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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MARLENE HARGER ZIMMERMANN
A BIOÉTICA NA FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO:
CONTRIBUIÇÕES PARA UM CUIDADO MAIS HUMANIZADO
CURITIBA
2006
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MARLENE HARGER ZIMMERMANN
A BIOÉTICA NA FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO:
CONTRIBUIÇÕES PARA UM CUIDADO MAIS HUMANIZADO
Dissertação apresentada como requisito
parcial à obtenção do grau de Mestre em
Educação, do Programa de Pós-
Graduação, nível de Mestrado, da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná, na Linha
de Pesquisa: Teoria e Prática da Educação
Superior.
Orientadora: Profa. Dra. Pura Lúcia Oliver
Martins.
CURITIBA
2006
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Para:
- meu marido Dalton César, pelo apoio, compreensão, incentivo e por suas contribuições
neste trabalho.
- minhas filhas Marina e Elisa pela paciência que tiveram, pela compreensão e por todos os
momentos de ausência física e afetiva que esta caminhada exigiu.
- meus pais Arno e Lutzi, pelo grande incentivo que recebi desde a escolha da profissão até
os dias atuais. Pelas incansáveis orações que sempre fizeram por mim, principalmente para
que mais esta etapa se cumprisse em minha vida.
- aos colegas docentes Enfermeiros e alunos dos cursos de Enfermagem em que atuo, por
participarem ativamente desta conquista, contribuindo com suas experiências de vida.
- a todos os colegas do Mestrado em Educação, pela riqueza das experiências que me
fizeram ampliar o olhar do conhecimento.
AGRADECIMENTOS
A Deus, pelo dom da vida e por ter-me possibilitado a realização deste trabalho,
inspirando e guiando-me em todos os momentos.
À Professora Doutora PURA LÚCIA OLIVÉR MARTINS, orientadora e amiga, pelo
grande conhecimento partilhado, pela paciência, compreensão, incentivo e carinho.
Pela forma humanizada com que me acolheu durante toda esta trajetória, ajudando-
me, de maneira incansável, a desvelar este caminho do conhecimento.
À Professora Doutora Neuza Bertoni Pinto, pelo seu carinho e pelas contribuições
realizadas para que este trabalho pudesse se tornar realidade.
À Professora Doutora Maria de Lourdes Rocha de Lima, pela generosidade com
que me acolheu, pelas orientações e sugestões dadas, que contribuíram de forma
indelével para esta pesquisa.
Às Enfermeiras Lídia Dalgallo Zarpellon e Maria Dagmar da Rocha, amigas
queridas, colegas de profissão e parceiras de mestrado que partilharam comigo
momentos inesquecíveis. Incentivaram-me a continuar lutando por uma Enfermagem
mais humanizada, através de seus exemplos de vida profissional.
À amiga enfermeira Luciene Regina Sowek, que não mediu esforços para auxiliar-
me neste desafio. Pelas palavras de ânimo e da certeza da vitória. Pelo exemplo de
acreditar em uma Enfermagem, que apesar das contradições, é o que realiza o
nosso viver.
À Susana Soares Tozetto, pedagoga amiga, que me incentivou a adentrar na
academia, acompanhando toda minha trajetória até aqui. A quem agradeço o
incentivo e a ampliação do meu olhar como enfermeira docente.
RESUMO
“A Bioética na formação do profissional Enfermeiro: contribuições para um cuidado
mais humanizado”, é um estudo que tem como objetivo geral analisar a contribuição
da Bioética para a formação do profissional Enfermeiro em um cuidado mais
humanizado. A partir da ótica dos alunos e docentes do curso de Enfermagem
analisar a contribuição da Bioética na formação do profissional Enfermeiro em um
cuidado mais humanizado. Esse estudo focaliza a bioética no curso de Enfermagem
para uma assistência humanizada tendo, como método teórico, o materialismo
histórico-dialético, numa abordagem qualitativa. Para a realização dessa
investigação, foi efetuada uma revisão da literatura buscando na história, a evolução
da Enfermagem e do seu ensino no Brasil. São sujeitos desta pesquisa, alunos e
docentes do curso de Enfermagem de duas Instituições de Ensino Superior da
cidade de Ponta Grossa, Paraná. A coleta de dados foi feita por meio da técnica do
Grupo Focal, cujos resultados foram analisados com o auxílio da Análise de
Conteúdo de Bardin, tendo como categorias de análise: a) condições objetivas de
trabalho; b) humanização/humanizador; c) dicotomia teoria/prática. A pesquisa
revelou que: a) A Bioética assume importante papel na formação do profissional
Enfermeiro. Ela contribui para um cuidado mais humanizado e oportuniza ao
Enfermeiro o repensar de sua prática. A preocupação com uma formação
humanizada se manifesta ao longo dos cursos, ora pela postura de alguns
professores, ora pela abordagem em diferentes disciplinas. b) necessidade de
humanizar os docentes na relação docente/discente. c) A humanização assume
certa complexidade na sua definição e operacionalização, devendo envolver todos
os segmentos da comunidade. O estudo apontou, também, alguns caminhos para a
formação do profissional enfermeiro.
Palavras-chave: Humanização. Formação. Enfermeiro. Bioética
ABSTRACT
“The Bioethics in the formation of the professional Nurse: contributions for a more
humanitarian care”, that has as general aim to analyze the contribution of the
Bioethics for the formation of the professional nurse in a more humanitarian care.
This study wants to analyse the contribution of Bioethics in the formation of the
professional nurse in a humanitarian care from the view of the Nursing students and
to verify, the conception of humanitarian care and its materialization in the practice
from the view of the professional Nurses. This study focuses the bioethics in the
nursing course for a humanitarian assistance, focusing as theoretical reference, the
historical-dialectical materialism. In order to achieve this inquiry, a revision of
literature was effected searching in history, the Nursing evolution and its education in
Brazil. Students and professors of the Nursing course of two Institutions of Superior
Education of Ponta Grossa city, Paraná, are involved in this research. The data was
got by the Focal Group technique, and the results had been analyzed with the aid of
the Bardin Content analysis, dividing the results in categories such as: a) objective
conditions of work; b) humanitarianism/humanitarian activity; c) dichotomy
theory/practice. The research revealed that: a) The Bioethics assumes important role
in the formation of the professional Nurse. It contributes for a humanitarian care and
allow nurses to rethink their practices. The concern about a humanitarian activity
appears during the academic formation, showed in the professors’ attitudes, or it can
be showed in different subjects. b) It is necessary to humanize the professors in the
relationship between teacher/student. c) The humanitarianism assumes certain
complexity in its definition and implantation, and it is necessary to consider the
involvement of all community segments. The study presented, also, some ways for
the formation of the professional nurse.
Key-words: Humanitarianism. Formation. Nurse. Bioethics.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................10
CAPÍTULO I..............................................................................................................25
HISTÓRIA DA ENFERMAGEM, DO SEU ENSINO E SUA RELAÇÃO COM A
PRÁTICA SOCIAL....................................................................................................25
1.1 HISTÓRIA DA ENFERMAGEM E DO SEU ENSINO NO MUNDO E A
PARTICIPAÇÃO DE FLORENCE NIGHTINGALE...............................................26
1.2 HISTÓRIA DA ENFERMAGEM E DO SEU ENSINO NO BRASIL......................40
CAPÍTULO II.............................................................................................................51
A BIOÉTICA E SUA RELAÇÃO COM O CUIDADO HUMANIZADO NA SAÚDE...51
2.1. TECNOLOGIA, TECNOCIÊNCIA E A BIOÉTICA ..............................................52
2.2 A BIOÉTICA E O CONTEXTO SOCIAL..............................................................52
2.3 A HUMANIZAÇÃO ..............................................................................................58
2.4 A ÉTICA KANTIANA NA BIOÉTICA E NO SEU ENSINO...................................63
2.4.1 A ética através da história.............................................................................63
2.4.2 O pensamento ético de Immanuel Kant .......................................................65
2.4.3 Pensamento ético de Kant e a Bioética........................................................67
2.4.4 Kant na pedagogia e no ensino da Bioética ................................................68
3.1 O CAMINHO PERCORRIDO ..............................................................................73
3.2 Sobre a técnica do Grupo Focal (GF) .................................................................75
3.3 Participantes do Grupo Focal: algumas considerações ......................................76
3.4 Planejamento do Grupo Focal.............................................................................77
3.4.1 Equipe .............................................................................................................78
3.4.2 Orçamento ......................................................................................................78
3.4.3 Grupo...............................................................................................................78
3.4.4 Conteúdo.........................................................................................................80
3.4.5 O ambiente e os recursos utilizados............................................................80
3.4.6 Convite............................................................................................................81
3.4.7 Cronograma....................................................................................................82
3.4.8 Condução da sessão (grupo Focal de Alunos) ...........................................83
3.4.8.1 Organização da sala de dinâmica: ................................................................83
3.4.8.2. Acolhimento dos sujeitos da pesquisa:.........................................................84
3.4.8.3 Técnica para descontração e para eleição do pseudônimo. .........................84
3.4.8.4 Explanação sobre a técnica ..........................................................................84
3.4.8.5 Assinatura da lista de presença e leitura e assinatura do Termo de
Consentimento livre e esclarecido.............................................................................85
3.4.8.6 Apresentação dos participantes....................................................................85
3.4.8.7 Início das perguntas norteadoras e finais:.....................................................85
3.4.8.8 Síntese dos principais temas abordados.......................................................86
3.4.8.9 Agradecimentos da pesquisadora.................................................................86
3.4.9 Condução da sessão (Grupo Focal de Professoras)........................................86
CAPÍTULO IV............................................................................................................88
CONTRIBUIÇÃO DA BIOÉTICA NA FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL
ENFERMEIRO PARA UMA ASSISTÊNCIA HUMANIZADA....................................88
4.1 CONDIÇÕES OBJETIVAS DE TRABALHO........................................................90
4.1.1 Pressão exercida (colegas da equipe/instituição).......................................90
4.1.2 Dificuldades em relação ao contexto social................................................92
4.2 HUMANIZAÇÃO / HUMANIZADOR ....................................................................92
4.2.1 Múltiplos olhares sobre a Humanização......................................................93
4.2.2 Universos da Humanização...........................................................................97
4.2.3 Humanização e a Formação ..........................................................................99
CAPÍTULO V...........................................................................................................110
CONCEPÇÃO DE ASSISTÊNCIA HUMANIZADA E SUA CONCRETIZAÇÃO
NA PRÁTICA..........................................................................................................110
5.1 CONDIÇÕES OBJETIVAS DE TRABALHO......................................................112
5.1.1 Pressão exercida (colegas da equipe/instituição).....................................112
5.1.2 Dificuldade em relação ao contexto social................................................114
5.2 HUMANIZAÇÃO/HUMANIZADOR ....................................................................116
5.2.2 Universos da Humanização.........................................................................119
5.2.3 Humanização e Formação ...........................................................................121
5.3 DICOTOMIA TEORIA/PRÁTICA .......................................................................128
UM OLHAR SOBRE A PRÁTICA...NOVO PONTO DE PARTIDA..........................136
APÊNDICES ...........................................................................................................150
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa não é um resultado individual, mas está intimamente
ligada a circunstâncias e pessoas com quem foram partilhadas idéias, olhares,
momentos, leituras e discussões, que foram tecendo assim esta produção, bem
como, ampliando o meu olhar de pesquisadora através da reflexão da Enfermagem
1
na sua totalidade.
Considerando a minha formação em Enfermagem, a decisão em
cursar mestrado na área da Educação deu-se em função das atividades que vêm
sendo por mim desempenhadas na formação de profissionais Enfermeiros,
2
associadas às reflexões que se formaram durante a minha trajetória de atuação na
área. Essa experiência permitiu-me visualizar que a formação inicial assume grande
importância no panorama das intervenções, objetivando a melhoria da assistência
de Enfermagem, ou seja, um cuidado humanizado. Adentrar na área da Educação
foi de grande significância. Desvelou-se um conhecimento que vem ao encontro das
inquietações que assolam a Educação em Enfermagem.
Este trabalho pretende trazer à tona algumas reflexões sobre a
formação do profissional Enfermeiro no que se refere à humanização dos cuidados
realizados pelo mesmo. Ao revisitar a história da Enfermagem, sob o olhar de
apreensão das condições objetivas de trabalho, compreende-se a dicotomia
instalada na atualidade em relação ao desenvolvimento técnico-científico e à
prestação do cuidado humanizado. Deparei-me com uma profissão que sofreu
diversas transformações e que vem acompanhada de contradições que são
vivenciadas no cotidiano. A Enfermagem desenvolve-se numa teia, como todas as
instituições sociais. Os aspectos políticos e sociais exerceram e exercem grande
influência em toda sua trajetória histórica bem como no seu cotidiano.
1
Enfermagem: uma disciplina profissional que adota uma perspectiva teórico-filosófica, característica das
ciências sociais humanas, que tem finalidade prática e social e é executada através de um processo de trabalho
compartilhado entre os membros da profissão e que acontece em um sistema que é de natureza interdisciplinar
(NEVES, 2002, p. 81).
Enfermagem: abrange diferentes categorias de trabalhadores, com diferentes níveis de instrução: o enfermeiro, o
técnico de enfermagem e o auxiliar de enfermagem (GERMANO, 1985, p. 10).
2
Neste trabalho far-se-á uso do termo ENFERMEIRO, gênero masculino, por opção própria tendo em vista a
profissão ser exercida por homens e mulheres com predomínio destas em relação ao número de enfermeiros
atualmente no Brasil.
11
A Bioética,
3
sendo uma das áreas do conhecimento humano que
mais vêm crescendo nos últimos trinta anos em todos os quadrantes da terra, e por
causa de seu importante lugar na sociedade contemporânea (PESSINI, 1997), vem
ao encontro do resgate da dignidade humana, enaltecendo a valoração da vida, num
cenário onde o sistema capitalista ganha expressão supervalorizando o “ter” sobre o
“ser”. Nesse espaço aparece a Enfermagem, na qual o cuidado humano ganha
expressão, sendo este considerado o cerne da profissão.
Desde os primórdios da humanidade, o ser humano, quando
assolado pela doença, foi atendido e cuidado por outro indivíduo. Esse legado se
perpetua até os dias atuais.
O verbo cuidar denota atenção, cautela, desvelo e zelo. Representa
mais que um momento de atenção. Na realidade é uma atitude de preocupação,
ocupação, responsabilização e envolvimento afetivo com o ser cuidado.
A história, por sua característica dinâmica, tem mostrado que o
cuidado dispensado aos doentes sofreu modificações ao longo do tempo no que se
refere à pessoa do cuidador (aquele que cuida). Familiares, escravos, membros da
Igreja, senhoras viúvas e ricas da sociedade, realizavam cuidados aos doentes. Nos
primórdios do cristianismo, através da instituição do diaconato, nasce a Enfermagem
como um serviço organizado; (SILVA, 1989) passando então ela a dispensar os
cuidados para aqueles que deles necessitavam.
A assistência é a razão de ser da Enfermagem, a pessoa é o cerne
da profissão do Enfermeiro, e o cuidado humano a sua expressão de trabalho. Este
sofre divergências na forma como é executado pelos profissionais da área de saúde.
Os princípios fundamentais, conforme o Código de Ética dos Profissionais de
Enfermagem, salientam o compromisso com a saúde do ser humano.
De acordo com Neves,
o desenvolvimento teórico do cuidar em enfermagem iniciou na década de
50 com Madeleine Leininger quando passou a defender as concepções de
que o cuidado é uma necessidade humana essencial e cuidar é a essência
da enfermagem e um modo de alcançar saúde, bem estar e a
sobrevivência das culturas e da civilização (NEVES, 2002, p. 79).
3
Termo que designa um estudo sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da saúde,
enquanto essa conduta é examinada à luz de valores e princípios morais. (SGRECCIA. MANUAL DE
BIOÉTICA, 1996)
12
Na execução do cuidado torna-se importante a associação de
conhecimentos técnico-científicos acrescidos de uma abordagem humanística
4
.
Nesta percepção, concordo com Watson quando aborda que o humanismo engloba
e se preocupa com a compreensão e avaliação das metas e experiências, as
diferenças individuais e suas singularidades (WATSON 1988 apud WALDOW, 1995,
p. 14).
Quando me reporto à formação do profissional Enfermeiro, recorro à
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96) a qual propõe
alterações curriculares que possibilitem a formação de Enfermeiros críticos e
reflexivos, aptos a atuar em diferentes situações da realidade brasileira. Daí vê-se a
importância de formar profissionais com esse perfil, que tenham suas ações
pautadas em princípios éticos e humanitários. Portanto, um ser pensante,
humanista, possuidor de uma visão do ser humano e do mundo que o rodeia.
No entanto, o ensino de Enfermagem, em geral, tem se ocupado de
formar profissionais com conhecimentos científicos e habilidades técnicas, ficando o
atendimento humanizado a desejar, ou seja, sua formação inicial está centrada nos
aspectos do saber fazer em detrimento do ser. Reafirmo esse pensamento com as
palavras de Saupe que diz:
A pedagogia tecnicista, a partir do pressuposto da neutralidade científica e
inspirada nos princípios da racionalidade, eficiência e produtividade, está
muito presente ainda no ensino da enfermagem (SAUPE, 1998, p. 156).
A divisão do conhecimento e do trabalho acarreta como
conseqüência a visão compartimentada do homem. O tecnicismo dificulta a
visualização, pelos profissionais Enfermeiros, do paciente como um ser único,
dotado de autonomia e com necessidades individuais que transcendem o
conhecimento científico e a habilidade técnica. O profissional Enfermeiro necessita
ter domínio e competência no manejo das máquinas, porém, compreender o doente
em sua totalidade, individualizar seu tratamento, valorizar seus temores, problemas
e necessidades, são aspectos de grande importância, muitas vezes esquecidos,
4
Entende-se por abordagem humanística a abordagem precedida do respeito ao doente em que a pessoa do
doente assume valoração acima da doença que o acomete.
13
nem sempre levado em consideração. Decisões importantes são tomadas em
relação ao paciente
5
sem ao menos lhe dirigirem a palavra ou um olhar.
De acordo com Fortes:
O respeito à pessoa humana é um dos valores básicos da sociedade
moderna, fundamentando-se no princípio de que cada pessoa deva ser
vista como um fim em si mesmo e não somente como um meio (FORTES,
1998, p. 13).
Todo ser humano, quando na posição de paciente, deve ser tratado
em virtude de suas necessidades de saúde.
Com o crescente aumento das especializações e da evolução
técnico-científica, ocorre um afastamento progressivo do profissional em relação aos
seus pacientes, tornando a relação entre eles cada vez mais impessoal e
despersonalizada. Percebo também que esse progresso resultou numa
fragmentação do conhecimento sobre as patologias e conseqüentemente, na
visualização do ser como um todo. Na área da saúde, essa fragmentação é
cotidianamente realizada. Verifico que os pacientes o tratados e conhecidos
através de suas patologias, órgãos, um caso, dificultando o atendimento integral
humanizado, com abrangência biopsicossocial e espiritual.
Na área da saúde, mais precisamente na Enfermagem, a
humanização torna-se tema central, tendo em vista que as atividades de
Enfermagem estão intimamente relacionadas à dignidade
6
do ser humano,
impregnadas de consideração pelo semelhante, amalgamadas pelo cuidar ético,
pois é um serviço prestado ao ser humano.
Em contrapartida, o momento atual é cerceado de mudanças cada
vez mais rápidas e complexas, advindas do progresso vertiginoso que ocorre no
mundo e no qual o ser humano se encontra inserido. O progresso é bem vindo,
porém, conflitos surgem principalmente no campo da ética, trazendo reflexos ao ser
humano. Sampaio (2004, p. 30) colabora dizendo que “estamos vivendo uma crise
global profunda, onde o vazio existencial e afetivo favorece a miséria, a violência, a
corrupção, o medo, resultado da fragilidade das relações e dos valores humanos”.
5
Paciente: neste trabalho será utilizado este termo para designar seres humanos que necessitam de cuidado de
outros seres humanos em qualquer fase do seu ciclo vital e do ciclo saúde-enfermidade (HORTA, 1979, p. 3).
6
Dignidade: palavra originária do latim dignitate, significando honradez, honra, nobreza, decência,
respeito a si próprio (FIGUEIREDO, 2006, p. 374).
14
Esse pensar vem ao encontro do que se pretende com esta
pesquisa, ou seja, repensar a formação do profissional Enfermeiro, na qual a
Bioética tenha atuação, contribuindo para revitalizar as relações entre os seres, cujo
cuidado constitui o vínculo entre eles.
Minayo (2000) expõe que nada pode ser intelectualmente um
problema se o tiver sido, num primeiro momento, um problema da vida prática.
Diante dessa afirmação e do exposto anteriormente, considero importante ressaltar
a minha trajetória como profissional Enfermeira, tendo em vista que fui responsável
pela seleção do tema desta pesquisa. Em minha experiência profissional de mais de
duas décadas, atuei no cuidado de pessoas doentes, e como docente na formação
de novos profissionais Enfermeiros, dentro e fora do âmbito hospitalar, inclusive no
acompanhamento de alunos em estágio nas Unidades de Terapia Intensiva. Nestas
Unidades, percebi que tanto alunos como profissionais Enfermeiros apresentavam
dificuldades em perceber o paciente como um ser humano possuidor de valores,
com suas crenças, seus medos. Isto me permitiu fazer uma profunda reflexão sobre
a atuação do Enfermeiro, bem como visualizar lacunas em sua formação inicial, não
do ponto de vista técnico, mas sim em relação à pessoa humana.
Pude conviver por dez anos, de forma muito próxima, com pessoas
portadoras de problemas renais graves, necessitando realizar tratamentos
substitutivos (diálise ou transplante) para continuarem vivas. Durante extenso e
prolongado contato com pacientes e seus familiares, vivenciei importantes situações
onde o relacionamento interpessoal (enfermeira/paciente/família), a visualização do
paciente na sua integralidade e a humanização foram “ferramentas” indispensáveis
para o cuidado, traduzindo-se em benefício para a melhoria da saúde do doente.
Ao assumir a disciplina semestral de Deontologia e Legislação
Profissional de Enfermagem no Curso de Enfermagem de uma Instituição de Ensino
Superior na cidade de Ponta Grossa, PR; solicitei à coordenadora do curso um
possível desmembramento do conteúdo programático, tendo em vista que muitos
temas eram compatíveis com a Bioética, ou seja, a ética aplicada. Após avaliações,
foram realizadas mudanças. Tanto a disciplina de Bioética em Enfermagem como a
de Ética Profissional ficaram com uma carga horária de 36 horas aula. Nesta última
são abordados temas pertinentes aos aspectos legais do exercício profissional do
Enfermeiro.
15
Durante as aulas, em relação à interação professor-aluno, notei que a
visualização do aluno como um todo; seus valores e limitações, o respeito a sua
individualidade e a valorização de suas vivências, contribuem significativamente
para a aprendizagem. Penso que essa vivência, em âmbito universitário, possa
servir de referencial para uma futura atuação profissional, permeada pelo respeito,
pelas atitudes humanizantes e pela visualização do todo.
Diante dessa trajetória de vida, ficou muito claro que, no desempenho
da prática profissional do Enfermeiro, a humanização da assistência lhe é cobrada,
porém, a sua efetivação ainda é uma conquista a ser realizada. Diante disso,
surgiram alguns questionamentos. Por que os Enfermeiros prestam uma assistência
do cuidado deficitária no aspecto “humanização”? Existe alguma relação desse
comportamento com os aspectos históricos da profissão? Como está sendo
abordado o cuidado interpessoal na formação? O Enfermeiro tem dado devida
importância às relações interpessoais com seus pacientes? Está sendo trabalhada,
na graduação, a visualização do paciente como um ser possuidor de autonomia? De
que maneira essa situação poderia ser melhorada? Seríamos capazes de construir
um mundo mais humano com a ajuda da Bioética?
Senti então a necessidade de buscar novos caminhos para ajudar na
formação do Enfermeiro. Penso que necessário se faz realizar implementações na
graduação que auxiliem a formar um profissional crítico, capaz de refletir sobre seus
atos, bem como perceber e respeitar o paciente com a dignidade que lhe é devida,
visualizando-o como pessoa em toda a sua integralidade.
Afirmar que a formação inicial pretende resolver todos os problemas
na atuação do Enfermeiro é no mínimo pretensiosa, mas tenho clareza de que uma
boa formação
7
na academia contribui para profissionais críticos e reflexivos no
mercado de trabalho, em estreita articulação com a prática profissional desenvolvida
hoje, favorecendo, assim as mudanças humanísticas que se fazem necessárias.
Desta forma considera-se o tema: “Contribuições da Bioética na formação do
profissional Enfermeiro para um cuidado mais humanizado” relevante, tendo em
vista que diante dos progressos científicos e tecnológicos que a humanidade tem
acompanhado nos últimos tempos, urgente se faz que tenhamos profissionais da
área de saúde que visualizem o doente como sujeito e não como objeto. Que
7
Entendo por boa formação, formar o Enfermeiro não tecnicamente competente, mas também possuidor de
valores humanos baseado em uma postura filosófica voltada ao cuidado humanizado.
16
valorizem o doente em detrimento da doença, levando em consideração sua
singularidade, seu momento, seu contexto, sua individualidade.
Desta forma, tomei como objeto de estudo desta pesquisa, o ensino
da Bioética na formação do profissional Enfermeiro procurando investigar (através
de professores e alunos) se este tem contribuído para um cuidado mais
humanizado, tendo em vista a importância, bem como a necessidade que se verifica
no contexto atual, de uma formação do profissional Enfermeiro pautada em valores
humanos.
A minha prática profissional, associada às reflexões provenientes da
Bioética, na qual a dignidade humana e o respeito à vida são altamente valorizados
e onde foi encontrado referencial teórico para postulados que vivenciei enquanto
enfermeira assistencial e formadora; foram os responsáveis por este
questionamento: Estaria o ensino da Bioética na Enfermagem contribuindo na
formação do profissional Enfermeiro para prestar um cuidado mais
humanizado?
As indagações continuaram: De que maneira estaria a preocupação
com o atendimento humanizado presente nos cursos de Enfermagem hoje? Como
isto se expressa no Projeto Político Pedagógico dos cursos? Como se concretiza na
prática?
Tomando como objeto de estudo o ensino da Bioética na formação
do profissional Enfermeiro para um cuidado mais humanizado, recorro a teses,
dissertações, artigos, ao Conselho Nacional de Educação bem como ao Projeto
Pedagógico de Cursos de Graduação em Enfermagem das instituições
selecionadas. Procurei levantar subsídios para a contextualização do referido objeto
realizando um levantamento da temática escolhida.
Entendo que diante dos avanços científicos e tecnológicos na área da
saúde, grandes desafios serão enfrentados pelos indivíduos num futuro próximo,
principalmente os profissionais da saúde, verificando-se, portanto, no momento
atual, a necessidade de orientação do pensar e do agir ético, priorizando a dignidade
humana, a subjetividade e a solidariedade no contexto social.
Essa preocupação para atender as exigências da sociedade,
encontra-se retratada nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação
em Enfermagem, instituídas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) através da
Resolução nº. 3, de 7 de novembro de 2001, cujo art. 4º, trata das competências e
17
habilidades gerais de que devem ser dotados os profissionais Enfermeiros. O inciso I
do referido artigo, intitulado “Atenção à Saúde”, aborda que:
[...] Cada profissional deve assegurar que sua prática seja realizada de
forma integrada e contínua com as demais instâncias do sistema de saúde,
sendo capaz de pensar criticamente, de analisar os problemas da
sociedade e de procurar soluções para os mesmos. Os profissionais devem
realizar seus serviços dentro dos mais altos padrões de qualidade e dos
princípios da ética/bioética, tendo em conta que a responsabilidade da
atenção à saúde não se encerra com o ato técnico, mas sim, com a
resolução do problema de saúde, tanto em nível individual como coletivo
(BRASIL, 2001).
Também se exige do profissional Enfermeiro uma formação de
competências e habilidades específicas que constam no art. 5º da mesma
Resolução, onde destaco:
XIII - assumir o compromisso ético, humanístico e social com o trabalho
multiprofissional em saúde;
XXIII - gerenciar o processo de trabalho em enfermagem com princípios de
Ética e Bioética, com resolutividade tanto em nível individual como coletivo
em todos os âmbitos de atuação profissional (BRASIL, 2001).
Percebo a importância de citar alguns incisos do art. 14, os quais
referem que a estrutura do Curso de Graduação em Enfermagem deverá assegurar:
VI a definição de estratégias pedagógicas que articulem o saber, o saber
fazer e o saber conviver, visando desenvolver o aprender a aprender, o
aprender a ser, o aprender a fazer, o aprender a viver juntos e o aprender a
conhecer que constitui indispensáveis à formação do Enfermeiro;
VIII a valoração das dimensões éticas e humanísticas, desenvolvendo no
aluno e no enfermeiro atitudes e valores orientados para a cidadania e para
a solidariedade (BRASIL, 2001).
Diante do que está posto, pode-se constatar que a Bioética, a
valoração das dimensões éticas e humanísticas, a utilização de estratégias
pedagógicas que articulem os saberes do profissional, entre eles o saber ser e a
aprender a viver juntos, estão presentes nas Diretrizes Curriculares Nacionais.
Na tentativa de contextualizar meu objeto de estudo, lanço também
um olhar sobre os Projetos Didático - Pedagógicos dos Cursos de Enfermagem das
18
Instituições de Ensino Superior “Lâmpada” e “Verde Esmeralda
8
”, da cidade de
Ponta Grossa. O interesse estava em verificar de que forma os Projetos
Pedagógicos abordavam a formação humanizada do profissional Enfermeiro numa
assistência humanizada.
No Projeto Didático-Pedagógico do curso de Enfermagem da
Instituição de Ensino Superior “Lâmpada”, a proposta sinaliza uma ação pedagógica
na assistência de Enfermagem Humanizada, dispondo a formação de um
profissional com uma visão generalista, humanista, crítica, reflexiva e responsável.
Um Enfermeiro, cujas ações sejam pautadas em princípios éticos e bioéticos, não se
encerrando suas ações com o ato técnico, mas sim com a resolução dos problemas
de saúde.
Percorrendo as disciplinas que permeiam a grade curricular,
visualizei, nas disciplinas de Antropologia Filosófica, Psicologia da Educação,
Psicologia Hospitalar, Ética Profissional, Enfermagem em Saúde da Criança e do
Adolescente, Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental e Bioética em Enfermagem,
essa perspectiva do cuidado humanizado bem como da atuação do profissional
pautada em princípios éticos.
Na grade curricular desse projeto encontro a disciplina de Bioética
presente. uma preocupação em formar profissionais, que ao atuarem na
sociedade, sejam possuidores de ações norteadas por princípios éticos e bioéticos,
nos quais os mesmos concorram para uma assistência de Enfermagem
humanizada.
No Projeto Didático-Pedagógico do curso de Enfermagem da
Instituição de Ensino Superior “Verde Esmeralda”, observo a mesma proposição
quanto à formação do Enfermeiro voltado para uma assistência mais humanizada.
Percebo uma ênfase no domínio de conteúdos científicos, técnicos, éticos e
humanistas. Esse Projeto não contempla em sua grade curricular a disciplina de
Bioética, ficando as reflexões pertinentes ao assunto restritas à disciplina de
Fundamentos de Enfermagem I.
8
Nome fantasia atribuído às Instituições de Ensino Superior do Paraná investigadas, salvaguardando a
identidade por princípios éticos. Em Enfermagem, a lâmpada é um símbolo utilizado pela precursora da
enfermagem (Florence Nightingale) e o verde esmeralda é a cor designada pelo Conselho Federal de
Enfermagem para a enfermagem.
19
Nessa disciplina uma abordagem de assuntos pertinentes à
Bioética. No entanto, uma diluição desta ética aplicada. Sua centralidade está na
ética da ação profissional referenciada pelo Código de Ética e pela Lei do Exercício
Profissional.
Não visualizei outras abordagens, na grade curricular, sobre temas
que objetivassem reflexões para uma assistência humanizada do cuidado.
Ao realizar um levantamento das pesquisas elaboradas na área de
interesse, recorro à internet (lilacs, scielo, medline), bem como a bibliotecas e
setores específicos como Comitê de Bioética. Saliento que houve dificuldade na
aquisição de material pela escassez de literatura relativa às temáticas: Enfermagem,
Bioética, formação, humanização.
Diante das minhas indagações, enquanto pesquisadora,
principalmente em relação ao ensino da Bioética levando a uma possível
humanização da assistência, encontrei realidades diversas. Certifiquei que no Peru o
ensino, as discussões dos assuntos relativos à Bioética são uma constante, mais
de uma década nos cursos de Enfermagem. No VI Congresso Mundial de Bioética
(2002) foi lançado um CD Room: El CD Room para la enseñanza de la Bioética, com
intuito de auxiliar o ensino. Encontrei na Asociación Peruana de Facultades y
Escuelas de Enfermaría um artigo intitulado Enfermería: formación ética para las
vidas (1999), que aborda os fundamentos de uma proposta pedagógica para a
formação ética e bioética das futuras Enfermeiras e Enfermeiros do Peru, que são
resumidos como uma ética para a vida.
Atravessando o oceano, pude perceber que, além do Peru, também
Portugal possui em suas faculdades o ensino da Bioética, como se pode confirmar
no artigo O Ensino da Bioética nas faculdades de Medicina Portuguesas (SILVA,
2003), que apresenta a gênese do ensino da bioética nas faculdades de medicina
daquele país. Dá-se particular relevo aos estudos de humanização em medicina,
iniciados há duas décadas.
no Brasil, encontrei ensaios dessas reflexões em cursos de
Instituições de Ensino Superior como Medicina e Enfermagem, como também em
Escolas de nível secundário. No levantamento realizado, a distribuição geográfica
aponta para locais onde essas reflexões aconteciam há mais tempo, como em Porto
Alegre, Brasília, São Paulo e Londrina. Mais precisamente nos cursos de
Enfermagem, as discussões referentes à temática Bioética, estão em fase
20
embrionária, porém, o importante é que esse novo olhar permeia algumas
instituições. A humanização na formação do profissional Enfermeiro ainda é algo a
ser conquistado, como se verificou no artigo intitulado Humanização do atendimento
em saúde: conhecimento veiculado na literatura brasileira de Enfermagem
(CASATE; CORRÊA, 2005). É um estudo qualitativo que analisa a produção
científica sobre “Humanização em saúde /Enfermagem”, compreendendo quais as
concepções sobre a humanização vêm se configurando. Neste estudo foi realizado
um levantamento bibliográfico de 42 artigos de 1950 até 2002 cujo resultado foi de
que a temática é pouco abordada na formação. Diante desse contexto, motivei-me
para dar andamento a esta pesquisa podendo contribuir para diminuir esta lacuna
que se faz presente na formação do profissional Enfermeiro.
Na contextualização do objeto de estudo, saliento que me deparei
com pesquisas que abordam o tema de Bioética sem alusão à humanização, ou
seja, sem uma preocupação com a mesma. Como exemplo, cito a Tese A bioética e
sua presença na educação para a saúde (FIGUEROA, 1998), em que a autora
procura valorizar a importância de condutas profissionais que favoreçam a prática da
bioética nas ações educativas, especialmente o respeito pela livre vontade do
usuário, porém, não faz referência à humanização e tão pouco à discussão da
temática Bioética na formação do profissional.
Entretanto, apesar de não abordar a relação da Bioética no viés da
humanização, encontrei um importante avanço no artigo: A relação Ética e trabalho
em saúde no processo de formação do Enfermeiro, em que a autora faz alusão ao
ensino da ética/bioética na graduação de Enfermagem, considerando a necessária
articulação dos conteúdos e referenciais norteadores da reflexão ética/bioética com
as experiências práticas de ensino.
No artigo Como conciliar humanização e tecnologia na formação de
enfermeiras/os (MEYER, 2002), a autora discute a incorporação do tema da
humanização do cuidado no contexto da Enfermagem brasileira, sem, contudo, fazer
alusão à Bioética.
Pude constatar em Tealdi, 1993, no seu artigo: Enseñar la bioética
como nuevo paradgima a los profesionales de la salud, outro avanço. Essa pesquisa
aborda a necessidade de ensinar a Bioética na formação dos profissionais de saúde,
o que poderia ajudar, segundo a autora, em um verdadeiro estado de consciência
21
dos princípios bioéticos, em uma melhor e muito mais humana e solidária atenção
aos pacientes nos centros de saúde assim como a seus familiares.
A mesma visualização percebi no artigo Bioética em la educación
para la salud: componentes essenciales em enfermería (MASALAN, 2002), em que
a autora destaca a necessidade de valorizar a Bioética no contexto da educação
para a saúde, considerando os componentes essenciais para a Enfermagem na
tarefa de humanizar a atenção na saúde.
No trabalho realizado por Gomes (1996) o autor vê a necessidade de
que se inicie uma formação ética do profissional da área nas disciplinas básicas. Um
curso teórico de introdução à bioética, a ética aplicada ao ambiente do ensino e
relativa ao respeito ao cadáver, aos mestres, animais de experiência e até à postura
acadêmica.
Observei também que na maioria dos cursos de graduação em
Enfermagem, o conteúdo da disciplina de Ética Profissional se restringe à
deontologia (estudo de deveres), não atendendo a um dos objetivos primordiais da
educação que é o desenvolvimento de comportamento moral nos alunos. O
comportamento moral é movido por valores interiores da pessoa, não pelo
conhecimento da norma e/ou o medo à punição advinda dos processos éticos. Em
relação a este prisma, pude notar um avanço.
Diante das leituras efetuadas, percebo que uma tendência em
substituição da ética deontológica pela Bioética vislumbrando um novo horizonte no
cuidado.
Em relação à importância do ensino da Bioética, Pessini;
Barchifontaine (1997), salientou que se torna urgente introduzir nos currículos de
formação dos profissionais da saúde a disciplina de Bioética. Selli (2002)
ressaltou que não é mais possível desconsiderar a Bioética nas ciências biomédicas,
principalmente, na Enfermagem. Neves (1996) diz que a Bioética designa uma nova
disciplina, que recorre às ciências biológicas para melhorar a qualidade de vida do
ser humano, permitindo ao homem participar desse processo.
Neste breve levantamento dos estudos pertinentes a essa questão,
verifiquei que há determinados avanços nos quais o ensino da Bioética é uma
constante décadas. Algumas pesquisas relatam a Bioética na formação, sem
relacionar com a humanização. Outras abordam a humanização fora do contexto da
Bioética. Outras ainda vêem a importância de se ter a Bioética na formação, com
22
alusão à humanização da assistência, colocando que esta é “como uma seiva” no
Curso de Enfermagem. Por seu turno, os trabalhos que relacionam Bioética
formação humanização não abordam necessariamente a Bioética enquanto
disciplina, e se alguns o fazem, não abarcam esta relação da Bioética na formação
do profissional Enfermeiro objetivando a humanização.
Assim sendo, meu questionamento sobre a contribuição da Bioética
na formação do profissional Enfermeiro para prestar uma assistência mais
humanizada persistiu. Nessa perspectiva, os trabalhos não avançam, daí
reafirmando novamente a importância deste estudo.
Tendo como objetivo geral analisar a contribuição da Bioética para a
formação do profissional Enfermeiro em um cuidado humanizado, e como objetivos
específicos: analisar, a partir da ótica dos alunos do curso de Enfermagem, a
contribuição da Bioética na formação do profissional Enfermeiro em um cuidado
mais humanizado e verificar, a partir da ótica dos profissionais Enfermeiros, a
concepção de cuidado humanizado e sua concretização na prática; esse estudo
focaliza a Bioética no curso de Enfermagem para uma assistência humanizada.
Diante da dicotomia entre o desenvolvimento técnico-científico e a
despersonalização, desvalorização do homem como pessoa, lancei um olhar ao
docente Enfermeiro e para o acadêmico de Enfermagem, verificando neste processo
de formação a contribuição da Bioética em Enfermagem no que se refere à
realização de um cuidado humanizado, fornecido ao paciente pelo profissional em
questão.
Partindo do pressuposto que o conhecimento científico faz uso de
metodologias para captar a realidade, optei pelo método histórico-dialético, numa
abordagem qualitativa. Sendo, professores e alunos, sujeitos historicamente
constituídos, inseridos num contexto social, importante se faz o estabelecimento de
um enfoque metodológico que se relacione à necessidade de obter uma
aproximação com sujeitos que desvelem a essência de suas vivências e
experiências, possibilitando a captura das perspectivas dos participantes, buscando
entendê-los numa totalidade concreta. Gadotti (2003, p. 25) vem em meu auxílio
dizendo que: “o pressuposto básico da dialética é que o sentido das coisas não está
na consideração de sua individualidade, mas na sua totalidade, em que tudo tem
que ver com tudo, nada é isolado”.
23
Este trabalho compõe-se de cinco capítulos. No primeiro encontram-
se os aspectos históricos da profissão de Enfermagem, considerando que essa
prática social é historicamente constituída e que a formação deste profissional
possui repercussões que atravessam o tempo e eclodem na atualidade. Focalizando
o sistema econômico capitalista e seus reflexos na história da Enfermagem e no
momento atual, esse capítulo apresenta também a trajetória do ensino de
Enfermagem, trazendo ao leitor uma visualização dos obstáculos percorridos, o
progresso realizado, e os desafios hoje ainda presentes na formação deste
profissional.
O segundo capítulo faz alusão à Bioética como ética aplicada e sua
relação com o cuidado na saúde. Essa conceituação remete a discussões sobre a
humanização na sociedade e o ensino nas áreas de saúde. Tais discussões, em
geral, foram permeadas com o modelo biomédico de educação instalado, com a
tecnociência e tecnologia no mundo e com os dilemas éticos enfrentados pelo
mundo atual.
Compõe o terceiro capítulo o caminho metodológico percorrido para
aquisição do conhecimento gerado. Utilizo como metodologia o método histórico-
dialético, numa abordagem qualitativa. Faço menção à cnica de coleta de dados
selecionada, o Grupo Focal, onde a entrevista e a observação encontram-se
inseridas, como instrumentos privilegiados para a consecução da técnica. Pela sua
natureza qualitativa, esta técnica está sendo largamente utilizada no campo da
Saúde quando se tem como objetivo obter informações de como as pessoas
pensam, sentem ou agem em relação a determinado tópico. Ao realizar Grupo Focal
de alunos e professoras do curso de Enfermagem, pude obter respostas pertinentes
às minhas indagações como também se desvelaram horizontes nunca antes
vislumbrados.
Estão contidas no quarto e quinto capítulos as análises dos dados
obtidos nesta pesquisa, onde realizei inferências pertinentes aos objetivos traçados.
A contribuição dos sujeitos da pesquisa, acadêmicos e docentes, foi de suma
importância. Para análise dos dados me apoiei em Bardin, na Análise do Conteúdo.
Definida esta como um conjunto de técnicas de análise de comunicações, com o
objetivo de obter indicadores que permitam a inferência de conhecimentos relativos
às condições de produção/recepção destas mensagens (BARDIN, 1977).
24
À guisa de conclusão, levantei alguns pontos que me permitem
ampliar a compreensão do objeto de estudo, bem como apontar caminhos para
outros trabalhos que podem vir a ser objeto de futuras pesquisas.
25
CAPÍTULO I
HISTÓRIA DA ENFERMAGEM, DO SEU ENSINO E SUA RELAÇÃO COM A
PRÁTICA SOCIAL
“A história da Enfermagem ocorre paralela à própria história da profissão, sofrendo
influências dos princípios que fundamentam seus marcos conceituais, dos objetivos que
sustentam ou embasam a criação de suas várias entidades, enfim, das próprias lutas
ideológicas que se travam a partir de diferentes concepções de mundo presentes na sociedade
e que repercutem na prática profissional das enfermeiras”.
Enfermeira Raimunda Medeiros Germano
26
1.1 HISTÓRIA DA ENFERMAGEM E DO SEU ENSINO NO MUNDO E A
PARTICIPAÇÃO DE FLORENCE NIGHTINGALE
Para melhor entender o papel do Enfermeiro necessita-se ter
compreensão da Enfermagem como prática social historicamente determinada. As
práticas de saúde, bem como a educação, não se dão de forma isolada. Encontram-
se num contexto mais amplo, no qual as relações sociais e políticas são fatores
determinantes, exercendo repercussões diretas sobre a Enfermagem. Daí a
importância de focar o olhar nos aspectos históricos e em sua evolução.
Conhecendo o ontem poderemos entender melhor o hoje e assim construir o
amanhã.
De acordo com Figueiredo:
A enfermagem é uma profissão de amplas atividades e abordagens, não
podendo ser entendida apenas pela virtude da técnica, mas sim da prática
científica, social, política, econômica, estética e ética que culmina numa arte
de cuidar (FIGUEIREDO, 2005, p. 2).
Ela vem se desenvolvendo através dos séculos e notadamente é
possuidora de características tais como arte, ciência e ideal. Na arte, dão-se ênfase
à estética, à intuição e à criatividade. Enquanto ciência, a experiência, a observação
e a validação tornam-se os pilares básicos para a Enfermagem. O ideal da profissão,
no dizer de Paschoal, Mantovani e Polak (2002, p. 7): “é a sua valorização, que
imprime respeito, o orgulho e a dignidade daqueles que a praticam”.
Possui ligação intrínseca com o cuidado. A necessidade de cuidado
advém, na maioria das vezes, de situações em que a saúde sofreu abalos, cedendo
lugar à doença. Esta, por sua vez, sempre esteve associada ao homem desde a vida
sobre a terra, em suas tentativas de lidar com ela da melhor forma que conhecia. A
doença era temida e suas conseqüências percebidas no desenvolvimento dos
grupos, quer pela mortalidade quer pela incapacidade para a luta na conquista de
territórios.
Nos primórdios, o espírito de servidão, entendido como inclinação
natural de doação e auxílio ao próximo, conduzia o trabalho da Enfermeira. Somente
mais tarde, com a aquisição do conhecimento científico, a profissão ganha o status
27
de ciência. Ciência esta que, agregada à arte do cuidado ao ser humano, tem
atraído muitos, que encontram nela motivo de realização pessoal.
Para se poder compreender a atuação da Enfermagem na sociedade
moderna, mister se faz conhecer a história da civilização, a luta pelo combate da
doença e relação desses fatores com a evolução da Enfermagem.
Têm-se na Enfermagem os modelos religioso, vocacional e
profissional, sendo que no capitalismo o modelo religioso é substituído pelo
vocacional. Nesse pensar, Almeida e Rocha contribuem dizendo:
O modelo religioso de enfermagem emerge no mundo cristão, atravessa a
Idade Média e vai se defrontar com o século XIX, e com a ascensão da
burguesia e sua instalação como classe social dominante, que dará o
significado de arte ou vocação à prática de enfermagem, para tornar
possível o treinamento de alguns agentes. Portanto, no capitalismo o
modelo religioso é substituído pelo vocacional (ALMEIDA; ROCHA, 1989, p.
45).
A Enfermagem ganhou o status de profissão somente no século XIX,
sendo até então constituída por uma prática rudimentar desestruturada. Suas
origens revelam que, inicialmente, as mães foram as primeiras Enfermeiras da
família. Os povos primitivos atribuíam a responsabilidade aos espíritos e as forças
sobrenaturais para tudo aquilo que não conseguiam explicar. Isso incluía as
doenças. Para eles, a doença era um castigo de Deus, e os espíritos diabólicos os
responsáveis por trazerem conseqüências maléficas para o corpo. Portanto, para
combatê-las recorriam aos sacerdotes ou feiticeiros, que, por sua vez, preparavam
fórmulas mágicas e remédios caseiros, assumindo as funções de Médico,
Farmacêutico e Enfermeiro. Tais serviços não eram sistematizados, mas sim,
realizados de forma empírica e intuitiva.
A história revela que, em seus primórdios, a Enfermagem e a
Medicina estavam extremamente ligadas ao Cristianismo, que via os pobres e
enfermos como objetos de benevolência. Relação esta que se perpetua até hoje,
com manifestações na prática social da Enfermagem.
Os que atuavam nessa profissão eram pessoas ligadas à Igreja que
procuravam salvar sua alma, salvando assim a alma do doente através do cuidado.
A Enfermeira, na pessoa da religiosa, executava o cuidado mediado pelo modelo
religioso (ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 37).
28
De acordo com Paixão (1979, p. 35), a influência da Igreja se fez
presente na saúde nos culos IV e V: “grande número de bispos tinham
conhecimento de medicina, o que os colocava duplamente em condições de
organizar e orientar a assistência [...] período de grande florescimento de hospitais”.
Com o advento do cristianismo, os princípios de fraternidade, amor ao próximo e
doação foram difundidos pela Igreja, trazendo repercussão para a Enfermagem
como se verificará adiante.
O advento dos mosteiros
9
incentivou a criação dos conventos
femininos sob direção das abadessas que, além de tarefas cotidianas, exerceram
influência no progresso dos hospitais e nos cuidados dispensados aos doentes. Os
monges e monjas da Idade Média tornaram-se os Enfermeiros da sociedade
ocidental.
No século XIII, a degradação moral, a corrupção dos costumes e a
decadência da fé suscitaram no coração de Francisco de Assis uma mudança
radical de vida, levando-o a desapegar-se de todo bem material e viver na pobreza,
sob a misericórdia divina. São Francisco de Assis fundou as ordens religiosas
masculina e feminina, sendo que esta última destinava atenção especial aos
doentes, fornecendo-lhes medicamentos e realizando curativos.
Observei que, no decorrer da história, muitos nomes surgiram com
atividade voltada para o auxílio dos pobres e doentes. Dentre eles, Santa Isabel de
Hungria e Santa Catarina de Siena que pertenciam à nobreza, sendo esta última de
grande expressão na profissão. Segundo Paixão (1979, p. 43): “seu nome deve ser
guardado pelas Enfermeiras como uma das mais perfeitas realizadoras de seu
ideal”.
Ao vislumbrar a história da humanidade percebi as influências que o
gênero, a religião e os aspectos sócio-econômicos exerceram na formação da
Enfermeira, sendo o espírito de abnegação e de servidão fator relevante que não
pode deixar de ser salientado na compreensão da trajetória da Enfermagem.
A influência religiosa também se fez presente dentro da Medicina
quando, na Idade Média, surgiram as primeiras Universidades na área, nas quais o
ensino era exclusivamente exercido por Ordens Religiosas e pelo clero (PAIXÃO,
1979).
9
Pequenos núcleos de homens virtuosos que se reuniam para estimular a viver o cristianismo na sua perfeição,
estabelecidos, porém, em regiões desertas. (PAIXÃO, 1979, p. 36)
29
Concomitantemente com a Igreja, as transformações econômicas e
políticas também tiveram expressiva influência na Enfermagem. De acordo com
Medeiros e Tavares (1997), com a queda da sociedade feudal, a filosofia religiosa
deixou de atender os ideais da nova sociedade. Com a aceitação do lucro e da
riqueza, ou seja, com o advento do capitalismo, e as conseqüentes perdas de
domínio e poder por parte da Igreja, os princípios religiosos foram abandonados.
Essa transformação se fez refletir na Enfermagem, pois mesmo com
o progresso da Medicina e o surgimento dos hospitais, estes passaram, a partir do
séc. XIII, a ter em seu interior pessoas não religiosas (os seculares). O fato da
expulsão dos religiosos dos hospitais trouxe para a Enfermagem um período crítico.
A Enfermagem, ora exercida com exclusividade pela Igreja, sofreu repercussão
imediata em sua prática no momento em que a Igreja foi abalada em seus alicerces,
com a queda do fervor e espírito cristão. Com o fechamento dos monastérios e
abadias, a assistência gratuita fornecida se extinguiu. Os poucos hospitais que
permaneceram com suas portas abertas representavam verdadeiros depósitos. Para
que os doentes não ficassem sem assistência, foi necessário o recrutamento de
pessoas que ocupassem o espaço deixado pelas religiosas. Devido à baixa
remuneração e desorganização, quem se apresentava para assumir essa função
eram aqueles de condição social baixa e de valores morais a desejar. Nessa época,
serviços de Enfermagem passaram a ser executados por mulheres sem qualificação
moral que não conseguiam emprego nas indústrias. Executavam trabalhos variados,
entre eles o cuidado ao doente, em troca de salários baixos (SILVA, 1989). O tipo
comum da Enfermeira era da bada, desordeira, mulher de vida. Muitos
doentes preferiam morrer nas suas casas. Paixão reafirma esse fato, quando nos diz
que, nessas condições, os doentes mais pobres, enquanto tivessem alguém para
cuidar deles em suas próprias casas, mesmo mal alimentados e desprovidos de
conforto, recusavam-se a ir para um hospital (PAIXÃO, 1979).
Essas pretensas Enfermeiras deixavam os doentes morrerem
abandonados e, além disso, ainda extorquiam gorjetas. Carlos Dikens retrata esse
tipo de “enfermeira” ignorante e sem ideal em seu livro “Martin Chuzzlewit” (PAIXÃO,
1979).
Como conseqüência, a imagem do trabalho da Enfermagem passa a
ser refletido na sociedade como uma função de pouco valor, menosprezado,
desempenhado por mulheres de categoria inferior (MEDEIROS; TAVARES, 1997).
30
A queda da qualidade e quantidade de pessoas que atendiam os
doentes suscitou uma reforma religiosa. Surgem os nomes de Lutero (Alemanha) e
Calvino (Suíça) que avançam nessa reforma, tendo como objetivo a separação da
Igreja de Roma.
Diante desse cenário e para tomar as providências para a reforma
dos costumes, formou-se o Concílio de Trento (1545-1563), onde a questão da
assistência também recebeu especial atenção. Foram elaboradas recomendações
aos bispos para a organização, manutenção e fiscalização dos serviços hospitalares,
dando assim continuidade à atuação da Igreja sobre os enfermos e seu cuidado,
favorecendo o surgimento de numerosas organizações religiosas dedicadas à
Enfermagem. É nesta data, séc. XVI, que surge o Camilo de Lellis,
10
cujo nome é
lembrado na Enfermagem contemporânea pelo auxílio espiritual e profissional que
dispensava aos doentes.
No séc. XVII na França, São Vicente de Paulo destaca-se pela sua
dedicação aos pobres e doentes com obras planejadas e adiantadas para a época,
(PAIXÃO, 1979). Foi fundador de instituições de caridade, entre elas: O Instituto das
Filhas da Caridade, que elevaram a Enfermagem a níveis jamais alcançados
anteriormente. São Vicente de Paulo estabeleceu dois pontos de imenso valor: a
liberdade de ação de suas filhas e a instrução que lhes era dada. Deviam saber ler e
escrever, além de aprenderem os rudimentos da arte da Enfermagem. Além disso,
essas instituições possuíam um programa de ética em relação a atitudes com
médicos e doentes. Para os esclarecimentos científicos, São Vicente recorreu ao
auxílio dos médicos.
Essa iniciativa católica teve repercussão em Paris, na Irlanda, na
Austrália, etc. Em 1836, em Kaiserwerth, na Alemanha, o pastor luterano Theodor
Fliedner e sua esposa Frederika fundam o Instituto das Diaconisas (FONSECA,
2002). Essas congregações religiosas e institutos eram os únicos locais onde se
dava preparo moral à Enfermeira e uma relativa formação científica e técnica.
Porém, apesar da inexigência dos votos de suas seguidoras, possuíam um número
reduzido de pessoas treinadas para oferecer atendimento aos doentes (PAIXÃO,
1979).
10
Fundador da Ordem hospitaleira dos Camilianos. Canonizado em 1746. Padroeiro (desde 1930) dos
enfermeiros e enfermeiras (ENCICLOPÉDIA LAROUSSE CULTURAL, 1998, p. 1086).
31
A Enfermagem estruturou-se como profissão num determinado
momento histórico e numa sociedade determinada. A Enfermagem Moderna
11
, ou
profissional, tem origem na Inglaterra, na segunda metade do século XIX, período
em que esta passava por um processo de desenvolvimento econômico-capitalista
conhecido como Revolução Industrial.
Com o capitalismo, o corpo passa a ser expressão máxima,
considerado como força de trabalho. Todavia as condições precárias de saúde da
classe trabalhadora da Inglaterra e a pesada jornada de trabalho imposta
repercutiram na saúde do trabalhador, constituindo ameaça à produção. Diante
desse fato, o governo passa a preocupar-se com a saúde da população, garantindo
condições para que a produção e o lucro se tornassem efetivos (MEDEIROS;
TAVARES, 1997). Nesse pensamento cito Almeida e Rocha que dizem:
A Medicina do capital comanda esta tarefa e para melhor desempenhá-la
utiliza-se do Hospital, transformado agora no principal instrumento de
recuperação da saúde. Nele destaca-se a importância do trabalho de
Enfermagem para a realização dos objetivos da Medicina do capital
(ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 11).
Torna-se então necessário treinar o pessoal de Enfermagem para
atendimento hospitalar, espaço este, destinado à recuperação da saúde, objetivando
a continuidade do plano social-econômico em expansão, bem como disciplinar a
conduta da Enfermeira, a fim de diminuir os efeitos negativos do hospital, regulando
assim o modo de vida segundo o capitalismo.
Na origem da Enfermagem moderna, a preocupação não recai sobre
os instrumentos de trabalho que permitirão prestar o cuidado, mas sim, sobre o
disciplinamento. Este se tornará o responsável pela sistematização das técnicas de
Enfermagem. O saber da Enfermagem é delineado em relação ao que rodeia o
paciente, como o ambiente, a ventilação, a limpeza, etc. (ALMEIDA; ROCHA, 1989,
p. 48).
Importante citar que nessa época, o trabalho de Enfermagem é
comandado pela técnica disciplinar, dentro de uma hierarquia de poder, com o
objetivo de auxiliar o trabalho do médico. Desse modo, o espaço hospitalar passa a
ser visto como um local adequado para a cura dos doentes.
11
O termo “Enfermagem Moderna” refere-se ao ensino de enfermagem sistematizado, com base em princípios
científicos, iniciado por Florence Nightingale no século XIX (RIZZOTTO, 1999, p. 1).
32
Nesse cenário surge Florence Nightingale. Filha de família abastada
inglesa, nascida em Florença (Itália) em 1820. Possuía cultura e idéias incomuns
para sua época. Conhecia o grego e o latim, além de falar diversas línguas. Estudou
artes, matemática, filosofia, história, política e economia. Considerada precursora da
Enfermagem Moderna, foi responsável pela sua institucionalização e pela divisão
técnica em seu interior. Meyer (1995, p. 69) afirma que a institucionalização da
Enfermagem, significou, basicamente, disciplinar a conduta do pessoal hospitalar e o
ambiente do doente”.
Em Waldow (1995, p. 48), encontramos que “a enfermagem foi
entendida por Nightingale como uma arte e uma ciência que requer uma educação
formal, organizada e científica”. Nightingale, através de suas experiências, foi levada
a acreditar que a Enfermagem necessitava de treinamento, pois o bastavam a
inteligência e a intuição feminina, como era a convicção daquela época (LIRA;
BONFIM, 1898, p. 8). Leopardi contribui com essa afirmação, dizendo:
A questão teórica na profissão nasce com Florence Nightingale, quando ela
apresenta suas reflexões e diz que a natureza da Enfermagem é diferente
da medicina e que, portanto, é necessário estudar e estruturar as maneiras
de fortalecer nos indivíduos suas potencialidades naturais para que, por sua
própria força, se opere a cura. Com esta preposição, ela afirma a
importância de um trabalho dirigido por conhecimentos gerais e específicos
que toda enfermeira deve ter (LEOPARDI, 1999, p. 8).
Como nos diz Paixão (1979, p. 67), “seus dotes eram excepcionais,
sua visão muito larga, encarando o problema com horizontes mais amplos e o
preparo de enfermeiras em bases mais científicas”. Tinha bondade extrema,
capacidade de trabalho, organização invejável, observação afinada e espírito crítico.
Preocupada com as péssimas condições de assistência dos hospitais
ingleses, visitou instituições de saúde da Europa, tais como Alemanha, Áustria e
Itália. Viagens estas que permitiram a ela visualizar como era a Enfermagem
exercida nesses locais, fornecendo assim subsídios para melhorias no setor. Deram-
lhe também experiências, que foram úteis por toda sua vida, conforme relatado em
uma de suas obras, Notas sobre Enfermagem. (NIGHTINGALE, 1859).
Nessa obra, Nightingale salienta a importância do meio ambiente
(ventilação, luz, calor, dieta, silêncio, condições sanitárias), do repouso e da higiene
na recuperação da saúde, bem como a importância que as atividades de
Enfermagem exercem sobre o binômio saúde-doença. O que se verifica é que
33
Nightingale dava ênfase às cores, às flores, às crianças e animais como valor
terapêutico. A sua visualização envolve a totalidade, onde a soma das partes possui
o caráter de resolutividade em se tratando de doença.
Fonseca (2002), ao realizar uma leitura genereificada (relativo a
gênero) da obra de Florence Nightingale, Notas de Enfermagem, faz alusão a essa
tarefa no mundo dos negócios, reformando hospitais militares de campanha,
administração sanitária do exército, participando também de elaboração de políticas
internas e externas. A mesma autora relata que esta obra de Nightingale foi escrita
com o propósito de reforçar os papéis femininos, muito valorizados no século, que
constituiu a base histórica para a consolidação do capitalismo, nos quais o trabalho
das mulheres, de produção e de reprodução da força de trabalho, constituía a base
material.
Desde a infância, Nightingale demonstrava interesse pelos enfermos,
o que a fez querer trabalhar no hospital aos 24 anos. Porém, sua mãe a proibiu
devido à situação vigente nesses estabelecimentos de saúde ingleses, onde dois
grupos de pessoas atendiam aos doentes: um formado por religiosas católicas e
anglicanas e outro de pessoas sem educação e sem moral, geralmente prostitutas,
com grande índice de embriaguez (PAIXÃO, 1979). Essa resistência de sua família
fundamenta-se quando se toma conhecimento do ambiente dos hospitais do culo
XIX: malcheirosos, asquerosos e superlotados (LIRA; BOMBIM, 1989).
Em 1851, com 31 anos, Nightingale conseguiu autorização para
realizar estágio de três meses em Kaiserwerth, na Alemanha, que possuía 100 leitos
hospitalares e um serviço reconhecido pela moralidade.
Nessa Instituição, Nightingale percebeu a necessidade de estender
às muitas jovens, o benefício daquela formação, bem como a de ampliar o quadro
de pessoal no atendimento aos doentes.
De 1854 a 1856, com a guerra da Criméia, conflito este de russos e
franceses contra os ingleses, Nigtingale, sabendo que aos soldados feridos ingleses
faltavam cuidados de Enfermagem, ofereceu ao Ministro da Guerra seu serviço.
Juntamente com 38 voluntárias dirigiu-se à Base Militar de Scutari, no Estreito de
Bósforo, com o objetivo de reorganizar os Hospitais Militares, lotados com 4.000
feridos (Fonseca, 2002). Pela sua tenacidade, destacou-se na administração desses
hospitais de guerra e na humanização da assistência aos soldados. Introduziu
equipamentos de banho, água corrente, serviços de lavanderia, cozinha, laboratório,
34
aquisição de roupas, suprimento de medicamentos, material de recreação, um
programa de reserva de material, bem como, assistência para familiares dos
soldados. Com a ajuda das esposas dos soldados montou um quadro de pessoal
para a lavanderia. Com as reformas empreendidas, viu a mortalidade baixar de 42%
para 2%, no espaço de seis meses. Essa experiência tornou Nightingale convicta de
que a Enfermagem requer treinamento bem planejado (LIRA; BOMFIM, 1989).
Não bastando o cuidado diurno, Nightingale ainda reunia forças para
dar atendimento aos doentes no período noturno, com auxílio de uma lâmpada, o
que a faz conhecida até os dias atuais como a “Dama da Lâmpada”.
Permaneceu nesse local até o fim da guerra. Retornando ao seu
país, recebeu do governo inglês e do povo um prêmio de 40 mil libras, com o qual
pode atingir seu objetivo, de fundar em 9 de julho de 1860, a primeira escola de
enfermeiras. Ficava no St. Thomas Hospital e era voltada para o ensino de alunas
nas práticas de Enfermagem relativas à atividade hospitalar e visitas domiciliares
(MEDEIROS; TAVARES, 1997).
Importante relembrar que na metade do século XIX, o trabalho na
Enfermagem era realizado por mulheres de vida, desordeiras e badas,
exigindo de Nightingale grande esforço para transpor obstáculos. No entanto,
suscitou a grande reforma sócio-político-sanitária, deflagrada primeiramente em seu
país e posteriormente pelo mundo afora (WALDOW, 1995).
Ao fundar a escola de Enfermagem, Nightingale preconizou como
requisitos essenciais, para a admissão das alunas, um mínimo de condições
educacionais e um máximo de elevação moral. O ingresso nessa instituição era
rigoroso: entre mil a duas mil candidatas anuais, somente quinze a trinta estudantes
eram selecionadas. Permaneciam as estudantes, como internas, em alojamentos do
hospital, por três anos. Lira e Bomfim relatam atividades realizadas pelas alunas.
As aulas diárias eram acompanhadas por estágios práticos onde realizavam
curativos, extração de estilhaços, arrumação de camas, medicação contra
dores, auxílio às cirurgias, limpeza das enfermarias, além de adquirir
conhecimento sobre técnicas (LIRA; BOMFIM, 1898, p. 9).
Nightingale possuía a ambição de reformar a Enfermagem em sua
pátria e no mundo inteiro, por meio de novas e numerosas escolas. Essa sua
ambição foi criando vulto com o ingresso de jovens educadas, cultas e de elevada
posição social. Cuidava Nightingale da seleção das candidatas, fazendo com que a
35
Enfermagem se tornasse uma profissão honrosa. Nota-se que as bases da reforma
dessa profissão assentaram-se sobre o controle da moral. Esses aspectos fazem de
Nightingale, pioneira e renovadora da Enfermagem, elevando a categoria e
preparando as enfermeiras com bases mais científicas.
Alguns dos pontos essenciais na concepção de educação de
Enfermeiras, estabelecidas por Nightingale foram:
1º) Direção da escola por uma enfermeira, e não por médicos, como se
fizera até então nos pequenos e raros cursos dados nos hospitais.
2º) Mais ensino metódico, em vez de apenas ocasional, através da prática.
3º) Seleção das candidatas sob o ponto de vista físico, moral, intelectual e
de aptidão profissional (PAIXÃO, 1979, p. 73).
O curso de Enfermagem tinha duração de três a quatro anos. Nele se
formavam duas classes de profissionais: as nurses e as lady nurses.
A contribuição de Nightingale para o desenvolvimento da
Enfermagem constitui-se fato inegável. Porém, provavelmente pelo reflexo da
Revolução Industrial, responsabiliza-se a mesma pela divisão técnica da atividade
profissional, através das funções exercidas pelas nurses e a lady nurse. Aquelas
pertencentes à classe social inferior, “recebiam formação gratuita, moravam no
hospital e dedicavam-se integralmente a ele, recebendo salários” (MEYER, 1995, p.
70). O trabalho era assistencial, manual, ou seja, exerciam o cuidado de forma direta
aos pacientes. as lady nurses, de classe social mais elevada, custeavam seu
próprio estudo, moravam na escola, detentoras de saber técnico mais aprofundado.
Realizavam supervisão das atividades exercidas pelas nurses, além das atividades
de ensino, ou seja, um trabalho intelectual. Ninghtingale “incorporou os parâmetros
capitalistas de racionalidade e eficiência na forma de divisão do trabalho,
reproduzindo, no interior dos hospitais e da equipe de Enfermagem, a divisão social
do trabalho” (RIZZOTTO, 1999, p. 29). Almeida e Rocha também fazem comentários
a respeito dessa fragmentação dizendo:
Internamente reproduz a divisão social das classes através da divisão
técnica do trabalho que separa as atividades gerenciais daquelas dirigidas
ao cuidado direto, marca que caracterizará a enfermagem no seu
desenvolvimento futuro: a instituição de relações de
dominação/subordinação entre seus agentes (ALMEIDA; ROCHA, 1989, p.
11).
36
Nesse pensamento, Meyer intervém dizendo que dessa forma,
legitimou-se a hierarquia e a disciplina no trabalho de Enfermagem e materializaram-
se as relações de dominação, reproduzindo-se na profissão não as relações de
gênero vigentes, mas também as relações de classe (MEYER, 1995, p. 70).
Silva (1989) salienta que o trabalho das lady nurses era valorizado
socialmente, pois detinham o saber da Enfermagem. Em contrapartida, as atividades
realizadas pelas nurseso eram reconhecidas, mas sim desprestigiadas.
Transportando para a atualidade, tem-se no lugar das nurses, as
Auxiliares e Técnicas de Enfermagem. Ocupando o lugar das lady nurses
encontramos os Enfermeiros, que exercem atividades de supervisão, de
administração da assistência, de ensino e de pesquisa.
Importante salientar que as lady nurses foram as responsáveis pela
propagação da Enfermagem pelo mundo, através da difusão do sistema
nightingaleano.
A Inglaterra, além de ter sido o berço da Enfermagem moderna,
ainda o foi na organização da classe, cujas enfermeiras se opuseram aos médicos e
administradores hospitalares, que não aceitavam essa liberdade profissional. Diga-
se de passagem, que as lutas entre a classe dos Enfermeiros e dos médicos
persistem na atualidade, em que a Enfermagem, enquanto profissão liberal
detentora de autonomia que lhe é conferida legalmente, ainda luta por seu espaço
de atuação.
Na Inglaterra, a Sra. Bedford Fenwik funda a Associação Inglesa de
Enfermeiras (1887), o Conselho Internacional de Enfermeiras e o Britain Journal of
Nursing.
A difusão do Sistema Nightingale, sistema de ensino voltado para a
capacitação e melhoria do atendimento de Enfermagem, estendeu-se por toda a
Inglaterra e pelos Estados Unidos, de onde se propagou para Áustria, países
escandinavos, Dinamarca, Suécia, Noruega, Finlândia, Holanda, Bélgica, Suíça,
Grécia, Portugal, Espanha, Ásia e África, China, Índia, Irã, Israel, Ásia, Síria,
Oceania, Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, México, Uruguai, Venezuela
e Brasil (PAIXÃO, 1979). Enfim, para o mundo todo.
Uma dos reflexos do sistema Nightingale foi o trabalho realizado por
Henri Durant, que, apoiado nas idéias de Nightingale, criou a Cruz Vermelha, em
37
1859, com o objetivo de dar assistência aos soldados feridos em guerra (LIRA E
BOMFIM, 1898).
Em 1875, o Hospital Geral de Montreal (Canadá) pediu a Nightingale
auxílio para reformar sua Enfermagem. Nos Estados Unidos, as religiosas iniciaram
diversas escolas com a adoção desse sistema inovador. Em New Haven (1879),
publica-se o primeiro livro norte-americano para alunos de Enfermagem. Na França,
houve tentativa da classe médica na criação de escolas de enfermeiras, porém por
não terem compreendido a função da enfermeira-chefe dentro do hospital,
fracassaram. A Itália teve em Nápoles, em 1896, sua primeira escola de
Enfermagem, que lentamente expandiu-se por todo território italiano.
No início do século XX até a década de quarenta,
predominantemente nos Estados Unidos, desenvolveu-se a Enfermagem funcional,
12
onde o número de escolas multiplicou-se rapidamente para acompanhar o rápido
crescimento dos hospitais, trazendo como conseqüência a formação das
enfermeiras num ensino técnico desprovido de cientificidade, “uma vez que o
interesse maior não era o crescimento intelectual das estudantes, mas sim torná-las
rápidas e eficientes no atendimento do doente” (MEYER, 1995, p. 72). Almeida e
Rocha contribuem enfatizando que:
As técnicas de enfermagem e os procedimentos executados para a
prestação do cuidado enfatizavam a economia de tempo e movimento a fim
de dar conta das inúmeras tarefas hospitalares, (...) e a possibilidade do
controle, feito por enfermeiras, do grande número do pessoal de
enfermagem subalterno que terá de ser utilizado nos hospitais (ALMEIDA;
ROCHA, 1989, p. 49).
Simultaneamente a isso, o aumento do número de hospitais e de
internações fez crescer grandemente a demanda pelos cuidados de Enfermagem,
ampliando a assistência desprovida de qualificação, onde a ênfase às técnicas
ganha expressão, sobressaindo o desempenho de tarefas e procedimentos em
detrimento do doente. As tarefas na Enfermagem são designadas de acordo com
sua complexidade e nível de competência do pessoal. Tal prática foi influenciada por
F.W.Taylor
13
, que visava implantar a racionalidade e eficiência nas fábricas, com
12
O termo “Enfermagem Funcional” refere-se à prática da enfermagem na qual o foco da atenção são as tarefas e
os procedimentos. (ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 52)
13
F.W.Taylor: responsável pelo conceito de gerência publicada em 1910, num esforço de trazer a racionalidade e
eficiência para o trabalho das fábricas. A teoria sobre a gerência era baseada na premissa de que gerentes são
38
menores gastos (MEYER, 1995). Em relação ao hospital uma perseguição da
racionalidade econômica, maior produção e menos gastos.
A mesma autora salienta aspectos importantes deste momento
histórico, com repercussão para a Enfermagem atual:
a) rigidez de treinamento com intuito do alcance das metas de produtividade
e eficiência;
b) hierarquia e as relações de poder são ampliadas com a crescente divisão
técnica do trabalho e os discursos de gerência científica;
c) acentuação da característica técnica do fazer em enfermagem;
d) ênfase à destreza e à habilidade manual;
e) descrição organizada e minuciosa dos procedimentos que pretende
conferir um caráter profissional concretizando assim sua passagem do
domínio privado para o público (MEYER, 1995, p. 73).
Após a Segunda Guerra Mundial, há uma mudança do pensamento
americano no que se refere ao trabalho da Enfermagem, sofrendo este
transformação da modalidade funcional (trabalho por tarefas) para a modalidade do
trabalho em equipe, tendo em vista deslocar o foco de atenção que estava centrado
nas tarefas, para o paciente, ou seja, nas suas necessidades. Almeida e Rocha
(1989, p. 63) contribuem dizendo “que é elaborado e caracterizado o trabalho em
equipe, procurando também dar cunho científico ao trabalho e humanizá-lo, assim
como humanizar o cuidado ao paciente”. Esse aspecto tem conotação positiva,
quando a ‘pessoa’ do paciente é salientada, denotando uma preocupação com o
aspecto da humanização do atendimento fornecido.
Aqui percebo também influência do modo como o trabalho era
organizado nos ambientes fabris no modo de atuação do cuidado em Enfermagem.
Um trabalho em equipe e sob influência do capitalismo. Nesse pensar, Almeida
contribui dizendo:
Nas empresas americanas, onde a acumulação e reprodução ampliada do
capital foram realizadas, o fator humano começa a ter status. (...) em que as
formas de regulamentação da força de trabalho do operário, efetuada por
via autoritária direta (esquema Taylor-Fayol), cedem lugar a sua exploração
de forma indireta: pela manipulação do operário por especialistas, os quais,
por sua vez são instrumentos manipulados pela direção das empresas. (...)
pessoas capazes de pensar e planejar; o operário era visto como uma pessoa que necessitava de supervisão
cerrada e constante direção (BESWETHERIK, 1979, p. 18 apud ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 52).
39
sempre perseguindo o aumento da produtividade com a redução de custos
(ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 64).
Na década de 50, surge a preocupação em organizar os princípios
científicos que devem nortear a prática da Enfermagem, buscando-se
fundamentação para as técnicas de Enfermagem desenvolvidas. Proposta esta
encabeçada por educadores da América do Norte, após estudo de cinco anos. Até
então, a mesma era vista como não científica e suas ações baseadas na intuição.
(ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 58)
Florence Ninghtingale, atuando na segunda metade do séc. XIX,
deixa o seu nome não somente na história da Enfermagem como também na história
da humanidade, pois segundo Castro apud Paixão (1989):
Ela reformou não hospitais militares de campanha, mas também, e de
modo considerável, a administração sanitária do exército; participou da
elaboração de políticas internas e externas, atuou com expert em assuntos
sanitários, tornando-se uma autoridade em problemas indianos e, lançou
bases da enfermagem como profissão para todo o mundo (CASTRO, apud
PAIXÃO, 1989, p. 4).
Na concepção de Nightingale (1989, p. 6), ser enfermeira “é executar
o trabalho conforme seu próprio elevado conceito do que é certo e o melhor mesmo
para o doente, não apenas cumprir ordens, mas para sua própria satisfação”.
Para ela “Enfermagem”, palavra que usava “por falta de outra
melhor”, deveria significar o uso apropriado de ar puro, iluminação, aquecimento,
repouso, limpeza, silêncio e dieta adequada com o mínimo dispêndio de energia do
paciente, de modo a mantê-lo nas melhores condições possíveis para que a
natureza nele pudesse agir. Para Ninghtingale, o ambiente exercia importante fator
para o restabelecimento do paciente, devendo este ser deixado em condições
favoráveis para fornecer auxílio adequado. Com ela é possível verificar a mudança
no cuidado de Enfermagem, passando este de uma finalidade religiosa para o
controle do meio ambiente do paciente. Daí tem-se a disciplina que é o elemento-
chave desse processo e que é incorporada pela Enfermagem a fim de normatizar e
regulamentar toda a vida do hospital (ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 41). Sobre esse
aspecto, cito Foucauld que diz:
É preciso individualizar e distribuir os doentes em um espaço onde possam
ser vigiados e onde seja registrado o que acontece; ao mesmo tempo se
modificar o ar que respiram a temperatura do meio, a água que bebem, o
40
regime, de modo que o quadro hospitalar que os disciplina seja um
instrumento de modificação com função terapêutica (FOUCAULD, 1981
p.102).
Hoje o sentido da Enfermagem está limitado e passou a significar
pouco mais que administração de medicamentos, verificação de sinais vitais,
realização de curativos. Acreditava Nightingale que, observar com profundidade e
descrever com propriedade, confere à Enfermagem um novo caráter intelectual e
científico e, tudo que requer observação, empenho e perseverança constituem uma
boa Enfermagem.
1.2 HISTÓRIA DA ENFERMAGEM E DO SEU ENSINO NO BRASIL
Ao voltar o olhar para o passado enfocando a institucionalização da
Enfermagem no Brasil, percebo a dinamicidade dos fenômenos. Nada é imutável,
pelo contrário, a evolução se configura gerando suas tendências para o hoje.
Abordando sobre a história da Enfermagem no Brasil, verifico uma
estreita ligação entre a mesma e as transformações ocorridas no sistema econômico
do país.
Ao longo da história, evidencia-se que a Enfermagem evoluiu de uma
prática espontânea, pragmática, intuitiva, caritativa, para uma profissão de saber,
arte, ciência (ARGERAMI; CORREA, 1989 apud SPINDOLA; MOREIRA, 1999).
Antes de 1500, o cuidado aos doentes no Brasil se fazia pelos
nativos indígenas, onde os feiticeiros e pajés ganham destaque.
No Brasil colonial, o serviço de saúde era executado pelos jesuítas,
que passam a manter enfermarias próximas aos colégios que fundavam. Faziam-no
de forma caritativa e gratuitamente. Com destaque a José de Anchieta, missionário
destemido e ativo, não se limitando à catequese, exercendo atuação como
professor, médico e Enfermeiro, acudindo as necessidades do povo. Em seus
escritos há relatos da medicina empírica no uso de antídotos contra venenos de
cobras e o uso de plantas medicinais. Uso de talas de casca de árvores, ligaduras
de cipó, ventosas de chifre de boi (PAIXÃO, 1979). Lira e Bomfim (1989, p. 18) citam
41
que “Anchieta dedicou-se especialmente ao estudo das plantas e ao preparo de
medicamentos, chegando mesmo a fazer pesquisas sobre a saúde dos índios”.
Em 1543, verifica-se no Brasil a fundação da primeira Santa Casa de
Misericórdia
14
, em Santos, sendo o atendimento realizado por religiosos, auxiliados
por voluntários e escravos. Paixão (1979, p.104) relata que “havia senhores que
alugavam escravos peritos em Enfermagem para servirem no cuidado aos doentes
particulares”. Qualquer pessoa poderia realizar o cuidado dos doentes e após
pequena experiência, tornar-se-ia prático. A pouca exigência para o desempenho,
no Brasil, das funções atribuídas aos Enfermeiros, deve-se ao fato da falta de
divulgação dos conhecimentos científicos que remontam essa época, como também
da falta de visão do que era a Enfermagem.
No relato histórico consta o nome de Francisca de Sande, baiana,
primeira voluntária de Enfermagem no Brasil, no século XVII, a qual improvisava
hospitais durante as epidemias e não media esforços nas despesas para auxiliar os
doentes pobres (PAIXÃO, 1979).
As Santas Casas foram abertas em diversos lugares do Brasil tais
como, Rio de Janeiro (1852), São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e Angra dos
Reis, sendo os estabelecimentos entregues às religiosas que chegavam ao país.
Essas Santas Casas funcionavam como albergues, acolhendo os pobres e órfãos.
Até esse período, a assistência de Enfermagem é praticada pelos jesuítas, pajés,
curandeiros e voluntários. Sobre o hospital, Foucault assim se expressa:
O hospital era essencialmente uma instituição de assistência aos pobres.
Instituição de assistência, como também de separação e exclusão. O pobre
como pobre tem necessidade de assistência e, como doente, portador de
doença e de possível contágio, é perigoso. (...) O personagem ideal do
hospital, até o séc. XVIII, não é o doente que é preciso curar, mas o pobre
que está morrendo (FOUCAULT, 2005, p. 101).
No século XIX, 1832, as escolas de Medicina surgem no Brasil,
sendo estabelecidas no Rio de Janeiro pela necessidade premente, pois são raros
os brasileiros que conseguiam obter seus conhecimentos no continente europeu.
Em relação às funções de enfermeira, estas permaneciam relegadas
ao plano doméstico ou religioso, sem nenhum caráter técnico ou científico.
14
Tipo de casa de caridade então comum em Portugal e, sob outros nomes diversos, em muitos outros países, que
inclui hospitais e recolhimentos para pobres e órfãos. (PAIXÃO, 1979, p. 103).
42
Quando da Guerra do Paraguai, no século XIX, as enfermeiras do
Hospital Real de Guarnição da Corte foram enviadas para locais de campanha,
sendo solicitado às irmãs de caridade que ocupassem o lugar dentro dos hospitais.
Nessa guerra tem destaque a figura de Anna Nery, que voluntariamente dedicou-se
à ajuda dos feridos juntamente com as irmãs vicentinas, nos hospitais de campanha,
recebendo o título de “mãe dos brasileiros” e de “grande irmã da caridade leiga”. De
acordo com Germano (1985, p. 25), “a ideologia da Enfermagem desde seus
primórdios, e, em particular, a de Anna Nery, para os brasileiros, significa
abnegação, obediência, dedicação”. Isso marcou indelevelmente a profissão.
A constituição da Enfermagem profissional no Brasil sofreu grande
influência da sociedade brasileira em transformação, do avanço econômico e das
mudanças sociais. No campo político (Proclamação da República, Revolução de
1930); no campo econômico (crise do ciclo do café e a aceleração do processo
industrial) e no campo social (urbanização, imigração e os movimentos sociais)
(RIZZOTTO, 1999).
Após a Proclamação da República, a Enfermagem passa a ser
prática institucional. Os hospitais tinham como objetivo tratar dos doentes vítimas
das longas viagens por mar e dos militares. Esses imigrantes vieram ao Brasil
inicialmente para desempenhar atividades agrícolas. Porém, com a crise na
agricultura, deslocaram-se para as cidades, aumentando assim a população urbana.
Sobre essa situação, Minayo (2000, p. 78) contribui dizendo: “A modernização
capitalista se traduziu na internacionalização acelerada do capital, industrialização e
urbanização também aceleradas, fortes migrações do campo para a cidade”.
A aglomeração de pessoas em precárias condições de vida facilitou a
proliferação de doenças infecto-contagiosas, agravando o quadro de saúde, o que
provocou medidas urgentes para salvaguardar a imagem do país no exterior. Nesse
intuito, acordos entre o governo e as Santas Casas foram realizados.
Em relação a esse pensar, Rizzotto, em sua dissertação, denuncia
que:
A falta de segurança no trabalho, as péssimas condições de vida e a falta
de assistência à saúde acabaram levando os trabalhadores a reivindicarem
por melhores condições sociais, pois a crise sanitária existente no País o
tinha como fator principal as epidemias, mas sim o processo de urbanização
acelerado, as péssimas condições de trabalho e os baixos salários
impunham aos trabalhadores e suas famílias condições subumanas de vida
(RIZZOTTO, 1999, p. 18).
43
Pelas grandes epidemias (febre amarela, varíola, hanseníase,
tuberculose, sífilis) o país se assolado. As exportações são prejudicadas pelas
péssimas repercussões, fazendo com que o Estado se preocupe em controlar a
saúde pública. Singer, analisando essa questão diz que:
Os serviços de saúde surgem, portanto, essencialmente como serviços de
controle das contradições entre os interesses individuais dos membros das
várias classes sociais e o interesse do sistema social como um todo, no que
se refere à prevenção das doenças contagiosas (...) com a função de impor
normas coletivas de conduta visando a Saúde Pública (SINGER In
RIZZOTO, 1999, p. 20).
A Enfermagem passa a ser profissão institucionalizada importante
para atender a esta nova visão de saúde, que era cuidar do saneamento e
habitação, principalmente nos portos e cidades, devido às doenças transmissíveis
que dificultavam as transações econômicas, prejudicando assim o país. Essa
afirmação é contraditória. Rizzoto afirma que a institucionalização da Enfermagem
Moderna no Brasil serviu muito mais para atender ao avanço da Medicina hospitalar,
eleita como núcleo da prática médica no modo de produção capitalista, do que para
instaurar uma assistência de Enfermagem voltada para a Saúde Pública
15
(RIZZOTTO, 1999, p. 5).
As tentativas de ensino na Enfermagem no Brasil remontam de 1880,
com a criação da Escola Alfredo Pinto no Rio de Janeiro, vinculada ao hospital
psiquiátrico, onde médicos ministravam curso de dois anos. De acordo com Fonseca
(2002), o ensino de Enfermagem foi instituído oficialmente no Brasil em 1890 com a
criação da Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras, composta por
docentes médicos, e tendo como objetivo formar pessoal para trabalhar junto ao
Hospital Nacional de Alienados.
Na década de vinte, o progresso da biologia, da fisiologia, da
microbiologia, etc., trazem repercussões para a Saúde Pública e outro local
desponta como espaço para se desenvolver: o hospital. Isso provoca abandono
progressivo das medidas preventivas e de caráter coletivo, migrando-se para uma
atenção curativa e de aspecto individual. Isto exigiu um número maior de pessoal de
Enfermagem para compor a equipe hospitalar (RIZZOTTO, 1999). Portanto, uma
passagem visível do modelo sanitarista para o Modelo Biomédico. De acordo com
15
Saúde Pública compreendida como práticas de saúde preventivas e de atenção primária, realizadas fora do
campo hospitalar e vinculadas ao Estado. (RIZZOTTO, 1999, p. 1)
44
Rizzotto (1999, p. 6), “este desenvolvimento da Enfermagem Profissional no Brasil
esteve condicionado, desde a sua origem, aos interesses do desenvolvimento
econômico capitalista, à visão liberal da sociedade e aos rumos tomados pela
Medicina”.
O hospital passa de uma instituição de abrigo a marginalizados para
morrer a um centro de cura, que necessita quadro de pessoal com preparo técnico-
científico adequado para a demanda. Na estrutura hospitalar, a Medicina assume a
coordenação e o direcionamento da assistência à saúde, o que vinha ao encontro do
pensamento capitalista, que necessitava do corpo como força de trabalho. A
Enfermagem, por sua vez, ocupa um novo espaço, socialmente valorizado,
amenizando o passado de degradação em que foi constituída. Em contrapartida,
torna-se função de auxiliar do médico, submissão esta advinda de sua própria
história (RIZZOTTO, 1999).
Podemos dizer que a Enfermagem propriamente dita, surge no
Brasil na década de vinte, sofrendo influência direta do modelo de Florence
Nightingale, que se originara nos hospitais europeus e se desenvolvera nos
hospitais americanos. Modelo este trazido pelas enfermeiras americanas no que se
refere à assistência e ao ensino, como veremos adiante.
Como diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública, Carlos
Chagas, preocupado com a situação de saúde vigente no país, solicita a presença
de enfermeiras americanas para auxiliar. Com isso, pode-se afirmar que o
desenvolvimento da Enfermagem no Brasil recebeu grande influência do modelo
americano de Enfermagem, através da formalização, com a Fundação Rockfeller.
Auxílio este para organizar o serviço de saúde. De acordo com Galleguillos e
Oliveira (2001, p. 466), “a Fundação Rockfeller tinha objetivos bem definidos para a
América Latina: criar condições sanitárias adequadas ao desenvolvimento
capitalista”.
Em 1921, chega ao Rio de Janeiro um grupo de enfermeiras
visitadoras iniciando um curso intensivo sob a direção da Sra. Ethel Parsons,
denominado de “Missão cnica”, encarregada de estudar a situação da
Enfermagem no Brasil e apresentar ao governo brasileiro recomendações para o
programa que iria ser adotado (PAIXÃO, 1979).
Após o diagnóstico efetuado sobre a situação da saúde brasileira, foi
criado o Serviço de Enfermagem do Departamento Nacional de Saúde. No Rio de
45
Janeiro, em novembro de 1922, foi criada a Escola de Enfermeiras do Departamento
Nacional de Saúde Pública (DNSP), cuja atividade iniciou-se em 1923. Essa escola
mais tarde passou a ser denominada de Escola Anna Nery, pelo decreto
presidencial de 31 de março de 1926, em tributo à brasileira Anna Nery, pelos
serviços prestados como voluntária na Guerra do Paraguai (RIZZOTTO, 1999). Toda
a atividade desenvolvida pela escola ocorreu sob supervisão de enfermeiras norte-
americanas, treinadas de acordo com o modelo de Florence Nigthingale.
Além da supervisão, o que se verifica é que o ensino de Enfermagem
estava centrado no modelo americano de “alto padrão”, reproduzindo desta maneira
a divisão de classes existentes na sociedade, preocupado com questões internas da
profissão, marcado pelo preconceito, elitismo e autoritarismo, convergentes com as
políticas do governo para a saúde e à educação (GERMANO 1985).
Adentrando na análise curricular do primeiro Programa de Ensino
implantado pela escola de Enfermagem, verifica-se que o objetivo da mesma era
formar enfermeiras voltadas para atuação na área hospitalar, satisfazendo assim
uma parcela restrita da população (RIZZOTTO, 1999, p. 48).
Esses primeiros currículos de Enfermagem previam, no seu esquema
geral, um número considerável de disciplinas da área biológica, conforme o modelo
americano de currículo, cuja influência ainda se verifica em nosso país.
A primeira diretora dessa escola foi Miss Clara Louise Kienninger,
tendo início o curso em 19 de fevereiro de 1923, com 14 alunas e duração de 28
meses. Em 19 de junho de 1925, recebiam estas o diploma (PAIXÃO, 1979). Após
sucessivas diretoras americanas, o Brasil teve a sua primeira diretora brasileira:
Raquel Haddock Lobo, sendo a pioneira da Enfermagem moderna entre nós.
Em alguns estados como São Paulo e Minas Gerais, iniciavam-se
cursos para Visitadoras Sanitárias, procurando desta forma sanar a ausência de
enfermeiras diplomadas. As alunas oriundas desse curso foram as primeiras
pessoas a serem preparadas para trabalhar com Saúde Pública no Brasil.
Neste trilhar sobre a história da Enfermagem e do seu ensino no
Brasil é importante salientar a criação, em 1926, da Associação Brasileira de
Enfermagem (ABen), cujo primeiro nome foi Associação de Enfermeiras Diplomadas,
tendo como fundadoras as alunas das primeiras e segundas turmas da Escola de
Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, incentivadas pelas Sras
Ethel Parsons e D. Edith Fraenkel (PAIXÃO, 1979).
46
Melo (1986) apud Medeiros e Tavares (1997) afirma que, a partir da
criação da Escola de Enfermagem do DNSP, o trabalho da Enfermagem nasce
dividido, pois as enfermeiras advindas da classe alta atuavam na supervisão e
ensino da equipe de Enfermagem. Trabalho este considerado superior em oposição
ao trabalho manual desenvolvido por outros membros da equipe.
A influência americana também foi visível na mística do autoritarismo
e da dureza como sinônimos de competência e de respeito, que a Enfermagem
brasileira absorveu da experiência americana. Positivamente, a influência americana
abriu novos campos para a Enfermagem, o que foi sentido pelo sensível aumento da
demanda por enfermeiras qualificadas.
A partir de 1930, o Brasil passa por um período difícil devido aos
acontecimentos políticos. É o período do Estado Novo, antidemocrático. Ocorre o
declínio da prática sanitária e com ela o Departamento Nacional de Saúde Pública.
O interesse da política de Saúde Pública, associado ao desenvolvimento do
processo de industrialização, volta-se para o cuidado individual, com ênfase no
cuidado médico.
As enfermeiras continuam atuando no ensino e na Saúde Pública e,
os hospitais, a empregar religiosos e serviçais como pessoal dominante no exercício
da prática da Enfermagem hospitalar. Permanece o exercício da profissão sem
treinamento sistematizado. O aprendizado se na própria prática, em que as mais
velhas ensinam as mais novas.
Reportando-me à educação, em 15 de junho de 1938, o decreto
20.109 estabeleceu a Escola Ana Néri como padrão no Brasil. Foi a primeira escola
do Brasil integrada em Universidade (PAIXÃO, 1979).
Os anos 40 e 50 marcam a consolidação da Enfermagem
profissional. Os anos após a II Guerra Mundial marcam intenso desenvolvimento
científico e tecnológico na área da saúde e, para a Enfermagem, isso significará o
abandono das práticas baseadas na “intuição e na experiência,” substituindo-as por
conhecimentos baseados na área médica (ALMEIDA; ROCHA, 1989, p.12).
Também devido à guerra, o desenvolvimento urbano e industrial é
estimulado. Com isso, as cidades e indústrias crescem demasiadamente. Muitos
saem do campo para morar na cidade, crescendo também o número de assalariados
urbanos. É criado o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) através do acordo
entre Brasil e Estados Unidos, cujo objetivo era prestar atendimento aos
47
trabalhadores na extração de borracha, que estavam sendo dizimados pela malária
e febre amarela. Era grande interesse nesse produto durante a guerra.
Os trabalhadores passaram a exigir uma medicina curativa e
hospitalar, ao mesmo tempo em que havia um grande crescimento da indústria
hospitalar. Esse novo hospital, com novas tecnologias, precisava de pessoal auxiliar
capacitado, que soubesse trabalhar com os novos aparelhos, equipamentos e
medicamentos. Nesse pensar, Paixão relata que:
O crescente progresso da profissão, maior atenção dada aos problemas de
saúde, estudos atentos dos variados graus de dificuldade e
responsabilidade no cuidado aos doentes, além de outras causas, levaram
membros dos mais competentes na profissão a pensar na formação de um
grupo auxiliar (PAIXÃO, 1979, p. 130).
Além da necessidade de pessoal qualificado para as atividades
hospitalares, cito Almeida e Rocha (1989, p. 55), que assim se expressam: “inclui-se
aqui o desenvolvimento de uma hierarquia hospitalar, baseada nos princípios do
taylorismo,
16
de divisão do processo de trabalho em componentes menores
possíveis e pagando com isso menos para os trabalhadores”.
Ampliam-se, desta forma, as áreas de atuação da Enfermagem, bem
como a necessidade de qualificação e melhor desempenho, É período que legitima o
pessoal Auxiliar existente. Através da Lei 795 de 6 de agosto de 1949 (SANTOS
et al. 1997, p.122), são criados oficialmente os cursos de Auxiliar de Enfermagem e
regulamentadas as escolas de nível superior existentes no país. Estes cursos
continuam sendo realizados, principalmente pelas atendentes da rede sica de
saúde e do hospital, cabendo às enfermeiras a supervisão e administração dos
mesmos.
Em 1955, a Lei 2604 de 17 de setembro (SANTOS et al. 1997, p.29),
regula o exercício da Enfermagem profissional, oficializando a divisão de trabalho
manual e intelectual, ou seja, a divisão do trabalho em categorias tais como:
Enfermeiros, Auxiliares, Técnicos, Atendentes e Práticos de Enfermagem.
Essa divisão de trabalho manual e intelectual gera conflitos dentro da
equipe, tendo em vista que o trabalho manual é mais cansativo e pesado, a jornada
de trabalho maior e o salário menor. Os Enfermeiros assumem posições de gerência
16
Taylorismo: Teoria advinda de F.W.Taylor onde a gerência era baseada na premissa de que gerentes são
pessoas capazes de pensar e planejar; o operário era visto como uma pessoa que necessitava de supervisão
cerrada e constante direção. (BESWETHERIK, 1979, p. 18 apud ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 53)
48
dos serviços atendendo aos interesses da instituição. Pensando sobre essa divisão
do trabalho manual e intelectual e sua relação com o capitalismo cito Martins que
diz:
É, portanto, característica do modo de produção capitalista a separação
entre trabalho manual e o trabalho intelectual, cujo sentido último esem
legitimar a desvalorização do trabalho, controlar o processo de produção;
enfim, retirar do trabalhador a autonomia, o controle do processo,
assegurando, assim, a exploração que está na raiz do processo de
acumulação, fim último do capitalismo (MARTINS, 1993, p. 169).
A Lei deixa claro que o Enfermeiro é responsável pelo trabalho
intelectual (pensar) e os Auxiliares e Técnicos, pelo trabalho manual (fazer).
Os anos 60 e 70 marcam a ampliação e expansão da Enfermagem
profissional. Com a necessidade de mão de obra hospitalar surgem outras
categorias como o atendente de Enfermagem, que pelo baixo custo supera a
quantidade dos Auxiliares de Enfermagem. Medeiros e Tavares relatam que:
Isto reflete o funcionamento do capitalismo, no setor saúde, exigindo um
número maior de trabalhadores sem qualificação e uma pequena parcela de
portadores de saber profissional (MEDEIROS; TAVARES, 1997, p. 283).
Essa situação possui repercussão nos dias atuais, acarretando a
indefinição do perfil do Enfermeiro.
A partir da década de 60, é estimulada a expansão dos serviços de
Saúde Pública (atenção primária à saúde) destacando-se o crescimento da
utilização dos Auxiliares e Atendentes de Enfermagem e das Agentes de Saúde para
prestar serviços à população carente. Aqui se tem uma questão social importante: tal
prática visa fazer diminuir as tensões sociais, fazendo com que o povo o fique tão
agitado e não exija a assistência que não tem. Simultaneamente, visa racionalizar os
gastos do setor saúde, tendo em vista que é mais barato pagar profissionais desta
categoria de Enfermagem do que profissionais formados.
Com a criação do curso de Auxiliar de Enfermagem, paulatinamente
verificou-se uma lacuna entre as atividades elementares exercidas pelos Auxiliares e
as de maior complexidade, exercidas pelos Enfermeiros, que não era preenchida
satisfatoriamente por nenhuma categoria. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional n° 4024 de 20/ 2/1961 (SANTOS et al. 1997), abre horizontes para a
formação de técnicos nas mais variadas profissões. Em 1966, surge o Técnico de
49
Enfermagem, aprovado pelo Conselho Federal de Educação no parecer n° 171.
(SANTOS et al. 1997).
A divisão das categorias dentro da Enfermagem tornou-se fértil
campo para conflitos referentes às delimitações das funções exercidas pelo
Enfermeiro como também para a identificação do seu perfil. Essa situação se
agravada após as décadas de 50 e 60, quando as escolas preparavam seus alunos
com o objetivo de exercerem a gerência, porém, muitas vezes eles exerciam o
cuidado direto.
Na década de 70, a Medicina passa por um intenso avanço
tecnológico e é nesse mesmo período que a previdência entra em crise, acentuando
a dicotomia entre saúde pública preventiva e assistência médica curativa. A
formação dos Enfermeiros passa pela pós-graduação dos mesmos, envolvendo-os
nas pesquisas e produção científica do conhecimento (MEDEIROS; TAVARES,
1997).
Os anos 80 marcam a ascensão da Enfermagem através da
intelectualização. Na década de 80, entra em declínio o sistema previdenciário e,
com a Reforma Sanitária, resultado da VIII Conferência Nacional de Saúde, o
Enfermeiro é requerido no trabalho individual e coletivo, atendendo integralmente e
promovendo a saúde no seu aspecto geral (MEDEIROS; TAVARES, 1997).
Para a Enfermagem, esse momento é um marco, posto que, de certa
maneira, oficializa-se a divisão técnica do trabalho, ficando a cargo do Enfermeiro as
funções de gerência, supervisão, ensino e pesquisa.
Lançando um olhar sobre a história da Enfermagem no Brasil,
observo que ela, enquanto prática social sofre as determinações históricas da
sociedade. Isso leva à afirmação de que a Enfermagem não pode ser mais encarada
como “arte e devoção” ou “manifestação de caridade”. O desenvolvimento da
Enfermagem deve ser estudado como resultado, não de esforços individuais, mas
de relações econômicas, políticas e ideológicas do setor saúde com a sociedade.
Ao encerrar este capítulo, saliento a importância dos aspectos
históricos e sua evolução, que possibilitam ao profissional fazer inferências no seu
cotidiano, realizando implementações que possam construir o hoje, pautado na
visualização e compreensão dos fatos de ontem. Muitos problemas vividos hoje pela
Enfermagem têm sua raiz num passado remoto e se reproduzem no presente.
50
Refletir sobre a Enfermagem enquanto prática social e historicamente
constituída torna-se importante para a discussão dos novos caminhos, que
necessitam ser percorridos por essa profissão, plena de contradições e de desafios.
Neste momento histórico em que vivemos, coloco em discussão a
humanização e percebo que a Bioética pode contribuir para o cuidado mais
humanizado.
51
CAPÍTULO II
A BIOÉTICA E SUA RELAÇÃO COM O CUIDADO HUMANIZADO NA SAÚDE
“Devemos avançar de uma ciência eticamente livre para outra eticamente responsável: de
uma tecnocracia que domina o homem para uma tecnologia que esteja a serviço da
humanidade do próprio homem”.
Hans Kung
52
2.1. TECNOLOGIA, TECNOCIÊNCIA E A BIOÉTICA
Nas últimas décadas, um grande desenvolvimento da ciência e da
tecnologia
17
vem se fazendo presente no contexto mundial, trazendo inovações,
benefícios, realizando transformações em praticamente todas as áreas.
A sociedade contemporânea está assentada sobre a supremacia do
consumismo, sendo a aquisição material a mola propulsora, regendo atos e
decisões. Como resultado, pode-se dizer que as pessoas que dispõem de poder de
compra obtêm vantagens em relação a outras, gerando divisão social.
A área da saúde não é imune a esse processo. O poder financeiro
reflete-se em seu cotidiano, gerando questionamentos quanto à conduta dos
profissionais em relação ao atendimento no cuidado da saúde. Instituições de saúde
assumem esse pensar, proporcionando forma de tratamento, acesso à instituição, à
internação, e ao atendimento de forma diferenciada, favorecendo assim a
hegemonia vigente.
A vida, valor supremo do ser humano passa a objetizar-se, (tornar
objeto), tornando-se a tecnociência
18
maximizada num processo de fragmentação,
de desvalorização, de desconstrução do indivíduo. Isso gera uma transformação do
profissional de Enfermagem em relação ao cuidado, principalmente na prática
hospitalar, separando “cada vez mais o profissional do cuidado mais efetivo e
afetivo” (FIGUEIREDO; VIANA, 2006, p. 372).
Nesse pensar, a Bioética vem como instrumento auxiliar do
profissional de saúde, ao relacionar a ética com a ciência e a tecnologia, na tentativa
do resgate da dignidade do ser humano, do respeito à vida e da proteção à pessoa.
Ou seja, a “bioética, deve ser incorporada como valor e preceito por todos e
principalmente pelos cuidadores” (FIGUEIREDO; VIANA, 2006, p. 376).
2.2 A BIOÉTICA E O CONTEXTO SOCIAL
17
Define-se tecnologia como o conjunto de instruções ou de habilidades necessárias para a produção de bens e
serviços. (FIGUEIREDO, VIANA, 2006, p. 388)
18
Define-se tecnociência a conciliação entre a técnica e a ciência, num processo de integração. (VI
CONGRESSO BRASILEIRO DE BIOÉTICA E I CONGRESO DEL MERCOSUR, Foz do Iguaçu, 2005)
53
As transformações ocorridas no mundo através do Iluminismo
Filosófico, da Revolução Científica e Industrial, são a razão de ser do paradigma
tecnicista, que durante muito tempo tem influenciado o pensamento humano
(RODRIGUEZ, 2003. p. 55). O mundo, a partir de Newton, foi compreendido como
uma quina perfeita, criando uma formulação matemática para a concepção
mecanicista da natureza.
Descartes ressaltava o papel do sujeito, baseando seu todo na
dúvida, na divisão, na indução e na revisão. Para Descartes, a razão é quem oferece
o critério de verdade. A concepção racional, reducionista, especializada, simplificada
e fragmentada do mundo, encontrada no racionalismo cartesiano, leva à separação
do sujeito-objeto (RODRIGUEZ, 2003, p. 56).
Esse paradigma cartesiano possui repercussões no cotidiano. Sua
herança se manifesta em muitas áreas. Sob a sua influência vê-se a predominância
do racionalismo científico, uma divisão do conhecimento em disciplinas e
especializações cada vez mais numerosas. Além da fragmentação do saber,
percebe-se que estamos inseridos numa civilização do ter, onde se elevam os
valores materiais, com predomínio do individualismo e fragmentação dos aspectos
psíquicos do homem, tratando-o somente como um ser biológico. Nesse
pensamento cito Minayo:
A concepção positivista da ciência universal, atemporal e isenta de valores
conduzindo os rumos da humanidade, na área da saúde foi sendo
problematizada por um debate teórico e ideológico que engajou questões
tanto de cientificidade dos postulados vigentes como da ética de
investigação científica (MINAYO, 2000, p. 59).
No século XX, a humanidade pôde acompanhar o desenvolvimento
técnico-científico concomitantemente com a dicotomia entre a ciência e a ética, entre
o agir moral e o agir técnico, gerando um assustador processo de desumanização.
Segundo Cardoso (1995), o homem atual separou a razão do sentimento, a ciência
da ética, a utilidade da felicidade. Perdeu-se a percepção da realidade como um
todo.
O progresso técnico-científico, nos últimos 50 anos, foi notório.
Trouxe para a humanidade inúmeros benefícios, porém, em relação a valores, o
efeito foi contrário. A humanidade sofre as conseqüências do condicionamento
54
materialista, mecanicista e reducionista, que estão implícitas no paradigma
cartesiano.
Surge a Bioética a partir da pressão de fatos históricos, reveladores
de práticas de pesquisa, das quais estava ausente qualquer parâmetro de
consideração do ser humano. Nasce como resposta da cultura contemporânea às
implicações morais das tecnologias biomédicas, sendo o ser humano referência
central de suas reflexões.
Na área da saúde, as progressivas especializações geraram
dificuldade da visão global do paciente, com sua história pessoal, na sua totalidade
de existência. O profissional de saúde passou a visualizar o paciente como doença
em detrimento do doente. Observa-se a ênfase da denominação “caso”, “número”,
havendo uma despersonalização do sujeito envolvido. O paciente encontra
dificuldade em sentir-se como ator principal, como sujeito autônomo, possuidor do
direito de decidir sobre seu tratamento, seu diagnóstico, ou seja, alguém que
participa das decisões. Nessa concepção, a palavra e o diálogo são suprimidos.
Nesse pensar, Pessini e Barchifontaine (1997, p. 161) assim se expressam: “a
relação médico-paciente se desagrega e começa a imperar na medicina a tecnologia
(adoração da técnica)”. A abordagem reducionista da medicina faz o dico ver a
saúde como mero funcionamento mecânico do organismo, perdendo de vista o
paciente como ser humano.
Segundo Moraes (2001), a visão mecânica separa os indivíduos de
seus relacionamentos, o reconhecendo a importância do contexto em que estão
inseridos, gerando um individualismo exagerado, onde prevalece o egocentrismo
humano. Observa-se também a ausência de ética e de solidariedade onde os
significados do amor e da compaixão são perdidos.
Diante dessa desagregação, percebe-se que a ciência está exigindo
uma nova visão de mundo, diferente, não fragmentada. Daí a necessidade de unir
as partes deste homem “esfacelado”, para alcançar uma visão de totalidade: corpo e
espírito, ciência e ética.
Focando essa dissociação entre ciência e ética, urgente se faz um
repensar do conhecimento, uma busca de benefícios e da garantia da integridade do
ser humano, tendo como norteador o princípio da dignidade humana. De acordo com
Oliveira (2000, p. 61), ӎ fundamental que lutemos para substituir o enfoque
tecnológico pelo humanitário na medicina”. Uma reinserção, como Weil (1993, p. 48)
55
afirma: “do conhecimento a serviço dos valores éticos: reintegração dos altos valores
éticos, introdução do conceito de bioética na ciência”.
O termo Bioética originou-se a partir de janeiro de 1971, quando o
biólogo e oncologista Rensselaer Potter, publicou o livro: “Bioética: a ponte para o
futuro”. (NEVES, 1996, p.8). Potter diagnosticou o perigo que representa para a
humanidade a separação entre o saber científico e o saber humanista.
Etimologicamente significa ética da vida. Palavra formada por dois vocábulos de
origem grega: bios (vida) e ética (costumes, valores relativos a determinado
agrupamento social, em algum momento de sua história). Em junho de 1971, André
Hellegers, obstetra, usou o termo Bioética para aplicar a ética na medicina e nas
ciências biológicas. (NEVES, 1996, p.8).
Segundo Pessini e Barchifontaine (1997, p. 30), “bioética é o estudo
sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da saúde,
enquanto essa conduta é examinada à luz de valores e princípios morais”. Ela
refere-se a assuntos gerais da saúde, indo da pesquisa à qualidade do atendimento
nas instituições.
A Bioética, segundo Schrammm é:
Disciplina específica da Filosofia Moral que visa o estudo sistemático dos
aspectos morais ou éticos implicados pela conduta humana consistindo na
aplicação dos saberes da Ciência da Vida e da Saúde ao mundo da vida,
em particular, à vida humana (SCHRAMM, 2001, p. 32).
A Bioética não se coloca contrária ao desenvolvimento técnico-
científico, porém, a necessidade do estabelecimento de limites para salvaguardar
a garantia do respeito à dignidade humana, realizando, com isso, reflexões para
identificar valores e normas que guiem o agir humano. Importante salientar que a
Bioética deve prevalecer sobre a técnica, a tecnologia e ciência, permeando toda a
prática do profissional.
No sistema econômico vigente, no qual o capitalismo visa a uma
produção cada vez maior e em menor tempo, objetivando o lucro, a preocupação
com o ser humano ganha expressão. Como exemplo, cito as pesquisas envolvendo
seres humanos, a fertilização in vitro, a clonagem, às células troncos, etc. O lucro
objetivado gera uma competição desmedida. Nesse pensar, Figueiredo; Viana
contribuem dizendo (2006, p. 380): “Se o critério do ato humano é o lucro, as
56
violações monstruosas da dignidade humana são inevitáveis e, nesse sentido,
necessita-se da Bioética para guiar a relação entre ciência, tecnologia e vida.”
Ela busca compreender o contexto que envolve o ser humano, sua
vida, saúde, morte. Também as tecnologias que instrumentalizam a vivência
humana, haja vista as importantes repercussões para a qualidade de vida.
Encontram-se dentro da Bioética princípios e normas que, segundo
Silva (1998), são: a autonomia, entendida como o direito à liberdade; o respeito ao
ser humano considerado como fim (em Bioética recebe o nome de beneficência) e a
justiça, isto é, a eqüidade de todos os indivíduos inscritos no reino da humanidade.
Resumidamente, esses princípios o definidos como: o da
autonomia relacionado à dignidade humana; o da beneficência, à compreensão dos
limites e às possibilidades da relação entre o bem e o mal e o da justiça, a
distribuição eqüitativa (FIGUEIREDO; VIANA, 2006).
Em relação aos modelos teóricos propostos para a Bioética, existem
diversos, que estão alicerçados em diferentes enfoques filosóficos, ou seja, os
chamados paradigmas. Entre eles encontra-se o paradigma antropológico ou
perspectiva personalista humanizante, que é baseado em uma filosofia humanista e
globalizante, tendo como referência o conceito de pessoa. Segundo Oliveira (2000,
p.104), o paradigma antropológico “é uma antropologia filosófica que se empenha na
compreensão do homem na totalidade de sua realização como pessoa, que toma o
homem na singularidade de sua individualidade e na universalidade de sua
humanidade”. Sgreccia (2000) afirma que necessária se faz uma união entre
biologia, antropologia e ética.
Podem-se registrar três marcos na história da Bioética no Brasil,
sendo eles: a) em 1993, a publicação pelo Conselho Federal de Medicina da
primeira Revista de Bioética; b) em 1996, a criação do CONEP (Comissão Nacional
de Ética em Pesquisa) envolvendo seres humanos; c) em 2004, a inauguração do
primeiro mestrado stricto sensu em Bioética em São Paulo.
uma estreita ligação da Bioética com a humanização. Pessini e
Barchifontaine afirmam que a Bioética busca, de maneira especial, humanizar o
ambiente de clínicas e de hospitais e, em particular, promove os direitos do paciente
para exercer uma sadia liberdade e terminar seus dias com uma morte digna
(PESSINI; BARCHIFONTAINE, 1997, p. 42).
57
Em relação ao ensino, a Bioética é uma disciplina reconhecida
praticamente em todos os cursos da área de saúde e na maioria dos cursos de
ciências humanas das universidades européias, norte-americanas e italianas. Em
relação ao Brasil, Oliveira contribui dizendo que:
No Brasil ainda não é uma disciplina “autônoma”, embora muitas faculdades
de medicina e algumas de filosofia dediquem a bioética uma carga horária
mínima. É uma área de estudo que está consolidada, e sua
institucionalização é uma realidade (OLIVEIRA, 2000, p. 14).
A mesma autora faz referência ao segundo grau como momento mais
apropriado para o início das reflexões Bioéticas, bem como a necessidade de
criação, pelo governo brasileiro, de programas de educação em Bioética (PEB) para
os cursos de nível superior e os de pós-graduação (OLIVEIRA, 2000).
Isso posto, denota-se que a educação assume então, um papel
fundamental, tendo em vista a necessidade de formação do profissional Enfermeiro
numa visão humanizada, com a contribuição das reflexões da Bioética, em que os
valores: pessoa, dignidade e individualidade ganham expressão, dispondo o
conhecimento a serviço dos valores éticos.
Precisa-se desenvolver no aluno a intuição, a criatividade, a
sensibilidade e o sentimento, para que o mesmo possa perceber a realidade do
outro. Sob esta ótica, o profissional reconhece o paciente como cidadão, valoriza a
sua autonomia em relação ao tratamento, trabalha na recuperação e promoção da
saúde das pessoas, trata o doente da doença e não simplesmente a doença do
doente.
Nesse cenário, entendo que o Enfermeiro deverá desempenhar sua
função, orientado para transformações, buscando o resgate dos valores humanos,
com vistas à melhoria da qualidade de assistência prestada ao paciente,
proporcionando-lhe maior satisfação, através do respeito da individualidade,
integralidade e dignidade, sendo suas ações pautadas em princípios éticos, morais e
humanísticos.
Sgreccia coloca que uma relação entre o momento operativo da
Bioética com os valores e a vida ética.
A Bioética se torna operativa ao passar à medicina: é no momento operativo
que se desenvolve a vida ética e se realizam os valores. Essa
operacionalização, quando conduzida de acordo com a coerência entre e
58
competência específica e a consciência dos valores, torna ética a ação em
si e contribui para o enriquecimento do ser pessoal, tanto do profissional
como do doente, bem como da sociedade (SGRECCIA, 2002, p. 201).
Dessa forma, a consciência dos valores assume importância em
relação ao desenvolvimento da vida ética. Por conseguinte, quanto mais rica for à
consciência de valores, tanto mais atenta e sensível será a consciência do
profissional, possibilitando então uma assistência humanizada e integral.
2.3 A HUMANIZAÇÃO
O relacionamento estabelecido entre paciente e Enfermeiro ganha o
nome de relacionamento assistencial, sendo este a base da prática da Enfermagem.
Para que esse relacionamento se efetive são necessários alguns fatores como:
empatia, respeito mútuo, clima de confiança, sinceridade, etc.
Na área da saúde, mais precisamente na Enfermagem, a
humanização torna-se tema central, tendo em vista que a prática do cuidado em
Enfermagem se estabelece entre seres humanos. Um que presta cuidado e outro
que necessita do mesmo. Contudo, Silva (2004, p. 26) diz que: “o cuidado humano é
uma das habilidades mais difíceis de ser implementadas, justamente porque as
pessoas possuem limiares diferentes de sensibilização”.
Quando despojado de sua saúde, os indivíduos têm seus aspectos
emocionais envolvidos, tendo em vista que além do desconhecido em relação ao
futuro de sua doença, encontram-se em um ambiente não propício, sob a
responsabilidade de uma equipe de saúde, longe de seus familiares e muitas vezes
tratados como se não tivessem individualidade e identidade própria.
Sendo profissional da saúde, pergunto: o que é humanizar o
atendimento? O que é humanizar a Enfermagem? É modificar os ambientes? É
uniformizar os funcionários? É abolir camas ou macas nos corredores? É implantar
serviço de voluntariado? É aumentar o número de ambulâncias?
Humanização consiste no ato de humanizar, que é produto do ser
humano, é tornar humano, dar estado ou condições de homem, humanar. Também
pode ser compreendido como tornar benévolo e benigno (REMEN, 1993).
59
Humanizar é estar com o paciente numa atitude de escuta, de ajuda, de
preocupação com seu restabelecimento.
Por assistência humanizada entende-se o esforço de tratar o
paciente com respeito às suas necessidades pessoais, considerando sua autonomia
nas escolhas, de se sentir aceito, de ser escutado, compreendido. Constrói-se assim
a dignidade humana, que está fortemente associada ao referencial de assistência
humanizada. Daí a necessidade da humanização ser individualizada (SANTOS,
2004).
Observar e respeitar o ser humano que estamos assistindo, em suas
várias interfaces, ou seja, seu medo, seu pudor, sua individualidade, suas emoções,
são as estratégias de humanização do cuidado.
Porém, o que observo hoje, é que a pessoa quando acometida pela
doença, deixou de ser o centro das atenções e foi instrumentalizada em função de
um determinado fim. Existem ambientes tecnicamente perfeitos, mas, desprovidos
de ‘calor humano’. Hoje é evidenciada a coisificação (tornar coisa, objeto) das
pessoas e sacralização das coisas, portanto, uma inversão de valores (PESSINI,
BERTACHINI, 2004).
Diante desse panorama, justifica-se a necessidade de políticas de
humanização. O Brasil possui alguns programas voltados para essa temática. O
Programa Nacional de Humanização dos Serviços de Saúde, lançado em 24 de
maio de 2000, é um deles que, de acordo com Pessini, Bertachini:
Tem como proposta reduzir as dificuldades encontradas durante o
tratamento, favorecer a recuperação da comunicação entre a equipe de
profissionais da saúde e o usuário, incluindo família, diante do momento de
fragilidade emocional do paciente (PESSINI; BERTACHINI, 2004, p. 2).
Outro projeto é o Programa de Humanização do Pré-Natal e
Nascimento, de de junho de 2000, tendo como objetivo assegurar a melhoria do
acesso, da cobertura e da qualidade do acompanhamento pré-natal, da assistência
ao pré-natal e o puerpério
(
PESSINI; BERTACHINI, 2004).
O terceiro projeto sobre essa temática, é a de Humanização no
Programa de Saúde da Família, de 1994, implantada pelo Ministério da Saúde. O
enfoque está voltado para a atenção integral do indivíduo e família, através de ações
desenvolvidas nas unidades de saúde, no domicílio e na própria comunidade
60
(PESSINI; BERTACHINI, 2004). Esse projeto solicita uma equipe multidisciplinar, na
qual a presença do Enfermeiro é indispensável.
Defronta-se com a humanização pragmática da assistência (que a
dignidade em termos de atuação humana voltada para o ser humano que atua,
produz, pensa e realiza) e a humanização personalística (na qual a dignidade está
estruturada em “ser humano”, antes do que ”fazer coisas humanas”) (SANTOS,
2004).
O cuidado humanizado exige do profissional a união de percepção,
conhecimento, empatia, alteridade e respeito pela dignidade e pela autonomia,
sendo este direito de quem está sendo cuidado: de ser lembrado que é um ser
humano. Ser humano este que se distingue dos demais pela sua capacidade de
reflexão e imaginação, caracterizando-o como um ser único, autêntico e individual.
De acordo com Pessini; Barchifontaine (1997, p. 11), “conhecimento e competência
técnico-científica são imprescindíveis, mas tem que estar sempre junto com
humanismo”. Nas ações de Enfermagem deve ser maximizado o homem e
minimizada a doença, desta forma sobressaindo o valor pessoa em detrimento da
doença.
A procura de visualização do ser humano como sujeito, e não objeto
de sua história dá ênfase à humanização que, na Medicina, consiste no
reconhecimento da dignidade de pessoa em todo ser humano, indo do momento da
concepção até sua morte, tendo a consciência de sua espiritualidade e imortalidade
(SGRECCIA, 2002).
A tecnologia e a técnica estão presentes na vida moderna e afastá-
las da ciência não é possível. Importante que se façam reflexões sobre a relação
que estas estabelecem entre si e a ciência, no desenvolvimento da humanização,
nas relações que permeiam o ser humano em seu estado de saúde ou de doença.
Voltando meu olhar para a história da Enfermagem, assinalo que esta
teve grande repercussão na operacionalização da humanização que ora abordo.
Nas primeiras cadas do século XX, os instrumentos e técnicas de Enfermagem
foram concebidos com a atuação não voltada para o doente, mas sim para o
procedimento a ser executado, ou seja, as tarefas e os procedimentos assumem
maior ênfase. Esse processo, além de perpetuar-se até os dias atuais, pode ser
considerado um dos fatores inerentes à valorização da cnica em detrimento da
pessoa.
61
A tecnologia tem sido um dos grandes fatores de afastamento na
relação Enfermagem – paciente, tendo em vista sua despersonalização e a perda de
sua individualidade, privacidade, subjetividade e singularidade.
Na humanização, a autonomia do paciente deve ser respeitada,
sendo esta considerada como a capacidade do indivíduo de autogovernar-se, de
decidir sobre seu tratamento. As instituições de saúde despojam o indivíduo de suas
vestes na mesma proporção que assumem unilateralmente as decisões sobre o seu
tratamento. Nesse pensar, cito Leopardi (1999, p. 132) que expressa: “seres
humanos são livres e se espera que se envolvam em seu próprio cuidado e nas
decisões sobre sua vida”. Portanto, as atitudes do profissional de Enfermagem em
relação à forma do atendimento no cuidado precisam ser repensadas. É necessário
que o paternalismo seja superado.
Todo ser humano, na posição de paciente, deve ser tratado em
virtude de suas necessidades de saúde e não como meio para a satisfação de
interesses de terceiros, da ciência ou dos profissionais de saúde. É necessário,
portanto, que as ações e os serviços de saúde sejam orientados no sentido de
humanizar suas práticas (FORTES 1998).
Quando um profissional da saúde se aproxima do doente, ele está se
aproximando de uma pessoa e este corpo não é objeto de intervenção, mas sim um
sujeito autônomo, livre, responsável, consciente, possuidor de valores morais,
culturais e espirituais, membro de uma família e inserido em uma sociedade.
Segundo Sgreccia (2002, p. 127) “em todo ato médico e em toda intervenção na
corporeidade não poderá deixar de estar presente esta riqueza e esta ligação: é ato
de uma pessoa sobre outra pessoa com a mediação corpórea”. Daí a necessidade
dos profissionais de saúde serem pessoas reflexivas, humanas e com visão integral.
Em se tratando de profissionais da saúde (talvez profissionais da
“doença”, pela ênfase no cuidado da doença), concorda-se com Aguiar apud
Rodriguez (2003, p. 66) quando assim se expressa: “A aplicação do reducionismo ao
campo da saúde alimenta a crescente especialização dos médicos, processo que
tem como conseqüência a fragmentação dos pacientes em órgãos e sistemas”. Essa
crescente fragmentação possui repercussões em vários âmbitos, sendo o cuidado
de Enfermagem humanizado afetado por ela.
O cuidado de Enfermagem possui em sua estrutura o conhecimento,
que é o saber de Enfermagem corporificado em um nível técnico (instrumentos e
62
condutas), e relações sociais específicas, visando ao atendimento das necessidades
humanas (ALMEIDA; ROCHA, 1989).
Essas necessidades humanas abrangem os aspectos biológicos,
psicológicos e sociológicos, em que a interação Enfermeiro paciente assume vital
importância. Verifica-se, na prática, a fragmentação do cuidado, sendo este
“subdividido e realizado por tarefas e procedimentos, sem centrar-se no paciente, ou
seja, um mesmo paciente é assistido por vários elementos da Enfermagem”.
(ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 33, 34) Na prática, o cuidado ainda é executado de
forma parcelada, ou seja, um Auxiliar de Enfermagem verifica os sinais vitais, outro
arruma o leito, um terceiro administra a medicação prescrita pelo médico, ficando o
Enfermeiro responsável pela supervisão desse atendimento.
Muitas atividades são desenvolvidas sem que haja um processo de
reflexão associado ao fazer na Enfermagem. Essa divisão de tarefas faz com que a
assistência fique parcelada e o paciente perca o referencial sobre o responsável
pelo atendimento. Dificulta-se, com isso, a integralidade do atendimento ao paciente,
acarretando transtornos em relação à humanização.
O diálogo, instrumento fundamental entre o ser cuidador (aquele que
cuida) e o ser cuidado, assume grande importância na área de saúde,
principalmente na área de Enfermagem, tendo em vista que seus profissionais
permanecem em tempo integral com o paciente. O diálogo é possuidor de valores de
informação e de terapêutica. O Enfermeiro necessita aliar aos conhecimentos
técnicos científicos de sua prática diária, a comunicação entre os seres participantes
da relação de cuidado, tendo em vista que essa interação é fundamental na
recuperação do bem-estar do ser humano. Porém, essa comunicação deve ser
adaptada às características de seu interlocutor, ou seja, as palavras precisam estar
impregnadas das condições necessárias para que o paciente compreenda a
mensagem proferida. Assim pode-se deduzir que o cuidado humanizado manifesta-
se também na forma como a informação é fornecida, devendo ter caráter simples,
inteligível, verdadeiro e leal, a fim de promover segurança, confiança, facilitando na
resolução do problema instalado.
A utilização da linguagem técnica pela equipe de Enfermagem não
deve ser utilizada inadvertidamente junto ao paciente, posto que pode provocar
imagens fantasiosas em relação à sua patologia, gerando confusão e ansiedade.
63
Em se tratando de assistência humanizada no viés do ensino da
Bioética, considero importante trazer pensamentos de Immanuel Kant, que vêm ao
encontro da abordagem que estou realizando nesta pesquisa. Sua contribuição é
notória. É um dos filósofos que mais se aproxima dos aspectos concernentes à
Bioética, à humanização, ao valor inegável que se deve dar ao homem, sendo este
não tratado como meio, mas como fim em si mesmo.
2.4 A ÉTICA KANTIANA NA BIOÉTICA E NO SEU ENSINO
Escrever sobre a ética inserida no contexto da saúde, isto é, ética
aplicada, não é uma tarefa fácil, haja vista a complexidade dos temas: ética, saúde e
ética aplicada. A ética vem permeando a história da humanidade e seus
questionamentos tornam-se molas propulsoras na tentativa de compreensão do agir
humano.
Diante de fatos ocorridos na humanidade, onde o agir humano foi
contra o próprio homem, reflexões se fizeram necessárias, dando surgimento à
Bioética, uma ética aplicada à humanidade e, no campo da saúde, uma ética para
nortear o agir humano nas questões a ela inerentes.
Quando me deparei com a ética de Immanuel Kant, surgiu o seguinte
questionamento: Qual a interferência do pensamento kantiano na Bioética? Que
relações possui com o ensino da mesma? Para responder, necessário se faz uma
incursão da ética através da história, tecendo um panorama da mesma e suas
implicações com o mundo pós-moderno.
2.4.1 A ética através da história
a) Ética antiga e medieval: A ética é entendida como disciplina filosófica, tendo seu
começo com a própria filosofia, datada do séc. VI a.C. O termo ética originou-se do
vocábulo grego ethos, que significava assentamento, vida comum (Ilíada, de
Homero). Posteriormente adquiriu outros significados como hábito, caráter, modo de
64
pensar. Aristóteles formou o adjetivo ético para designar uma classe particular de
virtudes humanas e a Ética como ciência que estuda essas virtudes. De acordo com
Vasquez (2000, p. 25), ethos e mos (moral em latim), “caráter” e “costume”,
assentam-se num modo de comportamento que não corresponde a uma disposição
natural, mas que é adquirido ou conquistado por hábito. Em Roma, ethos é similar a
mores, traduzido como costume, caráter. Os romanos formaram da palavra mores, o
adjetivo moralis (moral, relativo a costumes). O desenvolvimento do pensamento
ético nessa época faz alusão a nomes como Demócrito, Protágoras, Sócrates,
Antístenes, Platão, bem como os estóicos e epicuristas. Ética, na qual os problemas
políticos e morais são objetos de atenção. A busca da felicidade estava no centro
das preocupações éticas. Em Platão verifica-se a procura do bem, utilizando a
contemplação das idéias. A virtude ganha expressão e sua prática (areté) se traduz
na coisa mais preciosa para o homem. A ética de Platão tem como referência a
polis, sendo este o terreno próprio da vida moral. De acordo com Germano (1993, p.
25), Aristóteles (384-322 a.C.) destaca-se, nesse período, pelo fato de a ética
assumir um caráter de disciplina filosófica sistematizada. Na época medieval
sobressaem-se os nomes de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, em que a
relação entre ética e cristianismo ganha expressão, procurando identificar a moral
com a vontade divina e, desta forma, identificando-a como uma ética teocêntrica.
b) Ética moderna e contemporânea: devido às mudanças na ordem social,
econômica, espiritual e política, também uma nova concepção ético-filosófica na
época moderna, procurando correlacionar as normas sociais e as necessidades
espirituais. Ética Antropocêntrica, na qual nomes como Descartes, Hobbes, Spinoza,
Maquiavel ganham expressão. Porém, foi a filosofia de Kant (1724-1804) que alterou
radicalmente a ética moderna. A universalidade da moral para todos os seres
racionais faz a dicotomia da visão cristã feudal de homens bons e maus. Adiante,
faremos alusão a essa ética, que tem suas repercussões no mundo contemporâneo.
Outro filósofo, Hegel não pode deixar de ser elencado nesse período,
haja vista suas contribuições relativas à história filosófica da liberdade, tema este
central do seu pensamento.
Quando discorro sobre a ética contemporânea, acerca do
pensamento ético atual, devo incluir nomes como Kierkegaard, Marx, Nietzsche,
65
Freud, Gramsci e Sartre. Os filósofos da época indagaram: O que é o homem? Para
Marx (ser econômico), em Heidegger (existência, ser existente), Freud (ser
libidinoso) e em Sartre (ser livre).
No dizer de Vasquez, de acordo com a orientação geral que segue o
movimento filosófico, desde Hegel aos nossos dias, o pensamento ético também
reage:
a) contra o formalismo e o universalismo abstrato e em favor do homem
concreto (...)
b)contra o racionalismo absoluto e em favor do reconhecimento do irracional
do comportamento humano(...)
c) contra a fundamentação transcendente (metafísica) da ética em favor da
procura da sua origem no próprio homem (...) (VÁSQUEZ; 2000 p. 285).
Com essa afirmação visualizo o desafio atual em relação ao
pensamento ético e os diferentes rumos nos quais se orientam a doutrina
contemporânea no campo da ética.
2.4.2 O pensamento ético de Immanuel Kant
Kant define a ética como a ciência das leis da liberdade, aceitando
também que se a compreenda como a teoria dos costumes. Seus imperativos
(mandamentos da razão) categóricos ou mandamentos absolutos podem ser:
técnicos (pertencentes à arte), pragmáticos (pertencentes ao bem-estar) e morais
(pertencentes à livre conduta em geral, aos costumes)
Para Kant, a questão moral básica diz respeito à motivação, daí a
formulação do imperativo categórico: “Age segundo xima tal que possas ao
mesmo tempo querer que ela se torne lei universal” (KANT, 2005, p. 1). Portanto,
antes de executar uma ação, necessário se faz que se reflita se a máxima que
pretendo seguir é digna de ser universalizada. De acordo com o filósofo prussiano, o
homem é legislador de si mesmo e todos os homens são fins em si mesmos. Posso
dizer com isso que o homem, para Kant, assume figura central, pois sendo ele
66
sujeito cognoscente (consciência moral) a si mesmo a sua própria lei. Ele é
criador e está no centro tanto do conhecimento quanto da moral.
Em sua obra Crítica da razão prática, Kant afirma que:
Uma ação praticada por dever tem o seu valor moral não no propósito
que por meio dela se quer alcançar, mas na máxima que a determina; não
depende, pois, da realidade do objeto da ação, mas meramente do princípio
do querer segundo o qual tal ação foi praticada (KANT, 2005, p. 27).
Portanto a moral, para ser validada, necessita do imperativo
categórico “tu deves” (o dever), que deve ser precedido pela razão. Percebo que a
ética de Kant é uma ética deontológica, na qual o agir se pelo dever, amor ao
dever pelo dever, obediência à lei pela lei.
Levanto o seguinte questionamento: Quando uma ação é
considerada moral? Perez (2001, p. 29) responde dizendo: “para que uma ação seja
considerada moral, a determinação da mesma deve conter o espírito (ou força da
lei)”. Portanto, a lei exerce poder sobre a vontade, que por sua vez incide contra as
inclinações dos impulsos sensíveis dos sujeitos.
Na Fundamentação da metafísica dos costumes (1785) e
posteriormente na Crítica da razão prática (1788), noto como o filósofo proíbe
degradar o ser humano ao papel de mero instrumento, conforme se depreende do
segundo imperativo categórico: “Age de tal maneira que possas usar a humanidade,
tanto em tua pessoa como na de qualquer outro, sempre e simultaneamente como
fim e nunca simplesmente como meio” (KANT, 2005, p. 59). Verifico aqui o conteúdo
humanista deste pensamento onde, o respeito pela dignidade do ser humano tem
grande expressão. Nesse pensar, cita-se Valls quando afirma:
Convém lembrar que a ética de Kant o proíbe tratar os homens como
meios, mas sim, proíbe que se trate a humanidade, em nós ou nos outros
meramente como meio e não ao mesmo tempo como um fim em si (a
doutrina da dignidade humana) (VALLS, 2004, p. 152).
A ética Kantiana é uma ética formal e autônoma, quer dizer, ela deve
ser aplicada a todos os homens, independente de sua posição social. A autonomia
que é conferida ao homem é fundamental em seu pensar, tendo em vista que para
haver um comportamento moral, necessário se faz que esteja atrelada a um sujeito
autônomo, livre, ativo e criador. A autonomia proposta por Kant está diretamente
relacionada com a razão.
67
A liberdade, em Kant, deverá ser procurada fora do campo da
experiência e da razão teórica, portanto, na razão prática, onde se é possível pensar
a liberdade e reivindicá-la para o sujeito moral. Esse sujeito moral, no plano das
decisões éticas, pode escolher e optar atuando assim como causa livre. Suas ações
podem ser remetidas à sua liberdade, a algo que não atue determinadamente, mas
que pode iniciar absolutamente uma série de ações. Daí, a importância da
autonomia do sujeito nas suas decisões morais.
2.4.3 Pensamento ético de Kant e a Bioética
Na história verifica-se, a partir do Iluminismo, o papel preponderante
da autonomia no pensamento ético. Kant procurou defender a autonomia do sujeito
bem como um conceito ilimitado de respeito por essa autonomia. Kant (2005, p. 66)
afirma que “a autonomia é, pois, o fundamento da dignidade da natureza humana e
de toda a natureza racional”.
Na perspectiva de Kant, o homem não deve ser tratado como meio,
mas, e somente só, como fim em si mesmo. Afirma o filósofo que não podemos
dispor do homem para mutilar, degradar ou matar (KANT, 2005, p. 60). Projetando
esse pensamento para a Bioética, deve-se evitar a utilização de um doente para o
“bem da sociedade” ou para experiências médicas injustificadas. Uma pessoa não
pode ser considerada um mero objeto de satisfação dos nossos interesses ou
desejos. Não pode, portanto, ser manipulada ao nosso bel prazer. Isso também
inclui a responsabilidade que assume a equipe de saúde no atendimento do
paciente, bem como orienta pesquisadores, indicando limites, não atentando contra
a essência da pessoa.
O respeito pela dignidade do ser humano, visualizada no pensamento
ético de Kant, ganha expressão na atualidade, tendo em vista que o cerne da
Bioética é o ser humano e seus valores morais. Os profissionais da saúde que
realizam pesquisas clínicas devem contemplar esse imperativo de Kant. Ao
executarem pesquisas sem que, após o devido esclarecimento, haja o
consentimento do pesquisado, estarão tratando o sujeito como mero objeto e não
um fim em si mesmo.
68
O pensamento Kantiano sugere que a clonagem seria considerada
por Kant como moralmente proibida se o clone não fosse respeitado como um fim
em si mesmo e concebido como mero meio de fornecer órgãos no futuro.
2.4.4 Kant na pedagogia e no ensino da Bioética
A educação familiar, o ambiente e a escola exerceram na vida de
Kant influências marcantes sobre seu caráter, bem como sobre suas idéias e
doutrinas. A dignidade e o valor da natureza humana são frutos desse passado
vivenciado por Kant, sendo dever do homem produzir em si a moralidade (KANT,
2004).
Diante dos questionamentos propostos pelo filósofo da Prússia, ou
seja: O que podemos fazer? O que devemos fazer? O que podemos esperar?
Deparo-me com certa dificuldade em fornecer respostas. Porém, baseando-me em
seu próprio ensinamento, procuro trazer algumas reflexões. De acordo com Markl
(2002, p. 36), Kant lembra da importância do método crítico, ou seja, “verificar a
confiabilidade do conhecimento e educar os homens para explorarem de forma
metódica e disciplinada, a verdade ou pelo menos procurarem compreender
fielmente a realidade que nos é acessível”. Importante então que o homem tenha
seus conhecimentos fundamentados em bases confiáveis, tendo então a capacidade
de elaborar apreciação correta de seus juízos e de seu agir, fazendo uso de muita
prudência e humildade.
O dever, no que se refere ao fazer, tomando como base o processo
educativo, refere-se à busca incessante do processo da aquisição do conhecimento.
Através do conhecimento é que se pode exercer a dignidade.
Sobre a educação, Kant afirma: “O melhor meio de compreender é
fazer, o que se aprende mais seguramente é o que se aprende por si mesmo”.
Acreditava Kant que a educação tem relação direta com o melhor desenvolvimento
da natureza humana. Em sua obra Sobre a Pedagogia, Kant afirma que o homem é
a única criatura que precisa ser educada (KANT, 2004, p. 11). Dessa afirmação é
possível inferir que o homem, além da necessidade de cuidados, possui também
necessidade premente de formação, sendo esta, de acordo com Kant, aquela que
69
compreende a disciplina e a instrução. Kant colocava a educação como condição
necessária para o homem se tornar verdadeiro homem, a educação como
responsável direta pela sua formação moral. Confirma-se esse pensar em seu dizer
“Ele é aquilo que a educação dele faz” (KANT, 2004).
Ao reportar-me ao ensino da Bioética, faço alusão às reflexões de
Kant no que concerne à visualização da perfeição da natureza humana melhorada
através do processo educativo, projetando em uma perspectiva futura da felicidade
da espécie humana. O ensino da Bioética vem contribuir com essa perspectiva
quando visualiza a necessidade de educar para que o homem tenha condições de
contribuir com a felicidade, numa universalização. Devido ao poder que lhe é
conferido, o homem tem a condição de, através de seu agir moral, trazer a felicidade
ou até mesmo a destruição para a espécie humana.
Em seu pensamento, Kant (2004, p, 19) afirma: “a educação é uma
arte cuja prática necessita ser aperfeiçoada por várias gerações”, e ainda:
Somente pode surgir um conceito da arte de educar na medida em que
cada geração transmite suas experiências e seus conhecimentos à geração
seguinte, a qual lhes acrescenta algo de seu e os transmite à geração que
lhe segue (KANT, 2004, p. 21).
Recordo aqui os ensinamentos que as gerações passadas nos
forneceram. Atrocidades foram realizadas pelo homem contra a sua própria
natureza, através de abusos experimentais em seres humanos, dando surgimento
ao Código de Nuremberg, com objetivo de nortear pesquisas. Fatos estes que
suscitaram discussões mundiais, gerando a elaboração de normas que guiassem o
agir humano na tentativa de que tal desumanização não mais se repita. Visualizo
então como as palavras de Kant ressoam na atualidade, e como o ensino da
Bioética ganha força e expressão hoje. Assim a educação deve visar a benefícios,
não somente em curto prazo, mas principalmente para que as ações educativas
tenham reflexos na construção de um futuro melhor. No ensino da Bioética é
manifestada a preocupação que se deve ter com toda a biosfera habitada pelo
homem.
Kant lembra que através da educação o homem deve ser
disciplinado, tornar-se culto, prudente e moral, sempre voltado para os bons fins,
que devem ser universais.
70
Segundo nos lembra Kant, a educação necessita ser apoiada em
princípios, perdendo assim seu caráter puramente mecânico. Esse critério vem ao
encontro dos conteúdos ministrados na disciplina de Bioética, uma vez que esta;
como visto, tem como fundamento princípios tais como: autonomia, beneficência,
não-maleficência, justiça. Todos servem ao conjunto da ética, procurando levar em
consideração os seus diversos campos de atuação. Manifesta-se aqui a importância
do princípio da universalização, pelo seu uso freqüente no campo da ética médica,
na pesquisa e experimentação em seres humanos.
No mundo contemporâneo, experimenta-se uma inversão de valores
morais que, por sua vez, são o fundamento da ética. Diante do espantoso
desenvolvimento tecnológico e científico percebe-se que o ser humano foi perdendo
seu valor e sua posição central de sujeito historicamente constituído. Parece ter
havido gradativamente uma espécie de perda de humanização. O dinheiro, o lucro e
o poder assumem grande valor na sociedade contemporânea.
Quando se olha a ciência, verifica-se que o próprio conhecimento
científico se torna um valor a ser perseguido, ficando muitas vezes o homem
paralelo a ele, ou seja, produz-se o conhecimento simplesmente para se ter mais
conhecimento, ou mesmo que dele apenas se usufrua o lucro financeiro.
Urgente se faz que o ser humano seja recolocado no centro da
problemática de valores. Daí a importância da educação, precisamente a da
Bioética, haja vista que ela favorece as relações mútuas entre os homens, levando-
os a preservar seu bem mais precioso a vida. Nesse sentido, as reflexões da
Bioética no processo educativo contribuem para um conhecimento pautado em
valores e princípios éticos que ajudam o homem a conduzir o seu agir dentro de uma
moral-prática.
Nesse contexto, a educação envolve uma relação com o mundo dos
valores. A dimensão ética do bem não pode esquivar-se do processo e da finalidade
educativa, mas deve estar voltada para a promoção do homem. Homem este
possuidor de autonomia, valores, crenças, experiências e medos. Portanto, um ser
singular, único. Daí a necessidade que se impõe do respeito à pessoa humana, não
a subjugando à qualidade de objeto, como já dizia Kant.
Na universidade, observa-se a preocupação dos docentes em formar
pessoas habilitadas técnica e cientificamente para o mercado de trabalho em
detrimento da formação pessoal, pautada em valores éticos e morais. Não se pode
71
perder de vista o ser humano enquanto ser individual e coletivo. Daí a importância
da formação de valores através da Bioética, em que a pessoa é vista como sujeito
moral, investida de um valor absoluto que se expressa pela sua dignidade,
insubstituível.
Diante dessas reflexões, em que Kant enaltece a educação, a
autonomia e o valor do ser humano, percebo que a Bioética pode auxiliar a
compreensão desses aspectos ao assumir a humanização como um valor a ser
perseguido para que a humanidade encontre ressonância entre o ter, o ser e o
saber. Isso justifica a ênfase dada, pelo presente estudo, da importância do ensino
da Bioética na formação do profissional Enfermeiro, com o objetivo de tornar o
cuidado mais humanizado.
72
CAPÍTULO III
O PERCURSO METODOLÓGICO
“O método qualitativo de pesquisa, opção metodológica que se mostra cada vez mais
utilizada na Enfermagem, oferece a possibilidade de alcançar as respostas para questões
particulares que envolvem o cuidado e a assistência de enfermagem”.
Neide de Souza Praça.
73
3.1 O CAMINHO PERCORRIDO
No intuito de tornar o conhecimento obtido adequado a um modelo
acadêmico, cuja sistematização é requisito para transformá-lo em ciência, foi
necessário utilizar-me de critérios que dessem cientificidade às minhas
interrogações.
Nas leituras realizadas, observei que para ser reconhecido como
científico, o discurso necessita ser gico, coerente, sistemático e, sobretudo, ser
bem argumentado, distanciando-se de outros conhecimentos como senso comum,
sabedoria, ideologia (DEMO, 2000, p. 26).
Dentre as metodologias que o conhecimento científico faz uso para
captar a realidade, optei pelo método histórico-dialético, numa abordagem
qualitativa. Triviños (1987, p. 51) esclarece que o materialismo histórico é: “a ciência
filosófica do marxismo que estuda as leis sociológicas que caracterizam a vida da
sociedade, de sua evolução histórica e da prática social dos homens”.
Os sujeitos foram professores e alunos inseridos num contexto social.
Importante se faz o estabelecimento de um enfoque metodológico que se relacione à
necessidade de obter uma aproximação com sujeitos que desvelem a essência de
suas vivências e experiências, que possibilite a captura das perspectivas dos
participantes, buscando entendê-los numa totalidade concreta. Gadotti (2003, p. 25)
vem em meu auxílio dizendo : “o pressuposto básico da dialética é que o sentido das
coisas não está na consideração de sua individualidade, mas na sua totalidade, em
que tudo tem que ver com tudo, nada é isolado”.
O método histórico-dialético possibilita uma crítica às questões
intrínsecas da profissão de Enfermagem, pois ela está articulada com a totalidade
das realidades sociais, econômicas e políticas. Em relação ao método, dialético,
Minayo complementa dizendo que:
Os princípios da especificidade histórica e de totalidade lhe conferem
potencialidade, para, do ponto de vista metodológico, apreender e analisar
os acontecimentos, as relações e cada momento como etapa de um
processo, como parte de um todo (MINAYO, 2000, p. 13)
74
Fazendo uso dessa abordagem pude reconhecer as contradições
existentes na realidade da prática da Enfermagem e de como a totalidade se torna
premente na compreensão e na discussão de novos rumos para a profissão.
Em relação ao método dialético, Gadotti (2003, p. 24-27) faz
inferência aos princípios gerais da Dialética sendo eles:
a) Tudo se relaciona (princípio da totalidade);
b) Tudo se transforma (princípio do movimento);
c) Mudança qualitativa (princípio da mudança qualitativa);
d) Unidade e luta dos contrários (princípio da contradição).
Esse mesmo autor, ao referir-se ao princípio da contradição, aborda
que ela é a essência ou a lei fundamental da dialética, pois a transformação das
coisas só é possível devido às forças opostas que estão no interior das mesmas,
tendendo simultaneamente à unidade e à oposição (GADOTTI, 2003, p. 27).
Perante a realidade complexa e emergente que está posta, faz-se
necessária a utilização de metodologias qualitativas. De acordo com revisões
bibliográficas que efetuei, verifiquei que a abordagem qualitativa tem sido a opção
metodológica que vem sendo cada vez mais utilizada nas pesquisas em Educação e
em Enfermagem. De acordo com Merigui, essa abordagem oferece a possibilidade
de alcançar as respostas para questões particulares que envolvem o cuidado e a
assistência da Enfermagem, desvendando assim, os aspectos subjetivos da
experiência humana no processo de saúde (MEREGUI, 2003).
Esta pesquisa encontra ressonância com o dizer de Meregui, pois se
busca obter conhecimentos e possíveis respostas sobre a relevância do ensino de
Bioética na formação do profissional Enfermeiro.
No dizer de Minayo (1999, p. 21), a pesquisa qualitativa trabalha com
o universo dos significados, dos motivos, dos valores, das aspirações e das atitudes,
correspondendo a um espaço mais profundo das relações, dos processos, bem
como, dos fenômenos os quais não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis.
Para que pudesse ser operacionalizada a pesquisa, após a
aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa, dei seqüência à coleta de
dados selecionando, como instrumento, a cnica do Grupo Focal (GF), onde
entrevista e observação encontram-se inseridos. Sobre a observação cito Martins
(2004, p. 87), quando afirma que esta: “utiliza os sentidos na obtenção de
75
determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas
também em examinar fatos ou fenômenos que se deseja estudar”.
Fiz uso da técnica do Grupo Focal, porque, no âmbito das
abordagens qualitativas em pesquisa social e no campo da saúde, esta vem sendo
cada vez mais utilizada. Os sujeitos participantes da pesquisa encontram no Grupo
Focal liberdade de expressão, que é favorecida pelo ambiente, levando a uma
participação efetiva. Também ajuda o fato de o foco principal ser um tema de
conhecimento e interesse de todos, facilitando as relações e interações.
No dizer de Gatti (2005, p. 9), ao se fazer uso da técnica do Grupo
Focal, “há interesse não somente no que as pessoas pensam e expressam, mas
também em como elas pensam e por que pensam”. Daí, a importância de utilizar
essa técnica na pesquisa. Sendo os sujeitos artífices da história, sofrendo influência
do meio social, mister se faz desvelar este “como” e “porquê” pensam, na busca de
novas compreensões, de novo “olhar” no caleidoscópio da ciência, que apresenta
para nós sempre novas possibilidades e até mesmo com surpresas.
Ao se reportar ao Grupo Focal como técnica para coleta de dados,
faz-se menção de que ele é utilizada quando se quer compreender diferenças e
divergências, contraposições e contradições (GATTI, 2005). Nesse pensamento, o
método dialético ganha força, tendo em vista que a contradição é a mola propulsora
para o desvelamento do real, da apreensão do real.
3.2 SOBRE A TÉCNICA DO GRUPO FOCAL (GF)
Essa técnica é empregada há muito tempo. Mencionada
primeiramente como técnica de pesquisa em marketing nos anos de 1920. Foi
introduzida nas ciências sociais, por R. Merton, em 1950, com o objetivo de estudar
as reações das pessoas à propaganda de guerra. Pertence à categoria mais geral
de pesquisa aberta ou não estruturada, visando colocar as respostas do sujeito no
seu próprio contexto (MINAYO, 2000, p. 109). Grupo Focal é uma técnica que
integra, discute, avalia o tema proposto, sendo flexível e dinâmico, pois, na primeira
etapa dos trabalhos são realizadas atividades de descontração, cujo comportamento
pode envolver o grupo durante a reunião.
76
Em relação à importância desta técnica, cito Minayo,
O grupo focal consiste numa técnica de inegável importância para se tratar
das questões da saúde sob o ângulo do social, porque se presta ao estudo
de representações e relações dos diferenciados grupos profissionais da
área, dos vários processos de trabalho e também da população (MINAYO,
2000, p. 129).
De acordo com Debus, Grupo Focal é uma das principais técnicas de
investigação, que se apropriou da dinâmica de grupo, permitindo a um pequeno
número de participantes ser guiado por um moderador qualificado, procurando
alcançar níveis crescentes de compreensão e aprofundamento de um tema em
estudo (DEBUS, 2004, p. 3).
Giovanazzo (2001) explicita a finalidade do Grupo Focal, sendo este
apropriado quando o objetivo é explicar como as pessoas consideram uma
experiência ou uma idéia e, durante a reunião, possam ser obtidas informações
sobre o que as pessoas pensam ou sentem ou ainda sobre a forma como agem.
Diante desses pensamentos, acredito que esta técnica vem ao
encontro do objeto de pesquisa, haja vista que o relato das vivências e experiências
dos acadêmicos e professores é fundamental para a captação do real por eles
vivenciado. Através da interação que ocorreu nos grupos, pude verificar a força que
o componente histórico exerce sobre a Enfermagem enquanto profissão, e como o
contexto social influencia a tomada de decisão destes.
Autores relatam sobre a cnica, informando que a mesma deve ser
composta por 8 a 12 elementos. Quanto maior o grupo, maior a possibilidade de
haverem conversas paralelas, o que certamente influenciará negativamente nos
resultados.
3.3 PARTICIPANTES DO GRUPO FOCAL: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Em relação à seleção dos participantes do GF, privilegia-se a escolha
segundo alguns critérios, conforme o problema em estudo, e desde que possuam
características comuns que os qualifiquem para a discussão da questão focal
77
(GATTI, 2005). Também convém assinalar que os participantes devem ter vivência
com o tema a ser discutido, propiciando riqueza na troca de informações.
Nesta pesquisa, a referida técnica foi realizada com dois grupos
distintos: um de docentes e outro de alunos. O primeiro composto por sete docentes
do Curso de Enfermagem, de duas Instituições de Ensino Superior da cidade de
Ponta Grossa, no estado do Paraná.
Para compor o grupo de alunos, selecionei oito universitários da
Instituição de Ensino Superior “Lâmpada”. Quanto aos critérios para a seleção
desses sujeitos considerei: Alunos matriculados no curso de Enfermagem matutino
ou noturno; que já tivessem atuação na área de Enfermagem; que cursaram a
disciplina de Bioética em Enfermagem (terceiro período); que fossem alunos da
instituição “Lâmpada”, pelo fato de que nela, a disciplina de Bioética integra a grade
curricular. Considerei importante o que esses alunos tinham a dizer sobre a face
humanizadora da Bioética na formação do profissional Enfermeiro em um cuidado
mais humanizado.
Para composição do Grupo Focal de docentes, selecionei os
seguintes critérios: enfermeiras docentes que atuassem na Instituição “Lâmpada”;
enfermeiras docentes que atuassem na Instituição “Verde Esmeralda”; que tiveram
ou não participação na disciplina de Fundamentos de Enfermagem I e/ou Bioética
em Enfermagem.
3.4 PLANEJAMENTO DO GRUPO FOCAL
De acordo com revisão de literatura, o Grupo Focal necessita de
prévio planejamento em que aspectos inerentes ao andamento dos trabalhos
necessitam ser contemplados. As decisões referentes ao mesmo foram tomadas
quinze dias antes do convite formulado. Nesse planejamento (Apêndice A) fiz alusão
à equipe, ao orçamento, ao grupo, ao conteúdo, à seleção do local e coleta de
dados, ao convite, ao cronograma e à condução da sessão. A seguir abordarei cada
item em particular, pela importância que possuem.
78
3.4.1 Equipe
A equipe de trabalho na realização do Grupo Focal foi composta de
uma enfermeira, no papel de Moderadora, um psicólogo, como Observador, uma
acadêmica de Enfermagem, como Auxiliar de Pesquisa (GF de alunos), uma
enfermeira, como Auxiliar de Pesquisa (GF de professoras), e eu, como
pesquisadora e também observadora, estando presente na execução de todo o
processo.
3.4.2 Orçamento
Como toda pesquisa, esta também denotou gastos que foram
custeados pela pesquisadora. No orçamento (Apêndice B) foram contemplados
custos com equipamento, material de expediente, coquetel e diversos.
3.4.3 Grupo
A realização desta técnica contou com a participação do moderador,
do observador e do auxiliar de pesquisa como elementos importantes para o
sucesso desejado. A função do observador é registrar, o que se torna um fator
indispensável para o enriquecimento das análises. Chianca apud Gatti (2005)
recomenda que o observador divida o processo de observação em três etapas a
saber: abertura, em que o observador se coloca de forma a registrar o mais
fielmente possível todas as informações; o desenvolvimento, no qual o grupo
começa a se posicionar frente ao tema a ser desenvolvido e; o fechamento, quando
o grupo começa a formular uma síntese dos fenômenos ocorridos.
Diante disso, convidei um colega docente, que é psicólogo, com
atuação no ensino do Curso de Enfermagem da Instituição “Lâmpada”, para auxiliar
nas anotações durante o desenvolver da técnica. Penso que esse profissional possui
habilidades importantes, próprias de sua profissão, tais como a da observação, o
que vem ao encontro do que se pretendeu com a pesquisa. O convite foi realizado
primeiramente pelo telefone e foi prontamente aceito. Posteriormente, fiz a entrega
79
do mesmo pessoalmente. O psicólogo teve participação como observador nos
Grupos Focais de alunos e de professoras.
No Grupo Focal, a observação ganhou grande significado, pois foi
através das palavras, gestos, silêncio, tom de voz, da expressão fisionômica que a
essência pôde ser captada. Desta forma procurei, além de ver, examinar como esta
se manifesta.
Quanto à função do moderador, em todas as leituras que foram
efetuadas, os autores foram unânimes em concordar com o papel preponderante
que exerce. É dele a responsabilidade pelos encaminhamentos e direcionamentos
necessários, bem como o incentivo na participação de todos os componentes do
grupo, para que se aprofundem as discussões, possibilitando a revelação de novos
aspectos e novos olhares, relativos ao tema.
No GF, o que ganha grande significado são as interações que se
estabelecem entre os membros. As respostas das perguntas feitas pelo moderador
ficam em segundo plano. Essas interações é que possibilitam a captação de
significados. No dizer de Gatti (2005, p. 9), “o grupo focal permite emergir uma
multiplicidade de pontos de vista e processos emocionais, pelo próprio contexto de
interação criado, permitindo a captação de significados que, com outros meios,
poderiam ser difíceis de manifestar”.
O moderador da discussão deve ter o máximo de cuidado de não
emitir opiniões particulares, de concordar ou não com as colocações realizadas
pelos participantes, de se posicionar perante as idéias do grupo. Enfim, sua atuação
se baseia em realizar encaminhamentos pertinentes ao tema focado e atentar para a
participação de todos na discussão, criando condições para que as interações
aconteçam.
Para exercer o papel de moderadora no GF, convidei uma colega
enfermeira, mestre, com atuação em um Órgão de Saúde do Estado do Paraná,
também docente no Curso de Enfermagem da Instituição “Lâmpada. Como
características aponto a liderança, visão grupal e boa interação com os sujeitos da
pesquisa. Ela teve participação nos Grupos Focais de alunos e de professoras. O
convite foi realizado primeiramente pelo telefone, e foi prontamente aceito.
Posteriormente realizei a entrega do mesmo pessoalmente.
A atuação da moderadora foi considerada como de baixo
envolvimento, isto é, a moderadora tinha o controle dos tópicos a serem discutidos e
80
da dinâmica da discussão, porém, seu papel se restringiu a fazer a discussão
progredir sem fazer comentários diretivos.
Durante o transcorrer das atividades propostas é importante a
presença do auxiliar de pesquisa, pois tem como funções evitar a distração dos
participantes e facilitar o transcorrer de todo o percurso programado. Através de
contato telefônico, convidei a assumir esse encargo uma acadêmica de
Enfermagem, a qual prontamente aceitou e no dia seguinte, realizei a entrega do
convite em sua residência. Ela teve atuação no Grupo Focal de alunos. Para o grupo
de professores fiz o convite a uma colega Enfermeira que é docente da Instituição
de Ensino Superior “Verde Esmeralda” que também de imediato aceitou o convite
realizado.
Nesse planejamento, estabeleci que fosse feita uma reunião única
dos Grupos Focais de professoras e de alunos.
3.4.4 Conteúdo
Em relação ao conteúdo elaborei um roteiro de entrevista contendo
questões do tipo: introdutória, de transição, chave, final, resumo e de fechamento.
Esse roteiro das questões pertinentes ao grupo focal de alunos e de professoras,
encontra-se no Apêndice E.
Saliento que estas perguntas norteadoras do grupo, ficando sob
encargo da moderadora sua condução, auxiliando desta forma na progressão e no
enriquecimento da reunião.
3.4.5 O ambiente e os recursos utilizados
Para que esta técnica tenha êxito, é muito importante que se
atenção ao ambiente onde ocorrerá a reunião do Grupo Focal. Este deve estar livre
de barulho, de situações de permitam a distração, ser confortável, agradável,
preferencialmente que seja um local diferente do cotidiano dos participantes da
pesquisa e de fácil acesso.
81
O uso desta técnica necessita de recursos, tais como gravação e/ou
filmagem das falas, o que requer um ambiente silencioso, já mencionado.
O ambiente deve permitir o manuseio de cadeiras. A melhor maneira
de dispô-las é em forma de “U” ou circular, possibilitando assim a visualização, pelo
moderador e pelo observador, de todos os participantes, bem como de cada
membro do grupo entre si.
O ambiente escolhido, um salão de festas de um condomínio,
adequou-se perfeitamente aos requisitos citados.
As cadeiras foram dispostas ao redor de mesas centrais, ficando os
participantes em forma de círculo com a possibilidade de visualização de todos entre
si. A moderadora, a auxiliar de pesquisa e eu também estávamos presentes neste
círculo. O observador optou em permanecer fora do círculo, atrás dele para poder
visualizar com maior facilidade, e levantar-se em determinados momentos para
anotações mais fiéis sem perturbar demasiadamente a pesquisa em questão
(Apêndice F).
Recorri à gravação como recurso auxiliar. Três gravadores foram
posicionados em espaços diversos sobre a mesa para a captação da voz, facilitando
a transcrição posterior. Os participantes da pesquisa foram comunicados e avisados
que a sessão seria gravada, não havendo nenhuma objeção ao fato. Os gravadores
foram ligados no início da reunião, com intervalo entre eles de aproximadamente 3
minutos, cada um, fazendo com que no momento de troca das fitas dois gravadores
continuassem em operação. Isso fez com que não houvesse interrupção ou perda
de parte das conversas entre as trocas de fitas.
3.4.6 Convite
Inicialmente elaborei uma lista de potenciais participantes que iriam
ser convidados a participar das sessões. De acordo com Freitas; Oliveira (1998, p.
11)“, esta lista deve levar em consideração os objetivos da pesquisa, a consideração
das possíveis contribuições destas pessoas ao objetivo da pesquisa e as
características das pessoas”.
Posteriormente realizei contato telefônico com esses prováveis
participantes, verificando a possibilidade e a aceitação. Chamou-me a atenção que
82
os alunos ficaram lisonjeados com o convite. Alguns confirmaram sua presença no
momento do convite e outros o fizeram posteriormente, pois dependiam da
possibilidade de troca de plantão em seus locais de trabalho.
Quanto ao convite realizado para os docentes, as dificuldades foram
maiores. Duas professoras contatadas por telefone não deram retorno. Tive que
repetir as ligações para obter resposta. Deu-me a impressão de falta de interesse
e/ou de compromisso com o material ou com o tema proposto.
Consecutivamente realizei a entrega dos convites para os alunos e
professoras em seu local de trabalho e/ou residência. O convite (apêndice D)
contém o objetivo do encontro, o tema a ser abordado, o local, data e hora, assim
como telefones para contato com a pesquisadora. Nele saliento ainda a importância
da participação de cada um.
Por motivo de segurança, no dia anterior ao evento, fiz contato com
os participantes, fazendo-os lembrar-se do compromisso bem como confirmando
suas presenças. Porém, isso não foi suficiente para garantir o número de
participantes previstos para a composição do grupo. Uma das docentes não
compareceu por encontrar-se acamada. Sua presença não foi substituída, ficando o
grupo composto por sete docentes. O Grupo Focal de alunos obteve cem por cento
de presença.
No momento da entrega dos convites, percebi que alguns
demonstravam inquietação, curiosidade, ansiedade com os aspectos inerentes,
principalmente, à cnica, sendo para todos algo desconhecido. Uns preocupados
com o tema, queriam fazer uso de literatura para maior subsídio. Orientei que não
era necessário, visto que o objetivo da pesquisa era a contribuição pessoal sobre o
assunto.
A moderadora e o observador não possuíam conhecimento da
referida técnica, o que foi sanado com entrega de material bibliográfico com
posterior discussão. Reunimo-nos previamente para discutir a técnica, em que as
dúvidas foram sanadas. Pela forma com que os trabalhos transcorreram, percebi
que eles dominaram o assunto.
3.4.7 Cronograma
83
Dentro do cronograma estabelecido, não houve necessidade de
realizar modificações de datas. As reuniões ocorreram num intervalo de quinze dias.
Num primeiro momento foi realizado o Grupo Focal de alunos, posteriormente o de
docentes.
O cronograma foi assim definido: planejamento, condução e análise.
A elaboração do planejamento exigiu duas semanas que incluíram a seleção da
temática dos participantes, a divisão das atividades e a metodologia de trabalho. A
condução constituiu-se do recrutamento dos participantes exigindo uma semana.
Para análise dos dados (transcrição e tratamento dos dados), detive-me cerca de 40
dias.
3.4.8 Condução da sessão (grupo Focal de Alunos)
Primeiramente farei menção à condução da sessão no Grupo Focal
de alunos e posteriormente a das docentes.
Para dar andamento às reuniões realizei um roteiro de atividades do
Grupo Focal (Apêndice E) com o objetivo de cumprir todos os passos. Procurei
desta forma, situar a equipe de trabalho (observador, moderador, pesquisadora e
auxiliar de pesquisa) promovendo, assim, diminuição da ansiedade para obter os
melhores resultados possíveis. Esse roteiro será explanado devido sua importância
na coleta de dados com a técnica do Grupo Focal.
3.4.8.1 Organização da sala de dinâmica:
O ambiente foi composto por duas mesas agrupadas, doze cadeiras
ao redor, três mesas auxiliares, uma mesa grande, onde foram dispostas figuras
diversas e um balcão, onde foi servido o coquetel.
84
3.4.8.2. Acolhimento dos sujeitos da pesquisa:
À medida que os sujeitos da pesquisa e a equipe de trabalho foram
chegando ao local, um coquetel aguardava-os, proporcionando descontração e
interação entre os membros além de um gostoso café da manhã. Durante o tempo
de descontração foi entregue crachá individualizado. A auxiliar de pesquisa solicitou
o preenchimento de dados dos sujeitos da pesquisa contendo: nome, endereço,
cidade, telefone, e-mail, profissão, local de trabalho, tempo de atuação na profissão
e período em que se encontra na faculdade de Enfermagem.
3.4.8.3 Técnica para descontração e para eleição do pseudônimo.
No terceiro momento orientei os participantes da pesquisa para
elegerem uma gravura que se aproximasse da resposta à questão: Como você se
sente como acadêmica (o) hoje? Figuras diversas foram dispersas sobre a mesa
para que cada participante elegesse uma. Após a escolha, solicitei que colassem em
papel próprio e escrevessem um pseudônimo que traduzisse o significado do
desenho escolhido. Nas mesas auxiliares estavam dispostos canetas, cola e papel
(Apêndice G).
3.4.8.4 Explanação sobre a técnica
Posteriormente à eleição da gravura e ao preenchimento do
pseudônimo, os participantes escolheram seus lugares à mesa de forma aleatória.
Tomando a palavra, a moderadora apresentou-se dando as boas vindas, agradeceu
a presença de todos e do auxílio que davam para a execução desta pesquisa. Fez
também a apresentação do observador e da auxiliar de pesquisa esclarecendo aos
acadêmicos a função que estes teriam no Grupo Focal. Inicialmente realizou uma
breve apresentação dos tópicos de discussão, uma abordagem sobre a técnica e
seu objetivo, a orientação à utilização do gravador, e orientação sobre a dinâmica do
85
trabalho (importância de todos participarem, de evitar as conversas paralelas, evitar
dispersão, por exemplo, levantar das cadeiras, etc.). Por último, a moderadora
apresentou o tema focal da reunião, ou seja, a humanização na formação do
profissional Enfermeiro, sob a ótica dos alunos.
3.4.8.5 Assinatura da lista de presença e leitura e assinatura do Termo de
Consentimento livre e esclarecido
Os participantes assinaram a lista de presença contendo nome,
pseudônimo, profissão e tempo de atuação. Na seqüência, a moderadora fez a
leitura do Termo de Consentimento (Apêndice H), cujo preenchimento e assinatura,
pelos sujeitos da pesquisa, deram-se em seguida.
3.4.8.6 Apresentação dos participantes
A moderadora solicitou que se fizesse a apresentação de cada
participante, em que dados como nome, local onde trabalha, período que está na
faculdade, profissão e tempo de atuação, bem como pseudônimo eleito fosse
partilhado com o grupo. As apresentações foram de forma seqüencial, iniciando-se
pela esquerda da moderadora, o que foi livremente decidido pelo grupo. Os
participantes foram denominados pelos seguintes pseudônimos, no intuito de
salvaguardar sua identidade: Dificuldade, Guerreira, Abertura, Contente, Capaz,
Realizada, Realizada II e Realizado.
3.4.8.7 Início das perguntas norteadoras e finais:
Após a apresentação de cada participante, a moderadora deu início
às perguntas norteadoras. Estando a discussão ocorrendo em torno de uma hora,
deram-se início as perguntas finais.
86
3.4.8.8 Síntese dos principais temas abordados
A moderadora realizou a síntese do que havia sido abordado
solicitando que cada um fizesse uma colocação sobre o tema, algo esquecido que
ainda pudesse contribuir no fechamento das discussões. Todos falaram,
contribuindo sobremaneira com a pesquisa.
3.4.8.9 Agradecimentos da pesquisadora
No momento final, tomei a palavra e agradeci a presença de todos,
inclusive da equipe de trabalho, que prontamente se colocou à disposição.
A reunião do grupo focal de alunos teve duração de 2 horas e 30
minutos com o comparecimento de todos. Os acadêmicos agradeceram muito o fato
de terem sido escolhidos, dizendo que desconheciam a técnica e que se sentiram
‘importantes’ por poderem contribuir com a pesquisa. Para eles, foram momentos de
grandes reflexões e de uma visita ao passado, quando revivenciaram situações
acadêmicas e profissionais.
Posteriormente, iniciei a transcrição dos dados que exigiram tempo e
material. Neste Grupo Focal foram utilizadas vinte laudas para a transcrição e três
para o relato das observações.
3.4.9 Condução da sessão (Grupo Focal de Professoras)
Para dar andamento à pesquisa, realizei, como no grupo focal de
alunos, um roteiro de atividades (Apêndice A) para nortear os trabalhos com os
docentes. A reunião ocorreu no mesmo local do Grupo Focal de alunos, com um
coquetel recepcionando os colegas. Evitando repetições desnecessárias, farei
referência somente a alguns pontos que foram específicos deste Grupo Focal. Os
demais tópicos trabalhados foram idênticos ao Grupo Focal de alunos. Na equipe
87
de trabalho houve mudança na auxiliar de pesquisa, sendo esta uma colega
docente.
Para a eleição do pseudônimo das professoras utilizou-se a técnica
da Estrela, de autoria de Lopes (2000, p. 59). As participantes da pesquisa foram
orientadas a escolherem uma mensagem escrita numa estrela. Ela estava com
pontas dobradas e a mensagem escrita em seu interior. Foram distribuídos copinhos
contendo água. A estrela foi colocada neste copo com as pontas dobradas viradas
para cima. Devido à umidade, com o passar dos segundos, as pontas se abriram
possibilitando a leitura. Solicitou-se então às docentes que diante da mensagem,
escolhessem a palavra que mais as marcaram. A palavra escolhida pelas
participantes foi utilizada como pseudônimo (Apêndice G).
Esta reunião teve igual duração a do grupo focal de alunos, isto é, 2
horas e 30 minutos. As professoras agradeceram o convite e expuseram que outros
momentos como estes deveriam ser repetidos devido à importância das reflexões
sobre a formação e que eles se fazem necessários acontecer esporadicamente.
Na seqüência dei início à transcrição dos dados que denotaram
tempo e material. Nesse Grupo Focal de professoras, foram utilizadas vinte e quatro
laudas para a transcrição e também três para o relato das observações.
Deixo aqui registrado, às contribuições da moderadora com suas
inferências, que aconteceram em momento posterior à realização do grupo focal.
Após parte do material transcrito, reuni-me com a mesma para análise dos dados.
Ela teceu comentários quanto à participação heterogênea do grupo de alunos.
Houve necessidade de incentivar a fala de alguns acadêmicos, tendo em vista o
monopólio da conversa assumida por outros. No grupo focal de professoras a
participação foi homogênea. Salientou a riqueza da técnica como instrumento para
melhorar as relações interpessoais, bem como, proporcionou visita ao passado de
cada profissional, inclusive ao seu. De acordo com ela, houve interação e grande
crescimento para todos. O envolvimento dos participantes foi notório, pois a
abordagem do tema focal, a humanização, é inerente a prática individual dos
envolvidos.
Neste capítulo procurei descrever o caminho percorrido para a coleta
de dados desta pesquisa, como também a opção metodológica, salientando os
passos realizados. A humanização na formação do profissional Enfermeiro foi o
assunto focalizado nos dois Grupos Focais.
88
CAPÍTULO IV
CONTRIBUIÇÃO DA BIOÉTICA NA FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL
ENFERMEIRO PARA UMA ASSISTÊNCIA HUMANIZADA
Para ser humano, é preciso emocionar... e bater palmas se a platéia não se
interessou e seguir esta paixão quando todos dela fogem. Ser Enfermeiro é uma escolha, não
há de ser submissão”.
Autor desconhecido
89
Neste capítulo será analisada a contribuição da Bioética para a
formação do profissional Enfermeiro em um cuidado humanizado pela ótica dos
alunos, bem como a concepção de assistência humanizada e sua concretização na
prática.
Para efeito deste estudo, alunos do curso de Enfermagem, de uma
Instituição de Ensino Superior tornaram-se sujeitos da pesquisa. De um universo de
trezentos e quarenta e nove alunos do curso de Enfermagem matutino (196 do
período matutino e 153 do noturno) da Instituição “Lâmpada” selecionei oito, através
dos critérios que já foram explanados anteriormente. Duas alunas do quinto período
noturno, duas alunas do sexto período diurno, duas alunas e um aluno do sétimo
período diurno, e uma aluna do oitavo período diurno.
No quadro abaixo apresento dados obtidos no grupo focal de alunos.
QUADRO 1 – RESULTADO DO GRUPO FOCAL DE ALUNOS
Nome Pseudônimo Profissão/Onde trabalha Tempo atuação
P. G.H. Dificuldade Técnica - Laboratório 10 anos
A.C.M. Guerreira Técnica - Instituto Saúde 11 anos
T.W.S. Contente Técnica - Hemepar 28 anos
M.Z.S. Abertura Técnica - Hospital B.J. 4 anos
M.M.S. Capaz Auxiliar - Assist.Médica 20 anos
R.B. Realizada Técnica - Hospital B.J. 3 anos
D.D.S. Realizada II Auxiliar - Hosp. Criança 9 anos
R.P. Realizado Auxiliar - Nefromed 5 anos
Fonte: a autora
Como se vê, na escolha do pseudônimo, que foi de caráter individual,
três participantes, ao responderem à pergunta sobre como se sentiam como
acadêmicos, expressaram que estavam realizados. Como duas acadêmicas
escolheram o mesmo pseudônimo, optei por identificar uma delas como Realizada II.
O outro participante que também escolheu o mesmo pseudônimo, permaneceu
como Realizado, por ser do sexo masculino.
Dos oito participantes, cinco são Técnicas de Enfermagem e três
Auxiliares de Enfermagem. Todos possuem ocupação em diversas áreas da saúde.
Esse foi um dos critérios estabelecidos na escolha dos sujeitos da pesquisa.
90
É relevante destacar o tempo de atuação que os escolhidos possuem
na área de Enfermagem. Todos com mais de três anos, quatro com mais de 10 anos
e um com 28 anos de profissão. A experiência na área confere à pesquisa um
caráter importante, pois a vivência certamente contribuiu para a riqueza do que foi
explanado.
Os dados levantados e analisados a partir da ótica dos participantes,
possibilitaram a definição de categorias de análise. Sobre a análise, Minayo (2000,
p. 75) contribui dizendo: “Não podemos conhecer uma coisa a não ser decompondo-
a, para a seguir recompô-la, reconstruí-la e reagrupar suas partes. Análise e síntese
são inseparáveis, mas para sintetizar com êxito é preciso analisar”. Pelas
recorrências apresentadas, os dados obtidos foram agrupados nas seguintes
categorias: condições objetivas de trabalho, humanização/humanizador e dicotomia
entre teoria e prática. O objetivo foi organizar para facilitar a análise.
4.1 CONDIÇÕES OBJETIVAS DE TRABALHO
Quando analisei a fala dos alunos, encontrei múltiplos aspectos tais
como: a humanização, as condições de trabalho e as dificuldades. Notória é a
percepção da aflição que os envolve quando abordam sobre sua futura atuação na
função de Enfermeiros. Para fins didáticos, achei melhor realizar uma subdivisão da
categoria ‘condições objetivas de trabalho’ em: pressão exercida e dificuldades em
relação ao contexto social.
4.1.1 Pressão exercida (colegas da equipe/instituição)
O que chama a atenção é que os futuros Enfermeiros sofrem pressão
de sua própria categoria, tanto de Auxiliares como de Técnicos de Enfermagem.
Encontrei nestas falas a confirmação deste fato. Dificuldade disse que “ser
enfermeira pelo que deu para perceber até agora não é nada fácil, quer dizer, é
muito difícil ser enfermeira. Além da parte teórica, além da prática, é muito
91
complicado”. Guerreira relatou: “o que eu noto assim, é a parte dos colegas né, que
são Auxiliares iguais a eu .O colega quando te vê, parece que vai devorar a gente
como se a gente fosse um sanduichão enorme, que a gente sabe tudo porque faz
faculdade. Eles te testam e tão perguntando. (...) e o medo que eu tenho de ser
enfermeira, eu conhecer o pessoal da área de saúde, conheço muita gente né? Eu,
como enfermeira depois, será que vou conseguir controlar esse pessoal? Será que
eles vão me respeitar? Eu tenho medo dessas coisas sabe? Eles o te dão valor
que você têm sabe? Você ta sabendo, você está demonstrando e eles sempre estão
desmerecendo a gente. Eu me sinto assim; um verdadeiro sanduíche. Sempre estão
me testando”.
Essa fala expressou a situação das relações profissionais dentro da
Enfermagem, cheia de dissabores e competições. Nakamae (1987) lembra que
esses degraus na profissão, longe de corresponderem às exigências cnicas, antes
atendem aos interesses capitalistas de economia de mão-de-obra. Sobressaiu-se o
capitalismo quando a profissional mencionou o sentimento de ser testada, de ser
“devorada”. Isso porque a situação econômica do Enfermeiro é melhor, quando
comparada aos demais membros da equipe de Enfermagem, gerando obviamente
situações de inveja. Outro fator a ser lembrado é a questão do conhecimento que o
Enfermeiro possui. Daí o fato de Eles te testam e tão perguntando”. Sobre isso, cito
Nakamae, quando diz:
O enfermeiro ao deter o monopólio do saber no terreno da enfermagem,
exerce papel dominante face aos demais profissionais dessa área,
colocados estes do lado dos que não sabem ou se supõe não saberem
(NAKAMAE, 1987, p. 85).
Percebi também que diante das reflexões proporcionadas pela
faculdade, a aluna possui um outro olhar, onde o capital possui importância. Porém,
ao que me parece, este assume uma desvalia em relação ao valor humano e à vida.
Por isso a recomendação que no decorrer da fala aparece: Falo pra todo mundo; a
faculdade tá lá. Vão buscar conhecimento. Não sei por que não vão”.
O controle exercido pelas instituições de saúde é notório quando
Realizado assim se expressa: “Quando você se percebe cliente é que você vê como
é difícil ter meia hora para visitar a pessoa na UTI, e você trabalha ali e sabe,
mas é uma coisa. Votem meia hora e entra dois. Se entrar dois não tem como
um sair e entrar o outro nem que seja por cinco minutos.”
92
4.1.2 Dificuldades em relação ao contexto social
Os alunos, sujeitos da pesquisa, o acadêmicos de uma Instituição
particular e trabalham para poder custear seus estudos. Isso acarreta transtornos e
dificuldades de operacionalização, ora de aspecto financeiro, ora de cansaço pela
dupla ou tripla jornada, considerando que a maioria dos profissionais de
Enfermagem é do gênero feminino, sobrecarregando as funções executadas pelas
mulheres. As falas demonstram como esse fato tem repercussão para os alunos do
curso de Enfermagem. Dificuldade comentou que: “encontrei muita dificuldade.
Além da parte familiar, parte profissional, como a gente trabalha por causa do
horário e também como acadêmica. É muito complicado”. Guerreira corroborou
afirmando “tenho dificuldade enorme pra poder continuar as aulas”. Este mesmo
pensamento norteia o pensamento de Contente, relatando que “eu feliz por eu
conseguir estar quase no final da faculdade com a dificuldade financeira, dificuldade
também porque d a gente faz transtorno de vir, não eu ter que mudar de
horário, mas dos outros funcionários que trabalham junto, daí a gente faz mudança
de funcionários, troca de horário, então toda essa dificuldade pra mim enfrentar
esses anos todos na faculdade.” Realizada I abordou sua dificuldade associada
ao ambiente de trabalho dizendo: “Muitas vezes eu...fico sobrecarregada, acho que
não vou conseguir. Estou muito cansada por trabalhar numa ala que é bem
estressante, a UTI. (...) adoro minha profissão embora muito sobrecarregada, as
vezes com família, situação financeira.”
Pode-se somar a este fato, as questões sociais em relação ao
capitalismo, onde a produção, o lucro e a força de trabalho ganham expressão
dominando todas as áreas, inclusive a de saúde.
4.2 HUMANIZAÇÃO / HUMANIZADOR
Como segunda categoria de análise para a obtenção do objetivo
específico da pesquisa; optei pela humanização e seus aspectos, haja vista ser este
o tema central das discussões do Grupo Focal. Novamente optei por subdividir a
93
categoria ficando assim estabelecido: múltiplos olhares sobre a humanização,
universos da humanização e humanização e a formação.
Atualmente a humanização é amplamente discutida em várias áreas
de atuação, onde o ser humano se faz presente. Dentro do ambiente acadêmico, ela
se encontra ora sendo abordada pelo corpo discente, ora pela administração ou pelo
corpo docente.
4.2.1 Múltiplos olhares sobre a Humanização
Verifiquei que a definição de humanização assume diversas
conotações, como se pode confirmar através das seguintes manifestações.
Guerreira assim se expressou: “Eu acho que humanização é você sentir ele, no
olhar dele saber a carência que ele tem. Você não tratar a doença dele, você olhar
ele como uma úlcera. (...) mas a cabecinha dele como é que tá? Aquele cheiro fétido
da úlcera. Como é que ele está se sentindo com aquele cheiro. Será que alguém
perguntou pra ele?”. Um dos princípios da Bioética é a alteridade, cujo fundamento
é colocar-se no lugar do outro. Esse ”sentir ele” vem ao encontro do pensamento de
Monte que diz:
Humanizar significa tratar os pacientes como gente, respeitá-los como
sujeitos de dignidade especial e senti-los como pessoas potencialmente
iguais a nós próprios; ou seja, simplesmente respeitar a pessoalidade e a
dignidade inerentes aos seres humanos (MONTE, 2002, p. 7).
Na busca da humanização da atenção à saúde, são essenciais as
atitudes que marquem o respeito pelo usuário, merecendo destaque o respeito
devido a cada pessoa, como por exemplo, chamá-la pelo próprio nome e não
fazendo uso de pseudônimos impessoais como ‘mãezinha’, ‘tia (o)’, ‘vozinho’,
‘vozinha’, ‘meu filho’, e outros estigmatizantes como ‘o aidético’, ‘o tuberculoso’, o
‘desnutrido’, ‘o da úlcera’.
Guerreira continuou: “humanização é um conjunto e pra mim a
humanização está em primeiro lugar, você procurar saber olhar o outro. Se você não
sabe olhar diferente, não adianta quatro anos de faculdade, fazer especialização,
fazer um mestrado e continuar cuidando da doença e não do paciente”.
94
Esse pensamento expressa que o conhecimento científico por si só,
adquirido na academia, despojado de elementos que permitam reflexões profundas,
não é suficiente para se obter um cuidado humanizado. Questões como às relações
que se dão entre Enfermeiro/paciente, respeito entre colegas da equipe, valor
humano no cuidado, devem ser abordados na academia sob pena de se continuar
cuidando da doença e não do doente”.
Relatou ainda que “(...) Humanização ta ligada com educação”.
Realizado comentou que “as atitudes de humanização são atitudes simples. (...)
Humanização você tem ou não tem, porque eu acho no início nasce com ela ou
traz de casa. Se você não traz, eu acredito que você não tem como adquirir isso.
Não é uma habilidade como você puncionar uma veia”. Abertura referiu-se à
humanização como “a gente deve valorizar a dor do paciente, a queixa dele.
Humanização é deixar confortável, escutar o que ele quer falar. (...) A gente precisa
estar sempre aberta a escutar a queixa do paciente, ver o olhar da pessoa, o que ele
quer expressar para a gente né? Então eu aprendi que a humanização é ‘olha pra
mim, me escuta (...)”. Verifico nesses pensamentos a importância que a
comunicação não-verbal assume em relação ao cuidado humano. Muitas vezes o
olhar, o sorriso, a escuta, o toque, o silêncio, a presença, são instrumentos
necessários e em muitas circunstâncias o “melhor remédio” para o restabelecimento
do paciente.
Para que a pessoa enferma receba a atenção necessária, com vistas
ao seu bem estar, é necessário que o cuidado seja provido de cientificidade e
espírito humanitário. Importante que o Enfermeiro forneça adequadamente
informações e esclarecimentos e que esteja consciente de que o seu papel inclui
respeito à individualidade de cada pessoa. Seus hábitos, crenças, cultura, etc.
Sobre o contato, acrescento que o olhar nos olhos facilita o
desenvolvimento de uma relação de confiança, demonstrando que o Enfermeiro,
naquele momento, está mais interessado no cliente do que em qualquer coisa, além
de demonstrar atenção (PAULA, 2004).
Eu, enquanto pesquisadora e enfermeira, com a experiência que
minha trajetória dentro da profissão proporcionou, entendo que a Enfermagem é
feita de pequenas coisas, de atos simples que assumem grande conotação, de
atitudes e gestos que traduzam a preocupação com o restabelecimento do paciente.
Da presença ao lado do doente, não corporal somente, mas sim em atitude de
95
prontidão, de preocupação, de desvelo, de valorização da singularidade do paciente,
daquele que necessita do cuidado. Em resumo, como disse Abertura “para mim são
as pequenas coisas que o paciente quer”. E outro pensamento que lanço é que a
forma de atendimento é que faz a diferença. Um grande conhecimento científico
deverá ser amalgamado com aspectos do “ser” Enfermeiro, fazendo assim a grande
diferença no atendimento.
Penso que se faz necessário valorizar o infinitivo “estar com” o
paciente do que somente “falar do” paciente. Este com conotação de cuidado
distante da ‘pessoa’ do paciente, aquele denotando aproximação, preocupação,
interesse.
A fala de Abertura continua: “humanização eu considero que a gente
deve acolher a todos (...) a gente deve ter o cuidado em tratar com a pessoa e se a
gente não se cuida, a gente vira apenas uma técnica, vai puncionar, colocar soro,
se ta gotejando, mas as vezes.não se nem conta de olhar no rosto da pessoa(...)
então, pra isso exige uma abertura”.
Enfocando o cuidado humanizado com a individualização que lhe é
pertinente, apóio-me em Figueiredo; Viana (2006, p. 375) quando relata que: “só o
ser humano é dotado de sensibilidade, de sentir-se a si e sentir pelo outro, e desta
forma, torna-se um ser singular, único”. As técnicas devem ser executadas com a
preocupação de um cuidado ético, ou seja, com a visualização do indivíduo como
um todo. O desempenho do cuidado é similar ao desempenho de atividades numa
fábrica onde a qualidade efetuada tem primazia sobre a produção em massa.
Qualidade aqui, refere-se à dignidade, à alteridade, à beneficência e à autonomia
vivenciadas. Figueiredo contribui afirmando:
A técnica consiste no aperfeiçoamento do objeto exterior ao indivíduo (...) o
cuidado consiste em uma atitude de desvelo e preocupação com o próximo
e pode ser compreendido como uma busca da perfeição da conduta
humana, a qual, na enfermagem, situa-se na realização correta e
responsável de um dado procedimento com o devido consentimento do
outro, para o outro e com o outro (FIGUEIREDO, VIANA 2006, p. 382).
As crenças também ganham significado quando se aborda sobre
humanizar os cuidados. Verifiquei isso na fala de Contente dizendo que é
importante ser avaliado também as crenças dele também. Tem paciente que gosta
de levar seu livrinho, sua Bíblia”. Em relação à assistência dirigida ao ser humano,
Leopardi afirma:
96
...constitui-se de atendimento ao sujeito de si mesmo, de atenção ao seu
direito à privacidade, respeito às suas crenças, enfim, de criação de normas
e rotinas dirigidas à integralidade do indivíduo que, por alguma
circunstância, em algum momento de sua vida, submete-se à assistência de
saúde (LEOPARDI, 1999, p. 139).
Realizada apontou que a UTI precisa de melhorias neste sentido,
quando afirma que: “dentro de uma UTI a humanização, eu não sei se é porque o
paciente está em coma, que ele não vai ver, que ele não vai ouvir que ele não vai
fazer nada, a humanização é muito precária. [...] Eu acho que isso é muito
desumano, ali é muito desumano mesmo”. Dificuldade interveio dizendo “o que
você tem que fazer: dar uma atenção melhor, ir lá explicar, ter paciência com aquele
familiar”.
Contente abordou outro aspecto da humanização quando disse:
“falta muito mesmo, do entendimento da parte da humanização. Mesmo no hospital
a pessoa fica retornando, retornando”. Nesse relato, o conceito de humanização
assume a conotação de resolutividade dos casos. O programa do Ministério da
Saúde, HumanizaSUS
19
, tem esse intuito onde a resolução das situações no
atendimento ganha expressão, evitando que haja retornos desnecessários,
oferecendo assim um atendimento/tratamento humanizado.
Já, Dificuldade expôs seu pensamento sobre humanização dizendo
que “a recepção tua com o paciente, influencia muito o tratamento”. A afirmação
procede. O relacionamento interpessoal entre Enfermeiro–paciente é fator
preponderante para o estabelecimento de vínculos que, por sua vez, são
necessários para recuperação dos agravos ou, no caso de atenção primária, para a
prevenção de enfermidades.
Entendo que este tema realiza dialeticamente um repensar sobre a
forma de interpretação dos atos permitindo mudanças de concepção em prol da
humanização. Capaz expressou essa idéia quando disse: “Até pouco tempo achava
que ser humano, tratar as pessoas humanamente seria tratar da maneira que eu
gostaria de ser tratada. De pouco tempo pra cá que comecei a analisar que não é, o
verificar isto eu gosto você pode não gostar. Então realmente é preciso conhecer o
que a outra pessoa gosta, o que agrada a pessoa”. Realizado II, na mesma linha de
19
HumanizaSUS: política nacional de Humanização do Ministério da Saúde, tendo como proposta priorizar o
atendimento com qualidade e a participação integrada dos gestores, trabalhadores e usuários na consolidação do
SUS (BRASIL, 2004).
97
pensamento, afirmou que: “Então você percebe isso e daí você repensa bastante,
você reflete muito nas tuas atitudes né, como profissional”.
Diante deste pensamento, cito Zagonel (2005) que, em palestra
efetuada para Enfermagem, disse: ”a relação enfermeira-paciente é dialética, pois
ao voltar-se para mim mesmo, encontro o outro e ao voltar-se para ele é necessário
que eu me volte sobre mim mesmo”.
A humanização do cuidado perpassa pela arte da Enfermagem, e
tratar bem o ser humano é arte de saber amar. Esses pensamentos são, com
propriedade, expostos no poema abaixo, de autoria de Ermelina, profissional Auxiliar
de Enfermagem.
Humanizar
Quero ser humana, para perdoar.
Quero ser sempre pronta, para o bem alcançar.
Quero ser um laço, para poder desamarrar.
Quero ser uma ponte, para uma vida salvar.
E com o ser humano
Com carinho tratar.
Ter um objetivo, um sonho para carregar.
Carinho e dedicação
Para um bom trabalho realizar.
E, entre o céu e a terra
Os mistérios poder desvendar
Tratar bem o ser humano
É a arte de saber amar.
4.2.2 Universos da Humanização
A humanização torna-se importante no desenvolvimento de todo
trabalho e deve permear universos como a administração, a coordenação, a família,
98
o próprio profissional. Este último, no caso da Enfermagem, é essencial no
atendimento humanizado do paciente. O próprio paciente, que nesse quebra-cabeça
imenso, possui sua parcela de atuação. Nesse pensar, cito as seguintes falas:
Abertura relatou que: “Eu penso que a gente tem que ser diferente na humanização
consigo mesmo, com a equipe de trabalho; saber conversar, saber valorizar a
equipe”. Dificuldade fez menção ao aspecto pessoal da humanização quando
disse: “acho que não pode pensar no cliente, porque eu também posso ser
cliente, então se você não cuidar um pouco de você, você não tem capacidade pra
cuidar do paciente. (...) Hoje eu tenho certeza que tenho que cuidar do paciente
primeiro, ver ele como um todo com ela falou, mas tem que cuidar de você primeiro,
senão você não vai cuidar bem do outro“(...) Se eu não estou bem, eu não vou
conseguir tratar bem o paciente(...) então, começa a gente a ter que tratar a cabeça
da gente pra poder cuidar do paciente”. Esse pensamento volta-se ao cuidador.
necessidade de ter consciência de que não somos diferentes das outras pessoas.
Também somos seres humanos que atendem outros seres humanos, passíveis de
situações de sofrimento, cansaço, estresse e que sofrem diante de atitudes não
humanizadas daqueles que estão sob nossos cuidados. Guerreira expressou isso
quando citou: “às vezes o cliente não tem um pingo de humanização, ele não
entende ou ele não é educado e daí atinge a gente também sabe”.
Santos afirma que:
Estaremos exercendo uma profissão mais humanizada em nós mesmos, na
qual seremos vistos como seres singulares e humanos, sem negar nossas
necessidades de cuidados e sem deixar de cuidar de nós mesmos
(SANTOS, 2004, p. 30).
Necessita-se estar atento para cuidar do próprio cuidador
(autocuidado) antes do cuidado com o outro. Esse problema praticamente não é
discutido dentro das universidades e a Enfermagem, exposta aos riscos de ordem
emocional, física, biológica, ambiental e psíquica, vê-se desprovida dessa reflexão
tão pertinente à profissão. Alterações no ritmo de sono e demais funções fisiológicas
são comuns aos Enfermeiros, em virtude de excesso de trabalho, do ambiente
estressante e dos horários irregulares. A prática e o ambiente de Enfermagem
provocam mal-estar e até adoecimento dos profissionais que de um modo geral, têm
recorrido aos serviços de saúde mental. A literatura tem mostrado que cresce o
99
número de agravos psíquicos, medicalizações, suicídios de médicos e Enfermeiros,
porteiros de hospitais etc.
Realizada II percebeu a humanização inerente a todo ambiente de
trabalho: “Eu penso que humanização não é só ali no paciente. Você tem que ter um
trabalho humanizado desde de quem faz a limpeza de dentro do hospital até o
cliente. (...) Você tem que ter um trabalho humanizado com a família dele”. Nesse
pensamento, Realizada assim se expressou: “eu acho que humanização... precisa
ser trabalhado em equipe, do começo ali da equipe, da coordenação” Essas falas
expressam uma visão da humanização que contempla o todo, o universo em que se
insere o indivíduo, percorrendo das instâncias administrativas às curativas.
Humanizar é um processo de vivência que permeia todas as atividades do local e
das pessoas que ali trabalham. Deve-se fornecer ao paciente um tratamento digno
de pessoa humana, individualizando sua assistência, visualizando sua integralidade,
respeitando e valorizando suas características. Nesse sentido, cita-se Guéra (2004,
26) que diz:
A humanização é um processo que envolve todos os membros da equipe.
Neste processo devem ser envolvidos profissionais de todos os setores,
direção e gestores da instituição, além de formuladores de políticas
públicas, conselhos profissionais e entidades formadoras (GUÉRA, 2004, p.
26).
4.2.3 Humanização e a Formação
Nesta subcategoria analisei aspectos inerentes à humanização,
enfocando a formação, a partir dos relatos dos sujeitos da pesquisa.
Neste contexto, Realizada acredita que é possível ter uma formação
voltada para humanização: “é nas disciplinas, o só ética e na bioética que foi
falado, outros professores também trabalharam bastante voltado na humanização”.
Tem como preceito que possui humanização pelo “fato de você ter educação” E que
“na formação acadêmica o que você aprende são os limites”. Abordou também que
“é preciso você parar e pensar e ver o que você está fazendo, se a tua atitude está
correta [...] às vezes você tem que mudar a tua maneira de pensar [...] às vezes é
100
preciso você estar dentro de uma sala de aula, ouvir uma pessoa experiente, ouvir a
opinião dos outros para você tentar mudar ou mudar”.
Essa fala deixa clara a importância do processo de reflexão na
formação. Momentos devem ser oportunizados durante a vida acadêmica, para que
esse processo ocorra, contrapondo vivência pessoal com novos conceitos.
Corroborando com esse pensamento cito Dificuldade que assim se expressou; “a
formação ela contribui nessa questão da humanização na forma da reflexão”. Um
processo de construção, desconstrução e de reconstrução constante que aprimore o
humano.
A partir desses dados, pode-se inferir que a formação acadêmica
contribui para a humanização, num processo onde a reflexão ganha destaque. O
resultado do aprimoramento repercute na vida dos acadêmicos. Na fala de
Guerreira notei isso quando disse “é incrível a diferença que faz. E as pessoas
notam a diferença em você. Eu como Auxiliar, eles falam: nossa, fizeram lavagem
cerebral em você lá? O que é que fizeram com você?” Dificuldade corroborou com
este pensamento, dizendo que “é o caso da gente aprimorar nossa educação”.
Ante os pensamentos expostos sobre a formação humanizada,
concluo que ela tende a permear todo o processo de formação, ou seja, em toda
grade curricular do curso de Enfermagem, não ficando apenas ao encargo da
Bioética ou da Ética Profissional, as questões inerentes à humanização. Abertura
contribui dizendo “eu acredito que tanto a psicologia, tanto a bioética, a ética, tudo
faz com que a gente se lapide bem numa forma mais científica, não assim tão
vulgar”. Guerreira assim referiu-se: “desde o primeiro período se fala em
humanização e até agora se fala. [...] foi em ética, foi em farmacologia.”. Contente
complementou: “políticas de saúde também”. Realizada: “Cada matéria vem
disseminando um pouquinho de humanização. Até última agora, Saúde do Adulto,
foi falado bastante. O professor falou muito de humanização. Acho que a faculdade
toda vem dando esse curso de humanização, de pouquinho em pouquinho”.
Notei também a importância dada à sistematização de um ensino
pautado na problematização, onde a construção do conhecimento acontece
coletivamente, proporcionando ao aluno uma aprendizagem significativa.
também a necessidade de atitude de abertura ao novo e acolhimento da pessoa do
outro no processo relacional entre os seres humanos, possibilitando, com isso, um
101
crescimento. O ser humano nunca se encontra totalmente concluído em seu
aprendizado.
Na formação, os limites ganham expressão, pois de acordo com o
relatado, o sujeito adquire aspectos da humanização em sua educação familiar.
Como disse Realizada: “você veio com tua formação de tratar bem as pessoas,
mas aprende a ter os limites, eles te ensinam a dar os limites pra você”.
Realizado corroborou com esse pensamento afirmando que
“educado todos são (...) eu acredito até que o ambiente possa deixar uma pessoa
melhor, (...) mas aquela base de educação, de humanização, ela tem que ter.
Talvez não seja o modelo que se espera, daí talvez tenha que lapida-la um pouco.
Concordo que é possível trabalhar isso na formação, que a base ele tem. (...)
ela já vem do berço”.
Vejo que a humanização antecede à academia. Tem início na família.
O papel da escola é “lapidar” esse aprendizado que a educação familiar forneceu.
Sendo assim, a formação acadêmica assume uma função primordial. Através dos
processos de reflexão, procura-se prover a necessária “lapidação”, aperfeiçoando a
humanização iniciada na família. A fala de Realizado veio ao encontro desse
pensamento quando afirmou: “Conseguir trabalhar isso eu acho possível, tanto que
aconteceu comigo. Estas atitudes são pelo menos essas reflexões de pensar nessas
pequenas coisas que fazem grande diferença”. Dificuldade disse “então, eu acho
que a vida acadêmica, nossa, como ela ajuda”.
Ao reportar-me sobre o processo de formação, volto meu olhar para a
universidade. Sua importância é fundamental na formação intelectual, crítica,
autônoma, reflexiva, política e ética do aluno. Deve ser pautada em valores como
justiça, liberdade, respeito, responsabilidade, solidariedade, amor. Portanto, uma
formação humana. Concordo com Sobrinho quando afirma:
Formação humana plena comporta várias dimensões: técnica, política,
social, enfim, tudo o que tem a ver com o desenvolvimento material e
espiritual do indivíduo e da sociedade. A educação, para ser completa, tem
que interferir sobre todas essas dimensões (SOBRINHO, 2002, p. 19).
A formação humana é citada pelo aluno como sendo muito relevante,
conferindo-lhe uma visão ampliada do cuidado, na qual pacientes, familiares e a
Enfermagem constituem um amálgama de interações.
102
Por meio das interações chega-se a empatia, cuja essência consiste
em perceber o que as outras pessoas sentem sem que elas o digam. Quando existe
a conexão com o paciente através da empatia, as prioridades e importâncias
traçadas no cuidado tornam-se comuns às prioridades e importâncias do próprio
paciente (SANTOS, 2004).
Partindo do pressuposto que a universidade é a casa do saber
espera-se que a mesma seja o centro de desenvolvimento do espírito crítico e
científico. Almeja-se que os estudantes se tornem cidadãos críticos e ativos. Por
isso, os professores devem estar sempre atentos, envidando constantes esforços
para serem agentes transformadores, eficazes na formação desse espírito. O
pensamento de Realizada 2 vem ao encontro dessa idéia quando exprime: “ter
consciência de que ela está ali para poder ajudar, não veio da faculdade com os
conhecimentos, mas deve passar estes conhecimentos para os colegas também,
para os funcionários da instituição”. Quer dizer, socializar o conhecimento, gerando
uma sociedade mais justa e humana.
Nessa categoria, também foram consideradas as sugestões que os
alunos propuseram em relação à humanização e à formação. De acordo com
Guerreira “acho que tinha que ter carga horária maior na bioética, dentro da
faculdade, tem tanto pra se aprender, pra se falar sabe?”. Realizada completa: “eu
achei que foram poucas horas, deveria ter sido mais, daí, infelizmente a professora
teve que correr um pouco a matéria e poderia ter sido dada mais devagar”.
Sobre esse pensar deixo registrado que as disciplinas de Ética e
Bioética não dispõem de uma carga horária condizente nas grades curriculares,
dadas a necessidade e importância que os temas assumem no cotidiano do
profissional Enfermeiro. É uma constatação que vem sendo relatada em diversos
momentos por profissionais Enfermeiros. A atuação da Enfermagem atende um
mercado determinado onde os interesses de lucro jamais poderiam sobrepor-se à
dignidade da pessoa humana. Todavia não é interessante que os profissionais de
Enfermagem realizem reflexões, promovam mudanças. A acomodação é, em certo
sentido, desejada pelo sistema capitalista. Oliveira (apud Germano 1985, p. 57) diz:
”A prática dos profissionais de saúde é pautada por uma falta de clareza sobre a
existência de dois projetos na sociedade (conservação/transformação), daí se
observar um alto grau de alienação”.
103
A segunda sugestão dada pelos alunos no Grupo Focal foi a
diminuição do número de alunos em campo de estágio proporcionado assim melhor
qualidade de ensino e, consequentemente, melhor aprendizado. No dizer de
Abertura isso aparece como: “Então, eu acho que estágio de oito, de nove alunos a
professora não pode atender individual cada um porque cada um tem uma
dificuldade diferente”. Aqui se aborda também a individualidade do ensino, levando-
se em consideração que cada um tem suas particularidades, sua singularidade, que
no mundo do conhecimento precisam ser valorizadas. Isso também é humanização.
A pesquisa também desvelou a necessidade premente de humanizar
os docentes na relação docente/discente. Realizada confirma isso na seguinte
afirmação: “Acho que tem que ter na faculdade, com os professores, uma aula de
humanização”. Dificuldade corrobora com este pensamento: “acho que não
trabalhar a gente, mas os professores também” Continua citando que estes estão
“despersonalizados, quer dizer: ele te um abraço e ao mesmo tempo vem com
voz agressiva depois altera, depois carinhoso. o é um professor, são vários”.
Questiona-se então: que dicotomia é esta? algum transtorno psicológico? Por
que os docentes têm este comportamento? Sentem-se ameaçados pelo discente?
Acredito que precisam ser ouvidos, o que demandaria uma outra pesquisa. No
momento, o que infiro é que o corpo docente também necessita de elementos de
reflexão que auxiliem na visualização de que o aluno é, assim como os professores,
uma ‘pessoa’ com medo, angustiada, estressada, limitada. Nesse sentido,
Dificuldade diz: “a gente precisa trabalhar os dois lados. (...) Os professores
também, acho que eles poderiam trabalhar um pouco com eles procurando entender
nosso lado, porque eles começam a reprovar com uma simples falta. Ele fica
chateado porque o aluno faltou, mas ele estava doente!”.
Em situações de estágio, o aluno sofre muito com o comportamento
dominador do docente sendo que, por vezes, sente-se tão inferiorizado e
ridicularizado que o estágio passa a se tornar um tormento e não um momento de
aprendizado. Certamente a forma como é trabalhada a transposição do
conhecimento na prática repercute nos alunos. Por vezes, pode ocasionar traumas
de dimensões nem imaginadas pelo formador. Importante lembrar que o formador
precisa colocar-se no lugar do aluno. Deve lembrar as dificuldades que vivenciou
quando se viu, pela primeira vez, diante de um paciente grave e teve que atuar,
prestando o devido cuidado. Faz-se necessário efetivar no cotidiano de professores
104
e alunos a concretização do princípio da alteridade, o que significaria um melhor
aprendizado e melhor relacionamento entre ambos. Certamente também traria
benefícios para todos, para o aprendiz, para o formador e para as pessoas que
receberão os cuidados.
Analisando a questão da Licenciatura Plena e sua efetivação na
prática, Realizado, assim se expressa: “porque se estufa tanto o peito pra dizer que
temos um curso de licenciatura plena que é muito mais que o bacharelado, pelo
menos é essa a visão que eu tenho e que eles procuram passar; no fim não dão
importância a Prática de Ensino”. E ainda faz um apelo (...) “se o diferencial do curso
é a Licenciatura Plena, então vamos dar uma atenção melhor para a Prática de
Ensino”.
A contradição se manifesta quando Realizado diz: “se você não levar
isso pra tua vida, vo não tem porque fazer licenciatura, então poderia ser
Bacharelado que Prática de Ensino dão pouca importância assim, que é passível
de ser colocado quando se acha uma brecha. Então eu acho que isso é uma
contradição”.
Continuando a análise, farei algumas abordagens sobre a
contribuição do Ensino da Bioética na vida do acadêmico e profissional de
Enfermagem. Realizada II relata: “Um dia eu comentei com a professora Marlene
que eu aprendi muito com ela tanto em ética como bioética. [...] Modifiquei muito
meu comportamento dentro do meu trabalho depois que eu tive a matéria dela.
Consegui ter uma visão do todo, de como tratar uma pessoa.Corroborando com
esta fala pode-se inferir que o agir em saúde deve refletir a maneira de o profissional
ser, pensar, sentir e atuar devido sua autonomia e liberdade que lhe são próprias
(FIGUEIREDO, 2006).
Guerreira afirma “acho que melhorei bastante. Desde o ano
passado eu to aplicando. Acho que tenho muito pra aprender e... vou tentar sempre
estar melhorando cada vez mais”. Realizado confirma dizendo: “Acho que, depois
que passamos pela disciplina de Bioética e de Ética Profissional, a minha vida
mudou muito. (...) não como profissional inclusive como pessoa também. (...) foi
muito presente depois que eu passei por esta disciplina”
Figueiredo (2006, p. 378) reafirma esse pensamento sobre a Bioética
dizendo que ela “é o instrumento necessário para subsidiar o modo de agir do
profissional de saúde”.
105
Realizado ainda afirma que em relação à Bioética “a matéria
contribuiu muito para minha formação até pessoal por causa da reflexão. Foi em
bioética que nós aprendemos essa questão mais humana, questões não palpáveis
que não é uma técnica, é uma coisa abstrata. Em bioética e ética que isso se tornou
mais presente. Na bioética você viu o todo mesmo, assim como que circunda todo
este mundo e todos estes profissionais” A Bioética procura compreender o ser
humano, a sua vida, sua saúde, sua morte, e todas as tecnologias que
instrumentalizam sua vivência para o melhor viver (FIGUEIREDO, 2006). A reflexão
é enfocada como algo importantíssimo que precede a ação, cerceada da virtude da
prudência. Nesse pensar, Guerreira contribui dizendo: “Acho que tem que saber
ouvir, refletir para depois você agir. Não ouvir e sair fazendo. Tem quem parar,
refletir para depois poder dar resposta e você poder agir”.
Dificuldade afirmou que: “Tivemos a disciplina de Bioética que
reforçou para gente a humanização e fez a gente pensar: nossa, eu fiz isso como
fizeram comigo, eu fiz isso às vezes por pressa, por descuido ou por raiva de não
chamar outro colega meio preguiçoso para te ajudar. Então você vai meio sozinho
puxar o paciente da cama. Ele levou aquele soco que não precisaria ter levado”.
O acadêmico de Enfermagem, ao participar ativamente da disciplina,
projeta em sua vida os fatos narrados/comentados em sala de aula. Daí procede à
afirmação de que a sala de aula é um grande laboratório, onde a teoria entrelaça-se
com a prática, traduzindo-se em um aprendizado que acompanhará o futuro
profissional no desenvolver de suas ações.
A Bioética como ciência, vem neste momento em que a humanidade
vivencia uma desvalorização da vida e da dignidade do homem, auxiliar, através de
reflexões pertinentes sobre assuntos muito polêmicos, a equacionar os aspectos
éticos desenvolvidos, de difícil resolução. As reflexões possibilitam a elaboração do
pensamento crítico, muito importante para a atuação do profissional da saúde, em
especial do Enfermeiro. Em relação às reflexões, Abertura diz: “reflexões que
ajudam a gente a mudar, ter uma visão diferente a respeito do respeito à vida”.
Ainda em relação à formação, os alunos sinalizaram o que
consideram importante para ajudar o futuro profissional Enfermeiro a realizar
atividades que envolvam um cuidado humanizado. O princípio da alteridade ganha
expressão quando Realizado assim diz: “ele colocar-se no lugar do paciente
sempre”. Abertura lembra uma postura de mudança, iniciando por si própria: ”nós
106
que temos que começar a mudar”. As situações, depois de refletidas, são
internalizadas, num processo de desconstrução e reconstrução.
Mizukami, sobre isso contribui dizendo:
A experiência constitui, pois, um conjunto de realidades vividas pelo
homem, realidades essas que possuem significados reais e concretos para
ele e que funciona, ao mesmo tempo, como ponto de partida para
mudanças e crescimento, que nada é acabado e o conhecimento possui
uma característica dinâmica (MIZUKAMI, 1986, p. 43).
Realizada lembrou que a educação continuada no relacionamento
interpessoal da equipe de trabalho é muito importante, e não devemos nos omitir
nesse processo. Diz ela: “saber a forma de colocar a ética, a bioética para as outras
pessoas que não têm (...) acho que tem que ser falado dentro da unidade onde a
gente trabalha, sobre a humanização. Falar com jeito para eles pensarem melhor e
mudarem o seu jeito de ser”. Contente complementa: “acho que os funcionários têm
que cobrar um do outro, conversar, não ter medo de conversar”.
Em suma, os alunos abordam que as atividades que envolvam um
cuidado humanizado imprescindem de reflexões do próprio agir. Nesse contexto
estão inseridos a alteridade, o cuidado com o outro e a importância de realizá-lo em
equipe. A soma dos esforços operacionalizada em um cuidado humanizado
beneficia paciente e equipe que o assiste, gerando a satisfação do dever cumprido.
4.3 DICOTOMIA ENTRE TEORIA E PRÁTICA
Nesta terceira categoria, aspectos da humanização o abordados
em relação a sua efetivação no trabalho realizado. Guerreira assim se expressou
“Humanização ligada com educação, humanização ta ligada na minha casa,
então por que no meu trabalho eu não fiz? Se todos nós erramos, porque s
erramos e estamos errando? Hoje quando a gente for trabalhar a tarde nós vamos
errar. É uma coisa nossa de dentro. (...) de noite faço reflexão e fico pensando: meu
Deus do céu, mas eu fiz aquilo? Coisa que eu falo que jamais eu ia fazer, de repente
eu fiz aquilo. Aquilo de veio de berço, meus pais me educaram. Porque eu fiz
aquilo naquela hora?”
107
Neste pensar, visualiza-se na fala de Dificuldade os conflitos que o
profissional possui diante de suas atitudes: “Tem pacientes que eu não sei se não fui
culpada por ele ter ido a óbito, por delitos que eu fiz coisas que... que era errado. O
mesmo sentimento tem Guerreira: “Muitos pacientes eu poderia ter cuidado melhor,
dar uma assistência melhor [...] a gente não sabe se um deles foi a óbito por causa
da gente. Por que antigamente não tinha Enfermeira supervisionando a gente, então
aquilo que você fazia tava bom. Não tinha para quem perguntar. Quem auxiliava a
gente eram os médicos. Eles ficavam mais próximos da gente”.
Sobre a fala da aluna quando se referencia aos médicos que
estavam mais próximos para auxiliar, é oportuno salientar que vejo aqui uma
inversão de papéis. O profissional Auxiliar de Enfermagem surgiu com o objetivo de
“auxiliar” o profissional Enfermeiro, que dele necessitava. Para conseguir
desempenhar suas funções, delegava ao Auxiliar de Enfermagem tarefas de menor
complexidade. Hoje, em algumas instituições, onde o Enfermeiro já não se faz
presente realizando o cuidado, o médico assume esse papel, tornando-se então
referencial para o Auxiliar de Enfermagem. Com o passar dos anos o Enfermeiro
não se ocupa tanto das funções de assistência, da efetivação do cuidado, mas sim
do gerenciamento de uma empresa (que são as instituições de saúde). Estas
necessitam de controle de gastos e de supervisão. O Enfermeiro acaba entrando em
conflito porque não era isto que o havia levado a realizar um curso de quatro anos.
As contradições continuam. Não que as funções administrativas sejam de menor
importância. Porém, o fato é que o cuidado realizado aos pacientes tornou-se função
quase exclusiva de Auxiliares e de Técnicos de Enfermagem. Cito Almeida e Rocha
quando explicitam que:
O desenvolvimento dos serviços de saúde fez-se principalmente à custa da
absorção de pessoal auxiliar, envolvido diretamente no cuidado ao paciente,
mão-de-obra de custo mais barato (ALMEIRA; ROCHA, 1989, p. 13).
Para o sistema é interessante que as atividades sejam exercidas
pelos profissionais de nível médio, mas isso traz para a população e para os
próprios Enfermeiros repercussões importantes. Uma delas é o questionamento
social da necessidade de formação do profissional Enfermeiro. Para a comunidade
intra e extra-hospitalar esse profissional não é reconhecido como tal. Quem é
108
reconhecido e chamado pelo nome de Enfermeiro são justamente os Técnicos e
Auxiliares de Enfermagem.
Outro aspecto importante é que cuidar de pessoas doentes não é
algo simples e nem cil em virtude da complexidade do ser humano.
necessidade de profissionais constantemente capacitados por uma educação
continuada. Somente assim, ouviremos menos afirmações como esta de
Dificuldade: “Que hoje que estou estudando e vejo que é totalmente diferente o que
deveria ter sido feito. Uma imprudência que você não tem noção que era errado”.
Muitos serviços negligenciam o cuidado, deixando as tarefas a
encargo de pessoas que não possuem conhecimento adequado e que atuam sem
supervisão.
A efetivação da humanização no trabalho necessita de
complementaridade, ou seja, o trabalho na área da saúde precisa ser realizado
através de uma equipe que tenha como pressuposto alcançar os mesmos objetivos.
Na fala de Capaz esta dicotomia é visualizada quando disse: “Sozinho a gente não
consegue. [...] eu acho que aos poucos isso vai se infiltrando e acaba dando certo
porque sozinha é complicado. Quando você entra, você começa, mas quando a
equipe toda vai do outro lado você sempre acaba cedendo né? É complicado, acho
que precisa realmente ser trabalhado um bom tempo para que isso realmente
funcione”. A humanização será tanto mais efetiva quanto maior for o número de
pessoas inseridas nas discussões a ela pertinentes. Por isso, é que o início de tais
discussões deve ocorrer no ensino de primeiro grau. Essa questão foi tema de
discussão no Congresso Brasileiro de Bioética em Foz do Iguaçu, em setembro de
2005.
A humanização assume aspectos subjetivos. Faz os profissionais
repensarem, questionarem suas condutas na busca de respostas para o conflito
entre o saber e o fazer. Se eu sei o que é humanização, porque não tenho atitudes
humanizantes? Guerreira expressou isto na seguinte fala: “Eu fico triste sabe, com
essa história da humanização. (...) que humanização todos nós temos, porque a
gente não põe em prática? Às vezes eu fico me perguntando sabe, me revolta”.
Realizada II fez menção, em sua fala, da revolta que sente diante da
dicotomia entre o falado e o realizado, abordando as condições internas de trabalho
que não acolhem o empregado numa atitude humanizante: “As vezes você se
revolta porque dentro do local de trabalho eles falam bastante de humanização, mas
109
quando o funcionário está precisando ele não é tratado neste sentido”. Continuando
seu pensamento, fez menção à atuação do profissional na prática do cuidado com o
cliente onde “infelizmente a gente deixa de lado, a gente o trata como pessoa, a
gente trata como objeto de trabalho”.
Dificuldade expressou bem o conflito vivenciado entre o saber e o
fazer, dizendo: “É muito complicado, a gente tem uma noção da coisa e chega e
ver totalmente diferente... Você aprendeu uma coisa diante da tua prática e você
chega lá e não é aquilo”. Diante dessa afirmação, questiono: Como aproximar o real
das instituições ao ideal ensinado na academia? Como aproximar o ideal ensinado
ao real enfrentado nas instituições de saúde? Como articular a teoria e a prática?
Ainda hoje, a pedagogia está às voltas com este problema: a integração entre
pensamento e ação. A revalorização da ação, quer dizer, a dialética ação–
pensamento, pensamento-ação, constitui o caminho que conduz à educação integral
do homem (PILLETI, 1995 apud SAUPE, 1998).
Os aspectos inerentes ao fazer são também de responsabilidade do
próprio profissional. Ele unir o saber com o fazer. Conscientizar-se e fazer o certo,
partindo do pressuposto de que é sujeito livre e autônomo. Dificuldade disse: “para
as pessoas se conscientizarem e fazerem o certo, não fazendo tudo ao contrário do
que aprende”.
Este capítulo se constituiu da análise da temática da humanização na
formação do profissional Enfermeiro, sob a ótica discente. Igualmente, a Bioética
pôde ser analisada e correlacionada com os aspectos da formação. Verificou-se que
ela assume importante papel na formação humana do profissional Enfermeiro.
110
CAPÍTULO V
CONCEPÇÃO DE ASSISTÊNCIA HUMANIZADA E SUA CONCRETIZAÇÃO NA
PRÁTICA
“O grande desafio dos profissionais da saúde é cuidar do ser humano na sua
totalidade, exercendo uma ação preferencial em relação a sua dor e seu sofrimento, nas
dimensões física, psíquica, social, espiritual com uma competência tecnocientífica e
humana”.
Luiz Antônio Bettinelli.
111
Neste capítulo serão analisadas: a contribuição da Bioética para a
formação do profissional Enfermeiro em um cuidado humanizado pela ótica dos
docentes; a concepção de assistência humanizada e sua concretização na prática.
Convidei professoras de duas Instituições de Ensino Superior do
Estado do Paraná para participarem da pesquisa. Selecionei oito, utilizando os
critérios que foram explanados anteriormente. Quatro Enfermeiras docentes da
Instituição de Ensino Superior “Lâmpada” e quatro enfermeiras docentes que da
Instituição de Ensino “Verde Esmeralda”. Uma das docentes da Instituição
“Lâmpada” não pôde comparecer por estar acamada.
Para resguardar a identidade dos sujeitos foram utilizados os
seguintes pseudônimos: Felicidade, Firmeza, Responsável, Determinada, Conquista,
Humana e Amor.
No Quadro 2 apresento dados obtidos do grupo focal das docentes
enfermeiras:
QUADRO 2 - RESULTADO DO GRUPO FOCAL DE DOCENTES ENFERMEIRAS
Nome Pseudônimo Instituição Tempo atuação
R.B Felicidade ‘LÂMPADA’ 13 anos
G.R. Firmeza ‘LÂMPADA’ 9 anos
V.L.M. Responsável LÂMPADA’ 23 anos
A.C. Determinada ‘VERDE ESMERALDA’ 9 anos
M.D.R Conquista VERDE ESMERALDA’ 10 anos
L.D.Z Humana VERDE ESMERALDA’ 18 anos
A.B.S. Amor VERDE ESMERALDA’ 26 anos
Fonte: a autora
Em relação à eleição do pseudônimo, que foi de caráter individual,
percebeu-se que, desta vez não houve repetições. A utilização de pseudônimos,
tanto dos participantes quanto das instituições, objetivou salvaguardá-las de
qualquer informação que pudessem expô-las.
Lançando um olhar em relação ao tempo de atuação percebe-se que
todas são enfermeiras com grande experiência na Enfermagem (vinte e seis anos) e
no mínimo de nove anos. Duas delas atuam na área mais de vinte anos. A
112
experiência na área confere à pesquisa um caráter importante, pois a vivência
certamente contribuiu para a riqueza do que foi explanado.
Os dados levantados possibilitaram a definição de categorias de
análise utilizadas para a organização. São as mesmas utilizadas na análise dos
dados obtidos sob a ótica dos alunos.
5.1 CONDIÇÕES OBJETIVAS DE TRABALHO
5.1.1 Pressão exercida (colegas da equipe/instituição)
Quando se fala sobre humanização do atendimento, muitos aspectos
vêm à tona. Um deles é a importância da individualização do atendimento. Normas,
regras e determinações devem ser conciliadas com a singularidade de cada
paciente, sua situação pessoal, necessidades e vontades. Isso exige prudência. Os
serviços carecem de normas institucionalizadas para o bom andamento do
atendimento. Porém, a rigidez muitas vezes desumaniza e precisa ser flexibilizada
de acordo com a situação. Nesse sentido, Firmeza expressou que “a gente
estabelece na área de saúde metas, então meu paciente tem que receber
medicação no horário, o curativo tem que ser feito desse jeito e daí eu esqueço de
perguntar se é isso que ele quer.” O fato de que as coisas “têm que ser feito desse
jeito” devem ser questionadas pelo Enfermeiro. Por que devem ser feitas assim?
Onde está a minha autonomia enquanto profissional? A quem interessa que as
coisas sejam feitas dessa forma?
Na prática, percebo que as atitudes provenientes da autonomia do
sujeito, quando não conhecidas pelos profissionais de saúde, tomam uma conotação
de absurdo, de desconcertante. Algo fora dos parâmetros internos
institucionalizados no qual o Enfermeiro vem se aplicando ao longo dos anos sem a
necessária reflexão. O resultado é a geração de dissabores nas relações entre
empregado/empregador e entre Enfermeiro/paciente e, além disso, de situações de
estresse advindas de pressões da instituição onde se trabalha. Visualizo aqui o
princípio da dialética que é o do movimento, onde tudo se transforma, nada é
imutável e tudo se relaciona, conferindo à totalidade grande importância.
113
Nesta subcategoria também se colocam as questões objetivas de
trabalho, no que se refere ao quadro de pessoal. A falta do número adequado de
funcionários gera sobrecarga de atividades. Nesse sentido, Felicidade expressou-
se: “é difícil, lhe é cobrado tem que fazer... tem que fazer...”. Essa pressão imposta
pelo sistema que recai sobre a equipe, aumenta o estresse. A Enfermagem é a
segunda profissão com o maior número de casos desta patologia. Sobre este
pensar, cito Rodrigues:
A vida das pessoas es mais agitada, seus desafios cada vez maiores
requerem que inúmeras solicitações sejam vencidas a cada instante. (...) O
stress, atualmente faz parte de nossas vidas porque as exigências do
mercado requerem que produzamos debaixo dessa grande pressão
(RODRIGUES, 2001, p. 204).
Amor, com uma visão de coordenadora de curso, contribui dizendo
que: “por outro lado nós somos, temos aquela questão de que na enfermagem nós
não queremos ver erros, que não possam admitir erros. E enquanto supervisora, nós
estamos ali com muito rigor pra esse atendimento”. Aqui ganha expressão a
“cobrança”, sentida pelo Enfermeiro no desempenho de suas funções relacionadas
com o cuidado da vida de outrem, ou seja, a responsabilidade legal que este
assume. Cito Favareto (2005, p. 34), quando diz: “o enfermeiro, querendo ou não,
tem uma parte de responsabilidade na assistência ao paciente e por este motivo,
deve estar sempre atento às ações que são realizadas pela sua equipe”. Ele deve
estar sempre vigilante para evitar casos de negligência, imprudência ou até, nesse
caso, de imperícia durante o exercício profissional. Porém, como ser humano que é;
não está imune a erros. Será responsabilizado, principalmente quando houver danos
a terceiros. O número de processos éticos na área de Enfermagem tem crescido nos
últimos tempos. Entre outras, a função de supervisão do Enfermeiro, visa coibir este
aumento. Tudo isso faz aumentar o rigor, muitas vezes, em detrimento da
humanização.
Responsável fez alusão ao sentimento de impotência vivido pelo
Enfermeiro em relação a outros membros da equipe multidisciplinar: “Nós temos um
monte de coisas que nós somos impotentes. Aí é o médico, uma hegemonia eterna
dentro da saúde. Tudo tem que se adaptar em volta dele. É o diretor, o
administrador”. Diante dessa afirmação, cito Minayo:
114
Na prática médica e suas relações com a sociedade, o positivismo se
manifesta: (...) Na dominação corporativa dos médicos em relação aos
outros campos do conhecimento, adotando-os de forma pragmática; no
tratamento subalterno dado aos outros profissionais da área (enfermagem,
assistentes sociais, nutricionistas, etc...) (MINAYO, 2000, p. 49).
Conquista contribui com a pesquisa quando se referiu ao
relacionamento em equipe. “E ao mesmo tempo a gente percebe que os
profissionais, eles realmente, não é da enfermagem, muitos momentos
conflitos entre equipe porque o meu pensar difere do outro que está ali. Isto forma
uma situação tão difícil!”. O relacionamento interpessoal interfere no cuidado
humanizado, repercutindo em todos os envolvidos. Para que este cuidado seja
concretizado, é necessário que a humanização permeie por toda a equipe
multidisciplinar.
5.1.2 Dificuldade em relação ao contexto social
O atendimento à saúde sofre repercussões de forma direta do
contexto social. No dizer de Firmeza isso se manifesta quando realça que as
condições de trabalho são sine qua non para a humanização “e que eu preciso ter
um máximo de clientes para poder atender, ter material”. No sistema econômico-
social vigente uma lacuna entre o que deveria ser e o que é. Isso gera conflitos
que muitas vezes atinge o profissional de saúde. Normalmente, no sistema de saúde
brasileiro, são precárias as condições que lhe são oferecidas para que desempenhe
seu papel. A falta de recursos humanos e de material assume grande importância.
uma sobrecarga de atendimentos, gerando estresse no Enfermeiro e sua equipe.
Várias instituições dão preferência para a contratação de profissionais de
Enfermagem menos dispendiosos (Auxiliares e Técnicos de Enfermagem). A equipe
de Enfermeiros fica defasada, gerando sobrecarga e comprometendo a qualidade do
atendimento oferecido. Daí, a necessidade urgente do Enfermeiro questionar sua
atuação e condições de trabalho. Em relação à saúde do trabalhador, Minayo
acrescenta:
Definir categorias e programas centrados na segurança do trabalho e no
combate a doenças profissionais, questionar as condições gerais de
115
produção, do ponto de vista dos interesses das classes trabalhadoras, exige
afrontar forças econômicas e políticas dominantes (MINAYO, 2000, p. 190).
Neste pensar, Felicidade salientou: “como é que você quer que teu
funcionário atenda de uma forma humanizada se falta agulha, se ele tem que usar
um aparelho que não funciona”. Amor complementou dizendo: “Algumas vezes agir
desta forma, pensar de como desejaria de ser assistido, vai demandar mais tempo
pra assistência, mas daí pense quantos pacientes essa pessoa teria pra assistir ao
mesmo tempo? Ela tem uma unidade inteira quase pra assistir. Duas pessoas no
plantão noturno pra dar assistência pra um setor inteirinho dentro de um hospital.”
Esses aspectos atingem de forma direta a qualidade do atendimento. Portanto,
exige-se do profissional de Enfermagem, que reflita sobre essa sua prática. Como
solucionar esses problemas de contexto social, promovendo melhorias no cuidado.
Urge que participem de associações de classes, que se mobilizem, que ampliem
seus estudos, que se unam aos demais colegas da profissão. O problema é de
grande amplitude, envolvendo o Sistema Único de Saúde brasileiro e as políticas
públicas. As condições de trabalho necessitam ser reavaliadas, pois são em grande
parte responsáveis também pela qualidade do cuidado oferecido. São como já
afirmadas, condições sine qua non para a concretização da humanização na área da
saúde.
Humana disse: “A Saúde blica tem todo um fazer e toda uma
assistência voltada para a manhã e a tarde fica ociosa”. De maneira geral os
horários são impostos obedecendo a um critério de normatização, impondo ao
usuário regras que nem sempre são as mais recomendadas para determinadas
situações. O estabelecimento de horários para o atendimento, por exemplo, em
vários locais, visa somente a interesses de terceiros, menosprezando-se
necessidades individuais e comunitárias. Sabe-se que durante o período vespertino,
os médicos estão em seus consultórios, fazendo com que o atendimento das
unidades de saúde não se estenda além das 16h00min. Importante se faz que mais
Enfermeiros tenham percepção deste fato, para que possam suscitar mudanças.
Sobre isso Conquista, referindo-se ao contexto social, afirmou: “aí a gente percebe
que na realidade nós trabalhamos pra um sistema, um sistema político social que
nós estamos inseridos. Ele determina que nós temos que começar tal horário e
terminar tal horário.(...) estamos num mundo neo-liberal em que o retorno, o
resultado não é bem essa questão. São outros fatores por detrás”.
116
5.2 HUMANIZAÇÃO/HUMANIZADOR
5.2.1 Múltiplos olhares sobre a humanização
Nesta segunda categoria, no Grupo Focal de docentes, a
humanização assume vários olhares. Firmeza abordou que “trabalhar na área da
saúde exige que a pessoa valorize o ser humano, que ele valorize a vida”. Continuou
sua fala inferindo que a desumanização “é a não valorização do outro enquanto ser
humano” E ainda: “você está vendo o outro como fonte de lucro, como uma parte de
teu trabalho, como um órgão, como uma técnica, e não como um ser humano.”
Para que ocorra o atendimento humanizador no pensamento de
Firmeza é necessária uma somatória de fatores tais como a formação e as
condições sociais para operacionalização do cuidado, “mas acho que tem um
terceiro lado junto, de peso igual, que seria a essência da pessoa”. Neste pensar, a
essência se traduz em princípios, na educação adquirida pelo processo de formação
no seio da família, manifestada pelos indivíduos e suas atitudes no cotidiano.
Outro aspecto que sobressai é a individualidade no atendimento. Na
área da obstetrícia, Firmeza exemplificou dizendo: “parto humanizado é você
respeitar a vontade dela, seja em qualquer área, seja em qualquer clínica em que
for” Nesse pensar, a Bioética vem ao encontro do resgate do direito dos pacientes.
Os pacientes têm direito de participar das decisões que envolvam sua saúde e
recuperação. Têm direito a uma autonomia que lhes permitam opinar sobre o
tratamento e que suas vontades sejam respeitadas. Sobre isso, Firmeza afirmou:
“nós nos sentimos donos do paciente” exemplificando: “eu vou trocar, eu vou fazer
na hora que eu puder, eu não posso fazer o curativo agora porque tenho outras
coisas pra fazer. Então a gente se sente dono do paciente. A gente não pergunta
primeiro. A gente faz e ainda acha que ele tem que agradecer por a gente estar
fazendo. A gente acha que está fazendo um favor, muito contrário. Então a gente
tem que começar a colocar o paciente em primeiro plano”.
Esse paternalismo que emerge desses pensamentos é ainda muito
comum nos profissionais de saúde, de maneira geral. Foucault adverte sobre a
117
questão do poder e do disciplinamento que acontece também dentro do hospital
dizendo:
É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar
e punir. Estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade que através deles
são diferenciados e sancionados. (...) No coração do processo de disciplina,
ele manifesta a sujeição dos que são percebidos como objetos e a
objetivação dos que se sujeitam (FOUCAULD, 1977, p. 165).
Outro prisma da humanização, abordado por Humana é “colocar-se
no lugar do outro... (...) é perceber este teu paciente, este teu cliente, este teu
doente”. Essa reflexão permite ao profissional repensar suas atitudes, que muitas
vezes não vão ao encontro do que os serviços oferecem.
Salientou também Humana que o princípio da alteridade é
necessário para a efetivação do cuidado humanizado dizendo: “não tem como fazer
algo humanizado e fazer uma assistência humanizada, tratar o meu próprio aluno,
meu próprio colega sem me colocar no lugar do outro”. Para Humana, esse é o
critério que baliza suas ações, pois, ao colocar-se no lugar do indivíduo, tenta ter a
percepção do que mais convém a ele. Essa é uma atitude de humanização.
O cuidado humanizado assume conotação de escutar e individualizar
o tratamento, de valorizar o querer do outro. Neste pensamento cito Amor que
disse: “se eu vou atender de uma forma humanizada, implica em que vou explicar
para ele, que eu vou escutá-lo. Acho que humanização é escutar o indivíduo
principalmente. Eu vou perguntar se o cliente quer acompanhante ou não, eu vou
dar tempo para ele pensar, para ela decidir o que ele quer”. Evidencio, nesta fala, o
princípio da autonomia que é colocado em prática, na qual o paciente torna-se
sujeito ativo de seu tratamento. O profissional Enfermeiro tem sua parcela de
contribuição neste processo. Sobre isso, Horta afirma que:
A percepção individual de si mesmo é afetada pela doença, como a
liberdade, a independência, a privacidade e a auto-estima. Quando a
enfermeira faz o paciente participar do seu plano de cuidados, ela está
obedecendo ao princípio de conservação, procurando manter íntegros os
mecanismos de defesa biológicos fundamentais do indivíduo (HORTA,
1979, p. 13).
Os múltiplos olhares sobre a humanização abrangem a totalidade do
ser. Conquista salientou isso quando disse: os nossos clientes não querem
realmente o curativo, é muito além, porque o homem é um todo: corpo, mente e
118
alma”. Ao ser atendido, o ser humano necessita que sejam considerados, pelo
profissional da saúde, aspectos emocionais e psicológicos, e o somente
fisiológicos. As ações, na prática, ganham ressonância quando amalgamadas da
visualização do indivíduo em sua totalidade. Nesse pensamento, cito Minayo:
Incluindo os dados operacionalizáveis e junto com o conhecimento técnico,
qualquer ação de tratamento, de prevenção ou de planejamento deveria
estar atenta aos valores, atitudes e crenças dos grupos a quem a ação se
dirige (MINAYO, 2000, p. 16).
Conquista também se referiu sobre a forma de execução do cuidado
com o paciente, isto é, como este cuidado transcende às nossas atitudes, quando
abordou: “Então, ele percebe através de cada um de nós como que s fazemos o
cuidado com ele”. A técnica executada pelo Enfermeiro é acompanhada de fatores
subjetivos inerentes ao cuidado. O paciente tem percepção da forma como este
cuidado é feito, com desvelo, com rapidez, com atenção ou com carinho. Cito Bittes-
Junior,1997 apud Costenaro; Lacerda, que contribuem afirmando:
Aprender a fazer o cuidado de ser humano para ser humano é uma ação
contínua para os profissionais de enfermagem, e “tão importante quanto o
cuidar é estarmos atentos aos efeitos que o cuidado produz nos pacientes”
(BITTES-JUNIOR, 1997 apud COSTENARO; LACERDA, 2002, p. 31).
Portanto, o paciente percebe se o profissional está preocupado pelo
seu restabelecimento, ou se está sendo considerado apenas ‘mais um’. Em muitas
ocasiões da prática, o paciente evita chamar o Enfermeiro para prestar atendimento
ou sanar dúvidas, porque tem a percepção de que está atrapalhando o serviço.
Percepção esta, originada de experiência negativas anteriores.
Responsável, do ponto de vista de sua área de atuação, a pediatria,
abordou a humanização nos seguintes aspectos: atuação do funcionário na
recreação, as acomodações da mãe ao lado do berço da criança e as modificações
do ambiente. Sobre isso, relatou: “pintar tudo, colorir tudo. (...) ter sala pra essas
crianças poderem brincar”. A humanização, para Responsável, também se verifica
através do cuidado realizado com a criança. Disse: “vai fazer curativo de queimado?
Tem que ter bala, pirulito. Você tem que agradar e o que a criança gosta é doce.
Tem criança que não chora. Sabe que até esquece? Além do efeito da liberação da
endorfina com o açúcar, (...) é a questão de ela saber que tem alguém te dando
119
alguma coisa. (...) Acho que isso é humanização também. Você melhorar um pouco
esse tipo de coisa e a Enfermeira tem que conhecer isso”.
Devido à hospitalização o ser humano perde a liberdade, a
independência, a privacidade e a auto-estima. No caso da criança, seus objetos de
uso pessoal fazem muita falta; como também os animais de estimação. Sobre isto
Responsável assim se expressou: “tive até que vir mandar trazer cachorro pra
mostrar pra criança na janela. A criança mudou, era o que ela mais queria”. Essa
percepção do Enfermeiro, inerente aos aspectos subjetivos do tratamento, é
primordial. A iniciativa, a coragem e perseverança para humanizar o cuidado, são
atitudes que fazem do Enfermeiro um profissional reconhecido e valorizado. Aqui,
visualizo a integração do conhecimento científico com aspectos éticos e
humanísticos, imprescindíveis para o cuidado humanizado.
Conquista comentou que houve um progresso importante: “A
gente percebe que alguns médicos têm essa preocupação de saber o nome do
doente, de respeitar, de pedir um biombo, etc.” São atitudes de valorização e
visualização do paciente como ‘pessoa’ no processo saúde-doença. Diz ela ainda
que “há profissionais que estão ali muito tempo, estão com muitos vícios,
estão acostumados a fazer as coisas daquela forma”. Porém, dentro de todo este
contexto, as mudanças também o percebidas no próprio profissional que
questiona sua prática. Sobre isso, Conquista exemplificou dizendo: “Mas, eu
percebo que a maioria de nós, que estamos aqui, (...) a gente... não quer mais que
nosso aluno seja um excelente técnico. A gente quer colocar nele, desde o primeiro
ano, estes aspectos éticos, humanos”. Percebo a preocupação do docente, não
somente com a formação de um profissional habilidoso tecnicamente, mas também,
com visão ampliada no trato com o ser humano. Na formação, salientou Conquista,
“existe a preocupação de que os aspectos éticos e humanos sejam abordados
desde o início do curso de Enfermagem”.
5.2.2 Universos da Humanização
Do mesmo modo que no Grupo Focal de alunos, neste, de
professores, a humanização é abordada sob vários universos. Um deles refere-se a
120
aspectos intrínsecos do profissional, que deve anteceder ao cuidado de terceiros.
Antes de humanizar precisamos ser humanizados. Neste pensar, Determinada
enfocou, “humanização, pra mim deve vir de dentro“ Firmeza contribuiu dizendo:
“ela tem que ser para ele poder ensinar. Eu ensino aquilo que eu sou”. Diante
dessas falas, infiro: nossos atos transcendem nossa subjetividade.
Como foi afirmado, humanizar não é tarefa fácil. Precisa ser
vivenciada por todos os envolvidos no cuidado, sejam eles pacientes, a família, a
equipe de saúde e a sociedade. Na percepção de Determinada, há uma
constatação de que “nós o temos humanização entre a equipe”. Isso demanda
grande esforço do profissional Enfermeiro que, sendo responsável por sua equipe,
tem a tarefa de operacionalizar essa vivência entre os seus, para que então se
efetive na prática o cuidado dispensado aos pacientes. De acordo com
Determinada: “há necessidade da preocupação, do coleguismo, do
companheirismo” vivenciado dentro da equipe. E continuou dizendo: a
humanização é muito abordada num aspecto de humanização com o cliente externo,
ficando a humanização com o cliente interno, aluno, colega de trabalho; a desejar”.
A humanização, de acordo com Pessini; Bertachini (2001) pressupõe considerar a
essência do ser, o respeito à individualidade e a necessidade de construção de um
espaço dentro das instituições de saúde, onde haja legitimação do humano das
pessoas envolvidas (gripo meu).
O funcionário necessita ser valorizado, humanizado para poder
prestar um bom cuidado de Enfermagem. Determinada fez um paralelo entre o
cuidado e o cuidador: “eu acho muito difícil você chegar a atender uma pessoa de
maneira adequada se você deixou teu filho doente em casa, se você não está bem.
Ninguém te perguntou se você está bem”. Essa afirmação demonstra que o
processo de humanização é também interno, ou seja, deve permear toda a equipe,
cabendo ao Enfermeiro a função de proporcionar soluções adequadas, cabíveis para
cada situação.
Quando se abordam os universos da humanização, visualizo que os
aspectos administrativos contribuem no processo. Nesse sentido, Amor colocou
que: “às vezes a gente encontra funcionários em função errada na saúde pública,
(...) funcionário que não poderia estar naquele setor, que não tem paciência com as
pessoas que chegam ali. (...) falta visão pra quem administra aquela unidade.
Colocar em outro local... Inclusive seria humanização com ele”.
121
Outro universo no qual a humanização é lembrada é com o passado
do profissional que repercute em suas atitudes. Amor fez referência a esse aspecto
em sua fala: “Então é histórico na enfermagem essa posição de mando, de rigidez e
nós não perdemos até hoje”. De acordo com ela, essas atitudes manifestam-se no
cotidiano da enfermeira e do docente, principalmente na formação do aluno. A
rigidez com que o profissional Enfermeiro foi formado repercute em suas ações.
Saliento, também, que a humanização é feita também de pequenos
atos como Firmeza mesmo disse: “É avisar que vai acender a luz. É o bater a porta
antes de entrar. Às vezes não toma tempo. Às vezes, não toma mais tempo que se
você fazer o mesmo procedimento que você tomaria se você não fosse”.
5.2.3 Humanização e Formação
Quando a humanização é vista pela via da formação, surgem vários
aspectos a serem abordados. Um deles é que, independentemente do grau de
instrução, os aspectos humanos devem constar da formação. Outro é que a
essência, o temperamento do indivíduo, assume papel preponderante. Firmeza tem
esse pensamento e exemplificou dizendo: “acho muito difícil o funcionário que
espanca o seu filho, fazer uma faculdade completamente humanizada, chegar e
não ser agressivo com o paciente”.
Na formação do profissional, necessário se faz que a humanização
seja abordada, discutida, trabalhada e vivenciada pelos docentes e alunos, de
maneira a fornecer subsídios para a sua aplicação prática. Quando os professores
falam da humanização normalmente se reportam à formação que tiveram. O tema
não era trabalhado. Essa lacuna repercutiu e ainda repercute na vida profissional.
Diante desse pensamento, Responsável contribuiu dizendo: Trinta anos atrás a
gente não conseguia ver esse lado, dentro da nossa formação”. Determinada
enfocou: “humanização, pra mim deve vir de dentro. Como é que eu vou trabalhar
isso, a humanização com o cliente externo se nós não fomos humanizados. Nós não
tivemos essa formação de humanização. Nós não temos humanização entre a
equipe. (...) Então acho muito difícil você dar aquilo que você não tem. (...) eu sinto
que não fui preparada para fazer um trabalho mais humano. Fui preparada pra
122
aprender a administrar uma injeção, fazer uma escala. Nós não trabalhamos com a
morte, nós não trabalhamos com vida, nós o trabalhamos com o sofrimento a
ponto de preparar os alunos para que encarem este problema que a gente está
encontrando no nosso dia a dia no nosso trabalho”. Amor complementou: “Aí eu
aprendo que eu não posso levar para o hospital os problemas da minha casa e do
hospital pra minha casa. O que eu sou? Robô ou gente? Que forma humanizada eu
fui preparada para atuar? Daí eu vou trabalhar no hospital (...) vou para uma unidade
de terapia intensiva, trabalho com morte todos os dias. Não tenho um suporte pra
isso. Escuta... que enfermeira é essa? Sabe, é difícil. Você é formada desse jeito.
(...) Nós que temos dificuldade em sermos humanos com nossos alunos, como é
que eles serão com os pacientes?”. Firmeza disse: ”Muitas coisas que eu aprendi
sobre humanização não foi na faculdade, porque lá saí uma Técnica de Enfermagem
melhorada. Quando eu me formei não existia humanização no parto”.
Vejo então, diante dessas manifestações, que o Enfermeiro, como os
demais profissionais, não é alguém pronto e acabado. Dialeticamente falando, o
Enfermeiro vivencia o princípio do movimento, onde tudo se transforma.
necessidade constante de aprimoramento. É muito importante que o profissional
tenha percepção do dinamismo da vida e, com seu trabalho, continuidade à
construção de melhorias. Na fala de Determinada, isso é expresso: “eu sinto que
faltou e com isso eu tento mudar. A visão que eu passo para os alunos é essa
mudança. Tem que aprender a fazer direitinho, tem, mas você tem que fazer com
amor, você tem que fazer com respeito de uma maneira mais humana possível”.
Ela ainda afirmou que: “a gente prepara os alunos tecnicistas e
mecanicistas”. Determinada tem a percepção de que ”estamos tentando mudar”.
Felicidade, que trabalha essencialmente com a parte cnica da profissão, disse: “A
grande preocupação minha com essa disciplina é não tornar o aluno tecnicista. (...)
Então está sendo cobrado a técnica, mas também esta questão humana, para não
acabar perdendo isso. Falo então do preparo do paciente, conversar com ele antes,
explicar antes de realizar a técnica, na linguagem que ele possa entender”.
Felicidade expandiu a visão e, nesta concepção, inseriu também a humanização
entre os acadêmicos, quando disse: “Não a parte técnica, também com
dinâmicas, porque eles depois vão para o estágio e vão trabalhar junto lá. A questão
do relacionamento, procurando tornar um grupo mais unido, que se ajudem. A
importância de trabalhar com todos, porque isso vai precisar na vida profissional”.
123
Considero de extrema relevância essas iniciativas que envolvem o relacionamento
interpessoal. Os alunos devem compreender que a união, a solidariedade e o
companheirismo são aspectos importantes de humanização. Dinâmicas de união
contribuirão para ajudá-los a formar, no futuro, equipes unidas. Na Enfermagem
hoje, a desunião, a falta de colaboração, a inveja, a individualidade estão ainda
muito presentes. Fruto da história da profissão, da divisão de classe, da falta de
visão ampliada.
Dimensões do aprendizado referentes à formação do Enfermeiro
foram citadas por Firmeza: “Os alunos tem que ter uma capacidade técnica, tem
que ter uma capacidade no conhecimento científico e tem que ter uma humanidade,
uma sensibilidade”. Considero importante essa afirmação. Vejo a humanização do
cuidado inserida dentro da disciplina. Ter percepção da realidade é um grande
passo para mudanças. Há necessidade de associar, como uma rede, os aspectos do
saber, do fazer e do ser profissional. Ter consciência do perfil que se tenta formar no
aluno do curso de Enfermagem, para atender a comunidade, é muito importante.
Diante dessas reflexões, questiono: O projeto político-pedagógico é do
conhecimento de todo o corpo docente? necessidade de um grande trabalho de
reflexão, de revisão, a fim de que se possam realizar modificações pertinentes nesse
âmbito? Os docentes têm conhecimento do perfil do profissional de Enfermagem
que querem formar? As instituições formadoras têm interesse de que seu corpo
docente seja detentor deste saber?
Um fator que vem contribuir com esta visão mecanicista e tecnicista é
a própria condição imposta pelos meios de comunicação. Determinação sobre isso
abordou: “hoje o mundo é muito mecânico. Os alunos não lêem mais, não viram as
páginas dos livros, tudo na internet. Então ficou tudo mais prático”.
Analisando ainda, a contribuição dos professores na formação dos
alunos, no curso de Enfermagem, Determinação salientou: “cada professor deve
contribuir falando dentro da sua disciplina, colocando a humanização dentro da
mesma. Não há necessidade de ter uma disciplina. (...) cada um se preocupando
com a sua, mas trabalhando isso dentro de cada matéria, dentro de cada dia de
aula, em cada encontro, você pode estar trabalhando isto aos pouquinhos”. Humana
fez menção de sua atuação na disciplina de Fundamentos de Enfermagem na
questão da humanização, dizendo: “Tentei trabalhar esta disciplina sempre em cima
da problematização. (...) Como os assuntos são polêmicos (aborto,
124
homossexualismo, morte), fiz com que esse aluno, desde o primeiro ano, ele tente
entender e aceitar a opinião do outro. Isso foi um ponto bem forte da disciplina e
acho que teve sucesso”. Já, Conquista, que também atuou na referida disciplina,
deu sua contribuição dizendo: “precisei trabalhar qual é a função do Enfermeiro, a
questão do sigilo, a questão do respeito profissional, o trabalho em equipe”. Percebo
que essa disciplina é ministrada de forma a contribuir com os assuntos ético-
profissionais. Ao que parece, os bioéticos carecem de maior enfoque.
Firmeza disse: “Todos temos a mesma obrigação de estar
ensinando ética, de estar ensinando a ser ‘humano’, a ser sensível, a valorizar o ser
humano”. Humana, sobre isto, contribuiu dizendo: “vai depender do professor que
está trabalhando de estar abordando esse assunto, não de uma forma... Ah!
Humanizar é isso, ser ético é isso... mas de uma forma espontânea”. Através
dessas falas, verifico que está se propondo a humanização na formação do
Enfermeiro, através da interdisciplinaridade. Trata-se de promover a integração de
diversas disciplinas, a fim de possibilitar a aquisição de um saber unitário e
articulado. Porém, o que deveria ser, o que é obrigação, ainda são realidades não
contempladas de forma unânime por todo o corpo docente, como esta pesquisa está
apontando.
As abordagens inerentes à humanização no curso de Enfermagem,
parecem ser insipientes, esporádicas, individuais e até isoladas. Não possuem
caráter de uniformidade e de totalidade. Sobre isso, Firmeza afirmou: “a
humanização acontece de forma isolada. Um exemplo ou outro a gente vê. Mas
acho que a grande maioria, de forma isolada. Quando um professor acredita nisso,
ele passa. Não é uma filosofia do curso”. O problema apontado demonstra a
necessidade de mudanças nos projetos político-pedagógicos, o que somente
ocorrerá se houver realmente interesse na formação do profissional crítico, reflexivo,
ético e com atitudes humanizantes em relação ao cuidado com terceiros.
Por outro lado, existem avanços relativos à formação humanizada.
Eles podem ser conhecidos através da fala de Conquista: “Eu percebo que todas as
profissionais estão se preocupando. No curso de Medicina, na PUC, saiu uma turma
que o ensino deles não é o ensino tradicional. Na UEL, tem a questão da
problematização,( ...) ainda sobrepõe o ensino tecnicista, mas temos escola em
que o ensino está voltado para questões de resgatar a humanização, todos estes
princípios que faltam. (...) Mesmo que nós saibamos que não é total de todas as
125
escolas que ainda não perceberam essa temática, mas aos poucos s estamos
percebendo com o trabalho com os alunos que está presente. Isso vai, a
tendência é ampliar, é relevante”.
Nesse mesmo pensar, Responsável contribuiu dizendo: “eu acho
que é gratificante, nós como docentes, até sentir isso em questão da humanização.
A gente trabalha, tem toda essa formação, mas acho que nós estamos passando
alguma coisa. (...) Tem alguns professores que devem estar enfatizando muito que
deve estar ficando na formação deles isso. Então, eu sinto isso como um fator
positivo”. Sobre o mesmo tema, Amor expressou: “Dentro do nosso curso tem
pessoas que são mais voltadas para a humanização do que outras. (...) Noto pelas
conversas que nós temos, pela forma de preparar ao conteúdo da disciplina, pela
conversa que a gente tem com os alunos. Inclusive a humanização na forma de dar
aula. (...) Então, eu observo, que existem professores que estão mais abertos para
ensinar o aluno de forma mais humanizada e isso vai refletir no cuidado sim”.
Diante desse panorama, dificuldades são visualizadas. Enfermeiros
têm manifestado sua insatisfação diante do que está posto. Para o aluno, essas são
situações importantes, onde são oportunizadas reflexões que propiciam o
crescimento. Responsável sobre isso disse: “Falta um monte de coisas. Em relação
à equipe, ao sistema. Da impressão que às vezes, a gente se sente impotente, mas
em relação ao que eu posso fazer! (...) Quero mostrar pro aluno tudo isso. (...) Mas
tem o outro lado positivo do crescimento”.
Ainda, em relação às mudanças, Amor fez referência ao curso de
Enfermagem dizendo: “esse processo das mudanças de metodologias dos cursos,
teve muita resistência. Então são poucos os professores que adotaram, lutaram e
brigaram, brigas imensas. E foram anos de amadurecimento pra que isso pudesse
acontecer. O resultado é que é muito bom”. Sinalizo aqui, que o aspecto cultural está
envolvido no processo de mudança, no qual comportamentos e atitudes têm
relevância. Isso demanda tempo, perseverança e paciência para que se efetive. Aqui
também verifico a riqueza do trabalho em equipe. Docentes unidos em busca de um
ideal, voltados para melhorias, porque acreditam na esperança de um futuro melhor,
onde a Enfermagem brilhe pelo atendimento humanizado. Ainda há que se caminhar
muito nesse sentido.
Quando analiso a humanização no viés da formação, não posso
deixar de salientar que é comum encontrar abordagens sobre o tema inseridas
126
nos Trabalhos de Conclusão dos Cursos de Enfermagem. A Enfermagem é uma
disciplina baseada em filosofia, teoria, prática e pesquisa (LEOPARDI, 1999).
Humana afirmou: “Tem monografias que eles estão abordando este assunto. A
gente alguém abordando Bioética, alguém abordando a humanização. Fui
orientadora de duas alunas que abordaram uma assistência humanizada na coleta
do preventivo do câncer. (...) a gente que o aluno está resgatando e que ele está
vendo isso sabe? (...) a gente percebe isso na formação. Foi bastante evidente”.
A temática da humanização parece ser um fato real, possui
expressão e presença dentro dos cursos de Enfermagem. Em relação às
monografias realizadas, fiz um levantamento, nos dois cursos desde sua
implantação. Convém lembrar que, de acordo com Responsável: “quando o título
não está puxando para humanização, (...) está dentro do texto”. Abaixo, cito
monografias cuja temática foi a humanização.
- Humanização da Assistência de Enfermagem ao cliente do Programa de Saúde da
Família.
- Assistência de Enfermagem humanizada no puerpério.
- Humanização da assistência de Enfermagem no pré-operatório.
-A relevância da humanização frente à equipe de Enfermagem e ao
acompanhamento pediátrico.
- Humanizando a coleta do preventivo do colo uterino.
- O papel do Enfermeiro na promoção do relacionamento interpessoal na equipe de
Enfermagem.
- Humanização de Enfermagem em clientes com HIV-AIDS em fase terminal.
- Humanização no centro cirúrgico: comportamento e respeito da equipe de
Enfermagem frente o paciente no trans-operatório.
- Ação do Enfermeiro de urgência e emergência na prática da triagem humanizada.
Noto que a humanização perpassa as diversas áreas da
Enfermagem, tais como pediatria, doenças infecto-contagiosas, centro cirúrgico,
clínica cirúrgica, urgência e emergência, puerpério, programa de saúde da família
etc. Isso demonstra que a humanização tende a permear, como uma seiva, o ensino
da Enfermagem, em suas mais diversas expressões.
Um dado que considero extremamente importante e que esta
pesquisa mostrou, foi o ganho que a cidade e os profissionais Enfermeiros obtiveram
com a presença dos acadêmicos de Enfermagem. Lembro aqui que, até quatro anos
127
atrás, esse curso não era oferecido por nenhuma faculdade dos Campos Gerais. Na
fala de Humana, ela comentou sobre essa importante mudança: “Acho que Ponta
Grossa ganhou muito com o acadêmico, porque a partir do momento que eles estão
indo pra campo de estágio, o serviço melhorou muito na assistência de enfermagem.
Porque ele provocou o profissional que está na assistência da Saúde Pública a
irem busca e a procurar. Porque a presença do aluno no estágio fez uma revolução.
(...) Vi alunos que fizeram uma mudança na sala de puericultura, humanizaram. (...)
Esse acadêmico para Ponta Grossa veio contribuir na melhoria da assistência.”
Humana também se reportou aos Enfermeiros: “o aluno só trouxe benefícios, (...) ele
veio a contribuir até pra nós. A gente sentiu a necessidade e ir em busca, de
crescimento”. Responsável complementou dizendo: “Eu acho que a tendência é
essa. Quem está se formando, está chegando e está exigindo. Se a enfermeira
está vinte anos e nunca exigiu aquilo, começa essa exigência. Eu acho que isso
tende a mudar”. Este ganho a que as docentes se referem, não foi somente para a
cidade, mas inclui os profissionais de Enfermagem que necessitaram atualizar-se.
Exigiu mudanças, reflexões, pois novas idéias surgiram. Resistência também houve,
mas ela se faz necessária para o crescimento.
Humana continuou sua fala em relação aos acadêmicos afirmando:
“Eles estão saindo com uma visão mais crítica, mais apurada nestes termos éticos,
humanos e mesmo deste espaço de criar estas possibilidades, esta criatividade de
mudar o ambiente, de melhorar”.
Ao terminar a análise desta categoria, deixo assinaladas as ações
que as docentes consideram importantes para ajudar o futuro profissional a realizar
um cuidado humanizado. Humana citou: “eu tenho tentado durante a docência,
sempre deixar claro para o aluno que para ele prestar uma assistência humanizada,
em qualquer atividade que ele for fazer, ele tem que se colocar um pouco no lugar
do outro. Para sentir o que o outro está sentindo, como ele gostaria de ser tratado,
como ele gostaria de ser ouvido, como ele gostaria de ser percebido. Porque a partir
do momento que ele começa a sentir isso, ele vai ter uma postura diferente nessa
assistência que ele vai dar.” Firmeza completou: “É a gente despertar no aluno, a
valorização do outro enquanto ser humano, enquanto sujeito. Sujeito que decide ser
humano, que sente que tem família, que não é um corpo. (...) para isso nós
precisamos trabalhar com eles. Eles precisam trabalhar com eles próprios, para que
ele possa ter essa consciência despertada dentro dele. Porque mesmo que não
128
tenha seringa, eu posso ser humana. Mesmo que eu esteja cuidando de vinte
pacientes, eu posso ser humana”. Determinada, além de citar ações para os
acadêmicos, fez uma avaliação de suas dificuldades, apontando o passado, quando
disse: ”Todos nós temos certa bagagem capaz de transmitir isso para o próximo,
nossos alunos, para que eles possam adquirir seus próprios conhecimentos. E
através dessa orientação que a gente passa, através da vivência que nós já tivemos,
que possam melhorar. Que eles não passem por que nós passamos. Aprender com
tanta dificuldade, aprender com tanto erro”.
5.3 DICOTOMIA TEORIA/PRÁTICA
Analisando esta terceira categoria, a humanização aparece na prática
como sendo algo ainda utópico, um sonho, algo a ser conquistado. Algo que
demanda esforço, perseverança, como um longo caminho a ser percorrido.
Conquista a humanização como algo complexo: “acho muito complexa essa
questão de humanização. Na fala de Firmeza, com sua experiência na área da
obstetrícia, isso fica claro quando disse: “eu ainda sonho com o parto humanizado,
com a valorização da paciente, com a valorização do neném. (...) ainda quero mudar
o mundo. (...) nessa área você querer mudar é um grande caminho a percorrer, mas
eu ainda acredito nisso”. Percebo que essa docente enfermeira tem clara percepção
do que é e do que deveria ser. Essa consciência é um passo importante, é a mola
propulsora para mudanças.
No dizer de Determinada, a humanização assume conotação de algo
polêmico necessitando ser assimilada internamente, ou seja; “as pessoas têm que
começar a viver humanização para passar isso para frente”.
Amor percebe a efetivação do cuidado humanizado na prática
quando se reportou aos alunos sobre a atuação no cuidado em campo de estágio: “a
gente os ganhos dos nossos alunos, quando a gente consegue mostrar para eles
que por, exemplo, nas unidades de saúde não tem lençol para uma mulher se cobrir
na hora que ela vai fazer uma coleta de preventivo. E daí a gente tem aventais
descartáveis e a gente leva o nosso e deixa e não mais uma mulher coletando
preventivo sem pelo menos usar um dos nossos lençóis e aventais descartáveis,
129
porque nossos alunos introjetaram que é um absurdo uma mulher ficar nua
enquanto está sendo examinada”. Apesar de ser o cuidado humanizado algo que
demanda esforço e exige perseverança, verifico que ele acontece através de
atitudes simples, que, por sua vez, podem ser de grande valia para a pessoa que
está sendo cuidada. Referindo-se ao cuidado humano, Leopardi diz:
O processo de vida envolve várias dimensões complementares (biológica,
psicológica, afetiva, social, cultural, ética, política). No entanto, ao se
sujeitarem temporariamente à instituição de saúde, os indivíduos expõem
toda a sua fragilidade e se os profissionais da área da saúde o avaliarem
à sua competência técnica, a perspectiva humanística, a situação vivida por
esse sujeito pode ser ainda, mais dolorosa (LEOPARDI, 1999, p. 139).
Em relação à prática do cuidado humanizado, percebo progresso
quando faço comparação do passado com os tempos atuais. Responsável, com
sua experiência na pediatria, confirmou isso dizendo: “Eu sempre tento analisar o
que evoluiu. (...) A criança era tratada sem retirar do berço, (...) os pais não podiam
visitar, (...) a criança era arrancada dos braços da mãe, ficava trancada na
enfermaria. (...) Então hoje, de você ter um monte de coisas: ter recreação, ter
brinquedo”. Apesar do processo penoso e demorado para se constituir a
humanização, em alguns lugares já há evidentes sinais de vitória.
Para a institucionalização do cuidado humanizado, ao Enfermeiro
cabe um papel preponderante. Muitas vezes, terá que travar lutas intensas para
mostrar aos administradores a necessidade de mudanças, bem como os benefícios
que estas trarão para o paciente, para a família, para a equipe da saúde e para a
instituição. Nesse pensamento cito Responsável, quando abordou sobre o
Enfermeiro na pediatria: “A enfermeira tem que, faz parte do plano dela, determinar
alguém pra brincar com a criança. (...) Na hora que ela põe sua escala, tem que ter
um funcionário determinado. (...) Recreação é uma atividade de enfermagem em
pediatria. (...) Tem que ter uma cadeira, no quarto, para mãe deitar, ela vai ficar junto
o dia inteiro. (...) uma sala tem que ser para as crianças saírem da enfermaria e
brincarem”.
Essa luta protagonizada pelo Enfermeiro é necessária na
concretização de mudanças para melhorias no atendimento. No dizer de
Responsável: “então são coisas assim que você, às vezes, tem que brigar, (...) e
nós como enfermeiras temos este papel”. As mudanças na práxis do Enfermeiro
ocorrem devido ao processo de transformação do pensamento sobre esta mesma
130
práxis. Minayo (2000) afirma que a transformação de nossas idéias sobre a
realidade e a transformação da realidade caminham juntas.
Foi também salientado que há uma dicotomia entre o saber e o fazer,
de difícil operacionalização. Sabe-se como as coisas deveriam ser realizadas,
porém, assim não ocorrem. Firmeza, em sua fala, afirmou isso dizendo “que a gente
vê que deveria ser o que é muito diferente da realidade”.
Aqui um grande questionamento: porque a realidade se mostra
desta forma? Como fazer para que os conhecimentos adquiridos através de uma
sistematização possam ser colocados em consonância com a prática vivida?
Aproprio-me das palavras de Almeida citando que:
Trata-se de uma crise (ruptura ou dissociação entre a prática, o domínio
institucional e o saber) que exige a tomada de consciência do significado
atual da Enfermagem profissional, a sua inserção no projeto capitalista da
saúde, as imposições derivadas da estrutura dos serviços de saúde, etc.
(ALMEIDA; ROCHA, 1989, p. 15).
Vejo a necessidade de fazer alusão à história da Enfermagem para
poder analisar o problema. Na evolução da profissão, através do tempo, houve
várias modificações na maneira de trabalhar. O cuidado primeiramente era realizado
individualmente, depois em equipe. O trabalho em equipe deslocou a função do
Enfermeiro da execução direta para a gerência e/ou supervisão.
O fato de o trabalho ser realizado por várias pessoas faz que o
Enfermeiro elabore o plano assistencial a ser executado por sua equipe. Para ter
informações sobre o paciente, delega as funções do cuidado a Auxiliares e Técnicos
de Enfermagem que lhe darão subsídios para implementar o plano assistencial por
ele organizado. aqui uma fragmentação do trabalho, com a concepção separada
da execução (ALMEIDA; ROCHA 1989, p. 65). Os Auxiliares de Enfermagem
assumem o cuidado possibilitando aos Enfermeiros a ocupação de cargos de
direção. Como se percebe, o trabalho na Enfermagem é parcelado em tarefas,
procedimentos e responsabilidades diferentes, assumidos por elementos diferentes
da mesma equipe.
Essa divisão técnica expressa a estrutura de classes da sociedade
capitalista. A divisão técnica aumenta a destreza dos procedimentos, diminuindo
custos, mas também:
131
enquanto a divisão social do trabalho subdivide a sociedade, a divisão
parcelada do trabalho subdivide o homem, e, enquanto a subdivisão da
sociedade pode fortalecer o indivíduo e a espécie, a subdivisão do
indivíduo, quando efetuada com menosprezo das capacidades e
necessidades humanas, é um crime contra a pessoa e contra a humanidade
(BRAVERMAN , 1893, p. 72 apud ALMEIDA E ROCHA, 1989, p. 70).
A fragmentação do trabalho faz com que aqueles que detêm maior
conhecimento teórico (os Enfermeiros) não são os executores do serviço. os que
executam (Técnicos e Auxiliares) acabam tendo uma maior prática, porém sem o
devido conhecimento teórico.
Então, percebe-se uma dicotomia onde os saberes são divididos,
hierarquizados. Alguns elementos da equipe dominam a concepção do trabalho e
outros a execução, ou seja, uma dicotomia entre o saber e o fazer, entre a teoria e a
prática. Nesse pensar, recorro a Nakamae que diz:
A divisão técnica no âmbito da enfermagem, sobredeterminada pela divisão
social do trabalho, fez do enfermeiro o detentor do saber da enfermagem e
o agente encarregado do controle da eficácia (capitalista) do trabalho dos
subalternos (NAKAMAE, 1987, p. 113).
No capitalismo, o trabalho intelectual dos Enfermeiros é mais
valorizado que o manual executado pelos Auxiliares e cnicos de Enfermagem.
Sobre os Auxiliares de Enfermagem, Almeida diz:
Seu trabalho esmais voltado para o lado do trabalho manual. Apesar do
seu trabalho não ser produtivo, ele é o mais explorado pelo capital, tendo
sua jornada de trabalho muitas vezes duplicada devido seu pequeno salário.
É ele que realiza o trabalho mais cansativo e pesado na Enfermagem
(ALMEIDA, ROCHA, 1989, p. 80).
As questões referentes à concretização do cuidado humanizado são
motivo de conflitos, de sofrimento para o Enfermeiro pois, como disse Conquista:
“eu, enfermeira dez anos atuando, isso me traz muito sofrimento, porque
momentos que a gente apensa em deixar o ambiente hospitalar em decorrência
de você perceber que eu estou praticando uma assistência que não tenho condições
de abordar, acompanhar todos os pacientes, então eu não estou sendo humana”.
Conquista continuou dizendo: “Na minha realidade, que trabalho no hospital, em
que muitas vezes eu fico frustrada porque em vez de eu estar cuidando do doente,
aprendendo, se inteirando com ele, (...) 70% do meu horário de serviço eu estou
comprando briga, (...) briga oculta, aquele jeitinho e tal pra conseguir que o paciente
132
tenha assistência melhor. (...) é o tempo que eu estou deixando de cuidar do meu
doente, que estou brigando”. Fica claro aqui que o discurso sobre o cuidado
humanizado muitas vezes não está em sintonia com o sistema vigente. Nessas
manifestações, percebo que o profissional tem percepção do que deveria ser feito,
porém, a sobrecarga de atividades, predominantemente de caráter gerencial, não
permitem estar ao lado e “acompanhar todos os pacientes... eu não tenho condições
de assistir como eu deveria”. Isto gera conflitos e sofrimentos. Diante desse quadro,
concordo com Sowek quando afirma:
“Ao mesmo tempo que a (o) enfermeira (o) sabe que seu papel, sua função
primordial, reside na atenção integral, ou “eqüidiversa”‘ao homem sadio ou
doente, ela também é forçada, impelida pelas instituições a responder por
uma gama de atividades que a distanciam de seu objetivo principal. (...) A
(o) enfermeira (o) sente-se, então dividida, pressionada a cumprir ordens
vindas do médico e da administração, e que nem sempre coincidem com a
vontade do cliente” (SOWEK, 2000, p. 208).
Conquista continuou: “quando você sai daquele horário de serviço,
você fica se perguntando: ‘mas a gente busca todos esses elementos pra melhorar o
cuidado humano e eu s do hospital e não consegui fazer nem 50%’.”.
Novamente a contradição do que deveria ser do que realmente é. O profissional
expressa um dever moral de realizar o atendimento humanizado, contudo, para sua
concretização encontra muitas dificuldades.
Ainda sobre o sofrimento vivenciado em relação à efetivação da
humanização na prática, cito Responsável que disse: “Era proibido a mãe entrar,
somente no horário de visita. Quando internava a e não podia entrar no corredor.
Era tirado do braço da e a criança gritando. Então, aquilo pra mim...eu cansei de
chorar de ver aquelas coisas. Não me conformava”. No dia-a-dia a realidade se
mostra diferente dos discursos sobre a humanização. O fato de o profissional
vivenciar situações de desumanização, não raras vezes acabam servindo de
estímulo para grandes empreendimentos. Exemplo disso foi o que ocorreu com
Responsável, que depois de muitas brigas conseguiu implantar um ambiente de
trabalho mais humanizado.
Diante das dificuldades, o Enfermeiro necessita de ‘injeções de
ânimo’, que o incentivem a buscar um cuidado humanizado. Responsável, sobre
isso, afirmou “parece até meio desanimador e de vez em quando a gente precisa de
uma injeção de ânimo assim e ver que tem coisas positivas”.
133
Outra contribuição valiosa para a pesquisa refere-se às atitudes do
docente, enquanto formador. Aqui a humanização aparece também como uma
grande dicotomia. Novamente, sua prática é contrária ao seu discurso. Amor
abordou o assunto dizendo: “Como é que eu ensino humanização na escola, se eu
professora sou extremamente exigente com meu aluno, se ele não pode errar uma
vírgula. (...) como é que nós corrigimos os nossos trabalhos. Trabalhos que nós
pedimos, corrigimos as provas. Qual o grau que nós temos de exigência? Então,
como é que nós humanizamos esta relação com o nosso aluno na correção dos
trabalhos e das provas? (...) Na hora em que nós sabemos que nossos alunos estão
sobrecarregados de tarefa, nós ainda damos um trabalho hoje pra entregar daqui a
quatro dias para tentarmos melhorar a nota. Felicidade confirmou:” questionei a
falta dela na aula de curativo e mandei ela fazer um trabalho de curativo para
amanhã” Amor deu continuidade a sua fala: “É final de ano. Será que eles vão
passar a noite acordados pra poder fazer isso daí? Acredito que não. Mas também
eles m que dormir não é? (...) E quanto ao aluno que trabalha, como é que é essa
situação? E nós ouvimos dos nossos alunos essa queixa de forma muito grande”.
E Amor continuou: “Você nota a exigência dura, rígida tanto em sala
de aula, quanto em hospital ou unidade de saúde. É aquele professor que tem a
exigência de um curso de graduação como se o aluno estivesse no curso de
mestrado. (...) Existem professores extremamente rígidos em termos de técnica,
esquecendo que o aluno vem de um evoluir. Diante dessas colocações importantes
e profundas, questiono: Quantos docentes refletem sobre suas ações? Reafirmo: a
prática, na Enfermagem, tem início em sala de aula e não somente quando o aluno
se desloca para o estágio. O docente assume sua prática durante suas aulas, no
contato com os alunos. Suas atitudes permeiam as relações. Essa realidade
necessita ser trabalhada, refletida e mudada se quisermos contribuir para uma
formação humanizante do profissional de saúde. As interações iniciam-se no espaço
acadêmico e perpetuam-se adiante. Felicidade contribuiu com esse pensamento:
“Se fala sobre humanização, mas na prática, não trata daquela forma”.
Na fala de Conquista, identifico novamente a dicotomia entre a teoria
e a prática. Em sua fala disse: “o aluno tinha uma idéia de que o enfermeiro, o papel
dele é de supervisão e direção. (...) aí, precisei trabalhar bem qual é a função do
Enfermeiro. (...) que o enfermeiro, para saber cuidar de um doente ele tem que tocar
no doente e que nunca vou delegar uma função se eu não sei fazer”. Essa
134
percepção de que o aluno tem a respeito do papel do Enfermeiro é motivada pela
atuação deste no meio hospitalar. O gerenciamento e a supervisão são ações que
absorvem integralmente o tempo que este profissional dispõe. Como já dito, o
cuidado direto ao paciente acaba não acontecendo. Daí, não o acadêmico, como
também, a sociedade em geral, identifica que o papel desempenhado pelo
Enfermeiro resume-se nestes dois fazeres.
Ainda abordando a dicotomia teoria/prática, Conquista também
disse: “A gente pensa que sai da faculdade e resolve o mundo, que aquilo ali é
difícil, mas pra ele não vai ser.” Esta dificuldade teoria/prática continua sendo motivo
para grandes questionamentos. O que fazer para maior aproximação entre o
discurso e a operacionalização? Penso que mudanças ocorrerão, a partir de um
efetivo trabalho de equipe do corpo docente, discente e da comunidade. Que cada
elemento que compõe este grande quebra-cabeça, tenha o mesmo objetivo e lute
para alcançá-lo.
O problema gera um processo de reflexão em muitos profissionais.
Conquista vivencia isso e comentou: “Eu me acho, pelo menos 30% das vezes, que
sou desumana com o funcionário que está cuidando. Com meu aluno pela forma que
eu conduzo. Então a gente está se autoavaliando e eu sinto que momentos que
eu faço o procedimento que eu não consegui nem dizer uma boa tarde, um bom dia.
Então tem horas, que eu sinto que fui desumana com o cuidar do ser humano”. O
processo de avaliação é um instrumento importante, pois quem deseja crescer,
necessita autoavaliar-se e submeter-se à avaliação de terceiros. Se mais
profissionais tivessem esta atitude, poderia ser que tivéssemos um crescimento
importante.
Finalizando este capítulo, considero conveniente assinalar as
sugestões que foram apontadas pelas professoras do curso de Enfermagem sobre o
tema. Uma das docentes citou que o que cabe a nós é a responsabilidade de
despertar a consciência de alunos e demais Enfermeiros, incluindo os assistenciais,
para a questão de humanização.
a necessidade de se criar a cultura da humanização, dentro da
área profissional, sendo cada um, executor de sua parte.
Sobre as Instituições formadoras, foi questionado: de que forma elas
poderiam contribuir, considerando que existem professores que não estão tão
voltados para a humanização, de que haja crescimento tanto de alunos como de
135
professores? O Grupo Focal de professoras, ora formado, conforme salientado,
poderia contribuir com os Enfermeiros da cidade incluindo os das escolas de
Enfermagem, através da educação continuada.
Outro elemento que as professoras abordaram são as condições
necessárias que poderiam auxiliar na humanização. Por exemplo, um horário
específico, um incentivo de disponibilidade, principalmente em relação ao
atendimento de alunos.
Neste capítulo procurei analisar, através da contribuição das
professoras do curso de Enfermagem que participaram do Grupo Focal, a temática
da humanização na formação e sua concretização. Sugestões foram apontadas
objetivando melhorias do corpo docente, discente e profissionais Enfermeiros da
comunidade, no que tange à humanização do cuidado dispensado ao paciente.
136
UM OLHAR SOBRE A PRÁTICA...
NOVO PONTO DE PARTIDA...
“Talvez não tenhamos conseguido fazer o melhor, mas lutamos para que o melhor fosse
feito... Não somos o que deveríamos ser, mas graças a Deus, não somos o que éramos”.
Martin Luther King
137
O objetivo deste estudo foi analisar a Bioética no currículo do curso
de Enfermagem, verificando a contribuição desta para a formação do profissional
Enfermeiro em um cuidado humanizado. A pesquisa revela que essa preocupação
se manifesta ao longo do curso, ora pela postura de alguns professores, ora pela
abordagem em diferentes disciplinas. Então o estudo se amplia e analisa a
presença/ausência dessa preocupação na formação do profissional Enfermeiro nas
instituições analisadas.
Com as diversas leituras, discussões e reflexões, durante a
realização deste trabalho, percebi um crescimento, uma visualização diferenciada
daquela do início da caminhada. As reflexões que ocorreram nesta trajetória
permitem-me tecer algumas considerações sobre o objeto de estudo a contribuição
da bioética na formação do profissional enfermeiro em um cuidado humanizado”,
como também sobre aspectos referentes ao processo de formação deste
profissional.
No decorrer da caminhada, os questionamentos foram constantes.
Agora no término, outras perguntas surgem, mostrando que os fatores da história
são dinâmicos. Dialeticamente estamos num constante processo de ir e vir, de
contradições, de interação com uma totalidade, que progride pela união de
contrários.
Esta pesquisa evidenciou que a humanização assume certa
complexidade na sua operacionalização e na sua definição. Deve a mesma envolver
todos os segmentos da comunidade seja ela intra ou extra-hospitalar.
Na formação, a humanização foi evidenciada como uma preocupação
por vários docentes. As manifestações demonstraram que ela permeia o currículo da
Enfermagem. Além disso, a humanização perpassa por aspectos pessoais
antecedentes à formação sistematizada, bem como, por questões culturais como o
paternalismo.
A educação, enquanto processo dialético movido pela contradição, é
portador de “fermento de transformação”, o que possibilita acelerar a crítica da
situação na qual ela aparece (SAUPE, 1998). Diante desta afirmação e devido ao
sistema social vigente, há um reconhecimento, por parte de docentes e alunos, da
existência de uma dicotomia entre o querer fazer e o que se faz. As condições
objetivas de trabalho levam o profissional de Enfermagem a um conflito que se
expressa no seu cotidiano, quando presta o cuidado na área da saúde.
138
A formação dos docentes de Enfermagem ocorreu de forma
fragmentada e com ausência de alguns fatores. Entre eles, a reflexão da execução
do cuidado e o executar técnico maximizado em detrimento do cuidado humanizado.
Daí há necessidade de implementações em relação à humanização dos mesmos,
sendo este um caminho apontado, nesta pesquisa. Importante se faz também,
oportunizar reflexões ao corpo docente e discente, sobre aspectos éticos e sociais
da atuação do Enfermeiro no mercado de trabalho. Percebo que necessidade de
formar Enfermeiros que aprendam a pensar, sejam críticos. Isso denota um corpo de
professores que, além do conhecimento científico e técnico, disponham-se a pensar,
questionar, criticar, duvidar; suscitando possibilidades quanto ao seu fazer. Aspectos
éticos e humanísticos necessitam estar amalgamados neste conhecimento a ser
partilhado, bem como no relacionamento entre docente-discente.
A fragmentação não ocorre na profissão somente em nível de
operacionalização, mas na própria classe, a divisão do trabalho traz repercussões
importantes como tensões e conflitos. A divisão torna-se ferramenta necessária para
manter os interesses do sistema social capitalista vigente, onde sempre se visa à
diminuição dos custos. Essa situação é muito mais uma resposta às necessidades
colocadas pelo mercado de trabalho do que como opção profissional.
O presente estudo indica que a Enfermagem necessita de
profissionais que reflitam a sua atuação, que busquem a integração dentro da
classe, que alarguem seus horizontes, visualizando o mundo que os cercam. Faço
então o seguinte questionamento: estará o Enfermeiro assegurado de sua
permanência no mercado de trabalho tendo em vista que, na grande maioria das
vezes o cuidado é efetuado pelo Auxiliar de Enfermagem? Para tanto, necessário
se faz oportunizar, na formação, um processo de aprendizagem de argumentação e
do enfrentamento. Não para a acomodação e a passividade, como o que atualmente
se evidencia.
Continuo meu pensamento apontando para outro questionamento: o
que cada um de nós pode contribuir para que o trabalho na Enfermagem seja mais
integrado e, conseqüentemente, seja mais humanizado no cuidado com o paciente?
É preciso pensar sobre a humanização e repensar nossas atitudes. Na pesquisa,
constatei profissionais que estão nesse caminho, o que considero um progresso.
Na introdução deste trabalho lancei o seguinte questionamento:
Seremos capazes de construir um mundo mais humano com a ajuda da Bioética?
139
Esta pesquisa mostrou que as reflexões trazidas pela Bioética, durante a formação
do profissional Enfermeiro, podem sim, trazer benefícios, auxiliando na
concretização da humanização do atendimento prestado.
O ensino da Bioética no curso de Enfermagem é uma ferramenta de
auxílio, principalmente porque propicia o desenvolvimento da reflexão. Permite ao
aluno visualizar a necessidade e importância do atendimento humanizado aos
pacientes. Quando as pessoas interiormente assimilam a necessidade de
mudanças, a concretização torna-se mais fácil e provável.
O aluno sinaliza a Bioética como instrumento para a humanização e
que esta se operacionaliza com atitudes próprias, advindas de um processo
reflexivo. Este opera no cotidiano sensíveis mudanças, necessárias para um
atendimento de qualidade, em que a humanização ganha expressão.
A dignidade da pessoa humana é ponto chave da humanização. A
visão de que todas as pessoas são dotadas de sentimentos, vontades e crenças que
precisam ser respeitadas, é condição para a humanização. Ficou claro na pesquisa
que esta consciência vem ocorrendo. Provavelmente não no ritmo desejado.
Condicionamentos culturais e pessoais, dificuldades estruturais dificultam o
processo. Talvez o exemplo mais eloqüente do crescimento dessa consciência seja
a dicotomia entre a teoria e a prática, tão enfatizada nos Grupos Focais. Fica claro
nos depoimentos o conflito vivenciado pelos profissionais Enfermeiros, que ao terem
consciência de seu dever de humanizar o cuidado, sentem-se impotentes diante das
dificuldades objetivas de trabalho. Entendo que as dificuldades estruturais
(fragmentação, divisão, sobrecarga de trabalho, etc.) e culturais (paternalismo,
submissão, etc.) somente serão vencidas à medida que cresça ainda mais a referida
conscientização.
Embora o crescimento da conscientização possa ser fomentado nos
mais diversos ambientes, o da academia é de importância fundamental. O caminho
é longo, mas não impossível.
A Enfermagem é uma profissão possuidora de implicações
científicas, tecnológicas e artísticas. É uma arte cujo fundamento é o conhecimento
científico, auxiliada pelos recursos tecnológicos. Constitui-se de uma profissão
antiga com acenos para um futuro que espera de seus profissionais algumas
mudanças; talvez da postura, de visualização, de reflexões que levem esta profissão
ao reconhecimento que lhe é devido.
140
Espero que este trabalho possa auxiliar Enfermeiros e educadores a
refletirem sobre sua prática. Que os aspectos éticos e humanísticos estejam
inseridos nesta práxis, construindo assim uma sociedade mais humana, onde a
dignidade do homem e o respeito à vida prevaleçam num constante esforço da vida
em sociedade.
Tenho ciência que este material não se encontra acabado, mas sim é
um lugar de chegar e partir. O desejo de seguir buscando assume relevância nestas
idas e vindas. Continuar seguindo é a meta que proponho tendo em vista que,
dialeticamente, tudo se transforma nada é imutável.
Finalizo este trabalho com um pensamento de Gandhi, o qual vem ao
encontro do meu pensar: A alegria está na luta, no esforço e no sofrimento que a
luta envolve, e não na vitória em si”.
141
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150
APÊNDICES
APÊNDICE A - PLANEJAMENTO DO GRUPO FOCAL .........................................151
APÊNDICE B - ORÇAMENTO DO GRUPO FOCAL...............................................153
APÊNDICE C - PERGUNTAS PARA O GRUPO FOCAL .......................................155
APÊNDICE D - CONVITE .......................................................................................157
APÊNDICE E - ROTEIRO DE ATIVIDADES...........................................................159
APÊNDICE F - AMBIENTE .....................................................................................161
APÊNDICE G - ESCOLHA DO PSEUDÔNIMO (GRUPO FOCAL DE ALUNOS)...164
APÊNDICE H - ESCOLHA DO PSEUDÔNIMO (GRUPO FOCAL DE
PROFESSORAS)............................................................................173
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO......................................................175
151
APÊNDICE A - PLANEJAMENTO DO GRUPO FOCAL
152
PLANEJAMENTO DO GRUPO FOCAL
ASPECTOS CONSIDERAÇÕES
Equipe
Moderadora: Enfermeira L.S.
Pesquisadora: Marlene Harger Zimmermann
Observador: Psicólogo A.O.
Auxiliar de pesquisa: Aluna S.
Orçamento R$215.00(coquetel; crachás, fotocópias, lembrança, fita, etc)
Moderadora
Enfermeira Mestre: L.S.
Nível de envolvimento: alto
Grupo
Tamanho: 8 pessoas
Número de moderadores: 1
Composição: alunos do curso de Enfermagem do CESCAGE
que atuam na área da saúde (enfermagem)
Número: uma reunião única
Critérios de seleção dos participantes: exerçam atividade
profissional e tenham cursado a disciplina de Bioética em
Enfermagem.
Conteúdo
Roteiro de entrevista: definição da temática
definição das questões
Seleção do local e coleta de
dados
Sala: salão de festas do Edifício Mon Blanc (Xavier da Silva,
440), em Ponta Grossa, PR.
Gravação: uso de três gravadores portáteis.
Convite Será realizada lista dos possíveis participantes com número
de telefone. Posteriormente, será realizado previamente pela
pesquisadora, contato telefônico com os alunos. Após o
aceite em participar da pesquisa, será entregue o convite
pessoalmente pela mesma.
Cronograma
Planejamento: duas semanas com tempo de duas horas
onde foram trabalhados: a temática, os participantes, divisão
das atividades, metodologia de trabalho.
Condução: uma semana: recrutar os participantes a realizar
a reunião.
Transcrição: quatro semanas: transcrever, tratar os dados e
realizar primeiras análises.
Condução da sessão Lista com o material a ser utilizado nas reuniões
Coquetel no início da sessão e entrega dos crachás aos
participantes.
Atividade de descontração dos participantes e eleição do
pseudônimo
Apresentação da técnica (Grupo focal)
Apresentação dos participantes
Desenvolvimento da temática
Síntese final
Agradecimentos
Análise
Transcrições: responsável: pesquisadora e auxiliar de
pesquisa.
Tratamento dos dados: responsável: pesquisadora.
Análise: responsável: pesquisadora, utilizando a técnica de
análise de conteúdo.
153
APÊNDICE B - ORÇAMENTO DO GRUPO FOCAL
154
ORÇAMENTO PARA A PESQUISA
Para a pesquisa serão utilizados:
a) Equipamento: Valor
3 gravadores portáteis (não terão custo devido empréstimo)
8 pilhas alcalinas R$ 7,10
b) Material de expediente: Valor
16 crachás R$ 8,00
4 fitas cassete de 90 minutos R$ 15,00
8 canetas pilot color R$ 4,50
16 envelopes tamanho médio para convites R$ 5,20
100 folhas de papel A4 R$ 5,00
1 tubo cola de 50gr R$ 1,70
1 cartucho de tinta preta remanufaturado R$ 25,00
c) Coquetel: Valor
6 refrigerantes R$ 11,40
Salgados R$ 25,00
Doces R$ 18,50
d) Diversos Valor
16 chocolates (lembrança para sujeitos da pesquisa) R$ 22,00
1 lembrança para moderadora R$ 15,50
1 lembrança para observador R$ 18,00
1 lembrança para auxiliar de pesquisa R$ 14,00
20 telefonemas R$ 20,00
________________________________________________________________
Total R$ 215,90
155
APÊNDICE C - PERGUNTAS PARA O GRUPO FOCAL
156
PERGUNTAS PARA O GRUPO FOCAL DE PROFESSORAS
1) Fale um pouco sobre sua experiência profissional como enfermeira e docente.
2) O que você entende por assistência humanizada? De que forma que ela se
concretiza na prática?
3) E na formação do enfermeiro como ela acontece durante o curso? Ela está
presente durante o curso? Em que momento? Em uma disciplina, nas várias
disciplinas? Como um tema transversal?
4) Os professores que trabalham com você abordam aspectos que envolvem a
humanização na realização de atividades práticas e/ou teóricas na formação
do profissional enfermeiro? Como?
5) Ao trabalhar com a disciplina de Bioética e/ou Fundamentos de Enfermagem
quais foram os pontos fundamentais que você abordou? Por quê?
6) Para ajudar o futuro profissional a realizar atividades que envolvam um
cuidado humanizado, o que você considera importante?
7) Após este período de discussão, nós gostaríamos que cada uma de vocês
fizesse uma declaração final sobre o tema formação humanizada do
enfermeiro.
8) Para finalizarmos, vocês poderiam nos dizer se nós esquecemos de abordar
algo ou se vocês têm algum conselho para nos dar?
PERGUNTAS PARA O GRUPO FOCAL DE ALUNOS
1) Fale um pouco sobre sua experiência como profissional e acadêmico de
enfermagem.
2) O que você entende por formação humanizada, no curso de Graduação em
enfermagem?
3) Os professores do curso de graduação em enfermagem demonstram
interesse e preocupação com os aspectos que envolvem a humanização na
realização de atividades práticas e/ou teóricas? Como?
4) E na formação do enfermeiro como ela acontece durante o curso? Ela está
presente durante o curso? Em que momento? Em uma disciplina, nas várias
disciplinas? Como um tema transversal?
5) A disciplina de Bioética em Enfermagem pode contribuir para uma assistência
humanizada? De que forma?
6) Para ajudar o futuro profissional a realizar atividades que envolvam um
cuidado humanizado, o que você considera importante?
7) Em sua opinião está presente no curso de enfermagem a preocupação com o
atendimento humanizado?
8) Após este período de discussão, nós gostaríamos que cada um de vocês
fizesse uma declaração final sobre o tema formação humanizada do
enfermeiro.
9) Para finalizarmos, vocês poderiam nos dizer se nós esquecemos de abordar
algo ou se vocês têm algum conselho para nos dar?
157
APÊNDICE D - CONVITE
158
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
CONVITE PARA PARTICIPAÇÃO EM PESQUISA
Estou realizando uma pesquisa sobre a Contribuição da disciplina de Bioética
na formação do profissional enfermeiro para um cuidado humanizado. Esta
pesquisa é uma das etapas da dissertação do Mestrado em Educação realizado
na PUC-PR.
Convido você para fazer parte do grupo focal, sendo este um método de
coleta de dados muito utilizado nas pesquisas da área da saúde.
Sua participação é muito importante para a realização desta dissertação. Será
mantido sigilo das informações obtidas.
Agradeço a sua colaboração. Aguardo você para a reunião do grupo que
acontecerá no dia 19 de novembro (sábado), às 09h00min no seguinte local:
Rua Xavier da Silva, 440, apto 11. Salão de Festas. Edifício Mon Blanc (Ponta
Grossa - Centro). Perto da UEPG.
Marlene Harger Zimmermann
Pesquisadora
Fone: 3243-8819 / 91021274
159
APÊNDICE E - ROTEIRO DE ATIVIDADES
160
ROTEIRO DE ATIVIDADES DO GRUPO FOCAL
LOCAL: Salão de Festas do Edifício Mon Blanc
DATA: 19/11/05 INÍCIO: ................. TÉRMINO:....................
1) Organização da sala e da dinâmica
2) Acolhimento dos sujeitos da pesquisa:
a) elaboração de crachá,
b) preenchimento de dados dos sujeitos da pesquisa
3) Técnica para descontração e para eleição do pseudônimo.
4) Explanação sobre a técnica
a) breve apresentação dos tópicos de discussão
b) o que vem a ser a técnica,
c) utilização do gravador,
d) importância de todos participarem,
e) evitar conversas paralelas
f) desligar celular
g) orientar sobre local dos sanitários e que serão servidos lanches durante a
técnica.
5) Função do:
Orientador: integrar o grupo e manter as discussões do tema central.
Observador: terá uma postura neutra e fará os registros de forma mais fiel
possível.
6) Objetivo: reflexões referentes ao tema humanização na formação do
profissional enfermeiro, sob o ponto de vista dos acadêmicos.
7) Assinar Lista de presença
8) Assinar Termo de consentimento livre e esclarecido
9) Apresentação dos participantes
a) nome,
b) período e turno que estuda
c) local onde trabalha
d) profissão que possui
e) tempo que está na área de enfermagem.
10) Início das perguntas norteadoras.
11) Início das perguntas finais
12) Síntese dos principais temas abordados
13) Agradecimento (entrega de brinde).
161
APÊNDICE F - AMBIENTE
162
163
164
APÊNDICE G - ESCOLHA DO PSEUDÔNIMO (GRUPO FOCAL DE ALUNOS)
165
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172
173
APÊNDICE H - ESCOLHA DO PSEUDÔNIMO (GRUPO FOCAL DE
PROFESSORAS)
174
175
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO
176
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu,______________________________________, RG nº__________________,
estou sendo convidada (o) a participar de um estudo denominado: “A Bioética na
formação do profissional enfermeiro: contribuições para um cuidado mais
humanizado?”, cujo objetivo é verificar a contribuição da disciplina de Bioética na
formação do profissional enfermeiro em um cuidado humanizado.
Sei que para o avanço da pesquisa a participação de voluntários é de
fundamental importância. Caso aceite a participar desta pesquisa, participarei de
reuniões onde serão realizadas reflexões sobre aspectos da formação do
profissional enfermeiro bem como sua prática.
Estou ciente de que as reuniões serão gravadas e seus resultados, bem como a
minha privacidade será respeitada, ou seja, meu nome, ou qualquer outro dado
confidencial, se mantido em sigilo. A elaboração final dos dados será feita de
maneira codificada, respeitando o imperativo ético da confidencialidade.
Estou ciente também de que posso me recusar a participar do estudo, ou retirar
meu consentimento a qualquer momento, sem precisar justificar, sem sofrer
qualquer dano.
A pesquisadora envolvida com o referido projeto é a enfermeira e docente
Marlene Harger Zimmermann com quem poderei manter contacto pelos telefones:
3243-8819 ou 9102-1272. Estão garantidas todas as informações que eu queira
saber antes, durante e depois do estudo.
Li, portanto, este termo, fui orientada (o) quanto ao teor da pesquisa acima
mencionada e compreendi a natureza e o objetivo do estudo do qual fui convidada
(o) a participar. Concordo, voluntariamente em participar desta pesquisa, sabendo
que não receberei nem pagarei nenhum valor econômico por minha participação.
___________________________________
Assinatura do sujeito da pesquisa
___________________________________
Assinatura do pesquisador
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