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Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em História da Faculdade de História, Direito e
Serviço Social da Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do grau de
Doutor em História.
ÈUHDGHFRQFHQWUDomR: História e Cultura Social
2ULHQWDGRU Prof. Dr. Ivan Aparecido Manoel.
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Freitas, Nainôra Maria Barbosa de
A criação da diocese de Ribeirão Preto e o governo do
primeiro Bispo : D. Alberto José Gonçalves / Nainôra Maria
Barbosa de Freitas. –Franca : UNESP, 2006
Tese – Doutorado – HistóriaFaculdade de História,
Direito e Serviço Social – UNESP.
1. Diocese de Ribeirão Preto (SP) – História eclesiástica.
2. Igreja Católica
História
Brasil. 3. Província Eclesi
ástica
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Tese para obtenção do grau de doutor em História.
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Em memória de meus pais:
José e Romilda
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Esta pesquisa contou com a ajuda inestivel de inúmeras pessoas, que contribuíram
de forma direta ou indireta, a elas meu agradecimento, apesar de saber que corro riscos de
esquecer nomes na lista a seguir.
Ao prof. dr. Ivan Aparecido Manoel, que, mais do que orientador revelou-se um
amigo, minha eterna gratio pela paciência com que ao longo desses anos me orientou e animou
nos momentos mais diceis.
Sem citar nomes, agradeço aos funcionários da Cúria Metropolitana de Ribeio
Preto, da Cúria Metropolitana de São Paulo, Cúria Metropolitana de Curitiba, Cúria Diocesana de
Franca, Catedral de Ribeio Preto, do Arquivo Público e Histórico de Ribeio Preto, Arquivo
da mara Municipal de Ribeio Preto, Arquivo Público Municipal de São Carlos, Arquivo do
Jornal “A Cidade”, Arquivo Secreto do Vaticano, Arquivo Hisrico do Vaticano, Arquivos das
Paquias da diocese de Ribeirão Preto, Museu de Arte Sacra de São Jo da Boa Vista, Arquivo
Público do Estado de São Paulo, Arquivo da Paróquia Nossa Senhora da Conceição Palmeira
PR, Biblioteca Pública do Estado do Paraná, pela ajuda inestivel na garimpagem dos
documentos e livros.
Um agradecimento especial se faz indispensável às funciorias do Centro de
Estudos da Arquidiocese de Ribeio Preto: Ivone, Lisandra e Fabiana.
Aos funciorios da biblioteca da Unesp, obrigada pela ajuda e compreensão das
minhas dificuldades.
Aos funcionários da pós-graduação da Unesp de Franca, obrigada pelas orientações.
Aos colegas do Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeio Preto, do Centro
Universitário Bao de Ma e do Centro Universitário Claretiano, pela força nos momentos
diceis. Meu agradecimento a essas instituições pela compreensão em minhas ausências.
Aos professores dr. Ubaldo Silveira e dra. Teresa Malatian, pelas cticas e sugestões
no exame de qualificação.
A Adveniat, cuja bolsa possibilitou a visita aos Arquivos do Vaticano.
A Claudete e Célia, amigas que abandonei no meio de um projeto, obrigada pelo
carinho.
Aos meus leitores Belmira e Osmair, sem vocês não sei o que teria sido de mim,
obrigada pelos apontamentos, cticas e sugeses.
7
Célia, João e Belinha, obrigada pelas traduções que fizeram em diferentes momentos
Aos meus alunos que me animaram, cobraram e ajudaram com suas indagações, nas pessoas de
Edgar, Márcio, Círio e Maciel, que diretamente contribuíram em algum momento para a pesquisa.
Ao cônego Arnaldo Álvaro Padovani, pela gentileza com que “me contou” a hisria
da diocese.
Ao padre Francisco de Assis Correia, obrigada pelas informações e material sobre a
história da arquidiocese.
A d. Diógenes Silva Matthes, bispo de Franca, obrigada pelas indicações.
A d. Pedro Fedalto, arcebispo emérito de Curitiba, minha gratio pela acolhida em
sua casa, por partilhar seu conhecimento sobre d Alberto, d. Manuel e a hisria eclesiástica.
Aos amigos Claretianos de Curitiba, obrigada pela hospedagem.
Às Irmãs da Divina Providenza, obrigada pelo carinho com que me receberam em
Roma.
A d. Arnaldo Ribeiro, arcebispo erito de Ribeio Preto, obrigada pela
disponibilidade com que me acolheu ao longo desses anos, partilhando seu conhecimento e
facilitando minha vida durante a pesquisa com cartas de apresentação.
À profa. Clarisse, a Raimundo e Daniel, obrigada pelas correções e acertos finais do
texto.
Aos colegas Hedmar e Marco, obrigada pelo apoio, sugestões e pela partilha de
conhecimento em diferentes momentos do curso.
Aos amigos: Regina, Afonso, Rita, Marilisa, Leonice, Renato, José Dias, Luis Carlos,
Maria Helena, Olívia, Flávio, Lílian, Márcia, Valmira, Sara, obrigada pela paciência com que “me
aturaram” nas horas diceis e nas alegres, vocês contribuíram para uma outra história.
Por fim, agradeço à minha falia: Maria Cecília, Fernando, Mariana, Ana lia,
Flavinha, vocês foram meu sol em dias de chuva. Obrigada é pouco.
5(6802
Esta tese aborda a criação da diocese de Ribeirão Preto e o governo de seu
primeiro bispo.
Em junho de 1908, foi criada a diocese de Ribeirão Preto junto com outras cinco
dioceses que passaram a fazer parte da Província Eclesiástica de São Paulo, projeto de D.
Duarte Leopoldo e Silva teve por objetivo aumentar e consolidar a presença da Igreja no
interior de São Paulo. O bispo eleito para Ribeirão Preto foi D. Alberto José Gonçalves, um
padre político que exerceu os cargos de deputado e senador da República pelo Paraná e que
veio com a incumbência arregimentar os católicos para o seio da Igreja e diminuir as forças da
modernidade anticlerical e de outras crenças na região. O governo de D. Alberto estendeu-se
de fevereiro de 1909 quando tomou posse até seu falecimento em maio de 1945. Ao longo dos
36 anos que esteve à frente da diocese de Ribeirão Preto, organizou o patrimônio, construiu e
embelezou a catedral, incentivou os padres a construírem e reformarem suas matrizes. A obra
pastoral de D. Alberto teve início com as visitas pastorais em sua diocese pregando,
administrando os sacramentos e orientando padres e fieis. O incentivo para que os padres
chamassem os leigos para participar das atividades da Igreja, a preocupação com a entrada de
outras crenças cristãs e não cristãs marcou o governo de D. Alberto. Distante da política
partidária e dos cargos eletivos, o Bispo de Ribeirão Preto preocupou-se em implantar o
ensino religioso nas escolas públicas, a Ação Católica nas paróquias e, realizou um Congresso
Eucarístico Diocesano. As diretrizes do Vaticano foram acolhidas e seguidas por D. Alberto e
pelo bispo auxiliar que chegou em 1940 D. Manoel da Silveira D’Elboux.
Palavras-chave: Igreja Católica, Diocese de Ribeirão Preto, D. Alberto José Gonçalves,
Província Eclesiástica de São Paulo.
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This thesis focuses on the establishment of the diocese of Ribeirão Preto and the
government of its first bishop.
In June of 1908 the diocese of Ribeirão Preto was created along with five other
dioceses which became part of the Ecclesiastical province of São Paulo, a project developed
by D. Duarte Leopoldo e Silva with the intent of increasing and consolidating the presence of
the Church in the interior of the state of São Paulo. The bishop elected for Ribeirão Preto was
D. Alberto José Gonçalves, a priest and politician who had held office as congressman and
senator for the Republic from the state of Paraná, and who came with the incumbency to
recruit all Catholics in the task of weakening the forces of anticlerical modernism and of other
beliefs in the region. D. Alberto’s term in government extended from February 1909, when he
took office, until his death in May of 1945. During the 36 years in which he was at the head of
the diocese of Ribeirão Preto he organized the assets, constructed and embellished the
cathedral, and encouraged his priests to build and renovate their parishes. D. Alberto’s
pastoral works began as pastoral visits in his diocese, preaching, administering the sacraments
and orientating priests and lay people. His incentive to his priests to call upon the
participation of lay people in church activities, as well as his preoccupation with the
expansion of other faiths, both Christian and non-Christian, were important issues of D.
Alberto’s government. Maintaining a distance from political parties and from any elected
office, the Bishop of Ribeirão Preto set about implanting religious teaching in the public
schools, setting up the Ação Católica” (Catholic Action) in the parishes and holding a
Diocesan Eucharistic Congress. All of the directives of the Vatican were accepted and
followed by D. Alberto and by his auxiliary bishop, D. Manoel da Silveira D’Élboux, who
arrived in 1940.
Key Words Catholic Church, Archdiocese Ribeirão Preto, Bishop Alberto José Gonçalves,
Ecclesiastical Province of São Paulo.
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ACMRP-SP - Arquivo da Câmara Municipal de Ribeirão Preto
ACDF-SP - Arquivo da Cúria Diocesana de Franca-SP
ACMC - Arquivo da Cúria Metropolitana de Curitiba
ACMRP-SP - Arquivo da Cúria Metropolitana de Ribeirão Preto-SP
ACMSP - Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo
ACRP-SP - Arquivo da Catedral de Ribeirão Preto-SP
MASSJBV - Museu de Arte Sacra de São João da Boa Vista-SP
APHRP-FJPM-SP - Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto-SP, Fundo José Pedro de
Miranda.
APNSAS-SP - Arquivo da Paróquia Nossa Senhora Aparecida - Sertãozinho-SP
APSBJCVB-SP - Arquivo da Paróquia do Senhor Bom Jesus da Cana Verde – Batatais-SP
APSRSRPQ-SP - Arquivo da Paróquia de Santa Rita - Santa Rita do Passa Quatro-SP
APSSM-SP - Arquivo da Paróquia de São Sebastião - Mococa-SP
ASgV-NAB - Archivio Segreto do Vaticano- Nunziatura Apostólica in Brasilae
ASV - Archivio Storico do Vaticano
BD - Boletim Diocesano
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1.1 A
ESCOLHA DOS
B
ISPOS
...............................................................................................................................31
1.2 O BISPADO DE RIBEIRÃO PRETO..................................................................................................................34
1.3 E
M BUSCA DAS CONDIÇÕES PARA A FORMAÇÃO DO BISPADO DE
R
IBEIRÃO
P
RETO
......................................38
1.4 C
ONSTRUÇÃO DA
C
ATEDRAL E A FORMAÇÃO DO PATRIMÔNIO
....................................................................47
1.5 O ELEITO: D. ALBERTO JOSÉ GONÇALVES ...................................................................................................54
1.6 S
AGRAÇÃO E POSSE DE D
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LBERTO
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...............................................................................65
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2.1 A
OBRA INICIAL DE D
. A
LBERTO
:
AS VISITAS PASTORAIS
.............................................................................75
2.2 C
LERO E O SEMINÁRIO
.................................................................................................................................83
2.2.1 O
CASO DO
P
ADRE
E
UCLIDES
G
OMES
C
ARNEIRO
.................................................................................87
2.2.2 F
ORMAÇÃO DO CLERO
:
A CONSTRUÇÃO DO SEMINÁRIO
.......................................................................93
2.3 O
BRA FINANCEIRA DA DIOCESE
...................................................................................................................98
2.3.1 O
RGANIZAÇÃO DAS FÁBRICAS DAS MATRIZES
....................................................................................100
2.3.2 OS DESVIOS ENVOLVENDO OS FABRIQUEIROS ....................................................................................108
2.4 V
ISITA AD LIMINA
......................................................................................................................................117
2.5 O
CULTO E AS ASSOCIAÇÕES LEIGAS
..........................................................................................................119
2.5.1 A
S FESTAS SAGRADAS
........................................................................................................................120
2.5.2 A
CATEQUESE
....................................................................................................................................129
2.5.3 A
SSOCIAÇÕES LEIGAS
........................................................................................................................130
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3.1 A IGREJA DE RIBEIRÃO PRETO E A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA DE 1932 ......................................151
3.2 B
ODAS DE OURO DE D
. A
LBERTO
...............................................................................................................157
3.3 I
GREJA E POLÍTICA
A L
IGA
E
LEITORAL
C
ATÓLICA
, LEC........................................................................161
3.4 A LEC
EM
R
IBEIRÃO
P
RETO
......................................................................................................................167
3.5 O
ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS CATÓLICAS E PÚBLICAS
......................................................................171
3.5.1 E
SCOLAS CATÓLICAS EM
R
IBEIRÃO
P
RETO
........................................................................................171
3.5.2 O
ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS
...................................................................................173
3.6 A
ÇÃO CATÓLICA
........................................................................................................................................179
3.6.1 O PROJETO DO RÁDIO .........................................................................................................................184
3.7 F
ORÇAS INIMIGAS DO CATOLICISMO NO SEIO DA DIOCESE
..........................................................................191
14
3.7.1 ESPIRITISMO.......................................................................................................................................192
3.7.2 P
ROTESTANTES
..................................................................................................................................198
3.7.3 M
ACUMBEIROS E CURANDEIROS
........................................................................................................202
3.7.4 C
OMUNISTAS
......................................................................................................................................203
3.8 A
CHEGADA DO BISPO AUXILIAR
:
D
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LBOUX E O FIM DO GOVERNO DE D
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3.8.1 C
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3.8.2 P
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1752'8d2
A História das Religiões, nas últimas décadas, ganhou espaço nos meios
acadêmicos, fora e dentro do Brasil. Em meio às abordagens a respeito das religiões, os
estudos sobre a Igreja católica cresceram entre os pesquisadores nas universidades brasileiras.
Durante séculos, escrever sobre a Igreja católica era quase um monopólio de padres e
religiosos. No culo XX, superando aquelas interpretações teóricas que reduziam as crenças
e as Igrejas, a católica em particular, à condição de ópio do povo e aparelho ideológico do
Estado, as novas abordagens no campo da História permitiram um outro olhar a respeito das
instituições religiosas e as manifestações de fé.
Ao estudarmos a Igreja Católica Apostólica Romana optamos pelo termo Igreja. O
conceito de Igreja usado por Ivan Manoel foi o adotado para delinear este estudo. Igreja
entendida como [...] uma Eklesia, uma reunião de fiéis, a assembléia dos cristãos, o povo de
Deus [...]
1
O conceito (NOHVLD deve ser compreendido com toda a hierarquia da Igreja (papa,
bispos e padres) em sintonia com os fiéis que seguem as diretrizes emanadas dessa hierarquia.
As diferentes manifestações da prática religiosa dos fiéis são estudadas como o lugar do
movimento de Jesus. Essas manifestações ao longo dos dois mil anos de história do
cristianismo, têm revelado a compreensão de realidades que apontaram caminhos percorridos,
ora dirigidos pela hierarquia, ora dissociados dela.
As correntes de interpretação historiográfica das manifestações da católica e da
Igreja, aqui entendida dentro do conceito especificado anteriormente, revelam que o estudo da
história do cristianismo mudou de foco no século XX. Diminuíram os estudos a respeito da
instituição, vista a partir dos grandes papas e bispos, crescendo em outra perspectiva, com os
estudiosos dedicando-se pobre, ao outro, nos rumos apontados pela nova história
2
, das
interpretações de gênero, da história das mentalidades; entre outras abordagens, buscando
uma trajetória em que a instituição passou a ser vista com outro olhar.
1
MANOEL, Ivan A. 23rQGXORGD+LVWyULD. Tempo e eternidade no pensamento católico. (1850-1960).
Maringá: UEM, 2004, p. 9-10.
2
BURKE, Peter. (Org.).
$HVFULWDGD+LVWyULD
Novas perspectivas. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Edunesp,
1992.
16
No conjunto da história eclesiástica, pesquisadores delinearam conceitos que
contribuíram para nortear a temática em que está inserida esta pesquisa.
3
A história
eclesiástica ganhou as academias e, com isso, um novo tratamento historiográfico.
4
Essa
historiografia explica os caminhos percorridos pela Igreja na passagem do século XIX para o
XX, quando ficou estabelecido o modelo de Igreja situado no contexto de tempo e espaço
para este trabalho ou seja, estudar a instituição a partir das diretrizes do projeto do Vaticano,
aqui entendido como URPDQL]DomR. A URPDQL]DomR é explicada pelo direcionamento dos
papas e da Secretaria de Estado do Vaticano, por meio do episcopado e do clero, aplicando as
diretrizes da Igreja diante do mundo moderno.
Para entender a Igreja e a romanização na sua vertente institucional, usamos o
conceito de Ivan Manoel:
[...] em um momento histórico, onde o Papa [entenda-se a hierarquia
eclesiástica] define um conceito de Igreja, estabelece suas tarefas e
estratégias de ação e reordena sua política interna em função de seu projeto
político e pastoral externo, e essa nova forma de autoentendimento
permanecerá em vigência até ser substituída por outra, gerada nas suas
próprias contradições internas e externas.
5
No Brasil, o projeto pastoral da Igreja, ao longo do período colonial e, depois,
Imperial, esteve atrelado ao Estado por meio do regime do 3DGURDGR5pJLR. O Estado dirigia
os negócios eclesiásticos no Brasil, dentre eles, a criação de dioceses, indicação dos bispos e
padres, administração dos dízimos, etc.
6
Com esse modelo de Igreja, os católicos praticavam
um catolicismo em que recebiam o sacramento do batismo e freqüentavam a igreja em
determinadas festas sacras, contratavam padres para celebrar em suas irmandades e
3
WEILER, Anton. História Eclesiástica e autocompreensão da Igreja.
&RQFLOLXP
(67): 806-810, 1971;
POULAT, Emile. Compreensão histórica da Igreja e compreensão eclesiástica da História. &RQFLOLXP (67): 811-
824, 1971.
4
A obra de Augustin Wernet representa um marco para os estudos mais pontais sobre a Igreja no Estado de São
Paulo. WERNET, Augustin.
$,JUHMD3DXOLVWDQRVpFXOR;,;
. São Paulo: Ática, 1987. O CEHILA (Centro de
Estudos da História da Igreja na América Latina e Caribe) e o CEPEHIB (Centro de Estudos de pesquisa de
História da Igreja no Brasil) contribuíram para aumentar o número de pesquisadores e obras publicadas sobre a
história da Igreja no Brasil em diferentes momentos. Grupos de estudos nas grandes universidades brasileiras
foram organizados com a temática Igreja ou ainda história das religiões. A ABHR (Associação Brasileira de
História das Religiões) tem publicado a Coleção Estudos da ABHR trazendo reflexões sobre a temática da
História das Religiões. GUERRIERO, Silas (Org.).
2HVWXGRGDV5HOLJL}HV
Desafios Contemporâneos. São
Paulo: Paulinas, 2003; SIEPIERSKI, Paulo D. & GIL, B. M.
5HOLJL}HVQR%UDVLO
Enfoques, dinâmicas e
abordagens. São Paulo: Paulinas, 2003; MANOEL, Ivan A. & FREITAS, Nainôra M. B. de.
+LVWyULDGDV
5HOLJL}HV Desafios, Problemas e Avanços Teóricos, Metodológicos e Historiográficos. São Paulo: Paulinas,
2003.
5
MANOEL, 2004, p. 10.
6
HOONAERT, E. (Coord.).
+LVWyULDGD,JUHMDQR%UDVLO
. tomo II/1. Petrópolis: Vozes, 1977, p.33. et seq.
17
confrarias; eram mais independentes da instituição em suas manifestações e a instituição
possuía pouca presença para aplicar suas diretrizes.
No século XIX, com as pidas transformações pelas quais passava a sociedade,
com a modernização, o advento de novas teorias, muitas delas anticlericais, o aumento da
secularização e da laicização, a resposta da Igreja foi dura e incisiva. A palavra de ordem na
cúria romana era o antimodernismo. Com o 6\OODEXV de 1864, do papa Pio IX
7
, houve um
repúdio e uma condenação à sociedade moderna.
8
Nascadas seguintes a Igreja posicionou-
se com um novo direcionamento pastoral. Esse posicionamento procedente da cúria romana,
conhecido pelo nome de URPDQL]DomR, chegou ao Brasil na segunda metade do culo XIX,
encontrando a Igreja atrelada ao regime do 3DGURDGR5pJLR. Durante o pontificado do papa
Pio IX (1846-1878), a situação da Igreja no Brasil revelou indícios de mudanças nas atitudes
dos bispos e padres, que assumiram uma postura mais alinhada com a política da cúria
romana.
9
Para Bruneau
10
, o episcopado escolhido por d. Pedro II era culto e refinado, o que
contribuiu para que fossem mais sensíveis às mudanças propostas pelo Vaticano. Alguns
bispos eleitos na segunda metade do século XIX, fizeram seus estudos em Roma
11
, o que,
certamente, favoreceu a aproximação com a linha de conduta conhecida comoURPDQL]DomR.
Uma outra situação preocupante para alguns bispos eram os padres. O bispo de
São Paulo d. Antonio Joaquim de Melo
12
tentou melhorar a situação de seu clero, uma vez
que este o primava por bons costumes, possuía uma formação precária, o que justificava as
sua tentativas de investir na formação dos futuros sacerdotes, criando o Seminário de São
Paulo, seguindo as normas de conduta que tinham em vista o modelo de Roma.
A postura de bispos brasileiros contra membros da maçonaria, instituição
condenada pelo Vaticano, provocou um choque entre a elite política local, as atitudes do
imperador d. Pedro II e a Igreja. O episódio ficou conhecido como Questão Religiosa, e os
bispos d. Vital e, depois, d. Macedo Costa levantaram um interdito contra os maçons que
7
MARTINA, Giacomo.
+LVWyULDGD,JUHMD
. De Lutero a nossos dias. III - A era do Liberalismo. São Paulo:
Loyola, 1997, p. 235-253. O capítulo analisa o 6\OODEXV de Pio IX.
8
AZZI, R.
$1HRFULVWDQGDGH
Um projeto restaurador. São Paulo: Paulus, 1994, p. 23.
9
BRUNEAU, T. C.
2FDWROLFLVPREUDVLOHLURHPpSRFDGHWUDQVLomR
. São Paulo: Loyola, 1974, p. 57.
10
BRUNEAU, T. 1974, p. 59.
11
MICELI, S. $(OLWH(FOHVLiVWLFD%UDVLOHLUD. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1988. Miceli apresenta um quadro
dos Bispos, com a formação escolar e clerical.
12
WERNET, Augustin.
$,JUHMD3DXOLVWDQRVpFXOR;,;
. São Paulo: Ática, 1987. O capítulo III. A reforma do
clero paulista de D. Antonio Joaquim de Melo, retrata estas mudanças.
18
freqüentavam as antigas irmandades.
13
Os bispos, alinhados com o Vaticano, foram presos,
julgados e condenados a quatro anos de prisão com trabalhos forçados.
14
O episódio da prisão dos bispos revelou que chegara ao Brasil uma situação
corrente na Europa: o choque de um Estado e seus líderes com a Igreja que buscava conservar
seu domínio e poder. Esse momento é caracterizado pela tentativa da Igreja de implementar
reformas, realizar uma clericalização trazendo propostas de mudanças na fisionomia da vida
eclesial, litúrgica e pastoral e na espiritualidade.
15
No Brasil, na segunda metade do culo XIX, o desconhecimento religioso, a
entrada de grande número de imigrantes europeus com outros ideais e crenças, a presença
cada vez maior da maçonaria e de Igrejas cristãs e não cristãs, no seio da sociedade,
acentuavam a carência e a precariedade em que encontrava a prática religiosa, em cidades em
franco desenvolvimento.
As práticas de religiosidade do povo brasileiro, tais como o batizado, o ensino das
rezas às crianças, as manifestações de fé e piedade nas festas dos santos padroeiros, a
recitação coletiva dos terços nas casas, constituíam as diferentes formas em que os católicos
do país expressavam sua fé. Era um catolicismo exteriorizado, herdado do período colonial.
De Roma chegavam novas devoções trazidas pelos padres, como o culto ao
,PDFXODGR&RUDomRGH0DULD que aumentou depois da proclamação do 'RJPDGD,PDFXODGD
&RQFHLomR, de 1854. Outra devoção, a do 6DJUDGR&RUDomRGH-HVXV veio acompanhada com
a consagração das igrejas, cidades, casas e famílias ao seu culto. A associação do Apostolado
da Oração, substituindo as antigas irmandades, introduziu um elemento-chave: promover os
interesses do 6DJUDGR &RUDomR GH -HVXV por meio da orientação dos padres e diretores
espirituais, que dirigiam as ões dos associados com o intuito fazer de florescer o espírito
cristão pela freqüência aos sacramentos e outras práticas de piedade, adotando o binômio
confissão-comunhão nas primeiras sextas-feiras do mês, em que era obrigatória a presença do
padre, uma vez que antes não era necessário, como maneira de expressar a devoção ao
6DJUDGR&RUDomRGH-HVXV
16
A expansão dessa devoção nas paróquias brasileiras ocorreu no
fim do século XIX e na primeira metade do século XX.
13
FRAGOSO, Hugo. A Igreja na formação do Estado liberal. In: BEOZZO, J. O. (Org.). +LVWyULDGD,JUHMDQR
%UDVLO
. Tomo II /2. Petrópolis: Vozes, 1980, p. 186-192.
14
FRAGOSO, 1980, p. 188.
15
HOONAERT, E. A Igreja no Brasil. In: DUSSEL, E.
+LVWyULD/LEHUDWLRQHV
. 500 anos de História da igreja na
América Latina. Trad. Rezende Costa. São Paulo: Paulinas, 1992, p. 311.
16
BEOZZO, J. O. A Igreja frente aos Estados Liberais: 1880-1930. In: DUSSEL, E.
+LVWyULD/LEHUDWLRQLV
. Op.
cit, p. 214. O papa Pio IX, deu impulso para que todos os cristãos celebrassem a festa do Sagrado Coração “ [...]
oficializou em 1856, para toda a Igreja, a festa do Sagrado Coração de Jesus. Leão XIII consagrou o mundo ao
19
Essas associações, dirigidas e controladas pelo clero, deixaram para trás aquelas
controladas por leigos, comuns no Brasil entre o século XVI e a primeira metade do culo
XIX.
17
No Brasil, a partir de 1889, com a proclamação da República e o fim do 3DGURDGR
5pJLR, a Igreja passou a caminhar com base em novas diretrizes, buscando um alinhamento
com o Vaticano.
18
Com esse contexto de Igreja, inúmeras questões surgiram e levaram ao estudo do
projeto da instalação e desenvolvimento da diocese de Ribeirão Preto. A tarefa a que nos
propomos é discutir a criação da diocese de Ribeirão Preto, ou Rivi Nigri
19
, e o governo do
seu primeiro bispo, d. Alberto José Gonçalves.
O recorte temporal tem início nos primeiros anos do século XX, quando em 1907,
a cidade de Ribeirão Preto foi escolhida para ser a sede de uma diocese no interior de São
Paulo. A pesquisa finaliza com a morte do primeiro bispo de Ribeirão Preto em 1945.
Para o período delineado, existe uma carência de estudos a respeito da história da
Igreja católica em Ribeirão Preto. Os mais específicos estão limitados às obras de monsenhor
dr. João Lauriano e do padre Francisco de Assis Correia. O livro do padre Francisco de Assis
Correia
20
, +LVWyULDGD$UTXLGLRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR, em sua versão inicial de 1983, edição
comemorativa do jubileu de diamante da diocese e jubileu de prata da arquidiocese, traça um
panorama geral da história da arquidiocese. O livro foi reeditado em 1998, para comemorar os
90 anos da criação da diocese e 40 anos da arquidiocese.
Mons. dr. João Lauriano, exerceu o cargo de vigário-geral do bispado de Ribeirão
Preto de 1927 a 1973, dedicou os últimos anos da vida a escrever a história da diocese. Seu
primeiro livro
21
, 6XEVtGL RVSDUDDKLVWyULDUHOLJLRVDGH5LEHLUmR3UHWR analisa os
primórdios da fundação da capela e depois matriz de São Sebastião.
Sagrado Coração em 1º de janeiro de 1900”. ZAGHENI, G.
$,GDGH&RQWHPSRUkQHD
Curso de História da
Igreja. São Paulo: Paulus, 1999, p. 64 et seq.
17
BOSCHI, C. C. 2V/HLJRVHR3RGHU. Irmandades Leigas e Política Colonizadora em Minas Gerais. São
Paulo: Ática, 1986; FREITAS, N. M. B. de
25RViULRGH0DULDQDHVXDVLUPDQGDGHV6HJXQGDPHWDGHGR
VpFXOR;9,,,
1991. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social,
Franca-SP, 1991.
18
MANOEL, 2004, p. 21.
19
A documentação oficial do Vaticano usa o termo latino Rivi Nigri para a diocese de Ribeirão Preto.
20
CORREIA, Padre Francisco de Assis.
+LVWyULDGD$UTXLGLRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR
Franca: Santa Rita,
1983.
21
LAURIANO, Monsenhor dr. João. 6XEVtGLRVSDUDD+LVWyULD5HOLJLRVDGH5LEHLUmR3UHWR(1845-1905).
Ribeirão Preto: Cúria Metropolitana, 1973; ______.
)XQGDomRH,QVWDODomRGR%LVSDGRGH5LEHLUmR3UHWR
1906-1909. Ribeirão Preto: Cúria Metropolitana, s/d. ______.
%LVSRVH$UFHELVSRVGH5LEHLUmR3UHWR
.
Ribeirão Preto: Cúria Metropolitana de Ribeirão Preto, s/d.
20
No livro )XQGDomRH LQVWDODomRGR% LV SDGRGH 5LEHLUmR3UHWR, o autor
escreve a respeito das circunstâncias da criação da Província Eclesiástica de São Paulo e a
diocese de Ribeirão Preto, transcrevendo trechos dos principais documentos.
Em %LVSRV H $UFHELVSRV GH 5LEHLUmR 3UHWR, traça um perfil dos bispos de d.
Alberto a d. frei Felício. O livro traz ainda a transcrição de alguns discursos, saudações e
outras reportagens a respeito dos bispos e suas obras na diocese.
As obras citadas deixaram sem respostas várias questões, dentre elas, o fato de
que a cidade de Batatais se planejara para ser a sede de uma diocese e disputara com a cidade
de Campinas essa preferência. O que aconteceu com a candidatura de Batatais para ser sede
de diocese? Por que a cidade escolhida pela hierarquia da Igreja foi Ribeirão Preto? Estes e
outros questionamentos representavam uma incógnita. Outra dúvida era: qual o papel
desempenhado pelos produtores de café para a criação do bispado em Ribeirão Preto? Afinal,
a região era considerada uma das mais ricas do país no fim do século XIX e início do XX. E o
primeiro bispo? Quem era o eleito que exercera cargo público de senador e que assumira a
diocese de Ribeirão Preto?
Diante dessas indagações, teve início a contextualização em que as
transformações na Igreja dentro e fora do Brasil permitiram a criação de uma Província
Eclesiástica em São Paulo. Os acontecimentos políticos, econômicos, culturais, sociais e
religiosos dos anos seguintes levaram à escolha de Ribeirão Preto, por parte da hierarquia da
Igreja, para ser a sede de uma diocese, criada em 1908 e instalada em 1909. O primeiro bispo
eleito foi o padre Alberto José Gonçalves, ex-senador e antigo pároco da catedral Nossa
Senhora da Luz, em Curitiba.
A formação da Província Eclesiástica de São Paulo, bem como da diocese de
Ribeirão Preto, segue os eventos que acompanharam a proclamação da República. Depois
disso, a Igreja católica iniciou um período de reorganização, devido à separação do Estado
com a Igreja e ao decreto 119A
de 7 de Janeiro de 1890
22
, e muitos bispos viram nessa
circunstância a oportunidade de uma renovação para a Igreja católica no Brasil.
A Igreja precisava dar uma resposta diante da nova realidade e, assim, foi
elaborado o documento conhecido como: &DUWD3DVWRUDO&ROHWLYDGR(SLVFRSDGR%UDVLOHLUR
22
PIVA, Frei Elói. Transição republicana: desafio e chance para a Igreja (I).
5(%
49, fasc. 195, 1989, p. 620-
639 e
5(%
50, fasc 198, 1990, p. 415-432.
21
GH , sob a liderança de d. Macedo Costa à frente do episcopado brasileiro, mostrando
um despertar católico.
24
A situação, cada vez mais clara, da modernização do país propiciou uma
renovação administrativa nos quadros da Igreja, para fazer frente à liberdade de culto e ao
pluralismo religioso que a República instituíra. Por meio de seus prelados, a Igreja criou
novas dioceses e paróquias e buscou instruir o clero para melhor atender seu rebanho.
25
Um dos principais representantes teóricos da Igreja no fim do século XIX e
início do XX, padre Júlio Maria, desenvolveu nas suas reflexões duas principais linhas
de abordagem: tornar o Brasil católico e unir a Igreja ao povo. Para concretizar essas
idéias, ele pregou, escreveu e evangelizou, tendo sempre em mente esse binômio. Para o
padre Júlio Maria, a Igreja precisava tomar uma atitude e mobilizar os fiéis. Livre das
amarras do Estado, ele acreditava que a Igreja poderia crescer e atingir o povo por meio
de uma evangelização.
Em 1899, os bispos da América Latina reuniram-se em Roma para o
&RQFtOLR3OHQiULR/DWLQR$PHULFDQR, sob a direção do papa Leão XIII. O resultado do
encontro, sob a forma de &DUWD3DVWRUDO veio completar os documentos que dirigiram a
vida da Igreja nas décadas seguintes e permitiu que os bispos se alinhassem,
fortalecendo os laços da centralização com a cúria romana e o papa.
A situação descrita possibilitou a criação da Província Eclesiástica de São
Paulo, pelo papa Pio X, em 7 de junho de 1908. Junto com a Província, foram criadas as
dioceses de Botucatu, Campinas, São Carlos do Pinhal, Taubaté e Ribeirão Preto, do
território desmembrado da diocese de São Paulo. A escolha da cidade de Ribeirão Preto
para sede de diocese e o governo do primeiro bispo constituem o objeto de estudo desta
pesquisa.
A cidade de Ribeirão Preto, por volta de 1913, contava com 17 associações
privadas, dentre elas clubes musicais e sociais, 22 indústrias de alimentos, bebidas e
outras pequenas fábricas.
23
A &DUWD3DVWRUDO&ROHWLYDGH representou um dos documentos mais importantes para dirigir os rumos
que a Igreja tomou após a separação do Estado, trazendo as diretrizes e normas a serem seguidas pelos padres e
fiéis.
24
MANOEL, I. A D. Antonio Macedo Costa e Rui Barbosa: a Igreja Católica na Ordem Republicana Brasileira.
5HYLVWD3yV+LVWyULD
. Assis-SP, v. 5, p. 67-81, 1997.
25
LUSTOSA, Oscar de F.
$,JUHMD&DWyOLFDQR%UDVLO5HS~EOLFD
. Cem anos de compromisso. (1889-1989).
São Paulo: Paulinas, 1991.
22
O censo de 1912, poucos anos depois da criação da diocese, indicava uma
população de 58.220 habitantes
26
, sendo a população urbana em torno de 18.732
pessoas, boa parte dela (cerca de 40%) formada por estrangeiros, provenientes
principalmente da Itália, Espanha e Portugal.
Todo esse crescimento econômico girava em torno do café, que estimulou
um grande desenvolvimento para o interior de São Paulo, com desdobramentos sócio-
culturais ainda não vistos em períodos anteriores.
Junto com o café, chegou, em 1883, à região de Ribeirão Preto a ferrovia
Mogiana. Esta e seus ramais, que se estendiam para Franca e Igarapava, chegando a
Uberaba (Minas Gerais), ajudaram a concretizar um fecundo povoamento da região
nordeste do estado de São Paulo.
27
Próximo de Ribeirão Preto, a Paulista, outra grande
ferrovia, disputava o espaço de domínio e poder com a Mogiana. Chegara em 1880 a
Porto Ferreira, às margens do rio Mogi-Guaçu.
28
O impacto da ferrovia foi muito grande no interior. Do tronco principal da
Mogiana e de sua concorrente saíam ramais, que eram chamados de YHUGDGHLUDV
HVWUDGDV FDWD FDIp. Através destes ramais, os grandes proprietários escoavam sua
produção cafeeira de dentro de suas fazendas ao litoral, de onde era exportado. O pai
de Alberto Santos Dumont, o sr. Henrique Dumont, grande proprietário, possuía um
desses ramais, com cerca de 60 km dentro de suas propriedades agrícolas.
29
A ferrovia permitiu a introdução de novos elementos que passaram a
compor o cenário da modernidade, diminuindo distâncias, alterando as feições do rural-
urbano, introduzindo não uma melhora na qualidade dos transportes, mas uma
relação diferenciada com as comunidades por onde ela passava. A ferrovia com mais
facilidade favoreceu a vinda de imigrantes e, com eles, a chegada de novas idéias, de
outras crenças, como as protestantes, de membros e simpatizantes do comunismo,
anarquismo, dos livres-pensadores, etc. A ferrovia facilitava a comunicação entre as
cidades interioranas, mas contribuía para a difusão de idéias contrárias à doutrina
católica. Esse motivo tornava urgente uma presença firme da Igreja na terra de
malvados, assim considerada pelos membros da Secretaria de Estado do Vaticano e só a
presença de um bispo podia disciplinar as gentes.
26
WALKER, T. & BARBOSA, A de S.
'RVFRURQpLVD0HWUySROH
; fios e tramas da sociedade e da política e da
política em Ribeirão Preto no século XX. Ribeirão Preto: Palavra Mágica, 2000, p. 40-47.
27
MATOS, Odilon N. de.
&DIpH)HUURYLDV
. São Paulo: Alfa Omega, 1974, p. 71-77.
28
MATOS, 1974, p. 66-68
29
MATOS, 1974, p. 84.
23
A época do café em Ribeirão Preto coincidiu com a República Velha,
período em que os grandes coronéis e barões de café dominaram o cenário político,
contexto no qual Ribeirão Preto e as cidades vizinhas estavam inseridas.
Nas primeiras décadas do século XX, a política de Ribeirão Preto esteve nas
mãos do chefe político coronel Joaquim da Cunha Diniz Junqueira, conhecido como
Quinzinho Junqueira”, que disputava com Francisco Schmidt o poder local.
30
Era ele
que dominava o cenário político no momento da criação do bispado.
Ambos fizeram parte da Comissão organizada inicialmente para a
construção da matriz em agosto de 1900; Francisco Schmidt era o presidente, e
Quinzinho Junqueira, membro da mesa. Por ocasião da visita, em 1907, do bispo de São
Paulo, d. Duarte Leopoldo e Silva, a Ribeirão Preto, foi organizada uma nova comissão,
liderada por monsenhor Joaquim Antonio de Siqueira
31
, vigário da matriz de São
Sebastião de Ribeirão Preto, para levantar o patrimônio da diocese a pedido do Bispo de
São Paulo. Novamente Francisco Schmidt e Quinzinho Junqueira estavam juntos.
Da região de Ribeirão Preto, participavam do cenário político no momento
da criação da diocese nomes como Washington Luís e Altino Arantes, entre outros.
Ambos possuíam suas bases em Batatais e encontraram apoio em Ribeirão Preto. Como
políticos influentes na região, que papel exerceram na criação da diocese? Altino
Arantes assinou a lista pedindo a criação do bispado de Batatais, por que vamos
encontrá-lo fazendo o discurso de recepção de d. Alberto em Ribeirão Preto?
Quais eram as intenções da cúria romana para considerar que o cenário
político, econômico e social vigente em Ribeirão Preto era favorável à criação de uma
diocese? Até que ponto os membros da Secretaria de Estado do Vaticano conheciam a
região para chamá-la de terra de malvados? Ou o termo foi atribuído porque a
população se recusou a contribuir para formar o patrimônio?
Buscar respostas para essas questões era mais do que apenas traçar o caminho da
criação do bispado. Eram outras as vertentes que fomos procurar a partir da criação da diocese
e da chegada de d. Alberto. Quem era esse político que chegou com poderes de bispo para
cuidar de uma região cuja população foi chamada pelos membros da Secretaria de Estado do
Vaticano de malvados”? Conseguiria ele traçar o caminho da evangelização que o Vaticano
30
WALKER, T. & BARBOSA, 2000, p. 43
31
Joaquim Antonio de Siqueira foi ordenado sacerdote em 15 de abril de 1872, no Seminário Episcopal de São
Paulo por d. Frei Vital de Oliveira, bispo de Olinda. O cônego Joaquim Antonio de Siqueira foi agraciado com o
título de monsenhor por ocasião da criação da Província Eclesiástica de São Paulo. No decorrer do trabalho
optamos por usar o título de monsenhor.
24
exigia naquele momento? Seu longo governo de 36 anos conseguiu atender aos objetivos a
que o próprio bispo se propôs ao assumir a diocese? Como conciliar as diretrizes romanas
com a situação de uma diocese extensa no interior de São Paulo com poucos padres? E as
mudanças por que a Igreja passou ao longo destes 36 anos?
Estava delimitado o tempo, aliás, um longo tempo, de 1907, quando d. Duarte
escolhe a cidade de Ribeirão Preto junto com outras cidades que viriam a compor a Província
Eclesiástica de São Paulo, até a morte de d. Alberto José Gonçalves, primeiro bispo de
Ribeirão Preto, em 1945.
A especialidade também revelou outra questão importante. Ficar com o estudo
centrado na sede da diocese, ou seja, na cidade de Ribeirão Preto, era deixar de lado nuanças
que permitiriam durante a pesquisa, vislumbrar a tentativa de implantação do projeto da Igreja
na região. Optamos por estudar de maneira geral a diocese, que contava com 36 paróquias
quando foi criada, sabendo dos riscos da abrangência da pesquisa.
Entre as razões que levaram a Santa a escolher a cidade de Ribeirão Preto para
sediar um dos bispados no interior encontra-se o fato de que, a partir da metade do século
XIX, a região de Ribeirão Preto cresceu rapidamente em torno da cultura do café num salto
significativo. A freguesia fora criada pela Lei n. 51 de 2 de julho de 1870, passando a vila em
12 de abril de 1871 e a cidade, em 1
o
. de abril de 1889. A criação da paróquia de São
Sebastião do Ribeirão Preto ocorreu em 16 de julho de 1870.
Com esse rápido crescimento, a construção do projeto de evangelização e
ocupação sistemática da Igreja católica na região tornou-se primordial.
A busca de respostas para as questões levantadas teve início nos arquivos da
cidade de Ribeirão Preto: catedral de São Sebastião, cúria metropolitana e Arquivo Público e
Histórico de Ribeirão Preto.
A documentação foi aos poucos mostrando como a história da diocese estava
inserida num contexto de Igreja nacional e situada no período em que a cúria romana buscava
uniformizar sua ão pastoral. Alguns documentos citados pelos autores, padre Francisco e
monsenhor Lauriano, não foram encontrados no arquivo da cúria de Ribeirão Preto, cuja
documentação é pequena para o período estudado. Os /LYURVGH5HJLVW URVGH3URYLV}HV e as
caixas que pertenceram a monsenhor João Lauriano compõem o grupo principal.
Como a antiga paróquia de São Sebastião do Ribeirão Preto pertencia ao bispado
de São Paulo, o Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo tornou-se outro referencial para
a pesquisa. As 3DVWDV GH 5LEH LUmR 3UHWR, do arcebispo d 'XDUWH, do cardeal d -RDTXLP
$UFRYHUGH, contêm os documentos relativos à criação da diocese. Outros documentos foram
25
consultados no Arquivo da Cúria em São Paulo, como a 3DVWD G $OEHUWR que traz a
correspondência do bispo com os arcebispos de São Paulo. Essa troca de correspondências
abriu caminho para delinear alguns temas que preocupavam o bispo e seus superiores.
A pesquisa realizada nos arquivos da Igreja foi completada com uma
documentação que faz parte do Fundo José Pedro de Miranda, do Arquivo Público e Histórico
de Ribeirão Preto. São caixas com documentos avulsos, como cartas, artigos de jornais,
documentos oficiais da cúria diocesana, da catedral de São Sebastião, entre outros que
contribuíram para mapear a história da diocese de Ribeirão Preto.
Nos arquivos paroquiais, a consulta foi feita aos Livros de Tombo e aos livros das
associações laicas. A escolha de algumas paróquias está relacionada com a leitura de
documentos que remetiam a situações em que era necessário buscar outras informações mais
pontuais nas paróquias.
A coleção do jornal 'LiULR GH 1RWtFLDV que pertence à Biblioteca do CEARP
(Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto), ao lado da consulta ao jornal $
&LGDGH, permitiu um outro olhar além da documentação oficial da Igreja.
Faltava saber do projeto de Batatais, pois, nos arquivos pesquisados, somente
notícias esparsas de que a cidade desejava sediar uma diocese. Em Batatais, no arquivo da
paróquia de Bom Jesus da Cana Verde, nenhum documento fez alusão direta ao então suposto
projeto de criação de diocese naquela cidade. Restava uma busca no Arquivo Secreto do
Vaticano (ASV/NAB).
No Arquivo Secreto do Vaticano encontramos a documentação referente à criação
da Província Eclesiástica de São Paulo e o Projeto de Criação de Diocese de Batatais, que faz
parte do Fundo da Nunciatura Apostólica do Brasil (ASgV/NAB) e do Arquivo Degli Affari,
conhecido como Histórico (ASV).
Os documentos pesquisados no Vaticano trouxeram uma contribuição para se
compreender a criação da Província Eclesiástica de São Paulo e a escolha de Ribeirão Preto
para ser a sede de diocese. Com essa documentação dos Arquivos do Vaticano, encerrava-se
um período que faz parte da formação da Província Eclesiástica de São Paulo e que consta do
primeiro capítulo.
O resultado da pesquisa está dividido em três capítulos. No primeiro capítulo $
3URYtQFLD(FOHVLiVWL F DGH6mR3DXORHR%LVSDGRGH5LEHLUmR3UHWR, analisamos o projeto de
d. Duarte para a criação da Província Eclesiástica de São Paulo. Nele, a cidade de Batatais foi
preterida por Ribeirão Preto. Abordo as dificuldades de formação do patrimônio para a
diocese de Ribeirão Preto e a escolha do primeiro bispo.
26
No segundo capítulo $ GLRF HV H  GH 5LEHLUmR 3UHWR H R JRYHUQR GH G $OEHUWR, a
abordagem tem início com as visitas pastorais que fizeram parte da obra pastoral do bispo.
Em seguida, por meio do clero, das associações religiosas e da organização da diocese do
ponto de vista administrativo e pastoral, buscamos visualizar o momento histórico da Igreja
no Brasil e a aplicação das diretrizes da Igreja no governo de d. Alberto.
No terceiro capítulo 5LEHLUmR 3UHWR R DOLQKDPHQWR DR SURMHWR GR 9DWLFDQR,
destacamos, nas décadas de 1930 e 1940, o último período do governo de d. Alberto e como a
Igreja em Ribeirão Preto buscou estar alinhada aos projetos da hierarquia, buscando implantar
o ensino religioso nas escolas, a entrada da Ação Católica na diocese, entre outras medidas,
tendo em vista o repúdio à modernidade e a outras crenças. A doença, a velhice de d. Alberto,
a chegada do bispo auxiliar, d. Manuel da Silveira D’ Elboux e os últimos cinco anos do
governo de d. Alberto também fazem parte deste capítulo.
A morte de d. Alberto, em 1945, fecha este estudo porque se encerra um período
para a história da Igreja em Ribeirão Preto.
A escolha do referencial teórico teve início com a leitura do texto de livre
docência do pesquisador Augustin Wernet
32
, que abriu caminho para o estudo da Igreja
romanizada e posteriormente de Ivan Manoel
33
, ao analisar o pensamento católico entre a
segunda metade do século XIX e a década de 1960.
A Igreja se esforçava para implantar um domínio da autoridade espiritual sobre a
temporal. A criação da Província Eclesiástica situada cadas depois do marco de tempo do
estudo de Wernet seria a concretização do projeto de uma Igreja romanizada?
Eis os objetivos principais deste estudo: Demonstrar a importância de Ribeirão
Preto e região no contexto cafeicultor da República, o que a levou a ser escolhida para sediar
uma das novas dioceses criadas na subdivisão da diocese de São Paulo.
Entender quais os mecanismos sociais, políticos e econômicos empregados para a
realização do projeto de criação do bispado de Ribeirão Preto. Demonstrar os trâmites
políticos internos da Igreja, que conduziram a elevação de Ribeirão Preto à condição de
bispado.
Uma vez criado o bispado, uma análise do governo do primeiro bispo, a
importância de suas cartas pastorais e a organização da diocese. Demonstrar as ações da Igreja
em Ribeirão Preto, a partir da chegada de d. Manuel, em 1940, bispo auxiliar de d. Alberto.
32
WERNET, 1987.
33
MANOEL, 2004.
&
$3Ë78/2
,
$)250$d2'$3529Ë1&,$(&/(6,È67,&$'(623$8/2
No início do século XX, a disputa pela divisão do bispado de São Paulo em várias
dioceses foi grande. O rápido desenvolvimento econômico, demográfico, social da região
contribuiu para aumentar as necessidades pastorais. A ausência do bispo, que, em razão do
tamanho da diocese, não conseguia cumprir suas obrigações de pastor visitando assiduamente
as paróquias do interior, incentivava que as cidades buscassem ser a sede de um bispado.
O começo deste movimento em prol da criação de uma diocese no interior do
Estado teve início no governo da diocese de São Paulo de d. Joaquim Arcoverde, mas foi com
d. José de Camargo Barros, por volta de 1903, que as cidades de Campinas e Batatais
enviaram seus pedidos ao Vaticano.
34
D. José, que a princípio foi contrário à divisão da
diocese alegando os parcos rendimentos para sustentar o bispo, acabou concordando.
Campinas e Batatais enviaram projetos à Secretaria de Estado do Vaticano e ao
papa Pio X, iniciando uma disputa entre as duas, cada uma ressaltando seus aspectos positivos
para receber a benesse de ser a sede de uma nova diocese no interior de São Paulo.
O projeto de Batatais tinha à frente o pároco José Lafayette de Godoy, e o de
Campinas, que, no início, teve o padre Francisco Campos Barreto, ganhou uma adesão de
peso com d. João Batista Nery, um campineiro que era bispo de Pouso Alegre.
35
Durante a reunião dos bispos da Província Meridional em 1904, no Santuário de
Aparecida, a cidade de Botucatu foi a escolhida por eles para ser a sede de uma nova diocese
no interior de São Paulo. Os bispos enviaram uma carta ao núncio comunicando a decisão do
34
GODOY, Padre Lafayette de. Correspondência ao núncio apostólico mons. Giúlio Tonti, 6/maio/1903,
$UFKLYLR6WRULFRGR9DWLFDQR$69). n. 101, fasc. 500. Acompanha a carta do padre Lafayette um: “ Progetto di
Diocese in Batataes”. De Campinas: “ Duas palavras sobre o Bispado do oeste de São Paulo, obra
GR$UFKLYLR
6WRULFRGR9DWLFDQR
fasc. 116 (s/ página).
35
D. João Batista Nery, nasceu em Campinas em 1863 e faleceu em 1920. Foi bispo de Vitória no Espírito Santo
de 1897 a 1901, quando foi nomeado para a diocese de Pouso Alegre, local em que permaneceu até 1908. Em
1908, assumiu a diocese de Campinas. BENCOSTA, Marcus L. Albino.
,JUHMDH3RGHUHP6mR3DXOR
D. João
Batista Correa Nery e a romanização do catolicismo brasileiro. (1908-2000). 1999. Tese (Doutorado em
História). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo, 1999.
28
grupo.
36
No entanto, Campinas e Batatais continuaram sua campanha para ser sede de
diocese.
D. José de Camargo Barros, bispo de São Paulo, encaminhou-se para Roma para
apresentar as propostas das candidatas a diocese: Campinas, Botucatu e Batatais.A Santa
exigia um patrimônio para cada cidade, a fim de garantir uma existência digna para o bispo. A
Secretaria de Estado do Vaticano deu um parecer favorável para os preparativos de divisão do
território de São Paulo em três dioceses: Campinas, Batatais e Botucatu. No retorno de Roma,
com os pedidos das cidades, d. José faleceu no naufrágio do navio Sírio.
37
Sua morte
repentina levou muitas pessoas a pensar no final do sonho das novas dioceses, pois o Vaticano
ainda não havia concretizado o projeto.
Após a morte de d. José, a Santa elegeu, para o governo da diocese de São
Paulo, d. Duarte Leopoldo e Silva, então bispo de Curitiba, que chegou a São Paulo em
1906.
38
Entre a morte de d. José e a posse de d. Duarte, a discussão sobre a criação de
novas dioceses continuou a ser feita nos bastidores da Igreja, bem como os procedimentos
institucionais da criação de novos bispados que tinham em vista recuperar o espaço restrito a
que a Igreja ficara nos tempos do 3DGURDGR.
A disputa entre as cidades foi grande. Somente quando d. Duarte assumiu o
governo da diocese, em 1907
39
, é que toda esta situação foi resolvida. Ele deu início aos
trabalhos para a elaboração de um amplo projeto que resultou na criação da Província
Eclesiástica de São Paulo, tendo por base o projeto de d. José de Camargo Barros, que fora
seu bispo. No projeto de d. Duarte o nome de Batatais desapareceu totalmente e surgiu o
nome da futura escolhida: Ribeirão Preto.
A discussão do projeto da Província Eclesiástica de São Paulo, no Vaticano,
encontrou oposição na divisão da diocese entre os cardeais membros da Secretaria de Estado
do Vaticano. No seu diário, d. Duarte escreveu que o cardeal Gasparri
40
representava a única
36
CARTA dos Bispos ao núncio Giulio Tonti, 7/set./1904$69. fasc. 116.
37
D. José de Camargo Barros, natural de Indaiatuba, São Paulo, foi nomeado bispo de Curitiba em 1903 e
assumiu a diocese de São Paulo em 1904, faleceu no naufrágio do navio Sírio quando retornava de Roma em 4
de agosto de 1906.
38
D. Duarte Leopoldo e Silva, antigo cônego da Sé de São Paulo, auxiliar de d. José, fazia apenas dois anos que
havia sido sagrado bispo de Curitiba, quando tomou posse na diocese de São Paulo. Natural de Taubaté, incluiu
sua cidade natal no projeto de criação da Província Eclesiástica de São Paulo.
39
VASCONCELOS, V. S.
+LVWyULDGD3URYtQFLD(FOHVLiVWLFDGH6mR3DXOR
. São Paulo: Saraiva, 1957, p. 100.
D. Duarte Leopoldo e Silva é transferido de Curitiba para São Paulo em 18/12/1906 e tomou posse em
14/4/1907.
40
Cardeal Pedro Gasparri (1852-1934) foi um dos mais influentes cardeais da Secretaria de Estado do Vaticano.
Foi um dos responsáveis pela redação da obra Código de Direito Canônico, iniciada no pontificado de Pio X e
29
oposição à criação da Província
41
e que, em audiência com o cardeal Gasparri, este mostrou-
se disposto a aceitar a execução do projeto. O cardeal Gasparri
42
deu um parecer contrário a
Ribeirão Preto e sugeriu que ficasse sob a guarda de Campinas até conseguir o patrimônio. A
posição contrária do cardeal é explicada porque Ribeirão Preto não conseguiu formar o
patrimônio exigido conforme vamos ver adiante.
Um dos entraves para a divisão do território da diocese de São Paulo estava
concentrado na questão econômica. D. Duarte fez o projeto de divisão para a criação de cinco
dioceses, mantendo sob sua guarda o Santuário de Aparecida, uma importante fonte de renda
para a diocese de São Paulo.
Como o Santuário estava no território da futura diocese de Taubaté, d. Duarte
encontrou oposição dentro e fora do Brasil. Uma adesão importante a d. Duarte foi o cardeal
Arcoverde, que endossou a proposta do bispo de São Paulo.
43
Um dos membros da Secretaria
de Estado, o cardeal Rampolla
44
, deu parecer contrário ao Santuário continuar nas mãos da
diocese de São Paulo.
O cardeal Arcoverde, para solucionar o problema e o prejudicar o bispo D.
Duarte e o bispado de São Paulo, chegou a sugerir ao núncio que a diocese de Campinas fosse
implantada mais tarde.
45
D. Duarte recebeu outra adesão importante ao seu projeto, a do núncio d. Giulio
Tonti, que encaminhou seu parecer para o secretário de Estado do Vaticano: [...] supplico a
dignarsi approvare il proposto progetto [...]
46
, dando total apoio e pedindo para que fosse
aprovado sem modificações.
A proposta de d. Duarte foi implantada em 1908 com algumas modificações. O
Santuário de Aparecida ficou pertencendo à diocese de São Paulo depois de muita discussão e
disputa com a diocese de Taubaté. As rendas do Santuário de Aparecida, mesmo em declínio,
eram bastante atrativas para serem desprezadas, e os membros da Secretaria de Estado do
Vaticano deram parecer favorável para d. Duarte como governante da futura arquidiocese,
promulgada por Bento XV. Exerceu o cargo de Secretário de Estado de 1914 a 1930. FLICHE, A & MARTIN,
V.
+LVWyULDGH/D,JOHVLD
. El mundo secularizado. Valencia: Edicep, 1991, p. 259. v. XXV (2).
41
SILVA, D. Duarte Leopoldo e Silva

Cópia do Diário de D. Duarte Leopoldo e Silva, p. 82.
$UTXLYRGD
&~ULD0 HWURSROLWDQDGH6mR3DXOR$&063
, São Paulo. (Pasta D. Duarte).
42
PARECER da Secretaria de Estado do Vaticano, 15/março/1908, $69. v. 6.
43
ARCOVERDE, D. Joaquim. Correspondência ao Bispo de São Paulo D. Duarte Leopoldo e Silva,
26/jun./1907.
$&063
. (Pasta Cardeal Arcoverde).
44
PARECER da Secretaria de Estado, 15/3/1908,
$69
. v. 6.
45
ARCOVERDE, D. Joaquim. Correspondência ao núncio Giulio Tonti, Rio de Janeiro, 3/maio/1906,$UFKLYLR
6HJUHWRGR9DWLFDQR$6J9
.

Congregazione Concistoriale, Relat. Dioc. n. 687).
46
BAVONA, Alessandro. Correspondência ao Secretário de Estado do Vaticano Rafaelle Merry Du Val,
Petrópolis, 21 gennaio 1908,
$69
. fasc. 141.
30
apontando que São Paulo não poderia ficar desguarnecido de suas rendas principais para a
manutenção do bispo, do seminário e do culto.
Em 26 de fevereiro de 1908, d. Duarte, em audiência com o Papa Pio X,
apresentou o projeto de formação da Província Eclesiástica de São Paulo. O projeto foi bem
recebido e abençoado por Pio X.
Duarte pediu ao Papa Pio X a faculdade de conferir a láurea de filosofia aos seus
seminaristas, o que prontamente lhe foi concedido, estando assim constituída a Faculdade de
Filosofia de São Paulo. O cardeal d. Arcoverde
47
confessou em uma carta para d. Duarte que
gostaria de transformar o Seminário Central de São Paulo em uma universidade, nos moldes
de Lovaina, na Bélgica, considerada como um modelo para o prelado.
A Faculdade de Filosofia passou a funcionar tendo como chanceler: o arcebispo d.
Duarte Leopoldo e Silva; vice- chanceler: d. Miguel Kruse O.S.B. abade do mosteiro de São
Bento; reitor: mons. dr. Maximiano da Silva Leite; secretário: padre dr. João Baptista de
Siqueira; lente catedrático: padre dr. Sebastião Leme da Silveira Cintra.
Os triunfos de d. Duarte no Vaticano devem ser atribuídos aos seus esforços e de
seus colaboradores, que prontamente prepararam os relatórios enviados a Romana, para
despachos internos.
Enquanto d. Duarte estava na missão especial em Roma, no Brasil, especialmente
no Estado de São Paulo, novenas foram realizadas, os alunos do Seminário Central de São
Paulo fizeram um tríduo a São José, missas foram celebradas em diferentes cidades e capelas
para que a viagem de d. Duarte o fosse infrutífera. Era de interesse de muitas pessoas a
divisão da diocese e por isso vemos essas manifestações por parte dos fiéis. O projeto de d.
Duarte contou com o aval do cardeal d. Arcoverde e do núncio d. Giulio Tonti, o que
representou um grande passo para a sua concretização.
Em 7 de junho de 1908, o Papa Pio X criava a Província Eclesiástica de São Paulo
pelo decreto da Bula 'LRFHVLXP 1LPLDP $PSOLWXGLQHP.” Na ocasião d. Duarte recebeu o
título de arcebispo da Província de São Paulo que passou a arquidiocese com cinco dioceses
sufragâneas: Taubaté, Campinas, Botucatu, São Carlos e Ribeirão Preto.
A criação das novas dioceses em 1908 e a posse dos cinco bispos da Província de
São Paulo marcaram uma nova etapa para a Igreja paulista, que tinha à frente o dinâmico d.
Duarte Leopoldo e Silva.
47
ARCOVERDE, D. Joaquim

Correspondência a D. Duarte Leopoldo e Silva, 1907.
$&063
. (Pasta Cardeal
Arcoverde).
31
$H VF RO KDGRV%LVSRV
Enquanto tramitavam os procedimentos para a criação das novas dioceses, surgia
o novo problema, a escolha dos Bispos que ocupariam os cargos. Estava iniciada a caça” ao
poder, pois não é sempre que se instalam cinco dioceses.
D. Nery conseguiu seu intento
48
e foi eleito para bispo de Campinas. Este episódio
foi apenas um dentre tantos para a formação da Província Eclesiástica de São Paulo.
A situação de VWDWXV de bispo era privilegiada na sociedade dos séculos passados e
por isso a cobiça pelo cargo ficou expressa na correspondência entre a Secretaria do Estado no
Vaticano e o núncio apostólico no Brasil.
Do ponto de vista eclesiástico, um bispo recebe a missão de santificar, ensinar e
governar o povo de Deus. Na prática, o papel do bispo ia além de dirigir apenas os negócios
eclesiásticos da região sob seu domínio. Compreendia, também, dirigir a ação cotidiana
daqueles que estão sob os cuidados do Pastor em muitos aspectos, principalmente na questão
moral. Ser o Pastor de uma sociedade exigia também um envolvimento nas questões mais
cotidianas ligadas à política, sugerir os candidatos políticos mais adequados, exercer e
incentivar a criação de obras de caridade para os pobres, atuar nas questões morais, etc...
Era realizada uma ampla pesquisa por meio de uma extensa rede de informações
sobre o candidato e sua conduta moral e religiosa, cartas eram escritas pedindo informações a
padres, bispos e leigos sobre os prováveis candidatos. As cartas de recomendação dos bispos e
reitores de seminários tinham peso garantido em muitos casos de indicação. Por outro lado,
denúncias de situação de vida que não condizia com as exigências morais eram sérios
impedimentos para o exercício do cargo de bispo.
Essa correspondência faz parte do fundo da Nunciatura Apostólica dos Arquivos
do Vaticano. No caso de d. João Nery, o procedimento era mais simples, bastava uma
nomeação para o novo bispado, uma vez que ele já exercia o cargo de bispo de Pouso Alegre.
Em relação aos candidatos, estes requeriam não apenas a tutela de outros prelados,
como também de pessoas influentes.
Entre as correspondências identificadas no Arquivo do Vaticano e endereçadas ao
Núncio Giúlio Tonti, uma nos chamou a atenção: a carta do Sr. Augusto Mariano de Freitas
49
,
48
D. Nery enviou uma carta ao Papa Pio X, pedindo para ser nomeado Bispo de Campinas: “[...] que
humildemente fosse nomeado [...]” . NERY, d. João B. C. Correspondênciaao Papa Pio X, Pouso Alegre
15/1/1904.
$69
. Fasc. 116.
49
FREITAS, Augusto Mariano. Correspondência ao Núncio Giulio Tonti, s/d.,
$6J91XQ]LDWXUD$S RVWyOLFDLQ
%UDVLOH$6J91$%
. n. 100, fasc. 493. Não tenho referência sobre o Sr. Augusto Mariano de Freitas.
32
que faz um longo relato sobre os prelados. A respeito de d. Joaquim Arcoverde, escreve que
na época em que governou a diocese de São Paulo tornou-se odioso de todos pelos
descalabros da administração, o que é mais humano do que divino. D. Duarte Leopoldo e
Silva, um dos Bispos mais elogiados do início do século XX, foi considerado louco e doente
pelo autor. A carta, num tom de fofoca, discorria sobre outros padres e dizia que era preciso
nomear para bispo alguém que não comprometesse o núncio e que o antigo bispo d. Antonio
Alvarenga, antes de morrer, havia indicado o mons. Manuel Vicente da Silva.
50
Mas tudo
ficou esquecido, e a carta indicando mons. Manuel talvez não tenha chegado a Roma. O
mesmo sr. Augusto Mariano acusa de alcoólatra o padre portador da carta para o Vaticano.
Quando d. Antonio Alvarenga faleceu, foi nomeado d. José de Camargo e Barros,
para substituir o bispo de São Paulo. Anos mais tarde, com a criação da Província, mons.
Manuel Vicente foi novamente preterido na escolha para chefiar um dos novos bispados,
criados em São Paulo, em 1908. Indicações de amigos ressaltando qualidades e denegrindo os
inimigos eram comuns entre a correspondência encontrada nos Arquivos do Vaticano.
O núncio, em carta dirigida ao Secretário de Estado do Vaticano
51
, afirmou que
nem ele, nem a Secretaria de Estado e nem mesmo o Vaticano conheciam a verdadeira
realidade do interior do Brasil a não ser superficialmente e que, salvo exceções, os bispos do
Norte estavam na mesma posição sem poder opinar sobre a criação ou não de bispados no
interior de São Paulo. Mas eram evidentes a todos o aumento da população, a chegada de
imigrantes protestantes e católicos e o crescimento das cidades na região cafeeira, o que
impunha uma situação urgente que exigia da Igreja uma resposta rápida.
As mudanças no quadro político e econômico refletiam-se na disputa de poder na
esfera da Igreja, e cartas indicando os padres para ocupar cargos e denegrindo a imagem de
outros, mesmo bispos, constituíam situações corriqueiras entre os prelados, fossem de alto ou
baixo escalão. As fontes consultadas e arroladas nesta pesquisa revelam o quanto muitos
prelados estavam mais interessados em questões mundanas do que preocupados com
melhorias para suas comunidades, discutindo problemas de evangelização. Por isso, nos
planos do Vaticano, os candidatos para as novas dioceses deveriam apresentar alguns pré-
requisitos tais como serem arrojados, instruídos nos moldes da romanização, capazes de
50
Mons. Manuel Vicente da Silva nasceu em 8/3/1851, estudou no seminário de São Paulo, local em que foi
professor, considerado grande orador, filosofo polemista. Exerceu cargo de vigário-geral com D. Alvarenga e
depois vigário capitular. $,JUHMDQRVTXDWURVpFXORVGH6mR3DXOR. 1554-1954. São Paulo: Documentários
Nacionais, 1955, p. 106.
51
TONTI, Giulio. Correspondência
ao Secretário de Estado do Vaticano Rafaelle Merry Du Val, Petrópolis
15/set./1905.
$69
fasc. 129
33
enfrentar a situação de reorganização que a Igreja estava às voltas com a Proclamação da
República, portanto, situação de adversidade.
O núncio era pressionado pelas indicações de todos os lados: do cardeal no Rio de
Janeiro, dos bispos, de outros prelados e até por fiéis leigos. Os pareceres de um núncio
tinham grande poder de veto sobre os nomes dos eleitos.
Os candidatos passavam por uma sabatina em que, por meio de diferentes pessoas
consultadas, suas vidas eram esquadrinhadas, como um processo de Gênere
52
que os
habilitava para serem sacerdotes. Reitores de seminários, leigos, amigos, eram convidados a
dar seu parecer.
Os Bispos que assumiram na Província Eclesiástica de São Paulo: Campinas d.
João Batista Correa Nery, e Ribeirão Preto – d. Alberto José Gonçalves, estudaram no
Seminário de São Paulo; o de Botucatu - d. Lúcio Antunes de Sousa, e o de Tauba d.
Epaminondas Nunes de Ávila e Silva, são frutos do Seminário de Diamantina, e somente d.
José Marcondes Homem de Melo, bispo de São Carlos, era procedente do colégio Caraça, em
Minas Gerais. Como se vê, nenhum deles realizou estudos no exterior. A formação destes
novos prelados esteve marcada pelos atritos que a Igreja viveu no fim do Império. No
seminário, a vida destes jovens já era indício de quem seriam seus padrinhos e da suposta
carreira que poderiam desenvolver no seio da Igreja.
53
Escolhidos pela Santa Sé, possuíam vínculos com a elite eclesiástica e civil do
país e, organizaram suas dioceses com novas paróquias, associações de leigos, construíram
Igrejas, criaram jornais ou boletins informativos, realizaram visitas pastorais, deram
regulamento às fábricas das matrizes, construíram palácios, novas catedrais, colocaram em
prática um plano de empreendimentos para a organização de suas dioceses.
Os bispos das dioceses paulistas, assim como outros bispos do Brasil, enfrentaram
também o crescimento do espiritismo, da maçonaria e dos avanços da sociedade laica no
campo do ensino, nas tentativas de instituir o divórcio, pondo fim ao casamento tal como o
concebia a Igreja. Estes, e outros males, foram relacionados na obra do padre Desidério
Deschand
54
, que traça uma análise dos problemas da Igreja no Brasil no início do século XX.
A criação da Província Eclesiástica contribuiu para uma atuação mais fecunda dos
bispos e do clero em geral. Ao longo das décadas que se seguiram, os maiores beneficiários
foram os leigos que tiveram um bispo mais próximo de suas cidades. Claro que os bispos não
52
Processo de Gênere - documento preparado pela Igreja em que a vida do candidato ao sacerdócio era
considerada apta ou não a receber o sacramento da ordem.
53
MICELI, S.
$(OLWH(FOHVLiVWLFD%UDVLOHLUD
. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1988, p. 109-122.
54
DESCHAND, D.
$VLWXDomRDFWXDOGDUHOLJLmRQR%UD]LO
. Rio de Janeiro: Garnier, 1910.
34
impediram em suas comunidades a crescente secularização da Igreja, mas auxiliaram a
desenvolver uma atuação maior da Igreja em muitos aspectos da sociedade.
D. Duarte, como prêmio pelo êxito da execução do projeto da criação da
arquidiocese, foi nomeado primeiro arcebispo de São Paulo.
Em seu 'LiULR
55
, afirmou que isso era secundário, o importante mesmo estava em
cumprir a missão a que fora destinado: dividir a ampla diocese para melhorar a cristã. D.
Duarte tentou dar a impressão de que ser nomeado arcebispo pouco significava, quando na
realidade sabemos que o alto título acabou lhe conferindo um destaque muito maior entre a
elite eclesiástica. No início do século XX, o papel desempenhado por um arcebispo diante da
província eclesiástica era mais consistente, todos os novos bispos se reportavam ao arcebispo
nas mais variadas instâncias e esperavam dele uma pronta resposta.
2%L VSDGR GH 5LEHLUmR3UHWR
Convirá fazer em Ribeirão Preto, a sede da futura diocese, que se pensava
collocar em Batatais, que não tem elementos próprios.”
56
A frase do cardeal Arcoverde, em
carta para o bispo de São Paulo, d. Duarte, explicava os argumentos da escolha da cidade de
Ribeirão Preto, para sede de bispado, em detrimento da cidade de Batatais, por parte da
hierarquia da Igreja católica.
A instalação do bispado em Ribeirão Preto ocorreu num contexto de grande
desenvolvimento político, social e crescimento econômico produzido pela expansão cafeeira
no “ oeste paulista.”
57
A freguesia de Ribeirão Preto foi criada pela Lei n. 51, de 2 de julho de 1870,
passando a Vila em menos de um ano, a 12 de abril de 1871, a cidade, em 1
o
. de abril de
1889. Com o crescimento, a cidade de Ribeirão Preto ganhou ares de metrópole e passou a ser
conhecida como Capital do Eldorado Paulista”, “ Capital do Café” , Capital do Ouro Verde.”
Contemporânea ao momento político, a vida eclesiástica começou a organizar-se
depois da criação da paróquia de São Sebastião do Ribeirão Preto. Em 16 de julho de 1870,
55
ACMSP

São Paulo (Pasta D. Duarte).
56
ARCOVERDE, D. Joaquim. Correspondência ao Bispo de São Paulo D. Duarte Leopoldo e Silva,
10/abri./1907.
$&063
São Paulo. (Pasta D. Arcoverde).
57
WALKER, Thomas W. & BARBOSA, Agnaldo de S.
'RV&RURQpLVj0HWUySROH
. Fios e tramas da sociedade
e política em Ribeirão Preto no século XX. Trad. Mariana C. Magri. Ribeirão Preto-SP: Palavra Mágica, 2000;
LOPES, L. S. A formação do Município de Ribeirão Preto e o surgimento do comércio e da indústria. In: 
$VVRFLDomR&RPHUFLDOH,QGXVWULDOGH5LEHLUmR3UHWR
.Um espelho de cem anos. Ribeirão Preto-SP: São
Francisco, 2004. Os autores de ambas as obras trabalham o crescimento econômico da cidade de Ribeirão Preto
no momento da criação do bispado.
35
em provisão passada em São Paulo, o arcediago da catedral, dr. Joaquim Manoel G.
D’ Andrade, instituía canonicamente a paróquia de São Sebastião do Ribeirão Preto, que teve
como primeiro roco padre Ângelo Philidory Torres.
58
A criação da paróquia tinha a
finalidade de organizar o culto e tornar o padre mais presente dirigindo as atividades
religiosas, tais como batizados e casamentos e incentivando as práticas de piedade dos seus
fiéis, como uma maior participação nas celebrações eucarísticas, oficializando matrimônios,
administrando outros sacramentos, celebrando novenas, procissões e terços.
Na segunda metade do século XIX, a Igreja no Brasil começava a vivenciar novas
formas de práticas de piedade e devoção.
As diretrizes emanadas por Roma e a fundação do Colégio Pio Latino Americano
em Roma, no ano de 1853, efetivaram algumas mudanças ao contribuírem para a
transformação no perfil do clero. Do Pio Latino sairá boa parte da nova hierarquia, sem
traços de galicanismo e de projetos de Igrejas ‘nacionais’, afinada com as diretrizes da Santa
Sé e reticente, quando não abertamente hostil, as políticas religiosas dos Estados nacionais.”
59
O clero formado na Europa chegava ao Brasil imbuído de uma visão clerical em
que o poder estava centrado nas mãos dos padres. A criação de paróquias depois da
Proclamação da República, também a criação de bispados, além das questões políticas, veio
resolver a demanda ocasionada pela expansão da fronteira agrícola paulista. O aumento
populacional que gerou imensos espaços o ocupados sistematicamente pela Igreja católica,
transformados em objetos de disputas com outras religiões, cristãs ou não.
A cidade de Ribeirão Preto que cresceu a partir da segunda metade do século XIX,
no início do século XX, era considerada como pólo regional. As atividades comerciais,
industriais, culturais começaram a despontar, trazendo consigo uma pida urbanização e
expansão populacional ocasionada pela vinda de milhares de imigrantes.
60
A vida cultural e os
entretenimentos contavam com as festas sacras, mas, a partir do século XX, uma intensa vida
noturna
61
foi-se fazendo presente em Ribeirão Preto, disputando a primazia com as festas
sacras.
58
CORREIA, F. de A.
+LVWyULDGD$UTXLGLRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR
. Franca-SP: Santa Rita, 1983.
59
BEOZZO, José Oscar. A Igreja frente aos Estados Liberais 1880-1930. In: DUSSEL, E. (Org.).
+LVWRULD
/LEHUDWLRQHV 500 anos de História da Igreja na América Latina. São Paulo: Paulinas, 1992, p. 195.
60
GUIÃO, J. R. (Org.).
20XQLFtSLRHD&LGDGHGH5LEHLUmR3UHWRQDFRPHPRUDomRGR &HQWHQiULRGD
,QGHSHQGrQFLD1DFLRQDO
. Ribeirão Preto: Câmara Municipal, 1923; BORGES, M. E.
$SLQWXUDQD
FDSLWDOGRFDIp
. Franca: Unesp, 1999. (entre outras obras sugeridas na bibliografia citada e consultada.)
61
SILVA, B. L.25HLGD1RLWHQD(OGRUDGR3DXOLVWD: François Cassoulet e os entretenimentos noturnos em
Ribeirão Preto 1880-1930. 2000. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço
Social, Franca-SP, 2000; TUON, L. I.
2FRWLGLDQRFXOWXUDOHP5LEHLUmR3UHWR
. 1997. Dissertação
(Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Franca-SP, 1997.
36
Trazida pela necessidade de escoamento da produção cafeeira com mais rapidez,
destinada à exportação, em 1883, chegou à região de Ribeirão Preto a ferrovia 0RJLDQD. Esta
e seus ramais, que se estendiam para Franca e Igarapava, alcançando até mesmo Uberaba, no
Estado de Minas Gerais, ajudaram a concretizar o fecundo povoamento e ocupação da região
nordeste do Estado de São Paulo.
62
A ferrovia favoreceu a circulação mais rápida de
mercadorias, pessoas e idéias.
Estávamos na 1
a
. República e os grandes cafeicultores dominavam o cenário
político da região de Ribeirão Preto. Nas primeiras décadas do século XX, o poder político na
região manteve-se solidamente nas mãos do chefe político local, coronel Joaquim da Cunha
Diniz Junqueira, mais conhecido como Quinzinho Junqueira.” Era ele quem dominava o
cenário político no momento da criação do bispado, apesar dos esforços de seu oponente,
Francisco Schmidt.
63
Significativamente ambos fizeram parte da Comissão organizada para a
construção da matriz, em agosto de 1900. Na comissão, Francisco Schmidt foi o presidente, e
Quinzinho Junqueira, membro da mesa.
Em 1907, durante a visita de d. Duarte Leopoldo e Silva a Ribeirão Preto, foi
organizada uma nova Comissão, liderada por monsenhor Joaquim Antônio de Siqueira, para
angariar um patrimônio para a futura diocese, mais uma vez Schmidt e Quinzinho Junqueira
estiveram juntos, apesar de adversários, ou por isso mesmo.
É significativo ressaltar que, no momento da criação da diocese, na região
existissem políticos como Altino Arantes e Washington Luís. Ambos tinham suas bases
políticas em Batatais e, sem dúvida, participavam também das articulações políticas na cidade
vizinha de Ribeirão Preto. Altino Arantes esteve presente na posse do bispo em 1909,
representando o povo no discurso de acolhida ao bispo d. Alberto, exatamente cinco anos
depois de ter participado de um abaixo-assinado, pedindo a criação da diocese na cidade de
Batatais.
64
O alto episcopado católico no Brasil estava de acordo, em 1907, em que Ribeirão
Preto constituía a cidade mais indicada para abrigar a sede do novo bispado na região.
Apesar de Batatais ter reunido alguns dos elementos que até então eram
considerados necessários para a instalação de um bispado, ou seja, possuía Igreja matriz e
patrimônio, não foi a cidade escolhida. O núncio d. Giulio Tonti, o cardeal Arcoverde e d.
Duarte apresentaram à Secretaria de Estado do Vaticano e ao papa Pio X a cidade de Ribeirão
62
MATOS, O N. de. &DIpHIHUURYLDV. São Paulo: Alfa Omega, 1974, p. 77.
63
WALKER, T. & BARBOSA, A de S.
'RVFRURQpLVjPHWUySROH
; fios e tramas da sociedade e da política em
Ribeirão Preto. Ribeirão Preto: Palavra Mágica, 2000, p. 43.
64
MEMORIAL a Sua santidade Papa Pio X.
$69
. fasc. 111.
37
Preto como a mais adequada para sediar um bispado na região. Sede distrital federal e
estadual, ela reunia também dois dos principais políticos da região naquela ocasião:
Quinzinho Junqueira e Francisco Schmidt, ambos influentes, inimigos, mas ambos católicos.
65
Apesar de Ribeirão Preto não possuir patrimônio, catedral e residência adequada
para o bispo, não representou um empecilho para d. Duarte e a Santa na escolha da nova
diocese. Os elementos próprios” que Ribeirão Preto possuía, segundo o cardeal Arcoverde,
estavam concentrados principalmente no crescimento urbano, na riqueza gerada pela
cafeicultura e na centralização geográfica, como pólo regional que cada vez mais se
destacava. Para a Secretaria de Estado do Vaticano, a região de Ribeirão era considerada rica,
industriosa e, portanto, o bispo nomeado não teria problemas para organizar o patrimônio, que
estava aos olhos da Secretaria em segundo plano. A execução do projeto de criação e
instalação da diocese não esteve vinculada à riqueza cafeeira cobiçada por quase todos
aqueles que se dirigiram para a região. A Igreja precisava de dinheiro, mas o bispado foi feito
sem obter os fundos considerados necessários e obrigatórios conforme recomenda a tradição.
Com toda essa condição, uma questão torna-se fundamental: porque a região considerada rica
não contribuiu para a formação do patrimônio?
Os donos do poder político na região, em sua maioria, também o eram do
econômico. Um exemplo era o coronel Quinzinho Junqueira, de família tradicional na região,
grande proprietário de terras e produtor de café, chefe do Partido Republicano de Ribeirão
Preto durante toda a República Velha até 1930, quando renunciou, e ainda assim continuou à
frente do poder político. Como chefe político, participou na escolha dos candidatos locais e
regionais aos cargos de prefeitos, vereadores, deputados, senadores e apoiando candidatos a
presidência, indicando nomes para ocupar cargos no governo, etc... Considerado como um
político conservador, era chamado de FKHImR. Os pesquisadores Walker e Barbosa
66
resumem,
em uma palavra, Quinzinho Junqueira: SUH V Wt JLR. Católico, como a grande maioria da
população naquele momento, participou das comissões formadas para a instalação do bispado,
mas não encontramos em sua correspondência dados de que ele houvesse se empenhado
pessoalmente para a sua criação.
67
O outro chefe político local, Francisco Schmidt, de origem humilde, imigrante
alemão, veio para o Brasil com os pais, aos seis anos de idade. Chegou a Ribeirão Preto no
fim do século XIX e, em pouco tempo, tornou-se dono de uma fortuna considerável, que ficou
65
SOUZA, Wlaumir. 'HPRFUDFLDEDQGHLUDQWH. Distritos eleitorais do Império à Primeira República. 2003.
Tese (Doutorado em Sociologia). Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara-SP, 2003.
66
WALKER, T. & BARBOSA, A de S., 2000, p. 63.
67
$UTXLYR3~EOLFRGR(VWDGRGH6mR3DXOR
. Arquivo Privado do Cel. Joaquim da Cunha Diniz Junqueira.
38
conhecido como o “ rei do café”. Seus amigos o consideravam um homem cheio de compaixão
e humanidade.
68
Francisco Schmidt também fez parte das comissões locais para auxiliar na
instalação do Bispado. Recebeu e hospedou, em 1907, o bispo de São Paulo, d. Duarte, em
seu palacete, durante sua estada em Ribeirão Preto, oferecendo um banquete de cinqüenta
talheres, no dia 21 de maio de 1907, à elite local. Dois anos depois, foi a vez de d. Alberto
José Gonçalves ser recebido no mesmo palacete, quando chegou a Ribeirão Preto, para tomar
posse do bispado.
(PEXVFDGDVFRQGLo}HVSDUDD I RUPDomRGRELVSDGRGH5LEHLUmR3UHWR
Quando visitou Ribeirão Preto e outras cidades do Estado, d. Duarte, estava
colocando em prática a tese que havia esboçado ao assumir a diocese de São Paulo, do dividir
para governar, que ele acreditava ser o lema dos fortes. A idéia da divisão pertencia a seus
antecessores, mas a concretização do projeto ocorreu no governo de d. Duarte. Sua tese
caminhava ao encontro da política estabelecida pelo Papa Pio X, restaurar o reinado de Cristo
na terra.
Para fundar uma nova diocese, era necessário obter alguns requisitos, entre eles,
um patrimônio para sustentá-la. A formação do patrimônio da diocese de Ribeirão Preto não
foi tarefa fácil, sendo dividida em duas etapas: a preparação inicial antes da criação da
diocese, em Ribeirão Preto, e a segunda etapa com a chegada do bispo nomeado.
Na primeira etapa, d. Duarte Leopoldo e Silva, bispo de São Paulo, e o vigário de
Ribeirão Preto, mons. Joaquim Antonio de Siqueira, foram os grandes protagonistas. Depois
de 1909, o bispo d. Alberto se encarregou de organizar o patrimônio da diocese.
Em maio de 1907, durante a visita de d. Duarte a Ribeirão Preto, preparando a
criação do bispado, foram feitas algumas sugestões, apresentadas pelo dr. Enéas da Silva, um
dos vereadores da cidade. O cônego Ezequias Fontoura
69
, que acompanhava d. Duarte,
combateu a idéia do dr. Enéas e sugeriu que a comissão formada em Ribeirão Preto tivesse
poderes sobre as comissões paroquiais. A idéia do cônego Ezequias partia do princípio de que
uma comissão central tinha poderes para coordenar atividades em prol do tema: angariar os
fundos necessários. Uma vez que não houvesse uma centralização na coordenação, as
68
WALKER, T. & BARBOSA, A de S., 2000, p. 62.
69
Cônego Ezequias Galvão da Fontoura nasceu na cidade paulista de Itu, em 23 de novembro de 1842, recebeu o
presbiterato em 1864, exercendo vários cargos na hierarquia da Igreja, dentre eles, professor do seminário central
e o de vigário capitular.
39
comissões atuariam independentes, o que poderia o ser produtivo. Prevaleceu a idéia do
cônego Ezequias Fontoura, certamente endossada por d. Duarte. A partir desta reunião, com
alguns acertos e sugestões, criou-se uma Comissão Central em Ribeirão Preto e coube a ela
nomear e coordenar as comissões paroquiais.
70
Para presidente da comissão central designou-
se o mons. Joaquim Siqueira, para o cargo de secretário, o padre Euclides Gomes Carneiro, e
como tesoureiro, o coronel Antonio Vicente Ferraz de Sampaio, seguida de vários homens
proeminentes da sociedade. Dois dos cargos principais ficavam nas mãos do clero local,
indicando que as diretrizes eram em sua maioria tomadas pelos representantes da Igreja.
Integravam a comissão em Ribeirão Preto, organizada por d. Duarte, além dos
citados: Cel. Francisco M. Junqueira, Cel. J. Alves da Costa Junior, Tte. Cel. Durval V. de
Souza, Com. José Manuel Mendes, Dr. Afonso Geribello, Álvaro Motta, Teodomiro Uchoa,
Cap. Antonio P. da Silva Junior, J. A de Almeida Macuco, Dr. Afonso Gama, Antonio G. de
Freitas, Dr. Antonio R. Guião, Osório de Siqueira, Tte. Cel. Saturnino de Carvalho, Dr.
Floriano L. Ribeiro, Cel. Francisco Schmidt, Cel. Joaquim da Cunha Junqueira, Victal
Antonio de Paiva, Dr. Augusto Loyolla, Cel. Domingos V. de Andrade, Cel. Eliseu C. Pinto,
Cel. Manoel Maximiano, Cel. J. Firmino de A. Junqueira, Cel. J. Bueno, José V. Martins e
Luis Baptista, que representavam a elite política e econômica da cidade de Ribeirão Preto. As
comissões principais eram compostas pelos homens, e as auxiliares, pelas mulheres.
71
A elite ribeirão pretana que integrava as comissões pouco ou quase nada fez em
conjunto para angariar os fundos necessários junto à municipalidade. Os relatórios da
Secretaria de Estado do Vaticano e de monsenhor Siqueira levam a concluir que a única forma
de contribuição efetiva da comissão foi feita de maneira individual.
O vigário de Ribeirão Preto, mons. Siqueira, não havia medido esforços para a
concretização do projeto. Ele fez um levantamento a pedido do bispo sobre as condições das
paróquias e capelas do futuro bispado, para mapear e organizar a formação do fundo
patrimonial para a constituição da fábrica do bispado.”
72
Em carta publicada no jornal $&LGDGH, datada de 26 de junho de 1907, ficou
claro como d. Duarte delegou amplas faculdades para que Monsenhor Siqueira trabalhasse em
70
LAURIANO, J.
)XQGDomRH,QVWDODomRGR%LVSDGRGH5LEHL UmR3UHWR
. (1906-1909) Ribeirão Preto: Cúria
Metropolitana, [s/d], p. 27-28.
71
As mulheres formaram Comissões Auxiliares, subordinadas à masculina, concessão de d. Duarte para
aquelas que administravam seus bens. Essa submissão segue a tônica da sociedade do início do século XX
em que a condição da mulher tinha por base uma ampla submissão ao homem: pai, marido, irmãos, tios. A
Comissão Auxiliar feminina de Ribeirão Preto era chefiada pelas sras. D. Iria Junqueira e D. Francisca do
Val. As duas senhoras, proprietárias de terras, representavam a elite feminina local.
72
Fábrica: termo técnico que se refere ao patrimônio cuja renda permitiria a existência e independência
financeira de uma diocese.
40
prol da obra da formação do patrimônio da diocese: Satisfazendo ao pedido de V. Revma.,
envio-lhe a lista das paróquias pertencentes à nova diocese, dando-lhe amplas faculdades para
fazer o que lhe aconselhar o seu bom espírito em favor de tão boa causa.”
73
A carta que d. Duarte enviou a mons. Siqueira teve uma boa repercussão na
região, conforme mensagem do padre Evaristo de Moraes, de Cravinhos, que enalteceu o
trabalho de d. Duarte e de monsenhor Siqueira, ressaltando que as paróquias deveriam e
poderiam contribuir para formar o patrimônio da diocese. Para o padre Evaristo [...] um
Bispado é um verdadeiro progresso, é um grande passo para a civilização e engrandecimento
de uma cidade”
74
, enfatizando que a presença de um bispo poderia ser benéfica e trazer
progressos para a cidade.
Mons. Siqueira era apenas o vigário da matriz de São Sebastião do Ribeirão Preto
e não exercia influência e poder sobre as outras matrizes e seus párocos. Por isso, a delegação
de poderes para liderar a comissão foi fundamental.
O bispo de São Paulo precisava de pessoas que trabalhassem para ele no interior,
organizando o patrimônio para viabilizar a execução do projeto de criação da Província
Eclesiástica. No caso de Ribeirão Preto, a opção de d. Duarte foi escolher o pároco da matriz,
mons. Joaquim Antonio de Siqueira, para estar à frente do projeto.
D. Duarte declarou que se responsabilizou perante a Santa Sé, empenhando sua
palavra para garantir a criação do bispado de Ribeirão Preto e o patrimônio necessário e que
[...] não admito siquer a hypótese de me ver collocado numa situação desagradável [...]”
75
O
que d. Duarte não admitiu era que, depois de todo seu trabalho perante a Nunciatura
Apostólica e da Secretaria de Estado do Vaticano, necessitasse voltar atrás por causa da
ausência de um patrimônio para a instalação da diocese, justamente na cidade considerada
uma das mais promissoras do Estado de São Paulo.
No entanto, a confiança dos líderes da Igreja no êxito do trabalho de base de
monsenhor Siqueira para angariar os fundos, na realidade, não era plena. d. Joaquim
Arcoverde, cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, escreveu a d. Duarte sobre os problemas
enfrentados na criação dos cinco novos bispados e, sobre Ribeirão Preto, afirma:
Não vi porém, cousa que inspirasse confiança em Ribeirão Preto. Há notável
diferença entre o modo como se houve o passo em outras cidades e o
73
O BISPADO. Carta de São Paulo de d. Duarte a mons. Siqueira. $&LGDGH, Ribeirão Preto-SP, 29/jun./1907.
74
CARTA DO Pe. EVARISTO MORAES a mons. Siqueira.
$&LGDGH
, Ribeirão Preto-SP, 30/jun./1907.
75
SILVA, D. Duarte Leopoldo e

Correspondência
a monsenhor Joaquim Siqueira, 26/jun./1907. Arquivo
Público e Histórico de Ribeirão Preto-SP, Fundo José Pedro de Miranda (
$3+53)-30
), Ribeirão Preto-SP.
41
seguido em Ribeirão Preto. Convém contudo crear alli uma diocese, si não
aquillo se perde. V. Excia. mesmo reconheceu essa necessidade. O vigário
de Ribeirão Preto é um santo, mas não infunde enthusiasmo.
76
As dificuldades enfrentadas, o descaso encontrado e os relatórios deixaram claro:
o mons. Siqueira não foi capaz de realizar a contento a tarefa que d. Duarte o encarregou. É
possível que o conteúdo da correspondência entre o cardeal d. Arcoverde e o bispo d. Duarte,
a respeito da incapacidade de mons. Siqueira, jamais tenha chegado ao seu conhecimento.
O que não se pode negar é o empenho de mons. Siqueira. Em tempos de poucas
ou quase nenhuma estrada, a Mogiana”, melhor meio de transporte da época, não chegava a
todas as localidades; mas ele visitou pessoalmente vinte e duas das trinta e cinco paróquias
que integrariam a diocese, formando comissões locais, tentando agilizar o patrimônio. O
esforço do padre não teve resultados satisfatórios aos olhos da cúria em São Paulo, porque
não rendeu o dinheiro necessário à formação do patrimônio. Nem mesmo na cidade em que
ele era o pároco, e que abrigaria a sede do bispado, mons. Siqueira convenceu os membros da
Câmara Municipal para contribuir na formação do patrimônio da diocese, conforme vamos
ver adiante.
Monsenhor Lauriano, em seu estudo sobre a criação da diocese transcreveu
integralmente a lista das paróquias com as comissões que foram formadas por Monsenhor
Siqueira em 1907:
1- No dia 12 de Julho de 1907, realizou-se uma reunião na matriz do
Bom Jesus da Cana Verde de Batatais, na qual foi nomeada a Comissão pró-
patrimônio, composta do seguinte modo: Presidente: Padre José Lafayette de
Godoy. Membros: Cel. Manuel Theodolino do Carmo, Cap. Ovídio de Lima,
Cap. Francisco Moreira.
2- No dia 18 de Julho, em reunião semelhante foi constituída a
Comissão da paróquia de Rifaina, assim organizada: Presidente: Vigário
Padre Canuto Amarante. Membros: José Pedro de Carvalho Guimarães,
Nicolau Miranda, Adolfo Quirino Borges.
76
ARCOVERDE, D. Joaquim. Correspondência a D. Duarte Leopoldo e Silva, 26/maio/1907.
$&063
, São
Paulo. (Pasta Cardeal Joaquim Arcoverde).
42
3- No dia 21 de Julho, igual providência foi tomada com relação à
paróquia do Patrocínio do Sapucaí, resultando a Comissão seguinte:
Presidente: Vigário Padre Heriberto Goethers. Membros: João Villela dos
Reis, José Candido de Figueiredo, Antonio Goulart d’ Andrade. Comissão
feminina: Dna. Balbina Lacerda Monteiro, Maria Lunfonsina dos Reis,
Maria Cândida Rosa, Maria José de Freitas.
4- No dia 24 de Julho é a vez de Franca, em cuja paróquia ficou
constituída a seguinte Comissão: Presidente: Vigário Padre Alonso Ferreira
de Carvalho. Membros: Major João Caetano Alves, Cel. Antonio Jacintho da
Silva, Tte. Cel. J. Pedro de Faria.
5- São José da Bela Vista teve a sua Comissão constituída no dia 25
de Julho, com a seguinte composição: Presidente: Vigário Padre Modesto da
Costa Mont-Serrat. Membros: Cel. Joaquim Antonio Garcia, Joaquim Garcia
Lopes da Silva Junior, Cel. Anselmo da Silva Lopes Diniz.
6- No dia 28 de Julho de 1907 organizou-se a Comissão da paróquia
de Brodowski, assim constituída: Presidente: Comendador Manoel Bueno da
Rocha Soares, Reinaldo Salles Oliveira, Antonio Leite de Oliveira, Joaquim
de Souza Neves.
77
Em relação às outras paróquias da futura diocese, mons. Lauriano informou que
nada encontrou no arquivo da cúria. A ausência de outras informações sobre essas comissões
nos levou a refletir sobre a sua a verdadeira atuação, se é que tiveram.
Os relatórios enviados por mons. Siqueira ao bispo d. Duarte não esclareceram se,
e com quanto, cada uma das comissões paroquiais contribuiu. Podemos afirmar, ao analisar os
nomes dos membros, que as comissões estavam formadas pelas elites locais. Não
conseguimos esclarecer mais sobre o assunto com a documentação consultada no Brasil e nos
Arquivos do Vaticano. A contribuição pecuniária das comissões permaneceu até agora uma
incógnita. Mas, levando em consideração que o bispado foi instituído sem o patrimônio
formado, o papel delas foi praticamente nulo, uma vez que não conseguiram formar o
patrimônio conforme as exigências do Vaticano.
77
LAURIANO, J.
)XQGDomRH,QVWDODomRGR%LVSDGRGH5LEHL UmR3UHWR
, p. 38-39.
43
No entanto, vale a pena comentar algumas comissões: a de Patrocínio Paulista foi
a segunda paróquia identificada depois de Ribeirão Preto, na lista arrolada por Monsenhor
Lauriano, que contou com uma comissão feminina. No livro de Tombo
78
da Paróquia de
Nossa Senhora do Patrocínio, o nenhuma referência sobre as comissões masculina ou
feminina. As mulheres de outras paróquias podiam e deveriam também ter contribuído de
alguma maneira, mas a ausência de fontes impede de afirmar. A participação das mulheres era
algo bastante inédito para a época, principalmente em se tratando de uma cidade pequena
como era a Patrocínio do Sapucahy, em 1907.
Na comissão de Batatais estavam os representantes que fizeram parte do abaixo-
assinado em 1903, enviado ao Vaticano
79
, com o projeto de criação da diocese de Batatais:
padre Lafayette de Godoy (vigário paroquial), Cel. Manoel Theodolino do Carmo
(capitalista), Cap. Ovídio de Lima (1
o
. tabelião), Cap. Francisco Moreira (escrivão da
coletoria). Estaria a comissão de Batatais verdadeiramente interessada em angariar fundos
para constituir o patrimônio para Ribeirão Preto?Em 1903, os mesmos senhores, junto com
outros, haviam assinado um pedido e enviado à Secretaria de Estado do Vaticano, para que a
cidade de Batatais fosse sede de bispado e adiantaram ao núncio d. Giúlio Tonti que o
patrimônio não constituía problema para ser formado. O padre Lafayette de Godoy, da matriz
de Batatais, afirmou que garantia a quantia exigida pela Santa Sé, de cem contos de réis
80
para
o patrimônio.
Quando monsenhor Siqueira alegou que quase não teve retorno das cidades, não
especificava quais, mas Batatais certamente era uma das candidatas a boicotar uma ajuda
financeira para o patrimônio de Ribeirão Preto. Que motivos teriam Batatais e o pároco
Lafayette de Godoy para contribuir com Ribeirão Preto? Diante das circunstâncias, nenhum,
uma vez que se chegou a anunciar que a cidade fora escolhida para sediar o bispado. A morte
do bispo d. José, em 14 de agosto de 1906, contribuiu para impedir que Batatais, fosse
elevada à categoria de bispado. Nos bastidores do Vaticano, a cidade estava indicada para
abrigar a sede do bispado junto com Campinas, Taubaté e Botucatu, de acordo com os
relatórios da Secretaria de Estado do Vaticano.
81
E quanto às outras paróquias, que vantagens poderiam ter com uma sede do
bispado mais próxima? A presença mais constante de um bispo poderia deixar os rocos
78
LIVRO de Tombo n. 1 Matriz de Nossa Senhora do Patrocínio.
$UTXLYRGD&~ULD'LRFHVDQDGH)UDQFD
$&')U63), Franca-SP.
79
$69
. fasc. 111.
80
PROGETTO
di Diocesi in Batataes
$6J91$%
. n. 101, fasc. 500.
81
Cf: Indice delle sezioni – Brasile
$69
. v. 62.
44
mais vigiados, o que não soava muito interessante para alguns vigários, cuja distância do
bispo favorecia um exercício de poder quase ilimitado. Por outro aspecto, é possível apontar
algumas facilidades, tais como a presença mais próxima do bispo para resolver problemas que
às vezes se arrastavam em razão das grandes distâncias. As visitas dos bispos poderiam ser
realizadas mais freqüentemente, como de fato o foram, depois da chegada de d. Alberto ao
bispado de Ribeirão Preto.
Analisando a suposta facilidade com a presença do bispo, isso não significava que
as cidades estivessem dispostas a contribuir com dinheiro para o patrimônio. Os relatórios de
mons. Siqueira deixaram claro que havia uma crise econômica na região, conseqüentemente,
escassez de recursos, necessitando manter ajuda nas paróquias, manter o culto em suas
matrizes e ou capelas; algumas estavam velhas, eram pequenas e precisavam de reformas, ou
de construir um novo templo. Um novo empreendimento gerava gastos e caberia aos fiéis
arcar com mais um custo, o que nem sempre era tarefa fácil, visto que muitos não viam com
bons olhos aumentar o patrimônio da Igreja católica.
Os resultados das visitas de mons. Siqueira às paróquias foram transformados em
relatórios enviados a d. Duarte. Esses relatórios fizeram parte da documentação enviada ao
Vaticano junto com o pedido de criação das dioceses.
82
Em um deles, monsenhor Siqueira
esclareceu que enviou cartas aos rocos, pedindo uma ajuda pecuniária para a formação do
patrimônio e que fracassou na missão, pois as respostas não trouxeram bons resultados, pois
somente oito vigários responderam o que o levou a considerar algumas cartas desanimadoras.
Ele alegou o fracasso da missão enumerando alguns fatores: não se considerava a pessoa
indicada para tal empreendimento, explicou que havia uma crise agrícola que se abatera na
região, que devia ser considerada como uma das principais causas também a falta de
sentimento religioso por parte da população. O retrato que fez das pessoas da região, formada
com muitos forasteiros, era de aventureiros que queriam apenas o enriquecimento fácil.
82
SIQUEIRA, Mons. Joaquim Antonio de. Correspondência
ao bispo d. Duarte, 12/jan.1908.
$&063
, São
Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
45
O último ponto descrito por mons. Siqueira era considerado preocupante pela
Igreja, por isso exigia prontamente a criação da nova diocese para que fossem evangelizadas
as gentes, disciplinando-as na fé cristã, antes mesmo que outras crenças conseguissem
alcançar essas pessoas, arregimentando-as para si. O medo de perder espaço numa sociedade
em que as forças estranhas ao catolicismo ganharam terreno com o advento da República, em
que as novas crenças estavam livres para se estabelecer em qualquer lugar, significou uma
reviravolta nos planos iniciais para a criação de um ou dois bispados no Estado de São Paulo.
Era preciso marcar a presença da Igreja com a criação das dioceses, para que os bispos, junto
com os padres, barrassem a conjuntura adversa. Como a região parecia terra de bravos, era
hora de agir para impor a lei católica.
O projeto que a cidade de Batatais havia enviado à Secretaria de Estado do
Vaticano usou o recenseamento de 1897, fazendo referências a uma população de 834.690
habitantes, para a área delimitada no projeto para a diocese a ser criada com sede em Batatais.
Dessa população o relatório informou:
4XDGURGDSRSXODomRGDUHJLmRGHOLPLWDGDQRSURMHWRSDUDFULDomRGDGLRFHVHGH
%DWDWDLV
3RSXODomRSRUQDFLRQDOLGDGHV 4XDQWLGDGHGHKDELWDQWHV
Brazileiros 667.752
Italianos 122.922
Portuguezes 20.922
Hespanhoes 13.005
Allemaes 3.331
Austríacos 2.537
Francezes 449
Outras nacionalidades 3.771
7RWDO 
)RQWH
: Vaticano, Archivio Storico, Segreteria Di Stato. Fasc 111.
Quando d. Duarte enviou seu projeto, uma cada depois do censo de 1897, os
dados referentes à população estavam modificados. O crescimento demográfico foi rápido em
toda a região, que necessitava de braços para as lavouras, permitindo a entrada de um maior
número de imigrantes.
46
Para a hierarquia da Igreja, a região conhecida como oeste paulista” ou sertão
desconhecido” necessitava conhecer a evangelização católica apostólica romana, antes que
outros irmãos de cristã chegassem. A presença dos maçons, protestantes, anarquistas e
seguidores do espiritismo era preocupação identificada pela Igreja que contribuiu para a Santa
Sé aceitar integralmente o projeto de d. Duarte.
83
A explosão do crescimento rápido da cidade
de Ribeirão Preto era evidente no grande número de imigrantes que chegava para trabalhar
nas lavouras e nas diferentes atividades comerciais, proporcionando uma nova configuração
social e econômica.
84
A divisão da grande diocese de São Paulo atenderia às necessidades de dar
impulso ao movimento religioso no interior do Estado. Esse ponto era considerado por d.
Duarte como inquestionável. O aumento da população, o surgimento de novas vilas e cidades,
em razão da expansão agrícola e comercial, trouxeram outra realidade e preocupação por
parte das autoridades religiosas, que estavam cientes de que, nas condições em que a situação
da Igreja no interior se encontrava, não poderiam atender à demanda. O número de imigrantes
aumentava, e a competição com a chegada e instalação de outras crenças no interior do país
era uma ameaça constante aos planos da Igreja, que recebia ataques dos anticlericais, dos
livres-pensadores, dos maçons e outros grupos contrários à Igreja católica.
O mapa apresentado por Batatais à Secretaria de Estado do Vaticano, em 1903,
mostrava parte do território do Estado de São Paulo como sertão desconhecido. A abertura da
fronteira agrícola, no início do século XX, permitiu que a expansão da Igreja acompanhasse
de certa forma o avanço econômico e político. Os desafios eram constantes e a Igreja estava
ciente de que seria seu papel evangelizar as gentes na moderna sociedade que a contestava.
Para a elite eclesiástica, um bispado representava uma arma segura na tentativa de fazer valer
seus planos de controle mais assíduo da sociedade. Essa tentativa seria efetivada pela
presença do bispo, incentivando o clero a formar e dirigir as associações leigas, fundando os
colégios católicos, que, ao serem instalados, contribuiriam para compor outra parcela de
presença da Igreja junto à sociedade.
Ao apresentar no Vaticano, em 26 de fevereiro de 1908, em audiência com o papa
Pio X, o projeto de constituição da Província Eclesiástica de São Paulo, d. Duarte foi bem
83
BAVONA, Alessandro. Correspondência ao Secretário de Estado Rafaelle Merry D. Val, Petrópolis
7/maio/1908. $69 Fasc. 143
84
LOPES, Luciana S. A formação do município de Ribeirão Preto e o surgimento do comércio e da indústria. In:
$VVRFLDomR&RPHUFLDOH,QGXVWULDOGH5LEHLUmR3UHWR
. Um espelho de 100 anos. Ribeirão Preto:
São Francisco, 2004, p. 167-177.
47
recebido, e seu projeto, aceito e abençoado, até mesmo com a permanência do Santuário de
Aparecida sob a jurisdição de São Paulo, e não do bispado de Taubaté.
Os problemas destacados por mons. Siqueira, ao descrever a população da região
de Ribeirão Preto, constituíam parte comum da vida cotidiana no Brasil daquele momento,
especificamente de São Paulo. Uma nova situação urbana estava despontando e, com ela, a
Igreja mantinha seus olhos vigilantes na nova sociedade que se organizava, muitas vezes
distante da influência da Igreja. O papel da mulher sob o manto da modernidade e do
casamento indissolúvel no seio da família representava garantia certa para a Igreja de que a
sociedade estaria santificada, conforme os desígnios católicos.
A hierarquia da Igreja considerava que a presença de padres, e mais ainda de um
bispo, constituía elemento seguro para tentar combater as idéias nefastas e,
conseqüentemente, tentar intensificar a evangelização e santificação da sociedade. Entende-se
que uma sociedade, em sua maioria analfabeta e que vivia de práticas de religiosidade, pouco
sabia sobre a Igreja institucionalizada e as ações de seu governo. Outros grupos tornavam-se
cada vez mais indiferentes a essa institucionalização e aos valores pregados pela Igreja. Desde
o início do século XIX, a hierarquia da instituição instigava os bispos e padres a que eles
pregassem o reinado de Cristo na terra, sobrepondo os valores das outras crenças e doutrinas,
considerados como a ruína dos homens.
&RQVWUXomRGD&DWHGUDOHDI RUP Do mRGRSDWULP{QLR
Enquanto algumas cidades, como Batatais, sonhavam em sediar um bispado e
tudo faziam em prol de tal sonho, outras não consideravam isso como relevante e pouca
importância atribuíam a ser a sede de uma diocese. Em Ribeirão Preto, não temos indícios
para afirmar que houve uma grande mobilização para formar o patrimônio que permitisse que
a cidade recebesse o bispado. Cidades como Taubaté, São Carlos, Campinas, Botucatu, que
foram escolhidas ou que queriam sediar um bispado, estavam com o patrimônio praticamente
formado, em 1908, enquanto Ribeirão Preto teve problemas e não angariou os duzentos
contos de réis exigidos pela Santa Sé.
A situação era complexa e não reportava à questão do dinheiro; era também
necessário construir uma casa para ser a residência do bispo e uma catedral.
O problema da casa ficou provisoriamente acertado com a doação da residência de
mons. Siqueira, mas continuava o problema da catedral. A matriz, ainda em construção,
48
precisava rapidamente ser transformada em catedral, e nessa tarefa mons. Siqueira teve
grande ajuda do padre Euclides Gomes Carneiro.
No início do século XX, a antiga matriz de Ribeirão Preto, velha e decadente,
necessitava ser substituída por outra maior e mais condizente com os serviços religiosos em
uma cidade com rápido crescimento. A Igreja, pequena, não comportava mais a população,
que crescia com a vinda dos imigrantes. Um outro fator, apontado pela pesquisadora
Valadão
85
, era que o antigo templo, construído em adobe, estava em ruínas. Em janeiro de
1901, o vigário mons. Siqueira reuniu uma comissão disposta a enfrentar a construção da
nova matriz, que, mais tarde, se tornou a catedral.
As negociações para a construção envolveram a cúria metropolitana de São Paulo
e a Municipalidade para derrubar a igreja velha dentro dos tramites exigidos pela Santa Sé,
uma vez que o local, espaço de reurbanização, abrigaria uma praça maior.
Após a publicação de edital em jornais da cidade e da capital, foram recebidas as
plantas de trinta e três projetos que ficaram expostas no Teatro Carlos Gomes. Formaram-se
duas Comissões, uma técnica para a escolha dos projetos, e outra, chamada de construtora.
Finalizando o relatório de 26 de janeiro de 1901, consta a assinatura dos membros da
comissão técnica, Dr. Theodomiro Mendonça Uchoa, Dr. Rufino A. de Almeida, Dr. Aniceto
Mazzoni, João Caetano Álvares, Dr. Afonso Geribello.
A comissão técnica considerou as bases oferecidas pelo edital de concorrência
muito defeituosas
86
, pois julgavam ser impossível organizar um projeto para a construção da
matriz que fosse ao mesmo tempo digno da religião católica e do futuro da cidade de Ribeirão
Preto. Dentro das condições que ficaram estabelecidas, o projeto deveria apresentar 27 metros
de largura por 67 metros de comprimento, com 1.809 m. de área coberta. O orçamento era
muito apertado, limitando o custo entre 400 e 500 contos de réis, ou 260 mil is por m
2
no
máximo, excluindo o feitio do altar-mor.
Depois da triagem inicial, a comissão reuniu-se novamente e começou a examinar
atentamente os projetos e, no Relatório para Parecer da Comissão Técnica, justificou-se para
cada projeto sua recusa em razão de fatores de exigências fixadas no edital, como dimensões
do prédio, descrição do orçamento, orçamento acima do previsto, estética do edifício, ou
ainda pelas condições climáticas de Ribeirão Preto.
85
VALADÃO, Valeria.
0HPyULD$UTXLWHW{QLFDHP5LEHLUmR3UHWR
; Planejamento Urbano e Política de
Preservação. 1997. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social,
Franca-SP, 1997, p. 64.
86
RELATÓRIO da Comissão de Engenheiros para a Comissão construtora da Matriz, Ribeirão Preto,
26/jan./1901, p. 3. Arquivo da Cúria Metropolitana de Ribeirão Preto-SP (
$&05363
). (Documentos Avulsos).
49
A comissão técnica, inicialmente, separou nove projetos que depois acabou
recusando, pois não encontrou um único que reunisse as condições exigidas pelo edital.
Dentre os nove escolhidos, o projeto do arquiteto Victor Dubugrás foi aprovado por voto
unânime, considerado pela comissão como superior a todos os outros, pela imponência
arquitetônica, pela beleza e por todo o conjunto da obra proposta. Mas a comissão reconheceu
que não podia indicá-lo e expôs as razões fundamentadas no orçamento, acreditando que ele
iria exceder em 50% o edital. Não levaram adiante o projeto que gostariam.
A comissão fez uma nova triagem nos projetos que haviam sido rejeitados
inicialmente e que mais uma vez foram rejeitados. O parecer da comissão apontava que os
projetos melhores estavam muito acima do orçamento pedido no edital. O relatório sugeriu
que alguns projetos melhores fossem selecionados e chamados seus arquitetos para refazê-los,
mas reservando-se o direito de realizar uma nova concorrência.
87
Convidaram o Dr. Carlos Eckman
88
, (1866-1940) de São Paulo, por ser a planta
que mais se aproximava dos requisitos exigidos pelo edital, para vir a Ribeirão Preto conhecer
o local e apresentar um projeto mais modesto, de acordo com as condições da população, e
receber o prêmio estabelecido em dois contos de réis.
Do arquiteto escolhido, Carlos Eckman, a comissão, inicialmente, expôs que o
projeto:
[...] deixa muito a desejar, principalmente pela manifesta desproporção entre
a torre central e o corpo do edifício, a ponto d’este quase desapparecer diante
d’ aquelle, não propõem a sua escolha, salvo melhor juízo. É preciso declarar
que o comprimento do edifício é apenas de 61 metros e não de 67, como
pede o edital.
89
O arquiteto refez seu projeto para adequá-lo às condições, e a construção da
matriz levou anos para terminar.
90
Em 1904, com os alicerces prontos, mons. Siqueira
enviou pedido de licença à cúria em São Paulo para [...] celebrar missa campal no local da
nova matriz, como uma forma de incentivar os fiéis a fazer novos donativos para a construção
RELATÓRIO da Comissão de Engenheiros para a Comissão Construtora da Matriz, Ribeirão Preto,
26/jan./1901, p. 19 a 23.
$&053
SP. (Documentos Avulsos).
88
Carlos Eckman, arquiteto sueco, chegou ao Brasil no final do século XIX.
89
RELATÓRIO Engenheiros para a Comissão Construtora da Matriz, Ribeirão Preto, 26/jan./1901, p. 19 a 23.
$&053
SP. (Documentos Avulsos).
89
idem.
89
RELATÓRIO
da Comissão de Engenheiros para a Comissão Construtora da Matriz, Ribeirão Preto,
26/jan./1901. $&053SP. (Documentos Avulsos).
90
Em relação ao concurso para escolha dos projetos, nada encontramos na documentação que fizesse referência
de que a matriz viria a ser a catedral do bispado ou mesmo que a cidade fosse escolhida para sede de um bispado.
A vizinha cidade de Batatais estava tentando alcançar essa condição.
50
da mesma.”
91
A missa foi celebrada em 3 de maio de 1905, com a participação de grande
número de pessoas. A missa campal representava um incentivo a mais para que os fiéis
contribuíssem para a causa, mobilizando a população numa grande manifestação pública.
Na data citada, encontramos também pedidos de padre Euclides Gomes Carneiro
sobre o mesmo tema: [...] celebrar missa na cadeia e em oratórios particulares, e esmolar
nestes locais para a construção da nova matriz.”
92
Ao que consta, a condição de construção da nova matriz passou por inúmeros
percalços. O velho templo foi desapropriado em 1905, para a construção da Praça Quinze,
conforme Ata da Câmara de 7/3/1905.
93
A Municipalidade comprometeu-se a pagar cinqüenta contos de réis, em vinte e
cinco parcelas de dois contos, como indenização do terreno da velha matriz, e mais seis
contos de réis para adaptar o salão que passou a abrigar o culto até o término da nova matriz.
Em 2 de julho de 1905, efetivou-se a entrega do prédio da matriz para a
municipalidade. A cerimônia da última missa foi bastante concorrida, boa parte da população
da cidade possuía algum tipo de vínculo com o templo: foi batizado, casou-se; além disso, o
espaço sagrado representava grande importância no imaginário coletivo da população, pois
era o local em que faziam suas preces a Deus.
94
O largo de uma matriz representava também
ponto de encontro, local para a realização de negócios, encontro de casais, troca de notícias
sobre assuntos variados. As festas religiosas, como a do santo padroeiro, contribuíam, no
início do século XX, com uma parcela do entretenimento da população.
O culto funcionou num salão improvisado na Rua Álvares Cabral, benzido em 4
de setembro de 1905 pelo vigário mons. Siqueira. A visita de d. Duarte, em 1907, e, dois anos
depois, a posse do primeiro bispo d. Alberto, tiveram suas cerimônias realizadas na capela de
São José, dos padres Agostinianos.
Inicialmente, o trabalho de construção das obras da matriz ficou a cargo do padre
Euclides Gomes Carneiro, coadjutor da Paróquia de São Sebastião do Ribeirão Preto.
Monsenhor Siqueira elogiou o trabalho do padre Euclides [...] dotado de uma têmpera de
ferroe força extraordinária, conseguiu levantar e cobrir o corpo da Igreja [...]
95
91
LIVRO de Tombon. 2, p. 149. Arquivo da Catedral de Ribeirão Preto-SP ($&53-SP). Ribeirão Preto-SP.
92
LIVRO de Tombo n. 2 p. 149.
$&53
-SP. Ribeirão Preto-SP.
93
LIVRO de Atas da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, n. 8, (1903-1907). p. 99-100.
$UTXLYRGD&kPDUD
0XQLFLSDOGH5LEHLUmR3UHWR$&D05363
). Ribeirão Preto-SP.
94 LAURIANO, Monsenhor Dr. João. $SRQWDPHQWRVVREUHD)XQGDomRGH5LEH LUmR3UHWR. Ribeirão Preto:
Cúria Metropolitana. s/d. p. 47.
95
LAURIANO, Monsenhor Dr. J.
)XQGDomRH,QVWDODomRGR%LVSDGRGH5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão
Preto: Cúria Metropolitana de Ribeirão Preto-SP, s/d. p. 33.
51
No relatório de d. Duarte para a Nunciatura Apostólica, ao se descreverem os
problemas de cada uma das novas dioceses a serem criadas, a ausência de um templo para
servir de catedral não era empecilho, mais importante era a criação da diocese em Ribeirão
Preto a todo custo:
[...] a de Ribeirão Preto, que será também um vasto e bello templo, está
ainda em construcção. Nem por isso me parece conveniente retardar a
creação desta última Diocese; sendo a sua primeira necessidade a presença
de um Bispo que possa impulsionar o movimento religioso, em uma zona
que, por seu afastamento, exige maior fiscalização e vigilancia. Demais, é
certo que o futuro Bispo, entre outros optimos serviços, poderá concorrer
vantajosamente para a conclusão da cathedral.
96
Para d. Duarte, a bênção do papa estendida a Ribeirão Preto, mesmo sem o
patrimônio, fechava com êxito seu projeto. As tentativas de esforço por parte do mons.
Siqueira de conseguir da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, por meio de um ofício, uma
verba para a formação do patrimônio da fábrica do bispado não surtiram efeito; a Câmara
97
deu parecer negativo, conforme ata de 16/11/1907.
98
Monsenhor Siqueira considerava o
pedido de verba à Câmara como de natureza sacratíssima, e o fato de ela ter dado um parecer
negativo, a despeito de seus esforços, foi para ele uma derrota. O parecer dos membros da
municipalidade de Ribeirão Preto deixou clara a posição firme adotada de não ajudar
financeiramente na formação do patrimônio de uma instituição religiosa. Os vereadores foram
enfáticos, alegando que tal contribuição não fazia parte das atribuições da Câmara e que não
poderiam ajudar. A proposta fora encampada e encaminhada pelo vereador Dr. Augusto
Ribeiro de Loyolla, com o pedido de incluir no orçamento da Câmara uma verba de quarenta
contos (40,000$000) para a formação do patrimônio. Num patrimônio orçado em duzentos
contos de réis para o bispado, esta quantia representava uma grande ajuda para a pida
aquisição do montante estimado. A resposta da Câmara
99
, datada de 16/11/1907, sob a
presidência de Manoel Maximiano Junqueira, revelou que durante a reunião os vereadores
acataram a fala de um dos membros da comissão de finanças, Antonio Vicente Ferraz de
96
RELATÓRIOdo Bispo de São Paulo à Nunciatura Apostólica sobre a criação de cinco novas dioceses.
$&063
. (Pasta d. Duarte).
97
LIVRO de Atas
da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, n. 9, p. 21 et seq., 16/nov./1907.
$&D05363
,
Ribeirão Preto-SP.
98
LIVRO de Atasda Câmara Municipal de Ribeirão Preto, n. 9, p. 21 et seq., 16/nov./1907. $&D053-SP,
Ribeirão Preto-SP.
99
LIVRO de Atas da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, n. 9, p. 21 et seq., 16/nov./1907.
$&D053
-SP,
Ribeirão Preto-SP.
52
Sampaio. No entendimento desse vereador, a Câmara não poderia dar um parecer favorável,
uma vez que, segundo a Constituição, não fazia parte das atribuições de uma Câmara
Municipal votar projetos que envolvessem apenas uma camada da população ou
contemplassem uma única crença, visto que no país vigoravam a liberdade e a igualdade dos
cultos.
A sessão de Finanças da mara Municipal não chegou a um acordo que fosse
satisfatório para a Igreja católica, na sessão de 30/10/1907. No dia 31/10/1907, a proposta de
subvenção de 40 contos de réis foi votada, obtendo votos favoráveis dos seguintes vereadores:
Dr. Loyola, Cel. Joaquim Alves e Cel. Eliseu Pinto. Votaram desfavoravelmente Cel. Antonio
de Sampaio, Cel. Joaquim Vieira e Cap. Renato Jardim.
O desempate coube ao Cel. Antonio de Sampaio que declarou não poder
como vereador, prestar o seu concurso à idéia da subvenção; todavia, como
homem e como católico, se havia de empenhar quanto estivesse nas suas
forças para a constituição do bispado de Ribeirão Preto.
100
Diferente de Ribeirão Preto, na cidade de São Carlos do Pinhal, a formação do
patrimônio da diocese, criada na mesma época que Ribeirão, recebeu uma ajuda importante da
Câmara Municipal. Pela Lei n. 135, foi incluída no orçamento a subvenção de 30 contos de
réis para o patrimônio do bispado de São Carlos: Fica o Intendente (Major Manuel Antonio
de Matos) autorizado a incluir no futuro orçamento, a subvenção de 30 contos de réis ao
bispado de São Carlos do Pinhal.”
101
A Lei de 3 de julho de 1907, da Câmara de São Carlos, coincidiu com o período
em que d. Duarte estava visitando as cidades, formando comissões para angariar fundos para
os novos bispados. Na região de Ribeirão Preto, mons. Siqueira também visitava cidades
tentando conseguir o dinheiro para formar o patrimônio, o que antecedeu a votação na Câmara
de Ribeirão Preto. Os vereadores da Câmara de São Carlos, diferentemente de Ribeirão Preto,
sequer levaram em consideração a Constituição brasileira e a liberdade de culto, votaram a
subvenção sem se importar com aumentar ou não o patrimônio da Igreja católica.
100
LAURIANO, Monsenhor Dr. João.
)XQGDomRH,QVWDODomRGR%LVSDGR
p. 41.
101
ATAS
das Sessões Extraordinárias 1900-1913, p. 177-178.
$UTXLYR3~EOLFR0XQLFLSDOGH6mR&DUORV
, São
Carlos-SP.
53
Em Ribeirão Preto, como havia interesses políticos em jogo, durante a visita de d.
Duarte em 1907, a Câmara contribuiu, entre outras coisas, com $500,000 (quinhentos mil
réis) e ornamentos para a recepção. Para a criação do bispado, certamente ocorreu a adesão de
seus membros, ou de parte deles, com alguma ajuda individual, facilitando na medida de seus
interesses políticos e religiosos, mas não houve um envolvimento do legislativo municipal.
Depois da recusa dos membros da Câmara em ajudar para a formação do
patrimônio, Monsenhor Siqueira pediu uma isenção de impostos para uma casa na Rua São
Sebastião, então residência paroquial, e de dois terrenos; um na Rua Tibiriçá e outro na Rua
Lafayete, que integrariam o patrimônio do bispado. A isenção de impostos foi dada, conforme
Atas da Câmara de 15/12/1908, mas com a condição de que as casas deveriam ser ocupadas
em função do bispado e não para outros fins lucrativos. A prática de aluguéis era comum, e os
imóveis da Igreja não escaparam a esse costume.
Oficialmente, as comunicações entre monsenhor Siqueira e a Câmara Municipal
ocorreram em diferentes momentos, e quase sempre referentes a pedidos de auxílio, exceto
quando mons. Siqueira enviou convite ao legislativo para participar dos festejos da recepção
de d. Duarte, por ocasião de sua visita pastoral citada.
No início do século XX, Ribeirão Preto estava constituída por grande número de
imigrantes, mas, na órbita política, uma parcela significativa do poder estava nas mãos dos
grandes senhores produtores de café. O envolvimento da população brasileira na vida política
era mínimo, e o voto estava restrito durante a República Velha a 6% da população.
102
Nem sempre a mentalidade expressa pelos representantes do povo revelava os
anseios da população, considerando-se que este era, em sua maioria, analfabeto e vivia muitas
vezes alheio às disputas políticas entre as elites. A Igreja, por sua vez, estava muito afastada
de uma eficaz e enraizada evangelização e, com a separação efetuada na República, ela
buscava ampliar seu espaço junto ao povo.
A posição expressa pela Câmara de Ribeirão Preto em sua resposta coletiva a
Monsenhor Siqueira, mostrou a presença e a força de vereadores pertencentes ou sensíveis aos
vários grupos anticlericais atuantes na época (maçons, positivistas, liberais) ou ligados a
confissões cristãs não católicas, cujas idéias seriam logicamente contrárias à contribuição, por
parte da Câmara, de tal soma de dinheiro, para a constituição de um patrimônio que
enriqueceria a Igreja católica. A negação de alguns vereadores da Câmara de Ribeirão Preto
em auxiliar a Igreja é um indício seguro da presença das idéias liberais, que advogavam a
102
LOVE, Joseph L. A República Brasileira: Federalismo e Regionalismo (1889-1937) In: MOTA, C. G. (Org.).
9LDJHP,QFRPSOHWD
. A Experiência Brasileira 1500-2000. A grande transação. São Paulo: Senac, 2000, p. 130.
54
causa da separação total entre o Estado e a Igreja. Para os políticos, uma coisa era a
contribuição pessoal para a causa; esta, deveria ser distinguida da contribuição patrimonial da
cidade para uma crença. Financiar o projeto dos católicos seria abrir um precedente forte
capaz de provocar nos inimigos da Igreja católica uma crítica à municipalidade e suas ações.
O argumento da constitucionalidade não era apenas uma novidade, mas uma
realidade com a qual os católicos precisavam se habituar.
A formação inicial do patrimônio da diocese contou, então, com a ajuda das
doações dos católicos em diferentes paróquias, principalmente na cidade de Ribeirão Preto, e
parte da contribuição foi direcionada para a construção da catedral. Um impulso maior foi
dado com a casa doada por mons. Siqueira, com a isenção dos impostos para os terrenos da
Igreja que a Câmara liberou, mas somente quando d. Alberto chegou é que começou uma
organização mais efetiva da arrecadação para o patrimônio.
A Câmara Municipal o contribuiu para a formação do patrimônio, mas, por
indicação da Comissão de Finanças, em Ata de 5/3/1909
103
, aprovou uma ajuda de um conto
de réis para os festejos da recepção do primeiro bispo, quantia significativa na época.
A ajuda pecuniária à recepção era muito diferente da formação do patrimônio da
Igreja. Formar patrimônio significava adquirir recursos; por isso os membros da mara não
aceitaram ajudar, mas receber o bispo era estabelecer um canal de ligação com a mais alta
autoridade eclesiástica da região, e certamente a Câmara e seus representantes não queriam
deixar passar a ocasião em branco sem manifestar seu apoio; sem contar que esta específica
autoridade eclesiástica circulava nos meios políticos com grande desenvoltura e possuía seus
canais de influência, mesmo depois de ter oficialmente deixado a política partidária.
2HO H L WRG$OEHUWR-RVp*RQoDOYHV
Como vimos, a região de Ribeirão Preto contribuía com uma grande parcela da
lucratividade econômica do país no início do século XX, bem como contava com alguns dos
grandes líderes políticos regionais que controlavam a política paulista. Esse fato pode ter
pesado diante da Santa Sé, na escolha do eleito para o governo da diocese.
Líderes da Igreja foram consultados a respeito das indicações para ocupar os
cargos das novas dioceses criadas na Província Eclesiastica de São Paulo. Destas indicações,
103
LIVRO de Atas
da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, n. 9, p. 72.
$&D053
, Ribeirão Preto-SP.
55
acredito que as palavras do núncio, do cardeal do Rio de Janeiro e de d. Duarte Leopoldo e
Silva, bispo de São Paulo, funcionaram como decisivas para Roma.
O jornal $&LGDGH, de Ribeirão Preto, publicou uma notícia
104
declarando que
monsenhor dr. Benedicto Paulo Alves de Souza
105
fora o escolhido para bispo de Ribeirão
Preto, ao lado de outros prelados nomeados para outros bispados. A notícia errônea circulou
na mídia, mas o eleito para ocupar a diocese o estava sequer entre os nomes da lista do
jornal. Encontrava-se em Curitiba e era o antigo vigário da catedral de Curitiba, no Estado do
Paraná.
O padre Alberto José Gonçalves, futuro bispo de Ribeirão Preto, tivera ampla
participação política, atuando primeiramente como deputado
106
, em seu Estado natal e, depois,
como senador. Nasceu na cidade de Palmeira, Estado do Paraná, em 20 de julho de 1859.
Filho de Francisco José Gonçalves, natural da freguesia de São Thiago Nogueira,
arquidiocese de Braga, Portugal, e de d. Constança Francisca de Paula, natural de Curitiba.
Seus avós maternos eram incógnitos, conforme consta no registro de batismo, da paróquia de
Nossa Senhora da Conceição
107
, da cidade de Palmeira e do Processo de Gênere
108
, fato este
não muito comum entre os escolhidos para os altos cargos. Passou parte de sua infância na
cidade de Curitiba, onde realizou seus estudos até julho de 1874, quando foi estudar no
Seminário Episcopal de São Paulo, local em que terminou seus estudos preparatórios. Em
dezembro de 1879, terminado o curso superior, prestou exames de ciências teológicas e
eclesiásticas. Em 4 de agosto de 1878 recebeu a tonsura e as ordens menores. Em 4 de agosto
de 1882, o subdiaconato; dois dias depois, o diaconato, e no dia 17 de setembro de 1882, o
presbiterato. Estava iniciada a carreira eclesiástica do padre Alberto. Durante os anos de 1878
a 1888, lecionou disciplinas como Aritmética, Latim e Geometria no Seminário de São Paulo,
ocupando também o cargo de Secretário do Seminário.
109
104
BISPADO de Ribeirão Preto. $&LGDGH, out. de 1907.
105
Monsenhor Bendicto Paulo Alves de Souza nasceu em São Paulo em 25 de janeiro de 1873, ordenado
sacerdote em 29 de fevereiro de 1896, por D. Joaquim Arcoverde, seguiu para Roma para estudar Direito
Canônico, atuou no Concílio Plenário Latino Americano como um dos notários. De volta ao Brasil, atuou no Rio
de Janeiro, trabalhando junto com o arcebispo e depois em São Paulo, exercendo vários cargos como membro do
cabido Diocesano, assistente eclesiástico da Liga da Boa Imprensa, etc.
32/<$17+($
. Álbum
Comemorativo do 1
o
. Quinquagenário da Fundação do Seminário Episcopal de São Paulo. 1906, p. 66-67.
106
A dissertação de mestrado de Marco Antonio Baldin: “ Pacificador Beligerante: Alberto José Gonçalves – um
Padre na Política Paranaense na 1
a
República (1892-1896)”, estuda a atuação política do Padre Alberto José
Gonçalves, como deputado, em Curitiba.
107
LIVRO de Batismo da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, n. 5, p. 58, 1855.
$UTXLYRGD3DUyTXLD1RVVD
6HQKRUDGD&RQFHLomR$316&3
Palmeira-PR
108
PROCESSO de Gênere de Alberto José Gonçalves, 5/março/1888, $&0&$UTXLYRGD&~ULD
0HWURSROLWDQDGH&XULWLED
, Curitiba. (Documentos Diversos).
109
Várias obras trazem a biografia de Alberto José Gonçalves. Dentre elas: GAMA, Affonso D.
(VERoR
ELRJUiSKLFRGH'RP$OEHUWR-*RQoDOYHV
São Paulo: Escolas Profissionais Salesianas, 1911; PINHÃO,
56
Seu retorno a Curitiba ocorreu quando foi nomeado vigário da Paróquia Nossa
Senhora da Luz de Curitiba, tomando posse em 8 de setembro de 1888.
110
Em Curitiba,
passou a dedicar-se a atividades espirituais inerentes a um pároco, além de realizar outras
obras, como o término da construção da nova matriz, que veio a ser a catedral de Curitiba. Foi
nomeado Vigário Geral Forense do Estado do Paraná em 15 de dezembro de 1890, cargo que
exerceu até a instalação da diocese em 30 de setembro 1894. Em 23 de agosto de 1897, foi
nomeado Protonatário Apostólico
111
, tendo sido agraciado com a &UX] ± 3 UR (FFOHVLD HW
3RQWtILFH, pelo Papa Leão XIII.
Exerceu o cargo de Provedor da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, local que
reformou e aumentou para melhor atender a população. Fundou o Hospício de Nossa Senhora
da Luz, para alienados e indigentes. Atuou como Diretor-Geral da Instrução Pública e
Comissário dos Exames de Preparatórios por parte do Governo Federal.
Em 1923, foi aclamado Membro da Academia de Letras do Paraná. O discurso de
recepção de d. Alberto foi feito por Alcidez Munhoz, que fora aluno de d. Alberto no
Seminário Episcopal de São Paulo, contando que havia estudado na gramática latina de
autoria do então padre Alberto. No discurso de Munhoz, uma frase resume quem foi d.
Alberto: D. Alberto tem sido um homem social e homem religioso.”
112
Munhoz explica que
d. Alberto social era o homem que exerceu cargos políticos e, como político, defendeu a
Igreja, citando como exemplo a luta no Senado contra o divórcio.
D. Alberto recebeu outras distinções, como a nomeação de Comendador da Coroa
da Itália por Decreto Real de 15 de abril de 1926, Conde, Assistente ao Sólio Pontifício pelo
Breve de 12 de setembro de 1932, quando completou 50 anos de ordenação sacerdotal.
Sua vida pública no campo político teve início na transição do Brasil Monárquico
para o Brasil Republicano. Eleito Deputado pelo Partido Conservador à Assembléia
Provincial do Paraná, em 1889, não tomou posse, uma vez que a Assembléia fora dissolvida,
com a mudança política do país.
Tavares.
9XOWRV(PLQHQWHVGR&OHUR%UDVLOHLUR
. Petrópolis: Vozes, 1943, p. 59 a 89; LAURIANO, Mons.João.
%LVSRVH$UFHELVSRVGH5LEHLUmR3UHWR
. (1909-1972). Ribeirão Preto-SP: Cúria Metropolitana. s/d.; CORREIA,
Francisco de Assis. +LVWyULDGD$UTXLGLRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR. Franca-SP: Santa Rita, 1983; BALDIN,
Marco Antonio.
3DFLILFDGRU%HOLJHUDQWH
: Alberto José Gonçalves – Um Padre na Política Paranaense da 1ª
Republica (1892-1896). Franca-SP, 2006.
110
32/<$17+($
. Álbum comemorativo do Quinquagenário da Fundação do Seminário Episcopal de São
Paulo, 1906, p. 101.
111
32/<$17+($
. 1906, p. 101.
112
MUNHOZ, Alcides.
'LVFXUVRSURQXQFLDGRQD$FDGHPLDGH/HWUDVGR3DUDQiSRURFFDVLmRGDUHFHSomR
GR$FDGrPLFR%LVSR'$OEHUWR-RVp*RQoDOYHV
. Curityba: Typ. I. G. & Cia, 1924, p. 4.
57
A proclamação da República veio acompanhada da separação Estado e Igreja, que
se transformou em uma realidade através do decreto 119-A, em que o Estado, extinguindo o
direito de 3DGURDGR abria espaço para a liberdade de culto, secularizava os cemitérios,
instituía o ensino laico e impunha a obrigatoriedade do casamento civil, entre outras medidas.
A Igreja precisou acostumar-se com a nova realidade. Os primeiros tempos foram, sem
dúvida, de adaptação. A reação do povo veio de diversas maneiras, as medidas adotadas pelo
novo regime deixaram a secular relação Estado Igreja de cabeça para baixo.
Um novo tempo abriu-se para as relações Estado e Igreja. A pastoral Coletiva de
1890 tornou-se uma [...] plataforma das posições teóricas da Igreja [...]
113
, que se
encontrava dividida em grupos. Uns queriam aproveitar a situação para ficar livres da tutela
do Estado, outros defendiam a união entre ambos, e outros, ainda, almejavam uma harmonia
entre os dois poderes. A presença marcante da Igreja nos quatro séculos de catolicismo
romano no Brasil ficou explícita na voz do padre Júlio Maria quando afirmou que [...] é
impossível que o Estado, órgão de interesses múltiplos, finja ignorar que na sociedade
crenças, princípios, idéias religiosas.
114
Para o Padre Júlio Maria o Estado podia separar, mas
não podia ignorar a presença da Igreja no seio da sociedade.
A Pastoral Coletiva de 1890 representou um dos primeiros esforços da Igreja
brasileira de reorganização depois de quase quatro séculos de regime do Padroado.
O jogo de interesses da Igreja colocado em prática a partir da política da
romanização, desde 1849, com o papa Pio IX
115
, mostrava o direcionamento da Igreja e sua
postura em relação ao episcopado, clero e aos fiéis. Um clero mais alinhado com Roma surgiu
a partir da segunda metade do século XIX no Brasil, seguindo as tendências do momento, e a
chamada romanização era a palavra de ordem. O esforço dos poucos bispos do Brasil e do
clero em colocar em prática as ordens emanadas de Roma alimentava as mudanças pelas quais
a Igreja passava, assolada pelas rápidas transformações em que perdia cada vez mais o
monopólio do sagrado para outras crenças cristãs e não cristãs, bem como para as inovações
da modernidade.
Após a proclamação da República, padre Alberto José Gonçalves, monarquista,
passou a integrar as fileiras do Partido Republicano. A adesão ao republicanismo, para padre
113
LUSTOSA, Oscar de F.
$,JUHMD&DWyOLFDQR%UDVLO5HS~EOLFD
. São Paulo: Paulinas, 1991, p. 21.
114
MARIA, Padre Júlio. A verdadeira idéia da teoria da separação. In: LUSTOSA, Oscar de F. (Org).
$,JUHMD
&DWyOLFDQR%UDVLOHR5HJLPH5HSXEOLFDQR
. Um aprendizado de liberdade. São Paulo: Loyola/CEPEHIB,
1990, p. 97 a 101.
115
MANOEL, I. A. Ação Católica Brasileira: marco na periodização da Igreja Católica no Brasil (um projeto de
pesquisa). In: COUTINHO, S. R. (Org.).
5HOLJLRVLGDGHV0LVWLFLVPRH+LVWyULDQR%UDVLO&HQWUDO
. Brasília:
CEHILA, 2001.
58
Alberto, estava marcada por um trabalho em que pretendia estar a serviço da Pátria, mas sob
inspiração divina. Era importante que a Igreja tivesse seus representantes dentro dos quadros
da política. A luta do padre Alberto e de outros sacerdotes estava centrada em conseguir abrir
para a Igreja católica alguns espaços oficiais, especialmente por meio da legislação. Atacada
pelos positivistas, liberais, maçons e livres pensadores, a Igreja era acusada de o seguir as
normas do novo regime, de incitar os fiéis a não realizarem o casamento civil, etc...
Foi nos espaços oficiais da Assembléia Estadual e depois do Senado Federal que
padre Alberto lutou para fazer prevalecer o projeto católico. Em 1892, foi eleito para a
Assembléia Constituinte do Estado do Parae reeleito por mais três legislaturas. Ocupou os
cargos de vice-presidente e Presidente da Comissão Executiva, participou da Comissão de
Instrução, Catequese e Civilização dos Índios e Comissão de Estatística no biênio
1892/1893.
116
Reeleito no biênio 1894/1895, exerceu o cargo de 1
o
. Presidente da Comissão
Executiva, participou da Comissão de Instrução, Catequese e Civilização dos Índios e da
Comissão de Redação.
Em 15 de novembro de 1895, foi eleito para o Senado da República, passando a
residir entre a capital federal, Rio de Janeiro, e Curitiba; seis meses por ano ele ficava em
cada cidade. Exerceu o cargo de Presidente da Comissão Executiva, de Secretário, durante
mandatos sucessivos, para os quais foi reeleito durante dez anos. O cargo de Senador permitiu
ao padre Alberto formar um círculo de amigos e também de inimigos, mas acima de tudo o
colocou na mídia da época. Tudo o que o padre fazia ou pensava era comentado, publicado e
discutido, fosse a seu favor ou contra. Participou ativamente dos debates a respeito da divisão
territorial entre o Paraná e Santa Catarina, entre outros.
Como sacerdote católico, legislou ao que ele chamava a serviço da Pátria. Num de
seus discursos no Senado afirmou [...] nunca fui republicano; os meus companheiros de
representação sabem que eu militava em outro partido político; que fiz oposição, não violenta
mas em todo caso formal, ao partido Republicano do Paraná [...]”
117
Em outra parte do mesmo
discurso afirmava que [...] testemunho, meu sangue e minha vida, afianço ao Senado e ao
Paiz, estão ao serviço da República, que estou certo fará a felicidade de minha Pátria.”
118
116
BALDIN, Marco Antonio. 2006. A dissertação de mestrado de Marco Antonio Baldin retrata o Padre
deputado na legislatura de 1892 a 1896.
117
ARANTES, A. D. Alberto Político. In: LAURIANO, Mons. J. (Org.). $GLRFHVHGH5 LEHLUmR3UHWRHP
KRPHQDJHPJUDWDHIHVWLYDDVHXDPDGR%LVS R'$OEHUWR-RVp*RQoDOYHVQDIHOL]RFFXUUH QFLDGDVGDWDV
MXELODUHVGHVHXVDFHUGyFLRH(SLVFRSDGR
. Ribeirão Preto-SP, [s.n.], 1934, p. 30.
118
ARANTES, 1934, p 31.
59
Padre Alberto estava entre aqueles que, como sacerdote católico, precisavam
defender a comunidade católica, e assim o fez ao advogar contra a instituição do divórcio no
Brasil. Os discursos do padre Alberto durante os trabalhos da Assembléia Constituinte contra
o divórcio e a favor da família estavam embasados na defesa da doutrina da Igreja católica
contra o mundo moderno e suas invenções, que perturbavam a ordem por ela estabelecida. Pe.
Alberto alegava em seu discurso a Assembléia que [...] si não foi a lei civil que formou os
laços de família e do casamento, claro é que não pode arrogar-se o direito de dissolvê-los.”
119
Nos jornais de Curitiba, padre Alberto expressou sua opinião e mostrou a seus
adversários que, uma vez separado o Estado da Igreja, a Constituição separou o temporal da
parte espiritual. Para ministrar um dos sacramentos, os ministros da Igreja não precisavam
requerer do Estado uma licença. Os católicos tinham em grande apreço o matrimônio, que era
considerado um sacramento e, como tal, quem não o praticasse estaria vivendo na mancebia e
no concubinato. O casamento na Igreja não tinha validade para o Estado. O Estado
republicano, liberal, que pregava a liberdade de culto, também o possuía interesses no
casamento oficializado por uma crença. O argumento do padre era simples: a Igreja jamais
estimulou seus fiéis a ir contra as leis; mesmo porque a hierarquia da Igreja, por meio de
Cartas Pastorais, instruía os párocos a “ [...] tomar precaução de insinuar e aconselhar aos fiéis
que se submettam às novas prescripções da lei civil [...]
120
A Igreja lutou contra algumas
destas mudanças inovadoras que lhe retiravam o caráter de pública, que a limitavam em
dirigir algumas ações. Padre Alberto tentou impedir que pessoas o católicas fossem
candidatas a cargos políticos, a validade do casamento religioso perante o Estado, o fim do
ensino religioso nas escolas e que os cemitérios saíssem de sua alçada para cair nos domínios
do Estado.
O momento era delicado e a defesa da religião, dos valores morais, pregados por
ela, formavam o pano de fundo de alguns dos discursos do padre Alberto e outros membros
mais politizados do clero.
O casamento, considerado como sacramento, foi defendido ao longo de sua vida
política e clerical, da qual ele sempre disse que “ não tenho uma consciência como sacerdote e
outra como homem público.
121
Mesmo depois de sagrado bispo, dirigiu a seus fiéis, em
diferentes cartas pastorais, sua preocupação para com a família e o sacramento do
matrimônio.
119
ARANTES, 1934, p. 33.
120
GONÇALVES, Alberto José. Casamento Civil III
$( V WUHOOD
, Curitiba, 29/Jan./1905, p.1.
121
ARANTES, 1934, p. 32.
60
A Igreja precisava manter a coesão e a unidade [...] o povo é a alma informe para
ser modelada e encaminhada à luz dos ensinamentos e práticas cristãs, e todo aquele que se
afastar desta obra, não pertence à unidade católica, visto que a sua dinâmica vital ameaça a
coesão dos demais.”
122
Esta fala assinala a maneira incisiva pela qual o discurso da Igreja
buscava estabelecer normas para que os fiéis, tendo à frente seus pastores, devessem assumir
uma postura unicamente a serviço da Igreja e falando a mesma linguagem que o clero.
Para o padre Alberto, que rejeitou veementemente o projeto de divórcio,
apresentado pelo Senador Coelho Rodrigues, a honra da família estava acima do Estado, uma
vez que este chegou muito tempo depois de a família já estar instituída e, portanto, cabia ao
Estado apenas protegê-la e o suprimir os laços antigos que a formavam na história, com
uma legitimidade inquestionável.
Padre Alberto defendeu suas idéias e, principalmente, o direito de ter a liberdade
de expressão. Atacou por meio da imprensa seus adversários e conclamava-os a refletir sobre
seus argumentos.
O aumento do número de maçons e espíritas preocupava principalmente a alta
hierarquia da Igreja, que por parte de muitos de seus membros o estava preparada para
enfrentar este rápido crescimento. A condenação foi a forma encontrada pela Igreja para
reagir aos ataques da maçonaria e outras associações que pudessem fazer frente a ela. Essas
proibições acentuaram-se durante o século XIX, principalmente após a publicação do
documento 6\OODEXV, publicado pelo papa Pio IX.
A maçonaria e o espiritismo eram considerados pela Igreja como seitas, e os que
se inscreviam nos seus quadros incorriam em grave ofensa, sob pena de excomunhão. Os
padres eram proibidos de realizar quaisquer ofícios fúnebres em favor dos maçons, tampouco
permitir a presença deles no culto, muito menos celebrar missas a pedido dos maçons, nem
admitir maçons como agremiados nas associações da Igreja. As proibições por parte da
hierarquia da Igreja eram constantes, e os padres eram admoestados a seguir as regras. Os
católicos eram convidados a não comparecer às festas ou solenidades promovidas pelos
maçons. O lema era que um católico não podia ser maçom e, se fosse maçom, não era
católico. Da mesma forma que se combatia a maçonaria, os espíritas eram condenados como
seita das trevas.
Nos discursos de um dos representantes da Igreja, contemporâneo de d. Alberto, o
padre Júlio Maria afirmava que [...] a maçonaria é filha do protestantismo, o espiritismo seu
122
BALHANA, Carlos Alberto de Freitas.
,GpLDVHPFRQIURQWR
. Curitiba: Grafipar, 1981, p. 28.
61
netinho.”
123
O espiritismo não era considerado pela Igreja como religião, mas como uma
moléstia grave, equiparado como herege, visto como antibíblico, anticristão, anticatólico,
anticlerical e antimoral, conseqüentemente representava a ruína de tudo o que era considerado
pelo clero como o mais sagrado. Assim pregava a Igreja por meio da hierarquia e
pretendendo, com esse discurso, chegar até os fiéis.
Uma vasta literatura católica começou a circular em maior escala no fim do século
XIX e início do XX, fazendo contraponto com os que combatiam a presença da Igreja católica
no seio da sociedade brasileira.
Revistas como 22OKRGD 5XD e $5ROKD, de Curitiba, anticlericais, atacavam sem
piedade o clero e a Igreja, considerada inimiga da modernidade e da liberdade de expressão. O
padre Alberto, figura pública, membro do alto clero e político, foi um dos principais alvos
desses ataques. As charges em que seu nome apareceu como monsenhor Trinca, ligando-o a
todo o tipo de questões torpes, satirizando-o: [...] como raro modelo de virtudes, piedoso e
bom como um santo, vivendo unicamente para Deus e para a Santa Igreja [...]
124
, o
atormentaram até mesmo depois de eleito bispo de Ribeirão Preto.
No fim do século XIX e início do XX, padre Alberto e seu amigo padre Desidério
Deschand não eram os únicos a serem publicamente achincalhados nos jornais e revistas pelos
inimigos da Igreja; na realidade era a Igreja católica que estava sendo atacada. É curiosa a
ligação entre o padre Alberto, que foi contemporâneo e amigo do lazarista francês, Desidério
Deschand, que chegou em Curitiba em 1896, encarregado de fundar o Seminário São José,
exercendo o cargo de professor e reitor do Seminário de Curitiba. Padre Deschand escreveu o
livro “ A situação actual da Igreja no Brazil”, publicado em 1910
125
, em que defendia a entrada
da Igreja na política e, conseqüentemente, queria ver os católicos mais atuantes no campo
político, defendendo a força do ensino religioso nas escolas, para minar as forças da
modernidade que entranhava no seio das famílias. A descristianização da sociedade e o
combate aos entraves da modernização como a defesa da família contra o divórcio os uniam.
O padre Alberto e o padre Deschand animaram a vida cultural de Curitiba,
participando de eventos, escrevendo crônicas e artigos para os jornais locais. Padre Alberto,
durante muito tempo, concentrou em suas mãos o poder religioso, como pároco da matriz de
Nossa Senhora da Luz e Vigário-Geral Forense antes da criação do bispado, e o poder
123
MARIA, Pe. Júlio.
&RPPHQWDULRPRUDO'RHYDQJHOKR'RPLQLFDOSDUD+RPLOLDV6HUP}HVH
&RQIHUrQFLDV. Manhumirim: O Lutador, 1939, p. 398 a 404.
124
ENGROSSAMENTOS
$5ROKD
, Curitiba, 21/maio/1908.
125
DESCHAND, D.
$VLWXDomRDFWXDOGD,JUHMDQR%UD]LO
. Rio de Janeiro: Guarnier, 1910.
LUSTOSA, O. de F.
$,JUHMD&DWyOLFDQR%UDVLO5HS~EOLFD
. São Paulo: Paulinas, 1991, p. 29, 39 e 40.
62
político, como deputado e senador. Padre Desidério Deschand, reitor do seminário, exerceu
suas funções no Paraná, animando a vida dos estudantes e realizando no Seminário São José
uma verdadeira cruzada para disciplinar os alunos que ele considerava “ [...] meninos e moços
acostumados à vida livre e insubordinada dos externos da capital [...]
126
, tentando enraizar os
fundamentos da boa moral cristã entre os jovens que passaram por aquele seminário.
O padre Desidério Deschand, expressava com seus argumentos que [...] os
cathólicos estão esquecendo com amedrontadora rapidez, os mais comesinhos princípios
morais e religiosos [...]”
127
, necessidade sentida por parte de alguns membros do clero de que
era preciso estar atento para que as novas forças aglutinadoras da sociedade impostas pela
Constituição não deturpassem os valores morais vigentes e pregados até então pela Igreja
católica.
Encontramos os dois amigos, padre Alberto J. Gonçalves e padre Desidério
Deschand
128
, juntos em diferentes ocasiões públicas. Padre Desidério, em sua obra A
situação actual da Igreja no Brazil” , defendia a participação da Igreja e seus membros na
política nacional, e seu amigo, o padre Alberto, efetivamente participou da vida política por
meio de seus mandatos públicos na Assembléia e no Senado.
Em 1900, a opção pela carreira política o fez afastar-se do cargo de vigário da
catedral Nossa Senhora da Luz, a pedido oficial do bispo de Curitiba, d. José de Camargo
Barros. Padre Alberto manifestara o desejo de deixar a paróquia, uma vez que ficava no Rio
de Janeiro por volta de seis meses por ano. O bispo d. José escreveu uma carta deixando claro
que ele devia tomar uma atitude: ou a paróquia ou a política.
[...] Você não quer deixar a política, e eu em sã consciência não posso deixar
por mais tempo os descalabros em que fica a catedral durante a sua ausência
apesar de toda a energia e boa vontade dos padres que o substituem. Vou lhe
falar com toda a franqueza. Tirada a causa supra mencionada não tenho
motivos para lhe aconselhar a deixar a paróquia, mas se esta causa não se
pode já remover então lhe aconselho que deixe, embora com pezar.
129
126
MONOGRAFIA do Seminário de Curitiba. p. 2-31, 1895-1906.
$&0&
Curitiba.
127
DESCHAND, p. 4, 1910.
128
Os padres Desidério e Alberto foram atacados pelos livres-pensadores do Paraná, em tom de sarcasmo e
ironia nos diferentes folhetos, jornais e revistas do fim do século XIX e início do XX. A abordagem anticlerical
classificou-os de beatos, carolas, mentirosos, inimigos do povo. Um dos principais expoentes desse ataque era o
jovem Dario Vellozo, que dirigiu e foi um dos principais colaboradores do periódico 5DPRGH$FiFLD, órgão da
maçonaria de Curitiba.
129
BARROS, D. José de Camargo. Correspondência ao Padre Alberto José Gonçalves, 12/ago./1900,
$&0&
,
Curitiba. Livro Copiador n. 4, 1899-1903.
63
D. José revelou que havia a licença da Santa para que o padre exercesse as
duas funções, mas que quem ficava interinamente na paróquia não tomava a sério as suas
obrigações e funções, e seis meses eram inconvenientes, seis anos mais ainda. A situação era
delicada porque o padre, era uma figura pública reconhecida e precisava concordar em perder
um dos altos cargos que exercia. A atitude do bispo d. José o colocou na corda bamba,
precisando tomar uma atitude. Ele acabou renunciando à catedral de Nossa Senhora da Luz,
depois de anos a sua frente. O bispo de Curitiba, quando enviou a carta ao padre Alberto,
havia escolhido um substituto, que imediatamente aceitou o cargo. Quem assumiu a catedral
Nossa Senhora da Luz, com a renúncia do padre Alberto, foi o cônego Celso Iberê da Cunha,
que permaneceu no cargo de 1901 a 1930.
Sem a catedral, o padre continuou com outros ofícios na capital paranaense, a
cultivar inimigos políticos, a escrever para os jornais locais, bem como passava meses no Rio
de Janeiro, exercendo seu mandato político.
Pouco antes de ser eleito oficialmente bispo, padre Alberto, foi zombado em
inúmeras charges, entre elas, uma com data de fevereiro de 1908
130
, de que agora ele não
tinha mais a paróquia, a senatoria e nem bispado e que, portanto, vivia de rezar umas
missinhas aqui e acolá. No momento em que a publicação apareceu no Paraná, na cidade do
Vaticano o nome do padre Alberto era indiscutivelmente aceito para ser o bispo da diocese de
Ribeirão Preto, que estava sendo criada junto com a Província Eclesiástica de São Paulo.
Nesse período, numa carta dirigida a d. Duarte
131
, padre Alberto pediu que, se
durante a visita do bispo ao papa, apresentando o projeto da Província Eclesiástica, seu nome
fosse confirmado para o bispado, que ele providenciasse a compra, em Roma, de uma capa
com o arminho, o báculo, o cânon para o serviço diário e um cerimonial bem explicado,
alegando que lá os preços eram muito mais acessíveis e que a economia seria grande.
Com a oficialização do processo da formação da Província de São Paulo, o nome
do padre Alberto foi confirmado como eleito para bispo de Ribeirão Preto. Na ocasião, em
Curitiba, na revista O Olho da Rua”
132
, em Carta Aberta, assinada pelo pseudônimo Zip, um
de seus adversários, escreveu sobre a admiração que o consagrava no momento e sugeriu
como ele deveria se portar como bispo. Elogiou o fato de que padre Alberto, quando governou
o bispado do Paraná, se saíra bem e que deveria, mesmo tremendo nas bases, ficar à altura do
130
22/+2'$58$, Curitiba, ano 2, n. 22, 29/2/1908.
131
GONÇALVES, Padre Alberto José. Correspondência a D. Duarte Leopoldo e Silva, 2/mar./1908.
$&063
,
São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto, D. Alberto I e II).
132
22/+2'$58$
, Curitiba, ano 2, n. 37, 19/9/1908.
64
cargo e honrar o Paraná. Este artigo mostrou que a mesmo alguns de seus adversários
políticos o reconheciam como um grande homem, apesar de satirizá-lo sempre.
As cartas de apresentação do padre Alberto que identificamos nos Arquivos do
Vaticano eram todas de elogio; elas o descreveram como homem religioso, devoto de Maria e
que, apesar de político, era capaz de passar pelos meandros da política e continuar sendo o
padre justo, piedoso e mariano que a sociedade conhecia.
Para o eleito de Ribeirão Preto em 1908, identificamos no Arquivo Secreto do
Vaticano
133
as seguintes cartas de apresentação: padre João Borges Quintão, reitor do
seminário de Curitiba, padre Desidério Deschand, superior do Colégio São Vicente de
Petrópolis (antigo reitor do Seminário de Curitiba), d. Duarte Leopoldo e Silva, bispo de São
Paulo, fr. Lucinius Korbe Ofm, pároco de Paranaguá, d. Joaquim Arcoverde, cardeal do Rio
de Janeiro. Os cinco nomes citados eram amigos de Alberto José Gonçalves e com ele
trocavam correspondências periodicamente. O núncio alegou que o padre Alberto seria uma
excelente aquisição para o episcopado. Com tantos elogios, a Secretaria de Estado do
Vaticano não teve dúvidas em aprovar o nome do padre para a diocese de Ribeirão Preto. Era
o ápice da carreira do prelado senador; a sagração a bispo representava um salto importante
para adentrar na hierarquia da Igreja católica. Padre Alberto sabia que como bispo ele seria
mais ouvido.
Padre Alberto reuniu os requisitos necessários para assumir a diocese de Ribeirão
Preto: político, capaz de articular com os homens ricos do lugar, hábil, capaz de contribuir
para enraizar o catolicismo na região. Padre Alberto foi o eleito entre tantos outros prelados
por seu FXUULF XOXP, por sua obra em favor da Igreja. A Igreja precisava de um homem forte
para enviar a uma terra de malvados”, um homem capaz de retardar e, quem sabe, impedir o
avanço de outras crenças na região. Um homem político para negociar com os homens e as
mulheres no local em que a presença da Igreja não era requisitada da forma com a qual ela
estava acostumada.
A separação Estado e Igreja trouxe elementos novos para o período em que, para
os bispos, o governo republicano havia transformado o regime em algo despojado de valor
ético, e cabia à Igreja resgatar e articular os valores necessários para o bom andamento da
ordem social. Tomando por base esse pensamento, o pesquisador Azzi declara: [...] não
apenas para os bispos a religião era o fundamento da nacionalidade brasileira, mas a
República com o seu caráter leigo não a poderia substituir.”
134
133
Cf:
$6J91$%
. Fasc. 617, n. 125.
134
AZZI, R.
2(VWDGR/HLJRHR3URMHWR8OWUDPRQWDQR
. São Paulo: Paulus, 1994, p. 21.
65
A ligação entre práticas religiosas e a situação cotidiana estavam entranhadas na
sociedade brasileira. Da formação do caráter, passando por crendices, o longo domínio de
religião oficial e única que o catolicismo teve no Brasil deixou marcas profundas que não
terminariam com um decreto na Constituição.
Nesse contexto, é criada em 7 de junho de 1908, pela Bula Pontifícia 'LRFHVLXP
1LPLDP$PSOLWXGLQHP, do Papa Pio X, a diocese de Ribeirão Preto e, logo em seguida, saia a
nomeação de seu primeiro bispo. Padre Alberto, escolhido para exercer o alto posto
hierárquico na Igreja, ele, que havia recebido vários títulos da Igreja, abandona a política
partidária para ser sagrado bispo.
Como bispo, sua atuação ficou limitada aos bastidores do cenário político, onde
pode exercer seu papel como tal, interferindo nas candidaturas políticas que não fossem
interessantes para a Igreja católica.
A carta do núncio apostólico d. Aversa
135
, de 20/4/1914, endereçada ao Secretário
de Estado do Vaticano, cardeal Merry Du Val, por ocasião da primeira visita $G/LPLQD de d.
Alberto, o elogiou e escreveu sobre os bons serviços prestados à Igreja e a República e de
como atuou nos bastidores a pedido do arcebispo d. Duarte Leopoldo e Silva, impedindo a
candidatura de Rodolfo Miranda ao governo de São Paulo, em contato com o senador
Pinheiro Machado.
O governo de D. Alberto, ao longo de 36 anos, na diocese de Ribeirão Preto,
constitui outra etapa na história da Província Eclesiástica de São Paulo.
6DJUDomRHSRVVHGHG$OEHUWR-RVp*RQoDOYHV
O novo bispo de Ribeirão Preto, Alberto José Gonçalves, foi nomeado
oficialmente por um Breve do papa Pio X, em cinco de dezembro de 1908.
136
Antes da
cerimônia de sagração, o eleito fez a profissão de católica e os juramentos estabelecidos,
conforme as fórmulas usadas. Os juramentos de padre Alberto foram feitos em Petrópolis,
diante do núncio apostólico d. Alessandro Bavona.
A sagração ocorreu na catedral Nossa Senhora da Luz, em Curitiba no dia 2 de
fevereiro de 1909, por d. Duarte Leopoldo e Silva, tendo bispos consagrantes d. João
Francisco Braga, bispo de Curitiba, e d. João Becker, bispo de Florianópolis. Os bispos foram
135
AVERSA, D. G. Correspondência ao cardeal Secretário de Estado do Vaticano Rafaelle Merry Du Val.,
20/abril/1914.
$6J91$%
. n. 687.
136
LAURIANO, Monsenhor João.
)XQGDomRH,QVWDODomRGR%LVSDGRGH5LEHLUmR3UHWR
.
Ribeirão Preto-SP: Cúria diocesana, s/d., p. 51.
66
convidados por padre Alberto. D. Duarte, escreveu ao cardeal Arcoverde, dizendo que “ [...] S.
Excia. deu-me a honra de convidar-me para sagrá-lo, honra que aceitei satisfeito por me
deparar occasião de rever meus primeiros diocesanos.”
137
Às oito horas da manhã, entraram na catedral de Curitiba o arcebispo Sagrante, os
bispos assistentes e o bispo sagrando, precedidos de cerca de quarenta sacerdotes e dos dois
paraninfos: Cel. Dr. Ismael da Rocha (diretor do Serviço Sanitário do Exército) e Dr.
Francisco de Assis Teixeira, ambos cunhados do padre Alberto. Guiando préstito pontifical
estava o mestre de cerimônias, mons. Dr. Benedicto Paulo Alves de Souza, da arquidiocese de
São Paulo, que havia sido indicado como o bispo de Ribeirão Preto pelos jornais dois anos
antes da sagração de d. Alberto.
138
A sagração de d. Alberto ganhou as páginas dos jornais de Ribeirão Preto que
noticiaram todos os eventos realizados em Curitiba. De Ribeirão Preto, seguiu, para prestigiar
o novo bispo, monsenhor Joaquim Antonio de Siqueira, fazendo uma saudação representando
a diocese.
Enquanto d. Alberto era festejado em Curitiba e despedia-se da cidade onde
trabalhara por várias décadas, em Ribeirão Preto uma comissão organizava os festejos da
recepção e posse.
A comissão dos festejos, presidida por padre Euclides Gomes Carneiro, tinha
como secretário Dr. Afonso Gama e tesoureiro Ten. Cel. Saturnino de Carvalho, que,
reunindo-se na casa paroquial da matriz de São Sebastião, distribuíram as atividades da
recepção a d. Alberto. Ficaram encarregados dos festejos e do embelezamento da rua: padre
Euclides, Luiz Baptista, Antonio Diederichsen (Associação Comercial) e o Dr. Lúcio
Miranda, representando a Legião Brasileira; para a recepção ficaram encarregados os
senhores Dr. Eliseu Guilherme Christiano, Dr. Antonio Rodrigues Guião, Dr. Floriano Leite
Ribeiro, Cel. Francisco Maximiano Junqueira, Cel. Antonio Vicente Ferraz de Sampaio e Cel.
Antonio Caetano, todos membros da elite política e econômica da cidade.
Coube a essa comissão expedir os convites da posse, marcada para 28 de fevereiro
de 1909, para as principais autoridades, tais como: presidente do Estado de São Paulo;
secretários: de Estado (Justiça, Interior, Agricultura), presidente do Estado do Paraná,
arcebispo de São Paulo, outros bispos e autoridades.
137
CÓPIA do Diário
de d. Duarte Leopoldo e Silva, 24/out./1908,
$&063
, São Paulo. (Pasta d. Duarte).
138
Curiosamente, monsenhor Benedicto retirou-se para o interior na ocasião que d. Duarte chegou de Roma com
as Bulas e as nomeações para os novos bispados da Província Eclesiástica de São Paulo. Aspirava monsenhor
Benedicto ocupar um dos cargos? Não temos como aferir, mas, levando-se em conta as funções exercidas por ele
e as notícias dos jornais de época, é possível que monsenhor Benedicto Paulo Alves de Souza tenha sonhado o
episcopado.
67
No trajeto do bispo do Paraná até o interior de São Paulo, d. Alberto foi saudado,
mas, quando entrou no território de sua diocese, as manifestações de júbilo aumentaram.
Foram programadas várias paradas nas estações de trem das cidades da diocese por onde
passou. Autoridades civis, fiéis e certamente curiosos acudiram à estação para saudar o bispo.
Em Ribeirão Preto, quando d. Alberto chegou à estação da Mogiana, esta estava
repleta de fiéis e autoridades que foram saudar o bispo.
S. Excia foi recebido ao som festivo dos acordes das bandas de música, pelos
membros da comissão dos festejos, os srs. Monsenhor Joaquim Antônio de
Siqueira, Coronel Saturnino de Carvalho, (?) Antonio Rodrigues Guião e
Afonso Gama e pelas autoridades civis e municipais da comarca e
município, Drs. Eliseu G. Cristiano, Juiz de Direito, Mário Pires, Promotor
Público, Cap. Luiz Batista Junior, prefeito interino, funcionários municipais
e oficiais da Guarda Nacional, que lhe deram as saudações de boas vindas e
formando-se o numeroso préstito fora da estação, entre alas de crianças,
alunos e alunas das escolas desta cidade e irmandades católicas da Paróquia,
seguiu-se pela rua General Osório, completamente repleta de povo,
representado por todas as classes sociais, que acolheram, com significativas
manifestações de simpatias e respeito o eminente prelado da diocese.
139
As ruas centrais da cidade por onde o cortejo passava foram preparadas,
enfeitadas, e o povo, convidado a saudá-lo de suas casas.
Uma saudação foi feita durante o cortejo em frente ao Hotel de Martino, pelo
acadêmico de direito Luiz Gomes.
No palacete Schmidt, local em que d. Alberto ficou inicialmente hospedado, o Dr.
Altino Arantes, deputado federal, foi convidado especialmente para ser o orador oficial
encarregado de saudar o bispo em nome de todo o povo. Como vimos, em 1903 encontramos
dr. Altino Arantes assinando o pedido de criação da diocese de Batatais, que fora enviado ao
núncio apostólico e ao Vaticano.
A escolha de Altino Arantes, um político da região, de expressão nacional, para
saudar um bispo que exercera cargos políticos, nos sugere que Estado e Igreja caminhavam
juntos nos momentos de maior interesse público, como diante de toda uma comunidade na
recepção de d. Alberto, mesmo que oficialmente pela Constituição estivessem separados. O
139
LIVRO de Tombo
n. 2, p. 53-54, 1890-1904.
$&5363
Ribeirão Preto-SP.
68
discurso de Altino Arantes exaltou os méritos não religiosos de d. Alberto como também
civis e patrióticos, dos serviços prestados à Pátria como deputado e senador federal.
No discurso, Altino Arantes ressaltou que [...] todos, sem distincção de crenças
ou de partidos [...]”
140
estavam ali para receber com boas vindas a nova autoridade religiosa
católica na região. Entre os fiéis católicos, participar de tão importante cerimônia consistia
uma honra sem precedentes, mas entre os membros de outras Igrejas consideramos que seria
exagerado afirmar que estavam contentes em participar de tal festa, principalmente porque
Altino Arantes afirmou, em seguida, que o novo bispo era o representante do episcopado que
tinha a função de disciplinar a heresia. Como poderia o bispo d. Alberto ser bem recebido
entre outras crenças que seu papel estava centrado em aumentar o número de adeptos do
catolicismo e combater as doutrinas consideradas pela Igreja como heréticas? O papel que a
Igreja exercia e as mudanças propostas no fim do século XIX ainda não atingiam o cerne de
questões como o ecumenismo e uma maior inserção em todos os setores da sociedade. A
Igreja rodeava importantes discussões como a família e o divórcio, nas quais não abria mão de
seus princípios, por mais absurdos que eles pudessem parecer aos olhos da moderna sociedade
urbanizada, que crescia cada vez mais. D. Alberto representava esse pensamento da Igreja.
D. Alberto, como representante do apóstolo Pedro, não tinha entre suas metas ser
um homem ecumênico, mesmo porque o discurso da Igreja era de rejeição e o de diálogo
com as outras crenças, inclusive para com os cristãos protestantes de quem a 3DVWRUDO
&ROHWLYD GRV %LVSRV, de 1915, afirmava que do [...] protestantismo, tiraram a sua origem
todos os erros político-sociaes que perturbam as nações modernas.”
141
Em seguida ao discurso de Altino Arantes, cantou-se o Hino Nacional,
mostrando-se mais uma vez como um acontecimento religioso pode estar associado a uma
simbologia de ordem não sacra; o hino nacional representa um dos principais sinais de um
Estado democrático.
O novo bispo, no palacete de Francisco Schmidt, recebeu os cumprimentos das
autoridades presentes civis e eclesiásticas, enquanto uma grande multidão do lado de fora
também tentava entrar para saudá-lo. Os relatos da posse descreveram o deslumbrante e
espontâneo contentamento da multidão que acompanhou os festejos. As comissões das
140
ARANTES, Altino. Saudações. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
, 1908-1918. Ribeirão Preto: Typ.
Guimarães, 1918, p. 41 a 46.
141
EPISCOPADO Brasileiro.
3DVWRUDO&ROOHFWLYDGRV6HQKRUHV$UFHELVSRVH% LVSRVGDV3URYtQFLDV
(FFOHVLiVWLFDV
. Rio de Janeiro: Martins de Araújo, 1915, p. 20.
69
paróquias pertencentes ao bispado vieram para recepcionar o bispo. A Companhia Mogiana
colocou trens especiais para atender à demanda da festa.
Como a catedral não estava concluída, a posse ocorreu na capela dos padres
Agostinianos, conhecida como capela São José.
A 1 ½ da tarde, S. Excia partiu do palacete Schmidt para a Catedral,
recebendo ali, depois das cerimônias respectivas, as suas vestes episcopais,
sendo pela orchestra e coro, cantado o hino sagrado. Sua Excia saiu para a
capela de São José debaixo do pálio, que era conduzido pelos seguintes srs.
Dr. Aureliano Gusmão, pelo presidente do estado, Dr. Altino Arantes, José
Lobo, Palmeira Ripper, Guilherme Oliveira, Macedo Bittencourt, Veiga
Miranda, coronéis Félix Cintra e Estevão Marcolino.
142
O bispo foi acompanhado pelas seguintes associações: Catecismo paroquial,
Arquiconfraria de São José, Pia União das Filhas de Maria, Rosário Perpétuo, Coração de
Jesus, todas com seus estandartes. Ao chegar a igreja de São José, foi cantado o 7H'HXP,
sendo iniciado por monsenhor Siqueira. O canto chamado 7H'HXP, era usado somente em
ocasiões solenes da Igreja.
Ao ler a Bula de nomeação, monsenhor Siqueira, que oficiou a cerimônia,
anunciou os cinqüenta dias de indulgências que o bispo concedia a todos os fiéis de sua
diocese por ocasião da posse, significando as bênçãos estendidas através do pastor a seus
fiéis.
O discurso gratulatório feito pelo padre Sebastião Leme da Silveira Cintra, então
com 27 anos, professor do seminário arquiepiscopal de São Paulo, dizia [..] sobre autoridade
do Bispo e sua paternidade [...]”
143
O jovem padre Leme seria mais tarde nomeado cardeal,
exercendo importante papel de liderança na Igreja no Brasil nos 1930.
Após as devidas cerimônias, o bispo D. Alberto fez seu discurso centrado na paz
que desejava para os filhos de Ribeirão Preto.
O livro 2EUDV 1RWiYHLV GD 5HVLGrQFLD GH 5LEHLUmR 3UHWR
144
, dos padres
Agostinianos, local cuja capela abrigou a cerimônia, dedicou oito linhas para a posse de d.
Alberto. A respeito da cerimônia de posse do bispo, citou apenas padre Euclides G. Carneiro
142
LIVRO de Tombo n. 3, p. 55. Arquivo da Catedral de Ribeirão Preto (
$&5363
), Ribeirão Preto.
143
CORREIA, Padre Francisco de Assis. +LVWyULDGD$UTXLGLRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR. p. 112.
144
OBRAS Notáveis da Residência de Ribeirão Preto, 1913. Arquivo da Paróquia São José (
$36-
RP), Ribeirão
Preto-SP. O livro traz alguns apontamentos para a história da residência dos Padres Agostinianos em Ribeirão
Preto.
70
que fez a alocução de entrada. Sobre o fato de monsenhor Siqueira ter presidido a cerimônia
nenhuma alusão, bem como das autoridades presentes. No entanto, foi d. Alberto que ao
longo das décadas seguintes, ordenou os padres Agostinianos em Ribeirão Preto e região.
O livro de Tombo da catedral traz uma descrição do brasão com as armas
Episcopais escolhidas por d. Alberto:
Na parte superior estão o chapéu, a mitra, a cruz e o báculo; na primeira
parte do escudo encontra-se, bem no centro, o monograma Ave Maria,
ladeado pela lua e uma estrela lembrando a Virgem Maria. Na 2
a
. parte, a
esquerda, vemos uma palmeira, imobilizando a cidade paranaense de igual
nome, onde nasceu o sr. Bispo, iluminada pelo sol que vai nascendo para
dos campos gerais do Paraná; à direita, estão o capacete e as lanças ou settas
do mártir São Sebastião, padroeiro da Catedral da Diocese. Por último, a
inscrição latina gravada na fita – Da mihi virtutem contra hostes tuos -? Que
quer dizer em vernáculo: Dá-me forças contra teus inimigos.
145
A frase escrita no brasão deixava claro que d. Alberto, um guerreiro, veio lutar
contra os inimigos da Igreja católica. O papel que exerceu como deputado e senador na defesa
da moral e dos valores da Igreja, agora faria a mais ainda como bispo, um verdadeiro pastor
dentro da hierarquia da Igreja.
A preocupação da Igreja com as rápidas transformações da sociedade eram muito
pertinentes. Ribeirão Preto, cidade que não havia enviado projeto para o Vaticano, buscando
sediar um bispado, no entanto, foi a escolhida. No momento da criação da diocese, em 1908,
existia uma loja maçônica: Loja Estrela D’ Oeste, fundada em 1885. Tudo indica que a
Maçonaria era atuante na região de Ribeirão Preto. O jornal /DXUR 6RGU p , da cidade da
Campinas, revela a respeito da militância dos maçons em Ribeirão Preto em 1907 e de um
congresso da Maçonaria na cidade.
Ainda a pouco em Ribeirão Preto, o congresso maçônico, que ali teve lugar
discutiu com largueza de vistas o palpitante assunto e ficou deliberado que a maçonaria
promoveria a fundação de cooperativas agrícolas e de produção.
146
A notícia revela a
presença dos maçons na cidade em número suficiente para realizar um congresso e da
tentativa de incentivo para fundação de cooperativas agrícolas partindo dos maçons.
145
LIVRO de Tombo, n. 3, verso p. 56, 1950. $&5363, Ribeirão Preto-SP.
146
COOPERATIVA Maçônica,
/DXUR6RGUp
, 10/abril/1907, ano 2, n. 11, p. 1, Campinas-SP. (Arquivo Publico
do Estado de São Paulo). O /DXUR6RGUp, intitulava-se um Semanário independente consagrado à propaganda e
defesa dos ideais da Maçonaria.
71
Quanto às outras crenças, o ramo protestante, representado pelos Metodistas,
chegou à cidade de Ribeirão Preto uma década antes da criação do bispado, em 1896,
instalando um colégio.
147
Durante o governo de d. Alberto outras denominações foram se
instalando em Ribeirão e região.
148
A presença de um alto percentual de imigrantes europeus na população, dentre
eles os italianos, permite afirmar que os anarquistas também veiculavam suas idéias na região,
mesmo que de forma mais tímida no momento da criação do bispado, em 1908. Nas cadas
seguintes, os comunistas apresentaram-se agremiados, formando um outro bloco capaz de
fazer frente ao projeto de catolicizar a região. D. Alberto chegava a Ribeirão Preto para
enfrentar essas forças opostas ao catolicismo.
Na escolha das Armas Episcopais, d. Alberto conseguiu juntar vários elementos
desde sua cidade natal a São Sebastião, padroeiro da diocese que assumiu. As Armas
Episcopais de um bispo mostravam, simbolicamente, o que para ele era importante, tais como
lugares e devoções. Sem abandonar a comunidade anterior que fisicamente ficava para trás, d.
Alberto trazia consigo as lembranças dela e, ao se referir a São Sebastião, mostrava o respeito
pela comunidade que o acolhia. As inúmeras viagens que d. Alberto fez ao Paraná
posteriormente, ao longo do seu episcopado, podiam ser facilmente entendidas quando vemos
no seu brasão as alusões à terra natal.
D. Alberto era devoto da Virgem Maria; em uma das cartas de referência a ele,
trazia a descrição de que escolheu a data de dois de fevereiro para sua sagração em razão da
devoção à Virgem Maria: “ [...] per la devozione Che il prelodato M. Gonçalves professa verso
Virgine, desidera ricevera la cosegrazione episcopale il 2 de febraio [...]”
149
, o que ficava
corroborado através de suas armas episcopais.
Nem tudo foi festa nos dias que antecederam a posse do novo bispo. Um artigo no
jornal 'LiULR GD 0DQKm fez uma crítica muito dura a respeito da relação Estado e Igreja,
dizendo que, apesar de separados pela Constituição Republicana de 1891, a ligação
147
ALMEIDA, Vasni de. &RQYHUWHUHQVLQDUHUHIRUP DU: a missão protestante em Ribeirão Preto (1896-1950).
Franca: Unesp, 1997. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social,
Franca-SP, 1997.
148
PERBONI, Fábio.
$ÈJXDR)RJRHR6DQJXH
: a Trindade da Salvação. Igreja da Assembléia de Deus em
Ribeirão Preto (1987-1997). 1999. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e
Serviço Social, Franca-SP, 1999.
149
BAVONA, Alessandro. Correspondência ao Secretario de Estado Rafaelle Merry D. Val, 31/out/1908,
$69
.
fasc. 143.
72
clandestina era da peor espécie.”
150
O artigo afirmava que o Estado precisava intervir, para
separar os bens da fábrica da matriz do patrimônio das Câmaras Municipais.
Muitas cidades do Brasil colonial e imperial estavam localizadas em terrenos
pertencentes ao patrimônio da Igreja. Alguns deles foram doados para erguer uma capela ao
santo de devoção do doador. O regime de 3DGURDGR5pJLR, isto é, os direitos exclusivos que o
rei possuía de administrar os negócios eclesiásticos no Brasil contribuíram para que o Estado
controlasse a vida da Igreja por séculos, desde 1500 até 1889. Separados pela Constituição
republicana, vinha à tona o controle sobre os terrenos disputados entre as fábricas das
matrizes e as municipalidades, conforme vamos ver no capítulo seguinte.
O autor do artigo considerava o assunto melindroso, mas recomendava que quanto
mais cedo as municipalidades tomassem uma posição, melhor seria, uma vez que muitas
cidades estavam em litígio com a Igreja. Os bens patrimoniais das Igrejas constituíram, ao
longo dos séculos, um dos alvos de cobiça do Estado liberal ou de seus aliados anticlericais.
Ao assumir a diocese, d. Alberto sabia dos enfrentamentos que o esperavam para
a organização da diocese em tentar barrar o avanço de outras denominações.
A diocese de Ribeirão Preto é apresentada no Relatório de d. Duarte para a
Nunciatura Apostólica com as seguintes características:
Patrono: São Sebastião; superfície: 28.190 Km; 34 Igrejas paroquiais; 8 Igrejas
filiais; 70 Oratórios Públicos; 37 Padres seculares; 3 Congregações religiosas masculinas com
3 casas e 12 sacerdotes e 9 irmãos leigos; 2 Congregações religiosas femininas com 2 casas e
28 irmãs; 2 colégios católicos e 5 escolas católicas; 79 associações católicas.
151
No mesmo relatório d. Duarte apontava para o problema de formação do
patrimônio da diocese de Ribeirão Preto, contando que duas outras cidades
152
da região
pleitearam ser a sede de diocese e que seus habitantes não quiseram contribuir para a
formação do patrimônio. O bispo alertava para os perigos da presença, em todas as novas
dioceses, dos espíritas e dos protestantes, estes, com os missionários da América do Norte,
que mantinham a sociedade bíblica semeando o que o bispo considerava como a descrença.
150
FLÁVIO, Ruy. A Igreja e o Estado.
'LiULRGD0DQKm
Ribeirão Preto, 10/fev./1909. Ruy Flávio era o
pseudônimo de João Rodrigues Guião, redator-chefe do jornal Diário da Manhã. CIONE, R.
+LVWyULDGH
5LEHLUmR3UHWR
: Legis Summa, 1996. v. 4, p. 115.
151
RELAZIONE Da Presentarsi Alla Nunziatura Apostólica Del Brasile Riguardo Al Projetto Della Creazione
Di Nuove Diocesi Nelle Stato Di San Paolo. p. 6-7, 14 Gennaio, 1908.
$&063
, São Paulo.
152
Não foi possível identificar com a pesquisa uma outra cidade além de Batatais que aspirava ser a sede
episcopal na região de Ribeirão Preto.
73
Para d. Duarte somente a presença de um bispo acompanhado de bons missionários, seria
capaz de cuidar e administrar evitando a perda das almas.
153
D. Alberto assumiu a diocese com 36 paróquias: Batatais, Brodowski, Caconde,
Cascavel, Cajuru, Casa Branca, Cravinhos, Espírito Santo do Pinhal, Espírito Santo do Rio do
Peixe (Divinolândia), Espírito Santo de Batatais (Nuporanga), Franca, Itobi, Ituverava,
Jardinópolis, Mato Grosso de Batatais (Altinópolis), Mococa, Mogi-Guassú, Patrocínio do
Sapucahy (Patrocínio Paulista), Ribeirão Preto, Rifaina, Santana dos Olhos D’ água (Ipuã),
Santo Antônio da Alegria, Santa Cruz da Estrela, Santa Cruz das Palmeiras, São João da Boa
Vista, São José da Bela Vista, São José do Morro Agudo (Morro Agudo), São José do Rio
Pardo, Santa Rita dos Coqueiros (Cássia dos Coqueiros), Santa Rita do Paraíso (Igarapava),
Santa Rita do Passa Quatro, São Simão, Sertãozinho, Tambaú, Vargem Grande (Vargem
Grande do Sul) e Vila Bonfim (Bonfim Paulista).
A divisão geográfica ficou estabelecida junto com as outras cinco dioceses do
Estado:
Começa no Rio Eleutério, no ponto em que este rio divide os Bispados de
São Paulo e Pouso Alegre, desce por este rio e pelo Mogy-Guassu e Rio
Pardo até sua barra no Rio Grande, sobe por este último até o ponto em que
começa a divisa do Bispado de Uberaba, dahi pelas divisa actuaes desse
Bispado e do de Pouso Alegre até o Rio Eleutério, onde teve princípio.
154
O Boletim Eclesiástico de São Paulo de 1908 publicou a listagem de todas as
paróquias por ordem de datas de fundação, com informações de população, santo padroeiro e
o respectivo vigário naquele momento. A paróquia mais antiga do novo bispado era Mogi-
Guassú, de 1773, criada ainda no período colonial; e a mais nova, de poucos anos antes da
criação do bispado, era a de Brodowski, de 1905.
153
RELAZIONE
Da Presentarsi Allá Nunziatura Apostólica Del Brasile Riguardo Al Projetto Della Creazione
Di Nuove Diocesi Nelle Stato Di San Paolo. 14 Gennaio, 1908, p. 8.
$&063
, São Paulo.
154
SILVA, D. Duarte Leopoldo e. Relatório sobre a criação das novas dioceses. São Paulo, [s.d.].
$&06363
.
&
$3Ë78/2
,,
2. A DIOCESE DE RIBEIRÃO PRETO E O GOVERNO DE D. ALBERTO JOSÉ GONÇALVES
A escolha da cidade de Ribeirão Preto para sede de bispado e de d. Alberto José
Gonçalves para bispo fez parte do projeto da hierarquia da Igreja para ocupar
sistematicamente e evangelizar a região remota do estado de São Paulo, conhecida por sua
riqueza.
O prelado eleito bispo, d. Alberto José Gonçalves, conforme vimos no capítulo
anterior, reunia todos os pré-requisitos necessários exigidos pela Santa Sé, para dirigir a obra
de evangelização, obter e administrar os bens patrimoniais a serem organizados após a
instalação do bispado.
Para iniciar sua obra, d. Alberto enviou da cidade de Curitiba uma carta aos novos
diocesanos, numa saudação que representava um primeiro passo para um engajamento com
seus fiéis. Nessa carta pastoral o bispo anunciou um novo tempo missionário, pois cabia ao
pastor [...] proteger o rebanho invadido de todas as partes [...]” e, mais ainda, [...]
empregaremos nossos esforços para que não se perca nenhum d’ aquelles que foram confiados
a nossa guarda e vigilância.”
155
Estava definida sua missão: consolidar a fé cristã entre os católicos e conquistar a
população itinerante que estava na região de Ribeirão Preto, atraída por uma suposta riqueza
fácil, e que foi chamada pelos membros da Secretaria de Estado do Vaticano de PDOYDGRV.
A missão do bispo era pastoral, precisava cuidar do rebanho, inserindo-o no
contexto da Igreja romanizada, cuidar das paróquias e dos padres, disciplinando-os de acordo
com as normas eclesiásticas. O bispo possui jurisdição ordinária e autoridade plena e
independente, prestando conta de seus atos somente ao papa. Ele tem poder para pregar a
palavra, administrar os sacramentos e aplicar as leis que se referem à consciência e que
regulam a disciplina. Era papel importante refrear aqueles que a Igreja considerava
extraviados da fé católica.
155
GONÇALVES, D. Alberto José. Primeira Carta Pastoral. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR

. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1918, p. 27.
75
Qual o caminho percorrido pelo bispo de Ribeirão Preto, d. Alberto José
Gonçalves, para executar sua missão?
D. Alberto seguia o modelo oriundo de Roma. Um conjunto de medidas chegava
para a Igreja na América após o &RQFtOLR3OHQiULR/DWLQR$PHULFDQR, em 1899, realizado no
Colégio Pio Latino-Americano em Roma. Padre Beozzo argumenta a respeito: “ A intenção do
Concílio o era penetrar na realidade latino americana, mas sim readequá-la ao novo perfil
da Igreja, centrado inteiramente em Roma.”
156
No Brasil, nas décadas seguintes à Carta Pastoral Collectiva dos Bispos, de 1890,
as determinações do Concílio Plenário Latino Americano e, posteriormente, as Cartas
Pastorais dos Bispos das Províncias Eclesiásticas Meridional e Setentrional, reafirmaram as
diretrizes traçadas por Roma, expressas nos documentos do Concílio Plenário.
157
Os bispos e
padres precisavam adequar-se ao modelo proposto pelos documentos e aplicar suas regras nas
dioceses e paróquias. Realizar as visitas pastorais, organizar a cúria e a administração dos
negócios eclesiásticos, bem como disciplinar e dirigir as associações laicas, constituíam parte
do projeto de governo de d. Alberto.
$REUDLQLFLDOGHG$OEHUWRDVYLVLWDVSDVWRUDLV
Tomadas as primeiras providências na sede da diocese, d. Alberto preparou a
visita pastoral, disposto a percorrer a diocese para conhecer as cidades com suas matrizes,
capelas e os fiéis que estavam sob seu governo. Apresentou-se como Pai e Pastor que estava
visitando o rebanho, anunciando a palavra àqueles que não tinham como ir até a sede da
diocese conhecer o bispo, suprema autoridade da Igreja na região.
O pesquisador Marcus Bencostta situa o início das visitas pastorais dos bispos no
Concílio de Tarragona, no ano de 506.
158
No entanto, séculos depois, o modelo proposto pelo
Concílio de Trento (1545-1563)
159
exigia que os bispos realizassem visitas pastorais e
156
BEOZZO, José Oscar. A Igreja frente aos Estados Liberais 1880-1930. In: DUSSEL, Enrique. +LVWyULD
/LEHUDWLRQLVDQRVGH+LVWyULDGD,JUHMDQD$PpULFD/DWLQD
São Paulo: Paulinas, 1992, p. 198.
157
LUSTOSA, Oscar de F. (Org.).
$,JUHMD&DWyOLFDQR%UDVLOHR5HJLPH5HSXEOLFDQR
. São Paulo: Loyola,
1990.
158
BENCOSTTA, M. L. $,JUHMDH3RGHUHP6mR3DXOR: D. João Baptista Correa Nery e a Romanização do
Catolicismo Brasileiro (1908-1920). 1999. Tese (Doutorado em História). Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas. São Paulo, 1999, p. 53.
159
A respeito do Concílio de Trento, sugerimos as obras que trazem boa indicação bibliográfica com
comentários sobre a historiografia do Concílio. ALBERIGO, G. (Org.).. +LVWyULDGRV&RQFtOLRV(FXPrQLFRV.
Trad. José Maria de Almeida. São Paulo: Paulus, 1995; MARTINA, G.
+LVWyULDGD,JUHMD'H/XWHURDQRVVRV
GLDV
I O Período da reforma. Trad. Orlando Soares Moreira. São Paulo: Loyola, 1995 e ZAGHENI, G.
&XUVR
GH+LVWRULDGD,JUHMD
. A idade Moderna. Trad. José Maria de Almeida. São Paulo: Paulus, 1999.
76
organizassem sínodos diocesanos em suas dioceses. O Concílio de Trento recomendava ainda
que os bispos visitassem toda a diocese, ou a maior parte dela, uma vez ao ano.
160
No século XIX, ainda vigente o concílio tridentino, os bispos, ao realizarem a
visita pastoral percorrendo a diocese, tinham vários propósitos, dentre eles, verificar o
cuidado material das igrejas, o zelo para com a moral do clero e do povo. No século XIX, na
Igreja paulista, d. Antonio Joaquim de Melo como bispo, realizou as reformas necessárias
para adequar o clero de São Paulo a um cuidado maior para com a Igreja e o culto
161
, tendo
sido seguido por seus sucessores.
As visitas pastorais tinham vários propósitos, como: pregar a palavra de Deus,
administrar os sacramentos aos fiéis devotos, entre eles, o crisma, e verificar a ão dos
párocos, bem como o andamento das paróquias e dos bens patrimoniais. Ao visitar uma
paróquia, o bispo estreitava os laços com o padre e a comunidade, anunciando a doutrina e
verificando o seu cumprimento. Em resumo, as visitas serviam para implantar o catolicismo
romanizado.
Esperava-se com esses eventos, despertar uma nova dimensão religiosa na vida
espiritual dos fiéis. Ouvindo novamente a palavra de Deus sendo pregada por bispos e padres,
os fiéis abandonariam as crenças supersticiosas e se recusariam a aderir às novas doutrinas
que ganhavam espaço no Brasil.
A expectativa era de que a presença do bispo criaria um clima propício à
consolidação do catolicismo no interior do estado de São Paulo, uma vez que nunca um bispo
residira tão próximo de seus fiéis. Com a criação da Província Eclesiástica de São Paulo,
dividiu-se o estado em regiões, e os bispos eleitos assumiram o papel de incrementar a fé. A
hierarquia da Igreja acreditava que poderia combater a secularização se bispos e padres
estreitassem laços com os fiéis, ensinando-lhes a doutrina da salvação, como pastores e
sucessores dos apóstolos e velando sobre o povo.
As paróquias da região de Ribeirão Preto prepararam-se para receber a autoridade
eclesiástica. Alguns lugares da diocese recebiam pela primeira vez a visita de um bispo, em
outros havia décadas que um bispo havia passado pela paróquia. Havia igrejas sem padres ou
com padres idosos, a assistência aos fiéis católicos era pequena.
160
Mesmo após o Concílio Vaticano I, a Igreja do início do século XX, segue algumas diretrizes tridentinas
como as indicadas para as visitas pastorais dos bispos.
161
WERNET, A $,JUHMD3DXOLVWDQRVpFXOR;,; São Paulo: Ática, 1987. A tese do prof. Augustin Wernet
retrata as visitas de D. Antonio Joaquim de Melo na diocese de São Paulo. Para o período que estudamos, a tese
de Marcus Bencostta aborda para a cidade de Campinas o programa de romanização de D. João B. Nery.
BENCOSTTA, 1999.
77
Por meio de uma &DUWD 3DVWRUDO, d. Alberto anunciava sua peregrinação pela
diocese e se apresentava como pastor, imitando o exemplo de Cristo. Era uma maneira de se
contrapor à sociedade secularizada. Na diocese de Ribeirão Preto, d. Alberto cumpria [...] a
missão que o Espírito Santo e a Igreja lhe confiaram [...] chamar ao aprisco alguma ovelha
tresmalhada, illudida pelas fallazes palavras de pseudo-pastores.”
162
Nas palavras do bispo, nem se admitia que as pessoas professassem outra crença,
mais ainda quando, partindo de uma formação católica, tivessem deixado de professar o
catolicismo, iludidas por falsos pastores.
163
Junto com a Carta Pastoral do anúncio da visita, o bispo enviava um
0DQGDPHQWR, orientando os vigários a preparar os livros da paróquia, da fábrica da matriz e
das irmandades, para serem verificados na ocasião. Cabia ao bispo, observar como estava a
aplicação da doutrina, isto é, dos dogmas e normas inerentes ao catolicismo e à sua prática
cotidiana, bem como o ensino do catecismo, e também analisar as contas da fábrica da matriz
e das capelas.
O itinerário das cidades contempladas nas visitas pastorais com as datas previstas
era lançado no início do ano pela cúria, facilitando a organização nas paróquias.
As cartas de d. Alberto, com orientações para o bom andamento das visitas
pastorais, eram enviadas com antecedência aos párocos. Os paroquianos deveriam ser
instruídos a respeito dos sacramentos que iam receber, como o crisma e matrimônio, para tirar
todos os papéis necessários antes da sua chegada.
No início do culo XX, a presença de um bispo em uma cidade sempre resultava
em acontecimento ímpar, pois sua personalidade se revestia de uma aura de santidade e poder.
Os livros de Tombo das paróquias e os jornais das cidades da diocese de Ribeirão Preto
revelam esse fato. Grande mobilização dos católicos da diocese se dirigia às estações de
linhas de ferro ou à entrada das cidades para acolher o bispo.
O 0DQGDPHQWR sobre a visita especificava que a recepção começaria na entrada
da cidade, com toda a comunidade católica saindo da Igreja, em procissão, levando à frente
uma cruz. Uma banda musical deveria tocar os hinos, ou os fiéis poderiam entoá-los. Arcos
triunfais cobertos de flores eram preparados, bandas executavam músicas sacras, hinos eram
cantados pelos agremiados das associações. Os membros das irmandades religiosas laicas
masculinas e femininas participavam de todas as cerimônias, paramentados com seus
162
GONÇALVES, D. Alberto J. Carta anunciando a visita pastoral. 25 de abril de 1909. In: $UFKLYRGD'LRFHVH
GR5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1918, p. 69-74.
163
O combate da Igreja dirigia-se a tudo o que fosse contrário à doutrina católica, demonstrando desprezo a
outras crenças. A idéia atual de Ecumenismo chegou mais tarde, só após o Concílio Vaticano II.
78
uniformes e fitas, que os distinguiam do restante da população. Representava um VWDWXV no
seio da comunidade pertencer a uma agremiação laica.
Como vimos, a visita pastoral contemplava analisar os livros paroquiais,
administrar o sacramento do crisma, rezar pelos fiéis defuntos, reunir-se com as associações
religiosas laicas, rezar e pregar para os demais fiéis, ou seja, um programa voltado para os
assuntos internos da Igreja e do bom andamento da fé.
Apesar de contemplar assuntos da Igreja, as municipalidades facilitaram e
contribuíram para abrilhantar a visita do bispo e, em muitas delas, contribuíram
financeiramente para as festas e compareceram oficialmente a todas as cerimônias.
D. Alberto, na &DU W D, avisou que não queria gastos desnecessários para não onerar
o povo e observou que não era preciso nomear comissões para recebê-lo. Escreveu que queria
simplicidade, bem como passar o maior tempo possível na companhia do pároco. A visita
apresentava-se como uma oportunidade de conhecer e estar mais próximo dos párocos, por
esse motivo pediu para partilhar da mesa comum, hospedando-se com os padres. A leitura dos
livros de Tombo revelou que nem sempre esses propósitos foram cumpridos.
Junto com o 0DQGDPHQWR anunciando a visita, expediu um documento chamado
&HULPRQLDOSDUDD U H F HSomRGR%LVSRHRVHUYLoRGD9LVLWD
164
, em que se especificavam, com
detalhes, todas as orientações para os diferentes momentos da presença do bispo. Apesar de
pretender ser modesto e não ser motivo de gastos ele não dispensou o cerimonial.
Após algumas visitas, o bispo fez uma recomendação aos párocos no sentido de
pedir às autoridades civis que tais visitas fossem desvinculadas de festas da cidade e não
concedessem licença para as barracas nas praças das matrizes, uma vez que, de acordo com
ele, comprometiam o resultado da visita, pois desviavam a concentração no objetivo maior,
que era espiritual, mas grande o número de pessoas que circulavam nas cidades por essa
ocasião atraía comerciantes com seus produtos.
Um ano depois de ter iniciado as visitas pastorais pela diocese, d. Alberto,
escreveu os $YLVRV'LRF H V DQRV , em que dispôs várias considerações a respeito de diversos
temas. Entre outras coisas, recomendava a recitação obrigatória dos atos de fé, esperança e
caridade e orações próprias, antes das missas; dispunha também sobre especificações de
pedidos de dispensas canônicas matrimoniais, sobre a manutenção correta dos documentos
emitidos pela hierarquia da Igreja e proibindo a celebração de missas em casas particulares.
164
CERIMONIAL para a recepção do Bispo e o Serviço da Visita. In: $UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR:
1908-1918. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1918, p. 77-89.
165
GONÇALVES, D. Alberto J. Avisos Diocesanos. In:
$UFKLYRGDGLRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
, p.
93-94.
79
As recomendações de d. Alberto visavam admoestar os padres que não seguiam à risca as
normas inerentes à condição do cargo.
Os bispos exortavam seus padres a seguir as regras, exigindo que adquirissem os
livros contendo as 3DVWRUDLV &RO H W LYDV, as $WDV H 'HFUHWRV GR &RQFtOLR e os %ROH WLQV
'LRFHVDQRV. D. Alberto acreditava que os padres poderiam conhecer os documentos para
estruturar a administração da paróquia e sua ação evangelizadora. De acordo com a pesquisa,
nem todos os párocos transcreviam os documentos que chegavam do Vaticano, nem deixavam
a escrituração em dia. Além disso, o fato de transcrever os documentos o garantia que as
diretrizes da Igreja estivessem sendo seguidas pelo clero na diocese.
Após a primeira visita geral, d. Alberto enviou uma &DUWD 3DVWRUDO
166
agradecendo a recepção que teve, ressaltando as demonstrações da multidão de fiéis que o
acolheram em festa. Essas demonstrações revelavam que o catolicismo ainda estava presente
nas comunidades interioranas.
167
A visita do bispo era uma festa que reunia as elites e os
pobres, mesmo separados pelas distinções sociais; ao receberem os sacramentos, tornavam-se,
por um breve momento, partícipes de um ritual secular, que os confirmava como membros de
uma única comunidade cristã.
As visitas duravam em média dois dias ou um pouco mais. Apesar de a riqueza da
região ter permitido que se construíssem estradas de ferro, como a Mogiana, a Paulista e seus
ramais, muitas cidades só poderiam ser alcançadas por estradas precárias, sem pavimentação.
D. Alberto viajava sempre acompanhado de algum padre. Documentos atestam,
nas primeiras décadas, a presença constante de padres Agostinianos auxiliando d. Alberto nas
visitas. Além deles, outros religiosos, como missionários de São Carlos, Beneditinos
Olivetanos, Claretianos, foram alguns dos quais, presentes na diocese, viajaram com d.
Alberto.
Como resultado das visitas pastorais, milhares de pessoas foram crismadas,
centenas receberam a primeira comunhão, outras se uniram pelo matrimônio, reforçando a
imagem de que o catolicismo não precisava do Estado para demonstrar seu poder diante da
166
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a 1
a
Visita Pastoral. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
, p.109-117
167
Mas nem toda cidade da diocese recebeu o bispo com festas. Ao escrever sobre seu governo na década de
1930, d. Alberto relatou um episódio em que, no início de seu governo, foi recebido em uma cidade com um
folheto denegrindo sua pessoa. A liberdade de optar por uma determinada crença, fenômeno próprio dos novos
tempos republicanos, possibilitou que os grupos anticlericais ou de outras crenças se manifestassem contra a
Igreja católica e seus membros.
80
sociedade laica, pois era a religião da grande maioria. Um exemplo claro disso foi que, em
pouco tempo de governo na diocese, 68.228 fiéis receberam o sacramento do crisma.
168
D. Alberto fez registros em que descreve as condições do patrimônio das
paróquias: [...] encontramos matrizes tão pobres, desprovidas de muitos objetos necessários
ao culto divino, tão pequenas que não podiam conter os fiéis, despojadas algumas de seu
patrimônio que lhes foram doadas [...]
169
Era o desabafo de um bispo indignado com a
situação de miserabilidade que encontrou nas matrizes e capelas do bispado. Nem todas eram
pobres, algumas possuíam patrimônio suficiente até para ser sede de bispado, como foi o caso
da matriz de Batatais. Em outras, os rocos é que possuíam bens, pois eram de famílias
abastadas. Havia também aquelas que possuíam bens mal administrados.
Como solução, para as matrizes pobres, o bispo passou a incentivar os rocos a
formar comissões para reformar ou construir novos templos mais adequados ao culto, bem
como provê-los de alfaias. Os párocos usaram os métodos tradicionais para angariar recursos,
tais como quermesses, leilões de prendas, listas de arrecadação, entre outros. Durante o
governo de d. Alberto, várias cidades da diocese ganharam nova matriz. Houve ocasiões em
que ele contribuiu diretamente com os párocos nas suas obras, conseguindo ao transporte
gratuito de materiais pela Companhia Mogiana.
170
D. Alberto compareceu a cerimônias de lançamento de pedra fundamental ou
festas depois das reformas, ou pela inauguração de novos templos e mesmo de altares, como a
capela do Santíssimo Sacramento, e até de altares laterais.
Uma visita do bispo a uma localidade justificava amesmo o deslocamento das
pessoas que moravam na zona rural, para as cidades. O catolicismo rural encontrava duas
vertentes: uma, a do antigo catolicismo colonial, regido pelas devoções aos santos e a
observância aos mandamentos
171
, e a outra, do fim do século XIX e início do XX,
especialmente em regiões como a de Ribeirão Preto com seus inúmeros imigrantes. Estes
estavam acostumados com uma presença mais constante dos padres e se sentiam abandonados
168
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a 1
a
visita Pastoral. 2 de
fevereiro de 1911. In: $UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães,
1918, p. 109-117.
169
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a 1
a
visita Pastoral. 2 de fev.
de 1911. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1918. p.114.
170
LIVRO de Tomboda Paróquia Nossa Senhora Aparecida, n. 1, p. 29. $316$6H63 (Arquivo da Paróquia de
Nossa Senhora Aparecida de Sertãozinho), Sertãozinho-SP.
171
HOONAERT, E. A Igreja no Brasil. In: DUSSEL, Enrique. (Org.).
+LVWyULD/LEHUDWLRQLV
500 anos de
História da Igreja na América Latina. São Paulo: Paulinas, 1992, p. 308.
81
pela ausência de uma assistência espiritual regular, uma vez que na Europa a presença de
padres e bispos era muito maior do que no interior do Brasil.
172
Os imigrantes que conheciam um catolicismo dirigido pelos padres contrastavam
com a população rural que seguia os princípios de um catolicismo doméstico, popular, de
beatos, beatas, de pregadores que percorriam o sertão, distante das vilas e cidades. No interior,
a presença do clero era pequena e esporádica. Muitas casas, mesmo as mais humildes,
possuíam oratórios ou imagens de santos de devoção da família, local em que se reuniam para
a reza do terço ou outras orações. O catolicismo doméstico, familiar, passado de geração a
geração, não necessitava da presença do sacerdote, que apenas em ocasiões específicas
oficializava pelos sacramentos, a crença dos fiéis.
173
A expressão da religiosidade dos brasileiros seguia o padrão colonial de
exteriorização. Ao pesquisar a fé do português que chegou à região das Minas Gerais no
século XVIII, José Ferreira Carrato afirmava que [...] a procissão é a expressão mais fiel do
religiosismo exteriorista português [...]”
174
Essa mesma fé continuava a ser praticada no início
do século XX. A vida simples do homem do campo, distante da cidade e de uma participação
mais intensa nos quadros das associações laicas, deixava-o alheio às mudanças.
A hierarquia da Igreja acreditava que uma maior assistência religiosa por parte
dos sacerdotes e do bispo poderia alterar esse quadro, reforçando o poder dos sacerdotes e da
instituição, suprimindo o caráter leigo do catolicismo colonial. Desde o século XIX, a Igreja
enfrentava cada vez mais a secularização da sociedade e a ingerência do Estado em assuntos
que ela considerava de foro interno. O matrimônio religioso representou um dos pontos em
que a Igreja precisou lutar para fazer valer suas prerrogativas. D. Alberto, em uma &DUWD
VREUH RV 6XIUiJLRV
175
abordou esse tema. Para ele, a sociedade aceitava as imposições do
Estado em realizar o casamento civil, alegando estarem fora da lei o homem e a mulher que
não se reuniam perante o Estado; entretanto, quando a Igreja impunha o sacramento do
matrimônio para os seus fiéis, era considerada intolerante.
O tema do matrimônio, entre outros, revela como o embate foi duro, somado às
novas idéias, e somente poderia ser enfrentado por pessoas preparadas para defender os
dogmas e os valores da Igreja. Dessa forma, os sacerdotes apresentavam-se como os
principais responsáveis para diretamente reverter a secularização da sociedade.
172
SOUZA, Wlaumir D. de.
$QDUTXLVPR(VWDGRHSDVWRUDOLPLJUDQWH
. Das disputas ideológicas pelo
imigrante aos limites da ordem: o caso Idalina. São Paulo: Editora Unesp, 2000, p. 65 et. seq.
173
HOONAERT, E. (Org.). +LVWyULDGD,JUHMDQR%UDVLO. São Paulo: Paulinas/Vozes. 1983. tomo II/1.
174
CARRATO, J. F.
,JUHMD,OXPLQLVPRH(VFRODV0LQHLUDV&RORQLDLV
. São Paulo: Nacional, 1968, p. 33.
175
GONÇALVES, D. Alberto José. “ Carta sobre os Suffragios. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
.
1908-1918. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1918, p. 148-152.
82
Contribuindo com o trabalho das visitas pastorais do bispo, estavam outras
atividades relacionadas com as associações religiosas laicas e as missões. O trabalho
missionário sempre fez parte da história da Igreja católica e colaborou, junto com as diretrizes
do papa Pio X e dos papas seguintes, para uma revitalização da vida interna da Igreja, a partir
da eucaristia, da catequese e da renovação litúrgica. O trabalho missionário representava o
caminho para a universalização da Igreja.
No fim do século XIX, a chegada de novas ordens religiosas que passaram a
prestar serviço público e gratuito, empenhadas no ensino, na assistência social e na área da
saúde, contribuiu para que os missionários atuassem pregando nas chamadas missões rurais e
urbanas.
176
As missões constituíam parte do projeto de cristianizar a sociedade. Durante sua
permanência, existia um programa que os sacerdotes deveriam cumprir, com tríduo, sermão,
missa cantada. As solenidades eram completadas com hora santa, benção do Santíssimo,
indulgência plenária aos que confessassem. A participação da imprensa católica, divulgando
as obras da Propagação da Fé nos colégios e conventos era intensa; também era realizada uma
coleta especial nas paróquias da diocese. O dinheiro arrecadado era enviado pelos bispos para
as missões em diferentes partes do mundo. Essa prática ainda é usada nos dias atuais.
A presença de missionários ou dos párocos servia para exortar os fiéis às rogativas
públicas. Essas rogativas eram orações especiais, como pedidos de chuva para a comunidade,
de bênçãos em meio a epidemias, de preparação para as missões, pedidos de paz em tempos
de guerra. As rogativas são descritas nos livros de Tombo das paróquias.
As missões rurais contribuíram para o avanço do catolicismo nas comunidades
pouco visitadas pelos padres e permitiram vislumbrar a situação de carência em que se
encontravam as regiões mais distantes das matrizes.
O relato de uma missão rural realizada na fazenda São Martinho, pertencente à
paróquia Nossa Senhora Aparecida, na cidade de Sertãozinho, deixou-nos uma versão bem
clara da sua importância.
Às cinco horas da manhã abria-se todos os dias a Egreja, que logo ficava
cheia de fiéis para receber os sacramentos e ouvir a palavra de Deus. Às seis
horas celebrava-se todos os dias a Santa Missa e após ella fazia-se uma
pequena instrucção ao povo. Ao meio dia reuniam-se todos os dias de 80 a
176
MATOS, H.C. J.
&DPLQKDQGRSHOD+LVWyULDGD,JUHMD
: uma orientação para iniciantes, v. 3. Belo
Horizonte: O Lutador, 1996, p. 79-83.
83
100 creanças para a aula do cathecismo. Às seis e meia da tarde outra vez a
capella ficava cheia do povo, rezávamos o santo terço, pregava um sermão
sobre as verdades eternas e terminava tudo com a benção do Santíssimo
Sacramento, entremeado tudo com cânticos piedosos, que tanto excitam o
fervor do povo [...]
177
Sobre a missão rural pregada pelo padre Leopoldo Ripa, missionário do Coração
de Maria, de 19 de dezembro a 27 de dezembro de 1926, em Sertãozinho, encontramos
informações sobre a ignorância religiosa do povo de acordo com a visão da Igreja católica,
principalmente entre os jovens, de modo que alguns mal sabiam rezar a oração mais
conhecida dos católicos, o Pai-Nosso.
O fato nada tem de extraordinário, uma vez que o conhecimento dos dogmas e
fundamentos doutrinários estava apenas na superficialidade do povo católico. A declaração do
missionário revela que, apesar dos esforços do bispo d. Alberto, das exortações para que os
padres ensinassem o catecismo, o povo seguia na sua ignorância. As missões representavam
uma pequena gota de alento, um momento em que mais intensamente alguns padres
vislumbravam a realidade da ignorância do povo e o missionário contribuía para amenizar a
situação.
Por toda a extensão da diocese, as missões urbanas e rurais atuavam como um
lenitivo. O número de confissões e comunhões durante a realização das missões era sempre
alto, o que significava que pelo menos naqueles dias a população vivia com mais intensidade
o catolicismo, com um efeito semelhante ao das visitas pastorais dos bispos.
&OHURHRVHP L QiULR
A empreitada de d. Alberto como bispo teve várias frentes de atuação, uma delas
era considerada fundamental no processo de alargamento das fronteiras do catolicismo no
século XX.
D. Alberto necessitava contar com o apoio dos padres seculares e regulares. Para
tanto, fazia-se necessário que o clero estivesse alinhado com as diretrizes do Vaticano, a fim
de consolidar a presença da Igreja no seio da sociedade por meio de sua hierarquia.
177
LIVRO de Tombo
da Paróquia Nossa Senhora Aparecida, n. 1, p. 100-101.
$316$6H63
Arquivo da
Paróquia de Nossa Senhora Aparecida de Sertãozinho), Sertãozinho-SP.
84
A tarefa que se apresentava para os bispos da Província Eclesiástica de São Paulo
não era fácil. Para d. Alberto, bispo de Ribeirão Preto, as dificuldades eram semelhantes.
Disciplinar o clero e condicioná-lo dentro da proposta centralizadora do Vaticano era sua
tarefa, e as visitas pastorais eram destinadas a observar o cumprimento das normas desse
processo.
Um dos desafios encontrados por d. Alberto foi o clero que, em 1909, era
pequeno, em geral, idoso e formado por muitos padres estrangeiros, conhecidos como padres
volantes, pois trocavam de paróquias e dioceses constantemente. Quanto às ordens religiosas
encontradas por d. Alberto, exerciam nas cidades da diocese diferentes atividades. Os
Agostinianos Recoletos possuíam casa na sede da diocese e cuidavam de paróquias nas
cidades da região. Os Salesianos, Irmãos Maristas, Filhas de Maria Auxiliadora e as Irmãs de
São José dedicavam-se às escolas ou Casas de Misericórdia.
178
Com o passar dos anos, d. Alberto atraiu outras ordens religiosas masculinas e
femininas. Algumas paróquias e suas atividades foram entregues a religiosos, como os
Missionários de São Carlos, Padres Claretianos, conhecidos como Missionários Filhos do
Imaculado Coração de Maria, os Beneditinos Olivetanos, as Salesianas, Irmãs Ursulinas,
Irmãs da Pia União de Jesus Maria e José, Irmãs Zeladoras do Coração de Jesus, Filhas de
Sant’Ana, Irmãs do Calvário, Filhas de São José, Irmãs Missionárias Franciscanas do Egito,
Irmãs Concepcionistas, entre outras.
A importância das ordens religiosas na evangelização pode ser atestada pela
segunda paróquia instalada na sede do bispado, sob a responsabilidade dos padres do
Imaculado Coração de Maria, os Claretinaos, a paróquia de Nossa Senhora do Rosário,
instalada em 12 de março de 1914, na Vila Tibério.
Os padres Agostinianos, que chegaram antes da instalação da diocese, construíram
a capela São José, local em que o bispo tomou posse.
179
Instalaram obras de caridade na
cidade de Ribeirão Preto, como a Oficina de Santa Rita, freqüentada por mulheres que
atendiam com vestimentas a população carente.
A matriz de Santo Antônio, que pertence aos padres Beneditinos Olivetanos e está
localizada no bairro dos Campos Elíseos, teve seu projeto inicial feito pelos padres
178
LAURIANO, João.
%LVSRVH$UFHELVSRVGH5LEHLUmR3UHWR
. (1909-1972). Ribeirão Preto-SP: Cúria
Metropolitana, s/d, p. 12.
179
A capela São José ganhou VWDWXV de paróquia somente em 19 de março de 1964 pelas mãos do arcebispo d.
Agnello Rossi. BELMONT, Frei Agostinho.
DQRVGDSUHVHQoD$JRVWLQLDQRV5HFROHWRVQR%UDVLO

. Rio de Janeiro: Gávea, 1999.
85
Scalabrinianos.
180
Os Beneditinos Olivetanos chegaram à sede da diocese em 1919; passaram
a viajar com d. Alberto, auxiliando nas visitas pastorais, e assumiram a igreja de Santo
Antonio e a irmandade de Santo Antonio.
Na sua primeira carta pastoral
181
, d. Alberto, dirigiu-se ao clero, convocando-o
para estar unido por uma diretriz comum, chamando os padres de cooperadores da ordem,
ressaltando que, em razão do cargo que havia exercido em Curitiba, compreendia-os em suas
angústias. Era uma maneira de o bispo aproximar-se do clero, destacando o valor dos padres
na missão de evangelização.
O clero necessitava estar em dia com as devidas licenças expedidas pela cúria para
não incorrer em desobediência ao direito canônico. Dentre estas licenças, estavam as
provisões para o bom andamento de uma paróquia. Os despachos eram variados, sendo
considerado o mais importante a autorização para exercer a função de roco ou vigário. Os
outros se constituíam em autorizações, tais como: binar missas, benzer paramentos, cruzes,
instituir associações leigas, usar fórmulas breves para ocasiões especiais, benzer água para pia
batismal, benzer escapulário, quadros de via-sacra, celebrar mais de uma missa de réquiem.
Alguns desses despachos referiam-se à autorização para procissões sob a invocação de um
santo ou da Virgem Maria, ou ainda do Cristo, com ou sem imagens. Para realizar a exposição
do Santíssimo Sacramento em dias não previstos, era preciso um despacho especial. Cabia ao
vigário-geral do bispado alertar os membros do clero para a renovação dessas licenças todos
os anos. Os padres que não procedessem de acordo com as normas adotadas incorriam no erro
e também no desagrado do bispo. Ao longo do governo de d. Alberto, muitos foram os padres
que deixaram de realizar todas essas exigências.
Outra recomendação da hierarquia da Igreja e instituída por d. Alberto era a
freqüência obrigatória nos retiros anuais, visando disciplinar o clero, de acordo com as &DUWDV
3DVWRUDLV. Inicialmente, os padres da diocese de Ribeirão Preto freqüentaram os retiros em
São Paulo. O cuidado de d. Alberto com o clero teve por objetivo tentar integrá-lo a uma
Igreja mais centralizadora e alinhada com o Vaticano, tarefa nada cil. Inúmeros desvios
180
Os Scalabrinianos permaneceram poucos anos na cidade de Ribeirão Preto. O texto de Felipe de Faria D.
Leite “A construção de um templo na formação de um bairro: a história da Abadia de Santo Antonio em face da
ocupação do bairro dos Campos Elíseos em Ribeirão Preto SP 1922-1956”, publicado na Revista Eletrônica da
Unesp de Franca, explica a história da matriz de Santo Antônio.
181
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR
. 1908-1918.
86
praticados pelo clero permitiram que a Igreja ficasse mais vulnerável e fosse atacada por seus
inimigos.
Em Ribeirão Preto, d. Alberto enfrentou dissabores com seus padres. Um dos
primeiros episódios enfrentados por ele ocorreu pouco tempo depois que chegou à diocese. O
padre Jonas Lopes do Prado, da paróquia de Nossa Senhora da Piedade de Mato Grosso de
Batatais (hoje Altinópolis), deixou o ministério em 1912, para casar-se com Jóia Battella, uma
presbiteriana. Aos olhos da Igreja, o pecado do padre era duplo, deixar o ministério e
debandar para o lado dos inimigos.
182
Desgostoso com a deserção, d. Alberto escreveu uma carta destinada aos
diocesanos com o tema: 6REUHDSRVWDVLDGHVDFHUGRWHV, em que esclareceu os fiéis sobre a
situação de dois padres, sem identificá-los, considerados por ele como náufragos, infiéis ao
sacramento da ordem. Na deserção dos padres, [...] o casamento segue bem de perto o
abandono da batina [...]
183
, o casamento era uma das principais causas de os sacerdotes
deixarem a Igreja. D. Alberto deixou explícita sua mágoa. Enquanto a Igreja combatia a
secularização da sociedade e a entrada livre de novas crenças, o bispo viu sair de seu rebanho
um prelado [...] victima de uma paixão violenta que o cegue, a qual não soube fugir ou
resistir [...]”
184
Apesar de recomendações da Igreja, de vigilância, regras e exortações, muitos
padres não resistiam ao celibato e deixavam o ministério, debaixo de grandes escândalos,
muitos deles publicados nos jornais. Foi possível apurar a respeito de um dos sacerdotes. A
respeito do outro, nada sabemos e permaneceu incógnito, uma vez que o bispo ocultou nomes
em sua &DUWD.
182
Jonas Lopes do Prado casou-se com Jóia Battella, em quinze de abril de mil novecentos e quatorze, na mesma
cidade em que exerceu seu paroquiato. Na certidão do casamento, consta que Jonas Lopes do Prado exercia o
cargo de professor, conforme registro no Livro B- 003, folhas 122F, sob numero 17. Cartório de Registro Civil
de Altinópolis. (registro localizado pelo pesquisador Oldemar Brondi de Figueiredo).
183
GONÇALVES, D. Alberto José. Sobre Apostasia dos sacerdotes. In:$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
1908-1918, p. 129.
184
GONÇALVES, D. Alberto José. Sobre a Apostasia de Sacerdotes. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR
3UHWR
1908-1918, p. 129.
87
D. Alberto dirigiu-se aos fiéis para que não deixassem sua fé ser abalada por essas
situações de escândalos, afirmando que, desde os tempos de Cristo, deserções sempre
existiram. O medo do Bispo justificava-se pelos escândalos que envolviam os prelados, os
quais representavam motivo de júbilo e vitória para os liberais e todos os que se declaravam
inimigos da Igreja, causando a deserção de pessoas que, diante deles, renegavam o
catolicismo.
185
A recomendação da hierarquia da Igreja era para que os bispos orientassem os
padres e, junto com eles, freqüentassem os retiros, destinados a fortalecer a fé dos prelados. O
retiro anual pregado para o clero foi uma das práticas introduzidas por D. Alberto, na tentativa
de disciplinar os padres.
2FDVRGR3DGUH(XFOLGHV* RPH V  &DUQHLUR
Outro episódio que trouxe dissabores para o bispo de Ribeirão Preto e o colocou
numa situação confusa diante da população foi o caso do padre Euclides Gomes Carneiro. Foi
muito ruim o ataque da imprensa sofrido pelo bispo. Mas ser atacado pela imprensa
representava uma situação conhecida por d. Alberto desde os tempos de Curitiba. O episódio
começou com a chegada do bispo a Ribeirão Preto, encontrando padre Euclides dinâmico, à
frente de inúmeros projetos assistenciais e religiosos.
Euclides Gomes Carneiro, natural de Itajubá, Minas Gerais, estudou no seminário
de Mariana e, ordenado por d. Silvério Gomes Pimenta, chegou a Ribeirão Preto em 1902, a
convite de monsenhor Joaquim Antonio de Siqueira, para ser o coadjutor da matriz de São
Sebastião.
Com seu dinamismo, padre Euclides iniciou as obras de fundação da Sociedade
dos Catequistas Voluntários, inaugurada em 7 de setembro de 1903, que adotou o nome pelo
qual é conhecida até os dias atuais: Sociedade Legião Brasileira. A entidade
186
adotou uma
linha cívica cultural, daí o nome, pois o termo catequista era usado para designar a catequese
da Igreja católica. Em 1910, a Sociedade Legião Brasileira inaugurou um salão próprio para
abrigar a biblioteca, salão de pinturas, movimentando a vida cultural com conferências
mensais que abordavam temas variados.
Dentre os conferencistas, encontramos os nomes de vários padres, bispos, como d.
185
Para o período de 1900 a 1923, consta nos Arquivos do Vaticano, na seção da Nunciatura Apostólica, cartas
contendo denúncias de que bispos e padres eram motivos de escândalo ou estavam envolvidos em situação que
denegria a imagem da Igreja.
186
MIRANDA, José Pedro de.
3DGUH(XFOLGHV*RPHV&DUQHLUR
. (vida e obra). Edição comemorativa do
centenário de seu nascimento. 1879-1979. [s.l./s.n.], 1979.
88
Alberto e d. Manuel, mas também de personagens que ficaram conhecidos na sociedade
brasileira por seus trabalhos, como Menotti Del Picchia, Altino Arantes, Monteiro Lobato,
entre outros. Em meio às atividades religiosas, padre Euclides dedicou-se às atividades
culturais e assistenciais, como a reorganização da Santa Casa de Misericórdia e a construção
do Asilo de Inválidos, hoje chamado Asilo Padre Euclides. A construção do asilo ocorreu no
momento em que o padre morava fora de Ribeirão Preto.
Padre Euclides, como vigário da catedral, era um dos homens de confiança de d.
Alberto. Quando o bispo fez a 1
a
. visita $GOLPLQD em 1914 a Roma, o padre Euclides, ficou
junto com o monsenhor Joaquim Antonio de Siqueira e padre Luis Góez de Conrado,
responsáveis pela diocese.
187
Em 1914, padre Euclides pediu a d. Alberto, diante de duas testemunhas,
monsenhor Siqueira e sr. Fernando Fragoso, para ser transferido da cidade, alegando que
estava numa situação insustentável; prontamente o bispo o removeu de Ribeirão Preto para
São José do Rio Pardo. O significado da situação insustentável não foi apurado, mas, aos
olhos da sociedade local, a notícia era de que o bispo d. Alberto havia mandado embora o
padre Euclides. Cinco anos depois, explodiu o episódio que os jornais da cidade de São José
do Rio Pardo estampavam em manchetes com o título +LVWyULDGHXP%LVSRDUURJDQWHHGH
XP3DGUHERQGRVR
188
, entre outros artigos, que são encontrados nos arquivos do Brasil e do
Vaticano.
A troca de correspondências entre o padre Euclides e d. Alberto revelou um outro
lado da questão, mostrou as goas do bispo diante da desobediência e ingratidão do padre.
Em carta a padre Euclides, d. Alberto
189
reconheceu que os anos de paroquiato em São José
do Rio Pardo contribuíram para agravar a situação, a ponto de precisar mandar o padre
embora da diocese.
Para o bispo e a hierarquia da Igreja, que acompanhou o caso, os erros canônicos
cometidos pelo padre Euclides foram vários: fazer festa a Nossa Senhora do Bom Sucesso em
São José do Rio Pardo, sem provisão eclesiástica, celebrar casamentos sem proclamas, não
celebrar as missas devidas na capela da Santa Casa de Misericórdia, de binar
190
sem
autorização, de celebrar na gruta de Lourdes, quando a Igreja recomendava para fazê-lo na
187
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência a d. Giuseppe Aversa. 27/mar./1914.
$6J91$%
.
188
2(63,2
, n. 21, 25/jun./1919, São José do Rio Pardo. Arquivo Público de Ribeirão Preto Ribeirão Preto
(APRP-SP), Ribeirão Preto-SP.
189
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondênciaao padre Euclides Gomes Carneiro, 1/jun./1919. $&053
SP (Arquivo da Cúria Metropolitana de Ribeirão Preto), Ribeirão Preto-SP. (Pasta monsenhor Lauriano).
190
Para um sacerdote celebrar mais de uma missa por dia era preciso uma provisão especial concedida pelo
bispo.
89
matriz. Padre Euclides, depois que deixou a catedral de Ribeirão Preto e assumiu como
pároco de São José do Rio Pardo, foi proibido pelo bispo de fazer obras sem pedir
autorização. No entanto, para piorar sua situação, esteve à frente da construção de um teatro
público em São José do Rio Pardo, sem pedir permissão.
Outra acusação feita pelo bispo dizia respeito às visitas do padre Euclides à cidade
de Ribeirão Preto, realizadas na ausência do bispo, visando angariar fundos para a construção
de um asilo em Ribeirão Preto, que, hoje, ainda em funcionamento, leva seu nome e é o local
em que ele está enterrado. D. Alberto tinha dificuldades para angariar fundos para a
construção da catedral e, segundo ele, o padre agia em oposição a seu objetivo ao pedir ajuda
às pessoas gradas para a construção de um asilo para abrigar idosos.
O bispo queixava-se dos quatros anos que passou sem visitar a paróquia do padre
e que este, por sua vez, nunca havia estado na estação quando ele por passava de trem. O
bispo acusou-o ainda de ter renegado sua própria mãe e sua família, pois, quando vinha a
Ribeirão Preto, não a visitava e que havia se separado de sua mãe quando ainda residia na
cidade. Para d. Alberto, essas atitudes eram indignas de um padre e dos bons princípios do
cristianismo. Padre Euclides
191
justificava-se dizendo que nunca tivera intenção de ofender a
d. Alberto nem a outras pessoas e que esperava que o bispo desse por encerrado o assunto.
192
Inúmeras cartas foram trocadas entre o d. Alberto e padre Euclides. Numa delas,
este dizia
193
que, saindo da paróquia de São José do Rio Pardo, pedira a população para
obedecer o bispo. Mas, nesse momento, a imprensa de São José do Rio Pardo publicava
notícias contra o bispo. As razões do bispo não foram veiculadas na imprensa, que ficou ao
lado do padre.
A disputa entre d. Alberto e padre Euclides chegou ao arcebispado e ao
governador do estado de São Paulo. O arcebispo recebeu queixas do advogado Jovino de
Sylos, condenando as supostas atitudes de d. Alberto. Diante da circunstância, d. Duarte
194
pediu a d. Alberto que esclarecesse a situação. O arcebispo alegou que não queria interferir,
mas que precisava saber dos fatos para poder dar uma resposta devida àqueles que a ele se
reportavam.
Até o núncio manifestou-se a d. Alberto, esperando que o incidente terminasse
191
CARNEIRO, Euclides Gomes. Correspondência a d. Alberto José Gonçalves, 9/jun./1919. $&05363,
Ribeirão Preto-SP. (caixa mons. Lauriano)
192
CARNEIRO, Euclides Gomes. Correspondência
a d. Alberto José Gonçalves, 29/jun./1919.
$&05363
,
Ribeirão Preto-SP. (caixa mons. Lauriano)
193
CARNEIRO, Euclides Gomes. Correspondência a d. Alberto José Gonçalves, 24/jul./1919. $&05363,
Ribeirão Preto-SP. (caixa mons. Lauriano)
194
SILVA, D. Duarte Leopoldo e. Correspondência a d. Alberto, 11/jun./1919.
$&05363
Ribeirão Preto-SP.
(Caixa monsenhor Lauriano).
90
respeitando a autoridade do prelado diocesano. d. Alberto respondeu ao núncio Ângelo
Scapardine, esclarecendo:
[...] outras razões que eu não publiquei. O Padre a que se refere o acto
gozava aqui de grande estima porque é dos taes que querem ser populares,
agradam o povo para atiralo contra o Bispo. Graças a Deus a imprensa, a
opinião publica aqui, conhecendo os factos, esta toda ao lado da auctoridade
eclesiástica. Da Parochia onde era vigário estão me pedindo a nomeação
de um novo vigário. mesmo partido a favor da autoridade. Garanto a
V. Excia que foi um espinho que me gravava a consciência que eu tirei.
195
Em relação à imprensa, a realidade não era a descrita pelo bispo. Uma parte dela
apoiou d. Alberto, mas alguns artigos de jornais o atacaram livremente, e a população da
cidade de São José do Rio Pardo pediu um novo vigário quando tiveram certeza de que o
bispo não voltaria atrás em sua decisão.
Em 14 de outubro de 1919, a cúria da diocese de Ribeirão Preto concedeu
196
que o
padre Euclides residisse fora da diocese. Poucos dias depois, em 6 de novembro de 1919, foi
expedida a carta de excardinação do padre Euclides Gomes Carneiro, da diocese de Ribeirão
Preto, para a diocese de Campinas.
Interessante observar que se o episódio foi tratado longamente na mídia de São
José do Rio Pardo e em Ribeirão Preto como questão grave e injuriosa, para a hierarquia da
Igreja tudo não passou de mais um caso de desobediência de um padre para com seu bispo,
pois foi dessa maneira que as notícias foram transmitidas do arcebispado e da nunciatura
apostólica para o Vaticano.
O padre Euclides foi embora da diocese de Ribeirão Preto, a pedido do bispo d.
Alberto. A obediência ao superior era condição básica para um candidato receber ordens. Era
ao bispo que se fazia um juramento estendido a seus sucessores. Transgredir as regras da
Igreja era motivo de expulsão. A pena do padre Euclides foi branda; d. Alberto permitiu sua
saída para outra diocese e, embora distante, ele ainda manteve contato com os responsáveis do
asilo por ele idealizado; visitou a cidade, recebeu homenagens e pediu que, quando morresse,
fosse enterrado em Ribeirão Preto. O conflito entre o bispo e o padre revelou a disputa de
espaço e gerou um clima propício para os ataques à Igreja, porque ordens emanadas de um
195
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência ao núncio d. Ângelo Scapardine, 21/jan./1919.
$6J9
1$%
196
LIVRO de Registros, n. 1, p. 209, 1909-1921.
$&05363
Ribeirão Preto-SP.
91
superior não deveriam ser questionadas. A documentação pesquisada nos arquivos da Igreja,
bem como as notícias publicadas nos jornais, revela dois lados da discussão, um interno, que
não chegou à imprensa, e outro, o do noticiário que atacava a imagem de d. Alberto e
santificava o padre Euclides.
Por parte da Igreja, mostra-se um padre desobediente às ordens do bispo e às
diretrizes que deviam ser seguidas. O outro lado, o da imprensa, revela o desconhecimento
das regras e diretrizes da Igreja, bem como tomaram partido do padre sem levar em conta a
posição e os argumentos do bispo.
Manifestações a favor de d. Alberto e ato de desagravo que o bispo recebeu foram
realizados nas cidades da diocese, como Franca
197
e Ribeirão Preto. O jornal de Ribeirão
Preto $ &LGDGH, partidário da Igreja, convidou e publicou
198
todos os eventos em favor do
bispo, com os nomes das pessoas que aderiram: Homenagem pela sociedade honesta de
Ribeirão Preto, justamente indignada com a campanha infamante movida contra Excelência” ,
que constou de um banquete no Paço Municipal, com a participação das mulheres no salão
nobre.
Encabeçava uma das listas de adesão, publicada no jornal $&LGDGH a assinatura
do Ministro da Marinha, Dr. Veiga Miranda, também havia assinatura de políticos, como Cel.
Joaquim da Cunha Diniz Junqueira, o prefeito João Rodrigues Guião, vereadores, professores,
médicos, advogados, corretores, comerciantes, tabeliães, empresários, fazendeiros,
funcionários públicos, diretores e inspetores de escolas, negociantes, bem como do povo de
Ribeirão Preto que se mobilizou em prol da causa do desagravo à pessoa do bispo.
As mulheres, grandes aliadas da Igreja, puderam participar do evento no salão
nobre. As inúmeras pessoas que acorreram ao almoço mostravam o prestígio e poder do bispo
na sociedade de Ribeirão Preto, certamente algumas pessoas o respeitavam e participavam das
homenagens em deferência à sua pessoa. Outras, por ser um ato social que envolveu a elite
política e econômica, não queriam ficar excluídas.
Qual a importância de comparecer a um ato de desagravo ao bispo? Como líder
espiritual, contava com o apoio dos fiéis, mas como explicar então a presença das autoridades
civis? Seria apenas por serem católicos ou havia algo mais? A colaboração entre os dois
poderes, Igreja e Estado, ao longo da história da República, era uma realidade papável. A
197
VILHENA, José Carlos de. Correspondência
a d. Alberto José Gonçalves. Ribeirão Preto,
$UTXLYRGD&~ULD
PHWURSROLWDQDGH5LEHLUmR3UHWR. Caixa Monsenhor Lauriano. Acompanha a correspondência cópia da Ata da
reunião da Conferência de São Vicente de Paula, de 29/06/1919 assinada pelos membros vicentinos, apoiando o
bispo.
198
Homenagem a D. Alberto Gonçalves .
$&LGDGH
. Ribeirão Preto, 11 janeiro 1922, p. 11
92
Igreja colaborou com as autoridades civis, por meio de sua hierarquia ou de seus padres. O
tema era de foro íntimo da Igreja e, portanto, não feria os princípios liberais da República, daí
ser maiscil explicar a presença dos políticos no ato em prol do bispo.
Das cidades da diocese e de outras dioceses, chegaram telegramas e moções
reafirmando a lealdade em favor de d. Alberto. De São Carlos, por exemplo, o jornal 6mR
&DUORV, órgão da imprensa da diocese, deu a notícia tomando partido de d. Alberto.
Na década seguinte, d. Alberto escreveu uma carta testamento, em 18 de março de
1932, que teve por testemunha o sr. João Alves Meira Junior. Nela, expôs sua angústia e seus
pesares, que, quando chegou a Ribeirão, era um homem público e, apesar dos reveses,
ocupava um cargo de muita responsabilidade. Sua posição exigia uma reputação a ser zelada e
por isso vinha a público para reabilitar sua imagem maculada com o que ele considerava
calúnias. A carta testamento não esclareceu quem e o que foi falado a respeito do bispo. Mas a
vida de d. Alberto, desde os tempos de Curitiba, foi acompanhada de perto pela imprensa.
Nem todo o clero representou uma dor de cabeça para o bispo, vários sacerdotes
exerceram o Ministério seguindo as diretrizes da Igreja, emanadas pelo Vaticano. Em
especial, na sede da diocese, destacamos a presença de monsenhor Lauriano.
199
Nas inúmeras
viagens de d. Alberto, era monsenhor Lauriano que ficava responsável pela diocese e estava à
frente dos negócios eclesiásticos, exercendo o cargo de vigário-geral, ficando incumbido de
pagar as contas, responder às cartas dos padres, atender os leigos, representava o homem forte
de d. Alberto. Foi aconfundido com o bispo, recebendo correspondências que chegavam à
cúria, endereçadas ao sr. bispo monsenhor Lauriano.
Outros prelados também se destacaram por seu trabalho, como monsenhor
Joaquim Antonio de Siqueira (um dos organizadores para a criação do bispado), cônego Assis
Barros (um dos organizadores do Congresso Eucarístico Diocesano de 1940), atuando junto
ao bispo ou na diocese. Outros, silenciosamente, desenvolveram seu trabalho apostólico nas
paróquias, seja como párocos ou vigários coadjutores.
Um dos padres da diocese veio a se destacar mais tarde por outro motivo, bem
mais complexo, o de santidade: padre Donizetti Tavares de Lima, mais conhecido como padre
Donizetti. O padre Donizetti assumiu como pároco da matriz de São José, na cidade de
Tambaú, em 1926, e nas décadas seguintes começou a mobilizar multidões, que para se
199
Monsenhor dr. João Lauriano nasceu na cidade de Mococa, em 13 de março de 1882, realizou os estudos
primários na cidade natal e depois no Seminário Episcopal de São Paulo. Em 1904, matriculou-se no Colégio Pio
Latino Americano de Roma, cursou a Universidade Gregoriana, local em que se doutorou em Teologia. De volta
ao Brasil, em 1910, ocupou vários cargos até ser nomeado em 1927 vigário-geral do bispado, cargo que exerceu
até o dia de sua morte, em 10 de outubro de 1973.
93
dirigiam para receber a bênção que muitos acreditavam milagrosa. O estudo de Reinaldo dos
Santos aponta como o padre é venerado como santo e lhe atribuem inúmeros milagres.
200
)RU P DomRGRFOHUR DFRQVWUXomRGRVHPLQiULR
Como nem todos os padres primavam por esta aura tão especial, d. Alberto, desde
que assumira a diocese, passou a preocupar-se com a formação dos seminaristas, um assunto
importante dentro do esquema da Igreja. Em uma das primeiras cartas circulares, dirigida aos
sacerdotes do bispado, em 10 de março de 1909, d. Alberto pediu:
É uma das nossas mais instantes preoccupações a formação do futuro clero
diocesano; pelo que, se não Nos faltarem os recursos que esperamos,
elevaremos o número dos estudantes do Seminário; e para isso, pode V.
Revdma. ir vendo, desde já, os meninos de sua Parochia que mostrem
vocação para o estado ecclesiastico, intelligentes, piedosos, de filiação
legitima, faça com que Nos requeiram sua admissão à matricula, juntando os
preciosos documentos, afim de serem opportunamente attendidos.
201
D. Alberto reconheceu que era necessário investir na formação dos jovens
candidatos ao sacerdócio para atender as inúmeras paróquias da diocese. Havia uma
recomendação de que os bispos fundassem, em suas dioceses, seminários menores para que os
candidatos “ [...] aprendessem os rudimentos da gramática e humanidades.”
202
Havia paróquias
sem sacerdotes, ou, com eles idosos, o que dificultava a assistência devida aos fiéis. Em 1909,
os candidatos ao sacerdócio na região de Ribeirão Preto freqüentavam o Seminário de São
Paulo e o Seminário de Pirapora.
Na carta de 2 de fevereiro de 1911, em que d. Alberto fez um balanço sobre a
primeira vista pastoral nas paróquias da diocese, revelou o destino das esmolas da
administração do crisma:
200
SANTOS, Reinaldo.&RQVWUXLQGRXPDVDQWLGDGH: os caminhos da reputação santoral do Padre Donizetti
Tavares de Lima . 2000. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e
Serviço Social, Franca-SP, 2000.
201
GONÇALVES, D. Alberto José. Circular. 10 de março de 1909. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
,
p. 91/92.
202
DECRETO de Constituição da Nova Província Eclesiástica de São Paulo. In: LAURIANO, Monsenhor João.
)XQGDomRH,QVWDODomR
do Bispado do Ribeirão Preto (1906-1909). Ribeirão Preto: Cúria metropolitana, s/d, p.
76.
94
Desde a nossa chegada a Diocese até o dia 31 de dezembro último,
recebemos de esmolas, por occasião da administração do Sacramento da
Confirmação, a quantia de 126:925$000 e foi dispendida a de 9:729$ [...].
Resultou, portanto, um saldo de 117:196$000, que dividimos em três partes
iguaes; uma que está sendo empregada na Cathedral, outra destinada ao
Seminário e a educação dos candidatos ao sacerdócio e a ultima á compra do
terreno e a construcção do Palácio Episcopal. Além do déficit que apresenta
o Seminário, temos ainda que solver alguns compromissos assumidos por
motivo da acquisição do edifício na Cidade de Batataes para o
funcionamento d’aquelle estabelecimento que, esperamos, em breve será
installado.
203
Nos anexos que acompanhavam a carta, o bispo especificou as despesas com o
Seminário desde 1909, até dezembro de 1911. As primeiras delas foram pagas ao Seminário
de São Paulo e ao de Pirapora. O dinheiro arrecadado com os emolumentos do crisma foi
usado para o seminário.
No começo do governo, d. Alberto escreveu ao cardeal Arcoverde pedindo sua
aprovação para a construção do seminário. Desconhecemos a resposta do cardeal Arcoverde
para d. Alberto. Mas o teor da carta que o cardeal escreveu para o arcebispo de São Paulo, d.
Duarte, comentando a carta de d. Alberto e identificando todos os motivos pelos quais o bispo
de Ribeirão Preto não deveria abrir um seminário, permite afirmar que ele se posicionou
contra o projeto. Dentre os motivos identificados por d. Arcoverde, estava a dificuldade para
encontrar professores qualificados para assumir as disciplinas. Um aspecto foi considerado
pelo cardeal como mais abusivo por parte de d. Alberto, o de ir na contramão das sugestões de
Roma, que mandara concentrar em seminários centrais e que a Província Eclesiástica de São
Paulo possuía um, que fora construído com grande empenho dos bispos de São Paulo e que
estava à disposição dos bispos da Província. A carta do cardeal considerava um absurdo d.
Alberto ter tamanha pretensão e que ainda alegava ter recebido a aprovação para o projeto do
arcebispo e esperava recebê-la do cardeal. [...] pois a minha, o a terá, terá sim uma
saraivada de impropérios contra este acto [...]
204
A lista de ações consideradas impossíveis de
realizar pelo cardeal ressaltava que o bispo não falava em pequeno seminário, mas em
seminário. O cardeal considerou um abuso por parte do bispo de Ribeirão Preto querer abrir
203
GONÇALVES, D. Alberto José. “ Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a 1
a
visita feita a Diocese”.
In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
, p. 116.
204
ARVOVERDE, D. Joaquim. Correspondência
a d. Duarte Leopoldo e Silva. 22/4/1910.
$&063
, São Paulo.
(Pasta Cardeal Arcoverde).
95
um seminário próprio, quando o arcebispo enfrentava dificuldades para manter o seminário
central da arquidiocese.
Desde o início do século XX, a formação dos seminaristas era direcionada pelas
3DVWRUDLV &ROHWLYDV GRV %LVSRV, as quais incentivavam a que, nos Seminários, a disciplina
fosse rigorosa, juntamente com uma sólida formação espiritual. Recomendava-se que fossem
entregues a uma congregação religiosa capaz de cuidar com zelo e decoro da formação dos
novos padres, prática comum em muitas dioceses.
Durante o período colonial e imperial, o número de seminários no Brasil foi
inexpressivo e o atendeu às reais necessidades em número e qualidade para a formação de
um bom clero. Na segunda metade do século XIX, os bispos passaram a enviar alguns padres
para estudar no Colégio Pio Latino Americano em Roma, o que contribuiu para melhorar o
grau de instrução. Com o advento da República, livre das amarras do Estado e do Padroado
Régio, uma das preocupações da hierarquia da Igreja era sanar as deficiências na formação do
clero.
Segundo Lima, “ [...] a Igreja brasileira foi obrigada a esperar que terminasse a sua
dependência do Estado para atualizar suas relações de dependência com a Igreja européia.”
205
As &DUWDV 3DVWRUDLV visavam assegurar o espaço da Igreja na vida cotidiana
perante a sociedade e o Estado laico. A formação do clero adquiriu importância, pois cabia ao
padre a liderança da comunidade e das inúmeras atividades inerentes à Igreja.
Uma das recomendações da 3DVWRUDO &ROH W LYDGRV%LVSRV de 1915 versava sobre a
formação de Seminários Centrais (cânones 1.252 ao 1.268)
206
, levando-se em conta que nem
todas as dioceses conseguiam formar um seminário com um corpo docente homogêneo e
capacitado. O seminário de São Paulo estava enquadrado nesse formato, e as honras delegadas
pelo papa Pio X contribuíram ainda mais para o elevá-lo à condição de superior diante da
tentativa dos novos bispos da Província de abrir seu próprio seminário.
Analisando por outro ângulo, o que o cardeal Arcoverde alertava na carta para o
arcebispo d. Duarte possuía fundamento. A criação da Faculdade de Filosofia de São Paulo,
reconhecida por Roma, elevou as condições de d. Duarte, como arcebispo, de manter um
205
LIMA, Luiz Gonzaga de S.
(YROXomR3ROtWLFDGRV&DWyOLFRVHGD,JUHMDQR%UDVLO
Petrópolis: Vozes, 1979,
p. 17.
206
EPISCOPADO Brasileiro.
3DVWRUDO&ROOHFWLYD
dos Senhores Arcebispos e Bispos das Províncias
Ecclesiásticas de São Sebastião do Rio de Janeiro, Marianna, S. Paulo, Cuyabá e Porto Alegre. Rio de Janeiro:
Martins de Araújo, 1915, p.316-318.
96
Seminário Central
207
, com todos os candidatos ao sacerdócio das dioceses da Província
Eclesiástica freqüentando a Faculdade de Filosofia mantida sob os cuidados do arcebispo.
Em 15 de julho de 1908 estava instalado o primeiro curso superior da Faculdade
de Filosofia de São Paulo, tendo à frente o abade do mosteiro de São Bento, d. Miguel Kruse,
e o arcebispo d. Duarte, bem como as bênçãos concedidas pelo papa Pio X para o
funcionamento do curso.
Em outras dioceses os bispos esforçaram-se para abrir seminários. Na diocese de
Campinas, instalada no mesmo momento que Ribeirão Preto, d. Nery iniciou a construção do
seminário em 1913 e, em 1915, ocorreu a inauguração do Seminário Diocesano Santa Maria,
de Campinas.
208
Em Ribeirão Preto, d. Alberto insistiu em ter um seminário próprio. Na festa de
encerramento do 1
o
. ano do seminário São José, de Curitiba, em 1896, que ele havia ajudado a
fundar, ressaltou o papel do seminário: [...] o jardim da Igreja, a esperança da religião, vós
sois como o jardim do Bispo e mais tarde entre vós que ele icolher essas árvores vigorosas
que darão frutos as paróquias da diocese.”
209
Essa fala de d. Alberto é significativa para
compreender seus esforços ao longo de décadas para abrir um seminário.
Contando com poucos padres e em número menor os devidamente capacitados
para exercer as funções dentro de um seminário, ficou claro por que d. Alberto encontrou
dificuldades para formar seminário e escola. Na cidade de Batatais, adquiriu a Escola
Agrícola e transformou-a no Colégio Diocesano São José, reinaugurado em 3 de fevereiro de
1912, sob orientação dos padres do Verbo Divino.
210
A propaganda do colégio, em Batatais,
estava nos anúncios de jornais como $&LGDGH, de Ribeirão Preto, com os dizeres de internato,
semi-internato e externato, destinado a alunos com vocação religiosa ou o. Entre 1912 e
1925 os padres “ alemães” cuidaram do colégio e, ao saírem da diocese, o bispo tomou
providências para que outro grupo de religiosos assumisse o Colégio Diocesano.
Em 1925, d. Alberto fez um convite aos Missionários Filhos do Imaculado
Coração de Maria, padres Claretianos, para assumir o Colégio, uma vez que os padres do
Verbo Divino haviam deixado a diocese. A parceria resultou, no ano seguinte, com a venda
do Colégio para os padres claretianos. Em 23 de novembro de 1926, o bispo d. Alberto
207
Cf:
$6J91$%
n. 124, fasc 615.
208
BENCOSTTA, Marcos L. A . Cultura escolar e história eclesiástica: reflexões sobre a ação romanizadora
pedagógica na formação de sacerdotes católicos e o Seminário Diocesano de Santa Maria. (1915-1919).
Campinas, &DGHUQRV&HGHV v. 20, n. 52, novembro 2000.
209
Monografia do Seminário.,
$&0&
. Curitiba.
210
O Colégio São José de Batatais foi fundado em 1905, pelo padre Atílio Cosi, com o nome de Escola Agrícola
São José.
97
consultou o Conselho Diocesano, para vender o prédio do Colégio em Batatais para os padres
da Congregação dos Missionários do Coração de Maria e, com o dinheiro da venda (200
contos de réis), empregar na construção de um seminário diocesano em Ribeirão Preto. O
conselho deu parecer favorável.
211
Tudo indica que era mais fácil manter os seminaristas
estudando em um Colégio em que o bispo apenas pagasse as mensalidades ou outras
despesas. O contrato entre o bispo e os padres Claretianos, assegurava que quinze
seminaristas poderiam estudar gratuitamente, ficando às custas do prelado os livros, vestuário,
medicina e outras despesas. Os seminaristas menores da diocese continuaram a estudar no
Colégio de Batatais até 1931. De 1932 a 1944, os estudos foram realizados em Campinas.
212
Os seminaristas que estudavam em Campinas ou Pirapora tinham dificuldades de
contato com o bispo e assim permaneciam até chegar ao presbiterato. Para reverter esse
quadro, d. Alberto lutou para fundar em Ribeirão Preto um seminário. O prédio ficou pronto
em 1938, mas d. Alberto o conseguiu colocá-lo em funcionamento e cedeu-o aos padres
Estigmatinos.
213
Na &DUWD3DVWRUDO sobre a administração da diocese, em abril de 1938, d. Alberto
informa que ordenou mais de cem sacerdotes. Esse número parece excessivo, mas, lembrando
seu trabalho por quase quatro cadas e considerando a extensão da diocese, o número de
paróquias criadas e o fato de que muitos desses padres eram religiosos Agostinianos,
Beneditinos Olivetanos e Claretianos, entre outros, que não permaneceram na diocese, o
número fica razoável.
Com a chegada de d. Manoel, a obra do seminário, ganhou impulso, pois este
ocupou os cargos de ministro de disciplina, vice-reitor e professor do Seminário Central de
São Paulo, conhecendo de perto a importância da formação para o sacerdócio.
A luta de d. Alberto desde 1909 e, depois de 1940, de d. Manoel, para melhorar a
formação do clero, teve alguns propósitos:
a) alinhar os padres com a proposta da hierarquia da Igreja,
b) levar o catolicismo para aqueles que desconheciam a mensagem do
Cristo,
c) retardar o avanço das outras crenças na região da diocese,
211
LIVRO de Atas
dos Consultores Diocesanos. p. Ribeirão Preto,
$UTXLYRGD&~ULD0HWURSROLWDQDGH
5LEHLUmR3UHWR
212
CORREIA, F. de A.
+LVWyULDGR6HPLQiULR$UTXLGLRFHVDQR0DULD,PDFXODGDGH5LEHLUmR3UHWR
. 2005,
p.28 a 32.
213
SEMINÁRIO Diocesano.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, n. 97, fevereiro 1938, p. 1.
98
d) dar impulso ao culto e às associações religiosas leigas entre os fiéis
católicos.
Os bispos d. Alberto e d. Manoel deram impulso, depois de 1940, à Obra das
Vocações Sacerdotais. Em 1945, d. Alberto conseguiu realizar seu grande sonho, inaugurou o
Seminário Maria Imaculada, no dia 19 de março, na rua Rui Barbosa, em Ribeirão Preto.
214
Era a concretização de um sonho de décadas, necessário para atender à demanda
das necessidades espirituais. O empenho de seu bispo auxiliar, d. Manuel, foi fundamental
para a concretização do sonho. Mais de três décadas separam a carta de d. Alberto, enviada ao
cardeal Arcoverde, pedindo apoio para a construção do seminário, até a concretização do
projeto.
Para exercer o cargo de reitor, veio de São Paulo, cedido pelo arcebispo, o cônego
Sílvio de Morais Matos, do cabido metropolitano daquela cidade. Como ministro de
disciplina, foi eleito o padre Arnaldo Álvaro Padovani. Em entrevista, o cônego Arnaldo
Álvaro Padovani afirma que passou a se dedicar à obra das Vocações Sacerdotais,
percorrendo em 1949 toda a diocese, pregando e buscando recursos.
215
O clero pequeno, volante e, muitas vezes, com pouca instrução representou um
dos entraves para que a obra missionária, seguindo as diretrizes da Igreja tivesse entraves no
governo do primeiro bispo. Em 1945, estava inaugurado não apenas o seminário, mas uma
nova etapa na Igreja de Ribeirão Preto, pois d. Alberto iria falecer em torno de dois meses
depois da inauguração do seminário.
2EUDILQDQFHLUDGDGLRFHVH
Na Igreja do Brasil, pouco ou quase nada se falava sobre o patrimônio, mesmo
porque, a1889, ela possuía a proteção e os subsídios do Estado. Com a separação do Estado
e Igreja, ocorrida com a República, embora o patrimônio da Igreja fosse preservado
legalmente, em muitas municipalidades, por diversos motivos, isso não ocorreu. Durante a
formação da Província Eclesiástica de São Paulo, membros da Secretaria de Estado do
Vaticano deram espaço à discussão sobre o patrimônio das novas dioceses e esse tema ocupou
parte substancial de seus relatórios.
214
CORREIA, Pe. Francisco A.
+LVWyULDGR6HPLQiULR$UTXLGLRFHVDQR0DULD,PDFXODGDGH5LEHLUmR3UHWR
.
2005, p. 37 (edição do autor.)
215
Entrevista da autora em 20/marco/2003. Entrevistado: Cônego Arnaldo Álvaro Padovani.
99
Para a criação de uma diocese, era necessário um bom patrimônio que assegurasse
ao bispo vida decente e ao mesmo tempo o capital necessário para manter o culto com
dignidade. Por esse motivo, o tema do patrimônio foi muito discutido nos relatórios da
Secretaria de Estado do Vaticano.
A criação da diocese de Ribeirão Preto foi realizada sem que o patrimônio exigido
pelo Vaticano estivesse formado. Os relatórios da Secretaria de Estado do Vaticano, sobre a
questão financeira, revelaram que, para a Santa Sé, era mais importante a instalação da
diocese na cidade escolhida pela hierarquia da Igreja, mesmo sem o patrimônio formado, do
que permitir que a região continuasse sem um bispo, um pastor capaz de domar a terra dos
malvados”.
Os representantes da Santa estavam informados das riquezas da região: É
certo poi Che molti dei parroci di quelle parti hanno delle rendite annuali molto superiori a
quelle di parecchi vescovi brasiliani, non esclusi quelli di alcune diocesi da poco create.”
216
Tudo indica que o Vaticano considerava que o bispo poderia obter o patrimônio
necessário depois de instalada a diocese, uma vez que se tratava de uma região rica. Muitos
párocos possuíam uma renda maior do que a dos bispos de algumas dioceses brasileiras. Em
1903, a cidade de Batatais, ao candidatar-se para ser sede de bispado, apresentou para a
Secretaria de Estado do Vaticano um patrimônio suficiente para sustentar o bispo. Junto com
seu projeto, enviou um relatório em que constavam as rendas das cidades da região.
Nesse relatório, a cidade de Ribeirão Preto constava com rendas superiores às
outras cidades da região de Batatais. A escolha da Igreja visava atingir um bom patrimônio no
futuro, pois a cidade possuía uma riqueza considerável, mas o projeto não obteve o êxito
esperado. A análise da documentação indica que a elite de Ribeirão Preto não assumiu a causa
da Igreja e o contribuiu para a formação do patrimônio, conforme as expectativas, fato que
levou os membros da Secretaria de Estado a considerar a região dominada por malvados”,
que não quiseram contribuir para a obra de instalação do bispado.
A Ribeirão Preto i fatti non risposero alle speranze: quando alle
sottoscrizione assicuravano um buon esito, i settari fecero sì. Che molti
ritirassero la propria firma; ma in quelle remote regioni industriose e
216
RAPPORTO
di Mons. Nunzio Del Brasile all’Emo Cardinal Segretario di Stato.
$69
. Fasc 141 Segreteria di
Stato. Sacra Congregazione degli Affari Ecclesiastici Straordinari Brasile. 15 de marzo 1908 p. 22 “ É certo, pois,
que muitos dos párocos daquelas partes tem algumas rendas anuais muito superiores àquelas de alguns bispos
brasileiros, não excluindo aqueles de algumas dioceses há pouco criadas.” Tradução Maria Felisbela Iannazzo
Ferreti.
100
progressive, dominate daí malvagi, è più Che mai necessaria la presenza Del
Vescovo, al quale non riuscirá difficile avere ció Che fa d’uopo.
217
No entanto, para o Vaticano, era preciso dominar, tomar posse da região para
implantar o catolicismo e para isso a presença do bispo era fundamental. Portanto, a execução
do projeto de criação da diocese de Ribeirão Preto ocorreu sem a formação do patrimônio. Na
documentação consultada, não consta que os deres da elite cafeeira da região tivessem
realizado alguma doação substancial. Concretamente, a diocese foi formada com o pequeno
pecúlio, de vinte contos de réis, da residência doada por monsenhor Siqueira
218
, alguns
terrenos e a catedral em construção. Alguns donativos avulsos de particulares ou de paróquias,
cujo montante não foi possível verificar, foram acrescidos a esses bens, de acordo com os
relatórios apresentados ao Vaticano.
Diante da situação descrita, foi natural que uma das providências do bispo fosse
relativa à organização do patrimônio, que passou a constituir um ponto nevrálgico, num
primeiro momento, logo após a instalação da diocese e a preparação para as visitas pastorais.
Um mês depois da posse, d. Alberto escreveu aos vigários abordando o aspecto
financeiro da diocese e enumerou alguns itens como prioridade, tais como: manutenção do
Bispo, manutenção dos alunos no seminário arquiepiscopal, construção da catedral,
construção de um palácio episcopal, construção de uma casa para abrigar os padres idosos.
Os itens citados e a regulamentação dos bens patrimoniais, pertencentes às
fábricas das matrizes, constituíram os primeiros cuidados da obra financeira de d. Alberto. Na
tentativa de obter o dinheiro necessário para as obras, este consultara os padres da diocese
sobre a possibilidade de contar com contribuições mensais ou por trimestre.
219
Na Igreja, o
dinheiro arrecadado na administração do crisma destinava-se à manutenção do bispo e de suas
obras, mas em Ribeirão Preto esse valor não seria suficiente, uma vez que d. Alberto
precisava organizar o patrimônio da diocese. Não temos registros sobre o teor das respostas
dos párocos, mas d. Alberto estava apenas iniciando seu trabalho.
2U JDQL ]Do mR GDV  I iEU LF DV GDVPDWUL]HV
217
RAPPORTOdi Mons. Nunzio Del Brasile all’Emo Cardinal Segretario di Stato. Petrópolis 21 Gennaio 1908,
p. 16/17.
$69
. Fasc 141. “ Em Ribeirão Preto os fatos não responderam as esperanças: quando as assinaturas
asseguravam um bom êxito, os partidários fizeram sim que muitos retirassem a própria assinatura, mas naquela
remota região laboriosa e progressista, dominada por “ malvados”, é mais que nunca necessária a presença do
bispo, ao qual não será difícil ter aquilo que precisa.” Tradução Maria Felisbela Iannazzo Ferreti
218
ASV. Sacra Congregazione degli Affari Ecclesiastici Straordinari. Brasile. 15 de marzo 1908.
219
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência aos vigários. 10/03/1909. São Paulo,
$UTXLYRGD&~ULD
0HWURSROLWDQD
.
101
Ao assumir, em 1909, o bispo certamente conhecia a situação da ausência de
patrimônio, que não fora formado de acordo com as recomendações da Igreja. Era preciso
inicialmente instalar e organizar a cúria diocesana. Os despachos, provisões, decretos e
comunicados, bem como toda a comunicação entre o bispo e o clero, o bispo e os fiéis, eram
realizados por meio da Cúria. O funcionamento ocorria por meio da nomeação de vários
cargos, dentre eles o de vigário-geral, a quem caberia, na ausência do bispo, responder pela
administração do bispado. Tudo indica que nos primeiros tempos da diocese não houve a
escolha de um vigário-geral mas d. Alberto nomeou o padre Dr. Evaristo de Moraes para
secretário e escrivão da Câmara Eclesiástica.
220
Em Ribeirão Preto, oito meses após sua posse, em 22 de outubro de 1909, d.
Alberto, lançou um documento intitulado 5HJXODPHQWRVREUH)iEULFDVH3DWULP{QLR
221
Nele,
o bispo deixou claro que era “ [...] um dos mais graves deveres acautelar os sagrados interesses
dos bens pertencentes às Egrejas [...] e que, para tanto, expedia o documento. D. Alberto
estava a par de algumas das dificuldades para regularizar a situação dos bens patrimoniais da
diocese, uma vez que estava visitando pastoralmente a diocese e conhecera de perto a situação
das fábricas das matrizes.
O documento foi baseado naquele emitido pelo antigo bispo de São Paulo, d. Lino
Deodato R. de Carvalho, de 1893. A regulamentação e a guarda dos bens patrimoniais não
estavam mais sob a responsabilidade do governo republicano. O 5HJXODPHQWR VREUH DV
)iEULFDV consistia em ,QVWUXFo}HVVREUH)iEULFDV e estabelecia as atribuições da fábrica, do
fabriqueiro, da nomeação do fabriqueiro, as disposições gerais, discriminando o papel a ser
exercido pelo fabriqueiro e a função da fábrica de uma matriz: Fábrica é em geral uma parte
dos bens ecclesiásticos ou de seus rendimentos, destinada a conservação e reparos das Egrejas
e às despezas do culto divino.”
222
A fábrica era o centro financeiro da matriz. Elas estavam classificadas, de acordo
com as rendas, em 1
a
e 2
a
categorias. As de 1
a
categoria eram aquelas cujas rendas
ultrapassavam a quantia de cinqüenta mil réis mensais, as de 2
a
categoria, as que excediam
esse valor mensal.
Pertenciam à fábrica da matriz todos os bens móveis ou imóveis, adquiridos por
doação ou compra, os títulos de rendas, as esmolas e doações feitas pelos fiéis; também as
220
LIVRO de Registros n. 1, 1909-1921, p. 5,
$&05363
. Ribeirão Preto-SP
221
GONÇALVES, D. Alberto José. Regulamento sobre Fábricas e Patrimônios das Egrejas do Bispado do
Ribeirão Preto In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
, p. 51-57
222
GONÇALVES, D. Alberto José. Instrucções sobre Fabricas. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
.
1908-1918, p.53.
102
esmolas, que podiam ser recolhidas durante as missas ou nas festas, as doações de casas,
terrenos, fazendas, ou objetos de culto como imagens, caracterizavam parte das doações para
o santo padroeiro da matriz. As alfaias do templo, como toalhas para os altares, cálices,
patenas, crucifixos e outros objetos também eram doados. Os devotos acreditavam que esse
gesto trazia proteção para a família, e a doação compunha parte do agradecimento.
Uma parte dos pré-requisitos para formar uma capela e depois transformá-la em
matriz tem por foco a formação do patrimônio, capaz de sustentar o culto com o devido
decoro. Para controlar e dirigir os negócios financeiros da capela ou das matrizes, os párocos
indicavam e os bispos nomeavam os fabriqueiros, pessoas a quem cabia Arrecadar todos os
utensílios, dinheiro, esmolas, oblações, bens e rendas das Igrejas.
223
Em algumas paróquias,
os próprios párocos exerciam essa função. Uma provisão, permitindo o exercício do cargo de
fabriqueiros para rocos ou leigos, era requisitada na cúria e precisava ser renovada
anualmente pelo bispo.
As atribuições do fabriqueiro se concentravam em administrar os bens da fábrica
da Igreja e prestar contas à autoridade diocesana. Havia um limite de duzentos mil réis de que
os fabriqueiros podiam dispor, com autorização prévia do pároco. As quantias superiores a
esta requeriam uma licença, concedida somente pela autoridade diocesana.
Os fabriqueiros não trabalhavam gratuitamente cuidando do patrimônio. Por essa
razão, o cargo era muito cobiçado. Recebiam um percentual de 10% das fábricas de 1
a
.
categoria e 5% das fábricas de 2
a
. categoria, quantia retirada dos rendimentos anuais, mas não
incidia sobre as doações definitivas. Tudo indica que os fabriqueiros eram incentivados a
trabalhar para passar a brica da matriz para 2
a
categoria, no seu interesse, e aumentando
ainda mais os rendimentos da Igreja. Cabia-lhes o controle sobre os bens patrimoniais da
Igreja, fosse das matrizes ou das capelas filiais. Também cabia registrar e prestar contas para a
cúria diocesana da receita e despesa das matrizes e capelas que estavam sob sua guarda. O
bispo nomeava comissões especiais para determinados fins, como a construção ou reforma
dos templos.
Logo no início, com a instalação da diocese e a chegada de d. Alberto, os
contratos e recibos de aforamento e de laudêmio foram padronizados, numa tentativa de
regularizar a situação, com o envio, pela cúria, de modelos das cartas de aforamento, recibos
dos foros e do laudêmio para os párocos e fabriqueiros. A Igreja possuía o foro, isto é, o
domínio útil sobre os terrenos que a ela pertenciam e cabia à fábrica da matriz cuidar do
223
GONÇALVES, D. Alberto José. Instrucções sobre Fabricas. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
.
1908-1918, p. 18
103
patrimônio. Assim, os terrenos das fábricas eram aforados e pagava-se para usá-los, porque
estavam sob a jurisdição da Igreja. Os pagamentos de foros eram anuais e variavam de acordo
com o tamanho do terreno. O laudêmio consistia num pagamento de dois e meio por cento
sobre o valor das transações de domínio útil do terreno nas vendas ou trocas. O valor podia
variar se fosse estipulado no contrato, num acordo entre as partes.
A 3DVWRUDO &ROHWLYD de 1915 especificava, seguindo a prescrição do &RQFtOLR
3OHQiULR/DWLQR$PHULFDQR, que cabia aos párocos o direito de usufruto das casas paroquiais,
móveis e dependências, mas cabia-lhes o dever de realizar os reparos sem exigir indenização
do prelado diocesano.
224
Para as matrizes, a colaboração das associações leigas nas festas, para obter
fundos para a construção e embelezamento dos templos, foi uma das fontes de recursos ao
lado das doações de particulares. Os membros das associações participavam das comissões
das matrizes e foram eles que, sustentaram financeiramente as obras, com doações ou com o
trabalho nas promoções como quermesses, leilões e tômbolas, ao lado das contribuições mais
humildes de todos os fiéis.
A documentação pesquisada mostrou os desacertos entre os fabriqueiros, párocos
e a cúria de Ribeirão Preto. O problema estava na forma de uso do dinheiro arrecadado pelas
fábricas, na quantidade e na forma de arrecadação. Padres queixaram-se a d. Alberto de que
os fabriqueiros não cumpriam as obrigações e o prestavam contas à fábrica da matriz. Por
sua vez, os fabriqueiros não cobravam os foros, ou cobravam e não conseguiam receber, ou
não prestavam contas. A situação era no mínimo confusa. Uma outra queixa comum entre os
prelados era de que as pessoas pagavam os impostos para as municipalidades e recusavam-se
a pagar pelo uso dos bens da Igreja. Novamente pesava o costume da Igreja pré-republicana
de que os dízimos eclesiásticos eram cobrados pelo Estado.
225
Tendo em vista tal problemática, em 19 de março de 1910, d. Alberto expediu um
novo documento: o 0DQGDPHQWRVREUH DV)iEULFDV
226
, tentando regulamentar, por meio de
uma legislação, o patrimônio da diocese. O texto abordava questões como administração dos
bens, definindo os direitos da Igreja perante a Constituição e a administração pública, e
também abordava os deveres dos foreiros e explicava com detalhes a cobrança do laudêmio.
Convocava os padres e fiéis a protestar contra a usurpação ou ocupação indevida, por parte
224
EPISCOPADO Brasileiro.
3DVWRUDO&ROOHFWLYDGH
Canon. 1183, p. 298-299.
225
OLIVEIRA, Dom Oscar de. 2VGt]LPRVHFOHVLiVWLFRVGR%UDVLO. Nos períodos da colônia e do Império. Belo
Horizonte: Universidade de Minas Gerais,1964.
226
GONÇALVES, D. Alberto José. Mandamento sobre as Fábricas da Diocese do Ribeirão Preto. In:
$UFKLYR
GD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. 1908-1918, p.95-102
104
das Câmaras Municipais ou de particulares, dos terrenos pertencentes à Igreja. Ela se
encontrava respaldada pelas leis republicanas para proteger seu patrimônio e até mesmo
ameaçava com penas eclesiásticas aqueles que burlassem as regras estabelecidas. Queremos
que se considere este Nosso Mandamento como um público e solenne protesto contra a illegal
e injusta occupação dos terrenos das Egrejas feita por quem quer que seja.
227
Apesar dos protestos do bispo, as penas eclesiásticas já não surtiam o efeito
desejado, e muitas pessoas, bem como as municipalidades, alheias a prováveis penas,
cobiçavam o patrimônio que pertencia à Igreja. Ao longo do governo de d. Alberto, ocorreram
inúmeras disputas entre a Igreja e as municipalidades ou particulares. Em tese, o poder
público republicano respeitou o patrimônio das Igrejas, mas houve casos, nos anos que se
seguiram à Proclamação da República, com as municipalidades em expansão, que ocupavam
os terrenos das igrejas. Para mostrar uma das contendas, analisamos a luta do pároco da
cidade de Batatais, Lafayette de Godoy.
Antes de d. Alberto assumir a diocese e lançar o 0DQGDPHQWRVREUHDVIiEULFDV,
na cidade de Batatais, o padre Lafayette de Godoy, entrou em uma contenda que se estendeu
por anos. A disputa surgiu quando a municipalidade resolveu construir um coreto ao lado da
igreja matriz. Em reação, o padre Lafayette escreveu ao núncio apostólico, Alessandro
Bavona, dizendo que havia consultado grandes juristas, como Rui Barbosa, Basílio Machado,
conde Afonso Celso, visconde de Ouro Preto e frei Júlio Maria, o que teve grande
repercussão. O padre encaminhou para o núncio as respostas desses cidadãos, exigindo que a
Igreja tomasse uma atitude, uma vez que considerava que a causa podia ser ganha. Os
pareceres de alguns dos juristas consultados apontavam para a legitimidade da Igreja,
enquanto outros decidiam pela municipalidade na posse do território.
Um desses pareceres, encontrado nos arquivos do Vaticano, a carta do sr. Basílio
Machado ao padre Lafayette
228
, defendia os direitos da fábrica das matrizes, quando as
municipalidades incorriam no erro de obstruir o bom andamento do culto. No verso dessa
carta, o padre Lafayette fez um longo comentário sobre o fato de que o terreno havia se
desincorporado gratuitamente da brica da matriz, que, segundo ele, isso havia acontecido
em Roma, com a Porta Pia, alegando que o foreiro nunca fora o proprietário, apenas tinha
permissão de uso. Para o padre, as Câmaras Municipais tinham direitos restritos de uso.
227
GONÇALVES, D. Alberto José. Mandamento sobre as Fábricas da Diocese do Ribeirão Preto. In:
$UFKLYR
GD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. 1908-1918, p. 96
228
MACHADO, Basílio. Correspondência
ao padre. José L. de Godoy. 29/8/1907.
$6J91$%
fasc. 626.
105
Padre Lafayette tentou mostrar que, se a causa não triunfasse, a maçonaria e o
regalismo é que sairiam vitoriosos.
229
O padre justificava que o parecer de Rui Barbosa,
concordava com o do conselheiro Lafayete Rodrigues Pereira, do visconde de Ouro Preto e de
Olegário de Almeida, na questão entre a Câmara e a fábrica da matriz de Batatais. A consulta
aos grandes juristas significava uma tentativa do padre de fazer justa a causa que reivindicava.
A carta do padre Lafayette foi enviada ao núncio Alessandro Bavona, que
escreveu para a cúria episcopal de São Paulo para saber da postura de d. Duarte. De São
Paulo, em nome de D. Duarte, respondeu monsenhor Francisco de Paula Rodrigues,
escrevendo que o referido padre o estava sendo apoiado pelo arcebispo e que o núncio
poderia contribuir para a situação. No livro de Tombo da matriz do Senhor Bom Jesus da
Cana Verde de Batatais, o padre Lafayette deixou um depoimento sobre o tema: “ Assim, pois,
espero que não seja lavrada a conta da minha inércia ou indifferença a consumação d’este
attentado contra a liberdade da consciência cathólica.”
230
O padre esclareceu que não conhecia os critérios da administração, [...] se estava
nos moldes católicos ou se nos moldes do livre pensamento, da maçonaria e de outros
elementos que formam o bloco contra os direitos seculares da Santa Egreja Cathólica.”
231
O coreto foi construído, apesar do posicionamento de adesão de juristas e de
alguns fiéis ao lado do padre, que refutaram a construção, alegando que o local o era
adequado. As disputas entre o padre Lafayette e a municipalidade, decorrentes de questões
patrimoniais, representaram um problema mais abrangente para a hierarquia da Igreja. Em
várias cidades brasileiras, as fábricas das matrizes e, ou párocos envolveram-se em contendas,
algumas judiciais, numa polêmica sobre a posse de terrenos.
O caso do padre Lafayette envolvia uma disputa com a hierarquia da Igreja
(padre e arcebispo), uma vez que ele havia enviado, em 1903, o projeto de criação da diocese
de Batatais, tentando fazer de sua paróquia sede de bispado. O projeto do padre Lafayette foi
preterido, com a escolha de Ribeirão Preto para sede da diocese. A mais alta hierarquia da
Igreja no estado de São Paulo cansou-se do que chamava as maluquices do padre” e d.
Duarte queixou-se a d. Alberto: [...] não posso, não vou dar explicações a esse maluco.
Finalmente o celebérrimo curato de Batataes ainda acaba por me tirar a paciência, se esse
padre continuar a lançar tanto desaforo[...]
232
229
MACHADO, Basílio. Correspondência ao padre. José L. de Godoy. 29/8/1907.
$6J91$%
fasc. 626
230
LIVRO de Tombo 3DUyTXLDGR6HQKRU%RP-HVXVGD&DQD9HUGH, n. 4, 8/3/1907. Batatais.
231
LIVRO de Tombo da
3DUyTXLDGR6HQKRU%RP-HVXVGD&DQD9HUGH
, n. 4, 8/3/1907. Batatais.
232
SILVA, D. Duarte Leopoldo e Silva. Correspondência a d. Alberto. 9/5/1910.
$&0636mR3DXOR
. (Pasta
Ribeirão Preto).
106
Quais eram os motivos para que o padre criticasse a hierarquia da Igreja que não
se posicionava diante do que ele considerava ser prioridade como a guarda do patrimônio?
Tudo indica que o padre Lafayette, inconformado por o ter conseguido apoio
para a criação do projeto de diocese de Batatais, se opôs a d. Duarte e à cúria da arquidiocese.
Para isso usou a guarda do patrimônio das fábricas das matrizes, instigando bispos, padres e
fabriqueiros a adotarem um critério definitivo a respeito das matrizes e fábrica
233
e criticando
o arcebispo.
A situação era no mínimo contraditória. A Igreja lançava documentos,
recomendando a guarda do patrimônio e, por outro, quando um padre assumia a defesa dos
interesses da Igreja diante da municipalidade, a hierarquia recusava-se a apoiar. Em Batatais e
em outras cidades, a municipalidade saiu vitoriosa da contenda, e a Igreja saiu perdendo.
Haveria motivos políticos? O que ou quem estava errado? Evocando os princípios do
liberalismo, algumas Câmaras Municipais usaram os terrenos da Igreja de acordo com suas
necessidades e sequer consultavam os padres para tanto. De outro lado, padres e fabriqueiros
mal preparados não sabiam administrar com eficiência os bens da fábrica e acabavam
perdendo a sua posse.
Em Ribeirão Preto, a matriz havia se deslocado a pedido da Câmara e, em 1905, o
velho templo foi destruído em razão da reurbanização da Praça XV. O novo templo que, em
1905, estava nos alicerces, situava-se a poucos quarteirões de distância do antigo. Situações
semelhantes ocorreram em outras cidades brasileiras. O crescimento urbano levou as
municipalidades de algumas localidades a adquirir os terrenos da fábrica da matriz. Em alguns
lugares, a Igreja cedeu gratuitamente seus terrenos para a construção de escolas
234
, usinas de
luz
235
, entre outras. A contribuição da Igreja para a expansão das vilas e cidades permitiu que
ela ganhasse espaço.
Após a proclamação da República, as maras Municipais passaram a cobrar
impostos das igrejas e paróquias. Algumas, sem recursos, contraíam dívidas com as
municipalidades. Algumas dívidas foram negociadas pelos párocos, outras foram executadas.
O vigário coadjutor de São Simão, padre Lafayette de Godoy, alegou não ter recursos para
233
GODOY, Padre José Lafayette. Correspondência ao núncio. 5/10/1909.
$6J91$%
. fasc 626. D. Alberto
removeu o padre Lafayette de Godoy para a cidade de São Simão.
234
LIVRO de Registro n. 1, 1909- 1929, p.34. Ribeirão Preto,
$&05363
Despacho concedendo a doação de
terreno para a Câmara de Vargem Grande para construção das Escolas Reunidas.
235
LIVRO de Registro n. 1, 1909- 1929, p.34. Ribeirão Preto,
$&05363
p. 28. Despacho concedendo a
doação de terreno da cachoeira para construção de usina para instalar luz e energia em Mato Grosso do Batataes
(hoje Altinópolis), em 5/11/1913.
107
pagar a dívida de cerca de 150$000 mil réis, com impostos, água e esgoto, da fábrica da
matriz com a Câmara Municipal.
236
Em Santa Rita dos Coqueiros (hoje ssia dos Coqueiros), a matriz entrou em
litígio com a mara Municipal de Cajuru, reivindicando a posse de um terreno do cemitério
antigo. A vila de Santa Rita dos Coqueiros pertencia à comarca de Cajuru. O barão Ribeiro
Barboza, prefeito de Cajuru, afirmou que [...] não acreditava que a Igreja fosse oprimir uma
Câmara que sempre mostrou condescendente com os assuntos da religião.”
237
A Câmara
acusou a Igreja pelo uso do terreno sem devida posse. Dessa forma, se havia dívida, esta devia
ser paga pela Igreja.”
238
Na realidade era a população que contribuía para a construção das
obras, seja com seus impostos para a municipalidade, ou com os dízimos e doações para a
Igreja.
No relatório apresentado à Secretaria de Estado do Vaticano, em 1914, por
ocasião da visita $G/LPLQD, d. Alberto afirmou que os emolumentos paroquiais eram pobres,
confirmando o estado de penúria e as dificuldades econômicas que encontrou para formar o
patrimônio do bispado.
239
As disputas entre as municipalidades e a Igreja foram inúmeras e nem sempre foi
possível conhecer o desfecho de todas elas. Para a Igreja, outro ponto ainda era mais grave: o
desvio de dinheiro dentro da própria instituição, envolvendo padres, fabriqueiros ou os fiéis.
236
GODOY, José Lafayette de. Correspondência a d. Alberto José Gonçalves. 16/5/1909.
$UTXLYR3~EOLFRH
+LVWyULFRGH5LEHLUmR3UHWR63)XQGR-RVp3HGURGH0LUDQGD$3+53)-3063
. Ribeirão Preto-SP
237
BARBOZA, Barão Ribeiro. Correspondênciaao padre Nicolau Paraggio. Cajuru, 16/9/1910. $3+53)-30
63
Ribeirão Preto-SP.
238
Ibid.
239
RELAZIONE della diocese di Ribeirão Preto Vaticano,
$6J91$%
Fasc. 687
108
2V  GH V Y LRVHQYROYHQGRRV  I DEU LTX HLURV
Um dos desacertos envolvendo um fabriqueiroocorreu no final de 1920 para 1930,
envolvendo a capela de Nossa Senhora Aparecida, hoje matriz da cidade de Itirapuã. A capela
pertencia à paróquia de Nossa Senhora do Patrocínio, em Patrocínio Paulista. A paróquia
estava com os padres agostinianos, que ficaram envolvidos com o sumiço do fabriqueiro e
desvio de dinheiro. O pároco, Frei Alexandre Gonçalvez
240
, escreveu ao monsenhor Lauriano
que o fabriqueiro da capela de Itirapuã desaparecera e que achava importante nomear outro,
para evitar irregularidades no patrimônio.
As irregularidades existiam: uma dívida de 8:673$000 (oito contos e setecentos
e setenta e três mil reis), dinheiro que fora desviado da construção da capela Nossa Senhora
Aparecida de Itirapuã.
241
Frei Alexandre foi ameaçado de execução dessa dívida pelo
advogado José de Giovani, de São Paulo, o qual o possuía nenhum documento que a
provasse. O padre consultou a comissão de obras da capela, a respeito da dívida, e juntos
resolveram não autorizar o pagamento sem a devida licença dos superiores. Era preciso o aval
de d. Alberto e do superior dos Agostinianos, uma vez que a paróquia de Nossa Senhora do
Patrocínio, localizada na cidade de Patrocínio Paulista, à qual pertencia a capela de Nossa
Senhora Aparecida, de Itirapuã, estava confiada aos padres Agostinianos.
O advogado José de Giovani alegou executar judicialmente a dívida se ela não
fosse liquidada com o sr. Antonio Miglioranza. Acusou os padres de serem maus pagadores e,
por meio de monsenhor Lauriano, pediu ao bispo para interferir para não precisar recorrer às
vias judiciais, visto que [...] dois sacerdotes de uma ordem religiosa, vigário e provincial
insistem em negar uma dívida.
242
A respeito dessa dívida, encontramos uma única referência no livro de Tombo da
matriz de Nossa Senhora do Patrocínio, feita pelo padre Innocente Oses e que fala das
reformas da matriz, e não da capela de Itirapuã, mas o nome do empreiteiro corresponde ao da
execução da dívida.
A princípio de junho de novecentos e vinte e oito, esta matris de Patrocínio
do Sapucahy passou por uma grande reforma exterior, foi pintada a óleo pelo
240
GONÇALVES, Frei Alexandre. Correspondência
a Monsenhor Lauriano. 8/4/1935.
$&05363
Ribeirão
Preto. (Pasta Monsenhor Lauriano).
241
GONÇALVES, Frei Alexandre. Correspondênciaa d. Alberto José Gonçalves. 7/6/1936.$&05363,
Ribeirão Preto-SP. (Pasta Monsenhor Lauriano).
242
GIOVANNI, José Di. Correspondência a monsenhor Lauriano. São Paulo, 19/06/1936.
$&05363
Ribeirão Preto-SP. (Caixa Monsenhor Lauriano).
109
empreitero Antonio Miglioranza, pela quantia de 15 contos de réis, dinheiro
este, que consegui com algumas festas feitas ad hod pagando essa
importância logo de concluído o serviço, como consta do recibo guardado na
Fábrica. Patrocínio do Sapucahy, 19 de agosto de 1928.
243
A solução do caso o apareceu na documentação pesquisada e a dívida em
questão representou apenas uma das inúmeras situações em que o patrimônio da Igreja foi
desviado para outros fins, seja por fabriqueiros leigos ou ainda por parte de alguns padres.
O crescimento urbano, no início do século XX, requereu um cuidado especial por
parte da Igreja, com relação ao seu patrimônio, uma vez que em torno de muitas capelas,
depois matrizes, surgiu a urbe, em terreno invariavelmente pertencente à Igreja. A ocupação
por parte das Câmaras Municipais e ou particulares, trouxeram problemas, usurpando da
autoridade jurídica da Igreja a posse dos terrenos.
O aforamento e o laudêmio dos terrenos pertenciam à brica da matriz e ao
fabriqueiro cabia realizar a sua cobrança. As fábricas das matrizes tinham problemas em
cobrar o que lhes era devido, com os fabriqueiros queixando-se de que para as maras
Municipais os foreiros pagavam sem nenhuma dificuldade e para a fábrica das matrizes
mostravam relutância. Pagar para a municipalidade representava um ponto, outro era pagar
para a Igreja, num país que reconhecia na Constituição a liberdade de culto.
A fábrica das matrizes cedia terrenos aos foreiros, ou seja, aos arrendatários, sob a
condição de cobrar um determinado preço. O número de foreiros variava de acordo com o
patrimônio das fábricas, em alguns locais chegou a ser considerável. Parte dessa história na
região da diocese de Ribeirão Preto está ainda para ser pesquisada e analisada.
Artigos foram escritos e publicados em jornais da época, referindo-se ao problema
da ocupação dos terrenos pertencentes à Igreja. A separação entre Estado e Igreja no Brasil,
em 1889, foi tranqüila e segura, uma vez que a Igreja não teve seu patrimônio seqüestrado,
como em outros países da América Latina, como o México e a Colômbia. No caso
brasileiro
244
, a separação foi um acordo amigável entre d. Macedo Costa, representando a
Igreja, e seu aluno Rui Barbosa, representando o Estado. A posse dos terrenos das fábricas das
matrizes estava assegurada através do artigo 119
A da Constituição de 1891, que separava o
Estado da Igreja e estabelecia a liberdade de culto, mas assegurava à Igreja o direito de manter
suas posses.
243
LIVRO de Tombo
da Paróquia de Nossa Senhora do Patrocínio. n. 1, p. 102.
$&')U63
. Franca-SP.
244
MANOEL, Ivan Aparecido. Dom Macedo Costa e Rui Barbosa: a Igreja Católica na Ordem Republicana
Brasileira.
3yV+LVWyULD
, Assis, v. 5, 67-81, 1997.
110
Nas décadas seguintes, em meio a uma urbanização no interior do estado de São
Paulo, os terrenos da fábrica das matrizes foram vendidos ou doados às municipalidades.
D. Alberto ou seus procuradores negociaram com as municipalidades os terrenos
que pertenciam à Igreja. Em algumas paróquias, ao realizar sua visita pastoral, o bispo
aproveitava para fechar negócios, como na cidade de Patrocínio do Sapucahy (Patrocínio
Paulista). O registro do livro de Tombo da matriz de Nossa Senhora do Patrocínio revelou que
o município comprara alguns terrenos, pela quantia de trinta contos de is, com juros anuais
de seis por cento ao ano.
245
O patrimônio da matriz foi por nós vendido a Câmara Municipal,
que conforme a escriptura, paga os juros annualmente, devendo pagar a importância da venda
no praso determinado na data da escriptura.
246
O detalhe do contrato, assinado em 14 de
junho de 1924, permitia que a municipalidade pagasse a dívida em trinta anos, com juros de
seis por cento ao ano. A municipalidade se comprometeu a pagar dez contos de réis por ano,
podendo ser renovado no caso de ambas as partes concordarem. Não há elementos que
permitam afirmar ou refutar que a quantia foi paga à Igreja.
D. Alberto foi um bispo preocupado com as questões administrativas, tanto
quanto com as espirituais. Uma regulamentação enviada a toda a diocese padronizava a ação
das fábricas, na compra e venda de alguns dos bens patrimoniais da diocese. Por duas
ocasiões pediu o parecer dos consultores diocesanos
247
: em 23 de novembro de 1926, ao
vender o prédio do Colégio Diocesano de Batatais, e a segunda vez, em 10 de março de 1937,
ao vender casas do patrimônio diocesano por cem contos de réis.
Outro episódio ocorreu quando o padre Euclides deixou a cidade de Ribeirão
Preto em 1915 e, portanto, a administração do Centro Operário São Benedito. Este Centro
criado por padre Euclides, era uma escola profissional, com maquinário de carpintaria e
mecânica, que fora incorporada ao patrimônio do bispado após disputa com a Câmara
Municipal. A escola fora construída com a mensalidade dos associados do Centro Operário e
outros donativos. Padre Euclides, em 1915, propôs para a Câmara assumir o passivo de 20
contos de réis do Centro Operário. O bispo interferiu, assumindo o Centro Operário e a
dívida. O local em que estava construído o Centro fora doado por João Baptista Nogueira
Borges e sua esposa, que doaram o terreno para a capela de São Benedito, conforme escritura
245
LIVRO de Tombo da matriz de Nossa Senhora do Patrocínio, n. 1, p. 140 .$&')U63, Franca-SP.
246
LIVRO de Tombo da Matriz de Nossa Senhora do Patrocínio. n. 1, p. 140.
$&')U63
, Franca-SP.
247
LIVRO de Atas dos Consultores Diocesanos, 1
o
. de março de 1924, p.
$&05363
Ribeirão Preto-SP. O
grupo de consultores em 1924 compunha-se de Monsenhor Joaquim Antonio de Siqueira, Cônego Carlos
Cerqueira, Pe. Dr. João Lauriano, Pe. Manuel Vinheta, Pe. Joaquim Alves Ferreira.
Os consultores eclesiásticos eram reconhecidos pelo saber e virtudes, que auxiliavam o bispo com conselhos
oportunos no governo da diocese e nos negócios de maior importância.
3DVWRUDO&ROOHFWLYDGH
. Can 1039
p. 270
111
passada em cartório, no dia 6 de maio de 1907. D. Alberto decidiu reinstalar a irmandade que
havia sido afastada por padre Euclides. Registrou em cartório o terreno da irmandade de São
Benedito, assegurando a posse do patrimônio. A disposição dada pelo bispo foi a de construir
a capela de São Benedito, inaugurada com bênção em 8 de abril de 1920.
248
Desde 1909, d. Alberto tentava regularizar as fábricas das matrizes. Em abril de
1924, viu-se obrigado a expedir novo documento: 0DQGDPHQW R VREUHR3DWULP{QLR, e o bispo
foi taxativo ao escrever: Queremos que se considere este Nosso mandamento como um
público e solemne protesto contra a illegal e injusta occupação dos terrenos das igrejas feita
por quem quer que seja.”
249
O teor do texto é elucidativo, os terrenos da Igreja estavam sendo ocupados por
particulares ou pelas municipalidades, sem a devida autorização. O novo documento, apoiava-
se no Código Civil, do dr. Teixeira de Freitas.
A Nunciatura Apostólica revelava a preocupação com a manutenção do
patrimônio e das condições de vida do clero, na tentativa de realizar um balanço sobre as
condições financeiras das dioceses. Para isso questionava a respeito das condições
econômicas das mitras e do clero, se existiam nas dioceses conventos, igrejas de propriedade
de ordens religiosas abandonadas ou mal administradas.
250
A posse de um bom patrimônio era
fundamental para a ação missionária e caritativa da Igreja e ainda permitia a construção de
templos em locais onde as igrejas protestantes estavam sendo erguidas.
Apesar dos percalços políticos financeiros enfrentados pela administração da
diocese, houve desde o início uma preocupação construtiva por parte de d. Alberto. O balanço
financeiro do primeiro ano de seu governo, na diocese de Ribeirão Preto, mostrou um bispo
capaz de em pouco tempo levantar a quantia de mais de cem contos de réis, adquiridos
principalmente com as esmolas do crisma.
Desde a nossa chegada a Diocese até o dia 31 de dezembro último,
recebemos de esmolas, por occasião da administração do Sacramento da
Confirmação, a quantia de 126:925$000 e foi dispendida a de 9:729$ [...].
Resultou, portanto, um saldo de 117:196$000, que dividimos em três partes
iguaes; uma que está sendo empregada na Cathedral, outra destinada ao
248
GONÇALVES, D. Alberto José. Sobre a Capella de S. Benedicto. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR
3UHWR
. 1918-1923, p. 31-33.
249
GONÇALVES, D. Alberto José. Mandamento sobre Patrimônios. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR
3UHWR. 1924-1928. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1924, p.6; $UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR. 1918-
1923. Ribeirão Preto: Typ. Livro Verde, 1924, p. 31-33.
250
CIRCULAR da Nunciatura Apostólica Brasil, Petrópolis, 18 de março de 1909.
$&063
São Paulo. (Pasta
D. Duarte Leopoldo e Silva).
112
Seminário e a educação dos candidatos ao sacerdócio e á ultima á compra do
terreno e á construcção do Palácio Episcopal. Além do déficit que apresenta
o Seminário, temos ainda que solver alguns compromissos assumidos por
motivo da acquisição do edifício na Cidade de Batataes para o
funcionamento d’aquelle estabelecimento que, esperamos, em breve será
installado.
251
A construção do palácio episcopal, obra de relevância, foi realizada gras à
contribuição financeira do bispo. A inauguração do palacete, em 13 de abril de 1912, contou
com a presença de vários membros da elite eclesiástica, dentre eles, o arcebispo d. Duarte
Leopoldo e Silva. Os jornais noticiaram a inauguração e a grande festa dos moradores.
O arcebispo d. Duarte e sua comitiva, nessa ocasião, visitaram, entre outros
lugares, a Santa Casa e a Câmara Municipal. Na mara, o prefeito Joaquim Macedo
Bittencourt
252
ressaltou que: [...] não estava quebrando as normas democráticas da Câmara
Municipal [...]”
253
Para o prefeito a Igreja sempre exercera um papel importante na sociedade.
A separação entre a Igreja e o Estado não tirou o seu prestígio e manteve sua soberania.
Como receber na Câmara Municipal um arcebispo e outros bispos da Igreja
católica sem ferir os sentimentos dos membros anticlericais ou que professavam outras
crenças? O discurso do prefeito mostrou que era possível.
Os católicos representavam uma parcela importante da população brasileira, mas
era preciso atenção com outras crenças e ao mesmo tempo a autoridade eclesiástica perdia
espaço diante das autoridades civis.
A visita do arcebispo de São Paulo era providencial para reafirmar que, ao lado da
inauguração do palácio episcopal e do avanço da construção da catedral, a Igreja católica em
Ribeirão Preto era atuante, a ponto de ter suas autoridades recebidas pela municipalidade.
A construção da catedral drenou por décadas vultuosos recursos e foi iniciada
antes da instalação do bispado. Em 1919, d. Alberto declarou ter destinado à catedral sessenta
contos de réis de seu bolso, e sessenta e dois contos teriam vindo da fábrica da paróquia. D.
Alberto prosseguiu com as obras e acabou contraindo uma dívida pessoal de 100:262$620 réis
(cem contos, duzentos e sessenta e dois mil e seiscentos e vinte réis). O bispo afirmou que
251
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a 1
a
visita feita a Diocese.
In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. 1918-1923, p 116.
252
PAZIANI, R. R.
&RQVWUXLQGRD3HWLW3DULV
: Joaquim Macedo Bittencourt e a Belle Epoque em Ribeirão
Preto 1911-1920. 2004. Tese (Doutorado em História). Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de
História, Direito e Serviço Social, Franca-SP, 2004. A obra traz uma análise sobre a cidade de Ribeirão Preto e o
governo do prefeito Joaquim M. Bittencourt.
253
OS NOSSOS hospedes.
$&,'$'(
Ribeirão Preto, 16/abril/1912, p. 1
113
fizera as dívidas confiando em promessas de doações. D. Alberto, não citou os que se
comprometeram, mas listou benfeitores, como o cel. Francisco Schmidt, que se comprometeu
a doar o órgão para a catedral. A comissão das senhoras contribuiu com 3:273$000 (três
contos, duzentos e setenta e três mil réis) e junto com outros donativos avulsos das senhoras
Carolina Maciel, Josephina de Freitas e Ilydia Uchoa, foi possível comprar dois
confessionários, os genuflexórios da capela do Santíssimo Sacramento, bancos e mobílias.
254
Testemunho de sua contribuição financeira, d. Alberto deixa, em 1938, em uma
Carta Pastoral: [...] quantia superior a duzentos contos de réis, como se pode verificar da
escripturação no livro próprio [...]”
255
Declara ainda que a procedência desse dinheiro, os
anos em que serviu a Nação e dos negócios que dissolveu em Curitiba”, foram empregados
nas obras da diocese de Ribeirão Preto.
O pintor Benedito Calixto foi contratado por d. Alberto para executar uma parte
da pintura decorativa da catedral. Benedito Calixto, amigo de d. Duarte, havia trabalhado em
São Paulo, na matriz de Santa Cecília e no Seminário Central. A pedido do bispo d. Duarte,
realizou o quadro QDXIUiJLRGRQDYLR6tULR(a morte do bispo d. José). A contratação de um
pintor especialista em arte sacra para as obras na catedral de Ribeirão Preto poderia ter por
trás a sugestão do arcebispo, uma vez que ele realizou trabalhos em muitas cidades da
Província Eclesiástica de São Paulo, como na diocese de São Carlos.
D. Alberto preocupava-se com o embelezamento do interior da catedral. O
trabalho de Benedito Calixto estendeu-se de 1916 a 1922 e custou aos cofres da diocese trinta
e um contos e quinhentos mil réis. A quantia, considerável para a época, foi paga para o
artista pintar as seis telas da vida de São Sebastião, o padroeiro da diocese. Os painéis
compreendem: Restituição da fala ao Neofita Zoe, Seras defensor da Igreja de Jesus Cristo, A
comunhão sobre os mártires nas prisões de Coliseu, O Interrogatório de Dioclesiano, Primeiro
martírio de São Sebastião, Segunda condenação de São Sebastião.
256
Maria E. Borges aponta
Benedito Calixto com um lugar de destaque na pintura do início do culo XX e identifica
que, além de Calixto, outros pintores contribuíram para decorar a catedral, como Rodolfo
Mosselo, Caetano Abate e Romolo Borzi.
257
Outro pintor que trabalhou na decoração interna da catedral foi Joaquim
254
GONÇALVES, D. Alberto José. Sobre as Obras da Cathedral. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
.
1918-1923, p. 22
255
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a sua Administração da
Diocese . %ROHWLP'LRFHVDQR, Ribeirão Preto, ano 9, n.99, p. 1-5, abril 1938.
256
BORGES, Maria Elizia.
$SLQWXUDQD³&DSLWDOGR&DIp´VXDKLVWyULDHHYROXomRQRSHUtRGRGD3ULPHLUD
5HS~EOLFD
. Franca-SP: Unesp, 1999, p. 49
257
BORGES, M. E., 1999, p. 50.
114
Gonçalves Netto D’ Athaide. De sua obra temos a seguinte referência:
A conclusão da decoração interna da mesma ficou sob a responsabilidade do
pintor português, autodidata, Joaquim Gonçalves Netto D’ Athaide (1891-
1948), que veio de São Paulo em 1924 com a imcumbência de decorar as
naves laterais da Catedral, contando com ajuda de Armando Battaglia e
Caetano Somma.
258
A pintura decorativa da catedral tem por temas a sagrada família e os santos da
Igreja católica. Retrata cenas da vida cotidiana de Maria, José e Jesus na sua infância. As
cenas contribuíam para a evangelização, inspirando os fiéis devotos a estabelecer uma relação
mais íntima com Deus, copiando o modelo da família de Jesus ou dos santos. A linguagem da
evangelização transmitida pela pintura era fundamental, pois a população da cidade era em
grande parte analfabeta.
Os altares laterais da catedral, erguidos com os santos de devoção da comunidade,
completam a decoração. Os autores (pintores, escultores) colocaram sua marca pessoal tanto
nas pinturas como nas esculturas do santos que não seguem um padrão. As imagens revelam
as diferentes épocas em que foram confeccionadas, ao longo do século XX, pois apresentam
estilos artísticos diferenciados.
A catedral era o ponto chave de todas as manifestações dirigidas pelo bispo e seus
padres. As principais reuniões religiosas, tais como a festa do Congresso Eucarístico
Diocesano, as missas da festa do santo padroeiro, a posse de d. Manuel, celebrações das
missões, concentrações das associações religiosas, ordenação de presbíteros, entre outras,
foram celebradas na catedral.
D. Alberto, ao mesmo tempo que se dedicou à ação do apostolado, buscou meios
para angariar fundos para a construção da catedral e outras obras, orientando os párocos na
tentativa de regularizar o patrimônio das fábricas das matrizes, tarefa que a documentação
revela que nem sempre foi realizada a contento.
Mas nem todas as paróquias possuíam um rico patrimônio e como não havia
cobrança de dízimos organizada, a Igreja precisava criar outros dispositivos para sua
manutenção. As irmandades leigas, em diferentes ocasiões, fizeram as vezes de um banco
para as matrizes, emprestando dinheiro, mesmo irregularmente, para que os vigários e
258
BORGES, M.E., 1999, p. 63.
115
coadjutores realizassem obras, tais como reformas e ou construção de templos.
259
Monsenhor
Lauriano alertou o fabriqueiro da matriz de São Simão
260
que a reforma da casa paroquial e as
despesas com a chegada e posse de novo pároco não entravam no rol das despesas da fábrica e
para esses fins precisavam arrumar dinheiro em outras fontes. As outras fontes, certamente,
eram as contribuições dos fiéis devotos. O exemplo da matriz de São Simão serve para
explicar o fato de que as casas paroquiais não entravam na conta da fábrica, porque muitas
delas pertenciam ao patrimônio particular dos párocos. No entanto, aqueles que não possuíam
capitais suficientes para adquirir um imóvel viviam em casas que, mesmo pertencendo ao
patrimônio da Igreja, eram reformadas e aparelhadas com o dinheiro procedente de doações
da comunidade, da família, etc. Por esse motivo é que também encontramos párocos residindo
em casas mais simples e outros em residências suntuosas.
A colaboração dos membros das associações, das elites políticas e econômicas, ao
lado de doações espontâneas de particulares e contribuições dos mais humildes dos fiéis,
representou uma das principais fontes de recursos para a construção e embelezamento dos
templos.
Uma preocupação do arcebispo e dos bispos da Província Eclesiástica de São
Paulo era a situação dos colonos italianos e dos padres que vieram para dar assistência a eles.
No estado de São Paulo estava concentrado um grupo importante de imigrantes. A região de
Ribeirão Preto recebeu muitos deles, e os italianos representavam, de longe, o maior
número.
261
Os colonos italianos católicos freqüentavam a Associação de Santo Antônio. Para
d. Alberto, o caso da Associação de Santo Antonio, freqüentada por colonos italianos, era
grave.
262
Era preciso explicar à Santa qual era a real situação dos colonos. Muitos deles
moravam próximo às cidades e nas fazendas havia capelas visitadas periodicamente pelos
padres. A assistência espiritual e a administração dos sacramentos não eram descuradas como
se noticiava na Itália. A percepção do bispo era clara, o desejo do enriquecimento e da
259
DECLARAÇÃO do vigário de São Simão sobre empréstimo contraído entre a Irmandade de São Sebastião
com a fábrica da matriz. 6/4/1930. $3+53)-3063, Ribeirão Preto-SP.
260
LAURIANO, Mons. João. Correspondência a Octaviano Pinto Ribeiro. 15/6/1937.
$3+53)-3063
,
Ribeirão Preto.
261
A obra de Thomas Walker e Agnaldo Barbosa, 'RV&RURQpLVD0HWUySROH, traz uma tabela sobre a imigração
para o Estado de São Paulo por nacionalidade. WALKER, W. T. & BARBOSA, A de S.'RVFRURQpLVD
PHWUySROH)LRVHWUDPDVGDVRFLHGDGHHGDSROtWLFDHP5LEHLUmR3UHWRQRVpFXOR;; Ribeirão Preto: Palavra
Mágica, 2000, p. 24/25
262
Uma pesquisa mais acurada sobre a Associação de Santo Antônio pode revelar qual o percentual dos colonos
italianos nos quadros da associação. Apenas referências foram encontradas nas correspondências trocadas entre a
cúria de São Paulo, Ribeirão Preto e o Vaticano. Outros documentos mais pontuais da associação não foram
encontrados nos arquivos pesquisados. Outras dioceses da Província Eclesiástica de São Paulo também estavam
envolvidas na discussão sobre o tratamento recebido pelos colonos italianos no Brasil.
116
melhoria da condição de vida era o sonho de muitos imigrantes que cruzaram o Atlântico. As
acusações foram encontradas de ambos os lados.
D. Alberto acusou a irmandade de Santo Antônio, sobre a qual ele alertava o
arcebispo de que tinha dúvidas se ela não era a responsável pela causa da escassez de
dinheiro, pois remetia [...] contos e contos de réis para a Itália e desconfio que o são
celebradas essas missas [...]
263
A irmandade de Santo Antônio preocupava também o arcebispo d. Duarte, que
sabia da necessidade de coibir os abusos praticados, de disciplinar as zeladoras, que ele
considerava muito independentes, pois recolhiam as intenções de missas às escondidas,
fugindo dos bispos e párocos, e que, apesar dos esforços, essa associação existia em várias
dioceses, como as de Curitiba, Campinas e Ribeirão Preto.
As cartas retratando o sofrimento dos colonos no Brasil chegaram a sugerir a
criação de uma diocese italiana no estado de São Paulo. A Santa Sé não aceitou a sugestão.
264
Em 1918, d. Alberto tomou uma medida mais drástica na diocese de Ribeirão
Preto, para acabar com os abusos de cobrança de dinheiro nas intenções de missas, fechou a
Associação de Santo Antônio de Pádua. No entanto, fundou uma nova associação, a Pia
União Diocesana de Santo Antônio de Pádua, sob a direção do padre Carlos Pedrazzani.
265
A
manobra de d. Alberto tinha em vista o coibir os abusos, mas controlar os bens da
associação, que era proprietária de um terreno, mantinha um Boletim mensal e, de acordo com
o bispo, estava construindo um hospital. A nova associação possuía estatuto jurídico, uma
diretoria e era proprietária da capela Santo Antônio. Em 1920, d. Alberto a confiou aos padres
Beneditinos Olivetanos
266
, estendendo, em 1923, os poderes de percorrer as fazendas da
região, para celebrar, confessar e angariar donativos, conseguir novos associados, apenas
comunicando os rocos da localidade.
267
Para a Igreja de Roma, era importante tirar das
mãos das zeladoras (es) o controle da associação para que este ficasse exclusivamente nas
mãos dos padres e do bispo. O bispo de Ribeirão Preto cumpria as determinações
recomendadas por Roma e pediu aos padres Beneditinos Olivetanos ajuda para disciplinar os
abusos que ocorriam.
263
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência
a d. Duarte Leopoldo e Silva. 8/7/1909.
$&063
, São
Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
264
Cf:
$6J91$%
. Fasc. 116, n. 125.
265
GONÇALVES, D. Alberto Jose. Sobre a Associação de Santo Antonio. 26/8/1918. In:
$UFKLYRGD'LRFHVH
GR5LEHLUmR3UHWR
. 1918-1923. Ribeirão Preto: Typ. Livro Verde, 1924, p.11-12
266
GONÇALVES, D. Alberto José. Sobre a Associação de Santo Antonio. 2/7/1920. In: $UFKLYRGD'LRFHVHGR
5LEHLUmR3UHWR
. 1918-1923, p. 35.
267
GONÇALVES, D. Alberto José. Sobre a Associação de Santo Antonio. 30/4/1923. In:
$UFKLYRGD'LRFHVH
GR5LEHLUmR3UHWR
. 1918-1923. Ribeirão Preto; Typ. Livro Verde, 1924, p. 63.
117
9LVLWDDGOLPLQD
Como forma de obediência à Santa Sé, em abril de 1914, d. Alberto partiu para
Roma, para fazer sua primeira visita $G/LPLQD, acompanhado do arcebispo de São Paulo, d.
Duarte, e do bispo eleito de Florianópolis.
268
Enviou uma carta de despedida ao povo de sua
diocese em 4 de abril de 1914. Em seu lugar, assumiram a diocese monsenhor Joaquim
Antonio de Siqueira, padre Euclides Gomes Carneiro e padre Luis Góez de Conrado. Na carta
em que se despediu da comunidade, o bispo anunciou que: Vou ver em Roma a Mãe e
Mestra de todas as Egrejas, sempre firme e inabalável, resistindo a todos os assaltos das
potestades infernaes, columna e firmamento da verdade, sede indefectível, onde o erro jamais
teve assento.”
269
A visita $G/L PL QD, considerada de suma importância dentro da política vaticana,
representava a possibilidade de estar com a suprema autoridade da Igreja, o papa, como
realizar uma peregrinação ao centro da vitalidade do culto católico, ou seja, o Vaticano. A
visita $G/LPLQD deveria ser realizada pelos bispos a cada cinco anos.
A viagem de d. Alberto, em 1914, era a primeira vez que o bispo saía do Brasil. O
núncio apostólico, d. José Aversa, escreveu para a Secretaria de Estado do Vaticano
270
,
apresentando d. Alberto e elogiando seu trabalho na tentativa de melhorar a vida dos
imigrantes italianos que chegavam às fazendas de café e eram maltratados por seus patrões.
Esse voto de louvor do núncio era importante para d. Alberto, pois, no Vaticano, chegavam
cartas com queixas a respeito da situação dos imigrantes italianos no Brasil, considerada
calamitosa. Uma carta do núncio, referindo-se aos bons serviços do bispo, representava uma
pérola no FXUULFXOXP de d. Alberto.
A carta do núncio relata a construção do palácio episcopal, inaugurado em 1913, e
a catedral quase finalizada. Os elogios continuaram alegando que o bispo estava prestando
bons serviços à Igreja e que atuava nos bastidores da política. Para o núncio, uma das
intervenções de d. Alberto, barrando a candidatura de um maçom, Rodolfo Miranda, ao
governo de São Paulo, mostrava seu fiel serviço a causa da Igreja.
268
Arcebispo Metropolitano. Jornal São Carlos, n. 200, 22 de abril de 1914.
D. Joaquim Domingues Oliveira, bispo de Florianópolis de 1914 a 1967. Desde 1927 a diocese de Florianópolis
passou a Arquidiocese, sendo d. Joaquim o primeiro arcebispo.
269
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta de despedida. Ribeirão Preto, 4 de abril de 1914. In:
$UFKLYRGD
'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto: Typ. Guimarães, 1918, p. 147-148.
270
AVERSA, D. G. Correspondência
a Rafaelle Merry Du Val. 20/4/1914.
$6J91$%
Fasc 733, n. 146.
118
D. Alberto levou também um relatório que foi apresentado ao papa e à Secretaria
de Estado do Vaticano, com informações sobre a diocese após cinco anos de trabalho.
271
Descrevia o aumento do número de paróquias, de trinta e seis, no início de seu governo, a
quarenta e duas, e que mais três paróquias estavam sendo preparadas. Outros temas abordados
foram a construção do palácio episcopal e da catedral; sobre esta afirmou que a construção
estava em estágio adiantado. Relatava sobre a organização do patrimônio da diocese, a vinda
de religiosos para atender a instrução e a assistência aos enfermos e lamentava que o clero
ainda era pouco numeroso, com 53 padres seculares e 10 seminaristas. Mostrava que, nesse
intervalo de tempo, havia conseguido dar andamento em algumas obras. Nas palavras do
núncio, o bispo de Ribeirão Preto havia feito muito, mas os dados apontavam para uma
situação geral precária.
Quanto aos religiosos, o relatório apontou a presença de 6 sacerdotes
Agostinianos e 2 irmãos; 3 Maristas; 2 sacerdotes dos Missionários de La Salette; 3
sacerdotes, missionários de São Carlos. As religiosas estavam representadas pelas Filhas de
Maria Auxiliadora, com 4 damas e 28 irmãs; Zeladoras do Sagrado Coração de Jesus, com 5
damas e 15 irmãs; Pia União Jesus Maria José, com 4 casas e 30 irmãs; Missionárias
Franciscanas do Egito, com um colégio e 4 irmãs; Irmãs de São José, com um colégio e 13
religiosas. Os religiosos ajudavam e assumiam algumas paróquias, como os Agostinianos,
mas o número de padres diocesanos e religiosos era pequeno para atender o crescimento da
população, que estava na casa de 750 mil pessoas.
Não temos nenhuma indicação sobre a conversa, em audiência particular no dia 2
de junho, entre d. Alberto e o papa Pio X, que havia criado a diocese de Ribeirão Preto.
Depois de concretizada a parte oficial da visita, d. Alberto fez algumas
peregrinações na Europa antes de retornar ao Brasil. O bispo, quando chegou à Europa,
desembarcou em Portugal, de Lisboa, partiu para Paris e depois para Roma. Conheceu
Florença, Veneza, Milão, Gênova, na Itália; Suíça, Alemanha, França e Bélgica. Na França,
participou do Congresso Eucarístico em Lourdes, local em que permaneceu de 18 a 27 de
julho de 1914. Retornou ao Brasil no mês de agosto, depois de quatro meses fora da diocese.
No que seria a segunda visita $G /LPLQD de 1920, d. Alberto enviou o relatório
por meio de d. Francisco do Rego Maia, que fez a visita em nome do bispo em 28 de março
de 1921. Na ocasião, d. Alberto, enfrentava problemas na diocese com um de seus padres e
talvez por isso não tenha sido a Roma, enviando relatório por portador.
271
Cf: ASgV-NAB. Fasc. 687.
119
Em 1925, d. Alberto fez sua segunda e última visita $G/LPLQD. Saiu de Ribeirão
Preto, no dia 13 de abril de 1925, teve audiência com o papa no dia 18 de maio de 1925,
retornando a Ribeirão Preto no dia 11 de agosto, conforme nota do 'LiULR
272
Da segunda
viagem existem poucas referências, apenas alguns trajetos são conhecidos através de seu
'LiULR. A segunda visita durou três meses.
Quanto aos relatórios das visitas seguintes, estes o desconhecidos, pois, nos
arquivos do Vaticano, o limite de período da documentação aberta à pesquisa impediu uma
consulta a outros anos. Em Ribeirão Preto, nada encontramos para o período pesquisado.
Desconhecemos os motivos que d. Alberto teve para não realizar nenhuma outra visita $G
/LPLQD a Roma. A documentação civil e eclesiástica consultada mantém um silêncio sobre o
tema. De 1930 para 1940, as freqüentes queixas de abalo na saúde do bispo e o avanço da
idade podem representar uma justificativa para a ausência nas outras visitas.
Apesar de sempre ter viajado muito entre Curitiba e o Rio de Janeiro, quando
estava na política, mais tarde, entre Ribeirão Preto e as cidades da diocese ou para outras,
como São Paulo e as estações de águas termais
273
, as duas viagens identificadas para o
exterior foram as de visitas $G/LPLQD, de 1914 e 1925.
2FXOWRHDVDVVRFLDo }HVOHLJDV
Os bispos da Província Eclesiástica Meridional, reunidos em Aparecida, no estado
de São Paulo, de 1
o
. a 7 de setembro de 1904, deixaram um documento, orientando os passos
da Igreja, de conformidade com o Concílio Plenário Latino-Americano, que ocorreu em 1899.
O documento orientou para o bom exercício de suas funções e sugeriu como proceder nas
mais variadas situações cotidianas. Incentivou os bispos e padres a convidar os membros das
associações, como as Conferências de São Vicente de Paulo, Apostolado da Oração, Senhoras
da Caridade, para auxiliar em várias obras:
1
o
. O Cathecismo dominical para meninos e meninas nas parochias e nas
fazendas ou sítios;
2
o
. promover os baptizamentos dos adultos, deixados sem baptismo por
descuido de seus Paes;
3
o
. a preparação dos meninos para a 1
a
Communhão e Chrisma;
4
o
. a legitimação das uniões civis e o casamento dos concubinários;
272
GONÇALVES, A J.
1RWDV
de vários fatos de minha vida e das viagens que fiz dentro e fora da diocese
(1908-1944). Manuscrito.
273
D. Alberto visitou anualmente as estações termais de Sônia, em Valinhos, e a de Poços de Caldas.
120
5
o
. a obra das vocações ecclesiásticas.
274
As diretrizes citadas abordavam todos os aspectos da vida cotidiana, inserindo o
fiel na Igreja por meio dos sacramentos e da doutrinação do catecismo. Era preciso
arregimentar braços para a obra sacrossanta da realizar na terra o reinado de Cristo e para isso
a fundação das associações dirigidas pelos padres representava um elo importante entre a
hierarquia da Igreja e os fiéis.
Na primeira &DUWD3DVWRUDO dirigida aos fiéis, d. Alberto sugeriu aos padres que
fundassem em suas paróquias a Conferência de São Vicente, uma vez que, para o prelado, os
vicentinos representavam um apoio imprescindível na evangelização e na ação social. Foi o
início do incentivo, por parte de d. Alberto, para uma ão dos leigos nas atividades sociais e
de evangelização.
275
O programa proposto pelos bispos da Província, em 1904, envolvia os leigos na
ajuda para bom o êxito das obras e administração dos sacramentos. Era o começo da tentativa,
ainda tímida, de atribuir algumas tarefas para os leigos, que, excluídos de interpretar a Bíblia
como os protestantes, vivendo no Brasil um catolicismo de fachada, ignorantes das coisas da
Igreja, precisavam de uma melhor instrução para exercerem a tarefa de cooperadores dos
padres num mundo em que a sociedade urbana e industrial se contrapunha às coisas de Deus.
Os novos bispos da Província de São Paulo seguiram a cartilha, buscando atuar, seja
diretamente ou nos bastidores, para implantar a ação romanizadora, contando com a ajuda dos
leigos dirigidos pelos padres.
$VIHVWDVVDJUDGDV
A criação da diocese e a chegada do bispo em Ribeirão Preto, em 1909,
impulsionaram e movimentaram os fiéis nas cerimônias religiosas da região, aumentou o
número de associações laicas e de confrades agremiados, o que resultou em uma participação
mais intensa na vida religiosa, estendendo-se em alguns aspectos a uma ação social, ainda que
caritativa.
Um dos problemas que a Igreja enfrentou foi o fato de que o povo praticava
manifestações de religiosidade, mas a fé era pouco consistente, [...] o povo ignorava os
274
EPISCOPADO Brasileiro. 3DVWRUDO&ROOHFWLYD dos Bispos da Província Ecclesiastica Meridional do Brasil.
Rio de Janeiro, Leuzinger, 1904, p. 24.
275
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto:
Typ. Guimarães, 1918, p. 25-36.
121
ensinamentos da religião [...]”
276
Essa constatação, por parte das lideranças da Igreja,
contribuiu para fazer pressão, o que, para uma parcela dos membros da hierarquia da Igreja,
significava voltar os olhos para a vida pública.
A inserção do catolicismo entre as camadas populares era pouco consistente, pois
era pequeno o conhecimento que os fiéis possuíam da fé que professavam. A Bíblia, livro
sagrado para os católicos, pertencia ao universo do clero. Poucos fiéis adentravam no
conhecimento profundo das verdades da fé. A situação foi lentamente mudando com a
implantação da ão Católica nos anos 1930, mas, mesmo assim, somente após o Concílio
Vaticano II houve uma maior inserção dos leigos na Igreja.
A articulação pregada por padres, como Desidério Deschand, Leonel Franca, entre
outros, anunciava como solução um maior engajamento da Igreja e dos leigos numa ampla
participação na vida pública, inclusive política, ocupando espaços na sociedade para que cada
vez mais os chamados inimigos da cristandade ficassem à margem deles. Mas essa articulação
ainda não se fazia presente integralmente no seio da Igreja no início do século XX.
Por ocasião da instalação da diocese de Ribeirão Preto, um dos suportes com que
os padres contavam eram as associações e as festas, que consistiam num pequeno retalho num
tecido maior, usando as festas para catequese.
As celebrações festivas, realizadas ao longo do ano litúrgico, contribuíram para
aumentar o prestígio da Igreja na sociedade local e serviram de forma de arregimentação e
pregação da palavra de Deus. As festas principais, estavam centradas nas celebrações da
Semana Santa e do santo padroeiro.
As cerimônias da Semana Santa contavam com inúmeros rituais, que preparavam
a festa considerada pelos católicos a mais importante: a Páscoa. O início da quaresma era
marcado pela quarta-feira de cinzas, iniciada com jejum. Os rituais da via-sacra eram
celebrados todas as sextas-feiras, que também eram dias de jejum, lembrando aos fiéis o
sofrimento do Cristo e incentivando a seguir seus passos. O ápice da quaresma se estendia do
domingo de ramos até sábado de aleluia, com as procissões, vias-sacras e outros rituais
próprios do período. Várias procissões eram celebradas nas paróquias, como a de ramos, do
encontro, da via dolorosa; o sermão das sete palavras antes da procissão do Senhor morto e
outras cerimônias de acordo com a presença do pároco ou o. As celebrações, feitas em
latim, pouco exigiam dos fiéis, que assistiam passivos ao culto e ouviam os sermões, que
representavam o ponto alto de uma celebração. Os programas das celebrações eram
276
BRUNEAU, 1974, p. 74.
122
publicados nos jornais, convidando a população para as cerimônias. Os padres esmeravam-se
no preparo, sabendo que um grande número de fiéis freqüentava os templos nessas datas para
cumprir os mandamentos. De acordo com eles, eram obrigatórias para os fiéis, durante a
quaresma, a confissão e a comunhão na Páscoa. A obrigação da comunhão pela Páscoa levava
o fiel a se confessar. A insistência dos padres para com os fiéis na prática dos sacramentos era
maior com aqueles que freqüentavam as associações laicas e que estavam mais próximos de
um controle por parte do clero. A Semana Santa representou o ápice da participação dos fiéis
nas cerimônias, seguida das festas do santo padroeiro.
Os santos, como intercessores, são valorizados por seus poderes mágicos, às vezes
mais do que por sua moral.
277
As festas realizadas aos santos intercessores permitiam uma
mobilização das comunidades nas matrizes e capelas para a parte sacra e a parte profana.
O santo padroeiro era celebrado com missa cantada, novena, terço, tríduo, sermão,
para o qual convidavam padres oradores de outras paróquias. A festa era acompanhada de
quermesse, leilões, entre outras atividades consideradas profanas mas necessárias para
arrecadar fundos, que eram empregados nas construções e ou reformas das igrejas.
Em 1910, na cidade de Ribeirão Preto, quase um ano depois da posse de d.
Alberto, a festa de São Sebastião, o padroeiro da diocese, o contou com a presença do
bispo, uma vez que ele estava em Curitiba
278
, mas a ausência, de acordo com os jornais da
época, não afetou o brilhantismo da festa.
O culto a São Sebastião era bastante difundido na região, e as paróquias que
pertenciam à diocese celebravam a devoção com festas.
279
Apesar do intenso processo de urbanização, as festas sacras constituíam um
acontecimento esperado pelas gentes que habitavam a cidade de Ribeirão Preto, que afluíam
das cidades e vilas vizinhas, bem como da zona rural, habiitada por boa parte da população.
As encíclicas papais incentivavam o culto à Virgem, ao Sagrado Coração e a
Cristo Rei, recomendando a prática dos exercícios espirituais como um auxílio para a
salvação eterna.
280
277
FRANCO JUNIOR, H.
$(YD%DUEDGD
Ensaios de Mitologia Medieval. São Paulo: Edusp, 1996.
278
GONÇALVES, D. Alberto José.
1RWDV
de vários fatos da minha vida e das viagens que fiz dentro e fora da
diocese (1908-1944). (Manuscrito)
279
FREITAS, N. M. B. de. A devoção a São Sebastião em Ribeirão Preto. In: SAMPAIO, J. H. (Org.).
6D~GH
GLQKHLURHDPRU
estudo da vivência religiosa a partir dos seus sujeitos. Piracicaba: UNIMEP/CEHILA, 2004, p.
165-171.
280
As Encíclicas “ E supremi Apostolatus ( Sobre a Restauração de tudo em Cristo) do Papa Pio X; “ Mens
Nostra” (Sobre os Exercícios Espirituais) , “ Miserentissimus Redemptor” ( Sobre o Sagrado Coração de Jesus) e
Quas Primas” (Sobre Cristo Rei), do Papa Pio XI, são alguns dos documentos da Igreja que incentivavam a
prática de exercícios espirituais.
123
A participação dos membros das associações nas festividades programadas pela
Igreja envolvia a relação do fiel com o santo padroeiro, com a Virgem Maria e com o criador.
Os pedidos estavam inseridos numa concepção que envolvia a trilogia: saúde, dinheiro e
amor.
281
As práticas de religiosidade, revelavam que o povo acreditava na mágica vinda da
parte do sagrado que amenizava as agruras da vida e enchia de esperança os corações ao
participarem de eventos que envolviam as emoções no seu aspecto lúdico. São Sebastião, um
santo do período colonial, um santo ligado às forças da agricultura, começava a perder espaço
para outros cultos mais próximos da identidade urbana, como Imaculado Coração de Maria,
Sagrado Coração de Jesus, introduzidos na liturgia pela Igreja romanizada.
A Igreja, por sua vez, aproveitava essas ocasiões festivas para mostrar sua força e
arregimentar um número maior de fiéis, começando com as crianças e chegando até os mais
velhos, que, agremiados nas associações leigas, recebiam orientação dos sacerdotes e eram
controlados pelo binômio: confissão/comunhão, que funcionava como palavras gicas para
esse tipo de controle e chegava mais facilmente por meio das mulheres nas questões
familiares e morais.
A importância das festas pode ser atestada quando o lançamento de uma pedra
fundamental para a construção de uma capela se transformava num motivo de grandes
comemorações, como ocorreu com a capela
282
de Nossa Senhora da Consolação, da
Arquiconfraria de Nossa Senhora da Consolação, localizada na igreja de São José, em
Ribeirão Preto, pertencente aos padres Agostinianos Recoletos. O culto, sob a invocação da
Virgem da Consolação
283
, padroeira da ordem dos Agostinianos Recoletos, foi introduzido na
região de Ribeirão Preto pelos padres dessa ordem, revelando parte da espiritualidade dos
frades, pois, até por volta de 1870, o Brasil, possuía apenas três paróquias
284
com essa
invocação. Uma grande festa foi organizada para a construção da capela de Nossa Senhora. da
Consolação, em maio de 1916, que contou com a presença do bispo d. Alberto, das
autoridades religiosas e civis, da elite local e dos membros do Colégio Santa Úrsula,
281
SALINAS, Maximiliano. Salud, Dinero y Amor: Uma inspiración festiva y popular para la historiografia Del
cuerpo. In: SAMPIO, Jorge H.
6D~GH'LQKHLURH$PRU
estudo da vivência religiosa a partir dos seus sujeitos.
Piracicaba: CEHILA/UNIMEP, 2004.
282
LIVRO de Obras
Notáveis da Residência de Ribeirão Preto dos padres Agostinianos, 21/2/1912.
$UTXLYRGD
3DUyTXLD6mR-RVp
Ribeirão Preto-SP.
283
LIVRO de Tombo da Paróquia de Nossa Senhora do Patrocínio. n. 2, p. 138-139.
$&')U63
, Franca-SP.
Traz o relato da correspondência entre o bispo e o vigário sobre a irmandade de Nossa Senhora da Consolação.
284
BEOZZO, J. O & MARQUES, L. C. L. Oragos de Paróquias, na primeira evangelização do Brasil. In:
SAMPAIO, J. H.
6D~GHGLQKHLURDPRU
: estudo da vivência religiosa a partir de seus sujeitos. Piracicaba:
Unimep/Cehila, 2004, p. 120.
124
Apostolado da Oração, Rosário Perpétuo, Filhas de Maria, Corte de São José, entre outras
escolas e associações leigas.
A presença dos membros das associações nas procissões e festividades permitia
que estes se destacassem diante do restante da população, que não fazia parte das
agremiações. O uso da vestimenta, dos símbolos, como fitas e medalhas, bem como o local
ocupado nas procissões e nos templos, junto aos estandartes de cada associação e muitas
vezes carregando o andor do santo padroeiro, fazia a diferença.
O programa festivo da Arquiconfraria de Nossa Senhora da Consolação era
similar a outras festividades, mas a presença de d. Alberto abrilhantou a festa e ele aproveitou
para discursar. Homem público, político nato, carregava em seu FXUULFXOXPo dom da oratória,
que sempre rendeu elogios por onde discursou.
Em todas as festas religiosas, os sermões e discursos do clero davam ênfase ao
projeto da Igreja de transformar a sociedade em um lugar onde Cristo reinasse. O que chamou
a atenção especial para esta cerimônia foi que, no final da celebração, o padre Agostinho,
representando os Agostinianos Recoletos, ordem proprietária da capela de São José, nos deu
uma pista de que as relações entre o poder religioso e o civil o eram inamistosas e que a
separação entre o Estado e Igreja estava mais no papel do que nas ações cotidianas; o citado
padre encerrou a cerimônia de lançamento da pedra fundamental dando vivas ao Brasil
católico, ao presidente da República, ao bispo d. Alberto, à religião católica e à cidade de
Ribeirão Preto. Os séculos de ligação do Estado com a Igreja, por meio do 3DGURDGR5pJLR,
não foram esquecidos tão facilmente pela população, que, muitas vezes alheia à posição mais
intransigente em relação à Igreja dos republicanos que advogavam a separação total do Estado
com a Igreja, o se sentia constrangida em participar de uma cerimônia festiva em que o
padre louvava a pátria e a Igreja ao mesmo tempo.
Em outra ocasião, em agosto de 1932, ao relatar a cerimônia de bênção e entrega
das fitas às primeiras aspirantes da associação Filhas de Maria, na matriz de Nossa Senhora da
Piedade, na cidade de Altinópolis, o padre José Murillo registrou no Tombo: [...] A
cerimônia foi comovente a Igreja estava ricamente enfeitada e cheia de fiéis desejosos de
contemplar o espetáculo até então novo na matriz [...]”
285
Os padres, reconheciam que as
cerimônias consistiam um verdadeiro espetáculo, uma festa conduzida pela hierarquia da
Igreja, que demonstrava sua força e poder nessas ocasiões. É importante lembrar que, em
1932, eram dias difíceis na região por causa da Revolução paulista, e uma festividade
285
LIVRO de Tombo da Paróquia de Nossa Senhora da Piedade, n. 2,
$UTXLYRGDSDUyTXLDGH1RVVD6HQKRUD
GD3LHGDGH±$OWLQySROLV
-SP.
125
revestida dos elementos sacros servia para amenizar as agruras dos tempos em que o estado de
São Paulo estava envolvido na luta constitucionalista.
As ocasiões citadas representam uma amostra do que ocorria nas cidades
pertencentes ao bispado, igual a outras dioceses do Brasil, em que as festividades
significavam um momento propício para o clero seguir o que era determinado pela hierarquia
da Igreja na orientação dos fiéis católicos.
Alguns meses do ano possuíam celebrações específicas com grandes festas e
rituais. No mês de março, a festa de São José; de maio, Nossa Senhora; junho era dedicado ao
Sagrado Coração de Jesus; em outubro, o Rosário; em novembro, as almas do Purgatório, e
em dezembro, a festa da Imaculada Conceição. De maneira geral, todas as paróquias da
diocese realizavam, em maior ou menor escala, essas festas específicas. Durante as festas, as
pregações, ao lado dos inúmeros rituais, contribuíam para enquadrar os fiéis na manutenção
do culto divino. Apesar dos esforços de muitos padres, o povo seguia à margem de uma
evangelização mais profunda.
Na cada de 1930, a pedido de d. Alberto, a cúria diocesana iniciou um
levantamento da situação das capelas na diocese, com o intuito de identificar e regularizar o
patrimônio e dirigir as festas. Cada paróquia enviou um relatório para a cúria, discriminando
as capelas que existiam e a situação delas.
Muitas capelas funcionavam em terreno doado para a Igreja, enquanto outras, em
terreno particular. Identificou-se que havia capelas com a escritura pública irregular, outras
sem escritura. Para a Igreja o problema estava com aquelas que funcionavam em terreno
particular fora de seu controle.
Numa das capelas, localizada na cidade de Jardinópolis, num terreno pertencente a
d. Pequena do Nascimento, era realizada uma das maiores festas da diocese: a festa do Senhor
Bom Jesus da Lapa.
A festa do Bom Jesus, de devoção popular, criou durante o governo de d. Alberto,
uma polêmica que foi parar no fórum. O culto ao Bom Jesus da Lapa, introduzido por uma
devota num terreno particular, abriu um precedente importante que obrigou o bispo a tentar
interditar a festa, sem, contudo, chegar ao bom êxito. Uma festa popular concorrida, que
mobilizava milhares de pessoas, obviamente gerava lucros que não chegavam aos cofres da
Igreja.
Nos primeiros tempos da festa, os padres da cidade de Jardinópolis, local em que
esta se realizava, eram convidados para celebrar, mas depois foram impedidos e lançaram, a
pedido do bispo, um interdito sobre ela.
126
Essa festa ficou temporariamente proibida para os fiéis católicos da diocese.
Encontramos notícias a respeito dela na seção policial dos jornais da época. Tumultos, brigas
e outras arruaças, eram considerados comuns naquela que foi a festa mais combatida durante
alguns anos pela Igreja. A capela e a festa foram idealizadas a partir de uma promessa feita
por uma senhora e, como eram de propriedade particular, estavam à revelia da autoridade
eclesiástica.
Inicialmente, monsenhor Lauriano, pároco da paróquia de Nossa Senhora
Aparecida, de Jardinópolis, era convidado e realizava a parte religiosa da festa, e eram
requeridas as devidas licenças na cúria diocesana.
286
Como a dona da festa o quis se
submeter à autoridade eclesiástica, a Igreja passou a conclamar os fiéis a não comparecerem à
festa.
Durante o período em que a Igreja viveu o regime do padroado régio, na colônia e
no Império, os festeiros possuíam autonomia, e os padres eram contratados para a parte
religiosa das festas dos santos padroeiros e das irmandades. Esse costume permaneceu durante
os primeiros anos da República.
Regulamentando esse costume, d. Alberto lançou, em 1918, um Regulamento
para as Festas”, seguindo as regras estipuladas na 3DVWRUDO&ROHWLYDGRV%LVSRV. Essa 3DVWRUDO
coibia as ações particulares de festeiros que não se submetessem às diretrizes da Igreja sobre
os procedimentos referentes às festividades religiosas. O Regulamento para as festas”
tentava disciplinar, por meio da autoridade dos padres, as festas. Para a Igreja, ao evitar os
abusos, as bebedeiras, jogatinas e imoralidades que vinham acompanhadas de crimes
hediondos, ela restaurava o sentido sacro das festas, de interiorização, conversão e piedade
filial ao santo devoto ou à Virgem. As esmolas arrecadadas, outro ponto a ser destacado no
Mandamento” , deviam ser impedidas de ficar em mãos alheias, e o balancete da festa deveria
ser lido nas missas e publicado na imprensa local, discriminando a receita e a despesa, e os
documentos comprobatórios ficariam na sacristia à disposição de quem quisesse verificar as
contas.
Em Jardinópolis, os responsáveis pela festa do Bom Jesus da Lapa não quiseram
passar a escritura pública de doação do terreno da capela para a paróquia e também não
prestavam contas da festa, uma das exigências feitas pelo vigário e confirmada pelo bispo.
287
Esses episódios fizeram com que a festa ficasse à revelia da autoridade eclesiástica e
286
LIVRO de Registros, n. 1, 1909-1921, p. 157. $&05363 Ribeirão Preto-SP. (Despacho para procissão em
louvor do Senhor Bom Jesus da Lapa, Jardinópolis com data de 2 de agosto de 1917).
287
CORREIA, F. de Assis.
$SHTXHQDGR1DVFLPHQWRHR%RP-HVXVGD/DSDGH-DUGLQySROLV
(1913-1950).
Brodowski-SP, 2005, p. 70 et seq.
127
constituíram pontos de discórdia, levando o vigário a protestar e tentar impedir a sua
realização. O litígio continuou com o novo vigário, padre Jayme Noguera, que acabou criando
uma nova festa na matriz, freqüentada pela elite local, enquanto a festa da Lapa constituía o
lugar dos pobres, esquecidos, negros, mestiços e mulatos, enfim, a população marginalizada
da sociedade.
Em diferentes ocasiões, monsenhor Lauriano exortou os fiéis devotos da cidade de
Jardinópolis e região para não freqüentar, classificando a festa “ [...] como uma afronta
ostensiva à Auctoridade Ecclesiástica [...]”
288
A questão envolvendo as autoridades eclesiásticas e os organizadores da festa
durou alguns anos. Em 26 de julho de 1934, poucos dias antes da data prevista para a
realização da festa, d. Alberto lançou um novo apelo a respeito da presença dos católicos:
[...] declaramos incursas em gravissimas penas as pessoas que tomarem parte
em taes actos, ou aos mesmos prestarem quaisquer auxilio directo ou
indirecto, devendo ser consideradas excluídas da comunhão cathólica,
perdendo, em conseqüência, o direito as graças espirituaes, e ficando
privadas dos suffragios da igreja, depois da sua morte.
289
A autoridade eclesiástica tomou medidas drásticas para coibir a participação dos
fiéis na festa e chegou ao extremo de expulsar 49 congregados marianos, dos 85 que
compunham a Congregação na cidade de Jardinópolis.
290
Uma irmã do Apostolado da Oração
pediu ajuda a monsenhor Lauriano, justificando a situação e a promessa que havia feito ao
Senhor Bom Jesus. A resposta do monsenhor foi que ela estava errada, pois os católicos
sabiam da proibição, explicou que a festa estava proibida por não ser oficializada pela
autoridade eclesiástica e que o bispo não queria proibir o culto, mas, sim, regularizar.
D. Alberto almejava que a capela e o culto, que funcionavam alheios à autoridade
do clero, passassem a ser controlados pela Igreja. A ausência do controle da Igreja sobre o
patrimônio e a festa incomodava o bispo e o clero, isso requeria cuidados e medidas que o
bispo tomou, como proibindo o culto e a freqüência dos fiéis católicos devotos do Senhor
Bom Jesus; quem incorria no erro era punido com expulsão de associações leigas, impedido
288
LAURIANO, Monsenhor. Appello aos Catholicos de Jardinópolis. 20/06/1931
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão
Preto-SP, n. 54, p.1-2, jun. 1934.
289
GONÇALVES, D. Alberto. Capella do Senhor Bom Jesus da Lapa de Jardinópolis. 26/07/1934. %ROHWLP
'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto-SP, n. 55, p. 1-2, jun. 1934.
290
CORREIA, F. de A
$3HTXHQDGR1DVFLPHQWRHR%RP-HVXVGD/DSDGH-DUGLQySROLV
(1913-1950).
Brdowski, 2005, p. 76
128
de ser padrinho de batismo ou ainda marginalizado. As autoridades eclesiásticas deixaram
claro que aqueles que a freqüentavam estavam desprezando as determinações emanadas da
autoridade religiosa. A Igreja acusava a festa de ser lugar seguro para [...] alcovitar ladrões,
batedores de carteira dos pobres romeiros, é um verdadeiro descalabro e escândalo pois não
tem nenhum fim religioso.”
291
Os tempos em que os fiéis dirigiam as festas dos santos ficaram para trás. O novo
modelo de Igreja exigia que somente os padres poderiam dirigir as festas e as associações.
Medidas repressivas foram tomadas por ela em toda parte para coibir os abusos dos fiéis que
insistiam na desobediência às regras.
A festa da Lapa confirmava que a Igreja o estava preparada para lidar com as
situações que envolviam o povo, com as grandes manifestações populares de , a posse de
patrimônio e relação com as autoridades eclesiásticas. A atitude do bispo e seus
representantes revela o caráter autoritário dos representantes da Igreja. O objetivo era ter o
controle sobre a festa, colocar em prática as diretrizes emanadas pela hierarquia, seguindo as
&DUWDV 3DVWRUDLV, em que a direção do culto deveria estar nas mãos dos padres. Na Igreja
romanizada não havia espaço para as antigas práticas devocionais e populares que estavam
nas mãos dos leigos; estes eram apenas colaboradores da hierarquia. O bispo chegou a
procurar o poder civil, tentando interditar a festa, mas em tempos de República, com a
liberdade de culto, nada conseguiu, uma vez que a festa era realizada em uma propriedade
particular.
A insubordinação dos fiéis às regras estabelecidas pela Igreja revelou que a
chegada do bispo e a implantação do bispado em 1909 nem sempre foram o motivo suficiente
para resolver as questões dos fiéis e estes não acatavam as ordens emanadas da autoridade
eclesiástica, mantendo seus cultos originais, independentes da presença do clero.
Depois de muita pressão, em 1935, a Igreja recebeu, da Sra. Pequena do
Nascimento, o terreno e a capela, com doação passada com escritura pública, regularizando a
situação da festa e ordenando o culto nos moldes eclesiásticos. Era uma pequena vitória da
Igreja romanizada que centralizava na hierarquia e no clero todas as atividades religiosas e
devocionais. No entanto, a festa do Senhor Bom Jesus continua a ser uma das mais populares
na diocese de Ribeirão Preto, reunindo todos os anos multidões, que continuam a celebrar nos
moldes tradicionais suas devoções, independentemente de a festa ser dirigida pelos padres.
291
Com vistas do sr. Dr. Delegado Regional de polícia os jogos de azar estão sendo obancados francamente em
Jardinópolis na Festa da Lapa,
'LiULRGH1RWtFLDV
. Ribeirão Preto-SP, 3/ago/1933 .p. 2
129
$FDWHTXHVH
A primeira comunhão foi outra celebração que passou a se revestir de importância
desde que fora instituída para crianças por Pio X. Era uma comemoração capaz de reunir pais
e crianças e inserir os(as) meninos(as) no seio mais intimo da relação com Deus ao receberem
o Cristo sacramentado sob a forma simbólica de pão e vinho. Os agentes eclesiais, no afã da
regeneração do catolicismo, incentivavam a primeira comunhão, preparando as crianças com
a catequese. O catecismo era o ensino da religião cristã, em que as crianças e adultos eram
instruídos e educados metodicamente nas verdades da fé para a vida cristã.
A catequese, antes ministrada somente pelos padres, passou a contar com a ajuda
de leigos, e Semanas de Catequese foram introduzidas tentando melhorar a qualidade e o
aprofundamento de temas ligados aos problemas enfrentados com a evangelização.
Os temas discutidos nas Semanas de Catequese eram variados. Tomando por base
a Semana realizada na paróquia de São João da Boa Vista
292
, identificamos alguns temas
como: papel da catequista; por que as crianças em idade escolar não freqüentam o catecismo;
emprego de material didático; como dar o catecismo; será suficiente o ensino do catecismo
nas escolas públicas para a formação da mocidade?; a professora católica, entre outros. Uma
reflexão sobre os temas discutidos mostra uma preocupação em como abordar as crianças de
forma a conseguir a adesão à catequese. Outro aspecto era a formação dos catequistas.
As semanas catequéticas, ao instruírem as catequistas, passaram a constituir um
dos elementos que integravam o projeto de consolidação da ação da Igreja sobre a sociedade.
O incentivo do bispo era de que todas as paróquias realizassem semanas catequéticas, no
entanto, a documentação consultada permite dizer que elas foram realizadas em apenas
algumas paróquias da diocese.
293
O funcionamento das festas e outras atividades paroquiais contaram com a ajuda
dos membros das associações religiosas leigas, sob a direção dos padres. O papel exercido por
essas associações contribuiu para o processo de evangelização das comunidades, pois, por
meio delas, os padres exerceram um domínio e encetaram um controle sobre as famílias. O
papel de dirigente espiritual dos padres permite dizer que as mulheres acolhiam a sua fala
como uma ordem a ser cumprida. Os livros de atas das diferentes associações, na primeira
292
LIVRO de Tombo
da matriz São João. n. 1, p. 97 São João da Boa Vista.
$UTXLYRGR0XVHXGH$UWH6DFUD
.
Os temas identificados constaram da Semana catequética da paróquia de São João, realizada entre os dias 22 a 29
de outubro de 1939, na sede da Congregação Mariana. Museu de Arte Sacra de São João da Boa Vista-SP.
293
LIVRO de Tombo n. 4 matriz de Nossa Sra da Conceição, Franca, p. 88. Em Franca o pároco José de Ganhi
instituiu a “ Congregação do catecismo que teve por padroeiro especial São José.
$&')U63
, Franca-SP.
130
metade do culo XX, trazem a fala dos dirigentes espirituais, deixando de lado as premissas
das mulheres.
294
As preces e demais ações empreendidas pelos membros das associações não
refletem suas necessidades particulares como grupos, mas a ação empreendedora ditada pela
hierarquia da Igreja.
A fundação e a instalação de associações leigas, dirigidas pelos padres, para
moças, senhoras, homens, crianças, consistiam num dos meios pelos quais a Igreja buscava
direcionar seus fiéis para seu seio, controlando a vida cotidiana e principalmente a moral das
pessoas. Em substituição ao modelo de catolicismo da cristandade colonial, a romanização
entrava lentamente no Brasil a partir de fins do século XIX. A criação da Província
Eclesiástica de São Paulo, em 1908, contribuiu para que o modelo de cristandade romanizada
chegasse ao interior do estado de São Paulo com a presença dos bispos da Província
Eclesiástica.
$VVRFLDo}HVOHLJDV
Ao longo do período colonial e imperial, as irmandades leigas exerceram o papel
principal junto às praticas religiosas no país. Irmandades, como do Santíssimo Sacramento,
presentes nas matrizes; ordens terceiras, como a ordem terceira do Carmo ou de São
Francisco; irmandades específicas que acolhiam negros, mulatos, pardos, tais como Rosário,
São Benedito, Santa Efigênia, Cordão Seráfico de São Francisco, entre outras, comandavam a
vida dos fiéis e eram pelos leigos dirigidas, sendo o padre um capelão contratado para atender
as necessidades de cada uma delas.
295
Na segunda metade do século XIX, novas associações leigas chegaram, com
outras invocações. Algumas delas eram oriundas da Europa, cujos padres seculares ou
missionários traziam o culto para o Brasil e, ao lado de milhares de imigrantes católicos,
contribuíram para implantar o projeto de romanização e moralização do catolicismo
brasileiro.
296
Diferentemente das associações religiosas leigas do período colonial, que
294
ARAUJO, C. R. Práticas religiosas de mulheres na Igreja católica das décadas de 20 a 60: a experiência
religiosa feminina e a devoção Mariana. In: HAMILTON, J.
6D~GHGLQKHLURHDPRU
. Op. Cit, p. 251 et seq.
295
A respeito das irmandades no período colonial e imperial uma vasta produção historiográfica foi publicada.
No entanto, a consulta à obra de Boschi permite identificar uma vasta bibliografia sobre o tema. BOSCHI, C.C.
2VOHLJRVHRSRGHU
Irmandades leigas e Política colonizadora em Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986.
296
SOUZA, W. D. de.
$QDUTXLVPR(VWDGRHSDVWRUDOGRLPLJUDQWH'DVGLVSXWDV LGHROyJLFDVSHOR
LPLJUDQWHDRVOLPLWHVGDRUGHP
o caso Idalina. São Paulo: Edunesp, 2000, p. 14-15.
131
possuíam vínculos tênues com os sacerdotes
297
, as novas tinham nos padres seus mentores e
dirigentes espirituais.
Corte de São José, Pia União do Rosário Perpétuo, Pia União das Filhas de Maria,
Apostolado da Oração, Cruzada Eucarística, Liga Católica Jesus, Maria e José, Liga do
Menino Jesus, Conferência de São Vicente de Paula, Congregados Marianos, Damas da
Caridade, Damas Cristãs, Congregação da Doutrina Cristã, Confraria do Coração de Maria,
Irmandade do Santíssimo Sacramento, Irmandade do Rosário, Irmandade de Nossa Senhora
da Consolação, Irmandade de Santo Antônio, Irmandade de São Benedito, Terceiras
Franciscanas, Infantes do Coração de Maria, Santa Therezinha, São Geraldo, Nossa Senhora
do Desterro, Liga de São Luiz, Santos Anjos, São José, Nossa Senhora Aparecida, Santa Rita,
Propagação da Fé, são as associações identificadas que já funcionavam ou foram fundadas nas
matrizes e capelas, durante os 36 anos do governo de d. Alberto na diocese de Ribeirão Preto.
Como as associações funcionavam nas matrizes e capelas que pertenciam à
diocese, as informações sobre elas nem sempre são completas. É difícil apresentar uma tabela
ou gráficos confiáveis sobre o número de fiéis ligados a essas diversas associações, porque os
vigários não se preocupavam muito em manter registros sobre elas e, posteriormente, nem
sempre as paróquias fizeram a guarda desses registros.
Por volta de 1930, monsenhor Lauriano, a pedido de d. Alberto, pediu aos padres
que enviassem relatórios identificando quantos associados pertenciam a cada irmandade
presente na paróquia. O cômputo do número de pessoas agremiadas foi realizado com base
nos poucos dados disponíveis nos relatórios anuais do Boletim Diocesano. A partir do
Boletim, elaboramos os gráficos, que, embora limitados a um período muito curto de nove
anos, podem dar uma idéia do número de associados e suas oscilações.
Com base nas pesquisas, podemos afirmar que a oscilação ocorreu, em parte, pela
ausência dos dados enviados pelos padres das paróquias. Tudo indica que os números podem
ser maiores, em alguns momentos identificados pelos gráficos e quadros. Na cada de 1940
caiu o número de associados. Os motivos que encontramos como resposta para essa baixa
sugerem que muitos padres continuaram sem enviar os relatórios, ou enviavam-nos
incompletos, e surgiram outros movimentos, as pessoas deixaram de freqüentar as
associações, com as transformações na sociedade decorrentes da guerra e das mudanças na
Igreja. A pesquisa aponta para um problema que requer um estudo aprofundado, buscando
uma maior abrangência de tempo para explicar os números levantados. No entanto, podemos
297
FREITAS, N.M. B. de.
25RViULRGH0DULDQDHVXDVLUPDQGDGHV
(segunda metade do século XVIII). 1991.
Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Franca-SP, 1991.
132
afirmar que a Igreja mantinha em seus quadros fiéis que, como agremiados, tentavam seguir
as regras. Alguns episódios, como aquele em que os agremiados foram expulsos da
Congregação Mariana por terem freqüentado a interditada festa da Lapa, na cidade de
Jardinópolis, revelam que nem sempre os membros das associações seguiam estritamente as
diretrizes e normas emanadas da Igreja.
O gráfico a seguir mostra o número de fiéis agremiados nas diferentes associações
que identificamos na diocese de Ribeirão Preto.
)RQWH
: Boletim Diocesano, de 1934 a 1943.
No ano de 1940, os dados apontam para um bom índice de participantes; o
momento coincidiu com a chegada de d. Manuel e com o início de suas visitas pastorais. Os
católicos da região vivenciavam os congressos eucarísticos paroquiais, que prepararam o
Congresso Eucarístico Diocesano, realizado em setembro de 1940. Certamente esses
acontecimentos trouxeram um fervor para os padres e fiéis da diocese.
A fundação das diferentes associações estava ligada à devoção e ao conhecimento
e direção dos padres. Alguns padres, ao notarem que as associações poderiam renovar o
espírito religioso e dar um impulso às atividades da Igreja, buscavam arregimentar as pessoas
para aderir aos projetos das associações. Dentro delas, os padres dirigiam suas práticas aos
fiéis, orientados por manuais específicos das associações ou por outras obras que eram
$662&,$d®(6/ $,&$6
0
10.000
20.000
30.000
40.000
50.000
60.000
1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1942 1943
$QR
17RWDOGH $VVRFLDGRV
133
publicadas com o Nihil Obstat” , ou seja, aprovados pela hierarquia da igreja sem nenhum
obstáculo.
Para ilustrar a importância das associações e o número de agremiados, vamos nos
valer de dados estatísticos dos relatórios do Boletim Diocesano. Escolhemos o Apostolado da
Oração, a Pia União das Filhas de Maria e os Congregados Marianos, para mostrar a expansão
das associações dirigidas pelos padres. As antigas associações, como a Irmandade do
Santíssimo Sacramento ou do Rosário, ainda funcionavam em algumas paróquias da diocese.
A escolha das três (Apostolado, Filhas de Maria e Marianos) teve por critérios principais os
números mais altos de participantes dentre as associações da diocese no período estudado e a
presença delas em quase todas as paróquias da diocese.
Gráfico das associações Apostolado da Oração, Filhas de Maria e Congregados
Marianos.
(92/8d2'$6$662&,$d®(65(/,*,26$6$SRVWRODGRGD
2UDomR)LOKDVGH0DULD H&RQJUHJDGRV0DULDQRV
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943
Apostolado Filhas de Maria Marianos
)RQWH
: Boletim Diocesano de 1934 a 1943.
134
Outras associações desempenharam papel de relevância em algumas paróquias. A
fundação da Liga Católica Jesus Maria e José, em 1934, fundada pelo pároco da igreja de
Nossa Senhora do Rosário, da Vila Tibério, em Ribeirão Preto, corresponde ao anseio que
muitos vigários possuíam de renovar o fervor e as devoções entre os fiéis de suas paróquias. O
secretário da Liga registrou em ata os motivos para a fundação da associação: Logo que o
vigário padre Victor tomou posse desta paróchia notou uma grande indiferença religiosa da
maior parte dos homens desta Villa e desejando ardentemente reavivar o fervor e o espírito
religioso, notou que um dos meios mais poderosos e efficazes da renovação espiritual seria
fundar a Liga Cathólica Jesus Maria e José [...]”
298
O exemplo desta associação pode ser
usado para as demais, uma vez que a sua finalidade principal era arregimentar os fiéis para a
causa da Igreja. A ata afirma que depois de distribuir mais de oitocentos folhetos para
divulgar a obra, no dia previsto, em torno de duzentos homens compareceram ao templo e
juraram, ao receber as insígnias da associação, defender a causa da Igreja e praticar o
catolicismo.
Em qualquer das associações religiosas laicas, o objetivo estava centrado em fazer
valer a disciplina e uma ampla participação dos leigos sob a égide dos padres. Ao se filiarem a
uma das associações, os confrades seguiam regras de conduta, estabelecidas nos manuais.
Para os Congregados Marianos, agremiação presente em quase todas as cidades da
diocese, a orientação do manual direcionava as ações cotidianas, do levantar ao deitar-se, com
exercícios e orações, recomendações de práticas diárias aconselhadas, tais como: ao se passar
em frente a uma igreja, deveria ser feita uma saudação ao Santíssimo Sacramento e, se
possível, uma pequena visita.
299
As reuniões semanais ou mensais representavam um
momento em que, dirigidos pelo líder espiritual, os fiéis (homens, mulheres e crianças)
recebiam a doutrina e eram instruídos sobre os documentos da Igreja.
Como exemplo, o capítulo da “ 3DVWRUDO &ROHWLYD GRV %LVSRV, a respeito da
santificação dos domingos e dias festivos, foi lido pelo diretor espiritual do Apostolado na
tentativa de melhor instruir os agremiados.
300
Essa prática era comum entre os diretores
espirituais das associações.
298
1
o
. Livro de Atas
da Liga Catholica Jesus Maria e José. 1934, p. 1.
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH1RVVD6HQKRUD
GR5RViULR
Ribeirão Preto-SP.
299
0DQXDO
dos Congregados de Nossa Senhora (Congregados Marianos). 6ª ed. São Paulo: Siqueira, 1944. As
Congregações Marianas receberam as primeiras regras no século XVI. No Brasil, no século XX, atingiram seu
apogeu na primeira metade, com a formação das Federações Marianas presentes em todo o país.
300
LIVRO de Atas
do Apostolado da Oração, novembro de 1927, p. 27.
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH1RVVD
6HQKRUDGR5RViULR
. Ribeirão Preto-SP
135
&21*5(*$'260$5,$126
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943
$QR
1RGHDVVRFLDGRV
Fonte: Boletim Diocesano 1934 - 1943
Os Congregados Marianos, nos anos 1940, ganharam impulso com a chegada de
d. Manuel e com a inauguração da Federação das Associações.
301
Para os agremiados de qualquer associação, a Igreja fazia suas recomendações a
respeito do cotidiano e de como os fiéis deveriam se portar. Havia um distanciamento entre os
que estavam agremiados e os fiéis que não freqüentavam as associações. Estes últimos
manifestavam a fé com um catolicismo de fachada, consistindo na prática de alguns
sacramentos, como o batismo das crianças. Por esse motivo os padres consideravam de
extrema importância conseguir o maior número possível de adeptos para as associações.
As notícias nos jornais ou nos livros das associações contavam sobre as aquisições
que as irmandades faziam, tais como: inauguração de sede própria, indício de que a
associação dispunha de recursos próprios ou que, dentre os seus membros, contava com
pessoas abastadas que poderiam ter feito doações de terrenos ou de prédios para aquisição de
sede própria. Algumas associações freqüentadas por um número menor de confrades e com
recursos financeiros limitados não contavam com sede própria e realizavam suas reuniões e
encontros nas salas pertencentes à matriz ou capela, tais como a sacristia ou mesmo ainda
dentro da matriz.
Outras aquisições das associações, de significativo valor simbólico para os
agremiados, estavam representadas por estandartes e imagens do santo padroeiro, que eram
301
No final do 3
o
. capítulo ao falar da obra de D. Manoel mostramos a força das concentrações marianas na
diocese.
136
doados para as matrizes, capelas ou altares laterais nos templos. Os estandartes das
associações, com papéis definidos, representavam iconograficamente uma articulação da
agremiação com seu lema e seus princípios. A figura central dos estandartes tinha estampado
o santo padroeiro e vinha acompanhada de uma simbologia própria que ia além do nome da
associação e do lema que a acompanhava. A confecção dos estandartes foi um dos elementos
que representaram no conjunto das associações, a consolidação de um grupo, que se reunia
periodicamente em torno de ideais comuns, sob a supervisão de um membro do clero. As atas
revelam o quanto a simbologia do estandarte como um sinal da agremiação era importante
para o grupo que se mobilizava para a sua aquisição.
As notícias dessas aquisições deixaram a imagem de futilidade por parte dos
membros, mostrando uma preocupação com a exteriorização da fé, com o templo e seus
adornos, que permeava a sociedade da época. D. Duarte Leopoldo e Silva, arcebispo de São
Paulo, mostrou preocupação com a liturgia e as alfaias do templo e as manifestações
visíveis.
302
Para muitos padres e bispos, as alfaias, os adornos, como vasos de flores e outros
enfeites das igrejas e capelas, compunham o zelo e o amor ao culto e às coisas sagradas.
O zelo e a simbologia que esses adornos representavam no conjunto das
associações explicam em parte a sua própria vitalidade. Numa roupagem diferente do apelo
das associações do período colonial, sob a orientação dos padres, que faziam o papel de
diretores espirituais, as associações exerceram um catolicismo diferenciado do colonial e
imperial. A prática do binômio confissão/comunhão, por parte dos fiéis, evidencia uma
mudança, mas não provocou uma profunda e concreta evangelização dos católicos.
Para a Igreja, a freqüência a uma associação e o cumprimento das regras
constituíam uma das garantias de prática do catolicismo. Em seus estudos sobre a mulher e a
educação, Ivan Manoel afirma que as mulheres formavam um grupo de adesão, e aquelas que
freqüentavam as escolas católicas tinham maiores possibilidades de estar integradas no
esquema que, acima de tudo, exigia da moça-esposa, um rígido comportamento moral e social
[...] difundindo na família e na sociedade os valores do catolicismo conservador.”
303
Dentro
da casa, a mulher exercia seu papel de promotora dos valores católicos a serem transmitidos
para sua família.
O principal foco de muitas dessas associações, controladas pelo clero, estava
centrado em lemas como o da Cruzada Eucarística, destinada às crianças, cuja divisa era:
302
SOUZA, Nei (Org.). &DWROLFLVPR HP 6mR3DXOR. 450 anos da presença da Igreja católica em São Paulo.
1554-2004. São Paulo: Paulinas, 2004, p. 431
303
MANOEL, I. A.
,JUHMDH(GXFDomRIHPLQLQD
1859-1919. Uma face do conservadorismo. São Paulo: Unesp,
1996, p. 76.
137
Orar, Lutar, Comungar, Conquistar. Ao reunir uma elite”, formando um exército cristão
304
,
era capaz de estabelecer o que os papas: Pio X, Bento XV e Pio XI chamaram, no início do
século XX, de reinado de Cristo nos corações, nas famílias, na pátria e no mundo inteiro.
Começava com as crianças para chegar aos adultos. Como a Cruzada Eucarística estava
destinada às crianças, em algumas paróquias as associações dos adultos ficavam responsáveis
por ela.
Obedecendo ao modelo pregado pelos párocos, as crianças da Cruzada Eucarística
eram incentivadas a praticar a caridade cristã. Mesas de doces e outros quitutes, pequenos
objetos de agrado, como cigarros, eram distribuídos aos idosos dos asilos em ocasiões
especiais pelos cruzadinhos e representavam uma forma de demonstrarem como se exercia a
caridade fraterna e, ao mesmo tempo, constituíam numa prática considerada pela Igreja como
agradável aos olhos do Cristo.
Os cruzadinhos reuniam-se sob a supervisão dos adultos que dirigiam as
atividades religiosas. Encontros semanais eram promovidos para orientar as crianças com uma
metodologia dirigida por manuais que eram publicados com a finalidade de facilitar o trabalho
dos agentes pastorais. O objetivo era inserir a criança em práticas que traduzissem as
diretrizes da Igreja. Na Cruzada Eucarística, a criança começava com uma fita mais fina e
depois adquiria em definitivo a fita mais grossa da cor amarela, que simbolizava sua adesão
aos cruzadinhos.
Um episódio envolvendo a Cruzada Eucarística revela como os dirigentes
tentavam converter as crianças por meio de métodos usados nos tempos da Inquisição, em que
obras consideradas nefastas ao espírito católico eram queimadas. Em agosto de 1943, a
Cruzada Eucarística da catedral, junto com as outras seções da cruzadinha de Ribeirão Preto,
queimou cerca de 240 livros infantis no pátio do Externato do Sagrado Coração de Jesus, que
era anexo à capela São Benedito.
305
Os livros chamados de pseudo-literatura infantil,
identificados como *LEL*XUL0LUL P;, foram considerados como deturpadores da moral
das crianças. As crianças, em substituição aos livros queimados, receberam jornais, revistas e
livros, como $YDQWH&UX]DGRV, 3HTXHQR0LVVLRQiULR2'RPL QJR, etc., obras de divulgação
da Cruzada Eucarística. O fato revela o método usado pelos dirigentes da cruzadinha para
alertar as crianças a respeito de uma literatura considerada nociva. Era preciso estimular as
crianças a ler somente a literatura capaz de dirigir a presença mais engajada na Igreja de
acordo com os valores do catolicismo.
304
0$18$/
e Pequeno Missal do Cruzado. Secretariado da Cruzada Eucarística. São Paulo: Siqueira, s/d.
305
LIVRO de Tombo n. 2, p. 3, Ribeirão Preto-SP.
$&5363
, Ribeirão Preto-SP.
138
A preocupação com as publicações maléficas” levou a Igreja a instituir o dia da
Boa Imprensa. Na cidade de Petrópolis foi fundado o Centro da Boa Imprensa em 29 de
janeiro de 1910, que serviu [...] de fonte de informação e consulta a respeito de questões de
atualidade; incumbe-se da refutação de calúnias assacadas contra a Igreja e seus ministros;
promove a edição e propaganda de bons livros; contribui para a manutenção de bibliotecas
populares e círculos de leitura [...]”
306
Em Ribeirão Preto, d. Alberto, escreveu um “ 0DQGDPHQWRHVWDEHOHFHQGRRGLDGD
%RD,PSUHQVD´ em fevereiro de 1919.
307
A festa deveria ser celebrada em toda a diocese no
dia 2 de fevereiro e, posteriormente, foi alterada para o mês de agosto. O bispo autorizou a
realização de uma coleta especial destinada às obras da boa imprensa, e os vigários poderiam
realizar em suas paróquias outras formas de arrecadar dinheiro em prol dela. Uma celebração
especial era realizada na data e acompanhada de conferências ou outras atividades
programadas pelos vigários. Nas cadas seguintes, a festa foi celebrada nas paróquias, e
padres empenharam-se para que os católicos assinassem os boletins e revistas das associações
ou outros jornais católicos.
Alguns jornais católicos ganharam destaque na região, como o $YLVRGD)UDQFD,
que pertenceu aos padres agostinianos. O semanário foi considerado pelo pároco da matriz
como [...] paladino itimorato e corajoso nos combates em prol da Igreja e da Pátria,
destacando-se pela sua firmesa inteprida do preclaro Dr. Mario S. de Vilhena, illustre redactor
chefe do jornal.”
308
Com a participação das crianças, os padres procuravam conquistar os pais,
atraindo-os para o seio da Igreja. Um dos objetivos era chegar até as famílias. A Igreja
disputava áreas de influência, estimulando, pela prática caritativa, a entrada de seus valores no
seio das classes urbanas, uma vez que perdia terreno, nessa área, para outras crenças e para as
associações ligadas ao Estado ou ainda a sindicatos. Ganhar espaço no seio da sociedade civil,
por meio das associações religiosas laicas, era uma das formas de garantia de manutenção dos
valores do catolicismo. Perder esse espaço era deixar que as novas crenças, o comunismo, o
anarquismo, o ateísmo, entre outros adeptos do anticlericalismo, ampliassem o raio de ação na
sociedade brasileira.
306
MATOS, Henrique C. J.
8PHVWXGRKLVWyULFRVREUHRFDWROLFLVPRPLOLWDQWHHP0LQDV
Belo
Horizonte: O Lutador, 1990, p. 121
307
GONÇALVES, D. Alberto José. Mandamento. Estabelecendo o dia da Boa Imprensa. Ribeirão preto. 2 de
fevereiro de 1919. In:
$UFKLYR GD 'LRFHVH GR 5LEHLUmR 3UHWR
. 1908-1918.Ribeirão Preto: Typ. Guimarães,
1918.
308
LIVRO de Tombo
n. 4 matriz de Nossa Sra. da Conceição, Franca, p. 90.
$&')U63
. Franca-SP.
139
Outra associação de destaque na diocese de Ribeirão Preto foi o grupo das Filhas
de Maria. Elas estiveram presentes em quase todas as paróquias. Em algumas cidades
ganharam força, formando um grupo de evangelização que mobilizava as diferentes
atividades de uma paróquia. A obra das Filhas de Maria tem por objetivo fomentar entre seus
membros a devoção filial à Virgem Maria, dando exemplos com uma vida de santificação a
fim de ganhar almas para Deus.
309
A Pia União das Filhas de Maria, destinada às moças, possuía um programa
centrado em três departamentos principais: o de piedade, o de estudo e o de ação. A partir dos
três, ficavam centrados os pontos que faziam a interligação com a ão Católica. O
departamento de piedade se subdividia em ação eucarística, ação de retiro, VFKRODFDQWRUXP,
ação de adoração. O departamento de estudo, em aula e formação das aspirantes, curso para
catequistas, biblioteca, aula de religião. O departamento de ação, em obra das vocações, obra
dos tabernáculos, postura para os pobres, sessão lítero-musical, imprensa. Por intermédio de
cada uma dessas sessões, a Igreja tentava se infiltrar no mundo feminino e, por ele, nas
famílias com uma sólida formação mariana e doutrinária.
Em algumas paróquias, as Filhas de Maria certamente tiveram maior êxito,
conforme os registros dos livros das atas.
310
O relatório das Filhas de Maria da cidade de São
João da Boa Vista deixou um registro da intensa atividade que elas possuíam naquela
paróquia, que ia desde a confecção de alfaias para os altares, até angariar donativos para
sustentar meninos pobres no seminário. Os pobres e excluídos ganharam um olhar
diferenciado das Filhas de Maria, que chegaram a montar um curso de alfabetização para as
moças empregadas. Outra obra era o trabalho na confecção de roupas, que eram distribuídas
aos pobres, por ocasião do Natal. As Filhas de Maria da cidade de São João, copiando
modelos que vinham do exterior, principalmente da França, mantiveram uma verdadeira
indústria artesanal, confeccionando santinhos, bentinhos, lembranças para festas religiosas,
como verdadeiras obras de arte sacra.
311
A matriz da Vila Tibério de Ribeirão Preto abrigava um dos grupos das Filhas de
Maria. Como a vila era um bairro operário, boa parte das moças trabalhava durante o dia e
estudava à noite. O papel desempenhado por elas na obra do apostolado, preparando a Páscoa
das moças e das crianças, ensinando o catecismo na paróquia, no bairro e nas fazendas,
309
TRABALHO.
%ROHWLP 'LRFHVDQR
.
ÏUJmR GD )HGHUDomR 0DULDQD )HPLQLQD
. Ano 2, n.21, p. 3, janeiro
1945.
310
LIVRO de Atas das Filhas de Maria.
$UTXLYRGR0XVHXGH$UWH6DFUD6mR-RmRGD%RD9LVWD63
.
311
O Museu de Arte Sacra da cidade de São João da Boa Vista guarda, em seu acervo, exemplares de bentinhos,
santinhos e outros objetos de lembrança das festas religiosas.
140
cuidando da Cruzada Eucarística, participando do coro da matriz e da obra das missões e das
vocações, mereceu os elogios do redator do Boletim Diocesano da Federação Mariana
feminina.
312
A Igreja, para marcar seu espaço, fazia de pequenas cerimônias um momento
inesquecível, como a entrada e aceitação da pessoa numa associação. A passagem pelos
rituais, como o recebimento das fitas, representava a entrada em um novo universo, definido
pelo seguimento das práticas necessárias a cada uma das associações, sob pena de banimento
a quem deixasse de seguir as normas estabelecidas.
Algumas peculiaridades permitiam identificar as Filhas de Maria na sociedade, o
uso das fitas com medalhas e o uniforme. Com essa indumentária, as moças deveriam
comparecer às inúmeras atividades oficiais da Igreja e outras festas, como a mudança de
estado, ou seja, o casamento de alguma companheira. Entre as Filhas de Maria, as aspirantes
recebiam pequenas fitas verdes, depois passavam para as azuis. Entre uma fita e outra, os
confrades passavam pelo estágio de verificação, se eram ou não merecedoras de ingressar
oficialmente na associação. No Salão d. Alberto”, inaugurado em maio de 1942, localizava-
se a sede da Pia União das Filhas de Maria da catedral.
313
O número de agremiadas das Filhas de Maria permitiu, em maior ou menor
escala, a participação nas diferentes atividades atribuídas a uma Filha de Maria. Apesar das
discrepâncias entre alguns dados, os números mostram que a presença das Filhas de Maria na
diocese não pode passar em branco.
312
FUNDAÇÃO e Histórico da Pia União das Filhas de Maria na Igreja Matriz de Vila Tibério.
%ROHWLP
'LRFHVDQR ÏUJmR GD )HGHUDomR 'LRFHVDQD GDV &RQJUHJDo}HV 0DULDQDV Ribeirão Preto, ano 2, n.15, p.4,
jun. 1944.
313
O Salão d. Alberto” tornou-se, um ponto de reunião das associações e outros encontros da diocese, bem
como abrigava a sede das Federações das associações inauguradas na década de 1940.
141
0
500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
3.500
4.000
1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943
)RQWH
: Boletim Diocesano de 1934 a 1943
No gráfico acima visualizamos alguns números sobre a presença da Pia União das
Filhas de Maria na diocese de Ribeirão Preto.
Uma das obras notáveis das Filhas de Maria foi a organização de bibliotecas. Em
1944, com 147 membros, que freqüentavam a catedral de Ribeirão Preto, possuíam uma
biblioteca com 600 volumes.
314
Em São João da Boa Vista, a biblioteca contava com 341
volumes, incentivando não a propaganda da boa leitura, como também trabalhando para o
conjunto da boa imprensa
315
. A associação das Filhas de Maria nessa cidade era um grupo
pequeno, se comparado com o número das agremiadas do Apostolado da Oração. Enquanto o
Apostolado da Oração contava com 652 membros em 1944, as Filhas de Maria possuíam
cento e nove membros.
316
O roco de Franca fez constar no Livro Tombo as dificuldades para construir o
prédio da biblioteca das Filhas de Maria devido à falta de recursos.
317
Paralelamente ao incentivo para a prática da boa imprensa, os padres passaram a
alertar os católicos a respeito da ameaça que chegava às casas pelos catálogos especializados,
como Cultura Moderna” , entre outros, que ofereciam livros com a suposta facilidade de
serem entregues por via postal. Esses catálogos eram considerados:
314
FUNDAÇÃO da Pia União das Filhas de Maria da Catedral. %ROHWLP 'LRFHVDQR ÏUJmR GD )HGHUDomR
0DULDQD)HPLQLQD
, Ribeirão Preto, ano 1, n. 10, p. 4, fev. 1944.
315
5(/$7Ï5,2
da Pia União das Filhas de Maria, março de 1943.
$UTXLYRGR0XV HXGH$UWH6DFUDGH6mR
-RmRGD%RD9LVWD
-SP.
316
RELATÓRIO do Movimento religioso das Paróquias %ROHWLP 'LRFHVDQR, Ribeirão Preto, ano 13, n. 155
março de 1943.
317
LIVRO de Tombo
da matriz de Nossa Senhora da Conceição, n. 4, p. 66. ACDFr-SP, Franca-SP. (Resumo do
Relatório apresentado a S. Excia Revmda. 10/1/1918).
142
[...] verdadeira quinta coluna da pregação do reino de Satanáz, faz seguir
secções inteiras de livros que, todos eles, especulam com a sensualidade do
leitor constituído portanto, leitura vedada pelo Índice Romano de livros
proibidos. É o caso da secção Sexualismo, que os títulos de cinco livros,
entre os quais títulos sugestivos: A canalha sexual e para evitar a gravidez.
318
A hierarquia da Igreja, que considerava a propaganda dessas obras uma afronta às
famílias católicas, passou a adotar uma política na tentativa de impedir que essa publicação
chegasse às casas das famílias católicas e que esses catálogos, considerados nefastos, fossem
destruídos e substituídos pelas revistas, jornais, boletins e livros católicos. Para facilitar a
aquisição do Novo Testamento, a editora Vozes, dos padres franciscanos da província de
Petrópolis, fez uma edição a um preço acessível de 6$000 réis como um incentivo para os
católicos adquirirem a obra. O Secretariado Nacional de Defesa da agia para anular a
entrada das obras protestantes e espíritas. Para isso o Secretariado [...] recomenda
insistentemente que se divulgue o mais possível o Novo Testamento. É um dos melhores
antídotos contra a propaganda sectária.
319
Tudo indica que o incentivo a uma leitura específica, destinada aos católicos,
funcionou entre as Filhas de Maria na diocese de Ribeirão Preto, uma vez que encontramos
indícios de pequenas bibliotecas nas associações das paróquias da diocese. Listas de livros
eram organizadas pelos padres e sugeridas como aquisição para as bibliotecas, organizadas
para as moças e senhoras ou para os homens e até mesmo para os párocos, como forma de
inspiração para a prática religiosa, incentivo às virtudes cristãs, como a castidade das moças e
moços, etc.
Algumas listas de livros foram publicadas no Boletim Diocesano; a divulgação
dessas obras era parte do projeto da Igreja para a Boa Imprensa, o que incluiu o incentivo para
a assinatura de boletins, revistas e jornais católicos. Se considerarmos que o número de
pessoas alfabetizadas e com condições financeiras de adquirir livros no Brasil era pequeno,
pode-se afirmar que a existência dessas bibliotecas especializadas era um luxo e constituía
uma conquista da Igreja em prol da defesa da fé.
A participação dos agremiados das associações não se restringia a um único
quadro. Algumas pessoas pertenciam aos quadros de todas as associações de uma paróquia. A
318
OLHO VIVO. &25 5HYLVWD (FOHVLiVWLFD % UDVLOHLUD. Petrópolis, Vozes, Ano 2, fasc 7, v. 4, jul. 1940, p.
411. (O artigo vem assinado por “ Um velho vigário do Rio”).
319
O NOVO TESTAMENTO a 6$000,
&255HYLVWD(FOHVLiVWLFD &DWyOLFD
. Petrópolis, Vozes, ano 2, fasc. 5, p.
378, maio 1940.
143
sra. Mariana Custódia do Nascimento, agremiada da Pia União das Filhas de Maria de São
João da Boa Vista, deixou um registro especificando:
Eu Mariana Custódia do Nascimento fui admitida na Pia União das Filhas de
Maria no dia 8 de dezembro de 1928, pertenço a Pia União de Santa
Therezinha, O apostolado da oração da irmandade de Nossa Senhora do
Carmo, A irmandade da Terra Santa, A hora diurna e noturna, A propagação
da Fé, Sou terceira Dominicana. Confraria do Santíssimo Imaculado Coração
de Maria, O Trânsito de São José, A cruzada Eucarística.
320
Uma busca primorosa nos livros das associações revelaria se a presença da sra.
Mariana era constante, obedecendo às regras e normas exigidas para cada uma delas, ou se
privilegiava as reuniões de alguma associação. O caso de d. Mariana não foi único e
representava uma realidade comum entre os fiéis que se agremiavam a mais de uma
associação, nas paróquias.
Um dos indícios de que os fiéis participavam de mais de uma associação pode ser
mostrado também por ocasião da tentativa da cúria de instituir uma cobrança para os
membros das associações, para auxiliar na criação de um programa de rádio. Alguns padres
foram contra, afirmando que os fiéis participavam de mais de uma associação, ficando
oneroso contribuir em todas elas. Consagrando a vida a Deus, por meio das de práticas
exigidas pelas associações, os membros trabalhavam nas diferentes atividades da Igreja, seja
na catequese, no campo social no qual algumas delas estavam diretamente empenhadas, seja
ainda nas promoções para arrecadar fundos para diversos fins, tais como construção e reforma
das matrizes e capelas, aquisição de ornamentos, entre outros projetos dirigidos pelos padres.
As Filhas de Maria, em conjunto com as senhoras do Apostolado e os membros da
Conferência de São Vicente de Paulo, as senhoras do Roupeiro de Santa Rita, entre outros
membros das associações, trabalhavam em prol da caridade fraterna, atendendo os pobres
com alimentos, roupas e remédios.
O cuidado com as alfaias do templo era tarefa da Obra dos Tabernáculos, cujos
membros estavam encarregados de produzir os paramentos e outros objetos necessários ao
culto. A Igreja incentivava a criação da Obra dos Tabernáculos nas paróquias para que, por
meio delas, as igrejas mais pobres fossem aparelhadas. As mulheres do Apostolado e as Filhas
de Maria foram as principais colaboradoras da Obra na diocese.
320
3,$ 8QLmR
das Filhas de Maria São João da Boa Vista. AMDSJBV-SP, São João da Boa Vista-SP.
(Documentos Avulsos).
144
Durante o período em que uma paróquia recebia as missões, os membros das
associações eram convidados a um trabalho mais intenso. Uma das atividades era visitar os
doentes e preparar o caminho para a visita do missionário, que oferecia os sacramentos da
confissão e eucaristia. Para a Igreja, o ato de visitar doentes e pobres consistiu uma verdadeira
missão, bom exemplo das moças e rapazes que se entregavam a essa tarefa, considerada por
muitos padres como o verdadeiro exercício do amor a Cristo e à Igreja.
Os padres agostinianos foram grandes responsáveis na diocese de Ribeirão Preto
pelo incentivo à fundação de diversas atividades de cunho social, como as Conferências de
São Vicente de Paulo
321
, Roupeiro de Santa Rita, presentes, nas paróquias pelas quais eles
passaram.
As paróquias revestiam-se de importância no conjunto de formação cristã da
família, e o padre exercia seu poder como administrador, diretor espiritual, dirigente das
atividades paroquiais, enfim, conselheiro da vida social.
Um dos principais problemas enfrentados pelo clero em relação aos leigos era o
momento do carnaval, quando grandes admoestações eram feitas, proibindo os fiéis e
principalmente os agremiados das associações laicas de freqüentarem os folguedos. Nas atas
de diferentes associações constam expulsões dos membros e, em algumas, os padres, como
diretores espirituais, descreveram sua tristeza por saberem das moças e moços que não se
comportaram como acreditavam que deveriam agir os bons cristãos.
A opção contrária oferecida aos católicos para se afastarem dos bailes
carnavalescos eram os retiros abertos, destinados aos fiéis, e os fechados, para os agremiados
das associações. Nos retiros abertos, realizados nas matrizes e/ou capelas, havia práticas
diárias, às vezes em números de duas, sendo mais usual uma pela manhã e outra pela tarde,
hora santa de guarda com o Santíssimo exposto, tudo em prol da expiação dos pecados
cometidos pelos que freqüentavam os festejos.
Os retiros fechados podiam terminar na matriz, e os participantes, para manifestar
a glória de Cristo, desfilavam pelas ruas cantando louvores até chegar ao templo.
322
A
representação simbólica das manifestações católicas, com os fiéis carregando os estandartes
das associações, entoando hinos religiosos pelas ruas, com procissões, servia para mostrar a
força do catolicismo e as glórias de Deus.
321
PETTERSON, Simone.
2VFHPDQRVGD6RFLHGDGHGH6mR9LFHQWHGH3DXORHP)UDQFD±63
.
1999. Dissertação (Mestrado em História) Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Franca-SP, 1999;
BELMONTE, Frei Agostinho.DQRVGDSUH V HQoDGRV$JRVWLQLDQRV5HFROHWRVQR%UDVLO Rio de
Janeiro: Gávea, 2000.
322
LIVRO de Tombo da matriz de São João, n. 1, p. 92, 1911.
$UTXLYRGR0XVHXGH$UWH6DFUDGH6mR-RmR
GD%RD9LVWD
, São João da Boa Vista-SP
145
As atas das associações revelam que o número de fiéis que freqüentaram os retiros
foi desigual de uma cidade para outra e dependeu de uma inserção em maior ou menor escala
dos agremiados nas atividades da Igreja. O papel desempenhado pelos párocos também
contribuiu para a integração dos fiéis. Alguns padres souberam organizar os leigos em suas
paróquias nas diferentes associações e contaram com o engajamento dos fiéis nas atividades
paroquiais durante o carnaval e fora dele.
Seguindo o modelo pregado pela hierarquia da Igreja, afastando-se dos prazeres
mundanos do carnaval, dedicando-se às coisas de Deus, com a promessa da salvação eterna,
esses desfiles faziam um contraponto com a crescente urbanização e a introdução de novos
costumes da modernidade. Uma modernidade que saía do recôndito mais íntimo do seio das
famílias, para agregar outros valores mundanos para os quais a Igreja perdia espaço.
A freqüência aos clubes esportivos, aos bailes carnavalescos, às festas
consideradas profanas, pois não representavam uma extensão da festa cristã, revelava a
inserção de um universo que irradiava um distanciamento dos valores pregados pela Igreja.
O Apostolado da Oração foi o grupo que teve o maior número de agremiados nas
associações da diocese para o período estudado. Presente em quase todas as cidades, sua obra
levava os fiéis a jejuar e a praticar a devoção às primeiras sextas-feiras de cada s, com
confissão e comunhão, demonstrando o amor pelo Cristo eucarístico.
Assim como as outras associações, os agremiados portavam fitas que os
distinguiam dos demais fiéis. O Apostolado publicava um boletim, Mensageiro do Coração
de Jesus” , em que difundia a obra e exortava os participantes a seguirem no oferecimento
diário a Cristo, em consagração a Deus e em oração pelas intenções da Igreja.
146
$32672/$'2'$25 $d2
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943
$QR
1RGHDVVRFLDGRV
)RQWH
: Boletim Diocesano de 1934 a 1943.
147
Uma associação possuía diferentes momentos, primeiramente quando era fundada,
e depois quando alçava a maioridade, passando a agregada àquela que era considerada
primária, que poderia estar em Roma ou ainda funcionar em São Paulo, sede da arquidiocese.
Os pedidos para regularizar a situação das delas constam entre os documentos consultados nos
arquivos. Muitas associações funcionaram por cadas, sem estar com as devidas licenças
regulamentadas. Foi o caso, por exemplo, da arquiconfraria da Consolação, da matriz Nossa
Senhora do Patrocínio, em Patrocínio do Sapucahy (Patrocínio Paulista), que foi em instalada
em 1907, passando a funcionar mais abertamente depois de 1925, filiada a igreja São José, de
Ribeirão Preto, ligada aos padres agostinianos recoletos e que, em 1939, ainda não possuía
licença de funcionamento por parte da autoridade diocesana. Ao requerer a licença para
celebrar a devoção com procissão, o pároco recebeu do bispo a resposta de que a confraria
não possuía licença para funcionar. Ao ver os agremiados consternados com a notícia, o padre
escreveu ao bispo pedindo despacho para regularizar a situação da confraria. D. Alberto
despachou uma provisão com as devidas licenças para a festa e para o seu funcionamento da
mesma.
323
A criação da arquidiocese de São Paulo intensificou a presença da Igreja no
interior do Estado, contribuindo para um aumento na participação mais engajada de alguns
leigos, mas o avanço das outras crenças, os católicos não conseguiram evitar.
Dentre os missionários que pregaram na diocese de Ribeirão Preto, destacamos os
padres redentoristas, que não possuíam casas na diocese, mas representaram um grupo sempre
presente nas missões. As missões significavam um momento de reavivamento da fé, quando
muitas pessoas, depois das pregações, procuravam os padres para se confessarem e receber a
eucaristia, reafirmando a fé católica.
A Igreja via-se às voltas com inúmeras questões, algumas, à primeira vista, de
menor impacto, mas que representavam no universo simbólico de domínio cotidiano um
problema cada vez maior, que precisava deter ou conter os avanços das novas idéias que
permeavam na sociedade. Um deles, aparentemente corriqueiro, dizia respeito às vestimentas
das mulheres usadas nos cultos. Do Vaticano, chegavam orientações pedindo aos bispos e
padres que coibissem o uso de roupas transparentes, sem mangas, decotadas ou indecorosas
que atentassem ao pudor, sob pena de expulsão do templo, das associações leigas e de recusa
na aceitação de serem madrinhas de batismo ou ainda na confirmação e os padres poderiam se
323
LIVRO de Tombo da matriz de Nossa Senhora do Patrocínio n. 2, p. 137-139.
$&')U63
Franca-SP.
(Patrocínio Paulista).
148
recusar a dar a comunhão àquelas que não se apresentassem discretamente.
324
A Igreja
recomendava que os bispos e padres usassem as festas da Virgem Maria para incentivar bom
exemplo e coibir os abusos.
A Virgem representava o exemplo da pureza, mansidão e retidão que as mulheres
de todas as idades deveriam seguir. Nas festas dedicadas aos santos padroeiros ou à Virgem, a
reza do terço, ou seja, a terça parte do Rosário, vinha acompanhada das ladainhas de Nossa
Senhora e da oração de São José. Encerrava-se o culto delegando-se à sagrada família uma
importância a ser seguida como modelo para a sociedade. A Sagrada Congregação do
Concílio, no Vaticano, exigia que fossem enviados relatórios sobre as condições na maneira
de trajar, sobre o lazer e outras atividades na comunidade e as medidas que foram tomadas
atendendo às recomendações. Os relatórios serviam para garantir, que os padres estavam
cumprindo as resoluções emanadas dos órgãos superiores da Igreja e que os fiéis cumpriam as
ordens dos padres. Dentro das associações, as recomendações para as moças eram freqüentes,
e aquelas que fugissem à regra podiam ser expulsas. Os fiéis, agremiados nas associações,
eram convocados, e o apenas convidados, para combater os costumes estranhos a moral e
aos valores da doutrina cristã.
Como prática dessas recomendações, o padre Manuel Joaquim Fernandes
convidou as Filhas de Maria de Patrocínio do Sapucahy a protestarem contra o tango e outras
danças semelhantes, sob pena de expulsão do grupo as que não acatassem as regras, e
incentivando ainda que os trajes usados no dia-a-dia fossem modestos e com decoro.
325
O tango, considerado uma dança sensual (ou permissiva), constava no rol
daquelas que eram consideradas nocivas para a prática dos católicos. Outra recomendação da
Igreja para os pais era para afastarem as filhas dos exercícios e dos concursos de ginástica
considerados inconvenientes para a prática das mulheres católicas. A partir do Vaticano e na
Itália, chegou-se a criar uma campanha de moralização dos costumes e dos trajes, com apoio
da rainha Helena e do governo fascista de Mussolini
326
, e este exemplo do que acontecia na
capital dos católicos deveria ser seguido por toda a Igreja.
Os exercícios físicos, os cuidados com a vestimenta, entretenimento como festas e
bailes, a literatura, eram controlados pela Igreja como sinal de regulamentação de conduta,
com práticas prescritas para o cristão na sociedade.
324
SBARRETTI, Cardeal. A Repressão da Immodestia.
%ROHWLP 'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP. ano 1, n. 8,
1930, p. 4-6.
325
FREITAS, N. M. B. de. Condição feminina e práticas religiosas. 5HYLVWD 5HJLRQDO GH +LVWyULD, Franca,
Arpam, 1990, p. 123-131.
326
OS EXCESSOS da Moda Feminina e as preoccupações das autoridades Ecclesiasticas.
%ROHWLP'LRFHVDQR
ano 1, n. 3, p. 6, mar. 1930.
149
No ano de 1930, em que o Vaticano enviou recomendações expressas sobre a
questão dos trajes, foram realizados 60 despachos para procissões
327
, sob as mais diferentes
invocações de Nossa Senhora, sem contar as de outros santos. Na Encíclica do papa Pio XI,
0HQV 1RVWUD
328
, escrita com a finalidade de promover e fomentar a prática dos exercícios
espirituais, apontava que os grandes males da sociedade eram a falta de reflexão, a frivolidade
contínua e febril, o amor à riqueza e aos prazeres, que debilitavam o coração afastavam o
homem das verdades eternas. A moralização dos costumes não era tarefa fácil, e toda a Igreja,
clero e fiéis deviam estar empenhados na empreitada.
Os fiéis, quando adotavam o espírito mariano, incluíam uma proposta de vida de
serem católicos exemplares e fervorosos, com uma vida espiritual marcada pelos
ensinamentos da Igreja, orientada pelos diretores espirituais.
A Igreja, por meio das inúmeras cerimônias religiosas, ligadas às associações ou
não, tentou introduzir os valores católicos na sociedade, enfrentando a modernidade.
327
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP ano 1, n. 1
ao n.12, 1930.
328
Encíclica Mens Nostra”, Pio XI. Publicada nos números de 3
a 6 do Boletim Diocesano de 1930.
&$3Ë78/2,,,

5,%(,5235(72

2$/,1+$0(172$2352-(72'29$7,&$12
Na década de 1930, inúmeros acontecimentos políticos e econômicos no mundo
que vivia o período entre guerras repercutiram no seio da Igreja. De Roma, a hierarquia
lançava um apelo para que a obra de Deus ganhasse força por meio da Ação Católica.
No Brasil, o final da primeira República com a Revolução de 1930, a deposição
do presidente Washington Luís e a ascensão de Getúlio Vargas trouxeram mudanças no
cenário político que também acenaram com um novo tempo nas relações do Estado com a
Igreja.
Os primeiros anos do governo de Vargas foram marcados por intensa agitação
política e problemas econômicos advindos da repercussão da queda da Bolsa de Nova York e
a crise do sistema cafeeiro no Brasil. A região de Ribeirão Preto, embasada na produção
cafeeira, sentiu de perto os reveses da oscilação econômica. Foram anos difíceis para a
população que, assolada pela situação, ficou envolvida num conflito armado que alterou a
vida cotidiana e atingia a Igreja e as manifestações religiosas do povo.
Para a Igreja, a morte do cardeal d. Joaquim Arcoverde, em 1930, fechou um
momento e abriu outro com a nomeação do cardeal d. Sebastião da Silveira Leme. Este
passou a manter uma relação mais estreita com o governo de Getúlio Vargas, o que permitiu o
estabelecimento de uma situação melhor para a implantação de alguns projetos por parte da
Igreja.
O incentivo a uma participação mais intensa dos leigos na vida da Igreja, a criação
de novas dioceses e paróquias, entre outras atividades, ocupavam o pensamento dos bispos. A
preocupação com a extensa diocese levou d. Alberto, no início de 1930, à tentativa de criação
de uma diocese, com sede na cidade de Franca, desmembrada de Ribeirão Preto.
D. Alberto, considerou os tempos difíceis, com a crise no Estado e a
movimentação política do início da década de 1930, como um suposto obstáculo a obra.
Ao que parece o projeto não encontrou eco entre os francanos. Artigos elogiando
ou denegrindo a idéia do bispo começaram a circular. Em 1930, ao ser questionado sobre o
assunto, d. Alberto esclareceu: [...] que o bem das almas exigia a divisão, resolvi tratar de
151
fazê-la, e, sem solicitação de quem quer que fosse, pensei que a cidade de Franca, pela sua
posição e importância, deveria ser escolhida para a sede do Bispado a ser creado.”
329
Inúmeros motivos impediram a concretização do projeto, entre eles, o bispo
assinalou o desinteresse dos fiéis, a crise no Estado e a movimentação política como um
suposto obstáculo à obra.
330
A segunda tentativa para criar o bispado de Franca, ocorreu em
1942, no fim do governo de d. Alberto, e fora estimulada por d. Manuel D’ Elboux mas
também fracassou. O limite territorial foi um dos impedimentos para a concretização do
projeto.
Enquanto, do Vaticano, com a Encíclica 0HQV1RVWUD, o papa Pio XI, convidava
os fiéis à prática de exercícios espirituais para combater o que chamou de mal gravíssimo a
frivolidade que deixava a sociedade da época doente, afastada de Deus, no interior do estado
de São Paulo, com o agravamento da situação política, o vigário-geral do bispado de Ribeirão
Preto, monsenhor dr. João Lauriano, manifestava-se, a pedido do bispo, d. Alberto, diante dos
acontecimentos com a revolução de 1930, enviando um comunicado que dizia:
[...] no momento de inquietação para a Pátria recomendo ao clero e aos
católicos, orações pedindo a Deus que se restabeleça a paz e a tranquilidade
no seio do povo brasileiro. [...] enquanto durar a perturbação dêem na missa
a Coleta pro pace e dirijam ao povo depois das Aves Marias e preces finais a
jaculatória: Senhora D Aparecida, rainha do Brasil dae-lhe a paz.
331
A participação da Igreja nos acontecimentos políticos e sociais da década de 1930
não se limitou às preces, pois a Igreja esteve envolvida com inúmeras atividades.
$, JUH M DGH5LEHLUmR3UHWRHD5HYROXomR&RQVWLWXFLRQDOLVW DGH 
A fermentação política em São Paulo foi grande, e a insatisfação de diferentes
grupos culminou com os acontecimentos de 1932. A situação no estado de São Paulo fez com
que os prelados se dirigissem ao povo pedindo a paz e orações. O cardeal Leme, em março de
1932, fez um pronunciamento sobre as necessidades de paz e de Deus no Brasil. Para o
329
O BISPADO DE FRANCA.
%ROHWLP'LRFHVDQR
Ribeirão Preto-SP, n. 6, p. 3, jun. 1930.
330
O BISPADO de Franca.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, n. 6, p.3-4, jun 1930.
A diocese de Franca foi criada décadas depois, em 1970 e instalada em 1971. O primeiro bispo d. Diógenes da
Silva Matthes, por coincidência, fez parte da primeira turma de alunos do Seminário Maria Imaculada, da
diocese de Ribeirão Preto, inaugurado por d. Alberto e d. Manuel, em março de 1945.
331
LAURIANO, Mons. Dr. João. Preces Pro Pace.15/10/1930.
%ROHWLP'LRFHVDQR
Ribeirão Preto-SP, ano 1, n.
10, p. 5, 1930.
152
cardeal, com a oração dos fiéis, seriam atraídas as graças divinas, os dirigentes seriam
despertados com as súplicas a Cristo Rei. A ligação com o patriotismo apareceu na exortação,
quando o cardeal pediu uma cruzada de orações pelatria mostrando aos fiéis que participar
dela passava a ser dever de todo cristão.
332
A Revolução Constitucionalista de 1932 teve uma participação do clero direta e
indiretamente na região de Ribeirão Preto. O tema da Revolução Constitucionalista e a
relação desta com a Igreja carece de pesquisas mais pontuais sobre o envolvimento dos padres
e da hierarquia na diocese de Ribeirão Preto.
Em Ribeirão Preto, em fevereiro de 1932, um grande comício foi preparado
contando com um grupo de vinte e dois clubes e associações da cidade, como a Associação
Comercial, Loja Maçônica Estrela D’Oeste, Legião Brasileira, entre outras, aparecem
militando pela causa dos paulistas. Esta militância encontrou eco no seio da Igreja em
Ribeirão Preto e, entre os organizadores do comício cívico, estavam os Congregados
Marianos. No dia 24 de fevereiro de 1932, a Praça XV recebeu os visitantes de cidades
vizinhas, discursaram Onésio Mota Cortez
333
, Francisco Junqueira, d. Elza Pompeu de
Camargo, representando a ala feminina, entre outros, que denunciaram o regime político do
presidente Getúlio Vargas e pediram mudanças na condução dos rumos do país, e a principal
delas era uma nova Constituição.
Outras manifestações foram realizadas na sede do bispado, nos meses seguintes.
Em 25 de maio de 1932, encontramos, num comício cívico discursando ao lado dos políticos
em prol da causa paulista, o cônego Assis Barros. Rubem Cione afirmou que o cônego Barros
escrevia inúmeros artigos cheios de civismo, sem contudo assiná-los.
334
Os paulistas lutavam por uma nova ordem, uma Constituição e, principalmente,
pelo direito de escolher seus governantes.
335
A revolução teve a adesão das cidades da região
de Ribeirão Preto, através do envolvimento dos políticos e da organização de batalhões de
voluntários, que se alistaram, cuidaram de alojamentos, alimentos, uniforme, transporte,
organizaram a Cruz Vermelha e a Casa do Soldado. Padres, participaram dos comícios cívicos
332
LEME, D. Sebastião. Brasil precisa de Deus em suas leis e seus homens
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto-
SP, ano 3, n. 30, p.3, jun 1932.
333
Sr. Onésio Motta Cortez, dirigiu o jornal 'LiULRGH1RWtFLDVna década 1930.
334
CIONE, R.
+LVWyULDGH5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1995, p. 137 v. 4.
335
CIONE, R.
+LVWyULDGH5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1995, p. 122 v. 4. Sobre o movimento
Constitucionalista na região, sugerimos a leitura das obras: SERRAZES, K.E.
$VIDFHVGDPHPyULD
A
Revolução Constituicionalista de 1932 na cidade paulista de Batatais2000. Dissertação (Mestrado em História)
Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Franca-SP, 2000; LEITE, Luis F. Dias.
2FOHURIUDQFDQRQD
UHYROXomR&RQVWLWXFLRQDOLVWDGH
: seu papel na cooptação popular 2004. TCC (Trabalho de Conclusão de
Curso em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Franca-SP, 2004.
153
que foram realizados na Praça XV de Novembro e Vias-Sacras foram rezadas nas matrizes e
na catedral.
336
D. Alberto recomendava e mons. Lauriano exortava pelo Boletim Diocesano, os
padres e os fiéis a pedir orações pelo país, mas algumas associações laicas continuaram a
dirigir suas preces para a Rússia, cuja ameaça do comunismo incomodava a elite eclesiástica,
que do Vaticano pedia incessantes orações.
337
Será que a situação interna não preocupava os
diretores espirituais? Tudo indica que a coordenação dos movimentos que preparavam os
Boletins mensais, como do Apostolado da Oração, seguia as diretrizes da hierarquia sem
pensar em outras questões, como a situação política e social da região. As preces para o
restabelecimento da paz no Brasil aparecem em algumas atas, mas seguir as diretrizes da cúria
romana orando pelos cristãos no México, pela Rússia, China e Japão constituiu uma
prioridade e fez parte das orações dos associados ao longo do ano de 1932.
O rádio, que perdia o caráter elitista e amador na passagem da década de
1920/30
338
, serviu ao bispo d. Alberto para se dirigir para a população, fazendo um
pronunciamento na rádio PRA 7, em 21 de agosto de 1932
339
. De acordo com Cione, esse
pronunciamento teve ampla repercussão em todo o interior paulista, inclusive no estado do
Paraná, local de nascimento do prelado. D. Alberto, como bom político, apelou para o término
da luta:
[...] Bispo que sou, rogo e espero que Nosso Senhor e sua e Santíssima,
atendendo às orações, aos sacrifícios e à abnegação de tantas almas, farão
com que em breve termine esta luta deplorável e concedam a paz desejada e
necessária para prosperidade da nossa Pátria.
340
Em seu pronunciamento o bispo assegurou que ninguém estava pensando em um
retalhamento da pátria e que empenhava seus cabelos brancos, pois o tempo se incumbiria de
fazer valer a verdade.
336
CIONE, R. +LVWyULDGH5LE HLUmR3UHWR. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1995, p. 110. v. 4.
337
LIVRO de Atas do Apostolado da Oração, p. 60 et seq.
5LEHLUmR3UHWR
$UTXLYRGD3DUyTXLD1RVVD
6HQKRUDGR5RViULR
; Primeiro Livro de Atas do Apostolado da Oração de São João da Boa Vista.
0XVHXGH
$UWH6DFUD±6mR-RmRGD%RD9LVWD
SP
338
MORAES, J. Geraldo V. de. &LGDGHHFXOWXUDXUEDQDQD3ULPHLUD5HS~EOLFD. São Paulo: Atual, 1994, p.
104.
339
CIONE, R.
+LVWyULDGH5LEHLUmR3UHWR
. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1996. v. IV, p. 132.
340
Idem, ibidem, p.133.
154
Em 24 de agosto de 1932, três dias após o pronunciamento na rádio PRA 7 de
Ribeirão Preto, d. Alberto
341
escreveu ao arcebispo de São Paulo, d. Duarte Leopoldo e Silva,
a respeito de sua festa de jubileu de ordenação sacerdotal e que, por causa da luta armada,
muitos bispos estavam impedidos de viajar e talvez fosse conveniente adiar a comemoração
do jubileu, com as solenidades próprias, para outra ocasião. A festa maior ocorreu em
1934.
O envolvimento do bispo de Ribeirão Preto com a política permitiu que a
Comissão Agrícola de São Paulo pedisse sua interferência junto aos padres para tentar
melhorar a situação da agricultura no Estado. Os padres deveriam fazer um apelo em suas
paróquias, incentivando os agricultores a retomar o crescimento agrícola. A grave crise que se
abateu sobre o país afetou diretamente a produção agrícola do Estado, e o governo apelou
para a Igreja na tentativa de tentar reverter a situação e, em agosto de 1932, d. Alberto enviou
um comunicado destinado aos padres, atendendo ao apelo do governo. O momento era de
crise, a luta dos constitucionalistas prosseguia e o clero paulista se manifestou dando seu
apoio e oferecendo suas preces. Em meio à luta política, a hierarquia da Igreja conclamava os
católicos a aderir ao Apostolado da Oração e, partindo da oração, chegar ao apostolado das
obras.
A luta armada da Revolução alterou a vida cotidiana das pessoas, as reuniões das
associações laicas foram canceladas e as festas religiosas também sofreram a conseqüências
dos acontecimentos. A comemoração do jubileu de d. Alberto foi adiada; as festas dos santos
padroeiros, canceladas. Padres procuraram o bispo e ao monsenhor Lauriano, explicando
sobre a difícil situação que se abatera na região e as dificuldades com o povo, que deixava
suas casas
342
com pavor, e os problemas econômicos que enfrentavam em suas paróquias. Da
paróquia de Mogi Guassú, o vigário
343
escreveu que o programa da festa do bispo havia sido
muito prejudicado pela Revolução, do ponto de vista material e espiritual. Em Patrocínio do
Sapucahy (Patrocínio Paulista), o pároco deixou registrado no livro de Tombo que a festa da
padroeira não ocorreu por [...] conta dos dias tristes da revolução paulista.
344
341
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência a d. Duarte Leopoldo e Silva. 24/agosto/1932.
$&063
,
São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
342
SILVA, Padre Raymundo da. Correspondência ao mons. João Lauriano. Guará, 18/nov./1932.
$&5363
, .
Ribeirão Preto (caixa monsenhor Lauriano).
343
VIEIRA, Padre Antonio Maria. Correspondência
a mons. João Lauriano. Mogi Guassú, 4/nov./1932.
$&53
-
SP, Ribeirão Preto-SP. (caixa Monsenhor Lauriano).
344
LIVRO de Tombo da Paróquia de Nossa Senhora do Patrocínio, n. 1, p. 108.
$&')U63
Franca-SP.
155
Algumas cartas descreveram complicadas situações, como a do padre José
Mendes
345
, relatando que a cidade de Pinhal caíra nas mãos dos federais, tornando a vida um
verdadeiro cativeiro, ele relata ainda que, com a destruição e a população apavorada, ele
pedira clemência às tropas para que nada ocorresse com as pessoas; contava que mais de 250
famílias haviam se retirado para a capital e cidades vizinhas, que as casas da cidade e das
fazendas foram saqueadas e que outros atos ocorreram, causando verdadeira revolta, e que aos
poucos, tudo estava sendo superado. A carta serviu para justificar porque ainda não havia
reunido o ramalhete espiritual para as bodas do bispo por causa das dificuldades causadas pela
debandada do povo”.
Na mesma situação, foi a carta do padre da cidade de São Sebastião da Grama,
dizendo:
[...] a tomada da cidade pela grande e desenfreada força mineira, a longa
parada dessas forças aqui e nenhuma liberdade quer tínhamos mais o pouco
que aqui ficamos não permitiam que se fizessem outras festividades em
honra do bondoso prelado. As pequenas quantias que estavam com a
comissão e deveriam constituir o óbulo a ser oferecido ao seminário
desapareceu com o saque que sofreram as casas, mas este testemunho de
respeitosa homenagem ao Bispo será formado logo que as condições deste
povo melhorarem.
346
Apesar de alguns prelados afirmarem que estavam alheios à política, o
envolvimento com o movimento constitucionalista ocorreu em maior ou menor escala. O
relato do pároco da matriz Nossa Senhora da Conceição, da cidade de Franca, permite uma
avaliação de alguns aspectos desse envolvimento.
Nós estivemos sempre alheios a toda a política. Pregamos a paz como é de
nossa obrigação. Apenas trabalhamos pela causa de São Paulo, a exemplo de
outros vigários e com approvação do exmo. Sr. Bispo na Campanha do Ouro
da qual fomos nomeados presidente, e na Campanha Pró Lavoura. Foi para
estes fins que fallamos uma noite do microphone do rádio, enaltecendo os
ideaes constitucionalistas, mas sem ferir nem de longe o prestigio das
345
MENDES, Padre José. Correspondênciaao mons. João Lauriano. Pinhal, 11/out./1932. $&05363,
Ribeirão Preto-SP. (caixa Monsenhor Lauriano).
346
Correspondência
de São Sebastião da Grama a monsenhor Lauriano .12/out/1932.
$&05363
, Ribeirão
Preto-SP (caixa Monsenhor Lauriano). (sem assinatura)
156
auctoridades constituídas [...] mandamos de capellão as trincheiras de
Rifaina ao Pe. Innocente Oses, que esteve quarenta e dous dias com os
soldados da linha de combate.
347
Para quem afirmou, no início do relatório, que esteve alheio à política, a
participação do padre foi bastante incisiva, apoiando publicamente, por discurso no rádio, o
movimento constitucionalista. O padre finalizou o relatório afirmando que o clero deveria
estar acima de todo partidarismo. Ao enviar o vigário coadjutor como capelão para o IURQW,
mais do que a mensagem de Deus, dava total e irrestrito apoio, tomando partido do
movimento constitucionalista de São Paulo.
O pároco de Franca não foi o único, identificamos os mesmos princípios com o
padre Argílio Malatesta, de Mococa, que considerou a luta como uma causa sacrossanta e por
isso conclamou os fiéis a enviar preces ao Sagrado Coração, pedindo proteção. O prelado
considerava que um povo sem lei não poderia nem mesmo progredir. Ao dirigir a reunião da
Associação do Apostolado da Oração, intimou as zeladoras e zeladas a [...] trabalharem pelo
aumento do Apostolado procurando ingressar no mesmo almas boas e piedosas que
generosamente consolem o Sagrado Coração de Jesus, tão ultrajado e esquecido dos homens
ingratos.”
348
A solução pregada pelo padre Malatesta e por outros vigários era conseguir, por
intermédio de preces ao Sagrado Coração de Jesus e ao Imaculado Coração de Maria, as
graças necessárias para reverter a situação que se abatera com a luta dos paulistas. As
entronizações seguiam um curso comum em meio à luta constitucionalista.
As cartas dos padres retrataram com clareza a situação comum a inúmeras cidades
e vilas do estado de São Paulo durante o período da Revolução: o medo, a fuga para outros
lugares, considerados mais seguros, a preocupação dos padres para com seus paroquianos que
sofreram as agruras da guerra, a escassez gerada pela levante armado.
A luta na região de Ribeirão Preto foi intensa e o próprio d. Alberto viu-se
envolvido. Muitas famílias foram consultá-lo se deveriam sair de suas casas com a
aproximação das tropas federais. O chefe das forças militares federais esteve com o bispo,
pedindo apoio para tranqüilizar as famílias.
349
Este respondeu que fazia parte de suas funções,
como prelado, dar uma assistência tranqüilizando e instruindo as famílias a permanecerem
347
LIVRO de Tombo da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, n. 4, p. 106. Franca, $&')U SP Franca SP.
348
LIVRO de Atas do Apostolado da Oração. 4/nov./1932, p. 99. Arquivo da Paróquia de São Sebastião (
$366
0R
-SP), Mococa-SP.
349
GONÇALVES, D. Alberto José.
&DUWDDR-RUQDOGR%UDVLO
. Rio de Janeiro, 12/out./1932.
157
como ele em suas casas, independentemente de uma comissão formada na cidade, em que seu
nome fora inserido a sua revelia.
Mas nem todas as associações rezavam somente em prol da causa dos paulistas,
pois atendiam aos pedidos da hierarquia da Igreja. Na matriz de Nossa Senhora do Rosário
350
de Ribeirão Preto, os agremiados do Apostolado da Oração, que durante os meses de julho a
setembro fizeram preces em prol da causa dos paulistas, no mês de outubro, quando a
Revolução caminhava para o final, a causa dos paulistas não aparece nas intenções das
orações. Seguindo o pedido do papa, as preces estavam direcionadas para aumentar o número
de católicos na China e no Japão, e a questão interna vivida pelo retorno de muitas famílias a
suas casas em várias cidades da região passava longe das preces naquele momento. Algumas
associações eram dirigidas por padres estrangeiros, acredito que, pelo menos oficialmente, se
preocupavam mais em seguir os pedidos de oração do papa do que na crise interna que a
população do interior de São Paulo vivia.
Em algumas cidades da diocese em que as atividades da Igreja foram canceladas,
após o término do conflito, foram celebradas missas de ação de graças para pagar promessa
pelo retorno de todos os voluntários e por não haver nenhuma propriedade saqueada ou
atacada durante os enfrentamentos.
351
O fim da Revolução permitiu o retorno à normalidade na região, e a situação
política instalada possibilitou que a Igreja, em seguida, lançasse sua campanha de participação
mais intensa na vida cotidiana brasileira e principalmente na política por meio da Ação
Católica e da Liga Eleitoral Católica. A festa das bodas de d. Alberto foi um dos
acontecimentos que a Igreja celebrou após o término da Revolução.
%RGDVGH  RXUR GHG$OEHUWR
Em 1932, durante a complicada situação política no estado de São Paulo, com a
crise econômica e a Revolução constitucionalista, d. Alberto completou 50 anos de
sacerdócio. A situação impediu a realização de uma grande festa na data certa. A festa, que
vinha sendo preparada por mons. Lauriano, ficou adiada para um “ tempo oportuno”. A
350
LIVRO de Atas do Apostolado da Oração, p. 69.
$UTXLYRGD3DUyTXLD1RVVD6HQKRUDGR5RViULR
.
Ribeirão Preto-SP.
351
LIVRO de Atas do Apostolado da Oração.
$UTXLYR3DUyTXLD6DQWD5LWDGH&iVVLD
. 30/10/1932, p. 20 e 21.
Santa Rita do Passa Quatro. Monsenhor Manuel Vinheta era o pároco de Santa Rita, celebrou missas de ação de
graças pelo fim da revolução.
158
recomendação de mons. Lauriano
352
era de que nas paróquias da diocese, na medida do
possível, a data fosse comemorada.
Monsenhor Lauriano deu início aos preparativos, pedindo aos padres que
enviassem os ramalhetes espirituais na intenção do bispo. Os ramalhetes espirituais eram
comuns e podiam ser realizados por meio de missas, recitação de jaculatórias, jejuns, orações,
terços, visitas ao santíssimo sacramento, leitura espiritual, mortificações, entre outras preces
realizadas pelos padres e fiéis. Simbolizavam ofertas especiais pedidas pela Igreja para uma
boa causa, no caso, as bodas do bispo, ou em outras ocasiões, quando encontramos o papa
pedindo aos fiéis e ao clero a oferta de ramalhetes espirituais pela paz mundial. Os pedidos
das bodas foram encaminhados aos padres no mês de maio de 1932.
Em Ribeirão Preto, monsenhor Lauriano preparou um programa simples, para o
dia 17 de setembro de 1932, na catedral: missa, às sete e trinta, celebrada pelo bispo, com
comunhão geral dos fiéis e associações religiosas. Às 10 horas missa cantada, com assistência
pontifical, com a presença do clero secular e regular, associações com estandartes e
distintivos, autoridades civis e militares, representações das paróquias e dos colégios
católicos. Depois da missa, o bispo recebeu o óbolo pró-seminário e os ramalhetes espirituais.
O empenho de monsenhor Lauriano, ao pedir para os padres que não deixassem
passar em branco, data considerada importante, mostrava a preocupação com o brilho das
bodas de d. Alberto, a quem monsenhor servia lealmente.
Ainda em 17 de setembro de 1932, muitas homenagens foram feitas a d. Alberto
José Gonçalves. O Boletim Diocesano, órgão oficial da igreja de Ribeirão Preto, trouxe a
notícia completa das festividades, que, nesse ano, fora reduzido às festividades religiosas por
causa da situação adversa da região e do estado de São Paulo. Os jornais locais, da capital e
do estado do Paraná publicaram matérias sobre a festa.
Um dos pontos altos ficou expresso na resposta ao apelo de monsenhor pelo
brilho da festa, o qual após a missa, subiu ao púlpito para saudar o bispo e entregou-lhe o
ramalhete espiritual da diocese, com 2.037.650 atos de piedade, e o Livro de Ouro, com a
importância de 33:842$000.
353
Os números explicam o apreço da comunidade para com seu
bispo, que, mesmo em tempos de penúria, enviaram, das diferentes partes da diocese, sua
contribuição. O relato do Boletim Diocesano explicou que a festa poderia ter sido maior, não
352
LAURIANO, Mons. João. As Bodas de Ouro da Ordenação Sacerdotal no nosso Amado Bispo Diocesano D.
Alberto José Gonçalves.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto-SP,. ano 3, n. 32, p. 1-2, agost 1932.
353
LAURIANO, Mons. João. As Bodas de Ouro Sacerdotaes de D. Alberto José Gonçalves.
%ROHWLP'LRFHVDQR
,
Ribeirão Preto-SP, ano 3, n. 33, p.1-10, set. 1932.
159
fossem as dificuldades, já que muitos padres não conseguiram enviar a contribuição por falta
de recursos.
Para coroar o brilho da festa, apesar das ausências e do programa restrito, o
cardeal enviou um telegrama com a notícia de que o papa Pio XI concedera a d. Alberto a
honra de Assistente ao Sólio Pontifício.
354
O papa Pio XI escreveu a d. Alberto,
parabenizando-o e concedendo-lhe ainda um título de nobreza, o de conde, e outras benesses.
A grande comemoração, com inúmeros prelados e convidados ilustres, foi
celebrada, dois anos depois, nos dias 1
o
. e 2 de fevereiro de 1934, quando foi publicado um
balanço exaltando o governo de d. Alberto e o progresso material e espiritual da diocese. O
jornal 'LiULR GH 1RWtFLDV
355
mostrou que o crescimento do patrimônio da diocese,
insignificante no momento de sua criação em 1909, passava a mais de mil contos de réis,
contando com a catedral, palácio episcopal e seminário diocesano. Quanto ao crescimento
espiritual, as comunhões, em 1915, em número de 267.446, em 1934, alcançava a cifra de
mais de um milhão, na diocese. Os dados revelavam que a Igreja, ao publicar esses números,
mostrava que era a crença que possuía o maior número de adeptos, mesmo com a liberdade de
culto introduzida com a República.
A contribuição das paróquias da diocese para o jubileu do bispo foi publicada
num balancete assinado pelos dois membros responsáveis pela comissão da festa: monsenhor
João Lauriano e cônego Assis Barros. A cifra de 72:535$000 como contribuição das
paróquias, tiradas as despesas, foi entregue ao Bispo num saldo de 50:774$500. Não foi
especificado no balancete se nesse número estavam inclusas as contribuições enviadas em
1932.
356
Apesar dos ataques sofridos em muitos momentos por parte de seus inimigos na
imprensa local, esta sabia reconhecer d. Alberto como chefe religioso, com influência e
prestígio no seio da sociedade, justificativa simples para não se omitir homenagens.
A presença do núncio apostólico d. Bento Aluizi Marsala, do arcebispo de São
Paulo, d. Duarte Leopoldo e Silva, abrilhantaram a festa e mostraram o prestígio de d.
Alberto. Outros prelados também participaram, tais como: d. Francisco de Aquino Correa,
arcebispo de Cuiabá, d. José Marcondes Homem de Melo, bispo de São Carlos, d. João de
Almeida Ferrão, bispo de Campanha.
354
O TÍTULO DE ASSISTENTE ao Sólio Pontifício, ou seja, assistente da cadeira papal representava um título
honorífico importante no curriculum de d. Alberto.
355
O BISPO Diocesano, D. Alberto José Gonçalves. 'LiULRGH1RWtFLDV. Ribeirão Preto, 1/ fev/1934, p. 1
356
BALANCETE das festas jubilares de S. Excia. Rvma. O Sr. Bispo Diocesano, D. Alberto José Gonçalves,
realizadas nesta cidade de Ribeirão Preto, no dia 2 de fevereiro do corrente anno.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão
Preto-SP, ano 5, n.55, p. 4, julho 1934.
160
É importante destacar que a Câmara Municipal de Ribeirão Preto decretou feriado
em homenagem ao jubileu sacerdotal do bispo, o que contribuiu para que a população pudesse
comparecer às festividades. As décadas em que d. Alberto viveu em Ribeirão Preto e o
impulso dado ao catolicismo permitiram ter seu trabalho reconhecido pelos políticos, que
decretaram feriado no município apesar da separação do Estado com a Igreja.
Monsenhor Lauriano organizou a publicação de uma 3ROLDQWpLD, com os feitos de
d. Alberto, que foi distribuída entre os convidados mais importantes da festa. Nela
encontramos artigos assinados por: Valois de Castro (“ D. Alberto, alumno e professor do
pequeno Seminário”); D. João, arcebispo de Curitiba (“ O Padre Alberto” ); Altino Arantes
(“ D. Alberto Político” ); o programa da festa, cópia dos documentos enviados por Roma para o
bispo e os discursos proferidos nas sessões de homenagens. Completavam a obra dirigida por
mons. Lauriano fotografias dos pais do homenageado, dos locais que passou em Curitiba,
Ribeirão Preto, como a catedral, palácio episcopal e cenas das homenagens.
Os jornais de Curitiba e da região da diocese publicaram artigos sobre a festa e
prestaram homenagens ao bispo.
No início dos anos 1930, no momento do jubileu de d. Alberto, visualizamos uma
articulação da Igreja com uma maior inserção no seio da sociedade com a volta do ensino
religioso nas escolas públicas, participando nos bastidores da política com a Liga Eleitoral
Católica e a chegada da Ação Católica.
Em Ribeirão Preto, para facilitar a organização dos comunicados realizados pela
cúria diocesana, mons. Lauriano, apoiado por d. Alberto, fundou o Boletim Diocesano. A
diocese não possuía um jornal que fosse porta-voz dos comunicados ao clero e aos fiéis.
No primeiro número, um comunicado explicativo determinava as diretrizes do
Boletim. Estava escrito que:
Na falta de um jornal nesta cidade, que represente os interesses da Diocese, e
attendendo as repetidas solicitações do clero, ficou resolvido dar publicidade
a este BOLETIM que, publicado mensalmente, i dando aos rvmos.
Vigários e demais sacerdotes as notícias que lhes serão de utilidade, podendo
assim acompanhar o movimento que for se operando na Diocese.
357
357
EDITORIAL
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 1 , n. 1. p.1, janeiro 1930.
161
Acompanhamos, por meio da fala do jornal da diocese, durante as décadas de
1930 a 1940, os informes sobre temas variados, tais como a Liga Eleitoral Católica, a
implantação do ensino religioso nas escolas públicas, a Ação Católica, comunicados e cartas
pastorais de d. Alberto, Bulas e Encíclicas dos papas, informes sobre a Igreja no mundo,
avisos gerais ao clero e os despachos do expediente do bispado. Nas décadas seguintes, o
Boletim revelou-se um dos principais meios de comunicação entre a cúria diocesana e os
padres.
,JUHMDHSROtWLFD±$/LJD(OHLWRUDO&DWyOLFD/(&
Com o fim da Revolução de 1932, a Igreja buscou aplicar uma resposta mais
atuante com a aproximação das eleições para a Assembléia Constitucionalista. A necessidade
de eleger candidatos sensíveis aos temas católicos ganhou forma mais concreta, fruto do que
vinha ocorrendo ao longo dos anos 1920, quando uma articulação dos leigos católicos com a
hierarquia, incentivados pelo cardeal Joaquim Arcoverde, permitiu que fosse fundada a revista
$ 2UGHP, em 1922, uma das mais representativas revistas dos católicos articulados. Junto
com a revista, estava o Centro D. Vital, ambos no Rio de Janeiro, tendo à frente, entre outros,
Jackson de Figueiredo e, depois, Alceu de Amoroso Lima, que assinava com o pseudônimo
de Tristão de Ataíde. A articulação era uma resposta à busca da Igreja de continuar a ser a
monopolizadora do sagrado, a guardiã da moral e da vida pública, através da via de melhor
entendimento com o Estado.
Desde 1889, a relação oficial da Igreja com os partidos políticos e a política
ocorria principalmente nos bastidores. Muitos padres continuaram a exercer cargos políticos e
a atuar, defendendo a causa da Igreja. D. Alberto foi um desses padres que, conforme vimos
no capítulo primeiro, ocupou os cargos de deputado e depois senador da República. Da
tribuna, o então padre Alberto tinha o suporte necessário para lutar de acordo com as
determinações de Roma. Por sua postura política, acabou recebendo o título de paladino da
Igreja”, dado a ele pelo arcebispo emérito de Curitiba, d. Pedro Fedalto.
358
A atividade política de d. Alberto ainda como padre, em Curitiba, permitiu que,
depois de deixar oficialmente a política partidária para exercer o cargo de bispo, ele
continuasse a se relacionar com o poder político de outra instância. Como bispo, passou
formalmente a criticar a criação de um partido político católico. A discussão a respeito da
358
FEDALTO, D. Pedro. $
$UTXLGLRFHVHGH&XULWLEDQDVXD+LVWyULD
. Curitiba: Cúria Metropolitana, 1958.
162
criação de um partido político católico ocorria desde o fim do século XIX
359
, quando padres e
bispos se pronunciavam a favor ou contra.
360
A necessidade de defender os interesses da Igreja no campo político era premente,
e a melhor solução para muitos membros do clero estava na fundação de um partido em que
os católicos pudessem eleger candidatos capazes de seguir uma orientação fiel aos princípios
da Igreja. A discussão envolveu questões como o nome do partido e, até mesmo, se era viável
a Igreja estar à frente de um partido político.
A opinião do clero estava dividida: d. Alberto, por exemplo, político hábil,
considerava inconveniente qualquer manifestação do episcopado que fosse de caráter político,
formando partido inimigo da religião. Ele fez referências a outros prelados que, de alguma
maneira haviam se manifestado quanto à política, como o arcebispo de Mariana, d. Silvério,
que serviu para manejos eleitorais. O arcebispo de Mariana havia indicado um candidato ao
governo que fora derrotado, revelando a desobediência dos mineiros, ficando o prelado de
acordo com d. Alberto, bastante embaraçado com a história.
361
No entanto, d. Alberto atuou
politicamente nos bastidores políticos até sua morte, em 1945. A questão é saber como ele
atuou.
O trânsito político de d. Alberto permitia com que ele recebesse a visita de
presidentes, como a do marechal Hermes da Fonseca
362
, durante sua estada no Rio de Janeiro.
Na referida visita, tudo indica que eles conversaram sobre a possibilidade de os católicos
obedecerem à hierarquia na indicação dos candidatos; mas d. Alberto considerava que
qualquer manifestação pública do clero seria explorada para fins políticos. A posição da
Igreja, no início da República, foi vulnerável, e alguns prelados não queriam se expor e estar
novamente sob o jugo da política.
A discussão sobre a formação de um partido político católico, a serviço da Igreja e
nos moldes dos que existiam em outros países, era uma tese discutível.
Na reunião dos bispos da província eclesiástica meridional do Brasil, em 1910,
seguindo o modelo adotado em outros países, ordenava-se que os fiéis católicos escolhessem
candidatos católicos para ocupar os cargos públicos.
359
LUSTOSA, Oscar de F.
,JUHMDH3ROtWLFDQR%UDVLO
. Do partido católico à LEC (1874-1945). São Paulo:
Loyola/CEPEHIB, 1983. A obra compila alguns documentos a respeito da Igreja e o partido católico.
360
LUSTOSA , O de F.
,JUHMDHSROtWLFDQR%UDVLO'R3DUWLGRFDWyOLFRj/(&
São Paulo:
Loyola, 1983; LUSTOSA, O de F.
$,JUHMD&DWyOLFDQR%UDVLOHR5HJLPH5HSXEOLFDQR8PDSUHQGL]DGRGH
OLEHUGDGH
São Paulo: Loyola, 1990.
361
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondênciaa D. Duarte Leopoldo e Silva. 1/2/11910. $&063, São
Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
362
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência
a D. Duarte Leopoldo e Silva. 1/2/11910.
$&063
, São
Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
163
Em meio à discussão sobre a criação de um partido católico surgiu, em 1912,
fruto do encontro dos bispos em 1910, a Liga Eleitoral Católica de Campinas, elaborada
inicialmente por d. João Baptista Nery, bispo de Campinas, que lançou uma &DU WD3DVWRUDO
orientando o clero e os fiéis católicos para uma ão política.
363
Para d. Nery, na formação da
LEC era incontestável a [...] urgente necessidade de estender a Ação Católica ao terreno
político [...] era considerada uma empresa arrojada.”
364
Para o bispo, o importante era encarar
os assuntos políticos sob o ponto de vista católico. Quais razões levaram o bispo de Campinas
a entender a importância da entrada dos católicos no campo político?
A separação do Estado com a Igreja ocorrida no fim do culo XIX era, em 1913,
uma ferida muito viva para alguns prelados que enxergavam de perto as reais necessidades de
ganhar espaço no campo político, atingindo a sociedade a partir de outros parâmetros,
revertendo as leis que emperravam uma maior atuação da Igreja. A eleição de candidatos
sensíveis às questões pertinentes à Igreja católica era urgente, e partilhavam da mesma
opinião outros prelados da época, que pregavam abertamente uma maior inserção dos
católicos na vida pública.
A defesa da participação ativa dos leigos, e até da fundação de um partido
católico, estava expressa na obra de Desidério Deschand, amigo pessoal de d. Alberto.
Deschand escreveu, na primeira década do culo XX, que os católicos estavam o apenas
indiferentes, mas [...] nunca cumpriram conscienciosamente seu dever de eleitores, nunca
trataram seriamente de se organisar em partido político para fazer respeitar a vontade
soberana do povo.”
365
O padre Deschand afirmava que uma República precisava respeitar a crença da
grande maioria da população; ora, isso era advogar a causa dos católicos, que representavam o
maior número de adeptos, uma vez que, até 1889, a religião oficial no Brasil era a católica. A
ameaça, vinda com a República, da laicização da sociedade com a entrada do ensino laico, da
secularização da sociedade, do positivismo e da influência da maçonaria, presentes na
Constituição, representavam, para o padre Deschand, motivos suficientes para a desconfiança
do governo republicano. A desconfiança, em fins do século XIX e início do XX, era mais da
Igreja e seus prelados, visto que a grande maioria da população continuava analfabeta,
363
BENCOSTA, Marcus L.
$,JUHMDH3RGHUHP6mR3DXOR
: D. João Baptista Nery e a Romanização do
Catolicismo Brasileiro (1908-1920). 1999. Tese (Doutorado em História). Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas. São Paulo, 1999. O autor trabalha o governo de D. Nery e o item 4 do capítulo 5
o
. trata sobre
a LEC.
364
NERY, D. João Baptista. Carta Pastoral In: LUSTOSA, Oscar de Figueiredo.
,JUHMDH3ROtWLFDQR%UDVLO
Do
partido católico à LEC (1874-1945). São Paulo: Loyola, 1983, p. 87
365
DESCHAND, D.
$VLWXDomRDFWXDOGDUHOLJLmRQR%UD]LO
. Rio de Janeiro, Guanier, 1910, p. 23.
164
residindo no campo, distante das discussões, entre outras coisas, sobre o ateísmo da
República.
Em meio à modernização do país, a expansão urbanística ganhava espaço com
uma população que lentamente saía do campo e se dirigia para as cidades e aderia aos poucos
às mudanças institucionais, às novas crenças e costumes.
A Igreja católica considerava explicitamente as outras crenças como inferiores.
Como a grande maioria da população ainda freqüentemente recebia os sacramentos como o
batismo, houve prelados, como Deschand, entre outros, que no início do século XX
consideravam uma afronta a Deus e aos fiéis católicos os artigos da Constituição brasileira
que feriam a herança da grande contribuição que a Igreja católica deu ao Brasil, ao longo dos
quatro séculos de sua presença no país.
Poucos anos depois da publicação da obra de Desidério Deschand, em 1915, o
bispo de Ribeirão Preto expressou, por meio da imprensa, sua opinião sobre a fundação de um
Partido Católico: [...] os cathólicos não devem apresentar seus candidatos diretamente, mas
concorrer às urnas votando nos candidatos escolhidos sem distincção de partidos, e que
merecem nosso apoio [...]”
366
Para d. Alberto, a Igreja não deveria tratar de partidos, mas, sim, de candidatos;
estes é que mereciam sua real preocupação, por suas posturas, à partir deles é que os fiéis
deveriam ser aconselhados a dar o seu voto. A crença e as formas pelas quais o candidato se
reportava a respeito da Igreja é que o qualificava para a indicação. Ao citar o bispo d. Nery e
o trabalho desenvolvido em Campinas, d. Alberto, afirmava que estava tentando fazer a
mesma coisa em sua diocese, mas em 1913, não apuramos nenhuma medida mais concreta,
como as que foram tomadas por parte do bispo de Campinas na década de 1910.
Duas décadas depois, em 1931, o cardeal Leme enviou um comunicado em que
esclarecia que o clero deveria ficar afastado das lutas partidárias, mas que não fossem
indiferentes às justas aspirações da consciência. A declaração de d. Leme esclarecia o papel
do clero: [...] o clero continue na sua missão exclusivamente pastoral, alheio de toda a
questão de política partidária que não impliquem assumptos de religião ou moral.”
367
No entanto, os acontecimentos após a Revolução constitucionalista de 1932 e as
eleições para a Assembléia Constituinte trouxeram um novo olhar em que a Igreja se
envolveu no alistamento eleitoral, criando a LEC.
366
D. ALBERTO e o Partido Cathólico,
$&LGDGH
Ribeirão Preto, 10/ jan /1915, p.1.
367
O CLERO e os Partidos políticos.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto, Ano 2, n. 22, p. 3-4 , 1931.
165
Em 1932, quando o cardeal d. Sebastião Leme criou a Liga Eleitoral Católica, a
articulação de grupos católicos a serviço da doutrina da Igreja contribuiu para que a LEC.
viesse a se constituir numa das principais obras de apoio à Igreja, na arregimentação e eleição
de candidatos a serviço da doutrina católica e do patrimônio da família cristã. Alceu de
Amoroso Lima, que representava uma importante liderança leiga católica, um dos
responsáveis pela revista $ 2UGHP, assumiu o cargo de secretário-geral da Liga Eleitoral
Católica.
O objetivo da Liga era orientar os fiéis católicos na escolha dos representantes
políticos nas eleições. A LEC. exerceu um papel imprescindível em algumas campanhas. Ela
não representava uma organização piedosa ou de caráter eclesiástico, ou seja, era orientada
por padres, mas sua organização era laica. Sua finalidade da LEC. estava estruturada em
alguns princípios como instruir, congregar, alistar o eleitorado católico, assegurando aos
candidatos, dos diferentes partidos, a aprovação pela Igreja, o apoio dos fiéis, desde que estes
defendessem os princípios sociais e morais católicos na Assembléia Constituinte e,
conseqüentemente, na vida pública brasileira.
368
Para Bencosta
369
, a Liga de Campinas, de 1912, não deve ser confundida com a
Liga criada por d. Leme, que teve por objetivo apoiar os candidatos às Assembléias
Constituintes. Certamente os tempos eram outros, mas, refutando as palavras do autor,
afirmamos que um dos objetivos era o mesmo: impedir a entrada de candidatos que não
fossem sensíveis aos ensinamentos e às diretrizes da Igreja católica.
Na prática, o papel dessas ligas seria não apenas organizar o eleitorado católico,
mas também fazer uma incisiva frente cristã, diante da idéias anti-clericais, que desafiavam
cada vez mais a Igreja e seus seguidores. As manifestações públicas da Igreja católica, com
suas procissões, festas de santos padroeiros e outras mais populares que faziam parte da
cultura religiosa do Brasil, permitiram que a Igreja ainda considerasse que era a dona da vez,
com larga influência em toda a sociedade brasileira. O advento do século XX, com suas
inúmeras transformações sócioculturais e econômicas, bem como de novos tempos no
domínio político, vislumbrados após o término da primeira guerra mundial, deixava dúvidas
do papel representado pela Igreja diante das massas urbanas. Aumentava o número de adeptos
de outras crenças, com a liberdade de culto, o que foi motivo de preocupação para a
hierarquia da Igreja, que conclamou os fiéis a saírem da indiferença e a lutarem contra os que
abertamente a criticavam e à doutrina pregada por Cristo.
368
BEOZZO, J. O.
&ULVWmRVQD8QLYHUVLGDGHHQDSROtWLFD
Petrópolis: Vozes, 1984, p. 31-32
369
BENCOSTA, M. L. 1999. p. 199.
166
Os (VWDWXWRVGD/LJD( OH LWRUDO&DWyOLFD
370
, no seu artigo 15
o
estabeleciam que os
candidatos que queriam o aval se comprometiam por escrito a defender, no decorrer do
mandato, o programa da Liga. Era uma condição e por trás dela estavam os prelados.
Aos padres coube a tarefa de incentivar os fiéis a ingressarem na LEC. usando o
argumento de que não era um partido católico: [...] PDVSDUDDGHIHVDPDLVSHUWR GDVFDXVDV
GDSiWULDHGDIDPtOLD[...]
371
Para o cardeal d. Leme e boa parte do alto clero, inclusive d.
Alberto, a LEC representou uma solução bastante viável para a inserção dos valores da Igreja
no campo político por meio do voto dos fiéis.
Um dos argumentos usados para convencer os católicos era de que o vínculo entre
a família e a pátria colocava a presença da Igreja no seio de muitas casas e advogava uma
causa centrada nos valores do cristianismo. Uma pátria, para vivenciar a ordem e a harmonia,
requeria também a existência da família. A harmonia da tria contribuía para a estabilidade
da família que, no pensamento da hierarquia da Igreja, devia ser essencialmente a família
católica, seguidora dos princípios dessa Igreja.
A LEC incentivava o voto, alegando que votar era ato cívico e representava um
ato de amor a Jesus. Em carta dirigida aos diocesanos, d. Alberto
372
ressaltou a importância do
voto, como uma arma que a justiça havia colocado nas mãos dos cidadãos. O bispo
aconselhava aos católicos que se alistassem e escolhessem os candidatos que [...] melhores
garantias offereçam de defenderem os direitos sagrados da sua consciencia, seja qual for o
partido político ao qual pertençam. E se os leitores cathólicos assim procederem, teremos
certamente uma Constituição que não offenda os sentimentos da maioria do povo
brasileiro.
373
D. Alberto manifestou-se sobre os partidos políticos e o alistamento eleitoral, foi
bastante enfático em dizer que era contra a fundação de um partido político católico. Afirmou
que o voto, mais que um direito, era um dever do cristão, mas que a Igreja podia condenar o
procedimento dos católicos que davam seu voto para os candidatos que fossem contrários às
suas convicções religiosas. D. Alberto alertou que a atitude da Igreja foi considerada por
muitos como intransigente, anti- republicana e antipatriótica.
370
ESTATUTOS da Liga Eleitoral Cathólica.
2&UDYLQKHQVH
Cravinhos,13/nov./1932. p.1a 2
371
VIDA RELIGIOSA,
'LiULRGH1RWtFLDV
Ribeirão Preto, 11/jan./1933, p. 2.
372
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta do Bispo de Ribeirão Preto aos seus diocesanos sobre o alistamento
eleitoral.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto-SP, ano 3, n. 36, p. 1-2, dez. 1932.
373
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta do Bispo de Ribeirão Preto aos seus diocesanos sobre o alistamento
eleitoral.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 3, n. 36, p. 1-2, dez. 1932.
167
$/( &H P5LEHLUmR3UHWR
A direção da LEC era composta por quatro Juntas: nacional, estadual, regional e
local. As Juntas possuíam o papel de orientação, promovendo os trabalhos de alistamento de
acordo com as instruções baixadas pelas Juntas superiores.
374
Em Ribeirão Preto, a vinda da LEC seguiu o caminho trilhado em outras dioceses.
D. Alberto instalou as Juntas, que trabalharam em prol do alistamento de eleitores masculinos
e incentivaram a inovação introduzida nos tempos de Vargas: o voto feminino.
Por meio da cúria, a cobrança de uma atitude por parte dos vigários não ficou
somente com a carta do bispo enviada a eles. O vigário-geral, em &LUFXODU dirigida aos
vigários
375
, orientou e admoestou que aqueles que ainda não haviam formado a Junta eleitoral
nas suas paróquias deveriam envidar todos os esforços para as constituírem, enviando à cúria
os nomes dos membros da Junta. Como a circular tem data de fins do mês de janeiro de 1933,
o padre incentivava a realizarem um trabalho rápido, antes das eleições de maio, para que o
maior número de homens e mulheres pudessem estar aptos na escolha dos candidatos.
Muitas paróquias da diocese de Ribeirão Preto responderam prontamente ao apelo
do bispo e de seu vigário geral, instituindo a LEC para o alistamento dos eleitores.
As associações leigas foram mobilizadas para fazer o trabalho. A propaganda para
o alistamento dos fiéis era feita pelos jornais, em reuniões das associações, e advogava a
causa da LEC e do alistamento, alegando que qualquer outra associação contrária seria
considerada cismática, uma vez que a Liga fora instituída sob orientação da cúria
metropolitana.
376
A pressão da cúria sobre os padres para trabalharem em prol da LEC foi grande, e
o empenho de d. Alberto de seguir o caminho traçado por outras dioceses revela seu
alinhamento, como bispo, com a proposta da hierarquia da Igreja no Brasil.
O bispo determinou três pontos a serem seguidos nas paróquias da diocese a
respeito do alistamento eleitoral:
1
o
. Que esta nossa Carta seja lida e explicada mais de uma vez por ocasião
das missas ou reuniões à tarde;
374
LUSTOSA, Oscar de F.
,JUHMDH3ROtWLFDQR%UDVLO'R3DUWLGR&DWyOLFRj/(&
. São Paulo:
Loyola/CEPEHIB, 1983.
375
LAURIANO, Mons. João. Liga Eleitoral Catholica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
Ribeirão Preto-SP, ano 4, n.37, p.2,
jan 1933.
376
DEFININDO situações a LEC e os Partidos.
'LiULRGH1RWtFLDV
. Ribeirão Preto, 31/janeiro/1933. p. 1.
168
2
o
. Que seja nomeada pelos Revds. Vigários uma commissão de três
membros que se incumbam de promover ou auxiliar o alistamento eleitoral
das pessoas de ambos os sexos que foram hábeis por lei;
3
o
. Que esta commissão se corresponda com a commissão Regional da sede
da Diocese sobre os trabalhos realizados de acordo com o respectivo
regulamento.
377
A posição da Igreja, mais do que contribuir com o Estado, era salvaguardar seus
direitos. As orientações serviam para assegurar que os fiéis votariam de acordo com as
disposições da Igreja. Para explicar essa posição, d. Alberto buscou nas idéias do papa Pio X a
defesa dos católicos ao recusar o voto para os candidatos considerados adversários às
convicções religiosas que atentassem contra os dogmas do catolicismo. O momento era
propício para buscar na política uma melhor posição para a Igreja e suas necessidades, por
meio de candidatos sensíveis aos interesses do catolicismo.
Acreditamos que, como d. Alberto havia atuado diretamente na política e conhecia
de perto as artimanhas dos bastidores, ele tinha feito a sugestão de organizar o eleitorado
católico fundando ligas eleitorais.
378
O incentivo para o voto das mulheres consistia uma novidade; elas eram
chamadas para o alistamento, sob a propaganda de que a mulher católica não podia se negar a
dar o seu voto, que seria como negar a amar o Cristo.
379
Em Ribeirão Preto, as mulheres, sob
a direção de d. Elza Pompeu de Camargo e do cônego Barros, formaram o Posto Feminino de
Qualificação Eleitoral.
380
D. Alberto, ao visitar a Junta de Ribeirão Preto da LEC
381
, afirmou que a Liga não
apresentaria candidatos e que a escolha era independente de partido. Num momento
importante para definir aqueles que redigiriam as leis do país, o bispo ressaltou que era
importante escolher candidatos que se comprometessem a votar em favor das reivindicações
377
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta do Bispo de Ribeirão Preto aos seus Diocesanos Sobre o Alistamento
Eleitoral. %ROHWLP'LRFHVDQR Ribeirão Preto-SP, ano 3, n. 36, p. 1-2, dez 1932.
378
D. ALBERTO e o Partido Católico,
$&L GDGH
. Ribeirão Preto, 10/out./1915.
379
AS CATHOLICAS refratárias ao voto.
'LiULRGH1RWtFLDV
. Ribeirão Preto, 18/jan./1933, p. 1.
380
Não disponho de dados de quantas mulheres se inscreveram nas Juntas da diocese de Ribeirão Preto, mas
tudo indica que no Estado de São Paulo o trabalho da Igreja não foi em vão, uma vez que as mulheres
participaram com candidatas e uma delas, da cidade de São Paulo, foi eleita para a Assembléia Constituinte, a
médica Carlota Pereira de Queiróz, que intensificou a luta pelos direitos das mulheres na sociedade brasileira.
381
LIGA Eleitoral Cathólica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto-SP, n. 38, p.1-2, fev. 1933.
169
católicas, como o ensino facultativo religioso nas escolas, os efeitos civis do casamento
realizados de acordo com a crença dos nubentes e a rejeição do divórcio.
382
A prática sobre os candidatos revelou ser diferente. A correspondência dos
candidatos enviada à cúria nos permite fazer uma afirmação contrária à fala de d. Alberto. A
Liga pode não ter abertamente apoiado, mas ocorreu a distribuição de cédulas de candidatos
apoiados pela Igreja, como demonstra um trecho de uma carta enviada a monsenhor Lauriano
que dizia:
[...] recebendo attendi com satisfação o pedido que enviou-me V. Rvma.
para que eu mandasse cédulas com o meu nome em primeiro turno, para a
votação nas eleições do próximo dia quatorze. Isto em virtude da resolução
da Liga Eleitoral Cathólica de recomendar aos cathólicos a sufragarem-me
nas urnas.
383
Da cidade de Franca, outra indicação de que o envio de cédulas era comum: o dr.
Maciel de Castro enviou carta
384
dirigida ao vigário de Pedregulho, alegando que teve
autorização de mons. Lauriano para distribuir cédulas do Partido Constitucionalista para o
primeiro turno das eleições junto ao eleitorado católico. De São João da Boa Vista, outra
carta
385
, agradecendo à LEC da diocese o apoio no primeiro turno. Sobre o mesmo teor
encontramos outras correspondências que corroboravam o fato de que candidatos à
Assembléia Constituinte foram apoiados por prelados que distribuíam as dulas entre os
fiéis, portanto, não estavam isentos de tomar partido.
Mas houve reações contrárias, e as dificuldades foram muitas para que a LEC
fosse aceita e assumida por parte do clero. Uma disputa entre o presidente da Liga e o vigário
de Mogy-Guassú destaca como as contendas estiveram presentes. O presidente da Junta, em
carta a mons. Lauriano, acusou o padre Lúis Vieira, que não se colocou do lado do clero
paulista, não apoiou a Junta, alegando que [...] QmRWL QKDREULJDomRGHJDVWDUGLQKHLURSDUD
OHYDURVEUDVLOHLURVDVXUQDV[...]
386
Próximo à eleição, o padre tentou impedir os católicos de
382
LIGA Eleitoral Cathólica. %ROHWLP'LRFHVDQR. Ribeirão Preto-SP, n.38, p.1-2, fev. 1933.
383
JUNQUEIRA, Celso Torquato. Correspondência
ao mons. João Lauriano. Orlândia, 10/10/1934.
$&053
-
SP, Ribeirão Preto-SP. (Caixa Monsenhor Lauriano).
384
CASTRO, Dr. Maciel de. Correspondência ao vigário de Pedregulho. 9/11/1934.
$&053
SP, Ribeirão
Preto-SP. (Caixa Monsenhor Lauriano).
385
ANDRADE, Teophilo. Correspondência
a monsenhor Lauriano. 17/11/1934.
$&053
-SP, Ribeirão Preto-
SP. (Caixa Monsenhor Lauriano).
386
VIEIRA, Luis. Correspondência
ao monsenhor Lauriano. 29/4/1933.
$3+53)-30
SP, Ribeirão Preto-SP
170
votar na chapa única, em que estavam inscritos os candidatos indicados pela Junta Estadual.
Em Mogy, havia 206 eleitores inscritos na LEC.
Outra indicação das fontes pesquisadas diz respeito aos partidos. O discurso da
Igreja era de que não importava o Partido, desde que o candidato preenchesse as exigências
necessárias. Na diocese de Ribeirão Preto, um candidato à Assembléia Constituinte procurou
o bispo, denunciando a presença de padre de fora
387
que estava realizando campanha contrária
ao Partido Constitucionalista e a favor do Partido Republicano Paulista. Agremiações da
Igreja, como os Congregados Marianos, participaram abertamente de comícios ligados ao
Partido Constitucionalista, e a carta de Celso Torquato Junqueira, candidato do Partido
Constitucionalista, representa um indicativo de que a postura dos dirigentes da Igreja, pelo
menos em Ribeirão Preto não foi tão isenta quanto o discurso.
Uma pesquisa mais apurada indicaria a atuação da LEC no pleito de 1933, bem
como os seguintes. A Igreja, como instituição, saiu vitoriosa, quando conseguiu aprovar
algumas de suas principais exigências na Constituição de 1934.
[...] incluindo apoio financeiro do Estado à Igreja, a proibição do divórcio e o
reconhecimento do casamento religioso, a educação religiosa durante o período escolar e os
subsídios do Estado para as escolas católicas.”
388
Em agosto de 1934, d. Alberto enviou um 0DQGDPH QW R destinados aos
diocesanos, com uma orientação para as eleições. Nele, o bispo deixa claro qual o papel do
cristão: o catholico que vota em inimigo da sua fé, é mais traidor do que um partidário que
vota em um partido contrário ao seu.”
389
O bispo enumera os princípios pelos quais era importante escolher os candidatos
adequados, uma vez que para ele os inimigos da fé não davam trégua atacando os católicos de
estarem sendo protegidos pela Constituição. d. Alberto explica que: Os postulados,
chamados religiosos, o foram incluídos na Constituição pelos padres, que eram apenas três
na Constituinte, como affirmam, mas sim por uma maioria considerável dos legisladores, e
não aproveitam à religião catholica exclusivamente, como se vae ver.”
390
Tudo indica que candidatos apoiados pela LEC foram eleitos, mostrando a força
da arregimentação dos católicos em torno de uma causa. Uma pesquisa sobre o papel da LEC
387
TORQUATO, Celso. Correspondência
a d. Alberto. 26/9/1934.
$&053
-SP, Ribeirão Preto-SP. (Caixa
Monsenhor Lauriano).
388
MAINWARING, Scott.
,JUHMD&DWyOLFDH3ROtWLFDQR%UDVLO
. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 48
389
D. Alberto José Gonçalves. Mandamento. %ROHWLP'LRFHVDQR. Ribeirão Preto, ano 5, n. 56, p. 2-4, agosto
1934.
390
D. Alberto José Gonçalves. Mandamento.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto, ano 5, n. 56, p. 2-4, agosto
1934
171
em cada cidade da diocese e os candidatos regionais eleitos pode indicar o êxito da força da
Igreja.
Concomitante à LEC, a luta pelo ensino religioso ganhou fôlego com a brecha
aberta pelo governo do retorno do ensino religioso às escolas. A tarefa de d. Alberto e dos
padres era instituir o ensino religioso nas escolas públicas das cidades pertencentes à diocese.
2HQVLQRUHOLJLRVRQDVHVFRODVFDWyOLFDVHS~EOLFDV
A educação representa no conjunto da história da Igreja um ponto imprescindível
de apoio à permanência da doutrina e das práticas pregadas pela hierarquia eclesiástica.
No século XX, a Igreja ainda exercia poder sobre a vida cotidiana das pessoas. Os
censos realizados pelo governo republicano apontam para uma permanência do catolicismo, a
religião praticada pela maioria dos brasileiros. Um dos fatores que contribuíram para a
permanência do catolicismo na vida cotidiana estava embasado nas escolas católicas e no
ensino religioso nas escolas. Com a proclamação da República e a separação entre o Estado e
a Igreja, veio a proibição do ensino religioso nas escolas públicas. D. Alberto, como padre no
Paraná, ocupou cargo de professor de escola pública
391
e, como deputado, fez parte da
Comissão de Instrução, Educação, Catequese e Civilização dos índios, entre outros trabalhos
que desempenhou em prol da educação. Quando chegou a Ribeirão Preto, logo tomou
providências para instalar escolas católicas na sede da diocese.
A escola pública estava presente em Ribeirão Preto antes da fundação dos
colégios confessionais. Os Metodistas anteciparam-se aos católicos, fundando um colégio em
1898
392
; estes tiveram sua primeira escola no início do século XX.
(VFRO DV F DWyOLFDVHP5LEHLUmR3UHWR
As escolas católicas constituíam um dos pontos importantes de guarda da e da
moral católica. Uma das primeiras escolas católicas em Ribeirão Preto, fundada em 1903, foi
o Externato Agostiniano, dos padres dessa ordem. A escola, gratuita, apesar de pequena,
revestiu-se de importância, pois funcionou até mesmo com ensino noturno, aberto em 1912,
destinado aos operários, numa época em que estudar ainda era privilégio de poucos. O
391
D. Alberto como deputado escreveu Projeto de lei sobre Ensino Público. BALDIN, 2006.
392
ALMEIDA, V. de.
(QVLQDUHFRQYHUWHU
: a ação Educacional Metodista em Ribeirão Preto, 1889-1950.
Estudos de História, Franca, v.5, n.1, p. 57-70.
172
Externato era o único estabelecimento de ensino particular que aceitava alunos gratuitamente.
Pouco se sabe sobre o Externato Agostiniano, no entanto, a cidade de Ribeirão Preto do início
do século XX recebeu, com ele, o impulso inicial para o estabelecimento de outras escolas
católicas.
Em 1912, incentivadas por d. Alberto, as irmãs Ursulinas estabeleceram colégio
para atender a população feminina. Era o primeiro colégio católico feminino de Ribeirão
Preto. O projeto educacional fazia parte da reforma iniciada no século XIX, em que as escolas
católicas desempenharam um papel diante da sociedade laica. Nas palavras do prof. Ivan
Manoel: [...] da e cristã para filhos cristãos; de filhos cristãos para famílias cristãs; das
famílias cristãs para a sociedade cristã. Com isso, esperava-se, em breve tempo, recristianizar
toda a sociedade moderna.
393
O ensino religioso constituía um meio para a Igreja chegar às classes média e alta
da sociedade, meninos e meninas recebiam uma educação pautada nos ensinamentos e valores
cristãos, no desapego das coisas mundanas.
Em 1918, convidadas e apoiadas por D. Alberto, chegaram as Irmãs Salesianas, da
Congregação das Religiosas Filhas de Maria Auxiliadora, fundando o Colégio Nossa Senhora
Auxiliadora.
394
Em 1938, os religiosos Maristas estabeleceram um colégio para os meninos,
procedentes da cidade de Franca, local em que haviam estabelecido seu colégio em 1902.
395
Os Maristas contribuíram para fechar um ciclo de escolas católicas que funcionaram durante o
governo de d. Alberto, na sede do bispado. A tardia fundação do colégio para meninos
explica-se pela proximidade da cidade de Batatais, local que possuía um colégio católico para
meninos, que funcionou também como colégio diocesano.
O colégio fundado em 1905 pelo padre Salesiano Atílio Cosi, como Escola
Agrícola de Batatais, passou a ser parte da diocese de Ribeirão Preto, em 1910, quando d.
Alberto o adquiriu por vinte contos de réis. Em 1912, esse colégio passou para a orientação
dos Padres do Verbo Divino, conhecidos como padres alemães, e recebeu o nome de Colégio
São José de Batatais.
396
393
MANOEL, Ivan Aparecido.
,JUHMDH(GXFDomRIHPLQLQD
(1859-1919). Uma face do conservadorismo. São
Paulo: Unesp, 1996, p. 49
394
FURTADO, Alessandra C.
0XOKHUHVFXOWDVHGHYRWDV
o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora de Ribeirão
Preto (1918-1960). Franca: Unesp, 2001. (dissertação de mestrado).
395
SAADI, Lamia J.
(GXFDomR0DULVWD2&ROpJLR&KDPSDJQDWGH)UDQFD
. Franca, 2002.
396
CORREIA, Padre Francisco de
$+LVWyULDGR6HPLQiULR$UTXLGLRFHVDQR0DULD,PDFXODGDGH5LEHLUmR
3UHWR
. Ribeirão Preto: 2005, p. 22 et seq.
173
Nas cidades maiores do bispado, atendendo a pedidos do bispo, religiosos
fundaram suas escolas para meninos e meninas, sob a forma de internato ou externato. Dentro
das escolas católicas funcionavam associações como Filhas de Maria, para as moças, e
Congregados Marianos, para os rapazes. Os relatórios apontavam as diferentes atividades em
que a juventude estudantil era envolvida, como retiros, missas seguidas de saraus e outras
apresentações musicais e teatrais, passeios nas cidades vizinhas, entre outras atividades. A
presença do bispo ou de monsenhor Lauriano abrilhantando as festividades das escolas
católicas foi constante e contribuiu para reafirmar a importância das escolas católicas na
permanência dos valores morais e éticos pregados pela Igreja.
2HQVL QR UH O LJLRVRQDVHVFRODVS~EOLFDV
A Igreja, que perdera espaço com a separação do Estado em 1889, já nas
primeiras décadas, obteve trânsito dentro das escolas. Entre 1920 e 1930, foi grande o avanço
do ensino religioso. Uma ampla correspondência foi trocada entre padres, bispos, leigos
discutindo o assunto e as formas de ação.
O Partido Político Regenerador de Minas Gerais, que teve à sua frente o leigo Dr.
Joaquim Furtado de Menezes, no Manifesto do Partido, expressava que o governo não podia
embaraçar o ensino religioso
397
precisava, sim, impulsionar a instrução do povo e levar em
conta suas crenças. Considerando que a maioria da população brasileira em 1909, época em
que foi lançado o Manifesto, constituía-se de católicos, o autor afirmava que o governo não
podia impedir os católicos de ministrar uma instrução religiosa ao povo. Para Menezes, se
outras crenças advogassem a mesma causa, os católicos precisavam reagir, pois o objetivo da
instrução religiosa era rebater a crescente secularização da sociedade.
Na década de 1930, durante o governo de Getúlio Vargas, a discussão sobre o
ensino religioso nas escolas públicas ganhou espaço. Os jornais publicavam artigos
defendendo a liberdade de pensar e escolher sua própria crença. A oficialização do ensino
religioso era considerada como um crime, o fim da liberdade, o fim do que a República e a
laicização haviam conseguido a duras penas.
A Igreja era acusada de prejudicar o progresso e de ser um empecilho à evolução
natural do homem.
398
Enquanto para alguns essas acusações pareciam banais, para outros,
397
LUSTOSA, O de F.
,JUHMDH3ROtWLFDQR%UDVLO'RSDUWLGRFDWyOLFRj/(&
São Paulo:
Loyola/CEPEHIB, 1983, p. 60.
398
BAPTISTA, Luiz Antonio. Religiões.
'LiULRGH1RWtFLDV
. Ribeirão Preto. 25/nov./1933, p. 5
174
conforme publicava o jornal 'LiULRGH1RWtFLDV o retorno do ensino religioso constituía sério
entrave. A Igreja, que buscava ocupar seu espaço na sociedade, considerava o retorno como
um significativo ganho. Apesar dos protestos de alguns, houve empenho da instituição em ter
a seu lado nas discussões a elite política, capaz de assegurar que novamente ela estaria dentro
das escolas.
Em 30 de abril de 1931, pelo Decreto n. 19.941, os católicos conseguiram do
governo de Getúlio Vargas a aprovação para o ensino religioso; embora inicialmente
facultativo, foi um triunfo da causa da Igreja na tentativa de cristianizar a sociedade.
A vitória do catolicismo veio com o Decreto n. 6.766, de 11 de outubro de 1934.
Nele, ficavam especificados os procedimentos a respeito do que competia ao Estado e às
autoridades do culto. O artigo 2
o
. do Decreto estabelecia que:
O pedido de matricula dos alunnos que tenham de receber ensino religioso
nesses estabelecimentos deve vir acompanhado de documento assignado
pelo pae ou responsável, declarando qual a confissão religiosa e cujos
princípios deseja sejam ministrados a seu filho e tutelado.
399
O Decreto proibia nas escolas oficiais a presença de símbolos, distribuição de
folhetos ou impressos de propaganda religiosa de qualquer culto durante as aulas comuns.
A igreja aproveitou a oportunidade e deu impulso à organização do ensino
religioso nas escolas públicas. Com a novidade, os padres escreveram à cúria pedindo
esclarecimentos, empenharam-se junto aos fiéis e às escolas para estabelecer o ensino
religioso. Era preciso esclarecer qual o papel da Igreja diante da permissão do retorno do
ensino religioso nas escolas públicas, sobre o que Ivan Manoel esclarece:
Requerer o direito de ensinar nas escolas mantidas pelo Estado, ou, mais
ainda, requerer o controle de todo o processo educacional não era, conforme
o pensamento da hierarquia católica, um ato político destinado a se limitar à
finitude do tempo humano, porque do tempo secular quem deve cuidar é o
Estado.
À igreja cabe cuidar do tempo eterno, destino natural da alma, que depende
da sua orientação, de sua educação para realizar esse plano divino.
400
399
O ENSINO religioso nas escolas.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto,. ano 2, n. 16, p. 9-10, abr 1931.
400
MANOEL, Ivan Aparecido.
,JUHMDHHGXFDomRIHPLQLQD
1859-1919. Uma face do conservadorismo. São
Paulo: Unesp, 1996, p. 58.
175
Internamente, os dirigentes religiosos enfrentariam uma intensa luta para colocar
em prática o ensino religioso. Era preciso cuidar do plano divino, ou seja, cuidar para que os
alunos recebessem a adequada e única orientação capaz de instruí-los na católica. Orientar
os padres, professores e ganhar a adesão dos diretores e dos pais dos alunos e da comunidade
em geral tornou-se o desafio da Igreja naquele momento.
Coube a monsenhor Lauriano escrever ao clero, falando da importância do projeto
e dos resultados que, para ele, poderiam ser alcançados nos corações e nas inteligências das
crianças, dos professores e dos próprios chefes de família. Ele expôs a cada categoria as
vantagens morais e espirituais que o ensino religioso poderia proporcionar, com um surto
consolador de progresso moral no meio da sociedade.”
Com o Decreto aprovado, a hierarquia da Igreja começou a articular a prática. Por
meio da cúria de Ribeirão Preto, no afã de facilitar, monsenhor Lauriano providenciou um
compêndio da doutrina católica a ser distribuído entre as paróquias para orientação dos
professores, sugerindo que cada paróquia formasse uma comissão para angariar fundos para
as despesas, e caberia aos padres fazer propaganda das vantagens do ensino religioso no
púlpito e na imprensa. O compêndio foi a obra de George Schreiner: +RUDVFDWHTXpWLFDV, que
era completado com outra obra: ([SOLFDomR GR SHTXHQR FDWHF L VP R, do padre Jacob
Huddleston Slater. Certamente outras obras foram usadas pelos professores pois, em 1940, a
arquidiocese de São Paulo resolveu unificar esse ensino e adotou o &DWKHFLVPR do padre C.
Guinet, em três volumes, obrigatórios para a arquidiocese a partir de 1941.
Com os livros indicados, o ensino religioso transmitia a doutrina e seus dogmas.
A tarefa dos professores era ensinar os valores da fé cristã, procedimentos de conduta moral,
explicações sobre a católica, como a Santíssima Trindade, os sacramentos, bem como
alertar as crianças e os jovens para os perigos das outras crenças. Em aula semanal, cada
turma de alunos era instruída sobre as verdades da fé e o que se esperava de um cristão no dia-
a-dia.
O ensino religioso foi organizado com um diretor arquidiocesano, um diretor
diocesano e um diretor paroquial, nomeado pela autoridade eclesiástica de cada diocese. O
diretor paroquial estava representado pelo pároco, a quem cabia nomear os professores
indicados pelo inspetor. Inicialmente, alguns padres ministraram as aulas. Os padres
estrangeiros foram proibidos de assumir o cargo, e eram muitos os padres nascidos fora do
Brasil. Foi preciso destinar aulas aos leigos, e aos padres, a supervisão e orientação. Como os
176
0
10.000
20.000
30.000
40.000
50.000
60.000
1939 1940 1942 1943
vigários não podiam exercer o cargo de inspetores do ensino religioso, eram nomeados leigos.
Aos inspetores cabia a tarefa de zelar pela execução do programa sob a orientação do vigário.
A cúria propôs que os padres organizassem a catequese preparando os
professores.
O livro de Tombo da matriz Nossa Senhora Aparecida de Sertãozinho
401
descreve
que a aula inaugural do ensino religioso tinha início com o Hino Nacional e encerrava-se com
o hino “ Queremos Deus.” Os católicos acreditavam que a Igreja e a pátria estavam unidas por
uma causa comum. A ação pedagógica estava revestida das nçãos divinas, que seriam
estendidas à pátria no entender da Igreja.
Mas os relatórios enviados à cúria de Ribeirão Preto apontam irregularidades.
Inúmeras foram as causas levantadas por monsenhor Lauriano que, no seu parecer, impediam
o avanço do projeto: a vontade de diretores ao não orientarem os alunos no momento da
matrícula, dificultando o trabalho dos sacerdotes; irregularidade no horário, que era
utilizada a última hora com prejuízo da atenção; acanhamento de exigir dos diretores o
cumprimento da lei; alguns diretores anulavam as nomeações de professores não eleitores,
como muitos vigários, ficando os grupos sem aulas; diretores de outras crenças não
facilitavam a aplicação do decreto, etc.
O processo de aprendizado dependia do laicato, mas poucos padres reconheciam
sua importância como uma liderança autônoma. Os padres, a partir das paróquias, deveriam
trabalhar para que a boa leitura chegasse a a escola pública, neutralizando ações da
sociedade laica e ou dos grupos contrários à postura da Igreja.
402
A correspondência trocada entre padres e a cúria e os comunicados publicados no
Boletim Diocesano demonstram que a Igreja vislumbrava que por meio do ensino religioso
nas escolas poderia atingir as massas. Em alguns anos, o número de alunos foi bem
representativo, conforme podemos ver seguinte no gráfico.
401
LIVRO de Tombo da Paróquia de Nossa Senhora Aparecida. n. 1, p. 123.
$316$6H
-SP- Sertãozinho.
402
DIEL, Paulo Fernando. A paróquia no Brasil na restauração católica durante a Primeira República. In.
LONDONO, F. T. (Org.).
3DUyTXLDHFRPXQLGDGHQR%UDVLO
. Perspectiva histórica. São Paulo: Paulus, 1997.
177
)RQWH
Boletim Diocesano: 1939/1943.
Os números oscilam também em outros dados quantitativos enviados à cúria. Os
padres não enviavam os dados todos os meses e os relatórios ficavam em branco. Outra
hipótese para explicar a ausência dos dados é que estes podiam não ser enviados à cúria com
tempo de sair no relatório anual organizado pelo vigário-geral e publicado no Boletim
Diocesano.
Citamos como exemplo a paróquia de Santa Rita de Cássia, em Santa Rita do
Passa Quatro, em que os dados apontam uma adesão de 97%
403
dos alunos matriculados no
Grupo Escolar e de 100%
404
na Escola Normal do Município.
Na cidade de Santa Rita do Passa Quatro não havia pessoas que professavam
outras crenças? Seria possível que somente os católicos estivessem matriculados nas escolas?
Uma pesquisa aprofundada sobre os relatórios enviados à cúria e confrontados
com outros documentos das diretorias de ensino e dos arquivos das escolas de cada cidade da
diocese, como o número de classes e alunos matriculados nas escolas, pode revelar como o
ensino religioso foi ministrado em cada uma das paróquias da diocese em salas de aula na
zona urbana e rural.
Nos gráficos a seguir, podemos visualizar o número total de salas de aula e de
professores entre os anos de 1939 e 1943, conforme dados do Boletim Diocesano.
403
TOLEDO, Gabriel Pompeu de Campos. Correspondência ao monsenhor Manuel Vinheta. 20/5/1934. Santa
Rita do Passa Quatro.
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH6DQWD5LWDGH&iVVLD
.
404
SARMENTO, Augusto de Vasconcelos. Correspondência ao monsenhor Manuel Vinheta. 20/5/1934. Santa
Rita do Passa Quatro.
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH6DQWD5LWDGH&iVVLD
.
178
0
200
400
600
800
1.000
1.200
1.400
1939 1940 1942 1943
Salas
Professores
)RQWH
Boletim Diocesano de Ribeirão Preto de 1939 a 1943.
Apesar dos depoimentos citados, a Igreja estava longe de alcançar a adesão de
cem por cento, uma vez que os problemas eram estruturais e, nas palavras de Mainwaring: “ A
educação religiosa deveria ser contínua, ao invés de orientada somente às crianças que
estavam se preparando para a primeira comunhão.
405
Mas não se pode negar o empenho do bispo d. Alberto, do vigário geral,
monsenhor Lauriano, e de outros padres para executar a obra, o que pode ser atestado pelos
esforços de orientar, contribuindo que materiais e compêndios chegassem até os padres e por
meio deles, aos professores.
Os relatórios enviados à cúria revelam que o ensino religioso esteve presente em
todas as paróquias da diocese. Os problemas foram inúmeros e de toda ordem, conforme
vimos anteriormente. A Igreja implantou o ensino religioso nas escolas e podemos afirmar
que teve seus ritos na diocese de Ribeirão Preto, tentando anular as forças dos colégios
protestantes, que eram considerados nefastos. As aulas foram ministradas em escolas, nas
cidades e na zona rural. Todas as cidades da diocese, em maior ou menor número, tiveram
aulas de ensino religioso, o que revela, em parte, o êxito do projeto.
O momento era fecundo para a Igreja, que avançava com suas propostas de um
maior engajamento dos leigos em suas obras, por intermédio da Ação Católica.
405
MAINWARING, S.
,JUHMD&DWyOLFDH3ROtWLFDH3ROtWLFDQR%UDVLO
. São Paulo: Brasiliense,
1989, p. 50.
179
$omR F DWyOLFD
A participação ativa dos leigos na Igreja teve seu impulso depois de o papa Pio X
ter publicado em 1905, em italiano, a Encíclica ,OIHUPRSURSyVLWR. A obra é considerada por
Casella como la prima meditazione organica sulla teologia del laicato.”
406
O autor considera
essa Encíclica precursora da chamada teologia do laicato, elaborada por Pio XI e os papas
seguintes.
A ão Católica nasceu na Itália, firmando-se no pontificado de Pio XI.
Concomitante ao que ocorria na Itália, na lgica, por iniciativa do padre Joseph Cardjin,
surgia a Juventude Operária Católica, a JOC, que deu impulso à formação do apostolado leigo
com o método ver, julgar e agir.” A Encíclica8ELDUFDQR do papa Pio XI, em 1922, referia-
se à necessidade de formar um exército de militantes cristãos. Foi nesse contexto de igreja que
a Ação Católica surgiu difundindo o papel do apostolado laico em auxílio ao clero.
407
Os objetivos e métodos para a Ação Católica eram claros e precisos [...] levar à
frente a grande ‘cruzada’ : ‘sacralizar’ a sociedade paganizada.”
408
Uma das propostas da
Igreja era renovar a vida do cristão por meio de várias frentes, tais como o ensino religioso
nas escolas públicas e a eleição de candidatos que apoiassem as demandas e interesses
católicos em todas as circunstâncias, tirando os católicos de sua letargia, para fazer oposição
ao modernismo, numa militância católica que foi se intensificando após a década de 1920.
Somente na década de 1930 é que a Ação Católica chegou ao Brasil, no momento
em que um dos principais expoentes do episcopado era d. Sebastião Leme da Silveira Cintra.
Ele acreditava que a mobilização dos fiéis católicos permitiria à Igreja recuperar seu espaço
na sociedade brasileira. A Ação Católica era um campo vasto, missionário, que apontava em
direção a uma Igreja mais participativa da vida cotidiana dos operários, da juventude,
imprensa, entre outros campos de atuação.
A Igreja contava, no Rio de Janeiro, desde a década de 1920, com o apoio da
revista $2UGHP e do Centro D. Vital, fundados por Jackson de Figueiredo.
409
Após a morte
406
CASELLA, Mario.
/¶$]LRQH&DWWROLFD'HO1RYHFHQWR
. Aspetti, momenti, interpretazioni, personaggi.
Roma: Veritas, 2003, p. 12.
407
MATOS, Henrique C. J.
8PHVWXGRKLVWyULFRVREUHRFDWROLFLVPRPLOLWDQWHHP 0LQDVHQWUHH
Belo Horizonte: O Lutador, 1990, p. 196 e s.
408
LUSTOSA, O. de Figueiredo.
&DWHTXHVH& DWyOLFDQR%UDVLOSDUDXPDKLVWyULDGDHYDQJHOL]DomR
. São
Paulo: Paulinas, 1992, p. 103.
409
Jackson de Figueiredo nasceu em Aracaju em 1891, exerceu intensa atividade como professor, jornalista,
ensaísta, crítico. Convertido ao catolicismo, é considerado um dos principais expoentes do laicato católico do
início do século XX, agente de transformação a partir das obras por ele fundadas, que representavam a irradiação
180
prematura de Jackson, tem destaque a liderança de Alceu de Amoroso Lima
410
à frente do
laicato brasileiro. A revista $2UGHP tinha por objetivo a recristianização da inteligência
brasileira. A igreja o queria que os intelectuais brasileiros se aproximassem do comunismo
e, para isso, a Ação Católica era o contraponto necessário para fazer valer suas idéias e a
doutrina.
O papel daão Católica era impulsionar o lugar dos leigos na vida apostólica da
Igreja. Dirigidos pela hierarquia, os leigos seguiam um programa de aperfeiçoamento
espiritual e desenvolvimento da ação social, com o objetivo de instalar o reinado de Cristo na
sociedade. Com um discurso de estar acima dos partidos políticos, a ão Católica atuava
indiretamente na sociedade e na política, com os adultos e as crianças para consolidar o reino
de Cristo na terra. A afirmação de Amoroso Lima de que os católicos deveriam participar
ativamente da vida pública fica expressa na afirmação: Os católicos não podem conservar-se
indiferentes no debate político.[...] A participação dos católicos na vida publica do seu país se
faz pela Ação Católica, pela ação social ou pela ação política.”
411
Em 1935, os bispos brasileiros lançaram um documento esclarecendo a posição
dos leigos e da Ação Católica: é a participação organizada do laicato catholico do Brasil no
apostolado hierarchico, para a difusão e actuação dos princípios catholicos na vida individual,
familiar e social.”
412
A tarefa das dioceses e paróquias era implantar a Ação Católica e nas paróquias
cabia ao sacerdote: a) estimular o apostolado do laicato coordenando as atividades das
diversas associações, b)urgir e executar, através das respectivas associações, os planos e
diretrizes dos órgãos superiores da Ação Católica.
413
A finalidade da Ação Católica, constava no documento dos bispos:
[...] dilatar e consolidar as actividades catholicas, propugnando pela
formação e o apostolado dos catholicos leigos no território nacional; reunir
em organizações próprias de caráter nacional, diocesano e parochial,
da ação social e espiritual dos católicos e suas idéias uma reação contra os socialistas. Faleceu em 1928, aos 37
anos de idade.
BEOZZO, J. Oscar. & ULVWmRVQD8QLYHUVLGDGHHQD3ROtWLFD. Petrópolis: Vozes, 1984. p.23 et seq.
410
Alceu de Amoroso Lima nasceu em Petrópolis em 11 de dezembro de 1893, converteu-se ao catolicismo por
influência de Jackson de Figueiredo, assumiu a direção do Centro D. Vital, publicou inúmeras obras na defesa do
catolicismo e foi um dos principais expoentes da Ação Católica no Brasil.
411
LIMA, Alceu de Amoroso. Recapitulando. $2UGHP, p. 16 a 18, jul. 1937.
412
ESTATUTOS da Ação Católica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 6, n. 66, p. 2, jun 1935.
413
LAURIANO, Monsenhor João. Acção Catholica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 6, n. 68, p. 1-3,
agos 1935.
181
homens, senhoras e a juventude, coordenando, ao mesmo tempo, todas as
associações e obras catholicas existentes.
414
Impossibilitada de realizar um levantamento em cada paróquia do antigo território
da diocese de Ribeirão Preto, acompanhamos os passos da Ação Católica no período
estudado, a partir do Boletim Diocesano e das correspondências que pertencem ao Fundo José
Pedro de Miranda, do Arquivo Público de Ribeirão Preto e do Arquivo da Cúria de Ribeirão
Preto, com a pasta de monsenhor dr. João Lauriano, entre outras fontes.
Depois de 1935, o Boletim Diocesano publicou vários artigos a respeito da Ação
Católica, os quais abordam temas como: os comunicados do vigário-geral do bispado,
transcrição de documentos dos bispos brasileiros sobre a ão Católica Brasileira, carta de
Pio XI ao cardeal Leme e ao episcopado brasileiro sobre a importância da Ação Católica
Brasileira, estatutos, instruções, pedidos de relatórios aos párocos, admoestações para os
padres que não implantaram a Ação Católica ou o enviavam relatórios sobre o movimento
nas paróquias, entre outros assuntos.
Os artigos explicavam que os padres, em cada paróquia, deveriam organizar um
metódico e regular curso doutrinário, destinado a tirar os leigos da ignorância religiosa em
que se encontravam e engajá-los na obra missionária da Igreja. A tarefa dos padres era
enfatizar que a base principal da Ação Católica era a instrução religiosa, que deveria ser
desenvolvida ao lado de outras práticas, como a freqüência aos sacramentos, santificação dos
domingos e dias santos de guarda, santificação da família, educação dos filhos.
Monsenhor Lauriano insistia em seus artigos que as bases da Ação Católica eram
a instrução religiosa e a prática fiel da doutrina, com a finalidade de conhecer, amar e servir a
Deus em todas as manifestações particulares e sociais dos homens. Segundo ele, os católicos
necessitavam conhecer Jesus Cristo, o evangelho e a Igreja. Para isso, monsenhor Lauriano
sugeriu que se organizasse em cada paróquia um metódico e regular curso ordinário,
instruindo os fiéis e combatendo a ignorância sobre as coisas da Igreja.
415
Para o monsenhor,
os padres deveriam dar essa orientação e, pelo menos uma vez por mês, freqüentar as
reuniões. Cada membro da Ação Católica recebia uma folha contendo a ação do mês e nela
escrevia o que tinha feito; a folha seria devolvida na reunião seguinte, e o resultado dessas
ações seria enviado à cúria a cada três meses. O sistema sugerido por monsenhor representava
414
O MANDAMENTO promulgatório.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 6, n. 66, p. 1-2, jun 1935.
415
LAURIANO, Monsenhor João. Acção cathólica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP,. ano 6, . 68, p. 1-2,
agosto 1935.
182
uma tentativa de controle das ações dos fiéis em executarem a obra, a pedido de d. Alberto,
alegando que era vontade do papa e de Deus.
A Ação Católica foi organizada para atingir toda a população católica masculina e
feminina, dos oito anos até a vida adulta e estava dividida por seções: religiosa, cívica e
social.
A inscrição na Ação Católica estava condicionada a quatro pontos: vida exemplar,
prática dos sacramentos, aceitação dos programas propostos por ela, pagamento de taxa anual.
As diretorias eram compostas de assistente eclesiástico, presidente, secretário e tesoureiro. A
diretoria diocesana era nomeada pelo bispo, e a paroquial, pelo pároco. A Ação Católica
Brasileira permitia que seus membros fossem filiados a partidos políticos, desde que seus
programas encontrassem fórmulas de manter afastada alguma atividade nociva aos princípios
da Igreja. A organização contava com: Comissão episcopal, Junta nacional, Conselho
nacional, Juntas e Conselhos diocesanos, Conselhos provinciais e paroquiais.
Uma das questões importantes presentes na Ação Católica era a subordinação à
hierarquia eclesiástica. Pio XI chegou a afirmar que esta estava acima da política de partidos e
que cabia a ela restaurar as coisas em Cristo, difundir seu reino nas famílias e na sociedade.
Para o papa Pio XI, o ideal da Ação Católica era o advento do reino de Cristo, portanto, a
festa de Cristo Rei era a festa da Ação Católica.
416
Nas palavras de monsenhor Lauriano, a Ação Católica havia chegado para tirar os
cristãos da letargia e do egoísmo em que viviam, [...] freqüentando os sacramentos quase
exclusivamente para proveito próprio... e que [...] os católicos que não seguiam o proposto
pela Ação Católica ficavam impedidos de viver na santificação do indivíduo, da família e da
sociedade”. Esse método, no pensamento da Igreja, permitiria que o fiel leigo se tornasse o
principal colaborador dos vigários nas paróquias.
A função da Ação Católica era clara: organizar e coordenar, sob a direção dos
padres, as diferentes associações que já existiam, inserindo o indivíduo e sua família no
conjunto das atividades religiosas e sociais do seu programa.
Pio XI dirigiu uma carta ao cardeal Sebastião Leme e ao episcopado, sobre a Ação
Católica brasileira, em 27 de outubro de 1935, que o Boletim Diocesano publicou a partir do
número 74, de fevereiro de 1936. Na carta, Pio XI escreveu sobre a imensidão do Brasil, que
requeria um maior número de sacerdotes e que, por isso, o engajamento dos leigos podia
contribuir para a obra da ão Católica. Ele reconhecia o esforço da hierarquia da Igreja para
416
LAURIANO, Monsenhor João. Acção cathólica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 6, n. 69, p. 1-2,
agosto 1935.
183
as vocações, até mesmo com a fundação de um colégio em Roma, mas a contribuição dos
leigos com ordem e método, como em todas as batalhas, era fundamental, insistindo que, era
necessário uma formação religiosa, moral e social “ [...] em grupos bem adestrados na teoria e
na prática [....] para ser o fermento evangélico que fará levantar a massa.”
417
O termo
adestrado”, usado por Pio XI, combinava com a realidade do que a Igreja, a partir de seus
padres, fazia no controle dos leigos. Outro destaque na carta foi o incentivo para a formação
de batalhões de valorosos soldados que atuariam defendendo o reinado de Cristo.
Em 1935, era diretor da ão Católica na diocese de Ribeirão Preto, bem como
dos Congregados Marianos, o cônego dr. Francisco de Assis Barros, roco da catedral e
secretário do bispado. O cônego Barros incluiu nas reuniões dos congregados, palestras, com
temas gerais abordando a Ação Católica.
Em 1937, o relatório do pároco da cidade de Mococa, padre Virgílio Malatesta,
discorreu sobre a ão das associações na cidade e da Ação Católica. A respeito dos
Congregados Marianos, escreveu que promoveram com bons resultados a Páscoa dos homens.
As Filhas de Maria executaram suas benéficas atividades e realizaram o retiro. Os elogios
maiores do pároco foram para o Apostolado da Oração, que lutou pela santificação das
famílias, levando um bom número de es e empregadas do comércio para as conferências
morais religiosas. O fruto foi a legalização canônica dos casais amancebados, que haviam
realizado somente o casamento civil. Quanto ao ensino religioso, diz o padre, houve um
esforço dos padres Capuchinhos para a realização da Semana do Ensino Religioso, com
conferências diárias explicativas, mas que os adultos desertaram de muitas delas. Nas escolas
que prevaleceram, os frutos foram bons. O último trecho do relatório transcrito a seguir
deixou uma visão mais ampla dos resultados:
[...] a maioria dos catholicos, mostra-se refractaria, ao menos indifferente
para uma organização mais realistica e própria da Ação Catholica. A
actuação da Junta Parochial da Ação Catholica não passou além d’ uma
representação puramente decorativa, limitando sua acção a intervir a umas
reuniões de caráter orgânico e directivo para organização preliminar, para
arregimentação própria, dicta dos catholicos em geral. Mas, quando se tratou
de por em execução o programma traçado, a excepção de uns bem
intencionados, a maioria desertou, faltando a seus compromissos.
418
417
PIO X. Acção Catholica Brasileira.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, n. 74, p. 1-3, fev. 1936.
418
LIVRO de Tombo da Paróquia de São Sebastião, p. 49 (1937).
$3660R
-SP. Mococa-SP.
184
Acredito que, assim como Mococa, outras paróquias da diocese de Ribeirão Preto
pouco ou quase nada fizeram em prol da Ação Católica antes da década de 1940. No
conjunto, as atividades acabavam sendo restritas a algumas ações caritativas e devocionais,
não atingindo o campo das formações consideradas como teóricas ou doutrinárias. Os párocos
queixavam-se de que membros atuantes dentro das associações nada ou quase nada faziam
para o trabalho da Ação Católica e consideravam que isso era fruto da falta de compreensão
da importância do seu verdadeiro apostolado ou da falta de preparo dos membros da Junta.
419
Tudo indica que na diocese de Ribeirão Preto, no início dos anos 1940, os leigos
estavam como os italianos das décadas de 1920 e 1930, que o pesquisador Cassela considerou
como passivos, inertes, imaturos, sem iniciativa.
420
A Ação Católica exigia um envolvimento
com a doutrina, a ação social e pastoral por parte do laicato em união com o clero.
Na prática, a implantação da Ação Católica ocorreu lentamente em algumas
paróquias, a partir das associações religiosas laicas. Da publicação das primeiras orientações
no Boletim, até meados de 1940, pouco foi feito. D. Alberto pedia maior empenho dos padres
e dos leigos. Monsenhor Lauriano exigia uma resposta dos grupos citados sobre a implantação
da Ação Católica e o ensino religioso. A exigência dos relatórios, discriminando com detalhes
o que estava sendo feito, era uma resposta aos incessantes pedidos da hierarquia da Igreja.
2SURMH W RGRUiGLR
Em Ribeirão Preto, esforços foram envidados por d. Alberto para implantar a
Ação Católica. Na segunda metade da década de 1930, monsenhor Lauriano, um aficionado
por rádio, seguindo os passos do que ocorria no restante da Igreja e em especial na
arquidiocese de São Paulo, tentou introduzir na diocese de Ribeirão Preto os programas
radiofônicos da Ação Católica. Contava para isso com o pioneirismo do rádio nessa cidade,
cuja estação PRA7 era a primeira rádio do interior do Brasil.
421
O objetivo era atingir a população a partir do principal meio de comunicação de
massa. Bispo e vigário-geral conseguiram visualizar que era preciso usar os melhores meios
disponíveis para chegar a toda parte. Para isso, d. Alberto dirigiu-se à cúria da arquidiocese
em São Paulo para obter informações sobre o contrato realizado entre o arcebispo de São
419
LIVRO de Tombo da Paróquia de São Sebastião, p. 49 (1937).$3660R-SP. Mococa-SP
420
CASELLA, M.
/¶$]LRQH&DWWROLFD'HO1RYHFHQWR
, p. 17
421
REZENDE, André L. & SANTIGO, Gil. 35$
$3ULPHLUD5iGLRGR,QWHULRUGR%UDVLO
. Ribeirão Preto,
2005, p. 28.
185
Paulo e a dio Excelsior, com o programa Voz de Anchieta, que ia ao ar todos os dias às
20 horas.
O uso do rádio como instrumento de transmissão da mensagem da Igreja aos
católicos era utilizado pelo chefe máximo da cristandade, o papa Pio XI, que, ao referir-se à
ação missionária, reportava-se ao rádio como um dos instrumentos para a propaganda
missionária.
422
Para a hierarquia da Igreja, o rádio foi considerado como uma arma poderosa
para espalhar a fé. A mensagem do papa Pio XII, ao inaugurar as novas instalações da dio
Vaticana, reporta-se ao progresso e aos aparelhos maravilhosos que permitiam vencer as
distâncias e que os padres e fiéis deveriam usar os benefícios do progresso a serviço da
Igreja.
423
Na tentativa de implantar o projeto semelhante, monsenhor Lauriano escreveu aos
padres da diocese a respeito dos programas católicos, mas os padres colocaram vários
empecilhos. D. Alberto reportou-se a d. José Gaspar de Affonseca e Silva, bispo auxiliar de
São Paulo, enumerando negativas dos padres [...] impossibilidade de arranjarem assinantes,
pelo preço da assinatura e serem em pequeno o número os possuidores de aparelho”
424
e suas
dúvidas quanto ao sucesso da proposta em Ribeirão Preto.
Apesar das dificuldades, foi criado um departamento de rádio para realizar a
propaganda da Ação Católica e alcançar toda a diocese através do importante veículo de
comunicação daquele momento. A diocese assinou um contrato com a Rádio Club, conhecida
por PRA7, atual Rádio Club de Ribeirão Preto.
A programação levava, em dois horários diferentes, pela manhã e à tarde, a
mensagem católica para Ribeirão Preto e região. Cada apresentação durava 15 minutos, que
poderiam ser usados de forma seguida ou espaçada, dependendo da programação da rádio.
Constavam no contrato a irradiação de músicas, notícias do bispado, avisos, literatura e
propaganda religiosa de interesse do bispado e da Igreja católica. Pelo contrato, a Rádio Club
se comprometia em irradiar as principais festividades dos católicos.
Em um dos pontos do contrato, a rádio também se comprometia, em sua
programação diária, na propaganda comercial e política, a o contrariar os interesses da
Igreja católica. Era um meio de controle que não permitia opiniões que ofendessem ou fossem
contra os dogmas da Igreja. As idéias consideradas nefastas foram banidas dos programas da
422
PIO XI, Da Imprensa diária e no Radio.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 6, n.81, p. 4, set 1936.
423
PIO XII, Mensagem de Pio XII ao inaugurar as novas instalações da Rádio Vaticana. 5(% vol.18, fasc 1, p.
210 – 213, mar 1958.
424
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência a d. José Gaspar, 18/12/935.
$&063
, São Paulo. (Pasta
Ribeirão Preto).
186
Rádio através de campanhas, em parceria com outras instituições e a Igreja, a qual se
considerava dona da verdade e, por isso, era exigente nas questões morais e éticas que
pudessem ferir seus princípios.
A primeira irradiação do programa católico ocorreu em 1
o
. de janeiro de 1936,
entre as 12 horas e 15 min e 12 horas e 30 min, à tarde, no horário das 17 horas e 45 min até
as 18 horas. Tudo indica que, nos primeiros tempos, o programa foi produzido e apresentado
por monsenhor Lauriano. Num depoimento aos autores do livro sobre a rádio PRA7, o cônego
Arnaldo Padovani afirma que: Depois houve uma fase em que o programa era feito por
jovens da Congregação Mariana, posteriormente Filhos de Maria, da Catedral e outras
pessoas. Em 1946, o Monsenhor Lauriano achou que eu deveria assumir o programa ”
Caminho, Verdade e Vida.
425
Em Ribeirão Preto, algumas atividades da Semana de Ação Missionária”, de 12 a
18 de outubro de 1936, foram transmitidas pela PRA7.
Inúmeras questões perpassam o programa e o contrato entre a Igreja e a rádio. A
cúria reconheceu a importância do programa para conquistar o povo e aumentar seu alcance
principalmente na população urbana? Isso justificava a forte pressão feita pela cúria para que
os rocos abraçassem a causa da rádio católica? Ou o fato de monsenhor Lauriano,
idealizador do projeto, ser um aficionado por rádio pesou mais na tentativa de imposição? Ou,
ainda, foram as recomendações da arquidiocese e da direção da Ação Católica para a
implantação do programa? Diante da documentação analisada, d. Alberto e monsenhor
Lauriano não queriam perder a oportunidade de evangelizar através do rádio. Sabiam o que
significava, diante de uma sociedade a cada dia mais exigente, ter nas os o meio de
comunicação de massa, o rádio. Ambos tentaram várias formas de colocar em prática o
projeto do rádio, que passou a funcionar nos anos seguintes com programas diários irradiados
às 12 horas, na PRA7.
É preciso lembrar que durante décadas monsenhor Lauriano, um aficionado pelo
rádio, fez parte da direção da Rádio Club - PRA7, emissora beneficiária do projeto.
Para angariar fundos, o departamento de rádio da Ação Católica criou uma
associação cujos sócios pagavam anuidades, em cotas mensais de 2$000 (dois mil réis), o que
totalizaria a quantia mínima de 24$000. A renda dessas anuidades, deduzidas as despesas, era
dividida em partes iguais, entre a cúria e a PRA7. Na nota explicativa, publicada no Boletim
425
REZENDE, A. & SANTIAGO, Gil. 2005, p. 105. Desde a primeira apresentação de 1946, o cônego Arnaldo
Padovani apresenta diariamente um programa católico, veiculado atualmente na rádio CMN/ Jovem Pan.
187
Diocesano
426
, o vigário-geral do Bispado não informa sobre esta divisão da renda; dizia
apenas que a cúria daria um apoio moral à Rádio Club. Monsenhor Lauriano sugeriu aos
vigários e paroquianos que contribuíssem com o projeto pagando mensalidades. De acordo
com o contrato, o controle dessas mensalidades seria realizado pelo bispado. Não foi possível
apurar quanto e em que lugar estava sendo aplicado o dinheiro recolhido, uma vez que parte
dele ficava para a cúria.
Em 22 de agosto de 1936, oito meses depois de iniciadas as irradiações, um artigo
no Boletim Diocesano analisava a situação das dificuldades para arrecadar fundos, acusando
que muitas paróquias que poderiam dar uma contribuição maior em virtude de sua condição
financeira não o fizeram.
A cúria considerava que a rádio cumpria fielmente sua parte do acordo, pois,
conforme os vigários, os frutos eram satisfatórios. Sendo assim, fez um apelo para as
contribuições a fim de cumprir também ela a sua parte. A contribuição para o cumprimento do
acordo entre a cúria e párocos deveria ser realizada pelas das diferentes associações religiosas,
mas nem todos os vigários a cumpriram. A nova proposta, de agosto de 1936, era de que 10%
da receita bruta, arrecadada em festas religiosas, na matriz ou capelas, seriam destinados a
essa finalidade.
Cartas foram dirigidas a todos os párocos, pedindo a adesão ao programa como
forma de incentivo à evangelização. Das respostas identificadas no arquivo da cúria de
Ribeirão Preto, em número de vinte e uma cartas
427
, enviadas ao monsenhor Lauriano, os
padres louvavam a iniciativa, mas se desculparam por não contribuir. Dentre as dificuldades
apresentadas, estava a de que poucas famílias possuíam aparelhos transmissores e que o sinal
da rádio não chegava bem às cidades, principalmente pela ausência de instalações elétricas
adequadas. O padre Manuel Vinheta, pároco de São João da Boa Vista, escreveu que
considerava a iniciativa muito louvável, mas para ser aplicada na cidade de Ribeirão Preto,
pois o sinal da rádio era limitado e com interferências e sua paróquia possuía quatro
aparelhos de rádio; portanto, como ele poderia pedir ou ainda exigir de seus fiéis recursos
para a manutenção do projeto? A carta do Padre Manoel Vinheta chamou a atenção pela
clareza como questionava a validade da evangelização através do rádio:
426
LAURIANO, Monsenhor João. Departamento de Rádio da Acção Catholica. %ROHWLP'LRFHVDQR, Ribeirão
Preto-SP, ano 6, n. 72, p.2, dezembro 1935.
427
As cartas dos párocos encontram-se na Pasta monsenhor Lauriano no Arquivo da Cúria Metropolitana de
Ribeirão Preto.
188
E que adianta ensinar um catecismo pelo rádio, se esse ensino não chega aos
indivíduos que mais precisam as multidões que devem ser movimentadas,
conforme os diversos ensinamentos do Santo Padre [...] segundo as
compilações de orientando a ensinar catecismo individual a formar a Ação
Católica [...] e que é inútil toda ação enquanto não haver essa formação
individual do catecismo em todos os cantos, em todas as camadas, em todas
as classes por todos os meios, pondo em movimento as associações
masculinas e femininas, o laicato todo, em suma a fim de obter algum
resultado?
428
A carta do padre Vinheta abordava aspectos levantados em maior ou menor escala
por outros padres, tais como: o problema dos recursos financeiros de cada paróquia que tinha
dificuldades para manter a matriz e suas capelas em funcionamento, junto com os ornamentos
necessários para o culto, e que a cobrança da taxa dos 10% seria um abuso. Para o padre
Vinheta, a evangelização deveria ser feita, mas de acordo com os recursos de cada paróquia.
Essa era voz geral. O problema é que as ordens da cúria recaíam sobre os padres que sofriam
uma crescente diminuição de recursos.
Padre Vinheta finalizava sua carta a monsenhor Lauriano, um dos mentores do
projeto da dio, questionando a canalização dos parcos recursos da paróquia à cúria.
Argumentava que [...] a população pode deixar a igreja e partir para o espiritismo ou coisas
piores”. O padre apelava para a principal ameaça à Igreja, a fuga de fiéis, para tentar deter a
cobrança a que as paróquias estavam sujeitas.
Outros padres consideravam louvável o programa de rádio, mas expuseram com
poucas palavras sua recusa em cobrar dos fiéis mais uma taxa. Alguns concordaram em apoiar
o projeto integralmente, e outros ainda alegaram que ele, o pároco, poderia e tinha obrigação
de contribuir, mas a comunidade ficava alheia, por falta de aparelhos de rádio, o que não
justificava a contribuição.
Seria o projeto de um programa católico no rádio o complicado a ponto de os
padres se manifestarem dessa forma ou a cúria realmente extorquia dinheiro das paróquias?
Um dos aspectos abordados nas correspondências dizia respeito às taxas a serem pagas;
muitos padres alegaram que não podiam pedir mais nenhuma contribuição em suas paróquias.
Fica claro que a cúria exigia o cumprimento de suas ordens e do pagamento das taxas, o que
onerava as paróquias, principalmente as sem recursos. Ao longo do ano, a cúria cobrava
428
VINHETA, Manoel. Correspondência ao Monsenhor Lauriano, 26/8/1936.
$&053
-SP, Ribeirão Preto-SP,
Pasta Monsenhor Lauriano.
189
várias taxas e contribuições para diferentes projetos, tais como: dinheiro para as missões, para
o Colégio Pio-Latino Americano e, depois da década de 1930, para o Colégio Pio Brasileiro;
algumas contribuições foram específicas, como para a construção da imagem do Cristo
Redentor no Rio de Janeiro, entre outras.
Também ficou evidente que, na época do projeto da rádio, mesmo em cidades da
diocese consideradas prósperas, como São João da Boa Vista, cujo pároco padre Manoel
Vinheta, que sempre foi considerado dinâmico por onde passou, houve dificuldades para
implantar o projeto, assinalando-se a ausência de aparelhos e os custos.
Uma das queixas de d. Alberto, na tentativa de efetivar o projeto, foi que as
paróquias dotadas de recursos, que poderiam contribuir, pouco ou nada enviaram à cúria,
enquanto outras, com recursos menores, contribuíram com quantia modesta. De um lado, a
desigualdade financeira entre as paróquias refletia-se na implantação dos programas de
evangelização; por outro, nem sempre foi o indicativo, paróquias mais pobres possuíam
associações que militavam em diferentes áreas pastorais e sociais.
Apesar desses inconvenientes, o governo da diocese implantou o programa de
rádio, que sofreu modificações, mas, ao longo das décadas seguintes, representou um dos
canais de comunicação do qual a igreja de Ribeirão Preto se valeu no processo de
evangelização.
429
É possível entender que os padres reclamavam de cobrança de taxas excessivas,
pois, em meio ao problema de angariar recursos para o programa da rádio, d. Alberto emitiu
uma &DUWD &LUFXODU
430
sobre o Seminário Brasileiro em Roma, em que escreveu sobre a
abertura do Colégio Pio Brasileiro e pediu aos cafeicultores que doassem sacas de café para o
projeto de atender aos seminaristas brasileiros, alegando que não podia mais pedir auxílios
pecuniários aos diocesanos. As sacas de café não foram encaradas pelo bispo como dinheiro
sonante, mas ele deixou instruções na casa comercial de que o café doado seria levado para
comercialização. Sem dinheiro o era possível tocar os inúmeros projetos de evangelização.
A boa vontade do povo é que sustentava as obras da Igreja. Nos anos seguintes continuaram
os pedidos de contribuições e orações para o Colégio Pio Brasileiro, entre outros projetos da
Igreja diocesana e nacional.
Em 1939, na cidade do Rio Janeiro, um importante evento marcou a vida da Igreja
e passou a dar impulso, entre outros projetos, à Ação Católica, o 1
o
. Concílio Plenário
429
Atualmente algumas paróquias realizam programas de rádio, independentes de um projeto da cúria
arquidiocesana.
430
GONÇALVES, D. Alberto José. Circular sobre o seminário brasileiro em Roma.
%ROHWLP'LRFHVDQR
,
Ribeirão Preto-SP, ano 6, n. 80, p. 1, agosto 1936.
190
Brasileiro, convocado pelo cardeal d. Sebastião Leme. Em 1916, quando fora eleito para o
governo da diocese de Olinda e Recife, escreveu sua &DUWD 3DVWRUDO em que visava uma
ampla mobilização da Igreja para cristianizar a sociedade brasileira; estava lançada a obra de
d. Leme. No Rio de Janeiro, em 1939, ao convocar o Concílio Plenário, ele deixava explícita a
tentativa de, a partir do episcopado, lançar as sementes para cristianizar as instituições sociais
brasileiras. A aproximação do cardeal Leme e do episcopado brasileiro com o governo de
Getúlio Vargas ficou evidente na visita ao Palácio do Catete, no dia 25 de julho de 1939.
O Concílio Plenário Brasileiro ocorreu de 2 a 20 de julho de 1939, reunidos na
Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro. O episcopado escreveu uma &DUWD3DVWRUDO destinada
ao clero e aos fiéis. Nela, os bispos apontam, entre outros temas, a importância da Ação
Católica. Era desejo dos bispos ver a Ação Católica organizada em todo o Brasil. A Igreja
aproveitava o bom momento de seu espaço na sociedade, na forma das grandes manifestações
por meio dos Congressos Eucarísticos, das concentrações das associações, tais como
Congregados Marianos, Filhas de Maria, mobilizando-se para ampliar cada vez sua influência
e privilégios junto à vida civil.
Por volta de 1940, algumas mudanças podem ser visualizadas para a Ação
Católica, de acordo com o padre Beozzo:
[...] a Ação Católica se marcada pela realização no plano diocesano,
regional e nacional, das Semanas da Ação Católica. Desde 1938, é editada a
revista nacional Ação Católica, órgão oficial da Ação Católica Brasileira,
sob responsabilidade da ‘Junta Nacional da Ação Católica Brasileira’ , no Rio
de Janeiro.
431
Os acontecimentos, de certa forma, pressionaram o bispo e o vigário-geral do
bispado de Ribeirão Preto a tratar a Ação Católica com especial deferência. No entanto, para
desgosto de d. Alberto, após o Primeiro Congresso Eucarístico Diocesano, monsenhor
Lauriano, em 1940, revela a triste situação da Ação Católica na diocese: [...] sem que,
entretanto, no geral, se tenha verificado, não digo um resultado satisfactorio, mas nem ao
menos um início de trabalho sobre a verdadeira Ação Católica.
432
Nos anos de 1940 é que a Ação Católica lentamente ganhou espaço na diocese de
Ribeirão Preto por intermédio das associações, com a implantação de medidas mais concretas,
431
BEOZZO, José Oscar.
&ULVWmRVQD8QLYHUVLGDGHHQD3ROtWLFD
. Petrópolis: Vozes, 1984, p. 33
432
Acção Catholica.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 11, n. 125, p. 3, setembro 1940.
191
conforme vamos ver adiante. Enquanto a hierarquia se esforçava para o crescimento da Ação
Católica, as outras crenças também aumentavam em número, abrindo escolas e templos nas
cidades da diocese.
)RUoDVLQLPLJDVGRFDWROL F LV PR QRVHLRGDGLRFHVH
Para os católicos, desde meados do século XIX, protestantes, positivistas, liberais,
comunistas, anarquistas, maçons e outros grupos simbolizavam uma ruptura com a sociedade
tradicional católica. Eram considerados anticlericais, portanto, sem levar em conta as
particularidades de cada um, sociedades inimigas do catolicismo.
433
Acompanhando o que
acontecia nos países europeus, era visível o crescimento gradativo do número de pessoas que
abandonavam e atacavam a tradição católica e a obediência incondicional ao papa e aos
membros hierárquicos da Igreja e migravam para outras crenças.
A liberdade de culto no Brasil, assumida pelo país após a proclamação da
República, permitiu legalmente a presença e o crescimento de outras crenças, com a Igreja
católica perdendo sua posição de religião oficial.
No entanto, para as outras crenças a situação não foi fácil. O período inicial após a
proclamação da República foi marcado por perseguições dos católicos, por preconceitos que
permaneceram nas décadas seguintes e por influência da liderança da Igreja, que continuava a
afirmar, em seu discurso, que era a única e a verdadeira religião dos brasileiros.
Em Ribeirão Preto, a criação da diocese teve por objetivo, entre outros, barrar a
entrada ou impedir o crescimento das forças contrárias aos ensinamentos católicos.
Uma cada antes da criação da Província Eclesiástica de São Paulo, os maçons
constituíam o objeto de preocupação da diocese dessa cidade. O relatório sobre o bispado de
São Paulo
434
, com data de 23 de julho de 1898, retrata que após a Igreja estar separada
oficialmente do Estado tivera vários frutos. O relatório descreve que:
[...] a pregação do Evangelho tornou-se mais assídua e o povo tem se
esforçado em sustentar com todo o esplendor o culto público”. O relatório
prossegue abordando os temas protestantismo e maçonaria: O
protestantismo pouco progresso tem feito nesta diocese. O culto da seita
protestante não satisfaz o povo brasileiro, em geral muito devoto da Virgem
433
BASTIAN, J. P.
3URWHVWDQWHVOLEHUDOHV\IUDQFPDVRQHV6RFLHGDGGHLGHDV\PRGHUQLGDGHQ$PHULFD
/DWLQDVLJOR;,;
. México: Fondo de Cultura Economica/ Cehila, 1990.
434
RELATÓRIO Diocesano 23/7/1898.
$&063
, São Paulo. (Pasta Documentos Avulsos).
192
Maria. O progresso do positivismo diminui. A Maçonaria faz maiores
progressos que o positivismo[...]
435
A preocupação da Igreja com o avanço de crenças contrárias à católica era
concreta. Protestantes, positivistas, maçons, atuavam nos mais variadosrculos da sociedade
e da política. Tudo indica que em Curitiba, e depois em Ribeirão Preto, d. Alberto manteve
relações cordiais com os maçons. O bispo sabia distinguir suas amizades das exigências
doutrinais da Igreja. Durante o período em que ocupou cargos políticos, certamente conviveu
com maçons. Como bispo de Ribeirão Preto, em nenhuma de suas circulares, cartas pastorais
ou em sua conduta ocorreu um ataque de frente à maçonaria. Todavia o bispo não hesitou em
cumprir seu dever de pastor todas as vezes em que foi necessário se indispor contra aqueles
que feriam os ensinamentos da Igreja.
Em Ribeirão Preto, na criação da diocese, em 1908, funcionava a Loja Maçônica
Estrela D’ Oeste. Conforme jornais de época, a Loja possuía intensa atividade em meio à
sociedade de Ribeirão Preto.
Pesquisadores, como Matos
436
, apontam como reconhecer os inimigos da religião
nacional: “ O ódio à Eucaristia, o ódio a Maria Santíssima e o ódio ao Papa.” Esses elementos
são considerados a base para os ataques frontais aos dogmas e à doutrina da Igreja.
(VSLUL W L VP R
Apesar dos esforços de d. Alberto, nas décadas seguintes à criação do bispado, o
número de espíritas cresceu e incomodou os católicos. Os espíritas fundaram escolas, estavam
nos jornais, seja anunciando espetáculos beneficentes para angariar fundos para suas obras,
seja nas páginas policiais, ao lado de notícias sobre os chamados macumbeiros, com quem os
seguidores de Kardec eram confundidos.
No fim do governo de d. Alberto, na década de 1940, os espíritas é que
ameaçavam a hegemonia dos católicos na região de Ribeirão Preto. Para Rubem Cione, as
primeiras notícias sobre o espiritismo são de fins de 1892. Em 1907, ao preparar a criação do
bispado, monsenhor Joaquim Antonio de Siqueira revelou a presença destes, vindos de
Uberaba. Nas décadas de 1920 e 1930 houve um crescimento das atividades espíritas na
435
RELATÓRIO Diocesano 23/7/1898.
$&063
, São Paulo. (Pasta Documentos Avulsos).
436
MATOS, Henrique C. J.
8PHVWXGRKLVWyULFRVREUHRFDWROLFLVPRPLOLWDQWHHP 0LQDVHQWUHH
.
Belo Horizonte: O Lutador, 1922, p. 158
193
cidade: em 1922, ocorreu a fundação de uma Sociedade Espírita; em 1926, o Centro Espírita
Eurípides Barsanulfo; em 1930, o Centro Espírita Batuíra; em 1932, o Centro Espírita União e
Caridade
437
, entre outras.
Em outras cidades da diocese, o movimento espírita também cresceu. No ano de
1909, quando d. Alberto tomou posse em Ribeirão Preto, na cidade de Franca, o Centro
Espírita Fé, Esperança e Caridade ganhou estatuto jurídico, com a aprovação de seus
Estatutos. A obra transformou-se no ponto de partida para a construção do Asilo Allan
Kardec, inaugurado em 1924 e, em 1927, surgiu o jornal $1RYD(UD, o que incomodava os
católicos.
438
Nas décadas seguintes, o crescimento do grupo espírita em Franca permitiu a
fundação de uma escola. A Fundação Pestalozzi, inaugurada em 1944 nessa cidade, mobilizou
o clero, que se opôs e conclamou os católicos a não matricularem seus filhos, por ser
considerada pela Igreja uma escola ímpia. D. Alberto chegou a ameaçar de excomunhão quem
freqüentasse a escola. As escolas fundadas pelas forças consideradas contrárias à Igreja eram
desmoralizadas pelos padres e bispos nos púlpitos, em programas de rádio ou através da
imprensa católica.
A Carta Pastoral Coletiva dos Bispos de 1915 classificava o espiritismo como
[...] conjunto de todas as superstições e astúcias da incredulidade moderna, que, negando a
eternidade das penas do inferno, o sacerdócio catholico e os direitos da Egreja catholica,
destroe todo o christianismo.”
439
Acompanhando o movimento iniciado pelos bispos da Província, em 2 de
fevereiro de 1916, no aniversário de sua posse, d. Alberto, lançou uma “ Carta sobre o
espiritismo”
440
, em que ressaltava as verdades dogmáticas da católica e comparava o
espiritismo a uma tentação do demônio, a uma erva daninha, um inimigo a devorar as ovelhas
do Senhor. Na &DUWD, explicava que muitas pessoas aceitavam participar porque
desconheciam as ilusões e a forma como explicam os fenômenos.
441
Considerado pelos bispos como um dos perigos que ameaçavam a hegemonia da
católica, a Igreja combateu do púlpito e através dos meios de comunicação o crescimento
437
CIONE, R. História de Ribeirão Preto. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1992, p. 912-916. Batuíra: 75 anos no
coração da Vila. -RUQDOGD9LOD Ribeirão Preto, ano 1, n. 6 p. 8, março 2006.
438
A respeito do espiritismo na cidade de Franca, sugerimos a dissertação de mestrado de Vera I. Jurkevics,
&UHQoDVHYLYrQFLDVHVStULWDVQDFLGDGHGH)UDQFD
. Franca: Unesp, 1998.
439
PASTORAL Collectiva dos Senhores Arcebispos e Bispos das Províncias Ecclesiásticas. n. 61, p. 14.
440
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta sobre o Espiritismo. In: $UF K LYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR 1908-
1918, p. 155-162.
441
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta sobre o Espiritismo. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
1908-
1918, p. 155-162
194
do espiritismo no Brasil. Os livros que pregavam contra o espiritismo faziam parte dos
projetos da boa imprensa, que divulgava livros de espiritualidade ao lado daqueles que
denegriam a imagem de outras crenças, inferiorizando-as. Um exemplo foi a obra dos padres
Pascoal Lacroix e Bueno de Sequeira, 2(VSLULWLVPRj/X]GD5D]mR , revelando os erros do
espiritismo e do ocultismo, ressaltando que a Bíblia era o local em que se deveriam buscar os
elementos que permitiam realizar a refutação contra as verdades da fé.
Ocorre que as verdades da somente eram conhecidas em sua extensão mais
ampla pelos padres; por isso, eram eles que dirigiam a doutrinação pregando dos púlpitos e
nas associações. A leitura de trechos de obras que combatiam o espiritismo, protestantismo e
maçonaria, dentro das associações, era prática comum.
443
Era necessário um conhecimento
maior da doutrina para afastar os fiéis das seitas e/ou igrejas consideradas opostas à
mensagem do catolicismo. A preocupação com a formação do clero era uma resposta a essas
necessidades, entre outras, pelas quais a Igreja precisava marcar seu espaço. Com sacerdotes
mais instruídos, a Igreja poderia estender seu conhecimento através da pregação aos fiéis.
Ao analisar a preocupação da Igreja com outras crenças, Mainwaring afirma [...]
somente nas décadas de 20 e 30, quando o espiritismo e o protestantismo começaram a
crescer, que a Igreja veio a ter maiores preocupações com as práticas religiosas populares
[...]”
444
A criação da diocese de Ribeirão Preto aponta uma preocupação com o avanço de
outras crenças, possibilitando a necessidade de um rápido domínio do espaço, na tentativa de
impedir ou pelo menos retardar o avanço de outras manifestações religiosas.
Para a Igreja, não era ela que precisava adequar seu discurso diante da realidade
que se apresentava no Brasil republicano, mas os fiéis devotos que necessitavam caminhar ao
encontro das diretrizes da Igreja. Era preciso evangelizar por meio das associações, do
catecismo e, acima de tudo, não freqüentar os lugares considerados por ela como perniciosos
à vida do cristão, como centros espíritas, terreiros de umbanda ou igrejas protestantes. Os
leigos militantes, que eram poucos, eram os grandes colaboradores junto com os padres, pois
incrementavam a participação nas associações. Seu trabalho contribuía para diluir as notícias
e diminuir a freqüência aos cultos considerados seitas.
442
LACROIX, P. & SEQUEIRA, F.M.B.
2(VSLULWLVPRD/X]GD5D]mR
. Rio de Janeiro, S.C.J., 1941.
443
1
o
. LIVRO de Atas do Apostolado da Oração. $UTXLYRGD3DUyTXLDGH1RVVD6HQKRUDGR5RViULR
Ribeirão Preto, p. 4. As mesmas referências foram encontradas nos livros de Atas das associações pesquisadas
para este estudo.
444
MAINWARING, S. 1989, p. 50.
195
Os padres consideravam a crença espírita uma superstição, porém ela ganhava
adeptos e preocupava a hierarquia da Igreja. Do Vaticano e de outros países europeus,
chegavam publicações condenando a prática contrária à católica.
Em janeiro de 1932, o jornal 'LiULRGH1RWtFLDV, de Ribeirão Preto, publicou uma
notícia sobre a organização de um espetáculo beneficente, no teatro Carlos Gomes, com a
finalidade de angariar fundos para a construção de uma sede de um grupo de espíritas. O teor
do texto confirma o posicionamento das perseguições: [...] o espiritismo mesmo contra a
vontade de seus adversários, dos seus dectratores, ganha terreno e conquista novos adeptos
colocando-se cada vez maior destaque.
445
Um dos inimigos ferrenhos era a Igreja católica. O
espetáculo beneficente, prática comum entre os católicos, era criticado por eles quando
adotado por outras crenças.
Uma das acusações dos católicos aos espíritas:
[quando] [...] sobrevem uma doença ou um luto em uma família e que as
almas estão conturbadas pela dor, os espíritas o se introduzindo
sorrateiramente na casa, offerecendo remédios para a doença que os médicos
não poderão curar: e sob pretexto de levar a consolação a essas almas, dizem
que a pessoa morta quer se comunicar com os parentes [...]”
446
O discurso da hierarquia católica atacava todos que estavam situados no mundo
descristianizado. Os ataques de autores católicos, padres e leigos, dizendo que o espiritismo
não era ciência, mas uma falsa religião, e que o protestantismo era a religião do dinheiro,
foram comuns nos artigos publicados no Boletim Diocesano de Ribeirão Preto, nos anos de
1930 em diante. Os católicos sentiam-se ameaçados ao perderem terreno diante da
secularização da sociedade e da opção das pessoas em freqüentarem outras crenças.
A atividade caritativa dos espíritas era outro aspecto que fazia um contraponto
com a assistência dada aos idosos e pobres, pelos confrades da Conferência de São Vicente de
Paulo, os vicentinos, e outras organizações caritativas dos católicos.
447
445
O ESPIRITISMO e a arte dramática. 'LiULRGH1RWtFLDV, Ribeirão Preto, 15/jan/1932, p. 1.
446
O ESPIRITISMO.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto, ano 2, n. 17, p. 11, maio 1931.
447
PETTERSON, S.
2VFHPDQRVGD6RFLHGDGHGH6mR9LFHQWHGH3DXORHP)UDQFD63
. Franca,
Unesp, 1999. (Dissertação de Mestrado)
196
A Igreja enfrentava a competição de outras crenças no campo caritativo; elas
ofereciam escolas e assistência social aos mais necessitados. Os espíritas colocavam anúncios
em jornais, fazendo propaganda de sua ação benemérita, informando que estavam à
disposição dos operários uma farmácia homeopática, consultório médico e um gabinete
dentário.
448
A assistência às comunidades mais pobres era um gesto que o jornal 'LiULRGH
1RWLFLDV noticiava da mesma forma que escrevia sobre as obras de caridade dos católicos.
Um estudo mais aprofundado sobre as atividades caritativas dos espíritas no início
do culo XX, na cidade de Ribeirão Preto, poderia revelar se foram bem sucedidos.
Certamente os avanços foram acontecendo e, pelos dados do censo de 1940, pode ser
comprovado que o grupo dos espíritas, nas maiores cidades da diocese, era maior que o dos
protestantes.
Demonstrativo do percentual religioso das principais cidades da diocese
&LGDGH 3RSXODomR &DWyOLFRV (VStULWDV 3URWHVWDQWHV 2XWURV
Ribeirão Preto 79.783 73.852 3.756 1.300 875
Franca 55.760 51.227 3.261 641 631
Ituverava 32.212 28.581 1.664 209 1.758
Igarapava 27.556 23.270 3.461 388 437
São João da Boa Vista
39.155 35.519 2.693 624 319
727$/      
3(5&(178$/     
)RQWH
Censo demográfico. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 1950. tomo 2.
448
UM BELO gesto.
'LiULRGH1RWtFLDV
, Ribeirão Preto, 1/set/1940, p. 2.
197
CATÓLICOS
91%
ESPÍRITAS
6%
OUTROS
2%
PROTEST.
1%
)RQWH
Censo demográfico. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 1950. tomo 2.
O percentual de espíritas ainda era insignificante perto dos católicos, mas
avançava como uma ameaça para os dirigentes da Igreja católica. O censo de 1940 identifica
as seguintes religiões: católicos romanos, protestantes, ortodoxos, israelitas, maometanos,
budistas, xintoístas, espíritas, positivistas, de outra religião, sem religião, de religião não
declarada. Para demonstrar o crescimento dos espíritas, identificamos os percentuais nas
maiores cidades da diocese. O quadro demonstrativo que vimos anteriormente seleciona
apenas os católicos, protestantes e espíritas. As outras crenças indicavam percentuais baixos e
as identificamos como outros”
O dado total das religiões nas cidades de Ribeirão Preto, Franca, Ituverava,
Igarapava e São João da Boa Vista abrangendo o percentual de 9% de pessoas que
participavam do protestantismo, espiritismo e outras crenças, ou se manifestavam sem
religião, era pouco se comparado com os 91% dos católicos. No entanto, os 6% de espíritas
representavam um número significativo para a hierarquia da Igreja. Os dados revelam que a
adesão a outras crenças pouco a pouco mudava o perfil religioso da população, visto que
retratam um período que tem menos de meio século depois da separação Estado e Igreja e da
concessão da liberdade de culto pelo Estado laico.
198
A preocupação com o avanço do espiritismo por parte da Igreja tinha fundamento.
Após a chegada do bispo auxiliar de Ribeirão Preto, d. Manoel da Silveira D’Elboux, foram
encontrados na sede da diocese nove centros espíritas em funcionamento. As tentativas de d.
Alberto e d. Manoel para barrar o crescimento incluíram, em fevereiro de 1942, a distribuição
de um folheto com o título: 3URIL VVmRGHIpFRQWUDRHVSLULWLVPR. Os padres deveriam divulgar
o folheto nas missas, com a recomendação expressa do bispo d. Alberto de que o folheto e seu
conteúdo esclarecendo os fiéis sobre o perigo do espiritismo deveria chegar inclusive à zona
rural.
Apesar do esforço da Igreja para tentar diminuir a divulgação do espiritismo no
seio da sociedade, os espíritas fortaleciam-se a cada dia e fundaram em 1945 a
Confraternização dos Espíritas de Ribeirão Preto.
449
3URWH V WDQW HV
Outro grupo que representava uma ameaça era o dos protestantes, que, ao lado da
Maçonaria, dos positivistas e dos liberais, possuíam suas casas e templos na sede do bispado e
em outras cidades da diocese.
A defesa da liberdade de culto ganhava espaço nas cidades da diocese de Ribeirão
Preto, políticos tentavam obstruir bênçãos de cemitérios, doações para o patrimônio da Igreja
católica, isenção de impostos, alegando que o período de domínio da Igreja havia ficado para
trás, que a conquista da liberdade espiritual e de culto era uma garantia da Constituição
republicana.
Os protestantes, ao longo das primeiras décadas do século XX, instalaram seus
templos e escolas com diferentes denominações nas cidades da diocese. Em Ribeirão Preto, os
primeiros foram os Metodistas em 1896; em 1927 os Presbiterianos; em 1937, a Assembléia
de Deus, seguida por outros grupos protestantes.
450
Na cidade de Altinópolis (antiga vila de Mato Grosso de Batatais), os
presbiterianos instalaram-se na praça ao lado da matriz, concorrendo no espaço físico com os
católicos. Representavam uma afronta aos católicos, principalmente porque nessa localidade
449
www.userp.org.br acessada em 27/01/2006.
450
PERBONI, F.$
ÈJXDR)RJRHR6DQJXH
a Trindade da Salvação. Igreja Assembléia de Deus em Ribeirão
Preto (1987-1997). Franca, Unesp, 1999. (Dissertação de Mestrado).O artigo de PARIZOTO, Roberta. A
construção de uma identidade religiosa: o presbiterianismo em Franca (1927-1997). (QVDLRVGH+L VWyULD,
Franca, v.3, n. ½, p.15-24, 1998. O texto revela que não era regra básica para o estabelecimento das Igrejas
protestantes a vinda de missionários. Em Franca, a Igreja Presbiteriana originou-se de uma discórdia da Igreja
Metodista local.
199
um sacerdote havia se unido a uma presbiteriana, dando o que era considerado pela Igreja
como um péssimo exemplo.
Em Ribeirão Preto, os Metodistas chegaram em 1896, e em 1899, instalaram um
colégio na cidade.
451
Numa prática comum, na sessão da Câmara Municipal, de 15 de janeiro
de 1909, a Igreja Metodista pediu isenção de impostos. Houve um debate entre os vereadores
Dr. Enéas Ferreira da Silva e o Sr. J. P. da Veiga Miranda. O Sr. Veiga Miranda foi contrário
a essa isenção, alegando que [...] isentar delle aquela associação religiosa é um perigoso
precedente, capaz de desfalcar em muito as rendas municipais.”
452
O sr. Enéas da Silva
acreditava que, se o culto católico havia recebido a isenção, por que não realizar o mesmo
procedimento ao culto protestante? A questão para o sr. Enéas da Silva era que a Câmara não
poderia privilegiar uma determinada religião, pois ia contra uma das maiores conquistas da
República, que era a liberdade de culto, e que a diminuição do imposto não seria tão grande
assim, sendo apenas da insignificante quantia de quatro mil e quinhentos réis ao ano do
imposto de viação” . Do embate travado entre os dois vereadores, saiu vitorioso o Sr. Enéas,
tendo o Sr. Veiga Miranda retirado seu parecer, abstendo-se de votar, enquanto os demais
votaram favoráveis ao parecer que dava isenção também à Igreja Metodista.
Pesquisadores como Walker afirmam que apesar de mais de 90% da população
de Ribeirão Preto ser formalmente católica, o controle do catolicismo sobre as pessoas sempre
foi ameno e a liberdade de outras religiões co-existirem com o catolicismo sempre foi
usualmente respeitada.”
453
Walker aponta que em Ribeirão Preto houve poucos casos de intolerância
religiosa durante a República Velha, mas nem tudo foi ameno, os católicos sempre se
sentiram ameaçados por outras crenças. Procuravam denegrir as outras manifestações
religiosas para as quais perdiam espaço e conseqüentemente fiéis. Por outro lado, o debate
travado entre os vereadores corrobora as palavras de Walker, de que nem sempre
prevaleceram a vontade e o pensamento dos católicos. A Igreja católica, sempre que pôde,
procurou dar o tom do discurso, menosprezando as outras crenças e tentando impor seus
princípios éticos e morais.
Durante a primeira metade do século XX, no Boletim Diocesano de Ribeirão
Preto, foram comuns as notícias, criticando o espiritismo, o protestantismo, o Rotary, a
Maçonaria, os livres-pensadores, entre outros grupos que representavam a modernidade.
451
ALMEIDA, V. Ensinar e Converter: a ação educacional metodista em Ribeirão Preto. 1899-1950. In:
(VWXGRVGH+LVWyULD
, Franca, v. 5, n.1, p. 57-70, 1998.
452
LIVRO de Atas da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, n. 9, p.50.
$&D053
-SP Ribeirão Preto.
453
WALKER, T. & SILVA, A. 2000, p. 49.
200
Um problema comum de que tratam as discussões entre católicos, protestantes e
espíritas dizia respeito ao dízimo. O Boletim Diocesano, reproduziu alguns artigos de outros
jornais, como do 2 $YLVR, jornal que se intitulava como Órgão da União Cathólica da
Mocidade Francana, em defesa do catolicismo.
454
Os católicos argumentavam que, como os
outros cultos, a Igreja precisava de dinheiro para que seus membros pudessem sobreviver e
por isso cobrava taxas. O texto acusa que o ataque dos espíritas e dos protestantes era sem
fundamento, uma vez que os padres estavam no seu direito de receber pelos serviços
prestados à comunidade.
Os artigos publicados de ambos os lados eram sempre escritos em um tom
pejorativo. Os católicos condenavam os protestantes, acusando-os de caminhar para o
racionalismo, a descrença e a negação da verdade revelada. Afirmavam que os protestantes
eram parasitas do catolicismo, cresceram como divisão e multiplicaram-se em seitas, e ainda
são “ [...] um estado intermediário entre o catolicismo e o ateísmo.”
455
O problema é que, na realidade, uns e outros ficavam procurando pequenas
questões, para mutuamente se atacarem. Os católicos precisavam encontrar formas de
desmoralizar os espíritas, protestantes, maçons e rotarianos, que estavam incluídos entre as
categorias consideradas nefastas” para a convivência; bispos e padres convidavam os fiéis a
integrarem as associações laicas para melhor edificação na fé. Inúmeros foram os escritos
publicados em defesa do catolicismo e combatendo o espiritismo e o protestantismo.
456
O jornal 2$YLVR alertava de forma aberta os fiéis a respeito dos perigos das falsas
doutrinas de protestantes e espíritas, escrevendo editorais em que a sociedade aparecia
contaminada por terríveis pragas”. Esse jornal, semanário, fundado pelos padres
Agostinianos, constituiu um dos baluartes da Igreja na diocese para combater os protestantes,
espíritas e outras crenças consideradas nocivas à ação da Igreja. Os efeitos da orientação dos
padres eram visíveis na adesão às associações, no aumento do número de comunhões, na
participação das festas e atividades da Igreja, embora os níveis ainda não fossem tão
satisfatórios.
Intensificavam-se também, por meio de comunicados e cartas pastorais, desde o
fim do século XIX, os conselhos aos fiéis leigos para não matricularem os filhos em escolas
454
O ESPIRITISMO. %ROHWLP'LRFHVDQR, Ribeirão Preto-SP, ano 2, n. 16, p. 10-11, abril 1931. No mesmo
número, o artigo, com o título “ Religião de Dinheiro”, explica as acusações dos protestantes.
455
DERROCADA Protestante.
%ROHWLP'LRFHVDQR
Ribeirão Preto-SP, ano 2, n. 24, p. 3, dezembro 1931.
456
Como exemplo indicamos as obras do Pe. Júlio Maria:
2$QMRGD/X]
;
2$QMRGDV7UHYDV
;
2V6HJUHGRVGR
(VSLULWLVPR; /X]QDV7UHYDV; $WDTXHV3URWHVWDQWHV; outras obras do mesmo cunho eram do Pe. Florêncio
Dubois:
2V3HQWHFRVWDLVFRQVSLUDFRQWUDD%tEOLD
;
2([%LVSRGH0DXUDHR%RP6HQVR
;
$LQWHUFHVVmRGRV
6DQWRVQD%tEOLD
. Algumas delas foram citadas em Atas das associações ou ainda sugeridas no Boletim
Diocesano, Ribeirão Preto-SP,.
201
que não fossem católicas e que não participassem de associações secretas e de seitas
consideradas nefastas. As associações serviam de base para os padres insistirem junto aos
fiéis no exercício da fé.
D. Alberto, que havia condenado o espiritismo, publicou uma Carta Pastoral,
em 20 de junho de 1921, combatendo os protestantes e a distribuição de bíblias e folhetins.
Por trás da distribuição das bíblias consideradas falsas, havia, segundo o bispo, uma
propaganda enganosa, cujo fim era a desnacionalização. Acusou os missionários protestantes
de estarem a serviço de governos estrangeiros e criticou-os indagando por que eles o se
ocupavam dos judeus e mórmons que viviam por ? Acusava-os de fazerem distinção entre
brancos e pretos, separando-os nas igrejas e cemitérios, criando um céu para brancos e outro
para os negros, numa clara referência ao racismo presente nos Estados Unidos.
457
As
preocupações de d. Alberto com a infiltração que chamou de heresia protestanteo ficou no
campo espiritual. Os argumentos abordavam também aspectos econômicos, dizendo que os
Estados Unidos dominavam o mercado brasileiro, taxando os produtos como a borracha e o
café, e que era necessário levantar-se contra as sorrateiras incursões que aqui faziam. Num
trecho mais incisivo, o bispo relaciona a ameaça ao patriotismo:
E infelizmente ainda brasileiros que não querem ver o perigo que corremos e
que auxiliam taes emprezas antipatrióticas.
458
Ao relacionar a noção de patriotismo, de defesa da pátria, com a repulsa aos
protestantes e à entrada de seus missionários, d. Alberto certamente esperava ganhar maior
número de adeptos e seguidores para a causa da Igreja. Desmoralizando a crença protestante,
acusando-a de ir contra os interesses do país, o bispo apelava para o patriotismo dos fiéis. A
defesa da pátria estava, nas palavras do bispo, associada à religião da maioria dos brasileiros:
o catolicismo. Era a face política do antigo senador da República que, evocando a defesa da
nação, combatia os grupos religiosos divergentes. A carta pastoral do bispo e os artigos de
jornais alinhados com a Igreja revelam o interesse de uma parcela da sociedade pelo tema,
apesar da liberdade de culto. Os protestantes representavam para muitos a idéia de
modernidade, para o bispo era a idéia do antipatriotismo.
As mudanças que ocorriam na política e na economia do país na primeira metade
do século XX contribuíram para intensificar as diferenças sociais, a migração inexorável do
457
No início do século XX, as lutas raciais nos Estados Unidos prosseguiam, meio século depois da Guerra de
Secessão. SELLERS, C. et all. 8PDUHDYDOLDomRGDKLVWyULDGRV(VWDGRV8QLGRV. De Colônia a Potência
Imperial. Trad. Ruy Jungman. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990.
458
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral sobre a propaganda protestante. 20 de junho de 1921. In:
$UFKLYRGD'LRFHVHGR5LEHLUmR3UHWR
. 1918-1923. Ribeirão Preto: Typ. Livro Verde, 1924, p. 39.
202
campo para a cidade, bem como para aumentar o avanço da aceitação de outras crenças pela
sociedade.
0DFXPEH L U RV H FXUDQGHLURV
O culto ligado às crenças africanas era mais discriminado e localizava-se na
periferia das cidades ou no fundo do quintal das casas nos bairros pobres, de forma
clandestina. A liberdade de culto não os beneficiou da mesma maneira que aos protestantes. O
pesquisador Artur C. Isaia aponta o preconceito em relação aos africanos, seus valores e
crenças, por parte de um dos expoentes da hierarquia católica, d. Carlos C. de V. Motta, que
dizia que: [...] a senzala havia invadido o salão” . Para o pesquisador a fala do arcebispo
refletia uma tese endossada pela hierarquia católica: Isto é, os valores da negritude estavam
conspurcando um Brasil civilizado, branco e católico.”
459
Além desses preconceitos, os curandeiros e macumbeiros eram alvo da polícia,
acusados de práticas de baixo espiritismo e curandeirismo. Em 2 de abril de 1932, o Jornal
Diário de Notícias, publicou artigo sobre o tema. Nele, informava que agiam impunemente e
que as casas desses macumbeiros eram freqüentadas por pessoas de destaque social, que [...]
baixam de suas posições na sociedade para se igualarem aos boçães homens de macumba.
460
No dia 3 de abril, uma nova notícia contando a ão da polícia, que fizera uma diligência,
prendendo o pai de santo e o material com que fabricava as mezinhas e garrafadas, causando
perigo aos incautos que faziam uso de tais remédios.
461
O fato de que a notícia foi escrita nas páginas policiais revela como a imprensa
tratou de manifestações de práticas não cristãs e que conseqüentemente fugiam do controle e
conhecimento da maioria da população. A descrição dos objetos de uso do curandeiro
mostrou a mescla de valores agregados a práticas de curandeirismo. Entre os objetos de culto
encontrados pelos agentes da polícia, estavam diversos tipos de pós, medalhas de anjos, um
nicho com Santo Antônio, um dos santos mais populares do Brasil, envolto em velas,
amuletos envoltos em panos pretos, cruzes diversas feitas em papel, traçadas de forma
cabalística. A notícia da prisão do pai de santo levou o jornal 'LiULRGH1RWtFLDV a publicar
459
ISAIA, Artur C. Catolicismo pré-conciliar e religiões mediúnicas no Brasil. In: MANOEL, I. A & FREITAS,
N. M. B de.
+LVWyULDGDV5HOLJL}HV
. Desafios, problemas e avanços teóricos, metodológicos e historiográficos.
São Paulo: Paulinas, 2006, p. 139.
460
Com a polícia. Curandeiros e macumbeiros agem impunemente nesta cidade. 'LiULRGH1RWtFLDV, Ribeirão
Preto, 2/ abril/ 1932. p.1.
461
Com a polícia. Nos domínios da macumba. Feliz diligência da polícia e apreensão de farto material e
correspondência de otários.
'LiULRGH1RWtFLDV
. Ribeirão Preto, 3/ abril/ 1932, p. 1.
203
outras reportagens, alegando que aquele pai de santo não era o único e outros o poderiam
ficar impunes. A cidade de Ribeirão Preto era [...] cheia de macumba, onde se pratica o
candomblé, a magia negra, onde se esfolam os otários [...]”
462
O catolicismo não convivia bem com essas práticas, e os padres pregavam
tentando afastar os católicos. Se na sede do bispado, na presença do bispo, as cerimônias de
candomblé estavam evidentes, nas outras cidades menores a presença da Igreja não era
unânime conforme os católicos acreditavam.
Favorecendo a ação da Igreja, jornais afirmavam a necessidade de policiamento
nos locais onde se exercia indevidamente a medicina como nos centros de macumba.
463
As
acusações, no entanto, não contribuíram para diminuir o número de freqüentadores e curiosos,
inclusive das classes mais altas.
&RPXQLVWDV
Outra preocupação da Igreja eram os comunistas, que, piores que os protestantes,
negavam a existência de Deus, destruindo os fundamentos do catolicismo, significando uma
ameaça considerada subversiva.
Em 1937, o Episcopado brasileiro pronunciou-se contra o comunismo com uma
Carta Pastoral, alertando para o perigo da doutrina; invocando o papa Pio XI, destacava-se a
advertência de que o comunismo era perverso e que, para refutá-lo, os católicos precisavam
estudar a doutrina da Igreja e as encíclicas, como a 4XDGUDJHVLPR $QQR e a 'LYLQL
5HGHPSWRULV, pois, nelas, os católicos encontrariam os subsídios para compreender a grandeza
da responsabilidade do cristão.
464
A Carta Pastoral representava uma orientação para os fiéis, capaz de impedir que
aderissem ao comunismo. Por meio da Ação Católica, poderiam desempenhar sua missão,
invocando Nossa Senhora do Rosário, considerada como aquela que triunfa sobre os erros e a
heresia, e na festa de Cristo Rei enfatizavam a realeza de Cristo sobre os indivíduos e a
sociedade.
Em Ribeirão Preto, no ano de 1937, a campanha da Igreja ganhou um reforço com
a adesão da mídia. A rádio PRA7, que transmitia os programas da Igreja católica, e o jornal
462
No domínio da macumba e da medicina illegal. 'LiULRGH1RWtFLDVRibeirão Preto, 10/ abril/ 1932, p. 6.
463
As tiradeiras de sorte.
'LiULRGH1RWLFLDV
. Ribeirão Preto, 26/ abril/ 1935, p. 1.
464
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral e Mandamento do Episcopado Brasileiro sobre o
Communismo Atheu.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, ano 8, n. 92, p. 1 – 5, setembro 1937.
204
'LiULR GH 1RWtFLDV, junto com o Centro de Imprensa de Ribeirão Preto, ao lado de outras
instituições, encetaram uma campanha contra o comunismo.
Os comunistas foram atacados, acusados de atentar contra a integridade da Pátria.
Alguns jornais, como o &RUUHLR G¶2HVWH, 'LiULR GD 0DQKm, $&LGDGH, 'LiULR GH 1RWtFLDV,
publicaram uma rie de reportagens sobre a campanha contra o comunismo
465
, realizada na
sede da PRA7, local em que jornalistas e outros membros da sociedade de Ribeirão Preto
defenderam suas idéias contra a chamada ideologia vinda de Moscou e os perigos que ela
representava contra o nacionalismo.
Os padres faziam pedidos de oração para os membros das associações e para os
fiéis durante as missas. A hierarquia da Igreja considerava que a ameaça do comunismo
precisava ser barrada.
Os comunistas, em número pequeno se comparados com outros grupos, estavam
presentes nas cidades da diocese. Após a campanha da PRA7, com as perseguições
empreendidas pelo governo e as perseguições policiais, a militância na região de Ribeirão
Preto aparentemente diminuiu.
466
Os problemas enfrentados pela hierarquia eram inúmeros, de toda ordem e de todo
tipo. Como resultado do encontro dos bispos da Província de São Paulo, realizado na cidade
de São Carlos, em 1940, foi escrita uma &LUFXODU 5HVHUYDGD GR (SLVFRSDGR DR&OHUR. Os
bispos de Ribeirão Preto, d. Alberto e seu auxiliar d. Manoel, participaram do encontro. Na
&LUFXODU, os bispos, enumeraram alguns aspectos que mereciam dos padres o cuidado e o zelo
redobrados. Entre eles, a preocupação com a grande entrada dos imigrantes japoneses pagãos,
que precisavam ser evangelizados de modo intenso.
A região de Ribeirão Preto recebeu uma parcela desses imigrantes, e o censo de
1940 aponta, em algumas cidades, um grupo numeroso de seguidores do budismo. Na cidade
de Ituverava, dos 32.212 habitantes, 1.421 declararam ser adeptos dessa crença. O processo
migratório de japoneses para a região foi o fator determinante para esses números. Não
encontramos nenhuma orientação especial por parte dos bispos d. Alberto e d. Manuel a
respeito de evangelização para o grupo dos japoneses na diocese de Ribeirão Preto.
A &DUWD &LUFXODU 5HVHUYDGD DR (SLVFRSDGR H DR &OHUR também identificou os
cismáticos, os católicos húngaros, os rotarianos, protestantes e espíritas, entre as categorias
465
Alguns dos artigos da campanha contra o comunismo foram identificados nos seguintes jornais, com as
respectivas datas: Diário da Manhã, nos dias 6/10/19/20/25/26 de novembro de 1937; Correio D’ Oeste,
9/11/1937; A Cidade, 7/11/1937; Diário de Notícias, 19/11/1937.
466
ROSA, Lilian R. de O.
&RPXQLVWDVHP5LEHLUmR3UHWR
Franca: Unesp, 1999, p. 87 et. seq.
205
que preocupavam o episcopado paulista e requeriam cuidados por parte dos sacerdotes na
orientação e conduta.
Em meio a essa pluralidade de crenças e outras manifestações sociais, políticas e
religiosas, a Igreja alegava ser a única capaz de dar à nação a estabilidade e a união de que os
brasileiros necessitavam. Para Artur Isaia, [...] a identificação do catolicismo com a
nacionalidade é muito importante para entendermos os jogos discursivos com os quais a
hierarquia da Igreja tentava desacreditar os demais componentes no campo religioso
brasileira.”
467
Aos católicos, era recomendada distância de uma convivência ou comunicação
com os grupos considerados hereges. Os padres aconselhavam que ficassem alerta ao menor
sinal de que os princípios dos inimigos pudessem avançar em adentrar suas casas. A tentativa
de desacreditar as outras crenças esteve presente em todo o governo de d. Alberto. A chegada
do bispo auxiliar concorreu para dar impulso ao catolicismo, num momento em que a saúde
de d. Alberto não permitia sua presença mais assídua à frente da diocese.
$ FKHJDGDGR ELVSR DX[LOLDUG0DQXHOGD6LOYHLUDG¶(OERX[HRILPGRJRYHUQRGHG
$OEHUWR±
Ao longo da década de 1930, d. Alberto insistiu em pedir um bispo auxiliar. Seu
estado de saúde piorava a cada dia, deixando-o debilitado e preocupado com a situação do
bispado.
Em 1934
468
, ele escreveu ao arcebispo d. Duarte, pedindo autorização para tratar
do assunto com o núncio apostólico; os motivos, ele deixou claros: , encontrava-se
enfraquecido, sem condições para realizar as visitas pastorais e com falhas na memória. O
interessante da carta foi a indicação que ele fez do vigário-geral, monsenhor João Lauriano
469
,
para ser seu bispo auxiliar ou coadjutor, alegando que o vigário conhecia a situação da
diocese e que era estimado pelo povo. D. Alberto lembrou os anos de trabalho a serviço da
Igreja, mas pediu uma palavrinha do arcebispo para o caso.
467
ISAIA, A C. 2006. p. 137.
468
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência ao arcebispo D. Duarte Leopoldo e Silva, 13/2/1934.
$&063
, São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
469
Monsenhor João Lauriano nasceu na cidade de Mococa em 13 de março de 1882, filho de Domingos
Lauriano e Leonarda Russo, estudou no seminário Episcopal de São Paulo e na Pontifícia Gregoriana de Roma,
foi ordenado em Roma; em 1908, no ano da criação da diocese de Ribeirão Preto e em 1909 recebeu o grau de
doutor em Teologia, regressando ao Brasil, onde passou a exercer o sacerdócio no bispado de Ribeirão Preto.
Exerceu o cargo de vigário-geral do bispado de 1927 até a sua morte em 1973.
206
A longa trajetória de d. Alberto a serviço da Igreja durou mais um tempo depois
da carta de 1934. Diferente dos dias atuais, quando, ao completar 75 anos, um bispo pede sua
renúncia, d. Alberto ficou à frente da diocese até sua morte, em 1945. Impossibilitado pela
idade e saúde, começou a declinar dos convites para comparecer a diferentes cerimônias e
comemorações.
Em 1938, quatro anos após pedir um bispo auxiliar, d. Alberto continuou com
suas queixas a d. Duarte, escrevendo que estava desanimado e enfraquecido, com dificuldades
para celebrar a missa, e confessava que [...] estava apavorado com os trabalhos da semana
santa” . A carta, em tom de desabafo, tinha um pedido ao arcebispo para que, como amigo
dele, intercedesse junto ao núncio, pedindo um auxiliar. Apelava para a caridade, afinal ia
completar 60 anos de serviço à Igreja e confessou que tinha ímpetos de abandonar seu posto.
[...] Dê no que der, é uma crueldade que estão fazendo commigo, e a
salvação das almas ficará compromettida mas a culpa não é minha, fiz o que
estava em minhas forças. O povo reclama meus serviços e eu não lhes posso
dar mais, se não em pequena escala. É a minha triste situação.
470
O desabafo e a frustração do bispo tinham razão de ser; adoentado, sentia o peso
de conduzir a grande diocese, sem contudo dar conta das inúmeras atribuições que cabiam a
um bispo. Ao vigário-geral, monsenhor Lauriano, foram confiadas inúmeras atividades, como,
por exemplo, a de administrar o patrimônio da diocese.
Monsenhor João Lauriano, vigário-geral do bispado, estava à frente, junto com
outros sacerdotes, de inúmeras atividades na diocese. Analisando as notícias do %ROHWLP
'LRFHVDQR verificamos, pelos comunicados, que o monsenhor, a pedido de d. Alberto,
conseguiu as informações a respeito do movimento religioso, das paróquias e dos padres, no
andamento da administração do bispado, solicitando aos vigários que enviassem relatórios
mensais ou anuais.
O monsenhor organizava o registro dos fatos ocorridos na diocese e fora dela,
relativos à Igreja, bem como a publicação dos documentos papais.
471
Vários assuntos relativos
à administração da diocese passavam por monsenhor Lauriano, que recebia as cartas dos
470
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondênciaa d. Duarte Leopoldo e Silva. 8 de fevereiro 1938.
$&063
, São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
471
VALE, Manoel Pereira do.
0RQVHQKRU-RmR/DXULDQR
. Ribeirão Preto: Arquidiocese de Ribeirão Preto,
1976, p. 19.
207
padres, que recorriam a ele como um intermediário do bispo
472
, que, doente, limitava sua
participação às festividades e eventos mais significativos.
Em 1938, d. Alberto não apenas reforçou o pedido de um auxiliar, como escreveu
uma &DUWD3DVWRUDO
473
destinada ao clero e aos fiéis, sobre a sua administração da diocese.
Sentindo o peso dos anos, a doença, bem como o afastamento das atividades a pedido do
médico, fez um balanço da administração antes de se retirar para Curitiba em tratamento. O
bispo relatou suas mágoas, dificuldades, calúnias que enfrentou, citando uma visita pastoral
do início de seu governo, em que fora recebido com um folheto difamatório que prevenia o
povo contra o “ explorador” .
Na &DUWD3 DVW RUDO explicou como empregou o dinheiro do crisma e outras rendas:
E para maior prova do meu asserto, ahi estão as obras que não se fazem com
palavras: o Palácio Episcopal, o Seminário e a chácara destinada ao recreio
dos alumnos, a Cúria Diocesana, a Igreja de São Benedicto, o Patrimônio da
Diocese e a Cathedral, com cujas obras concorri com quantia superior a
duzentos contos de réis [...]
474
Nos dados apresentados, o bispo afirmou que havia crismado mais de quinhentas
mil pessoas, nas sete vezes em que fez suas visitas pastorais, a todas as cidades da diocese. A
organização da diocese, de fato, representou um dos aspectos com que d. Alberto teve muito
cuidado no seu governo. Nas primeiras décadas, cuidou pessoalmente de cada paróquia por
meio das visitas pastorais e das cartas pastorais enviadas ao clero e aos fiéis. O empenho de d.
Alberto resultou num movimento importante de vitalidade da Igreja católica na região.
Em 36 anos de governo, d. Alberto escreveu Cartas Pastorais, Mandamentos e
avisos diversos, que foram enviados ao clero e aos fiéis católicos sobre os mais variados
temas: anunciando e orientando a visita diocesana, pedindo cooperação com a formação do
patrimônio, tabela de emolumentos paroquiais, orientação para coleta de esmolas,
mandamento sobre os dias santos e festas, sobre a lei do jejum e abstinência, carta
estabelecendo o dia da boa imprensa, avisos sobre casamentos e processos matrimoniais,
alistamento eleitoral, entre outros temas. A documentação presente em alguns livros Tombo
472
SAVIO, Luis. Correspondência
ao Monsenhor Lauriano. 21/05/1936.
$&053
-SP, Ribeirão Preto-SP. (Caixa
Monsenhor Lauriano). Na carta, o padre Luis pediu a intercessão de monsenhor junto ao bispo, pois não queria
que este ficasse nervoso por sua causa.
473
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a sua administração da
diocese.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, n. 98, p. 1-5, abril 1938.
474
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta Pastoral do Bispo de Ribeirão Preto sobre a sua administração.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, n. 98, p. 2, abril 1938.
208
ou publicada depois de 1930 no Boletim Diocesano permite olhar os diferentes momentos da
Igreja na diocese de Ribeirão Preto, em face de acontecimentos que envolviam aspectos
políticos, sociais e econômicos com a instituição, bem como com os projetos dos padres e a
vida cotidiana dos fiéis dentro e fora da Igreja durante o governo de d. Alberto.
Em dezembro 1939, ainda desalentado com o caso e sem ter uma luz positiva do
Vaticano a respeito da vinda de um auxiliar para ajudar a resolver seus problemas, d. Alberto
escreveu ao arcebispo dizendo que:
[...] o Núncio apostólico prometeu que viria e nada [...] conforme disse ao
Núncio apostólico não aceito a vinda de qualquer religioso [...] que o plano
dele é esperar minha morte para indicar mais um. Estou crendo com D.
Benedito que não houve passo algum para o caso [...] Por enquanto desculpe
a caceteação.
475
O Bispo estava cansado? Ou, sentia-se impotente diante da velhice e a doença que
o impediam de realizar a ação pastoral?
D. Alberto foi um viajante incansável, seja por suas atividades particulares em
São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro, pelas estações de água, ou ainda pela diocese para as
atividades pastorais.
O Vaticano resolveu atender aos insistentes apelos do bispo e nomeou um bispo
auxiliar para Ribeirão Preto. O eleito, padre Manuel da Silveira D’ Elboux, nasceu em Itu, no
interior de São Paulo, em 1904, filho de Osório Florêncio D’Elboux e Maria Francisca da
Silveira D’Elboux. Foi ordenado presbítero por d. Duarte Leopoldo e Silva, em 15 de agosto
de 1931, na igreja de Santa Efigênia, em São Paulo. Foi nomeado bispo auxiliar de Ribeirão
Preto em 10 de janeiro de 1940 e sagrado bispo em 31 de março de 1940. A sagração
episcopal ocorreu na igreja de Santa Cecília, em São Paulo, pelo arcebispo d. José Gaspar de
Afonseca e Silva, tendo por co-sagrantes d. Alberto José Gonçalves, bispo de Ribeirão Preto,
e d. Paulo de Tarso Campo, bispo de Santos. Participaram da cerimônia os bispos de Botucatu
e de Sorocaba, o abade do Santuário de Santo Antônio de Ribeirão Preto, d. Miguel Ângelo
Biondi, entre autoridades civis e eclesiásticas.
O FXUULFXOXP de d. Manuel demonstra uma carreira sacerdotal muita rápida.
Ordenado sacerdote em 1931, exerceu o cargo de vigário cooperador da matriz de Santa
475
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência
a d. José G. de A. e Silva. 30/12/1939.
$&063
, São
Paulo.
209
Efigênia
476
, foi secretário particular de d. Duarte, entre os anos de 1932 a 1935. Em 1935, foi
nomeado ministro do Seminário Central do Ipiranga, local em que permaneceu exercendo
vários cargos, chegando a reitor, até ser eleito bispo. Em menos de uma década como padre,
Manuel da Silveira D’ Elboux, aos trinta e seis anos, foi sagrado bispo, escolhendo como
dístico de seu brasão o lema: Urge-nos a caridade de Christo.”
D. Alberto, para acolher seu auxiliar, escreveu uma “ Carta Pastoral em que
anunciava ao clero e aos fiéis a chegada de d. Manoel, apresentando-o da seguinte forma:
Confio, Caríssimos Irmãos e Filhos, que tereis para com aquele que é
constituído também vosso Chefe espiritual, as demonstrações de respeito e
obediência que sempre de vós tenho recebido. [ ...] Se eu tiver de me
ausentar alguma vez da sede da Diocese, por exigência de minha saúde,
tereis, Caros Irmãos e Filhos, na pessoa do meu Auxiliar um Chefe, um
distribuidor das graças divinas, um apoio em vossas lutas, um consolador em
vossas provações, um guia, um pae a quem podereis recorrer com toda a
confiança.
477
A carta de apresentação mostrou um d. Alberto cheio de zelos para com aquele
que veio para ajudá-lo. D. Alberto, antecipadamente, confiou publicamente no trabalho que
seu auxiliar ia exercer, dedicando-se ao que o velho bispo já não fazia em razão da idade e da
doença. O momento era de alegria para d. Alberto; foi duplamente atendido em seu pedido:
veio um auxiliar, e o era religioso, conforme seu desejo.
478
Não foi possível apurar os
motivos pelos quais d. Alberto não queria um religioso, uma vez que, ao longo de seu
governo, foi ajudado pelos religiosos em suas visitas pastorais.
No dia da chegada de d. Manoel, d. Alberto estava internado na Santa Casa local,
o que contribuiu para diminuir o brilho da festa. No trajeto entre Campinas e Ribeirão Preto,
após entrar na região da diocese, em cada parada do trem, d. Manoel era recebido com
grandes manifestações de alegria. Esperavam-no nas plataformas das estações da estrada de
ferro o clero, os membros das associações religiosas, estudantes e o povo. A festa preparada
476
A matriz de Santa Efigênia funcionava como catedral provisória de São Paulo, na ocasião em que d. Manuel
exerceu o cargo de vigário cooperador.
477
GONÇALVES, D. Alberto José. Carta do Bispo de Ribeirão Preto apresentando o seu auxiliar d. Manoel da
Silveira D’ Elboux ao clero e aos diocesanos. %ROHWLP'LRFHVDQR, Ribeirão Preto-SP, ano 9, n. 118, p.1,
fevereiro 1940.
478
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondência a d. José Gaspar de A. e Silva, 30/12/1939. São Paulo.
$&063
, São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
210
em Ribeirão Preto foi adiada, e a recepção ao bispo foi silenciosa por causa do estado de
saúde de d. Alberto.
O jornal 'LiULRGH1RWtFLDV publicou o discurso
479
que seria pronunciado pelo juiz
da primeira vara, dr. Antonio Carlos Pereira da Costa, representando os fiéis católicos e o do
monsenhor João Lauriano, vigário-geral da diocese, o representante do clero. Os discursos
cujo teor traziam uma saudação a d. Manoel, exaltando seu lema, sua obra como padre e reitor
do seminário, não foram pronunciados por causa das mudanças na recepção do bispo.
Monsenhor Lauriano reiterou que, a pedido de d. Alberto, todo o clero já se colocava à
disposição do novo bispo, prontos para obedecer-lhe e colaborar com a propagação do
Evangelho e a defesa da fé. A diocese, em 1940, não dispunha de um jornal diário para
publicar as notícias relativas à diocese, mas a imprensa local cobriu os eventos. D. Manoel
recebeu a imprensa no Palácio Episcopal, junto com monsenhor Lauriano e o cônego Assis
Barros. Os discursos e a “ Carta Pastoral” de d. Alberto, de acolhida a d. Manoel, e as festas de
recepção foram publicadas no Boletim Diocesano do mês de abril de 1940.
Com a ajuda de d. Manoel, abriu-se um novo momento para a Igreja de Ribeirão
Preto, que, igual em outras partes do mundo, se via às voltas com a complexa situação
instalada com a segunda guerra mundial. As festas sacras e o Congresso Eucarístico
Diocesano de 1940 proporcionaram um momento forte de renovação espiritual para os fiéis
católicos.
Nos meses que se seguiram à chegada de d. Manoel, as festas de maio, dedicadas
à Virgem Maria, a festa de Corpus Christi, em junho, o mês do Sagrado Coração de Jesus e as
missões de agosto de 1940, foram noticiadas pelos jornais locais como grandes manifestações
dos católicos que mostravam sua força e crença.
A mobilização dos católicos na diocese, considerada pelo bispo como pequena,
era vista pela imprensa de forma diferente. A festa de Corpus Christi, em 1940, reuniu uma
pequena multidão, o que fez com que os jornais escrevessem que o fato constituía um indício
seguro de que, ao contrário do que muitos apregoavam, a crença nos dogmas da Igreja
católica a cada dia aumentava.
479
D. MANUEL da Silveira D’ Elboux.
'LiULRGH1RWLFLDV
, Ribeirão Preto, 21/abril/1940, p. 1.
211
Muitas pessoas participavam das festas sacras e aos poucos entravam nas searas
mais íntimas do catolicismo, ao fazerem sua adesão aos ideais pregados pela Igreja por meio
das associações. Mas incomodava a hierarquia o número daquelas que participavam de forma
paralela em outros cultos. O fato é que uma verdadeira evangelização era difícil. A pregação
da doutrina feita às crianças constituía um elemento efêmero, e atingir os adultos numa
verdadeira cruzada de evangelização era uma tarefa mais complexa que exigia da Igreja um
maior empenho para chegar à maturidade da adesão ao culto e à prática de valores que
enfrentavam outras crenças e a dessacralização da sociedade. Chegar aos pobres, às massas
urbanas e rurais era um desafio imenso nem sempre conseguido pela Igreja de forma
completa.
A festa de Cristo Rei, implantada na liturgia no ano santo de 1925, a entronização
do Sagrado Coração de Jesus e do Imaculado Coração de Maria nas paróquias, nas casas, nas
cidades, eram demonstrações de que o mundo católico reagia à secularização da sociedade.
No discurso dos padres, os frutos da entronização nos lares revertiam-se em frutos nas
famílias, tais como o fortalecimento da união entre seus membros. Para os padres não bastava
a entronização das imagens na sala principal, era preciso entronizar o próprio coração numa
dedicação à causa da Igreja. O modelo da família de Nazaré era seguido pelas famílias que
realizavam a entronização de suas casas e de seus membros.
480
&RQJUHVVRVHXFDUtVWLFRV
480
LIVRO de Atas do Apostolado da Oração.
$UTXLYR3DUyTXLDGH1RVVD6HQKRUDGR5RViULR
, p. 1.
Ribeirão Preto.
212
Uma das inovações da Igreja eram os Congressos Eucarísticos, exaltando a figura
do Cristo sacramentado, cujo culto se irradiava na vida cotidiana. Iniciados na Europa no fim
do século XIX, mais precisamente na França, foram abençoados pelo papa Leão XIII. O
primeiro Congresso Eucarístico Internacional foi realizado em Lille, na França, com o tema $
HXFDULVWLDVDOYDRPXQGR Rapidamente ganharam espaço nos países católicos.
481
Desde o 1
o
.
Congresso Eucarístico Nacional, em 1933, em Salvador, Bahia, sede primaz do arcebispado
do Brasil, o clero fazia propaganda do evento como um elemento a mais que contribuiria para
propagar a fé católica, despertando a fé e o amor a Jesus Cristo sacramentado. Bispos, padres,
membros das associações de fiéis, eram convidados a participar dos Congressos Eucarísticos
nacionais, diocesanos e paroquiais que passaram a fazer parte do cenário religioso.
A hierarquia da Igreja considerava como um dos objetivos principais dos
Congressos eucarísticos renovar a piedade e o espírito católico do povo brasileiro, mostrando
a força do catolicismo na vida cotidiana.
Os Congressos Eucarísticos eram celebrados como um triunfo de uma sociedade
que se rendia a Cristo Rei, conforme o desejo do papa Pio X. Inúmeras eram as motivações
que mobilizavam milhares de pessoas pelo mundo nos Congressos Eucarísticos e, por isso, a
alta hierarquia da Igreja comparecia paramentada, emprestando brilho às solenidades.
D. Alberto escreveu uma Carta
482
aos fiéis apresentando o Congresso; nela,
compara a Europa, que assistia ao desmoronamento das conquistas da civilização cristã, com
a tranqüilidade daqueles que podiam desfrutar das bênçãos de proclamar a realeza de Cristo.
Um dos objetivos do Congresso Eucarístico diocesano era preparar o Congresso Nacional,
que seria celebrado em 1942, na cidade de São Paulo. O bispo enfatizava que [...] o fim
primordial é intensificar entre os fiéis a devoção ao SS. Sacramento e o amparo as Vocações
Sacerdotais.”
483
Em 1939, seguindo as recomendações da cúria diocesana de Ribeirão Preto, os
padres organizaram em suas paróquias o Congresso Eucarístico Paroquial, preparando o
Congresso Eucarístico Diocesano, realizado em 1940. Tal preparação contou com as missões
na sede da diocese. Durante as missões, as pregações se intensificavam, conversões, seguidas
de confissão e comunhão, ocorriam em número alto. A força das celebrações pôde ser
identificada quando uma procissão dedicada a Nossa Senhora Aparecida reuniu cerca de vinte
481
Por ocasião da 2
a
visita Ad Limina, D. Alberto participou no Santuário de Lourdes na França de um
Congresso Eucarístico.
482
GONÇALVES, D. A. J. Primeiro Congresso Eucharistico Diocesano. %ROHWLP'LRFHVDQR, Ribeirão Preto-SP,
ano 9, n. 124, p. 1, agosto, 1940.
483
GONÇALVES, D. A. J. Primeiro Congresso Eucharistico Diocesano.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP,
ano 9, n. 124, p. 1, agosto, 1940.
213
mil pessoas e quando o encerramento das missões contou com trinta mil pessoas em uma
missa campal. As manifestações dos católicos indicavam que a presença da Igreja no seio da
sociedade, mesmo que considerada pequena pela hierarquia, era descrita pela imprensa como
um triunfo do catolicismo.
Preparando o Congresso, foram proferidas conferências nas cidades e na sede da
diocese, alertando os católicos para o triunfo da causa do Cristo. Era a contraposição ao
avanço do sectarismo, protestantismo, espiritismo e outras crenças consideradas pela Igreja
como seitas.
Em algumas paróquias, a preparação foi realizada nas cidades e na zona rural. A
primeira providência dos párocos consistiu em conseguir padres para auxiliar nas pregações e
nos demais rituais. O programa dependeu do número de padres suficientes para atender as
capelas e ajudar nas matrizes. De maneira geral, o programa nas paróquias contou com as
seguintes cerimônias: missa cantada votiva ao Espírito Santo, pregações com temas
específicos, como a Eucaristia e o Sagrado Coração de Jesus, confissões, festas de primeira
comunhão de crianças e adultos, adoração do Santíssimo, hora santa com meditação,
exposição do Santíssimo Sacramento. Uma ênfase na Eucaristia era dada pelos padres
seculares e missionários, ressaltando o papel do Cristo ressuscitado e eucarístico.
D. Alberto, ao enviar uma carta anunciando o Congresso, ressaltou a importância
de que todos os católicos estivessem [...] irmanados no Reino de Christo [...] reunidos no
do altar [...] ao grande cortejo triumphal de Jesus Hóstia.
484
D. Alberto, contando com seu bispo auxiliar, d. Manoel, e com os diretores do
Congresso, monsenhor João Lauriano
485
e cônego Assis Barros, preparou e realizou o 1
o
.
Congresso Eucarístico Diocesano, que ocorreu entre os dias 22 e 29 de setembro de 1940, na
sede da diocese.
No Congresso Eucarístico Diocesano, ao lado dos bispos de Ribeirão Preto, d.
Alberto José Gonçalves e d. Manuel da Silveira D’ Elboux, esteve presente o arcebispo
metropolitano de São Paulo, d. José Gaspar de Affonseca e Silva, o arcebispo de Cuiabá, d.
Francisco de Assis Correa, e os bispos d. Antonio Augusto de Assis, de Jaboticabal, d.
Francisco de Campos Barreto, de Campinas, d. Antonio dos Santos, de Assis, d. Gastão
484
GONÇALVES, Dom Alberto J. Primeiro Congresso Eucarístico Diocesano. %ROHWLP'LRFHVDQR, Ribeirão
Preto-SP, n.124, p. 1, agosto de 1940.
485
Uma das preocupações de monsenhor Lauriano ao preparar o Congresso Eucarístico não estava relacionada
com as questões de fé. O Monsenhor pediu informações para a cúria de São Paulo sobre os lugares em que
deviam ficar no altar as autoridades eclesiásticas no evento. Cartas foram identificadas com esse tema,
ressaltando a ordem hierárquica da Igreja. Ter no mesmo evento vários bispos e o arcebispo metropolitano
deixava o cerimonial em apuros quanto à posição de cada autoridade durante o evento.
214
Liberal Pinto, de São Carlos, d. Paulo de Tarso Campos, de Santos, d. Luiz Maria de
Sant’Ana, de Botucatu, bem como os representantes de outros bispos.
As autoridades civis também estiveram presentes; o interventor Dr. Adhemar de
Barros enviou como representante o Secretário da Educação e Saúde Pública, Dr. Mário Lins.
As autoridades civis de Ribeirão Preto também compareceram às cerimônias do Congresso. A
Igreja caminhava contribuindo para os projetos do Estado e vice-versa, quando interessava a
cada uma das partes.
O programa do 1
o
. Congresso Eucarístico Diocesano de Ribeirão Preto teve como
tema principal a “ (XFKDULVW L DH DV9RFDo}HV6DFHUGRWDLV e os temas das sessões “ (XFKDULVWLD
± 6DFUDPHQWR (XFKDULVWLD ± 6DFULItFLR (XFKDULVWLD ± /LWKXUJLD. As sessões de estudos,
missas solenes, sermões, exposição e benção do Santíssimo Sacramento foram algumas das
atividades.
As conferências foram proferidas por padres e leigos, destinadas aos adultos e
crianças. Os adultos tiveram sessões separadas para homens e moços, senhoras e moças. Os
homens reuniram-se na Vila Tibério e nos Campos Elíseos; os homens e moços do curato da
catedral reuniram-se na igreja São Benedito. Para as mulheres, apenas uma opção de lugar, as
senhoras e moças fizeram suas reuniões na igreja São José, dos padres agostinianos. Quanto
às crianças, as sessões foram realizadas em três lugares: no salão paroquial da Vila Tibério;
nos Campos Elíseos, no Instituto Mazzarello e no curato da catedral, no salão Santa Helena.
Durante o Congresso um dos momentos de destaque da manifestação dos
católicos foi a procissão solene pelas ruas da cidade. Os jornais e outras notícias da época
calculavam em 30 mil pessoas, sem contar as que ficaram na porta de suas casas, que foram
enfeitadas, esperando a procissão passar, quando o número pode ter atingido, de acordo com
os mais otimistas, 50 mil pessoas. A procissão representava a apoteose do Congresso, nela
estavam presentes a hierarquia da Igreja, as autoridades civis e os fiéis católicos de Ribeirão
Preto e região. As delegações das cidades da diocese compareceram em massa e, junto com os
fiéis de Ribeirão, podiam ser identificadas por suas roupas, distintivos e estandartes com as
associações a que pertenciam, o que certamente contribuiu para manifestar a força dos
católicos. No dia 29 de setembro, data do encerramento do Congresso, o arcebispo de São
Paulo, d. José Gaspar, celebrou em altar montado na porta da catedral uma missa solene, cujo
sermão foi proferido pelo bispo auxiliar de Ribeirão Preto, d. Manoel da Silveira D’ Elboux.
A emoção que a festa podia proporcionar aos fiéis permitia o fortalecimento da
devoção a Cristo e, por extensão, da adesão aos valores propagados pelos padres nas homilias
e preces durante a festa.
215
A importância do Congresso Eucarístico pode ser atestada quando verificamos
que a estação de rádio PRA7 de Ribeirão Preto transmitiu todas as solenidades.
O editorial do jornal 'LiULRGH1RWtFLDV afirmou que o Congresso Eucarístico era
[...] uma manifestação religiosa, uma cantante affirmação da imutabilidade da Igreja
Cathólica Apostólica Romana.”
486
Com uma grande população católica na diocese, uma manifestação que
mobilizava os fiéis constituía uma afirmação sem precedentes da força do catolicismo na
sociedade. Mas as multidões que compareciam às festas religiosas representavam apenas uma
parcela da população, e não o seu conjunto.
3DVWRUDO  GH G0DQRHO
Durante os preparativos para o Congresso que vinham ocorrendo desde o ano de
1939, d. Manoel, deu início a uma seqüência de visitas pastorais para conhecer a diocese.
Seguindo os passos de d. Alberto, o novo bispo pediu nçãos ao arcebispo d. José para
iniciar sua peregrinação pela diocese, expressando sua gratidão de filho para com o
arcebispo.
487
As impressões de d. Manoel a respeito da situação da diocese foram registradas,
numa carta endereçada ao arcebispo d. José Gaspar de Affonseca e Silva, contando os
resultados das visitas pastorais:
[...] uma abertura de coração: visitei quinze paróquias e, mais ou menos,
pude tomar o pulso da diocese. a situação no terreno espiritual, pode-se dizer
é precária. Sete paróquias não tem vigário, quatorze paróquias possuem
vigário, mas são eles tão doentes e velhinhos que absolutamente, não podem
acudir as necessidades das almas. O clero, com rara exceção, é estrangeiro e
constituído de padres volantes. Quase não existe paróquia em que não haja
casos embaraçosos para o Bispo. Algumas cidades poderiam ser verdadeiros
celeiros de vida espiritual religiosa vão se tornando deserto ainda onde
apenas bruxuleia a luz da fé, porque ainda acalentada pelas mãos de Deus.
486
CONGRESSO EUCARÍSTICO.
'LiULRGH1RWtFLDV
. Ribeirão Preto, 13/9/1940, p. 1-2.
487
D’ ELBOUX, D. Manuel da Silveira. Correspondência
ao Arcebispo D. José de Affonseca e Silva
17/jun./1940.
$&063
, São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
216
Este, Excia, o quadro presente da diocese. O que será do futuro?
Resolveremos o problema da falta de clero com 15 alunos nos Seminários
Menor e Maior?
488
A carta prosseguia apresentando ao arcebispo um programa em que d. Manoel
pedia aprovação para colocá-lo em prática.
As minhas sugestões seriam para a diocese de Ribeirão Preto. Quero
submete-las à apreciação de V. Excia:
1
o
. Instalação da obra das Vocações Sacerdotais
2
o
. Reunião do clero a cada três meses
3
o
. Federação e Confederação das Associações religiosas da diocese
4
o
. Instalação do secretariado da Cruzada Eucarística Infantil, estendendo
esta Associação a todas as Paróquias, colégios, etc... lançando-se neste meio
a semente da Ação Católica.
489
O programa de D. Manoel representava um meio de ter mais de perto o controle
de padres e leigos, de incentivar a obra missionária, expandir a ão do catolicismo na
diocese. Outro ponto forte era o incentivo às crianças à Cruzada Eucarística, tentando trazer
cada vez mais os fiéis para o seio da Igreja, por meio da Ação Católica.
D. Manoel aponta como um grave problema a assolar a diocese, ao lado do
casamento apenas no civil, a deserção dos chefes de família da assistência a missa dominical.
Outra preocupação de d. Manoel representava um problema antigo na diocese e
sobre o qual d. Alberto havia se manifestado, era o avanço do espiritismo. No início do
governo de d. Alberto, o combate contra o espiritismo vinha sendo realizado pelos católicos.
Algumas questões podem ser levantadas. O avanço dos espíritas significava que estava
terminava a obra de D. Alberto? Teria d. Alberto conseguido atingir seus objetivos durante as
décadas de seu governo?
As diretrizes e a metodologia da Igreja nos anos 1940 eram diferentes do
momento em que d. Alberto e outros bispos haviam assumido as dioceses da Província
Eclesiástica de São Paulo. Alguns problemas permaneceram, outros foram substituídos,
488
D’ ELBOUX, D. Manuel da Silveira. Correspondência ao Arcebispo D. José de Affonseca e Silva,
5/nov./1940.
$&063
São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
489
D’ ELBOUX, D. Manuel da Silveira. Correspondência ao Arcebispo D. José de Affonseca e Silva,
5/nov./1940.
$&063
, São Paulo. (Pasta Ribeirão Preto).
217
apesar dos avanços conseguidos pelos membros da Igreja. Ao longo do governo, d. Alberto
combateu as crenças contrárias à Igreja com os recursos e a metodologia de que dispunha. As
preocupações da Igreja em 1940 estavam inseridas num contexto diferente do início do século
XX, quando a diocese de Ribeirão Preto foi instalada.
A motivação era inserir os fiéis numa proposta engajada na Ação Católica e /ou,
outras associações laicas, capazes de capacitar o fiel a assumir um compromisso com os
projetos da Igreja. Fazia-se necessário deixar para trás a ignorância religiosa; os fiéis
precisavam conhecer a doutrina e os ensinamentos da Igreja para enfrentar as práticas
religiosas populares que ainda permaneciam no seio dos católicos.
490
Acompanhando os relatórios enviados à cúria, apesar das falhas, pois muitas
paróquias não enviavam os dados pedidos, os números apontam para um crescimento das
associações e dos membros em seus quadros, aumento no número de comunhões e, apesar de
participação limitada dos leigos comprometidos em muitas paróquias, a luta da Igreja e seus
membros persistiam por meio das associações, dos Congressos Eucarísticos mobilizando
multidões e da tentativa de implantar a Ação Católica nas paróquias da diocese.
É certo que se iniciava um novo tempo, em que o vigor, a juventude e a
disposição de d. Manoel, deram um impulso ao catolicismo, mas d. Alberto, continuou à
frente da diocese.
As consultas a d. Alberto continuaram a ser realizadas pelo arcebispo nos anos de
1940, sobre temas variados, como: a segunda guerra mundial, esquema para encontros dos
bispos, divórcio, casamento, educação e a reforma do ensino religioso, Congressos Marianos,
Eucarísticos, etc.
A segunda guerra mundial foi tema de inúmeras correspondências entre o
arcebispo d. José e o bispo de Ribeirão Preto. A posição de d. Alberto permite afirmar que o
bispo, longe de discordar do governo, recomenda ao arcebispo uma postura de apoio e sugere
que a Igreja não descuide de sua missão. Na carta a d. José, ele escreve:
Como é sabido, o povo brasileiro é infenso as guerras, e muito mais
profundamente são os paulistas que dão de preferência ao comércio, à
industria, e a todo gênero de trabalho útil e remunerador e fora de dúvida,
não daria acolhida a nossos conselhos, o que traria desprestigio a nossa
missão que é de ordem e de paz [...] Penso ser preferível publicar um
490
MAINWARING, S.
,JUHMD&DWyOLFDH3ROtWLFDQR%UDVLO
. 1916 1985. São Paulo: Brasiliense, 1989. p.50.
218
manifesto aconselhando em geral os nossos diocesanos que aceitem as
deliberações de nosso governo.
491
Fica claro que, para d. Alberto, a Igreja precisava se manifestar. A sugestão dele a
d. José era tomar cuidado ao assumir uma postura que permitisse servir como arma de
combate ao que chamou a missão de ordem e paz da Igreja. O momento era delicado, no
Brasil era grande a presença de padres e fiéis de origem dos paises das potências do Eixo,
contrários ao bloco democrático, ao qual aderiu o governo de Getúlio Vargas. O tema
mereceu discussões no seio do episcopado, e, de acordo com Lustosa
492
, apesar dos
contratempos, a Igreja deu seu apoio ao governo brasileiro.
D. Manoel e d. Alberto agiam nos bastidores do cenário político, articulando as
candidaturas de interesse da Igreja na região da diocese, na tentativa de impedir que
candidatos contrários aos esquemas do catolicismo fossem eleitos. Uma carta de d. Manoel
para d. Alberto deixa explícita a articulação: Estamos trabalhando sorrateiramente, pois, os
dois candidatos à presidência da sub-secção de Ribeirão Preto são divorcistas.”
493
Bispos e padres buscavam influenciar, na medida do possível, para que candidatos
a qualquer cargo no governo que militassem nas fileiras contrárias à doutrina católica não
fossem eleitos. Por meio das paróquias, os padres contavam com a ajuda dos leigos que
atuavam na Ação Católica ou em outros movimentos para atingir o objetivo de obstruir as
forças contrárias.
D. Manoel foi, aos poucos, colocando em prática alguns dos pontos em que pedira
orientação quando escrevera ao arcebispo de São Paulo em 1940.
Em 1942, realizando um dos projetos que anunciou ao tomar posse como bispo, d.
Manuel criou a Federação Diocesana das Congregações Marianas, um órgão que serviu para
orientar e formar a juventude mariana, obra em que contou com a ajuda do cônego Francisco
Assis Barros. Em 31 de maio de 1942, a primeira diretoria da Federação Diocesana das
Congregações Marianas tomou posse, durante uma sessão literário-musical realizada no
Salão d. Alberto.”
494
491
GONÇALVES, D. Alberto José. Correspondênciaa d. José de Affonseca e Silva. 6/8/1943. São Paulo,
$&063
, São Paulo.
492
LUSTOSA, Oscar de F.
$,JUHMD&DWyOLFDQR%UDVLO 5HS~EOLFD
: cem anos de compromisso. 1889-1989. São
Paulo: Paulinas, 1991. p.56
493
D’ ELBOUX, D. Manuel da Silveira. Correspondênciaa d. Alberto José Gonçalves. 15/12/1942. São Paulo,
$&063
. Pasta Ribeirão Preto.
494
FEDERAÇÃO Diocesana das Congregações Marianas.
%ROHWLP'LRFHVDQR
, Ribeirão Preto-SP, n. 146, p. 3.
junho de 1942.
219
Em outubro de 1942, foi lançado o 1
o
. número do Boletim Diocesano, Órgão da
Federação Diocesana das Congregações Marianas, quando havia uma estimativa de que, na
diocese, 2.122 agremiados participavam da congregação.
495
D. Manuel, à frente dos
congregados, realizou a 1
a
. Assembléia Mariana Diocesana em 8 de novembro de 1942,
direcionando os objetivos para as Congregações de toda a diocese. Outra atitude de d. Manuel
foi dar início à Concentração Mariana na diocese. O encontro mobilizava milhares de jovens
que acudiam das cidades que pertenciam à diocese.
A programação constava de missa, assembléia geral e um desfile, que era
realizado após a assembléia pelas ruas centrais da cidade. Os congregados compareciam com
suas bandeiras, fitas e distintivos. Durante o desfile entoavam cânticos e no final era recitado
um ato de Consagração a Nossa Senhora.
496
O secretário mundial das Congregões Marianas, padre Mariaux, veio a Ribeirão
Preto para a 2
a
Concentração Mariana. Na carta que enviou aos congregados marianos de
Ribeirão Preto, exaltou a cidade, o encontro, o trabalho desenvolvido pelos congregados,
afirmando que “ [...] até na Europa muitas Congregações Marianas invejariam os Congregados
de Ribeirão Preto por esta sede Mariana.
497
Por trás de todo esse avanço dos congregados e
da formação da federação, estavam d. Manoel e os padres diretores espirituais.
Solidificar a Federação das Associações tornou-se uma prioridade de d. Manoel,
pois, a partir das associações, os fiéis eram incentivados a participar da Ação Católica. A
fundação da Federação Mariana Feminina, em janeiro de 1943, sob a direção de d. Manoel,
veio consolidar o trabalho dos bispos, lembrando que este, para realizar qualquer
empreendimento, precisava do aval de d. Alberto.
Em outubro de 1943, passou a ser publicado o Boletim Diocesano, órgão da
Federação Feminina que era remetido a todos os grupos da diocese. O Boletim, de modelo
similar ao dos Congregados Marianos, era formado por avisos gerais, notícias sobre a igreja e
seus membros, relatórios sobre a vida espiritual das Pias Uniões das Filhas de Maria e dos
Congregados Marianos das paróquias da diocese com os resultados dos tesouros espirituais.
O Salão d. Alberto” foi inaugurado em 19 de maio de 1942 para servir de sede das associações religiosas da
catedral.
495
ESTATISTICA Mariana da Diocese.
%ROHWLP'LRFHVDQRÏUJmRGD)HGHUDomR'LRFHVDQDGDV
&RQJUHJDo}HV0DULDQDV, Ribeirão Preto, ano 1, n. 2, p. 9.
496
CONCENTRAÇÃO Diocesana.
%ROHWLP'LRFHVDQR
ÏUJmRGD)HGHUDomR'LRFHVDQDGDV&RQJUHJDo}HV
0DULDQDV
. Ribeirão Preto, ano 2, n. 13, p. 4-5, outubro 1943.
O trajeto do desfile começava pela Rua Visconde de Inhaúma, Duque de Caxias, Álvares Cabral, General
Osório, Pça Cel. Schmidt, Av Cel Luiz da Cunha, Pça Nossa Senhora do Rosário (Vila Tibério).
497
MARIAUX, Padre Walter. Carta aberta aos Congregados Marianos de Ribeirão Preto.
%ROHWLP'LRFHVDQR
.
ÏUJmRGD)HGHUDomR'LRFHVDQDGDV&RQJUHJDo}HV0DULDQDV
. Ribeirão Preto, ano 2, n. 14, p. 2-4, novembro
1943.
220
Os bispos recomendavam a leitura dos Boletins nas reuniões para que todos os participantes
tivessem acesso à informação e à formação espiritual.
Assumindo as visitas pastorais na diocese, d. Manoel incentivava as associações a
participar ativamente, instruindo na formação da fé as pessoas ligadas às associações laicas e,
a partir delas, realizar uma catequese que atingisse o restante da população. No ano de 1944,
havia, na diocese de Ribeirão Preto, 51 Pias Uniões das Filhas de Maria. Levando-se em conta
as 49 paróquias, quase todas tinham sua associação dedicada à Virgem Imaculada Conceição,
sendo que a catedral possuía três delas.
A fundação da Federação das Associações deu um impulso a elas, conforme o
relato de uma Filha de Maria.
498
Como diretor da Federação Mariana, d. Manoel reuniu as
Congregações da diocese na Assembléia Mariana Diocesana, buscando melhorar os
programas em execução. O bispo contava com as Congregações para determinar o programa
do Apostolado, tais como: catecismo nos centros, nos grupos escolares e na zona rural;
assistência vicentina, boa imprensa, programas de rádio, orientação moral dos espetáculos,
obra das vocações, etc. O bispo ressaltou que o importante era a qualidade, e não a
quantidade, dos católicos nas associações participando nas atividades da Igreja.
Os bispos incentivaram a abertura de uma livraria católica para combater a
chamada imprensa, facilitando a aquisição de livros edificantes para os católicos.
A pedagogia utilizada pela Igreja estava destinada em grande parte à classe média
ou alta. Nas escolas confessionais católicas para meninas e meninos, a freqüência nas
associações era parte da educação recebida. Associações como Filhas de Maria, Cruzada
Eucarística e Congregados Marianos eram formadas dentro das escolas destinadas aos alunos.
Prática comum no país, não fugiu à regra na diocese de Ribeirão Preto.
Muitas vezes, distante das classes operárias, a sede da diocese de Ribeirão Preto
celebrou o fato de conseguir instalar numa vila operária uma Pia União das Filhas de Maria,
levando-se em consideração que as moças trabalhavam durante o dia, e à noite se dedicavam
aos estudos. Era a Pia União da Vila Tibério, em Ribeirão Preto, que com incentivo permitiu
que se realizassem inúmeras atividades, como: Páscoa para as moças, ensino do catecismo na
paróquia, nos bairros e fazendas, trabalho na obra das missões e das vocações, cruzada
eucarística e as atividades no coro da matriz.
499
Considerando-se que a Pia União se
498
TRABALHO. Ribeirão Preto. %ROHWLP'LRFHVDQRÏUJmRGD)HGHUDomR)HPLQLQD0 DULDQD. Ribeirão
Preto, ano 2, n. 21, p. 5, janeiro 1945.
499
FUNDAÇÃO e história da Pia União das Filhas de Maria na Igreja matriz de Vila Tibério.
%ROHWLP
'LRFHVDQR
.
ÏUJmRGD)HGHUDomR0DULDQD)HPLQLQD
. Ribeirão Preto, ano 2, n. 14, p. 4, junho 1944.
221
localizava numa vila operária, os ganhos eram inquestionáveis e por isso foram tão
alardeados.
A Igreja não possuía mais o controle estrito da sociedade, como em outras épocas;
mesmo sendo ainda uma minoria, as pessoas declaravam-se abertamente adeptas de outras
crenças. De acordo com Thomas Bruneau
500
, as classes dias, as mais visadas, tinham
condições de se manter nas associações, de contribuir com as campanhas da Igreja, e os
padres eram formados nos seminários segundo os valores pregados e conduzidos pela classe
média. Depois de ordenados, muitos deles não sabiam como se relacionar e trabalhar com as
classes mais baixas, que constituíam a maioria da população brasileira.
As classes mais baixas, relegadas pelas elites, acabavam freqüentando os espaços
mais próximos de sua própria condição, como terreiros de candomblé, centros espíritas, onde
eram aceitos sem restrições de cor, raça, nível social. As paróquias nem sempre serviam como
centro de acolhida para pessoas das classes baixas. Dessa forma, ficam visíveis a importância
da fundação da Pia União das Filhas de Maria e sua atuação, no bairro operário da Vila
Tibério, em Ribeirão Preto. Comparada com outras dioceses, a ação social da Igreja em
Ribeirão Preto, entre os anos de 1909 a 1945, limitou-se mais a um assistencialismo e foi
menos incisiva do que em outras dioceses da antiga Província Eclesiástica de São Paulo.
501
Nos anos seguintes a 1940, os dois Bispos, d. Alberto e d. Manoel, auxiliados por
padres da diocese, empreenderam uma verdadeira cruzada para dar um impulso ao culto.
Seguindo os passos da &DUWD3DVWRUDOGRV%LVSRVGD3URYtQFLD
502
, iniciaram uma campanha
em defesa da fé, da moral e da família, combatendo os maus livros, excessos cometidos na
educação física, as roupas que não condiziam com os valores pregados pela Igreja, resgate da
autoridade paterna, entre outros temas. A chamada oposição continuava ridicularizando as
virtudes cristãs pregadas pela Igreja, como o matrimônio indissolúvel, o papel da mulher
como esposa e mãe, a proibição de filmes e livros contrários à moral cristã. A Igreja, por meio
do clero, dava continuidade à obra de guardiã da fé e da moral cristã.
A proposta da Igreja era promover um intenso trabalho para combater a
ignorância religiosa, levando os fiéis a estudar o catecismo, a alistar-se nas agremiações, a
participar da Ação Católica e do apostolado social e religioso.
500
BRUNEAU, T. C.
2
&DWROLFLVPR%UDVLOHLURHPeSRFDGH7UDQVLomR
. São Paulo: Loyola, 1974. p. 92
501
BENCOSTA, Marcus. L. A.
,JUHMDH3RGHUHP6mR3DXOR
: D. João Batista Corrêa Nery e a Romanização do
Catolicismo Brasileiro. (1908-1920) - Tese (Doutorado em História) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas. São Paulo, 1999. p. 173 et. seq.
502
3$6725$/&ROOHFWLYD
de 1940. Publicada pelo Boletim Diocesano a partir de dezembro de 1940 e nos
meses seguintes em 1941.
222
O trabalho dos dois bispos levou à consagração da diocese ao Coração de Maria.
Em 1943, seguindo as recomendações do papa Pio XII, d. Alberto determinou que a diocese
fosse consagrada ao puríssimo Coração de Maria. A festa realizou-se em 14 de novembro
durante a concentração dos marianos. O bispo auxiliar, d. Manoel, fez uma alocução depois
que d. Alberto recitou a prece da consagração, a qual tinha em vista os acontecimentos
mundiais. A Igreja orava pelo restabelecimento da paz mundial, implorando àquela que era
considerada por excelência a mãe protetora. De acordo com o Boletim Diocesano, “ [...] a sede
do Bispado transformou-se num largo templo, à cuja sombra se reuniu, para a festa solene de
sua Rainha a mocidade piedosa da Diocese.”
503
A festa da consagração representou o apogeu de um período em que d. Alberto
ainda estava à frente do bispado de Ribeirão Preto. Em 1945, depois de um longo período
doente, d. Alberto faleceu, encerrando-se a primeira etapa da diocese de Ribeirão Preto.
503
PALAVRAS do exmo. E revmo. Snr. Diretor.
%ROHWLP'LRFHVDQRÏUJmRGD)HGHUDomR'LRFHVDQDGDV
&RQJUHJDo}HV0DULDQDV
Ribeirão Preto, ano 2, n.14, p. 1, nov. 1943.
&
216,'(5$d®(6
)
,1$,6
Ao estudar um longo período da história da diocese de Ribeirão Preto, abrangendo
desde a escolha desta cidade para sede de diocese, passando pela formação do patrimônio,
bem como o governo do primeiro bispo, algumas considerações se fazem necessárias.
No fim do século XIX, ocorreu a ruptura do Estado com a Igreja no Brasil, em
decorrência da proclamação da República, e ela precisou se reestruturar, uma vez que ficou
livre da tutela do Estado, é verdade, mas, ao mesmo tempo, sem o amparo financeiro que lhe
vinha do tesouro público. Sem o apoio do Estado, viu-se diante da urgente necessidade de
reorganizar o patrimônio, a despesa com o culto e o templo, porque não mais contava com os
estipêndios estatais que lhe asseguravam a existência e que, muitas vezes, lhe permitiram
ampliar o seu patrimônio.
Abria-se um novo tempo eclesiástico, religioso e pastoral no Brasil, cujos agentes
procuravam agir de modo uniforme, em consonância com as diretrizes das reformas
romanizadoras implementadas pela cúria romana, após o pontificado de Pio IX.
No Brasil pós-república, alinhar-se com Roma significava, para o episcopado,
entre outras coisas, assumir o controle das ações da Igreja, criando novas paróquias, bispados,
construindo e reformando templos, instituindo associações laicas, dirigidas pelos padres para
atender às necessidades do culto e difundir a cristã, de acordo com a própria expansão das
vilas e cidades, particularmente em São Paulo, acompanhando o próprio avanço da fronteira
agrícola em direção ao oeste.
O alinhamento teve como resultado uma presença mais contínua dos padres em
regiões em que, até então, a assistência eclesiástica era esporádica, padres que deveriam agir
disciplinando o culto, administrando os sacramentos, dirigindo as associações laicas ao lado
de outras atividades religiosas e sociais. É nesse contexto de reorganização e expansão da
Igreja católica que foi criada a diocese de Ribeirão Preto.
A história da diocese de Ribeirão Preto teve seu início no culo XIX, com a
criação da paróquia de São Sebastião do Ribeirão Preto, em 16 de julho de 1870. O primeiro
vigário foi o pe. Ângelo Philidory Torres. A criação do bispado acompanhou o rápido
crescimento da cidade, tendo sido instalado menos de meio século após a oficialização da
224
Igreja com a paróquia. A preparação para a criação de um bispado na região, no entanto, teve
início nos primeiros anos do século XX; o projeto inicial, porém, previa a instalação da sede
do bispado em outra cidade, Batatais, e o processo se estendeu até 1908, quando foi criada a
Província Eclesiástica de São Paulo e instalada a sede do novo bispado em Ribeirão Preto.
Por volta de 1903, a cidade de Batatais começara a trabalhar para ser a sede de um
bispado no interior do Estado de São Paulo. Conforme os dados constantes da documentação
consultada, aquela cidade estava economicamente já mais consolidada e possuía os recursos
financeiros exigidos pelo Vaticano para sediar uma diocese. O projeto, enviado ao papa e à
Secretaria de Estado do Vaticano, argumentava sobre as necessidades espirituais de se manter
um bispo no interior de São Paulo, tendo em vista o crescimento da população na região e o
abandono em que a população católica se encontrava, ficando às vezes décadas sem receber a
visita pastoral do prelado. Alguns passavam a vida toda sem a oportunidade de ao menos ver a
pessoa de seu bispo.
Dito de outro modo, o catolicismo no Brasil, naquela quadra da história, se
resumia mais a uma prática e um costume do que necessariamente a uma religião plenamente
institucionalizada e organicamente estruturada. Por ter conhecimento, senão pleno, mas
fortemente fundamentado em dados dessa situação, é que a cúria romana se empenhava de
modo decidido pela instalação de novas paróquias e dioceses pelo interior do Brasil.
Comandando o projeto de criação de um bispado em Batatais estavam o pe. José
Lafayette de Godoy e políticos como Altino Arantes e Washington Luís. Os dois políticos
apoiaram o projeto do padre Lafayette e acreditamos que, dentre os motivos, estava o fato de
ambos serem católicos, mas também não se pode esquecer o que significaria em termos
eleitorais o apoio irrestrito a uma das principais instituições que controlavam uma parte
substancial da vida cotidiana dos brasileiros.
No entanto, a cidade de Batatais o era a única a querer ser sede de diocese,
competindo com Campinas e Botucatu. Além das questões estritamente eclesiásticas e
políticas, é significativo ressaltar o que, do ponto de vista cultural e mesmo ideológico,
representava ser a sede de uma diocese na primeira metade do século XX era uma honra
para uma cidade, a comprovação de seu VWDWXV diante de uma instituição multissecular e
estruturada em âmbito mundial.
A presença do bispo contribuía para incendiar o imaginário daqueles que sabiam o
quanto um bispado podia trazer de prestígio político e poder para uma cidade; por isso, não
era incomum o fato de que políticos, mesmo de posição mais alinhada com o liberalismo e
com o positivismo, se aliassem aos católicos em busca de condições para a instalação de um
225
bispado na cidade em que comandavam os processos políticos e sociais. Um exemplo
estudado foi a criação da diocese de Assis, em 1930, quando se aliaram o médico positivista e
chefe do PRP regional, dr. Lycurgo de Castro Santos, filho do dr. Lycurgo de Castro, um dos
fundadores do positivismo no Brasil, e dr. Vasco Joaquim Smith de Vasconcelos, juiz da
Comarca de Assis, este, católico praticante e envolvido com todas as atividades católicas.
Para Ivan Manoel, que estudou a criação da diocese de Assis, essa relação é explicada por:
[...] boa parte dos políticos brasileiros, identificados com as doutrinas
tributárias do Iluminismo e do liberalismo, que se orgulhavam de deísmo,
positivismo ou mesmo materialismo e até se pretendiam anticlericais,
aceitavam e apoiavam também as realizações católicas na sua
autocompreensão ultramontana e a criação da Diocese de Assis não fugiu a
essa tendência.
504
Quando, em 1906, o bispo de São Paulo, d. José de Camargo Barros, retornava de
Roma com o projeto de criação da diocese de Batatais e de Campinas previamente aprovado
pela Secretaria de Estado do Vaticano, faleceu durante um naufrágio. Seu sucessor, d. Duarte
Leopoldo e Silva, era o antigo pároco da matriz de Santa Cecília e conhecia o projeto de
criação de novas dioceses quando assumiu o bispado de São Paulo. Ao assumir, no entanto, d.
Duarte Leopoldo e Silva decidiu criar não apenas uma ou duas dioceses pelo interior de São
Paulo. Ao contrário, em lugar de uma modesta subdivisão da antiga diocese de São Paulo, fez
um projeto dividindo o estado de São Paulo em cinco novas dioceses, possibilitando dessa
maneira que o Vaticano instituísse a Província Eclesiástica de São Paulo sendo ele mesmo
nomeado arcebispo. A cidade de Batatais foi preterida, e a escolhida para ser a sede da nova
diocese foi Ribeirão Preto.
A criação da diocese de Ribeirão Preto é um caso VXL JHQHULV. Não houve por
parte do líder religioso da cidade, mons. Joaquim Antonio de Siqueira, e de seu vigário, padre
Euclides Gomes Carneiro, o encaminhamento de um pedido para a criação de diocese.
Tampouco os fiéis ou a elite política e econômica pleitearam do Vaticano que a cidade fosse
escolhida para ser a sede de uma diocese.
Partiu da hierarquia da Igreja, representada pelo bispo de São Paulo, d. Duarte
Leopoldo e Silva, e do cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, Joaquim Arcoverde, a escolha de
Ribeirão Preto no lugar de Batatais para sede de diocese na região nordeste do estado de São
504
MANOEL, Ivan A. Criação da Diocese de Assis: projeto católico e envolvimento da oligarquia.
+LVWyULD
, São
Paulo, v. 17/18, p. 230, 1998/1999.
226
Paulo. Mesmo depois de iniciado o processo de criação do bispado em Ribeirão Preto por
parte da hierarquia da Igreja, a elite política da cidade, associada aos cafeicultores, nada fez
para que o bispado fosse instalado. A escolha foi inteiramente da elite hierárquica da Igreja no
Brasil; o núncio apostólico d. Alessandro Bavona, o cardeal Arcoverde e d. Duarte Leopoldo
e Silva, bispo de São Paulo, foram os que trabalharam de comum acordo com os membros da
Secretaria de Estado do Vaticano e o papa Pio X.
No Vaticano, os dados sobre a riqueza da região e da cidade de Ribeirão Preto
eram conhecidos desde 1903. Os documentos enviados por Batatais pedindo a criação de uma
diocese com sede naquela cidade apontavam o avanço demográfico e econômico da cidade de
Ribeirão Preto em detrimento de outras cidades da região. Esse fato, juntamente com
informações estritamente eclesiásticas que, por certo, o próprio clero paulista se encarregava
de transmitir à cúria romana, permitia à alta hierarquia da Igreja Católica dispor de
informações suficientes para criar uma diocese em Ribeirão Preto, não obstante o pouco
interesse, ou mesmo oposição, das elites locais.
Como Ribeirão Preto não estava se preparando para sediar uma diocese, a igreja
matriz não possuía instrumentos econômicos para gerar recursos financeiros capazes de
sustentar o culto e o bispo, bem como seu novo prédio, destinado a ser a futura catedral, que
ainda estava em construção. Angariar os recursos financeiros exigidos pelo Vaticano
representou um dos desafios para o pároco de Ribeirão Preto, mons. Joaquim Antonio de
Siqueira, a quem d. Duarte delegou a tarefa de conseguir o patrimônio.
Apesar da riqueza da região, a elite política e econômica não abriu os bolsos”
para aumentar o que consideravam o patrimônio da Igreja”. É importante observar que a
alegação se fundamentava na seguinte tese: uma vez que o Estado tinha se separado da Igreja
e, mais ainda, que as novas bases políticas tinham raízes na liberdade de culto, não caberia
nenhum esforço, seja das elites, seja do poder público, para a constituição do patrimônio de
uma instituição religiosa em particular. Por isso, encontram-se nos documentos informações
de que políticos que votavam contra a doação e benefícios para a Igreja Católica Romana, em
Ribeirão Preto, particularmente faziam doações para a constituição do bispado mas cabe
ressaltar também que essas doações eram pequenas e não conseguiram totalizar o valor de
patrimônio exigido.
Os esforços de d. Duarte e de mons. Siqueira para formarem comissões nas
cidades da futura diocese, destinadas ao trabalho de arrecadação de fundos, também não
trouxeram um resultado positivo. Os recursos conseguidos por mons. Siqueira não foram
suficientes para integralizar o patrimônio exigido para a instalação da diocese. No entanto,
227
para o Vaticano a questão primordial não era o patrimônio, e sim a sua condição de existência
na região e a assistência eclesiástica à população, particularmente diante do avanço de outras
crenças e de projetos políticos de raízes liberais, positivistas e, quase inacreditável, de raízes
comunistas, e a diocese foi instalada, mesmo sem os recursos exigidos.
Ficou claro que, ao instituir a diocese de Ribeirão Preto, o papa Pio X, a
Secretaria de Estado do Vaticano, d. Duarte e o cardeal Arcoverde deram mais importância à
presença do bispo na região para dirigir os padres e leigos do que fazer o bispado em outra
cidade apenas tendo em conta a formação do patrimônio. A hierarquia da Igreja sabia que,
quando chegasse o bispo, este, aos poucos, numa região bastante rica, como era a região de
Ribeirão preto, poderia acertar o patrimônio, construir a catedral e o palácio episcopal, e foi
isso mesmo o que ocorreu.
No local considerado pelos membros da Secretaria de Estado do Vaticano como
uma terra de pessoas malvadas” , pois não quiseram colaborar com o projeto considerado de
natureza santificada, mais que em qualquer outro lugar se fazia necessária a presença do
bispo. Por esse motivo, os membros da Secretaria de Estado aceitaram implantar a diocese,
mesmo em condições um pouco adversas do ponto de vista material. Em seus relatórios sobre
a criação da Província Eclesiástica de São Paulo, ressaltava-se a importância da criação das
dioceses pelo interior como uma das formas de marcar presença diante do que consideravam
como ameaça à permanência da Igreja no centro da sociedade.
O bispo eleito para governar a diocese de Ribeirão Preto foi d. Alberto José
Gonçalves, que apresentara todos os pré-requisitos de alguém articulado com a sociedade e a
política, bem como de reputação ilibada, capaz de dirigir a diocese com pulso firme conforme
as aspirações da hierarquia.
Padre Alberto José Gonçalves, deputado e senador da República, deixou a vida
pública civil para dedicar-se a um projeto santificador aos olhos da Igreja: ser bispo, pastor e
defensor dos ideais da Igreja Católica Apostólica Romana na região de Ribeirão Preto,
fronteira agrícola do Estado de São Paulo, a Eldorado paulista, aquela que, no futuro, seria
considerada a Califórnia brasileira, mas também a cidade de muitos protestantes, muitos
espíritas e livres-pensadores e, também no futuro, um forte centro de idéias e militância de
esquerda, que já se anunciava naquele início do século XX.
O governo de d. Alberto foi marcado por transformações políticas, econômicas,
bem como por mudanças na relação entre o Estado e a Igreja. A separação, em 1890, entre o
Estado e a Igreja não foi agressiva como em outros países, e a comunicação entre as duas
instituições era, de maneira geral, cordial. O primeiro cardinalato da América Latina,
228
instalado no Rio de Janeiro, em 1905, com d. Joaquim Arcoverde, representava uma prova
dessa cordialidade. Esse fato contribuiu para que nas décadas seguintes as relações entre a
República e o Vaticano fossem amistosas.
A chegada de d. Alberto, em 1909, a Ribeirão Preto deu impulso à organização
administrativa da nova diocese, instalando a cúria diocesana, criando novas paróquias,
reformando templos e acima de tudo cuidando do patrimônio. Após a primeira visita pastoral
por toda a diocese, o bispo escreveu uma pastoral em que se dizia entristecido com a pobreza
dos templos e das alfaias. O cuidado com o patrimônio levou d. Alberto a escrever cartas e
mandamentos, orientando os procedimentos que os padres e fabriqueiros deveriam ter com o
patrimônio.
A tentativa de evangelizar constituiu o ponto alto do governo de d. Alberto. Ele
deu início ao trabalho pastoral, empreendendo por toda a diocese as visitas pastorais. Até a
década de 1930, d. Alberto visitou sete vezes as paróquias da diocese, promovendo uma
verdadeira cruzada para sanear os problemas administrativos dos templos, bem como orientar
e disciplinar as questões morais dos padres e fiéis. Em suas visitas, d. Alberto administrou
sacramentos, rezou pelos fiéis defuntos, vistoriou os livros administrativos e das associações
laicas. Reuniu-se também com membros das associações, participou de inaugurações e
incentivou os padres a realizar as reformas nos templos ou ainda a construir novas matrizes.
As visitas realizadas, seja pela ferrovia, seja por estradas sem pavimentação, revelam a
disposição do bispo de Ribeirão Preto em levar a todas as paróquias da diocese sua mensagem
como pastor. Era um bispo romanizado, cuidando de perto de seu rebanho.
Durante seu governo, d. Alberto incentivou a instalação de inúmeras associações
leigas. A partir dessas associações, dirigidas pelos padres, que eram os seus diretores
espirituais, a Igreja direcionava os leigos a seguir os preceitos e dogmas instituídos. Coube
aos padres dirigir a vida familiar e moral por meio de orientações realizadas nos sermões,
durante a confissão, bem como nas reuniões das associações e nas festas sacras.
Nessas orientações, o poder da hierarquia da Igreja era ressaltado, e a figura
simbólica do papa e suas encíclicas eram apresentadas como paradigmas a serem seguidos
preferencialmente por todos, mas obrigatoriamente pelos católicos. A hierarquia da Igreja,
adotando uma postura conservadora, condenava as ações da sociedade moderna e
secularizada, como o divórcio, as festas consideradas mundanas como o carnaval, as doutrinas
contrárias aos dogmas como o liberalismo, o comunismo e tudo o mais que pudesse afastar o
povo das diretrizes do centralismo romano.
229
A diocese de Ribeirão Preto, nas suas paróquias e capelas, por meio dos padres,
que, incentivados pelo bispo, procuravam seguir as diretrizes de Roma, se alinhou com o
projeto da cúria romana. A simbologia e a tradição que havia por trás das cerimônias
religiosas contribuía para envolver uma parte da população católica que continuava alheia a
um engajamento mais efetivo.
Dentro das associações, participando de reuniões, os grupos que aos poucos se
formaram, por incentivo do Prelado, passavam, pouco a pouco, a conhecer os documentos da
Igreja e suas diretrizes. Esse foi um dos motivos do incentivo do bispo para que os fiéis
participassem das associações religiosas laicas dirigidas pelos padres. Tal estímulo
apresentava esse engajamento como um engajamento da sociedade nas coisas divinas para
que fosse fiel aos ensinamentos de Cristo e às leis da Igreja. Em outras palavras, os fiéis
foram convencidos, em suas maior parte, de que seriam os auxiliares dos padres na cruzada de
transformação do mundo no reinado de Cristo.
As festas sacras constituíram um dos momentos em que o clero buscava envolver
os fiéis, excluindo as tradições populares religiosas que eram controladas pelos leigos e
instituindo as festas dirigidas pelos padres, como as festas marianas e de Cristo Rei. A festa
de consagração a Cristo Rei, realizada nas matrizes, capelas, cidades e casas particulares,
estava inserida num projeto da hierarquia da Igreja em que a palavra de ordem era estabelecer
a realeza de Cristo na terra e suplantar as novenas e rezas dirigidas pelos beatos e beatas, cujo
corolário era a festa mesma, a dança, a bebida e, ainda que de modo disfarçado, o sexo.
O lema do reinado de Cristo era pregado pelo papa e deveria ser seguido por todos
os cristãos. Na diocese de Ribeirão Preto, durante a primeira metade do século XX, inúmeras
matrizes, capelas e casas foram consagradas a Cristo Rei em cerimônias de que participavam
os fiéis, dirigidos e abençoados pelos sacerdotes. Nas festas, os fiéis e os membros das
associações laicas compareciam paramentados com fitas e estandartes, cantando hinos de
louvor ao Sagrado Coração de Jesus e ao Imaculado Coração de Maria, dando testemunho
público da devoção a Deus e a Cristo.
Depois de 1930, o Brasil conheceu novos rumos na relação Igreja e Estado,
quando Getúlio Vargas entrou no poder e o cardeal Leme assumiu a cadeira cardinalícia no
Rio de Janeiro. O apoio ostensivo dado pelo cardeal do Rio de Janeiro foi correlato ao apoio
decisivo do Estado para o retorno do ensino religioso nas escolas públicas, para o
reconhecimento do matrimônio eclesiástico, para a não-instituição do divórcio no Brasil,
resultando no aprofundamento da cooperação entre as duas instituições.
230
A presença do clero em inúmeros eventos da sociedade civil e das autoridades
civis nas festas e cerimônias religiosas revela o entrosamento amigável entre os dois grupos.
O episódio da inauguração da capela lateral na igreja São José, dos padres Agostinianos, em
Ribeirão Preto, marcou pela eloqüência da saudação ao Brasil e à República, associando a
idéia de ser cristão com a idéia de patriotismo. O projeto de construir o cidadão-católico foi
um dos pontos mais significativos da romanização do catolicismo brasileiro, para cuja
realização todo o sistema educacional da Igreja e suas diversas publicações foram
acionados.
505
Em 1931, a inauguração da estátua do Cristo Redentor no Corcovado, no Rio de
Janeiro, naquele momento, a capital do Brasil, representou uma importante manifestação da
força da Igreja perante a sociedade brasileira. O evento contou com a presença das
autoridades civis ao lado das eclesiásticas.
A Igreja apoiou o governo em diferentes ocasiões, como durante a crise
econômica que se abateu no início da década de 1930, orientando a população a retornar as
atividades agrícolas, ou, ainda durante a segunda guerra mundial, quando a hierarquia da
Igreja foi convidada a cooperar com o país, despertando o ardor cívico e do púlpito, os padres
abraçaram a causa da luta pela abolição dos totalitarismos. Os soldados brasileiros foram à
guerra para lutar contra os regimes totalitários com as bênçãos da Igreja. Em todos esses
eventos, d. Alberto, como bispo de Ribeirão Preto, abençoou e referendou a postura da
hierarquia.
No campo político, a atuação do bispo de Ribeirão Preto foi constante mas
discreta. O homem político que foi d. Alberto, depois de aclamado bispo, atuou nos
bastidores. Fora do palco, d. Alberto recebeu e visitou políticos influentes do país, do estado
de São Paulo e da cidade de Ribeirão Preto, entre outros. O conhecimento que possuía da
política e da vida pública, com todos os seus meandros, o transformou num homem
importante para os projetos dirigidos pela hierarquia da Igreja. O reconhecimento de seu
trabalho nos bastidores da política a favor da Igreja veio do núncio apostólico, d. José Aversa,
que em carta à Secretaria de Estado do Vaticano anunciou que d. Alberto fora um dos
colaboradores para que a Igreja continuasse a buscar espaço no seio da sociedade, fazendo
valer em diferentes ocasiões seu conhecimento da política, barrando a candidatura de maçons.
Apesar dos elogios, d. Alberto manteve uma atuação discreta, mas ao mesmo tempo uma
505
MANOEL, Ivan A. Cidadãos para a terra e para o céu: o projeto educacional do catolicismo ultramontano
(1850-1950).
)URQWHLUDV
, Campo Grande, v.7, n.13, p.109-124, 2003; MANOEL, Ivan A.
,JUHMDH(GXFDomR
)HPLQLQD
. Uma face do conservadorismo. São Paulo: Unesp, 1996.
231
posição firme, rejeitando a idéia de que deveria existir um partido político católico. Para d.
Alberto apoiar projetos e candidatos que falassem a língua da Igreja permitia atingir os
objetivos sem provocar embaraços desnecessários para o clero e os fiéis.
Alguns projetos que a Igreja possuía de caráter nacional foram implantados na
diocese de Ribeirão Preto, como a Liga Eleitoral Católica. Os católicos foram incentivados a
se alistar e candidatos foram sugeridos pelas Ligas locais e regionais na tentativa de eleger
aqueles que viessem a trabalhar pelos projetos da Igreja. A propaganda pelo alistamento dos
católicos em 1933 foi realizada pela imprensa escrita e falada, bem como a hierarquia da
Igreja na região de Ribeirão Preto sugeriu que o clero abraçasse a causa santificada,
incentivando essa participação política.
A cada de 1930, com suas mudanças drásticas na política nacional e,
conseqüentemente, no restante do país, coincidiu com a chegada ao Brasil de uma das
principais ações da Igreja no período, a Ação Católica. A inserção do leigo nas inúmeras
atividades da Igreja e na sociedade ganhou impulso após o lançamento da carta sobre a Ação
Católica em 1935. É visível o esforço despendido por d. Alberto e mons. Lauriano para que
padres e leigos entendessem a importância da Ação Católica. No entanto, na diocese de
Ribeirão Preto, foi somente no fim da cada de 1940 que o engajamento dos leigos ocorreu
de forma mais incisiva. Tudo indica que a formação das federações marianas deu início
timidamente às atividades da Ação Católica antes dos anos 1945.
Outros projetos foram realizados nos anos de 1940, quando a diocese recebeu o
bispo auxiliar, Manuel da Silveira D’ Elboux, pois d. Alberto, idoso e doente, estava
impossibilitado de estar à frente das atividades da diocese. A chegada de d. Manuel contribuiu
para dar um novo alento aos católicos. Repetindo as ações administrativas e pastorais
realizadas por d. Alberto, o bispo auxiliar percorreu a diocese em visita pastoral, identificando
os problemas mais urgentes nas paróquias.
Alguns projetos antigos de d. Alberto foram retomados por d. Manuel, como a
tentativa de criar o bispado de Franca, dividindo a diocese de Ribeirão Preto. D. Manoel
fracassou nesse projeto, do mesmo modo que d. Alberto, e a diocese de Franca somente foi
criada em 1970 este é um problema que ainda está a merecer seu historiador.
Os cinco anos em que d. Alberto partilhou o governo da diocese com d. Manuel
trouxeram motivações para o crescimento do catolicismo na região. D. Manuel incentivou
novos projetos de atuação para com os leigos e revitalizou os antigos. Nesse contexto foi
criado, em 1943, o Círculo Operário Católico. A história do rculo está relacionada a uma
antiga proposta iniciada pelo padre Euclides Gomes Carneiro. Por volta de 1910, padre
232
Euclides fez a primeira tentativa de fundar um Centro Operário em Ribeirão Preto, destinado
a atender a população operária e que funcionou junto à capela São Benedito, onde foi criada
uma escola, conforme vimos no capítulo segundo. Depois de padre Euclides ter deixado a
cidade de Ribeirão Preto, a cúria diocesana assumiu a escola e pouco se sabe de seu
funcionamento.
Seguindo as orientações do papa Leão XIII, que no fim do culo XIX escreveu a
encíclica 5HUXP1RYDUXP, lançando um olhar sobre a classe operária, a hierarquia da Igreja
em Ribeirão Preto fundou, no início de 1943, o Círculo Operário Ribeirão-pretano. De acordo
com o Boletim Diocesano a obra
[...] tem por objetivo promover a união da Classe operária, prestando-lhe todo
gênero de benefícios e defesas, isto é, cultural moral, intelectual, social, religiosa,
física, pela fundação ou adesão de escolas, pela realização de conferências, pela
imprensa, pelo rádio, cinema educativo, teatro, esportes, prestando-lhes ainda
assistência jurídica, médica, dentária, farmacêutica e material, pelas várias formas
de beneficência e mútuo socorro.
506
A proposta do Círculo era abranger todos os aspectos da vida cotidiana dos
operários e desta maneira incluir a presença da Igreja no seio das famílias operárias. Filiado à
Confederação Nacional de Operários Católicos, orientava as atividades sugerindo livros que
tinham por finalidade proporcionar uma cultura considerada sadia às classes trabalhadoras. A
popularização da publicação em edição popular da encíclica5HUXP1RYDUXP, do papa Leão
XIII, ao lado da Cartilha Circulista, obra de divulgação dos Círculos Operários
507
, revela
como a Igreja estava preocupada em ocupar um espaço junto à classe operária.
Com um ano de funcionamento, o Círculo Operário de Ribeirão Preto fundou em
1944 um jornal, denominado 2 &LUFXOLVWD, que funcionou entre os membros como parte de
divulgação da Boa Imprensa entre os católicos. A divulgação da obra do Círculo representou
um contraponto dos católicos aos sindicatos e partidos políticos, como o Partido Comunista
Brasileiro. Em menos de dois anos, o Círculo contava com a adesão de cerca de 2.000
membros.
508
506
CÍRCULO Operário ribeirãopretano.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto, ano 13, n. 154, p. 4, fev. 1943.
507
CÍRCULO Operário.
%ROHWLP'LRFHVDQR
. Ribeirão Preto, ano 13, n. 163, p. 6-7, nov. 1943.
508
CÍRCULO Operário ribeiropretano.
'LiULRGH1RWtFLDV
Ribeirão Preto, 14/set./1945, p. 2.
233
A obra do Círculo Operário revelava o alinhamento com as diretrizes da Igreja e
caminhava ao lado dos projetos nacionais e dos empreendimentos da Igreja diocesana de
Ribeirão Preto.
Com a doença de d. Alberto, as atividades na diocese eram encaminhadas por d.
Manuel. Apesar do esforço de d. Alberto em implantar os projetos sugeridos pela cúria
romana, inúmeras foram as dificuldades encontradas, o que nos permite afirmar que ele teve
êxito em apenas alguns desses projetos. Enquanto o patrimônio da Igreja crescia, outras
dificuldades não foram superadas, como aumentar o número do clero. As dificuldades para a
instalação do seminário diocesano, e conseqüentemente do pequeno clero, acabaram se
refletindo na superficialidade do catolicismo na diocese, registrada na pouca adesão ao projeto
da Ação Católica entre os anos de 1935 e 1945. O empenho do bispo não foi suficiente para
uma ampla adesão por parte dos fiéis aos projetos da Igreja. Enquanto a imprensa afirmava
que o catolicismo estava forte por causa de manifestações como as procissões e concentrações
dos congregados marianos, nos bastidores, os padres registravam nos Livros Tombo suas
dificuldades em implantar os projetos da Igreja como a os leigos engajados na catequese e na
Ação Católica.
Os últimos anos de d. Alberto foram de luta contra a velhice e a doença. Entre
1943 e 1945, o bispo por diversas vezes esteve internado na Santa Casa local. Em uma delas,
o arcebispo de São Paulo, d. José Gaspar de Afonseca e Silva, em deferência ao bispo de
Ribeirão Preto, veio visitá-lo.
509
Poucos dias depois o arcebispo faleceu num acidente de
avião. A doença e a idade avançada o deixavam debilitado e impossibilitado de acompanhar o
serviço religioso em algumas ocasiões. Em outubro de 1943, d. Alberto deixou Ribeirão Preto
com destino a Curitiba, retornando em março de 1944. De acordo com o 'LiULR foi a última
visita do bispo à cidade de Curitiba. Permaneceu quase todo o ano de 1944 em Ribeirão Preto
e, em maio de 1945, faleceu no Palácio Episcopal, encerrando um período da história da
Igreja de Ribeirão Preto.
Poucos meses após a morte de d. Alberto, em 7 de setembro de 1945, o jornal
'LiULR GH 1RWtFLDV passou a circular como órgão oficial da cúria de Ribeirão Preto. No
editorial, com o título 1RYD )DVH, foi anunciada a sua aquisição por parte da diocese. O
momento representava o fim do que consideramos a primeira etapa da história da diocese de
509
NOTICIÁRIO. Arcebispo Metropolitano de São Paulo.
%ROHWLP'LRFHVDQR
Ribeirão Preto, ano 13, n. 160, p.
4, agosto 1943. Três dias depois da visita a Ribeirão Preto, o arcebispo de São Paulo, veio a falecer num acidente
de avião no dia 27 de agosto de 1943.
234
Ribeirão Preto e o início de uma nova, com a confirmação por parte do Vaticano do nome de
d. Manuel, para bispo titular da diocese.
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A Cidade, Ribeirão Preto - 1907 - 1945
A Estrella, Curitiba - 1904 - 1905
Diário da Manhã – Rio de Janeiro - 10/2/1909
Diário de Campinas - Campinas – 12/3/1902
Diário de Notícias - Ribeirão Preto – 1932 - 1945
Jornal da Vila Ribeirão Preto – março 2006
Lauro Sodré –Campinas- 10/4/1907
O Cravinhense Cravinhos - 13/11/1932
O Espião São José do Rio Pardo – 25/06/1919
São Carlos São Carlos - 22/4/1914
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A Rolha Curitiba - 1908
O Olho da Rua Curitiba - 1908
Ramo da Acácia – Curitiba- 1908 – 1909
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Boletim Diocesano do Ribeirão Preto. Ribeirão Preto. 1930 a 1945
Boletim Diocesano. Órgão da Federação Diocesana das Congregações Marianas. Ribeirão
Preto. Outubro 1942 a Dezembro de 1944.
252
Boletim Diocesano. Órgão da Federação Mariana Feminina. Ribeirão Preto. Julho de 1943 a
Outubro de 1945
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1-$UFKLYL R6HJUHWRGR9DWLFDQR9DWLFDQR
1.1.- Archivio della Nunziatura Apostólica in Brasilae
Mons. TONTI, Giulio (1902-1906)
Fasc. 493, n. 100; 500, n. 101
Mons. BAVONA, Alessandro (1907-1911)
Fasc. 615, n. 124; 617, n.125; 618, n. 125; 626
Mons. SCAPARDINE, Ângelo (1917-1920)
Fasc. 848, n. 165
Mons. AVERSA, Giuseppe
Fasc. 733, n. 146; 687
1.2.- Congregazione Concistoriale
Relationes Diocesium Brasilae- fasc. 687, 772
$UFKLYLR6WRULFR±9DWLFDQR
- Segreteria Di Stato – fasc 111; 116; 129; 141; 143; 711; 500
- Indice delle sezioni – Brasile - v.6; v.60; v. 63
$UTXLYRGD&~ULD 0HWURSROLWDQDGH5LEH LUmR3U HWR
- Livro de Registros do movimento da administração da diocese Ribeirão Preto, n.1
(1909-1912)
- Livro de Atas dos Consultores Diocesanos 1924
- Pasta Monsenhor Lauriano
253
- Relatório para o parecer da Commissão de Engenheiros, relativo à escolha dos
projetos apresentados para a construcção da igreja Matriz de Ribeirão Preto, nomeada pela
respectiva Commissão Constructora – 1901 (documentos avulsos)
$UTXLYRGD&DWHGUDOGH5L EHLUmR3UHWR
- Livro de Tombo da Matriz de São Sebastião n. 2, 1890-1904
- Livro de Tombo da Matriz de São Sebastião n. 3 – 1950
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1
o
. Livro de Atas da Liga Catholica Jesus Maria e José. 1934.
1
o
. Livro de Atas do Apostolado da Oração. 1927
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Relatório da Pia União das Filhas de Maria. (documentos avulsos)
Livro de Tombo da matriz de São João, n.1, 1911.
Livro de Atas das Filhas de Maria. s/d
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Fundo José Pedro de Miranda (Documentos Avulsos)
$UTXLYR3~EOLFRGR(VWDGRGH6mR3DXOR
Arquivo Privado do Cel. Joaquim da Cunha Diniz Junqueira
$UTXLYRGD&~ULD 0HWURSROLWDQDGH&XULWLED
Monografia do Seminário de Curitiba 1895-1896
Pasta – Correspondência recebida de cidades diversas – 1903-1904
Livro Copiador nº. 4, 1899-1903
Processo de Gênere de Alberto José Gonçalves, 5/3/1888.
254
$UTXLYRGD&~ULD 0HWURSROLWDQDGH6mR3DXOR
Pasta Ribeirão Preto I e II
Pasta Cardeal Joaquim Arcoverde
Pasta D. Duarte Leopoldo e Silva
$UTXLYRGD&~ULD 'LRFHVDQDGH)UDQFD
Livro de Tombo da Matriz de Nossa Senhora da Conceição, n. 4
Livro de Tombo da Matriz de Nossa Senhora do Patrocínio, n. 2
$UTXLYRGD&kPDU D0XQLFLSDOGH5LEHLUmR3UHWR
Livro de Atas da Câmara Municipal n. 8 – 1903 a 1907
Livro de Atas da Câmara Municipal n. 9 – 1907 a 1912
$UTXLYR3~EOLFR0 XQLF LSDOGH6mR&DUORV
Livro de Atas das Sessões Extraordinárias 1900-1913
$UTXLYRGD3DUyTXLDGR6H QKRU%RP -HVXVGD&DQD9HUGH %DWDWDLV
Livro de Tombo da Matriz do Senhor Bom Jesus da Cana Verde. n. 4
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH1RVVD6HQKRUD$SDUHFLGD±6HUWmR]LQKR
Livro de Tombo da Matriz de Nossa Senhora Aparecida, n. 1, 1896
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH6mR6HEDVWLmR±0RFRFD
Livro de Atas do Apostolado da Oração. 1932
Livro de Tombo da Matriz de São Sebastião s/n, 1937
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH6DQWD5LWDGH&iVVLD±6DQWD5LWDGR3DVVD4XDWUR
Livro de Atas do Apostolado da Oração da Paróquia Santa Rita de Cássia.
$UTXLYRGD3DUyTXLD6mR-RVp±5LE HLUmR3UHWR
Livro de Obras Notáveis da Residência dos Padres Agostinianos de Ribeirão Preto, 1913.
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH1RVVD6HQKRUDGD3LHGDGH$OWLQySROLV
Livro de Tombo da Matriz de Nossa Senhora da Piedade, n. 3.
255
$UTXLYRGD3DUyTXLDGH1RVVD6HQKRUDGD&RQFHLomR±3DOPHLUD35
Livro de Batismo n. 5, 1855.
%LEOLRWHFD3DGUH;DYLHU0iFXD;DUODQ% URGRZVNL&HQWURGH(VWXGRVGD
$UTXLGLRFHVHGH5 L EHLUmR3UHWR
Coleção Jornal Diário de Notícias
GONÇALVES, A J. 1 RWDVGHYiULRVIDWRVGHPLQKDYLGDHGDVYLDJHQVTXHIL]GHQWURHIRUD
GDGLRFHVH (manuscrito)
$UTXLYRGR&tUFXORGH(VWXGRV%DQGHLUDQWHV&XULWLED
Jornal “ A Estrella” 1904-1905
%LEOLRWHFD3~EOLFDGR(VWDGRGR3DUDQi&XULWLED
Coleção de Revistas
A Rolha, O Olho da Rua, Ramo das Acácias.
'RFXPHQWRV,PSUHVVRV
Carta Pastoral e Mandamento do Episcopado Brasileiro sobre o Communismo Atheu. Rio de
Janeiro, 8 de setembro de 1937. In: %ROHWLP'LRFHVDQR. Ribeirão Preto, ano 8, n. 92, p.1-5, set
1937.
LAURIANO, Monsenhor João. $'LRFHVHGH5LEHLUmR3UHWR em homenagem grata e festiva a
seu amado Bispo D. Alberto José Gonçalves na Feliz occurrencia das datas jubilares de seu
sacerdócio e Episcopado. Ribeirão Preto, 1934.
Mensagem de Pio XII ao inaugurar as novas instalações da Rádio Vaticana. 5HYLVWD
(FOHVLiVWLFD%UDVLOHLUD vol 23, fasc.1, Março 1958. p. 210 213.
Pastoral Collectiva de 1940. Publicada pelo Boletim Diocesano a partir de dezembro de 1940
e nos meses seguintes em 1941.
Pastoral Collectiva dos Bispos da Província Ecclesiástica Meridional do Brasil. Rio de
Janeiro, Leuzinger, 1904.
256
Pastoral Collectiva dos Senhores Arcebispos e Bispos das Províncias Ecclesiásticas. Rio de
Janeiro: Martins de Araújo, 1915.
PIO X. Sobre a Restauração de tudo em Cristo. (E supremi Apostolatus). Petrópolis: Vozes,
1952. (Documentos Pontifícios n. 87)
PIO XI. Sobre o Comunismo Ateu. (Divini Redemptoris). 4
a
ed. Petrópolis: Vozes, 1945.
(Documentos Pontifícios n. 1)
PIO XI. Sobre o Cristo Rei. (Quas Primas). 2
a
. ed. Petrópolis: Vozes, 1950. (Documentos
Pontifícios n. 20)
PIO XI. Sobre o Sagrado Coração de Jesus. (Encíclica Miserentissimus Redemptor). 3
a
.ed.
Petrópolis: Vozes, 1956. (Documentos Pontifícios n. 21)
PIO XI. Sobre os Exercícios Espirituais. (Mens Nostra). Petrópolis: Vozes, 1946.
(Documentos Pontifícios n. 11)
POLYANTHEA. Álbum Comemorativo do 1
o
. Quinquagenário da Fundação do Seminário
Episcopal de São Paulo. 1906.
[ ) ,0]
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