diferentes culturas humanas. Portanto há quatro instâncias analíticas possíveis do
sagrado para Gil Filho (2005, p. 80-81):
I) A primeira refere-se à sua materialidade fenomênica a qual é apreendida
através dos nossos instrumentos perceptivos imediatos. Refere-se à
exterioridade do sagrado e sua concretude, a exemplo da estrutura edificada
do Templo, do lugar dos mortos e da ação social da religião através de
escolas e hospitais. Também constituindo a expressão do sagrado observamos
os lugares de peregrinação, a sacralização de formas da natureza (rios,
florestas, montanhas) e os lugares sagrados de modo geral. Trata-se da
paisagem religiosa.
II) A segunda é a apreensão conceitual através da razão, pela qual
concebemos o sagrado pelos seus predicados e reconhecemos a sua
linguagem simbólica. Sendo assim, entendemo-lo como sistema simbólico e
projeção cultural, neste aspecto a compreensão da cultura na qual a religião é
vivenciada é de fundamental importância, ignorar a cultura gera análises
equivocadas das religiões.
III) A terceira possibilidade é tradição e à natureza imanente do sagrado
enquanto fenômeno. Neste sentido procuraremos entender o sagrado a partir
das construções epistemológicas realizadas pelo grupo que se manifestam
através das Escrituras Sagradas, das Tradições Orais Sagradas e dos Mitos.
IV) A quarta possibilidade de reconhecimento do sagrado é o sentimento
religioso, seu caráter transcendente e não-racional. É uma dimensão de
inspiração muito presente na experiência religiosa. É a experiência do
sagrado em si. Esta dimensão, que escapa à razão conceitual em sua essência,
é reconhecida através de seus feitos. Trata-se daquilo que qualifica uma
sintonia entre o sentimento religioso e o fenômeno sagrado, é a experiência
mística, que precisa ser mais bem compreendida em nossa cultura, pois a
percepção atual de mística está eivada de equívocos. Nos antigos povos a
sabedoria adquirida pela mística não se reduzia ao silêncio do recolhimento
introspectivo individual, pelo contrário, ela acontecia primeiramente na
conversa e no diálogo realizado com o outro na comunidade.
As interfaces do sagrado são inúmeras, complexas e de difícil definição. A
pluralidade na qual o sagrado se inter-relaciona nenhuma cultura pode se auto-declarar
capaz de englobar suas diferentes manifestações. São múltiplas as interações e as
tensões que se colocam como variantes neste processo, condicionados aos tempos e
espaços em que as mutações são praticamente diárias e com diferentes significações.
A mística
8
que adjetiva da palavra “mistério”, perpassa as culturas quando estas
assumem e vivem a profundidade do sagrado, realizam experienciações e vivências
personalizando este elemento da dimensão humana, assim, o sentimento religioso age
como provocador e movimentador dos espaços culturais, das formas de vida e da
essência dos homens, causando mudanças e significando a existência da humanidade,
8
A mística é uma das dimensões da vida humana à qual todos têm acesso, quando descem a um nível
mais profundo de si mesmos, quando captam o outro lado das coisas e quando se sensibilizam diante do
outro e da grandiosidade, complexidade e harmonia do universo. (Ênio José da Costa Brito, São Paulo:
1996, p. 108)