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Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE
Campus de Toledo - PR
Centro de Ciências Sociais Aplicadas
Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio
Economia Agrária
Análise da tendência à redução do número de bóias-frias em Toledo/PR, a partir de
1970, redução influenciada pela modernização agrícola e pelas alterações nas culturas
produzidas
Silvia Cristina Bender Greco
Toledo - Paraná – Brasil
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SILVIA CRISTINA BENDER GRECO
Análise da tendência à redução do número de bóias-frias em Toledo/PR, a partir de
1970, redução influenciada pela modernização agrícola e pelas alterações nas culturas
produzidas
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Desenvolvimento Regional e
Agronegócio, da Universidade Estadual do
Oeste do Paraná, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Silvio Antônio
Colognese.
TOLEDO/PR
2007
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Ficha catalográfica elaborada por Kely Comin CRB 1177
g
G791a
Greco, Silvia Cristina Bender.
Análise da tendência à redução do número de bóias-frias
em Toledo/PR, a partir de 1970, redução influenciada pela
modernização agrícola e pelas alterações nas culturas
produzidas / Silvia Cristina Bender Greco. - Toledo, PR : [s.n],
2007.
110f.
Orientador: Dr. Silvio Antonio Colognese.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual do Oeste
do Paraná.
Bibliografia
1. Bóias-frias. 2. Mecanização Agrícola. 3. Modernização
Agrícola. 4. Alterações nas Culturas produzidas.
I. Greco, Silvia Cristina Bender. II. Universidade Estadual do
Oeste do Paraná.
CDU 338.1098162
SILVIA CRISTINA BENDER GRECO
Análise da tendência à redução do número de bóias-frias em Toledo/PR, a partir de
1970, redução influenciada pela modernização agrícola e pelas alterações nas culturas
produzidas
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em
Desenvolvimento Regional e Agronegócio, da
Universidade Estadual do Oeste do Paraná, como
requisito parcial à obtenção do título de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Silvio Antônio Colognese.
COMISSÃO EXAMINADORA
_____________________________________
Prof. Dr. Silvio Antônio Colognese
Universidade Estadual do Oeste do Paraná
_____________________________________
Prof. Dr. Erneldo Schallenberger
Universidade Estadual do Oeste do Paraná
_____________________________________
Prof. Dr. Nelson Dacio Tomazi
Universidade Estadual de Londrina
Toledo, 12 de junho de 2007
A meu filho, Marcelo Henrique.
A meu esposo, Marcelo.
AGRADECIMENTOS
À Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Toledo, pela
oportunidade da realização do curso.
Ao meu professor orientador, Dr. Silvio Antonio Colognese, que acreditou em mim
e me orientou com paciência, conhecimentos e amizade.
Ao meu marido, Marcelo, que foi o grande incentivador e motivador para essa
realização, com o seu afeto e a sua compreensão.
Ao meu filho, Marcelo Henrique, que, muitas vezes, em meu colo dividiu minha
atenção com livros e bóias-frias.
Aos meus pais e aos meus irmãos, que me auxiliaram em momentos difíceis
motivando-me com o orgulho que demonstravam sentir de mim.
Aos meus colegas, pelo companheirismo e amizade.
Em especial ao professor Moacir Piffer, por acreditar em mim e me motivar,
com idéias e sugestões.
À Clarice, secretária do curso, pela competência, paciência, amizade e simpatia que
sempre me dedicou.
A todos os professores, que, através do seu conhecimento, possibilitaram essa
conquista.
A todos os agricultores e bóias-frias que dispensaram o seu tempo sem receio e sem
impaciência, colaborando de todas as formas possíveis para que este estudo se
tornasse realidade.
RESUMO
O presente estudo objetivou apresentar a relação entre a diminuição do número de bóias-
frias e a modernização ocorrida na agricultura do município de Toledo-PR, a partir da
década de 1970. Apresentamos uma descrição do processo de colonização e modernização
da agricultura do município para mostrar como o bóia-fria se insere nesse contexto.
Realizamos questionamentos com bóias-frias, agricultores e recrutadores (“gatos”). Esses
questionamentos apresentaram as opiniões sobre o surgimento e as tendências quanto à
diminuição dessa forma de trabalho. Identificamos que o principal fator apontado como
causa de surgimento dos bóias-frias é a modernização da agricultura, aliando-se as
alterações nas culturas produzidas. Quanto ás tendências futuras, apresentou-se uma
tendência à diminuição cada vez maior do número de bóias-frias. Esse fato seria
conseqüência dos avanços cada vez maiores em tecnologia, substituindo-se cada vez mais o
trabalho manual pelo mecânico. Podemos concluir que os bóias-frias tiveram uma enorme
importância para o processo de modernização da agricultura. Isso pela utilização desses
trabalhadores em etapas não mecanizadas inicialmente. Com o constante e gradual
desenvolvimento de máquinas, tecnologias e insumos, a redução da necessidade de bóias-
frias fez com que gradualmente essa população diminuísse de forma extrema, tendendo à
extinção.
Palavras-chave: Bóias-frias. Modernização agrícola. Alterações culturais. Mecanização
agrícola
ABSTRACT
This work presents the connection between the diminution in the amount of field men
(bóias-frias) and the agricultural modernization in Toledo-Pr, since 70’s decade. It is
presented a description of the colonization process and the agricultural modernization to
show how the field men (bóias-frias) are set on this context. Questions were done with the
field men (bóias-frias), farmers and agents (gatos). Its answers showed an opinion about the
beginning and trends related to this kind of work and its diminution. It was identified that
the main cause of field men (bóias-frias) beginning is the agricultural modernization, in
addition to the produced crops changes. About the trends, the results show that the amount
of field men (bóias-frias) is decreasing continuously. This fact may happen as a
consequence of technology development, where the mechanical works take place over
manual work. Overall, the field men (bóias-frias) had an enormous importance to the
agricultural modernization because the fact that their work were used to non-mechanical
duties, at that time. With the constant machines, technologies, and inputs development, it is
possible to conclude that the necessity of field men (bóias-frias) work has been decreasing
as well as its population, nearly extinct.
KEY-WORDS: field men (bóias-frias), agricultural modernization, culture’s changes,
agricultural mechanization.
LISTA DE TABELAS
Tabela 01
Evolução das populações residentes nas zonas rural e urbana entre
1940 e 1990, nas Regiões Sudeste, Sul e Centro-
Oeste....................................................................................................
44
Tabela 02
Evolução das populações residentes nas zonas rural e urbana entre
1940 e 1990, nas Regiões Norte e Nordeste e no
Brasil....................................................................................................
44
Tabela 03
Total das populações rurais e urbanas do Paraná, Região Oeste e
Toledo, entre 1970 e 2000................................................................... 75
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01
Alterações percentuais das populações rural e urbana no Brasil,
de 1940 a 2000..........................................................................................
24
Gráfico 02
Evolução das áreas cultivadas com fumo no município de Toledo entre
1974 e 2003...............................................................................................
63
Gráfico 03
Evolução das áreas cultivadas com feijão no município de Toledo entre
1974 e 2003................................................................................................
64
Gráfico 04
Evolução das áreas cultivadas com algodão herbáceo no município de
Toledo entre 1979 e 2003...........................................................................
66
Gráfico 05
Evolução das áreas cultivadas com arroz no município de Toledo entre
1975 e 2003................................................................................................
67
Gráfico 06
Evolução das áreas cultivadas com milho no município de Toledo entre
1974 e 2003................................................................................................
68
Gráfico 07
Evolução das áreas cultivadas com soja no município de Toledo entre
1974 e 2003................................................................................................
69
Gráfico 08
Evolução das áreas cultivadas com trigo no município de Toledo entre
1974 e 2003...............................................................................................
70
Gráfico 09
Comparativo entre as variações nas áreas cultivadas com soja, trigo,
milho, fumo, algodão, feijão, arroz entre 1974 e 2004.............................
71
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................................. 7
ABSTRACT........................................................................................................................... 8
LISTA DE TABELAS.......................................................................................................... 9
LISTA DE GRÁFICOS........................................................................................................ 10
SUMÁRIO............................................................................................................................. 11
1. INTRODUÇÃO................................................................................................................. 13
2. CARACTERIZAÇÃO DO BÓIA-FRIA........................................................................ 17
2.1. Literatura sobre o Bóia-Fria............................................................................................. 17
2.2 O Processo de Colonização e a Formação dos Bóias-Frias no Município de
Toledo/PR...............................................................................................................................
26
2.3 A Inserção do Bóia-Fria no Município de Toledo .......................................................... 35
3. FORMULAÇÃO DO PROBLEMA................................................................................ 38
3.1 A modernização Agrícola e os Bóias-Frias.................................................................... 38
3.2 Problema de Pesquisa....................................................................................................... 48
3.3 Hipóteses.......................................................................................................................... 49
3.4 Objetivos........................................................................................................................... 50
3.4.1 Objetivo Geral............................................................................................................... 50
3.4.2 Objetivos Específicos.................................................................................................... 50
4. METODOLOGIA............................................................................................................. 51
4.1 Revisão de Literatura Metodológica................................................................................. 51
4.2 Procedimento Metodológico e Fontes de Dados.............................................................. 52
4.3 Instrumentos de Coleta de Dados..................................................................................... 53
4.4 População e Amostra........................................................................................................ 55
5. O BÓIA-FRIA NA AGRICULTURA DE TOLEDO.................................................... 56
6. EXPECTATIVAS E TENDÊNCIAS PARA OS BÓIAS-FRIAS DO MUNICÍPIO
DE TOLEDO – PR...............................................................................................................
73
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 97
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................ 102
APÊNDICE.......................................................................................................................... 107
ANEXO................................................................................................................................. 110
1. INTRODUÇÃO
O objeto dessa pesquisa é o grupo ocupacional
1
dos bóias-frias
2
no município de
Toledo-PR. Mais objetivamente, o trabalho aborda o surgimento e o desenvolvimento da
categoria dos bóias-frias. Enfatiza a relação entre a sua existência e a modernização
agrícola
3
, especificamente no município de Toledo-PR. Para dar conta desse objeto,
organizamos o nosso estudo em seis partes principais.
Na primeira parte (Capítulo 2) iniciamos a apresentação de informações sobre o
assunto. Assim buscamos realizar a caracterização do objeto em estudo apresentando as
diversas formas de nomeação e caracterização existentes para o grupo ocupacional dos
bóias-frias. Tal caracterização fez-se necessária em função das divergências encontradas na
literatura a este respeito. De toda a discussão dessa parte, optamos pela utilização do termo
bóia-fria.
Após a determinação e caracterização do objeto em estudo e as suas características,
buscamos descrever o processo de colonização do município de Toledo-PR, visando
apresentar o surgimento e a inserção do bóia-fria nesse contexto. A caracterização do
processo de colonização do município permite um melhor entendimento sobre as relações
de trabalho existentes, principalmente pela forma seletiva como ocorreu.
Pelo fato de a agricultura de Toledo passar a ser considerada moderna em
conseqüência de mudanças estruturais no processo produtivo, houve a necessidade de
identificar como esse fato influenciou a existência dos bóias-frias. Essas mudanças na
agricultura toledana se devem, principalmente, ao desenvolvimento de novas máquinas e
equipamentos. Além disso, citamos o aumento na utilização dos mesmos, além de insumos
1
Grupo ocupacional
: é o conjunto de categorias funcionais reunidas segundo a correlação e a afinidade
existentes entre elas quanto à natureza do trabalho e/ou o grau de conhecimento.
(
http://www.sefaz.ma.gov.br/pccs/default.asp - acesso 06:03:07 as 20:35).
2
Bóia-fria: denominação dada ao trabalhador agrícola que não tem emprego de caráter permanente. O bóia-
fria vive em condições muito precárias na periferia das cidades pequenas ou médias, trabalha por certos
períodos de tempo em várias propriedades sendo contratado por intermediários. Seu nome deriva do fato de
que esses trabalhadores trazem as suas refeições de casa e não têm condições de aquecê-las nos locais onde
trabalham (SANDRONI , 2004).
3
Modernização agrícola:
consiste na utilização de máquinas, equipamentos e insumos mais desenvolvidos
objetivando melhorar a produtividade (SANDRONI , 2004).
14
que tornaram o processo produtivo menos oneroso para os trabalhadores rurais. A segunda
parte encerra-se com a descrição de como ocorre a inserção dos bóias-frias no município.
A terceira parte traz o problema em questão, mostrando qual a relação entre a
modernização agrícola e a diminuição do número de bóias-frias. Uma dúvida surge dessa
relação, ou seja, a modernização é responsável pelo processo de diminuição?
Diante dessa dúvida, traçamos algumas hipóteses, ou seja, é possível que a
modernização da agricultura seja realmente responsável pelo desaparecimento dos bóias-
frias, pela utilização crescente de máquinas, equipamentos e insumos. Além disso,
possivelmente as alterações culturais tiveram grande responsabilidade na redução da
demanda por bóias-frias o que levaria ao processo de extinção das respectivas vagas de
trabalho e migração dos trabalhadores para outras ocupações, especialmente em áreas
urbanas.
Feitos tais esclarecimentos, surgiu à dúvida sobre a relação que existe entre o
processo de desaparecimento do grupo ocupacional dos bóias-frias e a modernização da
agricultura do município de Toledo a partir da década de 1970.
Assim sendo, traçamos alguns objetivos que se justificam pela necessidade de
explicação sobre a questão do desaparecimento do grupo ocupacional dos bóias-frias em
Toledo. Frente à grande importância desses trabalhadores e à carência de informações sobre
o seu processo de evolução e redução. Esses objetivos visam confrontar o tema com as
alterações agrícolas apresentadas pelo município de Toledo no mesmo período.
Na quarta parte apresentamos todos os processos metodológicos utilizados no
desenvolvimento da pesquisa. Descrevemos as fontes dos dados, os instrumentos utilizados
na coleta dos mesmos, bem como apresentando a população e a amostra em estudo. Para
tanto, utilizamos, como base de referência, obras de vários autores que tratam das alterações
sofridas pela agricultura e os conseqüentes efeitos sobre os trabalhadores bóias-frias.
O referencial bibliográfico adquiriu, contudo, maior representatividade quando
comparado às informações obtidas diretamente do objeto em estudo. Assim sendo, foram
aplicados, de forma aleatória, questionários a 50 bóias-frias do município. Objetivamos
obter informações que permitissem uma caracterização do perfil real destes trabalhadores
toledanos, bem como uma avaliação das tendências inerentes ao futuro profissional dos
mesmos em sua perspectiva pessoal.
15
O questionamento e o contado direto com os bóias-frias residentes no perímetro
urbano do município de Toledo permitiram que obtivéssemos uma compreensão dos fatos
acontecidos, de acordo com a opinião dos bóias-frias.
Duas das obras analisadas no presente estudo (D’incao, 1979 e Broietti, 2000)
trazem como amostra 50 bóias-frias analisados, mas ambos os estudos diferem-se em região
e objetivos. Trata-se, porém, de pesquisas de extrema importância para o assunto. Dessa
forma, optamos pela análise de uma amostragem de igual tamanho.
Para que não houvesse possibilidade de ausência de informações, buscamos,
contudo, outras técnicas como referência. Para o êxito do questionamento, tomamos por
base duas técnicas, uma conhecida como “bola de neve” e a outra como “ponto de
saturação”. Essas técnicas visam o questionamento dos indivíduos sem um número amostral
determinado, a fim de coletar informações até que se tenha uma visão clara das relações
analisadas ou que se saturem os temas analisados.
Além desses questionamentos, foram realizadas entrevistas com 15 agricultores e 2
“gatos” (recrutadores).
A quinta parte apresenta a relação do bóia-fria e a agricultura de Toledo, onde
buscamos caracterizar a agricultura do município e as alterações culturais ocorridas a partir
da década de 1970. Esses fatores são apresentados buscando mostrar como o bóia-fria se
insere nesse contexto de alterações sofridas pela agricultura toledana.
Dessa forma, surgem características específicas no processo de transformação do
setor agrícola de Toledo, características que devem ser analisadas de forma distinta.
Entendemos que as características da agricultura toledana devem ser analisadas
individualmente em suas causas e conseqüências.
Terminadas essas etapas, na sexta parte pudemos desenvolver a análise de todas as
relações identificadas na pesquisa que realizamos com os bóias-frias, com os agricultores e
com os “gatos”
4
(recrutadores). Além disso, realizamos a análise dos dados e das estatísticas
obtidas de fontes secundárias.
Traçamos a relação entre esses dados secundários e os dados primários objetivando
confirmar as hipóteses e cumprir os objetivos propostos. Nesta sexta parte podemos
4
Gatos: são os indivíduos responsáveis pelo recrutamento dos trabalhadores bóias-frias, além do transporte, da
fiscalização das atividades desenvolvidas e, em alguns casos, eram responsáveis, também, pelo pagamento
dos trabalhadores. São indivíduos que possuíam um veículo, geralmente uma caminhonete, utilizado no
transporte e obtinha dessa atividade uma das grandes fontes de renda nos períodos de colheitas ou alguns tratos
culturais. Fora dessa atividade, realizavam fretes dos mais variados (transportavam animais, máquinas,
móveis, entre outros). (definição da autora)
16
apresentar informações sobre a visão dos bóias-frias sobre as tendências de redução dessa
forma de trabalho. Além disso, apresentamos o modo como os agricultores vêem esse grupo
ocupacional e as tendências para o mesmo grupo. Essa análise completa-se com as
informações dos “gatos” questionados.
Podemos desenvolver a sétima etapa, após toda a descrição e análise das relações
entre a modernização da agricultura e a redução do número dos bóias-frias e a apresentação
2. CARACTERIZAÇÃO DO BÓIA-FRIA
2.1. Literatura sobre o bóia-fria
Os bóias-frias recebem essa denominação por ingerirem seus alimentos frios, uma
vez que não possuíam condições de aquecê-lo no campo. Quanto às formas de nominação
desses trabalhadores, existem as mais diversas. Na Região Sul, os termos mais utilizados
são bóias-frias ou trabalhadores volantes. Existem, entretanto, outras definições, que
variam a cada região, como: peão, empreiteiro, trabalhador volante, trabalhador temporário,
diarista, corumbas, birolos, clandestinos, moradores de rua, pau-de-arara, entre outras
apresentadas no Anexo I.
A diversidade de fatores apresentados como características básicas associadas a
esse grupo social fez necessário que caracterizássemos esses trabalhadores para a
determinação de qual é o objeto em estudo. Na presente pesquisa optamos por estudar
indivíduos que apresentem características como sendo trabalhadores residentes em áreas
urbanas, que prestam serviços de forma temporária ao setor agrícola.
Esses serviços visavam suprir necessidades maiores de mão-de-obra em certos
períodos de tempo, sem qualquer espécie de vínculo empregatício. Recebiam a
remuneração por atividade desempenhada, por produção ou por dia de serviço. Como
denominação, utilizamos o termo “bóia-fria”.
D’incao (1984) caracterizou o bóia-fria como:
[...] uma população errante que se desloca nas próprias regiões de origem, ou de
uma região para outra à procura de trabalho. Uma massa trabalhadora,
subempregada, que é absorvida pelo sistema produtivo – especialmente no setor
agrícola – de forma itinerante e intermitente, tendendo a se concentrar com maior
intensidade nas regiões de agricultura mais desenvolvida (D’INCAO, 1984, p.
10).
18
Fleischfresser (1988), Mattos Neto (1988) e Otero Ribeiro (1981) concordaram ao
apresentarem o surgimento dos bóias-frias vinculado às dificuldades de integração da mão-
de-obra originária da zona rural em um complexo e moderno sistema industrial urbano. Esse
excedente de trabalhadores surge, principalmente, pela modernização e mecanização
agrícola (instrumentos, máquinas, equipamentos, insumos, entre outros).
Quanto a esse processo de surgimento dos bóias-frias, Aguirre e Bianchi (1989)
buscaram analisar esse processo de forma diferenciada, ou seja, através da necessidade de
acumulação para a atividade capitalista. Essa acumulação poderia se dar pela utilização de
jornadas amplas de trabalho, aumento na produtividade ou na intensidade do trabalho.
O contrato de trabalho temporário representaria, segundo Ramos (1999), o marco da
desregulamentação dos direitos do trabalhador no Brasil. A jornada de trabalho já se
apresentava exaustiva, a intensidade do trabalho só poderia ser ampliada caso houvesse um
grande incentivo aos trabalhadores. Dessa forma, a acumulação foi viabilizada pelos
investimentos em capital fixo.
Grandes estudiosos buscaram estudar esse grupo ocupacional e as suas origens.
Muitos estudos realizados enfatizam, contudo, a modernização agrícola como causador da
migração rural urbana. Ou seja, sobre a questão da modernização agrícola e da evasão da
população rural em direção aos centros urbanos. São estudos que apresentam o
desenvolvimento tecnológico da agricultura brasileira e, principalmente, a paranaense, como
gerador de um excedente de mão-de-obra (IPARDES, 1986).
Essa diversidade de relatos sobre o surgimento dos bóias-frias apresenta, em grande
parte de seus relatos, uma origem homogênea para todas as regiões do Brasil. Entretanto,
cada região possui características específicas.
É nesse sentido que essa pesquisa teve como objeto de estudo o porquê do
surgimento dos bóias-frias e quais foram os fatores responsáveis pela sua formação e pela
sua redução, analisando as características individuais da formação da mão-de-obra volante
no município de Toledo.
Diante disso, para Graziano da Silva (1980), a diferenciação entre cidade e campo,
isto aliado ao processo de industrialização da agricultura, estas seriam as principais causas
da proletarização do campesinato. Essa proletarização ocorre como uma subordinação do
trabalho ao capital e não sob a forma de expropriação. Assim, o avanço do capitalismo
sobre a agricultura, reduziria a sazonalidade da mão-de-obra no setor rural. O camponês se
19
transforma em um assalariado temporário pela transformação de algumas atividades
agrícolas em ramos de atividades industriais.
Conforme aumenta a mecanização, assim se eleva, também, a sazonalidade da
ocupação dessa mão-de-obra. Para os proprietários, a solução mais econômica é a
substituição do trabalho fixo pelo temporário, o que agrava a situação dos trabalhadores
fixos.
Conforme Graziano da Silva (1980), o trabalho temporário se impõe aos pequenos
proprietários, aos parceiros ou aos arrendatários, que não possuem condições de sobreviver
com a produção das suas terras. Impõe-se também, aos trabalhadores totalmente
desprovidos de terras. Destaca, ainda, a importância desses trabalhadores como forma de
suprir as variações sazonais da necessidade de mão-de-obra sem que isso se reflita na folha
de salário para os proprietários.
Além disso, apresentam-se outras vantagens, pois o trabalho temporário permitiu, e
ainda permite, a complementação da renda dos trabalhadores. Para a empresa capitalista,
existe a vantagem de não precisar pagar pelo tempo em que o funcionário fica parado, ou
seja, não paga pela sua sazonalidade. O trabalho temporário serviu como complementação
de atividades no processo produtivo. Algumas culturas tinham apenas algumas etapas do
processo mecanizadas, no processo de modernização da agricultura.
Segundo Otero Ribeiro (1981), a modernização da agricultura brasileira,
intensificada entre os anos 1960 e 1970, teve características conservadoras, pois privilegiou
algumas regiões e culturas, além de beneficiar médios e grandes proprietários. Gerou a
expropriação de alguns pequenos agricultores, além do surgimento de uma classe proletária
no campo.
Assim, o aumento do mercado interno brasileiro de bens industriais ocorreu de
maneira semelhante a todo o mundo capitalista, ou seja, através da expropriação dos
camponeses como produtores independentes, transformando-os em miseráveis bóias-frias.
Esses trabalhadores, geralmente, não conseguiam ocupar-se ou manter-se através da venda
de sua força de trabalho.
Dessa forma, Graziano da Silva (1982) caracteriza o desenvolvimento do
capitalismo brasileiro no campo como lento e desigual (industrialização tardia). Cabe aqui
caracterizar o termo proletariado, utilizado por Graziano da Silva em seus estudos como
sendo a expropriação dos pequenos produtores familiares e sua conversão em assalariados
sem terra. Além disso, há ainda o aumento das atividades auxiliares que permite que os
20
mesmos se transformem em trabalhadores temporários. Não é apenas a expropriação dos
meios de produção, mas também a subordinação do trabalho ao capital.
Nesse contexto, o trabalhador volante apresentou-se como a expressão da
insuficiência do capitalismo, pois a modernização da agricultura ocorreu de forma parcial
(algumas regiões ou produtos). Assim, o trabalhador volante representou uma forma
transitória do processo de proletarização do camponês (SOTO, 2002).
Dessa forma, para o autor, somente se assalaria quem não tem meios próprios de
produção ou quem não possa garantir a sua reprodução através da utilização de seus meios
de produção. Decorre que o trabalho temporário foi responsável por mais da metade de
todos os empregos criados na agricultura entre 1970 e 1980.
A modernização da agricultura brasileira ocorreu de maneira extremamente desigual
entre as regiões. Além disso, considera-se ter sido parcial, por atingir apenas algumas fases
do processo produtivo de alguns produtos. Um exemplo é a cultura da cana-de-açúcar, que
teve implantada novas tecnologias na fase de preparo do solo e tratos culturais, contudo, na
fase de colheita, necessita-se de enormes quantidades de trabalhadores (GRAZIANO DA
SILVA, 1997).
Para que houvesse uma transição da agricultura tradicional para uma agricultura
mais moderna, fez-se necessária a utilização de bóias-frias, como parte do processo, pois a
agricultura toledana caracterizava-se inicialmente pela policultura, com o cultivo apenas
para subsistência. O início da década de 1970 trouxe grandes alterações econômicas e
sociais no município de Toledo, principalmente pelas políticas governamentais de incentivo
à agricultura. Essas políticas visavam ao aumento e à modernização do setor, com o
objetivo de melhorar o saldo de exportações.
Como as culturas de trigo e da soja se apresentaram extremamente adaptáveis às
condições de solo e clima da região, a adaptabilidade possibilitou uma produção em larga
escala. Esse fato fez com que o binômio soja/trigo se tornasse o maior ciclo econômico do
município de Toledo. Essa fase torna extremamente onerosas as aquisições de insumos, de
máquinas e de equipamentos, além de provocar uma redução na mão-de-obra utilizada no
setor. Tais fatores, aliados a uma produtividade em larga escada de soja e trigo, culminaram
em uma supervalorização das terras no município.
21
Esse fato propiciou um crescimento econômico
5
intenso no município, uma redução
da chegada de novos agricultores e o aumento da saída de agricultores residentes no
município. Essas migrações constituem-se, em sua grande maioria, por pequenos
proprietários que se dirigiram a novas fronteiras agrícolas. Essas novas fronteiras
geralmente eram em Estados como Mato Grosso de Sul e Tocantins.
O processo de alteração das características da agricultura de Toledo reflete-se na
grande redução da mão-de-obra, principalmente de bóias-frias utilizados na agricultura.
Culturas como a soja e o trigo são de fácil mecanização, aliando-se a existência de
maquinários adequados ao processo produtivo. Além desses fatores, as condições do solo e
do relevo da região são propícias à mecanização. Conseqüentemente, esses fatores causaram
uma grande redução na demanda por trabalhadores temporários.
Tal fato, apresentou-se como um dos principais fatores relacionados ao êxodo rural e à
liberação de excedentes de trabalhadores para as áreas urbanas. Para Fleischfresser (1988), a
tendência verificada no país foi a de que a modernização agrícola veio acompanhada pelo
aumento da desigualdade sócioeconômica entre os produtores.
A introdução de técnicas produtivas avançadas fez com que o tamanho da área se
tornasse uma oportunidade para uns, mas, para outros, uma barreira à introdução do
processo de tecnificação. Nesse contexto, os trabalhadores fixos das propriedades agrícolas
passaram a tornarem-se cada vez menos necessários. Dessa forma, a dificuldade de
obtenção dessas tecnologias se mostrou um dos maiores fatores causadores de
desigualdades no meio rural. Produtores que possuíam áreas produtivas menores tinham
maior dificuldade na obtenção de recursos para a aquisição das novas tecnologias. Situação
inversa é vivida pelos produtores com maiores áreas de terra.
A redução da necessidade de trabalho braçal propiciou o surgimento de uma grande
parcela de trabalhadores desempregados rurais. Em parte, tais trabalhadores recorreram às
áreas urbanas visando colocação profissional, o que geralmente não acontecia.
O número de desempregados aumentava gradativamente em virtude de políticas
econômicas adotadas pelos governos. A busca pela produção de culturas voltadas ao
mercado externo gerou um certo “desânimo” por parte dos agricultores. Esse desânimo
ocorreu sobre as culturas de produtos com maiores necessidades de tratos culturais manuais,
e que estariam mais sujeitas às intempéries climáticas. Dentre esses produtos destacam-se
5
Crescimento econômico: aumento na capacidade produtiva da economia e, portanto, da produção de bens e
serviços de determinado país ou área (SANDRONI , 2004).
22
principalmente as culturas como algodão, fumo e feijão. Tais culturas são mais suscetíveis a
perdas causadas por fatores climáticos.
Fleischfresser (1988) confirma tal fato afirmando que, no caso do Paraná, na década de
1970, essas medidas de política econômica para o setor agrícola tiveram maior
representatividade. Esse fato ocorreu pois coincidia com um período de esgotamento de suas
fronteiras agrícolas. Tais medidas privilegiavam os produtos de maior valor comercial
destinados à exportação, visando mercado externo, em prejuízo à produção de alimentos em
geral.
O início da década de 1970 apresenta grandes alterações na estrutura econômica do
município, haja vista as mudanças na política agrícola, objetivando modernizar a agricultura
a fim de obter aumentos nos índices de exportação. Dessa forma, houve muitos incentivos
ao cultivo de produtos destinados ao mercado externo como soja e trigo.Tais culturas eram
de fácil mecanização tendo em vista as condições de relevo e clima do município, que
tornaram estes produtos os mais cultivados até os dias atuais. É possível que esse fato seja
apontado como grande causador de desemprego de bóias-frias.
Assim sendo, a introdução e o desenvolvimento do binômio soja/trigo, isto aliado às
facilidades de mecanização de seu processo produtivo, impactaram negativamente sobre
grande parcela de trabalhadores rurais. Haja vista a redução da necessidade de
trabalhadores, substituídos por máquinas e equipamentos em praticamente todas as fases do
processo produtivo (BONI & CUNHA, 2002).
O setor agrícola foi uma grande fonte de mão-de-obra para o setor urbano,
principalmente a partir do aumento na utilização de máquinas agrícolas em substituição a
serviço braçal nos trabalhos agrícolas. Em decorrência, houve uma intensificação do
processo de migração
6
rural-urbana, ocasionando algumas alterações sociais. A
intensificação desse processo contribuiu intensamente para o inchaço das cidades,
colaborando dessa forma para o surgimento de áreas periféricas. Torna-se inevitável a
conseqüente depressão dos salários pelo excesso de trabalhadores (MARTINE & GARCIA,
1987).
De acordo com alguns autores como Ribeiro et al. (2002), Miklós (2000), Martine &
Garcia (1987) e Azevedo et al. (2000), a modernização agrícola e o desenvolvimento
7
6
Migração: mudar periodicamente, passar de uma região para outra, de um país para outro (FERREIRA,
2005).
7
Desenvolvimento
é o processo de mudança estrutural que leva à melhora do bem-estar de sua população.
(BACHA, 2004 ).
23
industrial possibilitaram um crescimento nos lucros, porém causando graves prejuízos.
Entre esses pontos negativos citam-se os danos ambientais, a concentração fundiária e o
surgimento do grupo social dos bóias-frias.
Esse assunto é tratado por D'incao (1979), dando ênfase à geração de problemas
como a escassez de trabalho, a expulsão do homem do campo e o conseqüente surgimento
dos bóias-frias. Esses trabalhadores constituem-se em uma parcela de trabalhadores que têm
na venda de sua força de trabalho a principal forma de subsistência, os denominados bóias-
frias.
As vantagens e desvantagens do processo de modernização da agricultura também
foram apresentadas por Guimarães (1982), que destaca o aumento da produtividade como
fator positivo e como fator negativo a dificuldade de acesso dos pequenos e médios
produtores a todas as atividades e benefícios da economia agrícola.
Algumas características inerentes aos bóias-frias foram apresentadas por autores
como Vicente (1998), Abreu (1995), Sallum Junior (1982) e Gonzáles & Bastos (1979).
Tais autores destacam que a divisão do trabalho pelos membros da família desaparece,
inexistindo, dessa forma, diferenciação entre idade e sexo dos trabalhadores. Todos
executam as mesmas atividades e são remunerados da mesma forma.
De acordo com IPARDES (1979) e Fleischfresser (1988), os bóias-frias apresentam
as mesmas características em seu processo de surgimento e a sua realidade socioeconômica
tanto a nível nacional, quanto a nível estadual e regional, é a mesma.
Cada região possui, entretanto, características específicas em seu processo de
modernização agrícola. Essa diferenciação mostra a importância do estudo individualizado
das formas apresentadas em cada processo de modernização agrícola e surgimento dos
bóias-frias. O setor agrícola mantinha, contudo, como principal incumbência, a geração de
excedentes que possibilitariam o financiamento do processo produtivo e industrial.
Assim sendo, De Masi (2003) afirma que a sociedade industrial não deu menos
importância à produção agrícola e, sim, deu menos importância aos trabalhadores agrícolas.
Isso se deve aos incentivos para a utilização de máquinas, como tratores, plantadeiras e
colheitadeiras, além de insumos agrícolas substituindo a utilização da mão-de-obra direta.
Essa menor ênfase aos trabalhadores permitiu que, cada vez mais, se substituísse
essa mão-de-obra por alguns equipamentos ou máquinas. Esses trabalhadores substituídos
necessitavam buscar outras fontes de renda. As alterações ocorridas na agricultura visavam
24
a uma maior especialização na produção. Nesse contexto, os trabalhadores fixos reduziram-
se gradativamente, e a existência de trabalhadores temporários tornava-se cada vez maior.
Assim, as novas exigências, quanto à especialização da produção agrícola,
transformaram a agricultura voltada ao atendimento das necessidades básicas em uma
agricultura moderna, responsável pela produção de mercadorias. Essa transformação
ocorreu tendo como base a implantação de novas máquinas, equipamentos e insumos.
Assim os colonos passaram a serem produtores de mercadorias (COLOGNESE et al, 1999).
No decorrer de todo esse processo, toda essa alteração nas relações agrícolas
ampliava o processo de migração rural-urbana. Isso ocasionou grandes dificuldades de
integração da mão-de-obra originária da zona rural em um complexo e moderno sistema
industrial urbano, gerando-se excedentes de trabalhadores (FLEISCHFRESSER, 1988 e
MATTOS NETO, 1988).
Essa falta de integração muitas vezes transformava ex-agricultores em trabalhadores
que dependiam da venda direta da sua força de trabalho. Esses trabalhadores recebem várias
denominações, de acordo com a região à qual pertencem. Na Região Sul do Brasil, as
denominações mais comuns são trabalhadores volantes ou bóias-frias. O bóia-fria
caracteriza-se pela venda de sua força de trabalho de forma temporária sem vínculos
empregatícios, recebendo por produção ou por diária.
O desenvolvimento tecnológico da agricultura brasileira e, principalmente, a
paranaense, é tido como um dos grandes responsáveis pela geração de excedente de mão-de-
obra rural. No Paraná, o surgimento dos bóias-frias apresenta-se como conseqüência de dois
fatores básicos: o aumento da área cultivada com soja e a valorização das terras (IPARDES,
1979).
As transferências populacionais das áreas rurais para áreas urbanas é um processo
contínuo de longa data, entretanto a partir de 1970 é que esse processo se intensifica,
conforme se observa no Gráfico 01 (IPARDES, 1986).
25
Gráfico 1: Alterações percentuais das populações rural e urbana no Brasil, de 1940 a 2000
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000
anos
percentagem (%)
rural urbana
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, IBGE, 1990; Censo Demográfico IBGE 2000;
Essas alterações nos percentuais de populações rural e urbana apresentam, de forma
clara, todo o processo de êxodo rural. Esse processo reflete em grande parte a escassez de
empregos na zona rural e a falta de condições de sobrevivência dos trabalhadores rurais.
Esse processo é tido como um dos fatores mais significativos no processo migratório,
gerado principalmente por alterações tecnológicas agrícolas. Esses números indicam que a
forte migração às áreas urbanas permitia a formação de grande reserva de mão-de-obra
concentrada em áreas periféricas.
Essas concentrações periféricas, aliadas ao excesso de oferta de mão-de-obra e, em
muitos casos, à falta de qualificação, desencadearam aumentos expressivos nas quantidades
de trabalhadores que passam a desempenhar atividades de bóia-fria. Assim, o trabalho
temporário torna-se mais adequado às necessidades irregulares de mão-de-obra na
agricultura, além da praticidade para os proprietários quanto à ausência de vínculo
empregatício.
A região oeste paranaense apresenta um processo de modernização agrícola intensa.
Dessa forma, a agricultura de base familiar passou por um processo de transformação, onde
essa modernização, aliada ao êxodo rural, permitiu o predomínio das médias e grandes
propriedades (IPARDES, 1986).
Ainda conforme dados do IPARDES (2005), no município de Toledo as
propriedades consideradas pequenas, com o estrato de 20 a menos de 50 ha, representavam
26
28% da área total. Há, porém, o predomínio das médias propriedades, acima de 50 ha, que
ocupam 49% das terras do município.
Dessa forma, quando D’incao (1979) afirma que quanto mais desenvolvida a
agricultura mais atrativa ela será a trabalhadores bóias-frias, pode-se dizer que em algumas
regiões, tal fato pode ocorrer. No município de Toledo, contudo, o desenvolvimento da
agricultura mostra-se atrativo aos bóias-frias apenas em um primeiro momento de transição
e adaptação aos novos métodos de produção. Quando há uma certa adaptação às novas
tecnologias e o aumento da existência e utilização das mesmas, ocorre uma enorme redução
nas necessidades de utilização desses trabalhadores.
2.2 O Processo de Colonização e a Formação dos Bóias-Frias no Município de
Toledo/PR
O oeste do Paraná compreende os territórios entre os Rios Guarani, Iguaçu, Piquiri e
Paraná, permanecendo uma região esquecida durante toda a fase do Império. Somente após
a permissão do governo brasileiro à Argentina para navegação do Rio Paraná é que essa
região começou a ser mais exposta. A sua efetiva colonização teve maior ênfase, entretanto,
somente a partir da década de 1940 (COLODEL, 1989). É nessa época, de acordo com
Colodel (1989), que o potencial da região torna-se conhecido nacionalmente atraindo
interesses econômicos de forma muito intensa. Em princípio alguns produtores de café de
São Paulo e, na seqüência, migrantes do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Anteriormente, no fim do século XIX, com o início da exploração da erva-mate,
desenvolve-se uma agricultura de subsistência, através de colonos beneficiados com terras
pertencentes à Colônia. Entretanto, muitos desses agricultores abandonaram suas terras
migrando para outras regiões em busca de maiores lucros através da exploração da madeira
e da erva-mate. Esses agricultores tornaram-se conhecidos e denominados pelo governo
como “desterrados” (WASCHOWICZ, 2001, p.233).
27
A revolução de 1924 trouxe alguns benefícios para a região oeste, principalmente
seu conhecimento a nível nacional pelo fato de a população da região ser composta
basicamente por argentinos e guaranis, ou seja, a região era quase que totalmente
dependente da Argentina. Essa realidade fez com que o governo brasileiro buscasse
alternativas para “nacionalizar” a fronteira do oeste do Paraná. Uma das principais
alternativas para essa tentativa foi a atração dos excedentes de mão-de-obra agrícola dos
Estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Esses excedentes seriam responsáveis
pela criação de um mercado produtor e consumidor, desenvolvendo e garantindo a posse da
região ao Brasil (WASCHOWICZ, 2001, p. 229).
A primeira leva de migrantes para a região oeste do Paraná encontrou enormes
dificuldades quanto ao clima e às densas matas. Isso gerou um certo desânimo, o que fez
com que muitos deixassem a região. Assim, para que se efetivasse a colonização, foi
necessária a destoca e a abertura de estradas na região. Para tanto utilizava-se de
trabalhadores mensus
8
que residiam na região. Além dos mensus, utilizaram-se outras
fontes de trabalho baratas, como trabalhadores provenientes de outras regiões do país, que
viram possibilidades de crescimento na região.
Essa corrente migratória era formada por gente originária de Estados como São
Paulo e Minas Gerais, entre outros, e se dirigiram para o interior paranaense em busca de
ocupação nas lavouras de café no norte do Paraná. Ou ainda, buscaram oportunidades de
melhoria no processo de colonização do oeste do Paraná (CHIBA & SOUZA, 1994).
A ocupação efetiva de Toledo ocorreu nas décadas de 1940 e 1950, baseada em
agricultores gaúchos e catarinenses. Toledo pertencia à Fazenda Britânia, que era de
propriedade da Companhia de Maderas Del Alto Paraná, de origem inglesa, sediada em
Buenos Aires na Argentina, sendo posteriormente vendida à Industrial Madeireira
Colonizadora Rio Paraná S/A – MARIPÁ.
A companhia dividiu a fazenda em áreas de aproximadamente 25 hectares, pois
seriam de fácil e segura aquisição por parte dos pequenos proprietários, o que estimulou a
migração e o conseqüente denso povoamento da região (WACHOWICZ,1982).
Um dos principais fatores que caracterizou a ocupação do município e da região foi a
seleção dos migrantes. As agências recrutadoras instaladas nos Estados de Santa Catarina e,
8
Os mensus
são trabalhadores de origem, geralmente, paraguaia, que se propunham a trabalhar braçalmente
em uma obrage. O termo equivale a peão, a expressão vem do espanhol mensual, ou seja, mensalista
(COLODEL, 1988, p. 53).
28
principalmente, Rio Grande do Sul, responsáveis pela propaganda e recrutamento dos
colonos migrantes, realizavam uma espécie de seleção dos agricultores e demais
interessados em migrarem para a região.
Buscavam, com isso, evitar a chegada de elementos que não possuíssem o real
propósito de contribuírem para o desenvolvimento regional, ou seja, não se permitiriam
aventureiros (CHIBA & SOUZA, 1994).
Esse fato não impediu a chegada e a instalação de uma população de baixa renda em
busca de condições para seu desenvolvimento. Essa população instalou-se de forma
desorganizada no lado do Rio Toledo oposto à área projetada da cidade, pois essa margem
não pertencia inicialmente à colonizadora, sendo assim não recebia investimentos da
mesma. Geraram-se dois núcleos urbanos distintos em Toledo, uma área mais desenvolvida
e uma área totalmente desestruturada.
Esses trabalhadores da área desestruturada representaram uma grande fonte de mão-
de-obra em todo o processo de abertura de lavouras e demais atividades agrícolas.
Entretanto, a primeira e importantíssima fonte de mão-de-obra para as atividades de destoca
e aberturas de novas áreas agrícolas foram trabalhadores de origem paraguaia que aqui já
residiam ou que vinham em busca de ocupação provindos do Paraguai.
Esses elementos eram fundamentais na realização de atividades braçais penosas,
sendo relegados a funções como derrubada de árvores e abertura de estradas, entre outras.
Não possuíam condições financeiras para a aquisição de uma propriedade agrícola para sua
sobrevivência, por isso trabalhavam de forma temporária em propriedades que demandavam
muita mão-de-obra.
Essas figuras extremamente importantes, interessantes e de pouco destaque, foram os
trabalhadores que executavam as tarefas mais árduas sem acesso a terras. Não podiam
cultivar nenhum produto para seu sustento, viviam da venda de sua mão-de-obra através de
contratos com as empresas que exploravam a região.
Para garantir seu sustento precisavam ir a busca de novas propriedades que
necessitassem de roçadas, ou destocas. Esses trabalhadores tornaram-se conhecidos como
mensu, ou mensalista, pois recebiam uma espécie de salário mensal.
De origem geralmente paraguaia, os mensus eram explorados ao máximo, pois
executavam as tarefas mais difíceis, sem garantia de ocupações posteriores. O recebimento
de salário mensal não garantia que o mensu teria uma ocupação no mês seguinte, ou algum
vínculo trabalhista.
29
Os mesmos eram explorados enquanto necessários para as empresas que extraiam
valores da região. Quando não havia atividade a ser desempenhada, esses trabalhadores não
recebiam salários. Isso os obrigava a estar em constante procura de novas ocupações.
Essas características permitem-nos compará-los aos bóias-frias existentes. Sobretudo
pela condição de exploração, pela execução de tarefas temporárias, e principalmente pela
dependência da venda de sua força de trabalho para o seu sustento. Efetivamente, o que os
descaracteriza como bóias-frias é o fato de que os mensus eram contratados por mês e
recebiam uma forma de salário, porém sem qualquer garantia de continuação de atividades.
Já os bóias-frias são contratados por tarefas ou por diárias, também sem qualquer espécie de
vínculo empregatício.
Os mensus tiveram uma grande redução na quantidade de atividades desempenhadas
por causa da redução das explorações de madeira e erva-mate na região. Muitos se dirigiram
para outras regiões ou retornaram a seu país de origem. Alguns insistiram e persistiram na
região, sobrevivendo de pequenos serviços prestados aos poucos colonizadores que aqui
existiam.
A presença de trabalhadores sem vínculos e que dependiam da venda da sua força de
trabalho para subsistência foi constante desde o início do processo de exploração da região
oeste pelas obrages
9
. Com a modernização da agricultura do município, essas pessoas
passaram a desempenhar uma função de grande importância para os agricultores, ou seja, a
realização de atividades mais árduas e penosas.
Esses trabalhadores mensus foram submissos aos obrageros
10
, perdendo seus
referenciais culturais, tornando-se indivíduos degradados humana e socialmente, como as
condições apresentadas pelos bóias-frias (COLOGNESE, et al, 1999).
A utilização de mão-de-obra temporária foi importante fator de auxílio em todo o
processo de colonização de Toledo. A chegada dos migrantes dos outros Estados do Sul
impulsionou o desenvolvimento de Toledo, principalmente a atividade agrícola de base
familiar propulsora da economia toledana.
Os objetivos da colonizadora MARIPÁ, que eram a criação de uma agricultura
diversificada, de base familiar, que produzia para consumo próprio e local em pequena
escala, foram atingidos. A colonização do município realizada pela Maripá foi realizada
9
Obrages são
empreendimentos econômicos baseados no latifúndio extrativista e nas relações de trabalho de
servidão (GREGORY, 2002, p.89).
10
Obrageros são os proprietários das obrages.
30
de forma seletiva, ou seja, optava-se por determinados colonos, que apresentavam
características pré-determinadas. Essa seleção de migrantes não foi, contudo, uma
característica apenas da colonizadora Maripá, ou seja, estava presente nas exigências de
outras colonizadoras responsáveis pelo processo de colonização do oeste do Paraná. Isso se
deve a exigências de conotação econômica, geradas por valores culturais e a preconceitos
dos administradores (GREGORY, 2002).
Segundo o autor supracitado, tal fato, aliado à modernização da agricultura no oeste
do Paraná, é que proporcionou a tendência de concentração de propriedades e de
concentração de produção.
A região oeste paranaense passou por um processo altamente seletivo de
modernização, tanto em caráter espacial quanto em nível de estratificação fundiária. Essa
tendência, de acordo com Figueiredo (1984), se manterá em seu desdobramento posterior.
Essa desigualdade apresenta-se, pois as pequenas propriedades se utilizavam de
trabalhadores temporários para algumas etapas da produção em que apenas o trabalho
familiar não fosse suficiente.
As propriedades de maior porte utilizavam esses trabalhadores em mais atividades,
pelo fato de que os trabalhadores contratados fixos não eram suficientes para completarem
algumas atividades necessárias. As propriedades que não utilizavam trabalho familiar
contratavam famílias, geralmente, para residirem na propriedade e desenvolverem as
atividades necessárias. As culturas produzidas, aliadas à escassez de máquinas e
equipamentos, ou insumos, como agrotóxicos, contudo, geralmente demandavam
trabalhadores extras, em propriedades de qualquer porte.
As culturas que mais demandavam mão-de-obra eram o café, o algodão e o fumo.
Essas atividades não apresentavam muitas possibilidades de mecanização, assim a grande
maioria dos tratos culturais ocorria de forma manual. Dentre as atividades que mais
necessitavam de trabalhadores destacam-se a capina e a colheita. Essas etapas faziam com
que se contratassem grandes levas de trabalhadores nesses períodos.
E alterações tiveram seu começo a partir do início da década de 1960. Nessa década
houve uma alteração nas relações produtivas nacionais, alteração que gerou impactos diretos
na economia toledana. Esses impactos devem-se à chamada “Revolução Verde”, onde o
governo subsidiava créditos ao setor agrícola para estimular o cultivo de produtos voltados à
exportação.
31
Esses créditos destinavam-se principalmente a médias e grandes propriedades em
detrimento das pequenas propriedades, que eram a base da agricultura de Toledo. A
introdução do binômio soja/trigo, culturas voltadas à exportação, gerou uma certa pressão
sobre os agricultores para que esses se adaptassem à nova realidade.
Essas alterações impactaram diretamente nos trabalhadores do município. A
alteração do que se produzia na propriedade levou muitos agricultores a dispensar
trabalhadores fixos. Quando não se dispunha de capital para adquirir equipamentos ou
máquinas, havia a possibilidade de contratar esses serviços de outros agricultores.
Assim, a atividade agrícola torna-se extremamente profissionalizada, ou seja,
desenvolvem-se tecnologias, máquinas, equipamentos e insumos, além de grandes estímulos
à preservação e à conservação do solo (NIEDERAUER, 1992).
Ainda de acordo com o autor, essa condição de “pólo de atração” aos migrantes
começou a se reduzir, principalmente a partir da década de 1970. Essa redução se deu
principalmente pelo desenvolvimento tecnológico da agricultura e a conseqüente elevação
nos custos de produção e das terras.
Diante dessas condições, os trabalhadores, fixos ou temporários, tiveram a demanda
pelos seus trabalhos cada vez mais reduzida, sendo que os trabalhadores fixos que perderam
seus empregos precisaram buscar outros empregos. E as maiores ofertas de emprego
estavam na área urbana.
Houve um maior estímulo à urbanização, com maior destaque aos setores
secundários e terciários. O crescimento da área urbana, aliado ao encarecimento do processo
produtivo agrícola, propiciou um deslocamento de populações rurais para zonas urbanas.
Segundo Colognese et al, (1999), as relações competitivas, o crescimento das
especulações imobiliárias e os custos para aquisição de tecnologias permitiram que algumas
pessoas se destacassem financeiramente pelas grandes extensões de terra que possuíam. Em
contrapartida, o mesmo processo colaborou imensamente para o desenvolvimento de uma
população de baixa renda. Essas pessoas geralmente abandonavam a agricultura e
migravam para áreas periféricas da zona urbana, representando um vasto contingente de
mão-de-obra barata. Parte dessa mão-de-obra serviu de base para a industrialização, que
necessitava de muitos trabalhadores.
Outra parte dessa mão-de-obra surgida do processo de urbanização não foi absorvida
pela zona urbana, e necessitava encontrar ocupação. Dessa forma retornou ao trabalho no
campo sob a forma de mão-de-obra temporário (bóia-fria), sem vínculo empregatício ou
32
quaisquer direitos ou benefícios sociais. Esses trabalhadores mantiveram sua residência na
zona urbana, mas trabalhavam na zona rural, para onde se deslocavam diariamente ou
quando solicitados.
Diante disso, Silva (1988) concorda com o fato de que a intensificação do processo
de migração rural-urbana gerou excedentes de mão-de-obra sem ocupação. Muitos desses
trabalhadores buscavam ocupações em atividades temporárias, como a função de bóia-fria.
A região oeste do Paraná teve características semelhantes quanto ao movimento
populacional ocorrido em todo o Paraná, com uma intensa urbanização e a grande liberação
de mão-de-obra do setor agrícola para o urbano. O processo migratório rural-urbano,
ocorreu de forma semelhante tanto em âmbito nacional quanto em âmbito estadual e
regional. A estrutura agropecuária do oeste Paranaense possui características geográficas
que permitam uma intensa mecanização (PERIS, 2003).
Inicialmente a agricultura desenvolvida no município baseava-se na diversificação
da produção, sendo que em 1956 os produtos cultivados era milho com 62%, mandioca com
14%, arroz com 8%, soja com 5%, trigo e feijão com 4%. O cultivo do milho e da mandioca
atrelava-se à suinocultura, atividade de grande destaque no período chegando a fazer parte
da renda de 91% dos agricultores, porém, conforme o processo de mecanização ia
aumentando, essas culturas tinham suas áreas alteradas. Reduzia-se a necessidade de mão-
de-obra para capinas e colheitas, entre outras atividades, passando para culturas que se
destinavam ao mercado externo.
Essa destinação ao mercado externo ocorreu em conseqüência de grandes
alterações nas políticas governamentais. Isso gerou grandes alterações nas estruturas social e
econômica de Toledo, principalmente a partir da década de 1970. Um dos grandes fatores
foi a política governamental de aumento das exportações através do aumento na produção
de soja e trigo. Essa alteração de culturas foi possibilitada porque as condições de solo e
clima da região apresentavam-se ideais para seu cultivo. Dessa forma o binômio soja/trigo
torna-se o maior ciclo produtivo do município.
Em função da capitalização observada no setor agrícola, a partir desse período houve
uma seleção e redefinição das características dos produtores e das propriedades rurais. Essa
redefinição se deu em função dos elevados preços das máquinas, implementos e insumos,
além da supervalorização das terras. Propriedades com melhores condições de obtenção de
créditos para a aquisição desses elementos reduziram a utilização de trabalho braçal. O
33
setor agrícola toledano passa a contar com médias e grandes propriedades as quais se
tornam as bases agrícolas do município.
Foi intensa a aceleração da diferenciação entre pequenos proprietários e os de
agricultores que possuíam melhores condições financeiras. Essa diferenciação ocorreu
principalmente pela mecanização agrícola, pelo modelo agroexportador adotado e pelas
linhas de crédito facilitadas. Tais fatores aumentaram a competitividade na agricultura onde
pequenos proprietários levavam enormes desvantagens (COLOGNESE, et al, 1999).
Entre essas desvantagens, incluíam-se a baixa produtividade e o elevado custo de
produção. Dessa forma, a competitividade ficava extremamente prejudicada, pois os grandes
proprietários ou os detentores de maior capital, produziam mais em menores espaços, o que
possibilitava um custo de produção menor. Essas dificuldades para os pequenos
proprietários fizeram com que muitos desses agricultores migrassem para zonas urbanas.
Geralmente se concentravam em áreas periféricas, dividindo espaço com os trabalhadores
que precisaram migrar para as áreas urbanas e prestar serviços ao setor agrícola. Alguns
passaram a competir nas mesmas atividades.
Os funcionários que eram fixos e perderam seus empregos precisando residir em
áreas urbanas, passaram a dividir espaço com alguns pequenos agricultores que não
conseguiram se manter no mercado. A grande maioria dos agricultores não possuía
especialização em atividades urbanas, pois sempre foram agricultores, dessa forma, a
colocação em alguma atividade da indústria ou do comércio era extremamente difícil.
Os proprietários passaram a dispensar grande parte de seus funcionários contratados
para se utilizarem de máquinas e equipamentos e aproveitando a existência de uma grande
oferta de mão-de-obra apenas como complementação de atividades agrícolas, em
substituição à manutenção de funcionários fixos. Dessa forma, os pequenos agricultores, os
trabalhadores que eram contratados fixos e os trabalhadores temporários passaram a buscar
ocupação juntamente com os descendentes dos mensus que ainda permaneceram na região.
Esses trabalhadores passaram a disputar ocupação no mercado de trabalho. Alguns
conseguiram ingressar em atividades urbanas, haja vista o aumento do desenvolvimento do
setor de indústria, comércio e serviços. Outros tantos, porém, menos especializados,
passaram a oferecer a sua força de trabalho ao setor agrícola em amplo crescimento, como
trabalhadores bóias-frias.
O predomínio das médias propriedades e a redução das pequenas, são fatores que
fizeram reduzir o número de funcionários contratados e aumentar o número de funcionários
34
temporários. Isso se deve ao fato de que, em médias propriedades, a utilização de maiores
tecnologias reduzia a necessidade de trabalhos manuais. Como os mesmos eram contratados
com salários mensais, os proprietários pagavam seus funcionários pelos períodos em que
estariam ociosos. No caso das pequenas propriedades, há o predomínio das atividades
familiares, entretanto, em algumas etapas em que a mão-de-obra familiar não fosse
suficiente, havia a contratação de trabalhadores temporários.
A redução inicial do número de funcionários contratados deu lugar a um aumento na
contratação de funcionários temporários, pois os mesmos recebiam apenas pelas atividades
desempenhadas, o que representava uma redução de custos para os proprietários. Dessa
forma, os bóias-frias apresentaram enorme importância para o processo de desenvolvimento
e do processo de substituição da agricultura tradicional por uma agricultura mais avançada,
representando uma fonte rápida e barata de fornecimento de mão-de-obra.
Staduto (2004, a) apresenta o aumento na procura por bóias-frias como uma
conseqüência da utilização de equipamentos na agricultura. Isso se deve ao fato de que as
máquinas e equipamentos utilizados eram, em sua grande maioria, importadas, e, em alguns
casos, inadequados às condições e cultivares nacionais. Além desse fator, há ainda o fato de
que esses equipamentos atenderem apenas partes do processo produtivo de algumas
culturas, mantendo a necessidade de complementação manual do processo produtivo.
A mão-de-obra dos bóias-frias pode ser tida como sendo um elemento participante
do processo de alterações do processo produtivo agrícola tradicional para o processo
produtivo agrícola capitalista, haja vista a necessidade de tempo, tecnologia e investimentos
em capital para a completa substituição destes trabalhadores. Assim sendo, em um primeiro
momento, o desenvolvimento e a modernização agrícola foram benéficos para os bóias-
frias, com o aumento da oferta de trabalho para os mesmos.
Conforme a industrialização avançava e se desenvolviam máquinas mais adequadas
às condições da agricultura nacional e que abrangessem mais etapas do processo produtivo,
houve uma gradual redução na demanda por esses trabalhadores.
Segundo Aguirre e Bianchi (1989), citados por Staduto (2004, a), a existência de
trabalhadores bóias-frias que complementavam as tarefas do processo produtivo é que
possibilitou o início do processo de modernização agrícola.
A região oeste passa a ser considerada como um “pólo de atração” aos migrantes
colonos. Essa atratividade começou a se reduzir com o desenvolvimento tecnológico da
agricultura e a conseqüente elevação nos custos de produção e das terras. Para os
35
trabalhadores que chegavam na região em busca de ocupação, essa atração se manteve
muito alta pelas possibilidades de empregos mesmo que temporários. Essa região teve
características semelhantes quanto ao movimento populacional ocorrido em todo o Paraná,
com uma intensa urbanização e a grande liberação de mão-de-obra do setor agrícola para o
urbano (PERIS, 2003).
A mão-de-obra em partes não encontrando ocupação passaria a vender a sua força de
trabalho, juntamente com ex-trabalhadores contratados e com descendentes de mensus, em
atividades de complementação do processo produtivo agrícola em que não existiam
equipamentos adequados, formando e intensificando a existência de bóias-frias em Toledo e
região.
Para Staduto (2004, b) a transição da forma de trabalho que se utiliza mão-de-obra
volante para um processo automatizado é um processo demorado mesmo em etapas do
processo produtivo bem avançadas em tecnologia, mas que provavelmente incompletas pela
existência de limites temporais e financeiros. Ainda conforme o autor, mesmo com toda a
agricultura desenvolvida, os contratos de trabalho permanecerão como uma instituição do
setor agrícola, pois a substituição de todas as tarefas realizadas de forma manual pela forma
mecânica não é totalmente disseminada nem factível de forma generalizada.
2.3 A Inserção do Bóia-fria no Município de Toledo
Os bóias-frias são elementos importantes na história do desenvolvimento da
agricultura toledana, sendo que a sua presença era constante em quase todas as atividades
agrícolas desenvolvidas no município. O recrutamento de bóias-frias passa, porém, por um
processo de gradual redução, sendo que a sua presença é cada vez menor em lavouras do
município. Dessa forma, buscamos identificar por que o grupo ocupacional dos bóias-frias
está reduzindo.
A modernização da agricultura gerou, em um primeiro momento, o aumento na
demanda por mão-de-obra de bóias-frias, pois a presença de máquinas e equipamentos
substituiu em grande parte os trabalhadores contratados fixos. A necessidade desses
trabalhadores permaneceu, pois os equipamentos e máquinas, em sua grande maioria,
36
ocupavam apenas parte do processo produtivo. Muitas atividades ainda precisavam ser
desempenhadas manualmente, assim os trabalhadores bóias-frias encontravam ocupação
com facilidade.
O mesmo processo de desenvolvimento agrícola do qual os bóias-frias participaram
e que foi um dos responsáveis pela sua existência passou a ser indicado, também como um
dos responsáveis pela sua redução. Conforme avançavam as pesquisas e se desenvolviam
equipamentos adequados à realidade nacional, mais etapas do processo produtivo passaram
a serem mecanizadas.
Outro fator importante foi o desenvolvimento de novos insumos e a alteração nas
culturas produzidas. Os insumos, como os agrotóxicos, reduziram as necessidades de
capinas manuais, pois havia um controle químico das ervas-daninhas nas culturas. Já as
alterações das culturas produzidas fizeram com que culturas como algodão, fumo e feijão
fossem substituídas por culturas como soja, milho, trigo. Assim, atividades que
necessitavam de muita mão-de-obra em grande parte das etapas do processo produtivo
deram lugar a culturas que apresentavam a possibilidade de controles químicos, máquinas
para plantio, colheita ou capinas.
Essas alterações das formas de se realizarem os tratos culturais e das culturas
produzidas no município são mais bem compreendidas quando se faz uma análise a partir do
processo de colonização. A importância dessa análise está na compreensão sobre a forma
como a agricultura do município se desenvolveu e as primeiras formas de produção
existentes.
O município de Toledo teve seu processo de colonização intensificado a partir das
décadas de 1940 e 1950. Até então as atividades desenvolvidas eram apenas extrativistas,
principalmente madeira e erva-mate. Nesse contexto surge a figura dos mensus, que eram
trabalhadores braçais, em sua grande maioria de origem paraguaia, incumbidos das tarefas
mais árduas.
Esses mensus perderam a sua função com o desenvolvimento da colonização e a
instalação de uma agricultura familiar. Como não possuíam condições financeiras para o
cultivo próprio, muitos deixavam a região em busca de novas perspectivas em regiões de
colonização mais inicial.
A partir das alterações nos processos agrícolas de produção para subsistência,
passando para uma produção especializada para a geração de excedentes, surge uma nova
geração de mão-de-obra barata.
37
Muitos colonos que não conseguiram acompanhar a implantação de novas
tecnologias e maquinários, não tendo condições de competir com grandes proprietários,
acabaram por desfazerem-se de suas terras dirigindo-se para áreas urbanas, geralmente
periféricas. Esses trabalhadores, juntamente com os mensus foram as duas principais fontes
de mão-de-obra barata
Os mensus viviam da realização de algumas atividades esporádicas para os colonos.
Já os colonos, que migraram para as áreas urbanas, dividiram-se em dois grupos, o grupo
dos que conseguiram alguma ocupação na zona urbana e aqueles que passaram a prestar
algum serviço aos agricultores que persistiam ou a grandes proprietários.
Parte do grupo dos mensus e parte do grupo dos antigos colonos foram a base da
formação dos bóias-frias. Entretanto a modernização da agricultura de Toledo e região vêm
ocasionando o desaparecimento dos bóias-frias.
Os impactos negativos da modernização ocorrida no setor agrícola da região oeste
paranaense adquire uma enorme importância para o município de Toledo, que é
basicamente agrícola (IPARDES, 1986).
O município de Toledo passou a ser considerado um município no qual predominam
as médias propriedades com área acima de 50 hectares (ha), que ocupam em torno de 49%
das terras do município. Esse fato seria uma conseqüência do êxodo rural, ou seja, os
pequenos proprietários se utilizam de trabalho familiar, ou se desfizeram de suas terras. Isso
se deve, em parte às dificuldades de competir com propriedades que se utilizam de
tecnologias avançadas (IPARDES, 2005).
Dessa forma, a análise das relações entre a modernização agrícola e o
desaparecimento desse grupo ocupacional no município de Toledo tornou-se extremamente
interessante. Essa relação apresenta certas particularidades, como um inicial aumento no
número de bóias-frias no município no início do processo de modernização agrícola, e a
continuação do processo provocando a redução e tendências ao desaparecimento
(STADUTO, 2004, a).
A principal importância na caracterização do município consiste na confirmação ou
rejeição das duas formas de interpretação quanto às conseqüências da modernização
agrícola sobre os bóias-frias. Isto é, a modernização agrícola contribuiu para a tendência à
diminuição dos bóias-frias ou a modernização ocorrida no município mostrou-se como
atrativa a esses trabalhadores.
38
Essa interpretação possibilitou uma análise aprofundada quanto às influências e às
transformações ocorridas na agricultura do município. Permitiu-nos, assim, a elaboração de
análises completas e coerentes com a realidade e características de Toledo. Assim sendo, o
presente estudo justifica-se pela busca da caracterização das influências geradas pelo
processo de modernização da agricultura sobre a população de bóias-frias, visando
caracterizar as expectativas e as tendências para esse grupo ocupacional, no município de
Toledo – PR.
3. FORMULAÇÃO DO PROBLEMA
3.1 A modernização Agrícola e os Bóias-frias
A partir da Crise de 1929, houve uma enorme necessidade de desenvolvimento da
indústria nacional, haja vista as dificuldades de importação de máquinas e equipamentos
para suprir as necessidades internas. Essa busca pelo desenvolvimento industrial gerou uma
grande oferta de trabalho.
Como as áreas urbanas possuíam uma população consideravelmente menor que a
população rural, esta se tornou atrativa a alguns residentes rurais. Esses agricultores
acabaram por se desfazerem de suas propriedades e dirigiram-se às áreas urbanas em busca
de ocupação, iniciando-se assim o processo de migração rural-urbana (CALAZANS,1977).
O processo migratório rural-urbano teve, como uma de suas causas, o aumento dos
incentivos ao setor industrial, gerando uma grande demanda por mão-de-obra, escassa na
área urbana e farta nas áreas rurais. Esse processo permitiu uma gradual inversão nos níveis
populacionais das áreas rurais e urbanas.
Assim sendo, o setor agrícola foi uma importante fonte de mão-de-obra para o setor
industrial (SZMRECSÁNYI, 1990; SORJ, 1986; PERES, 1982 e D'INCAO, 1979). O
desenvolvimento das indústrias não seria possível sem essa fonte rural de mão-de-obra.
Dessa forma, o setor agrícola cumpre a sua função de fornecer trabalhadores ao setor
industrial, além da geração de excedentes para exportação e de alimentos para consumo
interno, entre outros.
A transferência populacional ocorreu, todavia, em um processo de transferência
gradativa e ocorrida em fases distintas, como afirma Alves (1996). O autor supracitado
divide o processo de desenvolvimento industrial nacional em relação à agricultura em três
fases. A primeira fase engloba a transferência de recursos do setor primário para o setor
secundário. A partir de 1930 e intensificando-se a partir de 1950, o governo passou a
investir mais no setor industrial deixando em segundo plano o setor agrícola.
40
Em um segundo momento, todo o avanço industrial gerado pelos investimentos
governamentais começa a influenciar mais intensamente o setor agrícola. Esse setor passa a
ter, à sua disposição, insumos, máquinas e equipamentos que permitem aumentos e
melhorias na produtividade do setor. Ainda de acordo com Alves (1996), a agricultura
passou a denominar-se agroindústria
11
, principalmente a partir de 1970.
A transformação da agricultura em agroindústria dá início à terceira fase, a partir da
qual a utilização de mão-de-obra torna-se menos intensa e, em contrapartida, a presença de
máquinas e equipamentos torna-se cada vez mais constante. Trata-se da fase da
modernização da agricultura.
A modernização da agricultura foi um efeito do desenvolvimento da indústria
nacional que permitiu a produção de máquinas e equipamentos mais adequados às
necessidades internas, abrangendo mais etapas do processo produtivo agrícola. Da
modernização decorre uma redução na utilização de bóias-frias e uma procura por
trabalhadores fixos com certa qualificação para operar máquinas, como tratores,
colheitadeiras, semeadeiras, entre outras. Esse fato tornou-se constante em regiões de maior
acesso à tecnificação e com agricultura mais desenvolvida, como as Regiões Sul, Sudeste e
Centro-oeste brasileiros.
A produção agrícola passa a ser realizada de forma intensiva, entretanto o início do
processo de modernização não oferecia tecnologia a todas as fases do processo produtivo
ou ainda, não se podiam utilizar tecnologias em algumas fases, pois os equipamentos
inicialmente eram desenvolvidos no mercado externo e nem sempre se adaptavam às
condições de clima, relevo ou produtos nacionais.
Para que se completassem todas as atividades do processo produtivo fazia-se
necessária a utilização de trabalhadores braçais para as atividades ainda não mecanizadas.
Assim, os trabalhadores temporários encontravam ocupação de maneira mais fácil, pois a
demanda por mão-de-obra era intensa.
Staduto (2004, b) afirma que o surgimento do bóia-fria teve a enorme contribuição
de dois fatores simultâneos. Um deles é o processo de modernização agrícola, com a
intensificação da utilização de máquinas, equipamentos e insumos avançados que
facilitavam os tratos necessários ao processo produtivo. O outro fator refere-se à
11
Agroindústria:
atividade constituída pela função dos processos produtivos agrícolas e industriais no âmbito
de um mesmo capital social, ou, quando tal não acontece, a atividade caracteriza-se por uma grande
proximidade física entre a área que produz e a matéria-prima agrícola e seu processamento industrial
(SANDRONI , 2004).
41
implementação da legislação trabalhista, ampliando os direitos dos trabalhadores rurais. Isso
gerava certo receio aos agricultores de contratar funcionários fixos. Ocorre que, geralmente,
os funcionários temporários possuíam baixa qualificação e informação, com isso um baixo
poder de barganhar os seus direitos, o que levava a grande maioria dos proprietários ao não-
cumprimento dos direitos trabalhistas.
Já Cacciamali (1986) apresenta essas duas causas de forma separada. Para a autora,
alguns pesquisadores afirmam ser o surgimento dos Estatutos da Terra e do Trabalhador
Rural (ETR, Lei Federal nº 4.214, de 1963) o principal incentivador da utilização de
trabalhadores temporários em detrimento das contratações fixas de trabalhadores, como uma
forma de burlar a legislação vigente.
Por outro lado, ainda de acordo com a autora, outro grupo de pesquisadores afirma
que o aumento na utilização e existência de bóias-frias se deve ao desenvolvimento
capitalista do país e especificamente do setor agrícola. Para a autora, a legislação não é a
causa da existência do bóia-fria.
A contínua mecanização das atividades agrícolas foi gradativamente substituindo a
utilização de trabalhadores por máquinas e equipamentos, ou seja, a oferta de trabalho foi
reduzindo-se, gerando um excedente de trabalhadores mal ou pouco preparados. Essa má
preparação deve-se, em grande parte, à pouca escolaridade e à pouca qualificação para as
atividades industriais.
A partir da intensificação do desenvolvimento urbano, é que surgiram possibilidades
de aperfeiçoamento e capacitação dessa mão-de-obra, através da criação de cursos técnicos
e ensino supletivo. Isso permitiu que umas grandes parcelas dos bóias-frias existentes
pudessem ingressar no mercado de trabalho urbano, abandonando total ou parcialmente as
atividades temporárias, cuja demanda reduzia-se cada vez mais.
Vasconcellos (1999) confirma essa redução na oferta de trabalho, ao afirmar que a
etapa de mecanização ocorrida a partir de 1980 gerou uma redução do emprego de bóias-
frias, principalmente com a interiorização dos avanços mecânicos, intensificada a partir de
1990.
Essa forma de trabalho apresentou-se extremamente importante no desenvolvimento
de atividades que requeriam grandes quantidades de trabalhadores. Isso se deve tanto pela
forma dos tratos culturais, quanto pela inexistência de máquinas ou equipamentos que
pudessem ser empregados no processo produtivo.
42
Segundo Broietti (2000), a demanda por trabalhadores bóias-frias vem reduzindo-se
de maneira intensa de acordo com o avanço da tecnologia no campo, o que pode significar
uma tendência à sua total extinção. A modernização agrícola de uma região gera o gradual
desaparecimento dos bóias-frias, que cada vez mais serão substituídos por máquinas e
equipamentos.
Já D’incao (1979) afirma que a modernização e o desenvolvimento agrícola geram
uma maior atratividade da região aos bóias-frias, ou seja, quanto mais desenvolvida a
agricultura maior tende a ser a concentração de bóias-frias nessa região. Assim, a tendência
da redução da utilização de bóias-frias, tanto pela utilização de tecnologias, quanto pela
existência de possibilidade de capacitação e ocupação desses trabalhadores no setor urbano,
torna-se visível.
Tal fato confirma-se nas palavras de Alves (1996), ao afirmar que a redução na
utilização de mão-de-obra em conseqüência de avanços tecnológicos é uma tendência cada
vez mais presente. Staduto (2004, A), confirma esse fator quando afirma que as constantes
pressões das novas tecnologias sobre o setor agrícola intensificam o processo de redução na
demanda por bóias-frias.
Esse processo de troca da mão-de-obra por equipamentos e tecnologias ocorreu de
forma muito intensa, em conseqüência de fatores como o crescimento dos incentivos à
utilização dessas tecnologias como se a agricultura dependesse apenas dela para
desenvolver-se. Ou seja, muitos produtores viram a tecnologia como uma necessidade
básica ao processo produtivo, como a terra, a chuva e o sol.
Toda a nova gama de produtos, insumos e tecnologias em maquinários despertou,
em um grande número de proprietários, uma espécie de “necessidade” de aquisição desses
novos benefícios. O trabalho assalariado surge em substituição ao colonato
12
, a partir da
introdução de novas técnicas agrícolas e do fato de o agricultor passar a considerar a terra
como capital fixo (MARTINS, 1989). Desse modo, Vicente (1999) destaca que micro e
pequenos proprietários defrontam-se com três alternativas: ou se modernizam ao máximo,
de acordo com as suas possibilidades, ou migram para as cidades, ou, como última
alternativa, transformam-se em produtores de subsistência.
Para os trabalhadores migrantes para a zona urbana ou para os trabalhadores bóias-
frias, uma das maiores dificuldades encontradas para a colocação no mercado de trabalho
12
Colonato:
regime que utilizava mão-de-obra de trabalhadores livres, empregados na agricultura a partir da
extinção da escravidão (SANDRONI , 2004).
43
urbano foi a falta de qualificação. Grande parte desses trabalhadores possuía pouca ou
nenhuma escolaridade e a experiência de trabalho era restrita às atividades agrícolas,
agregada a hábitos e costumes diferenciados.
A maior dificuldade para a criação de uma sociedade urbana estaria em transformar
agricultores ou bóias-frias, quase que totalmente despreparados, em cidadãos com valores e
concepções urbanas. Essas alterações referem-se a conforto, acesso à escola, saúde,
praticidade na aquisição de mercadorias, lazer, entre outros. Assim, fazia-se necessário
desenvolver uma “ideologia urbana” nesses trabalhadores, valores que distinguem o campo
da cidade e a indústria da agricultura (MARTINS, 1989).
Para tanto, as idéias de conforto, facilidades quanto à educação e à saúde, acabaram
por gerar uma certa atração sobre pequenos agricultores, que passam a valorizar o trabalho e
a vida urbana em detrimento das árduas tarefas agrícolas.
Tais fatos, aliados às dificuldades de manutenção e de competitividade de pequenas
propriedades, impulsionaram muitos trabalhadores rurais a migrarem para áreas urbanas.
Isso se reflete nos números das populações rurais e urbanas no Brasil, entre 1940 e
2000, os quais indicam que a tendência mais comum e a solução mais procurada acaba
sendo a migração para o setor urbano, causando evolução diferenciada dos percentuais
populacionais observados nas regiões entre as décadas de 1940 e 2000. Conforme dados do
IBGE (1990 e 2000), a Região Sul apresentou uma alteração na população rural que, de
72,3% em 1940, passou para 18,6% em 2000, e urbana de 27,7% para 81,4% em 2000.
A Região Sudeste apresentou alterações significativas, sendo que a população rural
passou de 60% para 10,6% em 2000, a população urbana de 39,4% em 1940 alterou-se para
89,7% em 2000.
Quanto à Região Centro-Oeste, em 1940 a população rural representava 78,5% e em
2000 passou a representar 15,7%; a população urbana representava 21,5%, passando para
84,3% em 2000 (IBGE, 1990 e 2000), conforme dados da Tabela 01.
44
Tabela 01. Evolução das populações residentes nas zonas rural e urbana entre 1940 e 1990, nas Regiões Sudeste,
Sul e Centro-Oeste
SUDESTE SUL CENTRO-OESTE
ANO
RURAL URBANA RURAL URBANA RURAL URBANA
1940 60,0 39,4 72,3 27,7 78,5 21,5
1950 52,5 47,5 70,5 29,5 75,6 24,4
1960 42,7 57,3 62,4 37,6 65,0 35,0
1970 27,2 72,8 55,4 44,6 51,7 48,3
1980 16,0 84,0 51,0 49,0 45,0 55,0
1990 12,0 88,0 26,0 74,0 18,7 81,3
2000 10,6 89,7 18,6 81,4 15,7 84,3
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, IBGE, 1990; Censo Demográfico IBGE 2000;
Na Região Norte, a população rural representava cerca de 72,3% em 1940,
alterando-se para 28,5% em 2000; a população urbana alterou-se de 27,7% em 1940, para
71,5% em 2000. Na Região Nordeste, a população rural passou de 76,5% para 30,6%; a
urbana alterou-se de 23,5% para 69,4% em 2000, conforme dados da Tabela 02.
Tabela 02. Evolução das populações residentes nas zonas rural e urbana entre 1940 e 1990, nas Regiões Norte e
Nordeste e no Brasil
NORTE NORDESTE BRASIL
ANO
RURAL URBANA RURAL URBANA RURAL URBANA
1940 72,3 27,7 76,5 23,5 68,8 21,2
1950 68,5 31,5 73,6 26,4 63,8 36,2
1960 62,2 37,8 65,8 34,2 54,9 45,1
1970 54,9 45,1 58,0 42,0 44,0 56,0
1980 50,0 50,0 53,0 47,0 36,0 64,0
1990 42,2 57,8 39,4 60,0 24,5 75,5
2000 28,5 71,5 30,6 69,4 18,3 81,7
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, IBGE, 1990; Censo Demográfico IBGE 2000;
45
As Regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste brasileiras foram as mais favorecidas pelas
políticas setoriais para a tecnificação do setor agrícola, alterando-se, dessa forma, as
relações produtivas tradicionais com um crescimento desigual das taxas de produtividade
nessas regiões. As Regiões Norte e Nordeste, as quais possuíam uma agricultura menos
desenvolvida, sofreram alterações no setor agrícola, porém de forma não tão intensa quanto
as demais.
A modernização da agricultura tornou-se um dos principais objetivos
governamentais entre 1930 e 1964. A visão moderna é um dos principais focos do governo
após o golpe militar de 1964, visão que transformou a sociedade agrária predominante no
Brasil em uma sociedade moderna e industrializada. Ou seja, o golpe militar permitiu a
expansão do capitalismo no campo de maneira mais intensa (MARTINE & GARCIA,
1987).
Para Lopes, citado em Soto (2002), a base das transformações da economia agrária
em industrial foram as tecnologias e a proletarização, porém esses fatores trouxeram uma
enorme redução no número de trabalhadores assalariados utilizados.
Essas tecnologias, aliadas às políticas agrícolas nacionais, que continham
instrumentos de benefício aos pequenos proprietários, como linhas de crédito e
financiamentos, geraram grandes dificuldades quanto à concorrência com grandes
produtores, isso tanto em custo quanto em quantidades produzidas, o que acabou por reduzir
ou até mesmo anular esses benefícios.
Para Kageyama (1987), todavia, todo o processo de modernização da agricultura é o
resultado de dois fenômenos distintos: a crise do complexo rural e a modernização do setor
agrícola. Assim sendo, a alteração no foco dos investimentos governamentais do setor rural
para o urbano gerou um descontentamento aos agricultores, visto que proprietários de
melhores condições financeiras tiveram acesso a novos benefícios mecânicos e químicos e
puderam desenvolver as suas atividades de maneira mais intensa.
Os custos para a aquisição desses benefícios agravaram ainda mais as diferenciações
existentes entre pequenos, médios e grandes proprietários. Em seu estudo, Soto (2002)
apresenta uma discussão sobre a questão da mecanização agrícola, onde questiona se o seu
desenvolvimento foi uma causa para o êxodo-rural ou uma conseqüência da redução no
número de trabalhadores da zona rural, principalmente entre os anos 1940 e 1950.
46
Segundo o autor supracitado, o processo poderia ocorrer pela concentração de terras
e dificuldades para a fixação do homem no campo, ou seja, a expulsão. Por outro lado, a
migração poderia ser causada pelos atrativos oferecidos pelas cidades, fazendo com que os
trabalhadores não fossem expulsos do campo, mas, sim, atraídos pelas cidades.
Esses atrativos, como educação, saúde e lazer, fizeram com que alguns agricultores
deixassem assuas propriedades agrícolas, com difícil acesso à escola para as crianças, ao
atendimento médico, ao conforto e à praticidade na aquisição de algumas mercadorias. Soto
(2002) conclui que a industrialização da economia brasileira intensificou o processo de
urbanização e a industrialização no setor agrícola, sendo que o crescente fluxo de
trabalhadores transferidos do setor rural para o urbano foi de extrema importância como
fornecedora de mão-de-obra para o setor.
Diante dessa questão, Martine & Garcia (1987) afirmam que é após o início do
processo de modernização da agricultura que a migração se intensificou O êxodo rural é
visto como uma conseqüência do ritmo da modernização e do avanço do capitalismo no
campo, no qual o trabalho humano foi substituído em parte ou totalmente pela utilização de
trabalho mecânico.
Essa relação entre a modernização da agricultura e todo o processo de migração
rural-urbana é extremamente importante. Desse processo de migração surgem trabalhadores
que prestam serviços temporários à agricultura, ou seja, os bóias-frias são trabalhadores que
migraram da zona rural para a urbana. Essa migração deve-se a vários motivos, como a falta
de emprego, a substituição de trabalho manual por mecânico, utilização de insumos e
agrotóxicos eficientes, entre outros.
Com essa modernização da agricultura por causo do processo de substituição de
importações, a partir da década de 1950, é que a industrialização atinge o seu auge,
passando a se estender para a área agrícola como uma fase mais avançada de sua ocorrência.
A proletarização do campesinato
13
, segundo Soto (2002), é responsável pelo surgimento do
bóia-fria, sendo essa conseqüência a maior exaltação desse processo.
Para Graziano da Silva (1980), a diferenciação entre cidade e campo, aliada ao
processo de industrialização da aTc 0.0342 Tw9003[er se i[(na )Tj0.0301 Tc 0.0077 T1181765 0 Tdpa5(i( csr so dA proletarização do )Tj0.0006 Tc 350244 T-2-141785 -1.725 Td[(cam)8mpesinas, com)8(o)1( , a sordesização d[(trabalha do capitde n47ãoob(o aofirm)8so e)-6( )]TJ0.0138 Tc 0 TT*(exA pe iizaç. 13)TjETEMC Aparfact/P <Type /P i[ ati 7 >>BDC BT/TT0 1 Tf0 Tw 12 0 0 185.0009-19.3203 Tm 13)TjETEMC85.000102 0.Tw 4Tc 651 fC Aparfact/P <Type /P i[ ati 7 >>BDC BT/TT0 1 Tw 12 0 0 1229.0009-19.3203 Tm to
47
Graziano da Silva (1996) destaca, ainda, a importância desses trabalhadores como
forma de suprir as variações sazonais da necessidade de mão-de-obra sem que isso se reflita
na folha de salário para os proprietários.
O trabalho bóia-fria permitiu a obtenção de renda a esses trabalhadores e ainda
permite a complementação de renda para alguns trabalhadores. Para a empresa capitalista, a
vantagem de não precisar pagar pelo tempo em que o funcionário fica parado, além das
vantagens referentes aos direitos trabalhistas, torna essa mão-de-obra viável. Os agricultores
isentam-se das responsabilidades legais para com os bóias-frias, pois não há vínculo
trabalhista entre agricultores e bóias-frias, e não pagam pela sazonalidade dos funcionários
fixos.
O aumento do mercado interno brasileiro de bens industriais ocorreu em
conseqüência de fatores principais como a expropriação dos camponeses como produtores
independentes. Isso os transformou, em parte, em miseráveis bóias-frias, pois esses
trabalhadores não conseguiam ocupar-se pela venda de sua força de trabalho. Dessa forma,
Graziano da Silva (1996) caracteriza o desenvolvimento do capitalismo brasileiro no campo
como lento e desigual (industrialização tardia), ou seja, conforme se aumenta a
mecanização, se eleva, também, a sazonalidade da ocupação dessa mão-de-obra. Assim,
para os proprietários, a solução mais econômica é a substituição do trabalhador fixo pelo
temporário (bóia-fria).
Vasconcellos (1999) confirma esse fato ao afirmar que o lado perverso da
modernização foi o aumento na utilização de trabalhadores bóias-frias, a concentração
fundiária e a redução da geração de empregos no setor, lado confrontado com os benefícios
gerados, como o aumento da produtividade agrícola e a possibilidade de geração de
excedentes para exportação, entre outros benefícios.
Segundo Graziano da Silva (1982), a modernização da agricultura brasileira,
intensificada entre os anos 1960 e 1970, teve características conservadoras, isto é,
privilegiou algumas regiões e culturas, além de beneficiar médios e grandes proprietários,
gerando a expropriação de alguns pequenos agricultores, bem como o surgimento de uma
classe proletária
14
no campo.
14
Proletariado: expropriação dos pequenos produtores familiares e sua conversão em assalariados sem terra
Graziano da Silva (1982).
48
Frente a todas as dificuldades de subsistência e frente à sua separação dos meios de
produção, o trabalhador se vê obrigado a vender a única mercadoria de que dispõe: a sua
força de trabalho.
Diante do exposto, persiste uma dúvida básica: Se, por um lado, existem autores
que sugerem que a modernização da agricultura é responsável pela geração dos bóias-frias,
por outro lado, as evidências sugerem que, no oeste do Paraná, a modernização tem levado
ao seu desaparecimento. Ou seja, qual é a característica predominante no município de
Toledo? Assim sendo, o correto diagnóstico acerca da real situação desse grupo
ocupacional, bóia-fria, faz-se necessário e pertinente.
3.2 Problema de pesquisa
Os bóias-frias são personagens de extrema importância para a agricultura,
principalmente com o início do processo de modernização da agricultura. Existem, contudo,
divergências de conclusões obtidas por pesquisadores acerca dos fatores responsáveis pela
sua existência.
Não é a origem, mas, sim, o destino desse grupo ocupacional que gera maiores
dúvidas. Muitos são os estudos que revelam os condicionantes para a sua existência e a sua
grande importância para todo o processo de modernização agrícola e contribuição para o
processo de desenvolvimento industrial. Assim sendo, realizamos uma análise das formas e
dos níveis de exclusão da mão-de-obra no campo com foco nos bóias-frias. Visamos
analisar os fatores geradores da tendência ao desaparecimento desse grupo ocupacional.
Diante das diferentes formas de análise e interpretação dos fatos, questionamos
qual a relação existente entre a modernização agrícola de Toledo/PR e o processo de
desaparecimento dos bóias-frias, a partir da década de 1970, até os dias atuais?
49
3.3 Hipóteses
O processo de modernização, ou de mudança estrutural, ocorreu na agricultura
principalmente com a utilização de máquinas, equipamentos e insumos mais eficientes.
Essa modernização objetivava melhorar a produtividade da agricultura toledana, sendo o
principal responsável pela redução na demanda pelo trabalho prestado pelos bóias-frias,
bem como pela sua tendência ao completo desaparecimento.
Uma das principais relações apontada como responsável pela redução na demanda
por bóias-frias e o seu conseqüente gradual desaparecimento refere-se ao desenvolvimento e
expansão da utilização de máquinas, equipamentos e insumos agrícolas mais eficientes.
Outro fator de destaque nesse processo de redução do número de bóias-frias é a
alteração das culturas produzidas no município. Produtos altamente demandadores de mão-
de-obra (café, fumo, algodão, feijão) foram substituídos por culturas que utilizavam maiores
quantidades de máquinas e equipamentos, além de insumos, em seu processo produtivo
(soja, milho, trigo). Essas culturas que possuíam maior mecanização utilizavam mão-de-
obra em algumas etapas do processo produtivo, contribuindo para a redução dos
contingentes de bóias-frias existentes.
As atividades desempenhadas pelos bóias-frias nessas novas culturas restringiam-se
principalmente a capinas. Essas capinas eram necessárias pela não-existência de
equipamentos para tal atividade.
50
3.4 Objetivos
3.4.1 Objetivo Geral
Analisar a relação existente entre o desaparecimento dos bóias-frias e a
modernização da agricultura e as alterações dos produtos cultivados no município de
Toledo-PR, a partir da década de 1970.
3.4.2 Objetivos Específicos
- Verificar a relação existente entre a redução do número de bóias-frias e os níveis
tecnológicos empregados na agricultura do município.
- Identificar o comportamento de redução do grupo ocupacional dos bóias-frias em
Toledo a partir da década de 1970.
- Analisar a relação entre os tipos de culturas produzidas no município de Toledo e a
redução do número de bóias-frias.
- Identificar a possível existência de uma tendência à extinção desse grupo
ocupacional.
4. METODOLOGIA
Inicialmente adotamos o conceito bóia-fria, para representar o grupo de
trabalhadores que prestam serviços de forma temporária ao setor agrícola, em atividades
como capina, roçadas ou algumas etapas do processo produtivo. São trabalhadores que não
possuem vínculos empregatícios e recebem por atividade desempenhada, por produção ou
por dia.
Com este estudo objetivamos analisar a influência da modernização agrícola e das
alterações culturais sobre o desaparecimento do bóia-fria no município de Toledo no Estado
do Paraná. Analisamos o processo histórico de surgimento,do avanço e da redução desse
grupo ocupacional a partir da intensificação do processo de modernização agrícola e das
alterações nas culturas produzidas no município.
Na seqüência, apresentamos os referenciais metodológicos que proporcionam a
orientação necessária ao desenvolvimento da pesquisa.
4.1 Revisão de Literatura Metodológica
A metodologia representa os caminhos percorridos para se atingir um objetivo. Segundo
Gil (2000, p. 31), “o método científico pode ser entendido como o caminho para se chegar à
verdade em ciência, ou como, o conjunto de procedimentos que ordenam o pensamento e
esclarecem acerca dos meios adequados para se chegar ao conhecimento”.
Uma das técnicas utilizadas no desenvolvimento de uma pesquisa científica consiste na
determinação de uma amostra populacional. A amostragem consiste na seleção e escolha de
alguns indivíduos representantes da população para compor uma amostra (GIL, 2000).
Utilizamos a amostragem probabilística aleatória simples, selecionando elementos da
população de forma casual de modo a compor a amostra. Assim, coletamos informações
primárias junto aos bóias-frias, agricultores e “gatos” (recrutadores) com a aplicação de
52
questionários com questões abertas, com o objetivo de caracterizar, sob a ótica desses
elementos, a relação entre a gradual diminuição do número de bóias-frias e a modernização
agrícola.
O grupo focal da amostragem de bóias-frias concentra-se em bairros periféricos da
cidade de Toledo, sendo indivíduos abordados em suas residências após a indicação de sua
condição de bóia-fria. Essa abordagem se deu após a obtenção de informações com
vizinhos. Além das residências, abordamos indivíduos em “pontos de chapa” ou pontos de
bóia-fria
15
, para a coleta de informações. Alguns indivíduos apresentaram mais facilidades
de conversa, outros mais quietos, porém não houve nenhuma recusa de colaboração.
Quanto aos agricultores, estes foram abordados a partir de informações obtidas através
de questionamentos sobre a utilização de mão-de-obra volante. Os agricultores que
confirmaram já terem utilizado esses trabalhadores foram selecionados para entrevista. Estes
agricultores também fizeram a indicação de alguns indivíduos “gatos”
15
para
questionamentos.
A coleta de dados, realizada pela pesquisa bibliográfica e pela aplicação de
questionários, foi sucedida pela organização das informações de forma a facilitar a
extração de todas as informações necessárias ao desenvolvimento da pesquisa e a obtenção
de uma conclusão com fundamentos bem estruturados.
Para a análise das informações obtidas por meio de levantamentos bibliográficos e
entrevistas junto aos bóias-frias, agricultores e “gatos”, optamos pela análise qualitativa das
informações.
As análises qualitativas geram a possibilidade da realização de descrições das
qualidades de determinados fenômenos ou a caracterização das informações obtidas em
questionários e observações. Ou seja, essa análise permite que se captem as dimensões das
características humanas analisadas que vão além dos números obtidos (CORTES, 2002).
Ainda de acordo com Cortes (2002), a análise quantitativa de dados impede distorções
de interpretação, possibilitando a mensuração de fenômenos em termos numéricos e as
descrições mais detalhadas que permitiriam a explicação de certos fenômenos pela sua
organização em variáveis.
4.2 Procedimento Metodológico e Fontes de Dados
15
“Pontos de chapa” ou
Pontos de bóias-frias: designava os locais onde vários trabalhadores bóias-frias se
concentravam à espera dos “gatos”. Esses pontos formavam-se, geralmente, próximos a empresas que
comercializavam produtos agrícolas. Dessa forma os agricultores teriam maior facilidade de contrato com os
mesmos.
53
Para que se possa obter um referencial que caracterize a realidade do município
confrontando com as demais informações obtidas por pesquisas bibliográficas,
entrevistamos bóias-frias/ex-bóias-frias, recrutadores (“gatos”) e agricultores. Visamos
identificar possíveis tendências quanto ao desaparecimento do grupo ocupacional dos bóias-
frias frente aos avanços tecnológicos existentes no setor agrícola.
A presente pesquisa foi realizada no município de Toledo/PR, localizado no oeste
paranaense.
O município de Toledo/PR possui uma agricultura extremamente desenvolvida, ou
seja, há grande utilização de máquinas e equipamentos em grande parte das etapas do
processo produtivo, além de insumos que permitem um aumento na produtividade pela
existência de adubos e agrotóxico. A utilização desses benefícios apresentou-se, em um
primeiro momento, atrativa à existência de bóias-frias para, em seguida, passar a tornar-se
repulsiva a essa forma de trabalho.
Dessa forma, o município se enquadra nos estudos que indicam que uma agricultura
desenvolvida é atrativa aos bóias-frias, bem como nos estudos que apresentam a agricultura
desenvolvida como um dos principais fatores responsáveis pelo desaparecimento dos bóias-
frias.
4.3 Instrumentos de coleta de dados
O presente trabalho foi realizado no município de Toledo/PR, onde entrevistamos
bóias-frias/ex-bóias, recrutadores (“gatos”) e agricultores. Verificamos as hipóteses de que
os níveis de tecnologia utilizados na agricultura possam estar relacionados à extinção dos
bóias-frias da agricultura de Toledo – Paraná.
Além disso, buscamos analisar o comportamento desse grupo ocupacional a partir da
década de 1970. Buscamos identificar, junto a bóias-frias ou ex-bóias-frias, algumas
características e fatores inerentes à atividade, bem como analisar, sob a ótica desses
54
trabalhadores, os motivos que levam à tendência do desaparecimento dessa forma de
trabalho.
Outro fator relacionado à nossa análise foram as influências geradas pelas alterações
nos produtos cultivados no município e a redução do número de bóias-frias.
As entrevistas fornecem uma informação privilegiada, ou seja: “a melhor situação
para participar da mente de outro ser humano é a interação face a face, pois tem o caráter
inquestionável, de proximidade entre as pessoas, que proporciona as melhores
possibilidades de penetrar na mente, vida e definição dos indivíduos” (RICHARDSON,
1999, p. 207).
Os recrutadores, ou “gatos” (como são mais conhecidos), têm uma grande importância
quando narram os fatos relacionados à forma de recrutamento e à fiscalização dos
trabalhadores. Pelo fato de, na maioria das vezes, serem eles, os “gatos”, os responsáveis
pelo repasse dos pagamentos aos bóias-frias, a obtenção de informações sobre as condições
de exploração e baixa remuneração torna-se mais completa.
Quanto aos agricultores, buscamos informações sobre as alterações nas culturas
produzidas e sobre a relação com os bóias-frias, bem como a identificação de tendências
quanto ao processo de diminuição desse grupo social.
Para a correta análise e interpretação dos dados obtidos através das entrevistas,
realizamos um levantamento bibliográfico de autores que discorrem sobre o assunto. Isso
possibilitou o confronto de opiniões de autores com a realidade do município de Toledo.
Para Gil (2000), o questionamento direto permite que se identifiquem características
sob o ponto de vista dos entrevistados.
Assim, para que a real situação do bóia-fria seja entendida, fez-se necessário o
questionamento direto a esses trabalhadores de modo a obter o seu ponto de vista sobre a
sua situação, além da visão dos agricultores sobre a situação. As entrevistas realizadas
diretamente aos trabalhadores bóias-frias permitiram a real avaliação das condições de vida
desses trabalhadores.
Elaboramos e aplicamos questionários com questões abertas indagadas diretamente
aos bóias-frias. Durante as entrevistas, os bóias-frias foram questionados sobre as suas
origens e as atividades desempenhadas como fonte de renda, bem como as diferenças entre a
oferta de trabalho antigamente e a escassez de oferta atual para bóias-frias. Além disso,
questionamos esses bóias-frias sobre os motivos para essa redução na necessidade de sua
mão-de-obra e as previsões quanto à extinção ou manutenção da atividade.
55
No questionamento realizado com os “gatos”, buscamos identificar as formas de
recrutamento, como os bóias-frias eram selecionados, como se formava um “ponto de bóia-
fria”, as condições de segurança e da realização dos pagamentos, além de outras
informações que surgiam no decorrer da entrevista.
Os agricultores entrevistados foram indagados sobre a forma e a freqüência de
utilização do bóia-fria em sua propriedade. Procuramos identificar as razões para possíveis
reduções na demanda por bóias-frias e as suas causas. Além de informões gerais sobre as
relações de trabalho com esses bóias-frias, os agricultores expressaram as suas opiniões
quanto a tendências para os bóias-frias no município.
4.4 População e amostra
Diante da existência de informações incompletas sobre a quantidade de bóias-frias
existentes no município de Toledo/PR, estabelecemos que seriam aplicados, aleatoriamente,
questionários a 50 bóias-frias e ex-bóias-frias localizados em bairros periféricos da cidade
de Toledo. Além disso, questionamos 2 recrutadores (“gatos”) e 15 agricultores que se
utilizam ou utilizavam bóias-frias em suas propriedades, residentes em diversas áreas rurais
e urbanas do município.
Como não se dispõe de um dado exato sobre o número de bóias-frias no município de
Toledo, a quantidade de entrevistados foi determinada com base nas amostras selecionadas
nos estudos realizados por D’incao (1984) e Broietti (2000).
Utilizamos, como referência, as técnicas conhecidas como “bola de neve” e “ponto de
saturação”. De acordo com a técnica “bola de neve”, as informações serão coletadas e
acumuladas até que as relações se tornem claras e se possam caracterizar os fatos em
estudo (CAMARGO, 1984).
O “ponto de saturação” refere-se à busca de informações obtidas de diversos perfis
identificados, até que se saturem os temas, ou seja, até o ponto em que as respostas obtidas
apresentem conteúdos semelhantes não acrescentando novas informações (QUIVI &
CAMPENHOUDT, 1998 ).
56
5. O BÓIA-FRIA NA AGRICULTURA DE TOLEDO
As primeiras relações de exploração mais intensa de mão-de-obra remontam da
época da colonização da região oeste. No período da colonização do oeste paranaense não
havia bóias-frias, pelo menos na modalidade dos atualmente conhecidos. Havia apenas a
presença de trabalhadores extremamente explorados, desprovidos de quaisquer direitos,
contratados para realizarem as mais árduas tarefas, os chamados mensus
5
.
Os mensus apresentam algumas características semelhantes aos bóias-frias,
anteriormente citados, porém eram contratados por períodos pré-determinados e recebiam
uma forma de remuneração pré-estabelecida (WASCHOWICZ, 2001).
Em sua grande maioria, os trabalhadores mensus eram de origem paraguaia, sendo
recrutados pelos donos das obrages
6
, responsáveis pela exploração de madeira e erva-mate
na região. Os chefes de obrages, obrageiros
7
, concediam empréstimos aos mensus para que
pudessem chegar à região. Dessa forma, iniciavam seu trabalho com um saldo negativo
junto aos obrageros.
Eram extremamente explorados, porém a sua dívida nunca se reduzia, pois não
possuíam condições nem direito à terra, não podiam produzir para consumo próprio pois
deveriam adquirir todos os produtos necessários no armazém, geralmente de propriedade do
chefe da obrage.
Conforme Waschowicz (2001), inicialmente os trabalhadores mensus
desempenhavam atividades de abertura de picadas e estradas em busca de erva-mate e
madeira. Muitos desses trabalhadores miscigenaram-se com a população branca após o
período de colonização, gerando maior abundância de mão-de-obra.
Tal população foi denominada de “guaranis modernos”, por Ribeiro (apud
Waschovicz, 2001, p. 47), e acabavam acomodando-se às explorações e exigências impostas
pela sociedade existente.
A partir do início do processo de colonização, a figura do mensu passa a perder a
sua ocupação laboral em virtude da chegada de colonos, principalmente os vindos dos
Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Assim os mensus quase desapareceram da
região, migrando para outras terras.
57
As grandes dificuldades impostas pelas matas e pelo clima da região causavam, nos
primeiros anos, certo grau de desânimo em agricultores, daí que muitos acabavam por
deixar a região, migrando também para novas áreas.
Essa evasão de colonos foi benéfica, em certo ponto, para os mensus que ainda aqui
residiam, pois novamente foram tidos como necessários, desempenhando atividades como a
destoca, abertura de estradas e roçadas, haja vista a sua adaptação ao clima e às condições
aqui existentes (WASCHOWICZ, 2001).
A contratação de trabalhadores extras era comum durante o processo produtivo,
mesmo com a grande substituição desses trabalhadores por máquinas e equipamentos. Esse
fato ocorreu com maior intensidade em um período de início e transição para uma
agricultura moderna que buscava automizar algumas etapas do processo produtivo,
(Staduto, 2004, b)
A utilização de mão-de-obra extra, ocorria apenas em condições especiais em que o
trabalho familiar não fosse suficiente. Isso se deve ao fato de que o processo de colonização
do oeste do Paraná foi baseado na pequena propriedade de base familiar.
A necessidade de trabalhadores extras era suprida com a contratação de mensus, pois
nesse período a figura do bóia-fria não existia efetivamente. O trabalhador mensu supria
essa necessidade, sendo explorado intensamente pelos obrageros.
A existência de apenas algumas atividades extras para esses trabalhadores deve-se ao
fato de que, inicialmente, a agricultura desenvolvida no município de Toledo baseava-se no
trabalho familiar e na diversificação da produção. Em 1956, os principais produtos
cultivados eram milho (com 62%), mandioca (com 14%), arroz (com 8%), soja (com 5%),
trigo e feijão (com 4%). O cultivo do milho e da mandioca atrela-se à suinocultura,
atividade de grande destaque no período, chegando a fazer parte da renda de 91% dos
agricultores (SILVA, 1988).
As ofertas de trabalhos temporários eram muito limitadas. Dessa forma, o trabalho
familiar era suficiente, na maioria das vezes, para desempenhar todas as atividades.
Dependendo do tamanho da propriedade, poderiam existir funcionários fixos.
Com alterações em algumas culturas produzidas, inicialmente não havia a
necessidade de manter trabalhadores constantes. Ou seja, quando se desenvolviam
atividades como suinocultura ou bovinocultura, havia a necessidade de constantes tratos.
Assim, necessitava-se de um acompanhamento constante por algum trabalhador.
58
A contratação de trabalhadores temporários era a melhor forma para se ter
trabalhadores apenas quando se necessitasse, sem custos com períodos ociosos. Essas
contratações foram aumentadas com o desenvolvimento cada vez maior de lavouras com
culturas que necessitavam tratos em apenas algumas etapas.
Os trabalhadores temporários eram utilizados em algumas propriedades de menor
porte, em que as atividades eram desempenhadas pelas famílias. Nesses casos, para
desempenhar as atividades de colheita ou capina, haja vista a não-existência de funcionários
fixos.
Eram, contudo, contratações muito pequenas, devido à grande diversidade de
atividades desenvolvidas nas propriedades. Esses serviços eram realizados pelos membros
da família que, em poucas ocasiões, recebiam auxílio de trabalhadores extras. No período de
colonização, esses trabalhadores eram os mensus, pois ainda não havia bóias-frias.
Mesmo que a necessidade de trabalhadores temporários ocorresse desde do processo
de colonização, inicialmente com os mensus, a quantidade de serviço ofertada era pequena,
assim, esses trabalhadores precisavam estar em constantes buscas por trabalho. Essa busca,
tornava, muitas vezes, necessário que se deslocassem para várias áreas do município.
A incerteza quanto a trabalho e renda reduziu-se um pouco conforme se desenvolvia
a agricultura do município. Pois, a necessidade de contratação de funcionários fixos,
permitiu que muitos desses mensus, obtivessem um trabalho em algumas propriedades
agrícolas. Nessas propriedades residiam, realizavam suas tarefas e ainda tinham a
possibilidade de cultivar hortas ou criar pequenos animais para o consumo próprio.
Assim sendo, reduziu-se um grande número dos trabalhadores sem ocupação.
Inicialmente, conforme se desenvolvia e se modernizava a agricultura, aumentava a
necessidade de trabalhadores para a complementação de algumas atividades. Dessa forma,
os mensus que ainda existiam e que não possuíam empregos fixos, continuavam a prestar
serviços temporários, entretanto residindo em áreas periféricas do município.
Como a demanda por trabalhadores extras era intensa, houve uma grande
atratividade para trabalhadores sem ocupação fixa de outras regiões, como o norte
paranaense, migrarem para o município de Toledo.
Essa nova leva de trabalhadores de outras regiões, juntamente com os trabalhadores
temporários já existentes, formaram um grande contingente de trabalhadores que auxiliavam
as atividades agrícolas. As mudanças que vinham ocorrendo na agricultura e o aumento
desses trabalhadores temporários, geraram alterações nas relações de trabalho entre ambos.
59
Essas mudanças referem-se às características dessa mão-de-obra, transformando os
trabalhadores mensus e os migrantes em trabalhadores com as características próprias dos
bóias-frias.
Essas alterações agrícolas, contudo, ocorreram em virtude do avanço do capitalismo
sobre a agricultura sob a forma de máquinas e equipamentos. Essas alterações, motivaram
alguns pequenos agricultores, a vender suas terras e migrarem para as cidades. Essa
motivação apresentou-se pela visualização da oportunidade de melhoria nas condições de
vida. Isso, devido à baixa competitividade, gerada pela falta de capital para investimentos
em tecnificação da produção em suas propriedades, ou pelo fato de o tamanho da
propriedade ser muito pequeno, o que não permitia a sobrevivência da família.
A redução do tamanho das propriedades ocorreu, muitas vezes, em virtude da
divisão de terras entre os filhos do proprietário, que já possuía uma área pequena. Com essa
divisão se tornava cada vez menor, o que poderia não ser suficiente para o sustento da
família. A venda de suas propriedades e a migração para a cidade não garantia melhorias
nas condições de vida. Dentre esses pequenos proprietários, alguns não conseguiam, na
cidade, um emprego ou uma fonte de renda fixa, aumentando o número de trabalhadores a
ocupar a posição de desempregados.
A redução do tamanho das propriedades, causou uma menor busca por trabalhadores
extras, haja vista a menor quantidade de trabalho e a possibilidade do trabalho familiar ser
suficiente para o processo produtivo. Sendo que, alguns agricultores, acabaram por vender
suas propriedades e migrar para as cidades.
Os mensus, os novos trabalhadores e até mesmo antigos agricultores ofereciam sua
mão-de-obra a agricultores que ainda necessitassem de trabalhadores extras. Surge, dessa
forma, uma nova denominação para os mesmos: bóias-frias.
Essa denominação deve-se ao fato de que esses trabalhadores se dirigiam às
lavouras bem cedo, na manhã, e retornavam apenas à tarde, fazendo-se necessário almoçar
na lavoura. Como não havia forma de aquecer seu almoço, ingeriam a comida, ou a bóia,
fria.
Todas essas alterações nas relações de trabalho e nas propriedades agrícolas,
ocorrem em função da modernização agrícola, das alterações culturais e do processo de
urbanização e desenvolvimento industrial.
O cultivo de alguns produtos serviu como fonte de trabalho para os bóias-frias. Pois,
a utilização de máquinas e equipamentos era limitada a alguns produtos ou etapas do
60
processo produtivo. Dessa forma, a utilização de um número maior de trabalhadores bóias-
frias, ocorria em algumas culturas, como o cultivo do fumo, do algodão e do feijão. Essas
culturas caracterizavam-se pelo grande volume de mão-de-obra necessário em seu processo
produtivo pela pouca ou quase que inexistente mecanização para os tratos culturais dessas
plantações. Havendo, dessa forma, uma intensa demanda por bóias-frias, em virtude das
grandes áreas cultivadas com fumo, algodão e feijão.
Essas características inerentes à agricultura toledana passam, entretanto,
gradualmente por um processo de mudança. Principalmente as alterações das estruturas
social e econômica de Toledo ocorridas a partir da década de 1970. Essas alterações
referem-se à modernização da agricultura pelo avanço das máquinas e dos equipamentos,
além dos insumos.
As alterações nas relações de trabalho ocorrem com a redução das contratações de
trabalhadores fixos e com o aumento na contratação de trabalhadores temporários. Essa
alteração deve-se principalmente às novas formas de exploração da terra, ou seja, ao cultivo
de produtos em que se pudessem utilizar máquinas e equipamentos em grande parte dos
tratos culturais, como soja, trigo e milho.
Todas essas mudanças na agricultura ocorreram principalmente pela política
governamental de expansão das exportações através do aumento na produção de soja e trigo,
pois as condições de solo e clima da região se apresentavam ideais para o cultivo desses
produtos. Dessa forma, o binômio soja/trigo torna-se o maior ciclo produtivo do município,
e um dos maiores causadores de redução da demanda por trabalhadores.
Nesse contexto, os trabalhadores rurais, fixos ou temporários, sofrem grandes
influências do processo de modernização agrícola. Entre essas influências, a mais
significativa é a perca gradual de possibilidade de ocupação e obtenção de renda. Essa
gradual redução da demanda por trabalhadores se dá em virtude da maior utilização de
equipamentos e maquinários no processo produtivo.
Dessa forma, as culturas menos mecanizadas foram tornando-se menos atrativas aos
agricultores. Propriedades com melhores condições de obtenção de créditos para a aquisição
de equipamentos passaram gradualmente a reduzir a utilização de trabalho braçal no
processo produtivo. Nesse contexto, reduziu-se o número de propriedades agrícolas que
mantinham trabalhadores fixos, residentes nas propriedades. Os tratos culturais eram quase
que totalmente realizados por maquinários ou insumos, como tratores, semeadeiras,
colheitadeiras ou agrotóxicos.
61
O binômio soja/trigo, determinou um crescimento expressivo para o município de
Toledo, pois os produtos destinados à exportação representaram o maior ciclo econômico do
município, permitindo o desenvolvimento urbano e a crescente modernização da agricultura.
Esse desenvolvimento urbano foi possibilitado, em parte, pelos migrantes das áreas
rurais que não puderam ou não quiseram se manter na agricultura. Ou seja, alguns desses
trabalhadores migraram para a cidade em busca de conforto ou de melhorias (escola, saúde,
lazer...). A grande maioria dos migrantes constitui-se, contudo, de trabalhadores que
precisaram se dirigir para as cidades. Essa necessidade se deve a redução na oferta de
trabalho para os mesmos.
A alteração no processo de produção agrícola gerou impactos na redução das
imigrações e no surgimento de emigrantes que se dirigiam a novas fronteiras agrícolas.
Interligando-se a esses fatores, apresenta-se também o início do processo de migração para
as zonas urbanas e os problemas sociais decorrentes da falta de estrutura e da falta de
empregos do setor urbano (WACHOWICZ 1982).
Todas essas alterações relacionam-se com os aumentos da oferta de mão-de-obra de
trabalhadores de origem rural. E estes ocorrem paralelos à expansão da industrialização
toledana com o surgimento de agroindústrias
16
como alternativa à absorção do excesso de
mão-de-obra e para reduzir ou evitar o processo de emigração observados no período.
Mesmo diante do crescimento da zona urbana e do aumento da necessidade de
trabalhadores, a relação entre oferta e demanda por mão-de-obra permaneceu desigual,
principalmente pela redução contínua da necessidade de trabalhadores no setor agrícola. Ao
contrário, muitos trabalhadores que não tiveram a sua força de trabalho absorvida na zona
urbana retornaram ao campo em busca de ocupação, alguns deles sob a forma de trabalho
temporário.
É possível que essas alterações nas estruturas produtivas, causadas pelo processo de
utilização gradual de máquinas, equipamentos e insumos, conseqüentes da modernização da
agricultura, sejam causadoras da redução das demandas por trabalhadores, temporários ou
fixos. Essa redução somente ocorre, porém, após um período de valorização, ou seja, o
início do processo de modernização da agricultura utilizou muitos trabalhadores volantes.
16
Agroindústria:
atividade constituída pela função dos processos produtivos agrícolas e industriais no âmbito
de um mesmo capital social, ou, quando tal não acontece, a atividade caracteriza-se por uma grande
proximidade física entre a área que produz e a matéria-prima agrícola e seu processamento industrial
(SANDRONI , 2004).
62
Mesmo com a existência de máquinas e equipamentos, essa necessidade de
trabalhadores ocorreu, pois, inicialmente, não havia máquinas e equipamentos que
ocupassem todas as etapas do processo produtivo. Dessa forma, fazia-se necessário o
trabalho manual como complementação das atividades mecanizadas.
Todavia, a constante modernização agrícola valoriza o trabalho bóia-fria apenas em
um primeiro momento, quando as máquinas e equipamentos não atingem todas as fases do
processo produtivo e ainda são necessárias formas de trabalho manuais. Com um certo grau
de desenvolvimento nas indústrias produtoras de equipamentos agrícolas, o bóia-fria já
passa gradativamente a perder a sua importância para a agricultura. Essa tendência motiva-
se pela existência e pela disponibilidade de novas tecnologias, além de possibilidades de
obtenção de linhas de crédito pelos agricultores.
Os bóias-frias apresentam geralmente baixo nível de instrução ou pouco
conhecimento técnico. Apresentam, assim, dificuldades para operarem os novos
equipamentos. Dessa forma, concorrem a uma ocupação de forma desigual com os
trabalhadores especializados e capacitados, sendo que esses últimos acabam por serem
contratados como funcionários.
Além dessa inversão na necessidade de bóias-frias por motivos tecnológicos, houve
ainda outro fator que demonstra certas características e tendências à redução na utilização de
bóias-frias: a alteração nas culturas produzidas.
A introdução de máquinas e equipamentos que facilitassem e melhorassem os
processos produtivos, aliado às novas tendências de produção visando à exportação,
motivaram muitos produtores a alterarem as suas culturas. Ou seja, cultivares que
necessitavam enormes quantidades de trabalhadores braçais passaram a ceder lugar a
culturas altamente, ou quase que totalmente, mecanizáveis.
Esse foi um fator de grande importância no processo de redução da necessidade e
redução da utilização dos trabalhadores bóias-frias. As atividades que demandavam muito
serviço braçal tiveram as suas áreas reduzidas em relação a atividades quase que totalmente
mecanizadas.
A análise dessas alterações nas culturas produzidas é extremamente importante como
fator de comprovação das influências geradas por essas alterações sobre a necessidade de
mão-de-obra. Assim, podemos perceber tal redução a partir da análise dos gráficos
referentes à área total cultivada com fumo (Gráfico 02); feijão (Gráfico 03); algodão
(Gráfico 04) e arroz (Gráfico 05).
63
Gráfico 02. Evolução das áreas cultivadas com fumo no município de Toledo entre 1974 e 2003.
0
100
200
300
400
500
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
A cultura do fumo apresenta como característica a grande demanda por mão-de-obra
em seu processo produtivo, sendo que a maioria dos trabalhadores responsáveis pela
colheita eram bóias-frias. Diante dos dados apresentados, verificamos uma grande redução
na área cultivada com fumo.
Em virtude desse fator, a quantidade de bóias-frias utilizada sofreu uma significativa
redução. Essa redução foi tão intensa, pois na cultura do fumo, desde o plantio, o replante,
os desbastes e a colheita, mesmo até a aplicação de agrotóxicos, ou seja, em praticamente
todas as etapas do processo produtivo, existe uma grande necessidade de mão-de-obra.
Essa intensidade na necessidade de tratos culturais manuais estende-se ao feijão.
Esse produto requer mão-de-obra principalmente no período de colheita.
O fumo e o feijão são duas culturas que podem ser rapidamente prejudicadas por
fatores climáticos, ou seja, chuvas excessivas no período de colheita podem danificar
consideravelmente a produção e a qualidade dos grãos.
Além disso, os tratos culturais apresentam-se intensos e desgastantes. Esses fatores
foram alguns dos causadores da redução nas áreas ocupadas com essas culturas.
64
Gráfico 3. Evolução das áreas cultivadas com feijão no município de Toledo entre 1974 e 2003
0
250
500
750
1000
1250
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná; acesso: 21/10/2005
A cultura do feijão se caracteriza, também, pela utilização de mão-de-obra,
principalmente no período da colheita, sendo que a redução em sua área de cultivo
representa também a redução na procura por bóias-frias. Apresentamos essas reduções nas
áreas ocupadas pela cultura do feijão no Gráfico 03.
Além do fumo e do feijão, outra cultura que apresenta grandes riscos em seu cultivo
é a cultura do algodão, pois as condições climáticas podem reduzir a produtividade ou
prejudicar a qualidade do produto. Isto é, quando o algodão está em pluma, pronto para ser
colhido, deve haver um período de estiagem para que a colheita seja efetuada. Caso haja um
período chuvoso quando o algodão está em pluma, poderá haver danos parciais ou totais no
produto, que é extremamente sensível à umidade.
Outros fatores de dificuldades para o cultivo desse produto estão na necessidade de
grande quantidade de tratos culturais, como desbaste, capinas e colheita serem realizados de
forma manual. Essa necessidade era suprida por um grande número de bóias-frias. Assim, a
redução do cultivo desses produtos gerou uma perca de trabalho pelos bóias-frias.
O algodão requer grandes levas de mão-de-obra, principalmente na colheita, que
deve ser rápida para que não haja risco de perdas por eventuais alterações climáticas. Assim
65
sendo, essas três culturas, algodão, fumo e feijão, apresentavam vários fatores que serviram
de fatores de desmotivação para agricultores continuarem a produzir tais culturas.
Nesse contexto, os trabalhadores temporários eram inicialmente utilizados em larga
escala nos tratos culturais desses produtos, principalmente na colheita e nas capinas.
O surgimento de alguns equipamentos que permitiam a utilização de agrotóxicos
inicialmente gerou uma diminuição nas necessidades de trabalhadores para realizarem
capinas. Não podemos deixar de lembrar que a capina pode ser, em parte, evitada com a
utilização de agrotóxicos.
A colheita dessas culturas é, porém, manual, mesmo com a existência de máquinas.
Essas máquinas são de custos elevados, utilizadas apenas em algumas grandes
propriedades. As propriedades da região oeste apresentam-se pequenas ou médias, dessa
forma tornava-se inviável a utilização de máquinas, e assim a colheita é realizada de forma
manual.
Dessa forma, inicialmente, houve uma redução na quantidade de bóias-frias utilizada
para capinas, mantendo-se a necessidade para os períodos de colheita. Após o avanço da
modernização agrícola, as áreas cultivadas com fumo, feijão e algodão passaram a perder
espaço cultivável para produtos que possuíam mais opções de mecanização e incentivos
governamentais.
Os riscos inerentes a essas culturas também serviram de fatores de análise na troca
de cultivares. Dentre esses fatores, destacam-se os incentivos governamentais destinados a
produtos que se destinavam ao mercado externo (soja, trigo, milho), a desvalorização das
demais culturas e a escassez de equipamentos e insumos, além das grandes dificuldades
causadas por intempéries climáticas.
No Gráfico 04, apresentamos as alterações nas quantidades de áreas ocupadas pela
cultura do algodão. Essa cultura tem como característica a imensa quantidade de mão-de-
obra utilizada no período de colheita, em sua grande maioria trabalhadores bóias-frias.
66
Gráfico 4. Evolução das áreas cultivadas com algodão herbáceo no município de Toledo entre 1979 e 2003
0
2000
4000
6000
8000
10000
1979 1983 1987 1991 1995 1999 2003
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
Após um período de crescimento no cultivo, entre 1980 e 1990, a cultura do algodão
teve um decréscimo significativo. Grande demandadora de mão-de-obra, a cultura do
algodão era realizada em grande escala no município, sendo que, a partir de 1990, foi
gradativamente substituída por outros cultivares, como soja, trigo e milho, ou outras
atividades como pecuária, suinocultura e avicultura.
Essa substituição deu-se, em geral, por fatores como as condições de clima e os
constantes prejuízos aos agricultores, dentre outros. Destacam-se também fatores como a
falta de equipamentos adequados aos produtos e à realidade dos agricultores.
Nessa conjuntura, os bóias-frias perdem espaço de uma forma quase que
proporcional à redução das lavouras de algodão, fumo e feijão. Essa perda de espaço se deu
em virtude de as novas culturas serem altamente mecanizadas.
67
Gráfico 5. Evolução das áreas cultivadas com arroz no município de Toledo entre 1975 e 2003
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
1975 1979 1983 1987 1991 1995 1999 2003
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
As áreas cultivadas com arroz no município de Toledo seguem as mesmas
tendências de redução como as culturas de algodão e fumo. A utilização de bóias-frias era,
entretanto, mais intensa em atividades como a capina e não no processo de colheita, como as
demais culturas supracitadas.
Já a cultura do milho permanece com grandes áreas cultivadas em virtude da
expansão de atividades como a suinocultura, a pecuária e a avicultura. O milho é uma
atividade que demanda mão-de-obra, principalmente nas fases de capina e coleta de espigas
que ficaram na lavoura após a colheita.
Assim, na cultura de milho, a utilização de colheitadeiras e defensivos limitou a
utilização de mão-de-obra a algumas etapas do processo produtivo. Dentre essas etapas
estão a “cata” de milho no pós-colheita. Até mesmo no processo de capina, a utilização de
pulverizadeiras e agrotóxicos substituíram os bóias-frias.
As pequenas propriedades que não dispunham de tratores e pulverizadores ainda
tinham a opção de contratar agricultores que prestavam serviços com trator e outros
68
equipamentos, numa espécie de aluguel. Assim, limitava-se mais ainda a necessidade de
bóias-frias.
O Gráfico 06 apresenta as alterações nas áreas ocupadas por milho no município de
Toledo, a partir de 1974 até 2003.
Gráfico 06. Evolução das áreas cultivadas com milho no município de Toledo entre 1974 e 2003.
0
10000
20000
30000
40000
50000
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
Todo o processo de constantes pesquisas da indústria visava desenvolver
equipamentos que facilitassem e tornassem mais eficientes os processos produtivos das
culturas produzidas no Brasil. De acordo com a evolução dessa indústria, acompanhava-se a
redução na utilização dos bóias-frias, ou seja, a modernização reduzia gradativamente a
necessidade de atividades manuais e, conseqüentemente, de bóias-frias.
As principais culturas beneficiadas com esses avanços tecnológicos eram o trigo, a
soja e o milho. Cabe aqui lembrar o fato de que os incentivos governamentais foram
destinados a essas culturas mais intensamente, pelo fato de esses produtos serem voltados ao
mercado externo, principalmente.
69
Como soja e trigo tornaram-se culturas extremamente poupadoras de mão-de-obra,
haja vista o crescente desenvolvimento e utilização de máquinas e equipamentos em mais
etapas do processo produtivo, disso decorreu que o cultivo desses produtos, junto com o
cultivo do milho, tornaram-se as principais atividades desenvolvidas na região. Gráficos 07
e 08 .
Gráfico 07. Evolução das áreas cultivadas com soja no município de Toledo entre 1974 e 2003.
0
20000
40000
60000
80000
100000
120000
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
Conforme o Gráfico 07, acima representado, percebemos uma certa regularidade nas
áreas cultivadas com soja, apresentando um aumento substancial nas áreas cultivadas entre
1974 e 1989. A partir daí, houve uma pequena redução, seguida por uma estabilização e
leve crescimento posterior das áreas ocupadas por soja.
Isso pode ser a representação da substituição de culturas com tratos culturais
manuais pelas culturas mais mecanizadas em seu processo produtivo, motivando a escassez
de demanda por trabalhadores bóias-frias. Apesar de uma redução nas áreas destinadas ao
cultivo da soja e do trigo, essas se mantêm como atividades de grande destaque.
Essa redução apresenta-se em virtude de novas atividades apresentarem maiores
ocupações, como gado, suínos e peixes. Essas atividades não utilizam diretamente grandes
áreas em si, mas representam o abandono de áreas destinadas a essas culturas e ocupadas
70
com outras atividades que não necessitassem tanto acompanhamento como as culturas
normais.
Gráfico 8. Evolução das áreas cultivadas com trigo no município de Toledo entre 1974 e 2003
0
15000
30000
45000
60000
75000
90000
105000
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
ano
área (ha)
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
As quantidades demandadas por bóias-frias sofreram grandes influências pelas
alterações nas culturas produzidas no município, conforme podemos perceber pela análise
dos gráficos acima expostos.
A falta de ocupação para esses bóias-frias teve como alguns causadores o cultivo
altamente tecnificado de alguns produtos e o desenvolvimento de novas atividades como
pecuária, avicultura e suinocultura. Esses fatores apresentam-se como um dos principais
motivos propulsores que fizeram com que os bóias-frias buscassem outras fontes de renda.
Sendo assim, possibilitou-se a grande redução no número de bóias-frias existentes.
Essas alterações nas áreas cultivadas com soja, milho, trigo, algodão, fumo, arroz e
feijão, no município de Toledo, apresenta-se de forma comparativa no gráfico 9. esse
comparativo nos permite perceber a grande diferença entre as áreas cultivadas com produtos
71
que se utilizam de máquinas e tecnologias em mais etapas do processo produtivo, e as áreas
ocupadas com produtos com cultivo de forma mais manual.
Alguns dos produtos, como o fumo e o feijão, por exemplo, apresentam áreas bem
reduzidas em relação às demais, ficando quase que imperceptível no gráfico. O algodão e o
arroz apresentam-se ligeiramente perceptíveis, porém confirmam a grande diferença entre as
grandes áreas ocupadas por soja, milho e trigo. Essas três culturas ocupam extensas áreas
agrícolas do município, mesmo apresentando variações em suas extensões de terra.
Gráfico 9: Comparativo entre as variações nas áreas cultivadas com soja, trigo, milho, fumo, algodão, feijão,
arroz entre 1974 e 2004.
0
15000
30000
45000
60000
75000
90000
105000
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
ano
área (ha)
fumo feijão algodão arroz
milho soja trigo
Fonte: Sistema Estadual de Informações - Bpub - Base Pública Governo do Estado do Paraná- acesso: 21/10/2005
Percebe-se que culturas que utilizam maiores quantidades de máquinas e
equipamentos ocupam a grande parte da área agrícola cultivada no município, não sendo
necessário a contratação de trabalhadores extras. Ou seja, a necessidade de trabalho braçal
fica reduzida a culturas de tratos mais manuais e que ocupam as menores áreas.
No início do período em destaque a utilização de trabalhadores temporários
estendia-se a praticamente todas as culturas pela reduzida quantidade de equipamentos
específicos para cada produto, ou pela menor intensidade em sua utilização. Com o aumento
72
da variedade de equipamentos e máquinas agrícolas existentes e a difusão de sua utilização,
ocorre uma gradual redução na necessidade de trabalhadores bóias-frias, independente das
variações ocorridas nas extensões de áreas ocupadas com esses produtos, soja, trigo e milho.
A utilização de bóias-frias em culturas como algodão, feijão, arroz e fumo, não teve
grandes alterações, porém as áreas ocupadas com essas culturas continuaram a ser muito
pequenas, não sendo possível ocupar todo o excedente de bóias-frias não mais utilizados
pelas culturas da soja, milho e trigo.
Dessa forma, as grandes áreas cultivadas por trigo, soja e milho aliadas ao aumento
nas tecnologias, máquinas e equipamentos para seus tratos culturais representa uma redução
na oferta de trabalho para os bóias-frias. Esses fatos podem ser considerados os principais
causadores do processo de extinção do grupo ocupacional dos bóias-frias.
6. EXPECTATIVAS E TENDÊNCIAS PARA OS BÓIAS-FRIAS DE TOLEDO - PR
Os bóias-frias são trabalhadores que tendem a concentrar-se em regiões com uma
agricultura mais desenvolvida. D’incao (1984), ao fazer tal constatação, baseou-se no fato
de que a demanda por trabalhadores é mais intensa nessas áreas. Isso se deve ao fato de que
a agricultura desenvolvida utiliza mais maquinários, dessa forma há a necessidade de
complementação de algumas atividades de forma manual. Devido à intensidade na oferta de
trabalho, faz-se uso de bóias-frias.
Essas regiões com agricultura modernizada, dispõem, contudo, de maiores técnicas
mecânicas e de insumos, o que pode significar a redução da necessidade de trabalhadores
braçais pela grande utilização de máquinas e equipamentos no processo produtivo.
A agricultura toledana é considerada extremamente desenvolvida e com
características geográficas que permitem um grande índice de mecanização. Mesmo as
pequenas propriedades dispõem de máquinas e equipamentos para o desenvolvimento de
suas atividades. Dessa forma, a afirmação de D’incao (1984) aplica-se ao município de
Toledo apenas em um período anterior à modernização agrícola, ou no início desse
processo. Nessas etapas, o crescimento da atividade agrícola gerava um atrativo aos
trabalhadores bóias-frias. Entretanto, com a crescente implantação de máquinas e
equipamentos no processo produtivo, essa atratividade sofreu uma grande redução.
Assim sendo, buscamos analisar a relação entre os bóias-frias e a modernização da
agricultura do município de Toledo. Podemos constatar que há uma relação inversa entre
ambos, ou seja, o número de bóias-frias vem sendo gradativamente reduzido conforme a
modernização avança sobre a agricultura.
Essa redução ocorre porque a utilização de máquinas e equipamentos, ou a utilização
de insumos, permite uma maior praticidade para os agricultores na execução dos tratos
culturais, praticidade esta que não ocorre quando se faz necessária a utilização de bóias-
frias.
A existência dessa relação entre modernização agrícola e diminuição da utilização de
bóias-frias traz, ainda, outro fator relacionado. Essa nova relação é a alteração das culturas
produzidas. A praticidade gerada pela utilização de novas tecnologias para os tratos
74
culturais serviu como motivador aos agricultores para deixar de produzir culturas que
necessitassem de muitas atividades manuais, e passar a investir na produção de culturas
mecanizáveis.
A esse fato atrelam-se os incentivos governamentais. Esses incentivos visavam
aumentar as áreas cultivadas com produtos destinados ao mercado externo. Essas culturas
eram as propícias à mecanização.
Diante disso, os trabalhadores bóias-frias deixavam de ser tão necessários aos
agricultores. Podemos concluir que apenas no processo inicial de modernização da
agricultura os bóias-frias tiveram grande importância aos agricultores, pois nesse período
ainda havia grandes quantidades de lavouras ocupadas por produtos altamente
demandadores de mão-de-obra em seus tratos culturais, como o algodão, o fumo, e o feijão,
entre outros. Mesmo as culturas como o milho, a soja e o trigo, necessitavam de bóias-frias
para realizarem, principalmente, capinas. Esse período refere-se à pouca existência de
tecnologias ou de insumos para quase todos os tratos culturais necessários.
Com o desenvolvimento da indús02 w.0 Twl(eferequ o tri)]TJ-2]TJ0 Tc-0.00023.4512.445 0 ps altamerafrias eram para quoividamsm(go, neuantidaas. Es)]TJ0.0003 19470.399 T0612.445 0 8(o as cul. O)8( o desenvolvim)8(e)-1(ntoTw [(ndolvau)63o da )]TJ0.001 0830.2745 T0612.235 -1.725 que pes, cim0 p(su)6s, cit4(afrais utia ris arse[(a e aoocest de xicod)6(eumos)6(eais, cbm)9Ttevador ervvidas-ividaninhas,cess(iaseja,cessas que)5( )]TJ0.0003 T737.0449 Tw (go, neuantam)8( de bóias-fumos nte, ca os alt( d518( gme)5( )]T730.399 T 9.895 0 Tt)-7vim)8(em)8342n ferexTdgcon. Qdes ore-se8(o as cul)- que)5( )]TJ6.0003 T744.2745 T12.235 -1.725 quevaTd(a(go, necessitavam)8itav m)9(usso, os trabalhao da )]TJ0.001 0740.399 T6 13.22 0 em
75
agricultores não necessitavam mais realizar tarefas diárias em suas propriedades. Essa
ociosidade fez com que muitos agricultores resolvessem migrar para as cidades. Já no caso
dos trabalhadores estes precisaram migrar em busca de ocupação.
No Estado do Paraná, bem como na região de Toledo, esse fato é comprovado
através da análise dos índices populacionais rurais e urbanos, entre os anos de 1970 e 2000
(Tabela 3)
Tabela 3 Total das populações rurais e urbanas do Paraná, região oeste e Toledo, entre 1970 e 2000
Paraná Região Oeste Toledo
1970 2000 1970 2000 1970 2000
Urbana 2.504.378 7.782.005 149.516 928.362 14.986 85.911
Rural 4.425.490 1.776.121 602.916 209.174 53.899 12.278
Total 6.929.898 9.558.126 752.432 1.137.536 68.885 98.189
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, IBGE, 1990; Censo Demográfico IBGE 2000
Percebemos a relação entre o crescimento da população e as etapas econômicas
vivenciadas. Nas décadas de 1960 e 1970 houve uma expansão das fronteiras agrícolas e a
agricultura mantinha-se baseada na pequena propriedade de base familiar. A partir da
década de 1980, o constante desenvolvimento da indústria e o avanço na utilização de
máquinas agrícolas passam a alterar essa relação de trabalho agrícola.
As alterações nas relações de trabalho e a sua ligação com os ciclos de avanço
tecnológico são claramente percebidas. O constante desenvolvimento do processo de
implantação de novas tecnologias no setor agrícola contribui para a tendência de completa
substituição de trabalhadores bóias-frias por maquinários operados por funcionários
permanentes mais especializados.
Segundo Broietti (2000), a redução do número de bóias-frias de forma intensa é uma
tendência extremamente forte em virtude dos crescentes incentivos, como políticas e
créditos agrícolas destinados ao setor agrícola.
Diante de tal fator, esses trabalhadores recorrem a outros métodos de sobrevivência.
Entretanto, em grande parte esses trabalhadores possuem baixa formação escolar, ou seja,
86% apresentaram escolaridade entre 1ª e 4ª séries e 7% apresentam escolaridade entre 5ª e
76
8ª séries (incompleto). Este se torna um dos principais motivos para as dificuldades de
colocação no mercado de trabalho. Buscam, assim, ocupar-se em atividades que não
requerem muito estudo ou formação técnica.
A grande maioria desses bóias-frias, 86%, como anteriormente colocamos, tem
formação escolar primária incompleta, sendo um dos principais motivos para as dificuldades
de colocação no mercado de trabalho. Com falta de empregos na zona urbana, esses
trabalhadores buscaram a atividade volante como opção.
De acordo com dona Sandra:
“ É o que a gente sabe fazer, trabalhar na roça, sempre fez só isso,desde
criança, daí é difícil conseguir aprender outra coisa. Nem sei se quero fazer
outra coisa.”
Ainda, de acordo com todos os bóias-frias questionados, as principais dificuldades
para se conseguir uma ocupação nas atividades urbanas era dificultada pela falta de
qualificação ou falta de estudo ou, em alguns casos, a idade mais avançada.
Dona Ivete afirmava que buscou a ocupação como diarista, tendo muitas
dificuldades de encontrar trabalho:
“Em algumas casas queriam que eu anotasse todos os recados, mas eu
estudei pouco e mal apenas sabia escrever o básico, daí não deu certo. E
depois eu tinha filho pequeno, daí já viu, os patrões tem um medo, não sei de
que, pra chamar a gente pra trabalhar.”
A grande maioria desses trabalhadores volantes (74%) tem origem na zona rural
como trabalhadores fixos, parceiros ou arrendatários. Diante da redução contínua e gradual
no número de empregos fixos, viram-se obrigados a alterarem a sua forma de trabalho.
Deslocaram-se para a cidade em busca de melhores condições de sobrevivência.
Dentre os questionados, 20% têm origem urbana, porém os pais eram oriundos das
áreas rurais, desempenhando as mais variadas atividades. Apenas 6% têm origem urbana
sem vínculos rurais, entretanto vislumbravam no trabalho bóia-fria a possibilidade de obter
renda extra, principalmente nos fins de semana.
77
A expulsão do homem do campo é, todavia, o principal, mas não o único, motivo
para o êxodo rural. Alguns trabalhadores migraram para as cidades em busca de “facilidades
e comodismo”, ou seja, dentre os bóias-frias que provinham de zonas rurais apenas seis
trabalhadores disseram que essa migração deu-se em função de acreditarem ser mais fácil
obter emprego. Outro fator é a possibilidade de escola para as crianças e acesso a
atendimento médico.
Esses seriam os principais motivos que levaram esses bóias-frias a migrarem para as
cidades. Além disso havia a possibilidade de desempenhar atividades menos cansativas e
árduas, se comparadas aos serviços que executavam na agricultura.
A praticidade e o comodismo, a facilidade de recursos e de acesso a escolas, entre
outros, foi uma espécie de atrativo a essas famílias, famílias estas que, sem o correto
preparo e capacitação, migraram para as cidades, lançando-se a um mercado de trabalho
que exigia qualificação. Em alguns casos, acabaram residindo em periferias e ocupando-se
em subempregos.
Em outros casos, os agricultores conseguiram empregar-se em funções simples,
tendo uma moradia razoável, entretanto não cabe aqui analisá-los, pois o presente estudo
baseia-se apenas nos trabalhadores bóias-frias.
No Paraná, o crescimento na utilização da mão-de-obra volante deu-se com o
cultivo de cana-de-açúcar, algodão e café, principalmente, pois essas culturas representam
as maiores demandadoras de mão-de-obra volante. Estes trabalhadores eram contratados de
forma temporária para os períodos de colheita. Em algumas poucas exceções, eram
recrutados para períodos em que se necessitasse de capinas ou roçadas. No município de
Toledo, as atividades de maior destaque eram algodão, fumo e feijão.
Dentre a amostra questionada, 52%, ou seja, 26 trabalhadores, de certa forma,
acreditam serem beneficiados com essa forma de trabalho. Afirmavam isso mesmo achando
que, de forma geral, era uma atividade insegura e cansativa. Para os bóias-frias, trabalhar
como bóia-fria é vantajoso, pois é um dinheiro rápido e sem descontos. No trabalho fixo
seria necessário aguardar 30 dias para ter o salário. Na atividade volante essa remuneração é
diária.
Esse fato pode, em parte, contradizer D´incao (1984). De acordo com a autora, esses
trabalhadores seriam vítimas da sociedade capitalista acumuladora, sociedade essa que
explora de todas as maneiras possíveis esses trabalhadores sem trabalho, fixo, que se
submeteriam a qualquer forma de sustento.
78
Essa contradição ocorre, pois os bóias-frias questionados não se sentem vítimas da
sociedade. Acreditam que essa condição é uma conseqüência de todas as mudanças
ocorridas. E essas mudanças culturais e tecnológicas trazem benefícios para a sociedade.
Dessa forma os próprios bóias-frias poderiam ser beneficiados.
Todos os bóias-frias concordam, contudo, que essa era uma forma de trabalho que se
apresentava vantajosa apenas na rapidez do pagamento. Sem isso, era uma forma de
trabalho insegura e cansativa, que exigia muito, tanto física quanto emocionalmente. Essas
exigências devem-se à força necessária para as roçadas, colheitas e capinas realizadas em
dias de altas temperaturas, sob fiscalização constante, sem a possibilidade de uma correta
alimentação.
Quanto ao esforço emocional, cita-se a pressão do “gato” sobre os trabalhadores,
mas principalmente a humilhação de ser transportado em carroceria de caminhonetes e
caminhões.
Para dona Judite, a humilhação parecia maior:
“[...] quando o caminhão passava, às vezes a gente ouvia pessoas na rua
gritando olha o caminhão cheio de vaca e de boi, tudo indo para o abate, as
mulheres ficavam envergonhadas, era muito triste.”
Identificamos que, para todos os agricultores questionados, a utilização de bóias-
frias apresentava-se como sendo mais prático e fácil, pois, inicialmente, não havia o
compromisso com vínculos empregatícios, custos elevados com transportes, entre outros.
Para o agricultor, a utilização de uma mão-de-obra barata, por ser abundante,
tornava mais rápidas as atividades de sua propriedade, realizadas nos menores períodos
possíveis, pela quantidade de trabalhadores designados à função. A necessidade de
agilidade se dá principalmente na colheita, que deve ser feita de maneira rápida para evitar
perdas com intempéries climáticas.
Mesmo que todos os agricultores concordassem com os benefícios da utilização de
bóias-frias, da mesma forma 93,33% concordam que a utilização dos mesmos era uma “dor
de cabeça” necessária. Apenas um agricultor disse que nunca teve nenhuma forma de
problema com esses trabalhadores, como trabalhadores que não desempenhavam as suas
funções corretamente, que causavam problemas com outros bóias-frias ou com questões
legais de direitos trabalhistas.
79
Assim, a redução no número de bóias-frias significou, também, uma redução no
“incômodo” com trabalhadores que “matam serviço” ou não realizam a capina de forma
satisfatória, ou seja, apenas “amassam o mato”. Segundo os agricultores, muitos desses
volantes realizam um trabalho bem feito, mas alguns não trabalham de acordo com o que
deveria ser feito, e isso acarretaria essa “dor de cabeça”.
Esse fato gera uma outra forma de exclusão desses trabalhadores, pois o “gato”
acabava por selecionar os trabalhadores nos “pontos” de acordo com o desempenho dos
mesmos na execução de tarefas. Assim formava, muitas vezes, uma espécie de equipe fixa,
que era contratada, quase sempre, pelo mesmo “gato”.
Dessa forma, quando questionamos os bóias-frias quanto às principais vantagens e
às principais desvantagens de se trabalhar dessa forma temporária, foi citado, de forma
unânime, como maior vantagem nessa atividade, o recebimento de seus honorários de forma
diária. Esse fato contribuía para a formação de bóias-frias ocasionais, ou seja, muitos
trabalhadores desempenhavam a atividade bóia-fria de forma esporádica, apenas quando
necessitavam de dinheiro rápido.
Outro ponto destacado foi a variedade de serviços existentes e a possibilidade de
aprender qualquer função, o que lhes possibilitaria a melhoria na facilidade de encontrar
uma ocupação fixa pela ampla experiência acumulada. Todavia essa experiência não era
contabilizada, pois não havia uma forma de comprová-la, pela falta de registros.
A referência aos agricultores que eram extremamente exigentes quanto à qualidade
do serviço prestado ou à integração com colegas de trabalho apresenta-se como outra
vantagem para os bóias-frias, caso viessem a trabalhar com um patrão muito exigente ou
que os remunerasse de forma inadequada, ou ainda quando houvesse um desentendimento
com algum colega de trabalho. Dessa forma, não haveria a obrigação ou necessidade de
retornar à mesma propriedade no dia seguinte.
Identificamos, entre todos os bóias-frias questionados, que uma das principais
dificuldades inerentes à atividade temporária é a falta de garantia de ocupação e de
recebimento de renda, pois a sua renda está condicionada à execução de algum tipo de
trabalho. Assim não poderiam assumir compromissos financeiros de nenhuma espécie, pela
falta da garantia de como quitá-los.
Outro fator que tem destaque entre as opiniões de todos os bóias-frias questionados
sobre as desvantagens da profissão está no fato de que, nessa forma de trabalho informal,
não há a garantia dos direitos trabalhistas, como seguro desemprego e fundo de garantia,
80
entre outros. Esses são alguns dos fatores que identificam e justificam um dos principais
desejos desses trabalhadores, que é o de ter um emprego fixo.
Para dona Francisca:
“Era melhor se a gente pudesse aposentar depois de tanto tempo de
trabalho, mas sem assinar a carteira é muito difícil. Depois, assim desse
jeito, quando o patrão não quisesse, ele não pegava ninguém pra trabalha e
a gente ficava sem trabalho e sem dinheiro.”
Para 78% dos bóias-frias, ou seja, para 39 trabalhadores, mesmo recebendo
remunerações inferiores às obtidas com o trabalho bóia-fria, ainda assim iriam preferir a
garantia de um trabalho fixo com salários regulares.
Um trabalho fixo, além da garantia do salário, permitiria ainda a redução das funções
e dos trabalhos árduos, ou seja, desempenhando atividades agrícolas como bóias-frias. Estes
eram relegados à execução das atividades mais penosas. Caso obtivessem um trabalho
estável, essas dificuldades seriam reduzidas ou repassadas a outros bóias-frias.
Em Toledo não há uma distinção quanto à localização da residência ou condições de
trabalho dessas pessoas (fixos ou temporários), pois, segundo Luis Schaefer, presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Toledo, para o sindicato todas as pessoas que
desempenham alguma atividade na zona rural são consideradas trabalhadores rurais, sendo
possíveis de filiação ao mesmo sindicato. Assim, os trabalhadores bóias-frias da cidade de
Toledo são de difícil contagem, ou seja, não se tem um registro exato de quantos
trabalhadores desempenham ou desempenhavam essa atividade.
A observação e as conversas informais que realizamos com bóias-frias foram de
extrema importância, pois muitos deles gostam de contar as suas experiências de vida e se
mostram dispostos a ajudar. Dessa forma os conhecimentos obtidos baseiam-se na realidade
observada e vivida.
Quando propomos as hipóteses de que a redução do número de bóias-frias seria uma
conseqüência da modernização da agricultura e da alteração das culturas produzidas,
buscamos essa confirmação pela opinião de bóias-frias e de agricultores.
Dentre os agricultores questionados, 7 apontaram essa mecanização, aliada às
vantagens financeiras da alteração das culturas produzidas, como sendo os principais fatores
causadores dessa tendência à extinção dos bóias-frias. Todavia, 3 agricultores apontaram as
81
cobranças com Leis Trabalhistas como fatores de incentivo maior para as alterações nas
culturas produzidas e o aumento da utilização de máquinas e equipamentos. Já 5
agricultores afirmam que a união desses dois fatores é responsável pelas alterações nas
demandas por bóias-frias.
Em relação às Leis Trabalhistas, destaca-se que, de acordo com a Convenção
Coletiva de Trabalho 2004/2005, do Sindicato, pg. 03, cláusula 14ª, os empregadores
deverão fornecer aos empregados, mesmo que temporários, um local com estrutura própria
para que os empregados realizem as suas refeições, inclusive com acesso a banheiros.
Essa exigência é citada por 2 bóias-frias, ou seja, a redução dos bóias-frias se deve às
dificuldades para a contratação dos mesmos pelas exigências quanto às Leis Trabalhistas
bem como as cobranças por parte dos sindicatos. Para todos os agricultores questionados, a
necessidade de adaptarem-se às cláusulas da Convenção do Trabalho, isto aliado a outros
fatores, causou um certo medo de utilizar bóias-frias e acabavam por aumentarem ainda
mais os seus gastos.
Um exemplo é a regulamentação da forma de transporte utilizada para levar os
trabalhadores até seu local de trabalho, que deve ser feita em veículos próprios para essa
finalidade, como ônibus, e não mais poderia ser efetuado em carrocerias de caminhões,
como costumeiramente acontecia.
As exigências impostas pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Toledo, quanto
ao transporte, era que não poderia ser realizada por caminhões ou qualquer outra maneira
que não oferecesse segurança aos trabalhadores.
A Convenção Coletiva de Trabalho 2004/2005, do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de Toledo, pg. 03, cláusula 18, diz:
CLÁUSULA DÉCIMA OITAVA – DO TRANSPORTE DE EMPREGADOS
“O empregador deverá assegurar que o transporte dos empregados seja
feito em condições de segurança em veículos apropriados de conformidade
com a legislação vigente e que as ferramentas de trabalho estejam
devidamente acondicionadas e amarradas em local que não ofereça perigo
ao trabalhador transportado.
82
Esse fator apresenta-se como causa para a redução na procura por bóias-frias, pois,
quando questionamos sobre os reais motivos para a redução da utilização dos bóias-frias,
Dona Ana é bem enfática:
“O povo fala que foi por causa de trator colhedeira, plantadeira, veneno,
mas eu acho que só se começou a usar mais máquina por que muita gente
(trabalhadores), começou a reclama que não ia mais andar na carroceria de
caminhão, e isso assustou os agricultores.”
Dona Maria ainda continua relatando alguns acontecimentos como:
“E quando acontecia de alguém se machucar, um acidente, o agricultor
acabava se incomodando muito. Tem um agricultor, onde eu trabalhei, que
gastou toda a colheita de indenização e multa por que a caminhoneta tombou
e um bóia-fria quebrou a perna ou outros se machucaram um pouco, mas
isso já chegou. Ele nunca mais plantou algodão, e olha que fazia tempo que
ele plantava algodão, parece que foi a gota d’água pra ele.”
O auge da utilização de bóias-frias foi nas décadas de 1970 a 1980. A partir daí, o
cenário dos bóias-frias vem mudando. A demanda por sua mão-de-obra vem sendo reduzida
drasticamente, entretanto, até o presente momento, não chegou ao limite de sua completa
extinção.
Essa redução faz com que alguns ex-bóias-frias se mostrem com saudade dos
tempos de empregos fartos. Dentre os questionados 72% afirmam que, mesmo diante do
sofrimento e das dificuldades da vida de bóia-fria, quando havia grande oferta de trabalho
significava que haveria uma boa renda. Já para 28% nem mesmo o dinheiro que conseguiam
com seu trabalho compensava o esforço.
Nas conversas que realizamos com trabalhadores bóias-frias, esses descreveram, sob
seu ponto de vista, como foi o processo de redução da utilização da mão-de-obra volante.
Dentre os fatores citados, destacam-se as alterações nas culturas produzidas, ou seja,
conforme anteriormente hipotetizamos, as trocas ocorridas nas culturas produzidas
reduziram a necessidade de bóias-frias. Essas trocas deram-se principalmente em virtude
das dificuldades de todo o processo produtivo de algodão, fumo e feijão.
83
Conforme apresentamos anteriormente, essas culturas requerem muitos tratos
culturais e são muito propícias a perdas por motivos climáticos. Assim, as alterações nos
produtos cultivados apresentam-se como fatores que contribuíram para a redução do número
de bóias-frias existentes.
Seu Francisco relata como essa redução dos bóias-frias foi ocorrendo:
“Pouco a pouco os gatos foram desaparecendo, e os poucos que ainda
recrutavam bóias-frias, procuravam por equipes pequenas, para realizar
atividades como pequenas roçadas e cata de milho. Quase nunca era para
catar algodão. Isso dá muito trabalho e depois que depende muito do
tempo.”
Já conforme Seu Isidoro, um dos bóias-frias que questionamos, muito agricultor
perdeu a lavoura de algodão em ponto de colheita por causa do excesso de chuva na hora da
colheita:
“Isso deixa qualquer um desanimado, assim é claro que ninguém quer
plantar nada tão arriscado.
Objetivamos analisar a tendência ao desaparecimento desse grupo ocupacional dos
bóias-frias. Assim, pudemos identificar que, mesmo que 6% dos questionados ainda
trabalhem como bóias-frias esporadicamente, apenas 4% dizem que essa forma de trabalho
não se acabou, mesmo com toda tecnologia existente na agricultura. Ainda de acordo com
eles, nem vai se acabar, pois sempre existirá a necessidade de utilização de grandes levas de
trabalhadores sem o compromisso de uma contratação formal.
Registrou-se, contudo, que 96% afirmaram que a tendência à extinção é quase que
uma certeza, pois os trabalhadores precisam sobreviver e não poderiam ficar esperando
surgir algum serviço na agricultura para obterem renda.
Ou seja, para dona Maria:
84
“Se a gente fica esperando pra ter o que fazer então morre de fome, tem que
se virar, nada cai do céu a não ser chuva, se eu to trabalhando em alguma
coisa aqui na cidade eu não largo pra ser bóia-fria de novo, não.”
Diante desse fato, dona Maria faz previsão de que:
“Essa profissão vai acabar por falta de gente pra trabalhar, e depois sempre
aparece alguma coisa (máquinas, equipamentos ou insumos) pra dá conta do
serviço mesmo.”
Segundo o equivalente a 86% da amostragem de agricultores questionados, os
bóias-frias tendem a desaparecer. As atividades que necessitam de grandes levas de
trabalhadores temporários serão cada vez menores e esses trabalhadores terão que procurar
outras fontes de renda. Isso seria uma conseqüência inevitável do processo de modernização
constante da agricultura.
Apenas dois agricultores acreditam na manutenção de trabalhadores bóias-frias,
porém sem as mesmas características do início. As poucas atividades que demandarão mão-
de-obra podem ser desempenhadas por um número bem reduzido de trabalhadores fixos.
Assim, essa enorme redução nas atividades em que mais se utilizam bóias-frias,
devido a decepções/prejuízos ou à busca por culturas diferenciadas, mudou a forma de
contratação de trabalhadores. Da utilização de muitos trabalhadores temporários passou-se
para uma ou duas famílias fixas. Essas famílias residiam na propriedade e desempenhavam
todas as funções juntamente com a família do próprio agricultor.
Para o agricultor Pedro, que trocou o cultivo do algodão pelas atividades leiteira,
suína e piscicultura:
“[...] trabalhar com lavoura estava se tornando cada vez mais difícil,
principalmente pelas alterações no clima, muitas vezes estiagem na época
de plantio e chuva no período de colheita. Além disso, as atividades
85
desempenhadas atualmente proporcionam lucros muito superiores,
principalmente pela diversificação da propriedade.
Sua propriedade conta com o auxilio de uma família de empregados que trabalha
junto com os seus filhos. Contou-nos que já utilizou trabalhadores bóias-frias, mas, segundo
ele:
“[...] são pessoas difíceis de se trabalhar, pois alguns têm que ser
fiscalizados ‘de perto’ para garantia de um bom serviço, e isso acaba
tirando o sossego, incomoda mesmo.”
A procura de agricultores pelos “gatos” começou gradativamente a ser reduzida. De
acordo com os “gatos” que questionamos, a alternativa para o seu sustento foi voltar a sua
atividade para fretes, transporte de animais e o serviço de intermediação de negócios,
conhecido com “picaretas” ou “roleiros”
17
.
Esses “picaretas” estavam prontos para qualquer tipo de “rolo”, incluindo desde a
compra e venda de animais e implementos, até compra e venda de terras. Como esses
personagens estavam sempre em contato com diversos agricultores, possuíam informações
sobre quem queria comprar e quem queria vender os mais diversos produtos.
A redução na procura por bóias-frias foi percebida também pela geração de uma
excedente de trabalhadores nos pontos de bóia-fria.
Dona Maria relembra que:
“[...] quando não conseguia subir no caminhão de manhã, já saía em busca
de outra atividade para não perder o dia, tinha umas casas que eu já tinha
sido diarista e eu ia lá para ver se não tinha algum serviço.”
Um dos trabalhadores, Seu Luiz, relembra dos tempos de fartura de serviço. Segundo
ele, eram tantos “gatos” na disputa pelo bóia-fria:
17
Picaretas ou roleiros: termos utilizados para designar pessoas que realizam a intermediação de qualquer
espécie de negociação, produtos, terras, animais, entre outros. Por estarem sempre em contato com
agricultores, tinham conhecimento das necessidades de compra ou venda desses proprietários. Realizavam a
negociação e, em troca, recebiam um percentual do valor, ou ainda produtos, como animais, entre outros
(definição da autora).
86
“Às vezes, eu embarcava em um caminhão que oferecesse maior preço pela
diária, era quase um leilão, as vezes nem se sabia direito onde é que se iria
trabalhar. Quando um caminhão já estava muito cheio, a gente descia e
pulava pra outro pra garantir, por que o agricultor pedia tantos bóias-frias,
e era só isso que o gato levava. Se tivesse mais, o gato fazia descer.”
No Paraná, o número de bóias-frias, segundo o Censo Agropecuário de 1995,
ultrapassa as 400 mil pessoas, concentrando-se nas regiões norte e nordeste do Estado,
regiões produtoras de café, cana e algodão (IBGE, 2000).
Em Toledo não há a contagem do número exato de bóias-frias. Não existe registro
preciso, pois não há distinção quanto à moradia ou condições de trabalho (fixos ou
temporários). Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Município de
Toledo, Luiz Schaefer, todas as pessoas que desempenham alguma atividades na zona rural
são considerados trabalhadores rurais, sendo possíveis de filiação ao mesmo sindicato.
Mueler & Martine (1997) mostram que a categoria dos bóias-frias vem sendo
rapidamente reduzida, devido à tecnificação e à mecanização agrícola, que estão em
constantes avanços e apresentam-se mais atrativas para os proprietários do que a utilização
de bóias-frias.
Essa tendência ao desaparecimento confirma-se nas palavras de Aguirre e Bianchi
(1989), ao afirmarem que o processo de transição entre a agricultura tradicional para a
agricultura capitalista deve ter uma zona de extinção. Nesse ponto, a relação custo/beneficio
das tecnologias empregadas apresenta-se mais favorável. Assim, a utilização de mão-de-
obra tenderia à extinção.
O governo paranaense criou, em 1995, o Programa Vilas Rurais, segundo o qual as
famílias dos bóias-frias receberiam um lote de terra com casa e infra-estrutura mínima.
Entretanto, esse lote de terra era pequeno, não sendo suficiente para proporcionar o sustento
de uma família, sendo que essa ainda teria de vender sua mão-de-obra de maneira
temporária como complemento de renda (FERNANDES & PONTE, 2002).
Mesmo com o desenvolvimento deste programa para auxiliar esses trabalhadores,
ainda assim os constantes desenvolvimentos de novos maquinários e insumos agrícolas
tornam a utilização de mão-de-obra temporária cada vez mais desnecessária, o que agrava
ainda mais a situação desses trabalhadores (PERES, 1982).
87
Em concordância, Ferrante & Barone (1996) afirmam que a continuação do
processo de modernização agrícola contribuiu para tornar essa forma de trabalho quase que
inexistente. Podemos confirmar tal fato com as opiniões obtidas junto aos bóias-frias
questionados. Segundo 96%, ou seja, 48 trabalhadores, o principal fator causador da falta de
demanda pela sua mão-de-obra é a mecanização, que gerou a alteração nos produtos
cultivados. Culturas demandadoras de bóias-frias foram substituídas por atividades que
pudessem ser quase que totalmente mecanizadas.
Dentre os bóias-frias, 8% acreditam que a evolução do setor de agrotóxicos teve uma
enorme importância para o processo de redução de utilização de trabalhadores temporários
no setor agrícola, pois o controle das ervas daninhas com a utilização de herbicidas reduziu
a necessidade de grandes levas de pessoas para capinas. Essa era uma das atividades que
mais requeria o auxílio dos serviços de bóias-frias.
Seu Isidoro conta que:
“A grande maioria das lavouras em que eu ia catar algodão virou soja e
trigo, ou milho, vaca..., quase ninguém planta mais algodão, com o tempo
meio louco, arrisca a perder tudo na chuva demais ou na seca demais, aí
essas lavouras (milho, soja e trigo) podem até agüentar um pouco mais.”
Apenas 2 bóias-frias nos afirmaram que, em primeiro lugar, estão as mudanças nas
leis trabalhistas. Essas leis seriam responsáveis por “assustar” os agricultores, ou seja,
causar um certo receio de contratar trabalhadores temporários.
Para seu Antonio:
“Teve muito agricultor que não pegava mais bóia-fria por que se não
gastava muito com ônibus e outras vantagens que a gente deveria ter como
segurança e lugar para esquentar a comida, isso tirando o medo de
acontecer algum acidente e ter que pagar indenização , multa e outras
coisas.”
88
Assim a modernização, ou seja, o desenvolvimento de máquinas e insumos como
adubos e agrotóxicos, nos é apresentada pelos bóias-frias como o principal fator responsável
pela redução na demanda pelos seus serviços, porém não o único. Junto a ela, mencionam-se
as leis trabalhistas.
Dessa forma, os agricultores questionados afirmaram-nos que não demandam mais
mão-de-obra de bóias-frias por mudanças nas atividades produtivas da propriedade para
culturas quase que totalmente mecanizadas, ou que necessitem baixas quantidades de mão-
de-obra, supridas pela existência de trabalhadores fixos.
Seu Luiz conta que:
“Eu sempre carpia soja, catava algodão, carpia algodão, só que agora não
tem mais nada pra carpir, os venenos fazem o serviço, acabaram com tudo
até nosso serviço... tem veneno para tudo, menos pra acabar com a nossa
situação de necessidade.
Muitas vezes a associação da modernização agrícola com o êxodo rural como
origem de alguns bóias-frias não é feita pelos mesmos, que, em geral, são aqueles que se
originam de alguma forma de trabalho fixo.
Seu Tião cita que:
“Às vezes os olhos dos agricultores cresciam e eles compravam o que não
podiam pagar, antigamente tinha muito agricultor que teve que vender as
terras e trabalhar de peão por que não conseguia pagar o banco, quis tirar
nosso serviço e acabou tendo que trabalha junto com nós”
Entretanto, o fator de modernização da agricultura é colocado em evidência quando
se fala do porquê da alteração das culturas que necessitavam de bóias-frias para aquelas
poupadoras de mão-de-obra, e como conseqüência reduzindo a oferta de trabalho. Isso é
aliado ao fato de existirem cada vez mais equipamentos adequados às condições de relevo e
às culturas da região.
Seu Antonio relata que:
89
O que eu mais fazia era mexer com algodão, e feijão, mas quando começou
a acabar e a virar outras coisas eu passei a carpir soja, catar milho, carpir
milho, essas coisas, depois quase todo mundo tinha um trator pra passar
veneno ou pagava pra passar, era mais fácil pro agricultor, mas, e nos
como ficamos?”
O saudosismo se faz presente constantemente nas palavras dos bóias-frias, trata-se
de uma saudade de algo que não gostariam de viver novamente, como as palavras de “Seu
Zé”:
“Tinha lavoura que parecia as nuvens, branquinha, branquinha de tanto
algodão pra colher, tinha trabalho que quase a gente não dava conta,
chegava cedinho e saia quase escurecendo, no outro dia parecia que tava
tudo lá de novo pra gente colhe, daí foi começando ter cada vez menos, foi
acabando.”
“Seu Zé”, ainda continua:
“A gente escutava que não dava mais lucro por isso tava virando tudo soja,
trigo, gado, essas coisas, e ta acabando, junto com nós, é bóia-fria nunca
mais, só que tá difícil de viver, eu queria mesmo é trabalha num emprego
fixo com segurança (carteira assinada).”
Percebemos no próprio discurso do trabalhador a “consciência” de sua tendência à
extinção, que, segundo ele, se deve principalmente à troca de culturas, facilitada pela
mecanização no processo produtivo.
Seu Antonio, um dos mais faladores, conta que:
“qualquer agricultor que chegasse no banco pra financiar um trator ou uma
plantadeira conseguia rapidinho, mas tinha lavoura que não adiantava ter
90
trator, não tinha as outras máquinas certas, daí eles (agricultores)
plantavam o que dava, falava que saia mais barato do que pegar gente pra
trabalha, diz que dava menos dor de cabeça.”
Para 4% dos bóias-frias questionados, conforme apresentamos anteriormente, essa
forma de trabalho não se acabou, mesmo com toda tecnologia existente na agricultura.
Ainda de acordo com eles, nem vai se acabar, pois sempre existirá a necessidade de
utilização de trabalhadores sem o compromisso de uma contratação formal. Essa ausência
de vínculos facilita aos produtores a realização das atividades necessárias no processo
produtivo.
Mesmo que as atividades executadas ao longo do tempo sejam alteradas, como da
colheita de algodão, café, pela redução das áreas cultivadas, ou a capina, pela utilização de
herbicidas, esses trabalhadores passaram a desempenhar atividades de roçadas ou cata de
milho no pós-colheita, ou na colheita de mandioca, despesca ou cata de frango.
Essa variação nas atividades realizadas apresenta-se nas palavras de Marcos:
“Eu mesmo já fiz roçada em pasto, não dá pra passar veneno e tem lugar
onde o trator não entra, já catei frango, já ajudei a pegar peixe, sempre vai
ter algo pra fazer e dar um dinheirinho pra se manter.”
O desenvolvimento de produtos que realizavam o controle de ervas daninhas e o
aumento na sua utilização em propriedades agrícolas teve uma enorme importância para o
processo de redução de utilização de bóias-frias no setor agrícola, pois o controle das ervas
daninhas com a utilização de herbicidas reduziu a necessidade de grandes levas de pessoas
para capinas.
Com a redução no cultivo de plantações que demandam a utilização de grandes
quantidades de trabalhadores em curtos períodos de tempo, a atividade bóia-fria passou de
principal atividade de sustento da família, à condição de “bico”, ou seja, uma atividade de
complementação de renda.
Essa redução no cultivo de plantações que demandavam mais atividades manuais é
reforçada nas respostas que obtivemos dos agricultores e se confirmam pelos dados obtidos
91
e informados no Capítulo 5, item 5.1. Nesse capítulo apresentamos dados referentes às áreas
ocupadas por culturas como soja, milho, trigo, fumo, arroz, feijão e algodão.
Quando questionamos esses trabalhadores quanto à importância que a atividade
bóias-frias tinha em suas vidas, 94% (47) bóias-frias responderam que essa era a principal
atividade desempenhada como fonte de renda, ou seja, dependiam quase que
exclusivamente dessa atividade. Como residiam em área urbana, possuíam apenas a chance
de trabalhar esporadicamente como serventes de pedreiros, diaristas, entre outros. Apenas
6%, ou seja 3 trabalhadores, tinham a atividade bóia-fria como “bico”, por já desenvolverem
outras atividades, ou seja, o trabalho temporário era sua principal fonte de renda.
Com o passar do tempo, o que era atividade principal passou a ser tida como “bicos”
por todos os trabalhadores, e agora apenas 6 indivíduos da amostra realizam a atividade de
bóia-fria como complemento de renda. Os demais se dedicam a outras funções, haja vista a
irregularidade nas demandas.
Em virtude das incertezas quanto a futuras necessidades de utilização de bóias-frias,
quase que a totalidade desses trabalhadores procurou uma forma de renda mais contínua e
menos incerta que a atividade de bóia-fria, como atividades de serventes ou de pedreiros,
jardinagens, entre outras.
Mueller & Martine (1997) classificaram esses trabalhadores como bóias-frias
urbanos, pois vivem da venda de sua força de trabalho de maneira temporária, mas em
atividades urbanas.
A utilização de bóias-frias reduziu-se ao desempenho de algumas tarefas básicas,
como roçadas e “cata” de milho no pós-colheita, feijão e a colheita de algodão em pequenas
áreas que ainda são cultivadas em Toledo. Deve-se, também, ao fato de a transformação das
características de produção agrícola da cidade passar de uma grande produtora de soja para,
também, uma grande produtora de suínos e aves.
Para 2 bóias-frias, mesmo com a grande redução na demanda pelo trabalho
temporário que vem ocorrendo nos últimos anos, a necessidade pelos bóias-frias sempre
existirá. Mesmo com todos os equipamentos e insumos que possam ser produzidos, sempre
existirá a necessidade de utilização de trabalhadores.
Essa manutenção de demanda será devida à execução de novas atividades, como, por
exemplo, a já existente necessidade de trabalhadores para auxílio na cata de frangos em
aviários ou nos momentos de se retirarem peixes dos açudes. Dessa forma, não haveria mais
92
procura por trabalhos como colheitas, capinas ou roçadas, que eram as atividades mais
desempenhadas.
A maioria dos bóias-frias, 96% como já citamos, acreditam, contudo, no gradual e
completo desaparecimento dessa forma de trabalho, pois afirmaram-nos que mesmo não
existindo máquinas que realizam todas as funções necessárias, houve um aumento no
número de funcionários contratados fixos. Estes seriam responsáveis pelas etapas não
mecanizadas, haja vista a melhoria nas condições de trabalho.
Quando citamos as alterações nos tipos de atividades desempenhadas que
mantivessem a atividade dos bóias-frias, os mesmos afirmaram que as novas atividades
relacionam-se à piscicultura e a aviários, sendo que as empresas que atuam nesses ramos
possuem equipes de trabalhadores formadas e contratadas. Assim sendo, um bóia-fria não
conseguiria trabalho temporário nessas atividades.
Outro fator de destaque relaciona-se às necessidades de sobrevivência, ou seja, as
necessidades básicas precisam ser mantidas. A espera incerta da demanda pelos seus
serviços fará com que os trabalhadores busquem outras formas de ocupação que garantam
de certa forma seu sustento, não ficando à mercê de uma eventual oferta de trabalho bóia-
fria.
Assim sendo, a tendência à extinção completa do grupo ocupacional dos bóias-frias
apresenta sua sustentação nos próprios trabalhadores, haja vista que a maioria dos bóias-
frias que questionamos concorda com a sua extinção. A grande maioria não trabalha mais
como bóias-frias pela necessidade de maior segurança em sua fonte de renda, ou seja,
abandonaram por completo essa atividade e passaram a dedicar-se a atividades como
serviços domésticos, de jardinagem, serventes ou pedreiros, coleta de materiais recicláveis,
vigias, entre outras atividades.
As opiniões dos agricultores não divergem muito quando se trata da possível
extinção ou redução no número desses trabalhadores. Para todos os agricultores que
questionamos, os bóias-frias tendem a desaparecer por completo, pois as atividades
agrícolas serão cada vez mais tecnificadas. Assim a utilização de um número reduzido de
trabalhadores fixos será suficiente.
Conforme relatos da grande maioria agricultores, que equivalem a 86%, já não
existem muitos bóias-frias, e os que ainda persistem serão obrigados a procurarem outras
formas de sustento.
93
Apenas dois agricultores nos afirmaram que haverá uma enorme redução no número
desses trabalhadores mas não a sua completa extinção. Segundo os mesmos, haverá uma
alteração nas características dos bóias-frias. Entre essas alterações destacamos a passagem
de trabalhadores bóias-frias, a trabalhadores que trabalham na área urbana. Esses
trabalhadores urbanos esporadicamente prestam serviços ao setor agrícola, como uma forma
de complementação de renda.
Os 2 trabalhadores conhecidos como “gatos” nos contaram que a atividade de
freteiros e “picaretas” tornou-se a principal atividade desempenhada para o seu sustento.
Os gatos eram contratados, ou localizados pelos proprietários, através da indicação
de agricultores que já tiveram serviços prestados por determinado “gato” e satisfizeram as
necessidades. Isso é, eram contratados através da propaganda “boca-a-boca” feita pelos
agricultores. Assim, era de interesse desses agenciadores que a sua equipe fosse boa, com
bons trabalhadores.
O gato era, normalmente, proprietário de uma caminhonete ou caminhão para o
transporte dos bóias-frias, e tinha um bom conhecimento sobre os “pontos” em que esses
ficavam, e sabiam onde estariam os melhores trabalhadores. Além do transporte, eles eram
responsáveis, também, pela fiscalização e, algumas vezes, pelo pagamento dos volantes.
Dessa forma, os “gatos” deveriam ficar “de olho” nos trabalhadores para que esses
não matassem tempo, nem com ajuste de ferramentas (afiar enxadas e facões, entre outros).
Outra forma de perda de tempo seria com conversas e, até mesmo, tomando água repetidas e
demoradas vezes, isso em trabalhos em que recebiam por dia.
Nos trabalhos em que o pagamento era proporcional à produtividade, a
responsabilidade dos gatos estendia-se a fiscalizar se algum trabalhador não estivesse
realizando alguma espécie de fraude. Por exemplo, na colheita de algodão, em que recebem
por arroba colhida, os gatos vigiavam os bóias-frias para que esses não jogarem água no
produto ou colherem folhas e caules junto com a pluma, para aumentarem seu peso.
Geralmente, os “gatos” recebiam o equivalente a uma diária e meia, ou igual a uma
vez e meia o recebido pelo bóia-fria que tivesse a maior produtividade. Esse pagamento
também poderia ser realizado de acordo com um valor pré-determinado e negociado entre
agricultor e “gato”.
O processo de modernização agrícola, principalmente, acabou não só por afetar os
trabalhadores volantes, mas também os “gatos”, pois a redução na utilização desses
94
trabalhadores e as exigências quanto à segurança no transporte acabou, segundo os “gatos”,
deixando-os, de certa forma, desempregados.
Esses gatos passaram a trabalhar realizando fretes com o transporte de móveis,
máquinas ou animais, mas sem perder o vínculo com a agricultura. Na maioria das vezes,
atuam no transporte de animais ou grãos, ou ainda como intermediadores na negociação de
outros produtos como trocas e vendas de máquinas, terras, entre outros, os chamados
picaretas
17
.
Os bóias-frias têm sido utilizados em toda a extensão territorial brasileira, entretanto
o presente estudo irá concentrar-se na cidade de Toledo-PR, uma região extremamente
agrícola, que se utilizava intensivamente da mão-de-obra volante e que teve um processo de
modernização agrícola muito intenso a partir da década de 1960.
O desenvolvimento e a modernização agrícola e industrial geraram crescentes
rendimentos, porém causaram elevados prejuízos, como, por exemplo, os danos ambientais
e o surgimento de uma classe trabalhadora conhecida como excluídos ou bóias-frias
(RIBEIRO et al., 2002)
Para PERES (1982) e BERGAMASCO et al. (2000), a modernização da agricultura
cumpriu o que dela se esperava. Isto é, o aumento na produtividade com a conseqüente
redução nos preços dos alimentos, a geração de divisas para o país e o fornecimento de mão-
de-obra para as indústrias urbanas.
A utilização de bóias-frias reduziu-se ao desempenho de algumas tarefas básicas
como roçadas e “cata” de milho no pós-colheita, e a colheita de algodão em pequenas áreas
que ainda são cultivadas em Toledo. Deve-se, também, ao fato da transformação das
características de produção agrícola da cidade passar de uma grande produtora de soja para
uma grande produtora, também, de suínos e aves.
Os trabalhadores que ainda desempenham a função de bóia-fria representam 12%
dentre os questionados, ou seja, apenas 6 indivíduos ainda desempenham a atividade de
bóia-fria, porém esporadicamente, como um “bico”. Os 88% restantes ocupam-se em outras
atividades que garantam a sua sobrevivência.
Podemos caracterizá-los como indivíduos que têm, em média, idades superiores a 40
anos, ou seja, 9% têm idades entre 30 e 40 anos; 62% possuem idades entre 41 e 50 anos; e
29%, acima de 51 anos. Nenhum dos questionados que desempenham ou desempenhavam a
atividade de bóia-fria apresentou idade inferior a 30 anos. Isso pode ser um indício da busca
95
por estudo ou qualificação que lhes possibilitasse mais oportunidades de conseguir uma
ocupação fixa.
Dentre esses questionados, aqueles que apresentavam filhos em idade escolar
reforçavam-lhes a importância do estudo para melhores oportunidades de emprego. Todos
os filhos freqüentavam escolas, incentivados pelos pais.
Seu Antonio nos afirma que parecia estar prevendo essa tendência de redução da
oferta de empregos para os bóias-frias, pois fazia de tudo para que os seus filhos estudassem
e conseguissem uma ocupação melhor:
“Meus meninos, os dois mais velhos fizeram até a 8
a
série, dois deles, os
mais novos, terminaram o 2
o
grau, todos estão trabalhando, não vivem na
fartura mas não passam necessidade, isso é que importa pra mim.
Essa consciência da necessidade de estudo para os filhos, visando obter melhores
condições de vida, se junta à necessidade de desempenhar um bom serviço e garantir de
certa forma a renda que possibilitasse o estudo dos filhos.
Para seu Antonio, esse fato traz o “saudosismo” com relação às épocas de muito
serviço, quando havia disputas pelos “bons bóias-frias”, ou seja, quando o trabalhador se
destaca por produzir muito ou executar as suas funções com “capricho”, e era disputado
pelos “gatos”, quem oferecesse um valor maior “levava”. Era como uma espécie de leilão.
Os bóias-frias e ex-bóias-frias com idades superiores a 40 anos, quando
questionamos se teriam vontade de residir na zona rural, afirmaram que sim, pois a vida
seria mais fácil pela possibilidade de hortas e pequenas criações. Ou seja, mais de 45
trabalhadores teriam vontade de residir em uma área agrícola, como funcionários fixos.
Apenas 5 trabalhadores com idade inferior a 40 anos descartaram essa possibilidade,
pois a cidade forneceria, segundo eles, maiores possibilidades de uma vida melhor.
Entretanto, nenhum dos questionados está realizando algum curso técnico ou qualquer
forma de aperfeiçoamento em qualquer atividade que possa melhorar as suas condições
através de um emprego. Segundo esses trabalhadores, é pensando nos filhos que eles
querem ficar.
O grupo ocupacional dos bóias-frias apresenta-se de forma muito heterogênea no
município de Toledo, pois se constitui de trabalhadores de origens e histórias de vidas
96
diversas. Possuem, contudo, uma característica principal em comum, a necessidade da
venda de sua mão-de-obra de maneira temporária.
A utilização dessa forma de trabalho é contraditória, pois os agricultores reclamam
do incômodo, da necessidade de fiscalização constante e de controle sobre as tarefas
executadas pelos bóias-frias. Já os bóias-frias reclamam das condições de trabalho, da falta
de segurança no transporte, condições de alimentação, entre outros.
D´incao (1984) afirma que esses trabalhadores seriam vítimas da sociedade
capitalista acumuladora, que explora de todas as maneiras possíveis esses trabalhadores sem
trabalho fixo que se submeteriam a qualquer forma de sustento.
De acordo com as palavras do senhor Antônio:
“[...] como tinha bastante serviço de bóia-fria, nunca me preocupei muito, o
dinheiro vinha todo dia, daí não se pensava muito em quem era o culpado
por não se conseguir nada fixo, só quando terminava a safra e diminuía a
renda a gente procurava emprego garantido e não conseguia, mas tudo era
difícil.
Mesmo não se sentindo vítimas em uma sociedade exclusiva, esses trabalhadores
bóias-frias não vêem muitas possibilidades de melhorias em suas condições de vida.
A necessidade de sobrevivência faz com que esses bóias-frias busquem novas fontes
de renda, e a expectativa de uma colocação em um trabalho urbano com carteira de trabalho
assinada parece tornar-se cada vez mais um sonho distante. Cientes dessas dificuldades, a
ocupação passa a ser em atividades que requerem menos conhecimentos técnicos ou menos
estudo, como, por exemplo, as atividades de diaristas e serventes de pedreiro.
Assim, como tendência, esses bóias-frias estão conscientes das reduções na demanda
por bóias-frias, ou seja, os mesmos acreditam na extinção completa dessa forma de trabalho,
extinção causada principalmente pela modernização da agricultura de forma gradual e
constante.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos considerar que os bóias-frias surgiram como um grupo ocupacional de
trabalhadores destinados a vender a sua força de trabalho a fim se suprirem a necessidade de
mão-de-obra em certas etapas do processo produtivo ainda não mecanizadas. Apresentavam
como características básicas a falta de vínculos empregatícios, recebendo por atividade, por
diária ou por produção.
Tal grupo social apresentou extrema importância ao processo de modernização da
agricultura de várias regiões brasileiras, inclusive à região oeste paranaense. O processo de
modernização agrícola, aliado ao contínuo desenvolvimento e aperfeiçoamento dos
maquinários e insumos destinados ao setor, acabou, contudo, por gerar um efeito negativo
sobre esse grupo ocupacional e o seu gradual desaparecimento.
Essa redução do número de bóias-frias existentes confirma-se quando analisamos os
dados referentes às áreas ocupadas por culturas produzidas no município de Toledo/PR. As
culturas que se utilizavam mão-de-obra bóia-fria tiveram suas áreas reduzidas, enquanto
culturas mecanizadas mantiveram ou aumentaram as suas áreas de ocupação.
A redução de áreas ocupadas por atividades demandadoras de mão-de-obra bóia-fria
representa um dos fatores geradores da grande redução do número de bóias-frias existentes,
haja vista a necessidade de eles buscarem novas fontes de renda. Assim, o desenvolvimento
da mecanização agrícola apresentou-se como um facilitador de atividades para os
agricultores que optaram por substituir as atividades agrícolas desempenhadas.
A introdução e a crescente utilização de máquinas e equipamentos no setor agrícola
são tidos como os principais fatores geradores do processo de extinção do grupo
ocupacional dos bóias-frias. Tal fato é confirmado nas opiniões que obtivemos junto aos
bóias-frias e ex-bóias-frias quando os questionamos sobre os motivos para a redução da
demanda pelos seus serviços.
Tal conclusão não se restringe, contudo, apenas aos bóias-frias, mas estende-se aos
agricultores do município, que vêem nesse fator mecanização o principal motivo para as
alterações culturais que culminaram nas reduções de procura por bóias-frias.
98
Quanto a tendências futuras para o grupo ocupacional dos bóias-frias, consideramos
a possibilidade de sua completa extinção, tanto pela continuidade nos processos de
desenvolvimento tecnológico agrícola, quanto pela necessidade de esses trabalhadores
buscarem fontes de renda que lhes garantam a sobrevivência. Isso se deve à incerteza quanto
às necessidades de utilização de trabalhadores volantes, fato confirmado pela opinião da
maioria dos bóias-frias e dos agricultores questionados.
O presente estudo possibilitou-nos a caracterização dos bóias-frias de Toledo como
sendo indivíduos de baixa formação escolar, geralmente restrita ao ensino fundamental
incompleto.
Tal fato se apresenta para nós como um dos fatores limitadores das possibilidades de
ocupação por parte dos mesmos, ou seja, as dificuldades para uma ocupação em atividades
urbanas de forma fixa tornam-se extremamente grandes, haja vista as exigências do mercado
de trabalho atual.
Podemos caracterizar a idade média dos bóias-frias como sendo acima de 40 anos,
ou seja, apenas as pessoas de mais idade desempenham a atividade de bóia-fria. A tendência
à busca de ensino pelos mais jovens torna-se mais fácil de identificação, sendo que os de
mais idade acabam por conforma-se, de certa forma, com a sua condição, pois o fator
educacional apresenta-se como limitador nas possibilidades de ocupação.
Podemos identificar que a grande maioria dos bóias-frias tinha origens rurais, 74%.
Mesmo entre os 26% restantes, apenas 6% não apresentavam nenhuma forma de vínculo
com a área rural.
Os trabalhadores que apresentavam origem rural dividem os seus motivos para a
migração entre a busca por melhores empregos, a necessidade de deixar a agricultura em
virtude de falta de emprego e o comodismo oferecido pela zona urbana. Esse comodismo se
revela em facilidades de acesso a escolas, hospitais e trabalhos menos árduos.
Dentre as pessoas que questionamos, apenas 6 trabalhadores ainda desempenham a
atividade de bóia-fria apenas em alguns períodos. Os demais trabalhadores ocuparam-se em
outras atividades. Dentre as principais atividades, destacamos serviços de doméstica,
pedreiros e serventes, vigias, costureiras, zeladoras, entre outros. Esses trabalhadores sabiam
da necessidade de uma fonte de renda, haja vista as dificuldades crescentes de serem
chamados para o trabalho volante.
Mesmo diante de todas as dificuldades vividas no período em que trabalhavam como
bóias-frias, podemos identificar uma certa “saudade” da época. Isso por haver uma renda
99
que, de acordo com 72% da amostra, era uma renda boa, pois garantia a sobrevivência da
família. Apenas 28% afirmaram que nem mesmo essa renda compensava o sofrimento da
profissão.
Tal fato apresenta-se como um dos itens citados como vantajoso na atividade
volante. Além disso, o fato de receberem todos os dias é o principal fator de destaque
positivo no trabalho bóia-fria.
Mesmo que esse fator se apresenta como positivo, todos concordam, contudo, que as
desvantagens dessa forma de trabalho superavam qualquer vantagem que pudesse ser
considerada. Diante disso, a busca por ocupação na área urbana é intensa, sendo que 78%
dos questionados preferiam receber menos que o recebido como bóia-fria, desde que fosse
um trabalho com carteira de trabalho assinada, ou seja, um emprego fixo.
Ainda assim, identificamos que a vontade desses bóias-frias era de retornar à zona
rural para um trabalho agrícola. Apontam-se fatores como a possibilidade de criação de
animais e horta para consumo próprio como algumas das vantagens da vida na agricultura.
Apenas 5 acreditam que a cidade apresenta sempre mais possibilidade de melhores
condições de vida.
Para esses bóias-frias, a profissão apresentava-se como a principal fonte de renda
para a família, ou seja, 94% dos questionados. Para os demais, essa atividade era
desempenhada apenas como complemento de renda, principalmente para os mais jovens,
pela praticidade no recebimento de seus pagamentos de forma diária.
O processo de redução da demanda por bóias-frias foi-nos apontada como uma
conseqüência de dois fatores: a modernização da agricultura e as leis trabalhistas. Apenas 2
trabalhadores disseram ser as exigências legais o principal causador da redução na utilização
da mão-de-obra bóia-fria, haja vista o receio causado nos agricultores de utilizar tais
trabalhadores.
Os demais trabalhadores nos afirmam, contudo, que a utilização de novas máquinas
e equipamentos, além de insumos, é a causa principal da falta de trabalho para os bóias-
frias, ou seja, a possibilidade de modernização da agricultura gerou praticidade nos tratos
culturais dispensado os bóias-frias. Essa praticidade deu-se em virtude das características
geográficas do município, dotado com terras facilmente mecanizáveis, e a alteração nas
principais culturas produzidas.
Também os incentivos governamentais à produção de culturas voltadas à exportação,
aliados à facilidade de obtenção de crédito por parte dos agricultores para a mecanização,
100
são tidos como causadores da redução da demanda por bóias-frias, de acordo com 96% da
amostra questionada.
Essa redução nos é apontada como o início da extinção completa dos bóias-frias por
96%, ou seja, 48 bóias-frias. O processo de extinção deve-se à necessidade de
sobrevivência, que não permite a espera pela contratação de bóias-frias esporadicamente.
Assim sendo, esses trabalhadores buscam uma ocupação urbana. Tal fato alia-se à idéia
negativa sobre ser bóia-fria, ou seja, a grande maioria dos trabalhadores, como
anteriormente informado, não gostaria de trabalhar como volante novamente.
Apenas 2 trabalhadores, ou seja 4%, acreditam que sempre haverá a necessidade de
trabalhadores volantes, mesmo que as atividades desempenhadas sejam diferentes das que
eram tradicionalmente executadas.
Quanto aos agricultores questionados, pode-se caracterizá-los como pessoas que
trabalhavam utilizando a mão-de-obra de bóias-frias em suas atividades, pela praticidade de
sua utilização e contratação, sem vínculos empregatícios, não precisando pagar além da
produtividade realizada pelo indivíduo. Contradizendo essa praticidade afirmada por todos
os agricultores, a “incomodação” é apontada também de forma unânime, como uma
desvantagem nessa forma de trabalho, haja vista as dificuldades de controle de produção, a
qualidade do serviço, entre outros.
As leis trabalhistas são tidas como principal fator de descarte da utilização de bóias-
frias por 3 agricultores. Dentre os questionados, 7 afirmam ser a mecanização e a troca de
culturas produzidas o principal fator de redução da utilização de bóias-frias. Já 5
agricultores apontam a união desses dois fatores como sendo responsável pela tendência à
extinção, haja vista a falta de demanda por seus serviços.
A tendência a extinção total dos bóias-frias é colocada como certa por 13
agricultores, haja vista as alterações constantes na agricultura, como a introdução de
máquinas e equipamentos, além de insumos. Essas alterações apresentam características
cada vez ecanizaamcada das. eecanizm
101
uma caminhonete ou pequenos caminhões e a grande quantidade de agricultores em busca
de bóias-frias fazem com que os mesmos buscassem realizar o transporte de bóias-frias.
Quanto aos “gatos” questionados, ambos afirmaram não trabalhar mais com bóias-
frias, pois não havia mais procura por parte dos agricultores. Isso fez com que procurassem
outras atividades, como a realização de todos os tipos de fretes e de intermediadores em
negociações de mercadorias como animais, objetos, imóveis, entre outros, os chamados
“picaretas”. A tendência, segundo os “gatos”, é de completa extinção dos bóias-frias, fato
esse causado pelas alterações culturais possibilitadas pela praticidade dos tratos culturais
mecanizados.
Os “gatos” confirmam ser uma tarefa cansativa lidar com bóias-frias, mas
concordam com a importância desses trabalhadores para a agricultura. Viram-se, contudo,
receosos de continuar com essa fonte de mão-de-obra diante das leis trabalhistas
implantadas.
Diante de todos os fatos analisados, conclui-se que a introdução de máquinas e
equipamentos adequados às condições de relevo e solos do município, isto aliado aos
incentivos governamentais para produzir visando o mercado externo, causaram enormes
alterações no setor agrícola nacional, estadual e regional.
A praticidade da realização do processo produtivo agrícola permitiu e motivou cada
vez mais agricultores a buscarem produzir culturas que permitissem a utilização desses
benefícios tecnológicos, alterando-se, dessa forma, o cultivo de produtos demandadores de
mão-de-obra para o cultivo de produtos mais tecnificados.
Outra mudança identificada como um fator de redução de demanda por trabalhadores
braçais, como os bóias-frias, foram os insumos como agrotóxicos. Esses insumos permitiam
reduções na necessidade de trabalhadores para realizarem tarefas como, principalmente, a
capina.
Assim sendo, permite-se apresentar a tendência à completa extinção dos bóias-frias,
tendo como base as afirmações da grande maioria dos bóias-frias, dos agricultores e dos
“gatos” questionados. Esses indivíduos questionados apontaram a modernização agrícola, a
introdução de máquinas, equipamentos e insumos, como causa dessa tendência à extinção.
A modernização da agricultura, intensificada a partir da década de 1970, reflete-se
em um gradativo desaparecimento do grupo ocupacional dos bóias-frias no município de
Toledo-PR , tendendo à completa extinção dessa forma de trabalho.
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APÊNDICE I
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS BÓIAS-FRIAS
- Qual a principal vantagem e qual a principal desvantagem de ser bóia-fria?
- Quais as atividades desempenhadas?
- Por que trabalha, ou trabalhou como bóia-fria?
- Bóia-fria era, ou é, sua principal fonte de renda? Como complementa a renda?
- Existe muita dificuldade em encontrar serviço como bóia-fria?
- Como era antes e como é agora?
- Por que reduziu tanto?
- Em sua opinião, o bóia-fria vai desaparecer ou sempre existirá? Por que acha isso?
APÊNDICE II
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS RECRUTADORES (“GATOS”)
-O senhor realizava o recrutamento e o transporte de bóias-frias só no município de Toledo?
-Como funcionava todo o processo?
-Como o agricultor chegava até o senhor?
-Como era realizado o processo de recrutamento e transporte?
-Quais eram as formas de pagamento e quem era o responsável?
-Como eram punidas as falhas dos trabalhadores?
-A atividade de recrutamento e transporte de bóias-frias era sua principal atividade? O que
faz agora?
- Qual a sua opinião quanto à tendência de completa extinção dessa forma de trabalho?
APÊNDICE III
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS PROPRIETÁRIOS
- Qual a principal vantagem e qual a principal desvantagem de se utilizar o trabalhador
bóia-fria?
- Com relação à redução das áreas cultivadas com produtos que necessitavam de mais mão-
de-obra e o crescimento das áreas ocupadas por produtos de mais fácil mecanização, qual a
sua opinião?
- Que atividades desempenhava que necessitavam de bóia-fria?
- Por que alterou sua atividade?
- Em sua opinião, a tendência é a completa extinção ou sempre haverá a necessidade de
bóias-frias?
ANEXO I
- Funções desempenhadas pelos bóias-frias:
Colhem policulturas, derriçando café, retirando pés de feijão, leguminosas e
tuberosas, batendo feixes de cereais e sementes de flores, bem como cortando a cana.
Plantam culturas diversas, introduzindo sementes e mudas em solo, forrando e adubando-as
com cobertura vegetal. Cuidam de propriedades rurais. Efetuam preparo de mudas e
sementes através da construção de viveiros e canteiros, cujas atividades baseiam-se no
transplante e enxertia de espécies vegetais. Realizam tratos culturais, além de preparar o
solo para plantio
- Outros termos utilizados para a denominação de bóia-fria:
Trabalhador volante da agricultura - Abanador na agricultura, Adubador, Ajudante
de serviço de (aplicação de produtos agroquímicos), Apanhador, Aplicador agrícola,
Arrancador, Auxiliar de agricultura, Bóia-fria, Cabeça-de-campo, Capinador, Capineiro,
Capinheiro, Capinzeiro, Carpidor, Catadeira, Catador, Cavador, Ceifador, Ceifeiro,
Cerqueiro, Chefe de turma volante, Coletor, Colhedor, Colhedor de lavoura (exceto na
floricultura, fruticultura e horticultura), Cultivador de cultura permanente, Cultivador de
cultura temporária, Debulhador, Descascador, Destalador, Diarista, Empreiteiro,
Encarregado de silos, Encoivarador, Enxadeiro, Escolhedor, Esparramador de adubos,
Estercador, Foiceiro, Formador, Formigueiro (combate às formigas), Lavrador - exclusive
conta própria e empregador, Lavrador de cultura permanente - exclusive conta própria e
empregador, Lavrador de cultura temporária - exclusive conta própria e empregador,
Lavrador na horticultura e na floricultura - exclusive conta própria e empregador, Matador
de formiga, Plantador - exclusive conta própria e empregador, Plantador de cultura
permanente, Plantador de cultura temporária, Podador agrícola, Roçador, Ronda de formiga
(combate às formigas), Safrista, Selecionador e embalador de colheitas agrícolas, Semeador,
Sementeiro, Tarefeiro, Tirador de palha, Trabalhador agrícola polivalente, Valeiro, Volante.
Disponível em: (
http://www.mtecbo.gov.br/busca/descricao.asp?codigo=6220). Acesso 05
de março de 2007, 20: 42.
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