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UNIVERSIDADE GAMA FILHO
COORDENAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM DIREITO E ECONOMIA
CONTROVÉRSIAS ACERCA DA CONSTITUCIONALIDADE DO
RESSARCIMENTO AO SUS PELAS OPERADORAS DE PLANOS DE SAÚDE
José Francisco da Costa Júnior
Rio de Janeiro
2007
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2
UNIVERSIDADE GAMA FILHO
COORDENAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM DIREITO E ECONOMIA
CONTROVÉRSIAS ACERCA DA CONSTITUCIONALIDADE DO
RESSARCIMENTO AO SUS PELAS OPERADORAS DE PLANOS DE SAÚDE
Dissertação apresentada à Coordenação de
Pós-Graduação da UGF, área de
concentração em Direito e Economia, como
requisito parcial à obtenção do título de
Mestre em Direito.
José Francisco da Costa Júnior
Professor Orientador:
Doutor Francisco Mauro Dias
Rio de Janeiro
2007
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BIBLIOTECA/UGF
O(A) autor(a), abaixo assinado, autoriza ou não as Bibliotecas da Universidade
Gama Filho a reproduzir este trabalho para fins acadêmicos, de acordo com as
determinações da legislação sobre direito autoral, n(s) seguintes(s) formato(s)
Autorizado ( X ) Fotocópia ( X ) Meio digital
Não autorizado ( ) Fotocópia ( ) Meio digital
Assinatura do(a) autor(a) _____________________________________________
Atendendo Portaria 13/2006 da CAPES
O(A) autor(a), abaixo assinado, autoriza ou não a divulgação no sítio da CAPES.
( X ) Autorizado ( ) Não autorizado
Não sendo autorizado, justifique.
JUSTIFICATIVA:
Assinatura do(a) autor(a): _____________________________________________
4
Para Marilze, Tainá e Taís, que suportaram minha
impaciência, sofreram minhas ausências e souberam
me incentivar a não desistir.
5
Agradeço a meus pais, irmãos e amigos do magistério
e da advocacia que, da forma como puderam, me
prestaram grande ajuda.
Ao Dr. Francisco Mauro Dias, meu orientador, minha
gratidão especial, porquanto sempre se mostrou
receptivo; pela força e dedicação, e apesar dos
obstáculos surgidos no curso do trabalho, não me
deixou desistir, mostrando-me, a seu modo, que eu
seria capaz.
6
RESUMO
Este trabalho se constitui numa discussão sobre o instituto do Ressarcimento ao Sistema
Único de Saúde – SUS pelas Operadoras de Planos Privados de Saúde – OPS. São levantadas
as hipóteses apresentadas pelas partes envolvidas na defesa de seus interesses, além das
posições – muitas vezes controversas – do Judiciário e também a postura do Ministério
Público Federal. Assim, promove-se uma reflexão sobre a natureza jurídica do instituto,
defendida pelas OPS como sendo um novo tributo institdo de forma irregular ou uma forma
de indenizar o Estado. Nesse sentido, entendem elas, tanto num caso quanto no outro,
totalmente indevida a exação. Já o Estado, através da Agência Nacional de Saúde
Suplementar – ANS, defende que não se trata nem de novo tributo, nem de indenização, mas
mero ressarcimento ao erário público por despesas que seriam encargos das OPS. Em meio a
essas posições, o Judiciário ora se pronuncia a favor das OPS, ora a favor da ANS. Observa-
se, ainda, se o instituto é mecanismo para se evitar o enriquecimento ilícito das Operadoras,
além de possibilitar a implementação das poticas de saúde pública previstas na Constituição
Federal de 1988 e na Lei 8080/90. Pretende-se, aqui, não a solução da questão, mas sua
discuso, oferecendo subdios para uma reflexão sobre o assunto. Até porque, ainda tramita
no Supremo Tribunal Federal, a ADIN 1931-8, pendente, pois, de decisão. Reveste-se de
especial interesse o tema em foco, haja vista o parco material doutrinário a respeito, além de o
modelo regulatório implantado no País ser ainda, para o mercado, bastante recente.
Intrigaram-nos em especial, as fundamentações das decisões que concediam ou rejeitavam
as liminares argüidas pelas Operadoras, dada a particularidade do tema.
Referência bibliográfica
COSTA JÚNIOR, Jo Francisco da. Controvérsias Acerca da Constitucionalidade do
Ressarcimento ao SUS Pelas Operadoras de Planos de Saúde. 2007. Dissertação.
(Mestrado em Direito) – Coordenação de Pós-Graduação. Universidade Gama Filho, Rio
de Janeiro.
Regulação; saúde; ressarcimento; SUS; constitucionalidade.
7
ABSTRACT
This work is a discussion about the compensation to Sistema Único de Saúde - SUS by the
Operadoras de Planos Privados de Saúde – OPS (Health Private Plans Operators). A
hypothesis presented by the involved parts on the defense of their interests, besides the
positions – many times controversial – of Judiciary and either the posture of the
Ministério Público Federal (Federal Public Ministry). So, a reflection about the juridical
nature of the institute is made, defended by the OPS as a new tribute established in an
irregular form or an State indemnification form. On this way, they understand, that on
both cases, is totally undue the rigid collecting of taxes. Now the State, by the Agência
Nacional de Sde Suplementar – ANS (Supplement Health National Agency), defend
that is not about a new tribute, neither about indemnification, but mere compensation to
the public treasury for cost that was in cured by the OPS. Through these positions, the
Judiciary sometimes is in favor of the HPO, sometimes is favorable to the SUS. It is either
observed that if the institute is a mechanism to avoid the illicit enrichment of the
operators, beyond the implementation of the health public politics foreseen on the Federal
Constitution of 1988 and on the Law 8080/90. It is asked not the solution of the question,
but a discussion, offering subsides for a reflection about the matter. Either because is still
in course on the Supremo Tribunal Federal - STF the ADIN 1931-8, pending decision.
The focal point is of special interest, because of the sober doctrinal material about it,
besides the regulatory model implanted on the Country. This has intrigued us in special
way, the foundations of the decisions that conceded or rejected the thresholds argued by
the Operators, due the particularity of the theme.
PRINCIPAIS SIGLAS
ABI – Aviso dos Beneficiários Identificados
ABRAMGE – Associação Brasileira de Medicina de Grupo
AIH – Autorização para Internação Hospitalar
ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar
ARG – Aviso de Ressarcimento ao Gestor
CADIN – Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal
CASSI – Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil
CID – Classificação Internacional de Doenças
CF – Constituição Federal
CNS – Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços,
criada em 1994, é uma entidade sindical de terceiro grau
CNSP - Conselho Nacional de Seguros Privados
CONSU – Conselho de Saúde Suplementar
CSS – Câmara de Saúde Suplementar
CTN – Código Tributário Nacional
DIDES – Diretoria de Desenvolvimento Setorial
DSS – Departamento de Saúde Suplementar
IN – Instrução Normativa
INPS – Instituto Nacional de Previdência Social
LOS – Lei Orgânica da Saúde
LPS – Lei dos Planos de Saúde
NOB – Normas Operacionais Básicas
OPS – Operadoras de Planos Privados de Saúde
PND – Programa Nacional de Descentralização
RDC – Resolução de Diretoria Colegiada
RN – Resolução Normativa
SAS – Secretaria de Assistência à Saúde, Ministério da Saúde
SIB – Sistema de Identificação de Beneficiário
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Supremo Tribunal de Justiça
SUS – Sistema Único de Saúde
TUNEP – Tabela Única Nacional de Equivalências de Procedimentos
SUMÁRIO
GINA
INTRODUÇÃO ....................................................................................................
10
I. REGULAÇÃO DE MERCADO .........................................................................
1.1. Noções sobre a regulação de mercado ...........................................................
1.2. Diferença entre regulação e regulamentação ...................................................
1.3. Agências reguladoras .....................................................................................
1.4. Histórico ........................................................................................................
1.5. Criação das agências .......................................................................................
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12
17
18
19
22
II. A SAÚDE NO BRASIL ..............................................................................................
2.1. A saúde na Constituição de 1988: saúde pública e saúde privada........................
2.2. O serviço público de saúde .......................................................................................
2.3. O regime jurídico ......................................................................................................
2.4. Definição de saúde complementar e saúde e suplementar ....................................
24
24
24
26
28
III. REGULAÇÃO DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE NO BRASIL .........
3.1. Histórico do mercado de planos privados de saúde no Brasil – síntese..............
3.2. Regulação da saúde suplementar ...........................................................................
3.3. O marco regulatório de saúde no Brasil ................................................................
3.4. Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS ..................................................
3.4.1. Criação ....................................................................................................................
3.4.2. Finalidade ...............................................................................................................
30
30
34
36
38
38
38
IV. O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS.................................................................
4.1. Breves considerações ................................................................................................
40
40
5. O RESSARCIMENTO AO SUS.................................................................................
5.1. Controvérsias acerca do ressarcimento ao SUS ....................................................
5.2. Processamento do ressarcimento ao SUS ...............................................................
5.2.1 - Tabela única nacional de equivalência de procedimentos (Tunep)...................
5.3. Ressarcimento ao SUS – argumento do estado ......................................................
5.4. Ressarcimento ao SUS – argumento das operadoras de planos de saúde............
5.4.1. Primeira hipótese – contribuição social ..................................................................
5.4.2. Segunda hipótese – novo tributo .............................................................................
5.4.2.1. da natureza tributária do ressarcimento ao sus ....................................................
5.4.2.2. ressarcimento como taxa. hipótese de incidência.................................................
5.4.2.3. o que vem a ser serviço divisível como elemento da taxa ...................................
5.4.2.4. da ofensa ao disposto no § 7û do art. 150 da constituição federal .......................
5.4.2.5. da ofensa ao princípio da legalidade ....................................................................
5.4.2.6. da ofensa ao princípio da anterioridade ...............................................................
5.4.3. Terceira hipótese - indenização ..............................................................................
5.5. Ressarcimento ao SUS e a disciplina das externalidades ...............................
5.6. Ressarcimento. argumentos do Judiciário e Ministério Público...........................
5.7. Decisões favoráveis à inconstitucionalidade do ressarcimento ao SUS ...............
5.8. Decisões favoráveis à constitucionalidade do ressarcimento ao SUS ..................
45
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59
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68
69
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71
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75
80
81
CONCLUSÃO................................................................................................................. 83
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 86
ANEXO A – EXCERTOS DA LEI 8080, DE JUNHO DE 1990................................ 89
ANEXO B – EXCERTOS DA LEI 9656, 03 DE JUNHO DE 1998............................ 93
ANEXO C – EXCERTOS DA LEI 9961, 28 DE JANEIRO DE 2000........................ 98
ANEXO D – RESOLUÇÃO RDC Nû 17, 30 DE MARÇO DE 2000 .......................... 101
10
INTRODUÇÃO
O Sistema de Saúde brasileiro experimentou alterações consideráveis desde a
Constituição Federal de 1988, passando pela Lei 8.080/90 e as leis 9.656/98 e 9.961/00,
respectivamente, Lei Orgânica da Saúde (LOS), Lei dos Planos de Saúde (LPS) e Lei de
Criação da Agência Nacional da Saúde Suplementar - ANS.
A regulação da Saúde Suplementar no Brasil gerou farta discussão jurídica em
torno da constitucionalidade de vários dispositivos das leis 9.656/98 e 9.961/00, seu
marco, em especial, do que dispõe sobre a obrigatoriedade de as operadoras de planos
privados de saúde ressarcirem ao Sistema Único de Saúde - SUS, todas as despesas
havidas por este, quando do atendimento de um cidadão contratante de plano privado de
saúde.
O presente trabalho se constitui de uma análise do disposto no artigo 32 da Lei
de Planos de Saúde, responsável pela compulsoriedade do referido ressarcimento,
defendido – obviamente – pela ANS, execrado pelas operadoras e objeto de decisões
controversas do Judiciário.
Objetivamos apresentar as posições do Estado, das Operadoras e a direção da
Jurisprudência, tudo no sentido de se entender onde e quando poderia haver
constitucionalidade ou não, considerando-se, ainda, a natureza jurídica do instituto em
estudo.
Abordamos no primeiro capítulo, as noções sobre a regulação de mercado no
Brasil de uma forma geral, enfocando a necessária distinção entre regulação e
regulamentação; as Agências reguladoras e seu histórico de criação.
No capítulo segundo, enfocamos a saúde no Brasil, assim como definida na
Constituição Federal de 1988 (saúde pública e saúde privada), o Serviço Público de
Saúde, seu regime jurídico e caracterização de saúde complementar e saúde suplementar.
Tratamos, no capítulo terceiro, da regulação do mercado de planos de saúde no
Brasil, seu marco regulatório, com um breve histórico do mercado de planos de saúde no
País e da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS.
No capítulo quarto, tecemos breves considerações sobre o Sistema Único de
Saúde, proposto pela Constituição Federal de 1988 e regulado pela Lei 8.080/90, para que
se entenda o instituto do ressarcimento, principalmente no que diz respeito ao argumento
11
do Estado, mormente no que concerne ao seu financiamento pelo Poder Público e pelas
pessoas naturais ou jurídicas.
O capítulo quinto se dedica ao cerne do trabalho, quer seja, o ressarcimento ao
SUS, como ele se processa, os argumentos do Estado, das Operadoras e do Judiciário e
Ministério Público. Destacamos, nos argumentos das Operadoras, as hipóteses levantadas,
quais sejam, contribuição social, novo tributo e indenização.
Finalmente, o capítulo sexto mostra a conclusão a que chegamos com a pesquisa,
indicando as circunstâncias em que o Ressarcimento ao SUS é considerado constitucional
e aquelas em que fere o disposto na Constituição Federal, sem deixar de considerar os
caminhos da doutrina e jurisprudência.
1. REGULAÇÃO DE MERCADO
“Na prática, a regulação de primeira ordem, orientada à
eficiência, é suplementada por uma regulação de segunda ordem,
social ou política, que, muito freqüentemente, relaciona-se com a
correção de efeitos indesejados do mercado muito mais do que
com a correção de defeitos do mercado”.
Bukard Eberlein
1.1. Noções sobre a regulação de mercado
A noção de regulação de mercado, marcadamente na área da saúde, é importante
para a compreensão do que se pretende neste trabalho. É dela que nasce toda a
problemática apresentada. Para tal mister, necessário conhecer, mesmo que en passant,
seus precedentes históricos e jurídicos.
Segundo Vítor Ramos
1
, Julian Tudor Hart defendeu e demonstrou que
a oferta de cuidados médicos de qualidade tende a variar em sentido inverso ao
das necessidades em saúde da população servida e que os efeitos desta lei se
acentuam onde os cuidados médicos estão mais expostos às forças de mercado,
atenuando-se onde esta exposição é mais reduzida (...) e que “deixar a
distribuição de cuidados médicos fazer-se em função do mercado é socialmente
primitivo, es historicamente ultrapassado e qualquer retorno a este cenário irá
acentuar a má distribuição dos recursos médicos.
Os trabalhos de Hart se fundaram em estatísticas demográficas e de saúde do
Reino Unido entre 1934 e 1968, concluindo que as pessoas e grupos que mais
necessitavam de cuidados de saúde eram exatamente aquelas a quem menos esses serviços
eram ofertados, mesmo num sistema público gratuito como é o caso do Reino Unido.
Outra conclusão a que chega Hart, é a de que, quando os serviços de saúde ficam
entregues à “regulação” própria das forças de mercado, aprofundam-se as iniidades
preexistentes na sociedade que, por sua vez, são condicionadas por muitos outros fatores.
De acordo com o mesmo articulista
2
,
Quando Bismark decidiu, pela primeira vez no mundo e quase cem anos antes
da enunciação, por Hart, da ‘The inverse law’, a criação de uma contribuição
obrigatória específica para um fundo ou ‘caixa comum, ou quando, no pós-
1
RAMOS, Vítor. Regulação na Saúde ... e a “lei da inversão de cuidados” de J. T. Hart. Jornal Médico de
Família. Lisboa. 2003; nº 52 (31 de outubro). Pág. 2
2
op. cit, pág. 2.
13
guerra, este financiamento começou a ser feito pelos impostos gerais, como no
caso do serviço nacional de saúde do Reino Unido, passou a existir uma ‘mão
vivel, um instrumento público, um dispositivo de protão social, para
contrariar as falhas de mercado
na saúde e para atenuar os efeitos da ‘lei de
invero dos cuidados. (destacamos)
A existência de falhas de mercado está relacionada ao comportamento
competitivo das empresas e decorre das imperfeições na concorrência. Tais imperfeições
impedem a promoção do bem-estar social que se pretende com a implantação de políticas
públicas. Dessa forma, faz-se necessária a regulação econômica, já que o mercado não
consegue se auto-regular.
Lado outro, as falhas de mercado produzem um fenômeno que a Ciência da
Economia denomina externalidades, ou seja, os efeitos externos sofridos por uma ou
mais pessoas em decorrência de uma ação ou omissão de outras (pessoas). Sobre as
externalidades (positivas ou negativas) reportar-nos-emos no catulo 5º, item 5.5.
No Brasil, as regras gerais da ordem econômica preconizada pela Constituição
Federal de 1988, estão fundadas na valorização do trabalho e na livre iniciativa, para que a
todos seja assegurada uma existência digna, conforme os ditames da justiça social (CF,
art. 170).
Nesse diapasão, a Constituição Federal indica os fins da política econômica
estabelecendo um conjunto de normas objetivando a organização da economia, fundando,
a ordem econômica, nos seguintes prinpios: I- soberania nacional; II- propriedade
privada; III- função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do
consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado
conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e
prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno
emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constitdas sob
as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Dise, ainda, ser “assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade
econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos
previstos em lei.” (art. 170, CF/88).
Interessa-nos, em especial, o princípio da livre concorrência, que se inter-
relaciona com a livre iniciativa e as condições de seu exercício não abusivo, nos termos do
art. 173, § 4º da CF/88. É que é exatamente nesse campo que se insere a intervenção do
Estado no domínio econômico. E esta pode se efetivar diretamente – oportunidade em que
14
o Estado se utilizará de empresa pública ou de sociedade de economia mista – ou
indiretamente – naquelas situações em que o Estado apóia determinada atividade
econômica de particulares.
De fato, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu, em seu artigo 174, que o
Estado é agente normativo e regulador da atividade ecomica. Dessarte, deverá ele
orientar-se pelos três planos definidos pela Carta Magna de 1.988, quais sejam: a) aquele
em que ele, o Estado, exerce uma atividade econômica diretamente
3
, nos limites impostos
ou permitidos constitucionalmente; b) aquele em que ele normatiza
4
a atividade
econômica; e, c) aquele em que ele planeja
5
, estimula ou favorece a atividade econômica.
Percebe-se que o legislador constituinte optou pelo modelo liberal de economia,
em que esta se desenvolve nos moldes da “lei da oferta e da procura”, limitando-se ao
nimo a presença do Estado como agente de exploração direta da atividade econômica.
Aliás, o exercício direto da atividade econômica pelo Estado deve se limitar ao
disposto no art. 173 da Constituição Federal, quer seja, apenas “quando necessária aos
imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos
em lei.
Contudo, no mesmo artigo, § 4º, a Carta da República dispõe que “A lei reprimirá
o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da
concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”, antevendo-se aí, a atividade reguladora
estatal, visto que não é de bom alvitre, deixar ou esperar que o mercado não se auto-
regule.
Essa função reguladora está prevista art. 174, também da Carta Maior: “Como
agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei,
as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor
público e indicativo para o setor privado.
3
CF/88: Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a explorão direta de atividade econômica
pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse
coletivo, conforme definidos em lei.
4
CF/88: Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da
lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e
indicativo para o setor privado.
5
CF/88, art. 174 e Decreto-Lei nº 200/67, art. 7º: “Art. - A ação governamental obedecerá a planejamento que
vise a promover o desenvolvimento econômico-social do País e a segurança nacional, norteando-se segundo
planos e programas elaborados na forma do Título III, e compreenderá a elaboração e atualização dos seguintes
instrumentos básicos: a) plano geral de governo; b) programas gerais, setoriais e regionais, de duração
plurianual; c) orçamento-programa anual; d) programação financeira de desembolso.
15
O Estado, pois, tem o dever constitucional de orientar e corrigir os desvios do
processo econômico, fenômeno que Eros Grau denomina exercício da capacidade
normativa de conjuntura.
Segundo esse autor,
A capacidade normativa de conjuntura é exercida por meio de normas
emanadas do Poder Executivo, seja por intermédio da administração
centralizada, seja por alguns de seus entes autônomos, daí advindo a função
normativa. É a exigência de produção de normas de maneira imediata,
decorrentes da imposição da conjuntura econômica.o normas editadas pelo
Poder Executivo, visando dinamismo e flexibilidade, que são mais adequadas à
realidade econômica, tarefa que o Poder Legislativo não se apresenta
devidamente aprestado
6
.
A economia, pois, pelo seu dinamismo, exige agilidade na elaboração de normas,
donde o legislador constituinte permitiu ao Poder Executivo, o exercício da capacidade
normativa de conjuntura, que em última análise, é atividade de regulação exercida pelas
chamadas agências reguladoras, que será objeto de nossa análise em capítulo à parte.
Em “A Riqueza das Nações”, Adam Smith, na tentativa de justificar a doutrina do
Liberalismo Econômico, introduziu o termo “mão invisível” segundo a qual, numa
economia de mercado, a interação de indivíduos seria suficiente para acomodar a oferta e
a procura (e, via-de-regra, os preços, a qualidade, a quantidade etc), de modo a equilibrar
o mercado, mesmo não havendo uma entidade reguladora que fiscalizasse ou controlasse
todas as ações mercadológicas.
É certo que o mercadoo se auto-regula. Tamm é cediço que o Estado não
consegue regular todas as decisões, pois é-lhe impossível monitorar perfeitamente
fornecedores e consumidores. Da mesma forma, é impossível o estabelecimento de contratos
perfeitos. Decorre disso que as forças de mercado têm papel relevante em relação ao grau de
intervenção do governo. E essa intervenção se faz pelo viés da regulação.
Pires e Piccinini
7
entendem que a regulação objetiva:
a) Buscar a eficiência econômica, garantindo o serviço ao menor custo para o
usuário; b) Evitar o abuso do poder de monopólio, assegurando a menor diferença
entre preços e custos, de forma compatível com os níveis desejados de qualidade do
serviço; c) Assegurar a universalização do serviço; d) Assegurar a qualidade do
serviço prestado; e) Estabelecer canais para atender as reclamações dos usrios ou
consumidores sobre a prestação dos serviços; f) Estimular a inovação (identificar
oportunidades de novos serviços, remover (obstáculos e promover políticas de
6
GRAU, Eros. Planejamento econômico e regra jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 69.
7
PIRES, J. C. L. PICCININI, M. S. A regulação dos setores de infra-estrutura no Brasil. In: GIAMBIAGI,
F.; MOREIRA, M. M. A economia brasileira nos anos 90. Rio de Janeiro: BNDES, 1999.
16
incentivo à inovação); g) Assegurar a padronização tecnológica e a compatibilidade
entre equipamentos; h) Garantir a segurança e proteger o meio ambiente.
Decerto que, para o Estado, motivos existem vários para se buscar a regulação,
sendo o principal deles, o atingimento do interesse público, que certamente, passa pelos
objetivos acima expostos.
Nesse sentido, Marcos Juruena
8
esclarece que “A regulação também auxilia na
imposição de informação, sem a qual não se pode tomar decies razoáveis, e na redução
de custos de transação (que, embora não associados à produção, podem interferir na
formação de preços)”. Contudo, prefere não estabelecer objetivos como numerus clausus,
pois entende bem mais amplo o campo de atuação do Estado ao adotar uma potica
regulatória, bem assim, ao definir a função regulatória deste:
“O papel do Estado, assim, é fazer algo quando o mercado não pode agir só,
valendo-se, pois, de ferramentas regulatórias como proibições, licenças, fixação
de padrões técnicos de produção, de padrões de desempenho, subsídios, controle
de pros provisão de informações, atribuição de direitos de propriedade e
responsabilidade; igualmente, a desregulação deve ser vista como uma
ferramenta de política regulatória, impedindo ou garantindo a entrada no
mercado dentro de determinadas condições, cada qual aplicável a um
determinado contexto em que se preste ao atendimento de objetivos específicos.
À burocracia cabe implementar tais poticas e a definição do uso da ferramenta
adequada, sob o devido controle de representantes eleitos pelo povo.
9
Resta cristalino que o campo de atuação do Estado comoempresário” se reduziu,
nos termos do art. 173 da Constituição Federal de 1988, dando lugar a que a iniciativa
privada assuma o seu papel de produzir riquezas e distribuí-la, mas agindo sob o controle
do Estado, pelo viés da regulação.
A regulação de mercado é modo de intervenção do Estado na economia, com o fito
de cumprir o que dispõe o comando constitucional, impedindo que o poder econômico oprima
os mais fracos na cadeia de produção com o capitalismo puro, bem assim que, nas relações de
consumo, sejam efetivamente protegidos os direitos do consumidor, consoante determinam as
Leis 8.884/94 (que dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem
econômica e dá outras provincias) e 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).
Essa, portanto, a noção de Estado Regulador, aquela em que ele se situa entre o
Estado Liberal e o Estado Intervencionista.
8
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo regulatório. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2002,
pág. 36.
9
Op. Cit., pág. 37
17
1.2. Diferença ente regulação e regulamentação
No Brasil, freqüentemente, observa-se certa confusão ao se empregar os
vocábulos ‘REGULAR` e `REGULAMENTAR`.
De um lado, tem-se que `REGULAMENTAR` consiste no ato – exclusivo do
Chefe do Poder Executivo, consoante disposto no art. 84, IV, da Constituição Federal de
1988 – de editar decretos que esclareçam os termos da lei e possibilitem seu fiel
cumprimento. Na verdade, `REGULAMENTAR` é uma atividade de natureza legislativa,
porém, privativa do Chefe do Executivo, como visto. É esse o ensinamento de JURUENA,
para quem regulamentar “... é orientar como a Administração e os administrados vão
cumprir os comandos estabelecidos na lei, mediante detalhamento dessas normas
10
.
`REGULAR`, lado outro, é tomado como modo de intervenção indireta do Estado
na Economia através da edição de “regras disciplinadoras da ordem econômica com o
objetivo de ajustá-la aos ditames da justiça social
11
”.
A `REGULAÇÃO` visa, pois, à imposição de regras – pelo Estado – que
previnam e/ou coíbam comportamento abusivo por parte do mercado, já que a auto-
regulação não contempla, por óbvio, todo o arcabouço da conduta das pessoas no mundo
dos negócios.
Mas o próprio texto constitucional toma um termo pelo outro, como no caso
artigo 197:
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo
ao Poderblico dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação,
fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou
através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito
privado.
Também o faz a lei 9.478/97, em seus artigos 36, inciso I do art. 39:
Art. 36. A licitação para outorga dos contratos de concessão referidos no
art. 23 obedecerá ao disposto nesta Lei, na regulamentação
a ser
expedida pela ANP e no respectivo edital.(grifamos)
Art. 39. O edital conterá a exigência de que a empresa estrangeira que
concorrer isoladamente ou em consórcio deverá apresentar, juntamente
com sua proposta e em envelope separado:
10
Op. Cit., pág. 24.
11
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de janeiro : Lumen Juris,
2005, pág. 827.
18
I - prova de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade
jurídica e fiscal, nos termos da regulamentação
a ser editada pela ANP;
(grifamos)
A propósito, a ADIN 3596, proposta pelo PSOL – Partido Socialismo e Liberdade
– questiona a constitucionalidade do comando contido no retrocitado art. 36 da referida lei
9478/97, quando dise em sua parte final “... na regulamentação a ser expedida pela
ANP..”.
Para ficar estreme de dúvidas, é, ainda, a lição de Juruena
12
: “... o mesmo se diga
em relação ao uso dos termos “regulação”, que é técnica, despolitizada e independente,
distinta da “regulamentação”; esta tem sede no art. 84, IV da CF, ao passo que aquela, no
art. 174”.
Por isso, preferimos, no presente trabalho, a adoção da definição de Juruena e
Carvalho Filho, por entendê-las mais hermeneuticamente consentâneas.
É esse o contexto do presente trabalho, em que se abordará a regulação das
atividades de saúde suplementar no Brasil, a partir do comando constitucional (art. 196 e
197) pelo qual A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante poticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação” e “São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder
Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle,
devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa
sica ou jurídica de direito privado.
1.3. Agências reguladoras
As agências são unidades organizacionais não atreladas ao organograma do
Executivo, mas vinculam-se aos ministérios de suas respectivas áreas de atuação. Seu
formato jurídico-institucional (autarquia especial) caracteriza-se pela independência
administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo, estabilidade de seus
dirigentes e autonomia financeira
13
.
12
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro : Lumen Juris. 2005.
pág. 326
13
BAHIA , Ligia. Saúde e Sociedade. v.14, n.2, p. 11, maio-ago 2005.
19
À guisa de introdução a esse pico, importante trazer a lição de Pedro Dutra
14
:
Quatro fatores concretos contribuíram para definir o modelo moderno das
agências reguladoras. O primeiro, a necessidade de decisões em tempo
econômico, dirimindo conflitos entre prestadores e entre estes e usuários.
Setores como os de serviços públicos demandam altos investimentos de
instalação e de manutenção e a solução tardia de conflitos vulnera
investimentos e compromete o devido atendimento ao consumidor.
O segundo fator é a habilitação técnica da agência, que lhe permita enfrentar a
complexidade inerente aos serviços regulados, inclusive exigindo dos
prestadores obediências às inovações tecnológicas.
O terceiro é de ordem econômica: a teno a ser permanentemente dominada,
entre a tendência ao monopólio natural, inerente a esses serviços, e o fato de
eles deverem ser prestados em um regime constitucional de livre mercado.
O quarto fator opera no plano jurídico: aqui a tensão se acha na conciliação do
interesse público, imantado pelo conjunto dos consumidores, e o interesse
privado, manifestado nas empresas prestadoras dos serviços.
E, para concluir, acerca do mesmo tema, Marcos Juruena
15
A eficiência de uma agência reguladora será medida pelo funcionamento
harmônico desses seus elementos inexos, e também pelo estrito cumprimento
das regras legais que lhe disciplinam a ação.
Esta se desdobra em três planos, objetivos e complementares entre si: a edição
de regras específicas, destinadas aos prestadores de serviço e aos consumidores,
a fiscalização do cumprimento dessas regras, dos contratos específicos e da lei,
por parte dos prestadores, e, por fim a repressão à violação das regras legais,
das obrigações contratuais e das normas regulatórias pelos prestadores de
serviço.
1.4. Histórico
Para Carvalho Filho
16
, com a modernização do Estado brasileiro preconizada pela
Constituição Cidadã, uma das medidas adotadas pelo Governo foi a da criação de um
grupo especial de autarquias a que se convencionou denominar de agências, cujo objetivo
institucional consiste na função de controle de pessoas privadas incumbidas de prestação
de serviços públicos, em regra sob a forma de concessão, permissão ou autorização, e
também na de intervenção estatal no donio econômico, quando necessário para evitar
abusos nesse campo, perpetrados por pessoas da iniciativa privada.
Com a implementação da potica que transfere para o setor particular a execução
dos serviços públicos e reserva para a Administração Pública a regulação, o controle e a
14
DUTRA, Pedro. A fiscalização dos serviços públicos privatizados. Rio de Janeiro: Gazeta Mercatil,
20.out.1998, p.A-3
15
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Desestatização, privatização, concessões e terceirizações. Rio de Janeiro.
Lumen Juris, p.256/257
16
Op. Cit. págs. 433/434
20
fiscalização da prestação desses serviços aos consumidores e a ela própria, o Governo
Federal teve a necessidade de criar entidades para promover, com eficiência, essa
regulação, controle e fiscalização, pois não dispunha de condições para enfrentar a
atuação dessas parcerias. Tais entidades, criadas com essa finalidade e poder, são as
agências reguladoras.
Para tanto, necessário se fez alterar o texto constitucional, dada a exigência que
este impunha, de o Estado se afastar do exercício direto das atividades econômicas, mas
não previa de que maneira seria o mercado regulado. Assim, da Emenda Constitucional n
8/95 alterou a redação dos art. 21, XI e do art. 177, § 2º, III, da CF, para determinar a
criação de órgãos reguladores:
Art. 21. Compete à União:
[...]
XI – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os
serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que dispo sobre a
organização dos serviços, a criação de um óro regulador e outros aspectos
institucionais.
Art. 177. Constituem monolio da União:
[...]
§ 2º. A lei a que se refere o § 1º disporá sobre:
[...]
III – a estrutura e atribuições do óro regulador do monopólio da União.
Mas não havia em nosso ordenamento jurídico-ecomico, nenhum ente ou órgão
que se equiparasse ao de que se necessitava para a regulação do mercado. O modelo se
baseou, então, no que já existia no Direito Comparado.
A regulação nos Estados Unidos busca o atingimento de metas e estimula a
competitividade, apresentando como configurações comuns, a regulação como ação
distinta e externa da atividade reguladora, a limitação à liberdade do regulado, o interesse
público geral, a existência de um padrão ou de um modelo.
Assim, afirma Arianne Brito Rodrigues Cal
17
: “A função reguladora das agências
norte-americanas só pode ser exercida se expressamente delegada pelo Poder Legislativo.
As leis, naquele país, se limitam a estabelecer parâmetros, princípios, conceitos
indeterminados e compete às agências a função de baixar normas reguladoras”.
17
CAL, Arianne Brito Rodrigues. As agências reguladoras no direito brasileiro. Rio de Janeiro : Renovar.
2003. pág. 72.
21
Embora, nos Estados Unidos, as agências sejam dotadas de grande especialização
e discricionariedade técnica a ponto de suas decisões, a princípio, se situarem fora do
alcance do controle judicial, Cal
18
argumenta que foram criadas leis no sentido de
uniformizar as normas de procedimento exaradas pelas agências reguladoras em benefício
dos administrados:
O Poder Judiciário Norte-Americano passou a examinar não só o
procedimento, mas também a razoabilidade das decisões que,
anteriormente, por serem decisões técnicas nem sequer eram
questionadas. Além do que se passou a examinar a
proporcionalidade entre as medidas aplicas pelas agências aos
administrados, em relação aos fins contidos na lei.
Em 190, foi promulgada a Lei sobre Negociação de Regulamentos
(Negotiated Rulemaking Act), codificada na Lei de Procedimento
Administrativo, permitindo que os interessados afetados pelo
regulamento participassem de sua elaboração, antes mesmo de
iniciar-se o procedimento estabelecido na Lei de Procedimento
Administrativo.
O Estado brasileiro buscou um modelo semelhante. E, aqui, os organismos que
mais se aproximavam das necessidades do Executivo para o exercio do Poder regulador
determinado pela Constituição Federal, eram as autarquias, previstas no art. 37, inciso
XIX, litteris: “somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a
instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à
lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação”. (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Antes de previstas constitucionalmente, desde 1943 as autarquias já eram
reconhecidas e dotadas de personalidade jurídica de direito público, além de integradas na
administração indireta e conceituadas no Decreto-Lei nº 200/67 (arts. 4º e 5º, I). Com a
Constituição Federal de 1988, foram constitdas como autarquias especiais, que passaram
a se chamar agências reguladoras.
Como autarquias de regime especial, recebem os privilégios que a lei lhes
outorga, indispensáveis para se atingir os fins almejados. São entidades, portanto, que
integram a Administração Pública indireta
19
.
18
Op. cit., g. 74.
19
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 6. Ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
22
Para realizar seus deveres e obrigações, tais autarquias deverão ser fortes e
atentas à área sob seu controle. Quer dizer: nos moldes do modelo estadunidense, deve ter
elevado grau de especialização e autonomia, sem o que, surgirá o risco de pessoas
privadas praticarem abusos de poder econômico, visando à dominação dos mercados e à
eliminação da concorrência, provocando aumento arbitrário de seus lucros.
A Constituição já caracterizou essas formas de abusos (art. 173, § 4º), cabendo,
dessa maneira, às novas agências autárquicas a relevante função de controle dos serviços e
atividades exercidos sob o regime de concessão.
De se considerar que, no Brasil, as agências reguladoras assumem o papel de
proteger os direitos dos consumidores, estimular a competitividade entre os
concessionários, garantir o serviço com qualidade, continuidade, eficiência, confiabilidade
e isonomia e velar pela constante atualização dos serviços.
1.5. Criação das agências
Visto está que não havia lei específica disciplinando a criação dessas agências
reguladoras, exceto quanto à Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e à
Agência Nacional de Petróleo (ANP), cuja criação foi prevista constitucionalmente.
São criadas, então, as agências, através de leis esparsas, como a de n 9.427/96
que instituiu a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL); a Lei nº 9.472/97, que
criou a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL); a Lei nº 9.478/97, instituindo
a Agência Nacional de Petróleo (ANP); a Lei nº 9.782/99, criando a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVS); a Lei 9.961/00, que instituiu a Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS); a Lei 9.984/00, criando a Agência Nacional de Águas (ANA) e a Lei
nº 11.182, de 27 de Setembro de 2005, que cria a Agência Nacional de Aviação Civil
(ANAC).
Com exceção das acima (ANATEL e a ANP), as demais agências não têm
previsão constitucional, o que para Di Pietro
20
, significa que a delegação está sendo feita
pela lei instituidora e, por isso, a função normativa que exercem não pode, sob pena de
inconstitucionalidade, ser maior do que a exercida por qualquer outro órgão
administrativo ou entidade da Administrão Indireta.
20
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. pág. 391/392.
23
Enfim, a criação das agências, obrigatoriamente, tem de obedecer aos dispositivos
constitucionais concernentes à defesa do consumidor, à ordem econômica e financeira, à
ordem social e aos princípios e normas da Administração Pública, dos servidores e
agentes públicos, do controle de despesas e finançasblicas e custeio de atividades a seu
encargo, marcadamente, o do art. 37, § 3º, litteris:
[...]
§ 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração
blica direta e indireta, regulando especialmente: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998).
I - as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral,
asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação
periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998)
II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos
de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII; (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
III - a disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de
cargo, emprego ou função na administração pública. (Incldo pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998)
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da
ação penal cavel.
[...]
§ 6º - As pessoas judicas de direito público e as de direito privado prestadoras
de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa.
Esses dispositivos estabelecem, nos termos do caput, a responsabilidade com a
qual as agências reguladoras têm de desenvolver suas atividades perante o cidadão
consumidor, demonstrando a preocupação do legislador com o seu controle, sua
finalidade.
2. A SAÚDE NO BRASIL
2.1. A Saúde na Constituição Federal de 1988
O art. 196 da cf/88 determina que a saúde é um direito de todos e dever do estado.
todos têm direito à saúde e o estado tem o dever de prestá-la. assim, será correto afirmar
que a saúde é um serviço público.
Note-se, no entanto, que a saúde, a exemplo da educação e da previdência, não foi
monopolizada. Quer dizer: nada obstante ser um serviço público, a assistência à saúde é
livre à iniciativa privada, conforme dispõe o art. 199, caput, da CF/88.
O Legislador Constituinte determinou que o Estado se desincumbisse da sua
quota-parte, sem impedir que a iniciativa privada empreendesse ações nas áreas de saúde,
de educação e de previdência, diferentemente do que ocorre com outros serviços, como
energia elétrica, saneamento básico (água/esgoto) e telefonia, verdadeiros “monopólios”
do Poder Público, que pode prestá-los centralizada ou descentralizadamente, através das
empresas governamentais ou de terceiros (concessionários e permissionários).
A assistência à saúde, portanto, não será sempre um serviço público. Será serviço
público quando desempenhada, diretamente ou mediante convênio/contrato (art. 199, § 1º,
CF/88), pelo Poder Público. Será serviço particular quando desempenhada pelo particular:
iniciativa privada.
2.2. O serviço público de saúde
O Prof. Caio Tácito afirma que “entre as mais árduas missões do jurista, no
campo do Direito Administrativo, figura a de conceituar, adequadamente, o serviço
público
21
”.
Renato Alessi considera-a una delle piú incerte e nebulose di tutto quanto il
campo del diritto publico
22
.
Nada obstante, é possível identificar certos contornos próprios do serviço público,
a partir dos quais se torna possível a abordagem precisa do tema.
21
TÁCITO, Caio. Temas de Direitoblico. Renovar, vol. 1, 1 ed., 1977, pág. 637.
22
Cit. por Caio Tácito, op. cit. pág. 637.
25
Dentro dessa ótica, Marcelo Caetano assevera que “chamamos serviço público ao
modo de atuar da autoridade pública a fim de facultar, por modo regular e contínuo, a
quantos deles careçam, os meios idôneos para a satisfação de uma necessidade coletiva
individualmente sentida
23
”.
A opinião do jurista lusitano se ajusta ao ponto de vista de Maurice Hauriou, para
quem “serviço público é o serviço prestado ao público, de uma maneira regular e
contínua para satisfação de uma necessidade de ordem pública
24
”.
Paulo César Melo da Cunha
25
ensina que
“Sob uma ótica genérica, serviço público é todo aquele prestado pela
Administração, convindo advertir que ODETE MEDAUAR considera que à
expreso ‘serviço público’, por vezes, é conferido um espectro tão amplo que
sua concepção englobaria as atividades dos Poderes Legislativo e Judiciário.
Conclui, porém, que como atividade administrativa que é, se insere no âmbito do
Poder Executivo, tendo em vista que, sob o aspecto funcional, as ações
desenvolvidas pelos demais poderes de Estado não caracterizariam o sentido
técnico de tal atividade.
O servo público, a par da polícia administrativa, do ordenamento econômico e
do ordenamento social, se insere nas modalidades de atividades da
Administração Pública, que, desde que a sociedade transferiu o exercício do
poder para as mãos do Estado, dele espera o atendimento dos interesses das
diversas coletividades.” (destaques do original).
De seu turno, Carvalho Filho
26
, depois de apontar o conceito firmado por alguns
doutrinadores pátrios e aliegenas, explica que
“o conceito deve conter os diversos critérios relativos à atividade pública. De
forma simples e objetiva, conceituamos serviço público como toda atividade
prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de
direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e
secundárias da coletividade(destaque do original).
O aspecto que se pretende por em relevo, com base na lição de Jéze, reside no
fato de que
todas as vezes que se está em presença de um serviço público propriamente
dito, verifica-se a existência de regras jurídicas especiais, teorias jurídicas
especiais, todas elas com o objetivo de facilitar o funcionamento regular e
contínuo do serviço público, dar a maispida e cabal satisfação às
necessidades de interesse geral e, por esses motivos, tais regras são susceptíveis
de modificação a qualquer momento
27
.
23
CAETANO, Marcelo. Princípios Fundamentais do Direito Administrativo. Forense, 1 ed., pág. 265.
24
Cit. por José Matos de Vasconcelos. Direito Administrativo. Imprensa Oficial, 1 ed., vol. 1,g. 127.
25
CUNHA, Paulo César Melo da. A Regulação jurídica da sde suplementar no Brasil. Rio de Janeiro.
Lumen Juris. 2003. págs. 13 e 14
26
Op. Cit., pág. 301.
27
Cit. por José Matos de Vasconcelos , op. cit.,g. 127.
26
Em síntese, o serviço público tem por objetivo o atendimento de uma necessidade
de ordemblica, devendo ser prestado de forma regular e contínua, sujeitando-se,
portanto, a regras jurídicas especiais; ou, nas palavras do Prof. José Cretella Jr., é “toda
atividade que as pessoas jurídicas exercem, direta ou indiretamente, para a satisfação das
necessidades coletivas mediante procedimentos peculiares ao direito público.
28
Vê-se que a caracterização de um serviço como sendo de natureza pública decorre
do fato de que seu regime jurídico obedece a normas de direito público, submete-se ao
regime jurídico de direito público, enquanto o serviço privado se submete ao regime
jurídico privado.
Então, será perfeitamente adequado trazer à colação a lição do Prof. Themístocles
Brandão Cavalcanti, para quem “o essencial no serviço público é o regime jurídico a que
obedece, a parte que tem o Estado na sua regulamentação, no seu controle, os benefícios e
privilégios de que goza, o interesse coletivo a que visa o servir”
29
.
A conclusão é irrefutável: o que caracteriza o serviço público é o fato de estar
submetido a um regime de direito público. E a explicação é insofismável: o regime
jurídico público consagra a autoridade, o imperium, com que o Estado deve se haver ante
seus misteres.
Logo, a saúde prestada pelo Poder Público, nas três esferas de governo,
diretamente ou através de convênios ou contratos de direito público, são serviços públicos
e regem-se por regime jurídico de direito público.
A saúde prestada por particular é serviço privado e rege-se pelo regime jurídico
de direito privado.
2.3. O regime jurídico
Para a compreensão do tema, é conditio sine qua non ter em mira que a distinção
entre um serviço público e um serviço privado reside fundamentalmente no regime
jurídico a que se submete.
28
CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de Direito Administrativo. Forense, vol. IV, 1 ed., pág. 55.
29
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo. Freitas Bastos, 5 ed., pág. 210.
27
O serviço de saúde, enquanto um serviço público, está a cargo das pessoas
jurídicas de direito público (titularidade); o serviço de saúde, enquanto um serviço da livre
iniciativa privada, está a cargo das pessoas judicas de direito privado.
As pessoas jurídicas podem ser de direito privado ou público. A divio existe
porque o ordenamento jurídico disciplina dois tipos distintos de regime jurídico: o público
e o privado. O regime exprime a iia, sistema ou modo de regular, pelo qual as coisas,
instituições e pessoas devem se conduzir. O regime jurídico privado é regulado pelo
Direito Privado; o regime jurídico público, pelo Direito Público.
Será acertado dizer, então, que, no regime privado, o sistema é elaborado de
modo a que as coisas, instituições e pessoas sejam reguladas e conduzidas com estrita
observância ao prinpio da isonomia. No regime jurídico público, ao contrário, as coisas,
instituições e pessoas são reguladas e conduzidas com estrita observância ao princípio da
supremacia do interesse público. Em outras palavras, “...distinguem-se relações de
coordenação entre sujeitos de nível igual, e relações de subordinação entre sujeitos de
vel diferente, dos quais um é superior e outro inferior: as relões de direito privado
seriam caracterizadas pela igualdade dos sujeitos, e seriam, portanto relações de
coordenação; as relações de direito público seriam caracterizadas pela desigualdade dos
sujeitos, e seriam portanto relações de subordinação
30
.
No serviço privado, regido pelo direito privado, predomina a isonomia entre os
interesses particulares. “Sob esse ângulo, interesse privado é aquele submetido ao regime
jurídico do direito privado. Caracteriza-se, principalmente, por sua disponibilidade e pela
equivancia com outros interesses privados (princípio da autonomia da vontade e da
igualdade das partes na relação judica).
31
No serviço público, regido pelo direito público, predomina a supremacia do
interesseblico sobre o interesse particular e, portanto, o Estado o desempenha valendo-
se de prerrogativas, de autoridade
32
.
É, ainda, a lição de Carvalho Filho
33
, que se amolda perfeitamente ao caso em
tela:
30
BOBBIO, Norberto. Direito e estado no pensamento de Emanuel Kant. 2. ed. São Paulo : Mandarim. 2000.
pág. 83.
31
PRADE, Péricles. Conceito de Interesses Difusos. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987. pág. 31.
32
O poder de autoridade se manifesta, ao menos, de duas formas distintas: a) impondo unilateralmente
comportamentos aos particulares; b) atribuindo direitos aos particulares, através de vínculo não obrigacional
(SUNDFELD, Carlos Ari). Fundamentos de direito público. São Paulo. Malheiros. p. 149).
28
“Existem algumas atividades que, exercidas por particulares, poderiam indicar,
numa ótica genérica, a prestação de um serviço público, tendo em vista que
inegavelmente se destinam ao bem-estar de grupos sociais ou de comunidades
especificas da sociedade. É o caso de assistência médica ou de ensino
proporcionados por pessoas privadas, como entidades religiosas e organizações não-
governamentais. Numa visão jurídica, entretanto, tais atividades não constituem
serviços públicos, porque não são executados sob o regime jurídico de direito
público, mas sim dentro do âmbito normal das pessoas privadas que têm na
solidariedade ou assistência social um de seus objetivos institucionais. Mesmo que o
Poder público tenha o poder de regular e fiscalizar essas atividades, a atuação estatal
se faz dentro do âmbito normal de controle, e não sob um sistema normativo
espefico, destinado à detalhada disciplina da atividade. Por conseguinte, é mister
distinguir: um posto médico municipal enseja a prestação de servo público de
assistência médica, mas um posto médico mantido por entidade religiosa reflete o
exercio de atividade privada.”
Vistos tais aspectos, cumpre, ainda, definir saúde suplementar e saúde
complementar.
2.4. Definição de saúde suplementar e saúde complementar
A assistência à saúde é um direito de todos e um dever do Estado, assim
determinado pela Constituição Federal de 1988, que admite, porém, que as ações e
serviços de saúde sejam prestados pela iniciativa privada. É o que se depreende do art.
199, caput, litteris: a assistência à saúde é livre à iniciativa privada.”
E, na iniciativa privada, tanto pessoas físicas quanto jurídicas de direito privado
(médicos, hospitais, cnicas, operadoras de planos de saúde, seguradoras), podem prestar
tais serviços, mediante uma contra-prestação dos consumidores.
Visto está que a assistência à saúde não constitui monolio do Estado. Mas por
se tratar de um direito fundamental, submeter-se-á à regulamentação, fiscalização e
controle do Poder Público quando prestada por entidade privada.
Assim, a chamada Saúde Suplementar é essa assistência exercida por entidades
privadas, financiada diretamente pelo consumidor.
Por outro lado, na tarefa de auxiliar o Estado a garantir a saúde aos cidadãos, as
instituições privadas poderão participar de forma complementar na assistência estatal à
saúde. Quando tais instituições privadas celebram contratos de direito público com o
Governo, passam a integrar o sistema público de saúde, razão pela qual se submetem aos
princípios e diretrizes que orientam o serviço público, nascendo daí, a Saúde
Complementar.
33
Op. Cit., pág. 303.
29
Nesse sentido, um hospital particular que celebra um contrato de prestação de
serviços com o Estado deverá prestar assistência, integral e gratuita (sendo posteriormente
remunerado pelo Estado) a todas as pessoas que a ele acorrerem.
Diz-se complementar porque essa participação das entidades privadas só ocorrerá
quando o sistema público não possuir meios para suprir as necessidades da população.
É o que disciplina o disposto pela Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990 (Lei
Orgânica de Saúde – LOS), em seu artigo 24:
Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a
cobertura assistencial à população de uma determinada área, o SUS poderá
recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.
Parágrafo único: A participação complementar dos serviços privados será
formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas
de direto público.
Tanto a saúde suplementar, quanto a complementar são prestadas por entidades
privadas; esta, segue as mesmas diretrizes e princípios do SUS; aquela, rege-se por
princípios de direito privado.
Em síntese, o Sistema de Saúde em que o cidadão paga, é suplementar e não
complementar, ou seja, ele suplementa o SUS e não o complementa. A suplementação é
algo extra. Trata-se de algo que não faz parte da obrigação, mas que, por ser uma questão
de escolha pessoal, se deseja. Seria como se, tendo recebido 100% de algo, se quisesse
mais 20% e, por isso opta-se por ter um gasto maior. A complementação, ao contrário, é
parte da obrigação, como se uma parte fizesse 80% de algo e a outra parte devesse fazer
os 20% restantes. Trata-se do direito de escolha exercido pelo cidadão e por ele pago à
custa de seus rendimentos.
3. REGULAÇÃO DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE NO BRASIL
3.1. Histórico do mercado de planos privados de saúde no Brasil - síntese
A hisria dos planos privados de saúde no Brasil, tem sua gênese nas décadas de
1940 e 1950
34
, a partir da iniciativa de empresas estatais (como o Banco do Brasil, através
da caixa de assistência de seus funcionários, a CASSI) e dos governos estaduais que
criaram sistemas (formas) de assistência à saúde aos seus funciorios, eis que excluídos
da previdência social. Também, com a instalação das grandes empresas (mormente
indústrias multinacionais) que começam a oferecer a seus empregados a assistência
médica particular como forma de benefício (a essa modalidade de assistência suplementar
à saúde, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, definiu como Autogestão
35
).
Essa contribuição das empresas gerou o aparecimento, na década de 1960, das
chamadas “medicinas de grupo
36
, que se organizaram para oferecer a prestação de
serviço médico-hospitalar e de diagnóstico e terapia – ora através de “pacotes” pré-
elaborados por elas próprias, ora via programas assistenciais estabelecidos pelas empresas
contratantes.
Interessa apontar que a classe médica se sentiu incomodada com esta modalidade
de prática da medicina. Considerava que ela “mercantilizava” a medicina, eis que
34
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar. Regulação & Saúde: estrutura,
evolução e perspectivas da assistência médica suplementar / Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde
Suplementar. – Rio de Janeiro: ANS, 2002. p. 10/12.
35
Art. 2º Para efeito desta resolução, define-se como operadora de planos privados de assistência à saúde na
modalidade de autogestão: I – a pessoa jurídica de direito privado que, por intermédio de seu departamento de
recursos humanos ou óro assemelhado, opera plano privado de assistência à saúde exclusivamente aos
seguintes beneficiários: a) sócios; b) administradores e ex-administradores; c) empregados ativos e inativos; d)
ex-empregados; e) pensionistas; e f) grupos familiares dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores, limitado
ao terceiro grau de parentesco, consangüíneo ou afim; ou, II – a pessoa jurídica de direito privado sem
finalidades lucrativas que, vinculada ou não à entidade pública ou privada, opera plano privado de assistência à
saúde exclusivamente aos seguintes beneficiários: a) empregados e servidores públicos ativos; b) empregados e
servidores públicos inativos; c) ex-empregados e ex-servidores públicos; d) sócios, administradores e ex-
administradores, quando for o caso; e) empregados ativos e inativos, pensionistas e ex-empregados da própria
pessoa jurídica; e f) grupos familiares dos beneficiários descritos nos incisos anteriores, limitado ao terceiro grau
de parentesco, consaníneo ou afim. (ANS - Resolução Normativa – RN N° 137, 14. nov. 2006).
36
Medicina de Grupo é toda e qualquer pessoa jurídica que ofereça planos de assistência à saúde com
atendimento em serviços próprios de saúde ou de terceiros credenciados. É um sistema de atendimento médico-
hospitalar com serviços e hospitais próprios, e uma estrutura que inclui médicos e serviços auxiliares de
diagnóstico credenciados. Sua representação em âmbito nacional se faz através da ABRAMGE – Associação
Brasileira de Medicina de Grupo.
31
precificava o ato médico, delimitando até onde a atenção seria dispensada ao paciente,
“impedindo” o profissional de prosseguir com o tratamento caso este não constasse da
cobertura contratualmente pactuada.
Assim, uma vertente da classe médica se mobilizou em sentido contrário a tal
prática. Em Santos, SP, cria a União dos Médicos (hoje, Sistema Unimed), modalidade de
cooperativa de trabalho médico
37
, ainda na década de 1960, que hoje se transformou no
maior sistema de saúde privado organizado em cooperativa do mundo, uma concepção de
cooperativa genuinamente brasileira. Embora com características próprias, com o passar
do tempo, também as cooperativas tiveram de adotar uma estrutura de fornecimento de
assistência médica semelhante à da medicina de grupo, risco de não sobreviver no
mercado.
Identificando o filão de mercado, também as companhias seguradoras
38
, passam a
oferecer “produtos” neste segmento.
Estabelece-se, assim, a saúde suplementar no Brasil, como se vê, de maneira
“informal” do ponto de vista jurídico, já que não havia legislão a indicar parâmetros. A
única referência ao tema no Direitotrio até 1998, é a do Código Civil, no que respeita
aos seguros.
Nesse diapasão, a “regulação” legal se fazia por analogia ao capítulo dedicado
aos seguros, inserto no Código Civil de 1916, e, por isso mesmo, imprópria, dadas as
características diferentes. (E tanto é assim, imprópria, que com a lei 9.656/98, o segmento
do seguro saúde teve de se ajustar às normas editadas por esse novel diploma legal.)
Sem uma lei que regesse a matéria, as empresas, ditas fornecedoras de planos de
assistência à saúde (planos de saúde), elaboravam contratos segundo sua concepção de
necessidade da coletividade, mas muito mais, visando seu próprio desenvolvimento
econômico-financeiro. No mais das vezes, ludibriavam a boa-fé dos contratantes com
37
Cooperativas de serviços médicos ou odontológicos são toda e qualquer operadora organizada pelo modelo de
sociedade cooperativa por médicos, odontólogos e outros profissionais da saúde e que ofereça planos de saúde.
Nesse modelo de “empresa”, os contratantes (consumidores) são atendidos pelos cooperados, em serviços
próprios da Cooperativa ou por esta credenciados.
38
Companhias seguradoras: Sociedades Anônimas constituídas de acordo com a legislação específica para a
atividade de seguros e que comercializem seguros de saúde. Normalmente o contratante (consumidores) que
contrata um seguro-saúde escolhe o profissional ou empresa pelo qual quer ser atendido (dentro da rede própria
ou credenciada), paga pelo atendimento e depois é ressarcido pela seguradora dos valores despendidos.
32
cláusulas extremamente desfavoráveis aos fins a que se destinavam, o que se revertia em
lucros cada vez maiores.
Uma primeira intervenção do Estado que atingiu o segmento foi a edição do
Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078, 11 de setembro de 1990, em obediência ao
comando dos artigos 5º. XXXII, 170, V e 48, do Ato das Disposições Constitucionais
Transirias, da Constituição Federal de 1988.
No entanto, em que pese o Código de Defesa do Consumidor se revestir do
caráter de Lei de ordem pública e interesse social
39
, até o momento da edição da lei
9.656/98, muito pouco se alterou no comportamento prático, jurídico e mesmo judicial no
que tangia o cumprimento dos direitos do consumidor de planos privados de saúde.
Embora inúmeras ações judiciais se tivessem processado entre uma lei e outra, argüindo a
ilegalidade das cláusulas abusivas, a demora do Estado em implementar a prestação
jurisdicional postergou a necessária mudança de postura, até o ponto em que não mais era
possível sustentar aquele “estado de coisas”, exigindo-se uma ação mais incisiva do
Estado para estancar as práticas explorativas.
O assunto era (e é) de tal complexidade, que tramitava no Congresso Nacional,
desde 1993, o Projeto de Lei do Senado 93 (que mais tarde viria a se tornar a Lei
9.656/98), que buscava um entendimento acerca da regulação da matéria. Era preciso um
estudo minucioso das características do setor, das diversas realidades regionais do País,
das empresas que atuavam no segmento e, ainda, do próprio sistema oficial.
Não foi sem razão, portanto, que no período de apenas três anos, 24 projetos
distintos e 131 emendas foram oferecidas para tratar do assunto. Filtrar todas as propostas
e apresentar uma proposta final, foi tarefa que se viu do relatório do deputado Pinheiro
Landim, apresentada em outubro de 1997 ao plenário da Câmara, que o aprovou com
facilidade. Porém, não sem a contestação veemente das empresas que atuam no setor.
Embora não seja objeto deste trabalho, vale informar que 1998 foi um ano
eleitoral e o resultado da edição de uma lei dessa envergadura, com poderes de proteger o
consumidor que já não suportava as artimanhas do empresariado do setor, poderia trazer
inúmeros dividendos políticos. Foi o que ocorreu.
39
As normas de ordem pública, visam tutelar interesse amplo que, em regra, transcende aos conflitos dos
particulares, aos conflitos encontrados no Direito Privado, interpessoal (ACLIBES BURGARELLI, da Sexta
Câmara do 2º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, na apelação sem revisão 471.315-00/0, j. em 17.12.1996).
A inobservância do disposto numa lei ordem pública e interesse social é fulminada com a nulidade de pleno
direito.
33
Por isso, havia pressa em se aprovar o projeto. Todos sabiam da necessidade de
mais discussões e ajustes. E isso se conclui pelas notas taquigficas da sessão do Senado
Federal que aprovou o Substitutivo da Câmara ao Projeto de Lei do Senado nº 93/93: o
Parecer do Senador Sebastião Rocha (PDT/AP) dizia que havia necessidade de alterações,
devendo o Executivo lançar mão de Medidas Provisórias para corrigir suas
impropriedades.
Aos 03 de junho de 1998, o Congresso Nacional fez aprovar a Lei 9.656 (Lei dos
Planos de Saúde - LPS), que abrange tanto as operadoras de planos de saúde, seu modo de
constituição, capital e administração, quanto os produtos por elas oferecidos no mercado.
Seus dispositivos tratam, desde a autorização para funcionamento das empresas, até os
tipos de cobertura que devem constar dos instrumentos de contrato celebrados com
consumidores e prestadores de serviço terceirizados.
E no dia seguinte à publicação da lei, seguindo a orientação do senador Sebastião
Rocha, o Executivo iniciou a edição de um sem-número de Medidas Provisórias (44 ao
todo) que alteraram substancialmente o texto original, fruto de lobbies das operadoras,
mas também, da necessidade de se adequar o dispositivo legal à “novidade” chamada
regulação.
Inicialmente a lei determinou que o órgão público responsável pela regulação da
saúde fosse a Superintendência de Seguros Privados – SUSEP. Nessa determinação nota-
se a influência que a legislação anterior (capítulo sobre seguros do Código Civil de 1916)
exercia sobre o segmento.
Verificaram-se problemas de toda ordem, no entanto: carência de infra-estrutura
para atender as exigências legais; falta de pessoal qualificado; não-aceitação das empresas
do segmento em se sujeitarem à SUSEP, por não se caracterizarem como seguradoras,
embora a atividade guardasse semelhanças estreitas.
Finalmente, em dezembro de 2.000, a lei 9.961 e termo ao impasse, ao criar a
Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, pretendo jogar uma pá-de-cal sobre a
discussão. Mas a instalação da ANS também não foi pacífica, merecendo críticas, por
parte das operadoras, quanto à sua legalidade e competências. E um dos pontos que mais
geraram discussões foi a autonomia a ela conferida, principalmente no que concerne à
criação de mecanismos para obter receitas que a sustentem, reafirmando a obrigatoriedade
34
de ressarcimento ao SUS – Sistema Único de Saúde –, que, por isso, ensejou o presente
trabalho.
3.2. Regulação da saúde suplementar
Vimos que por várias décadas, o setor de saúde suplementar atuou sem uma
regulação que lhe fosse própria. Diversos segmentos surgiram, e com eles empresas que,
pelos mais variados motivos, fracassaram, causando prejuízos a consumidores e
prestadores de serviços.
Nesse período, face à ineficiência do Estado em prover o direito à saúde,
garantido pela Constituição, verificou-se um enorme crescimento do contingente de
consumidores de planos privados de saúde.
Como nem a Constituição Federal, nem a Lei nº 8.080/90 (Lei Orgânica da
Saúde, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências),
trataram de regular a atividade privada de assistência à saúde, surgiram inúmeras
iniciativas dos Poderes legislativos e executivos, federal e estaduais, de entidades
profissionais e de óros governamentais, voltados à elaboração de um regime jurídico
que a contemplasse.
Tais iniciativas ganharam relevo com a divulgação, pela imprensa, de freqüentes
problemas de restrição às coberturas dos chamados contratos de planos de saúde. Foram
de suma importância a intervenção do Judiciário decidindo favoravelmente ao consumidor
de tais serviços; gestões das entidades de defesa do consumidor e de médicos, acirraram
os casos de negativa de atendimento de clientes por parte das operadoras de planos e
seguros de saúde.
É dessa época, a edição, pelo Conselho Federal de Medicina – CFM, da
Resolução nº 1.401/93, que determinava que as empresas que comercializavam planos e
seguros de assistência privada à saúde, cobrissem todas as enfermidades previstas na
Classificação Internacional de Doenças (CID), sob pena de cancelamento do registro e
demais medidas administrativas cabíveis.
A CF/88 já erigira o marco de proteção jurídica da saúde pública para o cidadão
brasileiro, com a inserção do art. 196, que garante a saúde como direito de todos e dever
do Estado, conforme se viu.
35
Com a edição da Lei 9.656/98, o Estado passou a intervir indiretamente no setor
de assistência privada à saúde, regulamentando-o, fiscalizando-o e controlando-o.
Além de prever o modus operandi das operadoras e de seus produtos, previu a lei
de planos de saúde, a criação de um órgão regulador da atividade de saúde suplementar.
Dezoito meses depois, a Lei 9.961, de 29 de janeiro de 2000, instituiu a Agência Nacional
de Saúde Suplementar (ANS).
Como houve um lapso temporal de um ano e meio entre a edição da Lei 9.656/98
e a lei 9.961/00 que criou a ANS e até a sua instalação, a fiscalização das operadoras de
planos privados de assistência à saúde, no que concerne ao aspecto assistencial, foi
atribuída ao Departamento de Saúde Suplementar, do Ministério da Saúde (MS). Lado
outro, designou-se à Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), autarquia vinculada
ao Ministério da Fazenda, a fiscalização relativa ao seu aspecto econômico-financeiro.
Isso provocou a existência de dois vieses de fiscalização e dois órgãos federais diversos
para exercê-la no mesmo setor. Somente após a efetiva instalação da ANS, ainda que de
forma precária, a competência para regular, controlar e fiscalizar a atividade econômica,
em todos os aspectos passou a ser exercida por esta.
Finalmente, para Leonardo Vizeu Figueiredo
40
, a Saúde Suplementar passou a ser
mesmo, um novo ramo do Direito, dadas as suas particularidade e abrangência, definindo
...que o direito de saúde suplementar é o sistema de normas ou a disciplina
jurídica que tem objetivo tríplice: a) estabelecer regramento específico para se
garantir a qualidade técnica dos serviços privados de assisncia à saúde,
zelando pelos interesses dos consumidores; b) normatizar critérios financeiros
para a manutenção da higidez econômica do mercado, bem como para a
preservação dos agentes privados; e c) promover a defesa dos interesses
coletivos dos consumidores, zelando pela igualdade de acesso destes à
assisncia privada à sde, mediante padronização de contratos,
monitoramento e controle de preços, etc.
Destarte, podemos identificar que o direito de saúde suplementar objetiva o
estudo do disciplinamento jurídico da organização e do planejamento do
mercado de assisncia privada à saúde, a ser efetuada por parte do Poder
blico, norteando os agentes econômicos, regulando a disponibilização dos
serviços médicos prestados e, ainda, garantindo a defesa do consumidor.
Contudo, não comungamos com esse pensamento, eis que deriva mesmo do
poder regulador do Estado, como ocorre nas demais áreas por ele reguladas, como a
40
FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Curso de direito de saúde suplementar : manual jurídico de planos e
seguros de saúde. São Paulo : MP. 2006
36
telefonia, energia elétrica e outras que tais, inserindo-se no ordenamento jurídico como lei
ordinária.
3.3. O marco regulatório da saúde no Brasil
A Lei 9.656/98 é, inquestionavelmente, o divisor de águas da atividade privada de
assistência à saúde no Brasil.
Contudo a Lei 8.080/90
41
(LOS) já regulava, nacionalmente, as ações e serviços
de saúde, facultando seu exercício por pessoas naturais ou jurídicas de direito Público ou
privado, prescrevendo, nesse sentido, que o dever do Estado de garantir a saúde não exclui
o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.
Na esteira dos dispositivos constitucionais, reafirmou que a assistência à saúde é
livre à iniciativa privada e que, para esse mister, deverão ser observados os princípios
éticos e as normas exaradas pelo órgão de direção nacional do Sistema Único de Saúde –
SUS.
Mas seus dispositivos trataram da participação complementar da iniciativa
privada nas ações e serviços de saúde, executados pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Como visto no item 2.4 retro, há uma diferença fundamental entre participação
complementar e participação suplementar. A complementação é parte da obrigação e a
suplementação é extraordinária. Daí, a necessidade de uma norma que regulasse a saúde
suplementar.
Entende Paulo César Melo da Cunha
42
, que os dispositivos da Lei 8.080/90
constituem a base das ações privadas em termos de saúde pública no Brasil, litteris:
Embora considerada, também, a base da regulação das ações privadas de saúde
sob regime público, a disciplina do dispositivo veio com a mencionada Lei nº
41
Art. 1º - Esta lei regula, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada ou
conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito Público ou
privado.
Art. 2º - A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis
ao seu pleno exercio.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais
que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem
acesso universal e igualirio às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
§ 2º O dever do Estadoo exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.
(...) Art. 8º As ações e serviços de saúde, executados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), seja diretamente ou
mediante participação complementar da iniciativa privada, serão organizados de forma regionalizada e
hierarquizada em níveis de complexidade crescente.
42
Op. cit. p. 30
37
8.080, de 19 de setembro de 1990, que regula, em todo o terririo nacional, as
ações e serviços de saúde pública, executadas isolada ou conjuntamente, em
caráter permanente ou eventual, já se admitindo, desde seu art. 1º, a participação
de pessoas naturais ou jurídicas, de direito público ou privado na sua prestação.
O diploma, ao estabelecer o dever do Estado, não exclui o das pessoas, da
família, das empresas e da sociedade (princípio da subsidiariedade).
De fato, não tratou a Lei Orgânica da Saúde, da regulação da saúde suplementar.
Coube à Lei dos Planos de Saúde (9.656/98) esse desiderato.
Já em seu artigo (vide anexo B, deste trabalho), coloca sob sua regência, todas
as pessoas jurídicas de direito privado que operem planos de assistência à saúde e define o
que é um plano privado de assistência à saúde, bem assim, o que é uma operadora de
plano de saúde, lançando as bases dos requisitos essenciais à sua constituição e
funcionamento. Dispôs, ainda, que o órgão regulador seria a Agência Nacional de Saúde
Suplementar – ANS (que à altura da Medida Provisória 2177-44, de 24 de agosto de 2001,
já havia sido criada pela Lei 9.961/00).
As bases da regulação estão estampadas nesse primeiro artigo, que define o que é
um plano privado de assistência à saúde
43
, que pessoas
44
podem oferecê-los ao mercado e
a forma desse oferecimento, além de referir-se à ANS como órgão regulador, a essa altura
(da MP 2177-44), já criada pela Lei 9961/00.
Adiante, nos artigos 10 e 12
45
, determina as coberturas que os contratos de planos
privados de assistência à saúde se obrigam a oferecer, segmentando-as (as coberturas) em
a) ambulatorial (consultas médicas sem limitação, serviços de apoio diagnóstico e terapia,
além de tratamentos ambulatoriais); b) hospitalar (internações clínicas e cirúrgicas sem
limitação de prazo, valor máximo e quantidade, abrangendo todos os custos dela
decorrentes, inclusive os dos procedimentos ambulatoriais prestados durante a internação,
admitindo a exclusão, apenas, neste segmento, dos procedimentos de obstetrícia); c)
obstétrica (pré-natal, partos, assistência ao recém-nato filho natural ou adotivo nos
primeiros trinta dias e garantia da inclusão deste no plano do pai/mãe, sem cumprir prazos
43
Plano Privado de Assistência à Saúde: prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a
preço pré ous-estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a
assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente
escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica,
hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante
reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor. (Lei 9.656/98, art. 1
o
, I)
44
Operadora de Plano de Assistência à Saúde: pessoa jurídica constituída sob a modalidade de sociedade civil
ou comercial, cooperativa, ou entidade de autogestão, que opere produto, serviço ou contrato de que trata o
inciso I deste artigo. (Lei 9.656/98, art. 1
o
, II)
45
os artigos 1
o
, 10 e 12 da 9656, constam deste trabalho como anexo
38
de carência
46
); d) odontológica (consultas, exames auxiliares de diagnostico e terapia,
cirurgias menores
47
; e) plano-referência (todas as coberturas retro-mencionadas, exceto a
odontológica).
Finalmente, dispôs a Lei, que toda vez que um consumidor contratante de plano
privado de saúde utilizar-se da rede pública para receber qualquer atendimento previsto
nos artigos 10 e 12 retromencionados, obrigar-se-á a operadora do plano a ressarcir o SUS
pelo atendimento prestado. Essa disposição contida no artigo 32
48
da LPS é que gerou
grande celeuma, motivando inúmeras ações judiciais por parte das operadoras de planos
de saúde, que se julgaram prejudicadas. Tal reclamo é objeto também, deste trabalho e
será visto no capítulo V.
3.4. A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS
3.4.1. Criação
A Lei 9.656/98 nada diss sobre a criação de uma agência reguladora para o
setor. Isso porque as agências reguladoras que haviam sido constituídas até então, estavam
vinculadas aos setores que foram privatizados, o que não era o caso da saúde. No entanto,
os desencontros, tanto jurídicos, quanto econômico-financeiros, foram tamanhos que o
legislador optou pela criação de uma agência reguladora para o segmento, no intuito de
abrandar as dissensões.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar ANS foi instituída pela Lei n.°
9.961/00, regulamentada pelo Decreto n.° 3.327/00 e pela Resolução ANS n.° 593/2000,
que aprovou o seu Regimento Interno.
3.4.2. Finalidade
Consoante dispõe o art. 3º da Lei 9.961/00, A ANS tem por finalidade
institucional promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde,
46
Carência é o prazo ininterrupto, contado a partir do início da vigência do contrato, durante o qual os
associados não têm direito às coberturas contratadas.
47
o aquelas executadas no âmbito do ambulatório/consultório; procedimentos que não exigem uma estrutura
mais complexa para o atendimento.
48
Art. 32. Seo ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei,
de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos
contratos, prestados a seus consumidores e respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas,
conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema Único de Saúde - SUS.
39
regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e
consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no país.
Sua competência está disposta no art. 4º da mesma lei, em uma longa lista de 42
incisos, que compõe o anexo “C” ao presente trabalho.
Dentre eles destacamos o inciso VI, “Estabelecer normas para ressarcimento ao
Sistema Único de Saúde – SUS”, por se constituir no cerne de nosso trabalho.
4. O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS
4.1. Breves considerações.
Para se falar em ressarcimento ao SUS, deve-se conhecer, pelo menos de
passagem, o que seja o Sistema Único de Saúde.
Os direitos relativos à saúde (como também, à previdência e à assistência social)
são assegurados pela Constituição (Título VIII). No que toca à saúde, seu Capítulo II
dispõe “que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação” (art. 196).
As ações e serviços de saúde são de relevância pública e, por isso, devem ser
regulamentados, fiscalizados e controlados pelo Poder Público, mas sua execução pode se
dar direta ou, indiretamente através de terceiros (pessoas física ou jurídica de direito
privado).
Visto está que a CF/1988 estabelece o acesso universal e igualitário a todos os
cidadãos.
O princípio do acesso universal determina que os recursos e ações na área de
saúde pública devem ser destinados ao ser humano enquanto gênero, não podendo,
portanto, ficar restritos a um grupo, categoria ou classe de pessoas.
Lado outro, pelo princípio do acesso igualitário tem-se que pessoas numa mesma
circunstância patológica têm o direito de receber o mesmo tratamento, a mesma atenção
médica, à utilização dos mesmos recursos.
Cumprindo a disposição constitucional (art. 198), a Lei 8.080/90 estabeleceu os
princípios que regem a organização do SUS (art. 7º
49
), a saber: a) a descentralização (com
49
o art. 7º da Lei 8.080/90, estabelece os seguintes princípios: I - universalidade de acesso aos serviços de saúde
em todos os níveis de assistência; II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e
contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em
todos os níveis de complexidade do sistema; III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua
integridade física e moral; IV - igualdade da assisncia à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer
espécie; V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde; VI - divulgação de informações quanto
ao potencial dos serviços de saúde e sua utilização pelo usuário; VII - utilizão da epidemiologia para o
estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática; VIII - participação da
comunidade; IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo: a)
ênfase na descentralização dos serviços para os municípios; b) regionalização e hierarquização da rede de
41
direção única em cada esfera de governo); b) o atendimento integral e c) a participação da
comunidade.
Por descentralização entende-se a redistribuão da responsabilidade no que se
refere à atenção à saúde nos três níveis da Administração Pública, eis que, anteriormente,
as decies partiam do Poder Central, dificultando o atendimento.
Por atendimento integral entendem-se as ações de saúde voltadas, tanto para a
cura quanto, principalmente, para a prevenção, privilegiando-se ações de promoção da
saúde, num processo sistêmico, onde se inclui, também, o fornecimento de medicamentos
para o completo restabelecimento da saúde.
Já, pelo controle social (participação dos cidadãos) a Constituição garante que a
população, representada por entidades legalmente constitdas (Conselhos de Saúde, nos
termos da Lei n. 8.142/90), participará da elaboração das políticas públicas de saúde e do
controle de sua execução nos três níveis da Administração Pública.
Por esses princípios, evidenciou-se a percepção de que o legislador ordinário se
esforçou para flexibilizar o funcionamento do Sistema Único de Saúde, especialmente no
que concerne à proteção e promoção da saúde pública.
Isso foi importante porque os Municípios e os Estados passaram a comandar a
execução dos serviços, gerando economia e agilidade em relação ao que ocorria quando a
União centralizava todas as ações de saúde.
Em artigo para a revista Ciência & Saúde Coletiva, a professora Marta Arretche
50
,
do Departamento de Antropologia Política e Filosofia/Unesp, Faculdade de Ciências e Letras
de Araraquara, da Universidade Estaduallio de Mesquita Filho, elaborou a figura 1, abaixo,
a que denominou engenharia institucional do SUS”:
serviços de saúde; X - integração, em nível executivo, das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, na prestação de serviços de assistência à saúde da população; XII - capacidade de
resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e XIII - organização dos serviços públicos de modo a
evitar duplicidade de meios para fins idênticos.
50
ARRETCHE, Marta. Ciência & saúde coletiva. v.8 n. 2. Rio de Janeiro. 2003. disponível em
<http://www.scielo.br/pdf/csc/v8n2/a02v08n2.pdf
>, acessado em 21/07/2007.
42
Fig. 1 - Engenharia institucional do SUS - Marta Arretche
Explica, a autora, que essa estrutura está assentada em três dimensões, sobre as quais
pretende o Estado cumprir a disposição constitucional (descentralização, com direção única
em cada esfera de governo; atendimento integral e a participação da comunidade) de
proporcionar acesso universal e igualitário pelo cidadão às ações de saúde pública.
Numa primeira dimensão, o eleitor teria influência sobre as decisões dos governantes
de forma democrática. Assim, teria ele a oportunidade de, além de escolher quem ocupará os
cargos executivos e quais poticas atenderiam as necessidades da maioria, punir – pela via da
não reeleiçãoos maus governantes. Esse, o esteio da democracia e assim deveria funcionar.
A Constituição Federal de 1988 (no que foi seguida pela Lei 8.080/90) determinou
que o SUS se estruturaria como um sistema descentralizado e hierarquizado, incumbindo o
“município de prestar atendimento à população, e à União e aos estados a cooperação técnica
e financeira necessária ao desempenho dessa função”. Esta, a segunda dimensão da estrutura
proposta: a distribuição de funções entre os níveis de governo no SUS. É que, segundo a
autora,
“... no modelo brasileiro, é o governo federal que está encarregado das funções de
financiamento, formulação da política nacional de saúde e coordenação das ações
intergovernamentais, sendo que os governos estaduais também estão encarregados
do desempenho dessa função nos estados. Esse modelo de distribuição de funções
Conselho Nacional de
Saúde
Comissão Inter
g
estores
Tripartite
Comissão Inter
g
estores
Bipartite
Conselho Estadual de
Saúde
Conselho Municipal de
Saúde
Ministério da Saúde
Secretarias Estaduais
de saúde
Secretarias Municipais
de Saúde
Eleitor
Provedores
43
que, repito, não é o único adotado entre pses federativos tem como conseqüência
que o governo federal isto é, o Ministério da Saúde está encarregado de tomar as
decies mais importantes da política nacional de saúde. A concentração das funções
de financiamento no governo federal significa que as políticas dos governos locais
o fortemente dependentes das transferências deste ministério. Além disso, a
estratégia de construir um sistema descentralizado através de portarias editadas pelo
Ministério da Saúde as NOBs
51
(Lucchese, 1996; 2001; Carvalho, 2001; Goulart,
2001; Levcovitz, 2001) implica que neste nível de governo está concentrada a
autoridade para formular as regras que definem as ações de saúde de estados e
municípios. No plano estadual, as secretarias estaduais de Saúde também têm poder
de influência sobre as políticas de nível local, dada suas atribuições de coordenação
das ações, desde que suas políticas sejam congruentes com as regras do Ministério
da Saúde. A análise das relações entre os diferentes governos e seus municípios é
por demais complexa para ser tratada neste artigo.
[...]
Finalmente, as garantias institucionais do federalismo isto é, a autonomia política
de estados e municípios também devem funcionar como um contrapeso no plano
local à concentração de autoridade na União, porque estados e municípios podem ser
um ponto de veto à implementação de políticas federais, já que têm a prerrogativa
constitucional da não-adesão aos programas iniciados pelo governo federal ou pelos
governos estaduais. Em sua origem, na Convenção da Filadélfia nos EUA, o modelo
federativo de Estado teve como intenção deliberada suprimir a possibilidade da
tirania da União sobre os estados-membros, encarada como um grave problema dos
Estados Unitários do continente europeu (Ostrom, 1987).
Portanto, no SUS o governo federal deve "regular" as decisões dos governos locais
porque controla o financiamento e os mecanismos de coordenação
intergovernamental, mas, como contrapeso, estados e municípios têm direitos
institucionalizados de participação na formulação das regras das políticas que lhes
afetam diretamente e, no limite, têm a prerrogativa de não aderir à política federal.”
A terceira dimensão da estrutura institucional do SUS se refere às relações entre
governos e sociedade civil. É que tanto a Constituição Federal quanto as leis da Saúde
garantiram a participação de representantes da sociedade civil na formulação e implementação
da política de saúde, em todos os níveis de governo. Espera-se, com isso, um comportamento
responsável dos governos, bem como forçá-los à prática da negociação e da consulta, o que
também caracteriza o regime democrático.
Nesse passo, o ex-ministro da saúde, Adib Jatene
52
, afirma que
“oferecer o acesso à saúde de modo igualitário a toda população significa
reestruturar o Sistema Único de Saúde, adequando-o a uma forma de acordo
social abrangente. Ao contrastar a realidade contida no âmbito do direito posto,
existem normas no atual sistema jurídico aptas a oferecer o arcabouço necessário
a esta reestruturação.”
51
NOB’s: Normas Operacionais Básicas são instrumentos reguladores do processo de implementação dasões
públicas de saúde.
52
JATENE, Adib. Desafios da saúde no Brasil. Revista Brasil Rotário. Rio de Janeiro: Brasil Rotário, ano 80,
n. 995, p. 26-29, maio 2005. p. 27.
44
Cumpre frisar, no entanto, que, embora flexibilizado, o Sistema Único de Saúde
ainda padece de um mal importante, que é o seu financiamento. E, talvez, por isso, o
legislador tenha engendrado o chamado ressarcimento ao SUS, para minimizá-lo, já que
são enormes os problemas advindos da insuficiência de fontes de custeio, o que não foi
resolvido com o advento da LOS.
Nesse sentido, continua o ex-ministro:
“A carência de recursos representa um dos maiores problemas – senão o maior
– no cenário nacional. A Emenda Constitucional nº 29 objetivou equilibrar
despesas e receitas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Munipios
na área da saúde. Contudo, a manutenção do sistema e a defasagem de sarios
de prestadores de serviços nele inseridos atestam a necessidade premente de se
perquirir acerca de novos modos de obtenção de financiamento, aptos a cumprir
um verdadeiro papel social a pelo 75% da população brasileira (que dependem
exclusivamente do SUS, por não possuírem planos ou seguros de saúde)
53
.
Por tudo isso, o certo é que a estrutura do SUS é muito complexa: se por um lado
os representantes da sociedade civil têm garantido o direito de controlar e fiscalizar as
ações dos governos locais, por outro, o Ministério da Saúde tem também assegurado o
mesmo direito, assim como se garante aos governos locais a participação nas decisões do
Ministério da Saúde.
53
Em cotejo à realidade, nesta área, de países desenvolvidos, Jatene exemplifica: “Os franceses gastam US$ 100
bilhões por ano com a saúde pública, o que dá US$ 1,8 mil por habitante. O Canadá gasta US$ 2,2 mil e os EUA
estão chegando a US$ 4 mil por habitante – o que dá um total de US$ 1 trilhão. No Brasil, somando os gastos
dos
setores público e privado, aplicamos ao redor de US$ 300 dólares na saúde de cada habitante anualmente,
sendo que desse total US$ 200 são empregados pela iniciativa privada, que cuida de 35 milhões de pessoas – os
outros US$ 100 per capita são empregados pelo setor público para atender 140 milhões de brasileiros”. JATENE,
op. cit., p. 28,
45
5. O RESSARCIMENTO AO SUS
Convém, ao adentrarmos o assunto, bem definir o que seja ressarcimento.
Segundo Aurélio Buarque de Holanda
54
, ressarcimento é “o ato de ressarcir(-se);
indenização, reparação, compensação.”. Por sua vez, ressarcir é “indenizar, reparar,
compensar; abastecer, prover; (...) pagar-se.
Para Torrieri Guimarães
55
, Ressarcimento é reparação de dano, indenização,
satisfação de prejuízo ou despesa de outrem.
Assim entendido, o ressarcimento ao Sistema Único de Saúde – SUS, objetiva
recuperar numerário despendido com internações hospitalares de consumidores de planos
privados de assistência à saúde quando atendidos em hospitais próprios da rede pública ou
a ela conveniados. Visa, pois, garantir o recebimento daqueles valores ao argumento de
que referidos consumidores deveriam ter sido atendidos na rede hospitalar própria ou
credenciada da operadora de planos privados de saúde com a qual firmaram contrato.
Ocorre que nem todo consumidor de plano privado de saúde tinha (ou, mesmo
após a Lei 9.656/98, continua a não ter) direito a um atendimento integral. É que, como
visto, dependendo da modalidade de plano contratado, teria direito apenas à cobertura da
segmentação ambulatorial. Se necessita de uma cirurgia, por exemplo, esta não estaria
acobertada pelo plano. Forçosamente, na maioria dos casos, o consumidor contratante
desse plano irá se socorrer do SUS. Nesse caso, a operadora não estaria obrigada a atendê-
lo e, por conseguinte, não teria de ressarcir o SUS pelo atendimento por este prestado.
Surge, então, um impasse consistente da indagação se o ressarcimento é devido
ou não e, para soluciona-lo, as operadoras ingressaram com processos judiciais. Algumas
conseguiram liminares suspendendo a exigibilidade da cobrança. Outras, não.
Para se ter uma noção da vultuosidade do problema enfrentado, de um lado pela
Agência Nacional de Saúde Suplementar e, de outro, pelas Operadoras de Planos Privados
de Saúde, em 09 de agosto de 2006, a Associação Paulista de Estudos Tributários
divulgou em seu 14º Newsletter, notícia dando conta de que, segundo o Tribunal de
Contas da União – TCU, o Sistema Único de Saúde – SUS pode ter sofrido um prejuízo de
54
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro.
Nova Fronteira. 1986. pág. 1.496.
55
Guimarães, Deocleciano Torrieri (organizador). Dicionário Técnico Jurídico. São Paulo. Editora Rideel.
2003. pág. 470.
46
R$7 bilhões em sete anos (2000/2006) só com o não ressarcimento que as operadoras de
planos de saúde lhe deveriam ter feito
56
.
Pelo visto, o volume de valores movimentados a título de ressarcimento ao SUS,
gira em torno de R$1.000.000.000,00 (um bilhão de reais) por ano. É uma quantia
considerável, dada a situação de lamúria das estruturas do Sistema Público de Saúde no
Brasil.
De um lado, o Estado, via Agência Nacional de Saúde Suplementar, vê, no
instituto do Ressarcimento ao SUS, a oportunidade de lançar mão de tais valores para
minimizar a precariedade de seus atendimentos. De outro, as Operadoras de Planos
Privados de Saúde opõem resistência ao mesmo instituto, eis que fechada uma das
torneiras de suas “receitas”, ou melhor, de parte de suas despesas.
5.1. Controvérsias acerca do ressarcimento ao sus
Segundo Lígia Bahia
57
bem o demonstra, o instituto do ressarcimento ao SUS
pelas operadoras provocou uma grande discussão no Legislativo e no Judiciário, bem
56
Em investigação pedida pela Câmara, o Tribunal de Contas da União (TCU) detectou falhas administrativas
que podem ter provocado prejuízos de cerca de R$ 1 bilhão por ano ao Sistema Único de Saúde (SUS). Os erros,
atribuídos à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), são relativos à falta de ressarcimento integral dos
atendimentos feitos pelo SUS aos usuários de planos de saúde.
De acordo com a Lei 9.656/98, cabe à ANS cobrar o ressarcimento, com base na Tabela Única Nacional de
Equivalência de Procedimentos. Porém, o deputado Dr. Pinotti (PFL-SP) denuncia que a ANS cobrou das
operadoras de plano de saúde apenas 1/3 do que deveria. Procedimentos mais complexos, como quimioterapia,
tomografia, ressonância nuclear magnética e internações, não estariam sendo pagos ao SUS. O deputado afirma
que o suposto calote das operadoras de planos de saúde é "criminoso", pois tira recursos do SUS e dificulta o
atendimento à população de baixa renda.
A solicitação de investigação do TCU partiu da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara, por meio
de requerimento apresentado por Pinotti em outubro de 2004. O resultado da investigação do TCU foi divulgado
no Acórdão 1146/06.
Números do prejuízo: "O sistema público de saúde foi lesado em cerca de R$ 1 bilhão por ano desde o ano 2000,
o que significa até hoje R$ 7 bilhões", calcula Pinotti. "Isso é equivalente a tudo o que se gasta por ano em saúde
no município de São Paulo para 11 milhões de habitantes. Ou seja, é uma indecência, um crime", ressalta o
deputado.
Segundo ele, a situação é ainda mais grave quando se analisa a relação entre o número de usuários e o montante
de recursos movimentados nos sistemas público e privado de saúde. De acordo com o deputado, enquanto os
planos de saúde dispõem de R$ 42 bilhões por ano para atender 33 milhões de pessoas, o SUS teria apenas R$ 35
bilhões para aplicar no atendimento da população brasileira.
Controle: O TCU concluiu que os controles da ANS devem ser aprimorados para reverter o quadro de prejuízos
ao SUS. Em artigo publicado nos jornais Correio Braziliense e Folha de S. Paulo, o presidente da ANS, Fausto
Pereira dos Santos, argumenta que a agência reguladora tem atuado para garantir o equilíbrio do setor.
Ele pondera, no entanto, que enfrenta problemas com operadoras de planos de saúde que já faliram ou que
conseguiram liminares judiciais contra o ressarcimento. De acordo com a ANS, quase 60% das internações de
usuários do sistema privado no SUS não podem ser legalmente cobradas porque os planos de saúde não têm
cobertura para os procedimentos. Agência Câmara - Associação Paulista de Estudos Tributários, 14º Newsletter
da Abdir, 09.ago.2006”.
47
assim, no seio das empresas de planos de planos de saúde e mais recentemente nas
entidades de representação de hospitais privados.
Para ela, o ressarcimento é polêmico:
Por um lado, a cobrança pelo SUS do uso de serviços públicos por clientes de
planos de saúde tem sido avaliada como (sic) por gestores públicos, agências
multilaterais, como o Banco Mundial e o BID e setores da sociedade civil,
como uma ferramenta adequada à obtenção de maior equidade no
financiamento da saúde. Em contraste, as empresas de planos de planos de
saúde e mais recentemente entidades de representação de hospitais privados
consideram que cobrança de serviços (que são um direito de cidadania) é
inconstitucional. Em outros casos, os posicionamentos contrários ao
ressarcimento, ressaltam a inocuidade de tal instrumento de regulação em face
da superioridade das coberturas das empresas de planos de saúde, inclusive no
que se refere ao consumo de procedimentos de alto custo, relativamente àquelas
propiciadas pelo SUS.
O Poder Legislativo e o Poder Judiciáriom influenciando fortemente a
agenda de debates sobre o sub-sistema privado de saúde ao apresentar adendos
e reinterpretar a legislão reguladora. O Legislativo responde às fortes
pressões de prestadores de serviços.
Com efeito, o artigo 32
58
da Lei 9.656/98, estabelece a obrigatoriedade de as
operadoras de planos privados de saúde ressarcirem o Sistema Único de Saúde – SUS,
toda que vez que um contratante de seus planos fizerem uso da estrutura do sistema
público de saúde. E o faz de forma abrangente, ampla.
Pelo dispositivo, a Ancia Nacional de Saúde Suplementar se obriga a
disponibilizar a discriminação dos procedimentos realizados para cada consumidor,
através de um sistema de identificação dos consumidores de cada operadora. Para tanto,
todas as operadoras deveriam apresentar um cadastro com os dados de seus contratantes
57
BAHIA, Ligia. Padrões e mudanças no financiamento e regulação do sistema de saúde brasileiro: impactos
sobre as relações entre o Público e Privado. Saúde e Sociedade v.14, n.2, p.27, maio-ago 2005.
58
Art. 32º. Serão ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei,
de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos
contratos, prestados a seus consumidores e respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas,
conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema Único de Saúde – SUS. § 1º - O ressarcimento a que se
refere o caput será efetuado pelas operadoras à entidade prestadora de serviços, quando esta possuir
personalidade jurídica própria, e ao SUS, mediante tabela de procedimentos a ser aprovada pela ANS. § 2º - Para
a efetivação do ressarcimento, a ANS disponibilizará às operadoras a discriminação dos procedimentos
realizados para cada consumidor. § - A operadora efetuará o ressarcimento até o décimo quinto dia após a
apresentação da cobrança pela ANS, creditando os valores correspondentes à entidade prestadora ou ao
respectivo fundo de saúde, conforme o caso. § 4º - O ressarcimento não efetuado no prazo previsto no §3º será
cobrado com os seguintes acréscimos: I – juros de mora contados do mês seguinte ao do vencimento, à razão de
um por cento ao mês ou fração; IImulta de mora de dez por cento. § 5º - Os valores não recolhidos no prazo
previsto no §3º serão inscritos emvida ativa da ANS, a qual compete a cobrança judicial dos respectivos
créditos. § 6º - O produto de arrecadação dos juros e da multa de mora serão revertidos ao Fundo Nacional de
Saúde. § 7º - A ANS fixará normas aplicáveis ao processo de glosa ou impugnação dos procedimentos
encaminhados, conforme previsto no §2º deste artigo. § 8º - Os valores a serem ressarcidos não serão inferiores
aos praticados pelo SUS e nem superiores aos praticados pelas operadoras de produtos de que tratam o inciso I e
o §1º do art. 1º desta Lei.”
48
(incluindo dependentes e agregados), tais como, nome, filiação, inscrição no Cadastro de
Pessoas Físicas, número do contrato de plano de saúde e a segmentação contratada,
consoante demonstraremos no subitem 5.2, a seguir.
A particularização desses dados veio com a edição, pela Agência Nacional de
Saúde Suplementar, de várias resoluções, dentre as quais, a Resolução RDC Nº 62, de 20
de março de 2001, que estabeleceu as normas para o ressarcimento ao SUS previsto no art.
32 da Lei n.º 9.656, de 3 de junho de 1998.
Essa Resolução dispôs ainda, que seria criada a Tabela Única Nacional de
Equivalência de Procedimentos – TUNEP, para servir de parâmetro ao ressarcimento.
De sua vez, a TUNEP trouxe outra polêmica, pois seus valores eram, na maioria
dos casos, superiores aos que as operadoras despendiam com o atendimento a seus
consumidores, como se verá mais adiante.
O certo é que, de todos os ângulos que se analisava o instituto, ele era de fato,
polêmico. Ainda mais, se se considerar que o órgão regulador, recém-criado, ainda não
tinha a necessária estrutura física, de pessoal e instrumental, para processar todas as
informações e dados, não só a respeito do ressarcimento, mas de toda a legislação
reguladora.
5.2. Processamento do ressarcimento ao sus
Consoante disposto na RDC/ANS nº 62, a primeira obrigação das operadoras é
fornecer, periodicamente, à ANS, todas as informações e dados estatísticos relativos às
atividades que desenvolve, incluídas as de natureza cadastral. Estas, se comem do nome
completo, número do Cadastro de Pessoa Física – CPF, endereço completo, filiação, tipo
de plano contratado e outras, para os fins do art. 20
59
da Lei 9.656/98 (Lei dos Planos de
Saúde).
59
Art. 20. As operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei são obrigadas a
fornecer, periodicamente, à ANS todas as informações e estatísticas relativas as suas atividades, incluídas as de
natureza cadastral, especialmente aquelas que permitam a identificação dos consumidores e de seus dependentes,
incluindo seus nomes, inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas dos titulares e Municípios onde residem, para
fins do disposto no art. 32. § 1º Os agentes, especialmente designados pela ANS, para o exercício das atividades
de fiscalização e nos limites por ela estabelecidos, têm livre acesso às operadoras, podendo requisitar e apreender
processos, contratos, manuais de rotina operacional e demais documentos, relativos aos produtos de que tratam o
inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei. § 2º. Caracteriza-se como embaraço à fiscalização, sujeito às penas previstas
na lei, a imposição de qualquer dificuldade à consecução dos objetivos da fiscalização, de que trata o § 1º deste
artigo.
49
O objetivo de tal exincia é permitir à ANS a identificação dos consumidores de
cada operadora, criando um banco de dados que, uma vez cruzado com o banco de dados
do Sistema Único de Saúde – SUS (DATASUS), possibilita a identificação do
consumidor da operadora que se utilizar do sistema público de saúde.
A ANS criou e disponibilizou para as operadoras o chamado Sistema de
Informação de Beneficiários – SIB, pelo qual as informações são enviadas por meio
eletrônico à ANS.
Para oportunizar o cruzamento das informações, o SUS municia a ANS com o
envio das Autorizações de Internações Hospitalares (AIH), ou seja, uma lista com os
dados de todas as pessoas atendidas pelo SUS durante o período.
A ANS, por sua vez, cruza os dados das AIHs com o cadastro de clientes das
operadoras privadas e, dessa forma, identifica os atendimentos a serem ressarcidos.
Uma vez identificados quais consumidores de quais operadoras se utilizaram da
estrutura da Saúde Pública, a ANS envia comunicado às operadoras, acompanhado de
Aviso de Beneficiário Identificado (ABI), trimestralmente, com vistas ao recolhimento do
ressarcimento.
Conforme RDC/ANS 62, o ressarcimento é realizado utilizando-se como
parâmetro de preços, a Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos –
TUNEP, criada especialmente para esse fim.
O ABI tem as seguintes informações:
a) digo do beneficiário na operadora;
b) CNPJ da operadora;
c) nome, código e valores dos procedimentos de acordo com a TUNEP;
d) data do atendimento;
e) nome da unidade prestadora do serviço e sua natureza jurídica;
f) número e mês de competência do atendimento SUS;
g) município onde foi realizado o atendimento
Recebido o ABI (que é fornecido eletronicamente), a operadora tem 30 (trinta)
dias úteis para pagar ou apresentar à ANS, impugnações de caráter técnico e/ou
administrativo, acompanhadas de comprovação documental, para cada atendimento
50
realizado pelo SUS, individualmente. Isso deve ser feito junto à Gerência Geral de
Integração com o SUS/DIDES.
Se a operadora não impugnar, nem recolher o valor comunicado dentro do prazo,
o débito será inscrito no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público
Federal (CADIN) e será encaminhado processo à Procuradoria Geral da ANS, com o fito
de inscrever os valores na dívida ativa da Agência e posterior cobrança judicial.
Lado outro, se a operadora apresentar impugnação no prazo, a ANS terá 90
(noventa) dias para analisar, publicar e enviar à operadora, resultado da referida análise.
Recebida decisão a respeito das impugnações apresentadas, a operadora pode
interpor recurso à Diretoria de Desenvolvimento Setorial (DIDES) para as AIH´s
indeferidas, no prazo de 15 (quinze) dias corridos.
O prazo para a decisão final sobre os recursos será de no máximo noventa dias
contados a partir do dia 15 do mês subseqüente ao término do prazo para a interposição do
recurso.
A polêmica que se cria origina-se na resistência das operadoras em cumprir com o
disposto nas normas retro por entendê-las inconstitucionais, ao tempo em que lhes
decotariam parte de seus ganhos –, bem com como na posição da ANS de considerá-las
(as mesmas normas) perfeitamente constitucionais.
Segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde – CONASS:
Na regulamentão do ressarcimento, até a RDC n. 62, de 20 de março de 2001,
eram objeto de ressarcimento os atendimentos “realizados por unidades
públicas de saúde e os de urgência e emergência, realizados por
estabelecimentos privados, conveniados ou contratados pelo SUS”. A RN n. 93,
de 18 de março de 2005, alterou esse dispositivo, retirando os dois incisos que
delimitavam o tipo de atendimento a ser ressarcido.
O SIA/SUS possui três documentos distintos para o faturamento dos presta-
dores de serviços: a FAA
60
, a guia de SADT
61
e a APAC
62
. Apenas a APAC
permite um processo de identificação e batimento semelhante ao realizado com
as AIHs, pois permite, após o faturamento, a identificação individual do
paciente. As demais têm seu faturamento globalizado e não permitem a
identificação individualizada do paciente. Assim, elaso são pasveis de
cobrança do ressarcimento, com a técnica de identificação utilizada hoje.
60
FAA - Ficha de Atendimento Ambulatorial
61
SADT – Serviço de Apoio Diagnóstico e Terapia.
62
APAC – Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade
51
A ANS vem realizando estudos para o início da cobrança do ressarcimento das
APACs, embora ainda não exista previsão para a implantação dessa cobrança
63
.
Um aspecto, porém, é relevante nesse processo: nem a lei 9656/98, nem a
Resolução RDC/ANS Nº 62, foram precisas ao determinar que as Operadoras estariam
obrigadas ao ressarcimento. Assim, o entendimento geral é o de que todas elas estariam
abrangidas pela exação, bem assim, todas as modalidades de planos oferecidos no
mercado.
Convém assinalar que existiam (e ainda existem) operadoras que
comercializavam (e ainda comercializam) os chamados planos de sde em custo
operacional” ou “cartão desconto”.
Essa modalidade de plano consiste em a operadora oferecer às empresas
contratantes de serviços de atenção à saúde, procedimentos de clínica médica (consultas,
Serviços Auxiliares de Diagnóstico e Terapia – SADT e até internações hospitalares,
embora estas, muito pouco freqüentes) faturando todo o custo à contratante pelo sistema
de pós-pagamento. Quer dizer, a Operadora somente recebe os valores relativos aos
procedimentos efetivamente realizados, acrescidos, claro, de uma “taxa” de administração.
Se num determinado mês, não houvesse qualquer utilização por parte dos consumidores
(empregados da empresa contratante), esta contratante pagaria apenas um valor per capita
pela disponibilização dos serviços.
A principal caractestica dessa modalidade de atendimento é a cobertura do
chamado “pequeno risco”, nome pelo qual se convencionou chamar o atendimento
ambulatorial (consultas e SADT’s, estes, também conhecidos como exames
complementares).
Ocorre que tais planos, pelas suas próprias características, não garantiam – nem
tinham a finalidade de garantir – qualquer cobertura sem o pagamento de seu respectivo
custo por parte de empresa contratante. Custo este, de menor valor, que o abrangia
procedimentos mais complexos, como medicina nuclear, hemodinâmica e cirurgias em
geral. Tudo, então, bastante previsível e sob controle.
Assim, quando um empregado da contratante, consumidor dos serviços do plano
em “custo operacional” necessitava de um procedimento cirúrgico, este não estava
63
BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Saúde Suplementar/Conselho Nacional de Secretários
de Saúde. – Brasília : CONASS, 2007. (Coleção Progestores – Para entender a gestão do SUS, 11). p.
167/168.
52
abrangido pela cobertura contratual. Ou seja, estava excluído da cobertura e, pelo
princípio da obrigatoriedade da convenção,o estaria obrigada a Operadora à cobertura,
mesmo que se tratasse de um caso de perigo de morte.
Nesse caso, necessariamente o empregado da empresa – e consumidores da
Operadora pelo plano em questão –, sem condições de arcar com os custos cirúrgicos,
procurará atendimento pelo SUS.
Não obstante tais características próprias desse produto, a ANS inseria nos Avisos
de Beneficiários Identificados, os nomes dos consumidores desses “planos”, exigindo das
Operadoras o ressarcimento ao SUS pelo atendimento.
A nosso ver, com razão, as Operadoras questionaram tal cobrança, eis que nada
receberam pela prestação do serviço que, por sua vez, também não realizaram.
Especificamente, nesse caso, não haveria o alegado enriquecimento ilícito por
parte das operadoras.
Outro fator de disrdia era (ainda é, com muito menos freqüência) o caso dos
homônimos. Mesmo de posse do cadastro dos consumidores das Operadoras, que contém
o número do CPF e a filiação, ainda assim, ocorre de um consumidor ser tomado como
outro.
Às vezes, ocorria de um sujeito que nunca saíra do interior de Minas Gerais, nas
comunidades rurais mais longínquas, ter seu nome identificado pelo SUS como tendo sido
atendido em uma de suas unidades de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Para encontrar
esse consumidor em sua comunidade e pedir pra ele uma declaração de que nunca esteve
no Estado do Rio Grande do Sul e, muito menos, se submetido a tal cirurgia, era um
Deus nos acuda”. Quando o procedimento cirúrgico era de alta complexidade (cirurgia
cardíaca, transplante) cujo custo é mais elevado, era ainda mais complicado, porque até se
encontrar o “paciente”, o prazo de defesa poderia ter-se escoado e a Operadora não ter
como se desincumbir de demonstrar que não estava obrigada ao ressarcimento.
5.2.1 - Tabela única nacional de equivalência de procedimentos (Tunep)
A elaboração de uma tabela que pudesse contemplar todo o complexo de
procedimentos médico-hospitalares e de serviços auxiliares (ou de apoio) de diagnóstico e
terapia capaz de satisfazer ao comando legal e às operadoras não foi tarefa fácil.
53
De um lado as operadoras (mesmo o aceitando o instituto do ressarcimento) –
que em sua maioria já utilizava a tabela da Associação Médica Brasileira (Tabela AMB) –
, propuseram que esta fosse o parâmetro, com ajustes, já que consideravam seus valores
elevados. De outro lado, o Conselho Nacional de Saúde Suplementar – Consu, propôs a
Tunep. E esta foi instituída através da Resolução nº 23, em 21 de novembro de 1999, com
valores que variavam entre os pagos pelo SUS e os da tabela da AMB,o sem veementes
reclamos das operadoras e entidades médicas. Aquelas, porque a consideravam ainda mais
elevada do que a da AMB. Estas, porque, efetivamente, não eram os valores pagos aos
médicos/hospitais pelo SUS.
Paralelamente, como parte de seu planejamento estratégico, a AMB iniciou a
elaboração de uma lista referencial de procedimentos médicos – segundo seu
entendimento – tecnicamente correta, equânime, com metodologia de instituições
econômicas experientes, e com a chancela das três entidades médicas nacionais – AMB
(Associação Médica Brasileira), CFM (Conselho Federal de Medicina) e Fenam
(Federação Nacional dos Médicos). Surgiu, assim, em março de 2000, a iia da tabela
denominada Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos - CBHPM.
Em 2003, com a atualização da TUNEP via RN nº 31, a Associação Médica
Brasileira, Conselho Federal de Medicina e Federação Nacional dos Médicos, publicaram
a quarta versão da Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos,
fruto do trabalho conjunto dessas entidades, com o apoio técnico da FIPE – Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas.
Veja-se, para exemplo, a diferença de valores para o procedimento
adenoidectomia” (extirpação cirúrgica das adenóides - Estrutura que lembra uma
glândula ou umnglio –, segundo o Dicionário Digital de Termos Médicos
64
), entre a
TUNEP e a CBHPM:
TABELA CÓDIGO PROCEDIMENTO PROCEDIMENTO VALOR
CBHPM 3.02.05.04-2 Adenoidectomia 172,00
65
TUNEP 37002031 Adenoidectomia 424,36
66
64
<http://www.pdamed.com.br/diciomed/pdamed_0001_0206.php>, acessado em 20/05/2007.
65
disponível em <http://www.amb.org.br/cbhpm_4edicao.php3>, acesso em 20/05/2007
66
Resolução Normativa ANS nº 31, de 07/04/2003. disponível em http://www.ans.gov.br - acesso 20/05/2007
54
Os valores acima se referem à TUNEP de 2003 e à CBHPM, 4
a
edição,
também de 2003.
A TUNEP, que foi republicada pela ANS com a RDC n. 17, de 4 de abril de
2000, e atualizada diversas vezes, está na sua versão número dez, com a RN n. 31, de
06 de junho de 2006, publicada no Diário Oficial da União no dia 07 de junho de 2006.
A justificativa para os valores finais definidos na Tunep, segundo Scatena
67
, é
de que diversos fatores foram considerados, quais sejam:
a) Honorários médicos foram “tomados” do mercado a partir da tabela adotada
pelo Comitê Integrado de Entidades Fechadas de Assistência (CIEFAS),
associação representante de parcela do segmento de autogestões. Pressupõe
codificação e valoração construídas e aprimoradas a partir da tabela da
Associação Médica Brasileira (AMB-92).
b) Valores de Serviço de Apoio Diagnóstico e Terapêutico (SADT) foram
inicialmente estimados, automática e proporcionalmente, frente aos honorios
médicos acima descritos, mediante percentuais globais observados em
estatísticas de autogeses coletadas no momento inicial dos estudos de
implantação.
c) Valores de diárias calculados mediante tabela hospitalar de referência
aleatoriamente escolhida, sendo utilizada a tabela dos hospitais privados do Rio
de Janeiro, proporcionados segundo a média de permanência hospitalar
projetada para o procedimento.
d) Valores e taxas de salas cirúrgicas e de recuperação projetados
automaticamente, mediante os valores previstos na mesma tabela escolhida para
as drias.
e) Valores de taxas diversas, estimados proporcionalmente, mediante o valor
atribuído final de taxas e diárias acima descritos, mantendo uma proporção
lógica global ao efetivamente observado em algumas autogestões.
f) Valores de materiais e medicamentos estimados automática e
proporcionalmente, nas mesmas bases percentuais às adotadas pela tabela do
Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS).
Nem por isso, também a Tunep deixou de ser polêmica, ensejando medidas
judiciais por partes de várias Operadoras.
5.3 - Ressarcimento ao SUS – argumento do Estado
O Estado brasileiro, pelo seu Departamento de Saúde Suplementar (DSS) do
Ministério da Saúde e, óbvio, pela ANS, defendem a plena legalidade do instituto do
ressarcimento ao SUS pelas Operadoras de Planos Privados de Saúde.
67
SCATENA. M.A.N., O Ressarcimento ao SUS: Análise do perfil de utilização do Sistema Único de Saúde
segundo peodo da contratação dos planos. Tema de dissertação para obtenção do grau de Mestre em Saúde
Pública, ENSP/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, 2004.
55
Merece transcrição, para ilustrar a posição estatal, os esclarecimentos prestados
pelo Diretor do Departamento de Saúde Suplementar (DSS) do Ministério da Saúde nos
autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.931-8/DF (ainda em curso no STF),
ajuizada pela Confederação Nacional de Saúde – CNS, em que se buscava a suspensão da
eficácia da Lei nº 9.656/98:
Por oportuno deve-se frisar que, de forma alguma a legislação aponta
para qualquer forma de discriminação ao cidadão com ou sem plano ou
seguro saúde. Todos continuam com seus direitos de acesso universal
garantido e intocável (sic). Trata-se apenas de, como será abordado
adiante, fazer que essas operadoras efetivamente assumam sua
responsabilidade financeira contratual. Pois, apesar de vender contratos
que incluem coberturas diversas, nós sabemos que o sistema de
atendimento à urgência e emergência é fundamentalmente estatal. Ora:
vendem um produto queo entregam, permanecendo o ônus financeiro
exclusivamente para a sociedade em geral. Não seria este procedimento
fraudulento em sua essência?
[...]
o se está falando de discriminação de usuários, ou de limitação de
direitos de cidadania. Estamos sim, apontando a necessidade da empresa
honrar seus compromissos consignados em contrato. Pois, a cada vez que
um consumidor se interna em um hospital público, tendo adquirido um
produto que dava direito a internação em hospital particular, podemos
afirmar que eso acontecendo dois fenômenos: a operadora não honrou
com seu compromisso contratual e não disponibilizou leito hospitalar em
clínica privada, e todo o custo dessa internação desaparece da balança de
pagamentos da empresa. De forma mais direta: o consumidor é logrado e
a empresa lucra de forma abusiva, mais uma vez. Trata-se, portanto, de
fazer com que as operadoras apenas honrem seus compromissos,
independentemente da natureza jurídica do prestador de serviço, se
blico ou privado. Certamente a máxima de parte – cada vez menor,
acreditamos – do empresário brasileiro que afirma: ´o lucro é privado, e
o prejuízo é do Estado’, no caso em tela se aplicaria de forma um pouco
adaptada: ´a receita é do empresário e a despesa do Estado’. Desta forma
o ressarcimento ao SUS não apenas é justo socialmente, como se
transformará em importante ferramenta de organização do sistema de
saúde, pois a cada vez que ocorrer, estará significando que alguma
operadora deixou de prestar o serviço adequado (e contratado) a seus
clientes.
Para a ANS, pois, o instituto do ressarcimento não resulta em diminuição do
dever constitucional do Estado de garantir a todos os cidadãos o direito à saúde,
assegurando o “acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
proteção e recuperação” (CF/1988, art. 196). Também, no dizer do presidente do DSS,
objetiva apenas indenizar o Poder Público pelas despesas tidas com serviços não prestados
pela operadora privada, quando cobertos pelos contratos (já que tais procedimentos teriam
sido pagos pelo consumidor).
56
Assim, um dos objetivos do Ressarcimento ao SUS seria o de evitar que as
operadoras de planos privados de assistência à saúde se locupletem sem a respectiva
causa, visto que, ao transferirem atendimentos ao Estado, recebem a contra-prestação
pecuniária de seu consumidor sem, contudo, lhe prestar o respectivo serviço contratado.
No argumento do Estado, pode-se vislumbrar, no ressarcimento das operadoras ao
SUS, também, um clamor de justiça social a justificá-lo (aliás, previsto tanto na
Constituição Federal, quanto na Lei 8.080/90 (LOS)). Por isso, a sociedade – e nela
insertas as OPS’s – teria o compromisso de buscar a redução das desigualdades existentes
em seu seio.
Nesse passo, para o Estado, a natureza do ressarcimento é de restituição ao erário
daquilo que despendeu e não teria de despender se a operadora de plano privado de saúde
tivesse prestado o serviço para o qual fora contratada. Nada teria, portanto, de natureza
tributária.
Outro argumento é o de que haveria enriquecimento ilícito por parte das
operadoras, eis que, ao deixarem de atender seu consumidor (que foi atendido pelo SUS),
descumprem o contrato e embolsam o que com ele gastariam, desaguando, tal ato,
obrigatoriamente, no enriquecimento sem causa. Seria, portanto, a norma insculpida no
art. 32 da lei 9.656/98, uma obrigação civil de reparar o dano causado ao SUS. O
ressarcimento teria seu fundamento na responsabilidade civil, interpretando ser de
natureza jurídica meramente restituitória.
Finalmente, fundamenta sua argumentação nas Leis 8.080/96, 9.656/98, 9961/00,
e, principalmente, na Constituição Federal, no tocante ao dever do Estado de regular,
controlar e fiscalizar os serviços de saúde.
O Conselho Nacional de Secretários de Saúde – CONASS, neste ano de 2007,
editou a obra “Livro Saúde Suplementar (Coleção Progestores – Para Entender a Gestão
do SUS)
68
” em que sintetiza o argumento do Estado:
... a confederação nacional de saúde (CNS) – hospitais, estabelecimentos e
serviços – propôs ação direta de inconstitucionalidade – a Adin 1931-8 DF, na
qual questiona a constitucionalidade da lei, incluído o Art. 32. O julgamento da
Adin 1931-8 ainda não está concluído, no entanto, em sessão realizada em
agosto de 2003, foi realizado o julgamento de medida liminar e, no que diz
68
BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Saúde Suplementar / Conselho Nacional de Secretários
de Saúde. – Brasília : CONASS, 2007. (Coleção Progestores – Para entender a gestão do SUS, 11). p.
167/168.
57
respeito ao Artigo 32, não foi aceita a alegação de inconstitucionalidade formal
da norma.
Os autores da ação alegaram que, com o texto do artigo 32, o Estado revelava a
intenção de transferir para a iniciativa privada o ônus de assegurar saúde para
todos (Artigo 196 da CF), além de violar a garantia constitucional de ser livre à
iniciativa privada a assistência à saúde, inscrita no Artigo 199 da CF. Além
disso, afirmam que o ressarcimento teria caráter tributário, entendido como
fonte destinada a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social. E,
por ser tributo, violaria o § 4º do Artigo 195, combinado com o Artigo 154, Ida
Constituição, que exige lei complementar para tal fim, e não lei ordinária e
medidas provisórias.
A argumentação apresentada pela ANSsustentou a tese da constitucionalidade
do ressarcimento ao SUS”, tendo em vista que o referido instituto em nada
compromete o atendimento universal estabelecido na Constituão Federal de
1988, pois o ressarcimento em nada altera a relação entre o cidadão e o Estado,
apenas cria uma nova relação obrigacional entre o Estado e as operadoras.
Além disso, apresenta o ressarcimento ao SUS como obrigação civil, destinada
à recomposição do erário, de caráter indenizatório, decorrente do
enriquecimento sem causa, a ser experimentado pelas operadoras no caso do
não-cumprimento dos termos contratuais ao auferirem valores (mensalidades)
sem a correspondente contraprestação no custeio dos procedimentos médico-
ambulatoriais e hospitalares realizados, na prática, suportado pelo Estado”
(SCATENA. M.A.N., “O Ressarcimento ao SUS: Análise do perfil de
utilização do Sistema Único de Saúde segundo período da contratação dos
planos”, tese de dissertação para obtenção do grau de Mestre em Sdeblica,
ENSP/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, 2004).
A decisão pela constitucionalidade do ressarcimento ao SUS foi dada por meio
de liminar que não tem efeito vinculante, o que permite a ocorrência de
decisões divergentes em outros tribunais. Tal fato permite que as operadoras
obtenham decisões judiciais suspendendo ou anulando essa cobrança, o que
leva a um crescente número de ações judiciais. Esse quadro deverá perdurar até
o julgamento dorito da Adin 1931-8.
Além das demandas judiciais, observa-se ainda que o ressarcimento ao SUS
encontra questionamentos na própria literatura. Para Bahia e Viana, “existem
indícios, porém, da ineficácia de medidas eminentemente tecnocráticas para
regular os tradicionais mecanismos de transferência de clientes entre os setores
público e privado.
5.4 - Ressarcimento. argumento das operadoras de planos de saúde.
A princípio, as operadoras privadas de planos de saúde sequer admitem a
existência válida da norma (art. 32 da Lei 9.656/98), a teor dos mandados de segurança
impetrados contra a exação, admitindoad argumentandum – que o valor correspondente
ao ressarcimento só poderia ser caracterizado ou como uma nova contribuição para a
seguridade social, ou um novo tributo ou, ainda, como indenização.
Se se trata da instituição de uma nova contribuição para a seguridade social, o
requisito de ser instituída por Lei Complementar teria sido violado, considerando-se o
disposto no § 4º do art. 195 c/c art. 154, inciso I da Constituição Federal. Assim, não
poderia, nunca ser criada por lei ordinária. Esse argumento foi utilizado pelo segmento
58
das operadoras constitdas como medicina de grupo, representadas pela ABRAMGE –
Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo. Entenderam, também, que
quem se locupletaria com o ressarcimento ao SUS seria o próprio Estado, já que impôs
uma tabela (a Tunep) cujos valores se revelaram superiores aos despendidos por ele,
conforme se demonstrou acima.
De outra face, o segmento das operadoras constitdas como cooperativas de
trabalho médico, representado pelas Unimeds, apresentaram dois argumentos. Numa
primeira hipótese – a de que o instituto seria um novo tributo – entendem ser sua
inconstitucionalidade manifesta, porque o “ressarcimento ao SUS” não se insere como
fonte de custeio da Seguridade Social não instituída por lei complementar (art. 195, §4º),
estando, portanto em flagrante afronta ao art. 195, da Constituição Federal, pois os
serviços estatais de assistência à saúde são financiados pelos recursos previstos nesse
dispositivo, conforme art. 198, § 1º (CF/88).
Numa segunda hipótese – a de que o instituto seria indenização – também não
vislumbram a possibilidade da existência do art. 32, da Lei n. 9.656/98, no mundo
jurídico, eis que a obrigação de indenizar pressupõe ação ou omissão em ato ilícito, bem
como, haja relação de causalidade, a teor dos artigos 186 e 927 do Código Civil
Brasileiro.
5.4.1. Primeira hitese – contribuição social
Como visto, esse entendimento é esposado pelas operadoras empresas de
medicina de grupo. E isso se verifica, também, das peças de ingresso consistentes de
mandados de segurança pela inexigibilidade da cobrança do ressarcimento, nos diversos
tribunais do País, como por exemplo, os Autos n 2000.61.00.029283-8, cujo trâmite se
deu na 8ª Vara Cível da Justiça Federal da 1ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo.
Por esse argumento, o artigo 32 da Lei 9656/98 intenta criar uma nova
contribuição para o custeio da previdência social e transfere à iniciativa privada o dever
constitucional e originário do Estado de prestar, em caráter universal, serviços de
promoção, proteção e recuperação da saúde dos cidadãos, o que seria inconstitucional.
Afirmam que essa transferência de encargos terminará por resultar em aumento
incontrolável de despesas para as operadoras de planos de saúde, já que (o aumento)
recairia sobre seus contratados, sobre os valores de suas prestações. Isso faria com que os
59
cidadãos, que já não contam com a saúde pública (embora a financiem com o
recolhimento de tributos), terminará tendo por financiar, por via indireta, através das suas
prestações, o próprio sistema público de saúde.
A inconstitucionalidade, afirmam, está no fato de tal exação só poder ingressar no
mundo jurídico pela via da Lei Complementar, conforme artigo 195, parágrafo 4º, o que
não ocorreria no caso.
E, nesse sentido, se o instituto criado se revestisse das características de uma
contribuição social, só poderia, mesmo, ser instituído por lei complementar.
Com esse argumento, várias operadoras conseguiram, na Justiça, liminares para
se absterem de efetuar o ressarcimento.
5.4.2. Segunda hipótese – novo tributo
5.4.2.1. da natureza tributária do ressarcimento
Na demonstração de tal argumentação, utilizar-nos-emos, também, de parte do
conteúdo da peça de ingresso do mandado de segurança nº 2001.51.01.006531-5, cujo
trâmite se deu na 16ª Vara Federal do Rio de Janeiro - RJ, tendo como impetrante a
operadora Unimed Governador Valadares, da cidade de Governador Valadares – MG, de
nossa co-autoria (em parceria com a Unimed MG, e Unimed Brasil) e que culminou, à
época, com a concessão de medida liminar
69
(depois cassada) no sentido de que a ANS
(impetrada) se abstivesse da prática de qualquer ato punitivo (inscrição em dívida,
execução e inscrição em cadastros de crédito) tendente a exigir da impetrante o pagamento
de valores a título do ressarcimento previsto pelo artigo 32 da Lei nº 9656/98.
Não obstante, importa frisar que nosso entendimento se alterou na medida em que
nos aprofundamos no tema, até chegarmos à nossa atual posição, que se constitui,
também, nas conclusões do presente trabalho.
Para as operadoras, o ressarcimento nada tem de caráter indenizatório ou
restituirio, argumentando que sua caracterização se funda no arcabouço tributário.
Dessa forma, defendem as operadoras que o Código Tributário Nacional – CTN –
ao estabelecer em seu artigo 3º que
69
Liminar é um instituto do processo judicial pelo qual o juiz decide, provisoriamente, resguardar direitos ou
evitar prejuízos que possam ocorrer ao longo do processo, antes do julgamento dorito (definitivo) da causa.
60
Tributo é toda prestação pecuniária compulria, em moeda ou cujo valor nela
se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e
cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
conceitua tributo de forma cristalina, determinando seja observando estritamente o
preenchimento de todos os requisitos para que uma prestação tenha caráter tributário.
Assim, a prestação (ressarcimento, no caso) exigida é em moeda, não constitui
sanção por ato ilícito, foi instituída em lei, é compulsória, e será cobrada mediante
atividade administrativa plenamente vinculada. E que, nesse sentido, criou-se até mesmo
um contencioso administrativo, de impugnação à cobrança, que na realidade é o
lançamento realizado contra as operadoras privadas de plano de saúde.
Também, salientam que, consoante expressa o CTN, o nome dado à exação pouco
importa, pois que a análise do caráter tributário da exincia dar-se-á mediante análise dos
seus elementos constitutivos.
E este é o mandamento insculpido no artigo 4.º , I e II do vigente CTN:
Art. 4.º - A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato
gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualifi-la:
I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;
II - a destinação legal do produto de sua arrecadação.
Somente a existência dos elementos caracterizadores do tributo, pois, é que é
relevante.
E, nessa direção posiciona-se a doutrina:
"NOMEN IURIS". De nada adianta o legislador dar nome diverso às entidades
que cria. É boa doutrina que: "um tributo não segue a sorte do nome que se lhe
queira dar. Não será taxa tão-somente porque assim se o denominou, do mesmo
modo que, reciprocamente, como imposto o se há de o ser, apenas porque
assim batizado
70
.
Dada a rigidez dos impostos, o legislador muitas vezes dá a imposto o nome de
taxa, com o fito de subtrair-se aos rigores constitucionais. A designação não
confere entidade ao tributo. A circunstância de o legislador tê-lo batizado de
taxa não tem a virtude de lhe atribuir tal natureza
71
.
TRIBUTO: o CTN adotou a teoria segundo a qual os tributos se caracterizam
pelo caráter compulsório, e, para distingui-los das multas e penalidades inseriu a
cláusula “que o constitua sanção de ato ilícito.”
70
CANTO, Gilberto de Ulhoa. Temas de Direito Tributário. 2 ed. vol. III. Rio de Janeiro : Alba. 1963. p.51.
71
ATALIBA Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária.o Paulo : Malheiros Editores. 5 ed., 2003, p.122,
n.º 55.
61
Não são tributos, quer do ponto de vista teórico, quer do jurídico, no Brasil, as
prestações de cater contratual, como os ´preços´ (quase privados,blicos e
políticos).
Na doutrina brasileira, já se entendia do mesmo modo, e, em geral acolhia-se a
divisão tripartida dos tributos hoje consagrada no art. 5.° do CTN. A própria
Constituição de 1946 empregava a palavra ´tributo´ no mesmo sentido (p. ex.,
art. 141, § 34 dela)
72
.
Tributo e penas pecuniárias constituem as ´receitas derivadas´, que por sua vez
são subdivisões dos ´ingresso
73
.
Das receitas destituídas de coação não cuidam nem devia cuidar o CTN. A
Súmula n.° 545 conceitua os preços. Assim, o STF já atribuiu caráter de taxa ao
pro público revestido de compulsoriedade quanto ao uso ou pagamento. Em
princípio o tributo é decretado e calculado em moeda.
A lei criadora do tributo é a da pessoa jurídica constitucionalmente competente
para decretá-lo e só ela. Peca por inconstitucional o tributo instituído ou
majorado por decreto do Executivo estadual, ou municipal, que se funda apenas
em norma geral de Direito Financeiro Federal, ainda que esta defina como fato
gerador e a base de cálculo. O STF assim o decidiu, em relação ao Dec. 6.398-
SC, calculado apenas no A. C. 35/67 (R. E. 70, 412, Pleno, 25-11-71, Rel.
Thompson, unân., R.T.J. 60/470 e vários outros, inclusive do Pleno, em 1972,
quando a P.G.R. reabriu a questão: RE 74.464, R.T.J., 65/194)
´RATIO IURIS´ – Não poderia ter efetividade, nem sobrevivência, o sistema
tributário nacional instituído pela Constituão com evidentes e confessados
propósitos políticos, como a implantação do regime federativo, se fosse lícito ao
legislador ordinário iludi-lo, pela troca dos nomes de cada tributo para a invao
do campo tributário reservado a competência diversa. A jurisprudência do STF
fulminou de inconstitucionalidade, no regime constitucional anterior, várias
usurpações dessa natureza
74
(p. ex.mula 144 do STF, impostos estaduais que
mascaravam o imposto federal sobre atos e instrumentos regulados por lei da
União, falsas taxas, etc.).
A VINCULAÇÃO É IRRELEVANTE - O inciso II. do art. 4.° do CTN refere-se
a pseudotaxas, que disfarçam impostos com aplicação especial, sem qualquer
proveito, próximo ou remoto, nem qualquer provocação do serviço pelo
contribuinte. Fixado o conceito de taxa do art. 18, da Emenda n.° 1, de 1969, e
nos arts. 77 a 80 do CTN, cortam-se as asas e abusos e chicanas por meio da
cautela do art. 4.°, I e II
75
.
No assunto em questão, inúmeras vezes já se manifestaram nossos tribunais
superiores, e em todos os casos afastaram a cobrança de parcelas tributárias, mascaradas
com outras denominações jurídicas. E um dos exemplos clássicos, é o do Selo-Pedágio,
criado na década de 1980 pelo Governo Federal.
72
BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10 ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 1993. 667p
73
BALEEIRO, Aliomar. Introdução à Ciência das Finanças. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense. 1978. p.131
74
BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10 ed., Rio de Janeiro : Forense. 1993, p. 63.
75
Idem,g.64
62
Apelação em mandado de segurança n.º 2.348-PE
Segunda Turma (DJU,08.02.1991)
Relator: O Exmo. Sr. Juiz Jo Delgado
Apelantes: Distribuidora Guararapes de Bebidas Ltda. e outro
Apelado: Departamento Nacional de Estradas e Rodagem-DNER
EMENTA:-TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. SELO PEDÁGIO.
NATUREZA JURÍDICA DE TAXA. INEGÁVEL A SUA FEIÇÃO
TRIBUTÁRIA. INCONSTITUUCIONALIDADE.
1-Em razão de como foi tratado na lei Magna de 1988, avulta o pedágio
como sendo taxa,o se lhe podendo negar a feição tributária.
2-Como tal encarada, fornece à autoridade o meio de o automobilista
indenizar o Estado pela utilização de coisa conveniente a seus interesses, mas
que ocasiona riscos assim para o público como para os próprios serviços
governamentais .
3-Evidenciado está, “in casu, que o selo pedágio em comento não é
suscetível de ser destacado em unidades autônomas, nem de ser divisível o seu
custo entre os usuários, sendo, certo que, uma vez pago, não mais é posvel
auferir o número de vezes ou a quilometragem percorrida pelo usuário.
4-Destarte, afigura-se de notória inconstitucionalidade o selo pedágio
instituído pela Lei n.º 7.712/98
5-Provimento da apelação. Inversão do ônus da sucumbência.
76
Bastante elucidativo também se mostra o acórdão proferido pelo Tribunal
Regional Federal da 3.ª Região, in Revista dos Tribunais - Ano 6 – n.º 24 - julho/setembro
de 1988 - Caderno de Direito Tributário e Finanças Públicas, pág. 215:
TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE
O LUCRO - Dedução de prejuízos fiscais - Limitações Impostos pelos arts. 42 e
58 da Lei 8.981/95 - Afronta aos princípios constitucionais da anterioridade e
irretroatividade da lei - Ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito -
Violação aos princípios da certeza e da segurança jurídicas - Lealdade da
administração e boa-fé. (grifo do original)
.................................................................
A CF de 1988 protege o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a
irretroatividade das leis (arts. 5.º, XXXVI e 60, § 4.º, Inc. IV) garantindo certeza
e segurança jurídicas.
É de se afastar disposição que afronte os princípios da lealdade da
administração, da boa-fé e da certeza e segurança jurídicas, por serem esses
imanentes ao ordenamento. (MAS 97.03.054680-3/SP - TRF 3.ª R. – 4.ª T. - j.
04.03.1988 - Rela. Juíza Lúcia Figueiredo).
76
Lex Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais. Vol.26. out. 1.991. Lex
Editora.g. 502.
63
Além do que se expôs, e para corroborar com seus argumentos, as Operadoras
citam, ainda, os ditames contidos no art. 110 do CTN, que determinam a forma de
interpretação da legislação tributária quando esta se utiliza de conceitos de natureza de
direito privado.
Art. 110 - A lei tributáriao pode alterar a definição, o contdo e o alcance
de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou
implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou
pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou
liminar competências tributárias.
Concluem, as operadoras, assim, pela natureza tributária do suposto
ressarcimento. Mas, de que espécie?
É cediço que os tributos se dividem em três espécies: Impostos, taxas e
contribuões de melhoria.
De contribuão de melhoria não se trata.
Nem mesmo se se tratasse de contribuição social (como entende o grupo liderado
pela ABRAMGE) para o custeio da seguridade social, na forma prevista no art. 195 da
Constituição Federal, pois, se assim fosse, estaria ela sendo utilizada teleologicamente
como meio para se alcançar a assistência à saúde dos cidadãos em geral, o que exigiria lei
complementar para sua instituição (mencionado art. 195, §4º da Constituição). Entendem,
pois, que não poderia ser.
Se se tomar a definição de imposto – tributo cujo fato gerador independe de
qualquer atividade estatal específica – afirmam que, também, dele, não se trata.
Restou-lhes, pois a taxa, que entendem mais se adequar à exação, eis que tem o
caráter contra-prestacional do instituto que se denominou ressarcimento.
E, se é taxa, argumentam, mister se faz a análise dos elementos caracterizadores
deste tributo, para se concluir acerca de sua exigibilidade:
5.4.2.2. ressarcimento como taxa. hipóteses de incidência
A ocorrência da taxa se dá quando a hitese de incidência recai sobre uma
contraprestação que justifique sua cobrança.
64
As hipóteses de incidência formuladas nos dispositivos legais em comento,
destoariam do disposto no Parágrafo único do art. 77 e 78 do CTN e o inciso II e o inciso
III, do art. 145 da Constituição Federal, pelo que entendem-nas inaplicáveis.
Geraldo Ataliba
77
apresenta a distinção entre imposto e taxa, que consideramos
extremamente feliz:
A consistência da hipótese de incincia é que permite classificar os tributos
em vinculados e não vinculados a uma atuação estatal. Se a h.i. consistir numa
atuação estatal, o tributo se uma taxa ou contribuição (tributo vinculado); se
consistir em outro fato qualquer, o tributo seráo vinculado (imposto).... A
terminologia adotada advém da observação que nos autoriza a afirmar que no
primeiro caso (tributos vinculados) o legislador (1) vinculou o nascimento da
obrigação a uma atuação estatal, e, no segundo (2) não estabeleceu tal
vinculação, fixando casos de nascimento de obrigações tributárias
independentes e indiferentes a qualquer atuação estatal (tributos não
vinculados).
Modernamente são raras as dissonâncias doutrinárias, pois os mais abalizados
tributaristas caminham na mesma direção:
Nas taxas de polícia é necessário que o poder de polícia exista e seja exercido.
Não basta que o sujeito ativo tenha competência para usá-lo; nem basta que o
poder esteja em lei, disciplinado; é preciso que a administração o exerça como
determina a lei para que possa ser fato gerador da taxa.
78
Não é qualquer ato de polícia que autoriza a tributação por meio desta
modalidade de taxa, mas tão-somente o que se consubstancia num agir concreto
e específico da Administração, praticado com base em lei, que levanta uma
abstenção ou que mantém ou fiscaliza uma exceção já existente. O simples
poder de polícia não enseja a cobrança da taxa de polícia. O que enseja tal
cobrança é desempenho efetivo da atividade dirigida ao administrado.
79
o pode ser novamente notificado para recolher o tributo, á míngua de
qualquer exercício do poder de polícia pela municipalidade A simples
existência de um “serviço organizado de fiscalização não permite que se possa
cobrar taxas fundadas no poder de polícia. O CTN é claro ao dispor no
seu
art.77 que as taxas podem ser cobradas pelo exercício de poder de polícia.
80
Aliás, essa doutrina foi aprovada no Congresso Latino-Americano de Direito
Tributário (apud Célio Armando Janczeski - Taxas - Ed. Juruá-1999,.pp.87/88)
Es de la esencia de la taxa que el servicio estatal que constituye su
presupuesto de hecho sea prestado efectivamente por la Administración al
contribuyeste, aún cuando éste se resista a recibirlo. La prestación efectiva del
servicio al contribuyente es uno de los elementos caracterizadores más
77
ATALIBA, Geraldo. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. Vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1978. págs. p.117/118
78
BORGES, Arnaldo. Introdução ao Direito Tributário. Revista dos Tribunais. 1992, p.33
79
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário.o Paulo : Malheiros Editores.
1999. p.328/329.
80
LIMA, Pérsio Oliveira. Direito Tributário Contemporâneo. Atlas, pp. 49/53
65
importantes para distinguir la tasa de las otras especies tributarias,
particularmente del impuesto. La carga de la prueba de la efectiva prestación
del servicio, en caso de conflicto,debe corresponder a la Administración.
Também, na distinção formulada por Sacha Calmon
81
:
Porquanto circunstância de o serviço não vir a proporcionar vantagem ao
contribuinte, seria razão o suficiente para negar o pagamento, o que
caracterizaria um absurdo, até porque existem serviços públicos detrimentosos,
que causam malefícios ao contribuinte, como é o caso da certidão que declara o
bito para com o fisco.
(...)
A distinção entre "taxa de polícia" e "taxas de serviço" não possui legitimidade
científica. É que o exercício do poder de polícia feito pela Administração, é
serviço público, se exterioriza como tal. Inobstante a distinção, já cediça,
apresenta importantes serventias. As ditas "taxas de polícia" não podem ser
cobradas pela mera disponibilidade do serviço público. Não basta que o
Departamento da Polícia Federal que concede passaportes esteja em
funcionamento, para que o Poder Público cobre "taxa de expediente" de todos
os que estiverem sob a sua circunscrição , ao argumento de que o serviço está
posto à disposição dos contribuintes. As "taxas de polícia" se dão pela
realização de atos administrativos com base no poder geral de polícia,
diretamente relacionado à pessoa do contribuinte . Não se cuida de um
"benefício" ao contribuinte nem de recuperar o "custo do ato" , mas de
realizar atos de polícia (ob. cit. p. 48, n.º 30)
Necessário, indispensável, o "exercício de fato" do poder de polícia, cujo ônus
probatório é da Fazenda Pública, com a apresentação de um "termo de fiscalização" ou
algo semelhante, mesmo porque, do contribuinte não se pode exigir a prova negativa, p.
ex. "termo de não fiscalização", o que seria um absurdo.
Como afirmou o Min. Carlos Madeira: "não é baixando atos normativos que o
poder público fica com o direito de cobrar taxas, mas, sim, quando os executa. Não é o
poder de polícia, em abstrato que gera a taxa, mas o seu exercício efetivo (RTJ 116/650).
O que foi ratificado, recentemente pelo E. Min. Sydney Sanches: "Não se evidenciando o
exercício real e efetivo do poder de polícia de fiscalização de funcionamento, a exigência
da taxa de renovação é ilegítima (RTJ 140/627).
A endossar esse racionio, as seguintes decies de nossas cortes superiores:
Taxa de Licença para Localização - Exigência de Renovação-CTN-Arts.77 e
78-Súmula 157/STJ. A taxa, fundamentalmente vinculada à hipótese de
incidência determinada por atividade estatal individualizada, sofre limitações
objetivas, deve pois, corresponder à efetiva contraprestação de serviços e
materialização do poder de polícia, fatos justificadores da imposição fiscal. É
81
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição Federal de 1988. Sistema Tributário.
Forense, p. 49-n.º 31 e p. 49, nº 31.
66
ilegal, no caso, a exigência do pagamento anual a título de renovação de
licença para localização, em se tratando do mesmo estabelecimento, com as
mesmas atividades e localização inalterada. Auncia de objetiva
contraprestação. Precedentes da Súmula 157/STJ (REsp. 110.348-MG-Rel.
Min. Milton Luiz Pereira - DJ n.º 161/98.).
Taxa de Localização - Anúncios Luminosos - Cobrança pela Fazenda Pública
- Impossibilidade, salvo demonstrada a efetiva concretização do poder de
polícia - precedentes do STJ. A Fazendablica Municipal só pode cobrar
taxa de localização e Fiscalização de Anúncios Luminosos se demonstrar a
efetiva concretização do poder de polícia (REsp. 162.270-MG Rel. Min.
Adhemar Maciel - DJ 17.08.98,p.58)
Tributário. Taxa de Publicidade. Renovação. Painel luminoso. Poder de
Polícia. Falta de contraprestação. Súmula 157/STJ.Ilegalidade da cobrança de
taxa, com o timbre de renovação, quando inexistente a contraprestação de
serviços inerentes a essa espécie de tributos, ficando, desfigurado o efetivo
exercio do “poder de polícia”. (Recurso Especial n.º 182.157-RJ, Rel. Min.
Milton Luiz Pereira, DJU de 12/04/99).
Taxa- Licença de Localização. Renovação. Súmula 157/STJ. Há exercício do
Poder de Polícia na concessão inicial da licença. O mesmo não ocorre na
Renovação de Licença para Localização, onde não há o que verificar, pois o
estabelecimento é o mesmo que inicialmente foi licenciado (REsp. 222.298-SP-
DJU 25.10.99)
Taxa para Localização e Funcionamento. Só há contraprestação do serviço e
materialização do Poder de Polícia quando da obtenção da licença para
localização e funcionamento no território do Munipio e não nos anos que se
seguem. Cautelar Procedente (Medida Cautelar n.º 1.704-SC-Rel.Min. Garcia
Vieira - DJU 28.02.2000, p.30)
O STF, pela maioria de suas Turmas segue o mesmo itinerário:
o se evidenciando o exercio real e efetivo do poder de polícia de
fiscalização de funcionamento, a exigência da taxa de renovação é ilegítima
vem decidindo o STF (RE 104.951-RJ- Rel. Min. Sydney Sanches - RTJ
140/627; RE 140.278-CE-Infomativo STF n.º 42).
Dessa forma, entendem as operadoras que está claro que a taxa
institda pelo
artigo 32 da lei em comento, não preenche dos requisitos impostos pelo CTN para sua
criação, no que se refere ao efetivo poder de polícia.
Portanto, ela somente poderia ter sido criada pela utilização efetiva ou potencial
de serviço público específico e divisível posto à disposição do contribuinte.
Mas o que vem a ser esse serviço público colocado à disposição do contribuinte?
Mais uma vez socorremo-nos à doutrina nacional:
5.4.2.3. o que vem a ser serviço divisível e específico como elemento da taxa?
67
Deve-se ter em mente que, como está expresso no conceito trazido pelo CTN e
pela Constituição Federal, a taxa deverá recair tão somente sobre serviços públicos
específicos e divisíveis. É o que acontece, por exemplo, quando se paga a taxa pelo
fornecimento de água. Nesse caso, é perfeitamente possível saber, especificamente, a
quem é prestado o serviço, como também, a medida certa do quantum do serviço prestado
a cada contribuinte. Assim, deve arcar o beneficiário exatamente com a quantia do serviço
de que usufruiu. Isso, pois, um serviço específico e divivel.
Nesse sentido, Ruy Barbosa Nogueira, esclarece:
O Estado, na sua missão de atender ao bem comum, já presta serviços gerais à
coletividade, cujos gastos são cobertos, sobretudo, pela receita dos impostos.
Serviço divivel, necessário para a instituição da taxa, é o suscetível de
utilização individual pelo contribuinte, e específico é o destacável em unidade
autônoma. Não há, assim, possibilidade de confusão com serviços gerais.
Convém também esclarecer que esse serviço específico é aquele que somente
pode ser prestado pelo Estado, isto é, serviço administrativo ou jurisdicional.
ao Estado compete prestá-lo aos seus jurisdicionados como desempenho de
atribuições públicas e como decorrência do jus imperii.
Uma atividade civil, comercial ou industrial que possa ser prestada dentro da
relação negocial não tem natureza dessa atividade estatal específica. Esse
serviço específico há de decorrer do exercício do poder de regular (poder de
polícia), do poder de tributar ou da consorciação destes e sempre, para cada
pessoa jurídica dentro do direito público, em razão do exercio de atribuições
constitucionais de cada governo.
Que significam as expreses ‘pela utilização, efetiva ou potencial, de servos
publico’, ‘prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição?’.
Nesse caso a Poder Público cria o serviço que, do ponto de vista tributário, é
compulsório. Utilizado ou não pelo contribuinte, a taxa será devida, mas o
essencial é que o Poder Público efetivamente o tenha criado e que ele seja
suscetível de utilização.
O CTN no artigo 77 empregou a expreso ‘utilização efetiva ou potencial’ e a
Comissão esclareceu que isto ela fez na revio para ficarclaro que a
qualificação efetiva ou potencial refere-se à utilização do serviço pelo
contribuinte, e não, como poderia parecer pelo texto original, à sua prestação
por parte do poder tributante: a não ser assim, com efeito, poderia ser
pretendida a cobrança de taxa em razão do serviço de criação futura e
hipotética’.
Portanto, neste caso, para que o Poder Público possa exigir a taxa é preciso que
o serviço esteja em efetivo funcionamento, de modo que se o contribuinte dele
o se utilizar, tem que contribuir para sua manutenção.
Exemplo comum desta hipótese é o caso do contribuinte que tem rede de
serviço de água à sua porta e não o utiliza porque prefere a água de um poço ou
mina e no entanto, compulsoriamente, deve a taxa porque o serviço está a sua
disposição.
Finalmente devemos esclarecer bem que, no entanto, a taxa cobrada em razão
da utilização de serviço público pelo contribuinte ou posto à sua disposição é
diretamente contra-prestacional porque beneficia a ele, utente do serviço, a
taxa cobrada para o custeio do gasto com o exercício do poder de polícia não é
diretamente contra-prestacional, porque quem se beneficia da regulamentação é
68
essencialmente a sociedade e não o contribuinte sujeito ao poder de polícia, à
fiscalização ou regulamentação.
82
Mas, questionam as Operadoras de Planos Privados de Saúde: que serviço foi
prestado a elas? No seu entendimento, nenhum, pois aquele atendimento realizado, foi
dado primeiramente não a um consumidor de plano de saúde, mas a um cidadão brasileiro,
que se encontrava no exercício de seu legítimo e constitucional direito.
Portanto, a taxa seria cobrada de quem não usufrui qualquer serviço público, ou
seja, as operadoras de plano de saúde privado.
Além do que, o serviço de saúde não é exclusivo do Poder Público, podendo
também ser explorado pelo particular, como de fato o é,o se caracterizando assim como
serviço público específico, capaz de ensejar a cobrança de qualquer taxa, haja vista o
disposto no Art. 199 da Constituição Federal:
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
Ainda nesse passo, a parte final do art. 197, também da Constituição Federal:
Art. 197 ......................, devendo sua execução ser feita diretamente ou através
de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.
Aliás, o próprio artigo 197, determina que a prestação de serviços de assistência à
saúde, mesmo quando praticado por particulares será considerado de relevância pública.
Ou seja, as operadoras de plano de saúde prestam, nos termos da Constituição Federal,
serviço público de alta relevância.
5.4.2.4. da ofensa ao disposto no § 7.º do art. 150 da constituição federal
A Lei 9.656/98 ao criar a taxa em questão, elegeu como sua contribuinte as
operadoras privadas de plano de saúde.
Como dito, consideram as operadoras que em momento algum foi prestado
qualquer tipo de serviço específico e divisível que justifique a cobrança de qualquer taxa.
Não tendo sido prestado qualquer serviço à operadora, somente se pode entender
que ela foi eleita contribuinte do tributo na condição de responsável tributário, numa
situão de verdadeiro contribuinte substituto ou contribuinte de fato.
82
NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 14 ed. São Paulo : Saraiva - 1995 - págs. 162/163.
69
Contudo, tal nomeação encontra óbice no disposto no parágrafo 7.º do artigo 150
da Constituição Federal:
§ 7.º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de
responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva
ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da
quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
O texto constitucional não deixa margem a dupla interpretação. Somente nos
impostos e nas contribuições é possível a instituição do responsável tributário, sendo tal
figura completamente incompatível com a natureza contra-prestacional da taxa, pois a
rigor, somente quem se utilizou do serviçoblico específico e divisível pode ser
contribuinte de tal espécie tributária.
5.4.2.5. da ofensa ao princípio da legalidade
Os valores da taxa criada pelo art. 32 da Lei 9.656/98, os quais estão definidos em
tabela de ressarcimento (TUNEP), foram criados pela Resolução RDC n 17 de 30 de
março de 2.000 (e atualizados através da edição de novas resoluções).
Contudo, a fixação de tais valores mediante mera resolução da Diretoria
Colegiada da Agência Nacional de Saúde colidiria com o artigo 150, I da Constituição
Federal:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.
Trata-se do chamado Princípio da Legalidade, garantia-mor do contribuinte contra
o Poder do Príncipe que deve se sujeitar à lei para exigir ou aumentar tributos, não se
admitindo a utilização de qualquer outra norma de escalão inferior para tal desiderato.
Ainda no que se refere ao Princípio da Legalidade, a embasar o argumento das
OPS, os ensinamentos de Hugo de Brito Machado
83
:
Os prinpios jurídicos da tributação funcionam como limitações ao poder de
tributar. Como é sabido, o direito é um sistema de limites. Toda norma jurídica
constitui alguma forma de limitação da liberdade humana. Limita sempre, de
alguma forma, a conduta de alguém. O poder de tributar, como expressão da
soberania estatal, é limitado precisamente pelos denominados princípios
83
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 12 ed. São Paulo : Malheiros Editores. 1997.
pág. 183/5
70
jurídicos da tributação, que ditam a forma e as condições para o exercício
daquele aspecto da soberania estatal.
No Brasil, tais princípios residem na Constituição Federal, e o princípio da
legalidade (art. 150, item I), certamente o mais importante deles, impede que a
Uno, os Estados, o Distrito Federal e os Munipios exijam tributos que não
tenham sido estabelecidos por lei.
mediante lei é possível a criação e a majorão de tributo. Não mediante
decreto, ou portaria, ou instrução normativa, ou qualquer ato normativo que
o seja lei, em sentido próprio, restrito (conceito examinado no Catulo I, da
Segunda Parte, deste Curso). Essa regra, porém, admite exceções no que se
refere à majoração de certos tributos, que pode ocorrer, dentro de limites
fixados em lei, por ato do Poder Executivo. Tais exceções, é importante
esclarecer, são somente as previstas na própria Constituição Federal.
5.4.2.6. da ofensa ao princípio da anterioridade
Outro argumento das operadoras é o de que faleceria licitude ao Erário Federal,
pretender cobrar a taxa, disfarçada de ressarcimento, já no exercício de 2.000, haja vista
ter sido a mesma regulamentada por mera resolução em 30 de março de 2.000. E, mesmo
que fosse por lei complementar, não poderia ser exigida no mesmo exercício em que
instituída.
Tal exincia afrontaria textualmente o disposto no 150, III, b da Constituição
Federal, in verbis:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
b) no mesmo exercio financeiro em que haja sido publicada a lei que os
instituiu ou aumentou.
Também, como se viu, pois, dos mandados de segurança, as operadoras
consideram o ressarcimento como uma espécie de contribuição social para custeio da
Seguridade Social, na forma prevista pelo artigo 195 da Constituição Federal, já que tal
figura estaria sendo utilizada teleologicamente como meio para se alcançar a assistência à
saúde dos cidadãos em geral.
Sendo assim, exigiria lei complementar para sua instituição, conforme previsão
do art. 195, §4º da Constituição Federal.
Com esses argumentos, as operadoras entendem que o ressarcimento tem caráter
tributário,o podendo ser – como foi – instituído por lei ordinária, nem exigido no
mesmo exercício em que publicada a lei.
71
E foram várias as vitórias alcançadas liminarmente (depois cassadas, as
liminares) para a suspensão da exincia da exação, como foi o caso do Mandado de
Segurança retro-comentado.
No entanto, a posição do Judiciário se dividia, como se verá a seguir.
5.4.3. Terceira hipótese - indenização
Nesta terceira hitese, pela qual as operadoras consideram o ressarcimento como
forma de indenização, tamm não vislumbram a possibilidade da existência do art. 32, da
Lei n. 9.656/98, no mundo jurídico.
De fato, a obrigação de indenizar pressupõe ação ou omissão em ato ilícito, bem
como, haja relação de causalidade, a teor dos artigos 186 e 927 do Código Civil
Brasileiro:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão volunria, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.
A propósito do tema, adverte Aguiar Dias
84
, que “o juiz da ação de
responsabilidade civil deve agir da maneira a não permitir que a verba ressarcitória seja
convertida em enriquecimento ilícito, nem mesmo em imposição de ônus desarrazoados ao
responsável".
Lado outro, o nexo de causalidade entre a culpa e o dano, segundo o
entendimento do mestre Caiorio
85
é
... o mais delicado dos elementos da responsabilidade civil e o mais difícil de
ser determinado. Aliás, sempre que um problema jurídico vai ter na indagação
ou na pesquisa da causa, desponta a sua complexidade maior (...). Mesmo que
haja culpa e dano, não existe obrigação de reparar, se ambos não estabelecer
uma relação causal
Para as operadoras, não poderia o ressarcimento se revestir de obrigação de
indenizar, regido pela responsabilidade civil porque, o ato de um consumidor seu buscar
84
AGUIAR DIAS. José de. Da responsabilidade civil. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense. 1994, v. II, nº 233, pág.
771
85
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 8 ed. revista, Rio de Janeiro : Forense. 1996. pág. 76
72
atendimento no SUS, não constitui nenhum ilícito de sua parte (consumidor), nem da parte
da operadora, que sequer tem mecanismos para evitar que ele o faça. Lado outro, de se
considerar que, antes, o consumidor é também cidadão e, portanto, tem garantido o direito
à assistência universal e gratuita à sua saúde, independentemente de ter um plano privado
de assistência à saúde.
Esse fato impediria o Estado de recobrar o gastou com o cidadão que escolheu ser
atendido pelo SUS.
o havendo ilícito,o motivo para indenizar. Não há relação de causalidade
entre o ato do cidadão de buscar o atendimento via Sistema Público e a obrigação de
indenizar por parte das operadoras.
Não se configuraria, pois, nessa disposição legal, qualquer dos pressupostos
ensejadores do instituto da indenização, já que o ato de recorrer aos serviços do SUS
constitui livre manifestação de vontade e exercício de um direito de um consumidor (que
também tem o direito de atendimento pelo Sistema Público), sem qualquer participação
(direta ou indireta) da operadora nesse fato.
5.5. Ressarcimento ao SUS e a disciplina das externalidades
Revelam-se falaciosos os argumentos postos pelas operadoras, eis que partem de
premissas falsas, quais sejam, a instituição do tributo (taxa ou contribuição social) e a
inexistência de prestação de serviço específico e divisível pelo Estado a justificar a
cobrança de qualquer taxa ou a ausência de lei complementar a lhes validade no mundo
jurídico. De fato, o raciocínio é incorreto, pois não pretendeu o Estado a criação de um
novo tributo, mas ver-se reembolsado dos valores que indevidamente se viu forçado a
despender.
Tais gastos indevidos são o que, em Economia, se denomina externalidade
negativa, ou seja, efeitos externos danosos sofridos por uma ou mais pessoas em
decorrência de uma ação ou omissão de outras (pessoas).
Assim, a externalidade ocorra as ações de alguns agentes interferem no bem-estar
dos demais, sem que haja a devida incorporação (internalização) dos benefícios ou custos
gerados pelos responsáveis por essas ações. No primeiro caso (benefícios) a externalidade diz-
se positiva e, no segundo (custos), diz-se negativa.
73
Para exemplo, a poluição do ar gera externalidades negativas, pois suas
conseqüências resultam em um custo aos demais agentes que têm seu bem-estar reduzido por
ela. O uso de combustíveis fósseis gera externalidades adversas, como o aquecimento global,
em face da poluição do ar. De seu turno, a poluição do ar provoca danos à saúde, além de
provocar outros custos ambientais como perda da biodiversidade, de sistemas ecológicos, do
patrimônio cultural e estético. São as chamadas externalidades negativas.
Pode-se dizer que esse conceito advém do Direito Romano, onde honeste vivere,
neminem non laedere, suum cuique tribuere” , numa tradução livre, resulta em vive
honestamente, não prejudiques a ninguém, dá o seu a quem tem direito”, caracterizando a
licitude com que se deve agir e, por conseguinte, delimitando o que seja ilicitude.
Tratando do tema, Fábio Ulhoa
86
assevera que “Externalidade é conceituada como
todo efeito produzido por um agente econômico que repercute positiva ou negativamente
sobre a atividade ecomica, renda ou bem-estar de outro agente econômico, sem a
correspondente compensação. (destaque do original).
No entanto, entende o autor, que na noção de externalidade não se insere,
necessariamente, a determinação da licitude ou ilicitude do ato praticado ou da atividade. E
justifica:
A relevância da externalidade guarda relação com mudaas comportamentais e
evolução de valores, não necessariamente reproduzidas em normas judicas
proibitivas de atividades econômicas. Apenas recentemente, note-se, a agressão da
indústria ao meio ambiente transformou-se numa externalidade relevante (...), mas o
direito ambiental não tem respondido a essa transformação com a interdição das
atividades poluidoras, e sim por mecanismos mais ou menos eficientes de controle
de produção de poluentes. De qualquer forma, será certamente impossível pretender
a compensação de todas as deseconomias externas, tendo em vista inclusive que as
compensaçõeso elas próprias geradoras também de novas externalidades; o
estado, ao impor regras de direito ambiental à indústria, gera, como agente
econômico no conceito amplo aqui considerado, uma externalidade para o
empresário.
Não há como eliminar, na exploração de atividades econômicas, uma determinada
margem de prodão de efeitos negativos ou positivos não compensáveis. Nessa
margem, correspondente às externalidades irrelevantes, os efeitos gerados pela
empresao merecem sequer a atenção do direito. Correspondem a fatos não
jurídicos, isto é, ignorados pela ordem jurídica, tendo em vista a irrelevância dos
interesses atingidos, segundo ponderações de valor variáveis historicamente.”
87
86
COELHO,bio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 1.v. ed. 11 ver. e atual. São Paulo : Saraiva, 2007,
págs. 32ss.
87
Op. cit. págs. 33/34
74
Assim entendida a externalidade, queda-se vencido, também, o argumento das
operadoras, no sentido que o ressarcimentoo poderia subsistir se considerado como
indenização, eis que não haveria ilícito praticado a ensejá-lo.
Aplicando-se o conceito das externalidades ao caso em tela – ressarcimento ao SUS
pelas operadoras de planos de saúde – tem-se que o fato de as operadoras, quando obrigadas à
cobertura de procedimentos médico-hospitalares contratualmente previstas,o os honrando,
gera uma externalidade negativa, qual seja, o dispêndio, pelo Estado, de valores a que este não
estaria obrigado, mas sim aquelas. E, nesse caso, especificamente, não se pode classificar que
tal externalidade se caracterize como irrelevante (viu-se, atrás, que o dispêndio havido pelo
Estado com a ausência do ressarcimento, chegou à cifra nada modesta de R$ 7 bilhões em sete
anos.).
Daí, entendemos que a recusa das operadoras em efetuar o ressarcimento ao SUS,
nos casos devidos, constitui sim, o ilícito previsto nodigo Civil (arts. 884 e 885),
ensejando o enriquecimento sem causa, a ser coibido pelo órgão que regula a atividade, na
forma da norma posta (Lei 9656 e Resoluções da ANS).
E a fórmula encontrada pelo legislador para anular essa externalidade foi exatamente
o instituto do ressarcimento ao SUS. Sim, porque, uma externalidade negativa deixa de-lo,
somente quando é compensada. É o que a Economia denomina de internalização das
externalidades, ou seja, o agente que provocou a externalidade negativa deve compensar
aquele que por ela foi atingido. É também essa a lição de Fábio Ulhoa
88
:
O segundo desdobramento do conceito de externalidade na matéria jurídica volta-se
à definição dos mecanismos de compensação entre os agentes econômicos expostos
a tais efeitos (empresa e comunidade, empresários e vizinhos, fornecedor e
consumidor etc.). Ou, como prefere a economia, este desdobramento diz respeito ao
processo de internalização das externalidades. Quer dizer, uma vez conferida
relevância a certos efeitos produzidos por um empreendimento econômico
instria polui e gera empregos –, cabe discutir como se proceder à sua
compensação, por meio da imputação de obrigações ao emprerio pelos efeitos
considerados negativos, e do reconhecimento de direitos em relação aos reputados
positivos. Pro definição, quando uma externalidade é compensada ela deixa de ser
externalidade. É, por assim dizer, internalizada. Internalizar as externalidades para
equalizar a relação custos-benefícios sociais é, em termos jurídicos, impor deveres
garantir direitos para fazer justiça..
88
Op. cit. pág. 34
75
Temos, pois, que o que caracteriza a externalidade é a inexistência de compensação
entre as pessoas envolvidas. Havendo compensação de prejuízos (ou ganhos), dar-se-á a
internalização da externalidade e esta deixa de existir, produzindo-se o necessário equilíbrio.
Uma vez internalizada a externalidade gerada pela negativa indevida de atendimento
a consumidor de seu plano de saúde, pela via do ressarcimento ao SUS, as operadoras estarão
anulando a externalidade produzida, dela não se podendo escusar, sob pena de incorrerem no
ilícito do enriquecimento sem causa, como se demonstra a seguir, com os argumentos do
Ministério Público.
5.6. Ressarcimento. argumentos do Judiciário e Ministério Público.
Na esteira dos argumentos do Estado, de um lado, e dos das operadoras de outro,
o Judiciário se dividiu, ora acatando os (argumentos) de um, ora das outras.
Um dos argumentos postos pelo Judiciário, é o de que o Estadoo se
desincumbe de cumprir o disposto na Constituição Federal, quer seja, o de prover o
cidadão com os necessários mecanismos e instrumentos para que sua saúde seja
preservada ou restabelecida.
Uma vertente entende que quando um cidadão adere a um plano de saúde privado,
fá-lo exatamente porque o Estado não cumpre (ao menos satisfatoriamente) com seu dever
constitucional, pois, se assim não fosse, nenhum motivo teria para aderir a um plano de
saúde privado.
Assim é que, nos autos do Mandado de Segurança nº 2001.51.01.006531-5, tendo
como impetrante a Operadora Unimed Governador Valadares e impetrado Gerente de
Arrecadação e Finanças da Agencia Nacional de Saúde Suplementar – ANS, manifestou-
se o Juiz Federal Wilney Magno de Azevedo Silva, da 16ª Vara do Rio de Janeiro:
O superficial exame das evidências e dos documentos trazidos à juízo, permite-
me convir com a plausibilidade da tese da impetrante, uma vez que o artigo 196
da Constituição estipula:
‘A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros
agravos o ao acesso universal e igualitário ás ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação’.
Como bem assegurou a Impetrante na inicial:
‘O cidao que adere a um plano privado de assistência à saúde o renunciou
ao seu direito constitucional de ser atendido pela Rede Pública. De fato esta
pessoa tem o direito de opção. Ela pode se o desejar utilizar seu plano
privado, ou utilizar-se da rede pública. É mera faculdade, não estando ela
76
obrigada a optar por um ou outro, estando tal opção no âmbito de sua absoluta e
estrita conveniência pessoal.’
Mais do que isso. o cidadão que adere a um plano de saúde privado o faz,
justamente, porque o Estado não cumpre (ao menos satisfatoriamente) com seu
dever constitucional positivado no supramencionado artigo da Lei Maior, eis
que, se assimo fosse, nenhum motivo teria para aderir a um plano de saúde
privado.
Assim, pelo menos num jzo provisório, me afigura inconstitucional cobrar do
plano de saúde privado o atendimento feito a um contratado daquele, eis que o
cidadão, além de não perder o direito de ser atendido pelo Poder Público
quando adere a um plano privado de saúde, teria que arcar, ao final, com esse
‘ressarcimento’, vez que o plano, obviamente, repassaria o valor desembolsado
às mensalidades.
No mais, reporto-me também a fundamentação exarada pela MM. Juíza Federal
Substituta Doutora Paula Patrícia Provedel de Mello Nogueira nos autos do
mandado de segurança nº 20005101032576-0 onde efetivamente não
vislumbrou a natureza ressarcitória, que, segundo a ré qualifica a obrigação.
‘Se é dever do Estado fornecer assistência médica gratuita à população, na
forma do artigo. 196 da Lei Maior, não há como perquirir que este seja
remunerado através do "ressarcimento", por um serviço que tem obrigação de
prestar de forma graciosa.
É verdade que os hospitais e clínicas particulares são "ressarcidos" pelas
operadoras de plano de saúde das despesas pelo atendimento do contratante do
plano. No entanto, tal decorre do fato de que esses hospitais e clínicas não
possuem obrigação legal de atender a pessoas que os buscam sem
contraprestação pecuniária.
É exatamente nesse ponto que tais pessoas jurídicas se diferenciam do Estado.
Se a rede pública é onerada pelo contratante de plano que não logrou
atendimento particular, apesar da cobertura prevista no contrato celebrado,
cumpre a Agência Nacional de Saúde, no uso das atribuições que lhe foram
cometidas, atuar com as medidas que o poder fiscalizatório lhe confere.
Da mesma forma, não se sustenta a alegação de que a recuperação dos valores
elidiria o enriquecimento sem causa das operadoras. O valor que estas recebem
tem origem contratual e é pago independente da utilização dos serviços. O
pagamento não é suspenso por o utilização dos serviços, mas isso não implica
dizer que haja enriquecimento sem causa, uma vez que o contrato tem sua
contra-prestação calculada de forma atuarial e nele resta presente a "álea" típica
dos contratos de seguro.
Por todo exposto, entendo que tem razão a autora ao asseverar que não tendo a
exigência natureza ressarcitória, somente pode ser entendida como tributo’.
Assim, em juízo liminar, tenho que de acordo com o artigo 32, do diploma em
foco, não se encontra qualquer atividade estatal que possa dar margem à
cobrança, o que, desde logo, põe sob suspeita a exação, a qual, assim,
assemelha-se a um verdadeiro imposto, pois a base de cálculo é própria de
imposto e como tal não observou princípios constitucionais tributários, como o
da anterioridade, para sua instituição.
Outrossim, presente está o periculum in mora
, eis que caso não venha a ser
deferida a liminar terá a parte que se sujeitar a via da repetição do indébito caso
venha a ter ao final reconhecido a alegado.
Isto posto, DEFIRO A LIMINAR para que a impetrada se abstenha da prática
de qualquer ato punitivo (inscrição em dívida, execução e inscrição em
cadastros de crédito) tendente a exigir da impetrante o pagamento de valores a
título do ressarcimento previsto pelo artigo 32 da Lei 9656/98.
Comunique-se com urncia. Após, ao MPF.
77
Rio de Janeiro, 29 de junho de 2001.
Como dito anteriormente, a liminar foi cassada. É que os ministros do STF
votavam (ainda votam) a ADIN 1931-8, impetrada pela Confederação Nacional de Saúde
– CNS
89
, tendendo esposar o pensamento estatal acerca do assunto.
No que respeita ao ressarcimento ao SUS pelas operadoras de planos privados de
saúde, o ministro Mauricio Correa entendeu não haver qualquer inconstitucionalidade na
exação, visto não se tratar de matéria tributária, mas de mecanismo restituirio.
Assim, o seu voto:
(...)
44. Outra questão tida como contrária e ofensiva ao princípio da
proporcionalidade seria o ressarcimento, de que trata o caput do art. 32 da lei,
ao Poder Público dos serviços de atendimento que a rede hospitalar de saúde
pública prestar ao contratado do plano. Frise-se que esses serviços só atingem
os atendimentos previstos em contrato e que forem prestados aos respectivos
consumidores e seus dependentes por instituições públicas ou privadas,
conveniadas ou contratadas, integrantes do SUS, como está explicitamente
disciplinado no § 1
o
do artigo 32, na versão atual, verbis: “O ressarcimento a
que se refere o caput será efetuado pelas operadoras à entidade prestadora de
serviços, quando esta possuir personalidade jurídica própria, e ao Sistema
Único de Sde – SUS, mediante tabela de procedimento a ser aprovada pelo
CONSU.”
45. Não vejo atentado ao devido processo legal em disposição contratual que
assegurou a cobertura desses serviços que,o atendidos pelas operadoras no
momento de sua necessidade, foram prestados pela rede do SUS e por
instituições conveniadas e, por isso, devem ser ressarcidos à Administração
Publica, mediante condições preestabelecidas em resoluções internas da
CAMARA DE SAUDE SUPLEMENTAR. Observo que não há nada nos autos
relativamente aos pros que serão fixados, se atendem ou não as expectativas
da requerente. Tudo gira em torno de hipóteses.
46. Também, nenhuma consistência tem a argumentação de que a instituição
dessa modalidade de ressarcimento estaria a exigir lei complementar nos termos
do artigo 195, § 4
o
da Constituição Federal, que remete sua implementação ao
art. 154, I, da mesma Carta. Como resulta claro e expresso na norma, não impõe
ela a criação de nenhum tributo, mas exige que o agente do plano restitua à
Administração Pública os gastos efetuados pelos consumidores com que lhe
cumpre executar.
47. Mais uma vez, cuida-se de matéria que implica o exame concreto da
questão concernente aos preços para o ressarcimento dos serviços, que, agora
penso, com a nova definição jurídica dos planos, deverão ser revistos, se
porventura existentes, porque não mais ligados ao campo do seguro. Além do
mais, a regulamentação do dispositivo foi remetida à resolução do CONSU, que
o é objeto desta ação.
48. Tratando-se de segmento da maior sensibilidade social, pois envolve a
saúde e a vida das pessoas, tenho que as normas impugnadas nesta parte da
ação, em face da anômala condição em que os agentes da requerente operavam
89
A CNS - Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços, criada em 1994, é uma
entidade sindical de terceiro grau, o mais elevado existente na legislação sindical.
78
nesse mercado,o violam o devido processo legal, pelo que, neste exame
cautelar,o vejo que esteja caracterizado o periculum in mora,
recomendando-se, ao contrário, em virtude de boa dose de conveniência, que os
textos atacados sejam mantidos até o julgamento final da ação.
São as razões pelas quais indefiro o pedido quanto a esta parte..
Corroborando com esse pensamento (do Estado), o Ministério Público Federal
entendeu constitucional o disposto no art. 32 da lei 9656/98.
Combatendo a tese pela qual algumas operadoras consideram o ressarcimento
como uma espécie de contribuição social para custeio da Seguridade Social, na forma
constitucionalmente prevista (já que tal figura estaria sendo utilizada teleologicamente
como meio para se alcançar a assistência à saúde dos cidadãos em geral, exigindo lei
complementar para sua instituição, conforme previsão do art. 195, §4º da Constituição
Federal), o Ministério Público Federal, no Boletim dos Procuradores da República, de 16
de janeiro de 2001
90
, manifestou-se pela constitucionalidade do ressarcimento ao SUS.
Entendeu, por primeiro, que o instituto estaria inserto “na possibilidade normativa
do estabelecimento de ‘outras fontes’ fora das limitações formais decorrentes do art. 195,
§4º (segundo o qual, a lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção
ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I")”.
Para o MPF, o parágrafo primeiro do art. 198 da Constituição Federal autoriza a
criação de novas fontes para o custeio da seguridade social sem a necessidade da edição
de lei complementar.
Em uma segunda posição, e nesse mesmo passo, vislumbra a possibilidade de o
disposto no referido parágrafo primeiro (do art. 198 da CF) reportar-se ao conceito de
financiamento”. Isso distinguiria a origem dos recursos advindos do ressarcimento
(outras fontes) da (origem) das contribuições sociais decorrentes da incidência do art. 195.
Conclui que na expressão financiamento, “não se reportou o Constituinte a qualquer tipo
de exação tributária (mormente, as contribuições sociais, todas já abarcadas pelo art. 195,
incisos I, II e III e § 4º)”.
90
OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Ressarcimento ao sus : exame de mérito. mandado de segurança
individual. Boletim dos Procuradores da República. PR/SP. Autos n.º 2000.61.00.029283-8 – 8a Vara Cível
da Justiça Federal da 1
a
Subseção Judiciária do Estado deo Paulo. Impetrante: AMA Assistência Médica S/C
Ltda. Impetrado: Diretor da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, em São Paulo. São Paulo, 16. jan.
2001.
79
Não divisa, por outro lado, a possibilidade do instituto em comento se revestir de
caráter tributário, seja não vinculado (imposto), seja vinculado (taxa e contribuição).
Assim, revela que “o nascimento do dever jurídico de ressarcir, desse modo, não
decorre de fato afeto à esfera jurídica do contribuinte, sendo nítida a intervenção estatal na
circunstância concreta que faz irromper a relação jurídica com o Estado. [...] não há como
configurar o ressarcimento como novo imposto criado.
Também, entende que não há como se revestir a exação do caráter tributo
vinculado.
Não é taxa porque “não há qualquer exercício do poder de polícia ou utilização,
efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis (art. 145, II CF/88),
prestados ao ‘sujeito passivo’ do ressarcimento a justificar seja considerada a obrigação
tal exação tributária”.
Não é contribuição porque inexiste “qualquer atividade estatal que mesmo
indiretamente esteja vinculada à pessoa jurídica obrigada ao ressarcimento.”
Em sua argumentação, demonstra que a relação jurídica que existe entre a
operadora de plano privado de saúde e o Estado a justificar o ressarcimento ao SUS, não
reside no atendimento ao consumidor em si, mas da negativa do atendimento a esse
mesmo consumidor quando o contrato firmado com ela (operadora) prevê a cobertura.
Seja essa negativa por força de um contrato redigido de forma a enganar o consumidor-
utente, seja pela falta de estrutura médico-hospitalar, não importa.
E, concluindo sua argumentação, emite seu parecer, entendendo ser o
ressarcimento uma obrigação civil da espécie indenização, verbis:
O instituto do ressarcimento ao SUS revela-se juridicamente uma obrigação
civil (e não uma obrigação tributária) de cunho patrimonial, consistente na
indenização, por parte das Operadoras, de valores gastos pelo SUS em
tratamentos, os quais, estando devidamente cobertos pelos planos ajustados,
deveriam ser financiados pelas mesmas, representando (para o SUS) mera
incorporação ao Erário Público dos valores despendidos pelos consumidores em
favor das operadoras, mas por elas não aplicados em seu benefício (e, por
conseguinte, auferidos sem qualquer causa), no momento em que se encontram
liberadas da execução material do serviço.
Seu parecer final, no que concerne aos fundamentos jurídicos do ressarcimento ao
sus enquanto obrigação civil, ainda alcança uma compreensão de que o instituto se presta
a inibir o enriquecimento sem causa por parte das operadoras:
80
O enriquecimento” (das Operadoras) e o “empobrecimento” (“dispêndio de
recursos públicos do SUS”)o os limites positivos do dever. Isto justifica o §
5º do art 32 : “Os valores a serem ressarcidos não serão inferiores aos
praticados pelo SUS e nem superiores aos praticados pelas operadoras (...)”.
Por fim, permitindo entrever o requisito lógico necessário à concreção do
princípio do enriquecimento sem causa na espécie, há no ressarcimento um
nexo de correlação lógica entre o “enriquecimento” (que se busca evitar na
incorporação de valores sem justificativa no patrimônio das Operadoras) e o
“empobrecimento” (que se dá com a repercussão dos custos das atividades
implementadas a cargo do SUS). Desse modo, considerando o disposto em lei,
o se vislumbracio de inconstitucionalidade formal ou material na previo
normativa instauradora e disciplinadora do ressarcimento.
Considerando os argumentos postos acima, várias foram as decisões judiciais, ora
contemplando o viés das operadoras, ora o do Estado. Vejamos:
5.7. Decisões favoráveis à inconstitucionalidade do ressarcimento ao sus:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO
DE TUTELA. RESSARCIMENTO AO SUS POR ATENDIMENTO A
ASSOCIADO DE PLANO PRIVADO DE SAÚDE. ART. 32 DA LEI Nº
9.656/98. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE.
I – Ao determinar que as operadoras de plano privado de saúde efetuem o
ressarcimento pelo atendimento feito pelo Sistema Único de Saúde – SUS aos
seus associados, a lei obrigou as mesmas a arcar com os encargos gerados em
razão do cumprimento do dever constitucionalmente imputado ao Estado (art.
196 da Constituição Federal) de garantir a todos o acesso universal e igualitário
aos serviços de promoção, proteção e recuperação da sde.
II – Tendo direito constitucional de utilizar o SUS e o direito contratual de
utilizar o plano privado de saúde, cabe ao usuário fazer a opção pelo prestador
de serviço, sem que venha a ser onerado por utilizar o serviço público, que é
gratuito.o há relação jurídica entre as operadoras de plano de saúde e o
Estado que decorra da relação contratual entre elas e os seus clientes, apenas
pelo fato de serem eles beneficiários da Seguridade Social.
III – Acresce que o § 8º do art. 32 da Lei 9.656/98 dispõe que “os valores a
serem ressarcidos não seo inferiores aos praticados pelo SUS e nem
superiores aos praticados pelas operadoras de produtos de que tratam o inciso I
e o § 1º do art. 1º desta Lei”. Assim, ainda que fosse devido o ressarcimento,
o haveria como impor a utilização da tabela TUNEP para o ressarcimento,
tendo em vista que os seus valores são maiores que os pagos pelos planos de
saúde aos seus conveniados pelos serviços prestados.
IV – Agravo de instrumento provido.
(2ª TURMA DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª
REGIÃO - AGRAVO DE INSTRUMENTO – PROCESSO Nº
2001.02.01.017774-7, RELATOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO
CRUZ NETTO, PUBLICADO NO DIÁRIO DA JUSTIÇA O ACÓRDÃO NO
DJ, PÁGS 144/155 EM 18.09.2003)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE
SEGURANÇA. LIMINAR. INSCRIÇÃO DO NOME DOS DEVEDORES
NO CADIN (LEI Nº 10.522/02). RESSARCIMENTO AO SUS (LEI Nº
9656/98)
1. Conforme remansosa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não se
justifica o registro do nome do devedor no CADIN, ou qualquer outro óro
cadastral de proteção ao crédito, enquanto pendente de julgamento ligio
instaurado entre as partes sobre determinado débito, motivo pelo qual há de ser
concedida a liminar pleiteada até o final da ação.
81
2. Ademais, se ao final daão em que se discute os valores cobrados (Lei nº
9656/98, artigo 32) for reconhecido que tais débitos não são abarcados pela Lei
10.522, 19.07.02, a agravante poderá ter sofrido prejuízos incalculáveis, o
que também justifica a concessão da medida.
3. Agravo de instrumento provido.
(6ª TURMA DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª
REGIÃO - AGRAVO DE INSTRUMENTO – PROCESSO Nº
2002.02.01.006700-4, RELATOR DESEMBARGADOR POUL ERIK
DYRLUND, V.U., PUBLICADO NO DIÁRIO DA JUSTIÇA O ACÓRDÃO
NO DJ,II, FLS.200/202 EM 15.10.2002)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE
INDEFERIU PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RESSARCIMENTO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚ- DE. ART. 32, LEI Nº
9.656/98. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS.
- Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que indeferiu
o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, formulado com visos a impedir a
inscrão do débito atinente aos valores de ressarcimento ao Sistema Único de
Saúde (art. 32, da Lei nº 9.656/98) na dívida ativa da agravada, bem assim o
lançamento do nome da recorrente no CADIN e o eventual ajuizamento de ação
de execução fiscal da quantia discutida.
- A Constituição Federal deixa transparecer, de forma cristalina, que todo o
sistema de saúde é de responsabilidade do Estado, o qual deve zelar pelo bem-
estar da população, sem quaisquer ressalvas.
- As atividades desenvolvidas pelas empresas de saúde são consideradas de
interesse público, pelo que compete ao Estado tomar as providências cabíveis
no sentido de evitar eventuais negligências por parte de tais pessoas jurídicas.
- Em se tratando de verdadeira taxa cobrada em razão da utilização dos
serviços prestados, o sujeito passivo, ao invés de ser o próprio usuário do
sistema, passou a ser a empresa prestadora dos serviços médicos, configurando-
se, pois, em flagrante violação constitucional.
- Ademais, admitir a exigibilidade da exação derivada do ressarcimento a ser
feito pelas operadoras privadas ao SUS e, cumulativamente, das contribuições
sociais incidentes sobre a folha de salários; a receita e o faturamento; e do
lucro, constitui evidente afronta ao princípio insculpido no art. 150, II da
Constituição Federal.
- Reforma da decisão atacada, para impedir que a autarquia recorrida inscreva o
nome da agravante no CADIN, bem como a inserção do débito discutido em
vida ativa e conseqüente ajuizamento de execução fiscal.
- Agravo de instrumento provido.
(1ª TURMA DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª
REGIÃO - AGRAVO DE INSTRUMENTO – PROCESSO Nº
2002.02.01.026716-9, RELATORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA
REGINA COELI M. C. PEIXOTO, V.U., PUBLICADO NO DIÁRIO DA
JUSTIÇA O ACÓRDÃO NO DJU II, FLS. 217/223 EM 06.03.2003)
5.8. Decisões favoráveis à constitucionalidade do ressarcimento
ao SUS:
RESSARCIMENTO AO SUS. ARTIGO 32 DA LEI Nº 9.656/98.
INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 196 DA
CONSTITUIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO PARA OS
CONVENIADOS E PARA OS NÃO CONVENIADOS. INCOERÊNCIA
DE ONEROSIDADE EXCESSIVA. OBRIGAÇÃO LEGAL.
1. A obrigação legal instituída pelo artigo 32 da Lei nº 9.656/98 não afronta o
disposto no artigo 196 da Constituição da República, haja vista que não implica
em obstar o acesso da população às ações e serviços para promoção, proteção e
recuperação da saúde.
82
2. A possível discriminação torna-se remota na medida em que se constata que
a verificação da qualidade de segurado é feita a posteriori, mediante
cruzamento dos dados do atendido e do procedimento realizado com aqueles
constantes de banco de dados da ANS.
[...]
5. Agravo ao qual se deu provimento.
(TRF – 2ª Região, 5ª Turma, AGV nº 2003.02.01.000588-0/RJ, Rel. Des. Fed.
Alberto Nogueira, in DJU 24/09/2003).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL.
ADMINISTRATIVO. RESSARCIMENTO AO SUS. LEI Nº 9.656/1998.
NATUREZA REPARATÓRIA. ASSISTÊNCIA À SAÚDE. PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS. OFENSA NÃO
CARACTERIZADA. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO
LEGAL NA ESFERA ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO.
1. O ressarcimento previsto no art. 32 da Lei nº 9.656/98 possui caráter
restituitório, pois visa essencialmente a recuperação de valores antes
despendidos pelo Estado na assistência à saúde, de sorte a possibilitar o
emprego de tais recursos em favor do próprio sistema de saúde, seja no
aprimoramento ou na expansão dos serviços, em consonância aos preceitos e
diretrizes traçados nos arts. 196 a 198 da Carta Magna.
2. Tal exigência não se reveste de natureza tributária, porquanto o objetiva a
norma em questão a instituição de nova receita a ingressar nos cofresblicos,
razão pela qual, mostra-se desnecessária a edição de lei complementar para
dispor sobre a matéria, inexistindo, assim, qualquer ofensa aos prinpios
constitucionais triburios.
[...]
5. Agravo de instrumento desprovido e agravo regimental prejudicado.”
(TRF – 3ª Região, 6ª Turma, AG nº 2004.03.00018493-0/SP, Rel. Des. Fed.
Consuelo Yoshida, in DJU 05/11/2004).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RESSARCIMENTO AO SUS.
O ressarcimento ao SUS não tem natureza tributária, mas restituitória.
2. O art. 32 da Lei nº 9.656/98 não viola o art. 196 da Constituição Federal. O
ressarcimento não implica discriminação do SUS em relação ao atendimento de
pessoas conveniadas a planos de saúde, porque o atendimento a elas é feito sem
qualquer ônus para o paciente. Apenas ficou que a cobrança pelo serviço é feita
do plano ao qual o paciente é conveniado.
A ANS tem competência legal para administrar os procedimentos relativos ao
ressarcimento.
(TRF – 4ª Região, 3ª Turma, AG nº 2002.04.01.046240-2/SC, Rel. Juiz Luiz
Carlos de Castro Lugon, in DJU 06/10/2004).
83
CONCLUSÃO
No compasso das argumentações apresentadas, é de se refletir acerca do disposto
no art. 194 da Constituição Federal: “A seguridade social compreende um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a
assegurar os direitos relativos à saúde, à previncia e à assistência social”, e no art. 2
o
da
lei 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde): “O dever do Estado não exclui o das pessoas, da
família, das empresas e da sociedade.
Cada um (Estado e sociedade), nos exatos limites de sua responsabilidade, deve
contribuir para que seja assegurada a dignidade humana, marcadamente no que toca à
saúde. Especialmente, as Operadoras de Planos de Saúde, que – em sua maioria e durante
tanto tempo – se enriqueceram livre e, quase sempre impunemente, à custa de não cumprir
os termos de seus contratos, obrigando, muitas vezes, seus utentes-contratantes a recorrer
ao SUS – mesmo tendo assegurada a cobertura contratual – para garantir os cuidados com
sua saúde.
A grande controvérsia inicial provocada pela instituição do ressarcimento ao SUS
arrefeceu um pouco, a partir da constatação, pelas operadoras, de que elas não se podem
colocar acima da lei. Seus argumentos para extirpá-lo do ordenamento jurídico não
lograram êxito, pelo menos por enquanto.
Com efeito, o ressarcimento ao SUS não se reveste de caráter tributário, em que
pesem os argumentos das operadoras no sentido de assim caracterizá-lo, eis que ausentes
seus pressupostos.
Poderia até ser tratado como financiamento, nos termos defendidos pelo
Ministério Público Federal, elegendo-o como outra fonte de custeio da seguridade social.
Contudo,o vislumbramos, na mens legis do dispositivo em comento (artigo 32 da Lei
9.656/98), esse instituto.
Afigura-se-nos muito mais consentâneo, o argumento de que se trata,
efetivamente, de restituição ao erário, dos valores despendidos pelo Estado para oferecer
atenção à saúde do cidadão, quando essa obrigação seria da operadora de plano privado de
saúde pelo fato do descumprimento das obrigações legais e contratuais.
Assim, temos que, analisadas as argumentações postas, o ressarcimento ao SUS
pelas operadoras de planos de saúde será devido sempre que estas se negarem a atender a
84
necessidade de seu cliente/consumidor, atendidas as seguintes circunstâncias: a) o
contrato contiver cláusulas abusivas (nulas, portanto, nos termos do art. 51 do Código de
Defesa do Consumidor - CDC); b) tais cláusulas foram redigidas de forma ambígua e de
modo a dificultar a sua compreensão e pelo consumidor (CDC art. 54, § 3
o
); c) não seja
oferecida a devida estrutura (médicos, clínicas, hospitais etc.) aos consumidores de seus
contratos; d) por negativa de cobertura de procedimento previsto contratualmente e sendo
a modalidade contratual a de pré-pagamento (já que os contratos firmados na modalidade
de pós-pagamento não comportariam, pelas suas próprias características, o ressarcimento).
Na hipótese de estar clara no contrato a exclusão de cobertura (nos termos do
Código de Defesa do Consumidor, marcadamente o art. 54, § 4º, que estabelece: “As
cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com
destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”) e em consonância com a
legislação (arts. 10 e 12 da Lei da 9.656/98), entendemos não ser devido o ressarcimento,
poro haver, nesse caso, prática de ilícito a ensejar o reembolso aos cofres públicos, já
que não teriam, as operadoras, a obrigação legal de atendimento.
Constitui, efetivamente, enriquecimento ilícito, com vedação prevista nos arts.
884 e 885 do Código Civil (enriquecimento sem causa), caracterizando-se como
externalidade negativa o fato de as operadoras negarem atendimento a consumidor que,
por força de contrato tenha direito a atendimento previsto no contrato e na legislação
pertinente, o que nos faz concluir pela necessidade da internalização desses custos, sob
pena de prejuízo para toda a sociedade.
Finalmente, por esses argumentos, discordamos, data vênia, das decies
judiciais que, liminarmente, entenderam ilegal/inconstitucional o ressarcimento ao SUS,
bem assim, daquelas outras, também em sede de liminares, que entenderam que todo e
qualquer atendimento realizado pelo SUS a consumidores de planos privados de saúde
deva ser ressarcido pelas respectivas operadoras.
Repisamos, pois, que a sociedade – principalmente aquela parcela mais abastada e
privilegiada (inseridas aí as Operadoras de Planos Privados de Saúde) – não se pode furtar
à busca de um modelo social justo, que auxilie a redução das desigualdades existentes em
seu seio.
Nesse sentido, o ressarcimento ao SUS poderia até ser uma espécie de
contribuição social. Principalmente, porque, observa-se no Brasil, o que Julian Tudor Hart
85
já identificara nas estatísticas demográficas e de saúde do Reino Unido entre 1934 e 1968
(conforme demonstramos no primeiro capítulo deste trabalho): as pessoas e grupos que
mais necessitam de cuidados de saúde são exatamente aquelas a quem menos esses
serviços são ofertados. Mas para ingressar no mundo jurídico, teria de ser criada por lei
complementar, como visto.
Assim, concluímos que a natureza jurídica do ressarcimento é de restituição ao
erário público, daquilo que o Estado despendeu e não seria encargo seu se a operadora de
plano privado de saúde tivesse prestado o serviço para o qual fora contratada.
Essa restituição, como demonstrado, se faz necessária pelo fato de as operadoras
de planos de saúde provocarem uma externalidade negativa ao não internalizarem os
custos gerados pelo atendimento a seus consumidores contratantes de planos de saúde
quando (estes) se utilizam da estrutura dos órgãos públicos, estando obrigadas a prestá-lo
(o atendimento) por força do convencionado contratualmente e pelas exigências das
normas legais pertinentes.
A não internalização de custos provoca, sim, o enriquecimento sem causa, a que
se acostumaram inúmeras operadoras – por longos anos – pela prática ilícita do não
cumprimento das cláusulas contratuais firmadas com consumidores, obrigando-os à busca
de atenção à saúde nas unidades do SUS.
Não teria, portanto, natureza tributária. Tampouco, indenizatória. Entendemos, pois,
constitucional o instituto, nos termos aqui abordados.
86
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89
ANEXO A – EXCERTOS DA LEI Nº 8.080/90
LEI Nº 8.080
de 19 de Setembro de 1990.
Dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento
dos serviços correspondentes e dá outras provincias.
O Presidente da República, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono
a seguinte lei:
Disposição Preliminar
Art. 1º - Esta Lei regula, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde,
executados, isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas
naturais ou jurídicas de direito público ou privado.
TÍTULO I
Das Disposições Gerais
Art. 2º - A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as
condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º - O dever do Estado de garantir a saúde consiste na reformulação e execução de políticas
econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos no
estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos
serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
§ 2º - O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.
Art. 3º - A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a
alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a
educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde
da população expressam a organização social e econômica do País.
Parágrafo Único. Dizem respeito também à saúde as ações que, por força do disposto no
artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à coletividade condições de bem-estar
sico, mental e social.
TÍTULO II
Do Sistema Único de Saúde
Disposição Preliminar
Art. 4º - O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por orgãos e instituições públicas
federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas
pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde-SUS.
§ 1º - Estão incluídas no disposto neste artigo as instituições públicas federais, estaduais e
municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos
inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para a saúde.
§ 2º - A iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de Saúde-SUS, em caráter
complementar.
90
CAPÍTULO I
Dos Objetivos e Atribuições
Art. 5º - Dos objetivos do Sistema Único de Saúde-SUS :
I - a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde;
II - a formulação de potica de saúde destinada a promover, nos campos ecomico e social,
a observância do disposto no §1º do artigo desta Lei;
III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da
saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas.
[...]
CAPÍTULO II
Dos Princípios e Diretrizes
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou
conveniados que integram o Sistema Único de Saúde - SUS são desenvolvidos de acordo com
as diretrizes previstas no artigo 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes
prinpios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações
e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos
os níveis de complexidade do sistema;
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral;
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;
V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;
VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e sua utilização
pelo usuário;
VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de
recursos e a orientação programática;
VIII - participação da comunidade;
IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:
a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;
b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;
X - integração, em nível executivo, das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na prestação de serviços de assistência à saúde
da população;
XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e
XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins
idênticos.
CAPÍTULO III
Da Organização, da Direção e da Gestão
Art. 8º - As ações e serviços de saúde, executados pelo Sistema Único de Saúde-SUS, seja
diretamente ou mediante participação complementar da iniciativa privada, serão organizados
de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente.
[...]
91
Art. 18. À direção municipal do Sistema Único de Saúde-SUS, compete:
[...]
XI - controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços privados de saúde:
[...]
Art. 20. Os serviços privados de assistência à saúde caracterizam-se pela atuação, por
iniciativa própria, de profissionais liberais, legalmente habilitados, e de pessoas jurídicas e de
direito privado na promoção, proteção e recuperão da saúde.
Art. 21. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
Art. 22. Na prestação de serviços privados de assistência à saúde, serão observados os
princípios éticos e as normas expedidas pelo órgão de direção do Sistema Único de Saúde-
SUS quanto às condições para seu funcionamento.
Art. 23. É vedada a participação direta ou indireta de empresas ou de capitais estrangeiros na
assistência à saúde, salvo através de doações de organismos internacionais vinculados à
Organização das Nações Unidas, de entidades de cooperação técnica e de financiamento e
empréstimos.
§ 1º Em qualquer caso é obrigatória a autorização do órgão de direção nacional do Sistema
Único de Saúde-SUS, submetendo-se a seu controle as atividades que forem desenvolvidas e
os instrumentos que forem firmados.
§ 2º Excetuam-se do disposto neste artigo os serviços de saúde mantidos, sem finalidade
lucrativa, por empresas, para atendimento de seus empregados e dependentes, sem qualquer
ônus para a Seguridade Social.
CAPÍTULO II
Da Participação Complementar
Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura
assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde-SUS poderá
recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.
Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada
mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.
Art. 25. Na hipótese do artigo anterior, as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos terão
preferência para participar do Sistema Único de Saúde-SUS.
Art. 26. Os critérios e valores para a remuneração de serviços e os parâmetros de cobertura
assistencial serão estabelecida pela direção nacional do Sistema Único de Saúde-SUS,
aprovados no Conselho Nacional de Saúde.
§ 1º Na fixação dos critérios, valores, formas de reajuste e de pagamento da remuneração,
aludida neste artigo, a direção nacional do Sistema Único de Saúde-SUS, deverá fundamentar
seu ato em demonstrativo econômico-financeiro que garanta a efetiva qualidade dos serviços
contratados.
§ 2º Os serviços contratados submeter-se-ão às normas técnicas e administrativas e aos
princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde-SUS, mantido o equibrio econômico e
financeiro do contrato.
[...]
92
Art. 43. A gratuidade das ações e serviços de saúde fica preservada nos serviços públicos e
privados contratados , ressalvando-se as cláusulas dos contratos ou convênios estabelecidos
com as entidades privadas.
93
ANEXO B – EXCERTOS DA LEI Nº 9.656, DE 3 DE JUNHO DE 1998
LEI Nº 9.656, DE 3 DE JUNHO DE 1998
Dispõe sobre os planos privados de assistência à saúde.
Texto consolidado com as alterações impostas pela
medida provisória nº 2.177-44, de 24 de agosto de 2001
(D.O.U. nº 164-E, de 27 de agosto de 2001, Seção 1)
Altera a Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, que
dispõe sobre os planos privados de assistência à
saúde e dá outras providências
Art. 1º Submetem-se às disposições desta Lei as pessoas jurídicas de direito privado que
operam planos de assistência à saúde, sem prejuízo do cumprimento da legislação específica
que rege a sua atividade, adotando-se, para fins de aplicação das normas aqui estabelecidas, as
seguintes definições:
I - Plano Privado de Assistência à Saúde: prestação continuada de serviços ou cobertura de
custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a
finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e
atendimento por profissionais ou servos de saúde, livremente escolhidos, integrantes ouo
de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e
odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada,
mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor;
II - Operadora de Plano de Assistência à Saúde: pessoa jurídica constitda sob a modalidade
de sociedade civil ou comercial, cooperativa, ou entidade de autogestão, que opere produto,
serviço ou contrato de que trata o inciso I deste artigo.
III - Carteira: o conjunto de contratos de cobertura de custos assistenciais ou de serviços de
assistência à saúde em qualquer das modalidades de que tratam o inciso I e o §1º deste artigo,
com todos os direitos e obrigações nele contidos.
§1º Está subordinada às normas e à fiscalização da Agência Nacional de Saúde
Suplementar - ANS qualquer modalidade de produto, serviço e contrato que apresente,
além da garantia de cobertura financeira de riscos de assistência médica, hospitalar e
odontológica, outras características que o diferencie de atividade exclusivamente
financeira, tais como:
a) custeio de despesas;
b) oferecimento de rede credenciada ou referenciada;
c) reembolso de despesas;
d) mecanismos de regulação;
e) qualquer restrição contratual, técnica ou operacional para a cobertura de procedimentos
solicitados por prestador escolhido pelo consumidor; e
f) vinculação de cobertura financeira à aplicação de conceitos ou critérios médico-
assistenciais.
§2º Incluem-se na abrangência desta Lei as cooperativas que operem os produtos de que
tratam o inciso I e o §1º deste artigo, bem assim as entidades ou empresas que mantêm
sistemas de assistência à saúde, pela modalidade de autogestão ou de administração.
§ 3º As pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior podem constituir ou
participar do capital, ou do aumento do capital, de pessoas jurídicas de direito privado
constituídas sob as leis brasileiras para operar planos privados de assistência à saúde.
94
§ 4º É vedada às pessoas físicas a operação dos produtos de que tratam o inciso I e o §1º deste
artigo.
Art. 2º REVOGADO.
Art. 3º REVOGADO.
Art. 4º REVOGADO.
Art. 5º REVOGADO.
Art. 6º REVOGADO.
Art. 7º REVOGADO.
Art. 8º Para obter a autorização de funcionamento, as operadoras de planos privados de
assistência à saúde devem satisfazer os seguintes requisitos, independentemente de outros que
venham a ser determinados pela ANS:
I - registro nos Conselhos Regionais de Medicina e Odontologia, conforme o caso, em
cumprimento ao disposto no art. 1° da Lei nº 6.839, de 30 de outubro de 1980;
II - descrição pormenorizada dos serviços de saúde próprios oferecidos e daqueles a serem
prestados por terceiros;
III - descrição de suas instalações e equipamentos destinados a prestação de serviços;
IV - especificação dos recursos humanos qualificados e habilitados, com responsabilidade
técnica de acordo com as leis que regem a matéria;
V - demonstração da capacidade de atendimento em razão dos serviços a serem prestados;
VI - demonstração da viabilidade econômico-financeira dos planos privados de assistência à
saúde oferecidos, respeitadas as peculiaridades operacionais de cada uma das respectivas
operadoras;
VII - especificação da área geográfica coberta pelo plano privado de assistência à saúde.
§ 1º São dispensadas do cumprimento das condições estabelecidas nos incisos VI e VII deste
artigo, as entidades ou empresas que mantêm sistemas de assistência privada à saúde na
modalidade de autogestão, citadas no §2º do art. 1º.
§ 2º A autorização de funcionamento será cancelada caso a operadora não comercialize os
produtos de que tratam o inciso I e o § 1
o
do art 1
o
desta Lei, no prazo máximo de cento e
oitenta dias a contar do seu registro na ANS.
§ 3º As operadoras privadas de assistência à saúde poderão voluntariamente requerer
autorização para encerramento de suas atividades, observando os seguintes requisitos,
independentemente de outros que venham a ser determinados pela ANS:
a) comprovação da transferência da carteira sem prejuízo para o consumidor, ou a inexistência
de beneficiários sob sua responsabilidade;
b) garantia da continuidade da prestação de serviços dos beneficiários internados ou em
tratamento;
c) comprovação da quitação de suas obrigações com os prestadores de serviço no âmbito da
operação de planos privados de assistência à saúde;
d) informação prévia à ANS, aos beneficiários e aos prestadores de serviço contratados,
credenciados ou referenciados, na forma e nos prazos a serem definidos pela ANS.
[...]
Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial
médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados
exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar,
quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial
de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto:
I - tratamento clínico ou cirúrgico experimental;
95
II - procedimentos clínicos ou cirgicos para fins estéticos, bem como órteses e próteses para
o mesmo fim;
III - inseminação artificial;
IV - tratamento de rejuvenescimento ou de emagrecimento com finalidade estética;
V - fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados;
VI - fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar;
VII - fornecimento de próteses, órteses e seus acessórios não ligados ao ato cirúrgico;
VIII - REVOGADO.
IX - tratamentos icitos ou antiéticos, assim definidos sob o aspecto médico, ou não
reconhecidos pelas autoridades competentes;
X - casos de cataclismos, guerras e comoções internas, quando declarados pela autoridade
competente.
§ 1º As exceções constantes dos incisos deste artigo serão objeto de regulamentação pela
ANS.
§ 2º As pessoas jurídicas que comercializam produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art.
1º desta Lei oferecerão, obrigatoriamente, a partir de 3 de dezembro de 1999, o plano-
referência de que trata este artigo a todos os seus atuais e futuros consumidores.
§ 3º Excluem-se da obrigatoriedade a que se refere o § 2º deste artigo as pessoas jurídicas que
mantêm sistemas de assistência à saúde pela modalidade de autogestão e as pessoas jurídicas
que operem exclusivamente planos odontológicos.
§ 4º A amplitude das coberturas, inclusive de transplantes e de procedimentos de alta
complexidade, será definida por normas editadas pela ANS.
Art. 10-A. Cabe às operadoras definidas nos incisos I e II do § 1º do art. 1º desta Lei, por
meio de sua rede de unidades conveniadas, prestar servo de cirurgia pstica reconstrutiva
de mama, utilizando-se de todos os meios e técnicas necessárias, para o tratamento de
mutilação decorrente de utilização de técnica de tratamento de câncer.
(Art. 10-A incluído pela Lei nº 10.223, de 15 de maio de 2001)
Art. 11. É vedada a exclusão de cobertura às doenças e lesões preexistentes à data de
contratação dos produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei após vinte e
quatro meses de vigência do aludido instrumento contratual, cabendo à respectiva operadora o
ônus da prova e da demonstração do conhecimento prévio do consumidor ou beneficiário.
Parágrafo único. É vedada a suspensão da assistência à saúde do consumidor ou beneficiário,
titular ou dependente, até a prova de que trata o caput, na forma da regulamentação a ser
editada pela ANS.
Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso
I e o §1º do art. 1º desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo,
respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o
art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:
I - quando incluir atendimento ambulatorial:
a) cobertura de consultas médicas, em número ilimitado, em clínicas básicas e especializadas,
reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina;
b) cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos
ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente;
II - quando incluir internação hospitalar:
a) cobertura de internações hospitalares, vedada a limitação de prazo, valor máximo e
quantidade, em clínicas básicas e especializadas, reconhecidas pelo Conselho Federal de
Medicina, admitindo-se a exclusão dos procedimentos obstétricos;
b) cobertura de internações hospitalares em centro de terapia intensiva, ou similar, vedada a
limitação de prazo, valor máximo e quantidade, a critério do médico assistente;
96
c) cobertura de despesas referentes a honorários médicos, serviços gerais de enfermagem e
alimentação;
d) cobertura de exames complementares indispensáveis para o controle da evolução da doença
e elucidação diagnóstica, fornecimento de medicamentos, anestésicos, gases medicinais,
transfusões e sessões de quimioterapia e radioterapia, conforme prescrição do médico
assistente, realizados ou ministrados durante o período de internação hospitalar;
e) cobertura de toda e qualquer taxa, incluindo materiais utilizados, assim como da remoção
do paciente, comprovadamente necessária, para outro estabelecimento hospitalar, dentro dos
limites de abrangência geográfica previstos no contrato, em terririo brasileiro; e
f) cobertura de despesas de acompanhante, no caso de pacientes menores de dezoito anos;
III - quando incluir atendimento obstétrico:
a) cobertura assistencial ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, ou de seu
dependente, durante os primeiros trinta dias após o parto;
b) inscrição assegurada ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, como
dependente, isento do cumprimento dos períodos de carência, desde que a inscrição ocorra no
prazo máximo de trinta dias do nascimento ou da adoção;
IV - quando incluir atendimento odontológico:
a) cobertura de consultas e exames auxiliares ou complementares, solicitados pelo odontólogo
assistente;
b) cobertura de procedimentos preventivos, de dentística e endodontia;
c) cobertura de cirurgias orais menores, assim consideradas as realizadas em ambiente
ambulatorial e sem anestesia geral;
V - quando fixar períodos de carência:
a) prazo máximo de trezentos dias para partos a termo;
b) prazo máximo de cento e oitenta dias para os demais casos;
c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência;
VI - reembolso, em todos os tipos de produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta
Lei, nos limites das obrigações contratuais, das despesas efetuadas pelo beneficiário com
assistência à saúde, em casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização
dos serviços próprios, contratados ou credenciados pelas operadoras, de acordo com a relação
de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo respectivo produto, pagáveis no
prazo máximo de trinta dias após a entrega da documentação adequada;
VII - inscrição de filho adotivo, menor de doze anos de idade, aproveitando os períodos de
carência já cumpridos pelo consumidor adotante.
§ 1º Após cento e vinte dias da vigência desta Lei, fica proibido o oferecimento de produtos
de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei fora das segmentações de que trata este
artigo, observadas suas respectivas condições de abrangência e contratação.
§ 2º A partir de 3 de dezembro de 1999, da documentação relativa à contratação de produtos
de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei, nas segmentações de que trata este artigo,
deverá constar declaração em separado do consumidor, de que tem conhecimento da
existência e disponibilidade do plano referência, e de que este lhe foi oferecido.
[...]
Art. 20. As operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei são
obrigadas a fornecer, periodicamente, à ANS todas as informações e estatísticas relativas as
suas atividades, incluídas as de natureza cadastral, especialmente aquelas que permitam a
identificação dos consumidores e de seus dependentes, incluindo seus nomes, inscrições no
Cadastro de Pessoas Físicas dos titulares e Municípios onde residem, para fins do disposto no
art. 32.
97
§ 1º Os agentes, especialmente designados pela ANS, para o exercício das atividades de
fiscalização e nos limites por ela estabelecidos, têm livre acesso às operadoras, podendo
requisitar e apreender processos, contratos, manuais de rotina operacional e demais
documentos, relativos aos produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei.
§ 2º. Caracteriza-se como embaraço à fiscalização, sujeito às penas previstas na lei, a
imposição de qualquer dificuldade à consecução dos objetivos da fiscalização, de que trata o §
1º deste artigo.
[...]
Art. 32. Seo ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o §1º do
art. 1º desta Lei, de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de
atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, prestados a seus consumidores e
respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas,
integrantes do Sistema Único de Saúde - SUS.
§ 1º O ressarcimento a que se refere o caput será efetuado pelas operadoras à entidade
prestadora de serviços, quando esta possuir personalidade jurídica própria, e ao SUS,
mediante tabela de procedimentos a ser aprovada pela ANS.
§ 2º Para a efetivação do ressarcimento, a ANS disponibilizará às operadoras a discriminação
dos procedimentos realizados para cada consumidor.
§ 3° A operadora efetuará o ressarcimento até o décimo quinto dia após a apresentação da
cobrança pela ANS, creditando os valores correspondentes à entidade prestadora ou ao
respectivo fundo de sde, conforme o caso.
§ 4
o
O ressarcimento não efetuado no prazo previsto no parágrafo anterior será cobrado com
os seguintes acréscimos:
I - juros de mora contados do mês seguinte ao do vencimento, à razão de um por cento ao mês
ou fração;
II - multa de mora de dez por cento.
§ 5
o
Os valores não recolhidos no prazo previsto no §3º serão inscritos em dívida ativa da
ANS, a qual compete a cobrança judicial dos respectivos créditos.
§ 6
o
O produto da arrecadação dos juros e da multa de mora serão revertidos ao Fundo
Nacional de Saúde.
§ 7
o
A ANS fixará normas apliveis ao processo de glosa ou impugnação dos procedimentos
encaminhados, conforme previsto no § 2
o
deste artigo.
§ 8
o
Os valores a serem ressarcidos não serão inferiores aos praticados pelo SUS e nem
superiores aos praticados pelas operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o § 1
o
do art.
1
o
desta Lei.
98
ANEXO C - LEI N
o
9.961 DE 28 DE JANEIRO DE 2000.
LEI N
o
9.961 DE 28 DE JANEIRO DE 2000.
Cria a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
DA CRIAÇÃO E DA COMPETÊNCIA
Art. 1
o
É criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, autarquia sob o regime
especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro - RJ,
prazo de duração indeterminado e atuação em todo o território nacional, como órgão de
regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência
suplementar à saúde.
Parágrafo único. A natureza de autarquia especial conferida à ANS é caracterizada por
autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão de recursos humanos,
autonomia nas suas decisões técnicas e mandato fixo de seus dirigentes.
Art. 2
o
Caberá ao Poder Executivo instalar a ANS, devendo o seu regulamento, aprovado por
decreto do Presidente da República, fixar-lhe a estrutura organizacional básica.
Parágrafo único. Constituída a ANS, com a publicação de seu regimento interno, pela
diretoria colegiada, ficará a autarquia, automaticamente, investida no exercício de suas
atribuições.
Art. 3
o
A ANS terá por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na
assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas
relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de
saúde no País.
Art. 4
o
Compete à ANS:
I - propor políticas e diretrizes gerais ao Conselho Nacional de Saúde Suplementar - Consu
para a regulação do setor de saúde suplementar;
II - estabelecer as características gerais dos instrumentos contratuais utilizados na atividade
das operadoras;
III - elaborar o rol de procedimentos e eventos em saúde, que constituirão referência básica
para os fins do disposto na Lei n
o
9.656, de 3 de junho de 1998, e suas excepcionalidades;
IV - fixar critérios para os procedimentos de credenciamento e descredenciamento de
prestadores de serviço às operadoras;
V - estabelecer parâmetros e indicadores de qualidade e de cobertura em assistência à saúde
para os serviços próprios e de terceiros oferecidos pelas operadoras;
VI - estabelecer normas para ressarcimento ao Sistema Único de Saúde - SUS;
VII - estabelecer normas relativas à adoção e utilização, pelas operadoras de planos de
assistência à saúde, de mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde;
VIII - deliberar sobre a criação de câmaras técnicas, de caráter consultivo, de forma a
subsidiar suas decisões;
IX - normatizar os conceitos de doença e lesão preexistentes;
X - definir, para fins de aplicação da Lei n
o
9.656, de 1998, a segmentação das operadoras e
administradoras de planos privados de assistência à saúde, observando as suas peculiaridades;
XI - estabelecer critérios, responsabilidades, obrigações e normas de procedimento para
garantia dos direitos assegurados nos arts. 30 e 31 da Lei n
o
9.656, de 1998;
99
XII - estabelecer normas para registro dos produtos definidos no inciso I e no § 1
o
do art. 1
o
da Lei n
o
9.656, de 1998;
XIII - decidir sobre o estabelecimento de sub-segmentações aos tipos de planos definidos nos
incisos I a IV do art. 12 da Lei n
o
9.656, de 1998;
XIV - estabelecer critérios gerais para o exercício de cargos diretivos das operadoras de
planos privados de assistência à saúde;
XV - estabelecer critérios de aferição e controle da qualidade dos servos oferecidos pelas
operadoras de planos privados de assistência à saúde, sejam eles próprios, referenciados,
contratados ou conveniados;
XVI - estabelecer normas, rotinas e procedimentos para concessão, manutenção e
cancelamento de registro dos produtos das operadoras de planos privados de assistência à
saúde;
XVII - autorizar reajustes e revisões das contraprestações pecuniárias dos planos privados de
assistência à saúde, ouvido o Ministério da Fazenda; (Redação dada pela MP nº 2.177-44, de
24 de agosto de 2001).
XVIII - expedir normas e padrões para o envio de informões de natureza econômico-
financeira pelas operadoras, com vistas à homologação de reajustes e revisões;
XIX - proceder à integração de informações com os bancos de dados do Sistema Único de
Saúde;
XX - autorizar o registro dos planos privados de assistência à saúde;
XXI - monitorar a evolução dos preços de planos de assistência à saúde, seus prestadores de
serviços, e respectivos componentes e insumos;
XXII - autorizar o registro e o funcionamento das operadoras de planos privados de
assistência à saúde, bem assim sua cisão, fusão, incorporação, alteração ou transferência do
controle societário, sem prejuízo do disposto na Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994;
(Redação dada pela MP nº 2.177-44, de 24 de agosto de 2001).
XXIII - fiscalizar as atividades das operadoras de planos privados de assistência à saúde e
zelar pelo cumprimento das normas atinentes ao seu funcionamento;
XXIV - exercer o controle e a avaliação dos aspectos concernentes à garantia de acesso,
manutenção e qualidade dos serviços prestados, direta ou indiretamente, pelas operadoras de
planos privados de assistência à saúde;
XXV - avaliar a capacidade técnico-operacional das operadoras de planos privados de
assistência à saúde para garantir a compatibilidade da cobertura oferecida com os recursos
disponíveis na área geográfica de abrangência;
XXVI - fiscalizar a atuação das operadoras e prestadores de serviços de saúde com relação à
abrangência das coberturas de patologias e procedimentos;
XXVII - fiscalizar aspectos concernentes às coberturas e o cumprimento da legislação
referente aos aspectos sanitários e epidemiológicos, relativos à prestação de serviços médicos
e hospitalares no âmbito da saúde suplementar;
XXVIII - avaliar os mecanismos de regulação utilizados pelas operadoras de planos privados
de assistência à saúde;
XXIX - fiscalizar o cumprimento das disposições da Lei n
o
9.656, de 1998, e de sua
regulamentação;
XXX - aplicar as penalidades pelo descumprimento da Lei n
o
9.656, de 1998, e de sua
regulamentação;
XXXI - requisitar o fornecimento de informações às operadoras de planos privados de
assistência à saúde, bem como da rede prestadora de serviços a elas credenciadas;
XXXII - adotar as medidas necessárias para estimular a competição no setor de planos
privados de assistência à saúde;
XXXIII - instituir o regime de direção fiscal ou técnica nas operadoras;
100
XXXIV - proceder à liquidação extrajudicial e autorizar o liquidante a requerer a falência ou
insolvência civil das operadoras de planos privados de assistência à saúde; (Redação dada
pela MP nº 2.177-44, de 24 de agosto de 2001).
XXXV – determinar ou promover a alienação da carteira de planos privados de assistência à
saúde das operadoras; (Redação dada pela MP nº 2.097-36, de 26 de janeiro de 2001).
XXXVI - articular-se com os órgãos de defesa do consumidor visando a eficácia da proteção e
defesa do consumidor de serviços privados de assistência à saúde, observado o disposto na
Lei n
o
8.078, de 11 de setembro de 1990;
XXXVII - zelar pela qualidade dos serviços de assistência à saúde no âmbito da assistência à
saúde suplementar;
XXXVIII - administrar e arrecadar as taxas instituídas por esta Lei.
XXXIX – celebrar, nas condições que estabelecer, termo de compromisso de ajuste de
conduta e termo de compromisso e fiscalizar os seus cumprimentos. (Redação dada pela MP
nº 2.177-44, de 24 de agosto de 2001).
XL – definir as atribuições e competências do diretor técnico, diretor fiscal, do liquidante e do
responsável pela alienação de carteira. (Inciso incluído pela MP nº 2.097-36, de 26 de janeiro
de 2001).
XLI – fixar as normas para constituição, organização, funcionamento e fiscalização das
operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º da Lei nº 9.656, de 3 de
junho de 1998, incluindo: (Artigo e alíneas incluídas pela MP nº 2.177-44, de 24 de agosto de
2001).
a) conteúdos e modelos assistenciais;
b) adequação e utilização de tecnologias em saúde;
c) direção fiscal ou técnica;
d) liquidação extrajudicial;
e) procedimentos de recuperação financeira das operadoras;
f) normas de aplicação de penalidades;
g) garantias assistenciais, para cobertura dos planos ou produtos comercializados ou
disponibilizados;
XLII – estipular índices e demais condões técnicas sobre investimentos e outras relações
patrimoniais a serem observadas pelas operadoras de planos de assistência à saúde. (Inciso
incluído pela MP nº 2.177-44, de 24 de agosto de 2001).
§ 1
o
A recusa, a omissão, a falsidade ou o retardamento injustificado de informações ou
documentos solicitados pela ANS constitui infração punível com multa diária de R$ 5.000,00
(cinco mil reais), podendo ser aumentada em até vinte vezes, se necessário, para garantir a sua
eficácia em razão da situação econômica da operadora ou prestadora de serviços. (Redação
dada pelaMP nº 1.976-33, de 23 de novembro de 2000).
§ 2
o
As normas previstas neste artigo obedecerão às características específicas da operadora,
especialmente no que concerne à natureza jurídica de seus atos constitutivos.
§ 3
o
Revogado. (MP nº 2.177-44, de 24 de agosto de 2001).
101
ANEXO D – RESOLUÇÃO - RDC Nº 17, DE 30 DE MARÇO DE 2000
RESOLUÇÃO - RDC Nº 17, DE 30 DE MARÇO DE 2000*
Dispõe sobre a Tabela Única Nacional de Equivalência de
Procedimentos TUNEP para fins de ressarcimento dos atendimentos
prestados aos beneficiários de planos privados de assistência à saúde,
por instituições públicas ou privadas, integrantes do Sistema Único de
Saúde - SUS.
A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, no uso das
atribuições que lhe conferem o inciso III do art. 9º do regulamento aprovado pelo Decreto nº.
3327, de 05 de Janeiro de 2000, em reunião realizada em 30 de março de 2000, adotou a
seguinte resolução de Diretoria Colegiada e eu, Diretor Presidente determino a sua
publicação.
Art. 1º. Aprovar, nos termos dos artigos 32 da Lei 9.656 de 03 de junho de 1998, a Tabela
Única Nacional de Equivalência de Procedimentos TUNEP, conforme anexo desta Resolão.
Art. 2º. A TUNEP terá como finalidade única o ressarcimento, pelas operadoras de planos
privados de assistência á saúde, dos atendimentos prestados a seus beneficiários pelas
entidades integrantes do Sistema Único de Saúde- SUS, sendo vedada sua utilização para
outros fins.
Art. 3º. Esta Resolução entra em vigor na data da sua publicação.
JANUARIO MONTONE
* Esta Resolão contém anexos que constituem a TUNEP propriamente dita. Em face de sua
grande extensão, houvemos por bem deixar de juntá-la como anexo.
102
DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO MESTRADO EM DIREITO DA UNIVERSIDADE GAMA FILHO, NO RIO
DE JANEIRO, E APROVADA PELA COMISSÃO EXAMINADORA FORMADA PELOS SEGUINTES
PROFESSORES:
PROF. DR. FRANCISCO MAURO DIAS
UNIVERSIDADE GAMA FILHO - UGF
(ORIENTADOR)
PROF. DR. MARCOS JURUENA VILLELA SOUTO
UNIVERSIDADE GAMA FILHO - UGF
PROF. DR. ADILSON RODRIGUES PIRES
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Rio de Janeiro, 09 de julho de 2007
Prof. Dr. JOSÉ RIBAS VIEIRA
Coordenador do Programa de Pós-graduação em Direito
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