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Roberta Rego Rodrigues
A ORGANIZAÇÃO TEMÁTICA EM A HORA DA
ESTRELA E THE HOUR OF THE STAR
Belo Horizonte – 2005
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Roberta Rego Rodrigues
A ORGANIZAÇÃO TEMÁTICA EM A HORA DA
ESTRELA E THE HOUR OF THE STAR
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Estudos Lingüísticos da Faculdade
de Letras da Universidade Federal de Minas
Gerais como requisito parcial à obtenção do título
de Mestre em Lingüística Aplicada.
Área de concentração: Lingüística Aplicada.
Linha de Pesquisa: H – Estudos da Tradução
Orientadora: Profª Drª Adriana Silvina Pagano
Belo Horizonte
Faculdade de Letras da UFMG
2005
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Universidade Federal de Minas Gerais
Faculdade de Letras
Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Lingüísticos
Dissertação intitulada A organização temática em A hora da estrela e The hour of the star”, de autoria da
mestranda Roberta Rego Rodrigues, aprovada pela banca examinadora constituída pelas seguintes
professoras:
___________________________________
Profª Drª Adriana Pagano – FALE/UFMG – Orientadora
_____________________________________________________
Profª Drª Célia Magalhães – FALE/UFMG
______________________________________________________
Profª Drª Maria Lúcia Vasconcellos – UFSC
________________________________________________________
Profª Drª IDA LÚCIA MACHADO
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Lingüísticos
FALE/UFMG
Belo Horizonte, 4 de março de 2005.
Av. Antônio Carlos, 6627 – Belo Horizonte, MG – 31270-901 – Brasil – tel.: (031) 3499-5112 – fax (031) 3499-5490
A todos aqueles que
se interessam pelo
ato de traduzir, ato
esse que sempre se
constitui em um
grande desafio.
AGRADECIMENTOS
Sou grata à Universidade Federal de Minas Gerais, uma instituição que se destaca
enormemente na formação de alunos, professores e pesquisadores.
Sou grata à Faculdade de Letras da UFMG por ter me acolhido tão bem desde a
graduação.
Agradeço aos professores das disciplinas que cursei no Mestrado: Adriana Pagano,
Célia Magalhães, Marco Antônio de Oliveira e Sônia Pimenta, por terem contribuído para
ampliar minha visão acerca dos estudos lingüísticos.
Agradeço aos funcionários do PosLin por seus serviços prestados.
Agradeço a CAPES (Curso de Aperfeiçoamento em Nível Superior) pelo apoio
financeiro imprescindível para que eu realizasse esta pesquisa.
Agradeço à minha família. Em especial, papai e mamãe, que constituem meu
sustentáculo, no qual sempre encontro amor, apoio e incentivo para continuar minha
caminhada. À Renata, minha irmã querida e a melhor amiga que eu poderia ter. À tia Lena,
pela sua atenção e amor dispensados a mim e também por ter sido a primeira (senão única)
pessoa a ter me incentivado a fazer pesquisa na época da graduação.
Agradeço à minha orientadora Profª Drª Adriana Pagano. Sem suas contribuições,
meu percurso no Mestrado teria sido muito mais árduo. Com sua orientação eficiente e
pontual, Adriana ampliou minha visão de pesquisadora. Além de ser profissional,
competente e presente, Adriana é uma pessoa aberta, flexível e amável, características que,
em minha opinião, todo orientador deveria ter.
Agradeço a todos meus amigos, mesmo aqueles que não fazem mais parte da
minha vida.
Agradeço aos colegas e amigos do NET/FALE/UFMG (Núcleo dos Estudos da
Tradução da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais), especialmente
à Silvana, à Letícia, ao Marcos, ao Daniel, ao Roberto Carlos, ao Adail e à Verônica pelo
apoio substancial.
Agradeço a DEUS. Seja ele “a força que existe” como Clarice Lispector em algum
momento o denominou. Seja ele “o espírito do mundo” como Hegel talvez quisesse defini-
lo. Não O conheço, não sei exatamente do que se trata, mas sei que O sinto de alguma
forma.
Aprender a hablar es aprender a
traducir; cuando el niño
pregunta a su madre por el
significado de esta o aquella
palabra, lo que realmente le
pide es que traduzca a su
lenguaje el término
desconocido. La traducción
dentro de una lengua no es, en
este sentido, essencialmete
distinta a la traducción entre
dos lenguas, y la historia de
todos los pueblos repite la
experiencia infantil: incluso la
tribu más aislada tiene que
enfretarse, en un momento o en
otro, al lenguaje de un pueblo
extraño.
Octavio Paz, Traducción:
literatura y literalidad
RESUMO
Esta dissertação apresenta um estudo da organização temática em A hora da estrela de
Clarice Lispector e sua tradução para o inglês, The hour of the star, por Giovanni Pontiero.
A organização temática é abordada enquanto recurso coesivo estrutural (Halliday,1994),
sensível a especificidades de gênero do discurso e passível de ser mapeada a partir da
análise e classificação de todos os Temas dentro de um texto, verificando-se como escolhas
em nível local da oração possuem impacto no nível global da construção textual. No âmbito
dos estudos da tradução, a organização temática é reconhecida como problema de tradução
(Baker, 1992; Vasconcellos, 1997, 1998) e pode ser abordada a partir de critérios que
diferenciem as escolhas temáticas do tradutor motivadas por restrições sistêmicas daquelas
que evidenciam idiossincrasias do mesmo (Munday, 1998). A presente pesquisa parte do
aparelho teórico da lingüística sistêmica hallidayana, complementada pelos trabalhos de
Downing (1991), Eggins (1994), Martin et al. (1997), Thompson (2002), para examinar um
corpus composto por um texto original e sua tradução, utilizando recursos da metodologia
da lingüística de corpus. Para efeito de coleta de dados, o corpus foi digitalizado e revisado.
Após esta etapa, houve a anotação manual do mesmo e posterior extração de dados
mediante o programa WordSmith Tools. Os dados quantitativos foram analisados com vista
à identificação de padrões de escolhas temáticas em ambos os textos. Resultados apontam
que o texto alvo apresenta uma alta frequência de Temas ideacionais participantes enquanto
que o texto fonte apresenta um alto índice de Temas ideacionais processo-participantes.
Resultados também apontam para padrões distintos na correlação dos Temas interpessoais
com os ideacionais participantes e ideacionais processo-participantes, os quais revelam
representações diferentes do narrador da novela. A análise do narrador e dos processos em
posição temática relacionados a ele dentro do sistema da transitividade também corrobora
as diferenças nas representações observadas por meio da análise da organização temática.
Pode-se concluir que o tradutor segue padrões do texto fonte em sua re-textualização ao
mesmo tempo em que modifica a organização temática em muitos momentos na sua
tradução, o que pode ser tomado como evidência de um estilo próprio.
Palavras-chave: Estudos da Tradução baseados em corpus; Abordagens Discursivas da Tradução;
Gramática Sistêmico-Funcional; Organização Temática; Transitividade.
ABSTRACT
This thesis presents a study of thematic organisation in A hora da estrela by Clarice
Lispector and its translation into English, The hour of the star by Giovanni Pontiero.
Thematic organisation is approached as a structural cohesive resource (Halliday, 1994) that
can be related to genre and that can also be mapped through the analysis and classification
of all Themes in a text. The aim is to observe how choices at the local level of the clause
have an impact on the overall level of textual construction. Within the scope of translation
studies, thematic organisation is regarded as a translation problem (Baker, 1992;
Vasconcellos, 1997, 1998) and can be analysed in terms of criteria that might differentiate
translators’ thematic choices motivated by systemic restrictions from the ones that provide
evidence for translators’ idiosyncrasies (Munday, 1998). Drawing on Hallidayan systemic
linguistics supplemented with works by Downing (1991), Eggins (1994), Martin et al.
(1997), Thompson (2002), this research examines a corpus, consisting of an original text
and its translation by making use of corpus linguistics methodology. The corpus was
scanned and revised for the data to be collected. Manual annotation of the corpus and
subsequent extraction of data by means of the software WordSmith Tools allowed for the
retrieval of quantitative data, which were analysed aiming at the identification of patterns
concerning thematic choices in both texts. Results point to a high frequency of participant
ideational Themes in the target text whereas the source text presents a high frequency of
process-participant Themes. Results also point to distinct patterns in the correlation of
interpersonal Themes with participant ideational and process-participant ideational
Themes, which reveal different representations of the novella’s narrator. The analysis of
the narrator and thematised processes related to him in the transitivity system also
corroborates the differences in the representations observed by means of the study of
thematic organisation. The data show that in his re-textualisation the translator follows
patterns of the source text, although he brings about thematic choices different from the
original, which can point to the presence of a style of his own.
Key Words: Corpus based Translation Studies; Discourse Approaches; Systemic Functional Grammar;
Thematic Organisation; Transitivity.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Principais dados estatísticos do corpus...............................................................110
Tabela 2: Número e porcentagem de interrogativas polares no corpus..............................112
Tabela 3: Temas simples e múltiplos dos textos fonte e alvo.............................................119
Tabela 4: Temas não marcado e marcado dos textos fonte e alvo......................................120
Tabela 5: Temas textual, interpessoal e ideacionais dos textos fonte e alvo......................122
Tabela 6: Absolutos nos textos fonte e alvo.......................................................................129
Tabela 7: Temas ideacionais processo e participante marcados e não marcados...............131
Tabela 8: Número de Temas ideacionais participantes e processo-participantes relativos ao
Narrador e à Macabéa na correlação com os Temas interpessoais.....................................135
Tabela 9: Tipos de Temas interpessoais que co-ocorrem com os id. participantes e
processo-participantes nos textos fonte e alvo....................................................................136
Tabela 10: Tipos de participantes nos Temas ideacionais participantes e processo-
participantes nos textos fonte e alvo na correlação com os Temas interpessoais...............144
Tabela 11: Processos com maior ocorrência no corpus em relação à co-ocorrência dos
Temas interpessoais com os ideacionais participantes e com os ideacionais processo-
participantes........................................................................................................................147
Tabela 12: Participantes na correlação dos Temas interpessoais com os ideacionais
participantes e os ideacionais processo-participantes na função de sujeito e de
objeto...................................................................................................................................148
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Oração com Temas associados às três metafunções............................................43
Quadro 2: Excerto 1 para análise manual da organização temática....................................150
Quadro 3: Excerto 2 para análise manual da organização temática....................................151
Quadro 4: Excerto 3 para análise manual da organização temática....................................153
Quadro 5: Excerto 4 para análise manual da organização temática....................................155
Quadro 6: Excerto 1 para análise de hiperTema.................................................................158
Quadro 7: Excerto 2 para análise de hiperTema.................................................................159
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................... 12
1. REVISÃO TEÓRICA.......................................................................................... 20
1.1 A lingüística de corpus e os estudos da tradução........................................ 21
1.2 Halliday e a gramática sistêmico-funcional................................................. 29
1.3 A metafunção textual da linguagem............................................................ 34
1.4 A organização temática................................................................................ 37
1.5 Classificação de Temas................................................................................ 42
2. O CORPUS E A METODOLOGIA.....................................................................94
2.1 O corpus....................................................................................................... 95
2.1.1 Clarice Lispector e A hora da estrela.............................................. 96
2.1.2 Giovanni Pontiero e The hour of the star........................................ 98
2.2 Metodologia adotada para analisar o corpus............................................... 100
2.2.1 O programa WordSmith Tools......................................................... 100
2.2.2 Procedimentos de análise................................................................. 102
3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS.......................................................... 108
3.1 Apresentação................................................................................................ 109
3.2 Principais dados estatísticos do corpus em análise...................................... 110
3.3 Problemas encontrados na anotação e na classificação de Temas............... 110
3.4 Padrões de escolhas temáticas..................................................................... 119
3.5 Correlação de escolhas temáticas................................................................ 132
3.6 Tema e tessitura textual............................................................................... 149
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 162
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................ 167
The preconditions for
translation are a good
knowledge of the source
language and an excellent
knowledge of the target
language. This is a point I
stress again and again to my
students because the courses I
teach consistently reveal the
great deficiencies to lie in the
students’ own language, the
one in which they are writing.
Giovanni Pontiero, The risks
and rewards of literary
translation
INTRODUÇÃO
14
INTRODUÇÃO
Cabe, nesta introdução, mesmo que brevemente, descrever o percurso que me levou
a investigar tradução nesta pesquisa de mestrado. Além das motivações pessoais, (lembro
que a primeira tradução que fiz na vida foi de uma música do meu grupo de pop/rock
predileto o Queen aos treze anos), candidatei-me em 2001 a uma bolsa do Programa de
Aprimoramento Discente no projeto “Corpora, Cognição e Discurso”, por meio da qual tive
contato com abordagens discursivas da tradução. Participei dois anos desta pesquisa, a qual
me proporcionou uma visão mais ampla do que é a tradução e também uma experiência
maior com o mundo acadêmico.
O foco desta pesquisa é a organização temática, assunto que venho pesquisando
desde a graduação. Dado meu interesse por esse tópico, optei por investigar a organização
temática em um corpus paralelo bilíngüe de pequena dimensão, a saber, A hora da estrela,
de Clarice Lispector, e sua tradução para o inglês, The hour of the star, por Giovanni
Pontiero, sobretudo pelo fato de eu admirar a narrativa clariceana e me interessar pela
rescrita da mesma em outras línguas.
Os estudos da tradução, por ser um campo interdisciplinar, dialogam com teorias e
abordagens advindas de outros campos e áreas do conhecimento, tais como a Literatura, a
Lingüística, a Psicologia, a Sociologia, para citar alguns exemplos. Deste modo, pesquisas
que têm como seu objeto de estudo a tradução apresentam várias possibilidades de
investigação em função de tal interdisciplinaridade. Esta dissertação insere-se no campo da
lingüística aplicada, mais especificamente no campo das abordagens discursivas da
tradução.
Segundo Munday (2001:89-90), a perspectiva discursiva dentro dos estudos da
tradução estabeleceu-se na década de 1990, baseando-se em grande parte na teoria
15
sistêmico-funcional de Halliday que foi revisitada pelos teóricos da tradução Juliane
House, Mona Baker, Basil Hatim e Ian Mason.
A proposta de Halliday de análise e descrição da linguagem apresenta como um dos
seus pressupostos a consideração de três metafunções (HALLIDAY, 1994:xiii), a saber:
ideacional (sistema de transitividade), interpessoal (modo oracional e modalidade) e textual
(estrutura temática, sistema de informação e coesão). Esta pesquisa focaliza a metafunção
textual, mais especificamente a organização temática. Para abordar este tópico, utilizo a
metodologia da lingüística de corpus aliada à gramática sistêmico-funcional de Halliday,
concentrando-me na análise e descrição dos Temas (pontos de partida da mensagem) em
um corpus paralelo bilíngüe, constituído, como foi assinalado, por A hora da estrela de
Clarice Lispector (1998) e sua tradução para o inglês The hour of the star por Giovanni
Pontiero. Dados provenientes de uma pesquisa piloto inicial, que viabilizaram a redação do
projeto desta dissertação de mestrado, mostraram-se prolíficos para a realização desta
pesquisa.
Minha questão de investigação surgiu após ter feito duas disciplinas na graduação
do curso de Letras da UFMG que abordaram a organização temática, despertando assim o
meu interesse pelo assunto. Tendo isso em mente, após a leitura prazerosa de A hora da
estrela de Clarice Lispector (1998), vislumbrei a viabilidade de pesquisar a organização
temática nesta obra e em sua tradução para o inglês The hour of the star (1992). Pelo fato
de ser uma novela ou um “romance curto”, a anotação manual (HUNSTON, 2002:79) do
corpus, procedimento indispensável para esta pesquisa e de certa forma árduo, é possível
dentro do espaço de tempo permitido para a realização da mesma.
Levando-se em conta que, no campo dos estudos da tradução, é válido o
questionamento sobre a relação entre um texto traduzido e seu original (HALLIDAY,
2001:14, HOUSE, 2001:127), minha principal pergunta de pesquisa é a seguinte: Como a
organização temática se manifesta no texto fonte e no texto alvo, considerando-se tanto
16
semelhanças quanto diferenças? Isso implica levar em consideração que a tradução é uma
re-textualização, feita por um tradutor, de uma mensagem com base na textualização pelo
autor (COULTHARD: 2001:2-3). Assim, o estudo comparativo e descritivo de corpora
paralelos bilíngües torna-se viável porque “a sensibilidade em relação à construção de
realidades através da linguagem no texto fonte pode ajudar a avaliar os significados
escolhidos e re-textualizados no texto traduzido” (VASCONCELLOS, 1998:216)
1
. A
questão da avaliação não deve ser entendida em um sentido prescritivo, mas em um sentido
amplo de reflexão e comparação de duas realidades (texto original e texto traduzido)
construídas a partir de escolhas em diferentes níveis do continuum lingüístico.
Relacionada com esta principal pergunta de pesquisa, mais um questionamento
vinculado à questão dos participantes dentro de uma narrativa.
Montgomery (1993) discute a importância dada às ações dentro de uma narrativa
em detrimento de seus participantes, afirmando que, através da análise da transitividade
(metafunção ideacional) dos textos, o papel dos participantes é relevante também para a
percepção da narrativa. No presente corpus, faço um recorte para considerar a tematização
de dois dos principais participantes: o narrador e a protagonista Macabéa. Busco verificar
se a tematização dos protagonistas, concomitantemente com a interpessoalidade temática,
seriam relevantes para caracterizar a narrativa do texto fonte e do texto alvo do ponto de
vista da transitividade. Neste momento, torna-se necessário fazer uma ressalva, que será
retomada e desenvolvida posteriormente: apesar de os participantes elípticos na função de
sujeito não serem realizados tematicamente, eles serão considerados nesta correlação, pois
sua desconsideração causaria desproporção nos dados, que estes participantes elípticos
que ocorrem no texto fonte muitas vezes estão expressos de forma explícita no texto alvo.
Como será explicitado no Capítulo 1, mais especificamente na seção 1.5, o processo que
1
Minha tradução de: “Thus sensitivity to the construction of realities through language in the source text (ST)
can be of help in the assesment of the meanings selected and realized in the translated texts (TTs).”
17
ocorre em posição temática e que possui um participante elíptico na função de sujeito será
considerado um Tema ideacional processo-participante. Cabe salientar que este rótulo foi
criado atendendo-se à necessidade de caracterizar tal fenômeno em corpora paralelos.
É importante salientar que a pesquisa aqui proposta de maneira alguma busca julgar
o mérito da tradução analisada; tenciona-se pesquisar traços lingüísticos (HOUSE,
2001:155) de ambas as obras com vistas a observar a correlação entre a construção textual
e a configuração ficcional.
São objetivos gerais da minha pesquisa:
1. Contribuir com os estudos lingüísticos através da expansão do conhecimento acerca
da organização temática no português do Brasil;
2. Promover a interface entre os estudos da tradução, os estudos de corpora e a
gramática sistêmico-funcional de Halliday;
3. Contribuir com as pesquisas em tradução feitas pelos pesquisadores do NET
(Núcleo de Estudos da Tradução) da Faculdade de Letras da UFMG, no qual é
desenvolvido o projeto CORDIALL (Corpus Discursivo para Análises Lingüísticas
e Literárias), do qual esta dissertação faz parte.
São objetivos específicos da minha pesquisa:
1. Descrever e comparar os Temas e a organização temática nas obras A hora da
estrela e The hour of the star, focalizando-se padrões léxico-gramaticais,
semânticos e discursivos das mesmas, e verificando-se também em que medida a
descrição e a comparação dos Temas e da organização temática no corpus pode
apontar o estilo de escrita de Clarice Lispector e do tradutor Giovanni Pontiero, no
que diz respeito ao corpus analisado nesta dissertação;
18
2. Comprovar a viabilidade da aplicação da abordagem teórico-metodológica da
lingüística de corpus nos estudos da tradução, especialmente por meio da anotação
manual e posterior extração de dados com o software WordSmith Tools.
Esta dissertação apresenta quatro capítulos além desta Introdução.
O Capítulo 1 visa a fornecer uma revisão teórica na qual explora-se a interface dos
estudos da tradução com a lingüística sistêmica e a lingüística de corpus, com foco nos
principais conceitos da gramática sistêmico-funcional para finalmente expor os principais
pressupostos da noção de organização temática. Neste capítulo, dialogo principalmente
com os seguintes teóricos: no que concerne à lingüística de corpus, com Baker (1992, 1993,
1995, 1996), Kenny (2001) e Sinclair (2001); no que concerne à gramática sistêmico-
funcional, com Halliday (1978, 1994), Eggins (1994), Thompson (2002) e, Halliday e
Matthiessen (2004).
O Capítulo 2 apresenta o corpus utilizado nesta pesquisa bem como a metodologia
empregada, com o uso do programa WordSmith Tools, utilizado na coleta de dados. Neste
capítulo, faço referência especialmente aos seguintes teóricos: no que tange à explicação
literária do corpus, Pontiero (1992), Guidin (1994) e Sá (2000); no tocante ao programa
WordSmith Tools, Berber-Sardinha (1999, 2000); no que concerne à anotação do corpus,
Halliday (1994) e Hunston (2002).
O Capítulo 3 refere-se à análise e discussão dos dados (quantitativos e qualitativos)
à luz das teorias propostas nesta pesquisa. Utilizo sobretudo os seguintes teóricos: Downing
(1991), Halliday (1994), Munday (1998), Halliday e Matthiessen (2004).
O Capítulo 4 traz as considerações finais, visando a responder as perguntas de
pesquisa a partir dos resultados obtidos. Como esta pesquisa é um estudo de caso, tecerei
possíveis generalizações dos traços lingüísticos que podem ser estendidos a outros corpora.
19
Esse Capítulo também fornece sugestões para novas pesquisas advindas da análise e
metodologia empregadas neste corpus.
The foundation [of translation]
is laid by careful and repeated
reading of the source text. It
has even been said that the
most careful reading one can
give of a text is to translate it.
Conversely, each reader is a
translator in his own way.
Initial readings provide
information about the overall
setting, the plot, the intellectual
and emotional climate and
style.
Giovanni Pontiero, The risks
and rewards of literary
translation
REVISÃO TEÓRICA
22
1. REVISÃO TEÓRICA
Este capítulo apresenta o arcabouço teórico desta dissertação, tratando da interface
dos estudos da tradução, da lingüística de corpus e da lingüística sistêmica.
1.1 A lingüística de corpus e os estudos da tradução
A lingüística de corpus é o ramo da lingüística que pesquisa a linguagem tendo
como base corpora, que são conjuntos de textos em formato eletrônico. algumas
décadas atrás, a palavra corpus se referia a grupos de textos que eram impressos ou
compilados, e analisados manualmente. Com o advento do computador, tornou-se menos
árdua a manipulação dos corpora, devido a seu armazenamento em grandes quantidades e à
possibilidade de ser analisados automática ou semi-automaticamente. Para fins de pesquisa,
o corpus a ser analisado deve ser constituído de textos autênticos e deve ser elaborado a
partir de uma série de critérios que o tornem representativo. A proliferação de vários
corpora nas décadas de 1980 e 1990 proporcionou o estabelecimento da lingüística de
corpus como campo disciplinar (KENNY, 2001:22-27).
Ao defender que os textos traduzidos são eventos comunicativos genuínos de
qualquer língua e que para analisá-los, levando-se em conta seu contexto, torna-se
necessário o acesso a dados reais, Baker (1993:234-235) propõe a interface da lingüística
de corpus com os estudos da tradução, que auxiliará no entendimento do que é a tradução e
de como ela funciona. Através dessa interface, o questionamento de como melhorarmos
nossas traduções encontrará um respaldo mais confiável e real (BAKER, 1993:243)
proporcionado pela análise e pesquisa descritivas com base em diversos tipos de corpora.
Segundo Baker (1995:230-235), corpora podem ser classificados em três tipos: i)
corpora paralelos, que consistem de textos originais em uma língua A e suas traduções em
uma língua B; ii) corpora multilíngües, que são conjuntos de corpora monolíngües (textos
não-traduzidos em uma dada língua) constituídos a partir de critérios comuns; iii) corpora
23
comparáveis, que consistem de dois subcorpora: um com textos produzidos originalmente
em uma língua X e o outro com textos traduzidos para essa mesma ngua. Baker
(1995:233) propõe que, para pesquisar a tradução, deve-se mudar o foco de pesquisa
teórico, que meramente privilegia corpora paralelos, para um que compare a produção
textual espontânea numa língua com a produção de textos traduzidos. Segundo ela
(1995:233), essa mudança mostra-se mais acessível através dos corpora comparáveis,
porque eles “nos permitem capturar padrões que são ou restritos para o texto traduzido ou
que ocorrem com freqüência significativamente maior ou menor no texto traduzido do que
ocorrem nos originais”
2
(BAKER, 1995:235). Esse interesse é compartilhado por Baker
com os estudos descritivos da tradução (descriptive translation studies ou DTS).
Os teóricos dos estudos descritivos da tradução procuram descrever as traduções
como elas realmente se manifestam e investigar as características observadas das traduções
em relação aos contextos histórico, cultural e literário nos quais elas foram produzidas. Por
isso, a preocupação desses teóricos passa a contemplar mais a cultura de chegada, onde os
textos traduzidos ganham mais atenção. A base dos estudos descritivos da tradução é a
teoria dos poli-sistemas desenvolvida por Even-Zohar em 1978 e retomada por Toury em
1980. A teoria dos poli-sistemas considera que a literatura traduzida de qualquer cultura
possui um sistema próprio, participando assim na interação dinâmica entre os vários
sistemas dentro do poli-sistema. Sob essa perspectiva, a literatura traduzida passa a ser
entendida como produção textual per se (KENNY, 2001:49). Essa teoria é de suma
importância para o recente desenvolvimento dos estudos da tradução e dos estudos da
tradução baseados em corpus por três motivos principais: i) a teoria reafirma que é válido
pesquisar a literatura traduzida por si só; ii) ela uma certa especificidade aos textos
traduzidos, garantindo assim a pesquisa destes como um corpus; iii) ela valida o estudo da
2
Minha tradução de: “(…) allow us to capture patterns which are either restricted to translated text or which
occur with a significantly higher or lower frequency in translated text than they do in originals”.
24
literatura traduzida em comparação com a literatura não-traduzida na mesma ngua de
chegada (KENNY, 2001:49-50). A articulação entre a teoria dos poli-sistemas com os
estudos da tradução baseados em corpus é perfeitamente possível como pode ser verificado
acima com a proposta de Baker.
Os estudos descritivos da tradução caracterizam-se também pela pesquisa de
normas, universais e leis da tradução. As normas constituem-se de uma natureza abstrata,
sendo, portanto, observáveis em um mesmo tipo de situações recorrentes onde uma
regularidade de comportamento que, a partir do momento que é avaliado, pode ser
sancionado positivamente ou negativamente (KENNY, 2001:50-51). Cada cultura
apresenta suas normas tradutórias e elas mudam com o tempo, mas existe uma tendência de
os tradutores se ajustarem às normas prevalecentes (KENNY, 2001:51). No entanto,
Hermans (1999:80, apud KENNY, 2001:51) acredita que o termo ‘norma’ refere-se tanto a
uma regularidade observável do comportamento quanto a uma não-observável. É possível
aplicar o conceito de normas a padrões encontrados em textos traduzidos através da
lingüística de corpus, levando-se em conta se estes padrões são induzidos ou não e, caso o
sejam, qual norma ou grupos de normas aplicam-se a eles (KENNY, 2001:52).
Os universais representam tendências gerais e são observados independentemente
do tradutor, língua, gênero do discurso e período, enquanto que as leis são predições que se
relacionam à probabilidade de eventos tradutórios ocorrerem (KENNY, 2001:50-53).
Baker, que é favorável ao estudo dos universais em grande escala, ou seja, a partir de
corpora de grandes dimensões, considera que um dos principais objetivos dos estudos da
tradução é a pesquisa de “traços distintivos do texto traduzido per se” (BAKER, 1996:176)
3
. Baker acredita que toda língua segue padrões que são determinados pelo contexto e pela
finalidade onde ela é usada. Como o texto traduzido é produzido em condições específicas,
vinculado a um texto e a uma cultura fontes, ele também deve possuir seus próprios
3
Minha tradução de: “(...) distinctive features of translated text per se.”
25
padrões. Sendo assim, a proposta de Baker quanto aos universais da tradução contempla
os seguintes comportamentos: i) simplificação; ii) explicitação; iii) normalização e iv)
padronização ou nivelamento (levelling out) (BAKER, 1996:176-177).
Apesar de os universais da tradução não serem o foco da minha pesquisa, creio ser
importante defini-los, mesmo que brevemente, que se trata de uma teoria fortemente
vinculada aos estudos da tradução baseados em corpus.
Segundo Baker (1996:176-177), a simplificação seria a predisposição de o tradutor
simplificar mesmo que de forma não consciente a linguagem e/ou a mensagem; a
explicitação seria, de maneira simplificada, a prática de adicionar informação extra à
informação que se encontra de forma implícita no original; a normalização seria obedecer a
padrões e práticas que são típicas da língua alvo, a ponto de até exagerá-los; e, finalmente,
a padronização ou nivelamento seria a tendência de a produção do texto traduzido se
localizar no centro de um contínuo, evitando-se os extremos, ou seja, há a expectativa de se
encontrar menos variações entre conjuntos de textos traduzidos do que entre conjuntos de
textos originais.
Entretanto, algumas ressalvas a serem feitas aos estudos descritivos da tradução.
Kenny (2001:54) acha inadequado o uso do termo leis. Assim essa inadequação poderia se
aplicar também aos termos normas e universais. Estes conceitos são impróprios na opinião
de Kenny, que sua existência é hipotética, podendo vir a ser confirmada ou não através
de futuras pesquisas dentro dos estudos descritivos da tradução. Hermans (1999:92, apud
MUNDAY, 2001:117) também critica os estudos descritivos da tradução, no que tange a
seu questionamento acerca da possibilidade ou não de se saber se todas as variáveis são
relevantes à tradução e de como encontrar leis relevantes à tradução como um todo.
A elaboração e o uso de corpora de textos traduzidos de grandes dimensões
englobam uma série de desafios ao pesquisador, como atesta Baker (1996:178), que aponta
a dificuldade de se estabelecer critérios da escolha dos textos, assim como de adquirir os
26
direitos autorais para o uso das traduções em formato eletrônico. Ademais, Baker ressalta
a diferença entre os padrões lingüísticos produzidos na língua fonte e os universais da
tradução e o desafio em separá-los. Segundo Baker, o pesquisador não deve se restringir
somente ao uso das normas e padrões gerais da língua, tendo-se em vista que as exceções e
as peculiaridades tornam-se também relevantes, merecendo ser analisadas, aspecto este que
Tymoczko retoma em 1998.
Outra crítica aos estudos descritivos, desta vez por Tymoczko (1998), é a busca
incessante por objetividade e generalização, de certa forma uma herança do positivismo
que privilegia estes aspectos. Assim, os teóricos dos estudos descritivos acreditam na
possibilidade de se classificar todas as variantes que permeiam o fenômeno tradutório,
como se delas não dependessem fatores discursivos, sociais e cognitivos. Conforme Venuti
e Tymoczko (apud KENNY, 2001:55), existe uma dificuldade crescente em separar “fatos
de valores” na interpretação humana, o que significa que a subjetividade do autor perpassa
toda e qualquer escolha lingüística.
Tymoczko (1998) considera que os estudos da tradução baseados em corpus devem
contemplar tanto o processo quanto o produto tradutório, levando-se em conta tanto o
tradutor individualmente quanto os padrões culturais relacionados ao texto. Em sua
opinião, os estudos de corpora oferecem vantagens tais como a flexibilidade e a facilidade
de adaptação tanto no manuseio quanto na formação dos corpora em função das facilidades
oferecidas pelo computador.
Tymoczko (1998) afirma que por de trás da construção dos corpora, a presença
da intuição e do julgamento humano. Além disso, afirma que o objetivo principal dos
estudos da tradução deveria ser a possibilidade de se explorar a diferença e a diversidade do
mundo múltiplo em que vivemos:
27
os estudos da tradução baseados em corpus devem encontrar meios de
transcender sistemas de relação que concentram-se na semelhança e de evitar ser
aprisionados em um aparato binário que reconhece somente percepções de
igualdade e desigualdade absolutas. (TYMOCZKO, 1998:657)
4
Sob a perspectiva de Tymoczko, os estudos da tradução baseados em corpus
deveriam dirigir-se a conclusões que não sejam universalistas, mas que considerem o nosso
mundo multicultural onde a questão de a tradução ser fiel ou não, equivalente ou não, é
destituída de cabimento, tornando-se importante o que o texto traduzido por si tem a nos
oferecer.
Para Tymoczko (1998), os pesquisadores em estudos de corpora devem formular
“as perguntas certas” que levem a pesquisas genuínas e não cair no óbvio por meio de
análises quantitativas desnecessárias. Ela também considera que o espaço aberto pelos
estudos de corpora auxiliará a reintegração dos aspectos práticos e teóricos da tradução,
reintegração que contribuirá para o aperfeiçoamento da formação de tradutores e para
pesquisas com novas abordagens nos estudos da tradução.
Aceitando as observações de Tymoczko, mas relativizando os termos nos quais ela
exprime sua preocupação, podemos pensar que quando o pesquisador adota uma
abordagem guiada, em parte ou totalmente, pelo corpus (corpus-driven approach)
5
, faz-se
necessário um levantamento minucioso de dados, que muitas vezes pode até evidenciar o
que Tymoczko chama de “óbvio”, mas que se torna uma etapa indispensável a ser
perseguida para se chegar aos resultados, sejam eles satisfatórios ou não. Além disso,
4
Minha tradução de: “(...) CTS must find ways to move beyond systems of relationship that focus on likeness
and to avoid being locked into a binary apparatus that acknowledges only perceptions of absolute equality and
inequality.”
5
Em uma abordagem guiada pelo corpus (corpus-driven approach), o(a) pesquisador(a) não parte de
nenhuma pergunta de pesquisa ou hipótese pré-estabelecida para investigar o corpus. Ele(a) pesquisa o que o
corpus tem a lhe dizer e a partir daí vai formulando suas perguntas de pesquisa, isto é, a pesquisa do corpus
neste tipo de abordagem não exige a opção por teorias específicas a priori. Entretanto, segundo Pagano,
Magalhães e Alves (2004), não haveria uma separação muito definida entre corpus-driven approach e
corpus-based approach uma vez que a afiliação teórica do (a) lingüista pesquisador (a) o (a) orienta em todos
os estágios da pesquisa por meio do corpus.
28
muitas vezes o “óbvio” origina-se da intuição, cabendo aos estudos empíricos mostrar a
obviedade de fatos a partir de dados quantitativos e qualitativos.
Baker (apud KENNY, 2001:68) e Kenny (2001:68) crêem na necessidade de se
personalizar as análises em tradução, o que contraria os preceitos básicos dos estudos
descritivos que procuraram formular leis gerais que se aplicassem a todos os casos.
Contudo, a grande possibilidade de se lidar com os dados eletrônicos, permitindo ao
analista passar do geral ao particular e vice-versa com grande facilidade é por assim dizer a
grande vantagem dos estudos da tradução baseados em corpus, como Kenny aponta. Dessa
forma, o pesquisador não deve encarar os dados quantitativos (fornecidos pela metodologia
da lingüística de corpus) como um fim em si mesmos, mas como um meio que propicie a
ele analisá-los quantitativamente a partir de teorias discursivas e cognitivas do fenômeno
tradutório.
Deve-se salientar que a interface entre os estudos da tradução e da lingüística de
corpus não ocorre somente levando-se em conta corpora de grandes dimensões, mas
também corpora de pequenas dimensões que viabilizam pesquisas qualitativas a partir de
dados quantitativos do corpus selecionado e a partir de aspectos discursivos do texto
traduzido, bem como as estratégias, as escolhas e o processo cognitivo do tradutor. Para
efeito de exemplificação de pesquisas em tradução baseadas em corpus de pequenas
dimensões, cito as de Ghadessy e Gao (2001) em seu trabalho com um corpus paralelo
bilíngüe no par lingüístico inglês-chinês; Maia (1998) ao trabalhar com corpora paralelos e
comparáveis, focalizando a natureza do padrão SVO em sentenças no inglês e no português
europeu, principalmente nos casos onde o sujeito é constituído pelo pronome em primeira
pessoa (“I” e “eu”) ou por um grupo nominal; Munday (1998, 2002) ao pesquisar e analisar
um conto de García Márquez e sua tradução para o inglês e também uma coluna escrita por
García Márquez em um jornal cubano e suas traduções para o inglês britânico, para o inglês
americano e para o inglês (essa última tradução feita por cubanos), respectivamente; e, no
29
Brasil, Cruz (2003) e Mauri (2003) que investigam os verbos de elocução em corpora
paralelos bilíngües; Jesus (2004) que pesquisa os processos “pensar” e “think” e sua
repercussão em um corpus paralelo e comparável; e Assis (2004) que investiga a
representação discursiva de uma personagem por meio da transitividade em um corpus
paralelo bilíngüe.
Segundo Sinclair (2001:xi), a diferença entre corpora de grandes e pequenas
dimensões relaciona-se mais à metodologia e aos objetivos da pesquisa do que ao tamanho
do corpus. Biber (1993:243, apud HALVERSON, 1998:496) também está de acordo com
Sinclair quando diz que o tamanho não é a consideração mais importante ao se selecionar
uma amostra representativa de um corpus. Ao caracterizar a pesquisa com corpora de
pequenas dimensões, Sinclair afirma que, neste tipo de investigação, o pesquisador,
trabalhando com um corpus pequeno manualmente ou automaticamente, obtém uma
amostra de dados lingüísticos que serão analisados à luz de uma teoria discursiva,
retornando então o pesquisador ao corpus para confirmação de suas perguntas de pesquisa.
Dessa maneira, segundo Sinclair, esta abordagem caracteriza-se pela intervenção humana
antecipada (EHI - early human intervention), o que significa que o pesquisador inicia sua
interpretação de um fenômeno lingüístico partindo de pequenas amostras textuais, que
podem ser ampliadas no decorrer da pesquisa.
Uma das teorias usadas como base para a análise de corpora de pequenas dimensões
é a gramática sistêmico-funcional proposta por Halliday, sistematizada em sua publicação
de 1985, que tem se mostrado muito profícua enquanto teoria para a pesquisa de questões
discursivas. Halliday baseia sua obra na teoria sistêmica de Firth cujas categorias de
contexto de situação e de sistema foram re-utilizadas e ampliadas ; na teoria cultural de
Malinowski (com conceitos tais como o da definição de significado como função em
contexto e a caracterização do texto como multi-funcional) ; e na teoria cultural de Whorf
que via a intrínseca relação entre linguagem e cultura mediante a assunção de que a
30
linguagem incorpora um sistema conceitual que necessita de ser descrito por meio de
categorias lingüísticas que sejam relevantes (cf. KRESS, 1976:viii-xiv). A partir da
proposta de Halliday, vários autores elaboraram trabalhos que explicam ou expandem a
teoria sistêmico-funcional, como Eggins (1994), Bloor e Bloor (1995), Lock (1996), Martin
et al. (1997), Gómez-González (2001) e Thompson (2002). Dentre esses autores
mencionados, alguns exploram a gramática sistêmico-funcional com foco específico. Lock
(1996) revisita a gramática sistêmico-funcional, dando um enfoque direcionado ao ensino
do inglês como língua estrangeira enquanto que Gómez-González (2001), em sua releitura
da gramática, focaliza a metafunção textual, especificamente a organização temática. A
seguir, apresento alguns dos pressupostos básicos da gramática sistêmico-funcional de
Halliday, especialmente do sistema de organização temática que é o foco desta pesquisa de
mestrado.
1.2 Halliday e a gramática sistêmico-funcional
A gramática sistêmico-funcional de Halliday
6
baseia-se em uma teoria sistêmica,
onde o significado é visto como escolha, ou seja, a linguagem é interpretada como redes de
opções que se entrelaçam; e uma teoria funcional, que propõe o estudo da língua em seu
uso, levando-se em conta seus contextos de situação e cultura. Essa gramática interpreta a
linguagem, primeiramente, como um sistema de significados que é, então, acompanhado de
formas através das quais os significados podem ser realizados (HALLIDAY, 1994: xiii-
xiv).
A princípio, a gramática sistêmico-funcional toma como unidade de análise a
oração. Entretanto, isso não a impede de se projetar em direção ao texto. Ela tem como
objetivo fornecer informações textuais, semânticas e sintáticas que possibilitem ao falante
6
Esta pesquisa utilizará os termos da GSF (Gramática Sistêmico-Funcional) em português aprovados para
utilização pelas equipes de investigação da FLUL (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa) e do
projeto DIRECT da PUC-SP.
31
analisar qualquer texto que ocorra de forma natural e dentro de diversos tipos de estrutura
(DOWNING, 1991:121).
Da mesma forma em que a gramática hallidayana considera a língua em termos de
uso a fim de auxiliar a análise e interpretação textuais, leva-se em conta que duas perguntas
se tornam fundamentais para a investigação lingüística: como a linguagem é usada pelas
pessoas? E como a linguagem se estrutura para o uso? (BÁRBARA e GOUVEIA, 2003). É
a partir desses questionamentos que Halliday propõe as metafunções da linguagem que são
modos de descrever como o usuário da linguagem pode representar o mundo, interagir com
outros falantes e organizar suas mensagens, ou seja, como o usuário da linguagem pode
imprimir significado aos seus enunciados.
Seguindo o conceito de que os componentes fundamentais do significado na
linguagem são funcionais, Halliday apresenta as três metafunções que compõem a base de
sua teoria: ideacional, interpessoal e textual. A primeira diz respeito à maneira como o
“mundo” é representado e compreendido; a segunda relaciona-se ao modo como ocorre a
interação entre os falantes: autor e leitores, produtor de imagens e observadores; e a terceira
organiza a mensagem no que tange a escolhas específicas do sistema lingüístico
(HALLIDAY, 1994:xiii). Na verdade, todos os enunciados apresentam essas metafunções
“fundidas”; elas são explicadas separadamente por questões didáticas e metodológicas,
procurando fazer-se um recorte do sistema que seja elucidativo.
Segundo Halliday, “em todas as línguas, a oração tem o caráter de uma mensagem,
o que significa que a oração organiza-se de tal forma para adquirir um status de evento
comunicativo”
7
(HALLIDAY, 1994:37). Assim a organização temática, o sistema de
informação e a coesão são os componentes da metafunção textual responsáveis pela
tessitura de um texto (HALLIDAY, 1994:334). Na presente pesquisa, o componente
7
Minha tradução de: “We may assume that in all languages the clause has the character of a message: it has
some form of organization giving it the status of a communicative event”.
32
focalizado é a organização temática, mas torna-se necessário levar em conta a coesão,
que essa última auxilia no entendimento da primeira, pois a organização temática em um
texto está intrinsecamente ligada aos dispositivos coesivos do mesmo e à interpretação por
parte do analista, como será mostrado no capítulo 3.
A gramática sistêmico-funcional de Halliday é utilizada como um instrumental
indispensável em outras teorias como a Análise Crítica do Discurso que considera essencial
uma visão multifuncional do texto (FAIRCLOUGH, 1995:6). Ela também dialoga com a
lingüística de corpus, que ambas apresentam um quadro conceitual empirista, no qual os
dados são provenientes da observação da linguagem, que é vista sob uma perspectiva
probabilística (BERBER SARDINHA, 2000:349-350). Na presente proposta, ela será
utilizada como orientação teórica numa abordagem interdisciplinar com os estudos da
tradução baseados em corpus, para que os dados quantitativos possam ser interpretados sob
perspectivas de análise qualitativa. Para esta pesquisa de mestrado, como foi apontado, a
proposta hallidayana associa-se à abordagem metodológica de corpora de pequenas
dimensões, que vem sendo adotada também por outros pesquisadores do NET - Núcleo de
Estudos da Tradução da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais,
onde está sendo desenvolvido o corpus CORDIALL (Corpus Discursivo para Análises
Lingüísticas e Literárias).
De acordo com Pagano, Magalhães e Alves (2004), o corpus CORDIALL vem
sendo compilado desde 1999 e é composto por textos eletrônicos selecionados a partir de
critérios que contemplam as pesquisas desenvolvidas no NET. Atualmente, este corpus
consiste de quatro subcorpora : um corpus multilíngüe de textos traduzidos ; um corpus
comparável do português do Brasil; o CORPRAT (Corpus Processual para Análises
Tradutórias) e um corpus especializado de textos jornalísticos e acadêmicos, o qual não
inclui textos traduzidos. O CORDIALL contém textos em português do Brasil, inglês
(americano, britânico e canadense), espanhol (argentino e peninsular) e alemão, divididos
33
nas categorias ficção e não-ficção, considerando que os romances e contos são gêneros
incluídos na primeira categoria, enquanto que na segunda categoria incluem-se os gêneros
artigos e notícias de jornal, artigos de revista, artigos acadêmicos e resumos.
Minha pesquisa insere-se no primeiro subcorpora (corpus multilíngüe de textos
traduzidos), que ela apresenta um corpus paralelo bilíngüe que consiste em um original
escrito em português do Brasil (A hora da estrela) e sua tradução para o inglês (The hour of
the star), podendo ser incluído na categoria ficção.
Entre os trabalhos desenvolvidos por pesquisadores do CORDIALL com corpora
paralelos, podemos citar os seguintes.
Cruz (2003) investiga a configuração dos processos de transitividade por meio dos
verbos de elocução no corpus paralelo bilíngüe Harry Potter and the chamber of secrets e
sua tradução para o português do Brasil, Harry Potter e a câmara secreta. A pesquisadora
focaliza ambos componentes (lógico/paratático e experiencial) da metafunção ideacional,
sendo que uma de suas constatações diz respeito à presença maciça do processo verbal say
no texto fonte em diferentes instâncias da fala (pergunta, afirmação, exclamação,
interpelação) ao passo que, no texto alvo, este processo verbal é re-textualizado por outros
processos e categorias.
Mauri (2003) pesquisa os verbos de elocução, principalmente aqueles que indicam
processos mentais, das personagens femininas juntamente com suas colocações, em um
corpus paralelo bilíngüe constituído do texto fonte Laços de família, de Clarice Lispector, e
sua tradução para o italiano, Legami familiari, por Adelina Alletti. A pesquisadora conclui
que os níveis de introspecção das personagens femininas representados pelos verbos de
elocução do tipo mental foram distintos na tradução em função de questões sistêmicas da
língua italiana; em função das influências das colocações e em função do público alvo e do
próprio estilo da tradutora.
34
Jesus (2004) analisa dois tipos específicos de verbos de elocução do tipo mental
THINK e PENSAR em um corpus paralelo e comparável composto por Point counter
point, de Aldous Huxley, e sua tradução para o português do Brasil, Contraponto, por Érico
Veríssimo acrescida de um romance de Érico Verísssimo, Caminhos cruzados. A primeira
obra e a segunda constituem um corpus paralelo enquanto que a segunda obra e a terceira
formam um corpus comparável. O enfoque dado pela pesquisadora jaz no aspecto lógico da
projeção pertencente à metafunção ideacional. Uma de suas conclusões diz respeito à
predominância da estrutura sintagma preposicionado como forma de representação dos
pensamentos das personagens no corpus.
Alves (2004) realiza uma pesquisa na qual as palavras-chave de um corpus paralelo
foram examinadas. Houve a necessidade de re-compilação do corpus de referência para que
os dados fossem mais confiáveis. O pesquisador constatou que por causa da natureza do
corpus analisado os pronomes ela e she foram palavras-chave negativas, porque nas listas
de referência sua ocorrência foi baixa. O corpus em questão foi Macunaíma o herói sem
nenhum caráter e sua tradução para o inglês. Segundo o pesquisador, como neste corpus
paralelo as personagens proeminentes são masculinas, justifica-se então esses pronomes
terem sido palavras-chave negativas.
Assis (2004) investiga a construção da personagem Sethe por meio do sistema de
transitividade no corpus paralelo bilíngüe Beloved, de Toni Morrison, e em sua tradução
para o português do Brasil Amada, por Evelyn Kay Massaro. O pesquisador aponta que a
construção desta personagem em um nível distribucional dos tipos de processo é
praticamente semelhante em ambos os textos com uma diferença percentual de apenas 2,2
pontos, mas conclui afirmando que, após uma observação detalhada e em termos
discursivos, a representação de Sethe é distinta no texto alvo. Tal distinção é percebida com
o acompanhamento minucioso das escolhas tradutórias.
35
Magalhães (2005) analisa um corpus paralelo multilíngüe de pequenas dimensões
constituído pelo conto “Continuidad de los parques”, de Júlio Cortazar, e as traduções deste
conto para o português do Brasil e o inglês americano. No corpus mencionado, a
pesquisadora focaliza a coesão lexical, especialmente a colocação. Uma de suas conclusões
relaciona-se à necessidade de aliar as metafunções textual e ideacional a fim de encontrar
mais dados no tocante às diferentes organizações das mensagens em línguas diferentes.
Todos os trabalhos dos pesquisadores vinculados ao CORDIALL descritos acima
fazem uso de recursos da lingüística de corpus, incluindo-se o software WordSmith Tools.
A seguir, nas seções 1.3 e 1.4, haverá uma descrição detalhada da metafunção
textual e da organização temática respectivamente, objeto da presente pesquisa.
1.3 A metafunção textual da linguagem
Como foi dito, a metafunção textual da linguagem diz respeito à organização da
oração como mensagem. Ela organiza os significados experienciais e interpessoais através
da escolha do elemento que ocupa a posição inicial de cada oração – elemento este
chamado de Tema (HALLIDAY, 1973:107). Ao falar da metafunção textual, Martin et al.
(1997:21) afirmam que ela trata da organização da informação em orações individuais e,
por esse viés, trata também da organização do discurso. Eggins (1994:273) esclarece que a
metafunção textual “é o nível de organização oracional no qual a oração pode ser
condensada de modo que ela seja efetiva segundo seu propósito e seu contexto”
8
. Ela ainda
postula que o significado textual relaciona-se em grande escala à ordem dos constituintes
dentro de uma oração (1994:273).
A metafunção textual representa o potencial do falante no que concerne à
elaboração de textos. Como este componente (metafunção textual) fornece textura à
8
Minha tradução de: “This is the level of organization of the clause which enables the clause to be packaged
in ways which make it effective given its purpose and its context.”
36
linguagem, ele a torna relevante, determinando de que modo a linguagem opera em um
contexto de situação e de que modo se relaciona com seu ambiente, tanto com o ambiente
verbal, que se refere ao que foi dito e escrito anteriormente, quanto com o ambiente não-
verbal e situacional (HALLIDAY, 1978:112-113).
Um conceito central à metafunção textual é o de Tema. Segundo Halliday
(1994:37), Tema é
o elemento que serve como ponto de partida da mensagem; é o elemento de que
trata a oração. O restante da mensagem, a parte na qual o Tema se desenvolve,
chama-se (...) Rema. Enquanto estrutura da mensagem, portanto, uma oração
consiste de um Tema acompanhado por um Rema
9
.
Apesar de haver investigações sobre Rema, vale a pena ressaltar que a presente
pesquisa tratará somente da organização temática, ou seja, os Temas das orações serão
focalizados. Entende-se por organização temática a classificação e análise de todos os
Temas dentro de um texto com vistas à verificação de como a informação está organizada
no mesmo.
questionamentos quanto ao valor semântico do Tema. Hasan e Fries
(1995:xxvii-xxx) consideram a caracterização semântica do Tema abstrata e, desse modo,
acreditam que ela necessita ser mais clara no que tange ao fato de o Tema fazer parte do
significado textual. Eles ainda questionam os resultados variados encontrados em pesquisas
sobre Tema ao perguntarem se esses permitiriam conceituar e formular tal caracterização.
Além disso, afirmam que a identificação do Tema dentro de uma oração é à primeira vista
fácil, mas que se torna complicada quando Temas múltiplos, que obedecem às outras
diferentes metafunções da gramática sistêmico-funcional.
A classificação de Temas dentro de um texto e sua análise através dela
(Organização Temática) pode não solucionar tais dúvidas, como as manifestadas acima,
9
Minha tradução de: “The Theme is the element which serves as the point of departure of the message; it is
that with which the clause is concerned. The remainder of the message, the part in which the Theme is
developed, is called in Prague school terminology the Rheme. As a message structure, therefore, a clause
consists of a Theme accompanied by a Rheme; (…)”
37
quanto ao valor semântico do Tema, mas pode apontar características pertinentes à
organização textual.
No caso específico da tradução, Enkvist (1978:180, apud BAKER, 1992:119)
afirma que o(a) tradutor(a) deveria se conscientizar da dinâmica de informação do seu
texto. Não seria necessário conhecer a teoria lingüística com profundidade, mas o
conhecimento ou a noção da organização temática de tal texto o(a) auxiliaria a pelo menos
identificar e definir os problemas de tradução.
Desse modo, conscientizar-se de que muitas vezes existem estruturas temáticas
que se sobrepõem às outras dentro de um texto e de que a análise temática pode ser
representada hierarquicamente (BAKER, 1992:122-123) é um grande passo para a
compreensão do desenvolvimento da mensagem em um texto e até mesmo de dispositivos
narrativos, como é o caso do corpus desta pesquisa, composto pela novela A hora da estrela
de Clarice Lispector e sua tradução para o inglês, The hour of the star, por Giovanni
Pontiero, onde uma relação interativa entre um narrador na primeira pessoa do discurso
e sua narrativa na terceira pessoa.
Baker (1992:140-141) aponta que as escolhas de organização temática podem ser
decorrentes de diferenças entre as línguas. Em 2000, Baker começa a trabalhar com a
noção de estilo. Nessa sua primeira tentativa de mapear um quadro metodológico para
pesquisar a questão do estilo em traduções literárias, Baker (2000:245) afirma que estilo é
uma questão de padronização, isto é, envolve uma descrição de padrões recorrentes do
comportamento lingüístico ao invés de descrever intervenções individuais. Segundo
Halliday (1973:116), estilo pode ser entendido como as escolhas lingüísticas feitas pelo
escritor [tradutor] e sua relação com o significado global da obra. Ainda de acordo com
Halliday (1973:113), quanto ao estilo, devemos nos preocupar não somente com formas
agramaticais, mas também com aquelas que partem de algum padrão esperado de
freqüência. Seguindo esse raciocínio, podemos dizer que as escolhas do tradutor podem
38
obedecer a restrições de natureza sistêmica ou a decisões de caráter idiossincrático, sendo
que estas últimas, se estudadas através de pesquisas cumulativas que analisem várias
traduções de sua autoria, podem vir a apontar traços do seu estilo.
1.4 A organização temática
A organização temática (EGGINS, 1994:271), podendo também ser chamada de
estrutura temática (HALLIDAY, 1994) e de desenvolvimento temático (MARTIN et al.,
1997), consiste na análise e classificação de todos os Temas dentro de um texto,
verificando-se como opera o “fluxo” da mensagem através dele, ou seja, de que maneira a
informação é organizada dentro de tal texto.
Diferentemente da organização temática, a “progressão temática” diz respeito à
configuração de Temas e Remas ao longo do texto. Eggins (1994:303-304) afirma que a
progressão temática manifesta-se através da coesão, descrevendo dois tipos principais: o
padrão zig-zag e o padrão de Tema múltiplo. O padrão zig-zag ocorre quando um Rema de
uma oração é tematizado na oração seguinte. O padrão de Tema múltiplo dá-se por meio de
um Rema que contém muitas informações que são recuperadas em posição temática pelas
orações seguintes. Koch (2003:63-65) descreve quatro tipos de progressão temática: a
progressão temática com um Tema constante; a progressão temática com Tema derivado; a
progressão temática por desenvolvimento de um Rema subdividido e a progressão temática
com salto temático. O primeiro tipo de progressão temática descrito por Koch consiste em
vários tipos de Rema acrescentados a um mesmo tipo de Tema. O segundo tipo concerne à
derivação de Temas parciais de um hiperTema. O terceiro tipo relaciona-se à ampliação das
partes de um Rema super-ordenado. E, finalmente, o quarto tipo refere-se à “omissão de
um elemento intermediário da cadeia de progressão temática linear” (padrão zig-zag). A
progressão temática é explorada brevemente nesta dissertação (cf. capítulo 3) uma vez que
a mesma focaliza a organização temática.
39
Tanto por meio da progressão temática quanto por meio da organização temática,
aspectos coesivos estão implicados, visto que através da escolha temática, papéis
discursivos distintos podem ser representados, sendo que ela se torna fundamental na
estrutura de um discurso coerente (DAVIES, 1988:175-178).
Halliday (1994:37) define que a estrutura temática é alcançada através das várias
estruturas que são mapeadas entre si a fim de constituir uma oração, sendo que a primeira a
ser considerada é aquela que proporciona à oração um caráter de mensagem.
Baker (1992:126) afirma que a escolha individual de um Tema em uma dada oração
não é muito significativa; já a escolha dentro de um contexto mais amplo e como os Temas
são ordenados exercem um papel importante na organização de um texto e no fornecimento
de um ponto de orientação para a manifestação da linguagem.
Dentre alguns estudos sobre organização temática, Torsello (1990) analisa a
estrutura temática das primeiras duas páginas do romance To the lighthouse, de Virginia
Woolf, verificando que, através da metafunção textual, pode-se saber muito sobre o ponto
de vista do narrador e das personagens. Dourado (In: DOURADO, GIL e
VASCONCELLOS, 1995) pesquisa a organização temática no conto “A very short story”,
de Ernest Hemingway, e sua tradução para o português, constatando que tal organização
contribui para a textura de um texto ao mesmo tempo em que fornece uma idéia de como o
texto se desenvolve. A pesquisadora também ressalta a importância do desenvolvimento da
sensibilidade em relação à organização temática, pois, conscientizando-se da repercussão
desta organização em um texto, os tradutores serão hábeis em desenvolver um sistema
similar em suas re-textualizações, principalmente no que tange às estruturas marcadas.
Nesse sentido, Vasconcellos (1997) investiga nove traduções de graduandos do curso de
tradução da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) do conto “Appointment in
Samarra”, de Somerset Maugham, explorando a re-textualização da estrutura temática
nestas traduções. A pesquisadora conclui que a preservação dos Temas marcados do
40
original na tradução, quando possível, é sempre válida, pois a escolha destes Temas na
textualização serve para propósitos e efeitos específicos que devem ser correspondidos nas
re-textualizações. Munday (1998) pesquisa a organização temática no conto “El verano
feliz de la señora Forbes”, de Gabriel García Márquez, e sua tradução para o inglês,
concluindo que a tradutora em sua tradução tendeu a normalizar a estrutura temática do
texto fonte. Ghadessy e Gao (2001), em sua pesquisa com um corpus paralelo com
textos fonte em inglês e textos alvo em chinês, verificam que houve um grau significativo
de correlação entre ambos textos quanto aos padrões temáticos. Barbara e Gouveia (2003)
examinam como a estrutura temática opera no primeiro capítulo das traduções para o
português do Brasil e para o português europeu do romance Harry Potter and the prisoner
of Azkaban, de J. K. Rowling. Segundo os pesquisadores, de um ponto de vista
quantitativo, ambas traduções possuem um padrão temático semelhante. Entretanto, do
ponto de vista qualitativo, diferenças entre os textos alvo no que concerne ao contexto
de cultura dos tradutores, o que leva a re-textualizações distintas das mesmas categorias
léxico-semânticas dos Temas nas duas traduções. North (2003) pesquisa ensaios escritos
por alunos de graduação matriculados em um curso sobre a história da ciência, examinando
até que ponto o uso de Temas por parte dos estudantes pode variar segundo sua formação
disciplinar anterior. A pesquisadora constatou que a formação disciplinar anterior dos
estudantes influencia sua redação, o que sugere que o sucesso na escrita em um dado curso
pode ser afetado por práticas de redação em cursos precedentes.
Ao se analisar a organização temática, são observados os tipos de Temas, sua
distribuição, número de ocorrências e possível correlação com o gênero do discurso.
Siqueira (2000) pesquisa quatro Relatórios Anuais em português e suas respectivas
traduções para o inglês no tocante à organização temática. A pesquisadora tem como
objetivo verificar de que maneira aspectos de ordem cultural se manifestam nos textos alvo.
Sua pesquisa relaciona-se também ao conceito de gênero do discurso no caso relatórios e
41
leva em consideração que “cada comunidade lingüística possui suas maneiras
preferenciais de organizar seus vários tipos de discurso” (SIQUEIRA, 2000:229). Por meio
da organização temática, Siqueira constata que os originais não foram produzidos tendo em
vista um público alvo. Ademais, as traduções não obedecem a padrões culturais e ao gênero
do discurso por apresentarem re-textualizações temáticas somente no nível léxico-
gramatical. Pagano (2005) mostra que parece haver uma conexão entre organização
temática e gênero do discurso ao analisar o conto em espanhol “Espantos de Agosto” de
Gabriel García Márquez e suas traduções para o português e o inglês. Como os textos
analisados associam-se ao gênero literário-discursivo “conto”, um aspecto da organização
temática é inerente a eles: a presença de Temas ideacionais processo do tipo verbal que se
relacionam aos verbos de elocução e, conseqüentemente, dizem respeito à interação entre a
narrativa e seus personagens. Pagano pesquisa um conto (e sua tradução para o inglês)
retirado da mesma coletânea onde se encontra o conto original investigado por Munday
(1998). A pesquisadora (2005) verifica que os resultados que obteve corroboram as
observações teóricas, metodológicas e analíticas de Munday (1998). Contudo, Pagano
relativiza a afirmação de Munday, que diz respeito ao fato de a tradutora americana ter
normalizado a organização temática do texto fonte em espanhol no seu texto alvo em
inglês, ao observar que muitas das modificações de ordem temática em “The ghosts of
August” são motivadas por diferenças sistêmicas entre o par lingüístico espanhol-inglês.
Uma abordagem interessante do Tema em níveis acima da oração é feita por Martin
e Rose (2003), que exploram os conceitos de hiperTema, hiperNovo, macroTema e
macroNovo. Estes conceitos inserem-se em uma perspectiva discursiva na qual o fluxo de
informação apresenta uma regularidade e um ritmo que auxiliam o(a) leitor(a) a
compreender melhor o texto. O hiperTema localiza-se em um nível acima do Tema,
estabelecendo expectativas de como o texto irá se desenvolver. Ele pode ser representado
pela oração que apresenta o tópico ou pela topic sentence, que anuncia como será o
42
desenrolar da informação a partir de então. O hiperNovo relaciona-se ao acúmulo de
informação nova que freqüentemente surge em uma sentença que faz um retrospecto do
que aconteceu nos parágrafos anteriores. Deste modo, o hiperNovo proporciona uma nova
finalidade ao texto. Os Temas localizados em um nível acima dos hiperTemas são
chamados de macroTemas. Já a informação nova que se localiza em um nível acima do
hiperNovo é chamada de macroNovo. Tanto o macroTema quanto o macroNovo ocorrem
quando uma complexidade das fases de informação em um texto, complexidade esta
verificada comumente em textos mais híbridos (MARTIN e ROSE, 2003: 176, 181-183,
185). Exemplos de hiperTemas poderão ser encontrados na seção 3.5 desta dissertação.
Na análise textual, podem ser observados os Temas de cada oração que, por sua
vez, podem ser classificados de acordo com a metafunção e o elemento tematizado em cada
metafunção. Quanto à organização temática, Eggins (1994:318-319), por exemplo, analisa
textos considerando a metafunção e o estatuto de marcado e não marcado, focalizando os
Temas interpessoais e nos Temas ideacionais oracionais em três textos que abordam o
mesmo assunto (o choro de bebês), mas que pertencem a gêneros do discurso e registros
diferentes. O trabalho de Eggins reveste-se de interesse uma vez que apresenta uma
tentativa de anotação de texto com base nas categorias da gramática sistêmico-funcional
referentes ao Tema e à transitividade.
Para ilustrar os diferentes tipos de Temas, contemplados pela lingüística sistêmica,
a seguir serão selecionados quinze exemplos de cada tipo extraídos do texto fonte e do
texto alvo. Estes diferentes tipos de Temas representarão as categorias de análise da
presente pesquisa. Um debate mais aprofundado pode ser encontrado na seção que
apresenta a análise e discussão dos dados desta dissertação.
43
1.5 Classificação de Temas
De acordo com a proposta hallidayana, os Temas são classificados segundo as
metafunções da linguagem, a ocorrência dentro de uma oração e as escolhas mais ou menos
usuais. A ocorrência de somente um Tema ideacional dentro da oração aponta que este
Tema é simples enquanto que a ocorrência de um Tema interpessoal e/ou Tema textual
além do Tema ideacional indica que este Tema é múltiplo. Basicamente, o Tema ideacional
manifesta-se por meio de componentes de representação experiencial, a saber, os
participantes, os processos e as circunstâncias. Quanto à convencionalidade temática, o
parâmetro principal adotado nesta pesquisa é o padrão SVO. Um Tema não marcado ocorre
em orações que obedecem a esse padrão ao passo que um Tema marcado se em orações
que não seguem esse padrão. Entretanto, a utilização deste padrão como parâmetro de
classificação de Temas em marcados e não marcados torna-se insuficiente. Para efeito de
complementação, utilizamos também o parâmetro de quão usual ou não um Tema pode ser.
Este segundo parâmetro será explicitado nesta seção quando explicaremos os Temas não
marcados e marcados.
O quadro 1, a seguir, ilustra uma oração na qual Temas que contemplam as três
metafunções:
Quadro 1: Oração com Temas associados às três metafunções
(...), e bem sei que cada dia é
um dia roubado
da morte.
Tema
textual
Tema
interpessoal
Tema ideacional
processo-
participante
Rema
(Lispector, 1998:16)
44
Classificação quanto à co-existência de Temas associados às três metafunções
Tema Simples
Ocorre em orações nas quais há somente um Tema ideacional.
Exemplos de Temas simples:
<tema simples> Tudo no mundo <tema não marcado> <tema ideacional
participante> começou com um sim (p.11).
10
<tema simples> A moça <tema não marcado> <tema ideacional participante>
tinha ombros curvos como os de uma cerzideira (p.26).
<tema simples> Ela <tema não marcado> <tema ideacional participante> se
realizaria muito mais se se desse ao delicado labor de restaurar fios, (...) (p.26).
<tema simples> Ela <tema não marcado> <tema ideacional participante> me
incomoda tanto que fiquei oco. <tema simples> Estou <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante> oco desta moça (p.26).
<tema simples> Na distração <tema marcado> <tema ideacional circunstância>
aparece Deus (p.26).
<tema simples> O quarto <tema não marcado> <tema ideacional participante>
ficava num velho sobrado colonial da áspera rua do Acre entre as prostitutas que
serviam a marinheiros, depósitos de carvão e de cimento em , não longe do
cais do porto (p.30).
<tema simples> Se o leitor possui alguma riqueza e vida bem acomodada <tema
marcado> <tema ideacional oracional>, sairá de si para ver como é às vezes o
outro (p.30).
<tema simples> Faço <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> aqui o papel de vossa válvula de escape e da vida massacrante da
média burguesia (p.30).
<tema simples> Minto <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> : <tema simples> ela <tema não marcado> <tema ideacional
participante> era capim (p.31).
<tema simples> Dos verões sufocantes da abafada rua do Acre <tema marcado>
<tema ideacional circunstância> ela sentia o suor, um suor que cheirava mal.
<tema simples> Esse suor <tema não marcado> <tema ideacional participante>
me parece de má origem (p.31).
<tema simples> Quando dormia <tema marcado> <tema ideacional oracional>
quase que sonhava que a tia lhe batia na cabeça.
<tema simples> EVERYTHING in the world <tema não marcado> <tema
ideacional participante> began with a yes (p.11).
11
10
Todas as citações retiradas do original em português referem-se à edição consultada LISPECTOR, 1998.
11
Todas as citações retiradas da tradução em inglês referem-se à edição consultada LISPECTOR, 1992.
45
<tema simples> The girl <tema não marcado> <tema ideacional participante>
had drooping shoulders like those of a darning woman (p.25).
<tema simples> The darning-needle <tema não marcado> <tema ideacional
participante> turned mosquito (p.25).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> wasn't
even aware that she was unhappy. <tema simples> The one thing she had <tema
ideacional equativo> was faith (p.25).
<tema simples> If anyone knows of a better one <tema marcado> <tema
ideacional oracional>, let him speak up (…) (p.26)
<tema simples> In Alagoas <tema marcado> <tema ideacional circunstância>
they had a special name for this condition (...) (p.26)
<tema simples> During the day <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> she wore a blouse and skirt, <tema simples> at night <tema
marcado> <tema ideacional circunstância> she slept in her underwear (p.26).
<tema simples> From time to time <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, the girl was lucky enough to hear a cockerel welcome the dawn
(p.30).
<tema simples> If the reader is financially secure and enjoys the comforts of life
<tema marcado> <tema ideacional oracional>, he must step out of himself and
see how others live (p.30).
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> am
telling a lie: <tema simples> she <tema não marcado> <tema ideacional
participante> was wild grass (p.30).
<tema simples> In the night shadows <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> a man was whistling; <tema simples> there were <tema não
marcado> <tema ideacional processo> heavy footsteps and the howling of an
abandoned mongrel (p.30).
Tema Múltiplo
Ocorre em orações nas quais antes do Tema ideacional há um Tema textual e/ou um
Tema interpessoal.
Exemplos de Temas múltiplos:
<tema múltiplo> Mas <tema textual> antes da pré-história <tema marcado>
<tema ideacional circunstância> havia a pré-história da pré-história (p.11).
<tema múltiplo> o <tema interpessoal> tinha <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> aquela coisa delicada que se chama encanto
(p.27).
<tema múltiplo> <tema interpessoal> eu <tema não marcado> <tema
ideacional participante>, seu autor, a amo (p.27).
<tema múltiplo> Pois <tema textual> até mesmo <tema interpessoal> o fato de
vir a ser uma mulher <tema não marcado> <tema ideacional participante> não
parecia pertencer à sua vocação (p.28).
46
<tema múltiplo> Mas <tema textual> as companheiras de quarto <tema não
marcado> <tema ideacional participante> Maria da Penha, Maria Aparecida,
Maria José e Maria – apenas não se incomodavam (p.31).
<tema múltiplo> Às vezes <tema interpessoal> antes de dormir <tema marcado>
<tema ideacional oracional> sentia fome e ficava meio alucinada pensando em
coxa de vaca (p.31).
<tema múltiplo> Então <tema textual> defendia-se <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> da morte por intermédio de um viver de
menos, gastando pouco de sua vida para esta não acabar (p.32).
<tema múltiplo> Nem <tema interpessoal> posso <tema interpessoal> saber
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante>, <tema múltiplo>
mas <tema textual> acho <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> que não. <tema múltiplo> <tema interpessoal> uma vez <tema
interpessoal> se fez uma trágica pergunta: <tema ltiplo> quem <tema
interpessoal> <tema não marcado> <tema ideacional participante> sou eu?
(p.32)
<tema múltiplo> Então <tema textual> costumava <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> fingir que corria pelos corredores de boneca
na mão atrás de uma bola e rindo muito. (p.33)
<tema múltiplo> Sim <tema textual>, ela <tema não marcado> <tema ideacional
participante> era alegrezinha dentro de sua neurose. (p.36)
<tema múltiplo> Mas <tema textual> como as roía quase até o sabugo <tema
marcado> <tema ideacional oracional>, o vermelho berrante era logo desgastado
e via-se o sujo preto por baixo. (p.36)
<tema múltiplo> Pois <tema textual> um dos gestos mais despercebidos <tema
não marcado> <tema ideacional participante> é esta história de que não tenho
culpa e que sai como sair. (p.36)
<tema múltiplo> But <tema textual> before prehistory <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> there was the prehistory of prehistory (p.11)
<tema ltiplo> How <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> can I avenge myself? (p.25)
<tema ltiplo> Why <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> does she not fight back? (p.26)
<tema ltiplo> And <tema textual> so <tema textual> her days <tema não
marcado> <tema ideacional participante> passed (p.27).
<tema múltiplo> Therefore <tema textual> she <tema não marcado> <tema
ideacional participante> wasn't aware of her own unhappiness (p.27).
<tema múltiplo> Perhaps <tema interpessoal> she <tema não marcado> <tema
ideacional participante> felt there was some glory in living (p.27).
<tema múltiplo> So <tema textual> she <tema não marcado> <tema ideacional
participante> was happy (p.27).
<tema ltiplo> And <tema textual> so <tema textual> the days <tema não
marcado> <tema ideacional participante> passed (p.30).
47
<tema simples> They <tema não marcado> <tema ideacional participante>
turned on to their other sides <tema ltiplo> and <tema textual> went back
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> to sleep (p.31).
<tema múltiplo> Sometimes <tema interpessoal> before falling asleep <tema
marcado> <tema ideacional oracional> she felt the pangs of hunger <tema
múltiplo> and <tema textual> became <tema não marcado> <tema ideacional
processo-participante> quite giddy as she visualized a side of beef (p.31).
<tema múltiplo> Perhaps <tema interpessoal> the girl from the North-east
<tema não marcado> <tema ideacional participante> has already come to the
conclusion that life is troublesome, a soul that doesn't quite match its body, even
a delicate soul like hers (p.31).
<tema múltiplo> So <tema textual> she <tema não marcado> <tema ideacional
participante> shielded herself from death by living below par, by consuming her
life sparingly so that it shouldn't come to an abrupt ending (p.32).
<tema ltiplo> More surprisingly <tema interpessoal>, she <tema não
marcado> <tema ideacional participante> often dreamed about sex, she, who to
all appearances was completely asexual. (p.33)
<tema múltiplo> Dear God <tema interpessoal>, neurosis <tema não marcado>
<tema ideacional participante> counted for something: almost as good as
crutches. (p.34)
Classificação de Temas Ideacionais quanto às escolhas usuais ou menos usuais
Tema não marcado
Representa a posição mais usual na oração ao manifestar a convencionalidade de
escolhas em relação à estrutura SVO (sujeito verbo objeto). Corresponde ao sujeito em
uma oração declarativa, ao processo em uma imperativa e ao elemento Qu- em uma
interrogação. Com base em Pontes (1987:117, 119), no caso da língua portuguesa,
consideram-se não marcadas opções tais como processos impessoais e processos na passiva
pronominal em posições temáticas; e o que denominamos Tema ideacional processo-
participante, onde o participante na função de sujeito está elíptico, mas a posição em que o
processo aparece na oração ainda contempla a estrutura SVO.
Exemplos de processos impessoais em posição temática:
Falta o casal passeando no trigal (...)
É um bom negócio. (Pontes, 1987: 117, 121)
Exemplos de processos na passiva pronominal em posição temática:
48
(...) foram-se velhos quarteirões e em seu lugar ficou uma esplanada sem lógica
(...)
Mas tira (se) coisa daqui. (Pontes, 1987:117, 134)
Na oração acima Mas tira (se) coisa daqui”, o pronome átono “se” está entre
parêntesis, pois, na verdade, esta oração ocorreu sem ele, que na linguagem coloquial o
emprego deste pronome está desaparecendo (PONTES, 1987:133). Então, a inclusão deste
pronome entre parêntesis na sentença tem como objetivo mostrar como a oração seria
dentro das normas da Gramática Tradicional.
Exemplos de Temas não marcados:
<tema simples> Uma molécula <tema não marcado> <tema ideacional
participante> disse sim a outra molécula (p.11)
(...) <tema múltiplo> e <tema textual> eu <tema não marcado> <tema ideacional
participante> ouço escuro que estão rindo de mim em risos rápidos e ríspidos de
velhos (p.20).
<tema múltiplo> Por que <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> escrevo sobre uma jovem que nem pobreza enfeitada
tem? (p.21)
(...) <tema ltiplo> e <tema textual> não <tema interpessoal> <tema não
marcado> <tema ideacional processo> lugar para mim na terra dos homens
(p.21).
<tema simples> Experimentei <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> quase tudo, inclusive a paixão e o seu desespero (p.21).
<tema simples> O moço <tema não marcado> <tema ideacional participante>
consentiu (...) (p.21)
<tema simples> Tudo isso <tema não marcado> <tema ideacional participante>
acontece no ano este que passa <tema múltiplo> e <tema textual> <tema
interpessoal> acabarei <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> esta história difícil quando eu ficar exausto da luta, <tema
múltiplo> não <tema interpessoal> sou <tema não marcado> <tema ideacional
processo-participante> um desertor (p.32).
<tema simples> Volto <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> à moça: <tema simples> o luxo que se dava <tema não marcado>
<tema ideacional participante> era tomar um gole frio de café antes de dormir.
<tema simples> Pagava <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> o luxo tendo azia ao acordar (p.33).
<tema simples> Dava-se <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> melhor com um irreal cotidiano, <tema simples> vivia <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> em câmara leeeenta, lebre
puuuuulando no aaaar sobre os ooooouteiros, <tema simples> o vago <tema não
49
marcado> <tema ideacional participante> era o seu mundo terrestre, <tema
simples> o vago <tema não marcado> <tema ideacional participante> era o de
dentro da natureza. (p.34)
<tema simples> One molecule <tema não marcado> <tema ideacional
participante> said yes to another molecule (p.11)
<tema múltiplo> No one <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional participante> understands my meaning <tema múltiplo> and <tema
textual> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> can obscurely
hear mocking laughter with that rapid, edgy cackling of old men (p.20).
<tema ltiplo> Why <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> should I write about a young girl whose poverty is so
evident? (p.20-21)
<tema múltiplo> Yet <tema textual> I <tema não marcado> <tema ideacional
participante> am prepared to leave quietly by the back door (p.21).
<tema múltiplo> Now <tema textual> I <tema não marcado> <tema ideacional
participante> only wish to possess what might have been but never was (p.21).
<tema múltiplo> Please <tema interpessoal> take <tema não marcado> <tema
ideacional processo> me with you. <tema simples> You <tema não marcado>
<tema ideacional participante> can carry me on your back (p.21).
<tema simples> The typist <tema não marcado> <tema ideacional participante>
doesn't want to get off my back (p.21).
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> can
reveal nothing <tema múltiplo> for <tema textual> I <tema não marcado>
<tema ideacional participante> still haven't worked up enough enthusiasm to
write the story. (p.21-22)
<tema simples> These events <tema não marcado> <tema ideacional
participante> belong to the present <tema múltiplo> and <tema textual> I <tema
não marcado> <tema ideacional participante> shall only finish this awkward
narrative when I am too exhausted to struggle any longer. <tema simples> I
<tema não marcado> <tema ideacional participante> am no deserter (p.32).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> paid
for this luxury by waking up with heartburn (p.33).
Tema Marcado
Representa uma posição menos usual, que difere da estrutura SVO (sujeito verbo
objeto). O Tema marcado implica principalmente um processo anteposto ao sujeito da
oração (estrutura VS); uma circunstância no início da oração; uma oração hipotática
reduzida ou não-reduzida deslocada para o começo do período e um participante com
função de objeto no início da oração.
50
Exemplos de Temas marcados:
<tema simples> Assim é que <tema ideacional predicado> esta história será feita
de palavras que se agrupam em frases <tema múltiplo> e <tema textual> destas
<tema marcado> <tema ideacional participante> se evola um sentido secreto que
ultrapassa palavras e frases (p.14).
<tema simples> Para adormecer nas frígidas noites de inverno <tema marcado>
<tema ideacional oracional> enroscava-se em si mesma, recebendo-se e dando-
se o próprio parco calor (p.24).
<tema simples> Tudo isso <tema marcado> <tema ideacional participante> eu
disse tão longamente por medo de ter prometido demais e dar apenas o simples e
o pouco (p.24).
<tema simples> Se fosse criatura que se exprimisse <tema marcado> <tema
ideacional oracional> diria: (...) (p.24)
<tema simples> Apesar de eu não ter nada a ver com a moça <tema marcado>
<tema ideacional oracional>, terei que me escrever todo através dela por entre
espantos meus (p.24).
(...) <tema múltiplo> mas <tema textual> entre os fatos <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> há um sussurro (p.24).
<tema simples> Quando dormia <tema marcado> <tema ideacional oracional>
quase que sonhava que a tia lhe batia na cabeça (p.34).
<tema simples> Domingo <tema marcado> <tema ideacional circunstância> ela
acordava mais cedo para ficar mais tempo sem fazer nada (p.35).
(...) <tema simples> no cais do porto <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> viu um arco-íris (p.35).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> como as roía quase até o sabugo <tema
marcado> <tema ideacional oracional>, o vermelho berrante era logo desgastado
e via-se o sujo preto por baixo (p.36).
<tema simples> Quando acordava <tema marcado> <tema ideacional oracional>
não sabia mais quem era (p.36).
<tema simples> Durante o dia <tema marcado> <tema ideacional circunstância>
eu faço, como todos, gestos despercebidos por mim mesmo (p.36).
-- <tema simples> Isso <tema não marcado> <tema ideacional participante>,
moço, é indecência, <tema simples> disse <tema não marcado> <tema
ideacional processo> ela para o rádio (p.37).
<tema simples> A maior parte do tempo <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> tinha sem o saber o vazio que enche a alma dos santos (p.38).
<tema simples> Nas frigidas noites <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> , ela, toda estremecente sob o lençol de brim, costumava ler à luz
de vela os anúncios que recortava dos jornais velhos do escritório (p.38).
<tema simples> Without a shadow of doubt <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> she is a physical person (p.22).
51
<tema simples> In order to draw the girl <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, I must control my emotions (p.22).
<tema simples> In an effort to fall asleep on cold wintry nights <tema marcado>
<tema ideacional circunstância>, she would curl up into a ball, receiving and
giving out her own scant warmth (p.23).
<tema simples> Were she capable of explaining herself <tema marcado> <tema
ideacional oracional>, she might well confide: the world stands outside me
(p.24).
<tema simples> Even though I have nothing to do with the girl <tema marcado>
<tema ideacional oracional>, I shall have to write everything through her,
trapped as I am by my own fears (p.24).
(...) <tema múltiplo> but <tema textual> among the facts <tema marcado>
<tema ideacional circunstância> there is a murmuring (p.24).
<tema simples> As she slept <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, she often dreamed that her aunt was rapping her on the head
(p.33).
<tema simples> When she finally woke up <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, she was overcome by feelings of guilt without being able to explain
why (p.33).
<tema simples> Leaving God aside <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, I have just discovered that reality made little sense to the girl (p.34).
<tema simples> On Sundays <tema marcado> <tema ideacional circunstância>,
she always woke up early in order to be able to spend more time doing
absolutely nothing (p.34).
<tema múltiplo> Surely <tema interpessoal> one day <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> she would gain a place in the paradise reserved for
misfits. <tema múltiplo> Besides <tema textual>, in her case <tema marcado>
<tema ideacional circuntância> it simply isn't a question of gaining Paradise
(p.34).
<tema múltiplo> At this point <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, I must record one happy event (p.35).
<tema simples> Apart from her monthly visit to the cinema <tema marcado>
<tema ideacional circunstância>, she enjoyed another luxury. (p.35)
<tema simples> When she woke up <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, she no longer knew her own identity. (p.35)
Halliday (1967, apud KRESS, 1976:180) parte da noção do sistema de modo
oracional para diferenciar Temas não marcados dos marcados. O teórico afirma que o
Tema não marcado é o sujeito em uma oração declarativa, um elemento Qu- em uma
oração interrogativa e o primeiro item ideacional após o finito em uma oração interrogativa
polar. Quando esses elementos mencionados não ocorrem em posição inicial na oração,
52
temos então um Tema marcado. Para maior esclarecimento desta posição hallidayana,
torna-se necessário definir o que é o modo oracional. De acordo com Halliday (1994:72),
modo oracional é um componente que se constitui de duas partes: o sujeito e o finito, sendo
pertencente à metafunção interpessoal.
Exemplo de modo oracional:
Shall I go back one day to my former way of life? (p.22)
No exemplo acima, “Shall” é o finito e “Ié o sujeito, sendo que ambos formam o
modo oracional da sentença.
No caso da língua portuguesa, o modo oracional está sinalizado de forma diferente,
porque muitas vezes o finito “funde-se” com o predicador e podemos perceber que se trata
de uma interrogação por meio do sinal de pontuação, como no exemplo a seguir.
Exemplo de finito “fundindo-se” ao predicador:
Voltarei algum dia à minha vida anterior? (p.23)
No exemplo acima, o finito une-se ao predicador, resultando no processo
“Voltarei”. Além disso, o sujeito está elíptico. Deste modo, o reconhecimento do modo
oracional em sentenças nas quais há a “fusão” do finito com o predicador se dá pela
pontuação ao final das mesmas e não pela tematização de um finito.
Ainda de acordo com Halliday (1994:31), os conceitos de Sujeito psicológico,
gramatical e lógico podem ser úteis para se determinar quando um Tema é marcado ou não
marcado. O Sujeito psicológico corresponde ao que o falante ou usuário da linguagem tem
em mente para iniciar seu enunciado. O Sujeito gramatical relaciona-se a um grupo
nominal ou pronome na função de Sujeito e sua concordância em pessoa e número com o
verbo. Já o Sujeito lógico significa o “agente da ação”, aquele que estabelece relações entre
as coisas. Deste modo, quando essas três funções de Sujeito estão “fundidas” (conflated) na
53
oração ou correlacionadas entre si (“mapped” on to one another), temos um Tema não
marcado, enquanto que quando uma dessas funções deixa de coincidir com as outras, temos
então um Tema marcado.
Classificar um Tema em marcado ou não marcado muitas vezes gera controvérsia.
Então, a fim de se esclarecer melhor essa questão, optamos por utilizar a ordem SVO como
parâmetro nesta classificação, juntamente com as considerações de Halliday sobre o Tema
não marcado nos diferentes modos oracionais. As orações que seguem essa ordem são tidas
como não marcadas e, em grande parte, são declarativas; as que possuem a ordem VS são
consideradas marcadas e diferem de alguma maneira da oração declarativa neutra,
afirmativa, ativa. Estas generalizações foram apontadas pela pesquisa de Pontes (1987:149-
151) sobre a estrutura SVO e suas variantes no português do Brasil. Contudo, como visto
anteriormente, Pontes abre exceções e considera alguns casos VS como usuais no
português do Brasil.
Além da utilização do padrão SVO para identificar Temas não marcados e
marcados, faz-se necessário o uso de um outro parâmetro que consiste na noção de quão
usual um Tema pode ser (EGGINS, 1994: 296).
Exemplo:
-- Ah mês de maio, não me largues nunca mais! (Lispector, 1988:42).
No exemplo acima, “Ah mês de maio” e “não” são Temas interpessoais constituídos
de um vocativo e um adjunto modal de polaridade negativa respectivamente e “me” é um
Tema ideacional participante. De acordo com o padrão SVO, o Tema da oração imperativa
acima é marcado, pois a meta (“me”) encontra-se posicionada antes do processo. No
entanto, percebe-se que este posicionamento da meta é obrigatório nas imperativas no
português, o que significa que este Tema pode ser não marcado também. Segundo Cunha
e Cintra (2001:310), “me” é um pronome átono que está junto a uma palavra negativa e
deve preceder o verbo. Este posicionamento do pronome átono, segundo os autores, é
54
denominado próclise. Esta norma da gramática canônica corrobora de certa maneira que a
posição deste pronome é usual no português.
Cunha e Cintra (2001:162-163) afirmam que predominância da ordem direta no
português, ordem essa que é mais sensível nas orações declarativas. Afirmam também que
as inversões permitem alterar a ordem normal dos termos da oração, sendo que o uso
consagrou algumas delas, tornando-se até uma exigência gramatical. Segundo os autores,
há inversões de natureza estilística e de natureza gramatical.
Exemplos de inversões de natureza estilística:
Não vês o que te dou eu? (V. de MORAIS, apud CUNHA e CINTRA,
2001:162)
Quero levar-te a dédalos profundos,
Onde refervem sóis...e céus... e mundos... (CASTRO ALVES, p.162)
És tu! És tu! Sempre viste, enfim! (F. ESPANCA, p.162)
Exemplos de inversões de natureza gramatical:
Onde está a estrela da manhã? (M. BANDEIRA, p.163)
Ouve tu, meu cansado coração,
O que te diz a voz da natureza: (A. DE QUENTAL, p.164)
Formam-se bolhas na água... (F. PESSOA, p.164)
- Que venha essa coisa melhor! (M. RUBIÃO, p.164)
De acordo com Perini (2002:223), a ordem dos termos dentro da oração relaciona-
se com a definição das funções e com a explicitação das relações de correspondência.
Considerando os traços de anteposição e posição do auxiliar, o autor distingue dois tipos
principais de termos: os que podem ser colocados no início da sentença, sendo marcados e
os de posicionamento livre dentro da oração.
Exemplo:
(1) a. Rogério vai fazer o churrasco.
b. O churrasco, Rogério vai fazer. (PERINI, 2002:223)
Pontes (1987:107) afirma que se considerarmos as orações transitivas, a
predominância da estrutura SVO é maciça ao passo que a ocorrência da estrutura VS é mais
expressiva nas orações intransitivas. A autora (1987:107) também ressalta a possibilidade
55
de a estrutura VS se manifestar em orações transitivas desde que o enunciado seja
compreensível.
Exemplos de orações que manifestam a estrutura VS:
Aqui estou eu.
Lá vêm eles.
Falta alguma coisa no Brasil (...)
Era gente querendo saber (...)
Caí neve em Parnaíba. (PONTES, 1987:112,117,121,126)
Para efeito de anotação do corpus, adoto as posições de Pontes e Cunha e Cintra
(inversões de natureza gramatical), por considerá-las pertinentes à minha pesquisa.
Segundo Downing e Locke (2002:228-230), existem na língua inglesa elementos
tematizados que provocam inversão do sujeito e da parte finita do predicador por possuírem
um efeito mais marcado. Este fenômeno da língua inglesa ocorre por meio de dois tipos de
expressões: expressões de direção e expressões com significado negativo.
Nas expressões de direção, o que causa esta inversão são os complementos do
predicador que acompanham processos que expressam direção.
Exemplos:
Home went Alice.
There goes my last dollar.
Across the campus raced the students. (DOWNING e LOCKE, 2002:228)
Estes autores afirmam que quando estes complementos do predicador estão
tematizados, o tempo verbal do processo é simples, o que significa que o sujeito se inverte
com o predicador. O efeito deste tipo de construção é enfático, pois o ponto de partida da
mensagem se por meio de um complemento que expressa direção e também porque o
sujeito, localizado na posição final da sentença, recebe um foco máximo no que tange ao
sistema de informação. Este tipo de estrutura apresenta uma força exclamatória e um efeito
retórico (como em Here comes the bus! Off they go!) que se tornam ausentes quando esta
estrutura é reinvertida. Quando o sujeito é um pronome, deve-se evitar a inversão, que o
56
pronome expressa uma informação conhecida, tornando-se inapropriado colocá-lo na
posição final da sentença para que ele receba o foco máximo.
Nas expressões de significado negativo, o que causa essa inversão são os adjuntos
negativos tematizados tais como never, nowhere, under no circumstances; os grupos
nominais negativos tematizados tais como not a soul, not a thing; e os negativos implícitos
tematizados como hardly, scarcely, por exemplo.
Exemplos:
Never have I seen such a sight.
Under no circumstances must medicines be left within reach of children.
Not a thing could the patient remember.
Hardly a soul did the travelers see.
Scarcely had the show started than the fire broke.
(DOWNING e LOCKE, 2002:229)
Observa-se que, neste tipo de expressão, o sujeito se inverte não somente com o
predicador, mas também com o finito.
ainda outros tipos de Temas que causam essa inversão como so, neither, nor ao
introduzirem orações elípticas; such e so como modificadores de complementos ou
adjuntos; orações hipotáticas de condição e concessão, mais freqüentemente na linguagem
formal; e atributos, como os intensivos e os circunstanciais.
Exemplos:
Ed passed the exam and so did May.
Such a bad time did we have that we’ll never forget it.
Were he alive today, he would be horrified.
Bluer than velvet was the night.
On the hill stands a castle. (DOWNING e LOCKE, 2002:229-230)
No presente trabalho, as expressões de significado negativo, expostas por Downing
e Locke, foram muito úteis para a anotação do texto alvo, pois elas ocorrem com certa
freqüência na tradução e se estruturam por finito participante predicador. Quando as
57
orações, nas quais expressões de significado negativo, se iniciam por grupos nominais,
os Temas são considerados marcados. Quando essas mesmas orações se iniciam por
adjuntos modais, elas são consideradas não marcadas, pois adjuntos modais e finitos são
Temas interpessoais e os participantes que aparecem após estes Temas interpessoais são
Temas ideacionais não marcados.
Em corpora paralelos, a língua alvo pode apresentar características próprias que
podem motivar o tradutor a optar por mudanças na organização temática da re-
textualização. Na tradução, quando o tradutor é motivado a mudar a estrutura temática, e.g.
de não marcada para marcada, isso causa um efeito que pode levar a gerar uma outra
representação. Esta mudança é motivada muitas vezes em conseqüência da estrutura da
língua em que o texto está sendo traduzido (VASCONCELLOS, 1997:153,175).
Segundo Eggins (1994:52, 300-303), há alguns aspectos que indicam como a
escolha temática pode contribuir para a coesão e a coerência do texto. A opção por usar
Temas simples ou múltiplos é um deles. Esta opção relaciona-se aos valores de Modo do
texto. Entende-se por Modo a maneira pela qual a linguagem é representada na interação
entre falantes, entre escritores e leitores. Um outro aspecto é a escolha de Temas
ideacionais que se relaciona à variação de Modo entre os textos. Por exemplo, em
conversações, o ponto de partida da mensagem provém muitas vezes de nós mesmos ou
aqueles que estão ligados a nós de alguma maneira. Por isso, o uso maciço de pronomes
pessoais, mesmo estando elípticos. Na escrita acadêmica, o ponto de partida da mensagem
deriva de generalizações sobre pessoas, situações, causas. Assim, há a tematização de
abstrações porque não partirmos da nossa própria experiência. Escolher Temas marcados é
também outro aspecto. Essa escolha relaciona-se às dimensões de Modo. Temas marcados
ocorrem com menor freqüência em conversações casuais. quando um texto apresenta
muitos Temas marcados, ele parece pertencer mais à linguagem escrita. Um outro aspecto
58
significativo através do qual o Tema contribui para a coesão e a coerência de um texto é a
organização temática que mostra como os elementos temáticos sucedem-se uns aos outros.
Há ainda, de acordo com Thompson (2002:141-142), quatro funções principais
pelas quais podemos identificar como as escolhas temáticas operam. A primeira diz
respeito à manutenção de Temas não marcados através do texto e à progressão na qual o
Tema constitui-se um elemento do Rema da oração anterior. A segunda refere-se à
especificação do sistema para a interpretação da oração seguinte, o que é muitas vezes feito
por meio da escolha de um Tema marcado, especialmente uma circunstância, um Tema
ideacional equativo, ou um Tema ideacional predicado. A terceira diz respeito à sinalização
das fronteiras das seções em um texto. Isto pode ser feito mudando-se de um tipo de
escolha temática para outra. E, finalmente, a quarta refere-se à sinalização do que o falante
acha que seja um ponto de partida viável, útil e importante para a mensagem. A fim de
fazer isso, escolhe-se repetidamente o mesmo elemento que aparece em ordem temática.
As observações de Eggins (1994) e Thompson (2002) acima serão retomadas no
capítulo 3.
Classificação segundo as três metafunções da linguagem
Tema Textual
É constituído pelos adjuntos conjuntivos, conjunções (subordinadores e
coordenadores), continuativos, pronomes relativos, ou seja, elementos que “relacionam a
oração ao texto que a antecede” (VENTURA e LIMA-LOPES, 2002).
Halliday e Matthiessen (2004:83) consideram os continuativos (Oh, Não, Sim) e as
conjunções como inerentemente temáticos, porque elas quase sempre estarão no começo
da oração. Já os adjuntos conjuntivos (Portanto, Entretanto, entre outros) e os pronomes
relativos são caracteristicamente temáticos, pois estão freqüentemente em posição
temática, mas também ocorrem em outras posições da oração.
59
Exemplos de Temas textuais:
<tema múltiplo> Mas <tema textual> antes da pré-história <tema marcado>
<tema ideacional circunstância> havia a pré-história da pré-história <tema
múltiplo> e <tema textual> havia <tema não marcado> <tema ideacional
processo> o nunca <tema múltiplo> e <tema textual> havia <tema não
marcado> <tema ideacional processo> o sim (p.11).
<tema ltiplo> Então <tema textual> eu <tema não marcado> <tema
ideacional participante> canto alto agudo uma melodia sincopada e estridente
(...) (p.11)
<tema múltiplo> Agora <tema textual> me lembrei <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> de que houve um tempo em que para me
esquentar o espírito eu rezava: <tema simples> o movimento <tema não
marcado> <tema ideacional participante> é espírito (p.14).
<tema múltiplo> Aliás <tema textual> o material de que disponho <tema não
marcado> <tema ideacional participante> é parco e singelo demais (...) (p.14).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> não <tema interpessoal> vou <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> enfeitar a palavra <tema
múltiplo> pois <tema textual> se eu tocar no pão da moça <tema marcado>
<tema ideacional oracional> esse pão se tornará em ouro (...) (p.15).
<tema ltiplo> E <tema textual> sobretudo <tema textual> esse canal de rádio
<tema não marcado> <tema ideacional participante> aproveitava intervalos
entre as tais gotas de minuto para dar anúncios comerciais <tema simples> ela
<tema não marcado> <tema ideacional participante> adorava anúncios. (p.37)
<tema múltiplo> Então <tema textual> ela <tema não marcado> <tema
ideacional participante> se arrependera. (p.37)
<tema múltiplo> Pelo menos <tema textual> o futuro <tema não marcado>
<tema ideacional participante> tinha a vantagem de não ser o presente, <tema
múltiplo> sempre <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional processo> um melhor para o ruim (p.39).
<tema múltiplo> Pois <tema textual> , por estranho que pareça <tema marcado>
<tema ideacional oracional>, ela acreditava (p.39).
<tema múltiplo> E <tema textual> também <tema textual> porque se houver
algum leitor para essa história <tema marcado> <tema ideacional oracional>
quero que ele se embeba da jovem assim como um pano de chão todo
encharcado (p.39).
<tema múltiplo> and <tema textual> life <tema não marcado> <tema ideacional
participante> was born (p.11).
<tema múltiplo> But <tema textual> before prehistory <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> there was the prehistory of prehistory <tema múltiplo>
and <tema textual> there was <tema não marcado> <tema ideacional processo>
the never <tema múltiplo> and <tema textual> there was <tema não marcado>
<tema ideacional processo> the yes (p.11).
60
My heart <tema não marcado> <tema ideacional participante> has shed every
desire <tema múltiplo> and <tema textual> reduced <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> itself to one final or initial beat (p.12).
<tema múltiplo> Besides <tema textual>, the material at my disposal <tema não
marcado> <tema ideacional participante> is all too sparse and mundane, <tema
simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> possess few
details about my characters <tema ltiplo> and <tema textual> those details
<tema não marcado> <tema ideacional participante> are not very revealing;
(p.14).
<tema múltiplo> So <tema textual> this story <tema não marcado> <tema
ideacional participante> will consist of words that form phrases from which
there emanates a secret meaning that exceeds both words and phrases (p.14).
<tema múltiplo> Yet <tema textual> I <tema não marcado> <tema ideacional
participante> have no intention of adorning the word, <tema múltiplo> for
<tema textual> were I to touch the girl's bread <tema marcado> <tema
ideacional oracional>, that bread would turn to gold (…) (p.15).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante>
reckoned that it might not be such a bad thing being a vampire, <tema múltiplo>
for <tema textual> the blood <tema não marcado> <tema ideacional
participante> would add a touch of pink to her sallow complexion. <tema
múltiplo> For <tema textual> she <tema não marcado> <tema ideacional
participante> gave the impression of having no blood unless a day might come
when she would have to spill it. (p.25)
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> was as
light-headed as an idiot, <tema múltiplo> only <tema textual> she <tema não
marcado> <tema ideacional participante> was no idiot. (p.25)
<tema ltiplo> But <tema textual> that <tema não marcado> <tema ideacional
participante> is the problem: <tema simples> this story <tema não marcado>
<tema ideacional participante> has no technique, not even in matters of style
(p.35).
<tema múltiplo> In fact <tema textual>, I <tema não marcado> <tema
ideacional participante> sometimes think that I am not me. (p.36)
Tema Interpessoal
É realizado pelos adjuntos modais, ou seja, aqueles que “expressam o julgamento
do falante com relação à relevância da mensagem” (VENTURA e LIMA-LOPES, 2002);
os vocativos; os finitos; os elementos Qu- interrogativos e os elementos Qu- exclamativos.
De acordo com Halliday (1994:54), o Tema textual geralmente precede o Tema
interpessoal. Entretanto, segundo Thompson (2002:136-137), o Tema interpessoal pode
também preceder o Tema textual.
61
Exemplos de Temas interpessoais:
<tema ltiplo> o <tema interpessoal> sei <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante > o quê, (...) (p.11)
<tema múltiplo> E <tema textual> só <tema interpessoal> minto <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> na hora exata da mentira.
(p.18)
<tema múltiplo> Por que <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> escrevo? (p.18)
<tema múltiplo> Não <tema interpessoal> tenho <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> medo nem de chuvas tempestivas nem das
grandes ventanias soltas (...) (p.18)
<tema simples> Nunca <tema interpessoal> a <tema não marcado> <tema
ideacional participante> esqueci: <tema simples> jamais <tema interpessoal> se
esquece <tema não marcado> <tema ideacional processo> a pessoa com quem
se dormiu. (p.18)
<tema múltiplo> como <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> escrevo? (p.18)
<tema ltiplo> Sim <tema textual>, e <tema textual> talvez <tema
interpessoal> alcance <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> a flauta doce em que eu me enovelarei em macio cipó. (p.20)
<tema múltiplo> Talvez <tema interpessoal> fosse <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> assim para se defender da grande tentação de
ser infeliz de uma vez e ter pena de si. (p.38)
<tema ltiplo> o <tema interpessoal> sei <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> a quem acusar <tema múltiplo> mas <tema
textual> deve <tema interpessoal> haver <tema não marcado> <tema ideacional
processo> um réu (p.39).
<tema simples> Perdeu <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> o apetite, <tema múltiplo> só <tema interpessoal> tinha <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> a grande fome (p.39).
<tema múltiplo> Talvez <tema interpessoal> tivesse <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante> pela primeira vez se definido numa
classe social (p.40).
<tema múltiplo> Às vezes <tema interpessoal> só <tema interpessoal> a mentira
<tema não marcado> <tema ideacional participante> salva (p.41).
<tema simples> Do not <tema interpessoal>, therefore <tema textual>, expect
<tema não marcado> <tema ideacional processo> stars in what follows <tema
múltiplo> for <tema textual> nothing <tema interpessoal> <tema não marcado>
<tema ideacional participante> will scintillate (p.16).
<tema múltiplo> even <tema interpessoal> animals <tema não marcado> <tema
ideacional participante> struggle with time. (p.16)
<tema ltiplo> Why <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> do I write? (p.17)
62
<tema múltiplo> how <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> do I write? (p.18)
<tema múltiplo> To be frank <tema interpessoal>, I <tema não marcado> <tema
ideacional participante> am holding her destiny in my hands (...) (p.20)
-- <tema múltiplo> Please <tema interpessoal> take <tema não marcado> <tema
ideacional processo> me with you. (p.21)
<tema múltiplo> Nothing <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional participante> would persuade me to contaminate with brilliant,
mendacious words, a life as frugal as that of my typist. (p.36)
<tema ltiplo> Why <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> do I write? (p.36)
<tema múltiplo> Admittedly <tema interpessoal>, she <tema não marcado>
<tema ideacional participante> had never had any opportunity to make use of
this information (p.37).
<tema múltiplo> Perhaps <tema interpessoal> this <tema não marcado> <tema
ideacional participante> was her protection from the enormous temptation to be
unhappy and to feel sorry for herself (p.38).
<tema múltiplo> May <tema interpessoal> the Gods <tema não marcado>
<tema ideacional participante> never decree that I should write about a leper,
<tema múltiplo> for <tema textual> then <tema textual> I <tema não marcado>
<tema ideacional participante> should become covered in leprosy (p.39).
<tema múltiplo> Perhaps <tema interpessoal> I <tema não marcado> <tema
ideacional participante> shall succeed before finishing my story (p.39).
<tema múltiplo> Nothing <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional participante> could be done about the great clock that marked time
within time (p.40).
<tema ltiplo> Who <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional participante> can tell? (p.40)
Tema Ideacional Participante
Ocorre em uma oração na qual o primeiro grupo é um participante. O participante é
um tipo de elemento que é realizado por um grupo nominal (HALLIDAY, 1994:109). O
Tema ideacional participante não é marcado quando ele coincide com o sujeito. Quando
marcado, ele é um grupo nominal que desempenha o papel de objeto, mas que foi
deslocado para o início da oração.
63
Exemplos de Temas ideacionais participantes:
<tema simples> Esta história <tema não marcado> <tema ideacional
participante> acontece em estado de emergência e de calamidade pública (p.10).
<tema simples> A sua cara <tema não marcado> <tema ideacional participante>
é estreita e amarela como se ele já tivesse morrido (p.24).
<tema simples> Tudo isso <tema marcado> <tema ideacional participante> eu
disse tão longamente por medo de ter prometido demais e dar apenas o simples e
o pouco (p.24).
<tema simples> Isso <tema marcado> <tema ideacional participante> disse ele
(p.25).
-- <tema múltiplo> Bem <tema textual>, a despedida <tema não marcado>
<tema ideacional participante> pode não ser para já (...) (p.25)
<tema simples> A moça <tema não marcado> <tema ideacional participante>
tinha ombros curvos como os de uma cerzideira (p.26).
<tema simples> Uma colega de quarto <tema não marcado> <tema ideacional
participante> não sabia como avisar-lhe que seu cheiro era murrinhento (p.27).
<tema simples> A luz aberta e rebrilhante das ruas <tema não marcado> <tema
ideacional participante> atravessava a sua opacidade (p.42).
(...) <tema múltiplo> que <tema interpessoal> os mortos <tema não marcado>
<tema ideacional participante> me ajudem a suportar o quase insuportável,
que de nada me valem os vivos (p.42).
<tema simples> Ele <tema não marcado> <tema ideacional participante> a
olhara enxugando o rosto molhado com as mãos (p.43).
-- <tema simples> Eu <tema não marcado> <tema ideacional participante>
também acho esquisito <tema múltiplo> mas <tema textual> minha mãe <tema
não marcado> <tema ideacional participante> botou ele por promessa a Nossa
Senhora da Boa Morte se eu vingasse, (...) (p.43)
<tema simples> Eles <tema não marcado> <tema ideacional participante> não
sabiam como se passeia (p.43).
<tema múltiplo> E <tema textual> Macabéa <tema não marcado> <tema
ideacional participante>, com medo de que o silêncio significasse uma
ruptura, disse ao recém-namorado:
-- <tema simples> Eu <tema não marcado> <tema ideacional participante>
gosto tanto de parafuso e prego, e o senhor? (p.44)
<tema simples> This story <tema não marcado> <tema ideacional participante>
unfolds in a state of emergency and public calamity (p.8).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> had
learned to darn as a child, <tema múltiplo> and <tema textual> she <tema não
marcado> <tema ideacional participante> might have made more of her life had
she devoted herself to the delicate task of mending, perhaps even with silken
threads (p.25).
64
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> was
as light-headed as an idiot, <tema ltiplo> only <tema textual> she <tema não
marcado> <tema ideacional participante> was no idiot (p.25).
<tema simples> These events <tema não marcado> <tema ideacional
participante> belong to the present <tema múltiplo> and <tema textual> I <tema
não marcado> <tema ideacional participante> shall only finish this awkward
narrative when I am too exhausted to struggle any longer (p.32).
<tema múltiplo> Sometimes <tema interpessoal> the girl <tema não marcado>
<tema ideacional participante> remembered the disturbing words of a French
ballad (p.32).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> had
heard it sung out of tune by a group of young girls who danced in a circle,
joining hands - <tema simples> she <tema não marcado> <tema ideacional
participante> had listened without being able to participate because her aunt was
calling her to come and sweep the floor (p.32).
<tema simples> The ring on his finger <tema não marcado> <tema ideacional
participante> suggested that he was married (p.40).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> would
die of shame were she to eat in his presence, <tema múltiplo> for <tema
textual> he <tema não marcado> <tema ideacional participante> was much too
good-looking by far (p.41).
<tema múltiplo> Sometimes <tema interpessoal> only <tema interpessoal> a lie
<tema não marcado> <tema ideacional participante> can save you (p.41).
<tema simples> The girl <tema não marcado> <tema ideacional participante>
could scarcely believe that all this space was hers to enjoy (p.41).
Tema Ideacional Processo
Ocorre em uma oração na qual o primeiro grupo é um processo que não possui um
participante elíptico na função de sujeito. A princípio, toda oração pressupõe três
componentes: o processo em si; os participantes no processo e as circunstâncias associadas
com o processo (HALLIDAY, 1994:107). É através destes elementos que o sistema da
transitividade opera. Quando o processo é tematizado em estruturas inversas usuais, ele é
não marcado. Quando o processo é tematizado numa ordem VS não usual, ele torna-se
marcado. O Tema ideacional processo ocorre em orações cujos processos estão antepostos
ao sujeito; em casos de orações sem sujeito nas quais os processos são impessoais; em
orações cujos processos estão em sua forma pronominal e em orações imperativas. Um
exemplo de processo tematizado em estruturas inversas usuais no inglês é there be (haver)
65
que é considerado um processo existencial (THOMPSON, 2002:138). Cumpre relembrar
que, enquanto Thompson (2002:138) considera o processo existencial como Tema,
Halliday (1994:130) e Martin et al. (1997:37) consideram que somente there é o Tema da
oração. Em português, o processo haver é um exemplo de estrutura inversa usual, sendo
este processo existencial um Tema ideacional não marcado.
Exemplos de Temas ideacionais processo:
<tema múltiplo> e <tema textual> <tema não marcado> <tema ideacional
processo> falta de felicidade (p.11).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> antes da pré-história <tema marcado>
<tema ideacional circunstância> havia a pré-história da pré-história <tema
múltiplo> e <tema textual> havia <tema não marcado> <tema ideacional
processo> o nunca <tema múltiplo> e <tema textual> havia <tema não
marcado> <tema ideacional processo> o sim (p.11).
(...) <tema simples> existe <tema não marcado> <tema ideacional processo> a
quem falte o delicado essencial (p.12).
<tema múltiplo> E <tema textual> eis <tema não marcado> <tema ideacional
processo> que fiquei agora receoso quando pus palavras sobre a nordestina.
(p.18)
<tema múltiplo> Mas <tema textual> voam <tema marcado> <tema ideacional
processo> faíscas e lascas como aços espelhados (p.19).
<tema simples> Cuidai <tema não marcado> <tema ideacional processo> dela
porque meu poder é mostrá-la para que vós a reconheçais na rua, andando de
leve por causa da esvoaçada magreza (p.19).
(...) <tema múltiplo> sempre <tema interpessoal> <tema não marcado>
<tema ideacional processo> um melhor para o ruim. (p.39)
-- <tema múltiplo> Não <tema interpessoal> faz <tema não marcado> <tema
ideacional processo> mal, <tema ltiplo> não <tema interpessoal> faz <tema
não marcado> <tema ideacional processo> mal, <tema múltiplo> não <tema
interpessoal> faz <tema não marcado> <tema ideacional processo> mal... <tema
simples> a gente <tema não marcado> <tema ideacional participante> não
precisa entender o nome (p.44).
<tema simples> Era <tema não marcado> <tema ideacional processo> assim:
<tema simples> ficava <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> faminta mas não de comida, <tema simples> era <tema não
marcado> <tema ideacional processo> um gosto meio doloroso que subia do
baixo-ventre (...) (p.45)
-- <tema múltiplo> Pois <tema textual> para mim <tema marcado> <tema
ideacional participante> a melhor herança é mesmo muito dinheiro. <tema
múltiplo> Mas <tema textual> um dia <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> vou ser muito rico <tema simples> disse <tema não marcado>
<tema ideacional processo> ele que tinha uma grandeza demoníaca: <tema
66
simples> sua força <tema não marcado> <tema ideacional participante>
sangrava (p.45).
Ela: <tema simples> Desculpe <tema não marcado> <tema ideacional
processo> <tema múltiplo> mas <tema textual> não <tema interpessoal> acho
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> que sou muito
gente (p.48).
<tema ltiplo> But <tema textual> before prehistory <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> there was the prehistory of prehistory <tema múltiplo>
and <tema textual> there was <tema não marcado> <tema ideacional processo>
the never <tema múltiplo> and <tema textual> there was <tema não marcado>
<tema ideacional processo> the yes (p.11).
<tema múltiplo> Let <tema não marcado> <tema ideacional processo> no one
be mistaken (p.11).
<tema múltiplo> Put <tema não marcado> <tema ideacional processo> the two
together (...) (p.12)
<tema múltiplo> for <tema textual> there are <tema não marcado> <tema
ideacional processo> those who do not possess that essential essence (p.12).
<tema simples> Remember <tema não marcado> <tema ideacional processo>
that, no matter what I write, my basic material is the word (p.14).
<tema simples> Forgive <tema não marcado> <tema ideacional processo> me if
I add something more about myself since my identity is not very clear (…)
(p.15)
<tema simples> There is <tema não marcado> <tema ideacional processo> no
way of escaping facts (p.16).
<tema simples> See <tema não marcado> <tema ideacional processo> how
apprehensive I have become since putting down words about the girl from the
North-east (p.18).
<tema simples> There is <tema não marcado> <tema ideacional processo> little
comfort now (p.19).
-- <tema múltiplo> Ah <tema interpessoal>, merry month of May <tema
interpessoal>, abandon <tema não marcado> <tema ideacional processo> me no
more! (Bang) <absoluto> <tema simples> she <tema não marcado> <tema
ideacional participante> exclaimed inwardly the following morning, the seventh
of May, she who never exclaimed anything. (...) (p.42)
(...) <tema múltiplo> let <tema não marcado> <tema ideacional processo> the
souls in Purgatory assist me to bear the almost unbearable, <tema múltiplo> for
<tema textual> the living <tema não marcado> <tema ideacional participante>
are not much good to me (p.42).
She -- <tema simples> Forgive <tema não marcado> <tema ideacional
processo> me, <tema múltiplo> but <tema textual> I <tema não marcado>
<tema ideacional participante> don't believe that I am all that human (p.48).
He -- <tema simples> Look <tema não marcado> <tema ideacional processo>,
I'm going. <tema simples> You <tema não marcado> <tema ideacional
participante>'re a dead loss (p.48).
67
-- <tema múltiplo> Don't <tema interpessoal> get <tema não marcado> <tema
ideacional processo> upset! <tema simples> They <tema não marcado> <tema
ideacional participante> say getting upset can affect your stomach (p.49).
Tema Ideacional Processo-Participante
Este rótulo refere-se ao Tema de uma oração na qual o primeiro grupo é um
processo que possui um participante elíptico na função de sujeito e torna-se passível de ser
recuperado automaticamente por recursos coesivos e conhecimentos gramaticais: gênero,
número e tempo verbal em português. O mapeamento inicial deste tipo de Tema surgiu a
partir de discussões no âmbito do projeto CORDIALL, no NET/FALE/UFMG. Chegamos
a ele após o estudo de dois artigos: Barbara e Gouveia (2001) e Lima e Ventura-Lopes
(2002). Os primeiros autores acreditam que, em casos de orações com sujeito elíptico, o
Tema é o participante elíptico e este é não marcado. Os segundos autores consideram que o
Tema é o processo e que ele é marcado. Acreditando que o processo é o Tema, mas que o
participante elíptico também é de certa forma tematizado pois pode ser recuperado devido
aos dispositivos coesivos e conhecimentos gramaticais mencionados acima, podemos
conceber um rótulo que nos permita distinguir casos de sujeitos elípticos e não elípticos em
posição temática, dada sua relevância em um estudo de corpora paralelos. O que
denominamos Tema ideacional processo-participante é considerado não marcado por causa
da sua correspondência com a estrutura SVO, visto que apesar de o sujeito não estar
expresso gramaticalmente, ele é recuperável por meio da flexão verbal. Cumpre lembrar
também que, no caso da língua portuguesa, o uso do pronome pessoal torna-se muitas
vezes redundante, como afirma Pontes (1987:143). Daí, sua elipse tão freqüente. Este tipo
de Tema também ocorre na língua inglesa; entretanto, nesta língua, o participante elíptico é
recuperado por tratar-se de um caso de elipse de um sujeito imediatamente posterior à
explicitação do mesmo.
68
O rótulo Tema ideacional processo-participante foi elaborado para mapear um
fenômeno no qual, do ponto de vista sintático, um participante elíptico;
morfologicamente, o participante elíptico pode ser recuperado por meio da flexão verbal
(com maior especificidade em português e menos em inglês, que conservou apenas
algumas flexões, tais como –s na terceira pessoa do singular). Além disso, para efeito de
coleta de dados no WordSmith Tools e tendo em vista a importância de se mapear esse
fenômeno em corpora paralelos nos pares lingüísticos português-inglês/inglês-português,
distinguir Temas ideacionais participantes (sujeito não elíptico), Temas ideacionais
processo e Temas ideacionais processo-participantes potencializa a gama de aspectos a
serem observados na análise.
Exemplos de Temas ideacionais processo-participantes:
<tema múltiplo> mas <tema textual> sei <tema não marcado> <tema ideacional
processo-participante> que o universo jamais começou (p.11).
<tema múltiplo> <tema interpessoal> consigo <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> a simplicidade através de muito trabalho
(p.11).
<tema simples> A minha vida a mais verdadeira <tema não marcado> <tema
ideacional participante> é irreconhecível, extremamente interior <tema
múltiplo> e <tema textual> não <tema interpessoal> tem <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante> uma só palavra que a signifique (p.11).
<tema simples> Meu coração <tema não marcado> <tema ideacional
participante> se esvaziou de todo desejo <tema múltiplo> e <tema textual>
reduz-se <tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> ao
próprio último ou primeiro pulsar (p.11).
<tema múltiplo> Nunca <tema interpessoal> vi <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> palavra mais doida, inventada pelas
nordestinas que andam por aí aos montes (p.12).
<tema múltiplo> <tema interpessoal> não <tema interpessoal> inicio <tema
não marcado> <tema ideacional processo-participante> pelo fim que justificaria
o começo - como a morte parece dizer sobre a vida - porque preciso registrar os
fatos antecedentes (p.12).
<tema simples> Escrevo <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> neste instante com algum prévio pudor por vos estar invadindo
com tal narrativa tão exterior e explícita (p.12).
<tema múltiplo> Também <tema textual> sei <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> das coisas por estar vivendo (p.12).
69
Ela: <tema simples> Acho <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> que não sei dizer (p.48).
-- <tema múltiplo> Não <tema textual>, não <tema interpessoal> tenho <tema
não marcado> <tema ideacional processo-participante> nenhuma. <tema
simples> Acho <tema não marcado> <tema ideacional processo-participante>
que não preciso vencer na vida (p.49).
<tema múltiplo> Estava <tema interpessoal> habituada <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante> a se esquecer de si mesma. <tema
múltiplo> Nunca <tema interpessoal> quebrava <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> seus hábitos, <tema simples> tinha <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> medo de inventar (p.49).
-- <tema simples> Eu <tema não marcado> <tema ideacional participante> sei
<tema múltiplo> mas <tema textual> não <tema interpessoal> quero <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> dizer (p.50).
My heart <tema não marcado> <tema ideacional participante> has shed every
desire <tema múltiplo> and <tema textual> reduced <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> itself to one final or initial beat (p.12).
(...) <tema múltiplo> for <tema textual> she <tema não marcado> <tema
ideacional participante> was barely literate <tema múltiplo> and <tema textual>
had <tema interpessoal> only <tema interpessoal> received <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> three years of primary
schooling (p.15).
<tema simples> The word <tema não marcado> <tema ideacional participante>
must not be adorned <tema múltiplo> and <tema textual> become <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> aesthetically worthless
(p.20).
<tema múltiplo> Perhaps <tema interpessoal> I <tema não marcado> <tema
ideacional participante> might even acquire the sweet tones of the flute <tema
múltiplo> and <tema textual> become <tema não marcado> <tema ideacional
processo-participante> entwined in a creeper vine (p.20).
<tema simples> The old man <tema não marcado> <tema ideacional
participante> seized the opportunity <tema múltiplo> and <tema textual>
begged <tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> him
(p.21):
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> create
human action <tema múltiplo> and <tema textual> tremble <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante>. (p.22)
<tema simples> As the bus sped along <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, she daydreamed aloud <tema múltiplo> and <tema textual> voiced
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> the most
extravagant dreams. (p.37)
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante>
collected newspaper advertisements, <tema múltiplo> and <tema textual> pasted
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> them into an
album. (p.38)
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> was
weeping for the first time <tema múltiplo> and <tema textual> had <tema
interpessoal> never <tema interpessoal> imagined <tema não marcado> <tema
70
ideacional processo-participante> that there was so much water in her eyes.
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> wept
<tema múltiplo> and <tema textual> blew <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> her nose, no longer knowing why she was
weeping (p.50).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> was
tactful, however, <tema ltiplo> and <tema textual> quickly <tema
interpessoal> reassured <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> him: (p.52)
<tema simples> Olímpico <tema não marcado> <tema ideacional participante>
was becoming extremely impatient <tema ltiplo> but <tema textual> made
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> no reply (p.53).
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante> never
referred to 'love' as love, <tema múltiplo> but <tema textual> settled <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> for some vague expression
or other (p.54).
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> am now
about to efface myself once more <tema múltiplo> and <tema textual> return
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> to my two
characters who were transformed by circumstances into two semi-abstract
human beings (p.57).
<tema simples> His crimes <tema não marcado> <tema ideacional participante>
gave him prestige <tema múltiplo> and <tema textual> made <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> him a man whose honour
had already been purged. (p.58)
Tema Ideacional Circunstância
Aparece em uma oração na qual o primeiro grupo é uma circunstância que pode ser
de acompanhamento, ângulo, assunto, causa, contingência, extensão, localização, modo, ou
papel (HALLIDAY, 1994:151). Apesar de autores como Munday (1998) argumentarem
que este tipo de Tema pode ser considerado uma opção usual em línguas românicas, nesta
dissertação, seguindo-se a posição de Halliday, Eggins, Martin et al. e Thompson, o Tema
ideacional circunstância será considerado marcado nas orações declarativas.
Exemplos de Temas ideacionais circunstância:
(...) <tema simples> no fim <tema marcado> <tema ideacional circunstância>
talvez se entenda a necessidade do delimitado (p.13).
<tema simples> Como a nordestina <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, milhares de moças espalhadas por cortiços, vagas de cama
num quarto, atrás de balcões trabalhando até a estafa (p.14).
71
(...) <tema múltiplo> e <tema textual> um dia <tema marcado> <tema
ideacional circunstância>, quem sabe, cantarei loas que não as dificuldades da
nordestina (p.19).
<tema simples> Quanto à moça <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, ela vive num limbo impessoal, sem alcançar o pior nem o
melhor (p.23).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> um dia <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> viu algo que por um leve instante cobiçou: um livro que Seu
Raimundo, dado a literatura, deixara sobre a mesa. (p.40)
<tema simples> Na praça Mauá onde tomava o ônibus <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> fazia frio e nenhum agasalho havia contra o vento.
(p.40)
<tema múltiplo> Por que <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> não agia sempre assim na vida? (p.42)
-- (...) <tema simples> até um ano de idade <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> eu não era chamada porque não tinha nome, (...) (p.43)
-- <tema múltiplo> Também <tema textual> no sertão da Paraíba <tema
marcado> <tema ideacional circunstância> promessa é questão de grande dívida
de honra. (p.43)
<tema simples> Além dos cargueiros do mar nos domingos <tema marcado>
<tema ideacional circunstância>, só tinha essa música (p.51).
<tema simples> Uma vez <tema marcado> <tema ideacional circunstância> ele
falou assim: (p.52)
<tema múltiplo> como <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> é que uma pessoa consegue ser açougueiro? (p.53)
-- <tema simples> Até hoje <tema marcado> <tema ideacional circunstância>
com a graça de Deus nunca vomitei (p.54).
<tema múltiplo> E <tema textual> uma vez <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> os dois foram ao Jardim Zoológico, <tema simples> ela <tema
não marcado> <tema ideacional participante> pagando a própria entrada (p.54-
55).
<tema múltiplo> Assim <tema textual> pela primeira vez na vida <tema
marcado> <tema ideacional circunstância> tomou um táxi e foi para Olaria
(p.71).
<tema simples> for the past two and a half years <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> I have slowly started discovering the whys and the
wherefores (p.12).
<tema ltiplo> How <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> does one start at the beginning, if things happen before
they actually happen? (p.11)
<tema simples> In a street in Rio de Janeiro <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> I caught a glimpse of perdition on the face of a girl from the
North-east (p.12).
72
<tema simples> Unlike the reader <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, I reserve the right to be devastatingly cold, <tema múltiplo> for
<tema textual> this <tema não marcado> <tema ideacional participante> is not
simply a narrative, but above all primary life that breathes, breathes, breathes
(p.13).
<tema simples> Like every writer <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, I am clearly tempted to use succulent terms: (...) (p.15)
<tema simples> With humility <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> I confine myself (…) (p.15)
<tema múltiplo> And <tema textual> how <tema interpessoal> <tema não
marcado> <tema ideacional circunstância> does one satisfy that need? (p.16)
(…) <tema múltiplo> and <tema textual> by its very nature <tema marcado>
<tema ideacional circunstância> it is despised by everyone (p.16).
<tema simples> As for the girl <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, she exists in an impersonal limbo, untouched by what is worst or
best (p.23).
His offer <tema não marcado> <tema ideacional participante> made her
deliriously happy (bang) <tema múltiplo> for <tema textual> in the metal
factory <tema marcado> <tema ideacional circunstância> she would find her
only real connection with the world: (p.58)
<tema simples> In the meantime <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, his affair with Macabéa waned into a lukewarm routine (p.59).
<tema simples> At this point <tema marcado> <tema ideacional circunstância>
(bang), the affair between Olímpico and Macabéa came to an abrupt end (p.60).
<tema ltiplo> How <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> could there be so much sensuality in a body as
withered as hers, without her even suspecting its presence? (p.60)
<tema simples> At the outset of her affair with Olímpico <tema marcado>
<tema ideacional circunstância>, she had asked him for a small photograph,
three by four centimetres, which showed him smiling broadly and showing off
his gold tooth (p.60).
<tema simples> At that moment <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, Olímpico had an intuition, that came close to being an act of
kindness: (p.61)
<tema simples> From that moment onwards <tema marcado> <tema ideacional
circunstância>, she had studied ways and means of putting on some flesh (p.61).
Cumpre aqui fazer uma observação em relação a uma subclasse de adjunto. Como
pode ser observado acima, os exemplos Quanto à moça, ela vive num limbo impessoal,
sem alcançar o pior nem o melhor” (p.23) e As for the girl, she exists in an impersonal
limbo, untouched by what is worst or best” (p.23) possuem Temas simples, marcados e
ideacionais circunstância de assunto. Martin et al. (1997:33) consideram esta estrutura
73
como Tema Absoluto (Absolute Theme). Ambas classificações são possíveis no âmbito da
lingüística sistêmica. Optei, nesta pesquisa, pela classificação de Quanto à moça e As for
the girl como Temas ideacionais circunstância de assunto por introduzirem uma mensagem
sobre algo e/ou alguém que será retomada no Rema (cf. HALLIDAY, 1994:157-158).
Tema Ideacional Oracional
Ocorre quando uma oração hipotática reduzida ou não-reduzida no início do
período. Como o Tema ideacional oracional se manifesta anteriormente ao sujeito, este tipo
de Tema sempre será marcado.
Exemplos de Temas ideacionais oracionais:
<tema simples> Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta <tema
marcado> <tema ideacional oracional> continuarei a escrever (p.11).
<tema simples> Se esta história não existe <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, passará a existir (p.11).
<tema simples> Como eu irei dizer agora <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, esta história será o resultado de uma visão gradual (...) (p.12)
<tema simples> Se em vez de ponto fosse seguido por reticências <tema
marcado> <tema ideacional oracional> o título ficaria aberto a possíveis
imaginações vossas, porventura até malsãs e sem piedade (p.13).
<tema simples> Quando rezava <tema marcado> <tema ideacional oracional>
conseguia um oco de alma (...) (p.14)
<tema simples> Por ser ignorante <tema marcado> <tema ideacional oracional>
era obrigada na datilografia a copiar lentamente letra por letra (...) (p.15)
(...) <tema múltiplo> e <tema textual> ao escrever <tema marcado> <tema
ideacional oracional> me surpreendo um pouco (...) (p.15)
<tema simples> Enxugando as próprias lágrimas <tema marcado> <tema
ideacional oracional> tentou cantar o que ouvira. (p.51)
<tema simples> Quando ouviu <tema marcado> <tema ideacional oracional>
começara a chorar. (p.51)
<tema simples> Como era um alguém <tema marcado> <tema ideacional
oracional> , até comprou um batom cor-de-rosa. (p.54)
<tema múltiplo> Mas <tema textual> quando viu a massa compacta, grossa,
preta e roliça do rinoceronte que se movia em câmara lenta <tema marcado>
<tema ideacional oracional>, teve tanto medo que se mijou toda (p.55).
74
<tema simples> Tendo visto que seus comentários sobre bichos não agradavam
Olímpico <tema marcado> <tema ideacional oracional>, procurou outro
assunto: (p.55)
<tema múltiplo> E <tema textual> sem notar que ele próprio era de poucas
palavras como convém a um homem sério <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, disse-lhe: (p.55-56)
<tema múltiplo> Mas <tema textual> quando ele viu Glória <tema marcado>
<tema ideacional oracional>, colega da Macabéa, sentiu logo que ela tinha
classe (p.59).
<tema simples> Vendo-a <tema marcado> <tema ideacional oracional>, ele
logo adivinhou que, apesar de feia, Glória era bem alimentada (p.59).
<tema simples> So long as I have questions to which there are no answers
<tema marcado> <tema ideacional oracional>, I shall go on writing (p.11).
<tema simples> If this history does not exist <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, it will come to exist (p.11).
<tema simples> Even as I write this <tema marcado> <tema ideacional
oracional> I feel ashamed at pouncing on you with a narrative that is so open
and explicit (p.12).
<tema simples> If' there is any truth in it and clearly the story is true even
though invented <tema marcado> <tema ideacional oracional> - let everyone
see it reflected in himself (…) (p.12)
<tema simples> If, instead of a full stop, the title were followed by dotted lines
<tema marcado> <tema ideacional oracional>, it would remain open to every
kind of speculation on your part, however morbid or pitiless (p.13).
(...) <tema múltiplo> and <tema textual> as far as I know <tema marcado>
<tema ideacional oracional> they never protest (...) (p.14)
<tema simples> As I prayed <tema marcado> <tema ideacional oracional> I
emptied my soul (...) (p.14)
<tema simples> Since it was not in her nature to be downhearted <tema
marcado> <tema ideacional oracional>, she tried to carry on after Olímpico
abandoned her as if nothing had happened (p.61).
<tema simples> Since nobody wanted to give her a treat, much less become
engaged to her, <tema marcado> <tema ideacional oracional> she would give
herself a treat (p.61).
<tema simples> When she had finished <tema marcado> <tema ideacional
oracional>, she stood staring at herself in the mirror, at a face which stared back
in astonishment (p.61).
<tema simples> When she went back to her desk <tema marcado> <tema
ideacional oracional> Glória chuckled: (p.62)
<tema simples> As I said before <tema marcado> <tema ideacional oracional>,
she had no guardian angel (p.62).
<tema simples> Whenever she saw Macabéa looking more shrivelled than usual
<tema marcado> <tema ideacional oracional>, she would chide her: (p.63)
75
<tema simples> To compensate <tema marcado> <tema ideacional oracional>,
she identified with a portrait of the young Greta Garbo (p.64).
<tema simples> Although she couldn't explain it <tema marcado> <tema
ideacional oracional>, Macabéa was convinced that Garbo was the most
important woman in the world (p.64).
Tema Ideacional Predicado
Constitui-se em uma estrutura tematizada que permite ao falante selecionar um
elemento único e dar a este último um status temático enfático (THOMPSON, 2002:128).
Exemplos de Tema ideacional predicado em língua inglesa:
It’s not the technology which is wrong.
It is the second of these points that I shall be concentrating on in the rest of this
talk. (THOMPSON, 2002:128)
Exemplos de Tema ideacional predicado no português do Brasil:
As grandes enxurradas no cristalino, na região da caatinga, provocam uma corrida
de água muito rápida, pouca retenção no solo, a agricultura de ciclo anual não
vive, e é essa agricultura que alimenta o homem.
A física também tinha estagnado depois de um grande avanço, depois da física
nuclear, e não estava produzindo coisa nova. O novo vinha da genética. De fato, a
genética é que produziu uma série de transformações.
o político normalmente não gosta de ficar contra ele gosta de ir na maré,
porque ficar contra é ficar sozinho, é se isolar. [...] O intelectual, na política, rompe
mais facilmente, por isso que os outros desconfiam mais dele. (LONGHIN e
ILARI, 2000:204) (Grifos dos autores)
O Tema ideacional predicado ocorre quando uma interpretação de exclusividade
e ênfase em itens lexicais, envolvendo uma combinação de escolhas dos sistemas de
informação e de Tema. A predicação apresenta uma função adicional na linguagem escrita
que é a de direcionar o leitor a uma interpretação da estrutura de informação de um modo
intencional, que neste tipo de linguagem a proeminência tônica não é destacada
(HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004:95-97). Na predicação, o tipo de proeminência é o
temático que é “uma forma de informação nova e, portanto, o elemento ‘predicado’ carrega
o foco informativo na opção não-marcada (LONGHIN e ILARI, 2000:203). Longhin e
Ilari (2000:204) descrevem cinco tipos de orações por predicação (orações clivadas) que
76
ocorrem no português do Brasil: a clivada propriamente dita; a construção “é que”; a
construção “que”; a pseudoclivada e a “ser foco”. Os três primeiros tipos (clivada
propriamente dita; construção “é que” e construção “que”) são considerados nesta pesquisa
como Temas ideacionais predicados enquanto que os dois últimos tipos (pseudoclivada e
“ser foco”) são considerados como Temas ideacionais equativos. Por envolver uma
combinação dos sistemas de informação e de Tema, as orações com Tema ideacional
predicado não serão classificadas em Tema não marcado ou marcado. Isso se aplica
também às orações que possuem Tema ideacional equativo, Tema ideacional comentário e
Tema ideacional preposto por envolverem o mesmo tipo de combinação.
Exemplos de Temas ideacionais predicados:
<tema simples> Assim <tema ideacional predicado> é que os senhores sabem
mais do que imaginam (...) (p.12)
<tema simples> Assim <tema ideacional predicado> é que experimentarei
contra os meus hábitos uma história com começo, meio e "gran finale" seguido
de silêncio e de chuva caindo (p.13).
<tema simples> Por tudo isto <tema ideacional predicado> é que não vos dou a
vez (p.13).
(...) <tema simples> sou eu <tema ideacional predicado> que escrevo o que
estou escrevendo (p.13).
<tema simples> Assim <tema ideacional predicado> é que esta história será feita
de palavras que se agrupam em frases (...) (p.14)
(...) <tema simples> a tia <tema ideacional predicado> é que lhe dera um curso
ralo de como bater à máquina (p.15).
<tema múltiplo> e <tema textual> assim <tema textual> às vezes <tema
interpessoal> a forma <tema ideacional predicado> é que faz conteúdo (p.18).
<tema simples> Tenho <tema ideacional predicado> é que me copiar com uma
delicadeza de borboleta branca (p.20).
<tema múltiplo> E <tema textual> eu <tema ideacional predicado> é que
posso dizer assim: (...) (p.27)
<tema simples> <tema ideacional predicado> é que não piso <tema
múltiplo> pois <tema textual> tenho <tema não marcado> <tema ideacional
processo-participante> terror sem nenhuma vergonha do pardo pedaço de vida
imunda (p.30).
<tema simples> Era do nunca <tema ideacional predicado> que vinha o galo
(p.31).
77
<tema simples> Só depois <tema ideacional predicado> é que pensava com
satisfação: (...) (p.36)
<tema simples> Foi então (explosão) <tema ideacional predicado> que se
desmanchou de repente o namoro entre Olímpico e Macabéa. (p.60)
(...) <tema múltiplo> e <tema textual> é ele <tema ideacional predicado> quem
vai se casar com você! (p.77)
<tema simples> O pior <tema ideacional predicado> é que preciso perdoá-los.
(p.81)
<tema simples> it is me <tema ideacional predicado> who is writing what I am
writing (p.12).
(…) <tema múltiplo> and <tema textual> at times <tema interpessoal> it is the
form <tema ideacional predicado> that constitutes the content (p.18).
<tema simples> It is the murmuring <tema ideacional predicado> that frightens
me. (p.24)
(…) <tema simples> it was a numb sort of pain <tema ideacional predicado>
that rose from her lower abdomen, making the nipples of her breast quiver (…)
(p.44)
(…) <tema ltiplo> But <tema textual> it's only my face <tema ideacional
predicado> that's sad, because I'm really quite happy inside (p.52).
<tema simples> It is only now <tema ideacional predicado> that I have come to
understand. (p.82)
Tema Ideacional Equativo
Aparece quando uma nominalização com um elemento Qu-, muitas vezes
sinalizando contraste (BAKER, 1992:136). As orações que possuem um Tema ideacional
equativo são extensivas, porque apresentam dois participantes e verbalizam uma
identificação, o que possibilita muitas vezes a sua reversibilidade (LONGHIN e ILARI,
2000:196). O Tema ideacional equativo pode ser encontrado em uma oração pseudoclivada
ou em uma oração “ser foco”.
Exemplo de oração pseudoclivada e de oração “ser foco”:
Então, cada sociedade humana, mesmo atrasada, como Portugal ou a Grécia,
existe para preencher as condições de vida da sua população. Português come
muito, grego pobre come muito, italiano come muito; quem morre de fome é
brasileiro. (Pseudoclivada)
78
Nos meio empresarias, atualmente, existe também [...] grande coincidência no
sindicalismo moderno. Agora, eu encontro é uma certa ataraxia por parte da
classe política no sindicalismo moderno. (“ser foco”) (Longhin e Ilari,
2000:204)
Exemplos de Temas ideacionais equativos:
<tema simples> O que me atrapalha a vida <tema ideacional equativo> é
escrever (p.10).
(...) <tema múltiplo> e <tema textual> quem não tem pobreza de dinheiro <tema
ideacional equativo> tem pobreza de espírito ou saudade por lhe faltar coisa
mais preciosa que ouro (...) (p.12)
<tema simples> O que escrevo <tema ideacional equativo> é mais do que
invenção, <tema simples> é minha obrigação <tema ideacional comentário>
contar sobre essa moça entre milhares delas (p.13).
<tema múltiplo> E <tema textual> o que escrevo <tema ideacional equativo> é
uma névoa úmida (p.16).
<tema simples> O que me proponho contar <tema ideacional equativo> parece
fácil e à mão de todos (p.19).
<tema simples> A única coisa que queria <tema ideacional equativo> era viver
(p.27).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> o que doía mais <tema ideacional
equativo> era ser privada da sobremesa de todos os dias: (...) (p.28)
<tema simples> O que se segue <tema ideacional equativo> é apenas uma
tentativa de reproduzir três páginas que escrevi (...) (p.42)
<tema simples> Gostava <tema ideacional equativo> era de ver sangue. (p.46)
<tema múltiplo> Mas <tema textual> o que ela queria mesmo ser <tema
ideacional equativo> não era a altiva Greta Garbo cuja trágica sensualidade
estava em pedestal solitário <tema simples> O que ela queria <tema ideacional
equativo>, como eu já disse, era parecer com Marylin (p.64).
-- <tema simples> Essa história de regime de cachorro-quente <tema não
marcado> <tema ideacional participante> é pura neurose <tema múltiplo> e
<tema textual> o que está precisando <tema ideacional equativo> é de procurar
um psicanalista! (p.67)
<tema simples> O que sei <tema ideacional equativo> é que melodrama era o
ápice de sua vida, (...) (p.82)
<tema simples> Quem era <tema ideacional equativo> é que não sabia. (p.84)
<tema simples> What troubles my existence <tema ideacional equativo> is
writing (p.8).
<tema simples> What I am writing <tema ideacional equativo> is something
more than mere invention; (p.13).
<tema simples> The one thing she had <tema ideacional equativo> was faith
(p.25).
79
<tema simples> The only thing she desired <tema ideacional equativo> was to
live (p.27).
<tema múltiplo> But <tema textual> what pained her more <tema ideacional
equativo> was to be denied her favourite dessert: (…) (p.28).
<tema simples> The only thing <tema ideacional equativo> that can be said
about me is that I am breathing (p.38).
<tema simples> What follows <tema ideacional equativo> is merely an attempt
to reproduce three pages which I had already written (p.42).
<tema simples> The one thing he would like to have been <tema ideacional
equativo> was a bullfighter. (p.45)
<tema simples> What he liked <tema ideacional equativo> was to see blood
(p.45).
<tema simples> All I know <tema ideacional equativo> is that they were both
ingenuous and altogether insignificant (p.47).
<tema simples> What he didn't tell Macabéa <tema ideacional equativo> was
that he'd stolen it in a washroom at the factory: (…) (p.50)
<tema simples> What attracted Olímpico <tema ideacional equativo>, on the
other hand, was the sight of a butcher at work with his sharp knife (p.53).
<tema simples> What Macabéa wanted most of all <tema ideacional equativo>,
as I've already said, was to look like Marilyn Monroe (p.64).
(...) <tema simples> What you need <tema ideacional equativo> is a
psychiatrist! (p.67)
<tema múltiplo> After all <tema textual>, what I was giving <tema ideacional
equativo> was mine to give (p.73).
Tema Ideacional Preposto
Esse tipo de Tema é mais comum em situações de fala ou quando a escrita imita a
fala. Acontece quando “os falantes anunciam o Tema como um constituinte isolado e
substituem-no por um pronome na oração seguinte” (VENTURA e LIMA-LOPES, 2002).
Este constituinte isolado pode também ser recuperado por meio de sua repetição na oração
que vem logo em seguida. Segundo Thompson (2002:130), este tipo de Tema ocorre
grande parte das vezes em orações declarativas, mas também pode ocorrer em orações
interrogativas. Thompson (2002:130) também afirma que o Tema ideacional preposto é
normalmente um elemento nominal que tem a função de sujeito.
80
Exemplos de Temas ideacionais prepostos:
<tema múltiplo> E <tema textual> as galinhas <tema ideacional preposto>, que
faziam elas? (p.33)
<tema múltiplo> E <tema textual> a ma <tema ideacional preposto>,
bastou-lhe vê-lo para torná-lo imediatamente sua goiabada-com-queijo (p.43).
<tema simples> Greta Garbo <tema ideacional preposto>, pensava ela sem se
explicar, essa mulher deve ser a mulher mais importante do mundo (p.64).
Tema Ideacional Atributivo Preposto
O Tema Ideacional Atributivo Preposto constitui-se em um atributo do sujeito
deslocado para o início da sentença, localizando-se antes do sujeito (THOMPSON,
2002:140-141).
Exemplos de Temas ideacionais atributivos prepostos:
Pensava <tema marcado> <tema ideacional processo> a nordestina. <tema
simples> Deitada <tema marcado> <tema ideacional atributivo preposto>, não
sabia (p.31).
<tema simples> A música <tema não marcado> <tema ideacional participante>
era um fantasma pálido como uma rosa que é louca de beleza mas mortal: <tema
múltiplo> pálida e mortal <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto> a moça era hoje o fantasma suave e terrificante de uma infância sem
bola nem boneca (p.33).
<tema múltiplo> Então <tema textual> aflita <tema marcado> <tema ideacional
atributivo preposto> ela lhe disse: (...) (p.56)
<tema múltiplo> Mas <tema textual> mesmo oxigenada <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto> ela era loura, o que significava um degrau a mais
para Olímpico (p.59).
<tema simples> Surpreendido <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, Olímpico, sem entender, deu algumas gargalhadas (p.61).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> teimosa <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto> não vomitou para não desperdiçar o luxo do
chocolate (p.66).
<tema ltiplo> Então <tema textual> ali deitada <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto> teve uma úmida felicidade suprema, pois ela
nascera para o abraço da morte (p.84).
<tema simples> Deitada, morta <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, era tão grande como um cavalo morto (p.86).
81
<tema simples> More actor than writer, for with only one system of
punctuation at my disposal <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, I juggle with intonation and force another's breathing to accompany
my text (p.22-23).
<tema simples> Lost in thought <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, she examined the blotches on her face in the mirror (p.26).
<tema simples> Pale and feeling weak <tema marcado> <tema ideacional
atributivo preposto>, I tremble just like her (p.29).
<tema simples> Pale and transient <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, the girl was now the sweet and horrifying spectre of a childhood
without games or dolls (p.32).
<tema simples> Not desperate <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, <tema ltiplo> for <tema textual> she <tema não marcado> <tema
ideacional participante> was much too modest and simple to indulge in despair,
(…) (p.34)
<tema simples> Composed of fine organic matter <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto>, she existed (p.38).
<tema simples> Abashed <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, I shall try to relate the story of the story (p.42).
<tema simples> Aggressive as a fighting cock <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto>, Olímpico bristled at her foolish questions, to
which he Could provide no answers (p.44).
<tema simples> Deeply wounded <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, Macabéa replied: (…) (p.56)
<tema simples> Surprised and puzzled <tema marcado> <tema ideacional
atributivo preposto>, Olímpico went into hoots of laughter (p.61).
<tema múltiplo> Already <tema interpessoal> addicted to advertisements <tema
marcado> <tema ideacional atributivo preposto>, she had read about cod liver
oil (p.61).
<tema simples> Conscious of her mulatta sex appeal <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto>, she painted in a beauty spot above her lips, to
add a touch of glamour to the bleached hairs around her mouth (p.64).
<tema simples> Faced with this sudden offer of help <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto>, Macabéa, who never remembered to ask for
anything, asked her boss for time off by pretending she had toothache (p.71).
<tema simples> Mindful of her own frail existence <tema marcado> <tema
ideacional atributivo preposto>, she cautiously sipped the cold coffee which
tasted quite bitter (p.71).
<tema simples> Laid out and dead <tema marcado> <tema ideacional atributivo
preposto>, Macabéa looked as imposing as a dead stallion (p.85).
82
Em relação à identificação e extensão do Tema nestes casos de Tema ideacional
atributivo preposto, consideremos o seguinte exemplo: “Laid out and dead, Macabéa
looked as imposing as a dead stallion”. Thompson (2002:140-141) classificaria o Tema
desta oração como: “Laid out and dead, Macabéa”, ou seja, este autor incluiria o sujeito,
porque o atributo expressa uma relação de dependência com o grupo nominal, o que faz
deste último o verdadeiro ponto de partida da oração. Porém, uma classificação na qual
inclui-se somente o atributo preposto “Laid out and dead”. Segundo Halliday (1994:53),
em termos de organização temática, a classificação do Tema não excede o primeiro item
ideacional. Como nesta oração o primeiro item ideacional é o atributo, então ele é o Tema
da mesma. Assim como North (2003:147), utilizamos uma categoria descrita por
Thompson (2002:140-141), mas fazemos uma interpretação diferente, como a apresentada
acima, quanto à extensão do Tema.
Tema Ideacional Comentário
Constitui um comentário do escritor ou falante, a respeito do valor ou validade do
que será dito a seguir. Assemelha-se ao Tema ideacional predicado no que tange ao fato de
que o verdadeiro sujeito encontra-se na segunda oração. Difere do mesmo porque o
comentário não é um componente de significado da oração seguinte, o que impossibilita
reescrever orações com Tema ideacional comentário em uma única oração (THOMPSON,
2002:129). Orações com Tema ideacional comentário compõem-se do processo ser, do
atributo e de um sujeito, por exemplo:
Bem, é verdade que também eu não tenho piedade do meu personagem
principal, a nordestina (...) (p.13)
No exemplo acima, “é” corresponde ao processo ser, “verdade” é o atributo e “eu”
refere-se ao sujeito da segunda oração.
83
ainda casos especiais de Tema ideacional comentário. Downing e Locke
(2002:261-262) relatam que alguns grupos nominais e processos tais como seem, appear,
happen, look as if podem funcionar como comentários.
Exemplos de casos especiais de Tema ideacional comentário:
(...) é minha obrigação contar sobre essa moça entre milhares delas. (p.13)
Parece que estou mudando de modo de escrever. (p.17)
No primeiro exemplo acima, o comentário é um grupo nominal. Já no segundo
exemplo, o comentário é um processo.
Além disso, Halliday (1994:355) afirma que o Tema ideacional comentário também
pode ter a função de uma representação metafórica de modalidade, pois o Tema ideacional
comentário é uma maneira pela qual os falantes/usuários da linguagem expressam suas
opiniões. Nesta dissertação, foi feita uma leitura congruente dos Temas ideacionais
comentário sem considerar esta representação metafórica que estes Temas apresentam.
Em português, freqüentemente o comentário na forma de atributo não apresenta o
processo “ser”. Apesar da ausência de tal processo, estas estruturas são ainda Temas
ideacionais comentário, por exemplo:
Claro que era neurótica, não há sequer necessidade de dizer (p.34).
O exemplo logo acima mostra um Tema ideacional comentário que não apresenta o
processo “ser”.
Exemplos de Temas ideacionais comentário:
<tema múltiplo> Bem <tema textual>, é verdade <tema ideacional comentário>
que também eu não tenho piedade do meu personagem principal, a nordestina
(...) (p.13)
<tema simples> O que escrevo <tema ideacional equativo> é mais do que
invenção, <tema simples> é minha obrigação <tema ideacional comentário>
contar sobre essa moça entre milhares delas. (p.13)
<tema simples> É claro <tema ideacional comentário> que, como todo escritor,
tenho a tentação de usar termos suculentos: (...) (p.14-15)
<tema simples> Parece <tema ideacional comentário> que estou mudando de
modo de escrever. (p.17)
84
<tema múltiplo> Não <tema textual> , não <tema interpessoal> é fácil <tema
ideacional comentário> escrever. (p.19)
(...) é verdade <tema ideacional comentário> que também queria alcançar uma
sensação fina e que esse finíssimo não se quebrasse em linha perpétua (p.20).
-- Ah, essa não <absoluto> ! <tema simples> É tão bom <tema ideacional
comentário> estar aqui montado como estou que nunca mais vou sair de você!
(p.22)
<tema múltiplo> Claro <tema ideacional comentário> que era neurótica, <tema
múltiplo> não <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema ideacional
processo> sequer necessidade de dizer (p.34).
<tema simples> Verdade que <tema ideacional comentário> nunca achara modo
de aplicar essa informação (p.37).
<tema simples> É melhor <tema ideacional comentário> eu não falar em
felicidade ou infelicidade (...) (p.60)
(<tema simples> parece-me <tema ideacional comentário> que esse Deus era
muito misericordioso com ela: <tema simples> dava <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante> -lhe o que lhe tirava) (p.63)
-- <tema simples> Claro <tema ideacional comentário> que é! (p.68)
<tema múltiplo> o <tema interpessoal> foi difícil <tema ideacional
comentário> achar o endereço da madama Carlota (...) (p.71)
<tema simples> Estava <tema não marcado> <tema ideacional processo-
participante> meio bêbada, <tema múltiplo> não <tema interpessoal> sabia
<tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> o que pensava,
<tema simples> parecia <tema ideacional comentário> que lhe tinham dado um
forte cascudo na cabeça de ralos cabelos, <tema simples> sentia-se <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> tão desorientada como se lhe
tivesse acontecido uma infelicidade. (p.78)
<tema simples> É necessário <tema ideacional comentário> chegar a tal nada
que indiferentemente se ame ou não se ame o criminoso que nos mata (p.81).
<tema simples> It is true <tema ideacional comentário> that I, too, feel no pity
for my main character, the girl from the North-east: (…) (p.13)
<tema simples> It is also true <tema ideacional comentário> that I have
attempted to acquire a certain refinement of feeling (…) (p.20)
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante>
wanted more, <tema múltiplo> for <tema textual> it is true <tema ideacional
comentário> that when one extends a helping hand to the lower orders, <tema
simples> they <tema não marcado> <tema ideacional participante> want
everything else; (p.35)
<tema simples> It 's much too early <tema ideacional comentário> to say, <tema
múltiplo> but <tema textual> I <tema não marcado> <tema ideacional
participante> am hopeful (p.39).
<tema simples> It was futile <tema ideacional comentário> trying to struggle
(p.40).
85
<tema simples> She <tema não marcado> <tema ideacional participante>
became overwrought <tema múltiplo> and <tema textual> it was painful <tema
ideacional comentário> to live (p.44).
<tema simples> It 's now clear <tema ideacional comentário> that Olímpico was
by no means ingenuous, however much the universal victim. <tema simples> It
's now clear to me <tema ideacional comentário> that he was wicked to the core
(p.47).
<tema simples> It was exciting <tema ideacional comentário> to look down the
well (p.49).
<tema simples> It was so difficult <tema ideacional comentário> to think (p.54).
<tema simples> It's enough <tema ideacional comentário> to make anyone lose
their appetite (p.60).
<tema simples> It is better <tema ideacional comentário> not to speak of
happiness or unhappiness (…) (p.60)
(…) <tema múltiplo> and <tema textual> it was quite obvious <tema ideacional
comentário> that she didn't wash much (p.63).
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> then
gave up the brothel <tema múltiplo> for <tema textual> it wasn't easy <tema
ideacional comentário> looking after all those girls who spent most of their time
cheating me out of money (p.72).
Tema Ideacional Elíptico
O Tema ideacional elíptico pode se manifestar através da elipse anafórica ou
exofórica. Na elipse anafórica, a sentença que possui este tipo de Tema pressupõe somente
uma parte da oração antecedente. Já na elipse exofórica, a oração não pressupõe nenhuma
informação da oração anterior. Assim o sujeito e, muitas vezes, o finito são compreendidos
a partir do contexto. Neste tipo de elipse, a oração possui estrutura temática, mas é somente
um Rema (HALLIDAY, 1994:63). Segundo Thompson (2002:152), em relação a Temas ou
Remas elípticos, o elemento ausente pode ser recuperado por meio da situação (isto é, pode
ser fornecido pelo texto “exterior”) ou pode ser remetido à mensagem anterior. Nesta
dissertação, na elipse anafórica, o Tema ideacional elíptico será não marcado ou marcado
se o Tema anterior expresso for não marcado ou marcado. Na elipse exofórica, o Tema
ideacional elíptico será não marcado.
Exemplo de Tema ideacional elíptico anafórico:
86
Depois na certa escreverei algo alegre, embora alegre por quê? Ø Porque
também sou um homem de hosanas e um dia, quem sabe, cantarei loas que não
as dificuldades da nordestina. (p.19)
No exemplo acima, um Tema ideacional elíptico em “Porque também sou um
homem de hosanas e um dia, quem sabe, cantarei loas que não as dificuldades da
nordestina”. Esta oração pode ser reescrita da seguinte maneira: “Depois na certa escreverei
algo alegre porque também sou um homem de hosanas e um dia, quem sabe, cantarei loas
que não as dificuldades da nordestina”. Assim como o Tema da oração anterior é ideacional
circunstância e marcado (“Depois”), o Tema ideacional elíptico torna-se marcado também.
Exemplo de Tema ideacional elíptico exofórico:
“I feel awfully tired.”
“You’re suffering from shock.”
“Yes, that’s it, I suppose I am.”
“Better go home and rest.” (THOMPSON, 2002:153)
O diálogo transposto acima mostra que o Tema ideacional elíptico é identificável
por meio do contexto. “You’d” são os elementos elípticos em “Better go home and rest”,
sendo que “You” é o Tema ideacional elíptico não marcado. Segundo Halliday (1994:63),
este Tema ideacional elíptico (“You”) é exofórico, porque ele é recuperável através da
estrutura retórica da situação onde há os papéis de falante e ouvinte (“I” e “You”).
Exemplos de Temas ideacionais elípticos:
<tema múltiplo> Sobretudo <tema textual> dedico-me <tema não marcado>
<tema ideacional processo-participante> às vésperas de hoje e a hoje, ao
transparente véu de Debussy, a Marlos Nobre, a Prokofiev, a Carl Orff, a
Schönberg, aos dodecafônicos, aos gritos rascantes dos eletrônicos - <tema
múltiplo> a todos esses que em mim atingiram zonas assustadoramente
inesperadas <tema não marcado> <tema ideacional elíptico> (p.9).
<tema múltiplo> e <tema textual> esse oco <tema não marcado> <tema
ideacional participante> é o tudo que posso eu jamais ter. <tema múltiplo> Mais
do que isso, nada <tema não marcado> <tema ideacional elíptico> (p.14).
<tema múltiplo> E <tema textual> a moça <tema não marcado> <tema
ideacional participante> ganhara uma dignidade: <tema simples> era <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> enfim datilógrafa. <tema
simples> Embora, ao que parece, não aprovasse na linguagem duas consoantes
juntas e copiava a letra linda e redonda do amado chefe a palavra “designar” de
modo como em língua falada diria: "desiguinar" <tema não marcado> <tema
ideacional elíptico> (p.15).
87
<tema simples> Voltando a mim <tema marcado> <tema ideacional oracional>:
o que escreverei não pode ser absorvido por mentes que muito exijam e ávidas
de requintes. <tema múltiplo> Pois <tema textual> o que estarei dizendo <tema
não marcado> <tema ideacional participante> será apenas nu. <tema múltiplo>
Embora tenha como pano de fundo– e agora mesmo a penumbra atormentada
que sempre nos meus sonhos quando de noite atormentado durmo <tema não
marcado> <tema ideacional elíptico>. (p.16)
<tema múltiplo> Não <tema interpessoal> tenho <tema o marcado>
<tema ideacional processo-participante> medo nem de chuvas
tempestivas nem das grandes ventanias soltas, <tema múltiplo> pois
<tema textual> eu <tema não marcado> <tema ideacional participante>
também sou o escuro da noite. <tema múltiplo> Embora não agüente
bem ouvir um assovio no escuro, e passos <tema não marcado> <tema
ideacional elíptico>. (p.18)
<tema ltiplo> Pois <tema textual> tenho <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> que tornar nítido o que está quase apagado e
que mal vejo. <tema ltiplo> Com mãos de dedos duros enlameados apalpar o
invisível na própria lama. <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>
(p.19)
<tema simples> Depois <tema marcado> <tema ideacional circunstância> na
certa escreverei algo alegre, embora alegre por quê? <tema simples> Porque
também sou um homem de hosanas e um dia, quem sabe, cantarei loas que não
as dificuldades da nordestina <tema marcado> <tema ideacional elíptico>
(p.19).
<tema múltiplo> Por que <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> escrevo sobre uma jovem que nem pobreza enfeitada
tem? <tema múltiplo> Talvez <tema interpessoal> porque nela haja um
recolhimento <tema não marcado> <tema ideacional elíptico> <tema múltiplo>
e <tema textual> também <tema textual> porque na pobreza de corpo e espírito
eu toco na santidade, eu que quero sentir o sopro do meu além <tema não
marcado> <tema ideacional elíptico> (p.21).
<tema múltiplo> Mas <tema textual> por que <tema interpessoal> <tema não
marcado> <tema ideacional circunstância> estou me sentindo culpado? <tema
múltiplo> E <tema textual> procurando aliviar-me do peso de nada ter feito de
concreto em benefício da moça <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>
(p.23).
(...) <tema simples> é <tema não marcado> <tema ideacional processo> que
também considerava de dever seu evitar que a menina viesse um dia a ser uma
dessas moças que em Maceió ficavam nas ruas de cigarro aceso esperando
homem. <tema simples> Embora a menina não tivesse dado mostras de no
futuro vir a ser vagabunda de rua <tema não marcado> <tema ideacional
elíptico> (p.28).
-- <tema múltiplo> E <tema textual> , se me permite <tema marcado> <tema
ideacional oracional>, qual é mesmo a sua graça?
-- <tema simples> Macabéa <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>
(p.43).
<tema simples> Numa das vezes em que se encontraram <tema marcado> <tema
ideacional circunstância> ela afinal perguntou-lhe o nome.
-- <tema simples> Olímpico de Jesus Moreira Chaves <tema não marcado>
<tema ideacional elíptico> <tema simples> mentiu <tema marcado> <tema
88
ideacional processo> ele porque tinha como sobrenome apenas o de Jesus,
sobrenome dos que não têm pai (p.44).
<tema múltiplo> Às vezes <tema interpessoal> a graça <tema não marcado>
<tema ideacional participante> a pegava em pleno escritório. <tema múltiplo>
Então <tema textual> ela <tema não marcado> <tema ideacional participante> ia
ao banheiro para ficar sozinha. <tema múltiplo> De e sorrindo a passar
<tema não marcado> <tema ideacional elíptico> (<tema simples> parece <tema
não marcado> <tema ideacional processo> -me que esse Deus era muito
misericordioso com ela: <tema simples> dava <tema não marcado> <tema
ideacional processo-participante> -lhe o que lhe tirava). <tema múltiplo> Em
pensando em nada, os olhos moles <tema não marcado> <tema ideacional
elíptico> (p.63).
<tema múltiplo> E <tema textual> nem <tema textual> as pessoas ali presentes
<tema não marcado> <tema ideacional participante> sabiam. <tema múltiplo>
Embora por via das dúvidas algum vizinho tivesse pousado junto do corpo uma
vela acesa <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>. (p.82)
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> dedicate
it to the tempest of Beethoven. <tema simples> To the vibrations of Bach's
neutral colours <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>. <tema
simples> To Chopin who leaves me weak <tema não marcado> <tema
ideacional elíptico>. <tema simples> To Stravinsky who terrifies me <tema não
marcado> <tema ideacional elíptico> <tema múltiplo> and <tema textual>
makes <tema não marcado> <tema ideacional processo-participante> me soar in
flames. <tema simples> To Death and Transfiguration in which Richard Strauss
predicts my fate <tema não marcado> <tema ideacional elíptico> (p.7).
<tema simples> It <tema não marcado> <tema ideacional participante> is an
unfinished book because it offers no answer. <tema simples> An answer I hope
someone somewhere in the world may be able to provide <tema não marcado>
<tema ideacional elíptico> (p.8).
<tema ltiplo> How <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> does one start at the beginning, if things happen before
they actually happen? <tema simples> If before the pre-prehistory there already
existed apocalyptic monsters <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>?
(p.11)
<tema simples> Even as I write this <tema marcado> <tema ideacional
oracional> I feel ashamed at pouncing on you with a narrative that is so open
and explicit. <tema simples> A narrative, however, from which blood surging
with life might flow only to coagulate into lumps of trembling jelly <tema
marcado> <tema ideacional elíptico> (p.12).
<tema simples> This <tema não marcado> <tema ideacional participante>, too,
is my first condition; <tema simples> to proceed slowly notwithstanding my
impatience to tell you about this girl <tema não marcado> <tema ideacional
elíptico> (p.16).
<tema simples> Coming back to myself <tema marcado> <tema ideacional
oracional> what I am about to write cannot be assimilated by minds that expect
much and crave sophistication. <tema múltiplo> For <tema textual> what I am
about to express <tema não marcado> <tema ideacional participante> will be
quite stark. <tema múltiplo> Although it may have as its background - even now
- the tormented shadows that haunt my dreams as I sleep tormented at night
<tema não marcado> <tema ideacional elíptico>. (p.16)
89
<tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> am not
afraid of tempestuous storms or violent gales <tema múltiplo> for <tema
textual> I <tema não marcado> <tema ideacional participante> am also the
night's darkness. <tema simples> Even though I cannot bear to hear whistling or
footsteps in the dark <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>. (p.18)
(<tema simples> It 's my obsession <tema ideacional comentário> to become the
other man. <tema simples> In this case, the other woman <tema não marcado>
<tema ideacional elíptico>. <tema simples> Pale and feeling weak <tema
marcado> <tema ideacional atributivo preposto>, I tremble just like her.) (p.29)
<tema simples> There was <tema não marcado> <tema ideacional processo> no
music, only a constant ping like drops of falling rain - <tema simples> a drop for
every minute that passed <tema não marcado> <tema ideacional elíptico>
(p.37).
<tema simples> The only thing <tema não marcado> <tema ideacional
predicado> that can be said about me is that I am breathing.
<tema simples> Even though all she possessed within was that tiny essential
flame: the breath of life <tema não marcado> <tema ideacional elíptico> (p.38).
<tema ltiplo> How <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional circunstância> can I tell? <tema múltiplo> Not even <tema
interpessoal> those onlookers <tema não marcado> <tema ideacional
participante> could tell. <tema múltiplo> Although someone from a nearby
house, suspecting that she might be dying, placed a lit candle beside her body
<tema não marcado> <tema ideacional elíptico>. (p.81)
Como pode ser observado pelos exemplos acima, o Tema ideacional elíptico é um
fenômeno recorrente no corpus.
Segundo Halliday (1994:63), ainda certas estruturas que não apresentam
transitividade e modo oracional; portanto, não apresentam a estrutura Tema-Rema. Sendo
assim, são classificadas como tendo a função de Absolutos (Halliday, 1994:96). Cabe
relembrar aqui que, nesta pesquisa, Absoluto é um termo escolhido para se designar
orações que não possuem modo oracional ou transitividade e que esta denominação não
coincide com o que Martin et al. (1997:33) consideram Temas Absolutos (e que
consideramos como Temas ideacionais circunstância de assunto). Seguindo a proposta
hallidayana, a diferença entre Tema ideacional elíptico e Absoluto consiste no fato de que
no primeiro formas de recuperar a estrutura elidida enquanto que no segundo não
aparentemente elemento elidido. Os absolutos serão considerados na análise da organização
temática desta pesquisa por exercerem um papel relevante na coesão do texto. Além disso,
90
torna-se importante que se faça uma ressalva aqui no que tange às interpretações de
absolutos nesta dissertação, ressaltando que as mesmas são passíveis de outras análises.
Exemplos de Absolutos:
Os dois juntos <absoluto> - <tema simples> sou eu <tema ideacional
predicado> que escrevo o que estou escrevendo (p.11).
-- Ah, essa não <absoluto> ! <tema simples> É <tema não marcado> <tema
ideacional processo> tão bom estar aqui montado como estou que nunca mais
vou sair de você! (p.22)
<tema simples> A moça <tema não marcado> <tema ideacional participante>
tinha ombros curvos como os de uma cerzideira. (...) Cerzideirinha mosquito
<absoluto>. (p.26)
Os gordos ratos da rua do Acre <absoluto>. <tema simples> <tema
ideacional predicado> é que não piso (...) (p.30)
Rua do Acre para morar <absoluto>, rua do Lavradio para trabalhar <absoluto>,
cais do porto para ir espiar no Domingo <absoluto> , um ou outro prolongado
apito de navio cargueiro que não se sabe por que dava aperto no coração, um ou
outro delicioso embora um pouco doloroso cantar de galo <absoluto> (p.31).
Por Deus! <absoluto> <tema simples> eu <tema não marcado> <tema
ideacional participante> me dou melhor com os bichos do que com gente (p.32).
<tema simples> Às vezes <tema interpessoal> lembrava-se <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> de uma assustadora canção
desafinada de meninas brincando de roda de mãos dadas <tema simples> ela
<tema não marcado> <tema ideacional participante> só ouvia sem participar
porque a tia a queria para varrer o chão. As meninas de cabelos ondulados com
laço de fita cor-de-rosa <absoluto> (p.32-33).
Que pele <absoluto>, que nada <absoluto>, <tema simples> ela <tema não
marcado> <tema ideacional participante> o comeria, isso sim, às colheradas no
pote mesmo (p.38).
-- <tema simples> Nessa rádio <tema marcado> <tema ideacional
circunstância> eles dizem essa coisa de 'cultura' e palavras difíceis, <tema
múltiplo> por exemplo <tema textual> : o que <tema interpessoal> <tema não
marcado> <tema ideacional participante> quer dizer "eletrônico"?
Silêncio <absoluto>.
-- <tema simples> Eu <tema não marcado> <tema ideacional participante> sei
<tema múltiplo> mas <tema textual> não <tema interpessoal> quero <tema não
marcado> <tema ideacional processo-participante> dizer (p.50).
-- <tema simples> Eu <tema não marcado> <tema ideacional participante> acho
que até sei cantar essa música. Lá-lá-lá-lá-lá <absoluto> (p.51).
-- Mas puxa vida <absoluto>! <tema simples> Você <tema não marcado> <tema
ideacional participante> não abre o bico e nem tem assunto! (p.56)
The right to protest <absoluto>. (p.9)
-- Oh no! <absoluto> <tema simples> It <tema não marcado> <tema ideacional
processo> 's so comfortable up here that I intend to stay put! (p.21)
91
What a thin slice of water melon <absoluto>. (p.27)
Acre Street <absoluto>. What a slum <absoluto>. The plump rats of Acre Street
<absoluto>. <tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional
participante> keep well away from the place. (p.30)
Acre Street for living <absoluto>, Lavradio Street for working <absoluto>, the
docks for excursions on Sundays <absoluto>. Now and then the lingering sound
of a cargo ship's signal that strangely made the heart beat faster, and in between
each signal, the consoling though somewhat melancholy cries of the cockerel
<absoluto> (p.30-31).
<tema simples> One of the girls <tema não marcado> <tema ideacional
participante> sold Coty face powder. What a curious occupation! <absoluto>
(p.31)
<tema múltiplo> Sometimes <tema interpessoal> before falling asleep <tema
marcado> <tema ideacional circunstância> she felt the pangs of hunger <tema
múltiplo> and <tema textual> became <tema não marcado> <tema ideacional
processo-participante> quite giddy as she visualized a side of beef. <tema
simples> The solution <tema não marcado> <tema ideacional participante> was
to chew paper into pulp and swallow it. Honestly! <absoluto> (p.31)
Dear God! <absoluto> <tema simples> I <tema não marcado> <tema ideacional
participante> feel happier with animals than with people (p.31).
(...) <tema múltiplo> But <tema textual> I <tema não marcado> <tema
ideacional participante> shall continue.
To continue <absoluto>: (...) (p.36)
<tema múltiplo> Nothing <tema interpessoal> <tema não marcado> <tema
ideacional participante> could be done about the great clock that marked time
within time. Yes, to my exasperation, the same hour <absoluto> (p.40).
<tema simples> On the morning of the seventh of May <tema marcado> <tema
ideacional circunstância>, an unforeseen ecstasy gripped her tiny body. <tema
simples> The bright, open light from the streets <tema não marcado> <tema
ideacional participante> penetrated her opacity. May, the month of bridal Veils
floating in clouds of white <absoluto> (p.42).
Observe os exemplos abaixo:
Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos - sou eu que escrevo o que
estou escrevendo. (p.11)
Os gordos ratos da rua do Acre. é que não piso pois tenho terror sem
nenhuma vergonha do pardo pedaço de vida imunda. (p.30)
Além de absolutos, “Os dois juntos” e “Os gordos ratos da rua do Acre” podem ser
considerados tópicos, seguidos de comentários (PONTES, 1987:52). Dessa maneira, Pontes
(1987:52-59) explica que a ocorrência de tópicos no português do Brasil é muito comum,
mas que é uma característica da linguagem oral. Nesse sentido, o termo Absoluto como
92
utilizado por Halliday se aproxima do uso feito por Martin et al., mas cumpre lembrar que
Absoluto aqui é uma categoria mais ampla.
Neste capítulo, foram apresentadas as teorias que servem de base para esta
dissertação. Resumindo os principais critérios para a classificação temática, o Tema pode
ser:
Quanto à presença de elementos vinculados às três metafunções dentro da
oração: Simples ou Múltiplo;
Segundo as metafunções às quais se vincula: Textual ou Interpessoal ou
Ideacional;
Quanto ao fato de o Tema ideacional ser mais ou menos usual tendo em
vista o padrão SVO: Não Marcado ou Marcado.
Cabe salientar que no tocante à estrutura temática dentro de uma oração, o Tema
ideacional sempre ocorre enquanto que os Temas textuais e interperssoais não são pré-
requesitos para a realização de tal estrutura, apesar de sua importância para a tessitura e
estabelecimento de interação em um texto.
No capítulo seguinte, será abordada a metodologia deste trabalho e os
procedimentos adotados a fim de coletar os dados quantitativos. Antes, porém, serão
abordados alguns aspectos do corpus sob o ponto de vista literário, além de um breve
histórico da autora e do tradutor.
A hora da estrela will
undoubtedly be considered a
small masterpiece, profoundly
perspective, witty and moving.
Here Clarice is at her most
challenging. The dialogue
which permeates the whole
novel is remarkable. (…)
Translating this book was a
singular experience for me. The
text virtually possessed me and
the translation seemed to
progresss of its own accord. At
times, I had the strange feeling
of bleeding inside: as if I were
sharing some mystical
experience perhaps even
something supernatural. I have
never felt so close to a writer as
I did during this translation
which I completed in record
time, carried along by the text
itself.
Giovanni Pontiero, Patricia
Bins talks to Giovanni Pontiero
“Giovanni Pontiero, translator
of Drummond, Lispector,
Bandeira, Nélida, Lygia
Fagundes Telles”
O CORPUS E A METODOLOGIA
95
2. O CORPUS E A METODOLOGIA
Este capítulo diz respeito à descrição do corpus do ponto de vista literário,
acrescido de dados biográficos da escritora e do tradutor, além de explicar a metodologia
adotada nesta dissertação.
2.1 O corpus
Como foi assinalado, a pesquisa aqui proposta consiste no estudo da organização
temática na novela A hora da estrela de Clarice Lispector e sua tradução para o inglês, The
hour of the star, por Giovanni Pontiero. Esta pesquisa é um estudo textual com base em
dados obtidos através de recursos da metodologia dos estudos de corpora analisados sob a
perspectiva da gramática sistêmico-funcional. Como o texto fonte é em português e o texto
alvo é em inglês e a relação entre ambos é de original-tradução, o tipo deste corpus é
paralelo (BAKER, 1995:230-231).
Este corpus foi investigado por outros pesquisadores como, por exemplo,
Baubeta (1997). A pesquisadora focaliza a tradução do ponto de vista literário, observando
no texto fonte quais aspectos distintivos da técnica narrativa clariceana e escolha de itens
lexicais poderiam causar alguns problemas para o tradutor. Ela conclui que o tradutor tende
a explicar o texto fonte em sua re-textualização, talvez em função de sua consciência em
relação ao público alvo. Baubeta (1997:282) também conclui que Pontiero raramente
comprometeu o significado do original e fez poucas omissões, destacando-se seu trabalho
pioneiro em “descobrir”, traduzir, mas não “colonizar” o texto fonte, possibilitando assim
que os leitores de língua inglesa tivessem acesso a uma obra seminal da literatura brasileira.
Nélia Scott (1998 apud SCOTT, 2001) também realizou uma pesquisa com o
mesmo corpus utilizado nesta dissertação e, neste caso, sob uma perspectiva lingüística.
Sua pesquisa será explicada na seção 2.2.1. deste capítulo.
96
Antes, apresento alguns dados biográficos da escritora e do tradutor,
complementados com uma breve análise do corpus do ponto de vista literário,
contemplando a relação de Clarice Lispector e Giovanni Pontiero com a obra.
2.1.1 Clarice Lispector e A hora da estrela
Clarice Lispector nasceu na Ucrânia em 1925, ou em 1920, de acordo com outros
pesquisadores. Naturalizou-se brasileira em 1943. Morreu em 1977, meses após a
publicação de A hora da estrela, sua última obra publicada em vida. (GUIDIN,
1994:8,12,19)
A escritora publicou contos, romances, poemas, crônicas e até livros infantis. Além
da produção literária, Clarice Lispector iniciou-se no jornalismo e na tradução quando
cursava Direito no Rio de Janeiro. No conjunto de sua obra, A hora da estrela figura entre
os seus livros mais conhecidos e aclamados. (GUIDIN, 1994:6,12,19)
Segundo Guidin (1994:27), em função da complexidade da escrita clariceana,
alguns livros da escritora são difíceis de ser enquadrados dentro de algum gênero literário,
como é o caso de A hora da estrela. Nesta dissertação de mestrado, este livro será
denominado de novela por concordar com a própria definição de Lispector, o que também
faz que esta obra esteja localizada em um limite tênue entre o conto e o romance (GUIDIN,
1994:27).
Em seu único depoimento concedido à TV em janeiro de 1977, Clarice Lispector
conta ao jornalista Júlio Lerner que acabara de escrever uma novela, no caso A hora da
estrela, dando logo em seguida um breve resumo da obra:
É a história de uma ma nordestina, de Alagoas, tão pobre que só comia
cachorro-quente. A história não é isso, não. A história é de uma inocência
pisada, de uma miséria anônima (LERNER, 1992 apud GUIDIN, 1994:18).
97
Toda essa “inocência pisada” e essa “miséria anônima” concentram-se na
protagonista e heroína (ou anti-heroína?) da novela Macabéa. Ela é o instrumento que o
narrador Rodrigo S.M. utiliza para falar de si mesmo, o que o torna também personagem da
história. Esta relação interativa constitui-se em um foco narrativo onde há o entrelaçamento
de um narrador na primeira pessoa do discurso com sua narrativa na terceira pessoa.
Segundo Sá (2000:269-274), apesar de o narrador ter-se apaixonado pelos fatos de
sua história, ele acaba por achá-los banais, importando-se mesmo com “os sussurros por
entre eles”. Tenta seguir o tempo cronológico e linear, mas após muitas hesitações, sua
história realmente começa no meio, quando Macabéa é quase despedida de seu emprego.
Ainda de acordo com (2000:269-274), o narrador propõe uma narrativa que é simples,
sabendo que a simplicidade de sua história não impede que ela também seja árdua. Rodrigo
S.M. é um narrador que se identifica tanto com sua protagonista que acaba “morrendo”
com ela. (SÁ, 2000:269-274)
Além de apresentar um narrador-personagem e uma protagonista marcantes, A hora
da estrela é uma novela meta-literária, que, em suas páginas, momentos em que os
questionamentos quanto ao ofício do escritor, aos sentimentos advindos do ato da escrita
vêm à tona. Esta novela também contribui para a reflexão das questões sociais e femininas
por meio de Macábea, uma nordestina pobre e marginalizada, que queria mesmo ter alguma
satisfação na vida sem saber ao certo como alcançar isso. Segundo Guidin (1994:37, 56-
57), a escritora reflete sobre a migração do nordestino e sua adaptação ao eixo urbano no
sudeste do país por meio da personagem Macabéa. Através do narrador-personagem, a
presença de Macabéa denuncia um problema social, apesar de ela ser desprovida de
consciência política e ocupar um lugar inexpressivo diante da sociedade, representado pelo
seu silêncio e pela sua ignorância. Além disso, Macabéa torna-se também um instrumento
para a análise da “constituição da feminilidade”, pois, mesmo “carente de introspecção e
98
consciência”, ela é atormentada pela solidão, apaixona-se por um homem e deseja o que
não tem.
2.1.2 Giovanni Pontiero e The hour of the star
Giovanni Pontiero nasceu em 1932 em Glasgow (Escócia) e morreu em 1996 em
Manchester (Inglaterra). Estudou na Universidade de Glasgow onde se licenciou e
apresentou a sua tese de doutoramento em 1962 sobre a poesia de Manuel Bandeira.
Durante quase toda a sua vida, lecionou literatura latino-americana na Universidade de
Manchester.
12
Após sua graduação pela Universidade de Glasgow em 1960, Giovanni Pontiero
mudou-se para o Brasil a fim de reunir material para seu doutorado, ao mesmo tempo em
que serviu à Universidade da Paraíba em João Pessoa como Chefe do Departamento de
Estudos em Língua Inglesa e ao Instituto de Cultura Inglesa (Conselho Britânico) como
Diretor de Estudos. Seu encontro com a cultura brasileira fez que sua vida acadêmica
tivesse uma direção definitiva. Além disso, seu amor pelas literaturas portuguesa e
brasileira nunca “fraquejou” desde então. Depois desta experiência, Giovanni Pontiero
veio várias vezes à América do Sul, particularmente ao Brasil. (ORERO e SAGER, 1997)
Como pesquisador, manteve atividades produtivas, principalmente no campo dos
estudos literários portugueses e brasileiros, sendo autor de numerosos artigos, ensaios,
conferências, entradas em enciclopédias e traduções. Apesar de também ter traduzido obras
do espanhol e do italiano para o inglês, acabou por traduzir essencialmente autores de
língua portuguesa, sobretudo Clarice Lispector e José Saramago. Com esse último, acabou
por manter uma estreita amizade, tendo traduzido seis das suas obras.
13
12
http://www.instituto-camoes.pt/actividades/centros/gpontiero.htm
13
http://www.instituto-camoes.pt/actividades/centros/gpontiero.htm
99
Recebeu os seguintes prêmios de tradução: Prêmio de Tradução Camões (1968);
Prêmio Rio Branco (1970); Foreign Fiction Award, oferecido pelo Jornal The Independent
(1993); Outstanding Translation Award, oferecido pela American Literary Translator´s
Association (1994); Prêmio Teixeira-Gomes do Governo português (1995).
14
Giovanni Pontiero, em The hour of the star, inclui um texto perigráfico (ou
paratexto) que constitui um posfácio. Neste posfácio, o tradutor promove uma reflexão em
nós leitores ao discutir a protagonista Macabéa. Além de ser um texto esclarecedor, o
posfácio mostra o envolvimento do tradutor com A hora da estrela, o texto fonte, do qual
era profundo conhecedor, como ele mesmo admite em entrevista à Patricia Bins (In:
ORERO e SAGER, 1997). A intimidade literária entre tradutor e escritora é deste modo
estabelecida, cabendo a nós leitores e tradutores refletir acerca do ato de escrever literatura
e do ato de traduzi-la.
Em seu posfácio, Pontiero (1992:90-91) descreve Macabéa, falando de suas
características, origens, preferências. O tradutor destaca que a história de Macabéa sugere
um estereótipo extraído de uma pesquisa sociológica; entretanto, Clarice Lispector, ao
explorar este aspecto do ponto de vista psicológico, consegue extrair dele riqueza e graça.
Pontiero (1992:94) ressalta as duas únicas tentativas nas quais Macabéa foi positiva no
sentido de dar um novo rumo em sua vida, a saber, sua ida ao médico e à cartomante.
Segundo o tradutor, o heroísmo de Macabéa resume-se ao fato de ela não ser uma heroína.
Pontiero (1992:96) conclui seu posfácio, afirmando que as narrativas clariceanas têm por
pressuposto o silêncio tratado com tristeza, transformando-o em uma fonte de verdades
eternas. No posfácio, Pontiero (1992) não faz comentários sobre aspectos pontuais da
tradução.
14
http://www.instituto-camoes.pt/actividades/centros/gpontiero.htm
100
Em uma conferência apresentada na UMIST (University of Science &
Technology) em Manchester, Pontiero
15
(In: ORERO e SAGER, 1997) nos conta sobre sua
relação de tradutor com a escritora. O tradutor afirma que seu progresso no que tange à
tradução veio quando traduziu Amor para o inglês, um conto pertencente ao livro Laços de
família, de Clarice Lispector. Na época, diz Pontiero, Clarice era uma escritora brasileira
pouco conhecida internacionalmente, e, em 1991, a presença da escritora é
imprescindível em qualquer lista de livros de conteúdo feminista. A tradução deste conto
despertou o interesse dos editores da Texas University Press, que pediu a Pontiero que
traduzisse o livro inteiro. Ademais, Pontiero nos relata que após muitas tentativas em
contactar uma Clarice esquiva e caprichosa no Rio de Janeiro a fim de pedir-lhe para
autorizá-lo a traduzir Laços de família, ele finalmente recebeu um telegrama dizendo:
“Happy translation, Clarice”, como um único sinal de autorização. Segundo Pontiero,
tempos depois, a “feliz” tradução transformou-se em um relacionamento “feliz” com a
escritora e, conseqüentemente, um grande apoio para traduções posteriores.
As duas novelas mencionadas acima, A hora da estrela e The hour of the star, são
examinadas a partir da metodologia proposta pela lingüística de corpus, apresentada na
próxima seção.
15
Conferência apresentada em abril de 1991, publicada no livro The translator’s dialogue: Giovanni
Pontiero, editado por Pilar Orero e Juan C. Sager (1997).
101
2.2 Metodologia adotada para analisar o corpus
2.2.1 O programa WordSmith Tools
O software WordSmith Tools possui muitos recursos. Nesta seção, concentrar-me-ei
em suas ferramentas, pois foram os recursos mais utilizados por mim, sendo que, destas
ferramentas, Concord foi a mais usada nesta análise.
três ferramentas disponíveis neste programa: WordList (Lista de palavras);
KeyWords (Lista de palavras-chave); e Concord.
A ferramenta WordList gera três listas de palavras que disponibilizam o número de
ocorrências das palavras do corpus a ser pesquisado. Uma lista mostra todas estas
ocorrências por ordem alfabética. A outra mostra estas mesmas ocorrências, mas em ordem
decrescente, ou seja, das palavras que ocorreram em maior freqüência no corpus para
aquelas que ocorreram em menor freqüência. A última lista fornece dados estatísticos do
corpus, tais como o número total de palavras do corpus (ocorrências), o número de
palavras que não se repetem (vocábulos), o cálculo aritmético das ocorrências em relação
aos vocábulos (razão type/token), o número total de parágrafos, o comprimento destes
parágrafos, o comprimento das sentenças, entre outros dados. Segundo Scott (2001:54), as
listas de palavras auxiliam o pesquisador, porque a partir delas, ele pode identificar as
palavras mais comuns dentro de um corpus, o que possibilita a determinação de quais itens
lexicais podem ser considerados ou ignorados.
As listas de palavras-chave (KeyWords) são feitas comparando-se um corpus a um
outro bem maior que é representativo de vários tipos de texto (corpus de referência). A
obtenção de palavras-chave se quando o programa libera uma lista de vocábulos que são
“chave” no corpus menor, pois estes vocábulos mostram-se muito freqüentes no corpus de
102
referência. Como mencionado anteriormente, Nélia Scott (1998 apud SCOTT, 2001)
realizou uma pesquisa baseada em corpus utilizando as mesmas obras focalizadas nesta
dissertação. A pesquisadora trabalhou com padrões de negatividade, fazendo uso de listas
de palavras-chave. Scott descobriu que os itens never (nunca) e “não” eram palavras-chave
tanto no texto de chegada quanto no de partida, respectivamente, mas um número de itens
negativos foi omitido ou reformulado como sendo positivo (por exemplo, “não esqueça”
tornando-se “lembre-se”) na tradução, o que demonstra que o tradutor não considerou a
relevância da predominância de advérbios simples de negação tais como “não”, ainda que
tendo utilizado freqüentemente never, que é uma palavra-chave. (SCOTT, 1998 apud
SCOTT, 2001)
A ferramenta Concord produz uma lista de todas as ocorrências de uma palavra ou
expressão do corpus. Esta palavra ou expressão localiza-se no meio da linha de
concordância onde pode ser verificado seu contexto. De acordo com Baker (1995:228), a
utilização desta ferramenta pode ser feita em grande escala, possibilitando pelo menos as
possíveis implicações quanto à natureza de textos traduzidos e quanto à natureza destes
processos pelos quais tais textos vêm a ser o que são. Scott (2001:51) afirma que as linhas
de concordância não fornecem somente quais palavras co-ocorrem à palavra de busca, mas
também a freqüência de tal palavra.
Por meio desta breve explicação, percebe-se, portanto, que o programa WordSmith
Tools é um grande aliado do pesquisador, pois viabiliza análises quantitativas, que se
fossem feitas manualmente demandariam um longo período de tempo, e que com a rapidez
que o programa oferece, o pesquisador está apto a obter dados quantitativos
instantaneamente.
103
2.2.2 Procedimentos de análise
O corpus foi digitalizado, revisado e convertido em textos eletrônicos para o
formato TXT, a fim de que o processo de análise de dados fosse possível no programa
WordSmith Tools. Além disso, houve a anotação manual do corpus que consiste no
“processo de adicionar informação ao corpus”
16
(HUNSTON, 2002:79). No corpus em
análise, o procedimento da anotação foi o seguinte: foram classificados todos os Temas nos
textos fonte e alvo, tomando-se o cuidado de manter essa classificação sempre entre
parêntesis angulares < > que são usados para etiquetas em corpus eletrônico. Optou-se por
se classificar os Temas de orações independentes ou principais em casos de parataxe e por
não se classificar os Temas das orações em casos de hipotaxe (exceto quando a oração
hipotática é Tema ideacional oracional) e encaixadas (embedding), pois segundo Halliday
(1994:61), as orações hipotáticas e encaixadas se distinguem das orações paratáticas por
apresentar opções temáticas que se restringem a pressões estruturais de outros aspectos
léxico-gramaticais. Halliday (1994:61) ainda aponta que, em uma oração declarativa
independente, o falante possui livre escolha de Temas. Além disso, as orações em caso de
hipotaxe e em casos de encaixadas com um grupo nominal mantêm relação com alguma
outra oração em seu redor. Ainda de acordo com Halliday (1967, apud VASCONCELLOS,
1992:156), as conjunções subordinativas apontam uma relação de dependência que vai
além do domínio da oração subordinada, sendo desaconselhável classificá-las como Temas.
Durante o processo de anotação do corpus, houve o cuidado de se classificar os Temas até
o primeiro constituinte ideacional, porque de acordo com Halliday (1994:53), a estrutura
temática das orações não excede o primeiro elemento ideacional dentro das mesmas.
Ademais, não levaremos em consideração as interrogativas polares que são orações que
16
Minha tradução de: “Corpus annotation is the process of adding information to a corpus.” (grifo da autora)
104
demandam uma resposta positiva ou negativa (HALLIDAY, 1994:45). A motivação para
essa decisão será explicitada na seção 3.3.
Após essa anotação, o corpus foi processado no programa mencionado que permite
a análise automática de dados, que suas ferramentas possibilitam alcançar resultados que
muitas vezes seriam pouco confiáveis se contabilizados manualmente.
A ferramenta mais utilizada na presente pesquisa foi Concord que permitiu a
quantificação de todos os Temas anotados no corpus. Mas para que os rótulos ou tags (< >)
fossem reconhecidos pelo programa, foi necessário desativá-los no menu Settings. Desse
modo, foi possível fazer a quantificação, que consistiu na seleção de etiquetas (por
exemplo, <tema textual>; <tema ideacional participante>) como palavras de busca. Após o
comando, o programa lista todas as sentenças em que tal palavra de busca ocorre, o que
possibilita ao pesquisador verificar quantas são as ocorrências e expandir (item Grow) as
sentenças a fim de pesquisar o contexto no qual a palavra de busca ocorre.
Para identificar a co-ocorrência de Temas interpessoais, ideacionais participantes e
ideacionais processo-participantes, objeto de minha investigação, utilizei a ferramenta
Concord. Esta correlação foi considerada a partir de dois participantes específicos do
corpus: Rodrigo S. M. (narrador-personagem) e a protagonista Macabéa. Primeiramente,
foi selecionada a etiqueta <tema interpessoal> como palavra de busca. Dado o comando, o
programa listou todas as sentenças nas quais esta etiqueta ocorreu. Logo após, foi
selecionado na barra de ferramentas o item Grow a fim de expandir as sentenças e observar
melhor o contexto. Em seguida, foram verificados todos os trechos nos quais tal co-
ocorrência se manifestou. Para os trechos que não contemplaram tal co-ocorrência, foi
adotado o seguinte procedimento: a tecla Delete foi pressionada no teclado e depois o item
Zap foi selecionado na barra de ferramentas do programa. Deste modo, todos os trechos,
que não se incluíram em tal correlação, foram desconsiderados. Após estas etapas, os dados
coletados foram copiados para o Clipboard a fim de serem colados no editor de textos
105
Word da plataforma Windows. Depois da impressão das linhas de concordância que
contemplaram a correlação mencionada, foram classificados todos os Temas interpessoais;
foram identificados a que personagem relacionava cada linha de concordância; foram
identificados todos os tipos de processos a fim de se classificar os tipos de participantes que
ocorreram com o narrador e a protagonista Macabéa. Finalmente, foi feita a contagem de
todos estes itens para efetuar a análise e a discussão dos dados.
Ao listar ocorrências de um item específico, as linhas de concordância nos
fornecem informação que é interpretada através do insight e intuição do pesquisador
(HUNSTON, 2002:65). A ferramenta Concord produz uma lista onde a palavra de busca
fica centralizada (KWIC, ‘Key Word in Context’ ou ‘nódulo’), acompanhada de seu co-
texto (BERBER SARDINHA, 1999). Nesta pesquisa, a ferramenta Concord foi utilizada
após a anotação do corpus, uma metodologia que Hunston (2002:79) chama de
metodologia baseada em categorias (‘category-based’ methodology) que é aplicada
manualmente no mesmo. Cabe salientar que essa ferramenta não foi utilizada para
observação de colocações, mas apenas para buscas de rótulos.
Segundo Hunston (2002:84), a anotação do corpus baseada em categorias insere-se
no método de categorização sintática (parsing) (Tradução do termo para o português por
JESUS, 2004:127), que constitui na análise das sentenças em um corpus, levando-se em
conta seus sintagmas acrescidos por uma descrição gramatical. Hunston (2002:81)
menciona também que a anotação do corpus baseada na palavra relaciona-se ao método de
etiquetamento (tagging) (Tradução do termo para o português por JESUS, 2004:128), que
consiste na especificação da classe da palavra a ser analisada. De acordo com Hunston
(2002:87-89), existem outros dois tipos de anotação: a anotação de anáforas e a anotação
semântica. Quanto às anáforas, diferentes procedimentos para anotá-las. Pode-se optar
por identificar uma anáfora e seu antecedente ou estabelecer se o antecedente é
106
identificável ou não, por exemplo (HUNSTON, 2002:87-89). Já a anotação semântica
serve para categorizar palavras e sintagmas no corpus em relação ao conjunto de campos
semânticos, tais como, “cor”, “poder”, “educação” ou “medicina” (THOMAS e WILSON,
1997, apud HUNSTON, 2002:88).
De acordo com Hunston (2002:79), o uso de anotações para explorar um corpus
implica uma metodologia pela qual as partes de um corpus as palavras, as unidades
fonológicas, as orações são classificadas dentro de categorias que são utilizadas como
base para buscas no corpus e manipulações estatísticas.
Segundo Leech (1997:2, apud HUNSTON, 2002:80), o processo de anotação
enriquece o corpus, pois fornece uma fonte de informação lingüística para futuras pesquisas
e desenvolvimento na disciplina.
Halliday (1994:24-28) propõe o termo rotulação (labelling) para classificar uma
unidade lingüística segundo sua classe ou segundo sua função. Halliday (1994:24-28)
salienta que, apesar de ser necessária a rotulação por classes de palavras em alguns
momentos de sua gramática, o foco é prioritariamente na rotulação por funções.
Deste modo, esta dissertação utiliza a rotulação por funções (HALLIDAY,
1994:25). No decorrer desta pesquisa, o termo anotação (termo mais genérico) é
mencionado freqüentemente, lembrando-se de que sempre se refere à definição hallidayana
(rotulação por funções).
No capítulo seguinte, haverá a análise e discussão dos dados à luz das teorias
expostas nesta dissertação.
The study of the cultural
background of the work to be
translated is crucial and, the
more important the writer (…),
the greater the care which has
to be taken. However, there is
little doubt that the more
research is involved, the more
satisfying the task becomes.
Giovanni Pontiero, The risks
and rewards of literary
translation
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
109
3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
Este capítulo apresenta a análise qualitativa e discussão dos Temas do corpus a
partir dos dados quantitativos obtidos por meio da metodologia adotada nesta pesquisa.
Além disso, apresenta os principais dados estatísticos do corpus, problemas encontrados
durante a anotação e uma análise manual da organização temática e de hiperTemas. Para
efeitos de visualização, os Temas a serem destacados nos exemplos estão em negrito;
quando Tema ideacional elíptico ou a omissão de algum Tema por parte do tradutor, o
símbolo Ø é utilizado e quando há Absoluto, o rótulo é usado.
3.1 Apresentação
A análise e a discussão dos dados referentes a esta pesquisa serão divididas em
cinco seções: a seção dos principais dados estatísticos do corpus, a seção dos dados
relativos ao número de interrogativas polares no corpus, a razão pela qual não as
consideramos para análise da organização temática no corpus e alguns exemplos de orações
do corpus que abarcam mais de uma classificação temática ou que geraram dúvida durante
a anotação, a seção dos padrões de escolhas temáticas, a seção da correlação de escolhas
temáticas e a seção de Tema e tessitura textual. A primeira fundamenta-se na quantificação
dos bytes, types (vocábulos) e tokens (ocorrências) do corpus. A segunda explicita os
motivos pelos quais não consideramos as interrogativas polares na anotação do corpus e
apresenta alguns exemplos do corpus de difícil classificação. A terceira baseia-se na análise
da quantificação de todos os Temas. A quarta examina os Temas interpessoais que ocorrem
juntamente com os Temas ideacionais participantes e os Temas ideacionais processo-
participantes, focalizando-se o narrador e a personagem Macabéa. A quinta consiste na
análise da organização temática de quatro excertos dos textos fonte e alvo e também expõe
a análise de hiperTemas de dois excertos do original e da tradução.
110
3.2 Principais Dados Estatísticos do Corpus em análise
Os dados abaixo foram colhidos por meio da ferramenta WordList que fornece uma
lista com os principais dados estatísticos do corpus.
Tabela 1: Principais dados estatísticos do corpus
Características/Obras
A Hora da Estrela
The Hour of the Star
Bytes 295101
309113
Types (vocábulos) 4235
4176
Tokens(ocorrências) 22325
26148
De acordo com os dados, o texto alvo mostra-se um pouco mais extenso que o texto
fonte, porque o número de ocorrências (tokens) apresenta-se superior. O índice maior de
tokens no texto alvo demonstra também que a tradução possui uma quantidade maior de
palavras que se repetem em comparação ao original. Já o número de vocábulos (types) do
texto fonte é superior ao do texto alvo, o que talvez evidencie uma variedade lexical maior.
Isto corrobora as observações de Pagano (2002:141), que também encontra um índice
superior de vocábulos em textos em português (excertos de romances policiais traduzidos
por Érico Veríssimo nas décadas de 1930 e de 1940) em comparação aos originais em
inglês, constatando que traduções para o português obedecem a normas lingüísticas como,
por exemplo, o uso menos freqüente de repetição lexical. O número de tokens no texto alvo
apresenta-se maior também em função de a tradução ter oitenta e uma páginas enquanto
que o original contém oitenta páginas. Na verdade, a diferença do número de páginas entre
os textos fonte e alvo é ínfima, mas pode ter impacto na quantificação dos tokens.
3.3 Problemas encontrados na anotação e na classificação de Temas
Um primeiro problema diz respeito às interrogativas polares, que são orações que
requerem respostas positivas ou negativas (HALLIDAY, 1994:45). Estas orações
111
desempenham o papel de proporcionar uma oferta que é intercambiada em uma relação de
bens e serviços entre os usuários da linguagem (HALLIDAY, 1994:69).
A opção por não considerar as interrogativas polares originou-se da dificuldade de
classificá-las em português quando iniciadas por um processo. Em inglês, não houve esta
dificuldade, pois as interrogativas polares são muitas vezes iniciadas pelo finito que é o
auxiliar necessário para formular tais perguntas e constitui um Tema interpessoal.
Logo abaixo, darei alguns exemplos de interrogativas polares do texto fonte e do
texto alvo a fim de elucidar a nossa opção.
(TF) Será essa história um dia o meu coágulo? (p.12)
(TA) Will this story become my own coagulation one day? (p.12)
(TF) Voltarei algum dia à minha vida anterior? (p.23)
(TA) Shall I go back one day to my former way of life? (p.22)
(TF) Teria ela a sensação de que vivia para nada? (p.32)
(TA) Did she feel that she had nothing to live for? (p.32)
(TF) Será que ele vai me matar? (p.35)
(TA) Is he going to murder me? (p.35)
Nos exemplos acima, todas as interrogativas polares do texto fonte em português
iniciam-se com um processo. Já as interrogativas polares do texto alvo em inglês iniciam-se
com um finito seguido de um participante. Sob a perspectiva temática, os finitos são Temas
interpessoais e os participantes são Temas ideacionais. Como a classificação, neste caso,
ainda não é clara para o português, porque essa língua não faz uso de um sistema de
finitos/auxiliares tão freqüentemente como o inglês, decidimos excluir as interrogativas
polares da anotação de Temas, tanto do texto fonte quanto do texto alvo. Encontramos
respaldo em Munday (1998:191) para tal procedimento, pois em sua análise de um corpus
paralelo este autor desconsiderou os diálogos do texto fonte, um conto de Gabriel García
Márquez, e do texto alvo, a tradução deste conto para o inglês, em função das diferenças
sistêmicas, o que poderia interferir nos resultados. Cabe apontar que determinados
elementos utilizados no português para constituir interrogativas polares, tais como “será
112
que”, merecem ser mais estudados para poder avaliar se esses elementos seriam Temas
interpessoais.
A opção de interrogativas polares sem finito existe em inglês e Martin et al.
(1997:44) nos mostram como classificar estes casos que não se iniciam por um finito.
(...) Like the one in the garden, are you think of? (Martin et al., 1997:44)
Na oração acima, Martin et al. consideram uma interrogativa polar cujo Tema é
ideacional marcado, realizado por uma circunstância. Pautados por esta classificação, no
caso da língua inglesa, poderíamos classificar orações interrogativas que se iniciam por
processo ou outro elemento de transitividade como possuindo apenas um Tema ideacional.
Todavia, neste trabalho, optou-se por não classificar essas orações, tanto em inglês como
em português.
Abaixo, encontram-se alguns dados referentes ao número de páginas da novela.
Encontram-se também o número total de orações interrogativas e de interrogativas polares.
Estes dados contemplam o texto fonte e o texto alvo.
Tabela 2: Número e porcentagem de interrogativas polares no corpus
Lispector
Pontiero Porcentagem
total de
páginas da
novela
80
81
100%
total de
orações
interrogativas
243
244
100%
total de
interrogativas
polares
155
144
(TF)
63,78%
(TA)
59,01%
Apesar de o número de interrogativas polares corresponder à mais da metade do
número total de orações interrogativas, sua exclusão é necessária, uma vez que se
considerássemos apenas as interrogativas polares no inglês, os dados revelariam
desproporção no momento da comparação. Note-se que as orações interrogativas
113
remanescentes correspondem àquelas que se iniciam com elemento Qu- interrogativo, as
quais foram incluídas na anotação do corpus.
Além do problema das interrogativas polares, seguindo o modelo proposto por
Martin et al. (1997) em sua seção de Troubleshooting, podemos observar problemas de
orações que abarcam mais de uma classificação temática ou que apresentam uma
classificação problemática. Mostraremos algumas possibilidades de classificação
(destacando-se aquela adotada na presente pesquisa) para tais casos sem tencionar uma
conclusão final sobre as mesmas. Esta seção apresenta-se como uma tentativa de resolução
de problemas temáticos e também se torna útil para a reflexão acerca da organização
temática.
Um primeiro caso que gerou algumas dúvidas é:
A CULPA É MINHA
OU
A HORA DA ESTRELA <absoluto>
OU
ELA QUE SE ARRANJE (LISPECTOR, 1998:9)
A oração “Ela que se arranje” apresenta um desafio ao analista, uma vez que se
trata de uma oração optativa por exprimir os desejos do falante (Mateus, Brito, Duarte e
Faria, 2003:487). Decidimos classificar como Tema o Participante “Ela”, já que esta oração
pode ser parafraseada como “Que ela se arranje”, na qual “Que” é um elemento Qu-
exclamativo e constitui um Tema interpessoal. A diferença entre “Que ela se arranje” e
“Ela que se arranje” relaciona-se à ênfase empregada: a segunda oração é mais enfática e
que a primeira devido ao posicionamento do elemento Qu- exclamativo na oração, além do
contraste envolvido em “Ela que se arranje” em relação com “A culpa é minha”. Por
conseguinte, neste caso, a classificação temática em português demanda que se observe o
ato de fala em função da propriedade enfática envolvida neste tipo de estrutura.
no exemplo abaixo, a interpretação do leitor pode gerar duas possibilidades de
classificação:
114
A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não
tem uma só palavra que a signifique (p.11).
Na oração acima, “e não tem” pode ser um Tema múltiplo que se constitui de um
Tema textual (“e”), de um Tema interpessoal (“não”) e de um Tema não marcado
ideacional processo-participante ou, alternativamente, de um Tema não marcado ideacional
processo (“tem”). Este Tema pode ser não marcado ideacional processo-participante,
porque é possível interpretar um participante elíptico recuperado “A minha vida a mais
verdadeira”. Em contrapartida, este Tema também pode ser não marcado ideacional
processo, já que o processo “tem” pode significar “haver”. Neste exemplo acima, optei pela
primeira classificação, a de Tema não marcado ideacional processo-participante. Isto
mostra o papel da interpretação do analista no processo de classificação e anotação de um
corpus.
É necessário nesta seção fazer uma consideração sobre o emprego da conjunção
“porque” e como ela está sendo utilizada nesta pesquisa. Por exemplo, em:
não inicio pelo fim que justificaria o começo - como a morte parece dizer
sobre a vida - porque preciso registrar os fatos antecedentes (p.12).
Na anotação do corpus, todas as sentenças como esta acima que apresentam a
conjunção “porque” foram consideradas orações hipotáticas, apesar de algumas orações
que possuem tal conjunção apresentarem uma força paratática. Halliday (1994:236-237)
afirma que, em um significado lógico-semântico, a conjunção because se aplica tanto à
uma intensificação (enhancement) paratática quanto à uma intensificação hipotática.
Um aspecto problemático na hora da classificação de Temas no português é o uso
de expressões recorrentes tais como “assim é que”:
Assim é que os senhores sabem mais do que imaginam e estão fingindo de
sonsos. (p.12)
So, dear readers, you know more than you imagine however much you may
deny it. (p.13)
115
Uma possível interpretação de “assim é que” é enquanto oração clivada. Longhin e
Illari (2000:205) ressaltam que, em português, as orações clivadas podem apresentar
sintagmas preposicionais, advérbios e orações como identificadores. Teríamos acima uma
oração clivada de construção É QUE. Segundo Cunha e Cintra (2001:543), “Assim” é um
advérbio de modo; na gramática sistêmica (HALLIDAY, 1994:154), sob esta perspectiva,
“Assim” seria uma circunstância de modo do tipo qualidade, tendo correspondência com o
elemento Qu- interrogativo como?. De acordo com o Dicionário Brasileiro da Língua
Portuguesa (1981:207), “Assim” é um advérbio afirmativo quando se liga ao verbo ser,
como no exemplo a seguir, Assim é que ninguém está contente com a sua sorte” (grifos
dos autores). Portanto, ao levar em consideração a afirmação de Longhin e Ilari, pode-se
afirmar que “Assim” é um Tema ideacional predicado, pois “Assim” pode ser considerado
um advérbio e é um elemento circunstancial predicado em uma oração clivada de
construção É QUE.
Entretanto, há uma outra interpretação. Se verificarmos a tradução no exemplo
acima, “Assim” corresponde a “So”. Então, de acordo com a re-textualização no texto alvo,
“Assim” funciona como um adjunto conjuntivo causal (HALLIDAY, 1994:49) e, por
conseguinte, não seria um Tema ideacional predicado. Esse adjunto conjuntivo causal seria
um Tema textual e “é” um Tema ideacional processo não marcado. Nesta dissertação, optei
por considerar “Assim” como um Tema ideacional predicado, cabendo a ressalva de que
outras interpretações são possíveis.
No exemplo a seguir, verificam-se também duas possibilidades de classificação:
Limito-me a humildemente mas sem fazer estardalhaço de minha humildade
que já não seria humilde limito-me a contar as fracas aventuras de uma moça
numa cidade toda feita contra ela. Ela que deveria ter ficado no sertão de
Alagoas com vestido de chita e sem nenhuma datilografia, que escrevia tão
mal <absoluto>, só tinha até o terceiro ano primário (p.15).
Limito-me a humildemente mas sem fazer estardalhaço de minha humildade
que já não seria humilde limito-me a contar as fracas aventuras de uma moça
numa cidade toda feita contra ela. Ela que deveria ter ficado no sertão de
116
Alagoas com vestido de chita e sem nenhuma datilografia, que escrevia tão
mal, só tinha até o terceiro ano primário (p.15).
“Ela que deveria ter ficado no sertão de Alagoas com vestido de chita e sem
nenhuma datilografia, que escrevia tão mal” pode ser um absoluto, pois o participante
“Ela” é logo seguido de uma oração encaixada “adjetiva restritiva”, ou seja, o Rema é
elíptico onde se localiza o participante “Ela”, não existindo assim uma oração principal e
conseqüentemente nenhum processo. A classificação de orações em caso de hipotaxe e de
encaixadas não foi considerada, como foi explicitado na Metodologia desta dissertação.
Todavia, “Ela que deveria ter ficado no sertão de Alagoas com vestido de chita e sem
nenhuma datilografia, que escrevia tão mal” pode possuir um Tema simples, não
marcado e ideacional participante “Ela”. Esta possibilidade é considerada se levarmos em
conta que a interpolação das orações encaixadas “que deveria ter ficado no sertão de
Alagoas com vestido de chita e sem nenhuma datilografia, que escrevia tão mal”. Deste
modo, a oração principal seria “Ela tinha até o terceiro ano primário”. Para efeito de
anotação de corpus, optei pela primeira interpretação e classifiquei esta estrutura como
absoluto.
“Eis que” é uma outra estrutura problemática em português, podendo apresentar
diversas interpretações:
E eis que fiquei agora receoso quando pus palavras sobre a nordestina. (p.18)
See how apprehensive I have become since putting down words about the girl
from the North-east. (p.18)
E eis que (explosão) de repente aconteceu: o rosto da madama se acendeu todo
iluminado: (p.76)
Whereupon (bang) something happened out of the blue: Madame Carlota's face
suddenly lit up: (p.76)
Mas eis que de repente sinto o meu último esgar de revolta e uivo: o morticínio
dos pombos !!! (p.86)
But suddenly I make one last gesture of rebellion and start to howl: the
slaughter of doves! (p.85)
Observe-se que o tradutor re-textualizou “eis que” de três maneiras distintas: na
primeira sentença como um processo (“see”); na segunda como um adjunto conjuntivo
117
(“whereupon”) e na terceira como um adjunto modal (“suddenly”). Cunha e Cintra
(2001:252-253) e Cegalla (1991:224-225) afirmam que “eis (que)” é uma estrutura difícil
de ser classificada e que na gramática tradicional ela é considerada à parte como palavra
denotativa de designação por falta de uma definição mais precisa e mais generalizada. Os
gramáticos afirmam também que esta estrutura foi erroneamente considerada como
advérbio, e que pelo fato de designar alguma coisa, refere-se às unidades lexicais de
maneira geral. De acordo com Piacentini (2005)
17
, “eis que” é uma locução que
originalmente apresentava um sentido temporal, equivalente a “quando” e “eis senão
quando”, mas que passou a ter um sentido causal, sobretudo nos meios forenses,
apresentando um significado semelhante a “visto que”, “já que”, “uma vez que”,
“porquanto”. Segundo o Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa (1981:640), “eis
(que)” é considerado um advérbio, podendo apresentar também “força de um verbo”, sendo
ainda mais reforçado pelo “que”. Seguindo a definição deste último dicionário,
consideramos “eis” como um processo, pois foi o significado que pareceu mais cabível em
cada contexto.
certas estruturas que causam dúvida, pois podem ser um absoluto ou podem ter
um Tema ideacional elíptico. Por exemplo, em:
Vou agora começar pelo meio dizendo que –
– que ela era incompetente. Incompetente para a vida. (p.24)
I am about to begin in the middle by telling you that –
– that she was inept. Inept for living. (p.24)
“Incompetente para a vida” e “Inept for living”, à primeira vista, parecem orações
menores ou absolutos, pois não apresentam nem modo oracional e nem transitividade.
Entretanto, como estas estruturas pressupõem a oração anterior (observe-se que no Rema
imediatamente anterior, a presença dos atributos “incompetente” e “inept”), elas podem
17
http://kplus.cosmo.com.br/materia.asp?co=96&rv=Gramatica
118
ser consideradas como tendo Temas ideacionais elípticos. Optei por classificar estruturas
deste tipo como tendo Temas ideacionais elípticos.
Um outro problema foi classificar “Na certa” no exemplo abaixo em função da
dúvida sobre sua sinalização de significados interpessoais:
Na certa mereceria um dia o céu dos oblíquos onde entra quem é torto
(p.35).
Podemos descobrir que tipo de Tema é “Na certa” ao parafrasear a sentença,
substituindo-o por “Com certeza”, o que produz um efeito muito semelhante. Portanto, “Na
certa” é um adjunto modal de obviedade como of course, surely, obviously, clearly
(Halliday, 1994:49). Assim, este adjunto modal é um Tema interpessoal.
Um outro aspecto importante no momento da classificação é verificar e decidir se
trabalhamos com uma perspectiva congruente ou com uma metafórica (HALLIDAY,
1994:58). No exemplo abaixo:
Ela: -- Acho que não sei dizer (p.48).
Ela: -- Acho que não sei dizer (p.48).
Sob uma perspectiva de interpretação congruente, “Acho” é um Tema não
marcado ideacional processo-participante. sob a perspectiva de uma metáfora gramatical,
“Acho que” é um Tema interpessoal, pois funciona como um adjunto modal de opinião
(HALLIDAY, 1994:49); “não” também é um Tema interpessoal, enquanto que “sei” é um
Tema não marcado ideacional processo-participante. Para efeito de anotação de corpus,
Halliday (1994:58) aconselha levar-se em consideração ambas as perspectivas. Entretanto,
como a incidência de metáforas interpessoais do tipo acima não é significativamente alta no
presente corpus, optei por utilizar somente a classificação congruente. Para justificar minha
escolha, exponho os dados quantitativos retirados com o software WordSmith Tools em
relação às principais metáforas interpessoais no corpus: no texto fonte, “acho que” tem 14
ocorrências; “sinto que” e “creio que” apresentam cada um 1 ocorrência e “acredito que”
119
nenhuma ocorrência. no texto alvo “I think” apresenta 3 ocorrências; “I feel” 2
ocorrências e “I believe” 7 ocorrências.
3.4 Padrões de escolhas temáticas
Os dados apresentados a seguir são gerados pelo cômputo de todos os Temas do
corpus. A análise destes dados consiste em um estudo comparativo dos Temas no original e
na tradução.
Tabela 3: Temas simples e múltiplos dos textos fonte e alvo
Texto Fonte (Lispector)
Texto Alvo (Pontiero)
Tema simples 1312
1564
Tema múltiplo 910
742
A Tabela 3 aponta os dados quantitativos relativos aos Temas simples e múltiplos
nos textos fonte e alvo. Somando-se os valores, pode-se observar que o texto alvo apresenta
um número maior de Temas simples e múltiplos (2306) enquanto que o texto fonte
apresenta 2222 ocorrências. Talvez isso ocorra devido ao fato de a tradução segmentar
mais as orações se comparado ao original.
Exemplo de segmentação do texto alvo:
Pois era muito impressionável e acreditava em tudo o que existia e no que não
existia também. (p.33-34)
For the girl was most impressionable. She believed in everything that existed
and in everything non-existent as well. (p.33)
No exemplo acima, pode-se observar que o texto alvo apresenta um Tema simples
(“She”) que no texto fonte é um Tema múltiplo (“e acreditava”). Isso pode se relacionar ao
fato de o texto alvo apresentar mais Temas simples se comparado ao texto fonte (cf. Tabela
3): muitos dos Temas múltiplos do texto fonte são re-textualizados como Temas simples no
texto alvo e conseqüentemente há mais segmentação de orações na tradução.
120
Entretanto, um número maior de Temas múltiplos no texto fonte. Isso se deve
ao fato de que o número de Temas textuais e interpessoais é maior no texto fonte em
comparação ao texto alvo (cf. Tabela 5).
Exemplo de Tema interpessoal presente no texto fonte e ausente no texto alvo:
Bem sei que é assustador sair de si mesmo (...) (p.30-31)
I know that it is very frightening to step out of oneself (…) (p.30)
Como pode ser observado pelo exemplo acima, o original apresenta um Tema
interpessoal (“Bem”) que está ausente na tradução.
Exemplo de Tema textual presente no texto fonte e ausente no texto alvo:
E tudo devia ser porque Glória era gorda. (p.61)
This was probably due to the fact that Glória was buxom. (p.61)
O exemplo acima mostra que o texto alvo não apresenta o Tema textual (“E”) do
texto fonte. Exemplos como estes evidenciam a necessidade de sempre se olhar para o
corpus em detalhe para poder interpretar os dados quantitativos.
Tabela 4: Temas não marcado e marcado dos textos fonte e alvo
Texto Fonte (Lispector)
Texto Alvo (Pontiero)
Tema não marcado 1804
1886
Tema marcado 366
348
A Tabela 4 assinala os Temas não marcados e marcados do original e da tradução.
A diferença entre as ocorrências é pequena; todavia, percebe-se que o texto fonte apresenta
um maior número de Temas marcados ao passo que o texto alvo apresenta um número
superior de Temas não marcados. A razão pela qual o texto alvo apresenta uma alta
incidência de Temas não marcados relaciona-se à presença maciça de Temas ideacionais
participantes em sua forma não marcada (cf. Tabela 7).
O número maior de Temas marcados no texto fonte em comparação ao texto alvo
mostra que a escritora fez mais opções não usuais no decorrer de sua obra se compararmos
ao tradutor, o que pode ser evidenciado, por exemplo, pelo uso de Temas ideacionais
121
circunstância, que se encontram em uma proporção maior no original se comparados à
tradução (cf. Tabela 5).
Exemplos de Temas ideacionais circunstância do texto fonte re-textualizados como
participantes de processo relacional:
Não se trata de capricho meu no fim talvez se entenda a necessidade do
delimitado. (Mal e mal vislumbro o final que, se minha pobreza permitir, quero
que seja grandioso.) (p.13)
This is no caprice on my part - hopefully this need for confinement will
ultimately become clear. (The ending is still so vague yet, were my poverty to
permit, I should like it to be grandiose.) (p.13)
Nos exemplos acima, as orações com os Temas ideacionais circunstância “no
fim” e “Mal e mal” são re-textualizadas por orações com um Tema múltiplo constituído de
um Tema interpessoal “hopefully e de um Tema ideacional participante “this need for
confinement”, e por um Tema simples composto por um Tema ideacional participante “The
ending”, respectivamente. É interessante observar que o Tema “no fim” é re-textualizado
no Rema da oração (“ultimately”); que o adjunto modal “talvez” (em posição remática) é
traduzido pelo Tema interpessoal “hopefully”; além disso, o Tema “Mal e mal” está no
Rema (“still so vague yet”) e o participante “o final” no Rema é tematizado (“The
ending”).
Tabela 5: Temas textual, interpessoal e ideacionais dos textos fonte e alvo
Texto Fonte
(Lispector)
Texto Alvo
(Pontiero)
Tema textual
692
577
Tema interpessoal
472
292
Tema ideacional
participante
787
1596
Tema ideacional
processo
261
107
Tema ideacional
circunstância
176
169
Tema ideacional
oracional
142
175
Tema ideacional
processo-participante
696
90
Tema ideacional
predicado
17
6
122
Tema ideacional
equativo
14
26
Tema ideacional
preposto
3
-
Tema ideacional
atributivo preposto
10
15
Tema ideacional
comentário
22
40
Tema ideacional elíptico
88
75
A Tabela 5 diz respeito às ocorrências de todos os Temas textuais, interpessoais e
ideacionais do corpus. Cabe salientar aqui que são os Temas ideacionais que são
classificados em não marcado e marcado por serem constituídos de participantes, processos
e circunstâncias que contemplam um dos parâmetros de classificação de Temas nesta
dissertação – a ordem SVO.
Na Tabela 5, a presença maior de Temas textuais no texto fonte pode apontar uma
característica da escrita clariceana que preferência a períodos em que o uso de orações
paratáticas é mais frequente, se comparado ao texto alvo, ou seja, no original, alguns
períodos possuem mais orações paratáticas em comparação à tradução.
Exemplo de diferença entre o texto fonte e alvo:
Aliás descubro eu agora também eu não faço a menor falta, e até o que
escrevo um outro escreveria. (p.13-14)
It strikes me that I don't need her either and that what I am writing could be
written by another. (p.14)
Acontece porém que eu mesmo ainda não sei bem como esse isto terminará. E
também porque entendo que devo caminhar passo a passo de acordo com um
prazo determinado por horas: até um bicho lida com o tempo. (p.16)
As it happens, I have no idea how this story will end. Ø I also realize that I must
proceed step by step in accordance with a period of time measured in hours:
even animals struggle with time. (p.16)
Quanto aos Temas interpessoais, percebe-se que maior ocorrência deles no texto
fonte. Os dados podem indicar que a escritora (por meio do narrador) expressou seus
pensamentos, suas opiniões, modalizando os mesmos, com maior freqüência se comparado
ao tradutor. Contudo, é preciso observar algumas especificidades das línguas em pauta.
123
Exemplos de diferença entre o texto fonte e alvo:
Nunca vi palavra mais doida, inventada pelas nordestinas que andam por aos
montes. (p.12)
I have never come across a more foolish word, invented by all those unfortunate
girls from north-eastern Brazil. (p.12)
Perdeu o apetite, tinha a grande fome. (p.39)
She lost her appetite and Ø felt the great hunger thereafter. (p.39)
O primeiro par de exemplos acima mostra que, quanto ao Tema interpessoal, a
diferença entre os dois textos é sistêmica, ou seja, “never” está em posição remática por
questões do sistema da língua inglesa (a tematização de “never” é possível, mas possui
efeitos retóricos diferentes da formulação em português) enquanto que o sistema da língua
portuguesa possibilita que “Nunca” esteja em posição temática em função da elipse do
sujeito. No segundo par de exemplos, note-se que o Tema interpessoal “só” não é re-
textualizado no texto alvo.
Também na Tabela 5 pode-se observar uma faceta da escrita clariceana que
privilegia determinados aspectos dos seus enunciados, evidenciados através do alto índice
de ocorrência de Temas ideacionais predicados que são estruturas de ênfase. No texto
fonte, 17 ocorrências deste tipo de Tema enquanto que o texto alvo apresenta 6
ocorrências.
Exemplo de diferença entre o texto fonte e alvo:
(...) a tia é que lhe dera um curso ralo de como bater à máquina. (p.15)
Her aunt had given her a crash course in typing. (p.15)
Só depois é que pensava com satisfação: (...) (p.36)
Only later did she reflect with satisfaction: (...) (p.35)
Foi então (explosão) que se desmanchou de repente o namoro entre Olímpico e
Macabéa. (p.60)
At this point (bang), the affair between Olímpico and Macabéa came to an
abrupt end. (p.60)
Observe-se que nos exemplos acima o texto fonte apresenta Temas ideacionais
predicados que são re-textualizados como um Tema ideacional participante; como Temas
124
interpessoais, Tema textual e Tema ideacional participante; como um Tema ideacional
circunstância respectivamente.
Quanto aos Temas ideacionais processo, note-se que este tipo de Tema no texto
fonte apresenta mais que o dobro de ocorrências (cf. Tabela 5) se comparado ao texto alvo.
Exemplos de diferença entre o texto fonte e o texto alvo:
Trata-se de livro inacabado porque lhe falta a resposta. (p.10)
It is an unfinished book because it offers no answer. (p.8)
Nunca a esqueci: jamais se esquece a pessoa com quem se dormiu. (p.18)
I have never forgotten her: one never forgets a person with whom one has slept.
(p.18)
Os exemplos acima ilustram alguns aspectos que contribuem para a diferença dos
dados entre o original e a tradução no que concerne aos Temas ideacionais processo. Deste
modo, o processo impessoal (“Trata-se”) no primeiro par de exemplos e o processo
pronominal (“se esquece”) no segundo par de exemplos são re-textualizados como Temas
ideacionais participantes na re-textualização em função da língua inglesa não fazer uso
destes tipos de estrutura.
com relação aos Temas ideacionais equativos, a Tabela 5 mostra que o texto alvo
apresenta 26 ocorrências ao passo que o texto fonte apresenta 14 ocorrências. Isso se deve
ao fato de que, em algumas passagens do texto alvo, o tradutor faz uso do Tema ideacional
equativo que originalmente não estava sendo utilizado.
Exemplo de diferença entre o texto fonte e o texto alvo:
Eu poderia resolver pelo caminho mais fácil, matar a menina-infante, mas
quero o pior: a vida. (p.83)
I could resolve this story by taking the easy way out and murdering the infant
child, but what I want is something more: I want life. (p.82)
Eu era mais tolerante do que as outras porque sou bondosa e afinal estava
dando o que era meu. (p.74)
I was more understanding than the other prostitutes because I'm very
kindhearted. After all, what I was giving was mine to give. (p.73)
125
Ao re-textualizar passagens do texto fonte em que não originalmente um Tema
ideacional equativo, a representação que o tradutor cria pode ser mais enfática. Também
sentenças nas quais um Tema ideacional equativo são mais fáceis de serem processadas
pelo ouvinte e leitor (THOMPSON, 2002:127), isto é, a re-textualização pode ter tido como
objetivo, além de criar uma estrutura de ênfase, facilitar a leitura neste determinado trecho
da obra.
Lispector faz mais uso do Tema ideacional preposto em comparação ao tradutor,
como pode ser observado pela Tabela 5. Este Tema ocorre em situações nas quais a escrita
imita a fala e é identificado por meio de um participante que é retomado no Rema através
de um pronome ou grupo nominal. No exemplo abaixo, o Tema ideacional preposto foi re-
textualizado como um Tema ideacional oracional.
Exemplo de diferença entre o texto fonte e o texto alvo:
Greta Garbo, pensava ela sem se explicar, essa mulher deve ser a mulher mais
importante do mundo. (p.64)
Although she couldn't explain it, Macabéa was convinced that Garbo was the
most important woman in the world. (p.64)
Pontiero utilizou o Tema ideacional comentário muitas vezes em seu texto alvo
como pode ser verificado na Tabela 5, o que pode apontar para construções que “detalham”
alguns trechos de sua tradução por meio de comentários.
Exemplos de diferença entre o texto fonte e o texto alvo:
Não, menti, agora vi tudo: ele não era inocente coisa alguma, apesar de ser uma
vítima geral do mundo. (p.47)
No, I'm mistaken. It 's now clear that Olímpico was by no means ingenuous,
however much the universal victim. (p.47)
Não dá vontade de comer. (p.60)
It's enough to make anyone lose their appetite. (p.60)
Nem Glória era uma amiga: colega. Glória roliça, branca e morna. Tinha um
cheiro esquisito. Ø Porque não se lavava muito, com certeza. (p.63)
Not even Glória could be called a friend: just a workmate. Glória, who was
buxom, white and tepid. Her body exuded a peculiar smell, and it was quite
obvious that she didn't wash much. (p.63)
126
A incidência de Temas ideacionais atributivos prepostos é maior na tradução com 5
ocorrências a mais em comparação ao original. Isso pode evidenciar que o tradutor
privilegia as características das personagens a ponto de tematizá-las em alguns trechos.
Exemplos de diferença entre o texto fonte e alvo:
No espelho distraidamente examinou de perto as manchas no rosto. (p.27)
Lost in thought, she examined the blotches on her face in the mirror. (p.26)
Mas ele, galinho de briga que era, arrepiou-se todo com a pergunta tola e que
ele não sabia responder. (p.44)
Aggressive as a fighting cock, Olímpico bristled at her foolish questions, to
which he Could provide no answers. (p.44)
Sabia que tinha o sestro molengole de mulata, uma pintinha marcada junto da
boca, só para dar uma gostosura, e um buço forte que ela oxigenava. (p.64)
Conscious of her mulatta sex appeal, she painted in a beauty spot above her
lips, to add a touch of glamour to the bleached hairs around her mouth. (p.64)
Nos exemplos acima, pode-se observar que os Temas ideacionais atributivos
prepostos do texto alvo manifestam-se nos Remas dos trechos do texto fonte.
Na Tabela 5, pode-se observar que o texto fonte apresenta 696 ocorrências de
Temas ideacionais processo-participantes enquanto que o texto alvo apresenta 90
ocorrências. A alta ocorrência de Temas ideacionais processo-participantes no texto fonte
indica que o português é uma língua caracterizada pela alta incidência de elipse do sujeito,
o que é comprovado por Barbara e Gouveia (2001) quando eles afirmam que o português
possui uma caraterística pro-drop.
Exemplos de diferença entre o texto fonte e alvo:
-- Não, não tenho nenhuma. Acho que não preciso vencer na vida. (p.49)
-- I don't have any worries. I don't need to be successful. (p.49)
Estava habituada a se esquecer de si mesma. Nunca quebrava seus hábitos,
tinha medo de inventar. (p.49)
(…) accustomed as she was to forgetting about herself. Macabéa never broke
her routine. She was afraid of inventing situations. (p.49)
127
O texto fonte apresenta um número maior de circunstâncias em posição temática, 7
ocorrências a mais se comparado ao texto alvo. Estas ocorrências talvez indiquem que a
escritora constrói um texto com um quadro temporal, espacial, ou de outra natureza
circunstancial a fim de que a mensagem seguinte possa ser desenvolvida (DOWNING,
1991:126). Munday (1998:204) ainda ressalta que a localização de adjuntos circunstanciais
pode variar de acordo com a língua alvo e de acordo com a visão que o tradutor apresenta
acerca de sua orientação do quadro narrativo do original.
Exemplos de diferença entre texto fonte e alvo:
Não se trata de capricho meu no fim talvez se entenda a necessidade do
delimitado. (p.13)
This is no caprice on my part hopefully this need for confinement will
ultimately become clear. (p.13)
Material poroso <absoluto>, um dia viverei aqui a vida de uma molécula com
seu estrondo possível de átomos. (p.13)
Made of porous material, I shall one day assume the form of a molecule with
its potential explosion of atoms. (p.13)
No primeiro par de exemplos, discutido anteriormente, Lispector opta por
fornecer um quadro temporal por meio do Tema ideacional circunstância “no fim” ao passo
que o tradutor faz a opção de modalizar a oração através do Tema interpessoal “hopefully”.
No segundo par de exemplos, Lispector também fornece um quadro temporal através do
Tema ideacional circunstância “um dia” enquanto que o tradutor opta por re-textualizar
este Tema ideacional circunstância no Rema (“one day”).
No que tange aos Temas ideacionais oracionais, o texto alvo os apresentou em
maior quantidade em comparação ao texto fonte (33 ocorrências a mais que o original).
Isso se deve ao fato de que, no texto alvo, há maior presença de orações hipotáticas
reduzidas em posição temática se comparado ao texto fonte. Os dados parecem apontar
para diferenças sistêmicas no par lingüístico português-inglês.
Exemplos de diferença entre o texto fonte e o texto alvo:
Apesar de branca, tinha em si a força da mulatice. (p.59)
128
Although she was white, Glória displayed that vitality one associates with a
mulatta. (p.59)
Madama Carlota enquanto falava tirava de uma caixa aberta um bombom atrás
do outro (...) (p.73)
As she spoke, Madame Carlota extracted one chocolate after another from an
open box (…) (p.73)
O primeiro par de exemplos mostra que a circunstância é re-textualizada como
oração. Já, no segundo par de exemplos, enquanto a oração hipotática é apresentada após o
sujeito no português, no inglês procura-se não separar o participante do processo,
contemplando assim o padrão SVO.
Quanto aos Temas ideacionais elípticos, não grande diferença de ocorrências
entre o texto fonte e o texto alvo. Este tipo de Tema mostra uma faceta do estilo clariceano
de escrita, faceta esta que o tradutor re-textualizou semelhantemente em seu texto alvo.
Exemplo de semelhança no texto fonte e no texto alvo:
Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas,
pois eu também sou o escuro da noite. Ø Embora não agüente bem ouvir um
assovio no escuro, e passos. (p.18)
I am not afraid of tempestuous storms or violent gales for I am also the night's
darkness. Ø Even though I cannot bear to hear whistling or footsteps in the dark.
(p.18)
E nem as pessoas ali presentes sabiam. Ø Embora por via das dúvidas algum
vizinho tivesse pousado junto do corpo uma vela acesa. (p.82)
Not even those onlookers could tell. Ø Although someone from a nearby
house, suspecting that she might be dying, placed a lit candle beside her body.
(p.81)
Como se pode observar nos exemplos acima, Lispector, por meio da pontuação,
separa a oração hipotática da oração principal, fazendo que a hipotática tenha um Tema
ideacional elíptico que é na verdade o Tema da oração principal. Neste corpus, tal estilo de
escrita é bastante recorrente.
A seguir, a Tabela 6 apresenta todas as ocorrências de absolutos nos textos fonte e
alvo. Estas estruturas são consideradas por sua importância no que concerne à coesão
textual, pois, na verdade, não possuem estrutura temática. Os absolutos, como foi
129
explicado, não possuem estrutura temática por não terem nem transitividade nem modo
oracional. Estas estruturas também são chamadas de minor clauses (HALLIDAY,
1994:95).
Tabela 6: Absolutos nos textos fonte e alvo
Texto Fonte (Lispector)
Texto Alvo (Pontiero)
Absoluto 144
118
Os absolutos, que, reiteramos, são estruturas desprovidas de transitividade e de
modo oracional, foram considerados nesta pesquisa por exercerem um papel relevante
como dispositivos coesivos dentro de um texto. A maior ocorrência desta estrutura pode ser
verificada no texto fonte. O tradutor não re-textualiza todos os absolutos do texto fonte em
absolutos em seu texto alvo, propondo mudanças que apontam seu estilo tradutório e
literário, como nos exemplos abaixo.
Exemplos de diferença entre o texto fonte e o texto alvo:
Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos <absoluto> - sou eu que
escrevo o que estou escrevendo. (p.11)
To think is an act. To feel is a fact. Put the two together - it is me who is
writing what I am writing. (p.11)
Ah que medo de começar <absoluto> e ainda nem sequer sei o nome da moça.
(p.19)
I am scared of starting. I do not even know the girl's name. (p.19)
No primeiro par de exemplos, o que era originalmente um absoluto, o tradutor re-
textualiza como um Tema ideacional processo que proporciona uma compreensão mais
imediata da textualização: torna-se mais claro na tradução que “os dois juntos são o
“pensar” e o “sentir” em função da inclusão do processo. também o aspecto
interpessoal, que o leitor é interpelado através da imperativa. Já, no segundo par de
exemplos, o tradutor re-textualiza o absoluto do texto fonte em uma oração com Tema
130
ideacional participante que representa mais explicitamente a voz do narrador e mostra,
mais uma vez, a preferência pelo padrão SVO no inglês.
A Tabela 7 mostra as ocorrências de Temas ideacionais processo e participantes
marcados e não marcados no original e na tradução. Estas ocorrências relacionam-se aos
dados da Tabela 4.
Tabela 7: Temas ideacionais processo e participante marcados e não marcados
Texto Fonte
(Lispector)
Texto Alvo
(Pontiero)
Tema Id. Processo
Marcado
14
1
Tema Id. Processo Não
Marcado
247
106
Tema Id. Participante
Marcado
47
22
Tema Id. Participante
Não Marcado
740
1574
O número de Temas ideacionais participantes no texto alvo é notadamente superior
ao do texto fonte. Observando-se a Tabela 7, verifica-se que, em sua maioria, estes Temas
são não marcados, ou seja, correspondem aos sujeitos em orações declarativas. Um dado
análogo a esse é o número de Temas ideacionais processo-participantes (cf. Tabela 5) na
tradução. Estes Temas ocorrem com uma freqüência bem menor se comparado ao original,
indicando, como foi apontado diversas vezes nesta dissertação, que a estrutura da língua
inglesa possibilita a elipse do sujeito de forma mais restrita.
A Tabela 7 nos mostra que o texto fonte apresenta uma quantidade maior de
estruturas marcadas se comparado ao texto alvo. A única presença de um Tema ideacional
processo marcado no texto alvo indica que a ngua inglesa não faz muito uso de uma
variante da estrutura SVO a VS. o texto fonte em português utiliza mais
freqüentemente esta variante, como pode ser observado na Tabela 7. Apesar de ocorrerem
131
com menor freqüência em comparação ao texto fonte, os Temas ideacionais participantes
marcados aparecem no texto alvo. Estes Temas ocorrem através do deslocamento de
participantes que têm a função de objeto dentro da oração para a posição inicial da
sentença. Ainda que o texto alvo não seja tão “marcado” quanto o fonte, parece haver uma
tentativa por parte do tradutor de utilizar Temas ideacionais participantes, fazendo algumas
opções por estes tipos de Temas em sua forma marcada.
Exemplo de Tema ideacional participante marcado nos textos fonte e alvo:
De uma coisa tenho certeza: essa narrativa mexerá com uma coisa delicada: a
criação de uma pessoa inteira que na certa está tão viva quanto eu. (p.19)
Of one thing I am certain: this narrative will combine with something delicate:
the creation of an entire human being who is as much alive as I am. (p.19)
O tradutor re-textualiza semelhantemente o Tema ideacional participante marcado
do original, o que conseqüentemente resulta em uma representação similar deste aspecto do
texto fonte na tradução.
3.5 Correlação de escolhas temáticas
Nesta etapa da análise, foram quantificados os Temas interpessoais que ocorrem
juntamente com os ideacionais participantes e com os ideacionais processo-participantes.
Como foi dito na Introdução, a consideração dessa combinação de Temas surgiu
primeiramente, após a leitura de um artigo de Montgomery (1993), no qual se fala da
importância dos participantes ficcionais dentro de uma narrativa. Aplicado ao tópico desta
dissertação, pode ser observado que os Temas ideacionais participantes e os participantes
elípticos na função de sujeito são parte relevante de um texto ficcional. Entretanto, não
poderíamos nos concentrar somente na análise dos Temas ideacionais participantes e dos
participantes elípticos na função de sujeito, pois o componente interpessoal, como Halliday
(1994) aponta, é relevante e inseparável do ideacional. Desse modo, decidimos trabalhar
também com os Temas interpessoais, pois, como Hasan e Fries (1995) afirmam, eles são
132
tão importantes quanto os ideacionais, que para haver estrutura temática dentro da
oração, a transitividade e o modo oracional são fenômenos primordiais. Downing
(1991:129) também fala da importância do modo oracional para o falante/escritor projetar
sua mensagem que vai sendo delineada pelos elementos iniciais (os Temas) de cada oração.
Cabe salientar que essa correlação é considerada no que tange a dois participantes
específicos da novela: o narrador Rodrigo S.M. e a protagonista Macabéa.
Na novela, geralmente, o narrador se expressa por meio da primeira pessoa do
discurso e sua textualização na terceira pessoa do discurso dá-se nos momentos em que ele
discorre sobre a personagem Macabéa. Contudo, em alguns trechos da novela,
principalmente nos diálogos, Macabéa se exprime através da primeira pessoa do discurso.
Vejamos um exemplo que mostra Macabéa na primeira pessoa do discurso,
considerando-se a textualização e a re-textualização.
Exemplo da personagem Macabéa na primeira pessoa do discurso:
-- O que é que você come?
-- Cachorro-quente.
-- Só?
-- Às vezes como sanduíche de mortadela. (p.67)
-- What do you eat?
-- Hot dogs.
-- Is that all?
-- Sometimes I eat a mortadella sandwich. (p.66)
Os trechos acima se referem à primeira consulta médica de Macabéa em toda sua
vida. Note-se que no original o participante está elíptico enquanto que na tradução ele está
expresso.
Reiteramos que os pronomes na novela alternam-se entre a primeira e a terceira
pessoa do discurso, sendo que em grande parte dos casos a primeira pessoa refere-se ao
narrador e a terceira pessoa relaciona-se à personagem Macabéa.
Vejamos agora um exemplo do narrador na primeira pessoa do discurso e da
personagem Macabéa na terceira pessoa do discurso:
133
Minto: ela era capim. (p.31)
I am telling a lie: she was wild grass. (p.30)
As sentenças acima exemplificam a primeira pessoa e a terceira pessoa do
referentes ao narrador e à personagem Macabéa respectivamente.
Cabe aqui citar alguns críticos literários que falam da relação entre o narrador
Rodrigo S. M. e a personagem Macabéa.
Pontiero (1992:91-92) não fala especificamente do narrador, mas sim da relação da
escritora Clarice Lispector com Macabéa. Assim, ele considera a presença de Lispector no
narrador masculino. Em sua opinião, Clarice adotou um narrador masculino em A hora da
estrela com o objetivo de manter um "desligamento emocional" da narrativa. O tradutor
acredita que a validade e a necessidade de um narrador masculino é entretanto discutível.
De acordo com Guidin (1994:32-33), Clarice vale-se de um narrador masculino a
fim de questionar a autoria feminina do texto literário e o discurso feminino. Segundo a
autora (ibid.), Rodrigo S. M. utiliza Macabéa como um instrumento para contar a história
do processo de construção do texto. Guidin (ibid.) ainda afirma que Clarice concede sua
voz a um narrador masculino para destituir a personagem feminina, no caso Macabéa, de
um fluxo mental, fluxo esse que está presente inteiramente no narrador masculino. Além
disso, a autora (ibid.) acredita que a figura da escritora projeta-se em Macabéa, o que faz
que Clarice se identifique tanto com a nordestina quanto com o narrador.
Segundo (2000:273), à medida que o narrador conta a história de Macabéa, ele
revela sua identidade e sua problemática interior. (ibid.) acredita que, com a morte de
Macabéa, “morrem” com ela o narrador e Clarice Lispector.
Em seguida, a Tabela 8 mostra que tipos de Temas (ideacional participante ou
ideacional processo-participante) ocorrem em relação ao narrador e à Macabéa, levando-se
em conta também a co-ocorrência destes Temas mencionados com os Temas interpessoais.
A quantificação destes dados foi manual e feita após a identificação dos participantes nas
134
orações que contemplam a correlação dos Temas interpessoais, Temas ideacionais
participantes e Temas ideacionais processo-participantes.
Tabela 8: Número de Temas ideacionais participantes e processo-participantes
relativos ao Narrador e à Macabéa na correlação com os Temas interpessoais
Texto Fonte
(Narrador)
Texto Fonte
(Macabéa)
Texto Alvo
(Narrador)
Texto Alvo
(Macabéa)
Tema ideacional
participante
6
5
16
27
Tema ideacional
processo-
participante
69
79
2
11
A Tabela 8 diz respeito ao número de Temas ideacionais participantes e de Temas
ideacionais processo-participantes referente ao narrador e à Macabéa, levando-se em conta
a correlação com os Temas interpessoais tanto no texto fonte quanto no texto alvo. Os
dados da Tabela 8 relacionam-se com alguns dados da Tabela 5, pois a interpessoalidade
temática manifesta-se com maior freqüência em relação aos Temas ideacionais processo-
participantes no original ao passo que os Temas interpessoais co-ocorrem mais
freqüentemente com os Temas ideacionais participantes na tradução. Isso talvez ocorra
porque os Temas ideacionais processo-participantes são mais recorrentes no texto fonte e
os Temas ideacionais participantes no texto alvo.
Observando-se a Tabela 8, o número de participantes (considerando-se também os
participantes elípticos) no texto fonte é de 159 ocorrências enquanto que este número no
texto alvo é de 56 ocorrências. Assim, o texto alvo apresenta 103 ocorrências a menos que
o texto fonte, motivo pelo qual devemos levar em conta as diferenças sistêmicas no par
lingüístico português-inglês assim como as escolhas idiossincráticas feitas por parte do
tradutor.
A Tabela 9 a seguir diz respeito aos tipos de Temas interpessoais que ocorrem na
correlação com os Temas ideacionais participantes e com os ideacionais processo-
participantes. Houve primeiramente a identificação dos Temas interpessoais, sua
classificação e posterior quantificação, etapas essas que foram todas feitas manualmente.
135
Tabela 9: Tipos de Temas interpessoais que co-ocorrem com os id. participantes e processo-
participantes nos textos fonte e alvo
Tipos de Temas
interpessoais
Texto Fonte
(Narrador)
Texto Fonte
(Macabéa)
Texto Alvo
(Narrador)
Texto Alvo
(Macabéa)
Vocativo 1
1
1
1
Finito 19
12
3
13
Elemento Qu-
interrogativo
-
-
-
-
Elemento Qu-
exclamativo
-
-
2
1
Adjunto modal 70
77
14
31
TOTAL 90
88
20
46
Os adjuntos modais são os tipos de Tema interpessoal mais recorrentes
considerando-se a correlação com os Temas ideacionais participantes e processo-
participantes em ambos textos. Segundo Halliday (1994:49), os adjuntos modais exprimem
o julgamento dos falantes em relação à relevância da mensagem. O autor (1994:82-83)
ainda afirma que esses mesmos adjuntos modais podem ser de modo ou comentário. Os
adjuntos modais de modo relacionam-se ao sistema de modo oracional, uma vez que
podem ser classificados quanto à polaridade e à modalidade; quanto à temporalidade, e
quanto ao próprio modo oracional. Já os adjuntos modais de comentário não se relacionam
tão diretamente ao modo oracional quanto os adjuntos modais de modo. Por isso, os
adjuntos modais de comentário manifestam-se em posições da oração que são significativas
para a organização textual (HALLIDAY, 1994:82-83). Portanto, os adjuntos modais
realizados em posição temática contribuem de maneira expressiva para que, juntamente
com os Temas ideacionais e eventualmente os Temas textuais, os pontos de partida da
mensagem possam adquirir uma impressão, uma atitude, uma opinião, um julgamento a
mais por parte do falante e/ou do usuário da linguagem, imprimindo assim graus de
importância ao enunciado.
Os exemplos de adjuntos modais a seguir referentes ao texto fonte são
acompanhados de suas traduções postas entre parêntesis para efeito de comparação.
136
Exemplos de adjuntos modais realizados em posição temática no texto fonte:
Narrador:
Nunca vi palavra mais doida, inventada pelas nordestinas que andam por aos
montes. (p.12)
(I have never come across a more foolish word, invented by all those
unfortunate girls from north-eastern Brazil. [p.12])
Sim, não tenho classe social, marginalizado que sou. (p.18)
(Yes, I belong to no social category, marginal as I am. [p.18])
eu a vejo encantadora. eu, seu autor, a amo. (p.27)
(I am the only person who finds her charming. As the author, I alone love her.
[p.27])
Não sei a quem acusar (...) (p.39)
(I don't know whom I can blame [...] [p.39])
Nunca é um adjunto modal que diz respeito à habitualidade (HALLIDAY,
1994:82), ou seja, o usuário da linguagem utiliza este adjunto modal quando quer expressar
quão habitual pode ser um acontecimento ou um sentimento ou uma identificação ou uma
atribuição ou um comportamento.
Não é um adjunto modal de polaridade (HALLIDAY, 1994:82), polaridade essa que
pode ser denominada positiva ou negativa.
pertence ao grupo de adjuntos modais de intensidade (HALLIDAY, 1994:82).
Também pertencem a esse grupo adjuntos modais tais como, simplesmente, meramente,
realmente, de fato, para citar alguns exemplos (HALLIDAY, 1994:82.).
Macabéa:
vagamente tomava conhecimento da espécie de ausência que tinha de si em
si mesma. (p.24)
([...] and she was only vaguely aware of her own inner emptiness. [p.24])
Ela toda era um pouco encardida pois raramente se lavava. (p.27)
(Her general appearance was grimy for she rarely washed. [p.26])
Outro retrato: nunca recebera presentes. Aliás não precisava de muita coisa.
(p.40)
(Another portrait: she had never received gifts from anyone. It didn't worry her
for she needed so little. [p.40])
Ela: -- Desculpe mas não acho que sou muito gente. (p.48)
(She -- Forgive me, but I don't believe that I am all that human. [p.48])
Observando os exemplos acima, vemos que adjunto modal de polaridade Não foi o
mais recorrente em posição temática no texto fonte tanto em relação ao narrador quanto à
137
Macabéa. Diferentemente da língua inglesa que expressa sua polaridade juntamente com
um finito (HALLIDAY, 1994:88), a língua portuguesa faz uso deste adjunto modal para
expressar a polaridade negativa. Neste corpus, tal uso contribuiu para aumentar
significativamente a co-ocorrência dos Temas interpessoais com os ideacionais
participantes e processo-participantes no texto fonte em comparação ao texto alvo. Isto
corrobora os resultados de Munday (1998:193), em sua análise de um corpus paralelo no
par lingüístico espanhol-inglês, quando o autor afirma que o número maior de Temas
interpessoais no texto fonte em comparação ao texto alvo relaciona-se ao fato de que no
original em espanhol uma alta incidência do adjunto modal de polaridade negativa No
que na tradução em inglês é re-textualizado por um finito com polaridade negativa em
posição remática. Como foi apresentado na Metodologia, isto corrobora também as
constatações de Nélia Scott (1998 apud SCOTT, 2001), quando a pesquisadora afirma que
Não é uma palavra-chave na novela. Portanto, esta diferença sistêmica nos pares
lingüísticos português-inglês e espanhol-inglês significa que nestas línguas neo-latinas a
incidência de Temas interpessoais será superior em comparação à língua inglesa em função
da presença do adjunto modal de polaridade negativa em posição temática tanto no
português quanto no espanhol.
A seguir, alguns exemplos de sentenças com adjunto modal no texto alvo com suas
respectivas sentenças no texto fonte entre parêntesis para efeito de comparação.
Exemplos de adjuntos modais realizados em posição temática no texto alvo:
Narrador:
(A história determino com falso livre-arbítrio vai ter sete personagens e eu
sou um dos mais importantes deles, é claro. [p.12-13])
The story - I have decided with an illusion of free will - should have some
seven characters, and obviously I am one of the more important. (p.13)
(Sim, e talvez alcance a flauta doce em que eu me enovelarei em macio cipó.
[p.20])
Perhaps I might even acquire the sweet tones of the flute and become entwined
in a creeper vine. (p.20)
138
([...] pois tenho terror sem nenhuma vergonha do pardo pedaço de vida
imunda. [p.30])
To be frank, I am terrified of that dark hole and its depraved inhabitants. (p.30)
(Eu ainda poderia voltar atrás em retorno aos minutos passados e recomeçar com
alegria no ponto em que Macabéa estava de pé na calçada [...] [p.80])
I could turn the clock back and happily start again at the point when Macabéa
was standing on the pavement (...) (p.79)
(Quanto a mim, substituo o ato da morte por um seu símbolo. [p.83])
Personally, I substitute the act of death with one of its symbols. (p.82)
Macabéa:
(Vez por outra ia para a Zona Sul [...] [p.34])
Occasionally she wandered into the more fashionable quarters of the city (...)
(p.34)
(Mas como as roía quase até o sabugo, o vermelho berrante era logo desgastado
e via-se o sujo preto por baixo. [p.36])
Unfortunately, she had bitten her nails to such an extent that most of the
lacquer had disappeared, revealing the grime underneath. (p.35)
(Então precisava ela de condições especiais para ter encanto? [p.42])
Perhaps she needed special conditions in order to become appealing. (p.41)
(Quer dizer não sei bem quem eu sou. [p.56])
-- Honestly, I don't know what I am. (p.56)
Quanto aos tipos de adjunto modal (HALLIDAY, 1994: 49, 82-83) que ocorrem
nos exemplos acima referentes ao narrador e à Macabéa no texto alvo, obviously é um
adjunto modal deobviedade” (obviousness); perhaps é de probalidade; to be frank e
honestly são de “admissão” (admission); happily é de “disposição” (readiness);
occasionally é de “tipicalidade” (typicality); unfortunately relaciona-se à habilidade de
desejar (desirability) e personally é de opinião. Como pode ser observado pela Tabela 9, o
narrador e a personagem Macabéa em ambos os textos utilizam mais freqüentemente o
adjunto modal, um tipo de Tema interpessoal usado para modalizar suas falas e suas
manifestações de pensamento. Os exemplos acima mostram que o tradutor opta por
tematizar esses adjuntos.
Vejamos a análise dos finitos em relação ao narrador e à Macabéa.
Segundo Halliday (1994:75), o finito é um elemento que relaciona a proposição
com seu contexto no evento da fala. Halliday (1994:75) explica que o finito pode se
manifestar de duas maneiras: pela referência ao momento da fala e pela referência ao
139
julgamento do falante. A primeira denomina-se tempo primário e significa o passado, o
presente ou o futuro quando a fala ocorre. A segunda chama-se modalidade e constitui o
julgamento do falante quanto às probabilidades ou às obrigações envolvidas no seu
enunciado. Segundo Cegalla (1991:164), os finitos, na língua portuguesa, corresponderiam
ao que a Gramática Tradicional denomina verbos auxiliares. De acordo com o gramático
(1991:164), verbos auxiliares são aqueles que se ligam a uma forma nominal do verbo para
compor a voz passiva, os tempos compostos e as locuções verbais. Segundo Cegalla
(1991:164), ter, haver, ser, estar são os principais verbos auxiliares.
Em geral, o Tema interpessoal denominado finito em correlação com os Temas
ideacionais participantes e ideacionais processo-participantes ocorre mais freqüentemente
no texto fonte. Mais especificamente, no original, o narrador apresenta mais ocorrências de
finito em comparação à Macabéa, enquanto que no texto alvo Macabéa manifesta mais
finitos se comparado ao narrador.
Exemplos de finitos em posição temática no texto fonte:
Narrador:
Estarei lidando com fatos como se fossem as irremediáveis pedras de que falei.
(p.17)
Devo registrar aqui uma alegria. (p.35)
Estou passando por um pequeno inferno com esta história. (p.39)
(...) e já não posso mais retroceder. (p.80)
Estou agora me esforçando para rir em grande gargalhada. (p.86)
Quatro finitos apresentados acima expressam o tempo primário: “Devo”, “Estou”
no tempo presente e “Estarei” no tempo futuro. Já o finito “posso” relaciona-se à
modalidade, pois é um operador modal (HALLIDAY, 1994:76).
Em seguida, exemplos de finitos que ocorrem com a personagem Macabéa.
Macabéa:
Ela era subterrânea e nunca tinha tido floração. (p.31)
140
Havia, no começo do namoro, pedido a Olímpico um retratinho tamanho 3x4
onde ele saiu rindo para mostrar o canino de ouro (...) (p.61)
(...) como o dinheiro era emprestado, ela raciocinou tortamente que não era dela
e então podia gastá-lo. (p.71)
Sobretudo estava conhecendo pela primeira vez o que os outros chamavam de
paixão: estava apaixonada por Hans. (p.78)
Fora buscar no próprio profundo e negro âmago de si mesma o sopro de vida
que Deus nos dá. (p.84)
Os finitos referentes aos exemplos acima que expressam tempo primário são os
seguintes: “tinha”, “Havia”, “estava” e “Fora”, todos eles no tempo passado. “podia” é um
operador modal que expressa modalidade.
Exemplos de finitos em posição temática no texto alvo:
Narrador:
No sooner do I succeed in persuading her to speak, than she slips through my
fingers. (p.29)
I am consoled by this possibility and will do everything in my power to make it
come to pass. (p.29)
Dear God, only now am I remembering that people die. (p.86)
Macabéa:
She was subterranean and had never really flowered. (p.30)
Only later did she reflect with satisfaction: I am a typist and a virgin, and I like
coca-cola. Only then did she get dressed, and spend the rest of the day passively
enacting the role of being. (p.35)
May I drop dead this minute if I'm telling a lie. (p.56)
For only now did she understand that a woman is born a woman from that first
wall at birth. (p.84)
No caso da língua inglesa, como pode ser verificado nos exemplos acima, o finito
freqüentemente ocorre em posição temática nas orações declarativas quando inversões
do tipo finito sujeito predicador. Entretanto, o finito pode ocorrer também em posição
temática nas orações declarativas quando há a elipse do sujeito. Quando há elipse do
sujeito, o finito juntamente com o predicador resultam em um Tema ideacional processo-
participante.
141
um tipo de Tema interpessoal que ocorre somente no texto alvo: o elemento
Qu- exclamativo. O elemento Qu- exclamativo ocorre em orações optativas (HALLIDAY,
1994:87; PERINI, 2002:67). Quando o elemento Qu- exclamativo aparece em uma oração,
ele imprime um significado que se relaciona ao desejo do escritor/falante.
Exemplos de elemento Qu- exclamativo no texto alvo:
Narrador:
(Embora queira que para me animar sinos badalem enquanto adivinho a
realidade. [p.17])
How I should love to hear the pealing of bells in order to work up some
enthusiasm as I decipher reality: (…) (p.17)
(Quisera eu tanto que ela abrisse a boca e dissesse: [...] [p.68])
How I should like to see her open her mouth and say: (…) (p.68)
Macabéa:
(Ela teve inveja da girafa que pairava tão longe no ar. [p.55])
How she wished she could reach high up into the air like the giraffe (p.55).
Os elementos Qu- exclamativos também ocorrem no texto fonte, mas
acompanhando outros participantes fora o narrador e a Macábea.
O vocativo ocorre em ambos textos com a mesma freqüência. Segundo Halliday
(1994:52), o vocativo corresponde usualmente, mas não necessariamente, a um nome
pessoal e é usado para endereçar algo a alguém. De acordo com Cegalla (1991:312), o
termo vocativo origina-se do latim vocare que significa chamar. Pode ser um nome, um
título ou um apelido utilizado para chamar, ou interpelar a pessoa, o animal ou a coisa
personificada a qual nos dirigimos.
Vejamos a seguir exemplos deste Tema interpessoal.
Exemplos de vocativo no texto fonte:
Narrador:
Meu Deus, só agora me lembrei que a gente morre. (p.87)
Macabéa:
-- Ah mês de maio, não me largues nunca mais! (p.42).
Exemplos de vocativo no texto alvo:
142
Narrador:
Dear God, only now am I remembering that people die. (p.86)
Macabéa:
Up till now, thanks be to God, I've managed not to vomit. (p.53)
Observa-se a ausência de elementos Qu- interrogativos em posição temática na
correlação dos Temas interpessoais com os Temas ideacionais participantes e com os
ideacionais processo-participantes em ambos textos. Os elementos Qu- interrogativos são
Temas múltiplos, pois ao mesmo tempo em que são Temas interpessoais, são também
Temas ideacionais (participantes ou circunstância). A sua ausência justifica-se pelo fato de
não ter tido representação do narrador e da personagem Macabéa através deles.
Neste momento, passo a falar da transitividade na correlação dos Temas
interpessoais com os Temas ideacionais participantes e com os ideacionais processo-
participantes em ambos textos.
A Tabela 10 mostra os tipos de participantes manifestados pelo narrador e pela
personagem Macabéa no original e na tradução. Foram primeiramente identificados o
narrador e a personagem Macabéa nas orações. Após esta etapa, os participantes foram
classificados de acordo com os processos que eles manifestavam. Finalmente, foi feita a
quantificação manual dos participantes relacionada ao narrador e à Macabéa em ambos
textos.
143
Tabela 10: Tipos de participantes nos Temas ideacionais participantes e processo-
participantes nos textos fonte e alvo na correlação com os Temas interpessoais
Tipos de
participantes nos
Temas
ideacionais
participantes e
processo-
participantes
Texto Fonte
(Narrador)
Texto Fonte
(Macabéa)
Texto Alvo
(Narrador)
Texto Alvo
(Macabéa)
Ator
17
20
11
12
Meta 2
1
-
-
Comportante 1
3
1
-
Experienciador 41
46
4
19
Fenômeno -
2
-
-
Dizente 6
2
-
2
Alvo -
-
-
-
Portador 6
9
1
4
Atributo -
-
-
-
Identificado 2
1
1
1
Identificador -
-
-
-
Característica 2
1
1
1
Valor -
-
-
-
Existente -
-
-
-
TOTAL 77
84
19
39
Na correlação Temas ideacionais (participantes e processo-participantes) com os
Temas interpessoais, no texto fonte, o narrador apresenta-se mais recorrentemente como
experienciador enquanto que no texto alvo sua maior recorrência de participantes recai
sobre o ator. Quanto à personagem Macabéa, em ambos textos, sua representação
caracteriza-se pelo participante experienciador. Portanto, tanto o Narrador e Macabéa no
texto fonte como Macabéa no texto alvo apresentam mais freqüentemente uma
representação de mundo ligada ao processo mental (cf. Tabela 10), sendo que o narrador na
tradução que apresenta tal representação relacionada ao processo material.
Segundo Halliday e Matthiessen (2004:201,210), o experienciador é aquele
participante que “sente” e é dotado de consciência. O experienciador ocupa a posição de
sujeito, pois é um participante central e pode estar atrelado à percepção, à cognição, ao
desejo e à emoção, dependendo do tipo de processo mental que é manifestado.
144
Exemplos de experienciador em correlação com os Temas interpessoais no texto
fonte:
Narrador:
Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou. (p.11)
Nunca vi palavra mais doida, inventada pelas nordestinas que andam por aos
montes. (p.12)
O fato é que tenho nas minhas mãos um destino e no entanto não me sinto com
o poder de livremente inventar: sigo uma oculta linha fatal. (p.21)
Não, não quero ter sentimentalismo e portanto vou cortar o coitado implícito
dessa moça. (p.46)
agora entendo e agora brotou-se-me o sentido secreto: o violino é um
aviso. (p.82)
Macabéa:
Às vezes lembrava-se de uma assustadora canção desafinada de meninas
brincando de roda de mãos dadas ela ouvia sem participar porque a tia a
queria para varrer o chão. (p.32-33)
Vagamente pensava de muito longe e sem palavras o seguinte: já que sou, o
jeito é ser. (p.33)
Mal acreditava que usufruía o espaço. (p.41)
-- o gosto de ver sangue no cinema. Olhe, sangue eu não posso mesmo ver
porque me dá vontade de vomitar. (p.54)
Não sabia que ela própria era uma suicida embora nunca lhe tivesse ocorrido se
matar. (p.58)
Exemplos de experienciador em correlação com os Temas interpessoais no texto
alvo:
Macabéa (1ª pessoa do discurso):
She -- Of course I believe you, I believe you, I believe you. I didn't mean to hurt
your feelings. (p.48)
-- I can't stand the sight of blood when I go to the cinema. Honestly, I can't stand
it. It makes me feel like vomiting. (p.53)
-- I don't know what I am. I think I'm a little... how can I put it? - Honestly, I
don't know what I am. (p.56)
Macabéa (3ª pessoa do discurso):
More surprisingly, she often dreamed about sex, she, who to all appearances
was completely asexual. (p.33)
145
Once again, she sensed that her life was suddenly taking a turn for the better.
(p.78)
De acordo com Halliday e Matthiessen (2004:179), o ator é o participante que
“comete a façanha”, ou seja, aquele que ocasiona a mudança e, geralmente, tem a função de
sujeito. Este participante ocorre em orações nas quais o processo material que
expressam o “fazer” e o “acontecer”.
Exemplos de sentenças com atores (em correlação com os Temas interpessoais) no
texto alvo e as respectivas sentenças no texto fonte entre parêntesis para efeito de
comparação:
Narrador:
(Sim, e talvez alcance a flauta doce em que eu me enovelarei em macio cipó.
[p.20])
Perhaps I might even acquire the sweet tones of the flute and become entwined
in a creeper vine. (p.20)
(O fato é que tenho nas minhas mãos um destino [...] [p.21])
To be frank, I am holding her destiny in my hands (...) (p.20)
(Uma palavra dela eu às vezes consigo mas ela me foge por entre os dedos.
[p.29])
No sooner do I succeed in persuading her to speak, than she slips through my
fingers. (p.29)
(Estou contente com essa possibilidade e farei tudo para que esta se torne real.
[p.30])
I am consoled by this possibility and will do everything in my power to make it
come to pass. (p.29)
(Eu ainda poderia voltar atrás em retorno aos minutos passados e recomeçar com
alegria no ponto em que Macabéa estava de pé na calçada [...] [p.80])
I could turn the clock back and happily start again at the point when Macabéa
was standing on the pavement - but it isn't for me to say whether the fair-haired
foreigner looked at her. (p.79)
A interpessoalidade temática do narrador e da protagonista Macabéa no texto fonte
e desta última no texto alvo relaciona-se ao nível da consciência representado através dos
processos mentais, ou seja, quando estes participantes expressam seus julgamentos, suas
opiniões, suas impressões por meio dos Temas interpessoais, eles fazem uso mais
recorrentemente de processos que dizem respeito aos seus sentimentos e pensamentos (cf.
Tabela 10). em relação à interpessoalidade temática do narrador no texto alvo, observa-
146
se uma representação do mundo um pouco diferente: na tradução, o narrador em posição
temática utiliza processos materiais com maior freqüência. Isso demonstra que o narrador
no texto alvo se mostra mais interpessoal, tematicamente falando, quando exprime afazeres
e acontecimentos (cf. Tabela 10).
A Tabela 11 corresponde à soma dos tipos de participantes associados aos
processos. Por exemplo, a fim de quantificar o número de ocorrências em relação ao
processo material, foram somados juntamente todos os atores e todas as metas.
Tabela 11: Processos com maior ocorrência no corpus em relação à co-ocorrência dos Temas
interpessoais com os ideacionais participantes e com os ideacionais processo-participantes
Processos com maior
ocorrência no corpus
Texto Fonte
(Narrador)
Texto Fonte
(Macabéa)
Texto Alvo
(Narrador)
Texto Alvo
(Macabéa)
Comportamental 1
3
1
-
Existencial -
-
-
-
Material 19
21
11
12
Mental 41
48
4
19
Relacional 10
11
3
6
Verbal 6
2
-
2
A Tabela 11 mostra que os processos mentais são os mais recorrentes levando-se
em conta a interpessoalidade temática com respeito ao narrador e à personagem Macabéa
no original. Quanto à tradução, os processos materiais e os processos mentais apresentam-
se como os mais freqüentes considerando-se a mesma correlação. Isto verifica algumas
observações de Mauri (2003) sobre processos mentais em textos de Clarice Lispector, já
que em sua pesquisa (no caso Laços de família e sua tradução para o italiano Legami
familiari) constata-se que no texto fonte existem vários casos de verbos de elocução
utilizados como processos mentais.
Após a identificação dos tipos de participantes associados ao narrador e à
personagem Macabéa em ambos os textos, foi verificado quais destes participantes
possuíam a função de sujeito ou de objeto. As funções de sujeito e de objeto, que estão
sendo usadas aqui, são mencionadas por Halliday (1973:104; 1994:25) e entendemos que,
147
embora vinculadas à uma descrição gramatical diferente, elas podem ser úteis em
discussões baseadas na gramática sistêmico-funcional.
Tabela 12: Participantes na correlação dos Temas interpessoais com os ideacionais
participantes e os ideacionais processo-participantes na função de sujeito e de objeto
Função dos
participantes dentro
das orações
Texto Fonte
(Lispector)
Texto Alvo
(Pontiero)
Participantes na função
de sujeito
157
56
Participantes na função
de objeto
5
-
A Tabela 12 indica que todos os participantes (o narrador e a personagem Macabéa)
têm a função de sujeito no texto alvo. no texto fonte apenas cinco ocorrências destes
mesmos participantes na função de objeto.
Exemplos de participantes na função de objeto no texto fonte:
Narrador:
Sou inocente! Não me consumam! (p.85)
E agora – agora só me resta acender um cigarro e ir para casa. (p.87)
Nos exemplos acima, relativos ao narrador, os dois pronomes átonos me são as
metas, participantes estes pertencentes ao processo material.
Macabéa:
-- Ah mês de maio, não me largues nunca mais! (p.42).
Nunca lhe ocorrera a existência de outra língua e pensava que no Brasil se
falava brasileiro. (p.51)
Macabéa começou (explosão) a tremelicar toda por causa do lado penoso que há
na excessiva felicidade. Só lhe ocorreu dizer:
Mas casaco de pele não se precisa no calor do Rio... (p.77)
me no exemplo acima em relação à Macabéa é a meta, participante ligado ao
processo material enquanto que lhe nos exemplos acima é o fenômeno que é ligado ao
processo mental.
148
Ao pesquisar corpora paralelos bilíngües, Munday (1998:193) descobre que o
corpus em espanhol apresenta muitos Temas interpessoais em detrimento do corpus em
inglês. Se verificarmos os dados da Tabela 5, veremos que a interpessoalidade temática está
mais presente no texto fonte, o que condiz com a afirmação de Munday, pois ela é mais
encontrada em português, uma língua neo-latina como o espanhol. Por meio da correlação
estabelecida nesta seção, corrobora-se ainda mais que o texto fonte possui mais Temas
interpessoais que o texto alvo em função da diferença sistêmica entre o par lingüístico
português-inglês. Todavia, como alguns exemplos mostram, também escolhas
idiossincráticas feitas pelo tradutor.
3.6 Tema e tessitura textual
Examino nesta seção 4 excertos dos textos fonte e alvo que foram selecionados para
a análise manual da organização temática. O critério de escolha desses 4 excertos foi
pautado pela presença de diferenças lingüísticas de caráter idiossincrático. Os Temas foram
colocados em negrito a fim de facilitar sua localização e o símbolo Ø indica que Tema
ideacional elíptico. A análise está embasada nos fundamentos teóricos discutidos,
explorando-se aspectos das representações construídas a partir das escolhas temáticas.
Também está embasada de certa forma na proposta de Eggins (1994:318-319) de análise
textual, mais especificamente a sua proposta para examinar Tema.
Examino ainda 2 excertos dos textos fonte e alvo em relação ao conceito de
hiperTemas, apresentado no capítulo da Revisão Teórica.
Como foi apresentado no capítulo 1, Torsello (1990) analisa a organização
temática das primeiras duas páginas do romance To the lighthouse, de Virginia Woolf,
verificando que a metafunção textual fornece outras alternativas para avaliar o ponto de
vista do narrador e das personagens. Sua análise difere da minha, pois ela considera
149
elementos específicos da metafunção ideacional, enquanto que eu procurarei enfocar os
trechos abaixo privilegiando a metafunção textual, não deixando de esclarecer que os
Temas naturalmente contemplam as outras metafunções.
Quadro 2: Excerto 1 para análise manual da organização temática
TEXTO FONTE (LISPECTOR) TEXTO ALVO (PONTIERO)
Como é que sei tudo o que vai se seguir e
ainda o desconheço, que nunca o vivi? É
que numa rua do Rio de Janeiro peguei no ar
de relance o sentimento de perdição no rosto
de uma moça nordestina. Ø Sem falar que eu
em menino me criei no Nordeste. Também
sei das coisas por estar vivendo. Quem vive
sabe, mesmo sem saber que sabe. Assim
é
que os senhores sabem mais do que
imaginam e estão fingindo de sonsos.
How do I know all that is about to follow if
it is unfamiliar and something I have never
experienced? In a street in Rio de Janeiro I
caught a glimpse of perdition on the face of
a girl from the North-east. Ø Without
mentioning that I myself was raised as a
child in the North-east. Besides, I know
about certain things simply by living.
Anyone who lives knows, even without
knowing that he or she knows. So, dear
readers, you know more than you imagine
however much you may deny it.
(p.12) (p.12-13)
Observa-se no Quadro 2 que o tradutor operou certas modificações de ordem
temática em seu texto alvo que apontam para pontos de partida da mensagem distintos, o
que conseqüentemente imprime uma “direção de leitura” própria do texto alvo. Por
exemplo, o tradutor enfatizou uma circunstância (“In a street in Rio de Janeiro”),
colocando-a em posição temática. No texto fonte, esta circunstância está no Rema. Além de
motivações estruturais do sistema da língua inglesa, a escolha do tradutor em colocar uma
circunstância com a função de Tema fornece ao leitor um quadro espacial que facilita o
prosseguimento da mensagem (DOWNING, 1991:126).
Tanto no original quanto na tradução, Temas textuais (“Também” e “Besides”)
que são adjuntos conjuntivos aditivos (HALLIDAY, 1994:49) que contribuem para a
construção da tessitura de ambos textos.
A sentença final do parágrafo no texto alvo apresenta uma interpolação em posição
temática ao leitor que no texto fonte não é tematizada. Essa modificação feita pelo tradutor
150
consiste na pressuposição de que o grupo nominal “os senhores” seria os leitores,
transformando este grupo no vocativo “dear readers” que se torna um Tema interpessoal.
Quadro 3: Excerto 2 para análise manual da organização temática
TEXTO FONTE (LISPECTOR) TEXTO ALVO (PONTIERO)
(...) A palavra tem que se parecer com a
palavra. Atingi-la é o meu primeiro dever
para comigo. E a palavra não pode ser
enfeitada e artisticamente vã, tem que ser
apenas ela. Bem, é verdade que também
queria alcançar uma sensação fina e Ø que
esse finíssimo não se quebrasse em linha
perpétua. Ø Ao mesmo tempo que quero
também alcançar o trombone mais grosso e
baixo, grave e terra, tão a troco de nada que
por nervosismo de escrever eu tivesse um
acesso incontrolável de riso vindo do peito.
E quero aceitar minha liberdade sem pensar
o que muitos acham: Ø que existir é coisa de
doido, caso de loucura. Ø Porque parece.
Existir não é lógico.
(…) The word must resemble the word. To
attain the word is my first duty to myself.
The word must not be adorned and become
aesthetically worthless; it must be simply
itself. It is also true that I have attempted to
acquire a certain refinement of feeling and
Ø that this extreme refinement should not
break into a perpetual line. Ø At the same
time, I have attempted to imitate the deep,
raw, dense sound of the trombone, for no
good reason except that I feel so nervous
about writing that I might explode into a fit
of uncontrollable laughter. I want to accept
my freedom without reaching the conclusion
like so many others: Ø that existence is only
for fools and lunatics: for it would seem that
to exist is illogical.
(p.20) (p.20)
Verifica-se no Quadro 3 que nas três primeiras orações tanto do texto fonte quanto
do texto alvo uma progressão temática contínua (DOWNING e LOCKE, 2002:255)
devido ao fato de que o participante “a palavra” é recorrente nos Temas destas orações.
A textualização deste trecho e sua re-textualização caracterizam-se por uma alta
incidência de Temas ideacionais elípticos que estão muito presentes no corpus de uma
maneira geral. Estes Temas ideacionais elípticos revelam traços distintivos do estilo
literário clariceano que o tradutor re-textualizou semelhantemente em seu texto alvo: a
fragmentação da escrita e das idéias assinalada pela separação entre as orações principais e
as hipotáticas, como, por exemplo, em “E quero aceitar minha liberdade sem pensar o que
muitos acham: Ø que existir é coisa de doido, caso de loucura.” e “I want to accept my
freedom without reaching the conclusion like so many others: Ø that existence is only for
fools and lunatics”
151
O tradutor re-textualiza duas orações “Porque parece” (uma oração hipotática com
Tema ideacional elíptico) e “Existir não é lógico” (uma oração independente) em um único
período “for it would seem that to exist is illogical”, inserindo uma relação lógico-
semântica distinta no texto alvo, pois no original esta relação é fragmentada e na tradução
esta relação se torna condensada. Examinando esse trecho mais a fundo, percebe-se que
Lispector constrói com as três orações finais do parágrafo uma espécie de silogismo em sua
textualização, silogismo este que não ocorre na re-textualização. Observemos atentamente
o trecho a seguir: “E quero aceitar minha liberdade sem pensar o que muitos acham: que
existir é coisa de doido, caso de loucura. Porque parece. Existir não é lógico.” Esse trecho
pode ser parafraseado da seguinte maneira:
E quero aceitar minha liberdade sem pensar que existir é coisa de doido, caso de
loucura; Porque parece que existir é coisa de doido, caso de loucura; Existir não
é lógico.
Agora observemos o trecho em inglês: “I want to accept my freedom without
reaching the conclusion like so many others: that existence is only for fools and lunatics:
for it would seem that to exist is illogical.” Esse trecho pode ser parafraseado do seguinte
modo: I want to accept my freedom without reaching the conclusion that existence is only
for fools and lunatics; for it would seem that to exist is illogical. Por meio desta análise
mais detalhada, pode se perceber que o tradutor não considera parte do Rema que pode ser
recuperado da seguinte forma: “Porque parece que existir é coisa de doido, caso de
loucura” que funciona como uma premissa para a escritora concluir que “existir não é
lógico”. Como não há essa premissa na tradução, não há também uma oração que sirva para
concluir esse parágrafo no texto alvo, o que aponta para um efeito retórico e possivelmente
uma interpretação diferente deste trecho na re-textualização.
152
Quadro 4: Excerto 3 para análise manual da organização temática
TEXTO FONTE (LISPECTOR) TEXTO ALVO (PONTIERO)
Devo acrescentar um algo que importa
muito para a apreensão da narrativa: é que
esta é acompanhada do princípio ao fim por
uma levíssima e constante dor de dentes,
coisa de dentina exposta. Afianço também
que a história será igualmente acompanhada
pelo violino plangente tocado por um
homem magro bem na esquina. A sua cara é
estreita e amarela como se ele tivesse
morrido. E talvez tenha.
Tudo isso eu disse tão longamente por medo
de ter prometido demais e dar apenas o
simples e o pouco. Pois esta história é
quase nada. O jeito é começar de repente
assim como eu me lanço de repente na água
gélida do mar, modo de enfrentar com uma
coragem suicida o intenso frio. Vou agora
começar pelo meio dizendo que –
que ela era incompetente. Ø Incompetente
para a vida. Faltava-lhe o jeito de se ajeitar.
vagamente tomava conhecimento da
espécie de ausência que tinha de si em si
mesma. Se fosse criatura que se exprimisse
diria: o mundo é fora de mim, eu sou fora
de mim. (Vai ser difícil escrever esta
história. Apesar de eu não ter nada a ver
com a moça, terei que me escrever todo
através dela por entre espantos meus. Os
fatos são sonoros mas entre os fatos um
sussurro. É o sussurro o que me
impressiona).
I must add one important detail to help the
reader understand the narrative: it is
accompanied from start to finish by the
faintest yet nagging twinge of toothache,
caused by an exposed nerve. The story will
also be accompanied throughout by the
plangent tones of a violin played by a
musician on the street corner. His face is
thin and sallow as if he had just died.
Perhaps he is dead. I have explained these
details at great length for fear of having
promised too much and offering too little.
My story is almost trivial. The trick is to
begin suddenly, like plunging into an icy sea
and bearing its intense coldness with suicidal
courage. I am about to begin in the middle
by telling you that -
- that she was inept. Ø Inept for living. She
had no idea how to cope with life and she
was only vaguely aware of her own inner
emptiness. Were she capable of explaining
herself, she might well confide: the world
stands outside me. I stand outside myself.
(It's going to be difficult to tell this story.
Even though I have nothing to do with the
girl, I shall have to write everything through
her, trapped as I am by my own fears. The
facts are sonorous but among the facts
there is a murmuring. It is the murmuring
that frightens me.)
(p.24) (p.23-24)
Em primeiro lugar, observamos no Quadro 4 que muitos Temas ideacionais
processo-participantes no texto fonte (“Devo acrescentar”; “Afianço”; “E talvez tenha” e
“Vou agora começar”, para citar alguns exemplos) são re-textualizados no texto alvo por
Temas ideacionais participantes (“I”; “The story”; “Perhaps I” e “I”, respectivamente).
Observa-se que o tradutor constrói o participante “estória” por meio dos Temas
ideacionais participantes “it” e “The storyque nos trechos correspondentes do texto fonte
153
são textualizados como um Tema ideacional processo “é” e por um Tema ideacional
processo-participante “Afianço” respectivamente. É interessante observar o uso desta
construção “é que” que apresenta 67 ocorrências no texto fonte. É um uso bastante
recorrente que pode até mesmo apontar o estilo clariceano de escrita.
um Tema marcado no original que corresponde a um objeto que foi deslocado
para o início da sentença (“Tudo isso”). Na tradução, este Tema aparece em posição
remática (“these details”) e o Tema torna-se não marcado ideacional participante (“I”).
Observa-se que no texto fonte este Tema marcado ideacional participante introduz um novo
parágrafo enquanto que no texto alvo uma continuidade do parágrafo sem iniciar-se um
outro. Por isso, a escolha de um Tema não marcado no texto alvo pode estar relacionada
com a preferência pelo padrão SVO no inglês, deixando claro quem é o participante
(dizente – “I”), que é retomado em “My story”.
O tradutor re-textualiza dois períodos “Faltava-lhe o jeito de se ajeitar.
vagamente tomava conhecimento da espécie de ausência que tinha de si em si mesma.” em
um único “She had no idea how to cope with life and she was only vaguely aware of her
own inner emptiness ”. O impacto causado é de natureza coesiva, que ao imbricar dois
períodos em um só, foi necessário acrescentar uma conjunção paratática “and” que não está
presente no original. De acordo com Downing (1991:129), por meio das conjunções, é
possível saber qual direção lógica que a mensagem está tomando e sua conexão com a
informação anterior. A inclusão desta conjunção paratática, que é um Tema textual,
condensa as informações em um único período, proporcionando dessa forma uma relação
lógica de extensão aditiva positiva (HALLIDAY, 1994:324). Há ainda um impacto de
natureza interpessoal que diz respeito à tematização de dois adjuntos modais “Só” e
“vagamente” no texto fonte que se encontram em posição remática no texto alvo (“onlye
“vaguely”), tematização essa que destaca a atitude de Macabéa pelo fato destes adjuntos
modais fazerem parte do ponto de partida da mensagem.
154
“É o sussurro” é um Tema ideacional equativo, que vem seguido de uma
nominalização “o que me impressiona”. No texto alvo, a oração correspondente apresenta
um Tema ideacional predicado (“It’s the murmuring”). Apesar de serem estruturas
diferentes, ambas cumprem o papel de expressar um contraste ao “sussurro” e ao
“murmuring” mencionados nos Remas das orações anteriores ao mesmo tempo em que
ocorre uma progressão temática com salto temático (KOCH, 2003:63-65) ou padrão zig-
zag (EGGINS, 1994:303-304), pois “sussurro” e “murmuring” surgem primeiramente no
Rema para logo em seguida aparecerem no Tema ideacional equativo e no Tema ideacional
predicado respectivamente.
18
Quadro 5: Excerto 4 para análise manual da organização temática
TEXTO FONTE (LISPECTOR) TEXTO ALVO (PONTIERO)
Ela era calada (por não ter o que dizer) mas
gostava de ruídos. Eram vida. Ø Enquanto
o silêncio da noite assustava: parecia que
estava prestes a dizer uma palavra fatal.
Durante a noite na rua do Acre era raro
passar um carro, quanto mais buzinassem,
melhor para ela. Além desses medos, como
se não bastassem, tinha medo grande de
pegar doença ruim embaixo dela isso, a
tia lhe ensinara. Ø Embora os seus pequenos
óvulos tão murchos. Ø Tão, tão. Mas vivia
em tanta mesmice que de noite não se
lembrava do que acontecera de manhã.
Vagamente pensava de muito longe e sem
palavras o seguinte: já que sou, o jeito é ser.
Os galos de que falei avisavam mais um
repetido dia de cansaço. Cantavam o
cansaço. E as galinhas, que faziam elas?
Indagava-se a moça. Os galos pelo menos
cantavam. Por falar em galinha, a moça às
vezes comia num botequim um ovo duro.
Mas a tia lhe ensinara que comer ovo fazia
mal para o fígado. Sendo assim,
obedientemente adoecia, sentindo dores do
She rarely spoke (having little or nothing to
say) but she loved sounds. Sounds were
life. The night's silence made her feel
nervous. It was as if night were about to
pronounce some fatal word. At night, cars
seldom passed through Acre Street. When
they did, the louder their horns the more she
liked it. As if these fears were not enough,
she was also terrified of catching some
dreadful disease down below that was
something her aunt had taught her. Ø
Although her tiny ovules were all shrivelled.
Ø So hopelessly shrivelled. Her life was so
monotonous that by the end of the day she
could no longer remember what had
happened that same morning. She mused in
silence and the thought came to her: since I
am, the solution is to be. The cockerel I
mentioned earlier heralded yet another day.
It sang of weariness. Speaking of poultry,
the girl sometimes ate a hard-boiled Egg in a
snack-bar. Her aunt had always insisted that
eggs were bad for the liver. That being so,
she obediently became ill
and suffered
18
Cabe mencionar aqui que a sentença “É o sussurro o que me impressiona” aparece de maneira diferente em
edições anteriores da utilizada nesta dissertação. Conforme visto em (2000), que utiliza a e a 3ª edição
de A hora da estrela pela José Olímpio, essa sentença seria “É o sussurro que me impressiona”, o que
configuraria um Tema ideacional predicado. Como a edição usada nesta pesquisa corresponde àquela da
Editora Rocco (1998), consideramos a sentença com Tema ideacional equativo.
155
lado esquerdo oposto ao fígado. Pois era
muito impressionável e acreditava em tudo
o que existia e no que não existia também.
Mas não sabia enfeitar a realidade. Para ela
a realidade era demais para ser acreditada.
Aliás a palavra "realidade" não lhe dizia
nada. Ø Nem a mim, por Deus.
pains on the left side opposite the liver. For
the girl was most impressionable. She
believed in everything that existed and in
everything non-existent as well. But she
didn't know how to embellish reality. For
her, reality was too enormous to grasp.
Besides, the word reality meant nothing to
her. Ø Nor to me, dear God.
(p.33-34). (p.33).
Se observarmos a progressão temática em “Ela era calada (por não ter o que dizer)
mas gostava de ruídos. Eram vida.” e “She rarely spoke (having little or nothing to say) but
she loved sounds. Sounds were life.”, vemos o padrão zig-zag (EGGINS, 1994:303-304) ou
a progressão temática com salto temático (KOCH, 2003:63-65), que os grupos nominais
“ruídos” e “sounds” que estão em posição remática são retomados como Temas nas orações
seguintes: no texto fonte por meio de um Tema ideacional processo-participante “Eram” e
no texto alvo através de um Tema ideacional participante “Sounds”.
No texto fonte, “Enquanto o silêncio da noite assustava: parecia que estava
prestes a dizer uma palavra fatal.” é re-textualizado no texto alvo como “The night's silence
made her feel nervous. It was as if night were about to pronounce some fatal word.” o
desmembramento de um período em dois na tradução, o que causa uma segmentação de
orações. Além disso, a oração hipotática “Enquanto o silêncio da noite assustava”
estabelece uma referência anafórica com a oração anterior, que apresenta um Tema
ideacional elíptico. O tradutor opta por um Tema ideacional participante (The night's
silence”), além de especificar o participante (“her”) que fica assustado pelo silêncio da
noite. O impacto causado relaciona-se ao fato de que o tradutor opta por orações com
padrão SVO, mais familiares e que talvez facilitem a leitura neste trecho de sua re-
156
textualização ao segmentar um período em dois e também ao re-textualizar uma oração
com Tema ideacional elíptico em um Tema ideacional participante.
Observe os seguintes trechos do texto fonte e do texto alvo: “Durante a noite na rua
do Acre era raro passar um carro, quanto mais buzinassem, melhor para ela.” e At night,
cars seldom passed through Acre Street. When they did, the louder their horns the more she
liked it.” Parece haver uma tentativa por parte do tradutor de fornecer um número maior de
conexões nesse trecho do texto fonte na medida que ele constrói nexos de raciocínio ou de
pressuposição, quando ao segmentar a oração, ele introduz “When they did” que pode ser
parafraseado por “mas quando passavam”. Assim ele estabelece uma conexão que está
implícita e pode ser pressuposta no texto fonte.
As seguintes orações extraídas do texto fonte “E as galinhas, que faziam elas?
Indagava-se a moça. Os galos pelo menos cantavam.” não são re-textualizadas no texto
alvo, pois o tradutor opta por omitir este trecho e utiliza o hiperônimo “poultrypara se
referir às galinhas.
As orações “Aliás a palavra "realidade" não lhe dizia nada. Ø Nem a mim, por
Deus.” e “Besides, the word reality meant nothing to her. Ø Nor to me, dear God.” têm
como Temas textuais “Aliás” e “Besides” ao passo que como Temas ideacionais
participantes os grupos nominais “a palavra ‘realidade’” e “the word reality”. “Nem a mim,
por Deus” e “Nor to me, dear God” apresentam Temas ideacionais elípticos que se
encontram nas orações anteriores. Dessa maneira, os Remas “Nem a mim, por Deus” e
“Nor to me , dear God” podem ser parafraseados assim: “Aliás a palavra ‘realidade’ não
dizia nada nem a mim, por Deus” e “Besides, the word reality meant nothing nor to me,
dear God”. A presença deste Tema ideacional elíptico, além de sinalizar que a opinião do
narrador é a mesma de Macabéa com relação à palavra “realidade”, mostra a fragmentação
da escrita: “Nem a mim, por Deus” é claramente um afterthought, um pensamento, uma
reflexão após ter escrito aquilo sobre Macabéa.
157
Os dois Quadros seguintes dizem respeito à identificação e à interpretação dos
hiperTemas nos trechos escolhidos nos Quadros 6 e 7. Como já visto no capítulo da
Revisão Teórica, os hiperTemas estão em um nível acima dos Temas, pois, na verdade, são
sentenças que possuem tópicos que serão desenvolvidos ao longo do parágrafo.
Quadro 6: Excerto 1 para análise de hiperTema
TEXTO FONTE (LISPECTOR) TEXTO ALVO (PONTIERO)
Estou esquentando o corpo para iniciar,
esfregando as mãos uma na outra para ter
coragem. Agora me lembrei de que houve
um tempo em que para me esquentar o
espírito eu rezava: o movimento é espírito.
A reza era um meio de mudamente e
escondido de todos atingir-me a mim
mesmo. Quando rezava conseguia um oco de
alma - e esse oco é o tudo que posso eu
jamais ter. Mais do que isso, nada. Mas o
vazio tem o valor e a semelhança do pleno.
Um meio de obter é não procurar, um meio
de ter é o de não pedir e somente acreditar
que o silêncio que eu creio em mim é
resposta a meu - a meu mistério.
I am warming up before making a start,
rubbing my hands together to summon up
my courage. I can remember a time when I
used to pray in order to kindle my spirit:
movement is spirit. Prayer was a means of
confronting myself in silence away from the
gaze of others. As I prayed I emptied my
soul - and this emptiness is everything that I
can ever hope to possess. Apart from this,
there is nothing. But emptiness, too, has its
value and somehow resembles abundance.
One way of obtaining is not to search, one
way of possessing is not to ask; simply to
believe that my inner silence is the solution
to my - to my mystery.
(p.14) (p.14)
“Agora me lembrei de que houve um tempo em que para me esquentar o espírito eu
rezava: o movimento é espírito” e “I can remember a time when I used to pray in order to
kindle my spirit: movement is spirit” são hiperTemas porque introduzem o assunto que será
tratado logo a seguir. Funcionam como topic sentences que serão desenvolvidas ao longo
do parágrafo. Os hiperTemas exercem um papel relevante por orientarem os leitores na
compreensão do texto, que são pontos de partida da mensagem em um sentido mais
amplo, se comparados aos Temas.
158
Quadro 7: Excerto 2 para análise de hiperTema
TEXTO FONTE (LISPECTOR) TEXTO ALVO (PONTIERO)
Esqueci de dizer que às vezes a
datilógrafa tinha enjôo para comer. Isso
vinha desde pequena quando soubera que
havia comido gato frito. Assustou-se para
sempre. Perdeu o apetite, tinha a grande
fome. Parecia-lhe que havia cometido um
crime e que comera um anjo frito, as asas
estalando entre os dentes. Ela acreditava em
anjo e, porque acreditava, eles existiam.
Nunca havia jantado ou almoçado num
restaurante. Era de mesmo no botequim
da esquina. Tinha uma vaga idéia que
mulher que entra em restaurante é francesa e
desfrutável.
I forgot to mention that sometimes this
typist is nauseated by the thought of food.
This dates from her childhood when she
discovered that she had eaten a fried cat. The
thought revolted her for ever more. She lost
her appetite and felt the great hunger
thereafter. She was convinced that she had
committed a crime; that she had eaten a fried
angel, its wings snapping between her teeth.
She believed in angels, and because she
believed in them, they existed. The girl had
never eaten lunch or dinner in a restaurant.
She ate her food standing at the snack-bar on
the street comer. She fancied that a woman
who enters a restaurant must be French and
on the loose.
(p.39) (p.39)
O assunto deste dois parágrafos girará em torno destes dois hiperTemas: “Esqueci
de dizer que às vezes a datilógrafa tinha enjôo para comer” e “I forgot to mention that
sometimes this typist is nauseated by the thought of food”. Isso se deve ao fato de os
hiperTemas fornecerem uma idéia geral do que irá acontecer na seqüência do parágrafo.
Identificar o hiperTema de um dado parágrafo ou trecho auxilia o leitor a ter uma visão
mais ampla do texto que está lendo. Enfim, ter os hiperTemas em mente é certamente um
ponto de orientação para a leitura de qualquer texto em um âmbito mais discursivo.
Análises da organização temática de corpora paralelos bilíngües nos auxiliam a
verificar as escolhas tradutórias por meio de re-textualizações que privilegiam pontos de
partida da mensagem semelhantes e/ou diferentes, o que possivelmente aponta até mesmo o
estilo de escrita não apenas do autor mas também do tradutor.
No capítulo seguinte, serão introduzidas as considerações finais desta dissertação a
partir de uma síntese dos resultados da análise realizada e serão apresentadas sugestões
para novas pesquisas e também algumas limitações deste trabalho.
In his rendering of the source
text in the target language, the
translator constantly makes
choices. This is an elusive
process because it is
unconscious and instinctive
rather that conscious or logical.
Because there are no rules, no
laws or equivalence between
languages dictionaries only
propose possible, and, usually,
conventional equivalents which
may be inapplicable to literary
texts (…) there cannot be an
absolute right or wrong.
Giovanni Pontiero, The risks
and rewards of literary
translation
CONSIDERAÇÕES FINAIS
161
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pode ser observado pelo capítulo 3 (Análise e Discussão dos Dados), a
análise e a discussão da organização temática no corpus paralelo bilíngüe A hora da estrela
e The hour of the star apontam para semelhanças e diferenças entre textualização e re-
textualização sob este aspecto sistêmico-funcional. Por isso, cabe aqui retomar brevemente
os pontos discutidos no capítulo 3.
A diferença de segmentação de sentenças pode ser verificada por meio dos Temas
múltiplos e simples em ambos os textos: o original apresenta maior ocorrência de
Temas múltiplos enquanto que a tradução apresenta um maior índice de Temas
simples.
O texto fonte apresenta Temas textuais em maior quantidade em comparação ao
texto alvo, o que pode evidenciar a opção da escritora pelo uso mais freqüente de
orações paratáticas se comparado ao tradutor.
Com relação aos Temas interpessoais, verifica-se o seguinte: muitos destes Temas
textualizados pela escritora apresentam-se em posição remática na re-textualização
em função das diferenças sistêmicas entre o par lingüístico português-inglês. O
mesmo ocorre no corpus paralelo bilíngüe pesquisado por Munday (1998:193). No
texto fonte em espanhol, o adjunto modal de polaridade negativa No se manifesta
em posição temática enquanto que no texto alvo em inglês ele se manifesta em
posição remática.
Ademais, a escritora opta por utilizar mais Temas marcados em comparação ao
tradutor. Segundo Munday (1998:185), estes Temas marcados são resultados de
escolhas significativas por parte da escritora.
No que tange aos Temas ideacionais processo-participantes e aos ideacionais
participantes, o original possui uma alta ocorrência dos primeiros ao passo que a
162
tradução possui um alto índice dos segundos. Isso se deve ao fato de que o
português elide o sujeito com uma freqüência bem maior que o inglês, o que
corrobora Munday (1998:187-189) em sua pesquisa com um corpus paralelo
bilíngüe no par lingüístico espanhol-inglês.
O índice de Temas ideacionais processo é maior no texto fonte devido ao fato de
que o português apresenta opções de processos em sua forma impessoal e
pronominal, o que não ocorre em relação ao inglês.
No tocante aos Temas ideacionais circunstância, parece, quantitativamente falando,
que a escritora quis fornecer mais freqüentemente um quadro temporal/local ao
leitor para que as mensagens subseqüentes pudessem ser desenvolvidas
(DOWNING, 1991:126).
O tradutor opta por Temas ideacionais oracionais com maior freqüência, pois a re-
textualização apresenta mais orações hipotáticas reduzidas tematizadas se
comparado à textualização, além de a tradução apresentar orações hipotáticas em
posição temática que no original localizam-se em posição remática.
Com relação às estruturas tematizadas, a escritora utiliza mais freqüentemente
Temas ideacionais predicados e Temas ideacionais prepostos em comparação ao
tradutor enquanto que o tradutor opta por fazer um uso mais freqüente de Temas
ideacionais equativos e Temas ideacionais comentário se comparado à escritora.
Isso demonstra que o tradutor preocupa-se com a ênfase que é dada em certos
momentos da narrativa do texto fonte, mas isso também pode indicar que o tradutor
tem seu próprio estilo tradutório e literário pelo fato de fazer escolhas que se
relacionam com sua preocupação com o público-alvo (cf. seção 3.4 e seção 3.6).
Cabe salientar que estilo relaciona-se às opções lingüísticas feitas pelo escritor [ou
pelo tradutor] e sua relação com o sentido global da obra (HALLIDAY, 1973:116).
163
Cabe relembrar que o tradutor tende a optar pela estrutura SVO, como pode ser
observado pelo Quadro 3 e pelo Quadro 4 na seção 3.6 (Tema e tessitura textual).
A tradução apresenta um maior número de ocorrências de Temas ideacionais
atributivos prepostos, o que demonstra que o tradutor quer realçar atributos das
personagens em certos momentos de sua re-textualização.
Já os dados relativos aos Temas ideacionais elípticos e aos absolutos mostram que o
tradutor é sensível à escrita clariceana, pois ele re-textualiza semelhantemente
muitas destas estruturas em sua tradução. Nesse sentido, os dados desta pesquisa
corroboram as constatações de Baubeta (1997) ao concluir que o tradutor não quer
“colonizar” a textualização por não optar pela normalização da mesma.
Portanto, em um quadro comparativo, as diferenças de organização temática no
corpus são em grande parte de ordem sistêmica, mas também algumas delas podem apontar
para o estilo tradutório e literário de Pontiero enquanto que as semelhanças demonstram a
sensibilidade e a compreensão por parte do tradutor em relação à escrita clariceana. É claro
que pesquisas mais extensas com outras obras traduzidas por Pontiero poderiam dar
sustentação a esta afirmativa tentativa.
A correlação de Temas interpessoais com os Temas ideacionais participantes e os
ideacionais processo-participantes relativa ao narrador e à personagem Macabéa pode
caracterizar a narrativa, que os participantes e suas atitudes são importantes para
configurar o texto ficcional. Assim enquanto que a protagonista Macabéa tanto no texto
fonte quanto no texto alvo apresenta representações de mundo semelhantes quanto à
interpessoalidade temática, o mesmo não ocorre com o narrador: mais recorrentemente, no
texto fonte, sua interpessoalidade temática relaciona-se com uma representação do mundo
retratada pelos processos mentais ao passo que no texto alvo sua interpessoalidade temática
manifesta por meio de uma representação de mundo configurada pelos processos materiais.
Portanto, sob este aspecto, a configuração ficcional mostra-se distinta em ambos textos no
164
que tange ao narrador, mas mostra-se semelhante no que concerne à personagem
Macabéa, que apresenta uma representação de mundo relacionada aos processos mentais.
É interessante observar que Baker (1992:140) relativiza a visão hallidayana quanto
à classificação de Temas, afirmando que outros lingüistas adaptam seu modelo de acordo
com sua língua nativa ou com outras línguas com as quais eles sejam familiarizados. Como
diz Baker (1992:140), o modelo hallidayano é de fácil aplicação na língua inglesa que
apresenta uma ordem SVO mais fixa. Por isso, são necessárias adaptações às nguas com
uma ordem SVO mais flexível, pois, por exemplo, o modelo não prevê o processo como
Tema (BAKER, 1992:141). Feitas as devidas adaptações (e.g. a consideração das
categorias Tema ideacional processo, Tema ideacional processo-participante, Tema
ideacional elíptico), esta pesquisa mostra que a proposta hallidayana no que concerne à
classificação de Temas é aplicável, útil e viável. Porém, faz-se necessário sugerir questões
que precisam ser aprofundadas, tais como, as estruturas tematizadas e a definição de
parâmetros ainda mais específicos para a classificação de Temas em marcados e em não
marcados, principalmente no que diz respeito aos Temas ideacionais processo. Portanto, a
aplicabilidade da proposta hallidayana no tocante à classificação de Temas em línguas
como o português que apresenta uma ordem SVO mais livre é resultado de uma pesquisa
que leva em consideração outras interpretações desta proposta, interpretações tanto dos
adeptos de Halliday quanto da Gramática Tradicional.
Torna-se importante salientar as limitações desta pesquisa. Em primeiro lugar, mais
do que uma limitação, e sim uma dificuldade constatada. A fim de alcançar a coleta de
dados, as tarefas anteriores a essa etapa são complexas como a digitalização e posterior
revisão do corpus. Além disso, há a anotação do corpus que se apresenta como um trabalho
muito penoso, pois esta anotação deve ser constantemente revisada. Ademais, não podemos
focalizar todos os fenômenos decorrentes da organização temática, que a duração da
pesquisa de mestrado não nos possibilita isso. Uma outra limitação diz respeito ao fato de
165
que a interpessoalidade e a transitividade são exploradas nesta pesquisa somente do ponto
de vista temático. Além do mais, esta dissertação concentra-se na pesquisa da organização
temática, impossibilitando que a progressão temática fosse aprofundada.
Neste momento, cabe fazer algumas sugestões para novas pesquisas. Para efeito de
anotação de corpus, sugiro a utilização de um rótulo numérico, como o desenvolvido pelo
pesquisador Marcos Pereira Feitosa, chamado CROSF (FEITOSA, 2005) que consiste em
sete dígitos colocados entre parêntesis angulares. Este código foi desenvolvido
primeiramente para atender pesquisadores de organização temática, mas pode se estender a
outras metafunções também. Algumas das vantagens deste código são: com sua utilização
menor probabilidade de erros de digitação e também a visualização do texto fica mais
clara em comparação a rótulos feitos com palavras, que ocupam muito espaço.
Além disso, uma sugestão interessante a ser observada diz respeito a como lidar
com as diferenças sistêmicas relativas a uma organização temática em um corpus paralelo
bilíngüe no par lingüístico português-inglês. Por isso, é preciso aprofundar as reflexões
sobre as diferenças sistêmicas entre estas línguas. Por exemplo, delimitar critérios mais
específicos sobre o que pode ser desconsiderado de acordo com o foco da pesquisa, sem,
todavia, simplificar a análise. A título de exemplificação, poderíamos ter desconsiderado o
Tema interpessoal não no corpus em português por ele ocorrer prioritariamente nos Remas
no corpus em inglês, como o faz Munday (1998). Contudo, nesse caso, se por um lado
critérios como esse podem ser perfeitamente aplicáveis, por outro, elimina-se um aspecto
característico de uma língua. Assim, este tipo de decisão fica a critério do (a) pesquisador
(a) que irá estabelecer o tipo de foco que ele/ela quer imprimir em sua pesquisa.
Esta pesquisa é um estudo de caso que tem como um dos seus objetivos poder
colaborar para um mapeamento dos fenômenos lingüísticos em corpora paralelos. Assim,
esperamos que esta dissertação possa contribuir com um maior conhecimento acerca da
organização temática nestes corpora.
166
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