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Espera-se que os sujeitos possam retomar seu interesse por atividades e relações sociais que
haviam sido abandonadas ou assumir novas formas de interação social.
Encontramos, em diversas passagens das entrevistas realizadas na CT, relatos que
relacionavam as principais necessidades das adolescentes à busca por acolhimento, referências,
limites, atenção, escuta e compreensão, os quais não haviam sido supridos satisfatoriamente em
suas relações familiares, as quais foram descritas como conflituadas, permeadas por brigas,
desentendimentos e distanciamento afetivo. Indicando que a instituição está suprindo essas
necessidades, todas as adolescentes entrevistadas referiam que, apesar da rigidez e das
exigências, sentiam-se acolhidas, ensinadas, ajudadas e compreendidas, avaliando positivamente
a instituição e, inclusive, considerando que a equipe deveria ser ainda mais “dura”.
Buscando subsídios para compreender esse posicionamento das adolescentes que
permaneciam na CT, e que ali se deixavam “re-educar” e pediam, inclusive, maior rigidez nas
práticas - já rígidas - da instituição, encontramos entre autores vinculados à análise psicanalítica
do processo adolescente algumas indicações.
Para autores como Rassial (1997) e Melman (1995) é necessário compreender a fase
adolescente como uma operação de passagem e uma “crise psíquica” fundamentais para o
processo de desenvolvimento humano, na qual a busca por referências ocupa um lugar
fundamental. Segundo Rassial (1997), as principais manifestações e necessidades desse período
relacionam-se à indecisão subjetiva e à incerteza social, as quais o constituem e caracterizam
como uma “posição no intervalo”, convocando à busca por novos lugares e possibilidades
identificatórias. Além disso, Levisky (1997) sublinha a disposição dos adolescentes a “passar ao
ato” (1997, p.18), referindo-se à tendência a descarregar seus impulsos agressivos e sexuais
diretamente através do processo primário
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, em busca da satisfação imediata dos seus desejos.
Para o autor, nesse processo, freqüentemente, os jovens pensam apenas depois de realizar a ação,
muitas vezes percebendo as conseqüências de seus atos somente depois de os terem realizado.
Considerando que esse processo se dá, atualmente, em um contexto social caracterizado
pelo “liquefação de valores” (Balman, 2003), pelo individualismo e instantaneidade,
compreenderemos o sentimento de estarem “perdidas” e “vazias”, tantas vezes manifesto pelas
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O conceito “processo primário” refere-se a um dos modos de funcionamento do aparelho psíquico, tais como foram
definidos por Freud. O processo primário caracteriza o sistema inconsciente, nele, a energia psíquica escoa
livremente, passando de uma representação à outra. Tende a reinvestir plenamente as representações ligadas às
vivências de satisfação constitutivas do desejo (Laplanche e Pontalis, 1998).