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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ - PUCPR
LAIS CORDEIRO
CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO DE
PROFESSORES E ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA:
HISTÓRIA E MEMÓRIA NOS ANOS 50 E 60 DO SÉCULO XX.
CURITIBA
2006
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LAIS CORDEIRO
CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO DE PROFESSORES
E ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: HISTÓRIA E MEMÓRIA
NOS ANOS 50 E 60 DO SÉCULO XX.
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Educação da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná, na Linha
de Pesquisa História das Idéias e das
práticas Educacionais no Brasil, como
requesito parcial à obtenção do título de
mestre.
Orientadora: Pro Dra. Rosa Lydia
Teixeira
Corrêa.
CURITIBA
2006
2
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LAIS CORDEIRO
CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO DE PROFESSORES
E ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: HISTÓRIA E MEMÓRIA
NOS ANOS 50 E 60 DO SÉCULO XX.
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Educação da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná, na Linha
de Pesquisa História das Idéias e das
práticas Educacionais no Brasil, como
requesito parcial à obtenção do título de
mestre.
COMISSÃO EXAMINADORA
_________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Elisabeth Blanck
Miguel
_________________________________
Prof.ª Dr.ª Marta Morais da Costa
_________________________________
Prof.ª DrRosa Lydia Teixeira Correia
Curitiba, ____ de __________de_______
3
Dedico este trabalho aos meus filhos Cássia e
André, que são a justificativa maior de todo meu
esforço para a consolidação do sonho de fazer
parte daqueles que buscam entender a
Educação no Brasil.
4
AGRADECIMENTOS
À minha família que tanto sacrificou-se para que eu pudesse concluir este
trabalho.
À minha orientadora, Prof Dr.ª Rosa Lydia Teixeira Correia, que soube a hora
de me chamar ao real e a hora de dizer-me o quanto eu estava progredindo.
Aos meus pais, que sequer sabem a enormidade de seus gestos de carinho e
encorajamento.
A Deus que me deu o caminho a ser seguido.
5
RESUMO
A presente pesquisa investiga a (s) concepção (ões) de Educação
presente (s) na formação de professores de Língua Portuguesa sob o enfoque
histórico nos anos 50 e 60 do século XX. Para entender tais concepções ,
realiza-se uma breve retrospectiva histórica do período em questão
recuperando aspectos políticos e econômicos que o caracterizaram. A
sustentação de tal procedimento efetuou-se em historiadores como Romaneli,
Ribeiro, Cunha, entre outros. O fio condutor da investigação são as
orientações normativas contidas na Nomenclatura Gramatical Brasileira
(NGB), instituída no ano de 1958, cujas concepções vinculam-se ao
Funcionalismo, ao Estruturalismo e ao Nacionalismo. Esse documento
estabeleceu uma nova compreensão sobre o que deveria ser considerado
como conteúdo no ensino da Língua Portuguesa. Além disso, foi necessário
retroceder ao período imediatamente anterior e posterior à implantação
daquelas normas, o que foi feito por meio de dois elementos: análise de livros
didáticos usados no ensino da língua materna naquele momento e, para a
contextualização do estudo, foram realizadas entrevistas com professores de
Língua Portuguesa então atuantes ou que se formaram naquele período. Os
aspectos relativos à concepção de língua alicerçam-se em Saussere e
Bakhtin visando ao entendimento dos aspectos que nortearam a formação
docente nos anos que margearam a Nomenclatura Gramatical Brasileira.
Palavras-chave: educação, formação de professores, ensino da Língua
Portuguesa, história, Nomenclatura Gramatical Brasileira.
6
ABSTRACT
This research studies educational conceptions adopted in formative
activities in the 50's and 60's of the last century for Portuguese teachers
under a historical perspective. In order to understand these conceptions, this
work presents a brief historical background recovering the political and
economic aspects of the period. Historians such as Romaneli, Ribeiro, Cunha
and others gave the theoretical support of the hitorical part of the research.
The starting point of this investigation was the language norm of the Brazilian
Grammar (Nomenclatura Gramatical Brasileira - NGB) of 1958, closely related
to Functionalism, Structuralism and Nationalism. This research established a
new understanding of what was supposed to be the Portuguese Language
teaching content. Furthermore, the study of the period before and the one
after the implementation of NGB was also required and it happened in two
ways: the analysis of text books used in teaching the mother language at that
time and, for constextualization purposes, interviews with Portuguese
teachers, some teaching at that time and others being prepared to be
teachers in the period of this research. To achieve a better understanding of
the concepts adopted in teacher formative activities of the target period of
this study, the aspects related to language conceptions are based on
Saussure and Bakhtin.
Key words: educational, formative activities for teachers, Portuguese
Language Teaching, History, Brazilian Writing Norm.
7
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................ 09
2. RETROSPECTIVA SOCIAL, POLÍTICA E ECONÔMICA DO BRASIL ENTRE
1950 E 1960............................................................................................12
2.1 A questão da nacionalização no período de 1930 a 1960......................12
2.2. A educação escolar no Brasil e no Paraná.............................................23
3. A LÍNGUA PORTUGUESA COMO INSTRUMENTO DE FORMAÇÃO DE
CIDADÃOS...............................................................................................37
3.1. A língua portuguesa brasileira..............................................................37
3.2. A formação do professor de Língua Portuguesa....................................51
4. OS EFEITOS DA NOMENCLATURA GRAMATICAL BRASILEIRA NAS
CONCEPÇÕES DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E NA FORMAÇÃO
DE PROFESSORES................................................................................64
4.1 As causas da estruturação da Nomenclatura Gramatical Brasileira –
NGB.....................................................................................................65
4.2 Os livros didáticos antes da Nomenclatura Gramatical
Brasileira......................................................................................................70
4.2.1 – Guérios: autor e educador...............................................................83
4.3 – Os livros didáticos depois da Nomenclatura Gramatical Brasileira
(NGB)........85
4.4 - A formação do professor de Língua Portuguesa nos anos 50 e 60......94
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................103
REFERÊNCIAS.............................................................................................109
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA.......................................................................113
ANEXOS......................................................................................................116
8
1 INTRODUÇÃO
A Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB) promulgada no ano de
1958, para alguns filólogos daquela época, invalidava as gramáticas
existentes até então e libertava o português do Brasil. Além disso, ainda na
visão de tais filólogos, abriu novas perspectivas para o ensino de Língua
Portuguesa. Fecundada em um contexto nacionalista e nascida através dos
anseios de filólogos em oficializar a Língua Portuguesa do Brasil, a
Nomenclatura Gramatical Brasileira pode ser considerada um baluarte
representativo do Tecnicismo, que norteia a formação de docentes em
línguas, notadamente em língua portuguesa. Embora tal questão pareça
óbvia à primeira vista, este trabalho investigou-a visando superar,
compreensões apriorísticas.
Dessa forma a pesquisa efetuou-se em três momentos: a) prosseguir no
levantamento, seleção, leitura, análise e sistematização bibliográfica visando
orientar a fundamentação teórica; b) levantamento, seleção, leitura e análise
de livros didáticos e livros lidos por professores e alunos de cursos de ngua
portuguesa no período de estudo; c) entrevista com professores e alunos de
curso de língua portuguesa existentes no período do estudo.
Visando situar o problema de interesse deste estudo que é saber a
concepção ou as concepções que estiveram presentes na formação de
professores de Língua Portuguesa nas décadas de 50 e 60, fez- se necessário
realizar inicialmente um exercício intelectual de ntese, tendo como
referência a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), que norteia os
conteúdos e a metodologia do ensino de língua portuguesa no Brasil desde
1958.
Para se resolver a questão acima, traçaram-se os seguintes objetivos:
analisar, por meio de livros de Língua Portuguesa, a influência da
Nomenclatura Gramatical Brasileira de 1958 na formação de docentes de
modo geral e de Língua Portuguesa em particular visando destacar e analisar
também que concepção acha-se presente na orientação advinda dessa
nomenclatura. Analisar também, se essa influência está presente na maioria
9
dos livros de Língua Portuguesa destinados à formação de professores dessa
língua no período em estudo.
A pesquisa pautou-se na história para alcançar seus objetivos. O inicio
do século XX que foi marcado pela modernização, na qual a mecanização
passou a ser referencial para todos os setores da sociedade. Também data
desse período as primeira tentativas de diferenciação entre a Língua
Portuguesa usada no Brasil e a usada em Portugal. A caminhada histórica
alcança a institucionalização das universidades a partir da década de trinta.
Nos anos de 1930, início do Governo de Getúlio Vargas, a educação buscou a
democratização (menção à Escola Nova), fato que acaba interferindo nas
metodologias de ensino em geral e em especial nas de ensino de Língua
Portuguesa. Os primeiros momentos das Faculdades de Letras não podem
ser deixados de lado, pois, afinal, eles interferiram diretamente no contexto
do ensino de língua materna.
Visando explicações para a estruturação da Nomenclatura Gramatical
Brasileira e seus reflexos na postura dos professores de Língua Portuguesa
diante do andamento da ação docente, passa-se pelo período pós-guerra
que se apresentou com uma política educacional populista
1
e com a
continuidade na busca da oficialização das diferenças entre a língua
portuguesa do Brasil e a de Portugal.
Chegando-se, enfim, ao período de Juscelino Kubitschek tem-se o
slogan “50 anos em 5” que teve como resultado é o maior crescimento
industrial de toda a história do Brasil, cujo pano de fundo positivista. Tal
passagem tornou-se vital, pois o Paradigma Tecnicista, fruto daquele
discurso, permeia os planos de ensino de ngua Portuguesa e estrutura os
livros didáticos, cujos saberes estão retratados numa cronologia de
conteúdos demarcados e nominados pela NGB (Nomenclatura Gramatical
Brasileira) de 1958.
A partir daí, caminhou-se para a análise das concepções existentes nos
livros didáticos editados entre 1952 e 1964, assim como sua repercussão na
1
Embora a democratização da escola fosse uma necessidade, usa-se o termo
populismo por ser de consenso entre estudiosos do período Vargas.
10
formação de docentes de Língua Portuguesa e no ensino da mesma por
professores atuantes naquele período.
Estruturou-se a pesquisa em três capítulos: 1
º
- Retrospectiva social,
política e econômica do Brasil entre 1900 e1960. Neste momento do discurso
procura-se inserir o interlocutor no contexto histórico que molda os
elementos geradores da Nomenclatura Gramatical Brasileira. 2
º
- A Língua
Portuguesa como instrumento de formação de cidadãos. Aprofunda-se nesse
capítulo as reflexões do uso da língua materna em prol da criação de uma
identidade nacional. 3
º
- Os efeitos da Nomenclatura Gramatical Brasileira no
ensino de Língua Portuguesa e na formação de professores. Aqui, tem-se uma
análise de livros anteriores à NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira) e
posteriores a ela. Inseridas em tal análise estão intrínsecas as concepções e
saberes dos docentes de Língua Portuguesa dos anos de 1950 e 1960.
Também neste capítulo é feita uma reflexão a partir de depoimentos de
professores que atuavam no ensino de Língua Portuguesa ou cursavam
Letras naquele mesmo momento.
11
2 RETROSPECTIVA SOCIAL, POLÍTICA E ECONÔMICA DO BRASIL
ENTRE 1950 E 1960.
O sentimento nacionalista, que permeou a vida de alguns brasileiros e
influenciou o desenrolar da história do Brasil no período em estudo, agiu
diretamente na defesa da ngua portuguesa falada no Brasil. O resultado de
tal defesa é a NGB - Nomenclatura Gramatical Brasileira concebida em 1958.
Para melhor se perceber as causas e conseqüências do nacionalismo
no contexto histórico brasileiro; e, consequentemente, na estruturação da
Nomenclatura Gramatical Brasileira; discorrer-se sobre a história a partir
das duas primeiras décadas do século XX. Buscando uma linearidade,
percorrer-se-á os tempos de governo de Getúlio Vargas, cujo nacionalismo é
meta principal de governo. Nos governos de Juscelino Kubitschek e João
Goulart abordar-se-á, principalmente, a concretização da Nomenclatura
Gramatical Brasileira. E, finalmente, chegar-se-á à Ditadura Militar, que será o
ponto final da exposição.
2.1 A questão da Nacionalização no período de 1930 a 1960.
O processo político-econômico brasileiro do inicio do século XX foi
marcado pela modernização, as quinas passaram a ser o referencial para
todos os setores da sociedade e, embora ainda não existisse o termo
globalização, tal fenômeno era global. A elite econômica desfilava com seus
automóveis, suas invenções. Os literatos da época usaram nos cenários
elevadores, telefones, rádios, automóveis entre outros avanços tecnológicos,
como é o caso de Mário de Andrade em sua obra Paulicéia Desvairada. A
pintura, entre outros temas, buscou retratar a vida daqueles para quem o
progresso não chegou, aqui, cita-se como exemplo a obra de Lasar Segall,
Rua das erradias de 1926, que expõe a depressiva zona do mangue carioca.
12
No mesmo período em que ocorria a pobreza retratada por Segall em
alguns pontos da cidade do Rio de Janeiro, acontecia em todo país o declínio
das oligarquias. Ribeiro traz a seguinte justifica para tal fato: "tal declínio
evidentemente ocorre devido à existência de novas forças sociais, em
decorrência das modificações na estrutura econômica" (Ribeiro, 1986, p, 91).
Ribeiro ainda explica as causas e o papel dessa modificação: “a modificação
básica é representada pelo impulso sofrido pelo parque manufatureiro que,
apesar de débil, passa a ter papel indispensável no conjunto da economia
brasileira.” (Ribeiro, 1986, p, 91)
Isso faz com que muitos daqueles que imperavam no campo se
transferissem para as regiões urbanas buscando alternativas na indústria
que sofre uma grande expansão. A relação estabelecida entre dominantes e
dominados no campo permanece na cidade conforme explana Ribeiro:
O componente representado pela burguesia industrial apresenta pontos
de contato com os outros setores da classe dominante, não só pelo fato
de muitos dos industriais serem ou terem sido fazendeiros, como
também por se colocarem numa relação de dominação no que diz
respeito à mão de obra. (1986, p. 92)
Tais acontecimentos fazem de São Paulo uma metrópole próspera.
Sobre isso Cereja e Magalhães afirmam: A introdução de nosso país na
modernidade possui íntima ligação com o vertiginoso crescimento industrial
de São Paulo, que se deu a partir do início do século XX (2005, p. 227). A
riqueza gerada por essa situação transformou-se em investimentos em vários
setores da economia paulista, principalmente o industrial. A arte também
beneficiou-se de tamanho progresso, pois
As frações das elites mais comprometidas com o crescimento industrial
incorporavam os anseios de renovação e de revitalização cultural do
país, que se manifestavam através de jovens inquietos e
intelectualizados, alguns dos quais aristocráticos, que chegavam da
Europa trazendo idéias e propostas das vanguardas para os mais
diversos campos artísticos, o patrocínio de artistas acontecia
corriqueiramente. (Amaral, 2005, p. 228)
13
A chegada da massa de imigrantes entre 1880 e 1900,
principalmente italianos, em decorrência da força que representou, acabou
sendo um fator que impulsionou a industrialização. Por outro lado, muitos
desses imigrantes haviam vivido a experiência da luta de classes em seus
países e, em prol de melhores condições de trabalho, divulgaram aqui idéias
anarquistas e socialistas. O resultado de tais elementos é a organização do
proletariado que traz como conseqüência várias greves, sendo a maior delas
em 1917 em São Paulo
Os primeiros anos do século XX são, ainda, de radicais transformações
políticas, e abrangem acontecimentos decisivos para a vida nacional, como
as revoltas deflagradas pelo Movimento Tenentista ocorrido em 1922, que
teve como origem a crise política dos pleitos eleitorais. O Governo Federal
atuava ostensivamente na política partidária dos Estados e o Corpo Militar
era usado para manter a estabilidade política, fato que não agradava àqueles
militares cuja visão voltava ao momento da Proclamação da República e, por
isso, sentiam-se à margem da política nacional, pois se julgavam com o
direito de participar mais dos destinos do país pela inserção em decisões
políticas de caráter nacional. Esse contexto é agravado em outubro de
1921, quando o jornal Correio da Manhã publica algumas cartas
ofensivas ao Exército atribuídas ao candidato da "política do café com leite"
( nome dado à alternância no poder entre mineiros e paulistas) à Presidência
da República, Artur Bernardes que sai vencedor. Com a vitória de Bernardes,
jovens oficiais rebelaram-se para evitar a sua posse. O Tenentismo, portanto,
surgiu como um movimento de jovens oficiais decididos a romper com as
bases governamentais e através dele reivindicavam reformas nas bases
militares e na política atuante, pois concluíram “que o regime político era
bom, ruim eram os homens que estavam no poder” (Ribeiro, 1986, p. 93).
O ponto culminante do Movimento foi a Grande Marcha” iniciada em
abril de 1925, quando as forças gaúchas comandadas pelo capitão Luís
Carlos Prestes se uniam com as tropas que fugiam de São Paulo. Os dois
grupos unidos mantiveram focos para retomar a luta. Prestes iniciou a longa
marcha afastando-se do país. A coluna atravessou o Paraguai e voltou ao
Brasil através do Mato Grosso, passando por Goiás, a coluna dirigiu-se para o
14
Nordeste, atingiu o Estado do Maranhão e chegou, logo depois, à região
nordeste. Lá, os rebeldes percorreram praticamente todos os estados,
chegando a ameaçar efetivamente a cidade de Teresina. Em todos os
momentos a maior resistência vinha das forças arregimentadas pelos
coronéis.
Focos do movimento eclodiram por várias cidades. A série de
levantes dos tenentes ao longo da década de 20 culminou, em 1930, com a
sua participação na mudança do regime político em aliança com partidos das
oligarquias dissidentes e das camadas médias urbanas” ( Cunha, 1986 p.
233).
Ainda em 1922, aconteceu a fundação do Partido Comunista.
Intelectuais do porte de Astrojildo Pereira (um de seus fundadores), Caio
Prado Jr., Graciliano Ramos e Mário Schenberg vinculavam-se aos projetos
centrados na sociedade que tinham nas camadas proletárias o sujeito real da
intervenção social. Assim o PC foi o primeiro a representar de forma aberta e
programática o conjunto do proletariado brasileiro, e também a primeira
agremiação política a romper com os estreitos limites locais e ter âmbito
nacional. Assim,a intensidade do movimento operário, já então organizado
sob a liderança do Partido Comunista Brasileiro (...), mostrava não ser mais
possível definir a ‘questão social’ como um caso de polícia. Seria necessária
uma redefinição dessa ‘questão’, fazendo-se certas concessões aos
trabalhadores... (Cunha, 1986 p.233).
Não se pode deixar de referir a derrocada do monopólio na produção
de café tão poderoso em grande parte do século XIX e no início do século XX.
Ocasionada pela crise de 1929, mais especificamente com a quebra da bolsa
de Nova Iorque causada pela elevação das taxas de importação, medida de
proteção do governo dos Estados Unidos frente aos produtos europeus que
circulavam em abundância pelo território norte – americano. Em resposta, a
Europa elevou suas taxas alfandegárias na mesma medida. O resultado foi
uma crise no comércio mundial e a recessão.
Para tentar escapar da recessão, as empresas capitalizavam-se
colocando suas ações no mercado. A especulação foi maior do que se poderia
imaginar. Assim, o mercado deixou de confiar na Bolsa e quando as empresas
15
buscaram saídas para encontrar capital, as ações simplesmente deixaram de
ser negociadas. Era a queda da Bolsa de Nova Iorque. O famoso “crack” da
Bolsa teve repercussão imediata no mercado mundial, gerando uma crise
gigantesca.
Tal crise afetou o governo e os cafeicultores brasileiros na medida em
que havia entre ambos o Convênio de Taubaté, assinado em 1906. Nele
estava estipulado que “garantiriam aos cafeicultores um preço mínimo por
saca de café, estabelecido em moeda estrangeira, mas pago em moeda
brasileira...” (Cunha, 1986 p. 234). Com a quebra da Bolsa acontece um
rompimento entre a burguesia cafeeira e os seus representantes políticos.
As medidas tomadas por Washington Luís para enfrentar a crise,
abandonando a valorização do café, procurando manter os preços internos,
provocaram o desagrado da burguesia cafeeira.” (Cunha 1986 p. 234)
Em meio a isso, a política “café com leite” governava descontentando
os militares que acabaram organizando o Movimento Tenentista. No bojo
desses acontecimentos surgia o Modernismo representante de insatisfações
no campo artístico do período, assim também é percebido por Romanelli:
Durante o transcurso dos anos 20, vemos, portanto,
irromperem as revoltas armadas que definiram o Tenentismo, a
criação do Partido Comunista e a Semana de Arte Moderna, os
quais tinham em comum a contestação e a oposição à velha
ordem oligárquica latifundiária. (2005, p. 49)
Todos os componentes desse momento histórico apontam para um
nacionalismo que norteou mudanças ao longo das décadas seguintes. “Em
outubro de 1930, o Governo do Presidente Washington Luiz era derrubado por
um movimento armado que se iniciava ao sul do país e tivera repercussões
em vários pontos do território brasileiro.” (Romanelli, 2005, p.47)
Essa foi a chamada Revolução de 30 que teve como desfecho a
chegada de Getúlio Vargas ao poder. O Movimento, como diz Romanelli,
2005, p. 49 “ resultou de uma coalizão de forças” (...) Dessa coalizão podiam
distinguir-se duas correntes: a dos que desejavam mudanças apenas no
sentido jurídico, ou mesmo, promulgavam troca de pessoas no poder, e a
dos que se propunham lutar por mudanças mais profundas.” Esses últimos
16
os tenentes queriam um governo centralizado e nacionalista”. Como se
percebe os tenentistas primavam pelo nacionalismo. Como eles os
participantes do Modernismo tinham como maior característica a defesa
daquilo que é nacional, inclusive a defesa da língua coloquial usada pelo
brasileiro. Com essa intençãoTarsila escreveu o Manifesto Antropófago
2
que
seria o início do movimento antropofágico brasileiro, com a intenção de
deglutir e abrasileirar toda a cultura européia.” (Infante, 2005, p. 510).
Tendo os modernistas uma visão nacionalista ,e sendo boa parte de
seus participantes pertencentes ao Partido Comunista (como é o caso de
Graciliano Ramos), conclui-se que, embora nascido de idéias importadas,
também primou por tudo que fosse nacional assim como os tenentistas o
foram, aliás um dos líderes desse último, Prestes, foi um famoso filiado do
Partido Comunista Brasileiro.
Esse emaranhado de acontecimentos, como foi dito, leva ao poder
Getúlio Vargas em 1930, com a coalizão, entre tenentistas e
constitucionalistas “ os tenentistas conseguiram impor-se durante os
primeiros anos e a Revolução Constitucionalista foi um movimento
malogrado(Romanelli, 2005, p.50). Com os tenentistas ao lado de Vargas, o
nacionalismo tomou força e expandiu-se, tento como resultado “ o
florescimento da cultura nacional” (Romanelli, 2005, p. 54).
Vargas foi uma das figuras mais complexas da política brasileira. Era
odiado por componentes dos flancos e do centro inclusive, mas amado por
grande parte do povo que o chamava de "pai dos pobres". Estrategista
exemplar, uniu forças antagônicas para chegar ao poder pregando o fim dos
arranjos políticos oligárquicos da República Velha através da ampliação da
democracia. Para tanto tentou acabar com o chamado "voto de cabresto"
implantando o voto secreto. Os tenentes entendiam, porém, que apenas a
adoção de voto secreto não acabaria com o voto de cabresto”, pois a
situação era resquício das seculares relações de trabalho no campo. Assim,
propunham a suspensão provisória do processo eleitoral.
2
Manifesto Antropófago é o gerador do Movimento Antropofágico, cujo objetivo era
“devorar” idéias estrangeiras, eliminar o que não fosse bom para a realidade brasileira e
adaptar aquilo que fosse interessante à arte nacional.
17
Essa medida contribuiu com a "Revolução Constitucionalista de São
Paulo" (de julho a setembro de 1932), pois, mesmo sendo lógica, era
impopular e não agradou aos Constitucionalistas. Em junho de 1932, as
classes dominantes em São Paulo, com apoio de parte do aparelho do Estado
localizado, e das camadas médias seduzidas pelo ‘constitucionalismo’,
levantaram-se em armas contra o poder central” ( Cunha, 1986, p. 239).
Mesmo derrotados militarmente, os liberais paulistas uniram-se aos
conservadores e juntos forçaram Vargas a convocar uma constituinte e
eleições. Foram vencidos, “Vargas foi eleito pela Assembléia presidente
constitucional do Brasil até 1938. (...) Quando aconteceriam “eleições
diretas para presidente da República. (...), mas Vargas estava impedido de se
candidatar...” (Cunha, p. 253)
Em 1935, a Intentona Comunista pretendeu levar os comunistas ao
poder com um golpe, mas Vargas novamente sai vitorioso. Os comunistas
procuraram tomar vários quartéis; por outro lado, a situação internacional,
com a ascensão do nazi-fascismo, favorecia a implantação de regimes
totalitários de direita. Nesse quadro, Vargas deu um golpe de Estado, em
novembro de 1937, antes mesmo do término de seu mandato, pois, como
foi comentado, ele estava proibido de se candidatar à presidência em 1938.
Conforme relata Cunha:
Em novembro de 1937, o Senado e a Câmara dos Deputados
foram fechados, dissolvidos todos os partidos políticos, proibidas
as milícias, uniformes e insígnias, controladas as polícias
militares estaduais pelo Exército, queimadas as bandeiras dos
estados(símbolo da sua autonomia) (1986, p.254)
Vargas transformou-se em ditador e proclamou o "Estado Novo",
instaurando o populismo. Nesse período, que vai de 1937 até 1945, criou a
Justiça do Trabalho (1939), instituiu o salário mínimo, a Consolidação das Leis
do Trabalho, também conhecida por CLT. Os direitos trabalhistas também são
frutos de seu governo: carteira profissional, semana de trabalho de 48 horas
e as férias remuneradas. Em 1938, criou o IBGE ( Instituto brasileiro de
Geografia e Estatística), entre outras realizações.
18
Na busca de uma economia estável e nacional, o governo encontra
nas idéias de Roberto Simonsen a saída para o problema, conforme aponta
Cunha:
O Estado Novo assumiu as idéias que Roberto Simonsen, famoso
líder industrial paulista, vinha defendendo alguns anos. Dizia
ele que diante do valor declinante das exportões de
mercadorias brasileiras e da ascensão das estrangeiras, não
restava outra solução além da substituição dos produtos
importados, sob o patrocínio do Estado. (Cunha, 1986, p. 254)
Assim sendo, investiu muito na área de infra-estrutura. Iniciou com os
EUA entendimento para instalar uma grande indústria siderúrgica no país e
equipar as Forças Armadas, em troca da participação do Brasil na Segunda
Guerra Mundial, criando a Companhia Siderúrgica Nacional (1940), a Vale do
Rio Doce (1942), e a Hidrelétrica do Vale do São Francisco (1945).
Além disso, dissolveu o Congresso, proibiu partidos políticos,
estabeleceu censura à imprensa e sufocou uma tentativa de golpe
integralista (nazi-fascista) banindo seus líderes e também os liberais que se
opunham ao seu governo. Rompeu com os países do Eixo (Alemanha, Itália e
Japão), estabeleceu as bases da nacionalização do petróleo, introduziu um
sistema de câmbio e cotas para regularizar a exportação de café. A ditadura
caiu com o fim da guerra.
Embora tenha sido um ditador e governado com medidas
controladoras e populistas, o governo de Vargas foi marcado pelo
investimento no Brasil. Além de criar obras de infra-estrutura e desenvolver o
parque industrial brasileiro, tomou medidas favoráveis aos trabalhadores. Foi
na área do trabalho que deixou sua marca registrada. Sua política
econômica gerou empregos no Brasil e suas medidas na área do trabalho
favoreceram os trabalhadores brasileiros. Ou seja, Getúlio foi impulsionado
pelo nacionalismo.
Embora Vargas tivesse o apoio popular, a vitória das democracias na II
Guerra Mundial precipitou o fim do Estado Novo. Os setores liberais
agrupados na UDN (União Democrática Nacional), os intelectuais que se
uniram com a publicação do Manifesto dos Escritores e os chefes militares
19
democratas conseguiram que Vargas marcasse eleições presidenciais e
convocasse uma constituinte. Tais forças políticas lançaram candidatos
próprios para a presidência, mas o prestígio do qual gozava Vargas,
principalmente frente aos trabalhadores das indústrias, estruturou, em 1945,
o Movimento do Quererismo (nome originário do slogan do movimento:
Queremos Getúlio), cujo objetivo era de defender a permanência de Gelio
Vargas na presidência da República. No viés do movimento em questão,
surge o Partido Comunista do Brasil, recém-legalizado após anos de
clandestinidade, manifestando apoio a Getúlio. Nos anos que se sucederam,
o movimento atingiu outras capitais e ganhou dimensões de massa. Os
queremistas estavam seguros do prestígio do presidente. Vargas, por sua vez,
saudava os manifestantes da sacada do palácio presidencial e começava a
dar mostras de que pretendia continuar no poder.
Em outubro de 1945, Vargas foi deposto pelo alto comando do
Exército após tentar colocar seu irmão Benjamim Vargas na chefia do Polícia
do Distrito Federal. Tal manobra foi interpretada por seus adversários como
um golpe para preparar sua continuidade no poder.
Em 1946 assume o governo Eurico Gaspar Dutra, que foi apoiado por
Vargas, pois havia sido seu ministro da Guerra do governo. Naquele mesmo
ano é promulgada uma nova Constituição, cujos traços principais foram o
retorno da democracia, assegurando mandato presidencial de 5 anos,
eleições diretas e a manutenção de inúmeros direitos trabalhistas
conquistados ao longo da Era Vargas. Quanto à educação, a nova
Constituição retoma parte do texto de 1934 relativos à gratuidade . “No art.
168-II, lê-se o seguinte: ‘O ensino primário oficial é gratuito para todos; o
ensino oficial ulterior ao primário sê-lo-a para quantos provarem falta
ou insuficiência de recursos’. ( Ribeiro, 1986, p. 123). Mas, embora com o
apoio de Getúlio, que ainda gozava de certo prestígio popular, o governo
Dutra não consegue resolver o problema da “inflação que iniciada em 1942
marcou o governo Dutra, enriquecendo um pequeno grupo apenas, que os
salários reais diminuíam, e os preços subiam assustadoramente.” (Ribeiro,
1986, p. 124)
20
Internamente, o general Dutra objetivou acatar os interesse da classe
dominante. Essa tinha conseguido grandes vantagens, como o acúmulo de
capital, durante o Estado Novo. Depois de fortalecido passou a querer
participar mais de perto nas decisões governamentais. Para atingir seu
intento, Dutra buscou aperfeiçoamento da assistência estatal nos setores de
saúde, alimentação, transporte e energia. Adotou uma política econômica
liberalizante, facilitando o acúmulo de capital às custas de baixos salários, e
expandindo as empresas estrangeiras. Esta última traz conseqüências
drásticas à economia nacional.
O PCB (Parido Comunista Brasileiro) teve seu registro de
funcionamento cassado em função da política externa que se alia aos Estados
Unidos na Guerra Fria e rompe relações com a União Soviética. A
conseqüência mais imediata foi a abertura da economia brasileira às
importações norte-americanas. Para tentar evitar o crescimento excessivo de
tais importações, o Cruzeiro, moeda nacional, foi desvalorizado.
Os nacionalistas fizeram campanha contra o governo. As oligarquias
industriais, por sua vez, exigiam o congelamento do salário-mínimo com a
intenção de garantir o acúmulo de capitais. Isso provocava, é claro, greves
diuturnas e cuja responsabilidade era imputada aos comunistas. Mais de 100
sindicatos sofreram intervenção governamental com o intuito de encurralar o
movimento popular.
A conciliação social era improvável. A burguesia, temerosa em perder o
controle das massas urbanas proletárias que se inquietavam, o que
comprometia seu capital, decide substituir Dutra por alguém capaz conduzir
as massas.
Embora deposto em 1945, não foi difícil para Getúlio convencer o
eleitorado de que ele era a solução para os problemas que se apresentaram
no Governo Dutra. E assim foi reeleito em 1951. Com o apoio de setores
dissidentes (maioria) do PSD e todo o PTB, o "pai dos pobres", como era
conhecido Getúlio derrotou Eduardo Gomes (UDN) e Cristiano Machado
(candidato oficial do PSD) .
Nesse momento as marcas do governo Vargas, que eram visíveis
anteriormente, se fazem explícitas e irrefutáveis: o populismo e o
21
nacionalismo. Para tanto o plano interno é voltado ao desenvolvimento da
indústria nacional, tomando como base o acúmulo de capital. O plano
externo direciona-se para a criação de uma economia independente do
capitalismo internacional, agora sob a liderança norte-americana.
Colocando em prática suas aspirações de alavancar a economia,
Vargas direciona-se ao nacionalismo. Assim, lançou as bases para a
industrialização do país criando o Banco Nacional do Desenvolvimento
(BNDES) para financiar o programa. Na busca de uma aproximação maior
com os trabalhadores, Vargas concedeu aumentos salariais da ordem de
100%. Aumentou o salário mínimo em mais de 300%.
Ainda no primeiro ano de seu governo, Gelio denunciou a espantosa
remessa de lucros das empresas estrangeiras para suas matrizes, uma
terrível sangria para a economia nacional. Por conta disso, foi aprovada a Lei
de Remessas de Lucro em 1952, obrigando as empresas multinacionais a
reinvestirem no mínimo 10% de seu lucro líquido.
Sua política econômica nacionalista também é marcada pela criação
da PETROBRÁS em 1953 e do BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico), pela idealização da Eletrobrás, concebida somente no Governo
Goulart. Reequipou as ferrovias, construiu 600 quilômetros de rodovias por
ano, aumentou em 60% a produção de energia e limitou a remessa de
lucro para o
exterior das empresas estrangeiras.
As decisões de Getúlio não agradavam a todos, tanto que em 1954,
homens de sua guarda pessoal contrataram pistoleiros para eliminar o
jornalista da oposição Carlos Lacerda e estes mataram por engano um major
da Aeronáutica. Lacerda era jornalista, ex-comunista, extremista de direita
nos anos 40 e editava o jornal "Tribuna da Imprensa" e principal inimigo de
Getúlio. Para ele, Vargas era corrupto, extremamente benevolente para com
seus aliados e excessivamente tolerante para com os comunistas. Atacado
pelos opositores e diante do ultimato de renúncia feito pelas Forças Armadas,
Getúlio Vargas suicidou-se com dois tiros no peito na madrugada de 24 de
agosto daquele mesmo ano.
22
A influência de Getúlio no contexto nacional é tão imensa que mesmo
depois de sua morte, seus atos continuam conduzindo os passos de nossa
política. É o caso de sua carta-testamento transformada em programa
político pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), influente na eleição de JK
pela coligação PTB/PSD e mantenedora da chama do nacionalismo petebista
até o golpe militar de 1964.
A sucessão presidencial se através de Juscelino Kubitschek de
Oliveira que, eleito em 1955 pela coligação do PSD - Partido Social
Democrático - com o PTB - Partido Trabalhista Brasileiro, tem o gaúcho João
Goulart como vice-presidente. É a continuidade do populismo. que ao
contrário de Vargas, Juscelino Kubitschek incentiva a entrada do capital
estrangeiro. Com isso setores militares e políticos da oposição, especialmente
da UDN União Democrática Nacional -, iniciam um movimento a favor de
um golpe militar contra a posse de J.K. Mas em novembro de 1955, o ex-
ministro da guerra, General Teixeira Lott, põe as tropas nas ruas e garante a
posse do presidente eleito em janeiro de 1956.
O slogan de Juscelino era desenvolver o Brasil “50 anos em 5”. Uma
das premissas para a efetivação de tais palavras era a industrialização
acelerada do país e fazer desta o centro das atividades nacionais, superando
a dependência da economia do café. O resultado é o maior crescimento
industrial de toda a história do Brasil, a produção se expande na ordem de
80%. A receita para tamanho sucesso é o incentivo ao investimento do
capital estrangeiro. Segundo Ribeiro
no transcorrer do governo de Juscelino, a tentativa
(impossível) de conciliar o modelo político nacional-
desenvolvimentista – com o modelo econômico – substituição de
importações em sua segunda fase -, agora contando
basicamente com a colaboração do capital estrangeiro. (1986, p.
141)
Com o objetivo de levar o desenvolvimento para o interior do país, a
nova capital - Brasília - começa a ser construída em 1957 e é inaugurada em
1960. O projeto da cidade fica com o urbanista Lúcio Costa e o arquiteto
Oscar Niemeyer. A construção mobiliza trabalhadores de todas as regiões do
país. Mais de treze mil quilômetros de rodovias federais, ligando a nova
23
capital aos principais centros urbanos, são construídos. “Desta forma, os anos
de 1956 a 1961 constituíram-se no período ‘áureo’ do desenvolvimento
econômico brasileiro, aumentando as possibilidades de emprego ...” (Ribeiro,
1986, p. 141)
Também na década de 20 consolida-se o Modernismo, corrente
artística surgida como resposta às conseqüências da industrialização,
revalorizando a arte e sua forma. Para tanto os integrantes do movimento
apresentaram às seguintes características:
1
o
.) aprofundamento da investigação da cultura e da realidade,
iniciada pelos pré-modernistas
3
; 2
o
.) valorização da linguagem
falada e de suas formas típica como recurso literário, o que
significou uma profunda remodelação da linguagem literária,
que desde então se libertou definitivamente de modelos
acamicos e passou a considerar as formas coloquiais e
populares um patrimônio cultural expressivo muito importante.
(Infante, 2005, p.506)
2.2. Educação escolar no Brasil e no Paraná
A Educação na década de 1920 passa por uma reforma, estruturada
por Sampaio Dória, que representava a corrente liberal, a qual defendia a
igualdade de oportunidades e a evolução pela educação, além disso era
vinculado à Liga Nacionalista de o Paulo e via o analfabetismo como
incompatível com a civilização. Ademais temia como boa parte da elite
intelectual e política dos anos 1920 pela integridade da Pátria, afirmando
que
a alfabetização do povo é, na paz, a queso nacional por
excelência. pela solução dela o Brasil pode assimilar o
estrangeiro que aqui se instala em busca de fortuna esquiva. Do
contrário, é o nacional que desaparecerá absorvido pela
inteligência mais culta dos imigrantes. (Dória, 1923, p.16)
3
Pré-modernismo: movimento literário surgido no início do século XX e que deu base
para o Modernismo.
24
Dória explicita a preocupação em não deixar o nacional sucumbir ao
estrangeiro. A clareza de Dória não pára na ânsia do nacionalismo, continua
no seu posicionamento em relação ao sistema de ensino anterior, o qual
julgava pretensioso e ineficaz:
a escola urbana de quatro anos tal como tínhamos antes da
Reforma, é a mais pura, a mais acabada ideologia delirante. É
um aparelhamento que o alcança, nem pode jamais alcançar
os fins que visava. (Dória, 1923, p. 299)
Sendo o objetivo maior da reforma levar a instrução básica a todas as
crianças, foram criadas delegacias regionais de ensino, que visavam alcançar
alternativas para os altos índices de analfabetismo, cujo percentual na
população de mais de 15 anos era maior que 69%. Como pode ser observado
no quadro a seguir :
Especificação 1900 1920
População 17.438.434 30.635.605
Densidade demográfica 2,06 4,88
Renda per capita em dólares 55 90
Percentual de população urbana 10 16
Percentual de analfabetos (de 15
anos e mais)
65,3 69,9
(Lourenço Filho, apud Romanelli, 2005, p. 62)
As proposições da reforma eram tão avançadas a ponto de Azevedo
(1958, p. 55) afirmar que se tratava de “um divisor de águas” entre as idéias
conservadoras e as renovadoras ''uma reação categórica, intencional e
sistemática contra a velha estrutura do serviço educacional (...)''. Essa
educação deixava a condição de privilégio das classes mais abastadas e
direcionar-se-ia à população em geral. Como é percebido no contexto a
seguir.
deixa de constituir um privilégio determinado pela condição
ecomica e social do indivíduo, para assumir um ''caráter
biológico'', com que ela se organiza para a coletividade em
geral, reconhecendo a todo o indivíduo o direito a ser
educado até onde o permitam as suas aptidões naturais,
independentemente de razões de ordem econômica e social.
(Azevedo, 1958, p. 64)
25
O emaranhado de acontecimentos atinge a todos os estados, e o
Paraná não passa incólume. No início do século XX começa a se delinear
uma elite de intelectuais do Paraná com a fundação do Museu Paranaense
por Ermelino de Leão e José ndido da Silva Muricy e com as busca da
construção da identidade do Paraná. A modernidade se amplia trazendo a
melhoria da eletricidade, o telefone, a industrialização, os bondes,
automóveis e tudo isso através dos trilhos dos trens que desde muito
figuravam em nossas paisagens. Com o progresso veio a necessidade de se
educar a população. Assim, algumas escolas primárias surgiram pelo estado.
Vale lembrar que embora tenha ocorrido um aumento na demanda de alunos,
a grande maioria da população ainda não tinha acesso ao ensino das
primeiras letras.
À propagação das escolas primárias paranaenses, seguiu-se a
valorizão do ensino público secunrio de cunho propedêutico
e dos cursos profissionalizantes.(...) Curitiba contava ainda com
o Instituto de Agronomia, o Instituto Comercial, a Escola de
Aprendizes e Artífices e a Escola Profissional Feminina.
(WACHOWICZ, 2004 p. 91)
Além da educação pública também proliferaram as escolas particulares,
dentre elas as escolas de imigrantes. Sustentadas por diversas entidades
representativas de comunidades étnicas: alemães, polonesas, ucranianas,
italianas.
O nacionalismo, tão intenso no período em questão, atinge diretamente
as escolas estrangeiras em função do receio de se perder a nacionalidade em
meio a tantas culturas que chegavam diuturnamente. As escolas dos
imigrantes passaram a ser alvo constante de investidas. Uma das exigências
do nacionalismo foi a obrigatoriedade do ensino da ngua Portuguesa, da
história e da cultura brasileira. Tais obrigatoriedades apareceram em 1917,
no Código do Ensino de iniciativa do então Secretário do Interior, Justiça e
Instrução Pública, Dr. Enéas Marques dos Santos. O conteúdo do Código de
Ensino”, referente ao ensino particular, é exposto por WACHOWICZ:
26
Art.180 É obrigatório, em todas as instituições particulares do
curso primário ou secundário, nacionais ou estrangeiras, o
ensino da Língua Portuguesa.
Art. 181 Não poderão receber quaisquer favores diretos ou
indiretos do Estado ou Institutos as escolas particulares que não
cumprirem os seguintes preceitos:
Parágrafo 2º. – Ensinar a Corografia do Brasil, a História do Brasil
e a Língua Portuguesa, ao menos de acordo com o programa
oficial do curso primário.
Essa exigência fez com que as escolas polonesas, por exemplo,
modificassem seus programas para atendê-la. Para tanto estipularam o
seguinte currículo: pela parte da man ensinavam o polonês; à tarde o
português; entre uma aula e outra, havia um intervalo de dez minutos, sendo
que o tempo de duração de uma aula era de sessenta minutos; observa-se
aqui uma preocupação com o tempo de atenção dos alunos, pois não seria
produtível uma aula seguida de outra. Atendendo ainda ao avanço da
modernização, as escolas que tinham seus professores vindos da Europa ou
com relações européias e, consequentemente, com ideais relativos à Escola
Nova conforme atesta Wachowicz
Procurava-se a atualização pedagica. Nos cursos de
aperfeiçoamento, realizados nas férias e promovidos pela
entidades dos professores, como a Kultura e Oswiata
4
, e aos
quais comparecia grande número de professores, tratava-se das
disciplinas pedagógicas, sobretudo Psicologia, Metodologia e
Ptica, na linha dos defensores da Escola Nova, movimento que
na época estava desenvolvido na Europa e Estados Unidos.
(2002, p. 84)
Assim, eram estruturados os métodos de ensino para os cursos de
aperfeiçoamento, fundamentados no seguinte processo psicológico: “a)
preparo da criança para novos dados(...) b) apresentação dos dados novos
(...) c) comparação (...) d) generalização (...) e) aplicação (...)”(Wachowicz,
2002, p. 85). Já a alfabetização acontecia dentro do seguinte processo:
O professor deve, gradualmente, introduzir exercícios
sistemáticos, que preparam a criança para o estudo na cartilha.
As criaas devem aprender a separar palavras curtas em sons,
até serem capazes de o fazerem sem o auxílio do professor. Isso
pode ser feito através de jogos e brincadeira, em que as
4
Kultura e Oswiata: entidades que visavam à restauração da escola polonesa no
Brasil.
27
crianças se exercitam em interesse (...) Além disso, antes de
comar o trabalho na Cartilha, a criança deve aprender a
dominar o lápis (...) a criaa dever desenhar bastante, e
livremente: desenhar as personagens das histórias que ouve,
desenhar aquilo que a interessa com o objetivo de dominar o
lápis. (Wachowicz , 2002, p. 87)
Embora bem estruturadas sob o ponto de vista pedagógico, as escolas
polonesas não sobreviveram às investidas do nacionalismo criado pelo medo
gerado pela Primeira, e logo, pela Segunda Guerra Mundial, pois para
lideranças políticas a existência de comunidades estrangeiras era fato
fomentador de desconfianças e inseguranças, que tais comunidades
mantinham relacionamentos com seus países de origem e isso poderia gerar
movimentos homônimos aos existentes na Europa.
Com o fim das escolas polonesas, o Governo substituiu-as por escolas
nacionais, mas isso aconteceu quinze ou vinte anos mais tarde, resultando
no analfabetismo de uma geração inteira,
12.283 crianças, em 1937, recebiam instrução básica nas 349
escolas da imigrão polonesa no Brasil. Estas 349 escolas
foram repentinamente fechadas pelo fato de serem
estrangeiras, e não foram imediatamente substituídas por
escoas nacionais; a substituição destas escolas pela Escola
Pública tardou de 15 a 20 anos e, em alguns lugares, ainda não
se realizou; o resultado foi a permanência, no analfabetismo, de
uma geração inteira, na colonização polonesa, nos Estados
Meridionais do país. (WACHOWICZ, 2004, p. 99)
Devido ao panorama histórico da educação, o Paraná sofria com a
inexistência de profissionais capacitados. A falta desses profissionais ficou
mais clara quando o Paraná perdeu, na justiça, a Região do Contestado para
Santa Catarina. Esse acontecimento fez com que as lideranças políticas da
época se empenhassem mais num projeto de 1892, cujo progenitor era Rocha
Pombo. O projeto vislumbrava a fundação da Universidade do Paraná, sendo
inclusive colocada na Praça Ouvidor Pardinho sua pedra fundamental, porém
não houve andamento, pois o Movimento Federalista impediu a criação da
Universidade.
Após 20 anos o projeto é retomado tendo como líder Victor Ferreira do
Amaral, pois o Paraná se desenvolvia muito com abundante produção da
erva-mate e não podia mais esperar. Assim, “em 1913, a Universidade
28
começou a funcionar com os cursos de Ciências Jurídicas e Sociais,
Engenharia, Medicina e Cirurgia, Comércio, Odontologia, Farcia e
Obstetrícia.” (Wachowicz, 1986, p. 56)
Com a Primeira Guerra Mundial, veio a recessão econômica, depois,
em 1920, em nome de um nacionalismo ( o mesmo que interveio nas escolas
ditas estrangeiras), o Governo Federal lança mão de uma lei que decreta o
fechamento das Universidades, pois não via com bons olhos as iniciativas
surgidas de forma independente nos estados. Para evitar o fechamento, a
Universidade é desmembrada e transformada em faculdades. Durante mais
de 30 anos lutou-se pela Universidade, mas somente na década de cinqüenta
as faculdades são novamente reunidas e formam a Universidade Federal do
Paraná.
A industrialização é, ao mesmo tempo, causa e efeito do progresso
tecnológico, e, concomitante, veio a necessidade de mão de obra, como
conseqüência um aumento da demanda no ensino superior.
Assim se molda o panorama histórico não só do Paraná mas também do
Brasil nas décadas de 10 e 20 do século XX: um grande desenvolvimento
industrial, e, consequentemente, um aumento populacional urbano gerado
por aqueles que fugiam do desalento rural; por ex-escravos e/ou
descendentes que não tinham para onde ir; por imigrantes obrigados pela
guerra ou em busca de novas perspectivas de vida vinham aos grandes
centros com a esperança de realizar seus sonhos. Esse aglomerado de
elementos contribui para a fundação do Partido Comunista.
As idéias no campo da educação aparecem diferentes das do século
antecedente, quando a economia era voltada para o campo e o havia a
necessidade de mão de obra alfabetizada. Agora, com a industrialização, o
mercado precisa de pessoas mais preparadas, mesmo que fosse para apertar
um único botão. Fato também exemplificado em Tempos Modernos de 1936,
filme dirigido, produzido e estrelado por Chaplin. Assim a preocupação com
os problemas sociais, em especial com o alto índice de analfabetismo se
justifica e como conseqüência traz nas entrelinhas o nacionalismo exaltado
nas outras áreas já discutidas.
29
no campo das idéias, as coisas comaram a mudar com
movimentos culturais e pedagógicos em favor de
reformas mais profundas; de outro, no campo das
aspirações sociais, as mudanças vieram com o aumento
da demanda escolar impulsionada pelo ritmo mais
acelerado do progresso de urbanização ocasionado pelo
impulso dado à industrializão após a I Guerra e
acentuado depois de 1930. (Romanelli, 2005, p. 45)
A educação tomou o mesmo rumo da política e da economia. No
primeiro momento do Governo Vargas coexistiam “ duas políticas
educacionais opostas, a liberal e a autoritária” (Cunha, p.230). A última teve
suas origens nos anos 20 quando no governo de Artur Bernardes medidas
foram tomadas para impedir contestações à ordem social. Dessas medidas
surgiram o Conselho Nacional dos Estudantes e depois a União Nacional de
Estudantes – UNE- , “resultado da tentativa de cooptação dos estudantes,
opositores ao autoritarismo, pelo Estado, interessado no seu controle por
mecanismos corporativos. (Cunha,1986, p. 230). Contudo, as intenções não
são completamente alcançadas. A UNE caracterizou-se (embora estruturada
em bases autoritárias)
por orientações democticas, conseguindo razoável espaço
político, mesmo durante o Estado Novo”, pois a UNE nasceu
junto com a elaboração de uma nova política educacional, na
mesma linha dos educadores liberais igualitaristas, eno
silenciados, mas defendendo posições muito mais radicais do
que as sonhadas por eles.” (Cunha, 1986, p. 230, 231)
Os "educadores liberais igualitaristas" aos quais Cunha refere-se no
trecho anterior, surgem no bojo das necessidades das classes trabalhadoras
e dos estratos médios a partir de meados de 1932.
Dessa forma durante o período de 32 a 1935 a educação escolar vivia “
os conflitos cruzados entre setores das classes dominantes, da burocracia do
estado, de setores das camadas médias e das classes trabalhadoras
propiciaram o desenvolvimento contraditório das duas políticas educacionais”
(Cunha,1986, p.231) Mas também é nesse período que ocorrem grandes
mudanças em nosso contexto educacional como afirma Cunha:
30
Anísio Teixeira foi convocado (...) para ocupar a Diretoria de
Educação do Distrito Federal, o que fez de 1932 até 1935. Neste
período, realizou importantes mudanças no sistema educacional
escolar da cidade do Rio de Janeiro, principalmente no que se
refere à diminuição das distinções curriculares que separavam
as escolas pós-pririas para futuros operários, das escolas
secundárias para futuros burocratas e profissionais liberais.
(1985, p. 275)
A política educacional liberal estruturava-se no Liberalismo que
conforme Cunha é um “sistema de idéias construído por pensadores ingleses
e franceses, nos séculos XVII e XVIII (...) baseia-se em cinco princípios: o
individualismo, a liberdade, a propriedade, a igualdade e a democracia”
(1986, p. 256). Tais princípios deram margem à Escola Nova que via no
individualismo a capacidade de cada ser humano desenvolver seus talentos
próprios, na liberdade de escolha, na igualdade de direitos, todos devem ter
condições iguais de competir, na democracia igualitária onde todos têm o
direito de participar.
Essas novas idéias tornam-se densas ao mesmo tempo em que o
Ministério da Educação, criado por Getúlio Vargas 11 dias depois de sua
posse, em 03 de novembro de 1930, tem como seu primeiro Ministro,
Francisco Campos, reformador da educação em Minas Gerais na década de
20, seguidor da Escola Nova, que havia chegado ao Brasil pelas mãos de
educadores como Lourenço Filho, Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo entre
outros. Dessa forma nos descreve Cunha, aquele momento: Era no Rio de
Janeiro, sede da ABE, onde estava o principal foco irradiador de idéias
renovadoras no campo educacional” (1986, p. 273)
Essa nova visão não surge por uma questão social (ao menos sob o
ponto de vista dos governantes), mas sim econômica pois, como pode ser
observado em Romanelli:
desde a segunda metade do século XIX, os países mais
desenvolvidos vinham cuidando da implantão definitiva da
escola pública, universal e gratuita. (...) O capitalismo,
notadamente o capitalismo industrial, engendra a necessidade
de fornecer conhecimento a camadas cada vez mais numerosas,
31
seja pelas exigências da própria produção, seja pelas
necessidades do consumo que essa produção acarreta. Ampliar
a área social de atuação do sistema capitalista industrial é
condição de sobrevivência deste.(2005, p. 59)
A preocupação, seja qual for seu motivo, rendeu pontos positivos, pois
o índice de analfabetismo na cada de 20 beirava os 70 por cento, duas
cadas depois havia baixado quatorze pontos percentuais, isso na
população com idade superior a 15 anos, como mostra Romanelli (2005, p.
62), comentando o trabalho de Lourenço Filho.
Em 1955, surge o Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB, cujo
objetivo era pôr em evidência a cultura brasileira. Criado em 1955 por Café
Filho e implementado por Juscelino Kubitschek, o ISEB projetou-se como
centro formulador de uma ideologia desenvolvimentista no país. Também
sobressaiu enquanto matriz de uma concepção de cultura como elemento
impulsionador de transformações socioeconômicas e de fixação de
identidades nacionais.
O nacional-desenvolvimentismo foi então concebido como essa
ideologia-síntese capaz de levar o país por meio da ação estatal
(planejamento e investimento público) e de uma ampla frente classista à
superação do atraso econômico-social e da alienação cultural. Uma nação
desenvolvida e soberana estava, assim, no horizonte ideológico da maioria
desses intelectuais.
Também em 55, acontece a Campanha Nacional de Alimentação Escolar
- CNAEO que garantia a alimentação escolar dos alunos de toda a rede de
educação infantil matriculados em escolas públicas e filantrópicas, tendo
como objetivo atender às necessidades nutricionais dos alunos durante sua
permanência em sala de aula e, assim, contribuir para o crescimento, para o
desenvolvimento, para a aprendizagem e o conseqüente bom rendimento
escolar, bem como a formação de hábitos alimentares saudáveis.
As lutas ideológicas em torno da organização do sistema educacional
brasileiro têm suas vitórias dentro do governo de Juscelino Kubitschek.
Iniciadas em 1946, as idéias foram organizadas por uma comissão presidida
pelo eminente educador Lourenço Filho e dividida em três subcomissões:
uma para o Ensino Primário, uma para o Ensino Secundário e outra para o
32
Ensino Superior. Em novembro de 1948, um anteprojeto foi encaminhado à
Câmara Federal. Dava-se início a uma luta ideológica em torno das propostas
apresentadas. Primeiramente as discussões estavam voltadas às
interpretações contraditórias das propostas constitucionais. Posteriormente,
relacionaram-se à questão da responsabilidade do Estado quanto à educação,
inspirados nos educadores da velha geração de 30, e a participação das
instituições privadas de ensino. Depois de 13 anos de acirradas discussões foi
promulgada a Lei 4.024, em 20 de dezembro de 1961. A esse respeito
Romanelli comenta:
Notaram-se dois períodos nos debates em torno da reforma do
ensino: um primeiro, mais prolongado, que vai de 1948, quando
foi apresentado o anteprojeto primitivo, até 1958; um segundo
período coma e termina com a votação da lei, em 1961.
(2005, p. 172)
A luta trouxe resultados positivos para o sistema educacional, pois
colocou lado a lado educadores dos anos trinta e os contemporâneos da
cada de sessenta, além de elementos de segmentos sociais diferentes
como estudantes e operários. Ainda em Romanelli encontra-se a seguinte
ótica a respeito:
A consciência aprofundada e amadurecida dos problemas
relativos à nossa realidade educacional agora mobilizavam um
contingente muito mais significativo do que aquele com que
tinham contado ‘os pioneiros’. Participavam também da luta
estudantes , operários e intelectuais.(p. 172)
É facilmente percebida a preocupação com a realidade social brasileira
expressada desde a era Vargas, mas, mesmo assim, pouco se evoluiu no
sistema educacional, pois “havia ainda pouca probabilidade de que os termos
‘diretrizes e bases’ tivessem adequada interpretação por parte da
mentalidade formada no exercício das funções políticas do regime anterior.”
(Romanelli, 173)
A preocupação com os índices de analfabetismo continua presente,
tanto que em 1958 acontece a Campanha Nacional de Erradicação do
Analfabetismo, nascida do conflito existente entre a visão de que o
desenvolvimento econômico possibilita o desenvolvimento educacional e a
33
de que o desenvolvimento educacional possibilita o desenvolvimento
econômico. A primeira defendida pelo grupo dos desenvolvimentistas, a
segunda empunhada por educadores e economistas. À frente do projeto
estava Darci Ribeiro que inspirado pelo movimento da Escola Nova, cujo líder
era o educador baiano Anísio Teixeira, Darcy entrou na luta pela escola
pública gratuita e de qualidade. E abraçou definitivamente a causa da
educação, regendo movimentos como esse. O resultado de tanto esforço
aparece nos índices de analfabetismo nas cadas de 50 e 60 em relação às
anteriores, é o que mostra o gráfico a seguir estruturado por Lourenço Filho.
INDICADORES DEMOGRÁFICOS E ECONÔMICOS DE TAXAS DE
ALFABETIZAÇÃO
Especificação 1940 1950 1960
População 41.236.315 51.944.397 70.119.07
1
Densidade demográfica 4,8
8
6,14 8,3
9
Renda per capita em
lares
18
0
- 23
6
Percentual de população
urbana
3
1
36 4
6
Percentual de analfabetos
(de 15 anos ou mais)
56,
2
50,0 39,
5
Fonte: Lourenço Filho, Evolução da Taxa de Analfabetismo de 1900 a 1960.
R.B.E.P., nº. 100. Fundação IBGE Brasil: Séries Estatísticas
Retrospectivas,1970.
A diferença de percentual de analfabetos com mais de 15 anos entre as
cadas de 40 e 60 é de 16,7% a menos. Isso é de extremo significado,
levando-se em conta que a população cresceu praticamente 70%.
Analisando-se ainda os índices apresentados acima e comparando-os com
aqueles referidos na página 22 percebe-se que houve uma diminuição do
analfabetismo em quase 100%, em contra-partida a população quadriplicou.
Para se entender melhor o momento em questão, tem-se a necessidade
de refletir sobre os fatos até então acontecidos. Desde o final do século XIX, o
Brasil observa a valorização daquilo que é nacional. A intensificação desse
nacionalismo é evidenciado a partir de 1930. Nota-se isso primeiramente na
política, paulatinamente, voltada também para os problemas sociais
escancarados por grupos proletários organizados, inclui-se, nesse contexto, a
política educacional cada vez mais preocupada com o acesso do povo às
34
escolas. Também a economia tem um surto de nacionalismo quando busca
seu próprio desenvolvimento distanciando-se do capital estrangeiro. As
artes, em especial a literatura, fazem um caminham pela realidade brasileira
buscando expor suas mazelas, suas verdades dentro de um enredo cujas
paisagens e personagens são tipicamente nacionais. Nessa visão
nacionalista, surge oficialmente em 1958 a NGB Nomenclatura Gramatical
Brasileira que será melhor abordada no capítulo seguinte. Em 58 também,
vale lembrar, o Brasil ganha sua primeira Copa do Mundo, e, logicamente, o
sentimento patriótico cresce, aumentando ainda mais os sentimentos
nacionalistas já existentes.
Em 1957, 400 mil trabalhadores fizeram uma greve geral por reajuste
de salários para compensar a inflação. No Nordeste, as lutas pela terra se
intensificaram através das Ligas Camponesas que reivindicavam reforma
agrária e agitavam a política da região. O FMI – Fundo Monetário Internacional
- condicionou a liberação de empréstimos a uma política de contenção
salarial e corte nos gastos blicos. Isso desagradou os nacionalistas que,
imediatamente, pressionaram Kubitschek.
O período final do governo Kubitschek foi marcado por uma crise
econômica que, agravada com o rápido crescimento da indústria e dos gastos
com a construção da capital, elevou a inflação de menos de 20% ao ano em
1956, a mais de 30% em 1960. Como conseqüência cresceu a oposição ao
governo.
nio Quadros, sucessor de JK, logo após sua posse em 31 de janeiro de
1961, vira notícia em todos os jornais. Como exemplo reporta-se ao jornal
Folha de São Paulo que na edição de 25 de agosto de 1961 trouxe a seguinte
manchete " O presidente Jânio Quadros renunciou hoje ao cargo de
Presidente da República" .Eleito com apoio da mídia e elite , Jânio trazia como
lema “Vou varrer deste pais a corrupção . Dentre suas principais medidas
estão o reatamento das relações diplomáticas com os países socialistas, e a
conseqüente condecoração de Che Guevara com a ordem do Cruzeiro do Sul.
Devido aos problemas inflacionários busca controlar as remessas de lucros
para o exterior. Renuncia após sete meses de governo, quando assume seu
vice.
35
Jango, como era conhecido João Goulart vice de Jânio, sob regime
parlamentarista, assumiu a presidência em 7 de setembro de 1961 e
governou até o Golpe de 64, ocorrido em de abril. O confronto entre as
diferentes políticas econômicas marcaram seu mandato. Além disso, ainda
enfrentou conflitos sociais e greves urbanas e rurais.
A contradição de seu governo é observada na busca do estreitamento
de relações entre o movimento sindical e setores nacional-reformistas e na
política de estabilização baseada na contenção salarial, cujo objetivo era
reprimir os altos índices de inflação e manter as taxas de crescimento da
economia. Essas eram condições indispensáveis para a obtenção de novos
empréstimos junto ao FMI com finalidade de renegociação da dívida externa
e para a elevação do nível de investimento. O Plano Trienal também
determinou a realização das chamadas reformas de base: reforma agrária,
fiscal, educacional, bancária e eleitoral. Para o governo, elas eram
necessárias ao desenvolvimento de um "capitalismo nacional" e
"progressista".
A política de contenção salarial culminou com a convocação de uma
greve reivindicando melhoria das condições de trabalho e a formação de um
ministério nacionalista e democrático em 1961, estruturado pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria. O resultado do
movimento foi a conquista do 13º salário para os trabalhadores urbanos. No
mesmo ano realizou-se o 1º Congresso Nacional de Lavradores e
Trabalhadores Agrícolas, em Belo Horizonte, Minas Gerais. As exigências
foram a reforma agrária e a CLT (Consolidação das Leis de Trabalho) para os
trabalhadores rurais. Em 62, com a aprovação do Estatuto do Trabalhador
Rural, muitas ligas camponesas se transformaram em sindicatos rurais.
A velocidade dos acontecimentos também é sentida no âmbito da
educação. Nesse encontra-se Paulo Freire que com seu sistema de
alfabetização inovador alfabetizou 300 trabalhadores rurais de Angico no Rio
Grande do Norte em apenas 45 dias. Infelizmente para nós e felizmente para
os chilenos, Freire, em 1964 após o golpe militar, é exilado por 14 anos no
Chile. Durante esse período participa ativamente de projetos alfabetizadores
36
daquele país, que recebe uma distinção da UNESCO por ser um dos países
que mais contribuíram para a luta contra o analfabetismo.
Ainda na esteira da velocidade, são criadas as Universidades de
Brasília, a Federal de Alagoas, Espírito Santo e as Católicas de Petrópolis e de
Salvador. A justificativa para as intensas ações na área de educação é
encontrada em Romanelli quando cita um texto de Florestan Fernandes:
Os países subdesenvolvidos são, também, os que mais
dependem da educação como fator social construtivo. Tais
países precisam da educão para mobilizar o elemento humano
e inseri-lo no sistema de produção nacional; precisam da
educação para alargar o horizonte cultural do homem,
adaptando-o ao presente a uma complicada trama de
aspirações, que dão sentido e continuidade às tendências de
desenvolvimento econômico e de progresso social; e estilos de
vida e incentivar novas formas de relações sociais, requeridos
ou impostos pela gradual expansão da ordem social democrática
(2005, p. 183)
A lei de Diretrizes e Bases, votada no ano de 1961, refletia exatamente
o posicionamento de Florestan. Foi a oportunidade com que contou a
sociedade brasileira para organizar seu sistema de ensino, pelo menos em
seu aspecto formal” (Romanelli, 2005, p. 183)
No ano seguinte, foi instalado o Conselho Federal de Educação que
meses depois aprovou o Plano Nacional de Educação a ser desenvolvido
entre 1962 e 1970. As metas eram: 100% da população escolar entre 7 e 14
anos matriculada no ensino primário; a etapa seguinte, ginasial, exigiria
índices de matrícula entre 30 e 50%, dependendo da faixa etária e da série a
ser cursada. O ensino superior esperava 50% daqueles que terminassem o
curso colegial.
Essas reformas aumentaram a oposição ao governo e exaltaram a
polarização da sociedade brasileira: de um lado o proletariado de outro a
burguesia que, aliás, rapidamente afasta-se do governo . Jango, para evitar o
isolamento, reforçou as alianças com as correntes reformistas aproximando-
se de Leonel Brizola, então deputado federal pela Guanabara, de Miguel
Arraes, governador de Pernambuco, da UNE (União Nacional dos Estudantes)
e do Partido Comunista, que, mesmo ilegal, atuava nos movimentos popular
37
e sindical. O Plano Trienal foi abandonado em meados de 1963. Um plebiscito
nacional, efetuado nesse mesmo ano, derruba o parlamentarismo com 80%
dos votos para o presidencialismo.
As medidas de caráter nacionalista continuaram a ser implementadas
pelo Presidente. Assim, acontecem a limitação da remessa de capital para o
exterior, a nacionalização das empresas de comunicação e a revisão das
concessões para exploração de minérios. Logicamente, as retaliações
estrangeiras surgiram na mesma velocidade dos acontecimentos. Ocorre a
interrupção das negociações da dívida externa e o corte do crédito pelo
governo e pelas empresas privadas norte-americanas.
A Frente Parlamentar Nacionalista formada pelo Congresso vem em
apoio a Jango. Também se estrutura no Congresso a Ação Democrática
Parlamentar, que recebia ajuda financeira do Instituto Brasileiro de Ação
Democrática (I.B.A.D.), instituição mantida pela Embaixada dos Estados
Unidos. Essas duas frentes opostas fazem crescer a agitação política. Ao lado
de Jango estavam organizações como a UNE (União Nacional dos Estudantes),
a CGT e as Ligas Camponesas. No lado oposto encontravam-se o IPES, o IBAD
e a TFP (Tradição, Família e Propriedade).
A crise tem seu clímax no dia 13 de março, quando Jango decretou a
nacionalização das refinarias privadas de petróleo e desapropriou terras ao
longo das margens de ferrovias, de rodovias e de zonas de irrigação de
udes públicos para a reforma agrária. Isso tudo perante 300 mil pessoas.
A reação foi imediata, tanto que seis dias após o pronunciamento de
Jango, em 19 de março, realizou-se, em São Paulo, "Marcha da Família com
Deus pela Liberdade" a maior mobilização contra o governo. Organizada por
grupos da direita, com influência dos setores conservadores da Igreja
Católica, a manifestação reuniu cerca de 400 mil pessoas e forneceu o apoio
político necessário para derrubar o Presidente. Menos de duas semanas
depois, iniciou-se o movimento para o golpe. No dia de abril, ao perceber
que não contava com nenhum dispositivo militar e muito menos o apoio
armado dos grupos que o sustentavam, João Goulart abandona Brasília e
segue para Porto Alegre. Começava então a Ditadura Militar.
38
3 A LÍNGUA PORTUGUESA COMO INSTRUMENTO DE FORMAÇÃO
DE CIDADÃOS
3.1. A língua portuguesa brasileira
O sentimento nacionalista que se apoderou de significativo número de
brasileiros nas primeiras cadas do século XX fez com que a visão de
ensino ampliasse seu foco. Nesse sentido o ensino de Língua Portuguesa
também sofre o impacto dessa nova maneira de ver o Brasil e sua sociedade,
pois o quadro político, que se manifestava no período da década de 1930, é
caracterizado por Cunha como dualista: de um lado um Estado Liberal, que
advém do “liberalismo(...) um sistema de idéias construído por pensadores
ingleses e franceses, nos séculos XVII e XVIII, utilizado como arma ideológica
da burguesia nas lutas contra a aristocracia.”( CUNHA, 1986, p. 256) como
resquício da política café com leite, onde o poder político encontra-se em
uma elite financeira. De outro tem-se o Estado Totalitário no qual o controle é
exercido por uma classe. No caso do Brasil esse estado foi representado por
aqueles que se opuseram à elite financeira: os representantes das Forças
Armadas. No âmbito político, embora não dominantes, constituíam-se ainda:
comunistas, sindicalistas entre outros movimentos, pois os trabalhadores
reivindicavam melhores remunerações, melhores condições de trabalho,
descanso semanal, regularidade nas horas trabalhadas entre outras
solicitações; fato que gerou conflitos como as greves operárias. Para controlar
a situação, é constituído o Estado Autoritário, representado por Vargas,
visando intervir na realidade social. Para controlá-la O Estado autoritário
desempenha a função de árbitro e interventor na realidade social,
administrando os conflitos acima dos interesses particularistas dos grupos e
classes sociais, visando o interesse coletivo” (CUNHA, 1986, p. 281).
Tal exposição é fundamental para o entendimento do conceito da
Educação escolar e, em especial, do ensino de Língua Portuguesa naquele
período, pois a instauração do novo regime deveria diminuir os conflitos
existentes. Para tanto, uma das preocupações foi tornar, ao menos
39
teoricamente, a Educação acessível a todas as camadas sociais; medida,
aliás, extremamente populista, fato que dava forças ao governo federal e
atenuava os movimentos populares. Tal necessidade fica explícita na fala de
Nagle “pela multiplicação das instituições escolares, pela disseminação da
educação escolar, sepossível incorporar grandes camadas da população na
senda do progresso nacional e colocar o Brasil no caminho das grandes
nações do mundo (1974, p. 99). Nagle manifesta o pensamento dos
segmentos políticos e intelectuais que viam na educação a razão para inserir
o Brasil na senda da modernidade. Assim Romanelli os anos 30 desta
forma:
virada na História do Brasil, desses momentos raros na vida dos
povos quando se assiste a um processo de mudança real, não só
na quantidade como na qualidade. O país, muito sentindo
insuficiências, amadureceu sua realidade e passa a enfrentá-la
com decisão: a data é o coroamento de longa trajetória de
perguntas, perplexidades e lutas e o início de uma nova política,
que se traduz em todos os planos social, econômico,
intelectual. (2005, p. 10)
A extensão da educação a todas as classes sociais exigia um novo
pensar sobre as ações no sistema de ensino. A conseqüência desse pensar é
explicitada na publicação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova em
1932, ou seja, dois anos após a posse de Getúlio Vargas, escrito por Fernando
de Azevedo e assinado por vários intelectuais da época, dentre eles Anísio
Teixeira. O manifesto foi, como atesta Fernando de Azevedo, “um divisor de
águas” entre educadores liberais e conservadores, pois foi um movimento de
reação à pedagogia tradicional e, além disso, alicerçou-se nos fundamentos
da biologia e da psicologia dando ênfase ao indivíduo e a seu potencial
criador.
Observa-se que o contexto educacional estrutura-se com as mesmas
bases políticas: de um lado tem-se os liberais, constituídos por intelectuais
como Azevedo e Teixeira; de outro os conservadores com base católica
40
principalmente. Os primeiros assentam-se em elementos norteadores na
Escola Nova.
A Escola Nova tendo como base idéias de John Dewey, filósofo,
educador americano de extrema importância no século XX. Defendia as
potencialidades individuais e valores democráticos como a educação para
todos. Nessa concepção a educação é o único meio realmente efetivo para a
construção de uma sociedade democrática, que respeite as características
individuais de cada pessoa, inserindo-a em seu grupo social respeitando sua
unicidade, mas vendo-a como parte integrante e participativa de um todo.
Segundo Cunha
O binômio ‘indivíduo-grupo’ - ou ‘indivíduo-sociedade’ -
torna-se constante nas reflexões dos autores da época.
Ele aparece, via de regra, sugerindo que a escola,
norteada por princípios de respeito à vida social, não
pode prescindir da compreensão dos atributos individuais
do educando. Esse mesmo binômio tamm é enunciado
de modo alternativo, sugerindo que a educação, embora
voltada para o aluno, como ser peculiar, o pode fugir
às suas responsabilidades quanto à organização social.
(1995, p. 48),
Essa visão de educação foi acolhida no Brasil, proposta por Anísio
Teixeira”( Behrens, 2000, p. 47) que, ao conhecer o ideário de Dewey,
internaliza a concepção de educação, de homem, de sociedade defendidas
pelo educador americano. Segundo Anísio, a escola é local propício para a
construção de uma consciência social. Nela o indivíduo adquire valores; nela
condições para formar o ser social, pois a urbanidade exige, cada vez
mais, a cooperação no trabalho, no lazer, no cotidiano. Assim, nos descreve
Anísio Teixeira sua concepção de escola.
Como a escola visa formar o homem para o modo de vida
democrático, toda ela deve procurar, desde o início,
mostrar que o indivíduo, em si e por si, é somente
necessidades e impotências; que existe em função dos
outros e por causa dos outros; que a sua ação é sempre
uma transação com as coisas e pessoas e que saber é um
conjunto de conceitos e operações destinados a atender
àquelas necessidades, pela manipulação acertada e
adequada das coisas e pela cooperação com os outros no
trabalho que, hoje é sempre de grupo, cada um
41
dependendo de todos e todos dependendo de cada um”
(Teixeira, 1956, p. 10)
3
.
A escola, ainda na visão de Teixeira, deve ser agente de uma contínua
construção, reconstrução e transformação social e, ainda, colaborar com a
constante reflexão e revisão social frente à dinamicidade de uma sociedade
democrática:
O conceito social de educação significa que, cuide a escola
de interesses vocacionais ou interesses especiais de
qualquer sorte, ela não será educativa se não utilizar
esses interesses como meios para a participão em todos
os interesses da sociedade... Cultura ou utilitarismo serão
ideais educativos quando constituírem processo para uma
plena e generosa participação na vida social (Teixeira,
1930b, p. 88-89)
Enquanto a Escola Nova preocupa-se com o indivíduo, com o social,
com o democrático e os coloca como ideais educativos desde que contribuam
para com o processo da construção social, a Escola Tradicional centra-se no
ensino das humanidades, sem se preocupar com a individualidade.
O panorama da educação é, ao mesmo tempo, causa e conseqüência
de fatos históricos. Conseqüência porque surge a partir do antagonismo entre
a visão vanguardista de educadores como Anísio Teixeira e o olhar
conservador daqueles que muito se encontravam articulados ao poder
político e econômico, no caso os católicos.
A nova visão da educação fez com que se pensasse sobre o fazer
pedagógico. Naquele momento de transformação, a teoria da Escola Nova
inicia um longo confronto com o conservadorismo da Escola Tradicional que
avança décadas e aparece nos anos 60 reforçado pela oposição entre a
Escola Privada e a Escola blica. Costuma-se dizer que a discussão nesta
fase foi motivada pelos choques entre as diversas correntes em defesa dos
princípios da escola pública e da escola particular.” (Ribeiro, 1986, p. 150)
O conflito acontecia em função do posicionamento das escolas
confessionais, pois “do ponto de vista pedagógico, a Igreja Católica acusa a
escola blica de ter condições de desenvolver somente a inteligência e,
enquanto tal, instrui mas não educa”. Além disso, ainda relacionam o
42
aumento do índice de criminalidade com propagação da escola pública”
(Ribeiro, 1986, p.150). Não contentes os católicos acusavam os defensores
da escola pública de serem socialistas, comunistas e, enquanto tal,
pertencentes aos partidos radicais, extremistas da esquerda, os inimigos de
Deus, da Pátria e da Família” (Ribeiro, 1986, p. 151/152).
Os defensores da escola pública rebatiam as acusações do fazer
pedagógico “demonstrando que ela (escola pública) não se omite quanto aos
problemas dos fins da educação, entendendo que os próprios meios
subordinam-se a tais fins.” (Ribeiro, 1986, p. 152). o fato dos defensores
da escola pública serem comunistas contribuía para os contrapostos
explicitados pelos educadores que
influenciados pela ‘idéias novas’ rebatiam tal argumento,
afirmando que não cabia nem ao Estado e nem à família
determinar (...) o tipo de formação do indivíduo. O que os grupos
sociais deveriam proporcionar eram as condões para que cada
um fosse responvel pela própria formação. Daí a escola
blica a mais adequada. (Ribeiro, 1986, p. 152)
Em meio às discussões sobre a escolablica e privada, sobre a Escola
Nova e a Escola Tradicional, o ensino de Língua Portuguesa caminhava sem
muitas mudanças. Mas a onda de nacionalismo surgida com o Romantismo
nos meados do século XIX rompe a carapaça dos literatos e faz com que
esses busquem alternativas para a literatura. Todo o movimento literário da
época foi envolvido pelo nacionalismo que, aliás, passou a ser uma
característica do Modernismo
5
conforme se observa em Lajolo e Zilberman:
o tema dominante consiste no nacionalismo, presente desde as intenções
geradoras do movimento”. Os autores voltados para a literatura infantil
começaram a escrever sobre os problemas enfrentados pelas crianças ao
lerem texto no português de Portugal. Sobre isso, ainda, Lajolo e Zilberman
expõem:
As queixas de falta de material brasileiro são representadas pela
tradução e adaptação de rias histórias européias que,
circulando muitas vezes em edições portuguesas, não tinham,
com os pequenos leitores brasileiros, sequer a cumplicidade do
5
Modernismo: escola literária que tem como marco inicial a Semana de Arte
Moderna de 1922.
43
idioma. Editadas em Portugal, eram escritas num português que
se distanciava bastante da língua materna dos leitores
brasileiros. (Lajolo e Zilberman, 1987, p. 31)
Os problemas com as edições portuguesas são amenizados com o
surgimento da moderna indústria editorial brasileira. O aprimoramento
técnico de tipografias e o empreendimentos editoriais, como o de Monteiro
Lobato que “a partir de 1921, dedica-se à tarefa de editor, preocupado em
lançar novos autores”(Nicola, 1999, p. 267) As conseqüências foram visíveis,
pois o aumento do mero de revistas e jornais, principalmente os literários,
criados para divulgar as novas idéias modernistas acompanhou o
crescimento - ainda que pequeno - do público leitor. É o caso da Revista
Klaxon “primeiro periódico modernista, fruto das agitações do ano de 1921 e
da grande festa que foi a Semana de Arte Moderna.” (Nicola, 1999, p. 293)
Sobre Monteiro Lobato e sobre o nacionalismo da literatura infantil,
Nicola comenta:
A literatura infantil lobatiana, além do caráter moralista e
pedagico, não abandona a luta pelos interesses
nacionais empreendida pelo autor, com personagens
representativos das várias facetas de nosso povo e o Sítio
do Picapau Amarelo, que é a imagem do próprio Brasil.
Leia-se, por exemplo, O poço do Visconde, em que a ficção
e a realidade se misturam em torno do problema do
petróleo. (1999, p. 268)
Ainda sobre literatura infantil e, especificamente, sobre seu uso
pedagógico, Lajolo e Zilberman falam: Ocorreu também a apropriação
brasileira de um projeto educativo e ideológico que via no texto infantil e na
escola (e, principalmente, em ambos superpostos) aliados imprescindíveis
para a formação de cidadãos.” (1987, p. 32)
Isso significa dizer que a língua portuguesa passou, através do texto
infantil, a ser grande ferramenta para incutir no povo brasileiro a visão do
que se imagina ser um cidadão. É o que se percebe no texto de Olavo Bilac e
Coelho Neto usado por Lajolo e Zilberman para exemplificar o nacionalismo
na literatura infantil, vale lembrar que Olavo Bilac pertence ao
Parnasianismo
6
, portanto essa visão de cidadão está amarrada ao militarismo
6
Parnasianismo: estética da arte sobre a arte, que se manifesta a partir do final da
cada de 1870, prolongando-se até a Semana de Arte Moderna.
44
que naquele espaço de tempo esteve em evidência, pois a fase literária em
questão está dentro do contexto histórico que antecedeu a Reblica,
proclamada pelos militares, portanto as concepções estavam muito ligadas
ao militarismo.
De repente, a música tocou os primeiros compassos do
hino nacional. Um vento brando, vindo do mar, agitou a
bandeira brasileira, que estava no centro de um pelotão. A
bandeira desdobrou-se, palpitou no ar espalmada, com um
meneio triunfal. Parecia que o símbolo da Pátria abençoava os
filhos que iam partir, para defen-la.
E, então, ali, a idéia sagrada da Pátria se apresentou,
nítida e bela, diante da alma de Anselmo. E ele, compreendendo
enfim que sua vida valia menos do que a honra de sua nação.
Pediu a Deus, com os olhos cheios de lágrimas, que o fizesse um
dia morrer gloriosamente, abraçado às dobras daquela formosa
bandeira, toda verde e dourada, verde como os campos,
dourada como as madrugadas de sua terra. ( 1987, p. 32)
A necessidade de se trabalhar com uma língua diferente da lusitana
aparece com maior ênfase nesse momento, pois através do ensino de língua
portuguesa tem-se o formato de cidadão esperado naquele momento. Porém
as idéias nacionalistas dentro da literatura não são contemporâneas do
Parnasianismo, são anteriores ao século XX. É o caso de José de Alencar, por
exemplo, que escreve "Iracema" e "O Guarani", cujos heróis são
representantes únicos do povo brasileiro (segundo a visão romântica dessa
fase literária). Gonçalves Dias demonstra imensa saudade da terra natal
em seu imortal poema "Canção do Exílio". Ambos pertencentes ao
Romantismo, fase literária da primeira metade do século XIX, mas com raízes
no século XVIII. Tal nacionalismo é explicitado como característica romântica
por Nicola : “os românticos cultivavam o nacionalismo, que se manifestava na
exaltação da natureza pátria, no retorno ao passado histórico e na criação do
herói nacional” (1999, p. 129)
no parnasianismo que acontece no final do século XIX, encontra-se
como característica
o caráter de modelo exemplar que se examinou no plano
temático manifesta-se também ao nível da linguagem. Não por
45
coincidência, data desse mesmo fim de século XIX uma ria
preocupação com a correção de linguagem, presente na
produção literária em geral. (Lajolo e Zilberman, 1999, p. 41)
Lajolo e Zilberman abrem o capítulo “O modelo da língua nacional” com
um texto de Olavo Bilac, transcrito a seguir:
Falemos da língua admirável, que, com o toro natal,
recebemos de nossos maiores: d’ela falando, falemos de nós
todos, como Brasileiros, e do futuro e da seguraa do Brasil.
(...)
Queremos que o Brasil seja Brasil! Queremos conservar a
nossa raça, o nosso nome, a nossa história, e principalmente a
nossa língua, que é toda nossa vida, o nosso sangue, a nossa
alma, a nossa religião!(...)
A língua faz parte da terra. Se queremos defender a
nacionalidade, defendendo o solo, é urgente que defendamos
também, e antes de tudo, a língua, que já se integrou no solo, e
já é base da nacionalidade. (1999, p. 41)
Na Semana de Arte Moderna de 1922, nomes como Oswald de Andrade,
Mário de Andrade, Manuel Bandeira entre outros se apresentam oficialmente
no cenário literário. Todos pertencentes ao Modernismo, movimento
enraizado nas Vanguardas Européias, traz como principal aspecto o
renascimento do nacionalismo do Romantismo, agora revestido de uma
ojeriza a tudo que é estrangeiro. Característica ascendente de vários
movimentos como o Antropofágico. Sob esse enfoque os autores expõem sua
aversão inclusive à estrutura gramatical da Língua Portuguesa usada no
Brasil que era cópia daquela empregada em terras lusitanas. É exatamente
sobre essa polêmica que fala o poema "Pronominais" de Oswald de Andrade
transcrito a seguir:
Dê-me um cigarro
diz a gratica
do professor e do aluno
e do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco da Não Brasileira
dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me um cigarro. (Nicola, 1999, p. 308)
46
Percebe-se aqui uma evidente crítica ao uso de regras gramaticais
importadas por uma elite em detrimento de outras usadas naturalmente pelo
povo. Além da crítica percebe-se a defesa daquilo que é nacional, inclusive o
falar do brasileiro, reflexo do contexto histórico daquele momento que incluía
, entre outros fatos relevantes, a ascensão do Comunismo, como se nota
pelo uso do vocábulo camarada no penúltimo parágrafo. A crítica à
gramática lusitana consiste na obrigatoriedade de ênclise (colocação do
pronome depois do verbo), enquanto que o português do Brasil usa a próclise
(colocação do pronome antes do verbo). E, ainda, no uso descontraído da
segunda pessoa tu (verbo dar conjugado no imperativo afirmativo dá) sem
as devidas concorncias nas relações pronominais.
Além de Oswald de Andrade, Manuel Bandeira também exalta o falar
do povo em uma obra da década de 1930. Observa-se isso no trecho abaixo
transcrito de Evocação do Recife quando o autor se reporta ao fato de ele
saber das coisas não pela forma escrita dos jornais e dos livros, mas sim pela
língua falada pelo povo.
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada. (Nicola, 1999, p. 312)
O movimento modernista pregava a tomada de consciência da
realidade brasileira e defendia de forma ferrenha tudo que fosse nacional. O
nacionalismo foi extremamente marcante no movimento. Sobre isso,
transcreve-se do livro de Nicola um trecho do discurso de Mário de Andrade,
grande escritor modernista, proferido na conferência O Movimento
Modernista”, de 1942:
Manifestado especialmente pela arte, mas
manchado também com violência os costumes sociais e
políticos, o movimento modernista foi o prenunciador, o
47
preparador e por muitas partes o criador de um estado
de espírito nacional. A transformação do mundo, com o
enfraquecimento gradativo dos grandes impérios, com a
prática européia de novos ideais políticos, a rapidez dos
transportes e mil e uma outras causas internacionais,
bem como o desenvolvimento da consciência americana
e brasileira, os progressos internos da técnica e da
educação, impunham a criação de um espírito novo e
exigiam a reverificação e mesmo a remodelação da
Inteligência nacional. Isto foi o movimento modernista,
de que a Semana de Arte Moderna ficou sendo o brado
coletivo principal. (1999, p. 272)
Embora os modernistas tenham explicitado as críticas à imposição de
uso de uma língua que divergia daquela utilizada pela maioria da população
brasileira, essa reivindicação não foi exclusividade deles. Em 1907, fomentou-
se um movimento cujo objetivo era simplificar a ortografia da língua
portuguesa e Portugal se manifestava para alterar o sistema ortográfico.
Assim, antes que os lusitanos fizessem a alteração deles, teria acontecido
a brasileira. Essa passagem é descrita por Coutinho em sua obra:
Antes que o Governo Português tornasse obrigatória a
reforma ortográfica para Portugal e suas colônias, em
1911, cogitou entre nós a Academia Brasileira de Letras
de adotar, nas suas publicações oficiais, um sistema de
grafia de objetivo manifestamente simplificador. (1995,
p. 79)
Apenas a reforma portuguesa é realizada. Mas a idéia de oficializar as
diferenças entre o português do Brasil e o de Portugal arrasta-se até 1915,
quando “a Academia Brasileira aprova a proposta do acadêmico Silva Ramos,
no sentido de se harmonizar a reforma de 1907 com a portuguesa.”
( Coutinho, 1995, p. 79). Mas a história não terminaria naquele momento.
Quatro anos mais tarde, sem maiores esclarecimentos acontece a revogação
de tal proposta. Fato que levou “acadêmicos esclarecidos, em cujo número
48
figuravam Silva Ramos
7
, Amadeu Amaral
8
, Mário de Alencar
9
e Medeiros
Alburquerque
10
a reforçarem sua caminhada em busca da oficialização da
ortografia nacional”. (Coutinho, 1995, p. 80) Como se percebe a busca de
aproximação da língua portuguesa aos usos da mesma no Brasil é anterior ao
movimento modernista. Contudo foi com o auxílio do nacionalismo dos
modernistas que as diferenças entre o português do Brasil e de Portugal
tornaram-se explícitas.
A soma de todos esses fatos levou, em 1931, o Governo Provisório de
Getúlio Vargas a promulgar a primeira lei que trata de reforma ortográfica,
sob o Decreto 20 108, de 15/06/1931, que dispõe sobre o uso da ortografia
simplificada nas repartições públicas e nos estabelecimentos de ensino.
Conforme relata Coutinho:
Foi compreendendo isso que o nosso Governo, no intuito
patriótico de solucionar de uma vez tão complexo
problema, fonte de tamanhas incertezas e dificuldades,
tornou oficial, em todo o território brasileiro, o Acordo
celebrado, em 1931, entre a nossa Academia de Letras e
a Academia das Cncias de Lisboa. (1995, p. 80)
Sanado o problema, acreditava-se que a língua portuguesa utilizada
agora no Brasil possuía características do povo brasileiro. não era um
produto importado. Mas “como surgissem depois dúvidas na aplicação do
Acordo, em matéria de acentuação das palavras, foram elas sanadas pelo
Decreto Lei no. 292, de 23 de fevereiro de 1938.” (Coutinho, 1995. P. 80)
Não apenas o sentimento nacionalista influencia os movimentos em
torno da ngua portuguesa usada no Brasil. Eles acontecem também em
7
Silva Ramos: Professor, filólogo, poeta, membro fundador da Academia Brasileira de
Letras. http://www.biblio.com.br/conteudo/biografias/silvaramos.htm
8
Amadeu Amaral: poeta, folclorista, filólogo e ensaísta. No Brasil, foi o primeiro a
estudar cientificamente um dialeto regional
http://www.biblio.com.br/conteudo/AmadeuAmaral/AmadeuAmaral.htm
9
Mário de Alencar: poeta, jornalista, contista e romancista. Filho do grande romancista José de Alencar
http://www.biblio.com.br/conteudo/MariodeAlencar/MariodeAlencar.htm
10
Medeiros Albuquerque: jornalista, professor, político, contista, poeta, orador,
romancista, teatrólogo, enssta e memorialista
http://www.biblio.com.br/conteudo/medeirosalbuquerque/medeirosealbuquerque.htm
49
função da lingüística
11
que estava se difundindo a partir dos estudos de
análises internas que percebem a língua como “um sistema de signos
linísticos convencionais usados pelos membros de uma mesma
comunidade. Em outras palavras: um grupo social convenciona e utiliza um
conjunto organizado de elementos linísticos representativos. (Infante,
2005, p. 11) e não mais como uma série de normas impostas pelo estrato
social dominante. Ainda sobre a nova visão de conceito de língua tem-se
Suassuna quando se reporta a Saussure, lingüista franco-suíço. Aliás,
Câmara Jr. afirma que Saussure entendia a gramática descritiva,
cientificamente conduzida, isto é de maneira sistemática, objetiva e
coerente. O propósito dele era ver essa gramática como disciplina autônoma,
independente das disciplinas filosóficas da lógica e da psicologia (1999, p.
13). Retomando Suassuna, ao reportar-se a Saussure, tem-se:
Os postulados lingüísticos de Saussure foram traçados
sob uma ótica estruturalista (por sinal, ele pode ser
considerado o inaugurador oficial do Estruturalismo)
12
(...) estabeleceu uma distinção entre a língua e a fala,
considerando a língua um sistema abstrato, homogêneo,
social, supra-individual, ao passo que a fala seria a
realização concreta e individual da língua.(1999, p. 64)
A individualidade cogitada no fragmento acima vem ao encontro das
idéias dos defensores da Escola Nova e ao encontro dos ideais daqueles que
pensavam na língua portuguesa do Brasil como sendo um bem nacional.
Lembramos que entre os princípios da Escola Nova está o atendimento
educacional às características individuais dos alunos. Àquilo que é próprio de
cada um (emoções, sentimentos, desejos, interesses e características de
personalidade) é preciso que os educadores estejam atentos. Desse modo a
língua pode ser entendida como parte dessa individualidade quer de sujeitos
quer da nação. Naquele momento havia a preocupação com o modo pelo
11
Lingüística: ciência da linguagem introduzida no Brasil por Joaquim Mattoso Câmara
Jr.
12
Estruturalismo: método de análise e de estudo que privilegia a pesquisa das
estruturas organizado um domínio. Nas disciplinas contemporâneas, foi inspirando-se
sobretudo no modelo fornecido pela lingüística de F. Saussure que o estruturalismo apareceu
comotodo fecundo. (Durozoi e Roussel, 1993, p. 169)
50
qual os brasileiros usavam a língua, com suas diferenças de ortografia, de
concordância, de sintaxe, de semântica enfim com as diferenças provocadas
por vários fatores entre eles a distância geográfica entre brasileiros e
portugueses. Vale lembrar que a língua é a identidade de uma nação.
Enquanto a Lingüística se expandia pelo Brasil e pelo mundo, os
acordos ortográficos entre a Academia Brasileira de Letras e a Academia de
Ciências de Lisboa aconteciam mais duas vezes. Uma em 1943 e outra em
1945. A passagem de Coutinho a seguir é elucidativa quanto a não chegada
de acordo nesses encontros:
Depois de muita discuso, pronunciou-se o Congresso
Nacional pelo de 1943, que mereceu a sanção do Governo,
seno, por conseguinte, adotado em todo território
brasileiro. Em Portugal, é usado o de 1945. (Coutinho,
1995, p. 80)
No bojo desses acontecimentos estava o Positivismo, conceito criado
por Augusto Comte na segunda metade do século XIX para denominar a sua
filosofia, cuja
Característica é a romantização da ciência, sua devoção
como único guia da vida individual e social do homem,
único conhecimento, única moral, única religião possível.
Como Romantismo em ciência, o Positivismo acompanha e
estimula o nascimento e a afirmação da organizão
cnico-industrial da sociedade moderna e expressa a
exaltação otimista que acompanhou a origem do
industrialismo. (Abbagnano, 2003, p. 776)
Embora fosse uma filosofia do século XIX, no século seguinte, ainda
encontrava-se intensa, tanto que a presença do Positivismo é percebida
inclusive nas canções populares, como é o caso do samba Positivismo de
Noel Rosa e Orestes Barbosa em 1933.
A verdade, meu amor, mora num poço, / É Pilatos, na
Bíblia quem nos diz, / E também faleceu por ter pescoço,
/ O (infeliz) autor da guilhotina de Paris. / Vai, orgulhosa,
querida, / Mas aceita esta lição: / No mbio incerto da
vida, / A libra sempre é o corão, / O amor vem por
princípio, a ordem por base, / O progresso é que deve vir
por fim, / Desprezaste esta lei de Augusto Comte, / E
foste ser feliz longe de mim.(Noel Rosa, Perfil 2003)
51
Este trecho demonstra a presença da filosofia positivista em um meio
cultural popular do Brasil ao retratar a transgressão do fundamento básico
de tal filosofia pela amada do eu poético. A presença do Positivismo ainda é
observada no dístico Ordem e Progresso impresso na bandeira brasileira.
Mas a busca de elementos de identificação da língua com a linguagem
usada pela maioria dos brasileiros não ficou estagnada à ortografia. O
sentimento nacionalista que se instala em grupos de intelectuais e grupos
políticos ideológicos e economicamente dominantes; o anseio pela
democratização da escola; o conseqüente nacionalismo explícito dos autores
modernistas; o enfoque racionalista trazido pelo Positivismo; a divulgação da
visão sobre a língua que traz a Lingüística orientam, posteriormente, os
rumos da língua usada no Brasil. Assim começa a se estruturar a NGB
( Nomenclatura Gramatical Brasileira) oficializada em 1958. Pois existia
uma ortografia própria para o Brasil, portantoera hora de se esboçar uma
nomenclatura apropriada para o uso brasileiro.
Esse rumos são traçados por grandes filólogos como Silveira Bueno,
Serafim Silva Neto, entre outros, com o objetivo de buscar elementos que
estruturassem a língua portuguesa brasileira. O primeiro publica, em 1955, a
obra Tratado de Semântica Geral cujo tema era o sentido das palavras no
português do Brasil. O segundo, também em 1955, publica o livro Introdução
ao Estudo da língua Portuguesa no Brasil, o tema desse, como se observa no
próprio título, são as diferenças entre o português do Brasil e o de Portugal.
Resenhas críticas de tais obras foram produzidas por Edison Nobre
Lacerda, crítico e colaborador do jornal Gazeta do Povo daquele período,
foram divulgadas em jornais e conferências, posteriormente reunidas, junto
com outras análises, em uma coletânea editada também em 1955.
Lacerda deixa claro em sua resenha sobre a obra Tratado de Semântica
Geral que não concorda como muitas das observações feitas por Bueno, mas
reconhece a importância do estudo para aquele momento: “embora não
endossemos todas as afirmações do preclaro Professor, não temos dúvida em
reconhecer o grande valor do Tratado (1955, p. 163). sobre Silva Neto
apresenta-se inteiramente de acordo com a visão exposta no livro ”as
52
peculiaridades do português brasileiro, que se refletem na nossa literatura,
sobretudo a partir dos românticos, o eminente filólogo as vê, como devem ser
vistas, não como ‘erros’, mas como novos processos estilísticos.” (1955, p.
167)
O fato de os estudos dos filólogos estarem sendo editados e merecendo
análises expostas pela imprensa mostra que havia naquela época uma
inquietação em relação à língua no sentido de seu uso e de sua grafia. Além
disso, o número de nomenclaturas usadas era enorme tanto que Antenor
Nascentes, em 1946, publica a obra Léxico de Nomenclatura Gramatical
Brasileira.
A inquietação é tamanha que a Portaria de número 152 de 1957
designa uma comissão constituída pelos Professores Antenor Nascentes
13
,
ndido Jucá Filho
14
, Carlos Henrique da Rocha Lima
15
e Celso Ferreira da
Cunha
16
com o objetivo de uniformizar e simplificar a nomenclatura
gramatical usada para o ensino de língua portuguesa. Assim, em 1958, o
então Ministro da Educação Clóvis Salgado aprova a Nomenclatura
Gramatical Brasileira – NGB usada até hoje. Exemplo disso é a distribuição
dos conteúdos nos livros didáticos que seguem a mesma ordem: fonética,
morfologia e sintaxe.
A comissão se organiza e estrutura a Nomenclatura Gramatical
Brasileira. O resultado do trabalho é passado às os do então ministro
Clóvis Salgado. Junto a ele foram enumerados os motivos que
13
Antenor Nascentes: filólogo e escritor, autor de obras como: Dicionário de dúvidas e
dificuldades do idioma nacional(1943) e xico de nomenclatura gramatical brasileira (1946)
(Nova Enciclopédia de Biografias, p. 892, vl. 04)
14
Cândido Jucá Filho: escritor e professor brasileiro, dedicou-se ao magistério
secunrio. Publicou obras como: Novo Método de Análise da Linguagem. (Nova Enciclopédia
de Biografias, p. 670, vl.03)
15
Carlos Henrique da Rocha Lima: filólogo brasileiro, pertencente a ABL publicou
obras como: Teoria da análise sintática (1963), Gramática Normativa da Língua Portuguesa
(1957). ( Grande Enciclopédia Larousse Cultural, p.3661)
16
Celso Ferreira da Cunha: filólogo, gratico e lingüista brasileiro, autor de livros
como Gramática Moderna de acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira. ( Dicionário
Larousse Cultural, p. 250)
53
desencadearam sua elaboração, conforme é percebido no trecho da carta de
apresentação da Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB) ao Ministro.
Releva salientar que a Comissão, ao considerar as modificações
propostas, teve sempre em mira a recomendação de V.Ex.a
constante da Portaria Ministerial 152- “uma terminologia
simples, adequada e uniforme”- bem como atender ao tríplice
aspecto fixado nas Normas Preliminares de Trabalho:
a) a exatidão científica do termo;
b) a sua vulgarização internacional;
c) a sua tradição na vida escolar brasileira.
É percebido que o “tríplice aspecto relacionado no texto acima traz
implícitas duas preocupações daquele momento histórico. A primeira delas,
explicitada na letra a, é relativa à cientificidade das coisas, característica do
Positivismo que, embora distante temporalmente, ainda influencia a
comissão estruturadora da NGB. A segunda relaciona-se ao nacionalismo
que escancara-se no item seguinte quando usou-se o termo vulgarização. Por
fim esse mesmo nacionalismo é reafirmado no momento em que se enfatiza
seu uso na vida escolar brasileira.
O documento foi oficializado somente em 1959 conforme se observa na
portaria transcrita do prefácio da obra A Nomenclatura Gramatical Brasileira
Definida e Exemplificada de Guérios:
PORTARIA 36, DE 28 DE JANEIRO DE 1959
O Ministro do Estado da Educação e Cultura, tendo em
vista as razões que determinaram a expedição da Portaria
152, de 24 de abril de 1957, e considerando que o trabalho
proposto pela Comiso resultou de minucioso exame das
contribuições apresentadas por filólogos e lingüistas, de todo o
País, ao Anteprojeto de Simplificão e Unificação da
Nomenclatura Gramatical Brasileira, resolve:
Art.1º - Recomendar a adoção da Nomenclatura
Gramatical Brasileira, que segue anexa à presente Portaria, no
ensino programático da Língua Portuguesa e nas atividades que
visem à verificação do aprendizado, nos estabelecimentos de
ensino.
Art.2º - Aconselhar que entre em vigor:
a) para o ensino programático e atividades dele decorrentes, a
partir do início do primeiro período do ano letivo de 1959;
b) para os exames de admissão, adaptação, habilitação, seleção
e do art. 91 a, partir dos que se realizarem em primeira época
para o período letivo de 1960. (Guérios, 1960, prefácio)
54
Presume-se então, a partir da análise do documento acima, que o
ensino com base na Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB) nas salas de
aula torna-se imperativo. Embora apareça o termo recomenda-se, fica
obrigatória a sua utilização no conteúdo programático quando se estipula a
verificação de sua aprendizagem na seleção nos exames de admissão a partir
de 1960.
3.2. A formação do professor de Língua Portuguesa
A necessidade, num país de língua portuguesa, de uma disciplina no
currículo escolar, que tenha por objeto e objetivo o estudo dessa língua, e de
um profissional formado especificamente para encarregar-se do ensino da
mesma é uma necessidade. Contudo em uma perspectiva histórica percebe-
se que nem sempre foi assim. A disciplina de Língua Portuguesa, como é
nominada hoje, passou a existir nos currículos escolares brasileiros nas
últimas décadas do século XIX; antes denominava-se gramática, retórica
como se percebe no
Plano do Real Colégio de Nossa Senhora e São Caetano,
publicado por seu reitor, o prestero João Roo da Silva,
ilustra o funcionamento do ensino de língua materna nas
primeiras décadas do século XIX.(...) O currículo sico previsto
pela escola do padre Roo, estendia-se da gramática à
filosofia, passando pela retórica” (Lajolo & Zilberman, 1998, p.
146).
Antes disso, no período imperial por exemplo, os profissionais que
direcionavam o seu trabalho para a aquisição da escrita da língua materna
eram chamados de mestre de primeiras letras haveria (...) um bom mestre
de primeiras letras, em cuja aula se ensinaria a ler e depois escrever bem e
com acerto a língua nacional” ( Lajolo e Zilberman, 1998, p. 146). O conceito
do que seria língua nacional estava muito ligado ao português falado em
Portugal e o conteúdo da disciplina, consequentemente, voltava-se para os
55
autores portugueses, para o latim e para retórica; é o que se percebe ainda
em Lajolo e Zilberman:
os discípulos serão solidariamente instruídos na gramática
portuguesa por um método particular e fácil, falando-se na
mesma língua com pureza e sem os ordinários defeitos e lendo
para este fim autores puros e eloqüentes: serão da mesma forma
instruídos em aritmética, álgebra, geometria, geografia, história
universal, hisria de Portugal(...) latim, (...) retórica...” (1998, p.
147)
Em 1930 iniciam-se mudanças no sistema escolar brasileiro conforme
Lajolo e Zilberman:
As dificuldades vão se transmitindo de geração em geração, até
1930, ano de mudança política, que traz de volta a idéia de
tratar da instrução através de uma agência específica, o
Ministério de Educação, na ocasião acoplado ao da Saúde. De lá
vieram novas medidas, a vida escolar se organizou, o livro
didático, precisando responder a novas questões, deu outra
forma ao ensino ( 1998, p. 156)
Embora os acontecimentos da década de 30 tenham impulsionado
a educação como um todo, somente em meados de 1940, isso significa
dez anos de existência de locais de estudo de Língua Portuguesa, é que
aparecem concretizadas as primeiras transformações na visão do que seria o
ensino da mesma. A explicação para tamanha resistência é o conhecimento
que então se tinha da língua: gramática, retórica e poética aprendidas de e
em autores latinos e gregos. É possível fazer essa constatação por meio da
cima quarta publicação do livro didático de língua portuguesa “Sei Ler” de
Theodoro de Morais, editado em 1935, ou seja, cinco anos depois da
implementação da nova visão de educação promovida por Vargas. Mesmo
sendo a edição posterior a 1930, o livro traz as mesmas concepções de
conteúdo, ou seja, ainda permanecem a retórica, a poética e a gramática. A
primeira é explicitada quando Theodoro de Morais enfatiza a oralidade.
56
Materializam-se os sons o que pensamos. São eles arautos que se
devem fazer entender. Desandasse o nosso aparelho vocal a
emitir sons desprovidos de sentido e teríamos nele o equivalente
de um ventilador defeituoso, que atirasse ao chão, com a palha, a
polpa nutritiva do espírito a polpa das idéias que devia subir
para o celeiro e lá, assimilando-se, contribuir para a atividade do
cérebro.(1935, p. 313)
Quanto à poética e à gramática, tem-se bem claro o seu uso como
conteúdo de Língua Portuguesa na estrutura do livro que se baseia em textos
de grandes poetas como Antero de Quental, citado pelo autor no poema a
seguir:
Deus e Poesia
Que te diz a natureza,
A despedir-se saudosa,
Findo o dia?
Quando a noite é mais formosa
E o luar tem mais beleza?
- Poesia.
Que te diz esse profundo
Brilhar trêmulo de estrelas
Pelos céus?
E ao vê-las assim tão belas
Em que te fala este mundo?
- Fala em Deus. (Theodoro de Morais, 1935, p.21)
Por outro lado a gramática é observada quando o autor reporta-se a
Sampaio Dória, grande nome da educação brasileira e autor de vários livros
voltados para a educação, entre eles Como se aprende a língua” editado
pela primeira vez em 1922, cujas edições chegaram até 1946.
Posteriormente à primeira edição, Theodoro de Morais diz que a gramática
será melhor trabalhada no livro de Dória: “... como nos ensina Sampaio Dória
no seu livro admirável Como se aprende a língua, teria a oportunidade de ser
útil, facilitando ao pequeno estudante o conhecimento da estrutura e da vida
relacional dos períodos.” (1935, p. 314)
A concepção de que as descrições e as normas apresentadas pela
gramática são o caminho para “falar e escrever corretamente.” ( Suassuna,
1999, p. 25) também justifica o ensino da mesma nas aulas de língua
portuguesa.
57
Antes da década de 30 não havia cursos para a formação de
profissionais na área de ensino da língua materna. Assim, para se alcançar a
exigência social de escrever, pessoas sem formação específica como
autodidatas com formação humanística ministravam as aulas de língua
portuguesa. É o caso de Joaquim Mattoso Câmara Jr. que “formado em
Arquitetura (1927) e em Direito (1932), entrou para o magistério já em 1928,
e a partir de 1937 se dedicou exclusivamente a ele, passando para a área de
língua e lingüística” (Câmara, 2000, p. 03)
A falta de formação de profissionais para a educação, em especial para
o ensino da língua materna, aparece na primeira metade do século XIX,
quando o General Abreu e Lima, interessado nos problemas nacionais,
publica, em 1835, o Bosquejo histórico, político e literário do Brasil, criticando
com agudeza as lacunas culturais do país. (...) refere-se à absoluta
inexistência de qualquer programa de formação de professores”(Lajolo e
Zilberman, 1998, p. 163)
Como não havia uma formação específica, o ensino de língua
portuguesa dependia da concepção dos educadores em relação ao que
deveria ser conteúdo. O mesmo acontecia com a metodologia e com o
material utilizado. Assim, nas primeiras cadas do século XX, coexistiram
duas correntes: uma que se utilizava das gramáticas e outra que fazia uso
das coletâneas de textos como material de apoio em suas aulas. É o que
demonstra Suassuna ao se reportar ao prólogo de Ribeiro na primeira edição
de seu livro em 1890, cujo teor aparece exatamente igual na edição de 1915:
Duas direções diferentes têm dado os escritores ao
estudo da ciência da linguagem: na primeira o sentido
das palavras é tudo, a sua função e o seu valor lógico; a
gratica considerada sob esse aspecto é uma ciência
puramente abstrata, como o é a gica, a que se vincula
intimamente e com que se confunde; na segunda
atentam mais nos elementos mórficos das palavras,
consideram-nas sob seu aspecto material; a gramática
eno se torna uma sorte de anatomia ou histologia:
estudam-se as palavras como compostas de óros,
estudam-se, para nos exprimirmos assim, os tecidos
desses órgãos, os elementos desses tecidos, como
nascem e vivem, como crescem, prolificam e definham,
se encorpam e se apoucam (...) aparecem e morrem.
(1999, p. 26)
58
Assim a primeira direção era focada no sentido da palavra, no seu
valor semântico, para tanto os autores estruturavam suas obras a partir de
textos de autores consagrados ou não, esse é o caso de Theodoro de
Moraes, analisado neste capítulo. De formato simples e uniforme, o livro
apresenta um texto, algumas observações sobre interpretação e em seguida
comentários sobre elementos da língua normatizados pela gramática. A
segunda direção sobre a qual Ribeiro discorre restringe-se à exposição de
uma gramática normativa, sem explicações pormenorizadas. Exemplo desse
rumo é o próprio Ribeiro, conforme atesta Suassuna: apesar de esse autor
apontar para vantagem de uma articulação (...), observa-se que ele também
privilegia a segunda (1999, p.26).
Sobre esse aspecto, Coutinho discorre:
Os que se formaram em torno dos anos de 60 sabem que os
estudiosos das Letras, os eternos amantes da poesia e da ficção,
vivíamos em uma tensão entre dois pólos intelectuais e morais.
De um lado, a compreeno da obra literária exigia uma leitura
imanente rigorosa que, àquela altura, nos era proporcionada pelo
estruturalismo e pelo retorno aos formalistas russos, que anos e
anos de censura haviam impedido de circular na cultura
ocidental. O outro pólo, de cunho ético e político, era constituído
pela urgência de entender a sociedade brasileira que
habitávamos e que nos habitava, e, se possível, intervir nas suas
estruturas iníquas; para tanto, a teoria mais vigorosa de que se
dispunha vinha do marxismo
17
que então passou a ter
presença efetiva na cultura universitária e, em particular, na
cultura da nossa Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. A
teno entre essas duas exigências foi constitutiva de um certo
tipo de intelectual, que ainda sobrevive.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
40141995000300021
As diferentes óticas, comentadas por Coutinho, voltadas para a Língua
Portuguesa estavam emaranhadas em duas concepções: 1
ª
- a de que o
ensino da língua materna deve privilegiar a forma, a estrutura, portanto a
gramática deveria estar em primeiro plano; 2
ª
- a de que o ensino se
através da interlocução entre emissor e receptor.
Independente de qual direção tomassem, os professores precisavam ter
pleno domínio da língua, pois as explicações e as atividades necessárias ao
17
marxismo: lingüística os signos emergem, decididamente, do processo de
interação entre uma consciência individual e uma outra. ( Volochinov, 1986, p. 35)
59
entendimento do conteúdo precisavam ser formuladas por eles. Ao que tudo
indica, para aqueles que tinham a oportunidade de acesso à escola, os
professores de língua portuguesa alcançavam seus objetivos. É o que
abordam Lajolo e Zilberman através das anotações de uma normalista do
final do século XIX:
Aman tenho de comar a escrever diariamente carta ou
redação da Escola e copiar o exercício dos ornamentos da
meria. Nós da Escola poderemos sair sem saber Geometria,
Francês, História e tudo mais; mas sairmos sem saber escrever
uma carta, eu duvido. (...) Também Seu Sebastião depois da aula
fica na porta à espera, e todas temos de ir saindo e entregando
o exercício e a redão. Nenhum tem coragem de afrontar o
professor de Português, porque vemos que ele se esforça o mais
que pode em nosso benefício. (1996, p. 45)
Usar como exemplo as impressões de uma normalista do final do
século XIX para o momento histórico do início do século XX é justificado
também em Lajolo e Zilberman quando afirmam o século XX começava não
muito diferente de seu antecessor: a República não cumprira as promessas
(...) As dificuldades vão se transmitido de geração em geração, até 1930, ano
de mudança política” (1998, p. 156). Se o ocorreram mudanças, significa
que as concepções de ensino também não se alteraram.
A mudança política a qual Lajolo e Zilberman referem-se é o início do
Governo de Getúlio Vargas. Nesse momento o movimento da Escola Nova
expande-se vigorosamente conforme constata Ribeiro:
A comprovão do fato de as chamadas “idéias novas” estarem
se propagando vem da constatação de estarem elas presentes:
(...) 3
º
na criação das Universidades, como a de São Paulo
(1934), com a participação de Fernando de Azevedo, incluindo
uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, e a do Distrito
Federal (1935), com uma composição de escola distinta das
tradicionais, uma vez que se constita de faculdades de
Ciências Naturais, Ciências Sociais, Letras e Educação; ( Ribeiro,
1986, p. 107)
60
Na cada de 1930, portanto, aparecem as primeiras faculdades de
letras. Com a criação dos cursos de Letras tem-se um direcionamento para o
ensino de Língua Portuguesa
18
cujo objeto de estudo foi a Língua e os
objetivos eram: 1) a formação de profissionais para o ensino e a pesquisa na
área de Letras; 2) a elevação do nível do ensino secundário, normal e
superior e, consequentemente, a intelectualidade da sociedade em geral. Os
objetivos, obviamente, não poderiam ser outros, pois a concretização da
faculdade aconteceu na esteira do movimento da Escola Nova, pois essa
idealizava a democratização da educação e, para tanto, precisava de
profissionais que respondessem aos anseios de tais ideais. Isso é explicitado
no trecho do Manifesto de Fernando Azevedo transcrito a seguir:
X. reconstrução do sistema educacional em bases que
possam contribuir para a interpenetração das classes
sociais e formação de uma sociedade humana mais justa e
que tenha por objeto a organizão da escola unificada,
desde o Jardim dá Inncia à Universidade, (1958, p. 59)
Assim, a Faculdade de Letras dividiu-se em dois cursos: o de Letras
Clássicas e Português cuja grade curricular ficou assim definida: filologia
grega e latim; Filologia Portuguesa; Literatura Luso-Brasileira; Literatura
Grega e Literatura Latina. E o de Letras Estrangeiras apresentava-se como as
disciplinas de Língua e Literatura Francesa e Língua e Literatura Italiana.
Assim procederam todas as faculdades de Letras do país. Inclusive a
Universidade Federal do Paraná UFPR aborda o Decreto Lei 1.190/39
19
no qual
se previam quatro novos departamentos: Filosofia, Ciências e Letras (cursos
de Letras Clássicas, Letras Neolatinas e Letras Anglogermânicas)”
(Wachowicz, 1986, p. 189) para esclarecer o contexto histórico da
implantação de seus cursos.
O livro didático também foi atingido pelo movimento da década de
1930, pois aquele período
18
A denominação ensino de língua portuguesa aparece na década de 80, mas durante
todo trabalho usamo-la para facilitar o encaminhamento da redação.
19
http://www.humanas.ufpr.br/adm/historico.htm
61
traz de volta a idéia de tratar da instrução através de uma
agência específica, o Ministério de Educação, na ocasião
acoplado ao da Saúde. (...) De vieram novas medidas, a vida
escolar se organizou, o livro didático, precisando responder a
novas questões, deu outra forma ao ensino. (Lajolo e Zilberman,
1998, p. 156)
As novas medidas, às quais Lajolo e Zilberman fazem referência,
relacionam-se aos objetivos dos participantes do movimento da Escola Nova:
democratizar a educação. É observado nesse período, ainda por Lajolo e
Zilberman, uma certa aversão à figura do professor. Para comprovar as
autoras transcrevem um trecho autobiográfico de José Lins do Rego:
Meu primeiro mestre me ensinava as letras, a princípio
com agrado. Aos poucos foi se aborrecendo e chegou até
a gritar:
- Menino Burro!
apareceu dona Judite, sua mulher, e corrigiu o
nervoso do marido. o havia jeito. As grimas corriam
dos meus olhos e comecei a ter ódio do dr. Figueiredo.
(1998, p. 159)
Vale ressaltar aqui que a visão de José Lins do Rego é ampliada pelo
seu enfoque literário, porém é interessante na medida em que tal fragmento
traz à tona a posição de alguns professores daquele período, não existindo
uma formação específica, não havia como se exigir um comportamento
didático - pedagógico.
Apesar de implantados os cursos de Letras, dez anos foram
necessários para se sentir as primeiras alterações no ensino de Língua
Portuguesa. Isso significa dizer que a imagem descrita por José Lins do Rego
a respeito do professor chega à década de 1940. Uma das contribuições mais
importantes para que transformações ocorressem foi a de Joaquim Mattoso
Câmara Junior, o grande pioneiro, no Brasil, da lingüística descritiva “estudo
do mecanismo pelo qual uma dada língua funciona, num determinado
momento, como meio de comunicação entre seus falantes” (Câmara Jr.,
1999, p. 11)
20
.
20
Camara JR. ministrou o primeiro curso de lingüística do Brasil, na Universidade do
Distrito Federal (1938 e 1939) e depois na Universidade do Brasil, a partir de 1948, foi
62
Nos anos de 1940, Joaquim Mattoso Câmara Jr. publicou o primeiro
compêndio de linística da língua portuguesa e marcou o estabelecimento
de uma bibliografia básica da disciplina no país. Além disso, sistematizou a
língua falada no Brasil são os primeiros passos, depois dos acordo
ortográfico de 1931, para se pensar em uma estrutura de língua diferente, ou
ao menos não homônima à de Portugal. Vale lembrar que nessa época todo
estudo lingüístico sobre a língua portuguesa orientava-se pelo português
lusitano. Assim instaurou-se o estruturalismo, através dos estudos de Mattoso
Câmara, no Brasil.
O nacionalismo subjacente aos movimentos históricos junto à nova
visão a respeito da língua trazida pela lingüística delineiam novas
perspectivas para o ensino de Língua Portuguesa. O objeto de ensino a
língua - , aos poucos, perde a característica de mercadoria importada e passa
a ser vista como produto nacional, produto social, como devem ser todas as
línguas.
A reestruturação da Escola Secundária (hoje Ensino Médio) de abril de
1931 também trazia os ideais do nacionalismo e da democratização da
escola conforme se observa no esboço de um programa educacional extraído
do Manifesto de Fernando de Azevedo e transcrito por Ribeiro:
I. Estabelecimento de um sistema completo, com uma
estrutura
orgânica, conforme as necessidades brasileiras, as novas
diretrizes econômicas e sociais da civilização atual.
II. organização da escola secundária (12 a 18 anos) em tipo
flexível de nítida finalidade social, com escola para o povo, não
preposta a preservar e a transmitir as culturas clássicas, mas
destinada, pela sua estrutura democrática, a ser acessível e
proporcionar as mesmas oportunidades para todos, tendo, sobre
a base de uma cultura geral comum (3 anos), as seções de
especialização para as atividades de preferência intelectual
(humanidades e ciências) ou de preferência manual e mecânica
(cursos de caráter técnico) (1986, p. 102)
professor regente de Linística na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil.
63
Observa-se no item I a referência ao nacionalismo quando aparece a
expressão necessidades brasileiras”, no item II a democratização da
escola é percebida em todo o discurso, mas evidencia-se ao mencionar que
a escola devia “ser acessível e proporcionar as mesmas oportunidades para
todos”.
Caminhava-se para o período de 1937 a 1955 denominado por Ribeiro
como “Modelo Nacional Desenvolvimentista com Base na Industrialização
(1986, p. 05), nesse modelo acontece o crescimento cada vez mais
acelerado de forças econômico-sociais “ (Ribeiro, 1986, p. 119) Tal
dinamismo atingiu a Educação que se estruturou para suportar a demanda do
novo veio financeiro: a indústria , que exigiu racionalismo para o
desempenho das funções mais elementares. Esse contexto justifica o caráter
técnico que foi atribuído à escola secundária. Aliás, o racionalismo que
transparece nesse momento foi, entre outras causas, reflexo do Positivismo
que chegou ao Brasil nas malas de brasileiros vindos da Europa nos meados
de 1850 e que se estendeu no tempo com o auxílio das concepções militares.
A Educação passa a ser vista como um instrumento de divulgação da
ideologia do Estado Novo. Para tanto o Estado precisava manter uma
vigilância sobre ela. Assim, a reforma de 1931, segundo Cunha, “ representou
maior controle do poder central sobre o ensino secundário (1986, p. 293).
Não apenas o ensino secundário sofreu o controle do governo mas também o
ensino superior, pois “a escolha de reitores, diretores e até mesmo dos
membros do conselho técnico administrativo de cada instituto por
cooptação faria o poder do Estado penetrar até as primeiras instâncias da
organização do ensino” (Cunha 1986, p. 298)
Embora controladora, a Reforma Francisco Campos, ocorrida em 1931,
preocupou-se bastante com o ensino secundário, sendo o mesmo subdivido
em dois ciclos: "um fundamental , de cinco anos de duração, e outro
complementar, de dois anos, visando à preparação para o ingresso no ensino
superior " (Romanelli, 2005, p. 246).
A preocupação com a preparação dos futuros discentes do ensino
superior é nítida, conforme demonstra Cunha ao explicar a fala de
Capanema: no Brasil, haveria cursos ‘adequados’ aos vestibulares das três
64
faculdades principais: medicina, engenharia e direito, prevendo-se a
existência de outro para faculdade vindoura de educação, ciências e letras
(1986, p. 292). Percebe-se que o ensino das Letras não vinha em primeiro
plano, mesmo porque tal ensino em nível superior estava engatinhando. Mas
o interessante é que mesmo não existindo, ou estando no início a faculdade
de Letras, havia preocupação com o ensino de línguas pois,
O currículo do novo ensino secunrio trouxe uma novidade ao
ensino de línguas. O francês era, tradicionalmente, a língua viva
mais importante para os estudantes do ensino superior e,
consequentemente, do secundário. O currículo de 1931,
entretanto, fez a língua francesa presente apenas no curso
fundamental, incluindo a inglesa e a ale(esta facultativa) no
currículo do curso complementar
21
(1986 p. 292)
Além disso, no campo do ensino profissional houve alguma alteração a
ser considerada: foram criados dois tipos, um mantido pelo sistema oficial e
outro, paralelo, mantido pelas empresas. Assim, surgem o SENAI (Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial) e o SENAC (Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial). Com isso, ainda em 1942, o Decreto lei 4.481
dispõe sobre a obrigatoriedade das indústrias a matricularem 8% de seus
funcionários nas escolas do SENAI. Nota-se claramente a preocupação com a
qualificação da mão de obra, e, consequentemente, com a educação.
Vale lembrar que no cenário mundial acontecia a Segunda Guerra, e o
Brasil não tinha como fugir das conseqüências desse acontecimento de
dimensões únicas. A marinha alemã em represália à chegada da marinha
americana no Nordeste, afunda navios brasileiros. Assim “em 21 agosto de
1942, o governo brasileiro declarou guerra ao Eixo (Cunha, 2004, p. 324).
Eixo foi a denominação dada à aliança política e militar entre Alemanha -
Berlim , Roma Itália e Tóquio Japão. Isso, aparentemente, fez com que o
Brasil se aproximasse dos Estados Unidos que se instalaram no Nordeste
brasileiro depois da destruição da base militar de Pearl Harbor.
O nacionalismo manteve-se durante a existência do Estado Novo (entre
1937 e 1945). Getúlio Vargas evidencia o nacionalismo através da
continuidade da estruturação do Estado, iniciada em 30, orientando-se cada
21
Curso complementar era o curso que preparava os estudantes para o vestibular.
65
vez mais para a intervenção estatal na economia e para o nacionalismo
econômico. Foram criados nesse período o Conselho Nacional do Petróleo
(CNP), o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), a
Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a Fábrica Nacional de Motores
(FNM), entre outros.
A Reforma Capanema, em 1942, estruturou o ensino industrial,
reformou o ensino comercial e trouxe mudanças no ensino secundário. Sua
culminância foi as Leis Orgânicas de 1946. Em 1948 inicia-se a caminhada
para a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1961. O pano de fundo desta é
revestido de divergências em torno da descentralização ou não do ensino que
tornam-se mais veementes após a apresentação, pelo deputado Carlos
Lacerda, de um substitutivo, cujo teor versava sobre a liberdade de ensino,
passando este a estimular a iniciativa privada.
Ainda sobre a iniciativa privada, deve-se lembrar que as idéias
nacionalistas - reavivadas pela Primeira Guerra Mundial - e o conseqüente
digo do Ensino de 1917, não desapareceram e, conforme o artigo 180 da
reforma em questão “é obrigatório, em todas as instituições particulares do
curso primário ou secundário, nacionais ou estrangeiras, o ensino da Língua
Portuguesa” (Wachowicz, 2002, p. 40). Existindo a intenção de se utilizar da
educação como meio de imprimir sua ideologia no cidadão que ali se
formava, o ensino da língua materna era aquele que mais concorria infundir
tal ideologia nos discentes e, por conseqüência, na nação.
Não foi apenas no âmbito educacional que o populismo getulista
aconteceu, ele foi sentido em todas as áreas, e a trabalhista certamente é a
mais lembrada, Neste sentido, em 1943 ocorre a consolidação das Leis
Trabalhistas, que exigem a implantação de creches nas empresas para os
filhos de funcionários.
Concomitante a esses fatos históricos, aconteceu, a partir da década
de trinta, a institucionalização das universidades que, gradativamente,
aumentou o número de matrículas no ensino superior culminando com as
organizações estudantis, fortalecidas nos anos cinqüenta e início dos anos
sessenta. A importância delas é vista nos movimentos alavancados pela UNE
66
(União Nacional dos Estudantes) inclusive no período inicial de Ditadura
Militar na década de sessenta.
O período pós-guerra apresenta-se com a política educacional
populista de outrora. E, para efetivar a práxis de tal política, são
transformadas em estatais instituições de ensino privado para atender as
parcelas carentes da sociedade. Nesse contexto estavam a maioria das
universidades federalizadas existentes hoje no país, entre elas a
Universidade Federal do Paraná. Vale ressaltar que a estatização do ensino
superior agradou a professores e a alunos. Os primeiros por garantirem a
estabilidade, os segundos por não precisarem mais pagar por seus cursos.
Diante disso desenvolveu-se uma estratégia (subsidiada por diretrizes
doutrinárias introdutórias do ensino religioso nas escolas públicas) para
minimizar a influência do Estado sobre o ensino superior. Em decorrência
surgem as faculdades católicas no Rio de Janeiro em 1941, que, cinco anos
depois, transformam-se em Universidade Católica do Rio de Janeiro, sendo a
primeira universidade privada do país.
Na cada de 50 surgiu a televisão como força avassaladora,
monopolizando o tempo e a mente das crianças e dos jovens, afastando-os
progressivamente do hábito da leitura. Suassuna afirma que os meios de
comunicação em massa , em especial a televisão “leva a admitir a perda da
hegemonia da linguagem escrita, embora esta tenha se constituído,
efetivamente, no primeiro meio de comunicação de massa”(1999, p. 39).
Como se percebe, a compreensão e, poderíamos dizer, o lugar do ensino da
Língua começa a perder, digamos, certa importância na década de setenta,
pois a disciplina de Língua Portuguesa passa a ser entendida no âmbito mais
abrangente da Comunicação e Expressão, tanto para séries iniciais como
para as intermediárias do Ensino de Primeiro Grau. Nesse momento vários
autores se apropriam do nome da disciplina e utilizam-no em suas obras, é o
caso de Maria de Lourdes Ramos Krieger que, através da Editora Lunardelli
Brochura, publica seu livro Comunicação e Expressão através do Conto e
Crônica em 1976, direcionado ao ensino de 6
ª
rie.
A televisão foi resultado do avanço tecnológico que aconteceu na
esteira do Positivismo que, aliás, não margeou apenas a tecnologia, a política
67
também foi visada. Exemplo disso foi a vitória de Juscelino Kubitschek nos
meados dos anos 50 cuja promessa maior era fazer o Brasil progredir
cinqüenta anos em cinco, atacando o problema das estradas, da energia, dos
transportes e a construção de Brasília” (Ribeiro, 1986, p. 139) Esse impulso
na economia fez com que os horizontes se ampliassem, pois em relação à
Educação “houve um aumento percentual das despesas realizadas pela União
de quase 4,0%” (Ribeiro, 1986, p. 139) e, ainda, aconteceu a diversificação
das atividades econômicas criando novos empregos em quantidade e
qualidade, aumentando assim as possibilidades de acesso à escola, pois a
demanda de mão – de obra qualificada cresce. Conforme Ribeiro, o sistema
de ensino estruturou-se da seguinte forma:
Quanto à estrutura de ensino, manteve as etapas: ensino
primário de pelo menos 4 anos, ensino ginasial de 4 anos
com as subdivisões de secundário, comercial, industrial,
agrícola e normal, ensino colegial de 3 anos, subdividido
em secundário, comercial, industrial, agrícola e normal, e o
ensino superior. (Ribiero 1986. P. 153)
As possibilidades de acesso à escola exigiram a reformulação das
funções e dos objetivos dessa instituição. Assim em 1961 teve-se “a idéia de
que a educação deveria ser considerada como comunicação a serviço da
transformação do mundo (Ribeiro, 1986, p. 156) Mas até se chegar a 1961,
mudanças aconteceram. Uma delas foi relativa ao ensino de Língua
Portuguesa.
Como foi observado anteriormente, os professores da língua
materna estruturavam suas aulas a partir de dois tipos de livros didáticos:
aqueles que priorizavam a gramática e aqueles que se detinham à produção
e compreensão textual. Além disso aconteciam os embates entre filólogos
brasileiros e portugueses na busca de alternativas para a distância entre as
ortografias distintas de uma mesma língua. Como também já foi mencionado,
essa discussão foi encerrada em 1943 com o acordo ortográfico entre Brasil e
Portugal. Aliás vale lembrar que aconteceu um último acordo em 2004.
Independente das prioridades estipuladas pelos autores dos livros didáticos, a
necessidade de se organizar o ensino da língua materna foi inevitável. Com
68
um mero maior de alunos nas salas de aula, era imprescindível a
unificação do ensino para atender a uma clientela cada vez mais crescente.
Assim, estruturou-se em 1958 a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB).
69
4 OS EFEITOS DA NOMENCLATURA GRAMATICAL BRASILEIRA
NAS CONCEPÇÕES DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E NA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES.
A Nomenclatura Gramatical Brasileira marcou o ensino de Língua
Portuguesa. Para explicar tal fato, discorrer-se-á sobre a mesma em quatro
momentos: 1
º
- as causas de sua estruturação; 2
º
- os livros didáticos de
Língua Portuguesa que a antecederam; 3
º
- os livros didáticos de Língua
Portuguesa posteriores a ela; e finalmente o 4
º
- a formação dos professores
no período em que a NGB foi concebida.
4.1 As causas da estruturação da Nomenclatura Gramatical Brasileira
– NGB
Apoia-se em Saviani, quando ele discorre sobre o período de 1930 a
1970, para sintetizar a História da Educação Brasileira até então analisada,
Entre 1930 e 1960 caracterizou-se pelo predomínio da
concepção humanista com progressivo avanço da versão
moderna em detrimento da versão tradicional. No período
posterior a 1960 a concepção humanista começa a ceder
lugar à tendência tecnicista (concepção analítica) que vai
se tornar nitidamente predominante especialmente a
partir de 1969. (Filosofia da Educação Brasileira, 1983, p.
19)
Uma das justificativas para a mudança apontada por Saviani foi o
contexto de 1950 até o golpe de 64, quando Brasil viveu um período de
verdadeira euforia política e econômica, pois nesse espaço de tempo está
incluído o governo democrático de Juscelino Kubitschek (1956 -1961), que
"empreendeu uma política econômica industrial e desenvolvimentista,
levando à nação um Plano de Metas que propunha fazer o Brasil progredir 50
anos em 5” ( Ribeiro 1986, p. 139). Esse pode ser um bom exemplo daquilo
70
que poderíamos denominar de indícios preliminares de características do
Tecnicismo, tendência que viria a ser instituída, posteriormente, nos anos 70
do século XX, também no campo da educação revelando uma concepção
educativa fortemente vinculada às teorias sistêmicas.
O Tecnicismo calca-se em uma racionalidade técnica que é substrato
da eficiência, da eficácia e produtividade de qualquer sistema, entre eles o
educacional escolar. Com elementos advindos do Funcionalismo
22
, o
tecnicismo foi e contínua sendo um modo de entender a educação
principalmente a partir do uso dos meios de ensino como imprescindíveis
para garantir a qualidade e, consequentemente eficiência da aprendizagem
escolar .
Um bom exemplo de Tecnicismo é a Gramática Normativa. Não que esta
seja derivada daquele, pois, muito antes do Tecnicismo a Gramática
Normativa existia. Apenas deve-se ressaltar que nela encontram-se,
nitidamente, elementos do funcionalismo como: objetividade, funcionalidade
e eficiência. Exemplos disso são observados no índice que dividido em
capítulos organizam a distribuição dos conteúdos, tornando a busca pelos
mesmos funcional, nos capítulos que comumente apresentam-se
estruturados em explicação, exemplificação e exercios. É o caso do livro
didático “Curso de Gramática Aplicada aos Textos” de Ulisses de Infante que
está dividida em fonologia, morfologia e sintaxe. Todas as unidades trazem a
mesma organização: dividem-se em capítulos e esses seguem um único
esquema: texto, usado como pretexto para o estudo dos elementos
gramaticais, análise desse texto e os elementos constituintes da gramática
normativa elencados na Nomenclatura Gramatical Brasileira conforme se
observa no fragmento a seguir:
Capítulo 27. Sintaxe do período simples (I) Termos essenciais
da orão Fome (João Rui de Souza), 420. Lendo o texto, 421.
Introdão, 421. Os termos essenciais, 422. Sujeito, 4223.
Predicado, 423. Atividades, 425. Tipos de sujeito, 426. Sujeito
22
Funcionalismo : teoria, adotada sobretudo em etnologia, segundo a qual o sentido
de um fato cultural pode aparecer quando examinam suas relações funcionais com o
conjunto dos outros fatos sociais. (Durozoi e Roussel, 1993, p. 204)
71
determinado, 426. Sujeito indeterminado, 426. Oração sem
sujeito, 427. Atividades (Infante, surio)
Essa estrutura prima pela funcionalidade, pois basta procurar no índice
aquilo que se precisa e, imediatamente, localiza-se o desejado. A objetividade
é percebida na precisão de conceitos como Predicado é aquilo que se
declara do sujeito”(Infante, 2004, p. 423). Assim, se é funcional e objetivo
torna-se eficiente, pois atinge o objetivo a que se propõe: “apresentar os
conteúdos da disciplina gramatical de forma a que ela possa constituir um
poderoso instrumento na utilização diária da palavra falada e escrita”
(Infante, 2004, p. 3).
É interessante ressaltar que, embora essa pesquisa abranja o contexto
histórico até a década de 1960, a gramática normativa usada no período de
ouro do Tecnicismo no Brasil, a década de 70, é resultado do contexto
histórico contemporâneo ao governo de Juscelino Kubitschek, mais
precisamente em 1958, quando surge a atual Nomenclatura da Gramática
Brasileira, organizada com princípios do nacionalismo e do funcionalismo e,
ainda, das descobertas da Lingüística
Os movimentos nacionalistas em prol de uma língua portuguesa
brasileira, comentados anteriormente, aparecem desde a fase literária do
Romantismo. Cabe aqui recorrer a Machado de Assis, que, além do Realismo,
também integrou o Romantismo, quando comenta sobre a importância da
gramática: “Uma boa gramática é um alto serviço a uma língua e a um país.
Se essa língua é a nossa, e o País é este em que vivemos, o serviço cresce”
(Assis, apud, Tôrres, p. prefácio).
Esse mesmo nacionalismo coexiste com o crescimento industrial
impulsionado nos anos de 1920 mais ou menos e que adquire seu apogeu
nos anos de 1970. Vale mencionar que nesse espaço de tempo evidenciaram-
se duas concepções de nacionalismo. Uma embasada na visão militar que
almejava o civismo e outra com vistas ao desenvolvimento econômico. Essa
fomentada nos anos trinta e quarenta no governo de Getúlio Vargas. Aquela
relativo às décadas de 1960 e 1970, durante o Regime Militar. Independente
das concepções do nacionalismo, o ensino de Língua Portuguesa foi utilizado
como base para que ele fosse difundido.
72
O crescimento industrial cria a necessidade de mão de obra qualificada.
Segundo Romanelli, onde, pois, se desenvolvem relações capitalistas,
nasce a necessidade da leitura e da escrita, como pré-requisito de uma
melhor condição para concorrência no mercado de trabalho” (2005, p. 59).
Assim, a democratização da escola passa a traduzir uma espécie de
luta de classes, pois a demanda de alunos aumenta, mas a de escolas não.
Sobre isso Romanelli expõe:
Essa luta assumiu no terreno educacional características assaz
contraditórias, uma vez que o sistema escolar, cada vez mais
crescente e cada vez mais exigente, em matéria de
democratização do ensino, e , de outro lado, o controle das
elites mantidas no poder, que buscavam, por todos os meios
disponíveis, conter a pressão popular, pela distribuição limitada
de escolas (2005, p. 61)
De qualquer forma, o resultado foi um número maior de alunos nas
salas de aula e, portanto uma nova postura dos professores durante suas
aulas. Um dos problemas enfrentados era a diversidade de termos para os
elementos gramaticais, pois cada gramático de renome batizava os termos
de acordo com a sua subjetividade. Esse problema seria sanado com a
Nomenclatura Gramatical Brasileira NGB, estruturada em 1958 por uma
comissão formada por notáveis da época, dentre os quais estavam Antenor
Nascentes e Celso Cunha; estabeleceu uma divisão esquemática dos
conteúdos gramaticais, unificando e fixando, para uso escolar, a
nomenclatura a ser usada pelos professores. Devido a grande repercussão,
em 1959, ainda no governo de JK, uma portaria recomendou sua adoção em
todo o território nacional.
Embora com problemas referentes às nomenclaturas, os livros didáticos
norteados pela concepção de que o ensino da gramática, base para o
aprendizado da língua, eram muito respeitados. Além deles também haviam
os simpatizantes das coletâneas literárias
23
, defensores do ensino da língua
baseados na concepção de que o texto é o norte para o bom aprendizado da
língua materna.
23
Exemplo de obra simpatizante das coletâneas é “Sei Ler” de Theodor de Moraes.
73
O segundo ascendente da Nomenclatura Gramatical Brasileira fazia
parte do contexto histórico brasileiro desde os meados do século XIX, quando
as ciências são exaltadas. O Funcionalismo imprime sua marca na NGB
quando ela estrutura-se de forma objetiva e racional a partir de um esquema
que determina a seguinte fragmentação: Fonética, morfologia e sintaxe”
(Infante, 2005, p. 22), mas essa fragmentação está interligada, as partes
formam um todo.
A Lingüística também corrobora para o aparecimento da Nomenclatura
Gramatical Brasileira. Segundo Câmara Jr, ao abordar em sua obra os
problemas levantados pela então nova ciência, comenta sobre as variações
linísticas:
Um dos percalços mais sérios com que se tem
defrontado a gramática descritiva, desde a Antigüidade
Clássica, é o fato da enorme variabilidade da língua no
seu uso num momento dado. Ela varia no espaço,
criando no seu território o conceito dos dialetos
regionais. (1999, p. 17)
Ora, se é fato a variação da língua no espaço, a diferença entre o
português do Brasil e o de Portugal fica documentado e assim pode ser
diferenciado através de uma nomenclatura própria.
A esse respeito reporta-se a resenha de Lacerda, publicada na
Gazeta do Povo em 1955, cujo tema era o livro "Introdução ao Estudo da
Língua Portuguesa no Brasil" de Serafim Silva Neto. Lacerda faz o seguinte
comentário sobre a obra:
As peculiaridades do português brasileiro, que se refletem
na nossa literatura, sobretudo a partir dos românticos, o
eminente filólogo as vê, como devem ser vistas, não como
‘erros’, mas como novos processos estilísticos. (1955, p.
167)
Dentro do âmbito da lingüística ainda, pode-se ter como exemplo a
caminhada de Saussure nos primeiros momentos de seus estudos que
culminaram com a obra póstuma Curso de Lingüística Geral de 1916. A
primeira providência de Saussure foi “pôr ordem nos estudos lingüísticos”
74
(Carvalho, 2003, p.26). O motivo dessa providência também é explicado por
Carvalho: os lingüistas até então tratavam de coisas diferentes com nomes
iguais e vice-versa” (Carvalho, 2003, p. 26). Assim como na lingüística,
havia, na nomenclatura gramatical da língua portuguesa usada no Brasil,
uma infinidade de denominações e de conceitos para uma única classe
gramatical. Portanto a providência de Saussure é a mesma dos gramáticos
que estruturaram a Nomenclatura Gramatical Brasileira conciliar as
nomenclaturas.
Ainda encontra-se em Saussure justificativas para se estruturar uma
língua em torno de uma gramática normativa, pois língua
o se confunde com linguagem; é somente uma parte
determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo
tempo, um produto social da faculdade de linguagem é um
conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social
para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos.
(Saussere, 2004, p. 16)
Se a língua é um conjunto de convenções, o mais coerente é que se estruture
tais convenções na forma de uma gramática normativa.
Como se percebe a Nomenclatura Gramatical Brasileira é conseqüência
de um contexto histórico estruturado no movimento cujas bases estão
assentadas, principalmente, no funcionalismo nacionalista que encontra na
linística justificativa para impulsionar o ideário de nacionalização da língua.
4.2 – Os livros didáticos antes da Nomenclatura Gramatical Brasileira
Faz-se necessário neste instante abrir espaço para a análise do livro
didático, pois o livro escolar, ao fazer parte da cultura escolar, não integra
essa cultura arbitrariamente. É organizado, veiculado e utilizado com uma
intencionalidade, que é portador de uma dimensão da cultura social mais
ampla” (Corrêa, 2000, p. 19)
75
Como foi discorrido no capítulo anterior, a dualidade da educação
não se restringia aos paradigmas ou sistemas adotados mas também, no
caso do ensino de Língua Portuguesa o dualismo apareceu inclusive nos livros
didáticos. Assim têm-se duas correntes: os livros estruturados a partir da
concepção de que o ensino deveria ser através da gramática como sempre
havia sido desde os gregos, e outro que via o ensino de Língua Portuguesa
estruturado a partir do uso de textos.
Sendo assim, para se obter um perfil dos livros norteados pelo ensino
da gramática analisar-se-ão: a cima quarta edição de "Sei Ler", de
Theodoro de Moraes, publicado em 1935, destinado à terceira série do
chamado ensino ginasial; a obra de Valter Wey, "Língua Portuguesa" de 1953
, indicado para a segunda série do colegial; o livro "Português Colegial de
Antônio Sales Campos", publicado em 1955 e direcionado para alunos do
curso colegial em geral e ainda a quinta e a sétima edição de "Português
Ginasial" de R.F. Mansur Guérios, de 1952 e 1956 respectivamente,
direcionados às quatro séries ginasiais; também de Guérios a obra "Português
para o Concurso de Habilitação à Faculdade de Medicina, Escola de
Engenharia, etc.", da Universidade do Paraná, editado em 1958, o que seria
equivalente ao terceiro ano do ensino dio hoje. Todos anteriores à
Nomenclatura Gramatical Brasileira.
24
Antes da Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), os autores,
seguidores do modelo cuja linha mestra era a gramática, para facilitar o uso
do material relacionavam, em ordem alfabética, os elementos constituintes
da gramática, exemplo disso é o índice alfabético encontrado (anexo 01)
no início do livro "Português Ginasial" de R.F. Mansur Guérios, pois o se
dividia a gramática dentro do esquema: fonética, morfologia, sintaxe.
Percebe-se isso ao confrontarem-se os livros didáticos de Theodoro de
Moraes
25
e de Mansur Guérios, ambos abordam a tonicidade em um
24
Sem a pretensão de alterar ou causar algum dano à obra, apenas com a intenção
de facilitar a compreensão dos trechos, todos os recortes feitos para a exemplificação de
afirmações estão adaptadas à ortografia contemporânea.
25
Theodoro de Moraes foi escritor de obras voltadas para a metodologia da leitura,
todas publicadas pela Companhia Editora Nacional.
76
determinado momento de suas obras. Segundo Moraes As palavras
esdrúxulas são aquelas que pronunciamos erguendo o tom, a altura da voz,
quando dizemos a antepenúltima sílaba: pálido,zio, mero (1935, p. 41).
Guérios afirma “Se a sílaba nica for a antepenúltima sílaba, dir-se-á que
o vocábulo é proparoxítono (ou esdrúxulo): médico, pérfido, sílaba, etc.
(1952, p. 231)
Como se observa em Guérios encontram-se duas denominações para
as proparoxítonas, mostrando o caos de terminologias vivido nos anos
anteriores à NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira) de 1958, pois ele usa
os termos esdrúxula e proparoxítona na ânsia de contemplar todos os nomes
usados para um único processo de acento prosódico .
A obra "Português Ginasial" de Guérios tanto na edição de 1956 como
na de 1952 aborda os vocábulos o, a, os, as da seguinte forma:
Os articulares ou artigos o, a, os, as podem ser pronomes
demonstrativos: Disse-o (= Disse isso). Não sabes o que
dizes. (= Não sabes isso que dizes). Refiro-me ao livro do
professor e ao (livro) do aluno. Dei-lhe a minha pena e a de
Paulo. Dei-lhe os meus livros e os que pertenciam a Paulo.
(1952, p. 32 / 1956, p. 42)
O fato de não haver distinção clara entre as classes gramaticais faz
com que o autor atribua aos vocábulos o, a, os, as capacidade de serem, ao
mesmo tempo, artigos e pronomes demonstrativos tanto que exemplifica tal
capacidade em um único momento sem fazer diferenciação entre uma classe
e outra. Para perceber que os pronomes são exemplificados nas três
primeiras orações e os artigos nas três últimas o interlocutor deve ter um
bom domínio da morfologia da Língua Portuguesa, isso demonstra a
inexistência de preocupação com o aspecto metodológico da exposição dos
conteúdos aos receptores da obra. Ainda sobre a abrangência dos conceitos
dados às classes gramaticais, não se pode deixar de mencionar que os
artigos em questão são explanados dentro de um único capítulo que engloba
os adjetivos e os pronomes sem dar nenhuma explicação a respeito.
77
Ao analisar a obra "Português para o concurso de habilitação à
Faculdade de Medicina, Escola de Engenharia, etc.", da Universidade do
Paraná também de R.F.Mansur Guérios, percebe-se a oscilação das
nomenclaturas dentro de obras distintas, embora de um mesmo autor. Pois
Guérios, ao abordar o conteúdo orações coordenadas, nomina aquelas que
não possuem conjunção como “coordenada assindética ou justaposta” (1958,
p. 18). Quando explica as orações sindéticas também dois nomes para as
“aditivas ou aproximativas” (1958, p. 18). Contudo, na obra "Português
Ginasial" de 1956, Guérios explica as orações coordenadas da seguinte
forma: A oração que tiver conjunção coordenativa clara, será chamada
oração coordenada sindética, se não tiver conjunção, mas vírgula ou ponto-e-
vírgula, será chamada oração coordenada assindética.” (1956, p. 73)
À medida que as edições aproximam-se de 1958, ano da estruturação
da Nomenclatura Gramatical Brasileira, os livros didáticos voltados ao ensino
da gramática normativa demonstram uma maior preocupação de unificação
de denominações, assim apresentam vários nomes para um único termo.
Nesses livros a preocupação com os elementos da gramática normativa
eram primários (no sentido se estarem em primeiro plano). Assim, o havia
relação com textos, o que existia era um apanhado de frases soltas que
serviam de base para a explicação da função, da classe, ou da formação da
palavra. Como se observa na transcrição da explanação de Guérios sobre os
adjetivos: O adjetivo é colocado antes ou depois do substantivo (...) Mulher
bela” (1952, p. 33). Nenhum comentário além desse é feito. Dessa forma,
para se entender a explicação de Guérios o interlocutor deveria ter o
conhecimento do conceito de substantivo e de adjetivo. Percebe-se aqui uma
relação com o Estruturalismo, pois tem-se, nesse caso, a relação entre o
substantivo mulher e adjetivo bela. É essa relação que permite a língua
operar, portanto não haveria a necessidade de maiores explicações sobre as
classes gramaticais. Essa concepção é chamada de Gramática Sincrônica
26
que segundo Câmara “é o mecanismo pelo qual uma dada língua funciona,
26
Gramática Sincrônica: uma das divisões da lingüística feita por Saussere, a outra
denominou-se Diacrônica. Essa analisa a língua através da história, aquela através da
estrutura (mara, 1999, p. 13)
78
num dado momento(...) como meio de comunicação entre os seus falantes, e
na análise da estrutura, ou configuração formal” (1999, p. 11). Aliás é
interessante mencionar que Guérios tinha como “livros de cabeceira:
Dauzat
27
, Meillet
28
, Saussure (...), cada qual a arrastar após si novos
lineamentos lingüísticos, tudo a ensejar um levantamento acadêmico (Arns,
1979, p. 12). Isso não significa dizer que na década de 1950 Guérios fosse
discípulo de Saussure, mas seguia a gramática tradicional com certeza, pois
“desde Fernão de Oliveira e João de Barros
29
no século XVI, vêm se
multiplicando as gramáticas, pautadas no modelo greco-latino, intituladas
quer sincrônica, quer expositivas (Câmara, 1999, p. 11).
A relação gramática texto começou a ser exposta em 1951 quando
são publicadas portarias norteadoras de programas que visavam uma
metodologia baseada no ensino da língua materna através do texto. Guérios
em sua obra Portugs Ginasial, na edição de 1952, justifica a desobediência
a tais portarias: “já andava bem adiantada a composição desta gramática,
quando o ‘Diário Oficial’ da União publicou a portarias no. 966, de 2-10-51,
com os novos programas. Em conseqüência, não foi possível proceder à
reforma” (1952, prefácio). Em seguida Guérios argumenta “Se bem que a
vigência dos mesmos se verifiquem gradativamente, a começar da série,
em 1952” (1952, prefácio). A confiança no trabalho do professor era tão
consistente que o autor transcreve os novos programas constantes na
referida portaria pois “contando com a inteligência e a boa vontade dos
colegas, no sentido de acomodar os pontos entre as séries ou locupletar os
vazios que se verificam neste volume” (Guérios, 1952, prefácio)
Na transcrição da portaria 966 de outubro de 1952 feita por Guérios,
observa-se a leitura e a interpretação de textos em todas as séries, pois
desde a primeira até a quarta série o programa começa com o seguinte
conteúdo: “1. a) Leitura e interpretação de excertos breves e fáceis de
27
Dauzat: lingüista francês
http://test.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
01882001000200003&lng=es&nrm=iso
28
Meillet: lingüista francês
http://test.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
01882001000200003&lng=es&nrm=is
29
Fernão de Oliveira e João de Barros inauguram gramatização do português no
culo XVI.
79
prosadores e poetas brasileiros dos dois últimos séculos.” (Guérios, 1952,
prefácio). Isso significa que a concepção de ensino da Língua Portuguesa
abraça o contexto como referencial, com isso não haveria de se partir de uma
parte, neste caso de uma palavra, mas do todo o texto. A concepção
encontrada aqui margeava os ideais nacionalistas de formação da cultura
nacional ao explicitar a autoria brasileira dos textos. Aliás, três anos mais
tarde, tais ideais davam base para o Instituto de Estudos Brasileiros ISEB
conforme discorrido na página 28.
Pelas observações feitas a respeito das portarias chega-se à conclusão
de que a próxima edição do livro traria as alterações necessárias para o
cumprimento de tais publicações no Diário Oficial, mas a preocupação de
alguns autores, como Guérios, em relação ao ensino da gramática era tão
acentuado que a obra Português Ginasial aparece reeditada em 1956 sem
nenhuma alteração na estruturação dos conteúdos que novamente são
apresentados seguindo o seguinte esquema: conteúdo
explicação do conteúdo exercícios de fixação. Exemplo disso é a primeira
lição das edições de 1952 e 1956 da obra em questão, das quais
transcrevem-se algumas partes a seguir:
Lição 1
ª
- DA FRASE
Todos falam por meio de palavras combinadas e em
ordem. Ninguém dirá ou escreverá – Lição a estuda Pedro – mas,
sim – Pedro estuda a lição. É a isto que se chama frase (...)
Uma oração pode exprimir:
Afirmão: Pedro estuda a lição.
(...) QUESTIORIO:
1) Que é frase? 2) Como se chama a frase de sentido
completo?
3) Para que servem as reticências? (1952, p. 15 e 16; 1956, p.
17)
Não nenhum texto para ser lido, interpretado ou analisado. As
evidências de que se deve priorizar o texto, conforme a portaria de 1952,
aparecem apenas na introdução da obra em um item destinado às
instruções metodológicas conforme seguem: “Nas duas primeiras séries do
Curso Ginasial, o ensino de gramática será acentuadamente prático,
ministrado à medida que os fatos ocorrem, sempre baseado na leitura de
textos interpretados com a possível minúcia.” (1956, prefácio). O discurso
80
evidencia uma metodologia não contempladora da pseudo linearidade do
conteúdo gramatical: fonética, morfologia, sintaxe, pois ele deve ser
trabalhado segundo as palavras de Guérios de acordo com ao
acontecimentos dos fatos.
No parágrafo seguinte o autor retoma o discurso do ensino através da
gramática e se contrapõe ao próprio discurso quando elenca alguns
conteúdos “Recomendam-se pequenos exercícios orais e escritos, sobretudo
os referentes às flexões, às regras de concordância e regência e ao emprego
das formas mais freqüentes.” (1956, prefácio)
Com cuidado para não reforçar a contradição, o autor retoma logo a
prioridade da leitura e da interpretação do texto discorrendo desta forma:
A análise sintática será feita com razvel sobriedade; convém
evitar os excessos de nomenclaturas, os pormenores, os
subentendidos, as construções que, embora usuais e corretas,
o estão sujeitas aos rigores da lógica. Não se perca de vista
que o objetivo da análise é orientar o estudante na inteligência
dos textos e na corrão dos erros que ele comete. Excelente
processo de raciocínio, deve ela, entretanto, intervir com
oportunidade, sem prejuízo do ensino prático e literário da
língua. (1956, prefácio)
Mas, imediatamente, exalta a nomenclatura gramatical ao dizer que
não como se trabalhar a língua sem primeiro fazer a análise sintática:
“São mais apropriados à análise xica os períodos analisados
sintaticamente. Como é óbvio, não se pode, muitas vezes, sentir a categoria
de uma palavra sem o conhecimento prévio de sua função na frase. (1956,
p. prefácio)
Guérios traz intrínseca sua concepção de ensino da língua materna,
por mais que busque enquadra-se nos novos programas impostos pelas
portarias de 1951, não consegue desvencilhar-se da idéia de que a
gramática é fonte do bem falar e do bem escrever, entranhada em muitos
autores como bem comenta mara Jr. ao explicar o objetivo de análise
estrutural da gramática:
tinha em princípio esse objetivo a gramática tradicional,
elaborada a partir da Antigüidade Clássica para a língua grega e
em seguida a latina. Em português, desde Fernão de Oliveira e
81
João de Barros no século XVI, vêm se multiplicando as
gramáticas, pautadas pelo modelo greco-latino, intituladas quer
descritivas, quer expositivas. Ora, mais propriamente
normativas, se limitam a apresentar uma norma de
comportamento lingüístico, de acordo com a sempre repetida
definição – arte de falar e escrever corretamente- (1999, p. 11)
Suassuna, ao expor suas análises sobre livros didáticos de língua
portuguesa, intertextualiza com Câmara Jr. “a gramática é um instrumento
do bem falar e escrever” (Suassuna, 1999, p. 26).
Câmara Jr. deixa claro que as questões sobre a gramática não são
recentes. Em Suassuna tem-se a reafirmação de que tais questões são
antigas ao explicitar as primeiras concepções sobre gramática já “No período
helenístico, a gramática grega recebe grande impulso. (...) O estudo do Certo
e do Errado, na Grécia antiga, foi bastante desenvolvido (1999, p.21).
Obviamente o certo estava contemplado nas gramáticas e o errado exposto
nos falares dos menos intelectualizados. Com uma tradição tão antiga, não é
de surpreender a posição de defensor do ensino da gramática abraçada por
Guérios.
O nacionalismo presente naquele contexto histórico, em que a obra de
Guérios está inserida, contribui para a construção de uma gramática da
língua portuguesa usada no Brasil como foi demonstrado no capítulo
anterior. Aliado à visão de que gramática é sinônimo do bem falar e
escrever boa parte dos autores de livros didáticos e professores, reafirma a
concepção de ensino da língua materna dos gramaticistas como Guérios.
Além disso endossa o nacionalismo, pois regulamentar a gramática seria
construir bases a partir do uso correto da língua para construir uma nação
civilizada. Falar correto e bem é ser civilizado, portanto educado.
Esse nacionalismo positivista abordado anteriormente, corrobora com a
fragmentação da língua quando estudada sob o ponto de vista da gramática,
pois segundo Antero de Quental o que importava era resolver, decompor,
classificar e explicar o mundo dos fatos e das idéias” (Quental, apud Nicola,
1999, p. 178).
82
Antero de Quental foi um poeta do Realismo / Naturalismo Português,
sua fala acima transcrita está em um de seus discursos na Questão Coimbrã
30
em 1865. Embora longe da época de Grios, tal correlação é justificada
pela introdução do Positivismo que se justamente no Realismo /
Naturalismo, fase literária contemporânea da filosofia comteana. Isso não
significa que a normatização da língua não acontecia antes do Positivismo,
este apenas reforça a idéia de cientificidade daquela, pois a resolução, a
decomposição, a explicação da forma padrão é a base da gramática
normativa .
Ainda sobre a cientificidade , recorre-se a Câmara Jr. quando este se
refere aos novos olhares lançados pelos lingüistas sobre a gramática :
“procuram ascender a um plano que bem se pode chamar científico em seus
propósitos, pois procuram explicar a organização e o funcionamento das
formas linísticas com objetividade e espírito de análise.” (1999, p. 11)
As concepções de Câmara Jr são contemporâneas ao surgimento da
NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira), pois, embora sua obra em
questão seja de 1969, no prólogo da mesma, intitulado Advertência, o autor,
ao explicar os princípios norteadores da obra, relata que o assunto não me
tomou (...) de surpresa, pois tem sido abordado por mim em cursos aqui e no
estrangeiro, além de tratado, de 1956 a 1968, no exercício do cargo de
professor titular de português na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade Católica de Petrópolis.” Torna-se claro e necessário comentar
sobre a temporalidade coexistente entre NGB e Câmara Jr. quando é
relembrado que o último contribuiu muito na área de língua portuguesa no
Brasil e, portanto, a cientificidade atribuída por ele à gramática é relevante
para o entendimento de que a mesma era assunto inquietante que tinha
nuances do Positivismo como pano de fundo.
A preocupação com a gramática fica evidente em outra obra de Câmara
Jr., Manual de expressão oral e escrita, quando o autor discorre sobre o caos
linístico que aconteceria se não existisse uma normatização para a língua:
30
Questão Coimbrã: embate entre os conservadores Românticos, e os vanguardistas
Realistas/ Naturalistas.
83
Seria penoso que diante dessa precariedade da norma linística cada
um de nós tivesse, a cada momento, de achar soluções por si. A
gramática normativa, que se define como a arte de escrever e falar
corretamente, poupa-nos esse esforço, apresentando uma espécie de
código de leis, que estudamos para obedecer (1981, p. 91)
Em 1935, foi publicada a décima quarta edição do livro de Theodoro de
Moraes. Provavelmente, o primeiro exemplar seja de 1921, se for entendido
que ocorreu uma edição por ano. Outra evidência de que a obra pertence aos
anos vinte é o texto equivalente ao hoje chamado manual do professor ou
assessoria pedagógica, com data de janeiro de 1925.
A análise mostrou que, ao contrário das obras de Guérios, não havia
nenhuma preocupação com portarias ou decretos, pois, em momento algum,
faz alusão àquelas e a estes. O motivo mais provável de tal despreocupação
está no fato de a obra ser direcionada especialmente à leitura, e isso
desemboca na concepção de que o ensino da língua está diretamente ligado
a interpretação e análise textual. Também a escola, embora existissem
movimentos para reverter o quadro, não era para todos, pois em “1920,
65% da população de 15 anos e mais era analfabeta ( Ribeiro, 1986, p. 78).
A ausência de atitudes para a reversão do quadro é comentada por Ribeiro
quando se reporta aos Anuários Estatísticos, cuja primeira publicação
aconteceu em 1916, mas não teve continuidade: “a ausência deles indica um
certo desinteresse, uma não-prioridade em relação à organização escolar
com objetivo de atender à população em sua totalidade.”(1986, p. 80)
Assim o livro não precisava ser prático, pois o professor teria tempo
para estruturar e atender as necessidades dos alunos em sala de aula.
Mas a prioridade da leitura não exime o aprendizado das regras
gramaticais tidas como aquelas do bem falar e do bem escrever. Muito pelo
contrário essas sempre aparecem trabalhadas de forma paralela, isto é, as
regras estabelecidas pelo falar formal se apresentam, na maioria das vezes
indiretamente, como se observa no exercício a seguir extraído do livro em
questão:
Um cavalo pode ser veloz, manso, dócil, branco, etc., isto é
pode ter várias qualidades. Podemos imaginar cada uma delas
separadas do cavalo que as possui, podemos sepa-las
mentalmente. É este um dos poderes da nossa inteligência, e
84
tem por nome abstração. Um substantivo que serve para indicar
uma qualidade assim separada do seu possuidor, é o que
chamamos um substantivo abstrato. O melhor meio para, de
pronto, agruparmos muitos substantivos abstratos é
escolhermos o adjetivo correspondente para ponto de partida.
Experimentemos:
Adjetivo substantivo
cil ?
Justo ?
Injusto ? (Moraes, 1935, p. 161)
O exercio acima está relacionado a um texto, aliás todo o livro
procede as atividades a partir de um texto. Sendo assim, pode-se observar
que a gramática aparece em função de uma necessidade de conhecimento
surgido a partir de uma leitura. As nomenclaturas são explicadas no próprio
exercício, quando o autor explicita o conceito de substantivo abstrato,
imediatamente relaciona a palavras que apareceram no texto da aula (ver
anexo 1). O enunciado da questão utiliza a função fática
31
da linguagem, isso
mostra a preocupação do autor no quesito interlocução, pois busca
elementos para se aproximar do leitor, transformando um simples enunciado
em uma conversa informal e, assim, conduzindo o receptor através do
discurso.
Vale lembrar que nesse período não havia uma padronização da
nomenclatura gramatical brasileira, logo os autores de livros didáticos não se
preocupavam em transmitir nomenclaturas, mas sim em explicar o
funcionamento dos elementos constitutivos da língua. É o que mostra o livro
de Theodoro de Morais em várias passagens e, em especial, quando aborda a
transitividade verbal:
I) Comparemos os verbos destas duas sentenças:
A menina COLHEU flores.
A menina DORMIU.
Na 1
ª
sentença, o verbo colheu traz-nos à lembrança
duas idéias: o colhedor e a coisa que foi colhida. O colhedor foi
a menina; a coisa que foi colhida foram as flores. Quer isto dizer
que a ação designada pelo verbo colher começou na menina e
acabou nas flores; passou daquela para estas. A menina fez ou
executou a ação de colher. As flores receberam, sofreram a
ação: foram colhidas.
o mesmo não acontece com o verbo da 2
ª
sentença. O
verbo dormiu traz-nos à lembrança uma idéia: a menina que
31
Função fática: centrada no contato, no canal, caracteriza-se pelo uso de certas
expressões, visando estabelecer o contato com o interlocutor. ( Sacconi, 2005, p. 17)
85
dormiu. A ação de dormir comou na dorminhoca e acabou
nela mesma. Não foi além.
O verbo que designa uma ação que passa do que
executa à pessoa ou ao objeto que a recebe, chama-se verbo
transitivo.
O verbo que designa uma ação que não passa daquele
que a executa, chama-se verbo intransitivo.(1935, p. 171)
Percebe-se primeiro a preocupação com a funcionalidade dos termos e
depois com a nomenclatura. Isso fica mais evidente na continuidade da
explicação:
Se o amigo não dormiu, es agora preparando para, topando
com um verbo, saber se ele é transitivo ou intransitivo. Os
transitivos são polidos e delicados. Se lhes perguntamos, eles
respondem... Querem ver? Aqui está esta sentença incompleta:
O menino cortou...
Perguntemos:
- Cortou... o quê?
E o cortou nos dirá, conforme a verdade:
- O menino cortou o dedo.
(...)
Tomemos agora um verbo intransitivo, acostemo-lo com a maior
das amabilidades, e ele faz-se de surdo. Não responde. Querem
ver? Aqui es esta sentença:
A locomotiva apitou.
Perguntemos:
- Apitou o quê?
Nem resposta. (Moraes, 1935 p. 171)
Nota-se que, logo após conceituar os verbos transitivos e intransitivos,
o autor retoma a função fática da língua e demonstra como os verbos
funcionam no contexto da oração. O reforço no uso da função fática é
justificado pela tentativa de tornar o aprendizado mais agradável, aliás isso é
tão claro que observa-se a busca do humor quando o autor questiona se a
explanação não causou sono no receptor.
As características funcionalistas também são observadas na forma
sistematizada do tempo usado em sala de aula. Sobre isso Moraes, quando,
em 1925, expõe as instruções de uso da sua obra primeiro discorrendo sobre
a fase de preparação da aula pelo professor. Vale lembrar que os livros
didáticos não traziam as aula preparadas, diferentemente do encontrado
hoje, o professor devia estruturá-las. Depois fala sobre a fase de realização
86
das atividades em sala de aula pelo professor e pelo aluno. Após tece o
seguinte comentário:
Adotada esta orientação que, aliás, nada tem de nova e é até
tradicional em nossas classes, cada um dos capítulos, assim o
exigem a ordem e a exiguidade do tempo útil de cada lição, deve
tomar dois dias de aula: um para a fase de preparação, outro
para a fase de realização. (1935, p. 315)
Na contramão dos livros didáticos exclusivos de gramática normativa,
como os de Guérios, encontra-se a obra de Valter Wey que apresenta uma
coletânea de textos cuja função é subsidiar o programa escolar conforme o
próprio autor esclarece no prefácio do livro:
1 – a) Leitura, interpretação, análise literária, comentário
gramatical e filológico de textos de autores brasileiros e
portugueses, a partir do século XVI. b) Exercícios orais:
impressões de leituras feitas fora da aula; exposição de maria
do programa. C) Composição escrita: dissertação sobre temas
sociais e assuntos literários: artigos para revista escolar;
pequenos ensaios de crítica. D) Revisão de provas tipográficas.
(1953, prólogo)
A preocupação do autor com leitura, interpretação e análise evidencia-
se imediatamente, pois é o primeiro tópico abordado. Percebe-se ainda que a
gramática é colocada em segundo plano, pois a ela é destinado apenas um
comentário. O esquema descrito do prefácio é seguido literalmente no
corpo da obra, neste tem-se o seguinte caminho: tema
comentário sobre o tema referências bibliográficas do comentário
um ou dois textos de outros autores sobre o mesmo tema exercícios
contempladores das subjetividades dos discentes.
As etapas descritas acima são religiosamente seguidas em todos os
capítulos, mas para exemplificação utilizou-se apenas o primeiro capítulo cujo
tema é Teoria da Literatura. Dele foi analisada sua introdução que fala sobre
as influências a que está sujeita a literatura e sua posição entre as demais
artes, assunto sobre o qual Valter Wey discorre arduamente durante seis
ginas e o embasa com dezesseis autores. Em seguida apresenta dois
87
textos: o primeiro de José Veríssimo, cujo título é: "Que é literatura?"; o
segundo de Fidelino de Figueiredo com o título: "Arte e Realidade". Após os
textos, o autor expõe os seguintes exercios, que, embora longos, se faz
necessária, a seguir, sua citação.
1- Comentar e resumir as idéias expostas por Fidelino de
Figueiredo em Últimas Aventuras, capítulo Noção de
literatura – páginas 208-214.
2- Definições de literatura para discuso:
a) A obra literária é um conjunto de frases escritas ou
faladas, destinadas por imagens de toda espécie, quer
muito vivas e precisas, quer mais vagas e ideais, a
produzir nos leitores ou auditores uma emão especial,
a estética” (Hennequin).
b) Arte literária é a realização do belo literário, segundo os
preceitos da boa invenção, perfeita disposição e
excelente elocução”(apud A.S.Amora).
c) “Não definições que valham em literatura: toda
literatura, e particularmente uma literatura de acento
pessoal, de intenções renovadoras, define-se por suas
obras, esem seus exemplos”(Guilherme de Torre).
3- Trabalho para a classe: “Evolução histórica do conceito de
literatura” (V. bibliografia).
4- Resumir as idéias de Taine e explicar no que elas se
diferenciam essencialmente da teoria de B. Croce.
5- Comente como Silvio Romero se serviu da teoria de Taine
para aplicá-la na suaHistória dá Literatura Brasileira”.
6- Discutir as idéias de José Veríssimo sobre literatura,
principalmente as que estão no texto da antologia. (1953, p.
22)
Nota-se em Valter Wey uma preocupação com as relações que seus
interlocutores devem fazer, pois no primeiro exercícios ele pede que seja
feita uma resenha de um texto que aborda conceitos de literatura, cujo autor
é utilizado por Wey com um excerto sobre arte e realidade. Com esse
exercício Wey faz com que seus receptores interajam com o fragmento
citado em seu livro e com uma idéia mais densa sobre o mesmo tema
expressa na obra de Fidelino Figueiredo.
Mas a caminhada não pára. O passo seguinte é ampliar conceitos
abordados no exercício anterior, para tanto, são expostas concepções de
vários autores sobre literatura. É solicitado, nesse momento, que seja feita
uma discussão sobre tais conceitos. Após, são solicitadas novas leituras
indicadas na bibliografia, assim como novos resumos e análises. A mesma
88
estratégia é seguida nos demais capítulos, assim o autor busca contemplar
seus conteúdos: leitura, interpretação, análise literária. Em momento algum
os exercícios abordaram a gramática, confirmando que esta fica em segundo
plano na obra de Wey.
As concepções positivistas aparecem na obra de Wey imbutidas no
método para a aquisição do conhecimento. O passo a passo utilizado aparece
de forma gradual como uma experiência.
Na mesma linha de Wey, encontra-se a terceira edição, datada de
1955, da obra Português Colegial de Antônio Sales Campos
32
. Em ambos
existe uma cronologia de conteúdos, pois o primeiro autor, por direcionar sua
obra para a segunda série do Curso Colegial, aborda os aspectos da literatura
portuguesa, Sales Campos trabalha aspectos da literatura brasileira, pois
sua obra está estruturada para a terceira série do colegial.
Embora seguissem a mesma linha, Sales Campos não foi conivente na
metodologia de exposição dos conteúdos. Enquanto Wey preocupou-se em
explicar, exemplificar e induzir à prática do conteúdo abordado, o Campos
apenas expôs e exemplificou. A prática através de exercícios não acontece na
obra de Antônio Sales Campos, mas, assim como seu contemporâneo, faz
uma coletânea de textos para leitura, compreensão e análise subentendendo
que era tarefa do professor estruturar os exercícios necessários ao
entendimento do conteúdo trabalhado.
O ensino de língua portuguesa, quando analisado através dos livros
didáticos anteriores à NGB ( Nomenclatura Gramatical Brasileira), acontecia
de duas formas. A tradicional, assim denominada na carta de apresentação
da Nomenclatura Gramatical Brasileira ao Ministro Clóvis Salgado, que
primava pelo ensino a partir da compreensão da gramática normativa, e
aquela que visava o ensino a partir da compreensão, interpretação e
produção de textos literários conforme se percebe na obra "Sei Ler" de
Theodoro de Morais.
Independente do caminho seguido, havia algo em comum nos livros
didático anteriores à NGB: o fato de que o professor que os usasse como
32
Antônio S. Campos foi prof. de Literatura do Col. Univers., livre-docente de Lit. Bras.
da F. de Filos., Ciên. e Letras da Univ. de S. P., diretor da Inst. Púb. do Cea, Prof. dos Col. Rio
Branco e Roosevell em S. Paulo.
89
material de apoio em classe deveria ter pleno domínio do conteúdo a ser
trabalhado, pois nem os livros que privilegiavam o ensino de gramática, nem
aqueles que priorizavam os textos traziam as aulas preparadas. Assim, o
professor precisava, quisesse ou não, estruturar seus planos de aula.
4.2.1 – Guérios: autor e educador.
O Professor Rosário Farani Mansur Guérios fez parte da história de
vida daqueles que foram parte imprescindível deste trabalho: os docentes
que gentilmente concederam as entrevistas analisadas no capítulo 4, item 4;
será objeto de uma breve apreciação neste momento.
Curitibano, nascido em 10 de setembro de 1897, Rosário Farani
Mansur Guérios, filho de pai árabe e de mãe italiana, sempre conviveu com
idiomas diferentes da sua língua materna. Desde cedo interessou-se pelos
estudos da lingüística e pelo aprendizado de várias idiomas. Estudou no
ginásio Bom Jesus e formou-se em Direito pela Universidade Federal do
Paraná em 1934.
Leciona Português no Colégio Estadual Regente Feijó, em
Ponta Grossa, no Colégio Estadual do Parapor quatorze
anos e na Escola Técnica de Curitiba durante duas
cadas. Professor Catedrático titular de Língua
Portuguesa do Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes
da Universidade do Para, professor contratado de
Filologia Românica na então Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras e assistente de Lingüística no Museu
Paranaense. (Vargas, 2001, p.247)
Realmente, pelo extenso currículo do Professor Guérios, depreende-se
que certamente muitas das influências daí decorrentes fizeram parte e que
compuseram a vida acadêmica de um grande grupo de estudantes, pois,
além de todas as funções mencionadas, ainda manteve “durante muitos
90
anos na Voz do Paraná e na Gazeta do Povo a seção Divagações Linísticas,
de consulta obrigatória a estudantes e professores” (Vargas, 2001, p. 247).
Seus conhecimentos romperam a fronteira do estado e chegaram à Academia
Brasileira de Filologia. Como se isso ainda não bastasse, foi delegado
permanente do Brasil junto ao Comitê Internacional de Ciências Onomásticas
com sede na Bélgica. Mas sua ascensão internacional não pára aqui, pois “R.
F. Mansur Guérios se torna referência científica do International Journal of
American Linistics “ (Arns, 1979, p. 13)
Seu interesse por idiomas o leva a pesquisar línguas indígenas que
rendem duas obras: "Estudos Sobre a Língua Caingangue" (1942) e "Estudos
Sobre a Língua Camacã" (1945). Antes disso, em 1932, quando tinha apenas
25 anos publica "Novos Rumos da Tupinologia", obra que surpreende
estudiosos da época.
O Professor Mansur Guérios era um apaixonado por idiomas,
tanto que
aos 14 anos, aponta ‘O lyrico”, seu jornal, em que inicia as
primeiras perquirições na ordem vernácula, aliás, depois
de aos oito anos, ter vasculhado, com curiosidade e
penetração, problemas do porq do h, em hervilha e
outros termos de questão, segundo sua linguagem de
menino. (Arns, 1979, p. 11)
Além dos idiomas, Guérios também abraçou a docência na área de
Humanas pois
a filosofia e a sociologia eram o suporte necessário e
imperativo, inarredável e inegociável de sua posição
universitária, sem o que nenhum arcabouço permitiria sua
erão. Fundamentavam-se um pensamento e uma
mentalidade universitária, paranaense, na área das
Ciências Humanas, particularmente. (Arns, 1979, p. 12)
91
Em entrevista à Gazeta do Povo, publicada em 06/10/2002 na página
03, Priscila Gante de Moraes, neta do Professor Guérios, descreve um pouco
da personalidade do ilustre filólogo:
Ele era um homem rigoroso, mas quem o conhecia
gostava dele. o se cansava de dividir com os outros o
conhecimento acumulado durante os anos. Além das
aulas, dedicava parte do seu tempo para atender os
alunos. (Gazeta do Povo, 2002, p. 03)
Desta forma caminhou o Professor Dr. Rosário Farani Mansur Guérios,
contribuindo com a formação da intelectualidade paranaense até sua morte
em 31 de agosto de 1987.
4.3 Os livros didáticos depois da Nomenclatura Gramatical
Brasileira (NGB)
A NGB passa a ser imprescindível para o ensino de Língua Portuguesa,
portanto os livros didáticos voltados a ela aparecem de maneira vertiginosa.
Para oficializar a importância atribuída a NGB tem respaldo na portaria
número 36, de 28 de janeiro de 1959 que determina:
Art. 1
º
- Recomendar a adoção da Nomenclatura
Gramatical Brasileira , (...) no ensino da Língua Portuguesa
e nas atividades que visem à verificação do aprendizado,
nos estabelecimentos de ensino.
Art. 2
º
- Aconselhar que entre em vigor:
a) para o ensino progratico e atividades dele
decorrentes, a partir do início do primeiro período do
ano letivo de 1959;
b) para os exames de admissão, adaptação, habilitação,
seleção (...), a partir dos que se realizarem em
primeira época para o período letivo de 1960. (Portaria
036/59)
92
Para se entender o momento pós Nomenclatura Gramatical Brasileira,
livros didáticos imediatamente posteriores a ela foram analisados. São eles:
Moderna Gramática Expositiva de Artur de Almeida Tôrres destinada aos
alunos do ensino secundário ou superior, editado em 1964; Exercícios
Gramaticais e Textos para Corrigir de Luiz P. Victoria de 1961, confeccionada
para o público em geral; A Nomenclatura Gramatical Brasileira Definida e
Exemplificada de R. F. Mansur Guérios de 1960, direcionada para professores
de Língua Portuguesa; Conhecimento Básico de Orlando Mendes de Morais e
João Guimarães de 1965, que não pretendiam direcionar a uma série em
especial, pois como os próprios autores afirmam trata-se de um dicionário de
gramática; Português no Colégio de Raul Moreira Léllis de 1964, destinado
aos alunos de primeiro e segundo anos do colegial e Programa de Admissão
de 1964 cuja parte de língua portuguesa ficou a cargo de Domingos Paschoal
Cegalla estruturados aqueles que pretendiam prestar exame de admissão.
A diversidade de termos existentes nas gramáticas escolares não
atendia mais às necessidades da sociedade que caminhava para uma
pretensa organização racional e técnica, agregado a isso, tem-se o ideário da
Escola Nova que visava proporcionar condições de educação escolar a todos
sem distinção de estrato social. As conseqüências foram, como já comentado
no capítulo 2, item 2, um aumento de alunos e falta de estrutura física para
atender a nova demanda. Com um número maior de alunos, com a busca da
racionalidade e da técnica, o material didático usado nas aulas precisava ser
revisto. Além disso, os professores sentiam-se inseguros e questionados a
respeito das várias denominações para um mesmo termo. Sobre isso
encontra-se no prefácio da primeira edição de 1959, da Moderna Gramática
Expositiva de Artur de Almeida Tôrres
33
, ao falar sobre as vantagens da
uniformização da nomenclatura gramatical, a confirmação do desconforto dos
docentes em relação à diversidade de denominações:
33
Artur de Almeida Tôrres foi professor no Col. Dom Pedro II, na Academia Brasileira
de Filologia da Sociedade Brasileira de Romanistas.
93
Seu grande mérito está, pois, em ter acabado com a
multiplicidade de processos e classificações individuais,
resolvendo um importante problema que tanto torturava os
estudantes e concorria para o desprestígio do próprio mestre,
que não raro se via embaraçado diante dos mais variados e
extravagantes critérios.(1959, p. prefácio).
Além de buscar resolver a diversidade de termos, os estruturadores da NGB
se utilizaram de esquemas para tornar a gramática funcional. Pode-se
justificar tal procedimento em função de, naquele momento histórico, o
Estruturalismo de Saussure estar em evidência. Carvalho discorre sobre a
popularidade da obra Cours de linguistique nérale de Saussure :
O surto do movimento estruturalista data, por exemplo, da
cada de 1930- retardado, senão interrompido pelo
desencadear da Segunda Grande Guerra- e, no entanto, as suas
bases teóricas já estavam solidamente fincadas (...) então outros
caminhos iriam surgir , nos quais se poderiam aprofundar os
antigos. Tal o que se deu em 1957, quando Godel publicou as
Sources manuscrites du cours de linguistique générale. (2003, p.
09)
Com número de alunos aumentado pela democratização do acesso à
escola e pela necessidade do mercado de trabalho, pois “havia (...)
diversificação das atividades econômicas criando novos empregos em
quantidade e qualidade” ( Ribeiro, 1986, p. 143); cada vez mais exigia uma
estrutura organizada, uniforme e objetiva, bem aos moldes do Funcionalismo
como se percebe na nota introdutória da editora responsável pela obra
"Moderna Gramática Expositiva" de Artur de Almeida Tôrres quando reporta-
se à objetividade do livro: “...pela perfeição das definições como pelo
cuidadoso estudo das exceções, pela ausência absoluta de prolixidade,
defeito tão comum em obras deste tipo.”(1963, p. introdutória). Não apenas a
editora reflete sinais de racionalidade técnica na organização mas também
Tôrres, autor da obra, no prefácio da primeira edição em 1959, anexo à obra
editada em 1963, ao tecer o comentário abaixo; evidenciam-se
características de racionalidade organizacional ao reportar-se ao progresso
da ciências da linguagem :
94
Posto que ainda se ressinta de algumas ligeiras
imperfeições, o que é compreensível em trabalhos desta
natureza, a nova Nomenclatura tem a vantagem
incontestável de haver simplificado e unificado os métodos
até então adotados entre nós, traçando rumos mais
seguros e consenneos com o progresso da ciência da
linguagem. (1963, p. prefácio)
Vale lembrar que sistematização e racionalidade técnica são
características encontradas no Funcionalismo, pois as partes de um todo,
embora fracionadas, se articulam, fazem transações como demonstra o
fragmento a seguir extraído de Abbagnano:
Para indicar a unidade da fuão, o próprio Dewey
empregou a palavra transação, que servia para ressaltar a
impossibilidade de considerar os elementos de uma
função qualquer como entidades aunomas e
independentes da relação de que participam. (2003, p.
811)
Além disso o nacionalismo promovia uma busca incansável da
identidade brasileira e, naquele momento, para um grupo de intelectuais a
NGB era a consolidação de tal identidade. A mesma nota introdutória da
obra em questão traz a seguinte afirmação:
Esta Nomenclatura, que de certo modo invalida as
gramáticas até então publicadas e abre novas
perspectivas para o ensino e o estudo da gramática
portuguesa, retrata a evolução do idioma e seu estágio
atual de desenvolvimento. É, diríamos, o grito de Ipiranga
do português do Brasil (1963, p. introdutória)
A Nomenclatura Gramatical Brasileira fez as atenções se voltarem
para os livros didáticos que primavam o ensino da língua materna a partir
da gramática. Percebe-se essa evidência ainda na obra de Artur de Almeida
Tôrres, "Moderna Gramática Expositiva", que, conforme informação na contra
capa da décima quinta edição (ver anexo 02), teve oito edições apenas no
ano de 1959, sendo duas (a quarta e a quinta) em um único mês: setembro.
Ainda sobre as edições da obra em questão, salienta-se o fato de que, nos
95
anos subsequentes, aconteceram três edições em 1960, duas em 61, três em
1962 e a 15
ª
edição à qual pertence o exemplar analisado. A busca
desenfreada pela obra, causadora do número elevado de edições em tão
breve espaço de tempo, mostra o grau de importância dado à NGB.
Nessa mesma obra encontra-se na nota explicativa da editora a
seguinte concepção de ensino de língua portuguesa:
Uma gratica do idioma é um dos mais preciosos
instrumentos de trabalho e de cultura. com o estudo
acurado da gratica se alcança o donio do idioma, que
tanto importa ao estudante como ao profissional, pois é
fundamental para se obter rendimento nas leituras e
melhor se saber expressar, por escrito ou verbalmente,
idéias e conhecimentos. (1963, p. introdutória)
R. F. Mansur Guérios, analisado anteriormente através de duas
edições da obra Português Ginasial, aparece no contexto pós NGB ( mais
precisamente em 1960) com o livro "A Nomenclatura Gramatical Brasileira
Definida e Exemplificada". Nela Guérios reafirma sua predileção pelo ensino
da língua materna através da gramática e exalta as qualidades da NGB:
A convite do Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais
da Secretaria da Educação e Cultura e da Casa do
Professor Pririo do Paraná, ministrei aulas em várias
turmas, com o fito de explanar , principalmente aos
colegas, a nova nomenclatura gramatical (...) São óbvias
as vantagens de uma nomenclatura gramatical
simplificada e unificada, tanto para os docentes quanto
mais para os discentes. (1960, p. introdutória)
As concepções de Guérios são encontradas na obra de Luiz A P.
Victoria
34
, Exercícios Gramaticais e Textos para Corrigir, de 1961. A diferença
entre ambos está na exposição dos conteúdos. O último não traz explicações,
apenas o certo e o errado, sob o ponto de vista da NGB. o primeiro busca
justificativas para os fatos gramaticais. Além disso Victoria, na capa do
livro, estampa a seguinte frase : “(Português sem mestre)”. Em outras
34
Luiz A P. Victoria foi professor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade de o Paulo, foi autor de dezenas de livros ligados ao ensino de Línguas.
96
palavras, ele afirma que para se aprender a língua materna basta saber as
formas estipuladas pela gramática normativa. Ainda na capa, consta a
reafirmação de tal concepção: “Destina-se a: estudantes em geral; revisores;
candidatos a todos os concursos oficiais ou privados”.
Na mesma linha, sob a orientação de Victoria, tem-se a obra
Conhecimento Básico Dicionário de Gramática e Noções Básicas de
Gramática , de Orlando Mendes de Moraes
35
e João Guimarães
36
, de 1963.
Nessa encontram-se relacionados em ordem alfabética elementos
constituintes da NGB e da Gramática Histórica conforme exemplo:
ABRANDAMENTO
Na passagem para o português muitas palavras latinas
permutaram uma consoante forte em homornica branda. A
essa transformão chamamos abrandamento ou sonorização.
Damos alguns exemplos:
C em g: cattu – gato;
formica – formiga; ( 1963, p. 09)
A mescla de gramática histórica e gramática normativa é sentida em
toda a obra, pois ao mesmo tempo em que esclarece um fato lingüístico
através do contexto histórico , aparecem explicações puramente normativas
como: “sujeito é o membro da oração do qual se declara alguma coisa”
(1963, p. 141)
No emaranhado de concepções (históricas/normativas), ao se abordar
as noções básicas de gramática, tem-se a seguinte explicação: GRAMÁTICA
NORMATIVA (ou EXPOSITIVA) estabelece as normas para falar e escrever
corretamente. GRAMÁTICA HISTÓRICA explica a origem e a evolução da
língua.” (Moraes & Guimarães, 1963, p. 165)
37
. Portanto a abordagem da
gramática histórica se justifica pela necessidade de se ensinar a gramática
normativa.
35
Orlando Mendes de Morais foi professor da rede pública de São Paulo e autor de
livros voltados para o ensino da gramática.
36
João Guimaes foi prof. da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade de o Paulo e autor.
37
Caixa alta no original.
97
A relevância da gramática toma dimensões cada vez maiores, tanto
que na obra Português no Colégio de Raul Moreira Léllis
38
, na segunda edição,
em 1963, traz no programa do primeiro ano colegial uma ementa repleta de
elementos gramaticais e, já no término, como penúltimo elencado “e) Leitura
e interpretação de poucos textos brevíssimos de autores da época
anteclássica.” (1963, p. 17)
Vale ressaltar que esta obra traz em seu prefácio recortes da Lei no.
4024, de dezembro de 1961, cujo caráter era menos rígido que a anterior,
pois , segundo Romanelli, “a tacharam até de ‘carta de libertação da
educação nacional ‘’’ (2005, p. 179). A justificativa para tal afirmação está no
fato daquela Lei conter princípios da Escola Nova que primavam pela
subjetividade, ou seja, o aluno era visto como um indivíduo com diferenças
que não permitiam que o tratassem de forma massificada embora como
afirma Romanelli
Em 1
º
de julho de 1959, o O Estado de o Paulo e o Diário do
Congresso Nacional publicaram um segundo Manifesto dos
Educadores, uma mais redigido por Fernando Azevedo e
assinado por 189 pessoas, dentre as quais educadores,
intelectuais e estudantes (...) sem abandonar sua linha de
pensamento original, deixava um pouco de lado a preocupão
de afirmar os princípios da Escola Nova. (...)
Em 20 de dezembro de 1961, o projeto era
transformado em lei. ( 2005, p. 179)
Nos recortes da Lei, encontrados na obra de Léllis, destaca-se:
Nas recomendões (...) ao ensino da Língua Portuguesa, consta
que o estudo da linguagem deve ser feito visando,
primordialmente, a proporcionar ao educando adequada
expressão oral e escrita, considerando-se os estudos teóricos de
gramática e de estilística ‘meramente subsidiários’, constituindo
apenas meio para desenvolver no discente a sua capacidade de
expressão (Léllis, 1963, p. 15)
Percebe-se que o ensino dos elementos gramaticais deve servir para o
objetivo maior que é a oralidade e a escrita. Mesmo estando mais à vontade
para estruturar seu livro didático, llis não se desvencilha da concepção de
que o ensino da língua acontece através da gramática, tanto que dedica um
38
Raul Moreira Léllis foi professor dá Faculdade Católica de Filosofia, da Faculdade de
Santa Úrsula e professor no Instituto de Educação de São Paulo.
98
ano inteiro ao estudo de elementos gramaticais sob o ponto de vista
histórico, como se quisesse justificar a sua gramática contemporânea, pois
nenhuma lei é capaz, por si só, de operar transformações profundas, por
mais avançada que seja” (Romanelli, 2005, p. 179)
Ainda sobre a liberdade teorizada, mas não praticada por Léllis, recorre-
se, mais uma vez à Romanelli que, ao discorrer sobre as concepções de
ensino contidas na lei, finaliza dizendo:
Foi, sem dúvida, um progresso em matéria de legislação.
Dissemos em matéria de legislação e dissemos bem,
porque, na prática, as escolas acabaram compondo o seu
currículo de acordo com os recursos materiais e humanos
de que já dispunham. (2005, p. 181)
Se o currículo não mudou em função dos recursos materiais e
humanos, certamente a concepção de ensino de língua portuguesa também
não se alterou, sendo assim Léllis mantém suas convicções e seus conceitos
sobre o ensino de Língua Portuguesa.
No mesmo viés da obra de Léllis encontra-se o livro, muito conhecido
na cada de sessenta, Programa de Admissão que trazia os conteúdos de
Português, Geografia, História do Brasil e Matemática em um único exemplar.
Pode-se dizer que tal estrutura lembra as apostilas usadas, até hoje, pelos
“cursinhos pré vestibular”, pois ambos apresentam a mesma função:
preparar o aluno para uma avaliação que o promoverá ou não para um novo
nível educacional.
No programa de Português do referido livro, o autor Domingos
Paschoal Cegalla
39
elenca como conteúdo elementos da fonética e da
morfologia como ”alfabeto; vogais e consoantes; grupos vocálicos (...)
Conhecimentos das categorias gramaticais (...) Conjugação completa dos
verbos auxiliares e dos regulares” (1964, p. 11). Em momento algum, no
programa, menciona-se algo relativo a texto, seja produção, interpretação ou
análise. Contudo, no corpo da obra, todos os capítulos são iniciados por um
texto. A primeira vista isso denota a concepção de que o ensino da língua
será feito a partir de textos reunidos em uma coletânea como era feito em
39
Domingos Paschoal Cegalla é renomado autor de livros didáticos e de manuais de
gratica.
99
algumas obras anteriores à NGB, mas é um ledo engano. O caráter do texto é
apenas figurativo, não nada além de um breve estudo do vocabulário e,
não regularmente, a solicitação Faça uma breve interpretação oral do trecho
acima” (Cegalla, 1965, p. 16). Imediatamente, após os texto de abertura,
aparecem exercícios mecânicos intermináveis sobre o conteúdo gramatical
abordado como: Classifique os encontros vocálicos (...) Sublinhe os
encontros consonantais” (Cegalla, 1964, p. 27). A concepção de que a
gramática é o conteúdo fundamental para o ensino da língua materna
novamente fica frisada.
Os livros didáticos direcionados ao ensino da gramática normativa que
dividiam espaço antes da NGB com aqueles estruturados a partir de
coletâneas e que primavam pela análise, pela interpretação e pela produção
textual, ganham um espaço quase que exclusivo após a oficialização da
Nomenclatura Gramatical Brasileira. A única diferença destes para aqueles
anteriores à NGB é a tentativa dos autores em associar a gramática
normativa ao texto, buscando assim satisfazer as exigências da Lei 4.024, de
1961 que solicita o texto nos programas de língua portuguesa. Mas a
tentativa parece falha, pois o texto aparece apenas com função decorativa,
não interlocução entre texto e gramática em nenhum momento da obra
de Cegalla. Santos, ao descrever seus primeiros anos como docente comenta:
Ao ingressar no magistério oficial, em 1968, como
professora de Portugs, realizei um trabalho nos moldes
da linha tradicional. Minhas aulas semanais eram
dedicadas ao estudo de textos, ao estudo gramatical (que
ocupava a maior parte do tempo) e à produção de textos
(uma aula semanal)
Nesse trabalho, o ponto de partida para as atividades era
sempre um texto de autor consagrado, proposto pelo livro
didático adotado, utilizado como pretexto para o estudo
das regras gramaticais (1991, p. 10)
A descrição feita por Santos reflete o contexto do professor de língua
portuguesa da década de sessenta, e reforça a análise do obra de Cegalla
quando ressalta o fato de o texto servir apenas como elemento decorativo.
O livro didático de língua portuguesa conforme se constituiu a partir da
Nomenclatura Gramatical Brasileira transformou-se em um manual de
100
gramática, cujo objetivo maior é informar o essencial a respeito dos conceitos
dos elementos constituintes da gramática normativa. Aliás, o conteúdo de
Língua Portuguesa parece restringir-se apenas à nomenclatura dos
elementos, pois não há preocupação com ensino do uso dos termos, mas sim
com o ensino do nome dado aos termos. Exemplo disso é a estrutura
transcrita a seguir: “Termos acessórios da oração são as expressões
secundárias da oração. São três adjunto adnominal, adjunto adverbial e
aposto.”(Guérios, 1960, p. 29) Transcreve-se ainda um conceito clássico das
gramáticas “substantivo é a palavra com que designamos os seres em geral”
(Tôrres, 1964, p. 15)
O aspecto apostilado da obra Programa de Admissão é reforçado mais
tarde pelos princípios de racionalidade presentes no ideário tecnicista, o qual
segundo Saviani consiste em “planejar a educação de modo a dotá-la de uma
organização racional capaz de minimizar as interferências subjetivas que
pudessem pôr em risco sua eficiência”(1985, p.16). Portanto a NGB
(Nomenclatura Gramatical Brasileira), se observada a partir da ótica do
Tecnicismo, equivale a um manual do ensino da Língua Portuguesa. Sendo
um manual, os professores que se utilizavam de tais livros não precisavam se
preocupar com os planos de aula, pois os livros traziam as explicações
necessárias a elas.
As concepções contidas na Nomenclatura Gramatical Brasileira são
resultado do ensino tradicional de Língua Portuguesa, pois, historicamente,
seus articuladores tiveram uma formação tradicional e foram filólogos ligados
a aprendizagem e ao ensino de gramática. Por mais que estivessem em um
contexto no qual apareciam questões relativas ao nacionalismo, à lingüística,
ao Estruturalismo e ao Funcionalismo (vale lembrar que os dois últimos
relacionados ao Positivismo), não poderiam deixar de imprimir suas
concepções pessoais.
101
4.4 A formação do professor de Língua Portuguesa nos anos 50 e 60.
A formação dos docentes de Língua Portuguesa nas décadas de 1950
e 1960 foi reflexo da dualidade existente no contexto histórico e em especial
nas concepções trazidas pela Linística, que, por sua vez, também
apareceram de duas formas: o Estruturalismo de Saussure, já comentado nos
capítulos anteriores, e o Marxismo de Bakhtin
40
. Segundo Bosi:
os que se formaram em torno dos anos de 60 sabem que os
estudiosos das Letras, os eternos amantes da poesia e da ficção,
vivíamos em uma tensão entre dois pólos intelectuais e morais.
De um lado, a compreeno da obra literária exigia uma leitura
imanente rigorosa que, àquela altura, nos era proporcionada pelo
estruturalismo e pelo retorno aos formalistas russos, que anos e
anos de censura haviam impedido de circular na cultura
ocidental. O outro pólo, de cunho ético e político, era constituído
pela urgência de entender a sociedade brasileira que
habitávamos e que nos habitava, e, se possível, intervir nas suas
estruturas iníquas; para tanto, a teoria mais vigorosa de que se
dispunha vinha do marxismo que só então passou a ter presença
efetiva na cultura universitária e, em particular, na cultura da
nossa Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. A tensão entre
essas duas exigências foi constitutiva de um certo tipo de
intelectual, que ainda sobrevive.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
40141995000300021
O Formalismo e o Estruturalismo lingüístico defendiam a concepção de
que o texto estruturava-se através de um sistema e suas relações internas
formavam uma rede significante. o Marxismo
41
voltava-se para uma
análise da sociedade em que as relações básicas de produção,
substancialmente econômicas, determinavam estruturas de classe na medida
em que impunham regimes de exploração, os quais, por sua vez, se
traduziam em relações de dominação.
40
Marxismo de Bakhtin: Filosofia da linguagem na qual “toda enuncião faz parte de
um processo de comunicação ininterrupto, é um elemento do diálogo” (Bakhtin, 1986, p.15)
41
Marxismo: teoria social, econômica e política baseada nas concepções de Kal Marx
(Abbagnano, 2001, p. 673)
102
Para esclarecer melhor as diferenças entre Bakhtin e Saussure, reporta-
se à nota introdutória da obra Marxismo e Filosofia da Linguagem de Bakhtin
com a pseudônimo de V.N. Volochínov, onde encontra-se a seguinte análise:
Bakhtin coloca, em primeiro lugar, a questão dos dados reais da
linística, da natureza real dos fatos da língua. A língua é, como
para Saussere, um fato social, cuja existência se funda nas
necessidades da comunicação. Mas, ao contrário da lingüística
unificante de Saussere e de seus herdeiros, que faz da língua um
objeto abstrato ideal, que se consagra a ela como sistema
sincrônico homogêneo e rejeita suas manifestações (a fala)
individuais, Bakhtin, por sua vez valoriza justamente a fala, a
enunciação, e afirma sua natureza social, o individual: a fala
está indissoluvelmente ligada às condições da comunicação, que,
por sua vez, estão sempre ligadas às estruturas sociais. (Bakhtin,
1986, p. 14)
Em meio ao emaranhado de concepções a respeito do conceito de
língua e de fatos históricos, aconteceu em 1958 a NGB, Nomenclatura
Gramatical Brasileira, que provocou alterações nos livros didáticos de língua
portuguesa. Antes dela, havia dois grupos de autores: um primava pelo
aprendizado da língua materna através de textos, em especial os literários, é
o caso do livro “Sei Ler” de Theodoro de Moraes analisado anteriormente;
outro buscava na estrutura gramatical subsídios para o trabalho em sala de
aula, exemplo desse grupo é a obra de Mansur Guérios tambémanalisada.
Depois da NGB, predominaram os livros que defendiam o ensino da língua
portuguesa através da gramática, tornando assim o livro didático de língua
portuguesa em um manual.
Para se entender os reflexos disso na formação dos professores de
língua portuguesa, foram feitas entrevistas com alguns docentes que
cursavam Letras no período imediatamente anterior e imediatamente
posterior à Nomenclatura Gramatical Brasileira, ou seja, entre 1957 e 1963.
Além desses, tornaram-se necessárias entrevistas com professores que
atuaram naquele período.
As perguntas foram diretas, mas as respostas eram abertas com a
intenção de deixar o entrevistado bem à vontade para responder e, também,
para não direcioná-las. Assim, cada entrevistado expôs suas saudades, suas
103
verdades de acordo com as impressões do momento em que viveu. A
entrevista confeccionada para o grupo daqueles que eram graduandos de
Letras norteou-se a partir das seguintes questões: 1- Como transcorriam
as aulas de Língua Portuguesa? 2- Qual a metodologia usada nas aulas? 3-
Quais conteúdos eram trabalhados? 4- Qual material didático era usado? 5-
Percebeu-se alguma alteração na rotina da aulas quando surgiu a NGB?
O processo usado para a coleta dos dados foi variado, a maioria do
entrevistados respondeu as perguntas via e-mail, alguns pessoalmente e
outros preferiram responder por telefone. as entrevistas com o grupo que
atuou como professor naquele período aconteceu pessoalmente. As
perguntas para esse grupo não diferenciaram das feitas ao outro, foram elas:
1- Quais livros didáticos eram usados nas aulas de Língua Portuguesa? 2-
Quais as estratégias utilizadas nas aulas? 3- Como a gramática era
trabalhada? 4- Quais os reflexos da Nomenclatura Gramatical Brasileira nos
conteúdos de Língua Portuguesa?
Alguns dos entrevistados do grupo daqueles que passaram pelo curso
de Letras no período entre 1957 e 1963, ao responder o item 01, além do
saudosismo normal do bom tempo de faculdade, e, talvez em função desse
saudosismo, fizeram comentários sobre a postura dos alunos frente ao
professor: “aquilo que o professor falava era inquestionável” (depoimento,
anexo 03, p. 05) aqui se percebe a existência da concepção Tradicional, na
qual a escola, segundo Saviani "se organiza como uma agência centrada no
professor, o qual transmite, segundo uma gradação lógica, o acervo cultural
aos alunos" (1994, p. 18). A confirmação de tal concepção acontece com
frases como “era como se a sala de aula fosse uma biblioteca” (depoimento,
anexo 03, p. 05) cujo teor remete à ordem existente nas classe em função da
austeridade exercida pelo professor. Mas esses comentários servem apenas
como ilustração da descontração no momento da entrevista, pois o objetivo
da mesma era buscar subsídios para verificar a formação do professor
naquele período, embora, é claro, tais imagenso estejam fora do contexto,
elas não foram o foco principal. O interessante nas respostas para a questão
01, foi a unanimidade em relação ao número de alunos em classe “minha
turma, quando formou-se, era apenas de seis alunos” (depoimento, anexo 03,
104
p. 08). A quantidade de alunos parece ter norteado as aulas de Língua
Portuguesa, pois “sentávamos em volta do professor porque a sala era muito
espaçosa e discutíamos textos, nomenclaturas, enfim, opinávamos sobre
tudo, mas sempre direcionados pelo professor (depoimento, anexo 03,
p.08), é percebida, no discurso do entrevistado que o professor possibilitava
a interlocução em classe, característica da Escola Nova conforme Saviani:
o professor agiria como estimulador e orientador da
aprendizagem (...) Tal aprendizagem seria uma
decorrência esponnea do ambiente estimulante e da
relação viva que se estabeleceria entre os alunos e entre
estes e o professor. Para tanto, cada professor teria de
trabalhar com pequenos grupos de alunos, sem o que a
relação intrapessoal, essência da atividade educativa,
ficaria dificultada (1994, p. 21).
Além da interlocução, também nota-se que o pequeno número de
alunos contribuía para que a pedagogia escolanovista existisse em classe,
mas a expressão "direcionados pelo professor" retoma a pedagogia
tradicional, pois "na pedagogia tradicional a iniciativa cabia ao professor que
era, ao mesmo tempo, o sujeito do processo, o elemento decisivo e decisório"
(Saviani, 1996, p. 24)
Percebe-se, portanto, que, naquele momento, o professor caminhava
entre duas concepções, pois ele encontrava-se em um período contraditório.
Isso justifica o posicionamento tradicional do docente como dono do saber e
nuances de características da Escola Nova ao possibilitar a individualidade,
mesmo que controlada, o professor demonstrava princípio democrático,
humanista, além de proporcionar reflexão sobre aquilo que era o conteúdo a
ser trabalhado.
As respostas obtidas para a segunda pergunta confirmam as dadas à
questãomero 01, entre elas encontra-se o seguinte texto:
O professor entrava em sala, indicava a página na qual
encontrava-se o item a ser estudado, pedia que
lêssemos, depois tecia comentários e solicitava que
discorrêssemos sobre aquilo que tínhamos lido e ouvido.
Depois solicitava que registrássemos tudo por escrito.
105
Essa era a rotina adotada pela maioria. (Depoimento,
anexo 3, p. 03)
A postura tradicional do professor é verificada nas atitudes autoritárias
e repetitivas, pois " as escolas eram organizadas em forma de classes, cada
uma contando com um professor que expunha as lições que os alunos
seguiam atentamente e aplicava os exercícios que os alunos
deveriam realizar disciplinadamente" (Saviani,1994, p. 18). Mas mesmo
assim promovia o debate e o registro subjetivo das considerações
estruturadas em aula.
Em relação à questão 03 (quais conteúdos eram trabalhados?) , boa
parte reportou-se à leitura, constatando-se, entretanto, que a mesma é
confundida com forma, ainda que a pontuação possa ser considerada como
conteúdo.
era o que mais se fazia, as aulas de português eram
praticamente de leitura. Liamos silenciosamente, em
voz alta, aliás os momentos desta última eram
aterrorizantes, pois eram cobradas: postura, entonão,
pontuão. Não saber ler em público era uma vergonha.
Mas sempre nos solicitavam a análise sintática, os
elementos rificos. (depoimento, anexo 03, p. 03)
Em outro depoimento temos a seguinte afirmação: “gramática não
faltava, mas liamos muito também, fazíamos produção e análise de texto
inclusive” (depoimento, anexo 03, p. 06). Isso significa, segundo a análise dos
depoimentos, que no período pesquisado na formação do professor de Língua
Portuguesa a gramática, embora presente, não é o único conteúdo
trabalhado.
Na quarta questão destinada a buscar elementos sobre os livros
didáticos usados nos cursos de Letras, obtiveram-se respostas como: não
havia nenhum livro específico, na maioria, depois da explicação feita pelo
professor, às vezes usávamos textos contidos nos livros de literatura para
106
analisar os conteúdos de Língua Portuguesa.” (depoimento, anexo 03, p. 04)
Sobre isso Magda Soares
42
, em entrevista à TVE Brasil comenta:
a Antologia Nacional (...), foi um livro usado durante os anos 60
nas aulas de Português, ele era apenas uma antologia, uma
coletânea de textos. Ao lado da Antologia, usava-se uma
gramática, que era uma gramática normativa, sem exercícios,
sem atividades, nada disso.
http://www.tvebrasil.com.br/SALTO/entrevistas/magda_soares.ht
m
Tanto a fala de Magda Soares quanto o depoimento transcritos acima
confirmam a análise da resposta à questão 03: o ensino de gramática e a
análise textual coexistiam, sendo o primeiro em decorrência da última.
O fato de os livros de gramática não apresentarem exercícios poderia
ser um inconveniente, mas o professor daquele período via-se com o dono do
saber, Magda Soares comenta sobre isso quando lhe perguntam sobre o
manual do professor:
Esse manual do professor surge no fim dos anos 60,
início dos anos 70. É uma outra diferença grande. Antes
disso, eu imagino que os professores considerariam
quase que como uma ofensa que lhes fosse oferecido um
manual do professor ao lado do livro do aluno, mas isso
se tornou uma necessidade a partir dos anos 60,
exatamente pelo rebaixamento do ensino.
http://www.tvebrasil.com.br/SALTO/entrevistas/magda_so
ares.htm
A quinta pergunta referia-se especificamente aos reflexos da
Nomenclatura Gramatical Brasileira nas aulas de Língua Portuguesa. A
maioria afirmou não ter sentido alteração profunda no andamento das aulas,
mas os comentários eram intensos: naquela época ouvíamos comentários
referentes à NGB, mas a metodologia, o conteúdo enfim, não houve
alterações. (depoimento, anexo 03, p. 06). Em outro depoimento tem-se a
seguinte resposta: Havia apenas comentários.” (anexo, 3 p. 5). Ainda
apareceram reflexões como: Nas aulas não aconteceram alterações. Mas
lembro que havia muitos comentários. Os professores seguiram seus
42
Magda Soares: Doutora em Educação, Licenciada em Letras e autora de várias
obras sobre educação e leitura.
107
planejamentos, pelo menos era o que se percebia.” (depoimento, anexo 3,
p.8). Embora tenha aparecido o seguinte comentário “Mansur Guérios foi
meu professor, ele escreveu vários livros de gramática, portanto ele
discursava sobre a NGB e a usava em sala.” (depoimento, anexo 3, p. 7) fato
bastante compreensível, pois Guérios foi um dos autores analisados neste
trabalho e nele observou-se a preferência pela gramática normativa, percebe-
se que, ao menos nos primeiros momentos, a Nomenclatura Gramatical
Brasileira não refletiu imediatamente nas aulas de Língua Portuguesa nos
cursos de Letras. Contudo um dos entrevistados fez a seguinte explanação:
“só percebi o sentido da NGB quando, mais tarde, fui lecionar e vi os livros
didáticos quase que na totalidade trabalhando apenas a nomenclatura
gramatical. (depoimento, anexo 03, p. 02)
A formação desses professores seguiu o contexto histórico da época. O
reflexo da educação dualista, com paradigmas divergentes atuando ao
mesmo tempo culminou com concepções bastante heterogêneas, mas com
um ponto em comum: a gramática é importante para o ensino de Língua
Portuguesa, porém não haveria motivo de tê-la como conteúdo se não fosse
com a finalidade da utilização dela no texto. Além disso, outro fator relevante
na construção das concepções e na formação desses docente foi, sem
dúvida, a figura de seus professores ao mesmo tempo rígidos e
comprometidos com a função do magistério.
As entrevistas feitas com aqueles que atuaram como professores no
período em questão iniciaram com a questão de quais livros didáticos eram
usados nas aulas de Língua Portuguesa. Um dos entrevistados citou o livro
“Sei Ler” de Theodoro de Moraes:
Eu usei muito o livro Sei Ler de Theodoro de Moraes, ele
me auxiliava muito. Sempre pedia que os alunos
copiassem da lousa os textos. Assim eu treinava a
ortografia, a pontuão. Os exercícios do livro eram
simples e fáceis de serem entendidos. Era muito bom o
livro. (depoimento, anexo 3, p. 12)
Outros mencionaram Programa de Admissão, cuja parte cabia à
Língua Portuguesa de Domingos Paschoal Cegalla
43
, ambos analisados nesta
43
Ver anexo 3 página 12
108
pesquisa, percebe-se aqui a dualidade do período: Moraes primando pelo
ensino através do texto, e Cegalla baseando-se na gramática.
A respostas às questões sobre as estratégias utilizadas nas aulas
trouxeram à tona a primazia do ensino através dos textos, pois a maioria dos
professores esboçaram a seguinte roteiro: 1
º
- leitura silenciosa e em voz alta
do texto; 2
º
- cópia do texto; 3
º
- análise do texto; 4
º
- produção textual a partir
do texto; 5
º
- entrega do texto para correção; 6
º
- devolução do texto para
reescrita; 7
º
- leitura dos textos em voz alta pelos alunos; 8
º
- explicação oral
do conteúdo gramatical; 9
º
feitura de exercícios de fixação. O depoimento
transcrito a seguir confirma tais passos:
No livro Programa de Admissão, os capítulos eram
abertos por um texto, mas não havia, se não me falha a
meria, exercícios com texto. Por isso eu pedia para
que os alunos lessem silenciosamente ou em voz alta,
pedia para que explicassem o que tinham entendido, às
vezes eu passa um questionário sobre o texto no quadro.
Pedia para que os alunos copiassem o texto, aliás nada
era escrito no livro, tudo deveria ser feito no caderno. Os
alunos produziam textos a partir daquele lido, depois da
correção os reescreviam. De vez em quando pedia a
leitura dos textos. A gratica aparecia em seguida aos
textos e vinha acompanhada de alguns exercícios, assim
eu explicava o conteúdo e pedia que fizessem os
exercícios. (depoimento, anexo 03, p. 10)
Em relação à terceira questão cujo teor recai sobre o trabalho com a
gramática em sala de aula, os entrevistados foram diretos com se observa na
resposta transcrita a seguir: “a gramática era trabalhada de maneira
tradicional, o professor explicava as regras e os alunos faziam os exercícios”
(depoimento, anexo 3, p. 11), ou “a gramática era trabalhada de maneira
tradicional, o professor, no caso eu, explicava as regras e os alunos faziam os
exercícios” (depoimento, anexo 3, p. 13). A objetividade e o teor das
respostas demonstram concepções da Escola Tradicional, cuja escola
funciona como “local de apropriação de conteúdos e confrontação com
modelos e demonstrações.” (Silva, 196, p. 86)
Quanto à questão sobre os reflexos da Nomenclatura Gramatical
Brasileira nos conteúdos de Língua Portuguesa, os entrevistados foram
unânimes: “Eu estava no contexto da NGB, lembro que ela passou a ser
solicitada nos concursos. Foi bastante inquietante, pois a mudança dos
109
nomes dos termos fez com que surgissem vários livros. Tivemos que ir atrás
deles.”(depoimento, anexo 3, p. 11). Sobre a avalanche de livros um dos
entrevistados fez o seguinte comentário:
no como da década de sessenta, lembro que circulava
um livro do Mansur Guérios, que era professor da
Universidade Federal do Para, sobre a Nomenclatura
Gramatical Brasileira. Alguns anos depois, fui ministrar
aulas no curso colegial e conheci o livro porque os
conhecimentos da gramática normativa eram pré-
requisito nos exames de admissão. (depoimento, anexo
13, p. )
Percebe-se nos depoimentos que a Nomenclatura Gramatical Brasileira
não teve grande repercussão no primeiro ano de sua existência, mas nos
decorrentes foi tomando corpo e acaba delimitando o conteúdo de Língua
Portuguesa.
As concepções sobre o objeto de ensino da Língua Portuguesa
perpassam pelos conteúdo da gramática normativa, pois
a gramática normativa estabelece a norma culta, ou seja,
o padrão lingüístico que socialmente é considerado
modelar (...) as línguas que têm forma escrita, como é o
caso do português, necessitam da gramática normativa
para se garantir a existência de um padrão
lingüístico uniforme ( Cipro e Infante, 2005, p. 16)
Como é observado por Cipro Neto e Infante, no texto acima, a
gramática é necessária, portanto o conhecimento dela, principalmente, por
parte do professores de Língua Portuguesa é essencial. Assim não como
não a fazer presente na formação de tais profissionais. Contudo percebe-se
no discurso dos contemporâneos do surgimento da Nomenclatura Gramatical
Brasileira uma preocupação em trabalhar os conteúdos de Língua
Portuguesa através da análise de textos, buscando, desta forma, outros
métodos de ensino. Sobre isso Tanuri comenta:
A preocupão com a metodologia do ensino herdada
do ideário escolanovista continuava a se fazer
presente. Na euforia desenvolvimentista dos anos 50, as
tentativas de ‘modernização do ensino, que ocorriam na
110
escola média e na superior, atingem, também o ensino
primário e a formação de seus professores. ( 2000, p.78)
Portanto a formação de professores daquele período transcorria de
acordo com a dualidade existente, procurando conciliar posturas diferentes,
mas com o surgimento da Nomenclatura Gramatical Brasileira, sua adoção
como conteúdo programático de Língua Portuguesa e posterior pré-
requisito para exames de admissão, por exemplo, a transformam em único
foco do ensino da língua materna. Assim toda a atenção voltou-se para a
Nomenclatura Gramatical Brasileira. Os livros didáticos moldaram-se de
acordo com as exigências da NGB, por exemplo a divisão gramatical:
fonética, morfologia e sintaxe que permanece até hoje. A formação do
professor também a fazer-se em torno da NGB, se o material usado
contempla tais conteúdos, nada mais lógico que aqueles que irão explicá-los
se debrucem sobre eles e os assimilem.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O contexto histórico do final do século XIX e do começo do século XX foi
marcado pelos opostos: proletariado/burguesia, imigrantes/brasileiros,
comunismo/capitalismo cidade/campo, militar/civil, língua portuguesa do
Brasil/ língua portuguesa de Portugal. Pela relevância dessas dualidades,
serão feitas, a seguir, algumas ponderações a respeito das mesmas.
A crise gerada pela derrocada da produção de café, o avanço
tecnológico industrial, os imigrantes europeus que chegaram para substituir a
mão de obra escrava ou fugiram da Primeira Guerra Mundial ajudaram no
aumento da população urbana. Esses imigrantes vinham com uma cultura
diferente, com concepções de sociedade, de economia, de educação
diversificadas. Idéias anarquistas e socialistas desembarcavam com eles. A
soma dessas idéias mais o crescimento das metrópoles e o desenvolvimento
industrial resultou na organização do proletariado. No decorrer das primeiras
111
cadas do século XX, como conseqüência de tal organização, ocorreram
várias greves, sendo a maior delas em 1917 em o Paulo - mesmo ano da
Revolução Russa.
A chegada dos imigrantes desencadeia uma preocupação no que se
refere à identidade da pátria. Com uma experiência histórica muito maior do
que a brasileira, eles eram sinônimo de perigo em relação à identidade
nacional. Esse foi um dos motivos que levaram Sampaio Dória a elaborar um
sistema de ensino que privilegiasse a classe menos favorecida. Nesse
sentido, a preocupação como o analfabetismo foi ampliada, pois escrever a
língua nacional era visto como arma de defesa contra o estrangeirismo. Mais
tarde a xenofobia causada pela Segunda Guerra ecoa tanto que o ensino de
língua portuguesa foi imposto, pelo governo brasileiro, às escolas dos
imigrantes.
O mundo vê, através da Revolução Russa de 1917, o atrito da
ambivalência entre comunismo e capitalismo. A presença do primeiro
incomoda muito o segundo que reage de forma violenta. Mas, mesmo com
tais investidas, os comunistas reagiram e conseguiram benefícios para os
trabalhadores.
Os opostos cidade / campo explicitam-se com a falência dos barões do
café, com o aquecimento industrial, com a vinda dos ex-escravos para a
periferia, com a concentração dos imigrantes no grandes centros. O resultado
foi a queda da política café com leite e uma valorização, ainda maior das
metrópoles.
O contraste militar / civil evidencia-se com o Movimento Tenentista
ocorrido em 1922, que teve como origem a crise política dos pleitos
eleitorais. O Governo Federal atuava ostensivamente na política partidária
dos Estados e o Corpo Militar era usado para manter a estabilidade política,
fato que não agradava àqueles militares cuja visão voltava ao momento da
Proclamação da República e, por isso, sentiam-se à margem da política
nacional, pois julgavam-se com o direito sobre os poderes governamentais
que, naquele momento, estava nas mãos de civis.
Em relação ao dueto ngua Portuguesa de Portugal e a ngua
Portuguesa do Brasil, os literatos demonstraram oposição em relação a tudo
112
que não fosse nacional, inclusive à língua usa em Portugal, evidencia-se tal
fato quando um grupo de jovens se organizou em torno de um movimento
chamado Modernismo.
Em meio aos acontecimentos, estavam intelectuais da língua
portuguesa do Brasil. Eles lutavam para oficializar as diferenças entre a
Língua Portuguesa usada em Portugal e a Língua Portuguesa usada pelos
brasileiros. Nesse sentido, acordos ortográficos entre a Academia Brasileira
de Letras e a Academia de Ciências de Lisboa proliferaram desde o início do
século XX. Esse novo pensar sobre a língua materna acontece também em
função da lingüística difundida a partir dos estudos de análises internas que
percebem a língua como um sistema de signos lingüísticos convencionados e
usados por membros de uma mesma comunidade.
Tais acontecimentos são norteados por um sentimento nacionalista que
começa com a vontade de estruturar um país, é reforçado pelo anseio de
criar uma identidade nacional e culmina com a necessidade econômica de
gerar capital nacional. E, no bojo dos acontecimentos, está a língua materna
que passa a ser grande ferramenta para incutir no povo brasileiro o universo
do que se imaginava ser um cidadão.
O pano de fundo de todo esse contexto é o Positivismo que, em função
da industrialização, da necessidade de mão de obra para alimentar o
desenvolvimento, mantém suas características de organização e
prosperidade. Na esteira deste aparecem de um lado o Funcionalismo, com o
que manteve diálogo, de outro o Estruturalismo, com o qual não se articula.
Nesse cenário, a educação não passa despercebida, pois nela são
vistas alternativas para a resolução dos problemas nacionais. A língua
materna transforma-se em instrumento para a articulação da identidade
nacional e, através da alfabetização, para o problema da falta de mão de
obra qualificada, pois com a industrialização saber ler e escrever torna-se
necessário.
Assim, o ensino de língua portuguesa acontecia de duas formas: aquele
que tratava a língua como um todo e buscava elementos textuais para o
entendimento da mesma e o convencional que entendia o ensino da língua
como exclusividade da gramática. O primeiro primava pela análise, produção
113
e compreensão textual. O segundo baseava-se no ensino repetitivo de regras
e nomenclaturas gramaticais. Portanto os professores da língua materna
estruturavam suas aulas a partir de dois tipos de livros didáticos: aqueles que
priorizavam a gramática e aqueles que se detinham à produção e
compreensão textual. Contudo, por não haver consenso entre os autores dos
livros do primeiro modelo em relação à nomenclatura gramatical, coexistiam
vários nomes para um mesmo elemento gramatical.
Ainda sobre a forma de livro didático, fosse do grupo que priorizava a
gramática ou do grupo que valorizava o texto, é necessário ponderar que os
autores anteriores à Nomenclatura Gramatical Brasileira não se preocupavam
com o aspecto didático de suas obras. O fato de não constarem nas obras
explicações pormenorizadas sobre os conteúdos contemplados, fazia com
que o docente que as utilizasse buscasse elementos, instrumentos que o
auxiliasse em suas aulas. A conseqüência de tal necessidade era um
profissional comprometido e conhecedor profundo dos aspectos a servirem
de base para a formação de seus alunos.
Para suprir a necessidade de conciliação da nominação dos termos
gramaticais no sentido de simplificar o ensino da gramática; para abrandar a
ânsia de se ter uma nomenclatura própria atendendo aos ideais do
nacionalismo, às necessidades decorrentes do novo sistema de ensino, surge
em 1958 a Nomenclatura Gramatical que, mais tarde, é vista como um
manual organizado segundo os princípios de racionalidade presentes no
ideário tecnicista
Ao que tudo indica, os debates sobre a constituição da NGB não afetou
imediatamente a cotidiano dos cursos de Letras e dos professores, parece
que eles ficaram restritos ao grupo de intelectuais que a estruturaram, pois
nos depoimentos dos professores contemporâneos a ela observa-se que a
Nomenclatura Gramatical Brasileira chegou pronta à escola na forma de
livros didáticos e da Portaria número 36, de 28 de janeiro de 1959, que a
incorpora ao conteúdo programático de Língua Portuguesa.
Ao analisar as concepções presentes na formação de professores de
Língua Portuguesa do período imediatamente anterior à Nomenclatura
Gramatical Brasileira, percebe-se a incorporação a elas do dualismo do
114
contexto histórico brasileiro daquele período. Também são depreendidas duas
posturas entre os estudiosos de línguas: os estruturalistas e os marxistas.
A partir da Nomenclatura Gramatical Brasileira, inicia-se uma unificação
no ensino de Língua Portuguesa. Os livros didáticos, por exemplo, que se
apresentavam de duas formas (uns priorizando o texto e outros a gramática)
depois de 1958 apresentam, quase que com exclusividade, os elementos
constitutivos da NGB. Além disso, sua objetividade, funcionalidade e
eficiência a transformam em um manual aos moldes do tecnicismo que, por
sua vez, descende do Positivismo. Assim a Nomenclatura Gramatical
Brasileira virou sinônimo de conteúdo de Língua Portuguesa, pois ao se abrir
um livro didático de Língua Portuguesa, na grande maioria deles encontra-se
a seguinte seqüência: um texto, a interpretação desse texto, conceitos
gramaticais, fonéticos, morfológicos e sintáticos. Confirmando assim a
fragmentação e a mecanização do conhecimento, característicos do
Tecnicismo, cujo elemento principal de abordagem não é nem o professor
nem o aluno e sim a organização racional dos conteúdos a serem ensinados.
Nesse sentido a NGB encaixou-se perfeitamente às metodologias, pois nada
mais técnico do que um manual.
O problema, que aqui se encontra, é que um manual é feito para ser
assimilado de forma objetiva por qualquer indivíduo que tenha capacidade de
entendimento. Nesse sentido a NGB Nomenclatura Gramatical Brasileira
contribuiu para incutir no docente de Língua Portuguesa, desde a sua
formação, que ensinar a língua materna é apresentar um compêndio de
nomenclaturas, portanto houve uma restrição de conhecimentos, pois esses
profissionais tiveram a NGB como sinônimo de conteúdo. Não que a
gramática não deva ser ensinada nas escolas, muito pelo contrário. O que
aconteceu foi que o professor ficou condicionado a ensinar a nomenclatura e
não as relações dos elementos gramaticais dentro do discurso. Além disso
esses profissionais não tiveram mais que se preocupar com a estruturação de
seus planos de aula, pois boa parte dos livros didáticos que a seguiram
vinham com exercícios e explicações.
Portanto o problema que motivou a pesquisa: investigar qual (is)
concepção (ões) de educação e de formação de professores de Língua
115
Portuguesa nos anos cinqüenta e sessenta do século XX se resolve a partir da
seguinte constatação: a educação daquele período foi norteada pelo
sentimento nacionalista que, com auxílio do ideário da Escola Nova, a
concebe como de direito de todos. As concepções relacionadas à formação de
professores de Língua Portuguesa decorrem também do nacionalismo, pois a
formação de uma identidade nacional está relacionada à língua materna de
um povo. Além disso, estudiosos da língua pátria defendiam a oficialização da
existência da Língua Portuguesa do Brasil. A culminância desta última foi a
constituição da Nomenclatura Gramatical Brasileira em 1958. O caráter
objetivo, eficiente e funcional da NGB deriva das concepções do
Funcionalismo que, por sua vez trazia bases positivistas. Os autores de tal
documento eram contemporâneos da difusão do Estruturalismo, portanto as
concepções desta filosofia também o marcaram. Devido a propagação do
Maxismo que acontecia também na lingüística suas características foram
assimiladas pelos docentes daquele período.
A análise das concepções presentes na formação de professores de
Língua Portuguesa por meio de livros escolares destinados a essa formação, a
ponderação sobre a influência da Nomenclatura Gramatical Brasileira de
1958 na formação de docentes de Língua Portuguesa e análise das
concepções presentes na orientação advinda dessa nomenclatura foram
objetivos da presente investigação. E, sobre isso, cinco aspectos foram
observados:
1
º
- antes da Nomenclatura Gramatical Brasileira os livros
didáticos traziam várias nomenclaturas para um mesmo termo, o que
dificultava o desenvolvimento das aulas por parte dos docentes;
2
º
- também antes dela, a existência de obras destinadas ao
ensino de Língua Portuguesa através de textos era intensa;
3
º
- as duas vertentes não tinham, salvo algumas exceções,
caráter pedagógico;
4
º
- depois da NGB, os livros didáticos a priorizaram, tornado-a
sinônimo de conteúdo de Língua Portuguesa;
5
º
- os livros didáticos passaram a ter um aspecto apostilado,
minimizando o trabalho docente.
116
Observa-se nos aspectos elencados acima a necessidade de
estruturação das aulas pelo docente, decorrente da ausência de explicações
pormenorizadas nos livros didáticos anteriores à Nomenclatura Gramatical
Brasileira. Tal necessidade oportunizava um maior esclarecimento na
condução das atividades em classe, pois o docente era o autor de suas
ões.
Como os livros didáticos estavam diretamente ligados à formação do
professor de ngua Portuguesa, as concepções que os constituíram a
perpassaram. Isso significa dizer que depois da Nomenclatura Gramatical
Brasileira os professores foram formados sob as concepções desta e
passaram a priorizá-lá como conteúdo quase que único de Língua Portuguesa
e, como conseqüência, as denominações gramaticais passaram a ser mais
relevantes que a própria estrutura gramatical. Além disso, a minimização do
trabalho docente, favorecida pelo formato apostilado do livro didático, leva o
professor a reproduzir e não a refletir sobre suas ações em sala de aula.
117
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