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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
ELIZABETE MARIA REGINATO SANA
CARACTERIZAÇÃO PROFISSIONAL DAS
PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DOS CENTROS
DE CONVIVÊNCIA INFANTIL - CCI’S/UNESP
Presidente Prudente - SP
2007
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ELIZABETE MARIA REGINATO SANA
CARACTERIZAÇÃO PROFISSIONAL DAS
PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DOS CENTROS
DE CONVIVÊNCIA INFANTIL - CCI’S/UNESP.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós
Graduação em Educação da Faculdade de
Ciências e Tecnologia, da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
UNESP – Campus de Presidente Prudente –
SP, como requisito para obtenção do título de
Mestre em Educação na Linha de Pesquisa
Práticas Educativas e Formação de Professores,
sob a orientação da Professora Doutora Gilza
Maria Zauhy Garms.
Presidente Prudente - SP
2007
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Sana, Elizabete Maria Reginato.
S189c Caracterização profissional das professoras de educação infantil dos centros de
convivência infantil - CCI’s/UNESP / Presidente Prudente : [s.n], 2007
181 f. : il.
Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências
e Tecnologia
Orientador: Gilza Maria Zauhy Garms.
Banca: Elisabeth Gelli Yazlle, Célia Maria Guimarães
Inclui bibliografia
1. Educação. 2. Educação Infantil. 3. Professoras. 4. Pofissionalidade. I. Autor. II.
Título. III Presidente Prudente - Faculdade de Ciências e Tecnologia.
CDD(18.ed.) 370
Ficha cartográfica elaborada pelo Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação
UNESP – FCT – Campus de Presidente Prudente
ELIZABETE MARIA REGINATO SANA
CARACTERIZAÇÃO PROFISSIONAL DAS
PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DOS CENTROS
DE CONVIVÊNCIA INFANTIL - CCI’S/UNESP
COMISSÃO JULGADORA
DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM EDUCAÇÃO
Presidente e Orientador:
Profa. Dra. Gilza Maria Zauhy Garms______________________________________
2º Examinador:
Profa. Dra. Elisabeth Gelli Yazlle__________________________________________
3º Examinador:
Profa. Dra. Célia Maria Guimarães________________________________________
Presidente Prudente, 04 de junho de 2007
A Nair, minha mãe...
Pela dedicação, estímulo, amor e presença constante,
Dedico este trabalho.
AGRADECIMENTOS
A realização deste trabalho foi concretizada através da colaboração de muitas pessoas.
Manifesto minha gratidão de forma particular:
- à Professora Doutora Gilza Maria Zauhy Garms, orientadora deste trabalho, por toda
compreensão, paciência, competência, incentivo, dedicação e amizade demonstradas no
decorrer desta pesquisa;
- ao André Luís, pelo companheirismo, apoio, dedicação, incentivo, disponibilidade e amor,
sempre presentes no desenvolvimento desta pesquisa;
- a minha mãe Nair, por seu amor e por sua luta constante para que eu sempre fosse capaz de
dar o “próximo passo”;
- às amigas: Joana, Elisabeth, Danielle, Priscila e Juliana por terem sempre palavras amigas
em momentos difíceis;
- à Professora Doutora Célia Maria Guimarães e à Professora Maria Aparecida Zamberlan,
pela valiosa contribuição para com esta pesquisa, durante o exame de Qualificação;
- aos funcionários da Graduação, Pós-Graduação e Biblioteca da faculdade de Ciências e
Tecnologia pelos serviços e orientações prestados, sempre com muita paciência;
- às Supervisoras dos Centros de Convivência Infantil da Unesp, por sua contribuição;
- em especial, às professoras de Educação Infantil das unidades pesquisadas, por sua
colaboração, auxílio e paciência prestados à pesquisa;
A todas estas pessoas meu sincero agradecimento.
A Deus, meu agradecimento maior, por ter nos abençoado em cada momento desta pesquisa.
RESUMO
Esta pesquisa, vinculada à linha Práticas Educativas e Formação de Professores, apresenta uma
discussão a respeito dos elementos responsáveis pela constituição do perfil profissional das
professoras de Educação Infantil dos Centros de Convivência Infantil da Unesp – CCI’s/Unesp.
Historicamente, as profissionais responsáveis pelo cuidado e educação das crianças de 0 a cinco
anos de idade não necessitavam de qualquer tipo de preparação ou qualificação para desenvolver
este tipo de trabalho, histórico este que vêm sofrendo alterações no decorrer do percurso das
instituições de Educação Infantil e das próprias profissionais que nelas atuam. Para caracterizar
um perfil profissional destas professoras atualmente, existe a necessidade de se levar em
consideração critérios como: opção profissional, anseios, motivações, expectativas, desafios,
incertezas, objetivos e dúvidas sobre seu próprio trabalho e atitudes a serem tomadas com
relação à (re)construção de uma identidade que ainda vêm sendo discutida e analisada, tanto
diante de sua própria classe de profissionais, quanto diante da sociedade em geral. Partindo do
pressuposto de que tais critérios são essenciais para que se constitua o perfil profissional das
professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp, elencamos como objetivos norteadores desta
pesquisa: analisar aspectos referentes à formação das professoras para atuar na Educação Infantil
e estabelecer a importância da profissionalização das professoras dos CCI’s, diante da falsa
dicotomia existente entre cuidado e educação. A obtenção dos dados desta pesquisa foi amparada
pela pesquisa italiana de ONGARI & MOLINA (2003), através de questionários aplicados em
sete unidades de Educação Infantil da Unesp e a metodologia utilizada consistiu em uma
pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa. O trabalho revela um perfil profissional das
professoras de Educação Infantil que envolve formação inicial, formação em serviço, opção pelo
trabalho com crianças de 0 a cinco anos, o reconhecimento do quesito qualidade nas relações
estabelecidas com as crianças e com as demais integrantes do grupo, a importância atribuída à
troca de experiências e a relação com os pais, onde ainda prevalecem o não reconhecimento
profissional como professoras de Educação Infantil.
Palavras-chave: Educação Infantil, professoras, profissionalidade.
ABSTRACT
This research presents a quarrel regarding the responsible elements for the constitution of the
professional profile of the teachers of Infantile Education of the Centers of Infantile
Convivência of the Unesp - CCI' s/Unesp. Historically, the responsible professionals for the
care and education of the children of 0 the six years of age did not need any type of
preparation or qualification to develop this type of work, description this that comes suffering
alterations in elapsing of the passage of the institutions of Infantile Education and of the
proper professionals who in them act. To currently characterize a professional profile of these
teachers, it exists the necessity of if taking in consideration criteria as: professional option,
yearnings, motivations, expectations, challenges, uncertainties, objectives and doubts on its
proper work and attitudes to be taken with regard to (reverse speed) the construction of an
identity that still come being argued and analyzed, in such a way ahead of its proper
classroom of professionals, how much ahead of the society in general. Leaving of the
estimated one of that such criteria are essential so that if constitutes the professional profile of
the teachers of Infantile Education of CCI' s/Unesp, we elencamos as objective norteadores of
this research: to analyze referring aspects to the formation of the teachers to act in the
Infantile Education; to problematizar the process of formation continued in service for the
teachers of the CCI´s, being verified which used strategies so that all the teachers can have
access to the formation in service; to establish the importance of the professionalization of the
teachers of CCI' the s, ahead of the false existing dichotomy between taking care of and
educating. The research was developed through questionnaires proceeding from the Italian
research of ONGARI & MOLINA (2003), of seven units of Infantile Education of the Unesp
and the used methodology consisted of a exploratória research, of qualitative boarding. The
work discloses a profile professional of the teachers of Infantile Education that involves initial
formation, formation in service, option for the work with children of 0 the six years, the
recognition of the question quality in the relations established with the children and the
excessively integrant ones of the group, the importance attributed to the exchange of
experiences and the relation with the parents, where still takes advantage not the professional
recognition as teachers of Infantile Education.
Key words: Children’s Education, teachers, profissionalidade.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 16
CAPÍTULO 1 – AS INSTITUIÇÕES DA ORIGEM DA CRECHE NO BRASIL ATÉ O
MOMENTO ATUAL .........................................................................................................
22
1.1 As instituições de Educação Infantil no Brasil........................................................... 22
CAPÍTULO 2 - CONTEXTUALIZANDO O PROGRAMA CCI’s – CENTROS DE
CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP..........................................................................
36
2.1 Contexto gerador do Programa CCI’s – Centros de Convivência Infantil...................... 36
2.2 Os CCI’s/Unesp – Centros de Convivência Infantil da Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho”......................................................................................
40
2.3 Alteração do Regimento dos CCI’s/Unesp – Portaria Unesp no 49/1996 pela Portaria
Unesp no 311 de 23 de julho de 2004 .................................................................................
46
2.4 Regimento dos CCI’s/Unesp – elaborando uma nova proposta................................. 50
CAPÍTULO 3 - O PAPEL DA PROFESSORA NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
AMBIGÜIDADES E RECOMPENSAS ............................................................................
58
3.1 A creche cuida? A pré-escola educa? Papel da professora de Educação Infantil.......... 58
3.2 Ser mulher, ser mãe e ser professora de crianças pequenas: (in)definição?.................. 63
3.3 Representações sociais que envolvem o cotidiano das professoras de Educação
Infantil dos CCI’s/Unesp.....................................................................................................
77
CAPÍTULO 4 - TECENDO UMA ANÁLISE: caracterização profissional das
professoras da Educação Infantil dos CCI’s/Unesp.............................................................
89
4.1 Procedimentos Metodológicos da Pesquisa.................................................................... 89
4.2 Principal instrumento: o questionário............................................................................. 91
4.3 Quem são as professoras dos CCI’s/Unesp?................................................................. 93
- O perfil profissional........................................................................................................... 93
1ª Categoria: A formação das professoras .......................................................................... 96
- Formação inicial, formação em serviço e formação em serviço no local de trabalho....... 96
2ª categoria: A profissão de professoras de Educação Infantil ........................................... 105
- Percurso profissional ........................................................................................................ 105
- Dificuldades enfrentadas .................................................................................................. 109
- Percurso profissional: breve avaliação ............................................................................. 123
- Imagem que as professoras têm do seu próprio trabalho .................................................. 128
- Aspectos gratificantes do trabalho .................................................................................... 129
- Competências das professoras .......................................................................................... 132
- Principais fontes para aprender a exercer o trabalho ........................................................ 132
- Principais fontes de aprendizagem das professoras dos CCI’s/Unesp ............................. 133
- Em que se baseia o trabalho da professora ....................................................................... 138
- Competências de uma boa professora de Educação Infantil ............................................. 140
3ª Categoria: Relação com os pais ...................................................................................... 143
- Os pais .............................................................................................................................. 143
4ª Categoria: Relação com as crianças .............................................................................. 154
- Dimensões afetivas do trabalho ........................................................................................ 154
- Afeiçoar-se ........................................................................................................................ 156
5ª Categoria: Aspectos do serviço ..................................................................................... 160
- A Creche como serviço...................................................................................................... 160
- Avaliando a unidade.......................................................................................................... 161
CAPÍTULO 5 - (IN)CONCLUINDO: RESGATE DA IDENTIDADE PROFISSIONAL
DAS PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DOS CCI’S/UNESP ....................
165
BIBLIOGRAFIA................................................................................................................. 175
ANEXO: Questionário........................................................................................................ 181
LISTA DE QUADROS
Quadro 1- Documentos Legais relacionados à Educação Infantil ...................................... 25
Quadro 2 - Nomenclaturas e faixa etária das crianças......................................................... 33
Quadro 3- CCI’s da UNESP: localização e datas de implantação....................................... 40
Quadro 4 – Formação inicial das recreacionistas e auxiliares de recreacionistas dos
CCI’s/Unesp ........................................................................................................................
52
LISTA DE MAPAS
Mapa I - Localização dos CCI’s/Unesp e média de crianças atendidas................................42
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Dados pessoais: idade das professoras dos CCI’s/Unesp ................................. 95
Tabela 2 – Dados pessoais: estado civil das professoras dos CCI’s/Unesp ........................ 95
Tabela 3 – Dados pessoais: número de filhos das professoras dos CCI’s/Unesp ............... 95
Tabela 4 – Dados pessoais: idade do filho caçula das professoras dos CCI’s/Unesp ......... 96
Tabela 5 – Dados profissionais: diploma das professoras dos CCI’s/Unesp ...................... 97
Tabela 6 – Dados profissionais: formação continuada das professoras dos CCI’s/Unesp.. 100
Tabela 7 – Dados profissionais: tipo de formação continuada das professoras dos
CCI’s/Unesp.........................................................................................................................
102
Tabela 8 – Dados profissionais: posição atual e tempo de serviço das professoras dos
CCI’s/Unesp ........................................................................................................................
106
Tabela 9 – Dados profissionais: tempo de serviço na Educação Infantil ............................ 107
Tabela 10 – Dados profissionais: trabalhos desenvolvidos anteriormente pelas
professoras dos CCI’s/Unesp ..............................................................................................
107
Tabela 11 – Dados profissionais: motivo pelo qual exerce o trabalho como professora
dos CCI’s/Unesp .................................................................................................................
108
Tabela 12 – Tipo de dificuldades enfrentadas pelas professoras dos CCI’s/Unesp ............ 110
Tabela 13 – Motivos pelos quais o trabalho corresponde às expectativas das professoras
quando começaram as atividades na Educação Infantil ......................................................
124
Tabela 14 – Motivo principal para exercer o trabalho de professoras dos CCI’s/Unesp .... 126
Tabela 15– Satisfação profissional atual das professoras dos CCI’s/Unesp ....................... 126
Tabela 16 – Percurso profissional: escolha do trabalho pelas professoras dos
CCI’s/Unesp ........................................................................................................................
127
Tabela 17 – Aspectos gratificantes do trabalho como professoras dos CCI’s/Unesp ........ 129
Tabela 18 – Principais fontes de aprendizagem das professoras dos CCI’s/Unesp ............ 134
Tabela 19 – Competências de uma boa professora de Educação Infantil, segundo as
professoras dos CCI’s/Unesp...............................................................................................
140
Tabela 20 – Motivos pelos quais os pais optam pelos CCI’s/Unesp .................................. 144
Tabela 21 – Informações que os pais pedem sobre as crianças .......................................... 149
Tabela 22 –Critérios que definem o apegar-se a uma criança para as professoras dos
CCI’s/Unesp.........................................................................................................................
159
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Freqüência a cursos de atualização pelas professoras dos CCI’s/Unesp.........101
Gráfico 2 - Dificuldades em adaptarem-se aos locais de trabalho.....................................109
Gráfico 3 – Critérios em que se baseia o trabalho de professora de Educação Infantil......138
Gráfico 4 – Competências específicas de uma professora de Educação Infantil................146
Gráfico 5 – Interesse dos pais em relação à proposta dos CCI’s/Unesp.............................148
Gráfico 6 – Relação diante do comportamento dos pais.....................................................150
Gráfico 7 – Problemas enfrentados pelos pais que tem uma criança pequena....................153
Gráfico 8 – Afeiçoar-se a uma criança em especial é uma posição correta/incorreta.........157
Gráfico 9 – Qualidade do serviço oferecido pelo CCI em que atuam.................................162
Gráfico 10 – Satisfação dos pais, na visão das professoras................................................162
Gráfico 11 – Critérios que influenciam para um bom atendimento....................................163
16
INTRODUÇÃO
O trabalho com crianças de 0 a cinco anos de idade
1
desenvolvido pelas professoras
de Educação Infantil é claramente influenciado pelas concepções que essas professoras têm
em relação a si mesmas e ao trabalho que desenvolvem. Assim sendo, busco tecer algumas
considerações a respeito da caracterização profissional das professoras de Educação Infantil
dos Centros de Convivência Infantil da Unesp, tomando por base a visão que as próprias
professoras têm do trabalho que exercem: se cuidam, se educam, se atribuem importância à
formação, à prática cotidiana, ao relacionamento com os pais, crianças, colegas, se
encontram-se satisfeitas com o trabalho que realizam e se fazem realmente aquilo que gostam
O que se sabe é que esta profissão ainda oscila entre o ser mulher, como
característica primordial para o trabalho com crianças de 0 a cinco anos, envolvendo
prioritariamente o “cuidado” e o ser professora, assumindo o caráter educativo das escolas do
ensino fundamental, e que engloba o ato de “educar”:
Nessa “falsa divisão”, ficava implícita a idéia de que haveria uma forma de trabalho
mais ligada às atividades de assistência à criança pequena, para as quais era dado
um caráter não – educativo, uma vez que traziam para as creches e pré-escolas as
práticas sociais do modelo familiar e/ou hospitalar; e as outras que trabalhavam
numa suposta perspectiva educativa, em geral trazendo para as creches e pré-
escolas o modelo de trabalho escolar das escolas de ensino fundamental.
(CERISARA, 2002, p.10-11)
Assim, de acordo com a autora, acredito que existe a necessidade de se estabelecer
critérios que caracterizem as instituições de Educação Infantil e as professoras que nelas
atuam.
Partindo desse princípio é que surgiu o interesse pela área de Educação Infantil, em
1999, quando ingressei no curso de Pedagogia e iniciei um estágio em uma Instituição de
Educação Infantil Municipal de Presidente Prudente - SP, o que contribuiu para que eu viesse
a conhecer a estrutura e o funcionamento destas unidades, originando a curiosidade sobre
compreender um pouco mais a fundo o que a Educação Infantil buscava realizar com as
crianças de 0 a cinco anos de idade, e isso tudo influenciou para que eu tentasse satisfazer o
meu desejo em conhecer as professoras que realizam este trabalho.
1
Refiro-me à Educação Infantil que compreende as crianças da faixa etária de 0 a cinco anos, em adequação à
Lei 11.114, que instituiu o Ensino Fundamental obrigatório para crianças a partir dos seis anos de idade.
17
A oportunidade de conhecer a estrutura e o funcionamento das Unidades de
Educação Infantil da Unesp (CCI’s/ Unesp), surgiu a partir da pesquisa iniciada em 2001 na
graduação, denominada “Os Centros de Convivência Infantil – CCI’s/Unesp e sua busca de
reconciliação com a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96)”,
sob orientação da Profa. Dra. Gilza Maria Zauhy Garms. Partindo desse contexto, comecei a
participar do Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Educação Infantil, que contribuiu
grandemente através de leituras, debates e discussões a respeito dos temas referentes à
Educação Infantil e formação de professores, conduzindo a reflexões sobre o que poderia ser
feito para contribuir dentro dessa área, que implica em articular educação e cuidado, na
perspectiva de que a criança é ser ativo, sujeito de direitos e acima de tudo, criança, dessa
forma, podemos definir que:
O período de zero a seis anos se trata de uma etapa da vida infantil com
particularidades e especificidades, que a tornam distinta de outros momentos do
desenvolvimento humano; a criança não é um adulto em miniatura. (POLÍTICA
PARA OS CENTROS DE CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP, p. 11, 2005)
Enfatizando que a concepção de criança como sujeito de direitos e não simplesmente
como um “adulto em miniatura” é essencial que as profissionais que atuam com essas
crianças sejam preparadas e qualificadas para reconhecer a presente concepção e atuar de
acordo com ela.
Assim sendo, o objetivo dessa pesquisa define-se como uma busca pela
caracterização das professoras dos CCI’s/Unesp, tomando por base a visão que as próprias
professoras têm do trabalho que exercem: se cuidam, se educam, se atribuem importância à
formação, à prática cotidiana, ao relacionamento com crianças, pais, colegas (também
professoras) e com a supervisoras das unidades, se estão satisfeitas com o trabalho e se fazem
aquilo que realmente gostam.
Ressalta-se que não pretendo definir uma identidade das professoras de Educação
Infantil, mas levantar alguns critérios que possibilitem uma análise mais aprofundada do seu
papel perante a sociedade e de si mesmas diante do seu trabalho, onde ainda permeiam
concepções como a de que por ser mulher, as professoras não necessitam de curso superior ou
de uma formação específica na área em que atuam.
Pesquisar a identidade das professoras, buscando compreender qual é a imagem que
elas têm de sua profissão e relações com os demais envolvidos (crianças, pais, colegas e
supervisoras) é o que move esta pesquisa, além da curiosidade e relevância social, que
consiste em uma análise das experiências pessoais e profissionais, motivações e anseios
18
dessas mulheres, profissionais, mães, trabalhadoras, com o maior objetivo de mostrar à
sociedade a importância do papel que exercem atuando com a faixa etária de crianças de 0 a
cinco anos. Através dessa pesquisa, acredito que possam ser elaborados temas para reflexões
pertinentes na área da Educação Infantil e da formação das professoras, que venham a ser
utilizados tanto na formação continuada, quanto na formação inicial das professoras. Tais
reflexões podem estar vinculadas a temas como as relações com as outras profissionais,
relações com os pais, com as crianças, e também podem tomar proporções que caminham
além disso, enfocando concepções e representações que as professoras têm, as dificuldades
que enfrentam no decorrer do trabalho e das relações que estabelecem através dele e sua
satisfação em atuar como professoras de crianças de 0 a cinco anos.
Partindo daí, pode-se pensar em temas e reflexões pertinentes à área da Educação
Infantil e da formação das professoras, que venham a ser trabalhados em formações
continuadas.
Assim, busca-se também compreender as razões e motivações que conduziram as
atuais professoras a ingressar na profissão, e também de sua permanência nela, face à visível
desvalorização diante da sociedade, da remuneração incompatível com o trabalho e das
condições de trabalho, que geralmente não são as mais favoráveis, devido ao esgotamento
físico e emocional que uma profissão que exige atenção constante pode ocasionar.
Esta pesquisa insere-se em um conjunto de fatores extremamente relevantes, que
permeiam as principais inquietações e discuses na área da Educação Infantil, tais como:
serviço voltado à mãe trabalhadora, função socializadora das creches, redimensionamento
do aspecto higiênico-sanitário, garantia de padrões educativos e a importância da formação
do pessoal que atua diretamente com as crianças e nas relações estabelecidas entre os
principais componentes das instituições de Educação Infantil: professoras, crianças e pais.
Diante das discussões atuais a respeito da Educação Infantil, da identidade das suas
profissionais e dos dados provenientes da pesquisa iniciada na Graduação: “Os Centros de
Convivência Infantil – CCI’s/Unesp e sua busca de reconciliação com a Nova Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96)”, que objetivava conhecer e analisar a
problemática do processo de adaptação dos CCI’s da UNESP às normas da Nova Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96), e tomando algumas das categorias
utilizadas por Ongari; Molina (2003) em sua pesquisa realizada com as educadoras italianas
da Educação Infantil em um período de transição e definição de identidade profissional, serão
estabelecidos os critérios para análise dos questionários, que constituem o principal
19
instrumento de aquisição de dados da presente pesquisa, que constitui uma pesquisa
exploratória, assumindo a forma de estudo de caso.
Para possibilitar tal análise, utilizaram-se questionários como único instrumento
metodológico, sendo que foram enviados a sete Centros de Convivência Infantil da Unesp,
que aceitaram ser parte integrante desta pesquisa, que perfazem o total de quatorze unidades,
espalhadas por quase todos os campi da Unesp.
As categorias para análise dos questionários envolvem itens como: quem são as
professoras de creche; a imagem que têm do trabalho; as competências necessárias para ser
uma educadora de creche; a dimensão afetiva do trabalho; a creche enquanto local de trabalho
e a relação com os pais, buscando uma melhor compreensão destes aspectos, vigentes na
atuação diária das professoras.
Os questionamentos que movem esta pesquisa dizem respeito aos tipos de relações
estabelecidas nas instituições de Educação Infantil, abordadas através dos questionários
respondidos pelas professoras, tendo seu enfoque em suas expectativas, desafios, incertezas,
objetivos e dúvidas sobre seu próprio trabalho e atitudes a serem tomadas com relação à
(re)construção de uma identidade que ainda vem sendo discutida e analisada tanto diante de
sua própria classe de profissionais, quanto diante da sociedade em geral.
A investigação realizada tendo por base os questionários respondidos pelas professoras
de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp, possibilitou a organização desta pesquisa da seguinte
forma:
No Capítulo 1, serão considerados alguns aspectos históricos a respeito das origens das
creches no Brasil, envolvendo desde a luta pela implantação das unidades de Educação
Infantil como direito das mães trabalhadoras até o momento em que são reconhecidos os
direitos das crianças, através de documentos legais como: a Constituição da República
Federativa do Brasil (1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96). Em seguida, faz-se necessário tecer
considerações sobre a implantação do Programa CCI’s, em aspectos gerais, para que se possa
ter uma idéia de como foi instaurada sua implantação no Estado de São Paulo, e
posteriormente, nos campi da Unesp.
O capítulo 2 faz algumas considerações a respeito do contexto gerador do Programa
CCI’s – Centros de Convivência Infantil desde a sua implementação no Estado de São Paulo,
até o momento em que é implantado na Unesp, como Centro de Convivência Infantil da
Unesp, que atualmente conta com 14 unidades, situadas em 13 campi da Universidade,
espalhados pelo Estado de São Paulo. Este capítulo trata também da alteração de alguns
20
artigos do Regimento dos CCI’s/UNESP – Portaria Unesp n
o
49/1996 pela Portaria Unesp n
o
311 de 23 de julho de 2004, que orienta como deve ser realizado o trabalho nas unidades de
Educação Infantil da Unesp, além da reivindicação sobre a alteração do Regimento Interno
n.49 de março de 1996, por uma nova proposta que envolva as atuais disposições que vêm
sendo discutidas a respeito da Educação Infantil, tais como a necessidade de atualizações no
que se refere à Educação Infantil e aos critérios para um melhor atendimento às crianças de 0
a cinco anos. Partindo desse contexto que envolve mudanças e expectativas, existe a
necessidade de se analisar a função das unidades de Educação Infantil e de suas professoras,
relacionando tais aspectos com as relações vigentes nesse tipo de trabalho.
O capítulo 3 apresenta uma discussão a respeito da função das unidades de Educação
Infantil e das suas professoras, envolvendo as relações entre cuidar e educar, profissionalidade
e trabalho doméstico, ser mãe, ser mulher e ser professora, formação e prática docente, além
de critérios como opção e satisfação por trabalharem com crianças de 0 a cinco anos.
Explicito também algumas considerações a respeito das representações sociais, que direta e
indiretamente influenciam na caracterização do perfil profissional das professoras de
Educação Infantil.
Em seguida, no capítulo 4, apresento a pesquisa e suas categorias de análise,
elaboradas com o intuito de enfocar as diferentes áreas existentes na constituição do perfil
profissional de nossas professoras. São apresentados seus objetivos, metodologia e o
instrumento principal utilizado: o questionário, que aborda cinco áreas primordiais da
pesquisa: formação, profissão, relação com os pais, relação com as crianças e aspectos do
trabalho. Serão abordadas as categorias elaboradas a partir dos questionários respondidos
pelas professoras dos Centros de Convivência Infantil da Unesp – CCI’s/Unesp, com questões
a respeito do perfil profissional dessas professoras, que envolvem aspectos da vida familiar,
pessoal, situação profissional, relação com as crianças com as quais atuam, relação com os
pais, além da formação profissional.
Finalizando, o capítulo 5 aborda algumas (in)conclusões a respeito do perfil das
professoras da Educação Infantil dos CCI’s/Unesp, levando em consideração aspectos como:
expectativas, opções, dificuldades e satisfação em realizar seu papel como professoras de
Educação Infantil.
Assim, de agora em diante, relato um breve histórico a respeito das Instituições de
Educação Infantil no Brasil, objetivando vincular o passado destas instituições ao presente,
em que se percebe necessária uma (re)definição de papéis tanto das unidades, quanto das
professoras de Educação Infantil, visando atender às novas exigências legais (Constituição
21
Federal de 1988; Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9394/96); reconhecer
o papel das professoras de Educação Infantil, com suas especificidades e formação adequada
para que se garanta um atendimento de qualidade para as crianças de 0 a cinco anos de idade.
22
CAPÍTULO 1 - HISTÓRICO DAS ORIGENS DA CRECHE NO BRASIL ATÉ O
MOMENTO ATUAL
1.1 As instituições de Educação Infantil no Brasil
A Educação Infantil tornou-se foco de debates e discussões nas últimas décadas do
século XX, expressando o crescente interesse pela educação e cuidado das crianças de 0 a
cinco anos de idade e o reconhecimento da importância de seu papel no desenvolvimento
infantil. Contextualizar historicamente as instituições de Educação Infantil no Brasil
possibilita compreender os parâmetros que articulam interesses e forças políticas, econômicas
e ideológicas que definiram e mantém os atuais discursos que permeiam as práticas dessas
instituições. Segundo Cerisara (1996):
Falar em creches e pré-escolas no Brasil na década de 90 significa levar em
consideração as deliberações tomadas na Constituição de 1988 e que foram
gestadas em grande parte por ocasião de mobilizações ocorridas na década
de 80 em torno da criança e do adolescente, por parte de amplos setores da
sociedade civil organizada e de representantes de órgãos públicos, tendo
como pano de fundo os avanços do debate ideológico e do nível de
organização dos movimentos sociais preocupados com a educação das
crianças de 0 a 6 anos. (p.15)
Como pano de fundo para o surgimento das primeiras instituições de atendimento à
criança no final do século XIX e início do século XX, apresenta-se o capitalismo, os
processos de urbanização e o surgimento das primeiras indústrias. Tais transformações
contribuíram para mudanças na organização das famílias e primordialmente no trabalho
feminino diante dos âmbitos econômico, familiar e social, conduzindo as mulheres a ter que
deixar os filhos para auxiliar no trabalho doméstico ou mesmo a assumir o papel principal de
mantenedoras das residências.
No Brasil, as instituições de Educação Infantil surgem no final do século XIX para
que as mães tenham um local específico para deixar os filhos, o que permitiria a liberação da
mão-de-obra feminina. A partir da década de 70, as reivindicações das mulheres trabalhadoras
pelas creches decorrem principalmente devido ao aumento de sua inserção no mercado de
trabalho, partindo de transformações sociais que conduziram à expansão industrial, ao
crescimento das cidades e às mudanças organizacionais e estruturais das famílias. A busca das
mulheres pelas creches justificou-se principalmente pela necessidade encontrada por elas de
23
ter um local em que pudessem deixar os filhos para colaborar com o aumento na renda da
família através da realização de trabalho remunerado.
Duas contradições permearam a criação dessas instituições: a retirada de
responsabilidade da mãe sobre o filho ou a instituição como um mal necessário para
minimizar o abandono de crianças e as possibilidades de marginalização – a função
assistencial das instituições seria a possibilidade mais palpável para as mães trabalhadoras. A
esse respeito, Kuhlmann preconiza (1990):
No entanto, se a proposta de constituição das creches foi objeto de
controvérsias, a afirmação de sua necessidade pressupunha que essas
instituições poderiam colaborar para conciliar a contradição entre o papel
materno defendido e as condições de vida da mulher pobre e trabalhadora,
embora esta não deixasse de ser responsabilizada por sua situação.
(KUHLMANN, p.88)
Desta forma, as instituições apareciam com um caráter de favor para as mães que
necessitavam delas, e não como um dever da sociedade, atenuando e respondendo às
reivindicações da classe operária por condições adequadas de vida.
Segundo o autor, o histórico da Educação Infantil no Brasil nas últimas décadas
permite abordar duas formas principais de realização do trabalho em creches e pré-escolas
extremamente relacionadas à dissociação entre cuidado e educação: o trabalho assistencial e o
trabalho educacional.
O primeiro formato das instituições, no caso assistencialista, apresentava um
trabalho enfocado no modelo familiar, com uma forma de trabalho intrinsecamente ligada à
assistência às crianças pequenas, atribuindo-se ao trabalho um caráter não-educativo.
No Brasil, não havia consenso sobre a implantação de creches, pelo fato de que se
acreditava que sua instauração retiraria a responsabilidade das mães sobre os filhos pequenos,
no entanto outros acabavam defendendo sua criação como “um mal necessário”, perante
critérios como marginalização futura ou abandono de crianças pelas mães: o caminho seria
atendê-las assistencialmente.
As novas instituições não eram apenas um mal necessário, mas
representavam a sustentação dos saberes jurídico, médico e religioso no
controle e elaboração da política assistencial que estava sendo gestada, e que
tinha na questão da infância seu principal pilar. (KUHLMANN, 1998, p.88)
Este tipo de atendimento relatado pelo autor às crianças menores, de concepção
marcadamente assistencial, denominou-se “assistência científica”, configurado por uma
proposta educacional específica, voltada para submissão das famílias e das crianças das
24
classes populares, visando atender aspectos como alimentação e habitação, que surge em
caráter de substituição à Casa dos Expostos, onde as crianças eram deixadas: o trabalho
realizado nestas instituições baseava-se em critérios como guarda e proteção, tipicamente
assistenciais:
As concepções educacionais vigentes nessas instituições se mostravam
explicitamente preconceituosas, o que acabou por cristalizar a idéia de que,
em sua origem, no passado, aquelas instituições teriam sido pensadas como
lugar de guarda, de assistência, e não de educação. (KUHLMANN, 1998,
p.182)
Para Cerisara (2002), nas últimas décadas, constatou-se que as instituições de
Educação Infantil realizavam dois tipos de trabalho: um de caráter assistencial e outro de
caráter educativo. As instituições que apresentavam o suposto modelo educativo, em geral,
traziam para as instituições o molde do trabalho realizado nas escolas de ensino fundamental:
Nessa “falsa divisão” ficava implícita a idéia de que haveria uma forma de
trabalho mais ligada às atividades de assistência à criança pequena, para as
quais era dado um caráter não-educativo, uma vez que traziam para as
creches e pré-escolas as práticas sociais do modelo familiar e/ou hospitalar; e
as outras que trabalhavam numa suposta perspectiva educativa, em geral
trazendo para as creches e pré-escolas o modelo de trabalho escolar das
escolas de ensino fundamental. (p.10)
Ambas as perspectivas contribuem, até a atualidade, para que as professoras da
Educação Infantil façam um trabalho que ainda oscila entre o papel de mãe (relacionado à
família) e ao papel de professora, adotando a prática do ensino fundamental.
Apesar das aparentes dissociações entre as instituições preocupadas com a
assistência e educação, reconhece-se que essa dicotomia é falsa, pelo fato de que mesmo o
trabalho voltado ao assistencialismo tem caráter historicamente educativo, com uma proposta
voltada para crianças pobres; enquanto que o modelo escolarizante destina-se às crianças
consideradas mais favorecidas financeiramente. Partindo dessa perspectiva, Kuhlmann (1998)
ressalta:
O pensamento educacional tem mostrado resistência em aceitar os elementos
comuns entre instituições constituídas para atender a segmentos sociais
diferenciados. Insiste-se na negação do caráter educativo daquelas associadas
a entidades ou propostas assistenciais, como se educar fosse algo positivo,
neutro ou emancipador – adjetivos que dificilmente poderiam ser aplicados a
elas. (p.73)
Tal resistência não se justifica pelo fato de que as instituições de Educação Infantil,
as quais historicamente não podem ser aplicados tais adjetivos (instituições positivas, neutras
ou emancipadoras) tanto educam, quanto cuidam, indissociavelmente.
25
Para Cerisara (2002):
Simplificando um pouco, poderíamos dizer que tínhamos, de um lado, uma
apropriação do modelo hospitalar familiar e, de outro, uma apropriação do
modelo da escola do ensino fundamental. Nessa dicotomização, as atividades
ligadas ao corpo, à higiene, alimentação, sono das crianças eram
desvalorizadas e diferenciadas das atividades consideradas pedagógicas,
estas sim entendidas como sérias e merecedoras de atenção e valor. (p. 11)
Diante da falsa dicotomia entre cuidado e educação presente nas discussões a
respeito da Educação Infantil, discute-se, também, sua obrigatoriedade ou não. A Constituição
Federal de 1988 põe fim à discussão da sociedade em geral sobre o caráter opcional da
Educação Infantil, por parte do Estado, garantindo assim, o atendimento em creches e pré-
escolas às crianças de 0 a cinco anos de idade. Desde a promulgação da Constituição Federal
de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 e das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, a Educação Infantil vem sendo permeada por
discussões que envolvem as conseqüências trazidas pela implantação dessas leis.
Os avanços alcançados na legislação, no tocante à Educação Infantil, com destaque
para a Constituição Federal de 1988 e a LDB 9394/96, além da valorização da infância,
conduziram ao fortalecimento da Educação Infantil.
A vinculação entre a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB 9394/96) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), pode ser
observada abaixo:
Quadro 1- Documentos legais relacionados à educação infantil
Documentos Legais
Conteúdos
Constituição da República Federativa do Brasil –
1988
Art. 208 – (...).
IV – O dever do Estado com a educação será efetivado
mediante garantia de: (...) atendimento em creche e
pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade.
Art. 211 – A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios organizarão, em regime de colaboração,
seus sistemas de ensino.
(...).
II – Os Municípios atuarão, prioritariamente, no ensino
fundamental e na educação infantil.
26
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do
Estado assegurar à criança e ao adolescente, com
absoluta prioridade, direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização,
à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los
a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
Estatuto da Criança e do Adolescente - 1990
Art. 53 – A criança e o adolescente têm direito à
educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua
pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I – igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola;
(...).
V – acesso à escola pública e gratuita próxima de sua
residência.
Art. 54 – É dever do Estado assegurar à criança e ao
adolescente:
(...) atendimento em creche e pré-escola às crianças de
0 a 6 anos de idade.
Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – Lei 9394/1996
Art.4 - (...).
IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às
crianças de 0 a 6 anos de idade.
Art. 21 – A educação escolar compõe-se de: 1.
Educação Básica: formada pela Educação Infantil,
Ensino Fundamental e Ensino Médio.
Art. 29 – A educação infantil, primeira etapa da
educação básica, tem como finalidade o
desenvolvimento integral da criança.
Art. 30 – A educação infantil será oferecida em:
I) creches, ou entidades equivalentes, para
crianças de 0 a 3 anos de idade;
II) pré-escolas, para crianças de 4 a 6 anos.
Art. 31 – Na Educação Infantil a avaliação far-se-á
27
mediante acompanhamento e registro do seu
desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo
para o acesso ao ensino fundamental.
Art. 62 – A formação de docentes para atuar na
educação básica far-se-á em nível superior, em curso
de licenciatura, de graduação plena, em universidades
e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na
educação infantil e nas primeiras séries do ensino
fundamental, a oferecida em nível médio, na
modalidade Normal.
Observando o quadro, pode-se afirmar que historicamente, a Constituição Federal do
Brasil, de 05 de outubro de 1988, foi a primeira a reconhecer a Educação Infantil como um
direito das crianças pequenas, não restringindo-a ao âmbito do Direito da Família e
explicitando como dever do Estado seu provimento (artigo 208, inciso IV), tendo por
princípio disponibilizar as vagas necessárias para que o atendimento nas instituições se
estabeleça.
Com a promulgação da Constituição de 1988, garantindo o direito da educação para
crianças de 0 a 6 anos de idade, sejam elas filhas de trabalhadores (homens ou mulheres) ou
não, estabelecendo a Educação Infantil como primeira etapa de educação básica e
reconhecendo a criança como cidadã, constantes reformulações no campo das políticas
públicas vêm envolvendo a Educação Infantil.
Ao reconhecer a criança como prioridade, a Constituição de 1988 revela a
necessidade de que se estabeleça um novo olhar à infância e que se reconheça a importância
da Educação Infantil no desenvolvimento integral do ser humano.
O fato de a creche ser adotada na Constituição de 1988, no Capítulo da Educação,
define sua relevância e sua inserção no sistema educacional, além de defini-la como um
direito tanto das crianças quanto de seus pais. Delimita-se o caráter assistencialista da
Educação Infantil, definindo-a como um direito das crianças de 0 a 6 anos de idade, o que
abriu espaço para que discussões a respeito tivessem cada vez mais abertura diante da
sociedade, como pode ser observado em seu artigo 208:
IV – O dever do Estado com a educação será efetivado mediante garantia de:
(...) atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade.
28
Hoje, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9394/1996, considera
a Educação Infantil como “primeira etapa da educação básica”, alcançando relevância no
contexto da educação brasileira no século XX, ao reconhecer que a infância constitui uma fase
essencial na construção da cidadania, assim sendo, houve a necessidade de ampliar o
atendimento das crianças de 0 a cinco anos de idade. Como afirma Kuhlmann (1998):
No entanto, se a proposta de constituição das creches foi objeto de
controvérsias, a afirmação de sua necessidade pressupunha que essas
instituições poderiam colaborar para conciliar a contradição entre o papel
materno defendido e as condições de vida da mulher pobre e trabalhadora,
embora esta não deixasse de ser responsabilizada por sua situação. (p. 87-88)
A Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, fixada em decorrência da
Constituição de 1988, reafirma a responsabilidade dos municípios de oferecer a Educação
Infantil em creches (para crianças de 0 a 3 anos) e pré-escolas (para crianças de 4 a 6 anos),
com a opção de integrar-se ao Estado em uma rede única de educação básica (artigo 11, inciso
V). A LDB 9394/96 destina vários artigos à Educação Infantil, entre eles destacam-se os
abaixo relacionados:
Art. 4 – Inciso IV - Atendimento gratuito em creches e pré-escolas às
crianças de zero a seis anos de idade.
Art. 11- Os municípios incumbir-se-ão de:
V - Oferecer a Educação Infantil em creches e pré-escolas e, como
prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de
ensino somente quando estiverem atendidas as necessidades de sua área de
competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela
Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
Art. 29- A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
ação da família e da comunidade.
Art. 30- A Educação Infantil será oferecida em:
I. creches, ou entidades equivalentes, para crianças até 3 anos de idade;
II. pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade.
Art. 31- Na Educação Infantil, a avaliação far-se-á mediante
acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem objetivo de
promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.
Art. 62- A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em
nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação
mínima para o exercício do magistério na educação infantil e quatro
primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio na
modalidade Normal.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96,
incluir a creche no sistema educativo permite a integração creche - pré-escola, além de
possibilitar a necessária superação do caráter assistencial presente nas instituições. A garantia
do direito gratuito ao atendimento em creches e pré-escolas (art. 4), legitima a valorização da
29
concepção de infância e reconhece a importância de educação e cuidados, que viabilizem o
desenvolvimento integral da criança de 0 a cinco anos e possibilitem a construção da noção de
sua cidadania e o reconhecimento do direito das crianças e de suas famílias.
Além de reconhecer a Educação Infantil como primeira etapa da educação básica
(art.29), a Lei institui o atendimento por faixa etária, tentando estabelecer e respeitar as
especificidades das crianças de 0 a 3 anos e de 4 a 6 anos, através de um atendimento mais
adequado.
Em seu artigo 31, estabelecem-se critérios de avaliação na Educação Infantil,
legitimando a concepção de criança como ser integral e de ritmo individualizado, que deve ser
respeitado, através do acompanhamento e registro do desenvolvimento infantil. A Educação
Infantil deixa de ser vista, com base no artigo citado, como uma espécie de preparação para a
inserção da criança no ensino fundamental.
De acordo com o artigo 62, expresso pela LDB, fixa-se como profissional
responsável pelo atendimento às crianças de 0 a 6 anos, em creches e pré-escolas, o professor,
estabelecendo o sentido de profissionalidade à Educação Infantil, até então indefinida pela
possibilidade de vincular-se apenas ao cuidar, e não ao educar. Consolidam-se também as
creches e pré-escolas como instituições educativas, caminhando para a superação da falsa
dicotomia existente entre cuidado e educação.
Para Cerisara (2002):
Nesse sentido, pode-se dizer que a versão final da LDB incorpore na forma
de objetivo proclamado as discussões da área em torno da compreensão de
que trazer essas instituições para a área da educação seria uma forma de
avançar na busca de um trabalho com um caráter educativo-pedagógico
adequado às especificidades das crianças de 0 a 6 anos, além de possibilitar
que os profissionais, atuando junto à elas, viessem a ser professores com
direito à formação tanto inicial quanto em serviço e à valorização em termos
de seleção, contratação, estatuto, piso salarial, benefícios, entre outros. (p.12)
Atualmente, o que se busca é mediar o desenvolvimento infantil, garantindo a
articulação entre cuidado e educação, redefinindo estes dois termos e integrando-os na
principal meta da Educação Infantil: garantir uma educação de qualidade para as crianças de 0
a cinco anos, em que sejam priorizadas suas especificidades no decorrer de todo processo.
Tais especificidades envolvem desde a estimulação de crianças menores, até o
reconhecimento de que a infância é uma fase em que são necessários afeto, contato físico e
atenção constante.
30
A respeito da faixa etária atendida, do currículo e primordialmente da relação
cuidado e educação nas creches e pré-escolas, Montenegro (2001) estabelece a seguinte
relação entre creche e pré-escola/ cuidado e educação:
Quando se vislumbra de forma positiva o trabalho desenvolvido nos dois
níveis da educação infantil ou aquele que deveria ser realizado, em que a
creche representa um ambiente rico em relações afetivas e a pré-escola, em
atividades programadas respaldadas nos conhecimentos advindos de uma
melhor formação de suas profissionais, tem-se a impressão de que a creche
necessita de mais pré-escola e a pré-escola, de mais creche. É nesse sentido
que entendo a manutenção das palavras cuidar e educar como expressões dos
dois níveis da educação infantil, creche e pré-escola. O cuidado, ao se manter
como uma função, cumpre também o objetivo de remarcar a especificidade
desse nível de educação básica, o que o diferencia dos outros dois, os do
ensino fundamental e médio. (p.42)
Diante de tal afirmação, pode-se inferir que mesmo historicamente, quando
assumiram caráter declaradamente assistencial, as instituições de Educação Infantil, além de
cuidar, educavam. O quesito “cuidado” tornou-se o principal responsável pela diferenciação
existente entre as creches e os demais níveis de ensino. Para Kuhlmann (1998):
O que cabe aqui avaliar e analisar é que, no processo histórico de
constituição pré-escolares destinadas à infância pobre, o assistencialismo, ele
mesmo, foi configurado como uma proposta educacional específica para esse
setor social, dirigida para a submissão não só das famílias, mas também das
crianças das classes populares. Ou seja, a educação não seria
necessariamente sinônimo de emancipação. O fato de essas instituições
carregarem em suas estruturas a destinação a uma parcela social, a pobreza,
já representa uma concepção educacional. (p.182)
O autor destaca também duas características principais desta modalidade
assistencialista de educação: a primeira diz respeito à virtude pedagógica da concepção
educacional, que tira as crianças da rua, prevenindo a criminalidade; a segunda refere-se à
baixa qualidade do ensino, em que:
(...) previa-se uma educação que preparasse as crianças pobres para o futuro
que com maiores probabilidade lhes esteja destinado; não a mesma educação
dos outros, pois isso poderia levar essas crianças a pensarem mais sobre sua
realidade e a não sentirem resignadas em sua condição social. Por isso, uma
educação mais moral do que intelectual, voltada para a profissionalização.
(p.183)
Diante de tais afirmações, o autor afirma que educação e cuidado, mesmo dentro de
uma perspectiva assistencialista, caminham juntos, pois nesta concepção assistencial também
está presente uma certa intencionalidade educativa: que as crianças das classes populares
31
fossem educadas para a submissão e resignação social, em um tipo de educação voltado para a
profissionalização, pois por si só, a pobreza já representa uma concepção educacional.
Diante das argumentações do autor, é imprescindível ressaltar a importância dada às
políticas voltadas para a infância, em termos de legislação, que mais uma vez enfatizam
aspectos como cuidado e educação nas instituições que atendem crianças de 0 a cinco anos de
idade.
No que se refere às leis e documentação vigentes, em termos de Educação Infantil,
destacam-se alguns artigos que deixam transparecer a importância desse nível de ensino para
todos aqueles nele envolvidos (professoras, crianças de 0 a cinco anos, pais ).
A posição oficial das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(Parecer n. 22/98), estabelece:
Uma política nacional para a infância é um investimento social que
considera as crianças como sujeitos de direitos, cidadãos em processo e alvo
preferencial de políticas públicas. A partir desta definição, além das próprias
crianças de 0 a 6 anos e suas famílias, são também alvo de uma política para
a infância, os cuidados e a educação pré-natal voltados aos futuros pais.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, aprovadas em 1998,
de caráter mandatório, constitui-se de princípios, fundamentos e procedimentos que têm por
objetivo a orientação das instituões para crianças pequenas. Tomando por base o princípio
de uma política nacional voltada à infância, pressupõe-se a necessidade de estabelecerem-se
critérios que priorizem aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivos e sociais, levando ao
desenvolvimento das crianças de 0 a cinco anos e não apenas a uma preparação para a vida
escolar, como prevêem as Diretrizes Curriculares (1998):
As próprias crianças pequenas apontam ao Estado, à sociedade civil e às
famílias a importância de um investimento integrado entre as áreas de
educação, saúde, serviço social, cultura, habitação, lazer e esportes no
sentido de atendimento a suas necessidades e potencialidades, enquanto seres
humanos. (p. 7)
Além da Constituição de 1988, da LDB 9394/96 e das Diretrizes Curriculares, outros
documentos também tomam relevância diante da necessidade de se estabelecer uma política
educacional em que a Educação Infantil também se encontre inserida, tais como: o Estatuto da
Criança e do Adolescente (1990), a Política Nacional de Educação Infantil (publicada pelo
MEC em sua versão final no ano de 2005) e os Referenciais Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (1998).
32
O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n. 8069/90, regulamenta o artigo 227 da
Constituição Federal, consolidando a doutrina da proteção integral e especial a crianças e
adolescentes. Em acordo com a Convenção Internacional sobre os Direitos da Infância e
outras normas internacionais, o ECA foi promulgado em 13 de julho de 1990 e consiste no
resultado de uma ampla mobilização social.
Substituindo o Código de Menores (1979), o Estatuto da Criança e do Adolescente
ampliou os poderes dos municípios e dos cidadãos em defesa dos direitos da infância,
compreendendo as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. Considerado uma
referência internacional, inspirou as legislações de mais de 15 países.
O artigo 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece a obrigatoriedade,
por parte do Estado, em atender às crianças de 0 a 6 anos em creches e pré-escolas. Estabelece
ainda a criação de Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional (CONANDA) dos Direitos da
Criança e do Adolescente: instrumentos na defesa do atendimento de crianças e adolescentes.
Para Kramer (2003):
Entre nós, o reconhecimento das crianças como cidadãos é conquista recente:
apenas a partir da década de 1930 a escola elementar se tornou direito de
todos e, após avanços e retrocessos no cenário político brasileiro, temos uma
Constituição democrática (promulgada em 1988) e o Estatuto da Criança e
do Adolescente, de 1990, ambos fruto de intensa mobilização política da
população, que se configuram como avanços legais importantes, mas não se
tornaram ainda realidade. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2;
p. 97)
Os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI),
publicados em três volumes no ano de 1998 pelo Ministério da Educação e Cultura,
constituem um conjunto de referências e subsídios para o trabalho realizado pelos
profissionais que atuam em creches e pré-escolas, constituindo, assim, documentação
importante que trata desse nível de ensino em suas peculiaridades através de sua concepção de
criança, educação, instituição e do profissional que deve atuar com as crianças de 0 a seis
anos, além do significativo fio condutor necessário para o trabalho. Os três volumes dos
RCN’s englobam as seguintes concepções:
Um documento de Introdução, que apresenta uma reflexão sobre creches e
pré-escolas no Brasil, situando e fundamentando concepções de criança, de
educação, de instituição e do profissional que foram utilizadas para definir os
objetivos gerais da educação infantil e orientaram a organização dos
documentos de eixos de trabalho que estão agrupados em dois volumes
relacionados aos seguintes âmbitos de experiência: Formação Pessoal e
Social e Conhecimento de Mundo.
Um volume relativo ao âmbito de experiência: Formação Pessoal e Social
que contém o eixo de trabalho que favorece, prioritariamente, os processos
de construção da Identidade e Autonomia das crianças.
33
Um volume relativo ao âmbito de experiência: Conhecimento de Mundo que
contém seis documentos referentes aos eixos de trabalho orientados para a
construção das diferentes linguagens pelas crianças e para as relações que
estabelecem com os objetos de conhecimento: Movimento, Música, Artes
Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Sociedade e Matemática. (p.
7)
Atualmente, apesar do artigo 208 da Constituição Federal de 1998 estabelecer
creche e pré-escola como direito de crianças de 0 a seis anos de idade, muitas instituições
ainda não conseguiram atender plenamente às crianças em suas especificidades, e com a
aprovação da Lei nº 10.172 de 09/01/2001, que instituiu o Plano Nacional de Educação, o
Brasil, neste momento, estava empenhado em ampliar o Ensino Fundamental de oito para
nove anos por meio do acesso antecipado das crianças de 6 anos à 1ª série, empenho este já
efetivado por meio da Lei n
o
11.114, de 16/05/2005 - Parecer CNE/CEB n
o
39/2006, de
08/08/2006 que define “Art. 6º - É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos
menores, a partir dos seis anos de idade, no Ensino Fundamental” (p.2).
O referido documento estabelece também o quadro com as nomenclaturas
atualizadas a partir do decreto que fixa o ensino fundamental de nove anos:
Quadro 2 - Nomenclaturas e faixa etária das crianças
Etapa de Ensino Faixa etária prevista Duração
Educação Infantil
Creche
Pré-escola
Até 5 anos de idadeAté 3 anos
de idade
4 e 5 anos de idade
Ensino Fundamental
Anos iniciais
Anos finais
Até 14 anos de idade
de 6 a 10 anos de idade
de 11 a 14 anos de idade
9 anos
5 anos
4 anos
A matrícula das crianças de seis anos no ensino fundamental implica na diminuição
do tempo dessas crianças na Educação Infantil, e ainda mais, a preocupação da Educação
Infantil em assemelhar-se cada vez mais ao ensino fundamental, o que pode acarretar em
desestímulo ao desenvolvimento infantil, sem respeitar o estabelecimento de vínculos
34
afetivos, interações e tantas outras especificidades que envolvem o mundo da Educação
Infantil – aborda o Parecer CNE/CEB n
o
39/2006.
Para os profissionais que atuam na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, a
preocupação atual configura-se em compreender quais serão as implicações dessa política de
ampliação do Ensino Fundamental para nove anos em seu trabalho em sala de aula: a primeira
delas é que, no caso do Ensino Fundamental, as primeiras séries receberão crianças mais
novas e será necessário observar quais as especificidades desta faixa etária antes pertencente à
Educação Infantil. Não causaria estranheza se as crianças ingressantes no Ensino
Fundamental encontrarem-se perdidas diante do fato de terem que se alfabetizar aos seis anos
de idade, enquanto ainda poderiam estar desenvolvendo, além da alfabetização, a ludicidade,
socialização e as relações interpessoais nas instituições de Educação Infantil. Espera-se que as
crianças de seis anos que ingressem na 1ª série do Ensino Fundamental não acabem fazendo
parte das taxas de fracasso escolar devido ao fato de não terem tempo suficiente para
desenvolver com mais prudência suas outras habilidades e capacidades, que vão além da
alfabetização, do ler e do escrever, mas que com certeza, influenciam também nesse quesito.
A imposição de um ritmo acelerado, em que se espere das crianças uma
aprendizagem rápida e eficaz, não pode conduzir a uma massificação de crianças, obrigadas a
se alfabetizarem no primeiro ano de escolaridade. Desde que a política de ampliação do
Ensino Fundamental seja realmente implantada, deve-se ter a consciência de que serão nove
anos de Ensino Fundamental e isso requer uma série de alterações e regulamentações para que
seja possível a uma escola funcionar adequadamente, tais como: alterações no projeto
pedagógico, estruturação curricular, tempo e espaço de aprendizagem, além de condições
físicas (salas de aula e outras instalações). É essencial refletir sobre uma melhor distribuição
dos conteúdos curriculares para dar aos professores e alunos um ritmo mais tranqüilo de
aprendizagem, que não venha a comprometê-la ou intervir negativamente na aquisição dos
valores e vivencias ocorridas no interior das instituições escolares, sejam estas de Educação
Infantil ou Ensino Fundamental.
No momento de sua aprovação, a Lei 11.114, de 16/05/2005, gerou discussões a
respeito da verba do FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério), que naquele momento destinava-se apenas ao
Ensino Fundamental, questionava-se a possibilidade da alteração do ensino fundamental de
oito para nove anos ocorrer somente devido a esta verba (FUNDEF), que se destinava
exclusivamente para o ensino fundamental. Posteriormente, em 11/04/2007, ocorreu a
aprovação do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) pela
35
Câmara dos Deputados, fundo este que financia desde a creche (0 a 3 anos) e a pré-escola (de
4 a 5 anos) até o Ensino Médio. Finalmente, uma implementação que considera e destina
recursos também para a Educação Infantil.
Diante de tal definição, implantada pela Lei n
o
11.114, leis como a LDB 9394/96, a
Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA/1990) terão,
necessariamente, que sofrer alterações pelo fato de estabelecerem que a Educação Infantil
contempla crianças de 0 a seis anos de idade, e agora, este item referente à faixa etária
contempla crianças de 0 a cinco anos de idade.
De acordo com o Parecer CNE/CEB n
o
39/2006, as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil e a LDB 9394/96 devem sofrer ajustes para adequarem-se à implementação da Lei nº
11.114, aprovada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que como explicitado
anteriormente, amplia o ensino fundamental para nove anos, significando que a criança que
complete seis anos terá sua vaga nesta modalidade de ensino garantida, dado seu caráter de
obrigatoriedade.
Assim sendo, cabe-nos defender a necessidade de formação, seja esta inicial ou
continuada, para as professoras de Educação Infantil, que não podem ficar esquecidas em
meio às transformações ocorridas atualmente, e que devem atender às necessidades educativas
das crianças de 0 a cinco anos de idade, pois como afirma Perrenoud (2003):
O bom senso não basta para educar crianças pequenas. A primeira infância é
um momento em que as estruturas fundamentais da pessoa são organizadas.
Os erros educativos nessa fase têm, portanto, conseqüências das mais graves.
É preciso oferecer aos professores de educação infantil um elevado nível de
formação. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v. 2; p.18)
Após essa discussão a respeito do contexto histórico das instituições de Educação
Infantil no Brasil, é essencial que se conheça o contexto gerador do Programa CCI’s –
Centros de Convivência Infantil, que constituem o lócus da nossa investigação, para
posteriormente estabelecerem-se as relações existentes entre estes e o histórico das
instituições brasileiras.
36
CAPÍTULO 2 - CONTEXTUALIZANDO O PROGRAMA CCI’S – CENTROS DE
CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP
2.1 Contexto gerador do programa CCI’s – Centros de Convivência Infantil.
Tomando por base a análise tecida por Palmen (2005) em sua dissertação de
Mestrado, intitulada: “A implementação de creches nas universidades públicas estaduais
paulistas: USP, UNICAMP, UNESP”, a respeito do contexto que gerou o Programa Centros
de Convivência Infantil – CCI’s, voltados para filhos de funcionárias públicas em idade de
Educação Infantil (0 a seis anos de idade) nas Secretarias do Estado de São Paulo, podem ser
apresentadas algumas considerações.
No ano de 1979, o Fundo de Assistência Social do Palácio do Governo de São Paulo
(FASPG) propõe o estabelecimento do Programa Centros de Convivência Infantil no Estado
de São Paulo, com o intuito de atender a uma clientela bem específica: filhos de servidoras
públicas, com faixa etária de 3 meses a 6 anos e 11 meses.
O processo de implantação dos CCI’s buscava solucionar o quadro problemático
ocasionado pelo não cumprimento da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), implantada
na década de 40, durante o governo de Getúlio Vargas. A CLT apresentava a obrigatoriedade
de empresas particulares com mais de 30 funcionárias, maiores de 16 anos, implantarem
creches para os filhos de suas funcionárias ou estabelecerem convênios com creches distritais.
A proposta de atendimento nos primeiros CCI’s, criados em 1982, no governo de
Paulo Salim Maluf, era primordialmente assistencial (relacionado à guarda e acolhimento),
como se pode observar:
(...) objetivo de proporcionar a prestação de serviços necessários ao
acolhimento e à assistência à criança filho de funcionárias e servidoras das
Secretarias de Estado e Entidades Descentralizadas, mediante instalação e
administração por estes órgãos e ou entidades de Centros de Convivência
Infantil. (São Paulo, FASPG, Dossiê 1847, p.3)
Segundo Palmen (2005):
De acordo com o Dossiê 1847 do FASPG/SP, o Programa CCI em relação às
Secretarias de Estado são as instituições sociais de prestação de serviços,
contudo em relação às Entidades Descentralizadas (Empresas de economia
mista, Fundações e Autarquias) são benefícios sociais dentro da política de
recursos humanos.
37
Nesse sentido, a implantação dos Centros de Convivência Infantil no interior
das universidades não se configura necessariamente como um direito da
mulher trabalhadora, mas sim enquanto um benefício concedido pelo
empregador dentro da Política Social. (p.61)
Assim, é possível afirmar, segundo a autora, que a implantação do Programa CCI’s
pode ser considerada um marco político-social, por atender às necessidades das mulheres
(mães e servidoras públicas), quanto ao quesito de um local adequado para deixar os filhos
enquanto trabalham. No entanto, o que ocorre é a prioridade ao aspecto assistencial de
atendimento à mulher e não às crianças, não se faz referência ao direito da criança à
educação infantil, passando esta concepção a fazer parte do discurso político somente a
partir de 1988, com a promulgação da Constituição Brasileira.
Apoiado em dispositivos legais, como o Decreto n. 18.370 (08/01/1982), o Decreto
Estadual n. 22.865 (01/11/1984) e o Dossiê 1847 da FASPG, os CCI’s que propunham o
atendimento e assistência às crianças, passam também a valorizar e reconhecer o trabalho
feminino, respondendo à reestruturação da sociedade:
(...) nota-se assim a convergência dos poderes Executivos e Legislativos no
reconhecimento do direito das mulheres funcionárias públicas contarem com
a assistência a seus filhos durante o período de trabalho. Estas medidas
legais podem ser consideradas como primeiros marcos para a definição de
uma política social quanto ao atendimento de uma necessidade da mulher
funcionária pública e em decorrência de sua família. (São Paulo, FASPG,
Decreto Estadual n. 22865, p. 3)
Pode-se observar, portanto, que o foco do Programa CCI está em atender às
necessidades da mulher quanto ao atendimento de seus filhos, que não constituem o alvo
preferencial desta política de atendimento, ou ainda mais, que não constituem o direito da
criança à Educação Infantil, devido ao contexto político da época, regido pela ditadura, pelo
autoritarismo e centralização, em que ainda não eram reconhecidos os direitos estabelecidos
mais tarde pela Constituição Federal de 1988, que aparece especificamente nas atividades-fim
dos CCI’s, destacadas do documento da FASPG:
O CCI existe em função da mãe que trabalha fora de casa, mas seu conteúdo
programático deve ter como objetivo primordial à criança em suas relações
com a família;
O atendimento à criança no CCI deve visar o seu desenvolvimento integral,
isto é, bio-psico-social e pedagógico, o que significa também um envolvimento
com o grupo familiar e sua realidade;
Em relação à família não cabe ao CCI substituí-la, mas preservar e estimular
seus vínculos com a criança;
No CCI a família deve participar do processo não só do desenvolvimento da
criança como da vida da instituição em todos os seus momentos de atuação,
desde o planejamento, organização e funcionamento;
38
A participação das mães funcionárias e usuárias do CCI em reuniões,
entrevistas, palestras, atividades de grupo, etc..., deve ser assegurado pelas
chefias do órgão responsável, durante o expediente de trabalho;
O CCI deve atender à demanda total das crianças como princípio. Este
atendimento, contudo, quando impossível por dificuldades iniciais, deverá ser
feito por etapas e por módulos obedecendo critérios de prioridades como:
crianças em fase de aleitamento materno, crianças cuja situação econômica é
de baixo nível, mães com mais de um filho na faixa etária de atendimento,
mães sem qualquer outra possibilidade ou alternativa para solucionar a situação
de guarda ao filho;
A equipe interprofissional do CCI é composta por técnicos de nível
universitário e pessoal auxiliar, alguns com funções em tempo integral; outros,
em tempo parcial. A equipe poderá conter também elementos estagiários e
voluntários para complementação de tarefas específicas. A todos é
indispensável um processo de reciclagem permanente;
O número de técnico e auxiliares de equipe interprofissional é variável
segundo a faixa etária das crianças e a capacidade de atendimento do CCI;
O CCI destina-se ao atendimento da faixa etária de 3 meses a 6 anos e 11
meses (...) (PALMEN, 2005, p.63 apud FASPG/SP, Dossiê 1847, p.6)
Para a autora, tais características explicitadas acima caracterizam a fase de
implementação do Programa CCI’s do Estado de São Paulo, priorizando a mãe que trabalha
fora e estabelecendo o relacionamento entre a criança e sua família como objetivo primordial
do trabalho, visando o desenvolvimento integral da criança, sempre ressaltando a participação
da família em todos os momentos que constituem o cotidiano infantil.
Ainda segundo a autora, o ano de 1982 constitui o marco da implantação do
Programa CCI, tendo como fio condutor o Decreto n
o
18.370 (08/01/1982), mas existem
registros anteriores de reivindicações pela instalação de unidades de Educação Infantil nos
locais de trabalho desde 1965.
Ainda em 1982, a Emenda Constitucional n
o
31 (31/05/1982), oriunda do Poder
Legislativo, estabelece que o Estado de São Paulo deverá manter, em locais onde trabalhem
mais de 30 mulheres, um local próprio para que seus filhos recebam, durante seu período de
trabalho, assistência e vigilância. Tal emenda define a obrigatoriedade do Estado de São Paulo
em atender às mães trabalhadoras, funcionárias públicas estaduais, mantendo este
atendimento.
Passando para o ano de 1983, durante o governo de Orestes Quércia, o Fundo de
Assistência Social do Palácio do Governo (FASPG) transforma-se em Fundo Social de
Solidariedade do Estado de São Paulo (FUSSESP), visando uma nova proposta política,
incluindo novos técnicos ao programa (assistentes sociais, psicólogos, pedagogos) e
consultores nas áreas de arquitetura, nutrição e saúde. Assim, o Programa CCI toma novo
posicionamento político: atendimento à infância, enfatizando a participação das famílias
(mães e pais) nas ações dos CCI’s, inclusive com o incentivo para que se constituam
39
comissões familiares, que originaram o denominado Clube de Mães e Pais, cuja finalidade era
“...promover maior colaboração e participação nos problemas vivenciados pelos CCI’s (...)”
(São Paulo, FUSSESP, Dossiê 1848, p. 23)
No ano seguinte (1984), no governo de Franco Montoro, institui-se um grupo de
trabalho formado por representantes do FUSSESP, das Secretarias de Saúde, Economia e
Planejamento, Segurança Pública, Educação, Agricultura e Abastecimento, Administração,
Promoção Social e do Conselho Estadual da Condição Feminina. Este grupo elaborou um
documento estabelecendo diretrizes para o funcionamento dos CCI’s:
1. priorizações e critérios quanto à implantação de novos Centros de
Convivência Infantil, relativamente à natureza dos órgãos Estaduais;
2. priorizações e critérios quanto à clientela a ser atendida;
3. atribuições do FUSSESP e, quadro mínimo de pessoal para a implantação
e funcionamento do Centro de Convivência Infantil. (São Paulo, FUSSESP,
Dossiê 1848, p. 26 apud PALMEN, 2005, p.66)
O então governador Franco Montoro assinou o decreto n
o
22.865 em substituição ao
decreto n
o
18.370, reformulando as diretrizes do Programa CCI, no tocante à faixa etária
atendida, definição da clientela e participação e organização das funcionárias nos Clubes de
Mães.
Segundo Palmen (2005), o quadro de pessoal, mais especificamente o número de
profissionais presente nas Unidades, sempre consistiu em uma grande dificuldade em relação
à demanda crescente dos CCI’s. Além disso, a falta de pessoal específico para o atendimento
também foi um dos problemas enfrentados.
Visando a qualificação do trabalho realizado nos CCI’s,
Foi incorporada ao grupo uma técnica formada em Pedagogia, responsável
pelas orientações específicas desta área, já que anteriormente a Equipe do
Programa era formada apenas por técnicos nas áreas de Serviço Social e
Psicologia. (São Paulo, FUSSESP, Dossiê 1848, p. 27 apud PALMEN, 2005,
p.67)
Enfatizou-se, a partir dessa mudança, a área pedagógica, mas de acordo com a
autora, problemas em outras áreas de atendimento continuaram a existir, com a ausência de
profissionais atuantes nas áreas de: Nutrição, Enfermagem, Educação Física, Educação
Artística, que passaram a ser contratados, visando qualificar o trabalho realizado nos CCI’s.
Assim sendo, pode-se verificar que o Programa CCI sofreu alterações desde sua
constituição, mas sempre em busca e em nome da tão almejada qualidade do trabalho. Assim
sendo, o Programa CCI’s foi incorporado também na Universidade Estadual Paulista “Júlio de
40
Mesquita Filho”, buscando atender às reivindicações de funcionários e servidores por um
local onde pudessem deixar seus filhos durante sua jornada de trabalho diária, que será
abordado a partir deste momento.
2.2 Os CCI’s/Unesp – Centros de Convivência Infantil da Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.
A UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” conta com o
total de 16 campi, distribuídos por todo o Estado de São Paulo. Conseqüentemente, suas
unidades de Educação Infantil (CCI’s/Unesp) também compartilham dessa distribuição,
estando presentes em 13 campi da Universidade, o que conduz a uma caracterização própria
de cada unidade, de acordo com o local em que esteja inserido. (Palmen, 2005, p.139)
A Portaria Unesp n
o
70, de 19/04/1982, documento que rege os Centros de
Convivência Infantil em seu estabelecimento e funcionamento, estabelece em seu artigo 52:
“O CCI fixará suas normas de funcionamento por meio de Regimento Interno em consonância
com o presente Regimento”.
Seguindo o modelo de instituições de Educação Infantil implantadas pelo Estado de
São Paulo, implantaram-se também os Centros de Convivência Infantil da UNESP,
gradativamente, sendo instituídos através da Portaria UNESP n
o
70 de 19/01/82, devido à
pressão de servidores (técnico-administrativos e docentes), buscando atender às
reivindicações apresentadas pelas funcionárias quanto a um local adequado em que pudessem
deixar os filhos durante seu período de trabalho. As unidades encontram-se distribuídas em 13
campi da UNESP, perfazendo o total de 14 Centros, como pode ser visualizado abaixo:
Quadro 3 – CCI’s da UNESP: localização e datas de implantação
UNESP CCI Ano de implantação
Araçatuba “Cantinho Feliz” 1982
Araraquara “Casinha de Abelha” 1984
Assis “Criança Feliz” 1989
Bauru “Gente Miúda” 1982
41
“Lageado” 1988
Botucatu
Rubião Junior – “Pertinho da
Mamãe”
1987
Franca “Pintando o Sete” 1988
Guaratinguetá “Pingo de Gente” 1995
Ilha Solteira “Catatau” 1988
Jaboticabal “Recanto dos Pequeninos” 1987
Marília “Prof. Helton Alves Faleiros” 1989
Presidente Prudente “Chalezinho da Alegria” 1987
São José dos Campos “Dente de Leite” 1982
São José do Rio Preto “Bagunça Feliz” 1991
Em cada campi, criaram-se comissões que lutavam pela agilidade na implantação
dos CCI’s, implantados em diferentes datas e situações (Quadro II), mas sempre com o intuito
de atender às funcionárias públicas, ressaltando o direito da mãe trabalhadora a contar com
local apropriado para deixar seus filhos enquanto exercem suas atividades trabalhistas.
Criados de forma individual, atendendo e adequando-se às peculiaridades de cada campus;
sendo que a história das Unidades constitui-se particularmente no que se refere a espaço
físico, clientela, recursos financeiros e contratação de funcionários; Palmen (2005) afirma:
Por estarem instalados numa universidade cuja característica principal é ser
multicampi, seus CCI’s também possuem características próprias, que
respondem às necessidades dos locais onde estão instaladas, porém, hoje se
pautam por um único Regimento Interno, o qual só foi aprovado em 1996,
ou seja, 14 anos após a inauguração da primeira creche da UNESP, em
Bauru no ano de 1982. (p.140)
O mapa abaixo permite uma melhor visualização dos municípios que possuem
Centros de convivência Infantil da Unesp, além do número de crianças atendidas:
42
Mapa 1- Localização dos CCI’s/Unesp e média de crianças atendidas
(Fonte: PRAD – Pró-Reitoria da Administração/ Unesp/Reitoria; 2006)
A implantação das Unidades obedecia alguns critérios extraídos da Secretaria da
Educação do Estado de São Paulo, dentre os quais encontram-se: espaço físico suficiente,
renda familiar dos interessados, demanda de, no mínimo, 30 crianças com idade adequada
para freqüentar o CCI (que atende crianças de 4 meses a 6 anos e 11 meses) e quadro de
profissionais a ser contratado.
O CCI deve ser coordenado por um pedagogo, assistente social ou psicólogo, com
nível superior completo. No que se refere à formação dos demais profissionais e o
atendimento das crianças, o Regimento dos CCI’s/UNESP, aprovado pela Portaria UNESP n
o
49 de 07/03/96, dispõe dos seguintes princípios:
Os CCI’s “têm por objetivo proporcionar a prestação de serviços
necessários ao acolhimento, ao atendimento e à socialização de
crianças de até 07 (sete) anos de idade, filhos ou dependentes legais de
servidora (técnico-administrativa e docente) da Unesp, que esteja no
exercício de suas funções”. (art. 1º)
Os CCI’s dispõem para realização de suas atividades, do coordenador
de creche; auxiliar de enfermagem; recreacionista; auxiliar de
recreacionista; cozinheiro; auxiliar de cozinha; auxiliar de serviços
gerais; auxiliar administrativo. (art. 7º) Entre as funções presentes não
se incluem as de professor ou educador. Também não foram
específicos dessas funções, os requisitos prévios exigidos em termos
de formação.
43
De conformidade com o Título VII do Regimento dos CCI’s – “Do
Atendimento e Assistência” – evidencia-se que os CCI’s são
limitados, em seus objetivos, fundamentalmente a “alimentar”,
“higienizar” e “cuidar”. Ou seja, não prevê o educar como atividade
presente nas Unidades.
Segundo a Portaria UNESP n
o
70, os CCI’s são vinculados ao PROAS – Programa
de Assistência Social da Coordenadoria de Recursos Humanos, que por sua vez, vincula-se
à PRAD – Pró-Reitoria da Administração. Este vínculo pode ser melhor observado abaixo:
(Fonte: PALMEN, Sueli Helena de Camargo. A implementação de creches nas universidades públicas
estaduais paulistas. Campinas, SP, 2005, p.139)
A PRAD – Pró-Reitoria de Administração é responsável pelas seguintes
atribuições (Art. 4), no tocante aos Centros de Convivência Infantil da Unesp:
I. Propor e transmitir as diretrizes técnicas a serem adotadas pelos CCI’s;
II. Acompanhar e avaliar o desenvolvimento dos CCI’s, propondo medidas
para seu aperfeiçoamento;
III. Elaborar e executar projetos de treinamento e desenvolvimento dos
recursos humanos destinados aos CCI’s;
IV. Promover a integração dos CCI’s. (UNESP, Regimento dos CCI’s, 1996)
Quanto às crianças matriculadas, o Regimento dos CCI’s/UNESP, Portaria Unesp n
o
49 de 1996, prevê os seguintes benefícios (Art. 36):
I. Alimentação adequada a cada faixa etária, em obediência à orientação
técnica especializada, preservando a qualidade dos alimentos fornecidos, em
conformidade com a disponibilidade do CCI, nos horários convenientemente
estipulados;
II. Medicação, quando necessária por orientação médica, cabendo aos pais
fornecerem os respectivos medicamentos, que deverão ser entregues à
Coordenação do CCI ou à funcionária responsável, com a devida receita
médica;
REITORIA
PRAD
(Pró-Reitoria de
Administração)
PROEX
(Pró-Reitoria de
Extensão)
PROGRAD
(Pró-Reitoria de
Graduação)
PROPP
(Pró-Reitoria de Pós-
Graduação e Pesquisa)
PROAS
(Programa de Assistência
Social – Programa CCI)
44
III. Higiene corporal, sendo que os pais deverão fornecer o material solicitado
e repô-lo sempre que necessário;
IV. Atividades lúdicas variadas de caráter pedagógico, sob a orientação de
pessoa responsável, de acordo com a faixa etária;
V. Atendimento por pessoal especializado, mediante técnicas e planejamentos
previamente elaborados e com material selecionado criteriosamente, visando
ao desenvolvimento da criança, de acordo com as faixas etárias.
Fica explícito, diante dos benefícios propostos pelo Regimento dos CCI’s – Portaria
Unesp n
o
49/1996, que as atividades relacionadas ao cuidar prevalecem em detrimento do
trabalho educativo.
No que diz respeito à responsabilidade dos pais perante às crianças que freqüentam
as unidades (CCI’s/Unesp), o Título IX – “Da Responsabilidade dos Pais”, em seu artigo 39
estabelece:
I. O comparecimento ao CCI, quando convocados;
II. Providenciar os materiais pedagógicos de higiene pessoal da criança;
III. Fornecer as refeições e orientar a forma de administrá-las, quando se tratar
de dieta alimentar especial;
IV. O cumprimento das recomendações emitidas pelas áreas de saúde no
tocante aos exames médico-odontológicos periódicos e à imunização;
V. Conferir os pertences da criança à saída do CCI
.
Em aspectos gerais, as orientações para os pais referem-se a cumprir convocações e
recomendações relacionadas principalmente às questões de saúde e cuidado das crianças.
Os pais, além das responsabilidades estabelecidas no artigo 39, também atuam na
aquisição e contribuição material, que em termos gerais provêm do orçamento da
Universidade:
Art. 41 – O CCI poderá receber dos pais ou de terceiros contribuições
materiais e financeiras, mensais ou eventuais, para auxiliar na manutenção
ou para melhorar seu funcionamento. (UNESP, REGIMENTO DOS CCI’S,
1996)
Atualmente, a Universidade Estadual Paulista – UNESP, enfrenta um grande
desafio: incluir os Centros de Convivência Infantil – CCI’s/Unesp nas metas e princípios que
regem as políticas da Unesp e suas atividades-fim: ensino, pesquisa e extensão, com objetivo
de garantir e aperfeiçoar a qualidade na educação das crianças. Assim se define a importância
do trabalho realizado nos CCI’s/Unesp:
Nas ações desenvolvidas nos Centros de Convivência Infantil, encontramos
reflexos de trabalhos realizados por profissionais da Unesp, nos mais
diferentes campos do conhecimento e que vêm articulando a formação
docente, a pesquisa e a prestação de serviços à comunidade empenhando-se,
assim, no cumprimento da responsabilidade social que a Universidade deve
45
perseguir, principalmente aquelas de caráter público. A característica
multicampus da Unesp oferece condições extremamente vantajosas para que
a diversidade de áreas de conhecimento apresentem-se, nos seus Centros de
Convivência Infantil, como possibilidades para o aprofundamento e
aperfeiçoamento das atividades-fim da Universidade, ao lado da qualificação
da educação para nossas crianças. (POLÍTICA PARA OS CENTROS DE
CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP
2
, 2005, P. 11)
Diante disso, podemos inferir que as instituições de Educação Infantil da Unesp –
CCI’s/Unesp, estão iniciando um processo de valorização dentro da própria Universidade em
que estão inseridas, visando um trabalho que articule realmente o que a Universidade pode
oferecer com a existência dos CCI’s, que podem ser aproveitados como espaços de formação
docente, pesquisa e prestação de serviços à comunidade:
Ao lado das atuais creches das universidades estaduais e federais, incluir e
garantir a educação das crianças pequenas em Centros de Convivência
Infantil no contexto das atividades-fim da UNESP – Ensino, Pesquisa e
Extensão – representa uma política avançada no que se refere às
contribuições sociais e científicas que as instituições públicas devem à
sociedade brasileira, hoje posta refém dos processos de globalização, de
massificação e de despotencialização de seus indivíduos. (POLÍTICA PARA
OS CENTROS DE CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP, 2005, p. 29)
Segundo o documento Política para os Centros de Convivência Infantil da Unesp
(2005), historicamente, os CCI’s/Unesp surgiram como uma forma de garantir proteção e
cuidados (higiene, saúde) às crianças, enfatizando um caráter assistencial e de benefício
exclusivo às mães trabalhadoras, e não como a realidade pede, ou seja, como um direito das
crianças de 0 a cinco anos, visando sua inclusão na Educação Infantil.
Segundo o documento citado, no que se refere às questões relativas à estrutura física
dos CCI’s/Unesp, parece claro que por constituírem um local em que as crianças de 0 a 6 anos
convivem com adultos e com outras crianças de diferentes idades, em processo de constante
socialização, é essencial que estes espaços promovam relações, rotinas, descobertas,
responsabilidades, cooperação, entre outros aspectos fundamentais para o desenvolvimento
pleno das crianças que ali se encontram.
O Regimento dos CCI’s/Unesp – Portaria Unesp n
o
49/1996, alega que a maioria das
unidades enfrentou sérios problemas quanto ao espaço físico, que dificultaram a estruturação
dos CCI’s. Grande parte dos Centros foi implantada em prédios cedidos ou adaptados,
inadequados ao atendimento que seria prestado.
2
A Política para os Centros de Convivência Infantil da Unesp (2005) encontra-se em processo de aprovação pelo
Conselho Universitário, estando em fase de discussão nos órgãos colegiados.
46
Os progressos relacionados ao aspecto físico foram sendo alcançados com o decorrer
do tempo, sendo que atualmente, doze unidades possuem instalações próprias (seis foram
construídas com o fim de abrigar os CCI’s e outras seis são adaptadas), assim, pode-se afirmar
que atualmente a maioria dos CCI’s/UNESP possui estrutura física satisfatória.
O ambiente físico dos CCI’s conta com três subdivisões:
Área administrativa: salas de supervisão, secretaria e almoxarifado;
Área de serviços: sala de enfermagem, cozinha, refeitório e banheiros;
Área de atividades: playground, salas de aulas, salas para grupos etários (berçário,
maternal, minigrupo e jardim) e salas de estimulação.
Ainda de acordo com o Regimento dos CCI’s/Unesp, o horário de atendimento das
Unidades, em geral, atende às especificidades da clientela; sendo que o horário de entrada fica
entre 7h00 e 7h30 da manhã e o horário de saída entre 17h30 e 18h00 horas. Todas as
unidades atendem em período parcial e integral, e metade dos CCI’s têm férias coletivas e a
outra parte, férias por escala.
Atualmente, o Regimento dos Centros de Convivência Infantil da UNESP n
o
49 de
março de 1996 sofreu algumas alterações através da Portaria UNESP n
o
311 de 23 de julho de
2004, que serão tratadas a seguir.
2.3 Alteração do Regimento dos CCI’s/UNESP – Portaria Unesp n
o
49/1996 pela
Portaria Unesp n
o
311 de 23 de julho de 2004.
Os Centros de Convivência Infantil da UNESP são conduzidos por um regimento
próprio (Regimento dos Centros de Convivência Infantil da UNESP – Portaria UNESP n
o
49/
março de 1996), que orienta como deve ser realizado o trabalho nas unidades de Educação
Infantil. Essas unidades, espalhadas por diversos campi da Universidade, utilizam-se deste
Regimento como um “fio condutor” para possíveis e necessárias alterações, atendendo
particularidades da clientela e das instalações de cada CCI.
O Reitor da UNESP – Universidade Estadual Paulista, José Carlos Souza Trindade,
alterou, através da Portaria UNESP n
o
311 de 23 de julho de 2004, o Regimento instaurado
em 1996. O artigo 3 da Portaria UNESP n
o
311 estabelece quais são as alterações feitas ao
Regimento dos CCI’s de 1996:
47
Artigo 3 – Esta portaria entrará em vigor na data de sua publicação,
revogando-se as disposições em contrário e, em especial, os artigos 1º e 18º
do Regimento dos CCI’s da UNESP n.49/96. (UNESP, Portaria n
o
311,
2004)
Assim sendo, estabelece-se que a Portaria UNESP n
o
311/04 altera dois artigos (1º e
18º) dos 57 artigos que compõem o Regimento dos CCI’s de 1996. O artigo 7º, que merece
mais atenção , não sofreu qualquer espécie de alteração em seu conteúdo. Este artigo prevê:
Art. 7º – para a execução de suas atividades, o CCI contará com as seguintes
funções:
I. Coordenador da Creche;
II. Auxiliar de Enfermagem;
III. Recreacionista;
IV. Auxiliar de recreacionista;
V. Cozinheiro;
VI. Auxiliar de Cozinha;
VII. Auxiliar de Serviços Gerais. (UNESP, Regimento dos CCI’s, 1996)
Este artigo não prevê nas unidades a presença de professores ou educadores, mas de
recreacionistas e auxiliares. Não existem requisitos no aspecto referente à formação desses
profissionais, que trabalham diretamente com as crianças de 0 a cinco anos de idade,
contrariando a formação exigida pela LDB 9394/96, que determina que os profissionais que
atuam na educação básica tenham formação em nível superior ou “como formação mínima
para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino
fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade Normal” (art.62º).
O Regimento dos CCI’s/96, mesmo após modificações, não incorporou ainda a
necessidade de que os profissionais se adaptem à formação exigida pela lei e com o agravante
da formação desses profissionais não ter ainda o seu necessário reconhecimento pela
Universidade, contudo, a grande maioria das profissionais atende às exigências determinadas
pela LDB 9394/96 em termos de formação profissional .
O empenho por parte da legislação, em definir as especificidades da Educação
Infantil, os conhecimentos para atuar na área e a necessidade da criança ser reconhecida como
sujeito de direitos, fica praticamente invalidado se os profissionais da área não tiverem acesso
à formação inicial e em serviço, pois não basta que a legislação tenha este empenho se as
profissionais não puderem ter acesso a uma formação que lhes garanta a possibilidade de
oferecer às crianças a tão almejada qualidade no ensino, atendendo às peculiaridades que a
Educação Infantil exige.
48
O artigo 1º do Regimento dos CCI’s, após passar pela reformulação de Portaria
UNESP n
o
311/04, assumiu o seguinte formato:
Art.1º – Os Centros de Convivência Infantil da UNESP – CCI’s, previstos na
Portaria UNESP 70, de 19/01/82, têm por objetivos ao desenvolvimento da
criança de até 7 (sete) anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico,
intelectual e social, filhos de servidores (técnico-administrativos e docentes),
que estejam no exercício de suas funções, assegurando-se-lhes a formação
indispensável para o exercício da cidadania, e, o apoio ao ensino e à
pesquisa, por meio das modalidades:
I. Creche, para crianças de 04 meses a 3 anos e 11 meses;
II. Pré-escola, para crianças de 4 anos a 7anos.
A modificação no artigo 1º reconheceu que a criança deve ter assegurado o direito
de uma formação que conduza ao exercício da cidadania, além de incorporar como objetivo
dos CCI’s o apoio ao ensino e à pesquisa. Instituíram-se duas categorias que anteriormente
não apareciam definidas explicitamente: a creche (crianças de 4 meses a 3 anos e 11 meses) e
pré-escolas (crianças de 4 a 7 anos), assumindo que as crianças possuem peculiaridades
determinadas também pela faixa etária a que pertencem.
O parágrafo 1 do artigo 1º estabelece o atendimento dos Centros de Convivência
Infantil também para crianças filhos de:
I. Funcionários da Associação de Servidores local;
II. Funcionários das Fundações vinculadas à UNESP;
III. Alunos da graduação;
IV. Alunos da pós-graduação;
V. Alunos de pós-doutorado. (UNESP, Portaria UNESP n
o
311/04)
O atendimento destinado aos filhos de outras pessoas que não sejam filhos de
servidores da UNESP ocorrerá caso não existam filhos de servidores públicos na lista de
espera.
O artigo 2º prevê que terá direito à vaga no CCI, a criança filho de servidor cujo
cônjuge possa comprovar que não teve direito à vaga em outra unidade de Educação Infantil e
não faça uso do reembolso-creche no seu local de trabalho. Neste artigo, ficam estabelecidos
também os critérios constantes do processo seletivo para as famílias que desejam uma das
vagas na instituição, sendo, pela ordem, avaliação da ficha socioeconômica e entrevista.
A situação socioeconômica é o fator mais relevante, determinando a prioridade na
aceitação da matrícula. Os critérios estabelecidos para determinar o deferimento da matrícula
devem obedecer à seguinte somatória (por ordem de importância):
49
A criança que se encontra em período de aleitamento materno exclusivo;
A situação socioeconômica da família;
A ordem de inscrição.
Através do Ofício Circular n
o
51/2004 – PRAD, a respeito da alteração no
Regimento dos CCI’s/Unesp – Portaria Unesp n
o
49/1996, encaminhado às coordenadoras das
unidades, o Pró – Reitor da UNESP, Roberto Ribeiro Bazilli define o objetivo das alterações:
Pelo presente encaminho para ciência e orientação sobre como proceder
frente às disposições objeto da Portaria UNESP n
o
311, de 23 de julho de
2004, publicada no DOE de n
o
24, que alterou os artigos 1º e 18º do
Regimento dos CCI’s, baixado pela Portaria UNESP n
o
49/96.
Esclareço que a norma teve por intuito regulamentar ações que já vem sendo
praticadas pela maioria dos Centros de Convivência Infantil, algumas,
anteriores à publicação da Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional.
Diante dessa afirmação, pode-se observar que as alterações realizadas somente
regularizaram situações que vinham sendo praticadas nos CCI’s da UNESP, tais como o
atendimento de crianças filhos de servidores homens, pautando-se na igualdade de direitos e
deveres de ambos os sexos, desde que esses servidores homens possuam vínculo com a
Universidade. Esta constitui uma das situações que necessitava ser regulamentada, porque o
atendimento aos servidores homens vinha sendo realizado em algumas unidades.
Os CCI’s da UNESP reconhecem a importância da Educação Infantil para as
crianças, não mais pautando o atendimento somente como “benefício ao trabalhador”.
Definem-se a finalidade e o objetivo do atendimento, embasada em princípios de liberdade e
solidariedade:
Finalidade: o desenvolvimento integral da criança, complementando a ação
da família e da comunidade;
Objetivo: assegurar à criança atividades estimuladoras proporcionando
condições adequadas para promover o bem-estar e o desenvolvimento, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual, moral e social, e, apoio ao
ensino e à pesquisa. (PORTARIA UNESP n
o
311, 2004)
Diante das definições explicitadas, pode-se afirmar que a Educação Infantil passou
de direito dos pais a ser também um direito das crianças, tais definições encontram-se de
acordo com o artigo 29º da Lei 9394/96, que se refere à finalidade da Educação Infantil:
desenvolvimento integral da criança, complementando a ação da família e da comunidade.
As vagas remanescentes nos Centros, caso existam, devem ser preenchidas
prioritariamente por filhos de servidores. Se o candidato que preencha este requisito for
inexistente, as vagas podem ser preenchidas por filhos de pessoas que não possuam vínculo de
50
trabalho com a UNESP, seguindo a ordem estabelecida no artigo 1º, parágrafo 1, mencionado
anteriormente.
A vaga remanescente deve ser divulgada através de cartazes ou anúncios, afixados
nos locais de interesse (Associação de Servidores, Fundações, Diretórios Acadêmicos). O
processo para o ingresso nos CCI’s obedece aos critérios colocados anteriormente,
contemplados no artigo 2º da Portaria n
o
311/2004.
A Orientação da Portaria UNESP n
o
311/04 frisa que:
Com exceção dos artigos 1º e 18º do Regimento dos CCI’s da UNESP,
baixado pela Portaria UNESP n
o
49/96, os demais dispositivos da norma
regimental continuam vigentes.
Diante de tais modificações, que agora atribuem à criança a oportunidade de seu
“desenvolvimento integral, complementando a ação da família e da comunidade” (Portaria
Unesp n
o
311/2004) leva-se em consideração a necessidade de re(significar) a identidade
profissional das professoras dos Centros de Convivência Infantil da Unesp, objetos de nossa
investigação, pelo fato de ter sido estabelecido o direito das crianças ao seu desenvolvimento
integral.
2.4 Regimento dos CCI’s/UNESP – elaborando uma nova proposta
Os Centros de Convivência Infantil da Unesp, conduzidos por um regimento próprio
(Regimento dos Centros de Convivência Infantil da UNESP – Portaria UNESP n
o
49/ março
de 1996), que conduz o trabalho nas unidades de Educação Infantil da Unesp, sofreu
alterações reais através da elaboração de um novo Regimento, aprovado pelo CADE em 2006,
mas ainda em processo de homologação pelo CO, incorporando a necessidade de atualizações
no que se refere à Educação Infantil e aos critérios para um melhor atendimento às crianças de
0 a 6 anos e 11 meses.
O Reitor da UNESP – Universidade Estadual Paulista, José Carlos Souza Trindade,
alterou o Regimento instaurado em 1996, em que foram inseridas exigências educacionais,
como a formação dos profissionais e os novos critérios para atendimento educacional das
crianças de 3 meses a 6 anos e 11 meses.
51
O artigo 1º do Regimento dos CCI’s, após passar pela reformulação, assumiu o
seguinte formato:
Art.1º – Os Centros de Convivência Infantil da UNESP – CCI’s, previstos na
Portaria UNESP 70, de 19/01/82, têm por finalidade:
a) o atendimento educacional e de cuidados a crianças de 3 meses a 6 anos e
11 meses, dependentes de servidores (técnico-administrativo e docente), que
estejam no exercício de suas funções na Universidade, e de discentes,
assegurando às crianças a formação indispensável para o exercício da
cidadania e para o seu pleno desenvolvimento;
(...)
b) constituir-se espaço de pesquisa, ensino e extensão, facilitando,
desenvolvendo e participando de atividades no campo da educação infantil,
em articulação com os diversos campos de conhecimento presentes na
Unesp.
A modificação no artigo 1º reconheceu que a criança deve ter assegurado o direito
de uma formação que conduza ao exercício da cidadania, envolvendo cuidado e educação,
além de incorporar como objetivo dos CCI’s o apoio ao ensino e à pesquisa.
De acordo com a nova proposta de alteração do Regimento dos CCI’s/Unesp, em seu
artigo 4º, o atendimento será realizado da seguinte proporção: 70% das vagas para
dependentes de funcionários técnico-administrativos; 15% para dependentes de funcionários
docentes e 15% para dependentes de alunos de graduação, pós-graduação e pós-doutorado, o
que constitui uma evolução diante de um quadro que anteriormente atendia crianças
dependentes de alunos somente se houvessem vagas remanescentes.
Em seu artigo 2º, a nova proposta do Regimento dos CCI’s/Unesp define os
objetivos das instituições, visando atender aos direitos da criança, contribuindo para a
construção do seu conhecimento, além de reconhecer a importância da formação dos
profissionais:
a) Garantir os direitos fundamentais da criança, conforme legislação nacional e
acordos internacionais;
b) Contribuir com o processo de construção de conhecimentos sobre a infância,
sua educação, suas instituições;
c) Contribuir com a formação dos profissionais nas diversas áreas de saber da
Universidade, por meio da criação, coordenação e manutenção de estágios,
projetos de pesquisa e de extensão relacionados à infância;
d) Elaborar, executar e avaliar projetos que visem ao intercâmbio social,
cultural e educacional do CCI com a comunidade em geral.
Em seu artigo 19º, que define o quadro de pessoal presente nos Centros de
Convivência Infantil da Unesp, após as modificações realizadas no novo Regimento, assumiu
o seguinte formato:
52
I. Supervisor de CCI
II. Professor de Educação Infantil
III. Técnico de Enfermagem de CCI
IV. Cozinheiro de CCI
V. Auxiliar de Cozinha de CCI
VI. Auxiliar de Serviços Gerais de CCI
VII. Auxiliar Administrativo de CCI.
Complementa-se este artigo com o artigo 22º, item II, a respeito dos professores de
Educação Infantil:
Em conformidade com o disposto no artigo 62º da LDB, exigir-se-á para o
exercício da função de Professor de Educação Infantil, Curso Médio, na
modalidade Normal e, preferencialmente, Licenciatura Plena em Pedagogia
com Habilitação em Educação Infantil, podendo aceitar-se a formação em
Curso Normal Superior.
Assim, estabelece-se a necessidade do professor de Educação Infantil nos CCI’s da
Unesp, regularizando seu Regimento com o que vem determinado pela Lei 9394/96 (LDB),
deixando para trás as funções de recreacionistas e auxiliares, exigindo formação adequada das
profissionais, que por si só já buscavam sua formação, acredito que não apenas para
adaptarem-se às novas exigências da LDB 9394/96, mas também visando realizar um trabalho
cada vez melhor dentro das Instituições (CCI’s/Unesp).
O atual quadro de qualificação dos profissionais que atuam junto às crianças de zero
a seis freqüentadoras dos CCI’s/Unesp reflete as determinações da legislação brasileira
vigente, representadas no Quadro IV:
Quadro 4- Formação inicial das recreacionistas e auxiliares de recreacionistas dos
CCI’s/Unesp
(Fonte: Política para os Centros de Convivência Infantil da Unesp - 2005)
Função Ensino
Fundamental
(incompleto)
Ensino Médio
ou Magistério
Ensino Superior
(não Pedagogia)
Normal
Superior
Pedagogia
Cidadã
Pedagogia Total
Recreacionistas
00 07 04 04 10 39 64
Auxiliares de
recreacionistas
03 09 02 00 10 32 56
Total
03 15 06 04 20 71 120
53
Quando teve início o Programa CCI’s/Unesp na década de 80 - como local destinado
às crianças filhas de mães trabalhadoras e ainda vigentes o caráter assistencialista, de proteção
e cuidados - o que podia ser observado é que a grande maioria das profissionais que ali
atuava, denominadas recreacionistas, possuía formação a nível de ensino médio, sendo poucas
as profissionais com formação no Magistério. Buscando atender ao que exige a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96, conforme anunciado no documento
Política para os Centros de Convivência Infantil da Unesp (Novembro. 2005):
A partir de 1996, provavelmente em atendimento à LDB e também por
iniciativa das próprias profissionais, diversas recreacionistas buscaram
complementação em suas formações através da freqüência em cursos de
magistério e pedagogia. (p. 19)
O Quadro IV mostra dados atuais a respeito da formação de recreacionistas e
auxiliares de recreacionistas, que optamos denominar professoras, após o cumprimento das
exigências da LDB 9394/96.
O termo “professoras” parece ser o mais adequado para denominar as profissionais
de Educação Infantil dos CCI’s da Unesp nesta pesquisa, visto que o documento Política para
os Centros de Convivência Infantil da Unesp (2005) assim define o termo utilizado:
Ao criarmos a função de professor de educação infantil, não estamos apenas
substituindo a nomenclatura, em atendimento à legislação atual. Pelo
contrário, pretendemos que os adultos que atuam com nossas crianças,
interferindo direta e deliberadamente no seu processo de desenvolvimento e
aprendizagens, de ampliação de seus universos pessoais e culturais sejam,
efetivamente, interlocutores qualificados, não apenas enquanto portadores de
diploma ou certificado, mas possuidores de atitudes e com domínio de
conhecimentos que sustentem suas práticas com as crianças pequenas, na
perspectiva crítica que defendemos e cujo perfil delineamos na proposta de
Regimento dos CCI’s. Nesse sentido, não se justifica a função de auxiliar de
recreacionista, muitas vezes, figura dependente da recreacionista “titular”,
limitando suas funções aos cuidados básicos como higiene, alimentação e
segurança. (p.30)
Cerisara (1996) afirma que em nível nacional, as diferentes denominações assumidas
pelas profissionais de Educação Infantil decorrem das problemáticas exigências decorrentes
da profissão, que se referem à formação, função, salários, carga horária, entre outras.
Para a autora:
Principalmente as professoras, que passaram por uma formação específica
para poder assumir uma vida profissional no universo público, têm suas
expectativas de competência profissional tanto mais abaladas quanto mais
constatam que desenvolvem um trabalho que se opõe ao que se
convencionou chamar de profissional: há uma domesticidade nas relações
com fortes traços de emotividade, as práticas junto às crianças parecem não
54
guardar traços de racionalidade e objetividade, a não ser quando elaboram o
planejamento ou participam de reuniões de estudo. (p. 104)
Considerando que a Educação Infantil constitui um período único da vida das
crianças, momento que possibilita a aquisição de uma série de noções, tais como: a rotina
estabelecida nas instituições (hora de comer, dormir, brincar), os conhecimentos adquiridos
através do convívio com outros adultos e com as próprias crianças, a socialização, pequenas
coisas como segurar um talher, reconhecer suas roupas, vestir-se, dividir seus brinquedos, ir
ao banheiro sozinha – tais conhecimentos não são merecedores de valor aos olhos da
sociedade e até mesmo aos olhos dos pais, mas freqüentar uma unidade de Educação Infantil
para uma criança constitui uma experiência rica e diversificada, pelo convívio, regras,
direitos, deveres e atitudes que as crianças começam a desenvolver. Assim, de acordo com
Cerisara (2003), as professoras de Educação Infantil acreditam, e mais do que acreditam,
reivindicam, é que esta etapa da educação tenha seu devido reconhecimento e portanto, não
pode ser atribuída “a qualquer pessoa” a importante tarefa de educar e cuidar, é necessário
que as professoras tenham formação adequada e principalmente, tenham a valorização pela
qual lutam há tanto tempo: em termos financeiros, condições de trabalho, formação, mas
primordialmente, reconhecimento social pelo trabalho que desenvolvem. Segundo a autora:
A tentativa é romper com a tendência que se consolidou nos últimos anos, a
de considerar todo trabalho profissional feminino, que guarda das
características do trabalho doméstico, como negativo em si. O objetivo é
compreender como se dá a contaminação da práticas femininas domésticas
com a prática profissional das educadoras de creches e pré-escolas. O
esforço é no sentido de refletir a respeito da positividade dessas formas
femininas de relacionamento e de organização do trabalho das profissionais,
em especial para o trabalho que devem realizar com crianças de 0 a 6 anos.
(p.20, 2003)
Diante do Quadro IV, podemos verificar que as professoras de Educação Infantil dos
CCI’s/Unesp, responsáveis diretas pelas atividades educativas realizadas com as crianças,
encontram-se em visível adequação à legislação (LDB 9394/96). Afirma-se que:
Importante destacar que não se trata aqui de se atribuir valoração apenas à
certificação (diploma) em curso de tal ou qual natureza. Estudos e pesquisas
têm revelado a deficiência da grande maioria dos cursos de formação inicial
de educadores no que se refere à pedagogia específica para a pequena
infância, inviabilizando a elaboração, implementação e avaliação de
propostas pedagógicas direcionadas para a constituição dos sujeitos
autônomos, críticos, criativos e conscientes de seu papel transformador na
sociedade. (POLÍTICA PARA OS CENTROS DE CONVIVÊNCIA
INFANTIL DA UNESP, 2005, p.20
)
55
O documento citado expõe também a necessidade de estabelecer a função de
professor de Educação Infantil para os CCI’s/Unesp, não meramente para mudar uma
nomenclatura, estabelecida pela LDB 9394/96, o que se pretende é que os adultos que
interagem com as crianças sejam qualificados em atitudes, compromisso e domínio de
conhecimento que sustentem o trabalho a ser realizado com crianças pequenas.
A idéia de profissionalidade presente no citado documento permite afirmar que é
possível ultrapassar o caráter assistencialista e de maternagem presente no histórico das
instituições de Educação Infantil.
Ao se estabelecer a Política de Educação Infantil para os Centros de Convivência
Infantil da Unesp, ressalta-se o conceito de qualidade baseado em diretrizes e objetivos
propostos a serem alcançados no decorrer do trabalho com crianças de 0 a 6 anos de idade.
Dentre eles destaca-se:
(...)
f) A qualificação dos serviços oferecidos pelos CCI’s deve ter por parâmetro
o seu compromisso com: os direitos das crianças de zero a seis anos; a
qualidade das relações institucionais, estabelecidas dentro de cada CCI; a
qualidade das relações estabelecida entre o CCI e as famílias; a qualificação
dos profissionais; a adequação da estrutura física; a adequação da
proporcionalidade adulto-criança. (p. 32)
A qualidade define-se, assim, não apenas pela formação inicial do professor de
educação infantil que atua nas instituições, mas também pela necessária formação que associe
cuidar e educar, através de formação continuada e desenvolvendo atitudes que superem o
histórico da professora-mãe. De acordo com Peter Moss apud Política para os Centros de
Convivência Infantil da Unesp (2005):
Parece-nos que “qualidade” não é uma palavra neutra. É um conceito
construído socialmente. O conceito é o produto de uma maneira particular de
entender o mundo, o que tem sido chamado de Projeto da Modernidade.
Essa perspectiva filosófica teve um impacto poderoso na Europa e nos
Estados Unidos por centenas de anos. Valoriza a certeza, o progresso linear,
a ordem, a objetividade e a universalidade. Pressupõe que existe apenas uma
resposta para qualquer pergunta. Acredita em um mundo conhecido “lá
fora”, esperando para ser revelado e capaz de representação precisa, um
mundo que pode ser governado e manipulado. (p.13)
O conceito de qualidade, defendido atualmente pela política dos CCI’s/Unesp prevê
alguns valores – chave que acredito ser importante ressaltar para que fique claro este conceito
nas instituições de Educação Infantil e para todos aqueles que atuam em contato direto ou
indireto com crianças de zero a seis anos de idade. São eles:
56
No direito das crianças:
à brincadeira, como principal atividade e fonte da aprendizagem e
desenvolvimento, prevendo-se espaço, tempo, brinquedos e adultos
comprometidos;
à atenção individual que assegure o respeito à sua individualidade, ritmos
e características pessoais, à observação e à escuta por parte de adultos
especialmente qualificados;
à ambientes aconchegantes, seguros e estimulantes;
a manter contato com a natureza, incentivando-a ao cultivo, ao cuidado e
ao conhecimento de fenômenos naturais;
à ambientes higiênicos e saudáveis e ao acompanhamento de seu
desenvolvimento bio-psico-social, em colaboração com as famílias;
a uma alimentação saudável e equilibrada, conhecendo valores e hábitos
culturais e contribuindo para uma educação alimentar;
a desenvolver a curiosidade, a imaginação, a capacidade de expressão,
através do acesso aos bens culturais de sua comunidade e do
favorecimento das diferentes formas de expressão;
à proteção, ao afeto e à amizade;
a expressar seus sentimentos, compreendendo e respeitando suas situações
de conflito, suas reações emocionais negativas e favorecendo essa
expressão através de diversas formas de comunicação (dramatização,
música, desenho, jogos);
a desenvolver sua identidade cultural, racial e religiosa;
ao processo de socialização, através de atividades planejadas e do contato
deliberado com adultos diferentes e qualificados e com crianças de
diversas faixas etárias, em ambientes coletivos;
Nas relações institucionais:
com a existência de um clima de trabalho saudável, e baseado em gestão
democrática, interesses coletivos e públicos;
com a existência de uma filosofia de trabalho compartilhada pelos
educadores, com objetivos e metas claramente articulados;
com a existência de planejamento centrado na criança, vista na sua
integralidade, completude e singularidade;
com a existência de planejamento elaborado coletivamente e baseado na
permanente e sistemática avaliação de desenvolvimento e aprendizado das
crianças, em colaboração com suas famílias;
Na qualificação dos profissionais:
evidenciada por atitudes que consideram os direitos fundamentais da
criança;
evidenciada pela capacidade de contato lúdico e significativo para as
crianças;
evidenciada pelo envolvimento com a criança em sua totalidade e com
seus familiares;
evidenciada pela permanente atualização do conhecimento sobre a criança
e demais áreas que envolvem a sua compreensão em uma perspectiva
crítica;
evidenciada pela prevalência de atitudes coletivas, solidárias e éticas;
evidenciada pela autonomia, capacidade de tomada de decisões, empenho
em ações colaborativas e acatamento da decisões coletivas. (POLÍTICA
PARA OS CENTROS DE CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP,
2005, P.15)
O que cabe aqui é reconhecer que a atuação junto às crianças de 0 a seis anos exige
do professor uma gama muito grande de conhecimentos para que possa atender às
curiosidades infantis, que serão discutidas oportunamente, e para que isso seja possível,
57
espera-se que este tenha uma formação que o conduza a buscar ao lado das crianças as
respostas para seus questionamentos, sendo capaz de associar cuidado e educação, ambos
necessários ao crescimento e desenvolvimento infantil, reservando espaços para o lúdico, para
os cuidados e para atividades que desenvolvam sua curiosidade e estimulem sua condição de
criança.
No capítulo seguinte, veremos qual é o papel da professora de Educação Infantil em
todo o processo de atuação e formação, visando caracterizar profissionalmente sua identidade
profissional: professora, mãe, mulher: ela cuida? Educa? Qual a definição do seu papel?
58
CAPÍTULO 3 - O PAPEL DA PROFESSORA NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
AMBIGÜIDADES E RECOMPENSAS
3.1 A creche cuida? A pré-escola educa? O papel da professora de Educação Infantil
A necessidade de re(construir) a identidade das professoras de Educação Infantil
consiste em analisar as opções, motivações e expectativas daqueles que trabalham com
crianças pequenas, e um estudo destas características pode revelar uma identidade que oscila
entre a função historicamente delegada às mães, baseada nos cuidados e intrinsecamente
relacionada à família e às professoras do ensino fundamental, em que priorizam atividades
escolarizantes por todo período em que as crianças encontram-se nas instituições.
O contexto em que se inserem as professoras da Educação Infantil atualmente
remete à ambigüidade entre cuidado e educação, que permeia desde a formação universitária
destes profissionais até sua prática cotidiana nas instituições. Segundo Perrenoud (2003):
Se vários dirigentes políticos, eleitores e funcionários podem, muitas vezes
de boa-fé, pensar que o bom senso é suficiente para educar as crianças
pequenas, é porque não entenderam o que ocorre nos primeiros anos de vida,
nem compreenderam o tamanho da especialização que os educadores devem
mostrar. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v. 2, 2003, p. 20)
A educação das crianças de 0 a cinco anos envolve dois processos que, de forma
alguma, podem ou devem ser vistos como dissociáveis: cuidar e educar. Higiene, sono,
alimentação adequada fazem parte da tradicional concepção de cuidado presente nas
instituições de Educação Infantil, mas devemos ter claro que não é somente este o cuidado
necessário para as crianças que freqüentam creches e pré-escolas, tal como afirma Bujes
(2001):
Assim, cuidar inclui preocupações que vão desde a organização dos horários
de funcionamento da creche, compatíveis com a jornada de trabalho dos
responsáveis pela criança, passando pela organização do espaço, pela
atenção aos materiais que são oferecidos como brinquedos, pelo respeito às
manifestações da criança (de querer estar sozinha, de ter direito aos seus
ritmos, ao seu “jeitão”) até a consideração de que a creche não é um
instrumento de controle da família. (p. 18)
Para a autora, a concepção de educar pode assumir duas “vertentes”: uma prática
voltada para o ensino da submissão, da obediência – para crianças de classes populares ou o
59
modelo de “escolarização precoce”, em que se pratica a disciplina, em ideais de uma escola
de nível fundamental, com rotinas pobres e repetitivas. Em geral, são desconsideradas as
condições infantis, como se momentos como brincadeiras, sonhos, fantasias e o afeto tivessem
que passar rapidamente.
A autora define as conseqüências do envolvimento entre cuidar e educar dentro das
instituições de Educação Infantil:
Ao considerarmos que a educação infantil envolve simultaneamente cuidar e
educar vamos perceber que esta forma de concebê-la vai ter conseqüências
profundas na organização de experiências que ocorrem nas creches e pré-
escolas, dando a elas características que vão marcar sua identidade como
instituições que são diferentes da família, mas também da escola (aquela
voltada para crianças maiores de sete anos). Enquanto se mantiver a
confusão de papéis que vê na família ou na escola modelos a serem seguidos,
quem perde é a criança. (BUJES, 2001, p.17)
Partindo do princípio das instituições de Educação Infantil atenderem crianças de 0 a
cinco anos com qualidade, sem a utilização de modelos previamente definidos para o trabalho
a ser realizado, é extremante necessário que se encontre um ponto de referência do que pode
ser entendido como qualidade na Educação Infantil. De acordo com Bujes (2001), as crianças
dessa faixa etária devem ter assegurado nas instituições o acolhimento, a emoção, a
sensibilidade, além de habilidades sociais, o direito à expressão e ao desenvolvimento da
curiosidade e investigação (p.19), tais critérios demonstram qual a qualidade requerida para o
trabalho com as crianças de 0 a cinco anos.
Caracterizar a profissionalidade das professoras de Educação Infantil implica
redefinir seu papel diante da sociedade e da própria Universidade, considerando-se
indispensáveis fatores como a formação inicial e em serviço, que conduzam a uma reflexão
sobre as concepções que embasam sua prática, com o objetivo de contemplar cuidado e
educação na mesma instituição, através do desenvolvimento de um trabalho que vise o bem
estar infantil, familiar e social.
A competência da professora que trabalha com crianças pequenas necessita ser de
caráter polivalente, ou seja, é preciso que a professora trabalhe com conteúdos das mais
diferentes naturezas, que envolvem desde cuidados básicos até os conhecimentos específicos
das mais diferentes áreas do conhecimento, essenciais para que se desenvolva uma boa
atuação na área.
Quando o assunto se refere à reflexão sobre a prática, é necessário ressaltar que ser
um professor polivalente exige uma formação ampla do profissional, que propicie a este
60
refletir continuamente sobre o trabalho que desenvolve com as crianças pequenas. De acordo
com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, em seu volume 1:
Este caráter polivalente demanda, por sua vez, uma formação bastante ampla
do profissional que deve tornar-se, ele também, um aprendiz, refletindo
constantemente sobre sua prática, debatendo com seus pares, dialogando
com as famílias e a comunidade e buscando informações necessárias para o
trabalho que desenvolve. (p. 41, 1998)
As propostas em torno da Educação Infantil envolvem aspectos referentes ao
assistencialismo, aos cuidados físicos, necessidades emocionais e desenvolvimento cognitivo.
O cuidar e o educar fazem parte da discussão que permeia a Educação Infantil, e constituem a
base sobre a qual se elaboram suas propostas, considerando as concepções sobre criança,
aprendizagem, cuidado e educação.
A concepção de criança envolve toda uma construção historicamente delineada,
apresentando a criança como ser histórico e social, que faz parte de uma família que se
encontra inserida em uma sociedade que possui cultura própria. A criança deve ser vista como
ser pensante, que observa e sente o mundo de um jeito muito peculiar, estabelecendo relações,
sendo transformada pela sociedade e acima de tudo, transformando-a. De acordo com o
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (v. 1):
Compreender, conhecer e reconhecer o jeito particular das crianças serem e
estarem no mundo é o grande desafio da educação infantil e de seus
profissionais. Embora os conhecimentos derivados da psicologia,
antropologia, sociologia, medicina, etc. possam ser de grande valia para
desvelar o universo infantil apontando algumas características comuns de ser
das crianças, elas permanecem únicas em suas individualidades e diferenças.
(p. 22, 1998)
Assim, estabelece-se a individualidade das crianças e suas especificidades, não
apenas formadas pela idade, mas tamm pela família, grupo social, sociedade, cultura,
momento histórico em que se encontra inserida. O essencial é o reconhecimento de que as
crianças não são seres passivos, que formam uma “massa homogênea”, cada uma possui
características particulares que precisam ser consideradas e respeitadas pelas pessoas que com
elas convivem, é necessário que os adultos formem uma concepção real de criança.
A aprendizagem infantil constitui uma espécie de rede de conhecimentos, que são
configurados a partir do momento em que são estabelecidas relações com os níveis de
desenvolvimento das crianças, proporcionando experiências diversificadas, o que conduz a
uma aprendizagem significativa, por estar embasada em conhecimentos prévios que se
relacionam aos conhecimentos novos.
61
A educação e o cuidado, na Educação Infantil, caminham um ao lado do outro, sem
que exista a possibilidade de dissociá-los, embora ainda exista uma diferenciação entre
cuidado e educação, e entre os profissionais que realizam este trabalho com as crianças na
Educação Infantil. O educar significa estabelecer relações entre cuidados, brincadeiras e
aprendizagem, contribuindo para o avanço nas relações interpessoais das crianças e para
aquisição de conhecimentos sociais e culturais mais amplos. O cuidar faz parte da educação,
pois auxilia na valorização do desenvolvimento de capacidades pelas crianças, além do
comprometimento que exige por parte daquele que cuida, que precisa estimular, se solidarizar
com as limitações do outro e confiar nas capacidades que já foram desenvolvidas: daí a
construção do vínculo daquele que cuida e com quem é cuidado. Para Didonet (2003):
Não há um conteúdo “educativo” na creche descolado dos gestos de cuidar.
Não há um “ensino”, seja um conhecimento ou um hábito, que use via
diferente da atenção afetuosa, alegre, disponível e promotora da progressiva
autonomia da criança. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v. 1,
p.6)
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 e o Plano Nacional de
Educação reforçam a junção e complementação do cuidar e do educar para o atendimento das
crianças de zero a cinco anos. Sabemos que não é possível estabelecer diferenciações ou
separações: creche e pré-escola não constituem instituições distintas, assim, ambas cuidam e
educam.
As diferenças entre quem cuida e quem educa constituem um artifício social, que
desvincula e separa creche e pré-escola, tal como expõe Zabalza (2003), em seu artigo na
Revista Pátio Educação Infantil: Cuidado versus Educação – O dilema institucional das
escolas infantis:
Quase todos os países tendem a ser muito mais rigorosos quanto aos
requisitos impostos aos futuros educadores (no modelo educativo, portanto)
do que aos futuros “cuidadores”. Nesse último caso, sempre se recrutou
pessoal com experiência no cuidado de crianças (mães que procuravam
emprego, pessoas que gostavam de lidar com crianças pequenas, etc.) sem
levar em conta os estudos realizados ou o preparo acadêmico para
desempenhar esse trabalho. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.
1, p. 15)
Dessa discussão que envolve cuidado e educação, é proveniente a indefinição da
identidade das educadoras de Educação Infantil: como é possível estabelecer uma identidade
para profissionais que educam e cuidam, se socialmente ainda existem diferenciações e
separações entre estas duas funções?
62
Existe a possibilidade de afirmar que a fase de formação do ser humano de 0 a cinco
anos tem sua importância reconhecida socialmente, repercutindo através da nova legislação
que rege a educação (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96).
Partindo do pressuposto de que a professora é a responsável pela educação das
crianças de 0 a cinco anos de idade, como prevê a Lei 9394/96 e as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil de 1998, pode-se afirmar a necessidade de uma
formação em serviço que contemple a prática educativa, e não apenas uma teoria distante do
que realmente ocorre. Isso pode acontecer em dois momentos específicos: na formação
inicial e no decorrer de seu trabalho como professoras, através da formação continuada. No
que diz respeito à formação inicial específica voltada às professoras da Educação Infantil,
pode-se afirmar que não ocupou seu merecido espaço dentro dos cursos regulares de
formação de professores, inviabilizando qualquer espécie de educação que não fosse aquela
voltada às crianças maiores de 7 anos de idade. Contudo, diante da necessidade de formação
contínua, é necessário que se avalie sua contribuição no que se refere a favorecer um
trabalho de qualidade, que pode ser desenvolvido se a professora tiver clara uma intenção
educativa e uma qualificação que permita refletir continuamente sobre seu trabalho.
Os Referenciais para Formação de Professores Polivalentes (1998), estabelecem
que a formação em serviço ocorre em muitas ocasiões devido à necessidade de adequar as
profissionais e atualizá-las diante do novo contexto educacional, mas essa espécie de
formação nem sempre garante o vínculo com a prática docente estabelecida pelas
professoras da Educação Infantil nas creches e pré-escolas.
Caracterizar o sentido da profissionalidade da Educação Infantil envolve
características particulares das professoras, trata-se de um processo em que a experiência
cultural das professoras é determinante e, neste sentido faz-se necessário repensar os
programas de formação de professores, por se deterem nos aspectos técnicos em detrimento
das dimensões pessoais e humanas, primordialmente quando o foco são as professoras de
Educação Infantil.
Diante deste contexto, faz-se necessário uma reformulação dos atuais currículos
responsáveis pela formação das professoras, especificando o trabalho desenvolvido nas
instituições de Educação Infantil, e não mais baseando a formação nos princípios para
docência nas séries iniciais do ensino fundamental.
Atualmente, com a aprovação da Lei nº 11.114, que instituiu o Plano Nacional de
Educação, ampliando o Ensino Fundamental de oito para nove anos por meio do acesso
antecipado das crianças de 6 anos à 1ª série, desde que as crianças de 7 a 14 anos estejam
63
sendo plenamente atendidas pelas instituições educativas, o que se vive é um momento de
transição das políticas educacionais e da definição de quem são as professoras da Educação
Infantil. De acordo com Barbosa (2003), para que se estabeleçam parâmetros adequados à
atualidade educacional, é necessário que se considere a realidade vivida e se favoreça a
formação em nível superior.
A seguir, será discutida a identidade profissional das professoras da Educação
Infantil, em que se deve levar em conta: formação inicial e continuada, a ambigüidade entre
os quesitos cuidar e educar e as relações que se formam neste tipo de trabalho com as crianças
pequenas.
3.2 Ser mulher, ser mãe e ser professora de crianças pequenas: (in)definição?
Historicamente, a mulher vem sendo definida como alguém dotada de saberes
naturais para cuidar e educar crianças, ou seja, não necessita de fundamentos teóricos para
exercer tais competências. Defendia-se a idéia de que a mãe enfrenta as piores condições
possíveis, mas continua cuidando e educando seus filhos, portanto conhecer técnicas e
métodos que embasem o trabalho não é preciso. As professoras de Educação Infantil, não
eram vistas como profissionais, não se considerando aspectos referentes à formação, mas
apenas aqueles relacionados ao ser mãe, ser do sexo feminino e gostar de crianças, e isto era
suficiente para que uma pessoa fosse responsável (em parte) pela educação e cuidado de
crianças de 0 a cinco anos de idade. Este tipo de trabalho não era considerado profissional,
estava muito próximo do trabalho doméstico, das funções ligadas à casa e às mães, daí a
presente indefinição e o fato de praticamente não contarmos com homens que estejam
vinculados ao trabalho na Educação Infantil.
Pelo fato da profissionalidade constituir-se histórica e socialmente, tais concepções
influenciam até hoje na concepção do “ser professora”, desencadeando o desafio de
compreender o cotidiano dessa profissão e as características que permeiam este trabalho,
culturalmente construído através de um conjunto de práticas feminizantes.
Entende-se o trabalho feminino como não-profissional, por não apresentar
características predominantes no trabalho masculino, como explicita Cerisara (1996):
Uma concepção de trabalho profissional baseado na versão masculina de
trabalho em que predominam a racionalidade, a objetividade e as relações
64
impessoais e a correspondente negação de um trabalho feminino. Além
disso, evidencia que essas trabalhadoras não têm uma formação dirigida para
esta atividade profissional, que as habilite para exercê-la. (p.104)
De modo geral, a formação das professoras da Educação Infantil não é vista e analisada
como uma prioridade, pois existe a idéia inculcada de que qualquer pessoa é capaz de educar e
cuidar de uma criança pequena, que isso não exige qualquer tipo de profissionalização por ser
uma característica natural da mulher (ligada à questão do “ser mãe”). A formação das
professoras da Educação Infantil tem, sim, por base a identidade pessoal dessas mulheres;
identidade esta que vem sendo construída historicamente dentro de uma ocupação desvalorizada
socialmente – ser professora de crianças pequenas e ser mulher.
Mesmo diante de tal desvalorização, o trabalho como professora conduziu
historicamente a mulher a um avanço em suas perspectivas, pois muitas delas saíram de sua
condição de “donas de casa” ou “domésticas” para se dedicarem ao trabalho de educar e cuidar
de crianças pequenas. Nas instituições de Educação Infantil, essas mulheres sentem-se mais
livres para expressar o que pensam, trocar idéias e informações, participando ativamente de tudo
que permeia o trabalho realizado nas instituições.
Diante de toda a história das professoras de Educação Infantil, percebe-se que o que
consistia em um avanço histórico para as mulheres, atualmente é motivo de desvalorização e
desqualificação profissional, ligando intrinsecamente o trabalho de professora/educadora da
Educação Infantil a aspectos familiares que conduzem ao não-profissionalismo ou até mesmo a
uma crescente confusão de identidades entre o ser mãe e o ser profissional, negam sua real
função, que é a do exercício da docência na Educação Infantil, como aborda Cerisara (2002):
... se em casa há mães que exercem a maternidade junto aos filhos, e se na escola
de ensino fundamental há professoras que exercem o magistério com seus
alunos, nas creches e pré-escolas deve haver professoras de educação infantil
que atuem junto a crianças de 0 a 6 anos. (p.68)
O olhar voltado a essas professoras tem que ser construído levando-se em conta que
se trata de sujeitos sociais e de relações estabelecidas por esses sujeitos. Relações essas que
envolvem suas atividades profissionais e os projetos de formação em que estão inseridos.
A consolidação da importância do trabalho docente em instituições de Educação
Infantil só pode ocorrer a partir do momento em que se reconhecer a qualidade deste nível de
ensino, considerando as contradições entre o feminino e o profissional que tem permeado a
profissionalização destas professoras:
65
Princípios como a maternagem, que acompanhou a história da educação infantil
desde seus primórdios, segundo a qual bastava ser mulher para assumir a
educação da criança pequena, e a socialização, apenas no âmbito doméstico,
impediram a profissionalização da área. (KISHIMOTO apud CERISARA, 2002,
p.7)
Ao reconhecer que aspectos pessoais das professoras interferem no trabalho cotidiano,
implicitamente também se reconhece que o envolvimento emocional está diretamente ligado ao
seu trabalho com as crianças e com os adultos. Para Ongari; Molina (2003), dois são os aspectos
relacionados a esta concepção:
1. Relação entre o próprio trabalho e a experiência familiar: ser educadora de
crianças pequenas é um trabalho que deve ser desenvolvido por mulheres;
2. Percepção do que significa, para a educadora, a dimensão afetiva. (p. 54)
Quando se estabelecem relações entre o ‘ser professora’ e o ‘ser mãe’, desenvolve-se a
integração entre o educar e o cuidar, tarefas que não são passíveis de serem dissociadas e que
causam certa duplicidade de funções para a professora, que se considera inferiorizada por
apresentar uma base de formação que lhe permite educar, e ao mesmo tempo ter que exercer
atividades ligadas ao cuidado das crianças com as quais atua.
Para grande parte das professoras de crianças pequenas, o cuidar está intrinsecamente
relacionado aos cuidados físicos: à saúde, higiene, alimentação e segurança. Ao discutir a
questão do cuidar, no prefácio do livro ‘O Cuidado e a Formação Moral na Educação Infantil’,
de Thereza Montenegro (2001), Yves de La Taille considera:
Talvez não haja maiores problemas para pensar a formação deste profissional no
que diz respeito ao educar. Mas, eles certamente existem em relação ao cuidar.
O cuidar envolve a parte afetiva, componentes emocionais. O cuidar diz respeito
às necessidades singulares de cada criança objeto deste tipo de atenção. O cuidar
pressupõe certas atitudes, para não dizer certos “movimentos da alma”. (p. 12)
O trabalho com crianças de 0 a cinco anos de idade envolve educação e cuidado, na
perspectiva de que a criança é ser ativo, sujeito de direitos e acima de tudo isso, criança.
Assim sendo, a pesquisa busca caracterizar essas professoras, tomando por base sua própria
visão sobre o trabalho que exercem, quais as dificuldades de seu fazer pedagógico e o seu
conhecimento em relação à sua atuação como professoras de Educação Infantil.
A construção das identidades das profissionais de Educação Infantil forma-se através
de processos sociais, permeados por relações sociais que envolvem aspectos pessoais e
profissionais. A identidade das profissionais envolve também elementos relativos à formação
66
e qualificação, objetivando que a atividade docente possa ser desenvolvida adequadamente.
Para Silva (2001):
... a reflexão sobre a formação e a prática docente em geral nos dará
condições de superar as desigualdades que marcam a creche de maneira geral
e, em especial, as suas profissionais. (p. 22)
O processo de construção das identidades das professoras de Educação Infantil deve
ser pensado e refletido a partir das relações em que ocorrem, levando em consideração as
peculiaridades (especificidades) que envolvem toda a trajetória das professoras, além de ser
essencial que se vincule realmente essas profissionais ao campo da educação, de uma
educação relacionada ao cuidado, cuidado este que faz parte das relações específicas entre
professoras e crianças.
Um trabalho pedagógico que integre cuidado e educação é importante para que a
criança sinta-se segura, possa trabalhar suas emoções, construir e reformular hipóteses sobre o
mundo e, sobretudo, elaborar sua identidade pessoal e social.
Investigar a construção da identidade das professoras de creche e a
profissionalização do cuidar e do educar nos âmbitos sociais, históricos e da Universidade
Pública, implica em analisar opções, motivações, expectativas e a satisfação daqueles que
trabalham com crianças pequenas, em especial das professoras da Educação Infantil dos
CCI’s/UNESP, sujeitos de nossa pesquisa, diante do atual processo de transição e definição da
identidade profissional destas professoras, que pode hesitar entre os papéis de mãe ou de
professora.
Atualmente, definir uma identidade profissional para as professoras de Educação
Infantil implica em re(definir) o papel da instituição de Educação Infantil, mantidas por uma
“multiplicidade de linhas diretrizes e de recomendações de método” (Ongari; Molina, p.22,
2003). A intenção é oferecer subsídios, nas instituições e através dos professores, para um
trabalho de qualidade.
Para Freire:
A qualidade da educação infantil requer a implementação de ações
sistemáticas, que garantam que todas as relações construídas no interior da
creche e da pré-escola sejam educativas. (p.79, 1999)
Assim, o adulto exerce um papel fundamental no que se refere a garantir a
qualidade no atendimento; para isso, é necessário que a professora tenha uma intenção
educativa e uma qualificação que o permita “refletir continuamente sobre seu trabalho, com
base em uma formação permanente em serviço”. (FREIRE, p.79, 1999)
67
O que pode conferir o significado de profissionalidade à Educação Infantil são as
reflexões a respeito dos conceitos de infância e educação, numa perspectiva de que a criança
é ser ativo, e, portanto as professoras devem exercer uma prática inovadora, que só é
possível quando as mesmas definirem a identidade de sua profissão, articulando prática e
teoria, enfocando sempre as crianças de 0 a cinco anos de idade.
Para Cerisara (2002):
A defesa da profissionalização das professoras de educação infantil é tão
urgente quanto à redefinição da função das instituições de educação
infantil e está relacionada à concepção de que todas as crianças de 0 a 6
anos sejam elas pobres ou ricas, brancas, negras ou indígenas, estrangeiras
ou brasileiras, entre outras, tem o direito a uma educação infantil que
garanta uma infância digna e boas condições de vida. (p.108)
De acordo com a autora, a necessidade de definir a profissionalização das
professoras é latente e tão necessária quanto definir o papel das instituições, que ainda vivem
a dicotomia entre cuidado e educação, que acompanha o desenvolvimento da Educação
Infantil desde seu surgimento. Sabemos que a Educação Infantil foi reconhecida como parte
da educação somente com a promulgação da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB 9394/1996), a partir daí, surgiu a necessidade de que as profissionais se
enquadrassem como profissionais da Educação ou como “professoras”, ao mesmo tempo em
que tiveram que construir referências a respeito do trabalho que realizavam, e ao mesmo
tempo, as creches buscavam constituir-se como instituições educativas.
Enquanto não for possível delimitar melhor quais são as atividades e funções das
professoras de Educação Infantil, realmente será difícil definir uma identidade para elas, ao
mesmo tempo em que fica claro que a própria instituição de Educação Infantil é que vai
delimitando e delineando quem são suas profissionais e reconstruindo-se histórica e
socialmente.
A professora de Educação Infantil precisa ter em mente que não é apenas o fazer
pedagógico cotidiano dentro das instituições que constitui sua função como profissional, mas
também o fato de se preparar para ser uma pesquisadora capaz de avaliar sua prática, as
interações construídas com as crianças e familiares e estabelecer relações entre as
experiências vivenciadas e o conjunto de saberes que fazem parte de sua prática:
Ele é alguém cuja riqueza de experiências vividas deve ser integrada ao
conjunto de saberes que elabora o seu fazer docente. Dele são exigidos
investimento emocional, conhecimento técnico-pedagógico e compromisso
com a promoção do desenvolvimento dos alunos. Ele precisa abrir-se a seus
próprios modos de agir para enfrentar combinações que podem ser
68
criativamente estabelecidas entre diferentes coisas, lidar com os próprios
desejos e com a imaginação, compreendendo a maneira como a criança
constrói significados sobre o que a cerca e sobre si mesma. (OLIVEIRA; In:
REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2, 2003, p. 8)
Para que seja possível ampliar as discussões a respeito da docência na Educação
Infantil, é necessário que as competências das professoras sejam plenamente reconhecidas.
Tais competências não podem ser desenvolvidas apenas através da formação inicial ou da
formação continuada, precisam ser desenvolvidas com o decorrer de processos de formação,
que envolvam desde a prática cotidiana, até mesmo as relações existentes entre as próprias
crianças e suas famílias.
Para que tais objetivos sejam alcançados, embasado no que pedem as Diretrizes
Nacionais para a Formação Docente (1998), é necessário partir do pressuposto de que um
profissional de Educação Infantil interessado em realizar um trabalho adequado, seja capaz
de:
Compreender a primeira infância como uma fase de autocuidado,
entendimento do valor das linguagens e aproximação com um grupo de
referência sociocultural;
Compreender que as crianças de 0 a 3 anos de idade são mais dependentes
e necessitam de aprendizagens ligadas a relações corporais, afetivas e
emocionais;
Construir vínculos positivos com as crianças de 0 a 3 anos de idade,
integrando os papéis relacionados às necessidades desta faixa etária
(imitação, interação, brincadeira) aos cuidados (higiene e saúde);
Organizar situações adequadas de aprendizagem para as crianças de 4 a 6
anos de idade, considerando que se encontram em um processo de
ampliação de experiências, nos aspectos físico, afetivo, cognitivo,
psicossocial e lingüístico;
Planejar, elencar e didatizar os conteúdos, considerando o
desenvolvimento infantil desta faixa etária;
Trabalhar com crianças portadoras de necessidades especiais, na
perspectiva de inclusão;
Construir atitudes éticas quanto a sua função social, defendendo o direito
de todos à educação, refletindo sobre as teorias e preconceitos elaborados
pela própria profissional a respeito das crianças e de suas famílias, para
que seja possível estabelecer uma relação educativa livre de pré-conceito e
concepções que possam prejudicar sua atuação em sala de aula e fora dela.
(DIRETRIZES NACIONAIS PARA FORMAÇÃO DOCENTE APUD
REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL n
o
2, 2003, p.17)
O que já se pôde constatar é que as crianças se desenvolvem a partir de experiências
educativas bem planejadas e organizadas, portanto a formação ética e a competência da
professora de Educação Infantil em sua tarefa de cuidar e educar deve contar com a
especificidade da faixa etária em que atua, além de garantir às crianças o direito à infância.
Para Oliveira (2003):
69
Nas múltiplas situações criadas em creches e pré-escolas, a crianças tem no
professor alguém qualificado para mediar seu desenvolvimento, auxiliando-a a
ampliar linguagens que usa para representar e exprimir sua forma de
compreender o mundo e a si mesma. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO
INFANTIL, v.2, 2003, p. 7)
Como não existe um modelo único de formação voltada às professoras da Educação
Infantil, a experiência particular pautada no trabalho é em grande parte o principal elemento
através do qual pode ser definida essa profissão. Sabemos que as professoras embasam sua
formação em currículos bastante diferenciados, com duração diversa e finalidades bem
diferentes.
Diante de aspectos definidores dessa profissão, tais como: a formação inicial, a
formação em serviço e a experiência adquirida pelo trabalho, Ongari; Molina (2003) destacam a
importância de se considerar a experiência pessoal:
Além disso, o aspecto da própria experiência feminina, principalmente em
relação à maternidade, também reaparece como elemento crucial, nem sempre
reconhecido no percurso de construção da profissão. Por um lado, porque nos
comparamos ou nos comparamos no passado, com um modelo de educadora que
considera os ‘dotes femininos’ como único requisito exigido para desenvolver
este trabalho. Por outro lado, porque a diferenciação entre o tipo de cuidados
oferecidos, respectivamente, pelas educadoras e pelas mães não é tão fácil e
óbvia assim. E ainda a ‘dupla experiência’ ligada à ‘dupla presença’ pode ser
uma fonte profissional rica e qualitativamente importante, se adequadamente
reconhecida. (p. 92)
Na relação da busca por definir a identidade das professoras de Educação Infantil, não
é possível desconsiderar aspectos referentes à formação inicial, continuada e em serviço, além
das características específicas desta modalidade de educação, que não pode ser vista como
uma mera preparação ao ensino fundamental ou como uma alternativa para mães que não têm
com quem ou onde deixar seus filhos para que possam trabalhar. A professora de Educação
Infantil não pode ter como base para seu trabalho com crianças de 0 a cinco anos de idade a
docência nas séries inicias do ensino fundamental.
A função de cuidar na Educação Infantil está intimamente relacionada à formação das
professoras: o afeto que implica a questão do cuidado contrapõe-se à profissionalidade, voltada à
concepção masculina de trabalho, em que o homem é aquele destinado a realizar trabalho
remunerado, onde são exigidas racionalidade e objetividade, enquanto à mulher destina-se o
trabalho relacionado à emoção, bem distante do que se convencionou o chamado trabalho
profissional.
70
Atualmente, surgem estudos a respeito da profissionalidade das professoras de
Educação Infantil que consideram implicações como relações afetivas e experiências pessoais,
diante disso, insere-se também o aspecto da grande presença de mulheres na profissão do
magistério. Aspecto este que contribui fortemente na construção da identidade profissional destas
professoras, confirmando que a questão do gênero é um elemento presente nas relações sociais
que definem o significado das relações estabelecidas entre professoras, crianças e demais
profissionais.
Ao levantar a questão do gênero feminino como fator primordial na constituição da
identidade profissional, envolvem-se também questões históricas relacionadas à mulher, tais
como o trabalho doméstico, que conduz ao “ato de cuidar” das crianças, o que não é tido como
atividade profissional. A relação das professoras que tiveram uma formação voltada para a
prática docente de “educar” com essa duplicidade de funções, segundo Cerisara é a seguinte:
Principalmente as professoras, que passaram por uma formação específica para
poder assumir uma vida profissional no universo público, têm suas expectativas
de competência abaladas quanto mais constatam que desenvolvem um trabalho
que se opõe ao que se convencionou chamar de profissional: há uma
domesticidade nas relações com fortes traços de emotividade, as práticas junto
às crianças parecem não guardar traços de racionalidade e objetividade, a não ser
quando elaboram o planejamento ou participam de reuniões de estudo. (2002, p.
63)
Construir o sentido de profissionalidade das professoras da Educação Infantil, diante de
todos os aspectos relacionados, não constitui tarefa fácil. É necessário que a base dessa
construção seja a identidade pessoal das professoras, constituída historicamente e socialmente,
tendo como parâmetro que o trabalho com crianças pequenas não é igual ao trabalho realizado
com o ensino fundamental e também não é uma função que pode ser realizada por pessoas sem
uma formação específica.
Quando se pretende falar a respeito das professoras de Educação Infantil, a diferença
das professoras de séries iniciais é latente, e isso precisa ser explicitado para que as
particularidades do trabalho das professoras com as crianças de 0 a 6 anos em instituições de
educação e cuidado sejam respeitadas e garantidas, como define Arce (2001):
A ambigüidade entre o doméstico e o científico chega até os dias de hoje em
que, no cotidiano da Educação Infantil, predomina a utilização de termos
como “professorinha” ou “tia”, que configuram uma caracterização pouco
definida da profissional, oscilando entre o papel doméstico de mulher/mãe e
o trabalho de educar. (REVISTA EDUCAÇÃO E SOCIEDADE, 2001, p.
273)
71
Ao mesmo tempo em que se destaca a necessidade de não estabelecer separações
entre a profissional que “educa” e a profissional que “cuida”, estabelece-se a prioridade de
vincular a Educação Infantil como uma modalidade a ser trabalhada de forma unificada, no
entanto isto demanda que suas professoras tenham formação adequada ao nível de ensino e às
necessidades da Educação Infantil, por isso, é importante que se estabeleçam discussões cada
vez mais fundamentadas a respeito da formação das professoras de Educação Infantil, de seus
anseios profissionais, pessoais e das políticas que regem esta modalidade de ensino.
A Educação Infantil merece respeito e reconhecimento, assim como o trabalho que as
professoras que atuam com este nível de educação vêm realizando: o que esperamos é que a
Educação Infantil e suas professoras sejam reconhecidas e valorizadas perante a sociedade.
Assim, o objetivo da pesquisa requer conhecer quais fatores influenciam na
formação de professores, quais as dificuldades de seu fazer pedagógico e o seu conhecimento
em relação aos fundamentos básicos de sua atuação, que deve ser baseada em uma formação
que articule a diversidade de conceitos trabalhados nos programas de capacitação inicial e
continuada e sua prática profissional cotidiana, para que seja possível compreender seu papel,
diante da necessidade de articular educação e cuidado na mesma instituição. Para Kramer
(2003):
Nesse contexto, precisamos de professores dispostos a repensar a sua
identidade e a história coletiva que vai sendo constituída. Refiro-me àqueles
que, atuando na educação infantil, percebem-se como profissionais,
entendendo ao mesmo tempo em que, se somos professores, as pessoas de
pouca idade com as quais atuamos, muito mais que alunos, são crianças.
(REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v. 2, p.11)
É notório que o desenvolvimento de uma profissional de Educação Infantil, tomando
por base os sujeitos desta pesquisa, exige que passe por um processo contínuo de estudo,
discussão e reflexão, em que possa avaliar e analisar sua própria prática e assumir a
responsabilidade de reconhecer os objetivos que ainda não conseguiu atingir, buscando
formas de melhorar não apenas teoricamente, mas no cotidiano com as crianças e outros
profissionais.
Segundo os Referenciais para Formação de Professores Polivalentes (1998), a
formação inicial deve garantir aos profissionais de educação a possibilidade de refletir sobre
conteúdos, metodologias e competências do professor, formando assim, um profissional
reflexivo, que atue de acordo com a função social que cabe atualmente à escola. Contudo, este
tipo de formação não garante que o vínculo entre teoria e prática seja criado, em grande parte
72
das vezes, acaba deixando o professor sozinho no que diz respeito a integrar o “saber” ao
“saber fazer”, por isso:
É importante então, que a instituição de formação inicial esteja
continuamente refletindo tanto sobre os conteúdos como sobre a
metodologia com que estes são trabalhados, em função das competências
que se propõe a desenvolver, já que as relações pedagógicas que se
estabelecem ao longo da formação atuam sempre como currículo oculto. As
relações pedagógicas vivenciadas no processo de aprendizagem dos futuros
professores se estendem para o exercício da profissão, pois ainda que de
maneira involuntária, se convertem em referência para sua atuação.
(REFERENCIAIS PARA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
POLIVALENTES, 1998, p. 18)
De acordo com estes Referenciais (1998), para que tal situação possa ser superada, o
processo de formação inicial dos professores necessita de um currículo que articule teoria e
prática, colocando as competências dos professores como centro da formação. Para o
professor iniciante, o momento de refletir sobre sua prática, compreender, interpretar e poder
intervir na realidade em que se encontra não ocorre dentro dos cursos de formação, mas ao
iniciar sua trajetória profissional, quando se depara com atitudes que deve ou não tomar diante
das circunstâncias, intervenções que precisa realizar, e mais, qual posição deve ser a sua
diante das necessidades e prioridades da educação e da escola atuais, das crianças e de suas
próprias crenças: o que se coloca para estas professoras iniciantes é um desafio que precisa ser
superado, para que desenvolvam um trabalho de qualidade nas unidades de Educação Infantil.
A formação continuada constitui parte de um processo de formação e
desenvolvimento profissional, a que todos os professores devem ter acesso garantido. Este
tipo de formação busca atualizar, aprofundar e propiciar um processo de auto-avaliação e
reflexão sobre a prática educativa, mas para que isso seja possível, os professores devem estar
abertos para se questionarem a respeito de sua própria prática e de suas concepções,
considerando suas competências, capacidades e atitudes. Na proposta dos Referenciais para
Formação de Professores Polivalentes (1998), propõe-se dois tipos de formação continuada:
aquela que se realiza dentro da instituição, através da reflexão em equipe, da tomada de
decisões e assessoria com profissionais, além do papel fundamental da supervisão e
orientação pedagógica. Podendo ser tomada como uma segunda modalidade de formação,
existe a possibilidade também da formação que acontece fora da instituição, por meio de
programas entre as instituições, visando a troca e ampliação das experiências, sem perder o
foco a que se destinam: a formação dos professores e o seu trabalho.
Pode ser citada também a formação continuada em serviço, das profissionais que
estão atuando, e podem contar com a formação em seu local de trabalho, fator predominante
73
para que as relações entre as profissionais estreitem seus laços de cumplicidade entre si,
possam discutir e relativizar as questões pendentes dentro de seus locais de trabalho, além do
fator de que essa modalidade facilita a vida profissional e pessoal das profissionais,
possibilitando o acesso à formação em seu local de trabalho.
Machado (1998) defende algumas possibilidades de formação regular e formação
continuada para as profissionais de Educação Infantil, que objetivam aperfeiçoar e articular
conhecimentos na área educacional em que atuam:
A formação em cursos regulares destinando-se à aquisição de
conhecimentos, ao desenvolvimento de habilidades e incorporação de
valores imprescindíveis ao exercício de funções docentes e não docentes;
A formação em serviço permitindo a inserção do profissional nas
peculiaridades da instituição na qual irá trabalhar e na prática cotidiana junto
ao grupo de crianças; o acompanhamento e a avaliação do trabalho realizado,
a troca de experiências, a sensibilização para temas emergentes, o
aprofundamento teórico;
A formação continuada em cursos de especialização viabilizando a
discussão sobre valores inerentes à função, a aquisição e/ou o aprimoramento
de conhecimentos, habilidades e valores;
A formação continuada em seminários ou simpósios possibilitando a troca
de experiência em nível setorial, regional, nacional ou internacional e a
sensibilização e a informação para temas específicos. (p. 196, 1998)
A Educação Infantil, com a concepção de articular educação e cuidado, necessita
de profissionais com formação inicial adequada e que tenham acesso a programas de
formação em serviço, com a necessária valorização do seu trabalho, pois não é possível que
se exijam profissionais qualificados e atualizados se estes não sentirem que seu trabalho é
importante e que são valorizados socialmente. Assim, para Freire (1999):
Acredito que a formação do educador, em geral, esteja intrinsecamente
relacionada com a formação do cidadão, seja ele criança, adulto ou jovem.
Portanto, almejar uma educação de qualidade para as crianças, que
contribua para a formação de sua cidadania (sujeitos críticos, criativos,
autônomos, responsáveis, cooperativos, participantes) é estar
permanentemente voltado para a formação das educadoras que com elas
interagem. (p.79)
Diante da necessidade de formação continuada, é necessário que se avalie sua
contribuição no que se refere a favorecer um trabalho de qualidade, visando sempre o
desenvolvimento integral das crianças da Educação Infantil, principais integrantes dos
CCI´s – Centro de Convivência Infantil da Unesp.
A formação continuada ocorre em muitas ocasiões devido à necessidade de
adequar os profissionais e atualizá-los diante do novo contexto educacional, mas essa
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espécie de formação nem sempre garante o vínculo com a prática docente estabelecida pelos
professores da educação infantil nas creches e pré-escolas.
Alguns estudos demonstram a relevância de se colocar lado a lado a prática
desenvolvida por professores e os dados ligados à formação destes profissionais e mesmo
que tais estudos não enfoquem diretamente a Educação Infantil e seus profissionais,
contribuem grandemente para que seja possível uma reflexão a respeito dos processos de
formação e prática profissional.
Assim sendo, o processo de formação das professoras da Educação Infantil é visto
como algo indissociável da profissionalização, abrangendo o avanço escolar e a progressão
na carreira por parte dos professores e a melhoria na qualidade educacional oferecida, em
benefício das crianças de 0 a cinco anos de idade.
A formação das professoras de Educação Infantil não pode restringir-se ao domínio
de técnicas, desenvolver habilidades e competências ligadas à prática cotidiana. Aspectos
específicos da formação devem ser provenientes tanto da formação inicial quanto da formação
continuada, que deve prioritariamente, oportunizar “a atualização, o aprofundamento dos
conhecimentos profissionais e o desenvolvimento da capacidade de reflexão sobre o trabalho
educativo” (Referenciais para a Formação de Professores, MEC/Brasília, 1999).
Ao citar a reflexão sobre o trabalho educativo como ponto fundamental da formação
em serviço, enfatiza-se a necessidade de levar em consideração a capacidade das crianças,
suas expectativas e as possibilidades de organização de atividades. Engloba também as
representações desses profissionais da Educação Infantil a respeito do papel exercido por eles
e da construção de sua prática, permeada por sua experiência no trabalho que vêm
desenvolvendo no decorrer do tempo. Para Oliveira-Fomorzinho (2002):
O conceito de profissionalidade docente diz respeito à ação profissional
integrada que a pessoa da educadora desenvolve junto às crianças e famílias
com base em seus conhecimentos, competências e sentimentos, assumindo a
dimensão moral da profissão. (p. 41)
O trabalho da professora de Educação Infantil pode ser definido como um trabalho
que se assemelha aos dos outros professores, mas com peculiaridades que configuram um
profissional específico, diferente dos demais. Oliveira-Formozinho (2002) levanta quatro
aspectos fundamentais que concretizam as peculiaridades desses profissionais que podem vir
a auxiliar na análise dos dados referentes às relações entre os constituintes deste quadro
(professoras, crianças, pais e outros profissionais que atuam nas instituições), que em âmbitos
gerais dizem respeito e podem ser organizados da seguinte forma:
75
1. Especificidade que deriva das características da criança pequena: globalidade,
vulnerabilidade e dependência da família: quanto à globalidade, a criança desenvolve-se
como um todo integrado, conduzindo o trabalho do professor a uma indefinição de
fronteiras. A vulnerabilidade infantil consiste em fator diferenciador pela relação de
dependência estabelecida entre o adulto e a criança, envolvendo principalmente aspectos
emocionais, que além de constituírem um papel fundamental, constitui também a base
para que ocorra progresso no desenvolvimento infantil. O educador dessas crianças deve
ser capaz de reconhecer essa dependência da criança, e ao mesmo tempo, detectar suas
competências sociopsicológicas, manifestadas desde muito cedo;
2. Especificidade que deriva das características das tarefas: a educadora infantil desempenha
grande diversidade de tarefas pouco definidas – contempla desde o cuidado (bem-estar,
higiene e segurança) à educação (socialização, desenvolvimento e aprendizagem);
3. Especificidade baseada em uma rede de relações alargadas: relações de interação com
outros profissionais dentro do contexto escolar, com as famílias e com as crianças.
Requer-se também da profissional a integração de serviços, que exige uma complexidade
de papéis e funções. Pode-se definir a educadora da infância como alguém que se situa no
mundo da interação e a partir daí, desenvolve papéis e funções;
4. Profissionalidade baseada na integração e nas interações entre o conhecimento e a
experiência, nas interações e integrações entre os saberes e o afeto: a educadora de
crianças pequenas assume uma diversidade de tarefas e um papel abrangente com
fronteiras não muito bem definidas. A criança pequena tem necessidade de uma relação
que contemple educação e cuidados, aspectos que diferenciam em grande parte este
educador dos demais. O educador necessita envolver a globalidade e vulnerabilidade das
crianças, além de basear sua profissionalidade em um contexto de interações, que engloba
família, outros profissionais, autoridades e voluntários.
A educação de infância exige uma integração de serviços voltados às crianças e às
famílias. Oliveira-Formozinho delimita quatro pontos que segundo a autora estão no coração
da profissionalidade das educadoras (2002):
A centralização na criança e na globalidade da sua educação requer
integração de saberes;
A centralização na educação e nos cuidados requer integração de funções;
A relação com os pais, com outros profissionais, com agentes voluntários
requer interações e interfaces,
A relação com a comunidade requer interação e interfaces. (p. 49)
76
Para a autora, diante de tais aspectos, definir a professora da Educação Infantil como
alguém que exerce atividades específicas, para uma clientela bastante peculiar, no caso
crianças de 0 a cinco anos de idade, consiste em assumir a especificidade que se faz
necessária nos cursos de formação (inicial, continuada ou em serviço) destinados a essas
profissionais da infância.
O que não podemos deixar de colocar em debate, segundo a autora, é a formação dos
formadores de professores, uma vez que estes são responsáveis pela teoria a que os
professores têm acesso para que possam executar com competência e qualidade seu trabalho
com as crianças. O trabalho dos formadores necessita ser muito bem fundamentado,
demonstrando conhecimento e domínio das questões de sala de aula e escolas em que os
professores atuam. De acordo com os Referenciais para Formação de Professores Polivalentes
(1998):
Ninguém nega a importância da preparação destes profissionais formadores,
para viabilizar transformações na formação de professores. A sua tarefa não
é fácil e precisa ir sendo revista ao mesmo tempo que as discussões sobre a
formação evoluem. Isso significa que também eles necessitam inserir-se em
processos de desenvolvimento profissional contínuo. (p. 22)
Como pode ser observado, as pessoas responsáveis pela formação dos professores
também fazem parte do grupo que deve estar sempre em processo de atualização e formação
individual e social, pois não é possível ser um formador sem que se viabilize sua própria
formação.
Todas as modalidades de formação são válidas diante da realidade escolar e social
em que nos encontramos, cada vez mais existe a necessidade de atualização e aprofundamento
de conhecimentos e conteúdos que conduzam a uma relação mais profunda e embasada na
conexão entre teoria e prática exercida no trabalho, sem deixar de lembrar que para as
profissionais de Educação Infantil, que fazem parte do começo das vidas de muitas crianças, o
fato de estar integrado ao que de melhor pode ser feito em âmbito educacional, trará
resultados futuros cada vez melhores, afinal, crianças são vidas que começam a ser
desenhadas nas instituições de Educação Infantil: é necessário que tenham consciência disso.
Em âmbito de modalidade de formação adequada para as profissionais de que trata
esta pesquisa – as professoras de Educação Infantil dos CCI’s da Unesp, acredito que a
formação inicial deve ser prioridade para que as profissionais tenham conhecimento de
métodos e teorias que podem auxiliar no dia-a-dia com as crianças nas instituições de
Educação Infantil e que fazem parte de estudos que vêm sendo realizados sempre em busca de
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melhorar e aperfeiçoar o atendimento às crianças de 0 a cinco anos de idade, mesmo que
ainda não se garanta o vínculo entre o “saber” e o “saber fazer”, a formação inicial deve ser
garantida para todas as profissionais que se dedicam à Educação Infantil. É essencial no que
diz respeito a colocar como centro do processo de formação as competências do professor,
garantindo a especificidade e organização do trabalho pedagógico.
A formação continuada para as professoras de Educação Infantil das Unidades da
Unesp – CCI’s/Unesp - tem seu valor garantido a partir do momento em que estabelece
realmente a relação entre teoria e prática, objetivando atualizar, aprofundar e propiciar um
processo de auto-avaliação sobre a prática estabelecida profissionalmente. Os professores
devem estar prontos para refletirem sobre sua prática e relações que são capazes de
estabelecer e suas concepções, considerando suas competências, capacidades e atitudes,
embasados pela formação inicial a que tiveram acesso.
No que se refere à formação continuada em serviço, diante da atual conjuntura social
em que nos encontramos, e principalmente a mulher, dividida entre trabalho, casa, filhos,
estudo – em sua dupla ou tripla jornada diária – atribui-se a este tipo de formação grande
importância pelo fato de que constitui um facilitador por ser realizada dentro do seu próprio
local de trabalho, sem que exista necessidade de deslocamento de suas casas, ou sem que
abram mão de passar os poucos momentos em que se encontram “livres” com a família,
contribuindo da mesma forma para a reflexão e aprofundamento de discussões e saberes
advindos tanto da teoria quanto da prática estabelecida por elas.
Agora, acredito ser importante tecer algumas breves considerações a respeito das
representações sociais, por influenciarem as concepções das professoras e auxiliarem na
caracterização do seu perfil profissional, considerando transformações, opções, motivações,
entre outros critérios que interferem na construção do perfil profissional deste grupo: as
professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp.
3.3 Representações sociais que envolvem o cotidiano das professoras de Educação
Infantil dos CCI’s/Unesp.
Diante de aspectos que visam descortinar as relações existentes nas instituições de
Educação Infantil da Unesp – CCI’s/Unesp – entre professoras, crianças, pais e a visão que
essas professoras têm a respeito do próprio trabalho, das condições em que atuam, do
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relacionamento entre as crianças atendidas e seus pais, do posicionamento que esses pais
adotam com relação ao convívio com seus filhos, implica em levantar algumas
representações sociais que as professoras da Educação Infantil dos CCI’s/Unesp apresentam.
Guimarães (2000) define as representações sociais:
As representações sociais são elaborações psicológicas e sociais, construídas
pelos indivíduos e com os indivíduos e possuem uma dupla função: tornar
familiar o que é estranho/ameaçador e perceptível o que é invisível. É o
conhecimento habitualmente denominado espontâneo, ingênuo, vulgar, do
senso comum ou pensamento natural por oposição ao pensamento científico.
(p.41)
Nessa pesquisa, as representações sociais que as professoras de Educação Infantil
têm a respeito de si mesmas, do trabalho que realizam e das relações resultantes e existentes
dentro desse cotidiano de trabalho fazem-se importantes por dentro de sua própria trajetória
profissional e envolvem além do seu trabalho direto com as crianças, suas expectativas,
anseios, questionamentos, certezas, enfim, toda uma série de argumentações que surge no
decorrer desse trabalho, construído histórica e socialmente, e que vem a caracterizar um perfil
específico das profissionais.
Tal caracterização do perfil das professoras de Educação Infantil vem sofrendo
profundas modificações no que se refere ao nível de formação, à experiência profissional, à
satisfação pelo trabalho que realizam, aos objetivos a que se propõem atingir na atuação com
as crianças de 0 a cinco anos, enfim, em toda a trajetória que estas professoras percorrem
historicamente e que inevitavelmente, acaba por modificar sua atuação e a imagem que
constróem de si mesmas e de seu trabalho enquanto professoras de Educação Infantil.
O que historicamente construiu-se a respeito das professoras e das instituições de
Educação Infantil, apresentando como aspectos primordiais para atuar em tal profissão: o ser
mulher, ser mãe, históricos de cuidado e assistencialismo, são ultrapassados por um novo
modelo, que envolve, acima de tudo, a formação específica das professoras e a relação entre
cuidado e educação na mesma instituição, visando à qualidade do serviço oferecido.
As representações sociais das professoras de Educação Infantil implicam no
reconhecimento de que as condições e opções feitas por elas podem ser fatores de mudança na
caracterização de um perfil profissional, desde que sejam reconhecidos como responsáveis
por exercerem influência na vida pessoal e, por conseqüência, influenciarem também a vida
profissional destas professoras.
Assumindo o caráter de modalidade de conhecimento que visa a elaboração de
comportamentos e a comunicação entre indivíduos, as representações sociais permitem
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realizar antecipações e levantar expectativas, produzindo comportamentos e relações com o
meio em que ocorrem. Assim, no que se refere às professoras de Educação Infantil, “deve
influenciar também a formação de sua identidade profissional e, em conseqüência, suas ações
e condutas educativas no âmbito das instituições de educação infantil”. (GUIMARÃES, 2000,
p.58)
Reconhecendo que as representações sociais são formadas pelas professoras no
momento em ainda buscam formação, e que diante de tudo isso, tem papel fundamental as
experiências particulares (individuais) e os processos sociais a que estão expostas, reconhece-
se também que tais professoras fazem parte de um grupo específico, com características
próprias e que necessitam de um saber também específico para atuarem profissionalmente.
Tal grupo de professoras, no que se refere à Educação Infantil, requer atenção
especial quando se fala em cuidado e educação, em afeto, em dilemas como o ser mãe ou o
ser professora, o ser mulher como característica essencial para que possa assumir o papel de
professora de Educação Infantil. Quando se toma por base tal discussão, existe a necessidade
de que sejam revistos tais conceitos, formados histórica e socialmente.
Tais representações, intrínsecas à profissão de professoras de Educação Infantil já
não são mais justificáveis como pareciam anteriormente, pelo fato de que atualmente, já não
constitui mais o fato de ser do sexo feminino como condição única para exercer a profissão.
Hoje, existe a necessidade de formação, como mostra a LDB 9394/96 (art. 62), e
fazem parte de sua constituição como profissionais aspectos relacionados à formação
continuada ou em serviço. Quanto ao fato do afeto existente nas relações entre professoras e
crianças, é notório afirmar que tal relação, que perdura além dos aspectos educativos, faz
parte da elaboração e caracterização do perfil profissional das professoras, assim como o
“cuidar”, não mais visto como maternagem ou relacionado ao que se convencionou chamar
anteriormente “trabalho doméstico”, mas como uma característica natural daquelas que atuam
com crianças de 0 a cinco anos de idade, ou seja, com as crianças de Educação Infantil.
Dentro das quatro funções defendidas por Abric (1998) para as representações
sociais, descritas por Guimarães (2000), destaco aquela que mais contribui com esta pesquisa:
Funções identitárias: definem a identidade e protegem a especificidade dos
grupos. Isso permite que os indivíduos e grupos formem identidade pessoal e
social compatível com sistemas de normas e valores sociais e historicamente
determinados. (p.63)
Tal função caracteriza o objetivo maior dessa pesquisa, que consiste em analisar
critérios como: as opções, motivações, anseios, questionamentos, satisfação pessoal e
80
profissional das professoras dos CCI’s/Unesp, dentro da profissão que exercem. Assim,
acredito que pode ser definido um perfil profissional destas mulheres, enquanto grupo, não
homogêneo, pois todos os grupos apresentam suas diferenciações e divergências, mas
formando uma identidade pessoal e social historicamente determinada e que atualmente,
sofreu alterações pelas próprias condições em que vem se desenvolvendo e se atualizando
perante a sociedade, que vem exigindo mais destas profissionais em termos de formação e
atuação, o que se espera agora é seu pleno reconhecimento pela sociedade, e não apenas
críticas referentes ao tipo de trabalho que foi desenvolvido anteriormente, quando o que
estava presente era uma concepção sanitária e assistencial. Kuhlmann (1998) ressalta:
Como se vê, certas concepções e propostas educacionais para a criança
pequena não são fruto da história recente dessas instituições, como fazem
crer as interpretações que não levaram em conta essas evidências nas fontes
documentais. Tanto melhor que assim o seja: o fato de elas terem sido
pensadas não só como lugar de guarda, mas de educação da criança em um
ambiente coletivo, colabora para superarmos um sentimento de inferioridade
dessa área no interior da pesquisa educacional. Não precisamos mais
inventar a roda da educação, nem basta anunciarmos a sua existência: é
preciso dizer se a roda apenas gira em torno de si, ou a que lugar se dirige; é
preciso qualificar que educação queremos proporcionar às crianças, que
relação estabelecer com as famílias e que concepção defender sobre as
relações sociais e a democracia. A interpretação da história deixa de ser uma
linha evolutiva: se há um passado sombrio, o terreno é o da ambigüidade e
não o da polaridade entre passado e presente. (p.194)
Assim, pode-se perceber que o perfil das professoras vem sendo construído
historicamente, relacionado ao histórico das instituições de atendimento à infância, e que as
representações sociais oferecem meios para que se compreenda os saberes das professoras e o
que move suas intenções, opções e práticas.
Cerisara (1996), quando discute os critérios responsáveis pela caracterização do
atual perfil das professoras de Educação Infantil, afirma que é necessário levar em
consideração as relações estabelecidas no interior das unidades de Educação Infantil, e, além
disso, as relações vivenciadas pelas professoras em âmbito particular:
Sem pretender uma definição acabada do perfil destas profissionais de
Educação Infantil, pode-se afirmar que elas têm sido mulheres de diferentes
classes sociais, de diferentes idades, de diferentes raças, com diferentes
trajetórias de vida pessoal e profissional e que trabalham em uma instituição
que transita entre o espaço público e doméstico, em uma profissão que
guarda o traço de ambigüidade entre a função materna e a função docente.
(p.41)
Tais critérios influenciam na constituição do perfil profissional por apresentarem
incutidos toda uma série de concepções reveladas de forma particular, mas que influenciam
81
nas atitudes das professoras por fazerem parte de sua trajetória pessoal de vida, e serem
trazidos muitas vezes desde a infância.
A feminização é um dos principais indicadores desse perfil, trazendo à tona
indicativos como a necessidade de ser mulher para exercer a profissão de professora de
Educação Infantil, relacionando ao cuidado da mãe, ao âmbito doméstico, as atividades que
devem ser desenvolvidas pela professora com as crianças de 0 a cinco anos. O trabalho com
crianças dessa faixa etária também faz parte da constituição desse perfil, por envolver, além
do aspecto referente ao educar, critérios como o cuidado: o que conduz em larga escala ao
âmbito das relações domésticas e à falta de profissionalidade, ou seja não existe a necessidade
de ser profissional para atuar com as crianças em idade de Educação Infantil.
Tal feminização exerce influências, segundo a autora, positivas e negativas no que
diz respeito à organização do trabalho e na constituição da identidade profissional das
professoras, daí a importância da questão do gênero e das representações que este critério
possibilita:
Buscar a identidade profissional das auxiliares de sala e das professoras de
crianças de 0 a 6 anos exige que seja levado em consideração o gênero a que
pertencem, por entendê-lo como um elemento constitutivo das relações
sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos e como um
primeiro modo de dar significado às relações de poder. (CERISARA, 1996,
p.44)
A questão do gênero, além da influência que exerce a respeito do “ser mulher para
ser professora de Educação Infantil”, volta-se também para uma outra questão presente no
cotidiano das relações dessas profissionais: as relações de poder.
As relações sociais de poder entre masculino e feminino dizem respeito,
fundamentalmente, às diferenças existentes entre o trabalho realizado por homens e àquele
realizado por mulheres: em uma concepção masculinizante de trabalho, alega-se falta de
profissionalidade, falta de racionalidade e de objetividade como quesitos conflitantes da
ocupação feminina, ao mesmo tempo em que a concepção do trabalho masculino exige
profissionalidade, racionalidade e objetividade, características típicas de uma teoria masculina
de trabalho. Assim,
O lugar da mulher na vida humana, em um determinado grupo cultural, não é
diretamente o produto do que ela fez, mas do sentido que adquirem suas
atividades através da interação social concreta. (CERISARA, 1996, p.46)
Além do aspecto mencionado acima, as representações sociais das professoras
envolvem também uma série de outros elementos, que podem explicar a especificidade da
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profissão de professoras de Educação Infantil e dos serviços que realizam, que ainda ocupam
um lugar que fica entre o aspecto assistencial e o aspecto educacional. Assim, é essencial
considerar concepções e representações das professoras, para que sua função com as crianças
de 0 a cinco anos de idade não perca sua especificidade:
(...) função não apenas pedagógica (no sentido escolar), mas que consiste em
compartilhar com os pais aspectos de cuidado, criação, atendimento, apoio
ao crescimento da criança. (ONGARI; MOLINA, p.26, 2003)
As representações sociais permitem que se vá além de concepções das professoras a
respeito de si mesmas, permite que sejam tecidas considerações a respeito da visão que as
professoras têm sobre o papel que exercem com as crianças, sobre as características do
desenvolvimento infantil e de questões pertinentes aos pais que atualmente necessitam de
unidades de Educação Infantil.
Variáveis existentes nas relações profissionais das professoras de Educação Infantil,
tais como o fato de ter filhos ou não, a idade, a formação, o histórico da escolha (ou não) da
profissão; constituem fatores de relevância nas representações sociais atualmente
demonstradas pelas professoras. Ou seja, fatores pessoais e particulares também conduzem a
um tipo de trabalho, pelo fato de exercerem influência nas concepções e valores das
professoras. Assim, é possível elencar uma série de questões que se fazem importantes para
conhecer as representações das professoras de Educação Infantil:
- a imagem de si com adultos comprometidos diariamente com o
crescimento de crianças a eles confiadas e a avaliação da própria experiência
e carreira profissional;
- o modelo de creche que as educadoras têm: quais aspectos do velho e do
novo prevalecem hoje nas pessoas que nela trabalham e quais são as
diretrizes profissionais consideradas mais importantes;
- a individualização de possíveis tipologias profissionais que surgem das
diversas realidades institucionais e culturais, ligadas a diversos modos de
conceber a realidade infantil nos primeiríssimos anos. A criança como objeto
de cuidados e portadora de necessidades, principalmente, fisiológicas, que
devem ser satisfeitas? A criança dotada de competências precoces na sua
evolução social e mental que, portanto, exige do adulto um papel de
estimulação adequada das habilidades emergentes? A criança que necessita
de relacionamentos sociais e afetivos intensos e marcantes para chegar a
constituir a própria identidade e segurança pessoal?
- as imagens dos modelos educativos familiares predominantes e as
exigências dos novos pais em relação aos serviços;
- a percepção do partage com os pais do próprio papel de cuidar das
crianças, em particular sobre as formas que o inevitável envolvimento
emotivo com as crianças e os seus familiares pode assumir;
- a vivência relativa à própria experiência profissional em relação às
características específicas da história pessoal e feminina de cada uma. Um
interesse particular revestia, nesse sentido, o possível elo entre um trabalho
que se caracteriza em termos de cuidado e o próprio papel pessoal materno.
(ONGARI; MOLINA, p.28, 2003)
83
Tais critérios permitem uma percepção sobre as representações das professoras de
Educação Infantil, enfocando áreas que se encontram vinculadas à experiência profissional,
pessoal, suas relações com as crianças, divisão de responsabilidades com os pais no cuidado e
educação das crianças que não são seus filhos, mas que exigem delas carinho, afeto, atenção;
além da observação de seu próprio trabalho, a satisfação com que o realizam e a experiência
acumulada no decorrer de sua atuação como professoras.
O quesito experiência ou tempo de trabalho remete a um outro aspecto importante
do trabalho das professoras: as diferentes concepções vigentes nas instituições de Educação
Infantil pelas quais passaram dentro do contexto sócio-histórico de mudanças ocorridas: um
primeiro grupo de professoras, que ingressaram na profissão quando esta ainda era de aspecto
basicamente assistencialista, voltado aos cuidados para com as crianças de 0 a cinco anos, em
que não era exigida formação específica, tampouco estabelecidos critérios voltados para as
particularidades da Educação Infantil.
Em um segundo grupo de professoras, no que diz respeito ao tempo em que atuam,
estão aquelas que surgem no momento em que começa a ser exigida formação inicial, torna-se
necessária à formação continuada e a articulação consciente entre cuidado e educação, que
sabemos encontram-se presentes também no trabalho das professoras que ingressaram na
profissão quando esta era apenas de caráter assistencial, mas as professoras ainda não tinham
claro que educar fazia parte do seu papel.
A resistência das professoras que iniciaram seu trabalho durante a vigência do
assistencialismo, em aceitar que formação e atualização tornaram-se mais do que necessárias,
imprescindíveis pode ser observada como natural pelo fato de que nas representações sociais
dessas profissionais estão incutidos o cuidado, o improviso, a maternagem, o acúmulo de
funções e o trabalho com crianças de 0 a cinco anos como constituintes de relações de âmbito
doméstico.
Haverá diferenças entre as mulheres que assumem essas duas funções quanto
à articulação das práticas femininas nas instâncias domésticas e públicas de
suas vidas? Pelo fato de terem formação? Até que ponto sair do espaço
doméstico e exercer uma atividade profissional que guarda os traços do
trabalho doméstico significa ascensão em relação a ficar em casa? Qual a
diferença entre as práticas femininas domésticas e as práticas femininas
desenvolvidas no interior das creches? (CERISARA, p.56, 1996)
Até mesmo as relações existentes em termos de ascensão social encontram-se
presentes nas relações profissionais das professoras da Educação Infantil, quando o aspecto
que está em discussão é a saída do ambiente doméstico para um ambiente de caráter
84
doméstico, que lembra os afazeres do lar, mas que mesmo assim, ainda demonstra um
determinado extrato social de responsabilidade.
As representações sociais desempenham um papel muito amplo na vida das
professoras, articulando percepções sobre si mesmas, sobre suas capacidades e conflitos:
Significa desempenhar uma função de responsabilidade, somente delegada a
quem possui determinadas qualidades, ainda que a leitura geral sobre seu
trabalho leve em conta mais sua desqualificação profissional.
(...)
Significa ter a oportunidade de se envolver com o diferente, ampliando o
círculo de relações sociais e atingindo um universo de relações que lhe
permite ampliar seus próprios horizontes.
Significa ter um grau até certo ponto satisfatório de autonomia, constituindo-
se, em alguma medida, em uma autoridade.
Significa ter a oportunidade de resgatar, através de crianças (que são “os
seus”), direitos e desejos não satisfeitos.
Significa descobrir-se capaz, encontrando brechas para desconstruir a
percepção negativa sobre si mesma construída ao logo da vida nos diversos
lugares em que a condição subalterna e, no caso da escola, a distância
cultural e os mecanismos de seletividade internos ao sistema encarregaram-
se de lhe incutir.
Significa, ainda, a vivência de inúmeros conflitos nas relações com as
crianças e suas famílias, muitos dos quais a remetem a reflexões sobre
dimensões fundamentais sobre sua própria vida, constituindo-se em um
ambiente afetivo intenso.
(...)
Significa, por último, um questionamento permanente de seus valores e
conhecimentos, o que as conduziu a uma situação de ambigüidade: a de ter
sua atividade reconhecida e, ao mesmo tempo, ser questionadas sobre esse
mesmo aspecto, mostrando-lhes a vastidão do que há por acontecer e,
conseqüentemente, a insuficiência de suas condições atuais no tocante ao
desempenho profissional. (SILVA, p.68-69, 2001)
A heterogeneidade da formação também constitui um fator de influência nas
representações sociais das professoras, pois pode apontar elementos de diferenciação de
acordo com o tipo de formação a que tiveram acesso, naquilo que diz respeito à imagem que
elas têm do seu trabalho e quais as características que prevalecem neste trabalho, e isso
influencia na caracterização da profissão das professoras.
O elemento formação também está relacionado ao fato das professoras terem
escolhido este tipo de trabalho ou não: a escolha ou não de uma profissão está intimamente
ligada à satisfação em realizá-lo ou à idéia de obrigação. Para Ongari; Molina (2003):
Estritamente ligada à especificidade do percurso de formação é, além disso, a
motivação expressa em relação ao trabalho, ou seja, ao fato de que se tenha
chegado a fazer este trabalho por escolha ou de maneira casual. Essa variável
deveria ser importante, sobretudo no que diz respeito aos elementos de
avaliação do trabalho, tanto nos seus aspectos positivos (satisfação,
correspondência às expectativas) como de cansaço ou de dificuldade: de fato,
pode-se supor que quem escolheu fazer este tipo de trabalho tenha
expectativas bem definidas em relação ao seu conteúdo, e possa encontrar
85
nele uma maior satisfação em comparação com quem se encontra por acaso
trabalhando como educadora de creche. (p.37)
Em aspectos gerais, acredita-se que as professoras que tenham realmente feito a
opção por este tipo de trabalho, sintam-se mais satisfeitas em ter a oportunidade de poder
observar os resultados que alcançam com as crianças, com as relações de troca existentes no
grupo de trabalho, com as oportunidades de cursos de formação na área em que atuam.
Pelo contrário, se formos levar em consideração as professoras que atuam com as
crianças de 0 a cinco anos de idade por causalidade, falta de opção ou obrigadas (pelos pais,
pela condição econômica ou social em que viviam), encontraremos posições diferentes
daquelas constatadas entre as professoras que escolheram a profissão. Muitas vezes, podem
ser professoras frustradas por atuar em uma profissão que não gostam ou que não se sentem
bem, ou ainda mais, atuarem de maneira displicente com o trabalho e em conseqüência, com
as crianças.
Ongari; Molina (2003) elencam ainda mais critérios responsáveis também pela
caracterização da identidade das professoras de Educação Infantil: a idade e o fato de ter
filhos ou não.
As professoras de Educação Infantil passaram por todo um processo de
reformulação das instituições de atendimento à infância e da formação exigida para estas
profissionais, portanto, o quesito idade também exerce influência, não só neste sentido, mas
também no tipo de trabalho que é desenvolvido com as crianças. Pensa-se no seguinte: uma
professora que passou por toda uma experiência de trabalho em instituições que se utilizavam
do assistencialismo como critério fundamental para o trabalho, tem com as crianças
atualmente um trabalho semelhante a uma professora que se encontra a par das discussões
atuais a respeito de cuidado e educação, desenvolvimento integral da criança e uma política
contra o assistencialismo?
O segundo critério pode ser definido da seguinte forma:
A segunda variável é, ao contrário, relativa a um evento crucial da vida
adulta, que tem certamente um profundo impacto sobre a identidade não só
apenas pessoal, mas também profissional: o fato de ter ou não filhos e,
portanto, de viver o papel duplo de mãe e educadora. (ONGARI; MOLINA,
2003, p.37)
Este é um dos critérios, segundo as autoras, que exerce maior influência na
caracterização do perfil profissional das professoras de Educação Infantil, mas também não é
possível medir em que grau de intensidade esta influência é exercida; o que pode ser afirmado
86
é que a concepção e a imagem de criança e do papel da professora diante dessa criança sofrem
alterações de acordo com o que as professoras vivenciam enquanto mães e enquanto
professoras de Educação Infantil.
O critério acima explicitado: “ser mãe e ser educadora”, implica na questão do afeto,
da maternagem, da profissionalidade e novamente traz a tona o trabalho doméstico. Diante
disso, podem ser levantadas as seguintes questões:
Necessário se torna estender esta discussão para a especificidade do trabalho
realizado nas instituições de educação infantil na seguinte perspectiva: não
terá a afetividade um papel fundamental na construção das relações entre
adultos e crianças de 0 a 6 anos? Será possível pensar o trabalho com estas
crianças em instituições como a creche sem atividades que incluam a
maternagem e práticas ligadas ao trabalho doméstico? Serão estas atividades
excludentes da competência profissional? Como construir um perfil
profissional, se as práticas que são desenvolvidas se mesclam com as
práticas domésticas?
Ou ainda: se sabemos da necessidade de haver vínculo afetivo para que se
estabeleçam interações construtivas entre adultos e crianças nesta faixa
etária, como têm sido formadas estas educadoras para que tenham a
impressão de que não conseguem se manter como profissionais que associam
o afetivo com a ação pedagógica intencional? Será impossível associar estes
dois pólos? Perguntariam as educadoras: se gosto, não consigo agir orientada
por um projeto educativo, que inclui o gostar mas o resignifica?
(CERISARA, p.87, 1996)
A pesquisa da autora destaca que o aspecto afetivo conduz diretamente aos critérios
que impedem teoricamente que o trabalho adquirira ou mantenha características relacionadas
ao carinho, ao sentimento, pois isso dificulta sua caracterização como “profissional”. A
relação estabelecida nas instituições sobre o ser mãe e o ser professora acarretam nas mais
diversas caracterizações, que envolvem até o tipo de relação a ser mantida com as crianças
que são realmente filhos e com as crianças que constituem o papel de “alunos” nas
instituições de Educação Infantil - o saber conversar ou o bater – pois os papéis se
confundem: as professoras acreditam e articulam suas idéias dessa forma a tal ponto que as
crianças das instituições de Educação Infantil são vistas como filhos ou como parentes
próximos (sobrinhos, por exemplo).
Há a necessidade de que as professoras compreendam que a intencionalidade deve
estar presente nas relações existentes nas unidades de Educação Infantil entre professoras e
crianças, o que em geral, acaba não ocorrendo em casa nas relações entre mães e filhos, em
que se sobrepõem os aspectos espontâneos e afetivos:
(...) a família, atualmente, é um espaço em que as mediações se dão de forma
espontânea e instintiva, em outras palavras, a família é uma intimidade social
mantida por laços afetivos, na qual se incorporam subjetivamente valores e
87
idéias sem um planejamento ou intencionalidade conscientes. A creche por
sua vez é um espaço em que as mediações devem ter um caráter de
sistematização e de intencionalidade.
(...)
(...) se na família temos parentes, na creche temos profissionais que para
exercer suas funções necessitam de instrumentalização específica. Da mesma
forma, se a família é um espaço de socialização da criança, a creche é um
espaço da socialização da criança em grupo. (CERISARA, p,. 92, 1996)
Diante da falta de argumentação teórica consistente que possa embasar e diferenciar
os conceitos do “ser mãe” e do “ser professora”, segundo a autora, os papéis se confundem e
fazem com que as profissionais fiquem também confusas quanto a isso.
Se não assumiram o papel de mães em suas casas, convivem diariamente com elas, e
acabam por interiorizar este papel por atuarem nas unidades de Educação Infantil com
crianças de 0 a cinco anos de idade e pelo que o senso comum determina, este é um trabalho
que leva quem o realiza a assumir as características de segunda mãe.
Para a autora, o papel de mãe pode ser definido de duas formas: a primeira da mãe
que se abnega para atender os filhos, e a segunda da mãe ausente, como pode ser observado
através da seguinte colocação:
(...) o ideário a respeito da maternidade idealizada, em que a mãe aparece
como terna, aconchegante, amorosa, equilibrada, disponível, devota e
abnegada, delega às mães reais dois modelos: o das mães superprotetoras
(que se deixa agir em função de suas próprias carências) e não em função
dos interesses e necessidades da criança; e o das mães ausentes ou relapsas
(que são incapazes de se colocar suficientemente à disposição dos seus
filhos). (CERISARA, p.94, 1996)
Tais conceitos exercem influência sobre a caracterização do papel das professoras de
Educação Infantil: ou sentem-se culpadas por terem que deixar seus filhos para cuidar e
educar os filhos de outras pessoas, e tentam compensar esta “falta”, agindo somente em
função de seus filhos; ou realmente não se colocam à disposição dos próprios filhos,
assumindo uma posição de ausência perante estes.
A ambigüidade da questão do ser mãe e do ser professora é pertinente mesmo para
as professoras que possuem formação inicial voltada para assumir esta função. Trabalhar com
crianças de 0 a cinco anos de idade aparenta significar todo um processo que exige adaptação
por parte das professoras, que mesmo com formação não se encontram preparadas para
assumir, como professoras de Educação Infantil, a educação e o cuidado de crianças de 0 a
cinco anos.
88
Ao assumirem ora a função de mãe, ora a função de professoras do ensino
fundamental, as professoras de Educação Infantil perpetuam uma situação que envolve
ambigüidade de papéis:
Esse conflito é vivido como algo bastante problemático do ponto de vista
profissional e tem como uma de suas possíveis conseqüências o que tem sido
convencionado chamar de falta de profissionalismo no exercício do
magistério, principalmente das professoras que trabalham com crianças
pequenas.
Aliado a isso, elas não se sentem qualificadas para trabalhar como
professoras em escolas de 1º grau com crianças maiores. O que acaba por
criar um impasse, cuja solução estaria em uma suposta divisão clara e
definitiva entre as funções de professora de escola, de profissional de creche
e de mãe, nas diferentes instituições. (CERISARA, p.100, 1996)
As práticas profissionais articuladas no interior das instituições de Educação Infantil
constituem um trabalho ainda mais relacionado ao doméstico e à falta de profissionalismo,
quanto menores forem as crianças com as quais as professoras atuam; ao mesmo tempo em
que, se as crianças são maiores, a relação volta-se para aquela proveniente das escolas de
nível fundamental: a dificuldade de caracterizar as profissionais surge em proporções maiores
nesse quesito.
Os sentidos das ações e práticas das professoras de Educação Infantil e suas
representações sociais a respeito da caracterização do seu perfil enquanto mulheres,
profissionais, mães, envolvem em grande parte suas relações familiares, particulares, sociais,
históricas, que conduziram à escolha ou não da profissão e remetem aos motivos pelos quais
permanecem nela.
Tal caracterização profissional vai além: existe a necessidade de que sejam
observados também os critérios do âmbito da formação das profissionais (investimentos,
interesse, busca), sua articulação com a prática das instituições e as situações e relações que
possibilitam uma interpretação da realidade e de sua própria experiência.
A seguir, apresento os dados provenientes da pesquisa, analisados de acordo com os
referenciais teóricos anteriormente abordados, que permitiram a elaboração de algumas
categorias de análise, partindo do questionário respondido pelas professoras de Educação
Infantil dos CCI’s/Unesp.
89
CAPÍTULO 4 - TECENDO UMA ANÁLISE: CARACTERIZAÇÃO PROFISSIONAL
DAS PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DOS CCI’S/UNESP
4.1 Procedimentos Metodológicos da Pesquisa
Considerando a necessidade de compreender o papel das professoras de Educação
Infantil dos CCI’s/Unesp, e de que educação e cuidado devem estar presentes no cotidiano
nas instituições de Educação Infantil, permeiam-se os seguintes objetivos específicos:
Analisar aspectos referentes à formação das professoras para atuar na Educação Infantil;
Estabelecer a importância da profissionalização das professoras dos CCI’s, diante da falsa
dicotomia existente entre cuidado e educação, presente nas atuais discussões a respeito da
redefinição da atuação das profissionais da Educação Infantil, sabendo-se que é impossível
dissociá-los.
Tem-se como hipótese, devido às condições históricas de trabalho doméstico e trabalho
remunerado exercido pelas mulheres, que a duplicidade de funções encontra-se também presente
na vida profissional e pessoal das professoras que atuam nos Centros de Convivência Infantil da
UNESP, que enfrentam a difícil tarefa de colocarem em foco uma re(definição) de sua
profissionalidade: mulher, profissional, mãe, professora...Qual papel faz parte de seu cotidiano?
Partindo dessa hipótese, originou-se o objetivo geral da presente pesquisa, que consiste
na busca pela caracterização profissional das professoras da Educação Infantil dos Centros de
Convivência Infantil da Unesp, tomando por base a visão que as próprias professoras têm do
trabalho que exercem: se cuidam, se educam, se atribuem importância à formação, à prática
cotidiana, ao relacionamento com os pais, crianças, colegas, se se encontram satisfeitas com o
trabalho que realizam e se fazem realmente aquilo que gostam.
A interpretação dos resultados ocorreu através dos posicionamentos teóricos de
Nóvoa (1995), Freire (1999), Oliveira-Formozinho (2002), Ongari; Molina (2003), autores
que investigam a formação e profissionalização dos professores; bem como Silva (2001),
Cerisara (2002), Kramer (2003), Perrenoud (2003) que investigam especificamente a
profissionalização das professoras das instituições infantis. As representações sociais das
professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp foram analisadas partindo das concepções
de Cerisara (1996), Guimarães (2000) e Silva (2001). Referenciais como a Lei de Diretrizes e
90
Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) e as Diretrizes Curriculares para a Educação
Infantil (1998), são considerados essenciais para tecer uma análise a respeito da formação das
professoras e das concepções que permeiam seu trabalho. Acredito que os referenciais
teóricos citados consistem em uma importante base para que seja melhor pensado e refletido o
sentido de profissionalidade das professoras que atuam nos CCI’s investigados, bem como
poderá propiciar um maior entendimento a respeito do processo de formação destas, como um
dos fatores significativamente responsáveis pelos programas de cuidado e educação presentes
nos CCI’s/Unesp estudados. Ongari; Molina (2003), diante de tais discussões a respeito da
profissão das educadoras de creche na Itália, concluem:
Prioritariamente, e de modo inequívoco, a profissão de educadora de creche
surge na visão das protagonistas em sua especificidade, caracterizada por
percursos de aprendizagem, essencialmente centrados na própria experiência
pessoal e por competências educativas não ligadas a idéias que evocam
aptidões “femininas” ou “naturais” e, de alguma forma, não profissionais. (p.
148)
A metodologia fundamenta-se na abordagem qualitativa, constituindo uma
pesquisa exploratória, através da qual se tem-se a possibilidade de aprimorar idéias, e por
apresentar certa flexibilidade em seu planejamento, oferece a oportunidade de levantamento
de tipos variados de dados, visando descobrir, interpretar e retratar a realidade de forma
completa e profunda. Para Abramo (1979):
(...) são investigações de pesquisa empírica cujo objetivo é a formulação de
questões ou de um problema com tripla finalidade: desenvolver hipóteses,
aumentar a familiaridade do pesquisador como um ambiente, fato ou
fenômeno, para a realização de uma pesquisa futura mais precisa ou
modificar e clarificar conceitos. (p. 188)
Este tipo de pesquisa tem por finalidade proporcionar maiores informações sobre
determinado assunto e, ainda, descobrir um novo enfoque para o estudo que se pretende
realizar.
Para Gil (1993), a pesquisa exploratória tem como objetivo principal o
aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Através da pesquisa exploratória
avalia-se a possibilidade de se desenvolver um estudo inédito e interessante, sobre uma
determinada temática. Sendo assim, este tipo de pesquisa tem como objetivo proporcionar
maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito, além da
flexibilidade no planejamento.
91
Tomando por base a pesquisa: “Caracterização Profissional das Professoras da
Educação Infantil dos CCI’s - Centros de Convivência Infantil da Unesp”, serão analisados
aspectos referentes à formação inicial e em serviço, características do trabalho das professoras
da Educação Infantil, o relacionamento com as colegas de trabalho, com as supervisoras das
instituições em que atuam, com os pais, crianças atendidas e as perspectivas diante do
trabalho que realizam nos Centros de Convivência Infantil da Unesp – CCI’s/ Unesp.
4.2 Principal instrumento: o questionário.
Com o intuito de caracterizar a identidade das professoras de Educação Infantil no
Brasil, mais especificamente nos CCI’s/UNESP, objeto de nossa investigação, adotamos o
questionário proveniente da pesquisa italiana de Ongari; Molina (2003), que se encontra em
anexo, por percebermos que seria uma fonte segura e adequada para a realização desta
pesquisa, com algumas adaptações devido à realidade brasileira, a respeito da construção das
identidades das educadoras de creche da região centro-norte da Itália, que compreende as
províncias de Milão, Reggio-Emilia, Trento e Arezzo. Muitas dessas profissionais italianas
enfrentaram a transição das creches assistenciais às creches chamadas educativas, o que
provocou a luta por uma identidade ainda em construção, aspecto em que se assemelham ao
que está sendo vivenciado pelas professoras de Educação Infantil brasileira atualmente, e
portanto com as professoras dos CCI’s da Unesp. Tal definição de identidade, como
professoras de Educação Infantil, parte da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDB 9394/96, e esta construção certamente estará permeando o papel das
professoras nas instituições de Educação Infantil brasileiras, devido a esse fato, o
questionário, após detalhada leitura a algumas adequações, tornou-se a mais importante fonte
instrumental da pesquisa.
As adaptações realizadas no questionário aplicado nos Centros de Convivência
Infantil da Unesp dizem respeito, fundamentalmente, à questão que visa descortinar as
opiniões pessoais das professoras de Educação Infantil, permitindo que exponham suas
opiniões de forma mais aberta do que através das respostas diretas possibilitadas pelos
questionários.
92
Tais questões centraram-se nas opiniões, dificuldades, satisfação e sentimentos das
professoras, em aspectos diretamente relacionados ao cotidiano vivenciado pelas profissionais
nas instituições de Educação Infantil em que atuam.
O questionário original utilizado na pesquisa realizada por Ongari; Molina (2003)
enfoca cinco áreas, que acreditamos constituírem a base principal a ser analisada também
dentro da realidade das professoras dos CCI’s/Unesp, por contemplarem os mais diferentes
aspectos referentes à profissão, formação, relações existentes nas instituições e aspectos do
trabalho desenvolvido pelas professoras nas Instituições de Educação Infantil:
1) Formação: formação inicial, formação em serviço e formação em serviço no local de
trabalho;
2) Profissão: histórico de trabalho, função, imagem do próprio trabalho e das competências
necessárias para desenvolvê-lo, relação entre trabalho, experiência familiar e feminina;
3) Relação com os pais: conflitos, papel dos pais, imagem dos pais;
4) Relação com as crianças: dimensões emotiva e relacional;
5) Aspectos do serviço: satisfação e qualidade.
O questionário foi respondido pelas professoras de crianças de 0 a cinco anos de
idade de sete unidades (CCI “Dente de Leite” – São José dos Campos; CCI “Prof. Helton
Alves Faleiros” – Marília; CCI “Pintando o Sete” – Franca; CCI “Chalezinho da Alegria” –
Presidente Prudente; CCI “Catatau” – Ilha Solteira; CCI “Pertinho da Mamãe” – Rubião I –
Botucatu e CCI “ Lageado” - Botucatu), que atuam nos campi da UNESP do Estado de São
Paulo. Os questionários foram enviados para os CCI’s/ Unesp e entregues às professoras pela
Supervisora de cada unidade, precedidos por uma carta explicando a pesquisa e solicitando a
colaboração de todas as professoras que fazem parte do grupo que se pretende analisar. O
questionário é anônimo e se acredita que tenha sido respondido individualmente, de acordo
com as instruções contidas nas cartas de apresentação e também presente nos questionários
recebidos por cada uma das professoras.
Foram enviadas cartas que visavam explicar o objetivo da pesquisa e a importância
da participação das professoras de Educação Infantil para todos os Centros de Convivência
Infantil da Unesp.
Em seguida, as unidades que manifestaram o desejo de colaborar com a pesquisa
receberam os questionários, no total de sessenta, quantidade necessária para o número de
professoras dos sete CCI’s/Unesp que concordaram em participar.
A participação das professoras dos CCI’s/Unesp foi voluntária, sendo que as
profissionais ficaram à vontade para decidir se participariam ou não da pesquisa, sem
93
quaisquer intervenções por parte das supervisoras, que ficaram com a responsabilidade de
informá-las a respeito das condições e da representatividade da pesquisa para caracterizar a
identidade das professoras de Educação Infantil que atuam nos CCI’s/Unesp .
As categorias apresentadas a seguir são provenientes dos questionários respondidos
pelas professoras dos Centros de Convivência Infantil da Unesp – CCI’s/Unesp, e abordam
questões a respeito do perfil profissional dessas professoras, que envolvem aspectos da vida
familiar, pessoal, situação profissional, relação com as crianças com as quais atuam, relação
com os pais, além da formação profissional. A partir dessas questões, pretende-se definir
alguns critérios relevantes que fazem parte da caracterização da identidade das professoras
dos CCI’s/UNESP, podendo visualizar o percurso profissional destas mulheres.
Ressalta-se que 60 professoras de Educação Infantil de sete Centros de Convivência
Infantil da Unesp – CCI’s/Unesp (CCI “Dente de Leite” – São José dos Campos; CCI “Prof.
Helton Alves Faleiros” – Marília; CCI “Pintando o Sete” – Franca; CCI “Chalezinho da
Alegria” – Presidente Prudente; CCI “Catatau” – Ilha Solteira; CCI “Pertinho da Mamãe” –
Rubião I – Botucatu e CCI “Lageado” - Botucatu) contribuíram com a presente pesquisa,
respondendo ao questionário proposto.
A partir de agora, inicio uma análise dos dados provenientes dos questionários
respondidos pelas professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp. Primeiramente, levanto
algumas breves considerações a respeito de seu perfil enquanto mulheres, e, em seguida, serão
analisadas as cinco grandes categorias enfocadas nos questionários: formação, profissão,
relação com os pais, relação com as crianças e aspectos do serviço.
4.3 Quem são as professoras dos CCI’s/UNESP?
- O perfil profissional
Com referência à idade, 26 professoras têm entre 30 e 39 anos e 21 possuem de 40 a
49 anos, 33 são casadas (vide Tabela 1 e 2). Muitas têm filhos (34 delas), sendo que em quase
todos os casos, possuem um ou dois filhos. Grande parte das professoras (23) têm filhos
maiores de 10 anos, sendo que 11 delas têm filhos de 0 a cinco anos, ou seja, idade das
94
crianças que freqüentam a unidade, sendo que 8 com idade entre 0 e 3 anos (creche) e 3 com
idade entre 4 e cinco anos (pré-escola), podendo ser observada nas Tabelas 3 e 4.
Essas professoras formam um grupo de mulheres adultas, com uma vida pessoal e
profissional bem definida e por este fato, enfrentam a responsabilidade da denominada “dupla
jornada”, tendo que dividir seu tempo entre as tarefas e exigências domésticas e a
responsabilidade profissional, conciliando os papéis, o que se torna ainda mais complexo à
medida que essas mulheres têm a tarefa de cuidar dos filhos de outras pessoas. A “dupla
jornada”, pode ser melhor explicada à luz das representações sociais trazidas por estas
professoras, que geram uma espécie de culpa pelo fato de não terem mais tempo disponível
para estarem com seus próprios filhos por terem que cuidar e educar os filhos de outras
pessoas.
A maioria das professoras dos CCI’s/Unesp não enfrenta este tipo de problema, pois
têm filhos maiores de seis anos, ou seja, crianças que não se encontram mais em idade de
freqüentar creche ou pré-escola. Segundo Ongari; Molina (2003):
No caso das educadoras de creche, a coexistência dos papéis profissionais e
familiares mostra-se particularmente complexa, visto que a especificidade da
profissão exige em relação às crianças pequenas a realização de funções
take-care análogas, pelo menos do ponto de vista fenomenológico, àquelas
realizadas dentro da família. Isto, como pudemos constatar no decorrer da
nossa análise (ainda que o estudo aprofundado deste assunto não tenha seu
espaço aqui), é significativo tanto em relação à própria identidade pessoal,
enquanto mulher e mãe, como em relação à definição do próprio trabalho.
Se, portanto, na prática diária e na representação do próprio trabalho, a
conciliação do duplo papel parece de algum modo problemático, tal
integração mostra-se muito mais delicada para pessoa que profissionalmente
tem a tarefa de cuidar do crescimento nos primeiros anos de vida, dos filhos
dos outros. É mais problemático ainda quando os próprios filhos têm a
mesma idade das crianças ‘pequenas’ da creche. (p.42)
A conciliação de papéis toma proporções realmente relevantes quando se fazem
referências aos papéis de mãe e professora de Educação Infantil, pelo fato de estarem
incutidos nesses dois papéis aspectos que dizem respeito às relações domésticas; à
maternagem que se estabelece nas relações predominantes nas instituições de Educação
Infantil, em que as professoras acabam por atender as crianças como se fossem filhos; à culpa
por deixar os filhos em detrimento de outras crianças que não são seus filhos, ou seja,
constituem uma série de imagens que as professoras desenvolvem em torno do seu trabalho e
das atividades e responsabilidades provenientes de suas casas, para com suas famílias, em
especial, seus filhos.
95
Tabela 1 – Dados pessoais: idade das professoras dos CCI’s/Unesp
Idade Número
Menos de 24 anos 04
De 24 a 29 anos 08
De 30 a 39 anos 26
De 40 a 49 anos 21
Mais de 50 anos 01
Total 60
Tabela 2 – Dados pessoais: estado civil das professoras dos CCI’s/Unesp
Estado civil Número
Solteira 20
Casada 33
Separada, divorciada, viúva 07
Total 60
Tabela 3 – Dados pessoais: número de professoras que têm filhos e quantidade de filhos
Têm filhos Número
Não 26
Sim 34
Total 60
Quantidade de filhos Número
1 filho 16
2 filhos 10
3 ou mais 08
Total 34
96
Tabela 4 – Dados pessoais: idade do filho caçula das professoras dos CCI’s/Unesp
Idade do filho caçula Número
0-2 anos 03
3-5 anos 08
6-9 anos 07
10-15 anos 07
15-20 anos 06
Mais de 20 anos 03
Total 34
- 1ª Categoria: A formação das professoras
- Formação inicial, formação em serviço e formação em serviço no local de trabalho
Atualmente no Brasil, existe um amplo contingente de cursos voltados à formação
de professores, que contam com os mais diversos currículos. De acordo com os Referenciais
para Formação de Professores Polivalentes (1998):
O conjunto de saberes, atitudes, valores de que se apropriam os futuros
professores constituem a competência com que os novos professores iniciam
sua carreira e é também a base sobre a qual construirão e reconstruirão seus
conhecimentos no decorrer do exercício da profissão. (p.17)
Em geral, a formação inicial oferecida pelos cursos detém-se em grande parte às
exigências para o professor das séries iniciais do ensino fundamental, destinando pouca
importância à formação da professora de crianças pequenas dentro dos cursos regulares de
formação. Cerisara (1996) define essa falta de importância atribuída ao trabalho desenvolvido
nas unidades de Educação Infantil, e em conseqüência, à necessidade de formação específica,
como invisibilidade dos saberes das profissionais de creche:
Surge, portanto, um tema que merece um tratamento mais detalhado que diz
respeito à invisibilidade dos saberes destas profissionais de creche. Esse
tema tem sido abordado quando analisada a problemática da invisibilidade
do trabalho feminino no campo pelo fato de estar diretamente associado ao
trabalho familiar (...) (p.146)
97
Assim, acentua-se a desvalorização social do trabalho das professoras de Educação
Infantil, considerando-se que a profissão não necessita de qualificação das profissionais, e,
portanto não tem atribuída sua devida importância.
A formação de caráter específico destinado àqueles que desejam trabalhar com a
Educação Infantil, ocorre em geral, após a conclusão dos cursos regulares, através de
especialização ou habilitação na área.
As participantes da pesquisa até o presente momento possuem a seguinte formação
inicial: 30 possuem curso superior em Pedagogia ou estão cursando, 18 tem o curso
Pedagogia Cidadã e 4 freqüentaram Habilitação específica para trabalhar com Educação
Infantil; 3 possuem o curso Normal Superior; 1 possui somente o Magistério; 4 têm ensino
médio e apenas 1 possui o ensino fundamental. No caso do diploma universitário, ressalta-se
que 2 professoras possuem outros cursos não relacionados ao trabalho com Educação Infantil,
tais como: Matemática (01) e Serviço Social (01), no entanto, a professora que cursou
Matemática, fez Magistério e a professora que cursou Serviço Social cursou também
Pedagogia Cidadã. Outras 2 professoras cursaram o Normal Superior e 2 não responderam a
questão.
Enfatiza-se que 27 professoras cursaram Magistério e posteriormente, algum outro
curso, sendo em sua maioria Pedagogia Cidadã.
Assim sendo, podemos constatar que a grande maioria das professoras dos CCI’s da
Unesp buscou uma formação que contemplasse, pelo menos teoricamente, os aspectos
relacionados à educação, freqüentando o curso na área em que atuam.
Tabela 5 – Dados profissionais: diploma das professoras dos CCI’s/Unesp
Diploma Número
Ensino Fundamental 01
Ensino Médio 04
Magistério 01
Pedagogia 30
Pedagogia Cidadã 18
Outro diploma universitário 04
Total 58
98
A pesquisa realizada por Ongari; Molina (2003) revela que na Itália ainda pode-se
constatar que apesar de ser uma minoria, encontram-se profissionais com orientação
exclusivamente sanitária ou assistencial, o que não ocorre mais com as professoras das
unidades (CCI’s), pois mesmo a única profissional que cursou Serviço Social, cursou
posteriormente Pedagogia Cidadã.
A respeito da formação inicial de professores, Nóvoa (1995) ressalta que:
As escolas normais legitimam um saber produzido no exterior da profissão
docente, que veicula uma concepção de professores centrada na difusão e na
transmissão de conhecimentos, mas são também um lugar de reflexão sobre
as práticas, o que permite vislumbrar uma perspectiva dos professores como
profissionais de saber e de saber-fazer. (p. 16)
Tal concepção, voltada não só para a transmissão de conhecimentos, mas também
para a reflexão sobre a prática permite que desde sua formação inicial, os professores tenham
a possibilidade de estabelecer relações entre sua formação teórica e as condições de trabalho
que podem encontrar, referentes à prática em contato direto com as crianças, pais, colegas de
trabalho, com quem provavelmente compartilham idéias, reflexões e incertezas.
Ao afirmar que: “mais do que um lugar de aquisição de técnicas e conhecimentos, a
formação de professores é o momento-chave da socialização e da configuração profissional”
(p.18), Antonio Nóvoa (1995) exalta a importância de uma formação que contemple, além do
saber-fazer específico para cada área de atuação do professor, temas relativos à sua
socialização pessoal, que intrinsecamente, constituem parte primordial em sua atuação
enquanto profissional. A profissão docente passa por diferentes caminhos, que percorrem
desde a formação inicial até a formação que ocorre através da prática e da convivência com
outros profissionais:
O diálogo entre professores é fundamental para consolidar saberes
emergentes da prática profissional. Mas a criação de redes coletivas de
trabalho constitui, também, um fator decisivo de socialização profissional e
de afirmação de valores próprios da profissão docente. O desenvolvimento
de uma nova cultura profissional dos professores passa pela produção de
saberes que dêem corpo a um exercício autônomo da profissão docente.
(NÓVOA, 1995, p.26)
Questões que envolvem a heterogeneidade dos currículos na formação inicial das
professoras de Educação Infantil, podem ser observadas como um fator que remete à
importância da formação continuada (atualização), ressaltando que a formação inicial
constitui uma rede de relações como os outros tipos de formação, como afirmam Ongari;
Molina (2003):
99
Dada a disparidade da formação de base, a atualização em serviço adquire
um peso sem dúvida relevante. A importância de uma atualização
permanente e da requalificação do pessoal com orientação educativa foi,
como se mencionou, um critério-guia para muitas Administrações no
momento da criação de novos serviços e da reorganização dos já existentes.
(p. 44)
As atuais discussões a respeito da formação necessária para o trabalho com crianças
de 0 a cinco anos de idade parecem ter exercido certa influência sobre as professoras que
atuam nesta área, conduzindo a uma busca por formação, o que vem a contribuir para a
melhoria das condições do trabalho ao ponto em que as teorias educacionais são melhor
debatidas e estudadas nos momentos reservados para este fim nas unidades de Educação
Infantil.
Diante de um quadro em que a formação inicial assume sua devida importância
dentro do contexto em que se inserem as professoras dos Centros de Convivência Infantil da
Unesp, nota-se também que existe a busca e o interesse pela formação continuada, assim,
torna-se importante compreender qual o espaço destinado a este tipo de formação nas
unidades de Educação Infantil da Unesp, e qual seu papel diante da caracterização das
professoras frente à sua própria identidade profissional.
Quanto à formação em serviço, 27 professoras afirmam ter participado de todos os
cursos que demonstraram interesse, enquanto 22 alegam ter participado de algumas
oportunidades de formação em serviço pelo fato de não ser possível participar de todas
aquelas que têm interesse e 10 professoras enfatizam que nas unidades em que trabalham, os
freqüentadores da formação continuada são “eleitos” através de sorteio. A maioria das
professoras (43) afirma que nas unidades em que atuam existe um programa específico de
formação em serviço, que segundo elas é realizado através da verificação das necessidades
demonstradas pelas professoras no cotidiano de seu trabalho com as crianças.
Parte-se da premissa de que podemos definir formação como um
(...) processo contínuo e permanente de desenvolvimento, o que pede do
professor, disponibilidade para a aprendizagem; pede da formação que o
ensine a aprender; e do sistema escolar no qual se insere como profissional,
condições para continuar aprendendo. Ser profissional implica ser capaz de
aprender sempre, de mudar, mas exige também ser considerado como
profissional. (REFERENCIAIS PARA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
POLIVALENTES, 1998, p.16)
Para os Referenciais para Formação de Professores Polivalentes (1998), refletir a
respeito da formação do professor inclui discutir a formação inicial e a formação continuada,
diante disso, a formação continuada não pode assumir um aspecto de eventualidade,
100
casualidade, ou ser tomada como um instrumento que tenha por objetivos suprir as
deficiências da primeira formação (inicial), caso esta tenha sido de baixa qualidade. A
formação continuada
(...) é sempre parte integrante do exercício profissional de professor e tem a
mesma importância da formação inicial. Essa perspectiva leva a afirmar a
necessidade de transformar o modo como se dão as duas formas básicas de
formação de professores (formação inicial e formação continuada) para criar
um sistema de desenvolvimento profissional. (p.17)
Em geral, diante dos dados obtidos através das respostas dos questionários, as
professoras dos CCI’s/Unesp dão importância à formação tanto dentro quanto fora da
unidade, buscam formação através de Congressos, Encontros, Palestras, cursos, oficinas e
também grupos de estudo (em menormero), como pode ser observado abaixo:
Tabela 6 – Dados profissionais: formação continuada das professoras dos CCI’s/Unesp
Formação Continuada Número
Congressos, Encontros, Semanas 33
Cursos, Oficinas, Palestras 20
Grupo de Estudo e Pesquisa 07
Total 60
Em aspectos quantitativos, 87% das professoras afirmam ter freqüentado pelo menos
dois cursos de atualização nos últimos cinco anos, notando-se que em algumas unidades as
professoras demonstram ter maior interesse nas oportunidades de formação continuada
oferecidas, enquanto 13% apontam não ter freqüentado nenhum curso nos últimos cinco anos.
Nóvoa (1995) tece algumas considerações a respeito da formação, como parte importante da
profissionalidade docente, definida por ele também como uma responsabilidade do professor:
A formação pode estimular o desenvolvimento profissional dos professores,
no quadro de uma autonomia contextualizada da profissão docente. Importa
valorizar paradigmas de formação que promovam a preparação de
professores reflexivos, que assumam a responsabilidade do seu próprio
desenvolvimento profissional e que participem como protagonistas na
implementação das políticas educativas. (p.27)
101
Assim, a formação assume o caráter de responsabilidade e interesse do professor,
enquanto profissional reflexivo, para que seja capaz de refletir a respeito de sua própria
atuação e prática.
A formação toma a forma não mais de uma oportunidade a ser oferecida para o
professor, mas de uma busca por parte dele, enquanto profissional responsável por seu próprio
crescimento profissional e pela atualização de sua atuação docente, diante disso, acredito,
assim como o autor, que as possibilidades de atualização profissional devem constituir uma
busca pessoal das professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp, mesmo diante de uma
carga horária que dificulta este tipo de ação. Enquanto professoras reflexivas, faz parte de seu
campo de atuação também a busca pela qualidade do trabalho que realizam, além da melhoria
de sua atuação enquanto profissionais:
Esta preocupação, cada vez mais intensa com a elevação do nível
educacional e profissional do trabalhador de educação infantil, decorre tanto
do resultado de pesquisas – que evidenciam a intensa associação entre
formação educacional e a qualidade do atendimento oferecido à criança
pequena – quanto ao impacto, a longo prazo, na vida das crianças, de uma
experiência educacional de boa qualidade. (MACHADO, 1998, p.121 apud
ROSEMBERG, 1994, p.53 )
Gráfico 1 – Freqüência a cursos de atualização
Freqüentaram cursos de
atualização
Não Freqüentaram
Assim como a pesquisa italiana (2003) revela que a temática da formação
freqüentada pelas profissionais de Educação Infantil centra-se principalmente nas categorias
de caráter didático ou relacionadas ao desenvolvimento infantil, assemelha-se ao ocorrido
com as professoras dos CCI’s/Unesp, em que 71 delas alegam participar mais
significativamente de oportunidades que priorizem o desenvolvimento infantil, enquanto 22
dão preferência à formação que enfatize atividades didáticas, conforme descrição da tabela a
seguir:
102
Tabela 7 – Dados profissionais: tipo de formação continuada das professoras dos
CCI’s/Unesp
Tipo de formação Número
Desenvolvimento da criança 71
Atividades didáticas (“saber fazer”) 22
Encontros entre CCI’s 13
Alfabetização 07
Pesquisa 06
Pós-graduação 05
Orientação na unidade 02
Total 126
(A soma das respostas é superior ao total de professoras pelo fato das respostas serem múltiplas)
Nota-se também a presença de critérios como encontros entre os CCI’s, que não
deixam de enfatizar o desenvolvimento da criança, além da alfabetização, lembrada por 07
professoras como assunto principal de uma das oportunidades de formação a que tiveram
acesso.
O item referente às atividades didáticas, elencado como de grande importância para
as professoras dos CCI’s/Unesp, conduz a inferir que os aspectos priorizados levam em
consideração o “fazer educativo” e o trabalho cotidiano, e para que isso se estabeleça, parece
ser de necessidade das professoras que estejam sempre realizando formação que envolva o
desenvolvimento infantil e as atividades didáticas que pretendem realizar com as crianças nas
unidades:
Os aspectos do trabalho fortemente valorizados pelos momentos de
formação referem-se, sobretudo, ao “fazer” da educadora e à aquisição de
conhecimentos sobre as modalidades do desenvolvimento infantil, enquanto
tudo aquilo que não concerne diretamente às crianças, mas que, ao contrário,
diz respeito ao seu contexto de vida mais geral e também àquilo que se refere
aos aspectos institucionais do trabalho da educadora e às funções no
relacionamento com outras instâncias interessadas nos problemas da infância
(outros agentes educativos, sanitários ou assistenciais), mostra-se pouco
valorizado. (ONGARI; MOLINA, 2003, p.48)
Este “saber fazer” diz respeito, sobretudo, ao que deve ser realizado com as crianças
no período em que permanecem nas unidades (atividades didáticas) que conduzam ao
desenvolvimento infantil, primeiro critério levantado no que se refere aos temas de formação
103
continuada que as professoras freqüentaram nos últimos cinco anos. O saber fazer ocupa
espaço na procura por cursos de formação justamente por atender necessidades imediatas das
professoras, no que diz respeito ao que podem fazer para que as crianças se desenvolvam.
Popkewitz (1995) define a formação preocupada somente com o “saber fazer”:
A formação de professores tem-se preocupado com uma fragmentária
aquisição de informação e de competências dirigidas para a prática,
minimizando uma orientação intelectual. Assim, é historicamente
significativo que o resultado clássico das reformas educativas tenha se
reduzido às fronteiras da responsabilidade dos professores. Considerações
morais, éticas e intelectuais foram postas de lado em detrimento de
competências administrativas que hoje designamos por “gestão da sala de
aula”. (p.41)
Ao se preocuparem mais com aspectos práticos da profissão, em especial àqueles
relacionados ao “saber fazer”, a formação de professores acaba por deixar em segundo plano
tudo aquilo que se refere ao intelecto do professor, aos quesitos morais e éticos que fazem
parte da construção da sua profissão. Detém-se em referenciais do como atuar em sala de aula,
o que fazer em determinadas situações concretas, tomando como base apenas a ação imediata
do professor e não a reflexão sobre a atitude que deve tomar enquanto profissional,
principalmente no caso das professoras de Educação Infantil, que atuam com uma faixa etária
que exige reflexão a respeito da prática que irá influenciar em todo o percurso da vida das
crianças e na constituição de sua história pessoal enquanto indivíduo, pessoa.
Diante das especificidades da formação inicial das professoras, a formação em
serviço, seja oferecida na unidade em que atuam ou em outros locais, adquire relevância
inquestionável para que o trabalho desenvolva-se com qualidade. Ongari; Molina (2003)
definem a importância desse tipo de formação, declarando que: “(...) era importante, portanto,
compreender especialmente, pelo menos em termos gerais, qual o espaço que as experiências
de formação continuada têm na percepção da própria identidade profissional”. (p. 45)
Segundo os Referenciais para Formação de Professores Polivalentes (1998) faz parte
da formação continuada proporcionar reflexão sobre a prática, atualização, auto-avaliação
sobre o trabalho e um processo de questionamento crítico para que sejam elaboradas e
constituídas novas competências profissionais, assim, pode-se inferir, que a formação
continuada deve contar com seu espaço bem definido na percepção da identidade profissional
das professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp.
Quando se questionou a respeito da possibilidade de formação continuada no local
de serviço, a aprovação das professoras foi muito alta, inclusive, ressaltaram as prioridades
104
que encontram em seu cotidiano de trabalho e que precisariam ser solucionadas, alegando que
este tipo de formação seria um bom caminho, conforme os depoimentos:
Considero essencial a formação continuada do educador, sendo assim, as
oportunidades oferecidas dentro do local de trabalho contribuem e
acrescentam muito, tanto para o crescimento pessoal e profissional quanto
para a melhoria da própria instituição, visando sempre a qualidade em cada
área de atuação.
Acredito que esta é uma forma da unidade garantir uma formação
continuada dos profissionais que conseqüentemente reverte-se em benefícios
para si próprio e também é bom, pois o tempo de serviço não possibilita
fazer outros cursos, por exemplo.
Fundamental. É importante termos sempre a oportunidade de aprendermos
mais, com referências e profissionais habilitados. Isso representa uma
complementação positiva em nossa formação profissional, que é sempre
contínua.
É de extrema importância, pois muitas das dúvidas, anseios e necessidades
que procuramos sanar recebem um embasamento, um apoio para tais
questões. Um outro ponto é para enriquecer a parte pedagógica.
Dos sete Centros de Convivência Infantil da Unesp investigados nesta pesquisa,
cinco possuem um programa de formação em serviço que atende às profissionais dentro das
unidades, e segundo as professoras, como pode ser observado acima em seus depoimentos, a
formação visa atender suas dúvidas, anseios, fornecer subsídios teóricos para o trabalho,
enriquecendo a parte pedagógica. Para as professoras, isto contribui não só com a formação
individual, mas também com a formação das profissionais enquanto grupo. De acordo com
Nóvoa (1995):
É preciso trabalhar no sentido da diversificação dos modelos e das práticas
de formação, instituindo novas relações dos professores com o saber
pedagógico e cientifico. A formação passa pela experimentação, pela
inovação, pelo ensaio de novos modos de trabalho pedagógico. E por uma
reflexão crítica sobre sua utilização. A formação passa por processos de
investigação, diretamente articulados com as práticas educativas.
A dinamização de dispositivos de investigação-ação e de investigação-
formação pode dar corpo à apropriação pelos professores dos saberes que são
chamados a mobilizar no exercício de sua profissão. A este propósito é útil
conjugar uma formação de tipo clínico, isto é, baseada na articulação entre a
prática e a reflexão sobre a prática (PERRENOUD, 1991), e uma formação
de tipo investigativo, que confronte os professores com a produção de
saberes pertinentes (ELLIOTT, 1990). O esforço de formação passa sempre
pela mobilização de vários tipos de saber: saberes de uma prática reflexiva;
saberes de uma teoria especializada; saberes de uma militância pedagógica
(HAMELINE, 1991). (p.28)
Dessa forma, os professores assumem-se como produtores de sua própria profissão,
remetendo a um processo de mudança profissional, sem dissociar formação teórica, prática e
produção de saber.
105
Tornam-se capazes de avaliar sua atuação enquanto profissionais que trabalham
junto ás crianças, pais e a um grupo de outros professores, com formação heterogênea, mas
que são capazes de articular os componentes necessários para realizar um trabalho que
contemple, além da teoria, as práticas pedagógicas exercidas em sala de aula. De acordo com
o autor, a possibilidade de compartilhar o espaço de trabalho com outros profissionais
constitui uma possibilidade ampla de formação profissional, que ocorre através da troca e da
interação entre o coletivo, enfatizando experiências inovadoras em busca da qualidade no
serviço oferecido:
Toda formação encerra um projeto de ação. E de trans-formação. E não há
projetos sem opções. As minhas passam pela valorização das pessoas e dos
grupos que têm lutado pela inovação no interior das escolas e do sistema
educativo. Outras passarão pela tentativa de impor novos dispositivos de
controle e de enquadramento. Os desafios da formação de professores (e da
profissão docente) jogam-se neste confronto. (NÓVOA, 1995, p.31)
Após contextualizar as professoras de Educação Infantil em termos de formação e
vida particular, elenco algumas considerações a respeito da profissão que exercem,
envolvendo percurso profissional e dificuldades enfrentadas por essas professoras.
2ª categoria: A profissão de professoras de Educação Infantil.
- Percurso profissional.
Ao discutir os temas profissão e profissionalismo, Popkewitz (1995) estabelece
algumas considerações a respeito dos significados de tais palavras, que segundo o autor não
podem ser definidas como fixas, universais ou independentes do tempo e lugar. Tais conceitos
só podem ser construídos socialmente, de acordo com as transformações que a realidade
referente ao tempo e ao local em que ocorrem impõem:
Existem diferenças importantes entre as tradições anglo-americanas e
européias que, em parte, refletem a diversidade no desenvolvimento do
Estado no momento em que se consolidaram os dispositivos de formação em
certas atividades da classe média. Em muitos países europeus não existia, até
há pouco tempo, uma palavra equivalente ao termo anglo-saxônico
profissão. Este termo foi trazido para a língua de muitos países de modo a
descrever as formações do trabalho no contexto da classe média, a
importância cada vez maior da especialização no processo de
produção/reprodução e, especificamente no ensino, o esforço no sentido de
um prestígio profissional crescente.
106
O conceito anglo-americano de profissão não é um termo neutro que possa
ser facilmente incorporado noutros vocabulários nacionais, pois impõe uma
“lente” interpretativa sobre o modo como as profissões funcionam. (...) a
autonomia dos profissionais, o conhecimento técnico, o controle da profissão
sobre remunerações usufruídas e ainda uma nobre ética do trabalho são
características que servem para definir uma profissão. Contudo, este tipo
ideal tem uma frágil base se sustentação, na medida em que ignora as lutas
políticas, os confrontos e os compromissos que estão envolvidos na
formação das profissões. (p.38-39)
Assim sendo, o autor define profissão como algo a ser conquistado pelos próprios
profissionais na área em que atuam, principalmente com o objetivo de atingir o prestígio
através da profissionalização, tomando como critério que profissão não pode ser considerado
um termo neutro, e sim como algo em que se inserem concepções e interpretações no que se
refere ao seu funcionamento, cujo rótulo, segundo o autor, refere-se a um grupo bem formado,
especializado, dedicado e competente.
Diante dessa definição de profissão enfatizada pelo autor, enquanto uma conquista
que deve ser efetivada pelo grupo de profissionais, acredito que é importante refletir a respeito
da profissão das professoras de Educação Infantil, que poderemos perceber que constitui uma
conquista das professoras dos CCI’s/Unesp pelo fato de terem escolhido atuar nesta profissão,
e assim sendo, constituem um grupo de profissionais em busca do sentido de sua profissão.
Das professoras de Educação Infantil que responderam ao questionário, 32 ocupam a
função de recreacionistas e 26 são auxiliares de recreacionistas, sendo que 20 delas atuam de
10 a 14 anos na Educação Infantil, enquanto 15 profissionais atuam há mais de 14 anos na
área.
Tabela 8 – Dados profissionais: posição atual e tempo de serviço das professoras dos
CCI’s/Unesp
Posição Número
Recreacionista 32
Auxiliar 26
Substituta 02
Total 60
107
Tabela 9 – Dados profissionais: tempo de serviço na Educação Infantil
Tempo Número
1 ano 04
De 2 a 5 anos 11
De 6 a 9 anos 10
De 10 a 14 anos 20
Mais de 14 anos 15
Total 60
Grande parte das professoras teve outro tipo de experiência profissional antes de
ingressar na Educação Infantil, nas mais diferentes atividades, sendo que apenas 12
professoras não tiveram nenhum outro tipo de experiência profissional anterior, ou seja, a
atividade que exercem enquanto professoras de Educação Infantil foi seu primeiro trabalho.
Tabela 10 – Dados profissionais: trabalhos desenvolvidos anteriormente pelas
professoras dos CCI’s/Unesp
Tipo de trabalho Número
Nenhum 12
Outras creches (substituta) 01
Outras creches (efetiva) 06
Pré-escola 09
Ensino Fundamental 12
Babá 12
Outras atividades 40
Total 92
(Respostas múltiplas)
Nota-se que a maioria das professoras teve experiências com outras atividades não-
relacionadas ao trabalho com crianças de 0 a cinco anos (fábrica, comércio, secretária). É
importante ressaltar que 12 professoras atuaram como babás, atividade intimamente
relacionada ao cuidado de crianças, ao doméstico, à falta de profissionalidade, reportada
108
anteriormente; enquanto outras 12 atuaram como professoras do Ensino Fundamental,
atividade historicamente ligada somente ao âmbito educacional.
No entanto, o trabalho com crianças de 0 a cinco anos de idade é um fator de escolha
das entrevistadas, como pode ser visto na análise da questão referente ao motivo pelo qual
exercem o trabalho de professoras de Educação Infantil atualmente, onde 46 delas admitem
ter escolhido este tipo de trabalho.
Tabela 11 – Dados profissionais: motivo pelo qual exerce o trabalho como professora
dos CCI’s/Unesp
Motivos Número
Primeiro concurso em que passou 09
Chegou por acaso 05
Escolheu este trabalho 46
Total 60
A maioria das professoras possui mais de dez anos de serviço e exerceram outras
atividades antes de iniciarem o trabalho nas unidades de Educação Infantil, notando-se em
grande parte, trabalhos relacionados à área comercial, e mesmo diante de tais diferenças
quanto ao tipo de trabalho exercido nos CCI’s, as professoras afirmam não terem enfrentado
dificuldades no início do trabalho, o que mais adiante poderá ser questionado pelo fato das
professoras elegerem critérios que acreditam ter exercido influência ou dificultado o trabalho
nas unidades (CCI’s/Unesp) .
Quanto a esse quesito, as professoras dos CCI’s da Unesp assemelham-se ao das
profissionais da Educação Infantil pesquisadas por Ongari; Molina (2003), pelo fato de que
ambas apresentam experiências de trabalho anterior.
Diferenças também podem ser constatadas quando o assunto em questão é o tipo de
trabalho realizado pelas professoras anteriormente: as experiências de trabalho registradas
pela pesquisa italiana relacionam-se ao âmbito doméstico ou ao cuidado de crianças, enquanto
que as experiências de trabalho das professoras dos CCI’s/Unesp concentram-se mais em
atividades de cunho comercial, como foi descrito anteriormente.
De fato, somente uma pequena minoria não teve nenhum tipo de experiência
profissional anterior, já que mais da metade trabalhou em outras creches e
em serviços educativos para crianças maiores (em particular, na pré-escola).
109
Mostra-se também muito difundida a experiência como baby-sitter (40%).
(ONGARI; MOLINA, p.49, 2003)
Mesmo alegando não terem enfrentado dificuldades no início de seu trabalho nas
unidades de Educação Infantil da Unesp, as professoras elegeram alguns obstáculos
encontrados por elas no decorrer de seu cotidiano nas instituições, o que contradiz suas
próprias opiniões quanto ao quesito de dificuldades encontradas.
- Dificuldades enfrentadas
Ao questionar as professoras sobre suas dificuldades em se adaptarem ao ambiente
de trabalho, 65% dizem não ter apresentado qualquer dificuldade e 35% afirmaram sentir
algumas dificuldades, ao mesmo tempo em que nenhuma professora afirmou ter sentido muita
dificuldade.
Gráfico 2 - Dificuldades em se adaptarem aos locais de trabalho
Nenhuma dificuldade
Algumas dificuldades
Analisando a afirmação de que a maioria diz não apresentar dificuldades no trabalho
que realizam, pode-se constatar que existe certa contradição: ao mesmo tempo em que dizem
não enfrentar dificuldades, elencam uma série de problemas e desafios enfrentados por elas no
período em que iniciaram o trabalho e que perduram até os dias atuais.
Contradizendo os critérios levantados pelas educadoras italianas, que enfatizaram
em maior número como dificuldades no trabalho as relações entre as colegas, com as crianças
e a novidade do ambiente; as professoras dos CCI’s praticamente não dão muita importância a
estes quesitos, como pode ser observado na Tabela 12 – Tipo de dificuldades enfrentadas
pelas professoras dos CCI’s/Unesp. A respeito das dificuldades enfrentadas, as professoras
têm opiniões muito diversificadas:
110
Tabela 12 – Tipo de dificuldades enfrentadas pelas professoras dos CCI’s/Unesp
Dificuldades Número
Espaço físico 15
Carga horária 08
Pessoais/práticas 15
Desvalorização profissional 02
Relacionamento com as crianças em diferentes
situações do cotidiano
10
Relacionamento com colegas 01
Salário 02
Relação com os pais 07
Total 60
1 – Dificuldades pessoais/práticas
Dentro das dificuldades pessoais/práticas explicitadas, colocam-se: o medo de não
realizar um bom trabalho; não ter uma auxiliar por todo o período na sala; falta de tempo para
planejar; falta de material; ter duas professoras na sala; não ter experiência anterior e a rotina
de trabalho na unidade. A resposta de uma das professoras delimita bem esta questão:
“Quando eu comecei a trabalhar no CCI, cursava Magistério e nunca havia trabalhado em
Educação Infantil, pois sentia muita insegurança e medo em não conseguir realizar um bom
trabalho”.
As opiniões diferem muito entre as professoras, ao mesmo tempo em que algumas
afirmam que a permanência de duas professoras na mesma sala é algo que dificulta o trabalho,
por outro lado, existem reclamações de professoras pelo fato de não terem ao seu lado uma
auxiliar por todo o período em que estão com as crianças:
Não seria bem dificuldade, mas havendo duas pedagogas na mesma sala, em
certas situações (na maioria das vezes) a auxiliar nem sempre tem
autonomia.
(...) é não ter uma auxiliar ao meu lado por todo o período.
111
Ao mesmo tempo, as auxiliares sentem-se um pouco excluídas diante do trabalho
cotidiano ao lado das professoras:
Não ter oportunidade de crescer profissionalmente e me sentir a “auxiliar”.
As auxiliares não deveriam ser pedagogas, deveriam sim ter magistério ou
ensino superior para não serem alheias ao trabalho, mas duas professoras no
mesmo período, na mesma sala é difícil, não impossível, mas difícil.
A questão referente à exclusão das professoras, ao sentimento de rejeição
desenvolvido por elas, conduz ao “como” deve se dar a relação entre as professoras no
interior das unidades de Educação Infantil. Assim, o documento Política para os Centros de
Convivência Infantil da Unesp (2005), levantam os critérios necessários para que exista
qualidade em Educação Infantil, partindo das relações das professoras, e ressalta:
Nas relações institucionais:
com a existência de um clima de trabalho saudável, e baseado em gestão
democrática, interesses coletivos e públicos;
com a existência de uma filosofia de trabalho compartilhada pelos
educadores, com objetivos e metas claramente articulados;
com a existência de planejamento centrado na criança, vista a sua
integralidade, completude e singularidade;
com a existência de planejamento elaborado coletivamente e baseado na
permanente e sistemática avaliação de desenvolvimento e aprendizado das
crianças, em colaboração com as suas famílias. (p.14)
A questão da existência de duas profissionais na mesma sala, de onde provêm todas
as discussões a respeito de exclusão, de sentimento de inferioridade ou superioridade, não é
recente, o que geralmente acarreta em uma diferenciação de categorias: as auxiliares de sala e
as professoras, que em nosso caso, recebem denominação diferente, as recreacionistas e as
auxiliares. Outro elemento que pode ser ressaltado é o referente ao cuidado e educação dos
bebês e crianças pequenas, que constituem um grupo e que em geral, não podem ser atendidos
por um adulto sozinho:
Levando-se em conta que um adulto sozinho não pode atender a mais que
um bebê de cada vez, a companhia de outro adulto é muitas vezes
imprescindível. Saber trabalhar em dupla e em equipe, lidar com questões
relativas a divisão de tarefas e hierarquia, devem fazer parte das
competências do aspirante a profissional de educação infantil. (MACHADO,
1998, p.78)
Em princípio, o que teoricamente deveria ocorrer seria uma divisão de tarefas e
responsabilidades entre professoras e auxiliares, a respeito do grupo com o qual atuam e o que
historicamente ocorre são relações de conflito, principalmente a respeito do fator da
112
organização do “responsável” pela sala. Cerisara (1996) tece algumas considerações a
respeito das professoras e auxiliares de sala:
Além de fatores sociais, a dinâmica das relações estabelecidas entre as
auxiliares de sala e as professoras das creches que trabalham junto ao mesmo
grupo de crianças deve ser analisada levando em consideração a existência
de uma hierarquização oficial entre as duas. Esta hierarquização tem sido
evidenciada através de indicadores concretos, tais como carga horária
semanal de trabalho, salário, formação, divisão de tarefas. (p. 120)
No caso das professoras dos CCI’s, o que poderia diferenciar as profissionais –
recreacionista e auxiliares - em seu ambiente de trabalho, seria o fato de que as recreacionistas
ficam com a incumbência de “educar” e as auxiliares de “cuidar”, diferenciação que
notoriamente não existe e que chega ao fim com a declaração da Política para os Centros de
Convivência Infantil da Unesp (2005), que iguala as profissões, modificando sua
nomenclatura e acabando com tais divisões:
Nesse sentido, não se justifica a função de auxiliar de recreacionista, muitas
vezes, figura dependente da recreacionista “titular”, limitando suas funções
aos cuidados básicos como higiene, alimentação e segurança. (p.30)
Mesmo que nas relações estabelecidas entre as professoras de Educação Infantil dos
CCI’s/Unesp não existam todas as diferenciações encontradas por Cerisara (1996), acredito,
assim como a autora, que constituem fatores de relevância nas relações entre as professoras
desta pesquisa principalmente os itens: divisão de tarefas e tempo de serviço nas unidades.
Ao analisar este último critério, pode-se perceber que as professoras com mais
tempo de serviço afirmam ter maiores dificuldades ao terem que se relacionar e “dividir
tarefas” com as professoras mais jovens. E, em geral, as mais jovens afirmam ter optado pela
profissão e estarem muito satisfeitas com ela, mesmo que lhes sejam delegadas funções
apenas de cuidados, em detrimento das funções consideradas educativas, realizadas pelas
professoras que contam com maior tempo de trabalho nos CCI’s/Unesp.
Atualmente, pode ser observado que a maioria das professoras afirma
categoricamente que escolheu a profissão, mas historicamente sabe-se que o contexto social e
trabalhista em que a mulher se inseriu não oferecia muitas opções de escolha, dessa forma, o
que ocorre atualmente pode não constituir uma verdade concreta, o que dificulta as relações
profissionais e a busca da caracterização profissional destas professoras:
Os professores vivem tempos difíceis e paradoxais. Apesar das críticas e das
desconfianças em relação às suas competências profissionais exige-se-lhes
113
quase tudo. Temos de ser capazes de pensar a nossa profissão. (NÓVOA,
1995, p.12)
2 – Espaço físico
O espaço físico dos CCI’s/Unesp é apontado como uma dificuldade por grande parte
das professoras, que afirmam que este fator constitui um obstáculo que dificulta o
desenvolvimento de um trabalho com qualidade, retratado pelas opiniões a seguir:
Falta de espaço físico apropriado para a faixa etária com a qual eu trabalho
(crianças de 3 anos incompletos).
A falta de espaço em determinado momento causa dificuldade.
Não considero como dificuldade, mas o local poderia ser maior.
A insatisfação referente ao fator espaço físico pode ser explicada pelo fato de que
algumas unidades estão instaladas em locais adaptados, que não foram exclusivamente
construídos para abrigar uma instituição de Educação Infantil, pois as reclamações existentes
são características de duas unidades em específico.
As professoras dos CCI’s/Unesp reconhecem o espaço físico como parte importante
do cotidiano das unidades, no trabalho que realizam com as crianças sejam estas de qualquer
faixa etária. A Política para os Centros de Convivência Infantil da Unesp (2005) define a
importância do espaço físico das unidades de Educação Infantil da Unesp:
Esses espaços são aqueles:
que favoreçam uma relação de familiaridade, confiança e respeito entre a
instituição e os pais;
que acolham familiares durante o período de adaptação das crianças à
instituição e especialmente as mães, em ambiente adequado, durante todo
o período da amamentação;
que assegurem longos tempos de brincadeira;
que favoreçam a movimentação em espaços amplos;
que favoreçam o contato com a natureza e atividades ao ar livre;
que impeçam longos períodos de espera;
que permitam momentos de privacidade e quietude;
que ofereçam lugares adequados para o descanso e o sono;
que propiciem encontros e reuniões dos adultos – educadores entre si e
com familiares – bem como garantam momentos de estudo e pesquisa de
modo a aperfeiçoarem suas práticas e ações;
que favoreçam o acesso e a utilização autônoma de brinquedos, livros e
demais materiais de interesse da criança.
114
Reconhecendo o espaço físico diante destas características, é essencial atribuir sua
importância, já reconhecida pelas professoras dos Centros de Convivência Infantil da Unesp.
Importância esta ressaltada por Machado (1998), em sua tese de doutorado intitulada:
Desafios iminentes para projetos de formação de profissionais para Educação Infantil, ao
elaborar o seguinte quadro referente ao espaço a que as crianças devem ter acesso:
NOSSAS
CRIANÇAS TÊM
DIREITO AO
MOVIMENTO EM
ESPAÇOS
AMPLOS
criar condições para que as crianças possam correr, pular, brincar em
espaços amplos;
criar condições para que meninas e meninos possam jogar bola,
futebol;
criar condições para que meninas e meninos possam exercitar força,
agilidade e equilíbrio;
não permitir períodos longos de espera às crianças;
permitir que bebês fiquem no berço apenas para dormir ou descansar;
criar condições para que bebês possam engatinhar, aprender a andar e a
explorar outros ambientes;
organizar espaços para movimentos amplos protegidos de chuva;
organizar espaços para movimentos amplos ao ar livre;
ensinar para as crianças brincadeiras infantis que se realizam em
espaços amplos;
incorporar as famílias em atividades ao ar livre com as crianças.
Diante desse quadro, o que pode ser analisado em relação aos direitos das crianças
freqüentadoras dos CCI’s/Unesp das duas unidades citadas é que as professoras preocupam-se
em oferecer um trabalho voltado para quesitos em que estejam presentes a qualidade do
trabalho, além de assegurados os direitos das crianças ao pleno desenvolvimento, em todos os
aspectos possíveis, inclusive no que se refere aos âmbitos físico, motor e de lúdico.
3 - Relacionamento com as crianças em diferentes situações do cotidiano
Algumas professoras (10) alegam que a maior dificuldade existente para exercerem
seu trabalho na unidade de Educação Infantil é o relacionamento com as crianças em
diferentes situações do cotidiano, tais como: a dificuldade de adaptar-se com crianças maiores
(5 e 6 anos) ou menores (4 meses a 1 ano); crianças que freqüentam a unidade em tempo
115
integral; crianças que vão para a unidade mesmo estando doentes ou crianças que
permanecem na unidade após o horário.
O critério levantado pelas professoras quanto à dificuldade em se adaptarem ao
trabalho com crianças em idade de berçário (4 meses a 1 ano) ou com crianças maiores (5 e 6
anos) justifica-se pelo fato de que a maior parte das professoras mais antigas prefere trabalhar
com os bebês, atividade que aparenta estar mais relacionada ao “cuidar”; enquanto as mais
jovens preferem trabalhar com as crianças mais velhas, que se encontram em idade de pré-
escola, ou seja, idade que parece estar mais ligada ao “educar”.
O fato das professoras não se sentirem à vontade ao trabalhar com certa faixa etária
aparece claramente nos depoimentos abaixo relacionados:
Apesar de gostar de trabalhar com crianças maiores, me identifico melhor
com o berçário.
Trabalhar com bebês, pois exige uma responsabilidade muito grande mais do
que com crianças.
As representações sociais das professoras permitem que sejam elaboradas algumas
considerações a respeito das preferências de faixa etária com as quais as professoras desejam
trabalhar: no caso das professoras dos CCI’s/Unesp, grande parte das profissionais possui
formação em nível universitário, mas quando as professoras mais antigas afirmam que têm
preferência por atuarem com as crianças menores, isso explica-se pela relação que o trabalho
com bebês, mais especificamente que o trabalho realizado com as crianças de mais idade, tem
com o doméstico, com a maternagem, com a ausência da necessidade de formação e
profissionalidade, tal como aponta Kramer (2002):
As atividades do magistério infantil estão associadas ao papel sexual,
reprodutivo, desempenhado tradicionalmente pelas mulheres, caracterizando
situações que reproduzem o cotidiano, o trabalho doméstico de cuidados e
socialização infantil. (p.125, 2002)
As professoras que afirmam sentirem-se melhor trabalhando com as crianças mais
velhas, em geral são aquelas que já possuem uma formação específica desde cedo, ou seja,
não se adequaram aos requisitos da Lei de Diretrizes e Bases 9394/96, mas optaram pela
formação inicial assim que decidiram pelo trabalho com a Educação Infantil.
O que se espera é que tais preferências não abram espaço para práticas
assistencialistas ou excessivamente escolarizantes, que não priorizem a especificidade das
crianças de Educação Infantil. Campos (1994) aponta:
116
Em qualquer um dos casos, é claro, a criança está recebendo algum tipo de
educação: pode-se prever que a qualidade das experiências pedagógicas e
formativas, nos dois tipos de serviço, será bem diferente. No que se refere
aos aspectos ligados ao desenvolvimento cognitivo, é razoável supor que, na
maioria dos casos, contato com o adulto mais instruído resultará em
experiências menos limitadas para a criança. (p.33)
Assim, podemos inferir que o fator faixa etária com a qual as professoras preferem
atuar pode ser analisado mediante estas representações das próprias professoras, em algumas
optam pelo trabalho com bebês, relacionando aos fatores domésticos de cuidado, enquanto as
outras professoras optam pelo trabalho com as crianças maiores, em que já não se encontram
tão vinculados os cuidados, mas as práticas escolarizantes das professoras do ensino
fundamental. Tal quesito aponta também para a questão da desvalorização das professoras que
atuam com crianças menores:
(...) precisamos de professores que sejam respeitados nos seus direitos
(inclusive o direito à formação), revertendo a situação atual no contexto
brasileiro, em que os profissionais ganham não pelo nível que alcançam em
sua escolaridade, mas pelo nível de escolaridade em que trabalham; assim,
os que atuam com a criança pequena são ainda mais desvalorizados.
(KRAMER, REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2, p.13, 2003)
Esta discussão a respeito da desvalorização das professoras, primordialmente
daquelas que atuam com as crianças menores, encontra-se intrinsecamente ligada ao cuidar, e
que fazem a imagem da professora de Educação Infantil relacionar-se diretamente à imagem
daquela que cuida, da babá.
O que acreditamos é que deve ser preservada a identidade da Educação Infantil e
respeitados seus principais atores: as crianças de 0 a cinco anos de idade. Assim sendo,
Cerisara ressalta (1996) que:
(...) vale destacar que uma melhor definição do papel das profissionais de
creche, entendida enquanto maternagem social, diferenciado da maternidade
e do magistério, é fundamental para a constituição da identidade desta nova
função. No entanto, é importante que essa definição não signifique a
exclusão das formas femininas de se relacionar, em que estão presentes a
afetividade, os vínculos pessoais e a informalidade nas relações das
profissionais de creche entre si, com as mães das crianças e com as crianças
pequenas que freqüentam as creches. (p.164)
As crianças que freqüentam os CCI’s/Unesp em período integral constituem uma
realidade dentro das unidades, mas segundo as professoras, a permanência em período
integral muitas vezes acarreta em cansaço e irritação por parte das crianças.
As crianças que estando doentes, freqüentam a unidade também são um problema
levantado pelas professoras, pois segundo elas, essas crianças não conseguem participar
117
ativamente das atividades propostas e acabam não oferecendo o “rendimento” esperado pelas
professoras, como atestam os depoimentos a seguir:
Crianças que freqüentam a creche em período integral e crianças que
permanecem doentes, pois não possuem um rendimento favorável perante os
colegas e educadoras.
O fato de que algumas crianças permanecem por 12 horas na unidade, o que
provoca cansaço e irritação, e também quando as crianças vêm para a escola
doentes e assim fica difícil alcançar algum rendimento.
Como direitos das crianças, elencados por Machado (1998), em termos de proteção,
afeto e amizade, pode-se citar:
NOSSAS
CRIANÇAS TÊM
DIREITO À
PROTEÇÃO, AO
AFETO E À
AMIZADE
relacionar-se respeitosamente com as famílias das crianças;
respeitar as amizades infantis;
valorizar a cooperação entre adultos e crianças;
perceber as situações em que as crianças necessitam compreensão,
apoio e conforto;
evitar situações que provoquem exclusão das crianças;
respeitar os diferentes tempos de concentração das crianças nas
diferentes atividades;
ser discretos com relação a problemas das crianças, seus familiares
ou companheiros de equipe;
estar próximo e disponível mesmo quando as crianças já não
precisam mais de ajuda;
estar disponível para atender às crianças sempre que estas solicitam;
auxiliar as crianças a auto-controlarem impulsos excessivamente
agressivos;
explicar os motivos das atitudes tomadas às crianças;
reconhecer situações que amedrontam as crianças e interferir no
sentido de protegê-las;
reconhecer situações em que as crianças sejam vítimas de violência e
interferir no sentido de protegê-las.
Diante dos critérios elencados pela autora, acredito que as professoras dos
CCI’s/Unesp deveriam rever seus conceitos, principalmente no que diz respeito ao quesito
descrito por elas como “rendimento das crianças”, pois se estas encontram-se doentes, ou
freqüentam a creche em período integral necessitam ainda mais de um atendimento que lhes
proporcione bem-estar enquanto permanecem nas unidades, sentimento este que propicie sua
integração com o grupo e não sua exclusão pelo fato de ter maiores dificuldades que outras
crianças.
118
O sentido que confere profissionalidade à profissão de professoras de educação
Infantil inclui também o bom relacionamento com as crianças, o reconhecimento de que
necessitam de atenção, afeto e carinho principalmente por se tratar de uma faixa etária que
prioriza estas relações com os adultos, e que constituem a base para suas relações adultas
futuras.
4 – Carga horária de trabalho
Um dos aspectos predominantes no trabalho de professoras de Educação Infantil,
determinado também pela imagem do trabalho, é o cansaço, revelando um dos aspectos
negativos da profissão.
Em relação ao cansaço ocasionado pelo trabalho, ressaltam-se 5 itens que o
provocam, destacados abaixo com seus respectivos números de indicação pelas professoras
dos CCI’s/Unesp:
1- Atenção contínua (30);
2- Esforço físico (12);
3- Comunicação diária com os pais (08);
4- Emoções intensas no relacionamento com as crianças (07);
5- Relacionamento entre colegas (03).
A carga horária de trabalho é levantada como um problema pelas professoras, que
acreditam ser muito cansativo permanecer por oito horas com as crianças, pois isso exige
atenção contínua, o que ocasiona um certo cansaço mental nas profissionais.
A atenção contínua é citada como 1º fator responsável pelo cansaço, no que se refere
ao trabalho, por 30 professoras, pois envolve cansaço psicológico, fator extremamente
relevante, que também é ressaltado da seguinte forma:
( ) o aspecto estressante do envolvimento emocional é apontado
principalmente na necessidade de satisfazer, ao mesmo tempo, às exigências
de muitas crianças. (ONGARI; MOLINA, p.85, 2003)
Diante desse contexto, podemos afirmar que atender a muitas crianças provoca
realmente um cansaço advindo do stress de querer atendê-las, sem deixar suas necessidades
passarem despercebidas. Mesmo que as professoras revelem que um dos fatores primordiais
de sua satisfação dentro do esquema organizacional dos CCI’s/Unesp seja a relação numérica
adulto/criança, que foi analisada pelas professoras com índice alto de satisfação, não é fácil
119
conseguir desenvolver um trabalho que atenda totalmente a todas elas em suas necessidades,
como pode ser constatado por meio dos seguintes depoimentos:
(...) acho que a jornada de trabalho é um pouco estressante.
(...) Estar com as crianças durante oito horas seguidas se torna muito
cansativo e às vezes desgastante.
O esforço físico foi lembrado por 12 professoras, o que constitui um resultado
esperado, de modo que podemos considerar o trabalho com as crianças, em especial as
menores, bastante dependente dos aspectos corporais devido à dependência das crianças:
(...) se considerarmos que o trabalho com as crianças pequenas implica um
modo de relação centrado na corporeidade, que pode se tornar pesado do
ponto de vista físico: além de raramente poder ficar parada, a educadora
também carrega as crianças no colo, levanta-as (principalmente para a troca),
etc. E ainda permanece sentada ao lado das crianças, freqüentemente no chão
ou em um sofá baixinho, o que exige muita energia sempre que for
necessário se levantar. (ONGARI; MOLINA, 2003, p.84)
A comunicação com os pais foi lembrada por 08 professoras, determinando a
dificuldade encontrada pelas profissionais para terem acesso a um diálogo com eles, como
pode ser observado nos depoimentos:
(...) alguns pais falam que as crianças precisam de mais cuidados e muitas
vezes eles não colaboram.
(...) o relacionamento com os pais nem sempre é favorável ao nosso trabalho,
e reconhecido.
A falta de reconhecimento, por parte dos pais, do trabalho realizado nas unidades
pelas professoras é realmente um motivo que merece atenção, pois dificulta qualquer tipo de
relacionamento entre professora e pais. Dessa forma, o diálogo acaba sendo prejudicado
devido a essa desvalorização, e sabemos que na Educação Infantil o diálogo entre ambos é
essencial para que a qualidade educativa se estabeleça, pois constitui uma das formas mais
eficazes de transmissão de informações a respeito das crianças e das relações que elas
estabelecem dentro e fora das unidades de Educação Infantil.
Seguem, em ordem de importância, as emões provocadas pelo relacionamento
com as crianças, que envolvem carinho, atenção, disponibilidade imediata para atender aos
seus anseios e o relacionamento entre colegas, que segundo as professoras, complica-se
algumas vezes por diferentes opiniões dentro do mesmo agrupamento: “(...) era devido a uma
visão diferenciada com relação a outras educadoras, de como deveria ser o esquema de se
conduzir uma sala”.
120
Desta forma, o relacionamento entre as professoras dos CCI’s/Unesp, por constituir-
se também em uma relação de poder entre as denominadas recreacionistas e as auxiliares,
pode ser compreendida da seguinte forma:
Para avançar na discussão a respeito da dinâmica das relações entre as
profissionais de creche, incluindo tanto os conflitos e divergências, como as
convergências e cumplicidades entre mulheres que pertencem a estas duas
categorias profissionais e que convivem em um mesmo espaço é preciso,
portanto refletir sobre as modalidades de poder reservadas ao gênero
feminino em nossa sociedade (...). (CERISARA, p.115, 1996)
Tais relações de poder se estabelecem nas instituições de Educação Infantil entre as
professoras e geram conflitos a respeito de conceitos, atitudes a serem tomadas com relação às
crianças, tais dimensões conflitantes surgem a partir da posição que assumiram enquanto
professoras e das responsabilidades que suas próprias representações acabam por incutir:
recreacionistas acabam sendo em maior parte responsáveis pela educação das crianças,
enquanto que as auxiliares incumbem-se dos cuidados básicos – tais tarefas relacionam-se, em
ordem de seqüência, a uma prática tomada como escolarizante e outra, ligada ao doméstico
das relações. Nessas relações, predomina ainda a indefinição de tarefas e de identidade das
professoras:
Um aspecto que chamou atenção nos depoimentos foi a dificuldade para
indicar uma divisão clara de tarefas, aparecendo muito mais uma falta dessa
divisão. Várias podem ser as explicações em torno disso, mas duas merecem
destaque: uma delas pode estar relacionada ao que já foi indicado
anteriormente a respeito das formas femininas de relacionamento, em que
predomina a indefinição de tarefas, a simultaneidade de ações; a outra pode
ser atribuída a um estado real de indefinição das funções, quais devem ser
das auxiliares de sala e quais devem ser assumidas pelas professoras devido
a uma re-significação do papel educativo, tanto da creche quanto de suas
profissionais. (CERISARA, p.129, 1996)
De modo geral, os fatores a que atribuem importância quando o assunto é o cansaço
provocado pela profissão que exercem, são muito homogêneos, assim como definem Ongari;
Molina (2003), quando afirmam que em geral, as educadoras não conseguem separar aspectos
referentes ao desgaste físico do esforço psicológico que lhes é determinado pela profissão.
Quanto às questões referentes ao que não é satisfatório no trabalho que realizam e o
que pode ser considerado como uma dificuldade na unidade em que atuam, em geral, foram
levantados os mesmos itens, ou seja, as professoras que afirmaram que a carga horária é uma
dificuldade para exercer o trabalho na unidade, acreditam que a mesma é a principal condição
que impede que o seu trabalho seja mais satisfatório. Quanto a isso, ressalta-se que os CCI’s
vêm buscando realizar um trabalho que faça dele um: “Espaço de direito da criança, visando
121
práticas educativas e de cuidados que favoreçam seu desenvolvimento integral, enquanto ser
social e ativo” (Política para os Centros de Convivência Infantil da Unesp, 2005, p.35).
Para as professoras dos CCI’s/Unesp assim como para as educadoras italianas, a
responsabilidade deste tipo de trabalho constitui fator primordial para o cansaço físico, pois
abrange além dos aspectos físicos, aspectos emocionais: “O cansaço é o fator com o qual eu
tenho mais dificuldade, deixa a gente estressada, de cabeça quente, por ter que ficar o tempo
todo atenta ao que as crianças estão fazendo. É muito cansativo”.
Assim, fatores como carga horária, atenção contínua, relações com os pais, crianças
e com as outras professoras constituem os maiores focos do stress das professoras de
Educação Infantil, e merecem atenção para que se tente amenizá-los, através de
relacionamentos mais diretos com os pais e entre as professoras, pois fatores como a atenção
contínua e a relação com as crianças não são passíveis de mudanças por constituírem parte
essencial do trabalho que as professoras de Educação Infantil exercem.
5 – Relação com os pais
O relacionamento com os pais é lembrado como uma dificuldade por 7 professoras,
que se queixam de uma relação que não vem sendo construída com base no respeito pelo
trabalho e função das profissionais, vistas, segundo elas, como “babás”, como observado nos
depoimentos abaixo:
Relacionamento com os pais e o não reconhecimento como profissional,
achando que sou tudo, menos professora.
Minha maior dificuldade é não ser reconhecida como professora e ganhar
como deveria. (...) Quero ser reconhecida como educadora e não como babá.
A busca por formação, seja de caráter inicial ou continuada, pelas professoras dos
CCI’s/Unesp requer o reconhecimento por parte dos pais, que segundo elas ainda não
conseguem desvincular a imagem de babá da imagem de professora de Educação Infantil.
As representações sociais que os pais apresentam a respeito do trabalho das
professoras de Educação Infantil ainda se encontram ligadas ao trabalho assistencial e aos
critérios de cuidados, e não de cuidado-educação. As professoras comumente queixam-se que
os pais não reconhecem seu trabalho enquanto professoras, mas essa atitude não parte
somente dos pais, elas mesmas muitas vezes não têm consciência de seu papel, daí surgem as
discussões a respeito de sua identidade profissional: mulher, mãe, professora de Educação
122
Infantil e que por isso, necessitam de saberes específicos que atendam às peculiaridades da
faixa etária com a qual atuam.
Os pais, por sua vez, questionam a identidade das unidades de Educação Infantil e
isso faz com que possam ser vistas como uma extensão da casa, relacionada ao doméstico, e
assim sendo, não conseguem reconhecer as profissionais que lá atuam como professoras de
Educação Infantil:
A instituição creche, pelas próprias características de seu percurso histórico
em nossa sociedade, tem oscilado entre o domínio doméstico da família das
crianças, cuja responsável tem sido em nossa cultura a mãe dos seus filhos, e
o domínio público da escola formal, cuja responsável tem sido a professora
dos alunos. Portanto, o conflito reside, entre outros fatores, na identidade
dessa instituição em relação ao domínio a que pertence, pois é a partir dele
que sua função social e educativa pode ser definida e, como decorrência, a
identidade que a profissional deve ter, em concordância com a identidade e
funções assumidas pela instituição. (CERISARA, p.80, 1996)
Esta discussão, quando se refere ao reconhecimento das famílias em relação às
professoras de Educação Infantil, sai dos limites das relações entre família e profissionais,
passando para uma discussão também de caráter social e histórico, que envolve
representações a respeito das instituições de Educação Infantil e das professoras que ali se
encontram inseridas. Isso traz a referência da imagem externa da creche, definida por Ongari;
Molina (2003):
(...) o papel desempenhado por um fator que parece ser específico de
experiências de insatisfação e que diz respeito ao problema da imagem
externa da creche, ou seja, da falta de reconhecimento, em nível social, da
importância do trabalho educativo com crianças tão pequenas. (p.82)
É devido a essa imagem externa das instituições de Educação Infantil, formada
socialmente, que ainda não se reconhece a importância do trabalho educativo com as crianças
de 0 a cinco anos, atribuindo às instituições somente o caráter de cuidados.
Isso acarreta uma visão equivocada por parte dos pais, que convivem em sociedade,
e vêem as instituições com o caráter de guarda/satisfação de cuidados básicos das crianças,
embasado nas primeiras concepções do que seriam as unidades de Educação Infantil, o que
conduz à insatisfação por parte das professoras, que não se sentem reconhecidas pelos pais,
que refletem a compreensão que a sociedade apresenta do que é o trabalho com crianças de 0
a cinco anos de idade, crianças de Educação Infantil. Kramer (2003) ressalta que tal fator de
desvalorização das professoras constitui-se historicamente:
Precisam também se constituir como profissionais: professores e professoras
não são tios, como freqüentemente são tratados no conhecido e já
denunciado mecanismo de desvalorização, desqualificação e desprestígio.
123
Muitas pessoas que atuam na educação infantil e no ensino fundamental
acostumaram-se a ser chamadas de tia e tio, esvaziando o caráter profissional
da sua atuação, abrindo mão até do seu nome. Nesse título de pouco poder
que parece restar-lhes, encontramos marcas de classe social, histórias de
desigualdade e exclusão, gênero e etnia, preconceitos sofridos, dificuldades
enfrentadas. Nesse contexto, precisamos de professores dispostos a repensar
sua identidade e a história coletiva que via sendo constituída. (REVISTA
PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2, p.11)
A autora coloca que a desvalorização, a falta de reconhecimento e desprestígio
encontram-se também nas professoras e nos professores do ensino fundamental, o que condiz
com a realidade, mas sabemos que tais características estão muito presentes em todo o
histórico da Educação Infantil, e dessa forma, tais critérios fazem-se fortemente presentes na
atualidade da educação das crianças de 0 a cinco anos de idade.
- Percurso profissional: breve avaliação
Ao estabelecer critérios de avaliação do próprio percurso profissional, insere-se
principalmente a questão da profissão como escolha ou relacionada à causalidade. Assim, 47
professoras afirmam ter escolhido trabalhar com crianças de 0 a cinco anos de idade, 09
afirmam que exercem esta profissão por ter sido o primeiro concurso em que passaram e
outras 04 alegam ter chegado a esse trabalho por acaso.
Tal discussão envolve prioritariamente a polêmica referente ao profissionalismo das
professoras de Educação Infantil, em que estão inseridos critérios como conhecimentos
específicos na área em que atuam, a competência em um determinado âmbito de
conhecimentos, que gera a delimitação do campo de atuação. Dentre tais critérios, em geral,
mantém-se os profissionais qualificados e habilitados para exercer a profissão, no entanto:
“Chamar alguém ou alguma ocupação de ‘profissional’ não transforma alguém em
profissional. É preciso ser visto como profissional tanto por si próprio quanto pelos outros”
(Machado, 1998, p.64 apud Peters, 1988, p.93).
Assim, é essencial que as professoras de Educação Infantil se reconheçam como
profissionais antes de exigirem que a sociedade o faça, caso sua profissão seja vista como
uma mera extensão da função materna até por elas mesmas, constitui-se uma tarefa bastante
complexa seu reconhecimento social como profissionais, principalmente pelo fato histórico
concernente à profissão.
124
Machado (1998), recupera algumas questões a respeito do trabalho das professoras de
Educação Infantil e da sua formação, que acredito serem pertinentes também nesta pesquisa, tais
como:
Afinal, será correto denominar o adulto que se ocupa do trabalho junto a
crianças pequenas de profissional? Não seria mais adequado identificá-lo
como um semiprofissional ou de um artesão da educação infantil
(SPODECK et al 1988)? Profissional, no sentido de ser alguém que ganha a
vida exercendo determinada ocupação, para a qual se preparou, se formou
previamente? Semiprofissional, pois seu campo de atuação ainda não foi
bem definido, a exigência de formação prévia não é estrita? Artesão da
educação infantil, tendo em vista a impossibilidade de estandardização da
prática educativa e as deficiências dos modelos de formação existentes para a
área? (p. 65)
Tais questões podem ser definidas como parte integrante das dúvidas a respeito da
profissionalidade das professoras de Educação Infantil. Dúvidas geradas principalmente pela
formação das professoras, ainda não vistas como uma exigência para se atuar com crianças de 0 a
cinco anos, principalmente por fatores como a domesticidade relacionada ao cuidado e à falta de
racionalidade e objetividade, que caracterizam o trabalho considerado profissional.
Para a maioria das professoras (35), o trabalho corresponde suficientemente às
expectativas que tinham quando iniciaram o trabalho; 16 afirmam que o trabalho contempla
plenamente as suas expectativas; para 06 professoras, o trabalho corresponde às expectativas
mínimas e 03 alegam que o atual trabalho não corresponde minimamente às expectativas que
tinham quando iniciaram o trabalho como professoras de Educação Infantil.
As mais diversas alegações são feitas quanto aos fatores que contribuem para que o
trabalho corresponda às expectativas que as professoras tinham no início de suas atividades, como
mostra a tabela a seguir:
Tabela 13 – Motivos pelos quais o trabalho corresponde às expectativas das professoras
quando começaram as atividades na Educação Infantil
Motivos Número
Gostam do trabalho 31
Resultado do trabalho 04
Objetivos pessoais 05
Evolução do trabalho 09
Apoio no trabalho 03
Segurança adquirida com o tempo 02
Gosto adquirido com o tempo 02
Sente-se valorizada 01
Total 57
125
Ressalta-se que 03 professoras afirmaram que o trabalho não corresponde às suas
expectativas de quando iniciaram sua atuação na Educação Infantil pelo fato do salário não
ser adequado com o tipo de trabalho que realizam.
O gosto pelo trabalho está presente na maioria das respostas das professoras, como
pode ser observado pelos relatos a seguir:
Com minha recente formação na área da educação, tinha muitas expectativas
e anseio por praticar o que havia aprendido teoricamente. E nesta unidade
pude aprender muito e praticar por isso estou satisfeita.
Na verdade ultrapassou o que eu imaginava, a cada dia aprendo mais e mais,
é uma delícia, algo inexplicável, a teoria me trouxe algo bom, mas a prática é
o que está permitindo o meu amadurecimento (na prática profissional
principalmente).
Sempre tive vontade de trabalhar com crianças de Educação Infantil, então
por gostar do que faço, está correspondendo às minhas expectativas.
O “gostar” da profissão de professora de Educação Infantil é algo que deve ser
levado em consideração, principalmente pelo número de depoimentos que apontam para a
satisfação em exercer um trabalho que possui características bem peculiares, que envolve
educação e cuidado, inseridos em um contexto que deve priorizar ambos, e não um em
detrimento do outro.
Ter jeito ou pendor para uma atividade, realizá-la com mais facilidade que
outras, usufruir prazer na sua realização, são algumas das condições (mas
não as únicas) para a mobilização dos indivíduos, não só para seu
engajamento inicial, mas, também, para a permanência no campo da
educação infantil. Sem entrar no campo das motivações psicológicas
intrínsecas, é útil observar que a atividade profissional contrasta com aquela
exigida como hobby, mesmo quando este é altamente especializado. O
exercício profissional também é diferente do voluntário, visto que o
profissional recebe, sempre e necessariamente, uma remuneração pelo
serviço prestado. (MACHADO, 1998, p.66)
Pode-se constatar que as professoras realmente optaram pela profissão porque
sentem-se satisfeitas com o trabalho que realizam quando se analisa a tabela referente aos
motivos que levaram as professoras a exercerem esta profissão:
126
Tabela 14 – Motivo principal para exercer o trabalho de professoras dos CCI’s/Unesp
Motivos Número
Primeiro concurso em que passou 09
Chegou por acaso 04
Escolha 47
Total 60
Tal fato constitui um quadro compatível com o que se observa na pesquisa italiana
(2003), em que a maioria das profissionais afirma ter escolhido a profissão de educadora.
Portanto, podemos afirmar que a escolha da profissão constitui fator de satisfação para elas.
Diante de tais dados, constata-se também que 26 professoras consideram-se muito
satisfeitas com o trabalho que hoje realizam e apenas 02 declaram-se pouco satisfeitas.
Tabela 15– Satisfação profissional atual das professoras dos CCI’s/Unesp
Satisfação profissional Número
Muitíssimo satisfeita 14
Muito 26
Suficientemente 18
Pouco 02
Total 60
Notoriamente, pode-se afirmar que as professoras realmente escolheram a profissão
em que atuam, porque gostam do trabalho e em geral, não pretendem mudar seu tipo de
atividade futuramente:
127
Tabela 16 – Percurso profissional: escolha do trabalho pelas professoras dos
CCI’s/Unesp
Escolheria este trabalho Número
Sim 52
Não -
Não sei 08
Total 60
Em geral, as professoras afirmam que a escolha da profissão é uma opção pessoal,
de muita responsabilidade e que essa escolha deve contemplar ao mesmo tempo, satisfação
pessoal e profissional. Diante disso, expõem em suas respostas alguns critérios que as
conduziram à escolha da profissão e que atualmente fazem com que elas não queiram
modificar seu trabalho, permanecendo na mesma profissão, conforme apontam os
depoimentos:
Porque estou vendo a cada dia o desenvolvimento das crianças em todos os
sentidos, e isso me deixa muito feliz, porque de uma certa forma estou
contribuindo.
A nossa opção de trabalho, nossas escolhas, são fruto de decisões pessoais e
também uma satisfação pessoal e profissional.
A afirmação das professoras de que pretendem continuar exercendo a profissão
porque sentem-se realizadas com o trabalho é algo que não diferencia, no caso das professoras
dos CCI’s/Unesp desta pesquisa, idade ou tipo de formação, seja esta inicial ou continuada.
Tanto as professoras que possuem mais tempo na Educação Infantil, quanto àquelas que
ingressaram há pouco tempo possuem e declaram que esta é a profissão que realmente
optaram em seguir, e isto só tem a contribuir para o trabalho realizado com as crianças de 0 a
cinco anos de idade, pois se as professoras gostam do que fazem, isto indica que o fazem da
melhor forma possível, buscando qualidade no cuidado e educação das crianças.
Na pesquisa de Ongari; Molina (2003), não é este o quadro que aparece quando as
informações pedidas são a respeito de satisfação pessoal e profissional: as professoras
declaram-se satisfeitas, no entanto existe uma parcela que pretende exercer outras atividades
na área de educação ou mesmo modificar completamente seu tipo de trabalho, o que se reflete
na área educacional. Este quadro pode ser devido ao percurso de formação das educadoras,
que em alguns casos não é voltado especificamente para um embasamento teórico seguro do
128
trabalho com crianças pequenas. No caso das professoras dos CCI’s/Unesp, em sua maioria
possuem formação na área educacional, 30 cursaram Pedagogia e 18 cursaram Pedagogia
Cidadã, o que teoricamente, torna estas profissionais aptas para atuarem como professoras de
Educação Infantil, principalmente à medida em que afirmam ter escolhido a profissão, não
pensam em modificar seu tipo de trabalho e cursam diferentes modalidades de formação
continuada, seja nas unidades ou fora delas. Para Ongari; Molina (2003):
Quem tem um diploma específico para as crianças de 0 a 3 anos opta por
continuar sendo educadora na creche em número maior em relação àquelas
que têm um diploma para ensinar crianças maiores. Estas últimas, além
disso, pensam, em número significativamente maior, em mudar
completamente o tipo de trabalho, mas não em trabalhar noutra área
educativa. Isto poderia, talvez, indicar um maior desgaste profissional de
quem faz este tipo de trabalho partindo de um preparo não específico. (p. 59)
Este preparo específico citado pelas autoras no trabalho com crianças de 0 a cinco
anos representa a continuidade de um trabalho que visa atender às necessidades específicas da
faixa etária com a qual as educadoras italianas atuam e é extremamente necessário não só para
garantir uma formação que fique registrada em um diploma, mas para garantir às crianças um
atendimento de qualidade nas unidades de Educação Infantil. Tal preparo específico é
imprescindível também para as professoras dos CCI’s/Unesp, e espera-se que esteja
ocorrendo através das oportunidades de formação continuada a que elas têm acesso.
- Imagem que as professoras têm do seu próprio trabalho
A satisfação ou não com o trabalho que se exerce é questão fundamental para que a
qualidade educativa se estabeleça e depende das características particulares atribuídas a cada
tipo de trabalho e a imagem que se constrói dele.
Ongari; Molina definem a satisfação como:
(...) a dimensão emotiva que diz respeito à relação entre o conjunto das
experiências que o indivíduo tem quanto ao trabalho e a percepção daquilo
que realmente obtém a partir dele: depende, portanto, das características
específicas que são atribuídas ao tipo de trabalho. (2003, p.61)
Como já foi visto anteriormente, as professoras dos CCI’s/Unesp mostram-se satisfeitas
com o trabalho que realizam e elegem uma série de motivações que as conduzem a esta satisfação.
A questão refere-se mais diretamente ao grau de satisfação das profissionais com relação a
elementos como o contexto físico, as relações existentes, aspectos intrínsecos (estímulos
129
profissionais, o trabalho com crianças pequenas), aspectos extrínsecos (carga horária, salário) e a
imagem da instituição.
- Aspectos gratificantes do trabalho
As questões abertas permitem às professoras expor suas idéias de forma mais livre,
tendo oportunidade de estabelecerem uma espécie de “diálogo” com a questão, afirmando
realmente suas idéias. Ao questionar as professoras sobre sua satisfação profissional, como já foi
dito, elas afirmam que realmente escolheram a profissão e encontram-se satisfeitas com ela,
definindo como motivos para isso, em grande parte das vezes, aspectos particulares, tais como os
que podem ser visualizados na Tabela 17 – Aspectos gratificantes do trabalho como professoras
dos CCI’s/Unesp.
Os aspectos levantados como satisfatórios no trabalho realizado pelas professoras,
explicam o já afirmado “gosto” pelo trabalho, que pode ser melhor visualizado na tabela abaixo:
Tabela 17 – Aspectos gratificantes do trabalho como professoras dos CCI’s/Unesp
Aspectos gratificantes Número
Trabalho com crianças pequenas 26
Aprendizado das crianças 13
Espaço adequado 06
Ambiente agradável 06
Companheirismo entre colegas 06
Satisfação pessoal 04
Apoio da coordenação e equipe 04
Liberdade para planejar 03
Reconhecimento profissional 03
Confiança dos pais 02
Cuidar, ter paciência e carinho com as crianças 01
Crescimento profissional 01
Total 75
(Respostas múltiplas)
130
O trabalho com as crianças é o item citado mais freqüentemente pelas professoras,
que acreditam na importância do seu trabalho e que podem oferecer um serviço de qualidade
às crianças dos CCI’s/Unesp, o que pode ser constatado pelos depoimentos relatados a seguir:
Gosto do que faço, me sinto realizada em atuar na área de Educação Infantil,
além de saber que estou formando personalidades.
Amo meu trabalho com crianças nessa faixa etária.
Sinto-me satisfeita porque gosto de trabalhar com crianças.
O trabalho com crianças, como item mais citado, constitui um fator em que está
presente a profissionalidade da professora de Educação Infantil, pelo fato de que estão
preocupadas em oferecer uma educação de qualidade porque acreditam que trabalhar com
crianças é algo gratificante, buscam atualização, e conseqüentemente, contribuem para a
profissionalização da área em que atuam. Para Popkewitz (1995):
(...) falar de profissionalismo, integridade e responsabilidade sem tomar em
consideração as relações estruturais que configuram o ensino é perder de
vista a forma como a atividade educativa foi determinada historicamente.
(p.40)
Poder acompanhar o aprendizado das crianças é apontado como fator de satisfação
por 13 professoras, que enfatizam em suas declarações que os aspectos que as deixam mais
satisfeitas são:
Reconhecer o desenvolvimento das crianças através do meu trabalho.
É poder ver na criança o meu trabalho sendo desenvolvido, com objetivos
desejados alcançados.
Eu acho que o aspecto principal é o desenvolvimento das crianças durante o
ano.
As professoras elencam o aspecto “cuidar de crianças pequenas” como o mais
satisfatório em seu trabalho, enfatizando e confirmando em parte o que foi constatado por
Ongari; Molina:
Os aspectos do trabalho cotidiano que são mais indicados como satisfatórios
estão relacionados com as crianças pequenas e a estabilidade do trabalho: são
considerados muito satisfatórios por cerca de 50% das educadoras
entrevistadas. (2003, p.64)
Este critério surge para reforçar a idéia de que as professoras dos CCI’s/Unesp ainda
mantém a concepção do cuidado como a mais forte em suas relações com as crianças nas
unidades. O que não pode ser esquecido pelas professoras dos CCI’s/Unesp e não apenas por
elas , mas por todos que atuam na área de Educação Infantil é que:
131
Aqueles que nos cuidam medeiam nossas relações com o mundo. Nas
condições materiais e sociais em que vivem e de acordo com sua cultura,
seus costumes e suas crenças, organizam o ambiente em que vivemos,
possibilitando-nos agir nele e sobre ele. Possibilitam, assim, que as coisas
desse mundo façam sentido para nós e, ao mesmo tempo, apresentam-nos
aos outros, atribuindo-nos, ao interagir conosco, certas posições e sentidos.
Essa realidade humana está bem expressa no ditado xhosa, língua materna de
Nelson Mandela: pessoas são pessoas através de outras pessoas.
Tal ditado contrapõe-se fortemente à dissociação entre cuidar e educar, tão
freqüente em nossas escolas, pré-escolas e creches.
Esquecemos que, ao cuidar ou descuidar do outro, estamos colocando-o em
certa posição, dando-lhe certos sentidos, os quais contribuem para constitui-
lo como pessoa. (ROSSETTI-FERREIRA, p.10, 2003)
A associação necessária entre cuidado e educação para a formação das crianças de 0
a cinco anos como pessoas, com sentidos e relações propiciados através das interações com as
outras pessoas, em nosso caso, com as professoras dos CCI’s/Unesp, vão além das situações
vivenciadas no interior das unidades de Educação Infantil. Assim, Cerisara (1996) considera
que existe um contato mais amplo entre a criança e a professora de Educação Infantil:
Estas funções que ultrapassam as situações de ensino das escolas são muito
próximas dos eixos do trabalho na creche que são cuidar e educar as
crianças, o que significa desenvolver tarefas como alimentar, dar banho,
trocar de fraldas, manter contatos corporais constantes com as crianças e
estabelecer forma de comunicação cuja predominância reside em
manifestações emocionais-corporais. (p. 103)
Tais tarefas aproximam-se mais das práticas domésticas que não exigem
profissionalismo do que do trabalho exclusivamente escolar, o que conduz à reconhecida
constatação de que as tarefas realizadas pelas professoras da Educação Infantil acabam por
tomar o significado de não profissionais e informais, que não exigem qualquer qualificação
para serem realizadas:
Principalmente as professoras, que passaram por uma formação específica
para poder assumir uma vida profissional no universo público, têm suas
expectativas de competência profissional tanto mais abaladas quanto mais
constatam que desenvolvem um trabalho que se opõe ao que se
convencionou chamar de profissional: há uma domesticidade nas relações
com fortes traços de emotividade, as práticas junto às crianças parecem não
guardar traços de racionalidade e objetividade, a não ser quando elaboram o
planejamento ou participam de reuniões de estudo. (CERISARA, 1996, p.
104)
Ressalta-se que tais traços de emotividade ocasionados pela prática das professoras
de Educação Infantil fazem-se necessários quando o assunto é educação e cuidado de crianças
pequenas, e devem sim, estar presentes nas relações entre professora e crianças, mesmo com
132
sua falta de objetividade e racionalidade: a criança necessita de atenção e afeto para constituir
sua identidade pessoal – cuidado e educação fazem parte dessa construção.
- Competências das professoras
- Principais fontes para aprender a exercer o trabalho
Qual a imagem que as professoras tem de uma “boa professora”? Como se pode
aprender a ser uma boa professora?
Ongari; Molina (2005) afirmam que ainda não existem parâmetros que determinem
um único tipo de formação para uma professora de Educação Infantil, esta formação ocorre
por meio de currículos diferenciados, que não estabelecem critérios homogêneos para que a
formação se estabeleça. No entanto, existem quesitos essenciais necessários para uma “boa
professora” de Educação Infantil, que devem estar presentes em sua prática e no
desenvolvimento do seu trabalho enquanto professoras.
Uma professora de Educação Infantil, qualificada em relação à responsabilidade do
trabalho que realiza deve administrar algumas atitudes que contemplem o desenvolvimento
infantil, tais como:
Na qualificação dos profissionais:
evidenciada por atitudes que considerem os direitos fundamentais da
criança;
evidenciada pela capacidade de contato lúdico e significativo para as
crianças;
evidenciada pelo envolvimento com a criança em sua totalidade e com
seus familiares;
evidenciada pela permanente atualização do conhecimento sobre a criança
e demais áreas que envolvem a sua compreensão em uma perspectiva
crítica;
evidenciada pela prevalência de atitudes coletivas, solidárias e éticas;
evidenciada pela autonomia, capacidade de tomada de decisões, empenho
em ações colaborativas e acatamento de decisões coletivas. (Política para
os Centros de Convivência Infantil da Unesp, 2005, p.15)
De acordo com os Referenciais para Formação de Professores Polivalentes (1998),
diante dos aspectos que definem uma professora de Educação Infantil, existe a necessidade de
se estabelecerem critérios que definam a experiência possibilitada no concreto do trabalho e
através de possibilidades de formação continuada, definidas como elementos indispensáveis
133
na aquisição de competências profissionais, onde se considera essencial o “saber-fazer”, em
que se priorizam situações onde a professora atua de acordo com os conhecimentos que
adquire e tem contato nas unidades em que atua:
A formação continuada deve propiciar atualizações, aprofundamento das
temáticas educacionais e apoiar-se em uma reflexão sobre a prática
educativa, promovendo um processo constante de auto-avaliação que oriente
a construção contínua de competências profissionais. (p.20)
O âmbito da própria experiência feminina, em que se julga que nada mais precisa ser
feito, pois por ser mulher, a professora possui todos os requisitos necessários para ser uma boa
professora, também está presente nas discussões a respeito das características necessárias para
que uma mulher seja uma boa professora, como ressaltam Ongari; Molina:
Além disso, o aspecto da própria experiência feminina, principalmente em
relação à maternidade, também reaparece como elemento crucial, nem
sempre reconhecido no percurso de construção da profissão. Por um lado,
porque nos comparamos, ou pelo menos nos comparamos no passado, com
um modelo de educadora que considera os ‘dotes femininos’como único
requisito exigido para desenvolver este trabalho. Por outro lado, porque a
diferenciação entre o tipo de cuidados oferecidos, respectivamente, pelas
educadoras e pelas mães não é tão fácil e óbvia assim. E ainda, a ‘dupla
experiência’, ligada à ‘dupla presença’ pode ser uma fonte profissional rica e
qualitativamente importante, se adequadamente reconhecida. (2003, p.92)
Assim, as professoras dos CCI’s/Unesp levantam os critérios que para elas, definem
uma boa professora, compromissada com o trabalho e com a educação de qualidade para as
crianças de 0 a cinco anos que freqüentam as unidades, discutidos a seguir.
– Principais fontes de aprendizagem das professoras dos CCI’/Unesp
As respostas dadas à questão sobre quais são as principais fontes de aprendizagem
das professoras dos CCI’s/Unesp levantam como aspectos mais importantes: formação inicial
(40), seguida pela experiência e prática profissional (30) e pelos cursos de atualização com
técnicos e outros especialistas (21), como três primeiras escolhas das professoras, mais
representativas no que diz respeito ao aprendizado das mesmas. Para Nóvoa (1992):
A formação de professores pode desempenhar um papel importante na
configuração de uma nova profissionalidade docente, estimulando a
emergência de uma cultura profissional e de uma cultura organizacional no
seio das escolas.
134
A formação de professores tem ignorado, sistematicamente, o
desenvolvimento pessoal, confundindo formar e formar-se, não
compreendendo que a lógica da atividade educativa nem sempre coincide
com as dinâmicas próprias da formação. Mas também não tem valorizado
uma articulação entre a formação e os projetos das escolas, consideradas
como organizações dotadas de margens de autonomia e de decisão de dia
para dia mais importantes. Estes dois esquecimentos inviabilizam que a
formação tenha como eixo de referência o desenvolvimento profissional dos
professores, na dupla perspectiva do professor individual e do coletivo
docente. (p.24)
Assim como afirma Nóvoa (1992), acredito que a formação desempenha papel
essencial na definição da profissionalidade docente, ao mesmo tempo, esta formação deve
vincular-se ao coletivo docente e não ao professor como ser único, pois se este convive com
um grupo e precisa do apoio deste grupo para estabelecer critérios de um trabalho com
qualidade, é necessário que a formação profissional contemple este item.
A tabela a seguir mostra os resultados levantados pelas professoras como fontes
mais importantes para sua aprendizagem enquanto professoras de Educação Infantil:
Tabela 18 - Principais fontes de aprendizagem das professoras dos CCI’s/Unesp
Fontes Número
Formação inicial 40
Experiência e prática profissional 30
Cursos de atualização 21
Troca de idéias com colegas 19
Aprovação da coordenação 10
Livros e revistas 09
Observação da atuação dos colegas 09
Observação do comportamento dos pais 09
Experiência pessoal e familiar 08
Total 155
(Respostas múltiplas)
Diante da intensidade da resposta que elege a formação inicial como a primeira fonte
de aprendizagem das professoras dos CCI’s/Unesp, acredito que é importante nesse momento,
caracterizar formação. Kramer (2003) assim a define:
Defendo aqui a formação como direito à educação; direito de crianças,
jovens a adultos, também dos professores. (...) Formação entendida como
135
qualificação para o trabalho e como profissionalização, com avanços na
carreira e progressão na escolaridade. Formação que implica constituição de
identidade, para que professores possam narrar suas experiências e refletir
sobre práticas e trajetórias, compreender a própria história, redimensionar o
passado e o presente, ampliar seu saber e seu saber fazer. (p.99)
Vista dessa forma, a formação inicial é o primeiro elemento representativo para
aquisição de aprendizagem das professoras, mostrando a importância que atribuem à
formação e a uma base teórica consistente, reconhecendo que não é somente a experiência
cotidiana que contribui para desenvolver um trabalho adequado nas instituições de Educação
Infantil. Fica claro que para as professoras, a teoria caminha ao lado da prática,
principalmente quando elegem o segundo lugar em nível de importância: a experiência e a
prática profissional. Mesmo ao afirmarem que atribuem importância maior à formação inicial,
algumas respostas revelam que as professoras acreditam ainda que a prática é mais
importante, como pode ser observado no seguinte depoimento:
Pois tudo é necessário que ocorra em seqüência: a formação inicial é de
extrema importância, pois permite que tenhamos uma visão inicial; já a
prática é tudo, é ela que vai permitir-nos melhorar cada vez mais. Cursos
com especialistas abrem a mente ampliando os horizontes do conhecimento.
Também a família é a estrutura para um ser humano centrado. E claro se não
tivermos tudo isso, provavelmente a coordenadora não aprovará.
Para Nóvoa (1992):
A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou
de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as
práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso
é tão importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência.
(p.25)
Aspectos que revelam a feminilidade da profissão, que afirmam não ser necessária
uma formação específica para que uma mulher possa atuar com a Educação Infantil, por ser
uma profissão extremamente relacionada ao âmbito doméstico, “cuidado” de crianças e sem
necessidade de estabelecer bases específicas, ou seja, que pode ser feita por qualquer pessoa,
acabam ruindo em detrimento de uma visão diferenciada por parte das professoras, que
priorizam sim, a formação de base para exercerem seu trabalho com qualidade.
Ao ser questionada sobre o porque de sua opinião, uma professora declara:
A base teórica é fundamental, pois precisamos conhecer o nosso objeto de
“trabalho” para podermos atuar de acordo com as necessidades da faixa
etária. A prática então, torna-se aliada da teoria onde estaremos fazendo
relações e adaptações entre elas.
136
Boa parte das professoras acredita que a prática profissional aliada em primeiro
lugar aos cursos de atualização com técnicos ou especialistas podem auxiliar melhor no
cotidiano de seu trabalho do que a formação de base, formação inicial e afirmam que:
A experiência e a prática profissional trazem conhecimentos e soluções para
alguns problemas do cotidiano que ás vezes não encontramos nos livros,
reforçada pela troca de idéias com colegas, pais, coordenação e também
atualização de práticas eficientes.
A referência à atualização aparece bastante destacada nos depoimentos das
professoras, como algo que faz parte da consolidação de um bom trabalho, no entanto, o
aspecto do coletivo, do relacionar-se bem com as colegas de trabalho, da divisão de
responsabilidades, que deveria ser lembrado por constituir parte importante do campo de
atualização dentro das unidades, já que em sua maioria tem acesso à formação continuada em
suas unidades, parece ter menor significado para as professoras. Para Nóvoa (1992)
Práticas de formação que tomem como referência as dimensões coletivas
contribuem para a emancipação profissional e para a consolidação de uma
profissão que é autônoma na produção dos seus saberes e dos seus valores.
(p.27)
A importância da troca e da interação com as colegas de trabalho é muito bem
representada pelo depoimento da professora:
Creio que a interação com as demais colegas de trabalho possibilita uma
troca de idéias e informações altamente positivas, sendo capaz de gerar
novas hipóteses e sanar dúvidas. Também baseio-me naquilo que aprendi em
minha formação como educadora, mas sempre buscando nos referenciais
teóricos que leio, novos caminhos e possibilidades para uma práxis mais
eficaz.
Machado (1998) destaca que a iniciativa de participar de possibilidades de formação
continuada pode (e deve!) partir das próprias professoras, através do estabelecimento de
trocas de experiências com as outras colegas, da leitura de jornais ou revistas, cursando
programas de atualização ou participando de encontros da categoria:
Embora agindo muitas vezes por sua conta própria, os profissionais que
atuam diretamente com a criança pequena lidam com expectativas que se
entrecruzam nos contextos de atuação profissional, provenientes de
diferentes origens. (p.68)
A aprovação da coordenadora representa uma pequena parte das opiniões das
professoras ao lado da observação do comportamento dos pais, ambos são enfatizados de
137
forma especial na resposta da professora, que destaca: “Pois as mesmas fazem parte do meu
campo profissional, onde devemos estar sempre atualizados dentro da nossa área, buscando
sempre o parecer da coordenadora e ter um bom vínculo com os pais”.
A importância essencial do percurso percorrido para que se tenham boas professoras
deve-se, portanto, pela visão das professoras dos Centros de Convivência Infantil da Unesp, à
formação inicial, seguida pela experiência e prática profissional e cursos de atualização,
revelando que para essas profissionais a formação, seja em qualquer nível (inicial ou
continuada) tem atribuída sua devida importância ao lado das possibilidades de exercer sua
prática profissional.
A respeito disso, Silva (2001) ressalta que:
Estudos sobre a prática docente têm considerado a natureza da prática
desenvolvida por professores ao lado dos elementos referentes à formação e
qualificação para a atividade. Ainda que tais estudos não focalizem o
profissional de educação infantil, especialmente o da creche, a reflexão sobre
a formação e a prática docentes em geral nos dará condições de superar as
desigualdades que marcam a creche de maneira geral e, em especial, as suas
profissionais. (p.22)
Muitas professoras ressaltaram que todos os elementos (formação inicial,
experiência, prática profissional e atualização) são de extrema importância para que se efetue
um trabalho de qualidade, assim, acredito que o seguinte depoimento especifica claramente a
opinião de grande parte das professoras “Porque cada elemento contribui para a construção de
novos conceitos para que eu possa modificar ou não minha atuação e/ou conduta”.
As professoras dos CCI’s atribuem valor à teoria, e acreditam ser possível embasar
teoricamente a prática desenvolvida, isso ocorre devido à relação existente entre o surgimento
de uma figura profissional com uma formação de base teórica precisa, amparada pela
aprendizagem que ocorre no contexto em que atuam, ou seja, as unidades de Educação
Infantil. Machado (1998) enfatiza que:
Os profissionais também almejam que as instituições de educação infantil
ofereçam condições de trabalho e salários que lhes permitam exercer a
profissão com eficiência: que ao pais confiem em suas iniciativas junto às
crianças, valorizem seu trabalho e os apóiem nas reivindicações por
melhores condições de trabalho e remuneração. (p.68)
138
- Em que se baseia o trabalho da professora
A questão voltada para definir os critérios em que se baseia o trabalho das
professoras revelou que 42% das professoras acreditam que o trabalho deve ser baseado em
escolhas pessoais baseadas nas exigências atuais das crianças; enquanto 36% afirmam que
deve basear-se na programação realizada com quem desenvolve as funções de coordenação
pedagógica ou administrativa. A importância atribuída aos critérios pedagógicos precisos é
menor, ocupando a terceira posição, com 22% das indicações:
Gráfico 3 – Critérios em que se baseia o trabalho de professora de Educação Infantil
Escolhas pessoais
Programação com
responsáveis
Critérios pedagógicos
As escolhas pessoais baseadas nas necessidades das crianças ocupam a primeira
posição, como aspecto principal da profissão aproximadamente metade das entrevistadas
(42%). Este fator exerce a incumbência nas professoras de saber escolher a maneira com que
se relacionam com as crianças, pois se atribuem importância ao fato de levarem em
consideração as necessidades das crianças, é essencial que saibam distinguir diferenças entre
momentos e como devem agir, e revela ao mesmo tempo a preocupação das professoras em
atender às exigências infantis, característica que precisa ser levada em conta quando o
trabalho é realizado com crianças de 0 a cinco anos de idade:
Ao considerarmos que vivemos em contextos culturais e históricos em
permanente transformação, podemos incluir aí também a idéia de que as
crianças participam igualmente desta transformação e, neste processo
acabam também transformadas pelas experiências que vivem neste mundo
extremamente dinâmico. Portanto, penso que é de extrema importância nos
darmos conta de que as mudanças que ocorrem com as crianças, ao longo da
infância, são muito importantes e que algumas delas jamais se repetirão. Em
razão disso, considero da maior relevância defender o direito das crianças à
sua infância, o que tem sido negado a muitas delas.
Continuo pensando que a criança nos desafia porque ela tem uma lógica que
é toda sua, porque ela encontra maneiras peculiares e originais de se
expressar, porque ela é capaz através do brinquedo, do sonho e da fantasia de
viver num mundo que é apenas seu. Outro desafio que as crianças nos fazem
enfrentar é o de perceber o quanto são diferentes e que esta diferença não
139
deve ser desprezada nem levar-nos a tratá-las como desiguais. (BUJES, p.21,
2001)
Responderam 36% das professoras, que o trabalho baseia-se na programação
realizada com quem desenvolve as funções de coordenação pedagógica, tida como uma
espécie de colaboração da parte da supervisão para com o trabalho das professoras.
Algumas supervisoras das unidades têm encontros semanais com as professoras de
cada grupamento e passando orientações, esclarecimentos, tirando dúvidas e também ouvindo
as profissionais em relação às angustias vividas em seu cotidiano de trabalho. Enfatiza-se que
as supervisoras têm um papel importante na atuação das professoras de Educação Infantil,
principalmente no que se refere ao encorajamento no quesito formação e atualização,
contribuindo para o crescimento profissional das professoras e na constituição da sua
profissionalidade:
Por sua vez, para que atuação desses profissionais resulte em melhoria da
qualidade do atendimento, sublinha-se a imperiosa responsabilidade dos
gestores das instituições de educação infantil no sentido de prever condições
de espaço e infra-estrutura que possibilitem condições básicas para a
concretização do trabalho desses profissionais. (MACHADO, 1998, p.95)
Cerca de 22% das professoras acreditam que critérios pedagógicos precisos sejam a
base do trabalho como professoras de Educação Infantil. Ressalta-se que nenhuma professora
acredita que a harmonia organizacional com as demais colegas de trabalho possa contribuir
como base para o trabalho desenvolvido diariamente nas unidades, mesmo trabalhando com
outras professoras, em um mesmo grupamento e tendo oportunidade de estar ao lado das
colegas, assim, percebe-se que as professoras não atribuem qualquer importância ao papel que
se estabelece nas relações e trocas dentro de uma mesma instituição, atuando com as mesmas
crianças, consolidando a falta de importância atribuída ao aspecto do coletivo. Freire (1999)
enfatiza que:
Todo processo de aprender acontece em grupo. A pessoa humana – esta é
uma redundância, mas vivemos em um mundo tão acelerado, tão descartável,
que o humano está sendo cada vez mais globalizado, massificado, invadido,
passado por cima, engolido e a vida, cada vez mais banalizada. Então, gosto
de dar ênfase à “pessoa humana”, que é marcada pela incompletude. Ela vive
da falta, ela vive de desejo, por isso tem desejo e depende do grupo. Ela
sempre vive em grupo, já nasceu em grupo, e por isso é humana (...)
Essa pessoa humana, por ser marcada pela incompletude, também tem uma
dependência em relação ao outro, porque ela é finita, incompleta, nunca tem
tudo, sente falta, está em busca. (...)
Somos geneticamente amorosos, geneticamente sociais, dependemos do
grupo, só crescemos, só mudamos em grupo. Ninguém é uma ilha, ninguém
vive sozinho. Como a matéria-prima do educador não é o conhecimento, é a
pessoa humana que conhece, todos nós aprendemos e construímos
conhecimento em grupo. (p.22)
140
Acredito, assim como Freire (1999) que o conhecimento ocorre através das trocas,
da interação que só é possível através da habilidade de se constituir um grupo, assim, se as
professoras dos CCI’s/Unesp reconhecessem a importância de um trabalho em harmonia com
todo o grupo, teriam maiores possibilidades de aprendizagem e de aperfeiçoamento da sua
atuação enquanto profissionais, além de poderem contar e disponibilizar apoio entre elas,
quando surgem dificuldades e conflitos.
- Competências de uma boa professora de Educação Infantil
A imagem de uma boa professora de Educação Infantil presente na concepção das
próprias professoras exige determinadas características peculiares presentes na concepção que
elas têm do que uma boa professora de Educação Infantil deve saber fazer.
A pergunta presente no questionário, a esse respeito, coloca algumas características
que deveriam ser classificadas pelas professoras, em ordem de importância, daquelas que se
fazem necessárias para que uma profissional constitua sua imagem ideal de professora.
Tabela 19 – Competências de uma boa professora de Educação Infantil, segundo as
professoras dos CCI’s/Unesp
Competências Número
Propor às crianças experiências ricas e diversificadas 44
Uma boa programação didática 17
Enfrentar os momentos problemáticos do crescimento infantil 14
Estar sempre disponível 14
Criar na creche um clima familiar 12
Criar relacionamentos bem pessoais com as crianças 11
Promover a socialização em grupo das crianças 11
Ter relacionamentos afetivos intensos com as crianças 11
Responder às exigências dos pais 04
Trocar idéias com as colegas 03
Explicar aos pais os motivos das escolhas educativas 02
Controlar as próprias reações 02
Fazer com que obedeçam 01
141
O primeiro item levantado pelas professoras: propor às crianças experiências ricas e
diversificadas promove a importância atribuída a um trabalho diversificado, que garanta a
aprendizagem e a interação entre as crianças e entre estas e a professora. A professora de
Educação Infantil deve ter um perfil que englobe alguns critérios para que seja possível
garantir que as crianças tenham acesso real às experiências ricas e diversificadas, que lhes
proporcionem aquisição de conhecimentos novos e a garantia de experiências ricas e
diversificadas, tais como:
Refletir sobre a prática cotidiana;
Investigar o fazer específico;
Ser co-construtor do conhecimento das crianças e do seu próprio
conhecimento;
Criar ambientes e situações desafiadoras;
Questionar a própria concepção de criança, de aprendizagem infantil e de
atividades que são próprias da criança;
Apoiar a aprendizagem da criança e aprender com ela;
Sustentar as relações com a criança;
Lidar com a cultura da criança. (SANTOS, 2004, p.84)
Como segundo critério mais importante levantado pelas professoras, aparece uma
boa programação didática, no caso das professoras dos CCI’s/Unesp, realizada em conjunto
com a supervisão das unidades, o que favorece as relações entre coordenação e professoras,
tanto em âmbito profissional, quanto em âmbito relacional dentro das unidades.
Enfrentar os momentos problemáticos do desenvolvimento infantil e estar sempre
disponível correspondem à mesma importância para as professoras participantes desta
pesquisa, integrando aspectos bastante diferenciados, sendo que o primeiro (enfrentar os
momentos problemáticos do crescimento infantil) refere-se mais especificamente como
resposta às necessidades de caráter afetivo das crianças, enquanto o segundo (estar sempre
disponível) parte do princípio de que por ser mulher, a professora deve, em seu papel, estar
sempre disponível para executar suas atividades, remetendo ao caráter doméstico, onde falta
profissionalidade e objetividade. Cerisara (2002) utiliza-se de quatro critérios elencados por
Edith Pizza, que envolvem a vida doméstica e pública das professoras, com fatores
relacionados ao que se coloca como influência do trabalho doméstico, que naturalmente
fazem parte da concepção feminina:
1º) ausência de uma divisão nítida entre público e privado nas atividades
domésticas;
2º) sua repetição diária e automática: este fator (rotina) tem assumido duas
conotações distintas, pois, ao mesmo tempo em que é visto como um dos
elementos depreciativos desse trabalho, é a repetição rotineira que assegura
142
autonomia na realização das tarefas, pois “fazer à sua maneira” compensa o
“fazer sempre a mesma coisa”;
3º) o fato de estar naturalmente vinculado à mulher: portanto, ela não
necessita ter preparo prévio para se tornar dona-de-casa, uma vez que é um
saber natural, estando incluído nesse saber o cuidar de crianças;
4º) o fato de ser um trabalho que pode ser desempenhado profissionalmente,
quando necessário, principalmente para mulheres pobres, sem que se
precisem de qualquer outra qualificação. (CERISARA (1996) apud EDITH
PIZZA (1992), p.39)
Alguns destes critérios utilizados por Cerisara (1996) dão ênfase também ao que
vem sendo analisado nesta pesquisa, principalmente no tocante ao fator de que constitui um
saber natural da mulher cuidar/educar crianças pequenas e no que se refere à falta de
qualificação, como se ser professora de Educação Infantil fosse um “trabalho qualquer”, que
pode ser realizado profissionalmente ou não, mesmo porque é feito por mulheres, e em geral,
elas se utilizam deste tipo de trabalho como uma possibilidade de ascensão social “É possível
que para elas, mesmo com baixos salários, trabalhar fora de casa pode ter o significado de
ocupar um status social diferenciado”. (MACHADO, 1998, p.76)
Este critério que determina que para as mulheres, mesmo que o trabalho não
possibilite a aquisição de um bom salário, por estar intrinsecamente relacionado ao feminino
da profissão e às características de não ser um trabalho profissional, ainda assim constitui uma
oportunidade de ascensão social para as mulheres, pelo fato de ocuparem uma posição diante
da sociedade que para elas representa uma conquista diante de uma sociedade extremamente
masculina e que condena as práticas femininas ao âmbito doméstico (somente).
De menor importância, na visão das professoras, são critérios como: saber criar na
creche um clima familiar, ser capaz de ter relacionamentos bem pessoais com as crianças e ter
relacionamentos afetivos intensos com as crianças, face ao conteúdo afetivo presente nas
relações entre crianças e adultos. Tais critérios (saber criar na creche um clima familiar, ser
capaz de ter relacionamentos bem pessoais com as crianças e ter relacionamentos afetivos
intensos com as mesmas) são vistos ainda como mais importantes do que o controle e a
disciplina do grupo de crianças.
Dois itens chamam atenção por não terem atribuída sua importância: a troca de
idéias com colegas e a explicação aos pais dos motivos das escolhas educativas. A falta de
importância da troca de idéias com colegas, para as professoras dos CCI’s/Unesp, que são
parte integrante e importante na constituição do grupo (coletivo), explica-se pelo fato das
professoras não atribuírem importância ao quesito do coletivo.
O outro item citado ao qual não é atribuída importância, consiste em explicar aos
pais os motivos das escolhas educativas, momento importante da relação interna das unidades,
143
que parece não acontecer dentro da realidade dos CCI’s/Unesp, ou pelo fato dos pais não
demonstrarem interesse em conhecer as propostas da instituição freqüentada por seu filho ou
porque ainda não se estabeleceu uma relação de reconhecimento por parte dos pais das
crianças de que as profissionais que atuam com seus filhos são professoras de Educação
Infantil e não simplesmente babás, como costumam ser vistas.
Nesse ponto, novamente está presente o quesito profissionalidade:
Apesar do profissionalismo e de uma melhor qualidade nas escolas serem
idéias que mobilizam as nossas mais profundas crenças e esperanças, é
preciso reconhecer que as palavras em si não têm qualquer significado
intrínseco, só têm sentido em relação a outras palavras, a padrões sociais e a
cenários institucionais. (POPKEWITZ, 1995, p.48)
Essa falta de importância atribuída à comunicação com os pais não se explica porque
existe a necessidade de que haja interação entre pais e professoras, com o objetivo maior de
qualificar o trabalho nas instituições de Educação Infantil, reconhecendo a criança como
centro de todo do processo que ocorre nas unidades.
Claramente, para nossas professoras, critérios específicos demarcam a profissão que
exercem, além de estabelecer quais as competências esperadas por elas mesmas para que
sejam, segundo seus próprios critérios, boas professoras da Educação Infantil.
3ª Categoria: Relação com os pais
- Os Pais
As questões referentes aos pais e aos relacionamentos existentes entre pais, crianças
e professoras têm papel fundamental nesta pesquisa, já que contribuem para que se tenha uma
idéia do que esta relação representa para as professoras que atuam junto às unidades –
CCI’s/Unesp.
Foram levantadas nove questões, visando investigar os motivos da escolha da
unidade pelos pais na visão das professoras, competências das professoras e o interesse pelas
propostas dos CCI’s/Unesp.
A primeira questão refere-se aos motivos pelos quais os pais escolheram os
CCI’s/Unesp, na visão as professoras, que originaram a seguinte tabela:
144
Tabela 20 – Motivos pelos quais os pais optam pelos CCI’s/Unesp
Motivos Número
Poder deixar o filho em um ambiente seguro 51
Comodidade de horário 35
Reconhecer a necessidade de socialização das crianças 27
Possibilidade de que seja oferecido aos pais um espaço de
discussão para problemas educativos
11
Não ter outra solução 08
Preferência em relação a deixar com as avós 07
A convicção de que a criança se desenvolve mais
precocemente
04
(Respostas múltiplas)
Em geral, as professoras acreditam que os pais optam pelos CCI’s/Unesp porque
acreditam que estão deixando os filhos em um local seguro, que garanta que estarão sendo
bem cuidados no decorrer do dia em que ficam nas unidades, o que pode indicar a
denominada “falta de reconhecimento” de que tanto as professoras queixam-se no decorrer
dos seus depoimentos: parece que elas atribuem este indicativo de “ambiente seguro”, como
se a unidade fosse um local em que as mães deixassem seus filhos para serem cuidados,
apenas (e não também educados!), como está presente no depoimento da professora quando se
refere ao que mais a incomoda em seu trabalho diário “É a falta de reconhecimento dos pais,
que vêem a gente como babás, como tudo... menos como professoras”.
Assim como Cerisara (2002), acredito que isso se deve ao seguinte fato
historicamente influenciado:
Não há como manter uma atitude de impessoalidade e distanciamento nem
com as crianças, nem com as famílias, nem com as colegas de trabalho. A
presença maciça de mulheres, o predomínio de formas femininas de
relacionamento entre elas, a organização do espaço físico (que lembra o de
suas casas), as práticas desenvolvidas, utilizando objetos vinculados ao
universo doméstico, tais como camas, colchões, banheiras, fraldas, chupetas,
mamadeiras, ajudam a confirmar a presença de um universo onde estão
presentes práticas femininas domésticas e ausentes as práticas femininas
profissionais. (p.64)
A relação com os pais é influenciada pela imagem que eles desenvolveram ao longo
do tempo a respeito das instituições de Educação Infantil, de sua identidade enquanto
instituição somente de cuidados, o que acarreta na representação de que as professoras que lá
145
atuam não educam, e sim (ou apenas), cuidam. Daí surge toda a discussão referente à
desvalorização das professoras por parte dos pais e da sociedade em geral, que não leva em
consideração os saberes específicos que as professoras necessitam desenvolver para atuar
adequadamente com as crianças de 0 a cinco anos, que têm que levar em conta, além das
crianças, os pais. Cerisara (1996) ressalta que:
Ao considerarmos que a educação infantil envolve, simultaneamente cuidar e
educar, vamos perceber que esta forma de concebê-la vai ter conseqüências
profundas na organização das experiências que ocorrem nas creches e pré-
escolas, dando a elas características
que vão marcar sua identidade como
instituições que são diferentes da família, mas também da escola (aquela
voltada para as crianças maiores de sete anos). Enquanto se mantiver a
confusão de papéis que vê na família ou na escola os modelos a serem
seguidos , quem perde é a criança. (p.17)
É este o reconhecimento necessário por parte dos pais: que as instituições de
Educação Infantil, e em conseqüência as professoras que estão inseridas nelas, possuem
identidade própria justamente por constituírem instituições de Educação Infantil, dotadas de
peculiaridades.
A comodidade de horário também constitui um item relevante: 35 professoras
opinaram dizendo que a principal razão pela qual os pais deixam os filhos nas unidades é a
comodidade de horário, citada por tantas professoras como algo que incomoda,
principalmente quando as mesmas necessitam permanecer na unidade além do horário de
trabalho, para atender somente uma criança, conforme representado no depoimento a seguir:
“Ter que ficar na unidade para atender apenas uma criança é ruim, porque a gente fica lá, e
não tem mais nada para fazer com ela e o tempo não passa. É desgastante”.
Em números pouco menos relevantes, inclui-se o reconhecimento da necessidade de
socialização das crianças, o que se encontra presente nas atividades cotidianas das unidades
pelo fato das crianças estarem em contato direto entre elas mesmas e com as professoras, fator
importante para seu desenvolvimento pessoal e social: conviver com outras pessoas facilita
aceitar diferenças, estabelecer laços de amizade, afeto, carinho. Sarmento (2005) tece algumas
considerações a respeito das diferenças que as crianças enfrentam e que possivelmente devem
estar sendo trabalhadas para garantir que compreendam e aceitem as relações com o mundo
em que vivem:
Importa considerar que se a infância, considerada globalmente, é afetada
pelas mudanças sociais, as crianças, como seres concretos, são elas próprias,
entre si, diferentemente afetadas em função de pertencer às classes
populares, às classes médias ou à classe dominante, ou ao fato de ser menino
ou menina, de viver nos países ricos em desenvolvimento, de ser branca,
146
negra, amarela, etc, de pertencer a um universo cultural de dominância
religiosa cristã, muçulmana, hindu ou budista, etc. (p.14)
É relevante afirmar que as crianças participam das mudanças sociais que se
estabelecem e assim, reconhecer que a socialização constitui fator de importância para a vida
pessoal das crianças, é essencial.
Para que o trabalho de educação e cuidado se desenvolva nas instituições de
Educação Infantil, são necessárias competências específicas das professoras, que atuam junto
a uma faixa etária que possui características bem peculiares. Na questão referente a este tema,
as professoras acreditam que os pais esperam que acumulem certas competências, elencadas
da seguinte forma:
Gráfico 4 – Competências específicas de uma professora de Educação Infantil
As cinco principais competências que as professoras afirmam que os pais esperam
delas são, em ordem decrescente: conhecer o desenvolvimento das crianças de 0 a cinco anos
de idade (41%); ter uma enorme paciência (35%); enfrentar os momentos problemáticos do
desenvolvimento infantil (14%); ter um bom caráter (6%) e saber programar atividades
didáticas específicas (4%).
Quase metade das professoras acredita que os pais realmente importam-se com o
fator referente ao conhecimento das professoras sobre o processo de desenvolvimento das
crianças em idade de creche e pré-escola, certamente porque percebem indícios disso quando
são questionadas por alguns pais sobre as crianças e seu desenvolvimento diante das
atividades propostas diariamente nas unidades. Nóvoa (1995) enfatiza que:
A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou
de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as
práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso
Conhecer o
desenvolvimento
Paciência
Enfrentar momentos
Bom caráter
Programação
147
é tão importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da
experiência.(p.25)
O item paciência faz parte das atribuições das professoras, certamente por seu
trabalho exigir atenção contínua e responsabilidade, e os pais parecem reconhecer que não
constitui tarefa fácil educar e cuidar de crianças da faixa etária de 0 a cinco anos, em que
ainda são muito dependentes dos adultos para realizarem uma série de tarefas cotidianas.
Uma das exigências que os pais deixam transparecer para as professoras, levantada
como relativamente importante é saber enfrentar os momentos problemáticos do
desenvolvimento infantil, em que estão presentes os mais diferentes sentimentos, que devem
ser compreendidos, respeitados, aceitos e explicados para as crianças.
A respeito das competências específicas de uma professora de Educação Infantil,
Machado (1998) ressalta alguns dos aspectos que merecem atenção para que o perfil
profissional das professoras se constitua e fortaleça:
Preconceitos e estereótipos: raça, religião, gênero, pobreza;
Implicações do trabalho em equipe;
Implicações do trabalho junto às famílias;
Ética profissional;
Utilização de instrumentos: porque, como, quando e o que observar, registrar,
planejar, acompanhar, avaliar o trabalho realizado;
Auto-avaliação: reconhecimento de deficiências na formação prévia;
Auto-avaliação: reconhecimento de limitações pessoais, identificação de
expectativas, sonhos e preferências no trabalho com crianças pequenas;
Possibilidades de acesso à formação, permanência e progressão;
Possibilidades de acesso, permanência e progressão na carreira;
Saúde e energia física do profissional;
Formas de organização e participação enquanto categoria profissional;
Formas de participação e lazer na comunidade local, cidade, estado, país:
atualidades culturais, científicas, econômicas e políticas. (p. 179-180)
Acredito que estes aspectos devem ser reconhecidos pelas professoras de Educação
Infantil como constituintes da sua profissão e da sua profissionalidade enquanto professoras,
pelo fato de fazerem parte do papel que exercem perante as crianças, os pais e a sociedade em
geral. Estes critérios estão relacionados às competências necessárias para ser uma boa
professora de Educação Infantil elencadas pelas professoras dos CCI’s/Unesp à medida que
abordam amplamente todas as questões presentes na aquisição do perfil profissional das
professoras: aspectos referentes ao trabalho coletivo, ao acesso à formação, à comunicação
com a família até a avaliação do próprio trabalho enquanto professoras.
Segundo as professoras, as propostas oferecidas pelos CCI’s/Unesp interessa aos
pais, em sua maioria, suficientemente (48%):
148
Gráfico 5 – Interesse dos pais em relação à proposta dos CCI’s/Unesp
Suficientemente
Muitíssimo
Muito
Pouco
Enquanto a maioria das professoras (48%) acredita que as propostas dos
CCI’s/Unesp interessa suficientemente aos pais, para 27% delas as propostas interessam
muito aos pais; para 13%, interessam pouco e para 12% interessam muitíssimo. Em sua
maioria, as professoras acreditam que as propostas das unidades em que atuam interessam,
sim, aos pais das crianças, o que contribui para que consigam realizar um trabalho conjunto
com as famílias. Ao mesmo tempo em que afirmam que não são valorizadas
profissionalmente pelos pais, as professoras acreditam que o trabalho desenvolvidos nas
unidades é de interesse deles. No entanto, é notável ressaltar que as informações descritas na
tabela abaixo como aquelas que definem o interesse dos pais, refletem a visão de que o
cuidado preenche praticamente todo o tempo das crianças nas instituições, pois os
questionamentos feitos pelos pais em torno do que foi realizado no decorrer do dia centram-
se, em grande parte, nos aspectos relacionados aos cuidados destinados às crianças no período
em que estão nos CCI’s/Unesp (alimentação, sono e outros critérios de ordem física) e
esquecem de questionar sobre as relações que se estabelecem nas unidades, tias como
brincadeiras e participação em atividades. As informações a que me refiro destacam-se na
tabela:
149
Tabela 21 – Informações que os pais pedem sobre as crianças
Informações Sempre Algumas vezes Quase nunca
Não pede informações 10 28 17
Se e quanto comeu 39 21 0
Se evacuou e quanto 16 33 12
Se e quanto dormiu 18 34 15
Como se comportou com as
professoras
6 25 30
Como se comportou com outras
crianças
5 27 28
Qual foi seu humor 0 25 35
Do que brincou 2 25 32
Comportamentos particulares
(choro, agressividade)
7 37 15
Progressos na aprendizagem 8 31 21
O quanto participou das atividades
propostas
7 28 15
(Respostas múltiplas)
Diante de tal quadro, pode-se perceber que os pais preocupam-se mais com aspectos
como alimentação, sono e outras características de ordem física das crianças; enquanto
informações sobre comportamento, participação nas atividades, progressos na aprendizagem,
ludicidade, acabam sendo deixados em segundo plano, como de menor importância, que
demonstra que as unidades de Educação Infantil, pelo menos para boa parcela dos pais, ainda
são percebidas e vistas como locais apenas de cuidados (como se fosse possível cuidar sem
educar!), e não de cuidados e educação. Assim,
A indissociabilidade entre cuidado e educação precisa permear todo o
projeto pedagógico de uma creche, pré-escola ou escola. Trata-se, de certa
forma, de uma filosofia de atuação que prevalece – ou não – em todo o
planejamento. As famílias não procuram a instituição apenas para que
proporcione aos seus filhos os aprendizados definidos no currículo escolar.
Elas buscam compartilhar com os professores educadores o cuidado e a
educação de seus filhos. Esperam que estes sejam acolhidos em sua
individualidade, que comporta necessidades variadas.
(...)
150
Na época em que vivemos, em que a maior ou menor oportunidade de acesso
ao conhecimento define muita vezes o futuro de uma pessoa, as atividades de
cuidado assumem cada vez mais uma posição de destaque. As máquinas e os
robôs puderam substituir o ser humano em várias tarefas, mas não nas de
cuidado! O setor no qual mais crescem as oportunidades de emprego é o de
serviços. E a competência neles exigida envolve também delicadeza e
cuidado no trato. Outros setores que apresentam acentuado crescimento
dizem respeito diretamente ao cuidado das pessoas e do ambiente ecológico.
Cabe, então, a pergunta: será que estaremos preparando um futuro melhor
para nossas crianças se deixarmos o cuidado de fora das tarefas educativas
em nossas creches e pré-escolas? (ROSSETI-FERREIRA, p.12, 2003)
A autora define muito bem a importância do cuidado, que não deve ou pode ser
deixado de lado quando o assunto são as crianças da Educação Infantil, mas ao mesmo tempo,
existe a necessidade de que os pais compreendam que as instituições trabalham a questão de
cuidado e educação, e portanto suas professoras necessitam de uma formação que contemple
ambos, e não é simplesmente uma babá, não está nas unidades apenas para suprir as
necessidades básicas das crianças, é uma professora de Educação Infantil que precisa ser
reconhecida dentro do seu contexto de trabalho – em nosso caso, os Centros de Convivência
Infantil da Unesp.
Em caso de questões referentes ao comportamento das crianças e das reações
expressas pelos pais perante estes comportamentos, levantou-se a seguinte questão: se os pais
adotam, em relação ao filho, um comportamento que você considera errado, qual é a sua
reação predominante? Surgiu o seguinte gráfico:
Gráfico 6 – Relação diante do comportamento dos pais
Adapta-se às escolhas
Explica que não é a melhor
escolha
Espera que os pais comparem as
diferentes condutas
Encarrega a coordenadora de
falar com os pais
No caso da opinião dos pais ser diferente da opinião das professoras no que se refere
ao comportamento das crianças, quase metade das professoras (49%) acredita que a melhor
alternativa é procurar a solidariedade das colegas para com a sua opinião, e encarregar a
supervisora da unidade de falar com os pais a respeito do que seria melhor para a criança. Tal
151
fato aparenta demonstrar certa insegurança quanto à defesa de suas próprias opiniões, pois
não é o caso das professoras respeitarem incondicionalmente a opinião dos pais ou imporem a
sua própria opinião, mas de argumentarem com os pais para que tomem ciência de que
existem opiniões divergentes a respeito dos assuntos em questão.
Isto se deve às dificuldades de relacionamento existentes entre professoras de
Educação Infantil e pais, relação esta permeada por uma série de inseguranças por parte das
professoras, que mesmo atuando com as crianças por oito horas todos os dias, ainda sentem
que o seu trabalho e que sua profissão nas são valorizados pelos pais, devido às
representações que estes apresentam a respeito das professoras que trabalham em instituições
de Educação Infantil. Tal representação aparece enfatizada por Cerisara (2002):
A presença maciça de mulheres, o predomínio de formas femininas de
relacionamento entre elas, a organização do espaço físico (que lembra o de
suas casas), as práticas desenvolvidas, utilizando objetos vinculados ao
universo doméstico, tais como camas, colchões, banheiras, fraldas, chupetas,
mamadeiras, ajudam a confirmar a presença de um universo onde estão
presentes práticas femininas domésticas e ausentes as práticas femininas
profissionais. (p.64)
Esta é a imagem que os pais têm das professoras de Educação Infantil, na verdade,
um imaginário que revela antigas concepções, mas que ao mesmo tempo ainda não deixaram
de existir.
Parte das professoras (28%) alega que continuaria mantendo sua conduta com a
criança, esperando que os pais pudessem comparar diferentes escolhas; 16% acredita que
pode adaptar-se às escolhas feitas pelos pais, desde que elas não venham interferir no
andamento da rotina da unidade, o que parece ser um pouco complicado pelo fato de que cada
pai assume uma conduta diferente na criação dos filhos e age de forma diferente diante de
situações cotidianas, e, portanto, não é fácil adequar-se a cada tipo de família em especial.
Apenas 7% das professoras afirma que tentaria explicar que a conduta seguida pelos pais não
é a melhor alternativa para a criança, tentando interferir de forma intencional na criação das
crianças.
Para as professoras, o quesito comportamento com os filhos é alvo de muitas
discussões, sempre dando margem a novos dilemas sobre o que seria certo e o que seria
errado, mas na realidade, o que ocorre é que não existem normas específicas sobre como
devem ser dirigidas as atitudes dos pais ou das professoras no que se refere ao
comportamento, portanto, para quem já possui formação específica, como as professoras, é
necessário atentar para que trata-se do comportamento infantil e por isso, devem ser
152
respeitadas suas características enquanto criança. Gilles Brougère (2005) ressalta o tipo de
criança que temos hoje, e com a qual atuamos na Educação Infantil, além da importância das
professoras reconhecerem as angústias que os pais apresentam:
A pré-escola não é um espaço apenas para imaginação das crianças, mas
também encontro entre crianças e adultos – professores, pais, profissionais.
É um espaço cultural de encontro, e não só um lugar de desenvolvimento da
criança. Trata-se de um espaço de valores reelaborados, no qual se
constróem e reconstróem valores. É o primeiro espaço de vida onde essas
questões podem ser colocadas para as crianças. Deve ser um espaço
educativo para as crianças e também para os adultos. Uma idéia que me
parece interessante é que, no espaço escolar, os adultos também possam
aprender com outros adultos. Isso tem conseqüências na formação dos
profissionais. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.6, p.24,
2005)
Dessa forma, torna-se essencial conhecer as crianças para poder interferir de forma
adequada, mediando seu desenvolvimento, trata-se de reconhecer que o comportamento
infantil sofreu e vem sofrendo uma série de alterações sociais e culturalmente influenciadas,
ao mesmo tempo, é preciso que se reconheça que por se tratarem de crianças, necessitam ser
vistas como tais.
A instituição de Educação Infantil, ao proporcionar o contato direto entre
professoras, pais e crianças permite que sejam estabelecidas relações entre eles: é através
dessas relações que adultos podem aprender com outros adultos, ou seja, se forem
estabelecidas relações amigáveis entre pais e professoras, é possível que ambos aprendam uns
com os outros, valorizando mutuamente tal contato e reelaborando valores construídos.
Quando questionadas sobre os problemas que enfrentam os pais que tem uma
criança pequena, as professoras responderam que: 59% possuem ritmos de vida muito
acelerados, devido ao trabalho, estudo, compromissos que impedem que tenham um tempo
maior com as crianças; 21% têm dificuldade em conciliar família e trabalho, critério também
relacionado ao tempo escasso; 8% têm insegurança quanto aos critérios educativos, ou seja,
acabam por dar tudo que as crianças querem por não terem tempo suficiente para estar com
elas, em uma relação familiar concreta e 6% dividem-se igualmente entre: pouca
disponibilidade para se sacrificar pela criança, não conseguir resolver os problemas pessoais e
exigências excessivas em relação às instituições educacionais, pois acreditam que constitui
função somente da escola educar as crianças, negando um papel que faz parte da convivência
destas com sua família. Fortuna (2005) afirma que:
A grande quantidade de tempo e energia dedicada pelos pais ao cuidado dos
seus descendentes pode parecer pouco vantajosa, mas foi um fator essencial
153
para que aumentasse a coesão social, fator fundamental para a sobrevivência
de grupos. A sobrevivência humana – o futuro do homem – depende, então,
do cuidado que os adultos dedicam às crianças. Nessa perspectiva, as idéias
de Brougère iluminam esta reflexão final: é no presente da infância que
nasce a expressão do futuro. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL,
v.6, p.21, 2005)
Assim, os pais concentram seus problemas, em sua maioria, nas relações de pouco
tempo que estabelecem com seus filhos, e aparentam sentirem-se culpados por isto: daí
provêm relações semelhantes àquelas estabelecidas pelas professoras com seus filhos no que
se refere às questões do tempo em que permanecem juntos, em que os pais acabam tentando
compensar de certa forma a falta de disponibilidade de um tempo ao lado dos filhos em que
não existe compensação: o tempo do afeto, do carinho, da atenção, da orientação, necessários
para que as crianças se desenvolvam.
Gráfico 7 – Problemas enfrentados pelos pais que têm uma criança pequena
Ritmos de vida acelerados
Dificuldade em conciliar família e
trabalho
Insegurança em relação aos
critérios educativos
Pouca disponibilidade
Não resolver os problemas
pessoais
Exigências excessivas em
relação às instituições
educacionais
Atualmente, nas famílias, o que pode ser observado é uma forte tendência para a
participação mais efetiva dos pais (homens) em todas as atividades que dizem respeito ao
contexto familiar; diante disso, oportunizou-se uma questão referente a este novo conjunto,
em que as professoras opinaram sobre as diferenças na função “ser mãe” e “ser pai”, em que
se atentava para o fato das diferenças serem cada vez menores, obtendo-se a seguinte
conclusão: 31 professoras acreditam que ainda existem diferenças que, em parte, são
importantes. Para 22 professoras, existem semelhanças entre as funções e para 7 delas, pais e
mães desempenham funções bastante diferentes. Algumas justificativas:
154
Atualmente, os homens estão muito mais participativos em relação à
educação dos filhos. Porém, muitas mudanças têm que acontecer, pois o
preconceito em relação a isso é ainda muito grande.
Porque nos dias atuais, a responsabilidade do casal é dividida por igual,
desde os afazeres domésticos até a programação orçamentária. Dessa forma,
no que se refere à criação dos filhos não poderia ser de outra forma.
Porque mesmo que muitos homens cuidem dos filhos, trocam e levam para a
escola, cabe à mãe a participação e arrumação por ter mais habilidade e
tempo disponíveis, mesmo trabalhando fora.
É comum ver um relato como este último que se apresenta, em que existe um
discurso favorável à participação efetiva da mãe por ter mais tempo ou maior habilidade no
cuidado com as crianças; o que pode causar estranheza é o fato de uma professora de
Educação Infantil, que convive diariamente com questões referentes ao trabalho e ao
preconceito existente dentro de uma profissão extremamente feminina, afirmar que ainda
acredita que a mulher, enquanto mãe, tem maior responsabilidade na educação e no cuidado
de um filho que o pai, enquanto homem. Mas isto se deve aos fatores relacionados às
representações das professoras, que mesmo sentindo as dificuldades que isto pode gerar no
que diz respeito ao fator de valorização do trabalho diante dos pais, ainda apresenta uma visão
extremamente ligada às concepções de que para ser professora de Educação Infantil, é
necessário ser mulher: ter mais habilidade e tempo disponíveis, mesmo trabalhando fora,
remetem à dupla presença, também presente no cotidiano das professoras e que para estas
aparenta ser natural, pelo fato de que se é mulher, precisa estar “apta” para exercer suas
funções enquanto mulher.
4ª Categoria: Relação com as crianças
- Dimensões afetivas do trabalho
O envolvimento emocional constitui uma característica extremamente importante do
trabalho desenvolvido pelas professoras: relacionado com as crianças, com as outras
professoras e demais profissionais atuantes nas unidades e relacionado com os pais. Conhecer
as características desse envolvimento das professoras com as crianças constitui um momento
essencial na pesquisa, que busca compreender as relações entre ambas em seu dia-a-dia nas
unidades, estabelecida pelo contato diário e por questões afetivo-relacionais (afeto, carinho,
apego). Kramer (2003) faz referências a respeito de um conceito de criança que
155
necessariamente precisa ser conhecido e reavaliado pelas professoras, para que tenham uma
real dimensão do que o seu trabalho pode proporcionar:
Entender que as crianças têm um olhar crítico que vira pelo avesso a ordem
das coisas, que subverte o sentido de uma história, que muda a direção de
certas situações, exige que possamos conhecer nossas crianças, o que fazem,
do que brincam, como inventam, de que falam. E que possam falar mais.
(REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2, p.106)
Os relacionamentos entre professora e crianças exigem que as professoras conheçam
realmente as crianças com que atuam, do contrário, não terão condições de estabelecer um
relacionamento de afeto e confiança com essas crianças, o que na faixa etária em que se
encontram é um aspecto primordial para o seu desenvolvimento pessoal e social. Assim,
As crianças dessa faixa etária, como sabemos, têm necessidade de atenção,
carinho, segurança, sem as quais elas dificilmente poderiam sobreviver.
Simultaneamente, nesta etapa, as crianças tomam contato com o mundo que
as cerca, através das experiências diretas com as pessoas e as coisas deste
mundo e com as formas de expressão que nele ocorrem. Esta inserção das
crianças no mundo não seria possível sem que atividades voltadas
simultaneamente para cuidar e educar estivessem presentes. (BUJES, 2001,
p.16)
Toda essa gama de relacionamentos pode ser considerada como um dos núcleos da
profissão, e envolve prioritariamente a percepção do significado da dimensão afetiva deste
trabalho, especificamente feminino, para as professoras. Dessa forma, é preciso afirmar que:
A educação infantil foi marcada pelo modo como se concebeu, em cada
momento, o desenvolvimento das crianças (como crescem e como
aprendem) e pelas idéias sobre o que elas necessitam ou do que se deveria
fazer para propiciar esse desenvolvimento. (ZABALZA, Revista Pátio
Educação Infantil, v.1, p.15, 2003 )
De acordo com Bujes (2001):
Cada época tem a sua maneira própria de considerar o que é ser criança e de
caracterizar as mudanças que ocorrem com ela ao longo da infância. Nos
últimos três ou quatro séculos, a criança passou a ter uma importância como
nunca havia ocorrido antes e ela começou a ser descrita, estudada, e ter o seu
desenvolvimento previsto, como se ele ocorresse sempre do mesmo jeito e
na mesma seqüência (de forma linear e progressiva). (p.17)
O desenvolvimento infantil não pode ser visto como algo linear, pois ocorre através
e de acordo com as diferentes possibilidades de interação que as crianças têm em seu
cotidiano, por isso, é importante que as professoras de Educação Infantil respeitem a
156
individualidade das crianças, conheçam suas necessidades e desenvolvam um trabalho voltado
para elas.
A partir de agora, buscamos compreender um pouco sobre a imagem que as
professoras têm sobre o afeiçoar-se, analisando este envolvimento como um dos fatores que
se encontra presente na vida das professoras e das crianças com as quais convivem nas
unidades, constituindo dessa forma, um critério essencial no desenvolvimento infantil.
- Afeiçoar-se
A questão do afeiçoar-se está presente na convivência entre crianças e professoras
como vínculo afetivo nas relações educativas e de cuidado. Assim sendo, questiona-se as
professoras sobre a possibilidade de afeiçoar-se de modo especial a algumas crianças e outras
não: seria isto possível? Seria isto, mais que possível, correto na visão das professoras?
Para a maior parte das professoras (78%), afeiçoar-se mais com algumas crianças é
normal, desde que não descuidem das outras crianças, que fazem parte do grupo e sendo
assim, o equilíbrio dos comportamentos deve se manter. Assim,
A maioria das educadoras compartilha a idéia de que o componente afetivo
seja um elemento central na própria atuação profissional, desde que, ao
mesmo tempo, seja assegurada a dimensão coletiva e grupal do
relacionamento e, portanto, o equilíbrio dos comportamentos em relação a
todas as crianças sob seus cuidados. (ONGARI; MOLINA, p.122, 2003)
“Não deveria acontecer” - foi a resposta de 17% das professoras; enquanto 5%
responderam que afeiçoar-se especialmente a algumas crianças constitui algo inevitável.
A discussão a respeito da afetividade constituir parte do trabalho realizado nas
instituições de Educação Infantil, como um aspecto fundamental, remete mais uma vez para a
imagem da feminização presente na profissão de professora de Educação Infantil. Tomada
somente em seu sentido que considera a atuação da professora como algo sem
profissionalidade, por ter como aspectos determinantes as relações de afeto e carinho, que não
estão presentes em relações masculinas de trabalho, é pertinente questionar, assim como
Cerisara (1996):
(...) não terá a afetividade um papel fundamental na construção das relações
entre adultos e crianças de 0 a 6 anos?
(...)
Ou ainda: se sabemos das necessidades de haver vínculo afetivo para que se
estabeleçam interações construtivas entre adultos e crianças nesta faixa
etária, como têm sido formadas estas educadoras para que tenham a
157
impressão de que não conseguem se manter como profissionais que associam
o afetivo com a ação pedagógica intencional? Será impossível associar estes
dois pólos? Perguntariam as educadoras: se gosto, não consigo agir orientada
por um projeto educativo, que inclui o gostar mas o resignifica? (p.87)
A relação afetiva, muitas vezes associada à incapacidade e à falta de
profissionalidade por parte das professoras, não é uma questão passível de ser deixada de
lado: as crianças pequenas necessitam desta relação, assim como vem sendo desenvolvida, as
professoras vivem um dilema quanto à caracterização de sua identidade profissional ao
mesmo tempo em que tal dicotomia entre doméstico e público toma sentido em suas relações:
(...) Não se trata de desconhecer que a mistura entre doméstico e público,
assim como a preocupação com os sentimentos e a afetividade fazem parte
das atribuições femininas dentro da divisão e hierarquia socialmente
estabelecidas dentre os gêneros. Essa postura personalizadora certamente não
significa uma ruptura das subordinações de gênero. Todavia, acreditamos
que ela não deve ser avaliada a partir de um modelo pretensamente racional
ou técnico de trabalho docente, um modelo que idealiza a impessoalidade
dos espaços públicos masculinos e que opõem algum tipo de
profissionalismo à afetividade e personalização. (CARVALHO apud
CERISARA, p.88, 1996)
Desse modo, a profissionalidade e o afeto constituem mais uma das dicotomias
existentes na Educação Infantil: a profissionalidade não permite a existência de
características de afetividade; no entanto, esta afetividade está presente, sem dúvidas, nas
relações entre professora e crianças. Devido a isso, a profissionalidade das professoras está
sempre sendo colocada à prova.
No que se refere à questão do afeto existente entre professoras e crianças, as relações
podem ser retratadas através do seguinte gráfico:
Gráfico 8 – Afeiçoar-se a uma criança em especial é uma posição correta/incorreta
Sem problemas, desde que não
descuidem das outras crianças
Não deveria acontecer
É algo inevitável
158
Uma questão aberta a respeito do “apegar-se a uma criança” também esteve inserida
no contexto do questionário, visando compreender melhor o que as professoras levam em
consideração neste quesito. Sabe-se que os elementos emocionais estão muito presentes em
todas as atitudes das professoras e crianças. Como foi visto, a maior parte das professoras
alega que se apegar a uma criança não constitui um problema, desde que não descuide das
outras que permanecem sob sua responsabilidade. Além do que, as “divisões” de tarefas entre
professoras e mães ainda não se encontram bem definidas, e mais, acredito não ser possível
estabelecer esta divisão, porque crianças são crianças e necessitam de atenção, afeto e carinho
em qualquer instância, seja familiar ou não:
Temos um panorama de pais e educadores que vivem uma grande crise de
identidade e valores, originários de uma cultura e de um sistema que prega,
de forma avassaladora, a globalização, que não considera as diferenças de
cada ser humano, mas que, ao contrário, estimula a massificação. É difícil
ajudar o outro, especialmente as crianças, a se transformar sem que nós,
adultos, tenhamos orientação para nossa própria transformação.
(FRIEDMANN, REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.6, p.13,
2005)
Ao questionar abertamente sobre o que significa apegar-se a uma criança, surgiram
as mais diferentes respostas, enfatizando diversas características, tais como: jeito diferente de
gostar, ter carinho com a criança, vê-la com outros olhos, vínculo afetivo.
Ou seja, características relacionadas aos cuidados que uma mãe dispensa aos seus
filhos, relativos à emoção, ao carinho; atingindo uma dimensão afetiva que entra em conflito
com a profissão educativa: mais uma vez entrelaçando aspectos referentes ao “ser mãe, ser
mulher e o ser profissional”, mostrando que tais fatores ainda continuam sem uma definição
mais acentuada.
159
Tabela 22 – Critérios que definem o apegar-se a uma criança para as professoras dos
CCI’s/Unesp
Critérios Número
Ter carinho com a criança 18
Afinidade (ver com outros olhos) 13
Afeto 07
Compreender suas reações amá-la como é 07
Jeito diferente de gostar 05
Vínculo 03
Carência 02
Apego 02
Ter cuidado só com ela 02
Tê-la como exemplo diante das outras 01
Total 60
O primeiro item lembrado pelas professoras – ter carinho com a criança – pode ser
representado pelos depoimentos: “Sentir um carinho especial que vem de dentro”, “Em
determinados momentos atribuir a uma criança um carinho excessivo”.
Na discussão sobre a questão do afeiçoar-se a uma criança, Ongari; Molina (2003)
afirmam que o apegar-se encontra-se presente na vida das professoras, por constituir uma
relação entre pessoas e fazer-se essencial quando se trata de crianças de 0 a cinco anos; o que
não pode ocorrer é o total envolvimento da professora com uma criança, deixando de lado
características da própria instituição em que estão inseridas: a profissional deve ter claro os
limites de uma professora em relação a uma criança pela qual se encontra responsável, da
mesma forma em que deve estar ciente de sua responsabilidade profissional para com as
outras crianças, mas isso em nada impede da professora disponibilizar carinho, afeto, atenção
para as crianças com as quais convive. Pois:
Para lidar com as crianças é preciso, além disso, levar em conta a perspectiva
cultural do nosso agir e interagir no mundo, nossa condição de sujeitos da
história e da cultura. Reduzir as 23 milhões de crianças de 0 a 6 anos a
alunos é ter uma visão de que basta ensinar coisas. Ao contrário, a prática
pedagógica envolve conhecimentos e afetos, saberes e valores, cuidados e
atenção, seriedade e riso.
O cuidado, a atenção, o acolhimento, as trocas, as narrativas da história
precisam estar presentes na educação infantil, assim como a circulação de
saberes. Nas práticas realizadas, as crianças aprendem, nosso desafio é atuar
160
com liberdade para assegurar a apropriação e a construção do conhecimento
por todos. No que se refere à educação infantil, é preciso assegurar o direito
de brincar, criar, aprender, enfrentar os desafios de pensar a creche, a pré-
escola e a escola como instâncias de formação cultural: o desafio de pensar
as crianças como sujeitos de cultura e história, sujeitos sociais. Nós,
professores e professoras de educação infantil, também temos
responsabilidade social e coletiva nesse processo. (KRAMER, REVISTA
PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, p.11-12, 2003)
Como professoras de Educação Infantil, integrar aspectos de afetividade e
profissionalidade fazem parte de um cotidiano permeado por inquietações, mas que não
deixam de constituir a cada dia uma nova experiência de aprendizagem: estar com as crianças,
relacionar-se com elas profissional e emocionalmente, contribui para que se caracterize o
perfil das professoras que trabalham com as crianças de 0 a cinco anos nos CCI’s/Unesp e nas
demais instituições de Educação Infantil.
5ª Categoria: Aspectos do serviço
- A Creche como serviço
A creche, antigamente vista como espaço assistencial (e que ainda carrega algumas
dessas características), assume hoje a função educativa de envolver educação e cuidado na
mesma instituição através do trabalho realizado em seu interior pelas profissionais.
Criadas com objetivo assistencialista, as creches serviam apenas para recolher,
alimentar e cuidar das crianças, para que não ficassem expostas ou sujeitas a maus tratos.
O objetivo das creches inseria-se em um contexto em que eram exigidas funções
sociais relacionadas ao cuidado e guarda das crianças, e não à educação:
As concepções educacionais vigentes nessas instituições se mostravam
explicitamente preconceituosas, o que acabou por cristalizar a idéia de que,
em sua origem, no passado, aquelas instituições teriam sido pensadas como
lugar de guarda, de assistência, e não de educação. (KUHLMANN, 1998,
p.182)
Diante desta perspectiva assistencialista que originou o atendimento nas creches,
desenvolveu-se a idéia de que não seria necessário que se concretizasse um trabalho de
qualidade, que envolvesse itens como espaço físico adequado, materiais, planejamento de
atividades pedagógicas e formação específica dos profissionais que iriam trabalhar com essas
161
crianças. Assim surgiu a falsa dicotomia entre cuidado e educação, em que tenta-se algo que
não é possível: acreditar que um deles possa acontecer em detrimento do outro.
O cuidado aparece como uma série de medidas necessárias para que se garanta o
básico à criança: cuidados físicos, psicológicos e sociais:
Trata-se também de uma concepção errônea do que significam o
desenvolvimento e a aprendizagem da criança. Essa concepção vem de
longe, de um passado em que se pensava que a criança pequena era uma
tábula rasa na qual a família e a sociedade inscreviam os conhecimentos, os
hábitos, os comportamentos. Ou da idéia inatista de que tudo estava
adormecido, como germe ou potencialidade que aguardava o
amadurecimento físico para vir à tona; bastava esperar que isso acontecesse.
Nessa perspectiva, era suficiente cuidar da criança para que sobrevivesse às
intempéries físicas, psicológicas e sociais. (DIDONET, REVISTA PÁTIO
EDUCAÇÃO INFANTIL, v.1, 2003, p.7)
As instituições de Educação Infantil passam a ser direito da criança a partir da
Constituição Federal de 1988 e posteriormente, da Nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB 9394/96), deixando para trás o caráter somente assistencial, que
priorizava o atendimento em beneficio das mães trabalhadoras que não tinham onde deixar
seus filhos durante uma jornada diária de trabalho. Diante de tais mudanças, nota-se a
necessidade de verificar como as professoras vêem a qualidade da unidade em que atuam,
dentre outros aspectos.
- Avaliando a unidade
Duas perguntas existentes no questionário visavam investigar qual a idéia que as
professoras fazem sobre a unidade em que trabalham: uma das perguntas dizia respeito ao
serviço oferecido e a segunda questionava o nível de satisfação dos pais.
Ao questionar as professoras a respeito da qualidade do serviço oferecido pelo CCI em
que atuam, nota-se que em 81% das professoras julgam como ótimo o serviço oferecido, 15%
acreditam que o serviço é bom, enquanto 2% acham que o serviço oferecido é médio ou
péssimo.
162
Gráfico 9 – Qualidade do serviço oferecido pelo CCI em que atuam
Ótima
Boa
Média
Péssima
O fato das professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp acreditarem que seu
trabalho pode ser caracterizado como bom ou ótimo é importante no que se refere ao
sentimento de profissionalidade do trabalho que as professoras exercem: se acreditam que o
serviço oferecido é bom, é porque sentem-se competentes e profissionais naquilo que fazem:
A definição da atividade docente como profissão fundamenta-se, justamente,
na capacidade para tomar decisões e para as justificar: O professor é capaz
de levar a cabo uma reflexão dirigida ao autoconhecimento, de mobilizar a
consciência metacognitiva que distingue o desenhador do arquiteto, o
contabilista do auditor. Um profissional é capaz não só de praticar e de
compreender o seu ofício, mas também de comunicar aos outros as razões de
suas decisões e ações profissionais. (GARCÍA, 1995, p.59 apud SHULMAN,
1986, p.13)
No que se refere à satisfação dos pais por terem optado pelo CCI, 50% das professoras
acreditam que os pais sentem-se muito satisfeitos com a escolha, 28% estão muitíssimo
satisfeitos e 22% estão suficientemente satisfeitos com a escolha.
Gráfico 10 – Satisfação dos pais, na visão das professoras
Muitíssimo
Muito
Suficientemente
163
Entre os critérios determinados como demais influenciadores no quesito da boa
qualidade da Unidade encontram-se: a harmonia no grupo de trabalho, seguido do item
pessoal, o que novamente contraria a opinião das professoras, quando afirmaram
anteriormente que a relação com o pessoal não exerce grande influência no trabalho que
realizam nas unidades enquanto professoras de Educação Infantil.
Gráfico 11 – Critérios que influenciam para um bom atendimento
0
5
10
15
20
25
30
Harmonia
Pessoal
Apoio da administração
Atualização
Relacionamento com
pais
Tal avaliação positiva do item harmonia no grupo de trabalho, pode ser considerada
como algo relevante, como pode ser notado na opinião de uma das professoras:
Eu considero muito importante porque todos que fazem parte da equipe
compreendem seus papéis, o que possibilita atingirmos o principal objetivo
que é o de oferecer às crianças oportunidades significativas de
aprendizagem.
No que se refere aos critérios determinantes para um bom atendimento, em geral, as
opiniões das professoras revelam sempre que a harmonia no grupo de trabalho é um
influenciador para que o trabalho se estabeleça de forma adequada, garantindo qualidade
através de sua organização, diferente em cada unidade, mas que atende às prioridades de
crianças e professoras que ali se encontram. Contraditoriamente ao que foi respondido pelas
professoras nesta questão, na discussão a respeito das competências necessárias para ser uma
boa professora de educação Infantil, em que o aspecto do coletivo, do grupo de trabalho não é
tido como fator importante na opinião das professoras.
Os demais itens são avaliados de forma mais homogênea, no entanto, ressalta-se que
o relacionamento com os pais não é tido como algo essencial no convívio dentro das unidades
164
para que se tenha uma educação de qualidade, mas se sabe que este constitui um dos critérios
para que a criança desenvolva-se adequadamente:
Ao comprometer-se com uma educação infantil de qualidade, a instituição
deve assumir-se como um agente complementar à família, nas funções
indissociáveis de cuidar e educar; nesta perspectiva, não há de ser nem
espaço doméstico nem escola preparatória ou assemelhada àquelas do ensino
fundamental.
Será, em contrapartida, um espaço que proporcionará condições adequadas
para o desenvolvimento físico, emocional, cognitivo, e social da criança
como uma totalidade, promovendo a ampliação de suas experiências e
conhecimentos, desafiando seu raciocínio, estimulando a descoberta e
elaboração de hipóteses, seu interesse pelo processo de transformação da
natureza e pela convivência em sociedade, marcada por valores éticos, de
solidariedade, cooperação e respeito. (POLÍTICA PARA OS CENTROS DE
CONVIVÊNCIA INFANTIL DA UNESP, 2005, p.12)
Assim, presume-se que uma relação saudável entre professoras e pais seja essencial
para uma educação infantil de qualidade dentro das unidades – CCI’s/Unesp, tendo estes a
função de assumir um compromisso complementar à família, no que se refere ao cuidado e
educação das crianças de 0 a cinco anos de idade.
A partir de agora, apresento algumas considerações a respeito do tema apresentado
no decorrer desta pesquisa: a caracterização profissional das professoras de Educação Infantil
dos Centros de Convivência Infantil da Unesp.
165
CAPÍTULO 5 - (IN)CONCLUINDO: CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL
PROFISSIONAL DAS PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DOS
CCI’S/UNESP
Diante do objetivo primordial dessa pesquisa: a busca pela caracterização
profissional das professoras de Educação Infantil dos Centros de Convivência Infantil da
Unesp, tomando por base a visão que as próprias professoras têm do trabalho que exercem: se
cuidam, se educam, se atribuem importância à formação, à prática cotidiana, ao
relacionamento com os pais, crianças, colegas, se se encontram satisfeitas com o trabalho que
realizam e se fazem realmente aquilo que gostam, procuro tecer algumas considerações
destacadas no decorrer de todo o trabalho, e que suscitaram as conclusões aqui presentes.
Partindo do principal instrumento da pesquisa, ou seja, o questionário respondido
pelas professoras de Educação Infantil de sete unidades (CCI’s/Unesp), puderam ser
elencadas as categorias explicitadas anteriormente, como cinco categorias de análise:
formação, profissão, relação com os pais, relação com as crianças e aspectos do serviço.
Acredito, assim como afirma Cerisara (2002), que é importante ressaltar que as
pesquisas relacionadas às professoras de Educação Infantil vêm tomando mais espaço e sendo
mais comumente exploradas atualmente, devido às mudanças significativas ocorridas com a
formação dos docentes para realizar o trabalho com essa faixa etária, a diminuição dos anos
em que as crianças deveriam permanecer nas creches e pré-escolas e o reconhecimento, pelas
próprias professoras, da necessidade de formação, seja ela em qualquer nível, reconhecendo
assim, a especificidade do trabalho com crianças pequenas, que sabemos que exige muito
além do que simplesmente “ser mulher, ser mãe ou ter atributos domésticos”. Para Kramer
(2003):
Nessas trajetórias percorridas, construíram maneiras de ver o mundo, as
crianças e a si próprios que precisam ser levadas em consideração nos
processos de formação e trabalho cotidiano.
Precisam também se constituir como profissionais: professores e professoras
não são tios, como freqüentemente são tratados no conhecido e já
denunciado mecanismo de desvalorização, desqualificação e desprestígio.
(...) Nesse título de pouco poder, defendido por professoras como o único
bem que parece restar-lhes, encontramos marcas de classe social, histórias de
desigualdade e exclusão, discriminação de gênero, etnia, preconceitos
sofridos, dificuldades enfrentadas. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO
INFANTIL, v.2, p.11)
166
Diante desse quadro, procuramos estabelecer alguns critérios que se fazem
importantes dentro da trajetória profissional das professoras de Educação Infantil dos
CCI’s/Unesp, e que envolvem não só seu trabalho direto com crianças, mas suas expectativas,
desejos, contribuições, anseios e até mesmo seus medos, tentando caracterizar o perfil destas
professoras, assim, surgem algumas características, abordadas a seguir.
Quem são as professoras participantes desta pesquisa? Pode presumir-se o seguinte
perfil: em sua maioria, são mulheres adultas com idade entre 30 e 49 anos, casadas e com
número de filhos que varia entre um ou dois, em sua maioria maiores de 10 anos de idade.
Possuem diploma de nível universitário (Pedagogia), demonstram interesse pela formação em
serviço dentro e fora da Unidade e aquelas que podem usufruir da formação dentro das
unidades, afirmam que esta modalidade de formação encontra-se em acordo com as
necessidades apresentadas por elas. Afirmam que em geral, não encontraram dificuldades no
período inicial de seu trabalho.
A respeito da escolha pelo trabalho com a Educação Infantil, 46 professoras
afirmam ter optado por este tipo de atuação, e em geral encontram-se satisfeitas com o que
realizam e pretendem continuar sendo professoras de crianças pequenas.
Aspectos específicos da atuação das professoras, como o trabalho direto com as
crianças e a possibilidade de presenciar dia-a-dia seu aprendizado são tidos como os mais
satisfatórios.
Como aspectos não satisfatórios, citam-se a adequação ao espaço físico dos
CCI’s/Unesp, em especial os prédios que foram adaptados para acomodar as unidades
(CCI’s/Unesp) e não construídos especificamente para esse fim, e a falta de possibilidades de
atualização profissional, citadas pelas professoras que não têm acesso à formação no interior
das unidades, ou seja, aspectos relacionados aos recursos oferecidos. Diante das conclusões
desta pesquisa, podemos afirmar que o papel da Educação Infantil posto por Craidy (2001),
para a educação em geral, vem sendo alcançado pelas professoras dos CCI’s/Unesp. Este
papel postula que:
O papel da educação infantil, como da educação em geral, é proporcionar às
crianças um desenvolvimento integral em ambientes organizados e
culturalmente ricos, adequados à faixa etária, nos quais exista a necessária
integração com um adulto responsável e competente, assim como com
crianças de faixa etária próxima. (p.22)
167
As professoras que responderam aos questionários reconhecem a especificidade do
trabalho que desenvolvem, atribuindo à formação inicial e à experiência e prática profissional
maior importância entre os fatores para aprender exercer o trabalho. Revela-se assim, uma
realidade em que as professoras reconhecem a necessidade de formação inicial e sua junção
com a prática profissional, ambas indispensáveis para que se tenha uma Educação Infantil de
qualidade. Para uma Educação Infantil de qualidade, Craidy (2003) acredita que:
O caminho é respeitar a legislação. Aplicá-la sem tentar reduzi-la ou
minimizá-la, como está acontecendo em alguns lugares. Isso implica formar
e contratar profissionais qualificados, no mínimo com nível médio, na
modalidade normal, com formação específica; equipar creches e pré-escolas;
fazer supervisão e orientação pedagógica; ampliar vagas, garantindo o direito
constitucional a todos os que desejarem enviar os filhos a creches e pré-
escolas (art. 7º / XXV) e o direito das crianças à educação desde o
nascimento (art. 227). Aqui, cabe lembrar que a educação infantil em creches
e pré-escolas é direito dos pais e também das crianças, não devendo,
portanto, estar atrelada à exigência de que a mãe trabalhe fora de casa.
(REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2, p.23)
Como base do trabalho das professoras de Educação Infantil dos CCI’s/Unesp,
surgem algumas divisões interessantes, pelo fato de se constituírem contraditórias: a
necessidade de atender às curiosidades das crianças divide espaço com a programação
didática realizada com a colaboração da supervisora, através de reuniões entre supervisora e
as professoras responsáveis pelos grupamentos. Tal contradição pode ser colocada nos
seguintes parâmetros: ao mesmo tempo em que as professoras sentem que a base do trabalho
deve ser realizada através de programação didática, enfatizando conteúdos programados que
devem ser desenvolvidos com as crianças, definem também como importante atender às
necessidades e curiosidades das crianças, o que não é possível programar antecipadamente,
pois as curiosidades infantis surgem a partir das mais diferentes situações com as quais as
crianças têm contato no decorrer do dia, seja nas unidades de Educação Infantil, seja em suas
casas, ou ainda em outros ambientes que freqüentam.
Como competências essenciais da professora de Educação Infantil, cita-se o
oferecimento às crianças de experiências ricas e diversas. O segundo critério elencado
consiste em realizar uma boa programação didática, em que as professoras, mais uma vez,
atribuem certa importância ao fato de poderem contar com o auxílio e orientações da
coordenação, o que certamente contribui com seu trabalho, desde que não se torne a única
fonte vista como importante pelas professoras, que devem estar atentas também para
possibilidades de formação inicial e continuada, além da própria troca com as demais
168
professoras em seu local de trabalho, que necessita ser um aspecto valorizado por contribuir
para o trabalho.
O afeto presente nas relações entre professoras e crianças que se estabelecem no
interior das unidades de Educação Infantil, constitui realmente um dos aspectos mais centrais
da profissão. Como análise dessa relação, os dados indicam que para as professoras, afeiçoar-
se a alguma criança em especial, envolve aspectos como atenção, carinho, auxílio e satisfação
de necessidades. O fato de afeiçoar-se a uma criança constitui-se como normal, desde que o
grupo seja priorizado e receba atenção devida, no entanto, pode-se afirmar que os critérios
enfatizados pelas professoras como determinantes de um afeto em especial devem estar
presentes nas relações normais (cotidianas) das professoras com as crianças, não apenas com
algumas em especial, mas com todas elas, tais relações constituem uma necessidade infantil.
O serviço de educação e cuidado oferecido pelos CCI’s/Unesp é caracterizado, em
geral, como ótimo, sendo que metade das professoras (50%) acredita que os pais sentem-se
muito satisfeitos com a opção de deixarem seus filhos nas unidades (CCI’s/Unesp).
O aspecto que mais contribui para que este trabalho se efetive com qualidade é a
harmonia presente no grupo de trabalho e o pessoal envolvido, enfatizando desta forma a
competência, a vontade e a disponibilidade das profissionais. Ressalto, no entanto que este
dado é contraditório ao explicitado pelas professoras quando se referem às competências de
uma boa professora de Educação Infantil, em que o fator referente à harmonia no grupo de
trabalho não é considerado como importante para a maioria das professoras.
A relação estabelecida com os pais no interior das unidades representa um dos
fatores primordiais para que o trabalho educativo se estabeleça adequadamente, assim, é
interessante conhecer a visão que as professoras têm desta relação. Para as professoras dos
CCI’s/Unesp, poder deixar o filho em um ambiente seguro e a comodidade de horário
oferecida pelas unidades são os principais pré-requisitos que levam os pais a deixarem seus
filhos nas unidades. Tal comodidade de horário é alvo de críticas pelas professoras de duas
unidades, que reclamam por terem que se sujeitar a permanecer no local de trabalho com
apenas uma criança por até doze horas.
Quanto ao fato de contarem com um local seguro para deixar os filhos, as
professoras afirmam que os pais fazem esta opção por questões relacionadas aos cuidados
oferecidos às crianças dentro das unidades, questão presente também nos principais
questionamentos que os pais costumam fazer com relação ao cotidiano das crianças: são mais
comumente levantadas perguntas referentes aos cuidados básicos (alimentação e higiene).
169
Os critérios para que se tenha uma boa professora de Educação Infantil para os pais,
segundo as professoras, são por ordem de prioridade: conhecer o desenvolvimento das
crianças de 0 a cinco anos de idade e ter muita paciência. O interesse por parte dos pais pelas
propostas dos CCI’s/Unesp, para quase metade das professoras (48%) é tido como suficiente.
Ainda analisando a relação entre professoras e pais, as professoras parecem ter certo
receio em conversar abertamente com os pais e passam esta função para a coordenação, que
aparenta intermediar esta relação, pois quando foram questionadas sobre o caso dos pais
adotarem um comportamento que julgam ser errado em relação ao filho, afirmam, em sua
maioria (49%), que prefere conversar com a coordenação para que esta converse com os pais
da criança.
Quando questionadas sobre os problemas que enfrentam os pais que têm uma
criança pequena, 59% das professoras responderam que os pais possuem ritmos de vida muito
acelerados que dificultam que tenham um tempo maior com as crianças, enquanto 21% têm
dificuldade em conciliar família e trabalho, critério também relacionado à escassez de tempo.
A respeito dessa relação, Perrenoud (2003) ressalta:
O profissional da primeira infância deve, ademais, garantir a cooperação de
pais às vezes ausentes, às vezes muito angustiados, desconfiados, paralisados
ou agressivos.
Além disso, os problemas de desenvolvimento são, com mais freqüência
ainda de ordem sistêmica. Tudo se mantém: as dimensões fisiológicas,
psicológicas, culturais, relacionais. Intervir junto a uma criança pequena é
compreender a dinâmica familiar, ter uma representação das condições de
vida, dos dados sanitários e dos hábitos alimentares. (PÁTIO EDUCAÇÃO
INFANTIL, v.2, p.20)
Atualmente, nas famílias, o que pode ser observado é uma forte tendência para uma
tentativa de divisão de tarefas entre pai e mãe, assim, consolida-se uma participação mais
efetiva dos pais (homens) em todas as atividades que dizem respeito ao contexto familiar. Se
tal afirmação fosse verdadeira, se existem ainda diferenças importantes ou se pai e mãe
desempenham funções completamente diferentes, foi a questão levantada, para a qual se
obteve a seguinte resposta: para a maioria das professoras ainda existem diferenças que, em
parte, são importantes; em segundo plano, com número pouco menor de opiniões, as
professoras afirmaram que existem semelhanças entre as funções e para poucas delas, pais e
mães desempenham funções muito diferentes. Tais opiniões refletem ainda a imagem de que a
mulher é a pessoa mais apta para cuidar e educar as crianças, e como pode ser observado nos
relatos das professoras quando afirmam que as mães têm mais tempo disponível, mesmo que
trabalhem fora.
170
Diante dos dados obtidos a partir dos questionários, referentes às cinco grandes
categorias: formação, profissão, relação com os pais, relação com as crianças e aspectos do
serviço, podemos observar um perfil profissional que envolve formação inicial, busca pela
formação em serviço, escolha pelo trabalho com crianças de 0 a cinco anos, reconhecimento
da qualidade nos relacionamentos desenvolvidos no interior das unidades, seja com as
crianças, com outras professoras ou com os pais, mesmo que estes ainda não tenham
reconhecido o trabalho das professoras como profissional, mas como uma extensão de um
trabalho doméstico, em que imperam os atos de cuidado, em detrimento da educação.
Existe a necessidade de que se reconheça que a Educação Infantil, mais do que um
direito da mãe trabalhadora constitui um direito da criança, com a visão de que ela é um ser
ativo que se desenvolve: brinca, fala, briga, sorri, está em constante movimento. A criança é
um ser humano em pleno processo de desenvolvimento: necessita de cuidado, necessita ser
educada, necessita ser conduzida à descoberta:
Insistimos muito hoje – e com razão – nos direitos da criança, uma vez que
têm sido amplamente ridicularizados: exploração do trabalho infantil,
turismo sexual, violência dos adultos. Que essa causa justa não impeça o
progresso do conhecimento dos processos de desenvolvimento e
aprendizagem durante a primeira infância. Se vários dirigentes políticos,
eleitores e funcionários podem, muitas vezes de boa-fé, pensar que o bom
senso é suficiente para educar crianças pequenas, é porque não entenderam o
que ocorre nos primeiros anos de vida, nem compreenderam o tamanho da
especialização que os educadores devem mostrar. (PERRENOUD, 2003,
p.20)
Legalmente, o reconhecimento de que a Educação Infantil constitui a primeira etapa
da educação básica já existe, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei
9394/96, em seu artigo:
Art. 29- A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
ação da família e da comunidade.
Mas a implantação da lei em termos de Brasil não respeita o citado artigo quando
atenta ao fato de que a Educação Infantil deveria ser a primeira etapa da educação básica, pelo
fato de que a Educação Infantil não é obrigatória para as crianças de 0 a cinco anos de idade, e
portanto, não vem sendo completamente implantada nas instituições.
Assim como afirma Perrenoud (2003), o desafio é grande: que a sociedade
reconheça a Educação Infantil realmente como a primeira etapa da educação básica,
necessitando assim, de professoras qualificadas, bem preparadas e remuneradas de acordo
171
com a importância do trabalho que realizam, professoras que possam ter seus anseios,
dúvidas, questionamentos, expectativas, opções, dificuldades respeitadas e satisfação em
realizar o seu papel: professoras de crianças de 0 a cinco anos de idade, professoras de
Educação Infantil. Diante disso, é indispensável que se considerem os fatores cuidar e educar,
que devem estar presentes na mesma instituição, em busca de ampliar o que deve ser
oferecido às crianças dentro dessa dupla função das professoras: cuidar e educar de forma
integrada, tendo consciência de que ambos caminham lado a lado e se complementam. Afinal,
no que se refere às professoras:
(...) sua missão é dupla: não apenas atuar adequadamente junto às crianças,
mas também difundir saberes educativos e psicológicos junto aos pais, fazer
com que suas crenças e atitudes evoluam. A tarefa seria muito mais delicada
se não pudesse ser conduzida apesar das diferenças culturais e da dignidade
dos pais. (PERRENOUD, 2003, p.19)
Um trabalho pedagógico que integre cuidar e educar presentes na mesma instituição
é importante para que a criança sinta-se segura, possa trabalhar suas emoções, construir e
reformular hipóteses sobre o mundo e, sobretudo, elaborar sua própria identidade, e para que
isso seja possível, existe a necessidade de que as professoras que atuam junto a essas crianças
tenham bem definidas suas próprias atribuições e seu papel dentro das instituições de
Educação Infantil, para que assim contribuam para a construção da identidade infantil.
A relevância social desta pesquisa consiste na análise das experiências pessoais e
profissionais, motivações e anseios dessas professoras de Educação Infantil: mulheres,
profissionais, mães, trabalhadoras, com o maior objetivo de mostrar à sociedade a importância
do papel que exercem, diante da visível desvalorização social de seu trabalho, da remuneração
incompatível como a carga horária e a formação exigida e das condições de trabalho, que
geralmente não são as mais favoráveis, devido ao esgotamento físico que uma profissão que
exige atenção constante pode ocasionar.
Esta relevância justifica-se pela imagem externa que a sociedade apresenta a respeito
das instituições de Educação Infantil, e conseqüentemente, das suas professoras: uma imagem
de que as instituições revelam seu caráter de cuidados, assistencialismo, que não incluem
práticas educativas. Imagem esta proveniente dos aspectos histórico-sociais que permeiam
toda a constituição da Educação Infantil, onde estão presentes a feminização, a falta de
profissionalidade, de objetividade, enfim, de critérios que caracterizam um trabalho como
profissional – tal imagem, quando construída, dificilmente consegue ser extraída.
172
Essa é a luta das professoras da Educação Infantil: trazer a esta modalidade de
educação sua importância, que somente pode ser construída social e historicamente, como
acredito que vem ocorrendo. Esta é uma luta complexa, mas que embasada por uma formação
consistente por parte das professoras e por práticas que visem a qualidade na Educação
Infantil será bem sucedida.
A respeito da desvalorização, Perrenoud (2003) levanta alguns questionamentos:
Por que? Será porque a vida das crianças pequenas teria menos valor? Não
há mais, nos dias de hoje, uma explicação suficiente: o “sentimento da
infância” desenvolveu-se, mesmo que continue sendo, com muita freqüência,
um luxo de país rico. Não, o motivo arranjado por aqueles que recusam
meios à educação das crianças pequenas é a convicção de que as profissões
da primeira infância são extensões da função materna, as quais requerem
amor e tempo, mas nenhuma formação específica. Foi o que disseram por
muito tempo a respeito dos cuidados em enfermagem, já que a abnegação
das mães ou religiosas substituía a especialização, e o ato de cuidar parecia
mais uma atitude humana do que uma competência baseada em saberes e
capacidades. (REVISTA PÁTIO EDUCAÇÃO INFANTIL, v.2, p.19)
Existe uma série de fatores relevantes, que permeiam as principais inquietações e
discussões na área da Educação Infantil, tratados nessa pesquisa, tais como: o serviço
voltado à mãe trabalhadora, a função das unidades de Educação Infantil, redimensionamento
do aspecto assistencialista, a garantia de padrões educativos e a importância da formação
inicial e continuada do pessoal que atua diretamente com as crianças, além das relações
estabelecidas entre os componentes das instituições de Educação Infantil: professoras,
crianças e pais. São essas as principais características que envolvem o trabalho das
professoras de Educação Infantil e que devem ser realmente revistas socialmente e
culturalmente, para que se efetive uma Educação Infantil de qualidade, com professoras
satisfeitas em realizar seu trabalho com crianças de 0 a cinco anos de idade, reconhecidas
perante a sociedade e que confiem em seu próprio trabalho como professoras de Educação
Infantil.
A contribuição das representações sociais para esta pesquisa consiste na discussão
a respeito dos aspectos que visam descortinar as relações existentes nas instituições de
Educação Infantil da Unesp – CCI’s/Unesp – entre professoras, crianças, pais e a visão que
essas professoras têm a respeito do próprio trabalho, das condições em que atuam, do
relacionamento entre as crianças atendidas e seus pais, do posicionamento que esses pais
adotam com relação ao convívio com seus filhos, tudo isso embasado pela visão que as
professoras apresentam.
173
No decorrer desta pesquisa, pôde ser observada a importância das representações
sociais que as professoras de Educação Infantil têm a respeito de si mesmas, do seu trabalho e
das relações estabelecidas no decorrer do seu cotidiano e o quanto se caracterizam como
importantes em suas trajetórias profissionais, pelo fato de envolverem uma série de fatores,
tais como: o trabalho direto com as crianças, as expectativas, os anseios, os questionamentos,
as certezas, e que vêm a caracterizar um perfil específico das profissionais.
As representações sociais surgem influenciando pensamentos e atitudes, e por
conseqüência, desencadeando mudanças - necessárias na constituição do perfil das
professoras enquanto profissionais da Educação Infantil – que surgem pelo contato de suas
próprias representações com as de outras pessoas (profissionais de sua mesma área, pais das
crianças com as quais atuam).
As representações sociais podem contribuir para que sejam ultrapassados antigos
conceitos observados como imprescindíveis para a profissão (ser mulher, ser mãe, históricos
de cuidado e assistencialismo), por um novo conceito, que envolve formação específica das
professoras de Educação Infantil (tanto inicial quanto continuada) e a relação entre cuidado e
educação na mesma instituição, visando qualidade no serviço oferecido.
A contribuição desta pesquisa consiste na tentativa de se refletir e pensar em
caminhos didáticos que incentivem e aprimorem a formação das professoras, tendo por base
as informações de que a grande maioria delas apresenta interesse pela formação em serviço,
em especial se esta ocorrer no local de trabalho, e atendendo suas necessidades, dúvidas,
dificuldades e angústias. Acredito que o caminho está na reflexão do grupo de trabalho,
fortalecendo o aspecto do coletivo, trocando informações, experiências e idéias.
Como afirma Nóvoa (1992):
Práticas de formação que tomem como referência as dimensões coletivas
contribuem para a emancipação profissional e para a consolidação de uma
profissão que é autônoma na produção dos seus saberes e dos seus valores.
(...)
A formação pode estimular o desenvolvimento profissional dos professores,
no quadro de uma autonomia contextualizada da profissão docente. Importa
valorizar paradigmas de formação que promovam a preparação de
professores reflexivos, que assumam a responsabilidade do seu próprio
desenvolvimento profissional e que participem como protagonistas na
implementação de políticas educativas. (p.27)
Existe a necessidade de que sejam diversificadas as práticas de formação, inserindo
nesta modalidade o fator reflexivo: a professora de Educação Infantil, agora refiro-me a todas
elas, deve (re)pensar sobre a sua prática diária para que tenha argumentos para caracterizar
melhor suas características enquanto professora de crianças pequenas. Como afirma Nóvoa
174
(1992): “a formação não se faz antes da mudança, faz-se durante”, assim sendo, se existe a
necessidade de que a sociedade (incluindo os pais das crianças com as quais atuam)
modifiquem seus conceitos a respeito das professoras-profissionais de Educação Infantil, a
mudança deve partir delas: que continuem participando deste difícil processo, mas que trará
resultados, de buscar sua identificação enquanto professoras de Educação Infantil.
175
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