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UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO – UPF
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
MARISA APARECIDA FABRO SMIDERLE
A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E A ARGENTINA NA GESTÃO
LAURO MÜLLER (1912-1917)
Passo Fundo
2007
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1
MARISA APARECIDA FABRO SMIDERLE
A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E A ARGENTINA NA GESTÃO
LAURO MÜLLER (1912-1917)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em História, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
da Universidade de Passo Fundo como requisito parcial e
final para obtenção do grau de mestre em História sob a
orientação do Prof. Dr. Adelar Heinsfeld.
Passo Fundo
2007
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S639p Smiderle, Marisa Aparecida Fabro
A política externa brasileira e a Argentina na gestão Lauro
Müller (1912-1917). / Marisa Aparecida Fabro Smiderle. Passo
Fundo: UPF, 2006.
133 f.; 30 cm.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Passo Fundo.
Programa de Pós-Graduação em História, Passo Fundo,RS,2006.
Bibliografia: f. 157-165.
1. Política externa 2. História econômica I.Título
CDD- 981
Ficha Catalográfica elaborada pelo Bibliotecário: Alvarito Luiz Baratieri / CRB-14/273
3
AGRADECIMENTOS
Para meu esposo, Amauri com muito amor, ternura e gratidão.
Para meus filhos, Fernanda e Fábio pela ajuda e paciência.
Agradecimentos, para os meus pais, Renato e Aurora, para a minha irmã, Maristela,
para os familiares, Raul, Selita, Marisa, Marcos e Leda. Para os amigos que fiz nesta
caminhada e, agradeço também ao Prof. Dr. Adelar Heinsfeld, pela orientação e amizade.
4
Na medida em que a sociedade moderna passou a
reconhecer o valor de todo indivíduo e que
disponibilizou instrumentos que permitem o registro de
sua identidade, como é o caso da difusão do saber ler,
escrever e fotografar, abriu espaço para a legitimidade
do desejo de registro da memória do homem
“anônimo”, do indivíduo “comum”. Cuja vida é
composta por acontecimentos cotidianos, mas não
menos fundamentais a partir da ótica da produção de si.
(Angela de Castro Gomes)
5
RESUMO
Lauro Müller é considerado um dos mais importantes políticos catarinenses. Foi eleito como
governador de Santa Catarina por quatro vezes, foi deputado federal, senador, Ministro da
Indústria, Viação e Obras Públicas e das Relações Exteriores. Seu nome está gravado em
ruas, pontes, praças, grupos escolas e até em um Município de Santa Catarina. Até mesmo na
cidade do Rio de Janeiro, seu nome está gravado em lugares públicos. Lauro Müller foi o que
podemos chamar de um “Homem de Estado”. Foi nesta condição que esteve à frente do
Ministério das Relações Exteriores do Brasil, de 1912 a 1917. Além de substituir o ícone da
diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, Lauro Müller teve um outro enorme desafio:
conduzir a política externa do país diante do primeiro grande conflito do século XX: a
Primeira Guerra Mundial. Acusado de germanófilo, foi obrigado a exonerar-se do cargo. Em
relação ao continente americano, procurou traçar uma política de maior aproximação com os
Estados Unidos, bem como a Argentina. Esta aproximação com a região platina teve seu auge
com a assinatura, em 1915, de um Tratado de Cordial Inteligência, visando a solução pacífica
de controvérsias internacionais e que envolvia os três mais importantes países da região,
Argentina, Brasil e Chile, e ficou conhecido como Tratado do ABC.
Palavras-chave: Lauro Muller. Política externa. Argentina. Brasil. Tratado ABC.
6
ABSTRACT
Lauro Müller is considered one between more important catarinense politicians. He governed
Santa Catarina four times, he was Federal Representative, Factory Minister Traffic and Public
Works and Foreign Relations. His name’s engraved in streets, bridges, squares, groups,
schools and till a municipal district from Santa Catarina. Until Rio de Janeiro city his name is
in public places. Lauro Müller was what we can say of a “State Man”. In this condution that
he was in Brazilian Ministry of Foreign Relations of 1912 1917. Besides he substitute the
icon of Brazilian diplomacy, Barão do Rio Branco, Lauro Müller had an other big challenge:
to conduct the foreign politics of country in front of first big conflict of century: The First
World War. He was accused of germanofilo, he was forced to erconerate his post. In relation
of the American Continent, he tried to trace a politics of more approximation with the United
States of America and with Argentina. This approximation with the platinun region had its top
with the signature, in 1915, of a cordial intelligence Pact to look at pacific solution of
international controversies and that involved the three more important countries of region:
Argentina, Brazil and Chile; this was known as ABC Pact.
Key Words: Lauro Müller. Foreign politics. Argentina. Brazil. ABC Pact.
7
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Caricatura da recepção do Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Lauro
Müller, pelo Ministro do Exterior William Jennings Bryan, nos Estados Unidos .......... 48
Figura 2 Caricatura do Tratado do ABC, José Luis Murature representando a Argentina,
Lauro Müller representando o Brasil e Alejandro Lira representando o Chile ............... 107
8
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABC – Argentina, Brasil e Chile
ABL – Academia Brasileira de Letras
AHI – Arquivo Histórico do Itamaraty
EUA – Estados Unidos da América
MRE – Ministério das Relações Exteriores do Brasil
PRC – Partido Republicano Catarinense
PRM – Partido Republicano Mineiro
PRP – Partido Republicano Paulista
9
SUMÁRIO
1INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 10
2. LAURO MÜLLER: UM HOMEM DE ESTADO ........................................................ 14
2.1 PERFIL BIOGRÁFICO .................................................................................................. 14
2.2 CONSTRUÇÃO DO MITO POLÍTICO ......................................................................... 27
2.3 UM HOMEM DE ESTADO ........................................................................................... 38
3. A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NA GESTÃO DE LAURO MULLER .... 51
3.1 POLÍTICA INTERNA BRASILEIRA ............................................................................ 51
3.2 POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA ........................................................................... 56
3.3 POLÍTICA ARMAMENTISTA: BRASIL X ARGENTINA ......................................... 64
3.4 A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL ............................................................................. 68
3.5 REPERCUSSÃO NA IMPRENSA ARGENTINA ......................................................... 80
4. AS EXPECTATIVAS DE APROXIMAÇÃO NO CONE SUL: BRASIL X
ARGENTINA ....................................................................................................................... 89
4.1 BRASIL X ARGENTINA: AJUSTES E DESAJUSTES ............................................... 89
4.2 APROXIMAÇÃO ENTRE BRASIL E ARGENTINA .................................................. 97
4.3 O TRATADO DO ABC .................................................................................................. 99
4.4 REPERCUSSÃO DO TRATADO DO ABC SEGUNDO A IMPRENSA ..................... 112
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 117
FONTES CONSULTADAS ................................................................................................ 120
ANEXOS .............................................................................................................................. 129
10
1 INTRODUÇÃO
A pesquisa histórica deve ser feita nas fontes originais dos documentos que os atores
estatais e o estatais deixaram nos arquivos governamentais, assim para Ricardo Seitenfus:
“Para construir a história é necessário pesquisar as fontes. O triste hábito de muitos
historiadores de repetir os erros e os acertos, bem como as virtudes e os defeitos de pesquisas
realizadas por outros, transforma em mera reprodução o que deveria ser a produção original
da história.”
1
Assim, para desenvolver esta pesquisa, a coleta de dados realizou-se na
documentação exarada pelo Itamaraty, órgão oficial responsável pela formulação da política
externa brasileira. Desta forma, priorizaram-se os relatórios anuais organizados pelo
Ministério das Relações Exteriores e os Ofícios e Despachos, recebidos e enviados pelo
Ministro Lauro Müller. Também a imprensa mereceu destaque como fonte de informações.
É necessário considerar que uma pesquisa histórica não é definitiva, novas fontes
podem aparecer modificando o seu contexto final, pois a História é viva e mutável possuindo
lacunas a serem preenchidas.
A análise das relações internacionais é relevante para se entender a ideologia dos
Estados, atores no cenário mundial e dos Ministros, agentes que falam em nome da
coletividade nacional.
Um dos agentes das relações internacionais do Brasil foi o catarinense Lauro Müller,
que teve a grande responsabilidade de substituir o Barão do Rio Branco no Ministério das
Relações Exteriores.
Existem poucos trabalhos de cunho histórico que abordam a passagem do catarinense
Lauro Müller pelo Ministério das Relações Exteriores no período compreendido entre 1912 e
1917, bem como a relação brasileira com os países vizinhos pertencentes ao Cone Sul. Talvez
um dos motivos que fez com que a historiografia não tenha dado a atenção necessária à Lauro
Müller é que seu antecessor no Ministério foi o Barão do Rio Branco, ícone da diplomacia
nacional.
Lauro Severiano Müller, filho de imigrantes alemães, é considerado um dos políticos
mais importantes para Santa Catarina. Foi eleito governador do estado por quatro vezes,
senador, deputado federal e Ministro da Indústria, Obras e Viação na presidência de
Rodrigues Alves e Ministro das Relações Exteriores na presidência de Hermes da Fonseca e
1
SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva. Relações Internacionais. São Paulo: Manole, 2004, p14-15.
11
de Wenceslau Brás. Lauro Müller, como Ministro da Pasta do Exterior, renunciou ao Senado
e á chefia do Partido Republicano Catarinense, mas continuou fazendo as indicações
partidárias dos cargos políticos no seu estado. Para Licurgo Costa, ele foi uma das grandes
figuras políticas de Santa Catarina nas duas primeiras décadas da República, tendo renome e
prestígio político e social. Lauro Müller, enquanto Ministro do Exterior, recebeu títulos e
honrarias dos países que visitou, da Argentina, do Uruguai e dos Estados Unidos. Foi
participante da Maçonaria, eleito para a Academia Brasileira de Letras e Academia
Catarinense de Letras. Em dois momentos da política interna brasileira foi cogitado, pelo seu
partido e pela imprensa, como pré-candidato á presidência brasileira.
Assumindo o cargo de Ministro das Relações Exteriores em 1912, depois de cinco
anos de serviço, acabou por renunciar como Ministro em função da xenofobia de grupos
políticos do Brasil, sendo substituído por Nilo Peçanha. Para Walter Piazza,
2
a xenofobia de
alguns políticos, principalmente em relação a Alemanha na Primeira Guerra Mundial, fizeram
com que um estadista deixasse o cargo de representante da nação.
Também a influência política de Rui Barbosa contribuiu para o seu afastamento da
política externa brasileira. A retirada do político catarinense, Lauro Müller, do Ministério das
Relações Exteriores foi inoportuno e deixou os correligionários do Partido Republicano
Catarinense consternados, pois ele, como um mito político, deveria servir como exemplo para
os seus colegas partidários. Assim, para os partidários do PRC a sua renúncia foi um sacrifício
pessoal em favor do bem estar coletivo do seu país.
O Ministro das Relações Exteriores que fala em muitos momentos em nome da
coletividade nacional e também a política interna do país não pode ser separada dos
problemas externos. Estes precisam lidar com as reações das nações estrangeiras mediante a
política interna-externa de seu país de origem. Ele é o representante da nação diante dos
outros países.
As tomadas de decisões de um político podem ser afetadas pela imprensa, assim,
muitas atitudes políticas são alteradas com a influência da imprensa, sendo ela de oposição ou
favorável. Também a opinião pública pode sofrer influências pela imprensa.
A imprensa tem o poder de elaboração, de criação e de manutenção do imaginário
coletivo, tornando outros países ou políticos como sendo amigos ou inimigos. Podem assim,
usar os erros do passado para interpretar os atos no presente e, de certa forma, influenciar as
decisões políticas, pois os artigos nos jornais podem motivar imagens distorcidas ocasionando
2
PIAZZA, Walter Fernando. (Org) Dicionário Político Catarinense. Florianópolis: Assembléia do Estado de
Santa Catarina, 1994.
12
um clima de tensão entre os envolvidos. O mínimo incidente poderia gerar alguma forma de
desinteligência. Na análise feita dos jornais enviados da Legação Brasileira na Argentina para
o Itamaraty, percebe-se que os jornais foram usados para demonstrar a opinião dos políticos
argentinos e como a influência da imprensa poderia agregar valores numa tomada de decisões
na política interna e externa no Brasil.
No estado de Santa Catarina, a imprensa local tinha como um dos objetivos o
engrandecimento do nome de Lauro Müller, principalmente o jornal O Dia, do Partido
Republicano Catarinense, o mesmo de Müller. Para os catarinenses foi motivo de orgulho o
traçado político de um Homem de Estado como ele, mas que acabou sendo prejudicado na
política interna brasileira.
Na análise dos jornais da época é preponderante o entendimento de conceitos que
foram usados para que a notícia causasse o impacto que era esperado, seja na obediência, na
exaltação ou na utilização destes por partidos políticos. É necessário questionar se
imprimiram notícias e artigos para preencher o seu espaço, se noticiaram o que é relevante
para a política de seus proprietários ou de seus dirigentes, pois poderiam publicar o que
trouxesse maiores benefícios ao jornal, seja moral ou financeiramente. A imprensa tem o
poder de incutir, insinuar ou persuadir um povo a favor ou contra um sujeito público.
Também podem inspirar a opinião pública a abandonar ou a enaltecer um político ou uma
política de Estado. Nos jornais pesquisados percebe-se uma pressão positiva à política
praticada por Lauro Müller.
Na abordagem da construção do mito político percebe-se que a vida particular de cada
um está de alguma forma condicionada às escolhas que acontecem nos vários níveis de
intermediação entre a vida pública e a vida privada. Juntamente com a história individual,
que não pode ser desprendida do contexto social a que ele esteja inserido, existe a vida
política. Assim os pontos de cruzamento da biografia com a história política não podem ser
analisados em separados um do outro. Na análise da relação entre o político e a sociedade
aparece a presença dosheróis, dos mitos políticos e ou dos grandes homens’ e a conseqüente
ação destes nas rodas a que pertencem. Assim sendo, Lauro Müller, foi estilizado como um
mito político, principalmente, pela imprensa e pelos seus correligionários que o classificaram
como sendo um grande e verdadeiro Homem-herói.
Pelos jornais, tanto argentinos como brasileiros, percebe-se a construção e a
manutenção desse mito político de Lauro Müller, onde ele possui as potencialidades para as
suas atuações e, assim melhorar as suas reações perante a cobrança da sociedade. Mas sabe-se
que os homens fazem escolhas conforme os fatores sociais e políticos dentro do aspecto
13
histórico a que este esteja inserido, assim entende-se que Lauro Müller, apenas aproveitou as
oportunidades oferecidas. É possível afirmar que lhe foi oportunizado escolhas de vários
cargos políticos, e este escolheu o que melhor lhe convinha no momento político.
Para alguns, Lauro Müller, foi um homem ‘especial’ desprovido de ganância material
e, conseqüentemente, sem acúmulos de capitais financeiros, mas suas aspirações políticas
eram as de um homem obstinado aos seus objetivos. Assim, a análise biográfica de Lauro
Müller esteve condicionada à leitura do contexto político e social brasileiro do início do
século XX. O mito político, através de Lauro Müller, no sentido abordado, significou uma
idéia exagerada ou fantasiosa, mesmo que em alguns momentos possam ter sido verdadeiros,
apresentou desproporções e exaltações aumentadas em proporção aos fatos políticos
ocorridos.
A instabilidade política, tanto estadual, nacional e mundial, influenciou as estratégias
políticas e econômicas da administração presidencial do Brasil, e assim induziu a política
externa praticada na gestão do Ministro Lauro Müller, bem como o intercâmbio praticado
com o intuito de alavancar o país à uma potência hegemônica no Cone Sul.
Para analisar os fatos abordados julgou-se apropriado dividir o trabalho em três
capítulos. Assim, no primeiro, pretende-se relatar o perfil biográfico de Lauro Severiano
Müller, destacando sua vida particular e pública; a construção do mito político a que ele foi
exaltado pela imprensa brasileira e argentina, bem como pelos seus partidários.
No segundo capítulo, pretende-se apresentar algumas concepções referentes à política
externa brasileira na gestão do Ministro Lauro Müller, levando em consideração a política
interna brasileira, durante a República Velha. Na política externa cabe destaque a política
armamentista praticada pelo Brasil e pela Argentina e a influência da Primeira Guerra
Mundial nos dois países. Também será analisada a repercussão na imprensa argentina dos atos
políticos do Ministro do Exterior.
No terceiro capítulo, pretende-se abordar as expectativas de aproximação no Cone Sul
entre o Brasil e a Argentina, bem como os ajustes e os desajustes entre os dois países. Como
uma forma de pactuar, o Brasil, negociou tratado com a Argentina e Chile, o ABC, essa
análise, de um tratado de cordial inteligência, tem como finalidade contextualizar essa
iniciativa diplomática regional e permitir a avaliação de seu significado político.
14
2 LAURO MÜLLER: UM HOMEM DE ESTADO
Neste capítulo serão abordados os aspectos a respeito da vida particular, pública e
política de Lauro Müller. Ele foi um sujeito importante que teve seu nome impresso em ruas,
pontes, praças, grupos escolares e um município em Santa Catarina. Até mesmo na cidade do
Rio de Janeiro, seu nome está em lugares blicos. O Estado como ator nas relações
internacionais é uma das referências para a análise deste estudo. Por isso, além de
destacarmos a tentativa de transformar Lauro Müller como um mito político, veremos que
suas ações tem que ser entendidas como as de um Homem de Estado.
2.1 Perfil Biográfico
Lauro Severiano Müller, nascido em Itajaí aos 08 de novembro de 1863, filho de
Pedro Müller e Ana Maria Michels Müller, imigrantes alemães, freqüentou duas escolas
alemães: uma em Itajaí e outra em Blumenau. Aos 14 anos foi para o Rio de Janeiro e
freqüentou uma escola nacional formando-se Engenheiro Militar em 1888. Na Escola Militar
foi aluno de Benjamin Constant que lhe deu o principal impulso de idéias positivistas.
3
Se
formou Bacharel em Matemática e Ciências Físicas.
Na carreira militar, depois de concluir o curso de Cavalaria e Infantaria, passou a
aluno Alferes; promovido ao posto de Segundo Tenente após concluir o curso de Artilharia.
Em 1890 foi promovido a Primeiro Tenente por serviços relevantes à República, depois de
deixar o governo de Santa Catarina passou ao posto de Capitão. Após integrar as tropas
republicanas que defenderam a cidade da Lapa no Paraná do ataque do gaúcho federalista
Gumercindo Saraiva, passou a Major, em 1904 foi promovido a Tenente Coronel, em 1912
graduado ao posto de Coronel do corpo de Engenharia do Exército, em 1914 General de
Brigada e em 1920 promovido a General de Divisão. Na Academia Militar ocorreu seu
contato com a maçonaria. Lauro Müller é patrono da Academia Maçônica Catarinense de
Letras.
3
CORRÊA, Carlos Humberto. Lauro Müller. Diário Catarinense, Florianópolis, 25 de novembro de 1993,
(Suplemento Especial Governadores de Santa Catarina 1739-1993), p16.
15
Considerado um dos mais importantes políticos que Santa Catarina teve, Lauro
Müller, foi eleito governador do estado por quatro vezes, sendo o primeiro Governador
Republicano de Santa Catarina em 1889, em 1891, em 1902 e em 1918, senador, deputado
federal e Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas na presidência de Rodrigues Alves.
Exerceu o cargo de Ministro das Relações Exteriores na administração do presidente Hermes
da Fonseca e na presidência de Wenceslau Brás. Lauro Müller, na pasta do Exterior, como
para consolidar as relações do Brasil com a Argentina, fez uma visita em 1915 à Bacia do
Prata. “Passado o período difícil de Rio Branco-Zeballos, as relações entre os dois países
voltaram ao seu curso, dir-se-ía normal, isto é, com manifestações efusivas de amor fraternal,
mas sempre com uma certa e mútua desconfiança.”
4
Foi cio correspondente do Instituto
Histórico e Geográfico de Santa Catarina. É Patrono da cadeira número 26 da Academia
Catarinense de Letras e foi sucessor do Barão do Rio Branco na Cadeira 34, de Souza Caldas,
na Academia Brasileira de Letras, mas tomou posse em 16 de agosto de 1917. Como
escritor escreveu os seguintes discursos, que marcaram época: “Os ideais republicanos”;
“Liga de Defesa Nacional” e “Saudação à Hélio Lobo”; também redigiu os relatórios do
Ministério das Relações Exteriores. Foi presidente do Conselho Superior do Partido
Republicano Conservador Catarinense.
Da amizade com Benjamin Constant, Lauro Müller, conseguiu conhecimentos
científicos e a iniciação na filosofia positivista, também recebeu influências para apoiar o
movimento abolicionista, bem como para a Proclamação da República. Para dois escritores
catarinenses, um deles Walter Piazza, a história política do estado de Santa Catarina, no
início da Primeira República tem um único partido político de representação. “[...] tem, desde
a Proclamação da República três vértices: o Partido Republicano e as lideranças de Lauro
Müller e Hercílio Luz.”
5
E para Oswaldo Cabral, o catarinense, Lauro Müller, “foi, sem
dúvida alguma, um dos maiores nomes da política barriga-verde nos primeiros trinta anos da
era republicana, com largo prestígio nacional.”
6
O Partido Republicano Catarinense, fundado por Lauro Müller e Hercílio Luz em
1897, agremiação político-partidária que em 1910 não tinha oposição no estado de Santa
Catarina, “[...]se considerar-se a política catarinense como movendo-se circularmente em
torno de dois nomes: Lauro Severiano Müller e Hercílio Pedro da Luz. Isto é, entender que o
4
BUENO, Clodoaldo. Política Externa da Primeira República: os anos de apogeu (1902
a 1918). São Paulo:
Paz e Terra, 2003. p388.
5
PIAZZA, Walter Fernando. O Poder Legislativo Catarinense: das suas raízes aos nossos dias. (1834-1994).
2
a
ed. Florianópolis: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina, 1994. p231.
6
CABRAL, Oswaldo Rodrigues. História de Santa Catarina. Florianópolis: UFSC, 1968. p267.
16
Partido Republicano era, na verdade, aqueles dois nomes; e os mesmos, por sua vez, juntos ou
separadamente, eram o Partido.”
7
Müller possuía uma posição de liderança no partido a qual
era contestada por alguns partidários que não aceitavam que este preferisse os cargos federais
a administrar o seu estado. “A chefia local do Partido passava às mãos de cada Governador,
no período de seu mandato, permanecendo, entretanto, Lauro Müller, no Rio de Janeiro, como
Chefe Supremo.”
8
Lauro Müller, como Parlamentar Brasileiro Republicano, participou das reuniões para
a troca da Capital Federal do Rio de Janeiro para o Planalto Central que consta na Primeira
Constituição Brasileira de 1891. “Lauro Müller, quando da elaboração do anteprojeto
constitucional, ao articular ideológica e politicamente os artigos 2
o
e 3
o
da primeira
constituição republicana, que determinou a delimitação e a transferência da Capital da
República para o Planalto Central Brasileiro.”
9
Por ocasião da Proclamação da República foi escolhido um governador para cada
Província que passaram a denominar-se estado. “Em 1889 aos 26 anos tornou-se Governador
de Santa Catarina pela primeira vez indicado por Benjamin Constant e Antônio Justiniano
Esteves Júnior.”
10
Foi nomeado pelo marechal Deodoro da Fonseca e logo começa a destacar-
se: “É neste governo que Lauro Müller lança a campanha de contribuições voluntárias para
saldar as vidas da Nação.”
11
Müller, foi eleito pela Assembléia em 1890 para um segundo
mandato onde governou até 1891. “A 7 de janeiro de 1890, atendendo a dispositivo federal, o
governo do estado dissolveu as Câmaras Municipais. Em substituição, são criados os
Conselhos Municipais e nomeados os intendentes nomes, prioritariamente, retirados dos
integrantes dos clubes republicanos.”
12
Em novembro de 1891, num golpe de estado, o
presidente Deodoro da Fonseca dissolveu o Congresso Federal ocasionando a renúncia do
Presidente da República. Assim, assumindo o Governo Federal, Marechal Floriano Peixoto,
que destituiu os governadores que apoiaram Deodoro. Este apoio do governador de Santa
Catarina, Lauro Müller, acarretou também a sua renúncia, ocasionando uma situação
7
CORREA, Carlos Humberto. Um Estado entre duas Repúblicas, a revolução de 30 e a política de Santa
Catarina até 35. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1984, p18.
8
IDEM, p21.
9
MARQUES, Jarbas Silva. Anuário de Itajaí. Fundação Genésio Miranda Lins.Lauro Müller e a Capital da
Repúblicas. Itajaí: FGML, 2002, p12.
10
KONDER, Marcos. Lauro Müller: a Pequena Pátria. Florianópolis: FCC, 1992, p. 48.
11
CORRÊA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p17.
12
PIAZZA, Walter Fernando. (Org.). Op. cit., p569.
17
conturbada no estado. “Neste ínterim, face à situação política local, com a renúncia forçada de
Lauro Müller, do Governo Estadual, há uma série de polêmicas nos jornais desterrenses.”
13
Atuou como deputado federal de 1891 até 1899, sendo eleito senador em 1900. Foi
eleito ainda para governar Santa Catarina de 1902 a 1906, depois de concretizar acordos
políticos
14
entre os catarinenses. “Após tantas escaramuças o dr. Lauro Müller aparece em
Florianópolis, para apaziguar e, conseguiu congregar os elementos fracionados, dando de
novo ao Partido uma organização coesa e forte.”
15
Em 1902 ficou no governo do estado por
48 dias, preferindo o cargo de Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas:
Eleito, toma posse em 28 de setembro de 1902 em substituição ao primo Felipe
Schmidt, quarto governador eleito. Porém dias depois de assumir a administração
de Santa Catarina, renuncia ao cargo passando-o ao Presidente do Congresso
Representativo do Estado, Antonio Pereira da Silva e Oliveira, que por sua vez o
entrega ao vice-governador, Vidal José de Oliveira Ramos.
16
Governador eleito novamente em 1918-1922 renunciou ao cargo em nome de seu vice
Hercílio Luz. A luta política dentro do Partido Republicano Catarinense se acirrava. Os
candidatos Vidal Ramos e Felipe Schmidt estavam contra Hercílio Luz e Abdon Batista,
Lauro Müller fez um acordo com Hercílio Luz, sairia como candidato desde que não
assumisse o cargo. “Lauro, sumo pontífice da política de sua terra, [...] que se tornara uma das
grandes figuras da política nacional, desejou fazer Governador de Santa Catarina, o Dr.
Abdon Batista.”
17
Embora Lauro Müller tenha sido eleito para governador em quatro períodos
diferentes, só governou, efetivamente, o estado de Santa Catarina menos de nove meses
consecutivos.
No PRC possuía respeitabilidade, mas sua ausência constante do estado fez com que
perdesse o cargo de presidente do partido. Müller tinha a função de indicar os nomes para os
cargos de governador e vice de Santa Catarina, também dos deputados federais e senadores,
geralmente sem contestação dos partidários. “Lauro Müller exercia a política como uma arte,
através da diplomacia e dos conchavos no antigo Hotel Avenida, onde se hospedavam os
13
PIAZZA, Walter Fernando. (Org.). Op. cit., p222.
14
Enquanto Lauro Müller indicava os nomes para governadores, vice-governadores, deputados federais e
senadores para Hercílio Luz cabiam as indicações dos deputados estaduais.
15
PIAZZA, Walter Fernando. (Org.). Op. cit., p. 240.
16
CORRÊA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p. 18.
17
CABRAL, Oswaldo Rodrigues. Op. cit., 1968, p. 267.
18
catarinenses no Rio de Janeiro.”
18
Num partido único dentro do estado e sem adversários, os
políticos ao pleitearem um cargo não dependiam de ajuda econômica para se elegerem. “Os
nomes se revezavam no poder, mas quando estavam fora dele não perdiam as rédeas do
controle partidário através da participação na Comissão Executiva do Partido.”
19
Assim,
Lauro Müller, mesmo nos outros cargos que ocupou, até então, sempre esteve vinculado com
a política catarinense, mas a partir de 1921 foi afastado das reuniões do partido e das
resoluções da política do estado de Santa Catarina. Foi eleito senador pela última vez em 1921
e apesar da respeitabilidade de Lauro Müller dentro do estado, as suas ausências deixaram os
políticos catarinenses em dúvida com a sua chefia no PRC, assim em 1918 quando reeleito
governador do estado, Hercílio Luz, não permitiu mais que Lauro Müller voltasse ao estado.
O Partido Republicano Catarinense comandou a política do estado através dos nomes
de Lauro Müller, Hercílio Luz, Felipe Schmidt e Vidal Ramos, todos governadores de Santa
Catarina, que a partir da década de 1920 começam a sofrer contestações, quando surgem
nacionalmente propostas de renovação política. “Rompia-se o domínio da oligarquia Lauro,
Hercílio, Schmidt e Vidal, que ao longo de três décadas vinha se revesando no governo do
estado. Aliás, [...] garantiram para si mandatos solidificados até suas mortes.”
20
Como Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Lauro Müller, no governo do
presidente Rodrigues Alves, promoveu a abertura da Avenida Central da capital da República,
atual Avenida Rio Branco; também promoveu a construção do viaduto da estrada de Ferro da
Central do Brasil e proporcionou novas dimensões ao cais do porto do Rio de Janeiro. A partir
desta obra, o cais do Porto teve condições de receber navios de maior porte, beneficiando o
desenvolvimento de todo o país, e assim para o jornal catarinense O Dia, Lauro Müller “se
transformou no operário glorioso que fez a transformação da capital do país, que impulsionou
o avanço da viação férrea e decretou obras de portos em diversas circunscrições da
República.”
21
No Rio Grande do Sul, também na gestão do Ministro Lauro Müller, foi ampliado o
cais do Porto da capital gaúcha. preocupado com o problema do carvão nacional por sentir
o problema de perto em seu estado natal, tomou decisões importantes a respeito de sua defesa
contra a importação. Ele queria que se desse um maior valor ao produto com abundância no
18
CORRÊA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p19.
19
CORRÊA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p26.
20
PIAZZA, Walter Fernando. Op. cit., 1984, p578 .
21
O Dia, Órgão do Partido Republicano Catarinense. Dr. Lauro Müller. Florianópolis. 08/11/1914, n. 7665.
Ano XIV, p. 01. (Este jornal estava sob a responsabilidade de Joaquim Thiago da Fonseca como Diretor e Nereu
Ramos como Redator político).
19
Sul do País. Foi Lauro Müller que iniciou o desenvolvimento da exploração do carvão
nacional. Voltado para os problemas no Nordeste do país, o ministro catarinense, estudou
tentativas de solução para minimizar a seca da região. “Sua primeira iniciativa foi a abertura
da estrada de ferro ligando a cidade de São Francisco, no Nordeste brasileiro à Iguaçu.”
22
Também participou do saneamento da capital da República, uma cidade colonial, com lugares
praticamente inabitáveis e sombria, assim, num Rio de Janeiro que em 1910 tinha vários
problemas a serem resolvidos. O Ministro Lauro Müller, juntamente com o engenheiro Paulo
Frontin e o médico sanitarista Oswaldo Cruz transformaram a velha cidade.
Lauro Müller, como senador patrocinou no estado de Santa Catarina a campanha de
Hermes da Fonseca para presidente do Brasil em 1910 contra Rui Barbosa. Assim iniciou-se
uma certa inimizade entre Lauro Müller, do Partido Republicano, da ala Militarista e Rui
Barbosa, da ala Civilista. O adversário de Müller deu-lhe o apelido de ‘raposa de espada.’
23
Para Licurgo Costa o apelido que Rui Barbosa lhe deu foi de ‘enguia’.
24
No Senado, Rui
Barbosa declarou não ter inimizade com Lauro Müller. “Nunca tive motivos de antipatia
pessoal e vivi sempre nesta Casa com o honrado Ministro das Relações Exteriores as
melhores relações de boa camaradagem e amizade pessoal. Mas a nossa divergência começou
há muito tempo. [...] se pôs à frente do movimento político da candidatura Hermes.”
25
Depois do cargo de Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Lauro Müller
voltou ao Senado e permaneceu até 1912, quando foi convidado pelo Presidente Hermes da
Fonseca para substituir o Ministro das Relações Exteriores, Barão do Rio Branco, que havia
falecido.
Em uma entrevista para o Século, citado no jornal O Dia, órgão oficial do governo do
estado, referente à sua nomeação para a Pasta do Exterior, Lauro Müller, declarou que não era
de sua vontade aceitar o cargo de Ministro, mas quem assumisse a direção do Ministério
deveria encerrar a sua vida de político militante:
Eu se fosse, ocupar o alto cargo nem ao Senado voltaria, dava por fim da minha
carreira política.
Pensando assim creio que não serei o futuro ministro, nem o desejo. Substituir o
Barão do Rio Branco no atual momento é a maior honra que pode dar-se a um
22
CORREA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p. 18.
23
CORREA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p. 19.
24
COSTA, Licurgo Ramos da. Um Cambalacho Político. A verdade sobre o acordo de limites Paraná –
Santa Catarina. Florianópolis: Edições Lunardelli, 1987. p. 64.
25
Discurso de Rui Barbosa. Anais do Senado 1913, Vol. 5. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p. 252.
20
homem público, mas eu não a ambiciono. Julgo mais difícil ser um bom chanceler
que um presidente da República.
26
Mas, apesar de ter demonstrado uma certa arrogância, acabou por aceitar o cargo de
chanceler. Na política externa do Brasil, a nomeação de Lauro Müller, amenizou algumas
rusgas que haviam acontecido entre o país e a vizinha Argentina.
Assim, a ansiedade presente em certos segmentos na Argentina mediante a designação
do sucessor do Barão do Rio Branco se dissipou após a nomeação de Lauro Müller, pois ele,
como ministro das Relações Exteriores, sempre apregoou e imprimiu à diplomacia a amizade
entre o Brasil e a Argentina, pois em alguns momentos do passado, na gestão de Rio Branco
havia ocorrido a tentativa de isolar a Argentina em suas ações geopolíticas e territoriais. “A
primeira década do século XX, foi certamente, o período em que o confronto foi constante nas
relações entre o Brasil e Argentina.”
27
Mas inicialmente, Lauro Müller continuava com dúvidas se aceitaria a incumbência de
substituir o Barão, no cargo de Ministro. “Se fosse convidado para ser o substituto do Barão
do Rio Branco recusaria, porque não me julgo capaz de substituí-lo; se for nomeado ministro
das Relações Exteriores, tenho o dever de prestar os meus serviços ao país e ao governo do Sr.
Presidente da República.”
28
Após uma reunião com o presidente da República, Hermes da
Fonseca, ficou acertada a sua nomeação pelo Decreto de 14 de fevereiro de 1912, como
Ministro de Estado das Relações Exteriores.
29
Sobre sua nomeação e a substituição do Barão
do Rio Branco declarou: “Sucedo-o sem substituí-lo”. Assim, renunciava ao Senado e à
chefia do Partido Republicano Catarinense, mas não se afastava definitivamente das
indicações políticas dos cargos no estado de Santa Catarina. Para Licurgo Costa, Müller foi:
Um grande administrador, como provou nos dois Ministérios referidos, onde deixou
notáveis realizações. Mas para seu estado natal destinou suas disponibilidades de
talento apenas para tratos, combinações, cambalachos e acomodações políticas. De
inteligência viva e mordaz, seus ditos, comentários, gracejos e ironias tinham
grande acústica, espalhavam-se rapidamente, se por um lado sua dicacidade rendia-
lhe novos admiradores, por outro fazia-o perder a adesão dos atingidos por suas
críticas quase sempre ferinas.
30
26
O Dia, 14/02/1912.
27
HEINSFELD, Adelar. A geopolítica de Rio Branco: as fronteiras nacionais e o isolamento argentino.
Joaçaba: UNOESC, 2003, p. 137.
28
A Gazeta de Notícias, citado pelo O Dia., 20/02/1912.
29
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de maio de 1912 à 17 de maio de
1913. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1913, p. VI.
30
COSTA, Licurgo Ramos da. Op. cit., 1987, p. 63.
21
Como Ministro do Exterior fez diversas visitas a países estrangeiros. No ano de 1915,
Lauro Müller, foi para a Argentina onde compareceu em diversas festividades. “A
Universidade de Buenos Aires concedeu o título de Doctor in honois causa em especialidade
nas Sciencias physicas e mathematicas e pelo Aero-Club Argentino o diploma de Sócio
honorário da mesma Instituição.”
31
Além da Universidade de Buenos Aires, a de La Plata
ofereceu também um título ao Ministro. Título de Acadêmico em sciencias physicas,
mathematicas e astronomicas.”
32
Aproveitando a visita, o Ministro passou pelo Uruguai onde
foi feita a entrega do “Diploma de Sócio horário do Instituto de Engenheiros no Uruguai”
33
,
título entregue pela primeira vez a um estrangeiro.
Lauro Müller visitou também os Estados Unidos dando continuidade à política do
Barão do Rio Branco que percebeu a necessidade da aproximação com aquele país. Ele
chegou aos Estados Unidos no dia 11 de junho de 1913. Lá recebeu o título de Doutor em
Leis pela Universidade de Harvard.
Na Argentina, a imprensa comentou que haviam rumores no Rio de Janeiro sobre a
saúde de Lauro Müller e sua possível saída do Ministério que exige muito trabalho e
dedicação contínua do ministro, mas que durante sua gestão o Brasil e a Argentina estreitaram
suas relações comerciais e sua amizade. “Por lo que respecta a la Argentina, es evidente que
durante la gestión del Dr. Müller, la amistad de las dos naciones se estrechado y sus
relaciones se han heche aún más íntimas y cordiales”
34
Para o La Razón, o afastamento do
Ministro poderia estar vinculado à política interna do Brasil, onde sua suposta candidatura à
sucessão presidencial faria com que Lauro Müller deixasse a política externa para se dedicar
à política interna.
No volverá a desempeñar las funciones, según unos, su alejamiento responde a
rozamientos habidos con el primer magistrado, deseoso de imprimir rumbos nuevos
a su política interna. [...] Según otros, éste responde con su alejamiento a
31
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho de
1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p .36.
32
AHI. Seção dos Negócios Políticos e Diplomáticos da América. n. 28. Legação Brasileira em Buenos Aires,
31/05/1915.
33
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 a 03 de maio de
1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914. p. 33.
34
La Nación. Ecos del Dia en La cancelleria brasileña. Buenos Aires, 24/05/1916.
22
incitaciones de sus amigos, quienes desean que lleve a aquel estadista a la sucesión
del doctor Braz.
Los que han propalado el primer rumor lo relacionan con las afectuosas
demonstraciones de que el primer magistrado hiciera objeto en público,
recientemente, al senador Ruy Barbosa, jefe de la oposición civilista.
35
O momento internacional da gestão de Lauro Müller frente ao Ministério das Relações
Exteriores foi um dos mais conturbados do século XX, pois a Primeira Guerra Mundial estava
em andamento. E, mesmo depois que voltou da visita dos Estados Unidos, em outubro de
1916, o ministro Müller, continuou defendendo a neutralidade brasileira, declarando que o
Brasil deveria “conservar para com todos a mesma amizade.”
36
Pela primeira vez o mundo se
deparava com um conflito de âmbito mundial, contudo ele soube conduzir o Brasil de acordo
com os interesses da nacionalidade – ou ao menos do grupo dirigente.
Meses antes, no centenário do Congresso de Tucumã, em 16 de julho de 1916, em
Buenos Aires, Rui Barbosa, defendeu a adesão do Brasil aos aliados combatendo a
neutralidade brasileira na Primeira Guerra Mundial. Lauro Müller não gostou das suas
declarações e da campanha em favor do final da neutralidade do país perante a guerra. “No
seu retorno antecipado ao Brasil, em 17 de outubro, Müller desaprovou as palavras de Rui
Barbosa e defendeu a neutralidade afirmando que o país deveria conservar para com todos a
mesma amizade.”
37
Com a constante defesa da neutralidade brasileira, pelo ministro Müller, o desfecho da
política interna acabou por acarretar a sua renúncia do cargo, pois foi acusado por grupos
nacionais de ser germanista, pela sua descendência alemã.
A imprensa catarinense demonstrou a inconveniência da desculpa usada para tirar
Lauro Müller da política representativa do Brasil. Como não tinha alternativa nos palcos
políticos do Brasil ele deixou uma mensagem para o Presidente da República:
Exonerar-me do cargo de Ministro de Estado que V. Exa. tão benevolamente e
contra os meus desejos, me deu a honra de confiar-me.
Tão grave era então a situação do governo e tão perfeita foi sempre a harmonia de
vistas entre o presidente e o seu ministro, no traço da nossa política e nos atos
necessários, que eu faltaria à lealdade que a V. Exa. devia e às minhas próprias
responsabilidades de homem público, se me afastasse antes que o Congresso
35
La Razón. En el Brasil – Retiro del canciller Muller. Buenos Aires, 27/05/1916.
36
Id.,
37
BARRETO FILHO, Fernando P. Mello. Os sucessores do Barão: relações exteriores do Brasil: 1912-1964.
São Paulo: Paz e Terra, 2001, p. 42.
23
Nacional estivesse presente. [...] Se alguma falta pudes (sic) ao fazer um ministro, e
certamente não seria esse o meu caso, ela desapareceria diante da autoridade
constitucional de alto patriotismo e da comprovada capacidade dos representantes
autorizados, da vontade nacional, para norteá-la no que depender do conhecimento
íntimo dos negócios públicos.
38
Assim, Lauro Müller deixou o cargo de Ministro das Relações Exteriores, no mês de
maio, destacando que como militar seria apenas mais um ato de sacrifício para a sua pessoa e
de patriotismo para o Brasil,
[...] Fiel a uma norma de conduta a que nunca faltei, general que tenho a honra de
ser do Exército Brasileiro, volver ao seu seio, de onde não sei estar ausente nos
momentos em que ele possa eventualmente ser, com os seus companheiros do mar,
chamado como os primeiros ao sacrifício. [...] Permissão para dar a esta resolução o
caráter de irrevogável, declinando da subida honra de continuar servindo num posto
político junto à V. Exa. no que faço um penoso sacrifício por me afastar de uma
convivência tão honrosa quão profícua, pelo exemplo de labor sem desfalecimentos,
servido pelo mais sincero patriotismo.
39
Em resposta, o presidente do Brasil, Wenceslau Brás, enviou a Lauro Müller a
seguinte carta, no dia 03 de Maio de 1917:
Solicita exoneração do cargo de ministro de Estado das Relações Exteriores, que
com tanto brilho e eficiente operosidade, vinha exercendo desde o falecimento do
inolvidável brasileiro Barão do Rio Branco.
Dado o caráter de irrevogabilidade que o ilustre amigo imprimiu à sua resolução,
declinando de continuar no governo por motivos de alto valor patriótico, me
cabe acatá-lo e apresentar-lhe meus sinceros agradecimentos pelos valorosos
serviços prestados ao país em época difícil, serviços que estiveram na altura de seu
reconhecido patriotismo, seu talento e sua dedicação pelo bem público.(O DIA,
1917, p 03)
40
No Continente Americano, o Itamaraty, continuou a conservar a política da boa
vizinhança no período em que Lauro Müller esteve trabalhando como Ministro das Relações
Exteriores. Quando se exonerou do cargo, o presidente brasileiro ofereceu-lhe qualquer outra
pasta de ministro ou uma embaixada, o que Müller pediu licença para não aceitar.
38
O Dia. 05/05/1917.
39
O Dia. 05/05/1917.
40
O Dia. 08/05/1917, p 03.
24
Nos documentos oficiais e no arquivo particular de Lauro Müller que foram
pesquisados no Itamaraty não contém declarações do ministro para tentar defender-se ou
mesmo para justificar as acusações que o fizeram exonerar-se do Ministério das Relações
Exteriores.
Analisando alguns autores catarinenses, percebe-se que o Ministro Lauro Müller
acabou renunciando ao cargo sem defender-se das acusações, mas também sem comprovação
das mesmas pelas pessoas e ou políticos que o acusavam. Segundo Walter Piazza, Lauro
Müller declarava: ‘quem nasceu nesta terra, ou é brasileiro, ou é traidor’; para este autor a
xenofobia fê-lo renunciar.
41
Em defesa de Lauro Müller, Jali Meirinho declara: que “Embora
jamais tivesse demonstrado qualquer preferência pela terra dos seus antepassados, a 1
a
Grande
Guerra levou-o a renunciar ao posto de Chanceler.”
42
Novamente Walter Piazza defendeu o
Ministro. “Quando renunciou, após ter sido pressionado por uma campanha, em que o
acoimaram de germanófilo, e que custou a Santa Catarina enormes prejuízos, principalmente
no tocante às pressões dos xenófobos governamentais.”
43
Para Oswaldo Cabral, a passagem
do Ministro Lauro Müller pelo Ministério das Relações Exteriores, sucedendo ao Barão do
Rio Branco, não deslustrou as tradições do Itamaraty, apesar da sua renúncia. “Viu-se na
contingência de retirar-se, dada a sua qualidade de descendente de alemães e a sua opinião
contrária à declaração da guerra à Alemanha, opinando que o rompimento das relações
diplomáticas era suficiente para exprimir o nosso repúdio aos atos de agressão sofridos.”
44
Também as influências políticas de Rui Barbosa contribuíram para que se afastasse da
política externa brasileira. “A partir das insídias de Rui Barbosa e de outros americanófilos, se
estruturou uma campanha de difamação que afirmava que ele era contra a guerra por ser um
germanófilo em sua origem familiar.”
45
Percebe-se que a retirada de Lauro Müller do
Ministério das Relações Exteriores deixou os correligionários do Partido Republicano
Catarinense resignados. Sendo que a sua gestão esteve voltada para a concretização da
amizade do Brasil com os países do Continente Americano, bem como para as boas relações
para com todos, assim os políticos catarinenses não aprovavam a sua saída do Ministério e
interessava-lhes que ele continuasse como Ministro das Relações Exteriores.
41
PIAZZA, Walter Fernando. Santa Catarina: sua História. Florianópolis: Ed. Da UFSC, Ed. Lunardelli,
1983, p 486.
42
MEIRINHO, Jali e JAMUNDÁ, Theobaldo Costa. Nomes que Ajudaram a Fazer Santa Catarina. Vol. 1,
Florianópolis: EDEME, p 15.
43
PIAZZA, Walter Fernando. Op. cit., 1994, p 258.
44
CABRAL, Oswaldo Rodrigues. Op. cit., 1968, p 268.
45
MARQUES, Jarbas Silva. Op. cit., p 16 .
25
Em sua defesa também esteve o jornal Le Temps de Paris, com seu edital de n. 5
declarou que a origem germânica de Lauro Müller criou para ele uma situação delicada e que
este acabou abandonando o poder de representar o Brasil.
Deixando ao Congresso Nacional plena liberdade de se pronunciar sobre as
questões levantadas pelo atual conflito com a Alemanha. [...] O afastamento de
Lauro Müller da pasta do Exterior do Brasil no momento da abertura do Congresso
Nacional tem significação, por isso que se pode concluir que o Brasil caminha
firmemente para a guerra.
46
Também salientou que foi ele, como Ministro, quem assinou o protesto contra o
bloqueio dos submarinos e a declaração do rompimento das relações diplomáticas com a
Alemanha.
O jornal Correio da Manhã analisou os principais atos do Ministro Lauro Müller, do
início da neutralidade brasileira na guerra até o rompimento com a Alemanha e declarou que
em nenhum ato oficial foi possível encontrar entusiasmo pelos interesses alemães. No Brasil,
os argumentos apresentados demonstraram como seria ridículo fazer passar para o meio
político brasileiro, os antagonismos de etnias que a guerra acirrou, principalmente na Europa.
Enfatizando, em defesa de Lauro Müller, que este, apesar de ser descendente de alemão,
demonstrou que sempre esteve trabalhando pelo país que o escolheu como político e
representante da nação.
Na Inglaterra ou na França, a origem alemã não poderia ser motivo para se
desconfiar de um homem que, como Lauro Müller, tenha dedicado seu indiscutível
talento e todas as suas energias ao serviço do País, onde nasceu, onde foi educado e
ao qual está indissoluvelmente ligado todo o seu futuro político, material e
doméstico. Mas isso nunca se poderia admitir em um país como este, onde as
classes que realmente governam são em sua maioria de origem cosmopolita, onde a
grande população de origem alemã deve, durante muitas décadas ainda trabalhar de
mãos dadas com elementos nacionais, para o desenvolvimento do país.
47
Quando Lauro Müller foi indicado para assumir a cadeira do Barão do Rio Branco na
Academia Brasileira de Letras, não tomou posse no mesmo ano por imposição de José
46
Le Temps, citado pelo O Dia. 09/05/1917.
47
Correio da manhã, citado pelo O Dia.12/05/1917.
26
Veríssimo, que classificou a escolha do ministro como sendo ‘chapa-branca’. cinco anos
depois, em 16 de agosto de 1917, Lauro Müller tomou posse, proferiu discurso enaltecendo a
diplomacia de Barão do Rio Branco contestador das pretensões de países poderosos, mas
concedendo o condomínio da Lagoa Mirim ao vizinho Uruguai.
Lauro Müller, primeiro catarinense a se tornar imortal, afirmou que sua estada no
Ministério das Relações Exteriores foi sem ambição de tomar territórios alheios e nem
pretendeu governar além das fronteiras do país. Como um militar disciplinado estimulou o
serviço militar para os jovens brasileiros, onde os sacrifícios extremos determinariam o
patriotismo de um povo. Também declarou que desarmar a Nação é desarmar todos os direitos
que ela representa. “Fizemos da igualdade das soberanias um dogma da nossa política
internacional, relegando para o passado idéias de hegemonia, co-irmã do imperialismo
desenfreado que está assassinando e incendiando a Europa e quase o mundo inteiro.”
48
A Academia Brasileira de Letras recebeu Lauro Müller com várias contestações, por
ser ele um político e não um escritor. José Veríssimo demonstrou sua indignação afastando-
se das sessões da Academia.
Jejuno em literatura, Müller teve a candidatura impugnada por Salvador de
Mendonça apesar do apoio de Mário de Alencar. A eleição abalou a ABL. José
Veríssimo manifestou a Mário de Alencar sua reação indignada contra a influência
do Itamaraty na Academia que considerava transformada numa seção desse
Ministério. [...] O campo diplomático, por abrigar muitos escritores, tendeu a
procurar intersecção com a ABL onde se não obteve hegemonia, ao menos
conseguiu estabelecer ampla penetração do poder estatal em seus diversos
desdobramentos
pela presença de membros do corpo diplomático na instituição.
49
É possível afirmar que Lauro Müller preferia sempre os postos federais, seja no
Senado, na Câmara dos Deputados ou nos Ministérios, do que a governança de Santa
Catarina. Lauro Müller foi eleito senador pela última vez em 1921, para um mandato de nove
anos, naquilo que é considerado uma espécie de prêmio de aposentadoria a quem muito fez
pela vida blica catarinense e nacional. “Ficando no Rio de Janeiro, ele foi afastado
definitivamente das decisões políticas onde se resolviam os destinos de Santa Catarina.”
50
48
Discursos Acadêmicos. A Diplomacia do Barão do Rio Branco. Acesso em: 14 set. 2005. Disponível em:
www.academia.org.br/imortais/cads/34/lauro.htm.
49
MALATIAN, Teresa. Diplomacia e Letras na correspondência acadêmica: Machado de Assis e Oliveira Lima.
Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 13 n. 24, 1999, p 377-392.
50
CORREA, Carlos Humberto. Op. cit., 1984, p 19.
27
Morreu como senador em 30 de julho de 1926, aos 63 anos de idade devido à
arteriosclerose. Casado com Luiza de Andrade Müller, deixou três filhos, Lauro Müller Filho,
Laurita e Antônio Pedro. Após uma longa vida dedicada a causas públicas, morreu pobre.
Apesar de Marcos Konder defendê-lo, mesmo assim foi acusado de corrupto durante sua vida
pública.
51
Já Licurgo Costa declarou: “Aliais, (sic) antecipadamente a ressalva de que não o
consideramos corrupto em relação a dinheiro, mas sim politicamente. Ele era um político
corrupto e corruptor.”
52
Lauro Müller teve uma vida política ativa tanto no âmbito estadual como no federal,
sempre circulando em cargos de liderança onde pudesse estar a par da política nacional e a de
seu estado. Apesar de ter seu nome em obras públicas, tais como ruas, pontes, praças, grupos
escolares em Santa Catarina e no Rio de Janeiro e é nome em um Município catarinense, é
pouco conhecido em Santa Catarina, seu estado natal.
Nas décadas de 1900 à 1920, Lauro Müller, foi glorificado como um verdadeiro mito
político que deveria ser seguido na política republicana brasileira. Era defendido, como um
mito, principalmente pelos jornais, o meio de comunicação mais difundido na época. Como
homem público teve o político Rui Barbosa como um adversário a altura na política, já na
literatura, Müller, diferentemente de Barbosa, produziu apenas uns poucos discursos na
Academia e os Relatórios do Ministério das Relações Exteriores, que de certa forma era uma
obrigação a ser cumprida. Mesmo assim, fez parte da Academia Brasileira de Letras seguindo
uma tradição brasileira como político do Itamaraty.
2.2 Construção do Mito Político
Para Ruben Oliven a construção do mito político poderá transcorrer de forma a não
corresponder a sua realidade. “Ele não se propõe a esconder ou ostentar algo, mas a
deforma.”
53
Martin Feijó exprime que a criação e a sobrevivência do mito é obra do
inconsciente que se torna parte da vida cultural de uma sociedade. “O mito corresponde às
crenças de um povo, do conjunto da comunidade, da coletividade. Por isso, ele se torna a
51
KONDER, Marcos. Lauro Müller. Florianópolis, Imprensa Oficial, 1926.
52
COSTA, Licurgo Ramos da. Op. Cit., 1987, p. 66.
53
OLIVEN, Ruben George. Mitologias da Nação. In: FÉLIX, Loiva Otero e ELMIR, Cláudio P. Mitos e
heróis:construção de imaginários. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 1998, p. 36.
28
‘verdade’ desse povo. [...] os mitos refletem sempre um medo de mudança.”
54
O registro da
construção do mito político fica no imaginário da sociedade.
Para Raoul Girardet o mito altera a observação e contradiz as regras do raciocínio
lógico. O mito não pode ser abarcado ou definido e oferece múltiplas significações. “O mito
político é fabulação, deformação ou interpretação objetivamente recusável do real.”
55
para Loiva Félix o herói político tem seu carisma fabricado pela necessidade de
legitimar e justificar uma identidade. “O herói simboliza a identidade do grupo, mas se
sobrepõe a ele por ser especial, por ter uma missão.”
56
Assim, onde quer que o mito político
se encontre, manipulado ou não, sofisticado ou mitificado, ele exerce o mesmo fascínio.
Como o mito político constitui uma realidade ambígua e depende do desenrolar de sua
caminhada na política interna ou externa de um Estado, sua criação e manutenção estão
inseridas na idéia de herói de uma sociedade. Segundo Girardet o mito político é polimorfo,
um sujeito que pode variar de forma, conforme suas necessidades. “Os mitos políticos de
nossas sociedades contemporâneas não se diferenciam muito, sob esse aspecto, dos grandes
mitos sagrados das sociedades tradicionais.”
57
Assim, procuramos ver a construção do mito político, Lauro Müller, principalmente na
imprensa catarinense onde os editais visavam demonstrar a dedicação dele à política nacional.
Também alguns jornais argentinos contribuíram para a construção desse mito heróico.
Em relação à Lauro Müller, comprova-se a tentativa de criação, a existência e a
manutenção do mito político. Também entende-se que este mito político não ficou para a
posteridade como ficou o mito do Barão do Rio Branco. Pois, atualmente, mesmo em seu
estado natal, a maioria das pessoas não tem conhecimento de seus atos políticos. Assim,
Lauro Müller, foi um mito político enquanto estava atuante na política brasileira.
A imprensa tem a capacidade de construir ou de destruir um mito heróico; pela
repetição dos artigos em seus jornais o mito político continuará a ser lembrado e vivenciado.
Analisando o caso de Lauro Müller, percebe-se que a imprensa catarinense, principalmente o
situacionismo, adquiriu a incumbência da construção do mito político de Lauro Severiano
Müller. Também a imprensa argentina ajudou nessa construção e manutenção mitológica.
Para Loiva Félix. “O herói sempre tem qualidades que o distinguem dos demais mortais,
54
FEIJÓ, Martin Cezar. O que é herói. São Paulo: Brasiliense, 1984, p 13.
55
GIRARDET, Raoul. Mitos e mitologias políticas. São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p 13.
56
FÉLIX, Loiva Otero e ELMIR, Cláudio P. Mitos e heróis:construção de imaginários. A fabricação do
carisma: a construção mítica-heróica na memória republicana gaúcha. Porto Alegre: Ed.
Universidade/UFRGS, 1998, p 145.
57
GIRARDET, Raoul. Op. cit., p 15.
29
fazendo-se merecedor de um lugar entre os homens e a divindade. Tem virtudes como
vidente, justo, bom, genial, benfeitor, etc.
58
Assim, a imprensa da época, principalmente o
jornal O Dia, órgão do Partido Republicano Catarinense, se encarregou de propagar as
grandes virtudes e atitudes heróicas de Lauro Müller.
Assim, fez-se de Lauro Müller um verdadeiro herói para muitos catarinenses,
procurando demonstrar que ele sempre trabalhou muito pela sua pátria, mas sem esquecer do
seu estado. Sendo assim, o aspecto mítico foi veiculado por vários anos na imprensa, como
uma necessidade de reforçar o mito e legitimá-lo na política do Brasil. Como um partido
político precisa de representantes fortes com identidade nacional e renome, esse mito político
foi usado para reforçar a posição partidária e republicana dentro e fora do estado de Santa
Catarina. Loiva Félix, afirmou que há a transformação em referências de identidade, herói e
mito. “Percebemos a perpetuação e heroicização do ‘grande líder’ como forma de garantir a
coesão republicana.”
59
Os heróis podem ser idealizados, produzidos e desfeitos conforme os
interesses e para quem interessa esses heróis. “Deve levar em conta as condições de criação e
recriação do herói por quem está interessado em fazer uso dele.
60
Para Paulo Miceli o herói é
humano e assim possível de errar, mas a exaltação repetitiva não deixa o povo esquecer desse
herói. “O acontecimento histórico assume, assim, graças aos meios de comunicação de massa
uma nova dimensão.”
61
O mito transpõe os mecanismos e os comportamentos reguladores de
uma sociedade.
Na análise dos jornais, selecionou-se algumas passagens da vida pública de Lauro
Müller, tanto na esfera estadual como federal.
Assim, Lauro Müller comunicou ao governador de Santa Catarina, Coronel Vidal
Ramos, no dia 15 de fevereiro de 1912, que obedecendo ao dever de homem público de não
medir sacrifícios pessoais quando se trata dos altos interesses da Pátria, precisava aceitar a
incumbência de Ministro onde era necessário que se afastasse por completo da política interna
do estado de Santa Catarina:
A perda daquele que foi a segunda glória de seu nome e o maior homem de sua
época é ineparável para o Brasil que o chora, consolando-se de o haver perdido com
o legítimo orgulho de o ter tido por filho.
58
FÉLIX, Loiva Otero e ELMIR, Cláudio P. Op. cit., p. 151.
59
Id., p. 158.
60
MICELI, Paulo. Op. cit., p. 13.
61
MICELI, Paulo. Op. cit., p. 20.
30
A vida nacional que não se suspende, exigia que alguém tivesse a necessária
humildade para ser o Ministro onde ele foi o grande chanceler.
Designado o meu nome aceitei a gloriosa humilhação(sic)., estimulado pela
convicção de um sacrifício tanto mais nobre quanto mais consciente. [...] no tempo
e na tradição da chancelaria brasileira não pode ser obra de um homem por isso
mesmo que é a continuidade na tradição de um povo, mas deve ser a expressão de
um acordo completo e absoluto entre a ação do governo e os sentimentos da
nação.
62
Lauro Müller apesar da pouca experiência na área de chancelaria e da política externa
é elogiado pelo jornal O Dia: “O novo chanceler guiará com o firme a política
internacional do Brasil.”
63
Sabia ele que após aceitar o cargo para representar o seu país
perante outros Estados deveria deixar de lado a política catarinense, despedindo-se e
abandonando a carreira de político militante. Mas não abandonou as indicações de possíveis
candidatos dentro do PRC. “Seu próprio gesto, aceitando a espinhosa missão que, confiado na
sua amizade pessoal, o Sr. Marechal Hermes lhe entregou, importa e exprime a renúncia a
toda e qualquer ambição da ordem política.”
64
A imprensa argentina noticiou a nomeação do novo Ministro das Relações Exteriores,
no La Prensa, a notícia era de que o Ministro Lauro Müller participava da política interna
desde a época da Monarquia. El engeniero Muller tenido vasta actuación en su patria y
ha prestado servicios de importancia. Se le considera uno de los políticos más preparados y
de mayor iniciativa.”
65
O La Razón, noticiou que o novo ministro, Lauro Müller, é um
cidadão dotado de qualidades mesmo não sendo um diplomata de carreira. “Pero, por la
circunstancia misma de no pertenecer á la esculea de diplomáticos de Itamaraty, cabe esperar
quien respondiendo á la dificil misión de escusar su carácter se sucesor del gran canciller.”
66
Também o La Nación declarou votos desejando um bom mandato para Lauro Müller.
Depois da posse como Ministro das Relações Exteriores e apresentação ao pessoal da
sua secretaria Lauro Müller proferiu: “Sei que a Secretaria é uma tradição de honra,
patriotismo e capacidade. Conto, portanto, com ela para diminuir, pelo nosso trabalho, quanto
possível, a falta, do grande homem que o Brasil acaba de perder.”
67
Percebe-se que Lauro
Müller, como Ministro, é um exemplo a ser seguido, um mito político em seu estado natal.
62
O Dia. 16/02/1912.
63
O Dia. 23/02/1912.
64
O Dia. 23/02/1912.
65
La Prensa. Nuevo Ministro de Relaciones Exteriores del Brasil. Buenos Aires. 12/02/1912.
66
La Razón. Dr. Lauro Muller, sucesor del Barón de Río Branco. Buenos Aires. 14/02/1912.
67
La Razón. 14/02/1912.
31
“Apóstolo da paz continental, devotado ao pan-americanismo, como a condição
essencial da grandeza e da força do Novo Mundo, o dr. Lauro Müller rumou para
esses horizontes a nossa política internacional, restituindo ao Brasil o antigo
prestígio, readquirido não a golpes de força, mas a golpes de sabedoria.”
68
Logo após a nomeação de Lauro Müller para o Ministério das Relações Exteriores, O
Dia, edita um artigo com o título, O Novo Ministro dos Negócios Estrangeiros do Brasil,
declarando que a escolha do sucessor de Rio Branco, pelo então presidente Hermes da
Fonseca não se baseou em diplomatas de carreira, sendo que Lauro Müller manterá as
tradições políticas do Brasil, pois ele demonstrou seu valor como parlamentar e como
administrador. “Homem de grande talento e de grande atividade. É mesmo um dos homens
públicos mais em evidência e um candidato certo a presidência da república num futuro
próximo.”
69
Segundo os editais do jornal O Dia, foram vários os telegramas de congratulações pela
nomeação de Lauro Müller, para Ministro das Relações Exteriores, vindos de todas as partes
do país e até mesmo de algumas capitais do Continente Americano, onde a situação
prestigiosa alcançada pelo Brasil, na gestão de Rio Branco, não estava esquecida.
Nos jornais catarinenses pesquisados percebe-se a insistência de fazer com que Lauro
Müller seja sempre lembrado, quando tecem grandes elogios, dignificam seu nome e rendem
gloriosas congratulações à ele, bem como engrandecem-no como uma brilhante escolha para
Ministro. Sua atuação política, nos cargos públicos a que foi eleito ou nomeado, sempre foi de
engrandecimento à pátria e que muito enobreceu e elevou o estado de Santa Catarina. Nas
concepções da imprensa catarinense, principalmente em O Dia, Lauro Müller era um estadista
muito querido e admirado nas principais camadas sociais e políticas dentro e fora do país:
É que o peso das responsabilidades da chancelaria que Rio Branco tanto enobreceu
e levou só podia ser suportado com firmeza por um estadista da envergadura
máscula de como Lauro Müller, que, no seio do povo brasileiro já adquiriu títulos
de alta e indestrutível benemerência.
70
68
O Dia. 05/05/1917.
69
O Dia. 24/03/1912.
70
O Dia. 14/02/1912.
32
No mesmo jornal, encontra-se adjetivos elogiosos para o político Lauro Müller:
ilustre, eminente estadista, administrador incansável e dedicado, político abnegado e
patriótico, parlamentar hábil e invencível, destacando “seu extraordinário preparo intelectual,
as suas raras qualidades de estadista, o seu longo descortino e a sua segura visão, tonificada
nos profundos ensinamentos que recolheu de sua viagem ao velho mundo.”
71
Ainda em 1913, O Dia, declarou que coube a Lauro Müller a glória de substituir na
chancelaria brasileira o homem ilustre que foi o Ministro Barão do Rio Branco.
Quando ocorreu o falecimento do integralisador do território nacional, na amargura
do primeiro momento dizia-se que não nhamos um homem para substituí-lo
naquele alto posto, tão assinalado pelas luzes do seu espírito e do seu patriotismo na
política continental e mesmo no mundo europeu.
72
Assim sendo quando conhecida a nomeação de Lauro Müller, a nação teve certeza que
suas relações internacionais e os seus interesses encontraram segura garantia de defesa na
capacidade do novo Ministro catarinense. “Na questão do café com os Estados Unidos
acabamos de ser vitoriosos e a própria imprensa yanke atribui essa vitória à pertinente ação da
chancelaria brasileira.”
73
Assim, o Ministro Lauro Müller poderia resolver todos os problemas
da melhor forma possível, pois seus atos políticos estariam focados na solução da política
externa brasileira.
Lauro Müller, como Ministro das Relações Exteriores, acabou sendo a melhor escolha
para o Partido Republicano Catarinense que aproveitou a oportunidade para engrandecer sua
política, seu nome e os seus feitos, como um catarinense, que chegou a um posto tão alto no
comando federal e que nada poderá atrapalhar a continuação da política do Barão do Rio
Branco:
O honrado Sr. Presidente da República não poderia ter sido melhor inspirado, na
dolorosa e difícil contingência de substituir o extraordinário e inigualável brasileiro
que acaba de ser roubado à Pátria. A obra de Rio Branco precisa ser continuada.
Não pode sofrer solução de continuidade a construção do edifício nacional, a que se
entregará ininterruptamente o glorioso patriota. Prosseguir nessa obra, com a
segurança e a precisão do grande chanceler, nesta hora pranteado pela Nação inteira
71
O Dia. 28/04/1912.
72
O Dia. 23/05/1913.
73
O Dia. 23/05/1913.
33
será superior às forças de qualquer outro brasileiro. Mas com as qualidades do sr.
Lauro Müller essa grandiosa obra não será atalhada.
74
Logo no início de sua gestão como Ministro das Relações Exteriores, seu nome foi
lembrado como candidato à presidência do Brasil, o ex-presidente brasileiro Campos Salles,
concedeu uma entrevista ao correspondente do jornal A Noite, afirmando que existiam três
candidatos à presidência da República, sendo eles: Rui Barbosa, Rodrigues Alves e Lauro
Müller. “Diz que Ruy está incompatível com os elementos dirigentes, Rodrigues Alves
impossibilitado por motivos de idade e moléstia restando Lauro Müller que seria ótimo
candidato.”
75
Também no dia 21 de maio de 1913, em um telegrama enviado do Rio de
Janeiro declarações de que Lauro Müller é um dos candidatos à presidência. “Corre nas
rodas políticas que está assentada a candidatura do Sr. Lauro Müller para a presidência da
República sendo a mesma patrocinada por Minas e São Paulo.”
76
Percebe-se aqui que a
candidatura de Lauro Müller estaria em conformidade com a política vigente no país, a
política do Café-com-Leite, que norteou a maior parte da política da República Velha.
Essa suposta candidatura de Lauro Müller fortificou o seu nome dentro da política
nacional, mitificando cada vez mais sua influência na política catarinense,; essa mitificação
pode ser entendida como uma base política de apoio para os seus correligionários. Assim,
para Everaldo Rocha, o mito pertence à humanidade e aparece através do discurso que se dá a
conhecer, ou seja, pela palavra. Essa palavra pode estar inserida no mito que é um enigma e
um desafio, mas que não possui definições certas, nem verdades eternas, entende-se que é
uma construção idealizada. “Ele de ser sempre desafio, abertura, enigma. É livre e sábio o
suficiente para não temer a morte, não se deixa escravizar por conceitos que o obriguem a ser
isso ou aquilo.”
77
A imprensa argentina imprimia grandes elogios, tratando-o como um verdadeiro
amigo e como Ministro apostavam no sucesso de Lauro Müller como sucessor do Barão do
Rio Branco. Os jornalistas que estiveram no Brasil para visitar o Ministro das Relações
Exteriores, declararam que “Los sentimientos de sucesor del inolvidable Rio Branco para com
nuestro país son francamente amistosos sin ambajes ni reservas.”
78
74
O Dia. 29/02/1912.
75
A Noite, citado pelo O Dia. 04/04/1913.
76
O Dia. 21/05/1913.
77
ROCHA, Everaldo. O que é mito. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 16.
78
El Diário. Os periadistas argentinos en el Brasil. Uma visita al canciller Lauro Muller. Buenos Aires,
22/12/1913.
34
A boa formação que Lauro Müller recebeu em escolas superiores brasileiras e
francesas era ressaltada. Assim, declarou O Dia: “O que dele se poderia dizer com exatidão é
que é alemão por sangue, francês por espírito e brasileiro pelo coração e na alma, isto é, que é
verdadeiramente o que um americano do sul pode e deve ser o representante no Novo Mundo
da cultura do Velho Mundo.”
79
Brazílio Celestino Oliveira, em discurso na Maçonaria,
enaltecendo o ex-ministro destacava que:
[...] o seu espírito esteve sempre profundamente vinculado aos nobres ideais
republicanos, e até o dia de sua morte Lauro Müller foi, discretamente, sem
ostentação, o maçom perfeito, inteiramente voltado ao bem da Pátria, que tanto
engrandeceu, e da Humanidade, a que serviu com tanta generosidade.
80
Quando Lauro Müller, como Ministro das Relações Exteriores, visitou os Estados
Unidos, o Secretário de Estado norte-americano, Willian Jennins Bryan, em sua manifestação
afirmou “que muito conhecia a fama da sua argúcia e perspicácia dando-se por feliz por
poder pessoalmente tratar com um dos hábeis políticos e finos diplomatas da América.”
81
Em banquete oferecido pela Associação Pan-americana o embaixador Loyd Griscom
discursou lembrando o nome do Barão do Rio Branco e que também seria uma dificuldade
insuperável dar-lhe um sucessor:
Entretanto para se aquilatar o valor do Ministro que os Estados Unidos hoje
hospedam basta dizer que foi o Dr. Lauro Müller o escolhido para substituir o
grande chanceler e isso uma idéia de sua mentalidade e de sua capacidade de
homem do futuro já se cogitando do seu nome para a sucessão presidencial.
82
Por ocasião no aniversário de Lauro Müller, o jornal O Dia, aproveitava para enaltecer
o brio do Ministro. Assim foi em 1914: “Faz anos hoje o eminente Sr. General Lauro Müller.
O aniversário de um homem de estatura moral do proclamado patrício o pode deixar de ter
79
O Dia. 23/04/1912.
80
OLIVEIRA, Brazílio Celestino. Lauro Müller. Uma Gloriosa Figura da República. Florianópolis: Grande
Oriente de Florianópolis, IHGSC, 1957, p. 12.
81
O Dia. 15/06/1913.
82
O Dia. 20/06/1913.
35
a mais larga repercussão fora das alegrias do seu venturoso lar, desde que S. Exa. é um nome
nacional, a obra da sua grandeza e da sua glória.”
83
No ano seguinte, os editais de O Dia, elogiam a capacidade e a nobreza do Brasil em
permanecer na neutralidade diante dos acontecimentos da Primeira Guerra Mundial,
esperando que os outros países o imitem nessa decisão, parabenizando o Ministro das
Relações Exteriores. “Todos os corações voltam-se para Deus pedindo o prolongamento de
tão preciosa existência, da qual a Pátria espera importantes e novos alentos, quando outros
postos de maior destaque lhe forem confiados.”
84
E continua declarando como órgão oficial
do Partido Republicano Catarinense que jamais deixou de seguir os ensinamentos de Lauro
Müller: “Reitera os cumprimentos que dirigiu ao eminente catarinense, e ao notável brasileiro
que deixou de ser uma glória de sua terra para ser uma glória da América Latina.”
85
Na
idealização do mito político a imprensa catarinense estampou novos elogios e declarações de
afeto e de amizade à Lauro Müller, bem como, os agradecimentos do estado de Santa Catarina
pelo ilustre político que sempre defendeu sua Pátria.
Como administrador e como representante do nosso estado na Câmara e no Senado,
a sua ação inteligente e decidida, sem solução de continuidade, sem desfalecimento,
foi sempre em prol do nosso progresso, de modo que podemos dignamente ocupar
um lugar de destaque na Federação brasileira.
86
No ano de 1916, o Ministro das Relações Exteriores, Lauro Müller, tirou seis meses de
licença viajando para os Estados Unidos, pela segunda vez em sua gestão, para tratamento de
saúde. Na opinião do jornal O Dia, sua saída poderia ser definitiva caso houvesse um nome
forte que o substituísse e continuou declarando que a pasta do Exterior é um dos mais
importantes departamentos da administração pública, assim exigindo sacrifícios pela
complexidade do momento político e econômico.
Espírito altamente patriótico, cercado da confiança ilimitada do chefe da Nação e
prestigiado por todos os elementos políticos do país, que nele, no nosso glorioso
patrício, vêm (sic) o digno continuador do grande Barão do Rio Branco, a sua
83
O Dia. 08/11/1914.
84
O Dia. 09/11/1915.
85
O Dia. 09/11/1915.
86
O Dia. 09/11/1915.
36
retirada temporária do ministério, não importa o menor resquício de diminuição de
seu imenso prestígio, assegurado pela sua passagem através da alta administração do
país, onde soube, por uma série ininterrupta de serviços engrandecer o Brasil e
elevar bem alto o seu nome individual, que muito transpôs, como figura mundial
que é, as fronteiras do país.
87
Assim, a sua saída temporária do Ministério não diminuía o seu prestígio como
político de renome nacional e internacional; Lauro Müller como um patriota exemplar
estava se afastando do serviço por motivo de saúde:
Lauro Müller é um dos mais belos patriotas do Brasil.
Eminentemente culto, espírito dotado de alto descortino, alma ardente de patriota, o
nosso venerado conterrâneo ao deixar, provisoriamente, a pasta do exterior, faltou
exclusivamente por motivos de saúde, pois pelo seu nome, pela sua competência,
tantas vezes comprovada, pelos seus relevantes serviços prestados ao país,
ninguém, jamais, mereceu mais confiança do que ele por parte do honrado Sr.
Presidente da República.
88
Numa sessão solene do Clube Militar no Rio de Janeiro, Paulo Frontin, teceu elogios
ao Ministro Lauro Müller, quando da sua volta da visita aos Estados Unidos. Segundo O Dia:
“O Dr. Frontin terminou proclamando o Dr. Lauro Müller o apóstolo máximo da nossa
nacionalidade e defensor dos mais sagrados direitos do povo brasileiro.”
89
Aqui, percebe-se
que a imprensa catarinense continua dando ênfase ao mito político do defensor da
nacionalidade brasileira.
No dia 05 de maio de 1917, Lauro Müller ainda não tinha dado os motivos que o
levaram a desistir do cargo de Ministro no Ministério das Relações Exteriores para os
correligionários do seu Partido em Santa Catarina. Estes contestam a sua saída dignificando-o
como figura proeminente e declarando que foi atacado por conspiradores:
O Sr. General Lauro Müller deixou anteontem o alto posto de chefe da chancelaria
brasileira. Simples expectadores dos acontecimentos distanciados do teatro onde eles
se operam e se desenrolam na variante de todos os dias, não conhecemos ainda os
motivos que levaram o eminente servidor da república e da Pátria a manifestar ao
chefe da Nação o seu irrevogável desejo de exonerar-se do cargo que tanto
dignificou. [...] Lauro Müller lançou-se com a sua mocidade e a sua no seio dos
87
O Dia, 03/05/1916.
88
O Dia, 03/05/1916.
89
O Dia. 19/10/1916.
37
conspiradores que realizaram a formada memorável da República. E nunca mais o
seu nome deixou de figurar na História das instituições.
90
Percebe-se que o mito político de Lauro Müller permeou por muito tempo os editais de
vários jornais, sendo que a imprensa foi a continuadora mitológica dessa personalidade.
Assim, durante a sua gestão na política externa e administração do Ministério das Relações
Exteriores, ocorreram desconfianças de alguns políticos que tinham receios referentes à sua
política, principalmente durante a Primeira Guerra Mundial. Questionando-se: o Ministro
Lauro Müller ficaria a favor do Brasil ou seria influenciado pela sua descendência alemã?
Para O Dia, o medo demonstrado por alguns políticos brasileiros em relação à integridade
política e moral do Ministro não tinha precedentes, assim declarou: “O advento de uma
política germanófila, pelo simples fato de serem seus pré-alemães e de serem particularmente
numerosas e prósperas as colônias alemães no seu estado natal de Santa Catarina.”
91
Apesar
de grande número de alemães nos estados do Sul do Brasil, outros países também haviam
recebidos imigrantes alemães, tais como: os Estados Unidos e a Argentina.
No mesmo jornal, ocorreu a defesa de Lauro Müller, que nos últimos meses de sua
permanência no Ministério das Relações Exteriores colocaram a prova a pureza do seu
patriotismo e da sua obediência ao seu país. Assim, para o jornal, ele encarou com serenidade
os ataques dos políticos internos elevando o seu olhar para a política naval da Alemanha,
defendendo a concepção dos direitos e dos deveres da neutralidade do Governo Brasileiro.
O La Nación demonstrou a credibilidade de Lauro Müller como um verdadeiro
patriota e tinha o ex-Ministro como um nobre e sincero amigo e comparando-o aos fortes
homens da Roma Republicana. “Müller tiene la frialdad tenaz de aquellos prohombres de
Roma, de la Roma republicana, inexorables y duros para com todos y para consigo mismo,
que labraron la grandeza de su patria y lanzaron las bases del ‘imperium’.”
92
No jornal Idea Nacional, percebe-se a declaração de que a descendência de Lauro
Müller em momentos tão críticos para o Brasil e o mundo inspiraram em alguns políticos
uma inquietude. Mesmo assim, não foram ignorados os trabalhos e obras do mais alto
patriotismo que em benefício de seu país ele realizou e que possivelmente continuaria
realizando caso não tivesse sido obrigado a renunciar.
90
O Dia. 05/05/1917.
91
O Dia. 23/04/1912.
92
La Nación. 04/05/1917
38
La personalidade de este insigne internacionalista es bien conocida entre nosotros
por haber el pueblo argentino tenido la oportunidad de conocerle y ovacionarle.
[...] Cuidadoso experimentado y político sagaz, el doctor Lauro Müller ha
conquistado en su patria y fuera de ella laureles merecidos.
93
Nos jornais mencionados ocorreu uma suposta valorização do homem que foi Lauro
Müller, defendendo-o, elogiando-o e acima de tudo tratando-o como um verdadeiro mito
político. Além dos adjetivos tem as comparações com o Barão do Rio Branco e com heróis
romanos, bem como foi classificado como o maior político representante do estado de Santa
Catarina.
Na construção do mito político, a imprensa no início do século XX, principalmente a
partidária, foi a responsável pela base ideológica da mitificação do herói patriótico
reconhecido e adorado internacionalmente, sendo assim, Lauro Müller era indispensável para
a política interna e externa do país. Segundo os jornais ele era carismático, tinha grande
prestígio perante alguns políticos e era um homem de confiança para o governo brasileiro.
Percebe-se, na criação do mito, que os elogios engrandecendo as qualidades do
político e nas declarações da imprensa foram efetuadas para engrandecer o mito heróico-
político, de Lauro Müller, onde os seus atributos, sempre adequados, elevaram o seu nome
aos cargos públicos de grande prestígio a que foi nomeado e/ou eleito.
No âmbito estadual, a competência política de Lauro Müller esteve vinculada na forma
como articulava os nomes dos candidatos do seu estado, mesmo não estando presente nas
reuniões do Partido Republicano Catarinense, possuía representatividade política.
perdendo sua hegemonia a partir de 1920.
2.3 Um Homem de Estado
Com a República, ocorreu a mudança de poder na política brasileira. “Ao
descentralizar o poder através da estrutura federativa, a república deu um peso substancial às
oligarquias locais.”
94
Assim, na Velha República (1889-1930), a economia brasileira esteve
93
Idea Nacional. Nilo Peçanha – Nuevo Canciller Brasileño. Buenos Aires, 04/05/1917.
94
SANTOS, Norma Breda dos. A Política Exterior da Velha República (1889-1930). Revista de Informação
Legislativa, Brasília, ano 28, nº 111, Jul./Set. 1991, p. 255.
39
voltada para uma produção extensiva e em larga escala de matérias primas e gêneros tropicais
destinadas à exportação. Vários fatores contribuíram para isto:
- externamente, o desenvolvimento do comércio internacional, o crescimento da
população européia e norte-americana, a elevação do nível de vida, o aperfeiçoamento
tecnológico com a industrialização;
- internamente, a abolição da escravidão e a vinda de imigrantes juntamente com a
entrada de capital estrangeiro no país que financiaram estradas de ferro, empresas de
mineração, linhas de navegação e os grandes bancos estrangeiros que estabeleceram
filiais no país, proporcionaram um movimento da economia brasileira e o aumento
das exportações.
Para Norma Breda dos Santos, as condições internas de um Estado influenciaram na
sua política externa, aumentando assim a complexidade do entendimento das relações
internacionais. “A extensa pauta internacional, na qual há crescente confluência entre o
endógeno e o exógeno, aconselha prudência ao analista que busca modelos explicativos para
os processos decisórios.”
95
Para Irineu Streger, os Estados são atores de enorme preponderância no cenário
internacional, assim necessitam intercambiar. A soberania e a igualdade deles são
reconhecidas como princípios fundamentais das relações internacionais. “O Estado é ator que
possui personalidade jurídica. [...] Todos os Estados são juridicamente iguais e soberanos;
todos têm os mesmos direitos e os mesmos deveres fundamentais.”
96
O Estado mantêm
relações intercambiais e obrigações recíprocas nas relações internacionais que são as
atividades desenvolvidas para uma melhor convivência das nações. “Os Estados são
chamados a ter entre si relações constantes. Eles o fazem, por intermédio de órgãos
qualificados para exprimir sua vontade e agir em seu nome. [...] ao ministro das Relações
Exteriores, no escalão central, cabe assegurar as relações internacionais do Estado.”
97
Também para Leonardo Carvalho, a interdependência entre os atores acaba
desencadeando movimentos que geram conseqüências no ambiente internacional. “A noção
de Estado como ator nas relações internacionais é fundada com base num modelo clássico que
95
SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva. Op. cit., p 98.
96
STREGER, Irineu. Relações Internacionais. São Paulo: LTr, 1998, p 100.
97
STREGER, Irineu. Op. cit., p 90.
40
o entende como uma organização dotada de condição legítima para atuar no espaço
internacional.”
98
O Estado, na visão de Max Weber, demonstra o seu poder perante seus cidadãos. “O
Estado consiste em uma relação de dominação do homem sobre o homem [...] O Estado
pode existir, portanto sob a condição de que os homens dominados se submetam à autoridade
continuamente reivindicada pelos dominadores.”
99
A luta pela hegemonia de um Estado perante outros pode ser considerada como
ilegítima por alguns governantes, mas para outros é natural que um Estado mais forte política
e economicamente comande os demais. Nas relações internacionais, os Estados são atores
com o poder de restringir o direito de outros com quem mantém relações diplomáticas.
Os Estados são atores manifestos do sistema internacional. Até são atores
privilegiados, graças à situação eminente que o direito internacional em vigor lhes
concede: o Estado é a única entidade que, após sua existência ter sido reconhecido
pelos outros Estados, beneficie da plenitude das competências outorgadas aos
sujeitos de direito internacional: direito de legislar, direito de tratar, direito de
guerra, direito de intentar ão judicial. Mas o Estado também é a sede principal da
potência e do poder de coerção que podem ser empregados tanto em relação a seus
próprios sujeitos quanto em relação aos outros Estados.
100
Para Deutsch, o estudo das relações internacionais deve considerar os meios que temos
para compreender os acontecimentos internacionais, sendo eles positivos ou negativos. “O
conhecimento nos revela quais de nossos valores tendem a conflitar-se e onde e em que
momento os meios de que dispomos começam a prejudicar, a destruir nossos objetivos, ao
invés de ajudar-nos a alcançá-los.”
101
Segundo Seitenfus, “a atuação externa dos Estados e dos outros atores internacionais
não pode ser compreendida sem a devida análise das condições internas que a motivam.”
102
Para José Honório Rodrigues, o Estado atuará na política exterior conforme o que for de
interesse de sua política interna. “E, como as políticas nacionais são sistemas de estratégia
empregados pelos estados para garantir principalmente sua segurança territorial, e para
proporcionar o bem-estar econômico e a prosperidade a seus cidadãos, não se pode fazer uma
98
CARVALHO, Leonardo Arquimimo de. Introdução ao estudo das relações internacionais. Porto Alegre:
Síntese, 2003, p 37.
99
WEBER, Max. Ciência e Política. São Paulo: Editora Cultrix, 1967, p 55.
100
MERLE, Marcel. Sociologia das Relações Internacionais. Brasília. Universidade de Brasília, 1981, p 215.
101
DEUTSCH, Karl Wolfang. Análise das Relações Internacionais. 2
a
ed. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 1982, p 06.
102
SEITENFUS, Ricardo Antonio Silva. Op. cit., p 03.
41
distinção entre política externa e interna.”
103
Também para Seitenfus, o interesse nacional é
que denomina a atuação internacional de um Estado. “É necessário avaliar como a decisão
externa deverá ser aplicada internamente, [...] os compromissos assumidos com o exterior
possuem repercussões internas.”
104
Em função das determinações internas, alguns agentes acabam se destacando na
tomada de decisões nas relações internacionais. Estes agentes colocam as suas convicções à
serviço dos atores presentes no âmbito internacional, sejam Estados, organizações não-
governamentais, entre outros. Num dos estudos clássicos das relações internacionais,
Renouvin & Duroselle destacavam: “Estudar as relações internacionais sem levar em alta
linha de conta concepções pessoais, métodos, relações sentimentais do homem de Estado, é
negligenciar um fator importante, às vezes essencial.”
105
Os mesmos autores lembram que nas
relações internacionais a atuação do homem de Estado é considerável. “Porque, finalmente,
ele desempenha um papel pessoal na opção entre aspirações territoriais ambiciosas – e,
portanto, riscos a correr e atitude de satisfação, mesmo se, neste domínio, lhe for necessário
lutar contra as forças mais ‘chauvinistas’, mais ‘ultranacionalistas’ de opinião.”
106
Alguns Homens de Estado praticam a prudência e a precaução perante a política
externa de seu país, sem desvincular-se da política interna, este poderá imprimir uma política
mais conciliadora. Assim, entende-se que Lauro Müller, foi um Homem de Estado.
Sobre os homens de Estado se exercem forças que ele padece ou procura dominar.
Toda via a ação dessas forças não se situa unicamente num âmbito de causalidade.
Geralmente não basta para explicar as relações internacionais e, aliás, a política
interna, também, examinar as causas, isto é, as forças atuantes, e as
conseqüências.
107
Como o Estado é um ator privilegiado no cenário internacional, o ministro é o agente
que representa o Estado. “Entre os diferentes meios e fórmulas para relacionar-se com o
exterior, sobressai um agente indispensável para o Estado: o diplomata, representante do
103
RODRIGUES, JoHonório. Uma história diplomática do Brasil. 1531-1945. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1995, p 27.
104
SEITENFUS, Ricardo Antonio Silva. Op. cit., p 03
105
RENOUVIN, Pierre. & DUROSELLE, Jean-Baptiste. Introdução à História das Relações Internacionais.
São Paulo: DIFEL, 1967, p 06.
106
RENOUVIN, Pierre. & DUROSELLE, Jean-Baptiste. Op. cit., p 44.
107
Id., p 334.
42
Estado e, ao mesmo tempo, instrumento de ligação entre os seus objetivos externos e a
realidade internacional.”
108
No âmbito da política externa brasileira a presença de Lauro Müller na condução
do Ministério das Relações Exteriores, foi analisada por alguns autores. Moniz Bandeira,
para quem Lauro Müller em relação aos Estados Unidos, logo, manifestou o seu espírito de
subserviência.
109
Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno afirmam que Lauro Müller, bem
como os Ministros que o sucederam, promoveram um alinhamento automático e uma amizade
irrestrita, assim colocando o Brasil no bloco de poder liderado pelos Estados Unidos.
110
Para
Delgado Carvalho, foi Lauro Müller o primeiro que iniciou as visitas de chanceler brasileiro a
países estrangeiros.
111
Para Barreto Filho, Lauro Müller continuou a política americanista e
viajou duas vezes para os Estados Unidos, a primeira em 1913 e depois em 1916.
112
Para
Clodoaldo Bueno, a política de aproximação do Brasil com os Estados Unidos deixou as
potências européias com a impressão, não desfeita por Müller, de que o país voltava-se mais
para os Estados Unidos do que para elas. O mesmo autor cita Oliveira Lima que declarou que
Müller vacilava para deliberar na política externa.
113
Para José Honório Rodrigues, a
periodização da História Diplomática do Brasil estaria dividida em fases extrovertidas e
introvertidas. Depois da morte do Barão do Rio Branco, o Brasil, entraria numa fase de
introversão que ocorreu de 1912 à 1917, cinco anos, durante a gestão de Lauro Müller.
Segundo Rodrigues essa introversão é denominada como um período político e diplomático
que limitou-se a manter a posição conquistada pelo Brasil com o ministro Rio Branco. Essa
fase modificou-se a partir da Primeira Guerra Mundial.
114
Para Walter Piazza, Lauro Müller, como estadista, iniciou sua tarefa na presidência de
Hermes da Fonseca e se prolongou até a presidência de Wenceslau Brás, mas que não
conseguiu se manter no cargo de representante da coletividade nacional.
115
Num pequeno
ensaio biográfico sobre Lauro Müller, Marcos Konder afirma que o Ministro brasileiro
108
SEITENFUS, Ricardo Antonio Silva. Op. cit., p 102.
109
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Presença dos Estados Unidos no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1978, p 187.
110
CERVO, Amado Luiz e BUENO, Clodoaldo. História da Política Exterior do Brasil. São Paulo: Ática,
1992, p 182.
111
CARVALHO, Delgado de. História Diplomática do Brasil. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1959, p 261.
112
BARRETO FILHO, Fernando P. Melo. Op. cit., p 32.
113
BUENO, Clodoaldo. Política Externa da Primeira República: os anos de apogeu (1902
a 1918). São
Paulo: Paz e Terra. 2003, p 366.
114
RODRIGUES, José Honório. Op. cit., 1995, p 45.
115
PIAZZA, Walter Fernando. Santa Catarina. Florianópolis: Ed. da UFSC. Ed. Lunardelli, 1983, p 487.
43
procurou aproximar o Brasil da Argentina, espantando as nuvens negras e sinistras que se
haviam acumulado e foi festejado como o Apóstolo da Solidariedade Sul-americana.
116
O novo Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Lauro Müller, assumiu o cargo no
Itamaraty impregnado com o sentimento americanista. Já no primeiro Relatório que redige
isto fica claro: “A sinceridade da política que o Brasil tem procurado seguir sempre de
estreitar cada vez mais solidamente os laços que felizmente nos ligam à grande república do
Prata como a todos os povos irmãos do Continente.”
117
Segundo Clodoaldo Bueno, as relações entre o Brasil e a Argentina foram de
cordialidade e demonstravam um tom de amizade por parte do ministro. “Lauro Müller, sem
qualquer plano ou estratégia, procuraria desempenhar o papel de conciliador, de quem evita
divergir, concordando sempre e cultivando amizades, com todos se possível.”
118
Também
para Francisco Doratioto, Lauro Müller, manteve a política de aceitar a ascendência da
Argentina sobre o Paraguai, mas não em superioridade ao Brasil. “A Argentina não era,
porém motivo de preocupação para a Chancelaria brasileira. Ao contrário, em demonstação
do nível de excelência nas relações entre o Rio de Janeiro e Buenos Aires, [...] assinaram um
acordo para a solução pacífica de controvérsias.”
119
Após sua entrada no Ministério das Relações Exteriores, Lauro Müller concedeu
entrevista aos jornais argentinos, La Nación e La Razón brasileiro e argentino, destacando
que os dois países estavam destinados à estreitar seus vínculos de amizade e os interesses
nacionais deveriam estar acima das idéias e aspirações individuais. Segundo La Razón, La
política, sobre o bom relacionamento brasileña no procede á saltos, ni se modifica según los
sentimientos personales. Es el resultado de uma tradición fortalecida y prestigiada por el
respeto de que se le há rodeada em todos los tiempos.
120
La Nación, ressalta que o Ministro chegou ao cargo de representante da política
externa por seus próprios méritos, por sua virtude e pelo seu prestígio reconhecido pelos
governos do Brasil. Lauro Müller declarou que partilhava dos ideais de um regime
republicano desde garoto. Sendo assim, a manutenção da república seria ideal para os dois
países e a política de amizade deveria ser sempre praticada por todos os países sul-
116
KONDER, Marcos. Op. cit., 1926, p 48.
117
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de maio de 1912 a 17 de maio de
1913. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1913, p VII.
118
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 383.
119
DORATIOTO, Francisco Fernando Monteoliva. As Relações entre o Brasil e o Paraguai (1889-1930): do
Afastamento Pragmático à Reaproximação Cautelosa. Tomo II. Tese de Doutorado. Universidade de
Brasília, 1997, p 328.
120
La Razón. 07/03/1912.
44
americanos. Tanto o Brasil como a Argentina possuem extensos territórios e estão fadados ao
crescimento e ao desenvolvimento.
Han desaparecido hace mucho tiempo todas las cuestiones que hubieran podido
implicar una desavenencia, digo mal, una discusión entre estas naciones tan
estrechamento vinculadas por múltiples lazos. Desde niño he militado en el partido
republicano, y la bandera de este partido, asi como uno de los mejores argumentos
en que fandaba su programa la necesidad de hacer la república era, precisamente,
la política de acercamiento con los demás países sud-americanos, pues
considerábamos que la desaparición de un régimen distinto facilitaria naturalmente
nuestra vinculación y nuestra unión con las demás naciones del continente. La
República Argentina y la nuestra tienen enormes extensiones de territorio cuya
población tratamos unos y otros de acrescentar, como el medio mas eficaz para el
gran desenvovimiento a que estamos destinados.
121
Lauro Müller, externou que os dois países tem o mesmo regime político e as duas
nações poderiam marchar com os mesmos ideais e propósitos idênticos de união política e
comercial.
Tenemos el mismo régimen, marchamos hacia los mismo ideales y acariciando
idénticos propósitos. Y en cambio tenemos todas las circunstancias a favor de esta
unión. [...] Se puede amar sin ser correspondido, pero e a verdadera amistad se
funda en la mutua correspondencia.
122
Continuou, declarando que, a sua diplomacia é a da verdade e sem receios pela paz
que o continente está vivendo e é preciso aumentar os sentimentos de amizade que ligam os
dois países para que estes possam ser realmente grandes e fortes.
[...] Mi diplomacia es la verdad, la verdad sin preocupaciones recelosas. [...]
Tenemos con la Argentina los mismos idénticos problemas y propósitos. Todos los
países del continente están en paz absoluta. Aprovechemos el momento para
acentuarla, aumentandola hasta la fraternidad que debe ligarnos indisolublemente,
ya que ése será el mejor medio de que seamos realmente grandes y fuertes
.
123
Como para comprovar a veracidade das palavras de Lauro Müller, no La Nación,
o General Julio Roca declarou que o Brasil sempre buscou uma união amigável com a
121
La Nación. 22/08/1912.
122
La Nación. 22/08/1912.
123
La Nación. 22/08/1912.
45
Argentina, endossando as declarações do Ministro, ressaltou que se houve asperezas
diplomáticas, estas já se dissiparam e os dois países jovens precisavam agir juntos para
poderem desenvolver-se:
El Brasil está sinceramente entregado a la cordialidad más efectiva com nosostros.
Busca definir por siempre su política internacional com nuestro país em estrecha
unión fraternal. Las asperezas diplomáticas que hayan podido existir han
desaparecido y se transparenta um acendrado espíritu de concordia. [...] Estos
países jóvenes necesitan de una acción conjunta e eficaz para su propio
desenvolvimiento
.
124
Tanto para Müller como para Roca, as relações diplomáticas entre o Brasil e
Argentina, estavam alicerçadas na amizade e na igualdade econômica entre os dois países e
assim seria a hora de reforçar os laços entre as duas nações vizinhas e amigas.
Na política de aproximação com os países do Cone Sul, durante a gestão do Ministro
Lauro Müller, foi assinado um Tratado internacional no Rio de Janeiro, entre o Brasil e o
Uruguai, modificando a fronteira relativa ao Arroio São Miguel, essa assinatura acorreu no
dia 07 de maio de 1913. Para facilitar as relações comerciais entre Brasil e a República
Oriental do Uruguai fez-se o convênio mútuo de tráfego de linhas férreas de Sant’Anna do
Livramento a Rivera em 15 de maio de 1913.
125
Durante os anos de 1913 e 1916
trabalhavam comissões brasileiras de demarcações das linhas divisórias do Brasil com alguns
países vizinhos. Entre o Brasil e o Uruguai, ocorreu também a demarcação de dez ilhas, sendo
que sete ficaram para o Brasil e três para o Uruguai.
126
O Ministro Müller comunicou ao
presidente do Brasil, Wenceslau Brás, a inauguração do marco em Aceguá o último da
fronteira com o vizinho Uruguai, e participou da inauguração desse marco divisório,
declarando que o país vizinho sempre foi admirado pela política externa de amizade que
sempre praticou com os países do Continente Americano.
O jornal, El Diário, aponta a viagem do Ministro, como um ponto positivo de sua
política de aproximação entre os países da América. Mas também no contexto mítico acabou
declarando que Lauro Müller é uma personalidade de primeira linha em seu país, um
124
La Nación. 24/08/1912.
125
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 a 03 de maio de
1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, p 22.
126
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 a 03 de maio de
1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, p 292 –295. Um ofício da Comissão Brasileira de Limites com
o Uruguai, sobre a conveniência de conservarem os moradores do Município de Santa Victória do Palmar o
direito, de longa data exercido de extrair areias para construções, fazendo os seus suprimentos, como até agora,
na Ilha Brasileira da Lagoa Mirim, situada na embocadura do Arroio Cebollaty, embora a mesma ilha tenha
passado ao domínio do Uruguai, em virtude do Tratado de 1909.
46
elemento de concórdia e de aproximação internacional, também é um alto espírito
americanista e um amigo incondicional do povo uruguaio. “El canciller Müller, completando
la obra del baron de Rio Branco, traeria á los uruguayos la reiteracion del cordial espíritu
brasileño á su respecto. Haria el ministro el viaje por terra siendo esperado en la frontera
oriental, en Rivera, por su colega el ministro Barbaroux”
127
No dia 16 de maio de 1915, o Ministro Lauro Müller, foi recepcionado na cidade
de Buenos Aires e no dia 18 esteve novamente no Uruguai, concedendo entrevista, onde
analisou as conseqüências econômicas que a Primeira Guerra Mundial ocasionará para o
Continente Americano e também da perturbação da paz nos países sul-americanos:
Conhecemos perfeitamente a situação financeira que atravessa a América, ao
rebentar a conflagração européia. Sabemos que em conseqüência da crise tremenda
que foi repercutir desastrosamente até nos Estados que se julgavam livres de
qualquer influência estranha, as principais repúblicas sul-americanas tiveram de
praticar extraordinários esforços para conter a avalanche acabrunhadora de
dificuldades na vida econômica, produzida pela cessação de crédito, pela restrição
na facilidade para sua obtenção, pela retirada de garantias para a atração de capitais,
e, como conseqüência dessa causa a diminuição das rendas públicas. Foi um
fenômeno de caráter geral que afetou tanto os interesses particulares como os
nacionais, deteve, de improviso, a marcha no desenvolvimento das energias sociais,
em suas múltiplas instituições e abriu um parênteses de expectativa e previsão à
espera da evolução reparadora. Nessa situação econômica apremiante rebentou a
conflagração européia. Não mais foi possível reação alguma e em face do choque
que ameaçava destruir toda a fonte de recursos preexistentes foi necessário adotar
medidas acauteladoras de conservação
.
128
Assim, em Montevidéu, Müller declarou ao jornal, O Estado: “As aclamações do
Brasil que tenho ouvido em todo território uruguaio que percorri e nesta formosa capital são
viva demonstração feita de quando pode uma política inspirada sem conservar a justiça
merecer de um povo culto e nobre e construtor o mais forte dos incentivos para a política de
justiça e confraternização entre os povos americanos.”
129
Essas declarações do ministro
seriam uma forma de selar os vínculos de amizade entre os dois países, que foram reforçadas
após a demarcação dos limites fluviais modificados pelo tratado brasileiro que concedeu ao
Uruguai a navegação do Rio Jaguarão e da Lagoa Mirim.
127
El Diário. Visita importante – Nuestro deber. Montevidéo. 10/01/1914, p 01.
128
O Estado. 18/05/1915.
129
O Estado. 19/05/1915.
47
Um Tratado de Extradição com o Uruguai, foi assinado em 27 de dezembro de 1916,
por Lauro Müller e Baltasar Brum, que em caso de crime em qualquer um dos territórios dos
dois países, os criminosos seriam extraditados para o seu país de origem.
Lauro Müller, como ministro das Relações Exteriores do Brasil, fez duas visitas aos
Estados Unidos, uma em 1913 e a outra em 1916. Na opinião do jornal La Gaceta de Buenos
Aires, a primeira viagem do ministro Müller seria para fortalecer a amizade e,
conseqüentemente, incrementar as relações comerciais entre o Brasil e a potência do norte.
Este viaje no es, por lo demás, sino uma demonstración más de la amistad de los países,
fundada en positivos intereses económicos que buscan desarrollarse más aún, y consolidada
por acercamientos políticos significativos como el intercambio de embajadas permanentes
130
Na primeira visita, Lauro Müller, foi recebido pelo Ministro do Exterior William
Jennings Bryan, pelos senadores Elihu Root, Theodoro Roosevelt e pelo embaixador
brasileiro Domício da Gama. Segundo O Dia, Müller, ao chegar ao porto passou para o iate
presidencial MayFlower, onde foi apresentado aos membros do governo americano. Sua
programação de viagem continuou por Chicago, São Luiz, Califórnia, Niagara e Nova Iorque.
A Câmara do Comércio de Nova Iorque ofereceu-lhe um banquete de 300 talheres: “O
banquete oferecido ao dr. Lauro Müller pela Câmara do Comércio d’ali constituiu uma nota
culminante entre todas as que lhe tem sido promovidas em sua honra, pois é a primeira vez
que a dita Câmara rende homenagens públicas a um estadista estrangeiro.”
131
Para o jornal
catarinense, a recepção à Lauro Müller foi honrosa. Na primeira visita sua recepção foi
estampada no jornal norte-americano The Washington Post, onde percebe-se a amizade entre
os dois países.
Figura 1 Caricatura da recepção do Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Lauro Müller, pelo
Ministro do Exterior William Jennings Bryan, nos Estados Unidos./ 58
Fonte: The Washington Post. Greet Brazil’s Envoy. Bryan and others welcome Dr. Müller at od Point.
11/06/1913
130
La Gaceta, La visita de un canciller. Buenos Aires, 26/05/1913, p 01
131
O Dia. 22/06/1913.
48
Setores da imprensa Argentina não viam com bons olhos a visita de Lauro Müller aos
Estados Unidos:
julgado la visita del canciller brasileño á los Estados Unidos com el espíritu de
viril y sincera amistad que le inspira la nación brasileña, y con sus juicios ha
coincidido el de la opinion sensata y tranquila del Brasil. [...] Ese viaje fué un error
diplomático inspirado por la política interna para incubar á su favor una
candidatura presidencial, como una reacción civil simpatica contra el
conglomerado militar que domina y domina por muchos años todavia los
destinos, del Brasil. [...] Ni consiguió mejorar las relaciones entre los dos Estados,
ni siquiera su comercio, pues las cifras del último año marcan un evidente retroceso
mientras que ascienden las de nuestro país
.
132
Para Humberto Corrêa, as relações cordiais e a amizade que o Brasil manteve com
outras nações na política externa, foram o reflexo da gestão do ministro Lauro Müller, que
132
La Prensa. 15/01/1914.
49
numa segunda visita ao país norte-americano fez pronunciamento, demonstrando a grandeza
do Brasil, e assim, tornando-se o primeiro mensageiro diplomata concretizador da amizade
dos dois países.
133
Após, a visita aos Estados Unidos, o Senado Brasileiro, na pessoa do Senador Mendes
de Almeida que foi um defensor do Ministro das Relações Exteriores, declarou que Lauro
Müller o é somente o portador das manifestações e do sentimento nacional brasileiro: ele
representa também o pensamento elevado e uníssono da América do Sul e tem nesse
propósito formal de garantir a paz e a confraternidade entre as nações do continente.
134
Assim
o Senado do Brasil enviou ao Senado Norte-americano um telegrama de agradecimentos pelas
homenagens prestadas pelo seu governo e pelo seu povo ao Ministro. Lauro Müller retribuiu a
recepção que teve nos Estados Unidos através de um baile de gala no Itamaraty.
Depois da conflagração da primeira Guerra Mundial dividiram-se as opiniões de todos
os povos neutros ou beligerantes, pois o seu andamento e, conseqüentemente, seu término,
influenciaria no futuro de todos os países do mundo. O Brasil manteve neutralidade rigorosa e
encontrou oposição dos que desejavam a participação brasileira na guerra. A manutenção da
neutralidade brasileira, defendida pelo Ministro Lauro Müller, acarretaram a sua renúncia, no
dia 02 de maio de 1917, por pressões da oposição ao Ministro e pelo fato de ser filho de
imigrantes alemães. Após o ataque de um submarino de guerra germânico ao navio ‘Paraná’ o
Brasil deveria escolher um dos dois lados envolvidos no conflito.
Lauro Müller foi um Homem de Estado, pois suas ações e práticas, na tomada de
decisões que envolviam a política internacional brasileira, evidenciavam concepções que
visavam justamente fortalecer o Estado Nacional Brasileiro.
Entre as múltiplas atividades de um homem político, responsável, a mais alta, a que
lhe justifica as funções, a que lhe realiza as ambições, é a decisão. Uma grande parte
de seu tempo é consumida em acolher visitantes, em receber opiniões e relatórios de
seus subordinados, em estudar documentos, em pronunciar discursos, em
desempenhar um papel de representação. Entretanto, isso tudo é secundário, em
relação à sua tarefa essencial, que é decidir
.
135
133
CORRÊA, Carlos Humberto. Op. cit., 1993, p 18.
134
Discurso de Mendes de Almeida. Anais do Senado. 1913. Vol. 3. Rio de Janeiro:Editora Nacional, 1916, p
77.
135
RENOUVIN, Pierre. & DUROSELLE, Jean-Baptiste. Op. cit., p 435.
50
Nos planos da política interna e externa estão ligados inevitavelmente os
interesses de certos políticos que exercem coações em benefício de poucos e prejudicando o
andamento da administração governamental do país. “Em inúmeros casos, uma pressão ligada
à política interna é que obriga o homem de Estado a renunciar aos seus grandes desígnios.”
136
Ainda o Homem de Estado é influenciado por alguns grupos políticos sendo eles de oposição
e até mesmo os da situação e também pela ação que sofre da opinião pública.
Uma pressão exercida pela opinião pública global, tentemos examinar a influência
que grupos particulares de opinião procuram exercer sobre os governos mediante
uma série de ações indiretas. As ‘campanhas de imprensa’ representam uma das
formas mais conhecidas da mencionada ação.
137
Para Walter Piazza, o Ministro Lauro Müller: “No Ministério das Relações Exteriores
realiza toda uma obra que o consagra estadista.”
138
Um dos empenhos de Lauro Müller como Ministro das Relações Exteriores consistiu
numa aproximação definitiva do Brasil com as nações do Continente Americano viabilizadas
pelas visitas que fez aos Estados Unidos e aos países da Bacia do Prata e mantendo a
chancelaria à altura a que tinha elevado o Barão do Rio Branco.
Para o jornal O Dia, o Ministro Lauro Müller, foi prejudicado por políticos
brasileiros que foram levados pelo preconceito da sua descendência, por medos imaginários, e
por adversários que não souberam reconhecê-lo como um Homem de Estado.
Na política externa brasileira, o Ministro Lauro Müller, procurou aproximar o Brasil
dos países do Cone Sul e também dos Estados Unidos, mas sem alterar o ritmo das relações
internacionais do Brasil. Sua política externa foi pautada na boa amizade entre todos os países
e concretizando essas amizades através de várias visitas.
136
RENOUVIN, Pierre. & DUROSELLE, Jean-Baptiste. Op. cit., p 341.
137
Id., p 386.
138
PIAZZA, Walter Fernando. Op. cit., 1983, p 486.
51
3 A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NA GESTÃO DE LAURO MÜLLER
Neste capítulo será abordada a política externa brasileira na gestão do ministro das
Relações Exteriores, Lauro Müller. Aquele foi um período de enormes desafios para o novo
ministro. Internamente, ter que substituir o Barão do Rio Branco era uma tarefa extremamente
árdua. Neste sentido, Lauro Müller acabou dando continuidade à política do famoso
antecessor, em relação aos Estados Unidos da América e aos países platinos. Externamente, o
mundo caminhava para um conflito sem proporções, o que acabou sendo deflagrado,
efetivamente, em 1914. O Brasil, como potência regional, foi obrigado a se manifestar diante
do conflito, inicialmente mantendo uma posição de neutralidade e, posteriormente, assumindo
a condição de beligerante. O abandono da neutralidade brasileira na guerra, a descendência
alemã de Lauro Müller e políticos brasileiros que o acusaram de ser simpático e ter laços
afetivos com a Alemanha acarretaram a sua exoneração do Ministério das Relações
Exteriores.
3.1 Política Interna Brasileira
A troca do regime político no Brasil, a partir de 1889, não destruiu o sistema
coronelista das elites agrárias do país. A implantação da política dos Estados, criada por
Campos Salles assegurou o domínio político local e estadual onde o governo central só
interferia pedindo votos e apoio. “Assim, os ‘homens mais importantes do lugar’, pelo seu
poderio econômico, político e social, mantiveram-se mais fortemente ainda como chefes das
oligarquias regionais e, dessa forma, atuaram como as principais forças sociais no âmbito dos
governos estaduais e federal.”
139
Durante a República Velha, a política brasileira foi dominada pelas oligarquias
estaduais, principalmente Minas Gerais e São Paulo, onde os coronéis, aproveitando que o
voto não era secreto, controlavam os eleitores formados por homens maiores de 21 anos, com
exceção de padres, soldados e analfabetos e as mulheres. As fraudes e a manipulação dos
votos eram feitas em benefício do poder das oligarquias estaduais nas quais alguns grupos
privilegiados de latifundiários tinham ligações com o estado e recebiam ajuda do mesmo. Em
139
NAGLE, Jorge. Educação e sociedade na Primeira República. 2
a
ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 10.
52
alguns estados as oligarquias dominantes eram formadas por várias famílias de latifundiários,
como era o caso do Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. Nos estados os
governadores praticavam a troca de favores com os coronéis, pois estes tinham poder no
âmbito municipal e geralmente a população votava no candidato indicado pelos mesmos. “[...]
muitos coronéis passam a deter posições hegemônicas regionais, a disputar cargos nos
legislativos estadual e federal, bem como ocupar na área executiva funções burocráticas
rendosas.”
140
O clientelismo eleitoral foi usado pelos coronéis para indicar o voto das pessoas
que estavam na sua influência política, o então chamado de voto de cabresto.
Na política do Café com Leite o partido presente em todos os estados era o Partido
Republicano que influenciou a manutenção da “política dos governadores”, assim, o PRP
(Partido Republicano Paulista) e o PRM (Partido Republicano Mineiro) se intercalaram no
domínio federal, uma das exceções foi o presidente Hermes da Fonseca. São Paulo, grande
produtor de café, e Minas Gerais com tradição pecuarista, se alteravam na presidência do
Brasil, pois, nesta época, quem tinha mais poder aquisitivo tinha mais poder político.
A Política dos Governadores, esquema montado pelo presidente Campos Salles que
governou durante os anos de 1898-1902, com o objetivo de garantir a colaboração entre o
poder central e o poder dos estados, foi um acordo nacional entre as oligarquias estaduais e o
Presidente da República o qual nem queria tomar conhecimento de qual oligarquia estava no
domínio político estadual. Esta daria e receberia apoio do governo central. Esse apoio mútuo
indicava os deputados e os senadores que representariam as oligarquias estaduais no
Congresso Nacional.
Com o Convênio de Taubaté (1906), ficou acertado que os governos comprariam os
estoques excedentes de café, pois a superprodução fez com que os preços internacionais do
mesmo diminuíssem. Pelo acordo o governo passou a comprar e a estocar o excesso da
produção, equilibrando a oferta e mantendo o nível alto dos preços para os cafeicultores. “Do
ponto de vista dos grupos cafeeiros, o problema de superprodução era resolvido pela
estocagem do produto não exportado e pelos instrumentos de valorização e defesa; do ponto
de vista da economia nacional, a situação sobrecarregava as emissões, empréstimos e toda a
rede bancária, e o consumidor em geral.”
141
140
RESENDE, Maria Efigênia Lage de. O Processo político na Primeira República e o liberalismo oligárquico.
In. FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucila de Almeida Neves. O Brasil Republicano. O tempo do liberalismo
excludente – da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p
97.
141
NAGLE, Jorge. Op. cit., p 24.
53
Como os presidentes brasileiros procediam da aliança política Mineira e Paulista, a
presidência de Hermes da Fonseca foi exceção, pois a política nacional esteve representada
por ele, gaúcho, militar e ex-Ministro da Guerra. Hermes da Fonseca foi apoiado pela
situação, pelos estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul, e pelas forças armadas. Ganhou
a eleição presidencial contra Rui Barbosa, representante da situação baiana e civilista, nome
denominado em oposição às oligarquias preponderante no país e a representatividade da
classe militar. “Foi uma eleição disputada em que se procedeu a chamada ‘Campanha
Civilista’, com a candidatura de Rui Barbosa enfrentando o candidato oficial, Marechal
Hermes Rodrigues da Fonseca – patrocinado em Santa Catarina por Lauro Müller – que, neste
estado, obteve 10.716 votos contra 3.156 dados ao Tribuno baiano.”
142
Hermes da Fonseca
governou o Brasil durante o período de 1910-1914, para descontentamento dos políticos Café-
com-Leite. “O estado de São Paulo era o que oferecia mais motivos de intervenção por parte
do governo federal: havia sido o grande sustentáculo do candidato civilista e continuava no
início do governo Hermes, a se colocar oficialmente na oposição.”
143
Para José Maria Bello, os atos do presidente Marechal da Hermes, estavam inspirados
nas opiniões do também gaúcho Pinheiro Machado, assim o Ministério do Interior e Justiça
foi entregue ao deputado rio-grandense Rivadávia Correia, partidário de Pinheiro Machado.
“Sem experiência política e administrativa, de caráter bondoso e indeciso, o novo Presidente
da República, apesar da dedicada solidariedade de seus companheiros de classe, deixava-se
facilmente envolver pela trama de políticos.”
144
O governo de Hermes da Fonseca não conseguiu depor as oligarquias estaduais e os
problemas orçamentários provocaram a emissão acelerada de papel-moeda que resultou num
processo inflacionário, também na sua administração ocorreram a Revolta da Chibata no Rio
de Janeiro e a Revolta do Contestado na divisa de Paraná com Santa Catarina.
Na Revolta da Chibata que ocorreu em 1910 onde os protestos dos marinheiros
exigiam a extinção dos castigos corporais e sob a liderança do marinheiro João Cândido que
se apossaram de navios da esquadra brasileira. Para solucionar o problema com os
marinheiros e não destruir as cidades portuárias foi concedida a anistia aos marinheiros
revoltosos pelos ministros e pelo Congresso Nacional em decorrência do pronunciamento do
Ministro das Relações Exteriores Barão do Rio Branco, pois, este temia os conseqüentes
estragos aos navios brasileiros e com isso afetasse a hegemonia naval brasileira na América
142
PIAZZA, Walter Fernando. Op. cit., 1994, p 253.
143
SOUZA, Maria do Carmo Campello de. O Processo político-partidário na Primeira a República. In. MOTA,
Carlos Guilherme. (org). Brasil em Perspectiva. Rio de Janeiro: DIFEL, p 206.
144
BELLO, José Maria. História da República, (1889-1954). 5
a
ed. São Paulo: Editora Nacional, 1964, p. 264.
54
do Sul. O líder da oposição, o civilista Rui Barbosa e o senador da situação, Pinheiro
Machado, concordavam com a anistia como a melhor solução para não afetar a frota naval
brasileira.
Entre os estados de Santa Catarina e do Paraná ocorreu a Revolta do Contestado,
1912-1916, a região recebeu esse nome pela disputa dos dois estados pela faixa de terra
fronteiriça. No Contestado, por um lado estavam os sertanejos e de outro empresas norte-
americana, que exploravam a madeira e que construíram a Estrada de Ferro São Paulo-Rio
Grande do Sul que tinha por objetivo o transporte da madeira extraída e o transporte de
pessoas. A Guerra do Contestado foi a luta dos caboclos em reação à expropriação de suas
terras que através do misticismo, onde os sertanejos seguiam ‘monges’ no confronto com as
forças do governo, acarretaram um fanatismo praticado na região do Contestado que pregava
a volta da monarquia, segundo eles, a República havia tirado seus direitos à terra, os estados
de Santa Catarina e do Paraná deram posse dessas terras devolutas à políticos e fazendeiros
influentes da região. Com grande número de mortes, tanto do lado do Exército como do lado
dos sertanejos revoltosos, a campanha do Contestado também afetou a economia nacional.
Em 1916 os governos dos estados de Santa Catarina e do Paraná firmaram um acordo de
limites no Palácio do Catete encerrando o conflito pela disputa das terras entre os dois
estados.
No quadriênio 1914-1918 o Presidente Brasileiro foi Wenceslau Brás, mineiro e
advogado, pertencente ao Partido Republicano Mineiro, (PRM). Assim volta a Política do
Café com Leite enquanto que Rui Barbosa fracassava novamente em sua campanha civilista.
Pinheiro Machado foi assassinado em 08 de setembro 1915, em um hotel no Rio de Janeiro.
Para José Maria Bello poderia ter sido um crime político. “Um deputado de Pernambuco
propôs na Câmara Federal, por extravagante blague, um projeto de lei com um artigo único:
elimine-se o general Pinheiro Machado. [...] o inquérito policial não chegou a conclusões
precisas.”
145
O assassinato do senador gaúcho foi cometido por Manso de Paiva Coimbra,
julgado como doente mental e sem mandantes no crime.
Na sua administração ocorreu a deflagração da guerra desviando a atenção do povo
brasileiro dos problemas econômicos internos para um problema maior, a Primeira Guerra
Mundial. “A ação executiva de Wenceslau Brás irá se exercer de modo dominador sobre as
representações estaduais na medida em que seu poder emana dos grandes estados num sistema
145
BELLO, José Maria. Op. cit., p. 286.
55
onde continuava a florescer a ‘política dos governadores’.”
146
Durante seu mandato o país
desistiu da neutralidade na Primeira Guerra Mundial para apoiar os Estados Unidos quando
estes entram no conflito.
O Brasil Republicano atuou nas políticas estaduais com o princípio da autonomia
estadual onde a estrutura econômica estava definida pela grande propriedade. No centro-sul
do país a economia cafeeira era o pólo dinâmico do mercado externo, onde nos fins do século
XIX o Brasil supria em dois terços o mercado mundial de café. “[...] fase de expansão do setor
cafeeiro, será o marco de referência sócio-política da Primeira República.”
147
Assim o poder
político localizou-se nos estados e a sua participação restringiu-se aos representantes das
elites proprietárias baseadas na estrutura econômica.
Assim, os setores políticos e econômicos provocaram alterações no setor social, um
dos principais motivos foi o processo imigratório, principalmente vindos da Europa, que
alterou as relações trabalhistas, antes inseridas na escravidão negra. Apesar dos cafeicultores
representarem a hegemonia econômica durante a República Velha, nas duas primeiras
décadas do século XX ocorreu um impulso industrial onde os capitais estrangeiros investiam
na economia nacional. “[...] em especial em fábricas de aço, cimento, máquinas e
equipamentos, material elétrico, veículos automotores, produtos químicos, isto é, aqueles cuja
importação encontrava maiores dificuldades em virtude do esforço de guerra.”
148
Percebe-se que durante a República Velha e no governo de Wenceslau Brás a
tendência política foi a hegemonia das elites dos estados economicamente mais poderosos e
também com maior população do Brasil, ou seja, os cafeicultores de São Paulo e de Minas
Gerais. As eleições não tinham caráter competitivo, do acordo entre os dois estados era
indicado o candidato que seria eleito Presidente da República. Os partidos republicanos
estaduais mantinham contatos com os coronéis e estes com os eleitores, apenas nas épocas de
eleições ou em momentos que necessitavam trocar favores.
As últimas décadas do século XIX e as primeiras décadas do culo XX ficaram
conhecidas como belle époque, com as melhorias na iluminação que passou a ser elétrica,
surgimento dos bondes e dos metrôs, criação de mais cafés, teatros e cinemas, construção de
praças e novas obras arquitetônicas que caracterizaram a vida urbana das elites brasileiras.
146
SOUZA, Maria do Carmo Campello de. Op. cit., p 213.
147
SOUZA, Maria do Carmo Campello de. Op. cit., p 165.
148
AQUINO, Rubim Santos Leão de. Sociedade Brasileira: uma história através dos movimentos sociais: da
crise do escravismo ao apogeu do neoliberalismo. Rio de Janeiro: Record, 2000, p 259.
56
2.2 Política Externa Brasileira
Para Clodoaldo Bueno as relações internacionais possuem significado abrangente, pois
comporta o foco das relações políticas, econômicas, sociais e culturais desenvolvidas não
entre os Estados como também entre outras entidades presentes no cenário internacional,
como as organizações de caráter político ou cultural. “Tudo o que se refere às relações entre
grupos de um a outro lado das fronteiras nacionais, o estudo entre Estados e as relações entre
grupos não estatais através das fronteiras nacionais.”
149
A política externa de um país, os interesses da diplomacia e os objetivos nas
negociações comerciais com outros países estão inseridos nos tratados que demonstram as
variantes das ações do ministro do exterior perante as aspirações do seu governo.
Se a premissa básica do poder exterior é o princípio da acumulação do poder, ou da
preservação do status quo é lógico que a alternativa paz ou guerra resulta da
dependência absoluta em que se acha cada país de seus próprios recursos para sua
segurança territorial e econômica.
150
Na década de 1910, o deslocamento da linha diplomática de Londres para Washington
contribuiu para a aproximação do Brasil com os Estados Unidos. Na política externa o Barão
do Rio Branco tinha uma política americanista, ou seja, a amizade entre Brasil e Estados
Unidos deveria ser sem prejuízo e em relação de igualdade entre os dois. Depois de Rio
Branco, a política de amizade com as nações da América continuou com o então Ministro das
Relações Exteriores, Lauro Müller, onde a amizade com os Estados Unidos foi de poucas
reservas.
A entrada de Lauro Müller no Ministério das Relações Exteriores não altera o ritmo
das relações internacionais do Brasil. Ele visitou os Estados Unidos, o Uruguai, a Argentina e
o Chile para demonstrar a disposição do governo brasileiro, e a sua, em continuar a
manutenção da política da boa vizinhança onde a política exterior esteve voltada para a
consolidação das amizades do Brasil com os países do Prata e com o país forte da América do
149
BUENO, Clodoaldo. História das Relações Internacionais: Conceituação e Fontes. Memória da II Semana
da História,. Franca. São Paulo, 1980, p. 120.
150
RODRIGUES, José Honório. Op. cit., 1995, p. 28.
57
Norte. Alguns autores brasileiros já abordaram rapidamente a política exterior de Lauro
Müller. Para Barreto Filho, Müller, continuou a política americanista iniciada pelo Barão do
Rio Branco.
151
Segundo Clodoaldo Bueno um dos fatos de maior visibilidade do
estreitamento da amizade entre os dois países, foi a visita de Lauro Müller aos Estados
Unidos.
152
Também para Heitor Lyra, o novo ministro das Relações Exteriores, apesar de
filho de colonos alemães do sul do Brasil, entra para o Itamaraty imbuído de um verdadeiro
sentimento americanista.
153
Victor Valla, declarou que o governo brasileiro queria uma união
com os Estados Unidos para conquistar a hegemonia na América do Sul.
154
E Delgado
Carvalho afirma que o sucessor de Rio Branco procurou seguir fielmente a orientação dada ao
Itamaraty pela diplomacia do Barão.
155
Percebe-se assim que, a linha reguladora da política externa brasileira, na gestão de
Lauro Müller, esteve voltada para uma política de equilíbrio perante seus vizinhos na
América do Sul, mas principalmente na aproximação com os Estados Unidos, um país que
ditava as regras da economia mundial. Os acordos diplomáticos não pretendiam uma
subordinação à potência norte-americana; o ministro Müller sonhava que o Brasil caminharia
lado a lado com os Estados Unidos, mas com o decorrer da sua gestão percebeu que estes não
tratavam o Brasil com igualdade. O ministro também não levava em consideração a opinião
dos países da América do Sul quando negociava algum acordo com os Estados Unidos e
assim nos países platinos sentia-se uma certa desconfiança em relação a Müller. Clodoaldo
Bueno, analisou a política externa das gestões do Barão do Rio Branco e de Lauro Müller e
declara que estes pretendiam colocar o Brasil à condição de potência hegemônica perante
seus vizinhos da América do Sul.
156
Pela análise de Bueno, os Ministros Rio Branco e Müller
não necessitavam consultar os países platinos, mas sim, fazer com que estes apoiassem as
decisões externas dos dois.
Depois da gestão do Barão do Rio Branco, na pasta do exterior, o ministro Müller não
encontrou problemas territoriais com seus vizinhos. Para compreender a política externa do
Brasil é preciso ter em mente duas questões, conforme Deutsch descreve:
- “Primeiro à manutenção de sua independência e segurança;
151
BARRETO FILHO, Fernando P. Mello. Op. cit., p 32.
152
BUENO, Clodoaldo. Op. cit.., 2003, p 365.
153
LYRA, Heitor. A diplomacia brasileira na primeira república (1889-1930) e outros ensaios. Rio de
Janeiro: IHGB, 1992, p 36.
154
VALLA, Victor. A Penetração Norte-Americana na Economia Brasileira, 1900-1930. São Paulo: USP
(Tese de Doutorado em História), 1972, p 49.
155
CARVALHO, Delgado. Op. cit., 1959, p 244.
156
BUENO, Clodoaldo. Política Exterior de Rio Branco: o Brasil e o subsistema Norte-Americano de Poder.
(1902-1907). Anais de História. Assis, ano IX, 1977, p 31.
58
- Segundo à promoção e proteção de seus interesses econômicos, sobretudo os de seus
grupos mais influentes;”
157
A manutenção da independência política e a segurança territorial estavam
consolidadas e Müller procurou promover os interesses econômicos do país e de seus grupos
dirigentes conforme sua atuação com as alianças que fez com outros países do Cone Sul e
com os Estados Unidos.
O Brasil, através da política externa conduzida por Lauro Müller, procurou a defesa de
seus interesses econômicos e temia que a Argentina chegasse a superioridade perante os
países da América do Sul.
O Brasil, na República Velha, se insere na economia mundial capitalista como
exportador de produtos primários. A cafeicultura, foi a principal riqueza do país e as
estruturas políticas, econômicas e sociais estavam ligadas à monocultura cafeeira. Também a
exploração dos seringais se constituiu em núcleo econômico importante com a produção e
exportação da borracha.
A situação de dependência e subordinação orgânica e funcional da economia
brasileira com relação ao conjunto internacional de que participa, é um fator que se
prende às raízes da formação do país. Economia de exportação, constituída para o
fim de fornecer neros alimentícios e matérias-primas tropicais aos países e
populações das regiões temperadas da Europa e mais tarde da América, ela se
organizará e funcionará em ligação íntima e estreita dependência do comércio
ultramarino em função do qual se formou e desenvolveu.
158
Entre 1904 e 1913 o governo brasileiro adotou tarifa diferenciada em determinadas
condições, concedendo sucessivas reduções dos direitos de importação para alguns produtos
de procedência norte-americana; era uma espécie de compensação por ser os Estados Unidos
o maior importador do principal artigo de exportação brasileira, o café.
O Brasil assinou o Decreto n. 6.079 de 30 de junho de 1906 estabelecendo redução de
20% nos direitos de importação para consumo dos artigos de produção dos Estados Unidos
que tiveram entrada no país: farinha de trigo, leite condensado, manufaturas de borracha,
relógios, tintas, exceto tintas para escrever, vernizes, máquinas de escrever, caixas
frigoríficas, pianos, balanças e moinhos de vento. No Decreto n. 7.817 de 15
de janeiro de
1910 acrescentou os seguintes produtos: cimento, espartilhos, frutas secas, mobílias escolares
157
DEUTSCH, Karl Wolfang. Op. cit., p 119.
158
PRADO Jr., Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1982, p 271.
59
e secretárias. O Decreto n. 8.520 de 12 de janeiro de 1911 alterou e elevou para 30% a
redução da taxa referente à farinha de trigo compensadora de concessões ao café e outros
gêneros de produção nacional.
159
O Brasil se aproximando dos Estados Unidos seria um porta voz dos norte-americanos
na região do Cone Sul. Para Clodoaldo Bueno desenvolveu-se uma política externa que
defendia os interesses comerciais da elite exportadora, acomodando-as e consolidando novas
formas de produção onde o café se consolida como atividade econômica preponderante. “Os
europeus concentraram seus interesses na Ásia e na África deixando os Estados Unidos
concentrarem seus interesses econômicos, militares e políticos nas Américas.”
160
O Brasil
tinha seus interesses econômicos e políticos voltados aos Estados Unidos onde o apoio norte-
americano o tornaria um país forte na América do Sul.
A política externa de Lauro Müller, em relação a aproximação e a amizade com os
Estados Unidos, não era a mesma preconizada pelo Embaixador Brasileiro nos Estados
Unidos, Domício da Gama, que aprovava uma política com limites e reservas do Brasil
mediante acordos para com os norte-americanos. “Enquanto Müller tinha atitudes próprias de
uma amizade sem reservas, Domício entendia, em nome do interesse nacional, que a mesma
devesse ter limites.”
161
O mesmo autor afirmou que Domício da Gama não aceitava a
pretensão dos norte-americanos de pertencerem a uma civilização superior às da América
Latina e não concordava com a postura amistosa que Lauro Müller mantinha com os Estados
Unidos. “Domício era favorável à supressão das vantagens aduaneiras dadas pelo Brasil às
mercadorias de procedência norte-americana.”
162
Nas comunicações de Lauro Müller com Domício da Gama, com referência às
questões comerciais do Brasil, percebe-se a não concordância entre ambos. Domício da Gama
não concordava com as reduções de taxas alfandegária dos produtos norte-americanos e
sugeriu para o Ministro Müller que as discussões de interesse comercial poderiam ser
tratadas de igual para igual entre o Brasil e os Estados Unidos. Parte do ofício de Domício da
Gama para Lauro Müller demonstra o seu descontentamento quando o país não tem
retribuição dos favores que concedeu aos produtos norte-americanos: “concessão fazemos
aos artigos americanos não é compensada por nenhum favor efetivo e recente aos nossos, pois
que nunca os taxaram porque sempre deles precisaram, nossa situação sendo privilegiada
159
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 a 03 de maio de
1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914.
160
CONDURU, Guilherme Frazão. A política Externa de Rio Branco e os Tratados do ABC. Dissertação de
Mestrado. Universidade de Brasília. Brasília, Julho/1998, p 10.
161
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 367.
162
Id., p 379.
60
como dominadores naturais do mercado que somos, [...]”
163
Domício da Gama defendia a não
intervenção norte-americana nos problemas dos países da América do Sul. Em um discurso,
em banquete oferecido para o presidente norte-americano Taft, no dia 22 de fevereiro de
1913, em Nova York, Domício da Gama afirma que ele e o governo brasileiro eram contra a
doutrina Monroe, mas não seria o dia e nem o local de críticas. Assim, declarou: “... o seu
otimismo é contagioso. E nós precisamos tanto de otimismo pelo Sul, pelas vizinhanças do
Equador. Os países novos são como gente moça, propensas ao pessimismo.”
164
Durante a gestão de Lauro Müller ocorreu o problema do armazenamento do café por
alguns comerciantes norte-americanos, então foi criado um comitê para controlar o café entre
sindicatos de banqueiros, comerciantes europeus e um comerciante norte-americano, Herman
Sielcken. O comitê era integrado por quatro membros nomeado por Schroeder & Company,
quatro pela Société Générale e um pelo governo brasileiro. A questão do Truste do café que
surgiu entre 1912 e 1913, acarretou ao Brasil problemas diplomáticos e econômicos fazendo
com que o Ministro Lauro Müller solicitasse a Domício da Gama que este consultasse o
Presidente norte-americano Woodrow Wilson, para que este desse sugestões para solucionar o
problema da valorização e comercialização do café. O Ministro da Justiça dos Estados
Unidos retirou o processo referente aos Truste do Café e o Departamento de Justiça norte
americano negociou juntamente com o governo brasileiro para que o café fosse vendido para
o consumo nos Estados Unidos. A não solução do problema acarretaria problemas tanto para
o governo brasileiro como para o norte americano que tinha problemas com o México e
necessitava do apoio dos países latino-americanos. Durante a negociação entre os dois países,
o Ministro Lauro Müller, alertou que os Estados Unidos estariam ameaçando a velha amizade
entre ambos. “O Sr. Müller declarou que, se o governo norte-americano continuasse nesta
linha de pensamento, seria difícil impedir que muitos brasileiros concluíssem que os Estados
Unidos estavam deixando de agir como amigo tradicional.”
165
O Embaixador Domício da Gama, no primeiro banquete da sociedade Pan-Americana,
realizado em Nova York em maio de 1912, criticou a política norte-americana de armazenar
café para o seu preço cair. Para Domício da Gama os sul-americanos ainda têm muito a
aprender com as Nações estrangeiras e declarou:
163
Citado por BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 380.
164
Telegrama do Embaixador em Washington Domício da Gama para o Ministro Lauro Müller. AHI 234-2-1,
25/02/1913.
165
VALLA, Victor. Op. cit., p 49.
61
Quando minhas esperanças por uma nova era nas nossas relações comerciais
receberam rude golpe com endosso pelo governo dos Estados Unidos, de algo
arbitraria e inteiramente revolucionária, doutrina de se pagar aos outros, não o que
eles pedem pela sua mercadoria, mas o preço que os Estados Unidos, isto é, os
negociantes americanos quiseram pagar por ela. É doutrina nova em folha, e os
Estados Unidos parecem dispostos a impô-la, mesmo com sacrifícios da velha
amizade internacional.
166
Para E. Bradford Burns, o Ministro Müller estava disposto a uma cooperação e a uma
amizade irrestrita com os Estados Unidos, pois no final, os benefícios seriam melhores para o
Brasil do que algumas inconveniências transitórias. “O novo Ministro das Relações
Exteriores, Lauro Müller, julgou as observações e sugestões do seu embaixador prejudiciais
às metas supremas do Brasil.”
167
Clodoaldo Bueno comenta que Domício da Gama era crítico
com os latino-americanos que não zelavam pela soberania do seu país. “Domício da Gama
defendia, coerentemente, a não ingerência norte-americana nas questões sul-americanas.”
168
As concessões de favores entre os países eram muito importantes, pois o Brasil
buscava o aumento da venda de seus produtos e a compra de produtos de boa qualidade com
preços compatíveis ao mercado. O Congresso Brasileiro aprovou as leis de taxas
alfandegárias de tal maneira que o país cedesse tarifas preferenciais somente às nações que
oferecessem concessões tarifárias e facilidades comerciais. Foi apresentado ao Congresso em
junho de 1915 o Tratado assinado pelo Brasil em Washington a 24 de junho de 1914, com os
Estados Unidos, para o arranjo amigável de qualquer dificuldade que possa surgir entre os
dois países, aprovado e sancionado pelo Decreto n. 3.018 de 10 de novembro de 1915.
169
O monroismo, como doutrina, teve no Brasil, através do Barão do Rio Branco, um dos
seus defensores na América do Sul. “Em nome da defesa da América do Sul, procurava
colocar o Brasil como responsável pela defesa da Doutrina de Monroe e pela segurança do
sub-continente.”
170
Segundo Cervo e Bueno o Brasil seria o co-garante do monroismo na
América do Sul, mas em l906 o Barão do Rio Branco, Ministro das Relações Exteriores do
Brasil, em discurso, fez elogios à Europa amenizando a situação. “Não havia para o Barão do
Rio Branco, possibilidade de se formar, no continente americano, nenhum bloco de poder
166
Folha do Comércio, 14/06/1912.
167
BURNS, E. Bradford. As Relações Internacionais do Brasil durante a Primeira República. In: FAUSTO,
Bóris. História Geral da Civilização Brasileira. Tomo III V. 2 Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil S. A, 1990,
p 380.
168
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 371.
169
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p. XIX.
170
HEINSFELD, Adelar. As Ações Geopolíticas do Barão do Rio Branco e seus Reflexos na Argentina.
Porto Alegre: PUCRS (Tese de Doutorado), 2000, p. 317.
62
capaz de opor-se aos Estados Unidos, em razão da fraqueza e da falta de coesão dos países
hispânicos.”
171
Para a Argentina, a Doutrina Monroe não era favorável, pois o pólo da economia
argentina estava voltado para a Inglaterra, com o comércio de exportação do setor primário:
trigo, carne e lã, e a importação de manufaturados produzidas pelos ingleses. O governo
argentino autorizava a baixa dos direitos de importação sobre o café, a erva mate e o tabaco
vindos do Paraguai e do Brasil, desde que celebrados acordos internacionais de reciprocidade
comercial, ou seja, reduziria a taxa alfandegária a partir do momento que os países também
concedessem tarifas diferenciadas para os seus produtos.
Em 1912, Manuel Ferraz de Campos Salles foi nomeado para representar o Brasil na
Argentina como ministro, pois Lauro Müller confiava que o prestígio de Campos Salles em
Buenos Aires e as suas ligações pessoais com as lideranças argentinas pudessem contribuir
para restituir às relações bilaterais a atmosfera de cordialidade e confiança recíproca de que
ambos os países necessitavam. Assim, abria-se a expectativa de um ato diplomático que
pudesse qualificar positivamente uma relação que parecia esbarrar em desconfianças do Brasil
em relação ao seu adversário e vizinho.
A nomeação de Campos Salles ocasionou a nomeação de Julio Roca para a Legação
Argentina no Brasil, assim as relações entre os dois maiores países da América do Sul
continuavam, de certa forma, cordiais.
O Brasil comprava, entre outros produtos, o trigo argentino para sustentar seus moinhos
e a Argentina, sem esquecer a amizade entre ambos, pretendia barganhar na política econômica
com o Brasil esperando favores ao seu vinho. “[...] o governo argentino pensava em diminuir
o imposto de entrada da erva elaborada, mas que equipará-lo ao da erva cancheada lhe parecia
muito difícil, a menos que o Brasil estivesse disposto a conceder vantagens de entrada para os
vinhos de procedência argentina.”
172
Para melhorar as relações comerciais entre os dois países, seus governos, assinaram
um estatuto criando a mara de Comércio Argentina-Brasileira que estabeleceu seu caráter
político, onde a associação não tem objetivo de lucro, mas prioriza o favorecimento do
desenvolvimento das relações de ambos através das trocas comerciais, para facilitar a
constituição de sociedades financeiras, industriais e comerciais.
O Ministro Lauro Müller não descartava acordos comerciais com os países platinos
e com os Estados Unidos, sempre esteve em negociação com ambos. Em relação aos países
171
CERVO Amado Luiz e BUENO Clodoaldo. Op. cit., 1986, p. 168.
172
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p. 399.
63
platinos pretendia que o Brasil tivesse as rédeas para conduzir a todos, do lado dos norte-
americanos se contentava em andar lado à lado, nem a frente mas também nem atrás.
Em uma visita ao Brasil, em 27 de março de 1916, William Gibbs Mc Adoo,
Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, foi recebido pelo Ministro Lauro Müller. Os dois
políticos trocaram mensagem de amizade entre os dois países. Nesta data, Mc Adoo, declarou
que a amizade entre o Brasil e os Estados Unidos estava baseada no respeito mútuo.
A amizade histórica que existe entre o Brasil e os Estados Unidos não é, e nem foi
jamais meramente formalidade. Baseou-se sempre no seguro fundamento do
respeito estima e da admiração mútua. É nosso sincero desejo é que a força e os
recursos dos nossos grandes países possam sempre ser utilizados não somente para
o seu respeito e proveito recíprocos, senão também para os mais nobres fins da
humanidade.
173
Lauro Müller, respondendo ao Secretário Mc Adoo em 29 de março daquele mesmo
ano, declarou que essa amizade é um fato histórico, desde os primeiros dias da independência
do país, crescendo e fortalecendo-se, à proporção que os dois países têm aumentado
materialmente em recursos e se tem engrandecido moralmente pela compreensão dos seus
deveres continentais, tanto quanto pelos seus propósitos de servir em comum a uma política
humanitária. Percebe-se aqui a vontade e a necessidade de Müller em manter as boas relações
existentes entre o Brasil e os Estados Unidos, não pela economia, mas também como um
irmão mais novo que pede conselhos para o irmão mais velho.
O Brasil esteve em todas as conferências Pan-Americanas, nas quais os Estados Unidos
tinham por objetivo impulsionar o comércio com os países latino-americanos. Na I
Conferência, em 1889, os Estados Unidos ponderavam o afastamento da Europa para a sua
elevação política-econômica do continente americano, mas na realidade vê-se que as suas
pretensões eram os imensos mercados latino-americanos. Na IV Conferência, que ocorreu em
agosto de 1910 determinou a adoção de eficazes medidas em benefício dos produtores de café,
tendentes a combater a crise em que anos afeta o ramo da riqueza de muitas das Repúblicas
do Continente. Na II Conferência Internacional Americana, entre 1901-1902, optou-se pela
criação de um código de Direito Internacional Privado e outro de Direito Internacional Público,
173
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 á 03 de maio de
1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, p. 10.
64
para regular as relações entre os países do Continente que pretendia a eliminação de
desinteligências ou conflitos entre os países americanos.
174
Uma série de atos diplomáticos foi firmada por Lauro Müller com os países vizinhos,
relativos aos limites territoriais, estabelecendo demarcações e inaugurações de marcos. Na
Ata da 9
a
Conferência da Comissão Mista Brasileiro-Uruguaia de demarcação da fronteira,
realizada em 27 de fevereiro de 1914 sucessivamente nas ilhas do Braz e do Moinho, situadas
no rio Jaguarão, para a discriminação das mesmas ilhas, que ficaram pertencendo ao Brasil,
inauguração dos dois marcos respectivos. A Ata da 10
a
Conferência da Comissão mista
brasileiro-uruguaia de demarcação da fronteira, realizada em 10 de março de 1914 na ilha
Grande de Taquary, situada na Lagoa Mirim, para a especificação da referida ilha e de duas
ilhotas que ficam junto e reconhecidas as três como pertencentes ao Brasil. Inauguração do
marco construído naquela ilha. Ata da 11
a
Conferência da Comissão Mista brasileiro-
uruguaia de demarcação da fronteira realizada no Passo Geral do Arroio São Miguel em 20 de
Janeiro de 1915. Ata da 12
a
Conferência da Comissão Mista brasileiro-uruguaia de
demarcação da fronteira, realizada em 09 de maio de 1915, no Cerro do Aceguá nas nascentes
do Arroio da Mina para proceder-se à inauguração do marco internacional do mesmo Cerro,
único desta demarcação que fica sobre a própria linha de fronteira.
175
3.3 Política Armamentista: Brasil x Argentina
A política armamentista praticada pelo Brasil e pela Argentina preocupava o Ministro
do Exterior, Barão do Rio Branco, que alarmava-se com o poderio bélico argentino e com o
despreparo brasileiro das forças armadas. o ministro Lauro Müller atuou mais como um
apaziguador das relações do Brasil para com a Argentina.
Os dois países ambicionavam armar-se um mais do que o outro, sendo assim, a
problemática da guerra ou da paz entre eles foi analisado e discutido durante vários anos pelos
ministros da pasta do exterior. Por rios motivos não ocorreu a conflagração armada entre
ambos. Na esfera estatal, nas relações internacionais dos dois países, ocorreram críticas
mútuas, ideologicamente, procuraram inculcar o medo no seu adversário. O problema da
174
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 á 03 de maio de
1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, p 169.
175
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho
de 1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p 301-317.
65
dominação regional sempre esteve nas políticas externas praticadas pelo Brasil e Argentina,
juntamente com as idéias hegemônicas que gerou, no Brasil, um intuito de aproximação
tentando amenizar o clima de tensão apregoado pelas ideologias dos políticos argentinos.
A corrida armamentista visando a busca do equilíbrio de poder, da procura da
hegemonia e da convicção que a guerra chegaria logo, fizeram com que a Argentina e o
Brasil praticassem uma política de aproximação com o Chile, bem como a melhoria dos seus
armamentos. Uma etapa singular da história das relações externas entre o Brasil e a Argentina
foi caracterizada pela corrida armamentista, principalmente na Marinha do dois países.
Entre aproximadamente 1908 y el inicio de la Primeira Guerra Mundial, [...]
particularmente pronunciada em el âmbito naval -, há sido denominada como la
‘diplomacia de los acorazados’. Fue suerte de ‘paz armada’ entre las autoridades
de Buenos Aires y Rio de Janeiro, estimulada por la mutua desconfianza.”
176
Nas décadas de 1910 e 1920 o mundo vivia a paz armada onde os países procuravam
aumentar o seu poderio bélico. “Brasil e Argentina não escapavam do espírito do tempo que
os levava a gastar com unidades de combate naval.”
177
A Argentina confiou aos americanos a construção de seus grandes navios. “Os Estados
Unidos colaboraram, proporcionando instrução especial e adiantamentos técnicos secretos à
marinha argentina.”
178
A Legação Brasileira em Buenos Aires comunicava as grandes
manobras do exército argentino, considerando aquele país, “potência militar de primeira
ordem na América do Sul, podendo em caso de guerra mobilizar um exército de primeira linha
de 120.000 homens.”
179
O jornal O Dia noticiava que a Argentina adquiriu arsenal bélico e
demonstrou às autoridades militares o seu material disponível para uma possível guerra.
180
Com referência à aquisição bélica da Argentina, o Brasil, analisava e olhava com
prudência. O aumento da esquadra argentina foi maior que a brasileira, mas tanto o Brasil
como a Argentina comprometeram-se a não adquirir novas unidades navais. Assim, para
sacramentar este acerto o governo brasileiro mandou o Ex-presidente Campos Salles, como
176
ESCUDÉ. Carlos e CISNEROS, Andrés. História General de las RELACIONES EXTERIORES DE LA
REPÚBLICA ARGENTINA. La ‘diplomacia de los acorazados’ (1908-1914). Parte II TOMO VII, 2000.
www.argentina-rree.com/7/7.053.htm.
177
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 383-384.
178
FROTA, Luciara Silveira de Aragão e. Brasil-Argentina:divergências e convergências. Brasília: Centro
Gráfico do Senado Federal, 1991, p 55.
179
AHI. Nota da Legação Brasileira na Argentina ao Governo Brasileiro, 16/04/1914.
180
O Dia, 11/01/1916, p 01.
66
Ministro Plenipotenciário, a Buenos Aires durante algum tempo, e esperava-se, no Rio de
Janeiro, que o governo argentino fizesse o mesmo com uma personalidade de igual hierarquia
que acabou se consolidando com a nomeação de Julio Roca, também ex-presidente. “As
missões dos ex-presidentes deveriam selar o acordo de cavalheiros destinado a por fim à
corrida armamentista.”
181
As missões tiveram pouca durabilidade, Campos Salles ficou de 30
de abril à 06 de julho de 1912 e Julio Roca de 25 de maio à 14 de setembro do mesmo ano.
Para Clodoaldo Bueno, no ano de 1915 os relatórios emitidos por Souza Dantas,
Encarregado dos Negócios do Brasil em Buenos Aires ao Ministro do Exterior Lauro Müller,
transmitiam otimismo mas ao mesmo tempo um tom de reservas em que o país deveria cuidar
para não romper sua amizade e as relações comerciais com a Argentina. “Que o estado de
graça nas relações Brasil-Argentina estava sempre por um fio e que poderia acabar a qualquer
momento.”
182
Apesar dos problemas com o armamento o Brasil e a Argentina não cortaram
relações, mas ficaram as acusações de que um tentou se armar melhor e mais forte do que o
outro.
A Europa praticava o armamento e em 1914 a guerra acabou eclodindo no
Continente. O Brasil participa dela apenas no final, mais como um favor aos Estados Unidos
do que por necessidade de envolver-se no conflito que pela primeira vez mobilizou vários
países do mundo. Na versão do governo brasileiro, tinha uma linha de preservação da
amizade com os Estados Unidos.
Na ocasião da guerra, o Ministro Lauro Müller, pouco se manifesta em relação ao
armamentismo do Brasil e da Argentina, mas deixa claro, como militar, que não deverá haver
nenhum problema entre o país e seus vizinhos. Ficou numa situação de conciliador e as
diretrizes tomadas pela política externa são de cordial amizade com todos os países da
América, principalmente aos do Prata, mesmo com a questão do armamento e
aperfeiçoamento bélico e de pessoal entre os dois países.
na opinião do Presidente Brasileiro, Hermes da Fonseca, o Brasil deveria além de
ter armamentos ensinar e preparar os soldados brasileiros para usar esse material e solicitou
ao Congresso Nacional orçamentos, a princípio, dentro dos recursos disponibilizados pelo
país.
181
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p. 386.
182
Id., p. 392.
67
As fábricas e os arsenais têm passado por melhoramentos e ampliações necessários á
produção dos diversos artigos, compatível com as exigências do Exército, cujo
suprimento lhes compete. [...] A situação geográfica do nosso país e a sua
configuração topográfica estão a indicar que a nossa defesa exige um largo emprego
de artilharia de praça, convindo, por isso, que o Congresso Nacional estabeleça,
guiado pelo seu alto patriotismo e sabedoria, quadros de oficiais para as novas
fortificações e para defesa móvel das nossas costas.
183
Percebe-se que o presidente Hermes da Fonseca, como militar, priorizava a melhoria
do exército brasileiro, tanto em relação a aquisição material como o aperfeiçoamento humano
e esforçava-se para isso ficar evidente. “Tem o meu governo dedicado cuidados especiais aos
arsenais e fábricas de pólvora e de artefatos de guerra.”
184
Esse preparo militar não foi usado
contra os países do Cone Sul e mesmo com a participação brasileira no primeiro conflito
mundial o uso do exército e dos soldados, na década de 1910, não tiveram relevância a favor
ou contra os beligerantes.
Na análise das mensagens presidenciais de Wenceslau Brás, civil, não existe essa
ênfase ao armamento e aprimoramento dos soldados, mas percebe-se a preocupação de
manter a amizade do Brasil com outros países e o conflito na Europa preocupava mais o
governo do que possíveis atritos com vizinhos.
Durante sua gestão, o Ministro das Relações Exteriores Lauro Müller, apesar de
pertencer ao exército, assim entende-se que priorizava uma política de paz com os outros
países. “Lauro Müller, sem qualquer plano ou estratégia, procuraria desempenhar o papel de
conciliador, de quem evita divergir, concordando sempre e cultivando amizades, com todos
se possível.”
185
Até mesmo na Primeira Guerra Mundial sempre se manteve no discurso da
neutralidade brasileira perante a guerra. Mas em agosto de 1917, em discurso na Academia
Brasileira de Letras, estimulou o serviço militar dos jovens brasileiros e declarou que
desarmar um país é tirar-lhe os direitos a que tem mediante as outras nações.
186
Lauro
Müller, enquanto ministro das Relações Exteriores, não tinha pretensões armamentistas para
o Brasil, mas como militar que era, defendeu no discurso da ABL que se fosse necessário o
país deveria estar preparado para possíveis intervenções.
183
Mensagem Presidencial, Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1913, p 69-70.
184
Mensagem Presidencial, Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, p 96.
185
BUENO, Clodoaldo. Op. cit,. 2003, p 383.
186
Consultar. Discursos Acadêmicos. A Diplomacia do Barão do Rio Branco [citado 14/setembro de 2005]
Disponível: www.academia.org.br/imortais/cads/34/lauro.htm.
68
3.4 A Primeira Guerra Mundial
No período antecessor à guerra, o mundo vivia um momento de crise que significou a
busca de mudanças, a procura de soluções para os problemas políticos e incertezas sociais
onde os valores anteriormente apregoados já não significavam a resposta para os novos
anseios da humanidade. Economicamente dois centros de poder começam a sobressair no
cenário internacional, os Estados Unidos e o Japão. A política, as ambições territoriais e
comerciais européias lançaram o mundo a uma guerra mundial.
Quando a Primeira Guerra Mundial foi declarada no ano de 1914, que teve como
estopim o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando do Império Austro-Húngaro, o
Brasil procurou, inicialmente, manter-se neutro.
O Governo Brasileiro recebeu notificação oficial do Governo Imperial Alemão de que
se achava em estado de guerra com a França e o Império Russo. Expediu o Decreto n. 11.037
de 04 de agosto de 1914, onde estabelece que sejam fiéis e rigorosamente observadas e
cumpridas pelas autoridades brasileiras as regras de neutralidade na guerra entre as potências
européias e ainda afirmava não poder dar acolhida em suas águas territoriais a navios
apresados, sem exigir dos captores a descarga das mercadorias destinadas ao Brasil e
adquiridas por firmas brasileiras e a saída de navios ficou sujeita a senhas especiais dadas em
segredo dia e noite. Ocorreu a retenção da canhoeira alemã Eber, no porto da Bahia, onde a
sua oficialidade encontrada a bordo permaneceu sob custódia do governo brasileiro na capital
do Rio de Janeiro.
187
Como regras gerais da neutralidade os residentes no Brasil, nacionais e estrangeiros,
deveriam abster-se de qualquer participação de hostilidade a uma das potências em guerra.
Não seria permitido aos beligerantes promover no Brasil o alistamento de nacionais. Seria
proibida a exportação de artigos beligerantes dos portos do Brasil para os de qualquer das
potenciais beligerantes debaixo da bandeira brasileira ou de outra nação.
No Decreto n. 11.141 de 09 de setembro de 1914 o governo brasileiro determina que
os navios mercantes, pertencentes a países beligerantes, que tenham entrado, ou venham a
entrar, em portos brasileiros e que neles desembarquem passageiros ou carga alegando motivo
de força maior decorrente da situação de guerra na Europa, para não continuar sua viagem,
ficam impedidos de sair desses portos, salvo permissão especial escrita, dada pelo capitão do
187
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho
de 1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p. V.
69
porto respectivo com autorização do Ministério da Marinha e observados as demais
disposições em vigor.
188
Alguns navios não obedeceram ao decreto obrigando o governo a
tomar medidas radicais e foram retidos nos portos de Rio de Janeiro, Santos, Pernambuco,
Bahia, Paraíba, Rio Grande do Sul e Pará.
Apesar da não observância das regras e das apreensões, o Presidente Brasileiro
Hermes da Fonseca declarou que fossem mantidas as regras de neutralidade, um ano após o
início do conflito armado:
O Ministério da Marinha, sob cuja fiscalização a entrada e a saída nos portos
brasileiros dos navios nacionais e estrangeiros, beligerantes ou não, mobilizou toda
a nossa esquadra, distribuindo pelos nossos principais portos as nossas unidades
navais, deu instruções severas aos capitães dos portos para o exato cumprimento
das nossas regras de neutralidade, e a saída de navios ficou sujeita a senhas
especiais dadas em segredo dia e noite.
189
O Brasil e os Estados Unidos, durante a guerra, concretizaram a sua aproximação
econômica, pois os transportes marítimos estavam perigosos, prejudicando a entrega das
mercadorias transportadas para outros continentes. Os Estados Unidos, com sua política
protecionista se desenvolveram industrialmente e protegendo seus interesses econômicos no
plano internacional. “Na política externa, guardaram uma segura distância da Europa e de seus
conflitos, caracterizando-se por seu isolacionismo.”
190
deixando a concha isolacionista na
Primeira Guerra Mundial quando o bloqueio naval prejudicou sua economia e quando
submarinos alemães torpedearam navios neutros da América ameaçando as exportações,
principalmente, dos Estados Unidos.
No decorrer da guerra a Argentina presenciou os interesses britânicos em seu território
que desempenharam um importante papel no seu desenvolvimento econômico, onde os
investimentos se destinaram às ferrovias, a serviços públicos, frigoríficos e às empresas
agropecuárias. “O capital britânico passou a ter, então, forte presença na economia argentina e
188
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho de
1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p VI.
189
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho de
1915. Anexo A, Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p. V.
190
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 18 de maio de 1913 á 03 de maio
de 1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914, p. 168.
70
contribuiu para definir seu perfil agroexportador. Cerca de 30% do comércio exterior da
argentina até a I Guerra Mundial se destinou a Grã-Bretanha.”
191
O desenvolvimento da Argentina sustentou-se por várias décadas no modelo
agroexportador. “Las estrategias nacionales de desarrollo e inserción, el modelo
agroesportador o primario-exportador (1880-1930), el proyecto de dependencia nacional se
formaliza y afianza.”
192
A Argentina viveu um surto de prosperidade econômica com o início
da guerra “O PIB argentino saltou de US$ 1 bilhão para US$ 15 bilhões, sendo que às
vésperas da Guerra o país era responsável pela metade da capacidade econômica e pela terça
parte do comércio exterior de toda a América Latina.”
193
Durante a guerra, as importações do Brasil e da Argentina foram prejudicadas pelo
bloqueio alemão, pois não podiam receber suas mercadorias por mar. Por muito tempo alguns
países da América faziam empréstimos em países europeus. Com a problemática da
manutenção bélica o dinheiro ficou escasso fazendo com que estes buscassem ajuda
financeira nos bancos dos Estados Unidos. “No Brasil, na Argentina e demais Estados do
Prata, no Chile, na Bolívia, no Peru, na Colômbia, os governos que antes de 1914 tomavam
dinheiro na Europa, se dirigiam, agora, aos bancos americanos, como anteriormente o
faziam os Estados da América Central.”
194
A indústria da Inglaterra dominava a maioria dos mercados consumidores mundiais,
mas a Europa não desprezava o comércio com o Continente Americano, pois necessitava
dele. Devido ao conflito o Brasil não pode mais comercializar com importantes países
europeus como a Alemanha, a Bélgica, a Áustria e a Rússia.
Os países neutros foram prejudicados pelo bloqueio naval da Alemanha que afetou a
navegação e o comércio de várias nações. Os navios neutros e armados seriam considerados
inimigos e bombardeados pelo Império Alemão. “O governo britânico tomou a resolução a
partir do dia 07 de fevereiro de 1917 em diante de fechar o mar do Norte devido a minas e
ataques submarinos exceto as águas territoriais dinamarquesas e neerlandesas e em uma
passagem que facilitasse o tráfego costeiro dos Países Baixos.”
195
Mas as relações efetivadas
191
RAPOPORT, Mario. Os países do Cone Sul e as grandes potências. In: CERVO, Amado Luiz; RAPOPORT,
Mario (Orgs.) História do Cone Sul. Rio de Janeiro: Revan; Brasília:UnB, 1998, p 246.
192
BERNAL-MEZA, Raúl. Venturas y desventuras de la Argentina: los cambios de paradigma de política
exterior y su relación con los modelos de inserción. In: MARTINS, Estevão Chaves de Rezende; (Org.)
Relações Internacionais: visões do Brasil e da América Latina. Brasília: IBRI, 2003, p 289.
193
MELLO, Leonel Itaussu Almeida. Argentina e Brasil: a balança de poder no Cone Sul. São Paulo:
ANNABLUME, 1996, p 29.
194
RENOUVIN, Pierre. & DUROSELLE, Jean-Baptiste. Op. cit., p 159.
195
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930, p 18.
71
por Lauro Müller se mantiveram segundo a diplomacia brasileira, onde era indispensável dar
continuidade a política desenvolvida em relação aos Estados Unidos.
O Brasil teve sua exportação de café afetada pelos efeitos da conflagração européia,
pois necessitando de transporte, privou grande número de mercados consumidores ficando
então sujeito a apreensões por parte dos beligerantes. Logo no início das hostilidades, o
Governo do estado de São Paulo fez a solicitação da intervenção do Governo Federal junto ao
Império Alemão, a fim de ser evitada uma possível requisição dos cafés em Hamburgo e
Bremen, e, posteriormente, dos que se acham em Triste e em Antuérpia; aqueles depositados
em nome de firmas alemães e estes últimos no de empresas de países seus inimigos. “As
negociações foram bem sucedidas e o nosso café foi vendido ao preço de 65 marcos por saca
de 50 kilos de café, do tipo superior, preço excepcionalmente vantajoso naquele
momento.”
196
O dinheiro da venda foi depositado no Banco de Berlim e o governo alemão
decretou medidas rigorosas para impedir a saída do ouro mesmo que fosse para países
neutros como o Brasil. Em tais circunstâncias, o Governo do estado de São Paulo e o
Ministério das Relações Exteriores definiram responsabilidades solicitando:
- o reconhecimento da responsabilidade do Governo Alemão pelo efetivo e oportuno
pagamento desse depósito;
- a fixação de um câmbio da moeda alemã para o efeito do pagamento final;
- e a elevação do juro do depósito.
197
A primeira e principal foi atendida pelo Governo Alemão. O Presidente Brasileiro,
Wenceslau Brás, declarou que a propósito do bloqueio estabelecido pelos governos alemão e
austro-húngaro, no litoral da Inglaterra e em suas ilhas, França e parte oriental do
Mediterrâneo, considerava o mesmo uma ameaça eminente aos direitos e interesses vitais do
Brasil e resolveu manifestar sua opinião através do Ministro das Relações Exteriores, Lauro
Müller, para o ministro Alemão Adolph Pauli que esperava que seu país revisse seus atos em
estado de guerra e luta contra vários países europeus.
O Brasil protestaria, em resposta às ponderações que me fez, assegurei que não
tínhamos qualquer desejo de nos envolver no conflito europeu e que seríamos muito
felizes se a Alemanha evitasse atos ou procedimentos que ferissem nos nossos
196
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p IX.
197
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p IX.
72
direitos ou interesses vitais, permitindo-nos assim, nos mantermos na posição de
rigorosa neutralidade, como desejávamos.
198
O Governo Brasileiro considerava essencial a manutenção das relações diplomáticas
com a Alemanha para que nenhum navio brasileiro fosse atacado em qualquer mar, sob
qualquer pretexto, mesmo de conduzir contrabando de guerra, tendo as nações beligerantes
arbitrariamente incluídos nessa categoria.
Em virtude das questões decorrentes do bloqueio sem restrições, notificado em 31 de
Janeiro de 1917, o Governo dos Estados Unidos resolveu interromper as suas relações
diplomáticas com o Governo Imperial Alemão. A declaração do Sr. Alexander Benson,
Encarregado de Negócios dos Estados Unidos foi a seguinte:
O presidente dos Estados Unidos reluta em acreditar que a Alemanha ponha
atualmente em prática as ameaças feitas ao comércio neutro; se, porém, isso se der, o
Presidente dos Estados Unidos pedirá ao Congresso autorização para utilizar as
forças nacionais, a fim de proteger os cidadãos americanos que pacifica e legalmente
navegarem em alto mar e, por conseguinte, ele acredita que concorrerá para a paz do
mundo, se as outras Potências neutras acharem possível assumirá a mesma atitude
tomado pelo Governo dos Estados Unidos.
199
O Governo Britânico facilitava a saída do carvão de pedra para o Brasil, de modo que
pudessem funcionar regularmente o Lloyd Brasileiro, as estradas de ferro e as empresas de
iluminação de muitas cidades. Em 1917 o Governo Brasileiro deu a seguinte declaração: “O
drama sangrento que teve início na Europa perto de três anos não sinais de querer
diminuir de intensidade e já tomou o aspecto de luta verdadeiramente mundial.”
200
As relações comerciais do Brasil com os países europeus sofreram as inevitáveis
conseqüências da guerra; os beligerantes fizeram saber aos países neutros quais os produtos
considerados como contrabando de guerra, mas essa declaração se tornou arbitrária.
198
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1931, p 38.
199
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1931, p 42.
200
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1931, p 63.
73
“Tornando instável o comércio internacional e sujeito às interpretações as mais diversas dos
respectivos tribunais de presas.”
201
O Governo Brasileiro tomou medidas de neutralidade perante a guerra e a descarga de
mercadorias em portos brasileiros que seriam aceitas por motivos de inavegabilidade do
navio, de mal estado do mar, de falta de combustível, de falta de provisões de comida ou
descarga de mercadorias destinadas ao Brasil, em outros casos os navios pertencentes aos
países beligerantes não tinham permissão para aportar.
Lauro Müller telegrafou a Domício da Gama, Embaixador em Washington, solicitando
que este investigasse qual a política que os norte-americanos iriam adotar durante a Primeira
Guerra Mundial. Para José H. Rodrigues, “Müller desejava conhecer a opinião dos EUA,
para marchar de acordo.
202
Assim esperava-se que estes tomassem as decisões referentes ao
conflito, o Ministro Müller, não abria mão da neutralidade brasileira, mas por outro lado,
aquele que participasse da guerra poderia sair com vantagens perante os que continuassem
neutros; assim alguns políticos eram a favor da entrada do Brasil no conflito e outros como
Müller esperavam que o Governo Brasileiro não se envolvesse na guerra.
Para o Embaixador Norte-americano no Brasil, Edwin Vernon Morgan, a guerra
serviria para enfraquecer o Brasil. Mas ao mesmo tempo em que os Estados Unidos
necessitam da produção brasileira, carne, café, borracha, açúcar, cacau e ferro, o Brasil
precisava dos investimentos norte-americanos para o seu desenvolvimento e assim o apoio do
Governo Brasileiro aos aliados seria uma grande contribuição: “Seu senso de justiça e de
direito internacional é suficientemente vivo para fazê-lo sacrificar, temporariamente, a
aquisição de riqueza pela demonstração de simpatia para os princípios fundamentais no que a
humanidade e civilização estão fundados.”
203
De certa forma, a entrada do Brasil na guerra
em favor dos aliados influenciaria os outros países latino-americanos a se colocarem ao lado
dos Estados Unidos, principalmente em nome do pan-americanismo apregoado.
Depois do recebimento da notificação do Império Alemão de que não seria respeitada
a bandeira e os navios neutros, o Governo Brasileiro respondeu os notificando que o
torpedeamento de navio brasileiro em qualquer mar e sob qualquer pretexto importaria na
ruptura das relações diplomáticas.
201
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho
de 1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p X.
202
RODRIGUES, José Honório. Op. cit., p 68.
203
VALLA, Victor, Op. cit., p 38.
74
Para Lauro Müller, como Ministro, a neutralidade brasileira era um exemplo que
deveria ser seguido por outros países para o bem da humanidade. No dia 11 de outubro,
discursando no Pará declarou:
Os ódios que originam a atual guerra ficarão sobre o oceano, continuando a América
a abrigarem ideais de justiça e de paz. Ser neutro, disse, não é ser indiferente e sim
assegurar a guarda e a defesa dos mais sagrados interesses do país. Nenhum povo
luta pelo simples desejo de lutar, pela única vontade de ver correr sangue, não; mas
sim impelido pela necessidade imperiosa da defesa dos seus direitos e dos seus
ideais. Seria loucura intervir no conflito para o qual não contribuímos e nem somos
chamados.
204
Uma parcela da imprensa brasileira considerava essencial a manutenção das relações
diplomáticas entre os países neutros e os beligerantes, mas não deixava de fazer certas
apelações de que se o patriotismo e a dignidade do Brasil fossem ofendidos, sim, o país
deveria entrar na guerra para defender a sua soberania e deixar a neutralidade de lado. “Só há
uma hipótese que justificará a guerra: um arranhão em nossos brios, em nossa soberania para
ele de onde partir. Fora disso qualquer arremesso guerreiro é loucura.”
205
Com o torpedeamento do paquete brasileiro ‘Paraná’, em 1917, houve a quebra de
relações diplomáticas entre o Brasil e a Alemanha. “Dado o torpedeamento do vapor
brasileiro Paraná, esperamos que em inquérito regularmente feito fosse apurado o fato para
declararmos, como declaramos, a ruptura de relações com o Império Alemão.”
206
No
inquérito ficou realmente provado que o paquete brasileiro havia sido torpedeado por
submarino da marinha alemã. O navio brasileiro estava por volta de 10 milhas na costa
ocidental da França, pesava 6 mil toneladas e pertencia a Cia. Comércio e Navegação. No dia
11 de abril, o chanceler Lauro Müller notificou o Ministro alemão e o Brasil rompeu com a
Alemanha.
Na noite de 03 para 04 de abril último, em circunstâncias absolutamente
inadmissíveis, porquanto navegava em marcha reduzida, com todas as luzes
regularmente e tendo em dístico, bem iluminado, a palavra BRASIL muito em
evidência. Apesar dessas precauções, não lhe foi feita intimação alguma para que
parasse a fim de serem examinados os papéis de bordo e a natureza da carga, sendo
204
O Dia. 11/10/1916, p 01.
205
O Diário da Tarde, citado pelo jornal O Dia. 21/03/1916, p 01.
206
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930, p III.
75
torpedeado sem aviso prévio e alvejado, depois de atingindo pelo torpedo por cinco
tiros de canhão. Além disso, apesar de estar bem visível e muito próximo, o
submarino não prestou nenhuma assistência humanitária ao comandante e
equipagem brasileira, tendo havido perda de vidas e ferimentos.
207
Em 06 de abril de 1917, o Congresso dos Estados Unidos declarou. “O Presidente
Americano proclamou, que o estado de guerra existia entre os Estados Unidos da América e o
Governo Imperial Alemão.”
208
Assim, os Estados Unidos vislumbravam na guerra a chance
de tornar-se potência mundial, pois internamente sua economia estava em situação
confortável e sua política externa, na América Latina, estava bem estruturada. Percebe-se que
a entrada norte-americana na guerra era necessário no Continente Europeu, então dominado
pela Inglaterra, e durante a guerra desejado pela Alemanha.
O Governo Brasileiro rompeu as relações diplomáticas e comerciais com a Alemanha
e comunicou a ruptura com todos os países que mantinha relações comerciais e diplomáticas
com o Império Alemão.
Depois deste rompimento das relações com a Alemanha, Lauro Müller, solicitou a
volta dos consulares que estavam naquele país. “O Sr. Ministro das Relações Exteriores
entregou os passaportes ao Ministro Alemão no Rio de Janeiro e deu as ordens necessárias ao
Ministro do Brasil, em Berlim, para que se retirassem do Império Alemão com o pessoal da
Legação a seu cargo e os Consulares Brasileiros.”
209
Os submarinos alemães, com o ataque a navios comerciantes do Brasil, forçaram-no a
entrar na guerra como aliado, havendo com isso um rompimento da neutralidade brasileira
que havia sido decretada pelo Presidente Marechal Hermes da Fonseca. “E até contra nós, que
sempre tínhamos em conservar a mais estrita imparcialidade entre as partes em conflito, a
violência de uma delas arremeteu, forçando-nos a romper com o agressor, as nossas
relações diplomáticas.”
210
Tanto o Brasil como os Estados Unidos entraram na guerra pelo
fato de ter seus navios atacados pelos alemães, a Argentina pregava uma posição de paz
durante o conflito. “A entrada do Brasil na guerra era importante para os Estados Unidos em
relação à sua crescente influência na América Latina.”
211
207
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930, p VII.
208
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930, p 91.
209
AHI. Anexo I do Ofício n. 17 do Governo Brasileiro para a Legação Brasileira na Alemanha, 30/04/1917.
210
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930, p 11.
211
VALLA, Victor. Op. cit., p 44.
76
No decorrer da guerra o Brasil sofreu outros ataques de seus navios como o caso do
torpedeamento do vapor Rio Branco, por um submarino alemão, no mar do Norte, ocorrido
em maio de 1916.
O vapor Tocantins, do Lloyd Brasileiro, que, em sua viagem de Nova York para o
Rio de Janeiro foi impedido de prosseguir seu rumo, pelo couraçado francês
Marseillaise, no mar das Antilhas em 04 de junho de 1916 e o do apresamento do
vapor Rio Pardo pelas autoridades navais alemães, sucedido em 09 de dezembro de
1916, ainda no mar do Norte.
212
Após vários navios afundados pelos submarinos alemães, os Estados Unidos
declararam estar em estado de guerra com o Império Alemão. Nessa ocasião, o Ministro
Lauro Müller solicita exoneração do Itamaraty e assim, estava condenada a política de
moderação do presidente Wenceslau Brás. No dia 05 de maio o presidente nomeia Nilo
Peçanha para Ministro das Relações Exteriores do Brasil.
Existiam três vertentes sobre a posição brasileira frente ao conflito. Os aliadófilos, os
neutrais e os germanófilos, que o Ministro Lauro Müller foi acusado de pertencer a este
grupo, que seria amigo da Alemanha e assim como Ministro das Relações Exteriores usava a
neutralidade para não prejudicar os interesses alemães na guerra. “Entre os simpáticos aos
impérios centrais, contavam-se João Barreto de Meneses, Capistrano de Abreu, Said Ali e,
com destaque, o escritor e deputado federal Dunsheee de Abranches, cuja posição se
manifestara no início da guerra.”
213
Os aliadófilos eram José Veríssimo, Miguel Calmon,
Antônio Azevedo, Pedro Lessa, Barbosa Lima, Olavo Bilac e Manuel Bonfim. “Todos faziam
parte da Liga Brasileira dos Aliados, fundada em março de 1915, presidida por um dos mais
influentes intelectuais da época: Rui Barbosa, que participou até de manifestações
populares.”
214
Entre os neutrais estavam Pires do Rios, Assis Chateaubriand, Vicente de
Carvalho, Jackson de Figueiredo, Azevedo Amaral, Gabriel Salgado, Carlos de Laet, Alberto
Torres, Barreto Filho e Oliveira Lima. A posição de neutralidade brasileira apregoado pelo
Ministro Lauro Müller foi contestada pela imprensa que estava vinculada à partidários que
212
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 23 de junho de 1916 a 03 de maio
de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930, p 16.
213
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 453.
214
Id., p 456.
77
pretendiam a entrada do Brasil na guerra. “O Ministro das Relações Exteriores, Lauro Müller,
foi um dos alvos da imprensa partidária dos aliados.”
215
Por nota o Governo Brasileiro comunicou às nações amigas o sancionamento de lei que
revogava a neutralidade do Brasil perante a guerra que também envolvia os Estados Unidos e a
Alemanha, sendo que o país reconhecia assim que um dos beligerantes é parte integrante do
Continente Americano e que a este, o país está ligado, por uma tradicional amizade e pelo
mesmo pensamento na defesa dos interesses políticos e econômicos da América.
Com a entrada dos Estados Unidos, a guerra se definiu para o grupo dos Aliados. Se o
objetivo das potências que entraram no conflito era alcançar a supremacia mundial, para as
nações que permaneceram neutras a manutenção do sistema político mundial era preciso para
que as suas exportações e importações continuassem sem mudanças bruscas.
No decurso das hostilidades, o Brasil abandonou a neutralidade na Primeira Guerra
Mundial, o que agradou ao governo norte-americano. No dia 26 de outubro de 1917, o
Congresso Brasileiro votou o reconhecimento do estado de guerra. O Brasil tornou-se, assim,
juntamente com os Estados Unidos, um dos poucos países americanos a entrar no conflito, uma
vez que Uruguai, Peru, Equador e Bolívia apenas romperam relações diplomáticas e Argentina,
Chile e Paraguai mantiveram-se neutros.
[...] o Paraguai se compusera com o neutralismo argentino na I Guerra Mundial, em
lugar de ficar do lado dos Aliados, como fizera o Brasil. Afirmava-se que o Governo
paraguaio obedecia a todas as indicações em questões internacionais que lhes eram
feitas pela Chancelaria argentina.
216
Para Victor Valla, a guerra trouxe a problemática das relações de dependência entre os
países industrializados e os em desenvolvimento, assim analísa a opinião de alguns brasileiros
vinculados à política do país. Em sua análise, o Presidente da Comissão de Diplomacia da
Câmara de Deputados, Dunshee de Abranches, declarava que os norte-americanos
priorizaram seu lado econômico no conflito. “Com respeito à posição dos Estados Unidos na
guerra, [...] também acusava esta nação de visar os seus fins comerciais à custa do
conflito.”
217
Para o historiador e diplomata, que havia representado o governo brasileiro em
Lisboa, Berlim, Washington, Londres e Tóquio, Manoel de Oliveira Lima, os Estados Unidos
215
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p. 457.
216
DORATIOTO, Francisco Fernando Monteoliva. Op. cit., 1997, p 360
217
VALLA, Victor. Subsídios para uma melhor compreensão da entrada do Brasil na Primeira Guerra Mundial.
Estudos Históricos. N. 15. Marília, 1976, p 31.
78
com a Doutrina Monroe, tinham reservado o direito de escolher as ocasiões de usá-la
conforme fossem suas necessidades no Continente Americano. “[...] que os Estados Unidos
desejavam suas repúblicas irmãs preparadas coletivamente para se opor às ambições
européias, que, nesta hora, se traduziam na possível supremacia alemã. Profeticamente, previu
que o Japão seria o próximo ‘inimigo’.”
218
Já para o Ex-presidente do estado do Rio de
Janeiro e membro da mara Federal de Deputados, Alberto de Seixas Martins Torres, não
desejava que a Alemanha saísse vitoriosa da guerra e também achava irresponsável que o
governo tomasse posição numa luta que não pertencia ao Brasil e não atendia aos interesses
do país, assim entrar na guerra seria aceitar a propaganda norte-americana.
[...] que censurava os aliados quando quiseram atribuir à Alemanha toda a culpa da
guerra, livrando-se desta maneira, da responsabilidade de parcialmente provocá-la.
[...] ser pró-aliado significava uma cegueira com respeito à propaganda industriosa
dos Estados Unidos e da Inglaterra, e seu possível domínio mundial depois da
guerra.
219
Segundo Francisco Vinhosa, de 1914 à 1917, o Embaixador da Argentina, nos Estados
Unidos, tinha mais influência do que o Embaixador Brasileiro. “A administração norte-
americana mostrava-se muito mais interessada na entrada da Argentina na guerra do que na
entrada do Brasil. Com a recusa do governo argentino de declarar guerra aos alemães, o
prestígio de seu embaixador em Washington foi seriamente atingido.”
220
Esse ato de
suspender a neutralidade e de beligerância do Brasil pode ser considerado como um golpe
político que o faria se projetar mais do que a Argentina como possível líder das nações sul-
americanas durante a guerra.
A entrada do Brasil no conflito fez aumentar suas relações comerciais colocando-o no
cenário mundial e de 1914-1918, o mundo se deparou com um conflito mundial, que
impulsionou transformações na estrutura econômica do Brasil e dos outros países da América
do Sul. As dificuldades de importar produtos industrializados europeus fizeram com que o
setor secundário se mobilizasse para atender as necessidades existentes na economia. A
situação criada ao mercado mundial pelos acontecimentos europeus se refletiu no aumento da
exportação de carnes congeladas do Brasil e da Argentina para o Reino Unido.
218
Id., p 33.
219
VALLA, Victor. Op. cit., 1976, p 35.
220
VINHOSA, Francisco Luiz Teixeira. O Brasil e a primeira guerra mundial: a diplomacia brasileira e as
grandes potências. Rio de Janeiro: IHGB, 1990, p 121.
79
A Inglaterra investiu nos países do Cone Sul durante a guerra. A Argentina fornecia
trigo, cevada, aveia, milho, carne, lã, couros e tungstênio e o Brasil fornecia café, borracha e
manganês. “O governo dos Estados Unidos, por sua vez, procurava tirar proveito das
oportunidades comerciais que surgiram com a guerra. O Brasil, contudo, não despertava o
interesse dos investidores norte-americanos, que viam na Argentina, por exemplo, um
mercado mais atraente e lucrativo do que o brasileiro.”
221
Quando, em 1917, houve a declaração de guerra pelos Estados Unidos, a neutralidade
do Brasil não pode mais ser mantida. O torpedeamento de alguns navios mercantes foi a
desculpa para acompanhar os norte-americanos. A crise no Ministério das Relações Exteriores
tira o Ministro Lauro Müller do cargo suspeito de germanófilo pela sua origem alemã que foi
resolvida com a indicação de Nilo Peçanha.
A participação brasileira efetiva na Primeira Guerra Mundial foi o envio, ao campo de
batalha, de médicos cirurgiões, auxiliados por um grupo de estudantes de medicina. Também
enviou soldados, mas apenas para guardar o hospital brasileiro de campanha e o
patrulhamento do Atlântico Sul. Com a guerra em andamento aumentaram as exportações de
produtos agrícolas e matérias primas. Com a impossibilidade de importar o Brasil, teve um
surto industrial que resultou na geração de novos empregos.
A manutenção da neutralidade brasileira durante a Primeira Guerra Mundial, acarretou
em 1917, a exoneração de Lauro ller, considerado, favorável à Alemanha pela insistência
da neutralidade, assim sua exoneração pode ser atrelada a pressão da oposição ao governo
brasileiro e pelo fato de ser filho de imigrantes alemães e assim sua posição no Ministério das
Relações Exteriores poderia tornar-se constrangedora para o governo brasileiro, pois a
neutralidade era contestada pelos pró-aliados e o Brasil deveria optar por uma posição
mediante a guerra que já acontecia a quatro anos na Europa.
A opinião do ministro Lauro Müller estava divergindo da opinião pública brasileira
que solicitava o alinhamento do Brasil aos Estados Unidos na guerra em apoio incondicional
aos Aliados. Apesar da ambição brasileira na guerra estar inserida numa política econômica,
os que defendiam uma posição de neutralidade tinham a preocupação de que esse alinhamento
poderia tornar o Brasil ainda mais dependente dos Estados Unidos. Ocorreram manifestações
no país em favor da entrada do país na guerra e Lauro Müller declarou: “O argumento dos
oradores nas praças blicas é sempre o mesmo: o Brasil tem de seguir o exemplo dos
221
VINHOSA, Francisco Luiz Teixeira. Op. cit., 1990, p. 120.
80
Estados Unidos. Isto significaria tornarmos nossas opiniões, as opiniões dos Estados Unidos.
Mas um país independente governa-se por si.”
222
Para Lauro Müller, o Brasil não deveria envolver-se no conflito, mas após sua
saída, o novo ministro Nilo Peçanha, declarou que a política do Brasil seria francamente
americana, apesar da exoneração de Lauro Müller ter ocorrido no dia 02 de maio de 1917 o
Brasil só tornou-se beligerante a partir de 26 de outubro de 1917.
A queda de Lauro Müller foi ocasionada por sua suposta posição de germanófilo, por
não declarar abertamente guerra à Alemanha, mas durante a sua gestão como Ministro das
Relações Exteriores, esteve sempre como um defensor da amizade e de um alinhamento com
o Estados Unidos, que na sua opinião, seria o melhor caminho para o Brasil.
3.5 Repercussão na Imprensa Argentina
Na correspondência da Legação Brasileira em Buenos Aires, percebe-se a preocupação
dos representantes diplomáticos em analisar os artigos editados pela imprensa argentina
referentes aos acontecimentos ocorridos no Brasil, assim a seleção e envio de recortes de
jornais eram quase diárias, pois quando não era um jornal era outro que deixava as suas
impressões positivas ou negativas sobre o Brasil.
Os jornais argentinos reivindicam que o Brasil tratasse igualmente a Argentina tanto
como fazia com os Estados Unidos. Um exemplo é a compra de farinha de trigo que o Brasil
fazia do país, mas não concedia as mesmas isenções aduaneiras que as farinhas norte-
americanas. O La Razón em artigo informa as tarifas diferenciadas. “La inspeción General de
Aduanas, que tiene facultades para ello, hecho saber que queda sin efecto la rebeja
especial de 30 por ciento acordada desde hace um par de años á la importación de harinas
procedentes de los Estados Unidos de Norte América,
223
Para o jornal, essas concessões nos
direitos aduaneiros prejudicaram muito o produto argentino.
La Prensa, em edital, declarou que a Argentina ameaçava retaliações ao Brasil perante
as diferentes tarifas alfandegárias que o país praticava com os produtos dos Estados Unidos.
La Argentina pretende emanciparse del Brasil, em cuando al consumo de yerba mate se
refiere, por ejercer um acto de represalia, a causa de la liberación de derechos otorgada por
222
BARRETO FILHO, Fernando P. Mello. Op. cit., 2001, p. 45.
223
La Razón. 05/04/1913.
81
el gobierno brasileño á los trigos norteamericanos.”
224
O jornal declarava a intenção que a
Argentina tinha de desligar-se economicamente das relações que mantinha com o Brasil.
Em 1912, o ex-presidente brasileiro Campos Salles foi nomeado para representar o
Brasil na Argentina. Segundo declaração de La Argentina esse ato era uma forma de deixar a
Argentina caminhar e procurar sua hegemonia, pois a ação do Governo Brasileiro demonstrava
a amizade e o respeito para com a Argentina.. Uma vez que el Brasil renuncia á su política
imperialista, y despierta de sus sueños de hegemonia fundada en la fuerza material, el
caminho se le abre ancho para recorrerlo y engrandecerse sin obstaculizar la marcha
argentina.”
225
O Ministro Lauro Müller confiava que o prestígio de Campos Salles em Buenos
Aires e as suas ligações pessoais com as lideranças argentinas pudessem contribuir para
restituir as relações bilaterais à atmosfera de cordialidade e confiança recíproca de que
necessitavam os dois países.
Novamente abria-se a expectativa de um ato diplomático que pudesse qualificar
positivamente uma relação que parecia esbarrar em desconfianças e encerrar-se numa
determinação do comportamento do Brasil perante sua adversária e vizinha, a nação Argentina,
mas o governo brasileiro não pretendia dar destaque especial à esta Legação em relação à
Legação que estava no Chile, país que interessava para os acordos que o Brasil pretendia
assinar na América do Sul.
Parece que a nomeação de Campos Salles surtiu efeito, pois Saenz Peña, presidente
argentino, enviou discurso para o representante na Argentina, declarando que a América espera
exemplos e progressos espirituais dos dois países. O Senador A. Azevedo solicitou que o
discurso ficasse nos Anais do Senado para ser lembrado como uma forma de demonstração
dessa amizade. Parte do discurso de Saenz Peña. “O Brasil e a Argentina, estas Nações que
florescem sobre a imensa costa sul do Atlântico, devem representar hoje e sempre duas
paralelas interminas, (sic) destinadas a não se encontrarem nunca em postos imaginários de
conflitos.”
226
No dia 08 de junho de 1912 o presidente argentino Roque Saenz Peña, em
mensagem a sua nação declarou: Nuestras relaciones con las potencias extranjeras se
mantienen bajo el pie de la más perfecta cordialidad, como necesaria consecuencia de las
normas respetuosas, ecuánimes y conteses que han inspirado en todo tiempo la política
exterior de la república
227
A Argentina pregava a política da mais perfeita cordialidade, como
224
La Prensa,. 06/08/1913.
225
La Argentina, 16/03/1912.
226
Discurso de Antonio Azevedo. Anais do Senado. 1912. Vol. 1. Rio de Janeiro:Editora Nacional, 1914, p 339.
227
La Nación, 08/06/1912.
82
uma conseqüência lógica das boas relações, principalmente, com o Brasil, que está explicita
na política exterior do seu país.
Em 1915 os exportadores de farinhas de trigo dos Estados Unidos não estavam
atendendo aos pedidos de compra da cidade do Rio de Janeiro, encontrando preços melhores e
mais altos para o produto na Europa. A Argentina também exportava farinha de trigo para o
Brasil e solicitava benefícios para o seu produto. Souza Dantas, em correspondência para o
Ministro Lauro Müller, enviou as notícias argentinas referente ao assunto. La Nación, do dia
4 do corrente em artigo editorial, aconselha este Governo a aproveitar a ocasião para conseguir
de modo definitivo favores para as farinhas argentinas.”
228
Lauro Müller como Ministro, concedeu entrevista ao La Nación, declarando:
La Argentina tenido muchas beses superioridad sobre nuestra Marina y a la vez
nosotros, em ciertos momentos, la hemos tenido sobre ella, sin que eso haya podido
ser considerado como un peligro. [...] Lo que puedo afirmale categóricamente es
que el Brasil en ningún caso tomará la ofensiva, ni será el atacante contra ningún
pueblo del continente del sur.
229
O jornal La Prensa incentivava com seus editoriais o armamento e declarava que o
desarmamento era um sonho. “Defendia a manutenção dos navios de guerra da Argentina e
afirmava que esta não aspirava hegemonias, não se interessava pelo desarmamento de seus
vizinhos e não temia agressões européias ou americanas.”
230
Mas, no jornal La Mañana, percebe-se a intenção e as demonstrações da amizade dos
três países participantes, Argentina, Brasil e Chile do Cone Sul, bem como a possibilidade de
um tratado que poderia servir para o início de uma política de desarmamento e parar com os
grandes gastos militares. No habrá ninguna demonstración más clara, ni más convincente
de la sinceridad de esa política, de la efectividad de los sentimentos que nos vincualn al
pueblo del Brasil y de Chile, de la lealtad de los gobiernos que subscriben el tratado.”
231
O
desarmamento em conjunto seria a garantia de um futuro de paz, de harmonia e de trabalho e
progresso para a população da América do Sul. Tanto o Brasil como a Argentina pretendiam
se armar e se a Argentina não adquirisse material bélico o Brasil manteria sua posição de
superioridade naval. “Apesar das boas relações, havia entre as duas nações, desconfianças
228
AHI. Secção dos Negócios Econômicos da América. N. 29. Legação Brasileira na Argentina, 05/07/1915.
229
La Nación, 22/08/1912.
230
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 407.
231
La Mañana, 24/08/1915.
83
que o debate sobre o armamento fazia aflorar. [...] Na esfera militar, argentinos e brasileiros
viam-se como inimigos prováveis.”
232
O despacho da Legação Brasileira em Buenos Aires enviou uma análise do
discurso de Scherril, ex-Ministro dos Estados Unidos em Buenos Aires referente a Doutrina
Monroe, doutrina sintetizada na frase a América para os americanos’, que pode ser
considerada a gênese do pan-americanismo. Ela reforçou também a política isolacionista dos
Estados Unidos e contribuiu para fortalecer a sua posição na América Latina, editado no El
Tiempo e no La Nación.
Na opinião deste diplomata a doutrina de Monroe deve ser ampliada favorecendo o
Brasil e a República Argentina. O princípio da mediação e talvez a intervenção se
tornariam extensivos às duas nações da Sul–América, deixando de ser privilégio dos
Estados Unidos. Adquire uma certa importância esta declaração por ser de um
americanista de valor e um diplomata que esteve acreditado junto ao governo
argentino.
233
Quando o Ex-presidente norte-americano, Theodoro Roosevelt, visitou a Argentina em
1914, o ex-ministro Estanislau Zeballos proferiu um discurso que foi transcrito no jornal La
Nación, declarando que a Argentina, é independente, estimada e honrada, sua população é de
origem européia pura,
234
sendo assim, não poderia seguir a doutrina americanista, a Doutrina
Monroe
235
.
232
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 409-411.
233
AHI. Nota da Legação Brasileira na Argentina ao Governo Brasileiro, 13/02/1913.
234
A Argentina foi o país de destino de vários imigrantes europeus que procuraram as terras férteis ao redor de
Buenos Aires. Em 1914, 30% da população argentina tinha vindo do estrangeiro, predominavam os imigrantes
italianos e espanhóis, também vieram irlandeses e judeus da Rússia e da Europa Ocidental vieram os alemães
austríacos, franceses, ingleses e suíços.
235
Depois da Santa Aliança, 1815, o governo estadunidense manifestou-se contrário as intervenções dos países
europeus. O presidente James Monroe, em 1823, formulou a Doutrina Monroe, que negava o direito de
intervenção da Santa Aliança na nações americanas. Essa doutrina sintetizava a frase “a América para os
americanos”, e também pode ser considerada a gênese do pan-americanismo. Ela também reforçou a política
isolacinistas dos Estados Unidos e contribuiu para fortalecer a sua posição na América Latina. Seus principais
pontos eram:
- os países do continente americano, em virtude da condição de livres e independentes, não podiam ser
considerados territórios sujeitos a futuras colonizações por nenhuma potência européia;
- o sistema político das potências européias aliadas era diferente do americano. Qualquer tentativa das potências
aliadas de impor seu sistema, em qualquer parte do hemisférios, devia ser considerada um perigo à paz e a
segurança nacional;
- nas guerras das potências européias, por questões que diziam respeito exclusivamente a elas, os americanos não
deviam tomar parte.
84
a) que la civilización argentina está definitivamente estabelecida; que posue su
individualidad propia; que es estimada y honrada como tal en el concierto de las
naciones;
b) que esta civilización es, em origen y en carácter, puramente europea; y que, por
lo tanto, sólo puede seguir una política panamericana a condición de respetar y
mantener sus fuertes, vínculos morales, intelectuales y económicos con Europa;
c) que, en consecuencia, la doctrina de Monroe no seria aplicable a la República
Argentina.
236
Percebe-se que a imprensa portenha exprime a superioridade dos intelectuais
argentinos onde o homem branco domina a população fundada pelos exploradores europeus
ocorrendo a exaltação dos ânimos no país que estava se sentindo ameaçado pela nação norte-
americana e pela influência de agentes externos em que a mentalidade dos órgãos do governo
pregava a hegemonia e a qualidade do povo argentino.
Durante a guerra o comércio dos países sul-americanos foi afetado pelo conflito
armado, estes deixaram de comercializar com outros continentes pois, o transporte marítimo
foi atingido por várias sanções impostas pelos países beligerantes. A França, Inglaterra,
Alemanha e Estados Unidos tomaram medidas para ampliar e apoiar as suas relações
econômicas e o vínculos com a Argentina e o Brasil, sendo que o imperialismo americano
estaria ameaçado no Continente Americano e a Doutrina Monroe ou qualquer outra
subordinação imperialista no conflito europeu não privilegiaria os mercados argentino e
brasileiro. Assim se manifesta o La Nación:
La doctrina de Monroe viene a ser así virtualizada, no ya por los medios de uma
política panamericana, sino por la sanción del conflito europeo que deja la
enseñanza de que la conquista de estos mercados y su subordinación al
imperialismo, sea cual fuere su poderio y procedencia, es irrealizable sin deparar
sacrificios y zozobras que no compensan sus devaneos de prevalencia
.
237
Com a neutralidade na guerra, a Argentina permitiu um surto de desenvolvimento
industrial, principalmente nos produtos têxteis e móveis, além de expandir suas relações
comerciais e internacionais com a Inglaterra e com os Estados Unidos. Através do Decreto
n.5 o governo argentino, declarava sua neutralidade na guerra européia, adotando as
236
La Nación, 03/03/1914, p 01.
237
La Nacion, 09/09/1915.
85
disposições da Convenção concernente aos Direitos e Deveres das potências neutras assinada
no Tratado de Haya aos 18 de outubro de 1907.
238
Com a conflagração européia a Argentina e o Brasil se mantiveram neutros, seguindo
o caminho traçado pelos Estados Unidos. No La Razón, a política americana foi aprovada.
Cuando estalló la conflagración europea, sostuvimos la conveniencia de llegar a establecer
una acción solidaria en América, para sostener la neutralidad dentro de los limites del
derecho, la verdad y la justicia.”
239
A exportação de carnes congeladas estimulou o consumo dos países beligerantes e a
venda de carnes brasileiras, que têm suas indústrias localizadas nos Estados do Rio Grande do
Sul, São Paulo, Mato Grosso, Goiás e no Triângulo Mineiro. Durante a guerra o comércio de
carnes congeladas para os Estados Unidos aumentou, pois a sua produção era menor em
relação as necessidades do seu povo. La Nación informou que esteve na Argentina e no
Brasil, Carlos León Chandler, acionista das empresas ferroviárias Southern Raylway
Company, com o propósito de estreitar os vínculos comerciais com os países da América do
Sul. “Mr. Chandler acaba de realizar una jira por diversos puntos del Brasil, dando a
conocer las ventajas recíprocas que pueden reportar a los Estados Unidos y a los países
sudamericanos un mayor acercamiento comercial.”
240
No ano de 1915, durante a guerra, o Ministro Lauro Müller, visitou a Argentina para
afirmar o Tratado entre Brasil, Argentina e Chile e estranhou que os pontos turísticos do
Brasil não fossem conhecidos na Argentina. Sugeriu que a imprensa argentina publicasse
mais artigos e fotografias divulgando o turismo brasileiro. Assim a imprensa brasileira seria
recíproca com as belezas da Argentina estreitando os vínculos de amizade entre os dois
vizinhos. O Ministro concedeu entrevista ao La Razón para o repórter Luis Goruert que
declarando ser, o chanceler, um grande colaborador da paz sul-americana, Lauro Müller
respondeu:
Soy un pobre soldado de la paz. Felicitémonos todos de que este tratado pacifista se
haya firmado em estos momentos de agitación mundial, em estos momentos
culminates de la historia.
Que el ABC, que a algunos políticos los menos les será indiferente no hay la
menor duda que tendrá una repercusión de trascendental importancia para la
política internacional.
241
238
AHI. Nota do Governo Brasileiro a Legação Brasileira na Argentina, 26/08/1914.
239
La Razón, 14/03/1916.
240
La Nación, 29/06/1915.
241
La Razón, 09/06/1915.
86
Referente ao Tratado firmado entre o Brasil, a Argentina e o Chile, o ministro
declarou que este seria uma forma de aproximação entre os três países, no qual os políticos
deveriam pensar não só nos negócios mas também na paz entre os povos irmãos.
Los países sudamericanos, que antes eran considerados como parte inactiva en la
política de allende el mar, tendrán ahora un voto firme que será necesario
considerar y apreciar.
Sin querer avanzar mucho, creo que será el contrapeso de la política europea.
Todos nosotros unidos, formaremos una entidad noble, fuerte y respetada.
Inculquemos en nuestros pueblos el amor fraternal. Dejemos esas corrientes de
opiniones malentendidas, fomentadas por políticos de negocio; seamos los
trabajadores de paz y de concordia.
242
Para o Ministro Lauro Müller, o Brasil e a Argentina, deveriam manter a amizade e os
laços econômicos entre ambos.
Que este tratado sea el epilogo de esas recelos que no deben existir entre os pueblos
hermanos.
El pueblo argentino es un pueblo noble, grande y ‘guapo’.
Yo llevo en mi alma muchas flores recogidas en esa hermosa tierra. Flores que
depositaré en el Brasil, para que, al impregnarse nuestro ambiente, expandan el
perfume de amistad, de paz y de concordia duraderas.
243
Nesta entrevista de ller percebe-se a intenção de perpetuar os laços de amizade
entre o Brasil e a Argentina através do Tratado do ABC juntamente com o Chile, que irá
repercutir na política internacional, a união dos três países os tornaria uma instituição nobre,
forte e respeitada. Os países deveriam ser os trabalhadores da paz e da concórdia entre os
povos irmãos. Nos elogios ao país vizinho certos exageros como uma forma de agrado à
imprensa argentina, como o argentino é nobre, grande, hábil, esperto e talentoso. Nesse
discurso aparece o mito político que está implícito na frase do Ministro “Sou um pobre
soldado da paz” que, como militar demonstra seu espírito guerreiro, mas que se opõem ao ato
de guerrear, seu combate está voltado para a conservação da paz de todos os países.
O La Razón solicitou a reflexão da ação solidária do Brasil para com os Estados
Unidos na Primeira Guerra Mundial e continua que se a Argentina e quem deixar de ser
242
La Razón, 09/06/1915.
243
La Razón, 09/06/1915.
87
neutro e se aliar aos países mais fortes poderão ser prejudicados, pois os mais fracos quando
unidos aos poderosos sempre são explorados. O mesmo jornal analisa que na Argentina,
alguns políticos deixaram subir a cabeça o Tratado do ABC, (Argentina, Brasil e Chile) e os
países participantes do ABC se esquecem que a América do Norte vale por todo o abecedário
da América do Sul. A mesma opinião é compartilhada por Rui Barbosa, o Brasil o pode
vacilar na declaração do final da neutralidade.
Como el eminente estadista brasileño, Ruy Barbosa, no he podido concebir que se
vacilara, en una situación tan neta, precisa y apremiante, en el cumplimiento de
deberes indeclinables, en defensa de los más sagrados intereses de la existencia
nacional; que se vacilara, en adherir sin retardo, franca y resueltamente, a la
actitud serena e irrevocable de Estados Unidos ante el caos, amenazante de la
lucha más horrenda que jamás haya amenazado a la humanidad.
244
O afundamento de navios brasileiros teve ampla repercussão na opinião nacional. A
ruptura das relações diplomáticas ocorreu em 11 de abril de 1917 por nota do Governo
Brasileiro, assinada pelo Ministro das Relações Exteriores Lauro ller, à Legação da
Alemanha no Rio de Janeiro. A imprensa argentina aprovou a atitude do Ministro e apoiou a
política americana adotado pelo Brasil. No jornal La Época, com o título: Brasil e a Política
Americana, declarou que o Pan-americanismo dará novos e positivos sinais da sua existência
no Continente Americano:
Que la concordia brasileña-argentina entre sí, y, a la vez, la ambas naciones con las
doctrinas sostenidas y aplicadas por los Estados Unidos de Norte América,
demuestra la existencia de un pensamiento ininterrumpido y continuo en ambos
continentes.
La actitud resuelta y firme del Brasil no es, entonces, un acto dictado dentro del
continente. Hay motivos razonables para creer que el panamericanismo no tardará
en dar nuevas y positivas señales de su existencia.
245
Na guerra, a Argentina foi prejudicada em sua navegação com o aprisionamento do
vapor Presidente Mitre pela Inglaterra, sendo que o governo inglês capturou todos os navios
de propriedade alemã sem ter em conta a sua nacionalidade a bordo. Num sentimento de
americanismo, a Argentina, enviou ao Brasil suas congratulações pela atuação do governo
244
La Razón, 09/02/1917.
245
La Epoca, 12/04/1917.
88
perante a declaração de corte das relações diplomáticas com a Alemanha. El Poder Ejecutivo
de la nación envió ayer a la legación del Brasil, la contestación argentina a la nota en que la
nación vecina y hermana comunicaba que habia roto las relaciones diplomáticas con el
gobierno de Alemania.”
246
A eclosão da guerra repercutiu de maneira negativa na crescente e
próspera Argentina estagnando o seu desenvolvimento. A sua política de neutralidade perante
o conflito assumida por Victorio de La Plaza, foi mantida por Hipólito Irigoyen, eleito em
1916.
Durante a gestão do Ministro Lauro Müller a imprensa argentina esteve com seus
editoriais voltados e preocupados com um possível armamento bélico, em algumas vezes
estava explicito o incentivo para a aquisição de materiais bélicos, em outros momentos
pregavam o desarmamento entre o Brasil e a Argentina. Também cogitavam a idéia de que se
o Brasil se desarmasse a Argentina também poderia aderir ao desarmamento, mas o primeiro a
iniciar essa política deveria ser o Brasil. Assim, percebe-se que a imprensa argentina
manifestava-se em relação ao armamento argentino e brasileiro, hora a favor, hora contra.
A Argentina reivindicava que o tratamento do governo brasileiro deveria ser o mesmo
adotado em referência aos Estados Unidos, tanto em relação a amizade como às tarifas
alfandegárias praticada pelo Brasil.
246
La Prensa, 15/04/1917.
89
4 AS EXPECTATIVAS DE APROXIMAÇÃO NO CONE SUL: BRASIL X
ARGENTINA
Neste capítulo, veremos a política externa brasileira na gestão Lauro Müller voltada
para o Cone Sul da América. A ênfase sedada à Argentina. Neste sentido, será destacado o
Tratado do ABC, firmado em 1915, pelos três mais importantes países da América do Sul:
Argentina, Brasil e Chile.
4.1 Brasil x Argentina: Ajustes e Desajustes
No Cone Sul, o Brasil e a Argentina são países de peso em qualquer negociação
política. Os dois países procuraram construir uma imagem de superioridade perante o outro,
buscando a hegemonia no continente. Havia um equilíbrio de poder no Cone Sul, através da
aproximação econômica entre Brasil e Estados Unidos e, para contrapor, uma aproximação
entre Argentina e Inglaterra. O Brasil e a Argentina mantêm um relacionamento comercial de
exportação de produtos primários e também de importações.
É necessário conceituar ‘hegemonia’ e ‘liderança’, utilizados para analisar a política
praticada entre o Brasil e Argentina. Assim, hegemonia estaria ligado a supremacia de um
Estado-Nação dentro de um sistema, onde a potência hegemônica exerceria uma
proeminência militar, econômica e cultural perante as outras nações.
Sendo vocação intrínseca ao comportamento de qualquer Estado e da máxima
expansão da própria potência, a história das relações internacionais não é senão um
perpétuo alternar-se de equilíbrios instáveis e de tentativas hegemônicas por parte de
Estados, que se situam dentro ou fora de sistemas internacionais pouco a pouco
consolidados.
247
E por liderança, entende-se como uma forma de dominação baseada no prestígio e na
capacidade de persuadir ou dirigir, ou seja estar em primeiro lugar. “Definida como relação de
247
BELLIGNI, Silvano. Hegemonia. In: BOBBIO, Norberto (Org.). Dicionário de Política. 2
a
ed. Brasília:
Editora Universidade de Brasília, 1986, p 579.
90
liderança toda relação entre alguém que guia e alguém que está sendo guiado [...] acaba se
confundindo com o conceito de influência, sem manifestar nenhum traço específico.”
248
A corrida para conquistar a hegemonia pelos dois países foi idealizada pela visão de
que um seria melhor do que o outro, assim no âmbito das relações bilaterais a busca do
equilíbrio de poder no sub-continente, na década de 1910, está voltada para a idéia da
superioridade no Cone Sul, onde tanto o Brasil e a Argentina buscavam a liderança política no
âmbito regional. “Na percepção argentina, o Brasil era o portador de uma irrefreável vocação
expansionista, herdada do ‘espírito bandeirante’; na percepção brasileira, a Argentina
acalentava também um sonho expansionista de reconstrução do antigo Vice-reinado do Prata,
sob a hegemonia de Buenos Aires.”
249
O Brasil e a Argentina pertencem a uma região que, em alguns momentos podem gerar
uma interdependência mútua: “Não se deve dissimular que o Cone Sul é formado por três
países maiores – Brasil, Argentina e Chile, nessa ordem – e outros três que são os adjacentes e
necessários.”
250
No Cone Sul pode haver conflitos ou integração entre as nações vizinhas; há,
entre elas, desproporções, disparidades, contradições e disputas regionais.
Nas negociações diplomáticas entre os países do Cone Sul tentou-se resolver os
problemas comuns de economia e de política procurando-se um novo tipo de negociação na
política mundial. Numa perspectiva crítica a solução dos fenômenos da sociedade brasileira e
argentina, nas relações internacionais, sempre estiveram inseridas no Estado que procurava
legitimar sua política através das rivalidades regionais e no contexto continental esteve
voltada nas disputas econômicas e territoriais, também na expansão ou na defesa do seu
território. O Cone Sul era uma região com interesses geopolítico e estratégico, onde o Brasil e
a Argentina exaltavam suas ideologias de supremacia procurando legitimar as entidades
políticas do seu Estado.
Para Cervo e Rapoport o Cone Sul é uma entidade onde a política de um país reflete
nos outros. “Uma comprovação preliminar acerca da existência dessa entidade se dá quando se
verifica que um acontecimento que afeta, impacta ou perturba um dos países é sentido de
maneira particular no resto deles, ou seja, de maneira diferente de sua repercussão em outras
248
PETRACCA, Orazio M. Liderança. In: BOBBIO, Norberto (Org.). Dicionário de Política. 2ª ed. Brasília:
Editora Universidade de Brasília, 1986, p 715-716.
249
MELLO, Leonel Itaussu Almeida. O Brasil na geopolítica do Cone Sul. In: DEL PRIORE, Mary. 500 anos
de Brasil: histórias e reflexões. São Paulo: Scipione, 1999, p 73.
250
CERVO, Amado Luiz; RAPOPORT, Mario (Org.). História do Cone Sul, Rio de Janeiro: Revan;
Brasília:UnB, 1998, p 128.
91
partes do planeta.”
251
Ao longo do tempo, no Cone Sul ocorreram tentativas de integração
entre o Brasil e as outras nações. “O fato de as repúblicas menores do referido segmento
projetarem alianças com um país de maior expressão indicava tendências, aproximações que,
fatalmente, redundariam em blocos de pressão internacional.”
252
Cada país integrante do Cone
Sul tem um aspecto regional que não se desprende do global.
O Cone Sul, é também uma expressão geopolítica e econômica. Como objetos da
geopolítica, convertem-se em um assunto no qual se apresentam hipóteses de
conflito. Como objeto da economia, apresenta-se como um assunto que contém
recursos e riquezas e, a partir daí acentuam-se os modos de produção, os circuitos de
circulação de bens e intercâmbios comerciais e a prestação de serviços. Outra visão
conduz, em contrapartida, a pleitear hipóteses de integração e a considerar dentro
dos projetos de desenvolvimento econômico e, ainda sobrepostas a seus imperativos,
as questões sociais e culturais que estão na base da estrutura de sua populaçâo.
253
As alianças fortalecem os interesses políticos na formação de blocos regionais gerando
oportunidades de relações comerciais. A história em comum mostra que se trata de um
conjunto de países com os mesmos problemas mas que relutam em consertá-los. “As nações
do Cone Sul têm constituído tradicionalmente, ao longo dos séculos, uma verdadeira família,
porém, uma família mal na vida, com parentescos às vezes não assumidos e, às vezes, aceitos
com desgosto ou sob protesto.”
254
O Brasil e a Argentina, no dizer de Moniz Bandeira, estavam:
Histórica e geograficamente enlaçados pela rota do Atlântico e por fronteiras vivas
comuns, com economia em larga medida complementares, devido à variedade de
solos e de climas, ambos também mantinham estritas relações bilaterais de
comércio, desde os tempos da colonização.
255
Apesar de terem uma economia que pode ser considerada complementar, moldaram
uma política externa que objetivava a busca da hegemonia regional.
251
CERVO, Amado Luiz & RAPOPORT, Mario (Org.) Op. cit., 1998, p 123.
252
CERVO, Amado Luiz. & BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1986, p 53.
253
CERVO, Amado Luiz. & RAPOPORT, Mario. Op. cit, 1998, p 135-136.
254
Id, 1998, p 138.
255
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O Eixo Argentina-Brasil: o processo de integração da América
Latina. Brasília: UnB, 1987, p 15.
92
A formação de blocos políticos ou comerciais entre países vizinhos prioriza o
intercâmbio de produtos e de serviços, troca de idéias, influências entre as formas de cultura
social e manifestações de simpatia ou antipatia entre os formadores do bloco. “Os processos
regionalizados de integração econômica atestam a reversão da histórica tendência de oposição,
transformando importantes regiões fronteiriças em pólos de aproximação entre dois ou mais
Estados.”
256
Esse exemplo se aplica às tentativas de integração econômica do Brasil. “Na
economia nacional é preciso manter uma defesa inteligente dos nossos produtos de exportação,
é preciso favorecer e amparar a produção nacional, dos gêneros necessários ao consumo
interno, abrindo outras fontes de riqueza que atenuem as crises do café, da borracha e do
açúcar.”
257
Para Cervo e Rapoport as exportações do Cone Sul para o mercado mundial
estavam assim distribuídas em 1913: 32% eram feitas pela Argentina e 20% pelo Brasil.
258
Como confirmação dessa prosperidade, Moniz Bandeira, afirma que a Argentina
chegou a níveis de prosperidade melhores do que os do Brasil.
A Argentina, responsável, por 1/3 de todo o comércio exterior da América Latina em
1913, alcançou um nível de prosperidade muito superior ao do Brasil. Sua renda per
capita, que, em apenas 30 anos aumentou 05 vezes, somente se comparava com os
dos países da Europa Ocidental, sendo mesmo superior à da Suécia, Espanha e
Itália.
259
No decorrer de 1915, o desenvolvimento do comércio de carnes brasileira alarmou os
frigoríficos argentinos que exportavam para a Inglaterra. Diziam que o vizinho tinha a carne
mais barata do que a do seu país, essa foi uma preocupação comercial existente,
principalmente durante a guerra. O La Nación, um dos mais importantes jornais argentinos
vai dizer que “Las carnes argentinas e brasileñas cada una en su categoria, son igualmente
apreciadas y necesarias en el consumo de la Gran Bretaña, pero no pueden bajo ningún
concepto substituirse la una por la otra.”
260
Na construção de um bloco regional a existência de um poder hegemônico na
região pode agravar a situação comprometendo as realizações das partes envolvidas e
256
SEITENFUS, Ricardo Antonio Silva. Op. cit., p 91.
257
Discurso de João Luiz Alves. Anais do Senado 1913. Vol. 5. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p
152.
258
CERVO, Amado Luiz & RAPOPORT, Mario. Op. cit., 1998, p 251.
259
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Op. cit., 1987, p 16.
260
La Nación, 13/06/1915.
93
dificultando a existência do mesmo. A integração regional converge nas preferências da
política interna entre os Estados nas relações internacionais.
Tanto o Brasil como a Argentina, num bloco inserido no Cone Sul, possuem poderes
equivalentes de negociação e de influência mediante seus vizinhos, eles possuem a mesma
força de barganha. Na integração regional, percebe-se que os interesses brasileiros estão
evidentes na sua política externa que objetivava a autonomia política e econômica no
comando de qualquer aliança entre os países da América do Sul.
Na gestão do Ministro Lauro Müller, sua atuação na política externa, esteve voltada
para apaziguar os ânimos dos políticos argentinos que receavam a amizade do Brasil com os
Estados Unidos, que além de competir economicamente com a Argentina ainda compravam
pouco da sua produção. Depois da definição dos limites entre o Brasil e Argentina, não havia
nada de concreto para atrapalhar as relações entre os dois países.
A partir da Proclamação da República Brasileira, o regime adotou um modelo
político liberal onde o liberalismo político brasileiro estava baseado no coronelismo e a
supremacia rural das oligarquias, na política dos governadores, e concentra a economia
primário-exportadora na produção de café. “A economia caracteriza-se por ser dependente,
[...] centrada na cafeicultura, oficializada pelo Convênio de Taubaté (1906) e sustentada pela
política de valorização do produto-rei. Além disso, baseava-se na política de desvalorização
cambial [...]”
261
Os setores industriais que mais se desenvolveram na década de 1910-1920 foram os
ramos têxtil, de alimentação e de vestuários que não exigiam tecnologia sofisticada. A cidade
do Rio de Janeiro, capital do país, foi o maior centro industrial perdendo seu status para São
Paulo a partir de 1920 com a expansão da produção do café no interior do estado.
As exportações do Brasil tinham o café como o seu principal representante e o país
efetuou vendas para a Califórnia que aumentaram de 12.000 sacas em 1911, para 54.000 sacas
em 1912 e 168.000 sacas em 1913. A erva mate, desconhecida por algum tempo, estava em
grande demanda durante o período.
262
Em 19 de julho de 1913, o Senado Brasileiro rejeitou o
projeto de isenção de direitos de importação para construir e instalar uma fábrica de cimento
no estado de Santa Catarina mas promulgou a lei de isenção para alguns produtos. A Lei n.
261
MELLO, Leonel Itaussu Almeida.. Op. cit., 1999, p 71.
262
Discurso de Mendes de Almeida. Anais do Senado. 1914. Vol. 2 Rio de Janeiro:Editora Nacional. Jun/1914,
p 57.
94
2.210 de 28 de dezembro de 1909 concedeu isenção de direitos aduaneiros aos maquinismos
e acessórios destinados ao estabelecimento de fábricas de ferro esmaltado e cimento.
263
A exportação da borracha, principal produto do Pará e do Amazonas, as carnes
congeladas, e os couros, bem como o desenvolvimento de indústrias que fornecem produtos
que antes da guerra eram monopólio de fabricantes estrangeiros.
264
Assim, o consumidor
brasileiro, substituiu a compra de produtos estrangeiros por similares nacionais, pois as
importações foram prejudicadas pelos bloqueios dos países beligerantes “A guerra afetou as
transações comerciais afetando as importações e as exportações que eram feitas através do
mar. Com a guerra o Brasil aumentou suas vendas para o exterior de cereais, banha e carnes
congeladas, pois a Europa estava em guerra e não produzia tais produtos”.
265
O Governo Brasileiro, de 1904-1913, adotou tarifas diferenciadas de redução dos
direitos de importação no Brasil para alguns produtos de procedência norte-americana, foi
uma espécie de compensação por ser os Estados Unidos o maior importador do principal
artigo de exportação brasileira o café. Nos anos de 1915 e 1916 continuava em vigor a
autorização concedida ao Governo para adotar uma tarifa diferenciada para um ou outro
gênero de produção estrangeira, podendo a redução ir até o limite de 20%, limite que para a
farinha de trigo poderá ir até 30% desde que tais reduções sejam compensadoras de
concessões feitas a produtos brasileiros, a borracha e o fumo. A Embaixada dos Estados
Unidos em Nota n. 273 de 03 de Janeiro de 1916, pediu que fosse mantida, durante aquele
exercício, a costumada redução da tarifa aduaneira preferencial, para os mesmos artigos
originários daquele país, importados no Brasil, que lhes havia sido concedida durante o ano de
1915.
266
Assim, ambos concordaram em reforçar o comércio entre as duas nações concedendo
vantagens comerciais para seus produtos. O café, o açúcar e a borracha entrariam livremente
nos Estados Unidos e o Brasil concederia aos produtos americanos benefícios alfandegários.
“A crescente hegemonia dos Estados Unidos significará um gradativo, porém seguro,
alinhamento dos interesses brasileiros aos interesses norte-americanos”.
267
A partir de 1912 ocorreu a crise da exportação da borracha que afetou a Bolívia, Peru,
Colômbia, Equador e a Venezuela, mas principalmente o Brasil, que tinha na borracha seu
263
Parecer n. 75. Anais do Senado. 1913. V. 4. Rio de Janeiro:Editora Nacional, 1916, p 165.
264
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro. Imprensa Nacional. 1916. P. X..
265
CERVO, Amado Luiz. & BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1986, p 192.
266
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p 172.
267
SANTOS, Norma Breda dos. Op. cit., 1991, p 253-270.
95
segundo produto de exportação. Estes produtores não conseguiram competir, na Europa, com
a borracha enviada da Ásia, (Malásia, Indonésia e Ceilão) e do Congo. Mientras tanto, la
capacidad productiva del Oriente se estabelecido en esta forma: en 1913: 54.550
toneladas e en 1914: 85.450 toneladas; en 1911-1912, la producción del Brasil: 44.296
toneladas
268
No século XIX, com o progresso da indústria e o consumo do chocolate na
Europa e nos Estados Unidos, o cacau se torna gênero de grande expressão econômica.
Também se produzia e exportava-se o fumo e a erva mate.
A Argentina desenvolveu-se no setor pecuário inserindo-se gradativamente no
mercado externo, com sua economia exportadora agrícola de clima temperado. “Entre 1886-
1914 o produto interno bruto (PIB) argentino saltou de 1 bilhão para 15 bilhões de dólares,
sendo que às vésperas da Grande Guerra o país era responsável por 50% da capacidade
econômica e por um terço do comércio exterior de toda a América Latina.
269
Na década de 1910 concentrou seu comércio com a Inglaterra. “A Argentina desde a
Segunda metade do século XIX, converteu-se, praticamente, numa espécie de colônia
informal da Grã-Bretanha.”
270
Este foi seu principal parceiro econômico e comercial, também
era seu maior comprador de carne de gado, cereais como o trigo e fornecendo-lhe
manufaturados. Segundo dados estatísticos da imprensa argentina, a exportação de trigo
argentino para o Brasil, no ano de 1912, foi de 60.700 toneladas.
Entre 1890-1914, a população do país duplicou, saltando de 3,6 milhões para 7,2
milhões; a rede ferroviária cresceu de 12,7 mil Km para 31,1 mil Km; as
exportações de cereais saltaram de 1.038 para 5.294 milhares de toneladas e as de
carnes congeladas de 27 para 376 mil toneladas. Cristalizou-se naquela época a
concepção de uma Argentina-insular, que volta as costas às províncias do interior e
aos países do continente ao mesmo tempo em que se debruça sobre o litoral e se abre
para o exterior.
271
Os comerciantes argentinos têm na Grã-Bretanha e nos países da Europa o seu centro
de exportações. La clave para comprender la razón estaba en la imagen que las elites
argentinas tenían de un mundo euro-céntrico, liderado por Gran Bretaña, dentro de cuyo
sistema hegemónico el país debía desarrollarse en forma dependientemente asociada.”
272
A
oligarquia latifundiária da Argentina concentra suas riquezas nos produtos que tinham grande
268
La Prensa, 25/08/1913.
269
citado por MELLO, Leonel Itaussu Almeida, op. Cit, 1999, p 69.
270
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Op. cit., 1987, p 15.
271
MELLO, Leonel Itaussu Almeida. Op. cit., 1996, p 29.
272
BERNAL-MEZA, Raúl. Op. cit., p 289.
96
aceitação no mercado europeu e deixaram de investir nas indústrias para não competir com
seu comprador:
A elite crioula continuou a concentrar-se nos empreendimentos agropastoris e a
investir em terras, incentivada pelos preços compensadores que as exportações de
carne e cereais para a Grã-Bretanha por muito tempo lhe proporcionaram, e
articulou-se mais intimamente com o capital financeiro e o complexo exportador-
importador do que com a indústria em ascensão.
273
Os produtos de exportação da Argentina tais como o trigo e outros cereais, eram da
mesma natureza que alguns produtos norte-americanos e esta circunstância, que lhe permitiu
permanecer como reduto do capital europeu na América do Sul, transformou-a em alvo de
fortes pressões, que se refletiu em suas relações com o Brasil. A Legação Brasileira em Buenos
Aires envia artigos de jornais argentinos ao Brasil e chama a atenção do Ministro Lauro Müller
para as intenções comerciais do governo argentino que pretende solicitar ao governo brasileiro
a concessão de modo definitivo dos favores alfandegários para as farinhas argentina, pois os
Estados Unidos não estavam suprindo os pedidos do Rio de Janeiro, pois encontravam
melhores preços na Europa. La Nación, do dia 4 do corrente, em artigo editorial, aconselha
este Governo a aproveitar a ocasião para conseguir de modo definitivo favores para as farinhas
argentinas.”
274
A imprensa argentina defendia que o Brasil teria que aproveitar a oportunidade da
situação econômica na Europa, durante o conflito onde os Estados Unidos suspenderam a
venda de farinhas de trigo para o país. O Brasil deveria retirar as tarifas preferenciais para o
produto norte-americano, que compensavam as tarifas diferenciadas ao café brasileiro, e dar
tratamento diferencial para o produto argentino. O governo da Argentina deveria aproveitar a
ocasião para estabelecer de modo claro e definitivo tarifas para a exportação do rival
americano. Los molineros norteamericanos han resuelto suspender la provisión de harinas a
los mercados brasileño, por encontrar más conveniente enviarlas a los países europeus, donde
además de la ventaja de menor flete, encuentran la de precios más elevados.”
275
O mercado
europeu, um grande comprador dos produtos platinos, durante as décadas de 1900-1920
273
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Op. cit., 1987, p 16.
274
AHI. Ofício n. 29 da Legação Brasileira na Argentina ao Governo Brasileiro, 05/07/1915.
275
La Nación, Buenos Aires, 04/07/1915.
97
sempre recebeu fortes remessas da produção Argentina. Mesmo com a conflagração da
Primeira Guerra Mundial, este comércio continuou.
4.2 Aproximação entre Brasil e Argentina
Lauro Müller buscou a aproximação com a Argentina. Esta política refletiu de forma
positiva internamente. O exemplo é o discurso do Senador Sigismundo Gonçalves declarando
no Senado que Argentina é nossa irmã do sul e um país que prospera prodigiosamente. “Tanto
temos feito para mais nos ligarmos politicamente a ele, sobressaindo nesse serviço Mitre, Rio
Branco, Campos Salles, Roca, Saenz Peña e Lauro Müller; esse país a que, antes do trabalho
de tais estadistas, éramos já ligados pela natureza como irmãos siameses.”
276
Na imprensa brasileira, nos editoriais do jornal O Estado, percebe-se um certo
exagero na afirmação da continuidade das relações entre o Brasil e Argentina e a amizade
entre os dois países cultivadas apesar dos problemas que sempre afligiram os dois povos.
“Relações cimentadas pelo sangue que os dois povos derramaram juntos nas lutas pela
liberdade de outros povos irmãos, não poderá ser perturbada jamais, porque temos idênticos
destinos a cumprir na história Continental.”
277
Também no jornal O Dia, Lauro Müller
declarou que enquanto estivesse no Ministério das Relações Exteriores continuaria a exercer a
amizade tradicional para com os países vizinhos e o mesmo apregoava a paz entre o Brasil e a
Argentina, pois estes são amigos de longa data. “Que já se acham unidos por laços da mais
antiga e sincera amizade, se estreitam cada vez mais à sombra da paz, de forma a lhes permitir
que caminhem juntos para o progresso, no desempenho da importante missão social e política
que os dois povos amigos tem a representar na América do Sul.”
278
A Argentina e o Brasil têm políticas de equilíbrio de poder no Cone Sul através de suas
ligações com países desenvolvidos: assim o Brasil tentava aliar-se com os Estados Unidos e a
Argentina com a Inglaterra. Enquanto o Brasil contava com o mercado norte-americano para
suas exportações de café e cacau, a Argentina vendia para a Europa principalmente à Grã-
Bretanha, onde sua comercialização está concentrada na carne, lã, algodão e trigo. A
dependência comercial fez com que os interesses políticos do Brasil girassem em torno dos
276
Discurso de Sigismundo Gonçalves. Anais do Senado. 1912. Vol. 3. Rio de Janeiro: Editora Nacional. p 244.
277
O Estado. Independência Argentina. 25/05/1915, p 01.
278
O Dia, O dr. Lauro Müller e a política sul-americana. 10/03/1912, p 01.
98
Estados Unidos e os da Argentina em torno da Inglaterra. “A Argentina era o único país capaz
de oferecer uma competição séria no esforço por alcançar a cobiçada posição de primeira
potência da América do Sul e surgiu, assim, como o principal rival do Brasil.”
279
A declaração do ex-presidente da Argentina, Saenz Peña, Tudo nos une, nada nos
separa,” tenta demonstrar uma cordialidade que ligaria os dois povos amigos. Também
Campos Salles, quando nomeado Ministro na Argentina, enfatizou de forma concludente a
mesma a frase. O Dia traz o discurso:
De fato, tudo nos une: a amizade cabalmente demonstrada em dias anormais, a
aliança mantida longos anos nos campos de batalha, o grão de cultura dos dois povos
e o desejo de trabalhar e progredir moral, política e materialmente que si (sic) não
poderá realizar senão sob a égide da paz.”
280
Para demonstrar sua satisfação na nomeação de Campos Salles, a República da
Argentina nomeou o General Julio Roca para representar seu país no Brasil.
Durante o período da presidência de Victorino de la Plaza (1914-1918), e o seu
ministro das Relações Exteriores, José Luis Murature, o governo argentino iniciou
conversações e intercâmbios para estabelecer novas negociações com os países do Cone Sul.
“Decidieron aprovechar el momento de armonía existente entre las tres naciones del Cono Sur
e iniciaron conversaciones con las cancillerías de Río de Janeiro y Santiago de Chile.”
281
O Brasil e a Argentina, como atores, rivalizaram relações de poder na região do Cone
Sul priorizando a busca da hegemonia que impulsionou suas políticas e concepções
geopolíticas. Essa liderança política procurava inserir o país no contexto internacional, sendo
que a política de aproximação praticada entre os dois países teve um contrabalanço, o Chile.
279
BURNS, E. Bradford. In: FAUSTO, Bóris. Op. cit., 1990, p 391.
280
O Dia, 21/03/1912.
281
ESCUDÉ. Carlos e CISNEROS, Andrés. História General de las RELACIONES EXTERIORES DE LA
REPÚBLICA ARGENTINA. El Tratado del ABC (Argentina-Brasil e Chile) de mayo de 1915. Parte II TOMO
VII, 2000. www.argentina-rree.com/7/7.040.htm
99
4.3 O Tratado ABC
A idéia de formar um bloco países na América surgiu com o Tratado ABC, um acordo
internacional que seria firmado entre Argentina, Brasil e Chile, que tinha como objetivo a
aproximação entre os três países. A primeira tentativa teve as iniciativas diplomáticas na
gestão do Ministro das Relações Exteriores do Brasil, o Barão do Rio Branco. Apesar das
tentativas de aproximação entre os três países do Cone Sul, tanto o Brasil como a Argentina
tinham na rivalidade entre eles um empecilho para a concretização das negociações do
Tratado do ABC de 1915.
A primeira proposta para um tratado envolvendo os três países surgiu em 1904,
através do Barão do Rio Branco; foram elaboradas minutas de propostas de tratado em 1907 e
1909. Como Lauro Müller buscasse uma aproximação com a Argentina, na sua gestão a
proposta foi levada adiante, esperando que o tratado consolidasse a amizade com o país
vizinho.
O Chile via no tratado uma forma de ter o Brasil como aliado nas disputas territoriais
que tinha com a Argentina, com a Bolívia e com o Peru. Assim quando o ministro Lauro
Müller, do Brasil e José Luis Murature da Argentina, foram ao Chile negociar a assinatura do
Tratado do ABC, foram recebidos com aclamações.“La calurosa recepción que el Gobierno,
nuestros círculos sociales y el pueblo mismo hicieron a los Cancilleres de las Republicas, del
Brasil y Argentina exteriorizado suficientemente el pensamiento chileno sobre el ABC.”
282
para o Brasil, a inserção do Chile no tratado era uma forma de fazer com que a Argentina
tivesse sua atenção divida entre as fronteiras do Brasil e do Chile.
Esta tentativa de Tratado pode ser entendida como um elemento preocupante para as
nações menores da América do Sul, que tinham alguma pendência com os participantes do
Tratado. Rio Branco almejava o apoio ao Norte, dos Estados Unidos, e ao Sul, do Chile. “O
caráter transitório das tensões com a Argentina, a estratégia de aproximação com os Estados
Unidos rivalidade em relação ao Prata e recorrentes divergências, houve uma rivalidade que
chegou a beira do rompimento. Motivações de natureza geopolítica”.
283
O Tratado do ABC
tinha como uma das premissas a não intervenção de países europeus na América do Sul.
“Além de aumentar o prestígio das três nações sul-americanas, contribuiria para a sustentação
do princípio de que não é admissível a extensão do domínio ou do sistema europeu no Novo
282
Destacado del Año. 1915 – La visita de los Cancilleres. Chile. http://siglo20.tercera.cl/1910-15/rep.htm
283
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1977, p 52.
100
Mundo.”
284
O Barão do Rio Branco não aceitava uma aliança que fosse contra os Estados
Unidos, mas pretendia impedir que a Argentina conquistasse a hegemonia regional na
América do Sul, pois, esta hegemonia deveria ser conquistada pelo Brasil. “Ele tinha um
objetivo geopolítico bem definido: isolar a Argentina no concerto das nações Sul-americanas
e impedir que ela continuasse a exercer influência sobre os demais países da região.”
285
A
proporção que os Estados Unidos aumentavam sua importância comercial para o Brasil o
último laço econômico e diplomático da Inglaterra entrou em declínio.
A primeira ação concreta para a formação de um bloco regional aconteceu em 1903,
por ocasião da independência do Panamá, quando Rio Branco estabeleceu que o Brasil
reconhecesse a nova República de acordo com o reconhecimento da Argentina e do Chile,
assim agiram juntos abrindo caminho para a criação de uma aliança entre os três países. “Era
o primeiro passo para a criação da Tríplice Aliança, o ABC, [...] que Rio Branco proporia a
Manuel Gorotiaga, representante do Governo de Buenos Aires no Rio de Janeiro.”
286
Em 1907, o Chanceler chileno Puga Borne e o Ministro argentino Lorenzo Anadón,
reunidos em Santiago redigiram um tratado que objetivava reger as relações entre o Chile, a
Argentina e o Brasil. Assim, as Propostas do Projeto Puga Borne-Anadón, tinha como
objetivos: apoio ou aliança militar em caso de agressões externas; a preocupação de garantir
um equilíbrio militar entre os três países; o arbitramento como forma de solução das
controvérsias; a procura de adesão de outras repúblicas do continente; regulamentação das
condições da imigração estrangeira; a proibição de assumir compromisso com uma quarta
potência, sem o conhecimento dos parceiros. O Ministro das Relações Exteriores da
Argentina, Estanislau Severo Zeballos não recebeu bem a proposta, pois esta continha o
nome do Brasil, uma vez que na sua concepção deveria ocorrer uma aliança argentino-
chilena.
Em 1909, Puga Borne, entregou ao Barão do Rio Branco, na cidade de Petrópolis, um
esboço de um Tratado de cordial inteligência que objetivava consolidar as boas relações entre
os países. Assim, as propostas do Projeto Puga Borne tinham como objetivos: a
obrigatoriedade do arbitramento quando não fosse possível negociação direta; restrição da
celebração de acordos com outros países; a manutenção da paz e o estímulo ao progresso na
América do Sul; a regulamentação dos procedimentos sobre a declaração de guerra. Dias
depois Rio Branco redigiu e entregou sua versão do tratado de cordial inteligência e
284
CERVO, Amado Luiz e BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1992, p 178.
285
HEINSFELD, Adelar. As Relações entre as Nações no Continente Americano: O Tratado do ABC e a
busca da hegemonia na América do Sul. p 15.
286
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Op. cit., 1978, p 170.
101
arbitramento onde o ABC teria o papel de observador da ordem internacional no subsistema
sul-americano e seria o defensor do status quo regional. Sinteticamente, o projeto de Rio
Branco previa: a manutenção da paz e com estímulo ao progresso da América do Sul, tinham
implicações de natureza militar e sócio-econômico; alcance regional para favorecer a paz e o
progresso nos três países membros, mas também em todo o sul-continente; arbitramento para
a inteligência e execução; minimizar as possibilidades de confrontações militares; vedava a
possibilidade de aliança com uma quarta potência; tentativa de mediação; impedir que se
armassem ou reunissem imigrados políticos; desarmar os insurretos e restituir os armamentos
ao governo legal; pretensão regional, instabilidade política em país limítrofe. Para o ministro
Rio Branco, o Tratado do ABC deveria ser o único sistema de defesa da América do Sul e da
não ocorrência de guerras, bem como pretendia que o Brasil fosse o centro desse acordo
tripartidário. “Por su parte, Río Branco continuó la tradicional política exterior del Brasil, en
el sentido de evitar cualquier tipo de alianza subregional liderada por el gobierno argentino
que cercara a Brasil.”
287
Para Guilherme Conduru o conteúdo do projeto poderia dar origem a reclamações
dos vizinhos no sentido de que o ABC pretendia interferir nos seus assuntos internos ou
exercer uma hegemonia no subcontinente. “Ao se negociar a coordenação política no
acompanhamento de instabilidades políticas na região, as potências do ABC se arvoravam
como ‘observadores’ da ordem e da paz na América do Sul.”
288
Para Moniz Bandeira a
postura do ministro Barão do Rio Branco era a de enfrentar as questões internacionais que
surgissem envolvendo um dos três países e também, que o país não seria um servo dos
Estados Unidos. “Mas reivindicava para o Brasil a tutela da América do Sul. E não gostava
de intromissões.”
289
O ambiente político não favoreceu a formalização dessas alianças, a
busca da hegemonia pelo Brasil e pela Argentina, também dificultavam a consolidação de
acordos entre os dois países.
Para entender as propostas dos Tratados de 1907 e de 1909, entre a Argentina, o
Brasil e o Chile são necessários levar em conta os objetivos que o Ministro Barão do Rio
Branco pretendia na América do Sul. “A proposta de um Tratado de ‘cordial inteligência’
287
ESCUDÉ, Carlos e CISNEROS, Andrés. Op. cit., 2000. www.argentina-rree.com/7/7.053.htm
288
CONDURU, Guilherme Frazão. Uma tentativa de aproximação política no início do século: os projetos
do Tratado ABC (1907-1915). Simpósio Internacional: Estados Americanos: Relações Continentais e
Intercontinentais – 500 anos de História. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000, p 244-248.
289
BANDEIRA, Moniz. Op. cit., 1978, p 181.
102
entre Argentina, Brasil e Chile tem que ser entendida dentro dos parâmetros da geopolítica
clássica, que guiava os ‘Homens de Estado’ no início do século XX.”
290
Essas duas versões do ABC foram redefinidas em alguns pontos na versão de 1915. É
possível afirmar que as iniciativas de 1907/1909 não foram concretizadas por alguns motivos:
o Governo argentino assinaria um acordo que tivesse um compromisso de manutenção das
forças navais de poderio igual ou equivalente entre os três países; o Governo brasileiro não
assinaria um acordo que decidisse quando, quais e quantos armamentos poderiam adquirir. É
necessário considerar que os anos 1907/1909 representaram o auge da corrida armamentista
no Cone Sul, entre Argentina e Brasil. Assim, a rivalidade internacional e a busca da
hegemonia regional não permitiam a aproximação entre as três nações.
Em 1915, o Tratado entre a República dos Estados Unidos do Brasil, a Argentina e o
Chile para facilitar a solução pacífica de controvérsias internacionais, tinha como objetivo:
consolidar a amizade que ligava os contratantes; conjurar a hipótese de conflitos violentos no
futuro; cooperação para a confraternidade das Repúblicas americanas; facilitar a solução
amigável das questões exceptuadas do arbitramento. “O Tratado de 1915 restringia-se à busca
de soluções para controvérsias exclusivamente entre seus membros. O alcance regional,
explícito no projeto Puga Borne-Anadón e implícito no projeto Rio Branco, embora com
importantes diferenças, não encontra eco no texto de 1915.”
291
Heitor Lyra atribui a Lauro Müller a tentativa de formação da aliança entre as três
principais nações da América do Sul, seu objetivo era assegurar uma política permanente de
paz. Sobre o ABC, o autor declarou: “[...] e visando assegurar uma política permanente de
paz, tenta a aliança de três principais nações da América do Sul, Argentina, Brasil e Chile, o
ABC, votado, entretanto, ao fracasso, menos pelos seus próprios significados do que por uma
falta de preparação no ambiente continental.”
292
Os países mais fracos do Continente
Americano demonstraram receios quanto a essa aliança, mas ele o tinha impulsos
expansionistas, também não iria impor domínio sobre esses países.
Clodoaldo Bueno cita Abranches que em discurso no dia 06 de outubro de 1915
criticava a iniciativa do Ministro Lauro Müller sob o argumento de que não seria necessária a
assinatura do ABC em razão de uma suposta unidade política das repúblicas do continente.
290
HEINSFELD, Adelar. Lauro Müller e o Tratado do ABC: uma tentativa de conquista da hegemonia no
Cone Sul da América. Encontro Estadual de História. Florianópolis, jul/2004, p 13.
291
CONDURU, Guilherme Frazão. Op. cit., 1998, p 120.
292
LYRA, Heitor. Op. cit., 1992, p 36.
103
Lauro Müller via no ABC um mecanismo para consolidar cada vez mais as boas
relações com as duas repúblicas amiga do Prata e do Pacífico, acreditava que o
Ministro pretendia sublinhar o ânimo pacífico do Governo brasileiro em face da
deflagração do continente europeu.
293
As três nações deveriam se cuidar e defender-se mutuamente contra movimentos
revolucionários ou rebeliões, também preservar o equilíbrio de poder entre elas para que uma
não ficasse mais forte que a outra. “O Tratado do ABC é a afirmação do leal propósito das
Nações brasileira, argentina e chilena de cooperar para que se torne cada vez mais sólida a
confraternidade das Repúblicas Americanas.”
294
Por que o Brasil, a Argentina e o Chile procuravam um tratado que unisse as três
nações?
Pode-se levar em conta algumas hipóteses para a retomada do ABC em 1915: a
Primeira Guerra Mundial na Europa levou os três governos a se preocuparem com um tratado
que poderia demonstrar o interesse comum da paz ou de entrar no conflito; a mediação dos
três países em 1914 com os problemas entre o México e os Estados Unidos.
Para Clodoaldo Bueno: “Os três países propõem-se a manter um entendimento mútuo,
garantia da paz, estímulo ao progresso, recurso obrigatório ao arbitramento, impedir a
organização, em seus territórios de quaisquer expedições para promover guerra civil nos
territórios.”
295
O ABC se outorga o direito de intervenção sobre a América do Sul
estabelecendo regras sobre as demais repúblicas sul-americanas.
Para Guilherme Conduru podem-se distinguir algumas hipóteses sobre o significado
político do ABC:
A aproximação dos três países representaria a tentativa de constituir um bloco
político para equilibrar a penetração dos interesses norte-americanos e europeus na
América Latina; uma alternativa para resistir a hegemonia dos Estados Unidos; não
teria caráter anti norte-americano; momentos de aproximação alternados com
momentos de tensão entre as principais potências regionais; iniciativa do Chile em
1907 de reforçar os laços com o Brasil e a Argentina tendo em vista as disputas
territoriais com o Peru; Garantia da ordem e da estabilidade internacional no
subsistema sul-americano com a Argentina, seria apenas uma espécie de cortesia
diplomática.
296
293
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1977, p 75.
294
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 03 de maio de 1914 a 30 de junho
de 1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915, p 61.
295
BUENO Clodoaldo. Op. cit., 1977, p 89.
296
CONDURU, Guilherme Frazão. Op. cit., 1998, p 10.
104
A Legação do Governo Brasileiro na Argentina, enviou recordes de artigos do jornal
argentino, La Razón, contendo comentários sobre a discussão entre os generais Boonen
Rivera e Vergara sobre o propósito do aumento das linhas transandinas que ligam a Argentina
e o Chile. Assim, “Pelo Artigo de La Razón, fica este Ministério crente das idéias sobre o
novo ABC, lembrados pelo general Boonen Rivera que preconiza a aliança que deverá
vincular a Bolívia à Argentina e ao Chile.”
297
Para o General Rivera, Inspetor Geral do
Exército do Chile, o novo ABC abarcaria a Bolívia no lugar do Brasil, pois para ele os
interesses do Brasil não tem nenhuma afinidade com os da Argentina nem com os do seu
país, ele sustenta que a única e sólida aliança necessária à paz e ao poderio sul-americano
seria a formada pela Argentina, Bolívia e Chile.
O Chile tinha o Brasil como aliado e era um contrabalanço geopolítico que obrigava a
Argentina a concentrar-se nas duas fronteiras. “O Chile recebia com agrado a amizade que
lhe oferecia o Brasil, uma amizade tradicional que era quase uma aliança.”
298
A hegemonia de um país dentro de um sistema, com uma superioridade militar e
econômica são alguns dos pontos que podem conferir um alto potencial de intimidação e
coerção. O Brasil e a Argentina procuravam essa hegemonia, no Cone Sul, ao se unirem ao
Chile. “A rivalidade entre Chile e a Argentina materializada nas disputas territoriais não
resolvidas, seria o fundamento do ABC. Brasil e Chile procuravam neutralizar ou tornar sem
efeito prático a oposição Argentina a seus respectivos interesses na Amazônia e no
Pacífico.”
299
Os Ministros da Argentina, do Brasil e do Chile visitaram-se em caráter
diplomático e de forma oficial com o propósito de firmar o tratado que consolidará a
solidariedade americana e a neutralidade dos países do Continente Americano durante a
conflagração européia.
Durante a conflagração da guerra européia, o tratado do ABC continuava em
discussão sobre os possíveis efeitos, direitos e deveres dessa entidade internacional, onde
alguns jornais argentinos advogam artigos por uma ação conjunta da diplomacia americana
em favor da paz européia e também pelos interesses econômicos prejudicados pela guerra. No
despacho para a Legação Brasileira em Buenos Aires, Lauro Müller deixou clara a
297
AHI. Nota do Governo Brasileiro a Legação da Argentina, 03/06/1914.
298
BURNS, E. Bradford. In: FAUSTO, Bóris. Op. cit., 1990, p 395.
299
BUENO Clodoaldo. Op. cit., 1977, p 99.
105
preocupação do governo brasileiro e a “nossa ansiedade pelo restabelecimento da concórdia
mundial.”
300
No ano de 1914, durante as festas de celebração em Buenos Aires, por ocasião do
aniversário da Independência argentina, estiveram presentes os Ministros das Relações
Exteriores da Argentina, do Brasil e do Chile que procederam à assinatura dos três
instrumentos do Tratado Pacifista entre os três países designado Tratado do ABC. A visita
oficial do Ministro das Relações Exteriores do Brasil aos países do Uruguai, Argentina e
Chile, a convite dos respectivos governos, fortaleceu ainda mais os sentimentos cordiais entre
as três nações da América do Sul.
Os partidários do acordo almejavam o fortalecimento do espírito pacifista do
continente. Mas criaram certos receios em alguns países que, além de não fazerem parte do
Tratado do ABC, receavam que os participantes tivessem o domínio coletivo da América do
Sul. “Por meio desta hegemonia, os três maiores, mais ricos e mais armados países da região
exerceriam um controle sobre os demais países sul-americanos e estabeleceriam as regras de
funcionamento do subsistema.”
301
Mas no Tratado não existia nenhum compromisso de
natureza militar entre os três países.
O projeto do ABC não previa a coordenação política e diplomática entre as partes
contratadas caso houvesse algum distúrbio no território de um dos países. “Assim, a função
de acompanhar a situação interna dos países da região equivaleria a ‘fiscalizar’ o bom
funcionamento do subsistema regional, de modo a evitar distúrbios da ordem e garantir a
estabilidade e a vigente distribuição de poder. Na opinião de Conduru, “nesse sentido,
Argentina, Brasil e Chile compartilhariam uma autoridade hegemônica sobre o subsistema
sul-americano, o que o implicaria necessariamente numa ameaça para a soberania e a
independência das demais repúblicas.”
302
O Projeto do Tratado do ABC, de 1915, previa as seguintes obrigações aos
participantes: o que não fosse resolvido por via diplomática, nem submetido a arbitramento,
seria submetido ao exame de uma Comissão Permanente; cada parte indicará um Delegado;
qualquer governo poderá fazer a convocação da Comissão fazendo a comunicação oficial aos
outros dois governos; as Partes Contratantes terão prazo de três meses para darem as
informações necessárias para o exame e a Comissão terá um ano para dar o seu parecer, se não
300
AHI. Nota do Governo Brasileiro a Legação da Argentina. 27/11/1914.
301
CONDURU, Guilherme Frazão. Op. cit., 1998., p 115.
302
Id., 1998, p 120.
106
conseguir terá mais seis meses; se a Comissão não der nenhum parecer, as Partes Contratantes
terão sua liberdade para agir como melhor lhes convier.
Pelo Tratado do ABC, as controvérsias que por qualquer motivo originadas no futuro
surgirem, entre os três países, ou entre dois deles, e que não tiverem podido ser resolvidas por
via diplomática, nem submetidas a arbitragem, de acordo com aqueles Tratados ou com outros
posteriores, serão submetidas ao exame e parecer de uma Comissão Permanente, composta de
um Delegado de cada país e que se reunirão em Montevidéu. Pelo mesmo Tratado, as três
Potências obrigam-se a não praticar atos de hostilidade, enquanto a mencionada Comissão não
tiver apresentado o seu parecer, ou enquanto não houver decorrido o prazo prorrogável.
De um ano a contar da data da constituição daquela comissão, e declaram mantidos
os compromissos estabelecidos por aqueles tratados, bem como a obrigação de
cumprir os laudos arbitrais nas questões que tenham sido ou forem resolvidas de
acordo com os mesmos tratados.
303
Este Tratado poderia servir para resolver problemas futuros entre os países integrantes.
“O Tratado que o Congresso Nacional aprovou, o qual, afirmando a estreita e intensa
amizade existente entre os três países, facilita, para a sua constância inalterável no futuro, a
solução pacífica das controvérsias internacionais.”
304
A fórmula do ABC consagrava uma
política pacifista e de irmandade entre os países americanos, que poderia ser representada
pela caricatura dos três ministros de seus respectivos países: José Luis Murature da
Argentina, Lauro Müller do Brasil e Alejandro Lira do Chile.
Figura 2 – Caricatura do Tratado do ABC, José Luis Murature, Lauro Müller e
Alejandro Lira.
Fonte: www.todo-argentina.net/historia/gen/80victorio/victorio/htm
303
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p 59.
304
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p XIV.
107
Alguns autores analisaram o Tratado do ABC: para Moniz Bandeira, o ABC teria
representado uma tentativa de resistir à hegemonia norte-americana e as três nações
procurariam entender-se e caminhar de acordo nos casos que interessassem à América do Sul.
O Brasil sempre teve no Chile um sólido aliado.
305
Para Clodoaldo Bueno o ABC era um
Tratado Pacifista, que não previa aliança militar, nem equivalência naval ou cooperação anti-
insurrecional. Mas, durante as negociações de assinatura do tratado, o governo argentino
continuava a sua política de armamento.
306
Para Guilherme Conduru, a idéia de que o Chile
deteria o equilíbrio de poder entre o Brasil e Argentina, não encontra respaldo na análise da
política internacional do período. Também analisou que o Chile não seria inferior em termos
militares e econômicos, referentes ao Brasil e ao Chile.
307
Para E. Bradford Burns esperanças
efêmeras, sustentadas pelos três países, concentravam os esforços de formarem uma aliança
em torno do ABC, também o Chile sempre se mostrou disposto a manter uma aliança política
305
BANDEIRA, Moniz. Op. cit., 1978.
306
BUENO Clodoaldo. Op. cit., 1977, p 105.
307
CONDURU, Guilherme Frazão. Op. cit., 1998, p 125.
108
com o Brasil.
308
Para Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno, no contexto do Cone Sul, a
amizade e a mútua cordialidade do Brasil e do Chile, estavam reforçadas pelo fato de não
possuírem limites territoriais comuns, assim sem problemas lindeiros. Também tinham uma
rival em comum, a Argentina, com pretensões de conquistar a hegemonia na América do
Sul.
309
A posição de rivalidade entre a Argentina e o Brasil demonstrava a dificuldade da
cooperação militar entre os três países da América do Sul. Na opinião de Clodoaldo Bueno:
“Na administração de Lauro Müller pretende-se romper com a política não agressiva e
conciliadora dos tempos do Barão do Rio Branco. Nessa linha de raciocínio não pretendia
reivindicar para o Brasil o papel de poder hegemônico na América do Sul.”
310
Já na análise da
gestão do Ministro Lauro Müller, percebe-se que este pretendia continuar com a amizade do
Brasil com a Argentina, mas ao mesmo tempo negociava com os Estados Unidos e com o
Chile; assim entende-se que ele pretendia fazer do Brasil, um país hegemônico
regionalmente: “o ABC era uma proposta geopolítica em que a diplomacia brasileira
pretendia isolar a Argentina no concerto das nações sul-americanas e impedir que ela
continuasse exercendo influência sobre os demais países da região.”
311
No Brasil, o Tratado do ABC, foi remetido à Câmara dos Deputados, em 30 de junho
de 1915, com a Mensagem Presidencial de 23 do mesmo mês, acompanhado de uma exposição
de motivos do Ministro de Estado das Relações Exteriores, desta última data, dirigida ao Exmo
Sr. Presidente da República. “O referido Tratado foi aprovado pelo Congresso Nacional, em
Resolução Legislativa de 06 de novembro seguinte, sancionada pelo Executivo no dia 10 e
publicada pelo Decreto n. 3.019, desse mesmo dia.”
312
Para confirmar a cordial amizade entre a Argentina e o Brasil, o presidente argentino,
Victorino de La Plaza enviou mansagem ao Senado do seu país solicitando que este aprove o
tratado. “... el poder ejecutivo al someter el tratado a la consideracion de vuestra
honorabilidad abriga la confianza de que ha de prestarle su aprobacion en la forma del
proyecto de ley que acompano al presente mensaje.”
313
308
BURNS, E. Bradford. In: FAUSTO, Bóris. Op. cit., p 393-395.
309
CERVO, Amado Luiz e BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1986, p 48-75
310
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 1977, p 127.
311
HEINSFELD, Adelar. O Tratado do ABC (1915): uma tentativa integracionista. IX SOLAR. Rio de Janeiro,
nov/2004, p 01.
312
Relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil no período de 01 de julho de 1915 a 22 de junho
de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916, p 58.
313
Telegrama enviado de Dantas para Lauro Müller, n. 71 de 16/06/1915, transcrição da mensagem presidencial
de Victorino de La Plaza para o Senado com cópia para o seu ministro do exterior, José Luis Murature.
109
Uma das intermediações mais importantes feitas em conjunto pelo ABC foi a
mediação na crise entre o México e os Estados Unidos no ano de 1914. As companhias
petrolíferas norte-americanas estavam preocupadas com a Revolução Mexicana e as
conseqüências econômicas que ela traria para os seus investimentos no país, principalmente
porque o General Victoriano Huerta aproximava-se das companhias petrolíferas inglesas.
Assim, fuzileiros navais norte-americanos desembarcaram no porto de Vera Cruz, o mais
importante do México, essa atitude era uma forma de defender os interesses econômicos dos
norte-americanos, instalados no país. A intervenção do ABC e o problema do conflito
mundial na Europa acabaram por apaziguar os ânimos norte-americanos e chegou-se a um
acordo. “A proposta de mediação foi aceita por (Victoriano) Huerta e (Woodrow) Wilson.
Este, de fato, queria se servir do ABC com a finalidade de alijar Huerta do poder para, em
seguida controlar um novo governo provisório.”
314
Para Clodoaldo Bueno, Wilson aceitou
toda a negociação porque sua intenção era de intervir no novo governo do México. Já em
1913, o presidente norte-americano Wilson, declarou que, os Estados Unidos não poderiam
ter nenhuma compaixão com países que procuram prender o poder de governo, avançar com
seus interesses pessoais e ambição, enquanto a situação mexicana tornava-se cada vez mais
aguda indicando a existência de um espírito geral de inquietação e de atividade revolucionária
embrionária em muitos lugares, assim segundo o jornal norte-americano:
315
“... while the
Mexican sitution was becoming more and more acute in the closing days of the last
administration. [...] indicating as they did the existence of a general spirit of unrest and of
embryonic revolutionary activity in many quarters.
316
No Senado Brasileiro, ficou impresso o papel importante que representaram os três
países do ABC, que assumindo responsabilidades, acabaram por fazer uma intervenção de
grande alcance. “[...] pela primeira vez da pujança e da força moral que as anima e da coesão e
amizade que ligam esses povos entre si.”
317
Foi um exemplo da fraternidade universal que unia
os países da América do Sul em torno de uma política de paz e de solidariedade para com
todos.
314
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 425.
315
“Quando a situação mexicana estava se tornando mais e mais aguda nos dias de fechamento do último ano da
administração enquanto fizeram a existência de um espírito de princípio geral de inquietação e da atividade
embrionária e revolucionária em muitos quartéis.”
316
The Washington Post, President defines his Policy Toward South America. 12/03/1913.
317
Discurso de Mendes de Almeida. Anais do Senado. 1914. Vol. 3. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional. 1917, p
04.
110
A Argentina, o Brasil e o Chile deram um fecundo e salutar exemplo do seu amor à
paz e à cordialidade no continente americano, e os Estados Unidos e o xico,
aceitando essa mediação, mostraram, por sua vez, a candura e o sentimento de que
se acham possuídos, manifestando ao mesmo tempo o desejo de contribuir para a
grande vitória do século, para triunfo do pacifismo contra as lutas sangrentas e o
espírito de conquista.
318
A atitude dos participantes do Tratado do ABC demonstravam que as três nações
estavam unidas e concisas numa mesma política de defesa dos interesses do continente
americano, até porque a guerra fora da América era mais importante do que a situação criada
pelos Estados Unidos que estavam interessados no petróleo do México. O Embaixador
Brasileiro em Washington, Domício da Gama levou à Lauro Müller o pedido do presidente
norte-americano “que o presidente Wilson julgara ser momento de as nações americanas
consultarem-se para pôr fim na anarquia no México.”
319
Ao que Lauro Müller respondeu que
era favorável e protegeria a soberania do México.
Como a intermediação na negociação entre Estados Unidos e México deu origem a
esperanças passageiras alimentadas pelas três nações para assinar o Tratado do ABC e formar
uma aliança de amizade. No entanto, quando Lauro Müller visitou a Argentina, a imprensa, fez
ressurgir antigas desconfianças. E. Bradford Burns, analisando aquele momento, cita o jornal
La Prensa, declarando: “não poderia haver nenhuma cooperação verdadeira entre a Argentina,
o Brasil e o Chile porque o Brasil e o Chile se uniriam contra a Argentina.”
320
Já para
Clodoaldo Bueno, o ABC estaria com propostas pacifistas. “Passado o pior da crise nas
relações Estados Unidos-México, o agrupamento do ABC permanecia, na mente de muitos, até
na Europa, como um novo ator no contexto internacional e, nessa condição, deveria cuidar de
seus próprios interesses na nova conjuntura criada pela conflagração que se iniciava.”
321
Assim, a presença de Huerta e seu regime militar no México, conseguido por um golpe de
estado, não agradava aos Estado Unidos. “Em una palabra, el ABC se convirtió en un
instrumento de la política regional norteamericana. La mediación del ABC fue el primer caso
en donde el intervencionismo norteamericano a una república latinoamericana fue legitimado
por otras naciones del continente.”
322
Assim, o presidente norte-americano solicitou ajuda aos
318
Discurso de Mendes de Almeida. Anais do Senado. 1914. Vol. 3. Rio de Janeiro:Imprensa Nacional, 1917, p
05
319
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 430.
320
BURNS, E. Bradford. In: FAUSTO, Bóris. Op. cit., p 394.
321
BUENO, Clodoaldo. Op. cit., 2003, p 440.
322
ESCUDÉS, Carlos e CISNEROS, Andrés. História General de las RELACIONES EXTERIORES DE LA
REPÚBLICA ARGENTINA. La tercera fase: las relaciones argentino-noretamericanas durante la Primera
Guerra Mundial (1914-1918). Parte II TOMO VIII, 2000. www.argentina-rree.com/8/8.032.htm.
111
países do ABC para justificar a retirada do governo de Huerta, com a desculpa que não era
democrático e pretendia que Venustiano Carranza assumisse o governo do México. Para
Wilson, Carranza debía ser el reemplazante del régimen de Huerta y la atilidad del ABC debía
limitar-se a la consolidación de ese objetivo. Pero en la opinión de los miembros del ABC este
candidato no era neutral y constituía una amenaza a la estabilidad política mexicana.”
323
No Tratado do ABC, que para Francisco Doratioto, não se tratava de aliança, mas
poderia ser a base para tanto, despertou temores nas outras Chancelarias americanas. “O ABC
também não agradou aos Estados Unidos, pois poderia servir para conter a influência norte-
americana nesta parte do continente. O Secretário de Estado norte-americano, Root, declarou
ao Embaixador argentino em Washington que seu país se oporia ao ABC.”
324
Para o governo argentino o Tratado do ABC poderia ser uma forma de atrelar o país à
política de seus vizinhos, assim a relutância em assinar o tratado. “Por el lado, argentino, el
tratado tropezó con la oposición de sectores internos, entre ellos el radicalismo, y el gobierno
prefirió continuar con una política exterior no atada por compromisos com sus vecinos.”
325
Ainda em setembro de 1916 o Tratado do ABC não tinha sido aprovado pela Câmara dos
Deputados da Argentina que continuavam a estudar as possibilidades da assinatura do mesmo.
Embora o governo argentino, em telegrama à Câmara de Deputados, havia solicitado que o
Tratado do ABC fosse assinado. As pressões internas acabaram por derrubar as pretensões
externas.
Si bien el tratado del ABC no constituyó en mismo un pacto de alianza entre los
tres países del Cono Sur, bien pudo servir de base para ello, razón por la cual
generá temores en las otras cancillerías americanas y en el gobierno
norteamericano, atento éste ante cualquier posible amenaza a su política
panamericana.”
326
323
ESCUDÉS, Carlos e CISNEROS, Andrés História General de las RELACIONES EXTERIORES DE LA
REPÚBLICA ARGENTINA. La segunda fase (1900-1914): el inicio de la ‘diplomacia de control’ por parte del
gobierno de Estados Unidos. Parte II TOMO VIII, 2000. www.argentina-rree.com/8/8.025.htm.
324
DORATIOTO, Francisco Fernando Monteoliva. Op. cit., 1997, p 328.
325
ESCUDÉS, Carlos e CISNEROS, Andrés História General de las RELACIONES EXTERIORES DE LA
REPÚBLICA ARGENTINA. El Tratado del ABC (Argentina-Brasil-Chile) de mayo de 1915. Las actitud de la
Argentina y Brasil ante la Primera Guerra. Parte II TOMO VII, 2000. www.argentina-rree.com/7/7.057.htm
.
326
ESCUDÉS, Carlos e CISNEROS, Andrés História General de las RELACIONES EXTERIORES DE LA
REPÚBLICA ARGENTINA. El Tratado del ABC (Argentina-Brasil e Chile) de mayo de 1915. Parte II TOMO
VII, 2000. www.argentina-rree.com/7/7.040.htm
112
O Tratado do ABC entre os três países do Cone Sul, poderia servir de base para que
no futuro, Argentina, Brasil e Chile, pudessem unir-se e assim causariam temor nos outros
países da América do Sul e também nos Estados Unidos.
4.4 Repercussão do Tratado do ABC Segundo a Imprensa
A imprensa, notadamente a Argentina, vai conceder espaços generosos ao Tratado, seja
para defendê-lo, seja para criticá-lo.
O jornal El Diário incentivava a idéia de um tratado entre a Argentina, o Brasil e o
Chile, onde as relações comerciais se intensificariam e haveria o melhoramento do bem estar
da população dos participantes do Tratado.
Las fronteras que las delimitan se confunden sobre dilatadas líneas, de contactos
ineludibles y údiles para el intercambio de sus variadas produciones, y convenientes
á los mejoramientos del bienestar material, como intelectual y moral, sin los
temores de apocamientos en las virtudes defensiva.
327
no jornal La Razón, no mês de novembro a declaração que o tratado do ABC é
uma utopia e é pouco provável a sua ratificação pelos três países. El acuerdo llamado ABC
de que tanto se hablado, no pasa de ser una bella utopia, dadas las contradicciones
evidentes en que incurren, con sus palavras ó con sus hechos, las naciones que debieron
subscribirlo.”
328
No Brasil, o jornal O Dia, afirmou que o Tratado do ABC era prova evidente do
movimento de harmonia e de paz entre as nações do continente americano e em 1916 pela
comemoração do centenário de independência o artigo parabenizava e elogiava a Argentina.
Sentimo-nos satisfeitos pela esperança que temos na grandeza da América, grandeza
de trabalho, grandeza moral, grandeza de paz e porque dessa confraternização fomos
um dos mais ardorosos defensores, no tempo em que o sendo tinha-se de arrastar
com o chauvinismo dos exaltados.”
329
327
El Diário, El ABC, 18/09/1913.
328
La Razón, Las Armonias del ABC, 29/11/1913.
329
O Dia, República Argentina. 09/07/1916, p. 01.
113
Percebe-se na afirmação jornalística o dever heróico do Brasil e dos povos da
América que sofreram para chegar ao ponto de paz. O mito de solucionador de problemas
está implícito na declaração catarinense e durante a Primeira Guerra Mundial a política de
amizade entre o Brasil e Argentina deveria ser maior do que os horrores do outro lado do
Atlântico. “O ABC é a fórmula inicial dessa cartilha de fraternidade americana que Lauro
Müller vai colocando nas mãos dos povos do continente meridional em nome da civilização e
da humanidade.”
330
Em outro momento, La Razón lembra que a união dos povos sul-americanos no ABC
é uma necessidade política e uma segurança econômica para os três países. Essa união seria
possível pela tradição diplomática e pela amizade cultivada por ambos. La unidad en la
historia y en el idioma, la tradición y el recíproco afecto que nos unen, facilitan la gran
conquista de la fraternidad continental, bajo el amparo de una fuerza moral y material, que
reunidas, pueden significar un poder enorme y decisivo en el equilibrio mundial.”
331
Eles não
devem esquecer os outros povos irmãos do continente americano.
Para o jornal La Mañana, estaria na época de se chegar à uma era de paz e de
progresso continental, mas para que isso ocorresse seria necessário abandonar o
sentimentalismo poético e concretizar logo o Tratado. “Há llegado el momento de demonstrar
en los hechos la razón del ABC, de abandonar el lirismo estéril de los discursos y de las
fiestas y de ratificar en la práctica la lealdad de los tratados y la sinceridad de los
sentimientos.”
332
Esse Tratado deverá ser uma obra de comum progresso, de amparo em
situações de perigo, de solução pacífica das controvérsias e problemas internacionais e de
relações comerciais.
A opinião dos políticos norte-americanos, referente ao ABC, reflete os receios da
influência que a Argentina, o Brasil e Chile teriam na política e na economia no Continente
Americano. A Doutrina Monroe e o ABC são discutidos nos Estados Unidos. O jornal La
Prensa repercute isso.
Los hombres de pensamiento s intenso y autorizados en los Estados Unidos, en
materia Exterior comienzan a manifestar su opinión dirigente, respecto de la
posible organización o acción combinada y con carácter permanente de las
naciones del ABC y de los Estados Unidos, para influir en los negocios
internacionales continentales.
333
330
O Estado, Independência Argentina. 25/05/1915, p 01.
331
La Razón, 16/04/1915.
332
La Mañana, La Razón del ABC, 24/08/1915.
333
La Prensa, 24/11/1915.
114
La Razón publicou a entrevista dos ex-ministros das Relações Exteriores da Argentina,
Estanislau S. Zeballos e de Luis Maria Drago a respeito do Tratado do ABC. Segundo
Zeballos, não haveria benefícios num primeiro momento de aplicação do tratado, mas causaria
dissidências e complicações que poderiam alterar gravemente o estado de cordialidade que se
vivia naquele momento. Esse estado de cordialidade se manteria firme e eficaz se cada país
procedesse individualmente em suas decisões da política externa. A cordialidade,
principalmente na Argentina, não poderia ser mais satisfatória, pois era a mais sólida garantia
da paz internacional e não era necessário adotar remédios artificiais como o Tratado do ABC.
En el estado de cordialidad unánimemente mantenida, en que felizmente se desarrollan las
relaciones, entre las tres Repúblicas del ABC ningún propósito presente ni futuro aconseja la
sanción del convenio de 1915.”
334
A demora da assinatura na Câmara de Deputados
argentinos, para Zeballos, era uma demonstração cortês da rejeição do tratado e a discussão
deste assunto novamente era inoportuna. Também Drago, nos manisfetó que es abiertamente
contratio al tratado del ABC, pues este tratado no es una convención de arbitraje ni nada que
se parezea.
335
Para Zeballos e Drago, o Tratado do ABC, era supérfluo e quase perigoso. Dois
dias depois, o jornal publicou a opinião de José Luís Murature em relação ao ABC, que como
ministro que assinou o tratado, é óbvio que tinha um posicionamento contrário as opiniões dos
dois ex-ministros:
El significado de ese tratado es una síntesi de un momento histórico en la política
internacional.
Refleja en contraste con Europa – el espíritu de las principales naciones del
continente, esforzándose para asegurar todos los arbitrios que puedan concurrir a
la solución pacífica de cualquier conflicto.
336
O Tratado entre Argentina, Brasil e Chile não chegou a se consumar pela rivalidade
geopolítica, pela disputa de territórios, pela corrida armamentista e pelos problemas de
fronteiras e para não provocar reações contrárias por parte dos Estados Unidos. Em Buenos
Aires, La Prensa declarou que o Tratado do ABC não foi promovido pela chancelaria
argentina, porque foi uma iniciativa do Brasil, e que o Senado Federal argentino simplesmente
o aprovou como um ato de cortesia, amabilidade e respeito ao Brasil que se empenhava
diplomaticamente para que o tratado se concretizasse entre os três países. Lo sensato es que
334
La Razón, 26/10/1916.
335
La Razón, 26/10/1916.
336
La Razón, 28/10/1916.
115
la Argentina, al Brasil y Chile mantengan su individualidad en materia internacional,
renunciando a pretensiones hegemónicas y a ‘ententes’ o alianzas efímeras.”
337
Para o jornal,
La Nación, o Tratado do ABC foi aprovado pelo Senado argentino por pura complacência,
pois considerava inconveniente a forma em que foi estipulado e a Argentina não tem
necessidade de andar a reboque do Brasil e do Chile. Uno es que es tratdo del ABC coarta la
liberdad de la República Argentina para la dirección de su política internacional, porque la
obliga a marchar a remolque del Brasil y de Chile.
338
No mesmo jornal, um dia depois, tem
a opinião do ex-ministro das Relações Exteriores Carlos Rodríguez Larreta. Declara que o
ABC é uma política de paz continental, a harmonia entre as três nações evita a guerra entre
elas, duas nações vigiam a conduta da terceira e estão asseguras a independência dos povos
mais fracos, as três nações não podem entender-se para violar a justiça e a liberdade alheia, a
paz das três significa então a paz da América do Sul. O que é mais importante, na opinião de
Larreta, é que para ele de las tres naciones, es la República Argentina la más favorecida por
el ABC.
339
Para a Argentina oferece dois pontos de segurança: por um lado preserva o país da
guerra com o Brasil e por outro lado da guerra com o Chile. Para Larreta, o tratado do ABC já
era planejado pelo presidente argentino Mitre, que sempre manteve a amizade entre a
Argentina, o Brasil e o Chile. En cuanto a la política misma, me atrevo a decir que ya estaba
en el cerebro de Mitre, tanto era la perseverancia con que el gran estadista se esforzaba por
mantener simultáneamente nuestra amistad con Chile y el Brasil.”
340
Podia discutir se o
tratado de maio seria útil ou não, mas era preciso deixar estabelecida a solidariedade do ABC.
Uma vez firmado, negar a ratificação argentina seria um erro imperdoável.
Num sistema de inter-relação e de tendências à aliança no Cone Sul, o Brasil e a
Argentina concorriam à hegemonia continental e o Tratado do ABC acirrou ainda mais a
rivalidade entre os dois, pois, estas nações pretendiam conquistar a preponderância política, a
superioridade e o domínio na América do Sul. Assim, as respectivas posições políticas da
Argentina e do Brasil apresentavam a rivalidade internacional que inviabilizava uma iniciativa
de aproximação e cooperação diplomática, como também militar, entre as três nações.
A Primeira Guerra Mundial acabou por fazer surgir, entre os participantes do ABC,
uma preocupação em manter a paz no Continente Americano, principalmente no Cone Sul,
região em que estão inseridos, qualquer tomada de demonstrações a favor ou contra o conflito
seria feito em conjunto, sabe-se que não ocorreu desta forma, pois a Argentina continuou
337
La Prensa, 14/11/1916.
338
La Nación, 18/11/1916.
339
La Nación, 19/11/1916.
340
La Nación, 19/11/1916.
116
neutra durante toda a guerra e o Brasil deixou sua neutralidade de lado, a partir de 1917,
depois que os Estados Unidos entraram no conflito europeu.
Como todo acordo internacional, o tratado do ABC precisava ser ratificado pelos
Congressos dos países membros. Na Argentina o mesmo foi aprovado pelo Senado Federal,
mas foi rejeitado pela Câmara dos Deputados. Não sendo aprovado por uma das partes
contratantes o Tratado do ABC ficou sendo letra morta. Além disso, os desdobramentos
ocasionados pela Primeira Guerra Mundial que se desenvolvia na Europa, fazia com que os
olhares da diplomacia se dirigissem para o além-Atlântico.
117
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Lauro Müller, um dos políticos mais atuantes de Santa Catarina, exerceu praticamente
todos os cargos eletivos em seu estado natal. Teve uma vida política ativa, tanto no âmbito
estadual como no federal, sempre ocupando cargos de destaque, onde pudesse influenciar vida
política nacional e a de seu estado. Foram 37 anos dedicados, de forma ininterrupta, à vida
pública republicana. Ajudou a implantar a República, sendo o primeiro governador
catarinense; foi eleito para mais três mandatos como governador, embora tenha ficado à frente
do Executivo catarinense, nas quatro vezes em que ocupou o cargo, num total de apenas 9
meses. Foi eleito deputado Federal por 3 vezes e Senador em cinco oportunidades. Além da
vida político-partidária, teve paralelamente, uma carreira militar, atingindo em 1914 o posto
de General de Brigada.
Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, durante a presidência de Rodrigues
Alves, marcou época com obras públicas de grandes dimensões, como a abertura da Avenida
Central no Rio de Janeiro, hoje Avenida Rio Branco e proporcionou novas dimensões ao cais
do porto do Rio de Janeiro. Também participou do saneamento do Rio de Janeiro, uma cidade
antiga e colonial, juntamente com o engenheiro Paulo Frontin e o médico sanitarista Oswaldo
Cruz; no Rio Grande do Sul possibilitou a ampliação do cais do porto de Porto Alegre.
Lauro Müller foi o primeiro catarinense a se tornar imortal na Academia Brasileira de
Letras e também participou da Academia Catarinense de Letras, apesar de não ser escritor e
ter apenas publicado apenas alguns discursos, a maioria de cunho político.
Recebeu vários títulos e honrarias, na Argentina pelo Aero-Club, pela Universidade de
Buenos Aires e a de La Plata, no Uruguai pelo Instituto de Engenheiros e nos Estados Unidos
pela Universidade de Harvard.
Ministro das Relações Exteriores do Brasil de 1912 a 1917, teve como primeiro e
maior desafio suceder o ícone da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco. Por isso suas
palavras ao seu nomeado: “sucedo-o sem substituí-lo.” Dar continuidade à política do Barão,
ou alterá-la, era um desafio para Lauro Müller, que aos poucos foi imprimindo a sua forma de
atuar.
Como ministro foi o agente que falou em nome da coletividade nacional. E foi nesta
situação que visitou os Estados Unidos em 1913 e em 1916, atuando nas negociações
comerciais entre os dois países. Foi o primeiro ministro das Relações Exteriores do Brasil a
118
visitar o “grande irmão” do norte. Estas visitas contribuíram para estreitar os laços comerciais
e políticos entre os dois países. E por isso foi criticado, sendo acusado de adotar uma política
de subserviência do Brasil em relação aos Estados Unidos. Inclusive a imprensa Argentina
alardeou que estas visitas, na realidade, pretendiam projetar sua candidatura à presidência do
Brasil.
A imprensa, notadamente a catarinense, transformou Lauro Müller num mito político
de seu tempo. No período em que ocupou o Ministério das Relações Exteriores, a imprensa
fazia de seus atos político-administrativos atitudes heróicas. Neste sentido, inclusive setores
da imprensa Argentina e norte-americana contribuíram para edificar o mito Lauro Müller. No
entanto, este mito político não ficou para a posteridade, uma vez que hoje é pouco conhecido
no seu estado natal, embora seu nome esteja registrado em logradouros e edificações públicas.
Há inclusive um município em Santa Catarina chamado Lauro Müller.
Lauro Müller pode ser considerado um Homem de Estado, pois sempre esteve
vinculado aos interesses estatais, fazendo parte do grupo dirigente do país. Suas ações como
Ministro das Relações Exteriores não deixam dúvida que esteve à serviço do Estado, até por
que, as primeiras décadas do século XX foram marcadas historicamente pelo fortalecimento
do Estado-Nação.
Como ministro das Relações Exteriores, Lauro Müller teve três grandes preocupações.
O fortalecimento dos laços políticos e econômicos com os Estados Unidos, que
havia sido iniciado na gestão de Rio Branco. O Brasil era o maior exportador mundial de café,
e os Estados Unidos, o principal comprador. Assim, ao buscar uma maior aproximação com
os Estados Unidos, Lauro Müller pretendia incrementar ainda mais as relações comerciais, até
por que, aquele país era o principal fornecedor de produtos industrializados para o mercado
consumidor brasileiro. Por outro lado, a política do pan-americanismo, também
desenvolvida por Rio Branco, continuou a ser desenvolvida por Lauro Müller. Tanto é
verdade que, por ocasião da Primeira Guerra Mundial, o Brasil se posicionou ao lado dos
Estados Unidos, na defesa deste pan-americanismo.
A Primeira Guerra Mundial representou para a maioria dos países um novo desafio.
Pela primeira vez a humanidade se defrontava com um conflito de dimensões sem
precedentes. O Brasil, como pretenso líder da América do Sul, não poderia simplesmente
ignorar o que estava acontecendo na Europa. Lauro Müller, como defensor da neutralidade
oficial, pretendia fazer com que o Brasil não se envolvesse diretamente no conflito. No
entanto, em função de que havia um segmento importante do mundo político brasileiro
defendendo a participação brasileira na guerra, houve pressões para a queda de Lauro Müller.
119
Para isso, foi lembrada sua origem familiar alemã, sendo desencadeada uma campanha de
difamação, acusando-o de germanófilo. Diante disso, ficou insustentável sua manutenção no
Ministério, o que fez com que ele pedisse exoneração do cargo.
Mas sem dúvida, a ação mais marcante na gestão de Lauro Müller à frente da política
externa do Brasil foi a aproximação com a Argentina. A primeira década do século XX foi
marcada pela rivalidade brasileiro-argentina. Coube à Lauro Müller enfraquecer esta
rivalidade. A nomeação do ex-presidente Campos Salles, como ministro Plenipotenciário
brasileiro em Buenos Aires, logo no início da gestão de Lauro Müller, contribuiu
enormemente para isso. Como resposta à esta iniciativa, a Argentina também nomeou, como
seu ministro Plenipotenciário no Rio de Janeiro um ex-presidente, adepto da aproximação
com o Brasil, Julio Roca. A nomeação dos ex-presidentes passou a simbolizar a ideologia da
integração nas relações entre os dois países, bem como uma dinâmica de entendimento e de
cooperação entre si.
A aproximação entre o Brasil e Argentina aconteceu de forma lenta, pois o país
portenho sentia receios da amizade do Brasil com os Estados Unidos, pois as pretensões
argentinas, no continente, eram as mesmas do Brasil; assim, a busca da hegemonia política foi
uma disputada que prejudicou o entendimento cordial entre os dois países.
Na tentativa de aproximação Argentina-Brasil, o ponto alto foi a assinatura do Tratado
do ABC, em 1915, que tinha como objetivo principal resolver os contratempos entre os três
países signatários. Mas é possível afirmar que para o Brasil, este tratado, tinha também como
objetivo impedir que a Argentina continuasse a exercer influências sobre os demais países da
região do Cone Sul. O Brasil, contando com o Chile, tentava impedir a Argentina de
conquistar a hegemonia regional.
Apesar de toda a repercussão que a assinatura do Tratado do ABC teve, o mesmo não
foi aprovado, pois a Câmara dos Deputados da Argentina, ao negar sua aprovação, consegue
perceber as reais intensões brasileira: diminuir a margem de manobra argentina, amarrando-a
aos interesses do Brasil. Não sendo aprovado o Tratado, todo o esforço de Lauro Müller para
buscar a aproximação com a Argentina foi em vão.
Os xenófobos brasileiros, a Primeira Guerra Mundial, e o nacionalismo exarcebado
dentro do Brasil acabaram por influenciar o político Lauro Müller a pedir demissão do cargo
de Ministro das Relações Exteriores.
Este trabalho não se esgota aqui. É apenas um ponto de partida para entender a gestão
de Lauro Müller no Ministério das Relações Exteriores. Várias lacunas sobre sua atuação
certamente continuam abertas, que poderão ser preenchidas por outros trabalhos.
120
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b. Documentação Primária
ANAIS DO SENADO do ano de 1912, Biblioteca do Senado Federal, Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1914.
ANAIS DO SENADO do ano de 1913, Biblioteca do Senado Federal, Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1916.
ANAIS DO SENADO do ano de 1914, Biblioteca do Senado Federal, Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1917.
ANAIS DO SENADO do ano de 1915, Biblioteca do Senado Federal, Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1918.
ANAIS DO SENADO do ano de 1916, Biblioteca do Senado Federal, Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1918.
ANAIS DO SENADO do ano de 1917, Biblioteca do Senado Federal, Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1920.
MENSAGENS PRESIDENCIAIS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1912.
MENSAGENS PRESIDENCIAIS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1913.
MENSAGENS PRESIDENCIAIS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914.
MENSAGENS PRESIDENCIAIS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915.
MENSAGENS PRESIDENCIAIS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916.
MENSAGENS PRESIDENCIAIS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1917.
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL, no período
de 01 de maio de 1912 à 17 de maio de 1913. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1913.
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL no período
de 18 de maio de 1913 a 03 de maio de 1914. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1914.
126
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL no período
de 03 de maio de 1914 a 30 de junho de 1915. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915.
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL no período
de 01 de julho de 1915 a 22 de junho de 1916. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1916.
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL no período
de 23 de junho de 1916 a 03 de maio de 1917. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1931.
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL no período
de 01 de maio de 1917 a 03 de maio de 1918. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1920.
TELEGRAMAS expedidos do Brasil para Buenos Aires, 1913 a 1915. AHI 208-2-13
TELEGRAMAS recebidos de Buenos Aires, 1913 a 1915. AHI 234-2-1
TELEGRAMAS recebidos de Washington, 1913 a 1915. AHI 234-2-1
c. Manuscritos
ARQUIVO HISTÓRICO DO ITAMARATY – AHI
Rio de Janeiro - RJ
- Despachos à Legação de Buenos Aires, 1912-1917
- Ofícios da Legação de Buenos Aires, 1912-1917
ARQUIVO DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SANTA CATARINA
Palácio Cruz e Souza
Florianópolis – SC
- Manuscritos não editados
- Diário do Poder Legislativo – 1937
BIBLIOTECA PÚBLICA DE FLORIANÓPOLIS
Florianópolis – SC
- jornais de 1912 a 1917
d. Jornais, imprensa brasileira
FOLHA DO COMÉRCIO. Florianópolis, 1912-1917
127
O DIA. Florianópolis, 1912-1917
O ESTADO. Florianópolis, 1912-1917
e.Jornais, imprensa argentina
EL DIARIO. Buenos Aires, 1912-1917.
IDEA NACIONAL. Buenos Aires, 1912-1917.
LA ARGENTINA. Buenos Aires, 1912-1917.
LA CAPITAL. Rosário, 1912-1917.
LA ÉPOCA. Buenos Aires, 1912-1917.
LA GACETA. Buenos Aires, 1912-1917.
LA NACIÓN, Buenos Aires, 1917-1917.
LA PRENSA. Buenos Aires, 1912-1917.
LA RAZÓN. Buenos Aires, 1912-1917.
f. jornais de outros países
EL DIA. Montevidéo, 1912-1917.
EL DIÁRIO. Montevidéo, 1912-1917.
LA NACIÓN. Santiago, 1912-1917.
THE WASHINGTON POST. Washington, 1912-1917
THE WASHINGTON TIMES. Washington, 1912-1917
NEW YORK HERALD. Nova Yorke, 1912-1917.
g. Via on-line
www.cpdoc.fgv.br, visitado em 05/07/2005
www.revan.com.br, visitado em 10/08/2005
www.amersur.org.ar, visitado em 10/08/2005
www.mat.gor.br/legis/decretos/default.html, visitado em 14/11/2005
http://www.portalsbs.com.br/historia, visitado 14/11/2005
www.projetomemoria.art.br, visitado em 20/12/2005
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http://info.lncc.br, visitado em 06/09/2006
www2.mre.gov.br, visitado em 06/09/2005
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www.todo-argentina.net/historia/gen80/victorio/victorio/htm, visitado em 19/07/2006
http://siglo20.tercera.cl/1910-15/rep.htm, Destacado del Año, visitado em 19/07/2006
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129
ANEXO
130
ANEXO 1 - TRATADO ENTRE A REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS
DO BRASIL, A ARGENTINA E O CHILE PARA FACILITAR A SOLUÇÃO
PACÍFICA DE CONTROVÉRSIAS INTERNACIONAIS.
Os governos da República dos Estados Unidos do Brasil, da República Argentina e
da República do Chile, no desejo de afirmar neste momento a inteligência cordial, que a
comunhão de idéias e interesses criou entre os respectivos países, e de consolidar as relações
estreitas amizade que os ligam, conjurando a possibilidade de conflitos violentos no futuro; de
acordo com os desígnios de concórdia e de paz que inspiram a sua política internacional e com
o firme propósito de cooperar para que se torne cada vez mais sólida confraternidade das
Repúblicas americanas; tendo em vista que os vigentes Tratados de Arbitramento entre o
Brasil e o Chile, de 18/05/1899, entre a República Argentina e o Chile, de 28/05/1902, e entre
a república Argentina e o Brasil, de 07/09/1905, que consagram o arbitramento como único
meio de resolver todas as controvérsias de qualquer natureza que surgirem entre eles,
excetuaram deste recurso o primeiro dos referidos tratados as questões que não pudessem ser
formuladas juridicamente, e, os dois últimos, as que entendessem com os preceitos de
constitucionais dos paises Contratantes: resolveram adotar agora uma norma de procedimento
que facilite a solução amigável das questões excetuadas do arbitramento, em virtude dos
aludidos Tratados, e para este fim concordam em celebrar um Tratado especial, nomeando os
Plenipotenciários seguintes:
O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil o Senhor Doutor Lauro
Müller, Ministro de Estado das Relações Exteriores,
O presidente da República Argentina o Senhor Doutor José Luís Murature, Ministro
Secretário de Estado no Departamento das Relações Exteriores e Culto,
O presidente da República do Chile o Senhor Doutor Alejandro Lira, Ministro
Secretario de Estado no Departamento das Relações Exteriores,
Os quais, depois de trocados os seus Plenos Poderes, achados em boa e devida forma,
convieram no seguinte:
Artigo I
As controvérsias que por qualquer motivo originadas no futuro entre as três Partes
Contratantes ou entre duas delas e que não tiveram podido ser resolvidas por via diplomática,
nem submetidas a arbitramento, de conformidade com os tratados existentes ou com os que
131
forem celebrados posteriormente, serão submetidas ao exame e parecer de uma Comissão
Permanente, constituída pela forma estabelecida no Artigo III. As Altas Partes Contratantes se
obrigam a não praticar atos hostis, enquanto a Comissão, criada pelo presente Tratado, não
tiver dado o seu parecer ou não houver decorrido o prazo de um ano de que trata o Artigo V.
Fica entendido que o disposto no Artigo precedente não restringe de maneira alguma
os compromissos estabelecidos pelos Tratados de Arbitramento, atuais ou futuros, celebrados
entre as Altas Partes Contratantes, nem a obrigação de cumprir os laudos arbitrais nas
questões que, de conformidade com os referidos tratados, tenham sido ou forem resolvidas
por arbitramento.
Para constituir a Comissão Permanente, a que se refere o artigo I, cada uma das Altas
Partes Contratantes designará um Delegado, dentro dos três meses seguintes à troca de
ratificações do presente Tratado. Cada Governo poderá revogar o ato de nomeação de seu
Delegado, em qualquer momento antes do início do exame, devendo, nomear o substituto no
próprio ato da exoneração. A vaga ocorrente por outras causas será preenchida pelo Governo
respectivo e não suspenderá os efeitos das disposições do presente Tratado.
Artigo IV
As controvérsias, de que trata o artigo I, serão submetidas ao exame e parecer da
Comissão imediatamente após ao insucesso das negociações diplomáticas destinadas a
resolvê-las. Qualquer dos Governos, interessados na controvérsia, poderá fazer a convocação
da Comissão, para cujo efeito será suficiente a comunicação oficial desta decisão aos outros
dois Governos.
Artigo V
A Comissão Permanente se constituirá na cidade de Montevidéu, dentro de três meses
depois de sua convocação, e determinará as normas e o procedimento a que se deve
subordinar para o desempenho de sua missão. Ainda que, por qualquer motivo, a dita
Comissão deixe de se reunir uma vez decorrido os três meses, ela se considerará constituída
para efeito dos prazos estabelecidos no presente Artigo. As Altas Partes Contratantes
fornecerão todos os antecedentes e todas as informações necessárias ao exame. A Comissão
deverá apresentar seu parecer dentro de um a contar da data da sua constituição. Caso o
132
exame não tenha podido ser concluído ou o parecer redigido, dentro do prazo fixado, poderá
este ser prorrogado por mais seis meses, se nisso convierem as Altas Partes Contratantes.
Artigo VI
Submetido o parecer aos respectivos Governos, ou não havendo ele sido produzido
dentro dos prazos estipulados, as Altas Partes Contratantes recuperarão toda liberdade de ação
para proceder como melhor convier aos seus interesses sobre o assunto em exame.
Artigo VII
O presente Tratado será ratificado e as ratificações trocadas no Rio de Janeiro, no mais
breve prazo possível e vigorará até um ano depois da data de denúncia por qualquer das Altas
Partes Contratantes.
Em do que os Plenipotenciários acima nomeados, firmamos o presente instrumento
em três exemplares, cada um deles nas línguas espanhola e portuguesa, selando-os com os
nossos selos.
Feito na cidade de Buenos Aires aos 25 de maio de 1915.
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