107
que, quando é aplicado ao “objeto”, para investigar se é ou não um constituinte, o
teste, como vimos, não resulta eficaz (podemos coordenar “um pulo” e “uma
olhada”, ou “cabeça” e “tempo”). Quando aplicado a toda a construção, patenteia
que os dois tipos de construção propostos não diferem.
Cabe salientar que Neves, ao aplicar o teste ao “objeto” daquelas
construções, pretende investigar se o elemento nominal na função de “objeto” é
um constituinte “do mesmo tipo daquele com o qual se coordena” (Neves, 1999:
107). Sugere que, nas construções com verbo-suporte, a possibilidade de
coordenar os dois “objetos” implica o reconhecimento de que ambos são
constituintes. Ora, em sendo constituintes, concluir-se-á, segundo a autora, que
esses tipos de construção não formam um conjunto tão coeso quanto o caso das
expressões cristalizadas. Por outro lado, a autora sugere que, no caso das
expressões cristalizadas, a “impossibilidade” de coordenar dois elementos na
posição de objeto, impõe-se reconhecer que o elemento na posição de objeto não é
um tipo de constituinte; formaria com o verbo um “bloco” sintático, ou seja, um
conjunto cujos elementos são bastante “aderentes”.
A autora sugere ser possível, portanto, diferençar as construções pela
aplicação do teste ao elemento que ocupa a posição de “objeto”, já que, quando
incide sobre toda a construção, o teste não permite diferençá-las. No entanto,
como procuramos mostrar, mesmo aplicado ao “elemento-objeto”, o teste não
parece assinalar diferença entre as construções; intuímos, contudo, diferença entre
“dá uma olhada” e “tem cabeça” – diferença que parece justificar-se, por um lado,
pelo viés gramatical: “olhada”, forma deverbal, combina-se com “dar”, do que
resulta a construção “dar__Xada” ; as formas “X(ada)” são, por isso, produtivas
no português atual (Basílio, 2004: 43); ademais, indica certa ‘duração’ (embora
rápida); por outro lado, do ponto de vista funcional (entendido, agora, na
concepção funcionalista), por exemplo, típica da variedade coloquial da língua
falada, a construção “dar uma olhada” emprega-se, normalmente, em situações em
que não caberiam verbos como “investigar” ou ‘demorar-se’, dos quais se infere o
traço [+ durativo] (cf. Falante A: Você leu o artigo? Falante B: não, só dei uma
olhada, estava cansado, ou “Pedro olhou o carro (evento pontual) / Deu uma
olhada no carro (com certa duração)). Com “dar uma olhada”, o falante informa
que não se deteve na leitura do artigo, seus olhos apenas perpassaram pelo texto
rapidamente, de modo que ele “deu uma lida”, mas não “fez uma leitura”.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510544/CA