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REGINA MARA JURGIELEWECZ GOMES
EXPERIÊNCIAS COM GRUPO DE PROFESSORES
UNIVERSITÁRIOS: UM ESTUDO PSICANALÍTICO
PUC - CAMPINAS8
2006
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REGINA MARA JURGIELEWECZ GOMES
EXPERIÊNCIAS COM GRUPO DE PROFESSORES
UNIVERSITÁRIOS: UM ESTUDO PSICANALÍTICO
Tese apresentada como exigência para
obtenção do título de Doutor em Psicologia,
ao Programa de Pós-Graduação na área de
Profissão e Ciência, Ponticia Universidade
Católica de Campinas.
Orientador: Prof. Dr. Antônios Térzis
PUC - CAMPINAS
2006
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BANCA EXAMINADORA
Presidente e Orientador – Prof Dr. Antônios Térzis
1° Examinador – Profª Drª Márcia Simões Corrêa Neder Bacha
2° Examinador – Profª Drª Vera Lúcia Resende
3° Examinador – Profª Drª Dayse Maria Motta Borges
4° Examinador – Profª Drª Marly Aparecida Fernandes
Campinas, 17 de novembro de 2006
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Ao Renato e à Paula, como
expressão de um exemplo.
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AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Antônios I. Térzis,
orientador e incentivador desse trabalho, pelo apoio, atenção e amizade.
À coordenação e equipe do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, curso de Doutorado em
Psicologia como Profissão e Ciência do Centro de Ciências da Vida da Pontifícia Universidade
Católica de Campinas,
pela atenção e presteza na condução do curso.
Ao Prof. Dr. Sebastião Elyseu Júnior,
pelo incentivo e amizade incondicional em todos os momentos.
À profª Drª Márcia Simões Corrêa Neder Bacha,
pela amizade sincera e, sobretudo, pelo incentivo e apoio irrestrito na construção do meu sonho.
Aos professores que participaram dessa pesquisa,
minha gratidão se eterna àqueles que de forma desprendida e sincera tornaram este trabalho
possível. Muito obrigada aos professores que participaram do “grupo de reflexão”.
À Clélia Jurgielewicz Gomes,
mãe zelosa que soube oferecer seu aconchego e amparo nos momentos mais difíceis.
Ao Psicólogo Carlos Nery Folchini,
amigo que mesmo à distância demonstrou seu carinho e atenção ao fazer as versões para o
inglês e francês do resumo desse trabalho.
À profª Maria de Fátima Xavier,
por sua delicadeza e presteza na revio do vernáculo.
À Srª Janete Miranda de Mello,
pela atenção e gentileza na formatação deste trabalho
Ao “grupo de amigos de 6ª feira”,
por ter proporcionado conforto e serenidade em momentos difíceis.
Aos amigos: Alencastro, Teobaldo, Erso e Paulo,
por terem sido os “amigos certos nas horas incertas”.
Ao casal Elaine e Nelson,
por terem sido compreensivos e solidários nos instantes que necessitei.
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À Nina, Dido, Fafá, Fifí e Tutu,
por estarem a meu lado todo o tempo.
Àquele que carinhosamente chamo de “amigo”,
por me proteger em todos os momentos.
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“MINHA HISTÓRIA”
Quero contar um pouco de minha história para que possa ficar claro o
meu desejo em pretender estudar as relações entre professores ou entre pessoas
que gostam de estudar (pelo menos é o que suponho!).
Lembro-me com muita clareza de meus dias no grupo escolar,
atualmente ensino fundamental. Morávamos em Recife, nesta época em um local
chamado Jaboatão. Eu ia para o Grupo Escolar a com uma amiguinha, que
não me lembro seu nome. Tinha a possibilidade de escolher dois caminhos. Um
deles era preciso ir sozinha, pois não favorecia minha amiguinha. O caminho era
lindo. Passava por uma espécie de riacho que sempre estava repleto de flores e
muito verde. Lembro-me do prazer que sentia em fazer esse caminho, parecia
que caminhava por um belo jardim florido. Apenas parecia! O outro caminho,
aquele que fazia com minha amiguinha, era o melhor, mas minha mãe não
poderia saber, pois ele não era seguro. Íamos por um morro. Era lindo! Casas de
sapé, ruas feitas como trilheiros escorregadios, parecia um conto de fadas. O
melhor era a volta. Voltávamos por um caminho onde passávamos pela casa de
sua avó. Foi que fui apresentada às rosas em miniatura. Que perfeição! Tudo
era motivo de encanto, encantamento e satisfação.
Muito bom, mas tudo isso são minhas lembranças. As de minha mãe
são bem diferentes. Ela temia, pois eu teria que passar por uma rua movimentada
e então aprendi a desviar por um local onde havia um córrego sujo e era
necessário tomar cuidado para não escorregar. Ir pelo morro, nem pensar, pois
naquele local, ela própria jamais tivera coragem de passar.
Lembro-me, também, de minha sala e de minha professora. Como ela
era sábia, como aquele colégio era grande e parecia conter muitos segredos. Nas
comemorações, lá estava, pronta a declamar ou interpretar qualquer coisa.
Minha maior felicidade foi quando fui convidada a participar das aulas
especiais para o Admissão. Naquela época, após o Grupo escolar, era necessário
fazer uma avaliação para ingressar no Ginásio, isso era chamado de admissão.
Minha professora conversou com minha mãe e decidiram que eu poderia
participar das aulas. As aulas do grupo eram no período matutino e o admissão
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era no final da tarde. Minha mãe me levava e ficava me esperando, pois
retornávamos à noite. o tenho registro de nada igual ao prazer que sentia em
ter aquele livro de mais ou menos 500 páginas, que era o livro adotado para as
aulas do admissão. Chegava do grupo e minha mãe me obrigava a almoçar antes
de poder abri-lo e me deliciar com os afazeres propostos pela professora. Eu
sentia que era obrigada a almoçar, pois várias vezes minha mãe teve que tirar o
livro da mesa de almoço, pois eu ficava lendo e almoçando ao mesmo tempo.
Que prazer sentia em descobrir um mundo novo naquelas páginas. Sempre quis
que meus irmãos sentissem o mesmo, mas é claro que eles preferiam brincar
com os colegas.
Hoje vejo que muitas vezes pretendi que meus alunos ou colegas
sentissem prazer em aprender, em estudar, mas na grande maioria das vezes, sei
que fui interpretada como alguém fora dos padrões normais, ou qualquer coisa
semelhante. Nem de longe sou um “rato de bibliotecas” ou “devoradora de livros”,
sou apenas alguém que sentiu e sente prazer em estudar. Creio que isto tenha
sido um motivador para a escolha do magistério.
Continuando mais um pouco de minha história. Lembro-me que minhas
brincadeiras favoritas eram de professor/aluno. Eu sempre era a professora, é
claro!
Em 1970, meu pai decidiu retornar para Campo Grande, local onde se
encontrava toda sua família. Até então, eu nascida em São Paulo, havia vivido lá,
em Belo Horizonte e Recife. Fui para Campo Grande. Na época era um município
do então Mato Grosso. A divisão do estado e elevação de Campo Grande à
capital deu-se em 1977. Fiquei impressionada com o que vi. Encontrei uma
cidade cheia de barro vermelho, onde havia nas casas um aparelho que servia
para raspar o barro dos sapatos.
Na entrada das casas, um raspador de barros das solas dos sapatos.
Encontrei charretes nas ruas; a televisão era muito mais precária do que aquela
que eu conhecia. As pessoas falavam de forma diferente. O pior de tudo: meus
parentes tinham plena convicção de que eu não sabia o suficiente para passar na
prova do admissão, pois o ensino no nordeste era, segundo eles, muito fraco.
Que decepção! Fiquei profundamente triste e sem entender, pois eu achava que
havia mergulhado no velho oeste e aquelas pessoas achavam que eram mais
evoluídas ou mais sabidas.
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Passei a freqüentar a escola onde uma tia era diretora. Na verdade, eu
ia apenas para ficar fazendo exercícios na sala da secretaria. As pessoas tinham
plena certeza de que eu o teria a menor chance de ingressar no Ginásio. Por
sorte, minha mãe não entrou no esquema e foi me motivando explicando que
aquelas pessoas não sabiam do que estavam falando, tinham uma imagem pré-
conceituosa sobre o nordeste. Enfim, o dia das provas chegou. Fiz e achei que
estava fácil. As preocupações aumentaram. Chegou o dia do resultado e lá estava
o meu nome na lista dos aprovados. Que felicidade! Eu havia conseguido algo
maior que ter sido aprovada, consegui a garantia de que todo aquele prazer em
estudar não fora em vão.
para aliviar as tensões, no primeiro ano do então ginásio, eu uma
forasteira, que aprendera a ler e escrever no nordeste com métodos arcaicos,
pois eu aprendi a ler soletrando, consegui tirar 24 notas dez durante o ano, as
demais notas variaram entre 8,5 e 9,5. Claro que este foi o estandarte de meus
pais durante muito tempo, pensando bem, eu diria que até hoje!
Agora tinha uma fama - a estudiosa, cdf, responsável. Enfim, mudou
o panorama, estudar passou a ser uma responsabilidade e todos se achavam no
direito de exibir minhas notas e inquirir sobre meus estudos. Estava no fio da
navalha, poderia começar a sentir o estudo como um fardo pesado demais.
Felizmente continuei a sentir prazer em conquistar o conhecimento. Cheguei ao
segundo grau, o científico. Resolvi fazer o científico profissionalizante em análises
clínicas. Que coisa esplendorosa, quantas novidades. Claro que passei a ser
monitora da disciplina de análises clínicas. Estava iniciada minha carreira de
“docente”.
Comecei a me dedicar a ensinar meus colegas que tinham
dificuldades. Como era gratificante quando o colega conseguia entender aquilo
que eu lhe ensinava. Minha mãe precisou interferir, uma vez que eu ia para o
colégio pela manhã e passei a ser monitora todas as tardes e, portanto, estudava
em casa à noite e isto quer dizer que estudava até a madrugada. Fui obrigada a
diminuir o ritmo.
Cheguei ao terceiro ano. Na época não eram muito estimulados os
cursinhos após o terceiro ano. Tínhamos aulas pela manhã e a tarde; tínhamos as
outras aulas que seriam uma espécie de cursinhos de álgebra, inglês, redação e
outros. Novamente ficava estudando até a madrugada. Agora era compreensível,
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pois estava me preparando para o vestibular. Chegou o vestibular. Escolhi fazer
Psicologia. No dia do resultado, lá estava meu nome, fui aprovada. Minha
decepção foi enorme, pois minha família nem comemorou, pois tinham total
convicção de que eu seria aprovada.
No segundo ano de faculdade, era monitora e fui acumulando
funções a ponto de aplicar provas e até corrigi-las. Tinha meu tempo todo tomado
entre faculdade, monitoria e estágio. Conclui o curso no mês de dezembro e em
março do ano seguinte estava em Campinas iniciando o curso de Mestrado em
Psicologia. Na época eram quatro anos da entrada até a defesa da dissertação.
Como aluna do Mestrado, no segundo ano, comecei a lecionar em uma
Faculdade numa cidade próximo à Campinas. Foram momentos muito
importantes, aprendi sobre várias coisas, entre elas, o valor de uma verdadeira
amizade e o custo da solidariedade em período de greve entre professores.
No ano em que estava encerrando o Mestrado os professores fizeram
greve por melhoria salarial. Fui solidária e consegui ser demitida com mais 21
colegas. Foi muito doloroso, mas aprendi o valor da solidariedade e vi de perto o
que são os colegas egoístas que se acovardam e deixam seus supostos amigos,
em situações difíceis, sem a menor piedade. Estava entrando no mundo cruel dos
jogos de interesses e estava contemplando a falta de companheirismo entre os
chamados adoradores do saber ou simplesmente professores. Foi uma decepção
e tanto.
Voltei para Campo Grande com o título de Mestre. Na época, poucos
profissionais o tinham. Fui convidada para lecionar na faculdade católica, onde
havia estudado. Estava trabalhando em uma empresa estatal e iniciando
consultório. Comecei a lecionar, mas a disciplina era semestral e no período
seguinte tive o contrato encerrado para ser reiniciado no outro período. Assim,
iniciei minha vida docente em Campo Grande.
Nessa faculdade, cheguei a ser eleita chefe do departamento de
psicologia. Neste período a faculdade passou para universidade. Foram muitas
mudanças. Também comecei a lecionar na pós-graduação lato sensu e montei e
coordenei o primeiro curso de especialização em psicanálise da região. Foi uma
bela e árdua experiência. O curso de psicologia sofreu várias alterações, inclusive
implantei a contratação de professores com concurso, considerando que os
professores entravam por indicações e não necessariamente, por capacidade e
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competência. Foram tantas mudanças que o Reitor da Universidade resolveu
transferir o pró-reitor de graduação para outra cidade e me demitiu em nome da
manutenção da mesmice. A Universidade tem na direção padres salesianos.
Novamente experimentei o sabor da demissão e desta vez carregada
de comentários selvagens e indevidos, contudo existia uma unanimidade, todos
concordavam que eu era muito estudiosa e competente. Ufa! Pelo menos isto
estava salvo.
Fui trabalhar em outra faculdade particular e continuei a atividade de
consultório; havia desistido de trabalhar em empresa estatal. Fui convidada
para ingressar em uma outra faculdade particular. Agora já estava trabalhando em
duas faculdades e no consultório. Trabalhava também em curso de especialização
em uma cidade vizinha.
Nesta época iniciei a formação psicanalítica que, então, era um núcleo
da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro. Tínhamos aulas quinzenalmente
com analistas vindos do Rio de Janeiro, inicialmente e depois de todo o Brasil.
Neste período fui convidada a coordenar a criação do curso de
psicologia na cidade vizinha a Campo Grande onde trabalhava na s-
graduação. tendo a experiência de coordenação de curso, passei a coordenar
a construção do curso. Foi um sucesso, o curso foi autorizado e teve o seu início.
Passei a lecionar, também nessa cidade, uma vez por semana. estava com
três faculdades, a formação psicanatica e o consultório.
Posteriormente, fui convidada para trabalhar em uma quarta faculdade
que me ofereceu uma bela proposta, onde organizaríamos um núcleo de
atendimento aos alunos e professores. Fui contratada por 40 horas e tinha que
lecionar apenas 6 horas e o restante do tempo seria dedicado ao núcleo e
pesquisas. Foi necessário pedir demissão das demais faculdades para poder me
dedicar aos novos projetos. Nesse ínterim, conclui a formação psicanatica,
haviam se passado seis anos de seu início. Nesta época estava claro o meu
interesse na formação de professores, bem como suas dificuldades nos afazeres
docentes. Vinha acompanhando, desde as outras faculdades, o desempenho de
professores e observara que um dos maiores entraves estava em seus atributos
emocionais, nas condições afetivas dos professores em lidarem com os alunos,
seus colegas e a instituição. Havia observado ao longo dos anos o quanto os
professores sentem-se reféns dos alunos, o quanto as instituições particulares
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não incentivam o verdadeiro crescimento intelectual de seus professores e o
quanto os mesmos precisam se submeter ao trabalho exaustivo, sem condições
de estudos, para poderem sobreviver.
Decidi que gostaria de fazer o doutorado e desenvolver este tema. A
direção da faculdade concordou. Ingressei no doutorado. Quanta felicidade, o
futuro estava chegando! Para minha surpresa tudo mudou. A direção subitamente
foi trocada e os doutores e doutorandos foram logo demitidos. estava meu
nome na lista de doutorandos e é claro demitida. Mais uma vez experimentando
aquele gosto estranho da incompreensão misturada com injustiça e raiva, é claro!
Decidi continuar o doutorado e não retornar a atividade docente. Continuei
apenas na clínica. Hoje sei que não estava sozinha. Em 20 de março de 2005,
Renato Mezan escreve na Folha de São Paulo, “O escândalo dos Doutores”,
denunciando, justamente a questão das demissões de doutores pelas faculdades
particulares em todo o país. Que escândalo!
Cheguei aos dias de hoje. Estou tentando escrever de forma resumida
minha passagem pelo mundo. Alguns colegas estão acenando com convites
para que eu volte em breve para a docência, vamos aguardar!
Quero concluir dizendo que o prazer em estudar me fez e faz superar
todas as adversidades e tem me inspirado cada vez mais a formar pequenos
grupos com profissionais para estudos, e faz com que o prazer de
aprender/ensinar seja mantido. A necessidade de aprender se faz presente em
mim como a necessidade de oxigênio para respirar. Penso que o sou um
“alienígena”, portanto a necessidade de aprender deve ser inerente ao ser
humano e por que algumas pessoas parecem não ter essa necessidade? Por que
algumas pessoas fazem do ofício de ensinar um calvário e não a fonte de prazer?
Por que os professores têm tantas dificuldades em formarem grupos e serem
verdadeiramente solidários? Por que a escola deixou de ser um local de
enriquecimento intelectual para ser apenas de enriquecimento material? São
algumas dessas questões que me levaram a realizar este estudo e o desejo em
vê-lo formalizado que me levou a propô-lo em meu doutoramento. Espero que
“minha história seja um bom caminho para iniciar este estudo, que devo
confessar, tem tido várias experiências, desde enfrentar viagens de 2.400km por
semana, inicialmente, com custos financeiros elevados, certas inseguranças no
transcorrer das viagens de ônibus, que me obrigam a dormir duas noites sentada
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e não raro, com muitas dores na coluna. Nesses momentos, sou obrigada a
refletir sobre meu caminhar e após chegar de viagem, muito cansada e tendo que
iniciar minha atividade no consultório, sinto minhas forças redobradas e mais uma
vez vejo que o percurso em busca do conhecimento é pago apenas pelo prazer
do enriquecimento cultural, pessoal.
Tenho tido, também, descobertas, como grandes amigos que
compartilham do mesmo desejo e prazer em aprender/ensinar.
“Minha história” está aqui colocada com o intuito de mostrar que por
traz de toda objetividade de um trabalho científico, existe a subjetividade de quem
o faz. Como pesquisadora tive, também, meus motivadores pessoais, íntimos,
que nortearam meu trabalho. A construção teórica da pesquisa segue os
caminhos ditados pela possível objetividade, contudo o caminho da escolha do
tema segue o percurso da subjetividade, do desejo, portanto.
Concluo parafraseando Freud, quando diz que nada acontece por
acaso. Dedico-me ao estudo da formação do professor universitário porque isto
constitui a Minha História.
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RESUMO
GOMES, Regina Mara Jurgielewecz. Experiências com grupo de professores
universitários: um estudo psicanalítico. Campinas, 2006. 157f. Tese (Doutorado) - Curso
de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, 2006.
A presente pesquisa teve como objetivo investigar o envolvimento com a educação por
meio da cnica grupo de reflexão” com professores universitários. Objetivou, portanto,
refletir sobre a educação, bem como favorecer a elaboração das tensões geradas pelas
atividades das funções executadas pelos sujeitos da pesquisa. Estudou-se a
transferência dos professores em relação à Educação, bem como os vínculos com seus
alunos, colegas e instituição, a partir de suas falas. O campo de trabalho formado foi mais
restrito que o campo de um grupo terapêutico. Para o desenvolvimento dessa pesquisa
foi utilizada a técnica de grupo de reflexão” (DELAROSSA, 1979) orientada por uma
abordagem psicanalítica. O grupo foi constituído por quatro professores universitários,
voluntários de uma instituição pública, ambos os sexos e idades variadas. Dos relatos
verbais e não verbais dos professores, foi realizada uma análise qualitativa conforme os
pressupostos da teoria psicanalítica. As dificuldades vividas pelos integrantes desse
grupo de reflexão confirmaram a existência da resistência à identificação com o
feminino, bem como às peculiaridades do processo transferencial vivido em grupo. A
execução da tarefa proposta ao grupo foi obstaculizada por determinação de processos
inconscientes tais como os pressupostos básicos de dependência e de luta/fuga; por
angústias persecutória e depressiva e questões ligadas ao processo regressivo do
narcisismo primário.
Palavras-chave: Psicanálise. Grupo. Reflexão. Professor universitário.
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ABSTRACT
GOMES, Regina Mara Jurgielewecz. Experiencies with lecturers group: a psychoanalytic
study. Campinas, 2006. 157f. Tese (Doutorado) - Curso de Pós-Graduação em
Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, 2006.
This research aim is to study the involvement with education through the technique
‘reflection group’ with lecturers. The focus of it is to reflect upon education as well as to
favour the resolution of tensions generated by the activities executed by the subjects of
the research. It was studied the transference of the lecturers in relation to education as
well as the links with their pupils, colleagues and institution using their speeches. The
setting of this work was more restricted than the setting of the ‘therapeutic group’. For the
development of this research it was used the reflection group (DELAROSSA, 1979)
orientated towards a psychoanalytical approach. This group was set up by four lecturers,
volunteers in a public institution, from both sexes and several ages. Using the lecturer’s
verbal and non verbal reports it was done a qualitative analysis according to the
requirements of the psychoanalytic theory. The difficulties experienced by the members of
this ‘reflection group confirmed the existence of resistance to the identification with the
feminine, as well as the idiosyncrasies of the transferential process experienced in the
group. The obstacle to the execution of this proposed task is given to the processes that
occurred unconsciously such as the basic propositions of dependence and of
fight/escape; by persecutory and depressive anxieties and issues linked to the regressive
process of primary narcissism.
Key-words: Psychoanalysis. Group. Reflection. Lecturer.
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RÉSUMÉ
GOMES, Regina Mara Jurgielewecz. Expériences avec le groupe de professeurs
universitaires: um étude psychanalytique. Campinas, 2006. 157f. Tese (Doutorado) -
Curso de s-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de Campinas,
2006.
La presente recherche a comme objectif la investigation du rapport avec l’éducation à tra
vers de la technique ‘groupe de réflexion avec professeurs universitaires, donc la
réflexion sur l’éducation ainsi comme l’élaboration de les tensions generées par les
activites de les fonctions executées par les sujets de la recherche. Nous avons etudiés la
transference des professeurs en rapport a l’education ainsi comme leurs liaisons avec ses
étudiants, colleguès et l’instituition universitaire à partir de leurs discours. Le setting du
travail forme a été plus limite que le setting d’un groupe therapeutique. Pour le
developement de cette recherche nous avons utiliser la technique du ‘groupe de réflexion
(DELAROSA, 1979) orienteé par un rapprochement psychanalytique. Le groupe a été
formé par quatre professeurs universitaires, volontaires d’une instituition publique,
masculin et féminin et d’age variés. À partir de les discours verbal et non verbal des
professeurs, une analyse qualitative a été réalisée selon les propositions de la teorie
psychanalytique. Les difficultés experiméntees par les participants de ce ‘groupe de
réflexion’ ont confirmées l’existence de la résistance à l’identification avec le féminin ainsi
comme a les particularités du processus transferentiel experimentées dans le groupe.
L’execution de la proposition au groupe a été bloqueé par le processus inconscientes tels
quels les propositions elementaires de la dependence et de la dispute/l’échapée par les
angoisses persecutrices et depressives e les questions liées au processus regressive du
narcissisme primaire.
Mots-clefs: Psychanalyse. Groupe. Reflexion. Professeur Universitaire.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................... 17
CAPÍTULO 1 - O FENÔMENO GRUPAL: ASPECTOS HISTÓRICOS E
CONCEITOS FUNDAMENTAIS........................................................................ 20
1.1 Histórico....................................................................................................... 21
1.2 Freud e as contribuições fundamentais....................................................... 23
1.3 Foulks: principais contribuições .................................................................. 24
1.4 Bion: algumas contribuições........................................................................ 25
1.5 Delarossa: o criador do Grupo de Reflexão ................................................ 25
1.6 Contribuições de Didier Anzieu................................................................... 26
1.7 Principais contribuições de René Kaës....................................................... 32
1.8 Conceito fundamental sobre a teoria do vínculo de Pichon-Rivière............ 35
1.9 A organização do poder: uma contribuição................................................. 36
CAPÍTULO 2 - EDUCAÇÃO NO BRASIL: ALGUNS ASPECTOS HISRICOS. O
ENSINO SUPERIOR E A FORMAÇÃO DE SEU PROFESSOR ....................... 39
2.1 História da Educação no Brasil: alguns dados............................................ 40
2.2 O Ensino Superior no Brasil: alguns aspectos a serem considerados........ 47
2.3 O Professor do 3º Grau: algumas questões sobre sua formação................ 50
CAPÍTULO 3 - FORMAÇÃO DO PROFESSOR: CONSIDERAÇÕES
PSICANALÍTICAS............................................................................................. 61
3.1 Conceitos fundamentais: considerações sobre transferência, contratransferência e
resistências.................................................................................................. 62
3.2 Formação do professor: considerações psicanalíticas................................ 70
OBJETIVOS ...................................................................................................... 80
Objetivo geral..................................................................................................... 81
Objetivos específicos......................................................................................... 81
CAPÍTULO 4 - METODOLOGIA ....................................................................... 82
4.1 Participantes................................................................................................ 88
4.2 Campo de pesquisa..................................................................................... 89
4.3 Local............................................................................................................ 91
4.4 Instrumento.................................................................................................. 91
4.5 Procedimento............................................................................................... 93
4.6 Análise de material...................................................................................... 94
CAPÍTULO 5 - “GRUPO DE REFLEXÃO” ....................................................... 96
5.1 Antecedentes a Formação do “Grupo de reflexão”...................................... 97
5.2 Os Encontros Propriamente Ditos e Análises Preliminares......................... 100
5.3 Discussão Geral .......................................................................................... 137
CONCLUSÃO.................................................................................................... 148
REFERÊNCIAS ................................................................................................. 152
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INTRODUÇÃO
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18
O pensar sobre questões que privilegiem o exercício da função de
professor universitário é fruto do envolvimento, desta psicanalista e pesquisadora,
com o ensino em universidades mais de duas décadas. Além de estudar as
peculiaridades da função de professor, esse envolvimento, também, mostrou a
importância de estudar a sua formação, principalmente quanto a um aspecto que
se qualifica como essencial: as condições afetivo-emocionais para o ofício de
ensinar.
Poucos são os autores que chamam a atenção para a formação do
professor e em especial para a relação professor/aluno. Entretanto, em 1932,
Freud situava uma importante contribuição da psicanálise para a educação.
Não o esquecimento da relevância das relações de professores entre si e dos
professores com a instituição.
Por vários momentos, de forma não sistematizada, esta psicanalista
realizou grupos com professores universitários e pôde perceber que após
participarem deste tipo de vivência e da aquisição de informações sobre alguns
aspectos da transferência grupal, os vínculos em sala de aula foram
surpreendentemente melhorados e a aprendizagem deu saltos qualitativos
importantes. Conforme relato dos próprios professores que participaram dos
referidos grupos.
Surgiu, então, o desejo de investigar de forma mais sistematizada algo
que já se fazia de modo voluntário e menos sistematizado.
Como psicanalista, foi possível notar que a Psicanálise poderia
oferecer ajuda no esclarecimento das relações afetivas existentes no ofício de
ensinar. No intuito de poder compreender a educação, sobretudo no ensino
superior, surgiu, então, a proposta de estruturar o “grupo de reflexão” nos moldes
propostos por Delarossa (1979) a partir do referencial teórico da psicanálise.
Considerou-se uma abordagem psicanalítica socialmente contextualizada
para a compreensão do “grupo de reflexão”. Nesse sentido, foram utilizados os
pressupostos Freudianos, ratificados por Anzieu no quesito equivalência dos
grupos aos sonhos, bem como, a compreensão de fantasias inconscientes
ancoradas na cultura, conforme apontados por Neder Bacha. O ponto enfocado,
neste trabalho, foi o da relação dos professores com a educação, a partir dos
relatos de suas vivências com alunos, colegas, instituição, e outros, durante a
realização do “grupo de reflexão”.
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19
Para mostrar os resultados deste estudo, no capítulo I foram expostas
noções gerais de grupo, grupalidade e agrupamento. Nesse capítulo, foram
abordados pontos importantes sobre as relações grupais segundo alguns autores.
O principal tópico abordado diz respeito às considerações de Anzieu, sobretudo
na compreensão do fenômeno grupal em sua equivalência aos sonhos.
No capítulo II, abordou-se um pouco da história da educação no Brasil,
em especial a do ensino superior. Considerou-se além da história da educação no
Brasil, os aspectos que interferiram na construção do atual quadro da mesma,
principalmente do ensino superior. Nesse sentido, foram enfocadas as idéias de
alguns pensadores como, por exemplo: Marilena Chauí, Maria Cecília Cortez
Souza, Octavio Ianni, entre outros.
No capítulo III, foram realizadas as considerações psicanalíticas sobre
a formação do professor. Nesse capítulo foram abordados alguns aspectos das
relações transferenciais e das resistências. Em relação às considerações
psicanalíticas, tomou-se como ponto central as idéias de Neder Bacha no tocante
à compreensão das fantasias inconscientes respaldadas na cultura.
O capítulo IV dedicou-se à metodologia do trabalho trazendo autores
que esclarecem sobre a pesquisa qualitativa e, em particular, a pesquisa em
psicanálise. Encontra-se, nesse capítulo, dados sobre os participantes da
pesquisa, sobre o campo, o local, o instrumento utilizado, o procedimento e a
análise do material da pesquisa.
Finalmente no capítulo V, apresentou-se o grupo de reflexão”,
propriamente dito, acompanhado da análise de cada encontro e após uma análise
e discussão geral sobre todos os encontros. Finalmente, procedem-se as
conclusões deste estudo.
Depois de ter percorrido esse caminho, surgiram, então, indagações
que se tem a pretensão de tê-las elucidado ao término deste estudo. Pensou-se,
portanto, as seguintes questões: seria relevante para o professor universitário, no
exercício de suas funções, participar de “grupo de reflexão”? A experiência de
“grupo de reflexão” poderá ser uma fonte de dados sobre o ofício de ensinar?
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CAPÍTULO 1
O FENÔMENO GRUPAL: ASPECTOS HISTÓRICOS
E CONCEITOS FUNDAMENTAIS
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21
Neste capítulo serão ressaltados elementos considerados relevantes
para a compreensão do fenômeno grupal no que tange aos aspectos históricos,
conceitos fundamentais e alguns autores que são considerados de grande
importância.
Em relação aos autores citados, a ênfase será dada àqueles que
nortearam este trabalho.
1.1 Histórico
É importante, neste trabalho, destacar alguns aspectos sobre a
questão dos grupos, uma vez que se utiliza nesta pesquisa a formação de um tipo
particular de grupo, o “grupo de reflexão”.
Nesse sentido, conforme Anzieu e Martin (1971), o termo grupal é
usado para qualificar os fenômenos próprios do grupo, especialmente para
distinguir as relações entre as pessoas. A expressão grupalidade serve para
designar o conjunto das características internas essenciais para o grupo.
Para Zimerman e Osório (1997), é necessário que se faça a distinção
entre grupo e agrupamento. O grupo pressupõe que haja, entre as pessoas,
algum tipo de vínculo e interação social. No agrupamento, pode existir um
interesse comum, mas não vínculo entre as pessoas, o exemplo clássico é as
filas.
A utilização de grupos, com fins terapêuticos surge bem antes das
teorias atuais sobre dinâmicas de grupos, por isso esse tema será abordado sob
um ponto de vista histórico, considerando que não se trabalha com grupos
terapêuticos.
No Asclepéio de Pergamon no século II d.C., utilizavam-se várias
formas de terapias e, também, a interpretação de sonhos em grupo pelos
sacerdotes de Esculápio (NÉRI, 1999).
Kaplan e Sadock (1996) pontuam que os líderes tribais e religiosos
usavam dos grupos com o intuito de promover curas ou alterar comportamentos.
Os autores apontam, também, os asilos em mosteiros que tinham como finalidade
ajudarem aqueles mentalmente enfermos, bem como os grupos de Mesmer que
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eram submetidos à hipnose, e ainda, não se esquece da importância do teatro
grego antigo, nesse contexto.
Conforme Saidon (1983) foi em 1906 que o médico J. Pratts realizou
trabalho em grupo com pacientes tuberculosos. Isto atribuiu a Pratts o grau de
pioneiro na prática dos grupos terapêuticos.
Na atualidade, as práticas terapêuticas de grupo podem ser
identificadas a partir das teorias originais de psicoterapias de grupo, isto entre
1930 e 1962. Encontram-se, nessa prática, os T. group, a psicanálise e o
psicodrama. Essas áreas se desenvolvem teoricamente. A partir de 1962, surgem
respectivamente, os grupos de encontro e gestalt-terapias; a análise transacional,
os grupos operativos, os grupos psicanalíticos e a análise institucional; finalmente,
o psicodrama psicanalítico (SAIDON, 1983).
Ainda conforme Saidon (1983), é em 1931 que o trabalho com grupos
recebe o nome de psicoterapia de grupo e este fato deve-se a Moreno, que desde
1920 usava a técnica de grupos.
as primeiras publicações psicanalíticas datam de 1936 com L.
Wender e P. Schillder, que utilizam a técnica psicanalítica comgrupos terauticos.
Foi nos anos 40 que a psicoterapia de grupo ganhou seu status de
cientificidade, graças a esses trabalhos e aos de K. Lewin no campo da Psicologia
e Microssociologia.
Segue-se, na América Latina e na França, a influência marcante dos
grupos operativos de Pichon-Rivière a a análise institucional e a
psicossocianálise na França (SAIDON, 1983).
Na América Latina, instala-se definitivamente a corrente da psicanálise
de grupo com a publicação, em 1957, do livro Psicoterapias de Grupo de
Grimberg, Langer e Rodrigué.
Na Europa, a partir de Lewin, surgem os pioneiros da psicanálise de
grupo: Foulks, Bion, Anthony, Slavson e Ezriel. Por meio da sistematização de
Bion, as idéias Kleinianas são cada vez mais dominantes, sobretudo na escola
Argentina.
Na década de 1960, ocorre uma nova reformulação influenciada pelas
técnicas de potencial humano, ou seja, estava no auge práticas como os grupos
de encontro de Rogers e a gestalt-terapia de Perls. Não se pode deixar de lado as
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influências de W. Reich articulando o materialismo-histórico, na sociedade, e a
psicanálise.
Ainda na mesma década, surge a escola francesa, representada
principalmente por R. Käes, D. Anzieu e Missenard. Esses autores aprofundam o
conceito de inconsciente grupal. Estudam as idéias do grupo como um sonho,
falam do inconsciente grupal, de aparelho psíquico grupal e do der como uma
possibilidade de resistência.
Não se pode deixar de citar a existência da Análise Institucional que
surge na França, em 1962, e tem como agentes centrais: Gilles Deleuze e Felix
Guattari com a Esquizoanálise.
1.2 Freud e as contribuições fundamentais
Sabe-se que Freud nunca trabalhou com grupoterapia, mas suas
contribuições são o alicerce dessa atividade, ficando explícito em Psicologia de
Grupo e Análise do Ego de 1921, bem como em Totem e Tabu de 1912-13. Aos
olhos de Käes (1997), Freud deixa uma herança inquestionável na construção da
grupoterapia.
As principais obras escritas por Freud que contribuem de forma
expressiva para uma construção da compreensão sobre grupos são: Psicologia
das Massas e Análise do ego (1921), Totem e Tabu (1913), O futuro de uma
Ilusão (1927), Mal-estar na Civilização (1930), Moises e o Monoteísmo (1938) e,
também, As Perspectivas Futuras da Terapêutica Psicanalítica (1910). Resta
considerar que as idéias psicanalíticas sobre grupos surgem e que importantes
alterações emergem ao longo dos anos, como “Experiências com Grupos” (1975)
de W. Bion e, nos anos cinqüenta, aparece a obra “O Médico, o seu Paciente e a
Doença” (2005) de M. Balint. O chamado “Grupo Balint” nasce na Inglaterra como
um importante método para treino e aperfeiçoamento da relação terapêutica entre
médico e paciente.
Deve-se ressaltar que Freud e outros estudiosos como Mac Dougall,
observavam as multies. Os ingleses Bion e Foulks consideraram o grupo como
unidade oferecendo modelos práticos. Existem, portanto, estudos dirigidos para a
psicologia e macro-sociologia; esses estudos abordam os grandes grupos. Há,
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também, o estudo dirigido para o micro, que se dedica aos chamados pequenos
grupos.
1.3 Foulks: principais contribuições
Foulks e Anthony (1967, p. 178) considerado um dos pioneiros na
aplicação da psicanálise nos grupos, afirma que a “situação grupo-anatica foi
criada para ouvir pacientes atenciosamente e estimular o paciente a ampliar seu
âmbito de comunicação. Compreender é dar início à cura”. Inicia-se, aqui uma
indagação. Ouvir atenciosamente uma pessoa no grupo o exigiria a utilização
do processo secundário de funcionamento psíquico? Como, então, trabalhar em
regime de processo primário e utilizar a atenção flutuante? Essa indagação
circunda esse trabalho e a ela voltar-se-á quando da realização do “grupo de
reflexão”, objeto desta pesquisa.
Para Foulks e Anthony (1967), o trabalho com grupos só faz sentido se
trouxer benefícios individuais. No grupo, o paciente vive ou revive situações mais
próximas da vida comum, podendo discutir sobre os acontecimentos. A
interpretação para os autores é feita seguindo um modelo de rede. “Rede” são as
interligações dotadas de características do conjunto biológico, social, familiar, etc.
Para ele, os distúrbios não são uma simples função da personalidade, mas sim,
uma função de uma completa rede de relações entre inúmeras pessoas. Ligado
ao conceito de rede está o de Matrizes, que é a trama comum a todos os
membros do grupo, por isso, torna-se determinante do significado da
comunicação do grupo.
Foulks e Anthony (1967) admitiam a existência das interligações desde
as biológicas até as culturais, chegando às tramas que envolvem a todos os
membros do grupo. Parece que este autor, já considerava a complexidade da
cultura na organização dos grupos.
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1.4 Bion: algumas contribuições
Em Experiências com Grupos, Bion (1975) mostra que o grupo é
organizado em torno de duas mentalidades. Uma que ele chamou de mentalidade
de grupo de trabalho e a outra de mentalidade primitiva. A primeira, sendo uma
mentalidade coletiva e ao mesmo tempo um aspecto individual, tem como
característica desenvolver capacidades como atenção, representação verbal e
capacidade de pensamento simbólico. A segunda é a mentalidade primitiva que
corresponde à tendência em dar respostas automáticas. Para este autor, existem
três tipos de fantasias ou supostos básicos, que dão suporte à mentalidade
primitiva: “dependência”, “acasalamento” e “luta e fuga”. Deve-se lembrar que
essas mentalidades, trabalho e primitiva, não correspondem a uma seqüência. No
homem moderno (tecnológico), existe tanto um lado evoluído (trabalho) quanto
um lado primitivo (regredido). O importante é encontrar o equilíbrio e, este,
necessariamente, é fruto de conflitos. Para haver um verdadeiro crescimento, faz-
se mister a presença dos aspectos evoluído e primitivo.
Para Bion (1975, p. 46), o grupo é “essencial para a realização da vida
mental de um homem - tão essencial para isto quanto para a economia e a
guerra”.
1.5 Delarossa: o criador do Grupo de Reflexão
Delarossa (1979), psicanalista argentino e discípulo de Pichon-Rivière,
é o criador do “Grupo de Reflexão”; considera que este grupo oferece uma
oportunidade em que os participantes reúnem-se para conversar, falar, e, em
certa medida, dramatizar. Isso acontece em um campo mais restrito que o de um
grupo terapêutico. O “Grupo de reflexão” proposto por Delarossa, não pretende
ser terapêutico e sim proporcionar o alívio das tensões geradas no local de
trabalho.
Segundo Salis (2003), é pela “re-flexão” que se pode chegar ao
saber e assim poder superar o desconhecido. Para ele, o refletir de um espelho
simboliza o refletir do pensamento e este é o único caminho possível para o
homem vencer o desconhecido, os preconceitos, os estereótipos.
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Conforme o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, reflexão é a volta
da consciência sobre si mesmo para examinar o seu próprio conteúdo por meio
do entendimento (FERREIRA, 2004).
Diante disso, novamente surge a indagação no que se refere à
possibilidade de escuta do grupo pela via do processo primário e poder entendê-
lo como correlato dos sonhos. A observação do “grupo de reflexão” poderá trazer
respostas para essa questão, ou seja, será que é possível que os membros do
grupo possam refletir e agirem em processo primário de funcionamento mental?
Será possível, nesta dinâmica que a pesquisadora, também funcione em
processo primário, ou seja, possa ouvir os componentes do grupo em atenção
flutuante?
Com o intuito de poder conquistar a compreensão da realidade
psíquica dos integrantes do “grupo de reflexão”, que são nesta pesquisa,
professores universitários, construímos, então, o “grupo de reflexão” com uma
pergunta disparadora. A pergunta: “Fale sobre sua experiência como educador,
sobretudo no ensino de terceiro grau”. O “grupo de reflexão” construído seguiu os
moldes propostos por Delarossa, apresenta como objetivo o alívio das tensões,
oferecendo a oportunidade aos participantes a falarem livremente sobre si
mesmos e sobre suas experiências. Para atingir o objetivo proposto, o de
compreender a Educação via entendimento da realidade psíquica dos
componentes do grupo de reflexão, seguir-se-ão pressupostos sicos da
psicanálise, quais sejam, o do inconsciente, da compreensão dos modos de
funcionamento mental - processo primário e processo secundário e elementos
como transferência, contratransferência, resistência e, também, da teoria
daqueles que se especializaram na compreensão da dinâmica psíquica dos
grupos, como é o caso de Didier Anzieu.
1.6 Contribuições de Didier Anzieu
Para Anzieu (1993), o grupo é um envelope que faz com que os
indivíduos fiquem juntos. Existe uma rede de regulamentos implícitos ou
explícitos, atos e fatos, ritos, valores, particularidades da linguagem falada pelo
grupo. A rede de regulamentos (pensamentos, palavras, ações) permite constituir
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o espaço interno do grupo - garante a troca intragrupo e uma temporalidade
própria - passado de onde tira sua origem e futuro onde projeta suas metas. O
que faz um grupo perdurar é a sua trama simbólica. Ao reduzir o grupo a sua
trama, o envelope grupal se caracteriza como um sistema de regras. A trama
simbólica é necessária para o grupo, mas não é fundamental. Um grupo sem vida
psíquica pode sobreviver de sua trama.
O envelope funciona como filtro das energias e informações. O
envelope grupal se constitui no próprio movimento da projeção que os indivíduos
fazem sobre ele de suas fantasias, imagos.
De acordo com Anzieu (1993), a fantasia é um produto em grande
parte defensiva. É resultante de uma estruturação econômica e tópica que é por
ela representada, deformada e mascarada. Ela é, também, produtora de efeitos
particulares sobre os pensamentos, afetos e condutas dos membros do grupo.
No tocante ao método psicanalítico em relação aos grupos, Anzieu
(1993) considera que este pode ser utilizável para produção e tratamento dos
efeitos do inconsciente em condições científicas. Não em princípio nenhum
campo de manifestação dos efeitos do inconsciente ao qual não seja aplicável o
método psicanalítico.
Este autor considera que o método psicanalítico é um método de
pensamento científico e afirma ser necessário submeter as hipóteses sobre os
processos inconscientes a três critérios:
1) a cada tipo de fato clínico observado deve corresponder uma
hipótese que o justifique, e toda hipótese deve se apoiar num material clínico
significativo e preciso;
2) cada hipótese deve poder caber num corpo coerente de hiteses
próprias a esse campo, bem como ligar-se ou ser deduzida de hipóteses
estabelecidas em psicanálise geral;
3) cada hipótese tem de confirmar sua verdade por sua fecundidade
em outro domínio que não aquele sobre o qual foi estabelecida.
O método psicanalítico, aplicado aos fenômenos de grupo, obedece a
três critérios psicanalíticos:
1) uso do vocabulário psicanalítico (de Freud a seus sucessores).
É neste ponto que Anzieu aborda o fato de sustentar a analogia entre o
grupo e os sonhos (artigo de 1966) sustentando que o grupo, como o sonho, é a
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realização imaginária de um desejo reprimido. Este pensamento é oriundo da
primeira tópica Freudiana. Para ele Freud, após introduzir a segunda tópica,
concebe o aparelho psíquico individual via interiorização de um modelo grupal.
Kaës (1974b) fala da existência do aparelho psíquico grupal dotado das
mesmas instâncias que o aparelho psíquico individual, porém com princípios de
funcionamento diferente. Ele chama de aparelhos homólogos e não isomorfos.
Para Anzieu, o grupo é um sonho do ponto de vista da dinâmica
psíquica. As pessoas participam de grupos da mesma forma que, no sono, entram
em sonho. O grupo é a realização imaginária de um desejo, conforme o autor, os
processos primários, sob aparência de processo secundário, o determinantes,
ou seja, o grupo como o sonho é um debate com um fantasma subjacente.
Continua afirmando que a atividade em grupo é vivida como fonte de angústia
com a mesma intensidade com que é vivida como realização imaginária do
desejo. O grupo visto como sonho é a associação de um desejo e de uma defesa,
assim como nos sintomas.
Segundo o mesmo autor, o desejo realizado no grupo e no sonho é um
desejo reprimido na infância.
Afirma, ainda, que a situação de grupo livre provoca uma regressão e,
finalmente, que o desejo no sonho e no grupo é o cristalizado num sintoma ou
numa estrutura patológica, um desejo cujo sentido é incompreendido, mas que
procurará se realizar. Todo grupo tem sua simbologia e seus mitos. É um lugar de
trocas entre inconscientes. Essas trocas conduzem a estruturações
fantasmáticas, que podem ser fugazes, paralisantes, estáveis, ou estimulantes à
ação.
2) concepção do determinismo.
Todo processo inconsciente pode ser explicado via perspectivas:
dinâmica, econômica, tópica, genética e fantasmática.
3) interação entre o inconsciente dos sujeitos e o inconsciente do ou
dos interpretadores.
A cada efeito inconsciente que se manifesta, corresponde a uma
resistência se opondo a essa manifestação.
Com relação ao imaginário nos grupos, Anzieu (1993, p. 21) afirma
que: “O grupo é uma colocação em comum das imagens interiores e das
angústias dos participantes”.
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Para o autor, uma das maiores resistências de pesquisa científica
sobre os grupos reside no investimento narcísico de alguns setores de seu
funcionamento e na defesa contra a ferida narcísica. Acredita que os grupos se
sentem narcisicamente ameaçados, quando percebem o risco de colocar em
evidência os pontos fracos que preferem dissimular e, também, de desbotar sua
própria imagem ideal que sustentam com grande afinco.
Como já mencionado acima, Anzieu (1993), pontua que o grupo é um
sonho do ponto de vista da dinâmica psíquica.
Para ele, a pulsão ou id, só se constitui correlativamente à constituição
de um ego, de icio arcaico corporal, posteriormente apto a preencher as funções
de controle, de escolha em direção às pulsões e de sentido da realidade. O ego
arcaico que o grupo se atribui para se defender contra as pulsões, e para levar
em conta a realidade, é o líder ou o presidente da reunião. Ainda, pondera o autor
que os grupos têm tendência a forjar, a partir dos egos evoluídos de cada um, a
ficção de um ego comum relativamente autônomo, que tornaria o grupo capaz de
auto-regulação e asseguraria o controle da pulsão e uma percepção da realidade
acompanhada de senso crítico. Por meio do ego fictício do grupo é que se
diferencia o superego do grupo, que é a regra comum nascida do consentimento
de todos.
Este psicanalista propõe, ainda, a ilusão grupal como sendo a quarta
forma de ilusão social, referindo-se as três propostas por Freud em totem e tabu
(1912-1913), quais sejam, a religiosa, a da arte e a do sistema filosófico.
Mantendo a analogia entre grupo e sonho, o autor, afirma que o sonho é a ilusão
individual produzida no sono, é o desinvestimento máximo da realidade exterior.
Os grupos se desenrolam em situação de suposto isolamento, a realidade exterior
encontra-se suspensa. Esse desinvestimento objetal corresponde, em termos
econômicos, um sobre investimento do grupo, isto é, um transporte da libido
liberada para a realidade presente aqui e agora.
No grupo, como no sonho, o aparelho psíquico sofre regressões
cronológicas, tópicas e formais.
Com relação à regressão cronológica, pode-se afirmar que a situação
grupal ativa, nos membros, a ferida narcísica. O grupo é vivido como uma ameaça
angustiante de perda da identidade do ego.
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A regressão tópica revela que o grupo se torna o substituto do objeto
parcial de amor perdido (o seio).
A regressão formal se caracteriza pelas formas de comunicações
arcaicas mais próximas do processo primário. São os primeiros jogos de
expressões da criança com a mãe.
Anzieu (1993) chama de ilusão grupal um estado psíquico particular
observado nos grupos e que é espontaneamente verbalizado por seus membros
como um “bom grupo (estamos bem juntos, somos um bom grupo, nosso chefe é
bom).
Para Anzieu (1993), a ilusão grupal do ponto de vista dinâmico, revela
que a situação de grupo acarreta uma ameaça de perda da identidade do eu. Do
ponto de vista econômico, a ilusão grupal representa uma defesa coletiva contra a
angústia persecutória comum. Do ponto de vista tópico, a ilusão grupal ilustra o
funcionamento do Ego ideal nos grupos, e do ponto de vista genético, a situação
de grupo provoca uma regressão da posição edipiana à fase oral.
Anzieu (1993) afirma, ainda, que quando os seres humanos mergulham
na vida em grupo, às vezes, encontram seu poder criador, às vezes, partilham
uma ilusão encantadora ou autodestrutiva. Nesse último caso, a pulsão de morte,
clivada, inabalável e surda, é projetada não para o exterior, mas sobre o próprio
grupo.
No que se refere à chamada fantasmática oral em grupo, Anzieu (1993)
considera que a situação de grupo provoca uma regressão ou sadismo oral, uma
angústia correlativa de perda da identidade e uma busca compensatória de fusão
com a imago da mãe boa. É importante notar que o silêncio pode ser a expressão
do medo de ser devorado pelo grupo. A pulsão dico-oral exprime-se pelo
silêncio.
Nesse ponto, Anzieu fala que a demanda de amor no nível oral parece
ser um componente normal e importante da vocação do formador-professores.
Mostra que freqüentemente os professores de adultos gostam de terminar suas
exposições num estado de grande cansaço físico e psíquico, e de beber o leitinho
de seus louvores e de seus calorosos agradecimentos, quando se despedem.
As fantasias de “quebra”, segundo Anzieu (1993), são as representantes
da forma manifesta nos grupos da angústia de castração ou destruição.
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A angústia que envolve a fantasia de quebra observada no nível pré-
genital é a angústia de separação. No nível fálico é a impotência gerada por
valores morais, isto é, é a descoberta pela criança de sua impotência biológica de
atingir o prazer sexual que seus pais partilham em segredo. As fantasias de
quebra não condensam apenas angústias de castração oral e fálica. Observa-se
angústia paranóide de devoração e de perseguição destrutiva, angústia
esquizóide de fragmentação do corpo e do eu, angústia depressiva de separação
da mãe e a angústia de castração, no sentido fálico do termo.
Essa fantasmática apresenta-se apenas no contexto transferencial.
Surge quando os participantes do grupo se sentem privados da onipotência que
seu desejo infantil inconsciente visava adquirir.
A mola mestra fundamental da vida inconsciente dos grupos é o par
antagônico: ilusão grupal - fantasia de quebra. Os afetos e as pulsões postos em
jogo são diferentes nos dois casos.
Anzieu (1993, p. 125) observa o fenômeno que chamou de fantasma
do grupo máquina ou grupo sedutor-perseguidor em grupos de formação de forma
mais explícita. Os participantes m o sentimento de ser levados por um
processo psíquico cujo curso, uma vez deslanchado, parece-lhes inexorável”. A
explicação psicanalítica é a de que este momento é o da descoberta do
determinismo psíquico inconsciente; a força em questão é a do processo primário
liberado da repressão defensiva e escapando da vigilância do Eu: é a prova da
existência das pulsões e de sua energia indestrutível.
Para Anzieu (1993), é possível que a representação social consciente
do inconsciente seja utilizada como defesa contra o reconhecimento individual da
representação inconsciente, levando o grupo ao que ele denominou de resistência
paradoxal - uma autodestruição do grupo.
Para este o autor, o grupo fabrica ilusão pura e simplesmente. O grupo
como o sonho, preenche uma função de realização imaginária dos desejos não
cumpridos, em particular dos desejos proibidos.
O pequeno grupo funciona nas representações coletivas como um
lugar de realização imaginária das ameaças do superego e como um lugar de
realização real das ameaças da sociedade global.
Anzieu (1993) propõe cinco organizadores psíquicos inconscientes do
grupo. São eles:
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1°) fantasma individual - a ressonância fantasmática é o agrupamento
de alguns participantes em torno de um deles que deixou transparecer um de
seus fantasmas individuais inconscientes;
2°) imago - é uma representação de pessoa, que contribui para
constituir as instâncias psíquicas reguladoras do Ego, que são o Superego, o
Ideal do Ego, o Ego Ideal.
3°) fantasmas origirios - são representações psíquicas inconscientes
que incidem sobre as origens.
4°) O complexo de Édipo, organizador específico do grupo familiar ou
meta-organizador grupal.
O complexo de Édipo, segundo Freud, é o núcleo psíquico da cultura e
da sociabilidade, bem como da educação e da neurose. O complexo de Édipo
assegura a estrutura tópica da vida grupal, enquanto o fantasma individual, a
imago e os fantasmas origirios garantem a organização fantasmática.
5°) imagem do corpo próprio e o envelope psíquico do aparelho grupal.
Anzieu (1993, p. 199) enfatiza que “[...] pertencer a um grupo impõe,
muitas vezes, aos membros marcas corporais ou vestimentárias que significam a
participação de um corpo comum”. Afirma que existe a necessidade de o aparelho
psíquico, individual ou grupal, constituir-se em um envelope que o contenha, que
o delimite, que o proteja, e que permita trocas com o exterior, este fenômeno foi
chamado de EU-pele pelo próprio Anzieu.
Os cinco organizadores são independentes quanto a sua natureza e
interdependentes quanto a seu funcionamento, afirma Anzieu (1993).
1.7 Principais contribuições de René Kaës
Kaës (1977) afirma que o grupo pode, em diferentes circunstâncias,
funcionar como uma extensão da psique individual. A formação do aparelho
psíquico individual depende da construção de grupalidade que cada um traz
consigo.
Para Kaës (1974b), o grupo pode se organizar como se fosse uma
metáfora e/ou metonímia do corpo, ou de partes do corpo. O destino de um grupo
e de seus integrantes se define na relação que se estabelece entre o espaço
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vivido (o corpo) e a representação desse espaço, entre essa representação e o
espaço real que é seu suporte no palco da história.
É importante notar que a proteção de um grupo e a possibilidade de
utilização dos estímulos externos e das pulsões de seus membros, se o grupo
constituir, é denominado por Kaës (1974) de aparelho psíquico grupal. O aparelho
psíquico grupal é construído em dois pilares: um que é sobre os aparelhos
psíquicos individuais dos componentes do grupo e o outro sobre a cultura e
representações coletivas do grupo. O aparelho grupal se estrutura de forma mais
ou menos estável a partir da circulação fantasmática entre seus membros.
Este psicanalista afirma que para a compreensão do funcionamento e
dinâmica dos grupos, o necessários três conceitos fundamentais: os
organizadores psíquicos, organizadores sócio-culturais e o aparelho psíquico
grupal.
Kaës (1977) define os organizadores psíquicos como configurações
inconscientes, típica de relações entre objetos. Para este autor, os organizadores
psíquicos possuem a capacidade de mobilizar energia psíquica ou qualquer
equivalente físico ou social.
Ele afirma:
Su propriedad dominante es la de poseer uma estructura grupal,
es decir, constituir conjunto específico de relaciones entre objetos
ordenados para um fin de acuerdo com um esquema dramático
más o menos coherente (KAËS, 1977, p. 40).
Afirma, também, que os organizadores são inconscientes de formação
relativamente complexa que viabilizam os vínculos do agrupamento. São arranjos
inconscientes que determinam o lugar ocupado pelos membros do grupo em um
dado momento. Esse é um movimento clássico das relações de objeto.
Ainda para Kaës (1977), existem quatro organizadores psíquicos da
representação de grupo, a saber:
1) imagem do corpo - a forma do grupo é baseada neste organizador.
Se ocorrer a possibilidade da cisão, fragmentação psíquica, o grupo se organiza
no sentido de criar um corpo grupal;
2) fantasia original - é a referência às origens, ao objeto perdido. É o
transporte para o reviver das questões vinculadas à sexualidade (diferenças
sexuais, concepção, etc);
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3) complexos familiares e imagos - como o próprio nome sugere, este
organizador refere-se às questões edípicas, às relações familiares, às relações de
rivalidade e/ou cumplicidade entre irmãos, e,
4) imagem global de nosso funcionamento psíquico - este organizador
está intimamente relacionado ao mecanismo de identificação/projeção. Depende
da representação que cada um tem de si próprio e de grupos. É constituído a
partir da noção de grupalidade internalizada e que são projetadas no grupo para,
com isto, poder formar o novo aparelho psíquico grupal.
Os organizadores socioculturais da representação de objeto-grupo se
constituem por modelos de relações interpessoais ou coletivas que podem ser
práticos ou teóricos. Expressam as relações sociais, históricas, definindo os
lugares da existência grupal não em sua concretude quanto na proposição de
imagens proféticas, míticas ou proativa.
Os organizadores socioculturais resultam da elaboração da experiência
de diferentes formas de grupalidade e, também, da elaboração de experiências
sociais. Esse sistema define a cultura por meio de seus códigos comuns que
orientam as práticas sociais.
Nos organizadores socioculturais estão implícitos os organizadores
psíquicos que se expressando por meio da linguagem propiciam uma
comunicação intersubjetiva. As representações sociais do grupo, afirma Kaës
(1977), agrupam as elaborações coletivas da realidade intrapsíquica.
Por fim, o aparelho psíquico grupal (APG) que é, segundo Kaës (1977),
a expressão da criatividade do grupo. Esse aparelho regula a manifestação da
libido, bem como dos desejos e isso assegura a passagem das diferentes
realidades psíquicas para a realidade grupal.
Anzieu (1993) aceita as proposições de Kaës sobre o aparelho
psíquico grupal. Käes (1977) descreve os princípios norteadores desse aparelho,
que segundo ele, podem sinalizar o estado evolutivo do grupo acerca de seu
funcionamento. Os princípios apontados são a auto-suficiência do grupo em
relação à realidade física e social, a delimitação entre um interior e exterior do
grupo e a indiferenciação entre o indivíduo e o grupo (isomorfia).
O princípio da auto-suficiência do grupo em relação à realidade física
ou social refere-se à busca do grupo, de uma organização adequada à sua
percepção de realidade externa e suas necessidades manifestas. Esse princípio
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pode provocar ora uma luta por poder por evitar um debate interno, passando a
buscar apenas sua sobrevivência ou, também, o evitar o debate externo com
outros grupos buscando a sobrevivência de forma ensimesmada.
O princípio de delimitação entre um interior e exterior de grupo propõe
a localização do aparelho grupal em um espaço social, ou seja, favorece a
identidade grupal.
O princípio de indiferenciação entre o indivíduo e o grupo, tendência de
isomorfismo, revela que a estruturação interna individual inicia-se na construção
de sua grupalidade psíquica interna, considerando que nascemos num grupo. O
desenvolvimento dá-se a partir da tendência homomórfica, em que, a partir da
busca de si mesmo, há a possibilidade de separação dos grupos originais.
As concepções elaboradas por Kaës (1977/97) podem ser
perfeitamente entrelaçadas às de Anzieu (1993) no que tange aos organizadores
e ao aparelho psíquicos grupal com as fantasias inconscientes. Kaës (1997), no
anseio de esclarecer o término de um grupo, aborda o item do grande
desorganizador como sendo o agente pertinente ao desfecho de um grupo.
A compreensão do funcionamento grupal à luz da psicanálise é
perfeitamente possível considerando, segundo Anzieu et al. (1978), que na
realidade, os processos psíquicos que ocorrem nos grupos não deixam de ter
relação com os que a teoria psicanatica refere no domínio individual.
Kaës (1997) mostra a importância do estudo dos vínculos grupais,
alertando para que esse estudo não somente sirva para descrever, mas, também
para auxiliar o trabalho psíquico. Para que isso ocorra faz-se necessário criar,
manter e transformar os processos psíquicos comuns aos membros do grupo.
1.8 Conceito fundamental sobre a teoria do vínculo de Pichon-Rivière
Pichon-Rivière publica em 1980, a Teoria do Vínculo. No livro, Teoria
do Vínculo (1986), Pichon-Rivière apresenta o vínculo como uma estrutura
dinâmica, em movimento e que envolve tanto o sujeito quanto o objeto. O vínculo
é estabelecido pela totalidade do sujeito e está em constante evolução. Considera
a interpretação do vínculo como um dado operacional em que deve ocorrer a
síntese entre a teoria e a prática. A interpretação dar-se-á, portanto, por meio da
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captação de indícios e, também, do uso do chamado esquema conceitual
referencial e operacional (E.C.R.O.). Alerta para que todo analista conheça sua
própria fantasia do interpretar, para não distorcer essa tarefa. (PICHON-RIVIÈRE,
1986).
Pichon-Rivière (1986) nomeia os vínculos desde o normal até o
patológico. Chama a atenção para a existência de três dimensões que necessitam
ser cuidadosamente investigada: a dimensão individual, a grupal e, por fim, a
dimensão institucional ou social.
Tanto a psicologia quanto a psicanálise vem ao longo dos tempos
mostrando que se houver desenvolvimento do grupo, pode-se inferir que houve o
mesmo com o indivíduo, basta evocar a questão vincular e o poder dos grupos
primários (família) como produtores de saúde ou doença psíquica.
1.9 A organização do poder: uma contribuição
Acredita-se que, talvez, o trabalho com grupos possa ser uma chance
de crescimento por favorecer, também, o aparecimento de questões ligadas à
organização das instituições (família, escola, etc).
Conforme Pagès et al. (1993), a carreira profissional pode oferecer
uma ilusão de poder, pode iludir a realidade e oferecer uma máscara. Para que
haja a ilusão do poder, é necessária uma carga de trabalho elevada produzindo a
dependência e submissão do profissional à organização onde trabalha. Essa
perda de autonomia pode levar a perda de identidade. Ainda, segundo os autores,
as organizações podem exercer sobre o profissional uma ação direta sobre seus
impulsos e sua angústia primária, tirando, assim, as condições necessárias para
uma elaboração coerente a nível egóico. Isso significa que o profissional está
inconsciente desse processo e sem a possibilidade de viver suas fantasias e de
exercer influência sobre o objeto de seu trabalho.
Ao utilizar a concepção dos citados autores, pode-se pensar que a
relação do professor com a instituição tem raízes múltiplas, como projeção,
identificação, introjeção, ambivalência, prazer agressivo, entre outros. As trocas
psíquicas com a instituição ou com os colegas podem ser da ordem do
imaginário. A imagem inconsciente, portanto, que o professor cria da escola, dos
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seus colegas ou de seus alunos é, ao mesmo tempo, temida e desejada e faz
parte de uma formação psíquica que responde a algumas de suas necessidades
psicológicas.
A identidade do professor está, via de regra, ligada à sua atividade e às
trocas que realiza neste meio. Tais trocas terão como resultante a percepção de
compensações ou frustrações.
Conforme os mesmos autores, é importante que o profissional possa
ter compreensão de processos institucionais que o cercam, tais como:
1) entender que a economia vigente corresponde a um sistema
psicológico dominado pelo superego e que a identificação com o pai se faz
representar na organização pelo chefe, e:
2) entender, também, que os poderes materiais e psicológicos dos
chefes (coordenadores, diretores, reitores) estão longe de terem desaparecido.
Ao compreender tais processos, o profissional estará mais próximo a
uma realidade compreensível, ao entender o pareamento de figuras como pai X
chefe e sua correlação de forças com o sistema econômico vigente. Te a
oportunidade de compreender o deslocamento de forças do suposto poder do pai
agora transposto na figura do chefe. Poderá aliviar as tensões e anseios em
relação ao trabalho, esperando deste, apenas aquilo que a realidade
organizacional é capaz de proporcionar. Estaria, assim, aliviando suas
frustrações.
Outra compreensão importante, segundo os autores, diz respeito, à
natureza dos poderes utilizados nas instituições, que podem ser da ordem do
material ou da ordem psicológica; e tais poderes não necessariamente, serão
utilizados em benefício do profissional. Esses poderes vão desde a utilização do
conhecimento de um “segredo” até a coação ou submissão por questões
materiais.
O professor no anseio de promoção (mestrado, doutorado) pode ser
tomado por uma tentativa perpétua de superar-se. O risco e perigo estão no fato
de que para satisfazer tal ambição, deixe-se escravizar (PAGÈS et al., 1993).
Para esses autores é importante estar atento às reais necessidades de
conquistas por promoções, pois, em alguns casos, o preço de tal conquista pode
ser a dependência à organização a tal ponto que o faça desqualificar ou relegar a
segundo plano suas relações pessoais e familiares.
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Não se pode desconsiderar a complexidade do poder das organizações
de trabalho e sua influência na realidade psíquica e, também, concreta, dos
trabalhadores. Sendo o professor um trabalhador na Educação, é necessário
estar atentos, também, às nuances culturais do processo de trabalho. Lembrando
que o trabalho na Educação pressupõe a organização em grupos; grupos de
professores, grupo de alunos, grupo de coordenadores, etc.
Cabe aqui uma consideração final. Ao trabalhar com grupo de
professores do ensino superior, o se quer um olhar apenas nas relações dos
membros do grupo como se estivessem isentos de sua realidade sócio-cultural.
Por essa razão, neste estudo, traz-se, para a compreensão dos grupos, a questão
relativa ao poder das organizações de trabalho. Na necessidade de
contextualização, pretende-se um olhar para a cultura.
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CAPÍTULO 2
A EDUCAÇÃO NO BRASIL: ALGUNS ASPECTOS
HISTÓRICOS. O ENSINO SUPERIOR E A
FORMAÇÃO DE SEU PROFESSOR
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Neste capítulo serão abordados alguns aspectos da educação no
Brasil, bem como elementos que interferiram na elaboração da atual situação
educacional, sobretudo no ensino superior.
Serão destacadas as idéias de alguns pensadores que considerou-se
serem relevantes para a compreensão da educação e do ensino superior no
Brasil.
2.1 História da Educação no Brasil: alguns dados
A Educação é um tema dos mais instigantes e, também, multifacetado.
Podería-se abordar vários itens sobre o assunto, contudo deter-se-á em alguns
aspectos que considerados indispensáveis para a compreensão deste trabalho.
Com o único intuito de se situar historicamente, pontuar-se-ão alguns
aspectos da Educação no Brasil, para ter um breve olhar em sua evolução.
A educação no Brasil tem início com os Jesuítas, conforme Ribeiro
(1987). Os primeiros jesuítas chegaram ao território brasileiro em março de 1549
com o primeiro governador-geral, Tomé de Souza. Comandados pelo Padre
Manoel de Nóbrega, quinze dias após a chegada, edificaram, em Salvador, a
primeira escola brasileira, que teve como mestre o Irmão Vicente Rodrigues.
Vicente tornou·se o primeiro professor nos moldes europeus e durante mais de 50
anos dedicou·se ao ensino e a propagação da fé religiosa.
Segundo Silva (1992), o mais conhecido e talvez o mais atuante foi o
noviço José de Anchieta. Anchieta tornou·se mestre·escola do Colégio de
Piratininga; foi missionário em São Vicente, onde escreveu na areia os "Poemas à
Virgem Maria" (De beata virgine Dei matre Maria), missionário em Piratininga, Rio
de Janeiro e Espírito Santo; Provincial da Companhia de Jesus de 1579 a 1586 e
reitor do Colégio do Espírito Santo.
No Brasil os jesuítas se dedicaram ao trabalho educativo e a pregação
da católica. Perceberam que não seria possível converter os índios ao
catolicismo sem que soubessem ler e escrever. De Salvador a obra jesuítica
dirigiu-se ao sul e em 1570, vinte e um anos após a chegada, já era composta por
cinco escolas de instrução elementar (Porto Seguro, Ilhéus, São Vicente, Espírito
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Santo e São Paulo de Piratininga) e três colégios (Rio de Janeiro, Pernambuco e
Bahia).
Todas as escolas jesuítas eram regulamentadas por um documento,
escrito por Inácio de Loiola, o Ratio atque Instituto Studiorum, chamado
abreviadamente de Ratio Studiorum. Os jesuítas não se limitaram ao ensino das
primeiras letras; além do curso elementar, eles mantinham os cursos de Letras e
Filosofia, considerados secundários, e o curso de Teologia e Ciências Sagradas,
de vel superior, para formação de sacerdotes. No curso de Letras estudava-se
Gramática Latina, Humanidades e Retórica; e no curso de Filosofia estudava-se
Lógica, Metafísica, Moral, Matemática e Ciências Físicas e Naturais. Os que
pretendiam seguir as profissões liberais iam estudar na Europa, na Universidade
de Coimbra, em Portugal, a mais famosa no campo das ciências jurídicas e
teológicas, e na Universidade de Montpellier, na França, a mais procurada na
área da medicina.
Piletti (1996) mostra que com a descoberta do Brasil os índios ficaram
à mercê dos interesses predadores: as cidades desejavam integrá-los ao
processo colonizador; os jesuítas desejavam converte-los ao cristianismo e aos
valores europeus; os colonos estavam interessados em usá-los como escravos.
Os jesuítas então pensaram em afastar os índios dos interesses dos
colonizadores e criaram as “reduções” ou “missões”, no interior do território.
Nessas Missões, os índios, além de passarem pelo processo de catequização,
também eram orientados ao trabalho agrícola, que garantiam aos jesuítas uma de
suas fontes de renda.
As Missões acabaram por transformar os índios nômades em
sedentários, o que contribuiu decisivamente para facilitar a captura deles pelos
colonos, que conseguiam, às vezes, capturar tribos inteiras nessas Missões.
Os jesuítas permaneceram como mentores da educação brasileira
durante duzentos e dez anos, até 1759, quando foram expulsos de todas as
colônias portuguesas por decisão de Sebastião José de Carvalho, o marquês de
Pombal, primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777. No momento da expulsão
os jesuítas tinham 25 residências, 36 missões, 17 colégios e seminários, além de
seminários menores e escolas de primeiras letras instaladas em todas as cidades
onde havia casas da Companhia de Jesus. A educação brasileira, com isso,
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vivenciou uma grande ruptura histórica num processo já implantado e consolidado
como modelo educacional.
É importante destacar, que neste período, a educação feminina
restringia-se a boas maneiras e prendas domésticas.
Ainda conforme as observações de Ribeiro (1987), a formação
intelectual fornecida pelos jesuítas foi considerada, à época, como rígida”.
Dedicaram-se por rios anos à formação do professor, que estaria pronto
para o magistério, por volta de seus 30 anos de idade. Os professores que
eventualmente pudessem vir a interessar-se por novos elementos que não
fossem aqueles ensinados na formação jesuítica, deveriam ser imediatamente
afastados da docência. Essa formação afastava dos intelectuais outras
orientações religiosas e principalmente o espírito científico que no século XVII,
atingiu uma etapa significativa. Havia a busca de um novo método do
conhecimento, que caracterizava a ciência moderna. O método escolástico
medieval, adotado pelos jesuítas era reconhecidamente insuficiente.
Lembrando que escolástico é um sistema teológico-filosófico surgido nas escolas
da Idade Média e caracterizado pela coordenação entre Teologia e Filosofia;
concordância do conhecimento natural com o revelado (MICHAELIS, 1998).
Vale a pena destacar, ainda, que a preparação dos professores
jesuítas dizia respeito à escolha de homens que tinham atravessado o curso
rígido do colégio inferior e geralmente do colégio superior. Conforme Monroe
(1974), o princípio fundamental da Ordem dos jesuítas era de que tudo há de ser
feito para a maior glória de Deus (A.M.D.G. Ad Majorem Dei Gloriam). Na prática,
isto significava a completa subordinação do indivíduo à Ordem.
Em muitos aspectos é notório que a Educação no Brasil, avançou de
forma considerável, ao longo da história. Contudo, ainda é possível observar
algumas cicatrizes deixadas desde os Jesuítas. Nota-se a concepção de uma
formação de professores que precisa ser vocacionada, missionária, como se a
docência fosse um sacerdócio e que os professores “sacerdotes” devem
obediência plena à “Ordem”, no caso, às Instituições de ensino.
Por entender a importância dos Jesuítas na construção da Educação
no Brasil, deteve-se um pouco mais em sua história. Passar-se-á a um brevíssimo
apanhado histórico, com o intuito de situar e poder em seguida, compreender a
atual situação da Educação no Brasil, sobretudo o ensino superior.
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Para este apanhado histórico vale-se de cinco autores: Ribeiro (1987),
Peeters e Cooman (1968), Silva (1992), Piletti (1996) e Romanelli (1978).
Segundo os autores, em 1759, duzentos e dez anos após a chegada
dos Jesuítas e destes serem os únicos responsáveis pela educação no Brasil,
deixaram a conia cerca de quinhentos padres jesuítas, expulsos pelo Marquês
de Pombal, Ministro de D. José I, paralisando 17 colégios, 36 missões, seminários
menores e escolas elementares.
O Alvará de 28 de julho de 1759 determinou a instituição de aulas de
gramática latina, aulas de grego e de retórica, am de criar o cargo de "Diretor de
Estudos".
As idéias iluministas objetivavam transferir o poder, passando-o da
igreja para o Estado. Porém o Marquês de Pombal não visou uma reforma
brasileira e sim uma reforma educacional para a Metrópole (Portugal) e como não
houvesse interesse em equipar a colônia com um sistema educacional eficiente, a
suposta reforma foi um fracasso.
Com a chegada da Corte Portuguesa ao nosso país a escola e o
sistema educacional entram em voga novamente, que agora com a intenção
de atender às necessidades da nobreza.
Reconstrói-se a academização. Funda-se, no Rio de Janeiro a
Academia Científica em 1772. Em 1776 é criada pelos franciscanos uma escola
destinada à formação de sacerdotes. Em 1810 surge a Academia Militar e D. João
cria a primeira biblioteca neste mesmo ano. Tudo isto com objetivo certo: a
educação da elite. Todos os esforços para a construção da escola gratuita foram
em vão, não existiam verbas para isso, pois tudo o que se destinava à educação
estava sendo aplicado à educação elitista e acadêmica dos nobres. Isto acontece
na época da chamada “Independência do Brasil”. Neste período o ensino é
dirigido pelos vice-reis, nomeados por Portugal.
A função da escola não era mais a de engrossar as fileira de fiéis que
seguiam os ensinamentos dos padres”, mas sim a de atender os interesses de
uma elite que ficava cada vez mais poderosa.
O ensino superior foi criado durante a permanência da família real
portuguesa no Brasil, de 1808 a 1821. Proclamada a “Independência”, o império
descentralizou a direção e a organização das escolas, o que resultou em várias
aberturas e inúmeros fechamentos de escolas. Conforme os autores já citados, o
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estado não deu conta de gerenciar a Educação. Nem tentando dividir as
responsabilidades entre a federação e as províncias. Somente 360 anos depois
do descobrimento de nossa cultura indígena, precedido da invasão portuguesa, é
que o sistema educacional brasileiro foi aquecido novamente.
Surgem os padres que com várias ordens religiosas criam muitas
escolas secundárias para rapazes; e protestantes que criam escolas mistas. O
Estado não conseguiu se sobrepor à igreja e o ensino acadêmico, elitizado e
abstrato, volta a reinar como instrumento de doutrinação.
Com a República vem junto uma enxurrada de reformas e dentre elas
aquela desejada pelos positivistas da época: a introdução do estudo de ciências,
na escola primária e secundária, para contrapor o ensino escolástico das escolas
religiosas.
Na década de 1930 e 1940 surgem as primeiras preocupações e
chances educacionais reais para as camadas populacionais mais amplas, porém
o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova que mobilizou a educação nacional na
época, não contava com a participação direta desta camada da população na
conquista dessas chances.
Este foi um período profícuo no sentido administrativo. Foi criado o
Ministério da Educação; surge a primeira Universidade organizada por
determinação do Governo Federal, este fato deu-se em 1920. Surge então a
Universidade do Rio de Janeiro, durante o governo de Epitácio Pessoa. A criação
da primeira Universidade foi apenas a agregação de três escolas superiores
existentes no Rio de Janeiro: Faculdade de Direito, Faculdade de Medicina e
Escola Politécnica. Neste período, o governo federal reconheceu as
Universidades em estados com mais de 100.000 habitantes, por isso a
Universidade do Paraná, por exemplo, não fora reconhecida.
A constituição de 1937 previu a responsabilidade do Estado na
educação de crianças e adolescentes e a participação de indústrias e sindicatos
na educação e formação profissional dos empregados.
A discussão educacional nas décadas de 1930 e 1940 continuou sendo
ampliada nos próximos 20 anos. A Alfabetização o tinha mais a intenção de
doutrinação religiosa e passou a ser vista e realizada como instrumento de
emancipação da maioria da população brasileira.
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Ainda em 1946 o então Ministro Raul Leitão da Cunha regulamentou o
Ensino Primário e o Ensino Normal, além de criar o Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial (SENAC), atendendo as mudanças exigidas pela
sociedade após a Revolução de 1930.
Amparado nas doutrinas emanadas pela Carta Magna de 1946, o
ministro Clemente Mariani criou uma comissão, com o objetivo de elaborar um
anteprojeto de reforma geral da educação nacional. Essa comissão, presidida
pelo educador Lourenço Filho, era organizada em três subcomissões: uma para o
Ensino Primário, uma para o Ensino Médio e outra para o Ensino Superior. Em
novembro de 1948, esse anteprojeto foi encaminhado à Câmara Federal. Num
primeiro momento, as discussões, na Câmara, estiveram voltadas às
interpretações contraditórias das propostas constitucionais. Num momento
posterior, após a apresentação de um substitutivo do Deputado Carlos Lacerda,
as discussões mais marcantes relacionaram-se à questão da responsabilidade do
Estado quanto à educação, inspirados nas idéias dos educadores da velha
geração de 30.
Ainda, conforme os autores, em 1961 acontece a aprovação da Lei de
Diretrizes e Bases, que embora incompleta, representava o resultado de muita
discussão. A preocupação da lei não era científica e sim política, e continuava
desvinculada da realidade e do mundo do trabalho.
Depois de 13 anos de acirradas discussões, foi promulgada a Lei
4.024, em 20 de dezembro de 1961, sem a pujança do anteprojeto original,
prevalecendo as reivindicações da Igreja Católica e dos donos de
estabelecimentos particulares de ensino no confronto com os que defendiam o
monopólio estatal para a oferta da educação aos brasileiros.
As discussões sobre a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação
Nacional foi um fato marcante. Outras iniciativas marcaram, também, este período
como, talvez, o mais profícuo da História da Educação no Brasil:
a) em 1950, em Salvador, Anísio Teixeira inaugura o Centro Popular
de Educação (Centro Educacional Carneiro Ribeiro).
b) em 1953 a educação passa a ser administrada por um Ministério
próprio: o Ministério da Educação e Cultura.
c) em 1961 a Prefeitura Municipal de Natal, no Rio Grande do Norte,
inicia uma campanha de alfabetização, "De Pé no Chão Também se
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Aprende a Ler”. A técnica didática, criada pelo pernambucano Paulo
Freire, propunha-se a alfabetizar em 40 horas adultos analfabetos. A
experiência teve início na cidade de Angicos, no Rio Grande do
Norte, e, logo depois, na cidade de Tiriri, em Pernambuco.
d) o Conselho Federal de Educação é criado em 1962, cumprindo o
artigo 9
o
da Lei de Diretrizes e Bases. Este substitui o Conselho
Nacional de Educação. São criados também os Conselhos
Estaduais de Educação.
e) Em 1962 é criado o Plano Nacional de Educação e o Programa
Nacional de Alfabetização, pelo Ministério da Educação e Cultura,
inspirado no Método Paulo Freire.
Segundo os autores, Ribeiro (1987), Peeters e Cooman (1968), Silva
(1992), Piletti (1996) e Romanelli (1978), embora Paulo Freire estivesse
conseguindo um trabalho emancipador, a revolução de 64 calou todos e o
militarismo passou a reinar e mudou o rumo da educação no país. O militarismo
interrompeu o processo social que se encorpava e durante 20 anos
permanecemos no silêncio obrigatório e no não crescimento educacional. Para
contrabalançar esse engessamento, surgiram estudos progressistas que foram
retomados após este período. A reforma universitária, gestada pelo governo
militar em 1968, foi considerada um grande marco na história das universidades
brasileiras. O objetivo da reforma era modernizar a universidade para um projeto
econômico em desenvolvimento, dentro das condições de 'segurança' que a
ditadura pretendia para si e para os interesses do capital que o representava.
A Lei 5540/68 introduziu a relação custo-benefício e o capital humano
na educação, direcionando a universidade para o mercado de trabalho, ampliando
o acesso da classe média ao ensino superior e cerceando a autonomia
universitária. O relevante, nesta época, é que o governo tenta estruturar a
universidade. O militarismo seguia um modelo americano para o ensino. Essa lei
ficou vigente por muito tempo e algumas idéias não deram certo. Logo depois, as
universidades passaram por momentos difíceis, com o Ato Institucional número
cinco (AI-5) intimidando e proibindo as pessoas, da liberdade de expressão. O AI-
5 foi uma das medidas do governo militar que diminuiu ainda mais as liberdades
educacionais no País.
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Chegou-se aos anos 90 com uma multiplicidade de sistemas
educacionais. Estiveram presentes em nosso cotidiano a escola doutrinária, a
escola nova, a tecnicista e a progressista. O ensino superior no Brasil somente foi
retomar seu crescimento durante o governo de Fernando Henrique, quando houve
um sensível aumento de vagas nas universidades privadas. A demanda dos
alunos que saíam do ensino médio cresceu, havendo então a necessidade de
criarem novas vagas. Para os autores, a demanda gerada por essa ampliação foi
coberta por uma expansão do ensino privado. Essa expansão se deu por uma
legislação que facilitou a abertura de cursos e instituições, sobretudo de
faculdades, centros universitários e universidades.
A situação das universidades tem se deteriorado nos últimos anos
porque houve uma reforma silenciosa nos anos do governo FHC, década de
1990. O fato mais flagrante e evidente é de que a percentagem de vagas
oferecidas pelas universidades públicas se inverteu em relação às privadas, ou
seja, o pólo de expansão do ensino universitário brasileiro passou a ser a rede
privada.
Novamente um grande movimento educacional passou a ser realizado.
Modificou-se a Lei de Diretrizes e Bases; criou-se parâmetros curriculares
nacionais, a partir de uma discussão mais ampla e de contribuições de outros
países; criou-se um modelo de avaliação das escolas; ousou-se mexer no sistema
de avaliação; no modelo do vestibular.
Atualmente, no grande mero de instituições do ensino superior que
existem, o corpo docente é predominantemente de tempo parcial e tem outros
encargos. Na sua maioria vai à universidade somente para dar aula e o contato
entre professor e aluno limita-se, quase sempre, ao encontro em sala de aula.
(RIBEIRO, 1987; PILETTE, 1996; ROMANELLI, 1978; SILVA, 1992 e PEETERS e
COOMAN, 1968).
De acordo com o Ministério da Educação, cerca de 70% das vagas
existentes são de instituições privadas e apenas 30% estão nas universidades
públicas, conforme o Núcleo de Pesquisa da Agência Brasil (CANES, 2005).
2.2 O Ensino Superior no Brasil: alguns aspectos a serem considerados
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A educação superior no Brasil tem sofrido importantes mudanças e
reformas. Dando continuidade ao atual período do ensino superior no Brasil,
pode-se citar Sguissard e Silva Júnior (1999) quando afirmam que as reformas no
ensino superior se dão muito mais por uma questão de política econômica do que
uma política educacional. Neste ponto pode-se ver uma manifestação de postura
utilitarista por parte da ação estatal.
No dizer do sociólogo Ianni (1975), é a partir do século XX que o povo
brasileiro aparece como categoria política fundamental. Em particular, é depois da
Primeira Guerra Mundial que os setores médios e proletários urbanos e rurais
começam a contar mais abertamente como categoria política. Por isso, pode-se
verificar que a “revolução brasileira” em curso, neste século, é um processo que
compreende a luta por uma participação cada vez maior da população nacional
no debate e nas decisões políticas e econômicas. O florescimento da cultura
nacional ocorrido em especial nas décadas de vinte a cinqüenta, indica a criação
de novas modalidades de consciência nacional. Neste quadro é que se inserem
os golpes, as revoluções e os movimentos que assinalaram os fluxos e os
refluxos na vida político nacional.
O acesso massificado ao ensino superior no Brasil foi proporcionado
por instituições privadas de caráter não universitário e, ligado a isso, colocou-se o
problema da heterogeneidade do setor, bem como a existência de níveis baixos
do ensino ministrado. Como se vê, o modo pelo qual o ensino superior se instituiu
no Brasil como fenômeno histórico não foi resultado de acidentes, como alguns
podem julgar, mas adaptação conseqüente às condições e às possibilidades da
sociedade então estabelecida.
É possível notar, portanto, a expansão do ensino superior no Brasil,
principalmente no que se refere à abertura em larga escala de novas Instituições,
sobretudo as instituições privadas.
Existe hoje um conjunto significativo de alterações no ensino superior
brasileiro, que abrange desde o processo de transformação das instituições de
ensino superior em organizações sociais, ou seja, em entidades públicas de
natureza privada, até a implementação de uma série de medidas de ordem legal.
Segundo Scheibe e Aguiar (1999), o elemento fundamental da
reconfiguração do ensino superior tem sido a crise em que se encontra o sistema
público de ensino superior. O Decreto 2.306 de 1997 regulamenta a existência de
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uma tipologia inédita para o sistema de ensino superior brasileiro: Instituições de
Ensino Superior (IES) blicas, IES privadas sem fins lucrativos e IES privadas
com fins lucrativos. Quanto à sua organização acadêmica, as instituições de
ensino superior passaram a ser classificadas em: a) universidades; b) centros
universitários; c) faculdades integradas; d) faculdades; e) institutos superiores ou
escolas superiores.
Instaurou-se com essa legislação a distinção entre universidades de
pesquisa e universidades de ensino e normatizou-se uma hierarquia no interior do
ensino superior que, certamente, demandará cada vez mais em reivindicações
diferenciadas para cada setor. Destaque-se a questão da formação de
professores. Estabeleceu-se para essa formação, preferencialmente o nível mais
baixo da hierarquia. Um caminho que, independentemente do setor ao qual se
vincula (público, particular, comunitário), deverá ser sempre o menos oneroso. A
questão evidentemente é muito complexa, e necessita que seja estabelecido um
sistema nacional para a formação de professores.
Cabe, aqui, ressaltar alguns aspectos do ensino superior privado,
considerando que o ensino público vem mantendo sua excelência, principalmente
nas pós-graduações, mas depois da cada de 1990 apresenta visível
estrangulamento. No entendimento de Sampaio (1991), a questão do ensino
superior privado no Brasil apresenta algumas questões a serem observadas.
Segundo a autora, as principais alterações que começaram a ser desencadeadas
no setor privado a partir do final dos anos 80 e que afetam a configuração do
sistema são: diminuição do número de estabelecimentos particulares isolados;
simultaneamente a essa diminuição ocorreu um aumento do número de
universidades particulares; movimento de desconcentração regional e, seguindo
essa desconcentração regional, outro movimento de interiorização dos
estabelecimentos particulares e de suas matrículas; crescimento acelerado do
número de cursos e ampliação do leque de carreiras oferecidas pelo setor privado
de ensino superior. O movimento de transformação dos estabelecimentos
isolados em universidades acelerou-se a partir do final dos anos 80. Entre 1985 e
1996, o número de universidades particulares mais do que triplicou, passando de
20 para 64 (MEC, 1996).
Esse movimento, conforme Sampaio (1991) estaria expressando a
percepção, por parte da iniciativa privada, que estabelecimentos maiores, com
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uma oferta mais diversificada de cursos, gozariam de maiores vantagens
competitivas na disputa pela clientela de ensino superior. Por isso, os
estabelecimentos devem crescer, ampliando o escopo de seus cursos ou ainda
criando novas instalações físicas de forma a buscar, inclusive fora de seus
domínios já consolidadas, novas e diversificadas clientelas. A estratégia de
transformação da natureza institucional dos estabelecimentos inscreve-se
também no quadro das mudanças que ocorreram na moldura legal para o ensino
superior (SAMPAIO, 1991).
É importante destacar que para ingressar na docência do ensino
superior, não há muitas exigências legais no que se refere à titulação e à
formação pedagógica. Nem a antiga Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)
- Lei 5.540/68 e a atual 9.394/96 mencionam qualquer exigência sobre a
formação pedagógica como pré-requisito para o exercício do magistério no ensino
superior. Quanto à titulação, basta que o professor tenha a graduação na área
para concorrer à vaga de docente. Cabe a cada Instituição determinar o nível de
sua exigência para contratação. A única exigência da LDB é que um terço do
corpo docente seja constituído por mestres ou doutores.
A realidade sócio-político do ensino superior no Brasil está posta,
somando-se a isto, tem-se uma quantidade considerada demasiada de
faculdades e universidades espalhadas por todo território nacional. Resta agora,
uma questão que não quer calar: como anda a formação do professor de ensino
superior? E, sobretudo, quem é o docente universitário?
2.3 O Professor do 3º Grau: algumas questões sobre sua formação
Nas palavras de Elisa Lucarelli em: “O que de novo na educação
superior (2000, p. 67), o “poder e prestígio não provém da docência universitária
como saber pedagógico, mas do domínio de um campo científico, tecnológico ou
humanístico determinado”. Para ela, o docente universitário se reconhece a partir
de sua profissão de origem. O poder e o prestígio social não estão configurados
na docência. A docência perde seu status e deixa, portanto, de oferecer prestígio
e reconhecimento social. Isto responde a segunda questão, elaborada por esta
autora anteriormente, qual seja, quem é o docente universitário? A resposta, a
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51
partir de Lucarelli, é a de que o professor universitário é aquele cuja profissão
original o define. Ele não está, portanto, definido via docência. Isto faz pensar que
o ensinar continua sendo uma segunda opção, ou aquele famoso “bico”
profissional, se não, com certeza, o é a via determinante de seu prestígio
social.
A que se deve este desprestígio da docência? Cabe aqui uma
inquietação. A falta de prestígio do professor de ensino superior passa mais
vivamente pela questão do status sócio-cultural ou pela pouca expressividade de
seu poderio econômico? Parece que se está diante de uma ambigüidade. O
professor mesmo “desqualificado” ou desprestigiado, ainda garante na sociedade
um certo status, um certo prestígio, que lhe confere o lugar do dono do saber”;
ser professor universitário traz o equivalente de ser um profissional capacitado,
mas não necessariamente em todos os níveis. O professor universitário de escola
pública parece ter mais prestígio sócio-cultural do que o professor de instituição
privada. Esses são dados surgidos de impressões, pois o se encontram
trabalhos que possam garanti-los, como todas as referências sobre a formação do
professor no ensino superior são muito escassas.
Antes de responder, ou tentar compreender essa questão, que, sem
dúvida nenhuma, é dolorosa e requer uma análise mais complexa, passar-se-á
para a primeira questão que se formulou, que diz respeito à formação do
professor. Pode-se notar que existe uma corrente de pensadores da educação
que crê na necessidade de uma formação constante, interminável. O professor
está diante de um jogo de forças que o leva a buscar, conforme Lucarelli (2000),
uma “preparação permanente”.
É relevante observar a construção que traz a necessidade de uma
preparação constante. Chauí (2001) aponta momentos importantes da
universidade brasileira. Fala da universidade com caráter funcional da década de
1970. A qual recebeu esta denominação por adaptar-se às exigências do
mercado. É uma universidade voltada para a formação rápida de mão de obra
altamente qualificada para o mercado de trabalho, alterando para isso seus
currículos, programas e atividades.
Outro momento, é o da chamada universidade de resultados, década
de 1980. Recebeu esta denominação por garantir a utilidade de suas pesquisas
possibilitando, assim, a garantia dos resultados.
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52
A universidade de “resultados” vem com a expansão das universidades
particulares e a idéia de parceria entre as universidades públicas e o setor
empresarial para o financiamento de pesquisas. A possibilidade de emprego para
seus egressos e utilidade imediata das pesquisas é que garantiam à universidade
sua apresentação pública como portadora de resultados.
Segundo Chauí (2001), a universidade atual é a operacional, que é
estruturada por normas e padrões inteiramente alheios ao conhecimento e à
formação intelectual: a formação passa a ser transmissão rápida de
conhecimentos e adestramento para o mercado de trabalho; a pesquisa é aquela
voltada para os interesses de um desenvolvimento econômico pautado pelo
modelo neoliberal, estratégia de intervenção e instrumento de controle para a
consecução de um objetivo delimitado, local e parcial; e mede-se o resultado pelo
número de alunos, pelo aumento de horas-aula do professor, pela diminuição do
tempo para mestrado e doutorado, pela quantidade de publicações, colóquios e
congressos, numa ótica produtivista e eficientista, em termos de custo-benefício.
Para tanto, segundo a Filósofa, houve a expansão de escolas privadas
e parcerias entre empresas e universidades públicas. A universidade operacional
está embasada nos contratos de gestão e índices de produtividade. Nesta
universidade, a pesquisa é apenas a posse de instrumentos para intervir e
controlar alguma coisa, não há, portanto espaço para a pesquisa fruto da reflexão
e crítica. Para a mesma autora a atual estrutura da universidade destrói a
curiosidade e admiração pela descoberta do novo.
Ainda, conforme Chauí (2001), quando a Reforma do Estado
transforma a educação em serviço e a universidade em prestadora de serviços,
registra-se uma mudança profunda na própria concepção de universidade. A
universidade passa de instituição social à organização social.
Como “organização social”, a universidade obedece a uma outra lógica:
a da prática administrativa numa sociedade de mercado. Enquanto administração,
é regida pelos princípios da gestão, do planejamento, da produtividade, do
controle, da eficácia do sucesso, fundados numa racionalidade, que agora é
instrumental. Essa transformação não é gratuita e nem se dá por acaso: é próprio
ao movimento do capital promover a transformação de tudo - coisas, relações
sociais, bens culturais - em mercadoria destinada à troca: troca de equivalentes,
mediada pela mercadoria dinheiro, equivalente universal.
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Conforme Muls (2003), nesse contexto da implantação do modelo
político-econômico neoliberal, a estrutura sólida, implementadora e fiscal da
política educacional que interessa aos países ricos, tem sido o Banco Mundial,
que propõe e exige uma “rigorosa racionalização e maior eficácia nos gastos
públicos”. Os pontos principais da política educacional indicada pelo Banco
Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) para o nosso país e
para os países do Terceiro Mundo em geral são: o alto custo e a total ineficiência
das universidades blicas, que, segundo eles, apresentam baixíssima taxa de
retorno. Em conseqüência, a defesa clara da privatização do ensino superior e
existe a diversificação dos modelos de universidade. A autora sugere, também, o
conceito de que os países pobres não dispõem de recursos materiais e humanos
instalados para desenvolver a pesquisa, que “é coisa para países ricos”.
Desta forma, perdendo, de um lado, a sua função política e, de outro,
administradas pela racionalidade econômica, essencialmente gerencial e
mercadológica, cujos critérios são os da eficiência, da produtividade, da
rentabilidade e da competitividade, as universidades públicas o levadas a
submeter a educação ao mercado, com o mínimo de desperdício e o menor custo
possível; sofrem cortes cada vez maiores nas verbas destinadas, seja à pesquisa,
seja à infra-estrutura, seja à graduação ou à capacitação docente; passam a se
submeter às regras do mercado na competição pelos recursos do setor produtivo-
empresarial e na venda de serviços; e, no processo de luta pela sobrevivência,
acabam por se atrelar a uma imagem distorcida do lugar da pesquisa, da ciência
e da tecnologia no esforço de desenvolvimento econômico e social do país, que
passa a ser ditado pelos centros de conhecimento dos países desenvolvidos e
absorvido pelo modelo econômico defendido pelos governos neoliberais (MULS,
2003).
Segundo Muls (2003), a universidade pública perde a sua autonomia,
que agora passa a significar apenas gerenciamento empresarial para atendimento
das metas e indicadores estabelecidos no contrato firmado com o Estado.
Ao mesmo tempo, a potica educacional dos últimos governos tem
favorecido o fortalecimento das instituições privadas, quase sempre em
detrimento das universidades públicas. Algumas destas universidades têm
buscado a qualidade e têm procurado cumprir sua função pública e social,
atendendo, inclusive, seus compromissos com a região e com a comunidade mais
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imediata na qual estão inseridas, sem esquecer a sua natureza econômica, mas
priorizando o fato de serem universidades. Outras, ainda são geridas pela lógica
do lucro e pelas demandas imediatas do mercado, assumindo claramente o seu
caráter empresarial e pautando sua administração pela retórica produtivista e
eficientista.
Para a autora, existe o pressuposto de que tudo é equivalente de tudo -
tudo é mercadoria, portanto tudo se equivale - mesmo as diferentes facetas da
realidade social se equivalem - tudo pode ser administrado da mesma forma e
pelas mesmas regras. Inclusive a educação, um bem cultural.
Assim sendo, afirma Chauí (2001, p. 218) que é possível dirigir uma
universidade segundo as mesmas normas e os mesmos critérios com que se
administra uma montadora de automóveis ou uma rede de supermercados”.
Se o Estado reduz, portanto, os investimentos nos setores sociais, no
caso, na educação superior, e passa a exigir desse setor a mesma racionalidade
própria à atividade econômica como planejamento, otimização dos processos
gerenciais, metas concretas, racionalização dos gastos, relação custo e benefício,
controle rígido, retorno imediato e visível; então, o sucesso do “empreendimento”
educacional passa a ser a adequação do produto a um mercado cada vez mais
competitivo, em economias em transformação acelerada.
Neste sentido como fica a formação do professor, sem a curiosidade e
sem o prazer de descobrir o novo? O professor está envolto em seus afazeres
como um simples tarefeiro que necessita preencher diários, reproduzir ementas;
em algumas instituições não elabora, apenas recebe e aplica as avaliações,
controla e lança freqüências e notas. Sequer pode olhar ao seu redor, uma vez
que está submerso em um momento que a crença dominante é a de que a
necessidade de contínua formação” para uma adaptação ao mercado de
trabalho, ou melhor, ao frenético e mutante mercado de trabalho.
Chama-se a atenção para uma contínua formação” que pretende
atender ao Mercado. Entende-se que a formação como elemento de qualificação
e capacitação apenas se inicia com uma graduação e pretende ser interminável
na medida do desejo de adquirir conhecimento de quem o pratica. Nesse sentido
não há qualquer relação com a “adaptação” ao mercado de trabalho que parece
compreender muito mais um anseio em dominar novas tecnologias. Tais
tecnologias, muitas vazes ignoram a própria palavra do professor, como se o
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“professor da palavra”, “professor de cuspe e giz”, fosse ultrapassado, como se o
seu conhecimento tivesse que estar atrelado ao consumo de novas tecnologias.
Parece que esta é a manutenção do pensamento de Coménio (educador do
século XVII), o qual acreditava que educar seria possível desde que fosse
executado com precisão e exatidão e a tarefa de educar era comparada ao
mecanismo de um relógio. Usando a tecnologia ou o método adequado, não
margem de erros. A tarefa será executada com exatidão.
No texto intitulado “Professores e Inovações”, Maria Eugênia Castanho,
afirma que:
[...] diante de uma universidade que se torna a cada dia mais
operacional, com profundas mudanças em sua estrutura para
torná-la cada vez mais produtiva para a ordem neoliberal, cabe
aos docentes buscar caminhos não-ingênuos para inovações em
sua sala de aula, caminhos estes que se voltem para uma
mudança significativa e articulada com uma perspectiva que vise a
transformação de caráter geral da sociedade (CASTANHO, 2000,
p. 91).
Que caminhos seriam esses? O professor necessita estar em busca
incessante de um saber que venha a suprir as demandas do mercado. Será que
isto é possível? Não haveria uma confusão de coisas, não teria a Educação
que ocupar o seu lugar diante das conquistas devidamente estruturadas e
institucionalizadas do conhecimento?
É voz corrente entre pensadores da educação, como Fernandes
(2002), in: Docência na Universidade, no capítulo “Formação do professor
universitário: tarefa de quem?”, a formulação e o entendimento de que existe uma
necessidade de formação continuada para os professores. Para esta autora, é
necessário responsabilizar as instituições pela formação pedagógica de seus
professores. Para ela, a formação continuada deve estar presente no projeto
institucional que direção aos trabalhos acadêmicos. Fala da importância dos
professores discutirem o projeto pedagógico, o espaço institucional, o
fortalecimento da idéia professor-pesquisador, o respeito à história do professor e
conclui ressaltando a importância da prática cotidiana nas dimensões
epistemológica, pedagógica e política. Valoriza o ensino na perspectiva da
produção do conhecimento
Observando o pensamento desses autores, fica a questão: onde ou
quando está sendo considerada a realidade histórica e psíquica do educador? Por
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isso este é o momento de nós, psicanalistas, lançarmos um olhar para a formação
do professor que privilegie seus desejos, sua existência mental, sua história
pessoal e, sobretudo, sua história como educador. A educação é algo da ordem
do inacabado, mas o educador é da ordem do subjetivo e precisa ser entendido
em sua singularidade e subjetividade. Não é possível repetir as mesmas falas,
todos os anos, como se o professor não tivesse sua história e sua experiência
para contar. A história do educador é, muitas vezes, anulada, há um eterno
recomeçar, uma desqualificação da experiência do professor, como se este
sempre estivesse começando e não tenha nada a dizer de sua experiência.
No dizer de Mrech (2005, p. 29):
A educação é um constante processo de vir a ser. Algo da ordem
do tosco, do incompleto. A psicanálise tornou evidente que nunca
houve nem haverá como se atingir a prática perfeita, a Educação
perfeita, o professor perfeito. O que se tem a cada dia são
professores atuando.
Segundo a autora, o ser humano lida com processos complexos, como
afetividade, valores, desejos, vidas, questionamentos, etc. Aponta os limites
existentes no próprio corpo como barreiras para transformações constantes.
Observa que a educação continuada pode trazer a crença de que é possível o
sujeito transformar-se e aprender continuamente, esquecendo-se de seus limites,
inclusive, corporais. Cabe aqui lembrar que o somente os portadores de
necessidades especiais têm suas limitações físicas, mas todos apresentam algum
tipo de limitação. A autora faz uma alegoria comparando o ser humano e o
computador, chegando a conclusão de que o computador simplesmente repete o
que o ser humano, a partir de sua complexidade, é capaz, não só de repetir, mas,
sobretudo de criar. Aquilo que para Chauí está perdido no momento atual, ou
seja, a capacidade de criar.
Considerando o caminhar da Educação no Brasil, em especial o ensino
superior, nota-se que as abordagens sobre este tema trazem a chancela da
observação do comportamento aparente, manifesto. As decodificações são feitas
a partir do comportamento que os professores apresentam ou deveriam
apresentar. Os Jesuítas com sua formação docente considerada “rígida” traziam a
adaptação do comportamento de seus docentes, a seus padrões morais e
aqueles que virassem os olhos para as “novidades” seriam desligados da
docência. No que isto mudou? O professor hoje não tem uma “formação” também
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rígida, no sentido de ser interminável a busca pela adaptação a novas tecnologias
e ao Mercado, trazendo impregnado a si o valor do sacrifício?
O sacrifício está presente na História da Educação no Brasil e se faz
necessário considerar que o início desta história deu-se com os padres e que
para eles o sacrifício é algo necessário. É cil observar, nos dias atuais, o
sacrifício entre os professores. Para certo grupo de professores ainda é
necessário sacrificar os finais de semanas e feriados estudando, corrigindo
provas e trabalhos de seus alunos. A esses professores, o regime de trabalho
vinculado apenas às horas de atividades em sala de aula, às demais atividade
(como reuniões, estudos, etc), espera-se que o professor o faça em título de
colaboração, o que significa sem ser remunerada e para tanto fora do horário de
trabalho previamente combinado (o sentido da caridade). A esses professores a
tarefa de adaptar-se, constantemente, ao mercado de trabalho, que muda na
velocidade da luz, deixando a impressão de que os professores estão sempre
desqualificados e com a visão de mercado pode ou deve ser substituído por algo,
no caso alguém, mais atual, mais moderno. Ao professor a desconsideração por
sua história, sua experiência. Sua experiência torna-se invisível e como tal
desqualificada. Nestas bases somente um vocacionado, um missionário pode
levar a bom termo a educação.
A atual formação do professor propõe uma adaptação à realidade
social, mesmo que para atingir tal adaptação, seja necessária a repressão da vida
pulsional do professor. Parece que se está diante de uma proposta de adoecer
mental.
As mudanças sociais têm acontecido de forma tão drástica e rápida e a
isto se soma a velocidade das informações computadorizadas, não sendo
possível, portanto, prever com acerto qual o profissional que o futuro mercado de
trabalho irá necessitar.
A educação, em particular, a do ensino superior, deveria ser pautada
na relação aluno/professor, ao invés de simplesmente pretender acomodá-los
àquilo que já está posto. Parece que isso tem sido possível nos programas de
Pós-Graduação Strictu sensu.
Pode aqui, simplesmente, apontar que, se para Piaget a adaptação é
essencial à educação, para Mannoni (1977) a adaptação é sinal de doença, pois
deixa exposto o confronto entre realidade e reivindicação pulsional. Para Mannoni
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(1977) o erro da educação está no fato dela estar voltada para as necessidades
da sociedade e não do indivíduo.
As universidades que pretendem que seus cursos acompanhem a
evolução do mercado de trabalho, estão caindo neste equívoco, pois tentam a
adaptação do conhecimento ao mercado, “[...] nosso mundo está em mudança tão
rápida que é inútil a universidade pretender adotar seu ritmo, imitá-lo, em suma,
replicá-lo” (RIBEIRO, 2001, p.15 apud MRECH, 2005).
A desqualificação ou desprestígio da função de professor pode ser
compreendido por meio da observação da exploração de sua mão de obra, da
exigência de constantes aperfeiçoamentos e da desconsideração de sua história.
Aqui começaria a se delinear a terceira questão, já exposta, a da
“desqualificação” do professor.
Para Maria Cecília Souza, a questão crítica das escolas no Brasil, tem
início nos anos 80 com a difusão das idéias crítico-reprodutivistas de Pierre
Bourdieu e Jean Claude Passeron em que afirmam que: “a escola tem o papel de
legitimar a desigualdade social, através da reprodução da desigualdade” (SOUZA,
1998, p. 12). Conforme esta historiadora, a difusão dessas idéias crítico-
reprodutivistas, revela que haveria uma aparente naturalidade e uma pretensa
neutralidade nos dispositivos de seleção e de avaliação escolares.
A conseqüência destas idéias seria a da escola se sentir no direito de
conferir aos alunos, ou o pleno direito de ascender às instâncias do poder ou o de
freqüentar apenas os cursos técnicos ou de escolarização curta. Isto perpetuaria
o fracasso escolar mantendo a divisão social entre trabalho manual e trabalho
intelectual.
Para os professores universitários, esse é um dado de cil
observação. É muito comum perceber os alunos chegarem às faculdades com a
ilusão de terem passado por um processo seletivo que realmente tenha cumprido
seu papel, qual seja, o de selecionar o aluno mais bem capacitado para aquele
curso. O que se encontra é a constatação de que o processo seletivo apenas
eliminou os impossíveis”, aqueles que talvez o tenham conseguido sequer
escrever uma redação de forma compreensível. Via de regra, o aluno de baixa
renda, ou aquele que de uma forma ou de outra tenha tido uma escolarização
inicial de má qualidade, provavelmente terá o ingresso em uma faculdade,
também de má qualidade, ou será “selecionado”, mas provavelmente não
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conseguirá acompanhar o curso. É neste sentido que se observa algumas
faculdades apresentando os chamados “reforços” para alunos iniciantes que o
conseguem superar as mazelas da formação inicial. Acompanhando isto, segue o
pior, que é a convicção de que o diploma universitário i lhe conferir um lugar de
destaque no Mercado de trabalho. Essa constatação, dada a experiência, desta
autora, fica mais gritante nos cursos noturnos. Estes dados ficam evidentes com a
determinação das “cotas”. Ao invés de se melhorar o ensino básico e
fundamental, tenta-se empurrar o aluno, a todo custo para um ensino superior que
na prática lhe confere um diploma sem significado social. Fica assim mantida a
desigualdade.
Ainda conforme Souza (1998, p. 12), esta
[...] tese favoreceu um discurso ativista que tornou a escola um
lugar de faz-de-conta - criou mecanismos pedagógicos de “fingir
competências” e de destruir antigas competências, justificou a
criação de formas de o ensino blico driblar a avaliação, de
manter sob permanente suspeita o juízo dos professores, instigou-
os a fornecer certificados e diplomas de qualquer forma,
esvaziando seu valor social e simbólico.
A autora conclui afirmando que a crítica reiterada à instituição escolar
favoreceu a busca de novos modelos que negassem plenamente o anterior e,
portanto as “[...] reformas educativas passaram a ter como meta zerar as antigas
reformas e mais do que isso, anular a experiência docente” (SOUZA, 1998, p. 13).
Essas constatações vêm de encontro às questões já expostas. Mesmo
que Souza (1998) não tenha falado especificamente sobre o ensino superior, suas
observações são pertinentes, uma vez que trata-se do processo educacional em
que o terceiro grau é uma das pontas.
Ao encerar este capítulo, tem-se a impressão de ter sido apontado os
principais elementos que possam constituir a trama para o atual desfecho do
ensino superior no Brasil. A formação continuada”, do professor do ensino
superior se justifica apenas como um processo de qualificação a partir de seu
próprio desejo em buscar o conhecimento como fonte indispensável para sua
sobrevivência intelectual. A “Formação continuada” como exigência meramente
pedagógica e administrativa visando a adaptação ao Mercado de trabalho, fica,
apenas, com o mérito da conquista de novas tecnologias e isto poderia vir a
minimizar ou até mesmo, eliminar a necessidade da relação professor/aluno.
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Entrelaçado a este dado está a “desqualificação” do professor, que é uma
questão ambígua, como se apontou. Por ser essa “desqualificação” composta
de vários elementos, tratar-se-ão de seus aspectos psicológicos no próximo
capítulo.
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CAPÍTULO 3
FORMAÇÃO DE PROFESSOR: CONSIDERAÇÕES
PSICANALÍTICAS
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Esta parte do trabalho se dedicada a um breve entendimento do que
a psicanálise chama de transferência, contratransferência e, também das
resistências. Deter-se-á, também, na questão da significação do ensinar, do
feminino e do infantil, conforme elucidado por Neder Bacha. O entendimento
destes conceitos torna-se fundamental para este trabalho, considerando as
relações professor/aluno e todo o mais que circunda a vida psíquica de um
professor.
3.1 Conceitos fundamentais: considerações sobre transferência, contratransferência
e resistências
Freud inicia seu entendimento sobre o processo transferencial quando
publica em 1895 Estudos sobre a Histeria”. Desde então, o processo
transferencial é largamente estudado pelos psicanalistas, enquanto fenômeno da
clínica e mais especificamente na análise individual.
Em Estudos sobre a histeria (1895), realizados por Breuer e Freud, a
diferença essencial entre as idéias dos dois foi o fato de que aquilo que para
Breuer foi uma infelicidade, ou seja, pensar que sua paciente, Ana O. esperava
que o desejo amoroso dela fosse por ele satisfeito, tornou-se para Freud um feliz
contratempo, ou seja, a oportunidade para que descobrisse a transferência. E
com a transferência: a descoberta de que no presente sempre há, ao mesmo
tempo, componentes de passado, de substituição, de adiamento, de diferença.
Freud (1893 - 1895) afirma que a transferência ocorre por meio de uma
“falsa ligação”, o que ele acenava era o fato de a transferência ter a característica
de substituir uma figura anterior pela figura atual, no caso seria a do analista.
em 1901-1905 em “Fragmentos da análise de um caso de histeria”, Freud,
continua afirmando que as transferências são novas edições das fantasias e
impulsos que são criados e que se tornam conscientes durante o processo de
análise. É fundamental observar que transferência é a renovação de uma rie de
experiências psicológicas, aplicada à pessoa do presente.
No “Pós-escrito do caso Dora” de 1905, Freud consolida a
transferência como uma questão da técnica psicanalítica. Em 1912, em Dinâmica
da transferência o autor, afirma ser a transferência uma poderosa forma de
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resistência ao tratamento e que ao mesmo tempo é encarada como um veículo de
cura e capaz de atingir o sucesso de um tratamento. Ainda em 1912, no trabalho
“Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise”, pela primeira vez
Freud deixa clara a necessidade do anonimato do analista fazendo a famosa
comparação do “espelho”. Em 1913b em “Sobre o início do tratamento” Freud
alerta que a transferência deve ficar intocável enquanto não houver início razoável
de resistência para ser trabalhada. Em 1914, em “Recordar, repetir e elaborar”,
Freud fala sobre a neurose de transferência que surge no processo de análise.
Em “Sobre o amor transferencial de 1915, Freud esclarece sobre a necessidade
da regra de abstinência. Mostra, também, que na análise surge o “enamoramento”
do paciente pelo analista e que este enamoramento é igual a qualquer outro caso
de “namoro”. Freud esclarece que os motivos desse enamoramentro estão a
serviço das resistências ao tratamento. Deixa claro que em hipótese alguma esse
“amor” pode ser retribuído pelo analista, devendo ser interpretado. Em
“Conferências introdutórias sobre psicanálise” de 1916/17, Freud fala das
neuroses de transferência como o oposto das neuroses narcísicas e debate sobre
a questão dos problemas transferenciais nas psicoses. Em 1920, em “Além do
princípio do prazer”, surge uma mudança importante quanto à natureza da
transferência. Pela primeira vez as reações transferenciais foram vistas como
manifestações tanto do instinto libidinal como do instinto de morte. Em Inibição,
Sintoma e Ansiedade (1926), Freud esclarece que a repetição do passado o é
a atualização das relações vividas, mas o que é transferido é a realidade psíquica,
o desejo e as fantasias conexas, portanto as manifestações transferidas são os
equivalentes simbólicos. Em 1937 em “Análise terminável e interminável”, Freud
salientou o problema da transferência negativa prolongada e da atuação,
atribuídas à compulsão à repetição, como uma manifestação do instinto de morte.
Essas foram as colaborações centrais de Freud sobre o processo de
transferência.
Laplanche e Pontalis (2000) observam que a transferência pode ser
tratada como um caso particular de deslocamento de um objeto a outro, de uma
representação para outra e, ainda, segundo eles, Freud descobre que é na
transferência que a relação do sujeito com as figuras parentais é revivida.
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64
Para esses autores, Freud distingue dois tipos de transferência, uma
positiva e uma negativa, uma de sentimentos ternos e outra de sentimentos
hostis.
Greenson (1981), afirma que a transferência positiva é quando o
paciente sente pelo analista qualquer coisa como: amor, apego, confiança,
dedicação, admiração, paixão, desejo, ternura ou respeito. a transferência
negativa se baseia no ódio ou em qualquer de suas modalidades, ou derivativos.
Pode ser expressa como: ira, hostilidade, desconfiança, desdém, aversão,
censura, ressentimento, amargura, inveja, desprezo e aborrecimento.
Conforme Lourenço (2005), o sentimento transferencial encontra-se,
aguardando a oportunidade de dirigir-se à figura que ocupa, na transferência, o
lugar de algum personagem importante na história da pessoa. A autora, afirma
que tudo o que é descoberto no complexo de Édipo coaduna com a teoria sobre a
dinâmica da transferência; isto levaria Freud a ter dito que é na transferência que
o analista é colocado no lugar das imagos primordiais: imagos paternas, fraternas,
maternas. É mediante as relações estabelecidas entre o complexo de Édipo e a
transferência, que são considerados os obstáculos e as vantagens que a
transferência traz para o tratamento.
Todavia, as circunstâncias transferenciais, embora façam parte das
condições de uma análise, não se encerram nelas. Pode-se perceber como este
fenômeno, transferência, está presente, por exemplo, nas relações terapêuticas
(médicas, psicoterápicas), nas relações de grupos, e no ensino, entre o professor
e o aluno. Encontra-se o fenômeno transferencial impregnado em toda a cultura.
Após ter pontuado alguns aspectos, que se considera importantes, da
evolução histórica sobre o conceito de transferência, passar-se-á ao conceito de
contratransferência.
Segundo Laplache e Pontalis (2000, p. 102), contratransferência é o
“conjunto das reações inconscientes do analista à pessoa do analisando e, mais
particularmente, à transferência deste”.
Segundo esses autores, foi depois de Freud que os entendimentos
sobre a contratransferência foi objeto de grande investigação. O próprio Freud
pouco abordou sobre o tema. Em 1912, no trabalho Recomendações aos
médicos que exercem a psicanálise”, Freud aborda timidamente o tema.
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Etchegoyen (1987) revela que foi em 1910 em “Perspectivas futuras da
terapêutica psicanalítica” que Freud apresentou sua primeira constatação sobre a
contratransferência. Para esse psicanalista, pode-se definir a contratransferência
considerando dois aspectos: contratransferência querendo dizer que, assim como
o analisado tem sua transferência, o analista tem também a sua e o outro
aspecto, estabelece um equilíbrio, um contrapeso, que surge ao compreender que
a reação de um não é independente do que vem do outro. O mesmo autor
conclui, ponderando, que a maioria dos psicanalistas pensam como Freud, ou
seja, que os sentimentos e as pulsões da contratransferência surgem no
inconsciente do analista como resultado da transferência do analisado.
Considerando que este trabalho diz respeito a grupo de professores
faz-se necessário situar esses processos no âmbito grupal.
Situando o processo transferencial e contratransferencial no âmbito
grupal, deve-se considerar o que fica explícito nos trabalhos de Freud, ou seja,
que a situação transferencial e, também, a contratransferencial, o é exclusiva
da relação terapêutica, está presente em maior ou menor grau em cada ocasião
em que um indivíduo encontra com outro.
No chamado campo grupal existem múltiplas transferências e estas
adquirem uma complexidade maior do que no nível individual, à medida que
emergem tanto em relação aos integrantes do grupo (de cada um para com seus
pares, de cada um em relação à figura do coordenador, de cada um para com o
grupo como um todo, do todo grupal em relação ao coordenador), como em
relação ao contexto em que o grupo se desenvolve.
Zimerman e Osório (1997) afirmam que, no campo grupal, existe
transferência em tudo, mas nem tudo é transferência a ser trabalhada. Além
disso, uma importante diferença de manejo, em função do foco de trabalho
com o grupo. Na grupoterapia analítica, por exemplo, os processos transferenciais
são fundamentais ao trabalho analítico, enquanto num grupo onde o foco não é o
terapêutico, se devem trabalhar as manifestações transferenciais se estas
estiverem dificultando o andamento da tarefa.
Terzis (1999) mostra que a transferência é um importante ponto de
apoio na grupoterapia, assim como na análise individual. Afirma o autor: A
diferença consiste em que na análise individual o fenômeno se atualiza na pessoa
do analista, enquanto na grupoterapia, pode se dar sobre qualquer membro do
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grupo (TERZIS, 1999, p. 99). O referido autor esclarece que foi Ângelo Bejarano,
psicanalista seguidor da teoria de Melanie Klein, que ressaltou sobre a cisão da
transferência quando se trabalha em situação de seminário, em que os
integrantes trabalham alternadamente em pequenos grupos e em reuniões
plenárias. A transferência positiva se concentra sobre o pequeno grupo e a
transferência negativa sobre o grande grupo. Térzis (1999) considera, ainda, que
além da natureza da transferência ser diferente, é possível destacar as diferenças
quanto ao objeto da transferência. Observa que, no pequeno grupo, a
transferência central se destina ao coordenador do grupo. As transferências entre
os membros do grupo são chamadas de laterais e tendem a ser muito ativas.
Ressalta o autor que existe um terceiro tipo de transferência, que é aquela dos
integrantes do grupo para o próprio grupo enquanto entidade própria. Térzis
(1999) pontua a necessidade de se observar os objetos transferenciais na
grupoterapia. Para ele esses objetos são:
1) Objetos interiores ao grupo:
Ÿ “o grupoterapeuta: ‘transferência parental (de cada sujeito em
relação à figura central do grupoterapeuta);
Ÿ o grupo enquanto tal:‘transferência grupal (do grupo como totalidade
em relação à figura central);
Ÿ os outros participantes:’transferência fraternal’ (de cada sujeito em
relação com outros determinados sujeitos” (TERZIS, 1999, p.101)
2) Objeto exterior:
“o mundo exterior: ‘extratransferência’ (a transferência se efetua
através das experiências exteriores)” (TERZIS, 1999, p.101)
Da mesma forma como ocorre a transferência, também ocorre a
contra-transferência no processo grupal, ou seja, os sentimentos do analista ou
coordenador, em relação a cada um dos integrantes do grupo, em relação a
totalidade do grupo, os sentimentos que os participantes do grupo desenvolvem e
agem, em relação a cada um de seus pares, o sentimento de cada pessoa em
relação ao que o grupo, como uma totalidade abstrata, lhe desperta.
Zimerman e Osório (1997) mostram que a contratransferência, vivida
no processo grupal, destaca os sentimentos que são mobilizados. Mostram que
esses sentimentos são em relação a cada membro do grupo isoladamente, em
relação a um membro em particular, em relação ao grupo como um todo e
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finalmente de cada integrante do grupo ao que o grupo, como elemento abstrato,
representa.
Térzis (1999) aponta alguns tipos de contratransferência:
a) fantasias que ocorrem ao terapeuta, antes da sessão, sobre algum
elemento do grupo;
b) idéias ou temores sobre a evolução do grupo que o levem a
questionar sua capacidade profissional;
c) sentimentos negativos em relação a algum membro do grupo,
sobretudo àquele que se coloca na posição de vítima;
d) ocorrência de atos falhos;
e) sentimentos de hostilidade para os integrantes que formam conluios;
f) atrasos ou expressões que demonstrem desejo de que a sessão
termine o mais depressa possível.
O autor conclui afirmando sobre a importância da atitude emocional do
analista para com seu paciente e a necessidade desse em trabalhar seus
sentimentos para que não se tornem um elemento perturbador no tratamento.
O conceito de transferência traz impregnado o de contratransferência e
como ambos fazem parte da técnica psicanalítica, para melhor entendê-los, faz-se
necessário a conceituação do processo de resistência.
Em relação às resistências, Freud (1893) empregou o termo pela
primeira vez, ao se referir a Elisabeth Von R., com a palavra original widerstand”,
sendo que em alemão wider” significa contra”, como uma oposição ativa. Até
então a resistência era considerada exclusivamente como um obstáculo à análise,
correspondendo sua força à quantidade de energia com que as idéias tinham sido
reprimidas e expulsas de suas associações.
Durante um longo período, a expressão “resistência” foi empregada,
apenas com uma conotação de juízo pejorativo. A própria terminologia utilizada
para caracterizá-la, em épocas passadas era impregnada de expressões típicas
de ações militares, como se o trabalho analítico fosse uma beligerância do
paciente contra o analista e vice-versa.
Freud (1900), quando escreve a Interpretação dos Sonhos, mostra que
os conceitos de resistência e de censura estão intimamente relacionados: a
“censura” é para os sonhos aquilo que a “resistência” é para a associação livre.
Nesse trabalho, em suas considerações sobre o esquecimento dos sonhos, Freud
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deixou postulado que uma das regras da psicanálise é que tudo o que interrompe
o progresso do trabalho psicanalítico é uma resistência.
Lentamente, Freud foi entendendo que o reprimido mais do que um
corpo estranho era algo como um “infiltrado”. Assim, ele começa a deixar claro
que a resistência não era dirigida somente à recordação das lembranças
penosas, mas também contra a percepção de impulsos inaceitáveis, de natureza
sexual, que surgem distorcidos. Com isso, Freud conclui que o fenômeno
resistencial não era algo que surgia de tempos em tempos na análise, mas sim
que ele está permanentemente presente.
Assim, a resistência é conceituada como a resultante de forças dentro
do paciente, que se opõem ao analista, ou aos processos e procedimentos à
análise, isto é, que obstaculizam as funções de recordar, associar, elaborar, bem
como o desejo de mudar.
Para Laplache e Pontalis (2000, p. 458), resistência é: “tudo o que nos
atos e palavras do analisando, durante o tratamento psicanalítico, se opõe ao
acesso deste ao seu inconsciente”.
Para Greenson (1981), as resistências se opõem à eficácia dos
procedimentos analíticos e defendem o status quo do paciente. Para ele, as
resistências defendem a neurose e se opõem ao ego racional do paciente e à
situação analítica.
Para este psicanalista, é possível, por meio de exemplos clínicos,
constatar alguns exemplos de resistências consideradas as mais típicas, simples
e óbvias. São elas:
1) paciente silencioso - em geral significa que a pessoa não está
disposto a transmitir seus pensamentos ou emoções;
2) paciente “não está com vontade de falar” - é uma variação da
situação anterior; Aqui o paciente não está silencioso, mas não está com vontade
de falar.
3) afetos indicando resistência - geralmente tem-se a impressão de
que o paciente está alheio e desligado do que ele está relatando, o paciente
comunica verbalmente, mas existe uma ausência de afeto;
4) postura - aqui se pode observar desde uma postura de contração,
postura inalterada ou movimentos exagerados. A discrepância entre a postura e o
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conteúdo verbal, também é sinal de resistência. Deve-se destacar que os bocejos,
são sinais de resistência.
5) fixação no tempo - manter-se preso à um determinado período de
tempo é notado como resistência. Falar apenas do passado sem entremear com
qualquer coisa do presente, por exemplo;
6) falar de trivialidades ou apenas acontecimentos externos - quando
fala-se por muito tempo de assuntos banais ou assuntos importantes (política, por
exemplo) percebe-se que subjetivamente há a evitação de algum outro assunto;
7) assuntos evitados - isto pode ser feito consciente ou inconscientemente.
Em geral evita-se falar de assuntos que são considerados dolorosos;
8) rigidez - devem ser consideradas resistências as rotinas periódicas
levadas a cabo pelo paciente sem mudança nas sessões;
9) maneira de falar dos que evitam - aqui percebe-se o uso dos
chavões, de termos técnicos ou conversa vazia. Indica, geralmente, uma fuga. Os
chavões isolam as emoções e afastam o envolvimento emocional;
10) atraso ou não comparecer - indicam uma relutância para vir às
sessões, que pode estar consciente ou inconsciente, em última análise, o
paciente está tentando evitar algum tema que é percebido como incômodo;
11) paciente entediado - o tédio demonstra que o paciente está
evitando conscientizar-se de seus anseios instintuais e de suas fantasias. Isto
quer dizer que o paciente deu um jeito de bloquear a percepção consciente de
seus impulsos e, para substituí-lo, está com a tensão vazia característica do tédio;
12) paciente tem um segredo - é uma forma especial de resistência e
deve ser respeitado, contudo o segredo consciente é a declaração de que algo
está sendo evitado;
13) atuação - é uma repetição através da ação e não através de
palavras, recordações e emoções. A atuação deve ser mostrada como resistência
e seus motivos devem ser investigados. Um exemplo é o falar (ação) sobre o
material da sessão fora deste contexto, com outras pessoas, isto é uma forma de
fuga, em que o paciente desloca a transferência para outra pessoa com o intuito
de evitar ou diluir algum aspecto de seus sentimentos transferenciais;
14) alegria constante - sessões freqüentemente muito alegres
demonstram que alguma coisa está sendo bloqueada, geralmente algo
completamente adverso, podendo ser algum tipo de depressão;
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15) paciente não muda - se isto persiste por muito tempo, deve-se
procurar algum tipo de resistência mais sutil e escondida;
16) resistências silenciosas - são resistências mais difíceis de serem
percebidas e que em geral são percebidas quando o analista pode distanciar-
se do processo. Geralmente há um componente contratansferencial que impede a
percepção de tais resistências. Deve-se destacar o ato de fumar durante a
sessão. Este fato assemelha-se a outras ações que substituem o ato de
transformar em palavras os sentimentos ou anseios.
As resistências podem ser observadas tanto na análise individual,
quanto em qualquer tipo de formação de grupo, considerando que as resistências
aparecem em qualquer tipo de relação humana.
Foi somente a partir da concepção do inconsciente como elemento
fundamental na organização e funcionamento da dinâmica mental, que se tornou
incontestável a importância do entendimento da transferência e, também, das
resistências em todos os tipos de relacionamentos.
Crê-se que, com esta breve explanação, pode-se discutir a questão da
transferência, contratransferência e resistência na Educação. É sabido por todos
nós que o tema transferência e educação tem sido motivo de vários trabalhos, e,
neste sentido, propor-se-á um novo olhar para a questão, no qual o enfoque será
o grupo de professores do terceiro grau.
3.2 Formação do professor: considerações psicanalíticas
Ao pensar que a arte de ensinar se na transferência, pode-se
observar a relação aluno/professor como carregada de aspectos transferenciais e
que, na verdade, o aluno transfere para a figura do professor as lembranças das
vivências com as figuras parentais. Estas figuras parentais ou primitivas são as
figuras que imprimem significado em nossa vida psíquica e de forma simbólica
serão deslocadas, no presente, para a figura de suposto saber, concedido ao
professor em sala de aula. Neste ponto, é importante lembrar que, também,
ocorre a contratransferência, do professor para o(s) aluno(s).
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Afirma Pichón-Riviére (1986) que a transferência e contratansferência
ocorre em todos os tipos de interações. Entende, este autor, que por ser um
processo de interação, implica em aprendizagem da realidade.
Entende-se que a relação professor/aluno por ser carregada de
aspectos transferenciais e resistenciais e por definir-se como interação entre as
partes, destina-se, essa relação, mesmo que não queiram seus componentes, a
ser um agente de aprendizagem. As relações estabelecidas em sala de aula
partem de idéias conscientes e inconscientes. Os sentimentos experimentados
são, também, produto do vínculo transferencial, havendo, portanto, uma gama
bastante elevada de sentimentos destinados ao professor como representante de
uma figura parental. O entrelaçamento desses sentimentos pode ser facilitadores
ou não dessa aprendizagem. Por parte do professor, facilitador ou não da
condição de promover a aprendizagem.
Nesse sentido, pode-se notar que assim como o analista, citado por
Freud, os professores, também, ocupam um lugar na representação psíquica do
aluno e esse lugar está ligado às imagens ou figuras parentais desse aluno. O
professor é, portanto, temporariamente, o fiel depositário dos sentimentos dos
alunos. É para o professor, assim como para o analista, que o aluno entrega seus
sentimentos e espera, deseja que sejam retribuídos.
O professor, no momento em que ocupa um lugar na sala de aula,
serve para os alunos como objeto identificatório na ordem do fazer e como
espelho, no qual os alunos se espelham, este é o pensamento de Terzis (1996).
Este autor nos revela que o professor participa da construção da identidade do
aluno. Este fato é possível a partir de uma rede de vínculos que o aluno vai
introjetando e a experiência de uma relação vinculada na execução do fazer e do
pensar. O professor pode ser o agente que transforma a transferência de uma
“poderosa resistência contra”, no caso contra a aprendizagem, no vínculo que
pode facilitar a conquista da sabedoria e o sucesso decorrente desta aquisição.
Neste ponto vale a pena citar Bacha (2002), quando mostra que é
comum os professores ao falarem de suas experiências recorrerem a figuras de
linguagem retiradas de atividades bélicas (luta, combate, disciplina, rebeldia,
arma, etc ) e que em seguida recorrem às metáforas referentes à alimentação
(oferecer, suprir, alimentar, crescer, etc ). Parece que se está tangenciando uma
questão muito importante, qual seja, a representação relativa àquela que
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alimenta. Desse modo, aproxima-se à figura feminina. Cabe aqui ressaltar que
não se está falando simplesmente da questão de gênero-mulher-professora, mas
de uma questão mais ampla: o feminino.
Para Bacha (2002), o feminino como inscrito no inconsciente revela
que o ofício de educar e a identidade do professor estão ligados à figura materna,
tanto para homens quanto para mulheres. Independente do sexo do educador é
importante notar que o educar está ligado inconscientemente à figura materna.
Ainda para esta psicanalista, a teoria de sedução originária de
Laplanche elucida a questão da alteridade ao afirmar que a pulsão o é biogica
e sim implantada pelo outro, no caso o outro adulto como seu “objeto-fonte”. O
bebê ao nascer expressa sua necessidade de sobrevivência, expressa sua
necessidade de comer, portanto a necessidade do leite que poderá vir via seio ou
mamadeira, o que importa é que junto a este alimento/leite vi a sexualidade
inconsciente de quem o alimenta. o desviar da criança do seu destino
biológico e é-lhe implantada a sexualidade inconsciente. A autora deixa clara a
importância de se perceber que sexualidade diz respeito às pulsões parciais e
não a genitalidade.
Mezan (2003/2004) ao resenhar o livro de Neder Bacha (2002): “A arte
de formar: o feminino, o infantil e o epistemológico”, refere-se as fantasias bélicas
e nutricionais associadas à idéia e à imagem do feminino/aquisição do
conhecimento afirmando que:
Estas significações o repetitivamente negativas, tanto na
tradição grega quanto na que provém dos Padres da Igreja, e,
curiosamente, isso se reflete na forma como é imaginada a
aquisição do conhecimento. Na bíblia, o fruto da árvore do bem e
do mal é comido por Eva, que se torna assim a causa da expulsão
do Paraíso e de todo o sofrimento que acompanha a condição
humana. Na mitologia grega, para punir os homens por terem
recebido de Prometeu o fogo e com ele o conhecimento de como
dominá-lo, ou seja, as bases da civilização, Zeus envia à casa do
pai de Pandora a famosa caixa, que uma vez aberta pela jovem
deixa escapar todos os males que nos atormentam. A aquisição
do saber é portanto assimilada a uma transgressão, que, como
toda transgressão, gera culpa e ansiedade: e neste crime
originário o papel da mulher é sempre nefasto (BACHA, 2002
apud MEZAN, 2003/2004, p. 2 ).
Aqui fica fácil notar que a idéia da aquisição do conhecimento pareada
à figura feminina é percebida, em nossa cultura, como algo da ordem do mal. São
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as mulheres que seduzem, no sentido pejorativo, são as mulheres que perturbam
a concentração masculina, são as mulheres que induzem ao pecado, enfim são
as mulheres nefastas.
No afã de compreender a relação entre o feminino e a aquisição do
conhecimento Bacha (2005, p. 120) faz uma bela apreciação de Édipo revelando
a luta entre o arcaico pulsional e o intelectual. “[...] Sua lenda celebra a soberania
da potência do intelecto que a salva de ser devorado pelo monstro enigmático e
pulsional”. Esse monstro estaria próximo à figura materna, feminina, o que leva a
conclusão de que o conhecimento é um triunfar sobre o feminino. Para ela, a
educação traduziria o enfrentamento entre o intelectual e o sensível-sensual. Está
ligada essencialmente ao feminino e este está atrelado a idéias como as de
Rousseau que infantilizam a mulher e a de que ela está presa a seu sexo. “A
definição de histeria pode, reduzir-se a algumas palavras: doença das mulheres
sem homem. O amor é um movimento da alma que a mulher, desprovida de
razão e de força, não pode dominar (SALVADORE, 1994, p. 421-437 apud
BACHA, 1998).
Estando a mulher, o feminino preso a suposta inferioridade de seu
sexo, como o feminino pode transpor essa barreira? Como a educação pode ser
possível?
No capítulo “Infantil, Feminino, Idealizado”, Bacha (1998, p. 180) fala
sobre a relação entre educação e os papéis feminino e infantil. Segundo esta
psicanalista “[...] a marca das mulheres é a passividade diante de seus desejos e
de seu sexo. Daí sua inferioridade ‘natural’”. Coloca em debate os conceitos
postos sobre o feminino e como as chamadas “idealizações” tomam conta desses
conceitos, situando a mulher nos extremos entre anjos e diabos, vida e morte.
uma ambigüidade conferida ao feminino. É possível notar, também, que o infantil
como uma representação mantida inconscientemente, é conferida apenas às
mulheres, como se os homens não mais a tivessem. Neste contexto, também, as
crianças são vistas como dependentes da autonomia do adulto por ser superior e,
portanto poder impor-se. A educação surge então, como fruto da imposição, da
repressão da vida pulsional, visando sua adaptação à realidade social, esta é a
concepção de educação como adaptação. A adaptação sendo, portanto, a
conseqüência da repressão.
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74
Novamente está-se diante da educação e do feminino. Ao pensar na
questão da “desqualificação dos professores e mais precisamente no aspecto
sócio-econômico, a constatação do número de mulheres na educação faz-se crer
que, na atualidade, o desprestígio profissional está de mãos dadas à condição
feminina-mulher.
Em Mato Grosso do Sul, segundo dados do IBGE, censo 2000, item
grupo de base da ocupação principal, existem “profissionais do ensino” com curso
superior, no total de 18.934, sendo destes 13.923 mulheres. no ensino
superior, existem 1.539, sendo 649 mulheres. É fácil notar o número de
professoras principalmente nas séries iniciais da formação escolar. No meio
universitário o número de professoras é em conformidade com o curso. Na
tentativa de compreender o aspecto místico desse tema, Bacha (2002) esclarece
sobre a questão religiosa do pavor ao feminino. A autora observa que na
civilização ocidental, fica explícito que Deus é espírito e homem. O homem foi
feito a imagem e semelhança de Deus e foi animado pelo “sopro divino”, enquanto
a mulher é feita de sua costela, portanto ela é essencialmente matéria, e ele
apenas acidentalmente matéria. Sendo matéria igual a corpo e corpo igual às
necessidades físicas, Santo Agostinho elenca tais necessidades, como
concupiscências. A conclusão é a de que a mulher é o vaso do pecado”, o
próprio pecado em forma de gente. Daí advém o pavor ao feminino.
Contemplando alguns aspectos da história da cultura, fica revelado quanto é
angustiante a significão que existe no inconsciente do professor. Tal significão diz
respeito às fantasias da maternidade, do feminino.
Diante da constatação deste dado e o pareamento dos fatos, surge a
questão: o que fazer em relação a esse pavor ao feminino? A psicanálise e deve-
se entender como a psicanálise aplicada à educação com sua compreensão
sobre o inconsciente nos oferta a possibilidade de transformação desses valores
culturais. Para Bacha (2002), aplicar a psicanálise à situação educativa, significa
trabalhar a transferência do professor para com a educação e para com os
alunos, bem como compreender as transferências dos alunos para com o mestre,
procurando evitar a confusão entre as figuras projetadas pelos alunos e a sua
própria pessoa.
Ainda conforme a psicanalista Neder Bacha (1998), a escola prolonga
a infância. Mostra que nesta ótica tanto Mannoni, quanto Millot, concordam que:
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[...] o adulto infantilizaria a criança interditando-lhe o mundo do
trabalho e, com ele, sua ‘autonomia’, tornando-a dependente para
poder dominá-la. Instalado na posição de eu ideal e mais perfeito,
obrigaria a criança a ser sua cópia, cassando-lhes a voz e os
direitos e impondo a sua reclusão num universo infantil (BACHA,
1998, p. 177).
Parece que afetivamente está se aproximando não da questão da
“desqualificação” do professor, mas sim de seu adoecer psíquico.
No tocante ao aspecto do comportamento aparente, Rousseau (1973),
aponta uma equivalência entre o infantil e o feminino que assegura a
infantilização das mulheres alegando que estas sempre serão infantis. Para ele,
apenas os homens são capazes de raciocinar, às mulheres é dada a paixão e a
imaginação. A mulher é negada a capacidade de pensar. Se assim for, então a
educação nos molde em que se encontra, está fadada a infantilização eterna
acompanhada da impossibilidade de criar, apenas repetir como forma de
adaptação a um modelo posto. Considerando apenas o aspecto do
comportamento.
O educador, portanto, deverá sempre estar em processo de
crescimento, nunca se torna adulto e, por conseguinte, apenas repete e não cria.
Seria este o modelo da educação continuada? Parece que a identificação entre
educação e adaptação se faz presente e é fortemente defendida por vários
pensadores.
No capítulo O domínio do conhecimento” Bacha (1998) aborda a
questão de as escolas estarem lidando com um lado “intelectual” como que
separado do afetivo-sexual, como se não houvesse tal ligação. Neste sentido
seria a proposta de Rousseau da chamada “criança pura”. Para essa autora,
Rousseau estaria falando da dessexualização dos conhecimentos. Lembrando,
mais uma vez, que sexualidade diz respeito às pulsões parciais.
Fica uma questão: como é possível separar o aprender do afetivo-
sexual? O aprender não necessita caminhar com o prazer? As dificuldades de
aprendizagem não estariam ligadas a esterilidade do aprender? E o professor
como figura que deve dissociar o afetivo-sexual do intelectual como iria “fecundar”
com o saber?
Afirma a psicanalista:
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A atividade intelectual sublimada caminha junto com o afeto e é
uma fonte pulsional. A separação de pensamento, afetos e
pulsões sexuais corresponde não ao pensamento, mas à sua
inibição promovida pela idealização e que resulta numa atividade
intelectual empobrecida (BACHA, 1998, p.189).
De posse desses argumentos torna-se possível a observação de que
as escolas - e aqui se inclui as universidades - acabam por contribuírem com a
inibição do pensamento e trazem como conseqüência as dificuldades no aprender
e no ensinar. Tal inibição é fruto da transformação do conhecimento em
instrumento de domínio e para tanto o aluno e o professor devem abandonar não
suas histórias como os seus afetos. Neste ponto, vale a pena ressaltar que
para Neder Bacha (2002), a Educação deve ser entendida como uma arte, um
ofício, um artesanato. Para ela, cabe à Educação o despertar, o acordar as
paixões e sensibilidades no educando.
Freud (1932) esclarece que a psicanálise não se ocupa da educação,
mas a inspira na formação de pessoas e não de simples rebeldes,
A educação psicanalítica estará assumindo uma responsabilidade
para a qual o foi convidada, se ela tencionar transformar seus
discípulos em rebeldes. [...] A psicanálise já encerra em si mesma
fatores revolucionários suficientes para garantir que todo aquele
que nela se educar jamais tomará em sua vida posterior o partido
da reação e da repressão. Penso até mesmo que as crianças
revolucionárias não são desejáveis, sob nenhum ponto de vista
(FREUD, 1932 p. 184-185).
Destaca-se, aqui, que Freud afirmou existir três atividades impossíveis”:
psicanalisar, governar e educar. Para Mezan (2002, p. 427):
[...] a ‘impossibilidade diz respeito ao fato de os seres humanos
serem dotados de liberdade e iniciativa, razão pela qual jamais se
submeterão por completo à autoridade e sempre se sairão com
alguma atitude que o detentor da autoridade não havia previsto.
Portanto, não é possível educar alguém, completamente, torná-lo um
mero repetidor do mestre, a menos que isto seja feito às custas de pressões que,
em última análise, adoecem e fazem adoecer. A Educação, necessariamente,
passa pela realidade psíquica de cada um e conseqüentemente desvela a
realidade cultural na qual se está inserido.
Para que a Educação o incorra em grandes equívocos, com a
pretensão de simplesmente adaptar ou conformar o aluno ao meio social, faz-se
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necessário considerar que a realidade psíquica do professor está presente
durante a transmissão do conhecimento. Assim como a mãe implanta sua
sexualidade inconsciente no bebê, o professor também irá implantar sua paixão e
sensibilidade em seu aluno. Aqui fica a idéia de Neder Bacha, de que a Educação
é uma arte de se implantar a paixão (pelo conhecimento).
Resta-se apenas destacar que a chamada desqualificação” do professor,
no entendimento psicanalítico, passa pela compreensão do feminino e sua
vinculação com o infantil em nossa cultura. Não se pode pretender uma
apreciação da “desqualificação” do professor sem inseri-lo profundamente na
cultura ocidental. Os aspectos sociais e poticos complementam nossa
compreensão desse dado. Desse modo o papel desta psicanalista foi o de buscar
uma compreensão psicanalítica da Educação por meio do “grupo de reflexão”
com professores do terceiro grau, observando o “grupo de reflexão”, investigando
seus acontecimentos significativos e levantando os seus temas recorrentes. Em
momento algum se pretendeu psicologisar a compreensão, e sim pretendeu-se
agregar tais conceitos para uma visão ampla do atual quadro da Educação e dos
aspectos que constituem a formação do professor, em especial o professor do
terceiro grau.
Decidiu-se adotar as idéias de Neder Bacha, uma vez que esta
psicanalista e educadora propõe uma visão inovadora para a Educação via
psicanálise.
Neder Bacha (1998) não questiona os métodos, o como educar, mas
prefere iniciar com a questão sobre o que é educar? Na busca por essa resposta
passa por renomados autores como Piaget, Freud, Manonni, Millot, Lajonquière
até chegar a Laplanche. Essa autora revela que em sua incursão, por entre vários
autores, não encontrou especificamente a “mãe” como sendo aquela que
estabelece o início da vida psíquica. Em alguns momentos, como naquele diante
das teorias de Piaget e Skinner, encontrou o meio ambiente” como se fosse o
objeto indefinido capaz de ser o determinante do início da vida psíquica.
A autora no intuito de proporcionar uma compreensão adequada
denomina de “mães” as características citadas por cada grupo de autores.
Denomina para o primeiro, ou seja, para a teoria Piagetina a “mãe adaptativa”. A
teoria Piagetiana pretende, por excelência, a adaptação do sujeito ao meio social.
Para Neder Bacha (1998, p. 54):
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78
O be piagetiano, ou, o bebê sensório-motor, é um bebê
puramente prático, adaptativo, naturalizado; é a-simbólico e
autônomo em relação ao amor do outro, que assim emerge como
puramente legislador. O interacionismo social de Vigotsky, apesar
de inserir a mediação do outro (“o social”) no círculo da satisfação
das necessidades, também mantém essa mesma marginalidade
em relação à sexualidade do outro.
Deixa claro que para a teoria Piagetiana o essencial é a adaptação
mostrando que para Piaget, funcionalmente, a criança e o adulto são iguais no
sentido de que ambos funcionam se forem empurrados pela necessidade de
“adaptação”, contudo no campo estrutural, diferenças, que são construídas
pela ação do sujeito em interação com o objeto.
Ao analisar as teorias voltadas à psicanálise e à educação de Mannoni,
Millot e Lajonquière, a autora traça a chamada “mãe narcisista”. Ao contrário de
Piaget, Mannoni entende a adaptação como enlouquecedora. De forma muito
ampla e até grosseira, pode-se reduzir o pensamento de Millot no seguinte: “Se a
identificação narcísica é o mecanismo pelo qual se educa alguém, então não se
educa com teoria e sim com o que se é. O processo de identificação, sendo
inconsciente, está longe de poder ser dominado pelo educador (BACHA, 1998,
p.96).
Ainda nesta linha de pensamento, Bacha (1998, p. 93), diz:
Uma educação bem-sucedida o seria se permitisse que o sujeito
superasse a dependência para com as figuras ideais; quer dizer, o
educador permitiria a sua própria diluição como figura ideal. O que
lhe é inteiramente vedado, na medida em que a sua função, ele a
exerce através do narcisismo.
Para a autora:
As Teorizações como de Mannoni e Millot fazem toda a dinâmica
psíquica da educação girar em torno do pólo narcísico do
educador (idealização). Concebem a assimetria adulto/criança
como uma imposição que o adulto faz de um eu-ideal e mais
perfeito, visando apenas estender seus domínios egóicos. E
desprezam o conflito instaurado pela imperfeição de sua divisão
pelo Inconsciente, em relação ao qual, precisamente aquela
idealização poderia estar situada como uma defesa (BACHA,
1998, p.101).
Neder Bacha (1998, p. 116-117) referindo-se as idéias de Lajonquière
afirma:
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79
A sua proposição teórica define a relação do desejo (o saber) com
o conhecimento como sendo uma relação de determinação
daquele sobre estes [...]. [...] Lajonquière o distingue o
conhecimento da ciência, a função do Édipo e da castração é,
para ele propriamente ‘epistemológica’: cabe-lhe instituir o sujeito
da ciência (o sujeito epistêmico), que a partir de então será capaz
de distinguir o ser da aparência, o pai empírico do pai simbólico.
Para Lajonquière o “processo epistêmico” se define “como um ‘assalto’,
verdadeira batalha que o sujeito trava para ‘arrancar do outro o seu
conhecimento” (BACHA, 1998, p. 118).
De acordo com a autora é importante destacar o laço indissociável
entre aprender, brincar e criar. Aponta que a psicanálise vem mostrando que
existe uma denúncia a de que educação e prazer não andam juntos. Para ela, é
necessária a valorização da ilusão e do imaginário e, portanto, traz a idéia da
“mãe sedutora”, baseada na teoria da sedução originária de Laplanche. Esta
teoria revela a questão da alteridade ao afirmar que a pulsão não é biológica e
sim implantada pelo outro, no caso o outro adulto como seu “objeto-fonte”. o
desviar da criança do seu destino biológico, sendo-lhe implantada a sexualidade
inconsciente.
Pelo caminhar na cultura, a autora revela a importância de se perceber
a questão inconsciente do significado do feminino e do infantil, bem como, sua
vinculação ao epistemológico. A seguir, mostra-se como, em nossa cultura, esses
conceitos determinam a educação. A educação passa a ser compreendida
psicanalíticamente pela constatação de seus significados inconscientes em nossa
cultura e assim pode-se propor uma compreensão do educar e do papel do
professor, seja qual for o nível no qual venha a lecionar. No caso, deste estudo
pretende-se a compreensão psicanalítica do professor do ensino de terceiro grau,
contudo se faz necessário a compreensão de todo o processo educacional. A
análise dos “grupos de reflexão” foi norteada, também, por esses entendimentos,
considerando que se acredita na possibilidade dos laços entre psicanálise e
educação serem refeitos com o intuito de resgatar o sujeito na cultura.
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OBJETIVOS
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81
Objetivo geral
Compreender a educação, no ensino superior, a partir das realidades
psíquicas dos professores.
Objetivos específicos
- Levantar os temas recorrentes ou experiências, referentes à
educação, vividas pelos professores e evidenciadas pela discussão livre;
- Investigar os acontecimentos significativos para os professores,
como as angústias, fantasias e defesas apresentadas no aqui e agora.
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CAPÍTULO 4
METODOLOGIA
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83
Quando se pensa em fazer uma pesquisa, não é possível deixar de
lado uma de suas partes fundamentais, que é aquela que vai especificar e
esclarecer os procedimentos que o pesquisador i utilizar para alcançar seus
objetivos. Esta parte é o Método. Lembrando que a palavra Método vem do Grego
Methodos, palavra composta de Meta e Hodós, que significa caminho. O método
significa, então, o caminho a ser utilizado na pesquisa. Deve-se considerar que o
objeto de uma pesquisa é aquilo que se investigado, é a hipótese a ser
verificada.
É necessário, então, definir qual o caminho utilizado na investigação do
objeto escolhido para a pesquisa. Antes, porém, de se fazer uma ressalva
sobre as dificuldades de se escolher esse caminho, ou melhor, as dificuldades em
se apresentar o caminho escolhido e tê-lo como científico. Essa consideração
surge a partir do momento histórico em que se vive e, portanto, da evolução dos
conceitos de ciência e pesquisa. Para se fazer ciência, hoje, considera-se dois
tipos básicos de pesquisa, quais sejam, a pesquisa quantitativa e a pesquisa
qualitativa.
Existe uma grande discussão no que se refere à pesquisa quantitativa
e à qualitativa. Registra-se, aqui, apenas essa questão. Segundo Bauer e Gaskell
(2002) a característica da pesquisa quantitativa é o fato dela lidar com dados
numéricos, usando modelos estatísticos para explicar esses dados. Essa
pesquisa é conhecida como pesquisa hard.
A pesquisa qualitativa, no entanto, é aquela que evita números. Que
fique clara a palavra evita”, ou seja, não proíbe, e que a isto se entenda que,
mesmo na pesquisa qualitativa, a possibilidade de se apresentarem números,
se necessário for. A pesquisa qualitativa lida com a interpretação das realidades.
Essa pesquisa é considerada soft.
Os referidos autores, mostram que não é possível uma quantificação
de dados sem que haja a qualificação dos mesmos. Citam como um singelo
exemplo o fato de que, se alguém quiser saber sobre a distribuição de cores num
jardim de flores, é necessário, pois, que haja a identificação (qualitativa) das
cores. Mostram que não é possível haver uma análise estatística sem que haja a
interpretação dos dados. Entretanto, Bauer e Gaskell (2002), advertem para o fato
de que ainda é possível notar a existência de linha de pensamento que acredita
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que por serem epistemologicamente diferentes, as pesquisas qualitativa e
quantitativa sejam excludentes.
Um modo alternativo de pensamento, segundo esses autores, seria o
proposto na filosofia de Habermas apresentada em 1987 em Conhecimento e
Interesses Humanos, onde pontua que a ciência moderna configurou a forma
instrumental da racionalidade, o mundo sistêmico (razão) e colonizou o mundo
vivido (espaço social). Habermas identifica três interesses constitutivos do
conhecimento que estão na base das ciências “empírico-analítica”, “histórico-
hermenêutica” e “críticas”.
As ciências empírico-analíticas m como fundação o controle técnico.
A chave está no imperativo racional buscando o conhecimento para conseguir o
controle das condições materiais em que vivemos e com isto melhorar a condição
de vida.
Por outro lado, as ciências histórico-hermenêuticas, surgem, segundo
Habermas, por meio de um interesse prático no estabelecimento de consenso. A
compreensão hermenêutica tem como finalidade refazer canais de comunicação,
considerando que a falta de comunicação se constitui num problema social óbvio.
A tese de Habermas, em relação às ciências críticas, é de que os
interesses emancipatórios fornecem o referencial para se avançar além do
conhecimento nomológico e da hermenêutica. A razão, portanto é parte inerente
do interesse de conhecimento e a aplicação desta razão tem que ser um
empreendimento crítico.
É notório, conforme os autores, a existência de uma clivagem entre
quantitativo e qualitativo. Tal clivagem pode ser caracterizada pela separação da
técnica de “controle”, de um lado, e a de “compreensão”, de outro. A razão em si
é inerente a um interesse de conhecimento e a aplicação da razão é
fundamentalmente um empreendimento crítico. Foi no período Iluminista que ficou
registrado o começo do “método científico”, onde a razão foi corporificada no
método.
Para concluir, Bauer e Gaskell (2002), acreditam que mais importante
que o potencial crítico de diferentes metodologias de pesquisa, é a capacidade do
pesquisador em questionar seus próprios pressupostos e as interpretações de
seus dados, bem como o modo como esses pressupostos são recebidos e por
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quem são recebidos. Pensam que esses dados o muito mais importantes do
que a escolha da técnica empregada.
Para eles, a pesquisa qualitativa tem, necessariamente, a finalidade de
lidar com a interpretação de realidades sociais. Esse tipo de abordagem propicia
a reflexão e análise dos dados obtidos, considerando a singularidade e
subjetividade dos sujeitos, desobrigando da investigação numérica.
Sabe-se que o movimento Iluminista, nascido no Renascimento, foi o
gerador dos alicerces da ciência moderna, o que ampliou uma contradição entre
racionalismo e empirismo. Essa contradição deveu-se a correntes filosóficas que
supervalorizavam o raciocínio, desprezando as evidências empíricas, a ponto de
atribuí-las a uma mera ilusão dos sentidos.
As ciências modernas estão impregnadas pelo pensamento
determinista que tem a tendência de negar os componentes subjetivos do
conhecimento. As observações subjetivas são vistas como elemento estranho ao
ambiente científico, como exemplo claro temos as ciências da saúde, marcadas
pela objetividade acompanhada da perfeita previsibilidade da natureza.
Para Pereira (2001), o Positivismo de Augusto Comte, tenta delimitar o
campo de conhecimento ao das “experiências empíricas”, com isto, menospreza
as evidências de base racional ou lógica. Para esse autor, a rivalidade entre
pesquisa qualitativa e quantitativa está no dualismo entre as abordagens racional
e experimental. Para ele, ambas as modalidades de pesquisa podem interessar-
se por qualquer objeto, uma vez que, a identidade da pesquisa será expressa no
campo do método e não do objeto. A pesquisa qualitativa trabalha com
referenciais teóricos menos restritivos e oferece uma maior oportunidade de
manifestação da subjetividade do pesquisador.
Com a necessidade de manter essa subjetividade do pesquisador,
buscou-se o “caminho” ou método na pesquisa qualitativa, em que encontra na
psicanálise uma grande aliada para percorrer esse caminho. Utiliza-se a
psicanálise, portanto, como referencial teórico deste estudo.
Para Hermann (2004), a opção pelo método psicanalítico equivale a
propor uma opção ao modelo usual de pesquisa psicológica, baseada em
estatística, grupos de controle, protocolos, etc. Este autor questiona o positivismo,
em seu sentido mais amplo, alegando que o mesmo não produz muitas
descobertas importantes no campo da investigação da psique. Afirma que as
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descobertas mais importantes, nesse campo, são frutos da pesquisa psicanalítica.
Para ele, não vale a pena buscar exatidão científica fora da psicanálise, quando
se pretende trabalhar com esse referencial teórico.
Compreende-se as afirmações de Hermann, a partir do instante que se
ilumina o objeto de estudo da psicanálise, que é o inconsciente. Não há outra
possibilidade de estudar tal objeto a não ser pelo método psicanalítico. A teoria
comportamental-cognitiva não se ocupa desse objeto de estudo, devendo-se a
isto o fato de ser a psicanálise a detentora do grande número de descobertas
sobre a vida psíquica, obviamente fala-se da possibilidade do acesso ao
inconsciente.
A psicanálise oferece a possibilidade de buscar por trás do consciente
e do imediato, os aspectos inconscientes e as forças psíquicas que os
determinam e envolvem.
Deve-se deixar clara a diferença entre psicanálise e filosofia. A
psicanálise não é apenas uma teoria, mas, também, uma atividade que faz falar o
seu objeto (inconsciente) em condições precisas e devidamente codificadas.
Mezan (2005), ao abordar a questão da pesquisa em psicanálise,
lembra que esta está cada vez mais se inserindo nos programas das
universidades e apresenta como “modo de produção” de conhecimento, não só a
relação dual entre analista e paciente, mas a possibilidade de estudos dos textos
como sendo, também, um objeto de pesquisa. Esse método, segundo Mezan, é
organizado por Laplanche na Universidade de Paris VII. também, a
possibilidade do que se denomina de “psicanálise aplicada” que, em última
instância, traz o anseio de se estudar a constituição da subjetividade individual a
partir de condições gerais. Um psicanalista não pode viver apenas nos limites de
seu consultório, deve procurar contribuir para a compreensão e modificação das
condições sociais e culturais em que vive, (MEZAN, 2002).
Isso significa, para esse fisofo e psicanalista, que o problema
psicanalítico no que se refere ao modo do indivíduo em se constituir e constituir a
realidade, como portador de uma realidade psíquica, a partir de condições que
não são psíquicas, ou seja, o biológico e a interação com as outras pessoas, diz
respeito a questão da subjetividade. Para ele, a subjetividade é instituída
socialmente, assim como a língua, as regras de parentesco, etc. São modos de
aculturação necessários para a transmissão da cultura e perpetuação da
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sociedade. Vive-se sob os domínios das identificações, desde os modelos de
masculino e feminino a costumes, crenças e valores. Esse processo produzido
pela sociedade e encarnado em pessoas ou instituições caracteriza de modo
amplo a “educação”. Do ponto de vista psíquico, está-se diante dos jogos das
pulsões, das fantasias, dos objetos, das angústias e das defesas. Cada indivíduo
necessitará investir psiquicamente em tudo aquilo que a sociedade lhe oferece e
deverá fazer suas escolhas levando em conta seus desejos.
Considerando, portanto, a formação desta autora em psicanálise, como
pesquisadora escolhe-se a pesquisa qualitativa, pois esta permite a presença da
psicanálise como referencial teórico. Busca-se, portanto, a compreensão
psicanalítica para a educação, via entendimento da realidade psíquica dos
sujeitos que compõem a pesquisa.
A pesquisa em psicanálise é complexa e fecunda, deve ser objeto de
enunciados coerentes e passíveis de debates. Por ser a psicanálise uma
atividade a dois e não apenas a reflexão individual, pretende não apenas elucidar
o objeto de estudos, mas também poder transformá-lo, ou propiciar condições
para que possa se autotransformar (MEZAN, 2005).
Entende-se, portanto, que a postura desta pesquisadora está calcada
na questão sobre a formação do educador utilizando a compreensão psicanalítica
como referencial teórico, por acreditar em seu potencial transformador, seja de
uma realidade individual ou social, e por que isso faz parte da formação
profissional e, conseqüentemente, pessoal, desta estudiosa, como brevemente
exposto em “Minha História”, e que só pode ser compreendido après-coup.
Não se pode pensar sem Freud. Mezan (2006) faz esta afirmativa ao
esclarecer que nestes 150 anos da obra de Freud, a nossa cultura acabou sendo
composta pelas iias centrais ditadas por Freud, como o inquestionável
inconsciente, o Édipo, a sexualidade infantil, as defesas, as pulsões, a
importância da sexualidade na vida das pessoas, a criação do método
psicanalítico, que passa pela questão transferencial dentro e fora dos
consultórios. Esses temas fazem parte de nossa construção mental e, portanto,
nos define como sujeito do século XXI.
Nesse sentido, utiliza-se o método qualitativo com o enfoque
psicanalítico na tentativa de alcançar a compreensão do objeto de estudo, qual
seja, a compreensão da Educação via entendimento da realidade psíquica dos
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professores componentes do grupo de reflexão”, que está proposto segundo os
moldes preconizados por Alejo Delarossa em 1970.
4.1 Participantes
O “grupo de reflexão” foi formado por quatro professores pertencentes
a uma instituição de ensino superior, sendo dois homens e duas mulheres, com
idades variando entre 35 e 55 anos, todos com experiência anterior no magistério.
Matilde - professora formada em Ciências, no exercício do magistério
mais de vinte anos. Iniciou sua carreira no ensino médio, onde permaneceu
por mais de uma década e atualmente leciona apenas no ensino superior. Tem
experiência em instituições particulares e públicas. Casada, idade aproximada de
53 anos e está cursando mestrado.
Carmem - professora formada em Ciências Exatas, no exercício do
magistério há mais de dez anos. Iniciou sua carreira no ensino médio, onde
permaneceu menos de uma década e atualmente leciona apenas no ensino
superior. Tem experiência em instituições particulares e públicas. Separada, idade
aproximada de 48 anos e esta cursando o mestrado.
Gustavo - professor formado em Ciências, no exercício do magistério
mais de 30 anos. Iniciou sua carreira no ensino médio e atualmente leciona
apenas no ensino superior. Tem experiência em instituições particulares e
públicas. Casado, idade aproximada de 52 anos. Tem o curso de mestrado e
iniciou o curso de doutorado e não pôde concluí-lo.
Cleber - professor formado em uma profissão da área da saúde, no
exercício do magistério há menos de dez anos (entre sete e dez anos). Iniciou sua
carreira no ensino de Teologia em seminários religiosos e atualmente leciona
apenas no ensino superior. Tem experiência em seminários e instituição pública.
Casado, idade aproximada de 42 anos. Tem curso de especialista.
Os participantes da pesquisa são professores de uma faculdade
pública e são aqueles que se dispuseram, voluntariamente, a participarem do
“grupo de reflexão”. Esses professores são concursados para vaga de substituto,
o que determina que o concurso tem validade por quatro anos. Todos se
encontram em seu terceiro ano como professor, naquela faculdade. Todos têm
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contrato de 40 horas semanais. Esses professores lecionam disciplinas
compatíveis com sua profissão de origem, exceto o Cleber que relata estar, no
momento da pesquisa, lecionando uma disciplina que não diz respeito a sua
formação original. Todos os professores têm que viajar para cidades do interior do
estado para ministrarem aulas em outras unidades da referida faculdade.
As profissões não foram identificadas com precisão a fim de preservar
a identidade dos sujeitos da pesquisa. Nesse mesmo intuito, foi usada a palavra
universidade ou faculdade sem qualquer diferenciação.
4.2 Campo da pesquisa
Antes de iniciar a delimitação do campo da pesquisa propriamente dita,
cabe informar que em 2004 realizou-se uma verdadeira peregrinação a fim de
encontrar uma Instituição de Ensino Superior que autorizasse a realização desta
pesquisa.
Inicialmente contatou-se uma Instituição particular que revelou grande
interesse em participar da pesquisa. Apresentou-se o projeto de pesquisa várias
vezes para seus coordenadores de cursos, de núcleos, diretores de graduação e
pós-graduação até chegar à vice-reitoria. Após um ano de promessas, encontros
e desencontros, concluiu-se que as resistências eram muito maiores e elas
estavam impedindo a realização da pesquisa. Finalmente, ao se convencer das
dificuldades, desistiu-se de procurar essa instituição.
Em seguida, outra instituição, também privada, interessou-se pela
pesquisa. Montou-se o “grupo de reflexão”, no qual se conseguiu realizar três
encontros com seis integrantes. Os encontros foram interrompidos,
aparentemente, por absoluta incompatibilidade de horários entre os componentes.
A instituição estava em fase de remodelagem das atividades e os professores
ficaram com seus horários incompatíveis. Foi lamentável. Ficou-se com a
impressão de que houve algo além das incompatibilidades de horários, contudo
optou-se por não pormenorizar o caso e a situação.
A pesquisa, então, realizada configurou um campo onde as variáveis
dependeram, principalmente dos participantes dela, o que para Bleger (1985, p.
14) significa que “[...] entre os participantes se estrutura uma relação da qual
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depende tudo que nela acontece”. A regra primeira, segundo este autor, consiste
em procurar configurar o campo pelas variáveis que dependem do entrevistado,
no nosso caso, membros componentes do grupo de reflexão”. Para que isso
fosse cumprido, foi necessária a existência de um “setting”, local, onde
coexistiram o tempo, o lugar e o papel desempenhado pelos participantes.
Para atingir o objetivo, deste estudo, a compreensão da Educação via
entendimento da realidade psíquica dos professores componentes do “grupo de
reflexão” e preservar o campo, participou-se o menos possível, apresentando
apenas uma pergunta que se chamou de disparadora. O intuito foi o de propiciar
um campo adequado às reflexões que fossem guiadas pelo inconsciente dos
participantes e foi por essa razão que não se propuseram tarefas ou temas
definidos ao grupo. Nesse sentido, assumiu-se o papel de observador-participante
como diria Pichon-Rivière (1988), a atitude desta pesquisadora foi de interlocutor
que não propõe temas nem dá sugestões e, portanto, deixa os integrantes do
grupo livres para reagirem sem que tenha sido dado outro estímulo que o da
presença do observador, nem outra intenção a não ser a de falar livremente sobre
suas experiências como educador.
Apesar do desejo de neutralidade, implícito, deve-se lembrar que a
psicanálise não pode ser confundida com a teoria comportamental-cognitivo,
embasada no comportamento manifesto. Mesmo com toda suposta neutralidade,
a psicanálise, que lida com o inconsciente, conteúdo latente, traz a baila tudo o
que diz respeito ao imaginário, tudo o que está por traz do manifesto, ou seja,
suas fantasias, angústias, tensões, etc. Mesmo na pequena participação da
pesquisadora, sabe-se, pois, que sua simples presença já foi capaz de mobilizar o
imaginário dos sujeitos da pesquisa.
Durante os encontros, tomou-se nota de pontos significativos da fala
dos integrantes do “grupo de reflexão”. Optou-se por esta técnica uma vez que se
percebeu que o grupo estava sentido-se um tanto quanto ameaçado ou
perseguido, por isso a gravação poderia ser prejudicial ao andamento dos
encontros. Os integrantes do “grupo de reflexão” manifestaram alívio ao saberem
que não seriam gravadas as reuniões.
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4.3 Local
Os encontros do “grupo de reflexão” foram realizados na própria
instituição de ensino, local de trabalho dos sujeitos da pesquisa. As reunes
aconteceram em sala arejada, com claridade adequada e sem barulhos internos
ou externos que pudessem interferir na pesquisa. Não eram salas de aula e sim
salas de trabalho ou reunião. Os sujeitos da pesquisa sentavam-se nos locais que
consideravam o mais adequado, de livre escolha.
Em todos os encontros, os participantes sempre se sentaram próximos
entre si e, também, próximos da pesquisadora. Sentavam-se de forma a um ficar
de frente para o outro, onde podiam trocar olhares durante seus diálogos. O clima
dos encontros foi tranqüilo e cordial, sendo, sistematicamente, servido cafezinho
por um dos integrantes do grupo. Cabe informar que em todas as salas da
faculdade existe um computador para uso dos professores. Não foi possível a
utilização de uma sala sem esse equipamento.
4.4 Instrumento
O instrumento utilizado nesta pesquisa foi a técnica “Grupo de
Reflexão”. Essa técnica foi construída em 1970 pelo Argentino Alejo Delarossa.
Este autor propôs construir um grupo que tivesse como objetivo o alívio das
tensões geradas no trabalho. Ele realizou o grupo, pela primeira vez, para
pessoas que trabalhavam com pacientes psiquiátricos, em uma instituição
assistencial. Esse trabalho estendeu-se aos professores e coordenadores desta
instituição.
Para o autor, o “grupo de reflexão” pretende a elaboração das tensões
originadas pelas atividades do trabalho e não se propõe a uma função terapêutica
por excelência. O “grupo de reflexão”, segundo o autor, pretende considerar
exclusivamente os aspectos da vida relacional de seus integrantes, suas relações
com o mundo, de modo geral, e a imagem que constroem, em caráter evolutivo,
de si mesmos. No grupo original, não haviam temas pré-fixados previamente, em
cada sessão os integrantes do grupo escolhiam, livremente, um tema para
reflexão (DELAROSSA, 1979).
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Baseou-se nesse modelo para construir o grupo de reflexão” desta
pesquisa. A inovação proposta ao grupo de reflexão”, foi no sentido de ter
elaborado uma questão única, a qual se chamou de disparadora. Essa pergunta
disparadora foi apresentada, sempre, no início de cada encontro. O objetivo foi o
de facilitar a possibilidade da associação livre e ter, talvez, acesso ao
inconsciente dos membros do grupo. A pergunta teve o intuito de facilitar o início
das reflexões e a mínima participação desta pesquisadora foi em decorrência da
necessidade de deixá-los falar o mais livremente possível, se possível em
associação livre, e poder ouvi-los em atenção flutuante. A pergunta lançada ao
grupo, em todos os encontros, foi: “Fale de suas experiências como educador,
sobretudo no ensino superior”.
No dizer de Menninguer (1960), o primeiro passo é dado por aquele
que vem a seu encontro e é lógico que o entrevistador (pesquisador) o passo
seguinte formulando uma pergunta, mesmo que seja para quebrar o gelo.
Para a compreensão do grupo de reflexão”, valeu-se da tese
formulada por Anzieu em 1966 que propõe o estudo do grupo como o de um
sonho, seguindo as regras do processo primário de funcionamento mental e de
que o sonho é a realização imaginária de um desejo reprimido.
Valeu-se, também, da idéia de Anzieu (1972) em que considera a
equivalência entre o analista (no caso, pesquisador) e um artista ou músico que
respeita e conserva o texto, mas o reproduz a seu modo. A esse conceito, está
ligado ao da construção de uma interpretação, ou seja, é a partir da subjetividade
do pesquisador ou analista, que a interpretação será construída e como tal,
mesmo diante dos mesmos construtos teóricos, sua formulação será única.
A pesquisa psicanatica tem, portanto, a característica de poder oscilar
entre a subjetividade e a objetividade. Sendo o inconsciente o objeto de estudos
da psicanálise, pode-se considerar a assertiva de Fenichel (1981), quando
ressalta que a psicanálise tem a capacidade de oscilar entre o uso da empatia e
da intuição, por um lado, e o uso do conhecimento teórico por outro. Neste
trabalho, valeu-se dessa possibilidade ao usar os conceitos de associação livre e
atenção flutuante como integrantes da técnica/instrumento.
A associação livre segundo Laplanche e Pontalis (2000, p. 38) é
“Método que consiste em exprimir indiscriminadamente todos os pensamentos
que ocorrem ao espírito, quer a partir de um elemento dado (palavra, número,
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imagem de um sonho, qualquer representação), quer de forma espontânea”.
Pretende-se utilizar desse recurso por parte dos sujeitos da pesquisa, com o
intuito de deixá-los livres para expressarem suas experiências como educadores
(angústias, alegrias, tensões, medos, etc).
Ainda, segundo os mesmos autores, a atenção flutuante é
Segundo Freud, modo como o analista deve escutar o analisando:
não deve privilegiar a priori qualquer elemento do discurso dele, o
que implica que deixe funcionar o mais livremente possível a sua
própria atividade inconsciente e suspenda as motivações que
dirigem habitualmente a atenção. Essa recomendação técnica
constitui o correspondente da associação livre proposta ao
analisando (LAPLANCHE; PONTALIS, 2000, p. 40).
Esta autora instalou-se confortavelmente nessa vertente e pôde usar
da atenção flutuante para proceder à escuta do “grupo de reflexão” e, sobretudo
para utilizar o material daí decorrente, para proceder à análise do grupo e, então,
servida da compreensão psicanalítica, poder entender a educação.
4.5 Procedimento
O contato inicial com a Instituição de Ensino foi via coordenação de
curso. Esta coordenação teve acesso à proposta de pesquisa. A coordenadora
apresentou a proposta ao grupo de professores que compõe o quadro da
instituição e entregou-lhe a Carta Convite. Essa unidade da instituição é composta
por 20 professores. Destes, cinco professores apresentaram-se voluntariamente
para serem membros do grupo de reflexão”. O grupo fora formado com quatro
professores, pois os horários destes era compatível entre si e o da quinta pessoa
destoava dos demais. Os professores ficaram livres para adequação do horário
de encontro do grupo. A pesquisadora adaptou-se ao horário proposto pelos
professores. Os professores puderam conhecer a proposta da pesquisa antes do
início do grupo, através de uma entrevista com a pesquisadora. Em seguida
ratificaram o aceite assinando o “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”.
O total de encontros fora determinado em mero médio de quatro à
dose. Este número foi fruto de observação dos trabalhos de Delarossa (1979) e
Kaës e Anzieu (1989).
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94
4.6 Análise de material
Utilizou-se para compreensão do conteúdo dos encontros do “grupo de
reflexão”, a teoria psicanalítica.
A proposta adotada foi a de pensar psicanaliticamente sobre a
realidade psíquica dos componentes do “grupo de reflexão” para alcançar uma
compreensão da Educação no ensino superior.
Pensou-se na analogia entre as produções de grupos e as produções
oníricas, propostas por Freud (1921) em Psicologia de grupo (massas) e análise
do ego e vigorosamente ratificada por Anzieu desde 1966, quando publicou o
artigo referente à palestra conferida em 1965 na Sociedade Francesa de
Psicoterapia de Grupo, que trazia sua afirmação de que o grupo é um sonho, do
ponto de vista da dinâmica psíquica.
Anzieu (1993) fala que tanto o funcionamento do grupo como o
funcionamento do sonho constitui-se numa possível forma de passagem do
processo primário para o processo secundário. Nesse ponto Anzieu traz
novamente a teoria Freudiana que desde 1921 propõe a equivalência dos grupos
e hipnose com os sonhos, justamente pelo caráter de funcionamento em processo
primário podendo desembocar em funcionamento secundário.
Ferreira (1989) afirma que as ligações estreitas entre o grupo e o
sonho são, também, regidas pelo princípio de prazer. Ambos, grupo e sonho se
manifestam por meio de um jogo de símbolos, no qual o conhecimento do sonho
e seus símbolos, são possíveis quando seu conteúdo for narrado pelo
sonhador. A decodificação desse conteúdo permite acesso a seu aparelho
psíquico. Da mesma forma, se pode ter acesso a fragmentos da vida
emocional dos professores universitários, por meio de seus relatos no tocante à
suas experiências e vivências com a educação, relatadas durante a formação do
grupo de reflexão.
Para a análise do material, tem-se como referência a teoria
psicanalítica. Assim, cabe lembrar que aquilo que completa o sentido de um
sonho são as associações livres que as pessoas fazem do mesmo. Já na análise
de uma sessão de grupo, esse sentido aparece quando se leva em conta o
conjunto das falas do grupo, conjunto este que revela grandes semelhanças com
as associações livres dos sonhos.
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95
Mathieu (1967), afirma que aquele tema que apresenta repetição
recorrente na sua produção, passa a assumir a característica de expressar as
significações simbólicas do material, fazendo com que aquilo que estava latente
possa tornar-se manifesto.
A análise de material utilizado, no presente trabalho, consistiu em
observar os temas recorrentes que pudessem ser considerados essenciais. Eles
podem constituir os códigos geradores de sentidos dos relatos, o que por certo
lhes dão significações. Esteve-se, portanto, atento a todas as falas do grupo de
professores durante os encontros.
Utilizou-se da compreensão psicanalítica, via escuta em atenção
flutuante, para proceder a análise do material surgido nos encontros do “grupo de
reflexão” com o intuito de assim poder entender a educação.
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CAPÍTULO 5
GRUPO DE REFLEXÃO
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Neste capítulo apresentar-se-ão os relatos resumidos dos encontros e,
após cada encontro, far-se-á uma análise preliminar dos depoimentos. Ao final,
apresentar-se-á uma discussão ampla de todos os encontros.
Considerando a questão da subjetividade da autora nas interpretações
dos relatos, bem como na apresentação dos mesmos, os treze encontros e suas
análises, serão apresentados com o verbo na primeira pessoa.
Optou-se por apresentar os relatos de forma resumida no intuito de
preservar a identidade dos participantes da pesquisa, por acreditar que, se as
falas fossem registradas na íntegra, haveria uma maior possibilidade de
identificação. Procurou-se, ao máximo, preservar a identidade ou outros dados
que pudessem identificar os componentes da pesquisa.
Utilizou-se indistintamente dentro do texto as palavras faculdade e
universidade no intuito de não identificar o local onde a pesquisa fora realizada.
A pesquisa teve início em 28 de junho de 2005 e término em 04 de
outubro do mesmo ano, sendo realizados um total de 13 encontros.
Iniciar-se-á este item com o relato dos “Antecedentes da formação do
grupo de reflexão”, por entender que essas informações sejam relevantes para
contextualização da pesquisa.
5.1 Antecedentes à Formação do Grupo de Reflexão
Em novembro de 2004, após a qualificação do projeto de pesquisa
desta tese, contatou-se oficialmente a coordenadora de um curso superior de uma
faculdade pública em Campo Grande. Esse contato teve o intuito de formalizar o
pedido para realização da pesquisa com os professores dessa instituição.
Anteriormente esta pesquisadora havia estabelecido contato informal sobre o
assunto e aguardava a qualificação do projeto de tese para oficializar o contato.
Após entregar carta solicitando autorização para realizar a pesquisa, aguardou-se
até o início do ano letivo de 2005. Informaram que o projeto de tese seria
encaminhado à Universidade Federal para ser submetida ao comitê de ética.
Informou-se àquela instituição que já havia entregue o projeto ao comitê de ética
da Puccamp.
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98
Em 28 de março, o comitê de ética da Puccamp informou que o projeto
havia sido aprovado. Procedeu-se o envio do documento para as instâncias
competentes da Faculdade.
Em abril, a faculdade informou que a então coordenadora do curso, a
via de acesso para desenvolver a pesquisa, estava sendo desligada de suas
funções para cursar o doutorado em outro estado. Iniciou-se contato com a nova
coordenadora, que apresentou boa vontade, mas na prática revelou alguns
entraves.
No mês de maio, estabeleceu-se contato com a reitoria da faculdade,
onde apresentou-se a proposta de pesquisa para a vice-reitora, que
imediatamente autorizou a sua realização.Todo o processo continuou parado.
No mês de junho, novamente, necessitou-se de restabelecer contato
com a reitoria, uma vez que a coordenação não dispunha de “tempo” para que
pudesse compor o grupo de professores. Finalmente em meados do mês de
junho, a proposta de pesquisa foi apresentada aos professores e estes puderam
se manifestar sobre o desejo em participar.
Dos vinte professores do departamento, cinco mostraram-se
interessados em participar, contudo o grupo fora composto apenas por quatro
integrantes, por questão de compatibilidade de horário entre eles. Neste
momento, dois colegas que trabalham na referida instituição, informaram que
existia uma certa pré-disposição contrária à formação do grupo de reflexão”, por
parte de um dado grupo de professores, que eram também, radicalmente
contrários à teoria psicanalítica.
Esse dado deixou a impressão de que estava havendo um movimento
contrário à formação do grupo de reflexão”, pelo fato de a pesquisadora ser
psicanalista e estar utilizando a psicanálise como referencial teórico. Conforme
informação dos colegas, o grupo contrário conseguiu intimidar boa parte dos
professores e este, segundo os colegas, foi o principal motivo para que apenas
cinco se dispusessem a participar do grupo. Portanto, pode-se dizer que houve
uma certa pressão para que não houvesse a formação do grupo por parte de
alguns professores que não aceitam a teoria psicanalítica.
Durante a apresentação da proposta de pesquisa, ficou evidenciado
que não se falaria sobre teorias e sim, os professores falariam de suas
experiências. Os professores leram o projeto da pesquisa e conversaram
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individualmente com a pesquisadora que pôde, então, explicar os objetivos e
funcionamento do “grupo de reflexão”.
Finalmente, consegui-se organizar a participação de quatro professores
no grupo. Como mencionado na metodologia deste trabalho, o grupo fora
marcado com uma semana de antecedência. Ficou acordada reunião semanal, na
própria instituição, com uma hora e meia de duração, no horário em que os
professores deveriam estar na instituição para seus afazeres. A pesquisadora
adaptou-se ao melhor horário para o grupo.
Antes de passar à descrição e análise dos encontros, levantar-se-ão
algumas questões a serem problematizadas nesta pesquisa. Se de um lado
parecia que o grupo fluiria livremente, de outro se insinuavam entraves que, como
paredes de vidro, obstruiriam a formação do grupo de reflexão. A que atribuir
esses obstáculos? Será que a presença da psicanalista/pesquisadora no grupo de
reflexão ameaçaria uma dinâmica formada pelos professores dessa instituição?
Será que aquelas pessoas temiam parecer um grupo conspiratório, contra a
faculdade?
À medida que novas dificuldades surgiram, questionou-se a extensão
do objetivo geral da pesquisa, tal como proposto no projeto, já então submetido e
aprovado na qualificação. Segundo esse objetivo o grupo de reflexão deveria ser
composto por professores do ensino superior de modo a produzir uma fonte para
investigação psicanalítica da educação. Mas, à medida que novas dificuldades
surgiam, percebeu-se que o poderia superá-las buscando formar grupos de
professores de níveis de ensino heterogêneo. Colocava-se então a questão: por
que delimitar o grupo a professores de ensino superior? Será que essa restrição
havia se imposto como decorrência natural da inserção desta pesquisadora na
educação, efetivada desde sempre no ensino superior? Pude então suspeitar que
talvez a composição escolhida tenha sido marcada pela minha própria
subjetividade.
Dessa maneira, e na temporalidade própria do inconsciente tal como
descrita por Freud (1915), essa pesquisa de doutoramento surgia como ocasião
privilegiada para uma elaboração après-coup da minha experiência docente.
Conforme Freud (1915) é possível conferir a uma experiência um novo sentido,
uma nova eficácia psíquica a posteriori, ou seja, “Há experiências, impressões,
traços mnésicos que são ulteriormente remodelados em função de experiências
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100
novas, do acesso a outro grau de desenvolvimento” (LAPLANCHE; PONTALIS,
2000, p. 33).
Como se a pesquisa psicanalítica tem as suas próprias
particularidades. Como escreveu Mezan (2005) em “Que significa pesquisa em
psicanálise?”:
[...] a idéia de um pesquisador em psicanálise que se munisse de
um elenco de problemas e procurasse resolvê-los por meio do que
é geralmente admitido como pesquisa científica - observações,
controles, previsões, etc - soa algo ridícula, e com boas razões
provocaria hilaridade nos que possuem alguma noção do que é a
psicanálise (MEZAN, 2005, p. 95).
Apresentar-se-ão, agora, os relatos propriamente ditos de cada
encontro do “grupo de reflexão” e em seguida uma análise preliminar de cada um
deles.
A partir de agora o verbo será flexionado na primeira pessoa,
considerando as questões pertinentes à subjetividade inerente aos relatos.
5.2 Os encontros Propriamente Ditos e Análises Preliminares
1° encontro do “grupo de reflexão”
(28 de Junho de 2005)
O grupo fora previamente marcado para ter início às 08:00 h. Cheguei
à faculdade às 07:45h. Fui encaminhada para a sala onde realizaríamos o grupo a
fim de arrumá-la adequadamente. Para minha surpresa, lá se encontrava a
profª Matilde. Esta me recebeu com entusiasmo, contudo continuou seu afeito no
computador. Pude organizar a sala e ficamos aguardando o horário e os outros
membros.
A professora Matilde sempre chega cedo, porque pega carona até à
faculdade.
Nas salas da instituição, existem computadores e não foi possível uma
sala que não contasse com este equipamento. Um pouco antes das oito horas a
professora Matilde serviu cafezinho.
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101
Às oito horas dei início ao grupo, apenas com a professora Matilde. A
professora passou a justificar a ausência de seus colegas, alegando acúmulo de
trabalho e cansaço por parte de todos. Naquele momento chegou outra
professora. Era a profª Carmem. Estava muito inquieta e, ainda em pé, disse que
estava muito ocupada e que poderia participar por alguns minutos. Garanti a
ambas que não passaríamos do tempo combinado de uma hora e meia. Carmem
sentou-se e eu propus, novamente, a pergunta disparadora: Relate suas
experiências, como educadora, sobretudo no ensino superior”.
Matilde começou a falar sobre sua experiência. Ela veio da cidade de
Curitiba, onde fez um curso na área de ciências biológicas e em seguida casou-
se. Iniciou sua atividade no magistério no ensino médio. Contou de vivências
dramáticas em escolas na periferia de Curitiba, chegando a se emocionar durante
o relato. Essas vivências dramáticas diziam respeito a brigas de gangs na escola,
presença de policiais para prender aluno traficante, histórias de assaltos, todas as
histórias, enfim, diziam sobre violência.
Carmem observava atentamente, demonstrando claramente
desconhecer a história de sua colega.
Matilde continuou e passou a relatar as razões de sua vinda para
Campo Grande, onde seu marido recebeu proposta de trabalho. Iniciaram uma
nova vida. Matilde continuou sua atividade no magistério em curso de nível médio.
Está no ensino superior três anos. Falou que, naquele momento, tenta dar
início a seu processo de aposentadoria por tempo de serviço. Alegou que sempre
amou o relacionamento com seus alunos e que jamais escolheria outra profissão,
apesar das dificuldades financeiras. Mostrando sua vaidade feminina, justificou
que está com os cabelos brancos na raiz e que o pôde pintá-los por falta de
dinheiro, fazendo uma alusão às dificuldades financeiras a que um professor é
submetido.
Conta que três anos atrás fez o concurso para a faculdade que
trabalha, foi aprovada para o cargo de professora substituta e que o contrato
vence com quatro anos de duração, portanto o próximo ano. Está cursando o
mestrado em educação, pois pretende, se possível for, continuar na faculdade.
Em seguida, Carmem interrompe e disse que, também, gosta muito de
lecionar, mas que é muito difícil a vida na faculdade, pois as aulas são
ministradas no interior e os professores precisam se deslocar constantemente.
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Afirmou que as viagens o muito cansativas e que o valor das diárias é muito
baixo e isto as obriga a comer e dormir em locais de má qualidade.
Matilde interrompeu e disse que ela não se importa e que já viajou sem
dinheiro chegando mesmo a pedir emprestado para o dono do hotel onde se
hospedara.
Carmem ficou contrariada e começou a falar que é professora de
“exatas”, sempre lecionou e sua entrada na faculdade deu-se, também, há três
anos e que, também, está pensando que deve se preparar para a aposentadoria,
pois uma instituição pública pode oferecer melhores condições financeiras ao
aposentar. Afirmou que gosta muito do convívio com seus alunos, mas que o
clima organizacional na faculdade é muito tenso e que ninguém tem o hábito de
ser solidário ou colaborador com os próprios colegas. Falou de uma situação
hostil de competição e falta de companheirismo entre os colegas Apontou como
exemplo a formação do “grupo de reflexão”, pois os outros colegas não
compareceram e nem justificaram sua ausência.
Passou a falar de sua vida pessoal. Contou que é separada de seu
marido e que, por razões alheias a sua vontade, não pode contar com a
colaboração do ex-marido e teve, portanto, de sustentar os filhos sozinha e para
tanto precisou trabalhar muito. Tem orgulho de seus filhos, por atualmente,
estarem bem empregados e formados. Passou a falar da época em que se
separou do esposo e que seus filhos eram pequenos. Começou a contar sobre
sua experiência de trabalho na escola de uma Fundação, onde morou por mais de
cinco anos. Contou que seus filhos eram pequenos e que lá ela poderia
economizar e proporcionar um futuro melhor para eles. A Fundação, com
características de uma fazenda, está localizada em uma cidade do interior e exige
regime de moradia no local. O professor mora na Fundação e pode ir à cidade
algumas vezes ao ano.
O nosso tempo havia se esgotado quando eu sugeri encerrar o
grupo. Ambas concordaram e afirmaram que, na próxima semana, estariam e
iriam lembrar aos colegas para que não faltassem ao grupo.
Na saída, Carmem me abraçou e disse pensar que este tipo de
conversa era fundamental para eles e tinha gostado muito de participar, uma vez
que sentia que isso poderia aproximar mais os professores. E, por isso, ela estava
sentindo-se mais amparada, que era muito bom poder falar e ser ouvida. Matilde,
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103
um pouco mais distante, também me abraçou, ratificou o que Carmem afirmou e
despediu-se.
Análise do 1º encontro
O primeiro encontro contou com a presença de 50% dos integrantes do
grupo.
O encontro iniciou-se com Matilde justificando a ausência dos demais
colegas. Anunciou, assim, uma transferência lateral positiva. Em seguida, a
professora Carmem chegou e veio participar do encontro. Matilde começou a falar
de sua vida pessoal, mas, também, entrou na tarefa trazendo aspectos
dramáticos. Afirmou seu “amor” pelos alunos e pelo ofício de ensinar. Dando
continuidade, Matilde queixou-se das condições financeiras e lamentou as
dificuldades enfrentadas para lecionar. Surge a transferência extra-grupo
negativa, uma vez que lamentou a falta de dinheiro e de condições como sendo
algo exclusivamente externo.
Carmem começou a falar e queixou-se das dificuldades encontradas no
magistério, mas que, mesmo assim, gostava de lecionar. Falou de experiências
pessoais. Ficou, portanto, na pré-tarefa, conforme Pichón-Rivère (1988). Falou
sobre a competição e hostilidade entre os colegas e queixou-se pela ausência dos
demais ao encontro.
Os professores começaram a formular um estado emocional de
desconfiança, atribuem sentimentos negativos.
Nesse primeiro encontro já foi possível perceber o pressuposto de Bion
(1961), de dependência. Reclamaram, queixaram-se como se fossem crianças.
Em seguida, pode-se notar o pressuposto de luta/fuga, atacaram os colegas (o
outro) e ocorreu, também, a fuga do encontro por parte dos demais integrantes.
Carmem e Matilde ficaram quase todo o tempo do encontro na pré-
tarefa e quando entraram na tarefa, trouxeram situações dramáticas e queixosas.
Atribuíram um sentimento negativo ao extra grupo quando falaram de forma a
desqualificar a faculdade, queixaram-se da falta de dinheiro, da competição entre
os colegas.
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104
O fato de terem se mantido quase todo o tempo na pré-tarefa revelou a
resistência em entrarem na tarefa, em falarem sobre seus vínculos com a
educação.
Esse primeiro encontro já traz o obstáculo anunciado no tópico anterior,
antecedentes da formação do grupo de reflexão. O obstáculo anunciado estava
configurando-se como ausências e resistências em participar do “grupo de
reflexão”.
Exceto Matilde e Carmem, os demais professores previamente
comprometidos com o “grupo de reflexão”, não compareceram e nem justificaram
as suas ausências ao encontro. Ora, se esses encontros são tão bons, por que
nos aproximam, como ditos por Carmem e Matilde, por que os demais
professores não participaram?
Por outro lado, a fala de Carmem e Matilde soa como encarnação de
importantes elementos presentes na história da Educação no Brasil. Matilde falou
de seu envolvimento com o magistério inteiramente tomado pelo “amor” a seus
alunos e uma dedicação devotada e capaz de sacrifícios, enquanto Carmem
lamentou uma certa desvalorização da Educação.
Lopes (1998, p. 37) em: Da sagrada missão pedagógica” discorre
sobre o modelo e ideal do professor presente tanto na nossa sociedade quanto na
sua formação. Ela critica a prescrição de “um tipo de professor(a) identificado(a)
com a mãe, com santos e santas e até com Jesus Cristo”. Essa fantasia
missionária permeia a Educação no Brasil desde os Jesuítas, como já
mencionado no capítulo I. Parece que especialmente, Matilde, revelou esse lado
missionário, vocacionado, sente a educação como um fardo (não tem gratificação
financeira adequada), mas mesmo assim, seu “amor” por seus alunos não a
deixaria escolher outro ofício.
Carmem parece que conseguiu perceber a educação como um
trabalho que apresentava dificuldades e que também, lhe gratificava, contudo
estava pensando no seu envelhecer com um pouco mais de conforto e por isto
pretende aposentar-se vinculada a uma instituição pública. Seria a educação lhe
recompensando de alguma forma, mesmo que seja em sua não mais participação
na mesma.
Tanto Matilde quanto Carmem, neste primeiro encontro, mostraram-se
inicialmente resistente, revelando tensão e ansiedade. Com o decorrer do
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105
encontro, passaram a falar de suas vidas pessoais, mostrando claramente a
impossibilidade de fragmentação ou separação dos universos como trabalho e
vida afetiva, objetividade e subjetividade.
Retorna-se a Mezan (2005) quando, ao falar da escuta psicanalítica,
afirma que esta é uma forma de se conhecer a alma humana, bem como o falar
resulta de forças opostas que não devem ficar restritas a seu conteúdo manifesto.
O interlocutor não é, apenas, aquele que está presente, mas um outro significativo
de seu passado. Assim, Matilde e Carmem, falaram para a pesquisadora e,
sobretudo para si mesmas em uma tentativa, talvez, de a posteriori poderem
remodelar suas experiências já vividas.
É importante destacar a contratransferência provocada por este
encontro, que me dava à sensação de ser acolhida por ambas. Pôde-se, também,
observar que apesar de Matilde e Carmem estarem tensas inicialmente,
mostraram entusiasmo, vontade de continuar seus relatos e compartilharem seus
sentimentos. Mais do que isso, pareciam mesmo expressar a necessidade de
desabafo e pedido de auxílio.
2° encontro do “grupo de reflexão”
(05 de julho de 2005)
O Grupo foi previamente desmarcado por motivo de saúde da
pesquisadora.
Análise do 2º encontro
Apesar de impedida fisicamente, ainda assim, vivi o sentimento de
culpa por deixar os professores desamparados. Descobri, assim,
contratrasferencialmente como a minha presença agregava aquele grupo. Isso
ficou explicitado por Carmem, no primeiro encontro, quando demonstrou
desconhecer a história da colega Matilde e quando de nossa despedida puderam
falar sobre o quanto estavam sentindo-se amparadas e próximas.
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106
Segundo Anzieu (1993), o grupo é um lugar de trocas entre
inconscientes, é, também, um lugar com simbologia e mitos próprios. Para este
autor, o grupo é um sonho do ponto de vista da dinâmica psíquica. As pessoas
participam de grupos da mesma forma que, no sono, entram em sonho. O grupo é
a realização imaginária de um desejo. Para o autor, os processos primários, sob
aparência de processo secundário, são determinantes, ou seja, o grupo como o
sonho é um debate com um fantasma subjacente. O grupo visto como sonho é a
associação de um desejo e de uma defesa, assim como nos sintomas.
Matilde e Carmem estariam, portanto, iniciando a revelação de um
desejo aparentemente atual, mas que diante da compreensão psicanalítica, sabe-
se ser um desejo reprimido da infância, ou seja, o desejo de ser acolhido. Aceito
tanto pelos membros do grupo como por aquele que “comanda” um grupo.
Meu sentimento contratransferencial de tê-los “abandonado” foi,
possivelmente, decorrente da captação, a nível inconsciente, do desejo de ambas
em serem acolhidas e que eu pudesse funcionar como figura aglutinadora para
aquele grupo.
Neste momento, percebo meu sentimento de desamparo, abandono.
Como eu, uma psicanalista, tentaria entrar na compreensão da Educação por
outros modelos que não os clássicos, ou seja, via psicopatologia, por exemplo?
Minha sensação é de desamparo, uma vez que trilhar o caminho da compreensão
via grupo de reflexão” trouxe-me um sentimento de solidão. Foi preciso cercar-
me de autores mais arrojados, para continuar minha caminhada. Foi preciso
despir-me de preconceitos e perceber a minha transferência em relação à
Educação. Como eu estou ou estava transferida para a Educação? Quais o
meus desejos como educadora e como aprendiz? Será que meu desejo não seria
o de manutenção de uma educação missionária, mantida pelo amor ao aluno?
Sendo assim, como aprendiz, no doutoramento, também desejei ser amada e
acolhida. Estar sozinha diante de uma pesquisa disparou meus sentimentos de
abandono, mas que felizmente pude compreendê-los e usá-los na compreensão
deste trabalho. A angústia acabou sendo em mim disparada. Percebe-se que não
é possível dissociar educação, aprender ou ensinar de angustiar-se, como
descrito por Neder Bacha (2002, p. 46) quando afirma que está
[...] na elaboração dessa transferência, e da contratransferência, o
cerne da formação psicológica de todo professor: conectar a
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angústia de sentir-se angustiante com a figura que lhe corpo.
Isso implica superar em si próprio uma resistência ao feminino
reprimido no inconsciente, transformando em aliado esse
obstáculo que se opõe ao trabalho de educar e de pesquisar.
Assim, a angústia por mim vivida reflete meu processo transferencial
em relação à Educação. Como psicanalista, entende-se que este processo refere-
se, também, ao funcionamento do “grupo de reflexão”, ou seja, esta angústia que
foi disparada nos professores componentes do grupo, também, diz respeito aos
seus processos transferenciais em relação à Educação.
3 ° encontro do “grupo de reflexão”
(12 de julho de 2005)
Cheguei à universidade às 07:45h. Fui conduzida até à sala onde
realizaríamos o encontro para arrumá-la. A profª Matilde já se encontrava na sala.
Esta me recebeu com entusiasmo e disse que seus colegas confirmaram
presença. Em seguida, chegou o prof. Gustavo e a profª Carmem, ambos muito
gentis e solícitos. Afirmaram que o prof. Cleber havia confirmado sua presença.
Matilde sorriu e disse que todos conheciam o Cleber e falou-me que ele era muito
diferente deles, mas que deveria chegar atrasado e por isto deveríamos iniciar o
grupo sem sua presença.
Considerando o horário, iniciamos o grupo refazendo a pergunta
disparadora. Gustavo tomou a frente, recusando-se a falar de suas experiências,
alegando que nos conhecíamos, por termos trabalhado em uma outra
universidade. Carmem e Matilde o aceitaram o argumento e falaram que elas
não conheciam sua história.
Carmem tomou a frente e retomou sua história sobre a Fundação.
Explicou como funcionava o trabalho, informando que os alunos participavam de
aulas normais e, em outro período, de atividade profissionalizante. E isso trouxe
grande beneficio a seus filhos, uma vez que hoje exercem funções baseadas nas
atividades que aprenderam na Fundação. Contou que decidiu sair de lá porque
estava sentindo-se muito distante culturalmente, necessitava de reciclagem, de
oferecer novas oportunidades a si própria e a seus filhos. Falou com muita
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gratidão daquele período, mas lembrou que fora muito difícil, pois estava
separada de seu marido e teve que criar seus filhos sem a ajuda deste. Mostrou-
se orgulhosa por ter conseguido conduzir sua vida de forma satisfatória. Passou a
falar da universidade.
Gustavo e Matilde ouviram atentamente e foram bastante solidários e
confirmaram que Carmem era uma pessoa vencedora, considerando sua história.
Matilde disse que o único problema é que Carmem, às vezes, fica muito amarga
em suas avaliações.
Gustavo saiu em defesa de Carmem e deu continuidade à conversa
sobre a universidade. Começou falando que está na universidade pública três
anos e quando fez o concurso não sabia que seria contratado por quatro anos
como substituto. Contou que tem mais de 28 anos de experiência de trabalho
docente em universidade particular e fora demitido sumariamente dela sem
conhecer as razões. Falou com muita mágoa. Contou que está em outra
universidade particular, mas não se envolve com nada além das aulas e nada
espera desta universidade, a não ser seu salário. As outras professoras, Carmem
e Matilde sorriram e concordaram com a fala do professor.
Gustavo retomou a conversa sobre a universidade pública e desabafou
dizendo que lá é “uma gaiola de papagaios”, pois os professores limitavam-se a
repassarem iias de alguém que julgam ser o grande mestre, ou a única pessoa
capaz de pensar. Matilde ficou um pouco inquieta e pediu que Gustavo falasse
baixo, este ficou irritado e disse que este é o problema, pois ninguém tem
liberdade de expressão e que ali tinha um grupo marxista que pretendia dominar a
todos. Carmem ficou visivelmente irritada e disse que concordava com Gustavo e
que ali apenas valorizavam as pessoas que participam do grupo do todo
poderoso, que é Marxista, e ignora todas as demais idéias existentes, e por isso
todos são medrosos de contrariarem o grupo. Matilde alegou que se baterem de
frente com o grupo poderão sofrer represálias e, até mesmo, terem suas funções
impedidas na universidade.
Gustavo retomou afirmando que a vaidade e o medo são atributos
dominantes no meio e que a ciência ou o estudo sistemático não existem. As
pessoas se encontram para fazer fofocas e não para estudarem. Gustavo
afirma que o “boicote” ao grupo de reflexão foi devido ao fato de ser proposto por
uma pesquisadora psicanalista a qual adota uma abordagem que eles
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desprezam. Complementou dizendo que ali não era uma universidade e sim uma
gaiola onde apenas repetiam coisas que não entendiam e achavam que era dito
por um sábio.
Carmem concordou e afirmou que ninguém aprendia por decreto e sim
por estudo.
Matilde alegou que seus colegas estavam muito rancorosos e que ela
conseguiu conviver com o grupo dominante. Gustavo deu risada e mostrou que
ela não participava das reuniões deles. Nas reuniões gerais, ela não emitia sua
opinião e, para ele isto é medo. Matilde ficou sem graça e concordou
parcialmente. Carmem concordou e disse que ela não participou por opção, pois
pensava que o grupo dominante era intransigente e pedante.
Naquele momento, Cleber chegou à sala. Ficou em e perguntou
sobre a reunião. Cleber pegou uma cadeira giratória, que estava distante do
grupo e colocou-a à minha frente e ficou visivelmente esperando explicações.
Limitei-me a informá-lo que aquele era o “grupo de reflexão”. Ele falou que
tínhamos uma amiga em comum, que também era da área de saúde. Dirigiu-se
aos colegas e perguntou como eles estavam.
Gustavo alegou que ele interrompeu o andamento do grupo e que da
próxima vez deveria chegar no horário. Cleber sorridente pediu desculpas e disse
que o grupo podia continuar. Ele estava em uma atitude visível de desinteresse
em pertencer ao grupo, estava com uma postura diferente, uma vez que era o
único em cadeira giratória e fazia questão de ficar girando em meia lua, parecia
estar observando o funcionamento do grupo. O tempo havia expirado, quando
propus que continuássemos na próxima semana. Todos concordaram e foram
unânimes em pedir ao Cleber que viesse no horário combinado. Na saída, Matilde
abraçou-me e disse que o Cleber era muito diferente deles.
Análise do 3º encontro
Este encontro contou com todos os membros do grupo, apesar de
Cleber ter chegado apenas no final e praticamente não participou. Cleber sentou-
se em uma cadeira que não pertencia ao grupo e ficou posicionado como alguém
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que está fora de um grupo. Ficou a impressão de que Cleber atuou o seu desejo
de não integrar o grupo.
O encontro teve início com Gustavo recusando-se a entrar na tarefa
proposta.
Carmem deu prosseguimento e falou de sua história pessoal. Ficou na
pré-tarefa. Ao final de sua fala, começou a entrar na tarefa.
Gustavo deu continuidade e surgiu, então, a expressão “gaiola de
papagaios” como uma queixa. Queixou-se de serem dominados, de não poderem
pensar livremente. É como se fossem impedidos de exercer seu livre pensar.
Expressa no aqui agora do grupo a “gaiola” que trazem dentro de si. Ficou
explicitado o pressuposto básico de dependência descrito por Bion (1961).
Mostraram uma transferência extra grupo negativa, criticaram os
demais colegas da universidade, alegaram que eles não permitiram a discussão
sobre ciência, não permitiram o livre pensar, boicotaram o grupo de reflexão.
Esses colegas do extragrupo são os chamados de marxistas, pois eles participam
de estudos sobre esta corrente de pensamento.
Percebeu-se um movimento da transferência lateral positiva quando
eles acolheram-se participando do encontro e escutaram-se mutuamente. Houve
um movimento da transferência lateral negativa quando eles se atacaram, quando
mostraram-se rancorosos, “o Cleber é diferente” (com ares pejorativo). Refletiram
no grupo a rivalidade, a intrasubjetividade aparecendo na intersubjetividade.
A transferência central, para a pesquisadora foi positiva, considerando
os momentos em que entraram na tarefa.
Ficou anunciado o processo de luta/fuga, conforme Bion (1961) o
descreveu, fugiram e, também, atacaram o grupo. Fugiram quando chegaram
atrasados e atacaram com as rivalizações e comentários desfavoráveis sobre os
colegas.
O encontro se encerrou com a chegada do Cleber que parece que
viera somente para dizer que não desejava participar.
Durante o encontro teve-se a impressão de estar se configurando a
idéia de que o grupo é o local para a colocação das imagens interiores e
angústias de seus participantes, ou seja, o imaginário grupal, conforme Anzieu
(1993) o descreveu.
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Está-se considerando que tanto Matilde quanto Carmem e Gustavo
passaram a falar de suas vidas, de seus imaginários, de suas angústias, mesmo
que a pergunta disparadora solicitasse uma fala sobre a educação. O grupo
revelou por meio de seus integrantes, as suas fantasias, os seus medos, as suas
angústias, a partir do instante que começaram a discorrer sobre suas vidas.
Abordaram livremente os pontos descritos. Trouxeram seus medos e mágoas.
Percebeu-se o quanto as angústias, fantasias, enfim todas as
expectativas de vida misturaram-se à questão Educação. Como foi difícil separar,
se é que isto é possível, a educação dos demais itens da vida. Carmem, por
exemplo, revelou suas intimidades familiares e suas dores ao ter educado seus
filhos na ausência de seu companheiro e em lugar distante da cidade (fundação é
uma fazenda). Aqui não se está falando apenas de uma educação formal ou
informal, mas da educação do ponto de vista da mãe, ou da educação, também,
entrelaçada ao feminino. A mãe/educação caminhando juntas.
É possível perceber que a proposta de relação entre o grupo e os
sonhos, indicada por Freud (1921) e ratificada por Anzieu, em 1966, começa a
borbulhar no grupo de professores, uma vez que já foi possível notar as pulsões
libidinais e agressivas. “[...] tal como nos sonhos e nas hipnoses, nas operações
mentais de um grupo a função de verificação da realidade das coisas cai para
segundo plano, em comparação com a força dos impulsos plenos de desejos com
sua catexia afetiva“ (FREUD, 1921, p.104).
Surge, também, a possibilidade da formação de um ego preenchendo
funções de controle levando em conta a realidade, podendo estabelecer às regras
do grupo como seu superego (ANZIEU, 1993).
Nesse sentido, nota-se as falas de Gustavo e o quanto ele ficou
irritado. Falou com mágoa da antiga instituição em que trabalhou e com desprezo
pela atual instituição particular que leciona. O que será que o leva a isto? O que o
faz sentir que está em uma gaiola”, preso, sem liberdade? Supôs-se que esta
imagem de gaiola deixa transparecer uma angústia persecutória. O depósito de
imagens e angústias, desse tipo, no grupo, é o entendimento de Anzieu (1993) de
imaginário grupal.
Começam a surgir questões sobre a instituição em que o “grupo de
reflexão” é formado. Será que a instituição é de fato tão restritiva? É uma
instituição que se construiu no imaginário desses professores, a partir de imagens
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de proibições e castrações. É possível destacar que Gustavo pensava a
criatividade como proibida na instituição. Também, deixou clara sua relação de
mágoa com a instituição que trabalhou 28 anos e o atual desprezo pela nova
instituição particular na qual leciona. Ao referir-se à faculdade pública, onde o
“grupo de reflexão” estava sendo realizado, falou com rancor e agressividade da
“gaiola” em que se sentia preso e que foi levado a apenas repetir coisas como
papagaios. Estaria Gustavo externando a percepção de que os professores
estariam executando tarefas com a fantasia de que o meros “robôs” ou meros
“tarefeiros”? Ficou-se com a impressão de que diante deste fato, pareceu que
eles preferiam se colocar como vítimas da instituição e não como sujeitos de sua
própria história. Usaram dos lamentos e se mostraram impotentes e invejosos
diante da instituição que se fez representar por um suposto líder. Idealizaram o
der e projetaram suas fantasias e anseios. De um lado desejaram ser
comandados (“amados”, “acolhidos”), e de outro, rejeitaram o comando sem
propor outra forma de interação. Fizeram uma crítica invejosa, sem a proposta de
outra construção. Surgiu a cisão entre o bom e o mau, gerando as projeções que
darão início às idealizações. As pulsões ficaram expostas. Via Ilusão grupal
tentaram defender-se das angústias persecutória. Por alguns instantes pareceu
que acreditaram que estão em um grupo de “eleitos”, “escolhidos”, enfim,
especiais e, portanto, defendidos de supostos ataques. Fica aqui a questão: Por
que será que ao invés de utilizarem o Grupo de Reflexão” como uma nova forma
de integrarem-se à instituição, fizeram desse momento um instante de lamentos,
queixas?
Matilde deixou claro seu temor em que as conversas pudessem ser
ouvidas por terceiros e que ela fazia parte do grande grupo (marxista), o que
Gustavo logo demonstrou que ela estava parcialmente correta. A relação com o
outro grupo foi feita pela rivalidade e trouxe a inveja como principal componente.
Eles deram poderes ao “líder do outro grupo” no momento que passaram a ser
omissos de sua história e o construíram um novo modelo, apenas tentaram,
pela inveja, destruir o existente.
Freud (1921), em Psicologia de Grupo (massas) e análise do Ego,
menciona que é pela identificação com o líder que surge a falta de criatividade. Se
todos são iguais, identificados, como poderiam ser criativos? Os intensos vínculos
emocionais dos grupos podem explicar a falta de independência e iniciativa de
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seus membros. Continua e revela que uma outra característica presente nos
grupos é a fraqueza da capacidade intelectual. Foi possível notar esse fenômeno
nos relatos de Gustavo, quando falou que são meros repetidores (“gaiola de
papagaios”), bem como na interdependência ao grupo marxista e sua forte ligação
com o líder. Pode-se repetir a frase de Freud (1921, p. 154) quando diz que o
homem “[...] uma criatura individual numa horda conduzida por um chefe”. Nesse
sentido, observou-se o quanto os professores estão constituídos como horda e
não formam grupo. Não houve uma identificação com o líder que pudesse
direcioná-los.
Parece, também, que Gustavo desejou trazer para si o papel de líder e
quis que o grupo se identificasse com ele. Guardadas as devidas proporções, não
seria isto o que Cleber estaria tentando fazer, também, com a pesquisadora?
Apesar de não vê-la como professora e sim como profissional da saúde. Estaria o
Cleber tentando buscar uma identificação com a profissional de saúde por ter uma
visão desvalorizada da educação?
Neste ponto, vale lembrar que desde o primeiro encontro a presença
de Cleber foi previamente avisada, com a afirmação de que ele era “diferente”
deste grupo. Cleber, de fato, mostrou-se distante e com um ar de certa
superioridade. Tentou defender-se dizendo que também era da área de saúde e
que tínhamos amigo em comum. Contra o que ele estaria se defendendo? Que
fantasias o grupo poderia ter-lhe despertado? Pareceu que sua principal tentativa
de defesa refere-se ao fato de querer parecer-se com a pesquisadora via “área de
saúde”. Pensa-se que ele esteja se defendendo de ser professor. Não quer ser
reconhecido como da área de educação. Sua arrogância aparece como escudo
de proteção para não ser identificado como professor. Percebeu-se que ele está
em processo transferencial desde o início, quando resolveu participar do grupo,
mas as resistências se fizeram notar em uma atitude quase hostil e arrogante.
Sua postura na cadeira foi de um célebre comandante a observar seus
comandados. Isto pareceu que foi sentido pelos demais membros do grupo.
Matilde avisou a esta pesquisadora que ele era “diferente”. Ficou a questão: ele é
diferente porque usa a profissão como escudo para se proteger de suas
inseguranças em ser identificado como professor?
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Compreende-se em Freud (1921), que o “guia” não está na realidade
posta, mas sim na realidade psicológica, ou seja, é possível ser líder, quando
se é colocado como tal pelo “amor” que seus liderados lhe dedicam.
Neste encontro, ficou evidenciado o quanto Gustavo pretende um papel
de liderança. Cleber pareceu buscar uma identificação com a colega da área de
saúde. Não tem identificação com a educação, por isso o ar de desdém,
desprezo. Desprezo pela educação. Ambos, Gustavo e Cleber denotam um
funcionamento que se configurou como invejoso e não conseguem propor novas
construções sobre a questão educação. Estão cindidos; projetam e idealizam.
Pode-se dizer que além de o haver uma identificação com um líder, existe,
também, uma fragmentação e isto levaria a não estruturação de um grupo.
Matilde imersa em seu mundo apaixonado. É a encarnação da paixão,
surge como um retrato da educação no Brasil. Uma educação desvalorizada,
“pobre”, sem ambições de crescimento cultural. O crescimento é vivido como
trampolim para melhores condições de aposentadoria. Nesse contexto, Matilde
pareceu uma missionária. Cumpre sua missão sem questionar as condições que
lhe são oferecidas. Carmem, também revelou um funcionamento mais invejoso
em relação à liderança marxista; conseqüentemente surgem sentimentos
destrutivos em relação ao outro grupo. Por estar presa a esses sentimentos não
consegue propor uma ação mais criativa e inovadora para integrar-se à instituição
e, conseqüentemente, à educação. Apresentou-se com suavidade, mantendo-se
quase como uma expectadora da educação.
4° encontro do “grupo de reflexão”
(19 de julho de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. Fui informada que não
havia nenhum professor no local. Aguardei por uns instantes. Fui informada que
os professores estavam reunidos em outro local com a reitoria para decidirem
questões pertinentes à universidade. o fui avisada que eles não iriam
comparecer ao encontro do grupo.
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Análise do 4º encontro
Senti, contratransferencialmente, o peso da rejeição, pensei que o
grupo poderia ter me avisado e até poderíamos combinar outra data. A quem a
pesquisadora estaria representando neste momento? Quais fantasias estariam
envolvendo o grupo? Após o grupo ter se expressado e ter deixado expostos
alguns sentimentos, o que surgi adiante? Sabe-se, por meio dos escritos de
Freud em Totem e Tabu (1912-13) que a violação de qualquer tabu transforma o
transgressor em tabu. Será que se está diante de algum tabu? resta aguardar
a próxima reunião.
Aqui, parece adequado a elaboração da questão: quais são as minhas
fantasias em relação ao grupo? Quem é que o grupo representa para mim? Será
que eu não estaria participando do “jogo” do grupo? Será que eu estaria como
uma possível aliada do grupo, na empreitada de contraposição ao líder marxista?
Se isso estiver ocorrendo, eu estaria, portanto, participando da projeção deles.
Expor-se-á, neste instante, com o intuito de caminharmos na
transferência, uma parte de Minha História que o fora mencionada
anteriormente. Quando ainda acadêmica do curso de psicologia, fiz parte do
então movimento marxista. À época, um movimento muito importante e apenas os
acadêmicos considerados inteligentes, estudiosos, eram convidados a
participarem desta elite intelectual. Esse era o pensamento corrente à época.
Quero crer que isto esteja compondo um quadro que nos faz compreender melhor
a questão transferencial, ou contratransferencial, que me envolve e, portanto
envolve o grupo de reflexão”. Está-se considerando que como membro de um
grupo estamos entrelaçando questões inconscientes de todos os participantes,
inclusive da pesquisadora. Se eu, de alguma forma, percebo que entendo ou
entendia que o marxismo é a ideologia que privilegia a intelectualidade, penso
que a partir desta observação, pode-se então compreender, um pouco mais, os
membros do grupo. Estariam eles, acreditando, também, que apenas os
chamados marxistas, poderiam trazer para si a idéia de intelectuais? O que
sobraria para os demais? Talvez a gaiola de papagaios”? Talvez a mera noção
de tarefeiros? Nesse caminho, parece que se conseguiu entender melhor o
sentimento do grupo, ou seja, um sentimento de menos valia; e que eles reagem
com inveja do grupo dito intelectual. Reagem com o intuito de destruí-los, como
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se, destruindo-os, trouxessem para si a suposta intelectualidade, como se esta
não fosse uma construção na história de cada um.
Projetam nos Marxistas a intelectualidade. Ao projetar nos marxistas a
inteligência, eles se despojam disso. Assim, fica compreensível a composição da
“gaiola de papagaios”.
5° encontro do “grupo de reflexão”
(26 de julho de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. Fui informada que os
professores estavam em recesso escolar e que retornariam no início de agosto.
O Prof. Gustavo, no dia seguinte, avisou-me que poderíamos retornar
ao grupo de reflexão em 16 de agosto.
Análise do 5º encontro
Neste momento foi impossível não retomar Freud em Totem e Tabu
(1912-13) e sentir-me como aquela pessoa intrusa que pode transmitir aos
membros de um grupo alguma espécie de contaminação, como se fosse uma
transgressão. Compreendo que este sentimento deva-se ao fato dessa
pesquisadora estar transgredindo as proibições ditadas pelo Marxismo e estar
tentando se aproximar do inconsciente. Estaria, assim, rompendo as fronteiras do
consciente estabelecidas pelo marxismo. Para os professores que compõem o
“Grupo de Reflexão”, provavelmente, exista a fantasia de que apenas os
marxistas podem ser intelectuais.
Neste ponto, deve-se destacar que o fato de a pesquisadora não ter
encarnado o papel de antelíder, ou seja, de não estar realizando a fantasia de ser
a oponente ao der marxista, estaria causando frustrações aos membros do
grupo. Eles estariam frustrados porque a pesquisadora não encarnou o papel de
oponente ao líder. Percebe-se, também, que eles não se constituem como um
grupo, parece uma horda, mostram-se amorfos. Será que o fato deles não se
constituírem como grupo, seria uma manifestação de medo ou de desqualificação
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da educação? Estariam com medo de o grande líder perceber que eles estão em
um outro grupo? Seria este novo grupo uma proposta de conspiração? Parece
que se está compreendendo, inclusive as dificuldades iniciais à formação do
“grupo de reflexão”.
Os professores comportaram-se e até falaram de certo boicote à
formação do grupo de reflexão”. Esse fato deveu-se a uma suposta oposição
feita pelo grupo marxista. Neste momento pergunta-se: houve mesmo tal
oposição ou ela foi fruto do desejo de os professores serem notados e a
destacados pelo líder marxista? Desponta aqui uma visão paranóica em relação
ao líder marxista.
Nota-se que o “grupo de reflexão” tem funcionado com o olhar no outro,
dificilmente aproveita o “grupo de reflexão” para observar-se, utiliza seu tempo
observando as faltas alheias. Revela, assim, um funcionamento auto-referente,
imaturo, infantilizado e desorganizado. Enquanto desorganizado, funcionando
como se fosse uma horda, revela sua infantilização, funciona como quem espera
que o líder os posicione. Se mostra como crianças que esperam as diretrizes
ditadas pelo pai. O líder marxista parece que cumpre este papel, determinando o
certo e o errado. Como a psicanálise não é normatisadora, a pesquisadora não
encarnou o papel de pai, o grupo frustrado, se desorganiza ou simplesmente se
mantém na desorganização existente previamente.
Entende-se, também, que a psicologia, assim como a psicanálise e
principalmente esta, são vistas como agentes portadores de mistérios. A
pesquisadora torna-se, também, um elemento intruso, portador de um poder
misterioso (psicanálise), capaz de promover o contágio entre os membros do
grupo. A possibilidade disso traz à tona a ambivalência de sentimentos, o desejo
em transgredir o posto e o medo da retaliação pela transgressão. Há, também,
desejo do grupo em continuar participando da pesquisa, os integrantes dele
avisam que have continuidade, mas mantêm-se afastados, temporariamente,
para evitarem uma formação de vínculo que poderia promover o contágio. A
ambivancia está exposta.
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6° encontro do “grupo de reflexão”
(16 de agosto de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. Fui conduzida a à sala
para arrumá-la. A profª Matilde se encontrava no local. Fui recebida com
pedidos de desculpas por não terem me avisado do recesso. Em seguida, o prof.
Gustavo chegou. Trouxe cafezinho e também se desculpou pelos desencontros.
Dei início ao “Grupo de reflexão”. Começaram a falar sobre as dificuldades na
universidade quanto à comunicação. Gustavo falou que estavam novamente
trocando de coordenadora e que o maior desafio era fazer com que os
professores cumprissem seus horários. Matilde complementou, afirmando que
aquele que fizer cumprir horário será tido como chato, uma vez que os
professores com 40 horas de trabalho estão acostumados a terem outras
atividades em outros lugares e acham um absurdo terem de cumprir horário.
Gustavo falou sobre a questão da desonestidade e a falta de respeito
com a coisa pública e afirmou que apenas ele e Matilde cumprem os horários,
mas que isto é uma questão de foro íntimo, pois os demais acham que eles são
bobos ou ingênuos.
Matilde ficou muito irritada e comenta que esta questão sempre fora
fundamental em sua casa com seus filhos, pois para ela a honestidade é uma
obrigação de todos e o uma virtude excepcional. Gustavo afirmou que essa
questão é muito difícil para quem tem filhos, com os dele, também tem grande
dificuldade em explicar a diferença em ser honesto e ser “babaca”.
Ambos falaram da ausência de seus colegas e afirmaram que estes
estão tendo uma atitude de falta de compromisso. Matilde lembra que esta não é
uma característica de Carmem e, se ela não foi à reunião, deveria ser em virtude
de algum problema. Sorriu e disse que este não deveria ser o caso do Cleber.
Gustavo disse que o Cleber chegava atrasado, quando vinha à
faculdade, e sempre queria posar de bom samaritano. Matilde perguntou à
Gustavo se Cleber ainda era líder religioso. Gustavo disse que parece que ele
teve de deixar de ser líder religioso, mas que não sabia quais as razões, porque
ele continuava em sua religião. Matilde ficou pensativa e falou que deveria ser
difícil conciliar o consultório, na área de saúde, e ser religioso. Gustavo deu risada
e disse que esta era uma pergunta que a Regina podia responder. Apenas limitei-
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me a perguntar o porquê ela achava que deveria ser difícil. Matilde disse que não
expressou bem, achava difícil ser fanático religioso ou ser profissional da saúde.
Gustavo disse que a questão não era ser ou não ser religioso e sim ser
desinformado ou mal formado, pois as questões religiosas são íntimas e cada um
poderia ter a sua, sem interferir no trabalho. Gustavo sugeriu encerrar o encontro,
pois os demais não compareceram, Matilde concordou. Ficamos combinados para
a próxima semana. O encontro foi encerrado 15 minutos antes do tempo previsto.
Destaca-se que optou-se por chamar apenas de religioso a atuação de
Cleber, para não expor outros dados que possam identificar o sujeito da pesquisa.
Análise do 6º encontro
Neste encontro, novamente, houve a presença de 50% dos integrantes
do grupo.
Gustavo entrou na tarefa e ambos falaram dos problemas de
comunicação na faculdade. Queixaram-se da falta de compromisso, por parte dos
colegas, em cumprirem os horários. Mostraram a transferência lateral negativa.
Houve uma formação de sentimentos negativos em relação aos membros do
grupo e do extragrupo. Reclamaram da falta de sentimento de pertinência.
Matilde falou de experiências subjetivas. Falou sobre os filhos. Parece
que entrar na tarefa deve ser evitado, ficando, assim, na pré-tarefa. Revelou aqui
a resistência em entrar na tarefa proposta. Em seguida, Matilde justificou a
ausência de Carmem de forma a transparecer uma transferência lateral positiva,
contudo a transferência lateral para o Cleber é negativa. Fazem comentários
negativos sobre a maneira de Cleber proceder em relação aos horários de
trabalho; deixaram transparecer a rivalidade quando abordam a questão religiosa.
Gustavo tomou a iniciativa e propôs encerrar o encontro. Parece que
não agüentou a rivalização. Atualizaram no espaço presente os vínculos e
desejos do passado. Apresentaram o pressuposto da dependência quando
trouxeram a representação do grupo primário, da irmandade, ou seja, as
rivalizações na irmandade.
Este encontro confirma, também, a impressão de que os professores
não estão se organizando como grupo, estão amorfos. Os dois participantes,
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Gustavo e Matilde não aproveitam a oportunidade para refletirem, ficam falando
do outro. O outro como elemento para suas projeções. Falam sobre as
dificuldades de comunicação na universidade e se esquecem que a comunicação
é deles. Projetam na “universidade” seus problemas de comunicação. Ficam
apegados ao negativo, às faltas do outro e não falam de suas próprias faltas.
sempre uma disputa, uma rivalidade que tentam superar por meio de uma
afirmação narcísica. Os presentes, no caso Matilde e Gustavo, são honestos,
cumprem horários, ou seja, estão narcisicamente defendidos da reflexão sobre a
educação e sobre si mesmos. Deixam a impressão de que estão no grupo de
reflexão” para rivalizarem-se com o der marxista e não para compartilharem os
possíveis benefícios do “grupo de reflexão”.
A questão da rivalidade torna-se tema recorrente. Fica claro que existe
uma disputa narcísica, quem é o melhor. Contudo, a ambivalência se faz
presente. Ao mesmo tempo em que se valorizam, principalmente apontando as
falhas dos outros, desvalorizam-se, uma vez que não utilizam do tempo e espaço
proporcionado pelo “grupo de reflexão” para refletirem. É possível notar, também,
a rivalidade dos membros do grupo com o Cleber. Esta rivalidade aparece desde
quando avisaram que ele era diferente do grupo. Cleber, ao que parece, foi líder
religioso, e como Freud (1921) esclarece em Psicologia de Grupo e Análise do
Ego, o líder religioso equivaleria ao comandante-chefe, prevalecendo nos grupos
a ilusão de que o líder ama a todos igualmente. Quais seriam as fantasias dos
demais integrantes do “Grupo de Reflexão” em relação ao Cleber? Estariam eles
invejosos por que o Cleber fora líder religioso?
Se se caminhar por esse rumo, notar-se-á que os religiosos chamam-
se de irmãos, irmãos na fé, irmãos em Cristo. Isto igualaria a igreja à família.
Assim pode-se pensar que os integrantes do grupo estariam revelando suas
fantasias como uma família. Neste contexto, os irmãos presentes, Gustavo e
Matilde, oferecem para a mãe-pesquisadora o irmão ausente Cleber para ser
depreciado. É necessário destruí-lo para poderem ocupar seu suposto lugar de
preferido pela mãe-pesquisadora, uma vez que ambos trabalham na área de
saúde e, segundo o irmão-Cleber, têm, também, amigos em comum. Na tentativa
de se aproximarem da mãe-pesquisadora, tentam eliminar Cleber. Talvez, por não
suportarem a situação, propõem o rmino do grupo 15 minutos mais cedo.
Devem se afastar da mãe-pesquisadora. Aqui parece que se está diante do que
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Anzieu (1993) chama de fantasmática oral, em que o grupo vivencia a regressão
ao sadismo-oral, temendo ser devorado por ter tido o desejo de aniquilar um de
seus membros.
Surge outra observação: Gustavo foi o responsável por solicitar o
término do encontro. Parece que Gustavo está pretendendo o domínio do grupo,
está buscando a liderança. Percebe-se que ele, sempre que pode, tenta fazer o
papel da pesquisadora, ou pelo menos aquilo que ele pensa que seria o papel da
pesquisadora. Gustavo revela-se crítico, normatizador, enfim, comporta-se como
se fosse o pai que determina o certo e o errado.
7° encontro do “grupo de reflexão”
(23 de agosto de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual.
Recebi telefonema do prof. Gustavo dizendo que não haveria encontro
do grupo, pois estavam em semana pedagógica; ficou combinado um encontro
para a próxima semana.
Análise do 7º encontro
A semana pedagógica é prevista em calendário, em qualquer
instituição de ensino, portanto, os professores sabiam que naquela data estariam
em semana pedagógica e não falaram previamente, nem acenaram com a
possibilidade de outro horário. Novamente está-se diante de sentimentos
ambivalentes. Deixam transparecer os impulsos mais agressivos, não se
importam com a pesquisadora e, em seguida, combinam para a próxima semana
a continuidade dos encontros. Aparece a dificuldade de se enxergarem como
sujeitos da situação. Aquilo que eles reclamam da Educação, são eles quem faz.
A falta de compromisso é a deles, estamos novamente diante da projeção.
Projetam para a universidade os problemas de comunicação, enquanto são eles
próprios que determinam esta questão. Volta-se à infantilização, a questão sobre
o fato de as instituições infantilizarem seus membros. Como imaturos,
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infantilizados, idealizam. Idealizam um líder que os comandem, assim como uma
instituição que os proteja.
É importante destacar que mais uma vez foi o Gustavo que tomou a
frente e comunicou a esta pesquisadora que o encontro não ocorreria na data
prevista.
8° encontro do “grupo de reflexão”
(30 de agosto de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. No corredor, encontrei o
Prof. Gustavo. Fui à sala para arrumá-la e permaneci sozinha por mais de 30
minutos. Fiquei sentindo um misto de solidão e rejeição. Gustavo retornou à sala
dizendo que seus colegas eram mesmo irresponsáveis. O prof. Cleber chegou.
Iniciei o encontro. Gustavo estava irritado e deu uma bronca no Cleber que tratou
de desculpar-se dizendo que havia tido uma noite muito ruim, por isso perdera a
hora. Gustavo sorriu e disse que ele sempre perde a hora.
Cleber resolveu falar sobre sua história e contou que sempre foi
religioso e estudou para ser der religioso, por isto começou a lecionar em
seminários. Explicou que entrou na universidade três anos e que pretende
continuar, mas que sua prioridade é seu consultório, porque é de que tira o
sustento de sua família. Explicou que não é muito assíduo na universidade, uma
vez que esta não é sua prioridade. Atualmente leciona uma disciplina que não diz
respeito à sua formação original. A disciplina que a ele compete foi entregue para
um pedagogo.
Gustavo interferiu e perguntou o porquê ele permitiu que isto
acontecesse, por que não lutou por seus direitos. Cleber disse que não era de
criar polêmicas, era do tipo conciliador. Explicou que talvez esta fosse uma
característica que adquiriu pelo fato de ter sido líder religioso muitos anos.
Gustavo falou que uma diferença em ser conciliador e a covardia.
Ele não via razões para o Cleber se submeter a isto. Cleber ficou irritado. Disse
que o Gustavo era kami-case”, um suicida, pois se lançava em discussões que
não teriam futuro. Gustavo retrucou dizendo que ele falava o que pensava, pois a
universidade era um lugar para se pensar e discutir, ali estavam os ditos
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formadores de opino. Cleber retomou dizendo que ele não se considerava
covarde e sim cauteloso, pois tem uma família para sustentar. Cleber olhou para
esta pesquisadora e perguntou sobre os objetivos da pesquisa, quando iniciou o
doutorado, como fazia as suas viagens. Gustavo interferiu e disse que o Cleber
estava fugindo do assunto, que era a universidade, pois eles haviam iniciado
com muito atraso a reunião e o tempo já se havia esgotado. Esclareceu-se
algumas dúvidas do Cleber e encerrou-se o encontro. Ficou combinado para a
próxima semana.
Análise do 8º encontro
Novamente, compareceram ao encontro 50% dos integrantes do grupo.
Gustavo começou a falar queixando-se da irresponsabilidade dos
colegas que não compareceram. Cleber se desculpou pelo atraso e Gustavo o
criticou.
Cleber entrou na tarefa e começou a falar sobre suas experiências com
o ensino.
Em seguida, Gustavo o acusou de ser “covarde”, pois ele o “lutou”
por seus direitos em relação à disciplina que lecionava na faculdade. Cleber
retrucou e acusou Gustavo de ser suicida ou “kami-case”. Demonstraram uma
formação de sentimentos negativos, atacaram-se, evidenciaram a transferência
lateral negativa.
Após os ataques, Cleber tentou sair da tarefa, talvez para diminuir seu
suposto sofrimento em permanecer na tarefa, qual seja, falando sobre suas
experiência no ofício de ensinar. Gustavo o acusou de estar fugindo do tema
proposto. Novamente ficou evidente o pressuposto de luta/fuga formulado por
Bion (1961).
As queixas refletem o acting-out, eles agiram e não refletiram. Ficaram
limitados em suas queixas.
Representaram seu mundo interno no aqui agora. Como um grupo
desconfiado, atacaram, também, o objeto externo ao grupo.
Atacaram-se mutuamente evidenciando a transferência lateral
negativa.
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No encontro ficou evidente a rivalidade entre Cleber e Gustavo. Ambos
trouxeram o desejo de ser der e partiram para uma disputa sob o olhar atento da
pesquisadora. Ou poder-se-ia pensar em pesquisadora-mãe que observa seus
filhos disputando seu olhar? Cleber trouxe como qualidade o fato de ser
conciliador, o que Gustavo rebateu e atacou dizendo que era covardia. Cleber
contra-atacou chamando Gustavo de agressivo e suicida por lançar-se em
discussões ditas perigosas. Não estão falando de si, não estão refletindo. Eles se
atacavam. Gustavo atacou os outros, colocou-se no papel de “grande verdade”.
Aqui não se percebe o grupo marxista sabotando.
Começa-se a pensar que houve um grande delírio de perseguição,
considerando que o houve elementos que revelassem que o grupo marxista
realmente se importava com o “grupo de reflexão”. Parece que eles tentaram
compensar a sensação de pouca importância perante o líder marxista com um
sentimento de perseguição, o que os tornaria mais importantes.
Portanto, volta-se a questionar se houve o boicote ao “grupo de
reflexão” ou foi a expressão de um desejo? Em nenhum momento, até aqui,
houve a menção a fatos que ilustrassem o impedimento da realização do “grupo
de reflexão” por atividades, por exemplo, propostas pelo líder ou pelo grupo
marxista. As faltas aos encontros do grupo de reflexão” foram decorrentes dos
membros deste próprio grupo e eles ainda não refletiram sobre este fato. Talvez
nem venham a fazê-lo. Cleber e Gustavo, também, estavam fazendo uma
exibição de suas forças na presença da pesquisadora-mãe, se é que esta é a
fantasia deles. Ambos queriam o lugar de preferido da pesquisadora, um, porque
tem profissão na mesma área e, o outro, porque a conhece mais tempo. O
desejo de quererem a atenção e/ou a preferência da pesquisadora-mãe não os
isentou do pavoneamento, entre machos para impressionar a pesquisadora-
fêmea, uma vez que existiam apenas três integrantes no grupo, as outras duas
integrantes do sexo feminino não compareceram à reunião agendada.
Mais uma vez se está diante da rivalização, da disputa narcísica, da
inveja e da falta de reflexão sobre si. Limitaram-se a uma disputa corpo a corpo.
Não há ideologias, bem como o aluno não apareceu nas discussões.
Ambos desejam ser líder, mas baseiam-se na inveja e não na
proposição ou construção de um novo grupo.
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125
Volta a aparecer o provável desejo de Gustavo em querer o lugar da
pesquisadora. Ele tentou neutralizá-la. Parece que Gustavo acreditava que o
lugar dela deveria ser o de pai ou o de mãe que normatiza, determina as regras.
Ele passou a assumir essa posição. Acredita-se que ele estivesse encarnando a
sua concepção de educação. Ele se posicionou como um educador normatizador.
Nesse sentido, ficou compreensível sua rivalidade com o líder marxista, que
também é normatizador. Gustavo em sua postura revelou uma dimensão da
educação que é a de proponente de normas, regras.
9° encontro do “grupo de reflexão”
(06 de setembro de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. O prof. Gustavo estava
chegando e fomos para a sala. Pude arrumar a sala. Gustavo explicou que o
marido de Matilde havia sido hospitalizado, por isso ela não poderia comparecer.
Após alguns instantes, depois o prof. Cleber chegou. Iniciei o “grupo de reflexão”.
Noutro instante, entrou na sala a profª Renata, que foi a escolhida para ser a nova
coordenadora do departamento da faculdade. Renata falava ininterruptamente,
sobre banalidades, quase ignorando minha presença no local. Gustavo pediu
licença a ela e a mesma pediu desculpas e saiu.
Cleber retomou o assunto sobre o Gustavo ser “kami-case”, referindo-
se ao fato dele ter pedido que a nova coordenadora saísse da sala. Ambos riram
e Gustavo disse que ela era muito falante, se deixasse ia passar a manhã toda
falando e trabalho que é bom, não ia fazer. Cleber comentou que este é o
segredo da universidade, fazer de conta que trabalha, mas, na verdade, ali é
apenas mais um ganha pão e que ele depende desse trabalho, pois o consultório
não está muito bem.
Gustavo falou sobre datas especiais e lembrou que, no passado,
comemorava o seu dia profissional, mas este ano nem se lembrou e o que foi
pior, ninguém o parabenizou. Cleber comentou a mesma coisa sobre o dia de sua
profissão e disse que sentia muito por essas datas estarem perdendo sua
importância. Gustavo contou fatos do passado, quando o dia referente à sua
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profissão era comemorado com palestras e festas. Alegou que hoje sente
saudades daqueles tempos.
Cleber falou de uma colega que faleceu alguns anos vítima de um
tumor cerebral e começou a contar sua experiência com ela. Perguntou ao
Gustavo se a conhecia. Gustavo disse que sim, mas não tinha nenhuma
proximidade. Cleber passou a lamentar a perda da amiga e mostrou-se
inconformado com a questão da morte. Gustavo falou da dor de se perder
pessoas amadas, mas lembrou que é inevitável, ambos riem falando de suas
mortes e chegaram a conclusão que era melhor mudar de assunto.
Gustavo sai da sala e foi buscar cafezinho. Renata voltou a interromper
o encontro entrando na sala para dar um aviso e aproveitou para reclamar dos
demais professores que não compareciam à universidade. Gustavo brincou
dizendo que ela deveria ser macho e impor a freqüência a todos. Renata riu e
disse que não era louca, pois cada um faça o que quiser, porque ela irá fazer a
parte dela. Renata saiu da sala. Cleber falou do quanto a nova coordenadora está
vaidosa pelo cargo. Gustavo concordou e disse que ali na universidade há um
grupo de pessoas que são muito vaidosas. Cleber completou dizendo que além
de vaidosas, são invejosas e lembrou que a antiga coordenadora cia o
prejudicou diminuindo sua carga horária e ele acredita que foi pelo fato dele ter
tirado o 1° lugar no concurso, apesar de não ter mestrado e ela já está no
doutorado. Cleber fala de Lúcia com mágoa e diz que não gostaria que um dia ela
voltasse a ser coordenadora.
Gustavo lembrou que na última reunião geral dos professores fatos
semelhantes foram abordados e que eles perceberam que a Lúcia era muito
parcial, mas também tinha qualidades que as suas sucessoras não tinha. Ela
exigia a presença de todos e fazia cumprir os horários. Cleber concordou, mas
alegou que ela protegia um grupinho de pessoas e fazia média com outro grupo,
ou seja, procurava agradar gregos e troianos”. Ambos concordaram. Propus
encerrarmos a reunião, pois havíamos passado do horário. Ambos
concordaram. Gustavo ficou em e disse que queria me dar um abraço, pois
afinal de contas era o dia de meu aniversário. Cleber ficou surpreso e disse que,
se fosse aniversário dele, ele não teria ido trabalhar, todos riem. Ficou combinado
que retornaríamos na próxima semana.
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127
Análise do 9º encontro
No encontro houve, novamente, a presença de metade dos integrantes
do grupo.
Gustavo, antes de iniciar o encontro justificou a ausência da amiga
Matilde, demonstrando uma transferência lateral positiva.
Houve um fenômeno de interrupção, por parte da coordenadora da
faculdade que “ignorando” o encontro invadiu a sala e disparou a falar. Parece
que ela gostaria de ver o que acontecia ali ou gostaria de participar, mas não se
dispôs a isto.
Cleber retomou o assunto do encontro anterior e falou que o Gustavo
era “kami-case”. Gustavo disse que a coordenadora falava muito e que se “deixar
ninguém trabalha”. Ambos riram como crianças fazendo arte às escondidas.
Cleber entrou na tarefa. Falou da faculdade queixando-se que era um
“faz de conta que trabalha”. Falou que apenas queria o dinheiro, pois era o “ganha
pão”. Revelou uma transferência negativa em relação ao extragrupo.
Gustavo ficou falando sobre datas comemorativas e o quanto
atualmente não se comemora o dia do profissional. Lamentou como uma criança
que não tem festividades.
Cleber entrou em clima emocional negativo e começou a falar de uma
amiga que faleceu. Ambos falaram sobre morte. Surgiu um estado emocional
pesaroso. Representou-se no aqui agora do grupo o pesar em relação às mortes
internas de cada um.
A coordenadora da faculdade, novamente invadiu o encontro. Cleber e
Gustavo fizeram comentários que evidenciaram a transferência negativa no
extragrupo. Falaram das vaidades e invejas de seus colegas de faculdade.
Cleber queixou-se da antiga coordenadora da faculdade alegando que
esta o prejudicou, falou com mágoa. O estado emocional foi de ressentimento.
Ao rmino do encontro, Gustavo me abraçou e me felicitou, pois era
meu aniversário. Cleber estendeu a mão e disse que se fosse seu aniversário não
teria ido trabalhar. Transpareceu a transferência central positiva.
No encontro, tive a convicção de que estava certa em pensar sobre a
rivalidade entre ambos. De forma inconsciente, falaram de datas festivas. Seria
sobre meu aniversário ou sobre minha morte? O Cleber deixou transparecer sua
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rivalidade com a pesquisadora-profissional, falando de seu lugar em concurso
e que ele é apenas especialista. Lembrando que eles conhecem o dado de
estarem diante de uma pesquisadora-doutoranda. Parece que ele acena com a
inveja e rivalidade em relação a esta pesquisadora.
Os professores evidenciam, também, suas impressões sobre as
mulheres. As mulheres que pensam, produzem conhecimentos ou produzem
tumores cerebrais? Ambos, Gustavo e Cleber mostram o lado tumor das
mulheres, fazendo seus comentários sobre Renata, Lúcia e a amiga que faleceu.
A rivalidade supera o instante do grupo e passa a ser a típica rivalidade entre os
sexos, já descrita por Freud (1905).
Neste encontro configurou-se, também, o que Anzieu (1993) chamou
de fantasia de “quebra”. Foi possível notar a angústia de castração ou destruição,
principalmente quando falam das mulheres com certo tom destrutivo. As
angústias paranóides de devoração ou de perseguição destrutiva e a angústia
depressiva de separação da mãe também compõem a fantasia de “quebra”; eles
se rivalizaram, se atacaram, falaram de comemorações e de morte, como se a
morte fosse ser comemorada. Pode-se pensar que inconscientemente estão
anunciando a quebra” formal do grupo e isto traria as fantasia inerentes à
separação da mãe”. Provavelmente, no intuito de mostrar-se íntimo da
pesquisadora e assim vencer a competição com Cleber, considerando que estão
se rivalizando pela atenção da pesquisadora; Gustavo pretende o lugar de
preferido por que conhece a pesquisadora muitos anos e o Cleber pretende
este lugar por que tem profissão na mesma área e tem amigo em comum.
Gustavo, ao final da reunião, lembra” que era meu aniversário e me abraçou.
Tenho a nítida impressão de que ele estava anunciando nossa separação e
começou a se despedir, fazendo-a de forma doce para não ser devorado ou
castrado. Cleber limitou-se a estender a mão.
Neste encontro, Cleber deixou clara sua disputa profissional com a
pesquisadora-profissional da saúde. Ele se “esquece” que havia dito que seu
consultório era a fonte de sustento de sua família e que a faculdade era apenas
um complemento, agora fala o contrário. A faculdade é o provedor do sustento
familiar, uma vez que o consultório não tem dado os rendimentos necessários.
Cleber estava diante de uma rivalidade inconsciente que funcionava como
resistência a sua participação no grupo. Mostrou-se arrogante e vaidoso e ao
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129
mesmo tempo revelou sua fragilidade psíquica. No sentido fálico, conforme
Anzieu (1993) estava diante da angústia de castração. Temeu ser castrado, no
sentido de sua profissão, pela pesquisadora-profissional.
Ainda é notório, que os professores não se constituem como grupo, o
qual parece amorfo, contudo parece que a fantasia é de que é um grupo. Eles são
capazes de unirem-se para se defender de ataques, reais ou imaginários, do
externo. Quando Renata invade a reunião, eles prontamente se defendem.
Continuam depositando no outro as suas questões, ou seja, visualizam na
universidade o “faz de contas” em relação ao trabalho. Projetam aquilo que eles
fazem ou não fazem. São eles que estão fazendo de conta que o um grupo e
que estão refletindo sobre a Educação. Apresentam queixas como se fossem
crianças a reclamarem, a infantilização continua presente.
Neste encontro, ficou evidenciado, mais uma vez, que o Gustavo
queria o comando do grupo. Pode-se dizer que o der do grupo marxista é o
professor “Fulano de Tal” e que o líder do “Grupo de Reflexão” é o professor
Gustavo. Ou pelo menos esse parece ser o seu desejo. Assim, parece que
Gustavo pretendeu usar a pesquisadora no intuito de que o “Grupo de Reflexão”
pudesse vir a funcionar como um rival ao grupo marxista. Gustavo tentou paralisar
a pesquisadora no intuito de ocupar seu lugar que para ele, deveria ser o de
normatizador.
10° encontro do “grupo de reflexão”
(13 de setembro de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. Fiquei aguardando na sala.
Após uns 30 minutos, a profª Carmem chegou e justificou suas ausências com o
acúmulo de outros afazeres. Disse que a Matilde, o Gustavo e o Cleber
confirmaram que iriam ao “grupo de reflexão”. Ela pediu licença e retirou-se
alegando que voltaria quando os colegas chegassem. Aguardei por mais 30
minutos e decidi ir embora, considerando que esperei por mais de 60 minutos e a
professora Carmem o havia retornado à sala onde realizaríamos o encontro. Na
saída, encontrei a professora Carmem que estava conversando com outros
colegas e combinei que retornaríamos na próxima semana.
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130
Durante este dia a profª Matilde e o prof. Gustavo me telefonaram
pedindo desculpas por não terem comparecido ao grupo. Matilde disse que,
naquele dia pode ir à universidade depois das 10:00h e o nosso grupo se
encerra às 09:30h. Gustavo disse que foi convocado, às pressas, para uma
reunião em outro local. O Cleber não apresentou justificativa.
Análise do 10º encontro
Fiquei diante de um turbilhão de sentimentos. Ocorreu-me que tanto o
Gustavo quanto a Matilde tiveram seus motivos externos para faltarem e tiveram o
cuidado de avisar-me. Não estou esquecendo que o aviso não fora dado com
antecedência, mas estou considerando a possibilidade real de imprevistos. O
Cleber não se importou em dar explicações, talvez esteja ressentido por não estar
fazendo uma aliança com a pesquisadora para poder enfrentar o Gustavo.
Contudo, neste encontro a indagação maior é em relação à Carmem: por que não
aproveitou a ocasião e usou para refletir? Por que preferiu “fugir da sala como
um aluno que foge da aula? Parece que este é o funcionamento dominante:
comportam-se como alunos. Neste sentido, estaria ratificando a posição mais
infantil, imatura. Evitar a reflexão seria como evitar pensar sobre sua condição de
professor adulto e que tem alunos. Aguardar-se-á o próximo encontro.
11° encontro do “grupo de reflexão”
(20 de setembro de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. Fui até à sala para
prepará-la. A profª Matilde estava lá. Fui recebida com entusiasmo e logo
Matilde passou a justificar suas ausências. Falou do marido doente e de um filho
que estava para ganhar bebê. O prof. Gustavo chegou e foi servindo cafezinho.
Dei início à reunião. Ambos estavam sem contato há alguns dias e Matilde passou
a detalhar sobre a doença de seu marido, as dificuldades financeiras que tem
passado e sobre a vinda do neto(a) que se aproxima. Falaram sobre os colegas.
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A profª Renata entrou na sala conversando. Gustavo me olhou e
começou a rir. Matilde voltou a dar explicações para Renata que fez várias
perguntas de cunho pessoal. Renata estava radiante, pois sua nomeação para o
cargo de coordenadora havia saído no diário oficial. Gustavo a parabenizou e
ironicamente disse que ela estava em uma fria. A coordenadora geral, Cristina,
chegou, veio até à sala e todos foram cumprimentá-la. Matilde levantou e foi beijá-
la, Gustavo continuou sentado e me apresentou à coordenadora. Renata saiu
com a coordenadora geral.
Matilde e Gustavo começaram a ironizar sobre o fato da chefe geral ter
vindo trabalhar e me falaram que ela vem eventualmente e no final do expediente.
Segundo eles, a chefe aparece nos dias de reuniões para chamar a atenção
de todos. Gustavo disse que não concordava com o método de ficar dando
bronca no plural, pois que os nomes de quem cometeu a falha e poupe os
demais da bronca. Matilde alegou que somente assim elas conseguem mostrar
serviço.
Gustavo e Matilde mostraram-se constrangidos pelo fato de não termos
conseguido reunir o grupo sistematicamente. Gustavo disse que isto é bom, pois
ficou claro como que a universidade funciona de uma forma fragmentada e que o
discurso é muito diferente da prática. Lembrou que o Cleber caiu em contradição
dizendo que a universidade era um bico e que depois confessou que dependia
dela para o sustento de sua família. Matilde disse ter preocupações com o Cleber,
pois pensa que ele deve ter problemas como líder religioso e como profissional
liberal, uma vez que não é especializado e, na carreira de docente, ele nem o
mestrado tem e nem está cursando. Gustavo alegou que o Cleber é mais um
enganado com a educação e que pensa que ser professor é fácil. Para Gustavo,
ser professor demanda estudos e dedicação. Gustavo falou que iniciou o
doutorado e que não pôde concluí-lo porque a universidade onde lecionava o
demitiu após 28 anos de casa. Falou que sempre está lendo e mesmo assim é
difícil manter-se atualizado. Matilde confessou que lê bem menos que o Gustavo
e que ele é sabidamente um intelectual, pois publica em revistas nacionais e
internacionais. Ela acha injusto ele estar na situação que está. Gustavo disse que
também achava injusto, mas que isto é a realidade brasileira, que os honestos
nem sempre são bem sucedidos e os melhores cargos não necessariamente são
dados às pessoas por sua competência. Ambos ficaram falando de política local
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com os exemplos de corrupção e de desonestidade. Sugeri a ambos que
encerrássemos a reunião, pois já estava no horário e propus que tivéssemos um
último encontro com todos. Eles concordaram e disseram que iriam convocar os
demais para a próxima semana.
Análise do 11º encontro
Novamente, contou-se com 50% dos integrantes do grupo.
Matilde começou a falar sobre a experiência pessoal, sobre a saúde do
esposo, a preocupação com os filhos e a chegada do neto.
A coordenadora da faculdade, mais uma vez invadiu a reunião. Em
seguida a coordenadora geral fez o mesmo. Pareceu que o grupo gerou uma
curiosidade na coordenação. Tem-se a impressão de que desejam participar do
encontro, mas não o fizeram. Há uma resistência sendo evidenciada.
Gustavo começou a falar e ironizou as atitudes tomadas pela
coordenação geral da faculdade em relação aos professores. Matilde concordou
com Gustavo. Gustavo ficou irritado e falou com raiva sobre as “broncas no plural
que as chefes expressam em reuniões. Ficou evidente a transferência extragrupo
negativa. Houve um estado emocional negativo, houve desconfiança e
insatisfação com seus colegas.
Gustavo e Matilde falaram que estavam “constrangidos” porque não
conseguiram a participação de seus colegas no grupo de reflexão. Criticaram
seus colegas. Deixaram transparecer a transferência lateral negativa.
Queixaram-se da faculdade afirmando que o discurso é diferente da
prática”. Queixaram-se como crianças e ao mesmo tempo, ironizaram as figuras
de autoridade. Demonstram a existência do pressuposto de dependência.
Falaram do Cleber com um certo tom de crítica, deixando exposta a
transferência lateral negativa.
Gustavo passou a elogiar-se e obteve o apoio de Matilde. Conseguem
valorizar apenas o que é seu. Revelam o narcisismo. O que é bom está no grupo
e o que é ruim está fora do grupo. Surge o mecanismo da cisão.
Encerrou-se o grupo com Gustavo e Matilde falando de política local.
Falaram da corrupção. O extragrupo carregado de sentimento negativo.
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Ficaram na pré-tarefa. Revelaram, assim, a resistência em entrarem na
tarefa, talvez com o intuito de evitarem um possível sofrimento ao falarem sobre
seus vínculos com a educação.
Neste encontro ficou explícita a cumplicidade entre Matilde e Gustavo.
Ambos permaneceram aliados contra o Cleber. Falaram sobre seus chefes e
mantiveram o ar de ironia e descaso, o que nos faz pensar na inveja. Conforme já
havia pensado, parece que eles estão prestes a uma cobrança consciente de uma
participação, talvez, interpretativas por parte da pesquisadora. Sabe-se que não
seria este o papel da pesquisadora neste momento no grupo, mas o grupo cobra
uma intervenção, apesar de fugirem dele. Parece que eles querem uma solução,
como se a pesquisadora tivesse que cumprir o papel de “salvador da pátria”,
proponente de alguma solução mágica. Não seria este o desejo das crianças em
relação aos pais? Estariam eles reclamando que o pai-líder-marxista oferece um
posicionamento claro, normativo e a pesquisadora não cumpriu o desejo deles de
serem conduzidos? Seria esta a idéia que eles têm da Educação? Seria a
educação algo fácil de ser executado?
Gustavo limita-se ao rancor e à mágoa em relação à outra instituição
que o teria supostamente impedido de concluir o doutorado. A outra instituição o
impediu ou foi ele mesmo que o lutou o suficiente para concluir o doutorado?
Sabe-se que qualquer conquista demanda esforço. Parece que eles repetem com
a pesquisadora o que sempre fizeram, ou seja, colocam-se na posição de vítimas
ou infantilizam-se e ficam nos lamentos. Reclamam das injustiças, mas não
propõem soluções e nem se lançam para ir buscá-las. uma noção de
facilidade, como se não estivessem diante das dificuldades da vida.
A questão do narcisismo se faz notar, novamente. Gustavo reclamava,
como uma criança, das broncas que recebia e deixa claro que deveria ser
elogiado, pois ele cumpria suas obrigações. Deve-se lembrar que ele o se
propõe a refletir no grupo ou a comparecer assiduamente aos encontros.
Novamente a projeção e idealização se apresentam. Gustavo falou
sobre uma universidade que funciona fragmentada, enquanto que a fragmentação
faz parte deste grupo de professores. A rivalização e agressividade permanecem.
Falaram do Cleber com descaso e certa maledicência. Eles não falaram de seus
alunos, é como se a escola fosse feita apenas de colegas e superiores. Eles
estão imersos em um mundo que parece bem distante da Educação como uma
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construção. Falaram do outro, ou seja, da instituição e de seus colegas sempre
pelo lado negativo, como se quisessem que o outro ou eles próprios fossem o que
não são.
12 ° encontro do “grupo de reflexão”
(27 de setembro de 2005)
O grupo fora previamente cancelado por motivo de forte chuva no dia
anterior e previsão de “furacão”. Várias instituições públicas e privadas e,
também, escolas dispensaram seus funcionários e alunos a pedido da defesa
civil.
Neste dia a faculdade estava paralisada.
13° encontro do “grupo de reflexão”
(04 de outubro de 2005)
Cheguei à universidade no horário habitual. Na chegada encontrei o
prof. Gustavo e fomos para a sala onde já estava a profª Matilde. Organizei a sala.
Gustavo serviu cafezinho. Dei início ao “grupo de reflexão”. Conversaram sobre o
netinho de Matilde que nascera na noite anterior. Falaram sobre os prazeres e
desprazeres da maternidade e paternidade. Matilde falou de seus sentimentos por
ser avó. Falou do quanto estava feliz e não via a hora de poder brincar com o
neto. Gustavo falou sobre seu constrangimento por notar que seus colegas, mais
uma vez, não vieram para o grupo. Matilde disse que temia que eu ficasse com
uma impressão errada dos professores. Gustavo deu gargalhada e disse que era
impossível ter impressão errada diante dos fatos, quais sejam, os professores são
negligentes, relapsos e não têm nenhuma compreensão do que seja o
compromisso com um colega pesquisador, o que vale dizer que não sabem o que
é ciência. Gustavo continuou dizendo que tudo isto havia sido dito, pois o fato
era que na universidade não o hábito de se falar sobre ciência, de estudar.
o hábito de se fazer fofocas e puxar o tapete um do outro.
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Matilde interrompeu e disse que o Gustavo estava sendo cruel.
Gustavo perguntou quando foi que eles se encontraram para estudar ou discutir
ciência. Matilde sorriu e disse que Gustavo tinha razão. Ambos me pediram
desculpas e lamentaram o fato de não termos podido reunir o grupo mais uma
vez. Expliquei a eles que o grupo estava com 50% de seus membros e que se
esta era a realidade, então era com ela que iríamos trabalhar. Encerramos o
grupo. Deixei-os à vontade para conversarmos, futuramente, sobre o meu
trabalho de pesquisa. Nos despedimos.
Análise do 13º encontro
Neste encontro tivemos a presença de metade dos integrantes do
“grupo de reflexão”. Ambos ocuparam seus lugares, sempre de frente um para o
outro e, também, para a pesquisadora. Matilde começou a falar trazendo uma
experiência pessoal sobre o nascimento do neto. Parece que Matilde preferiu um
assunto agradável a ter que falar sobre a educação, tarefa proposta. Falar de uma
experiência agradável, talvez seja fugir do assunto proposto. É uma forma
defensiva de evitar falar de algo que possa ser mais doloroso.
Em seguida, Gustavo entrou na tarefa, vivenciando-a no aqui agora.
Falou de seus colegas “negligentes”, demonstrando a transferência lateral em seu
aspecto negativo. Revelou sentimento negativo falando do extragrupo apontando
a falta de desempenho científico de seus colegas de faculdade. Afirmou que
fazem “fofocas”, reclamou da falta de sentimento de pertincia (“puxam tapete”,
“nunca se encontram para estudar”). Encerrou-se o grupo com um lamento de
não terem podido se reunir mais vezes. Parece que perceberam a falta que o
grupo irá fazer e por isso demonstram um sentimento de pesar.
Os professores mantiveram-se basicamente na pré-tarefa. Esse
fenômeno pode ser visto como uma resistência do grupo para se reunirem.
Quando conseguem entrar na tarefa, o fazem com lamentos e queixas. São
desconfiados em relação a seus colegas, revelam sentimentos negativos, o que
Bion (1961) denomina em seus pressupostos básicos de luta/fuga. O grupo se
encerrou com um sentimento de angústia de separação. Finalmente a
pesquisadora, também, vivenciou o clima emocional da separação e, na ânsia de
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minimizar o sentimento de perda, atribuiu um sentimento de reconhecimento das
necessidades dos professores e lança uma esperança: “futuramente poderemos
nos encontrar”. Apesar de ser uma esperança messiânica, esta pode ser vista
como encorajadora.
Mais uma vez ficou evidente a parceria entre Gustavo e Matilde, agora
unidos contra os outros dois, Carmem e Cleber. Ambos foram muito gentis e ficou
clara a tomada de posição do Gustavo quando se disse a favor da ciência. Deu a
impressão de estar, também, tentando uma forma de restauração em relação a
uma possível quebra frente à pesquisadora. Valorizar a “ciência” seria valorizar a
pesquisadora-cientista. Reafirmar seu lugar de preferido pela pesquisadora-mãe,
garantir um lugar de destaque, quem sabe de filho preferido.
Matilde ateve-se mais a sua dedicação amorosa como vovó. Deixando
transparecer que a forma que encontra de falar sobre educação é familiar, ou
seja, não fala de alunos, mas sim de filhos e netos. Fica notória a sua participação
na educação como “apaixonada”, vocacionada pelo amor.
É possível notar o narcisismo, uma vez que os professores
aparecem, nem seus alunos encontram lugar nas conversas. Continuam
queixosos, reclamam, mas sempre do outro; projetam e idealizam os conteúdos.
Aqui surge uma questão: o fato deles falarem sobre seus familiares e não falarem
de seus alunos seria em decorrência, também, de uma fantasia em relação à
psicanálise? Pensam que para a psicanálise a única coisa que importa é o afetivo
familiar?
Encerramos nossos encontros, uma vez que combinamos que seriam
em torno de 12, no máximo.
A sensação que ficou foi a de estar contida, impedida de questionar
sobre dados afetivos, considerando que a proposta fora para um grupo de
reflexão” e não um grupo terapêutico. Talvez esta, também, tenha sido a
sensação que ficou para os membros do grupo.
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5.3 Discussão Geral
O grupo de reflexão, composto por quatro professores universitários,
teve um total de 13 encontros. Sendo que apenas sete se realizaram
efetivamente, e destes, apenas um contou com todos os integrantes.
Ao iniciar as considerações sobre o “grupo de reflexão”, nota-se que,
desde o primeiro encontro, os componentes presentes não falaram ou falaram
pouquíssimo sobre suas experiências no ensino superior.
Também fica expressivo o fato de não falarem de seus alunos, das
experiências em sala de aula, das questões ligadas à educação que pudesse
afligi-los. De forma recorrente queixam-se ora dos colegas, ora dos superiores
hierárquicos, ora da instituição como um todo. A queixa e os lamentos são tão
presentes quanto a ausência das experiências como educador, sobretudo no
ensino de terceiro grau.
Começa-se, então a se indagar: por que não falaram sobre a
educação no ensino superior? O que os estaria impedindo de atender a
solicitação desta pesquisadora, ou seja, de entrarem na tarefa proposta? Ao invés
disto, falaram de outras coisas que consideraram importantes. Falaram do
passado, como se fosse uma espécie de memorial, biografia, como, por exemplo,
a Matilde no primeiro encontro. Ficou-se com a impressão de que fizeram de
alguns encontros um momento catártico. Não usaram o grupo para reflexão.
Neste sentido, pensa-se que eles se comportam como sujeitos a um destino e
não sujeitos de uma reflexão. É-lhes oferecido um momento em que são tratados
como sujeitos pela pesquisadora e eles respondem como crianças queixosas.
Logo nos primeiros encontros apareceu uma metáfora que favorece o
surgimento de reflexões sobre o funcionamento do grupo: “gaiola de papagaios”
(expressão utilizada por Gustavo no terceiro encontro). Eles se sentem capazes
de pensar, contudo se igualam à gaiola de papagaio”. Parece que essa é a
fantasia que subjaz ao grupo. Dando asas a percepção desta autora sobre a
metáfora, destaca-se que o Papagaio fala e não pensa. Os membros do “Grupo
de Reflexão” se vêem como papagaios? Seria a gaiola o local de acolhimento?
Para que consigam deixar a posição de meros papagaios e conquistem a posição
de sujeitos, é necessário lutar por esta nova posição. Os integrantes do grupo
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mostram-se queixosos, como por exemplo, Gustavo, em relação a seu doutorado
não concluído, que apenas lamenta. Não criam possibilidades de soluções.
Querem deixar de ser papagaios, mas não lutam por esta condição. Está exposta
a ambigüidade do grupo.
Nesse contexto, é possível entender a dificuldade em participar do
“Grupo de Reflexão”, é ameaçar a condição de papagaio. Ameaçar a condição de
papagaio equivale a humanizá-lo. A dimensão do conflito existente está na
angústia de poderem pensar, querem, mas ao mesmo tempo não querem pensar.
São papagaios, tentam sair dessa condição, mas é difícil. Entende-se suas faltas
aos encontros do grupo como resistência a pensar, a deixar de ser papagaio.
Compreende-se que um grande esforço para estarem no “Grupo de Reflexão”.
Estão lutando para deixarem de ser papagaios que simplesmente repetem.
Surge uma nova questão: se estão na gaiola, como papagaios, quem
os colocou neste lugar? Quem os prendeu na gaiola? se evocar Freud (1921) em
Psicologia das Massas e análise do Ego, nota-se que quem os prendeu pode
ser o líder, um grande chefe, no caso o “líder marxista”, seria o mais provável.
Agora sim, a pesquisadora, com seu “Grupo de Reflexão” seria então o alguém
esperado para libertá-los da tal gaiola? O “Grupo de Reflexão” surgiria como a
possibilidade de humanização do papagaio? Estariam eles engaiolados pelo
Marxismo? Aqui se pode falar do “Marxismo” como sendo o perseguidor, isto se
levar em conta o mecanismo da projeção, não esquecendo que ela é filha da
cisão, o que equivale dizer que eles estariam projetando um objeto parcial.
Projetam no perseguidor o seu desejo em ficar engaiolado. Projetam na
pesquisadora e no “Grupo de Reflexão” o desejo de serem resgatados para o
mundo dos humanos pensantes. Nota-se que desejam ser resgatados e o
lutam para conquistar essa posição. A passividade fica evidente, bem como a
ambivancia.
A rivalidade entre eles se faz notar, bem como a rivalidade entre eles e
os outros. Rivalizam-se, como por exemplo, Cleber e Gustavo deixam
transparecer tal rivalidade de forma a beirarem a agressão verbal. Chegam a se
chamar de “Kami-case” e de “covarde”, reciprocamente. Lutam pelo lugar de
preferido, cada um a seu modo.
Nessa rivalização, aparece uma crença de superioridade. Por ser,
supostamente, superior e aqui não importam os motivos (amigo em comum,
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tempo de conhecimento, profissão na mesma área, etc), são os craques que não
precisam provar suas habilidades, não precisam expor suas idéias, como se elas
pudessem se manifestar espontaneamente. Como um craque que o precisa
fazer esforço, suas qualidades têm que ser reconhecidas pelo público e pronto.
Nesse contexto, valeu-se das idéias de Mezan (2006), ao escrever no
jornal Folha de São Paulo, do dia nove de julho, sobre a derrota da seleção
brasileira de futebol nos jogos da Copa do Mundo. Mezan (2006, p. 3) escreve:
Não é impossível unir indivíduos brilhantes numa equipe: os
físicos que fizeram a bomba atômica, os conjuntos de câmara de
música erudita, os professores de um cursinho bem - sucedido
mostram que isso é factível. Mas, para obter êxito nessa tarefa é
preciso vencer obstáculos muito específicos. Um deles é a
rivalidade entre os integrantes do grupo; outro consiste na
confiança na própria superioridade, na crença de que a
performance esperada se materializará espontaneamente [...].
Continua o autor em seus comentários acerca da derrota da equipe,
apontando que não houve a formação de uma equipe. Mezan (2006) esclarece
que o espírito de equipe se constrói nas bases descritas por Freud (1921) em
“Psicologia das Massas e Análise do Ego”, ou seja, é necessária a identificação
entre os membros do grupo, como conseqüência da identificação de cada um
com um ideal de ego investido por todos.
Se comparando o “Grupo de Reflexão” ao Grupo de craques do futebol,
chega-se a mesma conclusão, qual seja: não houve a formação de uma equipe.
Os integrantes do Grupo não revelaram uma identificação com o ideal comum: a
educação.
Desse modo, na presente pesquisa, percebe-se que os professores
que participaram dela, não se constituíram como grupo, exatamente por que não
manifestaram a existência de um ideal comum que os unissem. Movimentaram-se
como um agrupamento. Suas queixas foram individuais, as rivalidades foram
pessoais.
Nesse sentido, Neder Bacha (2002) ressalta que esta suposta falta de
identificação com os ideais da educação, que se nota como desvalorização, está
vinculada à resistência ao feminino. Conforme a autora, em nosso inconsciente o
ofício de educar está associado à figura materna, a mãe ogra, devoradora, diante
da qual nós nos protegemos.
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Aos poucos foi ficando nítida a identificação do grupo com a criança.
Os professores queixam-se de pais castradores, pais que podem conter seus
impulsos, uma vez que eles próprios sugerem que não poderiam fazê-lo. As
crianças o conseguem conter seus próprios impulsos e necessitam da ajuda
dos pais.
Compreende-se que é necessário conter os impulsos, dar vazão a
todos os impulsos é mortificante. Estão identificados com seus alunos, portanto
não falam deles. Falam como se fossem alunos, fruto de uma educação
repressora. Queixam-se dos adultos, ou seja, dos repressores.
Queixam-se como crianças que buscam o lugar de escolhido, preferido
pela mãe. Por um instante mostram que gostam de seus alunos, mas colocam-se
como vítimas da instituição. São vítimas de pessoas que ocupam lugares de
poder na instituição, o que equivale dizer que em suas fantasias são vítimas de
pai e de mãe. Competem com os irmãos, no caso colegas de trabalho, pelo olhar
de preferências desses pais ou mães institucionais.
Percebe-se, então, que a proposta de “grupo de reflexão” nos limitava,
ou seja, não nos dava liberdade para lidar com questões afetivas uma vez que a
proposta era clara, qual seja refletir sobre as experiências como educador no
ensino de terceiro grau. Começa-se a pensar que talvez Delarossa tenha ficado
preso aos aspectos secundários do funcionamento mental e a utilização das
idéias de Anzieu proporcionaria a condição de ir mais além na compreensão do
“grupo de reflexão”. Talvez a formação, desta pesquisadora como psicanalista
formada pela IPA, a tenha deixado com menos liberdade para interferir no
andamento do grupo. Contudo, como atualmente já desligou-se dessa instituição
e procurando alargar o campo de visão psicanalítica, pode-se, a posteriori,
compreender o ocorrido.
Nota-se que de fato há uma fantasia subjacente ao grupo, como há nos
sonhos. A fantasia subjacente que começa a se delinear é bastante caótica, é o
impreciso. Parece que a fantasia diz respeito ao fato de o grupo querer esta
autora e também ao espaço do “grupo de reflexão” como uma defesa contra a
angústia de viver o caótico, uma defesa contra a angústia de dissolução. A
vivência de tal angústia equivale a vivência de se dissolver no outro, ou seja, o
retorno ao útero materno. Configuraria a morte psíquica, a perda de sua própria
singularidade. A oferta do “grupo de reflexão” é a oferta do invólucro, do
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continente para essa angústia. Tal continente poderia viabilizar a transformação
do impreciso no eu, no caso do grupo na transformação para o nosso.
Observa-se que os componentes do “grupo de reflexão” viviam a
angústia de dissolução, do impreciso. É como se apenas o “grupo marxista”, em
suas fantasias, se constituíssem como grupo. Os professores do “grupo de
reflexão” chegam sentindo-se um nada e crêem que a construção desse grupo
poderia funcionar como a cola, o aglutinador que pudesse lhes dar a
singularidade, o eu.
A angústia tem sua dimensão criativa e também paralisante, os
integrantes do grupo não usam do espaço proporcionado pelo grupo de reflexão”
para mergulharem nessa angústia e aproveitarem aquilo que ela possa lhes
oferecer de criativo: a reflexão. Ficam, neste sentido, paralisados.
Como os professores estiveram todo o tempo dos nossos encontros
identificados com a criança, usam de inúmeros momentos dos encontros para
atacarem as variadas figuras de autoridade que possam estar presentes ou
ausentes. É por isso que, tal como crianças disputando em seus times, atacam a
cada encontro o “grupo marxista”.
Nesse contexto, não é de surpreender que eles tenham empregado
uma claríssima metáfora para descreverem seus modos de estarem na
instituição.
Talvez o fato de não terem respondido à pergunta disparadora: “Fale
sobre suas experiências como educador, sobretudo no ensino superior”, seja,
conforme dito anteriormente por Neder Bacha, um revelador das dificuldades
impostas no reconhecimento da identificação com o feminino como educador.
Essas dificuldades seriam, então, um grande indicador da importância da
contribuição de um “grupo de reflexão” como um trabalho psicanalítico,
socialmente contextualizado, na instituição de ensino.
Dando prosseguimento, surge uma indagação: qual foi o retrato da
educação no Brasil que conseguimos a partir do grupo de reflexão” com
professores do ensino superior? Que imagens conseguimos captar?
Nota-se que a idéia de missionário, trazida pelos Jesuítas, continua
presente nas falas dos educadores, sujeitos desta pesquisa. Não raro observa-se
as expressões da educação igualar-se a um sacerdócio. Essa idéia surgiu no
“grupo de reflexão” de forma bastante clara; a noção de missionário, alguém que
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tem uma missão a cumprir. O cumprimento de tal função vem carregado de um
certo amor”, que traz impregnado a noção de sacrifício. o vamos confundir
uma educação carregada pelo sexual-afetivo (sexualidade inconsciente nos
termos em que Freud a definiu), que proporcionaria uma riqueza de sentimentos e
o desejo em criar e conhecer, com a proposta vocacionada do amor com
sacrifício”.
Nota-se então uma vertente da educação expressa, principalmente por
Matilde, carregada deste amor/sacrifício que a empobrece. o traz uma
aquisição prazerosa do conhecimento e sim o sacrifício em transmiti-lo. Essa é
uma vertente bem atual da educação. Outra vertente é a expressa por Gustavo,
que revela o lado do educador normatizador, capaz de dizer o certo e o errado,
aquele que tem discípulos. Esse é um modelo de educador bem conhecido, o
educador que sofre por que tem de conhecer a verdade e não pode errar, mesmo
que tenha que criar suas próprias verdades. Em seguida vem uma vertente bem
conhecida nas faculdades: a do educador que não se reconhece como tal. O
profissional que se reconhece a partir de sua profissão de origem e não deseja
ser reconhecido como educador. Foi o caso do Cleber. Figura bem comum que
encarna a “desqualificação” do professor. Finalmente depara-se com a baixa
criatividade, aquele professor que segue as massas, que apenas se limita a
cumprir o necessário ou o solicitado. O investimento pessoal na educação é
pequeno. Carmem incorpora esse personagem, apenas é levada pelo grupo para
onde for; não revela críticas ou sugestões expressivas, enfim, participa pouco ou
não participa.
Parece que cada elemento que compôs o “grupo de reflexão” deixou
impressa sua marca, qual seja, a marca que cada um traz de sua transferência
em relação à Educação. O retrato tirado apresenta, portanto, quatro ângulos em
uma foto. A foto Educação no ensino superior ficou composta pelos ângulos,
“pobreza”, “normatização”, “desqualificação” e “falta de criatividade”.
Compreende-se que o existe apenas essa foto da Educação,
também, os ângulos opostos, como “riqueza”, “democracia”, “valorização e
“criatividade”. Contudo, estes vértices precisam ser encontrados a partir do desejo
de cada um.
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Considerando esses dados, pode-se, então, afirmar que o “grupo de
reflexão” pode servir como fonte de dados para o psicanalista compreender a
educação.
Ao chegar ao final deste trabalho, é possível afirmar, também, que a
prática do “grupo de reflexão” pode ser de grande auxílio para o professor. No
caso dos professores desta pesquisa, o grupo certamente poderia tê-los ajudado
a colocar e elaborar seus conflitos se essa prática fizesse parte de sua realidade
institucional.
Conclui-se, este trabalho, apontando mais uma vez que a Educação é
um constante vir a ser e que é de fundamental importância que os laços entre
Educação e Psicanálise mantenham-se apertados. Entende-se que apenas a
psicanálise articulada com a cultura oferece a compreensão da complexidade da
subjetividade do sujeito. Na ânsia de conquistar a compreensão da Educação
com o referencial da psicanálise, propôs-se o “grupo de reflexão”. Entretanto, não
se constituiu um grupo! Mesmo assim, será que se conseguiu angustiar os
professores o suficiente para provocá-los a pensar sobre sua transferência em
relação à educação?
Dando continuidade, torna-se mister ressaltar Anzieu (1993, p. 21)
quando afirma que “O grupo é uma colocação em comum das imagens interiores
e das angústias dos participantes”. Ficou evidenciado no “grupo de reflexão” que
mesmo que eles não tenham se constituído como uma equipe, por falta de um
ideal comum, vivenciaram suas angústias e projetaram as imagens internas para
o externo. Mesmo que não tenham tido a composição de grupo, viveram a
angústia de uma possível perda da identidade do ego. Como tem sido difícil para
eles perceberem, se é que perceberam, a posição de vítima na qual vivem. Não
abrem mão desse lugar, o de vítimas da situação.
No entender de Foulks (1967) o trabalho com grupos só faz sentido se
trouxer benefícios individuais. Por isso, crê-se que as preocupações de Matilde,
ao término dos encontros, bem como a exclamação de Carmem no primeiro
encontro, por exemplo, supõe-se que, talvez, de alguma forma, o “grupo de
reflexão” as ajudou.
Ao pensar com Bion (1975), notar-se que os sujeitos do “grupo de
reflexão” deram respostas automáticas (mentalidade primitiva), mas que, também,
apresentaram pensamento simbólico (mentalidade de grupo de trabalho).
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Conforme esse autor, os professores estariam presos aos supostos básicos que
dão suporte à mentalidade primitiva de dependência e também de luta/fuga.
O grupo que não se constituiu como grupo deixou clara a ambivalência.
Apresentaram características próprias de grupos e ao mesmo tempo não se
constituíram como tal. Revelaram a Ilusão Grupal, dita por Anzieu (1993),
sobretudo no quesito ameaça de perda da identidade (dinâmico) e a defesa
coletiva contra a angústia persecutória (econômico). Neste caso, a defesa contra
o perseguidor “marxismo”.
Os professores, ao tentarem seu mergulho no grupo, encontram a
angústia, sobretudo na dimensão autodestrutiva (pulsão de morte clivada). Não
conseguem chegar à dimensão mais encantadora, criativa. As representações
giram em torno da Fantasmática Oral, a pulsão sádico-oral se faz notar. Fazem
comentários maldosos dos outros”. A angústia paranóide de perseguição e
devoração se apresentam em vários momentos, principalmente em relação ao
“grupo marxista”, deixando exposta a Fantasia de Quebra.
Com relação aos Organizadores propostos por Kaës (1997), ressalta-
se a dificuldade de viabilização dos vínculos; a noção de grupalidade vem da
identificação e da projeção que tem em relação à Educação. Evidenciam, assim,
os Organizadores Sócio Culturais, deixando clara a sua representação cultural.
Os professores estão inseridos na cultura que determina o tipo de pensamento
sobre a Educação. Parece que não houve a constituição de um Aparelho Psíquico
Grupal, nos moldes descritos por Kaës. Este autor afirma, também, que os
organizadores psíquicos são inconscientes e de formação relativamente complexa
que viabilizam os vínculos do agrupamento. São arranjos inconscientes que
determinam o lugar ocupado pelos membros do grupo em um dado momento.
Movimento clássico das relações de objeto.
Ao afirmar que não houve formação de vínculos, fala-se segundo
Pichon-Rivière (1986), que o vínculo como estrutura dinâmica que envolve o
sujeito e objeto. Na verdade os vínculos existem, mas o se constituíram como
tal no “grupo de reflexão”.
Nesse momento é importante destacar o pensamento de rzis (1999)
quando afirma que no processo transferencial em grupo, transfere-se no aqui
agora os grupos internos de cada um. O grupo de reflexão” passa a ser uma
cópia do grupo primário. No processo terapêutico esses elementos são
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analisados, contudo no “grupo de reflexão” esses dados apenas ilustram o
movimento multitransferencial no aqui agora do grupo. Ainda para o autor, os
sujeitos do “grupo de reflexão” transferem para a pesquisadora suas
representações e ficam esperando respostas, soluções, explicações que os tirem
da gaiola”. Essa seria a transferência no objeto central - transferência central.
Sendo as transferências múltiplas, cada professor do grupo de reflexão”
representava no aqui agora, a imagem da irmandade - transferência lateral.
Aqui surge a Organização do Poder apontada por Pagès et al. (1993).
Deve-se considerar a estrutura da instituição na qual os professores estão
inseridos. uma competitividade instalada e a presença de líderes que
pretendem a conquista de poder. Este fato desencadeia nos docentes, a
competição e a busca pelo poder, contudo, faz-se necessária a árdua tarefa de ir
lutar pelo poder. Na posição mais infantil e queixosa, não espaço para se ser
der. Neste lugar é possível ser liderado.
Líder e liderado ou opressor e oprimido. Estando-se diante da história
da educação no Brasil, compreende-se que os avanços da Educação
transcorreram muito mais em função de uma economia do que das necessidades
educacionais propriamente ditas. Esses dados são possíveis de observar ao olhar
a construção da Educação que se iniciou com os jesuítas catequizando os índios,
determinando a sua verdade. A educação a serviço da religião. Em outro
momento, ela perde este caráter, mas assumi a posição de educação a serviço da
economia vigente. Fica fácil notar a idéia exposta por Chauí (2001) quanto à
equiparação das escolas a supermercados, ou seja, a transformação da
instituição social em organização social.
Ao se compreender as LDBs e as transformações que a educação vem
sofrendo ao longo dos tempos, fica mais fácil entender por que o professor pensa
em estar numa instituição pública com fins de aposentadoria, associada a ilusão
do emprego garantido. A entrada em uma instituição pública traria a possibilidade
de uma melhor aposentadoria e a dificuldade em perder seu emprego. Isto não se
faz notar na instituição particular, onde o tempo não lhe dá nenhuma garantia de
estabilidade. Gustavo fora demitido após quase 30 anos de trabalho na mesma
instituição.
Olhando a história da Educação no Brasil, entende-se por que o “grupo
de reflexão” não atingiu plenamente seus objetivos. O medo foi o maior
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responsável! Medo de se expor, de enfrentar suas fantasias, medo de confrontar-
se com sua iia sobre educação, medo em perceber que o “outro” é apenas uma
projeção de partes de si mesmo, medo das fantasias sobre os mistérios da
psicologia e da psicanálise. Enfim, medo de se reconhecer como educador em
uma cultura que se defende desta percepção.
Bacha (1998/2002) elucida esse medo ao revelar que, no inconsciente
de cada um de nós, o educar está intimamente relacionado à figura da mãe, ao
feminino. Não é necessário relembrar o quanto o feminino nos é apresentado
como assustador e do qual deve se defender. Teme-se a identificação com os
ideais da educação na medida em que se teme a identificação com o feminino.
Nesse caminho, pode-se inserir “grupos de reflexão” que sem dúvida
alguma poderão servir como agentes de mudança e assim cumprir em um
importante papel transformador. O “grupo de reflexão” poderá auxiliar na
conquista de um novo olhar para a educação na medida em que poderá favorecer
a reflexão dos professores sobre si mesmo, proporcionando o alívio das suas
tensões. Assim, o “grupo de reflexão” poderá ajudá-los a romper com barreiras
que impedem o pensar e o sentir, fazendo o encontro entre ensinar, criar e
brincar.
A compreensão de alguns aspectos da conjuntura histórico-sócio-
econômica o alívio do entendimento, contudo é imperativo que a educação
possa servir como instrumento para a mudança dessa realidade social. A
educação poderá cumprir este papel quando seus integrantes, professores,
puderem estar próximos de seu feminino. Parafraseando Neder Bacha, quando os
professores entenderem que são “Mestre e Cuca” ao mesmo tempo. Os Cucas,
porque são mestres que ensinam. A Cuca porque podem ser bruxas. E cuca
porque são deliciosos pães, conforme a cultura sulista, prestes a serem
devorados!
Conclui-se este trabalho ressaltando a descoberta de como um “grupo
de reflexão”, conduzido por um psicanalista, pode contribuir na prática dos
professores, por exemplo: levá-los a perceberem aquilo que a psicanalista pode
observar no grupo, ou seja, as relações intrincadas e complicadas no ofício de
ensinar; as transferências, e como isso interfere nos resultados que visam obter
com seus alunos e com a instituição.
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Foi possível observar, também, que um “grupo de reflexão” poderia
trabalhar, sistematicamente, a transferência que tem em relação à educação
como sendo a mãe má, diante da qual os professores se colocam como vítimas,
sentindo-se impotentes para serem um grupo, criarem alternativas ou fazerem
propostas. Abrir-se-ia uma oportunidade sistematizada de trabalhar com esses
professores sua identificação com a criança vítima da mãe má.
Acredita-se que apenas um psicanalista, munido da compreensão da
complexidade, que é a articulação da subjetividade do sujeito com a cultura,
poderá ter tal compreensão e proporcionar aos professores, via “grupo de
reflexão”, melhores condições de enxergarem os seus alunos, a si próprios, os
seus colegas e a instituição que trabalham. Abrir-se-ão, assim, novas
perspectivas para o ofício de ensinar.
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CONCLUSÃO
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Este estudo mostrou que cada um dos membros do grupo pesquisado
compõe uma realidade psíquica, a qual pôde ser notada a partir da experiência
compartilhada em termos de espaço e tempo entre os seus integrantes. O
relacionamento entre os professores deu-se por meio de diversas finalidades,
reais ou imaginárias, de cunho profissional (ensino), pessoal e, também, grupal
(“grupo de reflexão).
No espaço vincular, aconteceram intercâmbios que responderam a
acordos conscientes e inconscientes, individuais e/ou grupais, que resultaram em
identificações de papéis tais como: normatizador”, apaixonado em relação ao
ensino”, “desqualificador”, “pouco criativo”e “indiferente”.
Observou-se que a transferência não ocorreu num processo
terapêutico, mas, pode ser notada em todos os vínculos.
Neste trabalho, de-se observar a existência de quatro objetos de
transferência interna e um objeto externo, conforme a teoria dos grupos, a saber:
1) na pessoa da pesquisadora - cada professor transferiu seus
sentimentos em relação à figura central da psicanalista;
2) no grupo como totalidade (transferência grupal) - o “grupo de
reflexão” foi sentido pelos professores como um todo, puderam, também,
transferir seus sentimentos para o próprio grupo (transferência grupal);
3) de cada um em relação aos outros colegas (transferência lateral);
4) na própria tarefa do “grupo de reflexão” - o falar sobre seu ofício e os
vínculos se transformou em objeto de transferência;
5) objeto de transferência no mundo externo - os professores
efetuaram esse fenômeno por meio das experiências subjetivas transferidas para
outros grupos e pessoas fora do grupo (extratransferência).
Da mesma forma como ocorreu a transferência em todos esses objetos
internos e externos, também ocorreu, a contratransferência, ou seja, os
sentimentos da pesquisadora em relação a cada um dos integrantes do “grupo de
reflexão” e em relação ao grupo como um todo.
O “grupo de reflexão” funcionou conforme um arranjo de pressupostos
básicos, constituído de emoções intensas de origem primitivas. Esses
pressupostos sicos eram inconscientes e submetidos ao processo primário de
funcionamento mental. Foram utilizados pelos professores do “grupo de reflexão”
como formas mágicas destinadas a tratar as dificuldades que encontravam no
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ensino, com os alunos, com seus colegas, com a instituição e principalmente para
evitar a frustração inerente à própria profissão (ofício de ensinar).
Em relação aos vínculos entre professor e alunos, compartilharam
poucas experiências. O nculo foi percebido como compromisso e
responsabilidade visando o reconhecimento afetivo e financeiro, como um “bom
professor”. Na relação entre os colegas existiu a desconfiança, a rivalidade e o
receio de julgamento em relação à sua imagem como professor, demonstrando,
assim, um desgaste no vínculo entre eles. Os professores se vincularam ao
ensino na procura da realização do desejo de ensinar, bem como de crescer na
carreira docente e ter reconhecimento social.
Os professores apresentaram resistências a certas mudanças, nutrindo
o estereótipo de passividade e de não serem muito criativos.
Ficou evidenciado, também, à resistência à identificação com o
feminino.
Este estudo fez com que esta pesquisadora passasse a acreditar na
importância de se trabalhar as relações interpessoais na instituição acadêmica,
por meio da vivência grupal com os professores, considerando que tal vivência
pode servir para a reflexão e compartilhamento das experiências dos
participantes.
Acredita-se que como pesquisador que se serve da psicanálise na
análise de dados, deve-se considerar o subjetivo e o singular de cada um. Na
posição de pesquisadora e coordenadora de um grupo, percebeu-se que essa
função exigiu o co-pensar com o grupo.
Conforme os achados, nesta pesquisa, considera-se a necessidade de
fazer novas investigações, e os colegas pesquisadores devem levar em
consideração, não as varveis externas de uma pesquisa, mas, também, o
movimento emocional que pode obstaculizar ou, ainda, favorecer o trabalho.
Outra consideração, o trabalho de pesquisa deverá ter uma maior durabilidade de
tempo para que permita ao coordenador do grupo trabalhar as resistências que
obstaculizam a entrada na tarefa proposta.
Encerra-se este trabalho citando-se Kaës (1997, p. 21) quando afirma:
“[...] O grupo nos solicita a explorar outras configurações psíquicas do espaço
interno: somos confrontados com o múltiplo, o complexo, o heterogêneo no
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combate contra o caos e a ordem, contra o um e as partes, ou contra as
repartições ou os partos do singular e do plural”.
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REFERÊNCIAS
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