RESUMO
A obesidade é uma síndrome metabólica complexa de etiologia multifatorial, que afeta um
número progressivo de indivíduos. Estudos epidemiológicos confirmam que a síndrome
metabólica está relacionada com obesidade abdominal, resistência à insulina, diabetes e outros
fatores de risco metabólicos para doenças cardíacas. O tipo de alimentação, em especial os
ácidos graxos (AG) consumidos, podem estar relacionados com os distúrbios da obesidade. Os
ácidos graxos trans (AG trans) são obtidos pela dieta, em produtos contendo gorduras
hidrogenadas e derivados dos animais ruminantes. Estes AG são bem absorvidos pelo
organismo, e a composição destes no tecido adiposo (TA) reflete o consumo a longo prazo. Na
obesidade, o metabolismo do TA é alterado e o restabelecimento da homeostase energética
requer a identificação e regulação de genes envolvidos no metabolismo de lipídeos e
carboidratos. Os receptores ativadores da proliferação de peroxissomos (PPARs) estão
envolvidos na modulação do metabolismo e são ativados por AG. Os objetivos deste trabalho
foram determinar o conteúdo total de AG trans no TA subcutâneo (TAS), retroperitoneal (TAR)
e visceral (TAV) de obesos e não obesos submetidos à cirurgia bariátrica ou cirurgia abdominal;
analisar o padrão de expressão do PPARβ/δ e PPARγ1-3 nos diferentes depósitos destes TA; e
comparar a expressão destes receptores em obesos e não obesos. Os TA foram obtidos por
cirurgia. Para quantificar os AG trans, os lipídeos foram extraídos, saponificados e esterificados.
Os níveis de AG trans foram medidos por FTIR-ATR. Para quantificar o mRNA, o RNA total
foi extraído com TRIzol, foi reverso transcrito e determinado quantitativamente pela reação em
cadeia da polimerase (qRT-PR). A média de AG trans em pacientes obesos foi de 6.3% no TAR
e 8.7% no TAV. Nos pacientes não obesos, os resultados foram 6.9% no TAS e 9.3% no TAV.
Não houve diferença estatística entre os grupos. No entanto, o depósito de AG trans no TAV foi
maior nos pacientes obesos mórbidos (P<0.001) e nos não obesos (P<0.05). Por outro lado, a
quantidade de mRNA do PPARβ/δ nos diferentes depósitos de TA de obesos mórbidos mostrou
uma diminuição significativa no TAV (p<0.05). No grupo de não obesos, os níveis de PPARβ/δ
foram mais altos no TAS (p<0.05). Os níveis de PPARγ1-3 não diferiram estatisticamente entre
os depósitos de TA tanto de obesos quanto não obesos. Quando obesos e não obesos foram
comparados, os resultados revelaram uma diminuída expressão de PPARβ/δ no TAS (p=0.058) e
TAV (p=0.094) de obesos mórbidos. A expressão de PPARγ1-3 foi significantemente aumentada
no TAS (p=0.022) e diminuída no TAR (p=0.034) nos obesos mórbidos. A expressão de
PPARβ/δ no TAS e TAV correlacionou negativamente com a medida do quadril e com os níveis
de insulina, respectivamente. Os níveis de mRNA PPARγ1-3 no TAR correlacionaram
negativamente com a medida da cintura e do quadril e no TAV correlacionou positivamente com
a medida da cintura. Os valores encontrados de AG trans em todos os TA analisados são maiores
do que os reportados em outros países. Nós encontramos maior depósito destes AG no TAV do
que nos outros estoques. Os níveis elevados no TAV preocupam devido à alta taxa de lipólise
deste tecido e sua forte associação com alterações metabólicas. Os altos níveis de AG trans
encontrados refletem, ainda, o alto consumo destes na dieta dos brasileiros. Os resultados da
expressão de PPARs demonstram que PPARβ/δ e PPARγ1-3 são quantitativamente diferentes
nos depósitos de TA de obesos mórbidos comparados a não obesos e que o padrão de expressão
do PPARβ/δ é característico de cada depósito de TA. Os dados de correlação reforçam a relação
destes receptores com a obesidade.