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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
DANIELA ARAUJO
AS PALAVRAS E SEUS EFEITOS: O SEXISMO NA
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Porto Alegre
2006
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DANIELA ARAUJO
AS PALAVRAS E SEUS EFEITOS: O SEXISMO NA
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Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do grau de Mestre, pelo Programa de Pós-
graduação da Faculdade de Letras, da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Orientador: Professor Dr. Jorge Campos da Costa
Porto Alegre
2006
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DANIELA ARAUJO
AS PALAVRAS E SEUS EFEITOS: O SEXISMO NA
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Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do grau de Mestre, pelo Programa de Pós-
graduação da Faculdade de Letras, da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Aprovada em 22 de janeiro de 2007
BANCA EXAMINADORA:
Professora Dra. Vera Pereira (PUCRS)
Professora Dra. Margareth Axt (UFRGS)
AGRADECIMENTOS
A Deus, por nunca desistir de mim.
À minha família, que chega a ser irreal de tão perfeita.
À mim, pelo esforço, entusiasmo e críticas construtivas que fiz, durante o percurso.
Aos professores que tive em minha graduação e me incentivaram a continuar nesses
estudos.
Aos professores do curso de pós-graduação em Letras, em especial Ana Ibaños, pela
organização, humor e competência com que desenvolve seus trabalhos, incentivando
assim seus alunos. À Leci Barbisan, por seu amor ao que ensina de forma brilhante.
Ao meu professor e orientador, Dr. Jorge Campos da Costa, que, além de ter
conhecimento teórico, marca mais ainda por seu brilhantismo nas suas lições de vida.
Obrigada.
À PUCRS, pela oportunidade dada para a continuação de meus estudos.
À CAPES, por proporcionar a chance de estudar, com seu auxílio financeiro e seu
investimento cada vez maior no incentivo à educação científica do país, estimulando e
patrocinando novas descobertas de jovens pesquisadores .
“Aquilo que não me mata, só me fortalece.”
Nietzsche
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo verificar a validade e consistência da Teoria das
Implicaturas de Grice(1975), que descreve e explica o significado implícito enquanto
processo inferencial de comunicação. Os slogans publicitários servem como fonte de
análise para o trabalho, pois possuem uma camada significativa de implicaturas, ou seja,
dizem muito mais do que está dito. Estas implicaturas podem ser de diferentes tipos,
porém no trabalho são verificadas somente aquelas que indicam traços de sexismo, isto
é, aquelas que apresentam algum tipo de discriminação em relação ao gênero, nesse
caso, o feminino. A Teoria das Implicaturas de Grice, que é pragmática por natureza, é
considerada importante porque estuda o significado que escapa à abordagem semântica,
apesar de partir desta. Assim, o trabalho valoriza a interface entre a Pragmática e a
Semântica, acreditando que uma área complementa a outra no estudo do significado em
linguagem natural.
Palavras-chave: Semântica. Pragmática. Implicaturas. Publicidade. Sexismo.
ABSTRACT
The goal of this research is to verify the validity and consistency of Grice´s
Implicatures Theory (1975), which describes and explains the implicit meaning as an
inferential process of communication. The advertising slogans are used as source,
because they have a significant layer of implicatures, it means, they say more than they
have said. These implicatures can be of different types, but this study verify the
implicatures which indicate sexism traces, it means, indicate some discrimination mark
about the genre, in this case, the feminine genre. Grice´s Implicatures Theory, which is
pragmatic, is considered important because it deals with the meaning that escapes from
the semantic theory. So, this study emphasizes the interface between Pragmatics and
Semantics, presuming that one area completes the other in relation to the study of the
meaning.
Key-words: Semantics. Pragmatics. Implicatures. Advertising. Sexism.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................9
1 SOBRE A SEMÂNTICA E A PRAGMÁTICA................................................15
1.1 SOBRE A SEMÂNTICA....................................................................................16
1.2 SOBRE A PRAGMÁTICA.................................................................................20
1.3 SOBRE A INTERFACE SEMÂNTICA/PRAGMÁTICA..................................24
2 A TEORIA DAS IMPLICATURAS DE PAUL GRICE...................................31
2.1 CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO.........................................................31
2.2 A TEORIA DAS IMPLICATURAS (TI)............................................................33
2.3 DESDOBRAMENTOS CONTEMPORÂNEOS DA TI.....................................41
3 DISCURSO PUBLICITÁRIO E SEXISMO......................................................47
3.1 SOBRE O DISCURSO PUBLICITÁRIO...........................................................48
3.2 SOBRE O SEXISMO .........................................................................................55
3.3 SOBRE O SEXISMO NO DISCURSO..............................................................59
4 DISCURSO PUBLICITÁRIO,SEXISMO E ANÁLISE DE DADOS.............64
4.1 METODOLOGIA................................................................................................64
4.2 A ANÁLISE........................................................................................................66
CONCLUSÃO..........................................................................................................88
REFERÊNCIAS.......................................................................................................91
ANEXOS...................................................................................................................95
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como propósito analisar as implicaturas que estão presentes
na linguagem natural, sendo aqui constatadas em slogans publicitários. Falar em
implicaturas na linguagem natural é entrar no campo da Pragmática, teoria lingüística
que estuda o significado além do dito, e é alvo de grandes debates teóricos, visto ter
uma estreita relação, difícil de limitar, com a semântica das condições de verdade. Ao
estudar Pragmática estuda-se a linguagem natural, mas indo além das condições- de -
verdade expressas no nível do dito ou codificado. A Semântica como teoria lingüística
consegue demonstrar de maneira cientificamente provada o valor de verdade de cada
sentença, sua significação básica. Várias teorias semânticas tentam dar conta da noção
de significado com diferentes argumentos. Entretanto, quando envolve intenção do
falante, compreensão do ouvinte, as inferências que um dito provoca, a influência do
contexto (aliás, a própria noção de contexto, lingüisticamente falando), a precisão na
definição de “significado” já não é tão garantida como aquela obtida apenas no nível de
expressões livres de contexto. Se entender o significado em linguagem natural já não é
fácil para os semanticistas, pior fica quando o contexto entra em jogo. Por tal razão,
surge a Pragmática, com a proposta de ser uma nova teoria lingüística que tenta resolver
tal dificuldade.
A Pragmática busca desvendar cientificamente os mistérios que cercam a linguagem
natural e entender o que há por trás de tudo que é dito, por trás de uma proposição com
condições de verdade. Fica claro que tal área é inerente às propriedades das sentenças,
mostrando com isso a importância de uma interface entre a semântica das condições de
verdade e a semântica do uso. Trabalhando juntas, as duas áreas melhor determinam os
significados completos dos enunciados.
Nesse caminho em busca da sistematização da Pragmática e do estabelecimento de
uma interface com a Semântica, surgem vários teóricos com objetivo de melhor explicar
o processo da linguagem em uso de forma objetiva. Austin (1962), com a sua Teoria dos
Atos de Fala, Searle (1969), com sua complementação à Austin, Paul Grice (1967-
1975), com suas Implicaturas Conversacionais, Sperber e Wilson (1986), com a Teoria
da Relevância e Levinson(1983- 2000) são alguns nomes que mostram a importância do
estudo da Pragmática. O trabalho aponta a teoria de Grice(1975) como satisfatória para
explicar a significação da linguagem natural, os processos que ocorrem quando a
linguagem é posta em uso.
Grice revoluciona o estudo da Pragmática com seus estudos sobre o dito e os efeitos
de sentido que vão além do significado expresso, preocupação deste trabalho. O teórico
apresenta seu conceito de “implicatura” e seu conceito de Princípio de Cooperação,
mostrando que há leis que direcionam uma conversa e que, quando respeitadas ou
quebradas, provocam alguma inferência especifica. Para o autor, as implicaturas são
partes constituintes do dito, ou seja, as inferências são provocadas pelo que está
expresso. Grice (1967) distingue o dito do implicado. Dito é o que está expresso, seria a
semântica com suas condições de verdade. O que passa esse limite do expresso, ou seja,
o que envolve o processo inferencial do ouvinte, realizado a partir do sentido do dito,
gera a implicatura, é o implicado.
Não se quer dizer com isso que na Teoria das Implicaturas (TI) é plenamente
contemplado todo o âmbito que cerca a Pragmática. Há ainda pontos que falham na
cientificidade da teoria, que outros autores, em destaque Sperber e Wilson (1986),
tentam contemplar. Porém, Grice é valorizado aqui, pois consegue elaborar um estudo
minucioso sobre as implicaturas inferenciais, desenvolvendo principalmente - o que
torna elogiável sua teoria- uma metodologia de análise.
As inferências pragmáticas ocorrem sempre na comunicação humana. Quando o
falante, por exemplo, diz algo “nas entrelinhas”, o ouvinte precisa inferir a informação
que não foi dita, mas sugerida pelo dito. Ou seja, há uma implicatura por detrás da
semântica usada pelo falante. Muitas vezes as coisas não são ditas, propositadamente,
para gerarem implicaturas diversas, sem comprometer quem diz. Se o falante quer
criticar algo, mas não quer fazer isso deliberadamente, para não se comprometer, é
possível usar a ironia, por exemplo, já que pode cancelar caso alguém o critique. A
cancelabilidade das implicaturas é um dos recursos pragmáticos que Grice explora em
seus estudos.
A teoria desse autor consegue, por exemplo, explicar de forma sistemática e
aplicável os slogans publicitários que são ricos de implicaturas. Com o objetivo de
atingir o maior número de consumidores, sem comprometer quem cria o slogan, as
propagandas dizem pouco, mas costumam significar mais do que está dito. São dois
níveis de linguagem: o semântico, ou seja, o dito, e o pragmático, o implicado. Há nos
slogans publicitários uma rede de significações no que está expresso, o que mostra,
claramente, o caráter pragmático e, em especial, as implicaturas de Grice. Além de
significarem mais do que está dito, os slogans publicitários, que nesse trabalho são
analisados, são produzidos de forma persuasiva, pois a linguagem usada e as inferências
que ela provoca servem para convencer o consumidor em potencial a comprar o produto
em questão.
Essas implicaturas que persuadem também podem ecoar o pensamento de uma
sociedade. A partir do dito, é possível inferir preconceitos, por exemplo, marcas de
sexismo, como mostram as propagandas analisadas neste trabalho. Aliás, é importante
ressaltar o fato de a linguagem carregar preconceitos que são inferidos a partir do
expresso. Pensar que o gênero feminino na gramática é decorrente, derivado do
masculino, saber que o masculino é tido como principal na construção da língua, já é
evidência do sexismo na linguagem. Há uma discussão sobre esse tema, há estudiosos
que verificam que as palavras masculinas são consideradas como as neutras das línguas.
A palavra “Deus”, por exemplo, é masculina e é o símbolo de força maior. A idéia de
“humanidade” é expressa na palavra “o homem” (como em “o homem precisa cuidar da
natureza”), infere-se o sentido de “juventude” quando a expressão masculina “o jovem”
é usada (como na frase “o jovem de hoje é alienado”), enfim, as palavras masculinas são
referentes para termos generalizadores. O contrário não ocorre. Não se lê, por exemplo,
“a estudante deve fazer tal coisa” ou “a candidata deve...” quando se trata de uma
referência a ambos os sexos. O mais comum é ler: “o estudante deve fazer tal coisa” ou
“o candidato deve...”. A forma expressa no dito é masculinizada, e isso causa
inferências já sexistas, envoltas de preconceito.
As implicaturas primárias dos slogans publicitários são, então, aquelas que
persuadem o consumidor a comprar o produto anunciado. São sugeridas idéias, a partir
do dito, que provocam a vontade de ter o produto anunciado. Nesse processo inferencial
realizado pelo ouvinte (ou seja, o possível consumidor), além de aparecerem “razões”
para comprar o produto oferecido, aparecem, como implicaturas secundárias, as marcas
sexistas. Assim, é interessante perceber como isso ocorre.
A propaganda publicitária usa o dito a favor da inferência, ou seja, diz pouco, mas
seleciona o que é dito, para causar determinadas implicaturas, e que podem ser
canceláveis, facilitando a produção de preconceito em relação ao gênero feminino (que
é o foco de estudo do trabalho), pois por não estar no nível do dito, a propaganda não
pode ser enquadrada como preconceituosa. Assim, pode oferecer os seus produtos
reforçando idéias sexistas sobre a mulher.
Aliás, a publicidade é fonte inesgotável de análises já que se utiliza de vários
recursos e tem uma boa técnica de escrita, além de uma importante produção visual, que
aqui neste trabalho não se propõe verificar, visto este estar preocupado com a linguagem
escrita e suas implicaturas. As imagens das propagandas, quando analisadas neste
trabalho, servem apenas como coadjuvantes para a linguagem escrita, ou seja, quando
estão a serviço da produção de implicaturas.
Sabendo que publicidade vai além do que aqui é exposto, pretende-se apenas citar
algumas características de tal arte, que influenciam no estudo do dito e do implicado.
Então, visto que a Semântica estuda a noção de significado e que a Pragmática
estuda a significação em contexto, percebe-se que é importante a interface entre as duas
teorias lingüísticas. A partir desta interface estabelecida, é importante estabelecer um
outro nível de interface: Teoria das Implicaturas e publicidade sexista. O trabalho
aponta duas dimensões: há uma preocupação em verificar a validade da Teoria das
Implicaturas,como teoria pragmática que explica a comunicação humana de forma
objetiva, e há uma preocupação em mostrar, aplicando o modelo griceano, que as
propagandas publicitárias mostram no nível do não dito preconceitos sexistas contra a
mulher. Essas marcas sexistas lingüísticas são inferências disparadas pelos elementos
lingüísticos, daí a importância do modelo de análise de Grice(1975). O sexismo na
linguagem aparece na interface pragmática dado o caráter não-monotônico das
inferências contextualizadas.
Assim, visto que Paul Grice (1967-1975) tenta explicar metodologicamente a
significação em contexto, opta-se em utilizar sua teoria para explicar como um slogan
publicitário produz implicaturas, verificando se a teoria do autor é bem-sucedida para
tal propósito. A arte da publicidade foi escolhida para exemplificar a linguagem natural
e sua significação porque se utiliza muito de implícitos. A partir de um slogan
publicitário, podem-se perceber, conforme apontado anteriormente, os preconceitos de
uma sociedade, já que estes ecoam no nível do não dito. Um exemplo de preconceito
encontrado nos slogans é o sexismo, preconceito em relação ao gênero feminino.
Então, dentro desse contexto de estudo, são levantadas as seguintes hipóteses:
- A Pragmática tem um papel importante no estudo de significação da linguagem
natural, atuando ao lado da semântica das condições de verdade;
- O modelo de Grice é relevante para estudar a significação da linguagem natural, na
medida em que estuda a relação dito –não dito e suas inferências, de forma sistemática e
metodologicamente bem aplicável;
- As implicaturas de Grice podem ser verificadas em slogans publicitários, pois estes
comunicam muito mais do que está dito nos seus enunciados;
- Nas propagandas, marcas de sexismo, visto que a persuasão ocorre a partir da
produção de estereótipos femininos, da exploração de preconceitos que a sociedade
possui em relação ao gênero feminino. Tais marcas não estão presentes no nível
semântico, pois isso compromete quem escreve, aparecendo apenas no nível inferencial,
como implicaturas.
O que se acredita é que marcas implícitas de sexismo no discurso publicitário( o
que envolve a importância de estudar a Pragmática) e essas marcas sexistas podem ser
calculadas com o modelo de Grice( o que envolve a importância de estudar a Teoria das
Implicaturas).
A partir disso, pode-se dizer que os objetivos do trabalho são:
- Notar a importância da Pragmática dentro do contexto lingüístico e sua relação
com a semântica das condições de verdade, mostrando a linguagem posta em uso, a
significação contextualizada;
- Apresentar o modelo de Grice (1975) e sua Teoria das Implicaturas, considerada
uma das mais destacadas teorias da Pragmática, bem como as ampliações feitas ao
modelo griceano, mostrando a importância do estudo dos implícitos;
- Apresentar a linguagem publicitária como veículo de mídia que persuade o
consumidor a comprar um produto oferecido;
- Perceber a questão social sexista, o papel que a mulher representa nos dias atuais,
bem como relacionar isso com a linguagem;
- Sistematizar as implicaturas conversacionais calculadas nos slogans publicitários,
mediante a aplicação da Teoria das Implicaturas de Grice;
- Mostrar como os textos publicitários apresentam marcas sexistas no nível do
implicado, a fim de persuadir o consumidor a comprar seu produto.
Explicitados os objetivos do trabalho, a metodologia se consistirá em uma análise da
teoria pragmática, passando pela Semântica, seguindo com uma análise da teoria de
Grice (1975) e a aplicação desta nos slogans publicitários, a fim de perceber marcas
sexistas de persuasão.
Então, a organização do trabalho é da seguinte forma: o trabalho possui quatro
capítulos. O primeiro capítulo tem como propósito explanar brevemente sobre a teoria
semântica e sobre a teoria pragmática, bem como a interface entre ambas. Na primeira
seção do capítulo, é apresentado um breve panorama da teoria semântica, na segunda
seção é apresentado um breve panorama da teoria pragmática dentro do contexto
lingüístico e na terceira seção é feito um breve estudo sobre a importância da interface
entre Semântica e Pragmática, percebendo assim a relação desta última teoria com a
semântica das condições de verdade e verificando a importância do estudo da
significação em contexto.
No segundo capítulo, procura-se articular a teoria pragmática com a Teoria das
Implicaturas de Grice (1975), através do enfoque sobre a natureza dos implícitos. Na
primeira seção do segundo capítulo, é apresentado um breve panorama histórico da
teoria de Paul Grice (1967-1975). Na segunda seção do capítulo é feito um estudo mais
detalhado sobre Paul Grice e sua Teoria das Implicaturas, de acordo com o texto
“Lógica e Conversação” (1975). Nesse estudo, é abordado o modelo teórico griceano,
com o Princípio de Cooperação (através das categorias de Quantidade, Qualidade,
Relação e Modo) e os tipos de implicaturas. E, a partir dos pontos frágeis que este
apresenta, na terceira seção do segundo capítulo, são também ressaltadas as
argumentações de outros teóricos que desdobram a teoria griceana, como Sperber e
Wilson(1986) e Levinson(1983). As considerações de Costa(1984), Carston(2004) e
Davis(1991) também são relevantes para tal propósito.
Concluído o estudo teórico sobre a Teoria das Implicaturas de Grice (1975), o
trabalho segue no terceiro capítulo com o estudo de dois termos: linguagem publicitária
e sexismo, bem como o entrelaçamento dos dois tópicos.
O slogan publicitário, ao ser inferido pelo ouvinte, reflete muitas vezes a visão
sexista que a sociedade possui em relação à mulher, com o objetivo de vender seu
produto. Portanto, na primeira seção do terceiro capítulo busca-se mostrar um breve
panorama sobre a linguagem publicitária e seus recursos pragmáticos para persuadir o
consumidor. Por conseguinte, na segunda seção do terceiro capítulo, é estudada a
questão do sexismo e de como a mulher é vista na sociedade. Na terceira seção do
terceiro capítulo, é estudada a linguagem sexista.
O fechamento da investigação se dá no quarto capítulo, com a análise dos slogans
publicitários enunciados por revistas femininas, a partir do modelo griceano,
sistematizando as implicaturas conversacionais particularizadas. A metodologia
aplicada na análise é explicada na primeira seção do capítulo para a segunda seção ser a
análise em si.
A conclusão busca verificar se foram contempladas todas as hipóteses norteadoras
do trabalho.
1 SOBRE A SEMÂNTICA E A PRAGMÁTICA
Como foi visto na Introdução, a Semântica e a Pragmática são fundamentais para o
estudo do significado, seja no nível do dito, expresso, como no nível do implicado, do
não-dito. Pretende-se nesse capítulo contextualizar a Semântica, fazendo um breve
panorama de seu percurso histórico nos estudos sobre significado, chegando até à
necessidade do surgimento da Pragmática, como teoria lingüística,que se relaciona com
a semântica das condições de verdade, percebendo-se assim a importância da interface
entre as duas áreas, já que uma complementa a outra.
O slogan publicitário é o objeto de estudo deste trabalho, pois apresenta dois níveis
de linguagem: há uma semântica escolhida por quem faz a propaganda, que provoca
implicaturas específicas (que neste trabalho são as que apresentam marcas sexistas).
Essas implicaturas escapam à Semântica. A partir disso, entende-se a necessidade de
estudar a Pragmática, que se propõe a explicar o que vai além da linha do dito. É
importante lembrar que sem o dito não há implícitos, e sem implicaturas não há
comunicação eficiente, já que, por não sermos o tempo todo literais, sempre deixamos
algo nas entrelinhas e o ouvinte sabe disso, pois há um acordo tácito de comunicação
(GRICE,1975).
Assim, percebida a importância de estudar, embora de forma sucinta, sobre as duas
teorias, a primeira seção desse capítulo busca apresentar os fundamentos da teoria
semântica.
Na segunda seção, será mostrado o percurso histórico da Pragmática, ressaltando a
importância da Teoria das Implicaturas de Grice (1975), para na terceira seção, serem
verificadas as fronteiras entre as duas subteorias lingüísticas, destacando a importância
da interface. Citam-se assim autores como Bar-Hillel(1952), Carnap(1938),
Davidson(1967), Levinson(1983), Kempson(1980), Gazdar(1979), Morris(1938),
Sperber e Wilson(1986,1995), Campos(1984), Gedrat( 1993).
1.1 SOBRE A SEMÂNTICA
Conforme apontado anteriormente, a Semântica é chave para entender o processo
comunicacional entre os seres humanos, já que toda inferência surge a partir do dito, do
expresso, conforme defende Grice(1975). As implicaturas que existem numa
conversação humana envolvem uma semântica de condições de verdade. Uma frase já
conhecida pelos teóricos,mas ainda atual:estudar a significação da linguagem natural é
complicado. Muitos lingüistas, filósofos, psicólogos, tentam compreender como é o
funcionamento da língua, não somente como processo articulatório ou como processo
de interação social, mas como um mecanismo utilizado pelo ser humano e capaz de
expressar mil coisas ao dizer apenas uma. É aí que está o cerne da questão.
Grice (1967) assume que muito mais dito do que está expresso em um enunciado
(tomando aqui o enunciado como frase, oração, sentença, escrita ou proferida). Além de
Grice, outros estudiosos, como Sperber e Wilson (1986),Gazdar(1979), Levinson(1983)
e Costa(1984), se empenham em decifrar os caminhos que a linguagem percorre desde
seu proferimento, sua realização, até sua compreensão,sua recepção.
Como ponto de partida, é preciso entender primeiramente o que vem a ser
significado, lingüisticamente falando, a fim de compreender o dito e ir além deste.
O significado pode ser visto de diferentes ângulos, conforme a teoria que o recorta,
seja ela parte da ciência externa formal, seja parte da ciência externa cognitiva, seja
parte da ciência externa social. Ressalta-se aqui a divisão de ciência externa e interna
para a linguagem, estabelecida por Costa (informação verbal)
1
: ciência externa é
separada em Formal, Cognitiva e Social, enquanto que ciência interna é separada em
Fonologia, Morfologia, Sintaxe, Semântica, Pragmática. Esta parte do trabalho detém-se
na especificação das ciências externas e suas visões sobre o significado, visto ser isso o
relevante para o presente estudo, já que é o sentido-significado- o que se busca no dito e
até no não-dito. Aliás, o básico: entender o que é significado é fazer Semântica, já que
esta se define como uma subteoria que investiga as propriedades do significado.
1
COSTA,Jorge campos da. Comentário realizado em aula expositiva na disciplina de Fundamentos da
Semântica, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.Porto Alegre:2005.
Então, retomando o que Costa (2005) afirma, de que o tipo de lingüística que se
pratica depende da concepção que se assume de linguagem humana e a opção
metodológica em descrevê-la e explicá-la, retoma-se a idéia de que a Lingüística faz
interface externa com as ciências sociais, naturais ou formais e isso determina o
programa de investigação. Ou seja, a teoria semântica deve descrever e explicar as
propriedades do significado construídas de acordo com a opção metodológica assumida.
Começa então neste trabalho, a tentativa de explicar o significado pensando em
Semântica Cognitiva, Semântica Formal e Semântica Social.
Como Semântica Cognitiva, citamos Chomsky(1971) com sua teoria inatista que
tenta provar que a linguagem é inata ao ser humano e que todos os homens possuem
regras internas para a comunicação. A língua aqui é vista como um sistema de
princípios e parâmetros, onde há regras universais (princípios), com pequenas variações
lingüísticas (parâmetros). Essa teoria defende que o significado é organizado no
cérebro, estando relacionado com a cognição e seu processamento. O significado é
cognitivo. Por exemplo: “caderno” é a superfície lingüística de um conceito, que é
adquirido por meio de nossas manipulações sensoriais com o mundo. Tocando em
coisas que são cadernos formamos o conceito “caderno”. A forma deriva da
significação, pois é a partir da construção de significados que aprendemos.
Na Semântica Formal, há uma teoria lógica por trás. A lógica é uma teoria formal
que investiga o processo inferencial em que de premissas verdadeiras se chega,
necessariamente, a conclusões verdadeiras. A Lógica não tem conteúdo e sua linguagem
é artificial. A representação da linguagem natural pela linguagem lógica ocorre em nível
de simbolização e de demonstração, existindo a lógica proposicional que ocorre entre
proposições e dá conta da análise sintática externa e a lógica de predicados, que ocorre
dentro das proposições e dá conta da análise sintática interna. A preocupação não é
tanto com conteúdo. O significado é aqui estudado como um termo complexo que se
compõe de duas partes: o sentido e a referência. O sentido é o modo de apresentação do
objeto. Referência é o objeto no mundo real. O significado é abstrato, funcionando de
forma lógica- inferencial e está relacionado com as condições de verdade e a validade
dos argumentos. A idéia é que o conceito já existe independente de ser usado ou não. A
realidade está fora da realidade sensível a nós. Há várias árvores,por exemplo, mas a
arboricidade (abstrato) está em todas elas, pois é uma propriedade do nível extra-
sensorial,de acordo com essa teoria.
Para a Ciência Social e sua Semântica, o significado é uma entidade lingüística, é
uma realidade nominalista. A linguagem é feita para comunicação, nessa ciência. Não
se pode pensar em formas, porque não é o objeto de estudo. Para a Ciência Social, os
processos semânticos devem ser estudados para uma linguagem humana, como
fenômeno social, estrutural. Há um código social que é a língua e há as realizações
desse código.
Visto de forma sucinta as visões sobre o significado e as diferentes formas de
avaliar tal objeto, de acordo com a metodologia aplicada, segue-se,então, com um
panorama do percurso histórico da Lingüística como ciência e consequentemente da
Semântica como uma subteoria lingüística que estuda as propriedades do significado.
Saussure (1974) é considerado o pioneiro do estudo da Semântica como ciência. Ele
é um nome importante no percurso, pois busca desvendar o mistério que é a linguagem
humana de forma mais científica a fim de trazer precisão ao que se defende enquanto
teoria. Saussure cria a Lingüística Estrutural, chamada assim por se acreditar que
estrutura é o arranjo de um todo em partes. As categorias mentais, leis de pensamento
servem para refletir a organização e a distribuição das categorias lingüísticas.
Significação é levada em conta, pois é esse o real objetivo da comunicação humana:
dizer algo. Porém, o autor não desenvolve um estudo sobre o significado, apenas trata
da noção de signo ao apresentar a idéia de que o signo lingüístico tem duas faces, o
significante e o significado.
Bloomfield (1961), nos Estados Unidos, à mesma época de Sausure(1971), prefere
entender a Lingüística sob o prisma da Psicologia Behaviorista, Comportamental,
baseando-se em observações de comportamentos lingüísticos. Também apresenta
restrição quanto ao estudo do significado, visto deixar este de lado da teoria, ao
considerá-lo algo externo à forma lingüística. Bloomfield opta em deter-se na sintaxe.
De acordo com Costa (1984), as características mais marcantes do paradigma
estrutural da lingüística são: a escolha da língua como objeto de estudo (abstração
social), a utilização de método científico indutivo (a partir de dicotomias, sistematização
dos fatos lingüísticos), a finalidade de descrever a estrutura de línguas particulares e a
apresentação de teorias fortes como a Fonologia e a Morfologia, visando seus aspectos
formais. O grande problema continua sendo a dificuldade de trabalhar a relação sintática
(frase) com a semântica (significado). A Teoria Estrutural não dá conta das relações
sistemáticas entre frases, como no caso de ativa e passiva. Também não explica
fenômenos lingüísticos, como redundância, adição e tampouco distinguia frases
interrogativas de exclamativas, por exemplo. Ainda de acordo com esse autor, o
paradigma estrutural apresenta dificuldade em evitar frases anômalas, ou descrever
ambigüidade.
Eis que surge Chomsky(1971),com sua teoria revolucionária, tendo como maior
objetivo solucionar os problemas apresentados até então. Com seu paradigma gerativo-
transformacional, na década de cinqüenta, ele defende a idéia de que a linguagem é
inata, fenômeno biológico e, indo contra a teoria skinneriana, tenta explicar os
fenômenos da língua enquanto realizações de regras internas, conseqüentes de uma
Gramática Universal.
Entretanto, Chomsky explicita que as regras de sintaxe são de natureza diferente das
regras fonológicas e semânticas e opta em se dedicar à Sintaxe. A idéia de significado,
mesmo que já reconhecida, não é foco de atenção para Chomsky.
Segundo Costa (1984), o paradigma gerativo transformacional, parte da Ciência
Cognitiva, define como objeto de estudo a competência, ou seja, a capacidade humana,
inata de se comunicar, e a partir do método hipotético-dedutivo, seguindo teorias
matemáticas, formais, explicita as regras internas que um falante ideal usa para produzir
e compreender infinitas orações gramaticais, buscando propriedades universais nas
diferentes linguagens. Para Chomsky, a Sintaxe é gerativa e a Fonologia e a Semântica
são interpretativas. Como a primeira área é capaz de absorver toda formalidade e rigor
científico, acaba sendo destaque. O significado continua sendo problema e isso fragiliza
a teoria.
Chomsky, em 1972, tenta reajustar alguns de seus conceitos, afirmando que alguns
aspectos do significado são determinados pela estrutura superficial. Em meados de
1976, 1977, em outra revisão, agora denominada como teoria Padrão Ampliada,
Chomsky tenta novamente revisar o conceito de “Semântica”, admitindo que seu
modelo pudesse ir além da gramática da oração. Mesmo assim, o problema permanece.
A qualidade de Chomsky, portanto, é a elaboração de sua teoria sintática.
De acordo com Montague (1974), numa visão de Ciência Formal, a linguagem pode
ser vista e estudada como as linguagens artificiais da Lógica e da Matemática,
defendendo que não há uma diferença principal entre a linguagem formal e a natural.
Para Montague, Sintaxe e Semântica estão interligadas e é a Semântica que impõe
restrições à Sintaxe. Ele se utiliza do conceito de composicionalidade do matemático
Frege (1960, citado por Costa, 1984), aplicando-o no nível lexical e sintático. A idéia de
Frege é que o sentido da estrutura de um todo é uma função das estruturas das partes.
Assim, na visão formal, o significado depende da determinação da sintaxe para que seja
interpretado pela Semântica, sendo caracterizado por suas propriedades formais. Aqui, a
idéia é de que o significado tem relação direta com as condições de verdade, conceito
defendido por Tarski(1933, citado por Costa, 1984).
A grande vantagem dessa abordagem semântica é a capacidade formalista, o rigor
científico que possui. Por tal razão, este trabalho respeita muito a teoria formal de
significado. A posição adotada neste trabalho é a de que a teoria semântica se ocupa das
condições de verdade das sentenças, das que são provadas por meio de cálculos.
Nos anos 70, outras teorias surgem e cresce a interdisciplinaridade entre as áreas de
Lingüística, Sociologia e Filosofia, que tentam a todo custo definir o significado. Na
verdade, o problema está no fato de relacionar o significado global do enunciado com as
condições de verdade, pois estas não sustentam situações contextuais. O aspecto
comunicativo da linguagem ainda é o interesse dos estudiosos da Linguagem. Surge
então a Pragmática.
Vale lembrar que atualmente, há teorias que abordam uma semântica dinâmica,
teorias como a de Hans Kamp(1981), que busca analisar a partir de anáforas, relações
discursivas,o movimento, tentando defender a idéia de que o contexto cria o enunciado
e este cria o contexto,porém visto sob a óptica formalista. Enfim, os estudos sobre o
significado persistem até hoje.
Concluindo, percebemos nessa parte do trabalho que estudar Semântica é estudar as
propriedades do significado e sua noção varia de acordo com a área externa em que se
encontra.
A definição de significado dada pela Semântica Formal, que é considerada a melhor,
por sua precisão e objetividade , não contribui para o entendimento do significado em
situação contextual variável e por tal razão é justificável o surgimento da
Pragmática,como teoria do uso da linguagem. Vários estudiosos, de diferentes áreas
tentam, então, sistematizar a Pragmática. Tal panorama é tratado a seguir no trabalho.
1.2 SOBRE A PRAGMÁTICA
Conforme mostrado anteriormente, a Semântica estuda as propriedades do
significado. A Pragmática estuda a significação da linguagem natural usada no contexto
da comunicação. Nessa parte do trabalho, busca-se mostrar os fundamentos da
Pragmática, a partir de seu percurso histórico.
A fim de melhor entender o percurso da Pragmática, toma-se por base,
Dascal(1982),que reúne artigos diversos sobre o assunto, como o de Bar Hillel (1952),
Stalnaker(1982), Katz(1977) e Quine(1967). Além de Dascal(1982), também ressaltam-
se no trabalho Davis(1991), Levinson(1983)e outros nomes importantes como
Austin(1962),Searle(1969),Morris(1938),Carnap(1938),Grice(1957, 1975), Sperber e
Wilson(1986).
A denominação “Pragmática” vem do grego “pragma”, coisa,objeto e do verbo
“pracein”, que quer dizer “agir”, “fazer”. O termo é, segundo Dascal (1991), um rótulo
relacionado à Semiótica. Peirce (1839-1914) trata a Semiótica como qualquer processo
em que alguma coisa funciona como sinal para alguém. Seria a ciência dos sinais. A
relação peirciana semiótica básica envolve um sinal, uma designação e um intérprete.
Tal estudioso é quem cita a existência da Pragmática
Conforme explica Silveira
2
(2006) as teorias científicas para Peirce são conjuntos de
hipóteses cuja validade só pode ser determinada levando-se em conta sua eficácia e
sucesso, resultados, efeitos e conseqüências, ou seja, prática científica. A linha de
Peirce, portanto, faz parte de uma Filosofia da Ciência.
A partir da noção de semiótica de Peirce, Morris em 1938, trata a Ciência da
Linguagem como sendo dividida em Sintaxe (signos), Semântica (relação do signo e
designação) e Pragmática (signo e intérpretes). Rudolf Carnap em 1938 reformula a
idéia de Morris, definindo a Pragmática como o estudo da linguagem em relação aos
seus falantes, seus usuários. Ou seja, a Pragmática se vale do uso da língua, seus
usuários. Sendo estes desconsiderados e analisando apenas as expressões e designações,
o assunto já é Semântica. E, se não existe relação entre referente, interlocutores, tendo
apenas expressões por si mesmas, o ramo é da Sintaxe,que tem a ver mais com a
Lógica.
Em 1953, Wittgeinstein é destaque com sua obra “Investigações Filosóficas”,
porque busca mostrar o jogo da linguagem, o contexto como parte do significado
lingüístico. O filosofo cria o conceito “jogos da linguagem”, ressaltando a importância
do extralingüístico. De acordo com Gedrat (1993), Wittgeinstein mostra que o contexto
de uso de uma expressão determina seu significado em cada uma de suas ocorrências.
2
SILVEIRA,Jane Rita Caetano. Comentário realizado em aula expositiva na Pontifícia Universidade
dório Grande do Sul. Porto Alegre:2006.
Ao escrever seu artigo “Expressões Indiciais”, Bar Hillel em 1952 (in DASCAL,
1982) trata de avaliar o papel do contexto para a determinação da referência de uma
sentença. Ou seja, o contexto deve estar contido na sentença.
Um exemplo que Bar Hillel mostra é a diferença entre três frases
3
:
1 O gelo flutua sobre a água.
2 Está chovendo.
3 Estou com fome.
Percebe-se que apenas a primeira sentença pode ser entendida sem contexto, sem
elementos indiciais que remetam à significação a uma dependência de contexto. A
segunda frase é captada pelas pessoas que conhecem o lugar e o momento de sua
produção e a identificação da referência visada na sentença. A última frase exige o
conhecimento de seu produtor e do momento em que foi produzida, conforme analisa
Bar-Hillel.
O autor, assim, já mostra o cuidado de definir contexto como “descrições-de-
contexto”, a fim de ser considerado como entidade lingüística, formando assim par
ordenado junto com a sentença.
Grice em 1957 escreve o artigo “Meaning”, onde mostra, conforme aponta
Oliveira(2001), que é relevante estudar também as intenções no contexto da linguagem.
Nessa época, Grice defende a Pragmática como subteoria separada das outras, por
considerar o significado complexo de se estudar. Assim, com a Pragmática como
ciência, ocorreria uma sistematização e complementaria os estudos semânticos, no que
envolve o significado. Grice distingue, como dito anteriormente, o significado material
do significado não material, mostrando que há diferença entre os significados expressos
pelos usuários da língua, em determinadas ocasiões.
Essas observações são importantes para o percurso da Pragmática, influenciando
outros estudiosos, como Searle em 1969. Paul Grice perturba outros lógicos ao tratar o
uso da linguagem como um sistema de lógica perfeita, porém não-trivial. Ou seja, é
possível perceber o dito e o não dito, o significado que aparece no contexto da
comunicação e que foge das condições de verdade. E toda essa análise griceana é
ancorada num modelo objetivo, seguindo um raciocínio lógico dos usuários da língua.
3
BAR-HILLEL, Yehoshua. Expressões Indiciais. In:DASCAL,Marcelo. Fundamentos Metodológicos da
Linguistica.volume IV.Campinas: 1989.
Grice, diferente de outros formalistas, considera a comunicação natural perfeita
logicamente, sendo possível de estudá-la, de forma não trivial.
Austin com sua obra “How to do things with words”, em 1962, e sua Teoria de Atos
de Fala, tenta sistematizar pela primeira vez os fenômenos pragmáticos, indo além de
puras sugestões e propondo um modelo de abordagem. Austin argumenta que todo
proferimento envolve um aspecto locucionário,que seria o proferimento de uma
sentença com um certo sentido e referência, um aspecto ilocucionário,que seria a força
empregada no enunciado e um aspecto perlocucionário, que seria a intenção do locutor.
Searle, seguindo a linha de Austin, em 1969, com seu “Speech Acts” argumenta
que significado e ato ilocucionário não devem ser a mesma coisa, já que nem sempre é
possível diferenciar intenções do falante. Assim, ele reformula a tipologia dos atos de
fala, considerando os atos de proferimento( acústico,sonoro), os atos
proposicionais(referência que o locutor faz a um objeto e seu predicado), atos
ilocucionários( asserções,pedidos,ordens...)atos perlocucionários(efeitos,resultados dos
atos ilocucionários).
De acordo com Dascal(1982), Austin (1962) influencia a obra de Grice, de 1975, já
que este partindo das idéias dos atos de fala, formaliza a noção de “dito” e “implicado”,
lançando a Teoria das Implicaturas e o Princípio da Cooperação, com suas máximas de
conversação, e cria uma metodologia precisa de análise do uso da linguagem. Grice
mostra uma lógica não trivial na natureza da linguagem. Até hoje, ainda é uma teoria
respeitadíssima, por mostrar que há muito mais sentido naquilo que está dito a partir de
inferências calculáveis que o ouvinte faz.
Em 1979, Gazdar contribui de forma importante ao panorama da Pragmática como
teoria, ao defini-la como significado menos condições de verdade.
O que Gazdar tenta mostrar é que a semântica das condições de verdade não é a
única coisa que há num enunciado. Um exemplo disso são as frases “Júlia gosta de
Paula” e “Até Júlia gosta de Paula”, onde se percebe que as condições de verdade são as
mesmas em ambas, mas uma sentença vai mais além em seu sentido. Gazdar acredita
que é difícil trazer autonomia à Semântica, já que um mesmo enunciado pode trazer
proposições falsas ou verdadeiras de acordo com o contexto. Às vezes, uma entonação
pode mudar todo o sentido do que se diz, por exemplo. O importante de Gazdar é sua
ressalva de que a Semântica e a Pragmática precisam trabalhar conjuntamente na busca
pelo significado da linguagem natural. Assim como a Semântica não pode ser
autônoma, a Pragmática também precisa de sua base semântica, para ter outras
manifestações de sentido.
Em 1986, Sperber e Wilson definem a Pragmática como teoria da compreensão de
inferências, a partir da obra de Grice. Na verdade, os autores questionam o trabalho
desse último, apontando as seguintes questões: como saber qual a natureza do Princípio
de Cooperação e as máximas? Como saber se as regras, leis de conversação são
universais, inatas? Como definir que falante e ouvinte pensam a mesma coisa, a fim de
estabelecer compreensão(idéia de conhecimento mútuo)? São perguntas que servem
para lançar a teoria de Sperber e Wilson, intitulada “Teoria da Relevância”, que se
baseia no princípio griceano “Seja Relevante”, máxima não muito explorada por Grice.
O que Sperber e Wilson defendem é que há um princípio de ostensão e um processo
inferencial envolvidos na comunicação, ou seja, todo ato comunicativo é ostensivo e
inferencial. Não somente o falante e sua ostensão são estudados pelos autores, como
também a recepção do ouvinte, o processo inferencial, o cálculo não-trivial e não-
demonstrativo. A Teoria da Relevância, de abordagem pragmático-cognitiva, tem como
idéia que o conceito de Relevância seja proposto como uma espécie de máxima geral e
única, na qual uma inferência dedutiva pode ser calculada a partir da relação entre um
enunciado e um contexto. De acordo com esses autores, os indivíduos prestam atenção
apenas ao que os interessa, que pareça relevante.
Outro ponto de mérito de Sperber e Wilson é a revisão sobre os termos
“conhecimento mútuo” e “contexto”. O primeiro, para os autores, não existe, já que se
isso realmente fosse fato, se o falante e o ouvinte conhecessem a mesma coisa, não
precisaria ter comunicação. “Contexto” para Sperber e Wilson é complicado definir,
então eles optam em tratá-lo como uma representação mental.
Em última análise, pode-se afirmar que a Pragmática ainda apresenta variadas
definições. Visto que a Semântica é uma disciplina que estuda o significado estável, a
Pragmática é, então, responsável pelos outros aspectos que o compõem e nesta parte do
trabalho tratamos dos fundamentos de tal teoria, observando que esta faz parte da
Ciência da Linguagem, preocupando-se em estudar o significado que está além do dito e
tentando resolver questões de significação que a Semântica não consegue dar conta.
Percebe-se, além da importância de Grice com sua definição de dito e não dito e
implícitos, bem como a importância de Sperber e Wilson no percurso histórico, já que
encaixam em sua teoria mais uma área além da Semântica e da Pragmática: a Ciência
Cognitiva. Há uma interface entre essas teorias muito interessante de ser verificada, mas
que não é foco do trabalho. Falando em interface, já se percebe sua importância: a
Pragmática só existe, pois existe a Semântica, e a Semântica é afinada com a
Pragmática. Portanto, é fundamental observarmos a relevância da interface entre
Semântica e Pragmática, assunto abordado na próxima seção.
1.3 SOBRE A INTERFACE SEMÂNTICA / PRAGMÁTICA
Conforme apontado anteriormente, a interface entre Semântica e Pragmática é de
fundamental importância, pois uma área complementa a outra. O debate sobre os limites
entre as duas teorias depende da visão metodológica adotada. Há quem exclua a
Pragmática nos estudos do significado e há aqueles que acreditam que o significado está
no discurso e depende de fatores extralingüísticos para sua determinação.
Entretanto, a visão adotada neste trabalho, já evidenciada, é a de uma interface entre
as duas teorias.
Levinson, em 1983, ordena vários estudos pragmáticos e tenta analisar um a um, a
fim de clarear o conceito “Pragmática” e relacioná-lo com o conceito “Semântica”.
Primeiramente, ele tenta relacionar o conceito de “Pragmática” à teoria de
Chomsky(1971), sobre competência e performance, sendo a Pragmática o estudo dessa
última. Assim, o autor, aproveitando o que Gazdar(1979) define como Pragmática
(estudo do significado que não pode ser tratado de forma rigorosa e lógica pelas
condições de verdade), define o tópico como o estudo dos aspectos do significado dos
quais uma teoria semântica não dá conta.
Para Levinson (1983), a Pragmática deve se aliar á Semântica como uma camada de
significado instável, dependente de contexto, sobre o significado fixo pela Semântica. O
escopo da Pragmática deve incluir a ironia, a metáfora e o implícito, e não apenas o
significado convencional das sentenças.
Comunicado é diferente de dito. Este último tem relação com o expresso, o primeiro
tem relação com a intenção do falante de que o ouvinte reconheça o que se pretende
dizer, criando assim um conhecimento mútuo entre os dois. O primeiro é o objeto da
Pragmática e só existe por que há o dito, que é objeto de estudo da Semântica.
O problema de separar Pragmática e Semântica como foi feito anteriormente está
justamente no fato de que em algumas situações o significado convencional pode ser o
mesmo do que o pretendido pelo falante e assim não se pode afirmar que a Pragmática
trata do resíduo da semântica. Outro problema é o de que há casos em que elementos
convencionais da linguagem não entram nas condições de verdade das sentenças, como
ocorre com o uso de “mas”, que pode ser pela lógica das condições- de- verdade,
substituído por “e”. Assim, tal significado não seria tratado de forma adequada pela
Semântica.
A definição de Pragmática como estudo das relações entre contexto e linguagem
também apresenta problema, já que é complicado definir contexto.
Outra definição que Levinson explora é a de que Pragmática é o estudo do uso
apropriado das sentenças (Austin e Searle, 1962,1969, respectivamente).A Semântica
explica as condições de verdade da sentença, mas de acordo com essa idéia, a
Pragmática estabelece as condições de uso apropriado nas mesmas
circunstâncias,predizendo para cada sentença bem formada,numa leitura semântica
particular, o conjunto de contextos no qual ela seria apropriada. Isso é inviável, já que
não há como englobar todos possíveis casos. Inclusive, há situações em que a violação,
a má formação da sentença é proposital por parte do falante. É nisso que Grice(1975)
trabalha, já que são esses casos que geram as implicaturas.
Sobre a idéia de Sperber e Wilson(1986), de que a Pragmática envolve ostensão
também, Levinson(1983) aponta como não satisfatória.Tratar a Pragmática como o
estudo da dêixis,das pressuposições,atos de fala, indica os tópicos centrais da
Pragmática mas não prevê a inclusão ou exclusão de outros fenômenos da linguagem.
Levinson prioriza o questionamento sobre qual seria o input ou output da
Pragmática. Conforme aponta Gedrat(1993), Gazdar(1979) sugere que o domínio da
Pragmática sejam as sentenças emparelhadas com o contexto anterior ao seu enunciado
e o contra-domínio, um segundo contexto causado pelo enunciado das sentenças. Ou
seja, a Pragmática envolve o significado menos a Semântica, o contexto complementa a
contribuição da Semântica para o significado.
Gazdar(1979) não acha que a Semântica seja autônoma à Pragmática, já que muitas
vezes é preciso informação contextual para identificar as condições de verdade das
sentenças,como numa inversão da ordem dos fatos,onde o significado muda.
Barreto (2002) fornece detalhes da obra de Levinson(2000), onde a interface é
efetivamente discutida e uma nova perspectiva de relação entre as teorias do significado
é apresentada. Assim, é importante retomar as idéias de Levinson.
Segundo Barreto, o autor apresenta como visão tradicional de interface entre
Semântica e Pragmática a de que a primeira serve de input para a segunda teoria. Nessa
visão, Semântica fornece significados gerais que a Pragmática deveria posteriormente
restringir, sendo assim, uma visão de Pragmática Pós- Semântica. O fato de não aceitar
um idéia de Pragmática Pré- Semântica, apontada por Ivan Sag, seria uma Semântica
Pós-Pragmática. Assim, o exemplo “ter um filho e casar é pior do que casar e ter um
filho” seria computado pela Semântica, sem interferência pragmática, como uma
contradição. A Semântica interpretaria esse enunciado como uma contradição porque a
noção de temporalidade do “e” não é interpretada. A Pragmática já rejeita esse resultado
através da implicatura generalizada “e então”, que surge pela competência do usuário ao
interpretar que nesse enunciado é importante a ordem dos fatos. Logo, seria necessário,
segundo afirma Barreto, computar o significado do todo, alterando os dois argumentos
do predicado “é pior que”, através de um segundo componente semântico, mas que,
diferentemente do primeiro, aceitaria input pragmático.
Esta proposta não é boa, pois prediz intuições de verdade e falsidade erradas, e não é
econômica de acordo com Levinson (apud BARRETO,2002), pois dobra o
processamento semântico.
Robyn Carston(2004) aponta o problema do conetivo “e” para abordar a questão da
explicatura. Se é dito por exemplo: “Ana estava no quarto e estava vendo televisão”, ou
“Maria foi ofendida e saiu de casa”, ou “Paula é tenista e Laura é nadadora”, é
percebido claramente que há diferença pragmática entre os significados do conetivo “e”.
No primeiro há uma idéia de simultaneidade, no segundo de relação casual e no último é
apenas um conetivo lógico. Para a autora, esses casos não constituem ambigüidade
lexical, mas a forma como a informação é organizada na mente, já que mesmo sem o
conetivo “e”, a idéia permaneceria a mesma.
Carston entra então na outra proposta de Levinson, apresentada por Barreto, que é a
chamada Pragmática Pré-Semântica Restrita, que permite a interferência pragmática,
mas de forma limitada, envolvendo somente os fatores pragmáticos necessários para
desenvolver a forma lógica. Tal posição além de ser adotada por Carston, é também
seguida por Sperber e Wilson(1986) e Kempson(1986),que fazem distinção entre
implicatura e explicatura. Esta última serve para desenvolver a forma lógica,
enriquecendo-a com o mínimo necessário para que a representação semântica possa ter
uma forma proposicional completa. A explicatura é o input da implicatura.
Carston, em seu artigo Explicature and Semantics, de 1999, publicado em sua
página pessoal virtual( acessada em 2006) explica que a visão da Semântica da
linguagem natural é que uma sentença tem uma estrutura lógica e é marcada por seu
conteúdo veritativo, com base em suas estruturas. Assim, a Semântica captura as
propriedades lógicas das sentenças, incluindo a noção de verdade, a contradição, a
inferência válida. O conhecimento dessas propriedades é parte da competência
semântica de cada falante, conforme já citado. Como exemplo disso, são citadas as
frases seguintes:
1 (a) Se está chovendo não podemos jogar futebol.
(b) Está chovendo.
(c) Não podemos jogar futebol.
Ou:
2 (a) Se João parou seu carro numa posição ilegal e Cláudio bateu nele, então João é
responsável pelos danos.
(b) Cláudio bateu no carro de João e João parou seu carro numa posição ilegal.
(c) João é responsável pelos danos.
Percebe-se, observando as frases que o primeiro exemplo mostra um argumento
válido e o segundo parece inválido. Porém, a validade do primeiro, de acordo com
Carston,depende dos requerimentos que não estão expostos na sentença usada: o tempo
e o espaço da chuva mencionados em (b) é o mesmo que mencionado em (c) . Se a
conversa fosse através de um telefonema entre duas pessoas de lugares diferentes, uma
falando da Austrália e outra falando do Brasil, a partir das premissas apontadas, não se
chega em (c), apesar de se acreditar nas premissas (a) e (b). O mesmo ocorre com a
validade do segundo exemplo, já que é preciso ter uma relação casual entre os dois
eventos e essa relação não é exposta na sentença.
Carston mostra então que o julgamento de validade de uma sentença depende mais
do conteúdo léxico do que da estrutura sintática, ou seja, mais do significado do sistema
lingüístico, o conteúdo não é o do código lingüístico, mas o de outro processo capaz de
pegar o contexto extralingüístico.
A proposição expressa no primeiro exemplo, em (b), num contexto particular pode
significar o mesmo que:
“Está chovendo na Austrália, num tempo x.”
E a expressão usada no segundo exemplo, em (b) pode significar o mesmo que:
“[Cláudio bateu em João, no tempo x] p e [como resultado de p, João parou no
tempo x+1 numa posição ilegal]”.
De acordo com Carston, a idéia é a de que há indexadores escondidos na forma
lógica das sentenças. Há um elemento não realizado, marcando o lugar, ou o tempo, por
exemplo. Numa Semântica Formal se pensa em índice contextual, mas numa Semântica
mais psicologicamente orientada se aceita que há um processo de inferência pragmática
que encontra esse elemento escondido no contexto.
De acordo com Carston, a Semântica é livre de contexto e invariável e a Pragmática
é o significado do falante que envolve o contexto. Entra aí a sua defesa, já apontada
antes, do termo “explicatura”: é uma assumpção comunicada por um enunciado e tem
uma forma pragmática desenvolvida fora da forma lógica do enunciado. Há uma
diferença entre o dito e explicatura. O primeiro é invariável de contexto e é suprido sem
a intenção do falante ou intervenções de princípios pragmáticos, diferente do segundo,
que envolve um componente do significado pragmaticamente derivado, junto com o
linguisticamente codificado. A explicatura, conforme foi dito anteriormente, envolve
um enriquecimento, incorporando material conceitual (pragmático). Os seus
constituintes conceituais podem ser diferentes dos conceitos apresentados no lexical, na
forma lógica da sentença.
Levinson (apud BARRETO, 2002) se posicionou contrário aos que adotam a noção
de explicatura, porque esta noção faz um enriquecimento mínimo para ter condição de
verdade e seria necessário um enriquecimento maior que fosse suficiente para que se
tivesse uma especificidade informacional. Para Levinson, mudar o nome para
implicatura ou explicatura não muda a questão de que há uma intrusão pragmática no
conteúdo semântico, que é o que promete a interface entre Semântica e Pragmática.
Barreto ainda cita que Levinson considera as inferências pragmáticas necessárias
para o estabelecimento da condições de verdade no módulo de interpretação semântica.
O processamento semântico pode se dar até certo ponto, até surgir a Pragmática,que
auxilia na determinação das condições de verdade para a Semântica então seguir. O
argumento de Levinson, segundo Barreto, e já apresentado aqui,é que Grice trata os
implícitos dependentes da determinação do dito. O dito por sua vez depende dos
referidos processos lingüísticos (desambiguação, por exemplo). Mas tais processos
dependem de processos inferenciais que se igualam às implicaturas. Assim, o que é dito
parece tanto determinar como ser determinado pela implicatura.
Finalizando, Davis (1991) argumenta que a Pragmática pode ser vista como parte da
teoria da competência, por ser parte de uma teoria psicológica que explica o que é
conhecido tacitamente pelos falantes e que possibilita que utilizem e compreendam
sentenças de sua língua. Pelo conhecimento inato que se tem quanto às estruturas
sintáticas da língua, sabe-se dizer quando uma sentença não é bem formada. Essa
definição tem a vantagem de definir a Pragmática como um componente integrante da
Lingüística, articulando Semântica e Sintaxe Gerativa, de forma que a Pragmática não
se limita a dar conta dos restos da Semântica, mas há um domínio de fenômenos cujo
tratamento está em seu escopo, como afirma Portanova(1997).
Oliveira(2001) defende a idéia de Davis por achá-la consistente e por argumentar
que a Semântica deve dar conta das condições de satisfação das sentenças, inclusive
com relação a contextos particulares, quando afetarem as condições de verdade das
sentenças. Quando elementos contextuais afetarem as condições veritativas das mesmas,
a teoria de satisfação deve especificar a intenção do falante. Uma teoria pragmática tem
como domínio as intenções comunicativas do falante, os usos da linguagem que exigem
tais intenções e as estratégias usadas pelo ouvinte para calcular as intenções do falante e
compreenderem o que ele está dizendo.
Falando em interface não se pode deixar de lado a DRT (Discourse Representational
Theory), que trata os enunciados como fatores contextuais também. Hans Kamp (1981)
mostra que a informação pragmática interfere na representação semântica e em sua
interpretação. O contexto é trazido para dentro da semântica das condições de verdade e
com rigor formal. A DRS, que é a representação semântica discursiva é derivada de
algoritmos de input sintático, mas também incorpora a Pragmática. Há uma semântica
mais dinâmica.
Nos dias de hoje o debate em torno da definição e delimitação de estudo do campo
da Pragmática ainda é corrente. Áreas como a Semântica Computacional também
entram nessa relação de significação e uso, por exemplo. Assim, a discussão entre os
limites da Semântica e da Pragmática perdura até hoje.
Então, neste capítulo foram tratados os aspectos principais da Semântica e da
Pragmática, percebendo que a primeira área estuda as condições de verdade, o
significado estável e a segunda, a significação em contexto. Foi observado que é
importante a interface entre as duas teorias,já que a teoria semântica não dá conta de
toda a significação possível de um enunciado e a teoria pragmática precisa de uma base
semântica para conseguir desvendar os diversos sentidos de um enunciado. A posição
de Davis sobre a interface entre a Semântica e a Pragmática é válida.
A interface entre as duas áreas é presenciada na comunicação humana em todo
momento. Um slogan publicitário, por exemplo, apresenta o dito, o explícito, sua base
semântica, e carrega todos os implícitos, os não ditos, os sentidos diversos possíveis de
serem interpretados.
Para Levinson(1983), assim como a Fonologia não é autônoma à Sintaxe, a
Semântica não pode ser autônoma da Pragmática,pois precisa de seu input. Grice se
inclui nessa visão, onde a Semântica fornece significados gerais e a Pragmática os
restringe.
Paul Grice foi base para o estudo de diversos autores, que ampliam o seu modelo de
comunicação, mas nunca deixam de reconhecê-lo como peça chave para a
sistematização da Pragmática como ciência metodológica,possível de aplicação. Ao
explicar que implicaturas são proposições que estão implicadas pelo enunciado de uma
sentença em um dado contexto, mesmo que tal proposição esteja fora do dito, o autor
constrói uma teoria comunicacional inovadora. Por tal razão, Grice é escolhido como
foco do trabalho e no capítulo seguinte é tratado então sobre sua teoria e sua proposta
de criar um método de análise de conversação que envolve implicaturas e cálculos
inferenciais.
2 A TEORIA DAS IMPLICATURAS DE PAUL GRICE
No capítulo anterior, é percebido que a Semântica e a Pragmática são áreas
diferentes, mas complementares. Enquanto uma estuda as condições de verdade, o dito,
a outra trata do não dito, do significado em contexto, das inferências. Conforme
apontado anteriormente, Grice(1975) se destaca na história da Lingüística, por
apresentar uma teoria de comunicação inovadora. O autor defende a idéia de que há
muito mais dito do que o que está expresso, e a defesa é consistente, com cálculos
precisos, o que o aproxima dos formalistas, apesar de tratar de um tema mais próximo
dos informalistas. Esse contexto é importante destacar e nesse capítulo isso é feito.
Contextualizando o autor a sua época na primeira seção do capítulo, segue-se na
segunda seção com sua Teoria das Implicaturas, que mostra o modelo de comunicação
inferencial. Obviamente, como todo bom teórico, suas idéias ecoam e muitos autores
exploram o estudo da Teoria das Implicaturas, apontando novas observações, ampliando
assim o modelo. Os desdobramentos da Teoria das Implicaturas de Grice é o tema da
terceira seção deste capítulo.
Destacam-se aqui, além de autores como Gazdar(1979) e Costa(1984), os autores
Sperber e Wilson(1984),que apresentam um modelo cognitivo inferencial de
comunicação, a partir de observações,de críticas ao modelo griceano. Segue-se então.
2.1 CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO
Como foi apontado anteriormente, Paul Grice(1975) desenvolve seu trabalho em
uma época onde quase todos estudiosos estão preocupados em descobrir o significado
comunicacional da linguagem natural. O teórico busca explicar o significado das
palavras, separando-o em convencional e não- convencional, de forma precisa, tentando
provar que muitas vezes o que é dito não é o mesmo do que se quis dizer,ou seja,a
relação entre Semântica e Pragmática é apontada por Grice como estreita. Por tal razão,
é importante nessa seção contextualizar o autor com sua época.
O debate citado anteriormente proposto por Grice divide, na época, opiniões. De um
lado, os formalistas, estudiosos que entendiam a linguagem como algo lógico, formal,
acreditando que a linguagem não poderia ser analisada para fins comunicacionais, mas
servir às necessidades da ciência. Do outro lado, os informalistas, que não queriam
deixar a linguagem num lugar estanque, já que servia para muito mais coisas. Esses
apoiaram mais Grice do que os primeiros teóricos, embora o autor tente usar da lógica
para provar sua teoria de comunicação, destruindo a fronteira entre a Lógica e a
linguagem natural e fazendo da primeira um recurso para se estudar a segunda. Aliás,
Grice não ousa criar uma nova lógica para a linguagem natural, visto que considera
importante os estudos da Lógica Clássica.
Para Grice (1957), o significado das palavras é aquilo que o falante quer significar.
Para o autor, o que as palavras significam é uma questão do que as pessoas significam
com elas. O estudioso não avalia a ampliação do contexto para explicar a variação do
significado, pois de acordo com ele, há uma regularidade de uso e intenção. As
variações ocorrem sobre um modelo standard.
Em Meaning (1957, citado por OLIVEIRA, 2001), Grice distingue o significado
natural (significado n) de significado não- natural(significado- nn), sendo o primeiro o
que está dito e o segundo a intenção sobre o que foi dito. É o primeiro momento em que
aparece a idéia de “implicatura”, pois se mostra que a comunicação não envolve
somente codificação e decodificação, e o significado extrapola o que está posto. O
objetivo de Grice é descrever como esse processo ocorre, como um ouvinte entende o
que foi dito e o que não foi dito. Assim, Grice supõe uma regra interna do falante e do
ouvinte que possibilita esse entendimento. Com isso, o autor resolve se dedicar ao
estudo do significado –nn, denominando o que não é dito como implicado. Grice cria
então o novo modelo de comunicação, não mais de códigos, de codificação e
decodificação, mas do que é dito e do que não é dito, do é implicado. O teórico escreve
seu famoso artigo Logic and Conversation (1967), nas conferências feitas em
homenagem a William James, na Universidade de Harward. Surge a Teoria das
Implicaturas, que é o assunto da próxima seção do capítulo.
2.2 A TEORIA DAS IMPLICATURAS (TI)
Como foi citado anteriormente, Grice começa seu estudo na área da significação da
linguagem natural em 1957 com seu artigo ”Meaning”. Com o artigo “Logic and
Conversation”, de 1967(publicado em 1975), Grice revoluciona os estudos pragmáticos,
em relação à sistematização e ao cunho metodológico desenvolvido para analisar uma
conversação. O que se descobre é que há muito mais sentido do que pensamos que há
no dito. Grice desenvolve uma teoria para mostrar como um enunciado pode significar
mais do que o dito e como os usuários conseguem captar esses diferentes sentidos. Para
o autor, deve haver uma regra interna dos falantes que permite esse entendimento.
O exemplo clássico é do diálogo entre (A) e (B) sobre (C)
4
:
(A) - Como está Fulano no seu emprego novo?
(B) - Oh, muito bem,ele gosta de seus colegas e ainda não foi preso.
Para Grice, duas formas de significação distintas nesse diálogo:o que é dito e o
que é implicado (poderia (C) ter sido preso). A partir daí, ele sugere o conceito de
implicitar (implicate), implicatura (implicature) e implicado (implicatum). O dito seria o
convencional e o implicado é o foco de seu estudo. A noção de “dito” aqui é referente à
expressão usada, ao enunciado em termos literais, ou seja, a proposição com seu valor
semântico.
O modelo da Teoria das Implicaturas é composto por quatro categorias, que são
constituídas de máximas conversacionais e formam o “Principio da Cooperação”.
De acordo com Grice,quando dois indivíduos dialogam, há leis que governam esse
ato comunicativo, que cooperam com a fluência. A esse conjunto de regras observadas
pelos falantes, Grice dá o nome de “Principio de Cooperação”. Esse princípio consiste
4
GRICE, Paul. Lógica e Conversação. In: DASCAL,Marcelo (org.)Fundamentos metodológicos da
Lingüística.Volume 4. Campinas, Unicamp,1982.
nas normas que norteiam a conversação e que se referem à comunicação racional, na
qual os participantes reconhecem propósitos comuns:
Principio da Cooperação: Faça sua contribuição conversacional tal como é requerida
no momento em que ocorre, pelo propósito ou direção do intercâmbio conversacional
em que você está engajado.
As regras que regem o ato comunicativo fazem parte do ser humano.
O Princípio da Cooperação possui quatro categorias com máximas e submáximas:
1- Categoria de Quantidade
Tem relação com a quantidade de informação a ser fornecida numa mensagem:
Primeira máxima: Faça sua contribuição tão informativa quanto é requerido para o
propósito da conversação;
Segunda máxima: Não faça sua contribuição mais informativa do que o exigido para
o propósito da conversação.
Resumindo: diga somente o necessário, nem mais e nem menos.
Essa máxima explica a mensagem dita, mas não trata o significado que está além, de
acordo com Barreto(2002), pois, conforme Grice, o respeito às máximas produz o dito.
2- Categoria de Qualidade
A informação deve ser assumida como verdadeira.
Primeira máxima: Não diga o que você acredita ser falso;
Segunda máxima: Não diga senão aquilo que você pode fornecer evidência
adequada.
3- Categoria de Relação
A informação deve ser relevante.
Primeira máxima: Seja relevante.
4- Categoria de Modo
Ligada à idéia de “seja claro”.
Primeira máxima: Evite obscuridade de expressão;
Segunda máxima: Evite ambigüidade;
Terceira máxima: Seja breve;
Quarta máxima: Seja ordenado.
De acordo com Levinson (1983), as máximas especificam o que devem fazer os
participantes para conversar de modo mais eficiente, racional e cooperativo; devem falar
sincera, pertinente e claramente, ao tempo que transmitem informações suficientes.
Para Grice(1975), as outras regras, como a polidez, não são tão necessárias de serem
abordadas.
Se alguma dessas máximas não for seguida, é porque, de acordo com Grice, há
alguma razão para tal.
A violação, a quebra das máximas, serve para implicar algo. “Implicatura”, como já
foi mostrado anteriormente, é um termo geral que serve para diferenciar o dito do
implicado. O dito tem relação com o significado convencional das palavras e o
implicado permite ao falante demonstrar sua intenção de comunicar um significado
diferente do que se diz literalmente. Aqui entram as inferências pragmáticas.
É importante antes de abordar as quebras das máximas, ressaltar que Grice classifica
as implicaturas de acordo com seu conteúdo comunicado nas sentenças. Há dois tipos: a
implicatura convencional e a implicatura conversacional. A convencional é aquela
marcada no dito, estando presa ao significado convencional das palavras O uso de “até”,
“mas”, por exemplo, já implica algo. É na palavra que está carregado o implicado. A
implicatura conversacional é subdividida em particularizada e generalizada, onde esta
não depende de um contexto especial para ser desencadeada, o que pode se confundir
com a particularizada. Por exemplo:
(A) - Você falou com Claudia?
(B) - Eu falei com João.
Ao ouvir a resposta de (B), (A) acredita que ele esteja cooperando, portanto se deu
menos informação é porque implicou que não ligou pra Claudia.
As implicaturas generalizadas podem ser comunicadas em conceitos de escalas, as
chamadas implicaturas escalares.
Exemplo:
“Já li algumas páginas do livro.”
Independente do contexto, sabe-se que “não li todas as páginas” (não esquecendo
que pode ser cancelado: “li algumas páginas, na verdade todas”).
A implicatura conversacional particularizada exige o contexto, pois não decorre da
significação usual e sim de certos princípios básicos do ato comunicativo. Ela surge a
partir das máximas e suas quebras, violações. É graças às implicaturas particularizadas
que se entendem as ironias e a ambigüidade, por exemplo.
É preciso lembrar, entretanto, que essa violação não prejudica o Princípio
Cooperativo dos usuários da língua, pois geralmente ela ocorre para que o ouvinte tire
suas conclusões conforme o contexto conversacional.
Sobre a violação das máximas, é possível elaborar uma síntese, baseada na leitura de
Grice:
1- Uma máxima não é violada sem razão aparente:
(A) - Mãe! Posso sair hoje?
(B) - Você não arrumou a casa.
Percebe-se aqui uma violação da máxima de relação, ou seja, o que se esperava aqui
era uma resposta de sim ou não, que não foi dada, mas (B) entende (A), inferindo que a
resposta foi não.
2- Uma máxima só é violada para que outra não o seja:
(A) - Onde fica o posto de gasolina?
(B) - Em alguma esquina desse bairro.
É claro que (B) não foi tão informativo quanto (A) esperaria, mas este entende
perfeitamente o que (B) quis dizer, inferindo que ele também não sabe onde tem, senão
teria dado a resposta de forma precisa. O que (B) fez foi não violar a máxima de
qualidade, ou seja, falou somente o que tem evidências para mostrar.
3- Violação da máxima para gerar implicatura conversacional:
Aqui o falante quebra com a intenção de dizer algo. As figuras de linguagem, como
lembra Costa(1984), estão presentes nesses contexto. Tais quebras podem ser por:
I - Abandono da máxima de quantidade:
(A) - O que você pensa de Carla?
(B) - Cada um é cada um.
No exemplo citado, há uma falta de informação precisa, gerando uma tautologia que
pela lógica não teria tanto sentido como tem no contexto conversacional, ou seja, aqui
(B) ao faltar com informação e dizer uma tautologia, quis na verdade implicar que se
precisa respeitar a individualidade de cada um e não vai opinar sobre Carla, por
exemplo.
O contrário também pode ocorrer, pelo excesso de informação:
(A) - Como é seu marido?
(B) - Ah, João é loiro, olhos azuis, alto, musculoso, tem um iate, um apartamento
em Torres, outro em Gramado, adora estudar, é super inteligente, cozinha, limpa a casa,
me ajuda a cuidar das crianças.
No exemplo mostrado se percebe o excesso de informação, mas fica claro que (B)
quis implicar com isso que seu marido é perfeito, quanto mais informação prestava à
(A), mais tornava seu marido especial.
II - Abandono da máxima de qualidade:
(B) afirma algo que não é verdade ou que não pode evidenciar, mas com propósito
de implicar outra coisa. A ironia é um exemplo clássico para isso, assim como a
metáfora.
(A) - Você não quis alugar uma casa na praia?
(B) - Não, adoro sentir calor de mais de 41 graus aqui nessa cidade abafada que não
oferece nada no verão.
Sabe-se por inferências retiradas do contexto, que não é verdade o que (B) disse. A
ironia serve para afirmar o contrário do que se disse. Aqui, por exemplo, poderia se
pensar que (B) não tem dinheiro para alugar uma casa, ou não pôde alugar por alguma
razão, mas que não é o fato de sentir prazer com o calor, visto isso ser quase que
impossível no contexto.
Outro exemplo:
(A) - Viu como Laura sai com vários rapazes?
(B) - Sim, ela é um bonito sabonete.
Sabe-se obviamente que Laura não seria um sabonete de verdade e que (B) pela falta
de evidência do que afirma, usa essa figura de linguagem com o objetivo de implicar
algo, no caso que como um sabonete, ela passa de mão em mão (expressão popular).
III - Abandono da máxima de modo
Esse abandono pode ser feito de diferentes jeitos, pois envolve a questão: seja claro.
Assim, quebra-se esse modo das seguintes formas:
Ambigüidade:
“Hum,que bom esse seu personal trainner,hein...”
A expressão “bom” pode implicar diferentes significações, pois na Língua
Portuguesa tem relação com o fato de ser bonito também, atraente. Há uma segunda
intenção.
Falta de concisão:
(A) - O que é monócito?
(B) - Dicionário Aurélio,pagina 156, quarta linha, segunda coluna.
O detalhamento serve apenas para mostrar que (B) sabe onde se encontra a resposta.
Também pode ser vista sob o aspecto da ironia. Ao faltar com concisão quer
implicar que (A) precisa estudar mais, por exemplo.
Falta de ordem:
(A) - Que filme está passando na tevê?
(B) - Hasta la vista Baby!
A forma da sentença gera a implicatura, pois (B) pressupõe que (A) ao ouvir essa
frase a associe com o filme “Exterminador do Futuro”, de onde a frase é dita pela
personagem principal.
Não se deve esquecer da importância de Grice por conseguir sistematizar pela
primeira vez os fenômenos lingüísticos de explicação pragmática. Ele consegue
simplificar e colocar de forma estruturada as descrições de uso da linguagem natural.
Percebe se então que a implicatura convencional conversacional depende de um
calculo dedutivo e a pode ser calculável ou dedutível, cancelável, não-separável,
indeterminável, externa ao sentido do enunciado (não-convencional) não- determinadas
pelo dito, mas pelo dizer o dito. Analisamos essas características mais a fundo:
Calculáveis:
Mesmo que o ouvinte consiga entender intuitivamente o que se disse, é preciso
pensar no seguinte cálculo:
(A) - Estou com fome.
(B) - Há uma pizzaria nesta rua.
(A) acredita que (B) está respeitando o Princípio de Cooperação e, então, calcula: se
(B) disse que há uma pizzaria nesta rua ao ouvir minha frase, então (B) quis implicar
que: devo ir à pizzaria; a pizzaria está aberta; lá tem o que comer; eu posso ir lá comer e
acabar com minha fome.
Este cálculo é necessário na teoria de Grice para localizar uma implicatura
conversacional.
Isso serve para mostrar que não se trata de um significado convencional.
Canceláveis
As implicaturas são canceláveis. Pode-se dizer uma coisa, logo acrescentar idéias ou
retirar. Há uma diferença entre acarretamento e implicatura. O primeiro não pode ser
cancelado, já o segundo pode. Por exemplo:
“Ganhei um par de tênis de aniversário, senão dois” – cancelou-se a idéia de um par
apenas.
Não-separáveis
Precisa-se de um conhecimento contextual, onde nesse se uma expressão for
substituída, precisa ser por outra sinônima. Por exemplo, pode-se dizer: “minha perna
dói” ou “estou com dor na perna”.
Indetermináveis
Um enunciado pode ter diferentes implicaturas, de acordo com o contexto.
“Ele é uma fera!” - pode ser de bravo, de feio, de muito bom,etc.
Essa característica da implicatura serve como um recurso muito usado em slogans
publicitários, pois se escapa da responsabilidade do que disse, podendo inverter o
sentido. Ao permitir várias interpretações com poucas palavras, o slogan passa adiante
do dito, gerando implicaturas diversas.
Não-convencionais
Para diferenciar das implicaturas convencionais, as conversacionais não podem ter
no significado das palavras do enunciado a implicatura. O exemplo é:
(A) - O que tu achas de estudar política?
(B) - Tão simples como estudar a Teoria da Origem do Universo.
A resposta de (B) parece irrelevante, mas apenas quer mostrar a dificuldade de
estudar a política, comparando-a com uma teoria mais difícil.
Não- veiculadas pelo dito
Somente as condições de verdade não bastam para determinar as implicaturas, tanto
que a sentença pode ser verdadeira e a implicatura de seu enunciado falsa.
(A) - Ele é acusado de corrupção.
(B) - São críticas da oposição.
Em (A), o dito é verdadeiro. Em (B) o implicado é falso.
Até agora vimos que o que Grice não tenta provar que toda língua segue essas regras
numa conversação, mas mostrar que elas servem de base para uma possível modelagem
do sistema de conversação e que além do dito há implicaturas que acabam interferindo
no significado total do enunciado. As quebras das máximas permitem o entendimento,
justamente por serem compreendidas pelos usuários da língua. Grice tenta achar um
jeito de explicar como esse processo ocorre, e é bem-sucedido em seu cunho
metodológico, pois aplica uma metodologia para entender o funcionamento da língua.
Levinson elogia Grice, por pensar que este relaciona fenômenos lingüísticos com
regras de conversação, além de explicar o funcionamento na prática das tautologias e
das contradições.
Entretanto, como qualquer boa teoria, agora se reservam as críticas e ampliações ao
modelo. São feitas então, na seguinte seção, algumas observações relevantes sobre as
máximas e suas quebras bem como seus desdobramentos.
2.3 OS DESDOBRAMENTOS CONTEMPORÂNEOS DA TI
Conforme foi citado anteriormente toda teoria científica bem elaborada gera
discussões e desdobramentos e com Paul Grice(1975), com sua Teoria das Implicaturas,
não foi diferente. Esta seção busca mostrar as relevantes observações feitas a partir do
modelo griceano, levando em conta nomes como Levinson(1983), Carston(2004), Costa
(1986), Gedrat (1993), Barreto(2002).
O primeiro ponto a ser considerado é o que Levinson (1983) explica: retirando as
máximas de modo “seja breve” e “seja ordenado”, todas as outras não se referem à
estrutura de superfície diretamente. O que Levinson defende é que é complicado saber
se as implicaturas são geradas pela estrutura de superfície, pela representação semântica
ou pelas condições de verdade.
Como exemplo dessa dúvida, o autor cita as palavras “talvez”, “pode ser” e
“possivelmente”, onde apesar de terem a mesma implicatura, não possuem a mesma
estrutura de superfície. Podem também apresentar a mesma condição de verdade. Isso
pode ser observado em tautologias, que mostram que são necessariamente verdadeiras,
possuem as mesmas condições de verdade, mas não possuem as mesmas implicaturas.
Então, Levinson afirma que é mais provável que as implicaturas sejam derivadas da
representação semântica, junto com as condições de verdade, o que mostra de novo a
importância da interface entre Semântica e Pragmática, pois uma depende da outra.
Gazdar(1979), de acordo com Costa (1984), com sua contribuição da máxima de
quantidade, realmente fortifica o trabalho de Grice, pois propõe uma análise
distribuindo as implicaturas de quantidade em escalares e oracionais, já que, de acordo
com Gazdar, há uma relação de itens hierarquizados na língua, um grau de quantidade
de informação. Sem esquecer de mencionar que o autor aplica essa sua idéia de maneira
formalizada, solucionando problemas resistentes à teoria griceana.
Gazdar afirma que os conceitos de verdade e evidência são difíceis de formular.
Assim, propõe uma mudança na máxima de qualidade: “afirme somente o que você
conhece”, onde conhecer é tomado como primitivo e empregado em lógica epistêmica,
de acordo com Costa(1984). Porém, é complicada essa definição, pois nem sempre o
falante fala aquilo que realmente sabe, muitas vezes se diz o que não sabe, com a
mesma certeza. Para tanto, Gazdar reformula de novo sua máxima: “para qualquer
sentença declarativa x, a asserção de x compromete o falante para Sx”. Um exemplo
para isso é:
(A) - Tu comprarás o último CD da Maria Rita.
(B) - Sim, como tu sabes?
(A) - Não sei, estou te perguntando.
Ao explorar o tema “implicaturas oracionais e escalares”,Gazdar ganha um aliado:
Levinson(1983), que concorda que as implicaturas escalares consistem de um conjunto
de formas lingüísticas da mesma categoria gramatical que podem ser ordenadas em
seqüência de acordo com o grau de informação que têm. Uma escala desse tipo é e1, e2,
e3...,onde E1 acarreta E2, que acarreta E3... Levinson sistematiza a regra de derivação
de implicaturas escalares, que diz que se numa escala E1, E2, E3... (A) disser E2, ele
implicou E1. Se disser E3, implicou E1, E2... Ou seja, se é dito: “todos gostam de
mim”, acarreta que “alguns” gostam de mim,e se é dito “alguns gostam de mim”,
implica que “nem todos gostam de mim”.
Com as implicaturas oracionais, o cálculo funciona quase do mesmo jeito. Se é dito:
“é possível que p”, implica que “é possível que não p” e também que “p” não é
necessário.
Em 1979, Kaurttunen e Peters, segundo Costa(1984), trabalham com o conceito de
pressuposição, mostrando que ela pode ser implicatura convencional,implicatura
conversacional particularizada e implicatura conversacional generalizada. Quando se
percebe os condicionais contrafactuais, por exemplo, há situações em que a
pressuposição contrafactiva aparece como implicatura conversacional particularizada,
sendo um inferência que envolve o dito, suas condições de verdade,a situação particular
do contexto e as máximas griceanas na interação conversacional. Um exemplo do que
foi dito anteriormente é o uso de “se”:
“Se o meu primo tivesse ido naquele avião, ele não estaria vivo agora”.
Pensa-se pelo uso do condicional que a primeira oração é falsa, pois a segunda
assim é. Entretanto, há o exemplo:
“Se o meu primo tivesse casado com aquela mulher, ele estaria cada vez mais
infeliz, como de fato está.”
Aqui se percebe que a oração conseqüente é verdadeira, assim, o antecedente passa
a ser verdadeiro. Novamente entra a questão da máxima da qualidade (por isso a
importância de seu aprofundamento), pois é preciso supor que o falante esteja falando a
verdade ou não para que se passe da falsidade do conseqüente para a falsidade do
antecedente, por exemplo.
Karttunen e Peters mostram que outra relação entre o modo indicativo e o modo
subjuntivo, e que esse último é epistemologicamente possível, mas não
necessariamente. O indicativo também pode ser:
“Se eu comesse isso, engordaria”.
“Se eu comer isso, engoraderei”.
Outro ponto a observar é quando as pressuposições podem ser explicadas em termos
de condições de verdade, de condições preparatórias dos atos de fala e em princípios
conversacionais. Por exemplo:
“Lula criticou o Palocci pela declaração que este fez à imprensa.”
É pressuposto com isso que Palocci fez alguma declaração à imprensa. Mas mesmo
assim, pode ser cancelável:
“Lula criticou Palocci pela declaração que este deu à imprensa,mas na verdade
quem fez a declaração foi Jobim.”
Verbos de juízo de valor, como “condenar”, “criticar”, não dependem de um
contexto especifico, por isso podem ser considerados implicaturas conversacionais
generalizadas.
O outro tipo de pressuposição levantada por Costa(1984) é aquela que é determinada
pelo léxico, como o uso de “até”, “também”, onde não dependem de um contexto,
porque já está no próprio valor semântico,sendo considerada semanticamente sobre as
suas condições de verdade e pragmaticamente sobre sua significação extra-literal do
item lexical.
As pressuposições, como foram vistas, estão muito mais para Pragmática do que
para a Semântica.
Sperber e Wilson(1986) retomam a teoria de Grice, utilizando-a como insight para
uma nova teoria,com interface na Semântica Cognitiva. Os autores afirmam que há mais
um nível de significado além do dito e implicado, e o dito não é determinado pelas
condições de verdade apenas.
Os dois autores propõem um sistema de inferências não- triviais,como implicações
contextuais,derivadas da relação entre o enunciado o contexto,afirmando que a
derivação não pode ser feita nem do enunciado sozinho,nem do contexto
isoladamente,mas do jogo de ambos no ato comunicativo.Segundo eles, os
interlocutores buscam a maior relevância possível para o enunciado,envolvendo a
implicação contextual. Eles criam com isso o conceito de Relevância como o primeiro
princípio, entrando nele as máximas do Princípio de Cooperação.
Isso ocorre a partir do momento em que Sperber e Wilson(1986) mudam o conceito
de “conhecimento mútuo” de Grice (1975).Para esses autores, é desnecessário e
insuficiente para o contexto o conhecimento mútuo. Eles fizeram uma interpretação
cognitiva e comunicativa para tratar as inferências, em especial, a implicatura
conversacional particularizada, acreditando na relação menor custo, maior
beneficio.Segundo Sperber e Wilson, numa conversação os participantes não ficam o
tempo todo fazendo exercícios lógicos de inferência. Por tal razão, uma teoria
pragmática que procure aprender os dados significativos e inerentes à linguagem natural
não pode fazer parte dos sistemas dedutivos “standard”, precisando de uma dedução
mais rigorosa,com inferências não- triviais, sendo fundamental o Princípio da
Relevância. A implicação contextual é derivada de uma lógica não trivial, e a relevância
só pode ser constatada mediante operações dedutivas.
Gedrat(1993) explica que enquanto Grice considera a cooperação parte essencial da
comunicação humana, Sperber e Wilson(1984) consideram a relevância,não porque os
falantes obedecem a Máxima de Relevância, mas porque relevância é fundamental para
a cognição,para que os seres interajam racionalmente. Gedrat (1993) também afirma
que enquanto para Grice(1975) a quebra das máximas é o ponto crucial, Sperber e
Wilson defendem que não há violações na língua. Grice tem maior preocupação com o
significado implícito e Sperber e Wilson se preocupam com o explicito também, pois
acreditam que há a participação de fatores pragmáticos na designação da referência, na
desambiguação e em outras contribuições da Pragmática para o dito, o que Grice define
como o conteúdo condicional da verdade dos enunciados.
Para Sperber e Wilson, o contexto não foi bem definido por Grice e os autores
mostram que para a interpretação dos enunciados, geralmente o contexto não pode ser
fixado antes e sim construído, pois há inferências não triviais, como implicações
contextuais, derivadas da relação entre o enunciado e o contexto, onde os interlocutores
buscam a maior relevância possível.
A partir disso, Sperber e Wilson formulam o Princípio da Relevância, que afirma
que todo ato de comunicação ostensiva comunica a presunção de sua própria relevância
ótima.
O modelo de comunicação ostensivo-inferencial tenta alcançar efeitos cognitivos
que se baseiam na relação entre efeitos contextuais e esforço de processamento,
implicando graus de relevância. Se um enunciado tiver a mesma quantidade de
processos e operações que outro, o mais relevante será o que tiver maior número de
implicações contextuais, se os dois enunciados tiverem o mesmo número de
implicações contextuais, o mais relevante será o que tiver menor quantidade de
operações. Sperber e Wilson apresentam dois princípios de Relevância, um de base
comunicativa e outro de base cognitiva.
Carston (2004) segue mais ou menos a linha de Sperber e Wilson(1986),
defendendo a idéia de que há explicatura entre o dito e o não dito, e há uma interface
entre Semântica,Pragmática e Cognição.
De acordo com Carston(1991), Grice entende o enunciado como uma implicatura
conversacional generalizada, no nível da comunicação implícita, diferente de Sperber e
Wilson(1986) que apresentam a noção de explicatura, para mostrar que o ouvinte não
precisa deduzir algumas coisas,mas apenas desenvolver sua forma lógica codificada. Tal
decodificação passa por processos interpretativos no nível do explicito e não do
implícito. É no nível da explicatura, de acordo com Oliveira(2001), que o ouvinte
compreende algumas coisas, como a atribuição de referentes. Carston(1991), segundo
Oliveira, afirma que a explicatura pode ser mais ou menos explicita,desde que esta seja
uma combinação de traços linguisticamente codificados e contextualmente inferidos.
Sempre há uma contribuição lingüística, mas com um papel pequeno. O ouvinte
completa uma codificação lingüística atribuindo referentes, enriquecendo, tirando a
ambigüidade, e tudo isso é feito através de princípios de natureza pragmática.
Este trabalho considera importante destacar a grande contribuição de Sperber e
Wilson em relação à noção de contexto e principalmente à noção de conhecimento
mútuo. Os autores postulam que contexto é um construto psicológico, um subconjunto
de suposições do ouvinte sobre o mundo. São essas suposições, naturalmente, e não a
descrição real do mundo, que afetam a interpretação de um enunciado. Entretanto, o
presente estudo opta pela idéias de Grice, por ser aplicável de forma consistente.
Também é importante destacar a contribuição de Costa(1984) com sua ampliação ao
modelo griceano.
Costa, a partir do estudo da Relevância,contribui de forma perspicaz com a
discussão teórica, observando que Grice(1975) quis “implicar” com sua explicita
informalidade,os problemas que existem para que a lógica standard sistematize as
inferências do tipo implicatura conversacional. Para Costa, a supermáxima de relação
“Seja o mais relevante possível” ocupa uma posição mais alta no modelo, tornando uma
propriedade geral que se manifesta junto a todas outras máximas.
Ainda segundo o autor, a irrelevância é relevante, pois algumas vezes se muda de
assunto ou se foge do tópico a fim de ser relevante para o contexto. O que ocorre então,
de acordo com o teórico, é que nas implicaturas por quebra de máxima o dito está a
serviço do implicado e as quebras nada mais são do que “uma forma de irrelevância
pragmática para que o ouvinte busque a implicatura que é o aspecto central da
significação pretendida nesses casos” (Costa, 1984). A implicatura é a relevância
pragmática do dito; enquanto o acarretamento é uma parte da relação lógica relevante, a
relevância é o acarretamento pragmático.
Mesmo analisando os desdobramentos realizados a partir da teoria gricena, avalia-se
que Grice é ainda um nome poderoso nos postulados sobre a Linguagem.
Levinson(1983) destaca que na Teoria das Implicaturas de Grice há uma explanação
pragmática para fenômenos lingüísticos e regras de conversação,conforme já foi citado.
Destaca-se também o fato de Grice conseguir explicar como um enunciado significa
mais do que está expresso. Levinson também ressalta que Grice simplificou a estrutura
e o conteúdo das descrições semânticas, tendo também capacidade de explicar os
mecanismos pragmáticos que surgem com expressões como “mesmo”, “até”, inclusive a
capacidade de explicar tautologia e contradição, como já apontado anteriormente no
trabalho. Enfim, Levinson aponta a importância de Grice nos estudos pragmáticos e é
pelos méritos deste último que o presente trabalho se dedica à Teoria das Implicaturas,
com as importantes ampliações sugeridas por Costa (1984), que foram feitas a partir da
leitura de outros autores, como Gazdar(1979).
Conclui-se, portanto, nesta parte do trabalho, que Grice é fundamental para o
desenvolvimento cientifico da Pragmática. O autor propõe um modelo de comunicação
baseado num acordo tácito entre os participantes, onde há regras a serem seguidas, e
suas quebras provocam implicaturas, que são inferências provocadas a partir do dito.
Grice (1975) sofre críticas, principalmente na sua definição de contexto e conhecimento
mútuo, e por não explorar mais o conceito de Relevância, sendo isso feito por Costa
(1984) e Sperber e Wilson(1986). No entanto, vale ressaltar a importância de Grice por
tratar de temas como a intencionalidade, a significação além do contexto. A
intencionalidade do falante, o poder de persuasão, através do uso da língua é o grande
segredo da publicidade, por exemplo.
Publicidade, seu poder de persuasão e suas implicaturas, é o próximo tema desse
trabalho.
3 SOBRE O DISCURSO PUBLICITÁRIO E SOBRE O SEXISMO
Até agora se observou o contexto histórico da Pragmática e a importância de seu
estudo, mostrando diferentes propostas ao estudo da significação. Percebe-se que as
Implicaturas de Grice (1975) são importantes para explicar os fenômenos da
significação da linguagem natural, em especial, no processo de comunicação. O autor
mostra que há muito mais significado do que o que foi dito.
Embora mostrando alguma ampliação, algumas discussões sobre o modelo griceano,
ele ainda é forte o suficiente para servir como escopo de análise. Aceitando as sugestões
de autores posteriores à Grice,como Costa(1984), baseadas em Gazdar(1979),
Kartytunen e Peters(1978), Levinson(1983), Sperber e Wilson(1986),entre outros,
busca-se agora aplicar o modelo ao texto publicitário, pois, como se disse
anteriormente, há leis que direcionam uma conversa e a questão do dito e não dito é
fundamental, pois enquadra toda a relação comunicacional entre os seres humanos. E
para atingir um maior de número de “fiéis”, sem comprometer quem anuncia, a
propaganda se vale dos recursos da língua, buscando ser breve, clara, objetiva, ou seja,
respeitando o Princípio de Cooperação, mesmo praticando ambigüidade
propositadamente, bem como mentindo muitas vezes sem ser questionada (já que
convence o suficiente de que diz a verdade). A ambigüidade é percebida pelo ouvinte,
mas a mentira nem sempre, porque o cálculo inferencial é perfeito, e é isso que ilude o
possível comprador de que precisa do produto oferecido.
Há uma rede de significações no que está expresso, o que mostra, claramente, o
caráter pragmático e em especial as implicaturas de Grice. As implicaturas inferenciais
que persuadem, também mostram marcas claras de sexismo, são feitas de forma
preconceituosa sobre um gênero específico, que no caso do trabalho é sobre o feminino.
Há um estigma em relação ao gênero feminino que é apontado nos slogans apresentados
nesse trabalho, e tal estigma serve para persuadir quem compra. Assim, é esse o foco
que o trabalho se propõe agora a perceber: como ocorre a persuasão; quais implicaturas
estão em jogo e quais são as quebras que mais ocorrem, e por que razão; como se
constrói uma linguagem voltada a um público especifico consumidor, no caso, o público
feminino, a fim de persuadi-lo a comprar o produto em questão. Então, a fim de decifrar
essas questões, dentre tantas outras que envolvem o discurso publicitário, este capítulo
busca estudar o tema “discurso publicitário e sexismo”. Na primeira seção do capítulo,
é traçado um breve estudo sobre o discurso publicitário, que é persuasivo por natureza.
Portanto, fundamentalmente pragmático. Feito isso, é importante desvendar, na segunda
seção do presente capítulo, o que vem a ser sexismo, observando o papel da mulher nos
dias de hoje. Traça-se um breve resumo sobre o papel da mulher na sociedade e na
terceira seção do capítulo, é visto como o sexismo é percebido no âmbito da linguagem,
para ser possível no capitulo seguinte avaliar as propagandas publicitária, seus slogans,
baseando-se em marcas implícitas sexistas, deixadas pelas implicaturas.
3.1 SOBRE O DISCURSO PUBLICITÁRIO
Conforme apontado anteriormente, falar em discurso publicitário é fazer referência à
arte da persuasão, pois envolve alguém que quer vender um produto para alguém
comprar. Esse convencimento é feito através de um veículo de mídia, de massa, afinal,
quanto maior a divulgação, maior a possibilidade de venda. O objetivo do trabalho é
analisar as implicaturas e o sexismo que há por trás desse discurso.
Um anúncio publicitário, de acordo com Castro (2004), expressa uma carga
semântica e estilística que acaba revelando um contexto especifico, já que é feito em
uma determinada época, numa determinada sociedade, numa específica cultura. O que
se busca na publicidade e na propaganda, de acordo com a autora, é a apreensão de um
mundo subjetivo que transcende a realidade, gerando novos significados.
Para atingir o outro, a publicidade usa recursos que chamam a atenção, como
imagens, palavras, enfim, usam algo que surta efeito. Tudo é muito calculado na hora de
anunciar. É preciso a palavra certa, um som agradável, para se chegar finalmente ao
significado que se quer.
Ainda segundo Castro, na Antigüidade Clássica, os gregos faziam da argumentação a
arte de seduzir e persuadir, pois tinham a consciência de que o homem era movido pela
razão que obedece a uma técnica demonstrativa e pela emoção que corresponde a
técnicas expressivas, suscetíveis a demonstração de sentimentos. Assim, o sujeito
persuasivo tentava provar uma verdade e utilizava leis lógicas para tal.
De acordo com Charaudeau(1983), o sujeito precisa comprovar o que afirma de
forma convincente, e é aí que entra a máxima de qualidade. Persuadir significa usar a
linguagem com rigor lógico, sem contradição, com verossimilhança para permitir a
adesão do ouvinte. Toda relação argumentativa, para esse autor, é composta de uma
afirmação de partida, uma de chegada e várias de passagem. A de partida e a de chegada
têm relação estreita, pois uma é causa,conseqüência,da outra. O que há então é a Prova,
a Inferência e o Argumento.
As verdades matemáticas, para ele, pertencem ao certo, porque não são necessárias
de se persuadir, visto serem verdades absolutas,inquestionáveis. O provável está no
campo da retórica, pois não pode ser atingido pelo pensamento lógico. A retórica para o
autor é a faculdade de ver, teoricamente, o que em cada caso, pode ser capaz de gerar
persuasão.
A publicidade apela para o emotivo, para sensações. Segundo Maffesoli (1995,
apud CASTRO,2004), o que prevalece no discurso publicitário não é mais a produção
com suas conseqüências úteis para a sociedade, mas um desejo de bem viver, sem
questionamentos, em que são enfatizados os jogos de aparência e os aspectos materiais
da existência pelo manejo das imagens e pelo convencimento ao consumo desenfreado
dos objetos.Tudo isso faz com que a representação do cotidiano mostrado pela
publicidade, configure de certa forma, a sociedade. Nessa visão, a publicidade reflete a
vida “imediata e banal que retrata, na qual o que menos importa é o conteúdo, o fazer, o
fundo, mas a aparência, a forma, cuja importância se conhece nas interações de vida de
todos os dias” (Maffesoli,1995,pág.72, citado por CASTRO, 2004).
Para Castro, o discurso publicitário transcende o real e a verdade, buscando seduzir
o consumidor, com técnicas que favoreçam o sentimento, tendo como conseqüência
então o relaxamento da realidade e da crítica. Ao oferecer um produto de forma
sedutora, o cliente já se satisfaz. A publicidade instala a correspondência entre a
realidade e o desejo, instaurando uma nova realidade, em que o importante é o efeito de
verdade que foi criado.
No conjunto publicitário, se enxerga determinados estilos de vida, há a valorização
ou o silêncio de certas ideologias, há o convencimento da utilidade do que se é
oferecido, pois este é mostrado como perfeito e como a solução de todo e qualquer
problema.
Sant`Anna (1996,apud CASTRO 2004) afirma que o artista precisa buscar a verdade
sensorial subjetiva, a partir da realidade concreta. Diz o autor que o segredo é a venda e
sua arte, pois há todo um efeito sensorial nessa relação de compra e venda e para tal o
principal não é imitar a natureza, mas obter a essência do sujeito representado.
Charaudeau considera o termo “propaganda” mais abrangente que “publicidade”,
pois enquanto o primeiro se refere a qualquer persuasão, seja política, religiosa, por
exemplo,o segundo termo citado se destina a mensagens comerciais de produtos e
serviços,recriando de forma inteligente o que se quer vender, a fim de persuadir quem
for comprar. O trabalho opta em utilizar, então, o termo “publicidade”. Claro que essa
persuasão citada também é baseada no público alvo, quanto maior o nível cultural do
público destinado, por exemplo, mais rebuscamento terá a propaganda. O cartaz de rua,
por exemplo, busca um número abrangente de leitores, é voltado a mais gente.O preço
do produto também é influenciado pelo nível da publicidade em cima do produto,quanto
maior o recurso e rebuscamento, mais caro deve ser o produto oferecido, visto ter na
sociedade essa relação entre poder aquisitivo e poder cultural, quanto maior o nível
cultural, maior a exigência sobre o produto. O mesmo ocorre com o veículo onde o
slogan publicitário é comercializado. Num jornal, numa televisão, a divulgação é bem
maior do que numa revista cara, por exemplo.
A produção publicitária é determinada pela existência ou ausência de concorrência,
pois se não tiver, o que acaba ocorrendo é uma supervalorização do produto,um
convencimento de que ele é necessário, mas se tem concorrência, ainda é preciso
mostrar que o produto é o melhor. Por essa razão, muitos produtos evocam funções
mágicas, se transformando em objeto de desejo e realização pessoal.
Para tornar um anúncio atraente e persuasivo, segundo Cobra( apud CARVALHO,
1996), os publicitários usam toda criatividade possível, seja humor, imagens
excêntricas, diálogos, pessoas famosas aparecendo ou falando,até qualidades ocultas dos
objetos, como a presença emocional.
O texto publicitário geralmente mostra um título principal, destacado pelo tamanho,
cor, tipo de letra,enfim, direcionando a leitura do resto do anúncio. Depois, há o slogan,
o grito de guerra do produto,aquilo que fica ecoando na mente ao ver a divulgação do
que está sendo vendido.Geralmente o slogan é curto, de fácil memorização, marcante.
Os verbos que aperecem são geralmente no infinitivo, ou imperativo e as palavras têm
efeito emocional e figuras de retórica,sem perderem a clareza e a força expressiva do
texto. É graças ao slogan, que o produto se torna único, pois é valorizada sua
singularidade. No trabalho, os slogans são analisados em detrimento às imagens, pois o
objetivo é lingüístico. O uso de expressões que caracterizam aspectos positivos também
marca o leitor, pois estas vendem uma idéia de possuírem um diferencial de qualidade,
distinguindo-se de qualquer outro produto.
Reboul explica,como aponta Gedrat (1993), que a linguagem publicitária trabalha
fortemente com os implícitos. O autor mostra que o slogan produz um raciocínio lógico,
faz referência a entimemas, dilemas, implicações, polissemias, erros de categoria e
dicotomias.
Segundo Gedrat, o entimema é um raciocínio em que é enunciado uma premissa,
sendo as demais evidentes, como em “aproveita hoje que está em casa e alugue o filme
Matrix”, onde há a premissa “você está em casa”, dada como algo evidente.
No dilema, a contradição leva a uma única conclusão, como “ou qualidade garantida
ou seu produto de volta”, ou seja, não se sabe quanto à conclusão implícita da qualidade
do produto, já que não se discute o que não é dito explicitamente.
Na implicação, a autora explica que há uma exclusividade, sem ser enunciada
claramente.
A polissemia traz a ambigüidade, que é proposital.
A dicotomia, que traz falta de lógica, confunde. Por exemplo, ao dizer “Carrefour é
mais barato”,se compreende que os outros não são tão baratos como o anunciado,
mesmo sem ter evidências sobre isso.
Com o objetivo de vender, os produtos são associados com a vida do possível
comprador, para isso os publicitários recorrem a crenças populares, a respeito da cultura
da sociedade,ou seja, reproduzem os valores da sociedade, aquilo que realmente
importa.
valores de referência, saberes, normas, das quais participam o anunciante e o
receptor. Às vezes, até o nome do produto é modificado a fim de seduzir o leitor. Um
exemplo no Brasil, é do sabonete “Phebo” que nunca vendou tanto, como quando
recebeu um novo nome, reformulando assim a idéia do produto, o então sabonete novo
“Dove”. O mesmo ocorre com as “sandálias havaianas”, que graças aos comercias, à
publicidade persuasiva, o produto sai da categoria de sandálias baratas, para sandálias
modernas,até chiques,mudando consideravelmente até o seu preço, que deixou de ser
popular. A persuasão, a retórica é notável nesses casos.
A linguagem de certa forma seduz e um bom texto sobre isso é de Nely Carvalho
que aponta aspectos interessantes sobre esse processo de persuasão da publicidade. O
seu livro Publicidade – A Linguagem da Sedução, de 1996, mostra o caminho que a
publicidade percorre para atingir o possível comprador; A autora afirma que é pela
ordem do fazendo agir- como na propaganda “beba coca-cola”, ou pela
persuasão(fazendo crer) como em “só Omo lava mais branco”(entra aí a máxima de
qualidade) e pela sedução,como em ”se algum homem lhe oferecer flores, isso é
Impulse”
Segundo Carvalho, a linguagem da publicidade cria um mundo perfeito e ideal. Ter
objetos passa a ser sinônimo de felicidade, pois prometem bem-estar e sucesso.
A publicidade acaba impondo seu objetivo, mas não de forma evidente. As idéias do
produtor, os seus valores, mitos, estão nas entrelinhas, nos implícitos.
A publicidade, de acordo com Carvalho, induz uma visão dinâmica do social,
privilegiando implicitamente as idéias mais atuais, os fatos em emergência, as
inovações tecnológicas, as correntes de última hora e qualquer que seja seu implícito, é
o testemunho da sociedade de consumo,conduzindo a uma representação da cultura a
que pertence, permitindo estabelecer uma relação pessoal com a realidade particular. A
publicidade usa conotações culturais, icônicas e lingüísticas, sobretudo aquelas que
veiculam estereótipos. Os temas mais presentes nas propagandas são crianças, família,
mulher, símbolos de status, os mesmos temas mais presentes na cultura social.
Entretanto, o maior alvo das propagandas é a figura feminina. E é nas estratégias mais
usadas, como os jogos de palavras, as transcrições de testemunho em estilo direto, as
metáforas, as repetições, como estratégia de memorização, as hipérboles e os
estereótipos implicados que a entra a questão sexista.
Gedrat (1993) argumenta sobre a importância da figura na propaganda publicitária e
sua relação com a linguagem verbal. Segundo a autora, a propaganda visa tornar mais
informativa uma informação já desgastada, sendo que o registro verbal tem a função de
“ancorar” a mensagem. A autora cita a idéia de Eco (1976-77) de que muitas vezes não
há correspondência entre a imagem oferecida e o registro verbal. Na verdade, muitas
vezes a escrita é que tira a ambigüidade da imagem apresentada, quando é possível mais
de uma interpretação. Eco ainda lembra, segundo Gedrat, que a ideologia da publicidade
é a do consumismo. Consumir é algo natural numa sociedade capitalista.
Silveira (informação verbal)
5
faz uma breve explanação sobre a imagem, que antes,
pela teoria semiótica, era apenas decodificada e a partir de novas descobertas, como a
teoria de Grice e por conseguinte a de Sperber e Wilson, a imagem passa a ser vista
como um processo de comunicação,envolvendo inferências. É possível, a partir dela,
segundo Silveira, realizar o mesmo raciocínio dedutivo que se emprega numa
conversação. Ressalta-se novamente que o trabalho, por ter preocupação com os
enunciados, só analisa a imagem como coadjuvante na produção de implicaturas.
A publicidade toma conta de todos meios de comunicação. Em uma revista há mais
de dez mensagens publicitárias, um intervalo de um programa de televisão leva em
média quatro minutos, só de anúncios publicitários. Há programas, inclusive, que param
a toda hora, para anunciar algum produto. Há muito espaço para a propaganda e,
portanto, é preciso que um anúncio convença de forma eficaz um leitor a parar para lê-
lo, já que a concorrência é grande entre as mensagens publicitárias. A que melhor
persuade, a que melhor utiliza o jogo da linguagem, da imagem com a escrita é a que
mais marca o leitor. Há uma diferença entre informar sobre o produto e vender este.
Portanto, a propaganda boa, de qualidade, é aquela que informa as características do que
vende, e que persuade o destinatário. Tal persuasão em racional e emotiva. A persuasão
racional seria aquela baseada na argumentação e tem a ver com o bem-estar do
destinatário, prometendo ajudá-lo a alcançar o que deseja. A persuasão emotiva envolve
o subjetivo, convence sentimentalmente o consumidor, apelando para alguma de suas
emoções, algum desejo. Independente do tipo de persuasão, o processo ocorre com os
elementos implicados e a conseqüência da inferência realizada.
De Plas e Verdier (1979, citado por OLIVEIRA, 2001) argumentam que o processo
da criação publicitária envolve cinco etapas, a saber: o impacto fisiológico(escolha do
meio,lugar,visibilidade,etc), o impacto psicológico (efeito surpresa,despertar do
interesse, riso,agrado), manutenção da atenção,convencimento,determinação de
compra(por meio de persuasão).
Oliveira(2001) lembra da força que uma propaganda pode exercer sobre as pessoas.
Ao prometer algo, o destinatário se ilude de que vai conseguir, e logo vem a frustração
se não consegue. Um produto anunciado mexe com a vida das pessoas, na medida em
que promete o que é desejado, que persuade, que engana até. A linguagem publicitária é
5
SILVEIRA,Jane Rita Caetano. Comentário realizado em aula expositiva na Pontifícia Universidade do
Ro Grande do Sul. Porto Alegre:2006.
conotação pura, o discurso é alegórico e é nessa fantasia que o consumidor se embala,
envolvido pela sedução da linguagem publicitária.
O publicitário utiliza rios recursos para persuadir o leitor, seja usando adjetivos
positivos, belas imagens, implicando coisas que no fundo é o desejo do leitor,conforme
dito anteriormente.No momento dessa implicatura é que escapam alguns traços
preconceituosos de quem anuncia: muitas vezes para convencer alguém, se utiliza de
menosprezar algo, a fim de valorizar seu produto . O que ocorre, por exemplo, com a
idéia cultural do que seja a mulher e seu papel na sociedade.É evidente o preconceito
nas propagandas. Os produtos anunciados carregam certezas culturais, algum tipo de
discriminação. O estereótipo é usado para persuadir à compra. Porém, este não aparece
muitas vezes no nível do dito, ficando apenas implicado. A publicidade é percebida,
conforme já foi citado, como um retrato sócio-cultural, representando identidades,
fazendo parte do imaginário coletivo sócio cultural. Por isso, atinge tanto o seu público
receptor e o estereótipo cultural, utilizado como referência na publicidade, por ser um
tema clássico, de conhecimento inconsciente ou consciente coletivo, é freqüentemente
implícito nas propagandas publicitárias.
Em suma, ao se falar em publicidade, se fala em manipulação, feita com recursos
lingüísticos, estilísticos, que atraem o consumidor. O uso do léxico, da imagem, do
slogan, tudo é pensado de forma a convencer que o produto merece ser comprado.
Slogan é uma forma usada para dizer o banal da forma mais extraordinária possível.
Causa impacto ao ser lido, porque apela às paixões, sem fugir da razão. É curto, por
razão econômica, de espaço e até estilístico e não diz tudo, deixando informações
persuasivas no nível do não- dito. Traz nas implicaturas muitas vezes o pensamento da
sociedade e isso ajuda na venda.
A publicidade faz com que as pessoas desejem os produtos, não somente porque
precisam deles por necessidade, mas por que ele promete mais do que isso, como
sensações, prazeres.O valor está além do uso concreto do produto,está na realização
social, já que mostra nas implicaturas a possibilidade de ter amor, sucesso, juventude,
reconhecimento. Geralmente essas implicaturas indicam um pensamento da sociedade
de que é a mulher que busca tudo isso, pois se tem a idéia sexista de que o homem é
superior e não precisa de tanto. Percebendo que a mulher é quem mais faz compras, e é
ela a mais exigida pela sociedade( parece que há um inconsciente coletivo
estabelecendo essa idéia), precisando desempenhar vários papéis, de forma satisfatória,
como dona de casa, mãe, esposa, amante, profissional, a publicidade opta em se
direcionar às mulheres, e, por tal razão, a maioria das propagandas são feitas para o
público feminino. Percebendo a mulher como objeto de desejo do homem, as
propagandas também usam essa implicatura para vender ao público masculino,
prometendo atingir o seu desejo.
Não se consegue disfarçar marcas de sexismo presentes na publicidade, já que
mesmo que no dito isso não se perceba, nos implícitos, é visível a visão machista que a
sociedade tem da figura feminina. A publicidade aponta em seus implícitos as idéias
generalizadas que o coletivo tem sobre as mulheres. Assim, é importante entender um
pouco sobre o que é sexismo e qual a relação entre este tópico e o discurso (linguagem).
Na seção seguinte, tenta-se definir o termo “sexismo”, para na próxima estabelecer a
relação com o discurso a fim de que na seqüência seja possível analisar as implicaturas
que indicam marcas sexistas no discurso publicitário.
3.2 SOBRE O SEXISMO
Conforme citado anteriormente, a publicidade geralmente se direciona às mulheres,
pois são elas geralmente as responsáveis pelas compras e são o maior alvo de cobranças
da sociedade. Geralmente precisam ser donas de casa, boa esposa, boa mãe, boa amante,
linda, bem sucedida profissionalmente, enfim, muitas cobranças lhe são exigidas, no
coletivo cultural. A sociedade também cobra do homem que ele seja “superior”, mais
forte do que a mulher e nas propagandas dirigidas a eles é possível encontrar marcas
sexistas que implicam que a mulher é objeto sexual ou que é mais fútil e que o homem é
viril. Não se quer dizer que todas as mulheres concordam com a afirmação, tampouco se
pode afirmar que toda sociedade pensa assim. O trabalho aponta uma opinião. A
publicidade vende às mulheres idéias do que seria ideal para elas, e as implicaturas
analisadas apontam que o ideal para a mulher é ser objeto de desejo, mostrando assim
um traço do sexismo. Para os homens, a publicidade vende idéias do que seria ideal para
eles, e as implicaturas analisadas neste trabalho que se direcionam aos homens, também
envolvem mulheres como objetos, ou seja, não se percebe que por trás do que está
escrito há marcas de sexismo, o preconceito está nos implícitos, a partir de inferências
provocadas no ouvinte que direcionam um estigma em relação à figura feminina. Então,
esta segunda parte do terceiro capítulo trata do tema sexismo, tentando defini-lo, para na
próxima parte relacioná-lo com o discurso, a linguagem.
Para melhor entender, primeiramente, faz-se claro definir termos como gênero e
sexismo, bem como entender este último historicamente, a fim de compreender a
importância de se estudar isso. Assim, traça-se um breve panorama sobre tal tópico.
O termo “gênero” na lingüística se refere às várias formas de expressão, o termo
vem do latim genus, e não tem a ver com significado sexual. O termo gênero usado
neste trabalho é em nível mais social, referindo-se à implicação sexual, diferenciando os
termos feminino (como mulher, ou algo que mais se aproxime disso) e o termo
masculino (relacionado ao homem, a masculinidade, virilidade). Um homem mais
delicado, para esse contexto, pode até vir a ser considerado feminino, já que tem traços
culturalmente construídos característicos do sexo feminino. Assim, sexo é referente aos
traços biológicos,genéticos e gênero é a idéia de sexo diferenciando homem e mulher,
mas construída pela cultura da sociedade.
uma idéia coletiva e preconceituosa de que homem precisa ser mais “grosso” do
que mulher, que não pode brincar de boneca. Essa idéia já introduz o conceito do termo
“sexismo”.
As composições de gênero determinam os valores e modelos de corpo sexuado, suas
aptidões e criam paradigmas físicos e morais, e mentais, cujas associações tendem a
homogeneizar o “ser mulher” e o “ser homem”. A idéia de gênero está submetida à idéia
de comportamento social de homens e mulheres. Há a construção de uma identidade
sexual baseada em critérios arbitrários que são carregados pela história, pela cultura. A
mulher sempre foi vista como ser sensível, inapta a certas tarefas, com menos
intelectualidade. O homem sempre foi visto como o viril,forte,provedor de tudo.Ser
pensante. O gênero é construído socialmente. Os corpos são transformados em feminino
e masculino, como conseqüência de um discurso social dominante.Definir feminino e
masculino é diferente de definir homem de mulher. O que segue depois do
nascimento,as idéias que se tem de cada sexo, é que constrói o gênero feminino ou
masculino.
Sexismo é tudo aquilo que pode ser considerado como discriminatório ou usado
contra a alguém, por causa de seu sexo (que equivale no presente estudo ao sentido de
gênero, já que este é a construção social de feminino e masculino), muito mais do que
por causa de sua índole, ou seus méritos individuais. Sexismo é uma diferenciação feita
entre homem e mulher, ou até envolvendo homossexuais, transexuais, hermafroditas, e
que envolve preconceito em relação ao sexo em questão. É a idéia de que um sexo é
superior ao outro, separando as pessoas por grupos, seja de homens, de mulheres, enfim,
não há relação de igualdade, não há uma visão de que todos são iguais como indivíduos,
pois o que pesa é o sexo de cada um. Para os sexistas, o seu sexo é superior ao outro
tipo. E o sexismo pode aparecer contra todos. Pode ser discriminação contra os
homossexuais, discriminação contra os homens, enfim, é contra a algum sexo.
Obviamente, não se tratarão aqui casos como de transsexualismo, homossexualismo,
hemafrodismo, onde o preconceito é muito grande, sendo apenas apontado o sexismo
contra o gênero feminino, pois a publicidade, foco do trabalho, joga é com o homem e a
mulher ( e isso já indica que há um sexismo da sociedade inteira que nem considera
outros tipos sexuais além de “homem” e “mulher” como “normais”, já que quase não se
falam desses, muito menos nos meios de comunicação). O sexismo percebido na
publicidade é geralmente- e aqui nesse estudo sempre-contra a mulher.
Historicamente, as mulheres sempre foram vistas como mais fracas, o status da
mulher sempre foi menor do que o status dos homens. As mulheres geralmente estavam
“sob o comando” dos homens, “obedecendo-os” em casa. Não tinham emprego, não
tinham autonomia. As mais livres, que não estavam respeitando as “ordens” dos homens
eram as consideradas “ilegais”, “imorais”, como as prostitutas, que eram vistas- aliás,
ainda são- como desrespeitosas.
Desde a escola, as crianças aprendem a se portar na sala de aula de modo diferente,
de acordo com o sexo. Aliás, antes mesmo, nas brincadeiras, já é definido o papel de
cada sexo nas relações. A menina precisa ser delicada, quieta (mesmo sendo
considerada mais falante), educada. O menino é o que joga mais, participa mais de
atividades envolvendo o corpo, o físico. Os esportes como o futebol são mais voltados
aos meninos(hoje ainda há maior participação,embora continue ocorrendo preconceito
sexista em relação à mulher). Ainda há a famosa brincadeira de médico, onde o doutor é
o menino, ainda há a idéia de que arrumar quarto, ajudar nos afazeres da casa é tarefa da
menina, o menino é o “cuidador” da menina. As mulheres bem-sucedidas, com cargos
antes exercidos por homens, ainda precisam se portar como estes, usando “terninhos”,
roupa masculina, que trazem mais “seriedade”. As mulheres em cargos não executivos,
mas tidos culturalmente como masculinos, ainda precisam lidar com o preconceito, ou
deboche ao trabalhar, por exemplo, como frentistas (função exercida pelo homem até
então). Entretanto, mesmo com estas dificuldades em se equipararem aos homens, as
mulheres estão cada vez mais alcançando o espaço que até então era só deles.
A partir do século dezenove, ocorre uma mudança social gradativa, uma visão de
valorizar mais a mulher. Assim, movimentos começam a ser realizados em prol dos
direitos femininos, e uma corrente forte surge reforçando isso: o Femininsmo. Este
termo se refere à luta de mulher por um espaço maior na sociedade, já que o sexismo é
percebido como problema sério social. A Primeira Revolução Sexual, onde se critica
pela primeira vez a necessidade de virgindade por parte das mulheres, é o grande marco
da história, liberando-as para praticar sexo de forma livre, rompendo, assim, barreiras.
Jennifer Coates, aborda o tema “sexismo” em sua página virtual intitulada Gender
and Language( acessada em 2006). De acordo com seu estudo, as idéias feministas
surgem por volta de 1300, com a escritora Christine de Pizam, uma das primeiras
mulheres a oficialmente escrever como profissional.
De acordo com Coates, o movimento feminista, começa de forma organizada no
século dezenove. A socialista Charles Fourier usa a palavra Féminisme em 1837, com a
idéia de que as mulheres têm os mesmo direitos dos homens. Nesta época, então, são
feitas campanhas para o direito ao aborto, ao acesso da contracepção, ao fim da
discriminação, campanha a favor do divórcio, valorização na área educacional.Inclusive
questões mais sérias,como castração, estupro, hábitos de algumas culturas, em que a
mulher é objeto têm sido um alvo do movimento feminista até hoje.
No século dezenove,muitos países garantem pela primeira vez à mulher o direito ao
voto. Nas guerras, a contribuição das mulheres também passa a ser valorizada, gerando
empregos para elas.
De acordo com a enciclopédia virtual Wikipedia (acessada em 2006),os movimentos
feministas podem ser separados em três: First Wave Movement, Second Wave
Movement e Third Wave Movement. O primeiro movimento é considerado o mais
calmo, ocorrendo por volta de 1960. No segundo, já há uma intenção de luta por direitos
salariais iguais aos dos homens. É nesse movimento que surge a defesa de algumas
mulheres ao direito de terem controle de natalidade, que era restrito até então. As pílulas
anticoncepcionais começam, então, a serem mais utilizadas. E não demora a a luta pelo
direito ao aborto,porém, por ter resistência inclusive ao meio feminista, e acaba não
sendo totalmente aceitável até os dias de hoje. Graças ao uso de pílulas
anticoncepcionais, as mulheres começam então a se libertarem sexualmente.Aliás,a
relação sexual tem importância fundamental para as feministas, pois os homens
perdendo esse “poder” sobre as mulheres, já não precisam ser exclusivos, é possível a
troca de parceiros à vontade. A obrigação de casamento já não é mais a mesma depois
do segundo movimento e o sexo pornográfico, envolvendo mulheres de forma
humilhante, é condenado por Cathaine Mac Kinnon e Andréa Dworkin,que em 1980
conseguem incluir nos direitos civis essa questão.O terceiro movimento, o Pós-
Feministas não tem grandes repercussões, pois muitas pessoas acham que este é apenas
uma continuação do segundo movimento, que continua lutando por direitos que o
segundo obteve.
Na verdade, não há somente movimentos feministas. Há, por exemplo, uma corrente
que critica as feministas, por achar que estas se fazem muito de vitimas, reforçando a
discriminação.
A jornalista norueguesa Asne Seierstad, autora de “O livreiro de Cabul”, em
entrevista à revista Veja, de edição 1973, publicada no dia 13 de setembro de 2006,
conta como foi viver em uma família afegã. Tal reportagem é interessante, pois mostra
que ainda há na cultura de alguns países uma idéia sexista sobre a mulher, defendendo
então a relevância de um movimento feminista. De acordo com a lei do Islã, por
exemplo,uma mulher que casa novamente perde o direito de custódia dos filhos.
Divórcio é privilégio de homens, que podem,inclusive,ser polígamos.No Egito, de
acordo como site Wikipedia, ainda há mutilação contra mulher e sua genitália, quando o
homem decidir que é necessário. A autora entrevistada pela revista Veja, faz uma crítica
à opressão feminina nas famílias islâmicas. Ela relata que os talibãs obrigam os afegões
a viver como nos tempos de Maomé,proibindo o uso de maquiagem,ouvir
músicas,consumir bebidas alcoólicas. O homem, que é o chefe da casa, a mulher não
pode trabalhar e precisa obedecer. As mulheres são objetos, que passam dos pais ao
marido e valem dinheiro, sendo o preço estabelecido de acordo com sua beleza e dotes.
Importante ressaltar que não pode estar muito descoberta,pois perde valor. Para
cobrirem-se usam burcas,feita de material grosso que impede a circulação de ar sendo
muito desconfortável segundo a autora entrevistada.Na cabeça das mulheres
muçulmanas, tudo isso é para seu próprio bem, para protegê-las de perigo. Estando
dentro de casa, sob cuidados do marido, não há risco.A cultura é tão forte que para elas
são as mulheres ocidentais que enfrentam um mundo ameaçador.Segundo Seierstad, as
mulheres sofrem castigos se descumprirem qualquer ordem e é inaceitável defender que
isso é uma questão cultural, um relativismo, que toda cultura tem direito de manter seus
costumes, pois a dor é igual em qualquer pessoa, envolve direito civil e não proteção
apenas à mulher. Essa é uma luta das pessoas que são contra o sexismo. E é isso que
torna o assunto relevante de ser estudado, pois as propagandas publicitárias não saem
ilesas desta questão social e séria, como já se percebe.
Resumindo, o que foi entendido até então é que há sexo feminino e masculino. O
feminino é o que possui genitálias femininas,o masculino é o que possui traços físicos
masculinos. Tal definição é apenas de caráter biológico, fisiológico. O lado cultural, em
que se criam identidades femininas e masculinas, envolve a noção de gênero feminino e
gênero masculino, que é algo visto como questão social,ou seja,as diferenças entre os
dois estão num nível mais historicamente construído. Graças a esse fortalecimento
histórico de idéias de que homens são fortes,mulheres são objetos, frágeis,precisam do
homem para protegê-las, para lhes dá força, dinheiro,ainda perdura o sexismo. Este é
definido, conforme foi visto,como preconceito em relação ao sexo, no caso deste
trabalho, feminino. E há um movimento que tenta combater isso, que é o feminismo. A
sua defesa é de que o problema está em não serem todos os seres humanos tratados de
maneira igual. A sociedade é preconceituosa e a mulher ainda é desvalorizada
culturalmente. Esse sexismo percebido já não aparece tanto na “superfície”, devido à
visão politicamente correta de que não se deve ter preconceitos. Porém, as implicaturas
o deixam escapar. O sexismo no discurso é tema da próxima parte do trabalho.
3.3 SOBRE O SEXISMO NO DISCURSO
Como foi visto na parte anterior do capítulo o Feminismo denuncia o preconceito
pela diferença sexual,biológica,corporal entre homens e mulheres e tal preconceito pela
diferença citada se denomina sexismo. A opressão contra a mulher é historicamente
construída e persiste até os dias atuais. Nessa parte do trabalho, busca-se perceber a
relação entre o sexismo e o discurso, já que há marcas sexistas historicamente
construídas,que são percebidas,inferidas, através da linguagem.
Em uma sociedade patriarcal, a língua assume a aparência e o conteúdo patriarcal.
O gênero feminino na maioria das línguas, por exemplo, dissolve-se por detrás do
masculino, no nível do dito, do explicito. “Autora”, por exemplo, surge do radical
“autor”.
O próprio modo como as gramáticas explicam o funcionamento das línguas já
implica uma ideologia sexista. Para Joaquim Mattoso Câmara Junior, “o masculino e o
singular se caracterizam pela ausência de marcas do feminino e plural respectivamente
[...] ambos sendo assinalados por um morfema gramatical zero” (CÂMARA,1975).
Fazendo uma comparação com Cristianismo que também exerce sua força sobre as
questões sexistas, já que a mulher, Eva, forma-se a partir de Adão,a partir de sua
costela, na Gramática, o feminino sai da costela do masculino. Os grandes dicionários
de português do Brasil ensinam que “costureira” é a mulher que costura
amadoristicamente ou profissionalmente,especialmente roupas sociais e “costureiro” é o
que atua profissionalmente na costura. Essa diferença também aparece com outras
profissões, como “cozinheiro” e “cozinheira”. A palavra “homem” no sentido de ser
humano masculino é descrita com referências fortemente valorizadas, como
coragem,virilidade,vigor. E é associado com a união com a mulher. A palavra “mulher”
é associada com reprodução, amante de homem. Aliás, um casal ao falar do
companheiro e companheira já mostra marcas sexistas. A mulher tem um marido, papel
social do homem. O homem tem uma mulher.
Jennifer Coates, na sua página virtual intitulada Gender and Language, acessada em
2006, traça um breve panorama da relação entre sexismo e linguagem. Há
características na linguagem, no dito que implicam o sexismo. De acordo com a autora,
Robin Lakoff é um nome importante nos estudos sobre tal tema, pois ao publicar em
1975 o livro Language and Woman´s Place, aponta que as mulheres:
*usam muito mais polidez, como “poderia me emprestar o livro”;
*usam “tag questions”, ou seja, devolvem a pergunta que fazem, invertendo-a, como
“você não quer jantar,quer?”;
*usam mais advérbios;
*usam mais adjetivos para enfatizarem o que dizem;
*parafraseiam mais que os homens;
*costumam criar um vocabulário extenso ao se referirem sobre moda, enquanto os
homens fazem o mesmo, ao se referirem aos esportes;
*não costumam usar o verbo na forma imperativa tanto quanto os homens;
*pedem coisas mais indiretamente do que de forma direta,por exemplo “está calor
aqui” é dito com a intenção de alguém ligar o ventilador.
Assim, percebe-se que a linguagem explícita também implica marcas sexistas, traços
culturalmente construídos.
A autora Deborah Tannen(2006), citada por Coates (2006) traça um paralelo entre
homem e mulher e suas características, estabelecendo as diferenças entre eles
respectivamente: status X suporte, independência X intimidade, conselho X
entendimento, informação X sentimento, ordem X proposta. Para Tanne, os homens são
mais competitivos para dominarem uma idéia,já as mulheres querem receber apoio por
suas idéias. A mulher se preocupa mais do que o homem com o que dizer. Tannen, de
acordo com Coates,cria o seguinte quadro característico da linguagem masculina e da
feminina, evidenciando novamente diferenças entre os sexos:
Mulheres Homens
Falam muito Ouvem mais
Falam mais em ambiente
pequenos,íntimos
Falam bem para o grande público
Fala estabelecendo relações Negocia sua fala de acordo com o
contexto
Repete mais É objetivo
Enfim, resumindo, na relação entre homem e mulher, a linguagem é historicamente
construída e as regras de conversação também. Exemplos da língua inglesa, como
“chairman”, “fireman”, “mankind” carregam também marcas implícitas de sexismo,
com implicaturas convencionais, extraídas do dito.
Para evitar as implicaturas convencionais sexistas, há uma idéia de neutralização da
linguagem, ou seja, uma linguagem de gênero neutro,mas para tal seria preciso mudar
muitos conceitos. De acordo com a enciclopédia virtual Wikipedia (acessada em 2006),
alguns termos masculinos mostram uma aniquilação ao gênero feminino.Ao se referir a
seres humanos,por exemplo, se diz “o homem”(como ser vivo). No inglês, inclusive, a
palavra “woman”, para ser formada, se uniu com o radical “man”. Essas implicaturas
convencionais estão sendo pressionadas a desaparecerem.
O debate gira em torno de mudanças relevantes na linguagem, transformando-a em
neutra e não carregada por um preconceito histórico. A idéia é o que o dito não
provoque implicaturas com marcas sexistas.
Para evitar tais marcas de sexismo, é interessante algumas medidas, sugeridas pelos
estudiosos do assunto:
A) Não usar mais a expressão “direito do homem” e sim, “direito humano”;
B) Não dizer mais “aeromoça” e sim “atendente de vôo”;
C) Ao invés de “língua materna”, usar a expressão “língua de origem”;
D) “Reunião de pais” deve ser substituída por “reunião de pais e mães”;
E) “Os professores, os jovens, os brasileiros”, podem ser trocados por “professores e
professoras, juventude, povo brasileiro”;
F) “Precisa-se de estagiário” pode ser substituído por “estágio disponível”;
G) Em livros didáticos, trocar os títulos como “o aluno deve ler um texto” por “um
texto deve ser lido”.
Entre outras mudanças.
Observando esses detalhes sexistas, percebe-se como a linguagem é carregada
historicamente de preconceitos contra o sexo feminino que muitas vezes passa
despercebido, pois as pessoas acabam se acostumando e acreditam que é natural isso
que foi imposto. O sexismo deve ser evitado e há razões para o uso de uma linguagem
não sexista, pois as palavras podem interferir no jeito de pensar, no comportamento,
agregando sentimentos, conceitos e valores.
O texto publicitário não sai ileso da questão do sexismo,como já foi visto. Em
grande parte, as expressões apresentadas no texto publicitário podem não ser
implicaturas convencionais com marcas sexistas, como os exemplos apontados nesta
seção do trabalho, mas são implicaturas conversacionais particularizadas. Ou seja, não
se leva tanto em conta o uso de palavras masculinas generalizadoras na avaliação do
sexismo imposto pelas propagandas publicitárias. Há coisas mais graves na publicidade,
que vão além do que o significado convencional da palavra implica. Há traços fortes em
seus slogans que muitas vezes estão camuflados, ficam no nível do não dito. Os
estereótipos são criados nas implicaturas conversacionais particularizadas para vender, e
acabam mostrando o que pensa uma sociedade. A propaganda e sua linguagem mostram
como ideal uma mulher perfeita( linda,sexy, bem resolvida,etc) e as pessoas reais não
nascem assim, mas acabam lutando para se enquadrarem nesse perfil que não é dito,mas
implicado. Se alguém, por exemplo, processa uma propaganda por menosprezar
mulheres gordas (já que o ideal de beleza da sociedade é a magra e é isso que defendem
as propagandas publicitárias em seus implícitos), provavelmente perde a causa, pois no
nível do dito não há marcas preconceituosas.
O slogan publicitário persuade, fazendo acreditar, por exemplo, que tudo que
feminino é mais delicado, frágil e tudo que é masculino é viril. Fazendo acreditar que a
mulher é fútil e o homem não, que a mulher é objeto sexual, enquanto o homem é o
provedor financeiro. Tudo isso num nível implícito, criado a partir do conceito coletivo
de homem e mulher. A melhor maneira de estudar o sexismo não é somente analisando
o dito, onde essas marcas aparecem, mas analisando muito mais os implícitos, no caso
deste trabalho, onde essas marcas são inferidas.
O que se pretende analisar neste estudo é o tipo de sexismo freqüente nas
propagandas, os tipos de implicaturas extraídas a partir do dito que mostram marcas
sexistas, onde a mulher é vista como objeto a serviço do prazer masculino. Mesmo que
a propaganda em questão se direcione para a própria mulher, as propagandas as
persuadem para atrair os homens, ou seja, se ela vai ficar melhor com o produto
anunciado é com o intuito de agradar os homens. Outro tipo de sexismo evidenciado a
partir das implicaturas é o que mostra a mulher não somente bonita, mas fútil, que gasta
muito sem noção de razão. A futilidade feminina é explorada nas implicaturas dos
slogans, pois estas mostram a mulher como consumidora compulsiva, que não faz mais
nada além de gastar. O que se percebe nesse tipo de publicidade é que a mulher gasta
para agradar aos homens, sejam filhos ou maridos.
A outra forma de sexismo na linguagem publicitária, explorada a partir de
implicaturas é a de que o homem não precisa agradar as mulheres, ou seja, em uma
propaganda masculina, não precisa ter mulher (a não ser que ela seja seu objeto sexual
ou sua cozinheira). Aqui, o homem agrada a si, seus instintos. Sua masculinidade faz
bem para si e não para a mulher. O que está envolvido nesses comercias masculinos é o
dinheiro, a força e a aventura.
Por fim, conclui-se que a publicidade reflete o sistema ainda patriarcal da cultura
social, mesmo que tal reflexo seja nas implicaturas do dito. A mulher ainda é vista como
inferior ao homem, a serviço dele. O sexismo na publicidade, através das implicaturas
mostra essas marcas de conhecimento coletivo da sociedade sobre o papel da mulher.
Os implícitos que aparecem no texto publicitário e que direcionam ao sexismo são o
assunto para o próximo capitulo que mostra a análise de propagandas publicitárias,
elucidando o que foi dito até agora sobre o papel da mulher na publicidade. Nada
melhor para avaliar esses implícitos do que a teoria de Grice,que trata do significado
que vai além do dito e é isso que é feito no capítulo seguinte.
4 DISCURSO PUBLICITÁRIO, SEXISMO E ANÁLISE DOS DADOS
Os capítulos anteriores mostram a importância da Pragmática e a noção de que os
implícitos explicam aquilo que não foi totalmente expresso pelo dito. O slogan
publicitário serve como exemplo perfeito disso, isto é, expressa muito mais do que
diz,vai além do sentido literal. Por trás do que foi expresso, há crenças, valores, ideais,
que são percebidos no nível das implicaturas convencionais e no nível das implicaturas
conversacionais particularizadas, que são estudadas neste trabalho.
Este capítulo tenta aplicar a teoria griceana das implicaturas às propagandas
publicitárias. Na primeira seção aponta-se a metodologia utilizada para a análise, para
na próxima seção do capítulo, a análise ser feita.
4.1 METODOLOGIA
Assim como foi dito anteriormente, Grice (1975) busca sistematizar a conversação
humana, tentando explicar como é possível um ouvinte entender o que o falante disse e
o que quis dizer. Para tal, o autor elabora um cálculo lógico que é utilizado neste
trabalho para a análise das propagandas. Tal cálculo tenta explanar o que um indivíduo
(A) faz ao ouvir o enunciado (E) e julgar que dentro do contexto (C), o remetente da
mensagem (B) quis transmitir o implicado (Q), além do que (E) significa literalmente.
Costa (1984) afirma que esses cálculos se baseiam no Princípio de Cooperação e no
conhecimento de contexto, porém é esse o “x” da questão, pois os slogans são
dependentes do contexto e para poder aplicá-los em um cálculo dedutivo, pensa-se que
o contexto tem a função de um par ordenado com a sentença, e que seja parcialmente
conhecimento mútuo, pois do contrário não seria possível nova informação. Além disso,
também é preciso que seja um conjunto de proposições, formado, portanto, de entidades
representáveis lingüisticamente. Com essa definição de Costa, qualquer slogan
publicitário pode ser traduzido com referências conhecidas ou aceitas. O destinatário
poderá inferir o conteúdo significativo total permitido pelo remetente ( E+Q).
Pode-se pensar na teoria de Sperber e Wilson(1983) aqui,em relação à noção de
conhecimento mútuo e contexto. Para os autores não é possível falar em conhecimento
mútuo, visto que é impossível dizer que uma pessoa tem os mesmos pensamentos,
conceitos, que outra pessoa. O mesmo ocorre com o contexto, que é definido pelos
autores como um construto mental,que varia, é elástico, de acordo com as suposições
exigidas na hora do processamento das informações. Sperber e Wilson falam em
ambiente mutuamente manifesto. É uma maneira interessante de definição. O cerne da
questão está em conseguir a partir desses conceitos criar com forma lógica padrão uma
metodologia de análise.
A preocupação do trabalho é em avaliar a Teoria das Implicaturas de Grice, sua
metodologia, aplicabilidade, portanto, é utilizada a ampliação de seu modelo, sugerida
por Costa(1986), que diz que o conceito de contexto é o conjunto indeterminado de
sentenças mutualmente conhecidas,das quais apenas as relevantes,necessárias e
determinadas são consideradas para o cálculo de uma implicatura.
A análise das implicaturas é feita com o seguinte cálculo, a partir de Grice:
(A) o destinatário (o consumidor-masculino ou feminino)
(B) o remetente (as empresas que oferecem o produto)
(C) o contexto (conjunto de proposições potenciais, conhecidas por (A) e (B) ou que
pelo menos, podem ser aceitas como não controversas. O contexto da propaganda
também aparece aqui).
(E) o enunciado (o slogan)
(I) a implicatura (as inferências pragmáticas do tipo griceano)
O corpus se constitui de 19 propagandas e 21 slogans publicitários, já que uma
propaganda possui mais de um slogan. Essas propagandas podem ser encontradas nas
revistas Veja, Boa Forma, Cláudia, Playboy, Época, e no jornal Zero Hora. A
publicação dos slogans é do ano de 2006. Então, na seção seguinte do capítulo, dá-se
início às análises.
4.2 ANÁLISE DE DADOS
Como foi estabelecido na parte anterior deste capítulo, a metodologia aplicada na
análise dos slogans publicitários respeita a teoria de Grice(1975), seguindo o cálculo
dedutivo apresentado por Costa(1984).
Esta seção detém-se na análise dos slogans publicitários, lembrando que somente
são exploradas as implicaturas particularizadas e que a imagem só serve na análise
quando acrescenta alguma relação com a escrita e que acaba gerando implicatura.
Seguem-se então os slogans publicitários com suas análises:
Propaganda 1: Lojas Paquetá
(E1) Homens, negociem com elas um pedacinho do armário.
(I) O homem precisa negociar com as mulheres um pequeno espaço no armário,
porque este é ocupado todo por elas. (Implicatura conversacional particularizada por
quebra da máxima de quantidade).
(A) Consumidor masculino
(B) Lojas Paquetá
(C)
1- Lojas Paquetá vendem calçados (a imagem fornece tal informação);
2- Os calçados são guardados em armários;
3- O espaço dos armários é mais ocupado por mulheres;
4- Os homens comprarão os sapatos oferecidos pela loja, pois vale a pena pelo preço
sugerido na imagem e o enunciado garante isso ao prever que precisarão de espaço no
armário;
5- Comprando calçados, os homens precisam de mais espaço no armário;
6- Os homens devem negociar com as mulheres um lugar no armário;
7- Negociar implica na idéia de que não será fácil;
8- A palavra “pedacinho” implica que a negociação não será para todo o armário;
9- As mulheres continuarão com mais espaço no armário;
10- As mulheres têm mais calçados do que os homens, por isso ocupam mais espaço
em armários.
O cálculo inferencial feito por (A) deve ser:
1. (B) disse (E1);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E1) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E1) e implicou (I).
A implicatura percebida em evidência é a de que o homem não compra vários
sapatos. Mas há uma implicatura sexista em volta disso que aponta a mulher como a
maior compradora de sapatos e isso é tido como futilidade na sociedade. O homem,
então, pela implicatura gerada a partir do dito, não liga tanto para a futilidade e é mais
econômico do que a mulher. Ele comprará o sapato pois o preço indica estar barato.
A intenção de chamar a mulher de fútil fica no nível do não dito, sendo apenas
sugerida tal inferência.
Propaganda 2- Linha Pipper
(E2) Louras, ruivas ou morenas,não importa o seu gosto,a linha Pipper combina
com todas elas.
(I) O homem pode gostar de louras, ruivas ou morenas, pois os sapatos oferecidos
pela linha Pipper combina com qualquer uma delas. A citação “loura, ruiva ou morena”
é ambígua, pois tanto pode referir-se à mulher, como à cerveja (Implicatura
conversacional particularizada pela quebra da máxima de modo, por ter ambigüidade).
A imagem auxilia na ambigüidade, pois mostra as cervejas de cores diferentes e estas
são chamadas de loira, ruiva ou morena, na sociedade, comparando-as com as mulheres.
(A) Consumidor masculino
(B) Linha Pipper de calçados
(C)
1- Pipper é uma marca de sapatos, de acordo com a imagem;
2- Na imagem os calçados têm diferentes cores e modelos;
3- A cor dos sapatos combina com a cor das cervejas mostradas na imagem;
4- A referência às cervejas é feita na linguagem escrita pelas suas cores e estas
servem para descrever também cores de cabelos femininos, que não aparecem na
imagem,mas que o conhecimento extralingüístico fornece;
5- Com qualquer cor que o homem preferir, o sapato combinará;
6-Associando as cores das cervejas com as de cabelos femininos, qualquer mulher
que o homem pretende seduzir,combinará com o sapato;
7- Então vale a pena ter calçado da linha Pipper.
O cálculo de (A) então deve ser:
1. (B) disse (E2);
2. (B) não ofereceu todas as informações requeridas pelo que disse, sendo ambíguo;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E2) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E2) e implicou (I).
Propaganda 3- Desodorante Senador
(E3) O que agrada uma mulher é o quanto você tem de QI e não de HP.
(I) QI é relacionado à inteligência e HP aos odores do corpo. A mulher não se
interessa por esse último, mas pelo primeiro. O homem precisa ser inteligente para
conquistar uma mulher e cheiroso, usando desodorante Senador (Implicatura
conversacional particularizada por quebra da máxima de quantidade).
(A) Consumidor masculino
(B) Desodorante Senador
(C)
1- A imagem mostra um homem guiando uma mulher em sua bicicleta e ela aparece
sorridente;
2- O que agrada uma mulher é a inteligência de um homem e seu perfume;
3- HP é uma referência ao cheiro do homem. É uma expressão usada para fazer par
esteticamente com QI, num jogo de linguagem, que reduz as palavras, para efeito
estético e veloz;
4- Não basta o homem ser inteligente, precisa ser cheiroso;
5- O desodorante Senador resolve o problema de mau cheiro do homem;
6- Se homem está cheiroso, só importa o seu coeficiente de inteligência para seduzir
uma mulher.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E3);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E3) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E3) e implicou (I).
Propaganda IV: Mangels- rodas de alumínio e aço
(E4) Deixe as mulheres louquinhas usando silício ,titânio,estrônio e alumínio.
(I) Os homens querem deixar as mulheres loucas por eles e elas gostam não dos que
usam silicio,estrônio, alumínio,pois isso não se usa de fato,mas dos que usam carros
que possuem as rodas sugeridas pela imagem e que possuem tais compontentes(
Implicatura conversacional particularizada por quebra de máxima de qualidade,visto
não ser possível um homem usar esses componentes).
(A) Consumidor masculino
(B) Rodas Mangels
(C)
1- Mangels é uma marca de rodas de carro;
2- A imagem mostra modelos de rodas, além do texto escrito;
3- Deixar as mulheres louquinhas é deixá-las muito interessadas nos homens;
4- O homem não usa em silício, estrônio ou alumínio;
5- A descrição desses componentes pertence à roda de carro;
6- Quanto mais atrativa e melhor for a roda do carro, mais atrativo o homem se
torna;
7- Quanto mais atrativo o homem, mais agrada às mulheres;
8- A Mangels oferece essas rodas atraentes, que o tornarão atraente e deixarão as
mulheres loucas.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E4);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E4) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E4) e implicou (I).
(E5) A gente faz melhor do que as outras para você ser melhor do que os outros
(I) A Mangels é melhor do que as outras marcas de rodas e a usando o consumidor
em questão se torna melhor do que os outros homens, mostrando que há
competitividade a partir de bens materiais (Implicatura conversacional particularizada
por quebra da máxima de quantidade).
(C)
1- Mangels é uma marca de carro;
2- Mangels compete com as outras e se acha melhor;
3- O homem usando Mangels se torna melhor do que os que não usam;
4- O homem compra rodas Mangels para ser melhor do que os outros;
5- Mangels incentiva a competição entre os homens.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E5);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E5) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E5) e implicou (I).
(E6) Toda mulher sonha em encontrar um príncipe num cavalo branco. Mas se
aparecer num carro com rodas Mangels, também serve.
(I) Apesar da evolução da mulher, ela ainda está atrelada aos valores antigos,
pregados em contos de fadas, de forma machista, que vê o homem como príncipe.
Porém, mesmo acreditando nesse romantismo, a mulher aceita a praticidade do
capitalismo, o homem de carro. Mas não é qualquer carro que substitui o cavalo branco
dos contos de fada, e sim um com rodas Mangels ( Implicatura conversacional
particularizada por quebra da máxima de qualidade,por não existir príncipe, cavalos).
(A) Consumidor masculino
(B) Mangels
(C)
1- Mangels vende rodas para carros;
2- A mulher atual ainda pensa em príncipe e cavalo branco;
3- O homem continua sendo um príncipe;
4- Quanto melhor a roda, melhor o carro;
5- A mulher troca o cavalo branco pelo carro com rodas mangels.
6- A mulher é guiada pelo homem.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E6);
2. (B) não ofereceu todas as informações verdadeiras no que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E6) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E6) e implicou (I).
Propaganda 5: Relógios Dumont
(E7) Você vai olhar tantas vezes para o design que já vai funcionar como exercício
para o braço.
(I) Usando o relógio Dumont, se quer olhar várias vezes para o seu modelo e ao
fazer isso precisa levantar o braço. Assim, o braço estará fazendo exercício muscular e
se tornará mais musculoso, forte.(Implicatura conversacional particularizada por quebra
de máxima de quantidade).
(A) Consumidor masculino
(B) Relógios Dumont
(C)
1- Dumont é uma marca de relógio;
2- Na imagem aparecem relógios masculinos e a palavra design em destaque;
3- Palavras estrangeiras têm apelo estético, valorizando o produto anunciado;
4- O consumidor idealizado sabe que design quer dizer desenho;
5- O desenho do relógio é considerado bonito;
6- Quem tem esse relógio, olha o desenho várias vezes por ser este bonito;
7- Para olhar o desenho, é preciso movimentar o braço e isso, ao ser repetido muitas
vezes, fortalece sua musculatura;
8- O Relógio Dumont funciona como exercício além de mostrar o horário;
9- O Relógio Dumont deixa o homem com o braço exercitado.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E7);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E7) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E7) e implicou (I).
Propaganda 6: VIVO
(E8) Você já ganhou muita mesada de seu pai. Agora está na hora de retribuir.
(I) O pai é chefe da família e é quem supostamente tem o dinheiro, dando mesada
aos filhos, que quando crescem e viram homens, também com dinheiro, devem retribuir
esse investimento. (Implicatura conversacional particularizada por quebra da máxima de
qualidade, pois está afirmando algo sem evidência).
(A) Consumidor masculino
(B) Operadora Vivo de telefonia Celular
(C)
1- O pai é a figura masculina dentro de uma família;
2- É o pai que dá a mesada ao filho e não a mãe;
3- O pai é homem, portanto são os homens que administram o dinheiro na família;
4- A imagem mostra um homem jovem;
5- O homem, que é filho agora, tem dinheiro para retribuir a mesada que recebeu;
6- O homem tem dinheiro.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E8);
2. (B) não ofereceu todas as evidências requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E8) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E8) e implicou (I).
Os slogans publicitários analisados até então mostram uma linguagem incompleta
de significação (propositadamente), mas completa de implícitos,ou seja, no nível do
não dito, das inferências realizadas, percebe-se as implicaturas particularizadas que
mostram que o homem é uma figura forte, atraente,inteligente e com dinheiro.
Na primeira propaganda infere-se a partir do dito que a mulher é vista como mais
consumidora do que o homem e, portanto, ocupando mais espaço em armários. Isso é
uma idéia de consumismo exagerado da mulher-que ocupa um armário inteiro -
tornando sua imagem como alguém fútil. O homem por sua vez é mais econômico e só
compra o básico.
Na segunda propaganda, o homem novamente no implícito do dito é visto como o
centro, ao ser mostrado a possibilidade de escolher o que ele prefere. A referência é à
cerveja, mas percebe-se claramente a ambigüidade, pois também se trata de preferência
em relação às mulheres. E fica evidente que o homem pode ter a mulher que quiser.
Na terceira propaganda, o homem é inteligente, e é quem guia a mulher, isso se
percebe na imagem, que mostra ele carregando-a.
Na quarta propaganda, a mulher, a partir do cálculo inferencial, é vista como fútil
novamente, interesseira, que visa a roda do carro que o homem possui. Quem dirige o
carro é o homem, pois a propaganda só faz referência ao sexo masculino, tratando a
mulher como objeto de desejo. O homem valoriza muito o carro, pois é símbolo de
status,poder. Quanto melhor este for, e aí envolve a melhor roda, mais potente o homem
se sente e mais ele conquista as mulheres (que se importam com o melhor carro). A
sociedade prega que o homem precisa de carros velozes, por estilo aventureiro. Mas
antes disso,a sociedade mostra que o homem deve ter carro, pois é sua função
“carregar” a mulher. Então,essa,fútil como a sociedade mostra, opta em ficar com quem
tem o melhor carro,como se ela não tivesse condições de ter um próprio. A força de um
carro simboliza para o homem sua própria força. E nisso os homens competem,mostram
sua futilidade,que não é criticada pela sociedade,ao contrário é estimulada com carros.
A propaganda até estimula a competição.
Na quinta propaganda, implica-se que os relógios Dumont, além de exercitarem os
braços, são bonitos e “chiques” (já que há o uso de palavra estrangeira para designar seu
modelo, que por conhecimento de mundo sabemos que é usada para valorizar mais a
palavra, pois o inglês é valorizado como a língua do poder). O poder físico associado ao
status social é uma ótima combinação. A relação não é de futilidade e sim de virilidade,
pois trará força ao braço do homem.
Analisadas as propagandas, a partir de seus slogans publicitários, direcionadas ao
público masculino, mas com implicaturas sexistas que indicam que a mulher é objeto de
desejo do homem e ele pode ter a que quiser, a partir de agora, partimos para a análise
das propagandas para o público feminino, verificando suas implicaturas.
Propaganda 7: Condicionador Phytoervas- máscara hidratante para cabelos
(E9) Seu cabelo tem de ser jovem,mas não rebelde.
(I) Os cabelos precisam ser jovens e não podem ser rebeldes (essa obrigatoriedade e
contradição entre as duas informações se faz presente a partir da implicatura
convencional das palavras “tem” e “mas” e dos conceitos de “jovem” e “rebelde”. A
comparação é entre cabelo e jovens, apontando características semelhantes a ambos.
Ou seja, o cabelo da mulher pode ser jovem, mas ser rebelde como os jovens são
considerados, não precisa. Para tal, as mulheres precisam tratá-los( Implicatura
conversacional particularizada por quebra da máxima de qualidade, por ambigüidade
com os termos “jovem” e “rebelde” referentes a pessoas e a cabelos).
(A) Consumidora feminina
(B) Condicionador Phytoervas
(C)
1- Phytoervas é uma máscara hidratante para cabelos femininos;
2- O hidratante é usado par amaciar os cabelos;
3- Os cabelos devem ( a implicatura convencional de “tem de ser” garante essa
obrigatoriedade)ser bonitos;
4- A comparação de beleza é estabelecida com a juventude. Quanto mais
jovem,mais bonito se é(não só cabelos,mas pessoas, implicatura obtida a partir de
conhecimento de mundo);
5- Os jovens têm fama de serem rebeldes;
6- Os cabelos sendo comparados aos jovens deveriam ser rebeldes, mas isso não é
necessário.(Implicatura percebida com o uso de “mas” no contexto do enunciado;
7- A imagem mostra uma mulher serena, com cabelos lindos e “domados”;
8- O hidratante deixa o cabelo lindo, jovem, mas diferente da personalidade deste, o
cabelo fica domado,não rebelde.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E9);
2. (B) foi ambíguo naquilo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E9) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E9) e implicou (I).
Propaganda 8- O Boticário
(E 10) Aumente seu poder de atração
(I) A mulher se perfuma para atrair homens e quanto mais perfumada, mais atrai
(Implicatura conversacional particularizada por quebra da máxima de quantidade)
(A) Consumidora feminina
(B) Lojas O Boticário
(C)
1- O Boticário é uma loja que vende produtos de perfumaria e cosmética;
2- Accordes, perfume que aparece na imagem é um perfume de O Boticário;
3- Comprando um Accordes, mais R$ 3,90, ganha uma emulsão perfumada, diz o
anúncio;
4- Quanto mais perfumada, mais atraente a mulher fica;
5- A mulher tem o poder de atração (há implicatura convencional com o uso da
palavra “aumente”,ou seja, só se aumente o que já se tem);
6- Usando os dois produtos de O Boticário, esse poder de atração aumenta.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E10)
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E10) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E10) e implicou (I).
Propaganda 9: Lojas Conto Freire
(E 11) Ela merece se sentir assim-Dia das mães Lojas Conto Freire
(I) A mulher gosta de se sentir bela, e para tal, usa lingerie bonita. A mulher é
amante e mãe e gosta de sentir desejada, bonita (Implicatura conversacional
particularizada por quebra da máxima de quantidade).
(A) Consumidor masculino
(B) Lojas Conto Freire
(C)
1- Conto freire é uma loja de roupas e acessórios;
2- As mulheres escolhem belas lingeries para ficarem bonitas (conhecimento de
mundo implicado, ao usar a expressão “ela merece”, dando a idéia de que é algo que ela
quer );
3- As mulheres gostam jóias (conhecimento de mundo implicado pela imagem da
mulher com lingerie jóia e um semblante feliz);
4- Os homens adoram ver as mulheres bonitas e sensuais(conhecimento de mundo);
5- No dia das mães, as mulheres recebem presentes de seus maridos ou namorados;
6- Para os homens a mulher tem de ser sensual e não somente no papel de mãe;
7- Os homens comprando jóias agradam suas mulheres;
8- Os homens comprando lingerie agradaram suas mulheres;
9- Os homens comprando jóias e lingerie deixam a mulher satisfeita e bonita;
10- As mulheres bonitas e sensuais agradam os homens.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E11);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E11) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E11) e implicou (I).
Propaganda 10- Emagrecedor Magrims
(E12) Não sinta inveja das magras. Seja uma delas
(I) A mulher magra é o padrão ideal de beleza (conhecimento de mundo), por isso as
gordas sentem inveja. É uma gorda que inveja uma magra, pois o uso de “não sinta
inveja das magras” implica que ela sente isso e que não é magra, pois do contrário,não
sentiria .(quebra da máxima de quantidade)
(A) Consumidora feminina
(B) Emagracedor Magrims
(C)
1- Ser magra é ser invejada por quem não é;
2- Se alguém sente inveja da magra, é porque é bom ser magra;
3- Quem inveja a magra é uma gorda;
3- É possível ser magra, para não invejar mais quem tem esse padrão;
4- Usando o emagrecedor Magrims se fica magra;
5- Usando o emagrecedor magrims não sentirá mais inveja.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E12);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E12) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E12) e implicou (I).
Propaganda 11: Frisco Light
(E 13) Verão sem canga. Patrocínio Frisco Light
( I ) A beleza física e importante. No verão quem não tem corpo bonito se esconde
numa canga (conhecimento de mundo). Quem não é magro, não tem o corpo bonito
(preconceito presente na sociedade, conhecimento extralingüístico ancorado na imagem,
que auxilia no processamento de tal inferência). Quem não tem o corpo bonito não se
expõe. Frisco deixa a mulher magra para poder mostrar seu corpo, sem
canga.(Implicatura particularizada por quebra da máxima de quantidade)
(A) Consumidora feminina
(B) Frisco Light refresco
(C)
1- Frisco é uma marca de suco e light” (palavra inglesa que enfeita o termo) indica
que é leve, não tem calorias , portanto não engorda;
2- Somente magras exibem seus corpos;
3- A mulher gorda esconde o corpo numa canga em época de praia;
4- Quem toma o suco Frisco Light não engorda;
5- Não estando gorda pode exibir o corpo;
6- Exibir o corpo é um espetáculo, por isso a expressão “patrocínio”, como se fosse
um show;
7- Frisco é patrocinador desse espetáculo de mostrar um corpo bonito, porque ajuda
a criá-lo, já que não engorda por ser “light”.
O calculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E13);
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E13) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E13) e implicou (I).
Propaganda 12- Sundown
(E14) Chegou o Sundown com fator de sedução solar.
(I) O Sundown tem uma fórmula que seduz o homem (Implicatura conversacional
particularizada por quebra da máxima de qualidade, há um jogo de palavras, o fator que
há em loções bronzeadoras é de proteção de solar e não sedução solar).
(A) Consumidora feminina
(B) Sundown- protetor solar
(C)
1- Sundown é bronzeador;
2- Todo bronzeador tem fator de proteção solar;
3- Sundown tem fator de proteção e ainda tem fator de sedução solar;
4- Sundown bronzeia a pele;
5-Pele bronzeada é sedutor;
6- Ao ficar bronzeada a mulher seduz o homem;
7- Sundown ao ajudar a mulher a ficar bronzeada, ajuda também a seduzir os
homens;
8-Sundown tem então fator de sedução solar.
O cálculo de (A) deve ser:
1- (B) disse (E14);
2- (B) não ofereceu informação verdadeira no que disse;
3- Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4- (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5- (B) será relevante dizendo (E14) se pretender que (A) pense (I);
6- (B) disse (E14) e implicou (I).
Propaganda 13- Intimus Gel
(E15) Por que as mulheres gostam de dormir cobertas mesmo no verão? Enquanto
os homens colocam o ar condicionado no máximo, as mulheres não saem sem uma
casaquinho, porque elas querem se sentir protegidas. E o intimus gel noturno traz essa
proteção
(I) As mulheres precisam de proteção enquanto os homens são corajosos. Intimus
Gel protege a mulher. (Implicatura conversacional particularizada, respeitando a
máxima de quantidade).
(A) Consumidora feminina
(B) Intimus Gel Noturno
(C)
1- As mulheres sempre se cobrem, mesmo no verão, que é calor e não precisa se
cobrir, porque querem se sentir protegidas;
2- Ao querer sentir-se protegida, a mulher evidencia que é frágil;
3- O homem é valente e liga o ar condicionado no máximo, o oposto da mulher que
sente frio mesmo no calor;
4- O homem é mais forte que a mulher;
5- Intimus Gel protege a mulher na noite, pois cobre qualquer vazamento;
6- Intimus Gel é como um homem, valente, e serve para proteger a mulher.
O cálculo de (A)deve ser:
1. (B) disse (E15)
2. (B) ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E15) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E15) e implicou (I).
Propaganda 14- Menoscal
(E16) Cada homem prefere uma parte do corpo feminino. Se você quiser pode ter
todas as preferências de uma vez.
(I) Os homens gostam de diferentes partes femininas do corpo, a mulher quer atrair
o homem, tendo uma parte do corpo bonito. O produto oferece a possibilidade de ter
todas as partes bonitas, atraindo mais homens. (quebra da máxima de quantidade)
(A) Consumidora feminina
(B) Menoscal
(C)
1- Diferentes homens valorizam diferentes partes do corpo feminino;
2- A mulher se preocupa com a opinião do homem e quer ter o corpo bonito para
atrai-lo;
3- Quanto mais parte do corpo bonita tiver, mais a mulher atrairá os homens;
4- Usando o produto, o corpo ficará todo bonito e se conseguirá todos os homens.
O cálculo de (A) deve ser:
1-(B) disse (E16)
2- (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3- Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4- (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5- (B) será relevante dizendo (E16) se pretender que (A) pense (I);
6- (B) disse (E16) e implicou (I).
Propaganda 15: Credicard Mastercard
(E17) Batom:12,00
Sombra:15,00
Pó facial: 23,00
Ele chegar antes da hora,encontrá-la sem maquiagem e achar que você está
pronta,não tem preço.
(I) A mulher precisa de maquiagem e gasta dinheiro com isso, para seduzir o
homem. É demorada a produção de seu visual, o homem precisa chegar quando ela já
está pronta, para não pegá-la desarrumada,já que ela o seduz com sua beleza. Ele chegar
antes e não se importar com o fato de ela não estar maquiada, achando-a até
bonita,arrumada, é algo fora do comum e não há dinheiro que pague essa satisfação
feminina de ser aceita como é (Implicatura conversacional particularizada por quebra da
máxima de quantidade).
(A) Consumidora feminina
(B) Cartão Credicard Mastercard
(C)
1- Credicard é um cartão de credito;
2- Com cartão de credito se compra o que quiser, pois este funciona como dinheiro;
3- As maquiagens podem ser compradas com cartões de crédito e o valor delas
aparece na imagem;
4- A mulher precisa da maquiagem para se arrumar para o homem, para seduzi-lo;
5- Para se arrumar, se maquiar, a mulher precisa de bastante tempo e por isso o
homem espera;
6- O homem que não se importa em ver a mulher desarrumada e ainda acha que ela
está pronta sem maquiagem é algo raro de acontecer, pois as mulheres têm fama de
demorarem em se arrumar e o homem de se importar com a aparência delas.
7- O homem que não se importa em ver a mulher sem maquiagem, achando que esta
está pronta, é incomum e não há como comprar, pois não há dinheiro que pague;
8- Para todas outras coisas, como a maquiagem, o cartão Credicard pode comprar.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E17)
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E17) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E17) e implicou (I).
Propaganda 16: Lojas Pompéia
(E18) Não discuta a relação, melhore.
(I) uma implicatura convencional que indica que a mulher discute- a partir do
uso de “não” e “não discuta”. Para o homem, não é preciso discutir relação, basta a
mulher estar linda ou sexy, conforme mostra a imagem. Para a mulher, o mais
importante é discutir a relação. O homem acredita que se ela for sexy a relação
melhorará. O problema da relação não tem a ver com discussão,mas com sexo. As
lingeries ajudam a resolver isso.
(Implicatura conversacional particularizada por quebra de modo, é irônico, há uma
ironia em relação ao fato de as mulheres quererem sempre discutir relação e os homens
não).
(A) Consumidora feminina
(B) Lojas Pompéia
(C )
1- Mulheres discutem relação;
2- Os homens não gostam de discutir relações;
3- A imagem mostra uma mulher de lingerie;
4- A relação não está boa, pois precisa melhorar;
5- O problema da relação, conforme a escrita mostra, é da mulher;
5- É a mulher que precisa melhorar a relação;
6- Para melhorar a relação, a mulher não deve discutir e sim ser sexy, seduzir o
homem;
7- Sendo sexy, a relação melhora;
8- Nas lojas Pompéia há lingeries para serem compradas para este fim.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E18)
2. (B) foi irônico em sua declaração;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E18) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E18) e implicou (I).
Propaganda 17: Provedor Uol
(E19) Se tudo na vida fosse rapidinho como instalar o Uol.
(I) A imagem mostra um homem esperando a mulher se arrumar e isso leva, pela
expressão do seu rosto, muito tempo, não é tão rápido como instalar o Provedor Uol,
conforme anuncia a propaganda. Se a mulher fosse como o provedor uol, seria rápida
(Implicatura conversacional particularizada por quebra de máxima de modo - é irônica,
pois há uma critica em relação à demora das mulheres para se arrumar, ao mesmo tempo
em que mostra a qualidade de rapidez do provedor).
(A) Consumidor feminino e masculino
(B) Provedor UOL
(C )
1- Uol é um provedor de Internet;
2- A imagem mostra uma mulher se arrumando e um homem cansado, pela sua
expressão, de esperá-la;
3- A mulher não é rápida para se arrumar;
6- Se a mulher fosse como o Uol, seria rápida;
7- Uol é um provedor rápido.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E19)
2. (B) foi irônico em sua declaração, criticando a demora das mulheres para se
arrumarem;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E19) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E19) e implicou (I).
As propagandas descritas até então, que são direcionadas ao público feminino
mostram em, seus slogans, que a mulher tem duas características fortes: como objeto
sexual e como fútil.
Ao tratarem a beleza da mulher, sua sensualidade, como arma para seduzir homens,
ao mostrarem o que é necessário para a mulher conseguir atrair seu homem, as
propagandas demonstram que estes são superiores e que a mulher é que deve se esforçar
para atraí-lo. Os homens não precisam fazer nada, pois se há problemas na relação do
casal, por exemplo, basta a mulher resolver, como se fosse a culpada. Isso é percebido
sempre no nível do não dito. As propagandas apontam implicitamente, jogando com
conceitos de mundo e contexto específico. A melhor forma para manter uma relação boa
com seu parceiro, ou para seduzir um homem, é garantindo sua beleza, despertando no
homem vontade pelo sexo. A mulher então é vista como objeto sexual. Além disso, ela
é apresentada nas implicaturas como fútil, ou seja, preocupada com a aparência
excessivamente, e é apresentada também como demorada, pois se retrata a mulher
levando horas para se produzir para o homem,que é rápido e está sempre pronto. A
demora que as mulheres cometem se arrumando é sempre referente ao homem, ou
seja,só há uma produção de maquiagem porque há um homem a sua espera e a mulher
precisa estar linda,para o homem aprová-la.
A seguir outras propagandas, que apresentam a mulher com outra característica
marcante: a de “domesticada”.
Propagada 18: Refrigeradores Cônsul
(E20) Agora mesmo, em algum lugar do Brasil, tem uma mulher escolhendo uma
Cônsul. Agora também, agora também.
(I) A Cônsul é marca de eletrodomésticos, produtos para a casa e em todo momento
há mulheres que compram estes produtos. São elas que estão na casa e fazem as
compras do lar, são elas as donas de casa. (Implicatura conversacional particularizada
por quebra da máxima de qualidade,não há evidencia real do que se diz)
(A) Consumidora feminina
(B) Refrigerador Cônsul
(C)
1- Cônsul é marca de eletrodomésticos, mas a imagem mostra que a propaganda se
refere a um refrigerador;
2- Refrigerador é utensílio para casa;
3- Os refrigeradores Cônsul são vendidos em todo Brasil;
4- Em todo momento são comprados produtos Cônsul;
5- Quem compra produtos Cônsul é a mulher;
6- A mulher é responsável pelas compras da casa;
7- Mulher é dona de casa, responsável pelos serviços domésticos.
O cálculo de (A) deve ser:
1. (B) disse (E20)
2. (B) não forneceu evidencias suficientes para o que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E20) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E20) e implicou (I).
Propaganda 19: Tramontina e Lojas Manlec
(E21) Festival Tramontina e Manlec. É por isso que você não consegue sair da casa
de sua mãe.
(I) As mães são as pessoas que cozinham numa família. Elas fazem comidas boas
para os filhos, por isso eles não saem de casa, são protegidos pela mãe nesse sentido. As
panelas Tramontina são responsáveis pela boa comida da mulher e nas Lojas Manlec
estão em ofertas (Implicatura conversacional particularizada por quebra da máxima de
quantidade).
(A) Consumidora feminina
(B) Tramontina e Lojas Manlec
(C)
1- As mulheres cozinham em casa;
2- As mulheres são mães que cuidam de seus filhos;
3- Uma maneira boa de segurar o filho em casa é cozinhando bem;
4- Os filhos comem a comida feita por suas mães;
5- Ao cozinhar com panelas marca Tramontina, a comida fica boa;
6- A dona de casa já usa Tramontina,pois o filho já gosta da sua comida;
7- Na Lojas Manlec tem panelas Tramontina com preços baixos;
8- As mulheres compraram as panelas Tramontina nas Lojas Manlec e fazem
comidas boas para os filhos;
9- Gostando da comida,os filhos sempre ficam em casa para comer com a mãe.
O cálculo de (A) deve ser:
1.(B) disse (E21)
2. (B) não ofereceu todas informações requeridas pelo que disse;
3. Ainda assim, (B) deve estar cooperando;
4. (B) sabe que o consumidor sabe (C);
5. (B) será relevante dizendo (E21) se pretender que (A) pense (I);
6. (B) disse (E21) e implicou (I).
O que se percebe nestas duas últimas propagandas è a relação entre a mulher e o
serviço doméstico, ou seja, ela é responsável pelos cuidados da casa, implicando a idéia
de que quem é o responsável pelo trabalho fora de casa são os homens. As mulheres
cuidam do lar e são boas mães, e isso é uma imagem domesticada, onde se apresenta a
mulher como alguém que serve para cozinhar, cuida de casa, comprando utensílios
domésticos e cuidar dos filhos.
Analisando as propagandas, pôde-se verificar que estas apresentam marcas de
sexismo nos seus implícitos. As implicaturas que mostram marcas de sexismo são
apresentadas de diferentes formas e estão sempre nas entrelinhas, dificilmente aparecem
na superfície, porque o objetivo principal do anunciante do produto é vender o que
oferece,destacando sua qualidade. O que ocorre é que se provoca essas implicaturas em
relação ao dito e se provoca inferências sexistas sobre o papel da mulher, porque o
anunciante acha que está agradando, por pensar que é o que o consumidor procura.Em
sua visão, o que ele faz é implicar algumas idéias com o objetivo de persuadir à compra,
pois busca no nível do não dito tocar em algum desejo do consumidor em potencial.
Porém, por trás deste objetivo primário,há um secundário, o traço do sexismo, já que o
que se mostra nas implicaturas é a mulher como reflexo de uma construção cultural
criada ao longo dos tempos pela sociedade.A imagem da mulher é evidenciada nas
marcas implícitas das propagandas de forma bem sexista, sendo vista como objeto
sexual, como domesticada,como fútil,etc.Isso se percebe até na comparação entre as
propagandas que são elaboradas ao consumidor masculino e quando referentes ao
consumidor feminino. O homem é o forte, o viril, sempre pronto e o que tem dinheiro.A
propaganda é mais direta do que quando se refere ao público feminino.Aliás, mesmo
sendo este último gênero o destinatário,ainda assim, envolve o público masculino,já
que as propagandas feitas para as mulheres sugerem dicas para atrair os homens, de
diferentes formas, ou seja, o alvo de conquista é sempre o homem. A mulher está se
produzindo,cozinhando bem, se vestindo de forma bonita, não para ela,mas para um
homem,enquanto o homem é viril para ele mesmo.
A mulher está sempre um passo atrás do homem. Enquanto o homem é forte,viril,
fornecedor do dinheiro,a mulher é subjugada ao lar, à prestação de serviços domiciliares
e serviços sexuais, devendo estar bonita para ser seu objeto sexual, e não deve discutir
relação, pois é criticada. Aliás, conforme foi verificado, um dos slogans publicitários
mostra isso claramente ao implicar que as mulheres sempre querem discutir relação,e
que são culpadas dos problemas desta, já que se infere a partir do slogan que se elas
fossem mais satisfatórias em seus serviços sexuais(usando roupas mais sexy), a relação
melhoraria. A culpa, a reponsabilidade de uma relação está nas mãos da mulher, ela
deve satisfazer em primeiro plano o homem. Até na comida, se cozinhar bem, mantém o
filho em casa, do contrário, conforme implicado em um dos slogans analisados ,ele sai,
ou seja, o que se valoriza é o talento de cozinhar,sua domesticidade, e não o resto de
suas qualidades.
Esses protótipos de homem e mulher obtidos nas implicaturas dos slogans
publictários, vale frisar, nada mais são do que conceitos já formados na mente de uma
sociedade machista e que são refletidos não somente na publicidade mas na mídia em
geral, e nas relações sociais. O que as propagandas publicitárias com seus slogans
apontam é o reflexo de uma pensamento da sociedade atual, que apesar de ter evoluído
em muitos aspectos, continua com conceitos pré-formados sexistas sobre a relação
social entre homem e mulher, mostrando que o ideal desejado pela mulher é apenas o
de agradar o homem.
O grande mérito dos slogans publicitários está na habilidade em mostrar suas
marcas sexistas de forma não evidente, ou seja, os conceitos preconceituosos sobre a
mulher já não são tão explicitos, pois não se aceita ter preconceitos numa sociedade que
se diz “justa”. Esses preconceitos são então implícitos, escapam do dito e aparecem nos
cálculos inferenciais. Portanto, é importante ir além do que a imagem, do que slogan
publicitário mostra, é preciso buscar suas implicaturas e identificar assim as marcas
reais da sociedade e seu modo de pensar.
É preciso ir para as entrelinhas, para o não dito, encontrando o implicado, a fim de
desvendar os preconceitos implícitos e fazer uma análise critica disso. E não há melhor
recurso do que utilizando a Teoria das Implicaturas de Grice, que a partir de seu cálculo
inferencial, permite identificar o sexismo que há por trás do dito. Ou seja, estudando a
linguagem de forma precisa, objetiva, pode-se chegar a solução de problemas que
fogem do âmbito da Lingüística e caem no social, o que não é interesse deste
trabalho,que busca apenas avaliar linguisticamente um modelo de teoria pragmática,
verificando sua aplicabilidade e consistência. Percebe-se que a máxima de quantidade é
a mais violada, justamente porque as propagandas publicitárias dizem pouco (seja por
economia de espaço, dinheiro, seja por economia de palavras para não se
comprometerem, pois escolhem um dito que implica várias significações).
Neste capítulo foi feita, então, a análise dos slogans publicitários, realizando
primeiramente um breve estudo sobre a linguagem publicitária, a fim de entender os
mecanismos envolvidos em tal processo comunicativo. Em seguida foi abordado o tema
“sexismo”, explicando sua definição e após isso, ressaltou-se a sua relação com o
discurso, para definir o que seriam traços sexistas na linguagem. O capítulo termina
com a análise das propagandas selecionadas e o cálculo das suas implicaturas, avaliando
as marcas sexistas encontradas nas implicaturas calculadas.
Aqui se encerra então a tentativa de demonstrar com clareza a aplicação da Teoria
das Implicaturas de Paul Grice (1975) para explicar a compreensão da significação
implícita verbal da linguagem e as marcas sexistas que acabam vindo à tona. O trabalho
aponta como satisfatória a teoria escolhida, pois consegue demonstrar objetivamente as
implicaturas retiradas do nível do dito. Grice explica e demonstra a comunicação verbal
e a propaganda publicitária é uma ótima cobaia para isso, pois é rica de implícitos. A
linguagem publicitária é essencialmente pragmática, embora tenha uma semântica como
base. Assim, percebe-se a importância de estudar a significação em linguagem natural
partindo de uma interface entre Semântica e Pragmática.
CONCLUSÃO
O trabalho apresentado teve como objetivo valorizar a interface entre Semântica e
Pragmática e verificar a validade e consistência da Teoria das Implicaturas de
Grice(1975), que descreve e explica o significado implícito enquanto processo
inferencial de comunicação. Para tal, utilizou-se de slogans publicitários como fonte de
análise, por serem ricos em implícitos, especialmente implicaturas indicativas de marcas
sexistas. Os traços de sexismo no texto publicitário que estão presentes no nível do
implicado foi o outro tema que serviu de estudo ao trabalho. Importante ressaltar que é
possível entrelaçar esses tópicos- Pragmática, Implicaturas, Publicidade, Sexismo.
Este estudo foi organizado em quatro capítulos. No primeiro capítulo, foi tratado
sobre a interface entre Semântica e Pragmática, mostrando que a primeira serve de base
para segunda área. Foi feita uma breve explanação sobre o significado e suas diferentes
visões, de acordo com a teoria semântica que o recorta. Logo em seguida, foi
apresentado um breve panorama da teoria semântica e um panorama da teoria
pragmática dentro do contexto lingüístico, para depois finalizar com um estudo sobre a
importância da interface entre Semântica e Pragmática, percebendo assim a relação
desta última teoria com a semântica das condições de verdade e verificando a
importância do estudo da significação em contexto.
O que se buscou confirmar foi a idéia de que a Pragmática atua ao lado da
Semântica no estudo da significação humana. Tal hipótese é comprovada. Percebe-se
que a Semântica estuda o significado das condições de verdade e que não dá conta do
que escapa a isso, sendo, então, necessário o surgimento de uma teoria pragmática para
tratar de questões como a intenção do falante, o contexto, o uso da linguagem. Nomes
como Austin, Searle, e principalmente Grice, que diferença o dito do implicado, são
importantes no percurso da Pragmática enquanto Ciência da Linguagem. O último autor
citado ressalta a importância da interface, considerando que a Semântica fornece
significados gerais e a Pragmática os restringe.
Paul Grice é base para o estudo de diversos autores, que ampliam o seu modelo de
comunicação, mas nunca deixam de reconhecê-lo como peça chave para a
sistematização da Pragmática como ciência metodológica, possível de aplicação. Ao
explicar que implicaturas são proposições que estão implicadas pelo enunciado de uma
sentença em um dado contexto, mesmo que tal proposição esteja fora do dito, o autor
constrói uma teoria comunicacional inovadora.
No segundo capítulo deste trabalho, procurou-se então articular a teoria pragmática
com a Teoria das Implicaturas de Grice (1975), sendo apresentado um breve panorama
histórico da teoria do autor, para depois ser feito um estudo mais detalhado sobre a
Teoria das Implicaturas, de acordo com o texto “Lógica e Conversação”(1975). Nesse
estudo, foi abordado o modelo teórico griceano, com o Princípio de Cooperação (através
das categorias de Quantidade, Qualidade, Relação e Modo) e os tipos de implicaturas e,
a partir dos pontos frágeis que este apresentou, foram também ressaltadas as
argumentações de outros teóricos que desdobraram a teoria, como Sperber e
Wilson(1986), Levinson(1983),Costa(1984), Carston(1991,1999) e Davis(1991).
A segunda hipótese levantada no trabalho é confirmada, portanto. A Teoria das
Implicaturas de Grice (com seus desdobramentos) prova ser relevante no estudo da
significação da linguagem natural, na medida que relaciona dito e o não-dito de forma
sistemática e bem aplicável.
O terceiro capítulo estudou dois termos: discurso publicitário e sexismo, bem como
o entrelaçamento dos dois tópicos. Foi feito um breve estudo teórico sobre o tema
publicidade, apontando suas principais características, responsáveis por tornar a
propaganda persuasiva.
Percebe-se que a linguagem publicitária é rica de implícitos, sendo assim uma fonte
pragmática por natureza e ótima cobaia para o estudo das Implicaturas de Grice.
Nas propagandas analisadas, as implicaturas mostraram marcas de sexismo. Tal
tema também foi estudado nesse terceiro capítulo. O problema do sexismo foi apontado
como algo culturalmente construído, evidenciado, por exemplo, na linguagem do
cotidiano, que no nível do dito mostra que o gênero masculino é mais valorizado do que
o feminino. E também evidenciado no nível do não-dito,como em slogans
publicitários, que mostram a mulher como objeto sexual, domesticada ou fútil.
Verificou-se que os implícitos comunicam mais do que o dito, nos slogans
publicitários, persuadindo o consumidor em potencial a comprar seu produto, além de
implicar estereótipos sexistas, ecoando o pensamento de uma sociedade. As hipóteses
sobre o discurso publicitário e suas marcas sexistas, apresentadas no trabalho, são,
portanto, confirmadas. O que se notou é que a máxima de quantidade é violada com
maior freqüência, pois as propagandas dizem pouco, embora signifiquem muito. Há
também o uso da ironia, quebra da máxima de modo, sempre mostrando marcas
sexistas, visto que os slogans representam idéias culturais sobre as mulheres.As
inferências disparadas pelos elementos lingüísticos que indicam marcas de sexismo,
podem ser divididas em três categorias, a partir da análise dos slogans publicitários,
aplicando o modelo griceano: implicaturas que mostram mulher domesticada( como as
duas últimas propagandas analisadas- Cônsul e Tramontina), implicaturas que mostram
a mulher como objeto sexual( como as propagandas das Lojas Conto Freire e do
Sundown)e implicaturas que mostram a mulher como fútil( como nas propagandas das
Lojas Paquetá e do Provedor Uol). Importante ressaltar também as implicaturas que
mostram o homem como provedor financeiro( como na propaganda das lojas VIVO),
como forte,vaidoso(como na propaganda dos relógios Dummont) e como
inteligente(como na propaganda do Desodorante Senador). Assim, conclui-se que o
sexismo é resultado de um tipo de cultura em que o homem e a mulher assumem uma
relação de discriminação. O que está por trás da denúncia sexista é a explanação das
diferenças no sentido dos membros de uma classe terem privilégios em relação aos
membros de outra classe sexual. Essa percepção pôde ser realizada graças á aplicação
do modelo de Grice em slogans publicitários. Assim, fica evidente a importância de
Grice e seu estudo sobre as implicaturas conversacionais particularizadas. Vale ressaltar
que não faltam bons estudos sobre o modelo de Grice e que certamente virão outros,
pois conforme apontado anteriormente, assim como Semântica serve de base para a
Pragmática, Grice serviu e pode continuar servindo de base para outras teorias sobre a
significação da linguagem natural
O que se conclui é que slogans publicitários são pragmáticos por natureza (por isso
a importância de estudar a Pragmática), e as implicaturas que carregam, como as
sexistas, são complementação significativa indispensável ao dito para que ele
provoque o ato persuasivo da publicidade( por isso a importância da Teoria das
Implicaturas de Grice). O objetivo da publicidade é convencer o consumidor em
potencial de que o produto anunciado proporcionará a quem comprá-lo o que a
sociedade considera ideal e é nesse processo de persuasão que aparecem as marcas de
sexismo, pois há uma idéia cultural de que a mulher é fútil, domesticada ou objeto
sexual,enquanto o homem é forte, estável economicamente e inteligente.Pode-se dizer
que o presente estudo teve como preocupação não somente verificar a validade da teoria
das Implicaturas de Grice, como também mostrar que a linguagem publicitária é sexista.
É possível então fazer uma interface entre Pragmática, Grice, Publicidade e Sexismo,
sugerindo que a partir de um estudo objetivo, teórico, com precisão científica, como
este, pode-se chegar a solução de problemas sociais,como o Sexismo. Tal tópico não
ocorre somente no nível da publicidade,mas em outros contextos lingüísticos,sendo
relevante até pensar em um estudo posterior que mostre tais contextos.
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