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U n i v e r s i d a d e F e d e r a l F l u mi n ense
P r o g r a ma d e P ó s - G r a d u a ç ã o e m E d u c a ç ã o
Cu r s o d e M est r ado e m Ed u ca ção
A ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO
SOB A FORMA-SINDICATO NO CAPITALISMO NEOLIBERAL:
O PENSAMENTO PEDAGÓGICO E O PROJETO SINDICAL
DO
SINPRO-R
IO
,
DA
UPPES
E DO
SEPE-RJ
K
Ê N I A
M
I R A N D A
- Niterói, julho de 2005 -
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K
Ê N I A
M
I R A N D A
A ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO
SOB A FORMA-SINDICATO NO CAPITALISMO NEOLIBERAL:
O PENSAMENTO PEDAGÓGICO E O PROJETO SINDICAL
DO
SINPRO-R
IO
,
DA
UPPES
E DO
SEPE-RJ
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Educação.
Orientadora: Profª. Drª. Sonia Maria Rummert
- Niterói, julho de 2005 -
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K
Ê N I A
M
I R A N D A
A ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO
SOB A FORMA-SINDICATO NO CAPITALISMO NEOLIBERAL:
O PENSAMENTO PEDAGÓGICO E O PROJETO SINDICAL
DO
SINPRO-R
IO
,
DA
UPPES
E DO
SEPE-RJ
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Educação.
Aprovada em _____/______/2005
BANC A EXAM INAD O RA
______________________________________________________________
Prof. Dr. Armando Boito Jr. (UNICAMP)
______________________________________________________________
Prof. Dr. Gaudêncio Frigotto (UFF/ UERJ)
_____________________________________________________________
Prof. Dr. Marcelo Badaró Mattos (UFF)
_____________________________________________________________
Profª. Drª. Sonia Maria Rummert (UFF, orientadora)
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A José, companheiro de tantos sonhos
e realidade.
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A G R A D E C I M E N T O S
Aos meus pais, Dalva e Silvio, pelo apoio incondicional.
Aos amigos Marcélia Carraro e Heitor Fernandes. Sem a acolhida de
vocês esse mestrado teria sido muito mais difícil.
A José, por ser meu porto seguro nos momentos mais difíceis. Aproveito
para me desculpar pelas ausências.
A minha orientadora Sonia Rummert. Chego ao final deste curso com a
convicção de que você foi imprescindível para minha formação. Obrigada por ter
aceitado me conduzir, e com tanta dedicação, apesar das suas inúmeras tarefas.
Aos professores Gaudêncio Frigotto e Marcelo Badaró, pelas
contribuições na ocasião da qualificação do projeto de pesquisa.
Aos professores do Campo Trabalho e Educação, em especial, a Eunice
Trein e Ronaldo Rosas.
Aos demais professores e funcionários do programa de pós-graduação da
UFF.
A todos os colegas de mestrado e doutorado que me proporcionaram uma
rica experiência na Orientação Coletiva. Agradeço ao Lobo, sem responsabilizá-lo pelo
resultado, a sugestão de estrutura do capítulo 2.
Aos incentivadores desta jornada que me ofereceram diferentes formas
de apoio ao longo desta jornada Leandro Alves, Cecília Vieira (in memorian), José Luís
Antunes, meu irmão Silvinho, Sílvia Bittencourt, Paulo Carrano, Sandra Cardoso, Ingrid
Weber, Iremar Batista, Deusdith Alves, Anelise Gondar, Wagner Teixeira, Carmen
Lídia, Ana Cristina e Sílvia Borges.
Aos companheiros de militância do PSTU e do SEPE, em particular do
núcleo de Niterói, pela difícil e grandiosa greve que nós, trabalhadores em educação
desta rede, enfrentamos neste semestre contra o governo do PT.
Àqueles trabalhadores da Rede Municipal de Educação de Angra dos
Reis que, de alguma forma, colaboraram para que eu pudesse estudar em outra cidade.
Aos três sindicatos que foram objetos desta pesquisa, SINPRO-Rio,
UPPES e SEPE por terem viabilizado esta pesquisa, principalmente, aos entrevistados.
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RESU MO
Esta dissertação trata dos três grandes sindicatos do Rio de Janeiro de
trabalhadores em educação: SINPRO-Rio, UPPES e SEPE-RJ. A análise procura
identificar as divergências e as convergências entre os sindicatos em dois aspectos
fundamentais, a saber, o pensamento pedagógico e o projeto sindical. Entendemos que
o pensamento pedagógico abarca a concepção de educação e de sociedade e que o
projeto sindical comporta a concepção de sindicato, a estrutura organizativa e a prática
política das entidades.
Para tanto, partimos da análise da educação na sua relação com a base material
da sociedade, ou seja, como fenômeno superestrutural, buscando as transformações na
natureza do trabalho docente sob o padrão de acumulação flexível e, com isso,
compreender as especificidades dos sindicatos docentes.
Em síntese, a compreensão da escola, da natureza do trabalho docente, da forma-
sindicato em geral e da trajetória dos três sindicatos docentes em particular, permitiu
realizar uma análise do objeto empírico, e identificar, em que medida, esses sindicatos
defendem os interesses históricos da classe trabalhadora a qual formalmente
representam.
Palavras-chaves: trabalho e educação; educação e movimentos sindicais;
sindicalismo docente; trabalho docente na acumulação flexível; natureza do trabalho
docente.
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ABSTR AC TS
The present dissertation aims to discuss the three Unions of Professionals of
Education within of Rio de Janeiro: SINPRO-Rio, UPPES and SEPE-RJ. This analysis
seeks to identify divergences and convergences between the referred unions as far as
two main aspects are concerned, namely, their pedagogical orientation and their main
routing project. Our position is that the pedagogical orientation should comprise a
specific conception of education and society and the union’s routing project should
contain its core conception, its organizational structure and the political practice of each
entity.
As a means to reach that goal, the thesis starts by analyzing education and its
relation to the material base of society, that means, the relation to the superstructural
phenomenon, seeking to understand the transformations in the nature of the work of
professionals of education under the patterns of flexible accumulation and seeking to
understand, under this perspective, specificities of those unions.
In fact, the form of comprehension of school, the nature of the educator’s work,
of the Union-mode in general and the history of those three unions in particular has
enabled us to accomplish an analysis of the empirical object and identify to what extent
those unions do defend the historical interests of the working class which they formally
represent.
Key words: education and work, education and union movements, educator’s
unionism, educational work within flexible accumulation, nature of teachers work.
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Os Sindicatos (Trade Unions) funcionam bem
como centros de resistência contra as investidas do
capital. [...] Fracassam geralmente por se limitarem a uma
guerra de guerrilha contra os efeitos do sistema existente,
em vez de simultaneamente o tentarem mudar, em vez de
usarem suas forças organizadas como uma alavanca para a
emancipação final da classe operária, isto é, para abolição
última do sistema de salários. (MARX, 2003: 78).
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S U M Á R I O
{ TOC \O "1-3" \H \Z \U
}L
ISTA DE
S
IGLAS
AI-5 – Ato Institucional número 5
ANDES – Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior
AOERJ – Associação dos Orientadores Educacionais do Rio de Janeiro
APERJ – Associação dos Professores do Estado do Rio de Janeiro
ASSERJ – Associação dos Supervisores Educacionais do Rio de Janeiro
ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio
CEAPE – Centro de Estudos e Atualização em Política e Educação
CEP – Centro Estadual dos Professores
CEPE – Centro Estadual dos Profissionais da Educação
CGT- Central Geral dos Trabalhadores
CONTEE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino
CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores de Educação
CSN – Companhia Siderúrgica Nacional
CLT- Consolidação das Leis Trabalhistas
CUT- Central Única dos Trabalhadores
FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador
FETEERJ – Federação Estadual dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino
FS – Força Sindical
FUNDEF- Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental
LDB- Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MTE- Ministério do Trabalho e Emprego
MTIC- Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio
PCdoB- Partido Comunista do Brasil
PCB- Partido Comunista Brasileiro
PDT – Partido Democrático Trabalhista
PROUNI- Programa Universidade para Todos
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais
PSB – Partido Socialista Brasileiro
P-SOL- Partido Socialismo e Liberdade
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PT – Partido dos Trabalhadores
PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
SEP - Sociedade Estadual dos Professores
SEPE-RJ – Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro
SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio
SENAI- Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SINPRO-Rio- Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro e Região
UFF – Universidade Federal Fluminense
UPE – União dos Professores Estaduais
UPPDF – União dos Professores Primários do Distrito Federal
UPPES – União dos Professores Públicos no Estado- Sindicato
UPRJ- União dos Professores do Estado do Rio de Janeiro
UNE- União Nacional dos Estudantes
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INTRODUÇÃO
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A classe trabalhadora, ao longo da história, se organizou de diversas formas
contra uma das características inerentes ao sistema de salários: a tendência da redução
do valor da força de trabalho. O sindicalismo, consolidado como uma das formas
predominantes de organização dos trabalhadores é, no atual padrão produtivo, alvo de
uma grande ofensiva do capital.
Investigaremos, nesta pesquisa, três entidades de trabalhadores em educação do
Rio de Janeiro que possuem essa forma organizacional, o Sindicato dos Professores do
Rio de Janeiro (SINPRO-RIO), a União dos Professores Públicos no Estado (UPPE -
Sindicato) e O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (SEPE-RJ)
1
.
Temos como objetivo geral, analisar em que medida o pensamento pedagógico e
o projeto sindical do SINPRO, da UPPES e do SEPE convergem ou divergem no seu
interior e entre si, assim como, em que medida, representam os interesses históricos da
classe trabalhadora a qual formalmente representam.
Estamos entendendo que o pensamento pedagógico abarca a concepção de
sociedade e a concepção de educação das entidades, dialeticamente relacionadas,
embora cada uma das concepções tenha delimitado suas especificidades. E, o Projeto
Sindical, abarca a forma como a entidade concebe sua função social - articulada à sua
estrutura e às suas práticas políticas predominantes.
A educação, enquanto fenômeno superestrutural, é configurada pela disputa
entre as classes sociais. Portanto, para apreender a essência da concepção de educação
de cada um dos sindicatos, será necessário entrelaçar todos esses aspectos que integram
o que denominamos de pensamento pedagógico e de projeto sindical. A concepção de
educação incorpora esse complexo de interpretação da realidade.
Queremos com isso, demonstrar que, a aparente homogeneidade nos discursos
gerais sobre educação ou publicações dos sindicatos docentes, se desfaz à medida que as
mediações vão sendo buscadas para a análise das particularidades, revelando diferentes
concepções de sociedade e formas organizativas e de intervenção na realidade.
1
Os sindicatos em tela serão mencionados, neste trabalho, por ordem cronológica de fundação.
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Cabe ressaltar que, estudos anteriores levantaram as principais questões desta
pesquisa, assim como a minha prática na militância político-partidária e sindical. O
interesse pela temática teve início na monografia desenvolvida no curso de pós-
graduação lato sensu Educação Brasileira e Movimentos Sindicais da Universidade
Federal Fluminense em 2003, sob o título Tradições e contradições da organização dos
trabalhadores em educação de Angra dos Reis: SEPE e SINSPMAR
2
. Nesse trabalho,
procuramos resgatar a história dessas entidades e analisar as relações entre a concepção
e o projeto sindical do SEPE e do SINSPMAR, a fim de buscar elementos para a
compreensão de como tais entidades lidam com os limites estruturais da forma-
sindicato em um período de ofensiva do capital.
A forma-sindicato em sua atual crise pode ser compreendida através da crise
do capital, pois, integrante da totalidade social estabelece, com ela, relações recíprocas.
Ou seja, os três sindicatos que constituem o objeto da pesquisa ora apresentada têm uma
existência histórica determinada que está completamente articulada à trajetória do
desenvolvimento capitalista no país e no mundo, devendo ser destacadas as principais
determinações materiais e sociais para a investigação de suas atuais composições. O
objeto em estudo não existe desprendido da realidade concreta, não sendo possível
compreender o sindicalismo sem compreender sua relação com a totalidade social.
Sobre a crise do sindicalismo, BOITO levanta as seguintes questões:
trata-se de uma perda crescente e irreversível de energia ou de um
recuo momentâneo, após o qual o sindicalismo poderia recobrar suas
forças sem mudar o seu perfil? Ou será ainda que, além de um recuo
momentâneo, que seria a dimensão quantitativa do fenômeno, tal
fenômeno teria também, uma dimensão qualitativa, representada por
uma mutação no movimento sindical? (In SANTANA e RAMALHO
org.: 2003: 320).
Entendemos que a crise do sindicalismo não é linear e irrecobrável e que o
sindicalismo docente é expressão de que esta forma organizativa vive, como no caso de
outras categorias, um processo de expansão e não de esgotamento.
Contudo, a conjuntura nacional e internacional tem colocado e recolocado
desafios inúmeros ao movimento sindical, sejam de ordem objetiva, com as mudanças
no padrão produtivo, ou política, com a ofensiva do neoliberalismo após a restauração
2
Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (SEPE/ Angra) e Sindicato dos Servidores Públicos
Municipais de Angra dos Reis (SINSPMAR).
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capitalista no Leste Europeu. Esses ataques combinados parecem ter construído um
terreno propício ao recuo da consciência e organização da classe trabalhadora, que se
expressam por uma tendência de social-democratização das entidades, assim como a
redução da sua base tradicional, gerando uma crise para o movimento sindical.
Para entendermos o papel que o sindicato pode ter no fortalecimento da
organização dos trabalhadores, não podemos perder de vista os limites intrínsecos dessa
forma-organizativa, a fim de pensar suas possibilidades na subversão da economia e
relações sociais capitalistas.
Tal como apontou a análise marxiana e engelsiana, a forma-sindicato possui
limites estruturais e possibilidades de conscientização de classe. Esta compreensão o
permite que realizemos análises extremistas. Por um lado, não tratamos o sindicato
como uma forma organizativa débil e, por outro, sabemos que não é suficiente para
organizar o conjunto da classe trabalhadora, mas apenas determinados setores e,
conseqüentemente, determinados interesses.
Com relação à nossa opção metodológica, cabe destacar, está baseada na análise
da realidade e na produção do conhecimento através do método da economia política
marxista. Faremos, abaixo, considerações acerca do método de investigação para, em
seguida, apresentarmos a lógica de exposição desta pesquisa.
O método da economia política não é um apêndice e nem se restringe a um
procedimento de pesquisa. Ele é a própria forma de investigar e interpretar a realidade e
consiste em apropriar-se do plano fenomênico (KOSIK: 2002)– que revela e esconde a
estrutura social do objeto - para se chegar às relações mais essenciais da realidade. E,
dessa forma, superar o mundo da aparência do objeto em estudo, para que a teoria tenha
um caráter prático que seja ferramenta de intervenção e transformação na realidade e
não meramente uma teoria descritiva e contemplativa, como criticou Marx.
Sendo a realidade um todo articulado, cabe ao pesquisador realizar um recorte
dessa realidade para estudar a parte, pois num primeiro momento, ela se apresenta com
um todo caótico.
O processo de análise empreendido que vai entender como o todo está
constituído em partes, quais são suas principais determinações e mediações é que será
capaz de transformar o concreto real em concreto pensado, através da mediação do
abstrato.
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O concreto pensado é o resultado da análise científica da realidade. Ao final do
processo de investigação é construída a síntese de suas múltiplas determinações,
recompondo as relações que as partes estabelecem com a totalidade. Segundo Marx,
o concreto é concreto por ser a síntese de múltiplas determinações,
logo unidade na diversidade. É por isso que ele é para o pensamento
um processo de síntese, um resultado, e não um ponto de partida,
apesar de ser o verdadeiro ponto de partida e portanto igualmente o
ponto de partida da observação imediata e da representação. (2003:
248).
O que se conhece pela pesquisa científica é parte do real em sua existência
histórica, é o real compreendido pelo processo do pensamento, pela mediação do sujeito
que o conhece, relacionado à totalidade social. Portanto, não é a idéia que constrói a
realidade, mas o pensamento que a apreende com fins de modificá-la pela ação humana,
no movimento da práxis. Sendo a realidade um todo em movimento, o processo de
compreensão da sociedade em sua complexidade nunca se esgota.
A compreensão do movimento do real ocorre pelo processo de análise
organizado pelas categorias estruturantes - totalidade, mediação, contradição, práxis,
trabalho - que possibilitam a compreensão da realidade e a realização de uma produção
científica ancorada no materialismo histórico. Conhece-se o concreto real mediado por
tais instrumentos conceituando a realidade e reconstruindo-a como concreto pensado.
Como fundamentos desta investigação podemos também apontar, as categorias
de análise como forma-sindicato, trabalho produtivo e improdutivo, trabalho material e
imaterial, trabalho intelectual e manual, subsunção real e formal do trabalho ao
capital, educação, escola unitária, Estado, ideologia.
Para realizarmos a pesquisa de campo, adotamos como procedimentos
metodológicos a análise de fontes primárias escritas e orais. Como fontes primárias
orais realizamos duas entrevistas com dirigentes no SINPRO-Rio, uma na UPPES e três
no SEPE-RJ, cujos critérios de seleção são justificados no capítulo específico.
Como fontes primárias escritas recorreremos a jornais, dossiês, revistas, teses e
resoluções de congressos, estatutos, além dos sites dos três sindicatos e vídeo. Assim
como, 49 questionários, que distribuímos com a finalidade de mapear as forças políticas
que integram as direções e o perfil destes dirigentes, a partir de aspectos como: tempo
de militância, formação, faixa etária etc.
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A lógica de exposição da presente dissertação está organizada sob a forma de
três capítulos, além desta Introdução e das Considerações Finais.
No primeiro capítulo, Reestruturação Produtiva e Trabalho Docente, trataremos
das transformações recentes no modo de produção capitalista - do fordismo à
acumulação flexível-, a fim de buscar as repercussões objetivas e subjetivas desta
transição para as organizações sindicais da classe trabalhadora, levando em
consideração seus limites e possibilidades. Nesse sentido, analisaremos também as
repercussões do padrão de acumulação flexível para o trabalho docente através de
alguns aspectos tais como, função social da escola, composição de classe, processo de
trabalho, formas de contratação, autonomia docente, além do grau de subsunção ao
capital.
No segundo capítulo, Contexto social e educacional a partir da trajetória dos
sindicatos docentes, traçaremos um panorama, procurando identificar os aspectos
sociais, políticos, sindicais e educacionais mais relevantes para a compreensão dos três
sindicatos. Trata-se de destacar os posicionamentos que tais entidades sindicais ligadas
à educação, tiveram frente à luta de classes no Brasil. Em outras palavras, a origem, as
concepções e práticas políticas desses sindicatos são a expressão de como setores da
classe trabalhadora da área educacional se posicionam frente à disputa capital-trabalho e
às políticas educacionais resultantes desse embate, enfim, tem como objetivo examinar
os aspectos constituintes de sua identidade de classe. Para encerrar esta segunda parte,
apresentaremos, na seção Os sindicatos hoje, a estrutura das entidades e o perfil de seus
dirigentes.
No último capítulo, denominado O pensamento pedagógico e o projeto sindical
do SINPRO-Rio, da UPPES e do SEPE-RJ, analisaremos o pensamento pedagógico e o
projeto sindical das entidades apontando suas divergências e convergências principais a
partir da análise das fontes primárias. Estabeleceremos o confronto entre a prática das
entidades e os seus discursos, para que seja possível realizar uma síntese de suas
concepções e ações políticas predominantes.
Tal pesquisa pretende contribuir para a compreensão das especificidades do
sindicalismo docente e das disputas existentes em torno do fenômeno educativo
existentes no interior destas organizações representativas dos trabalhadores,
desconstruindo sua aparente homogeneidade de interesses. Outrossim, pretende associar
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o debate educacional ao projeto político de cada entidade e oferecer aos sindicalistas
defensores de uma proposta de educação socialista esta reflexão inicial.
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I - REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TRABALHO DOCENTE
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A história do modo de produção capitalista é marcada por transformações, desde
sua etapa revolucionária quando derrubou o regime feudal, a as adaptações e
rearranjos nos padrões de acumulação e, por conseguinte, nas relações sociais. A
estrutura econômica da sociedade condiciona e é influenciada dialeticamente por uma
superestrutura social. Para tanto, a partir das bases materiais de produção, o sistema
capitalista cria as relações sociais correspondentes, produzindo determinadas formas de
consciência e organização da sociedade coerentes ao seu objetivo central, a acumulação
do capital às custas da exploração do trabalho humano e do esgotamento dos recursos
naturais. Há, portanto, uma necessidade intrínseca e permanente de reorganização da
sociedade em consonância com o desenvolvimento das forças produtivas.
Porém, nesta pesquisa é fundamental focalizarmos a mais contemporânea dessas
transformações empreendidas no interior do modo capitalista de produção, a transição
do padrão de acumulação fordista / taylorista para o padrão de acumulação flexível. E, a
partir das continuidades e rupturas dessa transição, identificar as repercussões no
trabalho docente, analisando ainda se é possível falarmos em alterações essenciais de
sua natureza no padrão de acumulação flexível.
I.1
-
R
EESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA
O modo de produção capitalista estava organizado de maneira a promover com
regular satisfação a valorização do capital através do padrão de acumulação
fordista/taylorista até que a crise de 1973 impôs a necessidade de criação de novos
métodos de expansão que garantissem a funcionalidade e a reprodução sociometabólica
do capital (MÉSZÁROS, 2002).
Este padrão contemporâneo à bipolarização política, criada por Estados Unidos e
União Soviética, concedia pequenos benefícios à classe trabalhadora a fim de arrefecer
a luta de classes, colocando-se como par antagônico ao comunismo. O chamado Estado
de Bem-estar-social ou Estado Keynesiano viabilizado pelo crescimento econômico de
países centrais do sistema conseguiu sustentar, por certo período, uma política de pleno
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}
emprego e direitos sociais que os trabalhadores nunca haviam experimentado e, segundo
ANTUNES,
ofereceu a ilusão de que o sistema de metabolismo social do capital
pudesse ser efetiva, duradoura e definitivamente controlado, regulado
e fundado num compromisso entre capital e trabalho mediado pelo
Estado. (1999: 38)
Porém este conjunto de fatores não almejava somente a acomodação do
movimento sindical e a difusão da crença de um “capitalismo humanizado”, mas,
certamente, propiciar a ampliação do consumo de massas para uma produção excedente,
sendo esse o paliativo encontrado para o controle da crise de superprodução e do
desemprego estrutural.
Contudo, o processo de esgotamento das possibilidades de expansão do capital
sob o padrão taylorista / fordista chegou ao auge em 1973, na Europa, quando houve
uma diminuição nas taxas de crescimento somada à elevação inflacionária em um
contexto de avançado desenvolvimento tecnológico e intensificação da resistência
proletária.
Tal período de recessão exigiu do capitalismo uma resposta à queda de suas
taxas de lucro, fazendo-se urgente a reestruturação da produção a fim de superar mais
uma crise, aumentando a produtividade e intensificando a exploração da força de
trabalho.
A rigidez do Fordismo/Taylorismo, expressa na produção em rie; no controle
do tempo de trabalho; na especialização dos trabalhadores; na fragmentação causada
pela dicotomia entre trabalho manual e intelectual; na simplificação e desqualificação
causadas pela repetição de tarefas - possíveis graças ao alto nível de especialização da
maquinaria -, tornou-se incompatível com as expectativas traçadas para esta nova etapa
do desenvolvimento capitalista.
A figura do Estado interventor, as conquistas trabalhistas e seu arcabouço
político e ideológico, por sua vez, também se tornaram obstáculos ao novo momento
econômico e desfavoráveis na correlação de forças entre capital e trabalho. Estava posta
a necessidade de reestruturar produção, assim como a maneira de pensar a sociedade,
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}
com vistas a manter um certo patamar de estabilidade, garantindo a hegemonia
3
do
capital na sociedade.
Segundo ANTUNES, “a denominada crise do fordismo e do keynesianismo era
a expressão fenomênica de um quadro crítico mais complexo. Ela exprimia, em seu
significado mais profundo, uma crise estrutural do capital” (1999:31)
.
O objetivo da
reestruturação não era atacar sua essência, questionar a base de sustentação do modo de
produção capitalista, e sim revestir de novidades supérfluas a produção e a acumulação
privadas de um sistema instável que gera no seu crescimento crises cíclicas e que,
portanto, necessitava otimizar seus resultados.
A ideologia Neoliberal que buscou no plano político a articulação entre as novas
formas de produção material e espiritual, através de um novo complexo explicativo
desta realidade, logrou as tão esperadas condições históricas para sua disseminação,
quando mais uma vez se impôs ao capital a necessidade de administrar as múltiplas
determinações de sua crise. Uma ideologia inviabilizada durante o compromisso social-
democrata - período em que foi formulada - começou a ganhar contornos universais em
um contexto de necessidade de maior controle das organizações dos trabalhadores e
supressão de seus direitos, unificando, assim, a burguesia em torno deste projeto de
metamorfose do capital.
Para tal, não era suficiente reformar as bases produtivas utilizando a
apropriação do desenvolvimento científico e tecnológico, mas também as relações
sociais, principalmente redirecionando a intervenção do Estado em favor do mercado e
buscando o convencimento da classe trabalhadora à sua lógica.
3
Segundo Gramsci, em sua primeira formulação, hegemonia é o meio pelo qual uma determinada classe
social constrói e consolida uma direção política e cultural sobre as demais, usando seu poder de
convencimento para exercer a liderança de um bloco histórico, - classe dominante e seus aliados -,
arrefecendo os conflitos. Dessa forma, apresenta como interesses de toda a sociedade seus interesses
particulares através dos aparelhos privados de hegemonia, estabelecendo uma relação pedagógica
(GRAMSCI, 1999-vol.1). O conceito traz a centralidade da direção cultural que a classe dominante quer
imprimir ao conjunto da sociedade, porém cabe enfatizar que esta direção construída na superestrutura é
resultante da correlação de forças num período histórico. ANDERSON (2002) demonstra que o conceito
de hegemonia em Gramsci sofreu alterações ao longo de sua trajetória e ao tomar como ponto de partida a
obra de Maquiavel, o conceito foi estendido. A hegemonia não mais pertenceria apenas à sociedade civil
e a coerção à sociedade política, mas as duas esferas poderiam ser encontradas no Estado (estamos aqui
nos referindo ao lócus da sociedade política) segundo a definição de GRAMSCI. Para ANDERSON, na
primeira versão “Gramsci opõe a hegemonia à sociedade política ou ao Estado, enquanto na segunda o
próprio Estado se torna um aparelho de hegemonia. Em uma terceira versão, a distinção entre sociedade
civil e sociedade política desaparece totalmente: tanto o consentimento como a coerção tornam-se
extensões do Estado” (2002: 36-7). Então, o conceito de hegemonia passa a significar a direção ético-
política de uma classe sobre as demais, usando não a coerção, mas também seu poder de
convencimento, em proporções diferenciadas do binômio coerção-convencimento dependo do contexto
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Esta etapa do desenvolvimento capitalista é marcada pela predominância do
capital financeiro que, com a viabilidade da automação microeletrônica, pôde
reorganizar a produção de forma mais flexível
4
para lidar com sua instabilidade
sistêmica. Sendo assim, a reação do capital à crise foi reorganizar o processo produtivo,
gerando uma alteração de forma no padrão de acumulação, aliando a isto novos
mecanismos de subsunção, controle e cooptação da classe trabalhadora.
Em meio a rupturas e continuidades uma nova forma flexibilizada de gerir a
produção é apropriada pelo modo de produção capitalista para favorecer a recomposição
de sua expansão, através da emergência de novos setores da produção, flexibilização e
desregulamentação do mundo do trabalho e mercantilização de direitos sociais. O
momento “desfavorável” à acumulação,
instaura a necessidade histórico-ontológica, para o capital, de um
regime de acumulação flexível, que tende a mudar a estrutura de
“espaço-tempo” da reprodução sistêmica do capital. A instabilidade
sistêmica e a fluidez do mercado mundial exigem flexibilidade das
condições sociais de produção”.(ALVES, 2001.:54)
A principal referência do padrão de acumulação flexível, assim como do padrão
anterior, é originária da fábrica automobilística, porém desta vez baseada na experiência
de recuperação da economia japonesa pós 2
a
Guerra Mundial. Como esta forma de
organização da produção veio da fábrica Toyota, convencionou-se chamar de
Toyotismo o tipo de organização do processo de trabalho, modelo da reestruturação
produtiva em curso. Diverso do padrão anterior, baseado na grande produção de
mercadorias, o Toyotismo, pode ser diferenciado basicamente pelos seguintes traços
apontados por ANTUNES (1999:230): produção voltada à demanda do consumo;
heterogeneidade e diversidade na produção; trabalho operário em equipe e flexibilidade
nas funções, visando à intensificação da exploração sobre a força de trabalho; melhor
aproveitamento do tempo, estoque mínimo e terceirização de grande parte da produção.
A transferibilidade do toyotismo, ou de parte do seu receituário,
mostrou-se, portanto, de enorme interesse para o capitalismo
ocidental, em crise desde o início dos anos 70. Claro que sua
adaptabilidade, em maior ou menor escala, estava necessariamente
histórico.
4
O confronto direto com a rigidez do fordismo leva HARVEY (2003) a denominar esse novo estágio de
acumulação flexível, também assim denominado pela sua capacidade de convivência com diferentes
formas de produção, da artesanal à alta tecnologia.
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condicionada às condições econômicas, sociais, políticas, ideológicas,
quanto como à inserção desses países na divisão internacional do
trabalho, aos seus respectivos movimentos sindicais, às condições de
mercado de trabalho, entre outros tantos pontos presentes quando da
incorporação (de elementos) do toyotismo.(ANTUNES, 1999: 57)
Devido à posição subordinada que o Brasil ocupa na divisão internacional do
trabalho, pode-se afirmar que embora o neoliberalismo tenha sido bastante difundido, o
toyotismo não foi homogeneamente implementado no parque industrial brasileiro,
mesclando-se a outras formas de produção. A convivência de padrões de produção
moderníssimos e arcaicos é, no entanto, própria da acumulação flexível (HARVEY,
2003), que o capitalismo busca adequar a forma de produção à realidade encontrada
em uma dada região, desde que atenda ao objetivo maior de valorização do capital. Para
Tumolo (2002),
nesta chamada era da globalização, os diversos processos de trabalho
são sempre particulares a determinados países ou regiões, empresas e
até seções ou ilhas dentro de empresas e, neste plano, balizado
analiticamente pela categoria de trabalho concreto, não é possível
encontrar uma identidade entre eles. Tal identidade pode ser
desvendada no plano da totalidade, quando se considera que os
processos de trabalho estão subordinados ao processo de valorização
do capital, ou seja, ao processo de produção capitalista, tendo com
base as características analíticas de trabalho abstrato e trabalho
produtivo de mais-valia e capital. Dessa maneira torna-se
compreensível a razão pela qual os capitalistas lançam mão dos mais
diversos processos de trabalho, qual seja, encontrar as formas
históricas mais adequadas para intensificar a exploração sobre a classe
trabalhadora. (TUMOLO: 96)
O neoliberalismo impelido aos países da periferia do capitalismo, tem aliada a
exploração dos trabalhadores pela burguesia à subordinação da região aos interesses
imperialistas. No caso dos países latino-americanos, o neoliberalismo abriu as
economias ao capital transnacional, acentuou a desnacionalização e desindustrialização
e reservou-lhes o papel de consumidores de tecnologia e montadores de produtos.
Ainda que a implementação do projeto neoliberal tenha se dado nos países
centrais e em alguns países da América Latina nas décadas de 70 e 80, no Brasil o
neoliberalismo foi efetivamente implantado com a vitória de Fernando Collor de
Mello nas eleições presidenciais de 1989, em um governo eleito pela população.
{
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}
Essa implantação tardia do neoliberalismo no Brasil se deveu ao fato da classe
trabalhadora encontrar-se, até então, mobilizada em setores dos movimentos sociais e
sindicais em torno da luta anti-didatura e, posteriormente, em torno da Constituição de
1988. Esse obstáculo à disseminação neoliberal, que países sul-americanos como Chile
sob a presidência de Pinochet já haviam derrotado, retardou a viabilidade de tal proposta
no Brasil que vinha sendo defendida por frações da burguesia desde o governo
Sarney.
Porém, na década de 1990, no Brasil, uma nova correlação de forças pressionava
interna e externamente à adesão ao modelo neoliberal. De um lado, o modelo
desenvolvimentista que fizera crescer e diversificar o parque industrial brasileiro às
custas de um grande endividamento externo, dava sinais de esgotamento. Por outro, a
queda da taxa de lucro nos países centrais, e disputa intercapitalista por esta
recomposição, fazia com que a burguesia internacional, em especial a norte-americana,
provocasse uma nova ofensiva aos países periféricos exigindo a abertura do comércio e
a privatização, de acordo com as necessidades das economias centrais.
Com o campo imperialista mais coeso, graças à inexistência de
enfrentamentos bélicos entre os Estados centrais, com a União
Soviética em processo de desagregação e o movimento socialista em
crise, as burguesias imperialistas viram-se em condições mais
favoráveis para implantar a política de supressão de direitos sociais
nos seus países e para obrigar uma marcha à no desenvolvimento
capitalista na periferia. (BOITO, 1999: 117)
De acordo com análise de BOITO (1999), a configuração das classes sociais e
frações de classes brasileiras e sua relação com a burguesia internacional e imperialista
é determinante para a compreensão desse tardio, porém acelerado, processo de
implantação neoliberal.
Segundo o autor, a composição do bloco no poder durante a ditadura militar e o
governo Sarney, “além de preservar os interesses gerais do conjunto da burguesia,
orientava-se de modo a priorizar, diante das inevitáveis disputas econômicas entre as
diferentes frações burguesas, os interesses do capital monopolista.” (1999: 50). Embora
o neoliberalismo tenha preservado tais interesses, BOITO utiliza a metáfora dos círculos
concêntricos para demonstrar que a burguesia nacional e internacional não se beneficiou
homogeneamente dessa política, havendo diversas contradições no seu interior.
{
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}
O maior círculo desta metáfora representa a unidade de toda a burguesia: a
desregulamentação do mercado de trabalho e supressão de direitos sociais. Toda a
burguesia se beneficia desta política, das grandes às pequenas empresas, principalmente
as multinacionais, além do capital financeiro que recebe recursos das áreas sociais
redirecionadas para o pagamento da vida externa. Como subproduto da política de
desmonte dos serviços de saúde, educação e previdência social destaca-se o crescimento
na etapa neoliberal da nova burguesia de serviços, comparado por Boito a um
“carniceiro, que vive das sobras da guerra que o neoliberalismo trava contra os
trabalhadores” (1999: 72). Neste ponto, podemos identificar a ofensiva do capital na
área educacional, fundamental para a nossa análise; retomaremos este aspecto mais
adiante.
O segundo círculo intermediário e mais seleto diz respeito às políticas
privatistas, cujos favorecidos são o capital imperialista e o capital monopolista
brasileiro, que utilizam o Estado como anti-valor
5
para seu faturamento.
Já o terceiro e menor círculo, representa a política de abertura comercial e
desregulamentação financeira que contempla o núcleo beneficiário da política
neoliberal: o capital bancário e o capital imperialista.
Os trabalhadores, portanto, enfrentam a intensificação da exploração sobre o seu
trabalho, o desmonte de direitos adquiridos ao longo das lutas sociais e sindicais, assim
como a “desobrigação” do Estado
6
para com sua classe. É a classe situada fora dos três
5
Ver Francisco de Oliveira (1998: 35), “O fundo público, em resumo, é o anti-valor, menos no sentido de
que o sistema não mais produz valor, e mais no sentido de que os pressupostos da reprodução do valor
contêm, em si mesmos, os elementos mais fundamentais de sua negação”.
6
O Estado não é uma instituição supraclassista, ele surge da necessidade de proteção à propriedade
privada criada nas sociedades organizadas em classes e, cada vez mais, se torna um objeto estranho a essa
sociedade. Para Marx e Engels, a idéia expressa no Manifesto Comunista (1998: 10), de que “o poder do
Estado moderno não passa de um comitê que administra os negócios comuns da classe burguesa como um
todo” permanecerá ao longo de suas obras. Em A origem da família, da propriedade privada e do Estado,
Engels afirma que “como o Estado nasceu da necessidade de conter o antagonismo das classes, e como,
ao mesmo tempo, nasceu em meio ao conflito delas, é, por regra geral, o Estado da classe dominante,
classe que, por intermédio dele, se converte também em classe politicamente dominante e adquire novos
meios para a repressão e exploração da classe oprimida” (ENGELS, 1982: 193). Para Engels o Estado se
materializou como ferramenta de domínio de uma classe sobre outra, mas também como instrumento de
arrefecimento da luta de classes, o que tomamos como explicação à sua pseudoconcreticidade - aparente
neutralidade - uma vez que incorpora de forma subordinada os interesses da classe submetida à
dominação. A relação simbiótica que a classe dominante veio estabelecendo com o Estado não aniquilou
contudo, não por que não desejasse, mas por causa da impossibilidade, o reflexo da luta de classes no seu
interior. Na expressão dessas contradições externas a classe trabalhadora arrancou algumas conquistas
políticas e, em alguns casos, até o poder estatal provisoriamente. Na etapa Neoliberal, o Estado vem
tomando para si aquelas concessões que em outro momento histórico precisou fazer, acertando suas
contas com a classe trabalhadora.
{
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}
círculos concêntricos sobre a qual todas as demais têm a ganhar com a hiperexploração
da mercadoria força de trabalho.
Esse quadro nos possibilita compreender o grau de funcionalidade da política
neoliberal, uma década e meia em expansão no Brasil, e sua articulação aos
interesses do capital internacional. Tendo como destaque a unidade da burguesia em
torno dos ataques sistemáticos à classe trabalhadora, buscando novas formas de
subordinação do trabalho ao capital, que se desdobra também em novas formas de
cooptação do trabalhador individual assim como de suas organizações de classe. Dessa
forma, as mudanças gestadas na materialidade da base produtiva terão um profundo
desdobramento na caracterização dos trabalhadores imersos neste processo e, por
conseguinte, nas suas organizações classistas, aspectos que serão abordados na próxima
seção.
I.2
A
S REPERCUSSÕES PARA A ORGANIZAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA
O sistema capitalista, como movimento contraditório e destrutivo da
humanidade, é a origem de toda e qualquer “cooptação” da classe trabalhadora. Marx
chamou de dupla liberdade a capacidade de vender sua força de trabalho ou a de morrer
de fome e a de ser livre da propriedade dos meios e instrumentos de produção. Na
medida em que a sociedade vai se degradando, o exército de reserva tornando-se um
exército de miseráveis ou de lúpens, a acumulação e a concentração de renda
inviabilizando mesmo a existência precária de 6 bilhões de seres humanos e da própria
natureza, a procedência da cooptação dos trabalhadores é, em primeira instância, a sua
necessidade de sobrevivência inadiável. A base material é a determinante de sua
consciência.
Contudo, a administração do capital de seu sistema sociometabólico é bastante
complexa, permeada de mediações e de um esforço contínuo de gerir suas contradições
- algumas insolúveis - e prolongar sua existência, erguendo sobre a estrutura econômica
da sociedade uma superestrutura que condiciona as relações sociais correspondentes.
Tal relação é expressão de um processo dialético de influência recíproca entre a base
material e a base espiritual da sociedade capitalista, sempre como um processo
histórico. A metáfora é desenvolvida por Marx no Prefácio à contribuição à crítica da
economia política:
{
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}
Na produção social de sua existência, os homens estabelecem relações
determinadas, necessárias, independentes de sua vontade, relações de
produção que correspondem a um determinado grau de
desenvolvimento das forças produtivas materiais. O conjunto destas
relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a
base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e
política e a qual correspondem determinadas formas de consciência
social. O modo de produção da vida material condiciona o
desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral. Não é
a consciência dos homens que determina seu ser; é o ser social que,
inversamente, determina sua consciência (1983: 24).
Assim, a reorganização do cenário produtivo, promovida pelo capitalismo sob as
formas do padrão de acumulação flexível, traz novos contornos à velha exploração da
condição objetiva da classe trabalhadora associada à intensificação da exploração
subjetiva. O sistema capitalista é estruturalmente organizado a partir da instauração do
estranhamento do trabalho, construindo a classe operária através da apropriação do
trabalho vivo, onde o trabalhador é alienado do processo, do produto e da sua própria
dimensão humana. Porém, percebemos nesta etapa, um novo tipo de estranhamento.
Com a intencionalidade de intensificar a exploração dos trabalhadores, o capital
recompõe o processo de trabalho de forma que não abale a subordinação do trabalho ao
capital, apenas a camufle, mantendo, portanto, a alienação do produto. Em outras
palavras, no padrão de produção flexível, um restrito número de trabalhadores
industriais é chamado, na maioria dos casos, a uma desalienação ilusória e provisória
do processo de trabalho, participando de todas as etapas da produção, ou pelo menos de
um conjunto delas, sentindo-se responsável, colaborador, sócio, trabalhador coletivo
polivalente, comprometido subjetivamente com seu espaço de trabalho. Entendemos
que, desta forma, o capital coopta através do ilusório controle dos processos de trabalho,
a subjetividade dos trabalhadores.
Em decorrência da atual mudança na base estrutural da sociedade, o desmonte
das formas coletivas de organização ocorre também pela ênfase dada à captura da
subjetividade daqueles que conseguem trabalhar dentro dos ramos mais dinâmicos da
economia, além daqueles que ao ficarem à margem da contratação formal, são
funcionais e, de alguma forma, “solidários” à preservação das regras capitalistas à
medida que não as ameaçam, buscando alternativas atenuantes à sua caótica condição
de sobrevivência.
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}
Ou seja, essa reorganização do cenário produtivo promovida pelo capitalismo
sob as formas do padrão de acumulação flexível está também íntima e dependentemente
associada ao processo de “captura da subjetividade do trabalho” (ALVES, 2001:53).
Para tanto, é preciso conjugar o controle sobre as forças produtivas materiais da
sociedade com o controle de todas as esferas das relações sociais vigentes. A
subordinação do trabalho ao capital, passa, nesta etapa, pela transformação da
materialidade do processo produtivo associada à conformação do trabalhador, pela
apropriação de sua subjetividade a favor da lógica de acumulação.
A busca do consentimento ativo dos trabalhadores, chamados a serem
colaboradores do capital, está atrelada à necessidade objetiva do capital de conter as
lutas entre as classes sociais fundamentais e subsumir suas organizações coletivas.
Portanto, a proposta de conformação
7
do trabalhador é construída sobre as bases
materiais de alienação “parcial” do processo produtivo, pelo direcionamento interessado
de sua formação/ qualificação e pela interferência na sua relação com as entidades
sindicais
8
. Podemos perceber que tais elementos vão ao encontro de uma estratégia de
desmobilização geral, apelo exacerbado ao individualismo e negação das possibilidades
históricas, acarretando drásticas repercussões na organização dos trabalhadores e em sua
forma de pensar.
E, na atual fase de desenvolvimento capitalista, “que tipo de homem, dotado de
que particularidades psíquicas deve ser criado pelo sistema, a fim de que o próprio
sistema possa funcionar?” (KOSIK, 2002: 94).
Para RUMMERT (2000), a hegemonia neoliberal reformula categorias
explicativas da realidade a fim de fundamentar um novo projeto identificatório. Para
7 No plano subjetivo, o conceito utilizado por RUMMERT (2000) de projeto identificatório é elucidativo
para entendermos os elementos constitutivos da lógica imposta pelo capitalismo neoliberal ao imaginário
dos trabalhadores: “O projeto identificatório é constituído por um conjunto de proposições formuladas por
um grupo, por uma fração de classe ou por uma classe, que objetiva manter ou conquistar a hegemonia
sobre outros grupos, frações de classe ou, mesmo, sobre a totalidade social. Esse conjunto de proposições
se apresenta como um modelo carregado de positividades, com o qual é necessário identificar-se para
assegurar segundo a concepção de seus formuladores a inserção exitosa, individual e /ou coletiva, em
um dado momento histórico (2000: 178).
8 Embora a legislação sindical propicie a existência de sindicatos pelegos cooptados facilmente pela
ideologia neoliberal e que não precisariam ser destruídos, há sindicatos que se organizam paralelamente à
esta estrutura oficial e que, portanto, devem ser enquadrados, entendemos que é nesse contexto que se
insere a reforma sindical brasileira. O que estamos querendo já apontar aqui é que há uma necessidade do
capital de construir novas formas de relacionamento com os sindicatos, uma destruição mais complexa.
{
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}
tanto, RUMMERT destaca como as características interrelacionadas mais relevantes do
processo de interiorização do ideário neoliberal pelos trabalhadores, as seguintes:
1 - A ênfase no individualismo, substituição dos conflitos estruturais pelos
interpessoais. 2 - A construção simbólica de “culpados” fora da esfera macropolítica. 3 -
Hiperdimensionamento do mérito segundo a lógica do mercado. 4- Atribuição de caráter
superlativo ao presente, ou seja, o simulacro do a-historicismo. 5- A valorização da
descontinuidade dos processos vividos na sociedade e dos projetos, individuais e
coletivos, de inserção na vida socioeconômica. (empregabilidade) 6- O apelo à
competitividade 7-A gica mercantil como regente, determinante e explicativa da
realidade.
A autora afirma ainda que tais elementos do projeto identificatório neoliberal
coexistem com valores de projetos passados e que sua apreensão não é uniforme no
interior da sociedade. Porém esse processo não é capaz de conter as próprias
contradições que suscita. Por exemplo, o que levaria os trabalhadores de um modo geral
a aderirem a este projeto identificatório formulado pelo capital?
Podemos começar a buscar respostas a partir da compreensão do conceito de
ideologia, para MARX:
A consciência jamais pode ser outra coisa do que o ser consciente, e o
ser dos homens é o seu processo de vida real. E se, em toda ideologia,
os homens e suas relações aparecem invertidos como numa câmara
escura, tal fenômeno decorre de seu processo histórico de vida, do
mesmo modo por que a inversão na retina decorre de seu processo de
vida diretamente físico.(1987:37)
Afirmar que a realidade aparece invertida sob a ideologia, não é o mesmo que
dizer que existe uma realidade falsa e uma verdadeira e que, portanto, o
compreensão que exista paralela ou fora do mundo.
Quando a realidade se apresenta de forma invertida, revela seus aspectos
fenomênicos, uma vez que é a realidade, mas sua apresentação está em sentido
contrário, às avessas, transmudando a ordem em que as determinações aparecem,
aparentando uma pretensa independência entre elas.
A realidade se apresenta invertida por que está invertida na sociedade capitalista.
A riqueza de uma minoria da sociedade é financiada pela miséria da esmagadora
maioria. Os interesses individuais se contrapõem aos interesses coletivos. Os produtos
{
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}
criados pelo trabalho não pertencem àqueles que o realizam. O espetacular
desenvolvimento das forças produtivas não libera a humanidade para o mundo da
liberdade, mas antes, a torna supérflua.
Essa é a materialidade da ideologia, a realidade invertida, a essência oculta pelo
fenômeno, ou seja, não é propriamente uma falsidade. podemos considerar o
binômio verdadeiro- falso, se fundados numa análise dialética, ou seja, é falsa na
medida em que não é a realidade na sua totalidade e, é verdadeira na medida em que
apresenta parcela dessa realidade.
O mundo da pseudoconcreticidade é um claro-escuro de verdade e
engano. O seu elemento próprio é o duplo sentido. O fenômeno indica
a essência e, ao mesmo tempo, a esconde. A essência se manifesta no
fenômeno, mas de modo inadequado, parcial, ou apenas sob certos
ângulos e aspectos.(KOSIK, 2002: 15)
Sendo a realidade a unidade entre o fenômeno e a essência, entre a parte e o
todo,
se a essência não se manifestasse absolutamente no mundo
fenomênico, o mundo da realidade se distinguiria radical e
essencialmente do mundo do fenômeno: em tal caso o mundo da
realidade seria para o homem “o outro mundo” (platonismo,
cristianismo), e o único mundo ao alcance do homem seria o mundo
dos fenômenos. (idem, ibidem, 15-6)
Portanto, o potencial de cooptação da ideologia advém do fato de que está
conectada à realidade dos homens, não é de todo falseada, revela parcialmente a
realidade mas oculta o essencial. Ganha poder explicativo pelo que mostra do real,
ganha supremacia sobre aqueles que provavelmente seriam contrários a ela pelo que
esconde.
Poderíamos, portanto, definir uma expressão desse potencial de cooptação que
um determinado projeto identificatório tem em relação aos seus destinatários, antes de
tudo, pela forte coerção material aliada à ideologia. O trabalhador realmente passa a
acreditar na formulação do capital sobre o novo modelo de trabalhador adequado à
configuração do mundo do trabalho, se moldando a ele.
Com relação à coerção implementada a partir das transformações na base
material podemos destacar as principais mutações na composição da classe
trabalhadora, segundo
ANTUNES (1999)
: diversidade, heterogeneidade e complexidade
{
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}
da classe; divisão sexual do trabalho; crescimento no setor de serviços e emergência do
terceiro setor e formas de trabalho doméstico e, por último, transnacionalização do
capital e do mundo do trabalho.
Sobre o quadro de trabalhadores na economia formal, “uma tendência
freqüente à redução do proletariado industrial, fabril, tradicional, manual, estável e
especializado” (ANTUNES, 1999: 104), ao passo que o número de trabalhadores
precarizados, terceirizados, subcontratados vêm se expandindo como paliativo ao
desemprego estrutural.
O contingente feminino vem aumentando nos trabalhos precários e de menor
qualificação, acentuando a exploração de classe e de gênero
9
sobre esta parcela da força
de trabalho. Aspecto que é agravado, na avaliação de ANTUNES, pela freqüente
postura dos sindicatos em excluir as mulheres trabalhadoras quando não são maioria
absoluta no setor organizado. Assim,
se os organismos sindicais não forem capazes de permitir a (auto)
organização das mulheres e/ou dos/as trabalhadores/as part time no
espaço sindical, não é difícil imaginar um aprofundamento ainda
maior da crise dos organismos de representação sindical dos
trabalhadores (ANTUNES, 1999: 108).
Outra característica marcante é o crescimento do setor de serviços sob a lógica
do capital e do chamado terceiro setor que se propõe recompor as perdas geradas pelo
desemprego estrutural através de uma lógica dita diversa da lógica mercantil, mas que
não é uma
real alternativa transformadora da lógica do capital e de seu mercado
[...] essas atividades cumprem um papel de funcionalidade em relação
ao sistema, que hoje não quer ter nenhuma preocupação pública e
social com os desempregados (ANTUNES, 1999: 113).
A última característica apontada nos estudos de Antunes, a transnacionalização
do capital e do mundo do trabalho, interliga de certa forma trabalhadores de diversas
partes do mundo através da globalização do processo produtivo. Sendo assim,
como o capital é um sistema global, o mundo do trabalho e seus
desafios são também cada vez mais transnacionais, embora a
internacionalização da cadeia produtiva não tenha, até o presente,
9
Como veremos adiante na análise da categoria docente.
{
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}
gerado uma resposta internacional por parte da classe trabalhadora,
que ainda se mantém predominantemente em sua estruturação
nacional, o que é um limite enorme para a ação dos
trabalhadores.(ANTUNES 1999:115)
Tal quadro de reconfiguração da classe trabalhadora e da forma de produção,
expressões da metamorfose capitalista, gestou uma crise - apontada pela literatura
especializada - no interior das organizações sindicais que tem como efeitos mais
aparentes: a diminuição da sindicalização por causa da disseminação das formas
individuais de atuação; a criação de um fosso entre trabalhadores estáveis e precarizados
causado pela fragmentação da classe trabalhadora e flexibilização das conquistas
trabalhistas; afastamento das bases e burocratização das entidades, mudanças de
estratégias de ação nos sindicatos e conseqüente diminuição da ação grevista, abrindo
espaço para o sindicalismo de empresa, de resultados ou propositivo, negociando dentro
da ordem, tentando conciliar os incompatíveis interesses entre capital e trabalho,
descartando as mobilizações e o enfrentamento direto com o sistema.
A história do sindicalismo no Brasil foi marcada por um longo período de
controle e submissão ao Estado até o período conhecido como Novo Sindicalismo
10
que
começou a romper com os alguns traços da burocracia sindical. Estaremos tratando,
com maior aprofundamento, o período do novo sindicalismo no próximo capítulo a
partir de exemplos empíricos dos sindicatos docentes.
Os ataques que a acumulação flexível vem constantemente impondo às
organizações trabalhistas, denunciam a profunda contradição do que Boito chama de
ideologia teórica e ideologia prática
11
que compõem o discurso neoliberal. Embora
proclamem o fim da história, da luta de classes e de alternativas ao capitalismo,
investem substantivamente no desmonte sindical, ou pelo menos, em um determinado
modelo de sindicato, instituição marcada pelo paradoxo entre as classes antagônicas.
A ofensiva aos sindicatos nessa atual etapa do capitalismo nos coloca alguns
questionamentos importantes para a pesquisa, tais como, o sindicato é um obstáculo ao
10
Para MATTOS o próprio conceito de Novo Sindicalismo expressa um certo otimismo da produção
acadêmica sobre a configuração sindical da década de 1980 em comparação com fases históricas
anteriores: “Pouco mais de uma década depois, o balanço dos anos 80 constatava um exagero nas
previsões anteriores. o se concretizara a ruptura com o passado sindical brasileiro, ou, no máximo, ela
estaria em seus primeiros estágios. Tal balanço apontou muitas continuidades, onde antes se
vislumbravam mudanças radicais, o que, de certa forma, arranhou a imagem do novo sindicalismo”
(1998: 217).
11
“Os princípios da ideologia neoliberal não correspondem, de maneira coerente, às propostas e à prática
política que eles inspiram”. (BOITO, 1999:26)
{
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}
desenvolvimento do capitalismo? Quais condições objetivas impuseram a construção
dessa forma organizativa à classe trabalhadora? Quais as características essenciais do
sindicato que nos permite apontar seus limites e suas contribuições para a organização
da classe trabalhadora? Tentaremos respondê-las na seção abaixo.
I.
3
A
NATUREZA DA FORMA SINDICATO
Marx e Engels, em seus estudos sobre a organização dos trabalhadores,
identificaram várias formas históricas dos seus movimentos no marco da sociedade
capitalista, tais como: o cartismo, o ludismo, os sindicatos de ofício, as sociedades de
ajuda mútua, as sociedades de resistência, dentre outras.
O contexto de criação dessas entidades seria a expressão da luta de classes frente
à nova divisão do trabalho, que nos leva a buscar compreender as características do
modo de produção capitalista em oposição aos modos de produção anteriores.
Para Marx e Engels “a história de todas as sociedades até agora tem sido a
história das lutas de classe” (MARX, ENGELS, 1998: 8). A luta de classes como o
principal determinante da história constrói, a partir dos resultados sempre provisórios da
luta entre as classes antagônicas, novas formas de estar no mundo.
Nas sociedades pré-capitalistas - o modo de produção asiático, o escravista e o
feudal - tais lutas encontravam-se em diferentes estágios. Contudo, na sociedade
capitalista as classes sociais, e por conseguinte, as lutas movidas por interesses
antagônicos, tomam um desenho mais complexo e, conseqüentemente, novas formas
organizativas.
Os modos de produção da existência determinam a condição humana, pois o
homem se produz na relação de transformação da natureza através do trabalho. O
trabalho assume formas históricas diferentes e cada uma dessas formas representa um
modo específico de produção material e apropriação desse trabalho, assim como uma
forma espiritual, resultante das relações sociais estabelecidas nesse processo produtivo.
O modo pelo qual os homens produzem seus meios de vida depende,
antes de tudo, da natureza dos meios de vida encontrados e que têm
de reproduzir. Não se deve considerar tal modo de produção de um
único ponto de vista a saber: a reprodução da existência física dos
{
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}
indivíduos. Trata-se, muito mais, de uma determinada forma de
atividade dos indivíduos, determinada forma de manifestar sua vida,
determinado modo de vida dos mesmos. Tal como os indivíduos
manifestam sua vida, assim são eles. O que eles o, coincide,
portanto, com sua produção, tanto com o que produzem, como com o
modo como produzem. O que os indivíduos são, portanto, depende das
condições materiais de sua produção. (MARX, ENGELS, 1987: 27-
Grifos no Original).
Ao transformar a realidade material através do trabalho para satisfação de suas
necessidades, o homem modifica sua condição histórica, difere-se dos demais animais,
concomitantemente, modifica também sua inserção nessa realidade e seu modo de
compreendê-la.
O acirramento das contradições entre as classes sociais gerou, ao longo da
história, diversos modos de produção. O modo de produção construído pela burguesia
em substituição ao sistema feudal, tem como essência a transformação da força de
trabalho a capacidade humana de produzir bens materiais e imateriais em
mercadoria. Ao transformar a soma da força de trabalho e matéria-prima em
mercadoria, o capitalista oferece ao “produtor” uma quantidade de valor menor do que a
que ele realmente produziu.
Dessa forma, na sociedade capitalista, o trabalho é apartado de seu caráter
humanizador e ganha a forma de produtor de valor para o proprietário dos meios de
produção através da expropriação do produto trabalho. A mediação para essa
transformação é o trabalho assalariado.
Nesse momento, as condições objetivas para a construção de uma forma
organizativa da classe trabalhadora que regule, ou dispute o valor do salário estão
postas. De um lado, configurou-se na sociedade capitalista uma minoria proprietária dos
meios e instrumentos de produção e de outro lado uma maioria proprietária apenas da
sua força de trabalho, que recebe pela sua única propriedade, um salário. As classes
fundamentais desse período histórico estão consolidadas sob este modelo produtivo.
O trabalho é alienado do trabalhador, o produto não mais lhe pertence, o
processo não é mais integrado. Tais características referem-se, a num tipo de trabalho
que não existe para a satisfação das necessidades do conjunto da sociedade, mas sim à
acumulação de capital da classe social dominante, a burguesia.
{
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}
As relações sociais e de produção capitalistas assumiram ao longo de mais de
cinco séculos
12
de existência diversas formas de objetivação, mas podemos chamar de
características estruturais as seguintes: criação do capital como meio de produção
indispensável, aprofundamento da divisão do trabalho, produção de mercadorias - valor
de troca - em imensa quantidade graças ao desenvolvimento das forças produtivas e, por
último, mas não menos importante, a criação de uma mercadoria capaz de criar mais
valor - a força de trabalho.
Na condição de mercadoria, o trabalhador recebe apenas o valor de sua própria
reprodução, ou seja, aquilo que reproduzirá sua própria capacidade de trabalho e a de
uma nova geração de trabalhadores. A força de trabalho realiza uma jornada de trabalho
pré-determinada que compreende o tempo de trabalho necessário à sua sobrevivência
somado àquele tempo de trabalho excedente (de onde vem a mais-valia), que serve de
acumulação para o capitalista. O valor de reprodução é o principal definidor dos
salários, embora existam influências de outros aspectos como, as crises cíclicas do
capital e a configuração da luta de classes.
Em Salário, preço e lucro, Marx questiona o surgimento do fenômeno estranho
que levaria à humanidade a essa dicotomia entre aqueles homens proprietários e os
vendedores de sua força de trabalho, ou seja, qual a razão de
encontrarmos no mercado um conjunto de compradores possuidores
de terra, de maquinaria, de matéria-prima e de meios de subsistência,
coisas que, todas elas, salvo a terra no seu estado bruto, são produtos
do trabalho e, por outro lado, um conjunto de vendedores, que não
tem nada para vender exceto a sua força de trabalho, os seus braços e
cérebros que trabalham? (MARX, 2003: 46)
Como processo histórico, a expropriação original, ou ainda, acumulação
primitiva, é fruto da separação entre o trabalhador e seus instrumentos de trabalho, do
surgimento da propriedade privada, frente a essa decomposição,
semelhante estado de coisas manter-se-á e reproduzir-se-á numa
escala constantemente crescente, até que uma nova e fundamental
revolução no modo de produção o derrube de novo e restaure a união
original numa forma histórica nova. (idem, ibidem, 47).
12
Não entraremos no caráter controverso da demarcação temporal, apenas estamos remetendo à etapa do
capitalismo mercantil.
{
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}
Em um plano geral, o surgimento de novos modos de produção é possível no
decurso da história, uma vez que uma classe com características históricas e sociais
revolucionárias destrua o sistema de propriedade vigente e seu fenomênico potencial de
generalização. A intensificação da luta de classes pode resultar numa transformação
estrutural do modo de produção dando uma nova direção à vida econômica e social,
como aconteceu com a derrubada do sistema feudal.
Com a emergência do movimento operário no século XIX, resistente à
expropriação do modo de produção capitalista exposta acima, a nova forma organizativa
construída contra uma das características inerentes ao sistema de salários
13
, a tendência
da redução do preço da força de trabalho, foi o sindicato.
No atual estágio do modo de produção capitalista, poderíamos identificar uma
grande quantidade de formas organizativas privadas que se propõem representar a classe
trabalhadora, tais como os movimentos sociais de inúmeras vertentes
14
, partidos
políticos e sindicatos, organizações não-governamentais dentre outros. No entanto, o
sindicalismo se tornou uma das formas predominantes de organização dos trabalhadores
com o desenvolvimento do capitalismo. Desse modo, entendemos a forma de
organização sindicato, objeto desta pesquisa, como uma das formas históricas possíveis
de organização da classe trabalhadora, não a única e mais importante, mas com
especificidades, possuindo limites estruturais, assim como possibilidades de
conscientização de classe.
As entidades sindicais dos trabalhadores, enquanto instituições criadas a partir
das indústrias capitalistas e sobre as bases do salariato, têm o propósito, na maioria dos
casos, de defender os trabalhadores da ria do capital, negociando o valor pago à força
de trabalho. Por um lado, o capital intensifica a extração de mais-valia, diminuindo a
quantidade de trabalho paga ao trabalhador e, por outro, o sindicato negocia o valor
dessa mercadoria força de trabalho, sem no entanto, conseguir abolir o trabalho
assalariado. Na visão de Rosa Luxemburgo, os sindicatos representam
13
O salário, enquanto mecanismo de regulação da produção do valor, é o elemento funcional do sistema
sob o qual elemento repousa a extração da mais-valia e, por isso, o aspecto que primeiro incide sobre a
vida da classe trabalhadora.
14
No Brasil, podemos identificar, sem tentar sermos exaustivos, os seguintes movimentos sociais
organizados: de mulheres, de negros, de homossexuais, ecológico, de portadores de necessidades
especiais, religiosos, que podem ser transclassistas ou ainda de caráter classista, de reforma agrária (MST,
por exmplo), dos sem-teto, associações de bairro, entre outros.
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}
a defesa organizada da força-trabalho contra os ataques do lucro, a
expressão da resistência da classe operária contra a tendência
opressora da economia capitalista. [...] Por conseguinte, transforma-se
a luta sindical, nessas duas principais funções econômicas, em virtude
das condições objetivas da sociedade capitalista, em uma espécie de
trabalho de Sísifo.(LUXEMBURGO;1999: 84)
A contradição presente na análise dialética da forma sindicato consiste na
identificação de seus limites estruturais - pois imersa na própria estrutura construída
pelo capital - e nas possibilidades de conscientização dos trabalhadores frente ao
potencial de acirramento das disputas entre o capital e o trabalho.
Essa forma organizativa, pode tanto colocar as lutas setoriais em contato mais
agudo com a lógica do modo de produção e a contradição entre as forças produtivas e as
relações sociais de produção, como pode oferecer uma solução imediata e superficial a
esta contradição estrutural. Em outras palavras, na busca da superação da função social
de negociar o valor da mercadoria trabalhador, o sindicato precisa ir além da luta
econômica, mas também além da luta política
15
, que tinha para Marx, segundo ALVES,
um sentido reformista:
uma luta política que, em seu conteúdo, mantinha-se, tal como a luta
meramente econômica, vinculada a dimensão do trabalho assalariado
e á reprodução da lógica do capital (ALVES, 2003: 206).
“Sísifo” não pode se libertar exclusivamente por lutas setoriais, sejam elas de
caráter econômico ou político, usando a metáfora de Luxemburgo. Será prisioneiro de
uma ão exaustivamente defensiva ao capital, que opera sempre dentro de sua lógica,
tentando torná-la suportável à classe trabalhadora. Essa ação sindical não é só um
círculo vicioso como descrevia Luxemburgo, mas também uma forma de auto-
destruição (MIRANDA, 2003). Na contradição interna consolidação/ fragilização - se
o sindicato não consegue apontar para uma organização mais ampla, seu isolamento
pode, até mesmo, colocar em xeque sua própria força para desempenhar a função,
minimalista, de negociar o valor da força de trabalho.
Os Sindicatos (Trade Unions) funcionam bem como centros de
resistência contra as investidas do capital. [...] Fracassam geralmente
15
MÉSZÁROS (2002:563-4) esclarece que a definição negativa de política para MARX está atrelada a
crítica da busca apenas do poder político que tenderia a conduzir a substituição do Estado por uma outra
forma e não a sua destruição.
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por se limitarem a uma guerra de guerrilha contra os efeitos do
sistema existente, em vez de simultaneamente o tentarem mudar, em
vez de usarem suas forças organizadas como uma alavanca para a
emancipação final da classe operária, isto é, para abolição última do
sistema de salários.(MARX, 2003: 78).
A gênese do sindicato no sistema capitalista limita-o a uma ação defensiva
contra a exploração capitalista, uma vez que foi criado para negociar o valor da única
mercadoria que produz valor - a força de trabalho. Contudo, a análise concreta do
movimento sindical permite entendê-lo como mediação da luta de classes ao buscar o
centro de sua potencialidade: a conscientização da classe trabalhadora. Dependendo do
caráter pedagógico que o sindicato escolha desempenhar, pode estar o cerne da sua
condição de mediador da transformação da condição de classe em si à condição classe
para si (LUKÁCS, 2003). Em outras palavras, a forma-sindicato pode, efetivamente,
contribuir para os trabalhadores avançarem na compreensão da realidade como
totalidade ao travarem lutas contra o capital.
Para compreendermos o papel que os sindicatos que trazemos como objeto
empírico para esta pesquisa desempenham - se estão circunscritos aos seus limites ou se
adentram no campo das possibilidades - precisamos, antes compreender que categoria
representam. Embora haja muitas similitudes com os demais trabalhadores,
principalmente relacionada a precarização das condições de trabalho,o trabalho dos
profissionais da educação possui algumas especificidades que vão de encontro ao rumo
do sindicalismo de outros setores. A principal delas seria a sua base, cada vez mais
heterogênea, complexa e explorada, porém, ampliada, como veremos a seguir.
I.4
O
TRABALHO DOCENTE NA ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL
Alguns estudos, de caráter marxista ou não, foram feitos sobre a natureza do
trabalho docente. Contudo, diversas questões não foram respondidas ao longo do tempo
e outras se colocaram de acordo com a conjuntura contemporânea.
Entender a natureza do trabalho docente não passa somente pela análise
profunda de técnicas e procedimentos pedagógicos, do conhecimento como fonte do
trabalho, da relação professor-aluno, mas é necessário trazer a inter-relação desses
processos com a totalidade das relações sociais. A educação como fenômeno da
superestrutura pode ser analisada quando localizada no tempo e no espaço. Desse
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modo, a educação não é um reflexo passivo da estrutura econômica da sociedade, mas
estabelece com ela relações de mútua influência, porém em desigualdade de condições,
estando em movimento na construção da realidade.
Como ponto de partida, devemos compreender que local de trabalho é a escola
na relação com a sociedade capitalista contemporânea. É no trabalho docente realizado
nesse espaço que estaremos nos referenciando para refletirmos sobre sua natureza.
Nas comunidades primitivas sem propriedade privada dos meios e instrumentos
de produção e excedentes e, portanto, sem a divisão em classes sociais, o fenômeno
educativo existia. Era de responsabilidade do coletivo, numa experiência
essencialmente prática de vivência no grupo, portanto, sem a materialização do espaço
escolar.
Até o surgimento de um novo modo de produção, esse ideal pedagógico de
adaptar a criança aos interesses e necessidades da comunidade respondeu ao modelo de
uma sociedade sem classes, cujos
fins da educação derivam da estrutura homogênea do ambiente social,
identificam-se com os interesses comuns do grupo, e se realizam
igualitariamente em todos os seus membros, de modo espontâneo e
integral: espontâneo na medida em que não existia nenhuma
instituição destinada a inculcá-los, integral no sentido que cada
membro da tribo incorporava mais ou menos bem tudo o que na
referida comunidade era possível receber e explorar
(PONCE,1996:21. Grifos no original.)
É com a mudança na forma de produção e apropriação no seio da sociedade que
a educação passa a ser compreendida como propriedade privada de uma determinada
classe social, aquela que controla os meios de produção material, começa também a
exercer o controle sobre os meios de produção espiritual.
A separação entre os homens que organizavam a sociedade e aqueles que
executavam as tarefas destruiu a unicidade da educação. Havia a necessidade de
educações diferentes correspondentes à divisão social do trabalho, e “certos
conhecimentos passaram a ser requeridos para o desempenho de determinadas funções,
conhecimentos esses que os seus detentores começaram a apreciar como fonte de
domínio” (idem, ibidem: 26). Assim, a educação foi ocupação das classes dominantes
na etapa pré-capitalista.
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A necessidade de ampliação da educação surge com o capitalismo, mais
precisamente, na transição da manufatura à grande indústria. A educação parcelar para a
classe operária emergente colaborava para a adaptação ao novo modelo produtivo. A
escola, instituição que por excelência desenvolve a função social de transmitir o
conhecimento produzido pela humanidade às novas gerações, consolidou uma estrutura
dual com organizações diferentes para as diferentes classes sociais.
Contudo, a natureza da escola e da produção de bens materiais não é
equivalente, cada uma guarda suas formas sociais correspondentes. Ao analisar a Teoria
do Capital Humano, FRIGOTTO (1989) vai realçar o caráter mediador da escola com a
estrutura da sociedade, demonstrando que não está situada no mesmo campo da
produção de mais-valia e nem é autônoma em relação a tais condicionantes objetivos.
Por não ser da mesma natureza que a produção, a prática educativa:
relaciona-se com essa não de forma imediata e direta, mas de forma
mediata. Sendo essas relações sociais relações de classe e, como tais,
expressam interesses antagônicos, essa mediação é contraditória.
(FRIGOTTO, 1989: 223)
Analisando a escola a partir da contradição inerente a sua estrutura, longe de
entendê-la como meramente reprodutivista da hegemonia capitalista constitui-se numa
ferramenta de disputa da sua própria direção, podendo vir a ser, até mesmo, ferramenta
para disputas outras, enfim, “é uma prática contraditória que engedra interesses
antagônicos” (1989: 214). Mesmo que para o capital essa mediação tenha traços
funcionais que realizam através do fornecimento pela escola “de um saber geral que se
articula ao saber específico e prático que se desenvolve no interior do processo
produtivo, e mediante a dotação de traços ideológicos, necessários ao capital, para a
grande massa de trabalhadores que constituem o corpo coletivo de trabalho” (idem,
ibidem).
Ao criticar as análises fatalistas da relação educação – produção material, o autor
atenta para a “relação dialética entre infra e superestrutura no interior do movimento
histórico” (1989:214). A unidade dialética entre essas esferas, na sua dimensão mais
ampla, guarda o movimento de construção e consolidação do capitalismo enquanto um
sistema. Como reflexo passivo, meramente reprodutivista, a metáfora da superestrutura
em nada pode nos servir como instrumento metodológico de análise. Portanto, a
{
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}
compreensão da totalidade social deve partir da produção humana da existência, nunca
de forma segmentada da sociedade, uma vez que mesmo havendo hegemonia
capitalista, aspectos dinâmicos da luta de classes podem disputar e redirecionar as
formas de consciência social e suas instituições.
A escola enquanto espaço contraditório, de natureza diversa da produção, é uma
mediação na sociedade capitalista e, portanto, dada a configuração da luta de classes
apresenta maior ou menor funcionalidade ao capital e sua expressão essencial, a
produção de mais-valia.
De acordo com o período em questão, caracterizado pelo padrão de acumulação
flexível, a correlação de forças se apresenta adversa à classe trabalhadora, num
movimento que a luta de classes consegue se manifestar, mas pouco consegue conter a
expansão das relações capitalistas. Nesse sentido, o capital tem realizado uma ofensiva
no interior das escolas e no debate educacional, utilizando em benefício próprio
algumas de suas características estruturais e conjunturais.
A função social da escola, transmitir conhecimento produzido pela humanidade
e, em alguns níveis produzir novos conhecimentos, é funcional ao capital na medida em
que possibilita o desenvolvimento das forças produtivas, aspecto primordial para o
desenvolvimento deste e de qualquer outro modo de produção. O desenvolvimento das
forças produtivas é essencial ao desenvolvimento da sociedade, sem produção e
reprodução do conhecimento a sociedade ficaria estagnada.
O trabalho como princípio educativo, mais ou menos explícito conforme o nível
de ensino, faz com que, hegemonizada pelas relações capitalistas, a escola reproduza a
força de trabalho
16
, tal como se necessita hoje. A escola promove a formação de um
trabalhador escolarizado, cujo saber sobre o trabalho será um saber fragmentado e não
um saber em que predomine os fundamentos do trabalho. Além disso, podemos destacar
a dimensão socializadora da escola, de coesão e adaptabilidade social em todas as
sociedades.
16 trabalhadores da educação mais próximos ou mais distantes desse processo de reprodução da força
de trabalho como aqueles que trabalham na educação básica e aqueles que atuam em cursos
profissionalizantes ou ainda de nível médio e superior. Utilizam um determinado conhecimento de forma
desinteressada ou interessada (Gramsci) de acordo com o nível e/ou modalidade de ensino ou ainda de
acordo com a fração de classe a que se destina. Na educação superior, por exemplo, os professores se
movem dentro de um currículo profundamente voltado para os fundamentos daquela profissão, e ainda
seus pesquisadores podem desenvolver pesquisas diretamente voltadas para a produção, ou não.
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A origem da escola como escola de classe, apresenta um aspecto essencial ao
modo capitalista de produção, a dualidade da educação que oferece diferentes escolas às
classes sociais antagônicas. Sem um sistema único de educação para as novas gerações,
a tendência de reprodução da divisão técnica e social do trabalho é prevalente, uma vez
que a negação do conhecimento ou sua disseminação parcelar não contribui para a
emancipação da classe trabalhadora.
Um aspecto conjuntural que podemos destacar é a intensificação da utilização da
escola na acumulação flexível como represamento do exército de reserva, como válvula
de escape dos conflitos sociais em uma sociedade que pode viver com um número muito
menor de trabalhadores industriais do que na etapa fordista. A sociedade atual não
precisa mais da educação geral básica para a reprodução da força de trabalho do
conjunto da população, dado o grau de objetivação do trabalho nas indústrias, o número
decrescente de trabalhadores necessários são capacitados sem o domínio dos
instrumentos técnicos e científicos da produção. Ou seja, a própria expansão da escola
esbarra na contradição apontada por Marx entre desenvolvimento das forças produtivas
e as respectivas relações de produção, funcionando como retração da potencialidade da
classe trabalhadora.
Se a escola fosse meramente uma fábrica de operários, estaria esgotado então
seu prazo de validade, porém é indispensável enquanto sistema de socialização,
sobretudo se observamos que a escola, na etapa da acumulação flexível, é o único
serviço de massas que se expande
17
. Isso ocorre por fatores combinados, seja para dar à
população a sensação de humanização retirada em outras esferas - como saúde, por
exemplo - seja por que sua negação poderia provocar um dano maior que suas
concessões homeopáticas, ou ainda a quebra de empresas que obtêm lucro como
fornecedoras no entorno das escolas como Braverman chama atenção:
Quase toda associação trabalhadora com a empresa moderna, ou com
seus ramos imitativos nas organizações governamentais ou ditas não
lucrativas assumiram a forma de compra e venda da força de trabalho.
Não podemos desdenhar o impacto econômico imediato do sistema
escolar ampliado. Não apenas o dilatamento do limite de escolaridade
limita o aumento do desemprego reconhecido, como também fornece
emprego para uma considerável massa de professores,
17
Este direito universal, a educação, tem se apresentado no neoliberalismo através de um duplo
movimento, de precarização das condições de trabalho e de expansão quantitativa de vagas.
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}
administradores, trabalhadores em construção e serviços e etc.
Ademais, a educação tornou-se uma área imensamente lucrativa de
acumulação do capital para a indústria de construção, para os
fornecedores de todos os tipos, e para uma multidão de empresas
subsidiárias. (BRAVERMAN, 1987: 372)
Esses e outros aspectos que Frigotto denominou de produtividade da escola
improdutiva demonstram que apesar da escola pública não gerar valor de troca no seu
interior, pode contribuir para o processo de valorização do capital e, particularmente,
como meio de acumulação para determinados ramos da economia.
O exposto acima nos leva a afirmar que a escola pode funcionar como anti-valor
(OLIVEIRA, 1998) para o capital e que, embora de natureza diversa da produção em si,
a forma de organização da escola é expressão da divisão técnica e social do trabalho
tal como está constituída na sociedade capitalista. Embora não produza mercadorias e
por isso não seja possível falar em paridade entre escola e produção, as relações sociais
capitalistas - e sua lógica organizativa - se estenderam a todas atividades sociais
existentes e, como todo fenômeno social, gera contraditoriamente no seu interior o seu
pólo oposto.
A escola dessa forma o é uma mera ferramenta e criação
18
do capital, é espaço
vivo de contradições que toma determinada direção de acordo com a luta de classes,
cabendo destacar que “não é da natureza da escola ser capitalista, senão que, por ser o
modo de produção social da existência dominantemente capitalista, tende a mediar os
interesses do capital” (FRIGOTTO, 1989: 223).
Ao buscar as relações da escola com a totalidade pretendemos entender o
contexto onde se desenvolve o trabalho do professor a fim de apreender sua natureza,
entendida aqui não como características imutáveis, mas natureza como sinônimo de
aspectos essenciais de seu trabalho.
A primeira polêmica que se apresenta em diversos textos, dentre eles CAÇÃO
(2001), ALEXANDRE (1993), HYPÓLITO (1991), ENGUITA (1991), APPLE (1995),
SAVIANI (1987), ARROYO (1980), é a classificação sociológica da função docente,
18 Embora haja escolas que tenham sido criadas exclusivamente para fins de reprodução da força de
trabalho em indústrias que tratam especificamente da educação profissional , sistema S ou ainda
sindicatos/ centrais sindicais que oferecem cursos de qualificação profissional, não estamos tratando dessa
modalidade educativa. Estamos nos referindo a escola regular, pública, dita universal.
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ou seja, se o professor é ou não um trabalhador, se é profissional intelectual ou ainda se
sua categoria encontra-se na classe média.
BOITO (1999), apontado anteriormente, demonstra que entre as classes
fundamentais existem diversas frações de classe com interesses e situações econômica e
social um tanto diferenciadas. O que demonstra que as classes fundamentais apenas se
reagrupam, não são homogêneas, mas possuem interesses comuns bem definidos.
Entendemos que as classes fundamentais podem ser definidas essencialmente
como aquelas proprietárias dos meios de produção e aquelas proprietárias
exclusivamente da mercadoria força-de-trabalho e, em um plano intermediário, o que
Marx chamou de pequena burguesia ou classe média, que reúne desde aqueles
profissionais empregados diretos do capital ou do Estado em postos de direção e
supervisão até aqueles que trabalham como profissionais liberais.
O estudo de Braverman sobre os processos de trabalho dentro do setor de
serviços, especialmente o trabalho nos escritórios, demonstra que a classe média
clássica em especial os trabalhadores de escritórios - sofreu um processo de
proletarização na medida em que foi perdendo suas qualificações e, conseqüentemente,
o domínio sobre seu processo de trabalho. O que antes era chamado de classe
trabalhadora ou classe operária, dado o nível de alargamento das relações produtivas
capitalistas começou a estabelecer grandes similitudes à “velha classe média”, uma vez
que o capitalismo colocou todos na condição de vendedores da mercadoria força de
trabalho:
As camadas médias do emprego: como a classe trabalhadora, ela não
possui qualquer independência econômica ou ocupacional; é
empregada pelo capital e afiliados, não possui acesso algum ao
processo de trabalho ou meios de produção fora do emprego, e deve
renovar seus trabalhos para o capital incessantemente a fim de
subsistir. Esta parcela do emprego abrange os engenheiros, técnicos,
quadro científico, os níveis inferiores da supervisão e gerência, o
considerável número dos empregados especializados e “liberais”
ocupados em mercadejamento, administração financeira e
organizacional e semelhantes, fora da indústria capitalista, em
hospitais, escolas, repartições públicas, etc. (1987: 341. Grifos
nossos).
Se a categoria de docentes já pertenceu à classe média na esfera econômica,
gozando de status social, ou como grupo que realiza potencialmente trabalho intelectual
{
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e/ou de supervisão, ou ainda, visto como pertencente ao grupo de profissionais liberais,
na atualidade precisa de uma nova análise e, por conseguinte, uma nova definição de
classe. A pauperização da categoria como um todo (e/ou sua proletarização) pode ter se
dado de forma articulada e simultânea à ascensão individual de cada professor
SILVEIRA (2002: 39). Ou seja, a categoria que foi perdendo o prestígio social ao longo
das últimas décadas era formada por uma determinada classe social e as novas gerações
que começaram a compor esta categoria têm sua origem, em geral, na classe
trabalhadora mais explorada.
Entendemos que professor é o trabalhador que vende sua força de trabalho para
uma instituição educacional (estatal ou privada) e que sobrevive desse trabalho e não de
outro. O professor realiza um trabalho de grande valor de uso, sendo remunerado para
seu exercício na divisão social do trabalho. Os trabalhadores da educação são
trabalhadores assalariados em sua totalidade, sem propriedade dos meios de produção,
possuindo parcial controle do processo de trabalho e flexibilizado nas suas formas de
contratação.
Quando dizemos que os trabalhadores da educação são assalariados, estamos
afirmando que não um número relevante de professores cuja forma de contratação
esteja fora das relações sociais capitalistas. O professor deve vender sua força de
trabalho ao Estado - seu maior empregador - ou à empresa de serviços educacionais
privada. São esses espaços de atuação que um trabalhador da educação possui. Possuir o
conhecimento específico de sua área não basta para que exerça sua profissão, ou seja, o
conhecimento não é o único instrumento de produção necessário. Atualmente, fora da
instituição escolar não há exercício da docência. Portanto, a escola pública ou privada, o
curso, ou ainda a empresa que oferece educação à distância são os principais meios de
produção, sem os quais o conhecimento profissional do professor se iguala ao
conhecimento profissional de um soldador sem seu equipamento de soldagem. Tal
analogia se no sentido de que o professor não pode exercer sua profissão com fins de
sobrevivência sem estar devidamente empregado, ou seja, em contato direto com os
demais instrumentos e meios de produção da educação.
Com relação ao controle parcial do processo de trabalho podemos apontar a
divisão técnica e social dentro das escolas expressa na transposição de técnicas de
administração empresarial, na fragmentação pedagógica, no distanciamento entre
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concepção e execução da qual fazem parte os especialistas (supervisores, orientadores,
administradores), exaustivamente analisados pelos críticos da pedagogia tecnicista, além
do fetichismo da autonomia que permeia a academia e o coletivo de professores.
Hypólito trata desse debate:
A escola transitou de um modelo tradicional, que se caracterizava pela
autonomia do professor em relação ao ensino e à organização escolar
e por processos burocráticos praticamente inexistentes, para um
modelo técnico-burocrático, caracterizado pela redução da autonomia
do professor em relação ao ensino e à organização da escola divisão
de tarefas, formas de controle, hierarquização (HYPÓLITO, 1991: 4)
Enquanto fenômeno social (e não natural), a autonomia do trabalhador pode
possuir diferentes graus, a sua manifestação maior ou menor em uma dada profissão
será expressão da produção material e das relações sociais correspondentes. A tese da
autonomia inalienável do trabalho docente defendida em diversos textos acadêmicos
apresenta-se, hoje, refutável. Transformou-se em uma autonomia rarefeita, síntese das
múltiplas determinações da configuração do espaço escolar, de sua relação com o
Estado ou com a iniciativa privada. A questão que se coloca é se o professor é um
trabalhador livre para planejar e executar seu trabalho. De um modo geral, podemos
dizer que sim, uma vez que não existe dentro de cada sala de aula um inspetor que
acompanha e registra o seu desenvolvimento. Porém caímos em situação similar a que
Marx se refere sobre a dupla liberdade do trabalhador de vender sua força de trabalho e
ser livre da propriedade dos meios e instrumentos de produção.
Poderíamos fazer uma analogia dizendo que o professor possui uma dupla
autonomia, que se expressa por um lado, pela autonomia de exercer sua criatividade sem
tempo para o planejamento dada a intensificação de sua jornada (chegando a trabalhar
até três turnos por dia em escolas diferentes) e por outro lado, a autonomia de planejar
aulas com sua baixa qualificação de fato, devido ao nível cada vez mais precário de
formação de professores e escassez de recursos humanos e físicos nas escolas públicas.
A autonomia não pode ser completamente alienada da classe trabalhadora, porém, a
superestimação da autonomia do professor não pode ocultar as relações sociais em que
este tipo de trabalho está inserido, não pode tornar-se um fetichismo aparentando uma
força mística que impede o capital de qualquer forma de subordinação.
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Com relação às formas de flexibilização da contratação da força de trabalho,
característica peculiar da acumulação flexível, podemos afirmar que houve uma
ampliação da base docente sob formas de crescente precarização. Existe uma clivagem
entre as escolas públicas e as escolas privadas no que tange à forma de contratação, por
isso dividiremos a análise em dois blocos.
Com relação às escolas públicas, se antes existia a figura do professor efetivo
como regra, ele agora compartilha de outras formas de contratação. Portanto, podemos
destacar três formas predominantes de contratação na rede pública: o professor efetivo,
o professor temporário e o professor precarizado. O professor efetivo é o servidor
público, concursado, estável, estatutário; o professor temporário é aquele profissional
de contrato por tempo determinado, em substituição ao incompleto quadro efetivo (sem
o direito a sindicalização previsto em alguns sindicatos), organizados sob o regime da
CLT; e, por fim, o professor precarizado que é aquele que realiza a ampliação de carga
horária via contrato provisório pode ser servidor efetivo ou temporário da rede de
ensino - sem nenhum direito trabalhista como licença médica, férias, 1 salário na
maioria dos casos. Este último exemplo é amplamente difundido na maior parte dos
municípios e estados, sendo a solução conveniente aos governos para a falta de
profissionais efetivos, inclusive como forma de pressão aos movimentos grevistas e
demais atividades de reivindicações da categoria, transformando-se na principal forma
de ampliação da jornada de trabalho dos docentes
19
.
Não muito divulgada, mas presente em algumas realidades, são as
terceirizações-extrajurídicas de professores realizadas pela comunidade escolar que
reúnem fundos através de “caixinhas” ou de empresas que fazem doações financeiras às
escolas públicas.
Com relação às formas de contratação na rede privada temos os professores-
horistas, que podem estar trabalhando baseados na CLT ou não, ou seja, podem ter sua
carteira de trabalho assinada ou sem qualquer proteção legal, o que gera instabilidade de
seus direitos, como por exemplo, as férias.
19 O regime de contratação através da duplicação ou triplicação da carga horária é uma dinâmica que,
uma vez estabelecida nas redes, encontra grandes dificuldades de ruptura. O Estado não quer romper tal
contratação temporária por ser uma forma de explorar ainda mais um profissional habilitado, os
trabalhadores não querem romper por ser a chance imediata de aumentar seu salário dobrando a carga
horária e os sindicatos não enfrentam jurídica e politicamente a questão para não causar
descontentamento à base.
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Nesse contexto, o professor-trabalhador-assalariado, que tem mais de um
emprego, na maioria dos casos, devido aos baixos salários
20
, pode estar sujeito a todas
essas formas de contratação em cada local de trabalho. Pode ser um professor-horista de
carteira assinada pela manhã, um professor efetivo à tarde, um professor precarizado à
noite e ainda um professor-horista sem proteção legal num curso pré-vestibular aos
sábados. Certamente esta multiplicidade de contratos trabalhistas vai interferir na
organização desses trabalhadores, aspecto que discutiremos adiante.
A fragmentação da categoria docente começa pelas diferentes formas de
contratos de trabalho em exercício numa mesma escola ou rede educacional, ou de um
mesmo trabalhador em locais de trabalho diferentes, como vimos acima, havendo,
porém, ataques direcionados ao conjunto dos trabalhadores da educação como a
previdência que vem sendo colocada nas mãos da iniciativa privada; a substituição de
planos de carreira por avaliações de desempenho e produtividade
21
que destroem a
paridade entre profissionais da ativa, também o faz em relação aos aposentados, o
sucateamento das condições objetivas de trabalho, queo desde a inexistência de
materiais escolares até a proibição legal de se alimentar na sua unidade de trabalho com
a merenda escolar, sem haver qualquer substitutivo como vale refeição e horário
assegurado de almoço.
Contribuindo para a precarização das condições de trabalho e desvalorização
deste setor, um grande chamado do Estado à sociedade civil ao financiamento da
educação pública, incentivo a “parcerias” e trabalho voluntário
22
, difundido a idéia de
20 Os salários dos professores são abaixo de seu próprio valor, ou seja, o professor recebe menos que o
necessário para reproduzir sua categoria. O valor da força de trabalho pode ser rebaixado pela média paga
aos trabalhadores do setor, por exemplo, os salários pagos aos professores pelos governos são tão baixos
que rebaixam a média de salários da categoria e, se por ventura, uma escola privada pagar um salário
acima da média, ainda assim, provavelmente, será abaixo do necessário para sua reprodução. Mas, como
o capital precisa reproduzir esta força de trabalho busca uma equivalência entre o salário e a reprodução,
o que vai se traduzir no rebaixamento da qualidade de formação desses trabalhadores, ou seja, é uma
tendência generalizável para a área de formação de professores a relação paradoxal entre aumento do
nível de escolaridade e esvaziamento de seu conteúdo. o faremos uma análise desta decadência da
qualidade da formação, o que percebemos é que quanto à escolaridade exigida não uma mudança
significativa, a não ser no profissional que trabalha nas séries iniciais, cuja tendência é a de elevação da
escolaridade a um determinado tipo de ensino superior. Enfim, a escolaridade segue a letra da LDB, a
equivalência é buscada através da queda na qualidade da formação.
21
No município e estado do Rio de Janeiro temos os exemplos do programa Nova escola, a esse respeito
ver NAJJAR (2004) e a diminuição do tempo de aula a fim de aumentar a “produtividade” do professor.
22
Um exemplo é o programa “Amigos da Escola” implementado pelo governo de Fernando Henrique
Cardoso, ainda em vigência.
{
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}
que qualquer um pode exercer a docência sem a exigência de formação, como se esta
tivesse sido transformada num trabalho em geral, abstrato.
A compreensão do contexto em que o trabalho docente está inserido na
atualidade nos permite analisar com fundamentação empírica a natureza do seu trabalho
e o grau de subsunção dessa categoria ao capital na próxima seção.
I.5
N
ATUREZA DO TRABALHO DOCENTE
Discutimos acerca da precarização do trabalho docente nas suas condições
objetivas e subjetivas. Cabe nesta seção, um exercício de definição de sua natureza de
trabalho levando em consideração tais aspectos apontados acima.
Embora a instituição escola tenha uma origem pré-capitalista, as relações sociais
e produtivas do modo de produção atual se expandiram a muitas esferas, chegando,
inclusive ao seu interior. A lógica capitalista reestruturou o espaço escolar, impondo sua
organização dos processos de trabalho através da divisão técnica e social do trabalho,
implementando novas formas de contratação e alterando o nível de subsunção destes
trabalhadores ao capital.
Consideremos a afirmação de Marx que um trabalho de idêntico conteúdo pode
ser produtivo ou improdutivo” (s/d: 115) para concluir que as categorias de trabalho
produtivo e trabalho improdutivo não são precisas para iniciarmos a análise da natureza
do trabalho docente. Como a caracterização não advém da natureza de um trabalho
específico, mas sim das relações sociais que se estabelecem a partir deste trabalho, o
professor pode, numa circunstância, ser definido como trabalhador produtivo e, noutra,
como trabalhador improdutivo, uma vez que sua característica fundamental é a
capacidade de gerar mais-valia.
Em Teorias da mais valia, Marx utiliza como exemplo fora da produção material
o caso dos professores:
Nos estabelecimentos de ensino, por exemplo, os professores, para o
empresário do estabelecimento, podem ser meros assalariados;
grande número de tais fábricas de ensino na Inglaterra. Embora eles
não sejam trabalhadores produtivos em relação aos alunos, assumem
{
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}
essa qualidade perante o empresário. Este permuta seu capital pela
força de trabalho deles e se enriquece por meio desse processo. (1980:
404).
Embora trabalho produtivo e improdutivo não sejam categorias que definam a
categoria docente em seu conjunto, é um apontamento importante para mais adiante
subsidiar a análise da base de sindicatos da rede pública e da rede privada, visto que
nesse caso, estaremos analisando as relações sociais presentes.
Sabemos que também não é possível definir sua natureza através da separação
entre trabalho intelectual e manual, grande equívoco cometido por muitos autores.
Definir a profissão docente como intelectualizada simplesmente tem sido uma forma de
“resistência” encontrada por muitos autores contra a ofensiva capitalista de
desqualificação, como se a condição intrínseca de trabalho intelectual dos professores
afastasse completamente a possibilidade de objetivação do seu trabalho. Porém, a
resistência semântica é mera figura de retórica e examinar a natureza docente em sua
essência é que pode possibilitar uma compreensão da questão com vistas à superação de
sua condição subordinada.
Para GRAMSCI (2000), embora em determinadas funções sociais incidam graus
diferentes de elaboração intelectual e esforço muscular-nervoso, não “há atividade
humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual, não se pode separar o
homo faber do homo sapiens” (2000, vol. II, 52-3).
As tentativas de separação entre concepção e execução na divisão de trabalho na
produção obtêm, no ximo, uma prevalência ou do trabalho manual ou do trabalho
intelectual numa dada tarefa, nunca a eliminação de uma das esferas que compõem a
unidade humana.
Como discutimos na seção anterior, o grau de autonomia do professor é cada vez
menor
23
, seja pela ampliação de sua jornada de trabalho, seja pelo rebaixamento de seu
nível de qualificação. A cristalização da imagem do professor como um sujeito pleno de
autonomia, de exercício intelectual inalienável, oculta as origens históricas de seu
processo de proletarização.
Todavia não respondemos à nossa questão central negando a análise do trabalho
do professor através dessas categorias dados seus limites. O que definiria, então, a
23
Embora a autonomia nunca possa ser exterminada completamente em nenhum tipo de trabalho. Nem o
artesão era absolutamente autônomo, nem o trabalhador fordista completamente alienado.
{
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}
natureza do trabalho docente? Segundo Saviani (1987) uma possibilidade é entendê-lo
como inserido no âmbito do trabalho imaterial. Embora seja uma boa direção para o
debate, discordamos apenas da afirmação que “a produção não material não está
diretamente vinculada ao modo de capitalista de produção” (80). E mais adiante, que
“pela própria natureza da coisa, isto é, em razão da característica específica inerente ao
ato pedagógico, o modo de produção não se dá, aí, senão em algumas esferas” (81),
fazendo referência a Marx.
Marx, influenciado pelo contexto histórico do século XIX, ao explicar a relação
entre o modo de produção capitalista e a produção social, afirma que:
A produção imaterial, mesmo quando se dedica apenas à troca, isto é,
produz mercadorias, pode ser de duas espécies:
1. Resulta em mercadorias, valores de uso, que possuem uma forma
autônoma, distinta dos produtores e consumidores, quer dizer, podem
existir e circular no intervalo entre produção e consumo como
mercadorias vendáveis, tais como livros, quadros, em suma, todos os
produtos artísticos que se distinguem do desempenho do artista
executante. A produção capitalista é aplicável de maneira muito
restrita. (...)
2. A produção é inseparável do ato de produzir, como sucede com
todos os artistas executantes, oradores, atores, professores, médicos,
padres, etc. Também o modo de produção capitalista se verifica
em extensão reduzida e, em virtude da natureza dessa atividade e, em
virtude da natureza dessa atividade, pode estender-se a algumas
esferas (1980: 404).
No caso dos professores podemos dizer que as duas formas de realização do
trabalho imaterial estão postas na atual realidade educacional. A não separação entre
produção e consumo existe nas escolas presenciais e ainda é maioria na atualidade.
Porém a expansão da Educação à distância é uma tendência inconteste, colocando a
educação e o trabalho de professores em um nível de objetivação nunca antes visto. A
produção se separa do ato do consumo nessa modalidade de ensino, o modo de
produção retira da escola suas características pré-capitalistas e se aplica em sua
inteireza. O processo de trabalho dos professores não se resume mais ao segundo caso, o
que nos leva a afirmar que aumentou o grau de subsunção ao capital.
{
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}
Estamos, portanto, diante da objetivação do trabalho docente e dos desafios
postos na atual etapa capitalista, que possui características chamadas de pós-modernas
por JAMESON, que “finalmente dissolve o cultural no econômico e o econômico no
cultural” (2001: 22). Sem querer tratar de todas as polêmicas desse debate, chamamos
atenção para o fato dos trabalhos imateriais estarem sofrendo uma forma de
incorporação à produção distinta das fases anteriores, expressão do capitalismo tardio e
suas formas de encurtamento entre base e superestrutura.
Quanto ao fato do modo capitalista de produção se aplicar na sua inteireza ou
não à escola, acreditamos que por serem de naturezas diversas, a análise da escola não é
uma simples transposição da análise da produção de mercadorias, mas é possível
realizar analogias. É precisamente no esforço de compreender a natureza do trabalho
docente frente às mudanças ocorridas na acumulação flexível que afirmamos que o
trabalho docente caminha na direção da subsunção formal à subsunção real do trabalho
ao capital. Tal etapa deve ser entendida na extensão de seu movimento, como etapa
transitória e, provavelmente, nunca conclusa.
O que estamos querendo dizer é que definir o trabalho docente na etapa de
subsunção formal não explica mais a sua condição, uma vez que o professor não é mais
um mestre- escola , não é empregador de si mesmo, ele não possui o controle total de
seu processo de trabalho, tampouco os meios e o conjunto dos instrumentos de
produção. Só lhe restou uma ferramenta de trabalho, que é o conhecimento parcial de
sua área de atuação, um conhecimento livre, não patenteado
24
, que está à disposição da
sociedade de diversas formas. Assim como também não nos parece correto afirmar que
a dependência do professor seja restrita à dependência econômica do comprador de sua
força de trabalho e que “não existe nenhuma relação política, fixada socialmente, de
hegemonia e subordinação (s/d: 94)”, aspectos que Marx considera uma das premissas
essenciais da subsunção formal
25
.
Marx não via os estágios de subsunção formal e real como independentes, mas
como faces do movimento histórico de desenvolvimento capitalista. As categorias não
são estáticas, as formas de subsunção podem ser criadas e recriadas em uma dada
24
Dentre as complexificações da sociedade contemporânea, podemos destacar a própria mercantilização e
exercício da propriedade privada sobre o conhecimento através das patentes.
25
Retomaremos essa discussão nos próximos capítulos.
{
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}
circunstância histórica, portanto categorias de análise dinâmicas
26
. Partindo dessa tese,
observamos que uma determinada profissão não estará eternamente situada em um
estágio de subsunção. Este é o caso da categoria docente que não mais se encontra
subsumido apenas formalmente ao capital. Por isso, discordamos da conclusão de
CAÇÃO (2001) ao afirmar que ao:
trabalho docente, por sua natureza e especificidade, não se aplicaria
senão de forma limitada, o modo de produção capitalista, sendo-lhe
impossível sofrer completo processo de objetivação, controle e
parcelarização, consideramos a subsunção formal do trabalho docente
ao capital, no sentido específico que Marx confere a esse conceito,
uma categoria profícua de análise” (2001: 194-5).
Cabe destacar que um importante diferencial de análise é que não entendemos o
conhecimento como meio de produção e sim como ferramenta de trabalho. Temos,
segundo o Dicionário do pensamento marxista (BOTTOMORE
(org.)
: 2001), três
elementos que compõem o processo de trabalho:
primeiro, o trabalho em si, uma atividade produtiva com um objetivo;
segundo o(s) objeto(s) sobre os quais o trabalho é realizado; e terceiro,
os meios que facilitam o processo de trabalho. [...] Os objetos do
trabalho e os meios do trabalho, em conjunto, são chamados de
“meios de produção”. (299).
Portanto, o que garante a um professor graduado o exercício de sua profissão
com fins de subsistência? O conhecimento adquirido ao longo da sua formação? A
certificação? Não apenas. Com esta ferramenta - o conhecimento - o profissional recém
formado não exerce sua profissão. Ele precisa tornar-se um trabalhador assalariado,
vender sua força de trabalho no “mercado educacional”, seja essa venda efetivada para
entes públicos ou privados. É nesse sentido, que afirmamos acima que o professor se
assemelha a um soldador, quando o domínio dos fundamentos do trabalho não lhe
garante a existência enquanto trabalhador individual, e que, portanto, deve tornar-se um
“trabalhador coletivo”, deve subsumir-se às relações sociais capitalistas. O seu
conhecimento na verdade é uma ferramenta imaterial de trabalho. Professor e soldador,
26
A própria análise da transição do fordismo para a acumulação flexível, nos possibilita notar que este
grau de subsunção pode tanto ter um caráter crescente, quanto decrescente. Na etapa fordista o domínio
do processo de trabalho pelo operário era irrelevante, ao passo que na acumulação flexível podemos notar
um recuo nesta esfera, sob o que denominamos de desalienação provisória e ilusória dos processos de
trabalho.
{
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}
ambos precisam dominar alguns dos fundamentos de seu trabalho, seja para dar aula,
seja para realizar uma solda.
Dessa forma, temos como meios e instrumentos de produção da educação as
escolas, sejam oriundas das redes municipais, estaduais, federais ou privadas em
qualquer uma das modalidades de ensino e a posse do conhecimento não faz do
professor um proprietário dos meios de produção
27
.
Tentamos proceder a análise não em termos absolutos, mas como processo,
movimento, como lei tendencial, chegando, então, a conclusão que o trabalho docente
encontra-se na fase transitória entre a subsunção formal e a subsunção real dos
processos de trabalho, onde a primeira etapa foi superada e a segunda ainda não se
completou.
Essa é a tendência, um processo crescente de alienação (ou perda de autonomia)
do trabalho docente, de transformações essenciais em sua forma. O que nos leva a
concluir que, enquanto relações historicamente determinadas, o trabalho docente tende a
uma subsunção real ao capital. Na falta de uma momenclatura melhor, poderíamos
definir este estágio como uma subsunção proto-real do trabalho docente ao capital.
A escola ainda não pode ser definida, no conjunto, como um serviço de vendas
de mercadorias, portanto, não é um modo de produção específico que “transforma
totalmente a natureza real do processo de trabalho e as suas condições reais” (MARX,
s/d: 104), sendo um equívoco tratar o trabalho docente como subsumido realmente ao
capital. Contudo, as relações sociais e o próprio processo de trabalho apresentam o
modelo das relações capitalistas em seu conjunto, a introdução de tecnologias neste
trabalho torna possível o processo de objetivação
28
que nunca será completamente
implementado, sempre será variável, apresentando um determinado grau de objetivação
em relação às demais formas de trabalho. E o grau hoje de objetivação do trabalho
27
Professores que possuem escolas são de fato professores ou capitalistas? É possível a esta categoria,
trabalhar em sua profissão fora das escolas, tenham elas as características que tiverem? As respostas a
estas questões são negativas. As aulas particulares são em um número tão insignificante que podem ser
desconsideradas para efeito de análise e também só existem em função da existência das escolas.
28
A educação a distância, em expansão hoje, representa a parcela da educação que pode ser desprendida,
em seu conjunto, do trabalho docente presencial, seja na educação superior ou ainda na educação
profissional. O trabalho cada vez mais assume uma forma genérica, por que o trabalho está objetivado. O
tutor tem o material objetivado, uma vez que sua própria formação não oferece condições de fugir da
reprodução, não tem instrumentos para gerir o processo. Essas modalidades de ensino são o laboratório
do capital demonstrando que o trabalho docente é objetivável, a questão é por que o capital ainda não
levou isso a cabo.
{
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}
docente ou de subsunção é maior do que no período que Marx analisou. Outra
característica peculiar da subsunção real que podemos perceber no trabalho docente:
Com o desenvolvimento da subordinação real do trabalho ao capital
ou do modo de produção especificamente capitalista não é o operário
individual que se converte no agente (...) real do processo de trabalho
no seu conjunto mas sim uma capacidade de trabalho socialmente
combinada. (s/d: 110).
Como afirmamos anteriormente o professor já não desenvolve sua atividade
profissional senão coletivamente e empregado pelo capital, ou seja, sob a forma de
trabalho socialmente combinada, o conhecimento é fragmentado em especialidades e o
professor, em muitos casos, não sabe exatamente o resultado que seu trabalho provocou
nos alunos.
Por que, então, o grau de objetivação não chegou ao seu limite? Porque para o
sistema capitalista não demanda pela substituição completa do professor, não
interessa ainda tamanha simplificação do trabalho docente frente às dificuldades
inerentes ao processo de objetivação.
É necessário, ainda, levar em consideração a composição dessa força de trabalho
que é barata, possuindo um exército de reserva considerável
29
composto
majoritariamente pela força de trabalho feminina
30
.
As disputas no interior da escola não são meras abstrações, as forças envolvidas
nestas disputas estão em movimento, impondo uma determinada direção. O resultado-
provisório- dessa disputa no espaço público escolar tem sido expressão da hegemonia
do capital, o que não elimina as diversas formas de resistências dos trabalhadores da
educação a essa conjuntura.
Por isso, promovemos a análise da escola como fenômeno superestrutural.
Sendo a escola um espaço de disputas que se sobrepõe a utilização imediata de sua
função social pelo capital - embora lhe seja funcional em inúmeros aspectos- deve ser
29
O último concurso para a rede estadual de educação contou com a maior relação candidato/vaga que se
tem registro para o salário de R$ 431,00.
30
Segundo BRAVERMAN: a porção feminina da população tornou-se o principal reservatório de
trabalho. Em todos os setores da classe trabalhadora, os que mais rapidamente crescem, são constituídos,
na maioria, de mulheres, e em alguns casos, a maioria esmagadora dos trabalhadores. As mulheres
constituem a reserva ideal de trabalho para as novas ocupações maciças (1987: 326).
{
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}
analisada radicalmente nas suas relações internas permeadas de contradições e também
na sua relação recíproca com a totalidade concreta.
Em ntese, poderíamos afirmar que a etapa de acumulação flexível acentuou
mudanças, tempos, em curso no interior da escola. Características do atual padrão
produtivo podem ser percebidas nas escolas através da flexibilização das formas de
contratação, mas também através da convivência de diferentes formas de processos de
trabalho. De um lado, existe a possibilidade real do trabalho docente ser destruído
pela objetivação completa o que ainda não foi levado às últimas conseqüências-, por
outro, a precarização das condições objetivas que representam retrocessos ao
processo de trabalho docente. Em qualquer um destes pólos, o professor está perdendo o
controle do processo de trabalho.
A flexibilização das relações trabalhistas nas escolas alterou a própria natureza
do trabalho docente, que perdendo autonomia vê-se, cada vez mais, subsumido ao
capital. E, alterou também a relação das entidades sindicais com a base, que em sua
maioria, apresenta hoje diferenças dos períodos anteriores. No próximo capítulo
estaremos apresentando parte da história das entidades a fim de balizar seus pontos de
continuidades e rupturas na atualidade.
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}
II - CONTEXTO SOCIAL E EDUCACIONAL A PARTIR DA TRAJETÓRIA
DOS SINDICATOS DOCENTES
{
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}
A trajetória das entidades sindicais ligadas à educação, sobre as quais estamos
realizando esta pesquisa, está entrelaçada à configuração da luta de classes no Brasil.
Em outras palavras, a origem, as concepções e práticas políticas desses sindicatos são a
expressão de como setores da classe trabalhadora da área educacional se posicionam
frente à disputa capital-trabalho e às políticas educacionais resultantes desse embate;
enfim, são aspectos constituintes de sua identidade de classe.
Organizamos este capítulo cronologicamente, de forma que, na primeira seção,
os aspectos políticos, educacionais e sindicais mais relevantes da história do Brasil, da
década de 1930 até os dias atuais, fossem sendo abordados através do surgimento de
cada um dos três sindicatos em análise. O foco da narrativa histórica vai se deslocando
de sindicato a sindicato na medida em que uma nova organização docente nasce no Rio
de Janeiro. Ou seja, em cada período histórico uma entidade assume o centro da
narrativa, decorrendo até a Constituição de 1988, que assegura o direito de
sindicalização dos servidores públicos e a implementação da política neoliberal. A partir
daí, trataremos da anatomia dos sindicatos hoje, ou seja, sua estrutura e o perfil de parte
de seus dirigentes.
Optamos por esta lógica de exposição, uma vez que não é nosso objeto de
estudos o histórico das três entidades em toda sua extensão - o que poderia se desdobrar
em três dissertações. Prevemos as inúmeras lacunas que, certamente, decorrerão desta
opção, mas acreditamos que este é um caminho factível, apesar das limitações.
Em linhas gerais, é possível afirmar que a consolidação da estrutura sindical
brasileira foi, originariamente, determinada pela influência anarquista dos imigrantes
europeus, pela diversidade de experiências da classe proletária que se formava no início
do século XX e, após a Revolução Russa, pelas idéias comunistas, fortalecidas pela
fundação do Partido Comunista do Brasil em 1922.
Nesse período, o Brasil, tinha uma economia de base agrário-exportadora
direcionada ao atendimento do mercado externo que coexistia com indústrias de
{
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}
pequeno porte, financiadas pelo lucro do café e voltadas ao pequeno consumo interno.
A predominância da produção agrícola condicionava o país à importação de produtos
industrializados. Porém, a reorientação do comércio internacional gerada pela I Guerra
Mundial e a grave crise de superprodução de 1929 colocaram em xeque esse fragilizado
modelo, restando à serôdia burguesia agrária a busca de mudanças na política
econômica. Para tanto, fruto de um pacto social entre a nascente burguesia industrial e a
oligarquia agrária, nasceu após 1930, um novo Estado modernizador e arrefecedor dos
movimentos sociais.
A incipiente burguesia industrial, que também começou a organizar suas
entidades de classe, pressionava pela intervenção do Estado na organização dos
trabalhadores através da repressão e até mesmo da formulação de políticas
compensatórias, almejando a recuperação do capital nacional através da
industrialização. Foi nesse quadro que o primeiro governo de Getúlio Vargas deu início
ao processo que se convencionou chamar de industrialização por substituição de
importações, promovendo a “transição para um capitalismo de base industrial
acompanhado de direitos sociais mínimos” (BOITO, 1999:112). Dessa forma, o
governo e o patronato fizeram concessões à classe trabalhadora, através da
regulamentação de direitos trabalhistas próprios do padrão de acumulação vigente como
férias, salário mínimo, carteira de trabalho, previdência e serviços assistenciais aos
quais os trabalhadores retribuiriam com o enquadramento à lógica taylorista e a
produtividade fordista.
Ainda assim, o controle das organizações sindicais era imprescindível para o
governo impor a ideologia de colaboração de classes neutralizando a força social do
movimento operário. Foi criado, então, o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio
(MTIC), órgão implementador da regulação sindical. Esse novo modelo - chamado de
sindicato oficial - era tutelado pelo Estado e subordinado aos seus interesses, composto
por um sistema corporativo e financiado pelo imposto sindical obrigatório, o que
resultou na burocratização das entidades, prestação de serviços assistencialistas e
direções pelegas
31
. Os sindicatos oficiais precisaram disputar a base com os sindicatos
autônomos que continuaram resistindo, contando para isso com a ajuda estatal que
31
Palavra de origem gaúcha que significa a do carneiro usada para amortecer o contato da sela com o
cavalo.
{
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}
vinculou benefícios
32
ao enquadramento das entidades, legitimando-as através da
obtenção da Carta Sindical
33
.
A chamada Revolução de 1930 significou, portanto, uma nova etapa para o
desenvolvimento capitalista brasileiro, o processo de industrialização impôs novas
exigências, tais como a expansão do ensino, ou parafraseando ROMANELLI (1989),
uma demanda social por educação. O ministério da Educação e Saúde foi criado para
organizar as políticas governamentais em torno do binômio educação-desenvolvimento
e um grupo de educadores divulgou o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, de
influência liberal, cuja proposta era “construir e aplicar um programa de reconstrução
educacional de âmbito nacional” (idem, ibdem: 146) que visava a universalização da
escola. Ao longo dessa década o debate em torno da educação ganhava maior dimensão,
e, os movimentos de professores começavam a se consolidar.
Esta síntese pretende contextualizar a fundação do primeiro dos três sindicatos
em estudo, o SINPRO-RIO, que ocorreu exatamente no marco da criação dos sindicatos
oficiais e polarizou, durante alguns poucos meses, com o Sindicato dos Trabalhadores
do Ensino do Rio de Janeiro
34
de orientação anarco-sindicalista.
II.1
O
S
INDICATO DOS
P
ROFESSORES DO
M
UNICÍPIO DO
R
IO DE
J
ANEIRO E REGIÃO
-
(S
INPRO
-
RIO
)
35
E O
E
STADO
G
ETULISTA
Em 1931, é fundado o Sindicato dos Professores do Ensino Secundário e
Comercial do Distrito Federal, sob a chancela do governo getulista e no contexto de
regulamentação da profissão docente, através do Registro de Professores no
Departamento Nacional de Educação. Foi criado um conselho gestor que indicaria uma
diretoria presidencialista. Em seguida, em 1932, houve uma ampliação do seu quadro
social, e alteração no nome, passando a se chamar Sindicato dos Professores do Distrito
Federal.
32
Benefícios oriundos das novas leis trabalhistas do primeiro governo Vargas.
33
Designação do registro burocratizador das entidades no MTIC.
34
Este último sindicato que já unificava todas as categorias dos trabalhadores em educação, e não
professores, teve uma existência muito curta, de julho a novembro de 1931. A esse respeito ver COELHO
(1988).
35
Optamos pela denominação atual do sindicato nos subtítulos, embora possuíssem outras siglas na
{
PAGE
}
Nesse período, o trabalho docente podia ser considerado como semi-assalariado,
uma vez que se adequava às possibilidades de trabalho da realidade da educação
brasileira organizada através de cursos seriados e cursos preparatórios
36
. Cabe destacar
que este sindicato foi classificado pelo Ministério do Trabalho como pertencente à
categoria de profissionais liberais, até 1938.
A Reforma Francisco Campos principiou um conjunto de políticas educacionais
que criou a base material para a expansão da categoria docente trabalhadora da rede
privada ao longo da década de 1930. Essa reforma organizou um sistema nacional para
algumas modalidades de ensino, dentre elas o ensino secundário e comercial - área
majoritária da base deste sindicato - tornando-o obrigatoriamente regular e presencial,
além de oficializar a rede privada de ensino. Nesse momento, os professores perdiam o
caráter de profissional liberal e adentravam majoritariamente para o assalariamento, um
dos aspectos importantes para a compreensão do crescimento sindical dessa categoria.
A rede pública educacional era, nesse período, incipiente, o que levou os
professores, saídos da condição de profissionais liberais, a se empregarem, em grande
parte, nas redes privadas de ensino que existiam em número significativo. Os
professores, que pertenciam às classes médias, sofreram uma queda no seu padrão de
vida devido a nova realidade de pagamento oferecida pelas escolas privadas
O sindicato, envolvido com a euforia pedagógica característica dos projetos
nacionalistas dos “Pioneiros”, encaminhou à comissão da Constituinte de 1934
37
uma
proposta de Plano de Educação Nacional, demonstrando que se ocupavam também
desse debate. SHIROMA (et.al) afirmam que as polarizações no debate sobre um
projeto de educação que contribuiria para a reforma da sociedade divergiam apenas no
plano fenomênico:
Dois projetos educacionais, da Igreja católica e dos defensores de uma
educação nova, adequada aos novos tempos, sobrelevaram em
importância, mas eram, sem dúvida, diversos apenas na superfície.
ocasião de sua fundação, a fim de não suscitar dúvidas sobre qual entidade estamos nos referindo.
36
Para os cursos preparatórios, de caráter propedêutico, os alunos buscavam as aulas-particulares e para
os seriados, as escolas. Isso viabilizava o exercício do trabalho docente como atividade liberal, vendendo
serviços àqueles alunos que podiam pagar pela preparação para os exames e empregando-se através do
Estado ou de empresa privada de ensino.
37
A Constituição de 1934 atribuiu ao Estado o dever da educação e exigiu a elaboração do Plano
Nacional de Educação e diretrizes nacionais para a educação.
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}
Não existia discordância de fundo entre eles: ambos se adequavam,
cada um a seu modo, às relações sociais vigentes e nem um nem outro
as colocavam em questão. (2000: 22)
Além da discussão em torno de um projeto nacional de educação, o sindicato,
nesse período
apoiou a criação do Registro de Professores e propôs alterações; fez
oposição às instruções de exames para 1931; lutou pelo pagamento
dos 70% das taxas de exames destinados aos professores e,
principalmente, pelo pagamento das férias (COELHO, 1988: 30).
Entretanto, a reivindicação sobre o pagamento de férias e demais
regulamentações trabalhistas não foram aceitas, mesmo com representação da entidade
no parlamento através de um deputado classista. Então, o sindicato voltou-se para uma
nova prioridade, a formação de cooperativas de ensino, talvez como uma tentativa de
recuperar a autonomia através dessa figura jurídica e ganhos econômicos similares aos
recebidos no exercício liberal da profissão, perdidos com o sistema de salários.
Essa recusa do Governo Provisório em atender parte dos interesses desses
trabalhadores gerou, na diretoria do sindicato, uma temporária postura oposicionista ao
governo que durou até o golpe do Estado Novo, que centralizou ainda mais o poder do
governo a pretexto da ameaça comunista. A repressão do governo causou o desmonte do
sindicato que decaiu de 558 filiados (1936) para 3, perdendo o registro sindical do
Ministério do Trabalho (COELHO, 1988).
No contexto de acirramento da disputa em torno da laicização do ensino na
Constituinte, e de interesses privatistas ou confessionais, sinônimo utilizado pela ala
católica para a hegemonia ideológica e financeira da educação-, foi promulgada a
Constituição de 1937, na ditadura do Estado Novo, que, ao contrário da de 1934, limitou
a responsabilidade do Estado no oferecimento à educação, tornando-a supletiva,
ampliando assim o campo de atuação das empresas privadas de ensino.
A carta sindical foi recuperada pelo Sindicato dos Professores do Distrito
Federal quando, em 1938, tomou posse uma nova diretoria aliada ao governo. Ao
contrário de COELHO (1988), não atribuímos as conquistas trabalhistas que se
seguiram à gestão da diretoria indicada (1938-1943), mas à política populista de Getúlio
Vargas inserida na conjuntura nacional e internacional que visava conter a insatisfação
{
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}
dos trabalhadores devido às restrições aos direitos trabalhistas
38
causadas pela entrada
do Brasil na II Guerra Mundial. Com o aumento das pressões pelo fim da ditadura, a
estratégia do governo foi a consolidação da política populista que ao mesmo tempo
fazia concessões urgentes e preventivas à crescente reorganização dos movimentos
sociais
39
e buscava novas bases de apoio para a manutenção do poder durante a abertura
democrática.
A legislação trabalhista, criada em 1937, inspirada na Carta del Lavoro da Itália
fascista, visava obter o consenso entre os trabalhadores e atrelar ainda mais o sindicato
ao Estado, criando as federações e confederações as quais os sindicatos deveriam
hierarquicamente se submeter. Com relação às questões trabalhistas:
o governo organizou, em maio de 1939, a Justiça do Trabalho, cuja
origem eram as juntas de Conciliação e Julgamento. A sistematização
e ampliação da legislação trabalhista se deu com a Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), em junho de 1943 (FAUSTO, 1995: 374).
Em 1945, o Estado Novo chegava ao fim deixando para os trabalhadores, em
geral, concessões trabalhistas, como as apontadas acima
40
, e para os trabalhadores da
rede privada de ensino, uma portaria ministerial que regulamentava a base de cálculo
do salário, o que na prática representou um aumento de 33%, estabeleceu um limite da
jornada de trabalho, dentre outras medidas que atendiam parcialmente às reivindicações
da categoria.
No campo da educação pública, a ditadura do Estado Novo não fez as mesmas
concessões, o debate foi minimizado pela supressão das liberdades civis, a dualidade
educacional sistematizada através da prioridade à educação profissionalizante necessária
ao desenvolvimento. Nesse sentido, o Estado Novo avançou na proposta de construir
uma educação nacional baseada no binômio educação-desenvolvimento expressa na
Reforma Capanema, baixou decretos que instituíram o sistema de Ensino Profissional,
criou o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), reformou o Ensino
38
Intensificação da exploração da força de trabalho: arrocho salarial, corte de férias, aumento da jornada
de trabalho, aumento do custo de vida, em prol do “esforço de guerra”.
39
A União Nacional dos Estudantes (UNE) que viria a representar importante papel contra a ditadura foi
fundada no ano de 1938 e engrossava os movimentos contestatórios nesse período.
40
O Sindicato dos Professores do Ensino Secundário, Primário e de Artes do Rio de Janeiro
(nomenclatura adquirida em 1943) começou a utilizar a Justiça do Trabalho somente no período
democrático, buscando acordos coletivos e, posteriormente, o dissídio coletivo contra o sindicato
patronal. Ver a esse respeito COELHO, 1988.
{
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}
Secundário e o Ensino Comercial, mantendo o dualismo do sistema educacional. A
Reforma Capanema viria a ser complementada, em 1946, concluindo as chamadas “Leis
orgânicas do ensino”.
Os movimentos sociais tentavam se reorganizar no entremeio de escassas
conquistas democráticas e cerceamento político do governo Dutra. No campo
educacional, os Pioneiros da Educação Nova retomavam o debate em torno da
elaboração de bases e diretrizes da educação nacional. O anteprojeto de LDB que
chegou à Câmara, em 1948, marcou o início desse movimento que se efetivou em
1961, sob a lei 4.024/61. No campo sindical, novas entidades foram criadas, o número
de sindicalização aumentou e começaram as tentativas de unificação dos
trabalhadores
41
, porém, segundo MATTOS (2003: 25), “a mais significativa herança da
ditadura a manter-se no período democrático, impondo sérios limites à própria
democracia, foi a estrutura sindical”.
Para não fugir da proposta de substituição de entidades no centro da narrativa,
podemos, muito sinteticamente, afirmar que esse sindicato permaneceu atrelado à
estrutura de sindicato oficial durante toda a sua história até os dias de hoje, arrancando
acordos coletivos ou instaurando dissídios na justiça do trabalho, conforme a correlação
de forças se apresentava às conquistas trabalhistas. O SINPRO-Rio
42
sofreu
intervenções da ditadura militar, chegando a ser colocado, por um período, na
ilegalidade e ter seus diretores perseguidos. No período de redemocratização esteve
junto aos movimentos sociais e conseguiu, em algumas ocasiões, mobilizar a categoria
por questões corporativas e de interesses nacionais.
Em setembro de 1945, é criada uma nova organização docente no Estado do Rio
de Janeiro - a União dos Professores Estaduais. Esta entidade passará a ser, a partir
desse momento, o foco da narrativa.
41
Os sindicatos docentes da rede privada promoveram a intersindicalização através da fundação da
Federação Interestadual de Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (FITEE) em 1947.
42
O sindicato recebeu a nomenclatura atual - Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro e
Região- recentemente, quando ampliou sua base territorial para os municípios de Itaguaí, Paracambi e
Seropédica como estaremos tratando na seção 2.
{
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}
II.2
A
U
NIÃO DOS
P
ROFESSORES
P
ÚBLICOS NO
E
STADO
S
INDICATO
(UPPES)
,
O
PERÍODO DEMOCRÁTICO E A DITADURA
Em 1945, é fundada a União dos Professores Estaduais - (UPE), que logo após a
aprovação do estatuto teve a denominação modificada para União do Professores
Primários Estaduais - UPPE. Nesse período a cidade do Rio de Janeiro era a capital do
país e a capital do Estado do Rio de Janeiro, Niterói, o que explica a localização da sede
nesta última cidade.
Como determinante importante para a compreensão desta nova entidade,
destacamos a composição da base essencialmente diversa do sindicato em tela
anteriormente. A base do Sindicato dos Professores do Ensino Secundário, Primário e
de Artes do Rio de Janeiro era, majoritariamente, masculina. Com efeito, nos registros
da diretoria apenas dois nomes femininos aparecem - Maria de Lourdes Nogueira, no
Conselho deliberativo de 1936, e Déborah Lago de Toledo Fonseca, como suplente em
1944 - em contraponto ao conjunto masculino nos diversos setores do quadro diretivo:
diretoria provisória, conselhos diretores, juntas administrativas, diretorias eleitas,
conselhos deliberativos, comissão executiva, juntas governativas, conselho consultivo
(COELHO, 1988).
SILVEIRA (2002:41) demonstra como a mulher foi ocupando maciçamente os
níveis mais baixos da pirâmide ocupacional” educacional em diferentes períodos
históricos. Originariamente a feminilização do ensino primário era calcada pelo ideário
da vocação que trazia as questões ideológicas de subserviência da mulher e a
predestinação àqueles trabalhos extensivos da esfera doméstica. No processo de divisão
sexual do trabalho e de grandes restrições à co-educação, “a mulher, principal mão-de-
obra do magistério nas escolas primárias, deveria preservar o tradicional ideal de pureza
e de submissão (idem, ibidem:29)”.
O exercício da docência na educação secundária e superior cabia aos homens e a
educação primária às mulheres, reproduzindo as relações patriarcais na organização da
educação brasileira e nos diferentes sindicatos dessa área. Como vimos, o SINPRO
representa a educação privada e a união/ associação representa a educação pública,
porém as diferenças de base e de formas jurídicas de organização não são as únicas,
destacamos também a distinta composição de gênero .
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}
Em 1946, as Leis Orgânicas do Ensino foram concluídas com decretos que
organizaram o ensino normal e primário, ramos que não haviam sido priorizados pelo
Estado Novo, além de acrescentar à regulamentação do ensino técnico profissional, o
decreto sobre cursos técnicos agrícolas e a criação do Serviço Nacional de
Aprendizagem do Comércio (SENAC).
A consolidação da política de substituição de importações, ampliou e
diversificou o setor industrial, transformando o perfil da classe trabalhadora, devido à
massiva migração de trabalhadores do campo para as cidades e a conseqüente
reorganização do espaço urbano em função das novas características da base produtiva.
A industrialização se expandiu, produzindo nesse momento no país, além de bens não-
duráveis, os de consumo duráveis e implementando indústrias de base, criando uma
imensa demanda por trabalhadores qualificados, o que também deveria promover, além
da instituição do ensino industrial, uma normatização centralizadora para a educação
primária e a dos professores através do Ensino normal.
As leis orgânicas do ensino primário e normal, que diretamente repercutiram na
base da UPPE, centralizaram as diretrizes dessas modalidades de ensino, estabelecendo
normas para sua implantação no país. Tal como o ensino normal, o ensino primário
apresentava diversas disparidades nacionais, já que
Era a administração estadual que cuidava do assunto e a ela estavam
afetas até então as reformas por que passara esse nível de ensino.
Acontecia, porém, que a ausência de diretrizes centrais criava uma
desorganização completa no sistema, que cada Estado inovava ou
abandonava, de acordo com sua própria política (ROMANELLI,1989:
160).
Do mesmo modo, este decreto colocou em evidência o problema da qualificação
docente fazendo referência à “sua carreira, remuneração, formação e normas para
preenchimento de cargos no magistério e na administração” (idem, ibidem, 161). A
formação docente deveria ser estruturada pela lei do ensino normal, que curiosamente,
estabelecia o limite de 25 anos de idade para ingresso nos cursos normais,
provavelmente como uma forma de reserva de mercado para população feminina de
classe média e alta
43
, e não de qualificação dos professores leigos em pleno exercício. O
43
O contexto familiar das normalistas era pertencente, majoritariamente, as classes médias e altas nesse
período. A origem de classe dos professores começa a se modificar lentamente ao longo da expansão da
{
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}
contexto educacional estava voltado para essas discussões em torno de remuneração e
qualificação que deveriam acompanhar a expansão do ensino, como se a lei do valor
não imperasse também nas decisões educacionais, significando maior oferta e menor
preço da mercadoria, no caso mercadoria força de trabalho docente.
Uma passeata de reivindicação salarial, da qual participariam professores de
várias regiões do estado do Rio de Janeiro para uma audiência com o interventor
Hernani do Amaral Peixoto, marcou a fundação desta associação - UPPE
O quadro de expansão da rede educacional e a decadência dos salários – isto é, o
barateamento da mercadoria força de trabalho docente, agora oferecida em maior
quantidade - dos professores primários ao final da década de 1940 contribuiriam para o
crescimento das Uniões, não na capital do Estado do Rio de Janeiro, mas também no
Distrito Federal e no país.
A Constituição de 1946 legalizou a possibilidade de organização docente através
de associações, o que fez com que a recém criada UPPE, trabalhasse na construção de
uma outra associação no Distrito Federal (ANDRADE, 2001: 92), resultando na
fundação da União dos Professores Primários do Distrito Federal (UPPDF), em 1948.
ANDRADE destaca a influência de Icleya Gomes de Almeida, presidente da UPPES, na
UPPDF como muito marcante, “sempre acentuando em suas manifestações o caráter
corporativista, na linha do assistencialismo e do lazer, característica embrionária
daquelas entidades” (2001: 98).
Com o perfil de uma entidade corporativista não havia manifestações de caráter
político, apenas atividades estritamente pontuais de reivindicações econômicas, as
principais atividades que se tem registro da trajetória desta associação referem-se às
gestões personalistas de suas presidentes. Não registro de participação em
mobilizações dessa associação no período de arrocho salarial do governo Dutra, que,
aliado aos Estados Unidos durante a Guerra Fria, abriu o país aos interesses
internacionais, liberando as importações e, implementando medidas de combate ao
comunismo, cassou o direito de greve, prendeu lideranças e interveio em diversos
sindicatos. Ou seja, a entidade passou ao largo da eclosão de greves no país, sem
nenhuma represália.
educação da escola pública como veremos adiante.
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}
A fundação da associação coube à Maria Francisca Pereira Marinho, que
assumiu a presidência tendo como vice Icleya Gomes de Almeida (1945 a 1946) que
exerceram uma curta gestão, fato que não seria a regra da entidade.
A segunda gestão de Icleya (1946-1961), ficaria marcada inicialmente pela
“Campanha dos Tijolinhos” para a construção de uma sede para a entidade que resultou
na doação pelo governo do Estado de um “excelente terreno no centro de Niterói, na rua
La Salle”.(MARCADOS pela história, 2004: 32) Os caminhos percorridos por esta
gestão demonstram uma prática política de colaboração entre a entidade e as autoridades
do Estado.
A diretoria, profundamente envolvida com a construção da sede, também
patrocinou atividades de lazer num período de turbulenta conjuntura nacional, como
podemos verificar através do texto presente no livro “Marcados pela História”:
Icleya amava e sabia honrar eventos culturais, por isso sentiu-se,
muitíssimo, gratificada quando pôde oferecer aos seus filiados uma
infinidade de cursos, a maioria com preços simbólicos. Em meados de
1948, além das aulas do curso de alfabetização, eram ministrados
cursos de solfejo e de violino. As peças teatrais também enchiam de
emoção as festas por ela promovidas. Todos os eventos tinham um
sabor incomum de glamour cultural (2004: 33)
E, mais adiante, ainda sobre a gestão da segunda presidente:
Conseguiu algumas melhorias salariais, mas a maior de todas veio
através do governador Celso Peçanha. Este acatou a idéia da
presidente da instituição e mudou o quinquênio em triênio, pois, além
de conhecer, de perto, o caráter e as intenções da associação; sabia do
bom conceito que repercutia por todo o estado e decidiu assinar
todos os atos, favoráveis ao magistério fluminense, dentro da própria
UPPES. (idem, ibdem)
44
.
Fica explícito o caráter retrógrado da entidade e o aliciamento populista da
relação como o governo, características “que prevaleciam antes do Golpe de 64”
(MANGABEIRA, 1993:13). Segundo a mesma autora, o poder da liderança sindical
burocrática “decorria das ligações que mantinha com o Estado e da sua penetração nas
44
O governador Celso Peçanha também viria a sancionar a lei que concedeu aposentadoria aos
professores aos 25 anos de exercício na sede da UPPES em 1961.
{
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}
instituições corporativas” (idem, ibdem:14). No caso desta associação, o projeto de
colaboração de classes estava associado também a uma matriz cristã, além do cunho
político populista presente em diversos trechos de sua história, como missas em datas
comemorativas, imagens sacras nas sedes, orações precedentes aos discursos.
Tais práticas tradicionais na relação do sindicalismo brasileiro com o Estado e a
base, continuaram existindo, demonstrando a permanência do regime corporativo
mesmo no período de democratização. A estratégia política do populismo teve início
com Vargas, nas décadas de 1930 e 1940, não feneceu com seus sucessores, sendo
fortalecida quando Getúlio Vargas retornou em 1950 como presidente eleito.
Diferenciando-se do significado utilizado por Lênin no contexto dos
movimentos rurais, o conceito de populismo na América Latina, guarda características
bastante peculiares:
Visa à mobilidade do apoio entre os grupos subalternos da sociedade e
seu caráter manipulador de controle de grupos “marginais”.Há uma
acentuada ênfase no papel do Estado, mas esse tipo de populismo gira
essencialmente em torno de um estilo de política baseado na atração
pessoal de um líder e na fidelidade pessoal a ele, que têm seu
fundamento num elaborado sistema de proteções e paternalismo. A
ideologia populista é moralista, emocional, antiintelectual e não-
específica em seu programa. (BOTTOMORE org., 2001: 290).
Outros aspectos complementares compõem o quadro desse modelo sindical
como a substituição das reivindicações políticas pelas econômicas, a inexistência de
eleições, oposições e renovações nos quadros de liderança. Estes aspectos o
evidenciados no trecho abaixo do livro que trata do “remanejamento” da vice-presidente
Anaíta Custódio Cardoso em 1961:
A professora Icleya, que até aquela data, se dedicara inteiramente à
UPPES, decidiu que era chegada a hora de deixar a presidência. Sendo
assim, convidou a vice-presidente, professora Anaíta, para candidatar-
se à presidência, pois, além de integrante da instituição, era uma
grande amiga, pessoa de integridade absoluta. (MARCADOS..., 2004:
34).
Anaíta seria responsável pela mais longa gestão da UPPES até hoje, cerca de três
décadas, encerrada apenas em 1988 quando deixou a presidência após o desgaste
{
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}
sofrido por acusações de fraude por parte da vice-presidente, tendo sua entrada proibida
na sede da associação.
Anaíta aprofundou as tendências corporativas e populistas das gestões
anteriores, na contracorrente da ascensão de um movimento sindical paralelo às
organizações sindicais oficiais, como entidades de base e intersindicais que
organizavam greves por todo o país desde meados da década de 1950. Dentre as greves
podemos destacar: a greve dos 300 mil, em São Paulo, e a constituição do Pacto de
Unidade Sindical em 1953; a greve do setor de transportes e a formação do Pacto de
Unidade e Ação, em 1960 e a criação do Comando Geral dos Trabalhadores do Brasil
(1962).
No contexto da política nacional-desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek o
debate em torno do anteprojeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional foi
retomado, porém, como foi apontado, a promulgação da LDB se deu em 1961, no
governo João Goulart. Após substitutivos, emendas e vetos, a educação na nova LDB
continuaria distante do ideal de democratização do acesso e contemplaria grande parte
dos interesses privatistas e confessionais.
A conjuntura de instabilidade econômica e as tentativas de implantação das
reformas de base no governo Goulart, a fim de organizar o capitalismo nacional frente à
crescente organização da classe trabalhadora, redundaria no golpe militar de 1964.
O golpe de 1964 significaria a maior repressão aos sindicatos de toda a história
brasileira. Tornara-se clara a política de desmonte e esvaziamento dos sindicatos pelos
militares, condição indispensável à implementação de sua política econômica, já que:
A articulação de militares com empresários ligados ao grande capital
nacional e estrangeiro, apoiada pelos latifundiários e políticos
conservadores, se deu, entre outros objetivos em torno da proposta de
conter os avanços dos movimentos organizados de trabalhadores do
campo e da cidade. Por outro lado, a crise econômica que só fazia
crescer desde o fim do governo JK seria combatida pela ditadura com
uma receita cujo principal remédio era o arrocho salarial. Para tanto,
controlar os sindicatos era fundamental (MATTOS, 2003:49).
A base sindical foi diminuindo por causa da perseguição aos trabalhadores
chamados “subversivos”. Os dirigentes sindicais foram escolhidos e indicados pelo
governo, cuja meta era dar sustentação ao bloco no poder, promovendo um atendimento
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}
assistencialista e garantindo a ampliação patrimonial da entidade, aniquilando as lutas
econômicas e políticas.
Nesse momento de crise dos sindicatos, a UPPES, com a vigência da LDB, lei
5692/71 e as mudanças na estrutura do ensino, ampliou sua base, filiando professores do
ensino de 1º e 2º graus. Houve a terceira mudança na denominação, tornou-se União dos
Professores Públicos Estaduais, permanecendo a sigla - UPPES.
A luta política nunca esteve nos horizontes da UPPES e mesmo as
reivindicações corporativistas ou meramente econômicas foram substituídas - com a
crise da política populista - por um maior número de atividades culturais, como a
criação de concursos e do Festival de Valores Upeanos que homenageava
personalidades, ou ainda por espaços de lazer como a construção da Casa do Professor.
Ou seja, a UPPES demarcava mais sua ação, os determinantes políticos limitavam sua
ação reivindicatória e obrigavam a entidade a um movimento mais introspectivo, qual
seja, a consolidação patrimonial e de seu caráter assistencial.
Todavia, o movimento combativo não havia sido completamente aniquilado no
contexto brasileiro, e ainda dava respostas à postura governamental, tendo como ápice
as greves metalúrgicas ocorridas em Contagem-MG e Osasco-SP, no ano de 1968. A
preocupação com o rumo de tais greves causou o acirramento dos militares no trato com
as forças sociais oposicionistas, sendo, em seguida, baixado o Ato-Institucional número
5 (AI-5).
A legitimação da ditadura era baseada nos feitos do chamado Milagre
Econômico, período marcado por altas taxas de crescimento, sustentadas à custa de
grande endividamento externo e intensificação da exploração da força de trabalho,
garantindo maior acumulação às empresas privadas. Essa política gerou uma grave crise
no país, em meados da década de 1970, devido à alta dívida externa e interna, inflação
crescente, precárias condições de trabalho e remuneração, reflexo também do
esgotamento das formas de acumulação nos países centrais do sistema. A constatação
do fracasso do milagre econômico gerou por um lado, a rearticulação da classe
trabalhadora e, por outro lado, a ditadura começou a preparar a lenta e controlada
transição para uma democratização burguesa.
Ao final da década de 1970 um grande número de greves, em várias categorias,
se espalhava do ABC paulista a outras partes do Brasil e as reivindicações ampliavam-
{
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}
se para além das questões corporativistas, características até então arrefecidas pela
prática sindical atrelada à institucionalidade. As formas se diversificavam: greves
gerais, greves com ocupação de fábricas, greves por categoria, greves por empresas.
Houve sindicalização de setores como o de serviços, de assalariados médios e de
trabalhadores rurais.
Na efervescência dessas lutas é que está inserida a grande greve da categoria
docente que viria a proporcionar a construção de uma entidade nos marcos do Novo
Sindicalismo e, portanto, bastante distinta da trajetória linear que a UPPES traçou até a
atualidade.
II.3
O
S
INDICATO
E
STADUAL DOS
P
ROFISSIONAIS DA
E
DUCAÇÃO DO
R
IO DE
J
ANEIRO
-
(SEPE)
E O
“N
OVO
S
INDICALISMO
A Sociedade Estadual do Professores (SEP) nasceu em 1977, num momento de
revigoramento do movimento operário. O chamado Novo Sindicalismo, período de
rupturas e permanências com relação ao passado sindical brasileiro, tem, segundo
MATTOS (1998), as mobilizações como sua característica fundamental. Um novo ciclo
grevista se abriu no país, a partir das tentativas de organização de um sindicalismo
autônomo, combativo, baseado em novas formas de relacionamento com as bases.
Embora não representasse um bloco homogêneo, o novo sindicalismo teve a prática do
sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo como grande expoente.
Esse conjunto de transformações da ação sindical - embora heterogêneo -
conhecido como Novo Sindicalismo, impulsionou uma onda de greves no país, da qual
participaram, no ano de 1979, os professores do RJ e sua entidade de classe recém
criada. O Rio de Janeiro foi, nesse período, o “segundo estado em termos de números de
paralisações” (MATTOS 1998: 194) do país.
A greve dos professores foi realizada em um “quadro bem diferente daquele dos
metalúrgicos e bancários, pois não dispunham de sindicatos nem de tradição de ação
coletiva anterior. Tiveram como instrumento de organização a incipiente Sociedade
Estadual dos Professores (SEP)”(idem, ibidem:197).
{
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}
A entidade se construiu nesse movimento grevista em prol do plano de carreira e
de enfrentamento ao governo estadual, porém a estratégia de condução do movimento
demonstra a relação entre o novo e o velho sindicalismo:
o CEP, de cuja juventude e caráter legal não sindical parecia derivar
uma coesão maior, dividia-se claramente entre uma corrente
identificada com o fazer greve como instrumento de combate à
estrutura sindical e à ditadura (além de arma para conquistas salariais)
na linha que se afirmava com o novo sindicalismo-, e um grupo que
recomendava prudência na estratégia de aprofundamento da transição
democrática (MATTOS,1998: 198).
Apesar da divisão interna, o movimento conseguiu fazer da greve de 1979,
um marco, um símbolo, na história do movimento de organização
política dos profissionais de educação, quando conquistou um piso
salarial equivalente hoje a cinco salários-mínimos. Mesmo sob forte
repressão, com a prisão de algumas lideranças, as professoras
conseguiram ver suas reivindicações alcançadas ainda que com o
sacrifício da sua entidade, colocada sob intervenção federal.
(SILVEIRA, 2002: 90)
A fusão a outras entidades, como a União dos Professores do Rio de Janeiro
(UPRJ) e a Associação dos Professores do Estado do Rio de Janeiro (APERJ),
caminhava na direção de unificação da categoria e fortalecimento da entidade
45
,
denominando-se Centro Estadual de Professores (CEP/ RJ) . Em 1979 a entidade
realizou sua primeira eleição para a diretoria.
Vencidos os dois primeiros anos de retração da década de 1980, o movimento
sindical brasileiro reordenou a luta de classes no cenário político nacional,
impulsionando a construção de uma entidade classista que abrangesse o coletivo dos
trabalhadores do país. Cabe destacar que os sindicatos brasileiros experimentavam uma
realidade contrastante à conjuntura internacional, pois esse quadro expansivo e de
conquistas não correspondia às transformações na base do processo produtivo que
influenciaria a organização dos trabalhadores em curso nos países de capitalismo
avançado.
45
Para um melhor aprofundamento da temática ler: SILVEIRA, Marta Lima Moraes. Entre Gregos e
Troianos. As relações entre o SEPE/RJ e a categoria de profissionais de Educação do Estado do Rio de
Janeiro. Niterói, 2002.
{
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}
A despeito da retração do movimento operário internacional - resultante da crise
do Estado de Bem-Estar-Social e o decorrente esgotamento do padrão de acumulação
fordista/ taylorista
46
, e que encontraria as condições necessárias à implementação no
Brasil no final da década de 1980 - a classe trabalhadora brasileira, avançou em uma
antiga aspiração: a construção de uma Central Sindical.
MATTOS destaca que, “do ponto de vista da chegada do novo sindicalismo às
direções sindicais cariocas, a criação e a ampliação do raio de ação da Central Única dos
Trabalhadores (CUT) foram fatores decisivos” (1998:220). O SEPE se filiou, em 1985,
à recém criada CUT, entidade intersindical de origem combativa que foi um agente
fundamental na luta anti-ditadura. A CUT não foi a única central criada no país
47
,
porém, a maior e mais importante organização dos trabalhadores, expressão desse
momento de rearticulação das lutas no cenário nacional.
A incorporação, em 1987, dos funcionários administrativos correspondeu a mais
uma unificação dos trabalhadores da educação em torno da sigla CEPE: Centro Estadual
dos Profissionais da Educação. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988,
que garantiu ao funcionalismo público o direito a sindicalização
48
, o CEPE tornou-se,
finalmente, o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (SEPE).
Portanto, a base do SEPE consistia também nos profissionais da educação básica
do Estado do Rio de Janeiro e não apenas a categoria docente, podendo filiar-se
quaisquer profissionais das redes municipais de educação da capital e interior do estado,
assim como servidores da rede estadual e da rede privada
49
.
46
A esse respeito ver o capítulo 2.
47
Na disputa acirrada pela direção do movimento, a Unidade Sindical organizou, no mesmo ano da
fundação da CUT, outro congresso com a finalidade de construir outra central sindical e esvaziar a CUT.
Neste congresso foi criada a Coordenação Nacional da Classe Trabalhadora, mais tarde transformada em
Central Geral dos Trabalhadores (CGT). Em 1988, a central tornou-se Confederação, a fim de receber
verbas do imposto sindical. A suposta neutralidade frente à disputa entre capital e trabalho difundida pela
Confederação foi desmontada quando a entidade se posicionou contrária às greves gerais e a favor do
sindicalismo de resultados. A discordância entre setores da direita e o setor reformista resultou na divisão
da entidade e na criação de uma outra central, que recuperou o nome de Central Geral dos Trabalhadores.
Este fato acelerou o enfraquecimento de ambas as entidades, abrindo espaço para a rearticulação dos
setores que implementariam o sindicalismo de resultados: a Força Sindical.
48
Para MASCARENHAS (2000: 125), o movimento dos funcionários públicos representou uma parcela
importante do novo sindicalismo, compondo uma nova identidade ao “se distinguir do Estado-Governo,
explicitando um caráter de relativa autonomia em relação a este, quando contestam as políticas públicas,
estão exatamente se desvencilhando da tirania da função representada pelos atributos da hierarquia,
organização e disciplina.
49
A base social do SEPE, embora estatutariamente possua pontos de interseção com a base do SINPRO e
da UPPES, guarda algumas diferenças na prática, conforme explicaremos a seguir. Com relação ao
{
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}
A base do SEPE mais fortalecida com as unificações começou, no entanto, a
enfrentar uma política de desgaste do movimento grevista principal forma de
mobilização deste modelo sindical-, segundo SILVEIRA (2000):
parece haver por parte dos governos, a partir da greve de 1986, uma
aposta no esgotamento por si do movimento, além de um desgaste
da greve junto à opinião pública devido a longa duração da mesma
(2002: 121 ).
A redução da amplitude das greves e a derrota nas reivindicações econômicas
seriam aspectos representativos do acirramento da luta de classes, da truculência, e do
aumento da exploração da força de trabalho que a política neoliberal viria implementar
no país a partir da eleição de Collor, em 1989. Cartilha seguida também pelos governos
estaduais,
é necessário lembrar que um dos sérios problemas enfrentados por
este sindicato ocorreu durante o segundo governo populista de Leonel
Brizola (1990-1994) e, mais recentemente, no governo Garotinho
(1999-2002), quando foi cancelado o desconto em folha de pagamento
da contribuição sindical das professoras e funcionários filiados, o que
dificultou muito o trabalho desta instituição. Isso sem contar que
reivindicações tidas como justas são desconsideradas e tratadas até
com recurso à violência, como durante o governo Moreira Franco
(1987-1990), que utilizou, por várias vezes, forças policiais de forma
truculenta para conter o movimento reivindicatório que se manifestava
sob a forma de passeatas, vigílias, entre outras. (SILVEIRA, 2002:14-
5).
No capítulo anterior, tratamos do contexto de implantação do neoliberalismo e
como a desregulamentação dos direitos conquistados pelos trabalhadores abriu espaço
para a nova burguesia de serviços, que teve na educação um importante setor de
expansão. Nesse sentido, os sindicatos da área educacional, enfrentaram também uma
profunda contra-reforma, marcada pela tentativa de redução da esfera estatal na
educação pública, flexibilização das relações trabalhistas, suscitando inúmeras políticas
SINPRO, as principais diferenças se referem ao SEPE não englobar docentes do ensino superior - por
que entende que sua entidade representativa é a Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior
(ANDES)- e, na prática, o SEPE ter construído sua representatividade na rede pública e o SINPRO, na
rede privada. Com relação à UPPES, a diferença consiste em o SEPE pretender representar todos os
profissionais da educação das redes públicas, sejam eles da rede estadual ou das diversas redes municipais
e a UPPES somente admitir filiações da rede educacional estadual de docentes e especialistas. E, como
apontado acima, o SEPE é o único sindicato que estendeu sua base aos funcionários administrativos. Não
na história dessas entidades uma tentativa de buscar politicamente a fusão, os sindicatos se definem
como muito distintos, aspecto que estaremos tratando no próximo capítulo.
{
PAGE
}
públicas
50
de redirecionamento de verbas e estreitamento da relação educação /mercado,
consolidando uma nova proposta de educação para a conformação da classe
trabalhadora.
Segundo os diagnósticos dos organismos de financiamento internacionais, como
o BIRD
51
, a crise das escolas latino-americanas não seria passível de solução pelo
Estado devido a sua ineficiência, mas seria uma questão de realocação dos recursos e de
novas gerências. A responsabilidade de atendimento deste serviço deveria ser delegada
à sociedade civil, consubstanciando uma política de privatização, e de captação de
recursos financeiros e humanos na esfera privada, seja através de trabalho voluntário ou
parcerias com instituições.
Segundo a lógica liberal, inaugurada por FRIEDMAN
52
, alicerçada pela teoria
do capital humano, o estabelecimento da concorrência estimularia a melhoria na
qualidade dos serviços oferecidos e possibilitaria uma maior liberdade de escolha aos
pais e mães que descartariam as escolas que não oferecessem um razoável retorno do
seu investimento, uma boa relação custo-benefício, propondo para tanto vales-
educacionais.
Vimos que a expansão do sistema educacional decorreu da necessidade do
capital de adequar a escola e o trabalhador aos rumos da nova divisão (técnica e social)
internacional do trabalho, centrando esforços na ampliação das taxas de escolarização,
prioritariamente no ensino fundamental, assim como da pressão da classe trabalhadora.
Porém, na década de 1990, surge uma nova versão para mediar o binômio do
desenvolvimento- educação no contexto neoliberal, a qualificação. O estágio neoliberal
do capitalismo objetivou destinar à educação um papel estritamente mercantil, operando
sob a lógica meritocrática e difundindo valores como: individualismo, produtividade,
competitividade, consumismo, que traduzem sua ideologia societária de culpabilizar os
sujeitos, buscando-se “firmar uma consciência alienada de que os vencedores ou os
incluídos devem-no a seu esforço e competência” (FRIGOTTO, 1998: 14).
50
Podemos destacar: o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
valorização do Magistério (FUNDEF), Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB),
Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN),mas recentemente
o PROUNI e o FUNDEB. No governo Estadual o Programa Nova Escola.
51
Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento.
52
Ver Capitalismo e Liberdade (FRIEDMAN, 1977).
{
PAGE
}
Em um contexto de subtração dos postos de trabalho, a educação profissional
aparece como redentora das crises de desemprego instaladas pelas novas condições
materiais. Inclusive muitas organizações sindicais começaram a enfatizar a discussão
sobre qualificação nesse contexto. Alguns sindicatos e, até mesmo centrais sindicais,
situavam-se no plano fenomênico da questão, associando o desemprego à baixa
escolaridade e a insuficiente qualificação dos trabalhadores. Ou ainda, se compreendiam
a falácia do deslocamento do desemprego estrutural para a problemática da qualificação,
declaravam buscar apenas novos caminhos de contato com os trabalhadores, agora
desfiliados, assim como recursos públicos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
Poucas foram as resistências sindicais à hegemonia dessa perspectiva. Na verdade, esses
enganos ou auto-enganos faziam parte de uma mudança mais ampla e profunda no seio
da classe trabalhadora organizada, como mostraremos a seguir.
No início da década de 1990, correntes políticas começaram a redirecionar os
rumos da maior central sindical do país, a CUT, para uma perspectiva social-democrata,
sob a argumentação das mudanças trazidas pela chegada do neoliberalismo e o braço
sindical do governo - a Força Sindical.
O surgimento da Força Sindical, em 1991, polarizou com a CUT as negociações
entre capital e trabalho. A nova Central patrocinada pelo governo Collor, combinou a
velha estrutura sindical com o ideário neoliberal, apresentando-se aos trabalhadores
como alternativa a crise do sindicalismo. A proposta de ação da central, baseada na
conciliação entre o capital e trabalho, tentava difundir a idéia de humanizar o
capitalismo, reformando-o sobre o prisma da negociação pacífica e estritamente
representativa. As idéias de sustentação de sua ação são assim apontadas por Antunes:
reconhecimento da vitória do capitalismo e da inevitabilidade da
lógica do mercado; a limitação e restrição da luta sindical, que deve
ater-se à busca de melhorias nas condições de trabalho, não cabendo
aos sindicatos extrapolarem este âmbito da luta; a papel da ação
política cabe exclusivamente aos partidos, que devem ser totalmente
desvinculados da ação sindical; o Estado deve reduzir a sua ação, em
favor de uma política privatizante (ANTUNES,1995: 38).
O sindicalismo de resultados estava agora consolidado sob a direção da direita
sindical aliada aos interesses do neoliberalismo. Os sindicatos controlados por essa
{
PAGE
}
facção do movimento filiada à Força Sindical apoiaram, por exemplo, a privatização das
próprias empresas onde estavam organizados, tais como a Usiminas e a CSN.
A contra-reforma que a Força Sindical introduziu no movimento dos
trabalhadores não foi o único determinante da mudança de estratégia da CUT, mas foi
um marco na história das centrais sindicais e no movimento de social-democratização
que os sindicatos começaram a empreender frente ao quadro de cooptação,
fragmentação e retração de sua base tradicional.
Embora não seja possível aprofundar a discussão sobre a trajetória da CUT neste
trabalho, cabe destacar que a literatura revisada
53
aponta pelo menos três fases da
Central. A primeira de prática marcadamente combativa e de massas, a segunda de
aproximação da política social-democrata e a terceira conhecida como propositiva ou de
conciliação de classes, expressa nas diversas formas de negociação buscada pela Central
com o patronato, como as câmaras setoriais e os organismos tripartites.
O SEPE porém, seguiu apostando nas mobilizações de massa ao longo da etapa
neoliberal. Inúmeras foram as greves nesse período, o debate sobre um projeto
educacional - que teve grande destaque no congresso da entidade de 1992 - seria pauta
de muitas outras discussões, assim como o enfrentamento às políticas neoliberais de
desmonte dos direitos sociais. O sindicato manteve a política de unificação dos
trabalhadores da educação, na década de 1990, com a incorporação da Associação dos
Supervisores Educacionais do Rio de Janeiro (ASSEERJ) e a Associação de
Orientadores Educacionais do Rio de Janeiro (AOERJ), mantendo a sigla SEPE.
Porém é necessário considerar que a eleição de Luís Inácio Lula da Silva
inaugurou uma nova fase da relação sindicato-estado-capital, em que, marcadamente a
CUT assume uma espécie de sindicalismo governista ou neoliberal. Nessa etapa, a
central não se contrapôs as políticas governamentais, não mobilizou lutas contra a
reforma da previdência- onde vislumbrara grande potencial de lucro através do controle
os fundos de pensão- e vêm manifestando apoio às reformas sindical, trabalhista e
universitária. Muitos sindicalistas assumiram altos postos no governo federal, e outros,
administradores de fundos públicos dentro das centrais, o que levou Francisco de
Oliveira (2003) a falar em uma nova classe social, para na verdade abordar o fenômeno
53
Como podemos constatar nos estudos de Boito (1999); Rummert (2000); Souza (2002) e Tumolo
(2002).
{
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}
de conversão de classe destes ex-sindicalistas. Ou seja, a central optou pela defesa dos
interesses do governo, que são os interesses do capital e estabeleceu uma renovada
estrutura de sindicato oficial, aspecto que retomaremos no próximo capítulo.
A influência que a CUT tem no SEPE, desde sua origem, colocou o
debate dos rumos da CUT no centro do congresso de junho/ 2005 a fim de decidir sobre
a continuidade ou ruptura com a central. Entendemos esse debate como sintomático das
disputas políticas internas à entidade, constituindo indicadores de sua concepção de
sociedade, da qual trataremos no capítulo 3.
II.4
O
S SINDICATOS HOJE
:
ESTRUTURA SINDICAL E PERFIL DOS DIRIGENTES
A trajetória dessas três entidades no contexto social e educacional brasileiro viria
a constituir, na atualidade, uma configuração sindical expressa em sua estrutura
organizativa e política, assim como, um determinado perfil de dirigentes.
Para compor a estrutura dos sindicatos utilizamos, fundamentalmente seus
estatutos, mas também consultas ao site e visitas às sedes e seus respectivos
departamentos com fins de esclarecimento e complementação. Para tentar apreender
elementos além dos físicos, elaboramos um questionário para os dirigentes sindicais.
Este instrumento de pesquisa possuía duas finalidades imbricadas, a saber, mapear as
correntes existentes dentro das direções para subsidiar a escolha das entrevistados e
traçar um quadro aproximativo do perfil dos dirigentes sindicais em cada entidade,
ilustrando as relações entre a estrutura sindical e os seus elaboradores.
Sendo assim, essa seção tem a característica de lidar com aspectos mais
objetivos do projeto sindical das entidades, para subsidiar a análise do movimento
realizado por essa estrutura organizativa, ou seja, sua forma política, no próximo
capítulo.
{
PAGE
}
II.4.1- SINPRO-Rio
O Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro e Região (SINPRO-
RIO) é constituído, segundo seu estatuto (SINPRO, 2000),
para fins de estudo, promoção cultural, reivindicação, defesa e
representação legal da categoria profissional dos professores de todos
os níveis, ramos e graus de ensino que ministrem, quaisquer que sejam
as denominações que se lhes dêem, constituindo uma categoria
profissional diferenciada na forma da legislação em vigor, na base
territorial dos Municípios do Rio de Janeiro, Itaguaí, Paracambi e
Seropédica. (Art. 1.º)
Dentre os deveres do Sindicato previstos no Art. 4.º, podemos destacar: “d)
defender o ensino público, gratuito e de qualidade para todos”; alínea aparentemente
paradoxal, uma vez que o SINPRO se construiu como um sindicato preferente da rede
privada. Todavia, a direção do SINPRO defende, em seus discursos e publicações, a
existência da rede privada como complemento da rede pública. Por um lado, a educação
pública faria parte de um projeto estratégico de nação e, por outro, a educação privada
garantiria a liberdade e autonomia das classes médias e altas de optarem por projetos
específicos.
O SINPRO é filiado à Central Única dos Trabalhadores (CUT), à Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (CONTEE) e à Federação
Estadual dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (FETEERJ). Nele, apenas o
presidente possui licença sindical.
São órgãos de deliberação e administração sindical do SINPRO: { HYPERLINK
"http://www.sinpro-rio.org.br/estatuto/congresso.html" }.
O congresso, maior instância da entidade, ocorre uma vez a cada gestão
ordinariamente e quando da necessidade da assembléia ou diretoria,
extraordinariamente. Participam do Congresso os membros da diretoria e delegados
filiados dos estabelecimentos de ensino, de cursos livres, de cursos de línguas e de
estabelecimentos de ensino profissional técnico, conforme o Art. 15, inciso II, do
estatuto.
{
PAGE
}
As assembléias podem ser setoriais ou gerais. Todos os associados podem
participar das assembléias gerais ordinárias que ocorrem anualmente no mês de
novembro para a prestação de contas da Diretoria e deliberação orçamentária para o
próximo ano, havendo também a possibilidade de convocação para assembléias
extraordinárias. Quanto às assembléias setoriais, é possível a participação de professores
não sindicalizados quando respeitar unicamente a matéria coletiva de trabalho, que
tais assembléias deliberam sobre assuntos específicos de empresas, instituições
empregadoras ou estabelecimentos de ensino.
A Diretoria da entidade é constituída por uma direção executiva: Presidente, dois
Vice-Presidentes, primeiro e segundo Secretários, primeiro e segundo Tesoureiros, um
Procurador, um Diretor de Comunicação, um Diretor de Educação e Cultura e um
Diretor de Patrimônio -, Diretoria de zonais e delegacias, Conselho fiscal e diretores
representantes da FETERJ.
As eleições são realizadas a cada três anos. O SINPRO, segundo dados do
departamento de comunicação, possui cerca de 17 mil filiados -mas nem todos são
considerados sócios ativos - majoritariamente da rede privada, e recebe a contribuição
sindical de 10 reais mensais.
O Sindicato se organiza territorialmente através de zonais
54
e de delegacias
sindicais
55
. Segundo o Art. 61, “A zonal é um organismo regional de organização e
mobilização dos professores, abrangendo os professores dos estabelecimentos de ensino
de todos os níveis, ramos e graus com base na área delimitada”. E, delegacia, segundo o
Art. 62, “é uma base regional do Sindicato organizada para dinamizar o trabalho
sindical na área e facilitar o acesso dos professores aos serviços da Entidade”.
Ainda integrante da diretoria executiva, temos o Conselho fiscal, órgão
verificador da entidade, composto por três membros que devem acompanhar a
assembléia geral ordinária e registrar seus balancetes e deliberações, assim como o
acompanhamento da administração do patrimônio da entidade.
54
A saber: Centro, Sul, Tijuca, Méier, Jacarepaguá/Barra, Leopoldina, Ilha do Governador, Central e
Oeste.
55
São as subsedes de Campo Grande e Barra da Tijuca.
{
PAGE
}
Finalmente, o Conselho de representantes pode ser convocado pela diretoria ou
pelos seus componentes, tem uma pauta específica de discussão, através de delegados
das instituições, delegacias ou zonais.
O SINPRO fundou, em 2000, um espaço de formação para sua base: o Centro de
Estudos e Atualização em Política e Educação (CEAPE), mais conhecido como Escola
do professor. Ocupando quase todo o andar de sua sede, a Escola do professor possui
programação semestral com cursos de línguas estrangeiras, cursos de atualização, cursos
de artesanato e oficinas -de criação literária, teatro de cordel, contação de histórias e
animação-, cursos de informática, atividades culturais no Rio de Janeiro e Sind Tuor,
ciclo de palestras e seminários.
Além desses serviços-educacionais oferecidos na sede, o SINPRO oferece aos
filiados assistência jurídica, disponibilização de currículos nos seu site, e os seguintes
convênios: empresas de auto-escolas, auto-peças e mecânicos, dentistas,
fonoaudiólogos, laboratórios e farmácias, médicos, nutricionistas, óticas, psicólogos e
terapeutas, pousadas, restaurantes, dentre outros.
No site do SINPRO (www.sinpro-rio.org.br/historia.html), encontramos uma
retrospectiva da entidade, enfocando o período de 1931 a 1950, da qual retiramos
algumas fotos que explicitam a imagem que o sindicato quer transmitir para quem
acessa sua gina em busca de sua história. Não fotos do sindicato ou de suas ações
em nenhuma outra seção.
{ SHAPE \* MERGEFORMAT }
Fonte: Site do SINPRO-Rio
Fonte: Site do SINPRO-Rio
As fotos não são da própria entidade, mas do período de sua fundação o que
demonstra que a entidade destaque aos seus 74 anos de existência e o contexto
histórico de ascensão da política trabalhista-populista.
II.4.2- UPPE- Sindicato
Foto 1
“Getúlio Vargas – líder da
Revolução de 30”
Foto 2
Manifestação da Federação
do Trabalho em 1934
{
PAGE
}
A União dos Professores Públicos no Estado Sindicato recebeu este nome, em
1988, com a transformação da associação para sindicato e, posteriormente, a
incorporação de novos trabalhadores como os chamados especialistas em educação. É
organizada sobre uma estrutura presidencialista, comportando uma Diretoria Executiva
e seis diretorias regionais, além do conselho consultivo e do conselho fiscal.
A Diretoria Executiva, por sua vez, divide-se nos seguintes cargos: presidente,
secretário-geral, tesoureiro, secretário, direção do departamento assistencial, direção de
biblioteca e criatividade, direção de relações públicas e divulgação e direção da Casa do
Professor.
As direções regionais, num no total de seis, são organizadas por pólos de
municípios, a única que possui sede é a de Campos de Goitacazes
56
. As diretoras
regionais têm a função, segundo o estatuto, de “representar a entidade, de acordo com as
instruções expedidas pela presidência” (cap. VI), realizando a conexão entre os poucos
filiados da rede estadual dos pólos- composto de uma quantidade imensa de municípios-
e a direção executiva, levando as questões para serem tratadas nas reuniões dos
sindicatos na sede da entidade.
A entidade não abrange, segundo a Carta Sindical, os professores das demais
redes municipais do estado, conforme o Art.2, por isso não lhe pode ser oferecida a
assistência jurídica principal forma de luta econômica da entidade–, gerando
desinteresse pela atuação nas redes municipais.
A UPPES define-se como uma entidade “apartidária, quanto às ideologias
políticas e às crenças religiosas”, embora sua trajetória esteja em contraposição a sua
apresentação no site (www.uppe.com.br). Não possui filiação a nenhuma central
sindical, mas é filiada a Federação das Associações e Sindicatos dos Servidores
Públicos do Estado do Rio de Janeiro (FASP-RJ) somando aproximadamente 17 mil
56
A Região 1 abrange os municípios do Rio de Janeiro e Niterói; a Região 2, Rio das Flores, Comendador
Levy gasparian, Paraíba do Sul, Três Rios, Areal, São José do Vale do Rio Preto, Vassouras, Paty do
Alferes e Sapucaia; a Região 3, Bom Jardim, Cachoeiras de Macacu, Cantagalo, Nova Friburgo, Duas
Barras, São Sebastião do Alto, Macuco, Trajano de Moraes, santa Maria Madalena e Sumidouro; a
Região 4, Araruama, Arraial do Cabo, Cabo Frio, São Pedro da Aldeia, Saquarema, Iguaba Grande e
Búzios, a Região 5 engloba Aperité, Cambuci, Itaocara, Bom Jesus de Itabapoana, Itaperuna, São José de
Ubá, Miracema, Santo Antônio de Pádua, Porciúncula, Natividade, Varre-Sai Laje do Muriaé; finalmente
a Região 6 que possui a subsede, campos dos Goytacazes, Italva, São Francisco do Itabapoana, Cardoso
Moreira, São João da Barra, São Fidélis, Carapebus e Quissamã. Há, ainda, a intenção de criar mais uma
região abarcando os municípios de Barra de São João, Rio das Ostras, Macaé, Conceição de Macabu e
Casimiro de Abreu.
{
PAGE
}
filiados
57
. o licenças sindicais, tal fato decorre da permanência majoritária de
professores aposentados na direção dessa entidade.
A UPPES, como podemos depreender de sua forma organizativa, guarda uma
estrutura muito semelhante a da época de sua fundação, marcadamente assume uma
função assistencialista representada em seu maior departamento, o Assistencial - e
legalista frente às demandas individuais ou coletivas da categoria.
O departamento assistencial é subdividido nos seguintes setores: Ação
fundamental de assistência, Ação acessória ou secundária de assistência, departamento
técnico, departamento assistencial, além do departamento de educação e instrução.
No setor chamado de Ação fundamental de assistência encontra-se o
departamento jurídico que atua através de todas as áreas: cível, familiar, administrativa,
trabalhista. Ou seja, encampa ações coletivas e individuais.
O filiado arca com as custas
processuais e o sindicato com os honorários advocatícios.
A Ação acessória ou secundária de assistência oferece diversos serviços como
filiação e desfiliação, cessão de teatro e salão de festas, hospedagem na casa do
professor, auxílio funeral, cursos, assistência técnica para assuntos profissionais da
categoria, planos de saúde UNIMED, consultório dentário (“a preço popular”), terapia
de grupo ou individual, somando-se ainda diversos convênios particulares com
profissionais das áreas médicas, odontológica, psicológica, estética, além de
estabelecimentos comerciais como academias de ginástica.
Por fim, a respeito do departamento de educação e instrução, a entidade afirma:
No momento de grandes mudanças em que estamos vivendo, a
educação - como produtora do crescimento e da ascensão dos
grupamentos humanos - influindo, consequentemente, nas questões
políticas, econômicas e sociais, tem que se tornar, de fato, a principal
preocupação dos segmentos da sociedade e prioridade das ações
governamentais.
Para tanto, a UPPES realiza convênios que oferecem descontos aos filiados para
sua formação e promove palestras avulsas.
57
Dados do departamento de Relações Públicas e Divulgação em abril / 2005.
{
PAGE
}
A direção da Casa do Professor é responsável pela sede campestre em Pendotiba
(bairro de Niterói), eventos culturais, festas e hospedagens promovidas e financiadas
pela entidade.
Para ter acesso a esses inúmeros serviços assistencialistas o filiado desconta 2%
de seu piso salarial e assume cobranças parciais dos serviços.
Outro fator relevante para a explicitação das características da entidade é a
dimensão do seu departamento de relações públicas e de divulgação, cujo objetivo é
propagar o trabalho da diretoria. Com efeito, o referido departamento possui o programa
semanal chamado UPPES TV, na emissora TVE / Rede Brasil, além de participação
semanal em programa municipal (canal 36/ NET), e produção de jornal bimestral com
tiragem de 20 mil exemplares. Assim como, é também de responsabilidade do referido
departamento a organização de dossiês estruturados a partir de reportagens de jornais,
carta de pais de alunos, professores e alunos da rede estadual, retratando como a
educação aparece na mídia e entregues, em audiência, ao ministro da educação daquela
conjuntura. Não há, todavia, texto síntese do sindicato promovendo análise sobre os
fatos recolhidos que compõe os dossiês, a saber, 1996, 1997-1998 e 2004.
A entidade lançou um livro em 2004, intitulado “Marcados pela história” que se
propõe contar seus 59 anos de existência, assim resenhado na contracapa do livro pela
diretora do departamento técnico:
Marcados pela história, biografia romanceada da UPPES, inicia-se
focalizando a atual presidente que, em retrospecto interessante, lembra
os pormenores do desenrolar dos acontecimentos que se deram com
figuras que tiveram participação ativa e destacada na história do
nascimento, estruturação e crescimento da instituição.
A evidência da citação demonstra que o centro da narrativa são as presidentes da
entidade.
No site da UPPES (www.uppe.com.br/apresenta1.htm), a página de apresentação
traz como subtítulo: Histórico e finalidades. Nessa página encontramos as fotos de seu
patrimônio físico, 3) a sede, 4) a casa do professor e 5) a subsede:
Fotos 3, 4 e 5
Fotos das Instalações da UPPES
{
PAGE
}
{ INCLUDEPICTURE "http://www.uppe.com.br/images/predio6.jpg" \*
MERGEFORMATINET }3 { INCLUDEPICTURE
"http://www.uppe.com.br/images/casa.jpg" \* MERGEFORMATINET }4{
INCLUDEPICTURE "http://www.uppe.com.br/images/atend.jpg" \*
MERGEFORMATINET }5
Porém, em outras seções estão disponíveis fotos diversas, 4) demonstrando os
serviços assistencialistas oferecidos (na seção Apoio ao Filiado:
www.UPPES.com.br/filiado1.htm-), ou detalhando o patrimônio físico e os eventos
culturais da entidade{ HYPERLINK "http:// (na seção Cultura e Lazer:
www.uppe.com.br/cultura1.htm" }):
Fotos 6, 7 e 8.
Fotos de serviços da UPPES
6
7{ INCLUDEPICTURE
"http://www.uppe.com.br/images/profnova6.jpg" \*
MERGEFORMATINET }
8
Não fotos de atividades reivindicativas da entidade ou
ainda da categoria, excetuando as festas. A entidade se mostra
aos visitantes do site como detentora de propriedades, fornecedora de serviços e
realizações culturais.
F
onte: Site da UPPES.
Fonte: site da UPPES
.
{
PAGE
}
II.4.3 –SEPE-RJ
O Sindicato dos Profissionais de Educação do Estado do Rio de Janeiro (SEPE-
RJ) possui abrangência estadual, representando todos os trabalhadores da educação,
sejam “professores, funcionários administrativos, orientadores e supervisores, ativos e
com registro de concursados, cooperativados ou terceirizados” - Art. /estatuto - da
rede pública ou privada. Também é possível serem admitidos na condição de sócio
provisório os estudantes da área da educação.
Informações do Centro de Processamentos de Dados do SEPE-RJ, obtidas em
maio de 2005, demonstram que sua base já ultrapassou 50.000 filiações, das quais
25.923 são da rede estadual, 16.623 da rede municipal do Rio de Janeiro e 11.100 de
outras redes municipais do estado. A mesma fonte indica que 60% das filiações são
constituídas de docentes. Esses números representam um crescimento de cerca de 30%
no número de filiações em três anos se comparados aos dados de Silveira em 2002
58
.
A direção do SEPE é colegiada, composta por 48 membros, em regime de
composição proporcional ao percentual de cada chapa
59
obtido nas eleições gerais. O
Sindicato é filiado à Central Única dos Trabalhadores (CUT) e à Confederação Nacional
dos Trabalhadores de Educação (CNTE), estando organizado em uma direção estadual
com sede no centro do Rio de Janeiro, nove núcleos regionais
60
no grande Rio e 45
núcleos municipais
61
. Possui 11 licenças sindicais na rede estadual de educação e 6 na
rede municipal do Rio de Janeiro.
58
“o SEPE/RJ conta com aproximadamente 40 mil filiados. Desses, 20.272 pertencem a rede estadual e
15.595 a rede municipal do Rio de Janeiro. Os demais fazem parte das redes de outros municípios”(2002:
95).
59
As chapas são compostas por partidos políticos, tendências partidárias, sindicais ou independentes que
assumem o número de cargos proporcionais a sua votação.
60
Os núcleos regionais, organizados na cidade do Rio de Janeiro, estão assim localizados: I- Centro, II-
Madureira, III - Méier, IV Penha, V- Campo Grande, VI- Jacarepaguá, VII- Ilha do Governador, VIII-
Bangu.
61
A saber, Angra dos Reis, Barra do Piraí, Barra Mansa, Belford Roxo, Cabo Frio, Cachoeiras de Macacu,
Campos, Conceição de Macabu, , Duque de Caxias, Iguaba Grande, Itaboraí, Itaguaí, Itaocara, Itaperuna,
Itatiaia, Macaé, Magé, Mangaratiba, Maricá, Mendes, Mesquita, Miguel Pereira, Nilópolis,Niterói, Nova
Friburgo, Nova Iguaçu, Parati, Petrópolis, Pinheiral, Porciúncula, Quatis, Queimados, Resende, Rio
Bonito, Rio das Ostras, Santo Antônio de Pádua, São Gonçalo, São João de Meriti, Saquarema, Tanguá,
Teresópolis, Três Rios, Valença, Vassouras, Volta Redonda. Encontra-se em fase de implantação, os
núcleos de Iguaba,Parati e Petrópolis.
{
PAGE
}
A direção do Sindicato se divide em Coordenação Geral, Coordenação da
Capital, Coordenação do Grande Rio e Coordenação do Interior, além das seguintes
secretarias: Finanças; Organização; Imprensa; Assuntos Jurídicos; Assuntos
Educacionais; Cultura e Formação; Gênero, Anti-racismo e Orientação Sexual;
Funcionários; Aposentados; e Saúde.
A diretoria estadual está submetida a instâncias superiores que são o Congresso
Estadual, a Conferência Estadual, a Assembléia Geral e o Conselho Deliberativo.
O Congresso Estadual é a instância máxima do sindicato, somente ele pode
promover alterações no estatuto, deliberar sobre a constituição da base ou ainda destituir
a direção. Realiza-se com a periodicidade de dois anos através de delegados eleitos nas
bases, além dos membros efetivos da Diretoria Estadual.
A Conferência Estadual trata de questões mais específicas da entidade, como por
exemplo, a temática educacional, e sua convocação que pode ser feita pela diretoria,
conselho deliberativo e/ou assembléia geral é realizada de acordo com as necessidades
conjunturais.
A Assembléia Geral é o maior espaço de deliberação do sindicato, uma vez que
todos os trabalhadores da educação podem participar, votando nas questões pertinentes
às redes educacionais nas quais trabalham, obedecendo as deliberações congressuais e
o Estatuto em vigor.
O Conselho Deliberativo, o órgão organizativo das assembléias gerais,
sistematiza informações sobre o conjunto das regionais e núcleos municipais, sendo
constituído por membros da diretoria estadual, das diretorias regionais, dos núcleos e
por conselheiros ou representantes de escolas.
Portanto, cabe à Diretoria Estadual deliberar sobre o cotidiano do sindicato,
respeitando os encaminhamentos das instâncias descritas acima, organizando-se
administrativa e politicamente.
Ao Conselho Fiscal cabe, como o próprio nome diz, a fiscalização financeira e
do patrimônio do sindicato, sendo composto por membros eleitos com mandato de dois
anos.
Por último, o departamento jurídico que encaminha as ações reivindicativas
trabalhistas de caráter coletivo ou individual da categoria, tais como processos
{
PAGE
}
indenizatórios por perdas salariais, mandatos de segurança etc, como ação
complementar à luta política
62
O SEPE aposta nas mobilizações de massa, não esteve organizado juridicamente
ao longo de sua história através do modelo oficial de sindicato com carta sindical
expedida pelo Ministério do Trabalho, buscando sua representação nas escolas. Nesse
sentido, o financiamento do sindicato é feito exclusivamente por seus filiados através da
autorização de desconto de 1% do salário, não estando atrelado ao imposto sindical e
tampouco à venda de serviços assistencialistas, embora, a entidade tenha realizado um
convênio com uma empresa de saúde a fim de oferecer descontos aos filiados. Como
afirma SILVEIRA:
o convênio com empresas de saúde passou a ocorrer a partir de
1995. O Sindicato, no percorrer de sua história, nunca teve uma
preocupação em investir em ganhos assistencialistas: não manteve
convênio com empresas de saúde, não tem sede campestre, etc. As
campanhas de filiação sempre se pautaram na questão da necessidade
de participação como fator de fortalecimento da entidade e da
categoria como um todo.(2002: 170)
Portanto, a arrecadação financeira destina-se fundamentalmente às mobilizações,
infra-estrutura e formação dos filiados, das quais poderíamos destacar, grosso modo,
filiação à CUT, publicações ordinárias e extraordinárias, repasse aos núcleos
municipais, despesas com funcionários e aluguéis, e, recentemente, com a aquisição de
uma sede no centro do Rio de Janeiro.
È com esse espírito que a entidade quer ser vista no site. As fotos abaixo foram
retiradas da seção de História da entidade ({ HYPERLINK "http://www.sepe-
rj.org.br/historia-p.htm" }
63
) e correspondem ao período de transformação da associação
em sindicato. Não há mais fotos em nenhuma outra seção.
62
Sobre o longo debate travado pelas diretorias do SEPE quanto à pertinência de um departamento
jurídico, ver SILVEIRA (2002: 181).
63
Acesso em abril /2005.
{
PAGE
}
Foto 9 e 10
Fotos de Mobilização do SEPE-RJ
Fonte:site do SEPE.
As fotos selecionadas pelo SEPE são todas de mobilizações ou assembléias da
entidade, demonstrando quais são as ações que pretende evidenciar de sua prática
sindical.
II.4.4 – PERFIL DOS DIRIGENTES SINDICAIS
O perfil dos dirigentes sindicais que objetivamos delinear através do
questionário mais se aproxima do que revela por inteiro determinados elementos
comuns aos integrantes de um mesmo sindicato.
Distribuímos 49 questionários: 11 para toda a diretoria executiva do SINPRO, 8
para toda a diretoria da UPPES e 30 para a Direção Estadual do SEPE (2 para cada uma
das 4 coordenações e dois para cada uma das 11 secretarias).
Desse total foram respondidos 26 questionários (quantitativo abaixo de nossas
expectativas). No SINPRO alguns diretores se recusaram a responder e outros não
foram encontrados, resultando em 5 questionários preenchidos. Na UPPES todos se
disponibilizaram a responder, no entanto, três não devolveram. Fato que também
ocorreu no SEPE, todos aceitaram responder, mas 16 foram efetivamente preenchidos.
Portanto, sabemos que o papel desse instrumento de pesquisa se restringe a
levantar questões para o mapeamento dos sindicatos, incrementando dados às seções
anteriores, sendo sucedido pela análise das fontes primárias e entrevistas com os
dirigentes. Não trabalharemos com todos aspectos da tabela que construímos, e sim,
estaremos nos concentrando nos pontos que podem delinear características dos
dirigentes e pontos a serem desdobrados no próximo capítulo.
Os dados recolhidos foram tabulados e sistematizados na tabela
comparativa que apresentamos a seguir:
{
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}
T A BE L A
1
-
P
E R F I L D O S D I R I G E N T E S S I N D I C A I S
64
Questão SINPRO-Rio UPPES SEPE-RJ
1. Tempo de militância (média)
26,8 anos 19,4 anos 14,7 anos
2. Filiação partidária
sim: 60%
não: 40%
Sim: 20 %
não: 80%
sim: 100%
não:0 %
3.1 Avaliação da política
educacional do Governo Lula
quanto ao Ensino Fundamental
crítica: 20%
favorável: 40%
neutra: 20%
ND: 20%
crítica: 80%
favorável: 20%
neutra: 0%
ND: 0%
crítica: 56,25%
favorável: 37,5%
neutra: 0%
ND: 6,25%
3.2 Quanto ao Ensino Médio
crítica: 20%
favorável: 40%
Neutra: 40%
ND: 0 %
crítica: 100%
favorável: 0%
Neutra: 0%
ND: 0 %
crítica: 37,5%
favorável: 37,5%
neutra: 12,5%
ND: 12,5%
3.3 Quanto à Educação Superior
crítica: 20%
favorável: 40%
Neutra: 40%
ND: 0%
crítica: 100%
favorável: 0%
neutra: 0 %
ND: 0%
crítica: 50%
favorável: 37,5%
neutra: 12,5%
ND: 0%
3.4 Expectativas gerais quanto
ao Governo Lula
Positiva: 80%
Positiva com restrições: 0 %
Negativa:20%
Positiva: 0%
Positiva com restrições: 0 %
Negativa: 100%
Positiva: 43,75%
Positiva com restrições:18,75%
Negativa: 37,5%
64
Legenda: ND =Não declarado – SE= Sem Escolaridade – EF= Ensino Fundamental – EM = Ensino Médio – Esp= Especialização - ES= Educação Superior.
{
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}
Questão SINPRO-Rio UPPES SEPE-RJ
4. Escolaridade
EM: 20% Gra: 20%
Esp: 60% Mes: 0%
Dou: 0%
EM: 20% Gra: 40%
Esp: 20% Mes: 0%
Dou: 20%
EM: 18,75% Gra: 25%
Esp: 31,25% Mes: 25%
Dou: 0%
4.1 Escolaridade paterna
SE: 0% EF: 60%
EM: 0% ES: 40%
SE: 20% EF: 20%
EM: 20% ES: 40%
SE: 6,25% EF: 31,25%
EM: 25% ES: 18,75%
4.2 Escolaridade materna
SE: 20% EF: 40%
EM: 20% ES: 20%
SE: 20% EF: 20%
EM: 60% ES: 0%
SE: 0% EF: 56,25%
EM: 37,5% ES: 6,25%
5. Renda pessoal
Entre R$ 1.200 e R$ 1.800: 60%
Acima de R$ 3.000: 40%
Entre R$ 1.200 e R$ 1.800: 20%
Acima de R$ 3.000: 60%
Não declarado: 20%
Até R$ 600: 12,5%
Entre R$ 600 e 1.200: 12,5%
Entre R$ 1.200 e 1.800: 12,5%
Entre R$ 1.800 e 2.200:12,5%
Entre R$ 2.200 e 3.000:12,5%
Acima de R$ 3.000: 37,5%
6. Faixa etária
Entre 56 e 65 anos: 60%
Acima de 65 anos: 20%
Não declarado: 20%
Até 45 anos: 20%
Entre 46 e 55 anos: 20%
Entre 56 e 65 anos: 40%
Acima de 65 anos: 20%
Até 35 anos:12,5%
Entre 36 e 45 anos: 50%
Entre 46 e 55 anos: 25%
Entre 56 e 65 anos: 12,5%
Acima de 65 anos: 0%
7. Sexo
F: 40% M: 60% F: 80% M: 20% F: 62,5% M: 37,5%
Fonte: levantamento realizado pela autora, abril / maio, 2005.
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}
Em primeiro lugar, poderíamos destacar a média elevada do tempo de militância,
e de direção, dos dirigentes sindicais. Como destacamos, no SINPRO, uma grande
parte dos sindicalistas esna direção desde 1978. Mas na UPPES e no SEPE a média
também é alta, demonstrando a dificuldade, ou opção, das direções na formação de
novos quadros. Essa média associada a elementos discutidos nas seções anteriores,
como as regras eleitorais da UPPES, mas também a inexistência de uma chapa de
oposição nas últimas eleições do SINPRO, os quatro anos de mandato nas gestões
desses dois sindicatos, caracterizam um processo de burocratização dessas entidades.
No entanto, essa questão precisaria ser melhor investigada, o que não poderemos fazer
nesta pesquisa.
Os dados sobre filiação partidária demonstram a desvinculação da UPPES de
uma militância política partidária e acentua, no SEPE, essa proximidade entre a
militância partidária à militância sindical. No SINPRO uma divisão entre
sindicalistas sem filiação e militantes partidários, que nos levará a investigar como essas
duas “correntes” se organizam no interior da direção.
Quanto à avaliação das políticas educacionais do governo Lula, a mais crítica é a
da UPPES. Ao entrelaçar esse aspecto a componentes anteriores, principalmente a quase
inexistência de filiação partidária e a reverência às políticas populistas, creditamos tal
avaliação àquela assumida pelos grupos conservadores, sem um maior aprofundamento
do debate. Tal avaliação está condizente às expectativas negativas quanto ao conjunto
do governo Lula. No SINPRO, a avaliação é mais favorável que crítica, contendo um
percentual de neutralidade, demonstrando que o sindicato, em grande parte, não se opõe
às políticas publicas governamentais. Também apresenta concordância em relação à
avaliação geral do governo Lula, majoritariamente positiva. no SEPE uma certa
predominância das avaliações críticas quanto às políticas educacionais do governo
“ptista”, no entanto, as avaliações positivas, ou positivas com algumas restrições,
prevalecem sobre as negativas no âmbito de avaliação do governo federal como um
todo. Caberá investigar, em quais aspectos, então, o governo tem melhores resultados
que na área educacional.
O item escolaridade, demonstra que o SEPE possui o quadro de mais alta
formação. Presumimos que esse fato, associado a outros, como faixa etária dos
dirigentes, o nível de disputas existentes no interior do sindicato e a fundação no
contexto de redemocratização do país, revela a busca da formação acadêmica como
fortalecimento das lutas no campo educacional. A reformulação do discurso acadêmico
{
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}
contemporâneo à redemocratização, ao surgimento do Novo sindicalismo e a expansão
da pós-graduação brasileira a partir da década de 1980, e, posteriormente o debate em
torno da atual LDB levaram estes dirigentes, que provavelmente cursaram a graduação
nesse período, a buscarem a continuidade de sua formação.
O cruzamento de dados entre escolaridade dos pais e a escolaridade dos
dirigentes indicam que há uma elevação no nível de escolaridade dos professores,
conforme, SILVEIRA (2002) já havia assinalado, indicando uma visível modificação da
origem de classe desses novos professores do ensino fundamental. Tal fato pode ser
notado principalmente no SEPE, os dirigentes possuem a maior formação enquanto seus
pais possuem a menor das três entidades. na UPPES, em que a escolaridade materna
está situada, na maioria dos casos, no Ensino Médio, provavelmente no curso de
formação de professores, parece ter ocorrido uma continuidade da formação de
normalistas.
A renda pessoal está, em vários casos, situada na faixa superior a três mil reais
em todas as entidades
65
e uma grande porcentagem de dirigentes do sexo feminino,
sendo que, apenas no SINPRO é menor que o mero de dirigentes do sexo masculino,
característica presente desde sua origem, porém como um crescimento do número de
mulheres na diretoria.
A análise de diferentes aspectos nesse capítulo, como a história dos sindicatos
em questão e sua estrutura, suas relações com o contexto brasileiro, dos quais
destacamos o movimento da classe trabalhadora e a construção das políticas
educacionais, assim como os traços mais gerais dos sindicalistas atuais, objetivaram
ampliar a visão acerca do nosso objeto de pesquisa. Acreditamos que esse panorama
traçado permitirá uma fundamentação maior ao centro de nossa análise, a investigação
do pensamento pedagógico e o projeto sindical das entidades e suas interfaces.
65
O que aparentemente é uma contradição no que tange a tendência de queda do valor da força de trabalho
docente, na verdade confirma tal tendência, posto que, nas conversas informais com os diretores, muitos
afirmaram ter mais de três empregos e até mesmo em cidades diferentes.
{
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}
III - O PENSAMENTO PEDAGÓGICO E O PROJETO SINDICAL DO
SINPRO-RIO, DA UPPES E DO SEPE-RJ
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}
Trataremos neste capítulo do pensamento pedagógico dos sindicatos em tela e de
seus projetos sindicais. Estamos entendendo que o pensamento pedagógico abarca a
concepção de sociedade e a concepção de educação das entidades, dialeticamente
relacionadas, embora cada uma das concepções tenham delimitadas suas
especificidades. E, o Projeto Sindical, abarca a forma como a entidade concebe sua
função social - articulada à sua estrutura e ao perfil dos dirigentes - e às suas práticas
políticas.
Optamos nesta seção pela ordem crescente no nível de abstração do debate,
primeiro trataremos do conteúdo das concepções e práticas educacionais das entidades,
para num segundo momento, apresentarmos a totalidade que oferece sustentação à
concepção de educação de cada sindicato. Queremos com isso, demonstrar que, a
aparente homogeneidade nos discursos gerais sobre educação ou publicações dos
sindicatos, se desfaz à medida que as mediações vão sendo buscadas para a análise das
particularidades, revelando diferentes concepções de sociedade.
No capítulo anterior tratamos da estrutura dos sindicatos por entendermos que
sua história e forma organizativa expressam e são expressões de suas concepções.
Embora nosso recorte temporal seja a partir da década de 1990 em que o neoliberalismo
se instalou no país, recuperamos uma parte da história dessas entidades. Esse estudo nos
permitiu selecionar o material de pesquisa para esse capítulo, a seleção de entrevistados
e das fontes primárias que, fundamentaram a análise, embora nem todas sejam citadas
no corpo do texto. Tentamos buscar os mesmos elementos de análise nos três sindicatos,
mas nem sempre foi possível devido à diversidade de sua forma organizativa.
Na UPPES contamos com três “dossiês sobre os problemas da educação pública
estadual no Rio de Janeiro” nos anos de 1996, 1997-1998 e 2004; jornais periódicos, o
livro biográfico: Marcados pela história e o site: http://www.uppe.com.br. Como a
entidade se organiza a partir de uma estrutura completamente verticalizada e
centralizada, entrevistamos a presidente da gestão que está no cargo desde 1988, e cabe
destacar, não possui filiação partidária.
{
PAGE
}
No SINPRO utilizamos teses do último congresso (2004), o vídeo de posse da
atual diretoria, revistas, o site http://www.sinpro-rio.org.br e duas entrevistas. Uma
entrevista foi realizada com o presidente da entidade no cargo desde 1996, e na diretoria
executiva da entidade desde 1978, e outra entrevista contemplou o diretor de Educação
e Cultura que também dirige o Centro de Estudos e atualização em política e educação
(CEAPE), conhecido como Escola do Professor. Após a eleição do PT para a
presidência da república houve um rompimento na diretoria ocasionando a formação de
duas chapas em disputa nas próximas eleições para o sindicato, lideradas por esses dois
dirigentes. Na chapa de situação do atual presidente a hegemonia da corrente ptista
Articulação Sindical. Na chapa de situação do Diretor do departamento de Educação
encontramos “ptistas” de outras correntes, filiados ao PCdoB, ao PCB, ao PDT e ao
PSB, além de diretores independentes
66
.
No SEPE tivemos como fontes primárias as resoluções do Congresso de
Educação de 1992, revistas, o site http://www.sepe-rj.org.br e as teses do último
Congresso (2005). Com relação à escolha dos entrevistados, cabe destacar que foi
bastante complexa e fez parte do processo de análise da entidade, cuja justificativa
apresentaremos a seguir. A vitória do PT para o governo federal significou uma
reorganização interna das forças que compõem a diretoria da entidade - montada a partir
dos critérios de proporcionalidade- configurando três grandes blocos ou frentes dentro
da diretoria. Na falta de caracterização
67
melhor, poderíamos afirmar que o marco da
eleição de Lula revelou com maior nitidez, as forças políticas de “esquerda”, de
“centro” e de “direita” no interior desta direção.
Nas seis chapas da última eleição havia correntes políticas e subgrupos de
núcleos ou regionais de filiação partidária ou independente de partidos. Grosso modo,
poderíamos definir a composição do grupo de esquerda pelos militantes do P-SOL
(algumas correntes), PSTU, pelo grupo da OMP (Organização Marxista Proletária - sem
Partido) e militantes independentes. O centro é composto pelos militantes do P-SOL
(algumas correntes) e PT (algumas correntes). E a direita da direção, formada pelo PT
(majoritariamente a Articulação Sindical), PCB, PCdoB, PDT e PSB. Os entrevistados
66
Independente é como o meio organizado partidariamente convencionou denominar aqueles sujeitos não
filiados à partidos políticos.
67
Esta nomenclatura é bastante superficial, uma vez que a complexidade destes grupos é, em certa
medida, homogeneizada dentro destas três posições políticas. Ficaremos, no entanto, com esta definição
que já se tornou clássica no meio sindical.
{
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}
do SEPE são representativos destes grupos. A primeira diretora, do grupo de esquerda, é
militante de uma corrente do P-SOL; o segundo, do denominado centro, é do PT do
Coletivo de Educadores Socialistas; e a terceira é da Articulação Sindical, corrente
também do PT.
Nosso objetivo geral neste capítulo é analisar em que medida o pensamento
pedagógico e o projeto sindical do SINPRO, da UPPES e do SEPE convergem ou
divergem no seu interior e entre si, assim como, em que medida, representam os
interesses históricos da classe trabalhadora
68
a qual formalmente representam.
III.1
O
P
ENSAMENTO
P
EDAGÓGICO DO
SINPRO,
DA
UPPES
E DO
SEPE,
III. 1.1- A Concepção de Educação dos sindicatos
Vejamos, abaixo, algumas das primeiras formulações sobre a concepção de
educação dos sindicatos, segundo os entrevistados das três entidades:
Educação como direito de todos que conduza a emancipação e à
cidadania, para isso tem que abarcar uma ampla formação, não pode
ser restrita ao mercado de trabalho. (Presidente SINPRO, 2004)
Quando a gente pensa em educação... a gente o poderia pensar, no
primeiro momento, em educação e trabalho. Houve uma época em que
a educação estava muito voltada para o mercado de trabalho. Temos
que voltar aos princípios da educação, a questão da formação do
homem integral, em se tratando da educação sica. (Presidente
UPPES, 2005)
A educação não deve ser para formar mão-de-obra, para formar capital
humano, mas uma educação que forme um ser humano integral, com
todas suas potencialidades desenvolvidas.[...] Tem que atuar na
formação do ser crítico e consciente, atuando na sociedade e
modificando essa sociedade. (Coordenadora 1 SEPE, 2005)
68
Para tentar escapar de uma idealização da classe trabalhadora, vamos fazer uma distinção entre os
interesses históricos contidos na produção socialista e os interesses da classe trabalhadora concreta.
Utilizaremos a expressão interesses históricos da classe trabalhadora no sentido de busca de superação
da sociedade capitalista, ou seja, a partir da perspectiva socialista, essa é a classe que tem a ganhar com a
abolição da propriedade privada dos meios e instrumentos de produção, tal como MARX e ENGELS a
apresentam no Manifesto Comunista. No entanto, sabemos que, empiricamente, não existe uma
homogeneidade de interesses no interior da classe trabalhadora, ao contrário, podemos identificar, no seu
interior, uma grande fragmentação.
{
PAGE
}
Uma formação mais humanística que prepare o aluno para se inserir
nesse mundo, no mundo contemporâneo, que trabalhe com valores de
cidadania e que também prepare para inserção no mundo de trabalho,
mas não apenas no mundo da terceirização, onde teria reduzido sua
carga de conhecimento de disciplinas.[...]. A formação geral também,
que você não discute apenas um segmento do conhecimento, do saber,
da própria formação para o mercado de trabalho, permanece sendo
luta do sindicato. (Coordenador 2 SEPE, 2005)
Pouco poderíamos diferenciar, a priori, das formulações gerais expostas pelos
dirigentes sindicais. Estes discursos representam, num primeiro momento, uma
abstração, uma vez que o real não é completamente apreensível em seu ponto de partida.
Logo, entendemos que as mediações mercado de trabalho, financiamento, laicidade da
educação ajudam a destruir a pseudoconcreticidade das formulações gerais sobre
educação. Essa decomposição do todo possui caráter meramente metodológico. O
resultado desse processo de análise será a rearticulação das partes com a totalidade a fim
de nos aproximarmos de sua essência construindo a síntese de suas múltiplas
determinações.
A relação educação e trabalho
A relação entre educação e trabalho é o cerne do debate educacional para o
campo marxista. O enfoque desse relacionamento representa diferentes concepções de
educação- que tomaram diversas configurações históricas- porém, todas oriundas da
centralidade que tem o trabalho na sociedade, por ser a forma pela qual o homem
produz sua existência. Essas concepções tanto podem almejar um relacionamento de
domínio técnico-científico do trabalho, como nas concepções educacionais socialistas,
ou a permanência da fragmentação da compreensão do processo produtivo, que se
pela apropriação da forma do trabalho, mas não de seu conteúdo.
A concepção de educação, a organização das escolas, seus projetos e
metodologias se constroem a partir dessa contradição fundamental, entre a apropriação
da base técnica do trabalho ou a sua aprendizagem fragmentada.
Dada a importância que a relação com o trabalho tem para a análise da educação
e a abordagem da temática ter sido feita pelos entrevistados, nas citações acima, através
da mediação mercado de trabalho, iniciaremos por essa particularidade.
Para o diretor da Escola do Professor do SINPRO, a relação entre mercado de
trabalho e educação tende a se estabelecer, exclusivamente, a partir da demanda dos
{
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}
alunos. A escola não é o centro dessa discussão e sim os gestores das políticas públicas
educacionais, que devem balancear essa busca com as necessidades da sociedade.
Convém destacarmos o trecho abaixo:
os alunos em geral tendem a buscar a empregabilidade [...] mas creio
que um país que tenha um projeto de nação, deve estruturar seu ensino
de acordo com as necessidades de desenvolvimento da sociedade. [...]
O país pode se desenvolver com educação, a formação do cidadão,
a capacidade de análise, a capacidade de crítica que está sempre ligada
à educação (Diretor CEAPE/ SINPRO, 2005).
Cabe destacar, também, a visão do presidente da entidade:
Não discussão da entidade sobre a relação com o trabalho, que
escola é necessária [...] isso vai ficar no plano das concepções
individuais. (Presidente do SINPRO, 2004).
O discurso evasivo do SINPRO sobre a relação educação e trabalho e a
articulação da educação a um projeto de desenvolvimento nacional – aspecto que
estaremos tratando na seção sobre concepção de sociedade é justificado pelos
entrevistados pela compreensão de que não uma concepção de educação da entidade,
como podemos notar na fala do diretor:
Não tem uma concepção de educação fechada, o que a gente crê aqui
na escola do professor, o que a gente procura é em todas as áreas do
conhecimento dar chance do professor fazer cursos e discutir
questões.[...] A gente não tem uma concepção de educação que
procura impor. A nossa concepção de educação é baseada em coisas
muito gerais, a gente defende a gratuidade do ensino público, a gente
defende as eleições democráticas para os dirigentes... (Diretor
CEAPE/ SINPRO 2005)
E também na do presidente:
Os sindicatos não têm uma discussão acumulada para chegar ao
patamar de dizer que a concepção de educação do sindicato é essa ou
aquela. Pode até ser que, por exemplo, a UPPES o tenha por ser uma
entidade dirigida por um grupo conservador.[...] Eu não posso dizer
isso em nome do sindicato,[...] não tem uma visão de entidade. [...]
Pode fazer uma experiência, são 42 diretores, por que já perguntou pra
mim, duvido que alguém te responda isso (Presidente SINPRO, 2004).
Entendemos que o fato da entidade não ter discutido sua concepção de educação
nas documentações que registram sua história e o debate não aparecer nas três teses do
8º Congresso do SINPRO (ConSINPRO/ 2004) – embora tratem de outros pontos
{
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}
relevantes da área educacional - não significa que a entidade não possua uma concepção
de educação, ou um pensamento pedagógico. Como a necessidade de discutir uma
concepção de educação não existe, na maioria dos casos, nos próprios locais de trabalho
da base desta categoria posto que os professores devem se adaptar a um projeto
político pedagógico predeterminado na rede privada de ensino - o sindicato não avalia
esse ponto como necessário, ou pelo menos, prioritário. Mas as falas em eventos, como
na posse da diretoria, os artigos em revistas, a realização de cursos e seminários, enfim,
a prática da entidade revela sua apreensão sobre o fenômeno educativo. Como por
exemplo, a referência à Escola do Professor como objetivação de uma concepção de
educação da entidade,
esse projeto que temos aqui, no quinto andar, é um projeto que tenta
dar alguns passos nessa direção, mas são tímidos ainda.[...] Tem uma
assessora pedagógica que foi contrata pelo sindicato para auxiliar no
projeto e esse projeto começou em 2000. (Presidente SINPRO, 2004).
O presidente refere-se à Escola do Professor (CEAPE) que oferece aos filiados
serviços organizados sob as formas de: cursos de atualização que abrangem temas
diversos, cursos de línguas estrangeiras, oficinas, artesanato, informática; atividades
culturais e o Sind Tour com visitas e passeios, caminhadas ecológicas e viagens
nacionais e internacionais. A única atividade regular que é gratuita é a chamada
Sindicato Cidadão de alfabetização de jovens e adultos, realizado por professores
voluntários.
Se a Escola do Professor é um projeto que pretende sistematizar a concepção e,
conseqüentemente a prática educacional da entidade, o sindicato parece voltar,
nostalgicamente, à década de 1930 quando, conforme tratamos no capítulo 2, a entidade
tentou resgatar a autonomia perdida pelo assalariamento através do incentivo às
cooperativas. A escola do professor seria então uma cooperativa com finalidades
internas oferecendo serviços e formação continuada à sua base, ou nas palavras do
presidente, “os melhores cursos a preço de banana” (Presidente SINPRO, In: Posse da
diretoria do SINPRO-RIO, 2003). Parece estarmos diante de uma concepção de
educação, uma educação autogestada por um grupo de trabalhadores e oferecida como
serviço de preços variados a outro grupo.
para a presidente da UPPES, a formação de um homem integral passa pela
descoberta de seus talentos e enquadramento ao sistema produtivo. Para ela, a educação
deve ser capaz de formar
{
PAGE
}
um ser integral, esse ser capaz, amadurecido e capaz de se conduzir
diante dessa sociedade, capaz de fazer as escolhas, de acertar suas
escolhas,de ser uma pessoa produtiva, no que for... (Presidente
UPPES, 2005).
E este processo educativo deveria ser contemporâneo:
Houve uma época (na época industrial) que preparava para ser uma
pessoa que trabalhava na indústria, hoje em dia as coisas mudam com
muita facilidade. Então, nós temos que preparar o indivíduo para que
ele seja capaz de mudar, compreender que a vocação não é uma única
e exclusiva... Você tem linhas de vocação, e você pode conhecer as
suas tendências e pode se adaptar a esse novo mundo que muda tanto.
(Presidente UPPES, 2005)
Ou seja, podemos notar nesta interpretação, uma inversão da centralidade do
trabalho na sociedade para a centralidade do conhecimento, período em que “os
professores precisam estar muito bem preparados para esse novo milênio, que é o
milênio da sociedade do conhecimento” (Presidente UPPES, 2005). Ou seja, o
conhecimento, nesta perspectiva, se autonomizaria das condições objetivas da
sociedade.
Se as teorias sobre as vocações, amplamente difundidas nas correntes da
psicologia, se propunham a justificar a divisão do trabalho a partir das classes sociais no
período fordista/taylorista, a fim de conformar o trabalhador ao exercício de uma única
função, no atual padrão de acumulação, se apresentam extemporâneas, exigindo novas
formulações. A explicação do dom, de que o sujeito nasceu para esta ou para aquela
profissão não são suficientes para um mundo do trabalho que exige uma grande
flexibilidade profissional. Por isso, uma explicação mais abrangente surge em torno da
pretensa vocação dos sujeitos, o que a presidente explicitará a seguir:
eu trabalhei com isso, porque sou orientadora educacional e assistente
social. Trabalhei durante muito tempo na educação vocacional, que
faz as pessoas se descobrirem, seus talentos, suas linhas vocacionais.
Indubitavelmente a educação prepara o homem para o trabalho,
quando ela é aquela educação que a gente sonha. (Presidente UPPES,
2005. Grifo nosso).
Na sua concepção, a relação entre educação e mercado de trabalho deve ser feita
de forma mecânica e utilitarista com a finalidade de adequação ao atual padrão
produtivo, de forma a preparar o aluno
{
PAGE
}
para esse mundo novo, rápido e de mudanças. [...] A vocação não é
uma só, a gente tem coisas que está mais apta a fazer bem, mas várias
coisas, [...] Qualquer um de nós pode desenvolver mais de uma
função. [...] No mundo de hoje que é mutável, s temos que preparar
a criança. Hoje você está fazendo uma coisa, amanhã você está
fazendo outra, com a mesma alegria, com o mesmo prazer, nas suas
linhas de vocação. (Presidente UPPES, 2005).
As chamadas linhas vocacionais nada mais são que instrumentos ideológicos da
polivalência profissional
69
. A discussão sobre polivalência não abarca as profissões
clássicas que gozam de grande prestígio social, mas destina-se às profissões ocupadas
pela classe trabalhadora. Os apologéticos da polivalência não defendem,
conseqüentemente, que médicos exerçam esta função hoje e amanhã sejam comerciários
e depois de amanhã sejam camelôs, assim como um engenheiro não pode ter sido
trocador de ônibus ontem e amanhã desempenhar funções de um estivador.
Essas explicações tentam dissimular o conteúdo de classe dessa discussão,
tratando-a como simples opção de um sujeito, livre de determinações. A presidente
afirma que a descoberta dessas linhas vocacionais para uns se dá de forma rápida, outros
demoram mais, precisam trabalhar para descobrirem que não querem aquela profissão,
utilizando exemplos familiares para demonstrar que há crianças que
não sabem o que querem ser, diz que quer ser bombeiro, outro dia
estava até vendo sobre isso... que quer ser gari... uma pessoa estava
falando: por que eles querem ser gari? Por que eles acham
emocionante andar ali, pular atrás daquele carro, a criança quer
emoção, [...] essa criança não tem condição de escolher ainda. Vai
dizer que vai ser policial? Bombeiro? Ele muda no meio do caminho.
(Presidente UPPES, 2005)
O integrante da família da presidente, apesar da juventude, afirma que quer ser
bombeiro. Por que essa opção é encarada como imatura? Se quisesse ser administrador
de empresas ele teria descoberto sua linha vocacional (e de classe)? As razões desta
escolha, segundo a entrevistada, são sempre de caráter individual, nunca de classe.
Embora para afirmar que um sujeito descobriu sua vocação ela deva estar perfeitamente
coadunada com sua inserção social.
69
Estudos como o de RAMOS (2001), sobre a Pedagogia das Competências, e de DUARTE (2000), sobre
as apropriações neoliberais e s-modernas da teoria vigotskiana, demonstram o retorno feito por teorias
educacionais ao campo da psicologia para adequação da educação da classe trabalhadora ao padrão de
acumulação flexível e, conseqüentemente, à manutenção da hegemonia do capital no campo educacional.
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}
Entendemos que esta concepção de educação está articulada à proposta de
educação do capital que tem o marco da divisão do trabalho. É funcional ao sistema
capitalista um trabalhador de formação polivalente, versátil, de grande potencial de
adaptabilidade às transformações cada vez mais rápidas e constantes das forças
produtivas, sem o domínio desse trabalho e, portanto, sem autonomia frente ao capital.
Esse modelo educacional parcela o conhecimento, significando, em última instância,
uma fragmentação da compreensão da realidade e uma proposta educacional
diretamente funcional ao mercado de trabalho. Embora na abertura desta seção a
presidente da UPPES afirme que não é possível pensar em educação e trabalho, na
introdução do dossiê de 1998 a UPPES, sob a mesma presidência, afirma:
A falta de professores deixa em desigualdade, na hora de enfrentar o
mercado de trabalho ou o concorrido vestibular, aqueles que tem, na
rede oficial, a única opção para seus estudos. (1998: 5)
no Dossiê, que aponta os problemas da educação no ano de 1996, fica patente
a naturalização da dualidade educacional, quando a UPPES afirma que a categoria está
em extinção o que compromete, também, a rede particular” (UPPES,1996: 4). Ou seja,
apesar de representar os professores da rede pública, a entidade realiza uma avaliação
que leva em consideração os danos que a formação inadequada e a desvalorização dos
profissionais pode causar também à rede privada. A entidade demonstra que as classes
médias também devem se ocupar das questões relativas ao professor, pois também
podem ser atingidas pela precarização da profissão.
Esta é a característica estruturante da proposta educacional do capital, conforme
tratamos no capítulo 1, qual seja, a dualidade educacional, uma escola polivalente para a
classe trabalhadora e outra de formação geral para a classe burguesa. Assim, temos num
pólo um setor educacional de justaposição de inúmeras áreas do conhecimento que
garante a burguesia uma cultura geral e a capacidade de permanecer na condição de
dirigente da sociedade, chegando aos mais elevados níveis de ensino. Inclusive tendo a
sua disposição o setor de pesquisa de ponta que produz novos conhecimentos
objetivando o desenvolvimento das forças produtivas. E, no outro pólo, um setor
educacional voltado para a classe trabalhadora que tenha uma valia para a produção na
moderna sociedade industrial e letrada, de gradações distintas de ensino, que pode até
ser diretamente profissionalizante.
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}
Essa concepção e essa prática educacional consolidam a formação classista que
interessa ao capital, pois o conhecimento não pode ser totalmente negado ao trabalhador
na sociedade moderna, isso inviabilizaria a produtividade (SAVIANI, 2003). No
movimento de concessão e negação do conhecimento - que o capital quer como
propriedade privada, mas que não pode levar essa propriedade às últimas
conseqüências- o capital projeta uma educação com ênfase em conhecimentos
parcelados, transitórios, efêmeros, multifuncionais, que a presidente da UPPES defende
através do que chamou de linhas vocacionais, do retorno ao terreno da psicologia.
A questão da psicologia hoje, a questão emocional, a inteligência
emocional é reconhecida mundialmente [...] o quanto ela é importante
para a aprendizagem, para o desenvolvimento dos talentos, das
tendências. (Presidente da UPPES, 2005)
Para ser coerente a UPPES propõe que esta teoria também seja levada em conta
para os professores, mais precisamente como elemento integrante dos concursos
públicos:
Os professores têm que ser professores vocacionados. Nos concursos
de ingresso ao magistério, precisam também visar a vocação, os que
buscam o concurso do magistério não podem buscar somente para ter
um emprego,[...] tem que haver uma avaliação da vocação dessa
pessoa. [...] Nós fazemos isso aqui na UPPES para admitir os
funcionários, existem testes para ver a vocação. (Presidente da
UPPES, 2005).
O debate acerca da qualidade da formação do professor, o cus privilegiado
dessa formação não é discutido, sendo substituído por um elemento independente das
condições objetivas: a vocação. No site da UPPES, temos ainda a afirmação da
compreensão da educação como sinônimo de prazer, de entretenimento, integração
social:
[Entende-se] a educação como base da cultura de uma nação e o lazer,
tônica do esforço educativo, que, ao despertar da sensibilidade e da
afetividade, capacitarão o ser humano para viver harmoniosamente: ({
HYPERLINK "http://www.uppe.com.br" }. Acesso em maio/ 2005).
A esse ideário presente no trecho em destaque, e também no conjunto da
entrevista, SAVIANI chamou de teoria pedagógica não-crítica. Para esses grupos “a
sociedade é concebida como essencialmente harmoniosa, tendendo à integração de seus
membros” (SAVIANI, 2002: 4), cuja visão está plenamente articulada ao deslocamento
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}
da questão pedagógica para a psicológica que tratamos acima através das “linhas
vocacionais”.
Para finalizar, a presidente sustenta que a divisão entre trabalho “manual” e
“intelectual” deve ocorrer também no trabalho docente, através de uma hierarquia de
disciplinas e uma superestimação dos especialistas:
Mas que escola é essa de que estamos falando? A escola que tem os
professores, mestres que são ligados à questão mesmo mais
intelectual, aqueles profissionais que vão orientar os professores da
área comportamental, e aqueles outros que são auxiliares também dos
professores. eu digo os professores de música, de artes, de
educação física. A escola tem que ser uma escola que prazer aos
alunos e aos professores. (Presidente da UPPES, 2005).
Uma tal definição que hierarquiza as disciplinas e naturaliza a dicotomia dos
profissionais que executam e aqueles que elaboram, defendida pela UPPES, é típica da
pedagogia tecnicista. No capítulo 1 mostramos que, por mais que o capital deseje, essa
separação não é possível, havendo, no entanto, uma predominância maior de um
trabalho manual ou intelectual derivada da divisão técnica e social do trabalho.
Citaremos agora o que, para os dirigentes do SEPE, sobrevém àqueles discursos
iniciais:
É diferente ter o domínio da base científica do processo de trabalho...
isso que para nós é educação politécnica, por isso defendemos a escola
unitária (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
A formação do aluno tem que ser a mais ampla possível, na escola
unitária, para que ele possa fazer essa escolha (profissional)
(Coordenador 2 SEPE, 2005)
Tem que ter uma perspectiva de aliar a formação geral e técnica, um
processo que vai estar formando um cidadão, na escola única
(Coordenadora 3 SEPE, 2005).
Quando os coordenadores referem-se à escola unitária explicam que é um debate
sistematizado nas resoluções do 1
º
Congresso de educação e unificação
70
/ 1992.
70
Momento em que deu a unificação com a AOERJ e ASERJ, tratada no capítulo 2. No congresso houve
sistematizações sobre os seguintes temas: Condições de trabalho nas escolas públicas; Escola, mulher e
etnia; Eles não querem a participação popular; Quem tem medo da discussão?; A escola e os
funcionários; Gestão Democrática; Sobre projetos de educação; Nossa concepção de escola e as
resoluções políticas.
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Vejamos as resoluções congressuais no ponto “Nossa concepção de escola”, onde
aparece a expressão escola unitária. Reivindicam
um projeto que rompa com a gica de educar para ser mão-de-obra,
seja ela barata ou cara; que contribua para a construção de uma
sociedade igualitária e democrática de fato, rompendo com a alienação
imposta; que assegure a formação crítica do sujeito histórico, do
homem e da mulher conscientes de seu papel na transformação do
mundo, livres de preconceitos de raça, credo e de sexo.[...] Uma
escola que forme cidadãos capazes de compreender as bases
científicas que regem a natureza e a sociedade. [...] Essa escola deverá
ser unitária (SEPE, 1992, 13).
E mais adiante, afirmam que para isso, essa escola deverá
adotar o trabalho como princípio educativo, livre da exploração e da
alienação impostas pela sociedade de classes, buscando romper com a
dicotomia entre trabalho manual e trabalho intelectual, teoria e prática,
formação geral e formação profissional (idem, ibidem).
A formulação de escola unitária
71
é de Gramsci que sistematizou e aprofundou a
produção de Marx sobre educação politécnica ou tecnológica
72
. A escola unitária advém
de uma concepção e prática educacional baseada na compreensão da realidade em sua
totalidade, ou seja, em seus aspectos científicos, políticos, no domínio do trabalho e na
formação integral do homem.
A formação humana integral de cunho socialista, que Marx e Gramsci
desenvolveram como contraproposta à elaborada pelo capital, deveria unificar três tipos
de formação, a educação intelectual, a educação corporal e a educação tecnológica
(MARX, ENGELS, 1992: 60), articulados para oferecer os fundamentos científicos
gerais do trabalho, tornando-o princípio educativo.
O conteúdo pedagógico, cuja gênese é a tecnologia, possibilitaria a compreensão
das bases do trabalho na sociedade moderna e o domínio do homem sobre um
conhecimento até então estranho a ele e aos de sua classe. A proposta dessa educação é
unificar a compreensão humana sobre a realidade comprometida pela divisão real do
trabalho intelectual e manual. Mesmo que a escola unitária possa realizar a práxis dentro
de seu espaço formativo, a dicotomia na sociedade capitalista permanecerá, pois o
71
A esse respeito ver a obra “A Escola de Gramsci”. NOSELLA, Paolo (1992).
72
O contexto de utilização dessas expressões sinônimas é apresentado por SAVIANI (2003), e o
histórico do conceito de educação politécnica no Brasil e as disputas nos seu entorno por RODRIGUES
(1998).
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padrão de produção não será modificado pela via educacional. Essa escola unitária, pois
sem distinção de classes, se realizará plenamente fora da sociedade capitalista.
Porém, apesar dos limites impostos por essa realidade, deve ter sua construção iniciada
nas atuais condições objetivas, colaborando dialeticamente para a construção do novo,
na medida em que a escola unitária traz no seu interior germes dessa novidade.
A propriedade privada e o trabalho alienado tornaram os homens unilaterais,
portanto, a finalidade formativa desta educação é a onilateralidade, “um
desenvolvimento total, completo, multilateral, em todos os sentidos das faculdades e das
forças produtivas, das necessidades e da capacidade da sua satisfação”
(MANACORDA,1991: 78), e a sua finalidade política é “a luta pelas formas sociais
novas do trabalho” (PISTRAK, 2000: 44). Se a existência humana está centrada no
trabalho e também, nessa concepção, a formação deve estar centrada no trabalho não
alienado, a educação deve estar a serviço da construção de uma nova sociedade, naquilo
em que efetivamente a educação pode colaborar: a instrumentalização para a
compreensão da realidade sob bases científicas.
Contudo, podemos observar que, embora os três coordenadores do SEPE façam
referência às resoluções de 1992
73
que apontam para a escola unitária, o conteúdo de
duas de suas interpretações acerca do seu significado é bastante diversificado do
exposto acima, chegando até mesmo a negá-la.
Consideramos plenamente coadunado à discussão de escola unitária o
desenvolvimento apresentado pela diretora 1 do SEPE sobre o teor da resolução de
1992:
Não acreditamos numa educação formadora de apertadores de
parafusos, pessoas providas de ferramentas superficiais para
estarem atuando no mercado de trabalho, isso não as pessoas o
essencial para se colocarem na vida de forma autônoma. Infelizmente,
as políticas públicas não estão voltadas para esse tipo de concepção de
escola.[...] O papel da escola básica deve ser bem centrado na
formação de sujeitos críticos, que tenham capacidade e instrumentos
intelectuais e de sociabilidade para estarem intervindo na sociedade,
para modificá-la, isso é muito maior. Garantindo o direito de todos ao
73 Em 2004, o documento foi redistribuído na íntegra na conferência, afirmando que, embora o
documento datasse de 1992, “suas deliberações mostram-se bastante atuais. O diagnóstico de nossas
condições de trabalho, passando a nossa concepção de escola e as bandeiras de luta apontadas, ainda
contém bastante vigor, podendo constituir-se instrumento importante na luta contra o projeto neoliberal
de educação e na construção de um projeto alternativo de sociedade” (SEPE: 2004:1)
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conhecimento sistematizado e acumulado pela humanidade, sem
parcelamento do saber. Um espaço de direito de apropriação desse
conhecimento, dessas ferramentas de inserção na sociedade.
(Coordenadora 1 SEPE, 2005)
Contudo os outros dois entrevistados, no desdobramento da análise, utilizam a
expressão da resolução - escola unitária - para tratar de propostas um tanto quanto
diferenciadas. Vejamos o coordenador 2:
Deve existir uma relação com o mercado de trabalho, preparar o aluno
para se inserir no mercado de trabalho como trabalhador, desenvolver
as aptidões. [...] mas a escola não pode ficar restrita ao mercado de
trabalho, ou seja, preparar mão-de-obra para o mercado de trabalho.
Mas tem que ter a preocupação de criar condições para que o aluno se
aproprie dos mecanismos necessários para que ele possa decidir em
que esfera do mundo do trabalho ele quer se inserir. Então, nesse
sentido, a formação do aluno deve ser a mais ampla possível pra que
ele possa fazer essa escolha durante seu curso escolar... e até venha
mudar essa escolha durante sua formação e não apenas ao final dela.
(Coordenador 2 SEPE, 2005)
Nesse ponto uma negação da concepção de escola unitária, visto que, na
essência da concepção educacional socialista, um projeto coletivo de formação e de
superação da sociedade de classes e não um projeto que busca soluções individualizadas
ou pontuais. A formação que propicia os domínios da base científica do trabalho é
diferente de uma formação que apresenta rias informações sobre as esferas do
trabalho para melhorar a escolha profissional de uma parcela dos filhos da classe
trabalhadora. Assim como, a proposta de uma educação unitária, parte do pressuposto
que, só com o fim da sociedade de classes, um sujeito antes pertencente a classe
trabalhadora poderá efetivamente decidir em que esfera do trabalho ele quer se inserir.
Hoje, esta decisão não passa apenas pela escola, mas pelas condições de sobrevivência e
reprodução da classe trabalhadora. Há, aqui, uma convergência com a visão da UPPES
de desenvolver aptidões e suprimir as determinações de classe na inserção no mercado
de trabalho.
Com relação à intervenção da diretora 3 do SEPE, o fim político que
apresentamos acima de superação da sociedade de classes abraçado pela escola unitária
também não aparece em sua avaliação sobre o mundo do trabalho. Mesmo um processo
de formação mais ampla deveria colaborar para a integração objetiva e subjetiva do
trabalhador no mundo do trabalho capitalista, ou seja, ajudar na capacitação deste
trabalhador apresentando diversas possibilidades:
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O cidadão vai sair da escola e vai se inserir no mercado... que ele
possa fazer isso tendo a consciência de que é um cidadão trabalhador.
E ao se inserir nesse mercado ele vai estar o tempo todo interagindo
com direitos e deveres advindos do mundo do trabalho. [...] Acho que
hoje a gente tem que ter um aprofundamento dessa discussão na
relação de que a escola não tem que formar trabalhador.
(Coordenadora 3 SEPE, 2005)
Mais que formar o trabalhador, educação deve ter um caráter de troca, pois para
a coordenadora A formação é um capital simbólico” (Coordenadora 3 SEPE, 2005). A
coordenadora acha ainda que é possível fazer a seguinte relação,
Essa discussão de escola única... transferindo para essa questão de
Gaia, de um planeta que é único, que não tem meio, não tem homem,
não tem bicho, transferindo para a questão da educação de que você
tem que ter uma visão holística de todas as situações, de todas as
abordagens, é esse desafio que a gente tem. (Coordenadora 3 SEPE,
2005)
A concepção de escola unitária está amparada na interpretação da realidade a
partir do conceito de totalidade concreta e não de uma visão “holística” de forte apelo
místico e metafísico que busca a unicidade através da conjugação entre a realidade e a
transcendentalidade.
Diante do exposto concluímos que, embora o SEPE seja o único sindicato que
possua resoluções sobre sua concepção de educação e que venha tentando construir até
mesmo um projeto político pedagógico em suas conferências
74
e congressos, a
apropriação dessas discussões não possui a convergência que os entrevistados afirmam
existir. Consideramos um equívoco analítico atribuir essas divergências em torno da
concepção de escola unitária a uma incapacidade da direção de aprofundar esse debate,
mas a algo que uma das coordenadoras percebera na entrevista, quando perguntada
sobre a atualidade destas resoluções:
não voltamos a discutir especificamente as teses de 92 [1º Congresso
de educação], mas creio que se voltarmos a discutir, não vai ter mais
acordo, isso tem a ver com nossas atuais discordâncias políticas
(Coordenadora 1 SEPE, 2005).
74
Em 1999, a Conferência de Educação do SEPE discutiu o tema: “Construindo o nosso projeto
pedagógico”, embora não tenha tido um documento final sobre a proposta.
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A coordenadora 1 aponta para a relação entre concepção de educação e projeto
societário - que discutiremos mais à frente-, enquanto que, para o Coordenador 2, as
resoluções carecem apenas de atualizações, pois:
algumas resoluções com certeza se mantém, resoluções gerais [...]
porém de 92 pra nos tivemos a efetivação da nova LDB. Tivemos
uma série de projetos na rede municipal, no caso rede da rede
estadual, o Nova Escola, [...] que não atenderam a essas
reivindicações históricas do sindicato e que acabaram colocando
novos desafios de elaboração de resposta a esses projetos na área
educacional, alguns congressos foram atualizando a posição do
sindicato frente a esses temas. (Coordenador 2 SEPE, 2005)
Diante de mais uma discordância da atualidade e capacidade de aglutinação da
concepção de escola unitária das forças políticas atuantes hoje no SEPE, é importante
elucidar ainda a avaliação que aponta para a questão da qualificação profissional, por
ser um aspecto importante na relação entre educação e mercado de trabalho:
A visão da CUT é diferente da nossa, por exemplo. Eles [A CUT]
aderiram ao projeto do FAT, de gastar dinheiro do FAT para fazer
qualificação profissional com cursos rápidos, como se isso fosse
qualificar profissionalmente... está adestrando um pouquinho melhor,
atualizando a força de trabalho para apertar um parafuso melhor, que
agora não é apertar um parafuso, é apertar um botão. Então tem que
ter um pouquinho mais de conhecimento, mas não é o conhecimento
da base técnica do trabalho. Não concordo com o que a CUT vem
fazendo e chamando de educação. Atualmente, a CUT tem uma
concepção pode concordar ou não, fechada de mundo, e a concepção
de educação está dentro dela, a agenda está de acordo como os pontos
do Banco Mundial de formação dos trabalhadores, de reconversão do
parque tecnológico etc. (Coordenadora 1 SEPE, 2005)
No VIII Congresso do SEPE em 1998 o sindicato recusou a utilização das verbas
do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) retiradas do seguro-desemprego e
disponibilizadas para o Programa Nacional de Qualificação do Trabalhador (Planfor),
tal discussão foi marcada por grande polêmica. Os defensores da utilização da verba
recorriam aos argumentos que, se o movimento combativo se negasse a fazê-lo, outros
atores sociais o fariam como os sindicatos pelegos, os governos municipais e estaduais
etc. Os militantes contrários atentavam para o processo de cooptação em curso do
governo federal aos movimentos sindicais.
A resolução de não utilização da verba do FAT foi de encontro à prática da CUT
que mudou sua postura ao participar das câmaras setoriais, dos fundos tripartites e criar
{
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um alto grau de dependência da verba do FAT. Ações que consideramos típicas do
oportunismo -no sentido marxista- de flexibilização dos princípios para o
aproveitamento de situações que conduzam mais facilmente a um resultado, sem a
ruptura com a situação estabelecida (BOBBIO, MATTEUCI, PASQUINO, 2004: 846).
Embora por motivações distintas, nenhum dos três sindicatos utiliza verbas do
FAT para cursos de qualificação profissional, porém essa polêmica parece que pode
voltar à tona no SEPE, se levarmos em consideração a seguinte argumentação:
Temos resoluções de não utilização das verbas do FAT, mas o
sindicato tem que se aproveitar dessas contradições (Coordenadora 3
SEPE, 2005)
A CUT não realizou somente cursos para “apertar botões” e é verdade que as
contradições são inerentes a qualquer fenômeno social, entretanto tais exceções de
cursos de qualificação que fugiam a esta tônica não eram sustentáveis, o que acabou
ocasionando sua interrupção. Da mesma forma que cumpriam o papel de se mostrarem
como experiências generalizáveis, enquanto os programas mais utilitários seguiam se
expandindo.
Para a coordenadora 1 do SEPE,
depois desse andar da CUT de convênios com o governo federal, de
utilização da verba do FAT, de adesão a uma agenda neoliberal de
formação dos trabalhadores, aqui no SEPE, não tem mesmo... mais
acordo. Por que não para separar o acordo sobre educação da visão
geral, do que está acontecendo na sociedade, no rumo que a CUT
tomou, inclusive de defesa da reforma sindical e trabalhista, no nosso
congresso agora vai estar sendo discutido se mantemos filiados à CUT
ou não, eu acho que o devemos manter. Não para achar que é
uma coisa pontual, que é a concepção de educação que não mais
acordo (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
RUMMERT (2000) que analisou, dentre outras centrais sindicais, além de
entidades representativas do capital, o projeto identificatório da CUT e sua proposta de
educação para o trabalhador a partir das publicações da central, concluiu que, seus
“objetivos voltam-se para a formação integral do trabalhador e se distanciam do caráter
utilitário e funcionalista dos outros projetos identificatórios” (2000: 184). Porém, os
resultados atuais da pesquisa demonstram que aquele discurso predominante na década
de 1990 sofreu uma guinada nos últimos anos refletindo a própria postura (macro)
política da Central. RUMMERT demonstra que a ação da CUT no âmbito da educação,
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Não significou, assim, a expressão de uma plena valorização da
temática educacional , mas decorreu, sobretudo, de uma ênfase
conferida por, pelo menos, duas vertentes externas: a exigência
explicitada pelo Capital de que a classe trabalhadora apresentasse
maior grau de escolaridade e qualificação e a política pública de
formação profissional implementada pelo governo federal, que
possibilitou o acesso, por diferentes agências da sociedade civil, entre
elas as sindicais, a significativos recursos oriundos do FAT.
(RUMMERT, 2005: 7)
Dessa forma, os projetos de qualificação dos trabalhadores da CUT vêm
corroborando a gica adequada ao padrão de acumulação flexível. Para tal, os
dirigentes da central se utilizam de um papel que outras entidades da sociedade civil não
possuem, o de representante dos trabalhadores, e assim “concorrem, de forma
expressiva, para a construção do fértil terreno em que se consolida e se amplia a
hegemonia do capital”(RUMMERT, 2005: 6).
Os demais sindicatos, SINPRO (embora filiado à CUT) e UPPES não
associaram suas concepções de educação à projetos de qualificação profissional, nem
realizam projetos nos moldes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Financiamento da educação
Dois dos sindicatos investigados são representativos da rede pública, como
vimos no capítulo anterior, a UPPES e o SEPE, enquanto que o SINPRO representa os
professores da rede privada de ensino. Todavia, os três colocam-se em defesa
intransigente da educação pública para todos. Um aspecto relevante a ser destacado
refere-se ao fato dos três sindicatos participarem de conselhos “deliberativos
75
como
Conselho Municipal e Estadual de Educação, do FUNDEF - assim como reivindicarem
melhores condições objetivas dentro das escolas públicas e valorização profissional.
que se definir, portanto, o espaço que a temática de financiamento tem nos sindicatos e
a discussão sobre a responsabilidade de financiamento.
Nesse tópico, estaremos analisando qual a compreensão do papel do Estado
enquanto financiador da educação e o papel da iniciativa privada ou da nova burguesia
75
Esses conselhos possuem inúmeras limitações, dado que a formulação das políticas públicas
educacionais são elaboradas, majoritariamente, pelo Poder Executivo, tornando esses conselhos, na
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}
de serviços educacionais, para esses sindicatos frente à política de desregulamentação e
diminuição da intervenção estatal característica do modelo neoliberal em curso no
Brasil.
Ao tratar do aparente paradoxo de um sindicato da rede privada defender a
educação pública, o presidente do SINPRO afirma que “o sindicato sempre teve uma
posição clara de defesa da escola pública, gratuita e laica, em toda sua história”
(Presidente SINPRO, 2004). Quando perguntado das ações promovidas pelo sindicato
na direção dessa bandeira, o entrevistado se posiciona afirmando
Lidero uma concepção algum tempo aqui nesse sindicato, acho
que está mesmo na hora de uma grande mudança que é fazer com que
a luta pela escola pública deixe de ser meramente uma referência
retórica das entidades.[...] A luta pela escola pública sempre esteve na
nossa bandeira número um, mas nunca saiu da bandeira para o
concreto, evidentemente excluindo-se alguns momentos (Presidente
SINPRO, 2004).
A análise da prática do SINPRO demonstra que o discurso sobre a escola pública
é abstracionista, uma figura de retórica a qual recorre-se na maioria dos eventos
realizados pela entidade e dos quais participa.
O presidente, destaca ainda, que a escola privada “tem que ser levada a seu
devido lugar, uma escola ... complementar, não pode ser o centro do processo
educacional” (Presidente SINPRO, 2004). Isso quer dizer que a rede privada é uma
opção, vamos assim dizer, a oferta da escola particular não pode ser a
oferta principal para a população. A população, primeiro, ela tem que
ter uma boa escola pública, escola de qualidade, acesso aberto a toda e
qualquer camada da população. Se por uma questão de opção religiosa
ou ideológica, (o pai quiser) ele coloca e paga. (Presidente
SINPRO, 2004)
Podemos inferir dessa fala que o acesso à escola pública deve ser para todos sem
distinção de classe e que a escola privada é opcional. Mas, opcional também para todos?
Não, para aqueles que podem pagar por ela e que não a procuram apenas por aspectos
religiosos, na maioria dos casos, mas pelo conteúdo de seu ensino que é,
substantivamente diferente da escola pública, isso se estivermos nos referindo às escolas
privadas de elite. A presidente da UPPES compartilha da mesma opinião:
melhor das hipóteses, consultivos.
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A educação pública deveria ser para todos, sem distinção de classe
social, classe econômica e entendo a educação privada não como
educação privada, mas como educação particular.[...] Uma educação
que seria como as escolas confessionais, as escolas católicas, as
escolas metodistas, elas têm uma particularidade (Presidente UPPES,
2005).
A análise do conjunto dessas falas revela o “direito à subjetividade” das classes
que podem garanti-lo através de um pagamento e esconde outros aspectos, tais como os
limites diferenciados de liberdade para as classes sociais e a benevolência com a
apropriação privada de um direito universal, a educação. Ou seja, o trabalhador mais
explorado de sua classe não possui tal liberdade de escolha se assim desejar e, em
alguns casos, nem o acesso a esse direito fundamental lhe é assegurado pelo Estado. Do
mesmo modo, à dimensão mercantil da empresa privada, de extração de mais-valia do
trabalhador professor
76
, é sobreposta uma lógica de direito à diversidade, de
particularidade, de individualismo característico da sociedade burguesa, e acentuado na
lógica pós-moderna:
Nunca uma escola particular para ter recursos financeiros, os recursos
financeiros viriam automaticamente, todos precisam de recursos
financeiros [...] para os custos, [...] ganharia-se dinheiro em
conseqüência de um trabalho realizado, bom etc. E a escola pública
para todos [...] a escola pública não é para filho de pobre. Se a
pessoa é rica e quer botar o seu filho na escola pública, ele tem
dinheiro, ele tem direito, ele paga os impostos. Essa convivência, na
democracia, é salutar.[...] Nós temos que conviver na sociedade como
ela é, [...] é desigual. A que a gente possa ter [...] uma sociedade
menos desigual. Eu sou fã da escola pública. [...] Essa história de dizer
que o filho do rico não tem direito à universidade pública, por que que
não tem? Não paga imposto para ter a escola? È para todo mundo
(Presidente UPPES, 2005. Grifo nosso).
Mas as convergências entre as entidades não terminam nesse ponto; para o
presidente do SINPRO, “Não há confronto entre escola pública e privada” (Presidente
SINPRO, In: Posse da diretoria do SINPRO-RIO, 2003), assim como para uma das
coordenadoras do SEPE,
a escola pública tem que ser para todos, tem que ter a mesma
qualidade que é oferecida pra escola da elite. [...] Construir esse
patamar de qualidade que está posto na escola da elite. (Coordenadora
3 SEPE, 2005).
76
A esse respeito ver as relações socais que tornam o conteúdo do mesmo trabalho, produtivo ou
improdutivo, no capítulo 1, especificamente, seção 1.4.
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}
Embora reconheça a existência de classes e escolas diferentes, a coordenadora
acredita que é possível uma conciliação desses interesses antagônicos, chegando ao
patamar de uma convivência harmoniosa, supostamente os interesses competitivos da
rede privada seriam eliminados e escolas com o mesmo patamar de qualidade
coexistiriam, a pública se espelhando no modelo da escola privada. Enfim, a rede
privada deveria continuar fazendo parte, só que de forma complementar, ressaltariam os
entrevistados, do sistema de educação do país.
Certamente essa não é a compreensão que sustenta a seguinte resolução
congressual de 1992: “estatização dos grandes grupos empresariais que se apossaram do
ensino” (SEPE, 1992: 14), demonstrando que no âmbito interno do SEPE diferentes
formas de ver a questão:
A gente acompanha a expansão da rede privada com bastante
preocupação, principalmente no ensino superior que chega a 80%
[...] e temos resoluções de congresso de verba pública para escola
pública e expansão da escola pública com qualidade para todos os
níveis (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
Os três sindicatos trataram da questão da Educação Superior, mesmo que o
SINPRO tenha representação nesse nível de ensino, da mesma forma que duas das três
teses do 8 º ConSINPRO e a maioria das treze teses do XI Congresso do SEPE tratam
da reforma universitária. Sobre a expansão da educação privada, principalmente no
ensino superior, o presidente do SINPRO afirma que é abusiva, pois estas redes devem
ter controle estatal e não tiveram durante o governo de Fernando Henrique Cardoso:
Essa situação herdada [pelo governo Lula], que é trágica, ela exige
uma mobilização da sociedade, na defesa da escola pública, dessa
escola que nós queremos. Então não é uma tarefa do governo, não é
uma tarefa do governo, não é uma tarefa do sindicato, é uma
tarefa da sociedade. E essa compreensão pra lutar pela qualidade não
existe (Presidente SINPRO, 2004).
No que se refere à qualidade do ensino privado,o presidente observa que,
o processo que se deu ao longo desses anos tem um componente
ideológico que passa pela cabeça da população, de tanto dizerem que a
escola pública está em crise, aí, conseqüentemente o dono da escola
particular diz que é a escola particular que tem qualidade, isso é uma
balela. [...] um nicho de qualidade, o resto é da pior qualidade
(Presidente SINPRO, 2004).
{
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}
Para o presidente do SINPRO a questão da qualidade nas redes privadas e
pública é meramente ideológica
77
, fazendo com que frações da classe trabalhadora e da
classe média procurem a escola privada por uma interpretação invertida da realidade.
Essa interpretação é verdadeira somente em parte, pois a defesa da escola pública não
pode ser mistificada, a qualidade de seu ensino não é intrínseca e a-histórica.
Por um lado é verdade que a ideologia neoliberal proclamou a ineficiência dos
serviços públicos ao longo da década de 1990 e, por outro lado, se ocupou em,
efetivamente, destruir suas bases. Há, de fato um número grande (e crescente) de
escolas privadas que não possuem condições mínimas de existência, mas o fato é que
preencheram um espaço concreto deixado pelo desinvestimento do Estado na educação
pública e se aproveitaram do redirecionamento de verbas públicas a esses setores. As
redes públicas foram sucateadas, tendo dificuldades de cumprir até os duzentos dias
letivos por falta de professores -até mesmo aqueles de contratação flexibilizada
78
-, ou
seja, as condições objetivas de trabalho forma largamente precarizadas, assim como a
expansão do ensino não se deu em todas as etapas da educação básica, principalmente
na educação infantil e no ensino médio. Os aspectos abordados não se referem a
questões meramente ideológicas.
Todos os sindicatos defendem um maior investimento na educação, entendem o
Estado como financiador único ou principal da educação. Nesse sentido, acham que a
participação nos conselhos é importante para o acompanhamento da aplicação das
verbas públicas. Contudo, nenhum deles possui uma secretaria que se ocupe
efetivamente da fiscalização da aplicação do percentual dos impostos pelos governos,
conforme estabelecido pela LDB 9394/96. Se voltarmos ao capítulo anterior,
perceberemos que as entidades possuem uma diversificada composição de secretarias e
departamentos, alguns incomuns à tradição sindical, porém, nenhum deles se ocupa de
forma orgânica desse debate, limitando-se a representações em tais fóruns.
As secretarias para acompanhamento da aplicação das verbas públicas seriam
fundamentais, inclusive, como forma de embate à burguesia de serviços que tem
crescido no período neoliberal, cujos interesses são de desmonte dos direitos sociais,
nesse caso, especialmente, a educação. Assim como, fortaleceria as negociações do
77
O conceito de ideologia que estamos utilizando refere-se ao adotado por Marx em A Ideologia Alemã,
debate já realizado no capítulo 1.
78
Tal como tratamos na seção 1.3 do capítulo 1 as questões de flexibilização das relações de trabalho na
educação e a precarização das condições de trabalho no período da acumulação flexível.
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}
valor desta força de trabalho, ou seja, teriam mais elementos para discutir a
desvalorização salarial desta categoria, pois a sua valorização efetivará com a
derrubada deste modelo econômico.
Laicidade do ensino
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (nº 9394/96) foi promulgada em
dezembro de 1996, após oito anos de intenso debate no Congresso Nacional. Em
meados de 1997, a LDB sofreu sua primeira alteração, especificamente em seu artigo
33, que trata do ensino religioso nas escolas públicas. De fato, o ensino laico é uma das
temáticas mais controversas na história da educação brasileira e tem sido uma bandeira
de luta dos movimentos educacionais. Desde o manifesto dos Pioneiros da Escola Nova
(1932), a laicidade do ensino brasileiro, em particular, na escola pública, jamais foi
alcançada. Aliás, em 2004, o governo estadual do Rio de Janeiro realizou concurso
público para o preenchimento de vagas de professor de religião nas escolas públicas.
A seguir, analisaremos como os sindicatos, sujeitos desta pesquisa, abordam a
relação da educação com a religião.Vejamos no trecho abaixo:
Nas assembléias, o sindicato se posicionou a favor do ensino religioso,
eu sou a favor do ensino religioso. [...] Um ensino religioso que possa
falar sobre a vida, as questões da moral, da ética. (Presidente UPPES,
2005)
O princípio constitucional do Estado laico é desacatado, assim como a natureza
da escola como espaço estritamente científico. Essa posição retrógrada que deliberou
pelo ensino religioso, denuncia o quanto esse sindicato está em campo diametralmente
oposto aos movimentos educacionais organizados nas ocasiões dos debates em torno
das LDBs. A UPPES assume para si os interesses da bancada religiosa,
Acho que aqui no Brasil, quando a gente fala que a escola tem que ser
laica... eu não sei porque que tem que ser. Não é obrigatório, opcional,
os pais podem fazer a opção. (Presidente UPPES, 2005)
Este segundo argumento, que trata do caráter facultativo do ensino religioso
baseia-se numa pretensa democracia que se contrapõe à própria noção de espaço público
como espaço da coletividade, do interesse comum, sem distinções.
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}
Podemos identificar no SINPRO, novamente, a defesa da escola privada como
espaço de exercício da liberdade e de solução para os conflitos sociais a partir de saídas
individuais ou de determinados grupos,
Defendemos o ensino laico para o ensino público [...] Tem as escolas
religiosas particulares, mas faz parte das escolhas dos pais. [...]
Deve existir a liberdade do ensino privado mas como algo
complementar (Diretor CEAPE/ SINPRO, 2005)
A concepção do SINPRO encontra acolhida no discurso da coordenadora 3 do
SEPE, quando mais uma demonstração que fala em nome de suas próprias
concepções e não das deliberações da coletividade do sindicato:
O ensino religioso na escola privada é uma opção. O ensino religioso,
na escola pública, ocorreria sem ônus para o Estado, que que é isso?
Dentro de uma comunidade do setor a, b ou c, que queiram propiciar
uma interlocução dos seus princípios e concepção religiosa, ok. É
democrático, a escola é um espaço plural e tem que estar aberta para
todas as alternativas. (Coordenadora 3 SEPE, 2005)
Tratar a abertura da escola para grupos religiosos, desde que não acarrete ônus
ao Estado, não é a deliberação do SEPE. É possível também afirmar, a partir dessa
interpretação, em que a democracia é tratada como sinônimo de laisser-faire, a escola
perde sua especificidade e ganha a tarefa de tornar-se um microcosmo.
Não obstante, a coordenadora posiciona-se contra “o criacionismo na escola.
Isso é um contra-senso, vai de encontro ao espaço científico na escola” (Coordenadora 3
SEPE, 2005)
No entanto as resoluções do SEPE encontram acolhida nos discursos dos demais
coordenadores entrevistados, para a coordenadora 1:
O ensino religioso é extemporâneo. [...] nas resoluções [do SEPE] está
que se as pessoas têm o direito a ter religião, que tenham nos seus
locais religiosos, não na escola. [...] Não só o SEPE não, mas o
movimento de educadores é contra, [...] temos resoluções inúmeras
sempre reafirmando o ensino laico. [...] O ensino religioso, inclusive
com ônus para o Estado, a gente como um resultado de um grande
lobby do movimento dos religiosos na LDB.[...] A gente vê com muita
preocupação essa escalada no Rio de Janeiro do ensino religioso,
agora oficializada com 500 profissionais concursados, enquanto estão
faltando professores [...] esses professores tinham que ter ovel
superior em teologia, nem isso eles têm [...] dois estados
regulamentaram, a Bahia e o Rio de Janeiro. (Coordenadora 1 SEPE,
2005)
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O coordenador 2, concorde à afirmação acima, questiona a argumentação do
ensino ecumênico:
a gente sabe que isso é impossível, cada um tem sua religião [...] é
impossível você se desvincular da sua ideologia [...] Estão dando um
ensino baseado no criacionismo, que é completamente contrário ao
espaço científico da escola. A escola é um lugar de transmissão e
construção de conhecimentos cientificamente comprovados através da
história. (Coordenador 2 SEPE, 2005).
No plano mais geral, a coordenadora 1, atribui tal vitória do movimento
religioso na LDB ao “ascenso da visão conservadora dentro da educação [que] é muito
grande. Nessa questão religiosa, ela fica mais evidente” (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
Esse é, de fato, um ponto de grande importância: a ascensão de uma visão
conservadora na educação. Os movimentos religiosos vêm disputando espaço na
educação muito tempo. Cabe lembrar, que os primeiros educadores, e por cerca de
200 anos os únicos, no Brasil, foram os jesuítas. O confronto entre o movimento
religioso e os defensores do ensino laico -organizados no movimento da Escola Nova-
na disputa das políticas públicas, inicia-se na década de 1930 (ROMANELLI, 1989),
resultando em concessões para os religiosos em vários momentos da história da
educação.
Além disso, é preciso considerar que, atualmente, os interesses religiosos vêm
tirando vantagem da expansão de um espaço não científico na educação. Embora sua
atuação seja anterior a esse fato, ganhou fôlego com a disseminação do pensamento pós-
moderno. Ou seja, parece-nos que o espaço escolar, hoje, encontra-se aberto a
manifestações não científicas, fato que advém do conteúdo epistemológico do
pensamento pós-moderno.
Em outras palavras, a educação tem sido hegemonizada pelas teorias pós-
modernas e tornado a escola pública brasileira laboratório de experiências que
prescindem da razão.
Como elementos estruturantes do conteúdo da pós-modernidade, JAMESON
(2002) destaca a propagação do Fim da História e, por conseguinte, das classes sociais,
o ataque as meta-narrativas modernas, o desmonte da racionalidade e a inviabilidade de
sínteses totalizantes. O pensamento pós-moderno sustenta uma ideologia equalizadora
das produções humanas, quaisquer manifestações culturais, sejam elas científicas,
metafísicas, particulares, afetivas, possuem um poder explicativo e valor social
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idênticos. Enfim, o deslocamento da verdade para a subjetividade, para o ponto de
vista, para as diferentes interpretações do real.
O campo da educação tem difundido teorias derivadas do pós-modernismo que
vêm ganhando hegemonia no espaço acadêmico. Muitas produções nessa área não
resistiriam ao menor critério de cientificidade. Portanto, se a realidade escolar não está
em oposição aos procedimentos que não possuem o rigor da ciência, por que resistiria
fortemente ao ensino religioso?
As religiões são o atalho da humanidade para as questões que não consegue
explicar pela ciência (KOSIK, 2002). Para o autor, embora o détour seja o único
caminho de acesso á verdade,
periodicamente a humanidade tenta poupar-se o trabalho desse desvio
e procura observar diretamente a essência das coisas (o misticismo é
justamente a impaciência do homem em conhecer a verdade).(Idem,
2002: 27).
Ainda não alcançamos a laicidade da escola pública brasileira, da mesma forma
que a religiosidade está presente e encontrando respaldo dentro de alguns sindicatos,
como no caso da UPPES com imagens de santos na sede e capela na sede campestre,
como expressão de uma forte ideologia que atrai e obscurece a consciência da maioria
esmagadora da sociedade.
III.1.2 - Concepção de Sociedade dos sindicatos
Diante do exposto na concepção de educação, não chegamos a esta seção do
trabalho considerando que as perspectivas societárias dos sindicatos convergem para o
mesmo ponto.
A compreensão que um dirigente possui sobre a sociedade determina sua
avaliação sobre educação - por isso tantas antinomias - sua opção por um modelo de
sindicato, uma certa prática política e a própria representatividade de setores da
categoria. Precisamos, no entanto, levar em consideração que as inferências ao longo da
seção não abarcam a complexidade de pensamentos das entidades, apenas lhes extrai
aquelas características passíveis de generalizações. E, em segundo lugar, que as
conclusões foram construídas no processo de análise do conjunto da pesquisa, cujas
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}
citações das entrevistas ou fontes primárias não podem esgotar , mas m o papel de
elucidar tais avaliações.
As amálgamas que encontramos, em determinados momentos das entrevistas,
revelam uma incoerência existente entre o discurso e a prática sindical, mas não entre o
discurso e a concepção de sociedade dos entrevistados, como estaremos demonstrando a
seguir.
A afirmação do presidente do SINPRO sobre a função social da escola denota
sua concepção de sociedade e, conseqüentemente, a forma como compreende sua
intervenção nela:
Essa escola é um direito do cidadão e uma necessidade para um
projeto estratégico de nação. Projeto soberano (Presidente SINPRO,
2004).
Esse projeto soberano,
não pode ser construído sem que tenha uma base de uma escola
pública sólida, ideologicamente forte, isso não é uma tarefa de
governo só (Presidente SINPRO, 2004- grifos nossos).
Para a construção desse projeto faz-se necessário
construir alianças em torno da defesa e conquista da escola pública de
qualidade. Construir alianças com os setores da sociedade organizada,
com as associações de moradores, com as associações de pais, com as
ONGs, entidades culturais, ou seja, qualquer entidade que represente
setores da sociedade (Presidente SINPRO, 2004).
Depreendemos da fala do presidente do SINPRO que qualquer entidade que
represente setores da sociedade civil possui idêntica legitimidade e uma suposta
homogeneidade de interesses, inclusive as ONGs. O que não fica evidente é se essas
alianças têm o papel de pressionar o Estado pela educação pública ou ajudá-lo a
oferecê-la. Em outras palavras, se levarmos em consideração apenas tal discurso, não
fica claro se a tarefa de realização, leia-se financiamento, desse projeto de nação é
responsabilidade exclusiva do Estado ou da sociedade civil. Como tratamos da
compreensão dos sindicatos sobre financiamento, arriscamos concluir diante desse
dilema que se não cabe exclusivamente ao Estado oferecer a educação no país e que, até
mesmo empresas podem fazê-lo, a sociedade civil também pode.
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}
A tese para o ConSINPRO assinada pelo presidente e outros diretores
executivos, no ponto de avaliação de conjuntura, contribui para a compreensão da
concepção de sociedade do sindicato:
A economia brasileira passou por um período de intenso crescimento
econômico de 1930 a 1980, através da estratégia do chamado
nacional-desenvolvimentismo. Um crescimento sustentável
respaldado pelo Estado, liderando setores estratégicos, e pelo modelo
de “substituição de importação”. (tese 1, SINPRO: 2004. Grifo nosso)
Embora esse modelo receba algumas críticas na seqüência do documento:
Entretanto este modelo chegou ao esgotamento na década de 1980,
principalmente em função da crise fiscal do Estado, elevado
endividamento externo, falta de competitividade no mercado externo e
na indústria local, e alto nível de concentração de renda, com
engessamento do mercado interno. (Tese 1, SINPRO: 2004)
O resultado que pode ser retirado dessa avaliação é que o modelo de
desenvolvimentismo é correto para os atuais dirigentes do SINPRO
79
, pois é
sustentável, porém foi mal administrado, pela ditadura militar. O que talvez explique
por que o SINPRO, defensor da política desenvolvimentista, se tornou atuante na:
luta contra a ditadura , este sindicato aqui se transformou num espaço
aberto para qualquer movimento de contestação do regime militar.
(Presidente SINPRO, 2004)
O conjunto do discurso deixa claro um posicionamento desenvolvimentista e
nacionalista, na direção da entidade, baseado numa política de amplas alianças
característica de uma parcela da tradição de esquerda brasileira, em particular, do PCB e
do PCdoB
80
. Essa concepção, está fundada na idéia de que a transformação da
sociedade se dará por meio de reformas sociais realizadas a partir da aliança com
diversos setores, até mesmo, a burguesia brasileira.
Consideramos uma concepção progressista, no sentindo que propõe mudanças e
não está adaptada à atual organização da sociedade, mas a critica e planeja sua
transformação. Porém é reformista, pois se nega a qualquer forma de ruptura, e pretende
79
Como não entrevistamos os dirigentes do período em que o sindicato foi perseguido pela ditadura por
não fazer parte de nosso recorte nesta pesquisa, atribuímos a responsabilidade das avaliações àqueles que
assinam a tese em questão.
80
Embora não tenha sido formalmente registrada, temos a informação que uma grande parte da diretoria
do SINPRO é oriunda desses partidos.
{
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esta mudança através de etapas bem definidas e graduais em direção ao socialismo, ou
de uma equalização entre as classes sociais que levaria, conseqüentemente, a uma
melhoria das condições de vida da classe trabalhadora.
A história do movimento operário já mostrou a fragilidade dessa linha política
nacionalista (HOBSBAWM, 2000). Os interesses do capital, principalmente na
atualidade, não são cerceados pelas fronteiras nacionais, do mesmo modo que, entre as
classes antagônicas não há mais que interesses comuns fugidios e pontuais.
Não entraremos nesse momento na avaliação do governo federal, como faremos
com a UPPES devido à particularidade dos entrevistados do SINPRO terem associado
profundamente esta avaliação de conjuntura a uma avaliação de estrutura e prática
sindical. A visão exposta acima é compartilhada pelo diretor da Escola do Professor e
está expressa na seção sobre concepção de educação, que podemos repetir aqui a título
de confirmação: “mas creio que um país que tenha um projeto de nação, deve estruturar
seu ensino de acordo com as necessidades de desenvolvimento da sociedade” (diretor
CEAPE/ SINPRO, 2005).
Para concluir, o presidente reafirma o papel aglutinador que, sem dúvida, os
educadores devem cumprir enquanto vanguardas dessa luta:
necessidade das organizações dos trabalhadores em educação em
geral, compreender que isso não é uma luta deles é uma luta do
conjunto da sociedade. Eles como parcela, talvez, mais consciente da
necessidade dessa luta teriam que ser uma espécie de uma vanguarda,
no sentido de ampliar essa luta, tecer essas alianças com a sociedade
(Presidente SINPRO, 2004).
Com relação a UPPES, sabemos que possui uma visão harmônica da
sociedade, o que retira, portanto, das classes sociais o papel de construir a história, que é
sempre delegada a personalidades:
Pelo que eu tenho acompanhado no Brasil, ainda não apareceu um
governante preocupado com a educação. [...] Para saber quem é ele,
teria que ter aquela reforma política, os partidos teriam que ter a sua
filosofia, sua ideologia e eles deveriam ser obrigados a fazer o que
eles prometem. Os partidos teriam que colocar gente séria, gente
honesta, séria, que fossem cuidar do dinheiro público com muito
cuidado. (Presidente UPPES, 2005)
Essa expectativa, renovada a cada eleição, levou a UPPES a pedir, na abertura
do dossiê sobre a avaliação dos problemas educacionais no estado do Rio de Janeiro, ao
governo federal que oferecesse “saúde, segurança e educação pública de qualidade.
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Queira Deus, que isto, ainda, se realize no governo do Presidente Fernando Henrique! A
educação não pode esperar mais” (UPPES,1996: 5). Se não levarmos em consideração o
fato da educação ser a última das reivindicações, nem o apelo metafísico, sobressai, do
trecho acima, a compreensão de que o sindicato ou demais movimentos sociais possuem
um papel muito insignificante na transformação da realidade, o papel que lhes está
reservado é o de informantes e torcedores inconformados, aspectos que confirmam a
visão populita discutida no capítulo dois.
Na edição comemorativa do dia do trabalhador, o jornal da UPPES traz
elementos da avaliação da entidade sobre o governo Lula e a função social da educação,
transversos pela concepção de sociedade:
Os países adiantados, o são, porque, em alguma fase de sua trajetória
e, ainda hoje, fazem da educação a grande prioridade. O Brasil,
infelizmente, ainda não aprendeu essa lição. Investimos pouco e mal
em educação. O salto qualitativo em educação começa a partir de um
magistério valorizado. Estudos apontam que o trabalhador brasileiro
possui menor escolaridade que o de outros países, resultando em uma
menor produtividade. O trabalho produtivo e cada vez mais
sofisticado do mundo atual necessita de pessoal qualificado. A
educação é o caminho para isso. (UPPES, 2004b: 2).
O foco das diferenças sociais nacionais e internacionais se resume à educação
nessa concepção. Para a UPPES, sendo a sociedade harmônica o que reside inadequado
são as diferenças de oportunidade. Essa recuperação da ideologia do capital humano,
visa associar a educação a empregabilidade individual e ao desenvolvimento nacional
desvinculado da luta de classes como FRIGOTTO evidenciou:
O capital humano, concebido como força-de-trabalho, potenciada com
educação ou treinamento, constitui-se no elemento-chave para dar a
entender que o trabalhador assalariado que investe nesse capital se
torna ele mesmo um capitalista. Desaparecem, portanto, nesta ótica, as
diferenças de classes. (FRIGOTTO, 1989: 217)
Em síntese, para a UPPES a sociedade capitalista pode ser visualizada na
estrutura, as mudanças ocorridas no padrão de produção são perceptíveis, assim como as
relações precarizadas de contratos de trabalho, que também chegam aos professores. A
educação é o motor desse desenvolvimento, acima da sociedade de classes. Tal
apreensão da realidade desencadeará práticas sindicais bastante condizentes como
estaremos vendo mais adiante.
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Sobre o SEPE, começaremos pelas resoluções do Congresso de 1992, tão citadas
na seção anterior, atentando para as sistematizações “Sobre projetos de educação”
A escola vivencia no seu dia-a-dia os mesmos conflitos presentes na
luta geral da sociedade entre as classes antagônicas. [...] Assim é
possível e necessário que essa contradição seja explorada por nós,
profissionais da educação, e pelo nosso sindicato, desde que tenhamos
clareza da sociedade que queremos e da escola que melhor lhe serve.
(1992)
E o projeto político pedagógico dessa escola deve ser
um projeto que sirva como arma na luta dos trabalhadores por uma
escola que colabore com o projeto de transformação global da
sociedade. (1992: 12-3)
A escola não é meramente reprodutivista da gica capitalista, nem tampouco
superior a ela, está inserida nas suas relações e permeada por contradições as quais são
compreendidas como campo de luta da classe trabalhadora, sendo esse o papel da
entidade:
Na sociedade capitalista a educação cumpre esse papel, tem cumprido
esse papel de formar capital humano, mas fazemos o contraponto a
esse tipo de visão (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
Para o coordenador 2, a
concepção de sociedade vai se mostrando nos embates cotidianos, na
luta de classes, nas greves, nas assembléias, nos fóruns, nos
congressos, nos conselhos deliberativos. Aqui, esse processo tende
sempre a uma visão de sociedade de esquerda, democrática e com um
viés socialista. Por que isso é o que predomina na atuação dos
militantes do sindicato. Não diria na atuação da base, não sei se a
categoria defende o SEPE como um sindicato socialista. Tem
elementos gerais de concepções de sociedade democrática, não
excludente, que incorpore os setores que não são privilegiados na
sociedade que podem ser abraçados pela entidade (Coordenador 2
SEPE, 2005)
Com relação à formulação geral de sociedade a coordenadora 3 demonstra
concordância:
O projeto societário que tem acordo, que é o que nos defendemos, é de
uma sociedade libertária, socialista, democrática, onde haja liberdade
e igualdade para todos. (Coordenadora 3 SEPE, 2005)
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Mas essa concepção socialista não é homogênea em seus métodos, como destaca
o coordenador 2:
numa concepção de socialismo você vai ter nuances, o socialismo
moreno do Brizola, socialismo petista, do PSB, socialismo trotskista,
do PCdoB. (Coordenador 2 SEPE, 2005).
A própria escolha dos entrevistados do SEPE já significou uma análise dessas
diferentes formas de organização política dentro da entidade, todas com representação
em razão do critério de composição da diretoria por proporcionalidade, o que torna esta
entidade mais complexa que as demais.
Para demarcar os chamados diferentes socialismos, recorremos às teses
assinadas pelos entrevistados.
A tese “SEPE: 28 anos de luta e resistência. Adaptar-se jamais!”, que a
coordenadora 1 integra, analisa e denuncia a posição de subordinação dos países latino-
americanos com relação ao imperialismo, em particular, o papel do governo Lula como
“subxerife do setor sul” e, o PT, como partido neoliberal contra os trabalhadores.
Posiciona-se contra as reformas sindical, trabalhista e universitária afirmando que,
“reforma, se for agrária”. Dentre outros temas defende a desfiliação à CUT, que
chama de um dos ministérios, pois a percebe como freio da classe trabalhadora à
derrubada das reformas do governo, critica com igual radicalidade o governo estadual e
municipal. Conclamando a categoria, portanto à
construção de uma alternativa combativa, classista e, no mínimo
anticapitalista. Unir campo e cidade não pode ser mais uma simples
bandeira e, sim, constituir-se numa prática cotidiana e classista –não à
proposta “ongueira” de aglutinar a “sociedade civil organizada”. (Tese
8, SEPE: 2005).
A organização de uma “resistência mais consistente ao sistema” (idem, ibidem),
aponta na direção de um socialismo de método revolucionário, sem conciliação com o
capitalismo ou qualquer caminho de reformas. Isso nos levou a caracterizar essa força
política que compõe com outros setores na direção do SEPE, como esquerda da
entidade, embora sabendo que esta definição não dá conta da complexidade do real.
A tese “Radicalizar na democracia para transformar a CUT e o SEPE” recebe a
assinatura do coordenador 2 e aponta para a necessidade de:
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radicalizar a democracia e adotar a pluralidade na nossa forma de
pensar [...] Articular nossa ação pelas macro-transformações com
micro-revoluções no nosso cotidiano, romper com dualismos
maniqueístas e com a farsa em que as finalidades “nobres” justificam
quaisquer meios para atingi-la. (Tese 4, SEPE: 2005)
Complementado pelo coordenador 2, essa frente defende “métodos mais
democráticos... que são classificados por alguns setores como métodos burgueses”
(Coordenador 2 SEPE, 2005). Sobre a polêmica, o coordenador afirma que no SEPE
aqueles militantes,
que acreditam na democracia onde o voto e a participação direta do
cidadão é importante, e aqueles que defendem como uma postura
democrática a ditadura de um segmento da classe trabalhadora sobre o
conjunto da sociedade. (Coordenador 2 SEPE, 2005).
Nesse ponto uma crítica ao grupo de esquerda, situado na tradição marxista
de derrubada do capitalismo e de transição realizada pela ditadura do proletariado, para
demonstrar que o método político do grupo denominado por nós de centrista, seria
marcado por uma crítica à sociedade capitalista, sem, no entanto, a promoção de
rupturas com o sistema. A única radicalização aceitável é a da democracia burguesa
existente, através do voto popular e mobilizações sociais que conduzam a sociedade a
“um governo democrático-popular, que enfrente as desigualdades socais e distribua as
riquezas”(Tese 4, SEPE: 2005).
Esta tese critica os danos da política neoliberal e a adesão parcial do governo
Lula a este modelo, no que respeita “a condução das políticas macroeconômicas da
dupla Meirelles/ Palocci” (idem, ibidem), realizando uma cisão teórica que é
inviabilizada na realidade concreta, qual seja, a direção econômica e a direção política
de um governo. Realiza críticas à CUT e, sem ruptura com a central, propõe mudanças
na sua direção, que tem tornado a entidade “hesitante para encaminhar algumas lutas
importantes, como no caso da reforma da previdência e não demonstra a independência
necessária para confrontar o governo Lula na defesa dos interesses dos trabalhadores”,
enfim possuem a proposta de resolução de “uma CUT independente e socialista” (idem,
ibidem). Por tudo isso, o coordenador 2 avalia:
È um governo que tem primado por alianças com os setores de centro
e de direita, caindo numa lógica fisiológica que não contribui para a
elevação de consciência da classe trabalhadora, pagando
religiosamente a dívida externa.[...] Porém o acho que nossa
entidade deva aprovar oposição ao governo Lula... temos que
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pressionar o governo a mudar o seu curso, por que a vitória do Lula
nas eleições não foi uma vitória apenas do Partido dos Trabalhadores,
ela é fruto de décadas da organização dos trabalhadores. Então essa
vitória nos pertence. (Coordenador 2 SEPE, 2005).
As reformas graduais no capitalismo, sem violência, que possibilitariam uma
transição tranqüila para o socialismo pela via constitucional e a defesa da democracia
como sistema político que deve ser radicalizado, aproxima esse grupo do reformismo
(BOTTOMORE org:2001: 313). nesse grupo que denominamos de centrista, outras
correntes além dessa, como dissemos no início da seção, que fazem críticas ainda mais
incisivas ao governo Lula , à CUT e às reformas. Porém é um grupo muito heterogêneo,
algumas correntes se aproximam mais da esquerda e, a maioria, tem mais pontos em
comum com a direita.
“SEPE – 28 anos: unidade e reformas para avançar na luta”, tese a que a terceira
coordenadora se incorpora, também faz críticas ao neoliberalismo e ao imperialismo
norte-americano que, conduzido pelo autoritarismo do Partido Republicano, tem
tornado as relações internacionais muito difíceis para os países “em desenvolvimento”.
Faz uma avaliação positiva da CUT e das reformas e do governo Lula de um modo geral
e das suas ações internacionais em particular que “revelam um projeto de inserção do
país como importante líder regional” (Tese 13, SEPE: 2005). Esses aspectos, como a
afirmação de uma nação forte, demonstram similitudes com a concepção do SINPRO,
que podemos atribuir ao pertencimento de ambos dirigentes à mesma corrente ptista -
Articulação Sindical-, muito embora não seja uma corrente homogênea. Podemos
identificar tais similitudes no trecho abaixo:
É preciso construir um projeto de entendimento nacional, em torno
das variáveis-chave da economia [...] capaz de garantir o
desenvolvimento sustentável para a economia brasileira. A referida
proposta aponta para uma transição rumo a um novo modelo de
crescimento sustentável com redistribuição de renda. Seu objetivo é
libertar a economia nacional da armadilha monetária e cambial, que
subordina o País aos humores dos capitais especulativos (Tese 13,
SEPE: 2005).
Embora a coordenadora 3 ainda mencione a finalidade do socialismo, como
vimos acima, o discurso da transformação societal, ou reforma nacional não aponta na
direção de construção do socialismo em nenhum ponto desta tese. Traz para os
movimentos a seguinte responsabilidade:
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A experiência destes dois anos [do governo Lula] mostra que os
avanços nas políticas públicas dependem sempre da capacidade de
proposição, mobilização e negociação dos trabalhadores (as) e da
sociedade. (Tese 13, SEPE: 2005).
Dito em outras palavras pela coordenadora:
hoje os movimentos têm a tarefa de redimensionar a própria ordem
neoliberal que nos coloca, enquanto país dependente, numa relação
bastante difícil frente ao grande capital. (Coordenadora 3 SEPE,
2005).
A responsabilidade de um governo eleito sob a política de amplas alianças, mas
que se fazia ver, a partir da trajetória do PT, como representativo dos interesses da
classe trabalhadora, é deslocada, nesta tese, para os movimentos sociais. Ou seja, a
classe trabalhadora elegeu o PT na esperança de melhorias sociais para o país e, em
seguida, é culpabilizada pela continuidade da cartilha neoliberal por este governo.
Não é verdadeiro que os movimentos sociais não tenham ajudado o suficiente ao
governo federal a mudar seus rumos. Por exemplo, os movimentos sociais têm
pressionado através dos conflitos no campo, das greves dos servidores públicos, das
manifestações contra a reforma da previdência, dentre outros. Mas é verdadeiro o poder
de arrefecimento deste governo sobre uma parcela significativa dos militantes e
instituições históricas deste país, esse marco histórico da eleição de Lula se revelou
particularmente importante para a compreensão dos contornos do movimento sindical
atual. Em suma, a força conservadora do grupo no poder estendeu seus tentáculos
influenciando e arrefecendo o poder contestatório de sua base de sustentação, mas a
recíproca não foi verdadeira.
Francisco de Oliveira (2003), ao mostrar o fundo público sob controle dos
sindicalistas e a composição dos quadros do governo por grande parte desses dirigentes,
recompôs a materialidade dessa cooptação de parcela do movimento sindical e social.
Embora esse grupo não represente, verdadeiramente, uma nova classe social, mas seja
resultado de uma conversão real de classe que é camuflada pela ideologia de
correspondência entre sua origem familiar e atuais interesses, usaremos a expressão de
OLIVEIRA para ilustrar esse processo cooptativo das capas mais altas do antigo
proletariado:
A nova classe tem unidade de objetivos, formou-se no consenso
ideológico sobre a nova função do Estado, trabalha no interior dos
{
PAGE
}
controles de fundos de estatais e semiestatais e está no lugar que faz a
ponte com o sistema financeiro.(2003: 148)
A relação do governo com os movimentos sociais e, principalmente sindicais, se
estreitou. A coordenadora 3 destaca o papel principal dos movimentos sociais e, o
secundário do governo, no entanto, agenda o atendimento às pressões sociais que
deverão ocorrer:
No momento oportuno, as lutas vão apontar os caminhos, ou a própria
transformação do quadro em que nos encontramos. (Coordenadora 3
SEPE, 2005).
Poderíamos afirmar que o SEPE é um sindicato que traz como bandeira o
socialismo, a democracia e a defesa dos interesses da categoria e da classe trabalhadora.
Identificar uma concepção de sociedade além destes pontos gerais não é possível, a
própria visão de socialismo se apresenta fracionada. Porém, existe uma hegemonia
governista composta pelo centro e direita da diretoria que vem causando ameaças à
autonomia do sindicato. Ou seja, a miscibilidade dos interesses dos sindicalistas e do
governo federal tem refletido também no SEPE.
O SEPE, portanto, é o mais complexo na análise da concepção de sociedade,
pois abarca diferentes correntes no interior de sua direção. Embora, os outros sindicatos
também não sejam integralmente convergentes, possuem blocos mais unificados ao
redor da composição de sua direção, como na UPPES e, reconfigurados em dois blocos
no SINPRO, por discordância de estratégia, mas não necessariamente, apresentando
divergências de fundo.
III.2
O
P
ROJETO SINDICAL DO
SINPRO,
DA
UPPES
E DO
SEPE
O Projeto Sindical compreende, de forma articulada, a maneira como a entidade
concebe a finalidade da forma-sindicato e a prática política no quadro posto pelo
período neoliberal e pelas mudanças na natureza do trabalho da categoria -
determinantes da sua estrutura organizativa. Nesse sentido, pretendemos identificar, em
que medida, também os projetos sindicais se articulam ao pensamento pedagógico das
entidades, ou seja, sua concepção de sociedade e de educação.
{
PAGE
}
SINPRO
Do ponto de vista do presidente do SINPRO, o sindicato não desempenhava sua
função social até algum tempo atrás, pois não havia, na entidade, um entendimento
do papel do sindicato dos professores como produção intelectual e [...]
ele se comportava somente dentro da esfera da luta corporativa, por
melhores salários e não conseguia sair disso. [...] Nós achávamos que
por ser um sindicato de intelectuais tinha que ter uma produção
intelectual, uma produção, principalmente, no campo da educação e da
cultura. (Presidente SINPRO, 2004)
Aspecto que, por sua vez, foi solucionado através da seguinte medida:
Quando eu cheguei à presidência do sindicato em 2000, eu comprei o
quinto andar e montamos esse projeto chamado de Centro de estudos e
atualização em política e educação [...] O objetivo era abrir processo
de discussão sobre as questões da cultura e da educação, do lazer,
cursos, palestras (Presidente SINPRO, 2004).
A análise desse projeto demonstrou que o papel estratégico da Escola do
Professor não é de formação política de quadros da entidade e, nem para os quadros do
movimento social de uma maneira geral naquela perspectiva de alianças mencionada
anteriormente
81
, mas o de oferecer possibilidades de ampliação do horizonte cultural
dos seus filiados, desde que esses paguem as mensalidades. Da afirmação acima,
também é possível destacar o tom personalista das ações empreendidas e a expansão
patrimonial da entidade sob esta direção.
A outra vertente pela qual o SINPRO dará demonstrações de sua compreensão
acerca da função social do sindicato é a explicação sobre a impossibilidade de
unificação com o SEPE, no final da década de 1970,
Não tinha essa idéia de formar um único sindicato, [...] teríamos
dificuldades legais, porque naquela época era proibida a
sindicalização dos funcionários públicos. [...] o importante para eles
[SEPE] era o seguinte, o movimento passa por fora, as demandas
81
Muito embora a Tese 1 do SINPRO afirme que vem construindo novas parcerias “através da Escola do
Professor, contribuindo para a implantação de políticas sociais como as campanhas: Fome Zero,
Alfabetização, Promoções da Igualdade Racial” (Tese 1, SINPRO: 2005), essas parcerias passam ao largo
da construção de um bloco em defesa da escola pública, não significam mais que a seção do espaço da
Escola para esses programas de políticas focais
{
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}
sociais, elas passam por fora da estrutura oficial. (Presidente SINPRO,
2004).
O SINPRO foi fruto da gestação das políticas trabalhistas da era Vargas, nasceu
enquadrado à estrutura de sindicato oficial e assim permaneceu ao longo de sua história,
como vimos no capítulo anterior. O fato do SEPE se mover paralelamente a esta
estrutura o torna alvo de muitas críticas do SINPRO:
O SEPE até hoje não é sindicato legal, não tem a carta sindical. Não
tem por incompetência, por que despreza a ação política legal, dentro
dos marcos da legalidade. Olha como se isso fosse um mero processo
na Justiça, não tece... não vai procurar agir politicamente dentro do
governo para conseguir a carta. [...] A carta o tem a menor
importância, importante é o movimento... e hoje é uma entidade
esvaziada. (Presidente SINPRO, 2004).
O ponto a que se quer chegar não é apenas da opção do SEPE de ter se
construído paralelamente à legislação trabalhista, mas a sua própria dinâmica interna:
Então ele (SEPE) nunca se preocupou em solidificar uma
infraestrutura organizativa. [...] Essa concepção dele de movimento
permanente, ninguém agüenta isso, não tem resposta real para o
professor que todo dia tem que acordar e ir para a sala de aula
trabalhar de manhã e de tarde, não pode ficar fazendo movimento a
vida toda. Então, o SEPE começa a ser questionado violentamente
pela própria categoria e, na sua composição política interna, tem um
estatuto absurdo, na minha concepção, e que contempla qualquer
grupo de pessoas que se auto-intitule uma tendência... faz-se da
direção da entidade um saco de gatos. [...] Criaram um monstrengo.
(Presidente SINPRO, 2004)
Perante esse quadro de negação ao modelo sindical adotado pelo SEPE, o
SINPRO reafirma o seu quadro, organizado sob o presidencialismo e nega a tarefa de
mediação do sindicato na construção diária da organização da classe trabalhadora.
Ainda que, aparentemente, o diretor do CEAPE discorde que o SEPE realize
uma organização permanente e pareça estar em oposição ao presidente, quando
realizamos uma aproximação maior do conteúdo defendido pelos dirigentes do
SINPRO, percebemos que ambos possuem a mesma compreensão. Para os dois
dirigentes, o equívoco do SEPE é não oferecer um atendimento sistemático, como os
cursos do SINPRO, ao sindicalizado e estar focado na questão da luta, seja corporativa,
seja a luta mais ampla:
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}
O SEPE não consegue manter um grau de organização permanente,
tem ciclos [...] que ofereça meios do professor participar do sindicato
de uma maneira mais contínua. Parece que a entidade consegue
meios de se expressar quando existe uma crise salarial. Não é só
organizar, é ter uma agenda que permita uma participação mais
permanente da discussão da educação (Diretor CEAPE/ SINPRO,
2005).
Para o diretor do CEAPE esse equívoco do SEPE é que incentiva que uma
parcela da categoria se filie à UPPES, fragmentando assim a base da categoria.
A UPPES tenta mais se fazer representar justamente pelas falhas do
SEPE. Eu acho que essa representação deveria ser unificada. O
processo de representação não é um processo de livre concorrência, a
livre concorrência é para você ganhar a entidade. (Diretor CEAPE/
SINPRO, 2005)
O modelo sindical que unificaria a categoria da rede pública, para o SINPRO,
seria uma estrutura de conciliação entre a UPPES e o SEPE, talvez algo parecido com a
estrutura do SINPRO:
A gente acha que o sindicato tem que ter essas duas pernas: a defesa
do salário e das condições de trabalho e o oferecimento de serviços ao
professor, especialmente cultura e, evidentemente, um jurídico mais
estruturado. (Diretor CEAPE/ SINPRO, 2005)
No que diz respeito aos problemas internos do SINPRO, o diretor aponta a perda
da autonomia sindical, criticando o fato de haver
um certo deslumbramento do atual presidente com o governo Lula, o
que fez (parte da diretoria) perder a dimensão crítica. [...] O governo
Lula tem todo espectro de avaliação do campo que o elegeu que vai
desde um governo redentor até um governo traidor. Eu... por exemplo,
discordo da política econômica, cada vez fica mais difícil ter um
projeto de desenvolvimento... mas não pra perder a capacidade
crítica (Diretor CEAPE/ SINPRO, 2005).
A direção que estava, em parte, unida desde 1978 foi bipolarizada na última
gestão que coincide com a gestão do governo do PT, na esfera federal. O grande debate
que se trava na disputa eleitoral deste ano é o da independência sindical frente aos
governos. O diretor explicita as razões da composição de uma outra chapa dizendo que
a “chapa não é anti-partido político [...] somos contra é o atrelamento”. (Diretor
CEAPE/ SINPRO, 2005). Entretanto, a argumentação revela um caráter conservador:
{
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}
a entidade não pode estar atrelada a partidos políticos por que os
professores pertencem a diversas correntes de pensamento e a maioria
deles nem pertencem a partidos políticos. (Diretor CEAPE/ SINPRO,
2005)
Nesse discurso percebemos que, ao contrário da defesa da politização da
categoria, o sindicato, em nome da autonomia sindical, não pode manifestar a sua (ou
suas) posições políticas devido à complexidade política da base. Porém, a relação entre
partidos políticos e sindicato é recuperada sobre outro ângulo na tese 2. A relação é
criticada pela chapa do diretor do CEAPE por ocorrer sem mediações: “não pode o
sindicato agir como correia de transmissão de qualquer governo, pois o seu
compromisso é com a classe trabalhadora e não com a ordem estabelecida” (Tese 2,
SINPRO: 2004)
Para a Tese 1, da qual o presidente é a maior expressão, o debate é assim tratado:
Não podemos confundir a legítima ação partidária nos sindicatos com
o aparelhamento da entidade por um ou mais partidos. Esta ação deve
ser severamente repudiada, como também devemos repudiar o
aparelhamento feito, muitas vezes, por grupos de pessoas, que se
enquistam na burocracia sindical (Tese 1, SINPRO: 2004)
Não temos a pretensão de apresentar respostas ao debate tão complexo que ora
se apresenta entre a relação de partidos e sindicatos, mas a análise das teses e dos
questionários aplicados nos permitiria afirmar que a chapa do presidente é uma chapa
que, na prática da entidade, tem defendido integralmente as políticas do governo
federal.
A década de 1990, que marcou a chegada do neoliberalismo no país, significou
para a entidade um recuo nas lutas e nas conquistas para a categoria. Nesse contexto, o
SINPRO diminuiu as mobilizações e passou a recorrer muito mais ao departamento
jurídico para a assessoria dos acordos coletivos.
O patronato intensificou o processo de flexibilização das relações de trabalho
disputando com os sindicatos a suspensão das conquistas dos trabalhadores dos
estabelecimentos particulares de ensino, significando uma tentativa de “diminuir os
acordos coletivos de trabalho [...] A gente manteve, grosso modo, as conquistas da
década de 80, mas não conseguiu avançar” (Diretor CEAPE/ SINPRO, 2005)
O presidente concorda que o neoliberalismo significou um aumento da coerção
aos trabalhadores: “estamos num momento de medo de participação e vontade de
participar, o cara quer participar, mas tem que resguardar o emprego dele” (Presidente
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}
do SINPRO,2004). Mas atribui a queda das mobilizações ao fato da grande campanha
salarial, em 2000, ter provocado uma “mudança no sindicato patronal... ele ficou mais
negociador. Então de para cá, a gente conseguiu repor as perdas na base da
negociação, sem grandes mobilizações” (Presidente do SINPRO,2004). A argumentação
desconsidera completamente, ou naturaliza, o fato da tendência dos sindicatos e centrais
dos trabalhadores se tornarem mais negociadores e não o patronato.
Do ponto de vista das repercussões do neoliberalismo para a categoria uma
grande convergência na análise da condição docente pelas duas teses do SINPRO.
A tese 1 destaque à consolidação do sistema que “extrai a mais-valia do
trabalhador” (Tese1, SINPRO: 2004) dado que nesta relação social, o trabalho docente
assume a forma de trabalho produtivo para o empresário. E, “diante deste quadro a
formação acadêmica e intelectual é relegada a um segundo plano, juntamente com as
atividades de lazer” (Tese1, SINPRO: 2004), assim como a precarização dos direitos
trabalhistas.
A condição docente na rede privada é aprofundada pela Tese 2:
Os professores pressionados cada vez mais por essa conjuntura vão
sucumbindo diante das novas relações de trabalho e da nova realidade
da educação como mercadoria. [...] Hoje a escola é um grande centro
comercial onde o cliente sempre tem razão e o balconista (professor) é
punido, através da equipe pedagógica e, em muitos casos, pelas
coordenações e direção dos estabelecimentos. (Tese 2, SINPRO:
2004)
O Sindicato afirma a existência da precarização do trabalho docente nos últimos
anos que, na rede privada, compromete ainda mais a autonomia docente. Como
dissemos no capítulo 1, não uma perda da função intelectual do professor, pois tal
esfera compõe a unidade humana, há uma perda de sua autonomia e aumento do
processo de subsunção ao capital, na direção de uma objetivação cada vez maior.
A prática sindical desta entidade atua nessa realidade sob duas frentes. A
primeira é a tentativa de assegurar nos acordos coletivos que não haja flexibilização das
relações trabalhistas, embora muitas empresas de ensino sigam desrespeitando a lei. A
segunda, é atuar na formação continuada do professor oferecendo possibilidades de
acesso a um meio cultural, ou de consumo cultural, que ele já não tem mais devido à sua
condição de intensa proletarização. Mas não há, no SINPRO, uma campanha maior de
combate à precarização das condições de trabalho docente.
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A Escola do Professor é, atualmente, a maior forma de contato que a direção tem
com a base. que os acordos coletivos, que mobilizam mais interesses, são feitos por
níveis (Educação Básica e Educação Superior), assim como, por modalidades
educacionais não regulares (por exemplo, cursos de línguas estrangeiras), fracionando
assim, a base do sindicato, que já é instável, uma vez que reflete a alta rotatividade
existente nas contratações da rede privada.
UPPES
A UPPES se autoentitula o “sindicato que resolve” (UPPES, 2004d: 3); a linha
de atuação do sindicato “permite que a entidade mantenha um diálogo permanente com
o governo” (idem, ibidem), mas se essa postura dialógica não for suficiente, também
podem, “se for o caso, utilizar a Justiça na resolução de assuntos pendentes, para os
quais a entidade entende serem direitos da categoria” (idem, ibidem).
Para a presidente, a participação na UPPES deve ser reivindicativa “mas sem
renegarmos nossa posição de educadores, que deve servir de exemplo tanto para nossos
alunos como para a própria sociedade” (UPPES, 2004a: 4). Demonstrando, através
dessa fala, que percebe a prática sindical convencional ou combativa como um
rebaixamento da condição docente.
Portanto, a prática sindical da UPPES é realizada através de “discussões [...]
com os prefeitos” (Presidente, UPPES: 2005). Mas, também é pautada pelas seguintes
ações:
Levamos pessoas para falarem sobre educação com esse objetivo
nosso. Fazemos mobilizações... Tivemos durante quatro anos um
programa de entrevistas na TVE para influenciar, estamos sempre em
contato com os deputados e, por fim, temos ido muito a Justiça
também. (Presidente UPPES, 2005)
Para a presidente da entidade, a compreensão de que o professor é uma figura
exemplar para a sociedade, não lhe permite estar envolvido em manifestações, mas
somente em mobilizações que não sejam contrárias aos “princípios que [...] foram
legados por nossos fundadores e que permitiram o crescimento harmonioso do
sindicato” (UPPES, 2004a: 5). A entidade destaca o “reconhecimento” de Brizola a essa
postura chamada de ética na ocasião de uma audiência que ocorreu no segundo mandato
do governador:
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}
Brizola simplesmente enfatizou: “Até que enfim, durante muito
tempo, agora conseguimos ver pela frente professores de verdade”
(UPPES, 2004c:3)
Por esta e outras razões, este sindicato, que completará, em 2005, 60 anos de
atividade ininterrupta, nunca realizou
uma greve, por que nunca foi aprovada aqui no nosso sindicato, nas
assembléias, greve. Por que os professores entendem que, como a
greve ainda não foi regulamentada, os governantes fazem o que
querem com ela, eles também não têm muito interesse em investir em
educação, a greve faz com que eles economizem, parem de pagar o
professor, não tem merenda escolar etc. (Presidente UPPES, 2005).
O sindicato sempre primou pelas negociações diretas com os governos e pelo
caminho judicial. A participação da base se resume às visitas a sede para utilização de
serviços médicos ou dentários, ou ainda para freqüência aos cursos oferecidos. Não
possui um índice significativo de aumento em sua filiação nas duas últimas gestões,
aspecto que a presidente atribuiu ao grande número de empréstimos descontados em
folha e que não permitem o desconto da contribuição à entidade (Presidente, UPPES:
2005).
Sobre a precarização da condição docente, aprofundada nos últimos anos, e
amplamente alardeada nos meios de comunicação da UPPES, a entidade afirma que é
enfrentada pela categoria por ser essa
Uma carreira em que o amor ao que se faz tem que estar acima de
tudo. É por isso, que apesar dos baixos salários, das péssimas
condições de trabalho e do descaso das autoridades, o magistério
brasileiro resiste bravamente. (UPPES, 2004c: 4)
Mas essa resistência da categoria não pode ser a tônica da profissão docente.
Segundo esta ideologia, os governos devem perceber o valor dessa profissão e o papel
estratégico da educação no equilíbrio das diferenças internacionais. Segundo o jornal da
entidade:
Para nossa infelicidade, não temos tido governantes realmente capazes
de, como fez a Coréia do Sul, fixar as verdadeiras prioridades que
fazem um país e seu povo efetivamente crescer. E a prioridade das
prioridades, como foi dito são três: Educação, Educação e
Educação. (UPPES, 2005: 1)
Quando perguntada sobre os dois outros sindicatos que disputam a representação
da categoria a presidente não quis formular uma análise, afirmando unicamente: “Nós
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}
temos a carta sindical, nós somos o sindicato oficial, e o SINPRO é da rede privada
(Presidente, UPPES: 2005)
Cabe descrever, as alíneas do capítulo I do Estatuto- Do sindicato e seus fins-
que demonstram o peso das ações assistencialistas e de colaboração com os governos na
prática da entidade:
Art.1 A UNIÃO DOS PROFESSORES PÚBLICOS NO ESTADO-
SINDICATO, [..] é constituída para fins de defesa, proteção,
representação e assistência dos integrantes da carreira do Magistério
Público Estadual [...], pelo que se propõe: [...]
c) adotar medidas de utilidade e beneficência para seus filiados, na
forma dos regulamentos que forem elaborados; [...]
e) prestar assistência aos filiados através dos departamentos
especializados;
f) cooperar com os poderes públicos, por meio de sugestões, para
maior difusão e aperfeiçoamento da educação, como pela participação
em Conselhos ligados aos interesses de ensino, da administração
educacional e outros.
Achamos suficientemente esclarecedoras as alíneas destacadas para demonstrar
a relação assistencialista desta entidade com sua base. O que, aliás, está de acordo com
o perfil do professor apontado acima pela presidente, com os testes vocacionais para
admissão na carreira, todas condizentes com a prioridade dada ao departamento
assistencial do sindicato, em particular, ao setor de psicologia.
Também é elucidativa a edição de nov /dez de 2003 do jornal do sindicato, a
qual veio acompanhada de um cupom para que a categoria ajudasse a definir as
prioridades de ação do sindicato, com 3 opções de múltipla escolha: assistência
odontológica, orientação psicológica e outros (com espaço para indicar outras
possibilidades).
A UPPES sempre elegeu suas diretorias através do que chama de “consenso dos
filiados”, chapa única aclamada por unanimidade. Porém, na última eleição teve que
enfrentar uma chapa de oposição, instalando pela primeira vez um processo eleitoral
82
.
A esse respeito, a presidente comenta:
82
A chapa de oposição que disputou a eleição e perdeu não se tornou um grupo organizado dentro da
entidade.
{
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}
A presença de uma oposição aumenta ainda mais a nossa vontade de
aperfeiçoamento, no sentido de oferecermos sempre o melhor a nossos
filiados. Mas, esta oposição não pode ser rancorosa e sem levar em
conta o passado glorioso da UPPES, nas quais pontos como ética,
seriedade e postura de educador no encaminhamento das questões são
pontos históricos inegociáveis no ambiente de nosso sindicato
(UPPES, 2004a: 4)
A possibilidade de um processo eleitoral foi prevista no estatuto da entidade na
ocasião da transformação de associação para sindicato, mas nunca havia sido realizada.
A existência de um único processo eleitoral, que obteve votos por via postal e votos por
procuração, conforme previsto no estatuto (Art. 25 e 26), é a expressão do caráter
autocrático da entidade, prática desta diretoria desde 1988 e das demais diretorias desde
1945.
SEPE
A compreensão da função social do sindicato, para os dirigentes do SEPE,
convergem em alguns pontos, conforme veio se configurando nas questões anteriores.
Para a coordenadora 1, a amplitude dos quadros do sindicato denota uma compreensão
da entidade acerca desta função:
A gente abriu os quadros do sindicato para todos os profissionais da
educação e desempregados também, a visão do sindicato é de defesa
da educação pública [...] é um sindicato que luta pelos interesses
imediatos e históricos da classe trabalhadora [...] colaborar, portanto,
para a organização da classe (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
O que a coordenadora chamou de interesses imediatos da classe trabalhadora
que compreende também os interesses daqueles trabalhadores flexibilizados- não se
desvincula das questões mais gerais do sindicato, tais como a melhoria da educação
pública:
A questão salarial não é uma questão corporativa, na medida em isso é
mais um elemento de medidor da qualidade da educação. Se você tem
um profissional mal pago, trabalha em inúmeras escolas, o trabalho
necessariamente vai ser precarizado. Isso é um fator de
desqualificação da escola, então a gente lutar por um salário justo, por
um plano de carreira, por melhores condições de trabalho, na verdade
é estar lutando pela qualificação da escola, não é uma questão
meramente corporativa. (Coordenadora 1 SEPE, 2005)
{
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}
Uma vez que o sindicato é compreendido como uma forma de organização de
frente única
83
,
você reúne nos sindicatos diversos atores sociais, você reúne
socialistas, comunistas, social-democratas, e até capitalistas [...] Essa
visão de que é necessário construir um sindicato vermelho, ou seja,
um sindicato dos revolucionários, daqueles que querem a greve,
daqueles que querem a oposição ao governo Lula é um equívoco
histórico. (Coordenador 2 SEPE, 2005)
Entretanto, a coordenadora 3 afirma que o SEPE não tem conseguido realizar
essa frente única de organização das diversas forças políticas existentes no interior do
ramo de atuação:
O SEPE deixou de ser um sindicato de massa e é claramente hoje um
sindicato de vanguarda. Quando tomamos nossas decisões, nós não
pensamos na massa que não está na assembléia e acabamos nos
distanciando da massa que está em casa ou na assembléia. Talvez hoje
nosso desafio hoje seja fazer a curvatura da vara entre a massa e a
vanguarda, para que a gente possa adquirir representatividade e
legitimidade frente aos profissionais da educação. (Coordenadora 3
SEPE, 2005)
O SEPE é um dos maiores - senão o maior - sindicato do Rio de Janeiro, com
cerca de 55 mil filiações nos dias de hoje, conforme detalhamos anteriormente. Se o
número de suas filiações não é suficiente para classificá-lo como sindicato de massas,
poderíamos acrescentar que as decisões do movimento não são tomadas via cupom
como na UPPES, mas em fóruns consultivos e deliberativos, como vimos no capítulo
anterior. No Congresso de 2005 houve um número superior a 1.000 inscrições de
delegados
84
eleitos na base da categoria, na proporção de 10 trabalhadores (mesmo que
não fossem filiados) para 1 delegado.
A proporcionalidade é outro elemento fundamental para a compreensão do
SEPE enquanto uma forma organizativa de composição e tentativa de unidade na luta
pela defesa da categoria e organização da classe trabalhadora. Mas, como vimos na
seção anterior, essa organização não converge para as mesmas estratégias e finalidades,
83
“Fórmula política [...] com o fim de fomentar e sancionar a unidade de ação em torno de objetivos
econômicos e políticos transitórios da classe operária, salvaguardada a fisionomia ideológica e orgânica
de cada partido” (BOBBIO, MATTEUCI, PASQUINO, 2004: 528).
84
Segundo dados do SEPE, a participação dos delegados foi financiada integralmente pelo SEPE-RJ, ou
com a colaboração das regionais e núcleos municipais.
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}
o que, muitas vezes, deixa o sindicato sem direcionamento, imerso num quadro de
disputas desmedidas.
O SEPE entende que a preocupação com a formação política dos quadros e da
base se dá nas ações cotidianas da entidade, como por exemplo
visitas às escolas para discussões; campanhas unificadas das redes
municipais e estadual, intervindo nas políticas públicas como a
questão da municipalização, intervenção em direções; congressos com
a categoria; paralisações, passeatas, greves. A partir de nossas
campanhas gerais... colocando na televisão, em outdoors, eixos gerais
de luta e eixos mais particulares da categoria, assim a gente vai
publicizando esse pensamento não para as escolas, mas também
para a sociedade (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
A coordenadora também chama atenção para a existência do “curso de
especialização em convênio com a UFF, sabemos que não é suficiente, o sindicato
precisa de mais espaços de formação sistemática, mas é uma política de formação de
quadros que temos” (Coordenadora 1 SEPE, 2005).
Em contraposição ao modelo de formação oferecido pelo SINPRO através dos
cursos avulsos da Escola do Professor, o único curso de que o SEPE participa é
oferecido fora da sede, em convênio com uma universidade pública, para a realização
do curso de especialização em educação Educação Brasileira e Movimentos
Sindicais
85
.
A postura do SEPE com relação à flexibilização da contratação do trabalhador
da educação é peremptória tanto nas suas publicações, quanto na avaliação de que “a
escola também tem se tornado um espaço de violência, como agressora dos direitos
trabalhistas e direitos fundamentais dos alunos e da comunidade” (Coordenadora 1
SEPE, 2005). Apontando para uma realidade de
precarização das relações trabalhistas. até acordos completamente
informais que a gente orienta para as escolas não permitirem, como as
“caixinhas”, vaquinha de 10 reais dos alunos para contratar
professores, classes de alfabetização com 40 alunos, professores
85
O curso começou em 1992, atualmente na sexta turma, está organizado sob os seguintes componentes
curriculares: A relação Capital-Trabalho e Educação; As relações Sindicatos-Estado e Movimento
Docente; Linguagem, Comunicação e Poder; A relação Escola-Sociedade; Movimento Social,
Sindicalismo e Escola; Políticas e Gestão da Escola Pública no Brasil, Organização e Gestão Sindical no
Movimento Docente; O pedagógico no Trabalho Sindical e no Trabalho Escolar; Atividades culturais,
Pesquisa/ Monografia, Seminários.
{
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}
adoecendo dentro desse espaço, enfim, um espaço que tem violentado
muitos direitos, não só dos professores (idem, ibidem).
No plano mais geral, os dirigentes avaliam que a ação do sindicato tem sido de
intensificação da resistência à disposição dos governos em diminuir os direitos sociais e
trabalhistas, mas não de novas conquistas:
A ofensiva do neoliberalismo, suas conseqüências políticas e
influência ideológica, tem tornado a realidade ainda mais difícil para
os movimentos. O governo estadual tem reagido com muita violência
e as conquistas são cada vez mais difíceis, temos que pressionar
muito.Voltamos a exigir democracia nas eleições para diretores, por
exemplo. (Coordenador 2, SEPE: 2005)
O quadro de flexibilização das contratações de trabalho levou o sindicato a aliar
as mobilizações de massa ao recurso de ações na Justiça, conferindo um certo interesse
ao departamento jurídico da entidade.
A vitória jurídica que ocasionou a contratação de mais de 9.500 professores, esse
ano, chamados do concurso de 2001 e 2003, é reivindicada pelo SEPE e pela UPPES
como resultado de suas ações. No entanto, o SEPE recebeu um significativo aumento na
filiação depois desse fato, enquanto a UPPES manteve o seu quantitativo.
O aumento no quadro de filiados do SEPE foi algo, em torno de 30%, no último
ano. Esse quadro que vai de encontro à situação de crise do sindicalismo, é atribuído ao
fato acima, mas também,
à uma outra ação contra o Banerj, que ela nos gerou 5 mil filiações
novas; a expansão das redes com o dinheiro do FUNDEF que obrigou
algumas redes a abrirem concursos; aos movimentos nos municípios
nesse início de ano, como a greve de Niterói e a situação de Caxias,
que fortalecem o movimento e trazem novas filiações; mas também,
acredito que em muito menor número, ao convênio de saúde e
descontos em estabelecimentos. (Coordenadora 1, SEPE: 2005)
No que diz respeito à avaliação sobre os demais sindicatos, convergência
entre os coordenadores em torno da UPPES, tida como um sindicato pelego,
no final da década de 80 nós [núcleo do SEPE de Niterói /RJ]
ocupamos a UPPES e tínhamos como proposta filiar em massa para ir
para a disputa eleitoral, mas não foi adiante [...] acho que depois disso
que eles colocaram no estatuto que pode concorrer à eleição quem
tem, não sei quantos anos de filiação (Coordenadora 3 SEPE, 2005).
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Nunca houve qualquer tentativa de unificação destas entidades por motivos que,
agora, são óbvios. E quanto à avaliação sobre o SINPRO divergências, entre os
coordenadores do SEPE, que vão desde a burocratização da entidade, passando pela
avaliação de divisão de papéis dentro da educação a partir das diferentes redes, até a
crítica sobre a despolitização:
O SINPRO hoje faz um debate que nós enfrentamos uns quinze
anos atrás, principalmente por conta da participação dos setores
ligados ao PT que claramente fazem parte da direção. (Coordenadora
3 SEPE, 2005)
Esse debate sobre a relação sindicato / partido sabemos qual lugar ocupa dentro
do SINPRO, qual seja, por um lado demonstra a tentativa de aparelhamento da entidade
por um grupo e, por outro, a tentativa de encobrir a relação entre partidos e sindicatos.
A coordenadora do SEPE critica este último posicionamento, mas não percebe o
primeiro, provavelmente por ter uma prática muito próxima.
Integram o SEPE desde aqueles que querem direcionar o sindicato para a luta da
classe trabalhadora como um todo contra o sistema capitalista, até aqueles que
pretendem lutar por condições melhores de vida para a classe trabalhadora, dentro do
sistema existente. Dentro de sua heterogeneidade, poderíamos, no entanto, afirmar que é
um sindicato que efetivamente organiza a categoria e acredita nas mobilizações, no
embate, na combatividade como o melhor caminho para atingir seus objetivos.
III.3
SINPRO,
UPPES
E
SEPE:
C
ONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS
Diante do trabalho realizado ao longo do capítulo, não pretendemos ser
exaustivos retomando cada ponto, mas apenas dar uma forma de síntese à análise dos
problemas teóricos que tentamos enfrentar .
De um modo geral, podemos afirmar que a vertente predominante nas
concepções de educação dos sindicatos dos trabalhadores analisados está em
contraposição a uma concepção de educação socialista, que no corpo do trabalho foi
apresentada a partir da formulação de Gramsci, de Escola Unitária, a qual apenas uma
parte do SEPE sustentou. Essas concepções de educação apresentam diferentes nuances,
mas cada uma delas, forma um bloco, relativamente coeso com a sua concepção de
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sociedade, confirmando a nossa suposição de que eram elementos integrantes de um
pensamento pedagógico do sindicato.
Na integralidade dos sindicatos e, na maioria dos dirigentes entrevistados, foi
estabelecida uma relação sem mediações da educação com o mercado de trabalho,
guardadas as devidas gradações na forma de adesão. No caso do SEPE, inclusive indo
de encontro a deliberações congressuais, seu órgão maior de formulação.
A consideração da UPPES em defesa do ensino religioso soou desafinada ao
movimento progressista dos educadores. O SINPRO defendeu a laicidade no ensino
público e a escola privada como espaço de liberdade, inclusive religiosa. Embora a
convergência do SEPE em torno do assunto tenha sido logo esclarecida que estava
situada apenas no não financiamento do Estado deste ensino, a maioria dos
coordenadores reafirmou a bandeira histórica da laicidade.
Ao passo que a questão do financiamento revelou uma aproximação entre o
SINPRO e a UPPES, na defesa do ensino privado como complementar ao sistema
nacional de educação e evidenciou a defesa da maioria das forças políticas do SEPE
pela escola pública.
A função social dos sindicatos revelou algumas similitudes entre o SINPRO e a
UPPES, no sentido de que ambos atribuem ao sindicato o papel de oferecimento de
serviços ao filiado, porém contendo uma diferença significativa no conteúdo desses
serviços. No SINPRO estão mais voltados a cursos de formação geral e na UPPES, a
atendimentos na área de saúde. Para o SEPE o sindicato não deve oferecer serviços e a
assinatura de um convênio de saúde é vista, pela categoria, como um ponto inegociável
devido às perdas de direitos sociais. As formas atuais de reivindicação dos direitos da
categoria voltam a distinguir as três entidades, o SINPRO tornou-se preferencialmente
negociador, a UPPES é essencialmente conciliadora e o SEPE majoritariamente
combativo.
A relação entre a direção e a base é ainda muito mais marcada pelos
antagonismos. Abarca desde a consulta prioritária via meios de comunicação, até a
realização de um Congresso com número expressivo de delegados. A distinção entre
esses extremos apontou para uma resposta da categoria; o único sindicato que possui um
número significativo de novas filiações é o SEPE. Esse resultado contradiz aqueles que
generalizam que o movimento da classe trabalhadora não quer representações
combativas, ou pelo menos, complexifica a análise. Também nos remete ao debate mais
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geral de crise da forma-sindicato, não decretando o seu fim como o fazem alguns
autores, mas demonstrando seus desafios e transformações na atualidade.
O Pensamento Pedagógico e o Projeto Sindical mostram-se articulados em todos
os três sindicatos, porém com diferentes recursos às mediações.
A UPPES possui um discurso supraclassista condizente à centralidade que
empresta à educação para a resolução das desigualdades sociais e econômicas entre os
países e entre os sujeitos. A estrutura anti-democrática e assistencialista tenta arrefecer
os conflitos seja para o ter que assumir sua existência, seja porque, efetivamente, não
os reconhece. A visão e a prática conservadora da entidade não contribui sequer para os
avanços corporativos dos filiados. Assume a forma-sindicato objetivando apenas seus
benefícios institucionais, pois poderia ser uma “ONG assistencialista”, por mais
redundante que pareça a expressão.
O SINPRO é marcado por uma visão desenvolvimentista e nacionalista contra o
capitalismo, colocando a educação como apêndice desse projeto. Seu discurso situa-se à
esquerda de sua prática sindical, mas não em oposição a ela. A identificação de parcela
dos trabalhadores da rede privada com a classe burguesa, reflete na sua organização,
que é marcada também pela nostálgica busca do exercício liberal da profissão.
O SEPE tem uma visão de classes da sociedade, incorpora no seu interior
diferentes forças políticas e permanece apostando nas mobilizações e enfrentamento
como estratégia de luta, característica da fase originária da CUT, mesmo frente à
ofensiva neoliberal. O seu pensamento pedagógico expressa, em certa medida, essa
concepção societária, mas anuncia que suas formulações vigentes sobre educação
começam a ser campo de disputas e podem, em um curto período de tempo, ser
substituídas.
O posicionamento dos diferentes dirigentes sindicais frente ao governo federal,
demonstra que, se havia uma certa unidade na organização dos trabalhadores nos
períodos da ditadura militar e da ascensão do neoliberalismo no Brasil, agora uma
reconfiguração das forças políticas, aspecto notável no SINPRO e no SEPE.
Pontos que antes eram inegociáveis para o movimento como um todo, hoje
começam a ser flexibilizados por uma parcela dos militantes. Isso fica evidenciado, por
exemplo, pela controvérsia em torno das avaliações sobre as reformas, que sinalizamos
através das análises feitas pelas teses.
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Sem a pretensão de enfrentar esse debate, é possível afirmar que os estudos
empíricos apontaram na direção de uma nova etapa aberta com a vitória de Lula para os
sindicatos em particular e, para o movimento da classe trabalhadora em geral no Brasil.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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O recorte desta pesquisa, dentro das inúmeras possibilidades que os sindicatos
ofereciam, ficou circunscrito a dois aspectos fundamentais, o pensamento pedagógico -
principalmente suas concepções acerca da educação – e seus projetos sindicais, ou seja a
auto-definição da função social do sindicato e a sua materialização através da estrutura e
composição da direção, aspectos que combinados são expressões da forma de inserção
destes sindicatos na luta de classes.
Ao longo das nossas análises levantamos muitas questões, talvez proporcionais
ao tamanho do objeto empírico que elegemos. Algumas foram respondidas e outras
surgiram, sem que tivéssemos condições de enfrentá-las.
A pesquisa empírica confirmou hipóteses que havíamos construído no projeto de
pesquisa e trouxe novos elementos, os quais não tivemos tempo
86
de retornar à teoria e
enfrentá-los com maior profundidade, por isso apenas os apontamos como questões que
precisam ser melhor investigadas. Para identificar as questões que tratamos e, aquelas
em aberto, retomaremos os pontos centrais de cada capítulo e apontaremos as suas
relações.
Em um primeiro momento, tratamos da relação mediata da escola com a
produção (FRIGOTTO, 1989), posto que não está situada no mesmo campo da
produção de mais-valia e nem é autônoma em relação a tais condicionantes objetivos.
No entanto, mesmo a instituição escola possuindo uma relação mediata com a produção,
as relações sociais e produtivas do modo de produção atual se expandiram a muitas
86
Cabe registrar que as condições objetivas que enfrentamos no modelo de mestrado que busca se
adequar à compressão do espaço-tempo (HARVEY,2003) não permitiram que tivéssemos oportunidade
de amadurecer algumas reflexões. Na verdade, este curso foi realizado no curto período de 28 meses,
sendo que a produção desta dissertação, incluindo-se a realização da pesquisa de campo, ocorreu em um
período inferior a um semestre. Além disso, vale destacar que as agências de fomento não concedem
bolsas de estudos que financiem pesquisas desenvolvidas por servidores públicos em exercício.
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esferas, chegando, inclusive ao seu interior. A lógica capitalista reestruturou a produção
material e espiritual da sociedade, transformando também o espaço escolar, impondo a
divisão técnica e social do trabalho. A forma organizativa referenciada no atual padrão
produtivo se manifesta principalmente com a implementação de novas formas de
contratação e a alteração do nível de subsunção dos trabalhadores da educação ao
capital.
O grau de autonomia do professor vem tornando-se cada vez menor, seja pela
ampliação de sua jornada de trabalho, seja pelo rebaixamento de seu nível de
qualificação. A cristalização da imagem do professor como um sujeito pleno de
autonomia, de exercício intelectual inalienável, oculta as origens históricas de seu
processo de proletarização, aspecto que tentamos desconstruir.
Além disso, recolocamos o debate da definição de meios e instrumentos de
produção na educação. Diferente de outros autores, definimos a escola como meio de
produção e o conhecimento como ferramenta imaterial desse processo de trabalho.
Verificamos que a partir dessa definição, o professor está empregado diretamente ao
capital, dado que não tem a posse dos meios produtivos, por assim dizer.
Para buscar apreender a natureza do trabalho docente e o nível de subsunção da
categoria docente ao capital frente às transformações ocorridas entre o padrão de
produção fordista e a acumulação flexível, recorremos a categorias marxistas.
Confirmamos a análise de outros autores de que o trabalho docente é um trabalho
imaterial, mas apontamos para os processos de encurtamento entre a estrutura e a
superestrutura (JAMESON, 2002), abrindo, portanto, um novo campo de investigação,
sobretudo para o fenômeno superestrutural educativo. Não foi possível enfrentar essa
problemática. Dado o recorte de nossa pesquisa, centramos a análise no trabalho
docente em suas condições objetivas e nas formas de contratação, para compreendermos
a configuração e as particularidades de suas organizações sindicais. Construímos uma
nova categoria subsunção proto-real - para explicar o processo transitório entre a
subsunção formal e real do trabalho docente ao capital.
Por que, então, esse processo de intensificação da subsunção do trabalho docente
ao capital não se tornou absoluto? Acreditamos que para o sistema capitalista ainda não
demanda pela subsunção completa desses profissionais, não interessa tamanha
simplificação do trabalho docente frente às dificuldades inerentes ao processo de
objetivação, à uma força de trabalho tão barata e um exército de reserva considerável
composto majoritariamente pela força de trabalho feminina superexplorada.
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Assinalamos também que esse movimento de precarização das condições de trabalho
não é linear e enfrenta resistências desta categoria que, na contramão da crise dos
sindicatos, vem consolidando suas organizações sindicais. Este resultado da pesquisa
acentua a vitalidade e a pertinência da forma-sindicato na atualidade mesmo com o
surgimento de novos desafios.
Elementos relevantes da história do sindicalismo e da educação no Brasil foram
entrelaçados à trajetória de cada sindicato para explicitar como vieram se construindo
no contexto das lutas entre capital e trabalho.
O SINPRO, fundado no contexto das políticas trabalhistas do Governo Getulista,
se construiu como um típico sindicato oficial, presidencialista e de prestação de
serviços. Assim como a prática negociadora e cartorial que busca através da via
institucional os acordos trabalhistas é prevalente até os dias de hoje. A UPPES é um
exemplo de uma entidade conservadora e assistencialista, que não engrossou o
movimento sindical que tentava se restabelecer no período da democratização e
permaneceu, sem intervenções, nos períodos mais virulentos da ditadura militar. O
SEPE, por sua vez, foi fundado no contexto de grande efervescência dos sindicatos
brasileiros, no surgimento do “Novo Sindicalismo”, movimento que se estabeleceu na
contradição entre a crítica ao sindicato oficial e sua reprodução em algumas esferas
(MATTOS, 1998). Nesse período, um novo ciclo grevista se abriu no país, a partir das
tentativas de organização de um sindicalismo autônomo, combativo, baseado em novas
formas de relacionamento com as bases e na luta pela redemocratização.
O perfil dos dirigentes desses sindicatos mostrou consonância com esta
estrutura, como se esperava, mas anunciou elementos importantes que precisam ser
melhor investigados, como por exemplo, a burocratização e o atrelamento dos
sindicatos ao governo, este último aspecto também em relevo nas entrevistas.
Ao relacionar a trajetória e estrutura, apresentadas no capítulo, à análise do
projeto sindical das entidades, percebemos que se até o último governo de FHC, o
SINPRO e o SEPE eram unânimes na crítica às políticas neoliberais - nos discursos, nas
publicações (revistas, jornais, boletins) e na prática sindical - hoje não conseguem
visualizar a continuidade dessas políticas no governo Lula.
A década de 1990 foi o marco da desregulamentação das conquistas trabalhistas,
da abertura de uma crise para o sindicalismo brasileiro, depois do ascenso das lutas
expresso pelo “Novo Sindicalismo”. Esse quadro, que o movimento operário dos países
centrais do capitalismo enfrentava desde a década anterior, representou uma mudança
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das táticas e estratégias do movimento sindical brasileiro, em sua maioria, e na mais
combativa de suas centrais, a CUT. Essa central que se organizou paralela à estrutura
oficial que não permitia a existência de centrais sindicais (apenas a hierarquia das
confederações e federações), foi trilhando, ao longo da década de 1990, um caminho de
aproximação à estrutura oficial, ao tomar a decisão de se envolver nas câmaras setoriais,
na dependência da verba do FAT, que se tornou maior que a arrecadação de suas
filiações, e no governo Lula, se colocou como um braço sindical do governo - papel
análogo ao que a Força Sindical desempenhou no governo Collor.
A precarização das condições de trabalho dos trabalhadores da educação e a
ofensiva neoliberal trouxeram novas dificuldades para as suas organizações sindicais,
mas essa relação não teve caráter mecânico. Não há, nessa empiria, a comprovação do
esgotamento da forma-sindicato. Ao contrário, pode ser percebida a manutenção de seu
quadro de filiação, ou no caso do SEPE, o crescimento de sua base em cerca de 30%
no último ano. Esses sindicatos passaram por mudanças na década neoliberal, mas não
por profundas transformações. Se compararmos seus desenhos políticos nas ocasiões de
seu surgimento à atualidade, vamos perceber, nesses extremos, mais continuidades que
rupturas. Embora não seja possível afirmar tais linhas de continuidade com precisão,
uma vez que não recuperamos a trajetória completa de cada entidade, é possível traçar
algumas características marcantes.
No contexto de realinhamento do movimento sindical brasileiro, temos a UPPES
mantenedora da postura de colaboração entre as classes; o SINPRO prescindiu das
atividades reivindicativas e consolidou seu caráter negociador; e o SEPE, não
acompanhou a guinada da CUT para o caminho propositivo. Embora, hoje enfrente o
fortalecimento de uma social-democratização no conjunto de sua direção, o qual, se for
consolidado, pode significar uma mudança estrutural na postura política da entidade.
O avanço das correntes social-democratas também precisa ser melhor
compreendido, mas é possível relacioná-lo, em alguma medida, a uma tendência do
movimento internacional de abandono de posições revolucionárias com a contra-
reforma do capitalismo, representada pelo processo de restauração nos países do Leste
Europeu. Essa proclamação da vitória do capitalismo ofereceu as condições políticas
para o avanço do neoliberalismo e a moderação dos movimentos da classe trabalhadora,
já que as condições objetivas já estavam postas com o esgotamento do fordismo.
No Brasil, esse processo teve início com o governo de Collor, se consolidando
com seus sucessores. Mas foi com a vitória do maior partido considerado de esquerda, o
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PT, sob um conjunto de alianças com a burguesia, que a continuidade da política
neoliberal causou seus maiores estragos na organização da classe trabalhadora e, talvez
ainda não tenhamos a dimensão exata desse processo. Abordamos alguns aspectos
relacionados à cooptação das direções sindicalistas (OLIVEIRA, 2003), mas muito
ainda há a ser analisado.
As questões mais visíveis desse processo foram apontadas no SINPRO e no
SEPE ao longo do último capítulo. O SINPRO se dividiu devido ao atrelamento de uma
parte da diretoria ao governo federal. No entanto, a outra chapa, não combate a essência
dessa prática política, mas sim qualquer relação entre o sindicato e partido político,
apresentando uma postura conservadora. Essa avaliação sobre os principais
posicionamentos das chapas é que poderia explicar a cisão na diretoria unida há anos.
que, embora haja divergências entre as chapas, ambas possuem, em sua maioria,
expectativas positivas quanto ao governo Lula e não são críticos às políticas públicas
educacionais deste governo.
No SEPE também uma defesa das políticas governamentais e acordo, se não
no conjunto, na maioria da direção, quanto aos rumos traçados pelo governo “ptista”.
uma hegemonia de defesa do governo Lula, demonstrando certa perda de autonomia
sindical frente a este governo. A própria discussão de desfiliação da CUT foi o centro
do último congresso da entidade, em junho de 2005, e combatida pela maioria dos seus
dirigentes. Cabe talvez destacar, que os delegados aprovaram a realização de um
plebiscito na base para adiar esta decisão.
Para Marx e Engels, o sindicato, apesar de suas limitações estruturais, pode se
constituir como espaço de formação política dos trabalhadores, colaborando assim para
a construção de um movimento mais amplo. Essa compreensão da natureza da forma-
sindicato nos possibilita concluir que o SINPRO e a UPPES estão circunscritos ao
limites da estrutura sindical de negociar o valor da força de trabalho e a tentativa de
promover melhorias corporativas. Nenhum dos dois sindicatos estabelece com a base
uma prática consciente de formação política, restringindo-se ao oferecimento de
serviços, assistenciais no caso da UPPES e educacionais no caso do SINPRO.
A conformação com os limites do sindicato inscrevem essas entidades numa
prática corporativista e reformista de que é possível tornar a vida do trabalhador melhor
dentro do capitalismo. O objetivo da ação sindical passa a ser a negociação para a
minimização da exploração do capital, e não a sua própria extinção a fim de possibilitar
um exercício de organização da classe trabalhadora contra sua condição de mercadoria.
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No SEPE, embora as vozes não sejam uníssonas na definição do papel histórico
da classe trabalhadora frente ao capitalismo, a compreensão de que o sindicato deve
contribuir para as lutas dessa classe social. Não nos parece possível afirmar que o
conjunto da diretoria atual tenha como bandeira o socialismo, embora o reivindique no
seu discurso. Mas, o SEPE não se detém aos seus limites e se aproxima das
possibilidades apontadas por Marx de colaborar com a construção da consciência de
classe forjada a partir das condições concretas da existência e de enfrentamento com o
capital. Pois, mesmo com tantas disputas internas, o SEPE ainda é um sindicato que
mobiliza a categoria e não aderiu à ala majoritária do sindicalismo brasileiro de
proposições.
A trajetória de cada sindicato construiu uma estrutura e um projeto sindical que
acabamos de explicitar, mas também um pensamento pedagógico por nós analisado que
comporta a concepção de educação e de sociedade.
A especificidade desses sindicatos, situados no campo educacional, trouxe
muitas possibilidades de análise. Escolhemos três aspectos para abordar a problemática
da concepção de educação, a partir das entrevistas e das fontes primárias escritas, a
saber: a relação entre trabalho e educação, pela centralidade que possui para o debate
educacional no campo marxista; a questão do financiamento e a laicidade do ensino por
serem, freqüentemente, questões relegadas a um segundo plano pelos sindicatos,
quando, na verdade, são questões essenciais.
Portanto, a pesquisa buscou compreender como a disputa teórica no campo
educacional ganha corpo dentro de uma forma específica de organização da classe
trabalhadora, que é o sindicato. Não engrossamos o coro daqueles que acham que o
sindicato deve ser um assessor pedagógico, e que portanto, a sua demonstração de
preocupação com o fenômeno educativo deve se dar através da inversão de prioridades,
em que às questões macro-políticas devem se sobrepor às especificidades pedagógicas.
A compreensão da forma-sindicato em seus limites e possibilidades nos permitiu
ampliar a compreensão de sua função social. O sindicato da área educacional não é
equivalente a um espaço de educação formal de professores, cada um guarda suas
especificidades. O sindicato, enquanto espaço que pode revelar a efervescência da luta
de classes, não pode perder a dimensão da totalidade, da relação entre educação e
estrutura social.
Para não cairmos nessa armadilha simplista, não seria suficiente realizar apenas
uma análise da concepção educacional dos sindicatos, chegando à conclusão de que um
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sindicato não demonstra preocupações educacionais pois não formulou um documento,
e que outro cumpriu a função social de um sindicato docente, ao sistematizar os anseios
educacionais de uma categoria em uma teoria pedagógica. Sabemos que a
sistematização do debate pelos sindicatos nos oferece muitos indícios, mas não esgota a
análise. Entendemos que a essência do pensamento pedagógico é mais abrangente do
que um documento-síntese, pois mesmo quando ele existe é alvo de disputas, como
vimos, principalmente no SEPE. Esperamos ter conseguido demonstrar a complexidade
destas formulações pedagógicas através de todas as mediações que buscamos.
Lamentavelmente, identificamos no discurso sobre educação da maioria dos
dirigentes sindicais a adesão ao discurso dominante. Embora sejam de entidades tão
diferentes, os sindicalistas entrevistados defendem, para a classe trabalhadora, que
formalmente representam, uma educação dual e uma relação mecanizada entre educação
e produção. Um modelo educacional que mais se aproxima da educação polivalente, que
parcela o conhecimento, significando uma proposta educacional diretamente funcional
ao mercado de trabalho, do que uma educação voltada aos interesses históricos da classe
trabalhadora, construídos em torno da formulação de Escola Unitária.
Na compreensão da UPPES a educação tem um papel equalizador das diferenças
sócio-econômicas que não é explorado pelos dirigentes nacionais, a razão dessa opção,
no entanto, é discutida no plano individual ou da (in)competência dos políticos
profissionais. A educação deveria preparar o sujeito para exercer toda sua linha
vocacional, ou seja, desempenhar múltiplas funções de acordo com a demanda do
mercado de trabalho.
Para o SINPRO, a educação é um serviço que tanto pode ser oferecido pelo
governo, pelas empresas ou ainda pela sociedade civil, que o oferece dentro de sua
própria sede. Também entende a educação pública como um apêndice de um projeto de
desenvolvimento nacional.
no SEPE, resoluções congressuais em torno da proposta de Escola
Unitária. Essa formulação advém de uma concepção e prática educacional baseada na
compreensão da realidade em sua totalidade, ou seja, em seus aspectos científicos,
políticos, no domínio do trabalho e na formação integral do homem. Embora haja, no
SEPE, deliberações que o de encontro a concepção de educação polivalente,
percebemos que se uma nova discussão ocorrer, tais concepções podem ser subsumidas
à lógica educativa do capital.
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Quando os coordenadores explicitaram suas interpretações sobre a resolução de
um projeto de Escola Unitária, em alguns casos, negaram sua essência teórica e política,
demonstrando que o SEPE corre o risco de vir a ter uma formulação de educação à
direita de sua prática política ainda combativa. Não há a unidade em torno da concepção
educacional que esperávamos encontrar, visto que o sindicato possui o maior debate e
sistematização sobre a temática das três entidades estudadas. Da mesma forma, não
muitas convergências, na direção do SEPE, em torno dos rumos do sindicato,
expressando as disputas políticas internas. Se o SEPE parece, em muitos momentos,
representar um grande desencontro, esse aspecto é resultado da proporcionalidade que
traz para o seu interior, as disputas políticas presentes senão na sociedade, pelo menos,
nos movimentos sociais. Como organizar essas diferentes forças políticas dentro de uma
mesma entidade não sabemos, apenas acreditamos que esse caminho é imprescindível
para combater a aristocracia operária e suas formas de aparelhamento institucional.
A análise do conjunto do pensamento pedagógico e do projeto sindical das
entidades demonstrou que uma tarefa inadiável, para os revolucionários que pretendem
fazer do sindicato uma mediação para a classe trabalhadora em sua luta contra o capital,
é
adaptar às condições existentes nos sindicatos de cada país para
mobilizar as massas não apenas contra a burguesia, mas também
contra o regime totalitário dos próprios sindicatos e contra os
dirigentes que sustentam esse regime. A primeira palavra de ordem
desta luta é: independência total e incondicional dos sindicatos em
relação ao Estado capitalista. Isso significa lutar para transformar os
sindicatos em organismos das grandes massas exploradas e não da
aristocracia operária. (TROTSKI, 1978: 103)
Os sindicatos precisam colaborar para a unificação e conscientização da classe
trabalhadora. Uma unificação que supere a organização por setores ou profissões, como
no caso dos sindicatos estudados apenas um unifica os trabalhadores da educação, e
arriscaríamos afirmar que de uma forma muito desproporcional, consolidando ainda a
hegemonia da categoria docente.
A forma-sindicato, enquanto ferramenta privilegiada de experiência de embate
entre capital e trabalho, pode colaborar para a organização da classe trabalhadora se não
for utilizada como um fim em si mesma.
A experiência brasileira entre os movimentos e o governo que foi inaugurada
com a chegada ao poder do maior partido dito de esquerda, o PT, fortalece as análises
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que apontam o equívoco do caminho parlamentar para a derrubada do capitalismo,
recolocando o debate sobre as táticas e estratégias da luta socialista. Dessa forma, se
abre no meio desta crise instaurada nos movimentos da classe trabalhadora, um novo
campo de investigação e um novo terreno para as intervenções revolucionárias que
buscam a superação da sociedade de classes.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E FONTES
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UPPES – União dos Professores Públicos no Estado Sindicato. Estatuto. Niterói:
UPPES, s/d.
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Sítios da Internet
SEPE-RJ: { HYPERLINK "http://www.sepe-rj.org.br" }.
SINPRO-Rio: { HYPERLINK "http://www.sinpro-rio.org.br" }.
UPPES: { HYPERLINK "http://www.uppe.com.br" }.
1.
F
ONTES
P
RIMÁRIAS
O
RAIS
:
Entrevistas concedidas à autora:
SINPRO
PRESIDENTE do SINPRO-Rio, julho /2004.
DIRETOR do CEAPE, maio/ 2005.
UPPES
PRESIDENTE da UPPES, maio / 2005.
SEPE
COORDENADORA 1, abril / 2005.
COORDENADOR 2, junho / 2005.
COORDENADORA 3, junho/ 2005
2.
F
ONTES
P
RIMÁRIAS
E
SCRITAS
:
J
ORNAIS
UPPES, jornal. Ano XI, nº 17 – Edição de março e abril, 2004 a.
----------. Ano XI, n° 18 – Edição de abril e maio, 2004 b.
----------. Ano XI, nº 20 – Edição de agosto, 2004 c.
----------. Ano XI, nº 22 – Edição de outubro e novembro, 2004 d.
----------. Ano XII, nº 03 – Edição de maio a julho, 2005.
D
OSSIÊS
UPPES. Dossiês sobre os problemas da Educação Pública estadual no Rio de Janeiro,
1996.
{
PAGE
}
----------. Dossiê sobre a Educação, 1997/ 1998.
----------. Dossiê sobre a Educação, 2004.
T
ESES
C
ONCRESSUAIS
SINPRO-Rio. Tese 1. Teses do 8º ConSINPRO, 2004.
---------. Tese 2. Um SINPRO além da burocracia e do economicismo, 2004.
SEPE-RJ. Tese 4. Radicalizar na democracia para transformar a CUT e o SEPE, 2005.
---------. Tese 8. Sepe: 28 de luta e resistência. Adaptar-se jamais, 2005.
----------. Tese 13. Sepe – 28 anos: unidade e reformas para avançar na luta, 2005.
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ANEXO
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