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SOBRE A ABSTRAÇÃO NA HISTORIOGRAFIA DA ARQUITETURA MODERNA
Hilton Berredo
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Ciências da Arquitetura, área
de concentração em Pensamento História e
Critica.
Orientador: Profa. Dra. Beatriz Santos de Oliveira
Rio de Janeiro
Fevereiro 2007
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ii
SOBRE A ABSTRAÇÃO NA HISTORIOGRAFIA DA ARQUITETURA MODERNA
Hilton Esteves de Berredo
Profa. Dra. Beatriz Santos de Oliveira
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,
como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciências em
Arquitetura, área de concentração em Pensamento História e Critica.
Aprovada por:
______________________________
Presidente, Profa. Dra. Beatriz Santos de Oliveira
_______________________________
Profa. Dra. Ceça Guimaraens
_______________________________
Prof. Dr. João Masao Kamita
_______________________________
Prof. Dr. Paulo Venâncio Filho
Rio de Janeiro
Fevereiro 2007
Ficha Catalográfica
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iii
Berredo, Hilton.
Sobre a Abstração na Historiografia da Arquitetura
Moderna/ Hilton Berredo. - Rio de Janeiro: UFRJ/FAU,
2007.
ix, 207p. il.; 29,7cm
Orientador: Profa. Dra. Beatriz Santos de Oliveira
Dissertação de Mestrado UFRJ/ Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo/ Programa de Pós-graduação em
Arquitetura, 2007.
Referências Bibliográficas: p. 200-207
1.Abstração, Autonomia, Arte e Arquitetura. 2.
Analistas Historiográficos. I. Oliveira, Beatriz Santos de. II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, Programa de Pós-graduação em
Arquitetura. III. Sobre a Abstração na Historiografia da
Arquitetura Moderna.
iv
RESUMO
SOBRE A ABSTRAÇÃO NA HISTORIOGRAFIA DA ARQUITETURA MODERNA
Hilton Berredo
Profa. Dra. Beatriz Santos de Oliveira
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em
Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em
Ciências em Arquitetura.
Resumo
O objetivo deste texto é apresentar o universo de conceitos e problemas que envolvem a
idéia da abstração na arquitetura moderna. De início, o termo ‘abstração’ é investigado na
pintura abstrata, discutindo-se seus traços de “internacionalismo”, e “irracionalidade”, bem
como sua aparência visual desprovida do sentido de representação do mundo visível. A
análise revela a centralidade do conceito de autonomia delineado como autonomia das
condições de produção, autonomia formal e autonomia da experiência estética. Tais noções
são primeiramente discutidas com relação aos conceitos e modelos arquiteturais de
Kasimir Maliêvitch. Três análises historiográficas são discutidas em seguida e a narrativa
da arquitetura moderna brasileira surge empenhada na procura de uma genealogia própria,
distante das preocupações abstracionistas. Lucio Costa inicia essa narrativa com Oscar
Niemeyer ao centro, cuja fortuna crítica internacional é explicada à luz da discussão sobre
abstração e tradição nacional. Segue-se uma análise de textos de Costa, Le Corbusier e
Walter Gropius e outros de autoridades na história do período. Como resultado, surge uma
pluralidade de questões envolvendo a arquitetura moderna: colaborações e diferenças entre
artistas e arquitetos; similaridades e diferenças entre as práticas da arte e da arquitetura;
diferenças no papel da abstração na arquitetura e na historiografia no Brasil e no exterior; o
papel da analogia visual como um argumento crítico; e a unidade dos três princípios
albertianos como um fator limitador da manipulação formal abstrata livre na arquitetura
moderna.
Palavras-chave: Abstração, Autonomia, Arte abstrata, e Arquitetura moderna
Rio de Janeiro
Fevereiro 2007
v
ABSTRACT
ABOUT ABSTRACTION IN THE HISTORIOGRAPHY OF MODERN
ARCHITECTURE
Hilton Berredo
Profa. Dra. Beatriz Santos de Oliveira
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em
Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em
Ciências em Arquitetura.
The objective of this text is to present the universe of concepts and problems evolving
around the idea of abstraction in modern architecture. The term ‘abstraction’ is first
investigated in painting, in its characteristics of “internationalism” and “irrationality”, as
well as in its visual appearance deprived of the sense of representation of the seen world.
The central concept of autonomy ooov vedre.74(d)-0.29a5585(ru(c)3.74(e)3.74(p)-3(“)4363(t)-2.1655.74(r)9-0.239(i)]TJ256.111 0 T585(o)-0.295585(m)-2.45995(y)29.5585( )-80.1938(o)-0.295585(f)2.80439( )-80.1938(t)-2.16436(h)-0.295585(e)6558( )-90.2009(c)3.74(o)-0.295d955858(o)-.195(v)-571(-2.16436(a)3.74(t)-2.16436(i)-2.16436(o)-0.295)2.80439(e.74(d)-0.295585( )-80.1938(o)-0.295585(f)2.85585( )-150.233(p)-0.295585(r)2.80)2.80439(a)3.74(d)-5(e)3c571( )-12-2.16436(a)3.74(t)-2.16436(i)-2.163142(i)-2.16,36(d)-0.293142(.)-0.14)9-0.23250]TJ-245f.8 Td[(a)3.74(r)2.3.8 Td[.1938(e)-0.16558(r)2.80561(a)3.7185(2549a5585(ru(c)3.74(e)3.74(p)-0.294363(t)-2.16558(o)-0.295585(n)-0.295585(o)-0.295585(m)-2.459185(2549a5585(r-120.217(a)3.74(n)-0.295585(85(2549a5585(ru(c)3.75(a)3.74(u)-0.294363(t)-2.16558(o)-0.295585(n)-0.295585(o)-0.295585(m)-2.45917(s)-295585( )-70.1879(o)-0.295517(s)-”)3.74( 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Td[(i)-2.16558(n)-0.294(a)3.74(r)2.l.74(t)-2.1558(n)-0.294195(v)-0.296558(i)-2.16558(n)-0.20.25,)-45)3.74(o)-0.295585(m)-2.45995(o)-0.295585(d)-0.295574(a558(o)-0.295585516544990.295585(e)3.74(a)3.74(r)2.80439(c)3.74(h)-0.295585(i)-160.242(t)-2.16558(e)3.74(c)3.74(t)-2.16558(u)-0.2026(h)-:(e)3.74(c)585516545e3.74( )-160.241(c)3)2.80439(a)436(u)-0.2980561( -280.313(a)3256.111 0 T0.235(U)1.225(p)--2.16436(a)3.74(t)-2.16436(i)-2.16436(o)-0.295)2.80439(e58551654480439(b)-0.295585(a)3.74(n)-0.29558551654438(o.74(r79.42312(e)]TJ3.74(t)-2.1879(o)-0.2f74(p)-0.295585(r.74(p)-0.295585(r.74(o)-0.295585(n)-0.29558)2.80439(e5855165448 -280.313(a)3436(h)-16436(s)-1.w.74( )-15.1879(s)-1.2312(e)3.74(e)3.745165448 d[(d)-.74(p)-0.2-2.16436(a)3.74(t)-2.1-1.52434(e)3.74(s-270.306(i)-2.1695165448 d[(d)-0.23142(i)-2.160439(l)-2.16142(.)-0.1479.4231250]TJ-249.627 -13.8 Td[)3.74(r)2.8043-2.16.74(h)-)-80.195(i)-2.14974(j)-2.16558(e)3.74(c).74(b)-0.29;(e)3.74(c)58521)-07216558(s)-1.23.74(t)-2.1585(o)-0.290.294974(e))2.80561(a)16558(g558(u)-0.2.74(h)-)-80.195(i)-2.1.1832(D)1.55585(l).242(i)-2.165591)-0721Td[(J)-11.2359(a)3.74(n)-0.29558591)-0721d955858(o)-.195(v)-)1.5242(o)-0.2f58(u)-0.2026(h)-.74(p)-0.295585(r.74(o)-0.295585(n)-0.29558)2.80439(e58591)-0721-280.313(a)3436(h)-16436(s)-1.w.74( )-15.1879(s)-1.2312(e)3.74(e)3.7491)-07.16436( )-160.2295585(e86739(i)]TJ Td[(r65590(o)659)2.80439(e)3.74(p)-0.216436(r)2.80439(a)3.74(c)3.74(t)-2.1585(n)-0.29558)2.80439(e58590(o)6595585( )-70.1879(o)-0.295590(o)659d[(d)-.74(p)-0.2-2.16436(a)95590(o)659d[(d)-0.295585(a)3.74(n)-0.29558590(o)6595585( )-70.1879(o)-0.295590(o)659d[(d)-.74(p)-0.2)3.74(r)2.80439(c)3.74(h)-0.295585(i))2.8-90.20-0.2c571( )-12-2.16436(a)3.85( ))1.57319(o)-0.216436(r)2.;0439(s)-1.2312(t)-2.1e8673250]TJ-249974(n)-0.294195(v)-0.29f.8 Td[f.8 Td[3.74(t)3.8 Td[ Td[(wTd[(i)-2.16585(n)-0.29558)2.804 i1 th1pao558(s)-1.22ao1ob85(c5585(m)-2.2997(s).74(n)-0.295585(1)-0.1457564(r)2.805585(m)335585(1)-0.4980561( -280.313(a)3.74(b)-0.295585(s)-1.2312(t)-2.16436(r)2.80439(a)3.74(c)3.74(t)-2.16436(i)-2.16436(o)-0.295.7410(o)0c)3.74(t)-2.1436(o)-0.295.7410(o)0c)3.74(t)-2.1432955854.584R7 12 Tf-2.1643-2.16436(t)-2.16436(e)3.74(r)2.80439(n)-0.295585(a)3.74(t)-2.16436(i)-2.16436(o)-0.295585(n)-0.295585(a).7410(o)0c -120.217(a)3.74(n)-0.295585()(o)0ctoo tr0439(i)-2.195(v)-9(a)436(u)-0.29195(v)-9(a)3.74( )n.295585(e)3.7410(o)0c .74(p)-0.2rch s-0.2c571( )-12-2.16436(a)3.85( )ort
vi
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................
p. 11
1. ABSTRAÇÃO, AUTONOMIA, ARTE E ARQUITETURA ...........................
p. 18
1.1. Indefinições preliminares ....................................................................................
p. 20
3.2. A abstração nas narrativas históricas pioneiras ...................................................
p. 113
3.2.1. Hitchcock (1929) …………………………………………………………..... p. 113
3.2.1.1. A estética dos Novos Pioneiros .....................................................................
p. 114
3.2.1.2. O desenvolvimento da maneira .....................................................................
p. 117
3.2.2. Hitchcock; Johnson (1932) …………………………………………………..
p. 120
3.2.3. Sartoris (1932) ………………………………………………………………. p. 124
3.2.4. Kaufmann (1933) …………………………………………………………….
p. 125
3.2.5. Pevsner (1936) ……………………………………………………………….
p. 131
3.2.6. Giedion (1941) ……………………………………………………………….
p. 136
3.2.6.1. Dessau ...........................................................................................................
p. 145
3.2.7. Sartoris (1943) ..................................................................................................
p. 148
3.2.8. Hitchcock;Barr (1948) …………………………………………………….… p. 149
3.2.8.1. Arquitetos, pintores e pintores-arquitetos .....................................................
p. 156
3.2.8.2. Wright, um pioneiro contra a pintura ............................................................
p. 162
3.2.8.3. A Bauhaus e a pintura abstrata ......................................................................
p. 164
3.2.8.4. O “Surrealismo abstrato” de Niemeyer e Burle-Marx ..................................
p. 167
3.2.9. Zevi (1948) .......................................................................................................
p. 167
3.2.10. Zevi (1950) .....................................................................................................
p. 168
3.2.11. Zevi (1953) .....................................................................................................
p. 173
3.2.12. Benevolo (1960) .............................................................................................
p. 176
CONCLUSÃO ..........................................................................................................
p. 179
Lista de Ilustrações ..................................................................................................
p. vii
Bibliografia ...............................................................................................................
p. 198
viii
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
figura 1 George BRAQUE, O Português, 1911-1912, óleo s/ tela. p. 12
figura 2 Pablo PICASSO, Guitarra, 1912, carvão s/ papel. p. 12
figura 3 L. COSTA, A. REIDY, J. MOREIRA, C. LEÃO, E. VASCONCELOS
e O. NIEMEYER. Ministério da Educação e Saúde. Rio de Janeiro.
1936-1943.
p. 13
figura 4 L. COSTA, croquis para Brasília. p. 13
figura 5 MOMA. Gráfico de Alfred H. Barr, Jr. New York, 1936. p. 19
figura 6 Geroge GROSZ e John HEART FIELD em 1920. p. 21
figura 7 DOESBURG. Objeto esteticamente transformado. C. 1917. p. 23
figura 8 RAPHAEL. São Jorge, óleo s/ tela. p. 24
figura 9 Ellsworth KELLY. Colors for a Large Wall . 1951, óleo s/ madeira p. 24
figura 10 Jeremy BENTHAM, Panopticon, 1791 p. 30
figura 11 Vladimir TATLIN. Monumento à Terceira Internacional, 1920. p. 32
figura 12 Vladimir TATLIN, O Trabalho que nos Encara,1920. p. 33
figura 13 Guillaume APOLLINAIRE em 1917. p. 34
figura 14 Vladimir TATLIN, Contra-relevo (reconstrução),1915 p. 36
figura 15 DOESBURG e Van EESTEREN. Contra-Construção, Gouache s/ lito. p. 37
figura 16 União dos Arquitetos Contemporâneos (OSA), 1927. p. 38
figura 17 Wassily KANDINSKY. Composição VIII, 1913. p. 39
figura 18 KUPKA, Os discos de Newton, 1911/1912 , óleo s/ tela. p. 39
figura 19 Piet MONDRIAN. Composição (1935-1942) , óleo s/ tela. p. 40
figura 20 Jean ARP. Figura (1920). p. 42
figura 21 DOESBURG e ARP. La Aubette (1926-1928). p. 43
figura 22 Kasimir MALIÊVITCH. Três elementos Suprematistas em Contraste
(1927).
p. 44
figura 23 Kasimir MALIÊVITCH. Suprematismo (Quadrado Amarelo), 1917-
18.
p. 45
figura 24 Kasimir MALIÊVITCH. Duas Xícaras Suprematismo, 1923. p. 46
figura 25 Kasimir MALIÊVITCH. Quadrado Negro (dir.) e fragmento de Gota p. 46
figura 26 Kasimir MALIÊVITCH. Arkhitekton, 1927, gesso e madeira p. 48
figura 27 Kasimir MALIÊVITCH. Arkhitekton p. 48
figura 28 Kasimir MALIÊVITCH. Modern Buildings 1923-1924 p. 49
figura 29 El LISSITZKY. Estudo para Proun 1E Cidade, 1919-1920. p. 50
figura 30 Ben NICHOLSON. Composição (1938). p. 54
figura 31 Di CAVALCANTI. O Samba (1928), óleo s/ tela. p. 55
figura 32 Cândido PORTINARI. Auto-retrato (1956), óleo s/ tela. p. 56
figura 33 Cândido PORTINARI. Painel de azulejos p. 57
figura 34 LE CORBUSIER. Capela de Nôtre Dame du Haut. Ronchamp. 1955. p. 58
figura 35 A. KIEFER. A vida secreta das plantas. 2002, chumbo (h. 195 cm.). p. 65
figura 36 Sol LEWITT, Wall Drawing No. 681 C, 1993. p. 65
figura 37 William MORRIS p. 74
figura 38 DEUTSCHE WERKBUND. Cartaz da Exposição de 1914. p. 75
figura 39 Leon Baptiste ALBERTI. L'architecture et art de bien bastir, 1553. p. 78
figura 40 GIEDION propõe analogia visual entre L’Arlésienne e a Bauhaus p. 81
figura 41 Walter GROPIUS, Bauhaus Dessau, (1926). p. 82
ix
figura 42 REVISTA FORMA, Rio de Janeiro, 1932. "A Revolução e o Salão
Oficial".
p. 91
figura 43 - REVISTA DA SEMANA, Rio de Janeiro, 12 de Setembro de 1931.
"O Salão de 1931".
p. 91
figura 44 LE CORBUSIER, Pavilion de L'Esprit Nouveau, Paris, 1925. p. 93
figura 45 LE CORBUSIER, Pavilion de L'Esprit Nouveau (inteior). p. 93
figura 46 Gregori WARCHAVCHIK, Casa Modernista (1929) à página 121 de
SARTORIS, Gli elementi dell architettura razionale.
p. 94
figura 47 GROPIUS, página de Bauhaus novarquitetura. p. 100
figura 48 O Modulor de LE CORBUSIER. p. 101
figura 49 Yokov TCHERNIKOV. A Construção. p. 103
figura 50 Max BILL. Unidade Tripartida (1947), Aço inoxidável. p. 110
figura 51 Cândido PORTINARI. Retirantes. 1950, óleo s/ tela. p. 110
figura 52 Folha de rosto de Modern Architecture: Romanticism and
Reintegration.
p. 114
figura 53 Walter Gropius, Fábrica Fagus (1914). p. 115
figura 54 J. P. OUD. Casas de rua em Hoeck van Holland (1926-1927). p. 116
figura 55 Le CORBUSIER casas 'Citrohan' (1921). p. 117
figura 56 Bruno TAUT. Glashaus (1914). p. 118
figura 57 J. J. P. OUD. Croquis para fábrica em Purmerend (1919). p. 119
figura 58 J. J. P. OUD. Café de Unie (1925), Roterdam. p. 119
figura 59 Pavilhão de Barcelona de Mies (1929) em The International Style. p. 122
figura 60 BLONDEL. Comparação entre os perfis arquitetônicos e humanos. p. 127
figura 61 Página 31 de Von Ledoux ... de Emil Kaufmann (1933). p. 128
figura 62 Ferdinand HODLER, pintura reproduzida por PEVSNER em
Pioneeers.
p. 134
figura 63 Pierre-Auguste RENOIR pintura reproduzida por PEVSNER em
Pioneeers.
p. 135
figura 64 Pablo PICASSO, Guitar and Glass (1913), colagem. p. 138
figura 65 George BRAQUE. Copo, café e jornal (1913), colagem. p. 138
figura 66 George VANTONGERLOO, Inter-relações de massas baseadas na
elipsóide (1926), gesso.
p. 141
figura 67 DOESBURG e EESTEREN (esq.) e DOESBURG (dir.). p. 141
figura 68 Kasimir MALIÊVITCH. Composição não-objetiva (1915). p. 142
figura 69 Kasimir MALIÊVITCH. Arkhitekton, Alpha (1920). p. 142
figura 70 JEANNERET (LE CORBUSIER). Natureza morta (1925). p. 144
figura 71 LE CORBUSIER. Villa Savoye (1928-1930). p. 144
figura 72 Walter GROPIUS, Bauhaus, Dessau (1926). p. 146
x
figura 83 KUNISADA. Atores Japoneses. p. 163
figura 84 Paul KLEE. Partida do Fantasma (1931). p. 165
figura 85 Paul KLEE. Estrutural II (1931). p. 165
figura 86 Bruno ZEVI. Ilustração de Storia dell'architettura moderna. p. 169
figura 87 Hermann FINSTERLIN. Croquis de 1919-1920. p. 172
figura 88 Página de Bruno ZEVI, Poetica dell'architettura neoplastica. p. 174
11
INTRODUÇÃO
As primeiras obras de arte abstratas datam da segunda década do século XX e
foram pinturas produzidas em meio a um debate teórico cujo epicentro foi o Cubismo
parisiense de Pablo Picasso (1881-1973) e George Braque (1882-1963) [figuras 1 e 2], mas
que atingiu igualmente a pintores e arquitetos além de escultores, literatos, músicos,
poetas, críticos de arte, enfim, uma enorme gama de artistas e intelectuais da Europa
Central e da Rússia, homens e mulheres que de maneiras muito diferentes propugnavam a
abstração como a linguagem de todas as artes, de todos homens, de todas as
nacionalidades.
Em torno da idéia de uma arte abstrata universal surgiram movimentos artísticos
primeiramente na Rússia, em seguida na Holanda, e na França. Seus artistas e arquitetos
produziram manifestos e publicações de cunho teórico-panfletário, além de desenhos
visionários e, sobretudo, reais edificações que enfrentavam as questões postas pela vida
moderna à arquitetura contemporânea com uma linguagem arquitetural totalmente nova,
derivada da abstração. Assim, contribuíram decisivamente com suas propostas de arte
abstrata para o desenvolvimento da arquitetura moderna dos anos 1920, influenciando
especialmente a arquitetura produzida na Alemanha e o ensino da Bauhaus, com
conseqüências para todo o mundo.
Ao final dos anos 1920, já construídos exemplos irretocáveis de uma nova
arquitetura, inicia-se um esforço da parte de historiadores da arte, de arquitetos-
historiadores e de teóricos da arquitetura no sentido de determinar as origens, a genealogia
e a essência dessa nova arquitetura moderna. Eles iniciam a historiografia da arquitetura
moderna com o duplo intuito de a legitimar teórica e historicamente e de a difundir: junto
aos arquitetos, oferecendo motivos e exemplos para convencê-los e equipá-los para a
pratica adequada do edifício moderno; e aos jovens estudantes de arquitetura um modelo
formal que confere unidade estética a um conjunto de soluções técnicas prontas para
adoção.
No limiar dos anos 1940, um movimento moderno organizado
internacionalmente e diversas edificações concebidas a partir das novas idéias que se
espalharam pelo mundo, alcançando o Brasil. São edificações exemplares que mostram
com sucesso a face arquitetural do movimento moderno. Desde os anos 1910, o debate
teórico que sustenta o movimento moderno internacional tem na linguagem da abstração
12
figura 1 - George BRAQUE, O Português, 1911-1912, óleo s/ tela.
figura 2 - Pablo PICASSO, Guitarra, 1912, carvão s/ papel.
13
figura 3 - L. COSTA, A. REIDY, J. MOREIRA, C. LEÃO, E. VASCONCELOS e O. NIEMEYER.
Ministério da Educação e Saúde. Rio de Janeiro. 1936-1943.
figura 4 - L. COSTA, croquis para Brasília.
14
um forte ponto de apoio, entre outras razões, por suas propaladas qualidades universais,
garantindo sua validade e alcance internacional. Na historiografia estrangeira da
arquitetura moderna trata-se, a partir de 1929, de se interpretar o impacto da abstração na
arquitetura, surgindo em decorrência algumas questões importantes: de qual abstração se
trata essa influência da arte sobre a arquitetura? Qual seu significado? Que limites têm essa
influência? Em face da abstração como linguagem comum a todas as artes, que relações
profissionais se pode estabelecer entre artista e arquiteto? Arquitetura é arte ou existem
tanto aproximações quanto diferenças entre as disciplinas? Serão assim fluidos, os limites
disciplinares entre arte e arquitetura? Ou são, arquitetura e arte, disciplinas nítidas e
incontrastavelmente definíveis? Quais então, as diferenças e semelhanças entre um edifício
e uma obra de arte?
Essas questões, é claro, afloram nitidamente ou afundam-se nas entrelinhas dos
textos históricos, questões obviamente presentes na historiografia estrangeira da arquitetura
moderna face ao papel relevante que essa mesma historiografia confere à abstração na
genealogia que apresenta da arquitetura moderna. No entanto, a leitura que se segue sugere
que enquanto no debate teórico internacional a abstração ocupa com seu víeis
internacionalista um lugar central, na historiografia da arquitetura moderna brasileira,
muito mais afetada pelas questões de cunho nacionalista, a questão mal se esboça.
Essa percepção, ligada ao fato de que no Brasil, ao contrário do que aconteceu na
Europa Central e na Rússia, a abstração chega na arquitetura moderna muito antes do que
chega nas artes plásticas, coloca em perspectiva uma investigação mais profunda sobre a
abstração na arquitetura moderna brasileira. A arquitetura moderna e sua linguagem
abstrata, não apenas chega antes dos fundamentos a abstração, como chegam de sopetão,
acomodando-se a uma mentalidade artística provinciana preocupada com questões afins ao
populismo de Getúlio Vargas.
Alan Colquhoun, um autor recente, em sua Modern Architecture, obra de 2002, que
não consta nos estudos historiográficos adiante analisados, considera que o Movimento
Moderno no Brasil foi abraçado da noite para o dia (overnight) em 1930 por jovens
arquitetos fascinados pela retórica de Le Corbusier (1887-1966). Para Colquhoun, o mérito
desses jovens foi adaptar a linguagem arquitetônica corbusianas às condições brasileiras.
Colquhoun sugere que a arquitetura produzida por aqui naquele período entra na da
arquitetura apenas pelo valor de demonstração da obra de Le Corbusier, exemplificada
melhor no edifício do Ministério da Educação no Rio de Janeiro (fig. 3) que na obra
15
original do próprio mestre
1
. Colquoun ironiza a conversão: “como se a força de uma idéia
pudesse dar luz instantaneamente a uma arquitetura nova, dotando-a de simbolismo
popular”
2
. O plano “simplisticamente esquemático” (simplistically schematic) de Lúcio
Costa para Brasília (fig. 4), com dois eixos intercedendo num “ponto abstrato no espaço”
(an abstract point in space), lhe parece criar uma cidade sem centro” (a city without a
center), e dotada de um complexo governamental cuja arquitetura não tem vigor, apenas
facilidades de estilo” (thetrical style that had all the facility but little of the vigour of his
early work).
A análise de Colquhoun parece implicar que no Brasil a linguagem da abstração na
arquitetura não foi compreendida pelos arquitetos nos mesmos termos em que era
formulada nos países de origem. Hipótese que se lança com relação à face mais divulgada
da arquitetura brasileira, a arquitetura de Oscar Niemeyer (1907- ), e tem como foco a
questão do formalismo do arquiteto brasileiro. Especialmente notado em sua obra, o
formalismo em Niemeyer foi primeiramente apreciado, depois criticado até ser esquecido
na historiografia da arquitetura moderna, como mostra o segundo capítulo. Acusado de
gerar edificações de formas mirabolantes, mas sem maiores preocupações com a
racionalidade construtiva ou com o próprio programa, Niemeyer perde importância nessa
historiografia após ser defendido e louvado como se projetasse pinturas ou esculturas
surrealistas pairando à distância das preocupações da vida humana.
Tais observações, conectadas à historiografia da arte abstrata parecem levantar uma
outra hipótese, a de que o formalismo da arquitetura de Niemeyer talvez seja, no fundo, um
exemplo perfeito e acabado dos ideais da arte abstrata projetados sobre a arquitetura, ideais
cujas fontes parecem estar relacionadas ao ideal de imaterialidade do Suprematismo.
Mostrando-se uma compreensão superficial e provinciana da arquitetura moderna e
de sua linguagem abstrata (embora encarnada na obra de um brilhante epíteto) ou a
compreensão mais profunda do sentido de imaterialidade advogado pela abstração
suprematista, encarnado num arquiteto que levou com maestria a abstração à capital do
Brasil, o resultado parece apontar para o valor demonstrativo da obra de Niemeyer, mas
agora no sentido de que o termo abstração comum à arte e à arquitetura pode ser um termo
comum aos dois campos, porém com implicações totalmente diferentes em cada um deles.
O que se segue, no segundo capítulo, levanta tais questões para o futuro, mas seu propósito
aqui é simplesmente mapear as questões relativas à abstração na arquitetura moderna do
ponto de vista de sua historiografia a fim de pavimentar o debate sobre esse tema. Sendo
16
assim, o percurso a seguir trata primeiramente de se estabelecer uma idéia nítida dos
significados e problemas relativos ao termo abstração e esboçar suas implicações nas artes
plásticas e na arquitetura, assuntos do primeiro capítulo.
Em seguida, o segundo capítulo trata inicialmente de esclarecer as questões
relativas ao termo historiografia, especialmente quanto à idéia da escrita da história como
uma narrativa, seguindo este capítulo na revisão de dois autores de textos que tratam
justamente da historiografia da arquitetura moderna. São análises gerais da historiografia,
textos críticos, preocupados com questões propriamente historiográficas acerca da
historiografia da arquitetura moderna. Ressaltam-se ali as questões acerca do caráter
legitimador e dogmático dos textos históricos; de suas premissas metodológicas comuns;
sua estrutura discursiva; da determinação de quais sejam os autores mais influentes; das
diferenças de posições, metodologias e ideologias dos textos; das mudanças nos discursos
históricos ao longo do tempo; e da formação (ou não) de uma narrativa padrão, ou seja, da
existência ou não de uma visão ou uma versão canônica do que é o movimento moderno.
O segundo capítulo mostra ainda a diferença de foco entre o debate nacional e o
internacional e o deslocamento da questão da abstração, deixando a sugestão de que se na
historiografia estrangeira a abstração é fundamental, pois é parte importante da genealogia
da arquitetura moderna com seu espírito internacionalista, por sua vez, na historiografia
brasileira, a abstração perde importância em vista de no Brasil se pretender estabelecer
uma genealogia própria para a arquitetura moderna brasileira, uma genealogia mais
comprometida com noções do nacional.
Mas se no segundo capítulo discute-se o que certos comentadores afirmaram sobre os
autores da historiografia da arquitetura moderna, finalmente, no terceiro capítulo, vai-se
diretamente a eles, com o propósito de se verificar os termos em que ocorre o debate sobre
abstração e arquitetura moderna, coisa que não é o foco dos estudos discutidos no segundo
capítulo. Para as finalidades do terceiro capítulo, primeiramente delimita-se um novo
recorte na historiografia da arquitetura moderna, recorte desta vez desenhado
especialmente para que se possa captar em maior detalhe a presença da idéia de abstração
nas narrativas históricas da arquitetura moderna e poder discutir as questões que daí
surgem. Assim, inclui-se a única obra devotada especificamente às relações entre pintura e
arquitetura modernas e minimiza-se ou exclui-se aqueles autores que não avançam com o
tema. Ainda que atendendo a seu objetivo, o capítulo acaba também por colocar em
perspectiva novas questões para pesquisas futuras, especialmente aquelas relacionadas às
17
diferenças epistemológicas dos campos da arte e da arquitetura e sua relação com os
problemas causados pela prática da manipulação formal autônoma, uma decorrência do
experimentalismo da arte abstrata.
18
CAPÍTULO 1: ABSTRAÇÃO, AUTONOMIA, ARTE E ARQUITETURA.
Na literatura de arte dos anos 1910-1920 abstração e arte moderna são praticamente
sinônimos. Primeiramente desenvolvida em países da Europa Central e na Rússia, a arte
abstrata e sua teoria da abstração não demoraram a chegar no Novo Mundo. Ao final dos
anos 1920, os Estados Unidos, no testemunho de Erwin Panofsky, eram uma “força maior
na história da arte (...) animada por um espírito jovem de aventura”
3
. Essa força centrava-
se em Nova Iorque e a aventura tratava-se da defesa da abstração num sentido bem
abrangente. Na Universidade de Columbia, por exemplo, em 1928 já se podia discutir o
Cubismo de Pablo Picasso e George Braque com o professor Meyer Shapiro, em seu curso
de “Introdução à civilização contemporânea do Ocidente”
4
. E discutir o Cubismo significa
discutir a relação entre pintura, representação da figura e abstração. Nesse contexto nova-
iorquino desenrola-se a “aventura” teórico/histórica da defesa da arte moderna sob o signo
da equação ‘arte moderna igual arte abstrata’, uma equação paralela à outra: ‘arquitetura
moderna igual a arquitetura abstrata’. Tal empreendimento teórico, histórico e museológico
contou com a autoridade muito relevante do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque,
desde seu nascimento empenhado em defender a idéia de que diante da abstração, qualquer
outro estilo na arte ou na arquitetura estava historicamente morto, dando assim
conseqüências museológicas a uma equação excludente que iguala arte moderna à
abstração.
Em 1936 o diretor do MOMA, Alfred Barr (1902-1981), Jr patenteia um gráfico
(fig. 5) que visualidade ao triunfo da abstração
19
disciplinar. ainda o complicador das relações entre teoria e prática, isto é, das
diferenças notáveis entre a prática do artista e a prática do arquiteto, tanto quanto a
questãodas diferenças de posições entre o arquiteto e o artista na sociedade. Enquanto o
artista pode agir contra o público e ainda continuar produzindo arte, o arquiteto encontra-se
numa posição difícil de recusar o compromisso com o cliente, se quiser ver sua obra
realizada. Mas maior complicador da equação simplista parece ser, no entanto a própria
indeterminação dos conceitos de ‘arte’ e de ‘arquitetura’, que flutuam de teoria em teoria e
se apresentam teoricamente muito melhor como conceitos abertos do que como categorias
fechadas. O presente capítulo visa estabelecer essas indefinições preliminares, preparando
o caminho para uma leitura crítica da historiografia da arquitetura moderna.
figura 5 - MOMA. Gráfico de Alfred H. Barr, Jr. New York, 1936.
20
Há que se notar que embora expansionista e internacionalista, no Brasil, a abstração
não chega como tendência artística consistente senão no limiar dos anos 1950. Entre os
anos críticos de 1910-1920, o país ficou à margem da produção pioneira de arte abstrata e
ainda do debate teórico em torno da abstração. Quando a arquitetura moderna aporta aqui é
adaptada tanto aos fatores climáticos locais quanto à cultura artística local. Assim, o
espírito de ‘síntese das artes’ procurado na abstração é realizado na arquitetura brasileira
por artistas cujo universo estava muito distante das preocupações da arte abstrata. A
questão que se levanta então, sobre a relação entre abstração e arquitetura moderna
brasileira é a do significado e das conseqüências dessa inversão na cronologia modernista.
Essa é uma questão lateral neste estudo, mas que recebe alguma discussão no segundo
capítulo.
1.1. Indefinições preliminares
1.1.1. Arte moderna e abstração, modernismos e realismos
No final do século XIX, a arte moderna era alardeada na Europa como uma “forma
de cultura independente” (form of independent culture)
5
e sua importância para o mundo
estava justamente em sua independência de valores. O campo da arte estava assim posto
como um “domínio exemplar” (exemplary realm)
6
, onde se faz, se e se experimenta
com total independência moral face às condições sociais da existência, sobre as quais a arte
se impõe como uma “carga crítica sobre o mundo” (critical bearing upon the world)
7
, por
força de sua própria independência. Essa posição sobre a arte, sua independência - ou
autonomia - e seu papel crítico define o que se pode chamar de “tradição do
Modernismo”
8
.
Mas como conceber uma arquitetura totalmente independente das condições sociais
da existência em determinadas condições históricas? Por exemplo, que arquitetos europeus,
imersos na situação do primeiro pós-guerra poderiam se atrever a reivindicar esse tipo de
autonomia para a arquitetura? Ou, por outra, como poderiam, no mesmo período os
arquitetos americanos ignorar o gosto dos clientes e não ir à Europa copiar estilos? Pode-se
pensar também nas dificuldades para o arquiteto moderno brasileiro, quase duas décadas
mais tarde, resistir ao apelo nacionalista endêmico na intelectualidade nacional, e em
particular no grande cliente, o Estado Novo? Não é a toa que os funcionalistas europeus
21
desde o início não reconhecem as noções de ‘estilo’ ou ‘estética’ da arquitetura e que os
americanos sejam cínicos ou pragmáticos, como se queira. Não é a toa que as
reivindicações por uma arte abstrata no sentido forte do termo sejam postas de lado no
prédio do Ministério da Educação e Saúde no Rio de janeiro, como se discutirá no segundo
capítulo.
Nas artes plásticas, mesmo a ‘posição modernista’ esteve sob os ataques de
diversos Realismos, para os quais a arte é participação ou intervenção no processo social
9
e
não especulação abstrata sobre os meios artísticos. A Neue Sachlichkeit, por exemplo, é um
movimento realista alemão dos anos 1920 que não somente é anti-abstrato em pintura,
como assume uma postura abertamente anti-estética. Seu der, Geroge Grosz, em 1920
proclama a morte da arte e dá vivas a uma “nova arte da máquina de Tatlin” (neue
Maschinenkunst Tatlins) [fig. 6] à qual adere sem conhecer, mas adere certamente por ser
essa uma arte identificada à nascente Revolução Russa, uma arte antiburguesa. Grosz nesse
momento de turbulência e confusão (não só) teórica na Alemanha pinta ácidas visões dos
problemas da sociedade de seu país no pós-guerra, visões incompatíveis com a linguagem
da abstração, preocupada com um mundo de formas muito distante da realidade cotidiana.
Para Grozs (e seus pares), os artistas abstratos são “andarilhos no vazio (...) silenciosos e
indiferentes”
10
ao que se passa na sociedade.
figura 6 - Geroge GROSZ e John HEART FIELD em 1920.
22
Questão semelhante foi posta para a arquitetura moderna na Bauhaus com a queda
de Gropius e a ascensão de Hannes Meyer à direção da escola. Tratava-se de gerar objetos
arquitetônicos de formas abstratas (supostamente afins à indústria por sua geometria
elementar) ou de gerar soluções técnicas para questões como ‘habitação mínima’, entre
outras mais ligadas à objetividade da questão social e longe da metafísica da não-
objetividade? Num certo sentido, foi uma disputa em torno da questão da arquitetura como
arte que por um momento eclipsou o ponto de vista do “funcionalismo estético” do
primeiro com o “funcionalismo político”
11
do último. Nesse caso, porém, mesmo estando
em disputa o estatuto da arquitetura como arte, não uma rejeição da linguagem da arte
abstrata. A mesma linguagem abstrata pode ser vista nos edifícios dos dois arquitetos; não
está em questão a adoção de linhas retas e volumes prismáticos simples, mas uma visão
sobre o que é a arquitetura: arte ou técnica? Isso parece delinear uma diferença entre adotar
um léxico arquitetural abstrato e adotar uma posição que defende a arquitetura como arte.
Nesse sentido, e nesse sentido apenas, parece ser razoável a hipótese de que na arquitetura
a idéia de abstração tem um sentido forte na linguagem e um sentido fraco no conceito.
Isto é, a hipótese de que a arquitetura moderna possua uma linguagem estritamente abstrata
e anti-figurativa, ao mesmo tempo que renega a idéia de que a arquitetura seja uma ‘arte
abstrata’. O que se segue trata de investigar os sentidos da abstração e suas conseqüências
na arquitetura.
1.1.2. Os sentidos ‘forte’ e ‘fraco’ da abstração
O termo “modernismo” pode ser entendido na teoria da arte moderna como um
termo utilizado em textos teóricos para designar a idéia da arte moderna como a procura da
independência moral da arte, ou seja, de sua autonomia. Nesse sentido, o crítico de arte
norte-americano Clement Greenberg (1909-1994) pode ser considerado um sinônimo da
crítica “modernista” engajada na causa abstracionista. Em Greenberg, ‘modernismo’ e
‘abstração’ se confundem nas artes plásticas, adquirindo ambos os termos um sentido
‘forte’.
O termo abstração tem dois sentidos correlatos, mas diferentes na teoria
modernista: o primeiro refere-se à propriedade de obras de arte serem abstratas, e o
segundo ao processo pelo quais certos aspectos dos temas ou motivos são enfatizados,
enquanto outros são eliminados
12
.
23
No primeiro caso a obra de arte abstrata, seja qual for sua aparência, ainda que se
pareça com alguma coisa do nosso mundo visível, aquilo com que se parece não deve ser
usado como explicado por referência a um tema representado”
13
. Trata-se de um sentido
forte de abstração. Um exemplo do processo de ênfase e simplificação, que aqui se designa
como o sentido ‘fraco’ de abstração, pode ser encontrado na obra de Picasso, que por vezes
aplicava sobre seus temas processos de abstração complexos a ponto de se tornar difícil
figura 7 - DOESBURG. Objeto esteticamente transformado. C. 1917.
reconhecerem-se os temas representados em seus quadros
14
. Um exemplo do processo de
abstração é a seqüência de quadros publicada por Theo van Doesburg sob o título de
“Objeto esteticamente transformado”
15
(fig. 7), onde vemos as formas de uma vaca
sucessivamente geometrizadas e simplificadas, de tal modo que o último quadro, realizado
quase exclusivamente com formas quadrangulares, em nada nos lembraria a vaca original.
24
Se descrevermos o primeiro quadro da seqüência, necessariamente nos referiremos
de alguma forma à representação de uma vaca, mesmo se não conhecermos o título da
obra. Quanto ao último, sem conhecermos seu tulo, podemos descrever o quadro sem
citar a vaca e ainda assim não prejudicar a compreensão do aspecto puramente visível do
quadro. É claro que para realmente entendermos esse último quadro precisamos conhecer a
‘transformação’ a que o tema original foi submetido. Mas ainda assim, podemos descrevê-
lo sem citar a vaca original. Por exemplo: trata-se de uma composição com quadrângulos
de diferentes proporções e tamanhos, coloridos em matizes de verde, laranja, azul, além de
preto e organizados sobre um fundo branco a partir de alinhamentos horizontais e verticais
que sugerem a existência de uma grade invisível. Os quadrângulos coloridos, ademais,
guardam distancias entre si que são semelhantes ou proporcionais às suas próprias larguras
ou alturas, de sorte que podemos observar no branco do fundo o mesmo jogo de
proporções que observamos nos quadrângulos coloridos de variadas medidas, pesos e cores
contrastantes entre si. Com descrições como essa, apontando para uma série de relações
geométricas abstratas, podemos apreciar o quadro, mesmo sem conhecer suas origens. No
entanto, apenas conhecendo o ‘processo de abstração’ aplicado na imagem do quadro da
vaca na seqüência de obras dada é que podemos relacionar o quadrado central amarelo do
último quadro com o abdome do animal ou, na direita baixa, o quadrângulo preto adjacente
ao alaranjado com o focinho da vaca. O ponto de Doesburg não interessa tanto como
revelação de um processo de geometrização ou estilização geométrica de um tema, mas
sim como exacerbação gráfica, digamos, de uma idéia então corrente de que um quadro
pode ser visto como um jogo de relações de formas e cores sobre um plano, sem que nos
preocupemos com o tema representado. Uma idéia que tem como corolário o sentido de
que a abstração é uma espécie de substrato essencial e autônomo com relação ao tema. Ou
seja, a vaca não é, realmente, necessária. Desde se coloca uma questão importante com
relação à abstração na arquitetura, pois parece muito razoável discutir as diferenças entre
representação e abstração em pintura ou escultura, uma vez que se tratam de artes
historicamente representacionais, enquanto que a arquitetura claramente não trata de
representar coisa alguma do mundo. Se um edifício pode apresentar cariátides, ou outros
aspectos figurativos em suas partes, nada parece indicar, porém, que em seu todo o edifício
se comporte como uma representação de um mundo qualquer. Essa discussão será
retomada adiante. Antes, é preciso esclarecer o sentido ‘forte’ de abstração e ainda as
questões ligadas à autonomia que a abstração traz.
25
Em 1944, o crítico formalista autodidata Clement Greenberg publica o artigo ‘Arte
abstrata’
16
, onde resume a história da “revolução ocorrida na pintura ocidental nos últimos
sessenta anos”
17
, ou seja, circa 1884-1944. Em sua narrativa, tal revolução sucede a outra
anterior que “levou da planaridade hierática do Gótico à tridimensionalidade do
Renascimento”
18
. Greenberg desenvolve a tese histórica de que a abstração é o estilo que
culmina o processo ‘revolucionário’ de superação do Renascimento, o que na prática torna
a abstração o equivalente único da modernidade, o estilo cuja validade histórica para todas
as artes é inegável. Greenberg defende a idéia de que essa arte abstrata e a ciência moderna
pertencem “à mesma tendência cultural específica”
19
que remonta à autocrítica que Kant
promoveu na filosofia em favor da autonomia disciplinar. Nascida na pintura como
produto de sua procura por “auto-definição”, a abstração encarna a natureza puramente
visual da pintura. Para Greenberg, a “pureza” da arte visual se dá quando a arte se restringe
“exclusivamente ao que é dado na experiência visual [e essa] é uma idéia cuja única
justificativa reside na consistência científica”
20
. Assim Greenberg justifica sua posição que
na prática crítica tem como instrumentos apenas o “olho e o bom gosto” do crítico
21
. Como
crítico, Greenberg é um apologista da arte abstrata e não esconde: em 1940, ao tentar
apresentar sua explicação para “a atual supremacia da arte abstrata”
22
, reconhece ao final
de ‘Rumo a mais um novo Laocoonte’ que não alcança esse seu objetivo, tendo no lugar
disso apresentado apenas a “justificação histórica” da abstração: “Assim, o que escrevi
tornou-se uma apologia histórica da arte abstrata”
23
.
É por oposição aos pressupostos renascentistas que Greenberg historia a genealogia
da abstração, o que significa entre outras coisas que Greenberg, um dos mais influentes
críticos de arte norte-americanos de seu tempo, propugna a invenção da arte abstrata como
um feito maior, um feito da estatura da arte do Renascimento. Seus principais artistas estão
assim implicitamente colocados ombro a ombro com Leonardo Da Vinci ou Miguelangelo.
Os escritos de Greenberg e sua atuação comercial foram fatores que impulsionaram
diversas carreiras internacionais de pintores abstratos norte-americanos importantes, tais
como Jackson Pollock (1912-1956) e Willem de Kooning (1904-1997). Sua atuação foi,
nesse sentido, decisiva para que Nova Iorque “roubasse” a idéia de arte moderna gerada na
Europa e na União Soviética
24
. Franco em seu ‘apologismo’, Greenberg desenvolveu suas
teorias formalistas em artigos publicados no exercício da crítica de arte. A ampla
repercussão de suas teorias foi obviamente beneficiada em sua recepção intelectual pela
obra igualmente formalista e pró-abstracionista de Alfred H. Barr, Jr., que em 1929 se
26
torna o primeiro diretor do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque com a missão de
difundir a arte moderna através da formação de um acervo e exibições didáticas.
25
figura 8 - RAPHAEL. São Jorge, óleo s/ tela.
figura 9 - Ellsworth KELLY. Colors for a Large Wall . 1951, óleo s/ 64 painéis de Madeira. (240 x 240
cm).
27
1.1.3. Abstração e Autonomia
Nos termos kantianos, podemos ser ‘autônomos’ ou ‘heterônomos’. O primeiro
termo designando nossa capacidade de darmos leis a nós mesmos, e o segundo, o oposto,
quando aceitamos leis previamente dadas por uma força externa à nossa livre capacidade
de decidir
26
. Com relação à apreciação da arte, a idéia de autonomia estética implica em
que não podemos recorrer a termos não-estéticos para explicar as obras de arte; devemos
nos ater a uma análise formal do que vemos. No caso da pintura, como se viu na vaca de
Doesburg, mesmo que se trate de um retrato de um rei, o que devemos apreciar são os
elementos de forma, linha e cor. Assim, não se pode explicar as diversas fases de Pablo
Picasso a partir de seus diversos casamentos. Ou ainda, não podemos considerar em nossa
apreciação estética a relação dos papéis impressos usados nas colagens do mestre cubista
com sua vida cotidiana (por exemplo, o que está escrito num pedaço de jornal que Picasso
aplicou a uma tela), mas devemos tão somente vê-los como ‘superfícies planas no espaço
bidimensional’. Tal é a posição de um crítico como Clement Greenberg.
No entanto, mesmo quando reconhecemos que a força da composição de um quadro
está em seus elementos ‘abstratos’, é certamente um exagero dizer que podemos
compreender uma pintura figurativa qualquer sem nos preocuparmos com aquilo a que tal
pintura se refere. Roger Scruton demonstra esse ponto analisando o São Jorge de Raphael
27
(fig. 8): compreendemos o equilíbrio entre o impulso ascendente das patas traseiras do
cavalo e o impulso descendente da lança do Santo, porque compreendemos a cena
representada. Greenberg, no entanto, isola os elementos abstratos dos representacionais na
pintura e elimina esses últimos por identificá-los com a narrativa literária, que independe
da visualização do objeto ‘maçã’, por exemplo, quando descreve um acontecimento
qualquer envolvendo uma maçã.
Com efeito, a abstração segundo Greenberg atende à exigência de “especialização”
dos novos tempos, o que implica em que cada uma das artes abstenha-se de “tratar ou de
imitar o que reside fora do terreno de seus efeitos exclusivos”
28
. Na verdade, para o autor,
“a essência do modernismo” se encontra na questão da “autodefinição”, termo que
podemos igualar a ‘autonomia estética’. Greenberg descreve a ‘autodefinição’ como uma
“tendência autocrítica que teve início com o filósofo Kant”, ou seja, o “uso de métodos
característicos de uma disciplina, não no intuito de subvertê-la, mas para entrincheirá-la
28
mais firmemente em sua área de competência”
29
. Vale dizer que nessa sua metáfora
militar, a autonomia coloca cada disciplina em posição de combate àquilo que ela não é,
instaurando o que não é como o inimigo a combater. A pintura, or exemplo, trataria apenas
do que ela é, de sua “natureza literal”, ou seja, das “configurações de pigmento numa
superfície plana”
30
. Como nas demais disciplinas, a “autocrítica” na pintura faz “eliminar
dos efeitos específicos de cada arte todo e qualquer efeito que se pudesse imaginar ter sido
tomado de qualquer outra arte”
31
. A pintura não pode admitir contar qualquer tipo de
estória, sendo a tarefa de tecer narrativas, tarefa de uma outra arte, a literatura. Nesse
processo de “autodefinição”, cada arte procura tornar-se “pura”. Greenberg equivale assim
“pureza” a “autodefinição”
32
. E como “só a planaridade era única e exclusiva da arte
pictórica”, segue-se que “a pintura modernista se voltou para a planaridade e para mais
nada”
33
(fig. 9).
Clement Greenberg não é um historiador, embora recorra à história da arte para
empreender sua tarefa de delinear a genealogia da arte abstrata e justificar não seu gosto
particular por aquele estilo contemporâneo, mas a legitimidade histórica da abstração. No
relato de Greenberg, a arte abstrata é a resposta surgida na pintura a partir do Cubismo
como reação aos novos tempos, os quais exigem verdadeira autonomia em todas as artes,
atingindo igualmente a ficção, a poesia, e a arquitetura. Mais ainda, a abstração recusa
terminantemente qualquer compromisso com a figura em sua resposta à exigência do fim
das “ilusões de todos os tipos”. Na pintura, tanto quanto na escultura, o veredicto é claro:
“Não sobrou nada na natureza para as artes plásticas explorarem”
34
. Sua visão representa a
adoção de um sentido ‘forte’ de abstração num contexto teórico ‘modernista’, isto é,
comprometido com a idéia da arte moderna como a procura da autonomia da arte.
Abstração e autonomia, portanto, como reconhece Charles Harrison, são conceitos
“inextricáveis”. Harrison introduz uma distinção entre três categorias de teses de
autonomia da arte
35
. São categorias complementares, que não excluem umas às outras:
Autonomia das condições de produção da arte. Por essa perspectiva, a posição social
dos artistas ou o valor de mercado de suas obras não importam no desenvolvimento da arte,
sujeito apenas às suas questões internas. Tal é a posição de Greenberg quando afirma a
“especialização” do campo artístico e sua “auto-definição”. Theodor Adorno em sua
Aesthetic Theory argumenta no mesmo sentido, mas acrescenta um “propósito social
crítico”
36
nessa autonomia, entendida como uma “posição de oposição à própria sociedade,
29
uma posição que [a arte] pode ocupar ao definir-se como autônoma”
37
. Menos
preocupado com críticas à sociedade, Clive Bell argumenta que o artista, tal como o Santo,
“não produzem para viver vivem para produzir”, movidos por “uma necessidade
misteriosa”
38
. Essa variação de Bell da tese da autonomia da produção artística parece
encaixar-se perfeitamente num artista como Van Gogh, espécie de mártir messiânico da
pintura européia do século XIX. Parece poder também se aproximar de figuras como Mies
van der Rohe e Lucio Costa (1902-1998), por exemplo, que em momentos de sua vida
produziram exercícios arquiteturais ‘sem cliente’. No entanto, pode-se questionar
perfeitamente o fato de que, mesmo sem um cliente específico, seus projetos hipotéticos
referem-se a clientes genéricos sim, mas de determinada classe social e estilo de vida
compatível. Isso recolocaria Costa e Mies entre os comuns mortais, praticando seus
raciocínios arquiteturais em exercícios de demonstração conceitual visualizada em
desenhos, cuja perspectiva final seria o encontro de uma clientela adequada. Dados os
custos envolvidos na produção de um quadro e numa edificação, fica difícil defender uma
autonomia da arquitetura na base de uma autonomia de suas condições de produção.
Produzir um quadro ‘contra’ as convenções pode significar criar a médio prazo um novo
gosto, um novo público apreciador, e não necessariamente haver encontrado um cliente
comprador; ao passo que produzir uma residência como as de Mies e Costa significaria
haver encontrado quem apostasse em suas idéias. Nesse caso estaríamos comparando as
produções finais dos envolvidos quadros e edifícios e não quadros e desenhos de
arquitetura.
Autonomia da experiência estética. Coisa diferente é a questão da apreciação estética, ou
seja, da percepção que um observador qualquer tem de obras de arte ou de edificações.
Roger Fry, em 1909 opõe “vida imaginativa” à “vida real de necessidade e ação”
39
. Em sua
concepção de autonomia da experiência estética, somente à “vida imaginativa” é dada a
faculdade da “intensa contemplação desinteressada”, num retomada das idéias kantianas.
Quase sessenta anos depois, Greenberg (1967) defende a mesma idéia: para ele, “os juízos
estéticos são imediatos, intuitivos, não-deliberados e involuntários” e, sendo assim, não
espaço para “padrões, critérios, regras ou preceitos” prévios à experiência da obra de arte.
Como se observou acima, a crítica, nesse sentido tem como instrumentos apenas o “olho e
o bom gosto” do crítico. Mas esse “bom gosto” não seria constituído exatamente de
“padrões, critérios, regras ou preceitos”, simplesmente pressupostos e não explicitados?
30
Aqui cabe uma outra pergunta: a apreciação de um edifício poderia se dar nessa condição
de ‘juízos intuitivos” e “bom gosto” do crítico? Não seria isso a mesma coisa que observar
um objeto desconsiderando seus propósitos? O fato é que a autonomia estética” é uma
espécie de dogma pressuposto na atividade dos museus, por exemplo, onde encontramos
obras de arte removidas de seu contexto e postas lado a lado para uma apreciação
“desinteressada”, o que exclui o interesse por suas condições de produção. Ao apreciarmos
um edifício como o Panopticon (fig. 10), por exemplo, não deveríamos nos interessar por
saber algo sobre a sociedade que o produziu, como o produziu e porque o fez assim, mas
apenas atentar a nosso sentido estético e seus julgamentos “intuitivos”.
figura 10 - Panoptikon.
Autonomia formal. Nas teses dessa categoria, segundo Harrison, os elementos formais de
uma obra funcionam dentro de “um todo estético autocontido”
40
e assim não dependem de
sua correspondência com aspectos do mundo visível para seu valor. É a “coerência da
organização interna da obra” o que lhe o estatuto de obra de arte, um estatuto “cuja
medida deve ser formal”
41
. O conceito de Clive Bell de “forma significante” de 1914 se
enquadra nessa categoria, sem implicar na condenação greenberguina da pintura figurativa,
31
mas em sua completa irrelevância para a experiência estética, do sentido das figuras
representadas, o que traz de volta a discussão acima sobre o São Jorge de Raphael. No caso
do Panopticon, é seu partido radial e as relações formais que se estabelecem, por exemplo,
entre o centro e as alas, o que deverá importar na construção da obra artística e em sua
apeciação como fato estético.
1.1.4. O experimentalismo moderno
A abstração está ligada ainda à idéia de que a arte moderna é uma arte de caráter
experimental, que não lida com soluções herdadas, mas com a experimentação de novas
propostas. Renato Poggioli em seu clássico Teoria dell’arte d’avangardia (1962) estuda a
vanguarda não como fato estético, mas sociológico; enfoca as relações gerais entre o
fenômeno da vanguarda e a civilização ocidental. Poggioli relaciona a postura
experimentalista do movimento moderno com a idéia de Zeitgeist fazendo uma oposição
entre o Zeitgeist da antiguidade e o que chama de “mito do Zeitgeist
42
. Enquanto na
antiguidade se concebia o presente como um triunfo dos princípios do passado, para os
modernos, o presente vale por força de suas potencialidades para o futuro
43
. Os
modernos negam a autoridade do passado e vêem a cultura como um permanente processo
de criação do novo, surgindo daí o experimentalismo
44
da arte moderna. Outra tese é a de
Charlotte Douglas
45
, que sugere que o caráter experimental do movimento moderno pode
ser relacionado à crença comum às vanguardas russas e européias de que a experiência
ótica dos objetos opacos é uma ilusão de nosso mundo tridimensional, uma ilusão criada
por nossos sentidos. Dado o fato de obras de arte serem obras para os sentidos e estarem
mergulhadas nesse mundo tridimensional ilusório, tratava-se então de que os artistas
procurassem descobrir como demonstrar (e não representar ou ilustrar) a verdadeira
realidade, expondo os expectadores a suas experiências. O artista contaria para tanto com
sua intuição, com a qual ele poderia acessar o que nós outros não vemos. No Brasil, esta
segunda tese se adapta melhor a Lucio Costa que em seu ‘Razões da Nova Arquitetura’
(1936) encontra um modo de expressar as mesmas idéias do artista como um visionário
privilegiado, como se mostra adiante, embora o brasileiro não enfatize o papel
experimental da arte moderna.
32
Em manifesto de 1913, os cubo-futuristas russos, entre os quais Kasimir Maliêvitch
(1878-1935)
46
, declaravam que a arte ‘marcha na vanguarda da evolução psíquica’
47
e
explicavam que a sucessão de estilos na arte de seu tempo era resultado dessa evolução na
psique do artista. Como conseqüência desse caráter experimental, na Rússia surge a
expressão “arte de laboratório”. A idéia de ‘arte de laboratório’ é explicitada na vanguarda
russa em 1920, quando Vladimir Tatlin (1885-1953) acaba sua famosa Torre (Monumento
à Terceira Internacional Socialista) [fig. 11], e publica em parceria com seus três
assistentes um breve artigo de jornal
48
, “O Trabalho que nos Encara
49
[fig.12]. Ali os
artistas explicam o papel que os relevos e contra-relevos de Tatlin de 1914 a 1918
desempenharam como ‘trabalho em escala de laboratório’ para o projeto da Torre e
afirmam que tais explorações dos materiais e das maneiras de combiná-los poderiam se
tornar o início de novas disciplinas. No ano seguinte, o fundador do Construtivismo,
Aleksander Rodchenko (1891-1956) escreve sobre suas experiências plásticas:
Eu concebi essas últimas construções espaciais como experimentos,
especificamente para amarrar o projetista à lei da pertinência das formas
aplicadas, para obriga-lo a reunir as formas de acordo com leis e também para
mostrar seu universalismo, como a partir de formas idênticas ele pode reunir
todas as construções possíveis, de diferentes sistemas, tipos e aplicações
50
.
figura 11 - Vladimir TATLIN. Monumeno à Terceira Internacional, 1920.
33
figura 12 - Vladimir TATLIN, Capa de O Trabalho que nos Encara,1920.
Cooke observa que nesse texto está claramente colocada a idéia da arte como
“trabalho de laboratório para o projeto” (laboratory work for design). Essa idéia se torna
corrente na vanguarda russa, significando que as experimentações plásticas produzem
primeiramente in abstractu o conhecimento e as soluções ‘genéricas’ das formas que serão
posteriormente usadas por arquitetos e designer em problemas práticos específicos. Trata-
se, então, de um conceito de trabalho apropriado à prática de artistas, arquitetos e
designers, que está relacionado a uma analogia com a Ciência. Adiante discutiremos a
questão das analogias entre arte e arquitetura modernas e a ciência. Aqui cabe observar que
34
a analogia do laboratório parece ser construída sobre a idéia de que no laboratório o
cientista investiga o desconhecido que possibilita a criação da nova tecnologia,
semelhantemente ao artista que em seu ateliê dedica-se à experimentação do desconhecido
35
Na verdade, argumenta Charles Harrison, a própria idéia de “pintura pura” ia no
sentido contrário ao da pintura francesa moderna, que enfatizava a “exploração sofisticada
dos problemas do realismo e da autoconsciência na representação figurativa”
52
. Por outras
palavras, não era a abstração o alvo do Cubismo, mas a análise dos processos de figuração.
Assim, não foi em Paris, mas na Alemanha, na Áustria, na Holanda e na Rússia onde
surgiram os primeiros desenvolvimentos da arte abstrata
53
levados a cabo entre 1912 e
1920 por artistas que, no entanto, passaram por “algum tipo de aprendizagem nos estilos e
técnicas cubistas” nos anos decisivos de 1910-1912
54
. Dessa forma, desde o início da
década de 1920, embora decisivamente impulsionada pela experiência cubista parisiense, a
abstração estava “associada na mente de muitos com a possibilidade de uma estética
universal e, portanto internacional, para a qual as formas de pintura abstrata forneceriam
protótipos e exemplos”
55
.
1.1.6. Vanguarda russa e vanguardas européias
A Rússia foi entre 1910 e 1914 um fórum de discussão de idéias do mundo
inteiro
56
. As teorias que circulavam na vanguarda russa, não se distinguem daquelas do
modernismo da Europa Central
57
. Como observa Charlotte Douglas
58
, embora cada grupo
de vanguarda procurasse firmar sua identidade própria, todos reconheciam as mesmas
mudanças no modo de ver o mundo que se operava no início do século XX: o mundo de
objetos discretos e opacos era claramente falso. Cada um dos integrantes das vanguardas
reagia de maneiras diferentes às mudanças na percepção do mundo e todos provocavam,
recebiam, partilhavam influências de múltiplas fontes e as processavam de maneiras
diferentes. Por exemplo, parte importante nesse enorme ‘caldeirão cultural’, a Kasimir
Maliêvitch atribui-se uma multiplicidade de influencias: o poeta futurista italiano Tomasso
Marinetti (1876-1944), o non-sense zaum dos cubo-futuristas russos, as idéias da crítica
formalista de Schklovski, o zeitgeist pré-guerra, a obra esotérica “Tertium Organum” de P.
D. Uspenski, e ainda Nietzche, Schopenhauer, etc. A coesão estilística do Suprematismo
de Maliêvitch, no entanto faz o historiador tcheco Jiri Padrta, afirmar que Maliêvitch foi
capaz de transformar todo esse conhecimento na “chama selvagem de sua visão do mundo
sem objetos” , a ‘não-objetividade’
59
.
Além da intensa troca de publicações, correspondências e viagens, conta-se às
dezenas os artistas russos que além de Kandinsky (1866-1944) transitaram entre Paris,
36
Berlim e Munique nos anos que precederam a revolução russa de outubro de 1917.
Vladimir Tatlin, por exemplo, visitou em 1913 o ateliê de Picasso, onde viu sua série de
guitarras construídas a partir de materiais planos considerados não-artísticos, o que o
inspirou a realizar seus famosos ‘contra-relevos’, obras chave no desenvolvimento do
Construtivismo Russo
60
. Com a revolução, porém, muitos voltaram a seu país natal e a
Rússia se fechou por alguns anos.
Na Rússia, tanto as experimentações tridimensionais com diferentes materiais de
Tatlin (fig. 14), quanto os modelos em gesso de Maliêvitch afetaram a arquitetura russa. E
da mesma forma influenciaram a arquitetura ocidental. No depoimento do arquiteto e um
dos principais teóricos do Construtivismo arquitetônico Russo Moisei Ginzburg (1893-
1946)
61
, entre a revolução e o início dos anos vinte o trabalho dos arquitetos soviéticos se
desenvolveu em quase completo isolamento da Europa Ocidental e da América.
figura 14 - Vladimir TATLIN, Contra-relevo,1915 (reconstrução).
37
A partir de 1921 se restabeleceram as relações entre Rússia e Alemanha, mas a
partir de 1924-1925, ainda segundo Ginzburg é que as revistas estrangeiras voltaram a
circular na Rússia, divulgando ali as realizações dos arquitetos estrangeiros e “exercendo
considerável influência” sobre o trabalho cotidiano dos arquitetos russos. Mas Ginzburg
ressalta:
as realizações de nossos camaradas ocidentais foram da mesma forma sujeitas à
influência, por um lado dos princípios vitais do Construtivismo, exportados para
o ocidente em 1922 por Lissitzky e Ehrenburg, e, por outro, à influência das
composições suprematistas de Maliêvitch, cuja arquitetônica de planos, volume
e espaço apresentava extraordinária semelhança com as composições
arquiteturais tridimensionais dos holandeses Doesburg e van Eesteren
62
(fig.
15).
figura 15 - Theo van DOESBURG e Cornelis Van EESTEREN. Contra-Construção, Gouache sobre
lithografia (57.2 x 57.2 cm).
38
Em 1924, o livro de Ginzburg ‘Estilo e Época’ foi publicado. Nele, Ginzburg
estabelecia a base teórica e histórica para uma nova arquitetura numa nova época, livre do
ecletismo e do esteticismo da arquitetura capitalista. Em 1925, os Construtivistas
Alexander e Viktor Vesnin, juntamente com Moisei Ginzburg fundam a União dos
Arquitetos Contemporâneos, OSA
63
(fig. 16). Os Construtivistas entram em conflitos
teóricos com os Racionalistas, ou Formalistas do grupo ASNOVA, cujo foco central era a
importância relativa imputada à teoria estética dos Racionalistas, em oposição a um
funcionalismo derivado da tecnologia e dos novos materiais dos Construtivistas
64
. Mas em
que pese a polêmica, esses grupos partilhavam preocupações com a relação entre
arquitetura e o planejamento social, além de insistirem numa massa estrutural claramente
definida, baseada em formas geométricas simples, ordenadas
65
. Em sua História da
Arquitetura Russa, Brumfield dá ênfase às similaridades entre os edifícios Construtivistas e
a plasticidade da arquitetura Russa de princípios do período medieval e argumenta que o
estilo recebido com tanta simpatia pelo movimento moderno internacional em arquitetura
estava profundamente enraizado numa percepção da estrutura derivada das mais antigas
tradições da arquitetura Russa-Bizantina a habilidade de interpretar a forma sem
ornamento
66
.
Os arquitetos do grupo de Ginzburg desenvolveram métodos de trabalho
inteiramente racionais, ao passo que nas artes plásticas dos anos 1910-1920 a abstração
parece irremediavelmente comprometida com certa irracionalidade.
figura 16 - União dos Arquitetos Contemporâneos (OSA), 1927.
39
1.1.7. Abstração e irracionalidade
Kandinsky (fig. 17), Kupka (1871-1957) [fig.18] e Delaunay (1885-1979), embora
pioneiros criadores de arte abstrata e importantes para o movimento moderno, não criaram
movimentos de arte abstrata no sentido forte, como o fizeram Kasimir Maliêvitch -
fundador do Suprematismo na Rússia - e Piet Mondrian- que com van Doesburg definiu as
linhas do grupo De Stijl e seu estilo, o Neoplasticismo, na Holanda. Ambos os movimentos
operam com a abstração geométrica, mas com diferenças visíveis, a seguir exploradas nas
obras de Mondrian e Maliêvitch.
figura 17 - Wassily KANDINSKY. Composição VIII, 1913.
figura 18 - KUPKA, Os discos de Newton, 1911/1912 , óleo s/ tela.
40
Suprematismo e De Stijl foram movimentos organizados e se propuseram a
desenvolver as suas teorias para além da pintura e da escultura, alcançando a arquitetura e
o design. Cada uma dessas versões da “clara geometria” apregoa seu estilo como o
verdadeiro e único. De Stij é “O Estilo”, não apenas mais um outro ‘novo estilo’. O
Suprematismo é o supremus, o supremo estilo da “supremacia da sensação”. Como
movimentos, polemizaram em debates, manifestos e publicações diversas, realizaram
exposições importantes e itinerantes e, cada qual em seu pais, organizaram, aplicaram e
publicaram suas doutrinas na forma de princípios e métodos pedagógicos. Ambos os
movimentos desenvolveram seus estilos totais a partir das pinturas de Mondrian e
Maliêvitch. Ambos os movimentos tiveram (juntamente com o Construtivismo Russo)
participação decisiva no desenvolvimento da Bauhaus, especialmente no que toca à
superação do psicologismo e da vocação artesanal de seu início expressionista. Como
teóricos, Mondrian e Maliêvitch publicaram artigos e livros. As pinturas de Mondrian (fig.
19) e Maliêvitch, realmente devem ter parecido a seus contemporâneos “mundos
figurativamente inabitáveis”
67
.
figura 19 - Piet MONDRIAN. Composição (1935-1942), óleo s/ tela.
41
Ambas as abstrações valem-se de elementos geométricos e da cor pura para criar
um espaço que não é ilusão de tridimensionalidade pela representação de um volume no
espaço profundo, ou mesmo de um espaço pouquíssimo profundo, como se achatado num
plano. Através da cor, o efeito visual das pinturas de formas planas coloridas de Kasimir
Maliêvitch e dos planos ortogonais de cor e de Piet Mondrian (1872-1944) é o de uma
profundidade que não se pode medir, como a profundidade da perspectiva. Trata-se do
recurso a um efeito ótico das cores que por si mesmas parecem aproximar-se ou afastar-se
do espectador. Ao serem vistas simultaneamente as cores puras das pinturas de Mondrian e
Maliêvitch tomam entre si profundidades diferentes, mas sutis e variáveis, devido ao efeito
ótico. Trata-se, portanto de um efeito não de ilusão provocado por recursos do desenho,
como a perspectiva, ou de ilusão pictórica engendrada pelo artista, como a perspectiva
aérea, que imita um fenômeno atmosférico, mas um efeito da sensação da cor pura em
nossa mente. Essas diferentes profundidades geradas no contrataste das cores não se pode
medir, elas não são materiais, pertencem à nossa mente. É isso o que El Lissitzky quis
dizer em seu A.and Pangeometry, escrito de 1925: “A nova experiência óptica nos ensina
que duas superfícies [de cor] de intensidade diferente devem ser concebidas como tendo
uma relação de distância variável entre si muito embora possam estar [materialmente] no
mesmo plano [da tela]”
68
.
Parece razoável, portanto acreditar que esse espaço é criado na mente, que num
certo sentido, seu espaço é um espaço imaterial onde nenhum objeto material pode habitar.
Se pensarmos não em termos de cor, mas do desenho das formas, as conclusões são as
mesmas. As pinturas Suprematistas de Maliêvitch criam um espaço onde encontramos
profundidade, mas não perspectiva. Suas figuras quadrangulares surgem flutuantes como
trapézios que podem ser lidos como quadrados em profundidade, surgem também como
retângulos sobrepostos, sugerindo espaço entre suas massas. Que tamanho teriam esses
planos? Em que escala veríamos esses espaços? Não sabemos. Não podemos medir. Não
como verificar geometricamente. Não a ‘caixa perspética’, não horizonte, não
céu. Lissitzki classifica o sistema como “irracional” podendo “ser medido unicamente pela
intensidade e posição das superfícies-planos coloridas e estritamente definidas”
69
. Milner
fala de “relatividade no espaço e na escala dos elementos”
70
. Essa irracionalidade foi
interpretada pelo minimalista americano Donald Judd como não-antropomórfica
71
. Jean
Claude Macar demonstra o que chama de ‘paradoxo da razão intuitiva’ notando que
Maliêvitch a construção como estando sujeita não ao ‘eu quero’, mas ao ‘é necessário’
42
em concordância com uma lei objetiva e, ao mesmo tempo, como um ato de pura vontade
criativa e intuição, mais que do intelecto
72
.
Já a abstração biomórfica lida com uma gama de formas totalmente diferentes
daquelas da abstração geométrica de Maliêvitch e Mondrian. Segundo Chilvers o termo
‘biomórfico’ (biomorphic) [fig.20] se aplica à formas na arte abstrata que diferentemente
das formas geométricas, são derivadas ou sugeridas por formas orgânicas. A abstração
biomórfica pode ser vistas nos relevos pintados e na escultura do pioneiro no assunto Hans
Arp (1886-1966), um artista que aqui interessa por sua importância na historiografia da
arquitetura moderna. Arp expõe em 1912 na exposição do grupo Der Blauer Reiter de
Kandinsky
73
. Em 1915 sua primeira exposição individual se compõe de obras abstratas
biomórficas e geométricas
74
. Ainda em 1915 é um dos fundadores no movimento
irracionalista Dada em Zurique onde faz, em 1916, seus primeiros relevos policromados
abstratos
75
. Por influência de Arp e de sua futura esposa Sophie Taeuber (1889-1943), os
dadaístas de Zurique se aproximam da abstração de Kandinsky
76
.
figura 20 - Jean ARP. Figura (1920).
43
A presença de modalidades diferentes de abstração no mesmo artista pode ser
entendida pelo sentido de irracionalidade que Arp e Sophie conferiam à abstração, seja ela
geométrica ou biomórfica, e pelo recurso ao acaso na composição de obras em ambas as
modalidades
77
. Na Suiça em 1915 o casal criou em colaboração obras que para Arp são
“realidades em si, sem significado nem intenção cerebral
78
, obras criadas segundo “a lei do
acaso” (la loi du hasard). O casal acreditava assim “deixar o Elementar e o Espontâneo
reagir em plena liberdade”. Empregando ambas as linguagens, Arp colabora com van
Doesburg em projetos de arquitetura (fig. 21) ligados ao movimento De Stijl e em 1925
adere ao movimento surrealista.
figura 21 - DOESBURG e ARP. La Aubette (1926-1928).
44
1.2. Maliêvitch, pintura e arquitetura
Se Mondrian e Maliêvitch foram os principais responsáveis pela criação de dois
sistemas distintos de abstração geométrica, e participaram de movimentos que estenderam
suas ambições da pintura à arquitetura, apenas o segundo aventurou-se em propor
diretamente formas para a arquitetura moderna. Daí o interesse em entender seus passos.
As obras suprematistas de Kasimir Maliêvitch desenvolvem-se a partir de uma
dinâmica transformacional. O movimento é o pressuposto de toda a sua criação plástica.
Quadrado, triângulo e círculo são os elementos básicos da teoria de Kandinsky, os mesmos
elementos que a Alquimia usava em suas investigações das relações entre homem, mulher
e Deus
79
. Maliêvitch substitui o triângulo pela cruz, em seu triunvirato de formas básicas
(fig. 22). O quadrado, o elemento gerador irá girar e produzir o círculo. O Quadrado
multiplica-se em dois que se deslocam nos eixos vertical e horizontal, produzindo o
terceiro elemento de forma, a cruz
80
.
figura 22 - Kasimir MALIÊVITCH. Três elementos Suprematistas em Contraste (1927).
Mas a forma, para Maliêvitch é apenas uma ilusão. Em 1922 escreve que “(...) no
momento em que se manifesta a forma, (...) o homem esquece que esta é uma convenção
que, na realidade a forma não existe; como ele poderia nesse caso manifestar a excitação,
já que esta não é uma forma e não tem fronteiras?”
81
.
Essa problemática Maliêvitch
enfrentou a partir da pintura intitulada Quadrado Amarelo (fig. 23), que parece se fazer
transparente até o desaparecimento.
45
figura 23 - Kasimir MALIÊVITCH. Suprematismo (Quadrado Amarelo), 1917-18.
Seu próximo passo seria a série de brancos sobre branco. A partir dos quadros
brancos a atitude do Suprematismo com relação ao material se opõe à arte de Tatlin, a
“cultura dos materiais, apelo à estética”
82
. Olga Rozanova propõe uma distinção entre
‘não-objetualidade’ e não-objetividade, e conclui que talvez fosse mais sensível substituir a
pintura por projeções em telas na arte do não-objeto (nonobject art). Efetivamente,
indícios de que Maliêvitch tenha exposto chassis brancos vazios
83
. Daí imponderabilidade
das formas, transparência, fluidez espacial. Desse modo, a pintura malievitchiana atingiu
seus limites com a fase branca, onde sobrepõe formas brancas sobre fundo branco,
esgotando as possibilidades da pintura e assim o Suprematismo adentra a arquitetura. Mas
como pensar arquitetura com o parâmetro da não-objetividade? Parece haver algo
contraditório aí.
46
figura 24 - Kasimir MALIÊVITCH. Duas Xícaras Suprematismo, 1923.
Os primeiros trabalhos tridimensionais começam em seu estúdio na Escola de Arte
Popular de Vitebsk, em 1919. Ali nasce o Suprematismo Utilitário (fig. 24), onde os alunos
trabalham decorando as ruas da cidade. As formas do Suprematismo, inicialmente apenas
aplicadas sobre objetos existentes deveriam ser vistas como formas não-objetivas,
irracionais, e ter no seu espectador o mesmo efeito das pinturas suprematistas. O trabalho
nas ruas despertou o interesse dos estudantes por arquitetura
84
.
figura 25 - Kasimir MALIÊVITCH. Quadrado Negro (dir.) e fragmento de Gota c.1923-30.
47
A primeira afirmação tridimensional do Suprematismo pode ter sido um quadrado
negro pintado por Maliêvitch numa peça de gesso
85
(fig. 25). Em 1920, na publicação
“Suprematismo: 34 Desenhos” lança as bases da nova arquitetura a partir da ‘morte’ da
pintura declarando que no Suprematismo a pintura se tornou obsoleta e o próprio pintor é
uma noção preconceituosa do passado
86
. O elemento gerador Suprematista, o quadrado
negro, se tornaria a fórmula do novo sistema arquitetônico
87
.
Sobre o papel da síntese estilística na solução dos problemas sociais através da
arquitetura, Maliêvitch não pode ser mais claro. Ele pensa que a arte deve prover a nova
arquitetura e tudo ligado a sua integridade, refletindo os problemas sociais da sociedade
proletária
88
. Curiosamente, essa frase foi usada no seu depoimento quando interrogado sob
suspeita de espionagem e está ali para refutar críticas de formalismo burguês com
argumentos de engajamento social. Politicamente dizer que o Suprematismo pode refletir a
sociedade é equivaler-se ao marxismo em sua prerrogativa básica. Maliêvitch sonha com o
mundo em estilo Suprematista onde tudo - tecidos, jarros, pratos, mobília, cartazes -, tudo
deve ter desenhos suprematistas como uma nova forma de harmonia (Suprematist designs
as a new form of harmony)
89
.
Em 1920, pouco antes de iniciar seus primeiros trabalhos tridimensionais,
Maliêvitch imagina a organização de um sistema de satélites suprematistas, que Nakov
chama de ‘urbanismo planetário’. Daí lança a idéia de um ‘sistema de estruturas mundiais’
a partir da expansão indefinida de uma rede de satélites no espaço.
Em 1921, a Nova Política Econômica de Lênin, incita os artistas a abandonar a pura
especulação para participar da realidade cotidiana. Maliêvitch conclui nesse momento que
a arquitetura deve criar o ambiente da nova sociedade. Quando deixa Vitebsk, vai para
Petrograd e começa a criar desenhos e maquetes de arquitetura para servir de paradigma
para as realizações
90
.
O Suprematismo arquitetônico torna-se no Ginkhuk (Instituto Estatal de Cultura
Artística), o principal foco do artista e de seus estudantes Nikolai Suetin, Ilia Chashnik, e
Lazar Khidekel, entre outros, onde Maliêvitch realiza seus primeiros modelos em gesso, os
Arkhitektons (fig. 26 e 27), em 1923. É no Ginkhuk que Lissitzky inicia-se no
Suprematismo arquitetônico. No entanto Lissitzky é engenheiro por formação e não parece
haver assimilado a imaterialidade do Suprematismo. Ernst Kallai descreve os Arkhitectons,
como "pinturas suprematistas camufladas” (camouflaged Suprematist paintings)
91
, em sua
visão, eles são pura sensação plástica. No relato de um contemporâneo
92
, Maliêvitch teria
48
figura 26 - Kasimir MALIÊVITCH.
Arkhitekton, 1927, gesso e madeira.
figura 27 - Kasimir MALIÊVITCH.
Arkhitekton.
49
se referido à indeterminação de escala e de utilidade nos Arkhitektons. Um Arkhitekton
seria apenas uma composição estereométrica (a composition of stereometric figures), coisa
sem uso. O artista não teria objeções se fosse usado para decorar uma sala ou, ampliado, no
meio de uma praça. Da mesma forma, um Arkhitekton poderia servir como base de uma
estátua ou monumento e se um pássaro faz seu serviç
50
maioria se ordena segundo um eixo de simetria, inscrevendo-se obliquamente na superfície
da folha. Os terraços horizontais, largamente escuros, sublinham o caráter de deslocamento
do cubo de base. Nas margens, as anotações explicativas, escritas à mão por Maliêvitch,
insistem sobre o aspecto conceitual das representações gráficas desses corpos celestes.
93
Depois do fechamento do Ginkhuk, Maliêvitch continuou suas atividades
arquiteturais no GIII (Instituto Estatal de História da Arte) em Leningrado (antiga
Petrograd), onde seus antigos estudantes Suetin, Chashnik, Khidekel, V. Vorobiev, e o
arquiteto Aleksander Nikolsky eram agora professores e onde a questão da “cor
decoração de novas construções arquiteturais, áreas residenciais e praças”- em particular,
'ornamentação espacial tridimensional' - estava sendo discutida. Sabe-se que Maliêvitch
trocou correspondência com Nikolsky acerca da possibilidade de colaboração entre os dois
em projetos de arquitetura, o que teria gerado a questão da autoria. Em 1932 e 1933, os
últimos anos de sua vida, Maliêvitch trabalhou nos Arkhitektons no laboratório
experimental no museu do estado russo em Leningrado
94
.
figura 29 - El LISSITZKY. Estudo para Proun 1E Cidade, 1919-1920.
51
indícios de que Maliêvitch tenha entregado em 1932 à Glavnauka, o órgão
oficial de supervisão da arte e da ciência um projeto de Cidade Socialista. Não sabemos
como ela seria, mas talvez se desenvolvesse a partir de dois eixos cruzados, com a
simplicidade das pinturas Suprematistas. Talvez possamos encontrar no projeto de cidade
de um de seus alunos: tão abstrato e irracional como a arte de seu mestre, a cidade Proun
de Lissitzky (fig. 29) tem o quadrado como centro, de onde partem quatro eixos
95
. Ou por
outra, a cidade Proun tem a forma da cruz suprematista sobreposta ao quadrado gerador.
Não se publicou nada sobre referências a Maliêvitch e Lissitsky na biblioteca de Lúcio
Costa, mas não deixa de ser interessante pensar no traçado de Brasília como uma grande
cruz Suprematista plainando qual avião metafísico acima da História, mas ligeiramente
arqueada para adaptar-se à topografia, num difícil compromisso entre asas e raízes.
Após a morte de Maliêvitch, em 1935, suas obras foram confinadas em museus e coleções
particulares na Rússia.
Guardadas desde 1927 na Alemanha, apenas em 1958 as obras do artista foram
reapresentadas no Stedelijk Museum Amsterdam, data que é o começo da ‘segunda fase da
influência de Maliêvitch no mundo’
96
. Os Arkhitektons foram vistos pela última vez em
público em 1932 e daí se perdeu a possibilidade de localizá-las.
A documentação fotográfica dos arkhitektons foi publicada em 1970
97
, 17 fotografias de
cerca de 40 maquetes, das quais algumas talvez não fossem mais que elementos de
maquetes.
Em 1978 reconstruiram-se duas maquetes para a exposição do centenário de
Maliêvitch, no Centre George Pompidou, Paris. As reconstruções guiaram-se pelas
fotografias disponíveis, com a ajuda de um magnetoscópio. As aproximações necessárias
foram feitas na base da estimativa da espessura da mesa ou tábua onde se apoiava a
maquete fotografada
98
. Nesse momento, inesperadamente, após quarenta anos perdidas
numa possível remessa a Kiev, surgem cinco caixas contendo Arkhitektons originais
desmontados. Confrontados com os originais, os técnicos perceberam que a fotografia não
ajudou na determinação da escala e do tamanho dos Arkhitektons. As maquetes eram
infinitamente mais delicadas e refinadas em seus detalhes e o erro ficou em cerca de
50%
99
. Não sendo controladas por mensurações numéricas, pergunta-se Troels
Andersen
100
, o que daria então sua unidade? Seção áurea? Diagonal, bi secção ou tri secção
do quadrado? A medição provou que os elementos foram concebidos segundo apreciações
visuais e não segundo medidas precisas
101
. Realmente parece que procurar instrumentos
52
racionais de controle das proporções entre as partes dos Arkhitektons não faz muito
sentido. É mais interessante e coerente com as idéias do suprematista a hipótese da
sensibilidade e da intuição de Ohayon. Para esse autor, os arkhitektons são montados
segundo uma intuição, um sentimento de espaço, são um ato de pura sensibilidade. Por
isso, Ohayon considera imprópria qualquer comparação com as esculturas abstratas de
Vantongerloo, essas sim, elaboradas segundo princípios matemáticos
102
.
1.2.2. Não-objetividade x funcionalismo
A obra de Lissitzky (1890-1941) assume que os princípios da pintura suprematista
podem ser materializados, isto é, transpostos diretamente para a forma arquitetônica uma
crença que estava na base da teoria e da prática do grupo UNOVIS de Maliêvitch. No
entanto, Clark argumenta que quando o artista dirigiu seu pensamento para a arquitetura
ele próprio não acreditava que tal transferência fosse possível
103
. É fácil concordar com
essa tese. Para Maliêvitch, a verdadeira realidade não está no nosso mundo objetivo, a
verdadeira natureza do universo é pura ‘excitação’, energia: “a vida é excitação pura,
inconsciente, inexplicável”
104
. Maliêvitch dirigiu seus esforços teórico em larga medida
contra o mundo material, tentando deslocar as preocupações práticas da vida. É difícil
acreditar que o templo do “funcionalismo estético”, a Bauhaus tenha publicado o
Manifesto do Suprematismo. Mas um mérito da Bauhaus, muito por conta da
personalidade de Gropius, ao que parece, foi ser esse caldeirão de influências. Ainda assim
é preciso observar que para receber a influência do Suprematismo foi preciso eliminar o
caráter de não-objetividade que Maliêvitch lhe imprimiu. Uma tarefa que parece ter sido
mediada pela atividade de artsita e embaixador cultural da Rússia de Lissitzky.
Em 1927 Maliêvitch visita a Bauhaus onde é apresentado a Gropius, Mies e outros
pelo poeta e militante da vanguarda polonesa Tadeusz Peiper. A visita é ocasião de uma
interessante polêmica que Peiper descreve em sua revista Zwrotnika. Tudo gira em torno
da distinção que o suprematista faz entre arquitetura e ‘arquitetônica’; o primeiro tem valor
de uso, o segundo apenas valor artístico
105
. A ‘arquitetônica’ produz formas que se
preocupam apenas com combinações artísticas de formas espaciais: as obras resultantes
não são pensadas para serem habitadas
106
. A oposição entre arquitetura e ‘arquitetônica’ é
clareada por uma anedota que Maliêvitch conta num almoço com alguns professores da
Bauhaus. Certa vez para se divertir ele quebrou uma xícara em duas partes ao longo de seu
53
eixo vertical. Sua esposa fez uma cena, pois o casal passava por um difícil aperto
financeiro. Mas Maliêvitch gostou tanto de uma das metades da xícara que a guardou. Um
dia ele descobriu que sua mulher a estava usando para transferir farinha de um pote para
outro. Peiper observa espantado que a intenção dessa anedota era demonstrar que algo que
não fora criado originalmente tendo em mente um propósito utilitário poderia se tornar um
objeto utilitário
107
. Segundo Peiper, Gropius ouviu a anedota e não disse uma única
palavra. Podemos imaginar o embaraço do ‘funcionlista-esteta’ com a anedota desse esteta
anti-funcionalista. Mas podemos também pensar que Maliêvitch estava apenas criando
uma maneira de apresentar sua visão de ‘arte de laboratório’ e que Gropius não tinha
exatamente esse tipo de idéia do papel do artista para com a arquitetura, o papel de gerador
de formas abstratas para aplicação utilitária.
Os embaraços continuaram numa visita a Mies van der Rohe, Maliêvitch, quando
Maliêvitch defendeu o ponto de vista de que a arquitetura, tanto quanto as artes aplicadas e
a arte em geral, se desenvolveram exclusivamente por influência de idéias estéticas,
independente de fatores históricos, sociais, econômicos ou outros. Não satisfeito
Maliêvitch contou que tinha feito modelos arquitetônicos construídos dos novos elementos
arquiteturais seguindo o sistema gótico. Mies observou que esses edifícios góticos não
serviam para mais nada hoje em dia. “Quem sabe!”, respondeu o suprematista, convicto de
que a atualidade histórica não interessa à criação artística. Curiosamente, Peiper afirma que
essa resposta foi considerada “extraordinariamente interessante” pelos presentes
108
. Mas
então Maliêvitch, convicto de sua crença na autonomia das condições de produção da arte,
da arquitetura e do design, diz que a forma do mobiliário nunca teria mudado se não por
uma transformação nas perspectivas estéticas. Mies respondeu com a afirmação de que a
cadeira de braços havia mudado porque as pessoas atléticas de seu tempo sentam-se
diferentemente de seus antecessores
109
. Peiper relata que nesse ponto a conversa cuja
intenção era apresentar uns aos outros ferveu. Havia um excesso de questões controversas
e uma por uma elas desapareceram no silêncio
110
. No dia seguinte, num tour pela Bauhaus
surge a questão da relação entre o ensino da pintura de cavalete e os outros objetivos
científicos da Bauhaus, questão que não estava muito clara. Peiper observa que os
trabalhos dos estudantes criados em papel são bem recebidos, pois se entende seu
significado mesmo que eles não tenham qualquer valor de uso. Mas é preciso acrecentar
que na Bauhaus a questão desses trabalhos é familiarizar o estudante com as leis dos
materiais, fazê-los conhecer o princípio moderno da economia do material - algo como o
54
dos Construtivistas Russos, embora muito diferente da idéia de Maliêvitch de ‘trabalho de
laboratório’ com a forma pura, independente do material. Mas se o trabalho com materiais
não causa problemas a Peiper, e o ensino de pintura? Peiper indica que a pintura fica
deslocada nessa abordagem, o que levanta a questão de saber se as formas artísticas
influenciam as formas tecnológicas
111
.
1.3. Abstração na arte brasileira
A primeira obra de arte abstrata exposta no Brasil parece ter sido de autoria do
artista inglês Ben Nicholson (1894-1982) (fig.30), com o que o país entra na cronologia da
abstração de Fernando Cocchiarale e Ana Bella Geiger
112
. Foi no ano de 1938, dez anos
após Nicholson adotar a abstração por influência de sua mulher, Barbara Hepworth
113
. Não
haviam artistas abstratos no Brasil naquele momento, como não houvera antes.
figura 30 - Ben NICHOLSON. Composição (1938).
Apenas entre 1948 e 1949 surgem “núcleos de artistas abstratos no Rio e em São
Paulo”
114
. Os novos artistas e teóricos referem-se a Mondrian e Kandinsky para legitimar a
55
abolição da figura e seu contexto social, feito imperdoável na mentalidade nacionalista dos
egressos da Semana de 22, prontamente atacado por Di Cavalcanti (1879-1976): “cérebros
doentios”
115
eram esses abstracionistas. O compromisso de Di e de Portinari (1903-1962)
com a descrição das etnias, dos usos e costumes do ‘povo brasileiro’ (fig. 31) não podia
tolerar os novos artistas abstratos.
figura 31 - Di CAVALCANTI. O Samba (1928), óleo s/ tela.
56
A abstração como um ideal artístico não poderia ter se enquadrado no horizonte
artístico brasileiro antes de terminada a II Guerra, e com ela a Era Vargas, pondo fim ao
prestígio do pensamento nacionalista. Como observa Gullar em entrevista publicada
116
,
“Portinari ainda resistiu algum tempo [ao desprestígio da pintura do modernismo de
1922]”. Uma das razões dessa ‘resistência’ pode ser o fato de que Portinari (fig. 32)
desfrutou por longo tempo de grande visibilidade internacional devido aos seus elogiados
painéis de azulejos em edifícios de Niemeyer (fig. 33). Elogiados, como se verá adiante,
pelas autoridades do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, seus painéis foram tomados
como exemplares na relação da pintura com a arquitetura. No entanto, seu estilo foi por
tais autoridades discutivelmente qualificado de ‘abstrato’, o que pode ter lhe conferido uma
espécie de salvo-conduto na passagem do ‘prestígio’ do nacionalismo ao internacionalismo
da geração abstrata do final dos anos 1940 aos 1950. No entanto, não deve haver um único
comentarista brasileiro disposto a defender a idéia de um Portinari abstrato, surrealista ou
surrealista abstrato.
figura 32 - Cândido PORTINARI. Auto-retrato (1956), óleo s/ tela.
57
figura 33 - Cândido PORTINARI. Painel de azulejos.
1.4. Arte e arquitetura hoje: colaborações, intromissões e mais indefinições
Parece claro que a abstração coloca em evidência a pergunta sobre a relação entre
arte e arquitetura. Trata-se, como outras, de uma questão em aberto, sujeita a diferentes
interpretações. Mais ainda, é uma questão que se abre em outras tantas. Atualizando a
discussão, a pergunta sobre a relação entre arte e arquitetura surge hoje de maneira nítida
no trabalho colaborativo entre arquitetos e artistas, uma fonte importante de reflexões
sobre encontros e separações entre os dois campos. Em Londres, em 1997 havia um
movimento consistente de arte pública, com os artistas saindo do abrigo de seus ateliês e
galerias de arte para o campo aberto do domínio público, instalando-se na arena expansiva
da “arte pública”
117
. Nesse momento, segundo Richard MacCormack, a maioria dos
arquitetos e críticos Ingleses de arquitetura recusa o discurso da autonomia estética,
enquanto as diferenças entre arte e arquitetura se sustentam no isolamento educacional e
crítico dos dois campos
118
. As encomendas oficiais na Inglaterra, no entanto, começam a
estabelecer princípios que privilegiam novas relações entre artistas e arquitetos, ao
58
favorecer projetos de cunho colaborativo. Isso passa a exigir da parte de uns e de outros
um quadro conceitual que inclua acordo de visões, abertura mental e o reconhecimento da
criatividade inusitada do outro (Shared vision, open mindedness, recognition of another’s
unexpected creativity)
119
. Temos assim um novo quadro de atividades profissionais que,
por um lado envolve artistas e arquitetos em projetos colaborativos, e por outro arquitetos-
artistas construindo edifícios a partir de gestos expressivos digitalizados no computador.
Essa nova situação foi alvo de discussões num Fórum Acadêmico levado a cabo na
Royal Academy, London, em 12 de março de 1997, a seguir revisto.
Um complicador surge na figura do artista que projeta imensas instalações em que
se a arte se aproxima da condição da arquitetura (art approaching the condition of
architecture)
120
e o artista produz obras numa escala que os arquitetos consideravam sua
“reserva” (reserve). Vidler comenta a obra do artista norte-americano Mike Kelly para
introduzir o tema da memória, o que gera o comentário de Richard MacCormac de que o
movimento moderno criou uma idéia da “sintaxe espacial sem atributos”, que se coloca
como uma “experiência abstrata” (spatial syntax ... one that doesn’t have atributes to it,
that´s meant to be an abstract experience)
121
. Robert Maxwell lembra uma passagem de Le
Corbusier que recusa nos anos 1920 o projeto de uma capela porque não via como suas
formas abstratas poderiam desempenhar um papel simbólico
122
, posição revista em
Ronchamp (fig. 34).
figura 34 - LE CORBUSIER. Capela de Nôtre Dame du Haut. Ronchamp. 1955.
59
Robert Maxwell acredita que após o Cubismo e o movimento De Stijl o gestual do
artista plástico tenha sido completamente liberado e as formas nas telas dos pintores
puderam se tornar a expressão direta dos sentimentos do artista, mas na arquitetura, ao
invés de procurar o novo e o inesperado em sua própria subjetividade, o arquiteto justificou
seus atos pela ciência e o novo chega à arquitetura via mundo exterior
123
. Maxwell
reconhece que o que o artista risca como simples gesto no papel deve sofrer um processo
técnico e social para que se converta num edifício, mas se mostra surpreso ao constatar que
o impacto da abstração na pintura do século XX não se rebate na arquitetura devido a uma
distância precisa: “Entre o gesto livre e a realidade construída jaz um espaço: o espaço da
funcionalidade (Between the free gesture and the constructed reality lay a space:the space
of functionality)”
124
. É devido a esse “espaço” que surgem na teoria da arquitetura moderna
o que o autor chama de Mitos do Espaço e da Função (Myths of Space and Function),
modos de idealizar programa e construção a fim de apresentar como artísticas as “caixas
retangulares (rectangular boxes)” resultantes da tecnologia limitada da época. A exceção
histórica é o breve momento no início dos anos 1920 quando os arquitetos Russos,
liberados pela abstração podiam proclamar serem tanto artistas de vanguarda quanto
construtores de uma nova realidade
125
. Para Maxwell, o espírito do exemplo Russo estaria
sendo retomado em diversas tentativas contemporâneas de liberar as formas arquiteturais
das limitações do retângulo. Seus exemplos são os desenhos para Arquitetura Planetária
(Planetary Architecture) e o prédio do Corpo de Bombeiros de Weil am Rhein de Zaha
Hadid (1987); o projeto de Daniel Libeskind para o Museu Judaico de Berlim (1993-95);
os projetos de Rem Koolhaas para a Torre de Observação de Rotterdam (1982) e uma casa
perto de Paris (1990); o projeto para o Banco de Hong Kong e Shangai de Norman Foster;
e dois projetos para Berlim de Lebbedus Woods (1988 e 1990). Em todos os exemplos,
Maxwell encontra atitudes artísticas da parte dos arquitetos. Hadid por não comprometer
seu trabalho com convenções, expressando nos desenhos Planetary Architecture uma
arquitetura que é tão livre que escapa à gravidade (an architecture that is so free it escapes
gravity), o que coloca sua arquitetura claramente no domínio da arte abstrata, sem peso
(clearly in the realm of art abstract, weightless), enquanto que seu prédio dos bombeiros
é a prova de que o gesto pode ser construído, ainda que com mudanças em seu efeito
126
. O
zigue-zague abstrato de Libeskind faz do Museu Judaico uma peça de simbolismo
moderno que funciona pela justaposição de espaços, numa maneira muito poderosa de
expressar a empatia”
127
. Koolhaas sujeita as formas prismáticas a uma espécie de
60
subversão que lhes tira o aspecto racional, conferindo-lhes um visual arbitrário, assim nos
reconduzindo ao mundo do sentimento. Foster admite o acidental num projeto onde tudo
parece racional e técnico e Woods rasga com impaciência a ordem rígida de um edifício
convencional. Esses exemplos são favorecidos pela computação, que permite construir
edifícios em que todas as partes sejam diferentes - a alta tecnologia instrumentando a
reavaliação do Expressionismo.
Mas o discurso de Maxwell não parece muito consistente. Sua mensagem é um
confuso apelo à expressão e ao simbolismo na arquitetura que iguala desconstrução e
Expressionismo, expressão e arbitrariedade, arte e gestualidade. Num momento parece
querer criticar a abstração da arquitetura moderna, mas no momento seguinte elogia a
abstração de Hadid. Ainda que conceda ao que chama de ‘simbolismo’ o poder de elevar a
edificação ao nível da arte, sua idéia de ‘expressão’ soa indissociável da mão do artista.
Maxwell parece embalado na retomada do Expressionismo efetuada pelos artistas plásticos
dos anos 1980, uma onda que à altura de 1997 havia passado. Mas é preciso dizer que a
revalorização que o neo-Expressionismo trouxe à gestualidade do artista não tem tanto a
ver com a idéia de uma arte vinda do “interior”, quanto com a idéia de nomadismo
histórico e apropriação arbitrária de estilos do passado, numa atitude francamente anti-
historicista. A discussão no Fórum revela que essa idéia da mão do artista como veículo
privilegiado da arte não é muito razoável.
Richard MacCormac a certa altura declara pressupor que todos no Fórum
concordam que arquitetura é uma arte e que as artes deveriam ser todas ensinadas na
mesma instituição
128
. Para MacCormac, a experiência inglesa de tirar a arquitetura das
escolas de arte e levá-la para as Universidades em 1958 significou transformar a
arquitetura numa imitação patética da ciência (make architecture into a pathetic imitation
of science)
129
. No entanto a equação arquitetura=arte parece ser menos unânime no Forum
do que parece a MacCormac. Will Alsop, por exemplo, pratica pintura, mas não se
considera um artista, ele é um arquiteto que encara a arquitetura como “um meio aberto (an
open medium)” que permite colaborações e defende a distinção entre arte e arquitetura
130
.
Mark Cousins pensa que não existem essas coisas, arte e arquitetura, ambas são práticas
incrivelmente heterogêneas (incredibly heterogenous practices) que podem ter inúmeras
maneiras de se conectarem e de se desconectarem
131
. Nesse sentido, Cousins pensa que por
um lado não existem diferenças fundamentais entre arte e arquitetura, embora entre elas
hajam diferenças discursivas pelo simples fato de que ao se perguntar se determinada obra
61
é arte ou arquitetura se pode responder referindo tal obra a um conjunto de objetos
artísticos ou ao conjunto diferente de objetos arquitetônicos
132
. É a posição que parece
fazer mais sentido. Por sua vez, Mel Gooding retoma uma distinção entre o “útil” e o
“inútil”, a arte se caracterizando pela criação de objetos “inúteis” do ponto de vista prático,
a arquitetura, exatamente o contrário, mas Gooding reconhece uma profunda ligação entre
pintura e arquitetura e pensa que artista e arquiteto se encontram no dito de Joseph Beuys
de que toda pessoa é um artista
133
. Levando a discussão para a prática profissional, o
escultor William Pye acha falsa a questão de que o arquiteto tanto quanto o designer
desenham objetos que serão manufaturados por outros, enquanto o artista concebe e
executa suas próprias obras, o que seria a (falsa) distinção principal entre eles. Pye nota
que muitos artistas, como o minimalista Donald Judd, produzem como designers: criam
projetos de objetos que outros executam. O próprio Pye trabalha dessa maneira em projetos
de arte pública, mas indica (romanticamente) que uma diferença entre sua concepção e
uma concepção utilitarista. Pye diz que projeta uma fonte observando como a água se
derrama magicamente, enquanto a maioria, diz ele, pensa funcionalmente e projeta não a
magia da água jorrando, mas um jarro de água (a water jug)
134
. Sua concepção recebe a
crítica de MacCormac: confunde design e arquitetura, enquanto diz que arquitetura pode
ser arte, quando o que importa é discutir como as situações e as interações se estruturam.
Nesse sentido, a questão da colaboração entre arquitetos e artistas é extremamente
reveladora.
A questão da colaboração entre artistas e arquitetos é tema de artigo de Clare
Melhuish
135
que comenta as conseqüências do dispositivo que estabeleceu na Inglaterra em
1990 a recomendação de investir em cada construção um por cento de seu orçamento total
em arte. Inicialmente tal percentual foi usado principalmente no embelezamento dos novos
edifícios com obras de arte, mas criou-se uma situação em que as edificações eram dotadas
de “obras inapropriadas, que não eram site-specific (inappropriate works that were not
‘site-specific’) enquanto criava-se uma espécie de gueto da arte pública entre os
artistas
136
. Procurou-se solucionar o problema instituindo-se a idéia de que os artistas
deveriam se envolver desde o início do processo de concepção dos projetos de arquitetura e
planejamento urbano.
Essa solução trouxe rapidamente novos problemas. Alguns arquitetos se sentiram
ofendidos pela sugestão de que de algum modo eles teriam um “senso estético inadequado
(inadequate aesthetic sense)”
137
. Ao mesmo tempo incomodaram-se muitos outros
62
arquitetos que viam a arquitetura como uma arte, mas sentiam-se impedidos de produzir a
arquitetura que queriam dadas as limitações da legislação urbana, dos orçamentos, da
mentalidade da clientela e da própria imagem pública da profissão. Esses arquitetos
ingleses não gostavam da idéia de terem perdido para os artistas o direito de exercer seu
julgamento intuitivo e de dar curso às suas sensibilidades criativas
138
. Segundo Melhuish, a
perda teria sido o resultado da ênfase que a arquitetura do pós-guerra pôs no determinismo
funcional, na análise de pesquisas e na planta como geradora do projeto, empurrando os
arquitetos para o campo estritamente técnico. Por outro lado, essa mesma perda de ‘direitos
criativos’ teria feito com que muitos arquitetos se predispusessem favoravelmente à idéia
de trabalhar colaborativamente com artistas plásticos.
Melhuish historia a questão: a equação modernismo=funcionalismo, dogma dos
anos 1960, “obscureceu o fato de que modernismo na arquitetura foi fortemente
influenciado pelo Cubismo na pintura”
139
. Nos anos 1970, o modernismo fracassava na
arquitetura e os arquitetos ingleses viram-se num vácuo político com o ideal socialista
atacado pelo triunfo do thatcherismo. Por duas décadas então a arquitetura desenvolveu-se
a partir de idéias teóricas tomadas de outras disciplinas, o que deslanchou, como reação,
um novo interesse pela prática da arte como um paradigma para a arquitetura (has
prompted a new interest in art practice as a paradigm for architecture)
140
. O exemplo que
Melhuish é o emprego de instrumentos de computação gráfica como o Photoshop no
lugar do CAD, como meio de representação, no pressuposto da inadequação do desenho
convencional de arquitetura para a descrição da ocupação dos espaços. Mas pode-se
invocar também o uso que Zaha Hadid faz das técnicas de pintura em seu processo
criativo. Outro exemplo mais relativo a atitudes que o instrumental técnico vem do
arquiteto Tony Fretton, para quem a arte surge com uma inteligência da existência política
dos objetos (an intelligence about the way objects exist politically), enquanto a arquitetura
representa os valores da sociedade e das pessoas para a qual é construída”
141
. Melhuish
nota que nem toda arte tem conteúdo político, da mesma forma que nem toda a arquitetura
do pós-guerra é ruim, mas ainda assim, admite que a arte parece poder quebrar as regras de
um modo simplesmente não permitido à arquitetura. Isso advém da idéia de que enquanto
da arte espera-se subversão, da arquitetura espera-se que reforce o estabelecido
142
. Nesse
sentido, a arquitetura não é vista como uma questão central na cultura da nação (a central
issue in the culture of the nation)
143
, tal como a arte o é. Se é assim, podemos pensar que
talvez no Brasil dos anos 1950-1960 as coisas tenham se invertido um pouco com o
63
sucesso de Brasília que afirmou claramente o compromisso da arquitetura moderna
brasileira com a imagem de um país progressista.
A colaboração entre artistas e arquitetos parece encerrar algumas dificuldades na
transição das idéias da fase de projeto para a execução, quando surgem conflitos
envolvendo o papel que cada parte deve desempenhar, as atribuições de autoria e as
respectivas responsabilidades
144
. Parece ser aqui que a propalada autonomia do artista
deixa de ser um paradigma e passa a ser um problema. Enquanto o arquiteto é educado a
compreender a importância do programa e a adotar um sistema de notação de idéias
baseado na linguagem comum do desenho arquitetônico, o artista tende a diversificar os
modos de notação de suas idéias e a não se importar com a questão da responsabilidade. É
difícil imaginar, por questões de responsabilidade para com a saúde dos usuários, um
arquiteto propondo revestir de chumbo, por exemplo, a sala de estar de seu cliente. No
entanto, mesmo atentando contra a saúde de seus colecionadores, Anselm Kiefer (fig. 35)
desde os anos 1980 produz (e vende para ricos colecionadores) inúmeras obras de
dimensões avantajadas, compostos principalmente de chumbo. Ademais, enquanto o
arquiteto adapta suas idéias aos processos de construção, o artista parece tender a rejeitar
essas intromissões como desrespeitosas à sua noção de autoria. A questão da atenção ao
programa parece ser a mais importante, no entanto. É que o artista, como muito bem
observa Richard Wentworth
145
, deixa a coisa acontecer, não procura uma solução.
Dificilmente um artista se propõe solucionar problemas prévios ao início de seu próprio
processo criativo. No entanto, mesmo essa última afirmativa pode ser posta abaixo por
algum artista especialmente interessado em contestar a caixa-preta do processo de geração
da obra de arte. Esse parece ser o caso dos painéis de Sol Lewitt (fig. 36), por exemplo,
onde a partir de instruções simples e objetivas seus assistentes executam as ordens do
artista.
Pode-se concluir que um trabalho em colaboração para ser bem sucedido deve
começar com definições muito claras dos papéis, responsabilidades e autoria de cada parte,
devendo envolver ainda um acordo intelectual entre artista e arquiteto no sentido de
perseguirem interesses comuns assentados nos efeitos que a obra deverá causar à
sociedade. Mas evidentemente, uma colaboração bem sucedida não implica
necessariamente em uma edificação adequada, da mesma forma que a experiência de um e
de outro é de importância capital para o resultado. É preciso notar ainda que muitas das
complicações potenciais de um trabalho colaborativo devem-se a essa situação
64
contemporânea de privilegiar a interdisciplinaridade, onde o artista é convidado (ao menos
na Inglaterra) a estender sua colaboração ao domínio da concepção mesma da obra a
edificar. Tal situação pode realmente ter um precedente histórico nas vanguardas artísticas,
especialmente no Suprematismo e Construtivismo Russos (como também em certa medida
no movimento holandês De Stijl), quando artistas plásticos como Maliêvitch, Tatlin (e van
Doesburg) se aventuraram em proposições arquitetônicas. No entanto, no Brasil dos anos
1930-1960 nada leva a crer que artistas e arquitetos tenham se proposto a romper certas
barreiras. Na verdade, o conceito de colaboração entre artistas e arquitetos presidindo um
edifício como o Ministério da Educação e Saúde no Rio de Janeiro é aquele que coloca em
nichos diferentes e não-conflitantes artistas e arquitetos: os primeiros embelezando com
suas obras de arte a arquitetura dos projetistas sob uma visão comum do que é a
modernidade e de sua importância para o desenvolvimento do Brasil. Na relação de
Niemeyer e Portinari, cada macaco no seu galho. Ainda que não se possa dizer que o que
entendiam como ‘modernidade’ seja exatamente o que se disse sobre a ‘tradição
modernista’.
Nesse ponto recoloca-se a pergunta “mas, afinal, o que é abstração arquitetural e o
que fazer com isso? Uma resposta pode ser dada pela suspensão do contexto e a
generalização do cliente, tal como se discutirá a respeito das propostas de Le Corbusier.
Essa idéia de abstração arquitetural pode ser altamente criticável se aplicada na
prática profissional, mas no contexto acadêmico pode ter aplicação didática. Thomas
Hanrahan, atual Decano do Pratt Institute School of Architecture defende a idéia de que a
introdução do estudante à arquitetura deve ser abstrata em sua natureza
146
. Em seus cursos
na Columbia University, pôs em prática sua idéia: o terreno é dado apenas como um limite
volumétrico genérico (generic volumetric boundary) e a tarefa do estudante é definir o
espaço por meios de linhas e superfícies, num processo de trabalho de ateliê que pressupõe
uma operação de descontextualização. Colocar entre parênteses (bracketing) o contexto,
para o professor é uma estratégia pedagógica da abstração que leva a ênfase do processo de
trabalho do aluno a ser posta no desenvolvimento de uma idéia arquitetural enquanto
construto espacial e seccional (spatial and sectional construct) e na colocação e passagem
(placement and passage) do sujeito individual através do espaço construído. Por outras
palavras, num exercício de pura relação de um corpo individual genérico em uma
construção penetrável, concebida segundo uma concepção espacial regulada pela lógica do
movimento e do repouso.
65
Essa idéia de abstração na arquitetura na hipótese de sua aplicação ao projeto do
edifício, na verdade parece que diz mais respeito a respeito mais a uma concepção
abstrata da arquitetura do que a uma linguagem abstrata da arquitetura. Será preciso
então, elucidar essa diferença no estudo da abstração na historiografia da arquitetura
moderna. No próximo capítulo, o foco será a historiografia da arquitetura moderna, vista
como um todo a partir de três estudos historiográficos sobre o tema.
figura 35 - Anselm KIEFER. A vida secreta das plantas. 2002, chumbo (h. 195 cm.).
figura 36 - Sol Lewitt, Wall Drawing No. 681 C, 1993.
66
67
discursiva, e Nelcy Tinem, que procura analisar textos históricos e não-históricos à procura
de uma certa ‘imagem’ da arquitetura moderna brasileira. A revisão desses analistas neste
capítulo procurará oferecer não somente uma análise de suas visões das teorias ligadas à
arquitetura moderna, mas ainda colocá-las em contraste com as peculiaridades dos trâmites
da legitimação da obra dos arquitetos modernos brasileiros. O fato de que os três analistas
não estejam exatamente interessados no objeto deste estudo, a abstração na historiografia
da arquitetura moderna, faz com que este segundo capítulo se apresente por um lado como
uma preparação para o terceiro e, por outro, como uma certa inflexão no andamento deste
empreendimento.
Com relação aos textos especificamente escritos por historiadores que narram as
origens e a genealogia da arquitetura moderna é preciso distingui-los desde já dos escritos
teóricos de arquitetos, pois nesses últimos textos, ao contrário dos primeiros, não se coloca
a questão do papel, da função ou do significado da história em si mesma
150
. Os textos dos
historiadores são ‘narrativas históricas’. A idéia de que a escrita da história é a criação de
narrativas parece igualar historiador e ficcionista, ameaçando transformar seus escritos em
artefatos literários. Essa idéia da narrativa histórica é em parte devedora dos estudos
lingüísticos do século XX, especialmente os da vertente estruturalista, cujas conseqüências
tem sido discutidas intensamente entre os historiadores
151
. Não cabe aqui refazer essa
discussão, que se centra sobre a validade da História como forma de saber diante de seus
recursos literários e ficcionais. Para os fins deste estudo, o termo ‘narrativa’ não implica
em se colocar em questão a veracidade dos escritos estudados, como se nesses se
inventassem eventos, arquitetos e edifícios fictícios apenas para apresentar ao leitor uma
estória convincente. Implica sim, num certo ‘arranjo’ dos fatos, num enredo que pode
admitir frestas que omitem certos outros fatos. De início é preciso reconhecer que para
descrever os acontecimentos os historiadores lançam mão dos recursos da narrativa. A
narrativa assim entendida é um tipo de relato que Paul Ricoeur define como
Uma seqüência de ações e de experiências feitas por um certo número de
personagens (...) representados em situações que mudam ou a cuja mudança
reagem. Por sua vez, essas mudanças revelam aspectos ocultos da situação e das
personagens e engendram uma nova prova (predicament) que apela para o
pensamento, para a ação ou para a ambos. A resposta a essa prova conduz a
história a sua conclusão
152
.
Com efeito, em suas narrativas os pioneiros da historiografia do movimento
moderno relatam os feitos de arquitetos e movimentos artísticos que reagem às mudanças
68
sem precedentes trazidas pelos novos tempos. Tais mudanças revelam a obsolescência dos
postulados arquitetônicos assentados na experiência histórica e exigem a criação de uma
nova arquitetura que responda à nova situação, mas isso implica tanto em conceituar e
projetar algo diferente do existente quanto em edificar exemplos convincentes dessas
novas idéias. Naturalmente, as novas teorias e as edificações correlatas enfrentam
antagonismos e críticas por parte dos defensores da antiga ordem. No processo de
superação de suas antigas formulações é preciso derrotar aqueles que defendem a
arquitetura superada para se chegar à conclusão das narrativas que é a vitória do
movimento moderno.
As narrativas históricas, portanto, são criações de narradores que relatam os
acontecimentos e tecem as tramas que darão sentido a seus relatos tendo em pauta um fio
condutor. Cada diferente narrador criará sua obra em conformidade com suas crenças sobre
a sociedade, a história, a própria arquitetura e ainda suas noções éticas, morais ou
ideológicas. Por outras palavras, interpretará os fatos com base em seus pressupostos, os
quais variam muito de historiador para historiador, resultando em diferentes narrativas
contendo diferentes interpretações do mesmo objeto de estudo e em diferentes explicações
acerca de como as coisas aconteceram de tal modo e não de outro
153
. Para Tournikiotis, ou
bem se reconhece a existência simultânea de diferentes narrativas, cada uma relatando a
mesma série de eventos de maneira diferente, ou por outra se aceita que houve diferentes
movimentos modernos, cada um ocupando uma posição ligeiramente à parte dos outros
154
.
Se esse autor acredita na primeira hipótese, o exame da historiografia da arquitetura
moderna brasileira parece acenar com a segunda, ainda que não se esteja aqui em
condições de verificá-la. Mas não se pode deixar de notar que a tentativa de se dar uma
genealogia própria à arquitetura moderna brasileira que surge em Lucio Costa, num certo
sentido cria um outro universo moderno onde se situa o Brasil.
Naturalmente os narradores sabem que suas interpretações não são as únicas
possíveis, e por isso procuram argumentar a seu favor, porque sabem que se pode explicar
de modo diverso os fatos que compõem suas histórias
155
. Suas histórias, escritas para um
público que nem sempre compartilha seus pressupostos, precisam ter a força do
convencimento. Ainda mais quando os próprios historiadores acham-se implicados na
trama que deve levar à vitória por força da luta teórica com as forças opostas, como Lucio
Costa. Tornam-se tanto historiadores do movimento moderno quanto seus propagandistas,
ou ‘apologistas’, nos termos de Reyner Banham (1922-1988)
156
. Num certo sentido,
69
portanto, suas narrativas são peças de retórica, isto é, instrumentos de persuasão
157
concebidos para influenciar o leitor. Para que a retórica funcione, seja realmente
convincente, é necessário que a narrativa tenha uma coerência interna, o que significa que
ao narrar a origem e o desenvolvimento da arquitetura moderna e concluir com sua vitória,
o narrador precisa, por assim dizer, conhecer a história de trás para frente, isto é, narrar as
coisas de modo que tudo se encaminhe desde o início para a conclusão desejada. Isso
explica muita simplificação que possa ocorrer, isto é, omissão de fatos ou de caminhos
divergentes, coisa que ocorre por força desse caráter teleológico das narrativas.
2.1. Uma lista bibliográfica básica da arquitetura moderna
Naturalmente, como soe se constatar neste segundo capítulo, os analistas da
historiografia da arquitetura do movimento moderno não trabalham com todo o universo de
pesquisa definido pelo recorte temático ‘arquitetura moderna’, mas trabalham recortes
nesse universo estabelecidos pela metodologia ou pelos objetivos de cada autor. J. P.
Montaner, é intelectual de estatura certamente maior que os outros dois aqui revistos, e
embora compareça quantitativamente desproporcionalmente à sua importância relativa,
diga-se em defesa deste trabalho que suas idéias mais bem construídas se condensam de
maneira mais fácil. Admitida essa falta, e desde já reconhecendo ser esse um ponto
criticável deste trabalho, toma-se a liberdade de partir do Quadro cronológico de los textos
básicos de la arquitectura moderna
158
de Montaner para compor a lista bibliográfica a
seguir, com os títulos originais ordenados cronologicamente, considerando a data de
publicação original do texto. Essa lista compõe-se de textos históricos e escritos teóricos de
arquitetos, publicados na forma de livros ou de artigos, e inclui não somente os textos
listados por Montaner, como também outros revistos pelos analistas a seguir discutidos,
além de outros textos que comparecem aqui por conta do interesse na questão da abstração,
especialmente Painting Toward Architecture, obra de Hitchcock não mencionada por
nenhum dos analistas citados, mas que se mostrará sobremaneira importante no terceiro
capítulo.
1906 – Adolf Loos. Ornamento e Delito
1919 – Bruno Taut. Alpine Architektur
1919 – Bruno Taut. Die Stadtkrone
70
1920 - Bruno Taut. Der Weltbaumeister
1920 - Bruno Taut. Auflösung der Städte
1923 - Le Corbusier. Vers une architecture
1924 - Le Corbusier. Urbanisme
1924 - Walter Gropius. Internationale Architektur
1927 - Gustav Adolf Platz. Die Baukunst der neuesten Zeit
1927 - Walter Curt Behrendt. Der Sieg des neuen Baustils
1929 - Henry-Russell Hitchcock. Modern Architecture, Romanticism and Reintegration
1929 – Lazló Moholy-Nagy, Von material zur architektur
1930 – Gustav Adolf Platz. Die Baukunst der neuesten Zeit
1932 - Alberto Sartoris. Gli Elementi dell'Architettura Funzionale
1932 - H. R. Hitchcock e Phillip Johnson. The International Style. Architecture since 1922
1933 - Emil Kaufmann. Von Ledoux bis Le Corbusier: Ursprung und Entwicklung der
autonomen Architektur
1933 - Le Corbusier. La Ville Radieuse
1936 - Nikolaus Pevsner. Pioneers of Modern Movement. From William Morris to Walter
Gropius
1936 - Walter Gropius. Die neue Architektur und das Bauhaus
1936 – Lucio Costa. Razões da nova arquitetura
1937 - Walter C. Behrendt. Modern Building. Its Nature, Problems and Forms
1939 - Frank Lloyd Wright. An organic architecture: The architecture of democracy
1939 – Alfred Roth. A nova arquitetura
1940 – Alvar Aalto, A humanização da arquitetura
1940 - Alfred Roth. La Nouvelle architecture. Die neue Architektur. The New architecture
1941 - Sigfried Giedion. Space, Time and Architecture
1941 - Le Corbusier. La Charte d'Athénes
1941 - James M. Richards. An Introduction to Modern Architecture
1942 – Josep Lluís Sert. Can our cities survive?
1942 - Nikolaus Pevsner. An Outline of European Architecture
1943 - Phillip Goodwin. Brazil Builds
1944 – Sir James Maude Richards. An introduction to Modern Architecture
1945 - Bruno Zevi. Verso un'architettura orgánica
1947 - Alberto Sartoris. Introduzione all'architettura moderna
71
1948 - Sigfried Giedion. Mechanization Takes Command. A Contribution to Anonimous
History
1948 - Bruno Zevi. Saper vedere l'architettura
1948 - Henry-Russell Hitchcock. Painting Toward Architecture
1950 - Bruno Zevi. Storia dell'architettura moderna
1955 - Henry-Russell Hitchcock. Latin-American architecture since 1945
1955 – Gillo Dorfles. L’Architettura Moderna
1957 – Nikolaus Pevsner. An Outline of European Architecture
1957 - Frank Lloyd Wright. A Testament
1958 - Henry-Russell Hitchcock. Architecture: Nineteenth and Twentieth Centuries
1956 – Henrique Mindlin. Modern Architecture in Brazil
1960 - Leonardo Benevolo. Storia dell'architettura moderna
1960 - Reyner Banham. Theory and Design in the First Machine Age
1965 – Geraldo Ferraz. Warchavchik e a Introdução da Nova Arquitetura no Brasil: 1925
a 1940
1965 – Peter Collins. Changing Ideals in Modern Architecture
1965 – Le Corbusier. Viagem ao Oriente
1968 - Nikolaus Pevsner. The Sources of Modern Architecture and Design
1969 - Reyner Banham. The Architecture of the Well-Tempered Environment
1973 – Bruno Zevi. Il linguaggio moderno dell'architettura
1973 – Wolgang Pehnt. A arquitetura do Expressionismo
1979 – Manfredo Tafuri. Theories and History of Architecture
1979 – Carlos Lemos. Arquitetura Brasileira
1980 – Kenneth Frampton. Modern Architecture: a critical history
1981 – Yves Bruand. Arquitetura Contemporânea no Brasil
1986 – Louis I. Kahn. What Will Be Has Allways Been
2.2. Visões, versões e cânones
O conjunto das narrativas históricas consideradas como um todo levanta a questão
de se saber se desse conjunto emerge ou não uma espécie de narrativa padrão, discurso
hegemônico ou versão canônica, como se prefira. Essa é uma questão especialmente
importante para os analistas da historiografia da arquitetura moderna. Montaner defende
uma ‘visão’ comum a arquitetos, teóricos, historiadores e professores modernos, ‘visão’
72
assentada em premissas comuns consolidadas em Giedion. Com esse termo, Montaner
parece querer expressar a idéia de uma história modernista da arquitetura moderna. Mas
Giedion não é o ponto final da historiografia da arquitetura moderna, embora possa ser a
autoridade que concluiu a ‘visão’ de que Montaner, que parece ser a conclusão da
formulação da ‘tradição modernista’ na arquitetura, Giedion sua maior autoridade. Uma
historiografia que considere Peter Collins (1920-1981) e Tafuri (1935-1994), como faz
Tournikiotis, não permite dar conta de resolver o fato da existência de uma pluralidade de
narrativas na obra de nenhum autor. No entanto, Tinem encontra em Yves-Bruand, o autor
de uma ‘versão canônica’ do que seja a arquitetura moderna brasileira. Isso parece poder
ser interpretado como significando que o Brasil encontrou seu Giedion (1941) em Yves-
Bruand (1981) e que ainda hoje, a história da arquitetura moderna no Brasil é ainda a
história modernista da arquitetura brasileira.
Na arquitetura moderna da historiografia de Tinem a abstração desempenha um
papel muito pouco importante. Por outro lado na historiografia de Montaner, as “premissas
comuns” geram na historiografia textos históricos embasados numa análise da ‘pura
visualidade’, e na arquitetura uma linguagem abstrata, de extração neoplástica. Da mesma
forma, na historiografia de Tournikiotis, a abstração surge como questão importante na
definição de qualquer discussão sobre arquitetura moderna. A quase irrelevância da
abstração na historiografia de Tinem se por um lado indica a distância que separa as
vanguardas Russas e Européias da arquitetura brasileira, por outro parece apontar para a
inconveniência da abstração para os propósitos de Lucio Costa e seu protegée Oscar
Niemeyer. A abstração nas artes plásticas chegar ao Brasil com trinta anos de atraso com
relação à Europa e mais de dez anos após o prédio do Ministério de Educação e Saúde
instalar a ‘arquitetura moderna’ no Brasil, são fatos que não podem, na perspectiva deste
estudo ser considerados separadamente.
2.3. J. P. Montaner (2002)
J. P. Montaner defende uma continuidade nas premissas metodológicas que
sustentam tanto o “conceito plástico do espaço moderno” quanto as interpretações da
arquitetura moderna: o ve,ixt,m strnatands295585(i)-2.16436(o)-0.295585(n)15(t)-2.-80.1938(t)-2.1643brno2.80439( )-220.276(n)15(t)-2.100.207(n)-0.295585(o)-0.29-0.2955;938(B)6.6103585( )-250.295(p)-0.274(r)2.80439(a)3.74( )-585( )-100.206(f)2.804.80439(o)-0.295585(p)-80439(s)-1.2312(p)-0.295( )-390.377(p)-0.295),;938(B)6.6103585( )-250.295(p(a)3.74r)2.80439(a)271.2312(s)-1.2312(a)3.44(r)2.80439( )250(s)-1.22997(u)-0.294974-120.219(s)-1.2299iga eixdnas 974(a)3.74co4 Td[(v)-0.294974(i)-2.16558140.23(e)3.0.147723.74(s)-1.22997( 974(a)3.74)-0.2955854(a)3.74o na his pixcas e stão as
73
Montaner reconhece as diferenças entre o que chama de “escritos dos
protagonistas” e os escritos históricos que compõem “a criação de uma historiografia do
movimento moderno” mas, sublinha as premissas metodológicas em comum que
determinam o pensamento de suas obras que partilham o “novo conceito plástico do espaço
moderno”
159
.
Com relação à prática profissional e ao ensino do projeto moderno, os arquitetos e
professores do movimento moderno usaram o método projetual e didático, que o artista
plástico e professor da Bauhaus Lazló Moholy-Nagy, sintetizou em 1929: uma “autêntica
gramática do desenho moderno” que conduz seu seguidor a criar “necessariamente um
mundo abstrato e neoplasticista”
160
[grifo nosso]. Abstrato, certo. Mas a idéia de um
Moholy-Nagy militante do Neoplasticismo não deixa de soar estranha num artista de
extração lissitszkiana, muito mais interessado em relações materiais/sensoriais/espaciais
que em relações matemáticas e pureza de meios. Em todo caso, Montaner equivale os
escritos dos “protagonistas” da historiografia - os grandes criadores da arquitetura moderna
que a teorizaram em escritos teóricos - aos escritos históricos - as narrativas das origens e
desenvolvimentos da arquitetura moderna -, todos eivados de “parcialidade moralista e
dogmática”
161
.
Nessa base, comum a arquitetos, professores e historiadores, o racionalismo
cartesiano se expressa por um lado na confiança no progresso técnico; por outro no método
de decomposição da complexidade da realidade em seus elementos básicos, método que o
autor identifica na pintura do “elementarismo abstrato” (Mondrian e Maliêvitch), na
arquitetura neoplástica e no zoneamento urbano: decomposições do quadro, do edifício e
da cidade em “partes básicas e homogêneas”
162
. Montaner sugere uma base comum para as
manifestações diversificadas da arquitetura, tanto quanto a existência de uma “visão
canônica”
163
expressa na obra de Sigfried Giedion. Isso não implica em não reconhecer a
diversidade de interpretações históricas das narrativas, mas sim numa construção num
período limitado no tempo, pode-se dizer que numa construção historiográfica que
acomoda a diversidade num enredo convincente. Nesse sentido, para Montaner, Giedion é
esse autor da obra que consuma uma visão da história da arquitetura moderna desenvolvida
com diferentes contribuições de outros autores ao longo do tempo, uma visão que foi
adotada pela parcela mais influente do universo internacional de profissionais, professores
e historiadores, a “visão canônica”
164
.
74
figura 37 - William MORRIS.
Montaner lista os contribuintes da ‘visão’ na seguinte ordem de importância:
Pevsner, o primeiro a se referir ao termo “movimento moderno” e a dar-lhe um fio
condutor de William Morris (1834-1896) (fig. 37), a Walter Gropius, via Deutsche
Werkbund (fig. 38), fio este baseado em “honestidade, tecnologia e o espírito dos
tempos”
165
; Bruno Zevi (1918-2000), que distante da “ortodoxia racionalista”, a maior
contribuição teórica ao organicismo, redescobrindo Gaudí e “mitificando” Aalto, Wright,
75
Erich Mendelson e Hans Scharoun (1893-1972)
166
; Richards, que procura compatibilizar a
arquitetura moderna com “a admiração pelo antigo”
167
; Hitchcock, que introduz a
arquitetura moderna nos Estados Unidos, mantendo o conceito de ‘estilo’ - conceito
“oposto ao espírito renovador e internacional da arquitetura moderna”
168
; Behrendt, com
sua ênfase na “dualidade entre arquiteturas orgânicas e inorgânicas”; Roth, pelas
ilustrações apresentadas em sua obra de 1939. Dois outros autores são incluídos em tópico
à parte por constituírem a “continuidade das interpretações da arquitetura moderna”
169
:
Banham, que representa a continuidade de uma arquitetura confiante na tecnologia e nas
proclamações mesiânicas
170
; e Benevolo, com a insistência na “função social” da
arquitetura e na marginalização das “heterodoxias arquitetônicas do século XX”
171
.
figura 38 - DEUTSCHE WERKBUND. Cartaz da Exposição de 1914.
Inicialmente é preciso notar que um livro de ilustrações consta da lista de
contribuidores de Montaner. Isso parece se dever ao fato de ser esse um livro com novas
fotografias. As ilustrações dos edifícios exemplares na historiografia da arquitetura
moderna são em larga medida repetitivas, a mesma fotografia original reproduzida de autor
em autor. A seguir, a questão de dar um enredo que ligue essas partes num todo. Para
‘montar’ uma visão a partir desses fragmentos dispares, Giedion faz o papel do ‘historiador
cubista’, como sugere Montaner ao criticar o que lhe parece ser o método pictórico da
colagem cubista aplicado ao estudo histórico: Giedion analisa fragmentos, daí deduzindo
explicações simples para uma realidade complexa, critica Montaner. A idéia de Montaner
de ‘fragmentos’ colados numa nova história deixa implícita a existência de
descontinuidades, de omissões tanto quanto de simulação de unidade a partir da
76
dissimulação da realidade diversificada da arquitetura moderna. Nessa sua visão, a história
de Giedion parece ser a construção de um modelo conceitual de uma das manifestações
dentre outras da arquitetura moderna elevado à condição de verdade histórica. Um modelo
conceitual acompanhado de demonstrações visuais.
As interpretações dadas na historiografia analisada, todas as teorias, crenças e
77
Tournikiotis demonstra como Montaner aponta, que os historiadores negam a
história: a arquitetura moderna procura se desfazer da história quando acredita encarnar o
totalmente novo, o sem precedentes, o a-histórico; quando elimina a disciplina da história
de seus métodos didáticos - como na Bauhaus, mas é exatamente através do discurso
histórico que ela encontra um meio de difusão e legitimação.
Os textos que Tournikiotis considera em seu estudo são de Emil Kaufmann,
Nikolaus Pevsner, Sigfried Giedion, Henry-Russel Hitchcock, Bruno Zevi (1918-2000),
Leonardo Benevolo, Reyner Bahnham, Peter Collins e Manfredo Tafuri. Embora os
autores expressem diferentes visões, eles partem da mesma questão sobre como projetar o
edifício moderno, questão que ele coloca da seguinte forma: “como deve ser a arquitetura
do futuro?”. Assim, cada uma das histórias é o que chama de uma “arquitetura escrita”
(written architecture)
178
, no sentido de que os historiadores contemporâneos da arquitetura
que historiam, tratam todos de colocar os fundamentos para uma arquitetura do futuro
numa interpretação histórica do passado recente
179
. Teorizam o que deverá ser edificado a
partir de uma interpretação da história do que foi construído, numa confluência
história/teoria/projeto. O “denominador comum” que Tournikiotis ressalta entre todos os
historiadores que analisa (o que inclui Hitchcock) é uma “estrutura de coesão” embasando
teoria e história:
Uma visão da história da arquitetura como um todo, em decorrência de uma
filosofia da história;
Uma visão social baseada na convicção de que mudança social e arquitetônica estão
inextricavelmente ligadas;
Uma tese sobre a essência da arquitetura tipificada numa série de edificações
exemplares;
180
O recurso à descrição morfológica das edificações exemplares da arquitetura
moderna, advém da historia da arte alemã, e é um outro denominador comum aos
historiadores, com exceção de Collins e Tafuri, que trabalham num plano diferente de
análise.
78
A historiografia de Tournikiotis demonstra que durante os anos 1930, Pevsner,
Kaufmann e Giedion, historiadores da arte alemães lançaram as fundações históricas do
movimento moderno construindo genealogias que sugerem que o movimento moderno foi
uma revolução radical que acompanhou o passo do curso ascendente da história,
181
mas
que, na verdade os princípios de Alberti (fig. 39) mantém-se como arcabouço da definição
de arquitetura desses autores.
figura 39 - Leon Baptiste ALBERTI. L'architecture et art de bien bastir, Paris, 1553.
Necessidades construtivas (necessitas), conveniência funcional (commoditas), e
deleite estético (voluptas) são os três princípios fundamentais que determinam a arquitetura
desses textos históricos
182
. Tournikiotis acha um paradoxo Pevsner, Kaufmann, Giedion
criticarem o século XIX pela primazia do deleite, enquanto restringem suas análises ao
campo do deleite estético, da ‘pura visualidade’, não levantando qualquer objeção aos três
princípios como um todo ou advogando um rearranjo em sua hierarquia
183
. Mas não parece
79
haver paradoxo na convivência do deleite estético e da pura visualidade como modos de
apreciação da arquitetura e uma concepção de arquitetura baseada na integração dos
princípios albertianos, se esse modo de apreciar está pressupondo exatamente num
equilíbrio dos princípios Albertianos. Não parece ser razoável se confundir princípios de
apreciação da estética arquitetural com princípios de prática arquitetônica. Em todo caso,
esses historiadores de algum modo advogam que a arquitetura moderna nasce sem laços
com o passado, ao mesmo tempo em que se fundamenta em princípios do passado
184
e sua
principal preocupação ali é “fundir os três princípios Albertianos numa única e uniforme
entidade (to fuse the three principles into a single, uniform entity)
185
”. Essa fusão seria a
demonstração da verdadeira essência revolucionária do movimento moderno, uma vez que
dado ser a nova arquitetura o oposto daquela do século XIX, a questão passa a ser a da
reintegração de necessidade, conveniência e deleite no início do século XX
186
. Isso é
precisamente o porque, segundo Tournikiotis, da maior parte dos historiadores procurarem
a todo custo demonstrar em suas narrativas que a arquitetura do século XIX significava
desintegração. Os historiadores assim contrastavam a arquitetura ‘desintegrada’ com a
coesão do movimento moderno, cuja arquitetura conseguiu restaurar a pertinência da
função e da construção no epicentro de uma nova estética (restoring the pertinence of
function and construction at the epicenter of a new aesthetics).
187
Essa observação
interessa particularmente a este trabalho porque sugere que uma arquitetura que privilegie
seu componente estético, ou que se apresente como formalmente autônoma ameaça a idéia
de integração implícita na teoria da arquitetura moderna, tal com se apresenta na ‘visão’ de
Giedion. Sugere ainda que uma visão abstrata, ‘desinteressada’, da arquitetura pode não
dar conta completamente da compreensão de um objeto arquitetônico que não foi pensado
como ‘pura visualidade’, embora possa ser fonte de deleite. Vistos como objetos estéticos
autônomos, os edifícios modernos o obras de arte, o que faz com que inevitavelmente
essas narrativas pouco considerem os componentes funcionais e construtivos, os
incontornáveis fundamentos da arquitetura moderna
188
. Essa questão refere-se à discussão
da apreciação da arquitetura com base na autonomia da experiência estética ser
incompatível com os fundamentos da própria arquitetura, ou por outra da discussão acerca
da validade de se analisar sob determinado prisma algo que foi feito a partir de outras
bases. No entanto, na perspectiva de Montaner, as premissas da teoria tanto quanto da
prática arquitetônica são as mesmas. A questão então é se saber se a autonomia da
80
experiência estética é aplicável a uma arquitetura cuja autonomia formal está limitada pela
heteronomia de suas condições de produção.
2.4.1. Arte e abstração na historiografia de Tournikiotis
Hitchcock propõe a primeira genealogia do movimento moderno e ao mesmo
tempo uma gramática formal para uso dos arquitetos
189
. A obra de Hitchcock está
perpassada pela firme crença de que cada novo estilo deve ser determinado por seu próprio
conjunto de regras estéticas autônomas
190
. Hitchcock procurou explicar os fatos sem
expressar opiniões polêmicas
191
e se apresenta como um historiador neutro e objetivo que
não define o presente por oposição ao passado
192
. Os arquitetos são os protagonistas de sua
história da arquitetura e a evolução dos estilos depende principalmente de suas capacidades
criativas. Os arquitetos não são simplesmente os veículos do espírito da era, nem estão
sujeitos a valores não-artísticos, mas contribuem para a criação de sua era tanto quanto os
sábios e os artistas. O contexto social e cultural dos arquitetos está deliberadamente
apagado dessa sua história
193
, embora o critério da nacionalidade seja importante. Cada
inovação traz a aparência, a curto prazo, de ser superior ao que substitui, mas a evolução
da história da arquitetura não é um ascender contínuo, pelo contrário, uma ausência de
progresso se acompanha da ausência de um clímax
194
. Dessa forma, um jovem arquiteto
trabalhando numa nova arquitetura não é necessariamente superior a outro arquiteto mais
velho que ainda trabalha numa maneira declinante
195
, e os estilos se sobrepõem no tempo.
O presente é simplesmente o ponto mais recente numa história contínua e não um
momento em contraste absoluto com o passado
196
. Para Tournikiotis, The International
Style é um complemento de
81
à Neue Sachlichkeit
200
. As principais características do Estilo Internacional são
201
: o
telhado plano, o arranjo das janelas, o jogo de transparência e opacidade nos elementos de
vedação e sua planaridade imaterial. Os materiais acentuam a planaridade e a continuidade
das superfícies.
Pevsner e Giedion vêem a evolução da pintura ocidental como a força motriz por
traz da arquitetura. Mas suas narrativas divergem quando Pevsner se concentra no
impressionismo superado por Rousseau, ignorando Picasso, enquanto Giedion
precedência a Picasso, aos neoplasticistas e a Maliêvitch
202
.
figura 40 - GIEDION propõe analogia visual entre L’Arlésienne de Picasso e a Bauhaus de Gropius.
Tournikiotis não nota, mas tanto Pevsner quanto Giedion concordam que o que a
pintura trouxe à arquitetura foi a idéia de abstração. No relato de Giedion, a arquitetura
moderna, a partir da revolucionária abolição da perspectiva clássica realizada pela pintura
cubista, conseguiu pela primeira vez alcançar a interpenetração dos espaços interior e
exterior; mais ainda, ela introduziu a participação do tempo e do movimento na própria
concepção de arquitetura .
203
Giedion traça um paralelo entre o papel da perspectiva (ao
formular a linguagem plástica da Renascença) e o papel da pintura cubista (ao formular a
linguagem plástica da arquitetura)
204
, mas Tournikiotis critica a famosa justaposição que
82
Giedion propõe da pintura L’Arlésienne de Picasso e da Bauhaus de Gropius (fig. 40) com
o argumento de que ela se sustenta apenas numa semelhança morfológica sobre a qual
Giedion constrói toda a sua busca pelos fatos constituintes da arquitetura. “Não
nenhuma outra conexão, seja social ou técnica, capaz de ligar obras tão diferentes uma da
outra e tão distantes no tempo uma da outra”
205
. Há que se observar aqui que a comparação
da pintura de Picasso com o prédio da Bauhaus considerada sob o aspecto da analogia
visual entre as ilustrações do quadro e a fotografia do prédio é bastante convincente, pois
parece ser especialmente favorecida pelo rebatimento das linhas diagonais das esquadrias
do prédio sobre as diagonais do perfil de L’Arlésienne. Tal analogia apoiada na bi-
dimensionalidade, talvez ficasse muito prejudicada se comparássemos não a pintura com
uma fotografia do edifício, mas com o próprio prédio. Mesmo sob novo ângulo fotográfico
a analogia visual parece se sustentar (fig. 41). Este parece ser um bom exemplo de como a
‘pura visualidade’ pode mascarar a apreciação da arquitetura.
figura 41 - Walter Gropius, Bauhaus Dessau, (1926).
Bruno Zevi se opõe ao Cubismo, mas admira o Expressionismo
206
. A arquitetura
ocupa um lugar privilegiado entre as artes, mas é totalmente distinta. Sua principal
característica é existir no espaço tridimensional e incluir a humanidade enquanto a pintura
está confinada a duas dimensões, e a escultura desenvolvendo-se em três dimensões, exclui
a humanidade
207
. A adaptação do edifício a seu propósito social é o que define o campo do
deleite estético
208
em Bruno Zevi, onde uma bela arquitetura é aquela cujo “espaço interior
83
atrai-nos, eleva-nos e nos domina espiritualmente” e, conseqüentemente o oposto: “a
84
lo na esfera da arte, e defende a idéia do trabalho heterônomo, dependente de opções
tomadas na vida da sociedade
224
. Para Benevolo, os princípios formais autônomos do
Neoplasticismo ou do Purismo são fatores externos que impedem uma visão mais interna
do problema arquitetônico
225
. Benevolo acredita que no início do século XX as condições
econômicas e sociais favoráveis permitiram um grau de liberdade a uma elite, o que levou
a uma proliferação das vanguardas, pequenos grupos que falavam para todos e não
escutavam ninguém, uma situação de contradição entre sociedade e cultura que destruía o
equilíbrio necessário entra os objetivos gerais da sociedade e as ambições individuais
226
.
As villas de Le Corbusier dos anos 1920 são “casas isoladas e caras para clientes de
vanguarda
227
. Transcendendo o modelo da vanguarda, que se caracteriza por oferecer
modelos perfeitos para a sociedade, Walter Gropius e a Bauhaus mostram o caminho do
“compromisso pessoal”, abrindo-se para a sociedade e assumindo a dura tarefa de melhorar
o ambiente construído
228
. Com relação às ilustrações, Benevolo inova. O edifício da
Bauhaus Dessau de Walter Gropius (1927) é mostrado em seu estado atual (1971), sujeito
às conseqüências da passagem do tempo e, tal como a Ville Savoye, mostrando os
problemas de manutenção causados pelos materiais empregados: um mau envelhecimento
que destrói a imagem de volumes puros, enfatizando seu caráter existencial
229
, de edifícios
negligenciados.
Banham demonstra que as formas puras e nuas dos anos 1920 obedeciam a
preceitos da tradição acadêmica, garantindo a sobrevivência do modelo Grego e das regras
básicas da estética clássica (os sólidos filebianos, por exemplo), a coerência Albertiana, e a
harmonia das proporções. Banham aponta com isso uma contradição entre a natureza
desafiadora e progressista da tecnologia e a natureza imutável e eterna da estética clássica,
contradição notada apenas pelos futuristas italianos que argumentaram que a estética da
Beaux-Arts era impossível de se reconciliar com as novas condições do modernismo
230
.
Após denunciar a incapacidade da arquitetura moderna em expressar a primeira era da
máquina, segue para defender o alcance daquele objetivo na obra inicial de Buckminster
Fuller, o que funciona, segundo Tournikiotis, como uma parábola instrutiva para aqueles
que querem projetar uma arquitetura capaz de expressar o que seria uma segunda era da
máquina
231
. Banham defende um papel decisivo do futurismo e do De Stijl no
desenvolvimento do movimento moderno e situa o Von Material zu Architektur de
Moholy-Nagy – como a quintessência da Bauhaus
232
.
85
Tournikiotis aponta uma posição não-explicitada de Banham sobre a essência da
arquitetura: construção e função não podem existir sem estética
233
. Para Banham, a estética
é essencial para os edifícios se tornarem arquitetura, mas na era da máquina é preciso uma
estética colada às inovações técnicas e usos comuns da era. Essa nova disciplina estética
não pode emergir das Escolas de Arquitetura. A resolução das contradições da arquitetura
deve ser procurada na pintura e na escultura, e nos projetos De Stijl que ao final da
Primeira Guerra convergiram as idéias futuristas e as formas cubistas
234
. Assim, Banham
projeta para o futuro uma arquitetura de formas sempre renovadas, argumentando que
formas fertilizadas organicamente por princípios comuns à arquitetura e à tecnologia não
podem ser estáveis
235
. Para Banham, o erro do movimento moderno foi justamente
sucumbir a fórmulas regulares, interrompendo o processo evolutivo da tecnologia, o que se
tornou um novo academismo
236
.
A obra de Peter Collins, Changing Ideals in Modern Architecture atem-se à análise
dos ideais expressos nos projetos dos arquitetos modernos, suprindo uma falta que ele
nos historiadores que o precederam, mais preocupados com formas que com as mudanças
nos ideais que as produziram
237
. Este livro, segundo Tournikiotis teve grande influência no
desenvolvimento da arquitetura nos anos setenta e oitenta. Collins critica Banham por
apresentar uma visão mecânica da evolução da arquitetura em função da evolução
tecnológica. Para Collins o que define a arquitetura de uma época é a idéia que essa época
apresenta sobre que formas são mais apropriadas para serem selecionadas para a
arquitetura
238
. As ilustrações de seu livro não mostram a evolução da arquitetura como uma
série de mudanças na forma, mas nos valores estéticos, morais e intelectuais
239
dos
arquitetos. Para Collins, o racionalismo é a espinha dorsal de toda teoria arquitetural
válida
240
e ele procura reintroduzir a teoria da construção na prática arquitetônica
241
. Para
tanto, elege Auguste Perret a personalidade mais importante do início do século XX com
sua definição do arquiteto como um poeta que pensa e fala em construção (a poet who
thinks and speaks in construction)
242
. Collins propõe um neologismo para expressar sua
visão da teoria da arquitetura: oecodomics, um neologismo que pressupõe uma distinção
fundamental entre a teoria da arte e a teoria da arquitetura
243
. Nesse sentido, o autor recusa
a arquitetura como uma categoria especial da arte a ser julgada por uma teoria da beleza e
abraça a arquitetura como uma categoria que mantém certa relação com a teoria da arte,
mas exclusivamente no sentido da arte da construção
244
. Se a arquitetura não é arte, pois
seus dois princípios centrais, utilitas e firmitas não tem valores internos conexos com
86
qualquer arte
245
, Collins pode acusar Le Corbusier, Gropius, Mies van der Rohe de
haverem distorcido os princípios fundamentais da arquitetura, pois enfatizaram os
parâmetros artísticos às custas do racionalismo
246
. Collins, por oposição à procura do
espanto e da excitação (astonishment and excitement) na arquitetura, defende a idéia de
uma arquitetura banal (banal architecture). Seu exemplo é o prédio de apartamentos de
Auguste Perret na rua Raynouard em Paris, que de tão harmonioso com seu ambiente não
chama a atenção, senão pela placa afixada ao prédio onde se descobre que seu arquiteto é
um dos Pioneiros do Movimento Moderno
247
. Collins, observa Tournikiotis, não foi um
admirador da arte moderna e nutria verdadeira desaprovação pelas vanguardas. Em sua
franca oposição à idéia de uma fusão de pintura, escultura e arquitetura critica a estética
das formas puras e o ensino da Bauhaus. Collins não gosta da idéia de se estabelecer uma
conexão entre função, construção e pureza morfológica de superfícies lisas e massas
geométricas simples. A seu ver, enfatizar a dimensão artística da arquitetura representa o
perigo de ser levado à idéia de que o edifício é um objeto de arte no espaço, enquanto de
fato ele é simplesmente uma parte do espaço
248
. Para Collins, essa idéia provém do desejo
de se estabelecer uma analogia com a arte abstrata, algo a seu ver totalmente sem
sentido
249
. O arquiteto aprende com o pintor e o escultor apenas no plano das idéias, da
mesma forma que aprende com o biólogo e o engenheiro, de sorte que esse aprendizado
não seja o aprendizado de formas arquiteturais. Uma das mais importantes posições de
Collins para Tournikiotis é a idéia de que a reutilização de formas de períodos prévios não
é necessariamente contrária aos princípios da arquitetura moderna
250
. Collins estabeleceu
um paralelo entre arquitetura e direito, ao introduzir o conceito de precedent [precedente
ou jurisprudência]. Nesse sentido, a tarefa do historiador de arquitetura seria identificar e
estudar a evolução histórica de princípios “precedentes” que seriam pertinentes ainda
hoje
251
, como se construísse um “arquivo de precedentes” (an archive of prcedents). Nisso
não conflito com a noção de originalidade, já que todo bom arquiteto irá selecionar
criativamente (will select creatively), o que sugere para Tournikiotis a idéia de
“originalidade controlada” (controlled originality)
252
na realização de um “ecletismo
controlado” (controlled eclecticism)” que não se confunde com imitação de estilos ou
perda de unidade estilística
253
. A arquitetura a ser criada com tais princípios tem sua
unidade assentada na obediência ao programa (obedience to the program) e na expressão
honesta dos meios estruturais empregados (honest expression of the structural means
employed)
254
.
87
Manfredo Tafuri, marca o fim da progressão crítica da arquitetura moderna com seu
livro mais importante, Teorie e storia dell’architettura, publicado em 1968. Tafuri é um
arquiteto-historiador devotado ao serviço do ‘Novo Marxismo’ italiano dos anos sessenta e
seu foco é a questão do papel e da função do trabalho intelectual
255
. A história de Tafuri
não projeta uma arquitetura para a sociedade presente, ou para a do futuro, pois a luta por
uma sociedade livre deve preceder a busca de uma arquitetura para essa futura
sociedade
256
. Dessa forma, a obra de Tafuri atém-se estritamente a uma leitura do caráter
ideológico da história da arquitetura
257
. Tafuri é avesso a qualquer possibilidade de
tentativa de construção de uma teoria da arquitetura
258
, que todas as teorias da
arquitetura são ideologia. A história no sentido marxista é a única ciência que escapa da
marca da ideologia, sendo assim capaz de fundamentar a mudança radical da sociedade
primeiramente e da arquitetura como conseqüência
259
. Para Tafuri, a história que se assenta
no método dialético marxista, é a única ciência que torna possível o conhecimento das leis
de desenvolvimento da humanidade, sob as quais se produz a arquitetura
260
. Nessa história,
a arquitetura é vista como ideologia, termo usado especificamente como uma estrutura de
falsa consciência intelectual (specifically as the structure of the false intelectual
conscience)
261
. Segue-se que a atividade histórica se torna uma crítica das ideologias
arquiteturais (criticism of architectural ideologies)
262
. De seu ponto de vista, observa
Tournikiotis, já não há mais nenhum sentido em se escrever ou procurar uma genealogia da
arquitetura moderna
263
. A crítica histórica (critica storica) como um dos elementos
fundamentais da crítica da arquitetura (critica di architettura) recusa a crítica operativa
(critica operativa) – a crítica que pressupõe uma arquitetura), uma crítica de “falsa
consciência” que projeta a história no futuro
264
. Tafuri vê as obras de Giedion e Zevi como
sobreposições de história e projeto, contribuições historiográficas e verdadeiros projetos
arquiteturais (historiographical contributions and true architectural projects)
265
. O
objetivo da crítica histórica é encontrar no passado as ideologias que determinam o
significado da arquitetura a fim de revelar os problemas ocultos da arquitetura do presente
assim causando rupturas no futuro
266
. Acreditando que se deve usar todos os instrumentos
desenvolvidos pela cultura burguesa para usá-los contra essa mesma cultura
267
, Tafuri
acolhe, além do estrito marxismo, em diferentes medidas a contribuição de pensadores
mais recentes e até contemporâneos: Walter Benjamin, Roland Barthes, Umberto Eco,
Michel Foucault e Claude Lévi-Strauss. Esses autores forneceram a Tafuri os novos
‘instrumentos da crítica’, a saber, os da semiótica, enquanto ciência geral dos signos e o
88
estruturalismo. Portanto, para Tafuri, a arquitetura é uma linguagem, um meio de
comunicação, tanto quanto a pintura ou a escultura, e é analisada com a ajuda de
ferramentas usadas para a análise da linguagem da obra de arte, transferidas para a
arquitetura
268
. Tafuri reluta em fazer qualquer comentário sobre a forma arquitetônica,
evitando quaisquer julgamentos estéticos e mesmo a questão da construção do edifício
desaparece totalmente, rejeita também a idéia de construir uma linguagem arquitetural com
base no aprimoramento das técnicas de leitura
269
. Isso sugere a Tournikiotis a idéia de que
a arquitetura que Tafuri projeta é uma arquitetura “incorpórea (incorporeal)”
270
. Com isso
expressa a déia de uma arquitetura que existe apenas na esfera do discurso, sem função,
construção ou forma
271
. No domínio do imaterial a arquitetura de Tafuri desaparece como
uma pintura suprematista.
2.5. Nelci Tinem (2006)
O estudo historiográfico de Nelci Tinem, intitulado ‘O Alvo do Olhar
Estrangeiro’
272
traça uma “análise do processo de formação da versão historiográfica
canônica [grifo da autora] da arquitetura moderna brasileira” a partir de uma revisão dos
ensaios monográficos publicados sobre o tema (de 1943 a 1979), do que chama de
“manuais” de história da arquitetura moderna (1950 a 1980) e de revistas internacionais de
arquitetura (1939 a 1954).
Sua análise segue o modelo de interpretação historiográfica de Maria Luiza
Scalvini em L’immagine storiografia della’archittetura contemporanea de Platz a Giedion
1984. A julgar pelo título, o escopo cronológico do modelo de Scalvini vai de 1927 a 1941,
período para o qual parece funcionar bem a idéia de colaboração no tempo para
consolidação de uma ‘visão’, nos termos de Montaner. No entanto, Tinem aplica o modelo
de Scalvini a um certo número de textos de autores brasileiros ou estrangeiros, sejam eles
arquitetos, historiadores ou críticos que abrangem um período que vai de 1930 a 1981 nos
escritos monográficos sobre arquitetura moderna no Brasil; de 1950 a 1980 nos “manuais”;
e de 1930 a 1954 nas revistas estrangeiras. O modelo de Scalvini, na verdade é uma
adaptação à historiografia da arquitetura moderna brasileira do modelo interpretativo
sugerido por J. P. Bonta em Architecture and its interpretation (1979) para a
interpretação da obra arquitetônica edificada.
89
A idéia que surge é a de que uma “imagem historiográfica” que se forma “num
processo de acumulação e seleção de textos”
273
, tal como em Montaner se forma a ‘visão’
de Giedion. Curiosamente Tinem não diferencia os termos “imagem historiográfica”,
“versão historiográfica” e “versão canônica” e os usa como termos equivalentes. Na
narrativa da arquitetura moderna brasileira o ‘historiador cubista’ de Montaner reaparece
na figura do francês Yves Bruand, que em 1981 publica uma narrativa que reúne todas as
“interpretações parciais”
274
anteriores, a saber, Lúcio Costa (1936); Phillip Goodwin
(1943); Henrique Mindlin (1954); Geraldo Ferraz (1965); e Carlos Lemos (1979). A essa
progressão cronológica chama de “processo de consolidação de uma versão
historiográfica”. Enquanto isso, com contribuições de Pevsner (1947), Zevi (1950) e
Dorfles (1956), gera-se uma “versão canônica” em três autores, Hitchcock (1958),
Benevolo (1960) e Giedion (1963). Segue-se uma “reinterpretação historiográfica” da parte
de Argan (1970), Tafuri (1976) e Frampton (1980). Esse processo estrangeiro, Tinem
chama de “História Canonizada pelos Manuais”. Há ainda o que a autora chama de
“Documentos pré-canônicos”, que são os artigos publicados em quatro revistas
internacionais (c. 1946-1954).
Na verdade, o que se pode ler na narrativa de Tinem é a história da ‘canonização’
de Oscar Niemeyer, ungido único representante legítimo da ‘arquitetura moderna
brasileira’ pelo dublê de sumo sacerdote e eminência parda da ‘história/teoria/projeto da
arquitetura moderna brasileira’, e de sua recepção pela comunidade internacional para o
bem ou para o mal. Nelci Tinem, por certo embaraçada com os melindres dessa história tão
sacrossanta de dois personagens tão incensados nos dias de hoje, acha difícil entender
porque a ‘arquitetura moderna brasileira’ (Oscar Niemeyer) praticamente some na
“reinterpretação historiográfica” já que brilha na “versão historiográfica” e na “versão
canônica”, embora veja sua reputação oscilar muito nos “documentos pré-canônicos”. Não
é tão difícil assim de entender. Considere-se as equações: ‘arquitetura brasileira = Oscar
Niemeyer’ ; ‘Oscar Niemeyer = Formalismo’. Não é difícil concluir que a fortuna crítica
de Niemeyer na historiografia estrangeira está diretamente vinculada à fortuna crítica do
formalismo. Considere-se ainda o argumento da própria autora de que a ‘versão canônica’
se consolida entre 1958-1963, antes do golpe militar, e que a “reinterpretação” vai de 1970
a 1980. Considerando ainda as evidências que a autora de que uma outra equação
que diz ‘arquitetura brasileira = arquitetura do Estado’, nada faz supor que o formalismo a
serviço de uma imagem positiva da ditadura militar pudesse atrair a simpatia do comunista
90
Argan, ou do anti-visual Tafuri nos anos 1970. Ademais, os questionamentos nos
“documentos pré-canônicos” indicam que esse formalismo não é percebido no sentido
‘progressista’ da arte concreta de Max Bill (1908-1994), mas no pior sentido para o
equilíbrio albertiano, no sentido “desintegrado”. Por outras palavras, a arquitetura de Oscar
Niemeyer, vista como constituída de formas espetaculares, mas desvinculadas de
preocupações com a funcionalidade e a racionalidade construtiva, leva a idéia de
‘linguagem abstrata da arquitetura moderna’ à situação limite de se transformar na ‘visão
abstrata da arquitetura’. A estética adquirindo um peso “desintegrante” e se transformando
em mero instrumento de simbolização da ditadura. Lucio Costa desconversa quando sugere
que o desaparecimento se deu porque não havia mais graça numa arquitetura de extração
nacional quando a arquitetura moderna era um fato internacional.
275
2.5.1. Arte e abstração na historiografia de Tinem
Pouco se discute a questão da abstração na arquitetura moderna na narrativa de
Tinem, mas pode-se pensar, visto seu conteúdo, de que o pensamento de Lucio Costa tem
sua parte nessa falta. Até 1929 militante da arquitetura neocolonial, Lúcio Costa converte-
se subitamente em arquiteto moderno e começa a partir de 1930 a publicar textos onde
Tinem encontra a “intenção programática de estabelecer um elo entre a nova arquitetura e a
tradição clássica, marcada por suas leituras de Le Corbusier”
276
, ao mesmo tempo em que
“vincula os fundamentos dessa arquitetura à tradição construtiva portuguesa”
277
. Em 1931,
na qualidade de diretor da Escola Nacional de Belas Artes, organiza o Salão Oficial de
Artes Plásticas (que ficou conhecido como Salão Revolucionário) (figs. 42 e 43) para o
qual convida os modernistas de 1922 por ver neles o “verdadeiro propósito (...) de “ajustar
nossa mais autêntica seiva nativa, nossas raízes, ao campo das novas idéias”
278
. Para os
pintores modernistas de 22, a figuração é o pressuposto básico de uma pintura ou escultura
que queira representar as diversas etnias brasileiras em seus folguedos e labutas. Tanto
quanto a figuração é pressuposto da pintura acadêmica. Costa, com seu “espírito
conciliador”
279
expôs os convidados modernos lado a lado com os professores acadêmicos,
causando grande revolta.
91
figura 42 - REVISTA FORMA, Rio de Janeiro, 1932. "A Revolução e o Salão Oficial".
figura 43 - REVISTA DA SEMANA, Rio de Janeiro, 12 de Setembro de 1931. "O Salão de 1931".
92
É claro que Lucio Costa não estava com sua proposta igualando a todos pela
figuração, como faria Maliêvitch, ou Greenberg, que não viam diferença substancial entre
a figuração da arte de seu tempo e a estampada nas grutas de Lascaux. E seu espírito
conciliador em nada sugere que estivesse afrontando os acadêmicos. Mas afrontou e, nesse
sentido, pode-se pensar que Costa poderia ver teria visto os mesmos fundamentos nos
pintores acadêmicos e nos modernos, em meio às óbvias diferenças e esperasse uma
eventual transfiguração dos velhos espíritos, como ele sugere em Razões da nova
arquitetura
280
. Pode-se pensar então que na mentalidade conciliadora de Costa não haveria
espaço para a luta por posições, encomendas, manutenção de hierarquias e valores, que
envolve a chegada abrupta de uma nova geração abrindo espaço exatamente na Capital,
exatamente na Escola Nacional de Belas Artes. È crível essa hipótese, afinal ele introduziu
os modernos no ensino da escola sem promover “uma mudança estrutural que sustentasse a
modernização do ensino”
281
. Mas é crível também pensar que Costa não sabia bem o que
era o ‘moderno’, tanto quanto os ‘modernistas’ de 22 não sabiam bem do que se tratava a
‘tradição modernista’, não estando em pauta nas desavenças entre ‘modernos’ e
‘acadêmicos’ naquele momento nada parecido com disputas em torno da autonomia da
arte. Yves Bruand sugere que a súbita adesão de Lúcio Costa “à nova arquitetura” foi
temperada por dúvidas quanto à continuidade e permanência do movimento moderno e
medos com relação ao “seu caráter absoluto, intransigente e o aparente desprezo de seus
teóricos por tudo que se referisse ao passado”
282
. Definitivamente, Costa não se mostra
exatamente um paladino da autonomia da arte e/ou alguém cheio de confiança nos
pressupostos da arte abstrata. A idéia de internacionalismo inerente ao movimento
moderno recebe em Costa uma versão que desqualifica a atualidade desse
internacionalismo, colocando-o numa perspectiva histórica que poderia agradar (se isso
fosse possível) até mesmo a um defensor dos princípios neoclássicos da Missão Francesa.
Com efeito, Lucio estabelece um elo entre a Grécia clássica e o solo pátrio através dos
mestres-de-obras anônimos, que conservaram as qualidades do “estável, severo,
simples”
283
.
Na progressão de Tinem, até Mindlin parece que caminha uma idéia firme de
estabelecer uma genealogia própria da arquitetura moderna brasileira baseada na tradição.
Mas em 1965, Geraldo Ferraz tenta situar as “origens do movimento brasileiro (...) em
parâmetros contemporâneos e internacionais, europeus e norte-americanos, muito distantes
temporal e espacialmente da tradição colonial portuguesa”
284
. O autor coloca Warchavchik
93
na condição de pioneiro de uma arquitetura que tem como vínculo maior a revolução
industrial com suas novas possibilidades tecnológicas
285
. Ferraz, nota Tinem, repete a
narrativa de Giedion sobre as origens e o desenvolvimento da arquitetura moderna norte-
americana e européia, além de considerar o Cubismo “o ponto de partida para o
desenvolvimento da linguagem plástica do século XX [... que] introduziu a dimensão
tempo”
286
. A ponte para o Brasil é Warchavchik. Ferraz adota a visão de internacionalismo
do movimento moderno e enfatiza o papel da Bauhaus e do L’Esprit Nouveau (figs. 44 e
45) de Le Corbusier.
figura 44 - LE CORBUSIER, Pavilion de L'Esprit Nouveau, Paris, 1925.
figura 45 - LE CORBUSIER, Pavilion de L'Esprit Nouveau (inteior e fachada)
94
figura 46 - Gregori WARCHAVCHIK, Casa Modernista (1929) à página 121 de SARTORIS, Gli
elementi dell architettura razionale.
Para Ferraz, o polonês Warchavchik (fig. 46) é influenciado por Le Corbusier,
sendo sua famosa Casa Modernista em São Paulo (1929) um “manifesto, um experimento
95
(...) que ênfase à síntese das artes”
287
. O objetivo dessa casa-manifesto seria “difundir
uma nova maneira de construir novos materiais e novas técnicas -, um novo parâmetro
estético e uma nova forma de viver”. Tanto seu paisagismo, como as obras de arte que
contém, e ainda seus móveis e tapeçarias são contados entre os “atributos e qualidades do
edifício”
288
. Ferraz “acredita ver [o Pavilhão de L’Esprit Nouveau] reproposto na Casa
Modernista”
289
. Para Tinem, por apoiar-se na narrativa de Giedion, Ferraz vê-se forçado a
defender Gropius (o arquiteto favorito de Giedion) como sendo o modelo de Warchavchik.
No frigir dos ovos, a narrativa de Ferraz reconta a história da arquitetura moderna
aceitando a influência de Le Corbusier, mas contornando as origens gregas e portuguesas
da arquitetura moderna de Costa, para dar lugar à participação de São Paulo e ao caráter
“internacional” da arquitetura moderna praticada no Brasil, via Walter Gropius e,
conseqüentemente a Bauhaus. A questão talvez não seja tanto de fidelidade a Giedion, mas
a solução de um duplo problema. A exclusão de São Paulo da genealogia da arquitetura
moderna brasileira e a minimização da imagem de seu papel na dinamização da indústria
no Brasil. Em 1965 a arte concreta era uma realidade no Brasil e o exemplo de Max Bill
era apreciado pelos paulistas desde a 1ª Bienal de São Paulo, com conseqüências tanto para
a pintura concreta como para a poesia e o design brasileiros.
A participação de Warchavchik nas origens da arquitetura moderna brasileira
atende ainda a uma reivindicação de se valorizar o lado racional da arquitetura brasileira. O
caso de Oscar Niemeyer parece irremediavelmente comprometido com a irracionalidade,
ao menos para um autor como Pevsner. Tinem reporta-se à edição de An Outline of
European Architecture, onde Pevsner inclui em sua narrativa o surgimento no Brasil “do
novo estilo [devido ao] russo Gregori Warchavchik (...) em 1928”, estilo que depois
desapareceu por dez anos
290
. O autor sublinha a “revolta contra a razão” surgida na
arquitetura a partir dos anos 1940, e considera que a arquitetura brasileira, com sua
“tradição do mais ousado e disparatado barroco do século (...), [apresenta] as mais
fabulosas estruturas de hoje, mas também as mais frívolas”
291
. A “revolta contra a razão”
brasileira teve para Pevsner poder suficiente a ponto de “liberar os traços irracionais” do
caráter de Le Corbusier que “mudou completamente”, inclusive tendo criado a capela de
Ronchamp, para Pevsner “o mais polêmico monumento do novo irracionalismo”
292
. Tinem
cita Pevsner em artigo de 1961 em que contrapõe o Estilo Internacional dos anos 1930 à
“revolta contra a razão”, de modo que o primeiro “era um estilo preciso, que não admitia
imprecisões (...) era intransigente”, enquanto o segundo, gerou um “retrocesso”
293
. Embora
96
“anti-racionais”, os primeiros edifícios de Niemeyer, que “já não pertenciam ao Estilo
Internacional”, são notados pelas qualidades da “força, poder e grande originalidade”
294
. A
favor da razão, Pevsner declara em 1961: “A construção individual devia manter-se
racional. Se o edifício é quadrado, o arquiteto não é necessariamente um quadrado”
295
.
Em 1960, para Leonardo Benevolo, Niemeyer é uma exceção na arquitetura
brasileira, cultivando a “simplicidade” e o “espaço vazio” em sua “decidida simplificação
do repertório racionalista”
296
. Mas Tinem não nota que o autor parece querer conciliar-se
com a visão oposta (a de Pevsner, por exemplo) quando afirma que em Brasília, os
edifícios de Niemeyer ostentam um caráter decorativo nos “elementos importantes [... de
sua] caracterização”, pois o arquiteto “força os efeitos que pode conseguir com os
elementos construtivos comuns” a tal ponto que o autor os como “enormes objets
trouvéessurrealistas: “elementos de mármore polido e torneado como se fossem ossos de
animais”
297
. O que é isso, senão a irrupção da irracionalidade? O “formalismo” é
exigência do “jovem capitalismo” de uma “sociedade hierarquizada” por uma
“representação simbólica apropriada”
298
. O italiano Benevolo a medida àquela altura da
importância do Brasil na cena internacional: “a arquitetura brasileira pode ser deixada de
lado hoje como um capítulo encerrado”
299
.
Em 1971, outro italiano, Giulio Carlo Argan já não cita mais a arquitetura brasileira
em seu compêndio L’Arte Moderna, lamenta Tinem. Naquela obra, Argan aponta na
abstração do espaço (natureza) e da sociedade (história) a razão da crise da arquitetura
internacional
300
. Como poderia se interessar por uma arquitetura que “quer ser mais a
expressão de uma organização que de uma função” e que, conseqüentemente, passa a ser
vista, quando apropriada pela ditadura, como expressão de uma ordem opressiva, mais
ainda quando o autor acredita que mesmo a arquitetura de um Reidy é, como o restante da
arquitetura brasileira, o reflexo de um “processo desde cima e tem como objetivo estender
a toda a sociedade a tipologia idealizada para uma elite”
301
.
Um quarto italiano em 1973, Bruno Zevi, classifica a arquitetura brasileira como
neo-expressionista
302
dada a valorização do aspecto plástico, segundo Tinem. Zevi a
arquitetura moderna brasileira surgindo num momento de “crise do racionalismo”,
atenuando essa crise como “uma compensação provisória na euforia de curvas e brise-
soleil”
303
. A arquitetura brasileira lhe parece constituída de “esboços agigantados”
304
, o
que, pode-se pensar, remete tanto à idéia de falta de domínio da noção de escala, quanto de
fracasso da intenção plástica na edificação efetivamente construída. A Brasília de
97
Niemeyer, segundo Zevi, é produto de uma “anacrônica mania de grandeur
305
, onde
dominam edifícios “artificiosos (...) cuja aparência diverge de seus conteúdos”
306
.
Em 1976, para o quinto italiano da lista, Tafuri, Niemeyer é a própria arquitetura
brasileira, esta qualificada de “arquitetura da burocracia”, onde “o gratuito se tinge de
sofisticação certamente espetacular, mas de veleidade supérflua”
307
. Mas para Tafuri,
Reidy está fora dessa “arquitetura formalista”.
Em 1980 o Frampton de Modern Architecture:a critical history, defende a idéia de
que o estilo internacional nunca se universalizou por falta de “condições técnicas e/ou
econômicas” e nem mesmo Le Corbusier escapou nos anos 1920 de disfarçar de modernos
seus edifícios “apelando para o formalismo”
308
com suas “formas brancas, homogêneas,
[como se] feitas pela máquina”, mas, na realidade, construídas artesanalmente. Frampton
vê uma “releitura criativa” dos princípios lecorbuseanos no Ministério da Educação e
aponta o “conceito purista de marriage des contours no paisagismo de Burle-Marx, o
responsável por gerar “um novo estilo nacional baseado em grande parte na vegetação
indígena nacional”
309
. Niemeyer tem o auge de seu “domínio da forma livre” na “orgânica”
Casa das Canoas (1953-1954), mas depois parte para um “retorno aos clássicos
absolutos”
310
e, adotando com isso “o formalismo decadente, gratuito e de espírito
decorativo”
311
. Contrariamente ao que Tinem pensa, nada indica que haja qualquer
contradição entre “formalismo decadente” e os “clássicos absolutos”. Pelo contrário, a
“forma pura” dos “clássicos absolutos” é a própria forma do formalismo atemporal,
abstrato, absoluto que Frampton como decadente. Tinem não nota a ironia de Frampton
e pensa, confusamente que o autor aproxima Niemeyer da “tradição neoclássica”. Tinem
observa que Frampton “repete o cânon”, com Lúcio Costa e Warchavchik nos anos 1920 e
a adoção oficial da arquitetura moderna no regime de Vargas quando se tornam realidades
as propostas teóricas de Le Corbusier. Aqui fica confuso o que é “cânon”. Ou talvez mais
claro. A autora agora se refere ao “cânon” como uma seqüência reconhecida de fatos e não
como uma interpretação desses fatos, e parece que ignora a diferença entre personagens e
enredo. Na verdade, aplicada à fortuna crítica da arquitetura brasileira (Oscar Niemeyer) na
historiografia estrangeira, a idéia de um cânon “interpretativo” não parece se assentar bem
de modo algum.
98
CAPÍTULO 3: A ABSTRAÇÃO NOS DISCURSOS DA HISTÓRIA E DA TEORIA
PIONEIRAS DA ARQUITETURA MODERNA.
Neste capítulo o objetivo é apresentar o universo de discussão dos problemas
referentes à história e à teoria da abstração na arquitetura moderna tal como se apresenta
nos discursos arquiteturais de Walter Gropius, Le Corbusier e Lucio Costa e nas narrativas
históricas de historiadores da arquitetura moderna. O trio de arquitetos é o que surgiu como
central na criação de objetos exemplares e definidores do que a teoria e a história se
propõem a interpretar. São arquitetos importantes tanto por sua prática arquitetural quanto
por seus escritos. Sua pratica discursiva-arquitetural mostra-se importante na geração do
que se pode chamar de ‘visão’ modernista estampada nas narrativas históricas.
Os historiadores partilham da mesma visão e o todos entusiastas da arquitetura
moderna. Os textos revistos cobrem o período de 1929-1960. Tal período se inicia num
momento em que se procurava uma definição teórica do que se passava na obra de um
determinado grupo de arquitetos, passa por um momento que se pode chamar de chamar de
‘vitória do movimento moderno’ e se encerra com uma inflexão crítica, num momento
ligeiramente anterior ao ponto em que a arquitetura do movimento moderno começa a ser
questionada em suas premissas básicas. Entre 1929 e 1960 as posições teóricas evoluem da
‘pura visualidade’ a um aberto questionamento para com a possibilidade de se apreciar a
arquitetura como objeto de pura contemplação desinteressada. É um movimento que
acompanha um deslocamento da idéia de arquitetura como arte para uma idéia de
arquitetura como instrumento social, mas que não logra se desvincular das associações
históricas da arquitetura moderna com a arte abstrata, apenas reinterpretando essas
vinculações. Nas narrativas históricas, no início do processo a história da arte norte-
americana encontra-se numa posição importante e partilha com a história da arte alemã a fé
no olhar da ‘pura visualidade’, mas ao final essa posição é questionada nas publicações do
pós-guerra dos italianos Zevi e Benevolo. Enquanto Zevi volta logo atrás em suas
posições, Benevolo fecha o ciclo interessado em retirar da arte o poder crítico que sua
autonomia lhe confere para entregá-lo à arquitetura. Em Benevolo, a arte fica sujeita, para
cumprir sua ‘função social’, a submeter-se ao crivo da aplicabilidade arquitetônica.
Benevolo não pode banir o experimentalismo da arte moderna, mas condena as vanguardas
que criam indiferentes à ‘função social’ da arte. Na prática arquitetônica isso parece
acontecer no tempo como uma pressão que se desloca do estético para o funcional, do
99
arquiteto-artista para o arquiteto-técnico. No entanto, a presença dos postulados principais
da abstração na aparência visual da arquitetura não é questionada. A arquitetura moderna
internacional fala a ‘linguagem abstrata da arquitetura’, ainda que não se queira mais ver a
arquitetura como uma abstração’. O presente capítulo procura identificar e analisar esse
universo de posições e os termos referentes com o que se põe a discussão da ‘abstração’ na
arquitetura. Nesse sentido é uma historiografia da abstração na arquitetura moderna.
3.1. Três arquitetos e a abstração
3.1.1. Walter Gropius, o 'funcionalista esteta’
Gropius entende a arte como criação de beleza e a beleza como um valor universal.
está o lado esteta desse funcionalista: “a arte concerne a todos s, pois a beleza é
necessidade primeira de toda, vida civilizada”
312
. Mas a beleza para ele tem um
fundamento mais profundo que o simples deleite estético: “há saecula saeculorum as
disciplinas criativo-estéticas sempre geraram forças éticas”
313
. Nesse sentido podemos
invocar como exemplo o Construtivismo de Tatlin com sua ‘verdade dos materiais’ e o
papel importante que essa idéia desempenhou em Mies, estabelecendo um componente
ético na economia da forma. Essa é uma idéia que em Kaufmann se traduz pelo
fundamento político revolucionário da “forma mesma”, a forma pura dos sólidos
geométricos.
Além da ética, os artistas plásticos, são especialistas da visão e conhecem truques que a
ciência pode explicar:
“Com os truques do artista [(fig. 47)] eu posso mudar a aparência desse espaço. Eu preciso conhecer
essas coisas porque elas estão baseadas em certos fatos sobre a visão, sobre nossa psicologia, fatos
biológicos e assim por diante”
314
.
Em 1947, Gropius admitia os efeitos da “magia do artista” na arquitetura moderna,
na preferência pela “transparência que é alcançada por grandes superfícies de vidro, por
secções salientes e aberturas na obra arquitetônica
315
”. Com esses recursos a arquitetura
investe na tentativa de produção de uma “impressão de um contínuo espacial fluente”,
onde “o próprio espaço parece movimentar-se”. O edifício então “parece pairar no ar e o
100
espaço parece fluir”, integrando o “espaço externo infinito” na “composição espacial
arquitetônica, que se estende para o exterior”
316
. É frase que sugere uma apreciação do
edifício como a da obra de arte por um olho que se move enquanto a arquitetura como
um espetáculo visual que se desenrola no tempo.
figura 47 - GROPIUS, página de Bauhaus novarqquitetura
Hitchcock (1948) acredita que a experiência da Bauhaus fez com que os escritos de
Gropius afirmassem de forma muito mais clara que os de Corbusier “a relação teórica entre
pintura e arquitetura”
317
. Como se viu, a relevância da pintura no ensino da Bauhaus foi
posta em dúvida em 1927 na visita de Maliêvitch e Peiper. Deve-se considerar que naquela
altura, Maliêvitch decretara a morte da pintura. Peiper nada relata sobre a posição de
Maliêvitch ou de Gropius a respeito, mas tudo indica que o segundo defenderia a presença
da pintura como instrumento de “educação artística” do arquiteto, e a presença dos
próprios artistas como fundamental na criação de um ambiente criativo: “só é possível
intensificar o talento artístico inato quando a pessoa toda é influenciada pelo exemplo do
mestre e por seu trabalho”
318
. Nesse caso, Gropius está se referindo ao contato interpessoal
e direto do estudante com um criador tout-court. Os professores pintores são vistos dentro
do contexto da crença nos artistas como aqueles seres ‘antenados’, e capazes de criarem
101
“uma atmosfera intensiva” onde a formação artística é fundamental, pois “alimenta a
imaginação e as forças criativas”
319
.
Com relação às práticas pedagógicas na Bauhaus, a história da arte é eliminada por
se uma disciplina contraproducente. Essa tabula rasa da história se justifica, ao que parece,
pelo que seria o poder inibidor do exemplo do passado, a tradição vista como um
impedimento do experimentalismo da arte moderna. Gropius declara sem titubear que o
aluno iniciante é “facilmente desencorajado de fazer suas próprias experiências criativas”
quando introduzido ao “estudo das obras-primas do passado”. E é sobre essa base
experimentalista que o ensino deve avançar para “o pensamento tridimensional [que] é a
disciplina arquitetônica básica”. É em função dele que a capacitação dos estudantes na
expressão plástica deve agir a fim de dar “ao design a segurança instintiva de conceber o
espaço em termos de construção, economia e beleza harmônica”
320
.
Na época da fundação da Bauhaus alemã, Gropius tinha como objetivo “formar
pessoas com talento artístico para serem designers na indústria, artesãos, pintores e
arquitetos”
321
. A escola alemã procurava oferecer além de uma formação técnica e
102
Esse “denominador comum” seria uma “chave comum para a compreensão das
artes plásticas”
325
e ainda um instrumento de projeto que serviria para a “transformação [do
conteúdo paradoxal da mensagem artística] em formas de expressão visíveis”
326
. Nesse
sentido, o aluno da Bauhaus não aprenderia um estilo, mas um sistema que o levaria a
criações individuais até que, como escreveu em 1919, “dos grupos individuais uma idéia
grande, duradoura, religiosa-espiritual venha a emergir novamente, e que finalmente
deverá encontrar sua expressão cristalina numa grande Gesamtkunstwerk
327
, a obra de arte
total.
3.1.2. Le Corbusier e a matemática da beleza
Em 1961 Le Corbusier declara que “a gente tem simpatia pelo homem em seu
ambiente” e que encontrou na pintura os meios de desenvolver esse sentimento
328
e que,
embora contendo aspectos intelectuais, como a arquitetura, as artes plásticas “têm
possibilidades físicas mais imediatas”, embora tudo seja “uma [só] coisa. È sinfônico”. A
idéia do “sinfônico” está plenamente em harmonia com a idéia de Gropius de um
“denominador comum” para todas as artes. Isso faz pensar que é por força desse
“denominador comumque se pode experimentar imediatamente nas artes plásticas algo
que se pode levar à arquitetura. Enquanto na juventude a pintura fazia parte de sua rotina
diária, aos setenta e sete anos a arquitetura toma a maior parte do tempo de Le Corbusier:
“As últimas pinturas desses anos recentes são todas datadas do Natal, Ano Novo,
Pentecostes e 14 de julho, todos longos feriados”. Respondendo aos críticos que não o têm
como um pintor importante, ele considera ser seu “direito fazer pintura e escultura tanto
quanto arquitetura. Se aborrece as pessoas elas pod
103
A defesa que o manifesto faz da “busca de constantes” na obra de arte conduziria à
invenção do Modulor por Le Corbusier, seu complicado sistema de proporções aplicável à
arquitetura em busca de controle e beleza das formas. No manifesto Purista, a questão da
proporção é central e, nesse sentido, afirmam os autores que tudo “pode ser representado
por números; as proporções são as relações dos números que constituem um quadro. Um
quadro é uma equação. Quanto mais justos são os elementos entre si, tanto mais o
coeficiente de beleza tende a aumentar”
330
.
O termo ‘Purismo’, explicam os autores, é empregado para “exprimir em uma
palavra inteligível a característica do espírito moderno”
331
. Em pleno caos da Primeira
Guerra, num momento em que a arte viu nascer o movimento Dada, com sua
irracionalidade radical expressa no seu próprio nome ‘ininteligível’, o Purismo de Ozenfant
e Jeanneret quer que a arte reencontre os valores da razão, da ordem, da pureza, do cálculo
e do rigor. Embora sua época esteja em ebulição, eles pensam que “o esqueleto da vida
moderna é constituído pela ciência e pela indústria”
332
. Sendo necessário que a arte esteja
“verdadeiramente enraizada em seu tempo”
333
e ancorada na premissa de que a indústria
age dando conseqüência prática às leis descobertas pela ciência. O corolário é que se “a
indústria é condicionada pela ciência, e não faz mais do que realizar as conclusões da
ciência, a arte deve escorar-se em leis”
334
. Logo, arte e ciência têm os mesmos objetivos:
“a expressão das leis naturais pela busca das constantes”.
335
Assim, agindo de “acordo com
as leis naturais, elas desprezam o acaso”.
336
E das leis, voltamos à máquinas da indústria,
pois as “leis nos permitem considerar que a natureza age à maneira de uma máquina”.
337
figura 49 - TCHERNIKOV. A Construção.
104
A máquina é exemplo para a arte como para a arquitetura, norteando “figurações
rigorosas, arquiteturas rigorosas, formais, tão pura e simplesmente quanto as máquinas”.
338
Esse raciocino, conjugado às preocupações com construção e função, levaria Le Corbusier
à sua famosa frase “a casa é uma máquina de morar”
339
, mas em termos de formas
arquitetônicas, o exemplo da máquina é traduzido nos anos 1920 por superfícies lisas e
volumes simples. Em Le Corbusier, a máquina não é um modelo formal como em
Tchernikov, que toma a morfologia da máquina para suas formas arquitetônicas
340
(fig.
49).
Mas podemos nos perguntar se ligar arte, ciência, indústria e natureza através de
leis e suas constantes, não importaria na perda do sentido humano da arte? Não para os
Puristas. Para eles, é “a lei que causa o mais elevado deleite do espírito”
341
, a lei “é uma
força que nos vivifica, nos desenvolve, nos eleva e nos uma amplitude nova”
342
e isso
pela simples razão de que na ciência, como na arte, “a pesquisa das leis nos a chave das
harmonias”.
343
Com esse raciocínio, os Puristas podem concluir que a “arte que procede do
conhecimento das leis é uma arte, essencialmente humana, pura de todo ocultismo, uma
arte baseada na física”.
344
Os paralelos entre arte e ciência, tão caros a Giedion, para os
Puristas não incluem a questão do espaço-tempo. Escrevendo dois anos após a publicação
da Teoria Geral da Relatividade de Albert Einstein, os Puristas empregam como sinônimo
de espaço-tempo o termo ‘quarta-dimensão’, prática que se tornou comum de 1916 em
diante
345
e sentenciam: “a quarta dimensão (...) está fora de toda realidade plástica (...), é
absurdo pretender exprimir [na pintura] outras dimensões além daquelas que nossos
sentidos percebem (...)”.
346
O Purista deverá simplesmente procurar “perceber, conservar e
exprimir o invariante”
347
e sua pintura “deve propor construções tão claras quanto a
geometria”
348
, sabendo que entre “as leis, existem algumas que importam particularmente à
plástica (...) [pois] a natureza obedece como que a eixos (...) mas eixos principais, como
na árvore as folhas, os ramos, os galhos, um tronco”
349
. Nesse sentido, a arquitetura de Le
Corbusier estará atenta à questão dos eixos: “O eixo é o ordenador da arquitetura”
350
como,
por exemplo, em seu paradigmático projeto para o Palácio da Liga das Nações em Genebra
(1927). Sua arquitetura estará também ligada ao número através do “concreto armado,
última técnica construtiva, [que] permite pela primeira vez a realização rigorosa do
cálculo; o Número, que é a base de toda beleza, pode encontrar daqui em diante sua
expressão”
351
.
105
Entre 1920 e 1921, Le Corbusier assina uma série de artigos no L’Esprit Nouveau,
reunidos em livro publicado em 1923 sob o tulo de Vers une Architecture. Se no
manifesto Purista o tema é a pintura e a questão da arquitetura quase passa ao largo, em
Vers une Architecture dá-se exatamente o contrário. Nesse influente livro, sua visão de
arquitetura se expressa claramente como o olhar da ‘pura visualidade’. Para Corbusier, o
arquiteto, como o pintor purista, “realiza uma ordem (...) provocando emoções plásticas
(...), [ele] nos a medida de uma ordem que sentimos acordar com a ordem do
mundo”
352
. A arquitetura é “um fato de arte, um fenômeno de emoção (...) [e] consiste em
‘relações’ ”
353
.
Essas relações são estabelecidas entre “volumes primários”, cuja presença ou
ausência determina o que é e o que não é arquitetura
354
. Mas é preciso que as relações entre
os volumes e o espaço sejam “feitas de proporções justas”
355
. Para que transmita “profunda
harmonia”, a arquitetura deverá apresentar “formas belas, variedade de formas, unidade do
princípio geométrico”
356
. Assim, a “arquitetura é invenção plástica, é especulação
intelectual, é matemática superior
357
”. O rigor exigido contra “o arbitrário” é criado a partir
do uso do traçado regulador, “uma satisfação de ordem espiritual que conduz à busca de
relações engenhosas e de relações harmoniosas
358
”. A dado momento, o arquiteto chega a
igualar arquitetura e modenatura por meio de seu famoso bordão: “A arquitetura é o jogo
sábio, correto e magnífico dos volumes sob a luz; a modenatura é, ainda e exclusivamente,
o jogo sábio, correto e magnífico dos volumes sob a luz”
359
.
Le Corbusier não faz apenas da arquitetura uma abstração, sua noção de ‘homem’
parece estar igualmente ligada a uma visão abstrata. É o que parece sugerir uma afirmativa
que hoje seria peremptoriamente rejeitada como reducionista e politicamente incorreta:
“Todos os homens têm as mesmas necessidades”
360
, como se houvesse um ‘homem’
padrão. Trata-se de uma extensão ao homem do conceito de ‘tipo’. É Banham quem
observa que Le Corbusier, ao descrever a casa moderna, “parece especificar para essa casa
um habitant-type”.
361
Esse habitant-type é na verdade uma abstração do cliente que é dada
como verdade essencial. Isso porque ela é explicada através de uma teoria das “sensações”
válida para qualquer habitante da Terra. As formas puras” e brancas são tomadas como
universalmente apreendidas uniformemente. Nas formas brancas e puras está a essência
universal da linguagem abstrata da arquitetura moderna de Le Corbusier. A defesa teórica
dessa sua posição pode ser encontrada em artigo
362
publicado em L’Esprit Nouveau e não
reproduzido em Vers une Architecture, onde Le Corbusier e Ozenfant teorizam sobre a
106
existência de duas ordens distintas de sensação. Para eles, se mostrarmos formas e cores
primárias a qualquer pessoa da Terra, um cubo branco, por exemplo, “um Francês, um
Negro, um Lapão” reagirão com sensações idênticas. É o que eles chamam de “sensação
constante primária”. Mas se o cubo branco tiver manchas geométricas negras, o “homem
civilizado” reagirá com a idéia de um dado com o qual jogar. É o que os Puristas chamam
de “sensações secundárias”.
Parece que o jogo dos cubos se confunde nas percepções de raça implícitas na
escolha da metáfora do imaculado ‘cubo branco’, a todos igualmente ‘igual’, e das
‘manchas negras’, que ‘jogam’ o cubo no terreno do desigual. Mas obviamente não um
cubo branco capaz de ser apreendido universalmente da mesma forma, sem qualquer tipo
de associação que não passe pela cognição. No entanto, é exatamente esse tipo de
raciocínio que leva os Puristas a assumir a idéia de que “as grandes obras do passado são
aquelas baseadas em elementos primários, e essa é a única razão pela qual eles
perduram
363
”. Os poderosos “elementos primários” são como pílulas messiânicas dos
Puristas, e não instrumentos do simples deleite estético. O objetivo da arte “não é o simples
prazer, mais apropriadamente ela partilha a natureza da felicidade [grifo dos autores].”
364
3.1.3. Lúcio Costa e a máquina de narrar a tradição
Walter Gropius e Le Corbusier são os dois arquitetos que surgem com mais
freqüência e destaque na historiografia da arquitetura moderna. Enquanto o segundo tem
influência direta na arquitetura moderna brasileira, o primeiro sua influência colocada
em questão, sendo mencionado em Bruand uma única vez quando o autor afirma que,
como Le Corbusier, Gropius elabora sua “doutrina arquitetônica” a partir “dos problemas
técnicos e sociais” aos quais se subordinam as questões estéticas
365
, uma frase, aliás, que
poderia ser revista, uma vez que as questões estéticas em ambos não parecem assim tão
facilmente definíveis como “subordinadas”. Costa, que aceita o funcionalismo desprovido
de seu “excessivo rigor”
366
privilegia “reflexões de ordem estética” e apóia publicamente
em inúmeras ocasiões “a legitimidade da intenção plástica na arquitetura”
367
. Ao ver o
curso de arquitetura divorciar-se da Escola de Belas-Artes, declara em 1936 que a
arquitetura, embora de complexa realização, “continuava sendo fundamentalmente uma
arte plástica”
368
. Mas as discussões acerca do peculiar “modo de ser moderno” de Lúcio
Costa, em grande medida giram em torno das questões do nacional versus o internacional
107
que se confundem com as questões do valor da experiência do passado versus a tabula
rasa modernista, e ainda as questões relativas à dependência ou não da arquitetura
brasileira face aos modelos estrangeiros.
3.1.3.1. A questão da história
Embaraços com Lucio Costa no posto de eminência parda da historiografia da
arquitetura moderna brasileira podem se socorrer de Otávio Leonídio em Lucio Costa,
historiador?
369
, onde o autor demonstra que Costa nunca se pensou como e nunca poderia
ser classificado como um historiador e que seu modo de pensar era visual: “em Lucio
Costa valoriza-se uma outra forma de conhecimento, baseada na visão, no olhar”
370
, o
olhar da ‘pura visualidade’ que subjaz a sua arquitetura e suas teorias. Em que pese essa
observação, o não-historiador para o bem ou para o mal estará sempre nos fundamentos da
discussão sobre a história arquitetura moderna no Brasil. Em Razões da nova arquitetura
pode-se ler que, embora não-historiador, Costa tem uma visão da história. Ele se num
momento de transição que repete um padrão constante de patamares ascendentes, mas que
em seu tempo se em tal envergadura que supera a do Renascimento
371
devido à
novidade absoluta da presença da máquina. Costa tem ainda uma teoria para responder à
pergunta: porque se sucedem os estilos? Em sua teoria, a arquitetura evolui numa marcha
determinada pela necessidade de acompanhar as transformações da sociedade que são
provocadas por avanços técnicos
372
. A marcha é como uma escada
373
onde em cada degrau
uma força de oposição à subida e uma força favorável à ascensão
374
. Enquanto
predomina a oposição, um desacordo
375
entre a arquitetura e a técnica. A força de
oposição vem do velho espírito que não compreende as novas formas de expressão
376
daí
derivadas. Durante um período de transição essas forças se degladiam
377
até que o velho
espírito compreenda o novo e a transição finde num patamar superior. A força favorável
vem dos artistas que são as “antenas” que captam a vibração coletiva das novas idéias da
humanidade
378
e as condensam em obras de arte. Os artistas, portanto, têm como missão
restabelecer o equilíbrio entre arte e técnica, levando a humanidade a um outro patamar.
Nesse novo patamar então, a desintegração das artes do período de transição lugar a
uma coesão inquebrantável. Os artistas podem superar o velho espírito na luta da transição
porque são livres, como “livre é a arte”. Costa pensa que o velho espírito se transfigura no
novo patamar, após a transição. Parece, embora isso não fique muito claro, que algumas
108
antenas não funcionam tão bem quanto outras, já que continuam a fazer arte com o velho
espírito. Em todo caso, o velho espírito transfigurado no novo patamar percebe um novo
sentido nas verdades eternas e adere às novas formas de expressão. Ao final, tudo não
passou de um equívoco e os “senhores acadêmicos” aceitaram a nova arquitetura
379
. Isso
parece ser a visão que Costa teve de um final feliz para o Salão Revolucionário de 1931.
3.1.3.2. A tradição e o nacionalismo no prédio do Ministério
Uma saída para embaraços com a tradição de Costa face à tabula rasa modernista é
privilegiar seus feitos arquitetônicos, minimizando suas posições teóricas. Por exemplo,
afirmar que a “busca pela tradição torna-se superficial [...] diante da exploração radical da
linguagem arquitetônica a partir da técnica nova”
380
. Se a novidade se pela técnica
sempre em evolução, então o Lucio Costa arquiteto não é passadista, “pois um mundo
novo se desencadeou irreversivelmente”
381
. Além disso, ao se aceitar que se pode falar de
1920-1940 com os olhos em 2004, pode-se concordar com Roberto Segre que afirma ser
Costa um precursor “das tendências atuais”, com seu programa que visava “assumir e
respeitar o nosso lastro original luso-afro-nativo”
382
.
A tradição, no entanto não está somente ligada ao passadismo, mas liga-se também
à questão das essências na defesa da arte moderna dos anos 1920-1930, quando no Brasil
se defendia o vínculo da arte moderna “com um conjunto de qualidades essenciais, ou seja,
permanentes, presentes eventualmente desde o período colonial”
383
. Desde ali, pelo menos,
no Brasil a tradição é argumento de modernidade. Nesse pressuposto, qualquer arte ou
arquitetura necessariamente deverá buscar sua genealogia própria, ou ver-se atropelada
pela moderna estética da máquina. Daí parece advir a urgência de Lucio Costa em
encontrar em Le Corbusier uma ligação pelas essências, pelas qualidades atemporais da
verdade geométrica mediterrânea, enquanto por outro lado liga a arquitetura moderna à
ditadura de Vargas pelas origens nacionais. Carlos A. Ferreira Martins
384
sugere que o
“recurso às formas culturais dos países avançados” seria de qualquer modo inevitável, mas
aqui se dá pela via corbusiana favorecida especialmente pelas afinidades de início de
carreira [ocorrida em tempos diversos] em Corbusier e Costa e pela “preocupação de
pensar a arquitetura como instrumento de recuperação – ou de construção – de identidade”.
Nesse cenário, as essências atemporais afloram na arquitetura moderna brasileira, claras
sob a luz do sol, construindo o componente ‘brasileiro’ da arquitetura moderna, e
109
solapando a ameaça de simbolizar os porões da ditadura. Afinal, o prédio do Ministério da
Educação e Saúde não tem porões, é sob todos os ângulos transparente, e procura se elevar
do solo sem peso, alçado-se à condição do imaterial.
Embaraços morais com os porões pressupostos no prédio do Ministério pode-se
tentar atenuar considerando-se as esperanças que a esquerda depositou em Vargas logo no
início da Revolução de 30
385
. Logo no início, como no Salão Revolucionário, mas o fato é
que essa longa e pragmática parceria, concedeu a Lucio Costa o título premiado de
inventor da ‘arquitetura moderna brasileira’ e ao Brasil o Brasil de Vargas - o privilégio
de ostentar “uma arquitetura de primeira linha tão boa ou até melhor que a dos países
centrais”
386
. Se o prédio do Ministério é um sucesso do ponto de vista da exemplar
demonstração formal da obra corbusiana abrasileirada, como quer Colquhoun, na opinião
de parte da crítica internacional da época isso soou como uma impostura. Afinal, quando a
arquitetura moderna é teorizada como produto da base técnica e social da nova era, como
ver essas conexões entre o Brasil e aquele prédio? Como ver naquele prédio de ponta o
produto de uma sociedade técnica de ponta? Pura imagem, pura visualidade. Pura produção
de significados: a ‘forma pura’ travestida em encenação do nacional.
O orgulho nacional ferido pela crítica internacional não se cala até hoje entre os
comentaristas brasileiros de Costa. Parte dessa crítica acusada de miopia
387
vem
exatamente de Max Bill e cai sobre o prédio do Ministério. Não se trata de se querer
desqualificar o famoso prédio, mas de se colocar em nova perspectiva a discussão teórica
sobre o assunto. Primeiramente note-se que Max Bill não é apenas um paladino da precisão
matemática e da tecnologia de uma distante cidade na Suíça onde eventualmente alguns
brasileiros (Mary Vieira, por exemplo) estudaram o design que Bill aprendeu na Bauhaus.
Bill é exatamente o sujeito que venceu a Bienal Internacional de São Paulo com uma
peça de aço inoxidável, tecnologia de ponta modelada por uma mão de obra altamente
qualificada a partir de uma formulação avançada de geometria topológica, a fita de
Moebius. Essa obra, hoje no acervo do MAC-USP (fig. 50) mostrou a uma nova geração
de brasileiros hostilizada por Di Cavalcanti e Portinari uma alternativa à exaurida arte
nacionalista das figuras do povo brasileiro retratadas por esses pintores e tão caras ao
regime de Vargas. Depois do exemplo de Bill, a arte brasileira, passa ao largo da sobrevida
de Portinari (fig. 51) e das repetitivas mulatas que Di Cavalcanti pintava para a elite
‘branca’ e segue firme numa guinada em direção à abstração gestual e geométrica
internacional. Seu exemplo foi instrumental para o desenvolvimento do design paulista.
110
figura 50 - Max BILL. Unidade Tripartida (1947), Aço inoxidável.
figura 51 - Cândido PORTINARI. Retirantes. 1950 , óleo s/ tela.
111
Otília Beatriz Fiori Arantes em Esquema de Lucio Costa parece sugerir que Lucio
Costa talvez concordasse com a idéia de um movimento moderno brasileiro à parte do
modernismo internacional. É o que se pode pensar quando a autora apresenta a idéia de que
Lucio Costa “nunca se reconheceu no Movimento Modernista”
388
, adotando uma linha que
se esforça em defender uma “originalidade da contribuição brasileira”. Tal originalidade é
a promoção da “recuperação e preservação da arquitetura tradicional”. Mas o prêmio de
‘originalidade da contribuição nacional’ para a arquitetura moderna talvez caiba à Rússia,
com a recuperação que o Neoprimitivismo Russo deu às artes eslavas tradicionais na
década de 1900
389
, estimulados pela redescoberta empreendida pelo círculo de Mamontov
nos anos 1860-1890. No entanto, o argumento de Arantes com relação ao papel
demonstrativo do prédio do Ministério é muito estimulante. Segundo a autora, o prédio é
a contraprova espetacular da falência mundial da ideologia arquitetônica [diretamente
vinculada ao progresso técnico], transfigurada numa ideologia de segundo grau: a
consagração das virtudes nacionais
390
. Arantes quer transformar “o descompasso num
grande acerto, pois [acredita ela] foi a distorção da cópia que revelou a verdade profunda
do original”. Ela procura reverter a crítica de Bill entre outros, num triunfo do perfeito
entendimento dos arquitetos modernos brasileiros com relação ao movimento moderno, a
inigualável demonstração de que a arquitetura moderna é abstrata, “um simples jogo
abstrato de formas”, fato que a arquitetura moderna estaria escondendo
391
. Escondendo,
se for no Brasil. Seguindo sua interpretação, o prédio do Ministério parece poder ser
qualificado de uma manifestação proto-pós-moderna. Mas, embora muito atrativa, parece
que essa teoria só poderia fazer sentido se houvesse uma intenção dos arquitetos na
construção desse sentido. Talvez faça mais sentido declarar o prédio do Ministério como
marco inicial da revisão do conceito de internacionalismo da arquitetura moderna ou, por
outra, de marco regulatório de duas questões: a questão da relação entre arquitetura
moderna e linguagem abstrata e a questão da relação entre abstração e sua capacidade de
simbolização. Não parece fazer muito sentido se pensar que havia uma deliberada intenção
da parte de Costa, Niemeyer, de demonstrar a futilidade essencial da arquitetura moderna.
Talvez se possa pensar que ali está uma ‘arquitetura abstrata’, de linguagem abstrata, mas
decorada com arte figurativa e materiais nacionais. A tese de Arantes parece especialmente
desenhada para provar a importância de se tentar definir o universo conceitual que
constitui os meandros da abstração na arquitetura. Não estaria recorrendo em Arantes uma
112
confusão entre uma visão (nem sempre) abstrata da arquitetura e a obviamente abstrata
linguagem da arquitetura moderna?
3.1.3.3. Arte e arquitetura
Razões da nova arquitetura
392
é um texto estilisticamente complicado por uma
quantidade exasperante de virgulas e travessões numa profusão de adendos auto-
explicativos, cujo conteúdo é a defesa de uma arquitetura de estilo límpido e claro, feita de
formas puras. Costa esboça em Razões uma teoria da arte com prescrições para a pintura e
a escultura. A escultura de Costa apresenta uma mistura de características expressionistas e
do Cubismo analítico: deformações, supressões, acréscimos, tratamento de superfície com
uma infinidade de planos mínimos que se resolvem em superfícies maiores
393
. A pintura,
por sua vez parece ser uma mistura de Cubismo Sintético e Cubismo Analítico, pedindo
tanto colorido quanto volume e construção
394
. Tudo isso, sem mencionar o termo
abstração.
Para Costa, a pintura se sustenta no desenho. É o desenho o que lhe confere a
procura tenaz e persistente de uma forma com significação definida
395
. Suas prescrições
para as artes plásticas são o contexto para a citação do professor Portinari que defende a
superioridade do desenho desajeitado, mas provido de intenção. A pintura vale-se da
técnica para transmitir suas intenções e se beneficia do estudo das leis da ciência da
composição; das diferenciações de matéria no tratamento de diferentes materiais; da
atenção à atmosfera, mas longe da diluição da forma na procura da luz. A diluição da
forma é imperdoável numa pintura que se apóia na forma definida do desenho. Costa
acredita que diluir a forma foi um suicídio que o Cubismo evitou, certamente pensando
agora no Cubismo Sintético. Na relação entre artista plástico e arquiteto, Costa destaca a
colaboração de pintores e escultores, no sentido de uma soma de obras de arte ao edifício
“para que alcance as formas superiores de expressão num amável convívio das artes
plásticas”
396
.
Costa desenha sua teoria da arquitetura moderna: a essência da arquitetura está em
seu ser dual, constituído de uma parte permanente e outra parte motivada por fatores
técnicos, sociais e climáticos (“físicos”)
397
. A arquitetura está além da técnica, seu ponto de
partida. Ela procura a beleza do edifício não somente nas proporções do todo e em suas
relações com as partes, nos traçados reguladores, mas no jogo de contrastes entre cheios e
113
vazios. A arquitetura moderna viu-se liberada de limitações nesse jogo pelas novas
técnicas
398
. Na evolução da arquitetura do degrau inferior para a arquitetura moderna, a
‘máquina’ é exemplo de uma nova estética livre de saudosismos, criada a partir da técnica
com simplicidade, clareza, elegância e economia
399
. Os novos edifícios de linhas nítidas e
volumes de pura e límpida geometria alcançam um valor plástico próximo ao da arte
pura
400
. Seriedade e impassível altivez descrevem a qualidade mais característica dessa
arquitetura
401
, embora o leigo a veja como industrial e desprovida de ornamentos. Como a
arquitetura tem um papel utilitário e social, está sujeita a exigências de ordem social,
técnica e plástica que não permitem individualismos. No entanto a mudança na arquitetura
está ligada ao gênio: a um arquiteto de gênio, Le Corbusier, foi dado cristalizar em seus
prédios a nova arquitetura de maneira clara e definitiva
402
. A uniformidade visual da
arquitetura moderna, que não distingue palácios de fábricas ou moradias, é força e beleza,
prova de coerência e disciplina
403
e, sobretudo, prova da existência de um verdadeiro
estilo.
Nessa breve narrativa, Lucio Costa, que foi retratado como a eminência parda da
narrativa da arquitetura moderna brasileira, uma narrativa que não discute a questão da
autonomia formal, agora surge no flagrante de um momento quando o pouco que conhecia
das fontes e das razões da arquitetura internacional, das implicações e postulações dos
diferentes Cubismos, não o impede de tomar a dianteira e deitar mandos sobre a
interpretação da estética da máquina, ligando-a mais que depressa às essências comuns e
eternas e completando a equação: se máquina=forma pura e forma pura=tradição, então
máquina=tradição. E a máquina de morar de Corbusier se transforma na ‘máquina de
tradicionalisar’ de Lucio Costa.
3.2. A abstração nas narrativas históricas pioneiras
3.2.1. Hitchcock (1929)
Modern Architecture: Romanticism and Reintegration (New York: Payson &
Clarke, 1929) (fig. 52), é o livro que tornou Hitchcock o primeiro historiador a tentar dar
conta de uma genealogia do movimento moderno em arquitetura. Nessa obra, o termo
‘arquitetura moderna’ designa a arquitetura produzida entre 1750-1800. Gropius,
114
Corbusier, Oud e Mies eram os Novos Pioneiros que traziam uma nova “maneira
(manner)” para arquitetura que Hitchcock descreve como um “estilo pós-eclético”
404
.
figura 52 - Folha de rosto de Modern Architecture: Romanticism and Reintegration.
Nessa obra, o autor afirma a autonomia do desenvolvimento estético na arquitetura,
inclusive face às rápidas mudanças que a engenharia traz de ano para ano: “a estética dos
Novos Pioneiros mostrou uma continuidade de valores separada do prático e do
estrutural”
405
. Cada novo estilo deve ser determinado por seu próprio conjunto de regras
estéticas autônomas
406
. A técnica é apenas uma parte da arquitetura, a estética seu principal
fundamento: “A arquitetura dos Novos Pioneiros repousa mais centradamente numa
estética que numa técnica”
407
. Os princípios rígidos dos Novos Pioneiros demandariam
uma revisão repetida da expressão baseada em cada nova mudança técnica, mas limites
humanos para os assuntos estéticos. As forças da originalidade não podem indefinidamente
prover novos meios de expressão para cada novo meio de construção que aparece
408
.
3.2.1.1. A estética dos Novos Pioneiros
A nova maneira é baseada em princípios de design não herdados da arte do
passado. A preocupação é com o volume e não com a massa. Procura-se a unificação e não
115
a complexidade. Evita-se a riqueza de texturas de superfície, e procura-se monotonia e
pobreza de superfícies, pois a idéia é sublinhar a superfície como o limite geométrico do
volume. O ornamento irá ressurgir no futuro, ligado às necessidades construtivas do
estilo
409
. No futuro também surgirá o arranha-céu moderno, que em 1929 ainda espera pelo
primeiro Novo Pioneiro Americano, aquele capaz de tomar a engenharia como base e criar
diretamente do aranha-céu uma forma de arquitetura
410
.
Para Hitchcock, a pesquisa estética de Walter Gropius era controlada pelas
possibilidades técnicas e relacionada aos meios de organizar uma nova arquitetura em
grande escala
411
. Gropius, na Fábrica Fagus (fig. 53), conseguiu um efeito estético com o
lirismo no grupamento de chaminés totalmente apoiado num estudo livre das proporções
naturais e das relações entre as partes
412
. Hitchcock indica aqui o primeiro sucesso da
‘estética da máquina’ na arquitetura moderna.
figura 53 - Walter Gropius, Fábrica Fagus (1914).
116
Oud em 1921 numa casa de campo fora de Berlin alcança uma síntese mais perfeita
das tendências técnicas depois da fábrica de Gropius de 1914. Casas de rua em Hoeck van
Holland (fig. 54), o melhor monumento da nova arquitetura. Ela define, portanto a nova
maneira: totalmente livre de elementos herdados, onde o uso da cor é delicado e discreto,
“apenas a quantidade apropriada de contraste e variedade”
413
.
figura 54, J. P. OUD. Casas de rua em Hoeck van Holland (1926-1927).
Le Corbusier nas casas 'Citrohan' de 1921 (fig. 55) conseguiu pela primeira vez
atingir completamente sua nova estética baseada em seus novos métodos de construção.
Ênfase na superfície como limite do volume e não na massa. Simplificação positiva
análoga ao do automóvel e aviões streamline. Janela horizontal como motivo principal da
nova arquitetura
414
. Para Hitchcock, Corbusier em sua obra executada atingiu uma
demonstração mais avançada das possibilidades da nova estética que qualquer outro
arquiteto.
117
figura 55 - Le CORBUSIER casas 'Citrohan' (1921).
3.2.1.2. O desenvolvimento da maneira
Em 1922, J. P. Oud e Le Corbusier exibiam um estilo pós-eclético integrado.
Ambos tinham estado em estreita relação com a pintura abstrata radical e a escultura
respectiva. Oud propagava uma arquitetura desvinculada de todo “sentimentalismo
impressionista; apoiado em proporções limpas, cores francas, formas plenamente
orgânicas; despida de tudo supérfluo"
415
.
O desenvolvimento da maquinária de transportes trouxe um tipo de “beleza
puramente técnica (purely technical beauty)”, desvinculada da beleza do passado.
Hitchcock determina os fatores com os quais essa nova beleza foi alcançada: “refinamento
das necessidades estruturais, expressão direta e não-simbólica da função e relação íntima
das formas com os materiais (refinement of structural necessities, direct non-simbolic
expression of function, and intimate relation of formas to materials)”
416
. Porém, mais
importante e definitiva para Hitchcock foi a influência da pintura abstrata que surge a partir
de 1910, sugerindo valores arquiteturais nos volumes primários e nos desenhos de
maquinária e engenharia. As possibilidades de atingir em outra escala e nas três dimensões
reais os efeitos considerados de importância estética na pintura ocorreu a muitos homens
durante a Guerra
417
.
Na Alemanha foi a pintura do Expressionismo que influenciou os croquis
experimentais durante a Guerra. A Glashaus de Bruno Taut (fig. 56), mais experimental,
exprime o desejo de derivar as formas artísticas das possibilidades intrínsecas dos novos
118
métodos de construção
418
. As várias formas do Cubismo foram instrumentais na
determinação do caráter da maneira dos Novos Pioneiros durante sua inserção nos anos da
Guerra e imediatamente após. Gropius sai da Guerra como um Expressionista, mas os
pintores a ele associados eram Expressionistas “dos mais abstratos”
419
. A pintura abstrata
que influenciou a arquitetura era interpretada intelectualmente, “cerebralmente mesmo,
além de exata e específica em sua expressão”.
figura 56 - Bruno TAUT. Glashaus (1914).
A questão da experimentação formal livre surge em Oud. Para Hitchcock, os
desenvolvimentos dos anos da Guerra e a associação com os pintores do De Stijl tenderam
a empurrar Oud perigosamente longe em direção à experimentação estética livre
420
. Em
1919, Oud idealizou os mais significativos exemplares de seu “livre design”. Num projeto
de brica, Oud empenhou seu melhor esforço, determinado a alcançar na arquitetura os
119
efeitos do Neo-Plasticismo. Mas Hitchcock critica o “intrincado jogo de insignificantes
massas horizontais e verticais”, da fábrica: “construções abstratas de um escultor” (fig. 57).
Hitchcock parece pressupor que Oud ameaça o equilíbrio dos princípios albertianos. Para
Hitchcock essa obra de Oud é um “experimento na arquitetura de um Cubismo mal-
digerido”, mas reconhece que esse projeto teve influência considerável na Holanda, na
Alemanha e na Rússia
421
.
figura 57 - J. J. P. OUD. Croquis para fábrica em Purmerend (1919).
No Café de Unie em Roterdam (1925) (fig. 58), a cor viva e as letras proeminentes
se justificam como propaganda, mas o projeto significou um “retorno temporário ao
experimento estético”, uma “indulgência brincalhona em liberdade radical”. Teve suas
vantagens, reconhece Hitchcock, pois aumentou sua pegada na arquitetura e suavizou uma
maneira por demais subordinadas a necessidades práticas. Para o autror, Oud foi por vezes
tão longe quanto outros na experimentação estética, mas foi ele quem particularmente
sentiu a necessidade de uma fusão balanceada de técnica e expressão
422
.
figura 58 - J. J. P. OUD. Café de Unie (1925), Roterdam
120
O caso Oud é especialmente interessante porque demonstra desde o início que
Hitchcock, um autor que olha a arquitetura do ponto de vista da arquitetura como arte, da
pura visualidade e do deleite estético e mais ainda, um defensor da linguagem abstrata
como linguagem da arquitetura moderna alerta para os riscos do que mais tarde se
chamaria de ‘formalismo’ e que aqui se configura como um desequilíbrio entre técnica e
expressão.
3.2.2. Hitchcock; Johnson (1932)
O ano de 1932 viu nascer em Nova Iorque a expressão International Style
423
no
célebre livro de Henry-Russel Hitchcock (1903-1987) e Philip Johnson (1906-2005). O
termo ‘Estilo Internacional’ nascia para designar o modernismo na arquitetura. Sua
definição é dada nesse livro tomando-se como base a obra anterior à Primeira Guerra
Mundial de Walter Gropius (1883-1969) e de outros da Europa Central, esvaziadas, porém,
do idealismo e da preocupação social do Modernismo Europeu
424
. Embora muitas das
afirmações do livro tenham sido corrigidas em apêndice numa edição de 1966
425
, o termo
ganhou uso corrente na historiografia da arquitetura desde então. O livro foi concebido
como complemento à Modern Architects’, realizada no mesmo ano de 1932 pelo Museu
de Arte Moderna de Nova Iorque onde os curadores apresentam para o público americano
os edifícios que exemplificam o Estilo Internacional. Hitchcock e Johnson partilham a
curadoria dessa exposição com Alfred H. Barr, Jr. (1902-1981) e Lewis Mumford (1895-
1990). The International Style é um livro que pode ser caracterizado como uma espécie de
“catálogo de elementos morfológicos e compositivos”
426
, que apresenta 131 páginas de
ilustrações de edifícios.
Em sua edição de 1995
427
, The International Style traz uma nova introdução de
Philip Johnson
428
onde o arquiteto e co-autor dessa obra explica que, embora a viajem de
carro entre 1930 e 1931 pela Europa com o objetivo de pesquisar a ‘nova arquitetura’ tenha
sido decidida e empreendida por ele, Barr e Hitchcock, esse último tinha “o grande olhar’,
era o “supremo historiador” a quem realmente devemos ter escrito o livro, motivo pelo
qual adiante nos referiremos apenas a Hitchcock em nossas considerações.
O livro, segundo Johnson, resultou em “importantes postos de ensino em
universidades norte-americanas para Mies van der Rohe e Walter Gropius” e despertou a
crítica tanto dos “Marxistas e daqueles interessados no lado social da arquitetura” quanto
121
dos “arquitetos mais velhos” que os autores (Barr, Hitchcock e Johnson estavam então na
casa dos vinte anos). Os marxistas, interessados apenas em tecnologia e utilidade,
criticaram a “ênfase no desenho e no estilo” e os mais velhos, a “ênfase nas caixas lisas e
super-simplificadas da arquitetura moderna – essas estruturas simplistas, brancas, sem
caráter que qualquer-um-pode-fazer”. The International Style não é uma narrativa
histórica, é uma obra descritiva, e ilustrativa de um fenômeno nascente que os jovens Barr,
Hitchcock e Johnson tentavam compreender e dar um sentido.
The International Style dedica-se explicitamente à visualidade da arquitetura
moderna: “Deve ficar claro que as qualidades estéticas do Estilo são a preocupação
principal dos autores deste livro”
429
. Nas circunstâncias em que escrevem The
International Style, os funcionalistas parecem ser os únicos oponentes sérios dessa visão
estética da arquitetura que Hitchcock e Barr nos apresentam: “enquanto os funcionalistas
continuam a negar que o elemento estético na arquitetura seja importante [e que aleguem
que o estilo não existe], cresce o número de edifícios produzidos nos quais esses princípios
[estéticos] são inteligente e efetivamente seguidos, sem prejuízo de virtudes funcionais”
430
.
A obra é integralmente perpassada por uma polêmica com os funcionalistas travada em
duas frentes. Por um lado, os funcionalistas norte-americanos são acusados de ver uma boa
aparência, ou um bom desenho não como uma parte integral do projeto, mas apenas como
uma mercadoria a ser entregue ao cliente e somente no caso desse último encomenda-la
explicitamente. Para seus compatriotas, diz ele com reprovação, “o desenho é um artigo,
como um ornamento. Se o cliente insiste, eles ainda tentam provê-lo em complemento aos
outros artigos mais tangíveis que eles acreditam dever vir apropriadamente primeiro”
431
. A
comparação com o ornamento não é gratuita, pois “o ornamento pode ser adicionado à
obra depois de pronta”, da mesma forma que o funcionalista norte-americano adiciona uma
“fenestração rítmica” qualquer, sem “relação direta com o manejo da função e
estrutura”
432
.
a polêmica com os funcionalistas europeus se em uma outra base porque seus
edifícios “geralmente caem dentro dos limites do estilo internacional, [e assim] eles podem
ser relacionados entre seus representantes”
433
. O que acontece é que, para o autor, os
europeus são principalmente construtores e “podem dar-se ao luxo de serem inconscientes
dos efeitos estéticos que produzem”.
434
Portanto, por todo o livro, quando surge a polêmica
forma x função, esta é dividida num lamento sobre a baixa qualidade do funcionalismo
norte-americano, por um lado e, por outro, numa constatação de que embora o
122
funcionalista europeu refute a preocupação com a beleza das formas, ela está sempre
presente em suas obras.
Ressurge a questão do equilíbrio dos princípios albertianos na idéia de que “função
e estrutura não podem pagar o preço da estética do edifício”, isto é, atender às funções e à
solidez da construção é imperativo que não pode ser negligenciado por conta de uma
procura estética, e é por isso que “edifícios sólidos com um desenho pobre são melhores
que aqueles cujo brilhantismo aparente do desenho se paga com um inadequado
atendimento a função e com a distorção da arquitetura”
435
. A questão principal está na
crença de que solidez de construção e perfeito atendimento à função não são condições
suficientes para elevar o edifício à categoria de ‘arquitetura’
436
. É preciso que o fator
estético surja integrando função e estrutura e assim transformando ‘edificação’ em
‘arquitetura’. É por isso que é importante em The International Style demonstrar o caráter
estético ainda que ‘inconsciente’ dos funcionalistas europeus para poder classificar suas
edificações sob a rubrica ‘arquitetura’, tanto quanto é importante reprovar os funcionalistas
norte-americanos, demonstrando que suas edificações não alcançam o status arquitetônico
por conta da incompreensão da importância das questões estéticas.
figura 59 - Pavilhão de Barcelona de Mies (1929) em página de The International Style.
123
O Estilo Internacional admite obras de arte de escultura e pintura como decoração
dos edifícios, desde que “sem degenerar em mero ornamento aplicado”, o que contrairia o
princípio de ausência de decoração aplicada. Mas é importante que a pintura mural “não
quebre a superfície da parede desnecessariamente e é da maior importância que a pintura
mural seja “intrinsecamente excelente; de outro modo é melhor uma parede simples”
437
.
Outra advertência do autor vem por conta do uso de cores diferentes em paredes diferentes,
o que deve ser evitado, pois sua aplicação “enfatiza fortemente o efeito da superfície, mas
quebra a unidade do volume”
438
.
No Apêndice da edição de 1995, Hitchcock aponta as distorções que suas regras
para o ‘estilo’ causaram, entre as quais a dificuldade que os críticos notaram com relação
ao Pavilhão de Barcelona de Mies (fig. 59). Trata-se de um prédio de volumetria aberta,
essencialmente ‘moderno’, mas dificilmente compatível com as prescrições de um ‘estilo’
que se define no livro pela volumetria fechada por meio de superfícies planas. Mas,
curiosamente, o autor joga para o leitor a responsabilidade pelo erro em se “assumir que o
que os autores ofereceram como um diagnóstico e um prognóstico tivesse a intenção de ser
usado como um manual de regras acadêmico”
439
. Bem, nada parece mais difícil para um
jovem arquiteto ansioso por acertar seu passo com a ‘modernidade’ de Hitchcock do que
compreender seus “diagnóstico e prognóstico” - a determinação dos ‘sintomas’ da
arquitetura moderna seguida de uma conjectura sobre seu desenvolvimento -
diferentemente de um conjunto de regras a aplicar.
The International Style dedica à questão do estilo seu capítulo introdutório.
Hitchcock polemiza com o século XIX, acusando-o pelo “empobrecimento da própria idéia
de estilo”, resultado de seu fracasso “em criar um estilo de arquitetura por ter sido incapaz
de atingir uma disciplina geral de estrutura e projeto nos termos do dia”
440
. Explicitamente,
Hitchcock afirma a universalidade do Estilo: “Hoje um novo estilo veio a existir (...). Esse
estilo contemporâneo, que existe por todo o mundo, é unitário e inclusivo, não
fragmentário e não contraditório (...)”
441
. Ademais, esse estilo, se estava ainda indefinido
na obra de 1929, agora pode ser comparado em importância ao Gótico e o Clássico: “No
manejo dos problemas de estrutura está relacionada ao Gótico, no manejo dos problemas
de desenho está mais afinada ao Clássico. Na preeminência dada ao manejo da função se
distingue de ambos”.
442
124
Gropius desautoriza inteiramente o conceito de ‘Estilo Internacional’ em seus
escritos, termo que ele classifica como uma “infeliz expressão” por excluir a evolução
contínua da arquitetura e sua ligação com as “condições regionais”
443
. É interessante esse
ponto. Parece que Gropius toca num ponto que antecipa o que Kenneth Frampton viria a
chamar de ‘regionalismo crítico’. Mas é muito possível, no entanto, que essa argumentação
de Gropius não seja muito coerente com sua própria prática de professor de Harvard e
tenha surgido apenas como uma boutade destinada a combater o caráter ‘internacional’,
certamente notado por outros críticos. Nossa suspeita de inconsistência deve-se a uma
discussão que Hitchcock levanta na revista Architectural Record de agosto de 1951,
republicada na edição de 1995 de The International Style, onde à página 243 se que
Gropius se gaba do fato de que é difícil distinguir o trabalho de um de seus alunos dos
outros. Hitchcock quer dizer com isso que Gropius, na verdade, ensina um “estilo comum”,
ainda que não concorde com a existência de estilos em arquitetura moderna. Trata-se de
uma questão polêmica, mas nós podemos pensar que Gropius ensina em Harvard um estilo
a ser adotado pelo aluno independentemente de sua origem cultural e do lugar aonde vai se
inserir o projeto. Por outras palavras, que ensina a partir de uma visão abstrata da
arquitetura.
Se a idéia de estilo é tema controverso entre os arquitetos praticantes, Johnson
pondera que também se alinharia, caso fosse um arquiteto praticante quando da
publicação do livro, embora argumente:
Mas olhe para trás. Considere o Weissenhofsiedlung que ainda é reconhecido como
um evento maior na história dos anos vinte. Mies não impôs um ‘estilo’ aos
participantes? Tudo em estuque branco, tetos planos, janelas largas, horizontais. A
palavra ‘estilo’ não foi usada, mas muito interessantemente, as restrições foram
impostas não por um acadêmico, mas por Mies, um arquiteto praticante.
444
3.2.3. Sartoris (1932)
Sartoris foi o primeiro autor da historiografia estrangeira da arquitetura moderna a
publicar os primeiros exemplos de arquitetura moderna brasileira de autoria de
Warchavchik em Gli elementi dell'architettura funzionale Sintesi panoramici
dell'architettura moderna. Alberto Sartoris (1901 1998) foi o membro mais jovem do
CIAM (Congresso Internacional de Arquitetura Moderna), filiado em 1928. Pintor e
arquiteto conhecido por transformar seus projetos arquitetônicos em caprichosas
125
serigrafias, Sartoris a cor como a ‘quarta dimensão’ da arquitetura, a qual “designa e
qualifica os espaços. Ela exalta o ritmo ardente das formas puras. Ela é um órgão da
arquitetura, não um revestimento ornamental”
445
. Em Gli elementi o valor da obra
arquitetônica reside na “justa relação das cores, dos materiais, da massa plástica e das
funções práticas”. A arquitetura é uma arte antes de tudo e “a função faz do edificio, além
de uma obra de arte, também uma obra utilitária”. O funcionalismo europeu “cria e analisa
meios construtivos com rigor científico, tendo em vista os valores prático e estético”. O
funcionalismo está estritamente ligado à linguagem abstrata da geometria. O
funcionalismo, com suas “fórmulas rigorosamente geométricas exalta a arquitetura e a
conduz fatalmente à beleza pura, à formula perfeita, ao volume integral e benéfico”. Mas
Sartoris, ao mesmo tempo se preocupa em afastar o fantasma (ainda não nomeado) do
formalismo quando condena a pesquisa de formas novas a qualquer custo, “quando as
formas não nascem naturalmente da essência da própria obra”. Esse formalismo deve ser
condenado tal como “o emprego da forma somente ornamental, distante da finalidade
espiritual e técnica da arquitetura pura”.
3.2.4. Kaufmann (1933)
O livro de Emil Kaufmann, Von Ledoux bis Le Corbusier, Ursprung und
Entwicklung der autonomen Architektur foi publicado na Alemanha em 1933, no mesmo
ano em que recrudescia o terror nazista e a Bauhaus era fechada (e, portanto, três anos após
a publicação de Pevsner que examinamos). Em Prólogo para a primeira edição francesa
(1981) - traduzido e republicado na edição castelhana que citaremos (1985) -, Hubert
Damisch chama a atenção para o fato de que a tese central do livro, a de Le Corbusier
como o herdeiro legítimo do Francês Claude-Nicolas Ledoux (1736-1806) e do Alemão
Karl Friedrich Schinkel (1781-1841) escandalizaria, entre outros, os defensores do
neoclassicismo de Albert Speer, o arquiteto do Führer. De fato, o livro desde seu título
propõe-se a demonstrar não as ‘origens’ do movimento moderno, mas sim da ‘arquitetura
autônoma’.
Com seu título, Kaufmann frisa a idéia de uma arquitetura não submetida a outras
leis que as da própria arquitetura. Uma arquitetura que não se prestaria, portanto, aos
ditames de uma espetaculosidade que se pretenderia demonstrativa da exuberância do
poder do Estado, como a de Speer. Mas a polêmica de Kaufmann é com o Barroco. Seu
126
livro procura situar a origem da arquitetura autônoma na Revolução Francesa,
primeiramente esboçada na obra de Ledoux - o protagonista de seu enredo. A arquitetura
de Ledoux partilha o mesmo ideal de liberdade expresso em Rousseau. Sendo assim, A
pintura e a escultura aparecem em Kaufmann como um desenvolvimento correlato ao da
arquitetura autônoma
446
, o autor defendendo a autonomia das condições de produção das
duas disciplinas. O interesse de Kaufmann é dar como advindos da própria arquitetura
efeitos que os outros autores dão como produto da influência da pintura.
Enquanto se declaram “os direitos do indivíduo a partir dos direitos humanos”,
Kant estabelece a “moralidade autônoma” e Ledoux prepara “o cimento da arquitetura
autônoma”. Enquanto Kant estabelece a “moralidade autônoma”, Ledoux prepara “o
cimento da arquitetura autônoma”. Ao mesmo tempo, o sistema social está sendo
repensado por Rousseau, através de quem a nova época “busca e encontra a legitimação de
seus ideais na natureza”
447
. Enquanto Rousseau procura deduzir dela seu sistema social,
Ledoux , procura na natureza aos fundamentos de seu “sistema artístico”. O que torna o
Ledoux de Kaufmann maior que os demais arquitetos da Revolução é “seu maior desejo de
ter em conta a vontade da época servindo-se de meios estritamente arquitetônicos.”
448
Assim, Kaufmann estabelece o caráter revolucionário da obra de Ledoux que “como Kant,
também (...) estava absolutamente convencido da força subversiva das novas idéias”
449
.
Mas a arquitetura de Ledoux não é pura revolução, pois tendo vivido entre duas épocas -
pré e pós-revolução - sua obra, “o primeiro pronunciamento dos novos objetivos artísticos,
testemunho palpável do devir de um novo mundo”
450
, sofre dos males da transição. Ledoux
“em sua incoerente obra global”
451
está entre dois tempos: o anterior e o posterior à
Revolução. Kaufmann quer frisar a importância não do esforço de Ledoux no caminho
do novo, mas principalmente a importância da direção de um caminho que vai desembocar
em Le Corbusier. O autor é claro: “a pergunta decisiva e clarificadora não é ‘de onde?’,
mas ‘para onde?’. O sentido de uma obra pode apreender-se quando se contempla o
final do caminho que empreendeu”
452
.
Por todo o livro, Kaufmann chama Ledoux de ‘artista’, vez por outra de ‘arquiteto’.
Isso não apenas demonstra a importância que o autor deposita no caráter artístico da obra
do arquiteto, mas o claro sinal de que a arquitetura é uma atividade artística e de que este é
seu principal ponto de interesse. O conceito de autonomia da arquitetura de Kaufmann não
exclui a idéia de que arquitetura é arte. A certo momento, escusando-se de comentar
questões relativas ao funcionamento de um edifício, Kaufmann afirma que “se trata aqui
127
somente de desvelar o propósito artístico”
453
da obra de Ledoux. E a questão artística
central na análise de Kaufmann é “a separação das partes” do edifício, que embora possa
soar insignificante ao desavisado, trata-se de “um dos processos mais transcendentais da
história da arquitetura: a desintegração da unidade barroca [grifo do autor]”
454
. E aqui
começa a se delinear a polêmica do texto de Kaufmann: arquitetura autônoma x
heteronomia barroca. Por outras palavras, a arquitetura regida por leis próprias contra a
arquitetura regida por leis que lhe são estranhas, leis advindas de outras esferas.
Kaufmann caracteriza seu conceito de unidade barroca nos seguintes termos: “uma
parte predomina sobre as demais e, não obstante, todas as partes constituem o todo”
455
.
Trata-se de um modo de ver a unidade do edifício tal como tradicionalmente se concebe a
unidade de um organismo, onde um centro vital e partes a ele subordinadas. Por isso,
Kaufmann emprega a metáfora “organismos barrocos” ao se referir aos edifícios do
período. Assim, “os elementos dos organismos barrocos, perdem seu sentido a serem
subtraídos de sua relação com o todo. (...) Numa unidade barroca, a supressão de uma parte
suporia a destruição da totalidade”.
456
Isto é, a destruição da unidade.
Protagonista da luta pela autonomia da disciplina arquitetônica, Ledoux enfrenta
um antagonista na estrutura polêmica que Kaufmann desenvolve: seu professor Blondel, o
qual “não se submete apenas a leis artísticas de outro tempo, mas também a códigos de
esferas extra-artísticas”
457
. Isto é, Blondel guia-se tanto pela “a ineficácia das leis
artísticas [grifo do autor] válidas até então”
458
, quanto pela idéia de que o “arquiteto deve
sujeitar-se às proporções do corpo humano [fig. 60], dar formas às colunas derivando-as
das árvores, e desenhar o ornamento inspirando-se em flores e folhas”
459
.
figura 60 - BLONDEL. Comparação entre os perfis arquitetônicos e humanos
128
Embora tenhamos lido em Hitchcock que a arquitetura sempre foi uma idéia
abstrata, Kaufmann nos sugere aqui que a figuração foi uma característica da “época pré-
revolucionária [que] compreendia melhor um suporte se este se apresentava sob a
aparência de Atlante, Cariátide ou Hermes, [e] os pés de uma mesa [quando] se
apresentavam como patas de animal ou cascos de cavalo”
460
. Mas Kaufmann vê essa
figuração como uma intrusão no domínio da arquitetura e, por oposição a esse espírito
figurativo barroco, aponta dentre “as mais memoráveis tentativas daqueles dias” o que ele
chama de “os experimentos com a forma mesma [grifo do autor]. A predileção pelas
formas mais simples é característica do espírito severo da época.”
461
Em Ledoux surgem ‘fantasiosos’ produtos de uma pesquisa séria em direção às
“formas autônomas” empreendida pela “arquitetura visionária da Revolução”
462
. Em
alguns projetos de Ledoux, encontram-se “rígidos cubos”, além de uma cabana para um
lenhador em forma de pirâmide, uma casa de campo cilíndrica uma casa esférica para
guardas rurais”
463
(fig. 61). O caráter fantasioso desses projetos é encarado como uma
pesquisa de formas puras equivalente às da arquitetura moderna: “Nossa época,
semelhantemente à de Ledoux, se ocupa de experimentos similares que, a pesar de que
possam ser inviáveis no arquitetônico, são, no entanto, sumamente significativos pela
infatigável ambição de novas formas”
464
.
figura 61 - Página 31 de Von Ledoux ... de Emil Kaufmann (1933).
129
O que Kaufmann quer dizer com “experimentos com a forma mesma” não podemos
chamar exatamente de ‘manipulação formal abstrata’, pois o termo de Kaufmann não deve
ser confundido com uma idéia simplesmente de procura autônoma da forma. O autor
aponta o erro de se pensar de Ledoux que seus interesses tinham mais a ver com as formas.
Para ele, as formas autônomas eram uma questão de princípios: enquanto outros, como
Blondel, procuravam modelos no passado para tomar como norma, Ledoux procurava
descubrir as “bases primárias do próprio construir às quais queria regressar para
recomeçar, de certo modo de novo, desde o princípio”
465
. A autonomia de formas [grifo
do autor] que estava se delineando então, está estreitamente relacionada com a exigência
de uso apropriado de materiais”
466
. Em Ledoux inicia-se um reconhecimento de que os
materiais possuem suas próprias leis e “reconhecidas as leis próprias dos materiais [grifo
do autor] cessam as transformações da matéria inanimada em imagens orgânicas, acaba o
pan-animismo barroco.”
467
Kaufmann parece estar sugerindo aqui que sua idéia de
abstração na arquitetura moderna está ligada à oposição ao figurativismo ilusionista na
arquitetura barroca.
Por outro lado, o autor aponta o surgimento nos projetos de Ledoux de colunas de
seção quadrangular: “aparece o novo conceito de suporte que tem a forma de uma simples
estaca, muito antes de se dispor dos materiais atuais” e essa constatação o leva a concluir
que não é “o material o fator decisivo, mas uma sensibilidade autônoma que quer mostrar a
matéria tal como é, que pretende uma forma ‘objetiva’ (‘sachliche’ Form) [em alemão no
parêntese da edição castelhana].” De uma tacada, Kaufmann sugere estarem em Ledoux
as origens tanto da preocupação com o que mais tarde se chamaria de ‘verdade dos
materiais’, quanto da sensibilidade sachlich que se desenvolve na Alemanha, essa ‘palavra
chave do movimento moderno’ como Pevsner apontará. E ainda apóia-se no mito do artista
‘antenado’, aquele capaz de expressar agora o mundo futuro.
A frase chave de Ledoux, nesse sentido, está em seu livro L’Architecture, que para
Kaufmann “constitui, a uma só vez, o legado da era de Rousseau e o primeiro texto
programático da arquitetura de nosso tempo”
468
: Remontez au príncipe ... consultez la
nature; partout l’homme est isolé’ [em francês na edição castelhana]. Essa frase é a defesa
do novo princípio de “separação das partes”, que vem a substituir “o princípio feudal da
sociedade pré-revolucionária, que com tanta clareza se reflete na unidade barroca”.
469
Da
mesma maneira que na sociedade feudal todos eram dependentes do senhor, formando
assim uma coesão inquebrantável, na arquitetura barroca o ‘princípio de unidade’
130
estabelecia a coesão do todo pela predominância de uma parte sobre as demais. Ledoux, tal
como Rousseau, procura um sistema ‘natural’, que venha a substituir a força coerciva do
antigo sistema social. Se esse tipo de raciocínio parece um tanto mecânico, Kaufmann
tenta amenizar afirmando que não pretende dizer que “as formas artísticas dependam de
algum modo do sistema social ou da estrutura do Estado, mas unicamente que o mesmo
conceito fundamental, a mesma situação geral do espírito, provoca efeitos idênticos nos
fenômenos mais díspares.”
470
.
Se “o propósito geral da época consistia em estabelecer nítidas separações”
471
,
então a ‘separação das partes’, como afirmamos, toma uma posição central na nova
estética. Quebra-se, com isso, a obrigação de que os arquitetos obedeçam a “uma lei de
nível superior (...): a doutrina da beleza que se remonta a Leon Battista Alberti” que
prescrevia não regularidade, simetria, e proporção, “mas, sobretudo e acima da imagem
que compõe cada uma das partes, a concordância e coerência entre essas para harmonizar o
todo”.
472
Mas que fiquem claros dois aspectos. O primeiro, é que em Ledoux não se
consumou integralmente a autonomia da disciplina de arquitetura: “A história da
arquitetura do século XIX é a luta do crescente princípio de autonomia frente à declinante
heteronomia”
473
. Trata-se de um processo que se completará em Le Corbusier após cem
anos de vacilações.
“A obra de Blondel é absolutamente heterônima”, enquanto que em Ledoux,
Durand e Dubut “afloram tanto o sistema heterônimo quanto o autônomo”
474
. Em Durand,
Kaufmann encontra o “extrato revolucionário”
475
que despreza o adorno, estimula as
“soluções elementares em planta”; que emprega a “divisão regular do retângulo, as
combinações de um sistema de coordenadas perpendiculares”.
476
Desta forma, “[p]ouco
depois de 1800 se chegou a um ponto em que os ideais que aparecem em Ledoux e Boullée
(...) eram assimilados oficialmente”.
477
Mas ainda assim, foi difícil a superação da norma
de beleza albertiana: “A negação à submissão a qualquer código estético constitui a pauta
mais difícil da luta pelo princípio de autonomia”.
478
Nesse sentido, Kaufmann cita o
arrependimento de Schinkel (que absorveu as idéias francesas pelos ensinamentos de
Friedrich Gilly e Heinrich Gentz) que diz haver caído “no erro da abstração pura e radical”
ao desenvolver edifícios a partir das exigências funcionais e construtivas, quando o
essencial para o arquiteto arrependido seriam as “componentes histórica e poética”.
479
Com
toda essa resistência ilustre, apenas no século XX “se conseguiu resgatar a arquitetura da
esfera de uma regra estética essencialmente estranha a ela”.
480
131
Exatamente na mesma direção apontavam os fenômenos paralelos que tinham
lugar na pintura e na escultura. A tendência para a forma pura, ‘ideal’, por linhas de
contorno rigorosamente marcadas, o abandono de todo experimento ilusionista, se
correspondem com o desejo arquitetônico de veracidade, com a busca da forma pura
original, com o desejo de isolamento das partes. A renúncia aos efeitos pictóricos tem seu
recíproco arquitetônico na negativa a todo tipo de arte da perspectiva. (...) De modo similar
ao retorno arquitetônico às formas primárias da geometria elementar, a representação
gráfica abandona os procedimentos altamente evoluídos e regressa aos métodos simples
lineares.
481
Ao concluir sua narrativa, o autor admite ter extraído de sua história uma teoria: “O
presente ensaio mostrou a obra de Ledoux em seus traços mais importantes e deduziu da
estrutura de suas realizações e de seus projetos o conceito de autonomia arquitetônica.”
482
Nesse sentido, sua verdadeira intenção ao escrever sua narrativa histórica é estabelecer
uma teoria da arquitetura de seu próprio tempo, coisa que na qualidade de historiador ele
não poderia fazer. E mesmo se pudesse, estaria disso dispensado, dada sua crença de que o
que é a arquitetura contemporânea é evidente por si só. São suas palavras:
Levar a cabo uma interpretação da essência da arquitetura atual não pode ser
objeto de um trabalho de investigação histórica. Uma demonstração
circunstanciada do domínio do princípio de autonomia no século XX parece,
ademais, tão supérflua quanto necessária foi a comprovação de sua existência no
século XIX. Os testemunhos do modo de pensar da era Le Corbusier aparecem
com tão consumada nitidez ante nossos olhos, com uma claridade tão meridiana,
que tornam vãs as análises minuciosas a respeito.
483
3.2.5. Pevsner (1936)
O livro de Nikolaus Pevsner ‘Pioneiros do Desenho Moderno de William Morris a
Walter Gropius’ foi publicado na Inglaterra em 1936 sob o título de Pioneers of the
Modern Movement from William Morris to Walter Gropius. Em seu Prefácio, o autor
escreve que, fora engano seu, este seria o primeiro livro sobre o tema. Hitchcock, na
verdade publicou Modern Architecture: Romanticism and Integration em 1929, a primeira
genealogia do movimento moderno. O livro de Pevsner sofreu uma primeira revisão em
1948 para a qual colaboraram Barr, Hitchcock e Johnson, sendo republicado então pelo
Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. Ainda assim, por algum motivo que
desconhecemos, ficou a observação de Pevsner quanto a seu próprio pioneirismo
132
historiográfico. Em 1960 o livro sofre uma revisão radical, adquirindo então seu título
atual, Pioneiros do Desenho Moderno... E não Pioneiros do Movimento Moderno.
No Prefácio de 1960, Pevsner
484
reconhece a importância da pesquisa desenvolvida
desde a revisão de 1948, especialmente a dissertação de Reyner Banham e os artigos
publicados por Bruno Zevi em sua revista L’Architettura. Embora suas convicções não se
abalassem com as novas pesquisas, Pevsner acabou por reconhecer a importância de Gaudí
e Sant’Ellia, “aleijões e suas obras extravagâncias bombásticas” num ambiente onde razão
e funcionalismo ditavam o tom. Isso teria mudado após a Segunda Guerra quando Pevsner
viu-se novamente rodeado das “fantasias e monstros” do que ele chama de “Neo-Art-
Nouveau”. A “correção histórica” o obrigou a incluir em Pioneiros... A linhagem dos
novos monstrengos. Em 1968 Pevsner corrige “alguns erros” em nova edição e em 1974
em outra edição adiciona nova bibliografia e alguns comentários finais.
A narrativa de Pevsner inicia-se com a separação entre arte e artesanato na
Renascença quando “Leonardo da Vinci queria o artista como um cientista e um
humanista, nunca como um artesão”
485
. No século XVIII, tal atitude é incorporada à
filosofia da arte de Schiller e levada adiante seguidamente por Schelling, Coleridge,
Shelley e Keats. Tal “adulação” do artista enquanto o “sumo sacerdote de uma sociedade
secularizada” levou ao desprezo pela “utilidade e o público”, tomando a forma da “arte
pela arte”. Conseqüentemente, o público passou a “ridicularizar” os artistas, “louvados
apenas por um pequeno grupo de críticos e connoisseurs
486
.
Em 1861 a situação muda com um evento que “marca o início de uma nova era na
arte Ocidental”
487
. William Morris, artista “treinado como arquiteto e como pintor” abre
com seus sócios a firma Morris, Marshall & Faulfner. Um “seguidor fiel” de John Ruskin
(1819-1900), Morris levou à sua firma a filosofia do Mestre. “A verdade no fazer é para
Ruskin [- nos diz Pevsner -] o fazer à mão, e o fazer à mão é o fazer com alegria”
488
. Daí a
superioridade da Idade Média artesanal sobre a Renascença intelectualista. Pevsner aponta
uma contradição
489
: enquanto Morris queria uma arte popular, os preços dos produtos de
sua firma não eram nada ‘populares’. Sua atitude anti-máquina levou-o a um beco sem
saída. Um de seus seguidores, C.R. Ashbee (1863-1942) utilizou e propagandeou a
máquina como base da civilização moderna
490
, criando obras, no entanto medievalistas.
Por isso, muito embora Ashbee tenha adotado a máquina e, portanto, “uma das premissas
básicas do Movimento Moderno”
491
, sua arte medievalista o impede de ser visto como um
133
verdadeiro pioneiro, um daqueles que “desde o início pretenderam uma arte da
máquina”
492
. Assim está definida a estética moderna como a estética da máquina.
No continente europeu e nos Estados Unidos, os Austríacos Otto Wagner (1841-
1918) e Adolf Loos, os Norte-americanos Louis Sullivan (1856-1924) e Frank Lloyd
Wright (1869-1959) e o Belga Henri van de Velde (1863-1957). Todos com maior ou
menor ênfase se pronunciaram pelas máquinas, as superfícies sem adorno e a admiração
pela engenharia. Mas Wright defendia a máquina opondo-a às obras de Arte da história
493
.
O artista de Wright é aquele que falsifica a estrutura dos objetos num “incansável esforço
por fazer as coisas parecerem o que não são nem nunca poderão ser”
494
. Portanto, em 1901,
conclui Pevsner, “a posição de Wright era quase idêntica aos pensadores mais avançados
no futuro da arte e da arquitetura hoje.”
O próximo capítulo o autor dedica ao trabalho de simplificação das formas efetuado
por Morris e o movimento Arts and Crafts, sob inspiração dos pintores Pré-Rafaelitas.
Antes, porém ele termina seu resumo da genealogia do movimento moderno, apontando
Herman Muthesius (1861-1927) é a ligação entre o pensamento Inglês e a Alemanha, o
“líder reconhecido de uma nova tendência pela Sachlichkeit
495
. Segundo Pevsner, o termo
“intraduzível” exprime a “utilidade pura e perfeita” que Muthesius via no movimento
Inglês. Trata-se de uma palavra-chave do Movimento Moderno desde quando esse
arquiteto procurava um Maschinenstil, um estilo da máquina. Tudo se catalisa nas
discussões da Deutscher Werkbund onde em 1914 Muthesius trava uma discussão com van
de Velde. O primeiro defendia a estandardização da arquitetura, enquanto o segundo a
criação espontânea do artista, um individualista apaixonado, a seu ver
496
.
Observando o caráter “fantasioso” das visões futuristas vistas contra o contexto das
discussões da Werkbund, Pevsner encaixa em seu relato a presença de Sant’Ellia e o fervor
com que defendeu ainda em 1914 a idéia de que “os cálculos de resistência dos materiais, o
uso do concreto armado e do ferro excluíam a arquitetura no sentido tradicional”
497
. O
ciclo se encerra em 1914 com a Fábrica modelo de Gropius e Meyer na exposição da
Werkbund daquele ano.
Paralelamente à evolução da estética da máquina, O autor descreve a evolução
estética da arte quando aponta a desintegração do estilo no século XIX. Os adjetivos que
reserva para essa situação incluem “grosseria”, “abarrotamento”, “barbarismo”,
“atrocidade”, “incongruência”, “ignorância”, “vulgaridade”, etc.
134
Pevsner explica que num momento de “súbito crescimento na produção,
demandando mais e mais mãos, e assim levando a um crescimento igualmente rápido na
população”, não havia tempo livre para refinar todas aquelas inumeráveis inovações”
498
que se davam a partir da máquina.
Morris, sob inspiração dos pintores Pré-Rafaelitas voltou às “figuras simples,
atitudes simples, cores simples, fundos ornamentais”
499
. Morris trouxe “honestidade
decorativa”, “inspiração”, “novidade fundamental”, “imitação valiosa”, com seu estilo
“claro e sóbrio”, sua “unidade lógica de composição” e o “estudo acurado do crescimento
na natureza”.
500
Especialmente a qualidade moral da “honestidade decorativa” é o que
“conta mais na história do Movimento Moderno”
501
. Mas a pintura dos anos 1890
avançava em linhas semelhantes, porém sem o medievalismo de Morris, “lutando por algo
que nunca dantes existira”
502
e desse modo, a “ruptura foi alcançada pelos pintores antes
que pelos arquitetos”. A “revolução na pintura”
503
foi levada a cabos por Paul Cézanne
(1839-1906), Paul Gauguin (1848-1903), Vicent van Gogh (1853-1890) e Edvard Munch
(1863-1944), com contribuições menores de Georges Seurat (1859-1891), Henri Rousseau
(1844-1910, James Ensor (1860-1949), Jan Toorop (1858-1928) e Ferdinand Hodler
(1853-1918) (fig. 62).
figura 62 - Ferdinand HODLER, pintura reproduzida por PEVSNER em Pioneeers.
135
Esses pintores “encontram um eco na arquitetura e decoração contemporâneas”
504
e, segundo Pevsner, se opõem ao Impressionismo exemplificado na figura de Pierre-
Auguste Renoir (1841-1919) (fig. 63) com sua “abordagem superficial”, suas mulheres de
“corpos rosados”, seu “charme sensual”, sua “composição harmoniosa” e seu “glamour
atmosférico”
505
, qualidades que Pevsner como negativas. Pelo contrário, as mulheres de
Cézanne não têm apelo sensual, não agem pelo próprio prazer, mas “no interesse do
esquema abstrato da composição”
506
. Não, Cézanne não quer a “beleza transitória” cara a
Renoir e aos Impressionistas, mas sim “expressar as qualidades duradouras dos objetos”.
Em suas figuras, “não se permite nenhuma expressão pessoal, Cézanne não se importa com
o individual”
507
e seu caminho o leva “de volta aos fundamentos da geometria”
508
.
figura 63 - Pierre-Auguste RENOIR pintura reproduzida por PEVSNER em Pioneeers.
A polêmica segue contrapondo as qualidades negativas dos Impressionistas às
qualidades positivas da pintura dos anos 1890: “variedade de efeitos charmosos de
superfície” x “superfície plana contínua” e “contornos ritmicamente desenhados”;
“nuances delicadas” x “cores fortes e formas primitivas”; “proximidade com a realidade” x
“expressividade de padrão”; “observação rápida de fatos naturais” x “sua tradução para um
plano de significação abstrata”; “jogo espirituoso e artesania talentosa” x “seriedade,
136
consciência religiosa, paixão fervorosa”; “arte pela arte” x “arte a serviço de algo superior
ao que a própria arte pode ser”
509
.
Aqueles anos levariam tanto à “força”, “disciplina” e “exatidão” consumadas no
“Movimento Moderno do século vinte” quanto à “fraqueza”, “auto-indulgência” e
“relaxamento” configurados “no caminho cego do Art Nouveau”
510
, uma “moda curta, mas
muito significante na decoração”
511
. A importância do Art Nouveau para a arquitetura
moderna está no fato de que seus praticantes eram tão fascinados “por qualquer novidade
(...) que puderam tomar as inovações dos engenheiros a seu favor”
512
. Assim, Pevsner
entende “o estilo do século vinte como uma síntese do Movimento de Morris, do
desenvolvimento do edifício de aço e do Art Nouveau”
513
.
Pevsner introduz o conceito de misdating
514
, o erro de datação a que se é induzido
por obras que parecem pertencer a um período posterior ao efetivamente seu. O conceito
aparece por conta de um desenho de quatro casas particulares para Cidade Industrial de
Tony Garnier (1869-1948). O aspecto despojado de seus volumes simples, tetos planos e
estuque branco, que muito lembra a arquitetura dos anos 1920, leva Pevsner a ressaltar “o
Cubismo das pequenas casas” de 1901-04.
3.2.6. Giedion (1941)
Em Espaço, Tempo e Arquitetura, Giedion faz restrições a uma visão puramente
utilitarista da arquitetura quando escreve que na arquitetura o “direito de expressão deve
ser (...) afirmado, acima do aspecto puramente utilitário da obra
515
”, mas o artístico da
arquitetura, deve “encontrar sua satisfação dentro dos limites destas leis”
516
. E isso não é
tarefa fácil para qualquer mortal, pois “somente uma mão de mestre é capaz de ousar
manifestar uma independência entre expressão e função”
517
. A arquitetura é uma arte para
Giedion quando atende e simultaneamente transcende a funcionalidade do edifício
projetado pela expressão. A arquitetura deve “harmonizar a expressão artística com as
novas potencialidades da época
518
.
A importância da pintura abstrata para a compreensão da arquitetura moderna para
Giedion fica claramente expressa: “Ninguém poderá entender a arquitetura contemporânea,
nem perceber os sentimentos ocultos sob ela, a menos que tenha compreendido o espírito
animador dessa pintura
519
”. Mas para Giedion é à pintura cubista da fase analítica que
Giedion compara à arquitetura moderna. Para Giedion, a pintura cubista encontrou um
137
princípio “intimamente vinculado à vida moderna a simultaneidade”, princípio que foi
expresso visualmente nas pinturas cubistas pela “apresentação de objetos a partir de vários
pontos de vista”
520
. O Cubismo analítico é exatamente esse tipo de Cubismo, o de
L’Arlesiénne, o que irá relacionar à arquitetura de Gropius.
Giedion enfatiza, porém, que o caminho expresso visualmente pelo Cubismo deve-
se a um princípio ligado à vida da época, Mas que o Cubismo não chegou a essa
consciência intelectualmente. Embora tenha sido teorizado imensamente, o Cubismo foi
criado pelo artista, alguém capaz de nos revelar “a condição de nossa própria alma”
521
que é alguém que mantém relações com o mundo “emocionais em vez de práticas ou
cognitivas”
522
. O que o Cubismo descobriu sobre a expressão visual da nova era foi de
encontro ao que a ciência revelava em 1908, quando Hermann Minkowski declarou, na
citação de Giedion: “De agora em diante, o espaço sozinho ou o tempo sozinho estão
fadados a desvanecer como sombras; somente uma espécie de união de ambos preservará
sua existência”
523
. A partir daí, segundo Giedion, “o contexto comum de espaço-tempo foi
explorado pelos cubistas por meio da representação espacial e, pelos futuristas, através da
investigação do movimento”
524
. É nos elementos da abstração revelados pelo Cubismo
onde encontramos os “princípios formais configuradores de uma nova concepção
espacial”
525
. Essa concepção tem uma significação que vai “além do puramente visual”,
pois repousa na percepção de Giedion de que a “interpenetração do espaço total e
elementos do espaço poderia ter avançado numa época em que tanto a ciência quanto a
arte percebessem o espaço como essencialmente multifacetado e dinâmico.”
526
. Assim, na
‘nova concepção de espaço’ encontramos a ligação entre pintura, arquitetura e ciência.
Embora Giedion compare pintura do Cubismo Analítico de Picasso com arquitetura
de Gropius, ele explica que no Cubismo sintético, os “ângulos e as linhas começam a
crescer, a ser ampliados e, de repente, a partir daí desenvolve-se um dos elementos
constituintes da representação tempo-espaço o plano”
527
. Com o novo sentido espaço-
temporal do plano descortinou-se nas artes a “interação de elementos imponderavelmente
suspensos, penetrando ou fundindo-se uns aos outros de modo irracional, como também as
tensões ópticas geradas pelo contraste entre vários efeitos texturais”
528
e, dessa forma, o
“olho humano despertou para o espetáculo da forma, linha e cor isto é, para toda a
gramática da composição – reagindo dentro de uma órbita de planos flutuantes”
529
.
138
figura 64 - Pablo PICASSO, Guitar and Glass (1913), colagem.
figura 65 - George BRAQUE. Copo, café e jornal (1913), colagem.
139
Portanto, somos tomados por uma “concepção fundamental de nossa época: a
relação entre superfícies horizontais e verticais como base para determinado efeito
estético”
530
.
Embora Giedion ligue a ‘nova concepção de espaço’ à gramática da composição da
forma, linha e cor num contexto abstrato, ele se apressa a esclarecer que a nova arquitetura
não se confunde com geometria, mesmo afirmando que a “origem da arquitetura está
vinculada às suas relações com as proporções e as formas geométricas”
531
. E ainda mesmo
que desde sempre a arquitetura lance mão do “uso de um sistema de proporções ou de um
simples módulo [a fim de] criar uma unidade a partir de uma série de partes diferentes”
532
,
a arquitetura não é, como a geometria, uma disciplina que “depende exclusivamente de leis
eternas”, a arquitetura, pelo contrário, “existe para servir ao homem, que é tão mortal como
uma planta”
533
.
O argumento da proximidade entre pintura e arquitetura mediado por uma
concepção científica não convence a um crítico como Meyer Schapiro que dedica-se a
demonstrar ponto a ponto a insustentabilidade desse tipo de analogia. Meyer Shapiro
demonstra que nada disso estava presente no Cubismo
534
, como também não poderia estar
nas formulações do século XIX. Shapiro argumenta que essas propostas teóricas para a
interpretação da pintura do Cubismo Sintético devem-se à dificuldade que se tem para
compreender sua “mistura, sobreposição, transparência e descontinuidade paradoxal”. Uma
multiplicidade de elementos que podem vir de alguma figura ou objeto imbricada a
“elementos que são introduzidos para conectar partes, que são construções arbitrárias em
nome da unidade e não representam nada”, ou seja, uma visão fragmentada de figuras e
elementos abstratos num espaço incompreensível.
Em 1912, ao invés de realizar a profecia de Apollinaire, do advento da “pintura
pura”, o Cubismo de Picasso (fig. 64) e Braque (fig. 65) entra na fase Sintética, quando os
artistas passam a “aplicar à pintura, que é coisa no mundo, objetos do mundo (...) pedaços
de jornais”
535
e outros objetos reais, com a conseqüência de que “as fronteiras entre o
simulado e o real são removidas”
536
. Ao contrário de fragmentos de figuras embaralhadas
com coisas e não-coisas num resultado quase abstrato, o Cubismo Sintético reconstitui
figuras delimitadas, quase sólidas que surgem como “presença escultural”
537
.
Shapiro considera a abstração “o termo comum na analogia da ciência e da arte
modernas”
538
e observa que os fundamentos dessa analogia nunca são analisados em
detalhe. Contra isso recomenda:
140
(...) a especificação das correspondências em detalhe, e não como totalidade; deve-
se empreender uma descrição minuciosa dos objetos análogos, e particularmente
sua história, as datas e condições de seu surgimento, sua duração, suas mudanças e
destinos nas épocas subseqüentes
539
.
A analogia entre arte e ciência é enganosamente sugerida por uma série de termos
comuns, que tem em cada campo significados muito diferentes, tais como:
“ordem, unidade, plano, ponto, linha, eixo, proporção (...) forma, estrutura, espaço,
relação, simultaneidade, luz, superfície, volume, massa, movimento, equilíbrio,
simetria, assimetria (...) esquemas geométricos, (...) sistema projetivo (...)
540
.
Essa observação implicitamente sugere que se questione também analogias que se
estabeleçam entre arte e arquitetura com base nessa comunhão de termos. Assim precisa-se
perguntar, por exemplo, o que é o ‘plano’ na pintura abstrata e o que é o ‘plano’ na
arquitetura? Da mesma forma que ‘o que é transparência na pintura e na arquitetura’?
Giedion explora as questões do plano especialmente na seção dedicada ao Neoplasticismo,
um termo que “significa que o volume tridimensional é reduzido ao novo elemento de
plasticidade, o plano”
541
, a grande descoberta Cubista. Mondrian realiza sua arte com os
“elementos fundamentais da cor pura, dos planos, seu equilíbrio e inter-relações”
542
, mas
coube a Vantongerloo a modelagem do volume (fig. 66), o que parece ser algo um tanto
diferente. Giedion escreve que Vantongerloo “demonstrou, através dos prismas, lâminas e
vazios de sua obra plástica de 1918, que a escultura contemporânea, como a pintura, não
deveria se limitar a um único ponto de vista”.
543
Doesburg, “o espírito propulsor do círculo”
544
apresentou no início dos anos 1920s,
desenhos que eram na verdade tentativas “de apresentar as formas elementares da
arquitetura (linhas, superfície, volume, espaço, tempo)” [fig. 67]. estaria uma
“concepção fundamental de nossa época: a relação entre superfícies horizontais e verticais
como base para determinado efeito estético”
545
. Os desenhos de Doesburg tratam de “inter-
relações entre as superfícies planares, horizontais e verticais, flutuantes e transparentes de
uma casa”
546
. Pintor, homem de letras e arquiteto, diz Giedion, van Doesburg “não pode
ser omitido da história da arquitetura, já que, como Malevitch [sic], tinha o dom de
reconhecer a nova extensão do sentido de espaço e a habilidade para apresenta-la e explica-
la, tal qual nos experimentos de laboratórios”
547
.
141
figura 66 - George VANTONGERLOO, Inter-relações de massas baseadas na elipsóide (1926), gesso.
figura 67 - DOESBURG e EESTEREN (esq.) e DOESBURG (dir.).
142
figura 68 - Kasimir MALIÊVITCH. Suprematismo - Composição não-objetiva (1915).
figura 69 - Kasimir MALIÊVITCH. Arkhitekton, Alpha (1920).
143
Kasimir Maliêvitch é o artista que “eliminava completamente o objeto”
548
de sua
pintura (fig. 68). “Inter-relações puras é o que suas pinturas retratam. Retângulos e faixas
estendidos, sem relevo, flutuam em inter-relações contínuas no espaço, para o qual não
uma verdadeira medida humana”
549
. Nos volumes em gesso do Suprematista, Giedion
também encontra inter-relações, mas igualmente “a suspensão e a penetração [que]
compõem a base dos estudos semiplásticos de Malevitch [sic]”
550
.
Por um lado Giedion aproxima os Arkhitektons (fig. 69) da pura abstração, mas por
outro lado, o aproxima de uma certa arquitetura visionária. Da pura abstração quando
escreve que esses “objetos, portanto, não se destinam a um fim específico, e devem ser
entendidos simplesmente como investigação espacial. São criadas relações de mútua
dependência entre esses prismas, lâminas e superfícies, ao se penetrarem e se
desalojarem”. Da arquitetura visionária, comparando os experimentos de Maliêvitch com
as “chamadas megaestruturas dos anos 60”
551
. É interessante observar que Giedion não
traça nenhum de seus paralelos habituais com o espaço-tempo, em seu pequeno texto sobre
o Suprematismo. E nem fala em ‘planos’ quando se refere aos Arkhitektons, mas em
‘prismas, lâminas e superfícies’.
Le Corbusier é um arquiteto “saturado por sua sensibilidade de pintor”
552
, para
quem a “arquitetura e a pintura constituíam meramente dois instrumentos diferentes por
meio dos quais ele expressava a mesma concepção”
553
. Giedion investe na análise da
relação pintura-arquitetura em Corbusier quando aprecia os projetos de casas cujo “espírito
[...] mostra uma identidade absoluta com o espírito que anima a pintura moderna”
554
(fig.
70).
Em seus projetos de residências, Le Corbusier revela “uma preferência por objetos
leves e transparentes, cujas massas e contornos se fundem um ao outro numa espécie de
mariage des contours que nos leva dos quadros de Le Corbusier à sua arquitetura.”
555
O
autor não explica muito o que significa marriage des contours. Trata-se, porém, de um
recurso da pintura Purista de Le Corbusier que importa na sobreposição de objetos
diferentes com o mesmo contorno, criando assim uma situação de ambigüidade espacial,
isto é, uma situação onde determinada linha pode ser vista como pertencendo
alternativamente a um ou a outro objeto
556
. Giedion afirma que nas suas casas, Le
Corbusier, esse arquiteto que “nunca perdia de vista os elementos e princípios básicos”
557
,
trata as questões técnicas como possibilidades de expressão do espaço-tempo enquanto
fundo conceitual da nova era.
144
figura 70 - JEANNERET (LE CORBUSIER). Natureza morta (1925).
figura 71 - LE CORBUSIER. Villa Savoye (1928-1930)
145
A Villa Savoye, por exemplo, é impossível para Giedion de se compreender “a
partir de uma visão baseada num único ponto de vista; a casa é, literalmente, uma
construção no espaço-tempo”
558
. E mais profundamente: “O corpo da casa foi esvaziado
em todas as direções; por cima e por baixo, por dentro e por fora. Um corte transversal em
qualquer ponto mostra os espaços interno e externo penetrando-se inextricave1mente”
559
(fig. 71). Em projetos com esse tipo de interpenetração espacial, o arquiteto se aproxima do
escultor: “Ele nos mostrou como modelar as superfícies de uma casa - por cima e por
baixo, assim como pelos lados, uma tendência que se aproxima da modelagem escultórica
de um volume por todos os seus lados (...)”
560
. Giedion sugere uma nova aproximação da
arquitetura de Le Corbusier com a pintura cubista a partir do uso de materiais do cotidiano,
como jornais, nas colagens cubistas. Nesse caso, os elementos “freqüentemente
encontrados na indústria (...) pilares (...) a janela alongada (...). A plataforma de embarque
incorporada nos edifícios públicos e as rampas empregadas em algumas de suas casas para
realizar uma interpenetração do espaço”
561
. O arquiteto “tomou esses elementos de sua
vida cotidiana e os transformou, assim como os pintores transformam pedaços de papel em
arte”
562
.
3.2.6.1. Dessau
O famoso prédio de Gropius da Bauhaus em Dessau (1926) [fig. 72] é hoje
considerado
563
a obra-prima paradigmática do que também é conhecido como o Estilo
Moderno Internacional
564
. Tal prédio é igualmente o exemplo clássico dos efeitos da
pintura abstrata sobre a arquitetura moderna desde que Siegfried Giedion (1883–1968) em
seu Espaço, Tempo e Arquitetura (originalmente publicado em 1941), comparou-o à
pintura de Pablo Picasso (1881-1953) L’Aerlesienne, um óleo sobre tela de 1911-1912.
Nessa famosa passagem
565
, Giedion sustenta que a transparência das cortinas de vidro em
Dessau “permite que os espaços internos e externos sejam vistos simultaneamente, en face
e en profile, como L’Arlésienne de Picasso”. Giedion dá o significado filosófico da
“variedade de níveis de referência ou de pontos de referência, e a simultaneidade” que ele
vê naquela pintura cubista: “a concepção de espaço-tempo, em suma”.
Giedion deixa claro que não acredita que a arquitetura moderna derive a sua
linguagem dos feitos técnicos da engenharia, mesmo que acredite que “a origem da
arquitetura atual se encontra nos avanços técnicos pouco valorizados no momento em que
146
surgiram”
566
no século XIX. Para o autor, arquitetura e engenharia esta última o domínio
privilegiado dos avanços técnicos - são campos sujeitos igualmente à concepção do plano
enquanto um dos “elementos constituintes” da representação tempo-espaço.
figura 72 - Walter GROPIUS, Bauhaus, Dessau (1926).
Giedion compara o construtor de pontes com o artista. Ele encontra entre a
linguagem da engenharia de pontes mais avançada e a linguagem abstrata do pintor uma
imensa semelhança. “Não se trata de uma coincidência óptica fortuita, como se poderia
objetar, mas de um paralelismo definitivo de métodos”, sentencia e vai adiante exibindo
esse seu julgamento como proveniente da observação de que “subjacente ao poder especial
de visualização implícito em cada um desses campos, emergiram elementos semelhantes
que fornecem um impulso criativo para ambos”
567
. No engenheiro, como no pintor, os
elementos da ‘gramática da composição’ estão referenciados à nova concepção de espaço-
tempo. Tanto mais no arquiteto. No prédio em Dessau, por exemplo, Gropius, foi “capaz
de extrair dos desenvolvimentos da engenharia os meios necessários para conferir
expressão arquitetônica a essa nova noção de espaço”.
568
147
Giedion dedica à Bauhaus Dessau uma longa explanação conferindo verdadeiro
estatuto artístico e pioneirismo a esse prédio, “o único edifício importante desse período
que representou uma cristalização tão completa da nova concepção de espaço”
569
. Ele
encontra em Dessau a mesma “multiplicidade de pontos de vista”
570
do Cubismo, quando o
espectador com seu “olhar não é capaz de assimilar prontamente esse complexo; é
necessário percorrer todos os seus lados, observá-lo de cima e de baixo”.
571
Ele encontra
também no uso do vidro o aproveitamento de um material por suas qualidades poéticas: “O
vidro foi convocado em virtude de sua qualidade desmaterializante; a geração precedente o
havia utilizado para fins práticos”
572
. A geometria Cubista está clara na volumetria do
prédio: “O conjunto da Bauhaus é configurado por um arranjo de cubos, um justaposto ao
outro - cubos que diferem em tamanho, materiais e localização”
573
.
A par da qualidade desmaterializante conferida aos cubos envidraçados, Gropius os
quer flutuantes, seu propósito não é ancorá-los ao solo, mas fazer com que flutuem ou
pairem sobre o terreno”
574
. O jogo de contrastes entre planos horizontais e verticais pode
ser visto quando a “cortina de vidro contínua [vertical] contrasta com as faixas horizontais
da parede branca, nas partes superior e inferior do edifício”
575
.
Aqui, dois esforços principais da arquitetura moderna se vêem concretizados (...)
como a realização consciente do intento de um artista: a justaposição vertical de
planos horizontais suspensos que satisfaz nosso desejo de espaço relacional, e,
também, a transparência extensiva que permite que os espaços internos e externos
sejam vistos simultaneamente, en face e en profile, como "L'Arlésienne", de
Picasso, 1911-12 (fig. 298). Ou seja, a variedade de níveis de referência ou de
pontos de referência, e a simultaneidade - a concepção de espaço-tempo, em suma.
Nesse edifício Gropius vai muito além daquilo que poderia ser considerado tão-
somente como uma realização em termos técnicos.
576
O parágrafo acima tem sido imensamente discutido desde que Colin Rowe e Robert
Slutzky publicaram Transparency
577
, desautorizando as interpretações de Giedion tanto
quanto diminuindo a autoridade de Picasso e Gropius, restabelecendo Cézanne e Corbusier
em lugar proeminente
578
. No entanto, se seguirmos os conselhos de Schapiro podemos
observar que a analogia entre a pintura de Picasso e o edifício de Gropius não leva em
conta, por exemplo, os materiais que constituem cada uma das obras a que se refere o
termo comum ‘transparência’.
148
3.2.7. Sartoris (1943)
Em 1943 publica sua Introduzione alla architettura moderna. Livro onde
‘arquitetura moderna’, ‘arquitetura racional’ e ‘arquitetura funcional’ são termos
intercambiáveis. Banham nota, aliás, que Le Corbusier em Prefácio para Gli Elementi... de
1932, gerou essa equivalência dos termos, ‘racional’ e ‘funcional’: “Em vez de Racional,
diga Funcional”
579
, aconselhou-o Le Corbusier.
Em Introduzione, em meio a uma extensa defesa da arquitetura racional que “se
conecta rigorosamente aos princípios contemporâneos da beleza e da estética, da lógica e
da praticidade, da higiene e do urbanismo”
580
, Sartoris reproduz (fig. 73) três pinturas
geométricas, duas pinturas abstratas de formas orgânicas e uma escultura geométrica. No
entanto, o autor não tenta estabelecer nenhuma relação entre as pinturas e a arquitetura.
Estão ali no pressuposto da íntima relação entre a pintura e a arquitetura, estampada numa
semelhança morfológica que parece ser suficientemente evidente para não ser comentada.
Brevemente o autor refere-se “às condições presentes dos tempos”, que fizeram nascer
“uma ciência e uma arte nova das leis do espaço interno e do espaço íntimo”
581
. A
arquitetura e a pintura de Sartoris repousam sobre os mesmos fundamentos, ambas são “ato
lógico, fórmula racional, conquista característica do espírito que assume valor próprio”.
figura 73 - Carla PRINA e Mauro BEGGTIANI em página de SARTORIS.
149
3.2.8. Hitchcock;Barr (1948)
Hitchcock publica no Architect’s Yearbook seu primeiro artigo a respeito das
relações entre arte e arquitetura em Painting, Sculpture and Modern Architecture
582
. No
mesmo ano de 1948, publica Painting Toward Architecture, expandindo o artigo anterior
por encomenda de uma corporação norte-americana para a qual montara uma significativa
pinacoteca exclusivamente de arte abstrata. Painting Toward Architecture”, ao mesmo
tempo em que valoriza a pintura abstrata, valoriza a corporação e sua nova pinacoteca.
Hitchcock inicia seu Painting Toward Architecture com a afirmação de que a
arquitetura é essencialmente uma idéia abstrata, ao contrário da pintura que conheceu a
abstração no século XX
583
. Adverte para não nos deixarmos enganar pela idéia de que a
abstração existia na ornamentação ‘abstrata’ do passado, pois ela estava ali apenas para
embelezar algo, ou seja, existia em função de algo além de si mesma, algo que lhe dava
sentido, o que sugere a idéia de que somente a abstração da pintura abstrata é realmente
abstração, poie é autônoma. A arte abstrata, nos termos de Hitchcock é “considerada num
sentido amplo”. E é nesse sentido que esse tipo de arte “fala a linguagem visual mais
compreensível para os arquitetos”. Hitchcock explica que para os arquitetos essa arte
“opera no coração de seu domínio estético”. São os “aspectos abstratos” da pintura
moderna que “pertencem ao mundo do arquiteto enquanto artista visual”
584
.
Hitchcock faz duas ressalvas à arte abstrata dos anos 1920: em primeiro lugar, o
autor recusa a “mística” das propriedades “cosmológicas” da abstração, isto é, a presunção
dos Suprematistas e Neoplasticistas de sua “clara geometria” ser a “realidade final” e, em
segundo lugar, sem polemizar diretamente com Giedion, refuta como “irrelevantes” as
analogias que os artistas desses movimentos faziam da arte com a ciência
585
. Para o autor
somente interessam os aspectos formais da abstração. Hitchcock deixa explícito o que
entende por abstração: “(...) abstração implica em simplificação”. Assim definido o termo,
podemos melhor compreender o que ele diz quanto à pintura que teria particular
importância para a arquitetura moderna poder ser “absolutamente ou relativamente
abstrata”. Seria uma pintura “absolutamente” ou “relativamente” simplificada. O
‘Surrealismo abstrato’, pertence à segunda categoria, pois admite a figura simplificada.
a pintura de Moholy-Nagy (1895-1946) reproduzida em Painting Toward Architectureà
pág. 75 é um exemplo da pintura “absolutamente” abstrata (fig. 74).
150
figura 74 - MOHOLY-NAGY. Farbgitter no. 1 (1922
).
figura 75 - Joan MIRÓ. Personagens na noite (1940).
151
Ao historiar o desenvolvimento da pintura abstrata, Hitchcock situa seu clímax por
volta de 1923 (“some twenty-five years ago”), quando imperava a “crença extrema de que
os valores artísticos residem apenas [grifo do autor] na organização das formas, linhas,
cores, materiais, espaços e massas e na sua força expressiva imediata”
586
. Uma crença que
em 1948 lhe parecia “psicologicamente implausível” por ignorar as “memórias psíquicas
complexas” do espectador. Sua visão de abstração inclui a vertente ‘abstrata no sentido
fraco’ da figuração surrealista de Joan Miró (1893-1983) que consta de seu Painting
Toward Architecture(fig. 75) à página 89, como obra incluída no acervo corporativo que
dá origem ao livro. Tal obra de Miró enquadra-se perfeitamente em sua definição da
pintura que interessa à arquitetura moderna, a qual pode ser “relativamente abstrata”.
Adiante, o autor classificará esse tipo de Surrealismo de Miró e Hans Arp (1886-1966)
como “Surrealismo abstrato”, distinguindo-o do Surrealismo representacional da “pintura
de sonho”. Podemos dar como exemplo dessa última, a pintura de Salvador Dali (1904-
1989), um tipo de pintura que não consta no acervo corporativo e que, para Hitchcock teria
tanto a dizer para os arquitetos “em termos gráficos diretos” quanto a pintura do século
XIX: nada.
A pintura acadêmica e a pintura realista do século XIX não ofereciam à arquitetura,
justifica o autor, as “novas possibilidades estéticas inerentes aos planos, volumes, massas e
linhas que são os elementos básicos da arquitetura”
587
. Para Hitchcock a abstração foi o
fator que ofereceu uma solução estética para os novos problemas técnicos que desafiavam
os arquitetos. Hitchcock sugere que coube à abstração apontar um caminho para a
arquitetura porque foi a abstração o fator que resolveu os problemas que a pintura viu
causados em seu próprio campo pela invenção técnica da fotografia, credenciando-se daí
como ‘potencia catalisadora’ para a arquitetura. O autor traça as origens da pintura abstrata
a partir do desenvolvimento técnico da fotografia - que pôs em crise “tanto as finalidades
especiais quanto os meios legítimos” de se fazer arte. A figuração, isto é, a representação
da realidade visível tal como se apresenta aos nossos olhos, perde sua importância central
para a pintura, deslocada pelo aparecimento da fotografia. Paralelamente, na arquitetura as
invenções técnicas da engenharia mergulham os arquitetos em “dilemas teóricos” no
mesmo momento em que surgem os novos pressupostos da abstração na pintura.
Hitchcock toma uma célebre frase do pintor simbolista francês Maurice Denis
(1870-1943) para expressar tais novos pressupostos. Acontece, porém, que Hitchcock
152
altera significativamente o sentido da frase original de Denis que em português soaria algo
como: “Lembre-se que uma pintura antes de ser um cavalo de batalha, uma mulher nua,
ou alguma anedota é essencialmente uma superfície plana coberta com cores reunidas
numa certa ordem”
588
. Em seu “Painting Toward Architecture”, a citação é reformada para
algo como: “Antes de ser uma representação de qualquer coisa que seja, uma pintura é uma
superfície plana coberta com cores cores arranjadas numa certa ordem e assim arranjadas
para dar prazer ao olho.”
589
Por conta própria Hitchcock acrescenta o prazer estético visual
da apreciação estética autônoma numa frase que pretende simplesmente notar a autonomia
formal da pintura, os elementos formais de uma obra funcionam dentro de “um todo
estético autocontido”
590
e que assim não dependem de sua correspondência com aspectos
do mundo visível para seu valor. Hitchcock anuncia duas interpretações diferentes para o
tão citado parágrafo do pintor simbolista. A primeira interpretação sustentaria que “o valor
artístico de uma pintura ou de um edifício reside não no interesse intrínseco de seus
elementos individuais, mas na relação física entre eles”
591
. A segunda, que “meras linhas
de tensão ou áreas de cor pura, atraindo diretamente o olho, podem ser (...) poderosamente
expressivas”. Após situar o clímax da abstração por volta de 1923, Hitchcock afirma que
foi naquele momento de defesa mais “extremada” de uma adesão estrita à frase de Denis,
que “a pintura abstrata (...) desempenhou um papel principal na cristalização do caráter
visual da arquitetura moderna”
592
.
Na primeira fase do Cubismo, escreve o autor, a “aparência natural não foi
descartada (...), mas distorcida”. Para esse primeiro Cubismo, acredita Hitchcock, melhor
aplicar o termo “distorção do que abstração” (fig. 76). A disciplina do Cubismo a que Barr
se refere não está na fase de ‘distorção’ daquele estilo, e nem mesmo na fase seguinte, o
Cubismo analítico, “mais sugestivo das superfícies (...) da escultura que das plantas e
espaços da arquitetura”. Ela está no que Hitchcock chama de “fase arquitetônica do
Cubismo”
593
que inicia-se, em 1912, com o Cubismo sintético e o trabalho “extremamente
teórico de outros grupos trabalhando em Paris e alhures no mesmo momento”. Nessa nova
fase, explica, os elementos das pinturas são simplificados e sua escala aumentada, o que
torna as composições mais “arquitetônicas”. Dessa forma, os elementos “abstraídos” ou
“completamente não-representacionais” da arte do pré-guerra “chegaram muito perto da
pesquisa em puro design”. Simplificação e escala aumentada parecem-lhe predicados
suficientes do “arquitetônico”.
153
figura 76 - Juan GRIS. Retrato de Pablo Picasso (1912).
figura 77 - Pablo PICASSO, Guitarra (1912), folha de metal e arame
154
O Cubismo sintético, além de ser “arquitetônico”, “transcendia a bi-
dimensionalidade e lidava de uma maneira não-perspéctica com os problemas de
profundidade e projeção”
594
. O autor não explica a última questão, mas quanto a
‘transcender a bi-dimensionalidade’, os Cubistas começaram a fazer “construções”
experimentais (fig. 77), ou seja, “esculturas abstratas, nas quais as linhas e planos das
pinturas se materializavam em três dimensões”
595
. Estava pronto o caminho do plano
pictórico para o plano arquitetônico. Mas um caminho indireto. No gráfico de Barr não
uma ligação direta entre Cubismo e arquitetura moderna. A passagem se dá não do
Cubismo para a arquitetura, mas do Cubismo para os movimentos pós-cubistas, aqueles
que adotaram a ‘disciplina do Cubismo’.
A autonomia da experiência estética é o modo válido de apreciação da arquitetura e
Hitchcock o coloca em contraste com a impossibilidade de se de julgar ou ‘apreciar’
edifícios nos termos funcionalistas. O modo de apreciação funcionalista é restrito “aos que
tem o incentivo, o tempo e o treinamento especial para estudar em detalhe os seus
propósitos”
596
. E a arquitetura puramente funcional torna-se rapidamente obsoleta.
Portanto, o valor da arquitetura está naquilo “que todos podem apreender”: as formas e
padrões da arquitetura e seus valores artesanais - “a única esperança de adiar
indefinidamente a obsolescência cultural
597
dos edifícios. Por outras palavras, Hitchcock
defende a idéia de que a apreciação da arquitetura não é uma questão técnica, mas que é
diretamente relativa a um sentido estético imediato, que exclui a necessidade de se
considerar para que fins um dado objeto foi feito. A idéia de experiência estética autônoma
na apreciação da arquitetura de Hitchcock se acompanha da idéia de autonomia formal.
Esta última é apresentada em contraste com a visão ‘funcionalista’ da arquitetura como
fato técnico. Os verdadeiros funcionalistas em teoria, afirma o autor, “ficam contentes em
se restringir a uma arquitetura-engenharia”, como se o “efeito visual não tivesse
conseqüência”, não percebendo que a arquitetura “também existe como um agrupamento
visual de elementos materiais”
598
.
Para esse livro, Barr escreve um Prefácio
599
onde expressa suas reservas sobre a
influência da pintura sobre a arquitetura, ainda que veja a arquitetura como uma arte. Em
seu Prefácio, Barr dedica o livro ao “arquiteto enquanto artista” que ali encontrará obras de
arte de artistas igualmente “inseguros”, mas sem as amarras de mil outros “fatores técnicos
e sociais” que complicam sua atividade profissional. Arquitetos, ele admite, não são como
pintores e escultores que podem dedicar-se livremente à “busca da pureza da forma”, mas
155
podem beneficiar-se dessa busca quando apreciam artistas que se dedicam à investigação
da forma de maneira “apaixonada e focada” e assim tornam a pintura e a escultura artes
“valiosas para os arquitetos”.
Afirmando que apenas no século XX a arquitetura deixou-se influenciar pela
pintura e, “em certa medida”, pela escultura, Barr adverte em seu Prefácio que a influência
direta da pintura sobre a arquitetura moderna não deve ser exagerada: “teve curta duração,
relativa apenas à composição e planta, e nem sempre foi salutar”
600
.
Barr tem uma explicação para a ‘breve aproximação’ das duas disciplinas, como ele
entende. Em sua avaliação, os “funcionalistas dialéticos [isto é, os marxistas,]
abandonaram a arquitetura como arte, sob o pretexto de derivar suas formas
exclusivamente das exigências técnicas e utilitárias”. A tese de Barr alinhada em seu
Prefácio é que esse “niilismo artístico” deixou a “tecnolatria” dos arquitetos funcionalistas
“vulnerável à sedução” de pintores e escultores do grupo De Stijl e dos Construtivistas,
todos artistas que haviam passado pela “disciplina do Cubismo”.
O objeto da sedução, isto é, aquilo que atraiu os ‘niilistas artísticos’ foi exatamente
a estética de uns e outros: os primeiros, segundo Barr, “estudavam a estética do equilíbrio
assimétrico livre, por meio de retângulos interpenetrantes”, enquanto os construtivistas
preocupavam-se com a “estética do volume sem massa, da engenharia e das texturas e
superfícies industriais”. Em sua visão, os opostos - utilitaristas e estetas - se atraem. Para
Barr, o ‘Estilo Internacional’ é exatamente essa fusão de funcionalidade e beleza, como se
a estética houvesse sido convocada para amenizar a frieza funcionalista.
Barr estabelece um limite para a influência da pintura sobre a arquitetura moderna:
em “1930 o Estilo Internacional havia assimilado as lições tanto do funcionalismo quanto
da arte abstrata” e a partir daquele momento, a importância da pintura e da escultura para
os arquitetos repousaria apenas no fato dessas disciplinas serem “fonte de prazer e
estímulo, e daí de educação para o olho”.
O exemplo que ele aponta é o dos grandes arquitetos como Le Corbusier, Gropius e
Mies van der Rohe, que “se cercam de pinturas e esculturas abstratas”
601
. Barr a pintura
ainda como um apoio indireto para a recepção da arquitetura moderna e sustenta que a
educação do público na arte de Piet Mondrian, por exemplo, tornaria mais acessível ao
leigo a “estética do projeto arquitetônico, que geralmente emprega formas retilíneas”
602
.
Como diretor do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, seu papel é o de tornar acessível
e palatável ao gosto americano a modernidade artística.
156
3.2.8.1. Arquitetos, pintores e pintores-arquitetos
Logo em seguida ao primeiro impacto do Cubismo ‘arquitetônico’ sobre os jovens
arquitetos, começando nos anos de guerra (1914-1918) e se prolongando por muitos outros,
a construção civil praticamente parou, diz Hitchcock, “mesmo nos países neutros”, dando
lugar a uma atividade intelectual crítica inédita em torno da discussão de “teorias estéticas
e anti-estéticas”, numa referencia indireta ao movimento Dada. Naquele momento de
calmaria na atividade da construção civil, muitos jovens arquitetos se aproximaram dos
pintores e escultores de sua geração, sendo levados a tentarem eles mesmos a pintura e a
escultura. As ligações mais importantes, entre arquitetos e pintores, segundo Hitchcock,
foram as de Le Corbusier com os “desenvolvimentos pós-cubistas” na França, de J. P. Oud
(1890-1963) com os artistas De Stijl na Holanda, e na Alemanha com Gropius e Mies e “os
vários pintores abstratos que Gropius reuniu na Bauhaus”
603
. Nessas ligações e na iniciação
dos últimos na disciplina dos primeiros, Hitchcock situa a explicação para o fato dos
arquitetos modernos considerarem a pintura como “uma parte desejável da preparação
artística da profissão”, com a conseqüente inclusão de “exercícios abstratos de design”
604
na educação arquitetônica moderna.
Quando se refere à experiência Russa, o autor sustenta que em seu país os
Construtivistas russos, “num certo sentido teórico”, conseguiram convergir pintura,
escultura e arquitetura em suas construções e cenários (figs. 78 e 79). O que ele chama de
‘sentido teórico’ é a fato de que as construções, isto é, as esculturas Construtivistas “eram
realmente modelos pensados para serem executados em escala monumental” e a
cenografia, constituía uma “espécie de arquitetura temporária”
605
, erguida com “grandes
elementos abstratos arranjados no espaço real de um palco vazio, sem pano de fundo ou
qualquer ilusão de representação”
606
.
Mas Hitchcock não prossegue na análise da situação na Rússia, pois para o autor os
exemplos mais flagrantes da “imposição direta dos ideais da arte abstrata sobre a
arquitetura”
607
surgiram em países da Europa por volta de meados dos anos 1920s quando
abundavam os laços entre as artes. As trocas e contatos proliferavam e se estreitavam em
viagens empreendidas pelos Neoplasticistas (De Stijl), Suprematistas e Construtivistas
Russos através da Europa. Na América do Norte do pioneiro solitário anti-pictórico Frank
Lloyd Wright tais laços inexistiam.
157
figura 78 - Liubov POPOVA. Cenário (1923).
figura 79 - Varvara STEPANOVA. Cenário para produção de Meyerhold (1922).
158
A “imposição direta” de valores revelados na pintura abstrata sobre a arquitetura na
Europa Ocidental envolveu o Purismo de Le Corbusier e Amedée Ozenfant (1886-1966) e
as “pinturas similares” de Fernand Léger (1881-1955); a “arte abstrata holandesa” do
grupo De Stijl; a pintura da Bauhaus; e, por fim, o ‘Surrealismo abstrato’.
Na narrativa de Hitchcock, os Puristas, um dos “pequenos grupos de artistas com
rígidos programas teóricos”
608
formados no período, pretendiam conquistar o público para
a pintura moderna, na contra-mão dos Cubistas, que haviam recusado o gosto público. Para
reconquistá-lo, usavam em suas composições objetos simples. Garrafas, jarros, copos,
formas familiares para qualquer um. Objetos acreditavam, que encarnavam “um tipo
anônimo de pureza padronizada”. Esses objetos figuravam nas pinturas Puristas em
“agradáveis cores pastéis” de “acabamento liso e pincelado suaves” . Pintura e arquitetura
avançavam unidas na obra corbusiana do início dos anos 1920s, mas Hitchcock adverte
que a novas formas da arquitetura de Corbusier “não ‘derivavam’ das formas de suas
pinturas; elas dependiam mais claramente da estrutura de ferro que ele usava
consistentemente”
609
.
figura 80 - LE CORBUSIER. Ville Savoye (1929).
159
Onde estariam então os valores da pintura de Corbusier nos edifícios corbusianos
do período? Na “delicada precisão de padrão em suas paredes e aberturas”, que, para o
autor, é a contrapartida da “elegância contida” das formas da pintura do arquiteto.
Corbusier, o propagandista teórico dos “produtos da máquina” com suas linhas firmes,
denuncia Hitchcock, na prática procurava suaves superfícies planas em seus edifícios,
superfícies dotadas da “imaterialidade das formas coloridas da pintura pós-cubista”
610
.
Embora afirmando que as curvas da arquitetura de Corbusier dependiam da estrutura
adotada pelo arquiteto, o autor, por outro lado, afirma que as curvas dos objetos de suas
pinturas “ecoavam em suas plantas nas formas livremente encurvadas de anteparos não-
estruturais”, como o paravent da Ville Savoye (1929) [fig. 80]. O rigor da pintura Purista
de Corbusier explica ainda porque o arquiteto nunca se permitia composições a esmo.
Hitchcock Corbusier projetando suas plantas e elevações sempre “compactamente
ordenadas dentro de retângulos, como se estivessem emolduradas como uma pintura”
611
.
A pintura de Fernand Léger (1881-1955) de meados dos anos 1920 se assemelhava
à pintura Purista, mas alcançava uma escala “verdadeiramente arquitetural”, como se
fossem murais pintados. Mais importante, suas formas tubulares e humanas metalizadas
tornaram-se um “catalisador particularmente efetivo ao transformar elementos mecânicos
em elementos artisticamente úteis aos arquitetos”. A primeira afirmação está ligada ao uso
que a arquitetura pode fazer da pintura, isto é, reservar-lhe espaço em suas paredes para
pinturas murais. Quanto à transformação de ‘elementos mecânicos’ em artísticos,
Hitchcock imputa a Léger uma mediação entre a ‘estética da máquina’ e a pintura, o que
serviu como exemplo para os arquitetos.
Segundo Hitchcock, a influência de Léger sobre Corbusier fez o último abandonar
seu Purismo doutrinário ao final da década de 1920, quando a arquitetura corbusiana perde
a relação com a obra do pintor Corbusier. A obra corbusiana na pintura, acredita
Hitchcock, “indica o papel relevante que ele imputa à experimentação plástica livre para a
experiência estética do arquiteto”
612
, confirmando uma tese central no pensamento de
Hitchcock.
Afora Le Corbusier, o autor aponta outros dois artistas que trabalhavam por volta
de 1920 “consciente e diretamente em direção à arquitetura
613
”: o artista holandês Theo
van Doesburg (1883-1931) e seu compatriota, o escultor Georges Vantongerloo (1886-
160
1965). Em seu Painting Toward Architecturede 1948, Hitchcock frisa que as “curiosas
esculturas de retângulos encadeados” de Vantongerloo de quase trinta anos antes
“continuam a sugerir possibilidades de composição arquitetural em massa e volume mais
complexas do que qualquer arquiteto até o momento tenha aspirado construir”
614
. Quanto a
Doesburg, se durante a guerra ele desenhou “acessórios essencialmente decorativos” para a
arquitetura de Oud, por outro lado, suas construções isométricas coloridas do início dos
1920s podem ser vistas “tanto como pinturas abstratas autônomas, quanto como projetos
hipotéticos extremamente audazes para uma arquitetura de planos coloridos em interseção
no espaço”
615
. Mas o autor aponta Gerrit Thomas Rietveld (1888-1964) como o artista que
“traduziu as composições de van Doesburg mais diretamente para a arquitetura
616
.
figura 81 - Gerrit RIETVELD. Casa Rietveld-Schröder (1924), Utrecht.
A casa em Utrecht de Rietveld, 1924 (fig. 81), e o projeto de Oud para o Café De
Unie em Roterdam, 1925, são “casos extremos da influência direta da pintura abstrata
sobre a arquitetura. Na verdade, são hoje mais interessantes historicamente que plausíveis
como arquitetura”
617
. O que seria isso, ‘plausibilidade’? O termo ‘plausibilidade’ parece
surgir aqui como resposta a uma situação criada em que se defende a apreciação estética
autônoma e a autonomia formal nas artes plásticas e na arquitetura, mas ao mesmo tempo,
161
a subordinação da forma arquitetônica à norma de integração dos três princípios
albertianos. ‘Plausibilidade’ seria a garantia de uma limitação imposta à experimentação
formal livre na arquitetura. A arquitetura moderna, em seu contágio com as idéias das artes
plásticas abstratas perigou ‘desintegra-se’ na experimentação da forma autônoma. Mas
depois de 1925, Hitchcock conclui, com certo alívio, Corbusier e os arquitetos holandeses
“procuraram e encontraram o equivalente arquitetônico da pintura abstrata”
618
.
Após o apogeu dos anos 1920, as perspectivas de encontro entre arte e arquitetura
estariam ligadas à “colaboração prática entre os arquitetos modernos e pintores e
escultores”
619
, o que no caso de Hitchcok significa ouso de obras de arte como decoração
na arquitetura moderna. O ‘Surrealismo abstrato’, por exemplo, serviria para “dar leveza à
sever3.213 -20.64 Td[()250]TJ-251.188 -20.76 Td[(s95585(r)2.80561(a)34244( 45(e)3.74(cd4(v)-0.294974(e)305(ou)-0.295588305(3.213 -20.64 Td6436(t)-2.16436(e)3.74(t)-2.16436(u)-0.295585(r)2.80439(a)3.74( )-20.15u)-0.2961(e)3.74(x)-100.64 T7)3.74(m)-2.45995(pn436(e)3.74(t)-2.16436(u.80561(r)2.80560.64 T7)4(s)-1.229251.188 0 Td[(o)-0.295585(r)2.8099.577 -20.64 Td[-0.295585(r)2.80439(á)2.8084(m02( )-80.13.74(v)-0.294974795585(i)-2.16436(f)2.80 Td[(s)-1.22997(e).80561(r)2.80560.64 T7)4(r)2.80439(v)-0.295585(i)-2.16436(r)2.3364 T1)3.74( )-0.146571(ao)-0.295585(s)-1.2312( )-400.3r)2.80560364 T1)95585(e)3.74(r)2.80430364 T15585(r)2.80439( )-to fexv84(m02(142(r)2.8043.74244( (t)-2.16436(u)-0.293142(r)2.80439(a)250]TJ-255.151 -20.64 Td[5995( )-0.147792(e)3.74(t)-2.16436(u)-0.274(i)-2.3713.74(v)-0.i)-2.371)-0.294363(u)-0.295585( )-220.3.74(t)-2.12.80561(a)3.74(t)-2.1à)3.74( )-400.384(“)3.scubdoruraegraidcokegraiegraim urai anoa1nais s Su etô0439(a)36(e)3.74(g)(l)-2.16436()-0.295585(r)2.80(a)3.74(ç)3.74(ã)3.74((p)-0.295585((i)]TJ253.71 0 85(u)36(a)3.74(s)-1.2312()2.80439( )-4(i)]TJ25m)-2.45995(e)3.74244(n)-5.545(142(e)3.7424.74244(s)-1.702(à)3.74244( )250]TJ-25)-0.29593882 -20.76 Td)-40985.3713.213 -20985.371“(a)3.74244( )6 Td[(s95585(r)2l250]TJ-25)-0.29597(e)3.74(r)2.801(a)3.74(t)-2.185(a)3.50.395(i)-2.16436(n)]TJ293.21358(b)”(3.213 -20985.371d)-0.295585585.33.74(a)3319(s)-1.22997(o)-0.295585( )-50.1773(d)-0.295585(e)3.74( )-50.15585(e)761(H)1.57564(i5585.3.80561(a)3.74(m)-2.45995( )-0.14t)-2.16436(u)-0.295n.71 0 85(u)36(a)364(i5585.3.(l)-2.16436(a)3.585.3.“439(a)250]TJ-2.16436(f)2.804339(m)-7.535)3.74( )-50.585.3.36(e)3.74( )-50.1761(c)34-2.16436(o)-0.295585(’)(o)-0.295585( )-50-0.295585(e)3.74(r)2.80(l)-2.16436(a)3.585.3.36(e)3.74(g)9.71032(r)2.80439(a)3.74(ç585.3.e4( )-50.1773(‘)2.95585(e)3.74(62-400.383(p)-04(x)-10.3015(p)-0.29558.80439(i)-2.16436(n)-0.298027(c)3.7.535)142(r)2.8043)-1.2312(i)-2.151 -20.64 Td[2312( )-80.1933.74(t)-2.12.80561ce5J-253.109 -2012( )250]TJ-244.944 -20.64 T do ônô(r)2.80439(n)-0.295363(u)-0.295585( )-220.3.74u93.21358(b)-0.294974(u)-0.29497464366(ôe)-0.29497464366(ô)-0.295585(n)-0.293142542(454.s)-1.22997(c)na
162
escultura “Prometeu” de Jacques Lipchitz (1891-1973) [fig. 82] no célebre prédio do
antigo MEC no Rio de Janeiro que Hitchcock cita como exemplos de uma colaboração real
entre arquitetos e pintores ou escultores que “realça e não diminui a integridade da
arquitetura”
621
. Enquanto a obra de Lipchitz demonstra que “um complemento muito
efetivo para a arquitetura” estaria no trabalho experimental da escultura moderna posterior
aos anos 1920 devido à sua pesquisa sobre “vazios (...), elementos lineares no espaço e (...)
movimento
622
“, a colaboração entre Niemeyer, Portinari e Lipchitz, “sugere duas maneiras
diferentes pelas quais os edifícios modernos, plasticamente completos em sua própria
escala arquitetônica, podem, efetivamente utilizar o trabalho de pintores e escultores
simpáticos numa escala diferente e mais humana”
623
.
Hitchcok fecha seu texto concluindo que para a arquitetura moderna o “significado
central e o valor básico”
624
da abstração é que ela pode facilmente mostrar os resultados de
experimentos plásticos que numa escala arquitetônica plena tornam-se difíceis de realizar.
O papel da abstração contemporânea para o autor é o de avançar na experimentação
plástica e, com sua atitude exemplar na busca de novas soluções visuais, evitar que a
arquitetura moderna torne-se a “acadêmica repetição das formas de seus primeiros
mestres”
625
. O autor frisa a importância do contato do arquiteto e do leigo com aquele
“sentido de domínios estéticos ainda inexplorados” que a apreciação da arte abstrata e de
seus valores oferece. O contato e mesmo o envolvimento direto com um tipo de atividade
que abre ao espectador ou ao praticante a perspectiva de experimentação ou de criação de
novas visualidades. Dito de outra forma, o contato com uma atividade do campo da estética
experimental. Na outra face da moeda, essa pintura abstrata, se compreendida em seus
valores pelo leigo, “prepara o público para aceitar as formas visuais tanto quanto os
propósitos práticos da arquitetura moderna”
626
. Tanto o arquiteto quanto o público leigo
teriam muito que aprender com a pintura abstrata, pois veriam revelar-se nessa arte “muito
do que é relevante no que diz respeito à gênese das formas da arquitetura moderna”
627
.
3.2.8.2. Wright, um pioneiro contra a pintura
Hitchcock faz então um longo parêntese na explanação da influencia da pintura
abstrata sobre a arquitetura moderna. Entre os arquitetos modernos generalizadamente
praticantes de uma arquitetura devedora da pintura abstrata.
163
Frank Lloyd Wright “não deve nada à pintura moderna abstrata Européia”, dispara.
Antes pelo contrário, Wright “pavimentou o caminho para aquela forte aliança que viria
depois da primeira Guerra Européia [sic.]”
628
. Wright era “um respeitável inimigo da
pintura”, já avisara Barr no Prefácio
629
de Painting Toward Architecture”. Hitchcock
completa agora: “(...) ele protestava justamente contra a presença na obra de outros
arquitetos modernos daquelas tendências dos últimos vinte e cinco anos que são mais
claramente dependentes da pintura e escultura abstratas modernas.”
630
figura 83 - KUNISADA. Atores Japoneses.
Como então Wright teria ‘pavimentado’ o tal caminho? Hitchcock apresenta uma
reprodução de uma gravura japonesa de 1805, ‘Atores Japoneses’, de Kunisada (fig. 83)
como evidência de que os elementos geométricos simples encontrados nesse tipo de
gravura “criavam um interesse compositivo independentemente de seus temas”. Por outras
palavras, um efeito abstrato. Hitchcock, com essa ‘prova’ morfológica sustenta sua tese de
que Wright foi “o maior inovador de sua geração”, por haver desenvolvido “os princípios
do design abstrato” não no detalhe decorativo, no ornamento, mas “em escala arquitetônica
integral
631
”. Wright teria percebido o efeito abstrato das gravuras japonesas e daí
apreendido “possibilidades abstratas totalmente novas para a arquitetura”
632
. É a gravura
japonesa a referência onde Wright encontrou o caminho de “enfatizar os planos verticais
de suas paredes” e “sugerir a efetiva interpenetração dos espaços interior e exterior”
633
.
164
Fica assim demonstrado que “Wright encontrou uma maneira de utilizar plasticamente os
elementos da arquitetura doméstica [norte-] americana sem referência a qualquer
arquitetura anterior, Européia ou Oriental”.
Quando a obra de Wright apareceu pela primeira vez nas revistas alemãs em 1910 e
1911, o arquiteto norte-americano foi estudado e admirado pelos arquitetos europeus mais
jovens tornando-se uma influência básica exatamente no momento em que os esses jovens
travavam contato com a abstração
634
, isto é, o Cubismo de 1910.
3.2.8.3. A Bauhaus e a pintura abstrata
A obra dos holandeses e, “em menor medida, a dos Suprematistas e Construtivistas
Russos”, afirma Hitchcock, “parece ter sido o catalizador que fez cristalizar o que tem sido
chamado, inapropriadamente, de ‘estilo Bauhaus’
635
. Nos anos iniciais daquela escola
até 1923, nenhum dos três pintores contratados por seu diretor Walter Gropius pintava
abstração geométrica. O expressionista Lyonel Feininger (1871-1956) poderia ter
interesse para os arquitetos da Bauhaus por seus “planos de cor luminosa em contornos
precisos e organizados num preciso equilíbrio assimétrico”
636
. O russo Kandinsky, naquele
momento ostentava uma pintura “extremamente emotiva e musical, e não arquitetônica em
caráter”. Sua pintura posterior geometrizou-se, na explicação de Hitchcock, por influência
da arquitetura sobre sua pintura, e não pelo movimento contrário
637
. Ainda assim, insiste
Hitchcock, “o interesse contínuo dos arquitetos em sua arte indica que suas pinturas têm
uma relevância real para a arquitetura moderna
638
”.
O terceiro pintor, Paul Klee (1879-1940) é o artista mais diretamente associado
aos fundadores da nova arquitetura na Europa”
639
, mas o autor frisa no mesmo parágrafo
que sua arte “intuitiva, e até excêntrica” tem uma relação pouca óbvia com a arquitetura,
diferentemente daquela arte “racional e conscientemente organizada” dos Puristas,
Neoplasticistas, e dos “pintores geométricos russos”. A importância para a arquitetura da
arte de estilo mutável de Paul Klee está no mérito desta ter sido “um antídoto, no âmago da
arquitetura moderna alemã, para a suposição doutrinária e quase behaviorista de que todos
os meios artísticos poderiam ser analisados com precisão”, uma idéia que tornava a arte
“um mero ramo da ciência aplicada”. Mas a mensagem de Klee para os arquitetos é “mais
165
espiritual do que material, um antídoto para uma visão excessivamente mecanicista da
arquitetura moderna”
640
. Klee aguça o olhar do observador, prepara seu olho para as
166
Para Hitchcock, Feininger, Kandinsky e Klee são os pintores mais importantes na
história da Bauhaus, seguidos, em menor importância por Josef Albers (1897-1983) e
Moholy-Nagy, os que trabalhavam em linha próxima aos Russos e Holandeses. Hitchcock
justifica: “suas pinturas e gravuras muitas vezes parecem meros exemplos de pesquisa
controlada: exercícios de quase puro design
643
. O design, afirma, lucrou mais que a
arquitetura com a aplicação prática dos experimentos de Albers e Moholy. No entanto,
Hitchcock imputa aos dois artistas uma grande influência no ensino de arquitetura ao notar
que quando as escolas de arquitetura em geral assumem a responsabilidade pelo
treinamento estético de seus alunos, o fazem a partir das linhas de trabalhos de Albers e
Moholy.
No entanto, embora na Bauhaus se cultivasse, a exemplo dos Construtivistas russos,
um “interesse teórico” nas texturas e superfícies dos materiais, nada disso se traduziu na
prática inicial dos arquitetos daquela escola. Hitchcock contrapõe o “interesse teórico” dos
russos ao refinamento artesanal da obra de Paul Klee e sua “interminável variedade de
qualidades táteis”
644
(figs. 84 e 85), e explica que seu exemplo não ecoou na arquitetura
dos 1920s dado o estrito racionalismo daqueles anos que privilegiava “a precisão de
acabamento da máquina”
645
. Essa postura viria a ser descartada anos depois por “um
tipo mais sofisticado de funcionalismo” que revisaria a “idealizada estética da máquina dos
pioneiros teóricos”
646
em parte por efeito da crítica ao racionalismo provocado pelo
sucesso do ‘Surrealismo abstrato’ de Hans Arp e Joan Miro. A ‘sofisticação’ do novo
funcionalismo teria feito a arquitetura voltar-se para “o uso de materiais de texturas
variadas”, passando a coordenar no mesmo edifício qualidades de acabamento
características da máquina com as da mão.
Mas a pintura abstrata não é a única responsável pela incorporação da textura à arquitetura
moderna e Hitchcok mais três causas para essa inflexão funcionalista: os estudos
abstratos sobre texturas dos fotógrafos modernos; a compreensão de que o acabamento
industrial é apenas um “aspecto” e não uma “característica geral de produtos consistentes
da engenharia”
647
; e, por último, a decadência física dos acabamentos dos primeiros
edifícios modernos que “descoloriam e craquelavam” suas superfícies uniformes, enquanto
a pintura abstrata, emoldurada e envernizada, mantinha seu aspecto inicial, evocando
“visões de um universo Platônico autônomo de formas matemáticas puras”
648
. No entanto,
167
diferentemente de Leonardo Benevolo que publicará fotos da arquitetura moderna,
Hitchcock apresenta em seu livro imagens que preservam a pureza das formas.
A experiência da Bauhaus, escreve o autor, fez com que os escritos de Gropius
afirmassem de forma muito mais clara que os de Corbusier “a relação teórica entre pintura
e arquitetura”
649
.
3.2.8.4. O “Surrealismo abstrato” de Niemeyer e Burle-Marx
Ao fator ‘Surrealismo abstrato’, Hitchcock liga a “escola Brasileira de arquitetos
modernos”. Particularmente, os “jardins desenhados pelo pintor Burle-Marx”. Esses jardins
dos anos 1940 lhe parecem ser “a tradução direta da pintura abstrata não-mecânica em
termos de jardinismo”
650
. Tradução poderíamos pensar, da pintura de Arp, com suas
formas orgânicas e sensuais. Mas o autor descarta um interesse maior pelas traduções”
dos anos 1940 ao frisar que “não haverá novamente uma colaboração intelectual tão
estreita, uma sobreposição tão completa de propósitos artísticos entre pintores e arquitetos
como houve após a primeira Guerra Européia [sic.]”
651
. As discussões sobre a questão da
colaboração levada a cabo no primeiro capítulo desmentem a profecia de Hitchcock. Mas
sua análise do tipo de colaboração entre artista e arquiteto parece se configurar como uma
norma de relacionamento essencialmente moderna. Num certo sentido, portanto, Painting
Towards Architecture passa a se apresentar como o lugar de consolidação dessa ‘visão’, no
sentido de ser a obra que historiou/teorizou/projetou o ‘cânone’ da colaboração na tradição
modernista.
3.2.9. Zevi (1948)
Em 1948, sete anos após o Espaço, Tempo... de Giedion, e no mesmo ano em que
se publica em Nova Iorque o Painting Toward Architecture, Bruno Zevi publica em Turim
seu Saper Vedere l’Architettura, um libelo contra “os edifícios serem apreciados como se
fossem esculturas e pinturas, ou seja, externa e superficialmente como se fossem simples
fenômenos plásticos
652
”. Zevi Parece protestar contra a ‘autonomia das condições de
produção’ da arquitetura, e investe contra Giedion, estudioso sério, mas dedicado a
exercícios de comparação entre pintura e arquitetura que não passam de “jogos de azar
agradáveis como ginástica intelectual, mas nada mais do que isso”
653
. Zevi, um polemista
168
nato, considera esse tipo de abordagem contraproducente para a história e a crítica de
arquitetura, que devido a isso não progridem, paralisadas com o uso de um vocabulário
crítico que só tornam a arquitetura “um reflexo e um eco das tendências pictóricas
654
”. Se o
importante está na pintura, porque se preocupar com a arquitetura?
A arquitetura nada tem a ver com pintura porque sua essência está no espaço
interno do edifício, estando desqualificada como arquitetura toda construção desprovida de
tal essência, pois “tudo o que não tem espaço interior não é arquitetura”
655
. Por esse
motivo, “a cenografia, a arquitetura pintada ou desenhada o são arquitetura”
656
. Mas a
‘essência’ não é um valor, não basta ter espaço interno para ser boa arquitetura. O
“julgamento arquitetônico é fundamentalmente um julgamento sobre o espaço interior dos
edifícios”
657
, isto é, a boa qualidade do espaço interior é o que leva um edifício a entrar na
história da arquitetura.
Para Zevi, a arquitetura moderna repousa sobre a questão do espaço interno, pois
“se fundamenta na ‘planta livre’”, uma invenção que reassume “o desejo gótico da
continuidade espacial
658
”. Com tal genealogia da ‘planta livre’, Zevi desautoriza
inteiramente a idéia de que seria o Cubismo e sua disciplina espacial a fonte da
espacialidade arquitetônica moderna.
Em seu livro não uma linha sequer sobre Doesburg e o De Stijl. Ou melhor, um
dos componentes mais importantes do grupo, Mondrian, é citado apenas para desmerecer
uma comparação entre sua pintura e ‘a planimetria de Mies van der Rohe”
659
. Mas
nenhuma palavra sobre os importantes desenhos de Doesburg e suas conseqüências para
‘planta livre’ na casa de Rietveld em Utrecht. Uma abordagem do De Stijl desmontaria
inteiramente sua argumentação contra o estudo da pintura abstrata para a compreensão da
arquitetura moderna inviabilizando a unidade do livro. Zevi que muito provavelmente leu
painting Toward Architecture, percebeu isso, mas preferiu ignorar essa discussão nas
muitas revisões e reedições de seu Saber Ver a Arquitetura.
3.2.10. Zevi (1950)
Em 1950, dois anos depois de publicar Saber ver, Zevi nos traz sua Storia
dell’architettura moderna com uma seção dedicada específicamente à influência da pintura
sobre a arquitetura, num claro reposicionamento com relação a suas idéias sobre a
desimportância da pintura na ‘genealogia’ das formas da arquitetura moderna. O passo
169
mais ousado nesse sentido seria dado em seguida, quando em 1953 publica livro
especialmente dedicado ao movimento Neoplástico. Com essas duas obras, Saber ver...
perde sua importância como um relato da origem gótica da planta aberta e da espacialidade
moderna e como um libelo contra a visão pictórica da arquitetura, embora mantenha sua
importância como uma defesa do espaço interno como o ‘protagonista’ da arquitetura.
Na sua Storia dell’architettura moderna, encontramos uma seção especialmente
dedicada aos efeitos dos “ismos abstrato-figurativos” na “gênese da arquitetura
moderna”
660
(fig. 86). A pintura agora “abre e, em geral, estimula a renovação da
arquitetura” e a arte abstrata é importante porque se “propõe finalidades cognoscitivas mais
que líricas, reflete sobre os meios mais que sobre os resultados, quer argumentar (...), e não
comover”.
661
Zevi alinha-se então aos teóricos que criticara, afirmando que com a arte
abstrata “toda a pesquisa estética converge na arquitetonicidade”
662
.
figura 86 - Bruno ZEVI. Ilustração de Storia dell'architettura moderna .
170
Os ‘ismos’ - ou movimentos - não são analisados em sua ordem cronológica, pois
tal “seqüência não tem rigor conceitual”
663
, o que quer dizer que a ordem em que apresenta
cada ‘ismo’ traduz o julgamento do autor sobre “o grau de sua pertinência”
664
para o
desenvolvimento da arquitetura. Sendo assim, ele enumera os movimentos: “o Cubismo
com seus dois derivados, Purismo e Neoplasticismo; o Construtivismo, com seu colega a
experiência suprematista; o Expressionismo (...); e o Futurismo, embora seus reflexos
arquitetônicos tenham ficado no estado intencional”
665
.
O Cubismo é uma “reviravolta” tão importante quanto a descoberta da perspectiva
no Renascimento, julgada insuficiente para “indagar a realidade mais agudamente”
666
. Essa
indagação recai “sobre a complexa estrutura do objeto” e não é possível se o objeto está
”fechado”, sendo necessário “analisá-lo de vários lados e em seu interior movendo-nos, ou
seja, através de sucessivos quadros perspéticos”
667
. É o Tempo que se instaura nessa
análise, é a “visão cinética que suplanta assim aquela estática”
668
. Mas Zevi não se propõe
a abandonar sua disposição para com o racionalismo e apresenta um Cubismo que
“agrideo objeto para melhor conhecê-lo, “o decompõe, o penetra, o dilacera”
669
. Com
essa disposição destruidora para fins do conhecimnto, a pintura cubista elabora os
“instrumentos lingüísticos” que rapidamente contagiam as outras artes. Zevi explica como
a pintura, um domínio aparentemente tão distante da arquitetura pode influenciá-la por
haver uma “homogeneidade fundamental das artes”
670
.
A “lingüística contaminante” é a dos “planos que avançam e retrocedem,
superfícies que se interceptam quebrando os ângulos, placas g
171
quanto mil escorços em mutação constante. Mas é uma idéia que revela um Zevi, antes tão
preocupado com o espaço, agora envolvido com idéias sobre um olhar de ‘pura
visualidade’ projetado sobre as paredes da arquitetura moderna.
Zevi é um ardoroso combatente de todo resquício clássico na arquitetura moderna
tanto quanto de qualquer tentativa de colocar o racionalismo como fonte da arquitetura
moderna, daí sua divergência para com Gropius e suas intermináveis brigas com Philip
Johnson
674
. Ao final de suas considerações sobre o Cubismo, Zevi afirma que dada a
contribuição desse ‘ismo’ para a arquitetura, “é errada a apreciação de que o racionalismo
constitui o ato de nascimento da nova arquitetura”
675
. Assim, Zevi parece ceder às
observações de Hitchcock, aproveitando-as como argumentos para sua crítica ao
racionalismo arquitetônico.
A análise que Zevi faz do Purismo está totalmente contaminada por sua visão anti-
clássica. Em sua visão, esse ‘ismo’ que ele como classicista foi o arauto “de um mundo
regenerado, de uma sociedade guiada pela razão”, um movimento erradamente convencido
de que no interior da natureza caótica “vige uma harmonia fundamental”
676
. A necessidade
de regras e a pregação por volumes primários “uma componente intelectual de matriz
renascentista”. O Purismo sentencia, é um movimento de “gênese cubista, (...), mas
tomado por um processo redutivo da equação originária”
677
. A pouca estima de Zevi pelo
Purismo fica tão mais evidente quando analisa entusiasmadamente o Neoplasticismo
holandês com sua “desarticulação quadridimensional [que] constitui uma invariante básica
da moderna escritura arquitetônica”
678
.
quando Corbusier tomou consciência das conotações clacissistas do Purismo,
observa o autor, é que o arquiteto pode “renegá-lo nas curvas de Ronchamp”.
Construtivismo e Suprematismo são confundidos por Zevi a tal ponto que ele
afirma que Kasimir Maliêvitch teria criado o termo ‘Construtivismo’ em 1913, o que
constitui um total disparate. Sabe-se que o termo ‘cosntrutivismo’ não surge na Rússia
senão em 1921, no momento em que o ‘Primeiro Grupo de Trabalho de Construtivistas’
(Pervaia rabochai gruppa konstruktivistov) lança um manifesto “advogando uma
plataforma utilitária e socialista da arte para a indústria”
679
.
O Expressionismo goza do maior prestigio junto a Zevi, exatamente por seu caráter
anti-clássico. Mas ao comentar os primeiros anos da Bauhaus e a presença do
expressionista Itten entre os professores, Giedion afirma que a influência expressionista
172
“não foi vantajosa para a arquitetura”, acrescentando que Gropius “instintivamente se deu
conta da inadequação do Expressionismo e da necessidade de distanciar-se dele”
680
.
Por outro lado, o Expressionismo é um movimento que precede todos os demais e
“agita problemas dramaticamente existenciais no vértice de um angustiante protesto
emotivo”
681
. Seu objetivo não é como o do Cubismo e de seu derivados, “a criação de um
vocabulário figural apto a estimular a ordem”, mas representar uma “sociedade
desregrada” por efeito da Primeira Guerra Mundial. Embora todos os maiores arquitetos
alemães tenham passada pela “turbina expressionista”
682
, a arquitetura relutou em acolher
“com extrema demora e pesadas reservas uma mensagem de raízes essencialmente
psicológicas, que se manifestava como revolta contra todo princípio e método funcional
normal”
683
. Mas o Expressionismo “não tem limites cronológicos”
684
e no mesmo
momento em que “o racionalismo parecia haver ganho a batalha” reaparece
surpreendentemente na obra de Le Corbusier, na “capela de Ronchamp que é a
Einsteinturm do segundo pós-guerra”
685
e prossegue na arquitetura de Hans Scharoun , o
elo entre as experiências de 1918 e os anos 1950.
As “conseqüências no terreno lingüístico” desse movimento atemporal “ferozmente
crítico da decomposição Cubista” e ligado à “gestualidade matérica” é que, voltado “ao
grau zero da escritura arquitetônica, o Expressionismo regenera a linguagem”
686
arquitetônica.
figura 87 - Hermann FINSTERLIN. Croquis de 1919-1920.
173
O movimento de menor importância para a “lingüística” da nova arquitetura é o
Futurismo italiano. Embora a idéia central desse ‘ismo’ seja “a representação do
movimento”, bem sucedida na pintura e na escultura, ela é totalmente “exterior”, ou seja,
“não inerente” à linguagem arquitetônica das fantasias de Sant’Ellia
687
. As “labaredas
futuristas se enfraquecem nos projetos de Mario Chiattone (1891-1957) e nas confusões
gráficas de Virgilio Marchi” (1895-1960), escreve o autor, embora essas últimas
‘confusões’ pouco sejam diferentes dos “sensuais espaços curvilíneos”
688
das fantasias
arquitetônicas do pintor expressionista Hermann Finsterlin (1887-1973) [fig. 87] que Zevi
vê com bons olhos.
3.2.11. Zevi (1953)
Em Poetica dell'architettura neoplastica - Il languaggio della scomposizione
quadridimensionale (fig. 88) o movimento Neoplástico e, sobretudo a figura de Theo van
Doesburg ganham uma dimensão tão grandiosa que parece inacreditável sua ausência em
Saber Ver. Para começar, “Oud, Wils, van ‘t Hoff, Rietveld e, principalmente [grifo
nosso], Mies van der Rohe não teriam podido encontrar um ambiente, nem apoio, nem um
caminho”
689
sem Theo van Doesburg. A “vastíssima” influência de Doesburg teria
alcançado a Rússia, sentindo-se “nas buscas arquitetônicas de Malevitch [sic]”. Tese pouco
provável.
De qualquer modo, o movimento De Stijl teve ainda, para Zevi, o poder de dar
expressão a quem a ele se aliou e de exaurir o desenvolvimento daqueles que dele
acabaram se desligando: “Oud encontrou sua linguagem: depois não progrediu. Mondrian
[que se desligou do movimento em 1924] permaneceu soberbamente fiel ao
Neoplasticismo. Rietveld, depois do término do movimento não construiu nada de
significativo.”
690
A Bauhaus sem Doesburg “não teria sabido identificar sua linha de ação
didática”
691
. Zevi sugere que ropius tentou barrar a avassaladora presença de Doesburg em
Weimar a ponto de que na entrada do prédio da escola se afixou um aviso proibindo os
bauhäusler de freqüentarem o curso de Doesburg”
692
. Mas sua influência ali foi inevitável
e, ao final das contas, até Le Corbusier julgava a Bauhaus como “uma academia de arte
moderna influenciada sobre tudo pelo movimento holandês De Stijl”
693
. Zevi publica ao
final de seu livro uma carta inédita de Gropius datada de 3 de novembro de 1953
694
174
explicando que nunca convidou Doesburg para ensinar na Bauhaus e que nem lhe deu um
cargo porque o julgava “agressivo e fanático, com uma visão teórica tão estreita que não
tolerava nenhuma diversidade de opiniões”. Gropius nessa carta não nega que Doesburg
tenha influenciado a Bauhaus “como também influenciaram muitos outros movimentos”,
pois ele permitia que todos os movimentos dela se aproximassem e fossem ali estudados.
Porém, diz Gropius na citada carta, o “caráter de van Doesburg era tão unilateralmente
agressivo que ele queria anular todos os demais, destruindo o espírito de colaboração” que
o diretor da Bauhaus considerava importante cultivar. Zevi comenta tal carta expressando
sua opinião de que Gropius coloca as divergências no campo psicológico, enquanto que ele
acredita que as divergências estavam realmente “no tema substancial da criação de uma
linguagem arquitetônica moderna e portanto de um método didático de acordo”
695
.
figura 88 - Página de Bruno ZEVI, Poetica dell'architettura neoplastica.
175
E qual a fonte de tanto poder de influência de Doesburg? Em primeiro lugar sua
exponencial compreensão das possibilidades do Cubismo que “excitava uma maravilhosa
expectativa, uma efervescência de idéias e de experiências, um despertar poético sobre
amplos horizontes”
696
. No entanto, toda essa ‘excitação’ não poderia ter se traduzido em
arquitetura, não fosse Doesburg, pois a questão posta era “(...) qual o sistema para traduzir
as conquistas da pintura cubista em termos de arquitetura? Theo van Doesburg respondeu.
Explicou o conteúdo, ensinou o modo, disse com exatidão o porquê”
697
. Assim, o De Stijl
foi “a original conclusão de um longo e exaustivo processo da história”
698
.
Está claro que Zevi não poderia ignorar, por exemplo, a contribuição de Hendrik
Petrus Berlage (1856-1934) e Wright para o De Stijl, e pôs ambos situados nessa cadeia
histórica que se ‘conclui’ no De Stijl. Essa cadeia encontra suas raízes não no Gótico, mas
no neo-gótico Rijksmuseum de Amsterdam, do arquiteto Petrus Hubertus Cuypers (1827-
1921), projeto que “dá confiança aos caminhos da nova arquitetura” e segue com
contribuições de Otto Wagner (1841-1918), Josef Hoffman (1870-1956) e Charles
Mackintosh (1868-1928) até Berlage, o qual propagandeou Wright na Holanda como o
maior arquiteto vivo. Daí em diante, “com efeito, a adesão a Wright foi (...) absoluta desde
Berlage”
699
. E porque seria Wright tão grande? Zevi responde: “Gênio e poética: Wright
foi neoplástico antes do De Stijl e depois”
700
. Assim, fica o dito (aqui) pelo não dito (em
Saber Ver...) e é o Cubismo, através de Doesburg, que conduz a arquitetura moderna à sua
conclusão histórica.
Mas é Mies van der Rohe quem surge como “a mais alta personificação do
Neoplasticismo, livre e, no entanto, a única historicamente fiel”
701
. Para provar essa sua
última tese, Zevi recorre aos 17 pontos da arquitetura Neoplástica enumerados por
Doesburg em artigo de 1925 e reformulados numa palestra proferida em 1930 em Madri
702
.
Ponto a ponto, Zevi examina as obras de Le Corbusier, Wright, Gropius, Oud e Erich
Mendelson (1887-1953) para finalmente concluir que a obra de Mies van der Rohe
posterior ao De Stijl é a única que atende a cada um daqueles 17 pontos. E mais, ao
analisar as propostas urbanísticas do De Stijl, Zevi resume: “Imagina dez casas de Mies
construídas uma perto da outra: terás a idéia da cidade neoplástica”
703
.
Para concluir a questão do Cubismo, Zevi resume assim as conseqüências daquele
movimento levadas por Doesburg à arquitetura: “o velho edifício estático devia ser
destruído e reconstruído dinamicamente, a massa e o volume reduzidos a linhas e
superfícies, planos que se interceptam ou se justapõem, mas de todas as maneiras
176
independentes e em dissonância entre eles, espaço e tempo necessários para realizar uma
sucessão ininterrupta, filmada de perspectivas”
704
.
Ao analisar as diferenças entre uma cadeira de Rietveld de 1917 e uma outra de
Marcel Breuer de 1924, Zevi resume essas operações explicitando que o fundamento dos
ensinamentos de Doesburg é “a análise dos elementos e sua separação”
705
. Trata-se então,
se pergunta o autor, de uma arquitetura “raciocinada”, o que Doesburg propôs? Pode ser, é
sua resposta lacônica
706
. Talvez por isso ela tenha oferecido à análise crítica, instrumentos
essenciais para a compreensão da disciplina. É o que sugere a conclusão final de seu livro:
(...) em todo edifício a decomposição das partes, sua caracterização, sua
montagem, constituem um exercício mental indispensável, um processo analítico
didáticamente proveitoso (...). [A] busca neoplástica, posto que indique melhor que
qualquer outra o tempo e o procedimento da composição arquitetônica,
subministra um instrumento fecundo também no campo histórico-crítico e
novamente confirma a atualidade e abrangência de um método dinâmico de leitura
da arquitetura
707
.
3.2.12. Benevolo (1960)
No volumoso ‘História da Arquitetura Moderna’ Benevolo se opõe à prioridade que
os historiadores precedentes deram à morfologia da arquitetura moderna.
Por volta de 1890, a cultura artística tradicional entra rapidamente numa crise cujos
“motivos remotos e gerais, que podem ser” associados à ‘transformação do repertório
arquitetônico”, entre os quais destacam-se:
1) As novas teorias sobre a arte.
K. Fiedler, publica ensaio sobre a origem da Arte em 1887 em cuja explanação,
Benevolo, na verdade esclarece a posição de Kaufmann, enquanto indiretamente critica sua
adesão a Le Corbusier por pretender que “a arte ver
177
Riegl, que afirma que "mesmo o crítico de arte não pode libertar-se das exigências
particulares de seus contemporâneos em relação à arte", esclarecendo indiretamente porque
Pevsner, Kaufmann e Giedion permitem-se adotar um arquiteto favorito.
2) O exemplo dos pintores
“A obra inovadora dos arquitetos de vanguarda de 1890 em diante está em íntima
relação com a obra dos pintores”. Os pintores trazem: A disposição ativa, construtiva, em
relação à realidade (Van Gogh, que se pergunta "para que poderei servir, como poderei
ser útil de alguma maneira, como poderei saber mais e aprofundar isto ou aquilo?"); O
isolamento de cada artista (Cézanne: "Permanecerei apenas um primitivo no caminho que
eu mesmo descobri”); A tendência a teorizar, “Freqüentemente essas formulações teóricas
são o caminho das influências entre pintura e arquitetura como ocorre em relação ao
cloisonismo e o simbolismo, que estão por certo entre as fontes da art nouveau”.
É na arquitetura que os experimentos da pintura podem mostrar serem válidos ou
não:
“Uma vez que as inovações no campo da pintura precedem geralmente aquelas na
arquitetura - o mesmo ocorre mais tarde para o Cubismo e o abstracionismo em
relação ao movimento moderno -, tentou-se mais de uma vez explicar as segundas
como derivações das primeiras, e atribuir à pintura, neste período, uma função de
prioridade e de guia.”
Mas “[p]intores e arquitetos (...) não apenas influenciam-se entre si como, a rigor,
fazem o mesmo trabalho”. E, logo conclui:
“Na pintura, dado a maior imediaticidade dos procedimentos, as novas
descobertas vêm à luz antecipadamente, mas são fixadas apenas provisoriamente, e
destinam-se a serem postas em funcionamento para dar nova forma ao ambiente
em que vive e trabalha o homem, para projetar os objetos de uso, os móveis, os
edifícios, as cidades. As contribuições de Cézanne, de Gauguin, de Van Gogh -
como as de Braque, de Mondrian, de Van Doesburg - podem ser avaliadas
concretamente somente tendo-se em vista essa utilização; é Van de Velde quem
convalida os cloisonnistes, como, no após-guerra, é Oud quem convalida
Mondrian, é Breuer quem convalida Klee, e não vice-versa”.
178
Em resumo, se “as inovações principais amadurecem entre 1890 e 1895, (...)
delineiam-se somente no qüinqüênio sucessivo, sobretudo nos primeiros anos do século
XX.” Finalmente, nesses anos, a questão da vanguarda vista negativamente: “prepotência
do compromisso artístico sobre o compromisso humano encontram-se na pintura”,
diferentemente do que ocorre na arquitetura. “Na arquitetura, as coisas acontecem de modo
um tanto diverso, porque o arquiteto não está jamais tão-só face a suas obras, mas muitos,
como Mackintosh e Loos pagam pessoalmente por sua vocação artística anticonformista.”
179
CONCLUSÃO
As primeiras obras de arte abstratas datam da segunda década do século XX,
pinturas Européias e Russas. As pesquisas da pintura abstrata contribuíram para o
desenvolvimento da linguagem abstrata da arquitetura moderna e o estabelecimento dos
valores da leveza, da simplicidade, da transparência e do novo. Na pintura abstrata a
vontade de autonomia do artista face ao mundo visível pode se manifestar na radicalidade
de uma pintura cujo ‘espaço’ simplesmente não é habitável. Na tela, as formas abstratas
organizam-se autônomamente por conta de suas próprias leis. O espectador igualmente
liberta-se do mundo e contempla a obra abstrata com a plena autonomia que apreciação do
olhar da pura visualidade lhe confere. Tudo parece funcionar dentro de uma dialética do
visível e do invisível. O pintor pinta formas que não no mundo, dando ao espectador a
possibilidade de ver o invisível do mundo através do visível na tela. O que parece perfeita
circularidade de autonomias na pintura abstrata sofre questionamentos. As formas de
Maliêvitch dependem muito da iconologia bizantina. O gestual puro do artista livre
depende imensamente das condições sociais. O olhar do espectador nunca é um mesmo e
uniforme olhar inocente.
Quando as idéias da abstração contagiam Gropius e Corbusier, elas precisam ser
‘filtradas’.
Na arquitetura moderna, falar em autonomia formal na prática do arquiteto, por força de
expressão. A questão formal na arquitetura moderna será sempre uma questão post factum,
isto é, uma vez determinado o programa e escolhido método construtivo, o jogo pode ser
formal. Nesse caso, a abstração na arquitetura moderna é uma questão de adoção de um
certo padrão de linguagem formal, isto é, de construção geométrica tridimensional. E assim
não dúvida de que o mais correto é se reconhecer que existe o fator ‘estilo’ na
arquitetura moderna, e que Hitchcock está mais que correto em tentar identificá-lo.
Esse estilo abstrato na arquitetura foi inicialmente visto como não possuindo atributos para
fins de simbolização, desconsiderando a questão do caráter dos edifícios, mas quando
chega ao Brasil, instala-se num ambiente onde não espaço para a abstração e é aqui,
parece, que se impregna de simbolismo. Aqui o olhar de ‘pura visualidade’ perde a pureza
e adquire o interesse da representação do nacional. Nem por isso a arquitetura moderna
brasileira deixa de ser vista pelos críticos como uma imensa e penetrável obra de arte.
180
Mas essa visão relativamente abstrata do edifício, o arquiteto moderno praticante
não pode ter em seu dia a dia. Então ele precisa se ater ao espaço da funcionalidade tanto
quanto precisa de um historiador que lhe diga que o que ele faz é arte. E precisa também se
cercar de artistas, desde que cada um em seu nicho. Os historiadores fizeram seu papel.
Contrariamente a ressaltar diferenças estéticas entre arte e arquitetura, a nascente
historiografia da arquitetura moderna que se inaugura ao final dos anos 1920 atravessou as
décadas de 1930 a 1950 preocupando-se em encontrar analogias, semelhanças, paralelismo
e mesmo identidade entre a obra plástica e a arquitetônica. Nessa historiografia, a
arquitetura como tal não se apresenta como uma ciência social: a arquitetura é encarada
como uma disciplina artística e o arquiteto como um artista a enfrentar os desafios estéticos
que seu tempo lhe oferece.
A arquitetura contemporânea aos que pioneiramente a historiaram e teorizaram
procurando legitimá-la foi oferecida como um triunfo artístico de estatura comparável ao
dos grandes períodos históricos. Logo, como o templo Grego ou a catedral Gótica, o
edifício moderno deveria apresentar uma linguagem artística nitidamente distinta,
articulada e coesa. Essa linguagem, apresentada e fundamentada de formas diversas pelos
historiadores pioneiros, é a linguagem da abstração. Assim, os fundamentos da arte
abstrata tornam a estética da arquitetura idêntica àquela das artes plásticas, partilhando
com elas os mesmos elementos e valores, ancorando-se solidamente nos mesmos
princípios ditos universais e eternos.
Em sua formulação mais acabada, a linguagem da abstração é apresentada como
sendo a estética que permitiu a arquitetura moderna fundir função/estrutura/forma num
estilo coerente, original e totalmente independente de qualquer referência histórica, daí seu
triunfo sobre o passado e sua validade histórica. Nessa historiografia que formou gerações
de arquitetos parece estar em ação uma estratégia global para legitimar a linguagem da arte
abstrata como um estilo verdadeiramente integrado, coeso e abrangente, válido para todas
as artes contemporâneas, totalmente enraizado em sua época, e tão revolucionário em seu
tempo quanto a pintura de perspectiva que revolucionou a Renascença. Na historiografia
pioneira, a arquitetura moderna é uma arte que transcende função e construção porque as
expressa na linguagem dada pela abstração.
Arquitetura como arte e abstração como linguagem geral das artes: essa
proximidade, esse pertencer ao mesmo lugar estético através de uma verdadeira comunhão
de elementos e valores surge nas narrativas da arquitetura moderna, ora como um ponto de
181
permeabilidade entre o fazer arquitetônico e as artes plásticas, ora como paralelismo entre
campos disciplinares distintos. Numa vertente, o desenvolvimento da arquitetura moderna
vem como que a reboque do desenvolvimento da pintura européia, ameaçando tornar a
história da arquitetura moderna uma questão de ‘modernização’ disciplinar dependente de
processos e parâmetros externos. No segundo caso, arquitetura e artes plásticas tem
histórias paralelas, mas independentes, ambas referidas ao desenvolvimento global da
sociedade européia, onde surgem as condições da modernidade, o que ameaça tornar
arquitetura e artes plásticas espelhos passivos das transformações da sociedade européia.
Em ambos os casos, a abstração é a linguagem sem precedentes históricos, válida
para todas as artes e a criação artística é uma atividade eminentemente experimental. É
devido a esse caráter experimental que, por vias da abstração, a manipulação formal livre
aparece na historiografia pioneira da arquitetura moderna como uma nítida possibilidade
para o arquiteto no desenvolvimento do processo de concepção do edifício. Por outras
palavras, surge aí, no próprio horizonte metodológico do arquiteto moderno o experimento
formal autônomo. Vale dizer, a experimentação com formas totalmente desligada de
preocupações com função ou construção. Ocorre, no entanto, que o pressuposto para a
validade histórica da arquitetura moderna é ter fundido função/estrutura/forma numa
linguagem artística coerente e nova. Logo, devendo atender tanto à defesa da liberdade
artística do arquiteto moderno quanto à sua respeitabilidade técnica na sociedade, a questão
que se coloca para os historiadores é afastar a defesa da abstração na arte arquitetônica da
ameaça de contraditoriamente propugnar o desmantelamento da coerência interna da
arquitetura moderna em nome da liberdade artística implícita na própria idéia de abstração.
Delineia-se assim um quadro em que os historiadores pioneiros devem dar uma
resposta satisfatória ao problema de defender a autonomia da arquitetura frente às artes
plásticas ao mesmo tempo em que defendem uma identidade de princípios estéticos
abstratos.
Mas se a historiografia em questão está muito atenta ao problema de preservar a
idéia de autonomia do campo disciplinar arquitetônico, por outro lado não se preocupa
muito em aprofundar a questão da experimentação formal autônoma, limitando-se a
apontar que, diferentemente do que ocorre na pintura, na arquitetura função e estrutura
devem expressar-se com arte. Ora, se a abstração apresenta-se como novidade absoluta e
como experimentação formal livre, como compatibilizar autonomia formal com os
compromissos da arquitetura com programa e construção?
182
A contradição que ameaça se delinear entre arquitetura e experimentação formal
livre parece ser afastada quando, por exemplo, Sigmund Giedion, comentando as
complexas exigências do edifício moderno, defende o ponto de que o aspecto artístico da
arquitetura deve ser encontrado na satisfação de seus compromissos práticos . Essa
afirmação sugere que os limites da manipulação formal autônoma na arquitetura são
estabelecidos pelos limites da coesão entre função/estrutura/forma proporcionada pela via
da estética da abstração que a nascente historiografia da arquitetura moderna aponta como
principal triunfo do edifício do século XX. Ou seja, no fundo, para essa historiografia
pioneira, a experimentação formal autônoma tal como praticada nas artes plásticas
abstratas não tem lugar na arquitetura moderna, uma vez que a forma arquitetônica deve se
submeter a seus compromissos práticos. É por esse motivo que encontramos aqui emçãol
183
encontrar expressão artística livre sob a pressão de ditames práticos, pode ser
desestimulante para um jovem estudante ler em Giedion que fazer arquitetura não é tarefa
para qualquer mortal: “somente uma mão de mestre como a de Gropius (...) é capaz de
ousar manifestar independência entre expressão e função ”. Mas se a arquitetura moderna
assume uma linguagem universal, ainda que venha a se fazer de edifícios individuais, então
pode ser bastante razoável aceitar que os historiadores se concentrem em sua morfologia,
procurem exemplos e estimulem a imitação “criativa” do precedente. Isso no pressuposto
de ser a arquitetura moderna uma criação coletiva baseada em pressupostos supra-
individuais. Mas e quando surge a individualidade fantasiosa na arquitetura moderna
brasileira?
Em 1931, dois anos após a publicação de Modern Architecture: Romanticism and
Integration, de Henry-Russel Hitchcock, obra que inaugura a seqüência de narrativas da
arquitetura moderna com a defesa da influência da pintura abstrata na arquitetura, Lucio
Costa está às voltas com a montagem do que ficou conhecido como ‘Salão
Revolucionário’, que bem poderia ser rotulado de ‘Salão Conciliatório’, dado o fato de que
o arquiteto acolheu tanto os ‘modernos’ quanto os ‘acadêmicos’ na exposição. Uma das
explicações dessa tentativa conciliatória é o fato demonstrável de que nem o jovem diretor
da Escola de Belas Artes, nem os ‘modernos’ expositores haviam atingido o patamar onde
se discutia a abstração como tendência historicamente válida, retirando da figuração seu
valor tradicional. Os ‘modernos’ em questão estavam empenhados, e assim continuaram
por todo o Estado Novo, na figuração das etnias identificadas com o que seria ‘o povo
brasileiro’, de seus costumes, ambiente natural e artefatos. Essa arte figurativa nacionalista
foi em todo o mundo explorada como meio de propaganda política por ideologias
interessadas em identificar o regime no poder com o ‘verdadeiro’ povo nacional . No caso
brasileiro a cooptação da arte por parte do regime de Vargas parece ter delongado a
compreensão da abstração no Brasil, onde ela se firma plenamente nos anos 1950, com
o fim do poder daquela ditadura nacionalista.
Pode-se argumentar que se olharmos com os olhos do Hitchcock de Painting
Toward Architecture (1948) para a arquitetura brasileira que se impôs ao mundo, veremos
em nossa arquitetura os efeitos do ‘surrealismo abstrato’ evidentes na colaboração de
Burle-Marx (1909-1994) e Cândido Portinari (1903-1962) nos edifícios de Oscar Niemeyer
184
(1907- ) a partir do seminal prédio do antigo Ministério da Educação e Saúde no Rio de
Janeiro (1936-1943). Isso sugere que o Palácio Gustavo Capanema pode ter sido um fator
operativo atrasando o debate abstrato no Brasil. O edifício é para Hitchcock exemplo de
uma colaboração real entre arquitetos e pintores ou escultores abstratos, colaboração que
realça e não diminui a integridade do edifício, pois oposta a meros usos decorativos dos
elementos característicos da pintura e da escultura modernas como embelezamentos
superficiais da arquitetura . Essa atribuição de exemplaridade pode ser a tentativa de se
estabelecer a norma modernista de colaboração entre artistas e arquitetos.
Sob o olhar de Hitchcock, as formas amebóides dos azulejos do Portinari
colaborador de Niemeyer fazem parte da Later Abstract Art, isto é, a produção tardia
abstrata que sofreu a simplificação própria do processo de abstração, sendo, no entanto,
parcialmente representacional, isto é, relativamente livre em forma e cor. É a partir dessa
visão de Portinari e Burle-Marx como artistas ligados ao ‘surrealismo abstrato’ e de sua
compreensão da relação da arte abstrata com a arquitetura que Hitchcock legitima esta
parte da produção brasileira no cenário americano. O argumento levar à falsa conclusão de
que a arquitetura moderna brasileira amadurece enquanto reconhece a linguagem da
abstração como fundamento comum entre arte e arquitetura.
No entanto, a produção pictórica de Portinari não recomenda sua classificação
como abstracionista, e menos ainda como ‘surrealista abstrato’, embora suas ‘amebóides’
se aproximem em muito das formas de Arp. Mas qualquer sugestão de irracionalidade
amebóide deve ser logo repelida. O sucesso do Palácio e da parceria de Portinari com
Oscar Niemeyer pode ter retardado a emergência da abstração, ou embaralhado sua
compreensão por aqui, uma vez que Portinari torna-se o ‘pintor oficial’ do Brasil de
Vargas por conta da representação que faz do ‘povo brasileiro’ e não por sua arte amebóide
‘abstrata’. Mas que se considerar também que o próprio uso dos azulejos um caráter
nacionalista às amebóides ‘surrealistas’ recheadas de conchinhas e cavalos marinhos de
Portinari no Palácio. Isso parece sugerir que se em 1931 a abstração sequer entrava em
questão, obliterada pelo ‘nacional’, em 1943, no Palácio Capanema, a abstração aplicada
aos azulejos ‘surrealistas’ pode ser, com certa ironia, a invenção da ‘abstração
nacionalista’.
Em todo caso, a importância da abstração como conceito estético central e comum à
arte e à nova arquitetura evidenciada na historiografia pioneira da arquitetura moderna
quando contrastada com o panorama artístico no Brasil nos anos trinta, ressalta a
185
imaturidade do projeto artístico brasileiro, na qual se inclui a imaturidade da
‘modernidade’ do próprio Lucio Costa, que com grande eficiência mergulhou na tarefa de
afastar a contradição entre os princípios abstratos e as necessidades da mentalidade
nacionalista.
NOTAS
1 COLQUHOUN, Alan. Modern Architecture. Oxford: Oxford University Press, 2002, p.204.
2 Ibidem, p.214.
3 PANOFSKY, Erwin apud VENÂNCIO FILHO, Paulo. A unidade do pensamento de Meyer Shapiro in SHAPIRO, Meyer. A unidade da Arte em Picasso. São Paulo:
Cosac e Naify, 2002, p. 9.
4 Lillian Milgram in Prefácio, SHAPIRO, 2002, p. 15.
5 HARRISON e WOOD (Org.). Art in Theory 1900-2000 – An
186
42 POGGIOLI, Renato. The Theory of the Avant-Garde. U.S.A.: Harvard University Press, 1968, p.73.
43 Ibidem, p.73.
44 Ibidem , p.57.
45 DOUGLAS, Charlotte. Malevich and Western Art Theory in PETROVA, Evgenya et altri. Malevich – Artist and Theoretician. Paris: Flammarion, 1990 , p. 58.
46 Nesta pesquisa escolhemos adotar a grafia deste nome conforme faz Amy Dempsey em seu livro Estilos, Escolas & Movimentos Guia Eciclopédico da Arte
Moderna. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.
47 Conforme DOUGLAS, Charlotte, op. cit., 58.
48 Catherine Cooke. The Development of the Constructivist Architects' Design Method apud PAPADAKIS, A., COOKE, C. e BENJAMIN, A. (Org.). Deconstruction:
omnibus volume. New York: Rizzoli International Publications, Inc, 1989, p. 24.
49 Tradução livre do autor.
50 RODCHENKO, Aleksandr apud COOKE, Catherine. The Development of the Constructivist Architects' Design Method in PAPADAKIS, COOKE e BENJAMIN,
1989, p. 24.
51 APOLLINAIRE, Guillaume. On the Subject in Modern Painting. Republicado em HARRISON e WOOD, 2004, pp. 186-187.
52 HARRISON, Charles. ª, op. cit., p. 194.
53 Ibidem, p. 194.
54 Ibidem, p. 190.
55 Ibidem p. 194.
56 Segundo MACARDÉ, Jean Claude. Malevich, Painting and Writing: On the Development of a Suprematist Philosophy in GUGGENHEIM MUSEUM. Kazimir
Malevich Suprematism. Cátalogo. New York: Guggenheim Museum Publication, 2003, p. 39.
57 DOUGLAS, Charlotte. Malevich and Western European Art Theory, in PETROVA, Evgenya (et altri). Malevich – Artist and Theoretician. Paris: Flammarion,1990,
p. 56.
58 Ibidem, p.58.
59 Ibidem, p.59.
60 Como afirma LODDER, Christina. Russian Constructivism. New Haven and London: Yale University Press, 1983, p. 8.
61 GINZBURG, M. Results and Prospects (1927) in BENTON, Tim, BENTON, Charlotte e SHARP, Dennis. Form and Function – A source book for the History of
Architecture and Design 1890-1939. Londres: The open University, 1975, p. 158.
62 GINZBURG, M. op. cit., p. 158.
63 BRUMFIELD, William Craft. A History of Russian Architecture. Cambridge: The University of Washington Press, 2004, p. 471.
64 Ibidem, p. 471.
65 Ibidem.
66 Ibidem, pp. 472-473.
67 HARRISON, Charles. op.cit., p. 202.
68 EL LISSITZKY apud HARRISON, Charles. Abstração, figuração e representação in HARRISON, FRASCINA e PERRY, op. cit., p. 203.
69 NAKOV, Andrei B. Malevitch Ecrits. Paris: Champ Libre,1975, p. 91.
70 Ibidem, p. 183.
71 JUDD, Donald in Malevich - Independent Form, Color, Surface apud Art in America, vol. 62, no.2 (March-April 1974), pp. 52-5B; reprinted in Donald Judd:
Complete Writings 1959-1975 (New York. New York University Press, 1975), pp. 211-15.
72 Ibidem, p. 57.
73 CHILVERS, Ian. A Dictionary of Twentieth-Century Art. New York: Oxford University Press, 1999, p. 29.
74 WARNCKE, Carsten-Peter. De Stijl 1917-1931. Frankfurt: Benedikt Taschen, 1994, p. 206.
75 CHILVERS, op. cit., 1999, p. 29.
76 LEMOINE, Serge. Dada. Paris: Éditions Hazan, 2005, p. 13.
77 Ibidem, p. 17.
78 ARP, Hans (declaração de 1962) apud LEMOINE, 2005, p. 17.
79 MILNER, John. Kazimir Malevich and the Art of Geometry. New Haven and London: Yale University Press, 1996.
80 GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p. 261.
81 Deus Não Caiu – A Arte, A Igreja, A Fábrica., 1922, in NAKOV, Andrei B. op. cit..
82 Kazimir Malevich Introdução Ao Album Litográfico “Suprematismo – 34 Desenhos”. Ed. UNOVIS. Vitebsk, 1920 Reimpressão em fac-simili Ed. Dês Massons,
Lausanne, 1974.
83 MILNER, John. op. cit., p. 127.
84 Jean Claude Macardé, in GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p. p.67.
85 OHAYON, Jacques. Le degré zero de l’architecture in MUSÉE NATIONAL D’ART MODERNE, CENTRE GEORGES POMPIDOU, 1980, p. 21.
86 Tatiana Mikhienko in GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p.79.
87 Ibidem, p. 78.
88 Transcript Of The Ogpu (United State Political Agency) Interrogation Of Malevich, September1930, Conducted in Pp Ogpu In Lvo in GUGGENHEIM MUSEUM.
Kazimir Malevich Suprematism, op. cit., p. 249.
89 Tatiana Mikhienkoopus in GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p.80.
90 OHAYON, Jacques. in GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p. 21.
187
91 Tatiana Mikhienko in GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p. 80.
92 Ibidem.
93 OHAYON, Jacques. Le degré zero de l’architecture in MUSÉE NATIONAL D’ART MODERNE, CENTRE GEORGES POMPIDOU, op. cit., p. 22.
94 MIKHIENKO, Tatiana. The Suprematist Column - A Monument to Nonobjective Art in GUGGENHEIM MUSEUM, op. cit., p.81.
95 MILNER, op. cit., p. 179.
96 HULTEN, Pontus. Préface in MUSÉE NATIONAL D’ART MODERNE, CENTRE GEORGES POMPIDOU, op. cit., pp. 7-8.
97 em ANDERSEN, Troels. Malevich. Catalogue Raisonné of the Berlin Exhibition 1927, including the collection in the Stedelijk Museum Amsterdam; with a general
introd. to his work.
98 ANDERSEN, Troels. De R2 à R3 in MUSÉE NATIONAL D’ART MODERNE, CENTRE GEORGES POMPIDOU, op. cit., p. 13.
99 Ibidem, p. 13.
100 Ibidem.
101 Ibidem.
102 OHAYON, Jacques. Le degré zero de l’architecture in MUSÉE NATIONAL D’ART MODERNE, CENTRE GEORGES POMPIDOU, op. cit., p. 22.
103 CLARK. T. J. El Lissitzky in Vitebsk in PERLOFF, Nancy e REED, Brian (Org.). Situating El Lissitsky: Vitebsk, Berlin, Moscow. Los Angeles: Getty Reseach
Institute, 2003, p. 209.
104 NAKOV, Andrei B. op. cit., pp. 327 a 363.
105 PEIPER, Tadeusz. At the Bauhaus (1927) in FORGÁCS, Benson. Between Worlds a sourcebook of central european avant-gardes, 1910-1930. California: Los
Angels County Museum of Art and the MIT Press, 2002, p. 629.
106 Ibidem, p. 629.
107 Ibidem.
108 Ibidem, p. 630.
109 Ibidem.
110 Ibidem.
111 Ibidem.
112 COCCHIARALE, Fernando e GEIGER, Anna Bella. Abstracionismo Geométrico e Informal.Rio de Janeiro: FUNARTE, 1987, p. 31.
113 CHILVERS, op. cit., p. 443.
114 COCCHIARALE e GEIGER, op. cit., p. 11.
115 DI CAVALCANTI, Emiliano apud COCCHIARALE e GEIGER, op. cit., p. 11.
116 COCCHIARALE e GEIGER, op. cit , p. 85.
117 MacCORMAC, Richard Art and Architecture in Architectural Design Profile nº 128, London, Academy Editions, 1997, p.9
118 Ibidem, p.9.
119 Ibidem.
120 Academy Forum – Transgressions: crossing the lines of art and architecture – Extracts in Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 17.
121 Ibidem.
122 MAXWELL, Robert Transgressions in Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p.12.
123 Ibidem, p.11.
124 Ibidem.
125 Ibidem.
126 Ibidem, p.12.
127 Ibidem.
128 Academy Forum – Transgressions: crossing the lines of art and architecture Extracts in Architectural Design Profile 128, London, Academy Editions, 1997, p.
18
129 Ibidem.
130 Ibidem.
131 Ibidem.
132 Ibidem, p. 19.
133 Ibidem.
134 Academy Forum – Transgressions: crossing the lines of art and architecture – Extracts in Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 20.
135 MELHUISH, Clare. Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit., pp. 25-29.
136 Ibidem, p. 25.
137 Ibidem.
138 MELHUISH, Clare. Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 25
139 Ibidem, p. 26.
140, Ibidem.
141 FRETTON, Tony, apud MELHUISH, Clare Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 26.
142 MELHUISH, Clare. Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 25.
143 CULLINAN, Ted apud MELHUISH, Clare. Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 27.
144 MELHUISH, Clare. Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit., p. 28.
188
145 WENTWORTH, Richard apud MELHUISH, Clare. Art and architecture – the dynamics of collaboration. Architectural Design Profile nº 128, op. cit ., p. 28.
146 TSCHUMI, Bernard e CHENG, Irene (org.). The State of Architecture at the Beginning of the 21st Century. New York: The Monacelli Press, Inc. 2003, p. 1.
147 TOURNIKIOTIS, Panatotis. The Historiography of Modern Architecture. Cambridge: The MIT Press, 1999, p. ix.
148 FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975.
149 Ibidem.
150 TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 7.
151 Cf.MOSCATELI, Renato. A narrativa histórica em debate:algumas perspectivas. Revista Urutágua, n°6. Maringá. Disponível em
www.uem.br/urutagua/006/06moscateli.htm.
152 Ibidem.
153 THOMPSON, Edward P. apud MOSCATELI, Renato. A narrativa histórica em debate:algumas perspectivas. Revista Urutágua, n°6. Maringá. Disponível em
www.uem.br/urutagua/006/06moscateli.htm.
154 TOURNIKIOTIS, op. cit., p.3.
155 RICOEUR, Paul apud MOSCATELI, Renato. A narrativa histórica em debate:algumas perspectivas. Revista Urutágua, n°6. Maringá. Disponível em
www.uem.br/urutagua/006/06moscateli.htm
156 BANHAM, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva, 2003.
157 BLACKBURN, Simon. Dictionary of Philosophy. Oxford, New York: Oxford University press, 1996, p. 233.
158 MONTANER, J. M. La historiografia operativa del movimiento moderno in MONTANER, J. M. Arquitectura y Critica. 2002, pp. 52-53.
159 Ibidem, p. 34.
160 Ibidem.
161 Ibidem, p. 38.
162 Ibidem, p. 35.
163 Ibidem, p. 42.
164 Ibidem.
165 Ibidem, p. 45.
166 Ibidem, p. 46.
167 Ibidem, p. 47.
168 Ibidem.
169 Ibidem, p. 48.
170 Ibidem, pp. 48-49.
171 Ibidem, pp. 48-51.
172 Ibidem, p. 35.
173 VEYNE, Paul apud TINEM, Nelci. O Alvo do Olhar Estrangeiro O Brasil na historiografia da arquitetura moderna. João Pessoa: Editora Universitária, 2006, p.
21.
174 TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 226.
175 Ibidem , p. 227.
176 Ibidem, p. 231.
177 Ibidem, p. 193.
178 Ibidem, p. 4.
179 Ibidem, pp. 3-4.
180 Ibidem, pp. 3-4.
181 Ibidem, p. 226.
182 Ibidem, p. 240.
183 Ibidem, p. 241.
184 Ibidem.
185 Ibidem, p. 243.
186 Ibidem.
187 Ibidem, p. 243.
188 Ibidem, pp. 243-244.
189 Ibidem, p. 113.
190 Ibidem, p. 136.
191 Ibidem, p. 113.
192 Ibidem, p. 122.
193 Ibidem, p. 125.
194 Ibidem, p. 128.
195 Ibidem, p. 129.
196 Ibidem, p. 127.
197 Ibidem, p. 115.
198 Ibidem, p. 140.
189
199 Ibidem, pp. 139-140.
200 Ibidem, p. 138.
201 Ibidem, pp. 139-140.
202 Ibidem, p. 22.
203 Ibidem, p. 40.
204 Ibidem.
205 Ibidem, p. 48.
206 Ibidem, p. 57.
207 Ibidem, p. 80.
208 Ibidem, p. 81.
209 Ibidem.
210 Ibidem, p. 56.
211 Ibidem, p. 53.
212 Ibidem, p. 55.
213 Ibidem, p. 62.
214 Ibidem, p. 85.
215 BENEVOLO, Leonardo apud TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 27.
216 Ibidem, p. 94.
217 Ibidem, p. 96.
218 Ibidem.
219 BENEVOLO, Leonardo apud TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 100.
220 Ibidem, p. 107.
221 Ibidem, p. 96.
222 Ibidem, p. 107.
223 Ibidem, p. 108.
224 Ibidem, p. 107.
225 TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 108.
226 Ibidem, p. 98.
227 Ibidem, p. 99.
228 Ibidem, p. 98.
229 Ibidem, p. 105.
230 Ibidem, p. 146.
231 Ibidem, p. 151.
232 Ibidem, p. 150.
233 Ibidem, p. 162.
234 Ibidem, p. 163.
235 Ibidem, p. 165.
236 Ibidem.
237 Ibidem, p. 168.
238 Ibidem, p. 174.
239 Ibidem, p. 175.
240 Ibidem, p. 180.
241 Ibidem, p. 168.
242 PERRET, Auguste citado por COLLINS, Peter apud TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 178.
243 Ibidem, p. 178.
244 Ibidem, p. 179.
245 Ibidem, p. 180.
246 Ibidem, p. 169.
247 Ibidem, p. 188.
248 Ibidem, p. 183.
249 Ibidem, p. 181.
250 Ibidem, p. 176.
251 Ibidem, pp. 184-185.
252 Ibidem, p. 186.
253 Ibidem, p. 188.
254 Ibidem.
255 Ibidem, p. 198.
256 Ibidem, p. 193.
190
257 Ibidem, p. 198.
258 Ibidem, p. 212.
259 Ibidem, p. 214.
260 Ibidem, p. 202.
261 Ibidem, p. 198.
262 Ibidem.
263 Ibidem, p. 195.
264 Ibidem, p. 209.
265 Ibidem.
266 Ibidem, p. 210.
267 Ibidem, p. 199.
268 Ibidem, p. 214.
269 Ibidem, p. 211.
270 Ibidem, p. 199.
271 Ibidem, p. 215.
272 TINEM, Nelci. O Alvo do Olhar Estrangeiro – O Brasil na historiografia da arquitetura moderna. João Pessoa: Editora Universitária, 2006.
273 Ibidem, p. 212.
274 Ibidem, p. 25.
275 Ibidem.
276 Ibidem, p. 27.
277 Ibidem.
278 COSTA, Lúcio (1929) apud TINEM, op. cit., p. 44.
279 BRUAND, Yves (1981) apud TINEM op. cit., p. 56.
280 XAVIER, Alberto. (Org.). Arquitetura Moderna Brasileira: depoimento de uma geração. São Paulo: Pini/Abea/FVA, 1987.
281 FERRAZ, Geraldo (1965) apud TINEM, op. cit., p. 56.
282 BRUAND, Yves (1981) apud TINEM, op. cit., p. 57.
283 COSTA, Lúcio (1929) apud TINEM, op. cit., p. 28.
284 TINEM, op. cit., p. 27.
285 Ibidem, p. 34.
286 Ibidem.
287 Ibidem, p. 35.
288 Ibidem.
289 Ibidem.
290 Ibidem, p. 101.
291 PEVSNER, apud TINEM, op. cit., p. 102.
292Ibidem, p. 102.
293 Ibidem, p. 103.
294 Ibidem.
295 Ibidem, p. 104.
296 BENEVOLO, Leonardo (1960) apud TINEM, op. cit., p. 114.
297 Ibidem, p. 116.
298 Ibidem, p. 113.
299 Ibidem, p. 116.
300 ARGAN, Giulio Carlo, segundo TINEM, op. cit., p. 21.
301 TINEM, op. cit., p. 123..
302 Ibidem, p. 93.
303 ZEVI, Bruno apud TINEM, op. cit., p. 96.
304 Ibidem, p. 96.
305 Ibidem, p. 97.
306 Ibidem.
307 TAFURI, Manfredo apud TINEM, op. cit. p. 125.
308 FRAMPTON, Kenneth apud TINEM, op. cit., p. 126.
309 Ibidem, p. 128.
310 Ibidem.
311 Ibidem, p. 129.
312 GROPIUS, Walter. Bauhaus: Novarquitetura. São Paulo: Perspectiva, 2001, p. 82.
313 Ibidem, p. 82.
191
314 Em depoimento a John Peter apud PETER, John. The oral history of modern architecture: interviews with the greatest architects of the twentieth century. New
York: Harry N. Abrams, Inc, 1994, pp. 73-74.
315 GROPIUS, op. cit., p. 76.
316 Ibidem, p. 76.
317 HITCHCOCK, H. R. Painting Toward Architecture. New York: Duell, Sloan and Pearce, 1948, p. 38.
318 GROPIUS, op. cit., p. 44.
319 Ibidem, p. 44.
320 Ibidem, p. 94.
321 Ibidem, p. 37-38.
322 Ibidem, p. 39.
323 Ibidem, p. 77.
324 Ibidem.
325 Ibidem, p. 88.
326 Ibidem, p. 89.
327 GROPIUS, Walter Address to the Bauhaus Students in BENTON, Tim, BENTON, Charlotte e SHARP, Dennis. Form and Function – A source book for the History
of Architecture and Design 1890-1939. Londres: The Open University, 1975, p. 80.
328 PETER, op. cit., pp. 63-64.
329 Cf. Françoise Ducrot apud OZENFANT, Amedée e JEANNERET, Charles-Édouard. Depois do Cubismo. São Paulo: Cosac Naify, 2005, p. 11.
330 OZENFANT e JEANNERET, op. cit., p. 76.
331 Ibidem, p. 73.
332 Ibidem, p. 56.
333 Ibidem, p. 25.
334 Ibidem, p. 50.
335 Ibidem, p. 57.
336 Ibidem, p. 55.
337 Ibidem, p. 58.
338 Ibidem, p. 52.
339 LE CORBUSIER. Por uma Arquitetura. São Paulo: Perspectiva, 2004, p. XXXI.
340 Cf. COOKE, Catherine Chernikov – The construction of architectural and machine forms in Architectural Design 53 5/6-1983.
341 OZENFANT e JEANNERET, op. cit., p. 56.
342 Ibidem, p. 41.
343 Ibidem.
344 Ibidem, p. 63.
345 ATKINS, Robert. Art Spoke – A guide to Modern Ideas, Movements, and Buzzwords, 1848-1944. New York: Abbeville, 1993, p. 194.
346 OZENFANT e JEANNERET, op. cit., p. 32.
347 Ibidem, p. 75.
348 Ibidem, p. 77.
349 Ibidem, p. 66.
350 LE CORBUSIER, op. cit., p. 133.
351 OZENFANT e JEANNERET, op. cit., p. 44.
352 LE CORBUSIER, op. cit., p. 3.
353 Ibidem, p. 10.
354 Ibidem, pp. 16-17.
355 Ibidem, p. 27.
356 Ibidem, p. 27.
357 Ibidem, p. 101.
358 Ibidem, p. 47.
359 Ibidem, p. 153.
360 Ibidem, p. 89.
361 BANHAM, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva, 2003, p. 357.
362 LE CORBUSIER e OZENFANT. Purism in BENTON, Tim, BENTON, Charlotte e SHARP, Dennis. Form and Function – A source book for the History of
Architecture and Design 1890-1939. Londres: The Open University, 1975, pp. 89-90.
363 Ibidem, p. 90.
364 Ibidem, p. 89.
365 BRUAND, Yves. Arquitetura Contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2003, p. 120.
366 Ibidem, p. 120.
367 Ibidem, p. 121.
368 Ibidem.
192
369 NOBRE, Ana Luiza (et. altri). Um modo de ser moderno. São Paulo: Cosac e Naify, 2004, pp. 181-189.
370 LEONÍDIO, Otávio apud Lucio Costa, historiador? in NOBRE et altri, op. cit., p. 185.
371 XAVIER, Alberto. (Org.). Arquitetura Moderna Brasileira: depoimento de uma geração. São Paulo: Pini/Abea/FVA, 1987, p.27.
372 Ibidem, p. 26.
373 Ibidem, p. 28.
374 Ibidem, p. 26.
375 Ibidem, p. 27.
376 Ibidem, pp. 26 – 27.
377 Ibidem, p. 26.
378 Ibidem, p. 28.
379 Ibidem, p. 32.
380 WISNIK, Guilherme in A arquitetura lendo a cultura NOBRE et altri, op. cit., p. 39.
381 Ibidem, p. 38.
382 SEGRE, Roberto Ideologia e estética no pensamento de Lucio Costa in NOBRE et altri, op. cit., p. 105.
383 ARAÚJO, Ricardo Bezaquen apud Nas asas da razão: ética e estética na obra de Lucio Costa in NOBRE et altri, op. cit., p. 60.
384 MARTINS, Carlos A. F. Lucio Costa e Le Corbusier: afinidades eletivas NOBRE et altri, op. cit., pp. 71-83.
385 ARANTES, Otília Beatriz Fiori in Esquema de Lucio Costa NOBRE et altri, op. cit., p. 89.
386 Ibidem, p. 93.
387 Ibidem, p. 98.
388 Ibidem, p. 87.
389 GRAY, Camilla. L’Avant Garde Russe dans l’Art Moderne. Paris: Thames and Hudson SARL, 2003.
390 ARANTES, Otília Beatriz Fiori, op. cit., p. 99.
391 Ibidem, p. 100.
392 COSTA, Lucio. Razões da nova arquitetura. Revista da Diretoria de Engenharia da PDF, Rio de Janeiro: 3-9, jan. 1936.
393 XAVIER, Alberto. (Org.), op.cit., p. 39.
394 Ibidem.
395 Ibidem, p. 40.
396 Ibidem, p. 39.
397 Ibidem, p. 30.
398 Ibidem, p. 35.
399 Ibidem, p. 31.
400 Ibidem, p. 35.
401 Ibidem.
402 Ibidem, 31.
403 Ibidem, p. 37.
404 HITCHCOCK, H. R. Modern Architecture – Romanticism and Integration. New York: Payson & Clarke Ltd., 1929, p. 187.
405 Ibidem, p. 161.
406 TOURNIKIOTIS, Panatotis. The Historiography of Modern Architecture. Cambridge: The MIT Press, 1999, p. 136.
407 Hitchcock, 1929, p. 209.
408 Ibidem, p. 210.
409 Ibidem, pp. 60-61.
410 Ibidem, p. 201.
411 Ibidem, p. 188.
412 Ibidem, p. 156.
413 Ibidem, p. 181.
414 Ibidem, p. 167.
415 J.J.P. Oud, 1921 apud Hitchcock, 1929, p.175.
416 Hitchcock, 1929, p. 157.
417 Ibidem, p. 158.
418 Ibidem, p. 156.
419 Ibidem, p. 158.
420 Ibidem, p. 178.
421 Ibidem, p. 178.
422 Ibidem, p. 182.
423 HITCHCOCK, H.R. e JOHNSON, P. The International style: architecture since 1922. New York: W. W. Norton & Co. Inc., 1995.
424 FLEMING, John, HONOUR, Hugh e PEVSNER, Nikolaus. Penguin Dictionary of Architecture and Landscape Architecture. London: Penguin Books, 1999, pp.
285-286.
425 HITCHCOCK, H. R. e JOHNSON, P. op.cit..
193
426 TOURNIKIOTIS, op. cit., p. 140.
427 HITCHCOCK, H. R. e JOHNSON, P., op. cit..
428 JOHNSON, P. Foreword to the 1995 Edition in HITCHCOCK, H. R. e JOHNSON, P., op.cit., pp. 13-17.
429 HITCHCOCK, H. R., 1948, p. 27.
430 HITCHCOCK e JOHNSON, op.cit., pp. 38-39.
431 HITCHCOCK, 1948, p. 52.
432 Ibidem.
433 Ibidem, p. 53.
434 Ibidem.
435 Ibidem, p. 75.
436 Questão discutida no Capítulo VIII, Architecture and Building, HITCHCOCK, 1948, pp. 90-95.
437 HITCHCOCK, 1948, p. 85.
438 Ibidem, p. 88.
439 Ibidem, p. 247.
440 Ibidem, p. 34.
441 Ibidem, p. 35.
442 Ibidem, p. 36.
443 GROPIUS, op. cit., p. 132.
444 JOHNSON, P. Foreword to the 1995 Edition in HITCHCOCK, H. R. e JOHNSON, P , op. cit., p. 16.
445 SARTORIS, Alberto, cf. Françoise Jaunin em http://www.athenaeum.ch/oeuvre.htm (acesso 1/06/2006, 9:14hs)
446 KAUFMANN, Emil. De Ledoux a Le Corbusier – Origen y desarrollo de la arquitectura autónoma. Barcelona: Editorial Gustavo Gilli, 1985, p.74.
447 Ibidem, pp. 70-71.
448 Ibidem, p. 51.
449 Ibidem, p. 29.
450 Ibidem, p. 22.
451 Ibidem, p. 89.
452 Ibidem, pp. 69-70.
453 Ibidem, p. 59.
454 Ibidem, p. 37.
455 Ibidem, p. 40.
456 Ibidem.
457 Ibidem, p. 33.
458 Ibidem, p. 71.
459 Ibidem, p. 34.
460 Ibidem, pp. 72-73.
461 Ibidem, p. 54.
462 Ibidem.
463 Ibidem.
464 Ibidem.
465 Ibidem, p. 65.
466 Ibidem, p. 74.
467 Ibidem, p. 72.
468 Ibidem, pp. 29-30.
469 Ibidem, pp. 70-71.
470 Ibidem.
471 Ibidem, p. 59.
472 Ibidem, pp. 34-35.
473 Ibidem, p. 90.
474 Ibidem, p. 89.
475 Ibidem, p. 80.
476 Ibidem, pp. 80-81.
477 Ibidem, pp. 79-80.
478 Ibidem, p. 91.
479 Ibidem, p. 90.
480 Ibidem, p. 91.
481 Ibidem, pp. 74-75.
482 Ibidem, p. 94.
483 Ibidem, p. 94.
194
484 PEVSNER, Nikolaus. Pioneers of Modern Design – From William Morris to Walter Gropius. Middlesex: Penguin Books Ltd., 1974, p. 17.
485 Ibidem, p. 21.
486 Ibidem.
487 Ibidem, p. 22.
488 Ibidem, p. 23.
489 Ibidem, p. 24.
490 Ibidem, p. 26.
491 Ibidem.
492 Ibidem.
493 Ibidem, p. 31.
494 WRIGHT, F.L., apud PEVSNER, 1974, p. 31.
495 Ibidem, p. 32.
496 Ibidem, p. 37.
497 Ibidem.
498 Ibidem, p. 45.
499 Ibidem, p. 53.
500 Ibidem.
501 Ibidem.
502 Ibidem, p. 68.
503 Ibidem, p. 70.
504 Ibidem, p. 88.
505 Ibidem, p. 70.
506 Ibidem, p. 71.
507 Ibidem.
508 Ibidem, p. 75.
509 Ibidem, p. 88.
510 Ibidem, p. 89.
511 Ibidem, p. 96.
512 Ibidem, p. 147.
513 Ibidem.
514 Ibidem, p. 182.
515 GIEDION, Sigfried. Espaço, Tempo, Arquitetura – O desenvolvimento de uma nova tradição. São Paulo: MartinsFontes, 2004, p. 701.
516 Ibidem, p. 896.
517 Ibidem, p. 701.
518 Ibidem, p. 51.
519 Ibidem, p. 463.
520 Ibidem, p. 466.
521 Ibidem, p. 462.
522 Ibidem, p. 461.
523 Ibidem, p. 472.
524 Ibidem, p. 473.
525 Ibidem, p. 463.
526 Ibidem, p. 549.
527 Ibidem, p. 466.
528 Ibidem, pp. 491-592.
529 Ibidem.
530 Ibidem, p. 178.
531 Ibidem, p. 897.
532 Ibidem.
533 Ibidem.
534 SHAPIRO, Meyer. A unidade da arte de Picasso in SHAPIRO, 2002, p. 36.
535 Ibidem, p. 39.
536 Ibidem.
537 Ibidem, p. 41.
538 Ibidem, p. 150.
539 Ibidem, p. 158.
540 Ibidem, p. 161.
541 GIEDION, op. cit., p. 471.
195
542 Ibidem.
543 Ibidem.
544 Ibidem.
545 Ibidem, p. 178.
546 Ibidem, p. 179.
547 Ibidem, p. 471.
548 Ibidem.
549 Ibidem.
550 Ibidem.
551 Ibidem.
552 Ibidem, p. 610.
553 Ibidem, p. 548.
554 Ibidem.
555 Ibidem, p. 549.
556 Sobre as relações desse expediente da pintura de Le Corbusier com sua arquitetura ver REICHLIN, Bruno. Jeanneret-Le Corbusier, Painter-Architect in BLAU, Eve
and TROY, Nancy J.. Architecture and Cubism. Cambridge: The MIT Press, 2002.
557 GIEDION, op. cit., p. 568.
558 Ibidem, p. 556.
559 Ibidem.
560 Ibidem, p. 568.
561 Ibidem.
562 Ibidem, p. 569.
563 FRAMPTON, Kenneth. História Crítica da Arquitetura Moderna. São Paulo:Martins Fontes,1997, p. x.
564 FLEMING, John, HONOUR, Hugh e PEVSNER, Nikolaus. Penguin Dictionary of Architecture and Landscape Architecture. London: Penguin Books, 1999, p.
242.
565 GIEDION, op. cit., p. 521.
566 Ibidem, p. 237.
567 Ibidem, p. 493.
568 Ibidem, p. 524.
569 Ibidem, p. 525.
570
Ibidem.
571 Ibidem.
572 Ibidem, p. 524.
573 Ibidem.
574 Ibidem.
575Ibidem, p. 521.
576 Ibidem.
577 ROWE, Colin e SLUTZKY, Robert. Transparency With a Commentary by Bernhard Hoesli and an Introduction by Werner Oechslin. Basel; Boston; Berlin:
Birkhäuser, 1997.
578 Polêmica comentada em diversos artigos reunidos em BLAU, Eve and TROY, Nancy J., op. cit..
579 Le Corbusier apud BANHAM, op. cit., p. 500.
580 SARTORIS Alberto Introduzione alla architettura moderna. Milano: Ulrico Hoepli, 1943, p. 3.
581 Ibidem, p. 162.
582 The Architect’s Yearbook: 2, London 1948, pp.12-23, cf. HITCHCOCK, 1948, p. 50.
583 HITCHCOCK, 1948, p. 11.
584 Ibidem, p. 54.
585 Ibidem, p. 44.
586 Ibidem, p. 14.
587 Ibidem, p. 16.
588 DENIS, Maurice. A Definition of Neo-Traditionalism (1890) in NOCHLIN, Linda. Impressionism and Post-Impressionism 1874-1904 – Sources and Documents.
New Jersey: Prentice-Hall, Inc., 1966, p. 187.
589 HITCHCOCK, 1948, p. 14.
590 HARRISON, Charles. Abstração, figuração e representação in HARRISON, Charles, FRASCINA, Francis e PERRY, Gill. Prim5((v)18.2442(is)-0.113093(m)18.303oã)]TJ202.4367 0 Td[(,)-9.40934( )-9.40934C(u)-0.284994(b)-0.284994(is)-0.113093(m)18.303oã, Abs(r)-0.524752(a)-0.696653çao – 9]TJ-165734 -11.4 Td[(Co)-0.287256(m)18.3041(e)-0.700046çeo do scuo . São Pauo: Cosac Na(f)-0.524752(y)-0.287256( )-9.40708(E)-0.461419(d)-0.287256((ç)-0.698915(õ)-0.287256(e)-0.698915(s)-0.113093(,)-9.40708( )-9.40708(1)-0.284994(9)]TJ1644294 0 Td[(9)-0.284994(8)-0.284994(,)-9.40934( )-9.40934(p)-0.284994(.)-9.40934( )-9.40934(2)-0.284994(2)-0.284994(2)-0.284994(.)-9.40934( )]TJ-1644294 -11.52 Td[(5)-0.287256(9)-0.287256(1)-0.287237( )-9.40821(H)-0.636714(I)18.0044(T)-0.46255(CH)-0.636714(CO)-0.637845(CK)-0.637845(,)-9.40708( )-9.40708(1)-0.287256(9)-0.287256(4)-0.287256(8)-0.287256(,)-9.40708( )-9.40708(p)-0.287256(.)-9.40708( )-9.40708(1)-0.287256(3)-0.287256(.)-9.40708( )]TJT*[(5)-0.287256(9)-0.287256(2)-0.287237( )-9.40821(I)18.0044(b)-0.287256(id)-0.287256(e)-0.700046(m)18.3041(,)-9.40821( )-9.40821( )-9.40821(p)-0.287256(.)-9.40708( )-9.40708(1)-0.287256(4)-0.287256(.)-9.40708( )]TJT*[(5)-0.287256(9)-0.287256(3)-0.287237( )-9.40821(I)18.0044(b)-0.287256(id)-0.287256(e)-0.700046(m)18.3041(,)-9.40821( )-9.40821( )-9.40821(p)-0.287256(.)-9.40708( )-9.4070829)-0.287256(2)-0.287256(.)-9.40708( )]TJT*[(5)-0.287256(9)-0.287256(4)-0.287237( )-9.40821(I)18.0044(b)-0.287256(id)-0.287256(e)-0.700046(m)18.3041(,)-9.40821( )-9.40821( )-9.40821(p)-0.287256(.)-9.40708( )-9.40708293.
196
595 Ibidem.
596 Ibidem, p. 15.
597 Ibidem.
598 Ibidem.
599 Ibidem, pp. 8 a 10.
600 Ibidem, p. 9.
601 Ibidem, p. 10.
602 Ibidem.
603 Ibidem, p. 24.
604 Ibidem.
605 Ibidem.
606 Ibidem, p. 24.
607 Ibidem.
608 Ibidem, p. 26.
609 Ibidem.
610 Ibidem, p. 28.
611 Ibidem.
612 Ibidem, p. 30.
613 Ibidem.
614 Ibidem.
615 Ibidem, p. 32.
616 Ibidem.
617 Ibidem.
618 Ibidem.
619 Ibidem, p. 50.
620 Ibidem, p. 52.
621 Ibidem.
622 Ibidem.
623 Ibidem, p. 52.
624 Ibidem, p. 54.
625 Ibidem.
626 Ibidem, p. 45.
627 Ibidem, p. 48.
628 Ibidem, p. 20.
629 Ibidem, p. 10.
630 Ibidem, p. 20.
631 Ibidem.
632 Ibidem, p. 18.
633 Ibidem.
634 Ibidem, p. 20.
635 Ibidem, p. 34.
636 Ibidem.
637 Ibidem, p. 36.
638 Ibidem.
639 Ibidem.
640 Ibidem, p. 72.
641 Ibidem,
642 Ibidem, p. 38.
643 Ibidem.
644 Ibidem, p. 42, ver nota ao pé da página.
645 Ibidem, p. 44.
646Ibidem.
647 Ibidem.
648 Ibidem, p. 42.
649 Ibidem, p. 38.
650 Ibidem, p. 42.
651 GROPIUS, op. cit., pp. 39-40 e HITCHCOCK, op. cit., p. 50.
652 ZEVI, Bruno. Poetica de la arquitetura neoplastica. Buenos Ayres: Editorial Victor Lerú, 1966, p. 5.
197
653 Ibidem, p. 7.
654 Ibidem.
655 Ibidem, p. 24.
656 Ibidem.
657 Ibidem, p. 28.
658 Ibidem, p. 121-122.
659 Ibidem, p.7.
660 Ibidem, p. 12-25.
661 Ibidem, p. 12.
662 Ibidem.
663 Ibidem.
664 Ibidem, p. 13.
665 Ibidem, p. 12.
666 Ibidem, p. 13.
667 Ibidem.
668 Ibidem.
669 Ibidem.
670 Ibidem, p. 12.
671 Ibidem, p. 14.
672 Ibidem.
673 Ibidem.
674 Ver sobre isso o obituário de Zevi publicado no jornal Inglês The Guardiam, disponível em http://www.guardian.co.uk/obituaries/story/0,,230995,00.html (acesso
28/05/2006 10:08hs).
675 ZEVI, op. cit., p. 15.
676 Ibidem.
677 Ibidem, p. 16.
678 Ibidem, p. 18.
679 PERLOFF, Nancy. The Puzzle of El Lissitsky’s artistic Identity in PERLOFF, Nancy e REED, Brian (Org.). Situating El Lissitsky: Vitebsk, Berlin, Moscow. Los
Angeles: Getty Reseach Institute, 2003, p. 7.
680 GIEDION, op. cit., p. 515.
681 ZEVI, op. cit., p.20.
682 Ibidem, p.22.
683 Ibidem, p.21.
684 Ibidem, p.23.
685 Ibidem.
686 Ibidem.
687 Ibidem, p.24.
688 Ibidem, p. 22.
689 Ibidem, p. 9.
690 Ibidem, p. 49.
691 Ibidem, p.
7.
692 Ibidem, p. 4.
693 Ibidem, p.21.
694 Ibidem, p. 101.
695 Ibidem.
696 Ibidem, p. 23.
697 Ibidem,.
698 Ibidem, p. 33.
699 Ibidem, p. 39.
700 Ibidem, p. 40.
701 Ibidem, p. 77.
702 Ibidem, p.
51.
703 Ibidem, p.
92.
704 Ibidem, p.
23.
705 Ibidem, p.
72.
706 Ibidem, p.
31.
707 Ibidem, p.
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