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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MÍRIAM THAIS GUTERRES DIAS
A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA E OS DIREITOS DOS
PORTADORES DE TRANSTORNO MENTAL:
UMA ANÁLISE A PARTIR DO SERVIÇO RESIDENCIAL
TERAPÊUTICO MORADA SÃO PEDRO
Porto Alegre
Março 2007
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MÍRIAM THAIS GUTERRES DIAS
A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA E OS DIREITOS DOS
PORTADORES DE TRANSTORNO MENTAL:
UMA ANÁLISE A PARTIR DO SERVIÇO RESIDENCIAL
TERAPÊUTICO MORADA SÃO PEDRO
Tese apresentada como requisito para obtenção
do grau de Doutora, pelo Programa de Pós-
graduação da Faculdade de Serviço Social da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Nelson dos Reis
Porto Alegre
2007
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2
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecário Responsável
Ginamara Lima Jacques Pinto
CRB 10/1204
D541r Dias, Míriam Thais Guterres
A reforma psiquiátrica brasileira e os direitos dos portadores de
transtorno mental : uma análise a partir do serviço residencial
terapêutico morada São Pedro / Míriam Thais Guterres Dias. Porto
Alegre, 2007.
292 f.
Tese (Doutorado) – Faculdade de Serviço Social. Programa
de Pós-Graduação Serviço Social. PUCRS, 2007.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Nelson dos Reis
1. Morada São Pedro. 2. Reforma Psiquiátrica. 3. Política de Saúde.
4. Saúde Mental. I. Título.
CDD : 616.89
362.2042581
MÍRIAM THAIS GUTERRES DIAS
A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA E OS DIREITOS DOS PORTADORES
DE TRANSTORNO MENTAL: UMA ANÁLISE A PARTIR DO SERVIÇO
RESIDENCIAL TERAPÊUTICO MORADA SÃO PEDRO
Tese apresentada como requisito para obtenção
do grau de Doutora, pelo Programa de Pós-
graduação da Faculdade de Serviço Social da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul.
Aprovada em ____ de __________________ de ______.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________
Prof. Dr. Carlos Nelson dos Reis (Orientador – PUCRS)
______________________________________________
Profª. Dra. Jussara Maria Rosa Mendes (PUCRS)
______________________________________________
Profª Dra. Regina Célia Tamaso Mioto (UFSC)
_______________________________________________
Profª Dra. Luciane Carniel Wagner (CMIPA)
_______________________________________________
Profª. Dra. Simone Paulon (UFRGS)
Dedico esta tese aos meus queridos:
Otávio,
Lígia,
Afrânio,
Muito Obrigada!
AGRADECIMENTOS
O momento de agradecer é o de reconhecer os companheiros e
companheiras da jornada de militância, de trabalho, de qualificação... Esta trajetória
foi possível de ser realizada porque se tem um porto seguro para ser acolhida, tanto
nas alegrias como nas vicissitudes, que são os meus filhos e o meu marido, que
junto com a minha família extensiva, são fundamentais na minha vida.
Muitas instituições contribuíram para a realização deste processo, que
considero importante destacar, pois sem estes apoios, dificilmente se concretizaria o
projeto de doutoramento: a Unisinos, que viabilizou os meus estudos por um longo
período de tempo; a Fapergs, com o apoio na viabilização da pesquisa; a Capes por
proporcionar a condição de concluir a formação; a Secretaria de Estado da Saúde,
em especial aos meus colegas, pela tolerância com os meus estudos, e,
principalmente, ao Programa de s-Graduação da Faculdade de Serviço Social da
PUC RS que me recebeu com carinho e reconhecimento, proporcionando-me um
ambiente produtivo e com qualidade.
Muitos companheiras e companheiros da luta pela reforma psiquiátrica são
participantes deste trabalho, pois se está num espaço coletivo em que cada um
contribui com uma dimensão desta dinâmica e contraditória sociedade. A todos
vocês, agradeço por partilhar desta história.
Quero fazer um agradecimento especial ao meu orientador, Prof. Dr. Carlos
Nelson, parceiro incansável na realização desta produção, com seu apuro intelectual
e constante questionamento, acompanhado do espírito de colaboração... muito
obrigada!
RESUMO
Os direitos dos portadores de transtorno mental, na perspectiva da reforma
psiquiátrica brasileira, é o tema da presente tese, resultante de pesquisa explicativa
dialético-crítico aplicada no Serviço Residencial Terapêutico Morada São Pedro,
vinculado a Secretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul. O objetivo geral
foi verificar se a proposta de desinstitucionalização do Morada o Pedro
possibilitou a efetivação dos direitos dos seus usuários, visando contribuir na
formulação e execução de políticas públicas no campo da saúde mental. Realizado
um conjunto de técnicas qualitativas e a técnica do tipo quase-experimento para
comparação de dados da escala Independent Living Skills Survey (ILSS) dos
usuários quando internados no hospital psiquiátrico, ano de 2002, e como residentes
do Morada São Pedro, em 2004. A análise final realizada através da cnica de
triangulação dos dados obtidos com as técnicas qualitativas e com o teste t de
Student, revelou que o serviço criou oportunidades de produção de autonomia
possível, viabilizando o processo de desinstitucionalização. Faz-se ainda necessário
os usuários se constituírem de fato como sujeitos de direitos, para além do direito ao
consumo e de morar em condições dignas, quando se estará realizando
substancialmente a reforma psiquiátrica. Os resultados dessa pesquisa são
condensados nos capítulos: O Contexto Histórico da Política de Saúde e de Saúde
Mental no Brasil e no Rio Grande do Sul; As Repercussões dos Ajustes Estruturais
nas Reformas Sanitária e Psiquiátrica; e Evidências da Reforma Psiquiátrica no
Serviço Residencial Terapêutico Morada São Pedro.
Palavras-chave: Reforma Psiquiátrica. Direitos. Serviço Residencial
Terapêutico.
ABSTRACT
The rights of the psychiatric patients, in the perspective of the Brazilian
psychiatric reform, are the subject of the present thesis, dialectic-critical resultant of
explicativa research applied in the Residential Service Therapeutical Morada São
Pedro, tied the State Secretary of the Health of the Rio Grande do Sul. The general
objective was to verify if the proposal of deinstitutionalization of the Morada São
Pedro made possible the effectuation of the rights of the users, aiming at to
contribute in the formularization and execution of public politics in the field of the
mental health. Carried through a set of qualitative techniques and the technique of
the type almost-experiment for comparison of data of the scale Independent Living
Skills Survey (ILSS) of the users when interned in the psychiatric hospital, year of
2002, and as resident of the Morada São Pedro, in 2004. The carried through final
analysis through the technique of triangulation of the data gotten with the qualitative
techniques and test t of Student, disclosed that the service created chances of
production of possible autonomy, making possible the deinstitutionalization process.
One still becomes necessary the users if to constitute in fact as citizens of rights, stop
beyond the right to the consumption and to live in worthy conditions, when the
psychiatric reform will be being been becoming fullfilled substantially. The results of
this research are condensed in the chapters: The Historical Context of the Politics of
Health and Mental Health in Brazil and the Rio Grande do Sul; The Repercussions of
the Structural Adjustments in the Reforms Sanitary and Psychiatric; and Evidences of
the Psychiatric Reformation in the Residential Service Therapeutical Morada São
Pedro.
KEYWORDS: Psychiatric Reform. Rights. Residential Service Therapeutical
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 Freqüência de informações nos prontuários dos usuários de
serviços de saúde mental da região metropolitana de Porto
Alegre, 2003..................................................................................
142
Gráfico 02 Distribuição da população do HPSP segundo seu desempenho
nos domínios do ILSS, 2002.........................................................
182
Gráfico 03 Comparação dos desempenhos dos usuários sobre habilidades
da vida diária, anos 2002 e 2004..................................................
183
Gráfico 04 Comparação da freqüência da questão 2 do domínio lazer, anos
2002 e 2004..................................................................................
186
Gráfico 05 Comparação da freqüência da questão 1 do domínio transporte,
anos 2002 e 2004..........................................................................
187
Gráfico 06 Comparação da freqüência da questão 3 do domínio transporte,
anos 2002 e 2004..........................................................................
188
Gráfico 07 Comparação da freqüência da questão 4 do domínio lazer, anos
2002 e 2004..................................................................................
189
Gráfico 08 Comparação da freqüência da questão 9 do domínio lazer, anos
2002 e 2004..................................................................................
190
Gráfico 09 Comparação da freqüência da questão 6 do domínio
administração do dinheiro, anos 2002 e 2004..............................
194
Gráfico 10 Comparação da freqüência da questão 9 do domínio
administração do dinheiro, anos 2002 e 2004..............................
195
Gráfico 11 Comparação da freqüência da questão 12 do domínio
administração do dinheiro, anos 2002 e 2004..............................
196
Gráfico 12 Comparação da freqüência da questão 1 do domínio preparo e
armazenamento de alimentos, anos 2002 e 2004........................
198
Gráfico 13 Comparação da freqüência da questão 6 do domínio atividades
domésticas, anos 2002 e 2004.....................................................
199
9
Gráfico 14 Comparação da freqüência da questão 10 do domínio cuidados
pessoais, anos 2002 e 2004.........................................................
200
Gráfico 15 Comparação da freqüência da questão 7 do domínio saúde,
anos 2002 e 2004.........................................................................
201
Gráfico 16 Comparação da freqüência da questão 5 do domínio emprego,
anos 2002 e 2004.........................................................................
203
Gráfico 17 Comparação dos desempenhos dos usuários sobre habilidades
da vida diária nas dimensões individuais e organizacionais,
anos 2002 e 2004..........................................................................
204
Gráfico 18 Comparação da freqüência da questão 8 do domínio
administração do dinheiro, anos 2002 e 2004..............................
210
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no Brasil - República Velha.......................................................
024
Quadro 02 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no Brasil - Governo Provisório, Constitucionalista e Estado
Novo (1930-1945).....................................................................
029
Quadro 03 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no Brasil – Período do Desenvolvimentismo (1945 – 1964).....
034
Quadro 04 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no Brasil – Período do Regime Militar (1964 – 1985)...............
041
Quadro 05 - Síntese da Constituição das Políticas de Saúde e Saúde
Mental no Brasil – Período do Regime Militar e da Nova
República (Década de 1980).....................................................
048
Quadro 06 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no RS – Período do Império e da República Velha...................
061
Quadro 07 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no RS – Período Governo Provisório, Constitucionalista e
Estado Novo (1930-1945).........................................................
063
Quadro 08 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no RS – Período do Desenvolvimentismo (1945 –
1964).........................................................................................
067
Quadro 09 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no RS – Período do Regime Militar (1964 – 1985)...................
073
Quadro 10 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental
no RS – Período da Nova República........................................
079
Quadro 11 - Síntese da Política de Saúde no Brasil na década de 1990..... 091
Quadro 12 -
Síntese da Política de Saúde no Brasil na primeira década do
século XXI.................................................................................
095
11
Quadro 13 - Acontecimentos indicativos dos direitos em saúde mental....... 117
Quadro 14 -
Síntese da Política de Saúde Mental no Brasil a partir dos
anos 1990..................................................................................
132
Quadro 15 - Modalidades de Atenção em Saúde Mental e situação no
Brasil, 2006...............................................................................
135
Quadro 16 - Percentual de ocorrência de temas das Dissertações e Teses
de 1987 a 2006.........................................................................
144
Quadro 17 - Síntese da Política de Saúde Mental no Rio Grande do Sul a
partir dos anos 1990.................................................................
146
Quadro 18 - Roteiro da entrevista semi-estruturada com os gestores do
Morada São Pedro....................................................................
175
Quadro 19 -
Roteiro da entrevista semi-estruturada com os usuários do
Morada São Pedro....................................................................
176
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 - Número de hospitais psiquiátricos por natureza no Brasil, 1941
a 1991...........................................................................................
050
Tabela 02 - Alteração do gasto público em saúde nas esferas de gestão nos
anos de 1980, 1994 e 2002...........................................................
097
Tabela 03 -
Previsão orçamentária em 2004-2007 e valores pagos em 2004
às ações de atenção à saúde mental............................................
137
Tabela 04 -
Evolução Comparativa Percentual entre Gastos com Internação
Hospitalar e Rede Substitutiva em Saúde Mental, 1997 a 2006 –
Brasil.............................................................................................
140
Tabela 05 - Leitos e CAPS no Brasil – 1996 a 2006........................................ 140
LISTA DE SIGLAS
Abrasco - Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva
Abres - Associação Brasileira de Economia da Saúde
AIH – Autorização de internação Hospitalar
AIS - Ações Integradas de Saúde
Ampasa - Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde
ANS - Agência de Saúde Suplementar
BPC - Benefício de Prestação Continuada
CAPs - Caixa de Aposentadorias e Pensões
CAPS - Centro de Atenção Psicossocial
Cebes - Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
Cefess – Conselho Federal de Serviço Social
CES - Conselho Estadual de Saúde
CIB - Comissão Intergestora Bipartite
CILE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecico
CIMS - Comissão Interinstitucional Municipal de Saúde
Ciplan - Conselho Interministerial de Planejamento
CIS - Comissão Interinstitucional de Saúde
CIT - Comissão Intergestora Tripartite
CNS - Conselho Nacional de Saúde
Conasp - Conselho Consultivo de Administração de Saúde Previdenciária
14
CPMF – Contribuição Provisória de Movimentação Financeira
CRIS - Comissão Interinstitucional Regional de Saúde
Dataprev - Empresa de Processamento Dados da Previdência Social
DMLU - Departamento Municipal de Limpeza Urbana
DRU - Desvinculação de Recursos da União
DSS - Determinantes Sociais da Saúde
EUA – Estados Unidos da América
FAEC - Fundo de Ações Estratégicas e de Compensação
FBO – Fórum Brasileiro do Orçamento
Febem – Fundação do Bem Estar do Menor
FEE – Fundação de Economia e Estatística
Fffcmpa - Fundação Federal Faculdade Medicina de Porto Alegre
Fiocruz - Fundação Oswaldo Cruz
Funabem - Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
Funasa - Fundação Nacional de Saúde
HCPA – Hospital de Clínicas de Porto Alegre
HPSP - Hospital Psiquiátrico São Pedro
IAPs - Institutos de Aposentadorias e Pensões
Iapas - Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social
ILSS - Independent Living Skills Survey
Inamps - Instituto Nacional da Assistência Médica da Previdência Social
Inps - Instituto Nacional de Previdência Social
LBA - Legião Brasileira de Assistência
Lops - Lei Orgânica da Previdência Social
MAC - Média e Alta Complexidade
MEC - Ministério da Educação e Cultura
Mpas - Ministério da Previdência e Assistência Social
15
NOB - Norma Operacional Básica SUS
OEA – Organização dos Estados Americanos
OMS - Organização Mundial da Saúde
ONU – Organização das Nações Unidas
OPAS – Organização Pan-Americana de Saúde
Piass - Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento
Pisam - Plano Integrado de Saúde Mental
PNAD - Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios
PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PPA - Plano Plurianual
PPR - Partido Republicano Rio-Grandense
Prev-Saúde - Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde
Reforsus - Reforço à Reorganização do Sistema Único de Saúde
RS - Rio Grande do Sul
SALTE – Saúde, Alimento, Transporte e Energia
SES - Secretaria de Estado da Saúde
Sesp - Serviço Especial de Saúde Pública
SIA-SUS - Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS
SIH-SUS - Sistema de Informações Hospitalares do SUS
Sinpas - Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social
SSMA - Secretaria de Saúde e meio Ambiente
SRT - Serviços Residenciais Terapêuticos
SUDS - Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS - Sistema Único de Saúde
TCU - Tribunal de Contas da União
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 017
2 O CONTEXTO HISTÓRICO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E DE SAÚDE
MENTAL NO BRASIL E NO RIO GRANDE DO SUL..................................
022
2.1
CONSTITUIÇÃO HISTÓRICA DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E DE SAÚDE
MENTAL NO BRASIL...................................................................................
022
2.2
AS REFORMAS SANITÁRIA E PSIQUIÁTRICA NO BRASIL..................... 047
2.3
A POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL NO RIO GRANDE DO SUL.................. 058
3 AS REPERCUSSÕES DOS AJUSTES ESTRUTURAIS NAS
REFORMAS SANITÁRIA E PSIQUIÁTRICA..............................................
084
3.1
AS REFORMAS NO CONTEXTO DO AJUSTE ESTRUTURAL DO
ESTADO E OS IMPACTOS NA POLÍTICA DE SAÚDE..............................
084
3.2
O DEBATE SOBRE OS DIREITOS NO CAMPO DA SAÚDE MENTAL..... 108
3.3
O ESTADO DA ARTE DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL E NO
RIO GRANDE DO SUL................................................................................
130
4 EVIDÊNCIAS DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO SERVIÇO
RESIDENCIAL TERAPÊUTICO MORADA SÃO PEDRO..........................
154
4.1
MORADA SÃO PEDRO: PROPOSTA DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO.. 154
4.2
A CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA DA PESQUISA................................. 167
4.3
OS EFEITOS DO MORADA SÃO PEDRO NA VIDA DOS SUJEITOS........
179
5 CONCLUSÕES............................................................................................ 217
REFERÊNCIAS............................................................................................ 221
17
DOCUMENTOS INSTITUCIONAIS..............................................................
245
APÊNDICES.................................................................................................
250
Apêndice A –
Síntese das Conferências Nacionais de Saúde no
Brasil...................................................................................
250
Apêndice B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos
usuários do Morada São Pedro, coleta de dados do ano
2004.....................................................................................
253
Apêndice C –
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos sujeitos
da pesquisa da coleta de dados do ano 2006.....................
256
ANEXOS.......................................................................................................
258
Anexo A – Autorização do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital
Psiquiátrico São Pedro...........................................................
258
Anexo B – Escala Independent Living Skills Survey – ILSS…………… 260
Anexo C – Apresentação das tabelas com os dados coletados sobre as
dimensões da Escala ILSS.....................................................
266
Anexo D – Análise Estatística.................................................................. 288
1 INTRODUÇÃO
A presente tese tem como tema a reforma psiquiátrica brasileira, constituída
no cenário de democratização política e da reforma sanitária, e implementada no
contexto do debate sobre a reforma do Estado na cada de 1990. O objeto do
estudo é a verificação da efetividade dos direitos dos portadores de transtorno
mental a partir do projeto de desinstitucionalização Morada São Pedro, ação que
ainda requer estudo sobre sua condição de representar uma transformação no
horizonte da Reforma Psiquiátrica, entendida como superação do modelo
manicomial e hospitalocêntrico das práticas do Hospital Psiquiátrico São Pedro.
Os desafios para a implantação da reforma psiquiátrica estão postos pelo
contexto de alterações no papel do Estado, situação contraditória, pois
como se
relaciona o fato de que no cenário de ajuste estrutural, retração do Estado na
efetivação das políticas sociais e desmonte dos direitos sociais a partir de 1990, se
instala uma política blica de saúde mental, que tem como eixo os direitos dos
portadores de transtorno mental e uma nova lógica de atenção, com caráter
interdisciplinar, reabilitadora e de inclusão social, conforme preconizam um conjunto
de dispositivos legais como a Lei de Reforma Psiquiátrica do Rio Grande do Sul
(1992) e a Lei Federal de Saúde Mental (2001)?
As políticas de saúde e de saúde mental nasceram sob a égide da filantropia
e da preocupação com as condições necessárias para a reprodução da força de
trabalho, e não na perspectiva dos direitos e dos cuidados dignos aos indivíduos. A
construção do ideário que inspira a Constituição Federal de 1988 e o compromisso
de várias forças sociais, entre elas a categoria dos assistentes sociais, de imprimir
uma nova cultura na sociedade brasileira requer esforços permanentes e
qualificados de garantir uma nova ordem social e, por conseguinte, um novo modo
de cuidar e de considerar os que padecem de transtorno mental. Para tanto, os
desafios são para todos os agentes sociais, para a efetivação de uma política de
saúde mental que ainda está em implementação no Brasil.
A política de saúde mental brasileira passou por uma revisão crítica do
modelo hegemônico existente a então a partir de meados dos anos 1980, se
19
constituindo na perspectiva da reforma psiquiátrica, concebida no bojo da Reforma
Sanitária e instalada no contexto do debate sobre a Reforma do Estado no Brasil
nos anos 1990. Desde então, um conjunto de reivindicações, legislações e adoção
de novas modalidades de atenção aos portadores de transtorno mental vêm sendo
implantadas, tanto pela ação de agentes sociais como pelo Estado. Deste modo, é
relevante do ponto de vista científico que mais estudos sobre os efeitos destas
medidas se realizem, ampliando conhecimentos para decifrar uma política pública
que ainda está em andamento no país.
A magnitude do campo da saúde mental pode ser medida pela estimativa
mundial de que mais de 25% das pessoas, independentes da sua localização em
país desenvolvido ou em desenvolvimento, apresentam um ou mais transtornos
mentais e comportamentais durante o ciclo da vida (OMS, 2001). Associando este
dado epidemiológico ao fato de que o Brasil historicamente caracteriza-se por forte
desigualdade social, percebe-se a amplitude do problema a ser enfrentado pela
política de saúde mental, com grande contingente populacional requerendo cuidados
e exigindo seu direito à saúde, como preconiza a Constituição Federal de 1988.
O modelo clássico de atenção em saúde mental foi a construção e
manutenção de grandes asilos psiquiátricos que demonstraram sua incapacidade de
tratar e de respeitar os direitos dos portadores de transtorno mental. Esta também foi
a trajetória do Hospital Psiquiátrico São Pedro, no estado do Rio Grande do Sul,
único hospital psiquiátrico público do estado, que por mais de um século centralizou
o atendimento em saúde mental.
O projeto político da gestão estadual de 1999 a 2002 definiu como uma das
prioridades a implantação da reforma psiquiátrica no solo gaúcho, sendo o hospital
psiquiátrico público alvo de ações de transformação. Dentre elas, há um processo de
desinstitucionalização através da constituição do Projeto Morada São Pedro, em
2002, que criou novos espaços de moradia, implicando na criação de novas relações
sociais e na possibilidade de autonomia social para um grupo de moradores da
instituição.
O Morada São Pedro foi uma experiência pioneira no Rio Grande do Sul, e
são escassos os estudos sobre seu efeito na vida dos usuários, justificando assim a
20
pertinência de uma pesquisa para detectar suas possibilidades e sua relação com os
pressupostos da reforma psiquiátrica formulados pelos atores sociais que a
construíram: autonomia, inserção social, usufruto de direitos como qualquer cidadão
brasileiro, dos portadores de transtorno mental.
A experiência profissional
1
decorrente da inserção como assistente social na
política de saúde mental, primeiramente no Hospital Psiquiátrico o Pedro, a partir
de 1982, e posteriormente, na gestão da política de saúde mental, nos âmbitos
estadual e municipal, envolvendo ações de natureza técnica, administrativa e
política, permitiu uma concepção ampliada de exercício profissional, apreendendo
seu real significado como sujeito capaz de propor um novo projeto de sociedade,
construído coletivamente com outros setores sociais.
No horizonte do projeto ético-político do Serviço Social que aponta na direção
da ampliação da cidadania às camadas sociais alijadas do usufruto das riquezas
produzidas socialmente e no “reconhecimento da liberdade como valor ético central
e das demandas políticas a ela inerentes autonomia, emancipação e plena
expansão dos indivíduos sociais” (CFESS, 1994, p. 11), sustenta-se a relevância
desta pesquisa, pela sua possibilidade de contribuir na produção de conhecimento
sobre uma política pública peculiar, pois tanto no campo dos direitos como no
cenário de retração do investimento público, atinge camadas sociais que sofrem de
preconceito pela natureza do seu problema de saúde.
Portanto, analisar os efeitos de uma nova perspectiva de vida e de cuidado de
usuários que estiveram institucionalizados por muitos anos, pode revelar o alcance
da reforma psiquiátrica na garantia de seus direitos, ou a realização de uma ação na
direção da desresponsabilização do Estado, como preconiza o ideário neoliberal.
Nesta perspectiva, a pesquisa também tem uma relevância social e política, pois
permitirá adensar o debate em curso, neste momento histórico, sobre a continuidade
1
A autora é militante do Fórum Gaúcho de Saúde Mental e, no campo acadêmico, já realizou
pesquisas e artigos sobre o tema da reforma psiquiátrica e os direitos dos portadores de transtorno
mental.
21
ou não da reforma psiquiátrica, objeto de análise para deliberação do parlamento
gaúcho
2
.
O problema da pesquisa consiste na questão em que medida o projeto de
desinstitucionalização Morada São Pedro, para portadores de transtorno mental,
egressos de longa internação hospitalar, possibilitou a efetivação de seus direitos?
O objetivo geral é verificar se a proposta de desinstitucionalização do Projeto
Morada São Pedro, construída sob os auspícios da reforma psiquiátrica, possibilitou
a efetivação dos direitos dos portadores de transtorno mental, visando contribuir na
formulação e execução de políticas públicas no campo da saúde mental. Como
objetivos específicos, a tese pretende sistematizar a constituição da política de
saúde no Brasil para analisar a formulação da política da reforma psiquiátrica no
cenário de democratização e ao mesmo tempo de retração do Estado no campo das
políticas sociais; verificar as mudanças geradas na vida dos usuários do Projeto
Morada São Pedro; analisar as ações da gestão pública desenvolvidas no Projeto
Morada São Pedro em prol da garantia dos direitos dos portadores de transtorno
mental.
O método da pesquisa é o dialético-crítico, cuja metodologia consiste num
conjunto de técnicas quantitativa e qualitativa
3
. A técnica quantitativa utilizada foi de
quase-experimento para comparação das habilidades da vida diária com sua
situação pregressa de internação psiquiátrica através de uma escala que mede
áreas de habilidades de vida independente. As qualitativas foram a análise
documental dos materiais produzidos pelos órgãos blicos estadual e federal, bem
como de documentos das agências multilaterais, e entrevistas semi-estruturadas
com os usuários e os dirigentes do serviço Morada São Pedro. O momento da
análise dos dados da pesquisa operou-se através da triangulação e teve como
referência as categorias de análise do método dialético-crítico e as categorias
explicativas da realidade, definidas como direitos, política social,
desinstitucionalização e autonomia.
2
No ano de 2004 e posteriormente, em 2005, foi apresentado um projeto de lei na Assembléia
Legislativa do Estado alterando a Lei de Reforma Psiquiátrica no Rio Grande do Sul.
3
O detalhamento dos procedimentos metodológicos está presente no capítulo 4, item 4.2.
22
O resultado final desta produção está exposto em capítulos, de forma a
explicar as conexões estabelecidas em resposta ao problema e questões de
pesquisa. Primeiramente, no capítulo dois, retoma-se a constituição histórica das
políticas de saúde e de saúde mental no Brasil, como terreno explicativo das
reformas sanitária e psiquiátrica, com destaque para a constituição da saúde mental
no estado do Rio Grande do Sul.
A partir deste quadro, no capítulo três retomam-se as reformas no contexto do
ajuste estrutural do Estado e os impactos na política de saúde, situando o debate
sobre os direitos no campo da saúde mental, para ser possível uma sistematização
crítica sobre o estado da arte da reforma psiquiátrica no Brasil e no Rio Grande do
Sul. Posto este contexto, no capítulo quatro apresenta-se e problematiza-se o
serviço residencial terapêutico Morada São Pedro como uma proposta de
desinstitucionalização, lócus do presente estudo. Posteriormente, expõe-se a
construção metodológica da pesquisa para, por fim, revelar os efeitos do processo
de desinstitucionalização Morada São Pedro na vida dos moradores. Ao final, têm-se
as conclusões, revelando as reflexões sobre os resultados obtidos na busca de
responder as inquietações que suscitaram a investigação e a produção de
conhecimento sobre o tema da reforma psiquiátrica, na sua dimensão de garantia de
direitos dos portadores de transtorno mental.
2 CONTEXTO HISTÓRICO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E DE SAÚDE MENTAL
NO BRASIL E NO RIO GRANDE DO SUL
“O passado não reconhece o seu lugar,
está sempre presente”.
Mário Quintana
Neste capítulo desenvolve-se a trajetória das políticas de saúde e de saúde
mental no Brasil com a finalidade de particularizar suas conexões com o sistema
econômico, político e social do país. O capítulo inicia com a sistematização dos
fundamentos históricos das políticas de saúde e de saúde mental no Brasil, com a
demarcação temporal até a década de 1980, visto que a década seguinte é um
marco das mudanças políticas, econômicas e sociais na história brasileira.
Na seqüência, tem-se como foco de observação as reformas sanitária e
psiquiátrica, com seus processos instituintes e de consolidação, e por fim, um
resgate analítico sobre a saúde e saúde mental no Rio Grande do Sul. A
sistematização analítica destas trajetórias será realizada por períodos políticos e/ou
econômicos que marcaram a história brasileira, acompanhada por quadros sínteses
com os acontecimentos mais relevantes relacionados ao tema de estudo.
2.1 CONSTITUIÇÃO HISTÓRICA DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E DE SAÚDE
MENTAL NO BRASIL
As políticas sociais públicas são constituídas a partir de um determinado
modo da sociedade conceber e explicar fenômenos sociais, para, a partir de então,
ser possível a ação pública se efetivar, com seus dispositivos legais e de gestão. A
política setorial da saúde e sua especificidade de saúde mental foi sendo gestada no
teor, ritmo e tempo característicos da formação e consolidação do estado brasileiro
ao longo do culo vinte, particularidades que a moldam com feições contraditórias,
ora de negação, ora de reconhecimento da questão social
4
. A política social do tipo
4
Entendida como o conjunto das manifestações das desigualdades sociais geradas na sociedade
capitalista, e que “tem como raiz comum: a produção social cada vez mais coletiva, o trabalho torna-
se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada,
monopolizada por uma parte da sociedade” (IAMAMOTO, 1998, p. 27).
24
residual (COSTA, 1998, PEREIRA, 2002) foi a marca no período do Império
5
até
meados da década 1930 no Brasil, quando a assistência à saúde da população em
geral era realizada pelas instituições hospitalares vinculadas a entidades religiosas,
destinadas aos pobres. Nesta perspectiva, coube ao Estado a intervenção somente
nas situações que extrapolavam as capacidades daqueles agentes, como foi o caso
da construção do primeiro hospital psiquiátrico público
6
do Brasil, o Hospital Dom
Pedro II, em 1852, no Rio de Janeiro, e no Rio Grande do Sul, em 1884, o Hospital
Psiquiátrico o Pedro. Estes estabelecimentos contribuíram para o advento e
expansão do saber psiquiátrico a partir do Império, com a criação da Cátedra de
Psiquiatria nas duas Faculdades de Medicina existentes no país - Rio de Janeiro,
1881 e Bahia, 1883.
O Brasil, no final do século XIX e primeiras décadas do século seguinte,
depara-se com a necessidade de redefinir a composição de sua força de trabalho,
em decorrência do encerramento do ciclo do trabalho escravo como base da mão de
obra da época. Este período da República Velha (1889-1930) esteve sob a
inspiração do pensamento liberal e a peculiaridade de forte centralização do poder
assentado na aliança política dos grandes proprietários de terra e no bloco agrário
exportador. A eclosão da primeira guerra mundial ocasiona um abalo na economia
exportadora e possibilita o ingresso de capital externo e a instalação de indústrias
estrangeiras, formando um contingente de operários urbanos e criando as condições
para suas organizações reivindicatórias sobre melhores condições de trabalho e de
vida (IANNI, 1984; FIORI, 2003).
Neste cenário, fez-se necessária a adoção de estratégias para a reprodução
das condições de vida das classes trabalhadoras, que emergem com a instalação do
modo de produção capitalista, nos primórdios de sua fase industrial. São estas que
vão determinar as primeiras ações estatais no setor de saúde brasileiro (COSTA,
1986), a partir de um conjunto de medidas, como é possível constatar na síntese no
Quadro 1.
5
O Império preservou o sistema produtivo exportador herdado da colônia e organizou alianças
políticas internas que possibilitaram a definição das fronteiras do país. A partir de 1820, com o retorno
da família real a Portugal, se consolidou com a autonomia local dos senhores do café e do açúcar,
assentado na defesa irrestrita da escravidão como mão-de-obra na produção (FIORI, 2003).
6
No ano 1860 foi fundada a Casa de Saúde Dr. Eiras, no Rio de Janeiro, primeira instituição
psiquiátrica privada no país.
25
ANO ACONTECIMENTOS
1889 Primeira legislação de obrigatoriedade da vacina contra a varíola no Brasil para
crianças até seis meses de idade.
Rodrigues Alves nomeia Oswaldo Cruz como Diretor Geral de saúde pública, cargo
que corresponde atualmente ao de Ministro da Saúde.
1903
Primeira Lei Federal de Assistência aos Alienados, n 1.132, de 22/12/1903.
Reorganiza a assistência aos alienados.
1904 Epidemia de Varíola assola a capital do Brasil. Aprovada a lei da obrigatoriedade
da vacinação. Revolta da Vacina no Rio de Janeiro.
1919 Primeira lei de acidentes de trabalho.
1920 Criação do Departamento Nacional de Saúde Pública.
1921 Lei Carlos Chagas, com ampliação dos serviços de saúde pela ação estatal.
Lei Eloy Chaves - previdência social para ferroviários e portuários, através da
criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões – CAPs.
Promulgação do Código Sanitário.
1923
Criada a Liga Brasileira de Higiene Mental, no Rio de Janeiro.
1924 1º Congresso Brasileiro de Higiene.
Quadro 1 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no Brasil -
República Velha.
Fontes: OMS, 1955; FARIA, 1981; FEE, 1983; CERQUEIRA, 1984; COSTA, 1986; COSTA, 1989;
DELGADO, 1994; GUIMARÃES e TAVARES, 1994; PAULIN; TURATO, 2004; HOCHMAN, 2005;
FIOCRUZ, 2005; RAMOS, GEREMIAS, 2006.
A partir da ação governamental sobre as reivindicações da classe
trabalhadora, visando a diminuição dos conflitos advindo da relação capital e
trabalho, realiza-se uma mediação pelo atendimento de determinadas demandas de
frações de classe subordinadas. O apoio do círculo intelectual médico-sanitário foi
importante para esta mediação, pois consolidou rotinas científicas e administrativas
que sustentaram a iniciativa das classes dominantes nacionais no campo da
preservação da saúde da força de trabalho e no controle e erradicação de um
conjunto de doenças transmissíveis que debelava a saúde da população. A
incorporação da microbiologia, inovação científica européia, passa a ser uma
referência nas explicações da gênese das doenças, norteando a criação de
programas de saúde pública em ações de vacinação e campanhas sanitárias de
26
controle de vetores
7
para a prevenção de doenças, consolidadas pelo trabalho de
Oswaldo Cruz
8
.
Para tanto, “o modelo assistencial público tinha na campanha e na polícia
sanitária seus meios principais de efetivação” (MERHY; QUEIROZ, 1993, p. 03). A
polícia sanitária, outra influência européia, parte do pressuposto de que o governo
tinha a prerrogativa, com respaldo científico, de contrariar interesses individuais na
definição de regras para a higiene nas cidades e mudanças nos comportamentos
pessoais, de modo a erradicar doenças.
A saúde pública foi uma medicina de cidade: o controle das epidemias
concorreu favoravelmente para o significativo aumento da população nas cidades
brasileiras (COSTA, 1986, IYDA, 1994). O uso da força repressiva estatal
9
na
indução de normas e medidas de saúde, legitimada cientificamente, tanto serviu
como justificava para o Estado assegurar os interesses de instituir-se como poder
central, como para melhorar a situação sanitária nas cidades e, principalmente, nos
portos, local estratégico para o desenvolvimento econômico. Explica-se assim, a
particular relação entre Estado e sociedade denominada como “pacto de dominação”
(KOWARICK, 1985), em que o Estado tem o papel de criar as normas para garantir
o projeto econômico e político ao mesmo tempo em que assegura certas demandas
das classes subalternas.
O saneamento era a ênfase principal na saúde pública naquele momento,
motivo que levou o círculo médico-sanitário a defender a inclusão da carreira médica
neste campo, sob a influência da escola americana de saúde pública, principalmente
da Fundação Rockefeller
10
. Os esforços da categoria médica tiveram êxito e seus
discursos passaram a respaldar científica e politicamente as ações do governo,
organizando a área de saúde blica como é reconhecida até os dias atuais. Esta
7
Ação da vigilância sanitária de combater criadouros de larvas e espécies adultas de insetos,
roedores e quaisquer outros vetores transmissores de doenças.
8
Oswaldo Cruz (1872-1917) médico sanitarista que combateu as doenças endêmicas: a febre
amarela, a varíola e a peste bubônica.
9
O evento significativo de reação popular às medidas do Departamento Nacional de Saúde Pública
de obrigatoriedade de vacinação contra a varíola ocorreu no ano de 1904, no Rio de Janeiro,
conhecida como a Revolta da Vacina (COSTA, 1986).
10
A Fundação Rockefeller participou na organização de várias ações de enfrentamento de doenças
endêmicas, viabilizando ao longo do tempo a interiorização de postos de saúde em áreas rurais em
algumas regiões do país (HOCHMAN, 2005), como, até os dias atuais, presta apoio técnico e
financeiro para projetos de formação e qualificação profissional na área de saúde.
27
legitimidade pode ser medida pela criação dos Congressos Brasileiros de Higiene no
ano de 1924 (Quadro 1), que por várias décadas influenciou o pensamento técnico e
político na saúde pública brasileira (MERHY; QUEIROZ, 1993, HOCHMAN, 2005).
O debate travado no campo da saúde pública está posto na concepção em
vigor de que a medicina era distinta das ações sanitárias, pois [...] “a primeira para
curar através da clínica, patologia e terapêutica, e a segunda, para prevenir
doenças, prolongar e promover a saúde através da higiene e da educação sanitária”
(MERHY; QUEIROZ, 1993, p. 04). Ou seja, a primeira tinha o propósito de tratar as
doenças individuais e a outra, de cuidar dos problemas de saúde que atingiam
vários segmentos sociais.
O pensamento sanitarista foi constituído então na concepção denominada de
higienista, assentado num conjunto de práticas sanitárias para erradicar doenças
transmissíveis que afetam as condições de saúde. Mas, articulado a este, esteve
presente a concepção da eugenia
11
, termo que designa o “estudo dos fatores
socialmente controláveis que podem elevar ou rebaixar as qualidades raciais das
gerações futuras, tanto física como mentalmente” (COSTA, 1989, p. 81).
A eugenia se constituiu num movimento intelectual que correspondeu a vários
interesses, pois “[...] se buscava no Brasil uma ação social que saneasse a zona
rural, a fim de constituir um povo saudável, racialmente forte, permitindo, ao mesmo
tempo, a ocupação do país, considerada vital para a integração nacional” (MERHY;
QUEIROZ, 1993, p. 03). Portanto, sanear os aglomerados urbanos e rurais e
imprimir novos comportamentos sociais para debelar os efeitos da miscigenação
racial, considerada um risco social pela elite conservadora (GOMES; ADORNO,
1990; STANCIK, 2004), configuraram-se uma estratégia do governo para o propósito
de consolidação do Estado.
Deste modo, houve a aproximação histórica entre a eugenia e o higienismo
na conformação da saúde pública brasileira, influenciando sua expressão na saúde
mental de modo hegemônico, representado pela Liga Brasileira de Higiene Mental,
11
Termo criado pelo fisiologista inglês Galton no século XX que foi amplamente discutido por
intelectuais europeus e norte-americanos sobre os efeitos físicos e culturais produzidos pela
miscigenação das raças humanas (COSTA, 1989).
28
fundada em 1923. Os médicos psiquiatras da época se inspiraram no circuito
intelectual brasileiro, que foram os primeiros a difundi-la na cultura brasileira.
A necessidade fundamental dos psiquiatras era a de modificar a
realidade brasileira com a qual o estavam de acordo. [...] Os psiquiatras
acreditavam que o Brasil degradava-se moral e socialmente por causa dos
vícios, da ociosidade e da miscigenação racial do povo brasileiro. A
prevenção eugênica apareceu-lhes como o instrumento mais rápido e eficaz
para sanear a situação (COSTA, 1989, p. 61).
A prevenção eugênica se materializou através da criação de hospitais e
colônias-agrícolas públicas para os portadores de transtornos mentais, tuberculose e
hanseníase, sendo o período da Proclamação da República até 1941 caracterizado
como o da hegemonia do setor público nas ações relativas à assistência psiquiátrica
pela adoção do modelo das colônias (SAMPAIO, 1988). A considerada incapacidade
destes indivíduos em compor a mão de obra necessária ao modo de produção
capitalista decretou o seu destino: isolamento e segregação social. Três proposições
contraditórias entre si justificam a existência das instituições psiquiátricas: a)
indicação prioritariamente social, a remoção e exclusão do elemento perturbador, b)
preservação dos bens e segurança dos cidadãos, e c) uma indicação clínica com o
propósito de curar os doentes mentais (RESENDE, 1994). Portanto, fica evidente a
concepção vigente de que a presença de transtorno mental determina a segregação
social em instituição psiquiátrica.
Na fase final do período da República Velha, o Estado impulsionou a criação
de certos dispositivos para responder à demanda do mundo do trabalho, como:
legislação sobre acidentes de trabalho, ampliação dos serviços de saúde pela ação
estatal, promulgação do primeiro Código Sanitário e a instalação da previdência
social privada através da Lei Eloy Chaves, em 1923, com a criação das Caixas de
Aposentadorias e Pensões (CAPs)
12
, que se constituíram na origem do sistema de
previdência social e da medicina previdenciária pública no país.
Estas significativas medidas anunciam mudanças importantes no país, em
decorrência do cenário internacional de crise econômica no final da cada de vinte
do século XX, que repercutiu no Brasil, influenciando nas mudanças no modelo
12
Estas Caixas foram organizadas pelo setor privado e destinadas aos ferroviários e posteriormente
estendida a outras categorias profissionais, com financiamento tripartite: financiamento com
participação dos três segmentos envolvidos: empregadores, trabalhadores e Estado (COHN, 1996).
29
agro-exportador cafeeiro. No cenário político, houve alteração na correlação das
forças políticas que desencadeou a Revolução de 1930, iniciando um novo ciclo
econômico e um novo papel do Estado. O cenário de crise do setor agro-exportador
e a frágil articulação de outras forças políticas e econômicas criaram as condições
para o Estado brasileiro ter a centralidade na condução do processo produtivo e
político (FEE, 1983; FLEURY, 1994).
Este contexto demarca a instalação de outro estágio político brasileiro com o
presidente Getúlio Vargas, formado por três momentos particulares: Governo
Provisório (1930-1934), Constitucionalista (1934-1937) e Estado Novo (1937-1945).
No âmbito econômico, será o período de passagem para a economia urbano-
industrial e conseqüente declínio do poder oligárquico, hegemônico na República
Velha. O Estado se orienta pela modernização do estilo de vida da população, e
adota a política de atender as massas populares como fonte de legitimação e de
poder, bem como o estilo intervencionista na economia e nas políticas sociais
(SAES, 1999; LOPEZ, 2000; PEREIRA, 2002).
O presidente Getúlio Vargas criou novas estruturas e ordenamentos jurídicos
e realizou um conjunto de reformas com o propósito de “formação de um Estado
robusto e centralizador [...] pela constituição de um aparato governamental que
alcançasse todo o território nacional em projeto político-administrativo mais
unificado” (HOCHMAN, 2005, p. 130), criando, por exemplo, organizações na
estrutura do Estado, que são significativas até os dias atuais, como estão
sistematizados no Quadro 2.
30
ANO
ACONTECIMENTOS
1930
Criação do Ministério da Educação e Saúde Pública
1933
Criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões - IAP`s, que institui a
política de assistência médica previdenciária, destinada a grupos de
trabalhadores urbanos mais organizados.
1934
Lei nº. 24.559, que dispõe sobre a Assistência e Proteção à Pessoa e aos Bens
dos Psicopatas.
Reforma do Ministério, que passa a se denominar Ministério da Educação e
Saúde. Interiorização do Ministério com a criação de 08 regiões, cada uma com
Delegacia Federal de Saúde. Divisão de Amparo à Maternidade e à Infância.
1937
Lei criando as Conferências Nacionais de Saúde e as Conferências Nacionais de
Educação
1938
Criação do Conselho Nacional de Serviço Social, vinculado ao Ministério da
Educação e Saúde.
Criação dos serviços nacionais de saúde: Doenças Mentais, Organização
Sanitária, Organização Hospitalar, Lepra, Tuberculose, Febre Amarela, Peste,
Fiscalização da Medicina, Propaganda e Educação Sanitária, do Câncer e da
Criança.
1941
1ª Conferência Nacional de Saúde, de 10 a 15 de novembro.
O Ministério da Educação e Saúde é autorizado a organizar, por intermédio do
Decreto nº. 4275, o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP). O novo órgão é
criado em decorrência da Terceira Conferência Extraordinária dos Ministros das
Relações dos Continentes Americanos, realizada no mesmo ano, no Brasil.
Brasil e EUA assinam, em Washington, o Acordo Básico, com o apoio da
Fundação Rockefeller que define responsabilidades em relação às garantias
sanitárias, a fim de desenvolver na área de extração de borracha na Amazônia
as atividades de saneamento, profilaxia da malária e assistência médico-
sanitária aos trabalhadores daquele setor da economia.
1942
Lei obrigando a notificação de doenças profissionais provocadas por substâncias
tóxicas, utilizadas nas indústrias e por condições ambientais inadequadas à
saúde.
Quadro 2 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no Brasil -
Governo Provisório, Constitucionalista e Estado Novo (1930-1945).
Fontes: OMS, 1955; FEE, 1983; FARIA, 1981; CERQUEIRA, 1984; COSTA, 1986; COSTA, 1989;
DELGADO, 1994; GUIMARÃES e TAVARES, 1994; PEREIRA, 2002; HOCHMAN, 2005; FIOCRUZ,
2005; RAMOS, GEREMIAS, 2006.
Destaca-se a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública (1930),
responsável por dois setores sociais com o respaldo científico da época, que
considerava o saneamento indispensável, e para tanto, a educação seria a
ferramenta mais apropriada para propagar o pensamento higienista, como expressa
31
um dos seus intelectuais, Afrânio Peixoto: “Saneamento, sim! Educação, também!
Principalmente educação, porque então será mais fácil, e então durável, o
saneamento” (STANCIK, 2004, p. 55).
Esta perspectiva reflete a estratégia campanhista
13
vigente na época, com o
mecanismo da prevenção sendo privilegiado para combater doenças, e para tanto, é
imprescindível a educação. Concomitante, o governo fortaleceu a política de saúde
ancorada na assistência médica previdenciária, destinada a grupos de trabalhadores
urbanos mais organizados, através da criação dos Institutos de Aposentadorias e
Pensões – IAPs
14
em 1933 através da unificação das CAPs.
Deste modo, o governo adotou um padrão de intervenção planejada na
regulamentação de medidas de proteção social
15
, inspirada “na idéia do pensamento
liberal brasileiro, onde a intervenção estatal buscava a harmonia entre
empregadores e empregados” (COUTO, 2004, p. 95) criando assim as condições
favoráveis para a acumulação e expansão da industrialização
16
. Deste modo, a
criação dos IAPs representaram uma mudança importante no trato da questão social
por parte do Estado, que passa a se responsabilizar pelas estruturas de proteção
social, absorvendo o que havia sido gerado na sociedade civil, como foi o caso das
CAPs (COHN,1996).
Ao mesmo tempo, a criação dos IAPs, mantêm a prestação da assistência
médica dependente da contribuição dos trabalhadores, confirmando a concepção
predominante de que a saúde individual não era da competência da área de saúde
pública, como expressa Gustavo Capanema, considerado um dos mais
proeminentes intelectuais, sanitarista e ministro da saúde e educação por um longo
período:
13
Expressão ntese do modelo de saúde pública, centrado em campanhas de prevenção e de
controle de agentes produtores de doenças.
14
Entre 1933 e 1945 foram criados sete IAPs (Marítimos, Industriários, Transportadores de Carga,
Bancários, Comerciários, Estiva e Servidores do Estado). Fonte:
http://www.mre.gov.br/cdbrasil/itamaraty/web/port/polsoc/previd/iaps/index.htm
15
O sistema de proteção social no período pode ser caracterizado como do “tipo conservador ou
meritocrático-particularista, com fortes marcas corporativas e clientelistas na consagração de
privilégios e na concessão de benefícios” (DRAIBE, 1993b, p. 13).
16
As medidas são, entre outras, a definição de um percentual de 1% das rendas tributáveis à
maternidade e infância para o amparo dos desvalidos e o salário mínimo, criados através da
Constituição Federal de 1934. O salário mínimo foi regulamentado por Decreto em 1938 e somente
em 1940 inicia sua aplicação, com a publicação da sua primeira tabela.
32
À saúde pública não interessa o caso individual, seja um caso de
doença, seja qualquer outra situação especial relativa à saúde ou ao corpo.
O caso individual só interessa à saúde blica se puder afetar a
coletividade, se for capaz de pôr a coletividade em perigo. Fora disso, dele
não se ocupará a saúde pública (HOCHMAN, 2005, p. 136).
Como responsabilidade da saúde pública está subentendida a
responsabilidade do Estado, visto que se ocupa de conter os riscos à coletividade.
Nesta lógica, de que a ação estatal na saúde se justifica quando em situação de
risco à sociedade, está o fundamento da aprovação do Decreto nº. 24.559 em 1934,
dispondo sobre a assistência e proteção à pessoa e aos bens dos psicopatas. O
artigo primeiro define que a Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental terá por fim:
a) proporcionar aos psicopatas tratamento e proteção legal; b) dar amparo
médico e social não aos predispostos a doenças mentais, como também
aos egressos dos estabelecimentos psiquiátricos; c) concorrer para a
realização da higiene em geral e da profilaxia das psicopatias em especial
(DELGADO, 1992, p. 259).
Percebe-se a sintonia com as concepções prevencionista e higienista da
saúde pública da época, que resultou na formulação teórica do escopo da higiene
mental
17
. O artigo número quatro do Decreto define os estabelecimentos
psiquiátricos, e entre as organizações típicas deste atendimento consta “[...] outros
estabelecimentos de assistência social” (DELGADO, 1992, p. 261). Esta associação
entre assistência social e saúde mental evidencia o fenômeno do transtorno mental
num país com altos índices de desigualdade social, bem como, no período histórico
referido, o conjunto de organizações privadas filantrópicas a quem a sociedade
delegou a tarefa de isolar a pobreza.
Meses antes da instalação do Estado Novo, em 1937, o governo realiza a
segunda reforma ministerial na saúde que alterou sua denominação para de
Educação e da Saúde e cria as Conferências Nacionais de Saúde
18
, com o propósito
de reunir representantes de órgãos públicos, das esferas federal e estadual, e
17
A Liga Brasileira de Higiene Mental, fundada em 1923 no Rio de Janeiro, foi uma entidade civil que
funcionava com a ajuda de filantropos e com subvenção federal, sendo seus membros reconhecidos
como pertencentes à elite psiquiátrica do estado e do país. Suas ações e diretrizes visavam a
prevenção, a eugenia e a educação dos indivíduos em prol das condições satisfatórias de saúde
mental (COSTA, 1989).
18
A síntese de todas as Conferências Nacionais de Saúde está contida no Apêndice A.
33
facilitar o intercâmbio das atividades correlatas e “deliberação das questões
administrativas relativas à saúde pública” (HOCHMAN, 2005, p. 133).
A princípio, as Conferências Nacionais de Saúde foram criadas para substituir
os Congressos Brasileiros de Higiene
19
, contudo, por um longo período estas
instâncias coexistiram com finalidades distintas. Os Congressos Brasileiros de
Higiene, como espaços privilegiados para pensar as ações coletivas de saneamento
e combate às doenças epidêmicas, e as Conferências Nacionais de Saúde, como
instância de articulação técnica-governamental, uma vez que no seu formato foi
previsto a participação exclusiva do segmento governamental.
A realização da Conferência Nacional de Saúde aconteceu somente quatro
anos após, em 1941, com o objetivo de estabelecer as normas de organização e
administração sanitária. A conferência não debateu sobre os problemas existentes
na assistência à saúde no país, mas na organização estatal do setor, demandando a
criação de um ministério exclusivo (NORONHA, 2003). No mesmo ano, o Ministério
da Educação e Saúde organizou a criação de órgãos federais para combater os
principais problemas de saúde no Brasil, dentre eles o Serviço Nacional de Doenças
Mentais que, sob a administração de Adauto Botelho até o ano de 1954, se
caracterizou pela expansão dos hospitais psiquiátricos públicos (PAULIN; TURATO,
2004).
O ano de 1941 tem significativa importância no cenário da segunda guerra
mundial pelo ingresso dos Estados Unidos da América (EUA) no conflito e o término
da neutralidade dos países norte-americanos e latinos. Durante a realização da
Terceira Conferência Extraordinária dos Ministros das Relações dos Continentes
Americanos, realizada no Rio de Janeiro em 1942, os EUA pressionam os países a
romperem relações diplomáticas e comerciais com a Alemanha e aliados, tendo
havido receptividade pelo presidente Getúlio Vargas. A posição do governo foi de
aderir à guerra por motivos estratégicos, pois tinha forte oposição do Partido Ação
Integralista Brasileiro apoiado pelo nazismo, e pelo interesse de se converter numa
potência latino-americana no pós-guerra (DABÈNE, 2003).
19
Com cinco edições de 1924 até o ano de 1930 e retomados a partir de 1947 (HOCHMAN, 2005).
34
A posição adotada pelo Brasil de forte aliado dos EUA resultou na obtenção
de “[...] condições financeiras excepcionais, que posteriormente lhe permitiram
desenvolver uma indústria siderúrgica” (DABÈNE, 2003, p. 115). A partir desta
relação, acordos foram feitos entre ambos os países que culminaram na criação do
Serviço Especial de Saúde blica (SESP), que permaneceu ativo até a década de
1990 e em ações de erradicação de doenças endêmicas na Amazônia,
intermediadas pela Fundação Rockefeller.
O desfecho da segunda guerra mundial gerou a bipolaridade geopolítica
internacional, o que resultou na projeção de dois blocos com referências políticas e
econômicas antagônicas. No Brasil, inicia-se um outro período econômico, político e
social, classificado como desenvolvimentista (1946-1964)
20
, que corresponde a um
“projeto de superação do subdesenvolvimento através da industrialização integral,
por meio de planejamento e decidido apoio estatal” (BIELSCHOWSKI, 2004, p. 33).
Neste período, o governo considerou o setor saúde como estratégico para o
desenvolvimento econômico, tendo sido um dos quatro pilares do Plano SALTE
21
(saúde, alimentos, transporte e energia). A saúde foi o único setor social relacionado
aos problemas do desenvolvimento, pelo entendimento de que era “precondição ao
aumento da produção e da riqueza social” (FEE, 1983, p. 166). Esta afirmação
confirma a concepção de saúde presente na gênese de sua constituição de política
pública no Brasil, como fundamental na reprodução das condições de vida das
classes trabalhadoras e um setor considerado rentável pelos agentes econômicos.
Este período desenvolvimentista, relativo ao seu tempo de amadurecimento e
crise, compreendido no período de 1945 a 1964, foi marcante para o setor saúde,
visto os investimentos do governo na sua estruturação, como se verifica nos
acontecimentos mais relevantes sistematizados no Quadro 3.
20
BIELSCHOWSKI (2004, p. 33) sistematiza uma cronologia do desenvolvimentismo no Brasil, em
que o período de 1930 a 1944 corresponderia à sua origem, com o amadurecimento no período de
1945 a 1955, e seu apogeu e crise entre 1955 e 1964.
21
Plano Salte é considerado como o primeiro plano de desenvolvimento de cunho mais globalizante
no país (FEE, 1983, p. 165).
35
ANO
ACONTECIMENTOS
1946
Decreto Lei nº. 8.550 autorizou o Serviço Nacional de Doenças Mentais a realizar
convênios com governos estaduais para a construção de hospitais psiquiátricos.
1948
ONU – Declaração Universal dos Direitos Humanos
Plano SALTE Saúde, Alimentos, Transportes e Energia. Criado pela Lei Federal
nº. 196, de 1948, mas aprovado através da Lei nº. 1.102 que dispõe sobre sua
execução.
1950
2ª Conferência Nacional de Saúde, de 21 de novembro a 02 de dezembro.
1953
Criação do Ministério da Saúde
Criação do Laboratório Central de Controle de Drogas e Medicamentos, pelo
incremento da indústria farmacêutica: antibióticos e psicofármacos.
1954
OMS Legislação em Matéria de Assistência Psiquiátrica Comissão de
Especialistas em Saúde Mental.
1955
Realizado pela OPAS o Seminário de Viña del Mar (Chile), que teve como objetivo
avaliar o ensino da medicina preventiva e social e incentivou o movimento
preventivista no Brasil e a difusão das ciências sociais como base da análise do
fenômeno saúde/doença.
1960
Lei Orgânica da Previdência Social – Lops
Reunião Especial do Conselho Interamericano Econômico e Social da OEA - CIES
promovendo a reunião de Ministros do Interior dos Países da América Latina, no
Uruguai, onde foi elaborada a Carta de Punta Del Este.
1961
Decreto nº. 49.974 institui o Código Nacional de Saúde.
1962
Criado em cooperação com o PNUD e o ILPES/ Cepal, em Santiago do Chile, o
Centro Pan-Americano de Planejamento de Saúde.
Decreto nº. 52.464 fixa as Normas Técnicas Especiais para a Orientação,
Organização, Funcionamento e Fiscalização das Instituições de Assistência Médico-
Social, sob a responsabilidade do Ministério da Saúde.
1963
3ª Conferência Nacional de Saúde, de 09 a 15 de novembro.
Quadro 3 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no Brasil –
Período do Desenvolvimentismo (1945 – 1964).
Fontes: OMS, 1955; FARIA, 1981; FEE, 1983; CERQUEIRA, 1984; COSTA, 1986; COSTA, 1989;
DELGADO, 1994; GUIMARÃES e TAVARES, 1994; PAULIN e TURATO, 2004; HOCHMAN, 2005;
FIOCRUZ, 2005; RAMOS, GEREMIAS, 2006.
36
Neste contexto, é realizada a Conferência Nacional de Saúde (1950), com
o tema central sobre higiene e segurança do trabalho, prestação de assistência
médica sanitária e preventiva para trabalhadores e gestantes (NORONHA, 2003).
A
adoção destas iniciativas foi para promover as condições de saúde relativas ao
mundo do trabalho, fundamentais para o ciclo de desenvolvimento em curso. O
debate, iniciado em 1941, sobre a criação do Ministério da Saúde
22
se intensificou, e
as condições históricas para sua concretização ocorreram somente em 1953, como
uma estratégia de sustentação política do Presidente Vargas que, com o intuito de
fazer uma reforma ministerial para contemplar aliados políticos, cedeu à pressão dos
parlamentares, que por sua vez aproveitaram este projeto (no Congresso Nacional
desde 1950) para imprimir suas posições. A aprovação do projeto de lei de criação
do Ministério da Saúde tem particular significado por ter sido a primeira vez que uma
decisão sobre o campo da saúde extrapolou o circuito médico-sanitário e se
estendeu a um amplo debate entre as forças político-partidárias, pois desde então a
escolha do ministro da pasta passou para o campo político, e não mais do setor
saúde (HAMILTON; FONSECA, 2003).
Como assinalado, neste período após a segunda guerra mundial os
Estados Unidos da América passaram a exercer um poder hegemônico sobre o
mundo capitalista (HOBSBAWM, 1995), o que permitiu a difusão e expansão do seu
modelo de assistência sanitária. Este, a partir da década de 1950, consistiu na
ênfase do modelo assistencial hospitalocêntrico
23
de alta tecnologia e da prática
especializada (ALMEIDA, 1997).
Esta orientação influenciou a saúde mental no Brasil, com o governo
promulgando o Decreto de 1946, que estimula a construção de hospitais
psiquiátricos pelos governos estaduais, na ótica de consolidar “[...] a política macro-
hospitalar pública como o principal instrumento de intervenção sobre a doença
mental” (PAULIN; TURATO, 2004, p. 243). Esta política se concretizou com o
aumento de hospitais e consequentemente, da população institucionalizada: “em
1950 existiam 0,41 internados por 1.000 habitantes; 0,82 em 1970. Enquanto a
população geral aumentou 82% em 20 anos, a população do hospital psiquiátrico
22
O Ministério da Saúde foi criado em 25/07/1953, pela lei nº. 1.920, quando se separou do Ministério
da Educação e Saúde, este criado em 14/11/1930.
23
Hospitalocêntrico refere-se à política de considerar o hospital como o centro da atenção à saúde.
37
aumentou 213%, apesar do advento dos psicotrópicos” (CERQUEIRA, 1984, p. 87-
88). Este quadro de valorização da hospitalização psiquiátrica como eixo da política
pública de saúde mental será uma tônica no Brasil por algumas décadas.
Outra contribuição na constituição da política pública de saúde mental na
época foi o aceleramento da industrialização, com o estímulo do governo na
produção dos medicamentos específicos, os psicotrópicos, através da criação do
Laboratório Central de Controle de Drogas e Medicamentos, em 1954. O advento
destes medicamentos colaborou na eficácia terapêutica dos transtornos mentais,
mas não o suficiente para produzir um cuidado extra-hospitalar na medida em que o
modelo hospitalocêntrico tem vários determinantes econômicos e sociais.
Um deles é a urbanização, fenômeno na América Latina conseqüente da
“acelerada mudança da base produtiva de agrário-exportadora para urbano-
industrial, feita na maioria dos países, sem a concomitância de uma política agrícola
que orientasse novas bases e condições para a vida no perímetro rural” (REIS,
2001, p. 173). Aos grupos populacionais que não conseguiram ingressar neste novo
padrão de produção, um dos lugares destinados foram os hospitais psiquiátricos. Em
1950, existiam 24.234 leitos psiquiátricos e passou para 34.550 leitos em 1955
(ALVES, 1992; BRENER, 1996; COSTA, 2002).
Esta realidade produz vários movimentos distintos no campo da saúde, mas
não contraditórios. Por um lado a Organização Mundial da Saúde (OMS, 1955)
analisa as legislações em saúde mental em diversos países, em reunião de
especialistas em 1954, constatando a ênfase nos aspectos jurídicos
24
em detrimento
dos cuidados em saúde. Entre outras diretrizes, estabelece a necessidade de serem
criadas normas para orientação técnica do atendimento hospitalar psiquiátrico,
referendando o modelo centrado nesta instituição (OMS, 1955).
Ao mesmo tempo, no ano seguinte, a Organização Pan-Americana da Saúde
(OPAS) realizou o Seminário de Viña Del Mar (Chile) com o objetivo de avaliar o
ensino da medicina preventiva e social e incentivar o movimento preventista no
Brasil com a difusão das ciências sociais como base da análise do fenômeno
24
Constatação de que várias leis nacionais exigem o aval da justiça no reconhecimento da
necessidade de internação psiquiátrica (OMS, 1955), o que é o caso da lei brasileira de 1934 (ver
Quadro 2).
38
saúde/doença (FIOCRUZ, 2005). Estas concepções vão construir o modo de
atenção à saúde de base comunitária, a ser desenvolvido principalmente nos
centros urbanos, que será ratificada nos anos seguintes pela Conferência de Alma-
Ata
25
, em 1978, na lógica de redução de custos no atendimento básico de saúde,
visando reduzir a necessidade de hospitais de custo mais elevado. Este fator
econômico motiva os Estados Unidos da América a adotar em 1961
26
uma política
de saúde mental de desospitalização, visando reduzir os custos excessivos com
hospitais psiquiátricos (BANDEIRA, 1991, p. 356-357).
As primeiras críticas aos hospitais psiquiátricos surgem também no período
pós-segunda guerra mundial, a partir da experiência de médicos e enfermeiros que
foram prisioneiros dos campos de concentração nazistas. Inicia-se, assim, um
questionamento crítico de participação destes profissionais em instituições
psiquiátricas, que se baseiam em discriminações tão desumanas como as que eles
haviam padecido (TUNÕN; ABUDARA, 1988). Este questionamento resultou em
vários debates e novas formulações nos países centrais, como o surgimento da
Psiquiatria e Psicoterapia Institucional na França; na Inglaterra, o desenvolvimento
das Comunidades Terapêuticas e o movimento da antipsiquiatria, que vai defender o
louco diante da sociedade, e não mais optar pela sociedade em detrimento do louco.
No Brasil, segue-se a política de centralizar na internação hospitalar a
atenção em saúde mental, dinamizada a partir da reorganização da previdência
social pela promulgação da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) em 1960
(AMARANTE, 1994). Pois, “como efeito do ritmo acelerado da industrialização
durante a década de 1950, todo o sistema previdenciário cresce em volume de
recursos, em aparato institucional e em clientela a ser atendida” (COHN, 1996, p. 18)
os benefícios de aposentadorias e pensões prestados pelos IAPs são uniformizados
25
Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, na cidade de Alma-Ata, URSS, 6-12
de Setembro de 1978.
26
A partir do final da década de 1950, os Estados Unidos da América passa a planejar ações para a
assistência em saúde mental aos grupos sociais desprotegidos de cobertura de assistência à saúde.
Por inspiração da psiquiatria social, que surge na Europa, várias legislações são aprovadas visando a
criação de centros de saúde mental distritais com financiamento federal. O programa ões para a
Saúde Mental (Action for Mental Health) e a lei de construção de Centros de Saúde Mental
Comunitários (1963) no governo Kennedy, programou a existência de 2.300 serviços em todo o país,
mas, em meados de 1974, existiam somente 392, devido ao abandono desta política (WING, 1979, p.
247).
39
e a responsabilidade pela assistência médica passa a ser da Previdência Social,
gerando uma rápida expansão da medicina previdenciária.
Cristaliza-se, assim, o vínculo fundamental da Previdência Social
com o processo de acumulação: a partir dos anos 60 ela perde
gradualmente importância como fonte de recursos para investimentos em
setores básicos da economia para servir mais ao controle da capacidade
produtiva da força de trabalho empregada, tomando vulto no seu interior a
assistência médica, demanda à época não prioritária das classes
assalariadas (COHN, 1996, p. 19).
Deste modo, a assistência médica previdenciária passa a ser uma resposta
do Estado à classe assalariada, que sofria na sua capacidade de consumo devido às
perdas nos valores do salário mínimo
27
na época. O entendimento é de que a perda
salarial se compensa pela assistência médica, pois “as seqüelas poderão ser
tratadas medicamente, as epidemias combatidas, a tuberculose e o desequilíbrio
emocional tratados” (IAMAMOTO; CARVALHO, 1988, p. 248).
O setor saúde segue permeado pela disputa por legitimidade entre os dois
blocos existentes: a saúde pública, com seu modelo campanhista e a atenção
médica previdenciária, de cunho curativista e privado. Em decorrência desta
situação e no cenário econômico e político da época de João Goulart, amplo debate
nacional ocorre sobre o papel do Estado na implantação de um efetivo sistema de
saúde, com sua grande expressão na 3ª Conferência Nacional de Saúde
28
(1963),
quando o Ministério da Saúde propôs a criação de um Plano Nacional de Saúde e a
Municipalização dos serviços de saúde no Brasil.
A III Conferência Nacional de Saúde conseguiu definir uma filosofia
no que diz respeito à saúde, sobretudo: 1º) mostrando as íntimas relações
entre saúde e economia; 2º) definindo as necessidades da existência de
uma estrutura permanente de saúde; 3º) que esta estrutura permanente
deveria ter um nível de responsabilidade municipal com a assistência
técnica da área estadual e da área federal [...] (LUZ, 1986, p.101).
Este foi o primeiro debate sobre a necessidade de integração das ações
coletivas e individuais de saúde, sob a perspectiva desenvolvimentista, bem como a
27
Oliveira (2003, p. 78) delineia três fases de comportamento do salário mínimo real: a primeira,
1944-1951, reduz pela metade o poder aquisitivo do salário; a segunda, 1952-1957, recuperações e
declínios dependentes do poder político dos trabalhadores; e por fim, o ano de 1958 marca a
deteriorização do salário mínimo real, que se agrava pós-ano 1964.
28
Mário Magalhães era presidente da Sociedade Brasileira de Higiene e foi Secretário-Geral da
Conferência Nacional de Saúde.
40
primeira vez que foi discutida a organização dos serviços médicos privados
(MERHY; QUEIROZ, 1993). O temário desta Conferência, a primeira após a criação
do Ministério da Saúde, revelou a adoção da nova concepção de planejamento em
saúde, por isto é situada como num contexto de transição (MOYSÉS, 2005).
A adoção do planejamento como uma ferramenta estratégica no setor de
saúde foi constituída a partir da Carta de Punta del Este
29
(Uruguay),
produto final de
uma reunião entre os Estados Unidos da América e os países da América Latina, em
agosto de 1961, quando foi lançado o programa Aliança para o Progresso. Este
encontro teve o propósito de estabelecer uma ão “política de manutenção da
imunidade e afastamento da América Latina dos ideais comunistas, implicando
assim o alinhamento dos vizinhos do sul às propostas e aos interesses norte-
americanos” (PAIVA, 2004, p. 01). O cenário político mundial era o da guerra fria e o
evento foi desencadeado pela Revolução Cubana em 1959, e o conseqüente
alinhamento político e econômico de Cuba com a então União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas.
A partir da Carta de Punta del Este firmou-se entre os países o compromisso
de criar nos ministérios unidades de planejamento integradas aos organismos de
planejamento de desenvolvimento econômico e social. A saúde foi reconhecida
como um componente essencial do desenvolvimento e foi enfatizada a necessidade
do planejamento, sob a condução do Estado, para a consecução dos objetivos
nacionais de bem-estar, democracia e segurança, a partir de um plano de ações
para a Região da América Latina.
O circuito médico-sanitário corroborou e incorporou esta posição, como foi
expresso no XV Congresso Brasileiro de Higiene em 1962: “fazer da saúde pública
um instrumento efetivo no auxílio ao desenvolvimento econômico [...]” (LUZ, 1986, p.
98). Na prática, esta concepção gerou um crescimento das redes de saúde públicas
estaduais e municipais, e no atendimento de Pronto-Socorro, para atender a
população excluída do sistema previdenciário.
29
Documento aprovado na Reunião Extraordinária do Conselho Interamericano Econômico e Social –
Organização dos Estados Americanos (OEA).
41
Contudo, a discussão sobre as necessárias alterações na política de saúde é
interrompida pela instauração da ditadura militar, em 1964, e pelos seus vinte e um
anos de duração. A ditadura militar desmantelou os poderes estaduais e municipais
e intensificou a centralização das ações de saúde, ao mesmo tempo em que
organizou quatro Conferências Nacionais de Saúde
30
. A ausência de debate e de
fortalecimento das vontades políticas nos níveis regionais e locais, aliados à
implantação de reformas institucionais, afetou a saúde pública e a medicina
previdenciária existente, como conseqüência do impacto da ditadura na vida social e
individual dos brasileiros,
[...] realizando uma síntese nova e perversa, reorganizou os traços
institucionais do sanitarismo campanhista e os do modelo curativo da
atenção médica previdenciária [...] numa estratégia de medicalização social
sem precedentes na história do país (LUZ, 1991, p. 81).
Este sistema é o de cuidados médicos individuais como padrão de saúde, que
orienta um crescimento avassalador da produção quantitativa de atos médicos, com
conseqüente construção financiada pelo setor público, de grande número de
hospitais, laboratórios e serviços privados e a multiplicação de egressos das
faculdades de medicina e de odontologia (GUIMARÃES; TAVARES, 1994).
A criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), em 1966,
unificou os institutos existentes e passou ao comando do poder executivo federal,
com eliminação da participação direta dos trabalhadores na sua administração, ato
que revelou as características de centralização e autoritarismo do regime militar. O
serviço médico torna-se um tipo de estratégia de maior relevo na relação
estabelecida entre Estado e sociedade, traduzida como bem de consumo da
sociedade (LUZ, 1991; COHN, 1996). A Conferência Nacional realizou-se em
1967, num ambiente de recrudescimento do autoritarismo e repressão às
manifestações contrárias ao regime, com debate limitado aos recursos humanos do
setor.
Estes acontecimentos e os demais relevantes deste período do regime militar
(1964-1985) estão sistematizados no Quadro 4.
30
Ver Apêndice A.
42
ANO
ACONTECIMENTOS
1966
Instituto Nacional de Previdência Social – INPS, substituindo os antigos Institutos
de Aposentadoria e Pensões por categorias de trabalhadores.
Campanha Nacional de Saúde Mental – Ministério da Saúde, Decreto nº. 60.252.
1967
4ª Conferência Nacional de Saúde, de 30 de agosto a 04 de setembro.
1972
OPAS e Ministério da Saúde assinam “Acordo para a execução de um Programa
de Saúde Mental no Brasil”.
A OPAS e a Fundação Kellog apóiam técnica e financeiramente a criação do
primeiro curso de medicina social no Rio de Janeiro, o Instituto de Medicina Social
(IMS) da UERJ.
1973
Inamps – Manual de Serviço, valorizando a psiquiatria de comunidade para a
assistência extra-hospitalar. Resolução nº. 304.
Presidente Ernesto Geisel envia ao Congresso o II Plano Nacional de
Desenvolvimento – II PND.
Criação do Ministério da Previdência e Assistência Social
Ministério da Saúde estabelece o sistema hierarquizado e regionalizado de saúde
mental. Portaria nº. 32.
1974
OMS – Comitê de especialistas, em outubro – Genebra.
Lei 6.229 cria o Sistema Nacional de Saúde, estabelecendo os campos
institucionais da saúde coletiva e da saúde individual.
1975
5ª Conferência Nacional de Saúde, de 05 a 08 de agosto.
Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento – PIASS.
1976
Criação do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde – CEBES, por ocasião da 28ª
reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da
qual participaram profissionais ligados aos departamentos de medicina preventiva e
social do RJ e SP. Em novembro, o CEBES lançou a Revista Saúde em Debate
com o objetivo de ampliar e levar adiante as discussões e as análises do setor
saúde.
1977
Adotada pela Assembléia Mundial de Saúde da Organização Mundial da Saúde –
OMS, a meta de saúde para todos no ano 2000, na IV Reunião Especial de
Ministros da Saúde das Américas.
Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social – Simpas.
1977
6ª Conferência Nacional de Saúde, de 01 a 05 de agosto.
continua
43
continuação
Conferência Internacional de Alma Ata, promovida pela OMS e a UNICEF. Atenção
Primária de Saúde (APS) é definida então como a estratégia principal para a
expansão das coberturas dos serviços de saúde a toda a população e a
participação comunitária é incorporada como um dos princípios fundamentais.
Criação do Instituto Nacional da Assistência Médica da Previdência Social –
Inamps.
1978
Criação do Plano Integrado de Saúde Mental - Pisam.
1º Congresso Nacional de Trabalhadores em Saúde Mental, em São Paulo.
Criada a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva – Abrasco,
durante a I Reunião sobre Formação e Utilização de Pessoal de Nível Superior na
Área de Saúde Coletiva, promovida por: Ministério da Saúde, da Previdência e
Assistência Social e Organização Pan-Americana de Saúde.
3º Congresso Mineiro de Psiquiatria, com a presença de Franco Basaglia e Robert
Castel.
1º Simpósio Nacional de Política de Saúde, realizado pela Comissão de Saúde da
Câmara dos Deputados, sendo um marco expressivo do Movimento Sanitário.
1979
O Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes) apresentou e discutiu a primeira
proposta de reorientação do sistema de saúde.
Quadro 4 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no Brasil –
Período do Regime Militar (1964 – 1985)
Fontes: FARIA, 1981; FEE, 1983; COSTA, 1986; COSTA, 1989; DELGADO, 1994; GUIMARÃES;
TAVARES, 1994; AMARANTE, 1995a; HOCHMAN, 2005; FIOCRUZ, 2005; RAMOS, GEREMIAS,
2006.
No campo de saúde mental, destaca-se o Decreto nº. 60.252, que instituiu a
Campanha Nacional de Saúde Mental no âmbito das ações do Ministério da Saúde.
As suas finalidades e objetivos estão fundamentados nas concepções campanhistas
e da higiene mental, visando resolver o déficit de hospitais psiquiátricos. Contudo,
contempla duas inovações: uma, explícita, relativa a um esforço que deve ser feito
para a ampliação e distribuição de ambulatórios de saúde mental no país, com o fim
de “diminuir a necessidade de internação e assegurar a assistência terapêutica sem
afastar pacientes de seu ambiente social e familiar” (BRASIL, 1968, p. 45). A outra
inovação, esta implícita no documento, é relativa à adoção do planejamento como
ferramenta para o desenvolvimento das ações propostas, de abrangência nacional e
com atribuições a cada esfera de governo.
44
Durante o governo Geisel (1974 a 1979), a coalizão política do regime militar
passa por uma crise de legitimidade e perda de sustentação, bem como uma crise
econômica, gerada pela desestabilização no mercado internacional do petróleo em
1973
31
, que colaborou para o fim do período de milagre econômico brasileiro, com o
aumento da dívida externa para custear o aumento das importações. O governo
tomou a decisão de elevar as taxas de crescimento com a implantação do II Plano
Nacional de Desenvolvimento – II PND
32
.
O II PND anunciou o compromisso de aumentar o padrão de vida da
população, a partir da elevação dos salários, como estratégia para obtenção de
apoio à abertura política, e a não adoção de medidas para o setor produtivo
absorver seus custos crescentes, o que resultou na elevação da taxa de inflação
“que pode ser parcialmente explicada como um resultado da competição de setores
e grupos sociais por aumentos em sua fatia de renda nacional” (BAER, 1988, p.
410). Na área da saúde, o Plano define claramente dois grandes campos
institucionais: o do Ministério da Assistência e Previdência Social, criado em 1974,
com atuação voltada principalmente para o atendimento médico-assistencial
individualizado, visando organizar e ampliar os benefícios sociais com a
incorporação de segmentos populacionais à previdência social
33
. Possibilitou o
crescimento quantitativo da oferta de serviços e da instalação de unidades
assistenciais de saúde com o financiamento do fundo previdenciário, arrecadado das
empresas e dos salários.
O outro campo institucional foi o Ministério da Saúde, de caráter
eminentemente normativo, com ação executiva preferencialmente voltada para as
medidas e os atendimentos de interesse coletivo e para a saúde mental, a criação
de um sistema hierarquizado e regionalizado. Esta orientação esteve em sintonia
com a recomendação dos especialistas da OMS que, em reunião em Genebra,
emitem parecer sobre saúde mental nos países em desenvolvimento e
31
Outubro de 1973 - Países árabes tentam pelo confronto bélico com Israel recuperar seus territórios
ocupados, e usam o petróleo como arma, com o embargo da OPEP às vendas para as potências
ocidentais.
32
II PND para o período de 1975 a 1979 previu investimentos de larga escala e grande taxa de
crescimento para os setores como da indústria de base, infra-estrutura econômica e social,
mineração (BAER, 1988, p. 409).
33
Benefícios criados: Renda Mensal Vitalícia; salário-família; salário-maternidade; auxílio-natalidade
e diferenciação do plano previdenciário urbano e rural (DRAIBE, 1993b).
45
recomendam: descentralização no atendimento, criação de formas de prevenir, tratar
e reabilitar e condenam a construção de hospitais psiquiátricos para a reclusão de
doentes mentais (FARIA, 1981).
Na gestão Geisel, realizaram-se duas Conferências Nacionais, diferentemente
do período anterior da junta Militar e governo Médici, quando foi instalado e mantido
o Ato Institucional 5
34
, e não realizaram nenhuma. A Conferência teve como
tema central o Sistema Nacional de Saúde, e a 6ª, o controle das grandes endemias
e interiorização dos serviços de saúde, propondo o Programa de Interiorização das
Ações de Saúde e Saneamento (Piass) e Programa Nacional de Serviços Básicos
de Saúde - Prev-Saúde, que teve como finalidade “imprimir uma maior racionalidade
ao sistema de saúde” (MERHY; QUEIROZ, 1993, p. 6). Notadamente, estas
propostas estão sob a influência do II PND, uma vez que os participantes eram
delegações de técnicos representando órgãos federais, os estados e nomes
expressivos da medicina, correspondendo ao período de planejamento estatal das
Conferências Nacionais de Saúde (MOYSÉS, 2005).
Neste contexto, se configura um novo quadro institucional na política de
proteção social, em que se destacam outras iniciativas relevantes
35
: a criação do
Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (Sinpas)
36
e do Instituto
Nacional da Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), responsável pela
assistência médica. A presença institucional do Inamps em todos os estados como
representante do poder central dificultou ainda mais a capacidade do poder local de
formular e deliberar sobre políticas de saúde, que associada ao “[...] asfixiamento da
capacidade financeira autônoma dos estados e dos municípios estabelecido pela
Emenda Constitucional de 1969 [...] (NORONHA; LEVCOVITZ, 1994, p. 78)
dificultou a condução descentralizada de políticas sociais nas esferas estaduais de
governo. Do mesmo modo, estas iniciativas incrementaram a privatização no setor
da saúde, tendência histórica na realidade sanitária brasileira.
34
Decretado pelo Presidente Costa e Silva em 1968, que deu ao regime poderes absolutos e as
liberdades individuais ficaram restritas e desrespeitadas no Brasil.
35
Ver Quadro 4, pg. 41.
36
O Sinpas articulou diversos institutos e autarquias existentes, sendo formado então pelo IAPAS
(administração previdenciária); INPS (benefícios previdenciários); LBA (assistência social); Funabem
(assistência ao menor); e Dataprev (processamento de dados).
46
Com as mudanças efetivadas na sociedade brasileira a partir do
golpe militar de 1964, a assistência à saúde foi caracterizada por uma
política de privatização maciça. Esta política, desde a unificação dos IAPs,
criando o INPS em 1966, durante o Governo Castelo Branco, foi
implementada de forma mais efetiva no Governo Costa e Silva e seguida
pelos que o sucederam (COSTA, 2002, p. 10).
No período da “abertura lenta e gradual” do governo Geisel, ocorre o
decréscimo nos recursos destinados à saúde, e a insatisfação com o padrão de
cuidado à saúde. O Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento
(Piass) proposto pela Conferência Nacional de Saúde é adotado, absorvendo
também as orientações da Organização Mundial da Saúde, definidas na sua
Assembléia Mundial da Saúde (1977) e referendadas pela Conferência Internacional
de Alma-Ata: Atenção Primária à Saúde e de Saúde para todos no ano 2000. O
artigo sexto do documento explicita os propósitos e a orientação aos países em
desenvolvimento sobre a atenção à saúde.
Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde
baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem
fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de
indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a
um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu
desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e automedicação. Fazem
parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a
função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e
econômico global da comunidade (OMS, 1978).
Esta política propicia o incremento da oferta de serviços ambulatoriais básicos
à população excluída do acesso a equipamentos sociais (NORONHA; LEVCOVITZ,
1994) como uma forma também de contrabalançar o grau de privatização da
assistência médica expandida pela criação do Inamps. O Plano Integrado de Saúde
Mental é estabelecido, prevendo a formação das primeiras equipes multiprofissionais
de saúde mental nas coordenações estaduais de saúde. Visou a formação de
médicos generalistas para atender à clientela da saúde mental e o estímulo à
formação de equipes ambulatoriais multiprofissionais de saúde mental. Mas, de
concreto, a oferta de serviços não foi suficiente, pois no campo da saúde, a década
de 1970 foi marcada pela baixa destinação orçamentária, em patamares “sempre
inferiores a 2 % da despesa geral da união” (COHN, 1996, p. 38).
O final dos anos 1970 foi marcado, no campo político, por mudanças nas
regras autoritárias do regime militar, com a extinção, em 1978, do Ato Institucional
47
nº.º 5, que possibilitou o avanço das forças políticas de oposição e a sua vitória nas
eleições para governador, na maioria dos estados, em 1982. No campo da saúde
mental, nas duas últimas décadas deste período houve um intenso esforço de
recolher doentes para os hospitais psiquiátricos, “com ambulâncias percorrendo as
cidades, especialmente após os jogos de futebol, identificando indivíduos que
portassem a carteira do INPS e que estivessem dormindo embriagados na via
pública. Após averiguações, eram levados e internados com o diagnóstico de
psicose alcoólica” (COSTA, 2002, p. 10). No ano de 1971 existiam 80.000 leitos
psiquiátricos no Brasil (ALVES, 1992; BRENER, 1996; COSTA, 2002). Este era o
cenário da política de saúde mental, condição esta que determinou mudanças na
década posterior.
Decifrar para ver as interconexões históricas e sociais é fundamental para se
entender e explicitar a dinâmica dos fenômenos sociais. No período da República
Velha até a ditadura militar, verificou-se alguns pressupostos fundamentais para a
análise do setor saúde. Entre eles, destaca-se a visão do Estado sobre a
contribuição estratégica do setor tanto na reprodução das condições de vida das
classes de trabalhadores, como para o desenvolvimento da nação; conceitos
teóricos como o higienismo e a noção liberal da medicina, e, por conseguinte, a
histórica fragmentação entre saúde coletiva x atendimento médico individualizado,
como a ênfase dos interesses do mercado no setor.
A interconexão de interesses do capitalismo mundializado também fica
evidente pelas diferentes formas de orientação através dos organismos multilaterais.
Pode-se dizer que estas orientações marcaram definitivamente a política de saúde,
como a ênfase ora na hospitalização, ora na atenção primária, com destaque na
saúde mental; no ingresso do planejamento como ferramenta fundamental para a
organização e funcionamento do sistema de saúde. Estas características vão fundar
e constituir as políticas de saúde e saúde mental no Brasil, influenciando o momento
seguinte, quando ambas passam por processos de reforma.
Mas ao mesmo tempo, como reação a esta lógica mercantil e centralizadora
da saúde e do modelo hospitalocêntrico e manicomial na saúde mental, vários
segmentos profissionais e forças no legislativo começam a organizarem-se,
48
tornando o ano de 1979
37
profícuo no debate e na geração de novos patamares
conceituais, marcando o período seguinte da trajetória brasileira no campo da saúde
e da saúde mental.
2.2 AS REFORMAS SANITÁRIA E PSIQUIÁTRICA NO BRASIL
Os anos 1980 produziram profundas transformações no sistema de saúde
brasileiro, determinadas pelo quadro de crise econômica, social e política, advindas
da queda do produto interno bruto, da aceleração inflacionária e redução na
capacidade de investimento econômico, da perda da hegemonia das forças que
sustentavam o regime militar e da forte reação de vários segmentos sociais contra
as condições de vida instaladas. Como conseqüências, os rendimentos dos
assalariados foram retraídos, principalmente daqueles com salários próximos ao
mínimo; redução dramática do nível do emprego que reverteu um processo de
formalização do mercado de trabalho erigido nos anos predecedentes e aceleração
da desigualdade social (FIORI; KORNIS, 1994).
Vários segmentos majoritários da sociedade brasileira mobilizam-se para
encerrar o ciclo ditatorial, correspondendo ao momento em que os países da
América Latina fazem adesão aos princípios da democracia liberal, revestindo-se de
caráter transformador em relação ao tipo de Estado até então presente. Estas
relações entre sociedade e Estado passam a ter as características de estado de
direito, pluralismo político e sistema de representação partidária (SOLA, 1999), e
criam as condições históricas para o processo de democratização.
A década da crise foi também para o Brasil a década da
democratização e, enquanto a primeira veio gradativamente minando os
recursos disponíveis para o gasto social, a segunda impulsionou
movimentos generosos de reformas do seu sistema de proteção (DRAIBE,
1993a, p.22).
As mudanças ocorridas marcaram a formulação de nova concepção de saúde
e de saúde mental, e criaram novos desenhos institucionais, alterando
significativamente a política pública e a relação dos segmentos sociais envolvidos
com a gestão da saúde, com se constata no Quadro 5.
37
Ver Quadro 4, pg. 41.
49
PERÍODO ANO
ACONTECIMENTOS
7ª Conferência Nacional de Saúde, de 24 a 28 de março.
Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde (Prev-Saúde)
1980
2º Encontro Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental, em
Salvador.
1982
O Conselho Consultivo de Administração Previdenciária propõe o
Plano do Conasp – Plano de Reorientação da Assistência à Saúde no
Âmbito da Previdência Social, que após aprovado torna-se política
institucional oficial, por portaria n 3.062.
REGIME
MILITAR
1983
Implantação das Ações Integradas de Saúde
1985
Reunião de Secretários Municipais de Saúde, realizada em Montes
Claros em janeiro, lança a Carta de Montes Claros, chamada de “Muda
Saúde”, estabelecendo o marco referencial de um novo movimento
municipalista em saúde, lançando as bases para sua
institucionalização.
Congresso de Bauru, dos Trabalhadores de Saúde Mental, SP.
8ª Conferência Nacional de Saúde, de 17 a 21 de março.
1986
1ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (OMS), em
Ottawa, Canadá, que aprova a Carta de Ottawa para Promoção da
Saúde, documento referencial no assunto desde então.
Criação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde - SUDS
1987
1ª Conferência Nacional de Saúde Mental, Rio de janeiro, 25 a 28 de
julho de 1987.
Nova Constituição Federal
1988
2ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (OMS), em
Adelaide, Austrália. Tema Políticas Públicas Saudáveis.
NOVA REPÚBLICA
1989
Transferência do Inamps para o Ministério da Saúde
Quadro 5 - Síntese da Constituição das Políticas de Saúde e Saúde Mental no Brasil
– Período do Regime Militar e da Nova República (Década de 1980)
Fontes: FEE, 1983; COSTA, 1986; LANCETTI, 1987; AMARANTE, 1995a; GUIMARÃES, TAVARES,
1994; BRASIL, 2004; HOCHMAN, 2005; FIOCRUZ, 2005.
A Previdência Social encontrava-se numa crise financeira, em forma de déficit
operacional, em decorrência das políticas econômicas recessivas. A expansão da
cobertura de beneficiários, sem a respectiva criação de novas fontes de
financiamento que assegurassem os recursos necessários, são alvos de crítica, por
seu caráter de estratégia de recomposição de base do governo autoritário.
As críticas ao modelo de saúde vigente se intensificam por parte dos
movimentos populares emergentes; assim como ocorreu uma forte “[...] influência
internacional de democratização dos serviços de saúde e a necessidade do governo
50
buscar legitimidade(NESCO, 1988, p. 32) fazendo com que o Ministério da Saúde
emita sinais de mudança, convocando a Conferência Nacional de Saúde, em
1980, com o tema “Serviços sicos de Saúde”. Os participantes debatem sobre o
Prev-Saúde e a extensão das ações de saúde através dos serviços básicos
(MOYSÉS, 2005), mas o debate sobre este programa não ficou restrito à
Conferência, pois foi geral a avaliação crítica de que o mesmo centralizou ainda
mais as decisões, esvaziando a capacidade decisória das Secretarias Estaduais de
Saúde.
A assistência médica sofre drástica redução de recursos neste período, e,
para enfrentar a crise, em 1982, é criado o Conselho Consultivo de Administração de
Saúde Previdenciária (Conasp), substituindo o Prev-Saúde. Este consistiu numa
organização da assistência médica da Previdência Social, estabelecendo como
princípios a prioridade das ações primárias, com ênfase na assistência ambulatorial
e a integração dos níveis federal, estadual e municipal, num sistema regionalizado e
hierarquizado.
As Ações Integradas de Saúde (AIS) implantadas em 1983, resultantes do
recente ordenamento na política de saúde, visaram alcançar níveis de articulação
institucional que viabilizassem ações mais eficientes e eficazes, e produziram “um
deslocamento relativo de recursos financeiros da Previdência para o setor público
prestador de serviços de saúde e promoveram uma integração das ações setoriais”
(MERHY; QUEIROZ, 1993, p. 6). Suas diretrizes foram: universalidade do
atendimento; integralidade e equidade da atenção à saúde, e democratização
através da participação da sociedade civil e do controle social pelos usuários.
O Ministério da Previdência e Assistência Social incrementou o modelo de
“cuidados médicos individuais como padrão de saúde” (NORONHA; LEVCOVITZ,
1994), orientando um crescimento avassalador da produção quantitativa de atos
médicos, com conseqüente construção de grande número de hospitais, estes
financiados pelo setor público, e compra de vagas no setor privado
38
. Este período,
denominado de privatização da assistência médica previdenciária, é uma
38
Em 1949 o gasto com saúde blica correspondia a 13% em medicina curativa (modelo
hospitalocêntrico) e 87% em medicina preventiva; no final dos anos 1980, invertem-se estes
percentuais, passando respectivamente para 78% e 22% (DRAIBE, 1993 b).
51
característica desta fase pela “reorientação da política nacional de saúde para uma
prática médica curativa, individual, especializada e sofisticada, em detrimento de
medidas de saúde pública, de caráter preventivo e de interesse coletivo” (TEIXEIRA,
1986, p.107).
Por conseqüência, esta política de extensão da rede de leitos no setor
privado, com financiamento público, resultou num maior impulso ao modelo da
internação psiquiátrica nas ações de saúde mental, com um aumento de três vezes
no número de estabelecimentos psiquiátricos (ALVES, 1992; DELGADO, 1994). O
número de leitos existentes em 1981 era 100.000 e em 1984 passam para 105.765
em todo o Brasil (ALVES, 1992; BRENER, 1996; COSTA, 2002), numa proporção de
80% dos leitos contratados no setor privado e os 20% restantes no setor público
(TENÓRIO, 2002).
Assim, o aumento das internações psiquiátricas no período apresentado está
relacionado a uma resposta do Estado à falta de emprego como uma forma de
responder à questão social; o Estado realiza uma modalidade de proteção social
proporcionando a acumulação no setor privado da saúde mental. “[...] estimativas da
década de 80 mostram que cerca de 17 milhões de brasileiros encontram-se
afetados por alguma forma de transtorno mental. Destes, 500 mil encontram-se
confinados nos diversos hospitais psiquiátricos no país” (REICHENHEIM;
WERNECK, 1994). A presença do setor privado contratado pela Previdência Social
é relevante na oferta de serviços de hospital psiquiátrico ao longo de seis décadas,
como se constata na Tabela 01.
Tabela 01 - Número de hospitais psiquiátricos por natureza no Brasil,
1941 a 1991
Hospitais psiquiátricos/
natureza
1941 1961 1971 1981 1991
Privado - Filantrópico 39 81 269 357 259
Público 23 54 72 73 54
Total de hospitais 62 135 341 430 313
Fonte: ALVES, Domingos Sávio N. et al. Elementos para uma Análise da Assistência em Saúde
Mental no Brasil. In: CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE MENTAL, 2, Brasília. Anais. Ministério
da Saúde, 1992.
52
Os dados da Tabela 01 revelam, primeiramente, que a proporção de hospitais
privados filantrópicos é de 82,7% em 1991. Revelam também os efeitos da política
de construção de hospitais psiquiátricos a partir do período desenvolvimentista e o
seu aumento extraordinário na maior parte do regime militar, com financiamento
público. Revelam também uma redução no número de hospitais psiquiátricos no
período de 1981 a 1991, que pode ser creditada a mudanças na política estatal, que
passou a incentivar a oferta de serviços ambulatoriais previdenciários em saúde
mental. O governo realiza uma avaliação dos rumos das internações psiquiátricas e
cria medidas de incentivo ao tratamento extra-hospitalar, seguindo as orientações
dos Programas de “Atenção Primária” e “Saúde para todos no ano 2.000”, que a
OMS estabeleceu para propiciar o “incremento da oferta de serviços ambulatoriais
básicos à população excluída do acesso a equipamentos sociais” (NORONHA;
LEVCOVITZ, 1994, p. 79).
Esta avaliação é conduzida pelo Inamps, responsável pelo pagamento das
internações, que em 1982 faz um diagnóstico das internações psiquiátricas no
Brasil, concluindo que estas cresceram em 15% ao ano desde a década de 1970,
com indicações desnecessárias, manipulações de diagnósticos para fins de
ampliação de prazos de internação e uso do expediente de dar alta seguida de
imediata reinternação. A Portaria nº. 3.108 foi lançada para regular mudanças no
modelo assistencial em saúde mental, calcadas nos seguintes princípios: a) ser
predominantemente extra-hospitalar, b) ser exercida por equipe multidisciplinar,
c) incluir-se numa estratégia de atenção primária de saúde, d) utilizar recursos
intermediários entre o ambulatório e a internação integral, como hospital-dia,
hospital-noite, pré-internação, pensão e oficina protegidas, e) restringir a internação
aos casos estritamente necessários, f) promover a implantação progressiva de
pequenas unidades psiquiátricas em hospitais gerais (BRASIL, 1982).
As medidas, acima relacionadas, foram instituídas num contexto particular na
história brasileira, na conjuntura de crise econômica e política do ciclo ditatorial, que
anunciava sinais de desgaste e começou a ceder no seu autoritarismo: início da
organização de entidades sindicais, o retorno do pluripartidarismo e vitória da
oposição nas eleições diretas para governadores em 1982, e a grande mobilização
de um conjunto de movimentos sociais lutando por variados temas relacionados às
53
condições de vida. A inflação marcou índices alarmantes (em 1980, 110%, em 1983,
200%), o analfabetismo chegou a 25% dos habitantes, e o acesso aos serviços de
saúde estava prejudicado pela discriminação existente entre os segurados, cujos
serviços tinham maior volume de investimento e, mesmo assim, insuficientes, e os
dependentes da oferta de precários serviços estatais, com ínfimo investimento, e da
filantropia, responsável principal pela oferta de serviços hospitalares.
Este é um quadro sintético do último governo militar, que teve a tarefa
histórica de iniciar o processo de democratização no país, com a população
brasileira organizada em várias forças sociais e políticas criticando e propondo
mudanças nos rumos da Nação. O movimento pelas Diretas e a luta por uma
Constituinte Livre e Soberana demonstraram o novo cenário de participação popular
sob o auspício da cidadania. Assim “a sociedade brasileira retoma sua trajetória na
construção da democracia, deparando-se com um surto de exigências de cidadania,
oriundos de diferentes grupos” (FERREIRA, 1993, p. 21).
O período da Nova República (1985) foi de transição democrática, com o
restabelecimento de eleições diretas em todo o território nacional e a convocação de
uma nova constituição, com o fim de fundar um novo consenso político e social para
o país após o fim do ciclo ditatorial. O desafio na área econômica era a contenção
da inflação, e para tanto vários planos foram implantados, cujas conseqüências
repercutem em alguns setores até os dias atuais.
Em relação ao setor saúde, o governo anunciou a crise econômica e sua
incapacidade de financiá-la, intensificando o debate nos movimentos sociais, nas
categorias profissionais e no campo acadêmico, comprometidos com mudanças
sociais. Denunciaram as condições de saúde da população e propuseram
alternativas para a construção de uma nova política de saúde efetivamente
democrática, tendo como componentes essenciais a descentralização, a
universalização, participação da população e a unificação no setor.
A conseqüência da ampla mobilização pela reforma do setor saúde no bojo
dos debates pela democratização política brasileira criou as condições políticas para
a realização da 8ª Conferência Nacional de Saúde com o tema “Democracia é
Saúde”. Representou um dos acontecimentos mais significativos de sedimentação
54
das propostas que vinham sendo construídas e de encaminhamento para uma
legitimidade social e política na área da saúde, e a primeira Conferência Nacional a
se realizar após a restauração da democracia no país.
Participaram cerca de quatro mil pessoas, representantes de vários
segmentos da sociedade, propondo novo conceito de saúde, entendido como
resultante das condições de vida da população numa determinada sociedade,
rompendo deste modo com o entendimento de igualar saúde com ausência de
doença. As diretrizes desta Conferência são resultantes da produção crítica sobre o
setor saúde, onde diferentes forças sociais construíram o movimento da Reforma
Sanitária.
O conceito de Reforma Sanitária refere-se a um processo de
transformação da norma legal e do aparelho institucional que regulamenta e
se responsabiliza pela proteção à saúde dos cidadãos e corresponde a um
efetivo deslocamento do poder político em direção às camadas populares,
cuja expressão material se concretiza na busca do direito universal à saúde
e na criação de um sistema único de serviços sob a égide do Estado
(TEIXEIRA, 1989, p. 39).
Esta nova concepção sobre a saúde está calcada nos princípios de
universalização, descentralização, participação, e de que a saúde é um direito de
todos e dever do Estado, estabelecida no processo de proposições da mudança do
sistema de saúde, foram objeto de uma grande mobilização para que fosse
assumida pela Assembléia Constituinte. Esta concepção foi legitimada na
Constituição Federal de 1988, que foi a base para a Lei Orgânica da Saúde -
Sistema Único de Saúde - SUS, na forma das Leis Federais 8.080/90 e 8.142/90.
O significado inovador do movimento da reforma sanitária foi sua proposta de
ruptura com a forma histórica de constituição da política de saúde no Brasil:
centralizadora, autoritária, privativista, hospitalocêntrica, meritocrática e residual. A
política de saúde tem uma amplitude que extrapola o próprio setor, pois desde o seu
nascimento na primeira República até o período de democratização do país, esteve
no cerne dos debates e da constituição das políticas sociais desenvolvidas pelo
Estado brasileiro.
[...] as políticas e instituições de saúde desempenharam um papel histórico
para a construção e estabilização da ordem sociopolítica brasileira.
Ajudaram mesmo a modelar certos traços estruturais dessa ordem, entre as
55
quais a tendência à concentração de poder e à exclusão das classes
populares dos circuitos de decisão econômica, política e cultural do país
(LUZ, 1991, p. 77-78).
A saúde representa tanto um valor universal na sua dimensão de cuidados
para a manutenção e qualidade de vida, quanto um setor estratégico de política
pública, no atendimento das condições necessárias para a reprodução social.
Quando se entende política social também como uma estratégia de hegemonia,
estão contempladas tanto a capacidade da classe dominante de reafirmar sua
soberania, como a possibilidade da classe dominada de articular seus projetos
sociais, pois,
As lutas na esfera da reprodução, de caráter predominantemente
policlassista, não deixam de ser um campo propício à constituição de
sujeitos políticos e de projetos que interpelam as múltiplas forças sociais
atuantes desde uma perspectiva de classe (FLEURY, 1994, p. 51).
Deste modo, o movimento da reforma sanitária significou uma articulação de
forças sociais com uma mesma direção: qualificar a atenção em saúde e torná-la
pública, como direito universal dos cidadãos. A amplitude deste debate nacional
sobre a questão da saúde forjou as condições para a criação do Sistema Unificado e
Descentralizado de Saúde (SUDS), através de Decreto em 1987, com o objetivo de
contribuir para a consolidação e o desenvolvimento qualitativo das AIS. Estabeleceu
a reorganização das atribuições dos três níveis de poder, numa ação conjunta
inédita do Ministério da Saúde e da Previdência Social, dando ênfase ao nível
estadual.
As Ações Integradas de Saúde vão ganhar maior expressão nacional,
constituindo-se em importante estratégia no processo de descentralização da saúde,
e contemplando a participação na estrutura da saúde, através dos colegiados
representativos para acompanhamento da política de saúde - as Comissões
Interinstitucionais de Saúde no âmbito nacional (CIS), estadual (CRIS) e municipal
(CIMS), que formaram as bases para os Conselhos de Saúde, nas três esferas de
governo, a partir da Lei 8.142, de 1990.
O SUDS alterou o papel do Inamps que passou a ter as funções de
planejamento, programação orçamentária e acompanhamento do sistema de saúde,
56
deixando de ser prestador de serviço. Ao mesmo tempo em que o SUDS possibilitou
a superação de uma dicotomia histórica entre saúde pública (Ministério da Saúde) e
atenção médica curativa (Ministério da Previdência e Assistência Social), não
resolveu conflitos existentes, principalmente na definição clara de papéis entre
estados e municípios.
A própria União não aplicou seu discurso de descentralização, tendo somente
no ano seguinte franqueado a cessão de unidades hospitalares e de pessoal para os
estados, que na prática, não se efetivou por muitos anos. As medidas
descentralizadoras adotadas foram de transferência às Secretarias da Saúde a
gestão de contratos e convênios de serviços de terceiros. Contudo, a definição de
valores e dos sistemas de pagamentos permaneceu com o Inamps.
O município ficou num papel de coadjuvante, como prestador e executor de
serviço, sendo tratado com relativa heterogeneidade e clientelismo pelas Secretarias
de Saúde. Apesar dos obstáculos, o SUDS sobrevive até a aprovação da Lei
Orgânica da Saúde, em 1990, que por sua vez ocorreu porque as forças sociais
organizadas em prol do movimento de reforma sanitária conseguiram incorporar
suas premissas na Constituição Federal de 1988.
O Sistema Único de Saúde (SUS) representa a consagração do direito à
saúde como preceito constitucional e a existência de um arcabouço jurídico-legal
pleno, de cunho universalista e igualitário (DALLARI, 1995). Define saúde como
direito de cidadania e dever do Estado, implicando numa visão desmedicalizada da
saúde, na medida em que subentende uma definição afirmativa, diferente da visão
tradicional, típica das instituições médicas, que identifica saúde com ausência
relativa de doenças.
Nesta mesma direção, no campo de saúde mental também se expressou uma
importante movimentação dos segmentos sociais nele implicados. Inicialmente os
trabalhadores de saúde mental, seguidos pelos usuários dos serviços e seus
familiares, passam a reivindicar alterações no modo de atenção vigente. A
Conferência Nacional de Saúde Mental (1987), realizada após embates entre o
governo e o movimento da saúde mental (AMARANTE, 1994) teve como eixos de
57
debate a luta pela cidadania das pessoas com transtornos mentais e a reversão do
modelo manicomial hospitalocêntrico.
O ingresso dos profissionais ligados à Instituição psiquiátrica, os
trabalhadores em Saúde Mental: “[...] representa o transbordamento de uma questão
de natureza social e política, como a saúde mental, até então rigidamente contida
nos muros de um saber hegemônico marcadamente corporativo” (DELGADO, 1994,
p. 173). Os profissionais passam a examinar a sua forma de intervenção ao
criticarem o modo de produção do binômio saúde-doença e constatam que:
O cidadão é aquele que possui uma saúde ou um corpo apto para ser
incluído na produção. Mas, da mesma maneira que o estatuto do cidadão
vai-se configurando historicamente ligado aos processos produtivos, o
estatuto do louco vai-se constituindo em relação aos processos de anti-
produção. Loucos são aqueles que a violência da máquina social sucateia e
que nós, trabalhadores de saúde mental, temos por encargo administrar
(LANCETTI, 1987, p. 87).
O Movimento da Luta Antimanicomial passou a denunciar as condições de
segregação social dos portadores de transtorno mental. Propôs mudanças de
concepção sobre a doença mental, o direito destes passarem a ser considerados
cidadãos e alteração no modelo de atenção terapêutico hegemônico, o
hospitalocêntrico. O horizonte deste Movimento revela a busca da ampliação ou
criação de espaços participativos e democráticos, pois “os direitos humanos surgem
junto a uma revalorização da democracia como construção, e não como algo dado e
preexistente” (CALDERÓN; JELIN, 1987, p. 80).
Assim, o movimento social imprime uma luta tanto no campo político ao fazer
o debate sobre a necessária conquista de direitos de segmentos da população, bem
como no campo do conhecimento, ao estabelecer novas categorias teóricas,
filosóficas e práticas no campo da Saúde Mental, que indicam a necessária inclusão
do portador de transtorno mental no espaço dos cidadãos.
Os transtornos mentais são problemas de natureza e solução
distintas das doenças orgânicas; o problemático mental, além das
necessidades comuns, tem necessidades especiais que se aguçam
exponencialmente nos momentos de crise; integração e reintegração social
plena são os suportes mais consistentes da cura; o exercício de direitos e
liberdades individuais estarão sujeitos a limitações, exclusivamente com o
fim de assegurar os mesmos direitos e liberdades de outrem; o isolamento e
a segregação comprometem o projeto terapêutico, impedem o exercício da
cidadania e fragmentam a inserção social (PADRÃO, 1992, p. 13).
58
O movimento da Psiquiatria Democrática italiano influenciou o movimento
brasileiro da luta antimanicomial, principalmente após a visita de Basaglia (1979)
num evento em Minas Gerais
39
. A crítica e a prática na mudança no modo de
atenção centrado no hospital psiquiátrico construíram o conceito de
desinstitucionalização (BARROS, 1994). Esta propõe outra modalidade de atenção e
de relação terapêutica, garantindo os espaços dos sujeitos envolvidos, sejam os que
padecem de transtorno mental, sejam os operadores ou os trabalhadores em saúde
mental.
A desinstitucionalização é um trabalho terapêutico, voltado para a
reconstituição das pessoas enquanto sujeitos que sofrem. É provável que
não se resolva por hora, não se cure agora, mas no entanto seguramente
se cuida. Depois de ter descartado a “solução-cura” se descobriu que cuidar
significa ocupar-se, aqui e agora, de fazer com que se transformem os
modos de viver e sentir o sofrimento do “paciente” e que, ao mesmo tempo,
se transforme sua vida concreta e cotidiana, que alimenta este sofrimento
(ROTELLI, 1990, p. 33).
A partir destes debates, o hospital psiquiátrico passa a ser traduzido como
uma instituição manicomial em decorrência de seu modo operandis gerar uma
conseqüente degradação nos indivíduos pela massificação do atendimento a partir
das classificações nosológicas, o que cria uma despersonalização dos sujeitos;
utilização de espaços restritivos como medidas terapêuticas, gerando uma dupla
mortificação; desconhecimento do motivo da internação por parte do próprio
indivíduo internado; ausência de privacidade e de liberdade de expressão; violação
de correspondência; negação da sexualidade; infantilização; acesso à atividade
como prêmio e a interdição civil.
A internação psiquiátrica é um ato complexo, envolvendo vários
fatores, e do qual participa como força importante a ideologia do isolamento
do doente mental. A reversão de tal tendência implica a subversão de um
conceito amplo e longamente difundido pela própria psiquiatria (DELGADO,
1994, p. 183).
Portanto, o manicômio como uma instituição total (GOFFMAN, 1990) é um
lugar de segregação, de mortificação e degradação da individualidade e identidade
dos sujeitos, que materializa a lógica de aceitação da segregação e da violência,
bem como refratário às interfaces com a dinâmica social. Após a contextualização
39
Ver Quadro 4, pg. 41.
59
sobre a gênese e consolidação da política de saúde e saúde mental no Brasil, se
discorrerá sobre sua constituição no estado do Rio Grande do Sul, quando se
verificará a conexão e sintonia com as orientações nacionais e, ao mesmo tempo,
características peculiares que marcaram a trajetória gaúcha no campo sanitário e da
saúde mental.
2.3 A POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL NO RIO GRANDE DO SUL
O propósito de analisar a política de saúde mental no Estado do Rio Grande
do Sul, no contexto da saúde pública, está no interesse de recuperar o modo como
foi se constituindo e consolidando. Alguns aspectos da sua gênese histórica que
ainda influenciam o entendimento sobre a loucura e as formas de tratá-la no campo
da cultura e da política blica serão destacados, bem como as medidas que foram
sendo adotadas até o período final da década de 1980.
Inicialmente é preciso situar brevemente as características do estado gaúcho
na segunda metade do século XIX, reorganizando-se após a Guerra dos Farrapos
(1835–1845) e recebendo imigrantes de várias nações européias. Posteriormente
outro conflito bélico ocorre, a Guerra do Paraguai, que termina em 1870, ocasião em
que o estado tinha em torno de 470.000 habitantes e a assistência à saúde era
realizada por leigos e religiosos, pois os poucos médicos existentes atendiam
exclusivamente à classe de maior poder aquisitivo (PICCININI, 2000; KUHN, 2004).
No campo político, várias forças foram organizando-se e conduzindo a
consolidação da província no tempo da monarquia. O Partido Liberal, representante
dos pecuaristas e defensor do federalismo, era a principal força política até a criação
do Partido Conservador em 1848, este formado por parte da oligarquia regional e
defensora do Império. Os ideais republicanos e a postura crítica ao conservadorismo
criam as condições para a organização do Partido Republicano Rio-Grandense
(PRR) (1882), tendo como base os setores médios urbanos (KUHN, 2004).
O positivismo foi a inspiração do PRR durante seu comando do estado por um
longo período, visto ter se constituído numa força política importante na
consolidação do Rio Grande do Sul. As idéias de Augusto Comte precisaram ser
adaptadas à realidade gaúcha, pois formuladas para garantir o desenvolvimento
60
capitalista e assegurar os interesses da classe em ascensão, a burguesia européia,
no estado gaúcho o desafio era “desenvolver as forças produtivas do Estado,
favorecer a acumulação privada de capital e propiciar o progresso harmônico de
todas as atividades econômicas” (PESAVENTO, 1994, p. 67).
Neste período, a economia do estado estava alicerçada no setor agrícola,
voltado ao mercado interno brasileiro, “[...] atendendo às necessidades do setor
agro-exportador, que detinha, no momento, a hegemonia da economia nacional”
(FEE, 1983, p. 217). Portanto, o estado se caracterizou por ter sua economia
centrada na agricultura, com a formação e consolidação de forças políticas com
seus distintos projetos de sociedade e de Estado. As mudanças nos cenários
econômicos e políticos nacionais, bem como as produzidas pela Guerra Mundial,
permitiram o desenvolvimento de um conjunto de ações voltadas à diversificação da
economia, bem como na melhoria da estrutura para a circulação dos produtos da
industrialização que começa a se constituir
40
.
Em consonância com a política de saúde e de saúde mental emanada do
nível federal, a eugenia, a higiene mental e o assistencialismo inspiraram o
nascimento da institucionalização para o atendimento aos doentes mentais no solo
gaúcho. O assistencialismo é uma categoria importante para ser destacada,
considerando que marca a os dias de hoje a função social dos hospitais
psiquiátricos, que na sua origem denominavam-se de asilos. No período histórico
que vai das origens do capitalismo até meados do século XIX, “o trabalho e as
instituições de saúde repousavam em três pilares: a medicina liberal, as medidas
coletivas de prevenção e higiene e o assistencialismo” (MÉDICI, 1995, p. 366).
Os primeiros esforços de tratar os doentes mentais de forma institucionalizada
foram uma das obrigações das Santas Casas de Misericórdia, tarefa associada ao
caráter de assistência social destas organizações sociais
41
, correspondendo ao
modo residual de conceber a política social. A Santa Casa de Misericórdia de Porto
40
Produção de conservas, têxteis, vinho e calçados; técnicas de irrigação e implementos agrícolas no
cultivo do arroz; grande exportação de produtos da pecuária; ingresso de capital estrangeiro que fez
uma renovação tecnológica na pecuária, entre outras inovações (PESAVENTO, 1994).
41
O Imperador D. Pedro II emitiu carta ao Presidente da Província São Pedro em 1854, em cujo teor
consta: “Que não é admissível exonerarem-se os Hospitais e Casas de Caridade das Províncias da
obrigação de alimentarem e curarem os alienados que, em virtude de suas Instituições, tiverem a seu
cargo [...]” (WADI, 2002, p. 46).
61
Alegre iniciou suas atividades em 1826, quando começou o recolhimento dos
doentes mentais da então Província. Sua Direção foi a grande mobilizadora de
forças políticas para a criação de um estabelecimento especializado, por denunciar
sucessivos prejuízos financeiros e desgaste na sua imagem de filantropa, ao não
conseguir prestar um serviço adequado aos pacientes (WADI, 2002).
Em conseqüência da mobilização realizada pela Santa Casa é que o governo
começa a assumir diretamente uma ação de atendimento em saúde mental, com a
criação do Hospício São Pedro, processo que demorou cinco anos até o início das
suas atividades, em 1884
42
. A gênese da saúde mental como uma política pública
estatal no Rio Grande do Sul está diretamente relacionada às políticas nacionais de
saúde mental e às atividades do Hospital, que por muitas cadas se constituiu
como o pólo central de atendimento, origem da psiquiatria como especialidade
médica no solo gaúcho, de formação de profissionais em saúde mental e irradiador
das diversas reformas no modo de organizar a assistência no estado. As primeiras
iniciativas no campo da saúde e da saúde mental estão sistematizadas no Quadro 6.
42
A trajetória da instalação e funcionamento do Hospital Psiquiátrico São Pedro (1884) até a década
de 1950 está registrada com riqueza de detalhes nas obras de GODOY (1955) e WADI (2002).
62
Quadro 6 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no RS -
Período do Império e da República Velha
Fontes: GODOY, 1955; BICCA, PATRÍCIO, 1981; FEE, 1983; RECKZIEGEL, 1984; BUSNELLO,
1985; GOMES, 1985; PINÓS, 1993; SOARES, 1996; PICCININI, 2000; WADI, 2002.
Na concepção vigente na época, a instituição hospitalar se faz necessária
para assumir os estranhos à normalidade e de difícil convívio social, pois ainda não
havia se constituído organicamente o saber da psiquiatria, que posteriormente se
tornou a disciplina responsável pela administração e tratamento da loucura. O
ingresso de pacientes no estabelecimento não era por exclusivo critério médico, pois
os intendentes municipais foram autorizados a requisitarem internação psiquiátrica,
através de Decreto em 1924.
Esta concepção estava marcada pelo ideário assistencialista, próprio da
concepção residual de política social, que será a marca da instalação e consolidação
do hospital psiquiátrico estatal, pois este teve a tarefa de acolher os loucos pobres
de todo o estado. Para fins de ilustração desta afirmação, em 1929 realiza-se em
Porto Alegre o Congresso das Municipalidades do Estado, quando o Dr. Jacintho
PERÍODO ANO ACONTECIMENTOS
Império
1884 Inauguração do Hospício São Pedro, Porto Alegre, RS, criado por
Decreto Provincial de 1879.
1924 Decreto 3.356, que inclui os intendentes municipais entre as
autoridades competentes para requisitarem a internação de pacientes
no Hospital São Pedro.
1925 Criação do Manicômio Judiciário, o segundo no país.
Diretoria da Assistência aos Alienados do Rio Grande do Sul, com a
atribuição de direção conjunta do Hospício São Pedro e do
Manicômio Judiciário.
1926
Criação do Hospital Psiquiátrico Espírita de Porto Alegre – privado,
filantrópico, contratado pelo sistema público de saúde.
1928 1º Congresso das Municipalidades do Estado, que aprova o Plano de
Reorganização Sanitária do Estado.
Criação da Diretoria de Higiene e Saúde Pública, vinculada a
Diretoria Geral de Instrução Pública da Secretaria de Negócios do
Interior. O Hospital São Pedro estava vinculado à Diretoria de Higiene
e Saúde Pública.
República
Velha
1929
Congresso de Higiene e Hospitais, na cidade de Rio Grande, discute
a criação de Anexos Psiquiátricos nos hospitais gerais das principais
cidades do RS.
63
Godoy
43
, diretor do HPSP, apresenta uma tese no tema Assistência Social, de que
os municípios gaúchos deveriam “[...] daqui por diante concorrer materialmente para
o serviço de Assistência a Alienados, mantido pelo Hospital São Pedro, com uma
contribuição fixa, anual, pagável, por semestres vencidos” (GODOY, 1955, p. 95). A
proposta de Godoy é aprovada e está sustentada no problema de excesso de
internos no estabelecimento, revelando a função social exercida pelo hospital na
sociedade gaúcha.
Neste período histórico destaca-se também o esforço do governo em
organizar o setor blico de saúde, que por conta de sua inspiração positivista,
opunha resistência a iniciativas interventoras construídas na égide do higienismo,
estratégia adotada pela política de saúde no âmbito federal. O debate entre o valor
da liberdade individual e a necessidade de adoção de medidas para melhorar as
condições sanitárias foi a marca da relação entre os dirigentes governamentais e a
classe médica (LHULLIER, 2003), caracterizada por desavenças na busca da
legitimidade e autoridade médica no campo da saúde mental.
O período histórico subseqüente terá a marca da premência do
desenvolvimento industrial numa conformação política de ampliação do poder
central federal que orientará os estados na adoção das políticas econômicas e
sociais. Seguindo, então, os novos ordenamentos da organização social erigidos
com a Revolução de 1930, para responder às demandas sociais e garantir uma
unidade nacional no projeto de industrialização, se destacam no Rio Grande do Sul
a criação do Instituto de Previdência do Estado, a criação do Juizado de Menores e,
no setor saúde, a criação da Secretaria de Educação e Saúde Pública (1935) a
exemplo da criação do Ministério com a mesma denominação (1930). Até então, a
educação e a saúde estavam vinculadas à Secretaria de Negócios do Interior.
No setor da saúde mental, ocorre a instalação de dois hospitais psiquiátricos
privados, um deles criado pelo Dr. Jacintho Godoy, no intervalo dos dois mandatos
de dirigente do Hospital São Pedro, quando se descompatibilizou com as forças
43
Jacintho Godoy foi Diretor do HPSP por dois períodos: 1926-1932 e 1937-1951. No primeiro
período, como Diretor da Assistência aos Alienados, também era responsável pelo Manicômio
Judiciário. As mudanças implantadas por Godoy seguiam a mesma direção das adotadas nos demais
hospitais psiquiátricos no Brasil (RAMOS; GEREMIAS, 2006). Sobre a biografia de Jacintho Godoy
ver GODOY, 1955; PICCININI, 2000; WADI, 2002; WADI, 2006.
64
políticas que assumiram o governo do estado no início da década de 1930. Uma
síntese dos acontecimentos mais significativos deste período está sistematizada no
Quadro 7.
Quadro 7 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no RS -
Período Governo Provisório, Constitucionalista e Estado Novo (1930-1945)
Fontes: GODOY, 1955; BICCA, PATRÍCIO, 1981; FEE, 1983; RECKZIEGEL, 1984; BUSNELLO,
1985; GOMES, 1985; PINÓS, 1993; SOARES, 1996; PICCININI, 2000; UEBEL et al, 2003; WADI,
2002.
ANO
ACONTECIMENTOS
Criação do Instituto Previdenciário do Estado – IPE, substituindo a Caixa de
Aposentadoria e Pensões dos funcionários públicos.
1931
Criação da Clínica Psiquiátrica Olivé Leite, no município de Pelotas. Privada e
contratada pelo sistema público de saúde.
1933
Criação da Clínica Psiquiátrica São José, fundada por Jacintho Godoy. Privada.
1935
Decreto nº. 5.969 cria a Secretaria de Educação e Saúde Pública e o Conselho
Estadual de Educação, como órgão consultivo para traçar as diretrizes do ensino
no estado.
1937
Decreto Estadual nº. 6.880 subordina o Manicômio Judiciário à instância jurídica,
desligando-o da Diretoria de Assistência a Psicopatas.
Criação do Departamento Estadual de Saúde, substituindo a Diretoria Estadual de
Higiene e Saúde Pública. No mesmo ano, o Departamento é desvinculado da
Secretaria de Educação e Saúde Pública, ficando subordinado diretamente ao
Governo Estadual.
Decreto nº. 7.481, de 14/09, cria o Código Sanitário do Estado.
1938
Criado no Hospital São Pedro, o Serviço Aberto de Profilaxia Mental (ambulatório),
setor onde teve início a atividade do Serviço Social.
Governo do RS lança a proposta de criação do Ministério da Saúde e de um Plano
Nacional de Saúde durante reunião dos Interventores dos Estados do Paraná,
Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Criação do Preventório Amparo Santa Cruz e do auxílio financeiro às famílias dos
leprosos.
Criação do Hospital Colônia Itapoã, “leprosário”, em Viamão, através do Decreto nº.
50, de 30/12/1940.
1940
Departamento Estadual de Saúde é separado da Secretaria de Educação e Saúde
Pública, com a criação da Secretaria de Educação do Estado – Decreto nº. 31.
Decreto nº. 614 sanciona o Plano de Saneamento Básico para o Estado. 1944
Curso Intensivo de Saúde Pública, Decreto nº. 993.
1945
Criação do Serviço Social de Menores (Sesme). Decreto 890 no Departamento
Estadual de Saúde.
65
Na vigência do Estado Novo, o setor saúde tem destaque nas ações do
governo estadual, com sucessivas alterações estruturais organizativas até a
separação entre os setores de saúde e da educação. O governo inicia a formação
de profissionais especializados para o setor, bem como cria o Código Sanitário do
Estado. Este vai reafirmar delineamentos feitos no Congresso das
Municipalidades (1928), revelando que somente após o período de dez anos
existiram as condições de sustentação de um dispositivo de regras de proteção à
saúde dos cidadãos e do comércio com caráter coercitivo e vigilante de polícia
sanitária, nos moldes já implantados no âmbito federal (FEE, 1983).
Ações públicas são criadas para atender o problema da lepra, posteriormente
denominada de hanseníase, sob a ótica do modelo vigente na época de colônia,
quando os identificados como portadores da doença foram separados de suas
famílias, para proteger a sociedade dos riscos do contágio, uma vez que o existia
tratamento eficaz para debelar a doença. Os dirigentes do setor organizam-se de
forma mais articulada, lançando propostas de melhorias no setor para o âmbito
nacional. Tal ação está calcada num esforço de criar condições mais autônomas
para o setor, visto que neste período houve um acirramento do autoritarismo central,
inclusive com o fechamento do congresso e das assembléias legislativas, com a
instalação de um Estado autoritário-corporativo para o alcance dos objetivos de paz
social, segurança e progresso econômico (PESAVENTO, 1994).
No Hospital São Pedro tem início, em 1937, o segundo período de direção do
Dr. Godoy, que pela força política conquistada com os dirigentes do Estado Novo,
realiza um conjunto de obras na instituição e instala serviços ambulatoriais e
carreiras novas na área de saúde mental. “Lança as bases do que, mais tarde, veio
a se constituir a psiquiatria gaúcha” (PICCININI, 2000, p. 3), criando a carreira de
médico psiquiatra e definindo que o ingresso de profissionais se daria através de
66
concurso público; cria a Escola de Enfermagem e o Serviço de Assistência Social
44
,
medidas estas que resultam numa influência significativa na política de saúde mental
no estado.
O fenômeno da superlotação continua a ser um dos graves problemas da
instituição, como conseqüência de atender os psicopatas
45
indigentes de todo
estado, situação que fez o Dr. Godoy chamar o estabelecimento de
[...] mãe de todos, pois não somente acolhe doentes mentais de toda a
espécie, como doentes que não são doentes mentais e mesmo pessoas
que não são nem mesmo doentes. Serve inclusive como asilo de velhos,
inválidos, indigentes (GODOY, 1955, p. 155-156).
Como se verifica, a função social do hospital continuava a mesma quando da
sua fundação, o depositário estadual de todo tipo de indesejados e pobres da
sociedade. A capacidade do hospital era de 477 doentes e chegou a ter 1.800
pessoas. Um fato relevante na época foi a inclusão do Manicômio Judiciário, criado
em 1925, subordinado à estrutura da saúde, na área jurídica e de segurança,
situação existente até os dias de hoje, trazendo prejuízos na assistência à saúde
daqueles que cometem delitos e o, ao mesmo tempo, portadores de transtorno
mental. A legislação penal brasileira, por considerar o portador de transtorno mental
incapaz de juízo crítico, lhe imputa a medida de segurança, criando uma situação
em que o mesmo fica privado de direitos constitucionais de defesa e cumprimento
de pena com prazos determinados, conforme o tipo de delito, caracterizando-se
como um afronta aos direitos humanos destes indivíduos
46
.
44
A criação do Setor de Assistência Social em 1938 teve provavelmente influência das primeiras
escolas de Serviço Social no Brasil, em 1936 (SP) e 1937(RJ), quando institucionalizaram a
profissão. Esta, circunscrita no contexto de instalação do Estado Novo, se instaura como “[...] uma
forma de intervenção ideológica, que se baseia no assistencialismo como suporte de uma atuação
cujos efeitos são essencialmente políticos: o enquadramento das populações pobres e carentes, o
que engloba o conjunto das classes exploradas” (IAMAMOTO; CARVALHO, 1988, p. 221-222). O
trabalho de assistência social no hospital era realizado por “moças que possuíam conhecimentos
empíricos, por o existir em nosso estado pessoas de preparo técnico especializado” (HEINRICH,
1950, p. 13). A primeira Escola de Serviço Social no RS foi criada em 1945 nas Faculdades Católicas,
e em 1947 iniciaram-se os estágios no HPSP (BICCA; PATRÍCIO, 1981), sendo Myriam Heinrich uma
das primeiras estagiárias de Serviço Social no Hospital. Em 1957 a Escola de Serviço Social se
integra na PUCRS.
45
Denominação da época dos portadores de transtorno mental.
46
Sobre o tema ver DELGADO (1992) e MEDEIROS (2005).
67
O final do segundo conflito bélico mundial correspondeu ao término do Estado
Novo no Brasil, com a promulgação de nova Constituição Federal, em 1946,
instalando o regime democrático novamente no país e, no ano seguinte, a
Constituição Estadual. Contudo, não se alterou a correlação de forças entre a união
e os estados, pelo contrário, intensificou-se a dependência em relação à esfera
federal. No caso do Rio Grande do Sul, foi um período de importantes crises
econômicas, conseqüências do novo padrão de industrialização nacional instalado,
de produção de bens de consumo duráveis, alterando a vocação produtiva do centro
do país que passou a contar com os produtos primários originados no sul e nordeste
do país, cujas trocas comerciais beneficiavam o sudeste (FEE, 1983).
A nova ordem do desenvolvimento acelerado da economia brasileira, cada
vez mais dependente de financiamento internacional para custear a instalação da
infra-estrutura necessária, imprimiu um patamar de novas exigências no campo das
políticas sociais. O Plano federal SALTE, considerado “como o primeiro plano de
desenvolvimento de cunho mais globalizante” (FEE, 1983, p. 165), foi o orientador
no estado gaúcho das mudanças necessárias para atender as prioridades para o
desenvolvimentismo. Por isto, várias mudanças acontecem na política de saúde,
como se constata no Quadro 8.
68
continua
ANO
ACONTECIMENTOS
1948
Criação do Sanatório Psiquiátrico Espírita de Pelotas, no município de Pelotas.
1949
Criação do Hospital Psiquiátrico Maria Vicença da Fontoura Lopes, no município de
Rio Grande.
Início de atividades laborativas e de recreação no HPSP, por iniciativa da Assistente
Social Gelsa Correa e apoio do Dr. Mário Martins. Este trabalho deu origem ao
Serviço de Praxiterapia.
1954
Criação do Serviço Social do Departamento Estadual de Saúde, Decreto nº. 5.618.
1956
A SSMA contrata pela primeira vez uma assistente social, em Santa Maria, para
fazer a triagem das pessoas recolhidas pela Brigada Militar e encaminhar ao HPSP.
Convênio entre Estado e Ministério da Saúde - Serviço Nacional de Doenças
Mentais, recursos financeiros para a manutenção de serviços psiquiátricos de
unidades hospitalares. Decreto 1.080.
1957
Organização do Serviço de Praxiterapia no HPSP.
Criação da Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde – Lei nº. 3.602.
Criação da Secretaria do Trabalho e Habitação – Lei nº. 3.602.
1958
Convênio entre Estado e Ministério da Saúde - Serviço Nacional de Doenças
Mentais, para cooperação na construção de estabelecimentos psiquiátricos. Decreto
nº. 1.152.
Criação do Conselho Estadual de Saúde – Decreto nº. 10.390
Convênio entre Estado e Ministério da Saúde - Serviço Nacional de Doenças
Mentais, recursos financeiros para a manutenção de serviços psiquiátricos. Decreto
nº. 1.296.
Convênio entre Estado e Ministério da Saúde - Serviço Nacional de Doenças
Mentais, para o desenvolvimento dos serviços de profilaxia através da praxiterapia.
Decreto nº. 1.297.
Convênio entre Estado e Ministério da Saúde - Serviço Nacional de Doenças
Mentais, cooperação na construção, ampliação e reforma de estabelecimentos
psiquiátricos no Estado. Decreto nº. 1.386.
1959
Criação do Serviço Aberto no HPSP, ambulatório de psiquiatria.
1960
Criação da Clínica Pinel da Associação Encarnación Blaya, no município de Porto
Alegre. Privada e, até 1990, conveniada com o Inamps.
69
continuação
Quadro 8 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no RS -
Período do Desenvolvimentismo (1945 – 1964)
Fontes: GODOY, 1955; BICCA, PATRÍCIO, 1981; FEE, 1983; RECKZIEGEL, 1984; BUSNELLO,
1985; GOMES, 1985; PINÓS, 1993; SOARES, 1996; PICCININI, 2000; WADI, 2002; UEBEL et al,
2003.
Neste período desenvolvimentista são criadas importantes organizações
como a Secretaria de Negócios da Saúde, em 1958, a exemplo do Ministério da
Saúde, em 1953; o Conselho Estadual de Saúde
47
e a Escola de Saúde Pública,
bem como um novo Código Estadual de Saúde, com ênfase na orientação e
fiscalização dos serviços do setor, adequando os procedimentos do Código de 1938
à realidade socioeconômica da época dos anos 1960.
O setor saúde passou a ter maior estrutura para fazer frente ao desafio de
melhorar as condições sanitárias, necessárias para colaborar no desenvolvimento
estadual e, por conseguinte, nacional. Destaca-se a atualização e continuidade da
assistência social no setor sanitário, com a criação do Serviço Social no então
Departamento da Saúde, em 1954. Interessante notar a influência da profissão de
Serviço Social, institucionalizada no estado desde a criação da primeira Escola, em
1945.
47
O Conselho Estadual era um órgão consultivo e de planejamento, formado por técnicos da
Secretaria e por corporações profissionais médicos sanitaristas, psiquiatra e puericultor; assistente
social; engenheiro e odontólogo (FEE, 1983, p. 257).
Criação da Divisão Melanie Klein - DMK, com a instalação de duas enfermarias com
um total de 60 leitos passou a servir de sede do Curso de Especialização em
psiquiatria (David Zimmermann e Paulo Luis Vianna Guedes). Inovações no
atendimento, como a proibição da insulinoterapia, controle do eletroconvulsoterapia
e permissão de visitas durante 24 horas.
1961
Abertura de crédito especial para o Hospital São Pedro. Decreto nº. 12.362.
Criação do Código Estadual de Saúde Lei nº. 1.934. Ênfase na política sanitária,
orientador e fiscalizador dos serviços do setor, adequando os procedimentos do
Código de 1938 à realidade socioeconômica da época dos anos 60. A higiene
mental e a assistência psiquiátrica mereceram capítulo especial, pois as psicoses
passaram a ter notificação obrigatória.
1962
Criação da Escola de Saúde Pública – Decreto nº. 13.812.
70
A área de saúde mental teve um expressivo desenvolvimento, tanto por ações
realizadas no HPSP como na política setorial. A higiene mental e a assistência
psiquiátrica mereceram capítulo especial no Código Estadual de Saúde, pois as
psicoses passaram a ter notificação obrigatória. Vários convênios foram firmados
entre o Ministério da Saúde e a Secretaria estadual visando o incremento de
construção e reformas em hospitais psiquiátricos para atividades terapêuticas,
iniciativa que revela uma política de expansão de estabelecimentos especializados,
tanto que no setor privado são construídos três novos hospitais psiquiátricos.
Este período foi um marco na proliferação de novos referenciais teóricos no
âmbito terapêutico, com vários psiquiatras realizando intercâmbios internacionais e
se inspirando na psicanálise
48
, ambientoterapia
49
e formação multiprofissional na
forma de residência
50
. A possibilidade terapêutica através do trabalho e da
expressão artística
51
também foi desenvolvida neste período, constituindo-se, desde
então, como dispositivos terapêuticos relevantes.
Os novos referenciais imprimiram mudanças qualitativas no atendimento
prestado no HPSP, como a criação de ambientes para a realização de atividades
laborativas, por iniciativa de assistentes sociais (BICCA; PATRÍCIO, 1981), que foi
desenvolvendo-se ao longo do tempo até se constituir num setor forte de reabilitação
para os internos no hospital. Outro destaque é a organização do atendimento
ambulatorial articulado à unidade de internação (Divisão Melanie Klein) com
inovações no atendimento terapêutico, como a proibição da insulinoterapia, controle
do eletroconvulsoterapia e permissão de visitas aos internados durante 24 horas.
48
Mário Martins, Celestino Prunes, David Zimmermann e Paulo Guedes são os psiquiatras pioneiros
na introdução da psicanálise no RS. Os dois últimos criaram o 1º Curso de Especialização em
Psiquiatria no HPSP, em 1957, que originou posteriormente o Centro Psiquiátrico Melanie Klein
(GOMES, 2006).
49
O psiquiatra Marcelo Blaya Perez criou a Clínica Pinel, em 1960, e introduziu vários dispositivos
terapêuticos como o grupo operativo, a terapia ocupacional, o trabalho em equipe, que valorizou os
assistentes sociais e psicólogos, e a primeira residência em psiquiatria no Brasil (GOMES, 2006;
PICCININI, 2000).
50
Residência consiste numa formação de especialista através de treinamento em serviço de atenção
à saúde.
51
Esta iniciativa é creditada à psiquiatra alagoana Nise da Silveira (1926-1999) que revolucionou os
métodos de atendimento ao portador de transtornos mentais no Brasil, criando uma oficina de
terapêutica ocupacional para pacientes psiquiátricos, em 1946 no antigo Centro Psiquiátrico Nacional,
para, principalmente os esquizofrênicos, que geralmente eram isolados e considerados como
incompreensíveis. Seu trabalho teve repercussão internacional, e as obras dos seus internos hoje
constituem o Museu do Inconsciente, criado em 1952, no Rio de Janeiro, no Instituto Municipal Nise
da Silveira.
71
Contudo, a lógica de recolhimento de doentes mentais no HPSP continuava
presente, com medidas institucionais do governo para agilizar o encaminhamento
destes para a internação hospitalar.
Somente no período histórico posterior, quando o país esteve sob o controle
das forças militares, o estado gaúcho toma iniciativas para ampliar de forma mais
consistente a política de atenção à saúde mental, à lógica ambulatorial e à adoção
de medidas concretas para reduzir a superlotação do HPSP
52
. Uma destas ações
estatais foi a aprovação, em 1964, de um Decreto para a criação de Ambulatórios
em Saúde Mental em dezoito (18) municípios, seguindo uma lógica de
regionalização e densidade demográfica (RIO GRANDE DO SUL, 1964). Esta
iniciativa estimulou a criação de um conjunto de ambulatórios no estado, tanto no
âmbito estatal como no privado, que por muito tempo se constituíram como um
modo de atendimento associado ao tratamento hospitalar.
A outra medida foi o programa de setorização no HPSP (1973), quando os
seus internos foram agrupados conforme sua região no estado, substituindo o
critério adotado até então de distribuição dos pacientes em unidades de atendimento
por diagnóstico psiquiátrico. Esta medida foi associada ao programa de treinamento
de médicos generalistas do interior do estado, denominado de programa de
interiorização, visando prepará-los ao atendimento de pessoas com transtorno
mental (FARIA, 1981). Também se realizaram capacitações para os demais
profissionais do estado para identificação de pessoas com transtornos mentais e
propiciar o atendimento das crises agudas, dos egressos dos hospitais e daqueles
com indicação de internação por ação policial.
A articulação deste conjunto de ações estava orientada pelo objetivo de
reduzir o número de internos no HPSP, investindo na possibilidade de alta hospitalar
e valorização da continuidade do atendimento de forma ambulatorial na cidade de
origem do paciente. A estratégia foi a de integrar as ações das equipes de saúde
das regionais da Secretaria da Saúde com as das unidades de internação no HPSP,
de modo a facilitar a localização dos familiares e/ou responsáveis pelos pacientes
institucionalizados e propiciar o retorno destes na ocasião de alta.
52
Em 1965 o HPSP tinha 4.297 pacientes internados numa área física com capacidade real para
menos de 1.000 leitos.
72
Esta política constituiu-se num processo de desospitalização, proposta que
começa a ser construída neste período, tanto no âmbito do governo federal como
por organismos internacionais, quando os setores envolvidos com a saúde mental
fazem avaliações do custo e da baixa resolutividade dos grandes hospitais
psiquiátricos, indicando sua gradativa desmontagem e a constituição de hospitais
especializados para, em conjunto com serviços ambulatoriais, comporem a política
de atendimento. No caso, se está referindo à Campanha Nacional de Saúde Mental
(BRASIL, 1968) e à orientação técnica do Comitê de Especialistas da OMS em 1974
(FARIA, 1981).
A ação ordenada implantada também contempla a ferramenta do
planejamento em saúde, entendida como um procedimento técnico indispensável
para viabilizar a otimização de recursos e uma previsão de estratégias de
enfrentamento de determinados aspectos constitutivos da gestão na política social,
adotada no Brasil a partir da Carta de Punta del Este, em 1961
53
. Esta perspectiva
fica explicitada na exposição do Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria,
em artigo apresentado na 20ª Reunião Anual da Federação Mundial de Saúde
Mental, em 1967 em Lima, no Peru.
Conquanto se reconheça que o planejamento e a organização de
um serviço de saúde mental não podem, nos dias atuais, limitar-se a
simples construção de hospitais psiquiátricos, estes constituem um dos
elementos mais importantes da complexa estrutura que hoje se exige na
defesa do psiquismo [...]. A situação dos hospitais de assistência
psiquiátrica na América Latina é extremamente difícil, pela superlotação,
pela deficiência de recursos, pela precariedade dos serviços extra-
hospitalares [...] (SILVA, 1968, p. 29).
As medidas de desospitalização do HPSP foram resultados concretos de uma
importante organização estatal da política de saúde mental na época, pois pela
primeira vez foi formada uma instância responsável pelo planejamento e gestão das
ações na área. Em 1972 é criada a Equipe Central de Saúde Mental na Secretaria
de Saúde, que dirigiu um conjunto de ações significativas na condução de mudanças
requeridas, considerando que pela primeira vez o programa de saúde mental é
incluído entre as prioridades de governo na área da saúde (FARIA, 1981). Desta
forma, o programa de setorização e de qualificação de profissionais, na lógica da
53
Ver o item 2.1 neste capítulo.
73
regionalização, resultou na gradativa diminuição de pacientes internados no HPSP,
que no final do período do regime militar contava com 1.915 pacientes internados.
A sistematização dos acontecimentos mais relevantes na política de saúde
mental no Rio Grande do Sul durante o regime militar está contida no Quadro 9.
74
ANO ACONTECIMENTOS
1964 Criação de Ambulatórios de Saúde Mental, através do Decreto nº. 16.722, em 07/08.
São apontados 18 municípios, seguindo uma lógica de regionalização, para
constituírem ambulatórios.
1966 Adotado no HPSP o Plano de Reabilitação de Crônicos
1968 Curso de Especialização de Serviço Social Psiquiátrico, realizado pelo Curso de
Serviço Social da PUC RS em convênio com a Divisão Melanie Kleinº. A Clínica
Pinel inicia os Cursos de Especialização em Psiquiatria, abertos também para
assistentes sociais.
1969 Criação da FEBEM, extinguindo o Serviço Social de menores – SESME.
1970 Serviço de Saúde Mental Melanie Klein no HPSP, substituindo o antigo Serviço
Aberto. Delimitação territorial ao bairro Partenon para o atendimento ambulatorial.
1971 Convênio entre SSMA e UFRGS que transforma a DMK no Centro Psiquiátrico
Melanie Klein, visando a realização de um programa Comunitário para moradores
do bairro Partenon e para aluno e funcionários da UFRGS.
Lei nº. 6.503, que dispõe sobre a promoção, proteção e recuperação da Saúde
Pública. No Título III, da Promoção e Recuperação da Saúde, consta o Capítulo II,
da Assistência Social e Psiquiátrica.
Criação da Equipe Central de Saúde Mental da Secretaria de Saúde e Meio
Ambiente – SSMA, dirigida pelo Dr. Fernando Guedes até o ano de 1977.
Criação do programa Centro Agrícola de Reabilitação CAR, no Hospital Colônia
Itapoã, com a transferência de pacientes do HPSP.
1972
Criação da Clínica Psiquiátrica Prof. Paulo Guedes, no município de Caxias do Sul.
Privada e contratada com o sistema público de saúde.
Programa de Setorização no HPSP e Programa de Interiorização da saúde mental
no RS. Pela primeira vez o Programa de Saúde Mental é incluído entre as
prioridades da SSMA.
1973
Criação do Ambulatório Central de Psiquiatria (Central de Psiquiatria) - Capital e
interior - Emergência – triagem – ambulatório.
Decreto nº. 23.430, aprova o Regulamento que dispões sobre a promoção, proteção
e recuperação da Saúde Pública. No Título III, da Promoção e Recuperação da
Saúde, consta o Capítulo II, da Assistência Social e Psiquiátrica.
1974
Criação da ABCAL Associação Brasileira de Combate ao Alcoolismo
ambulatório - Capital e interior.
DMK cria o Setor de Crianças – atendimento hospitalar e ambulatorial. 1975
Clínica Psiquiátrica Santa Tecla, no município de Canoas – privada.
Quadro 9 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no RS -
Período do Regime Militar (1964 – 1985)
FONTES: BICCA, PATRÍCIO, 1981; FEE, 1983; RECKZIEGEL, 1984; BUSNELLO, 1985; GOMES,
1985; PINÓS, 1993; SOARES, 1996; PICCININI, 2000; WADI, 2002; UEBEL et al, 2003.
75
O HPSP seguiu no seu processo de mudanças, com destaque às medidas de
organização do atendimento da população institucionalizada, que consistia o seu
grande desafio, criando um plano de reabilitação para estes pacientes em 1966, que
posteriormente é incluído no Plano Diretor do hospital (1978). Este programa de
reabilitação foi uma iniciativa do setor de Serviço Social da instituição, que atuava de
forma propositiva e tinha legitimidade profissional para desencadear mudanças.
Não é coincidência que neste mesmo período analisado inicia-se a
especialização de Serviço Social em psiquiatria (1968), através de curso organizado
pela Faculdade de Serviço Social da PUC em convênio com a Divisão Melanie Klein
(RECKZIEGEL, 1984). A formação dos assistentes sociais vinha valorizando a
área psiquiátrica desde a Faculdade de Serviço Social com a professora Lúcia
Castillo, primeira assistente social a assumir o cargo em 1957, após sua experiência
nos Estados Unidos quando “[...] trouxera os fundamentos modernos da linha
psiquiátrica do serviço social” (KRUG et al, 1983, p. 100).
A perspectiva terapêutica da reabilitação gerou também a criação do Centro
Agrícola de Reabilitação da Colônia Itapoã - CAR
54
, no Hospital Colônia Itapõa
localizado em Viamão, iniciado em 1972 sob a coordenação da saúde mental da
Secretaria da Saúde, que deste modo tinha mais uma estratégia de enfrentamento
da superlotação no HPSP.
A Divisão Melanie Klein do HPSP passa a ser um centro de formação em
psiquiatria e de desenvolvimento da psiquiatria comunitária, a partir de convênio
entre a SSMS e a UFRGS, reafirmando sua vocação de atendimento ambulatorial,
mas agora na lógica de regionalização, pois seu âmbito de atuação se dirige aos
moradores do bairro Partenon, espaço geográfico de localização do HPSP.
Posteriormente, inicia o atendimento ao blico infantil, nas modalidades de
ambulatório e internação psiquiátrica.
O caráter comunitário no modo de atenção em saúde foi uma marca deste
período, com o pioneirismo do programa Sistema de Saúde Comunitária Murialdo,
instalado na região leste da capital, realizado pela Secretaria da Saúde com a
54
O CAR recebeu do HPSP pacientes masculinos com histórico de vida rural, para a partir de
atividades de caráter agrícola e pecuária, terem uma possibilidade de reabilitação. Para maior
conhecimento sobre a origem e seus primeiros dez anos de existência, ver Castellarin (1985).
76
cooperação técnica da Fundação SESP
55
, adotando a metodologia de integração
entre ações de prevenção, curativa e de reabilitação, associadas ao ensino e
pesquisa, modelo de saúde que começa a se consolidar (WITT, 2005, p. 96). Outra
conseqüência desta iniciativa foi a criação do programa de Residência em Medicina
Geral Comunitária no atual Centro de Saúde Escola Murialdo, quando inicia em
1976 exclusivamente para médicos e no ano seguinte amplia a formação para o
caráter multiprofissional, com o ingresso de assistentes sociais, enfermeiros e
médicos veterinários (UEBEL et al, 2003), sob a coordenação do Dr. Ellis Busnello.
No âmbito da política de saúde estadual foi sancionada a Lei nº. 6.503 em
1972, e dois anos depois o Decreto que a regulamenta, instituindo o novo código
sanitário. Constata-se que a gica de associar assistência social e psiquiatria
continua presente, pois no Título III, da Promoção e Recuperação da Saúde, consta
o Capítulo II, da Assistência Social e Psiquiátrica (RIO GRANDE DO SUL, 1999).
As finalidades indicadas são, entre outras, desenvolver programas de
prevenção da doença mental e prover assistência e proteção aos doentes mentais, e
os primeiros aspectos a serem definidos são os relativos à possibilidade de realizar
convênios com instituições psiquiátricas privadas e de “estimular a criação e
organização de instituições públicas ou privadas para a assistência psiquiátrica e
social ao doente mental e sua família”, conforme estabelece o artigo 769 do referido
Decreto. Na Secção que trata dos Serviços de Assistência Psiquiátrica, são
relacionados uma variedade de tipos de atendimento possíveis para o atendimento
em psiquiatria, pois na época, o nome da especialidade médica correspondia à
política de saúde mental.
O consolidado na Lei e Decreto do Código Sanitário refletia o momento
histórico de forte investimento no setor de saúde mental, considerando que a oferta
de serviços de saúde, financiados pela previdência social, foi uma relevante
estratégia de relação entre o governo militar, através de seus representantes no solo
gaúcho, e a sociedade.
55
Ver item 2.1 neste capítulo.
77
O Prev-Saúde
56
, que pretendeu racionalizar o sistema de saúde brasileiro
através do incremento de serviços básicos de saúde gerou um convênio entre a
SSMA e o Inamps (1980), com o propósito de criação do Plano Conjunto de Saúde
Mental para o Estado do RS e Norma Técnica para a Saúde Mental. O Inamps
estava com restrições orçamentárias para ampliar a contratação de novos leitos e
manter os existentes, precisando contar com o atendimento ambulatorial no
estado gaúcho. A SSMA tinha, ainda que de forma precária, um conjunto de serviços
básicos de saúde distribuídos nos municípios. Deste modo, o convênio estabeleceu
uma parceria em que os órgãos uniriam meios e recursos para a implantação de
equipes especializadas em todas as regiões sanitárias do estado; ampliação da
oferta de leitos no interior e programar o HPSP para atender até 500 pacientes (RIO
GRANDE DO SUL, 1981), e se destaca que foi o primeiro plano de âmbito estadual
para a saúde mental elaborado pelo governo estadual em parceria com o federal.
Neste cenário de incremento público de serviços básicos de saúde, com o
apoio da OMS, um grupo de pesquisadores e profissionais de saúde mental,
liderados pelo Dr. Ellis Busnello, elaboram o Manual de Treinamento em Cuidados
Primários de Saúde Mental, em abril de 1981, que foi adotado como guia técnico
para o atendimento ambulatorial na rede básica de saúde (RIO GRANDE DO SUL,
1981). Certamente foi uma iniciativa pioneira para o ingresso de ações de saúde
mental neste âmbito dos cuidados à saúde.
Neste período, o fenômeno da superlotação continuava no HPSP, e as
características e condições de sua população institucionalizada eram as seguintes:
61,7% dos pacientes na faixa etária mais produtiva, de 25 a 55 anos de idade;
63,7% sem necessidade de internação; 73,4% sem vínculo previdenciário; 55,5%
eram mulheres; 42,3% com mais de 10 anos de internação, e 39% deles sem família
localizada, entre estes, 47% sem necessidade de internação (SILVA et al, 1982), ou
seja, o retrato da exclusão e segregação, reforçando a função social dos hospitais
psiquiátricos. E, como “[...] todos sabemos, o sistema sócio-econômico determina as
modalidades de tratamento em diferentes níveis. No momento brasileiro atual, a
estes pacientes de nível sócio-econômico baixo a sociedade reserva a
modalidade asilo” (CONTEL, 1981, p. 187).
56
Criado em 1980. Ver item 2.1 deste capítulo.
78
No ano de 1982 o plano Conasp
57
organiza a assistência médica-
previdenciária, na tentativa de obter sucesso após o fracasso do Prev-Saúde, tendo
como eixo a integração da esfera federal e estadual, continuando na ênfase de
ampliação da rede ambulatorial. Esta integração foi operacionalizada através da
criação do Conselho Técnico-Administrativo do Convênio de co-gestão entre SSMA
e Inamps. As alternativas elaboradas pelo Conselho, em 1982 foram:
[...] alocação de pacientes em leitos contratados em regiões determinadas
do Estado, seja em asilos, casas de saúde, hospitais-gerais e pensões
protegidas; transferência da população residente do HPSP para o Hospital
Colônia Itapuã, estabelecendo-se um asilo específico auto-extinguível;
criação dentro da estrutura do HPSP de um local para estabelecer a
hospedagem definitiva dos atuais moradores, diferenciados da população
definida como objetivo do Hospital, auto-extinguível e fechada para novos
casos; encaminhamento às famílias conhecidas, interessadas ou
desinteressadas, após sua localização e preparo dos pacientes; manter a
atual estrutura (BUSNELLO, 1985, p. 191-192).
O convênio definiu como área de abrangência do HPSP a região
metropolitana de Porto Alegre, portanto não mais todo o estado, para a prestação de
assistência à saúde mental daqueles pacientes que não apresentam condições para
serem manejados em nível extra-hospitalar.
Constata-se que o conjunto de definições postas a partir da integração entre
a SSMA e o Inamps traz mudanças significativas na área de saúde mental.
Primeiramente, a sua denominação como tal, e não mais centrada na especialidade
médica; segundo, o esforço de colocar o HPSP como integrante de uma política
pública, relacionando e articulando medidas para todo o estado com as necessárias
mudanças no hospital.
As estratégias para enfrentar as demandas da saúde mental continuam na
próxima gestão, quando o Programa de Governo de Jair Soares (1983-1987) fez
uma análise da situação da saúde no estado, concluindo que,
[...] melhoraram os indicadores de mortalidade infantil e morbi-mortalidade
por doenças transmissíveis, entre outros, ao mesmo tempo [...] em que
cresceram os problemas de saúde mental. [...] A situação da saúde da
população, hoje, pode ser caracterizada como intermediária entre a das
regiões desenvolvidas e a daquelas em desenvolvimento (RIO GRANDE
DO SUL, 1983, p. 147).
57
Ver item 2.1 neste capítulo.
79
Para tanto, o governo estabeleceu vários objetivos, entre eles a instalação de
novos ambulatórios de saúde mental na capital e interior do estado, e a adoção de
“ações preventivas e o tratamento das doenças não transmissíveis, especialmente
quanto à saúde mental, as doenças cardiovasculares e o câncer” (RIO GRANDE DO
SUL, 1983, p. 149).
A gestão do HPSP inovou em aspectos significativos, principalmente na
valorização das demais áreas de conhecimento e respectivas profissões, na
valorização à qualificação profissional, uma diretriz estabelecida no plano de co-
gestão, criou, em 1984, um programa de residência em psiquiatria e especialização
multiprofissional em saúde mental, programas que continuam até hoje. O período
seguinte, o da Nova República é um marco na trajetória histórica do país e do
estado, com acontecimentos mais relevantes sistematizados no Quadro 10.
80
Quadro 10 - Síntese da Constituição da Política de Saúde e Saúde Mental no RS -
Período da Nova República
Fontes: BRASIL, 1987a; RUSCHEL, PECCIN, 1990; QUINTO NETO, 1992; PIÑOS, 1993; HIRDES,
KANTORSKI, 2003; FAGUNDES, 2006.
Um destaque importante da gestão do HPSP no período de 1983 a 1987 foi a
democratização interna da instituição; pela primeira vez, os setores profissionais e
as unidades de internação elegem suas chefias, e os profissionais assistentes
sociais, enfermeiros e psicólogos puderam assumir estes postos, marcando a
ANO ACONTECIMENTOS
1985 Criação do Ambulatório de Psiquiatria na Santa Casa de Misericórdia – Fffcmpa.
Proposta para uma política de atendimento ao doente mental para o Estado do
Rio Grande do Sul, elaborada pela equipe de psiquiatria do Inamps.
1986
HPSP - Transferência da sede do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal
da UFRGS para o HCPA. O atendimento de internação hospitalar passa a ser de
responsabilidade da SSMA, integrado ao Serviço de Saúde Mental Melanie Klein.
Convênio para a constituição do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
no Estado do Rio Grande do Sul, celebrado entre o MPAS Inamps; MS
Superintendência de Campanhas de Saúde Pública; MEC; SSMA.
Resolução CES nº. 03: inclusão de leitos psiquiátricos nos novos contratos e
convênios da SES com hospitais gerais; ênfase à saúde mental nos projetos de
municipalização.
I Encontro Estadual de Saúde Mental, com 280 participantes, preparatório da I
Conferência Nacional de Saúde Mental.
1987
HPSP adota dois programas de atendimento: do Usuário Recém Admitido e do
Usuário Psicossocialmente Institucionalizado, dividindo o hospital em área
hospitalar e área residencial ou de moradia.
1º Curso de Aperfeiçoamento em Administração em Serviços de Saúde Mental,
em Porto Alegre.
Criação do Centro Comunitário de Saúde Mental Nossa Casa, São Lourenço do
Sul, primeiro serviço de saúde mental substitutivo no Rio Grande do Sul.
II Encontro Estadual de Saúde Mental, com 320 participantes.
1988
I Simpósio Internacional de Saúde Mental Comunitária SISMEC - repensando a
saúde mental, em Santa Maria, UFSM, que contou com 750 participantes vindos
do Brasil, Uruguai e Argentina.
Promulgada a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul.
III Encontro Estadual de Saúde Mental no HPSP, dele participaram 850 pessoas.
Entre os convidados, estiveram os coordenadores nacionais de saúde mental do
Brasil, da Argentina e do Uruguai.
1989
Curso de Aperfeiçoamento em Administração em Serviços de Saúde Mental,
em Santa Maria.
81
ruptura com a autoridade exclusiva da medicina na instituição. Esta posição
democrática e de qualificação na atenção foi expressa no discurso de posse do
então diretor: “Tentaremos dar ao hospital uma total e democrática reestruturação da
organização cnica, administrativa, de planejamento, ensino e pesquisa”
(BUSNELLO, 1983).
Durante esta gestão estadual o país viveu um importante processo de
mudança no campo político, com o fim do regime militar e a instauração do regime
democrático, com eleição indireta para presidente da república, apesar de toda a
mobilização pelas Diretas-Já. Este ambiente de retorno à democracia propicia as
mudanças assinaladas no HPSP, que continua com o desafio de ofertar uma
atenção mais qualificada e fazer parte de um sistema estadual de saúde mental.
O ano de 1987 é um marco no setor da saúde, com a implantação do Sistema
Unificado e Descentralizado de Saúde - SUDS
58
no Estado do Rio Grande do Sul,
com a assinatura do Convênio celebrado entre o Mpas Inamps; MS
Superintendência de Campanhas de Saúde Pública; MEC; SSMA, com o objetivo de
“aperfeiçoamento da estratégia das Ações Integradas de Saúde, visando contribuir
para o avanço do processo de Reforma Sanitária” (BRASIL, 1987a). As diretrizes
assumidas pelo convênio estavam alicerçadas nos princípios constituídos pela
Reforma Sanitária, como universalização, integralidade, regionalização e
descentralização das ações de saúde. No âmbito das estruturas, definiu um conjunto
de alterações no Inamps e na SSMA, fundindo e atribuindo novas funções a setores
de ambos.
No aspecto da coordenação do SUDS gaúcho foi estabelecida a “forma
colegiada através do Conselho Estadual de Saúde (CES) que terá caráter
deliberativo no estabelecimento, acompanhamento e avaliação da Política Estadual
de Saúde, adotando-se a co-gestão como forma de relacionamento entre as partes
convenentes e como forma de financiamento do sistema” (BRASIL, 1987a, p. 11). O
CES foi formado por representantes do governo federal e estadual e da sociedade
civil de forma paritária com dezesseis (16) membros para cada segmento. No da
sociedade civil foram indicados três sindicatos, entidade ambientalista, associações
58
Ver item 2.2 deste capítulo.
82
de bairro, de aposentados, pastoral da saúde, representando a Igreja Católica e
prestadores de serviços privados e filantrópicos.
A gestão do SUDS ficou a cargo do Superintendente Regional do Inamps e do
Secretário de Saúde, integrantes da Comissão interinstitucional de Saúde (CIS), e
para a realização do processo de municipalização da saúde, a ação estratégica
prioritária do SUDS, cada município ficou com a incumbência de criar sua Comissão
Interinstitucional Municipal da Saúde (CIMS), com a tarefa de avaliar a acompanhar
a política municipal de saúde e o plano de municipalização, a ser aprovado pela CIS.
De imediato, o SUDS municipalizou a gestão da saúde em 23 municípios e
traçou como meta atingir um total de 150 dos 244 municípios
59
existentes no estado;
outra repercussão foi o descontentamento dos profissionais de saúde, que não
foram contemplados com representação no CES, que no segmento sociedade civil
contou com representantes de usuários do sistema de saúde e com prestadores de
serviços (FIOCRUZ, 1988). Esta reivindicação acompanhou todo o debate do
movimento da reforma sanitária pela instalação da nova Constituição, que alterou
significativamente a participação dos segmentos nos conselhos de saúde
60
.
A composição política constituída no governo Pedro Simon (1987-1990) criou
as condições para a formação de uma política de saúde mental orientada pelos
princípios da reforma sanitária: universalização, participação, integralidade,
descentralização sob a perspectiva da saúde coletiva. A gestão teve a marca de
assumir politicamente a defesa dos preceitos da reforma psiquiátrica, numa crítica
ao modelo hospitalocêntrico e manicomial adotado até então. As estratégias na
condução da política de saúde mental foram de redistribuição do poder, resgate da
cidadania do doente mental e socialização do saber (RIO GRANDE DO SUL,
1987a). Esta nova perspectiva de conduzir e pensar a saúde mental no estado
59
O Rio Grande do Sul tinha 8.536.123 habitantes, destes 67,5% residentes na área urbana e 32,5%
na rural.
60
A partir da Constituição Federal de 1988 e da Lei Orgânica da Saúde, nº. 8.142, 1990, os
conselhos de saúde tiveram sua composição formada paritariamente entre usuários (50%) e governo,
profissionais de saúde e prestadores de serviço.
83
marcou significativamente a história do setor
61
, imprimindo um debate participativo,
com a estratégia principal da formação e qualificação profissional (Quadro 10).
No âmbito da gestão, uma ação articulada com o Departamento das Ações de
Saúde (SSMA) e o CES produziram a aprovação da Resolução CES/RS nº. 03,
estabelecendo a inclusão de leitos psiquiátricos nos novos contratos e convênios da
SES com hospitais gerais e a ênfase à saúde mental a ser contemplada nos projetos
de municipalização (RIO GRANDE DO SUL, 1987 b). No início do período existiam
27 municípios com atendimento em saúde mental, e em julho de 1990, o estado
tinha 333 municípios, e destes, 101 com ações/serviços de atenção ao portador de
transtorno mental (RIO GRANDE DO SUL, 1990a).
No HPSP houve uma nova organização na assistência com a criação dos
programas do Usuário Recém Admitido e do Usuário Psicossocialmente
Institucionalizado, dividindo o hospital em área hospitalar e área residencial ou de
moradia. A partir de então, esforços começaram a ser realizados para extinguir a
função asilar assistencial da instituição, a adoção de tempo médio de tratamento
hospitalar e de critérios de internação, composição de equipe multidisciplinar nas
unidades de atendimento e abordagens terapêuticas e sociais para uma atenção
individualizada e comunitária aos moradores (RIO GRANDE DO SUL, 1990b).
Com a segunda direção do HPSP na mesma gestão estadual, instala-se o
movimento pela transformação da instituição, que torna-se pública durante a
realização da VII Semana de Estudos com o tema Por uma Sociedade sem
Manicômios, com a divulgação dos Direitos dos doentes mentais e expressivas
manifestações na sociedade local, com ampla repercussão pela mídia da época e
adesão de forças políticas gaúchas.
Para finalizar a sistematização e discussão sobre a saúde e saúde mental no
Rio Grande do Sul, é relevante apresentar como foi o comportamento do gasto no
setor na década de 1980, que vai revelar o inexpressivo investimento público no
setor. O estudo realizado por Rabelo (1994) sobre as despesas executadas pela
Administração Direta estadual no setor saúde na década de 1980, detectou a
61
Ver Fagundes (2006), que apresenta detalhadamente o processo democrático e produtor de novos
saberes na saúde mental no período.
84
gradativa redução
62
no programa de saúde, que corresponde ao “conjunto de ações
desenvolvidas no sentido de promoção, proteção, recuperação e reabilitação da
saúde” (RABELO, 1994, p. 229).
Este programa englobava as despesas principais, entre outras, nas atividades
de: a) assistência médico-sanitária em geral, para manutenção das unidades de
saúde; b) assistência hospitalar e c) ações de saúde, através de convênios e
contratos. A atividade assistência hospitalar correspondia à manutenção e reforma
dos hospitais próprios do estado, no caso o HPSP, Colônia Itapoã, Sanatório
Partenon e dois hospitais em Alvorada e Cachoeirinha, administrados através de
uma Fundação, para quem o estado repassa verbas. No ano de 1989 foram
realizadas reformas no HPSP, o que consumiu 15% das despesas estaduais no
referido programa.
Outra constatação importante e que revela o impacto da estadualização da
saúde através do SUDS, é que no período de 1980 até 1988 a atividade assistência
médico-sanitária em geral absorveu em torno de 50% do Programa Saúde,
reduzindo nos anos 1989 e 1990 a 6,96% e 12,20% respectivamente, por conta do
aporte de recursos federais no custeio das despesas no Programa (RABELO, 1994).
O período estudado revelou mudanças significativas na gestão do sistema de
saúde, com a instalação da descentralização do âmbito federal para o estadual, e o
parco financiamento público na manutenção dos serviços prestados à população,
dificultando sua ampliação e conseqüente qualidade, num setor fundamental para a
reprodução das condições de vida dos sujeitos. Ao mesmo tempo, foi uma época
revolucionária quanto à mudança de concepção sobre a forma da atenção na saúde
mental, gravando a passagem para uma nova perspectiva pautada na noção de
cidadania dos portadores de transtorno mental.
Esta concepção será consolidada e combatida a partir da década de 1990,
debate do próximo capítulo, que vai analisar aquele ambiente de profundas
transformações no campo econômico e conseqüente impacto no político e social,
com a adoção dos ajustes estruturais e alterações no papel do Estado brasileiro.
62
No ano de 1976 a despesa foi 2,82 %; no ano de 1980, foi de 2,20% e em 1990, de 1,72%.
3 AS REPERCUSSÕES DOS AJUSTES ESTRUTURAIS NAS REFORMAS
SANITÁRIA E PSIQUIÁTRICA
A cada de 1990 está gravada na história brasileira como marco de
mudanças significativas na sua trajetória econômica, política e social. Os fatores
desencadeantes das mudanças foram tanto internos como externos. Mudanças
estas que vão alterar os conceitos sobre direitos e sobre os rumos da política de
saúde e de saúde mental, aspectos que aqui serão analisados na perspectiva crítica
e histórica. Inicialmente se situará brevemente as alterações ocorridas no sistema
capitalista e no Estado nos países centrais, para se compreender sua influência nos
países periféricos, como é o caso do Brasil.
3.1 AS REFORMAS NO CONTEXTO DO AJUSTE ESTRUTURAL DO ESTADO E
OS IMPACTOS NA POLÍTICA DE SAÚDE
O mundo no período do pós-segunda guerra mundial passou por profundas
mudanças, com o reordenamento das forças políticas e econômicas produzidas pelo
conflito bélico, com as alterações no processo de produção no capitalismo, criando o
ambiente para a adoção das teorias de Keynes, que credita ao Estado o papel de
interventor na economia e na produção da proteção social.
A produção e o consumo em massa foram as estratégias adotadas neste
período de crescimento econômico, com a expansão do modelo fordista de
produção industrial. Este modelo baseou-se em inovações tecnológicas e
organizacionais calcadas na produção a partir de ciclos operatórios curtos,
segmentados e em fluxo contínuo e progressivo, de modo a obter uma grande
produção no menor tempo possível, associado a uma política de recompensa ao
operário pela obtenção de um salário mais elevado (LARANJEIRA, 1997). O
fordismo foi um aliado da teoria econômica de Keynes, tendo formado a base do
longo período de expansão pós-guerra nos países com capitalismo avançado,
quando os padrões de vida se elevaram e o consumo e a democracia de massa
foram expandidas e preservadas (HARVEY, 1993; HOBSBAWM, 1995).
86
A intervenção estatal na política econômica construiu as condições de conter
a retração do mercado e possibilitar sua expansão, e, no campo das políticas sociais
a adoção de mecanismos de proteção social tanto aos trabalhadores como aos
segmentos populacionais à margem do processo produtivo, possibilitou a ampliação
da cidadania. Nesta particularidade é que os direitos sociais passam a se constituir
como um princípio valorativo, atingindo este patamar em decorrência da tensão
gerada pelas reações das classes trabalhadoras à exploração gerada pelo capital,
que aviltava suas condições de vida.
O Estado de Bem Estar Social consagrou os direitos sociais ao
desvinculá-los da relação contratual feita pelos assalariados e estendê-los a
todos os cidadãos. Assim, os direitos sociais incorporam-se plenamente à
condição de cidadania, na medida em que a sociedade reconheceu a
necessidade do Estado fornecer as condições mínimas de sobrevivência a
todos os cidadãos (TEIXEIRA, 1986, p. 98).
O Estado de Bem Estar Social foi um fator propiciador do desenvolvimento
econômico e social nos países centrais, com uma sustentação significativa de
proteção social, período reconhecido como dos anos dourados (HOBSBAWM,
1995). Mas chegou a década de 1970 em que “o mundo capitalista avançado caiu
numa longa e profunda recessão, combinando, pela primeira vez, baixas taxas de
crescimento com altas taxas de inflação” (ANDERSON, 1995, p. 10). O fenômeno da
inflação foi decorrente da política monetária adotada para manter a economia
estável, num cenário de retração de investimentos e forte pressão da classe
trabalhadora para a manutenção e criação de programas de seguridade social. O
aumento dos déficits públicos gerados pelo gasto social “resultou em desequilíbrio
nos balanços de pagamento, inflação e medíocres taxas de crescimento” (DUPAS,
1999, p. 226).
Este cenário de alta da inflação, baixas taxas de crescimento e o aumento da
dívida pública produziram crises estruturais que atingiram diferentes dimensões, e
estas serão respondidas “pelo capital com a reestruturação produtiva, a globalização
e a ofensiva neoliberal” (BEHRING, 1998, p. 187). A reestruturação produtiva
significa a alteração na produção industrial, que passa a ter a microeletrônica como
a sua base e o modo de produção deixa de ser padronizado e especializado, para
87
ser polivalente, flexível
63
, dependente da informática e da robótica, e como
conseqüência, prescindível do trabalho humano. Estas mudanças estruturais
provocaram profundas alterações nas relações sociais até então conhecidas, que
formavam uma determinada moldura de referências tanto para a vida coletiva como
para a vida privada dos homens e mulheres nas sociedades.
O fenômeno da globalização, entendido economicamente como “estágio mais
avançado da internacionalização e da integração da economia mundial capitalista“
(COUTINHO, 1996, p. 225) produziu um enfraquecimento do Estado-Nação pela sua
debilidade na capacidade de intervir na circulação de valores, agora agilizados pela
informatização, bem como a redução na sua capacidade de deliberação em virtude
dos acordos serem feitos na abrangência mundial, não mais dependente
exclusivamente das regras nacionais. A integração supranacional e a formação de
regimes transnacionais é a nova ordem do capital, pois se constituíram processos
estruturadores dos mercados financeiros, da ciência e tecnologia, meios de
comunicação, dos serviços estratégicos e redes produtivas e comerciais
(CASTELLS, 1999, OFFE, 1999). As décadas da crise, como Hobsbawm denomina
o período de 1973 a 1993, “foi a era em que os Estados nacionais perderam seus
poderes econômicos” (1995, p. 398).
A ofensiva neoliberal, como resposta às crises do capitalismo na década de
1970, consiste na retomada teórica de princípios clássicos liberais e tem como eixo
a crítica do mercado sobre as conseqüências do intervencionismo estatal dos países
centrais assumido com o Estado de Bem Estar Social
e
a sua aliança com a
democracia social, por esta prejudicar a expansão da economia. Os fundamentos da
liberdade do mercado e da desigualdade natural entre os homens foram retomados
como necessários para o pleno crescimento econômico, pois,
[...] o novo igualitarismo promovido pelo Estado de Bem Estar Social
destruía a liberdade dos cidadãos e a vitalidade da concorrência, da qual
dependia a prosperidade de todos. [...] a desigualdade era um valor positivo
- na realidade imprescindível em si
-, pois disso precisavam as sociedades
ocidentais (ANDERSON, 1995, p. 10).
63
O modelo passa a ser o da Toyota Japão: qualidade total, ilha de produção, “just in time”,
redução de estoques, integração de gerência e produção.
88
Os países desenvolvidos passaram a fazer uma série de ajustes para
enfrentar a crise, os quais incidiram nos direitos sociais conquistados pelas lutas
históricas das classes trabalhadoras, “quando o grande capital rompe o ‘pacto’ que
suportava o Welfare State, começa a ocorrer a retirada das coberturas sociais
públicas e tem-se o corte nos direitos sociais” (NETTO, 1996, p. 99). Os Estados
adotam, portanto, as orientações neoliberais que implicam numa mudança radical
nos rumos da economia e nas medidas de proteção social, pois passa a ter
prioridade “a estabilidade monetária, a contenção do orçamento, concessões fiscais
aos detentores de capital e abandono do pleno emprego” (ANDERSON, 1995, p.
13). As medidas tomadas pelos países centrais resultaram no controle inflacionário,
na contenção salarial, no enfraquecimento da organização sindical dos
trabalhadores e no aumento do desemprego.
As décadas da crise atingiram os países da América Latina com o aumento
das suas dívidas públicas, a recessão e o desemprego. Como opção para saírem
desta situação, os países desenvolvidos, seus credores, estabeleceram um
receituário para equilibrar suas contas, através do denominado Consenso de
Washington
64
. Este orientou a adoção da disciplina fiscal, abertura ao mercado
internacional, privatizações, desregulação estatal, controle da inflação e redução dos
gastos do governo na prestação de serviços sociais e em melhorias da infra-
estrutura blica em nome “da soberania absoluta do mercado auto-regulável nas
relações econômicas, tanto internas quanto externas” (BATISTA, 1994, p. 27),
provocando a redução do papel do Estado no incremento da economia e na garantia
dos direitos sociais. Pelo quadro que se instalou, Antunes (2004) denomina esta
década como a da desertificação social e política neoliberal.
As mudanças provocadas pelas orientações neoliberais originadas do
Consenso de Washington têm uma repercussão ímpar, pois se contrapõem às
experiências de Estado desenvolvimentista nos países da América Latina. Estes, por
sua vez, sequer tinham usufruído as vantagens do keynesianismo, e de forma
abrupta se vêem impelidos a encontrar respostas a sua dependência do mercado
64
Termo cunhado pelo economista inglês Willamson em 1989, para designar um conjunto de
princípios para guiar os países em desenvolvimento em uma rota de ajustes para enfrentar problemas
da dívida pública e inflação.
89
financeiro globalizado, ao desemprego e às novas exclusões sociais resultantes do
acirramento das desigualdades sociais (REIS, 2001; SOARES, 2002).
No Brasil, o último decênio do século XX vai representar um momento
histórico eivado de contradições. A conquista do direito da escolha livre de seus
governantes e a construção de um consenso mínimo sobre direitos sociais a serem
efetivados ocorreram no contexto de ajuste econômico e de reforma das estruturas
do Estado, implicando na retração do financiamento das políticas sociais e no
agravamento das históricas desigualdades sociais.
A década de 1990 expressou várias rupturas relevantes no país. No quadro
político, com o retorno do sufrágio universal retornando a democracia representativa;
na área econômica, a política de estabilização pela via da recessão para combater a
herança da inflação; a desregulamentação da economia através da liberação dos
preços dos produtos e conseqüentes privatizações e liberalização das importações,
e flexibilização das relações capital-trabalho (SOARES, 2001).
O Estado perde sua função de agente econômico produtivo, e deste modo
suas atribuições são revisadas com a adoção da denominada reforma
administrativa. Embora “[...] o ajuste estrutural permaneça entre os principais
objetivos, a ênfase deslocou-se para a reforma do Estado, particularmente para a
reforma administrativa” (BRESSER PEREIRA, 1998, p. 21). As mudanças
econômicas advindas com o Plano Real (1994) demandaram uma articulação de
reforma administrativa no Estado brasileiro, com o objetivo de ser mais competitiva a
inserção do país no mercado internacional. As privatizações e a flexibilização da
gestão, principalmente das relações de trabalho, foram centrais na reforma da
década de 1990 (PIERONTONI, 2001). Assim como no conjunto dos países da
América Latina, a reforma passou a ser o eixo justificador das mudanças profundas
realizadas nos pilares da estrutura do Estado. Em conseqüência, o sentido positivo
do termo reforma,
[...] foi apropriado e reconvertido pelos ideólogos do neoliberalismo num
significante que alude a processos e transformações sociais de claro sinal
involutivo e antidemocrático, [...], pois as ‘reformas econômicas’ postas em
prática na América Latina são, na realidade, ‘contra-reformas orientadas
para aumentar a desigualdade econômica e social e para esvaziar de todo
conteúdo as instituições democráticas (BORÓN, 1999, p. 11).
90
A expressão contra-reforma do Estado passou a representar a crítica ao
processo de desmonte do Estado (NORONHA; SOARES, 2001; BEHRING, 2003)
que redundou na ruptura dos compromissos assumidos na efetivação da seguridade
social. Na especificidade do setor saúde, as mudanças de rota foram relativas às
dimensões da descentralização, na relação entre o público e o privado, e no
princípio da universalização.
A reforma administrativa do Estado brasileiro produziu uma alteração no
projeto societário construído no bojo da luta pela democratização e referendado nos
princípios da Constituição Federal, de um Estado público garantidor da cidadania.
Este Estado é próprio do tipo desenvolvimentista (COHN, 2000; FIORI, 2003),
esgotado no final do governo Sarney, no quadro de crise descrito sobre a década
de 1980, mas não perceptível na época da formulação do princípio de cidadania:
dever do Estado e direito dos cidadãos.
Assim foi com o movimento da reforma sanitária, que “[...] contribuiu para
transformar a política de saúde em elemento fundamental na conjuntura de
estabilização da ordem política” (LUZ, 1991, p. 88). O mesmo teve a pretensão de
pensar as mudanças do setor saúde como estratégico e aglutinador de um outro
projeto nacional com relações políticas democráticas e garantidoras da cidadania
para todos os brasileiros. Suas proposições de mudanças não se restringiram ao
setor, entendendo que para estas acontecerem era imprescindível uma nova ordem
social, pois “a saúde não se resolve a partir do setor saúde” (AROUCA, 1992, p.
173). O projeto da reforma sanitária foi gestado num momento histórico de
encerramento de um determinado ciclo de produção econômica e social, e de
anúncio de mudanças estruturais que alterariam a relação entre Estado e sociedade.
A institucionalização da política de saúde se formaliza com o marco legal das
Leis 8.080 e 8.142 em 1990 (Quadro 11) e se processa no mesmo momento em que
o governo brasileiro adota medidas de ajuste fiscal e reestruturação administrativa
do Estado. Este cenário demonstra a histórica contradição presente em sociedades
capitalistas, que são o ambiente fértil de lutas sociais entre distintos e antagônicos
projetos societários.
91
A partir de agora se destacará alguns dos aspectos fundamentais que
caracterizam a política de saúde no momento atual, com dezessete anos de vigência
das leis orgânicas (8.080 e 8.142), mas, como se demonstrará distante dos
princípios da Reforma Sanitária. Os aspectos eleitos para serem contextualizados
são os da descentralização, financiamento, controle social e modos de atenção em
saúde, cujos acontecimentos mais relevantes a eles relacionados estão
sistematizados no Quadro 11.
92
ANO
ACONTECIMENTOS
Promulgada a Lei Orgânica da Saúde - Lei nº. 8.080 dispõe sobre as condições para a promoção,
a proteção e a recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes, definindo os parâmetros para o modelo assistencial e estabelecendo os papéis
das três esferas de Governo. Institui o Sistema Único de Saúde.
1990
Lei nº. 8 142 dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde
(SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área de saúde.
Norma Operacional Básica 91 - Autorização de Internação Hospitalar AIH, forma de
remuneração dos prestadores de serviço; os Conselhos estaduais e municipais de saúde CES e
CMS.
1991
3ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (OMS), em Sundswall, Suécia. Tema:
Ambientes Favoráveis à Saúde.
Realiza-se a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento a ECO 92, no
Rio de Janeiro.
1992
9ª Conferência Nacional de Saúde, de 09 a 14 de agosto.
Norma Operacional Básica NOB 93 regulamenta o processo de descentralização da gestão dos
serviços e ações no âmbito do Sistema Único de Saúde. Comissões Intergestoras: instâncias de
negociação compostos por gestores federal, estadual e municipal Tripartite, e pelos gestores
estaduais e municipais - Bipartite; o Sistema de Informação Ambulatorial - SIA, instrumento para
cadastro de serviços e controle do orçamento; repasses do governo federal aos estados.
1993
Lei nº. 8 689 extingue o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social - Inamps.
Criação do Programa de Saúde da Família PSF - como estratégia de reorientação dos serviços
de atenção básica à saúde
1994
Decreto nº. 1.232 dispõe sobre as condições e a forma de repasse regular e automático de
recursos do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos de Saúde Estaduais, Municipais e do DF.
Lei nº. 9.311 institui a contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de
créditos e direitos de natureza financeira - CPMF, cuja finalidade seria o custeio dos serviços de
saúde.
Norma Operacional Básica NOB 96 - Resolução nº.195 - de 27/08/1996. Estabeleceu a divisão de
responsabilidades entre estados e municípios; definiu modalidades de gestão municipal da saúde;
definiu critérios de alocação de recursos; institui o Piso de Atenção Básica PAB, estabelecendo
um valor per capita para financiamento das ações de atenção básica; criou a Programação
Pactuada Integrada PPI; definiu o Programa Agentes Comunitários de Saúde Pacs e
Programa Saúde da Família PSF como estratégias de mudança do modelo assistencial.
1996
10ª Conferência Nacional de Saúde, de 02 a 06 de setembro.
Projeto Reforço à Reorganização do SUS Reforsus (MS/BID/Banco Mundial). Os objetivos desse
projeto são as recuperações física e tecnológica da rede de serviços e o desenvolvimento da
capacidade de gestão dos Sistemas de diferentes níveis
Normas e Diretrizes do Programa de Agentes Comunitários de Saúde e do Programa de Saúde da
Família
1997
4ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (OMS), em Jacarta, Indonésia. Tema:
Novos Protagonistas para uma Nova Era: Orientando a Promoção da Saúde pelo Século XXI
adentro. Primeira conferência em país em desenvolvimento e primeira em que inclui o setor privado
no apoio à promoção da saúde.
1998
Implantação do Piso de Atenção Básica (PAB), que marca uma transformação no modelo de
financiamento da atenção básica, sendo uma das principais medidas para viabilizar a organização
da atenção básica à saúde nos municípios.
Quadro 11 - Síntese da Política de Saúde no Brasil na década de 1990
Fonte: Portarias do Ministério da Saúde. Documentos da OPAS e ONU (ver referências
bibliográficas).
93
A descentralização é um dos aspectos fundamentais nas mudanças
propostas pela reforma sanitária, e do mesmo modo, imprescindível no projeto de
reforma administrativa do Estado, na medida em que viabiliza o repasse de
atribuições às demais esferas governamentais, inclusive como forma de “resolver a
crise de financiamento do sistema, aumentando a participação dessas esferas locais
no gasto público em saúde” (VIANA, 1997, p. 207). A perspectiva primeira era de
distribuir o poder e reduzir a força centralizadora presente na instância federal, que
tornava os estados e municípios reféns das deliberações do governo central. “Assim,
a descentralização é parte integrante, indissociável, da democratização”
(CAPISTRANO FILHO, 1995, p. 62-63). Contudo, o cenário de mudanças requeridas
no papel do Estado brasileiro nos anos 1990 vai requerer a aplicação da
descentralização como um instrumento importante para a racionalidade e eficácia.
O Estado intervencionista no Brasil, centralizado e autoritário, com
programas sociais atentos a interesses particulares, comprometeu a eficácia
dos seus gastos sociais e não beneficiou os mais necessitados. Essa
situação acentuou-se com a crise fiscal e tornou necessário que se
repensasse o modelo de desenvolvimento em vigor no país. [...] a
reestruturação do Estado pareceu indispensável e a descentralização surgiu
como uma possibilidade para que se redefinissem os diversos níveis de
intervenção governamental (JUNQUEIRA, 1997, p. 179).
A descentralização realizada no país tomou as feições de contra-reforma,
com a implantação de uma política de saúde em consonância com o ajuste fiscal e
da reforma administrativa, bem como orientada pelos organismos internacionais
para o combate à pobreza e, portanto, de focalização das políticas sociais
(RIZZOTTO, 2000), que no caso da saúde, concretizou-se na prioridade da atenção
básica à saúde através da estratégia dos
Programas Agentes Comunitários de
Saúde (Pacs) e Saúde da Família (PSF)
65
, subvertendo, desse modo, o ideário da
reforma sanitária.
A racionalidade administrativa
66
foi materializada através das Normas
Operacionais Básicas (NOB), que a partir de 1991 (Quadro 11) começam a conduzir
os acordos intergestores sobre as competências e sobre o financiamento das ações
e serviços de saúde. A NOB de 1991 teve a marca de regulamentar o processo de
65
Criado em 1994, referendado através da NOB de 1996 e de documentos posteriores (Quadro 11).
66
O Banco Mundial orientou que “[...] para os gastos públicos serem eficientes e eficazes, é
necessário dar maior autonomia e responsabilidade às entidades públicas descentralizadas”
(JUNQUEIRA, 1997, p. 180).
94
descentralização das ações e serviços de saúde, reorganizando as atribuições até
então específicas do Inamps, extinto no mesmo ano pela lei nº. 8.689 (Quadro 11).
Certamente esta decisão foi um marco de ruptura com a forte centralização política e
administrativa expressa por esse órgão na organização da assistência à saúde.
Desde então um conjunto de NOBs vêm sendo editadas, apontando as regras
pactuadas entre as esferas de governo. A gestão passa a ter
[...] ênfase nos aspectos pragmáticos da regulamentação e implementação
do SUS, com destaque nas suas dimensões técnicas (gerência,
programação e avaliação) [...] reforçando assim a tendência de se reduzir a
questão da justiça social e da equidade e democratização da saúde a
parâmetros meramente quantitativos (de custo/efetividade, cobertura,
avaliação, perfil do gasto, etc.) (COHN; ELIAS, 2002, p. 174).
A racionalidade administrativa do SUS é a expressão da nova ordem da
administração pública gerencial (BRESSER PEREIRA, 1998) em que a eficiência e a
eficácia passaram a ser a tônica da gestão orientada para resultados de modo a
reduzir o custo blico e tornar mais efetiva a administração dos serviços. Tanto as
normatizações como definições sobre o financiamento das ações e serviços da
saúde passaram a ser regulamentadas pelas NOBs.
Particularmente na situação do financiamento, Carvalho (2001) assinala que a
Lei 8.080
67
, combinada com a Lei 8.142
68
, determina que todo o recurso federal para
a saúde seja transferido em valor per capita segundo critério populacional.
Parcialmente esta premissa é atendida através do Piso de Atenção Básica Ampliado
(PAB)
69
, que corresponde a um montante de recursos financeiros federais
transferidos aos municípios na forma conhecida como fundo a fundo, regulamentada
pelo Decreto Lei nº. 1232 de 1994, destinado ao financiamento das ações de
atenção básica à saúde, conforme estabelece a NOB de 1996 (Quadro 11).
Contudo, a determinação da lei orgânica “nunca se cumpriu, e todas as NOBs
afrontam esta prescrição criando outros critérios de distribuição de recursos”
(CARVALHO, 2001, p. 437).
67
Lei 8.080, no artigo 35, parágrafo 1º: “Metade dos recursos destinados a estados e municípios será
distribuída segundo o quociente de sua divisão pelo número de habitantes, independente de qualquer
procedimento prévio”.
68
Lei 8.142 no artigo 3, parágrafo 1º: “Enquanto não for regulamentada a aplicação dos critérios
revistos no art. 35/8.080, será utilizado, para o repasse dos recursos, exclusivamente o critério
estabelecido no parágrafo primeiro do mesmo artigo”.
69
Atualmente o valor per capita é de R$ 15,00 hab/ano, conforme Portaria do Ministério da Saúde nº.
650 de 2006.
95
A responsabilidade no financiamento das ações e serviços é das três esferas
de governo, porém na medida em que a instância federal carimba o financiamento,
ou seja, define os programas em que serão alocados os recursos, resulta na perda
da autonomia da esfera municipal (PORTO, 2006).
Ilustra a situação o fato de que
em 1997 existiam 5 tipos de despesas registrados pelo sistema de processamento
de dados do Ministério da Saúde, denominado Datasus, passando para 77 itens no
ano de 2001. Cada item corresponde a recursos vinculados a programas
específicos, de maneira que, “para o município ser merecedor dos recursos, é
condição a implementação da política” (MARQUES; MENDES, 2003, p. 406)
definida pelo governo federal
70
.
O financiamento do setor de saúde é um impasse presente desde a
promulgação da Constituição Federal em 1988, que previu no artigo 198,
parágrafo
71
: “O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com
recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, além de outras fontes” (BRASIL, 1988). O debate sobre o
financiamento público da saúde vai ser a tônica dos debates na próxima década,
como se constata no Quadro 12.
70
Os autores Marques; Mendes (2003) destacam uma experiência gaúcha, da gestão 1999-2002, em
que o financiamento estadual para a saúde nos municípios foi realizado sem a pré-definição de
programas, com a opção de “transferir recursos de forma global fundo a fundo sem vinculá-los ao
desenvolvimento de determinados programas” (p. 411).
71
Parágrafo único renomeado para § 1º pela Emenda Constitucional nº 29, de 13.09.00.
96
ANO ACONTECIMENTOS
Emenda Constitucional nº. 29, de 13/09/00, altera os artigos. 34, 35, 160, 167 e 198
da Constituição Federal e acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, para assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e
serviços públicos de saúde.
5ª Conferência Internacional de Promoção da Saúde (OMS), na Cidade do México,
México. Tema: Das idéias às ações.
11ª Conferência Nacional de Saúde, de 15 a 19 de dezembro.
2000
Lei nº. 9 961 cria a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e define sua
finalidade, estrutura, atribuições, receitas, sua vinculação ao Ministério da Saúde, e
sua natureza.
2001 Norma Operacional da Assistência à Saúde NOB NOAS 2001- Portaria GM nº. 95 de
26/01/01
Norma Operacional da Assistência à Saúde NOB NOAS - alterações pela Portaria nº.
373 de 27/02/2002
Portaria Ministério da Saúde nº. 1101 - Estabelece os parâmetros de cobertura
assistencial no âmbito do SUS.
2002
Carta à Sociedade Brasileira – Em Defesa da Saúde dos Brasileiros, produzida pela
ABRASCO, CEBES e intelectuais do movimento da Reforma Sanitária Brasileira.
2003 12ª Conferência Nacional de Saúde, de 07 a 11 de dezembro.
2005
Manifesto “Reafirmando compromissos pela saúde dos brasileiros”, elaborado por
várias entidades, e que desde então, constituíram o Fórum da Reforma Sanitária
Brasileira (novembro).
Portaria Ministério da Saúde nº. 399 Diretrizes do Pacto pela Saúde
Consolidação do SUS.
Portaria Ministério da Saúde nº. 675 – Direitos dos Usuários do SUS.
Portaria Ministério da Saúde nº. 687 – Promoção da Saúde.
Portaria Ministério da Saúde nº. 698 – Gestão do SUS.
Portaria Ministério da Saúde nº. 699 - Regulamenta as Diretrizes Operacionais dos
Pactos Pela Vida e de Gestão.
3ª Conferência Nacional de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (março).
Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais de Saúde – DSS (março)
Documento “O SUS é pra valer: universal, humanizado e de qualidade”, elaborado e
divulgado pelo Fórum da Reforma Sanitária Brasileira (julho).
2006
Documento “Gasto em Saúde no Brasil: é muito ou pouco?”, elaborado e divulgado
pelo Fórum da Reforma Sanitária Brasileira (julho).
Quadro 12 - Síntese da Política de Saúde no Brasil na primeira década do século
XXI
Fontes: BRASIL, 2004; HOCHMAN, 2005; FIOCRUZ, 2005.
97
O governo federal vem ao longo deste tempo criando diferentes estratégias
para lidar com a questão do financiamento blico da saúde, por conta do ajuste
estrutural e da crítica da área econômica à vinculação de receitas a políticas
específicas, A CPMF
72
foi criada após intenso debate na sociedade com a finalidade
de aumentar os recursos para o setor. Contudo, sua finalidade foi desvirtuada e não
houve aumento significativo (CARVALHO, 2003) para custear as ações e serviços
do setor.
Desde a promulgação da lei orgânica da saúde, os Conselhos Nacional,
Estaduais e Municipais de Saúde vêm lutando pela vinculação orçamentária nas três
esferas de gestão, como uma forma de garantir financiamento suficiente para o
alcance dos objetivos da política. Por muito tempo se realizou a luta pela aprovação
do Projeto de Emenda Constitucional nº. 29, com a deflagração de uma ampla
mobilização popular a partir da 10ª Conferência Nacional de Saúde (1996). A
aprovação da Emenda Constitucional nº. 29
73
no ano de 2000 foi uma vitória parcial
do movimento pela saúde. Vitória porque, apesar da resistência do setor econômico
do governo
74
e dos representantes do mercado no Congresso Nacional, foi possível
estabelecer percentuais orçamentários nas três esferas de governo para custear a
saúde.
Contudo, o prazo de transitoriedade da Emenda foi estabelecido até o ano de
2004, quando nova lei complementar deveria ser adotada para regulamentar o artigo
198 da Constituição Federal. Na ausência desta regulamentação, as esferas de
governo têm dado interpretações diversas sobre o que significam ações e serviços
de saúde, reduzindo assim o gasto real no setor saúde.
72
Contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de
natureza financeira, criada com a Lei nº. 9.311 em 1996.
73
Disposições Constitucionais Transitórias - Art. 77. Até o exercício financeiro de 2004, os recursos
mínimos aplicados nas ações e serviços públicos de saúde serão equivalentes:
I - no caso da União: a) no ano 2000, o montante empenhado em ações e serviços públicos de saúde
no exercício financeiro de 1999 acrescido de, no mínimo, cinco por cento; b) do ano 2001 ao ano
2004, o valor apurado no ano anterior, corrigido pela variação nominal do Produto Interno Bruto
PIB; II - no caso dos Estados e do Distrito Federal, doze por cento do produto da arrecadação dos
impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os artigos 157 e 159, inciso I, alínea
a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; e III - no caso
dos Municípios e do Distrito Federal, quinze por cento do produto da arrecadação dos impostos a que
se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os artigos 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º.
74
O então Ministro da Saúde, José Serra, é cobrado por defender a vinculação de verbas para a
saúde, pois mudou de opinião por entender que os setores com verbas o vinculadas são os
primeiros a receberem cortes em casos de crise fiscal, como ocorreu com a saúde nas crises de 1991
e 1993. SERRA, José. Saúde: vinculação necessária. Folha de São Paulo. 09/07/2000.
98
Existem estimativas de que o descumprimento da Emenda
constitucional nº. 29, por parte da União e dos Estados, significou, no
período de 2000-2004, uma perda para o financiamento do SUS na ordem
de R$7,2 bilhões. Contudo, verificou-se um aumento da participação dos
governos estaduais e municipais no financiamento do SUS (PORTO, 2006,
p. 577).
A participação das três esferas de governo no gasto público em saúde sofreu
de fato alterações significativas, com os municípios, principalmente, ampliando o
financiamento de ações e serviços no setor. “A Emenda Constitucional 29 foi uma
reengenharia, pois o governo federal conseguiu reduzir suas obrigações e repassou
aos estados e municípios a maior responsabilidade no financiamento do setor
saúde” (NORONHA; SOARES, 2001, p. 449), como se verifica no Tabela 02.
Tabela 02 – Alteração do gasto público em saúde nas esferas de gestão nos anos
1980, 1994 e 2002.
Ano / percentual por
esfera de gestão
% Federal
% Estadual
% Municipal
1980 75,0 18,0 7,0
1994 60,7 22,1 17,2
2002 58,0 20,0 22,0
Fontes: MARQUES; MENDES, 2003; PORTO, 2006.
Constata-se que em duas décadas houve um aumento importante na
participação dos municípios no gastos com saúde, de 7% em 1980 a 22% em 2002,
assim como uma significativa redução de gastos na esfera federal. Outra medida
adotada por esta instância que dificulta o financiamento das políticas sociais é a
Desvinculação de Recursos da União (DRU)
75
que retém 20% de todos os impostos
e contribuições federais, afetando diretamente o Orçamento da Seguridade Social.
“A
concepção de orçamento único e diversidade de fontes de financiamento para os
componentes da seguridade social foi abandonada” (NORONHA; SOARES, 2001, p.
448) por conta dos compromissos dos governos federais com as metas negociadas
com os financiadores internacionais, exigindo o descumprimento da norma
75
Em 1994 o Poder Executivo propôs e o Congresso aprovou uma emenda à Constituição que
autorizou a desvinculação de 20% de todos os impostos e contribuições federais. Foi criado o Fundo
Social de Emergência, posteriormente denominado Fundo de Estabilização Fiscal, que vigorou até
1999. A partir de 2000 passou a se chamar Desvinculação de Recursos da União (DRU) tendo sua
prorrogação aprovada pelo Congresso até 2007.
99
constitucional relativa ao financiamento da Seguridade Social. Em estudo realizado
pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social, foi
constatada esta realidade.
No período de 2000 a 2005, mais de R$ 222 bilhões em recursos da
Seguridade Social foram utilizados, de algum modo, para sustentar o
superávit primário
76
da União. Em 2005, foram arrecadados para o
Orçamento da Seguridade Social R$ 278,1 bilhões. Apenas R$ 221,2
bilhões foram gastos em despesas típicas de previdência, saúde e
assistência social. [...] Esses resultados subvertem os preceitos
estabelecidos pela Constituição de 1988, que concebe a Seguridade Social
como sistema para proteção de direitos e garantia de serviços de
responsabilidade estatal, relativos à saúde, previdência e assistência social
(ASSOCIAÇÃO, 2006, p. 45).
A contra-reforma do Estado é apoiada por organismos financeiros
internacionais como o Banco Mundial, que no caso da saúde, propugna
pressupostos e diretrizes divergentes dos projetos originais de reforma sanitária.
Estas propostas “valorizam a eficiência e a eficácia em detrimento da equidade
mediante políticas de ajuste macroeconômico e, no setor saúde, através da
focalização e da cesta básica de serviços” (PAIM; ALMEIDA FILHO, 2000, p. 50),
com uma política focalista na busca da equidade para os mais pobres, priorizando
assim a atenção básica em saúde.
O Banco Mundial tem se ocupado em analisar o setor de saúde nos países
em desenvolvimento e lançado orientações que têm como direção a ampliação da
desresponsabilização do Estado nas políticas sociais. Em estudo realizado por
Rizzotto (2000), foram sistematizadas várias destas orientações especificamente ao
Brasil, sendo que uma delas sintetiza o rumo esperado:
[...] introdução de reformas institucionais e no sistema de financiamento do
setor de saúde, que incluiria a descentralização, com dotação de recursos,
prioritariamente para os pobres, mobilização de recursos privados,
racionamento da atenção médica e o uso de incentivos e técnicas de gestão
modernas (RIZZOTTO, 2000, p. 156).
Na orientação relativa às alterações institucionais necessárias para os ajustes
estruturais na saúde, destaca-se a flexibilização da gestão, um dos eixos da reforma
administrativa do Estado, que alterou a relação público-privado existente no serviço
76
O superávit primário é um mecanismo contábil que a partir das orientações do FMI, tornou-se uma
ferramenta para o pagamento da dívida. O governo passa a ter como objetivo arrecadar mais do que
gasta, não considerando o pagamento de juros da dívida (FBO, 2004).
100
público, com maior incremento nas estruturas jurídico-administrativas. Estas
permitiram às fundações, cooperativas e organizações sociais (COSTA, 2000) serem
prestadoras de serviços de saúde, com financiamento público, e na captação de
profissionais através de contratos precários ou por meio das terceirizações nas
contratações, com evasão fiscal pelo não recolhimento de contribuições sociais na
contratação de prestadores individualizados.
O
impacto da reforma na saúde foi mais significativo “nos aspectos
relacionados com a área de recursos humanos por introduzirem modificações
substantivas e generalizadas nas relações de vínculos trabalhista, direitos e
vantagens e carreiras do serviço público(PIERONTONI, 2001, 345). Esta realidade
tem agravado as condições de trabalho e consequentemente, a oferta qualificada de
serviços e ações de saúde, tendo sido o tema central da Conferência Nacional de
Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (março de 2006), com o lema “a
desprecarização é urgente” (DOMINGUEZ, 2006).
Os Consórcios Intermunicipais de Saúde, na forma de associações ou como
entidades civis de direito privado, têm sido uma alternativa para os municípios
aperfeiçoarem estruturas e equipamentos de maior complexidade tecnológica,
facilitar o acesso aos serviços de saúde e, principalmente, atender a legislação
relativa à responsabilidade na gestão fiscal
77
no quesito relativo à contratação de
pessoal. No ano de 2000 existiam 91 consórcios distribuídos em sete estados,
abrangendo 22% dos municípios e 12% da população brasileira, confirmando a
expressiva participação de municípios pequenos
78
, concentrados nas regiões Sul e
Sudeste. Esta realidade refuta o discurso dos gestores que justificam a implantação
de consórcios “para suprir a falta de recursos humanos e financeiros, uma vez que
no Sul e Sudeste estão concentrados a maior parte dos recursos tecnológicos e
humanos da saúde” (LIMA, 2000, p. 993). Ou seja, os consórcios se constituem
numa modalidade mais flexível de contratação de serviços e de profissionais, com
seus funcionamentos facilitados para atender ao projeto de desoneração pública
frente às políticas sociais.
77
Lei complementar nº. 101, de 4/05/2000 - Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a
responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências.
78
71,35% dos municípios no Brasil têm até 19.900 habitantes (DELGADO et al., 2007, p. 62).
101
A orientação do Banco Mundial contém ainda uma questão crucial que
precisa ser discutida; o relativo ao princípio da universalização da assistência à
saúde. Este princípio é o mais atingido com a contra-reforma no setor saúde, visto
que tanto no financiamento como na prioridade da atenção à saúde existe a
seletividade para os mais pobres, ocorrendo assim a “cisão entre assistência para
ricos e remediados através dos planos privados e assistência para os pobres com o
SUS” (NORONHA; SOARES, 2001, p. 449). Este processo teve seu impulso com a
adoção das Ações Integradas de Saúde e intensificadas com o SUDS (Quadro 5)
quando os recursos financeiros vinculados ao Inamps foram dirigidos para as
administrações estaduais e municipais ampliarem a cobertura e a eficiência da
assistência à saúde, que consequentemente, reduziu a transferência de recursos
para a compra de serviços no setor privado. Esta medida gerou perda da qualidade
dos serviços privados e contratados, levando as empresas e a classe média a
buscarem no mercado da medicina supletiva
79
a sua própria assistência médica
(MÉDICI, 1995).
Desde então, o setor privado de saúde vem crescendo significativamente “[...]
com a expansão do sistema de assistência médica supletiva nas áreas de economia
mais dinâmica” (BARROS, 1997, p. 115). A articulação público-privado se constituiu
como integrante do processo de desenvolvimento da política de saúde, com o
governo criando a Agência de Saúde Suplementar
80
no ano 2000 (Quadro 11) e o
Departamento de Economia da Saúde
81
, com fomento de linhas de pesquisa e
estudos sobre esta matéria. Na 11ª Conferência Nacional de Saúde (2000), os
conferencistas destacaram que a descentralização melhorou o acesso da população
aos serviços de saúde, mas também denunciaram o descumprimento do princípio da
universalização na organização das redes de serviços (MATTOS, 2005).
79
Medicina supletiva equivale às modalidades organizacionais de Medicina de Grupo, Cooperativas
Médicas, Seguro Saúde e Plano Auto-Administrados pelas empresas (MEDICI, 1995).
80
A Agência de Saúde Suplementar é um dos órgãos vinculados ao Ministério da Saúde, junto com o
Conselho Nacional de Saúde, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Agência nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa), Instituto Nacional do Câncer (INCA) e Fundação Nacional de Saúde (Funasa).
81
O Departamento integra a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério
da Saúde. “Economia da Saúde é o campo de conhecimento voltado para o desenvolvimento e uso
de ferramentas de economia na análise, formulação e implementação das políticas de saúde. Envolve
a análise e o desenvolvimento de metodologias relacionadas ao financiamento do sistema, a
mecanismos de alocação de recursos, à apuração de custos, à avaliação tecnológica, etc. Busca o
aumento da eficiência no uso dos recursos públicos e a eqüidade na distribuição dos benefícios de
saúde por ele propiciados”. Ministério da Saúde.
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/area.cfm?id_area=1001
102
No tocante ao financiamento, o Banco Mundial equipa e aparelha as
instituições de saúde, principalmente através de empréstimos como o Reforsus
82
, e
preconiza a cobrança direta dos usuários pelos serviços recebidos, sendo o Brasil
por enquanto, o único na América Latina que não cobra por serviços prestados
(NORONHA; SOARES, 2001). Esta proposta é conseqüência do paradigma da
economia da saúde, que vem orientando a atual posição dos organismos
internacionais em relação ao setor.
A nova agenda para o século XXI engloba proposições derivadas do
paradigma da economia da saúde, acentuando fortemente uma visão de
cidadania social restrita, dirigida aos segmentos populacionais
extremamente empobrecidos e articulando atenção à saúde com proteção
social (NOGUEIRA; PIRES, 2004, p. 758).
O destaque que a economia da saúde vem adquirindo reforça a constatação
de que a universalização está cindida, com o governo optando pelos mais pobres
para terem direito à saúde, ou mais precisamente, acesso, pois a noção de direito
pleno está desconstituída. Contudo, considerando a desigualdade social e o
desemprego estrutural presentes no Brasil, o sistema público de saúde tem sido o
responsável pela grande maioria da assistência, com a participação tanto maior
quanto menor o nível de renda da população (PORTO et al., 2006, p. 907).
Em estudo realizado nos dados da Pesquisa Nacional de Amostra de
Domicílios (PNAD) nos anos de 1998 e 2003 relativos ao tipo de financiamento dos
serviços de saúde utilizados pela população: SUS, plano de saúde
83
e pagamento
direto por serviço, os resultados revelaram que o SUS é o financiador de 61% dos
atendimentos em saúde e 70% das internações hospitalares realizadas no ano de
2003, tendo aumentado sua participação em 9,3% e 4,1% respectivamente, em
relação ao ano de 1998 (PORTO et al., 2006).
Por conta desta realidade do financiamento e rompimento do princípio da
universalização, os Conselhos de Saúde, em conjunto com demais forças sociais
82
Reforsus Reforço à Reorganização do Sistema Único de Saúde. Consiste num dos projetos
financiados pelo Banco Mundial, que o denomina de Projeto de Reforma do Setor Saúde (RIZZOTTO,
2000).
83
Dados do IBGE informam que 25% da população brasileira têm algum plano de saúde privado
(MARSIGLIA et al., 2007, p. 33).
103
organizadas, continuam na luta pela regulamentação do financiamento
84
da saúde
no Brasil, pois é preciso garantir as condições materiais para uma atenção com
qualidade e dignidade. Contudo, a mobilização e capacidade organizativa dos
Conselhos de Saúde têm estado em ritmo descompassado como efeito do
“esgotamento do ideário original da Reforma Sanitária” (COHN; ELIAS, 2002),
advindo do avanço da contra-reforma do Estado. A exigência sobre os Conselhos é
quanto a sua capacidade gerencial na agilidade de examinar e aprovar as propostas
de saúde emanadas do gestor, revelando um prejuízo na qualidade dos debates e,
principalmente, um esvaziamento do caráter deliberativo dos conselhos, com a
participação “confinada aos canais institucionais de participação [...] burocratizados
onde são referendadas as decisões tomadas pelo executivo” (COHN, 2000, p.
315).
A luta pela maior democratização no setor e fortalecimento do controle social
tem tido sua expressão máxima nas Conferências Nacionais de Saúde
85
. A
(1992), deliberou sobre a necessária autonomia e independência de forças
representativas da sociedade civil em relação ao Estado; a 10ª (1996), confirmou o
encaminhamento da anterior, e referendou o gestor como protagonista desse
processo; a 11ª (2000), enfatizou que a participação também fundamental na
produção do SUS, e não exclusivamente na sua fiscalização (MATTOS et al., 2005)
e, por fim, a 12ª Conferência enfatiza, entre vários aspectos, que suas deliberações
devem ser cumpridas pelos gestores e a realização de capacitação para os
conselheiros (CARVALHO; CORDOVIL, 2004).
O controle social na agenda das políticas públicas tem sido exaustivamente
discutido
86
, revelando que ainda é preciso haver um fortalecimento da capacidade
de articulação dos segmentos populares, para fazer frente aos interesses
organizados dos gestores, corporações e mercado da saúde. Também se faz
necessária uma política de formação de conselheiros, visto que o setor de saúde
está com intensa exigência de conhecimentos técnicos requeridos para o crescente
84
Tramita no Congresso Nacional desde 2003 o Projeto de Lei Complementar 01/03, que tem o apoio
do setor saúde. Tramitam dois outros projetos de lei complementar - 159/04 e 181/04. Há uma
expectativa de que o governo apoie sua aprovação no ano de 2007.
85
Ver Apêndice A.
86
Ver Bravo (2002a e 2002b); Dagnino (2002); Degennszajh (2000); Gohn (1991; 2003); Nogueira,
Marco Aurélio (1997, 2004); Santos Júnior et al (2004).
104
papel regulatório do Estado. Esta ação é fundamental para superar a situação
comumente encontrada hoje, de,
[...] os conselhos de saúde locais são como convidados ‘inconvenientes’ ao
exercício do processo decisório. Sua base de representação é frágil e a
formação dos conselheiros é insuficiente para a tomada de decisão em
assuntos de caráter técnico (GERSCHMAN, 2004, p. 17).
As mesmas características do início da década de 1990 ainda estão
presentes na atualidade do Brasil, com “a cultura fortemente clientelista [...] com a
baixa capacidade de gestão dos municípios e a sociedade civil com pequena
capacidade para impulsionar e para controlar o governo (CAMPOS, 2005, p. 19)
dificultando o amadurecimento político e o apogeu da cidadania. Os princípios da
descentralização e participação estão “[...] cada vez mais esmaecidos, esquecidos
em nome da eficiência do gasto em saúde” (MARQUES; MENDES, 2003, p. 405).
O debate e o esforço de garantir as condições necessárias para o pleno
desenvolvimento do SUS têm ocupado a agenda política dos diversos segmentos
envolvidos no setor, com ênfase nos aspectos de gestão e financiamento. O
processo de implantação do SUS
[...] tem avançado nas linhas de menor resistência política o repasse dos
serviços enquanto o ‘núcleo duro da Reforma correspondente ao
financiamento do sistema de saúde não sofreu as alterações necessárias
para a implementação da política a ser efetivada, com o que se obteve o
estabelecimento apenas de mudanças de caráter administrativo ou
reorganizativo dos serviços do SUS (GERSCHMAN, 2004, p. 261).
Esta avaliação tem sido recorrente nos segmentos do setor, caracterizado
pela tensão entre os pressupostos da reforma sanitária e a viabilização possível
desta política pública no contexto de retração do Estado no investimento necessário
para garantir a cidadania no Brasil. Setores defensores da reforma começam a
organizar mobilizações junto ao Congresso Nacional e ao governo federal
pressionando pela garantia de financiamento e pela adoção dos princípios da
reforma sanitária na política de saúde, tendo se constituído como uma força social
denominada Fórum da Reforma Sanitária Brasileira
87
(Quadro 12).
87
Formado pela Abrasco, Cebes, Ampasa, Rede UNIDA, Abres.
105
A Fiocruz fez no ano de 2005 um diagnóstico sobre os determinantes sociais
de saúde, elementos de ordem econômica e social que afetam a situação de saúde
de uma população, e concluiu que “as desigualdades sociais e econômicas, injustas
e evitáveis ou seja, as iniqüidades são as nossas mais graves doenças”
(LOPES, 2006, p. 11). Em decorrência, propôs a formação de um grupo
interdisciplinar e intersetorial para abordar a questão dos determinantes sociais, o
que foi assumido pelo governo federal com a criação da Comissão Nacional sobre
Determinantes Sociais da Saúde (DSS)
88
, com o objetivo de formular caminhos para
a saúde pública no Brasil no prazo de dois anos, em três linhas de ação: produção
de informações e conhecimentos, apoio e avaliação de políticas e mobilização
social. As desigualdades sociais brasileiras determinam as condições de saúde da
população, como conseqüência das escolhas sobre a política econômica e social no
país.
A tensão presente no setor saúde produziu, muito recentemente, uma nova
reestruturação na política pública de saúde. Seu breve exame torna-se importante,
considerando que vai alterar significativamente a dinâmica do financiamento, da
gestão e das prioridades em saúde. A nova reorganização da saúde não adota mais
a lógica das normas operacionais básicas (NOB), ferramenta de normatização e
consenso entre os gestores, mas a lógica do Pacto, entendendo se tratar de um
novo patamar de relações e responsabilidades dos gestores. Ou seja, não se trata
mais de somente regular o sistema de saúde a partir de suas legislações, mas de
instalar uma nova dinâmica e novos conceitos no próprio sistema. A projeção desta
mudança é ser de longo prazo, e envolveu os governos federal, estaduais e
municipais, com a aprovação do Conselho Nacional de Saúde.
A deliberação final se materializou a partir de fevereiro de 2006 através de um
conjunto de portarias ministeriais (Quadro 12), sob a denominação de Pacto da
Saúde Consolidação do SUS. O Pacto é formado pelos componentes: Pacto em
Defesa do SUS; Pacto pela Vida e Pacto de Gestão, e tem como diretrizes a
integralidade, equidade, responsabilidade sanitária, mobilização e participação
88
Criada em março de 2006, formada por dezessetes personalidades públicas das áreas da cultura,
da saúde e demais setores do conhecimento. A Comissão segue uma orientação da OMS, que criou
sua própria em 2005 para apoiar e coordenar este movimento no âmbito internacional, sendo que o
Brasil foi o primeiro país a acatar.
106
social, intersetorialidade, informação, educação e comunicação, e sustentabilidade.
Brevemente, e a partir das Portarias Ministeriais, se destacará os aspectos mais
fundamentais de cada componente.
O Pacto em Defesa do SUS visa implementar um projeto permanente de
mobilização social com a finalidade de: a) mostrar a saúde como direito de cidadania
e o SUS como sistema público universal garantidor desses direitos; b) alcançar, no
curto prazo, a regulamentação da Emenda Constitucional 29, pelo Congresso
Nacional; c) garantir, no longo prazo, o incremento dos recursos orçamentários e
financeiros para a saúde; d) aprovar o orçamento do SUS, composto pelos
orçamentos das três esferas de gestão, explicitando o compromisso de cada uma
delas; e) elaborar e divulgar a carta dos direitos dos usuários do SUS, que se
efetivou através da Portaria nº. 675 (Quadro 12).
O Pacto pela Vida é constituído por um conjunto de compromissos sanitários,
expressos em objetivos de processos e resultados e derivados da análise da
situação de saúde da população e das prioridades definidas pelos governos federal,
estaduais e municipais. As prioridades inicialmente estabelecidas são a saúde do
Idoso; câncer de colo de útero e de mama, mortalidade infantil e materna, doenças
emergentes e endemias (ênfase na dengue, hanseníase, tuberculose, malária e
influenza), promoção da saúde, atenção básica à saúde.
O Pacto de Gestão radicaliza a descentralização de atribuições do Ministério
da Saúde para os estados e municípios, promovendo um choque de
descentralização, acompanhado da desburocratização dos processos normativos.
Reforça a territorialização da saúde como base para organização dos sistemas,
estruturando as regiões sanitárias e instituindo colegiados de gestão regional.
Reitera a importância da participação e do controle social com o compromisso de
apoio a sua qualificação. Explicita as diretrizes para o sistema de financiamento
público tripartite: busca critérios de alocação eqüitativa dos recursos; reforça os
mecanismos de transferência fundo a fundo entre gestores; estabelece relações
contratuais entre os entes federativos, e integra em cinco blocos o financiamento
federal: atenção básica, média e alta complexidade, vigilância em saúde, assistência
farmacêutica e gestão.
107
Constata-se que estão contidas no componente Pacto em Defesa do SUS
algumas premissas centrais do movimento da reforma sanitária, como os direitos
dos cidadãos à saúde e o financiamento como garantidor e viabilizador destes. No
Pacto pela Vida constam as ações prioritárias estabelecidas com a confirmação da
atenção básica e, pela primeira vez com destaque, a promoção da saúde, que tem
formulada uma política nacional através da portaria ministerial nº. 687.
A promoção da saúde tem se desenvolvido nos últimos vinte anos nos países
centrais (BUSS, 2003), cujos conceitos e práticas têm sido orientadas pelas
Conferências Internacionais de Promoção da Saúde (Quadros 5 e 12), que teve
sua quinta edição, desde 1986, promovida pela OMS em Ottawa, Canadá, que
aprova a Carta de Ottawa para Promoção da Saúde, documento referencial no
assunto desde então. A Carta de Ottawa definiu o conceito de promoção da saúde
como:
[...] processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua
qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle
deste processo. Para atingir um estado de completo bem-estar físico,
mental e social os indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações,
satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A
saúde deve ser vista como um recurso para a vida, e não como objetivo de
viver. Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo, que enfatiza os
recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas. Assim, a
promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai
para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global
(OMS, 1986).
O conceito revela a perspectiva de saúde em que os indivíduos têm a maior
responsabilidade na sua condição de bem estar pelas escolhas quanto a estilos de
vida, bem como valoriza o meio ambiente e a conexão necessária entre os setores,
na perspectiva da sustentabilidade
89
. A promoção da saúde apresenta-se
[...] como uma estratégia de mediação entre as pessoas e seu ambiente,
combinando escolhas individuais com responsabilidade social pela saúde.
Nesse sentido, as estratégias de promoção da saúde são mais integradas e
intersetoriais, bem com supõem uma efetiva participação da população
desde sua formulação até sua implementação (BUSS, 2003, p. 34-35).
89
A Conferência Mundial de Meio Ambiente ECO Rio, realizada no Rio de Janeiro em 1992 definiu
a saúde ambiental como prioridade para a promoção da saúde, compondo a Agenda 21 da ONU. A
OMS vem incorporando a “questão do desenvolvimento econômico e social sustentado como
importante pauta extra-setorial para o campo da saúde” (PAIM; ALMEIDA FILHO, 2000, p. 46-47).
108
A promoção em saúde no Brasil estava secundarizada nos debates sobre
modos de atenção em saúde, estes mais intensos em torno da saúde da família,
integralidade e humanização. E por sua vez, o debate sobre modos de atenção
estava reduzido pelo fato das questões ligadas ao financiamento e à gestão terem
sido a tônica da discussão na implantação do SUS (PAIM, 2003). O objetivo geral da
Política Nacional da Promoção da Saúde é: Promover a qualidade de vida e reduzir
vulnerabilidade e riscos à saúde relacionados aos seus determinantes e
condicionantes modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente,
educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais (BRASIL, 2006a,
p.13). Destaca-se a conexão estreita que haverá entre a Comissão Nacional sobre
Determinantes Sociais da Saúde e a promoção da saúde como prioridade do
governo no setor de saúde, que pretende reduzir as iniqüidades regionais e locais.
O destaque no componente Pacto de Gestão é a definição de que ocorrerá
uma radicalização da descentralização das atribuições do Ministério da Saúde.
Implicará na maior autonomia municipal na definição das suas prioridades e
programas de saúde, considerando que se extingue a figura da habilitação de
gestão
90
do sistema de saúde e se amplia a responsabilidade sanitária de cada
instância através do Termo de Compromisso de Gestão. As instâncias estaduais de
pactuação
91
terão maior autonomia e serão criadas instâncias regionais para
agilização do sistema. As mudanças no financiamento serão importantes,
desaparecendo ao longo de um determinado tempo a forma de repasse de verbas
por convênios vinculados a programas específicos, e o repasse, fundo a fundo,
passa a ser a modalidade preferencial, concentrado em cinco blocos de ações.
Muitas das mudanças estabelecidas neste recente reordenamento na gestão
do SUS estão em sintonia com antigas reivindicações, como a de substituir o
financiamento atrelado à realização de determinados programas (AROUCA, 2006, p.
9) e a maior descentralização das atribuições federais, pois somente estas duas
medidas criarão condições mais favoráveis para o desenvolvimento satisfatório da
política de saúde no país. A promoção da saúde tem o desafio de qualificar e
ampliar a concepção de saúde, pois “a visibilidade da saúde na área social está na
90
A NOB NOAS Norma Operacional da Assistência à Saúde 2001 alterou as formas de habilitação
para a gestão, criadas pelas NOB anteriores para Gestão Plena do Sistema Municipal.
91
Comissão Intergestora Bipartite (CIB).
109
“assistência ao doente” (hospitais, construções) que redundam em maior retorno
político do que a assistência à saúde” (COHN 2000, 317).
A prioridade da promoção da saúde é uma questão que precisa ser ainda
melhor dimensionada, pois pode significar redução de investimentos em ações e
serviços de assistência direta, se sua ênfase recair sobre a dimensão da educação
em saúde e de mudanças de estilos de vida, a exemplo de experiências americanas
na década de 1980, quando os programas indicaram uma “[...] clara opção pela
proposta mínima de mudança de estilo de vida por meio de programas de
modificação de comportamentos considerados de risco (hábito de fumar, dieta, etc.)”
(PAIM; ALMEIDA FILHO, 2000, p. 46). Somente no seu desenrolar se verificará a
direção destas mudanças, se na intensificação da contra-reforma do setor saúde ou
em avanços na efetivação de pressupostos da reforma sanitária. Os rumos vão estar
condicionados pelas capacidades de articulação das forças sociais de toda a
sociedade, ou seja, da tensão permanente da luta pela hegemonia das forças
sociais que aspiram um projeto societário de usufruto das riquezas socialmente
produzidas.
3.2 O DEBATE SOBRE OS DIREITOS NO CAMPO DA SAÚDE MENTAL
A dimensão dos direitos no campo da saúde mental constitui-se numa
discussão central no debate que se intensifica de forma mais preponderante a partir
dos anos 1990, na reivindicação da cidadania às pessoas portadoras de transtorno
mental, entendendo cidadania como o “processo de desenvolvimento dos direitos no
interior das sociedades capitalistas” (MARSIGLIA, 1987, p. 13). uma contradição
nesta discussão, considerando que histórica, teórica e juridicamente a noção de
direitos se relaciona com a racionalidade e autodeterminação legitimada
socialmente. Para o enfrentamento deste debate se faz necessária uma abordagem
sobre a construção dos fundamentos dos direitos e das condições que propiciam ser
promulgada a cidadania dos portadores de transtorno mental.
110
Abordar a temática dos direitos implica em fazer referência ao acontecimento
histórico
92
que marca preponderantemente seu surgimento na história da
humanidade, a Revolução Francesa
93
. Esta s fim ao Antigo Regime na França,
gravou na história da humanidade ideários que ainda são referenciados, como o
lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, anunciando um novo lugar para o
indivíduo, agora livre da opressão dos regimes absolutistas. O cenário era o da
primeira revolução industrial, que provocou mudanças ímpares na relação do
homem com o seu meio a partir da constituição do modo de produção capitalista
industrial, que influenciado pela Revolução Francesa estabeleceu “os negócios
pacíficos como um interesse universal” (POLANYI, 2000 p. 21).
O Iluminismo
94
marcou o início da modernidade e influenciou sobremaneira a
Revolução Francesa, pois imprimiu o estatuto antropocêntrico, necessário para a
sociedade prescindir do absolutismo e assumir por si mesmo os seus rumos.
Hobsbawm (1996, p. 29) faz uma análise sobre a economia industrial na época,
dizendo que “era o produto da combinação do progresso do Iluminismo em geral
liberdade, igualdade e economia política com o avanço material da produção”. O
iluminismo “juntou uma complexa coleção de idéias que abrangiam direitos
humanos, governo constitucional e liberdade econômica” (MERQUIOR, 1991, p. 49),
compondo um quadro de referência organizativo e explicativo da sociedade.
Determinadas formulações teóricas contribuíram para a construção do novo
ideário propagado pela Revolução Francesa, como a concepção do liberalismo,
político e econômico
95
que lança as bases do Estado liberal; a crítica às idéias
mercantilistas e a preconização do liberalismo econômico
96
, e o conceito de
soberania popular
97
que defende a liberdade e a igualdade entre os homens
(MENDONÇA, 1994). A partir deste marco histórico, rompe-se a vinculação da Igreja
com o Estado, instituiu-se a figura da República, e a necessidade da Constituição
92
Declaração de Direitos de Virgínia (EUA), em 1776, foi também um marco na história de
constituição de direitos.
93
Período de maio de 1789 a novembro de 1799. Falcon e Moura (1995) denominam a Revolução
Francesa como um conjunto de movimentos revolucionários, com a ocorrência de quatro revoluções:
a aristocrática, a burguesa, a camponesa e a popular, que se sucediam ou se sobrepunham.
94
Iluminismo é uma “linha filosófica caracterizada pelo empenho de estender a crítica e o guia da
razão em todos os campos da experiência humana” (ABBAGNANO, 1982, p. 509).
95
Publicação na Inglaterra, em 1688, da obra Segundo Tratado de John Locke.
96
Na Inglaterra, Adam Smith publica em 1776 a obra A Riqueza das Nações.
97
Na França, Jacques Rousseau publica em 1762 a obra o Contrato Social.
111
como manifestação da vontade geral, viabilizando a concepção dos direitos do
homem com a aprovação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em
1789.
A premissa da República e da constituição como garantidoras do princípio da
liberdade e da soberania do povo construiu a noção de Estado de direito, que na sua
formulação liberal significa a “constitucionalização dos direitos naturais, ou seja, a
transformação desses direitos em direitos juridicamente protegidos, isto é,
verdadeiros direitos positivos” (BOBBIO, 1995, p. 18). Esta premissa corresponde a
noção dos direitos civis assentados na igualdade e liberdade de todos os indivíduos
ou cidadãos.
[...] o cidadão é um corolário do surgimento do capitalismo, mas que o
pensamento liberal que embasava a criação do novo Estado era ao mesmo
tempo revolucionário, enquanto estabelece os princípios universais da
igualdade e liberdade, e profundamente reacionário e antidemocrático
quando os restringia exclusivamente aos direitos civis (TEIXEIRA, 1986, p.
96).
Os ideários da Revolução Francesa foram a expressão do liberalismo,
legitimados pela via revolucionária. E foi possível realizar-se pelo estágio da
economia na época, que precisava de mais espaço político para sua expansão, até
então impedida pelo absolutismo. Tem relevância a afirmação de que “os direitos
humanos de liberdade, fraternidade e igualdade são problemáticos, não por si só,
mas em função do contexto em que se originam, enquanto postulados ideais
abstratos e irrealizáveis” (MÉSZÁROS, 1993, p. 207). Ou seja, este ideário foi
explicitado como forma de garantir os interesses privados e não coletivos da
sociedade.
A concepção de Estado liberal foi a que justificou a economia de mercado, o
mercado de trabalho e o livre comércio, ou seja, trocas livres no capitalismo,
possibilitando sua expansão desde o século XVIII. Com o advento do capitalismo, na
sua fase industrial, e com o surgimento da ciência e sua ênfase na racionalidade, o
homem passou a ser objeto de controle, seja pela sua exploração através do
trabalho, seja por não ser considerado apto para tal.
112
O marco das problematizações relativas ao fenômeno da loucura, entendida
como resultante das condições materiais que produzem a vida social e espiritual do
homem
,
é o contexto histórico da passagem da sociedade feudal para a sociedade
moderna, esta advinda da industrialização e do iluminismo. Ao longo do tempo,
várias análises foram feitas para sua compreensão
98
e a busca de sua normalização.
A produção das idéias, das representações e da consciência está, a
princípio, direta e intimamente ligada à atividade material e ao comércio
material dos homens; ela é a linguagem da vida real. As representações, o
pensamento, o comércio intelectual dos homens aparece aqui como a
emanação direta de seu comportamento material (MARX; ENGELS, 2002,
p. 18).
A loucura é apreendida como uma manifestação humana, decorrente dos
modos de vida e percepções sobre os mesmos, diretamente relacionados a um
determinado momento histórico. Ao longo do tempo, a sociedade destinou espaços
específicos para os loucos, e esta reclusão passou por várias modalidades. A mais
antiga era a prática de recolher os loucos junto com outras minorias sociais, em
edifícios mantidos pelo poder público ou por grupos religiosos. Posteriormente, na
Europa, aparecem as instituições hospitalares destinadas a dar tratamento dico
aos doentes sem recursos e que passam a acolher também os loucos, sendo que o
tratamento ficava a cargo de pessoas sem formação médica, quase sempre
religiosas. Um terceiro grupo de instituições, mais freqüentes a partir do século XIX,
caracteriza-se por acolher apenas doentes mentais e dar-lhes tratamento médico
sistemático e especializado. Essas passam a se chamar ‘manicômios’ (CASTEL,
1978; PESSOTTI, 1996).
Muito antes da Revolução Francesa existiam “asilos para alienados”,
contudo, a divulgação das idéias de Descartes
99
, de identificar o pensamento como
condição para a existência, instala o consenso da razão e do juízo como condição
para o homem ser capaz de cuidar de si: “[...] um racionalismo que classifica a
loucura como erro, perda da verdade. [...] em que a loucura se torna condição de
impossibilidade do pensamento. Se eu penso não posso ser louco, se louco não
posso pensar” (MACHADO, 2000, p. 29).
98
Ver Castel (1978); Wing (1979); Szasz (1984); Foucault (1989b); Perrusi (1995); David-Ménard
(1996) entre outros.
99
René Descartes (1596-1650) filósofo, físico e matemático francês, reconhecido como fundador da
filosofia e matemática modernas.
113
Nesta perspectiva, por entender que a causa da loucura é excesso ou desvio,
um tipo de imoralidade, a cura passa pelo tratamento moral das afecções ou paixões
morais. O tratamento moral é exercido sobre as idéias e o correspondente
comportamento, visando “corrigir excessos passionais, desvios da norma ética do
grupo social” (PESSOTTI, 1996, p.128), sendo que a instituição asilar se impõe
como ambiente ideal de reordenação ou reeducação.
Os próprios princípios legados pela Revolução Francesa são os justificadores
da exclusão dos segmentos da população identificados como não pertencentes ao
estatuto de cidadãos. “A contradição entre a liberdade do indivíduo e a segurança da
sociedade como um todo, como razão que deve excluir aqueles que possam
ameaçá-la” (TUÑON; ABUDARA, 1988, p. 178), legitima a existência do manicômio.
Pois “o princípio da Igualdade estava contemplado, tratando-se os desarranjados
mentalmente de igual modo” (PITTA; DALLARI, 1992, p. 92).
Ou seja, o sujeito de direitos e de deveres tem condições de acesso aos
recursos da sociedade em igual medida, mas este espaço não pode ser partilhado
por aqueles que não estão enquadrados nas regras gerais, são exceção. Para tal, é
necessária igual atitude frente a este segmento, que é a de realizar uma grande
internação (FOUCAULT, 1989a), onde iguais sejam tratados da mesma forma. Os
manicômios foram criados com o intuito de estabelecer uma ordem social,
separando os capazes para o trabalho daqueles que não se enquadravam no
processo de produção estabelecido. Esta concepção teve e ainda tem legitimidade
social, sendo aceita como algo natural e inquestionável.
A concepção manicomial pode ser caracterizada como um fenômeno
ideológico, uma vez que os manicômios criam um tipo de solução para enfrentar o
impacto que o transtorno mental causa nos homens e na sociedade, e resolve o
problema de mão de obra excedente, seja pelas exigências da industrialização, seja
pelo desemprego massivo. Gramsci contribui no entendimento deste fenômeno
quando afirma que por serem historicamente necessárias “[...] as ideologias têm
uma validade psicológica: elas organizam as massas humanas, formam o terreno
sobre o qual os homens se movimentam, adquirem consciência de sua posição,
lutam, etc” (GRAMSCI, 1991, p. 62).
114
As instituições psiquiátricas têm esta característica de serem consideradas
naturais e necessárias, mesmo em processos de críticas e avaliações que vem
ocorrendo desde a segunda metade do século vinte. As primeiras críticas aos
hospitais psiquiátricos surgem após a segunda guerra mundial, a partir da
experiência de médicos e enfermeiros que foram prisioneiros dos campos de
concentração nazistas. Inicia-se assim um questionamento crítico de participação
destes profissionais em instituições psiquiátricas, que se baseiam em discriminações
tão desumanas como as que haviam padecido (TUNÕN; ABUDARA, 1988).
Este, como outros movimentos, geram no mundo e, posteriormente no Brasil,
a construção do ideário de defesa dos direitos e de cuidados aos portadores de
transtorno mental mais dignos (VASCONCELOS, 1992; BARROS, 1994; DIAS,
1997b; AMARANTE, 1995a; COIMBRA, 2000), conhecido como a luta pela reforma
psiquiátrica. processualidade e historicidade no campo dos
direitos, pois são
gerados “em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas
liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma
vez nem de uma vez por todas” (BOBBIO, 1992, p. 5).
Assim tem sido a trajetória de constituição dos direitos na humanidade, como
no século vinte, quando após vários acontecimentos e atrocidades cometidas entre
os povos, pela primeira vez as nações assumem como norma de direito
internacional, de caráter geral, a promoção e proteção dos direitos humanos, com a
proclamação e adoção da Resolução nº. º 217 da Assembléia Geral das Nações
Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 10 de dezembro de 1948,
com a premissa máxima de que todos os homens nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. A idéia contemporânea de direitos humanos surge como
“reação à demonstração de irracionalidade e da capacidade do homem de se
autodestruir” (VIEIRA, 2003, p. 30) revelada pelas atrocidades cometidas contra a
humanidade no século vinte. Estes direitos consagrados não são absolutos, os
Estados podem adotar leis que limitem o exercício dos mesmos. No Brasil, a luta
pelos direitos humanos se materializa nos movimentos contra a ditadura militar, o
que faz, posteriormente, o Estado brasileiro adotar um conjunto de mecanismos de
indenização às vítimas da ditadura militar.
115
Com seu significado inovador, a norma dos direitos humanos surge e se
desenvolve dentro do sistema jurídico e político do imediato pós-guerra e do
bipolarismo ideológico e estratégico da guerra fria que influenciou o mundo durante
mais de quarenta anos. Estes anos corresponderam ao apogeu do crescimento e
desenvolvimento econômico e social nos países com capitalismo maduro,
correspondendo ao período do Estado de Bem Estar. Contudo, este período
encerrou-se na década de 1970, com as transformações societárias advindas da
ocorrência de vários fenômenos interligados, distintos, mas interdependentes, como
a reestruturação produtiva, os ajustes estruturais e a globalização econômica e
cultural.
As conseqüências da era do desmoronamento (HOBSBAWM, 1995) foram
drásticas, com maior relevo para os países não desenvolvidos, que sequer tinham
usufruído as vantagens do keynesianismo, e de forma abrupta se vêem impelidos a
encontrar respostas ao desemprego, bem com encontrar saídas para sua
dependência do mercado financeiro globalizado, sobre o qual não tem controle. O
enfrentamento das desigualdades sociais continua a ser um desafio nos países
latino americanos, entre eles o Brasil
100
, que por conta da retração no financiamento
das políticas sociais, tem adotado ações pontuais de enfrentamento da indigência
101
.
Continuamos convivendo com a velha contradição da primeira
Revolução Industrial: nunca a ciência, a técnica e os meios produtivos
dispuseram de tantas e tão concretas possibilidades para dar um fim a
velhos males, mas a triunfante lógica da produção para o mercado e para o
lucro privado impede que se libere o uso social dessas possibilidades
extraordinárias (TRINDADE, 2002, p. 209).
A produção das riquezas, expandidas com o avanço tecnológico e a
globalização da economia o reduziram as desigualdades sociais no mundo. Pelo
contrário, acirraram mais ainda as diferenças entre as suas regiões e no interior das
nações, principalmente as latino-americanas. É neste cenário que a noção dos
direitos têm sido cada vez mais valorizada, tanto pelos movimentos que os
reivindicam como pelos organismos internacionais. Trindade (2002) destaca este
paradoxo, expressando que “os arautos mais sofisticados do neoliberalismo
100
No Brasil as desigualdades sociais o muito acentuadas, com o ganho mediano dos 10% mais
ricos equivalendo a 30 vezes mais que o dos 40% mais pobres (MARSIGLIA, et al, 2007, p. 21).
101
Ver matéria jornalística assinada por Marcelo Billi, Desde 2001, crescimento favorece pobres”, na
Folha de São Paulo do dia 24/12/2006.
116
dedicam-lhes condescendência apropriada a romantismos fora de moda. É como se
tivessem concluído que se tornou mais eficiente ‘acatá-los’ para melhor desacatá-
los” (p. 21).
O reordenamento do capitalismo na sua fase de produção flexível e na
contingente reestruturação do Estado nos países em desenvolvimento, como o
Brasil, torna ainda mais distante o horizonte de uma nova ordem social,
considerando-se que “os direitos humanos integram direitos e valores universais,
nenhuma pessoa pode ser excluída desse respeito, e toda exclusão social é
negação do humano” (DALLARI, 2000, p.24). O horizonte é o do respeito aos
direitos dos homens e mulheres, com universalização do acesso a bens e serviços,
tendo a liberdade como valor central nos seus corolários de autonomia e
emancipação dos indivíduos sociais.
Os organismos internacionais a partir dos anos 1990 orientam as políticas
econômicas e sociais dos países da América Latina quanto às formas de ajustes
econômicos e estratégias para o reordenamento dos Estados (NOGUEIRA, V,
2004). As orientações destes organismos alcançam também o campo da saúde
mental oriundas mais especificamente da Organização Mundial da Saúde (OMS) e
sua agência para a América Latina e Caribe, a Organização Pan-Americana de
Saúde (OPAS), além das Nações Unidas (DIAS, 2004b).
Atribui-se as orientações destas agências sobre os direitos dos portadores de
transtorno mental ao fenômeno da multiplicação dos direitos elaborado por Bobbio,
ao constatar que o homem não é mais considerado
como “homem em abstrato, mas
[...] tomado na diversidade de seus diversos status sociais, com base em diferentes
critérios de diferenciação” (1992, p. 68-69). Estas organizações, representantes de
um conjunto de nações, hegemonicamente os países centrais com maior
capacidade política, decorrente da sua maior capacidade econômica, ao assumirem
a noção de igualdade de direitos rompem com o conceito até então hegemônico de
que as pessoas portadoras de um determinado transtorno mental o destituídas de
razão, logo, estão à margem do convívio e das relações na sociedade. As profundas
transformações societárias ocorridas nas últimas décadas, com “[...] a atomização e
a pulverização imediatas da vida social, as novas sensibilidades’ produzidas pelas
tecnologias [...]” (NETTO, 1996, p. 98) têm alterado o sentido da vida humana e
117
social, rompendo com posições até então consideradas como verdades
cristalizadas.
É nesta conjuntura que passa a haver uma sintonia entre os postulados do
movimento pela reforma psiquiátrica com os ordenamentos instituídos mundialmente
pelas agências multilaterais. Mas esta conjuntura histórica não supera o antigo
problema do preconceito, segregação e desassistência, pois “[...] uma coisa é falar
dos direitos do homem [...] outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva”
(BOBBIO, 1992, 63), o que se transforma em desafio constante para as forças
sociais que lutam por justiça social e emancipação humana.
Algumas iniciativas dos organismos internacionais têm relevância por serem
um guia orientador para a formulação de políticas públicas e criação de mecanismos
de proteção dos direitos. Estas, como as inserções dos segmentos que lutam por
direitos dos portadores de transtorno mental estão sistematizados no Quadro 13.
118
ANO
ACONTECIMENTOS
1990
Declaração de Caracas – OPAS.
ONU - Resolução nº. 119. Declaração sobre A Proteção de Pessoas Acometidas de
Transtorno Mental e a Melhoria da Assistência à Saúde Mental, bem como os vinte e
cinco Princípios em Saúde Mental: são a referência mais completa e detalhada de
proteção às pessoas portadoras de transtornos mentais, bem como são um guia
importante para os Estados ordenarem suas legislações e seus sistemas de atenção
em saúde mental.
I Encontro Nacional dos Usuários e Familiares da Luta Antimanicomial, realizado em
São Paulo.
1991
II Encontro Nacional dos Usuários e Familiares da Luta Antimanicomial, realizado no
Rio de Janeiro.
1992
2ª Conferência Nacional de Saúde Mental, Brasília, 01 a 04 de dezembro.
I Encontro Nacional da Luta Antimanicomial, Salvador, Bahia.
ONU - Normas Uniformes sobre Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com
Inabilidades, com o objetivo de assegurar os mesmos direitos de qualquer pessoa ao
acesso a espaços sociais, culturais e de trabalho aos portadores de transtornos
mentais.
1993
Carta de Direitos dos Usuários e Familiares de Serviços de Saúde Mental - Produzida
pelos participantes do III Encontro Nacional dos Usuários e Familiares da Luta
Antimanicomial, realizado em Santos/SP, em Dezembro.
1995
II Encontro Nacional da luta Antimanicomial, Belo Horizonte, Minas Gerais.
1996
IV Encontro Nacional de Usuários e Familiares do Movimento da Luta
Antimanicomial, abril, em Franco da Rocha, SP.
OPAS - Resolução CD40/15, orientando os Estados Membros a que formulem e
desenvolvam programas nacionais de saúde mental como um componente integral
dos planos nacionais de saúde; intensifiquem as ações para a reorientação dos
serviços de saúde mental com vistas a modificar seu enfoque: da institucionalização
passe a ser comunitário; que se esforcem em melhorar a legislação que proteja os
direitos humanos das pessoas com transtornos mentais.
1997
III Encontro Nacional da Luta Antimanicomial, Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
1999
V Encontro Nacional de Usuários e Familiares do Movimento da Luta Antimanicomial,
11 a 13 dezembro, em Betim, MG
1999
IV Encontro Nacional da Luta Antimanicomial, em Paripueira , Alagoas.
2000
VI Encontro Nacional de Usuários e Familiares do Movimento da Luta
Antimanicomial, 16 a 19 novembro, em Goiânia, Goiás.
2001
Lei nº. 10.216, de 06 de abril, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas
portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde
mental.
Continua
119
Continuação
OEA - Organização dos Estados Americanos - Comissão Interamericana de Direitos
Humanos, em Santiago do Chile. Documento Recomendación sobre la Promoción y
Protección de los Derechos de las Personas com Discapacidad Mental. Propõe
medidas no âmbito legislativo, de gestão e de assistência nestes patamares, como
responsabilidades dos governos e dos agentes sociais das sociedades dos Países
Membros.
2001
3ª Conferência Nacional de Saúde Mental, Brasília, 11 a 15 de dezembro.
V Encontro Nacional da Luta Antimanicomial, Rio de Janeiro. 2002
Portaria Ministério da Saúde nº. 2.391 – Regulamenta o controle das internações
psiquiátricas involuntárias e voluntárias.
2003 VII Encontro Nacional de Usuários e Familiares do Movimento da Luta
Antimanicomial, 18 a 21 de setembro, RJ.
2004 Rede Nacional Internúcleos da luta Antimanicomial.
2005 VI Encontro Nacional da Luta Antimanicomial, São Paulo.
2006 Núcleo Brasileiro de Direitos Humanos e Saúde Mental, Portaria Interministerial
3.347.
Quadro 13 - Acontecimentos indicativos dos Direitos em Saúde Mental
Fonte: Portarias do Ministério da Saúde; relatórios das organizações ver nas referências
bibliográficas.
Destaca-se a Conferência Regional para a Reestruturação da Atenção
Psiquiátrica na América Latina (OPAS,1990) que passou a ser identificada como a
Declaração de Caracas, resultado de avaliações que OPAS realizou sobre a
situação da atenção em saúde mental na região, e constatou freqüentes
desrespeitos aos direitos dos portadores de transtorno mental, bem como com a
avaliação de que a assistência deveria ser de base comunitária e não mais centrada
no modelo hospitalocêntrico.
La Declaración de Caracas es un instrumento de gran valor en lo
que se refiere a la promoción de servicios comunitarios y aboga por una
atención psiquiátrica participativa, integral, continua y preventiva donde el
hospital psiquiátrico no constituya la única modalidad asistencial porque [...]
crea condiciones desfavorables que ponen en peligro los derechos
humanos y civiles del enfermo (JIMÉNEZ; VÁSQUEZ, 2001, p.266).
A Declaração de Caracas passou a ser um importante parâmetro na
elaboração de políticas na área de saúde mental que contemplam a atenção de
base municipal e ambulatorial, na avaliação de que o modelo centrado no hospital
120
psiquiátrico não produz condições para o desenvolvimento de saúde mental para as
populações. Outra declaração importante é a da Organização das Nações Unidas
102
(ONU), que em 1991 adotou os Princípios para a Proteção de Pessoas com
Enfermidade Mental e para a Melhoria da Assistência à Saúde Mental, explicitando
no Princípio das Liberdades Fundamentais e Direitos Básicos, que “toda pessoa com
uma enfermidade mental terá o direito de exercer todos os direitos civis, políticos,
econômicos, sociais e culturais” (ONU, 1991, p. 31).
A efetivação destes direitos continua sendo um horizonte a ser alcançado, e
para tanto, a via privilegiada é a de mobilização social e ação política, considerando
que mudanças de concepção requerem debate e articulação para alçarem o
patamar de legitimidade. O próprio segmento envolvido alcançou o patamar de ser
protagonista desta luta, com a existência de várias instâncias de participação e
reivindicação por inclusão social, bem como elaboraram uma Carta sobre os Direitos
dos Usuários e Familiares nos Serviços de Saúde Mental, em 1993, que tem sido a
referência na luta por condições dignas e com qualidade na atenção.
A potência na luta por direitos “somente se explicita quando se politiza, até
mesmo porque tem como ser travada em meio a conflitos sociais, jogos
institucionais e postulações de autoridade ou de poder” (NOGUEIRA, M, 2004, p.
62). A elaboração e a aprovação da Lei de Reforma Psiquiátrica
103
no Rio Grande do
Sul foi um destes momentos que marcou a saúde mental no estado na luta pela
cidadania dos portadores de transtorno mental.
Uma mudança conceitual, significativa, foi contemplada nas Disposições da
Lei de Reforma Psiquiátrica gaúcha, referente à denominação de pessoa com
sofrimento psíquico em substituição ao termo prevalente de doente mental. Muito
além de uma questão meramente semântica, esta denominação significa dizer que a
pessoa que sofre com um adoecimento não se reduz em sua condição de sujeito à
patologia de que é portadora. A expressão sofrimento psíquico anuncia uma
102
Ver outras Resoluções dos organismos internacionais sobre saúde mental em Dias (2004b) e no
Quadro 13, p. 117.
103
Lei da Reforma Psiquiátrica nº. 9.716, de 1992, dispõe sobre a reforma psiquiátrica no Rio
Grande do Sul, determina a substituição progressiva dos leitos nos hospitais psiquiátricos por rede de
atenção integral em saúde mental, determina regras de proteção aos que padecem de sofrimento
psíquico, especialmente quanto às internações psiquiátricas compulsórias e outras providências”
(RIO GRANDE DO SUL, 1992b).
121
mudança conceitual da consideração da cidadania do sujeito com diagnóstico de
doença mental, expresso também nos Marcos Conceituais da II Conferência
Nacional de Saúde Mental, em 1992
104
: “é necessário construir mudança no modo
de pensar a pessoa com transtornos mentais em sua existência, e não apenas a
partir de seu diagnóstico” (BRASIL, 1994).
Esta concepção é fundamental, norteadora dos novos parâmetros de relação
da pessoa consigo mesma e com a sociedade, pois existe certo consenso de que
a existência de um diagnóstico de doença mental ou a internação em
estabelecimento psiquiátrico não deve implicar na perda da capacidade civil (PITTA;
DALLARI, 1992). Portanto, a lei gaúcha contempla a condição de cidadão e sujeito
de direitos do portador de sofrimento psíquico.
Artigo 1º - Com fundamento em transtornos em saúde mental ninguém
sofrerá limitação em sua condição de cidadão e sujeito de direitos,
internações de qualquer natureza em outras formas de privação de
liberdade sem o devido processo legal nos termos do artigo 5º, Inciso LIV,
da Constituição Federal (RIO GRANDE DO SUL, 1992b).
No âmbito federal, somente em 2001 foi sancionada a Lei nº.10.216
105
,
dispondo sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos
mentais e redirecionando o modelo assistencial em saúde mental. Esta lei,
conhecida como a Lei da Reforma Psiquiátrica foi debatida no Congresso Nacional
por doze anos, e é o resultado possível e negociado do Projeto de Lei Paulo
Delgado que o Movimento Nacional da Luta Antimanicomial formulou e articulou
como proposta de reversão do modelo manicomial em 1989. Houve uma disputa
acirrada entre as forças que apóiam e as contrárias à extinção progressiva dos
hospitais psiquiátricos e sua substituição por outros recursos assistenciais, e a
regulamentação da internação psíquica compulsória.
A aprovação da lei no congresso e sua sanção pelo presidente da República
foi o desdobramento de uma tensão entre as diferentes forças sociais implicadas no
processo: o movimento da luta antimanicomial e demais forças sociais que
defendem o mesmo projeto, os proprietários dos hospitais psiquiátricos e os
segmentos que lutam pela manutenção da ordem estabelecida de que lugar de
104
Ver Quadro 11, p. 91.
105
Ver Quadro 12, p. 95.
122
louco é no hospício. O governo que, ao longo de várias gestões
106
, adotou um
conjunto de medidas na direção da reforma psiquiátrica, resistia em assumir esta
posição frente à sociedade.
O acontecimento que desencadeou a tomada de decisão para a aprovação
da Lei foi o fato da OMS-OPAS ter escolhido como tema do Dia Mundial da Saúde
(07 de abril) do ano de 2001 com o lema Saúde Mental: Cuidar Sim, Excluir Não, no
propósito de difundir e conclamar todos a alterar a situação de que “a saúde mental
ainda não recebe a atenção e os recursos que lhe são devidos” (OPAS, 2001). Esta
iniciativa teve o mérito de assinalar a atenção para a saúde mental novamente na
agenda dos países, o que repercutiu positivamente no Brasil. Além de a Lei ter sido
sancionada na véspera do Dia Mundial da Saúde, após nove anos o Ministério da
Saúde marcou e realizou a III Conferência Nacional de Saúde Mental
107
em
dezembro do mesmo ano.
Apesar do atraso na criação de legislação sobre direitos dos portadores de
transtorno mental, o Brasil teve um avanço significativo neste campo, principalmente
pelas iniciativas de seus Estados
108
e do movimento social da Luta Antimanicomial,
que com a parceria de vários segmentos sociais, construiu um outro patamar de
reconhecimento da cidadania deste grupo social e criou uma significativa rede de
atenção. Quando os sujeitos se instalam como seres políticos, pode-se visualizar a
possibilidade de efetiva mudança. A política é uma proposta sobre a distribuição do
poder; é a capacidade de fazer proposições de ações com um fim determinado;
deste modo, o único lugar possível do homem é de se constituir como ser político
(TESTA, 1992). Por este cenário brasileiro, a OMS (2001) lança o Relatório sobre a
Saúde no Mundo 2001: Saúde Mental por ocasião da III Conferência Nacional de
Saúde Mental do Brasil, em 2001, num reconhecimento dos esforços realizados no
país, apesar de todas as tensões e dificuldades estruturais na efetivação de políticas
públicas na saúde e especificamente na saúde mental.
106
Ver Quadro 11, p. 91.
107
Ver Quadro 12, p. 95.
108
Vários Estados brasileiros também aprovaram Leis de Reforma Psiquiatria: Rio Grande do Sul
(1992), que foi o pioneiro, Espírito Santo (1992), Pernambuco (1992), Ceará (1993), Distrito Federal
(1995), Minas Gerais (1995) Paraná (1995) e Rio Grande do Norte (1995) (BASIL, 2001).
123
As normas internacionais e nacionais sobre os direitos do portador de
transtorno mental estão alicerçadas na afirmação universal dos direitos humanos
para todos os povos e no reconhecimento de que violação quando existe
discriminação e desrespeito aos sujeitos que padecem de transtorno mental. A
OPAS formou um grupo de trabalho, em 1998, para a realização de um diagnóstico
sobre o estado dos direitos humanos das pessoas com transtorno mental nos países
da América Central e concluiu que os direitos são mais violados em hospitais
psiquiátricos, destacando-se o desrespeito à liberdade, ao livre trânsito, à
integridade física, privacidade e à internação voluntária (OPAS, 1998).
No Brasil, é permanente esta histórica violação de direitos; serão destacadas
algumas delas, por serem uma grave transgressão ética ao princípio de que os
portadores de transtorno mental são sujeitos de direitos. Este enunciado ético é
absoluto, pois “um enunciado ético não pode ser relativista [...] fazer uma afirmação
ética é dispensar, automaticamente, o peso das evidências empíricas como garantia
de legitimação última do que é dito” (COSTA, 1996, p. 28). A afirmação de que os
portadores de transtorno mental são sujeitos de direitos é independente da
confirmação e de determinadas circunstâncias e julgamentos, pois é um valor
construído social e historicamente.
Entre as formas de violação dos direitos está o taxa de mortalidade maior
entre os internados em hospitais psiquiátricos comparando com a população em
geral, conforme estudo realizado em 2001 no HPSP, quando ficou evidenciado que
a expectativa de tempo de vida é menor entre os moradores do hospital (57,2 anos)
em relação à população geral do Estado (71,5 anos) (DIAS et al, 2001, p. 42). Outra
situação de desrespeito ao direito da integridade física dos portadores de transtorno
mental no Rio Grande do Sul foi a existência, num hospital psiquiátrico privado e
conveniado com o SUS, de quinze (15) celas fortes para contenção de internos
constatado pelo GAPH
109
em 1995, agravado pelo fato deste estabelecimento ter
recebido nos anos seguintes o Prêmio Qualidade do Rio Grande do Sul, pelo
109
GAPH Grupo de Acompanhamento e Avaliação da Assistência Psiquiátrica Hospitalar/RS, que
realizou suas atividades no período de 1993 a 2000. Somente no ano de 2000 as celas fortes deste
hospital foram interditadas e, posteriormente, em função do reordenamento da saúde neste município
da região sul do estado e pelas contínuas pressões pela forma como este hospital “tratava” os
portadores de sofrimento psíquico, seus proprietários resolveram fechá-lo no ano de 2003.
124
“reconhecimento do trabalho de Qualidade Total que vem sendo desenvolvido pela
empresa” (DIAS, 2004a, p. 75).
Por uma violação a este mesmo princípio, o Brasil foi condenado na Corte
Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos
(OEA) pela morte do usuário Damião Ximenes Lopes
110
numa clínica psiquiátrica
conveniada com o SUS, com base na Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, nos artigos que tratam da garantia à integridade física, à vida e de
garantias e proteção judicial dos seus cidadãos (OLIVEIRA, E. 2006). Este
acontecimento contribuiu para a iniciativa do Ministério da Saúde de formar o Núcleo
Brasileiro de Direitos Humanos e Saúde Mental
111
, com uma tarefa de “contribuir
para o aperfeiçoamento e a ampliação dos mecanismos de promoção e proteção
dos direitos, combatendo o estigma, a intolerância, a discriminação, a exclusão
social e os maus tratos às pessoas com transtornos mentais” (BRASIL, 2006c, p.
02). O governo brasileiro pretende com esta medida reduzir o quadro de violações
ainda presentes no país.
De modo geral, a internação psiquiátrica tem sido um dos aspectos mais
discutidos no campo da saúde mental, pela situação de ser produtora de várias
formas de desrespeito aos direitos (MEDEIROS; GUIMARÃES, 2002; DALMOLIN,
2006). A Câmara dos Deputados, através da Comissão de Direitos Humanos, a
OAB, o Conselho Federal de Psicologia, Centro de Justiça Global e os diversos
núcleos que lutam pela reforma psiquiátrica, têm acompanhado e denunciado
sistematicamente as práticas de violação de direitos
112
. Um aspecto da internação
psiquiátrica é a dimensão da internação compulsória e involuntária, um dos sérios
problemas, não no campo dos direitos, entendido como o conjunto de “normas
que declaram, reconhecem, definem, atribuem direitos ao homem” (BOBBIO, 1992,
77), como na subjetividade daqueles que têm esta experiência no percurso da vida.
A internação compulsória não tem sido adotada exclusivamente para aquelas
110
Damião Lopes tinha 30 anos quando foi internado na Casa de Repouso Guararapes em 1999,
instituição privada contratada pelo SUS, em Sobral, Ceará, sendo encontrado no terceiro dia com
marcas de agressões violentas, o que o levou ao óbito. Processos contra os funcionários e o médico
da clínica ainda não foram julgados no Brasil. A família procurou uma ONG que luta por justiça e
contou com o apoio do movimento da luta antimanicomial local e nacional.
111
Ver Quadro 13, p. 117.
112
Ver Brasil (2000); Centro de Justiça Global (2004); Conselho Federal de Psicologia (2004).
125
pessoas seriamente comprometidas pela gravidade de seu transtorno. Mesmo em
relação a estes,
O dilema entre o dever de cuidar e os direitos individuais de cada ser
humanos, a sociedade via provedores dos cuidados social e de saúde
tem a obrigação moral e social de providenciar sustento e tratamento para
aqueles com sérios transtornos mentais. Todavia, isso significa o direito de
suspender todos os direitos e responsabilidades civis dos doentes mentais,
permitindo inclusive detenção forçada e tratamento involuntário?
(VASCONCELOS, 2003, p. 184).
Esta é uma indagação de natureza ética, que revela a ainda necessária
discussão e, principalmente, mudança de mentalidade em vários segmentos sociais,
principalmente entre os profissionais da saúde (BRITTO, 2004; AMARANTE et al,
2005). A internação compulsória foi abordada tanto na legislação estadual (artigos
10º e 11º) como na federal (artigos ao 9º), normatizando regras e
responsabilidades dos estabelecimentos e profissionais, bem como a intermediação
do Ministério Público na tarefa de fiscalizá-las. A Portaria nº. 2.391, de 2002
113
do
Ministério da Saúde regulamenta esta matéria, criando os mecanismos de controle
necessários e definindo a participação dos gestores estaduais no acompanhamento
desta medida.
A raiz da internação involuntária e compulsória está no fundamento da
cidadania, que é o de estabelecer o direito do usuário formar opinião sobre seu
transtorno e poder escolher sobre seu ingresso voluntário numa instituição hospitalar
psiquiátrica. Caracteriza também o direito à informação sobre suas condições de
saúde, o que deve ser garantido pelo profissional de saúde envolvido, mais do que o
uso da autoridade de determinar a internação. “A aplicação do princípio da
autonomia na relação cuidador-cuidado [...] trouxe ao cenário da atenção à saúde
uma nova ética: agora o usuário pode decidir sobre o que é melhor para si”
(QUINTO NETO, 1992, p. 9).
113
Regulamenta o controle das internações psiquiátricas involuntárias e voluntárias de acordo com o
disposto na Lei 10.216, e os procedimentos de notificação ao Ministério Público pelos
estabelecimentos de saúde, integrantes ou não do SUS. No seu artigo 10 fica estabelecido que o
gestor estadual do SUS constitua uma Comissão Revisora das Internações Psiquiátricas
Involuntárias, com a participação de integrante designado pelo Ministério Público Estadual, que fará o
acompanhamento dessas internações, no prazo de setenta e duas horas após o recebimento da
comunicação pertinente. (Ver Quadro 13, p. 117).
126
Por fim, e provavelmente a questão mais aguda revela uma violação
importante dos direitos dos portadores de transtorno mental, é o relativo à interdição
como instrumento de acesso a benefícios sociais. A interdição civil é um recurso
jurídico que corresponde ao reconhecimento legal de que alguém é considerado
incapaz para a prática da vida civil (INSTITUTO FRANCO BASAGLIA, 2004).
Através deste instrumento jurídico, o Estado tem a prerrogativa legal de negar
os direitos fundamentais de sujeitos pela sua condição de portador de uma doença
muito particular, que afeta e prejudica a capacidade de discernimento e de auto-
cuidado, sob a justificativa de que, desta forma, está se realizando a proteção dos
incapacitados. Nestes casos, o mesmo será representado por um curador, que por
determinação jurídica, assume o compromisso de representação com
responsabilidade pública. “É através da nomeação do curador que o Estado
dispensa sua proteção às pessoas (maiores), cuja incapacidade para exercer os
atos da vida civil foi processualmente comprovada” (MEDEIROS, 2005, p. 89).
A questão do estatuto da interdição tem seu fundamento no pressuposto da
racionalidade como critério definitivo sobre a autonomia e discernimento dos
indivíduos, instaurado com o Iluminismo. No Brasil, este instrumento jurídico está
regulamentado no Código Civil, e no campo da saúde mental, o Decreto Lei .
24.559, de 1934
114
que dispõe sobre a Assistência e Proteção à Pessoa e aos Bens
dos Psicopatas, é claro o artigo 26 ao expressar: “os psicopatas, assim declarados
por perícia média processada de forma regular, são absolutamente incapazes de
exercer pessoalmente os atos da vida civil” (DELGADO, 1992, p. 269). Esta
afirmação evidencia a prerrogativa legal de destituir os direitos civis de determinados
grupos de pessoas de forma absoluta, não considerando singularidades e graus
variados de possibilidades.
Esta premissa foi problematizada no campo jurídico e no da defesa dos
direitos (BRASIL, 2002b), provocando uma mudança, ainda que tênue, mas
importante no sentido de não mais generalizar a todos os portadores de transtorno
mental a condição de interdito. O novo Código Civil, Lei 010.406, de 10 de janeiro
de 2002, que passou a vigorar a partir de janeiro de 2003, no artigo 1.767 define os
114
Ver Quadro 2, p. 29.
127
que estão sujeitos à curatela, entre eles: I aqueles que, por enfermidade ou
deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida
civil” (MEDEIROS, 2005, p. 111). Contemporaneamente então, inicia-se uma tomada
de posição que poderá beneficiar a muitos portadores de transtorno mental que
estão sob o signo da interdição.
O paciente não é mais tido como absolutamente incompetente
destituído de vontade e incapaz por si, devendo sempre submeter-se a
tratamento. O doente tem competência admitida: não é mais incompetente,
a priori, por ser doente mental. Seus sintomas são vistos na sua totalidade,
em toda a sua personalidade, podendo haver dano parcial dessa, mas sem
comprometer seu convívio social (COHEN; MARCOLINO, 1996, p. 20).
Contudo, como anunciado anteriormente, para além desta necessária
discussão, uma outra dimensão a ser enfrentada, relativa à interdição solicitada
pela estrutura da Previdência Social para aqueles usuários com possibilidade de
acesso ao Benefício de Prestação Continuada
115
. Este recurso está,
[...] cada vez mais banalizado, especialmente em função das exigências do
sistema previdenciário. É urgente o estabelecimento de uma norma
administrativa que distinga com clareza e eficácia administrativa a
incapacidade laborativa da incapacidade civil. Hoje, o paciente mental que
pleiteia o benefício por incapacidade para o trabalho é quase
invariavelmente obrigado a submeter-se à interdição de seus direitos civis
(DELGADO, 2001, p. 286).
A Previdência Social seguia a orientação legal indicada pelo Decreto nº.
3.048, de 06/05/1999, no artigo 162, os parágrafos
116
1º: “é obrigatória a
apresentação do termo de curatela, ainda que provisória, para concessão de
aposentadoria por invalidez decorrente de doença mental”. O parágrafo
estabelecia que: “verificada, administrativamente, a recuperação da capacidade para
o trabalho do curatelado de que trata o parágrafo 1º, a aposentadoria será
encerrada”. Este Decreto foi substituído pelo de nº. 5.699, de 13/02/2006, que
acresce e altera dispositivos do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n
o
3.048, de 6 de maio de 1999.
115
O Benefício de Prestação Continuada previsto na Lei Orgânica da Assistência Social é provido
pelo Governo Federal, consistindo no repasse de 1 (um) salário mínimo mensal ao idoso (com 65
anos ou mais) e à pessoa com deficiência que comprove não ter meios para suprir sua subsistência
ou de tê-la suprida por sua família.
116
Incluídos pelo Decreto nº. 4.729, 2003.
128
A Previdência Social, através de documento interno
117
fez um conjunto de
orientações às Agências de Previdência Social, como as que seguem: interrupção
da solicitação do Termo de Curatela para os casos de aposentadoria por invalidez
decorrente de enfermidade mental, inclusive aos benefícios de que dispõe a Lei
Orgânica da Assistência Social (LOAS), para os quais tem havido a exigência
indevida desse documento, por parte dos servidores da APS; e nos casos da família
expressar incapacidade do usuário para o recebimento do benefício, a conduta é
solicitar uma procuração, visto que “o fato de ser acometido de enfermidade mental
não significa a impossibilidade de consciência e expressão válida de vontade em
todos os momentos” e também, “a interdição, seja total ou parcial, nunca deve ser
exigência do INSS”. As demais orientações seguem esta direção, indicando os
dispositivos jurídicos que as fundamentam.
Constata-se nas orientações da Previdência Social uma auto-crítica sobre a
extrapolação de funções que vinha cometendo, ao exigir interdição civil para a
concessão de benefícios devidamente regulamentados. Uma explicação possível
para esta atitude recai no aspecto econômico, pois existe uma lógica nas relações
entre quem tem o dever e quem tem o direito, de fazer uma série de exigências para
protelar a concessão, e, portanto, no caso específico, protelar uma despesa pública.
Medeiros (2005) realizou um estudo sobre a situação da interdição civil na
promotoria de Justiça de Família e Sucessões de Porto Alegre, no período dos anos
2000 a 2002. Os dados encontrados foram os seguintes: em 55,2% o motivo tinha
sido a presença de transtornos mentais e comportamentais; 98,4% com interdição
total; 40,5% dos interditos residem em hospital psiquiátrico e manicômio judiciário, e
16,2% em serviços residenciais terapêuticos; o tipo de renda está distribuído da
seguinte forma - 86,5% provenientes do sistema de seguridade social:
aposentadorias (37,1%), pensão previdenciária (31,2%) e benefício de prestação
continuada (18,1%), e 45% dos sujeitos interditados com renda a dois salários
mínimos
118
. Esta é uma descrição de um “sujeito sem capacidade de exercício, sem
poder de voz e de vontade; sujeito sem autonomia; sujeito que passa a ser
117
Instituto Nacional no Seguro Social - Memorando-circular 09 23/02/2006, expedido pela
Diretoria de Benefícios até a publicação da nova instrução normativa que irá disciplinar os assuntos
relacionados ao novo decreto.
118
A faixa de renda é de a um salário mínimo 30%; e de 01 a 02 salários mínimos 15%
(MEDEIROS, 2005).
129
considerado como um cidadão incompleto” (MEDEIROS, 2005, p. 196), confirmando
o padrão excludente e desigual persistente na sociedade brasileira.
A conclusão é direta: existe de fato uma fratura na cidadania, pois para se
garantir o acesso a um direito social é preciso abrir mão de direitos civis e políticos.
Portanto, pensar direitos aos portadores de transtorno mental envolve uma
multiplicidade de dimensões, cujo pólo central é o relativo à noção da autonomia
possível e requerida, de modo a reduzir os impactos das violações legais,
institucionais e culturais a que estes estão submetidos. Esta é o tipo de autonomia
que se pode almejar nos tempos atuais, mas tendo como horizonte o sentido potente
da emancipação humana quando do “controle efetivo total, pelos produtores
associados, das condições de sua própria vida – e, em primeiro lugar, das condições
materiais da produção -, para que consigam realizar os objetivos estabelecidos por
eles próprios” (MÉSZÁROS, 2004, p. 122).
A autonomia como sinônimo de liberdade na vida, “[...] não é um processo
natural, resultado harmonioso e equilibrado das relações sociais e do
desenvolvimento econômico” (CATTANI, 1996, p. 149). Pelo contrário, é
condicionada pelas determinações econômicas, sociais e culturais de cada momento
histórico. O movimento histórico dialético configura a história como processo,
permeada de contradições que, com as condições materiais necessárias, os homens
podem ir superando estágios anteriores e anunciando novos, os quais por sua vez,
também trazem em si contradições e diferenças, pois os homens são protagonistas
desta história; modificam-na e por ela são modificados. Os direitos estão nesta
perspectiva, em construção histórica, conforme as necessidades e capacidades
humanas de anunciar sua emancipação.
Para além da ordem legal e institucional garantidora da cidadania e
democracia [...] direitos dizem respeito ao modo como as relações sociais
se estruturam. [...] os direitos estabelecem uma forma de sociabilidade
regida pelo reconhecimento do outro como sujeito de interesses válidos,
valores pertinentes e demandas legítimas (TELLES, 1999, p. 138).
Finalizando, concluiu-se que o manicômio foi uma instituição necessária na
fase do capitalismo industrial, que produziu a segregação e a tutela dos portadores
de transtorno mental, e que em tempos de neoliberalismo e globalização é possível
ser aceita no campo teórico a noção de direitos a este segmento, ainda que
130
concretamente não realizáveis. Este consenso existe a respeito do fracasso do
modelo manicomial, e esta condição foi possível na atual configuração da sociedade
com características pós-industrial, pois a sociedade não precisa mais exercer o
controle dos indivíduos através desta instituição total, uma vez que os segmentos
desprotegidos pela nova lógica do capitalismo, formado, entre outros, pelos “doentes
estigmatizados” estão situados “nas bordas da sociedade oficial, eles se vêem e são
vistos como uma não-sociedade ou uma contra-sociedade e assim interatuam com a
ordem” (NETTO, 1996, p. 96).
Esta nova realidade possibilitou avanços no sentido de salvaguardar direitos
dos que padecem de transtorno mental, ainda que de forma restrita, bem como a
capacidade de agentes sociais formularem e executarem políticas públicas de
superação do modelo hospitalocêntrico. Contudo, estes ocorreram quando da
adoção dos ajustes estruturais e reforma administrativa do Estado no Brasil,
revelando outra
contradição: “desde o fim da Guerra Fria, o que permanece no
mundo com incidência planetária são apenas o mercado e o discurso dos direitos
humanos: [...] o mercado porque excludente, os direitos humanos porque
incompletos” (ALVES, 2000, p. 202).
Entre as conseqüências da reestruturação produtiva e da globalização da
economia nas últimas duas décadas do século XX até os dias atuais, está a da não
realização dos direitos, pois “no plano real seu gozo está condicionado àqueles que
podem aproveitar as oportunidades de desenvolvimento completo de suas
capacidades humanas [...]” (BUSSINGUER, 1997, p. 35), e estes não são os
segmentos majoritários da sociedade brasileira, que lutam no cotidiano para ter
condições mínimas de dignidade na vida.
Assim, as condições postas expressam novas configurações da questão
social e continuam sendo o desafio permanente dos indivíduos sociais, os mesmos
desde o advento do capitalismo e do liberalismo no mundo moderno. Em 1846 foi
escrito que,
Nos pergaminhos, podemos facilmente proclamar constituições, o
direito de todo o cidadão à educação, ao trabalho e, sobretudo, a um
mínimo de meios de subsistência. Mas, com isso, não se fez tudo; ao se
escreverem esses desejos generosos sobre o papel, persiste a verdadeira
tarefa de fazer frutificar essas idéias liberais por meio de instituições
131
materiais e inteligentes, por meio de instituições sociais (MARX, 2006, p.
50).
Ou seja, as aspirações dos homens e mulheres por emancipação são
históricas e em permanente devir. As sociedades avançaram na criação do
estatuto dos direitos para todos os sujeitos, superando a racionalidade como critério
de diferenciação. O desafio é a efetivação através de ações concretas e efetivas,
para a superação deste hiato nas desigualdades sociais e na realização da
cidadania. “A superação significa constante integração nas novas aquisições,
compreensão dos novos fatos à luz do saber conquistado [...]” (LEFÈBVRE, 1988, p.
109), ou seja, para as permanentes análises da nossa sociedade, se faz necessário
o constante deciframento da realidade e dos fenômenos que lhe dão dinamicidade.
3.3 O ESTADO DA ARTE DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL E NO RIO
GRANDE DO SUL
Uma sistematização do panorama da situação atual da política pública de
saúde mental no Brasil é necessária para se analisar qualitativamente o seu cenário
na perspectiva da reforma psiquiátrica. Inicialmente, é importante uma definição
sobre o que se está entendendo como reforma psiquiátrica, pois esta expressão
pode ter vários significados. Um deles compreende-a como uma mera reorganização
dos serviços e modernização da instituição psiquiátrica (MACHADO, 2005),
seguindo as orientações dos organismos internacionais e na ótica da humanização
da atenção. Ou seja, se as instituições psiquiátricas perderem o caráter asilar e
adotarem relações mais respeitosas com os seus assistidos, a reforma psiquiátrica
está concretizada.
Outra perspectiva é de se constituir como um “conjunto de transformações de
práticas, saberes, valores culturais e sociais” (DELGADO, 2007, p. 39),
compreensão que tem sua construção desde a I Conferência Nacional de Saúde
Mental (1987) e por todos os debates produzidos nas várias instâncias e encontros
da luta antimanicomial
119
. No I Encontro Nacional da Luta Antimanicomial (1993)
foram discutidos os esforços para a superação de qualquer forma de segregação,
como condição para a efetivação dos direitos de todos os cidadãos.
119
Ver Quadros 10 (p. 79) e 13 (p. 117).
132
A nossa sociedade não consegue conviver com as diferenças e a
forma que encontra de lidar é de excluí-los. Condição a partir da qual, esta
sociedade se descompromete com o que é parte dela. É preciso mudar o
padrão cultural, o que não significa negar as diferenças, mas respeitá-las e
garantir a heterogeneidade e a cidadania na sociedade. Precisa ficar claro
que não é a proteção dos excluídos que propomos, mas sim relações de
troca que respeitem as diferenças, possibilitando a transformação legítima
das relações (ENCONTRO, 1993, p. 15).
A possibilidade de se considerar as diferentes formas de expressão e
inserção dos sujeitos no mundo equivale a respeitar as diferenças nas possibilidades
e nas limitações de cada um, na perspectiva de que as relações devam ser
produzidas de forma democrática e com respeito à dignidade humana.
O verdadeiro desafio da reforma psiquiátrica não é a ingênua (e
politicamente perigosa) utopia de um mundo de homens ‘mentalmente
saudáveis’. Sempre haverá aqueles para quem a vida é mais difícil, o
sofrimento mais penoso, e a necessidade de ajuda mais constante. O alvo
da reforma é curar instituições, práticas e conceitos que nos permitam lidar
com essas pessoas sem descrevê-las negativamente; que possibilitem o
exercício da solidariedade sem o recurso à piedade (BEZERRA JÚNIOR,
1994, p. 187).
Assim, a reforma psiquiátrica tem contida em si esta perspectiva de incidir
sobre as instituições, entendidas como representações simbólicas e organizadoras
da relação entre indivíduo e sociedade. Por fim, a partir do desvelamento de
diversas dimensões e significados, entende-se reforma psiquiátrica como um
processo de reversão do modo manicomial e hospitalocêntrico de enfrentar o
fenômeno do transtorno mental e do sofrimento psíquico
120
, com a centralidade da
cidadania dos sujeitos, estes inseridos numa histórica e determinada sociedade.
Para tanto, algumas categorias lhes são intrínsecas: desinstitucionalização,
intersetorialidade, interdisciplinaridade e a integralidade da atenção.
O momento atual da saúde mental indica que a reforma psiquiátrica está em
processo, com imensos desafios a serem superados, mas ao mesmo tempo, está
materializada e legitimada no país e no estado do Rio Grande do Sul, como se
demonstrará. Inicialmente, se desenvolverá o contexto nacional e posteriormente o
120
“Conjunto de mal-estares e dificuldades de conviver com a multiplicidade contraditória de
significados oriundos do antagonismo subjetividade e objetividade. Caracteriza-se por dificuldade de
operar planos e definir sentido de vida, aliada ao sentido de impotência e vazio, o eu experimentado
como coisa alheia” (SAMPAIO, 1999).
133
estadual. Para tanto, se utilizará dos quadros sínteses dos acontecimentos mais
relevantes, como o Quadro 14, da saúde mental no país a partir dos anos 1990.
ANO
ACONTECIMENTOS
1991
Portaria Ministério da Saúde nº.189 – Cria procedimentos na Tabela SUS para
pagamento de ações de: leito psiquiátrico em hospital geral e hospital-dia, em centros
de atenção psicossocial, oficinas terapêuticas e visitas domiciliares.
Portaria Ministério da Saúde nº. 407 – Regulamenta exigências mínimas para o
funcionamento de hospitais psiquiátricos.
1992
Portaria Ministério da Saúde nº. 224 – Regulamenta o funcionamento de um conjunto
de serviços de saúde mental. Esta Portaria teve a particularidade de ter sido aprovada
previamente pelos coordenadores estaduais de saúde mental.
Portaria Ministério da Saúde nº. 106 - Serviços Residenciais Terapêuticos.
Portaria Ministério da Saúde nº. 799 - Programa Permanente de Organização e
Acompanhamento das Ações Assistenciais em Saúde Mental.
2000
Portaria Ministério da Saúde nº. 1.220 – Regulamenta o cadastro e financiamento dos
Serviços Residenciais Terapêuticos.
Portaria Ministério da Saúde nº. 44 - Regulamentação de Hospital Dia.
Portaria Ministério da Saúde nº. 298 - Concessão de passe livre para pessoas
portadoras de deficiência.
2001
Portaria Ministério da Saúde nº. 175 – Regulamentação sobre a supervisão técnica
dos Serviços Residenciais Terapêuticos.
Portaria nº.101 - ANVISA - Regulamentação do funcionamento de serviços
psicossociais para atendimento de usuários de álcool e outras drogas.
Portaria Ministério da Saúde nº. 77 – Redefine o financiamento e cobrança em
hospitais psiquiátricos.
Portaria Ministério da Saúde nº. 251 - Diretrizes e normas para a assistência hospitalar
em psiquiatria e reclassifica os hospitais psiquiátricos na rede SUS.
Portaria Ministério da Saúde nº. 336 - Normas e diretrizes para a organização de
serviços em saúde mental: CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPS ad, CAPS i.
Portaria Ministério da Saúde nº. 816 - Cria o Programa Nacional de Atenção
Comunitária Integrada a Usuários de álcool e outras drogas.
2002
Portaria Ministério da Saúde nº. 817 - Inclusão de código de procedimentos para
financiamento de tratamento de internação hospitalar em hospital geral para
transtornos derivados do uso de álcool e outras drogas.
Lei nº. 10.708, cria o auxílio-reabilitação psicossocial para assistência,
acompanhamento e integração social, fora de unidade hospitalar, de pacientes
acometidos de transtornos mentais internados em hospitais ou unidades psiquiátricas,
Programa de Volta para Casa.
2003
Portaria Ministério da Saúde nº. 2.077 – Regulamenta o auxílio reabilitação
psicossocial – Programa De Volta para Casa.
2004
Portaria Ministério da Saúde nº. 52 – Institui o Programa Anual de Reestruturação da
Assistência Psiquiátrica Hospitalar no SUS.
Continua
134
continuação
Portaria Ministério da Saúde nº. 2.197 - Redefine e amplia a atenção integral para
usuários de álcool e outras drogas, no âmbito do SUS.
2004
Portaria Ministério da Saúde nº. 2.068, que institui incentivo aos municípios de R$
10.000,00 para a implantação de Serviços Residenciais Terapêuticos.
Portaria Ministério da Saúde nº. 245 - Destina incentivo financeiro antecipado para
CAPS em fase de implantação.
Portaria Ministério da Saúde nº. 1.174 – Programa de Qualificação dos CAPS,
garantindo a supervisão clínico-institucional
regular e incentivando a integração permanente com a rede básica.
Portaria Interministerial nº. 353 - Institui o Grupo de Trabalho de Saúde Mental e
Economia Solidária.
2005
Portaria nº. 1.169 - Destina incentivo financeiro para municípios que desenvolvam
projetos de Inclusão Social pelo Trabalho destinados a pessoas portadoras de
transtornos mentais e/ou de transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas.
2005
OPAS - Carta de Brasília - Princípios Orientadores para o Desenvolvimento da
Atenção em Saúde Mental nas Américas.
Quadro 14 - Síntese da Política de Saúde Mental no Brasil a partir dos anos 1990
Fontes: GUIMARÃES, TAVARES, 1994; KINOSHITA, 1996; BRASIL, 2004; JIMÉNEZ; VÁSQUEZ,
2001; FIOCRUZ, 2005; HOCHMAN, 2005.
A reforma psiquiátrica tem sido a diretriz da política pública adotada
paulatinamente, com avanços e recuos, pelo governo brasileiro desde a década de
1990, permanentemente sendo negociada entre as forças políticas
121
. Contudo, a
adoção da reforma psiquiátrica acontece num momento histórico e contraditório em
que os países da América Latina começam a vivenciar os primeiros ensaios
neoliberais. "A retração do Estado e a cessão de espaços ao capital privado ocorre
tanto na esfera econômica como na do bem estar social" (LAURELL, 2002, p. 166),
agrava o processo de empobrecimento de camadas significativas da população.
Os ajustes neoliberais visam remercantilizar os bens sociais, reduzir o gasto
público e suprimir a noção de direitos sociais, com repercussão especial aos
portadores de transtorno mental. Esta é uma preocupação dos segmentos do setor
121
A partir de uma composição política, a coordenação da política nacional de saúde mental no
Governo Collor de Mello é assumida por um profissional médico pertencente ao movimento nacional
da luta antimanicomial, Dr. Domingos Sávio. Esta condição possibilitou o estabelecimento das
primeiras portarias ministeriais que reordenava a assistência na direção da reforma psiquiátrica, e a
constituição de uma referência para as futuras gestões sobre os pressupostos fundamentais que
deveriam seguir este setor na política de saúde no Brasil.
135
da saúde mental, que na III Conferência Nacional de Saúde Mental deliberaram
sobre a urgência de se “garantir o financiamento público da seguridade social,
elemento fundamental para viabilizar a efetiva reinserção social dos usuários de
saúde mental” (BRASIL, 2002c, p. 89), visto ser a seguridade social a área mais
sensível em circunstâncias de ajustes fiscais.
Este contexto é relevante por ser propício à captura dos ideários da luta pela
transformação da atenção em saúde mental, como justificadora de redução e
precarização da oferta de serviços em saúde mental, pelo risco de que,
[...] no atual contexto de crise do Estado e dos serviços públicos, e de uma
onda neoliberal conservadora, o movimento antimanicomial seja apropriado
por políticas privativistas e francamente negligenciadoras da assistência, o
que particularmente vem acontecendo, por exemplo, nos EUA e Inglaterra
(VASCONCELOS, 1990, p. 112).
A análise sobre o estado da arte da reforma psiquiátrica pretende verificar de
que tipo ela se constitui no Brasil, e para isto serão utilizadas as seguintes
categorias operacionais: modalidades de atenção e oferta de serviços, gastos em
saúde mental, garantia de direitos e produção científica na temática. Um conjunto de
dispositivos de cuidados vem se construindo na saúde mental no Brasil, compondo o
que se denomina rede de atenção integral em saúde mental, como definido na II
Conferência Nacional de Saúde Mental (1994). As modalidades Serviço Residencial
Terapêutico, Centro de Atenção Psicossocial, De Volta para Casa e Inclusão Social
pelo Trabalho são os que mais representam a natureza da mudança na política de
saúde mental, pois contemplam as necessidades singulares e sociais dos sujeitos
portadores de transtorno mental. A descrição de cada um deles, bem como o
instrumento legal de criação e a oferta dos mesmos no Brasil está no Quadro 15.
136
TIPO PORTARIA
ANO
DESCRIÇÃO SITUAÇÃO
2006
SRT –
Serviço
Residencial
Terapêutico
nº. 106
em
2000
Moradias ou casas inseridas,
preferencialmente na comunidade,
destinadas a cuidar dos portadores de
transtornos mentais, egressos de
internações psiquiátricas de longa
permanência, que não possuam suporte
social e laços familiares e que viabilizem
sua inserção social.
475 SRT
CAPS –
Centro de
Atenção
Psicossocial
nº. 366
em 2002
Cria as modalidades de serviços: CAPS I,
CAPS II e CAPS III, definidos
porte/complexidade e abrangência
populacional, realiza prioritariamente o
atendimento de pacientes com transtornos
mentais severos e persistentes em sua
área territorial; serviço ambulatorial de
atenção diária que funcione segundo a
lógica do território.
1.000 CAPS
De Volta para
Casa
nº. 2.077
em
2003
Auxílio-reabilitação psicossocial para
assistência, acompanhamento e
integração social, fora de unidade
hospitalar, de pacientes acometidos de
transtornos mentais internados em
hospitais ou unidades psiquiátricas.
2.600 benefícios
Inclusão
Social pelo
Trabalho
nº. 1.169
em 2005
Incentivo financeiro para municípios que
desenvolvam projetos de Inclusão Social
pelo Trabalho, destinados a pessoas
portadoras de transtornos mentais e/ou de
transtornos decorrentes do uso de álcool e
outras drogas.
400 programas
Quadro 15 - Modalidades de Atenção em Saúde Mental e situação no Brasil, 2006
Fonte - elaboração a partir de BRASIL, 2006b.
No ano de 2004 o Tribunal de Contas da União (TCU) realizou uma auditoria
para avaliar as ações de atenção à saúde mental
122
vinculadas no Plano Plurianual
(PPA) 2004-2007. Previamente à realização da auditoria, o TCU elaborou um
diagnóstico da política, identificando como ameaças e fraquezas,
[...] a insuficiência da rede extra-hospitalar; dificuldade na capacitação dos
recursos humanos; restrição de gastos dos municípios com pessoal em
razão da Lei de Responsabilidade Fiscal; problemas de logística na
aquisição e fornecimento de medicamentos; estigmatização dos
122
Gerenciadas pela Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde (SAS), por meio da
Coordenação Geral de Saúde Mental.
137
beneficiários pela sociedade; avaliação deficiente das ações pela ausência
de indicadores no PPA e inexistência de informações necessárias para a
gestão das ações de saúde mental nos sistemas do SUS (BRASIL, 2005, p.
11).
Como oportunidades, constataram “melhoria de desempenho nas dimensões
de articulação institucional, descentralização, eficácia, efetividade e eqüidade das
ações, bem assim quanto à sua operacionalização e execução”. Como conclusão,
[...] as análises iniciais indicaram que as medidas adotadas pelo Programa
ainda são insuficientes para consolidar e ampliar uma rede de atenção de
base comunitária e territorial, promotora da reintegração social e da
cidadania da pessoa portadora de transtorno mental (BRASIL, 2005, p. 11).
A longa transcrição se justifica pela objetividade e clareza da avaliação
realizada pelo Tribunal sobre a situação da saúde mental no Brasil no momento. É
uma avaliação técnica porque tem como parâmetro os marcos legais instituídos, mas
com a percepção do alcance esperado pela reforma psiquiátrica, como se constata
na exposição contida na conclusão. O TCU analisou os gastos em saúde mental
executados pelo governo federal, o que se reproduzirá pelo significado que o
orçamento tem nas políticas sociais públicas. É a previsão orçamentária e a sua
execução que oferecem a medida mais real e concreta sobre o estado da arte da
saúde mental, assim como de toda e qualquer outra atividade pública. A Tabela 03,
elaborada pelo TCU, considerou os valores alocados no PPA para as três ações
diretamente relacionadas à atenção em saúde mental no período 2004 a 2007 e no
orçamento de 2004.
138
Tabela 03 - Previsão orçamentária em 2004-2007 e valores pagos em 2004 às
ações de atenção à saúde mental.
Ação
Previsão PPA
2004/2007
Previsto
orçamento
2004
Valores pagos
até 15/01/2005
% Execução
financeira em
2004
0843 – De Volta para
Casa
28.525.000 6.300.000 1.587.283 25,19
0844 - Apoio a Serviços
Extra-hospitalares para
Transtornos de Saúde
Mental e decorrentes
do Uso de Álcool e
outras Drogas
55.061.191
10.316.000
776.846
7,53
6233 - Atenção à
Saúde Mental
2.717.000 586.999 111.700 19,03
Total 86.843.191 17.202.999 2.475.829 14,39
Fonte: BRASIL, 2005, p. 13.
As informações da Tabela 03 revelam que globalmente não foi executado o
parâmetro esperado no primeiro ano do PPA (2004), em torno de 25% da previsão
orçamentária para quatro anos. Isoladamente, somente o Programa de Volta para
Casa alcançou esta proporção. Contudo, estas informações são insuficientes para a
avaliação sobre os gastos em saúde mental, uma vez que várias fontes para seu
financiamento e, por conseguinte, diferentes registros de dados sobre gasto em
saúde no sistema brasileiro.
Uma despesa significativa de volume de recursos não está contemplada no
PPA com a especificidade da saúde mental, que são as relacionadas aos
procedimentos ambulatoriais e de internação
123
por meio do Programa Atenção
Hospitalar e Ambulatorial no Sistema Único de Saúde. Os incentivos financeiros
para a instalação dos CAPS e SRT o lançados na conta do MAC, fundo da Média
e Alta Complexidade, o que causa menor execução financeira da ação 0844. Outra
fonte de financiamento é o Fundo de Ações Estratégicas e de Compensação
(FAEC), que paga o custeio dos CAPS e SRT, também repassados fundo a fundo. O
123
Estes têm a Remuneração por Serviços Produzidos (procedimentos ambulatoriais (SIA) e
hospitalares (SIH)) pela rede contratada e/ou conveniada ao SUS com pagamento creditado
diretamente nas contas correntes dos prestadores de serviço pelo Fundo Nacional da Saúde.
139
FAEC
124
foi criado para garantir o financiamento, pelo gestor federal, de
procedimentos de alta complexidade em pacientes com referência interestadual ou
procedimentos decorrentes de ações consideradas estratégicas pelo Ministério da
Saúde, que decorrem de políticas de saúde definidas em função das necessidades
de grupos prioritários (SOUZA, 2003).
Outro estudo sobre os gastos em saúde mental foi realizado a partir dos
dados
125
relacionados aos procedimentos ambulatoriais e de internação,
possibilitando um retrato das despesas a partir desta outra fonte de financiamento.
No ano de 2003, Andreoli revela que 3,1% do gasto do poder público com o SUS foi
destinado a ações e serviços de saúde mental (2007, p. 95). Este percentual
corresponde ao parâmetro deliberado na II Conferência Nacional de Saúde Mental
(BRASIL, 1994) para o financiamento de ações no setor.
No exame das despesas
nesta área per capita nos últimos cinco anos o estudo revelou uma redução de 40%
em relação ao ano de 1998 (de 0,05 para 0,03 reais). Esta informação é importante,
pois revela uma queda na capacidade do governo de financiar ações em saúde
mental, e, por conseguinte, na política de saúde.
Outro aspecto examinado no estudo é que as internações psiquiátricas
representaram 3% total de gastos com hospitalizações no Brasil (ANDREOLI, 2007,
p. 91), revelando alguns pontos interessantes para análise. Um deles, Andreoli
relaciona à redução de leitos no país, queda significativa que será posteriormente
analisada. Outro ponto é relativo a uma importante mudança nesta última década
quanto à magnitude da internação psiquiátrica, pois nas diretrizes anteriores à
reforma psiquiátrica, esta era o centro do atendimento em saúde mental, por isto a
expressão hospitalocêntrica.
Em 2003 a internação psiquiátrica foi a sétima causa das internações no
Brasil (MARSIGLIA, 2007) e em 1992 o tratamento psiquiátrico foi a segunda causa
de internação hospitalar no Brasil, antecedida pela internação para parto (FARIA;
JATENE, 1995). Interessante estes maiores motivos de internação na época, pois as
124
Portaria do Ministério da Saúde nº. 531, de 1999. Até então, a totalidade dos recursos federais
destinados ao custeio da assistência à saúde estava alocada nos tetos financeiros dos estados e do
Distrito Federal. Dessa forma, o Ministério da Saúde não dispunha de instrumentos que lhe
possibilitassem financiar e priorizar ações consideradas estratégicas (SOUZA, 2003, p. 08).
125
Departamento de Informação e Informática do SUS (Datasus).
140
pessoas entravam no hospital para nascer e depois quando ficavam loucas. Esta
loucura, condicionada por múltiplos fatores, dentre eles as condições de vida da
maioria da população brasileira, como estudo recente confirmou.
As classes sociais, num plano mais complexo da realidade,
determinam as condições materiais de vida e a estrutura ocupacional,
mediações que, uma vez quantificadas, explicam a magnitude e a
distribuição das doenças nas populações. [...] Enfim, baixa escolaridade,
baixa renda e exclusão do mercado de trabalho, expressões da estrutura
das classes sociais, proporcionam situações de estresse contribuindo para
a produção dos transtornos mentais comuns (LUDERMIR; MELO FILHO,
2002, p. 220).
Continuando nas reflexões sobre os gastos em saúde mental, o estudo
referido revelou que o principal gasto no ano de 2003 foi em internação psiquiátrica
(85,8%) enquanto que com CAPS foi de 2% (ANDREOLI, 2007, p. 95). Este dado diz
respeito diretamente a uma das lutas do movimento da reforma psiquiátrica, que é a
reversão do modelo hospitalocêntrico, tanto que uma das diretrizes aprovada na III
Conferência Nacional de Saúde foi a de “garantir a imediata inversão de prioridades
no financiamento da política de saúde mental, na proporcionalidade de 80% para a
rede substitutiva e 20% para o sistema hospitalar” (BRASIL, 2002c, p. 86).
A constatação de que houve maior gasto em internação psiquiátrica é crucial,
pois define qual é o estado da arte da reforma psiquiátrica: redução de leitos e
não investimento em serviços de atenção integral em saúde mental. Mas, dados
mais atualizados revelam que está havendo esta reversão almejada,
considerando os gastos realizados no conjunto das modalidades de saúde mental.
Na Tabela 04 apresenta-se um estudo comparativo que permite a visualização da
evolução dos gastos percentuais em internação e nos serviços de saúde mental,
denominados como substitutivos à internação psiquiátrica.
141
Tabela 04 - Evolução Comparativa Percentual entre Gastos com Internação
Hospitalar e Rede Substitutiva em Saúde Mental, 1997 a 2006 – Brasil.
Ano / Composição de
Gastos
% Gastos Internação
Hospitalar
% Gastos com Rede
Substitutiva
1997 93,2 6,8
2000 91,0 9,0
2002 80,0 20,0
2004 63,8 36,2
2006 49,0 51,0
Fonte: Elaboração realizada a partir de BRASIL (2003 e 2006b) e DELGADO et al (2007).
Os dados da Tabela 04 revelam uma alteração ascendente de 6,8% dez
anos para 51% serviços de atenção em saúde mental de natureza ambulatorial e
territorial, superando assim a histórica supremacia da internação psiquiátrica na
atenção em saúde mental. Os dados sobre os gastos são confirmados com o
quantitativo dos serviços CAPS e leitos, como se constata na Tabela 05.
Tabela 05 – Leitos e CAPS no Brasil, 1996 a 2006 – Brasil
LEITOS
CAPS
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2005 2006
LEITOS 72.514
71.041
70.323
66.393
60.868
56.258
56.258
42.076
39.600
CAPS 154 176 231 237 253 295 382 672 1.000
Fonte: Elaboração realizada a partir de BRASIL (2003 e 2006b) e DELGADO et al (2007).
A expansão do serviço tipo CAPS foi muito significativa, mas possível pelo
custeio ser realizado com os recursos do FAEC. O Rio Grande do Sul tem
cadastrado, em 2006, o número de 97 CAPS, um quantitativo muito satisfatório na
proporção demográfica
126
, considerando que estes serviços são para municípios
com mais de 20.000 habitantes, e o estado tem 100 cidades com este contingente
126
A Coordenação Nacional de Saúde Mental criou o indicador CAPS/100.000 habitantes para medir
a capacidade de resposta dos serviços para o atendimento da população. Consideraram a cobertura
de serviços de CAPS como razoável a boa, seja nos municípios ou nos estados, quando a média
ultrapassa o valor de 0,50. O Rio Grande do Sul está com a média de 0,70 em 2006, revelando
aumento significativo em relação a 2002, quando estava com 0,39, e superior a média nacional de
0,44, estando localizado no terceiro lugar no ranking da cobertura nacional (BRASIL, 2007).
142
populacional, do total de 496 municípios. Contudo, com a significativa prevalência
dos transtornos mentais na população em geral, de 3% com transtornos mentais
severos e persistentes que necessitam atendimento contínuo; 12% com transtornos
mentais decorrentes do uso prejudicial de álcool e outras drogas; e 12% estimado da
população que necessita de atendimento contínuo ou eventual (DELGADO et al,
2007), pode-se concluir que os recursos gastos e o quantitativo dos serviços de
atendimento em saúde mental no país ainda são insuficientes.
Quanto aos leitos, a queda na sua oferta também é significativa, estando os
mesmos distribuídos em 225 hospitais (BRASIL, 2006b), quando em 1991 existiam
313 hospitais psiquiátricos
127
, seis destes no Rio Grande do Sul. Estas reduções no
número de leitos e de hospitais estão diretamente relacionadas tanto a um conjunto
de iniciativas do governo, com medidas de fiscalização e normatização do
funcionamento dos hospitais psiquiátricos
128
, como por situações graves de violação
de direitos humanos, que desencadearam crises nos estabelecimentos e posterior
fechamento de alguns
129
. Contudo, a supremacia do setor privado e filantrópico
persiste, ainda que com uma redução dos 82,7% em 1991, para 58% em 2006
(DELGADO et al, 2007).
A coordenação nacional da política de saúde mental expressa que os
desafios não são mais em relação à mudança do modelo de atenção, mas sim na
consolidação desta através da sustentabilidade financeira, técnica e política
(BRASIL, 2006b). Esta avaliação está em sintonia com a realidade atual, em que as
forças contrárias à reforma psiquiátrica se rearticulam
130
; mudanças no setor saúde
com o Pacto da Saúde alterando a forma de financiamento, com a previsão do
término da FAEC. Esta medida é uma solicitação do movimento sanitário de algum
tempo, para reduzir o centralismo e poder do governo federal na definição das
prioridades, reduzindo com isto a autonomia dos municípios na definição de suas
prioridades. Contudo, o custeio dos serviços de saúde mental estava garantido na
estratégia FAEC, e ainda não definição sobre como será o financiamento nesta
área.
127
Ver Tabela 01, p. 50.
128
Ver Quadro 14, p. 132.
129
Algumas situações abordadas no item 3.2.
130
Agora o setor que faz críticas não é o do mercado hospitalar, mas o coorporativo profissional. Ver
manifestações da Associação Brasileira de Psiquiatria no site http://www.abpbrasil.org.br/.
143
A questão das garantias necessárias para o financiamento em saúde mental
envolveu os organizadores e participantes da conferência da OPAS no Brasil em
2005 para marcar os quinze anos da Declaração de Caracas, quando se
comprometeram a “defender, junto às autoridades nacionais, o argumento de que é
necessário aumentar o financiamento em saúde mental, para enfrentar a dramática
carga de morbidade e incapacidade gerada pelos transtornos mentais” (OPAS,
2005, p. 5).
Outra dimensão fundamental também precisa ser consolidada e
institucionalizada, a de respeito aos direitos dos portadores de transtorno mental,
postura ainda em construção na sociedade e nos serviços de saúde mental.
Sendo uma questão de base ética, o futuro da reforma psiquiátrica
não está apenas no sucesso terapêutico-assistencial das novas tecnologias
de cuidado ou dos novos serviços, mas na escolha da sociedade brasileira,
da forma como vai lidar com os seus diferentes, com suas minorias, com os
sujeitos em desvantagem social (AMARANTE, 1995b, p. 5).
Esta realidade ainda é persistente, como se detectou em estudo nos
prontuários dos usuários dos serviços de saúde mental da região metropolitana de
Porto Alegre (DIAS, 2003), quando foram pesquisados os dados sociodemográficos
e terapêuticos realizados. Os dados obtidos estão visualizados no gráfico 01, o que
facilitará o entendimento sobre a afirmação realizada.
0
50
100
sexo idade estado civil escolaridade com quem mora
trabalho moradia renda individual renda familiar situação civil
consulta tempo tratamento evasões altas
Gráfico 01 - Freqüência de informações nos prontuários dos usuários de serviços de
saúde mental da região metropolitana de Porto Alegre, 2003.
Fonte: Dias, 2003.
144
Verifica-se a partir do Gráfico 01 que as informações existentes nos
prontuários dos usuários relativas à identificação pessoal constam em quantidade
significativa, assim como as relativas ao tratamento realizado. Contudo, as
informações referentes à cidadania, como a escolaridade, trabalho, moradia, renda e
a situação civil
131
dos usuários, tem a presença mediana nos prontuários
pesquisados. Ou seja, a ausência destes registros revela o quanto a concepção dos
direitos dos portadores de transtorno mental ainda está por se realizar.
A noção dos direitos serem pauta de projetos terapêuticos, orientadores da
ação de cuidados, significa conhecer quem é o usuário que precisa de atenção, qual
sua realidade quanto às condições de moradia, trabalho, educação, cultura, vínculos
afetivos e sociais. Principalmente, que a ação terapêutica seja uma ponte para a
construção de novas relações sociais, de possibilidades de construção de outras
oportunidades de vida, numa sociedade tão desigual.
O problema não é o transtorno mental que precisa ser cuidado
continuamente e por toda a vida, mas como colaborar para que os indivíduos
portadores destes transtornos sejam cidadãos e incluídos no mundo. Portanto, é
fundamental que se possam vislumbrar possibilidades de alargamento de acesso a
direitos, e no caso da saúde mental, constatar que a superação do manicômio não
se reduz à extinção dos hospitais psiquiátricos, mas sim a uma perspectiva ética de
relação entre sujeitos distintos, mas iguais de direitos.
A outra perspectiva para análise da situação atual da reforma psiquiátrica é a
produção acadêmica em programas de pós-graduação stricto senso. Os bancos de
teses foram pesquisados com os termos reforma psiquiátrica e
desinstitucionalização, cujo resultado foi um total de 262 produções (74,8% no nível
de mestrado e 25,2% no nível de doutorado), distribuídas em trinta e seis (36)
Unidades de Ensino (USP/USP Ribeirão Preto, com 22%, Fiocruz com 10,7% e
UERJ com 7,3% das produções). No Rio Grande do Sul constou o registro de nove
produções, na proporção de 3,4% em relação ao total no país. As áreas de
conhecimento com maior concentração das produções foram: enfermagem (30,2%),
saúde pública e saúde coletiva (22,2%), psicologia (21,8%); o serviço social teve
131
Conhecimento sobre se o usuário está em pleno gozo de seus direitos civis ou está sob interdição
civil.
145
4,2% das produções. O ano de 1987 foi o primeiro a ter uma produção e, após um
intervalo, começa uma regularidade a partir de 1992. Os temas foram agrupados por
categorias e distribuídos por percentual de ocorrência, como se visualiza no Quadro
16.
TEMAS
%
1987 1994
%
1995
1999
%
2000
2006
Desinstitucionalização 18 4 0
Reinserção social pelo trabalho e pelo programa de
bolsa-auxílio
9 9 9
Organização do trabalho em saúde mental 9 13 20
Novas formas de cuidado 18 38 46
Contextualização e Conceituação 9 5 7
Compartilhando experiências 28 31 18
Outros 9 0 0
Quadro 16 - Percentual de ocorrência de temas das Dissertações e Teses de 1987 a
2006
Fonte: Resumo das Dissertações e Teses obtidos junto aos Banco de Teses, 2006.
Constata-se neste quadro que algumas temáticas foram sendo pesquisadas
com mais vigor no período de 2000 a 2006, enquanto outras tiveram seu interesse
reduzido ao longo do tempo. Pesquisas sobre novas formas de cuidado e para
compartilhamento de experiências atingiram um patamar considerável no segundo
período, sendo que somente a primeira manteve o interesse, de forma majoritária,
entre os pesquisadores na área. O interesse na organização do trabalho passou a
ser relevante como conseqüência da expansão das modalidades de atenção nos
últimos anos. Pode-se concluir que os temas da reforma psiquiátrica e da
desinstitucionalização têm sido alvo de estudos investigativos, revelando o interesse
entre os profissionais de saúde em compreender e desvelar todas as suas
possibilidades.
Há um reconhecimento internacional dos avanços no país, e no estado do Rio
Grande do Sul, na capacidade de formulação de legislação protetora dos direitos
dos portadores de transtorno mental. A OPAS apresentou um estudo investigativo
146
sobre os efeitos da Declaração de Caracas nos países da região
132
, quando o Brasil
foi destacado, pois “following the recommendations of the Caracas Declaration,
Brazil has undertaken a fertile legislation reform at both the national and state levels”
(BOLIS, 2001, p. 14). O estado do Rio Grande do Sul é assinalado neste
documento, em função da Lei 9.716, como se constata:
Since 1992 eight stadual laws have been enacted, all of them
establish the progressive substitution of the mental health hospital for other
medical services. Law No. 9,716 of 7 August 1992 of Rio Grande do Sul, for
example, prescribes the progressive substitution of the beds in the
psychiatric hospitals for comprehensive care networks of health services. In
addition, the norm states principles for the protection of the mental patients,
especially in voluntary hospitalization situations (BOLIS, 2001, p. 15).
O processo de construção, instalação e também de reação à reforma
psiquiátrica no Rio Grande do Sul está marcado pela permanente tensão entre os
pólos de modernização e ruptura
133
no campo da saúde mental, o que, mesmo
assim, produziu um cenário satisfatório de avanços na oferta de serviços e na
qualificação profissional. Apesar da reforma psiquiátrica no estado não estar ainda
plenamente realizada, a década de 1990 vai ter a sua marca no campo da saúde
mental, pelo impacto que o processo de constituição, aprovação e medidas tomadas
por vários agentes sociais após a lei de Reforma Psiquiátrica, como se constata no
Quadro 17, que sistematiza os acontecimentos mais relevantes a partir da década
de 1990.
132
Os países do Mercosul que participaram da investigação foram a Argentina, o Brasil, o Paraguai e
o Uruguai. Estudo apresentado durante o XXVI Congresso Internacional sobre Legislação e Saúde
Mental, ocorrido em Montreal Canadá, pela conselheira Mónica Bolis da OPAS, sobre os efeitos da
Declaração de Caracas nos países da região.
133
Estes termos, que especificam e caracterizam determinadas concepções e práticas, se toma
emprestado de José Paulo Netto, que na sua obra Ditadura e Serviço Social, as utiliza para a análise
do Serviço Social no Brasil a partir da ditadura militar (NETTO, 1991).
147
ANO
ACONTECIMENTO
1990
Criação da Pensão Pública Protegida Nova Vida em Porto Alegre, através de um
convênio entre a SSMA e a Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, em
agosto.
Divisão do HPSP em duas áreas: a de moradia e a hospitalar, com 130 leitos.
1991
Organização do Fórum Gaúcho de Saúde Mental
III Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, na UFRGS, Porto Alegre. Realização do
Curso Saúde Mental nos Municípios. Apresentação de relatos das várias experiências
gaúchas em saúde mental.
1ª Conferência Estadual de Saúde Mental, de 03 a 06 de junho, em Tramandaí.
1992
Lei de Reforma Psiquiátrica no Rio Grande do Sul, 07 de agosto.
Cursos de Aperfeiçoamento em Saúde Mental Coletiva, em Rio Grande e Alegrete.
Cursos de Especialização em Saúde Mental Coletiva em Ijuí e Bagé
Carta Instituinte São Pedro Cidadão – Conselho Estadual de Saúde
1993
Encontro Estadual de Saúde Mental, com o tema “Louca Vida”, promovido pelo FGSM,
em Porto Alegre
1994
Lei nº. 10.097 que cria o Conselho Estadual de Saúde no RS
5º Curso de Especialização em Saúde Mental Coletiva, em Bagé.
V Encontro Estadual de Saúde Mental Coletiva e o I Encuentro de Salud Mental del
Cono Sur, em Bagé, com a participação de 500 pessoas do Brasil, Argentina, Uruguai
e Paraguai.
1995
Lei municipal de saúde mental em Canoas.
1996
Lei municipal de saúde mental em Alegrete.
1998
Lei municipal de saúde mental em Bagé.
1999
Encontro Estadual de Saúde Mental, em Porto Alegre, comemorando o Dia 18 de
maio, dia nacional da luta antimanicomial
Comissão de Saúde e Meio Ambiente cria Grupo de Trabalho para propor mudanças
no HPSP.
2004
Apresentação do projeto de Lei 40 na Assembléia Legislativa revogando a lei de
Reforma Psiquiátrica. O autor arquivou o projeto após não ter obtido apoio dos líderes
das bancadas para votação em plenário.
Reapresentação do projeto de Lei 40 na Assembléia Legislativa revogando a lei de
Reforma Psiquiátrica. A Comissão de Saúde rejeitou através de parecer, o teor da
proposta, em 2006.
2005
Mental Tchê - Encontro Estadual do Movimento pela Reforma Psiquiátrica, São
Lourenço do Sul, comemorando o Dia 18 de maio, dia nacional da luta antimanicomial
2º Mental Tchê, São Lourenço do Sul. 2006
I Encontro Estadual de CAPS, Caxias do Sul.
Quadro 17 - Síntese da Política de Saúde Mental no Rio Grande do Sul a partir dos
anos 1990
Fontes: SOARES, 1996, PICCININI, 2000; FAGUNDES, 2006.
148
Assim como a intervenção pública na Clínica Psiquiátrica Casa de Saúde
Anchieta, em Santos no ano de 1989
134
(KONOSHITA, 1996) representou para
aquele estado e para o Brasil o marco zero da reforma psiquiátrica, no Rio Grande
do Sul duas experiências basilares. Uma, na transformação da assistência aos
usuários em situação aguda, com o tratamento passando a ser de natureza
comunitária e extra-hospitalar, o serviço de saúde mental Nossa Casa, de São
Lourenço do Sul, criado em 16 de agosto de 1988
135
.
A outra é uma experiência pioneira da adoção da lógica da
desinstitucionalização para pessoas com longa trajetória de institucionalização
psiquiátrica, a Pensão Pública Protegida Nova Vida
136
, que “a partir das
necessidades individuais – de todos os sujeitos implicados: pensionista, família,
equipe, sociedade fomos construindo um projeto coletivo baseado no respeito, no
resgate da cidadania, na desinstitucionalização, na participação” (FISCHER, 1992,
p. 25).
A mobilização das distintas e antagônicas forças envolvidas nesta disputa é
permanente desde a aprovação da Lei de Reforma Psiquiátrica, em 1992,
caracterizando-se esta como um marco de ruptura no modelo até então vigente de
saúde mental no solo gaúcho. Nos períodos anteriores analisados
137
, registrou-se
um conjunto de reformas na política de saúde mental no estado, a maioria delas
tendo como pólo irradiador mudanças no HPSP
138
.
O período de apresentação e debate do projeto de Lei na Assembléia
Legislativa foi marcado por grandes mobilizações sociais, que extrapolaram a
discussão restrita dos grupos sociais interessados, alcançando a esfera da
sociedade gaúcha. Entre eles, destaca-se a I Conferência Estadual de Saúde
Mental, em 1992, que foi um fórum fundamental na defesa da cidadania dos
portadores de transtorno mental, na indicação de que a saúde mental deveria ter
como referência o município, com caráter multidisciplinar e da necessária inter-
134
Ver Quadro 5, p. 48.
135
Ver Quadro 10, p. 79.
136
A Clínica Pinel em 1990 encerrou um convênio com o antigo Inamps de manutenção de uma
pensão. Com esta medida, os 58 pensionistas foram assumidos pelos governos estadual e municipal.
137
Ver item 2.3.
138
A discussão que se realizará girará na órbita do HPSP, considerando o tema deste estudo ser um
projeto vinculado a este estabelecimento.
149
relação com as demais políticas sociais visando a integralidade da atenção (RIO
GRANDE DO SUL, 1992 a).
A presença e o papel mobilizador do Fórum Gaúcho de Saúde Mental foram
preponderantes no processo de discussão da lei de reforma psiquiátrica, realizando
eventos, campanhas, comunicações e debates na imprensa em todo o estado,
resultando que o Rio Grande do Sul foi o pioneiro na história do Brasil em
estabelecer uma legislação
139
que contemplasse a nova lógica em saúde mental
(QUINTO NETO, 1992; DIAS, 1997a; FAGUNDES, 2006). A organização do Fórum
Gaúcho de Saúde Mental (FGSM) ocorreu em 1991, durante um encontro estadual
realizado em Bagé, quando os vários grupos que defendem uma sociedade sem
manicômios existentes no estado se articularam e se fortaleceram como um
movimento social, marcado pela informalidade, mas orgânico na defesa do projeto
da luta antimanicomial.
O Conselho Estadual de Saúde
140
(CES) foi uma instância que também
desempenhou um papel importante na formulação da reforma psiquiátrica no estado
do Rio Grande do Sul. Um conjunto de medidas foram adotadas (DIAS, 1997 a),
sendo mais significativa a construção do projeto de transformação do Hospital
Psiquiátrico São Pedro, denominado São Pedro Cidadão, em 1993. A Comissão de
Saúde Mental do CES desencadeou um debate público e constituiu um grupo de
trabalho com os diversos segmentos envolvidos no campo da saúde mental, cujo
resultado se traduziu no Relatório da Comissão de Saúde Mental, denominado Carta
Instituinte São Pedro Cidadão (RIO GRANDE DO SUL, 1993a), que foi apresentado
e aprovado por unanimidade pelo Plenário do Conselho.
A homologação
141
desta proposta não foi realizada na gestão estadual
daquele período, somente em 1999 quando o programa São Pedro Cidadão foi
alçado a uma das prioridades do governo. A mobilização em torno das mudanças no
HPSP, símbolo da luta pela reforma psiquiátrica no estado, foi e continua sendo,
139
Ver no Quadro 17 (p. 146) a promulgação de leis Municipais de saúde mental.
140
O Conselho Estadual de Saúde estava numa época com fértil e agudo debate sobre sua
identidade, que culminou na aprovação da Lei 10.097 lhe outorgando a devida legitimidade.
141
Conforme prevê a Lei 10.097 do CES, artigo 5º: “As decisões do Conselho Estadual de Saúde
serão consubstanciadas em Resoluções. Parágrafo único - O Secretário da Saúde e do Meio
Ambiente, na qualidade de Gestor do Sistema Único de Saúde/RS, terá o prazo de trinta (30) dias
para homologar sobre as Resoluções” (RIO GRANDE DO SUL, 1994).
150
desde então um espaço de disputas
142
entre os que defendem e os que são
contrários às mudanças no campo da saúde mental. Aqui no solo gaúcho ainda tem
sentido a guerra de posições:
Estamos em pleno universo gramsciano: uma guerra de posições
que se desenvolve por caminhos tortuosos, onde atores a favor e contra a
Reforma Sanitária defendem seus ideários e entram em luta (de forma
velada ou aberta), nas mais diversas instâncias - no interior dos aparelhos
das instituições de saúde, junto às organizações da sociedade, no
Congresso e nas instituições profissionais do setor - no contexto de uma
grave crise social e econômica (GALLO; NASCIMENTO, 1989, p. 93).
Numa das mudanças no HPSP foi adotada uma tática, que na órbita do
discurso fez a apologia de cumprimento da legislação da reforma psiquiátrica em
vigor, mas concretamente foi uma necessidade de adequação e distribuição de AIH
no Estado, pois era a época da introdução da NOB 1991. Houve a significativa
redução no quantitativo de leitos hospitalares psiquiátricos, através da medida
drástica de retirada de 915 leitos do HPSP do sistema de internação hospitalar (SIH
SUS) em 1995, e consequentemente, liberando este quantitativo de AIH para ser
utilizados pela rede hospitalar SUS no estado, permanecendo 130 cadastrados e
autorizados a realizar internação psiquiátrica.
As pessoas institucionalizadas permaneceram sob cuidados na área asilar
143
no Hospital, mas os atendimentos passaram a ser registrados como ambulatoriais.
Ou seja, aquelas pessoas continuaram internadas, mas, por um artifício político-
administrativo, sua ocupação deixou de ser considerada como de leito psiquiátrico
(DIAS, 1997
a).
Na época, o gestor anunciou tal medida como sendo de cumprimento da
reforma psiquiátrica, mas esta não foi corroborada pela ausência de medidas para
ampliação da oferta de serviços substitutivos de atenção em saúde mental. Em
relação à oferta de serviços ambulatoriais em saúde mental, na primeira metade da
década de 1990 foi constatado que houve um aumento, mas este ocorreu através do
142
Desde o ano de 2004 por duas vezes foi apresentado um projeto de lei que revoga a lei de
Reforma psiquiátrica no estado (Quadro 17, p. 146).
143
Em 1991 o HPSP foi dividido administrativa e tecnicamente em duas áreas: asilar e hospitalar,
esta com 130 leitos.
151
empenho dos municípios. Estes aumentaram na proporção de 44,2% no período de
1991 a 1995, e em relação CAPS, o aumento foi de 28,6% no mesmo período
144
.
O processo de implantação do SUS estava em curso no Brasil, com a
municipalização
145
sendo efetivada sob orientação da NOB 1991
146
, esta por sua vez
iniciada com a implantação das Ações Integradas de Saúde (AIS), que “viabilizaram
concretamente a expansão da capacidade instalada da rede pública, sobretudo
ambulatorial” (NORONHA; LEVCOVITZ, 1994, p. 86). Assim, a expansão da atenção
em saúde mental do tipo ambulatorial está mais diretamente relacionada à
municipalização. Mas este processo se deve também a uma peculiaridade gaúcha
(BEZERRA JÚNIOR, 1994), que se inicia na década anterior, de forte mobilização e
produção no campo da saúde mental, em que diferentes cursos e eventos
147
foram
motivadores do movimento de crítica ao modelo manicomial e hospitalocêntrico e de
produção de uma rica variedade de formas de cuidar e respeitar os portadores de
transtorno mental gaúchos.
[...] realizamos em dez anos, de 1987 a 1996, dezoito cursos de saúde
mental coletiva, que estão inventariados no próximo capítulo, “implicamos”
709 alunos, 556 em aperfeiçoamento e 153 em especialização. Contamos
com 97 professores e “implicamos igual dezena de apoiadores docentes
locais em cada curso. na metade do período, em 1992, tínhamos 112
serviços de saúde mental criados nos municípios “implicados” (FAGUNDES,
2006, p. 96).
A aprovação da Lei de Reforma Psiquiátrica foi um motivo alegado por dois
governos
148
estaduais para fazerem propostas de venda da área de 16 hectares
onde se localiza o HPSP, para ocupação de condomínios e de centro de compras.
As reações foram intensas, por parte de vários segmentos da sociedade e do
movimento da luta antimanicomial. Estas ocasiões tiveram a peculiaridade de
produzir consenso na defesa de uma causa: os contrários
149
à reforma psiquiátrica
por motivos óbvios, e os defensores, por considerarem o terreno e os prédios de uso
144
Dados obtidos junto a 284 municípios, correspondendo a 66,51% dos municípios do Estado na
época (DIAS, 1997
a).
145
No Rio Grande do Sul até o início do ano de 1996, 150 cidades (35,13%) do Estado já estavam
municipalizadas.
146
Ver Quadro 11, p. 91.
147
Ver Quadros 10 (p. 79) e 17 (p. 146).
148
As tentativas foram nos anos de 1992 e 1996, repetindo iniciativas realizadas em 1987.
149
As organizações que formalmente se manifestaram contra foram a Associação dos Hospitais do
Rio Grande do Sul, a Sociedade de Apoio ao Doente Mental (SADOM), a Associação de Funcionários
do HPSP, e posteriormente, se agregou a este grupo, o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul.
152
legítimo dos que viviam por décadas, sendo por direito o local preferencial para
viverem.
Outras propostas de mudanças foram as tentativas de transferência de
moradores para o Hospital Colônia Itap(RIO GRANDE DO SUL, 1991 a) e mais
recentemente, a Secretaria de Estado da Saúde inseriu no PPA 2004-2007 a ação
de “construir 100 Residenciais Terapêuticos para reinserção de pacientes na
comunidade. As casas serão construídas na área do Hospital Colônia Itapoã” (RIO
GRANDE DO SUL, 2003a, p. 246). No exame do documento para deliberação do
Conselho Estadual de Saúde, a Comissão de Saúde Mental rejeitou esta ação, pelo
seu caráter segregador ao pretender enviar para um local afastado do centro urbano
pessoas institucionalizadas que vinham algum tempo interagindo de forma
produtiva na cidade. Por outro lado, a SES não destinou verbas para a conclusão do
Serviço Residencial Terapêutico Morada São Pedro
150
, que consiste de igual modo
em serviços residenciais terapêuticos.
As normas legais construídas para resguardar os direitos dos portadores de
transtorno mental e o programa de avaliação da assistência hospitalar psiquiátrica
do Ministério da Saúde
151
possibilitaram um maior acompanhamento da assistência
prestada pelos hospitais psiquiátricos. Particularmente o HPSP tem sido
frequentemente vistoriado e fiscalizado, também pelo Ministério Público, detectando
as condições insalubres e os maus tratos praticados. Várias mobilizações têm sido
feitas, seja para a transformação da assistência, como o Serviço residencial
terapêutico Morada São Pedro, seja pela sua manutenção nos moldes atuais, na
visão modernizadora e humanizadora da reforma psiquiátrica.
A mais recente e articulada proposta foi construída pela Comissão de Saúde
e Meio Ambiente da Assembléia Legislativa, que criou um Grupo de Trabalho
152
para
estudar e encaminhar propostas para os inúmeros problemas enfrentados pelo
Hospital Psiquiátrico São Pedro (a curto, médio e longo prazo). Após a conclusão
dos trabalhos, o grupo propôs a constituição de uma Fundação de Direito Público
150
Este projeto será detalhado no próximo capítulo.
151
Ver Quadros 11 (p. 91) e 12 (p. 95).
152
Formado a partir de uma Audiência Pública na Comissão de Saúde e Meio Ambiente, em 05 de
maio de 2004, solicitada pelo Sindicato dos Servidores Públicos do Estado (SINDSEPE) e da
Comissão de Mobilização dos Funcionários do HPSP.
153
para ter maior capacidade jurídica e administrativa de solução para os problemas
que acompanham esta instituição. Reafirmaram a aplicação das decisões contidas
no Projeto “São Pedro Cidadão” e a continuidade ao projeto “Morada São Pedro”,
entre outras sugestões (RIO GRANDE DO SUL, 2004). O esforço despendido pelas
entidades e parlamento em pensar alternativas para o estabelecimento não teve
continuidade, posto que o governo estadual não pautou a questão do HPSP na sua
agenda.
A adoção dos pressupostos da Reforma Psiquiátrica, especificamente no
caso brasileiro, foi sem dúvida um avanço quanto à introdução dos direitos dos
portadores de transtorno mental, que passam a compor um conjunto de dispositivos
legais garantidores da sua cidadania. Contudo, pensar em cidadania para este
segmento é pensar na efetivação das políticas públicas no Brasil, que tem a marca
de ser um dos mais desiguais do mundo. É um contingente de aproximadamente
34% da população que vive abaixo da linha da pobreza (MARSIGLIA, 2007, p. 21) e,
portanto, “nem sempre têm noção de seus direitos ou ignoram seus direitos civis ou
os têm sistematicamente desrespeitados por outros cidadãos, pelo governo, pela
polícia. Não se sentem protegidos pela sociedade e pelas leis” (CARVALHO, 2004,
p. 216).
São presenciados inúmeros recuos no processo de consolidação real do
sistema de saúde, em especial quanto aos aspectos fundamentais do financiamento,
do desenho organizacional e da prestação direta de serviços à população, ao
mesmo tempo em que se amplia o ordenamento legal da saúde privada sob a
denominação de saúde suplementar, crescendo a oferta de serviços de natureza
privada e contratada por empregadores e empregados. Ou seja, a lógica de que a
saúde é um direito de quem trabalha continua vigorando, pela maior presença do
mercado no setor saúde, ficando o serviço público destinado às camadas “pobres e
carentes” da sociedade.
O presente capítulo pretendeu situar e articular algumas das dimensões
contidas no debate sobre a reforma psiquiátrica no Brasil e no Rio Grande do Sul a
partir da década de 1990. Estas dimensões, ainda que com a aparência de serem
independentes entre si, na realidade estão em interconexão histórica e estrutural. O
contexto dos ajustes estruturais no país condiciona a formulação e implantação das
154
propostas de reversão do modelo manicomial e hospitalocêntrico, ainda presentes
no campo da cultura e da assistência em saúde mental. Mas, pela natureza
contraditória da realidade, criam-se as condições para instaurar uma nova
perspectiva, pautada nos direitos de todos os sujeitos, independente de suas
condições emocionais.
Esta sistematização foi necessária para configurar uma referência histórica e
teórica de análise de uma experiência de desinstitucionalização, em que um grupo
de internos do HPSP passou a morar e a viver sob esta perspectiva. Pretende-se
então responder ao seguinte problema de pesquisa: Em que medida a proposta de
desinstitucionalização Morada São Pedro possibilitou a efetivação dos direitos dos
portadores de transtorno mental egressos de longa internação hospitalar? Este
estudo tem o objetivo de verificar se o referido projeto, construído sob os auspícios
da reforma psiquiátrica, possibilitou a efetivação dos direitos daqueles sujeitos,
visando contribuir na formulação e execução de políticas públicas no campo da
saúde mental, como se verá no próximo capítulo.
4 EVIDÊNCIAS DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO SERVIÇO RESIDENCIAL
TERAPÊUTICO MORADA SÃO PEDRO
“O respeito à autonomia e à dignidade de cada um
é um imperativo ético
e não um favor que podemos ou não
conceder uns aos outros”
Paulo Freire, 2003
Este capítulo apresenta, inicialmente, a constituição e o funcionamento do
serviço residencial terapêutico Morada São Pedro, para situar este dispositivo da
atenção em saúde mental na perspectiva da reforma psiquiátrica, adotado como
política blica no estado gaúcho. Na seqüência se apresenta o caminho
metodológico realizado no processo investigativo, para posterior discussão teórica
dos resultados obtidos, procurando responder às questões norteadoras, e assim,
contribuir no conhecimento e na elaboração de políticas públicas no campo da
saúde mental.
4.1 MORADA SÃO PEDRO: PROPOSTA DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO
O Morada São Pedro consiste numa proposta de desinstitucionalização de
sujeitos portadores de transtorno mental que, por longo período, foram
hospitalizados no HPSP. Materializa-se num condomínio habitacional em que
moram tanto os egressos da internação psiquiátrica como parte dos habitantes da
Vila São Pedro
153
, realizado a partir do programa denominado São Pedro Cidadão,
que na perspectiva de garantia de direitos e superação do Hospício
São Pedro,
exigiu uma transformação para “além de uma assistência digna em saúde mental, a
garantia de inserção social com moradia, trabalho, renda, educação, cultura e lazer”
(MENEGASSI et al, 2002, p. 251). O Morada é um serviço vinculado ao HPSP,
responsável institucional pela sua manutenção, conservação e provimento de
pessoal.
153
A Vila São Pedro está localizada no quarteirão de terreno blico na Av. Ipiranga próxima à Av.
Salvador França, atualmente 3ª Perimetral. Na parte do terreno vizinha aos fundos do Hospital
Psiquiátrico São Pedro foi realizado o projeto de condomínio residencial Morada São Pedro, que por
sua vez, se constitui num serviço residencial terapêutico para egressos de longo tempo de
internação.
156
O programa São Pedro Cidadão foi construído através de esforços de
múltiplos atores no contexto da aprovação da lei de Reforma Psiquiátrica no estado
do Rio Grande do Sul. A Comissão de Saúde Mental do Conselho Estadual de
Saúde, em conjunto com as Comissões de Saúde e de Cidadania e Direitos
Humanos da Assembléia Legislativa; com a Secretaria de Saúde e Meio Ambiente;
Prefeitura Municipal de Porto Alegre, através da Secretaria Municipal de Saúde e o
Conselho Municipal de Saúde realizaram o evento São Pedro Cidadão – Assembléia
Instituinte
154
em 1993. A partir das discussões sobre as necessárias transformações
no HPSP, os participantes, representantes de vários segmentos vinculados à política
pública de saúde mental, formaram grupos de trabalho temáticos com a tarefa de
elaboração de propostas que garantissem “a atenção integral à saúde e o resgate da
identidade e cidadania” (RIO GRANDE DO SUL, 1993b).
Entre as propostas construídas e aprovadas pelo Conselho Estadual de
Saúde, constantes do Relatório Carta Instituinte São Pedro Cidadão, uma foi
específica à situação dos moradores, definindo ser necessário
Favorecer a interação entre o hospital e a comunidade com o objetivo
de provocar uma mudança cultural intensa para garantir um melhor
atendimento, elevando a qualidade de vida e evitando, ao máximo, o
processo de institucionalização. Levando em consideração as condições
físicas e psíquicas dos moradores com possibilidade de autodeterminação,
a Comissão propõe a criação de outras modalidades de moradia e
assistência como casa, apartamentos, pensões comunitárias, etc. (RIO
GRANDE DO SUL, 1993b).
Esta proposta atende ao artigo 12 da Lei de Reforma Psiquiátrica gaúcha, que
estabelece:
Aos pacientes asilares, assim entendidos aqueles que perderam o
vínculo com a sociedade familiar e que se encontram ao desamparo e
dependendo do Estado para sua manutenção, este providenciará atenção
integral, devendo, sempre que possível, integrá-los à sociedade através de
políticas comuns com a comunidade de sua proveniência (RIO GRANDE
DO SUL, 1992b).
Naquela época, algumas propostas de desinstitucionalização estavam em
curso no Brasil e no estado, com experiências denominadas de pensões
154
Na data de 29 e 30 de abril de 1993, no Auditório da Assembléia Legislativa.
157
protegidas
155
e lares abrigados (FURTADO, 2006), que foram as precursoras dos
Serviços Residenciais Terapêuticos. A modalidade de pensão para portadores de
transtorno mental estava pensada na década de 1970, preconizada pelo
Inamps
156
como uma forma intermediária entre a internação psiquiátrica e a
integração social, na perspectiva de desospitalização dos hospitais psiquiátricos de
grande porte. Posteriormente, no Rio Grande do Sul foi aprovada a Lei das Pensões
Públicas
157
em 1992, como negociação para aprovação da Lei da Reforma
Psiquiátrica (DIAS, 1997 a). Estas pensões não chegaram a ser implementadas,
visto não terem base política nem cnica
158
que as legitimasse como estratégia de
política pública.
No âmbito nacional, a política de saúde mental instituiu os Serviços
Residenciais Terapêuticos (SRTs) em 2000, a partir da Portaria do Ministério da
Saúde n. 106, que estabeleceu um conjunto de medidas de gestão e
financiamento
159
para viabilizar os processos de saída de usuários dos hospitais
psiquiátricos sem vínculo familiar ou com precárias condições de inserção social,
como uma estratégia de efetivação da reforma psiquiátrica. Esta estratégia,
associada ao Programa de Volta para Casa
160
, que instituiu o auxílio reabilitação
psicossocial para a assistência, acompanhamento e integração social para egressos
de longos períodos de internações psiquiátricas, são ferramentas fundamentais para
os processos de desinstitucionalização, visto que os hospitais psiquiátricos, assim
como o HPSP, estão repletos de sujeitos pobres e sem vínculos afetivos capazes de
lhes dar suporte para uma vida na sociedade. Este problema é de grande
magnitude, pois estimativa de que aproximadamente 13.500 moradores
ocupantes de 30% dos leitos psiquiátricos no Brasil têm condições de se
beneficiarem de SRTs (FURTADO, 2006).
155
No Rio Grande do Sul a experiência pioneira foi a Pensão Pública Protegida Nova Vida, ver item
3.3.
156
Manual de Serviço, valorizando a psiquiatria de comunidade para a assistência extra-hospitalar.
Resolução n. 304, 1973 (Quadro 4, p. 41).
157
Lei n. 9.715, 1992.
158
Um dos aspectos críticos da Lei era a previsão de pensões para 50 internos, o que dificilmente
possibilitaria a atenção individualizada e qualificada na perspectiva da inclusão social.
159
Ver Quadro 14, p. 132.
160
Lei n. 10.708, de 31/07/2003 e Portaria ministerial n. 2.077, 2003. O Auxílio corresponde a um
valor de R$ 240,00 mensais, com a necessidade de comprometimento do município na tarefa de
prover suporte aos beneficiários egressos.
158
Assim como muitas experiências foram desenvolvidas no Brasil desde a
década de 1990
161
e no próprio HPSP ao longo de sua trajetória
162
, o Programa São
Pedro Cidadão foi uma proposta de transformação institucional global, adotada
como uma ação prioritária do governo na gestão 1999-2002. Desencadeou um
conjunto de iniciativas provocadoras do processo de desinstitucionalização e,
portanto, de produção de novas práticas possibilitadoras de vida mais digna aos
moradores do histórico hospício gaúcho, na visão estratégica da intersetoralidade e
da integralidade.
A implementação do São Pedro Cidadão foi um desafio de instituir um novo
modo de cuidar em condições, muitas vezes, adversas, seja por depender de verbas
públicas, seja pela dificuldade de aceitação de propostas transgressoras ao discurso
competente, “aquele que pode ser proferido, ouvido e aceito como verdadeiro ou
autorizado porque perdeu os laços com o lugar e o tempo de sua origem” (CHAUÍ,
1993, p. 07). Este é o discurso da razão e da ciência, da tradição e do
conservadorismo, sustentador de relações estabelecidas e mantenedoras do status
quo do saber e posições legitimados na sociedade. Este discurso foi
permanentemente utilizado por outro projeto de mudanças no HPSP, cuja proposta,
ainda, é de,
[...] transformar o São Pedro num hospital de referência, moderno, com
equipamentos eficientes e rápidos para investigação clínica e exames
complementares, prestigiado, reconhecido por sua importância na área
médico-social, em que os profissionais reconhecem a existência da doença
mental e esforçam-se para reduzir o sofrimento de seus portadores
(COSTA, 2001, p. 02).
Esta perspectiva visa produzir a humanização das relações entre profissionais
e pacientes, e oferecer tecnologia mais avançada para diminuir o sofrimento de ser
portador de um transtorno mental. A tensão entre os projetos contrário e favorável à
161
FISCHER (1992), GUIMARÃES; SAEKI (2001), SCARCELLI (2002), MOREIRA; ANDRADE,
(2003), NICÁCIO, (2003), ARAÚJO (2004), LOBO (2004), JAEGGER et al (2004), FONSECA (2005),
WEYLER; FERNANDES (2005).
162
Para maiores detalhes ver os Quadros 06, 07, 08, 09 e 10 e 17. Destaca-se uma iniciativa
realizada em 1986 na enfermaria Margareth Mahler denominada de “Abrigo Domiciliar para pacientes
psicossocialmente crônicos”, desenvolvida durante estágio curricular de Serviço Social, que visava a
maior autonomia das moradoras ali institucionalizadas (ZANINI, 1987). A partir deste projeto, a
enfermaria passou a desenvolver ações terapêuticas mais individualizadas e de respeito às suas
moradoras.
159
reforma psiquiátrica foi permanente naquele período, e, como assinalado
163
,
continua presente na sociedade gaúcha. Outro elemento desafiante, que esteve
presente na implementação do São Pedro Cidadão, foi a ocupação de espaços
estatais por agentes do movimento da luta antimanicomial, protagonistas da sua
elaboração e que ao longo do tempo lutavam pelas necessárias transformações na
atenção em saúde mental.
Sair da posição de denúncia e assumir a responsabilidade por uma
outra práxis é um desafio enfrentado a toda hora. Entretanto, é necessário
ter clareza para não supor que a máquina pública seja neutra, que basta
mudar o motorista para que as coisas se dirijam para o lugar que se quer.
Não, a máquina pública é pesada quando se espera leve, é rígida quando
se precisa de flexibilidade, é linear quando se requer estruturas complexas
(ROCHA, 1999, p. 37-38).
O contexto, então, da implementação do São Pedro Cidadão, foi de disputa
de projetos e ao mesmo tempo, de desafios postos pela vontade de mudar e de
seguir as regras instituídas do aparato estatal, em ritmos diversos aos requeridos
em processos de mudança. Este quadro foi sinalizador dos cuidados necessários
para a realização de mudanças que fossem respeitosas com os usuários e
profissionais, exigindo uma postura permanente de negociação e de construção de
canais de participação, cujo processo todo gerou uma produção
164
significativa, bem
como os destaques de experiência inovadora pelo Ministério da Saúde, financiador
de dois projetos em convênio com o Reforsus
165
(DIAS et al, 2002 a e 2002b).
A situação dos moradores no HPSP em 1998 era o retrato do abandono e
isolamento, com 741 moradores distribuídos em 15 enfermarias (unidades de
internação). A maioria do sexo feminino (61,6%), procedentes do interior do estado
(60,7%), sem família conhecida (55,1%) e um grupo significativo com família
conhecida (31,5%), mas sem condições de fazer visitas ou recebê-los em casa. A
faixa etária com maior concentração dos moradores era a de 40 a 59 anos de idade
(39,4%) seguida pelo grupo com idade acima dos 60 anos (36,2%). Em relação ao
tempo médio de permanência na instituição, a maioria (45,8%) estava com até 09
163
Para maiores detalhes ver item 3.3.
164
MONTEIRO et al. (2000), FRICHEMBRUDER; CRUZ (2001), MENEGASSI et al. (2002), DIAS
(2002d), ALVES (2002), NUNES et al. (2003), ENGELMAN (2003), BELINI; HIRDES (2006),
OLIVEIRA, R (2006), PAULON et al. (2007).
165
Projeto Morar, financiamento das primeiras bolsas-auxílio aos moradores que ocuparam as casas
na Vila São Pedro, e a pesquisa Seguimento e Avaliação da Reforma Psiquiátrica no HPSP.
160
anos de internação, seguido pelo grupo com o intervalo de tempo de permanência
de 10 a 20 anos (19,4%). Quanto ao acesso a algum tipo de benefício social, um
pequeno grupo (17,97%) recebia pensão ou aposentadoria (RIO GRANDE DO SUL,
1998).
Contemplando este diagnóstico da situação dos moradores e as diversas
dimensões presentes nos propósitos do São Pedro Cidadão, como a atenção digna,
moradia, trabalho, renda e ensino, traçados no ano de 1993, a proposta da Direção
do HPSP para a sua implantação foi ampla: Criação do Conselho Gestor de
implantação; Projeto Praça, Reformulação das Unidades Hospitalares;
Reestruturação da Área de Moradia; Usina de Criatividade e Produção; Área de
Ensino e Pesquisa, Dom Bosco e Administração (RIO GRANDE DO SUL, 1999 b).
Inicialmente, a reestruturação da área de moradia consistiria em reformas nas
enfermarias, considerando que muitas estavam em condições precárias de
habitabilidade, oferecendo riscos aos moradores e trabalhadores. Mas na discussão
sobre como radicalizar na mudança, originou-se a proposta de construir casas para
moradia dos usuários em área externa ao hospital. Esta radicalização teve o impulso
fundamental da vontade expressa de muitos internos do HPSP, como a que
procurou o Diretor Geral
166
dias após sua posse em 1999: “Eu não posso morrer
aqui. Me disseram que vocês podem me ajudar. Eu preciso ir embora daqui...”
(FRICHEMBRUDER et al., 2001, p. 14).
O desejo expresso reflete a situação de pobreza e vulnerabilidade social das
pessoas institucionalizadas, pois sem meios próprios para sustentar um novo lugar
para morar e sem grupo de referência para ter suporte social, sobra a esperança de
alcançá-lo. 86,6% dos moradores desconhecem o destino de suas famílias, e as
conhecidas não têm condições de fazer visitas ou recebê-los em casa (RIO
GRANDE DO SUL, 1998). Dentre as necessidades implícitas no pedido da moradora
está a efetivação do direito à moradia, um dos direitos humanos inscrito na
Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, no seu artigo 25: “Todo
homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família
166
Dr. Régis Antônio Campos Cruz.
161
saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e
serviços sociais indispensáveis” (ONU, 1948).
No Brasil, o direito à moradia foi considerado direito social através da Emenda
Constitucional n. 26, de 14 de fevereiro de 2000, em seu artigo 6
o
: “São direitos
sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer a segurança, a moradia, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição”. Portanto, somente a partir desta
recente data, é considerado o dever do Estado na garantia do acesso à moradia
através de políticas públicas habitacionais. Mas a habitação está intrinsecamente
relacionada à propriedade da terra, um dos pilares da histórica desigualdade social
no Brasil. A constituição inicial da sociedade brasileira revela que o exercício da
cidadania civil foi obstaculizado por três fatores: a escravidão, a grande propriedade
rural e um Estado comprometido com os interesses privados. Esta situação que
torna o Brasil a terra da cidadania inconclusa (CARVALHO, 2004), pois a presença
de alguns direitos não garante que todos sejam considerados.
No país, o acesso a terra através da compra foi legalmente definido em 1850,
substituindo o regime de posses até então vigente; desde então, um conjunto de
legislações foi se constituindo, dentre elas as que estabelecem parâmetros de
ocupação nas cidades, gerando valores diferenciados da terra, conforme sua
localização geográfica. Esta situação criou a segregação territorial, dividindo as
cidades em zonas valorizadas, com infra-estrutura urbana, a cidade formal, legal e
urbanizada, e a cidade informal, ilegal e desprovida de infra-estrutura [...]”
(RELATÓRIO, 2003, p. 03) evidenciando a premência da elaboração “de uma
política urbana que vise a inclusão social e territorial da população, tendo como meta
a regularização fundiária
167
e a urbanização dos assentamentos de baixa renda”
(RELATÓRIO, 2003, p. 03).
Portanto, se para o conjunto da população o não acesso à habitação é um
grande obstáculo para a efetivação de seus direitos, mais difícil é para aqueles
institucionalizados. O desafio então, foi criar meios para viabilizar moradia. Por
tratar-se de proposta estatal, se fez necessária a busca de meios próprios para
167
Legalização e urbanização e integração do conjunto de serviços públicos e comunitários
(BORGES, 2004).
162
viabilizar as moradias externas
168
, e após vários esforços de busca de terrenos do
estado, a alternativa existente foi aproveitar uma área pública existente no mesmo
quarteirão e nos fundos do HPSP, com acesso pela Avenida Ipiranga, onde se
formou uma vila, de forma irregular, há muitas décadas. A estratégia adotada foi,
então, a interação com a política habitacional pública cujo propósito era realizar a
reforma urbana, integrando o programa São Pedro Cidadão com o programa de
Regularização Fundiária do governo estadual
169
em desenvolvimento na Vila São
Pedro.
Esta tem sido uma possibilidade nas experiências de dispositivos residenciais,
que tanto têm sido executadas na própria área física de hospitais (MILAGRES, 2002;
FONSECA, 2005), como em bairros residenciais, “[...] que muitas vezes pode ser
feito nas bordas do próprio terreno da instituição, dada a expansão da ocupação
urbana” (VASCONCELOS, 2000, p. 117). Assim, o serviço Morada São Pedro
170
foi
criado nas bordas do HPSP, com a projeção de construção de um condomínio
residencial para receber, numa primeira etapa, 144 usuários do Hospital e 450
residentes da Vila São Pedro, procurando
“minimizar duas formas de exclusão, a
saber: a que obriga milhões de pessoas a morar nas cidades sem acesso à
legalização da terra, infra-estrutura e serviços, e a que confina nos hospitais
psiquiátricos os portadores de sofrimento psíquico (CABRAL; BELLOC, 2004, p.
114).
A Vila São Pedro é constituída por famílias que vivem do pequeno comércio e
como catadores de materiais recicláveis, com a fama de abrigar pessoas que
cometem delitos, como tráfico de drogas e desmanche de veículos,
É nesse espaço, comprimido em meio a tantas instituições
imponentes no entorno como um grande shopping, o manicômio mais
antigo da cidade, o Instituto Psiquiátrico Forense, uma delegacia da policia
civil, um quartel da polícia militar e outro do exército, uma Igreja, além de
três avenidas com grande fluxo de veículos que ligam vários pontos da
cidade - que o “os loucos perigosos” recém saídos do manicômio tiveram
que se haver com os perigosos da vila, que também como os loucos do
168
Outras possibilidades de moradia a ex-usuárias foram proporcionadas pela política municipal de
habitação através do DEMHAB, Porto Alegre.
169
Secretaria Especial de Habitação.
170
O Projeto foi elaborado para a construção de 91 casas, 55 para os residentes da Vila São Pedro e
36 para os moradores do HPSP. Esta fase desdobrou-se em dois momentos, sendo a primeira de
construção de 27 casas para 84 moradores do HPSP e 30 para os habitantes da Vila São Pedro. Esta
fase foi concretizada e não houve a conclusão do condomínio residencial.
163
manicômio encontram dificuldade de inserção não-marginal no contexto da
cidade contemporânea (JARDIM et al. 2005, p. 03).
O apelido da Vila São Pedro é Vila Cachorro Sentado, revelando o
desprestígio e desvalia que tem na cidade, o que certamente reflete na auto-estima
de seus residentes. Mas é típica da urbanização capitalista a troca de nome de parte
das cidades, por produzir,
[...] zonas e bairros excluídos em termos simbólicos e/ou materiais daquilo
que se compreende como a cidade, processo concretizado por meio de
signos que identificam e promovem ideais que projetam na consciência
social e dos indivíduos a visão – paisagem – de que tais espaços não fazem
parte da cidade ou formam uma “outra” cidade (FERNANDES, 2006, p.
199).
Um amplo processo de discussão e participação, de sensibilização entre os
trabalhadores e os moradores
171
, capacitação
172
e qualificação profissional, criação
de dispositivos internos produtores de autonomia dos usuários (Casas de Passagem
e de Transição), de ensino
173
, de geração de renda
174
e de interação com os
moradores da Vila São Pedro foram desenvolvidos no período da gestão
(FRICHEMBRUDER et al., 2001; ALVES, 2002; MENEGASSI, 2002; JARDIM et al.,
2004; PAULON et al, 2007). A referência central desta proposição foi o novo
dispositivo de inserção social criado, os Serviços Residenciais Terapêuticos, que na
portaria ministerial n. 106 de 2000, artigo 1º, parágrafo único, definiu-os como
“moradias ou casas inseridas, preferencialmente, na comunidade, destinadas a
cuidar dos portadores de transtornos mentais, egressos de internações psiquiátricas
de longa permanência, que não possuam suporte social e laços familiares e que
viabilizem sua inserção social” (BRASIL, 2004, p. 100).
171
A pesquisa Qualidade de Vida dos Moradores Institucionalizados no HPSP realizada no período
de 19/05 a 15/07/2000 detectou que dos 682 moradores institucionalizados, 212 apresentam
capacidade de auto-cuidado como higiene pessoal e do ambiente, sendo que 85 moradores desejam
integrar-se ao projeto de implantação de moradias extra-hospitalares (RIO GRANDE DO SUL, 2000).
172
A Escola de Saúde Pública, da SES, realizou o Curso Básico de Qualificação para o
Acompanhante Terapêutico, uma modalidade clínica que se utiliza do espaço público da cultura como
dispositivo para o ato terapêutico (CABRAL; BELLOC, 2004). O Curso teve a duração de oito meses
em três edições, 2000 a 2003, atingindo 120 trabalhadores e 30 serviços de saúde dos municípios da
macrorregião metropolitana e abrigos de proteção especial da Secretaria do Trabalho, Cidadania e
Ação Social (PALOMBINI, 2004).
173
Ingresso de moradores nos programas da área de educação Movimento pela Alfabetização
(MOVA) e ensino de jovens e adultos (EJA).
174
Valorização e ampliação das atividades existentes com o apoio do programa Coletivos de
Trabalho, da Secretaria do Trabalho, Cidadania e Assistência Social (STACS) e do DMLU.
164
Esta modalidade de atenção, construída a partir de várias experiências no
país para oferecer respostas dignas aos institucionalizados nos hospitais
psiquiátricos, criou uma referência teórica e técnica de viabilização da proposta de
residências extra-muros para os moradores no HPSP. A definição dos SRT deixa
claro que se trata de uma modalidade institucional de saúde para a inclusão social
de sujeitos que, por longos anos de suas vidas, por serem portadores de um
transtorno mental, foram segregados e isolados da sociedade.
A expressão inclusão social aqui adotada não está impregnada de sentido
ingênuo e elitista, de que a simples convivência com outros grupos sociais, ou seja,
o convívio na cidade represente uma inclusão efetiva e consistente, situação esta de
viés idealista. A expressão está fazendo uma referência à condição básica de vida
de sujeitos, que como seres sociais, têm como pré-condição o convívio, a troca, o
conflito que, por conseguinte, constrói e consolida uma determinada sociedade.
Portanto, a expressão inclusão social está indicando a situação do seu oposto,
exclusão da sociedade por ser portador de uma determinada patologia.
O investimento financeiro para a manutenção dos SRTs foi estabelecido como
sendo a conversão do financiamento da internação hospitalar do SUS para o estado
ou município responsável pelo serviço, como definiu o artigo 2º da portaria:
A cada transferência de paciente do Hospital Especializado para o
Serviço de Residência Terapêutica, deve-se reduzir ou descredenciar do
SUS, igual número de leitos naquele hospital, realocando o recurso da AIH
correspondente para os tetos orçamentários do estado ou município que se
responsabilizará pela assistência ao paciente e pela rede substitutiva de
cuidados em saúde mental (BRASIL, 2004, p. 100).
Esta medida é fundamental para a garantia da permanência de recursos
públicos na política de saúde mental, risco existente de que ao se fechar hospitais
psiquiátricos ou reduzir seus leitos, o respectivo financiamento acabe sendo
direcionado a outras ações de saúde, e as propostas da reforma psiquiátrica se
transformem em facilitadoras da desresponsabilização do Estado.
Os dispositivos e serviços residenciais, principalmente aqueles que
implicam a aquisição de patrimônios físicos, constituem uma estratégia
fundamental de conversão e deslocamento dos recursos investidos nos
asilos para a rede social mais ampla, sem o risco de uma forte volatilização
em recursos sem tangibilidade física, facilmente deslocáveis para outros
investimentos públicos mais prioritários (VASCONCELOS, 2000, p. 99).
165
O serviço Morada São Pedro não pode utilizar esta modalidade de
financiamento para o seu custeio, visto o HPSP não possuir mais as AIH na área
asilar, como exposto
175
, tendo ficado definido que até a criação de outra fonte
federal, o governo continuaria provendo os meios através do orçamento do Tesouro
do Estado. No aspecto da construção do condomínio, a decisão tomada foi de
direcionar parte das verbas orçadas para reforma de áreas físicas do hospital,
equivalente ao número de beneficiados no projeto, agregando orçamento da
Secretaria Especial da Habitação para a construção do condomínio residencial.
Esta decisão precisou ser defendida a partir do conceito da saúde coletiva,
pois o Tribunal de Contas do Estado apontou a SES por ter utilizado verba da saúde
em despesa do setor habitacional. Conforme preconiza o artigo da lei 8.080, de
1990: “a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a
alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda,
a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais”
(BRASIL, 1990).
A situação exposta revela os desafios dos projetos de transformação de um
modo cristalizado de ordenamento jurídico, legitimamente representando os
consensos já estabelecidos na sociedade, mas que ainda precisam ter a flexibilidade
requerida para contemplar a diversidade das necessidades humanas, no caso,
sujeitos portadores de transtornos mentais mais graves que requerem cuidados
específicos. Este é um dos desafios da desinstitucionalização, pois ainda que os
sujeitos nestas situações de maior gravidade sejam a menor parcela dentre os que
têm transtornos mentais é a que requer maior necessidade de cuidados
permanentes e constantes, gerando maior sobrecarga aos serviços e seus
trabalhadores (BANDEIRA; LESAGE; MORISSETE, 1994) e, consequentemente,
com necessidade de investimento compatível a estas necessidades. Mas é preciso
ultrapassar a resposta conhecida e legitimada socialmente, de que existe um
lugar para estes indivíduos, qual seja o hospital psiquiátrico ou manicômio, não
sendo necessários investimentos e esforços para a inovação. Pois,
175
Para maiores detalhes ver item 3.3.
166
[...] pode-se constatar que mesmo pacientes que seriam considerados
psiquiatricamente bastante comprometidos pela ciência acadêmica vigente
podem viver num clima de liberdade, autonomia e consideração mútua,
dependendo apenas de que se lhes respeite a condição de seres humanos. [...]
são pessoas que vivem experiências difíceis, doloridas, dilacerantes,
experiências que, na maior parte das vezes, não encontram uma alocação
possível na esfera gregária do sujeito e que resistem às formas de comunicação
pelos códigos partilhados. Mas que, nem por isso, o menos humanas, menos
passíveis de reconhecimento e de solidariedade (NAFFAH NETO, 2006, p. 5).
Torna-se então um desafio ético para a sociedade assumir posições de
garantir cuidados necessários e imprescindíveis àqueles com maiores
vulnerabilidades. O projeto Morada São Pedro é a expressão desta posição, no
entendimento de que morar é uma das instâncias sociais (FERREIRA, 1996) capaz
de possibilitar uma outra condição de vida a estes usuários, é uma ponte para a
realização da existência. Para isto ocorrer faz-se necessária a mediação de uma
estratégia que viabilize a aprendizagem para a retomada da vida cotidiana e,
provavelmente, para a formulação de projetos de vida, embotada pelo confinamento
manicomial.
Esta estratégia é a reabilitação psicossocial, que visa proporcionar àqueles
com prejuízos importantes decorrentes do transtorno mental, o “aumento da
contratualidade afetiva, social e econômica que viabilize o melhor nível possível de
autonomia para a vida na comunidade” (PITTA, 1996, p. 9). Como indicado no artigo
da portaria 106, de 2000, a equipe profissional de cada serviço deve elaborar seu
projeto terapêutico com o objetivo de oferecer ao usuário
Um amplo projeto de reintegração social, por meio de programas de
alfabetização, de reinserção no trabalho, de mobilização de recursos
comunitários, de autonomia para as atividades domésticas e pessoais e de
estímulo à formação de associações de usuários, familiares e voluntários
[...] respeitar os direitos do usuário como cidadão e como sujeito em
condição de desenvolver uma vida com qualidade e integrada ao ambiente
comunitário (BRASIL, 2004, p. 101).
O tempo da gestão não foi suficiente para a conclusão de todas as etapas
previstas e no final do período, em 30 de dezembro de 2002, foi oficialmente
inaugurado o condomínio residencial, com alguns residentes da Vila São Pedro
recebendo suas casas e,
[...] oito pacientes do Hospital Psiquiátrico São Pedro reuniram seus poucos
pertences, tanto os que restaram após anos de internação como os recém
167
adquiridos para o “enxoval” da casa nova, e ocuparam as quatro primeiras
moradias que, àquelas alturas, tinham cores, nomes e distribuições
largamente debatidas nos eventos preparatórios àquele grande dia
(PAULON et al., 2007, p. 14).
Deste modo, após um longo processo de elaboração, construção e
preparação teve início uma estratégia fundamental para a desinstitucionalização:
sujeitos institucionalizados num manicômio passam a viver em condições de usufruir
do direito de ir e vir, de escolher seus modos particulares de existência, com poder
sobre o seu cotidiano, compartilhando afetos e trocas com liberdade. Pois agora a
“ênfase o é mais colocada no processo de cura, mas no projeto de invenção de
saúde e de reprodução social do paciente” (ROTELLI, 1990, p. 30).
Na seqüência, o Morada São Pedro teve um primeiro momento de risco sobre
sua continuidades com a alteração da correlação de forças advinda da troca de
governo. O suporte construído para o acompanhamento dos usuários, apoio aos
trabalhadores e de interação com os residentes da Vila São Pedro foi interrompido, e
a expressão desta descontinuidade foi a ocorrência de um assalto na casa destinada
às atividades da vida diária. “Ao sentimento de insegurança, solidão e desamparo de
todos os cuidadores, sobrepôs-se a garra pela sobrevivência do Projeto, o impulso
da continuidade, o desejo de concretização de tantos sonhos que aquelas casas
representavam” (PAULON et al., 2007, p. 18).
Este e outros acontecimentos geraram uma forte reação entre os segmentos
da sociedade envolvidos e interessados neste tema, acionados pelos trabalhadores
e moradores da Vila São Pedro, procurando formas de garantir a continuidade do
projeto para sua futura consolidação. Para ilustrar este momento, reproduz-se parte
da manifestação de um dirigente da Associação dos Moradores da Vila São Pedro,
realizada em audiência pública na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da
Assembléia Legislativa, cuja pauta da reunião ordinária foi Morada São Pedro,
Problemas e Perspectivas.
Fui contemplado e moro junto com os ex-pacientes do Hospital
Psiquiátrico São Pedro, com o projeto Morada São Pedro. Sou morador da
Rua J na qual sou vizinho deste pessoal. Batalhamos com bastante garra,
bastante luta com os demais colegas e venho batalhando para implementar
e dar continuidade e extensão ao projeto Morada São Pedro que foi uma
luta árdua, recebemos bastante críticas de algumas classes e estamos lá.
Esta é a nossa batalha e continuamos de novo apoiando tanto eles como
168
nós, porque eles como excluídos do hospital e nós, de uma forma geral,
excluídos pela Vila (RIO GRANDE DO SUL, 2003b).
O Morada São Pedro permanece até hoje nas mesmas condições de quando
inaugurado, ou seja, não houve a conclusão de todo o condomínio conforme
previsto, nem a urbanização e regularização fundiária em toda a Vila São Pedro,
permanecendo um contingente de seus originários residentes morando em
condições de habitabilidade diferenciada daqueles que estão de posse de suas
casas, assim como não houve ingresso significativo de novos egressos do HPSP.
Trata-se de um longo processo, um vasto mundo, marcado pela
busca do tratamento adequado e acessível e da autonomia possível dos
usuários e trabalhadores dos serviços públicos. A autonomia como tarefa
maior, como desafio posto pela construção da sociedade democrática: o
feito e o por fazer (DELGADO, 2001, p. 289).
Pelas características de ineditismo deste projeto no campo da saúde mental
no Rio Grande do Sul, esta pesquisa tem o interesse de verificar se houve
mudanças significativas na vida daqueles que tiveram a oportunidade de morar fora
dos muros do hospital psiquiátrico, se houve as condições de serem considerados
sujeitos de direitos, e capazes de viver com dignidade. Inicialmente, então, se
procederá à apresentação dos procedimentos metodológicos desenvolvidos no
processo da investigação, para posteriormente, ser realizada a discussão analítica
explicativa dos resultados.
4.2 A CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA DA PESQUISA
O projeto de pesquisa
176
foi elaborado no ano de 2002 com o propósito de
avaliar a efetividade do projeto Morada São Pedro em produzir a
desinstitucionalização e a garantia dos direitos dos seus usuários. Por tratar-se de
pesquisa com seres humanos, foi solicitada autorização ao Comitê de Ética em
Pesquisa do Hospital Psiquiátrico São Pedro (HPSP)
177
, que de acordo com a
legislação (BRASIL, 2002a), tem a responsabilidade de avaliar riscos decorrentes de
pesquisa à população. O delineamento da pesquisa escolhido tem risco mínimo de
176
Originalmente denominado Do Hospício para a Inclusão Social, aprovado pela Unisinos para ser
desenvolvido pela autora como pesquisadora da instituição, e para fins de seleção no Programa de
Pós-Graduação Doutorado em Serviço Social na PUCRS.
177
Autorização obtida em 26/05/ 2003, constante no Anexo A.
169
dano, mas mesmo assim é necessário o consentimento dos pesquisados
178
, de
modo a garantir sua voluntariedade e entendimento do alcance social do estudo
investigativo.
A pesquisa realizou-se na perspectiva dialético-crítico através de um conjunto
de técnicas quantitativas e qualitativas. A inspiração na produção de Marx, de
concepção materialista histórica e dialética, deve-se a consideração do movimento
contraditório presente na história do desenvolvimento da humanidade e na produção
das relações econômicas e sociais.
O método de Marx, “com seu cariz ontológico, sua radicalidade histórico-
crítica e seus procedimentos categorial-articuladores” (NETTO, 1993, p. 37), é uma
fonte rigorosa de análise da lógica capitalista, e, por conseguinte, de análise do
campo da saúde mental. Ao examinar a mercadoria como elemento fundamental da
produção capitalista, Marx o faz considerando os princípios da totalidade e
contradição, que se articulam de modo indissolúvel, mas não perdendo sua
identidade própria.
O princípio da totalidade significa que a natureza se apresenta como um todo
coerente onde objetos e fenômenos são ligados entre si, condicionando-se
reciprocamente. O todo crítico-dialético leva em conta essa ação recíproca e
examina os objetos e fenômenos buscando entendê-los numa totalidade concreta.
Ao mesmo tempo em que a realidade objetiva como um todo coerente,
compreende e avalia as partes do todo formando correlações concretas de
conjuntos e unidades sempre determinadas (MINAYO, 1993).
O princípio da contradição ou unidade e luta dos contrários significa que a
transformação das coisas é possível porque no seu próprio interior coexistem
forças opostas, tendendo simultaneamente à unidade e à oposição. A contradição,
que é universal, inerente a todas as coisas materiais e espirituais é a essência ou a
lei fundamental da dialética. Os elementos contraditórios, unidade e oposição,
coexistem numa realidade estruturada, e a existência de um está diretamente
relacionada à existência do outro.
178
Os termos de Consentimento Livre e Esclarecido para os diversos momentos e sujeitos da
pesquisa constam nos Apêndices B, C e D.
170
A perspectiva teórico-metodológica marxiana é fecunda na capacidade de
desvelar o conteúdo não manifesto aparente da realidade. Como no campo da
saúde, contexto dinâmico e amplo, repleto de múltiplos interesses e determinações,
que passam pelo campo cultural, científico, econômico e político. Nesse sentido,
acontecimentos que podem parecer num primeiro momento inovações e resultados
de lutas de alguns segmentos da sociedade, ao analisar-se com maior profundidade
suas condições concretas de realização, descobre-se que determinações
econômicas e políticas indicando tal mudança já estavam presentes na história.
Esse movimento contraditório permeia a sociedade, onde emergem forças
sociais que passam a se articular numa pauta de reivindicações de construção de
cidadania. O momento histórico em que se desenvolvem tais avanços é o mesmo
em que uma profunda mudança no campo econômico e político no país, como
reflexo do reordenamento do capitalismo, no âmbito dos países desenvolvidos.
A pesquisa pretende mostrar as faces possíveis de se traduzir expressões da
totalidade da questão da saúde mental, faces estas que revelam as contradições
existentes neste campo. A pesquisa não poderá mostrar toda a realidade, visto sua
complexidade e dinamismo próprio, mas certamente poderá colaborar na sua
apreensão mais qualificada. Para isto, a perspectiva materialista histórica e dialética
é a mais apropriada, por se constituir numa
[...] postura, ou concepção de mundo; enquanto um método que permite
uma apreensão radical (que vai à raiz) da realidade e, enquanto práxis, isto
é, unidade de teoria e prática na busca da transformação e de novas
sínteses no plano do conhecimento e no plano da realidade histórica
(FRIGOTTO, 1991, p. 75).
A processualidade dos movimentos contraditórios em diferentes estágios da
vida social traduz-se na historicidade, outra categoria central neste estudo. As
mudanças nas sociedades são permanentes, sendo importante verificar os rumos
que estas provocam em relação a determinados temas. O interesse no tema da
reforma psiquiátrica é uma conseqüência da inserção profissional e política nesta
área por duas décadas, pois,
No momento em que estabelecemos o desenho da pesquisa, em
que buscamos os sujeitos que dela participarão, estamos certamente
apoiados em um projeto político singular que se articula a projetos mais
171
amplos e que, em última análise, relaciona-se até mesmo com o projeto de
sociedade pelo qual lutamos (MARTINELLI, 2003, p. 26).
O tema deste estudo foi definido como a reforma psiquiátrica brasileira e a
efetivação dos direitos dos portadores de transtorno mental: uma análise a partir do
Projeto Morada São Pedro. As questões de pesquisa foram definidas procurando
contemplar algumas das dimensões deste tema: de que modo os propósitos da
Reforma Psiquiátrica no Brasil foram contemplados nos processos da Reforma
Sanitária e no debate sobre a Reforma do Estado? Qual é o estado da arte da
reforma psiquiátrica brasileira? As mudanças ocorridas na vida dos portadores de
transtorno mental a partir da sua saída do Hospital Psiquiátrico São Pedro para o
Projeto Morada São Pedro, possibilitou a garantia de seus direitos e a autonomia na
vida diária?
A cnica da análise documental foi utilizada para contemplar as duas
primeiras questões norteadoras, de modo a se verificar as conexões valorativas e
históricas das categorias explicativas da realidade quais sejam, direitos, política
social, desinstitucionalização e autonomia com o propósito de detectar as
contradições e os posicionamentos relativos ao tema. O material para análise foi
formado pelos documentos dos organismos responsáveis pela política de saúde
mental no âmbito nacional, Ministério da Saúde; âmbito estadual na Secretaria de
Estado da Saúde do Rio Grande do Sul, e no âmbito internacional, da Organização
Pan-Americana da Saúde, Organização Mundial da Saúde, bem como teses e
dissertações sobre o tema, através de busca nos bancos de teses dos descritores
Reforma Psiquiátrica e Desinstitucionalização
179
.
Para a terceira e última questão norteadora da pesquisa, relevante para
verificar se a realidade vivenciada pelos moradores durante vários anos na
instituição hospitalar, geradora de despersonalização e de sujeição à ordem
institucional, alterou-se com a mudança para um serviço criado para produzir saúde
e dignidade de vida, utilizou-se do desenho investigativo quase-experimento,
integrante dos “estudos que analisam variáveis a partir de um fator introduzido ou
alterado em suas condições habituais na amostra observada” (GOLDIM, 2000a, p.
72). Esta escolha foi tomada para ser possível a comparação das condições de
179
Este trabalho gerou um arquivo formado por 261 produções, entre teses e dissertações.
172
habilidades da vida diária dos usuários quando ainda moradores das unidades de
internação do HPSP e quando moradores do Morada São Pedro.
A comparação é uma forma eficaz de verificar a ocorrência de alterações de
comportamentos num determinado espaço de tempo, e foi possível concretizá-la
pelo fato de que no transcurso do processo de realização do São Pedro Cidadão,
houve oportunidade de realização da pesquisa Seguimento e Avaliação da Reforma
Psiquiátrica no Hospital Psiquiátrico São Pedro
180
(DIAS et al, 2002c; WAGNER et
al, 2006). Este estudo pesquisou as condições de sintomatologia psiquiátrica,
qualidade de vida e comportamento social da população institucionalizada do HPSP
quando foram aplicadas quatro escalas
181
correspondentes, entre elas o Inventário
de Habilidades de Vida Independente (ILSS) para medir a autonomia.
Este desenho investigativo é próprio da abordagem quantitativa, muito
freqüente na avaliação de programas e projetos sociais, para medir o alcance dos
seus propósitos e expressá-los sob forma estatística (MINAYO et al, 2005). Para
além da natureza positivista desta abordagem, está se considerando que um dos
princípios presentes no espaço da totalidade e da contradição é o da mudança
qualitativa. A transformação das coisas não se realiza num processo circular de
permanente repetição, mas num movimento espiral de negação e superação de uma
fase por outra, possíveis pelas suas condições objetivas e históricas.
A análise histórica do conhecimento, em contato com o real, forja os
instrumentos, as formas objetivas do conhecimento, as formas do imenso
conteúdo da vida (...) as formas verdadeiras do pensamento, isto é, aquelas
que correspondem ao conteúdo objetivo (LEFÈBVRE, 1991, p. 85).
A outra técnica de pesquisa utilizada para esta questão norteadora foi
a entrevista semi-estruturada com os usuários e os dirigentes do Projeto Morada
São Pedro, com o propósito de detectar suas percepções sobre a
desinstitucionalização no Morada São Pedro, com um roteiro específico para cada
180
Pesquisa financiada pelo Ministério da Saúde em convênio com o BID, projeto Reforsus. Estudo
semelhante foi realizado no Instituto Municipal de Assistência à Saúde Juliano Moreira (IMASJM),
Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (ABELHA et al, 2006). Ambos os projetos foram
propostos e assessorados pelo Dr. Manuel Desviat do Instituto Psiquiátrico e de Serviços de Saúde
Mental José Germain – Madri, Espanha.
181
Qualidade de vida, medida pelo World Health Organization Quality of Life instrument (WHOQOL-
brief); Sintomatologia psiquiátrica, medida pelo Brief Psychiatric Scale (BPRS-A); Comportamento
social, medido pela Social Behavior Schedule (SBS).
173
grupo. O roteiro utilizado foi o do tipo episódico (FLICK, 2004), por considerar o
cotidiano e a vivência de determinadas situações. Esta técnica, como a de análise
documental, é própria da abordagem qualitativa, que neste estudo corresponde ao
delineamento de pesquisa explicativa pelo seu caráter de “identificar os fatores que
determinam ou que contribuem para a ocorrência de fenômenos(GIL, 1993, p. 46).
É uma pesquisa qualitativa, na medida em que tem como premissas a historicidade
social, a complexidade e antagonismos presentes no fenômeno estudado (MINAYO,
2000).
A adoção das abordagens quantitativa e qualitativa, na relação de
“complementaridade e de articulação” (MARTINELLI, 2003, p. 27) teve como
propósito uma aproximação da totalidade do fenômeno estudado, pois “a
investigação tem de apoderar-se da matéria, em seus pormenores, de analisar suas
diferentes formas de desenvolvimento, e de perquirir a conexão íntima que entre
elas” (MARX, 1994, p.16).
No delineamento adotado, foi utilizada a amostra não probabilística
denominada intencional (GOLDIM, 2000a) ou por julgamento (OLIVEIRA, 2001),
uma vez que os próprios residentes e os trabalhadores do Morada São Pedro são os
sujeitos mais indicados para serem a fonte de informação qualificada para o
propósito da pesquisa, com a estimativa de adesão mínima de 70% dos usuários do
Morada.
Cabe uma maior exposição sobre a escala inventário de habilidades de vida
independente (ILSS), visto a mesma ser pouco utilizada na área de serviço social. É
uma escala de avaliação elaborada por Wallace (DIAS et al, 2002c), traduzida do
inglês Independent Living Skills Survey. O estudo de validação e confiabilidade foi
realizado por Lima et al (2003) no IMASJM para aplicação dessa escala em
pacientes de longa permanência em instituições e é de domínio público. A escala
ILSS possui nove (9) domínios: alimentação, cuidados pessoais, atividades
domésticas, preparo para o armazenamento dos alimentos, saúde, administração do
dinheiro, transporte, lazer e emprego, distribuídos em 84 itens (Anexo B).
A freqüência da ocorrência do comportamento é medido como nunca (0),
algumas vezes (1), com freqüência (2), na maioria das vezes (3) e sempre (4),
174
correspondente ao período do último mês em relação à data da aplicação do
questionário. A escala consiste num questionário de avaliação indireta, sendo sua
aplicação feita através de entrevistas com os profissionais responsáveis pelo
acompanhamento dos sujeitos institucionalizados.
controvérsias no uso desta escala, pois há a perspectiva de que a mesma
pressupõe a competência como condição para a autonomia, e por isto, está imbuída
de caráter moral (DELGADO, 2006). Contudo, questionários são instrumentos de
pesquisa padronizados muito úteis quando se precisa captar a “presença ou
ausência de determinada característica ou atributo no indivíduo, permitindo medir a
magnitude com que essa característica ou atributo se distribui naquele grupo”
(SOUZA et al., 2005, p. 133).
Ainda são restritos os estudos em população institucionalizada com o uso
destas escalas (GONÇALVES, 2001; ABELHA et al, 2006; BANDEIRA et al., 2003;
WAGNER et al, 2006), mas seus resultados podem ser importantes ferramentas no
planejamento de novos dispositivos para atender este público de forma mais
individualizada, considerando-se suas necessidades.
[...] medidas e escalas para mensuração do perfil clínico e do funcionamento
social de usuários de serviços que, mesmo polêmicas, podem ser importantes
para a avaliação e classificação de grupos de clientelas candidatas a ser
deslocadas para dispositivos residenciais. Assim, podem se tornar ferramentas
importantes no planejamento de políticas de reinserção de usuários asilados
nesses novos serviços (VASCONCELOS, 2000, p. 112).
Neste caso, esta escala possibilitou uma avaliação do alcance dos propósitos
do Morada São Pedro. A entrada no campo de pesquisa ocorreu em dois momentos
distintos. No primeiro momento, em 2003, quando inicialmente houve a preparação
das condições para a coleta de dados. Formalmente houve a apresentação do
projeto à direção do HPSP e à coordenação e trabalhadores do Morada, quando
foram identificados os usuários residentes. Com esta informação buscou-se, com a
devida autorização, os questionários preenchidos na pesquisa de 2002, para seus
dados serem sistematizados e formarem a base para a comparação das variáveis
dos mesmos sujeitos da pesquisa no intervalo de dois anos, uma vez que “o uso de
escalas estandardizadas aumenta a confiabilidade e comparabilidade dos dados, é
mais rápido e fácil de usar” (VASCONCELOS, 1995, p. 195).
175
Posteriormente, foram tomadas providências para a obtenção do
consentimento livre e esclarecido, quando constatou-se que a maioria dos usuários
são interditados. Foi preciso ser feita uma consulta na Assessoria Jurídica do
Hospital para obtenção de dados fidedignos quanto ao número de usuários em
situação de interdição civil. Constatou-se que dos 46 (quarenta e seis) usuários
integrantes do Projeto Morada São Pedro naquele momento, somente 03 (três) não
estavam interditados e 40 (quarenta) tinham participado da pesquisa de 2002,
requisito para serem incluídos na atual pesquisa. Entre os usuários interditados, a
sua maioria (trinta e três) tinham como curador servidores
182
do Hospital, e por ser
este o grupo maior, foram os escolhidos para serem convidados a participarem da
pesquisa, junto com os três não interditos.
Realizou-se uma apresentação do projeto aos curadores e com a
concordância dos mesmos, os termos de consentimento livre e esclarecido
(Apêndice B) foram assinados em duas vias, ficando uma via com o responsável e
outra com a pesquisadora, tendo o mesmo procedimento sido realizado com os
usuários não interditados. A conclusão deste processo ocorreu no mês de dezembro
de 2003.
Definiu-se a amostra em 30 (trinta) sujeitos de pesquisa, sendo vinte e três
mulheres e sete homens, correspondendo a 75% do universo de 40 moradores que
preenchiam os critérios para esta investigação: ter participado da pesquisa em 2002
e ser usuário do Morada São Pedro. No período seguinte
183
a coleta de dados foi
organizada através do agendamento de entrevistas com as cuidadoras, profissionais
responsáveis pelo acompanhamento dos mesmos no serviço. Naquele momento o
corpo de funcionários diurno era formado por dezessete profissionais. A forma de
escolher a entrevistada e consequentemente, os usuários correspondentes, seguiu a
aleatoriedade: as entrevistas foram sendo marcadas com as trabalhadoras com
maior disponibilidade de tempo até se atingir o tamanho da amostra definido.
182
Nos últimos anos o Ministério Público e o Poder Judiciário começaram a indicar preferencialmente
o diretor do HPSP como curador dos usuários interditados. Ainda situações de funcionários serem
os curadores. Neste caso, alguns permaneciam com o antigo Diretor, e os demais, com o Diretor
deste período de gestão.
183
No ano de 2004 a pesquisa passou a contar com o apoio de uma bolsista de iniciação científica da
FAPERGS.
176
A segunda entrada em campo foi no ano de 2006 para a realização das
entrevistas semi-estruturadas, que m como objetivo a “compreensão detalhada
das crenças, atitudes, valores e motivações, em relação aos comportamentos das
pessoas em contextos sociais específicos” (GASKELL, 2004, p. 65). As mesmas
foram realizadas com três gestoras
184
: a Diretora da área a que se vincula o serviço
Morada, a coordenadora em exercício e a que exerceu a função nos seus três
primeiros anos. O roteiro ou tópico guia (GASKELL, 2004) para a entrevista com as
gestoras foi o apresentado no Quadro 18.
Significado atribuído ao Morada São Pedro na política de saúde mental.
Identificação de instrumentos legais que definem os direitos dos usuários.
Percepção sobre a efetivação de direitos dos usuários no Morada São Pedro.
Identificação dos instrumentos e/ou equipamentos utilizados para ampliação das
condições de inclusão social dos usuários.
Locais da cidade mais utilizados pelos mesmos.
Informações sobre o orçamento anual e as principais fontes de financiamento do
Morada São Pedro.
Informações sobre como os usuários custeiam suas necessidades materiais.
Conseqüências da interdição civil na vida dos usuários.
Quadro 18 - Roteiro da entrevista semi-estruturada com os gestores do Morada São
Pedro
Fonte: Autora (2007)
Do mesmo modo, foi o momento de realizar as entrevistas nos mesmos
moldes com os usuários, pois se as escalas são eficientes para a comparação de
atributos, não conseguem “captar aspectos psicossociais, políticos, culturais e
simbólicos importantes da relação clientela-serviço”, por isso a importância da
“combinação de métodos quantitativos e qualitativos” (VASCONCELOS, 1995,
p.195). Num primeiro momento, houve a participação na assembléia geral do
serviço, combinada com a coordenação do serviço, quando foi apresentado o
objetivo da pesquisa e feito o convite para participarem. Dos presentes, onze
manifestaram vontade de colaborar, cujos nomes foram registrados e
posteriormente, procurados para a realização das entrevistas.
184
No Apêndice C está o Consentimento Livre e Esclarecido.
177
O planejamento foi de realizar seis entrevistas, correspondendo a 20% do
universo dos sujeitos pesquisados pela escala ILSS, contudo, devido às
circunstâncias do interesse despertado, realizaram-se oito entrevistas (27%). A
escolha dos mesmos seguiu o critério de disponibilidade de tempo, ou seja, nas idas
a campo procurava-se os usuários inscritos e quem estava no Morada era
convidado. No momento da entrevista
185
foi apresentado o CILE
186
diretamente aos
usuários, sendo solicitada sua confirmação para a participação na pesquisa com a
assinatura no documento ou marcação digital no mesmo, assim como a autorização
para a gravação da mesma. Considerando que anteriormente havia uma
autorização dos curadores para a realização da pesquisa, entendeu-se que no
momento da entrevista, ou seja, da relação direta com os usuários, estes deveriam
ser os autores da adesão.
A entrevista tinha início com a apresentação do objetivo da pesquisa, leitura
do CILE e assinatura, e após era feito um preâmbulo através da seguinte frase:
Vocês moraram por um longo tempo no Hospital Psiquiátrico São Pedro, e em
dezembro de 2002 se mudaram para o Morada São Pedro. A partir desta situação,
se iniciava o diálogo a partir do roteiro, exposto no Quadro 19.
O motivo da criação do Morada São Pedro.
Diferenças percebidas na vida a partir da mudança.
O que gostam e o que não gostam no Morada São Pedro.
Suas opiniões e escolhas são consideradas pelos integrantes do Morada.
Nomear os locais da cidade que circulam.
No que gastam seus rendimentos.
O que quer dizer ter direitos.
O que significa estar sob interdição civil.
Quadro 19 - Roteiro da entrevista semi-estruturada com os usuários do Morada São
Pedro
Fonte: Autora (2007)
185
A realização das entrevistas contou com a colaboração de estudantes do Curso de Psicologia da
Unisinos.
186
Apêndice C.
178
No momento da análise dos dados da pesquisa operou-se com a
triangulação, “estratégia de investigação voltada para a combinação de métodos e
técnicas” (MINAYO et al., 2005, p. 15) e teve como referência as categorias de
análise do método dialético-crítico
e as categorias explicativas da realidade direitos,
política social, desinstitucionalização e autonomia. A análise dos dados primários
realizou-se através dos seguintes momentos: ordenação dos dados, com o
tratamento estatístico dos dados quantitativos, transcrição das entrevistas para o
mapeamento do material coletado; classificação dos dados a partir das categorias
de análise e operacionais; e por fim, a análise final, com o estabelecimento das
conexões teóricas com os achados, tendo com eixo condutor as variáveis dos
domínios de habilidades da vida diária, na busca de responder às questões
norteadoras da pesquisa (LEFÈBVRE, 1991; GOLDIM, 2000a; MINAYO,1993, 2000,
2005; TRIVIÑOS, 1990; VÍCTORA et al, 2000).
Os dados coletados através da Escala ILSS tiveram dois tipos de análise
estatística. Uma pelo método estatístico descritivo
187
que geraram 84 (oitenta e
quatro) tabelas (Anexo C) com a freqüência e o percentual de cada uma das nove
dimensões constantes da escala e distribuídas em 84 itens do questionário, que
geraram gráficos para facilitar a visualização dos resultados. Posteriormente,
visando qualificar a comparação, foi adotado o teste t de Student
188
para amostras
emparelhadas. Inicialmente todos os itens da escala ILSS foram padronizados de 0
a 100, proporcionando que itens com amplitude de pontuação diferente pudessem
ser comparados. Todos os itens dos dois períodos envolvidos (2002 e 2004) foram
descritos por média e desvio padrão sendo, então, comparado pelo teste t de
Student. Os resultados foram apresentados em gráfico indicando a diferença entre
as médias dos períodos e seu respectivo intervalo de confiança de 95%. Intervalos
englobando o valor zero indicam diferenças que não atingiram significância
estatística ao nível α=0,05. Os dados foram processados e analisados com o auxílio
dos programas SPSS versão 12.0 e SigmaPlot versão 9.0.
Na análise dos dados obtidos através da escala foram considerados os
possíveis vieses na sua aplicação, considerando que o questionário foi respondido
187
Com a assessoria da estatística Usiara Brito.
188
Realizada pelo consultor epidemiologista Dr. Mário Wagner.
179
pelos trabalhadores, técnicos de referência dos moradores por casa no serviço
Morada, tecnicamente denominado em pesquisa de informante substituto, “técnica
utilizada especialmente para pessoas com dificuldades de comunicação, problemas
ou limitações cognitivas [...]” (SANTANA, et al., 1997, p. 557). Muitos sentimentos
perpassam pelos trabalhadores na execução de suas atividades quando uma
pretensão anunciada de mudanças necessárias. Muitos deles são pelo desejo de
participar efetivamente da construção de uma nova condição de vida dos usuários,
com práticas capazes de produzir autonomia e com respeito à cada um dos sujeitos.
O princípio da autonomia não pode mais ser entendido apenas
como sendo a auto-determinação de um individuo, esta é apenas uma de
suas várias possíveis leituras. A inclusão do outro na questão da autonomia
trouxe uma nova perspectiva que alia a ação individual com o componente
social. [...] que surge a responsabilidade pelo respeito à pessoa, que talvez
seja a melhor denominação para este princípio (GOLDIM, 2000b, p. 3).
O respeito à pessoa como elemento integrante da autonomia se aplica no
caso dos sujeitos portadores de transtorno mental, que vão depender de um outro
sujeito, trabalhador com uma postura ética e responsável, para terem suas
condições de vida alteradas. Mas, assim como aparecem estes desejos de que o
serviço alcance seus objetivos e os esforços sejam reconhecidos, também uma
pressão para que o hospital psiquiátrico São Pedro não se extinga e assim
prejudique a situação funcional de colegas
189
, receio que acompanha a maioria dos
trabalhadores desde a instalação do São Pedro Cidadão, sendo também uma
realidade encontrada, de modo geral, que dificulta a aceitação dos SRTs
(FURTADO, 2006).
Considerando esta situação, os resultados estatísticos foram cotejados com o
material oriundo das entrevistas e com observações realizadas no trabalho de
campo, bem como no conhecimento acumulado sobre o tema, pois “o pesquisador
deve experenciar o espaço e o tempo vividos pelos investigados e partilhar de suas
expectativas, para reconstruir o sentido que os atores sociais dão ao objeto da
pesquisa” (BAPTISTA, 2003, p. 37), à luz do referencial teórico, de modo a produzir
um conhecimento sobre o tema, o qual será apresentado na seqüência.
189
Nos preparativos para a mobilização para a reivindicação de contratação de mais funcionários
para o HPSP, uma trabalhadora expressou: “os pacientes vão todos sair para casa e não vão precisar
mais de funcionários” (Diário de Campo, dia 25/03/2003).
180
4.3 OS EFEITOS DO MORADA SÃO PEDRO NA VIDA DOS SUJEITOS
O Morada São Pedro é um dispositivo de cuidados a sujeitos portadores de
transtorno mental egressos do HPSP, onde permaneceram longos anos
institucionalizados. Este dispositivo está organizado sob a forma de serviço
residencial terapêutico, expressão que revela suas características de ser um
equipamento de saúde nos moldes de residência para pessoas que, por longo
tempo, não tiveram outra possibilidade de viver.
Viver é uma questão central, pois pode-se somente estar vivo e sentir o
tempo transcorrer, ou pode-se construir a vida, interagindo, pensando no futuro,
tendo satisfações no dia-a-dia. Esta é uma possibilidade para os homens e
mulheres, com plena condição de expressão e realização.
O Morada, como outros SRTs, é um serviço complexo, pois dele se espera
um cuidado satisfatório para com seus usuários, com incentivo e oportunidades para
a retomada gradual do cotidiano através do processo pedagógico de restabelecer o
contato produtivo nas teias da sociedade. A tarefa do Morada é realizar a
desinstitucionalização, oferecendo uma casa como experiência concreta de
“reaprendizagem do uso de tempo e espaço com ritmos domésticos e afetivos, o uso
de objetos e oportunidades da vida diária [...] centrado nas demandas singulares de
cada um, como acontece com os diferentes moradores de uma casa” (PITTA, 1996,
p. 21).
Para tanto, a concepção que orienta os sujeitos atores e cria as práticas
necessárias às mudanças requeridas na sociedade é o de saúde mental coletiva,
por se constituir num
Processo construtor de sujeitos sociais desencadeadores de
transformações nos modos de pensar, sentir e fazer políticas, ciências e
administrações no cotidiano das estruturas de mediação da sociedade,
extinguindo-as e substituindo-as por outras capazes de contribuir para a
criação de projetos de vida (FAGUNDES, 1995, 03).
Esta dinâmica das interconexões das demandas econômicas, sociais e
políticas produziu então o serviço Morada São Pedro que, para as gestoras,
181
corresponde a um dispositivo compatível com os propósitos da reforma psiquiátrica
no Brasil.
O Morada vem ao encontro de toda a questão da desinstitucionalização e para
mim o mais importante é a possibilidade do usuário existir como sujeito. Isso não
é um garantia, mas é uma possibilidade que o SRT propicia, que isso faz parte
de toda a política da reforma (Gestora 1)
190
.
A manifestação revela que o motivos da criação do serviço residencial
terapêutico foi incorporado, com o propósito da gestão de desencadear condições
para o processo de desinstitucionalização.
O projeto Morada São Pedro significa uma mudança importante na condução
dos assuntos da saúde mental. Muda é o estigma dos antigos pacientes do
Hospital São Pedro que agora, sem desconsiderar que eles tem problemas de
saúde mental, eles tem condições de levar a sua vida de uma outra forma, com
mais autonomia, sem serem obrigados a estarem morando entre os muros do
hospital, e podendo decidir as coisas da sua vida diária (Gestora 2)
Esta exposição aborda a possibilidade do Morada reverter a histórica
estigmatização sofrida pelos que padecem de transtorno mental quando segregados
em instituição psiquiátrica hospitalar, bem como, da oportunidade que o serviço cria
de ampliar as condições de autonomia de seus usuários.
Faz parte de um projeto bem maior, que é o projeto o Pedro Cidadão que
também foi construído pela Comissão de Saúde Mental e que vem ao encontro
do que preconiza a Lei da Reforma Psiquiátrica, a questão da extinção gradativa
dos hospitais psiquiátricos. Essa substituição é feita através de vários serviços,
entre eles os serviços substitutivos que seriam os residenciais terapêuticos
(Gestora 3).
As manifestações abordam as várias dimensões presentes neste serviço,
como sua potência na produção de mudanças no modo de cuidar sob a perspectiva
da desinstitucionalização. Revela também a condição do Morada ser resultante de
um processo de ruptura com um modo hegemônico de cuidados em saúde mental,
advindo de uma disputa de projetos, no caso o São Pedro Cidadão. Esta perspectiva
é possível de ser considerada pelo entendimento de políticas sociais como
estratégia de hegemonia, pois
190
Para preservar a identidade dos participantes da pesquisa, os mesmos serão identificados pela
sua característica de inserção no estudo: usuário para os moradores e gestora, para as que
exerceram ou exercem a função de coordenação e direção do serviço, acompanhados por um
número, equivalente à ordem de realização das entrevistas. Estes procedimentos são para proteger a
identidade dos colaboradores da pesquisa, conforme acordado nos CILE.
182
[...] permitem a incorporação dos interesses materiais das classes
dominadas; remetem ao campo dos conteúdos ideológicos nacional-
populares; referem-se às práticas de produção dos sujeitos; materializam-se
em um aparelho jurídico-administrativo-prestador de serviços que corporifica
a ampliação do Estado (FLEURY, 1994, p. 50).
Ou seja, houve a incorporação pelo Estado de um projeto inovador, inspirado
nos pressupostos da reforma psiquiátrica, fruto da articulação de forças sociais
distintas que, em determinado momento histórico, produziram uma passagem para
um outro patamar de atenção a portadores de transtorno mental. Em termos de
gestão, o Morada ainda não atingiu uma fase de consolidação, mas proporcionou
um resultado importante relativo a uma redução nos gastos públicos com os sujeitos
sob sua responsabilidade.
Uma gestora informou que “atualmente o Morada São Pedro tem um custo
médio de R$600,00 reais por mês por cada usuário, com exceção da medicação que
deve custar aproximadamente entre R$200,00 a R$300,00 reais por morador”
(Gestora 1). Considerando que gastos com medicamentos é uma despesa pública
com a população em geral, não será considerado no cálculo realizado a partir de
informações fornecidas pela SES
191
, que resultou num gasto diário por usuário no
valor de R$ 21,46 (vinte e um reais e quarenta e seis centavos) no ano de 2006.
Este valor é inferior ao do ano de 1998, de R$ 30,71 (trinta reais e setenta e um
centavos) exclusivamente com os residentes do HPSP. Os gastos do governo são
de provimento de pessoal, custos gerais, como telefone, energia elétrica e
alimentação.
Tem o fornecimento de um rancho mínimo para algumas casas. No
primeiro ano praticamente todos os moradores recebiam comida pronta, já
no finalzinho algumas casas começaram a receber in natura, depois no final
a maioria da casas, que eram em torno de 24, recebiam tudo in natura, e
duas recebiam pronta. Umas dez casas não recebem mais nem in natura,
eles mesmos se sustentam com a bolsa De Volta para Casa (Gestora 2).
Em termos da categoria política social constatam-se mudanças significativas
com a implantação do Morada, como uma ação pública de atenção em saúde
mental. E quanto às mudanças ocorridas na vida dos portadores de transtorno
mental a partir do ingresso no Morada São Pedro, estas possibilitaram a garantia de
seus direitos e a autonomia na vida diária? Esta foi uma das questões que guiou a
191
Demonstrativo de Custos do HPSP, nos anos de 1999 e 2006 (RIO GRANDE DO SUL, 1998 e
2006).
183
realização deste estudo, considerada relevante para a verificação da efetividade do
serviço na capacidade de promover a desinstitucionalização e a realização de
direitos.
O aspecto da autonomia dos moradores do HPSP tinha sido pesquisado
numa etapa anterior ao funcionamento do Morada. A investigação de 2002 realizada
em 97% (N=584) dos seus residentes
192
, revelou que a autonomia, uma das
propriedades e condição fundamentais da cidadania, é a capacidade mais
prejudicada entre os usuários de longa permanência na instituição psiquiátrica, como
se pode verificar no conjunto das dimensões da escala ILSS, no Gráfico 02.
Legenda:
AL Alimentação CP Cuidados pessoais
AD Atividades domésticas PA Preparo e armazenamento de alimentos
S Saúde DI Administração do dinheiro
TR Transporte LA Lazer
EM Emprego
Gráfico 02
193
- Distribuição da população do HPSP segundo seu desempenho nos
domínios do ILSS, 2002.
Fonte: DIAS et al, 2002c, p. 125.
192
Destes 54,3% (N=317) o mulheres e 45,7% (N=267) são homens, com a idade média de 54,7
anos; 60% dos moradores do HPSP estão internados há mais de 20 anos, sendo a média de
internação de 26,2 anos (DIAS et al, 2002c).
193
Os escores variam de 0 a 4, sendo que a pontuação 0 significa o nível mais baixo de autonomia e
a pontuação 4 o mais elevado. Foi considera de 0-1 como um mau desempenho e acima de 2 um
desempenho bom (DIAS et al, 2002 c).
0
20
40
60
80
100
percent
0-1 score >2
score >2
84,6 52,5 28,2 23,5 64,7 16 26,8 21,8 20,9
0-1
15,4 47,5 71,8 76,5 35,3 84 73,2 78,2 79,1
AL CP AD PA S DI TR LA EM
184
O gráfico revela que os melhores desempenhos foram nos domínios de
alimentação (84,6%) e saúde (64,7%), e os desempenhos mais prejudicados foram
os de administração do dinheiro (16%) e emprego (20,9%). No conjunto, “70% da
população apresentou um comprometimento considerado de moderado a grave”
(DIAS et al, 2002c, p. 124) no aspecto de autonomia. A conclusão da pesquisa foi de
que, sob vários aspectos,
[...] trata-se de uma população comprometida do ponto de vista da
autonomia. A importância da autonomia dos pacientes psiquiátricos em
vários aspectos da vida diária é fundamental para o processo de
desinstitucionalização. Os longos anos de internação e o conseqüente
afastamento da sociedade, assim como a gravidade maior ou menor dos
sintomas psiquiátricos fez com que esses indivíduos desenvolvessem
deficiências em lidar com questões que dependessem de iniciativa e
independência
(DIAS et al, 2002c, p. 128).
A mesma escala foi aplicada no ano de 2004 no grupo de trinta usuários do
Morada, e através do teste estatístico obteve-se as médias dos desempenhos de
cada domínio na comparação com o ano de 2002, cujo resultado consta no gráfico
03.
Gráfico 03 - Comparação dos desempenhos dos usuários nas habilidades da vida
diária, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007).
185
Os resultados da pesquisa com a escala ILSS revelam que estatisticamente
aumentaram as habilidades na vida diária dos trinta usuários que saíram do HPSP e
foram residir no Morada São Pedro, na média de 7,52 das freqüências dos quesitos
investigados em relação a 2002, como revelou o Gráfico 03. Os domínios da
alimentação e lazero tiveram alteração no período transcorrido de dois anos, com
as médias -0,29 e 0,0 respectivamente, e a saúde foi o terceiro pior desempenho
(2,5). Os domínios com mudanças significativas foram os de administração do
dinheiro (23,88), preparo de alimentos (16,30), transporte (13,49), atividades
domésticas (11,59) e cuidados pessoais (8,52), todos com médias superiores à
global na escala; o domínio emprego (7,42) aproximou-se da dia global do
desempenho medido pela escala
194
. Assim, em cinco dos nove domínios
examinados houve uma alteração positiva nas habilidades dos usuários em
vivenciarem seu cotidiano.
Posto este resultado global, será analisado cada domínio individualmente
articulando com os resultados obtidos com as entrevistas, de modo a se verificar
seus efeitos na vida dos usuários a partir do ingresso no serviço Morada São Pedro.
O domínio alimentação
195
refere-se aos aspectos de asseio e forma de
ingestão dos alimentos, e ao uso apropriado de utensílios nas refeições. O resultado
deste domínio não significa uma redução no desempenho, ou uma dificuldade de
sua realização pelos usuários, tanto que o Gráfico 02 mostra o desempenho superior
deste domínio em 2002. O Gráfico 03 revela que as freqüências nos quesitos
investigados dos trinta usuários foram estatisticamente semelhantes nos dois anos
pesquisados, não havendo mudanças no intervalo entre as medições, que
corresponde ao período da transferência daqueles usuários para o Morada São
Pedro. Considerando o alto desempenho deste domínio, infere-se que os bons
resultados permaneceram como habilidades dos moradores.
O domínio lazer mede uma variedade de entretenimento, com passatempos
realizados com regularidade e externos ao local de residência, como passeios,
atividades esportivas e participação em reuniões comunitárias; as relacionadas aos
cuidados com jardim ou quintal, bem como aqueles realizados na privacidade da
194
Os testes estatísticos realizados constam no Anexo D.
195
Ver a escala ILSS no Anexo B.
186
casa, como ouvir dio e ver televisão. Por fim, mede também a prática de escrever
cartas e ler jornais habitualmente. O Gráfico 03 revela a permanência da mesma
freqüência na comparação dos anos pesquisados, sendo que o Gráfico 02 mostra
que em 2002 o domínio lazer correspondeu a 78,2% no score de 0-1, considerado
um baixo resultado quanto à autonomia. Assim, estatisticamente pode-se concluir
que a mudança para o Morada não propiciou novas oportunidades aos usuários de
vivenciarem o lazer. Este resultado difere dos encontrados em estudo nos Serviços
Residenciais Terapêuticos no Estado do Rio de Janeiro, em que as atividades com
destaque entre as realizadas pelos moradores dentro das casas são as de lazer,
gestão da casa e laborativas (LOBO, 2004).
Contudo, este domínio é muito abrangente, pois envolve as esferas pública e
privada da vida, bem como requer a condição do sujeito ser alfabetizado, e por isso,
é muito rico por expressar algumas dimensões da desinstitucionalização. Assim, o
resultado estatístico desta dimensão precisa ser problematizado, ao mesmo tempo
em que é eficaz, pois reflete matematicamente a realidade dos desafios da
desinstitucionalização.
Um aspecto a ser analisado é o da circulação em espaços da cidade ou no
circuito espacial mais próximo, o que possibilita a interação social, fundamental para
contrapor a experiência de isolamento social advinda do longo tempo de
institucionalização. O domínio dos transportes tem uma interface importante com o
do lazer, e, por conseguinte, ambos serão analisados de forma articulada. Um
indicador do domínio laser é a realização de passeios fora do local da residência,
cujo resultado se constata no Gráfico 04.
187
Gráfico 04 – Comparação da freqüência da questão 2 do domínio lazer, anos 2002 e
2004.
Fonte: Autora (2007)
Verifica-se que houve uma pequeno aumento de passeios em áreas externas
do Morada (de 63,3% em 2002 para 66,7% em 2004)
196
e que aumentou
significativamente os que nunca realizam estes passeios (10% em 2002 para 23,3%
em 2004). Quando consultados sobre os locais que mais circulam na cidade, os
usuários referiram os supermercados, o banco e a igreja, tendo sido as mesmas
respostas das gestoras. Na questão para as gestoras sobre os instrumentos e/ou
equipamentos utilizados para ampliação das condições de inclusão social dos
usuários este aspecto foi referido como a realização pontual de passeios turísticos
em datas especiais e almoços em restaurantes da cidade.
O resultado deste indicador é corroborado com alguns do domínio dos
transportes. Este corresponde à habilidade de andar de ônibus e ler seus itinerários;
deslocar-se a pelos locais da vizinhança; respeitar as normas para pedestres;
informar-se e seguir as indicações de um trajeto; fazer viagens de longa distância e
comportar-se apropriadamente nos veículos de transporte, cuja mudança no Morada
foi na média de 13,49 em relação ao tempo do HPSP. Um indicador interessante
para refletir sobre a possibilidade de circulação pela cidade é o que mede se os
usuários andam de ônibus, como demonstra o Gráfico 05.
196
No Anexo C está a apresentação das tabelas com os dados coletados sobre as dimensões da
Escala ILSS.
Questão 2 - Passeia fora de seu local de residência
residência
0
5
10
15
20
25
nunca
algumas
vezes
com
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
freqüência
188
Gráfico 05 - Comparação da freqüência da questão 1 do domínio transporte, anos
2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007).
Observa-se que estatisticamente é insignificante a alteração ocorrida no
período estudado da freqüência nunca, de 53,33% (2002) para 56,67% (2004).
Significa que um mesmo grupo de usuários acrescido de mais alguns, não realizou
esta forma de interagir na cidade.
Mudar-se do manicômio para uma casa é uma passagem que exige
uma reestruturação da maneira de lidar com o espaço, com as outras
pessoas e consigo mesmo. o é simples. Exige atenção, cuidado e a
consciência de que essa mudança não se de uma hora para outra, mas
é um processo (JARDIM et al., 2004, p. 01).
A freqüência sempre anda de ônibus foi de 16,67% (2002) e passou para
36,67% (2004), revelando que um grupo passou a deslocar-se para espaços mais
distantes, ampliando os horizontes relacionais.
[...] alguns começaram a ir para um projeto de alfabetização de adultos, e
eles iam com os acompanhantes terapêuticos, e chegou num dado
momento eles pediram para irem sozinhos, então eles iam de ônibus
sozinhos para escola (Gestora 2).
O número significativo de usuários que passeiam em áreas externas ao
Morada o fazem, na maioria dos casos, locomovendo-se a pé, como se verifica no
Gráfico 06, do domínio dos transportes.
Questão 1 - Anda de ônibus
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqü
ência
2002
2004
189
Gráfico 06 - Comparação da freqüência da questão 3 do domínio transporte, anos
2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
Observa-se que houve uma redução drástica na freqüência daqueles que
nunca se locomoviam nas redondezas em 2002, correspondendo a 20% e passa a
ser 3,33% em 2004. A freqüência sempre passou de 56,67% (2002) para 93,33%
(2004), revelando ser esta uma atividade realizada pela quase totalidade dos
usuários. Ir a pé a locais da vizinhança corresponde aos deslocamentos aos
supermercados, bancos e igreja, organizações existentes nos quarteirões próximos
ao Morada, e as mais realizadas pelos usuários. Estes também realizam várias
atividades no HPSP, sejam as relacionadas ao trabalho, seja para lazer: “Foi
inaugurado o galpão crioulo, então eles tem usado o espaço do galpão crioulo para
bailes, jantares” (Gestora 2). Mas passear mais longe também gera satisfação, como
uma usuária expressa no relato a seguir.
Entrevistadora: O que tu vais fazer agora quando voltares pra casa?
Usuária 6: Eu vou almoçar e depois vou na casa da L e amanhã eu venho.
Entrevistadora: O que tem hoje? Usuária 6: Tem janta, mas eu não quero
a janta, quero o chá. Entrevistadora: Onde ela mora? Usuária 6: É longe.
Entrevistadora: E tu volta só amanhã? Usuária 6: É (...) e eu bem faceira
197
.
O diálogo mostra a satisfação em passear na casa da cuidadora, experiência
que lhe proporciona prazer, enquanto que em outro momento revela o medo urbano
da violência, quando perguntada sobre o comparecimento ao banco para receber o
benefício da previdência social.
197
As falas dos usuários entrevistados estão transcritas literalmente.
Questão 3 - Vai a pé a locais da vizinhança
0
5
10
15
20
25
30
nunca
algumas vezes
na maioria das
vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
190
Usuária 6: Não, eu vou junto com a L, ela tira o dinheiro (...). Entrevistadora:
E se tu quiseres, tu mesma tirar o teu dinheiro, tu sabes fazer? Usuária 6:
Não, não sei, ela que tira. Entrevistadora: E se a L. te ensinar como se
tira o dinheiro, tu queres aprender? Usuária 6: Não, eu tenho medo.
Entrevistadora: Porque tu tens medo? Usuária 6: Ladrão.
A exposição da usuária demonstra a dificuldade de ousar aprender a manejar
com a tecnologia bancária pelo receio que tem da violência que hoje faz parte do
cotidiano dos habitantes nas cidades, fazendo com que o estilo de vida seja
alterado, com a redução da convivência entre as pessoas (OLIVEIRA, M, 2006).
Contemporaneamente, o estar em casa com acesso aos meios de comunicação
viabilizados pela tecnologia passou a ser uma forma de lazer, e muitas vezes de
refúgio dos habitantes das cidades. Portanto, neste aspecto sintonia entre os
residentes do Morada com os habitantes das cidades em geral, como se verifica no
Gráfico 07.
Gráfico 07 – Comparação da freqüência da questão 4 do domínio lazer, anos 2002 e
2004.
Fonte: Autora (2007)
Em 2004 o ato de sempre ouvir rádio ou ver televisão passou para a
freqüência de 93,3% entre os usuários, quando em 2002 o percentual era de 73,3%.
Esta possibilidade de lazer era realizada de forma satisfatória no HPSP, onde as
enfermarias contam com estes aparelhos eletrônicos e muitos dos usuários
possuíam seus próprios, adquiridos com seus vencimentos. Houve uma
Questão 4: Ouve rádio ou vê televisão
0
5
10
15
20
25
30
nunca com freqüência na maioria das
vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
191
intensificação desta prática, pois no Morada coabitam, no máximo, quatro pessoas
por casa, todas equipadas e propiciadoras destas formas de entretenimento.
Quanto à prática de escrever cartas e ler jornais habitualmente, medido pela
escala, um prejuízo importante, considerando que 69% (N=404) da população do
HPSP são analfabetos e 12% de analfabetos funcionais (N=69), perfazendo um total
de 81% com prejuízos importantes no acesso ao sistema educacional (DIAS et al,
2002c, p. 120). Por fim, um outro aspecto considerado importante neste domínio é o
relativo à participação dos usuários do Morada em atividades comunitárias, visto
estar relacionada às possibilidades de interação e participação na vida social no
âmbito político. O Gráfico 08 revela o resultado deste aspecto.
Gráfico 08 - Comparação da freqüência da questão 9 do domínio lazer, anos 2002 e
2004.
Fonte: Autora (2007).
A presença importante da freqüência sempre participa (30%) em 2002
explica-se pela presença dos usuários nas várias atividades preparatórias à
instalação do Morada que se realizaram naquela época. No ano de 2004, verifica-se
que a maioria dos usuários (40%) nunca participou de reuniões de organizações
civis, enquanto que 33,3% sempre o fazem. Nos depoimentos prestados pelos
usuários não referência a este tipo de atividade. Durante o trabalho de coleta de
dados
198
, observou-se no mural da casa da equipe um material divulgando a reunião
do Orçamento Participativo local, que se realizaria na obra do Morada. As
198
Diário de Campo, dia 25/03/2003.
Questão 9 - Vai a reuniões de organizações cívicas ou outras
0
2
4
6
8
10
12
14
nunca algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
192
trabalhadoras informaram, na ocasião, que alguns usuários participam destas
atividades quando os assuntos estão diretamente relacionados ao serviço.
Uma gestora refere o espaço da cooperativa de trabalho ATUT
199
como um
lugar propiciador de tomada de decisões, pois mesmo “[...] que infelizmente
beneficia poucos moradores, eles têm reuniões com o Departamento Municipal de
Limpeza Urbana (DMLU) aonde quem vai nessas reuniões são os associados e
estão discutindo junto com outras cooperativas de trabalho o valor do fardo para a
reciclagem” (Gestora 1). Esta participação está relacionada à organização do
trabalho, fundamental para garantir a sua viabilidade e o sustento esperado pelos
seus operadores, correspondendo ao tipo corporativo, de “defesa de interesses
específicos de determinados grupos sociais” (NOGUEIRA, M, 2004, p. 131).
De modo geral pode-se compreender então algumas das razões do domínio
lazer não ter tido mudança na vida dos usuários, indicando alguns aspectos com
possibilidades a serem construídas, e outros, que estão em sintonia com as
condições atuais de vida nas cidades, exigindo que seja problematizado o sentido
tradicional do lazer.
Estaríamos caminhando em direção a uma “terceira cidade”, distinta
do burgo medieval e da cidade burguesa projetada no século XIX. Essa
trajetória estaria conduzindo as cidades a uma espécie de ville-paysage,
organizada para aqueles que nela não vivem a urbanidade no seu cotidiano.
Tais cidades estariam preferencialmente voltadas para o consumo, para a
diversão e para diferentes formas de reprodução do capital
(OLIVEIRA, M,
2006, p. 176).
A capacidade de consumo aumentou significativamente na vida dos usuários,
visto o domínio administração do dinheiro ter tido a média de 23,88 de aumento na
freqüência em relação ao período em que os mesmos estavam internados. Este
domínio tem os seguintes indicadores: habilidade de aquisição na quantidade
adequada de mercadorias, roupas e objetos de uso pessoal; tomada de providências
no conserto de roupas e objetos; pagar contas; administração adequada de seu
orçamento, com a procura de ajuda ou informação, se for necessário, para planejar
seu orçamento; prioridade na compra de itens essenciais; devolução de material
defeituoso ou troca mercadorias em lojas e conferência de troco em lojas; utilização
199
Associação dos Trabalhadores da Unidade de Triagem do HPSP.
193
do relógio para organizar sua programação diária, e por fim, compreensão dos
termos tutela ou curadoria, aspecto que será analisado na categoria dos direitos
200
.
A administração do dinheiro implica que, primeiramente, exista uma
capacidade dos sujeitos disporem de meios para satisfazerem suas necessidades
materiais, pessoais ou grupais, sejam elas as imprescindíveis para a manutenção da
vida, sejam as que proporcionam prazer e satisfação. Ter recursos financeiros é uma
condição para a possibilidade de autonomia, pois permite a liberdade de escolha
sobre os tipos e forma de consumo, como assinala uma gestora, ao expressar sua
posição sobre o serviço Morada.
As conquistas foram muito grandes, e justamente nesse processo
de começar a se reconhecer como sujeito, de poder começar a encontrar
um espaço de escuta, de poder começar a ter o acesso ao dinheiro que
para mim é algo muito importante, que te possibilita circular pelos espaços,
a participar das coisas, a adquirir coisas, que faz parte dos nossos valores
sociais (Gestora 1).
A totalidade dos usuários do Morada possui alguma renda mensal, pois os
que o tinham benefícios, como pensão, aposentadoria ou benefício de prestação
continuada
201
, foram incluídos no programa federal De Volta para Casa, instituído
em 2003 (Quadro 14).
A maioria dos usuários tem o benefício LOAS e todos eles têm a
bolsa de Volta para a Casa, como em geral eles moram em quatro em
alguma das casas, então esse orçamento é gerenciado pelas necessidades
comuns, e cada um tem os seus gastos pessoais. Então é assim, eles
gerenciam as necessidades em conjunto [...] Eles estão calçando a frente
das casas, botaram grades, eles estão se gerenciando (Gestora 2).
Percebe-se que o orçamento formado pelas rendas dos usuários permite aos
mesmos a realização de aquisições tanto de bens necessários como aqueles
relacionados à segurança e estética das casas.
[...] o benefício chega na pessoa e ela está gastando. Os supermercados
são os locais que mais eles vão, adoram almoçar e jantar fora, lancherias
do bairro, padarias do bairro (Gestora 3).
200
Gráfico 18.
201
Em 2002, 44% (N=257) da população residente no HPSP tinha renda fixa, e 31,5% (N=184)
destes através de benefício da previdência social; mas 48,5% (N=283), ou seja, a maioria dos
residentes do Hospital, não tinha renda nenhuma (DIAS et al, 2002c, p. 121).
194
Os rendimentos de alguns usuários obtidos com os benefícios sociais o
complementados com valores advindos da realização de atividades nas oficinas de
geração de renda existentes no HPSP: “alguns trabalham na reabilitação do hospital
ainda, então além da bolsa auxílio e do benefício, também tem essa outra renda...
eles financiam alimentação, vestuário, lazer” (Gestora 3). Os usuários sabem que
têm vencimentos mensais e quais são suas fontes, sentindo satisfação em anunciar
no que gastam seu dinheiro, como se constata nas suas falas:
Ela [referindo-se a curadora] recebe minha pensão que é do meu pai e da
minha mãe. Antes dela morrer, a minha tia recebeu toda a papelada da
minha pensão, aí a minha tia ficou como minha procuradora (Usuária 2);
Ganho a pensão... Compro as coisas pra casa (Usuária 5);
Entrevistadora: É na cooperativa que tu trabalhas de manhã? Usuária 6 - É
aí. Amanhã sai o dinheiro... (Usuária 6);
E aí ele [referindo-se ao marido] disse assim, o dinheiro é teu (Usuária 6);
Eu recebo pensão da minha família... Eu compro pão, bebida e outras
coisas mais (Usuário 8).
A condição de ser pensionista tem um valor importante para os usuários, por
ser uma representação de manutenção do vínculo com sua família. Para além da
viabilidade material de consumo que a pensão possibilita, as manifestações durante
as entrevistas revelam que os usuários sentem-se pertencentes a uma família, a
uma cidade, ou seja, tem raízes. Um usuário respondeu à pergunta “Tu moras
onde? Usuário 8: Eu sou de Pelotas”. Na constituição do saber psiquiátrico esteve
presente um entendimento de que o convívio entre o portador de transtorno mental e
sua família era prejudicial ao tratamento, e como este estava assentado no
isolamento nos hospitais psiquiátricos, resultou na separação familiar e no abandono
destes sujeitos nos manicômios (MORENO; ALENCASTRE, 2003).
Após longos anos apartados da vida familiar e social os usuários passam a ter
autonomia, como sinônimo de vida e de liberdade (CATTANI, 1996), sendo capazes
de interagir e requisitar sua própria independência em relação à instituição.
Porque tem uma casa com três a quatro moradores, e cada um com
uma média de renda de R$500 reais mensais. Eles compram alimentação,
vestuário, passeio, atividades que queiram fazer [...] alguns moradores
querem ter a sua conta de luz, e nós estávamos vendo como é que a gente
poderia separar isso, porque eles querem ter a sua conta de luz em baixo
da porta e querem pagar a sua conta de luz (Gestora 1).
195
Outra manifestação de desejar independência em relação à instituição
ocorreu por ocasião do começo do pagamento do auxílio financeiro do Programa de
Volta para Casa, quando algumas usuárias disseram que iriam comprar seus
próprios veis com esta verba, e devolver os que tinham, pois era o São Pedro
que tinha fornecido
202
. Está presente uma perspectiva consensual sobre a
autonomia, de ser constituída por duas condições essenciais: “liberdade
(independência do controle de influências) e ação (capacidade de ação intencional).
[...] A incapacidade mental limita a autonomia, porém estes indivíduos continuam a
merecer o respeito como pessoas” (GOLDIM, 2000b, p. 2). As manifestações dos
usuários revelam a liberdade e a ação, expressas pela postura de escolher por si
própria e poder ter a condição de realizar.
Ao “adquirirem dignidade, a identidade de consumidores e de cidadãos”
(FALEIROS et al, 1998) os usuários passam a ter respostas condizentes com o
requerido para o convívio em sociedade e em espaços coletivos. Um dos
indicadores deste domínio é a administração adequada do orçamento, isto é, se o
usuário planeja suas despesas de acordo com seus recursos financeiros. Os
resultados obtidos na comparação são interessantes para serem destacados, como
se visualiza no Gráfico 09.
Gráfico 09 - Comparação da freqüência da questão 6 do domínio administração do
dinheiro, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
202
Diário de Campo, 30/12/2003.
Questão 6 - Administra adequadamente seu orçamento
0
2
4
6
8
10
12
14
16
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
196
A alternativa nunca administra de forma adequada o orçamento foi a mais
freqüente em ambos os anos estudados. No ano de 2002, com 26,6% e em 2004,
com 46,67%. a alternativa sempre teve percentual de 16,6% em 2002 e 40% em
2004, significando que um grupo considerável desenvolveu neste período de tempo
esta habilidade. Contudo, pode-se inferir que há uma dificuldade importante na
realização desta habilidade, situação que é comum na sociedade, haja visto o
fenômeno da inadimplência das pessoas físicas
203
.
Por outro lado, pode estar presente neste dado uma manifestação das
cuidadoras, revelando certa frustração na expectativa de que a maioria dos usuários
poderia estar mais preparada para um controle adequado do seu orçamento, a
partir da vivência num serviço aberto e com mais possibilidades de intercâmbios
sociais e de consumo. Correlato a este indicador é a habilidade de priorizar o gasto
em produtos essenciais ao consumo, em detrimento do que seria supérfluo, como se
verifica no Gráfico 10.
Gráfico 10 - Comparação da freqüência da questão 9 do domínio administração do
dinheiro, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
A freqüência nunca prioriza itens essenciais correspondeu a 33,3%, enquanto
que a freqüência sempre foi de 53,3% no ano de 2004. Este percentual de 2004 é
203
Alguns dos principais fatores que leva os consumidores à inadimplência: falta de controle nos
gastos, comprometimento de renda com outras despesas, uso do dinheiro com outras compras, além
das relacionadas ao desemprego, redução de renda e doenças. Disponível em:
http://www.sebraesp.com.br/principal/abrindo%20seu%20neg%C3%B3cio/produtos%20sebrae/artigo
s/listadeartigos/inadimplencia.aspx.
Questão 9 - Compra itens essenciais antes de gastar
dinheiro com supérfluos
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
197
muito significativo, pois expressa que muitos usuários recuperaram ou aprenderam
uma habilidade importante na administração do orçamento doméstico, que é a
capacidade de priorizar suas despesas na vida diária, processo ainda a ser
desenvolvido com um grupo de usuários no Morada. Outro aspecto deste domínio
que se destaca é o relativo à conferência de troco, por ocasião de compras
realizadas no comércio, como se verifica no Gráfico 11.
Gráfico 11 - Comparação da freqüência da questão 12 do domínio administração do
dinheiro, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
A freqüência nunca confere troco correspondeu a 23,3%, enquanto que a
freqüência sempre foi de 66,67% no ano de 2004, muito superior estatisticamente
em relação a 2002. Este dado revela o domínio intelectual e de autocuidado, na
medida em que esta atitude visa proteger seus próprios vencimentos, essenciais
para uma vida digna, pois “as oportunidades de trocas materiais e simbólicas são
oportunidades precedentes na construção da capacidade relacional do sujeito”
(SARACENO, 1996b, p. 151), significando que os usuários estão em processo de
apropriação da sua vida.
O fato do domínio administração do dinheiro ter tido o melhor desempenho
entre um conjunto de habilidades de autonomia dos usuários expressa também a
presença do fenômeno do consumo, que passou a se constituir como integrante das
suas vidas diárias. A renda mensal dos usuários que contam exclusivamente com a
bolsa-auxílio do governo federal é inferior ao salário mínimo vigente, e os que
possuem o BPC, contam com um rendimento de um salário mínimo, assim como a
Questão 12 - Confere troco em lojas
0
5
10
15
20
25
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
198
maioria dos pensionistas
204
, o que se conclui que a maioria dos usuários estão
localizados na linha da pobreza
205
.
As despesas com a manutenção da estrutura de moradia, alimentação e do
apoio em saúde são providas pelo governo, que é responsabilidade assumida
pela lógica da política vigente até o advento da reforma psiquiátrica, do Estado ser o
guardião e o tutor dos indesejados pela sociedade
206
. Mas, as despesas com a
conservação das casas (higiene basicamente), vestuário e alimentação
complementar, além do rancho básico, são realizadas com os proventos dos
usuários, que ainda conseguem adquirir móveis
207
e utensílios domésticos para lhes
proporcionar mais conforto na vida diária.
A aquisição de objetos e móveis, bem como de alimentação diferenciada é
uma tônica nas exposições dos usuários, assim como se constata que as casas
estão equipadas com o conforto necessário. Esta situação corrobora a reflexão de
Martins (2003) de que antes o ideário de ascensão social dos pobres através do
trabalho consistia na propriedade imobiliária e no enraizamento nas cidades. Agora,
com as transformações societárias advindas da reestruturação produtiva, a
ascensão social é feita pelo consumo e pela propriedade mobiliária. “Os pobres, do
mesmo modo que as elites e a classe média descobriram que na sociedade
contemporânea o consumo ostensivo é um meio de afirmação social e de definição
de identidade” (MARTINS, 2003, p. 37). Nesta perspectiva, pode-se concluir que o
acesso ao consumo implicou numa forma de inserção social dos usuários do serviço
Morada São Pedro.
A habilidade de preparar e armazenar alimentos foi um dos domínios com
uma média (16,30) significativa de mudança entre os usuários do Morada.
Corresponde ao preparo de refeições simples, sem e com cozimento de alimentos;
guardar os alimentos de forma apropriada; identificar a sanidade dos mesmos; e
realizar as tarefas de higienização dos utensílios de cozinha, bem como guardá-los
204
Na pesquisa realizada em 2002, a renda mensal dos que tinham rendimentos fixos estava na
média de R$ 185,47 (cento e oitenta e cinco reais e quarenta e sete centavos) enquanto que o salário
mínimo vigente na época era de R$ 200,00 (duzentos reais) (DIAS et al., 2002c, p. 121).
205
Linha de pobreza equivalente a 01 salário mínimo (CAMPOS et al., 2003, p. 23).
206
Ver capítulo 2.
207
Parte do mobiliário inicial das casas foi adquirido com verba do Ministério da Saúde, de incentivo à
criação dos serviços residenciais terapêuticos.
199
apropriadamente. Os resultados obtidos neste indicador podem ser visualizados no
Gráfico 12.
Gráfico 12 - Comparação da freqüência da questão 1 do domínio preparo e
armazenamento de alimentos, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
Esta habilidade é uma das que reflete claramente a mudança ocorrida na vida
diária dos usuários, pois está relacionada à capacidade deles (83,33%) sempre
realizarem pequenos lanches (2004), superando o percentual de 50% em 2002. Os
SRTs têm a característica de desempenharem duas atribuições concomitantemente,
a de moradia e a de tratamento, situação que faz os usuários ora serem alvo dos
cuidados dos trabalhadores do serviço, ora “como donos da casa, com um elevado
nível de apropriação e cuidado (WEYLER; FERNANDES, 2005, p. 83).
Um domínio correlato é o das atividades domésticas, que corresponde às de
organização e manutenção do espaço da casa, como arrumar a cama diariamente,
com troca de roupa de cama sempre que necessário, mantendo o quarto limpo;
ocupar-se da arrumação da casa; organizar e realizar a lavagem e secagem das
roupas e guardá-las apropriadamente. A partir da mudança para o Morada este
domínio aumentou na dia de 11,59 em relação ao tempo em que os usuários
estavam internado no HPSP. Um dos indicadores interessantes para revelar a
mudança ocorrida é o constante no Gráfico 13.
Questão 1 - Prepara refeições simples que não precisam ser
misturadas ou cozidas
0
5
10
15
20
25
30
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
200
Gráfico 13 - Comparação da freqüência da questão 6 do domínio atividades
domésticas, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
A mudança neste indicador também é relevante, pois em 2002, 26,67% dos
usuários nunca se ocupavam da arrumação de sua casa e este percentual se reduz
para 6,67% no ano de 2004. A freqüência de sempre realizarem esta atividade
passa de 43,33% (2002) para 70% (2004). Neste domínio um aspecto importante
a ser considerado que é o relativo ao gênero. Uma cuidadora referiu que o usuário
de quem é referência não concorda com as “lidas domésticas por entender ser um
trabalho feminino, e como trabalha e estuda não precisa se ocupar com o cuidado
da casa”
208
. Deste modo, é realizado um estímulo constante para que todos os
usuários realizem estas atividades da vida diária, mas estas posições pessoais, fruto
da cultura são consideradas, pois “o respeito à autonomia e à dignidade de cada um
é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros”
(FREIRE, 2003, p. 59).
A dimensão cuidados pessoais equivale ao comportamento de manter o
asseio pessoal permanente, inclusive com o corte dos cabelos; resguardo no vestir-
se, conservação de bom estado de aparência pessoal e das vestimentas, e por fim,
se os usuários mantêm atitudes socialmente aceitas no convívio social. A média de
freqüência foi de 8,52 em relação ao tempo do HPSP. O indicador de conservar-se
limpo e arrumado o dia todo reflete uma atitude de auto-estima e satisfação, sendo a
208
Diário de campo, 25/03/2003.
Questão 6 - Se ocupa da arrumação de sua moradia quando
necessário
0
5
10
15
20
25
nunca algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
201
escolhida para ilustrar a mudança ocorrida a partir da transferência dos usuários
para o serviço do Morada, como se verifica no Gráfico 14.
Gráfico 14 - Comparação da freqüência da questão 10 do domínio cuidados
pessoais, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
Os resultados são relevantes, pois no ano 2002 a freqüência sempre
correspondeu a 56,66% e em 2004, passou para 96,67%, significando que quase a
totalidade dos usuários passou a preservar-se em condições de apresentação
pessoal de forma reconhecida socialmente. Ainda há dificuldades com alguns
usuários para manterem estas condições, mas isto é resultado do longo tempo de
isolamento institucional, quando “[...] desenvolvem um afrouxamento no
comportamento social, tornando os pacientes despreocupados em certos costumes
simples, como vestir-se, falar, assear-se e mesmo comunicar-se com o outro”
(MOURA FÉ, 2006, p. 4).
As características medidas neste domínio têm relação com o de saúde, que
se refere à habilidade de relatar apropriadamente seus problemas físicos, e cuidar
daqueles mais leves de forma apropriada; aceitar a medicação que lhe é
administrada e tomar seu medicamento sem supervisão; conseguir ajuda de
serviços públicos, quando necessário, e seguir suas orientações; fumar respeitando
as regras de segurança. A partir do ingresso no Morada, os usuários tiveram um
desempenho maior na média de 2,5 em relação ao tempo em que viviam no HPSP,
em 2002, quando se constatou que a saúde foi um dos melhores domínios quanto a
Questão 10 - Conserva-se limpo e arrumado o dia todo
0
5
10
15
20
25
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35
nunca algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
202
autonomia, com 64,7% da freqüência (Gráfico 2). O resultado na comparação de um
indicador entre os períodos se verifica no Gráfico 15.
Gráfico 15 - Comparação da freqüência da questão 7 do domínio saúde, anos 2002
e 2004.
Fonte: Autora (2007)
A freqüência nunca toma o medicamento sem supervisão era de 30% em
2002 e passou para 36,67%, significando que um pequeno grupo de usuários
passou a necessitar de apoio para seu cuidado com a saúde. Pode ser um efeito da
passagem do tempo sobre os indivíduos, que passam a depender mais de apoio
externo à medida que envelhecem. De modo geral, houve uma mudança
significativa no auto-cuidado em saúde, pois em 2002, 20% dos usuários tomavam
seus remédios sozinhos, quantitativo que passou para 50% em 2004.
Tem moradores com condições de se administrar, então eles têm a
medicação na sua própria casa, eles têm os horários definidos que eles
tomam as medicações. Os que não tem condições de gerenciar, a
referência providencia. Então a medicação fica na casa da equipe e nos
horários de tomar eles vão até lá, ou se eles não forem, a referência vai até
a casa deles, ou no fim de semana quem está no plantão (Gestora 3).
A mudança importante neste indicador revela que realizou-se um trabalho
para os usuários sentirem-se autorizados a também cuidarem de sua saúde,
acontecendo deste modo a desinstitucionalização, que “significa tratar o sujeito em
sua existência e em relação com suas condições concretas de vida. Isto significa
Questão 7 - Toma seu medicamento sem supervisão
0
2
4
6
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14
16
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
203
não administrar-lhe apenas fármacos ou psicoterapias, mas construir possibilidades”
(AMARANTE, 1995b, p. 494).
Aqui tentamos muitas vezes fazer com eles e muitas permitir que
eles façam sozinhos a partir do momento que eles consigam se sentirem
seguros para estarem fazendo essas coisas sozinhos. Precisa ir no
supermercado fazer compras, alguns gostam que a referência acompanhe,
até pela dificuldade que eles têm em lidar com o dinheiro, assim como tem
uns que vão sozinhos ao banco retirar o dinheiro da bolsa De Volta pra
Casa, tem outros que precisam que a referência acompanhe pra poder
digitar a senha; eles mesmos sabem qual o dia que sai o dinheiro, um
informa o outro, um já vai no banco e já diz para os demais (Gestora 3).
A ação dos trabalhadores é um dos determinantes na possibilidade de
ampliação da autonomia dos usuários, pois são os que têm a tarefa de estimular e
fazer junto toda vez que for necessário. “A produção de autonomia não se em si
para si. Ocorre no encontro, nas interfaces psicossociais. Nesse sentido, esta
produção está diretamente relacionada ao olhar do outro, que produzirá junto
determinadas formas de estar no mundo” (MOREIRA; ANDRADE, 2003, p. 265).
Por fim, a dimensão emprego, que corresponde às ações de procurá-lo
através de anúncios classificados ou através de contatos com pessoas ou serviços;
participar de entrevistas de seleção, ter aspirações realísticas de emprego, e
habilidade de cumprir os horários correspondentes aos compromissos, teve uma
mudança na média de 7,42 em relação ao tempo em que os usuários viviam no
HPSP. Um indicador será destacado, como se verifica no Gráfico 16.
204
Gráfico 16 - Comparação da freqüência da questão 5 do domínio emprego, anos
2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
A freqüência nunca aspira um emprego é a maior, tanto em 2002, com
43,33%, como em 2004, com 56,67%, podendo ser várias as explicações, mas
principalmente, o fato de que todos os usuários dispõem de remuneração mensal
justificaria este resultado. Contudo, é interessante verificar que a freqüência sempre
foi de 6,67% em 2002 e passou para 26,67% (2004), significando que alguns
usuários estão se percebendo capazes e autorizados a buscarem um emprego. “A
construção coletiva do protagonismo requer a saída da condição de usuário-objeto e
a criação de formas concretas que produzam um usuário-ator, sujeito político”
(TORRE; AMARANTE, 2001, p. 84).
Os nove domínios analisados na comparação das habilidades dos usuários
antes e depois do Morada o Pedro, revelaram que se desenvolveu um processo
de desinstitucionalização, possibilitador da ampliação da capacidade de autonomia
dos sujeitos, de “restabelecer a relação do indivíduo com o próprio corpo, reconstruir
o direito e a capacidade de uso dos objetos pessoais, reconstruírem o direito e a
capacidade de palavra [...]” (ROTELLI, 1990, p. 32-33).
No exame mais minucioso dos domínios analisados pode-se verificar que
características distintas entre os mesmos, revelando que alguns têm aspectos mais
diretamente relacionados à individualidade de cada usuário e dependentes de sua
vontade e interesse, bem como de atitudes e comportamentos possíveis decorrentes
Questão 5 - Tem aspirações realistas de emprego
0
2
4
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18
nunca
algumas
vezes
com
freqüência
na maioria
das vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
205
do fato de serem portadores de um transtorno mental importante. Outros domínios
revelam aspectos dependentes de meios e recursos externos a cada sujeito, no
caso, requerem ações e iniciativas do gestor e dos profissionais cuidadores do
serviço Morada São Pedro. Deste modo, domínios que integram o que se está
categorizando como dimensão individual e outros, a dimensão organizacional.
Na dimensão individual estão os domínios de alimentação, cuidados
pessoais, atividades domésticas e saúde. Já como dimensão organizacional, se
identifica os domínios de preparo de alimentos, administração do dinheiro,
transporte, lazer e emprego, visto que para os mesmos se realizarem, dependem de
estrutura e apoio pessoal como estímulo e motivação, ou seja, de um aparato
institucional. No Gráfico 17 se verifica o resultado da comparação destes domínios.
Gráfico 17 - Comparação dos desempenhos dos usuários sobre habilidades da vida
diária nas dimensões individuais e organizacionais, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
O Gráfico 17 revela que a dimensão individual teve uma média de 5,50 de
maior freqüência em 2004, na comparação com 2002, enquanto que a dimensão
206
organizacional teve uma média de 11,86 na comparação no mesmo período
209
. Este
resultado estatístico é altamente satisfatório, pois revela que o serviço Morada o
Pedro realizou um conjunto de esforços para viabilizar a desinstitucionalização,
proporcionando oportunidades de realizar-se o processo de autonomia possível.
Processo este permanente porque histórico e contraditório, requerendo constantes
mediações para o enfrentamento da desigualdade intrínseca à sociedade capitalista,
e de superação do preconceito e da passagem da condição de objeto para a de
sujeito. Pois “[...] a natureza do ato terapêutico agora centra-se em outra finalidade:
produzir autonomia, cidadania ativa, desconstruindo a relação de tutela e o lugar de
objeto que captura a possibilidade de ser sujeito” (TORRE; AMARANTE, 2001, p.
81).
Os resultados obtidos na vida dos usuários revelam a presença de duas
condições: a primeira, a própria existência e permanência do Morada como um
serviço público para atender este segmento da população em condições muito
particulares de vida. A materialidade de uma política pública é a condição inequívoca
para a efetivação de direitos.
Não há direitos de cidadania em abstrato, a não ser como princípios
éticos universais e expectativas de direitos. O usufruto efetivo de direitos
depende tanto da inserção dos grupos e indivíduos em ‘circunscrições
estatais’ concretas, territoriais, quanto de providências e decisões políticas
adotadas por governos concretos (NOGUEIRA, Marco, 2004, p. 62).
E por segundo, o compromisso revelado pelos atores envolvidos neste
projeto, que no cotidiano do seu trabalho viabilizam espaço para a produção de
novas possibilidades de vida. “Só o fato de escutar e fazer com que a palavra deles
tenha valor, tem outro significado. Essa atenção que a gente é bem diferenciada
da que ele tinha anteriormente, de um outro modelo em que os profissionais
acabavam definindo o que era melhor pra eles (Gestora 3).
Estas constatações, formadoras do terreno propício para a emancipação
possível, a passagem da condição de sujeitado para a de sujeito de direitos torna-se
possível em algumas dimensões da vida dos usuários do Morada. O direito que de
imediato se constata é o de poder morar numa casa e não mais numa enfermaria,
209
Ver Anexo D.
207
sem possibilidade de individualização, privacidade e sem poder sobre o seu
cotidiano, este regulado pela rotina hospitalar e manicomial. O morar numa casa
equivale a habitar, que para Saraceno (1996a), associado com a rede social e o
trabalho, são os três grandes cenários para a promoção da cidadania dos portadores
de transtorno mental.
O habitar tem a ver com um grau sempre mais evoluído de
‘propriedade’ (mas não somente material) do espaço no qual se vive, um
grau de contratualidade elevado em relação à organização material e
simbólica dos espaços e dos objetos, à sua divisão afetiva com os outros
(SARACENO, 1999, p. 114).
Os usuários chamam suas habitações de casinhas, sabem que não são de
sua propriedade, mas a consideram sua propriedade simbolicamente, como o lugar
em que vivem. “Morar diz respeito a uma das experiências mais fundamentais do ser
humano, relaciona-se com a possibilidade de uma ligação profunda com o ambiente
ou com uma pessoa que fornece acolhida, proteção e suporte” (WEYLER;
FERNANDES, 2005, p. 7), como expressa uma moradora.
Entrevistadora: Qual é a rua em que tu moras aqui? Usuária 2: Na rua J,
casa 6. Entrevistadora: Tu gostas de morar aqui? Gosto, me dou com todos
eles, converso com eles todos... Eu fico dentro da minha casa, eu fico
vendo televisão, não saio, quando meu marido vai trabalhar eu fico em
casa. Cozinho pra ele. Cuido dele (Usuária 2).
A condição de estar em casa e seguir seu próprio ritmo no cotidiano é uma
vivência importante para os usuários: “às vezes quando eu estou cansada vou me
deitar e mais tarde eu levanto, faço café para o meu marido, arrumo a roupa dele do
banho” (Usuária 2). Esta condição além de “vivenciar a intimidade de seus afetos,
sua relação com os objetos, seus afazeres, sua gente ou, então sua solidão”
(FERREIRA, 1999, p. 77), é um direito inalienável de todo sujeito, mas que pela
histórica desigualdade brasileira não tem sido vivenciada por todos os seus
cidadãos.
Contudo, os usuários revelaram desconhecer o motivo da criação do Morada
São Pedro quando perguntados diretamente durante a entrevista (Quadro 19). Este
resultado revelou que os mesmos não se apropriaram das razões desencadeadoras
deste processo, que foi a reforma psiquiátrica e o São Pedro Cidadão, mesmo
resultado encontrado em estudo sobre SRT em Campinas (ARAUJO, 2004). Um
208
usuário respondeu à questão dizendo se tratar do “projeto da casinha” (Usuária 7).
Os demais expressaram:
Eu não sei por que, mas quem deu aquelas casinhas pra nós morar foi o
diretor, a V, a M. Aí eu queria que o meu marido morasse comigo... aí tava
bem, gostei da casa, gostei da rua; dos vizinhos eu também gostava. Muito
mais bem cuidada, muito mais, sou bem atendida, compro o que eu quero
(Usuária 3).
Percebe-se nesta exposição da usuária a importância atribuída às relações
afetivas e um reconhecimento àqueles que viabilizaram a sua vontade de ter uma
outra condição de vida, assim como no constatado no próximo relato.
Entrevistadora: Te perguntaram se tu querias vir pra ? Usuária 5:
Perguntaram... Agora eu moro aqui. Entrevistadora: Desde quando tu moras
aqui? Usuária 5: Nem me lembro, eu vim em janeiro e era o grupo, 2003.
Entrevistadora: Tu sabes por estás aqui? Usuária 5: Porque a V. me botou.
Entrevistadora: Só por causa da V.? Usuária 5: É!
O desconhecimento do motivo da existência do Morada por parte dos
usuários não os impede de constatar as diferenças na forma de cuidado e de
consideração com a sua pessoa, como expressam alguns deles.
Entrevistadora: Onde é melhor aqui ou lá? Usuária 4: Aqui porque me
judiavam muito, botava na sala
210
, me amarravam. Entrevistadora: O que tu
gosta daqui? Usuária 4: Comida... eu gosto também de cantar.
A usuária expõe claramente as situações de violência por que passava
quando institucionalizada e refere as novas condições de alimentação e uma forma
de expressão cultural como motivo de satisfação pelo fato de estar no serviço
residencial terapêutico.
Entrevistadora: No que tu achas que é diferente o São Pedro daqui?
Usuária 5: Aqui é outra coisa, é melhor, a gente via os pacientes, as
injeção, aqui é mais calmo, a gente tem nosso cantinho. Eu queria ficar nas
casinhas. Entrevistadora: O que tu fazias lá durante o dia? Usuária 5:
Tomava remédio.
210
Sala de contenção ou cela forte, muito comum nos hospitais psiquiátricos, e proibidos desde 1992
no Brasil, a partir da Portaria do Ministério da Saúde n. 224, pelas suas características de cárcere
(Quadro 14).
209
Aqui a usuária destaca a ênfase existente na doença e no tratamento quando
moradora do hospital, e agora a satisfação de ter uma nova referência de vida, o seu
cantinho.
Entrevistadora: E porque tu achas que as pessoas moram aqui nas
casinhas? Usuária 6: Aqui é bom, era ruim, não tinha nada.
Entrevistadora: O que tu podias fazer lá? Usuária 6: Só sentada.
Muito significativa é a percepção dos usuários sobre o lugar do louco, aquele
renegado e despossuído de bens e de valor, que se localiza no HPSP, onde a
“tutela, a internação tem esta única finalidade: subtração das trocas, estabelecem
relações de mera dependência pessoal” (ROTELLI, 1990, p. 31), bem como a
produção de uma outra identidade que não a de doente, mas de um sujeito que
agora mora em outro lugar.
Entrevistadora: Se te dissesse assim, tu tens de voltar a morar no São
Pedro, tu aceitas? Usuária 4: o. Entrevistadora: Por quê? Usuária 4: Eu
não gosto de louco.
Entrevistadora: Porque tu achas que existe o São Pedro. Usuária 5: Para os
doentes. Entrevistadora: E aqui? Usuária 5: Aqui não é doente.
Estas expressões revelam o estigma que acompanha o lugar de trancar
loucos, identificado e reproduzido pelos próprios, quando noutra condição de vida,
ainda que num serviço vinculado e dependente da estrutura psiquiátrica hospitalar.
O direito de ir e vir é o mais identificado pelas gestoras como sendo garantido
a partir da existência do Morada: “Para mim o maior direito que as pessoas do
Morada tem hoje é o direito de ir e vir, esse é o direito que eles têm hoje efetivo”
(Gestora 1); “o mais importante é o direito de ir e vir, que eles estão livres para entrar
e sair, tanto na instituição que os abrigou por tanto tempo, quanto no espaço da
cidade” (Gestora 2). Entre os usuários, somente uma expressou esta nova condição
de vida a partir do ingresso no Morada: “O pessoal que veio pra cá tem mais
autonomia, liberdade também. Entrevistadora: Liberdade em que sentido? Sair e
voltar a hora que quiser. ...” (Usuária 1).
Como instrumentos legais provocadores e promotores de direitos aos
portadores de transtorno mental, os gestores identificaram a Carta dos Direitos,
produzida no III Encontro Nacional de Usuários e Familiares (Quadro 13), bem como
210
a lei da reforma psiquiátrica. O trabalho e a educação são as ações identificadas
pelas gestoras como as mais significativas proporcionadas pelo Morada para a
inclusão social, além do “espaço da vila, as trocas entre os antigos moradores da
vila e os novos moradores que são os ex pacientes do hospital’ (Gestora 2).
A maioria dos usuários entrevistados não soube dizer no que consiste a
pessoa ter direitos, como uma resposta ilustra: “Não sei, não tenho nem idéia”
(Usuária 5), mas algumas expressaram claramente a noção sobre este princípio.
Usuária 5: As crianças jogavam pedra em casa. Entrevistadora: tu
reclamaste? Usuária 5: Reclamei, eles pararam. Entrevistadora:
Reclamou na assembléia? Usuária 5: Na Assembléia, tenho meus direitos.
Entrevistadora: Sim, isso mesmo! E o que tu entendes por direito? Usuária
5: Pra a gente não jogar pedra na casa de ninguém, a gente tem que ser
respeitada como os outros, nada de atirarem pedra na casa de ninguém, um
não gosta os outros não gostam. Entrevistadora: E o que mais tu acha que
é direito teu? Usuária 5: Direito de cada um ter as suas casas.
O respeito indiscriminado é uma justa reivindicação, pois o mesmo constitui o
patamar da civilidade entre os sujeitos. A compreensão de direito social na defesa
da moradia para todos revela a magnitude desta necessidade humana e a noção de
igualdade de direitos no acesso a este direito. Outra expressão sobre direitos foi
verbalizada pela usuária 1.
Entrevistadora: O que tu entendes por ter direitos? Usuária 1: Ter direito é a
pessoa ser gente. Entrevistadora: um exemplo de um direito teu?
Usuária 1: Direito à liberdade... Entrevistadora: Tu foste votar no domingo?
Usuária 1: Votei. Entrevistadora: Outro direito teu. Usuária 1: Eu gostaria de
ter mais liberdade e mais direitos. Ter uma conta no banco que eu não
tenho (Usuária 1).
A expectativa de ser respeitada como sujeito é preponderante neste grupo de
usuários, na expectativa de superar relações marcadas pela discriminação e
segregação. Esta situação revela a ausência de direitos, pois os mesmos
“estabelecem uma forma de sociabilidade regida pelo reconhecimento do outro
como sujeito de interesses válidos, valores pertinentes e demandas legítimas”
(TELLES, 1999, p. 138). A manifestação da usuária expõe uma importante violação
de direitos, relativa à interdição civil da grande maioria dos usuários do Morada,
realizadas para fins de possibilitar acesso a benefícios sociais. No domínio
211
administração de dinheiro da escala ILSS há uma questão sobre o entendimento dos
usuários sobre este processo, cujo resultado se verifica no Gráfico 18.
Gráfico 18 - Comparação da freqüência da questão 8 do domínio administração do
dinheiro, anos 2002 e 2004.
Fonte: Autora (2007)
Constata-se que a freqüência nunca foi de 26,67% em 2002, alterando-se
para 36,67% em 2004. Semelhante são os resultados estatísticos da freqüência
sempre, que foi de 30% em 2002, e passou para 33,33% em 2004. Portanto, a
maioria dos usuários desconhece o significado dos termos tutela e curatela, situação
corroborada nas entrevistas. Todos os usuários disseram não saber o significado da
expressão interdição civil, mas muitos deles sabem que tem relação com
impedimentos percebido na vida deles, como a manifestada pela usuária 1, quando
expõe seu impedimento para abertura de conta bancária, e a manifestação do
usuário 8: “Ela [curadora] tem que assinar um papel lá no juiz, eu não sei assinar”.
O direito e dever de participar do processo eleitoral também ficam
prejudicados, situação que é de conhecimento dos usuários conforme seus relatos:
“eu não posso votar” (Usuária 5), “eu não voto porque eu não tenho título de eleitor”
(Usuário 8) são situações diferentes da usuária 1 que relatou ter votado nas últimas
eleições, mesmo sendo interditada. Esta ambigüidade encontrada nos depoimentos
sobre o exercício do sufrágio universal tem em si as contradições presentes nas
relações entre os sujeitos e o Estado, através das suas instituições, e, portanto, se
Questão 8 - Compreende os termos tutela ou curadoria
0
2
4
6
8
10
12
nunca algumas vezes na maioria das
vezes
sempre
Freqüência
2002
2004
212
constitui num espaço rico de produção de novas possibilidades de protagonismo e
de autonomia.
As gestoras explicitam alguns impactos na vida dos usuários decorrentes da
interdição civil, como prejuízos no gozo dos direitos civis, a obrigatoriedade de haver
nota fiscal de toda compra realizada, para fins de prestação de contas do curador
junto ao Ministério Público, a impossibilidade de realização de crediário, sendo
necessário o pagamento integral no ato da compra ou depender dos funcionários
para fazerem compras de forma parcelada, bem como. “Ela quer trabalhar e isso
atrapalha a vida dela, porque ela gostaria de não ser interditada, de ser autorizada,
de fazer um crediário, comprar as coisas parceladas e não à vista, depende muitas
vezes do funcionário fazer a conta no seu nome” (Gestora 3).
A figura do cidadão [...] é identificada à noção mais geral de sujeito,
de membro efetivo de uma comunidade humana, que se autodefine pelos
critérios de autonomia pessoal, pleno uso das faculdades racionais e
responsabilidade por seus atos. A psiquiatria e a justiça, ao decretarem
incapacidade civil do louco (superpondo-o à incapacidade laborativa)
acabam traindo a vocação de proteção da inspiração legal, e mergulham o
louco num limbo social (BEZERRA JÚNIOR, 1994, p. 185).
A expectativa de proteção social presente na interdição civil revela-se como
uma forma de mistificação, na medida em que oculta a quem de fato, na prática, se
destina a proteção, pois no imaginário social permanece o entendimento de
associação direta entre loucura e violência, posição esta referendada por
determinados setores da sociedade. De concreto, o instrumento jurídico de
interdição quando aplicado a sujeitos não incapazes, traz prejuízos a quem deveria
proteger, e como conseqüência, os transforma em cidadãos incompletos
(MEDEIROS, 2005), como ilustra um relato de uma gestora.
Aconteceu com um dos moradores ao fazer uma ocorrência policial e
dizerem assim, não, tu és interditado, então não podes assinar, tu não
podes fazer essa ocorrência e ele disse assim: como é, eu sou cidadão
eu tenho direito de fazer uma ocorrência... Acredito que nesse caso ele
deve ter dito [ser do Morada] porque ninguém me pergunta quando eu vou
lá se sou interditada ou não, certamente eles adizem assim, das casinhas
do São Pedro, se disser isso está ferrado (Gestora 3).
O anúncio feito pelo usuário de ser portador de direitos denuncia uma
injustiça e reivindica o tratamento igual aos demais indivíduos. Ainda que
213
concretamente não exista esta igualdade, tal exigência provoca a desestabilização
das “hierarquias simbólicas que os fixam na subalternidade própria daqueles que
são privados da palavra ou cuja palavra é descredenciada como pertinente à vida
pública de um país” (TELLES, 1999, p. 179). A interdição civil como exigência para a
concessão do BPC é uma realidade nos SRT no Brasil assim como é geral a
dificuldade para a desinterdição do usuário e a manutenção do benefício
(FURTADO, 2006), mas esta possibilidade não foi explicitada entre os sujeitos da
pesquisa neste estudo. Esta questão é fundamental na garantia dos direitos, pois
pelas características do grupo residente no Morada, faz-se necessária a criação de
espaços de reflexão e problematização sobre a condição de interdito, mediações
imprescindíveis para a condição de serem sujeitos de direitos.
A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é
vir a ser É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar
centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade,
vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade (FREIRE, 2003, p.
107).
Os usuários passarem a ser protagonistas de suas vidas requer a vivência de
oportunidades de maior autonomia, pois assim será possível uma aproximação da
condição de liberdade, esta entendida como possibilidade objetiva, ou seja,
“capacidade para perceber possibilidades e o poder para realizar aquelas ações que
mudam o curso das coisas, dando-lhe outra direção ou outro sentido” (CHAUÍ, 1999,
p. 362). O serviço Morada proporciona espaços de discussão sobre “dificuldades de
relacionamento, autonomia e responsabilidades quanto aos cuidados pessoais,
culinária, cuidados com a moradia, relação com vizinhos, dentre outros” (BELINI;
HIRDES, 2006, p. 13), que podem ser potencializados para a problematização dos
desafios para os usuários se autoproclamarem como sujeitos pertencentes a uma
sociedade, com direitos e deveres como os demais cidadãos.
O exercício democrático e a defesa da cidadania têm como
pressuposto sujeitos sociais que se organizam para reivindicar direitos.
Adquirem, no processo, capacidade crescente de vocalização. Isto é, de se
fazerem ouvir e de se representarem no espaço público, ampliando e
aprofundando o debate político (BODSTEIN, 2003, p. 20).
A condição de requisitar e reivindicar é fundamental, pois os direitos dos
homens são constituídos em determinados momentos históricos, “caracterizados por
214
lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo
gradual, não todos de uma vez, nem de uma vez por todas” (BOBBIO, 1992, p.5).
Na prática, está anunciada a reversão da violação de direitos para o acesso ao
BPC, com a recente revogação da exigência de interdição civil pela previdência
social
211
no Brasil.
Na situação relatada, não houve um cuidado em acolher a denúncia que
estava sendo feita, mas sim com a legalidade. O cumprimento com a legalidade é
uma responsabilidade do órgão policial assim como do setor da educação é o de
criar os meios pedagógicos para propiciar o processo de ensino e aprendizagem. A
prioridade com a realização da missão do setor educação também gera um prejuízo
ao processo de emancipação possível pela educação.
Nós tivemos um grupo que participou do X
212
, que é aquele projeto
de alfabetização por três meses, que pra nós foi um sucesso, mas que
apenas um do grupo de cinco alunos passou. Então a professora
considerou um fracasso. Isso é uma coisa que a gente quer retomar e tem
muitos interessados que querem voltar a estudar, só que eles não querem
que ocorra no São Pedro, eles querem ir pra fora, tanto que esse mesmo
grupo, eles começaram indo com uma referência e depois eles mesmos
disseram que sabiam ir sozinhos, pegar o ônibus e que iriam sozinhos para
o X. Para nós o fato de ter tido toda essa evolução, foi o maior sucesso
do mundo [...] o fato de poder estar saindo daqui, pegando um ônibus;
tiveram alguns que aprenderam assinar o nome, estar assinando um recibo,
pra nós é o máximo (Gestora 3).
A possibilidade de participar de um projeto de alfabetização oferecido para o
público em geral tem um significado importante, pois transmite a mensagem aos
usuários de que apesar das diferenças existentes, recebem um mesmo tratamento.
A dificuldade da organização em absorver esta realidade e de exclusivamente
valorizar o alcance do conhecimento almejado, dificulta a efetivação de processos
de inclusão social, gerando reflexões sobre que saídas possíveis podem ser
construídas, que não repitam a lógica totalizante de oferecer educação especial para
alunos especiais.
As longas décadas de reclusão promoveram significativas
experiências de desenraizamento da cidade e de suas tradições culturais.
São indivíduos que foram apartados de seus territórios, de suas famílias,
grupos sociais e, sobretudo, de seus direitos sociais e civis fundamentais. A
211
Ver item 3.3.
212
Referência a uma organização não governamental que desenvolve projetos de alfabetização no
estado e no país.
215
possibilidade de voltar a freqüentar diferentes espaços públicos de uma
cidade implica o retorno e a circulação de modos de viver e de habitar a
cena urbana [...] (WEYLER; FERNANDES, 2005, p. 2).
O convívio com aqueles que são diferentes causa estranhamento e
perplexidade, sentimentos que atravessam as relações cotidianas entre grupos, por
isto faz-se necessário ações de esclarecimento ao público em geral sobre as
características particulares de segmentos da população. A sociedade vem tendo
uma maior tolerância na convivência entre grupos de determinadas minorias,
quando esta não acarreta competição sobre postos de trabalho e usufruto de bens e
serviços. Ainda que haja estranhamento, uma tendência de serem considerados
dois pressupostos, opostos entre si:
[...] a promoção da igualdade universal, particularmente viável no contexto
das mudanças globais, com a suposta homogeneização social, os
processos de democratização e ampliação de oportunidades; e, por outro
lado, tem lugar a “política da diferença”, que postula o resgate de
identidades únicas, individuais e coletivas, e a reivindicação da diversidade,
da autonomia e da diferença (FERNÁNDEZ, 2005, p.195).
Esta tendência de valorizar as diferenças existentes entre os que são iguais,
no sentido de que todos têm os mesmos direitos, é fundamental para a reversão do
preconceito ao portador de transtorno mental. Contudo, este preconceito não tem a
prerrogativa de ser único, pois estranhamentos toda vez que ingresso em
territórios desconhecidos, como na ilustração de um episódio.
A pessoa de quem eu sou referência dizia assim, eu prefiro comprar
no armazém da vila e no início eu até senti medo, porque no Z
213
, eu me
sinto bem e ela o. Os seguranças ficam olhando dos pés a cabeça, ela
fica um pouco constrangida e esse constrangimento eu tive quando eu fui
com ela na vila, onde ela tranqüilamente transitou e onde todo mundo me
olhava dos pés a cabeça, então eu me senti como ela se sentiu no Z e ali no
armazém ela chega e grita no balcão, eu quero isso, eu quero arroz, quero
tal coisa (Gestora 3).
Outro fenômeno que agride a dignidade, independente da condição de ser
usuário de transtorno mental, experenciada pelos usuários do Morada é a violência
urbana, como expressam: “a falta de segurança na nossa casa” (Usuária 1); “as
crianças jogavam pedra em casa” (Usuária 5); “eles assaltam” (Usuário 8). A
213
Referência a um supermercado próximo ao Morada, que se localiza dentro de um centro
comercial.
216
escolha do território da Vila São Pedro para a construção do Morada foi alvo de
críticas, pois houve a defesa da idéia de que dentro do HPSP os mesmos estariam
mais protegidos do que expostos a riscos por passarem a viver na vila.
Dizia-se que a idéia era irresponsável e a Direção chegou a ser
acusada de desumana, por “jogar” pessoas incapazes e vulneráveis às
atrocidades da vida desprotegida fora do manicômio. Não eram incomuns
comentários de que levar doentes mentais para dentro de uma Vila popular,
reconhecidamente violenta, seria condená-los à morte, incluindo os
próprios trabalhadores que ousassem aderir à proposta (PAULON et al.,
2007, p. 11).
A violência na forma de “delinqüência que se revela nas ações fora da lei
socialmente reconhecida” (MINAYO, 1994, p. 8), é um dos fenômenos decorrentes
da urbanização, da alta concentração de renda e dos processos de desfiliação, ou,
“ruptura de vínculo com o social” (CASTEL, 1994, p. 23). Na atualidade, diversas
forças sociais se articulam para pensar formas de enfrentamento da violência, nas
suas mais variadas expressões, na certeza de que se trata de um fenômeno
transversal e estrutural.
Na ótica do espaço urbano, os governos municipais enfrentam limitações para
o incremento do desenvolvimento urbano, apesar dos processos de
descentralização das políticas públicas desde os anos 1980, acompanhados da
redução de investimentos e de mecanismos eficientes para a “sua intervenção nas
cidades, o que em parte explica os problemas de ilegalidade, desordem,
marginalidade e pobreza com que se dá o fenômeno de urbanização” (DIAZ, 2005,
p. 87). A violência urbana não é um fenômeno exclusivo das vilas irregulares,
habitadas por contingentes populacionais que não conseguiram ter acesso a
políticas públicas, pela razão destas serem insuficientes para as necessidades dos
sujeitos. Independente da localização territorial, a violência urbana está presente no
cotidiano da vida de todos os sujeitos, assim como os usuários do Morada.
As cidades dos nossos dias, como as do passado, são territórios de
fecundos conflitos, experimentações, lugar onde se produz a face do
diverso, do estranho, do familiar, do estrangeiro. Local ao mesmo tempo de
fabricação de práticas para acolhê-los, dar corpo às suas faces ou dissipá-
los (BAPTISTA, 1999, p. 123).
Os desafios postos aos homens e mulheres habitantes das cidades são os
mesmos dos usuários do Morada, e os resultados obtidos na investigação revelaram
217
que os usuários estão satisfeitos de modo geral com a transferência para o serviço e
saída do HPSP, situação também encontrada em avaliações de outros SRT
(GUIMARÃES; SAEKI, 2001, MILAGRES, 2002; JAEGGER et al., 2004). Constata-
se também que passaram a ter uma condição de vida mais digna e com ampliação
de usufruto de alguns direitos, dentre os constituídos na trajetória de constituição
da cidadania, esta entendida como “um conjunto de direitos positivos que vincula o
cidadão a seu Estado” (FLEURY, 1994 p. 59).
A reforma psiquiátrica no Brasil produziu mudanças significativas que estão
alterando positivamente a atenção em Saúde Mental, e no Rio Grande do Sul, a
experiência estatal pública analisada revelou que existe a possibilidade de se
concretizar uma ação intersetorial e com financiamento intragovernamental para o
acesso dos usuários a diversos programas sociais públicos. A oportunidade deste
grupo de usuários integrantes do serviço residencial terapêutico gerou maior
autonomia nas suas vidas, reflexo também da postura dos profissionais na condução
de uma proposta de desinstitucionalização. Contudo,
A constituição efetiva da conquista da cidadania estará
configurada como tal na exata medida em que ultrapasse o âmbito exclusivo
do acesso a determinados serviços e benefícios e tenha como eixo
articulador a constituição da autonomia dos sujeitos sociais, portadores do
direito de responsavelmente promoverem suas escolhas (COHN, 2003, p.
31).
A efetivação dos direitos dos portadores de transtorno mental requer,
portanto, a garantia do acesso às políticas sociais e uma postura ética de respeito as
suas singularidades, possível de se constituir com a superação radical da
mentalidade de discriminação existente nas relações entre homens e mulheres. Este
é um horizonte a ser perseguido, pois os usuários ainda têm uma longa caminhada
para se constituírem de fato como sujeitos de direitos, na sua plenitude, para além
do direito ao consumo e de morar em condições dignas. Para a maioridade realizar-
se, faz-se necessário o compromisso e o trabalho de muitos e diversificados agentes
sociais, quando se estará realizando substancialmente a reforma psiquiátrica.
5 CONCLUSÕES
A possibilidade de desvelar dimensões da realidade a partir da investigação é
sempre uma rica oportunidade de contribuição na geração de conhecimentos sobre
fenômenos sociais relevantes. O desafio de conhecer e compreender ângulos de
uma totalidade é permanente, sendo possível algumas capturas e traduções desta
dinâmica e contraditória sociedade.
A produção das relações entre homens e mulheres e os contrastes e
interdependências dos âmbitos de natureza social e o econômico formam o rico
processo histórico de constituição dos postulados éticos de respeito e valor dos
sujeitos. E é desta condição que existe a possibilidade de se realizar a aventura de
ampliar e criar novas compreensões e entendimentos sobre determinados
fenômenos sociais. Somente quando sujeito pertencente a um determinado contexto
é possível a vida, a incerteza e a crítica do processo em si, o que leva ao desafio
de buscar respostas.
Neste sentido, esta produção é fruto do protagonismo na construção de um
outro modo de pensar e agir em relação a um segmento da população
historicamente alijada socialmente. O ideário da reforma psiquiátrica produziu
resultados que ainda precisam ser consolidados. Para tanto, sua problematização é
fundamental para gerar novas luzes e inspirações para a sua afirmação.
No entanto, a problematização é possível na perspectiva da historicidade,
pois os homens e mulheres respondem às necessidades humanas com a produção
de bens materiais que gerarão a cultura e o conhecimento sobre si e o mundo, ou
seja, produzem fazendo história. Decifrar e detectar as interconexões históricas são
fundamentais para explicitar a dinâmica e a contradição presente nas políticas
sociais, a partir do comportamento do Estado nas suas relações com a sociedade.
A sistematização sobre a gênese e formulação da política de saúde no Brasil
revelou a visão estratégica do setor tanto na reprodução das condições de vida das
classes de trabalhadores, como para o desenvolvimento da nação, como também
explicitou os fundamentos teóricos da ainda presente dissociação e desarticulação
entre saúde coletiva e saúde individual, na disputa constante entre os interesses do
219
mercado e as demandas da cidadania. A interconexão de interesses do capitalismo
mundializado também fica evidenciada pelas diferentes formas de orientação
através dos organismos multilaterais, num contexto de profundas transformações
societárias advindas da reestruturação produtiva do capitalismo.
As orientações dos organismos multilaterais expressam as novas relações
constituídas no âmbito planetário, que como conseqüência alteram o conceito de
Estado-Nação, e definitivamente influenciam a formulação da política de saúde
brasileira. Ora a ênfase está no modelo hospitalocêntrico, ora está nos serviços
locais de saúde básica, com o estímulo à formulação de novas modalidades de
atenção para facilitar o afastamento do Estado das suas obrigações constitucionais.
Mudanças recentes alteraram a gestão do sistema de saúde através do
incremento da descentralização, mas a manutenção da política de redução do
financiamento público dificulta a ampliação e conseqüente qualidade dos serviços
prestados à população, num setor fundamental para a reprodução das condições de
vida dos sujeitos. Tem-se presenciado inúmeros recuos no processo de
consolidação real do sistema de saúde, em especial quanto aos aspectos
fundamentais do financiamento, do desenho organizacional e da prestação direta de
serviços à população, ao mesmo tempo em que se amplia o ordenamento legal da
saúde privada sob a denominação de saúde suplementar, crescendo a oferta de
serviços de natureza privada e contratada por empregadores e empregados. Ou
seja, a lógica de que a saúde é um direito de quem trabalha continua vigorando, pela
maior presença do mercado no setor de saúde, ficando o serviço público destinado
às camadas “pobres e carentes” da sociedade.
A reforma psiquiátrica brasileira viabilizou-se no bojo da reforma sanitária, que
por sua vez, implanta-se no ambiente das transformações societárias mais recentes.
Sua proposta é de reversão do modo de atenção em saúde mental de
características hospitalocêntrica e manicomial, historicamente construído sob a
égide da racionalidade e segregação. Esta é a perspectiva de reforma psiquiátrica
defendida, com a centralidade da cidadania dos sujeitos, estes inseridos numa
histórica e determinada sociedade. Esta proposta ainda requer ser defendida e
consolidada, visto que a substituição da atenção em saúde mental pode estar a
220
serviço da desresponsabilização do Estado, em tempos de ajustes estruturais e
alterações no seu papel, no caso brasileiro.
A sociedade do Rio Grande do Sul tem um acúmulo significativo de produção
nos âmbitos político, cultural e técnico no campo da saúde mental, condição que
viabilizou a existência de um serviço de atenção a sujeitos portadores de transtorno
mental grave, proporcionando-lhes uma outra condição de vida. Os governos têm
tido responsabilidade com esta população, sob sua tutela ao longo de vários anos,
cumprindo deste modo com uma das dimensões da lei de Reforma Psiquiátrica
estadual.
Esta posição é resultante de um profícuo e permanente debate entre várias
forças sociais, que por mais que a posição ainda hegemônica seja a de manter a
tradição e o conhecimento pretensamente científico de que lugar de louco é no
hospício, tem havido possibilidades de avanços contra-hegemônicos. O serviço
residencial terapêutico Morada São Pedro é uma evidência da possibilidade de ser
ofertada uma modalidade de cuidado que garante a ampliação da autonomia dos
portadores de transtorno mental.
A desinstitucionalização foi operada na vida dos usuários a partir do seu
ingresso no Morada São Pedro, pois os mesmos obtiveram condições favoráveis
para a ampliação da autonomia, com possibilidades de maior circulação pela cidade,
capacidade de fazer escolhas, acesso ao consumo de bens e materiais, no maior
domínio nos cuidados com a própria saúde e no desenrolar da vida diária. Cotidiano
este que altera significativamente suas condições de vida, comparadas com as de
segregação, típica de institucionalização psiquiátrica, como se verificou na
comparação dos desempenhos dos usuários sobre habilidades da vida diária entre
os anos 2002 e 2004. Os resultados estatísticos foram muito satisfatórios,
corroborados pelas manifestações dos usuários, revelando que os trabalhadores e
os gestores do Morada São Pedro realizaram um conjunto de esforços para
viabilizar a desinstitucionalização, pois ficou evidenciado que os usuários estão em
processo de apropriação da sua vida.
Os aspectos que contribuíram para este resultado estão fortemente
relacionados à efetivação de uma política blica e ao comprometimento dos
221
trabalhadores com um determinado propósito. A construção das casas, com
estrutura para receber pequeno grupo de usuários, permitindo assim a valorização e
o apoio a cada indivíduo, a manutenção da estrutura logística e da equipe de
profissionais, ações estas realizadas pela esfera de gestão estadual,
complementado pelo apoio financeiro a cada usuário pela instância federal, foram
determinantes para a ampliação da capacidade de autonomia dos moradores.
O Morada São Pedro é um serviço público recente, considerando que tem
quatro anos de funcionamento e ainda inconcluso. No período transcorrido, não
houve possibilidades de ser efetivado o conjunto de ações planejadas originalmente,
assim como não foram feitos projetos de alteração. A explicação está relacionada
aos impasses, ainda presentes, sobre o futuro do hospital psiquiátrico público, ao
qual está vinculado. E é esta situação que tem dificultado a realização de processos
de ampliar efetivamente os direitos dos seus usuários.
Estes precisam se reconhecer como sujeitos de direitos, condição
fundamental de cidadania, pois não basta este valor ser anunciado por outros,
terá sentido e razão de ser, quando pronunciado pelos próprios. Tarefa complexa,
visto que tal reconhecimento ainda é uma construção histórica a se realizar na
sociedade brasileira. Para ser possível o autoreconhecimento como sujeito de
direitos, é preciso que os demais agentes sociais implicados tenham esta
perspectiva, para serem provocadores e estimuladores da transformação.
A constatação é resultante da pesquisa que anuncia o processo ainda a ser
realizado, pois, por mais que tenha havido avanços no ordenamento jurídico-legal e
na formulação e execução da política blica de saúde mental, como demonstrado,
não se pode deduzir que a materialidade no acesso a modos de vida mais dignos
seja suficiente para a emancipação. Esta, um processo de vir a ser, se constrói com
o respeito aos desejos expressos dos usuários, de mais liberdade, mais
independência em relação à instituição e como indivíduo juridicamente reconhecido.
As contradições presentes nas relações entre os sujeitos e entre estes e o Estado,
através das suas instituições, constituem-se num espaço rico de produção de novas
possibilidades de protagonismo e de exercício pleno de direitos.
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Demonstrativo de Despesas. Porto Alegre, 2006. Mimeografado.
251
Apêndice A
SÍNTESE DAS CONFERÊNCIAS NACIONAIS DE SAÚDE NO BRASIL
252
N.º DATA GOVERNO CARACTERÍSTICA TEMÁRIO PARTICIPANTES
10 a 15/ 11 / 1941 Getúlio Vargas (1930-1945) Normas de organização e
administração sanitária
21 / 11 a 02 / 12 / 1950
Eurico Gaspar Dutra (1946-1950)
Sanitarismo
Clássico
Higiene e segurança do
trabalho, prestação de
assistência médica sanitária
e preventiva para
trabalhadores e gestantes.
Getúlio Vargas (1951-1954)
Café Filho (1954-1955)
Carlos Luz (1955)
Nereu Ramos (1955-1956)
Juscelino Kubitschek (1956-1961)
Jânio Quadros (1961)
Não se realizaram Conferências
de Saúde
Ranieri Mazzilli (1961)
09 a 15 / 11 / 1963 João Goulart (1961-1964) Transição Municipalização dos
serviços de saúde.
Não se realizou Conferência de
Saúde
Castello Branco (1964-1967)
30 / 08 a 04 / 09 / 1967 Mal. Arthur da Costa e Silva
(1967 - 1969)
Recursos humanos para as
atividades da saúde
Junta Militar (1969) Não se realizaram Conferências
E. G. Médici (1969-1974)
05 a 08 / 08 / 1975
Sistema Nacional de Saúde
01 a 05 / 08 /1977
Gal. Ernesto Geisel (1974-1979)
Controle das grandes
endemias e interiorização
dos serviços de saúde
24 a 28 / 03 / 1980
Gal. João Figueiredo
(1979-1985)
Planejamento
Estatal
Serviços Básicos de Saúde
Delegações de
técnicos
representando
órgãos federais,
os Estados e
nomes
expressivos da
medicina.
Continua.
253
Continuação.
17 a 21 de março de
1986
José Sarney
(1985-1989)
Democracia é Saúde
Precedidas de
Conferências
estaduais e
municipais.
09 a 14 de agosto de
1992
Fernando Collor de Melo
(1990-1992)
Reforma Sanitária
Descentralizando e
democratizando o
conhecimento
10ª 02 a 06 de setembro de
1996
Fernando Henrique Cardoso
(1995-1998)
Construindo um modelo de
atenção à saúde para a
qualidade de vida
11ª 15 a 19 de dezembro de
2000
Fernando Henrique Cardoso
(1999-2002)
Implantação do
SUS
Efetivando o SUS: acesso,
qualidade e humanização
na atenção à saúde com
controle social
12ª 07 a 11 de dezembro de
2003
Luiz Inácio Lula da Silva
(2003-2006)
Balanço do SUS A Saúde que temos, o SUS
que queremos.
Participação de
representantes
de usuários,
profissionais,
prestadores de
serviço e
governo
254
Apêndice B
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos usuários do Morada São Pedro,
coleta de dados do ano 2004
255
PESQUISA DO HOSPÍCIO PARA A INCLUSÃO SOCIAL
Prof.ª Ms. Míriam Dias
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Prezado (a) Sr (a):
I Esta pesquisa estuda sobre a Reforma Psiquiátrica, especificamente no eixo da
Desinstitucionalização e tem como objetivo principal acompanhar o cotidiano dos
usuários residentes na Morada São Pedro, captando a sua construção de novas
formas de vida e de autonomia.
II A coleta de dados será através da aplicação de um questionário formado por 84
itens, que abrangem as áreas de alimentação, cuidados pessoais, atividades
domésticas, preparo para o armazenamento dos alimentos, saúde, administração do
dinheiro, transporte, lazer e emprego.
III Este questionário se aplicada quatro vezes, com intervalos de três meses,
durante um ano e será respondida por um profissional que diretamente lhe
acompanha no Morada São Pedro.
IV A pesquisa pretende gerar conhecimento sobre as mudanças na sua vida,
quanto a sua capacidade de autonomia, após longo tempo de internação no hospital
psiquiátrico. Espera detectar que aspectos facilitam e dificultam a vida fora dos
muros hospitalares. Este conhecimento irá subsidiar outros projetos semelhantes no
âmbito das políticas de saúde, especificamente em saúde mental.
V – Esta pesquisa está vinculada à Universidade do Vale do Rio dos Sinos –
UNISINOS - Centro de Ciências Humanas, Área de Conhecimento de Serviço
Social, na linha de pesquisas sobre Políticas e Práticas Sociais e Políticas,
Programas e Práticas de Promoção à Saúde.
Pelo presente Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, declaro que
autorizo a minha participação neste projeto de pesquisa, pois fui informado(a), de
forma clara e detalhada, livre de qualquer forma de constrangimento e coerção, dos
riscos, desconfortos e benefícios, assim como das alternativas ás quais poderia ser
submetido, todos acima listados.
256
Fui, igualmente, informado:
Da garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a
qualquer dúvida a cerca dos procedimentos, riscos, benefícios e outros assuntos
relacionados com a pesquisa;
Da liberdade de retirar meu consentimento, a qualquer momento, e deixar de
participar do estudo, sem que isto traga prejuízo à continuidade do meu cuidado;
Da garantia de que não serei identificado quando da divulgação dos resultados e
que as informações obtidas ser utilizadas apenas para fins científicos vinculados
ao presente projeto de pesquisa;
Do compromisso de proporcionar informação atualizada obtida durante o estudo,
ainda que esta possa afetar a minha vontade em continuar participando;
Da garantia de que não haverá qualquer tipo de prejuízo à minha saúde e à ao
meio atendimento durante a realização da pesquisa.
O Pesquisador Responsável por este Projeto de Pesquisa é Míriam Thaís
Guterres Dias (051 9967-7775), tendo este documento sido revisado e aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNISINOS em 15 de abril de 2003 e do
Hospital Psiquiátrico São Pedro em 26 de maio de 2003.
Data _____/_____/_____.
__________________________ _______________________
Nome e assinatura do Sujeito
Pesquisado ou
Responsável Legal
Nome e assinatura do
Responsável pela obtenção do
presente consentimento
257
Apêndice C
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos
sujeitos da pesquisa, coleta de dados do ano 2006
258
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
A reforma psiquiátrica brasileira e a efetivação dos direitos dos portadores de
transtorno mental: uma análise a partir do Projeto Morada São Pedro
Declaração
A pesquisa é vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social
Doutorado, da PUCRS e tem como objetivo principal verificar a efetivação dos
direitos e a autonomia dos portadores de transtorno mental participantes do Projeto
Morada São Pedro, visando contribuir na formulação e execução de políticas
públicas no campo da saúde mental.
A coleta de dados qualitativos será através da realização de uma entrevista
semi-estruturada com os usuários do Projeto Morada São Pedro.
Os sujeitos participantes desta pesquisa têm a garantia: de receber
esclarecimento a qualquer dúvida a cerca dos procedimentos relacionados com a
pesquisa; de que não serão identificados quando da divulgação dos resultados; que
as informações obtidas serão utilizadas apenas para fins científicos vinculados a
pesquisa; não haverá qualquer tipo de prejuízo à sua saúde e ao atendimento
durante a realização da pesquisa.
Consentimento
A mim, _____________________________________________________
informaram dos objetivos desta entrevista e declaro aceitar voluntariamente a
participação na mesma.
A pesquisadora, doutoranda Miriam Dias, me comunicou que as informações
prestadas serão confidenciais e unicamente com o objetivo de colaborar na
pesquisa.
Assinatura do(a) entrevistado(a) _______________________________________
Assinatura do(a) pesquisador(a)_______________________________________
Data _____/_____/_____.
259
Anexo A
Autorização do Comitê de Ética em Pesquisa do
Hospital Psiquiátrico São Pedro
260
261
Anexo B
Escala Independent Living Skills Survey – ILSS
262
INVENTÁRIO DE HABILIDADES DE VIDA
INDEPENDENTE
(ILSS-Br)
Este questionário tem como finalidade obter seu ponto de vista sobre o
ajustamento social de seu filho, parente ou residente em sua casa ou em serviços
assistenciais. O ajustamento social pode ser avaliado pela maior ou menor
capacidade de uma pessoa cuidar de si mesma e de seus interesses como, por
exemplo, alimentar-se, arrumar-se, realizar atividades domésticas e cuidados com a
saúde, gerenciar suas finanças, utilizar transporte, realizar atividades de lazer e
trabalhar. Este questionário abrange todas essas áreas de vida independente.
Por favor, utilize a escala abaixo para marcar cada item. Observe com
atenção enquanto você realiza sua classificação de cada um dos 84 itens listados
neste questionário. Classifique cada um dos 84 itens de acordo com a frequência da
ocorrência deste comportamento em particular durante o último mês.
No final deste questionário uma escala para se pontuar o ajustamento
social global da pessoa. Por favor, marque com um "X" o local da linha que melhor
o/a descreve durante o último mês.
Nome da pessoa que está sendo avaliada
Nome da pessoa entrevistada
Relação entre o entrevistado e a pessoa que está sendo avaliada
Escala 1: Freqüência da ocorrência do comportamento
Para cada item deste questionário, por favor, registre na Coluna 1
do questionário a freqüência da ocorrência de cada comportamento
durante o último mês. Se não houve oportunidade para o
indivíduo se comportar de determinada forma (isto é, utilizar o
ônibus quando não houver disponibilidade desse serviço), registre
N/A (não se aplica). Ou, se não houve necessidade
de que o indivíduo se comporte dessa forma (isto é, o parente
ou encarregado das instalações, por exemplo, realiza as tarefas
domésticas), também registre N/A.
0______________1_________________2________________3______________4
nunca algumas vezes com freqüência na maioria das vezes sempre
263
Nome___________________ __
Data______________________
Freqüência do comportamento no último mês
I. Alimentação
1. Alimenta-se asseadamente
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
2. Usa utensílios adequados para se alimentar
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3. Alimenta-se em ritmo normal, sem
engolir às pressas nem demorar demais
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
4. Mastiga com a boca fechada
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5.Tira comida dos pratos de outras pessoas, sem
permissão
0 1 2 3 4
6. Come a quantidade de alimento apropriada
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7. Demonstra ter bons hábitos nutricionais (isto é, tem
uma
dieta bem equilibrada - não vive de doces e
refrigerantes)
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
8. Come comida que foi descartada
(por exemplo, do chão ou do lixo)
0 1 2 3 4
ll. Cuidados Pessoais
1. Toma banho usando sabonete todos os dias
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
2. Lava os cabelos pelo menos uma vez por semana
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3. Usa desodorante diariamente
(sem supervisão)
0 1 2 3 4
4. Escova ou penteia os cabelos diariamente
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5. Homem: barbeia-se quando necessário
ou mantém sua barba aparada
(sem supervisão)
0 1 2 3 4
6. Providencia o corte ou o penteado dos cabelos
quando necessário (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7. Escova os.dentes ou dentadura ou faz higiene bucal
pelo menos uma vez ao dia
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
8. Despe-se em horas e locais apropriados
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
9. Veste-se em horas e locais apropriados
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
10. Conserva-se limpo (a) e arrumado (a) o dia todo
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
11. Separa apropriadamente roupas sujas para serem
lavadas por ele (ela) ou por outras pessoas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
12. Veste-se apropriadamente quanto ao clima ou
eventos sociais (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
13. Quebra a etiqueta social em geral
(por exemplo, coça partes inadequadas do corpo
em público, arrota em público sem se desculpar)
0 1 2 3 4
III. Atividades domésticas
1. Arruma sua cama diariamente
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
2. Mantém o quarto ou espaço individual limpo
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3. Troca a roupa de cama sempre que necessário
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
264
Nome______________________
Data_______________________
Freqüência do comportamento no último mês
4. Recolhe objetos que caem no chão
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5. Limpa líquidos derramados
(sem necessidade de orientação).......................
0 1 2 3 4
6. Se ocupa da arrumação de sua
moradia quando necessário
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7. Realiza tarefas domésticas que lhe foram atribuídas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
8. Coloca a roupa suja no tanque ou na máquina de
lavar
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
9. Usa a quantidade correta de sabão para lavar a roupa
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
10. Coloca as roupas para secar
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
11. Guarda as roupas limpas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
12. Dobra e/ou pendura as roupas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
IV. Preparo e armazenamento dos alimentos
1. Prepara refeições simples que não precisem ser
misturadas ou cozidas (por exemplo,
sanduíches,saladas
ou cereal com leite)
0 1 2 3 4
2. Prepara e cozinha refeições simples (por
exemplo, ovos fritos, macarrão,etc.)
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3. Guarda os alimentos apropriadamente
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
4. Pode identificar e jogar fora alimentos
estragados (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5. Limpa a mesa (sem necessidade de orientação) 0 1 2 3 4
6. Lava e enxuga a louça e os utensílios de cozinha –
caneca, prato, etc. - ou usa máquina de lavar louça
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7. Guarda os utensílios de cozinha - caneca,
prato, etc. (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
V. Saúde
1- Relata apropriadamente seus problemas físicos
(sem exagerar ou omitir)
0 1 2 3 4
2- Cuida de seus próprios problemas físicos mais
leves de forma apropriada.
0 1 2 3 4
3- Consegue ajuda de serviços públicos adequados
(lNSS, bombeiros, policia, vigilância ou outros recursos -
assistente social, médico, dentista,
família, quando necessário.
0 1 2 3 4
4- Segue a orientação dos serviços acima citados 0 1 2 3 4
5. Fuma respeitando as regras de segurança. 0 1 2 3 4
6. Aceita tomar a medicação que lhe é administrada.
7. Toma seu medicamento sem supervisão (horários e
dosagens)
0 1 2 3 4
8. Contata serviços públicos (por exemplo, policia,
bombeiros, instituições para desabrigados) para fazer
queixas ou pedidos impróprios (por exemplo, entra na
delegacia para pedir uma carona para casa, telefona
diariamente para instituições de desabrigados para
relatar variados problemas sem importância)
0 1 2 3 4
265
Nome______________________
Data_______________________
Freqüência do comportamento no último mês
VI- Administração do dinheiro
1 - Compra a quantidade adequada de mercadorias
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
2 - Compra suas próprias roupas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3 - Compra objetos de uso pessoal
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
4 - Providencia o conserto de roupas e objetos
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5 - Paga contas (inclusive aluguel, alimentos, roupas,
transporte, atividades de lazer e bens pessoais
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
6 - Administra adequadamente seu orçamento (isto é,
planeja suas despesas de acordo com seus recursos
financeiros)
0 1 2 3 4
7 - Procura ajuda ou informação, quando necessário,
para planificação de seu orçamento
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
8 - Compreende os termos tutela ou curadoria
(se for aplicável ao caso)
0 1 2 3 4
9- Compra itens essenciais antes de gastar dinheiro com
supérfluos (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
10 - Utiliza o relógio para organizar sua programação
diária
0 1 2 3 4
11- Devolve material defeituoso ou troca mercadorias
em lojas (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
12- Confere troco em lojas (sem necessidade de
orientação)
0 1 2 3 4
VII. Transporte
1- Anda de ônibus (sem necessidade de orientação) 0 1 2 3 4
2- Lê itinerários de ônibus
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3- Vai a pé a locais da vizinhança
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
4- Respeita as normas para pedestres
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5- Informa-se e segue as indicações de um trajeto
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
6- Faz viagens de longa distância (de ônibus, trem
ou avião sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7- Comporta-se apropriadamente em ônibus, trens ou
aviões
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
VIII.Lazer
1- Ocupa-se regularmente com um passatempo
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
2- Passeia fora de seu local de residência
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3- Cuida do jardim ou quintal
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
4- Ouve rádio ou vê televisão
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5- Escreve cartas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
6- Assiste atividades esportivas
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7- Joga cartas ou outros jogos de mesa
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
266
Nome______________________
Data_______________________
Freqüência do comportamento no último mês
8- Lê jornais habitualmente
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
9. Vai a reuniões de organizações cívicas ou outras
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
IX. Emprego
1- Procura emprego através de anúncios classificados 0 1 2 3 4
2- Contata empregadores em potencial para avaliar
possíveis oportunidades de trabalho
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
3- Contata amigos/outros pacientes/assistente
social/agência para indicações de empregos
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
4- Participa de entrevistas de seleção para obter
emprego
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
5- Tem aspirações realísticas de emprego 0 1 2 3 4
6- Sai na hora certa para os compromissos
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
7- Sai na hora certa para o emprego
(sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
8- Chega na hora certa em seu emprego e respeita o
horário de almoço (sem necessidade de orientação)
0 1 2 3 4
267
Anexo C
Apresentação das tabelas com os dados coletados sobre as
dimensões da Escala ILSS
268
Tabelas com os dados coletados sobre as dimensões da Escala ILSS
I - ALIMENTAÇÃO
Questão 1: Alimenta-se asseadamente
2002 2004
freqüência % freqüência %
Nunca 0
0,00
0
0,00
algumas vezes 3
10,00
4
13,33
com freqüência 3
10,00
2
6,67
na maiora das vezes 5
16,67
1
3,33
sempre 19
63,33
23
76,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Usa utensílios adequados para se alimentar
2002 2004
freqüência % freqüência %
algumas vezes 0
0,00
4
13,33
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 5
16,67
0
0,00
sempre 24
80,00
26
86,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Alimenta-se em ritmo normal, sem engolir as pressas nem demorar
demais
2002 2004
freqüência % freqüência %
Nunca 0
0,00
2
6,67
algumas vezes 2
6,67
5
16,67
com freqüência 5
16,67
3
10,00
na maioria das vezes 4
13,33
4
13,33
sempre 19
63,33
16
53,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Mastiga de boca fechada
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 2
6,67
1
3,33
algumas vezes 1
3,33
5
16,67
com freqüência 3
10,00
1
3,33
na maioria das vezes 9
30,00
0
0,00
sempre 15
50,00
22
73,33
missing 0
0,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
269
Questão 5: Tira comida dos pratos dos outros sem permissão
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 27
90,00
28
93,33
algumas vezes 0
0,00
1
3,33
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 0
0,00
1
3,33
sempre 2
6,67
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Come a quantidade de alimentos apropriada
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 1
3,34
2
6,67
algumas vezes 4
13,33
4
13,33
com freqüência 4
13,33
1
3,33
na maioria das vezes 9
30,00
0
0,00
sempre 12
40,00
23
76,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Demonstra ter bons hábitos nutricionais
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 3
10,00
5
16,67
algumas vezes 3
10,00
5
16,67
com freqüência 5
16,67
3
10,00
na maioria das vezes 8
26,67
1
3,33
sempre 11
36,66
15
50,00
Missing 0
0,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 8: Come comida que foi descartada
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 27
90,00
28
93,33
algumas vezes 0
0,00
1
3,33
na maioria das vezes 2
6,67
0
0,00
sempre 1
3,33
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
270
II - CUIDADOS PESSOAIS
Questão 1: Toma banho usando sabonete todos os dias
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 1
3,33
1
3,33
algumas vezes 4
13,33
2
6,67
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 9
30,00
3
10,00
sempre 14
46,67
23
76,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Lava os cabelos pelo menos uma vez por semana
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
algumas vezes 2
6,67
2
6,67
na maioria das vezes 6
20,00
0
0,00
sempre 22
73,33
28
93,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Usa desodorante diariamente
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 5
16,67
2
6,67
algumas vezes 1
3,33
3
10,00
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das vezes 7
23,33
2
6,67
sempre 13
43,33
23
76,67
missing 2
6,67
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Escova ou penteia os cabelos diariamente
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 2
6,67
1
3,33
algumas vezes 3
10,00
3
10,00
com freqüência 3
10,00
0
0,00
na maioria das vezes 6
20,00
2
6,67
sempre 15
50,00
24
80,00
missing 1
3,33
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
271
Questão 5: Homem: barbeia-se quando necessário ou mantém sua barba aparada
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 3
10,00
1
3,33
algumas vezes 1
3,33
1
3,33
com freqüência 1
3,33
2
6,67
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 5
16,67
5
16,67
missing 19
63,34
20
66,67
30
100,00
30
100,00
Questão 6: Providencia o corte ou o cabelo penteado dos cabelos
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 6
20,00
5
16,67
algumas vezes 3
10,00
2
6,67
com freqüência 4
13,33
0
0,00
na maioria das vezes 10
33,33
1
3,33
sempre 7
23,34
22
73,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Escova ou dentes ou dentadura ou faz a higiene bucal pelo menos
uma vez ao dia
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 7
23,33
1
3,33
algumas vezes 0
0,00
3
10,00
com freqüência 3
10,00
2
6,67
na maioria das vezes 8
26,67
3
10,00
sempre 10
33,33
21
70,00
missing 2
6,67
0
0,00
30
100,00
30
100,00
Questão 8: Despe-se em horas e locais apropriados
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 2
6,67
0
0,00
algumas vezes 1
3,33
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 3
10,00
2
6,67
sempre 23
76,67
26
86,67
Total 30
100,00
30
100,00
272
Questão 9: Veste-se em horas e locais apropriados
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 1
3,33
0
0,00
algumas vezes 0
0,00
3
10,00
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 4
13,33
0
0,00
sempre 23
76,67
26
86,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 10: Conserva-se limpo e arrumado o dia todo
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 0
0,00
3
10,00
algumas vezes 3
10,00
4
13,33
com freqüência 2
6,67
3
10,00
na maioria das vezes 8
26,67
19
63,33
sempre 17
56,66
29
96,67
missing 0
0,00
1
3,33
Total 30
100,00
59
196,67
Questão 11: Separa apropriadamente roupas sujas para serem lavadas
por ele ou por outras pessoas
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 1
3,33
4
13,33
algumas vezes 3
10,00
3
10,00
com freqüência 3
10,00
2
6,67
na maioria das vezes 2
6,67
0
0,00
sempre 21
70,00
21
70,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 12: Veste-se apropriadamente quando ao clima ou eventos sociais
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 1
3,33
2
6,67
algumas vezes 1
3,33
3
10,00
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 6
20,00
2
6,67
sempre 20
66,67
22
73,33
Total 30
100,00
30
100,00
273
Questão 13: Quebra a etiqueta social
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 16
53,34
26
86,67
algumas vezes 4
13,33
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 3
10,00
0
0,00
sempre 6
20,00
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
III - ATIVIDADES DOMÉSTICAS
Questão 1: Arruma sua cama diariamente
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 3
10,00
1
3,33
algumas vezes 4
13,33
3
10,00
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das vezes
2
6,67
2
6,67
sempre 19
63,33
24
80,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Mantém o quarto ou espaço individual limpo
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 5
16,67
5
16,67
algumas vezes 4
13,33
3
10,00
com freqüência 3
10,00
3
10,00
na maioria das vezes
5
16,67
2
6,67
sempre 13
43,33
17
56,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Troca a roupa da cama sempre que necessário
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 8
26,67
7
23,33
algumas vezes 5
16,67
6
20,00
com freqüência 2
6,67
na maioria das vezes 3
10,00
1
3,33
sempre 11
36,66
16
53,33
missing 1
3,33
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
274
Questão 4: Recolhe objetos que caem no chão
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 4
13,33
2
6,67
algumas vezes 2
6,67
2
6,67
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 3
10,00
0
0,00
sempre 19
63,33
25
83,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 5: Limpa líquidos derramados
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 7
23,33
2
6,67
algumas vezes 2
6,67
5
16,67
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 3
10,00
2
6,67
sempre 17
56,67
20
66,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Se ocupa da arrumação de sua moradia quando necessário
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 8
26,67
2
6,67
algumas vezes 1
3,33
5
16,67
com freqüência 5
16,67
1
3,33
na maioria das vezes 3
10,00
1
3,33
sempre 13
43,33
21
70,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Realiza tarefas domésticas que lhe foram atribuídas
2002 2004
freqüência
% freqüência %
nunca 5
16,67
0
0,00
algumas vezes 3
10,00
3
10,00
com freqüência 1
3,33
2
6,67
na maioria das vezes 3
10,00
1
3,33
sempre 17
56,67
24
80,00
missing 1
3,33
0
0,00
missing 30
100,00
30
100,00
275
Questão 8: Coloca a roupa suja no tanque ou na máquina de lavar
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 5
16,67
5
16,67
algumas vezes 2
6,67
1
3,33
com freqüência 3
10,00
2
6,67
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 16
53,33
21
70,00
missing 3
10,00
0
0,00
30
100,00
30
100,00
Questão 9: Usa a quantidade correta de sabão para lavar a roupa
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 4
13,33
8
26,67
algumas vezes 0
0,00
4
13,33
com freqüência 3
10,00
1
3,33
na maioria das vezes 2
6,67
2
6,67
sempre 12
40,00
15
50,00
missing 9
30,00
0
0,00
30
100,00
30
100,00
Questão 10: Coloca as roupas para secar
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 5
16,67
1
3,33
algumas vezes 2
6,67
4
13,33
na maioria das vezes 2
6,67
2
6,67
sempre 17
56,66
23
76,67
missing 4
13,33
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 11: Guarda as roupas limpas
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 5
16,67
2
6,67
algumas vezes 1
3,33
4
13,33
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 4
13,33
1
3,33
sempre 19
63,34
22
73,33
Total 30
100,00
30
100,00
276
Questão 12: Guarda e/ou pendura as roupas
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 6
20,00
3
10,00
algumas vezes 2
6,67
7
23,33
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das vezes 4
13,33
2
6,67
sempre 16
53,33
18
60,00
Total 30
100,00
30
100,00
IV - PREPARO E ARMAZENAMENTO DE ALIMENTOS
Questão 1: Prepara refeições simples que não precisam ser misturadas
ou cozidas
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 6
20,00
2
6,67
algumas vezes 0
0,00
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 4
13,33
1
3,33
sempre 15
50,00
25
83,33
missing 4
13,34
0
0,00
30
100,00
30
100,00
Questão 2: Prepara e cozinha refeições simples
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 6
20,00
4
13,33
algumas vezes 0
0,00
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 4
13,33
2
6,67
sempre 14
46,67
21
70,00
missing 5
16,67
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Guarda os alimentos apropriadamente
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 5
16,67
2
6,67
algumas vezes 1
3,33
6
20,00
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 4
13,33
2
6,67
sempre 16
53,34
19
63,33
missing 3
10,00
0
0,00
30
100,00
30
100,00
277
Questão 4: Pode identificar e jogar fora alimentos estragados
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 6
20,00
6
20,00
algumas vezes 0
0,00
2
6,67
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 3
10,00
3
10,00
sempre 19
63,33
18
60,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 5: Limpa a mesa
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 6
20,00
2
6,67
algumas vezes 0
0,00
4
13,33
com freqüência 4
13,33
0
0,00
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 19
63,34
23
76,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Lava e enxuga a louça e os utensílios da cozinha
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 7
23,33
1
3,33
algumas vezes 1
3,33
4
13,33
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 0
0,00
24
80,00
sempre 16
53,34
0
0,00
missing 4
13,33
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Guarda os utensílios da cozinha
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 8
26,67
1
3,33
algumas vezes 0
0,00
3
10,00
com freqüência 2
6,67
2
6,67
na maioria das vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 16
53,33
24
80,00
missing 3
10,00
0
0,00
30
100,00
30
100,00
278
V - SAÚDE
Questão 1: Relata apropriadamente seus problemas físicos
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 2
6,67
4
13,33
algumas vezes 1
3,33
5
16,67
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das vezes 11
36,66
3
10,00
sempre 14
46,67
17
56,67
missing 0
0,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Cuida de seus próprios problemas físicos mais leves de forma
adequados
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 5
16,67
3
10,00
algumas vezes 2
6,67
2
6,67
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 13
43,33
2
6,67
sempre 7
23,33
21
70,00
System 1
3,33
1
3,33
30
100,00
30
100,00
Questão 3: Consegue ajuda de serviços publicos adequados
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 6
20,00
12
40,00
algumas vezes 1
3,33
2
6,67
com freqüência 4
13,33
1
3,33
na maioria das vezes 6
20,00
2
6,67
sempre 13
43,34
13
43,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Segue a orientação dos serviços citados
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 4
13,33
10
33,33
algumas vezes 1
3,33
4
13,33
com freqüência 3
10,00
0
0,00
na maioria das vezes 8
26,67
1
3,33
sempre 13
43,34
15
50,00
missing 1
3,33
0
0,00
30
100,00
30
100,00
279
Questão 5: Fuma respeitando as regras de segurança
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 3
10,00
2
6,67
algumas vezes 4
13,33
2
6,67
com freqüência 0
0,00
1
3,33
na maioria das vezes 8
26,67
2
6,67
sempre 8
26,67
16
53,33
missing 7
23,33
7
23,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Aceita tomar a medicação que lhe é administrada
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 0
0,00
1
3,33
algumas vezes 0
0,00
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 6
20,00
1
3,33
sempre 22
73,34
25
83,33
missing 1
3,33
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Toma seu medicamento sem supervisão
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 9
30,00
11
36,67
algumas vezes 7
23,34
2
6,67
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 6
20,00
15
50,00
missing 6
20,00
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 8: Contata serviços públicos para fazer queixas ou pedidos impróprios
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 24
80,00
27
90,00
algumas vezes 1
3,33
0
0,00
com freqüência 1
3,33
0
0,00
sempre 2
6,67
3
10,00
missing 2
6,67
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
280
VI - ADMINISTRAÇÃO DO DINHEIRO
Questão 1: Compra a quantidade adequada de mercadorias
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 9
30,00
9
30,00
algumas vezes 3
10,00
4
13,33
com freqüência 2
6,67
2
6,67
na maioria das vezes 4
13,33
0
0,00
sempre 4
13,33
14
46,67
missing 8
26,67
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Compra suas próprias roupas
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 10
33,33
9
30,00
algumas vezes 5
16,67
1
3,33
na maioria das vezes 4
13,33
4
13,33
sempre 3
10,00
15
50,00
missing 8
26,67
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Compra objetos de uso pessoal
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 9
30,00
5
16,67
algumas vezes 5
16,67
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 4
13,33
2
6,67
sempre 3
10,00
20
66,67
missing 8
26,67
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Providencia o conserto de roupas e objetos
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 6
20,00
12
40,00
algumas vezes 4
13,33
1
3,33
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 3
10,00
1
3,33
sempre 6
20,00
14
46,67
missing 9
30,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
281
Questão 5: Paga suas contas
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 10
33,33
10
33,33
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 4
13,34
17
56,67
missing 14
46,67
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Administra adequadamente seu orçamento
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 8
26,67
14
46,67
algumas vezes 5
16,67
2
6,67
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 2
6,67
1
3,33
sempre 5
16,66
12
40,00
missing 9
30,00
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Procura ajuda ou informação, quando necessário, para planificação
de seu orçamento
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 8
26,67
15
50,00
algumas vezes 4
13,33
1
3,33
com freqüência 3
10,00
0
0,00
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 6
20,00
13
43,33
missing 8
26,67
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 8: Compreende os termos tutela ou curadoria
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 8
26,67
11
36,67
algumas vezes 2
6,66
3
10,00
na maioria das vezes 3
10,00
2
6,67
sempre 9
30,00
10
33,33
missing 8
26,67
4
13,33
Total 30
100,00
30
100,00
282
Questão 9: Compra itens essenciais antes de gastar dinheiro com supérfluos
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 11
36,67
10
33,33
algumas vezes 2
6,67
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 2
6,66
0
0,00
sempre 6
20,00
16
53,33
missing 8
26,67
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 10: Utiliza o relógio para organizar sua programação diária
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 8
26,67
13
43,33
algumas vezes 2
6,67
0
0,00
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das vezes 5
16,66
0
0,00
sempre 6
20,00
16
53,33
missing 7
23,33
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 11: Devolve material defeituoso ou troca mercadorias em lojas
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 10
33,33
13
43,33
algumas vezes 3
10,00
1
3,33
com freqüência 0
0,00
0
0,00
na maioria das vezes 2
6,67
0
0,00
sempre 4
13,33
14
46,67
missing 11
36,67
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 12: Confere troco em lojas
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 10
33,33
7
23,33
algumas vezes 2
6,67
2
6,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 2
6,67
0
0,00
sempre 6
20,00
20
66,67
missing 9
30,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
283
VII - TRANSPORTE
Questão 1: Anda de ônibus
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 16
53,33
17
56,67
algumas vezes 4
13,33
0
0,00
com freqüência 0
0,00
1
3,33
na maioria das vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 5
16,67
11
36,67
missing 4
13,34
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Lê itinerários de ônibus
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 9
30,00
17
56,67
algumas vezes 4
13,33
1
3,33
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 4
13,33
10
33,33
missing 10
33,34
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Vai a pé a locais da vizinhança
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 6
20,00
1
3,33
algumas vezes 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 3
10,00
1
3,33
sempre 17
56,67
28
93,33
missing 3
10,00
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Respeita as normas para pedestre
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 5
16,67
5
16,67
algumas vezes 0
0,00
2
6,67
com freqüência 2
6,67
1
3,33
na maioria das vezes 3
10,00
2
6,67
sempre 14
46,66
19
63,33
missing 6
20,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
284
Questão 5: Informa-se e segue as indicações de um trajeto
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 4
13,33
9
30,00
algumas vezes 1
3,33
1
3,33
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 5
16,67
0
0,00
sempre 15
50,00
19
63,33
missing 4
13,34
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Faz viagem de longa distância
2002 2004
freqüência
% freqüência %
nunca 20
66,67
19
63,33
algumas vezes 1
3,33
4
13,33
com freqüência 0
0,00
1
3,33
na maioria das vezes 1
3,33
1
3,33
sempre 2
6,67
5
16,67
missing 6
20,00
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
2002 2004
freqüência
% freqüência %
nunca 2
6,67
0
0,00
algumas vezes 2
6,67
1
3,33
com freqüência 0
0,00
0
0,00
na maioria das vezes 4
13,33
0
0,00
sempre 14
46,67
28
93,33
missing 8
26,66
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
VIII - LAZER
Questão 1: Ocupa-se regularmente com seu passatempo
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 5
16,67
15
50,00
algumas vezes 2
6,67
3
10,00
com freqüência 4
13,33
1
3,33
na maioria das vezes 6
20,00
3
10,00
sempre 13
43,33
8
26,67
Total 30
100,00
30
100,00
285
Questão 2: Passeia fora de seu local de residência
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 3
10,00
7
23,33
algumas vezes 1
3,33
3
10,00
com freqüência 4
13,33
0
0,00
na maioria das vezes 3
10,00
0
0,00
sempre 19
63,34
20
66,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Cuida do jardim ou quintal
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 10
33,33
16
53,33
algumas vezes 5
16,67
2
6,67
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 4
13,33
2
6,67
sempre 2
6,67
9
30,00
missing 8
26,67
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Ouve rádio ou vê televisão
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 1
3,33
1
3,33
com freqüência 5
16,67
0
0,00
na maioria das vezes 2
6,67
0
0,00
sempre 22
73,33
28
93,33
missing 0
0,00
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 5: Escreve cartas
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 14
46,67
22
73,33
algumas vezes 2
6,67
0
0,00
com freqüência 1
3,33
0
0,00
sempre 0
0,00
5
16,67
System 13
43,33
3
10,00
30
100,00
30
100,00
286
Questão 6: Assiste atividades esportivas
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 7
23,33
16
53,33
algumas vezes 12
40,00
5
16,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das vezes 1
3,34
2
6,67
sempre 3
10,00
5
16,67
missing 6
20,00
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Joga cartas ou outros jogos de mesa
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 13
43,33
26
86,67
algumas vezes 8
26,67
0
0,00
com freqüência 2
6,67
0
0,00
sempre 1
3,33
2
6,67
missing 6
20,00
2
6,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 8: Lê jornais habitualmente
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 12
40,00
23
76,67
algumas vezes 2
6,67
3
10,00
com freqüência 1
3,33
1
3,33
na maioria das vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 0
0,00
2
6,67
missing 14
46,67
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 9: Vai a reuniões de organizações cívicas ou outras
2002 2004
freqüência
% freqüência
%
nunca 7
23,33
12
40,00
algumas vezes 2
6,67
6
20,00
com freqüência 3
10,00
2
6,67
na maioria das vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 9
30,00
10
33,33
missing 8
26,67
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
287
IX - EMPREGO
Questão 1: Procura emprego através de anúncios classificados
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 10
33,33
27
90,00
sempre 0
0,00
2
6,67
missing 20
66,67
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 2: Contata empregadoras em potencial para avaliar possíveis oportunidades
de trabalho
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 13
43,33
25
83,33
algumas vezes 0
0,00
1
3,33
com freqüência 0
0,00
1
3,33
na maioria das
vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 0
0,00
2
6,67
missing 16
53,34
1
3,33
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 3: Contata amigos/outros pacientes/assistentes social/agência para
indicação de emprego
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 13
43,33
24
80,00
algumas vezes 0
0,00
1
3,33
com freqüência 0
0,00
1
3,33
na maioria das
vezes 1
3,33
0
0,00
sempre 0
0,00
4
13,33
missing 16
53,34
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 4: Participa de entrevistas de seleção para obter emprego
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 14
46,67
28
93,33
sempre 0
0,00
2
6,67
missing 16
53,33
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
288
Questão 5: Tem aspirações realistas de emprego
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 13
43,33
17
56,67
algumas vezes 1
3,33
3
10,00
com freqüência 0
0,00
1
3,33
na maioria das
vezes 2
6,67
1
3,33
sempre 2
6,67
8
26,67
missing 12
40,00
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 6: Sai na hora certa para os compromissos
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 6
20,00
8
26,67
algumas vezes 0
0,00
5
16,67
com freqüência 1
3,33
0
0,00
na maioria das
vezes 6
20,00
0
0,00
sempre 10
33,33
17
56,67
missing 7
23,34
0
0,00
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 7: Sai na hora certa para o emprego
2002 2004
freqüência % freqüência
%
nunca 3
10,00
5
16,67
algumas vezes 0
0,00
3
10,00
com freqüência 2
6,67
0
0,00
na maioria das
vezes 4
13,33
0
0,00
sempre 11
36,67
14
46,67
missing 10
33,33
8
26,67
Total 30
100,00
30
100,00
Questão 8: Chega na hora certa em seu emprego e respeita o horário de almoço
2002 2004
freqüência % freqüência %
nunca 3
10,00
5
16,67
algumas vezes 1
3,33
3
10,00
com freqüência 3
10,00
0
0,00
na maioria das
vezes
3
10,00
1
3,33
sempre 11
36,67
15
50,00
missing 9
30,00
6
20,00
Total 30
100,00
30
100,00
289
Anexo D
Análise Estatística
290
ANÁLISE ESTATÍSTICA
Paired Samples Statistics
84.8214 21 18.06795 3.94275
85.1190 21 10.50041 2.29138
80.5128 30 14.43287 2.63507
71.9872 30 15.55512 2.83996
76.8056 30 26.76780 4.88711
65.2083 30 33.50865 6.11782
80.4762 30 25.14443 4.59072
64.1667 30 36.18511 6.60647
68.5417 30 21.66515 3.95550
66.0417 30 19.81075 3.61693
57.5149 28 34.89466 6.59447
33.6310 28 27.56699 5.20967
61.2434 27 25.51863 4.91106
47.7513 27 29.20231 5.61999
38.1226 29 19.97431 3.70914
38.1226 29 14.23955 2.64422
33.5938 24 25.20719 5.14540
26.1719 24 17.23530 3.51814
PAL_2004
PAL_2002
Pair
1
PCP_2004
PCP_2002
Pair
2
PAD_2004
PAD_2002
Pair
3
PPA_2004
PPA_2002
Pair
4
PSA_2004
PSA_2002
Pair
5
PDI_2004
PDI_2002
Pair
6
PTR_2004
PTR_2002
Pair
7
PLA_2004
PLA_2002
Pair
8
PEM_2004
PEM_2002
Pair
9
Mean N Std. Deviation
Std. Error
Mean
291
Paired Samples Test
-.29762 18.27269 3.98743 -8.61525 8.02001 -.075 20 .941
8.52564 17.78149 3.24644 1.88593 15.16536 2.626 29 .014
11.59722 38.42133 7.01474 -2.74954 25.94398 1.653 29 .109
16.30952 36.09018 6.58914 2.83323 29.78582 2.475 29 .019
2.50000 26.62297 4.86067 -7.44118 12.44118 .514 29 .611
23.88393 43.95156 8.30606 6.84129 40.92656 2.875 27 .008
13.49206 30.83947 5.93506 1.29238 25.69175 2.273 26 .032
.00000 23.07396 4.28473 -8.77686 8.77686 .000 28 1.000
7.42188 24.07974 4.91526 -2.74611 17.58986 1.510 23 .145
PAL_2004 - PAL_2002Pair 1
PCP_2004 - PCP_2002Pair 2
PAD_2004 - PAD_2002Pair 3
PPA_2004 - PPA_2002Pair 4
PSA_2004 - PSA_2002Pair 5
PDI_2004 - PDI_2002Pair 6
PTR_2004 - PTR_2002Pair 7
PLA_2004 - PLA_2002Pair 8
PEM_2004 - PEM_2002Pair 9
Mean Std. Deviation
Std. Error
Mean
Lower Upper
95% Confidence
Interval of the
Difference
Paired Differences
t df Sig. (2-tailed)
Paired Samples Statistics
63.1877 30 15.95468 2.91291
55.6638 30 16.61573 3.03360
tot2004
tot2002
Pair
1
Mean N Std. Deviation
Std. Error
Mean
Paired Samples Test
7.52395 19.25104 3.51474 .33549 14.71241 2.141 29 .041
tot2004 - tot2002Pair 1
Mean Std. Deviation
Std. Error
Mean
Lower Upper
95% Confidence
Interval of the
Difference
Paired Differences
t df Sig. (2-tailed)
292
Paired Samples Statistics
77.0223 30 16.29385 2.97484
71.5124 30 16.47215 3.00739
totind2004
totind2002
Pair
1
Mean N Std. Deviation
Std. Error
Mean
Paired Samples Test
5.50993 19.84135 3.62252 -1.89896 12.91881 1.521 29 .139
totind2004 - totind2002Pair 1
Mean Std. Deviation
Std. Error
Mean
Lower Upper
95% Confidence
Interval of the
Difference
Paired Differences
t df Sig. (2-tailed)
Paired Samples Statistics
52.9864 30 18.18318 3.31978
41.1184 30 19.70557 3.59773
totadm2004
totadm2002
Pair
1
Mean N Std. Deviation
Std. Error
Mean
Paired Samples Test
11.86800 21.05505 3.84411 4.00592 19.73009 3.087 29 .004
totadm2004 - totadm2002Pair 1
Mean Std. Deviation
Std. Error
Mean
Lower Upper
95% Confidence
Interval of the
Difference
Paired Differences
t df Sig. (2-tailed)
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