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RESUMO
Os animais peçonhentos são aqueles capazes de produzir e inocular veneno
(peçonha) em suas vítimas. No Brasil, foram catalogadas, até o momento, 326
espécies de serpentes, dentre as quais cerca de 50 são peçonhentas e de
grande interesse para a Saúde Publica. A Bothrops jararacussu é a espécie
brasileira que possui a capacidade de produzir e inocular a maior quantidade
de veneno. Nos acidentes ofídicos causados por esta espécie, a ação do
veneno não é totalmente neutralizada pelo soro específico, o antibotrópico,
sendo importante nestes casos a adoção de uma conduta terapêutica
diferenciada através da administração do soro poliespecífico, o antibotrópico-
crotálico. No entanto, considerando-se apenas os sintomas clínicos do
paciente, o médico não tem como discriminar se o acidente foi provocado por
B. jararacussu ou por outra espécie do gênero. Vale ainda ressaltar que para
as demais espécies do gênero Bothrops, o soro antibotrópico é o mais
indicado, fato que impossibilita o médico de adotar como estratégia geral, a
utilização do soro antibotrópico-crotálico como uma terapêutica única no
acidente botrópico. Esta tese teve como objetivo a caracterização, através de
técnicas de imunoquímica, do veneno de B. jararacussu e a identificação de
possíveis biomarcadores para este veneno. Para a triagem dos biomarcadores
foram produzidos soros espécie-específicos para os venenos de B. jararacussu
(soro anti-jararacussu) e para B. jararaca (soro anti-jararaca). Nas análises por
“imunoblotting” a partir do fracionamento por 2D-PAGE foi visto um bom
reconhecimento por ambos os soros, principalmente das frações de alto peso
do veneno de B. jararacussu, mostrando que estas frações são as mais
imunogênicas neste veneno. A partir destes dados, foram identificadas no
mapa bidimensional, as principais proteínas de baixa imunogenicidade deste
veneno. Uma proteína de 60kDa e pI ácido foi identificada como uma serino
proteinase. Esta identificação foi obtida a partir da homologia com uma
protease com domínio tripsina, denominada BOTIN, presente no banco de
dados de ESTs de B. insularis. Esta proteína de pI ácido (denominada Bjssu-
pI2,2) foi, pela primeira vez, descrita nesta espécie. Na região básica, foram
identificadas duas outras proteínas, as quais demonstraram um baixo
reconhecimento tanto pelo soro homólogo (soro anti-jararacussu) como pelo
heterólogo (soro anti-jararaca). A proteína de 29kDa foi identificada como uma
serino proteinase da família S1 e a de 16kDa foi identificada como
Botropstoxina-I (BthTX-I), a principal miotoxina do veneno de B. jararacussu.
Desta forma, a abordagem desta tese através de técnicas como eletroforese
bidimensional somado a técnicas sensíveis como “imunoblotting” e
espectrometria de massas, se mostrou muito interessante para o estudo
imunoquímico das frações do veneno de B. jararacussu. As diferenças no
reconhecimento dos soros espécie-específicos frente ao veneno de B.
jararacussu permitiram a identificação de três proteínas com potencial para
serem utilizadas como ferramenta para o desenvolvimento de diagnóstico
diferencial para esta espécie. Além disso, os resultados deste trabalho
reforçam a questão da ineficiência do soro antibotrópico para a neutralização
do veneno no acidente causado por esta espécie, podendo se relacionar a
importância da fração crotálica para a neutralização de toxinas pouco
imunogênicas do veneno de B.jararacussu, como é o caso da BthTX-I.