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ISABEL COELHO MOLA
AVALIANDO UMA PROPOSTA PARA MODIFICAR PRÁTICAS COERCITIVAS
DE PROFISSIONAIS DE EDUCAÇÃO FÍSICA
PUC-SP – SÃO PAULO
2007
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ISABEL COELHO MOLA
AVALIANDO UMA PROPOSTA PARA MODIFICAR PRÁTICAS COERCITIVAS
DE PROFISSIONAIS DE EDUCAÇÃO FÍSICA
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título
de DOUTORA em EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA
DA EDUCAÇÃO, sob orientação da Profa. Dra.
Melânia Moroz, PUC SP.
2007
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BANCA EXAMINADORA
4
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta tese por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: _________________________
São Paulo, maio de 2007
5
You are my sunshine,
My only sunshine.
You make me happy,
When skys are grey.
You never noticed,
How much I love you.
So please don't take my sunshine away.
Para João Pedro
6
AGRADECIMENTOS:
São 10 anos de aprendizagem com minha orientadora. Cheguei tão crua e agora consigo usar até
as palavras corretas para expressar minhas idéias. Minha sempre admiração por seu engajamento no
trabalho, que mesmo enfrentando problemas pessoais, sempre me acolheu.
Contar com opiniões da Profa. Dra. Denise Rubano e da Profa. Dra. Maria Regina Brandão na
qualificação ajudaram a traçar uma linha mais definida do trabalho. Obrigada por uma leitura tão
competente, e tão carinhosa.
Desde pequena, sempre vi meus pais lerem. Meu pai sempre me ensinou que os livros nos ajudam a
criar nossas próprias idéias e concepções, minha mãe sempre me ensinou que os livros nos fazem
companhia e que, por meio deles, vivemos em lugares e tempos diferentes dos nossos. A leitura
sempre foi um diferencial na minha vida. Com certeza estes são os meus maiores incentivadores de
todas as jornadas.
O período de construção de uma tese é complicado e nos faz abrir mão de muitas coisas. Ainda bem
que sempre tive o João Pedro de quem eu não abria mão. Quantas vezes não parei a leitura ou a
digitação para brincar de pokemon ou, nas noites, saía dos livros da tese e entrava nas aventuras
enormes de cavaleiros, leões, bruxas em lugares distantes e inexistentes. Todo meu amor ao meu
maior companheiro, João Pedro.
Na longa construção do trabalho existem momentos que estamos tão cansados, tão irritados e tão
desanimados que tudo parece longe e infinito. Nestes momentos tão solitários sempre contei com um
olhar, um abraço forte e um ombro. Ao Ricardo, meu companheiro, que sempre falou baixinho num
abraço que tudo ia dar certo e que nem tudo estava tão ruim assim, meu amor.
Quantas perguntas tive que responder para minha tão pequena e curiosa Luíza. Não foi muito
simples explicar o que era uma tese, quem era esse tal de Skinner, o que era punição, mas com tanta
curiosidade e charme, ela foi meu grande desafio, pois se uma criança de sete anos entendesse o
por que de tantas coisas, acho que estaria sendo clara. Se bem que na última semana ela me disse
que estava feliz que a tese tinha acabado mas ainda não entendia o que era isso.
Aos meus pequenos sobrinhos Antônio, Francisco e Felipe, meus momentos mais divertidos durante
toda essa confusão. Na chamada para as brincadeiras sempre ouvi uma frase tão simples: “depois
você faz isso...” Quem bom que eles estavam lá, para mostrar que sempre um tempo para brincar
e que depois a gente faz outras coisas.
Em muitos convites de jantares, sempre pude conversar com meus irmãos e agregados sobre meu
trabalho. Sempre bons ouvintes e grandes cozinheiros, mas o melhor era que, para a Carmen e o
Sidnei, as opiniões eram leigas e divertidas, para a Bia e o Gui a conversa era acadêmica e
divertida. Que bom poder contar sempre com tão boa comida e opiniões divertidas.
Uma das coisas mais importantes para trabalharmos em uma instituição beneficente é acreditar que
as pessoas mudam. Se alguém que acredita na mudança das crianças pela educação essa é a
diretora da Instituição, Sra Thereza Cavalcanti Samaja. Meus agradecimentos por sua confiança em
meu trabalho.
Aos professores que fizeram parte da pesquisa, meus agradecimentos ao engajamento à proposta e
a coragem de terem suas aulas observadas e discutidas sem medo de mudar.
7
RESUMO
Avaliando uma proposta para modificar práticas coercitivas de profissionais de
Educação Física
Tendo como referência a reflexão de B. F. Skinner sobre Educação, e suas
considerações sobre os efeitos nocivos do uso de práticas coercitiva, o presente
trabalho teve como objetivos identificar o uso de tais práticas nas atividades
pedagógicas de professores de Educação Física, e, em caso positivo, propor
intervenção no sentido de diminuir a freqüência de tais práticas.
O trabalho foi desenvolvido em uma instituição beneficente, localizada na cidade de
São Paulo. Foram participantes três profissionais que exerciam a função docente
nas modalidades de futsal, voleibol e capoeira. Os dados foram obtidos por
questionamento, (em situações estruturadas e informais), e por observação, nas
aulas das diferentes modalidades. A proposta de intervenção envolveu três etapas:
1) Pré-intervenção observação de três aulas, de cada modalidade, para detecção
das práticas coercitivas; 2) Intervenção observação de aulas e encontro de
discussão, com o docente, sobre situações evidenciadas nas interações
pedagógicas. O conjunto de aulas observadas variou entre 8 e 10, por professor; 3)
Pós-intervenção observação de três aulas, de cada modalidade, com o objetivo de
verificar os efeitos da intervenção.
Na Pré-Intervenção, detectou-se o uso de práticas coercitivas em três situações
diferentes: a) na ocorrência de comportamentos inadequados pelos alunos; b) na
ocorrência de comportamentos incorretos; e c) na intenção de motivar a turma.
Constatou-se que a ocorrência de práticas coercitivas era decorrente da inabilidade
dos docentes no desempenho de sua função e que determinados contextos
favoreciam a eclosão de comportamentos inadequados: a) falta de organização nas
atividades de ensino; b) uso freqüente de filas durante o ensino de movimentos; c)
número excessivo de informações e falta de clareza nas instruções fornecidas; d)
falta de planejamento das aulas; e) atenção do professor consequenciando
comportamentos inadequados e não comportamentos acadêmicos. Durante o
processo de intervenção, as informações relativas às práticas educativas
observadas foram tratadas tendo como modelo a Análise Funcional, o que permitiu
elencar as situações tomadas como alvo de discussão com os docentes. A
intervenção mostrou-se eficiente, que, dentre os resultados alcançados, houve
alteração das ações dos professores, no sentido de ministrarem suas aulas em um
ambiente reforçador, e não coercitivo. Para tanto, foi fundamental a modificação nas
próprias atividades de ensino - os professores passaram a criar situações que
favoreciam a emissão de comportamentos acadêmicos, portando incompatíveis ou
que tornavam menos provável a emissão de comportamentos inadequados pelos
alunos, os quais passaram a ser alvo de conseqüências reforçadoras. Os dados
obtidos permitem sugerir que uso de práticas coercitivas por docentes quando
suas propostas pedagógicas são pouco eficientes.
Palavras-Chave: Educação Física; Práticas Educativas; Práticas Coercitivas; Análise
Funcional.
8
ABSTRACT
Evaluating a proposal to modify coercive practices about professionals of Physical
Education
Having like reference a reflection of B. F. Skinner about Education and its
considerations about the use coercive practices noxious effects and considering that
these ones do present in our society, it developed the present work that had as
objective to identify there was the coercive practices use during teachers' Fitness
pedagogical activities, and, in positive case, propose intervention in the sense of
decreasing the frequency of such practices. The work was going developed in a
Beneficent Institution located in São Paulo's city. They were participants three
professionals that exercised the educator function in footsal, volleyball, and capoeira
modalities. The data were going obtained for question (structured and informal
situations) and for observation in natural context (the different modalities classes).
The intervention proposal involved three stages: 1) Pre-intervention observation of
three classes, of each modality, for coercive practices presents detection during the
pedagogical activities; 2) Intervention - classes observation and discussion of
encounter, with the educator about situations evidenced in the pedagogical
interactions; the observed classes set varied between 8 and 10, for teacher; 3) Post-
intervention observation of three classes, of each modality, with the goal of
verifying the intervention effects. In Pre-intervention, it detected the coercive
practices use in three different situations: a) the inadequate behaviors occurrence by
the students; b) the incorrect behaviors occurrence; and c) like form of motivating the
group. It verified that the occurrence of such coercive practices was current of the
educators’ inability in the performance of your function and how certain contexts
favored the inadequate behaviors appearance: a) organization lack during the
teaching activities; b) lines frequent use during the movements teaching; c)
information clearness excessive number and lack in the supplied instructions; d)
classes planning lack; e) teacher's attention occasioning inadequate behaviors and
not academic behaviors. During the Intervention process, the relative information to
the observed educational practices were going treated having like model the
Functional Analysis, what it allowed select the situations that would be objective of
discussion with the teachers. The intervention it showed efficient, since, among the
reached results, there was teachers actions alteration, in the sense of administer
their classes in a reforce ambient, and not coercive. For so much, it was fundamental
the modification in the teaching own activities - the teachers proceeded creating
situations that favored the academic behaviors emission, behaving incompatible or
that turned less probable the inadequate behaviors emission by the students, the
which ones would passed be reforces consequences objectives. The obtained data
allow to suggest that there is coercive practices use for educators when its
pedagogical proposals are little efficient.
Keywords: Physical Education; Educational Practices; Coercive Practices; Functional
Analysis.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................10
CONSIDERAÇÕES SOBRE O BEHAVIORISMO RADICAL............12
Ensino - Aprendizagem para o Behaviorismo Radical.........24
A Escola...............................................................................27
O Behaviorismo Radical e a Educação Física.....................37
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.........................................44
A instituição: contexto, condições físicas, recursos, projetos,
discentes, docentes.............................................................56
RESULTADOS E DISCUSSÃO........................................................66
Concepções e Práticas Educativas de S1...........................66
Concepções e Práticas Educativas de S2...........................128
Concepções e Práticas Educativas de S3...........................173
CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................212
Comportamentos inadequados e incorretos –
alvo das práticas coercitivas................................................213
Fatores relacionados à ocorrência de práticas coercitivas ..216
Mudando as práticas educativas dos professores –
a contribuição a partir da abordagem comportamental........219
A manutenção da atuação docente .....................................223
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................226
ANEXOS...........................................................................................230
10
Introdução
sete anos quando iniciei um Projeto de Atividade Física na instituição em
que trabalho, deparei-me com vários problemas de aceitação das atividades pelas
crianças. Durante esse tempo, como coordenadora do projeto, tenho buscado junto
com os professores, algumas opções de respostas para nossas aflições. Uma
dessas aflições diz respeito ao uso de ações coercitivas dos professores durante o
ensino de atividades físicas.
A ação coercitiva na área de Educação Física pode ser amplamente
evidenciada na atuação de técnicos esportivos tanto nas categorias de alto nível
quanto nas categorias iniciais. No caso da instituição em que trabalho, observando
as aulas, pude perceber que os professores utilizam ações coercitivas, tanto para
eliminar os comportamentos que julgam inadequados quanto para instalar aqueles
considerados adequados.
Como muitos autores afirmam e podemos comprovar na prática, a coerção
traz uma modificação de comportamento momentânea. Talvez seja exatamente esse
o maior mal da coerção: momentaneamente resolve o problema para o professor -
ao afastar o que é aversivo (neste caso o comportamento inadequado do aluno), o
comportamento do professor acaba sendo reforçado negativamente. O problemático
são os efeitos cumulativos do uso coerção e sua ineficiência para a aprendizagem.
Uma das perguntas que eu sempre me fiz é: se podemos observar o prazer
que o movimento traz para as crianças, por que temos que fazer o uso de ações
coercitivas tão freqüentemente na nossa prática?
O prazer do movimento é enfatizado em estudo realizado por Strazzacappa
(2001), que analisa a dança no espaço escolar. A autora observa que A imobilidade
física funciona como punição e a liberdade de se movimentar como prêmio. Estas
atitudes evidenciam que o movimento é sinônimo de prazer e a imobilidade, de
desconforto (p.1). Através do relato de professores da rede de ensino, a autora
verifica que a “aula de dança” é usada como moeda de troca para “acalmar” a
classe: ou vocês ficam quietos e prestam atenção, ou não irão para a aula de
dança” (Strazzacappa, 2001, p.5).
Posso observar no meu cotidiano a motivação que o movimento traz para as
crianças: nos momentos de ir para a capoeira ou para a dança, elas sempre o fazem
correndo e gritando; na fila de espera para novas vagas do futsal; e nas inúmeras
11
vezes em que esperam as aulas, as crianças sempre se movimentam. Se todo este
prazer está nas atividades que são objeto de nossa prática profissional, por que
necessitamos de tantas ações coercitivas no nosso dia-a-dia, ao ensinar?
Com esta grande inquietação, acabei sendo apresentada aos conceitos da
proposta do Behaviorismo Radical, que permite algumas tentativas de respostas.
Não fórmulas mágicas, mas propostas que nos levam a entender os
comportamentos adequados e inadequados dos alunos e, assim, entendendo-os,
permite-nos reduzir ou evitar o uso de ações coercitivas.
Quando me deparei com esta proposta, o que me encantou foi a maneira
como Skinner ressalta a importância de olharmos nosso aluno, de nos
preocuparmos efetivamente com ele, de descobrirmos o que ele faz de bom, de
reforçar comportamentos positivos diminuindo o uso de práticas coercitivas.
Nessa perspectiva, o presente trabalho apresenta uma proposta para diminuir
o uso de práticas coercitivas dos professores nas aulas de Educação Física,
procurando aumentar a eficácia da atuação docente. Início meu trabalho,
apresentando conceitos básicos do Behaviorismo Radical e aplicações no contexto
educacional, sem a pretensão de esgotar o assunto ou me aprofundar
demasiadamente na discussão teórica, uma vez que o; meu objetivo é o de que o
leitor compreenda de onde eu parti a prática pedagógica - para elaborar minha
proposta.
12
Considerações sobre o Behaviorismo Radical
O Behaviorismo Radical, proposto por B.F. Skinner, pode ser considerado a
filosofia da Ciência do Comportamento. Baum (1994) salienta que o Behaviorismo
Radical é o conjunto de idéias sobre a ciência chamada Análise do Comportamento;
desta maneira o Behaviorismo Radical não é a ciência do comportamento, mas sim
a filosofia que a embasa.
A proposta de Skinner, o Behaviorismo Radical, é baseada em um
pressuposto fundamental o de que os eventos com os quais a psicologia atua são
naturais -, do qual decorre uma proposição sobre as “causas”
1
do comportamento - a
de que tais “causas” são identificáveis (De Rose, 1982; Smith, 1994).
Zanotto (2000) afirma que, no momento em que elenca o comportamento
como seu objeto de estudo, Skinner está pressupondo que o comportamento é
ordenado e determinado (Skinner, 1974 apud Zanotto, 2000); desta forma é
possível descobrir e especificar os fatores que o determinam.
Para Skinner (1994), a ciência tem como objetivo a busca de relações
regulares e ordenadas entre os eventos da natureza. É por meio da identificação
destas relações que se pode atuar de forma mais eficiente sobre os fenômenos,
inclusive os humanos. Isto é importante porque, como afirma o autor:
Se pudermos observar cuidadosamente o comportamento
humano, de um ponto de vista objetivo e chegar a
compreendê-lo pelo que é, poderemos ser capazes de adotar
um curso mais sensato de ação. (Skinner, 1994, p.19).
Explicitando sua concepção determinista, Skinner propõe o modelo de
seleção por conseqüências, no qual focaliza três níveis de variação e seleção
responsáveis pela ocorrência do comportamento de um ser humano: a própria
seleção natural, que De Rose (1982) define como história genética resultante da
evolução da espécie ao momento da concepção do indivíduo; o condicionamento
operante, que diz respeito à história de vida de cada indivíduo, envolvendo as
1
O termo “causas” utilizado no behaviorismo radical tem o significado de relações funcionais entre eventos, isto é de relações
entre o comportamento e as variáveis (antecedentes e conseqüentes do ambiente) a ele relacionadas. Ambiente deve ser
entendido como aquilo (objeto físico, pessoa, fenômeno natural, mensagens, estados fisiológicos...) que se relaciona com o
comportamento.
13
relações entre o indivíduo e seu meio e que explica porque cada ser se comporta de
determinado modo, e, além desses dois, a evolução da cultura.
Segundo Zanotto (2000), no primeiro nível, o processo de seleção natural
possibilita aos organismos de uma dada espécie a aquisição, pelo processo seletivo,
de um conjunto de características e de padrões comportamentais que os prepara os
indivíduos para sobreviver em um mundo semelhante àquele em que a espécie
evoluiu
2
.
Em um segundo nível, os indivíduos são preparados para se comportarem em
ambientes em mudança: o condicionamento operante. Zanotto (2000) salienta que é
o comportamento operante que garante, a partir de variações também aleatórias nas
respostas do indivíduo durante sua história de vida, que novos comportamentos
sejam adquiridos, possibilitando-lhe a aquisição de um repertório comportamental
apropriado a novos ambientes.
Zanotto (2000) aponta que, apesar de a relação com o ambiente acelerar as
mudanças no indivíduo, é difícil a aquisição, no espaço de uma vida, de todo o
repertório comportamental necessário à sobrevivência do indivíduo, num mundo em
rápida mudança. A autora salienta que é a partir do comportamento de outras
pessoas que o indivíduo pode adquirir novos comportamentos; neste caso, faz-se
referência à evolução dos ambientes sociais, a cultura, (o terceiro e último nível de
variação e seleção) responsável, também, por levar os indivíduos a adquirirem
novos comportamentos. Na cultura, as conseqüências que exercem papel seletivo
são as que afetam o grupo, e não o indivíduo.
O que garante a evolução de uma cultura, entendida como o
conjunto das contingências sociais, é a ocorrência de práticas
cujas conseqüências contribuem para o sucesso do grupo e
não de seus membros individualmente. (Zanotto, 2000, p. 55).
Para Vale (1997), o ensino tem uma importância fundamental para a
humanidade ser da forma como ela é hoje. É devido ao fato de sermos capazes de
aprender e de ensinar que não precisamos passar, a cada nova geração, por todas
as experiências que foram necessárias para gerar o conhecimento original. Com
essa capacidade biológica e cultural de ensinar e aprender, não precisamos repetir a
história.
2
Skinner apóia-se na explicação darwinista da evolução das espécies - a seleção natural.
14
Conforme salientado por De Rose (1982), Smith (1994) e Zanotto (2000),
Skinner está interessado na relação entre o homem e o ambiente; assim, colocar em
foco o comportamento significa observar a relação “organismo-ambiente”. Desde
que é um processo, e não uma coisa, o comportamento não pode ser facilmente
imobilizado para observação. Para Skinner, o comportamento é mutável, fluido e
evanescente, e, por esta razão, faz grandes exigências ao pesquisador. Contudo,
não há nada essencialmente insolúvel nos problemas que surgem desse fato.
O autor acredita que o problema talvez esteja no status que o comportamento
adquiriu, no sentido de que “... o comportamento raramente foi concebido como um
objeto em si próprio, mas como mera expressão ou sintonia de acontecimentos mais
importantes que ocorrem dentro da pessoa que se comporta.” (Skinner, 2002 p.83).
O aspecto central é que, segundo o autor, na maioria das vezes, s apelamos para
alguma coisa dentro da pessoa para explicar suas ações. Diferentemente, o
Behaviorismo Radical assenta-se sobre a negativa ontológica da existência de
eventos imateriais, sem dimensões físicas, que ocorram em um mundo não-físico.
Para De Rose (1982), a premissa básica do Behaviorismo Radical é a de que
só existem eventos materiais ocorrendo em um universo físico. Isto não leva Skinner
a descartar enunciados sobre os eventos denominados “mentais”. Para o autor, eles
podem ser, em alguns casos, reinterpretados como descrições de eventos físicos,
ou de relações entre eventos físicos, enquanto em outros casos devem ser tomados
como metáforas. Uma boa parte da obra de Skinner está centrada na tentativa de
interpretar os eventos denominados “mentais” como fenômenos materiais,
envolvendo relações entre comportamento e ambiente.
Recorrendo a Zanotto (2000), podemos destacar que Skinner se opõe às
posturas mentalistas e às explicações que recorrem a causas internas para explicar
a ação humana. Para Skinner, o problema do mentalismo não está na suposição da
existência de estados o-observáveis ou de sentimentos, mas na atribuição a eles
de um status causal. Diferentemente do Behaviorismo Metodológico, Skinner não
coloca o mundo “interno”, de sentimentos e estados não-observáveis publicamente,
fora do alcance da ciência; apenas o nega como origem, início ou causa do
comportamento e o explica, quer enquanto estados corporais, quer enquanto
comportamento, a partir de condições existentes fora do homem, no ambiente (físico
e social) com o qual ele se relaciona.
15
Skinner (1994) afirma que uma parte do universo (o chamado mundo interior)
tem uma condição especial - estar encerrada no corpo das pessoas. Esta
característica, por um lado, impede a observação pública desses eventos e, por
outro lado, confere ao indivíduo um contato especialmente íntimo com os estímulos
que se originam no interior de seu próprio corpo. Para que estes eventos possam
ser descritos e levados em conta por uma ciência do comportamento, Skinner
admite a possibilidade da introspecção (auto-observação), advertindo, porém, que o
que é observado introspectivamente não é um mundo imaterial, mas é a parte do
universo material encerrada no corpo do indivíduo.
Skinner (2002) aponta que não nada mais familiar para alguém do que o
comportamento humano, pois estamos sempre na presença de ao menos uma
pessoa que se comporta. Nem algo mais importante do que o comportamento,
seja o nosso, ou de outra pessoa, o mais comum, o mais esporádico, o que produz
conseqüências para um indivíduo isolado ou o que afeta o mundo e a sociedade de
um modo geral. Apesar disso, o próprio autor reconhece que o comportamento
humano não é certamente a coisa que entendemos melhor. Tal dificuldade surge
não porque o comportamento seja inacessível, mas por ser complexo e por não ser,
infelizmente, o foco mais estudado pela ciência.
Zanotto (2000) salienta que, ao se referir à natureza processual e ao caráter
mutável e fluido do comportamento, Skinner não está afirmando sua indeterminação.
Ao contrário, Skinner busca determinantes demonstráveis para explicar o
comportamento, e os busca no ambiente. No entanto, o autor não se limita a tomar
como determinantes demonstráveis do comportamento apenas os aspectos do
ambiente ou estímulos que o antecedem, o que seria suficiente se o foco fosse o
comportamento respondente.
3
Ao contrário, seu foco principal de estudo está no comportamento que produz
algum efeito no mundo que o cerca, o denominado, por Skinner, comportamento
operante. Esta denominação tenta enfatizar o fato de que o comportamento opera
sobre o ambiente gerando conseqüências. Essas conseqüências que retroagem
sobre o organismo e alteram a probabilidade de ocorrência futura de comportamento
3
Se numa relação organismo-ambiente, verificar-se que, frente a estímulos específicos, uma dada resposta é eliciada,
abrangendo as reações inatas do organismo, esta ocorrência pode ser identificada como respondente. Para Skinner, os
comportamentos respondentes são importantes para o organismo sobreviver, daí fazerem parte de seu aparato biológico.
Pode-se dizer que a relação respondente é uma relação tipo causa-efeito, porque a resposta se segue confiavelmente ao
estímulo apresentado. Tecnicamente, diz-se que uma relação é respondente quando uma resposta é eliciada por um estímulo
antecedente (a denominada relação S-R).
16
semelhante ao que as produziu. Como afirma Skinner, Os homens agem sobre o
mundo, modificam-no, e por sua vez, são modificados pelas conseqüências de sua
ação.” (Skinner, 1957, p.15).
Alguns conceitos formulados por Skinner são fundamentais, daí fazermos
referência mais detalhada a eles, utilizando informações do próprio autor, como de
seus seguidores como Hall (1973), Ferster et al (1977), Baum (1994), Sidman (1995)
e Catania (1999).
Baum (1994) afirma que Skinner utilizou o termo operante como um nome
para uma categoria funcional de comportamento. O autor salienta que o termo
operante é
... freqüentemente usado no sentido de uma categoria de atos
que são discretos isto é, cada instância começa em certo
período de tempo, termina em outro período, e ocupa sem
interrupção todo o tempo entre estes dois períodos. Por
exemplo, quando alguém abre a porta, o ato tem um certo
início (aproximar-se da porta) e fim (atravessá-la, uma vez
aberta) e nada além ocorre entre eles. (Baum, 1994, p.4)
Segundo Hall (1973) e Ferster et al (1977), o comportamento operante opera
no ambiente e este, por sua vez, opera no comportamento; em outras palavras, o
termo operante pode ser utilizado para nomear os desempenhos que modificam ou
atuam sobre este ambiente. Desta maneira, conforme Ferster et al (1977), o
comportamento operante pode ser denominado de comportamento voluntário, visto
que para a realização deste comportamento estão envolvidas as musculaturas
estriadas do corpo.
Deve-se salientar que um operante é uma classe de atos que tem o mesmo
efeito ambiental. Baum (1994), exemplificando comportamentos operantes em
laboratório (o rato que pressiona a barra na câmara experimental, o pombo que bica
um disco), destaca que não faz diferença se o rato pressiona a barra com sua pata
esquerda, com a direita, com seu nariz ou boca, pois todas as possibilidades são
instâncias de pressão à barra. Da mesma forma que pressão à barra, ‘abrir a porta
da frente’ compreende todos os atos que têm o efeito de tornar a porta aberta. o
faz diferença se abro com a mão esquerda ou direita; ambas as respostas são
instâncias de classe abrir a porta. Assim, o comportamento operante é uma ação
que produz modificações no ambiente.
17
Na vida do ser humano, a maioria dos comportamentos é operante, dos mais
simples, como, por exemplo, bater na carteira com um lápis, aos mais complexos,
como o de escrever um livro. Podemos observar que tais comportamentos
ocorreram sem nenhum estímulo eliciador, como ocorreria no comportamento
respondente
4
; sendo assim, dizemos que os comportamentos operantes são
emitidos.
Conforme destacado pelos autores (Hall, 1973; Ferster et al, 1977; Sidman,
1995; Catania, 1999), qualquer conseqüência (estímulos físicos, sociais, eventos...)
que aumente a força ou probabilidade do comportamento ao qual se segue é
denominado um reforçador. Portanto, define-se o reforçador a partir da relação do
organismo com o ambiente: se tal relação evidenciar aumento da freqüência do
comportamento diz-se que é reforçadora. Podemos observar que esta definição traz
duas características fundamentais, ambas observáveis: a) um reforçador deve
seguir-se uma ação; b) um reforçador deve fazer com que essa ação seja repetida,
isto é, a freqüência da ocorrência deve ser aumentada.
Um dos elementos importantes da definição (item a) tem a ver com o tempo,
isto é, uma relação temporal entre a ação e o reforçador. Em uma relação de
reforçamento, o ato vem primeiro e o reforçador a seguir. A fim de ter o efeito
máximo, o reforçamento deve se seguir imediatamente ao comportamento. Quanto
mais rapidamente o reforçamento seguir um comportamento desejado, mas eficaz
será ele(Hall, 1973, p. 11). Com base em tal afirmação, podemos dizer que uma
professora que, durante a aula, caminha pela classe atendendo os alunos, fazendo
comentários e elogios sobre seus trabalhos, está fornecendo possíveis reforçadores,
de forma mais eficaz do que a professora que espera até o fim da semana para
expressar-se a respeito do trabalho semanal. Ainda, um elogio feito a uma criança
depois que ela tenha terminado adequadamente seu problema de matemática
poderia funcionar como um reforçador (caso preenchesse também a segunda parte
da definição), mas um elogio dado antes de o problema ter sido resolvido poderia
não reforçar este desempenho em particular. O elogio poderia reforçar outros
4
O comportamento respondente (reflexo) é eliciado por estímulos. Segundo Catania (1999), o respondente é uma classe de
respostas definida em termos dos estímulos que os produzem fidedignamente. Esta relação fidedigna entre um evento
ambiental, um estímulo e uma mudança resultante no comportamento, uma resposta, tem sido denominada reflexo. Por
exemplo, uma luz forte projetada no olho acostumado ao escuro produzirá inevitavelmente uma contração pupilar; a comida na
boca (estímulo antecedente) elicia a salivação (resposta). Tais exemplos têm em comum a característica de que algum
estímulo produz seguramente alguma resposta. Essa é a propriedade que define o comportamento respondente (reflexo).
Nessas circunstancias, dizemos que o estímulo elicia a resposta ou que a resposta é eliciada pelo estímulo; o estímulo é um
estímulo eliciador, e a resposta é uma resposta eliciada. Vale ressaltar que o comportamento respondente (reflexo) não é o
estímulo nem a resposta, é a relação entre ambos.
18
comportamentos o que a criança estivesse fazendo exatamente antes do elogio -,
como por exemplo, sentar-se quietamente.
O segundo elemento da definição é funcional (item b). Se o evento que se
segue a um ato for um reforçador, ele tornará mais provável que a pessoa faça
aquela mesma ação novamente, em circunstâncias semelhantes. Um aspecto muito
importante no comportamento dos organismos, inclusive o humano, é sua freqüência
de ocorrência. Por exemplo, se aquele elogio dado à criança for um reforçador, a
ação (empenhar-se na resolução de um problema) tende a se repetir.
Uma vez que o comportamento que ocorreu não pode ser
alterado, na realidade as conseqüências que seguem um
comportamento alteram apenas a probabilidade futura ou a
força do comportamento. Assim, pela manipulação das
conseqüências (ou condições de estímulos) do comportamento
operante, a probabilidade da sua ocorrência futura pode ser
alterada. (Hall, 1973, p.10)
Keller (1973) explica tal evento como lei do efeito”, enunciando que um ato
pode ser alterado em sua força por suas conseqüências. O comportamento de
crianças pequenas nos oferece exemplos de operantes reforçados por seus efeitos
diretos no ambiente. Por exemplo, uma criança com fome chora e, como
conseqüência, os pais lhe trazem alimento. A freqüência do choro aumentará todas
as vezes que a criança tiver ficado sem comer durante algum tempo. Apesar de
esse comportamento ter se iniciado como padrão reflexo inato, eliciado por um
período de tempo sem alimentação, tornou-se um desempenho operante reforçado
pelo comportamento dos pais de dar leite à criança. O choro é reforçado de forma
operante, virtualmente desde o nascimento, e a freqüência do choro operante
aumenta continuamente durante o crescimento e o desenvolvimento da criança
(Ferster et al, 1977).
Catania (1999), salientando a importância do uso correto da terminologia,
afirma: “Dizemos que a comida reforçou a pressão à barra no caso do rato ou que as
respostas de bicar o disco por um pombo foram reforçadas com água, mas não que
o alimento reforçou o rato ou que o pombo foi reforçado por bicar, ou que uma
criança foi reforçada.(Catania, 1999, p.91). Em outras palavras, deve-se especificar
o reforço e o comportamento reforçado.
Pode-se notar que a principal razão para esta restrição é ilustrada nos últimos
exemplos: quando se fala em reforçar organismo é comum omitir a resposta ou o
19
reforçador, ou ambos. Pode-se observar nos primeiros exemplos (a comida reforçou
a pressão à barra, no caso do rato) que esta restrição, defendida por Catania (1999),
nos força a explicitar o que está sendo usado como reforçador e a atuação do
organismo que é alvo.
Segundo Catania (1999), o termo reforçamento é descritivo, não explicativo.
Ele nomeia uma relação existente entre o comportamento e o ambiente. Retomando,
para o autor a terminologia do reforço requer que uma resposta tenha uma
conseqüência, que o responder aumente e que o aumento ocorra porque o
responder tem conseqüências e não por outras razões. Satisfeitas tais condições,
dizemos que a resposta foi reforçada e que o estímulo era um reforçador.
Panyan (1974) afirma que, dentre a grande variedade de reforçadores
potenciais que temos a nossa disposição, o que funciona melhor a uma criança deve
ser determinado individualmente. Aquilo que funciona como reforçador para uma
criança pode não ser reforçador adequado para outra.
Além disso, o autor salienta que, uma vez que os gostos mudam com o
passar do tempo, os reforçadores deveriam ser variados. Panyan (1974) sugere que,
para testar se um determinado evento é reforçador, ou não, devemos observar como
ele afeta o comportamento que está sendo apresentado; se ele não afetar o
comportamento de modo a fortalecer sua ocorrência, não será reforçador.
Para procurar um reforçador eficaz, o professor deve observar o que a criança
faz, as coisas com as quais brinca, aquilo de que diz gostar. É provável que estes
eventos sirvam como fortes reforçadores. Desta maneira podemos, novamente,
perceber a necessidade de observar nossos alunos e ficar sob controle de seus
comportamentos, conforme defendido por Skinner.
Além de descobrir quais o os reforçadores eficientes, Panyan (1974, pg.6)
defende que estes modificarão o comportamento se forem usados de maneira
correta. O autor sugere que três itens devem ser respeitados: a) reforçar a criança
apenas quando ela apresentar o comportamento desejado. Faça com que o
reforçador dependa do comportamento da criança. Não a reforce aleatoriamente, b)
reforçar a criança imediatamente depois que ela completar o comportamento
desejado, isto é “(...) <ocorrerá reforçamento> se os reforçadores forem dados
imediatamente após o comportamento desejado e se não houver atraso na sua
apresentação e c) reforçar a criança freqüentemente quando estiver ensinando uma
nova habilidade. Reforce cada uma das respostas corretas que forem apresentadas
20
na sessão. Quando estiver reforçando cada uma dessas respostas corretas, você
pode usar muitos reforçadores. Entretanto, dê o reforçador em pequenas porções de
forma que será eficaz durante toda a sessão de treino.” (Panyan 1974, p.9).
Para Skinner (1980), as relações do organismo com o ambiente podem ser
reforçadoras positivas e negativas. No reforçamento positivo, ao agir o organismo
produz (entra em contato com, recebe...) algo do ambiente (alimento, elogio,
sucesso, contato com pessoas...). Neste caso, os reforçadores constituem-se na
apresentação de estímulos, no acréscimo de alguma coisa (por exemplo, alimento,
contato sexual, elogio...) contingente à ação do organismo.
no reforçamento negativo, segundo Skinner (1994) é revigorado qualquer
comportamento que reduza ou faça cessar algo. O autor exemplifica que quando
tiramos um sapato apertado, a redução do aperto é negativamente reforçadora, pois
aumenta a probabilidade de que ajamos assim quando um sapato estiver apertado
(Skinner, 1994). Nesse caso, ocorreu reforçamento porque a probabilidade da ação
se manteve forte (aumenta a freqüência de tirar sapatos apertados), porém o
reforçamento foi negativo, porque a ação teve como efeito a retirada de um estímulo
(aperto produzido pelo sapato). Assim, diz-se que aquilo que foi postergado ou
eliminado (por exemplo, barulho, ameaça, zombaria,...) pela ação do organismo é
um reforçador negativo. No reforçamento negativo uma ação subtrai, remove ou
elimina algo, fazendo com que alguma condição ou coisa que estava antes do ato
desaparecesse. (Sidman, 1995, p.55). Skinner (1994) denomina de aversivo o
estímulo cuja remoção é reforçadora; desta maneira, estímulos reforçadores
negativos são estímulos aversivos.
Conforme afirma Sidman (1995) há três tipos de relações controladoras entre
conduta e conseqüências: reforçamento positivo, reforçamento negativo e punição.
Segundo Sant’Anna (2004), a punição é um procedimento que pode aparecer de
duas maneiras: pela apresentação de um estímulo aversivo (reforçador negativo) ou
pela retirada de um reforçador positivo. Como exemplo, podemos citar a mãe que
pune os gritos e risos inadequados de seu filho durante uma cerimônia religiosa com
um beliscão (apresentação de um estímulo aversivo) ou deixando-o sem a televisão
no período da tarde (retirada do reforçador positivo).
Sidman (1995) caracteriza o reforçamento negativo e a punição como eventos
que funcionam de maneiras diferentes.
21
Podemos fazer choques desaparecerem reforçamento
negativo; ou podemos tomar choque punição. Reforçamento
negativo torna uma ação mais provável, punição
usualmente torna a ação menos provável. (Sidman, 1995,
p.54, destaque nosso)
Segundo Millenson (1967), o procedimento de punição parece ser usado
freqüentemente não porque funcione tão bem, mas por que: (1) tem um efeito
imediato, e (2) sua liberação e/ou efeitos colaterais são quase sempre positivamente
reforçadores para a pessoa que administra a punição. Os efeitos imediatos da
punição o facilmente observados. Uma criança que ri na igreja pode ser
imediatamente silenciada por um beliscão; um cachorro que pula nas visitas pode
normalmente ser controlado por uma pancada com um jornal. Em ambos os casos,
da criança e do cachorro, os comportamentos indesejados/ inadequados não serão
permanentemente eliminados através da punição. No momento, todavia, o
comportamento indesejável é temporariamente suprimido; sendo assim, os agentes
punidores estão sendo reforçados.
Fazendo referência aos três tipos de relações controladoras, Sidman (1995)
destaca que, enquanto o controle por reforçamento positivo é considerado não
coercitivo, a coerção entre em cena quando nossas ações são controladas por
reforçamento negativo e punição. E o uso de coerção não é a melhor forma de levar
as pessoas a aprender, embora freqüente em nossa sociedade.
Segundo Sidman (1995), vivemos em um mundo coercitivo; a todo instante
estamos sendo bombardeados por sinais de perigo e ameaças. A própria natureza
o exemplo. O ambiente físico constantemente nos ameaça com frio, chuva, neve,
enchentes, dentre outros eventos. Na verdade estamos sempre lutando com o
ambiente. Logicamente não podemos atribuir intenções à natureza, que segue suas
leis gerais independentemente dos seres humanos, muito embora ela interfira na
forma como agimos. O autor salienta que talvez a coerção física presente seja
responsável também pela aceitação geral da coerção social como um fato de vida,
do que decorre a crença na punição como uma cnica eficaz de ensino para as
crianças.
Sidman (1995) considera o reforçamento negativo como a primeira de duas
categorias maiores de controle que ele define como coercitivo, mesmo com
característica de aumentar a freqüência do comportamento. O autor explica que o
procedimento de retirada de algo aversivo contingente ao comportamento desejado
22
tem a desvantagem de resultar em comportamento de fuga e esquiva. Uma das
respostas em situação de reforçamento negativo é o comportamento de fuga, isto é,
quando encontramos um estímulo aversivo fazemos tudo que podemos para deixar
de ter contato com ele, para fugir dele. Se o encontramos novamente, faremos o que
funcionou antes. Desta maneira é fortalecida a resposta que elimina ou atenua o
estímulo aversivo presente.
Outra resposta na situação de reforçamento negativo é o comportamento de
esquiva; neste caso é fortalecida a resposta que adia ou evita o estímulo aversivo;
pode-se dizer que o comportamento de esquiva é antecipatório a uma possível
ocorrência de estímulo aversivo. Na visão de Sidman (1995), o controle coercitivo,
do qual o reforçamento negativo e punição são categorias, engendra efeitos
colaterais, freqüentemente não desejados.
Fazer referência ao contexto educacional pode facilitar o entendimento dos
problemas gerados por um ambiente coercitivo. Não é difícil observar, em situação
de ensino-aprendizagem, exemplos de comportamentos de fuga e de esquiva.
Skinner (1972a) aponta comportamentos de chegar atrasado, cabular aulas, ou
simplesmente abandonar a escola como formas explícitas de fuga e de esquiva. Tais
comportamentos podem aparecer de formas mais sutis, mas não menos
problemáticas. Estar quieto em sala de aula, mas desatento às atividades, ou “colar”
nas provas são comportamentos que exemplificam fuga e esquiva. Se o ambiente de
sala de aula for continuamente aversivo, o aluno tende a tornar-se apático,
acomodando-se à situação sem reagir ou reclamar. Skinner (1972a) alerta que
desistir definitivamente da escola é o elo final dessa cadeia de fugas” (p.94)
O aluno torna-se taciturno, teimoso e inabordável. Fica
“bloqueado”. Recusa-se a obedecer. A inação é algumas vezes
uma forma de fuga (em vez de realizar a tarefa, o aluno
simplesmente aceita o castigo como mal menor) e, algumas
vezes, uma forma de ataque, cujo objetivo é enfurecer o
professor, mas é também (...) um efeito previsível do controle
aversivo. (Skinner, 1972a, p. 94)
Também Zanotto (2000) ressalta efeitos indesejáveis do reforçamento
negativo, como a estereotipia, a rigidez e até a passividade.
Ao aprender formas de eliminar ou atenuar o evento aversivo
de seu ambiente, o indivíduo parece evitar, pela repetição do
comportamento, a despeito de mudanças nas circunstâncias,
os riscos de ser novamente submetido à aversividade da
situação. Viver fugindo/esquivando-se, viver sob circunstâncias
23
nas quais constantemente atua para remover ou atenuar os
eventos aversivos, acaba por tornar o indivíduo um ser passivo
e sem ação. (Zanotto, 2000, p.48)
no caso da punição, além de gerar comportamentos emocionais
indesejáveis, seu efeito é bastante questionável, pois, embora tenha efeito imediato
em relação ao comportamento indesejável, tal efeito é apenas momentâneo, sem
que tenha efeitáve att
24
de tais estímulos discriminativos tem como conseqüência; 3) alguma alteração no
ambiente, que não ocorreria a) se tal comportamento fosse emitido na ausência dos
referidos estímulos discriminativos ou b) se o comportamento não ocorresse
(Todorov, 1985, p.75). Em sendo assim, o conceito de contingência é corretamente
aplicado quando três pontos inter-relacionados são identificados: antecedente,
resposta e conseqüência; como destacado por Haynes e O’Brien (1990), este é o
papel do analista do comportamento: indicar as relações existentes entre tais
variáveis e o comportamento em questão.
... é apenas quando analisamos o comportamento sob
contingências conhecidas de reforço que podemos começar a
ver o que ocorre na vida cotidiana. Fatos que inicialmente
desprezamos começam a comandar a nossa atenção, e coisas
que inicialmente nos chamavam a atenção aprendemos a
descontá-las ou ignorá-las. (...) Em outros termos, não mais
encaramos o comportamento e o ambiente como coisas ou
eventos separados, mas nos preocupamos com sua inter-
relação. Procuramos as contingências de reforço. Podemos
então interpretar o comportamento com mais sucesso.
(Skinner, 1975, p.184)
Ensino - Aprendizagem para o Behaviorismo Radical
Zanotto (2000) afirma que o complexo conjunto de interações do homem com
seu ambiente, com características comuns e peculiares aos três níveis mencionados
(ontogenético, filogenético e cultural), constitui o contexto no qual o homem aprende
a se comportar e sobreviver enquanto espécie, indivíduo e participante de uma
cultura. Como visto, Skinner defende que, na sua relação com o ambiente, o homem
aprende, muda seu comportamento, em função das conseqüências que produz. O
homem aprende com as conseqüências de sua ação, mesmo sem estar sendo
formalmente ensinado.” (Zanotto, 2000, p.29). Esta é uma das formas de aprender,
e, para tanto, não precisa estar sendo ensinado por alguém. Mas outra forma de
aprender: quando se é ensinado por alguém. Ensinar é a função do professor e a
aprendizagem é o produto a ser alcançado pela instituição educacional.
Para Skinner (1972a), o ensinar é definido como um arranjo de contingências
de reforçamento sob as quais o comportamento muda. Para o autor a aprendizagem
pode ocorrer e ocorre sem ensino formal, como visto, mas contingências
arranjadas aceleram o processo e podem gerar comportamento que, de outro modo,
não apareceriam.
25
Se o indivíduo pode aprender sem ser ensinado, então poderíamos supor que
Skinner defende uma aprendizagem espontânea (aprender com a vida)
5
. O autor se
opõe a este pensamento, pois para ele o mundo real não é um bom professor.
Apenas inserida em um ambiente natural, a criança não aprende muito, e pode
aprender a agir de modo inadequado; pois o ambiente físico gera muitos
comportamentos inconvenientes, perigosos e até mesmo supersticiosos, e o
ambiente social pode gerar comportamentos inadequados, como por exemplo, o
hostil e o egoísta. Desta maneira, deixar a aprendizagem ao acaso é correr o risco
de que não ocorra a aprendizagem que se gostaria.
Skinner afirma que ensinar é o ato de facilitar a aprendizagem(1972a, p.4).
O autor explica que aquele que ensina não seria quem “transmite o conhecimento”
ou quem “fecunda a semente do conhecimento”, mas sim quem fosse capaz de
arranjar as contingências de reforço de forma a facilitar a aprendizagem. Quando se
diz que o professor “ensina bem” quer-se salientar que ele facilita a aquisição de
uma resposta pelo aluno. Uma das conseqüências que se tira deste modo de ver o
ensino é que a qualidade do ato de ensinar do professor, e do método utilizado, vai
depender intimamente do ato de aprender do aluno.
Para levar o aluno a aprender, o professor deve propor a melhor forma de
ensiná-lo. Uma solução aparentemente simples seria trazer o ambiente (mundo real)
para dentro da sala de aula, como forma de motivar o aluno e despertar o seu
interesse. O próprio Skinner (1972a) contesta essa idéia levantando pontos falhos
na sua concepção:
Apenas uma pequena parte do mundo real pode ser trazida
para a sala de aula, mesmo com o auxílio de filmes,
gravadores e TV, e apenas uma pequena parte do restante
pode ser visitada fora (...) Infelizmente, o aluno não aprende
simplesmente quando coisas lhe são ditas ou mostradas. Algo
essencial à sua curiosidade natural ou desejo de aprender está
faltando na sala de aula. O que falta, tecnicamente falando, é
reforçamento positivo. (Skinner, 1972a, p.99).
Para o autor é importante que o professor reforce positivamente a ação do
aluno, isto é, logo após o aluno se comportar da maneira esperada, o professor
5
O Behaviorismo Radical não nega que a aprendizagem pode ocorrer sem o ensino formal, pois a aprendizagem ocorre
quando alguém (um ser humano, ou um animal) passa a fazer algo que não fazia anteriormente ou que fazia de modo diferente
antes de passar pela situação de aprendizagem. Desta maneira existe possibilidade de “aprender com a vida” como, por
exemplo, a criança que coloca o dedo na tomada, leva um choque, e aprende a não colocar mais o dedo na tomada. O
Behaviorismo Radical defende que esta possibilidade existe sim, mas coisas a serem aprendidas que se deixadas para
serem ensinadas pela vida podem ser aprendidas com muito sofrimento ou podem, no limite, nunca serem aprendidas.
(Zanotto, Moroz e Gioia, 2000)
26
deverá apresentar uma conseqüência que aumente a probabilidade de que a ação
volte a ocorrer em situação semelhante.
A defesa do papel do professor como promotor de aprendizagem do aluno
aparece, também, quando Skinner se opõe às explicações cognitivistas do processo
de aprendizagem. Para o autor, ao pressupor que o homem é dotado de habilidades
cognitivas que o capacitam a realizar atividades intelectuais complexas, dentre as
quais aprender, os cognitivistas continuam não respondendo a questão de como o
aluno aprende. Para Skinner (1972a), a mais séria falha dos cognitivistas éo dizer
ao professor o que fazer para gerar mudanças em seus alunos (como ensinar), nem
lhe oferecer qualquer meio satisfatório para saber se fez isso (avaliar se e como
ensinou).
Skinner (1972a) propõe uma análise dos processos de aprendizagem e
ensino fundamentados em conhecimentos rigorosos e sistematicamente construídos
nas complexas relações entre o comportamento humano, as condições de sua
ocorrência e suas conseqüências. Na visão do autor, as questões básicas para os
processos de aprendizagem e ensino são: por que uma pessoa deveria ensinar e
por que uma pessoa deveria aprender? Estas questões permitem analisar e planejar
as ações dos envolvidos no processo educacional, preservando, assim, a natureza
social da atividade educacional, e possibilitando a validação social de suas práticas
e de seus resultados.
Na formulação do processo de aprendizagem, destaca-se que o aluno é ativo
no processo de aprender. Skinner (1972b) afirma que, como qualquer organismo, o
aluno precisa agir antes que possa ser reforçado. Daí sua ressalva: o professor não
pode esperar que o aluno se comporte para depois reforçá-lo. É função do professor
levar o aluno a comportar-se.
Ensino é o arranjo de contingências de reforçamento que
agilizam a aprendizagem. A aprendizagem ocorre sem ensino,
felizmente, mas contingências melhoradas aceleram o
processo e podem mesmo gerar comportamento que, de outro
modo, nunca apareceria. (...) Não podemos simplesmente
esperar que nosso aluno se comporte de um dado modo (...)
para reforçá-lo. De um modo ou de outro, nós precisamos levá-
lo a se comportar. (Skinner, 1972b p.218)
Apesar de Skinner colocar o aluno com função ativa no processo, ele não
acredita que apenas levar o aluno a agir (a fazer algo) seja suficiente.
27
... o aluno não aprende simplesmente ao fazer. Embora seja
provável que ele venha a fazer coisas que fez antes, não
aumentamos a probabilidade de que faça algo uma segunda
vez pelo fato de o levarmos a fazê-la a primeira vez (...) Se
houver aprendizagem nessas circunstâncias é porque outras
condições foram inadvertidamente arranjadas (...) a execução
do comportamento pode ser essencial, mas não garante que
a aprendizagem ocorra. (Skinner, 1972a, p.5, destaque nosso)
Conforme destacado por Zanotto (2000), Skinner afirma que a ação do aluno,
emitida sob certas circunstâncias, será aprendida em função das conseqüências
que a ela se seguirem. Para o autor, o comportamento é modificado por suas
conseqüências; daí ser fundamental, no ensino, colocar a conseqüência contingente
ao comportamento.
As conseqüências produzidas pelo comportamento e que o tornam mais
provável o chamadas de reforçadoras, como visto. As conseqüências devem
ser contingentes ao que o organismo está fazendo em dadas circunstâncias. As
contingências, mais do que os reforçadores, são as coisas importantes(Skinner,
1972b, p.227).
Como salientado, a maneira como são apresentadas as conseqüências
pode definir o sucesso ou não dos reforçadores: para o reforço ser efetivo, é
necessário que o período de tempo entre a resposta e o reforço seja o menor
possível. O que tradicionalmente acontece nas salas de ensino é que, pelo fato de o
professor ter de lidar com vários alunos, na maioria das vezes, ele não age no
“tempo adequado” para que o seu reforço seja contingente à resposta emitida pelo
aluno.
A Escola
Inseridos em uma realidade coercitiva, não poderíamos deixar de observar a
escola nos mesmos moldes da sociedade que a produz. Skinner destaca o quanto a
coerção está presente em nosso mundo e, conseqüentemente, na escola.
Não é difícil explicar o uso do controle aversivo. O professor
pode arranjar facilmente contingências aversivas; sua cultura
lhe ensinou como fazê-lo. (...) O controle aversivo é, sem
dúvida, sancionado em parte porque é compatível com as
filosofias de governo e religião prevalecentes. (Skinner, 1972a,
p.96/97)
28
Zanotto (2000) indica que, desde os seus primórdios, a educação se embasa
em controle aversivo. No início, pelo uso de castigo corporal e de outras punições
corporais. A brutalidade dessas técnicas levou a reformas, mas, na verdade, o
controle aversivo, antes praticado por agressões, ganhou, ao longo do tempo,
características mais sutis, embora não menos graves quanto aos seus efeitos.
Skinner (1972a) apresenta diversas formas de coerção presentes na escola e
infelizmente podemos identificar algumas delas ainda hoje.
O ridículo (hoje amplamente verbalizado, mas antes
simbolizado pelas orelhas de burro, por forçar o aluno a sentar-
se de frente para a parede, ou pelo fato de ficar de no
canto), descomposturas, sarcasmo, crítica, encarceramento
(“ficar depois da aula”), tarefas extras em classe ou para casa,
perda de privilégios, trabalhos forçados, ostracismo, ser posto
no gelo e multas são alguns dos artifícios que têm permitido
ao professor poupar o bastão sem estragar a criança. (p.92)
O próprio autor identifica que, sob certos aspectos, os artifícios citados são
recursos menos condenáveis que as agressões físicas, mas o importante de se
constatar é que o padrão permanece. “O aluno passa grande parte do seu dia
fazendo coisas que não quer fazer.” (Skinner, 1972a, p.92).
Barros et al. (1997) afirmam que apesar da polêmica que rodeia o uso de
técnicas aversivas, frequentemente a escola se apresenta às crianças como uma
fonte de estimulação aversiva e muitas dessas crianças não toleram ter que “ir à
aula”, traduzindo a aversão em evasão escolar, repetência e baixo desempenho
escolar.
Os autores apontam diferentes motivos pelos quais a escola se tornou
aversiva e, dentre eles, a metodologia de ensino empregada tem papel fundamental.
Vale (1997) afirma que, segundo Skinner, a maioria dos problemas que surgem
dentro da sala de aula está relacionada não ao aluno, mas à metodologia utilizada
para fazer com que o aluno aprenda. Se o aluno não aprende é muito provavelmente
porque escola e professor ainda não compreenderam o modo como acontece a
aprendizagem e o que fazer para que ele aprenda.
De acordo com Vale (1997), a cadeia associativa que pode ser formada entre
“estudo” e os sentimentos gerados pela punição é capaz de fazer com que o aluno
despreze ou tenha ódio do comportamento de estudar, e de tudo relacionado ao
estudo. As crianças passam a emitir comportamentos que tanto levam à remoção da
29
estimulação aversiva (fuga), quanto à sua evitação (esquiva), distanciando-se do
desempenho esperado por pais e professores.
O uso do controle aversivo, dentre outras coisas, gera subprodutos
emocionais indesejáveis como o medo e a ansiedade, o que interfere negativamente
no desempenho escolar, já que desorganiza o repertório comportamental dos alunos
(Skinner, 1980, Sidman, 1995, Barros et al 1997). Nesta situação, afirma Vale
(1997), o aluno até estuda, mas também vão surgir todas as conseqüências comuns
ao controle aversivo, tais como: ansiedade, tédio, agressividade, evasão escolar,
falta de “gosto” pelo aprender, esquecimento rápido após a passagem do controle
aversivo, entre outros variados sentimentos que derivam do controle aversivo. Um
exemplo comum observado nas salas de aula são os momentos que antecedem as
provas. É comum observar alunos tensos e amedrontados. Em alguns casos, a
aversão é tão grande que o aluno sente-se “congelado”, deixando de se comportar
como realmente aprendeu e fazendo com que a nota final não reflita seu
desempenho, pois foi obtida em condições mais estressantes.
Vale (1997) destaca que muitos professores argumentam que, se não usarem
tais métodos, o aluno não vai estudar ou o colégio vai se tornar um “inferno”. Esta
argumentação evidencia as contingências de reforçamento que estão presentes na
sala de aula, na escola e na sociedade, indicando que professores adquirem, e
mantêm, formas de atuação punitivas e restritivas em relação ao seu aluno. Skinner
(1972a) afirma:
O professor tem medo de enfraquecer a ameaça sob a qual
seus alunos trabalham. O professor é julgado por seus
superiores e colegas pela severidade da ameaça que impõe:
será bom professor se fizer com que seus alunos trabalhem
duro, pouco importando como o professor faz isso e quanto ele
ensina seus alunos ao fazê-lo. Eventualmente ele passa a
avaliar-se da mesma maneira; se tenta mudar para métodos
não aversivos, pode descobrir que resiste em tornar as coisas
mais fáceis como se isso necessariamente significasse ensinar
menos. (p.95)
Zanotto (2000) adverte que as interações poucos amistosas, as críticas
constantes, mesmo que de intensidade pouco severa, os pequenos castigos, as
ameaças e cobranças e o recurso a notas e outros temidos mecanismos de
avaliação, são práticas disseminadas nas salas de aulas, que se instalam e se
mantêm na medida em que são reforçadas por seu efeito imediato nítido: a redução
30
na freqüência do comportamento indesejado do aluno. Zanotto (2000) aprofunda a
discussão quando se refere ao uso da punição na sala de aula, argumentando que
Skinner considera que, ao supor incorretamente que a punição seja o inverso do
reforçamento positivo e que seu efeito seja, simplesmente, a eliminação do
comportamento punido, o professor acaba tendo o efeito contrário ao desejado. Ao
fazer o uso das práticas punitivas, o professor acaba contribuindo, inadvertidamente,
para o fortalecimento do comportamento indesejado do aluno. Por exemplo: avisar
que vai punir posteriormente, punir quando o comportamento indesejado atingiu
grau maior de gravidade e punir inconsistentemente o mesmo comportamento acaba
gerando um efeito inverso ao pretendido pelo professor.
Skinner afirma que este é o principal problema do uso de punição: num
primeiro momento tem como conseqüência a diminuição do comportamento
indesejado do aluno. Desinformado em relação ao caráter temporário desse efeito
do controle aversivo na diminuição da força de resposta e na supressão do
comportamento em questão, o professor continua a defender e a adotar práticas
aversivas como forma de lidar com os “problemas” disciplinares e pedagógicos.
Barros et al (1997), por exemplo, apresentaram uma pesquisa em que testam
a hipótese de que a aplicação de técnicas aversivas resulta em queda no
desempenho escolar, se comparada com o desempenho escolar obtido em
procedimentos baseados no reforçamento positivo
6
. Para tanto, foram avaliadas 80
crianças de duas turmas de quarta série/1
o
grau de uma escola particular. As notas
obtidas com o procedimento positivo foram quase sempre maiores que as notas
obtidas com o procedimento aversivo. As autoras comentam que, a diferença nas
médias das notas dos alunos foi maior quando se mudou do procedimento aversivo
para o positivo, do que quando se mudou do positivo para o aversivo. As próprias
autoras levantam duas novas hipóteses para justificar a manutenção do
desempenho quando da passagem do procedimento positivo para o aversivo: a) a
resistência à extinção dos comportamentos reforçados durante a aplicação do
procedimento positivo; b) a facilitação da aprendizagem da unidade do conteúdo
ministrada sob o procedimento aversivo em função do sólido estabelecimento do
6
Os procedimentos positivos e aversivos foram apresentados em forma de unidades de um programa de ensino. Três
unidades foram apresentadas através do procedimento envolvendo controle aversivo e três através do procedimento
envolvendo controle positivo. Ao longo dos procedimentos foram registradas as freqüências de “comportamentos desejáveis” e
“comportamentos indesejáveis” e os resultados dos testes de desempenho escolar, no final de cada unidade
31
desempenho escolar anteriormente ensinado através do procedimento positivo e
que era básico para a unidade subseqüente.
Infelizmente, os exemplos de uso de contingências aversivas no contexto
educacional são inúmeros, e, com razão, Skinner (1972a) adverte que, por
desconhecer os efeitos do controle aversivo e sua ineficácia em possibilitar a
aquisição de comportamentos adequados, o professor pode despender boa parte de
seu tempo estabelecendo interações inadequadas com seus alunos, em vez de
interações que promovam a emissão de novos e desejáveis comportamentos.
Para Skinner, no entanto, possibilidade de superação das práticas
aversivas; tal superação se dá pela programação de novas contingências, pelo
planejamento rigoroso de práticas alternativas às coercitivas, pelo cuidado atento
com o método de ensinar. Como afirma Zanotto (2000), circunstâncias que facilitam
a ocorrência de comportamentos inadequados podem ser alteradas ou até
suprimidas, de modo a reduzir a possibilidade de que os alunos neles se engajem,
quer esses comportamentos se caracterizem como “problemas de disciplina”, quer
como “problemas acadêmicos”. Circunstâncias que propiciam a emissão e a
manutenção de comportamentos acadêmicos (portanto, incompatíveis com os
inadequados) diminuem a liberação de estímulos aversivos pelo professor. Para a
autora, cabe ao professor planejar e construir o espaço de ensino caracterizado pela
ausência de punição e pela presença de condições capazes de gerar e manter
comportamentos bem-sucedidos dos alunos.
Uma alternativa para enfrentar tal tarefa e arranjar conseqüências
reforçadoras na sala de aula é a utilização de um reforçador poderoso, disponível na
situação de aprendizagem e pouco utilizado pelos professores o sucesso -, dando
assim ao aluno mais oportunidades de acertar. É isto que Skinner (1975) destaca,
no trecho abaixo.
O professor pode freqüentemente trocar a punição pelo
reforçamento positivo de modo surpreendentemente simples
respondendo ao êxito do aluno em vez de responder às suas
falhas. Professores, muito freqüentemente, têm suposto que
seu papel é apontar para o que os alunos estão fazendo de
errado, mas apontar o que eles estão fazendo de certo fará,
freqüentemente, uma enorme diferença para o clima da aula e
para a eficiência da instrução. (p.145)
32
Vale (1997) salienta que, em alguns casos, o próprio aluno é capaz de
observar o sucesso de sua aprendizagem e ter seu comportamento de aprender
automaticamente reforçado. Mas, para que isto ocorra, é preciso que o aluno tenha
sucesso e, como Skinner ressalta, o sucesso na aprendizagem não é o mais comum
na escola; daí a importância de o professor mostrar o que os alunos estão fazendo
de certo (os sucessos parciais, as pequenas mudanças ocorridas na direção
esperada), pois, especialmente no início do processo de aprendizagem formal, o
professor é a principal fonte de reforçamento.
Apontar o que o aluno faz de certo, e não apenas para o que faz de errado.
Para que essa mudança possa ocorrer é necessário que seja dada ao professor a
oportunidade de aprender sobre a relação entre as suas ações e as ações de seus
alunos.
Retomando o dito anteriormente, a análise do comportamento propõe que a
Educação apóie-se nas contingências de reforçamento positivas, acreditando ser
possível, sob certas contingências de ensino, criar e manter motivação do aluno. Em
outras palavras, os autores behavioristas acreditam que é necessário criar
condições para que o aluno apresente e continue a apresentar, de forma diligente e
produtiva, os comportamentos que dele se espera.
Em suma, para o Behaviorismo Radical ensinar é planejar contingências de
reforçamento de modo a possibilitar que a aprendizagem ocorra de modo mais
eficiente.(Zanotto, Moroz, Gióia, 2000, p.232) Ensinar é arranjar contingências que
levem ao aprendizado do aluno, no caso contingências de ensino. Quando Skinner
(1972a) refere-se a “arranjo de contingências” ele está salientando a necessidade do
caráter planejado (intencional
7
) do ensino.
Para Zanotto (2000), O ensino formal cuidadosamente programado
possibilita agilizar e maximizar as mudanças comportamentais pretendidas, as quais,
se as deixar ocorrer naturalmente, podem ser bastante demoradas ou até mesmo
não ocorrer” (p.42).
O primeiro passo para que se possa “arranjar contingências de ensino” é ter
clareza das mudanças comportamentais que se quer obter. Para Zanotto (2000)
falar em “mudar” ou “gerar” ou em levar alguém a se “comportar de um certo modo
indica certamente a existência de um objetivo que se pretende atingir. Como afirma:
33
“Não se ensina se não se sabe o que se quer ensinar e se não se criam condições
necessárias para ensinar o que se pretende.” (Zanotto, 2000, p.42)
Skinner (1972a) não acredita num ensino que se realiza sem que o adulto
saiba “o que” e “a quem” ensinar e sem que se arranje, de forma adequada, as
condições para que esse ensino ocorra. Para o autor, o professor é o responsável
por planejar as chamadas contingências instrucionais, sob as quais os alunos
aprendem, e o planejamento é fundamental, inclusive para que o professor saiba
avaliar sua própria atuação. Como ressaltado por Zanotto (2000):
Um ensino assistemático e não planejado impede a
identificação de suas [professor] próprias falhas, impossibilita a
crítica e a revisão do que é feito sob o nome de ensino e gera
34
compete ao professor formular os objetivos, dispor as condições necessárias para
que o aluno se comporte em consonância com o que é proposto e liberar
conseqüências que contribuam para a manutenção do comportamento emitido.
“Apenas definindo o comportamento que queremos ensinar podemos começar a
pesquisar as condições das quais ele é função e a planejar um ensino efetivo”
(Skinner, 1972a, p. 173).
Com uma descrição detalhada do comportamento que se quer ensinar,
haverá mais facilidade para planejar procedimentos de ensino eficazes. Quando se
tem claro o que se quer ensinar, por exemplo, numa aula de Educação Física, fica
mais fácil decidir o que fazer na quadra, escolher material adequado, propor
atividades pertinentes, acompanhar e orientar o trabalho dos alunos e, enfim, avaliá-
los. Conforme destacado por Zanotto (2000), sob tais condições, o professor pode
verificar não apenas se o aluno aprendeu, mas também se ele, professor, ensinou.
Skinner não coloca a culpa do insucesso da aprendizagem no aluno, como
comumente professores o fazem, e nem exclusivamente no professor. O autor
salienta que o processo educativo é complexo, e envolve uma variedade de agentes,
que não pode ser entendido com base em apenas um de seus componentes. Mas,
dada à notória negligência em relação ao método de ensino, são necessárias
propostas que forneçam parâmetros para avaliar e rever as ões do professor, e os
procedimentos adotados ao ensinar.
O Behaviorismo Radical atribui ao aluno um papel ativo no processo de
aprender, que o aprendiz precisa agir para ter liberadas as conseqüências que
acabam por determinar seu próprio comportamento. Atribui também um papel ativo
ao professor, que deve se responsabilizar pela tarefa de planejar e dispor as
condições (antecedentes e conseqüentes) mais prováveis para a emissão dos
comportamentos que quer ensinar ao aluno. Nessa perspectiva, uma condição é
fundamental para o planejamento eficaz do ensino - o conhecimento, mesmo que
parcial, de cada um de seus alunos e das diferenças mais significativas entre eles,
no que diz respeito aos comportamentos possivelmente já aprendidos e às variações
na suscetibilidade aos reforçadores disponíveis na situação de ensino.
Zanotto (2000) adverte que conhecer cada aluno, e as diferenças entre eles,
não quer dizer que o professor precise conhecer todos os comportamentos que cada
um de seus alunos é capaz de emitir, pois isso se tornaria inviável com o número de
alunos por turmas. Quando se refere a conhecer cada aluno e suas diferenças, ela
35
se refere à identificação de comportamentos já disponíveis nos repertórios dos
alunos e que podem servir de ponto de partida para o ensino de novos
comportamentos.
Possibilitar que os alunos apresentem um comportamento que,
sabidamente, conseguem emitir e cuja probabilidade de ser
bem sucedido é alta que contingências em vigor que
explicam sua manutenção pode se constituir em uma
condição adicional para o professor planejar situações em que
um novo comportamento venha a ser ensinado de maneira
eficaz e em que os alunos o aprendam adequada e a
facilmente. (Zanotto, 2000, p.68).
Conhecer estes alunos e suas diferenças significa, também, que o professor
deve ser capaz de identificar as suscetibilidades peculiares de seus alunos aos
reforçadores, naturais ou arbitrários, e especialmente positivos, disponíveis em sala
de aula. Para arranjar competentemente as contingências para ensinar os
comportamentos previstos nos objetivos, a alunos cujos repertórios
comportamentais minimamente conhece, é necessário que o professor identifique,
dentre os variados reforçadores existentes na escola, aqueles acessíveis ao seu
controle e manipulação, passíveis de serem disponíveis aos alunos pelo arranjo de
contingências.
O recurso a reforçadores naturais primários, como água, comida, etc
8
, apesar
de presentes no cotidiano, são de uso limitado em situação formal de ensino. Outros
reforçadores, como afeição, a novidade, a exploração e a aprovação, estão
disponíveis, porém têm sido mais comumente usados de modo assistemático, e não
como parte de um cuidadoso planejamento de contingências. O que Skinner propõe
é que a utilização de tais reforçadores seja planejada, a fim de que seu uso seja
adequado.
Skinner chama a atenção para o uso de reforçadores pessoais (como afeição,
aprovação) destacando que, se usados em demasia, levam alguns alunos a
estabelecerem uma relação de dependência para com o professor, o que é pouco
eficaz a longo prazo. O uso de reforçadores pessoais é dificultado pela instabilidade
que os caracteriza.
Contingências pessoais são instáveis. O professor pode reter
sua aprovação para incentivar o aluno a se esforçar mais, mas
depois aprova-o depressa demais quando ele sinais de
extinção (desânimo). Pode reter a ajuda para que o aluno
8
Estamos considerando como reforçadores primários aqueles de claro valor biológico.
36
receba todo o mérito, e depois ajudar demais para evitar que
ele passe vergonha. Alunos comumente queixam-se de
favoritismo e hostilidade, nem sempre sem razão. (Skinner,
1972a, p.144)
Além disso, temos o uso de possíveis reforçadores arbitrários, tais como boas
notas, promoções e honras. Diz-se serem possíveis reforçadores porque em nossa
sociedade boas notas, promoções e honras, se forem atribuídas em função das
ações de alguém, tornam tais ações mais prováveis de ocorrerem novamente. No
entanto, sabemos de fato se algo é reforçador se, ao ser conseqüência da ação
de alguém, aumentar a ocorrência de tais ações no futuro. Skinner salienta que
estes reforçadores arbitrários podem ser problemáticos porque, sendo artificiais,
podem não ocorrer fora do ambiente escolar, e neste caso, a manutenção do
comportamento fica comprometida.
Com o pretexto de preparar melhor o aluno para se comportar em função de
conseqüências remotas, muitos educadores defendem “trazer o mundo para a sala
de aula”; no entanto tal proposta não é exeqüível. Conforme Zanotto (2000) salienta,
a solução não está na utilização de reforçadores naturais, em sala de aula, que
dificilmente é possível. Mas, para ela, através da análise comportamental, é
possível, por meio de procedimentos de ensino adequadamente planejados, produzir
reforçadores que atuem como mediadores entre o comportamento do aluno e as
conseqüências naturais. A autora defende que, sob certas condições, o aluno pode
ser ensinado a identificar padrões aceitáveis de comportamentos e a emiti-los de
modo a gerar, automática e imediatamente, eventos reforçadores para si mesmo.
Trata-se de um processo em que ocorre uma mudança no tipo
de evento reforçador que controla o comportamento do aluno,
substituindo-se os reforçadores arbitrários, arranjados pelo
professor, por reforçadores automaticamente gerados pelo
próprio aluno ao se comportar. Esses reforçadores
autogerados são fundamentais para liberar, paulatinamente, o
aluno dos reforçadores artificiais do ensino. (Zanotto, 2000, p.
75)
Para Vale (1997), o reforçador arbitrário é indicado até quando começam a
surgir situações reforçadoras naturais desse comportamento. Por exemplo, a criança
que está em processo de alfabetização inicialmente tem seu comportamento de ler
reforçado pela professora ou pelos pais, e, posteriormente, pode ser reforçado pelo
fato de conseguir ler sozinha seus livros de histórias.
37
Tal caminho para ensinar, proposto por Skinner, é complexo e requer do
professor conhecimentos sobre o processo ensino-aprendizagem e
comprometimento para percorrê-lo. Esta complexidade aparece desde as
aparentemente simples medidas de organização física da sala de aula ou quadra, no
caso de Educação Física, tornando-as ambientes estimulantes que atraiam a
presença do aluno, passando pela criação de reforçadores arbitrários explicitamente
contingentes aos comportamentos que se pretende ensinar, até chegar às medidas
mais complexas que possibilitem a passagem para reforçadores naturais, inerentes
ao ambiente físico e social da vida cotidiana do aluno. Pode-se dizer que se tem
como característica do trabalho educacional formal: passar dos reforçadores
arbitrários imediatos para reforçadores auto-gerados e naturais, de modo a preparar
o aluno para as conseqüências futuras que ocorrerão quando o aluno não mais
estiver sendo ensinado.
O exposto deixa claro que um contexto escolar coercitivo não apenas não
leva à aquisição de comportamentos produtivos, como também gera
comportamentos indesejáveis. Assim, a substituição de práticas coercitivas por
reforçadoras, no ambiente escolar, é necessária, sendo possível realizá-la se o
professor fizer com que a ação do aluno gere conseqüências naturalmente
reforçadoras. Embora tal contexto coercitivo prevaleça, não se pode culpar
professores por sua ocorrência, que sua formação não lhes disponibilizou
ferramentas que lhes permitissem superar tais práticas. Evidencia-se, pois, a
necessidade de criar condições para que o professor aprenda novas formas de
atuar, substituindo suas práticas coercitivas por outras positivamente reforçadoras.
É esta a direção do presente trabalho que se propõe a implementar uma
proposta de intervenção com o objetivo de diminuir a ocorrência de práticas
coercitivas e de aumentar a ocorrência de práticas reforçadoras pelo professor,
durante sua atividade docente. Tal proposta vai ao encontro do que é proposto por
autores da área de Educação Física, tal como se verá, a seguir.
O Behaviorismo Radical e a Educação Física
A aproximação do Behaviorismo Radical com a Educação Física ocorreu no
início da década de 70. No Brasil, ainda hoje, pouco se produziu em Educação
Física, a partir da abordagem comportamental. Na época, segundo Cillo (2002),
38
surgem os primeiros trabalhos em que os autores propõem diversas estratégias para
modelar, manter e generalizar habilidades esportivas, sendo que alguns autores
direcionam seus trabalhos para a Educação Física, enquanto outros focam seus
estudos no Esporte.
Cillo (2002) salienta que a aproximação entre a Análise do Comportamento e
o Esporte pode ter sido facilitada por alguns fatores relacionados a semelhanças
tanto na mensuração como na manipulação dos comportamentos. Como se a folha
de registro do analista do comportamento estivesse para o scout utilizado pelo
técnico para avaliar o desempenho de seus atletas”. (Cillo, 2002, p.72)
Scala (2000) utiliza uma divisão mais minuciosa da área da Educação Física;
para o autor, os estudos podem ser divididos em quatro campos específicos:
rendimento, educacional, recreação ou tempo livre e reabilitação.
O campo do esporte de alto rendimento centraliza a maior parte dos estudos.
O esporte de rendimento pode ser caracterizado como aquele que envolve
competição e tem como objetivo a superação de marcas ou índices e a obtenção de
títulos. Para Cillo (2002), no esporte, a análise do comportamento aplica sua
metodologia experimental, utilizando-a na mensuração dos comportamentos de
praticantes, técnicos e atletas, e suas respectivas variáveis controladoras. Baseada
na filosofia behaviorista, essa abordagem não se limita apenas à descrição dos
comportamentos, seus antecedentes e conseqüentes. Grande parte dos esforços de
seus aplicadores visa melhorar a qualidade dos desempenhos esportivos, da
interação entre os envolvidos, tornando assim, a prática física e esportiva mais
atraente, isto é, mais reforçadora.
Para Smoll e Smith (1987), Bredemeier (1999) e Cillo (2002), o trabalho do
analista na área do esporte é a análise do desempenho esportivo e das variáveis
das quais é função, e a procura pela melhoria deste desempenho. Porém, Cillo
(2000) salienta que não se trata apenas do desenvolvimento de técnicas e
procedimentos para o aumento do desempenho a qualquer custo. O autor alerta que
um analista do comportamento de orientação skinneriana sempre deveria buscar
substituir controles coercitivos por reforçamento positivo ou, no mínimo, por
contingências menos aversivas; sendo assim, o uso de técnicas comportamentais
estende-se desde tornar o ambiente da prática mais reforçador para os participantes
até o aperfeiçoamento de desempenho nos esportes de alto rendimento.
39
O campo educacional, segundo Scala (2000), apresenta um número menor
de investigações e engloba desde a atividade física para alunos escolares até
projetos sociais que utilizam o esporte como metodologia de ensino. Para Cillo
(2002), a atuação do analista neste campo está voltada para o desenvolvimento da
aprendizagem de habilidades básicas e específicas, além de atividades nem sempre
relacionadas à atividade física. O autor completa que a preocupação volta-se para a
necessidade de aumentar o uso de reforçamento positivo e a diminuição do uso de
controle aversivo nas aulas.
Os outros dois campos abordados por Scala (2000), o de reabilitação e o de
recreação ou tempo livre, apresentam poucas investigações nesta abordagem;
nestes campos, o autor apresenta o trabalho do analista de comportamento na
organização de atividades e salienta para a sua intervenção na busca da adesão
dos sujeitos através da construção de um ambiente reforçador.
Para Martin (1992), a Educação Física deveria ampliar a adoção de princípios
e técnicas comportamentais no trato com alunos e praticantes e assim aumentar o
uso de reforçamento positivo e diminuir o uso de controle aversivo. E por que
diminuir o controle aversivo? Porque práticas coercitivas são muito utilizadas no
ensino de habilidades motoras, especialmente na área esportiva e educacional.
Weinberg e Gould (2001) salientam que a maioria dos cnicos e professores
combina abordagens positiva e negativa, na tentativa de motivar e ensinar
habilidades a seus alunos e atletas. A abordagem positiva focaliza o comportamento
adequado, “recompensando-o”, o que aumenta a probabilidade de as respostas
desejáveis ocorrerem no futuro; no esporte tal prática ocorre, por exemplo, quando
“observamos pessoas fazendo algo corretamente(p.141). a abordagem negativa
focaliza nos comportamentos indesejáveis, punindo-os, na tentativa de levar a uma
futura redução desses comportamentos. Esta abordagem focaliza os erros; tenta
eliminar comportamentos indesejados por meio de punição (repreensão, crítica, ...).
Os autores advertem que, apesar de haver um consenso entre os psicólogos do
esporte que a abordagem positiva deveria ser a predominante, não é difícil cair na
armadilha de constantemente corrigir e observar o que es errado. Os autores
levantam a possibilidade de tal característica ser um reflexo da nossa sociedade que
usa a punição como o meio mais difundido de controlar o comportamento.
Também Cillo (2002) afirma que é muito utilizada, em aula e treinamentos
esportivos, a punição; espera-se que a apresentação de conseqüências punitivas
40
diminua a freqüência de uma resposta. Conforme o autor, seu uso é tradicional em
muitos contextos esportivos e de aprendizagem, e exemplifica: Vemos agressões
entre atletas, repreensão por parte de técnicos, perda de pontos ou índices por
irregularidade ou desrespeito às regras, exclusões temporárias ou permanentes
(p.80).
Weinberg e Gould (2001) salientam que esta é uma postura defendida por
muitos técnicos que adotam posturas punitivas para obter a aprendizagem e ao
desempenho. Estes técnicos supõem que, punindo os atletas pelos erros
cometidos, eles podem eliminar tais erros, eles supõem que se os jogadores
41
outras palavras, a punição dos erros acaba por prejudicar o repertório
comportamental do indivíduo.
Weinberg e Gould (2001), mesmo admitindo que há ocasiões em que a
punição pode ser empregada para eliminar comportamentos inadequados - como
quando, no jogo, regras o violadas e atletas são punidos com faltas, pênaltis,
exclusão momentânea ou efetiva – destacam que o mais importante é não criar, com
o uso excessivo de punição, um ambiente de aprendizagem desagradável e
aversivo. Os autores salientam que é necessária a aplicação sistemática de reforços
para ajudar a produzir comportamentos desejáveis, o que é incompatível com os
comportamentos indesejáveis, construindo assim um ambiente de efetiva
aprendizagem.
Defendendo o uso de reforçamento, Weinberg e Gould (2001) advertem que
os princípios do reforço são muito mais complexos do que as pessoas supõem.
Como afirmam:
os princípios do reforço são complexos porque as pessoas
reagem de forma diferente ao mesmo reforço que pode não
ser capaz de repetir um comportamento desejado e recebem
diferentes tipos de reforço em diferentes situações. (Weinberg
e Gould, 2001, p. 140).
Freqüentemente, o mesmo reforçador afetará duas pessoas de maneiras
diferentes. Exemplificando, fazem referência ao uso de repreensão: para uma
participante, a repreensão em aula de exercícios poderia significar ser punida (levar
à diminuição da freqüência do comportamento), enquanto poderia significar atenção
e reconhecimento para uma outra pessoa (levar ao aumento da freqüência do
comportamento).
É preciso considerar, ainda, que há comportamentos reforçados que não
podem ser repetidos. Por exemplo, no basquete, um armador faz, em média, 10
pontos por jogo. Ao marcar 30 pontos, ele receberá elogios e reconhecimento do
público, companheiros e técnico, e, naturalmente, quer repetir esse comportamento
reforçado. Entretanto, sua característica pessoal de passe é melhor que a de
arremessador; quando ele tenta marcar mais pontos, baixa sua porcentagem de
acertos porque arrisca um maior número de arremessos, e acaba por prejudicar seu
time.
Por fim, é necessário lembrar que há inúmeros reforços disponíveis e que
eles têm valor diferenciado, para cada indivíduo. Por exemplo, alguém em um
42
programa de exercícios é reforçado positivamente por ir ficando em forma e com boa
aparência. Mas, devido à sua participação no programa, ele passa menos tempo
com a família; como estar com a família tem mais valor que ficar em forma, ele
abandona o programa. Weinberg e Gould (2001) salientam que, infelizmente, muitos
técnicos e professores não têm consciência desses motivos e reforçadores
concorrentes; desta maneira sua ação docente pode produzir, no repertório dos
alunos, comportamentos não esperados e inadequados.
Weinberg e Gould (2001) chamam a atenção para a necessidade de dar
atenção à oportunidade e a freqüência da liberação do reforço (escolher o melhor
momento para reforçar comportamentos desejados e decidir com que freqüência
fazê-lo). Segundo os autores, durante os estágios iniciais do treinamento ou do
desenvolvimento de uma habilidade, as respostas desejáveis devem ser
freqüentemente reforçadas. O reforçamento contínuo não apenas age como
motivador, mas também fornece informações ao aprendiz sobre como ele está se
saindo. Entretanto, uma vez que a habilidade tenha sido dominada, ou esteja
43
para o aluno. Portanto é apropriado reforçar pequenas melhoras, à medida que a
habilidade é aprendida, pois assim é possível que as pessoas continuem a melhorar,
à medida que se aproximam mais e mais da resposta desejada (movimento da
cortada).
Os autores salientam ainda que é necessário reforçar o desempenho e não
apenas o resultado, pois um aluno pode executar a habilidade corretamente, sem
que o resultado seja o esperado. Muitas vezes o resultado está fora do controle do
jogador, sendo o desempenho correto tudo o que ele pode fazer. Weinberg e Gould
(2001) afirmam que professores e técnicos que enfatizam a vitória tendem a
recompensar jogadores com base no resultado. Reforçar o ponto marcado, mas não
a rebatida, seria, na visão dos autores, enviar uma mensagem errada ao executante,
pois seria reforçado o resultado e não o desempenho.
Além disso, seria necessário reconhecer que o esforço faz parte do
desempenho, pois nem todos podem ser bem sucedidos no esporte. Quando alunos
sabem que serão reconhecidos por tentarem habilidades novas e difíceis, e não
criticados por atuarem incorretamente, eles tendem a executar mais e,
conseqüentemente, melhorar o padrão de execução.
Conforme destacado por Cillo (2000), podemos compreender de que forma a
ciência do comportamento pode dar sua contribuição ao esporte e à atividade física.
Encarando as ações motoras como comportamentos, preocupamo-nos com as
condições que os produzem. Para tanto, o autor sugere analisar as contingências
em que os praticantes de Educação Física estão envolvidos, a fim de entender o que
está controlando seus desempenhos para, em seguida, propor um rearranjo de
contingências que permita relações saudáveis entre os indivíduos e um rendimento
otimizado, quaisquer que sejam os objetivos dos praticantes.
Tal rearranjo de contingências, em nossa concepção, implica propor formas
de ensinar os comportamentos, passando do controle aversivo para formas de
controle que não produzam os efeitos nocivos da coerção. Daí a proposição do
presente trabalho: implementar uma proposta de intervenção com o objetivo de
diminuir a ocorrência de práticas coercitivas e de aumentar a ocorrência de práticas
reforçadoras pelo professor, durante sua atividade docente.
44
Procedimentos Metodológicos
A coleta de dados foi realizada em uma instituição beneficente situada na
região centro-sul da cidade de São Paulo. Como salientado, o objetivo da pesquisa
foi identificar o uso ou não de práticas coercitivas nas atividades pedagógicas, e, em
caso positivo, propor intervenção no sentido de alterar a freqüência de tais práticas.
A mudança na perspectiva da prática pedagógica é necessária, uma vez que
consideramos que a aprendizagem de movimentos específicos de determinada
modalidade esportiva é influenciada diretamente pela relação pedagógica
professor/aluno que se estabelece nas aulas.
Procedimentos de Coleta de Dados.
Como faço parte da instituição desde 1997, transito facilmente pelos espaços,
administrativos e operacionais. No início de 2006, começamos a colher informações,
mais específicas, sobre a instituição e seus funcionários e obtivemos o devido
consentimento dos participantes (anexo1). Levantamos dados junto à administração
a respeito do número de atendimentos, quantidade de salas e laboratórios, quadro
de funcionários, equipe técnica e de apoio, cursos oferecidos etc... O levantamento
foi realizado por meio de conversas informais com a secretária da instituição, a
secretária da diretoria, o gerente geral e por consultas a documentos, tais como
históricos, planilha de atendimentos, projetos nas diversas áreas, dentre outros.
Os documentos consultados foram lidos na própria instituição, sempre na sala
da secretária da diretoria, com presença dela, na maioria das vezes. A partir da
análise foram destacadas informações sobre aspectos, de que não tínhamos
conhecimento a então, apesar de trabalharmos no local um bom tempo.
Foram levantados o histórico da instituição, a estrutura e funcionamento, objetivos
dos diversos projetos, organograma, regras e normas de funcionamento,
dificuldades de obtenção de financiamentos e patrocínios.
Também foram realizadas conversas, de caráter informal, com os
componentes da diretoria, coordenadores das diversas áreas, dicos, educadores
e funcionários. Estas aconteceram em diferentes locais, como refeitório, sala de
coordenação, sala da presidência, sala de projetos, quadra, salas de aula e locais
externos, tanto no horário da manhã quanto no da tarde e noite.
45
Nos dias em que realizávamos atividades na instituição, além do
levantamento de dados a partir de conversas informais e de consultas a
documentos, realizamos observações em situações classificadas como informais
(não-estruturadas) e formais (estruturadas).
O procedimento de coleta de dados em situações informais (não-
estruturadas) foi adotado por Zanotto (1985) e Lopes (2006) em seus respectivos
trabalhos de mestrado e doutorado. Ambas estudaram práticas educativas na
escola, realizando observações em diferentes circunstâncias. Ao final do período de
coleta, a figura das pesquisadoras, aparentemente, passou a integrar o cotidiano da
instituição.
No presente trabalho, as situações de coleta de dados de caráter informal ou
não-estruturado caracterizam-se por diferentes circunstâncias e locais. Foram feitas
durante os momentos de intervalo das aulas, nas reuniões de coordenação e de
início de ano, na quadra, no local de lanche ou no contêiner (sala de professores).
Nesta situação foram observados comportamentos e interações entre os membros
da instituição (professores, coordenação, funcionários, alunos).
As informações levantadas durante as situações não-estruturadas – tanto
aquelas obtidas por observações, por conversas informais, quanto as impressões e
inquietações acerca do observado foram anotadas em “caderno de campo”. Em
geral, as anotações das situações não estruturadas foram feitas ou durante a própria
ocorrência de um evento ou imediatamente após, nos próprios locais; quando isto
não foi possível, o registro foi feito posteriormente. Este registro, de situações não-
estruturadas, foi de grande utilidade para a familiarização da pesquisadora com os
alunos, professores e funcionários da instituição.
No início da coleta de dados das situações não-estruturadas, apenas a
presença da pesquisadora com um caderno anotando as aulas, na quadra ou no
contêiner, era motivo de inquietação principalmente das crianças, como ilustram
os exemplos a seguir: (a) enquanto estava descendo para a quadra com o caderno,
as crianças queriam saber o que eu ia escrever lá; (b) em outra ocasião, quando
anotava algo no caderno, duas crianças chegaram perto de mim e disseram anota
meu nome ai que eu também quero ganhar uniforme.”; (c) certa vez uma aluna
chegou perto de mim e disse “...letra linda que você tem, parece até de princesa
de história. Escreve meu nome pra ver como fica lindo.”; (d) houve até mesmo
crianças que vieram me perguntar se eu anotava o que eles faziam de errado para
46
depois contar para as mães. Com o passar dos dias, a continuidade dos registros e
a explicação simplificada dos objetivos do trabalho fizeram com que a figura da
pesquisadora, aparentemente, passasse a integrar o cotidiano de todos, como
ilustram os próximos exemplos: (a) depois de vários minutos de observação, a
professora disse “Nossa nem te vi chegar e nem te dei oi”; (b) em outra ocasião uma
aluna sacou, eu tive que me proteger para a bola não pegar em mim e ela disse
Desculpa Dona, nem te vi hoje. Você emagreceu? Parecia o poste da rede.”.
As situações de coleta de dados em situações formais ou estruturadas
ocorreram em três momentos: 1) foi utilizada a entrevista dirigida por questionário
(anexo 2) para obter dados referentes à formação acadêmica, atuação profissional e
informações dos professores sobre seu trabalho na modalidade escolhida. Optamos
pela entrevista dirigida pelo questionário como instrumento de coleta de dados
devido à maior facilidade dos professores em se expressar verbalmente. 2) sessões
de observações da aula dos professores desenvolvidas no ambiente regularmente
utilizado para tal (quadra). As observações foram desenvolvidas, especificamente,
com o intuito de identificarmos a utilização de práticas coercitivas pelos professores
durante o processo de ensino. Após as observações, foram feitas as análises
funcionais da aula e escolhidos 3 trechos para uma reunião individual com o
professor. 3) reuniões de 30 minutos com cada professor. Durante esta reunião, que
foi gravada, analisamos os três trechos, previamente selecionados pela
pesquisadora.
O período de coleta de dados da familiarização ao término aconteceu
entre fevereiro e agosto de 2006. Neste período, foram feitas, em média, duas
visitas por semana à instituição, apenas em duas semanas não foi possível nos
deslocarmos com a freqüência citada acima a a mesma. A permanência na
instituição variou entre duas e seis horas diárias, de acordo com as aulas e
disponibilidade dos professores e pesquisadora.
As visitas nos meses de fevereiro a abril permitiram a familiarização da
pesquisadora com o local, professores e alunos. Estão compreendidas nestes
meses também as três sessões de observação-teste. Juntamente com outra
pesquisadora foram feitas três observações de aulas, para garantir a confiabilidade
no procedimento de observação dos acontecimentos. Ambas observaram as aulas
separadamente e depois construíram a análise funcional de tal aula; com o confronto
47
das análises funcionais das aulas observadas, verificou-se que houve concordância
em relação aos dados coletados.
Durante os meses de maio a agosto foi realizada a coleta de dados em
situação estruturada. O procedimento foi desenvolvido em três momentos: 1) Pré-
Intervenção, envolvendo: a) observação e análise de três aulas, de cada professor,
para identificação do padrão comportamental; 2) Intervenção com cada professor,
envolvendo: a) observação e registro da aula; b) organização da aula em forma de
análise funcional; c) seleção dos aspectos a serem discutidos na reunião; c) reunião
de trinta minutos com cada professor para discussão da aula observada; 4) Pós-
Intervenção, envolvendo: a) observação e análise de três aulas de cada professor,
posteriores ao procedimento de intervenção, para identificação do padrão
comportamental de cada professor e confronto com o padrão inicial, a fim de
verificar se houve alteração em função do procedimento de intervenção executado.
No início de 2006 atuavam, no Projeto Adolescente e Atividade sica, quatro
professores, dois estagiários e um mestre de capoeira. Um professor e um estagiário
tinham começado a trabalhar no projeto neste ano, e como não sabíamos se iriam
se manter, não foram incluídos como sujeitos da pesquisa. Desta maneira, pudemos
entrevistar os três professores, um estagiário e o mestre de capoeira. Dois
professores não puderam ser participantes da presente pesquisa, um porque não se
sentia à vontade em ser observado e outro porque, nos dias em que desenvolvia a
atividade, não era possível o deslocamento da pesquisadora até a instituição.
As aulas de três professores - de voleibol, capoeira e futsal -, foram
observadas e registradas de forma cursiva. As aulas eram sempre ministradas no
mesmo local - a quadra poliesportiva.
Nas sessões de observação realizadas na quadra, registraram-se os
comportamentos dos professores e dos alunos, isto é, foi descrito o desenrolar das
atividades pedagógicas, focalizando as atividades de ensino propostas pelo
professor e as ações dos alunos, em sua dinâmica interacional. Sempre que foram
identificados eventos relativos ao contexto extra da aula e/ou da instituição (som,
barulho, evento externo), estes também foram registrados. Cabe lembrar que o
registro dos dados cumpriu as exigências necessárias, a fim de garantir sigilo de
informações que pudessem identificar os profissionais, os alunos e a instituição
participante da pesquisa.
48
Segue abaixo, quadro síntese das etapas de coleta, por sujeito, com
especificação do número de aulas e mês relativos à coleta. Pode-se observar que
houve similaridade nos meses e número de aulas em que ocorrem as coletas.
Alguma diferenciação, entre os sujeitos, ocorreu a partir de maio por motivos
particulares de cada sujeito. Houve aulas não observadas por falta do professor e
por feriados. No caso de S2, foi diminuída uma aula do procedimento de
intervenção, pois ele foi viajar para o exterior; optamos por encerrar antes o
procedimento de intervenção e manter as sessões de observação Pós-Intervenção.
Familiarização Pré- Intervenção
(observação da aula)
Intervenção
(observação da aula,
levantamento dos trechos e
reunião com o professor)
Pós-Intervenção
(observação da aula)
S1 Fev/Ab Maio – 3 aulas Maio/Jun/Jul - 10 aulas Jul – 3 aulas
S2 Fev/Ab Maio – 3 aulas Maio/Jun – 9 aulas Jun – 3 aulas
S3 Fev/Ab Maio – 3 aulas Maio/Jun/Jul – 10 aulas Agt - 3 aulas
Quadro 1: síntese das etapas de coleta por sujeito, número de aulas e mês de coleta
Como dito anteriormente, registramos em “caderno de campo” todas as
informações obtidas, as quais foram digitadas, em seguida. O procedimento de
digitação logo após o registro ter sido feito, além de necessário para permitir a
intervenção, permitiu acrescentar possíveis informações que não haviam sido
anotadas no momento da aula.
Das anotações oriundas de conversas informais e observações em situações
não estruturadas, destacamos trechos ou palavras considerados importantes ou
“significativos”. Como “significativos” foram considerados os trechos, palavras ou
expressões que mais chamavam atenção, os que mais incomodavam, os que mais
agradavam, os que pareciam estranhos, os esperados, os inesperados” (Zanotto,
1985, p.08). Destacamos alguns trechos relativos à infra-estrutura, ao
funcionamento da instituição, aos professores, aos alunos e a outros aspectos
relativos ao cotidiano da instituição que, possivelmente, podem estar relacionados
às práticas educativas nas aulas das modalidades esportivas.
No que se refere às observações de situações formais (aulas), os
comportamentos de professores e alunos foram registrados de forma cursiva e, após
à digitação, foram organizados em quadros de análise funcional para melhor
visualização das situações.
49
Os dados obtidos nas sessões de observação das aulas, como salientado
foram digitados a partir de anotações em letra cursiva, conforme disposto no
exemplo abaixo :
Contexto: Aula da professora S1 (16:00hs as 16:40hs). Estavam presentes
10 alunos. O grupo volta do lanche, que foi tomado na própria quadra, e se reúne
com a professora que está no centro da quadra.
Descrição: P. diz: "Seguinte pessoal. Duas pessoas no fundo para passar.
Passe na mão do levantador e um aluno vai sacar". G1 pergunta: "e quem vai
sacar?" P. diz: “A2G1 vai sacar” G1 se agita. P. diz: “Posso falar?" A1G1 diz: "P
explica de novo?" P olha para o G1 diz: "então presta atenção. A2G1 saca, o resto
fica em fila, entra 2 a 2. Um passa para a mão de A1G1, que é o levantador". G1 fica
em fila e vão entrando 2 a 2. P. observa. AsG1. Entram em dupla. <quem passa sai
e volta para a fila o outro continua esperando outro saque.> P. observa. A1G1 não
consegue realizar o movimento. P. olha para A1G1 e balança a cabeça <sinal de
desaprovação>. A1G1 vai para o fim da fila. P. corrige G1. P. diz: “A4G1 vai
sacar”. A4G1 vai para o saque. G1 executa o exercício. P diz: “não é para sacar na
mão não, é para se deslocar". P. vai para o lado da quadra onde tem dois alunos
que estão na fase de aprendizagem (iniciantes G2) e explica como posicionar as
mãos na manchete. A1G2 faz errado. P vai aela e demonstra como colocar a
mão. A1G2 observa P. P toca em A1G2 posicionando sua mão. A1G2 executa a
manchete. P. vai até A2G2 e lança uma bola. A2G2 executa a manchete. P. observa
G1 na quadra. AsG2 fazem manchetes sozinhas. P vai aG1. P reúne G1 e diz:
"vocês estão em quatro pessoas e dois passes certos. Presta atenção, não estou
brincando, vocês ficam retrucando". AsG1 se olham e falam um com os outros. P.
diz: "Sempre um alfinetando o outro". G1 diz entre si: "Pessoal tem que tentar". P.
diz: "Caramba tem que falar toda hora. Vamos fazer mais uma vez, se o exercício
sair ruim a gente pára". G1 vai para o exercício. A5G1 diz: "Ah não P! A gente quer
jogar né". P. diz: "Só depende de vocês, mais 6 minutos". A5G1 diz: "Vai A1, passou
saiu". P. observa e diz: "A1G1 você está entrando de lado, é de frente para a bola".
A1G1 olha para P. e vai para o fim da fila. P. observa. G1 executa movimento. P.
diz: "A3G1 está de lado". A3G1 olha P. e volta para a fila. P. vai até o G2 e diz:
"Mesmo rodízio. que agora um toque / uma manchete por cinco bolas. Uma
manchete / um toque. Entenderam?" A1G2 executa movimento. P. observa e diz:
"Tem que dominar a bola senão não para fazer". A1G2 pergunta: "Tudo junto
uma manchete / um toque?" P. responde: "Não, uma manchete e depois um toque.
A2G2 faz lá.” A2G2 executa P diz: “Entendeu?" A1G2 observa A2G2 fazendo e diz:
"Ah, entendi." P. observa A2G2 executando e diz: "A2G2 bate no antebraço e não na
mão". A2G2 executa. P observa. P. diz para G1: gua rapidão". G1 corre para
tomar água. P. vai até G2 e observa. P. diz: "Agora podem ir tomar água". G2 corre
para beber água. G1 volta da água. P. diz: "Contaram quantas bolas certas?" G1 diz:
“Foi mais que 7, melhor do que da outra vez que foi três". P. diz "Melhorou depois da
bronca não é?" G1 responde: "Foi melhor que antes né". P. diz: “Agora dois trios e
um quarteto”. G1 se organiza. P. observa e diz: “Vamos jogar um set”. G1 começa a
jogar. G2 volta da água e pergunta: "O que a gente faz?" P. diz: “Vocês entram para
jogar com eles”. G2 se olham e sorriem. P. coloca A1G2 de um lado da quadra,
A2G2 do outro e diz: “Atacou com força paga 50 abdominais do meu lado”. G joga.
50
P. observa. A5G1 bate na bola com força. P olha para A5G2. A5G2 diz: "Foi
encaixe". P diz: “Que medo hein!! De pagar 50 abdominais." G joga. P. observa.
A4G1 saca forte no A1G2. P. diz: "Pode vir pagar". A4G1 vai para o lado de P. e
começa a fazer abdominais. P. chama um ex-aluno que está sentado na
arquibancada e pede para ele contar os 50 abdominais de A4G2. A4G1 executa. P.
observa o jogo. G joga. A3G1 corta em A1G2 e olha para P.. P. diz: "pode vir pagar
50 A3G1”. A3G1 faz caretas e vai para o lado da P. Ex-aluno vem contar os
abdominais de A3G1. P observa jogo. G joga.
Após a anotação, os dados foram colocados num “Quadro analítico”, baseado
em Bocchi (2002), que permitiu identificar: (a) as práticas educativas de professores;
(b) se os alunos agiam em função dos comportamentos dos professores, e (c) se os
professores agiam em função dos comportamentos dos alunos. Para tanto, os
quadros analíticos foram estruturados em duas colunas principais: relativos às
interações entre professor-aluno (P-A), e às interações aluno-professor (A-P).
A seguir, apresentamos um exemplo de “Quadro Analítico”:
Quadro analítico da aula de voleibol (19/04/06) de S1 (2
a
aula durante
intervenção) início: 15:11 término: 15:40
Todos estão numa parte da quadra, que dividem com outra atividade, a capoeira.
São 06 alunos do G1 que estão fazendo o aquecimento na quadra (corrida), a
professora de voleibol e alguns alunos da próxima turma (G2).
Objetivo: Posicionar a defesa na quadra. Ataque.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P monta a rede. G2 vai chegando,
correndo e sentando na
arquibancada.
P monta a rede. G2 diz “oi professora”.
G2 diz “oi professora”. P diz: “senta na
arquibancada”.
P diz: “senta na
arquibancada”.
G2 olha para P e vai
para a arquibancada.
G2 vai para o carrinho,
pegam bolas e
começam a jogar bola
entre si.
G1 corre.
P monta a rede. G1 corre
A1G2 vai até P e diz:
“quer que eu diga para
guardar?”.
A1G2 vai até P e diz:
“quer que eu diga para
guardar”.
P diz: “quero sim”
51
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1G2 dirige-se ao
grupo de crianças e diz:
“A professora mandou
guardar a bola”
P coloca a rede.
G2 continuam jogando
as bolas. <várias vezes
as bolas vão para a
quadra onde está o
G1>
A2G1 vai até o grupo e
diz: “se você não
guardar eu vou falar
para a P não deixar
você jogar”.
P coloca a rede.
G2 guardam as bolas
no carrinho.
A2G1 volta para o G1 e
retorna a correr. G2
voltam a pegar as
bolas.
P coloca a rede.
A1G2 vai até P e diz:
“tia eles tão pegando a
bola”
P monta a rede e, de
vez em quando,
observa.
52
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz para G1: “aquece
dois a dois”
P pede para G2
sentarem na
arquibancada e diz:
“Vou falar uma coisa.
Primeiro vocês entram
pelo cantinho e fala oi
para a professora.
Depois ficam sentados
na arquibancada. Se
vocês pegarem as bolas
vão atrapalhar, se ficar
desfilando pela quadra
vão tomar boladas forte.
Deu para entender?
Preciso repetir”.
G2 dizem, em coro:
“não” .
G2 ficam na
arquibancada.
G1 aquece 2 a 2.
P retorna para a aula do
G1 e dá instrução.
G1 executa.
A maioria do G2 sai
andando pela grade de
proteção que fica em
volta da quadra
Parte de G2 fica na
arquibancada
.
G1 executa.
A maioria do G2 sai
andando pela grade de
proteção que fica em
volta da quadra.
Parte de G2 fica na
arquibancada
P observa G1. <...>
A2G2 diz: “P, o A3G2
pegou uma bola”
P vai ate o carrinho e
diz: “A3G2 devolve a
bola”.
A3G2 devolve a bola.
Várias crianças do G2
continuam na grade de
proteção.
P observa G2 e volta
para G1.
G1 pergunta o que é
para fazer.
P coloca cones na
quadra.
P coloca cones na
quadra.
G1 observa.
<...> A4G2 chora no
canto da quadra.
P vai até A4G2 e diz:
“O que foi?”.
A4G2 continua
chorando, A5G2 chega
perto e diz: “eu bati
nele, bati não, dei um
cutucão assim”.
Demonstra para P
como foi. <ele mostra
fazendo o movimento
devagar no peito de
A4G2>
P observa
53
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A4G2 continua
chorando, A5G2 diz:
“eu bati por que ele me
bateu também”.
P diz para A4G2: “Onde
tá doendo?” e diz para
A5G2 “não pode bater,
não pode revidar. Olha
só o seu tamanho e o
dele”.
A4G2 continua
chorando e mostra
onde está doendo.
A5G2 fica olhando para
P.
P diz: “vou fazer uma
massagem”. P se
aproxima de A4G2 e
esfrega a mão no peito
da criança. <mais
parece um carinho>
A4G2 pára de chorar e
olha para P.
A5G2 fica por perto.
P diz: “Eu pedi para
sentar aqui na
arquibancada e não
ficar correndo ou
andando pela grade de
proteção. Assim não vai
dar para ter treino.
Vocês não param. Se
bater de novo não vai
ter treino”.
G2 corre para sentar
novamente na
arquibancada.
<inclusive A4G2 e
A5G2>
P retorna para a quadra
e para G1
P retorna para a quadra
e para G1.
G1 faz manchete 2 a 2.
G2 voltam a andar na
grade de proteção
G1 faz manchete 2 a 2.
G2 voltam a andar na
grade de proteção.
P observa.
P diz para G1: “A3G1 a
bola tá quente? Que
manchete é essa?”
A3 olha para P.
G1 executa.
G2 andam na grade e
AnG2 pega uma bola e
começa a jogar em
outra criança que está
andando na grade.
P diz para AnG2 que
está lançando a bola :
“vai machucar ele!”.
AnG2 continua jogando
bola nas crianças da
grade.
P vai até o local, pega a
sacola de bolas que
está no carrinho e vai
guardando as bolas no
saco. Chega até AnG2
e pede a bola para ele.
AnG2 lança a bola na
grade e sai correndo.
P pega a bola e guarda
na sacola. P fica com a
sacola na mão. P volta
para quadra com G1.
P volta para quadra
com G1.
Alunos do G1 executam
manchete 2 a 2.
P pede para duas
crianças do G2 virem
ajudá-la (A1G2 e
A3G2).
A1G2 e A3G2 correm
até P.
54
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P pede para que elas
segurem dois arcos em
uma determinada
posição.
As crianças correm com
os arcos para os locais.
G1 pára de executar e
se reúne com P.
P diz para G1: “Presta
atenção. Passa pelo
bambolê, depois
defende a bola que o
outro ataca”.
A1G2 e A3G2 seguram
os bambolês e G1
executa.
A1G2 e A3G2 seguram
os bambolês e G1
executa
P diz: “vamos A5G1!
Não é desfile de moda
não”
A5G1 olha para P e
acelera o movimento.
P observa G1,
segurando saco de
bolas.
G1 executa
<...> P pede para A4G2 (que
é maior que as
crianças) segurar o
saco de bolas para ela
e não entregar para
nenhuma criança da
outra turma.
A4G2 pega o saco e
fica do lado da quadra.
P retorna para G1.
P retorna para G1 e diz
para A2G1: “vai! corre”!
A2G1 corre em direção
ao bambolê, defende e
erra.
A2G1 corre em direção
ao bambolê , defende e
erra.
P diz: “A2G1, ta
entrando de lado,
mesmo que a bola
esteja torta entra de
frente para a rede”.
A2G1 executa e erra P diz: “o corpo tava
certo o problema foi
que você defendeu
muito perto do rosto.
Vai lá”.
A2G1 executa e acerta.
A transformação do registro cursivo em quadros analíticos foi realizada para
os registros das observações pré-intervenção, permitindo estabelecer, para cada
professor, o “perfil de atuação pedagógica”, que foi construído a partir dos aspectos
que mais se destacavam. Tais quadros também foram elaborados para as
observações das aulas, durante a intervenção, permitindo, neste caso, identificar as
informações que seriam utilizadas pela pesquisadora para desenvolver a
intervenção junto aos professores. Finalmente, foram utilizados para as observações
pós-intervenção, permitindo avaliar se houve diminuição de práticas educativas
coercitivas pelos professores.
55
Como mencionado, o procedimento de intervenção envolveu a observação
da aula, pela pesquisadora, e posterior reunião de discussão, com o professor,
sobre os aspectos identificados, particularmente o uso de práticas coercitivas. Essa
reunião aconteceu sempre na aula posterior à observada, antes do início da
seguinte. A reunião ocorria no contêiner, com duração de no máximo 30 minutos,
era individual e sempre foi gravada.
Embora, pelo planejamento, pensássemos em focalizar apenas as práticas
coercitivas, as observações pré-intervenção evidenciaram que seria necessário
abarcar outros aspectos (por exemplo, forma de instrução dada pela professora).
Além disso, embora tivéssemos planejado analisar a aula por inteiro, com todas as
passagens, verificou-se, após o encontro de formação com o professor, que a
reunião tornara-se cansativa, longa e não produtiva. Após este encontro, foi tomada
a decisão, pela pesquisadora, de escolher três momentos da aula observada como
foco da discussão durante a intervenção.
Desta forma, após a construção de cada “Quadro Analítico” foram
selecionados três trechos para a análise da aula com o professor, tendo em vista os
seguintes critérios de seleção: (a) descrição de situações de processo ensino-
aprendizagem “eficientes”; considerou-se fundamental iniciar a reunião
apresentando, ao professor, atuações pedagógicas produtivas (porque ajudavam o
aluno a realizar adequadamente as atividades, porque permitiam o engajamento dos
alunos, porque eram reforçadoras etc); (b) descrição de práticas em relação a
comportamentos “inadequados (isto é, comportamentos não relacionados às
atividades de ensino desenvolvidas) e incorretos (comportamentos que, embora
relacionados às atividades, não correspondiam ao esperado pelo professor), ambas
as situações nas quais se identificou a ocorrência de práticas coercitivas; e (c)
escolha de uma passagem da aula que chamou atenção da pesquisadora (ou por
ser eficiente ou por se demonstrar não eficiente).
Os trechos foram destacados quadro analítico (com cores diferentes), foram
lidos e discutidos com o professor. Iniciávamos o encontro perguntando se, na
concepção do docente, a aula tinha sido boa e se os objetivos haviam sido atingidos.
Em seguida apresentávamos o primeiro trecho (situação de ensino-aprendizagem
efetiva) e solicitávamos que P identificasse o conteúdo trabalhado, os
comportamentos adequados dos alunos e os seus próprios, que tipo de
conseqüências foram por ele liberadas. Caso o P não identificasse algum destes
56
aspectos, a pesquisadora identificava para P Em seguida, era apresentado o
segundo trecho (situação em que apareciam comportamentos não relacionados às
atividades de ensino desenvolvidas) e solicitávamos que P identificasse: os
comportamentos inadequados ou incorretos do(s) aluno(s); - os seus
comportamentos; - a relação entre os comportamentos dos alunos e os seus
(identificar os efeitos de seus comportamentos sobre os comportamentos dos
alunos, e se as conseqüências eram reforçadoras ou coercitivas), e; - propusesse as
possíveis alterações de suas ações de modo a diminuir a ocorrência de
comportamentos inadequados e incorretos dos alunos (situações em que práticas
coercitivas estavam presentes). Caso P não identificasse algum destes itens ou não
fizesse propostas de alteração de suas ações, a própria P identificava os elementos,
sugerindo alternativas de atuação. No terceiro momento, o procedimento foi similar
aos anteriores.
A instituição: contexto, condições físicas, recursos, projetos, discentes, docentes
A instituição beneficente em que este estudo foi desenvolvido localiza-se em
um bairro da região centro-sul da cidade de São Paulo. O bairro é classificado como
pertencente à classe média, predominantemente residencial. O bairro possui um
centro comercial grande constituído por lojas, bancos, centro empresarial, empresas,
supermercados e pequenos comércios, conforme relato de moradores e funcionários
da instituição. O surgimento de duas favelas, por volta de 1980, de grande porte e
periculosidade, fez com que aumentasse a insegurança e gerasse uma
desvalorização dos imóveis.
Conforme documento da prefeitura
9
, a região conta com uma infra-estrutura
básica satisfatória, isto é, com rede de água, luz e esgoto. Porém, ao percorrer as
ruas do bairro, nota-se que a iluminação e pavimentação são satisfatórias nas ruas
principais, não ocorrendo o mesmo nas ruas mais estreitas travessas, vielas e nas
ruas das favelas.
As áreas de lazer como praças, campos de futebol de várzeas, parques
infantis, etc, são deficitárias, características observadas pelo número de crianças,
adolescentes e jovens que brincam, empinam pipa, andam de bicicleta e correm
pelas ruas e calçadas estreitas.
9
Dado obtido no site da prefeitura de São Paulo. (http://www.capital.sp.gov.br/portalpmsp/homec.jsp)
57
A instituição fica localizada em um terreno próprio de 9.500 m
2
. A área é
dividida em quatro construções: ambulatório e administração; espaço Gente Jovem;
creche; quadra poliesportiva, coberta e iluminada. Até o ano de 2004 o terreno era
rodeado por ruas; nesse ano, após um incêndio em uma das favelas próximas, os
moradores sem opções de moradia invadiram a rua que margeia os fundos da
instituição. Atualmente, a extensão da favela conta com 250 moradias que foram
sendo construídas em várias etapas, ampliadas e/ou divididas, pois são formados
por partes diferentes compostas por blocos de cimento, tijolos, pequenas estruturas
de concreto, papelões e outros materiais. Uma grande parcela das crianças
atendidas pela instituição vem dessa extensão.
Durante o período de realização da presente investigação, pôde-se notar
certa ambigüidade na relação entre a instituição e a comunidade. Por um lado, o
espaço físico, especialmente a quadra de esportes, parece representar um local de
lazer para a comunidade nos finais de semana e no período noturno, indicando uma
parceria entre ambas. Por outro, percebe-se certo descontentamento e/ou receio,
por parte dos membros da instituição, professores e seguranças, com relação à
comunidade, o que pode ser explicado pela ocorrência de várias invasões à
instituição, com vidros quebrados, banheiros depredados, luzes quebradas, grades
de proteção arrancadas, materiais roubados e ameaças a seguranças e diretores.
A instituição funcionava de segunda a sexta-feira no horário das 7 às 17
horas, para o público em geral, e até as 20 horas para os alunos com atividades
esportivas. Aos bados e domingos com eventos e festas agendadas. No entanto,
a partir de julho de 2006, após briga gerada por duas facções rivais sobre os
horários de uso da quadra para jogos de futebol amistosos, a instituição encerrou as
atividades esportivas após as 17 horas, com o desligamento das luzes de iluminação
da quadra. O incidente gerou também o cancelamento das aulas esportivas no
período de julho de 2006, que voltaram a ser realizadas apenas no início de agosto
do mesmo ano.
A mantenedora é uma antiga instituição humanitária internacional, com sede
na ilha de Malta, e que possui representação na OMS e é observadora permanente
da ONU. Aqui no Brasil, a Instituição foi fundada em 1957 e, a partir de 1970,
dinamizou e ampliou os serviços prestados, tendo sedes em São Paulo, Rio de
Janeiro e Brasília. A instituição foi recebedora de vários prêmios em reconhecimento
ao seu trabalho assistencial, entre eles o Prêmio Bem Eficiente 2003 que atesta a
58
idoneidade da instituição como filantrópica. Os recursos financeiros, para
manutenção do complexo e desenvolvimento de projetos, são totalmente
arrecadados no Brasil, através de parcerias com órgãos governamentais, empresas
privadas, campanhas, doações e eventos beneficentes.
Na sede de São Paulo, diferentes atividades são desenvolvidas: na área da
saúde, em um centro médico-odontológico; na área socioeducativa, com
atendimento na creche e no Espaço Gente Jovem, cursos profissionalizantes para
jovens e adultos; na área assistencial, atividades de assistência social, com doações
de alimentos e medicamentos; finalmente, na área esportivo/cultural, atividades
artísticas, culturais e esportivas.
No prédio ambulatorial encontram-se um ambulatório médico, com cinco
salas, para consultas de pediatria, odontologia e pré-natal, um ambulatório
nutricional, com três salas, para consultas e acompanhamento nutricional, um
laboratório de análise clinica e salas de trabalho administrativo. No ano de 2005
foram realizados 66.408 atendimentos divididos em áreas de pediatria, saúde da
mulher, oftalmologia, enfermagem, análises clínicas, otorrinolaringologia, psicologia,
nutrição, fonoaudiologia, neurologia, dermatologia e fisioterapia.
Pelo convênio denominado Gente Jovem, firmado com a prefeitura de São
Paulo, atende-se crianças e adolescentes entre 7 e 14 anos que freqüentam a
escola (escolas municipais ou estaduais de ensino regular) em um período; no outro
período as crianças e adolescentes são atendidos com atividades de reforço escolar,
artes, jardinagem, atividades culturais e esportivas. Atualmente, por esse convênio
são atendidas 140 crianças e adolescentes distribuídos no período da manhã (8 às
12 horas) e da tarde (12 às 17 horas). A equipe do Espaço Gente Jovem é
constituída por nove funcionários sendo uma cozinheira, duas auxiliares de cozinha,
duas faxineiras, uma diretora e três educadores.
Para todas as crianças, dependendo do seu horário de permanência, são
oferecidos café da manhã, almoço e lanche da tarde. Para a realização das
atividades, as crianças são divididas em três grupos (dá-se preferência a idades
semelhantes, mas não é obrigatório), cada um deles sob responsabilidade de um
educador. Os educadores são contratados pela instituição e devem ter, no mínimo, o
grau completo, mas dá-se preferência a quem realizou o magistério. As turmas
têm em média 25 crianças.
59
Nas atividades como artes, jardinagem e atividades de reforço, as crianças
precisam submeter-se ao horário de suas turmas. Nas atividades culturais e
esportivas não; elas escolhem as de sua preferência.
Na creche, o atendidas 163 crianças entre 4 meses e 6 anos em período
integral (7hs às 17hs). As crianças são divididas em grupos, respeitadas as faixas
etárias e/ou desenvolvimento, e fazem atividades variadas. Para todas as crianças
são oferecidas cinco refeições diárias com controle nutricional (café da manhã,
lanche, almoço, lanche da tarde e jantar). A equipe da creche é constituída por 32
funcionários divididos entre dezenove educadores, uma cozinheira, uma ajudante de
cozinha, uma lactarista, uma copeira, três ajudantes gerais, uma lavadeira, uma
auxiliar de enfermagem, uma diretora, uma auxiliar de administração, uma pedagoga
e uma assistente social.
Na creche e no convênio Espaço Gente Jovem são desenvolvidos, na área
esportivo/cultural, dois projetos respectivamente: O Projeto Criança e Atividade
Física e o Projeto Adolescente e Atividade Física. O primeiro projeto oferece
atividade física dirigida, uma vez por semana, ministrada por alunos dos 3º e 4º anos
de uma faculdade de Educação Física da cidade de São Paulo. O segundo projeto
oferece atividades esportivas como futsal, vôlei, handebol ou atividades
físicas/culturais como capoeira, dança e teatro, duas ou três vezes por semana,
ministrada por professores ou estagiários de Educação Física. Estas atividades são
regidas por acordo formal entre a instituição e a faculdade e faz parte da
60
de materiais esportivos, e outros dois que foram adaptados para servirem como
vestiários e banheiros. Ao fundo, localiza-se a quadra poliesportiva.
A estrutura da quadra e a disposição física dos contêineres são apropriados
para o funcionamento das atividades. No contêiner que funciona como sala dos
professores, os profissionais deixam seus pertences, aguardam suas aulas, fazem
reuniões e planejamentos. A localização da sala de material e da sala de
professores próximas à quadra facilita bastante a atuação dos professores e alunos
para a prática das atividades; o mesmo não ocorre com os banheiros. Os
contêineres adaptados para vestiário e banheiros parecem, à primeira vista, serem
propícios para as necessidades das crianças; mas, com a falta de limpeza
sistemática, uso inadequado da comunidade e constantes depredações, seu uso fica
restrito aos mais velhos e aos alunos do sexo masculino. Assim, a maioria das
crianças tem que subir até a creche ou ao prédio do Espaço Gente Jovem para uso
de banheiros.
A quadra poliesportiva é coberta, fechada por aramados e tem uma porta
central. Sua iluminação é adequada e possui nas extremidades duas arquibancadas
de madeira e ferro. Tem as diferentes marcações (futsal, vôlei e handebol) pintadas.
A limpeza externa da instituição é feita por dois funcionários. Por ter uma grande
extensão e contar com poucos funcionários, a quadra é limpa esporadicamente e
muitas vezes os próprios alunos e professores têm que ajudar, o que gera um
incômodo muito grande por parte dos professores. Estes incômodos são
exemplificados com comentários como: “Não para ninguém trabalhar com tanta
sujeira, ... e se alguém se machucar como fica?, ... eu não ganho para ficar limpando
quadra.”
Em sessões de observação na quadra, presenciamos inadequações de
limpeza e das disposições das arquibancadas nas extremidades da quadra. Em
várias ocasiões as bolas chutadas ou arremessadas para os gols acabavam batendo
nas arquibancadas chegando aa estourarem. Em uma observação da aula de
futsal, após o chute errado de um jovem para o gol, a bola bateu na ponta da
arquibancada e acabou rasgando. O comentário que se seguiu foi: “já tem pouca
bola, se estourar mais vamos ter que jogar com coco”.
A limitação dos materiais esportivos disponíveis, bem como a qualidade dos
mesmos, são, frequentemente, apontados pelos professores como elementos que
interferem no desenvolvimento de ações pedagógicas, como por exemplo,
61
“precisamos de mais bola nova de voleibol, por que estas estão soltando o couro”,
“vou ver se consigo uma doação de bolas de handebol novas, estas estão no talo”.
A despeito da relevância dos itens mencionados como elementos
desfavoráveis ao trabalho pedagógico e funcional, esta instituição promove projetos
comprometidos com a formação integral dos alunos e realiza um trabalho de
prevenção médica de qualidade, o que é reconhecido pelos prêmios mencionados
anteriormente, e propicia momentos de discussão entre professores, direção,
coordenação e outros profissionais.
O Projeto Adolescente e Atividade Física
As atividades culturais e esportivas para crianças maiores foram implantadas
cinco anos. Com apoio da Abrinq e do Governo do Estado de São Paulo, o
Projeto Adolescente e Atividade Física tem como objetivo geral aumentar o acervo
motor dos adolescentes, possibilitar o conhecimento de movimentos específicos de
modalidades esportivas, possibilitar conhecimento e respeito corporal e desenvolver
a valorização do grupo e dos companheiros. Esse projeto é desenvolvido para
crianças e adolescentes de 7 a 14 anos, matriculadas no Espaço Gente Jovem ou
pertencentes à comunidade em geral. Desenvolvem-se algumas práticas esportivas
como o futsal, o voleibol e o handebol e algumas práticas culturais como a dança a
capoeira e o teatro. Essas atividades são desenvolvidas durante a semana em
horários alternados (quadro 1).
Atividades Dias da semana Horários Local
Voleibol 2ª, 4ª, 6ª 14:00/17:00 Quadra
Futsal 2ª, 4ª, 6ª 17:15/20:15 Quadra
Handebol 3ª, 5ª 17:00/20:00 Quadra
Teatro 13:00/17:00 Salão Cultural
Dança 2ª, 3ª 13:00/17:00 Salão Cultural
Capoeira 2ª, 4ª, 6ª 14:00/17:00 Quadra
Quadro 2: horário das atividades do Projeto Adolescente e Atividade Física
Como ocorrem algumas atividades ao mesmo tempo, por exemplo vôlei e
capoeira, as crianças podem escolher de quais atividades desejam participar. A
escolha é livre e, apesar das atividades terem controle de freqüência, não
62
obrigatoriedade de permanência na atividade por um tempo pré-determinado e,
ainda, não há limite de atividades por criança.
Para ministrar as aulas nesse projeto, a instituição conta com oito
funcionários, sendo quatro professores de Educação Física, um mestre de capoeira,
dois estagiários e uma coordenadora.
Durante o horário das atividades são oferecidos lanches, que são
confeccionados na cozinha central do ambulatório médico. As próprias crianças e/ou
professores buscam o lanche na cozinha e levam para a quadra. Ao final da
atividade, o professor serve o lanche para as crianças. O lanche é composto por
bolachas, sanduíches, panetones ou bolos e suco.
Docentes
O corpo docente, na área esportiva, é composto por oito profissionais, na
faixa etária entre 20 e 40 anos de idade. Destes, dois atuam com futsal (um
professor e um estagiário), um professor com vôlei, um professor com handebol, um
professor com dança, um mestre
10
com a capoeira, um estagiário com o teatro e um
coordenador geral.
As divisões das turmas, bem como o tempo de prática de cada turma, são
decididos por cada professor, isto é, eles têm autonomia para dividir as turmas da
maneira que julgarem mais apropriada, por idade ou por nível técnico dos alunos.
Todos os funcionários graduados têm contrato de prestação de serviço com a
instituição e os graduandos têm contrato de estágio. A jornada de trabalho varia
entre quatro e nove horas semanais, dependendo do número de vezes que a
atividade é ministrada. Não existem horas destinadas a reuniões, planejamentos e
atividades extras. Estas atividades são feitas esporadicamente com a coordenação,
sem freqüência regular.
Para a efetivação do pagamento mensal, os docentes devem entregar os
planejamentos das aulas e listas de freqüência. Por ser uma obrigação, a entrega
dos planos gera descontentamento entre os professores, como pode ser
exemplificado pelos comentários: “vou ter que correr com estes planejamentos
porque senão, não recebo”, “vou fazer de qualquer jeito, pois estou atrasado”. Essa
obrigatoriedade foi uma maneira de a coordenação e a diretoria obrigarem os
professores a planejarem aulas, sendo que atualmente os planos são entregues,
63
mas ainda não é garantido o uso de tais planejamentos nas aulas. O que pudemos
perceber, nas observações é que as atividades são criadas no momento da prática,
e que há o uso sistemático de jogos coletivos nas aulas.
Discentes
O corpo discente do projeto Adolescente e Atividade Física é composto,
aproximadamente, por 306 alunos, tendo, em média 30 alunos por turma. Este
número variou do início ao fim das observações, pois muitas crianças começam a
prática de alguma modalidade, mas desistem algumas aulas depois; sendo assim o
número de crianças/adolescentes participantes é sempre oscilante. Dos seis cursos
existentes, 66 alunos fazem capoeira, 95 futsal, 51 handebol, 30 voleibol, 64 dança e
30 teatro. Os demais adolescentes (30 alunos) fazem mais de uma atividade por
semana; desde que o curso não esteja com o número de vagas preenchido e os
horários sejam compatíveis; os adolescentes são incentivados a fazerem mais de
uma atividade.
Apesar de a maioria dos adolescentes ser atendida no centro médico da
instituição, a partir do ano de 2006 todos os alunos fizeram exame médico específico
para verificação de possíveis dispensas médicas para a prática esportiva. No mês
de maio, em um sábado, foi feito em forma de mutirão voluntário, exame médico,
odontológico, nutricional e social de todos os alunos do Projeto Adolescente e
Atividade Física. O exame médico já era uma solicitação antiga dos professores e, a
partir daquela data, tornou-se obrigatório. O exame possibilita, além de segurança
para os adolescentes e professores, acompanhamento do crescimento e
desenvolvimento dos alunos para detecção de problemas nutricionais, de
crescimento e motores. De todos os adolescentes avaliados, apenas um aluno teve
que ser dispensado da prática esportiva e encaminhado para exames
complementares.
Todos os adolescentes matriculados nos cursos esportivos devem estar
cursando a escola regular, e os professores sempre estão estimulando e verificando,
junto aos próprios alunos e aos pais, o andamento do processo educacional formal.
Isto pode ser exemplificado com comentários como: 1) Aluno: “Perfessor, Perfessor
(sic) sei escrever meu nome naquela letra cumprida” (referindo-se à letra cursiva)
Professor: “Vem cá e escreve no meu caderno.” Aluno: “É que eu demoro um
10
Mestre é o nome dado à graduação máxima na capoeira. Este termo não se refere à titulação acadêmica
64
pouco.” Professor: “Não estou com pressa. Quero bem bonito” ; 2) “Mestre, o senhor
poderia dizer que se o meu filho não for na escola ele não vai poder vir mais na
capoeira?”; 3) Aluno1: “Jogador de futebol tem que ser bom de conta?” Professor:
“Tem, por que senão, não consegue contar o número de gols, saber a distância até
o gol”. Aluno2: “E contar o dim dim que vai receber”. Professor: “Isso também, por
que senão é enganado pelos outros como acontece muito por aí”
Como o projeto tem a finalidade de proporcionar aprendizado de habilidades e
não performance física
11
, nenhum adolescente pode ser excluído dos cursos por não
apresentar nível técnico satisfatório. A única forma de exclusão dos cursos é o
acúmulo de faltas sem justificativa (a partir de uma semana), ou afastamento
médico.
Os participantes e suas práticas educativas.
Conforme já tratado em momento anterior, as características dos participantes
foram identificadas a partir de entrevista direcionada por questionário e de conversas
informais. Quanto às intervenções junto às atuações dos participantes, estas foram
executadas a partir de análise de observações das aulas desenvolvidas nas
quadras.
O delineamento proposto está especificado no Quadro 2.
Pré - intervenção Intervenção Pós - intervenção
Observação
de aula
Encontros de
discussão
S1
3 10 10 3
S2
3 9 9 3
S3
3 10 10
interrupção
3
Quadro 3: Sessões de observação das aulas ministradas pelos sujeitos
Inicialmente, pretendíamos realizar as observações das práticas docentes
pós-intervenção logo em seguida ao término das sessões de intervenção. Como se
11
Todos os projetos visam ao aprendizado das habilidades específicas das modalidades, isto é, os professores estão
preocupados em ensinar, por exemplo, as várias maneiras de chutar no futsal; as habilidades de tocar, manchetear, cortar,
entre outras, no voleibol. Desta maneira, não deve ser um objetivo dos professores a formação de atletas para o nível
competitivo das modalidades. Sendo assim, os professores não objetivam a performance, mas sim a aprendizagem das
habilidades que compõem as modalidades.
65
observa no Quadro 2, isto não foi possível devido ao novo horário de funcionamento
das atividades esportivas. Com problemas gerados pela briga entre grupos da
comunidade que utilizavam a quadra nos períodos em que não havia aulas, a
direção geral da instituição decidiu, para segurança dos alunos e professores,
suspender as aulas na segunda quinzena do mês de julho e retomá-las a partir
de agosto. Desta maneira, as observações formais das práticas docentes pós-
intervenção só foram realizadas no mês de agosto. Não acreditamos que tal fato
tenha prejudicado a análise dos dados, pois permitiu verificar se os comportamentos
adquiridos nas intervenções e encontros foram mantidos. Em outras palavras,
acreditamos que a observação depois de algum tempo, por cerca de um mês do
final da intervenção, permitiu verificar se a mudança de práticas educativas ocorreu
na direção esperada, isto é, se diminuiu o uso de práticas coercitivas ou se
aumentou o de práticas reforçadoras.
A seguir, caracterizaremos os sujeitos descrevendo, individualmente, cada um
deles, apresentando suas concepções sobre ensino, planejamento, objetivos da
modalidade, bem como suas práticas educativas. Em relação a estas últimas, a
caracterização inicia-se por apresentar o que foi identificado durante a pré-
intervenção, e, em seguida, o que foi feito durante a intervenção, para finalizar com
o que foi observado no período pós-intervenção.
66
Resultados e Discussão
Concepções e Práticas Educativas de S1
S1 tem 23 anos, é solteira, reside num bairro afastado da instituição gastando
no mínimo uma hora para chegar a ela. Fez ensino regular em escola particular e
ingressou diretamente na faculdade de Educação Física. Graduou-se em bacharel
em Educação Física no ano de 2004 e, já no último ano da faculdade, iniciou o curso
de licenciatura na mesma universidade onde deve se graduar nesse ano de 2006.
Desde o segundo ano de graduação, ministra aulas em academias e atuou no
voleibol competitivo como árbitra e scoutista, pelo sistema de estágio remunerado.
Atualmente, além de trabalhar na instituição, exerce também o papel de instrutora de
musculação em centro empresarial e é auxiliar técnica de voleibol em um time de
escola.
Na instituição, S1 está dois anos atuando na modalidade de voleibol, com
uma carga horária de nove horas semanais, distribuídas em três dias da semana.
Sendo assim, é uma professora que iniciou recentemente sua prática docente.
Em relação ao grupo com que trabalha, S1 acredita que a maior contribuição
da sua modalidade para formação dos alunos é no campo da formação de valores,
que acredita que a participação dos alunos em sua modalidade é uma maneira de
fazer com que eles aprendam a respeitar uns aos outros e a ter disciplina. No seu
entender, sua principal função é a de avaliar o grau de dificuldade que eles têm no
relacionamento entre eles e com a sociedade e ser uma facilitadora do processo de
integração deste jovem com o mundo que o cerca. S1 percebe o voleibol como um
instrumento de inclusão social do adolescente. Em relação à modalidade voleibol,
enquanto movimentação e aprendizagem de habilidades, S1 reporta-se apenas à
necessidade dos alunos se envolverem ativamente para a aprendizagem de
movimentos específicos pertinentes ao voleibol. Como a instituição não objetiva a
participação dos alunos em competições e campeonatos, S1 não acredita que a
performance seja a principal busca no seu trabalho. Sua preocupação, segundo
12
Dado obtido no site da prefeitura de São Paulo. (http://www.capital.sp.gov.br/portalpmsp/homec.jsp)
13
Mestre é o nome dado à graduação máxima na capoeira. Este termo não se refere à titulação acadêmica
14
Todos os projetos visam ao aprendizado das habilidades específicas das modalidades, isto é, os professores estão
preocupados em ensinar, por exemplo, as várias maneiras de chutar no futsal; as habilidades de tocar, manchetear, cortar,
entre outras, no voleibol. Desta maneira, não deve ser um objetivo dos professores a formação de atletas para o nível
competitivo das modalidades. Sendo assim, os professores não objetivam a performance, mas sim a aprendizagem das
habilidades que compõem as modalidades.
67
declara, está mais voltada para a aprendizagem dos fundamentos e para a prática
lúdica do jogo.
Quando perguntado o que significa planejar / preparar aulas, S1 consegue
atribuir ao termo planejar a necessidade de uma linha direcional para a aplicação e
escolha das atividades, como podemos perceber em um trecho da resposta de S1:
“Precisa ter uma linha de raciocínio, para passar para eles. Planejar, eu acredito que
seja escolher alguns exercícios para que eles possam aprender em cima do que eu
estou passando para eles.” Podemos perceber, pelo comentário, que S1, apesar de
atribuir ao planejar uma direção, elenca apenas “conteúdos” para sua construção,
sem deixar claro quais comportamentos gostaria que seus alunos adquirissem. Para
planejar, S1 afirma utilizar-se de informações e conhecimentos adquiridos na
graduação, informações obtidas com outros professores além de informações de
livros, revistas, internet e em outros meios escritos. Apesar de menos freqüente, S1
reporta-se também à utilização de informações obtidas com os alunos e àquelas
obtidas em cursos, palestras e oficinas. Apesar de fazer referência a cursos para a
68
Quando perguntado para S1 como seria uma aula considerada boa, ela indica
que “...seria uma aula em que vo consegue atingir seus objetivos iniciais.”.
Quando solicitado que apresentasse o objetivo, o conteúdo, a estratégia e a
avaliação de uma aula considerada boa, S1 tem dificuldade em seguir tal divisão.
Como objetivo ela apresenta “O objetivo era esquema tático, defesa.”, como
conteúdo, S1 apresenta “Dinâmica entre eles, brincadeiras que levam a um
posicionamento correto na hora da quadra, velocidade também”. Como estratégia,
apresenta Foi modelo, a demonstração. A gente começou com a brincadeira bem
lúdica, e depois fomos para o exercício em si”. Quando questionada como avaliou o
processo, S1 diz que “No começo não estava saindo nada. A parte da brincadeira
beleza, mas depois não estava saindo porque eles não entenderam. A minha
demonstração foi meio equivocada pro entendimento deles. No final, eles já estavam
fazendo o que eu pedi. Então eu pude envolver outros fundamentos.”.
Com esta ilustração de uma aula podemos perceber que S1 apresenta um
objetivo muito geral e amplo, além de apresentar nos objetivos suas ações, e não as
dos alunos. S1 não explicita, em seus objetivos, quais comportamentos desejaria
que seus alunos apresentassem; desta maneira, ela tem dificuldade na avaliação
posterior. Nos itens de conteúdo e estratégia, S1 não delimita seus conteúdos para
trabalhar esquema tático e tem dificuldade de explicitar as estratégias; por exemplo,
ao falar sobre demonstração e modelo (estratégias citadas), não deixa claro o que
foi demonstrado. Quando analisamos a forma como avalia o desempenho dos
alunos, percebemos o reflexo de seus objetivos amplos e centrados em suas ações.
S1, ao avaliar, consegue identificar se os alunos apresentaram ou não um
comportamento (produto final). Ela não consegue verificar se houve alguma
melhora, mesmo que parcial, na habilidade. Novamente, indicações de que a
falta da construção de objetivos específicos dificulta a avaliação posterior.
Em suma, verifica-se que S1 é uma professora nova e com pouco tempo de
prática no ensino de voleibol. Por trabalhar em uma instituição com caráter
assistencialista e com um público classificado de “crianças de risco”
15
, S1 afirma
apresentar grande preocupação com aspectos de interação e convivência entre seus
alunos. Mesmo trabalhando com uma modalidade esportiva, S1 afirma que sua
maior preocupação é com aspectos sociais. Apesar de relatar esta preocupação
15
Classificação usada pelo Governo do Estado de São Paulo, para definir o publico alvo.
69
com o bem estar, com a interação e convivência de seus alunos, S1 atua em função
da aquisição, pelos alunos, dos comportamentos motores específicos do voleibol.
Pré - intervenção
Foram observadas três aulas de S1, sem a intervenção da pesquisadora, para
que pudéssemos conhecer melhor a maneira de atuação da professora. Nessas três
aulas foram detectados alguns aspectos relevantes.
No início das aulas fora perguntado para S1 qual seria o objetivo da aula a ser
ministrada. Os objetivos apresentados na forma oral e na primeira aula foram o
ataque e direcionamento do levantamento, na segunda, saque e passe e, na
terceira, direcionamento de ataque. Como se pode verificar, os objetivos o
abrangentes e não estão focados no que S1 quer que seus alunos alcancem e sim
no que irá executar. Aparentemente S1 não apresentava um planejamento prévio da
aula, tanto que alguns exercícios das aulas pareciam estar relacionados aos
objetivos, mas não apresentavam continuidade entre as aulas.
Um dos aspectos evidenciados foi a falta de um início formal da aula; em
outras palavras, o horário em que a aula inicia é variado, e S1 não explicita para os
alunos que a aula está iniciando. Nas três aulas observadas, verificou-se que os
alunos se encontravam na quadra quando S1 chegou. Na primeira aula, assim
que S1 chegou, os alunos, que estavam jogando bola aleatoriamente, pararam e
começaram a executar um alongamento deitados no chão. S1 vai, então, colocando
a rede até que propõe aos alunos iniciar o aquecimento. Nas outras duas aulas
observadas, quando S1 chega, os alunos estão dispersos pelo local jogando bola,
conversando ou brincando entre si. S1 coloca a rede e, após o término, pede para o
grupo se reunir, passando a instrução de uma atividade específica do voleibol.
Pudemos observar que, a não ser na primeira aula, quando tivemos a impressão de
um grupo bem integrado, S1 não explicitava para os alunos que estava dando início
à aula.
Outro aspecto a ser salientado é a desorganização na definição das turmas
que se evidenciou como fator de interferência na eclosão de comportamentos
inadequados (não relacionados às atividades desenvolvidas).
Num primeiro momento, supúnhamos que o grupo estava dividido em duas
turmas: uma turma com os mais velhos e mais adiantados, e outra, com os menores
e iniciantes. Supostamente o grupo mais avançado (G1) começaria antes e,
70
posteriormente, entrariam na quadra os mais novos (G2) (porém sem um horário
determinado; a primeira turma entraria por volta das 14 horas e a segunda turma por
volta das 15 h e 30 min.). Durante as aulas, porém, percebemos que a divisão não
se manteve de fato; em vários momentos da aula dos mais avançados (G1), alunos
menores, iniciantes (G2), participavam da aula fazendo exercícios. Em outros
momentos, S1 explicava um exercício para G1 e dirigia-se para passar instrução
para alguns alunos do G2, que se encontravam na lateral da quadra. Em alguns
jogos coletivos S1 acabava unindo alunos dos dois grupos.
A presença dos mais novos (G2) parecia ser um fator de desagrado para os
alunos do G1. Pudemos perceber o desagrado expresso em comportamentos que
ocorreram em alguns momentos das aulas. Os alunos do G1 faziam caretas ou
diziam que não queriam a presença dos iniciantes (G2). Em uma das aulas, S1
coloca dois alunos do G2 para jogar com os de G1, explicitando uma ameaça (50
abdominais) para os alunos do G1 caso sacassem ou cortassem em direção aos
menores. Em três momentos observados, alunos do G1 cortam ou sacam sobre
alunos do G2. Em dois momentos, S1 aplica a punição (abdominais), embora em
outro, S1 aceite a explicação do aluno e classifique a bola como “encaixe”
16
, não
aplicando a punição. S1 além de ter uma prática inconstante da punição, não deixa
claro para os alunos os critérios para sua aplicação, talvez porque ela própria não
tenha clareza a respeito. A seguir, trecho da aula em que aplica a punição.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Dois trios e um
quarteto”.
G1 se organiza na
quadra.
P diz: “Um set” G1 inicia o jogo. G2
volta da água.
G1 inicia o jogo. G2
volta da água.
P observa G1
G2 vai até P e diz: “O
que a gente faz
agora?”
P diz: “Agora vocês
entram para jogar com
eles”.
G2 observa P.
P diz: “A1G2 você entra
aqui e A2G2 você entra
lá no outro time”
Alunas do G2 vão para
os times e G1 faz careta
para P <demonstram
que não estão
satisfeitos com a
entrada de G2 no jogo>
<...>
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
16
A bola que por ser executada com bom movimento (encaixar a bola na batida da mão) sai com potência mas não
necessariamente com força.
71
P diz: “Atacou em cima
dos iniciantes paga
cinqüenta aqui do meu
lado”
G1 e G2 jogam.
A1G1ataca forte.
G1 e G2 jogam.
A1G1ataca forte.
P observa.
A1G1 ataca e diz: “P
isso foi encaixe”
P diz: “Que medo de
paga hein!
G joga. P observa
A2G1 saca forte no
iniciante.
P olha para A2G1 e diz:
“Pode vir pagar”
A2G1 sai da quadra e
posiciona-se do lado
de P.
P chama aluno que
estava sentado na
arquibancada e pede
para ele contar os
abdominais de A2G1.
A2G1 inicia os
abdominais e o aluno
da arquibancada
começa a contar.
G1 joga
P observa jogo.
A3G2 ataca no
iniciante.
P olha para A3G2 e diz:
“Pode vir pagar”
A3G2 vai até P e inicia
abdominais.
G1 joga
P observa o jogo.
G1 joga. P diz: “Pronto”
G1 pára de jogar. P desmonta a rede.
O que pudemos perceber é que, com a presença dos mais novos, o jogo
apresenta dinâmica diferenciada. Por apresentarem níveis de habilidade muito
diferentes, o jogo não flui com naturalidade (poucas vezes pudemos perceber a
seqüência básica do vôlei: saque, passe, levantamento e ataque); além de não
poderem atacar com força, por causa dos iniciantes, os mais avançados não
conseguem seqüenciar as jogadas. Além disso, a presença de comportamentos
inadequados de G1 (cortar sobre aluno de G2, por exemplo) parece ser favorecida
pela desorganização das turmas.
Fica claro, no trecho acima, o uso de práticas coercitivas. De fato, S1 faz uso
de tais práticas frente à emissão de dois tipos de comportamento dos alunos. Um,
quando os alunos não emitem comportamentos direcionados às atividades
desenvolvidas e propostas por S1, isto é, quando eles apresentam comportamentos
não acadêmicos e que podem interferir no bom andamento das aulas (os chamados
comportamentos indisciplinados/ inadequados, como exemplificado acima). A outra
utilização se quando os alunos emitem comportamentos relacionados às
atividades desenvolvidas e propostas por S1, mas com ineficiência na execução;
72
são comportamentos adequados ao que está sendo desenvolvido, porém com
movimentos ineficientes.
Outro comportamento freqüente de S1 é a ameaça de utilização de situações
aversivas ou de retirada de reforçadores (por exemplo, ficar sem o jogo) como forma
de promover o engajamento e envolvimento dos alunos nas atividades, isto é, como
forma de supostamente “motivar” a execução da atividade.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P joga a bola um por
um.
AsG1 correm atrás da
bola.
P lança a bola para
A4G1.
A4G1 não vai e diz:
"Péra, Péra!"
A4G1 não vai e diz:
"Péra, Péra!"
P repete o lançamento
e diz: "está muito fraco"
A4 corre e pega a bola. <...>
P diz: "agora até o final
da quadra" <P executa
os lançamentos> .
AsG1 correm para parar
a bola antes da linha de
fundo da quadra.
P lança a bola para
A5G1.
A5G1 começa a correr
antes de a bola ser
lançada.
A5G1 começa a correr
antes de a bola ser
lançada.
P diz: "nem roubando
você consegue pegar a
bola".
A5G1 corre e sorri. <...>
P diz: "quem não pegar
antes do fim da quadra
paga 10”.
G1 observa P e riem.
P lança a bola para
A3G1.
A3G1 não alcança a
bola antes de ela
chegar na linha de
fundo.
P diz: "paga 10!" A3G1 vai até a lateral
da quadra e faz 10
abdominais.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "vamos 2 a 2”. G1 bate bola dois a
dois.
P diz “A5G1 vem cá”. A5G1 vai até P.
P diz: "vou lançar a bola
para você e você tem
que acertar no carrinho.
Se não acertar paga
10”.
A5G1 olha, posiciona-se
no local indicado e
espera.
P lança a bola. A5G1 desloca-se, toca
a bola para o carrinho e
acerta.
O resto do G1 bate bola
dois a dois.
73
Nos dois momentos, a professora sinaliza com a aplicação de uma
conseqüência aversiva na tentativa de “motivar” os alunos a fazerem o exercício
corretamente. Nos dois exemplos a professora ameaça com os exercícios
abdominais, caso não ocorra execução apropriada (esperada) do movimento. A
ameaça não é para a emissão de comportamentos não acadêmicos, mas para o
movimento que não foi executado corretamente ou no nível desejado por S1. No
exemplo acima, verifica-se que quem não conseguisse alcançar a bola antes da
linha e quem não acertasse a bola no carrinho com o toque teria que realizar
abdominais. Em ambos os casos, o que está sendo punido é a ineficiência do
movimento.
Outro aspecto evidenciado refere-se às instruções oferecidas por S1 para os
grupos. Pudemos perceber que S1 precisa, frequentemente, repetir as instruções
para os alunos, interrompendo a aula para ameaçar os que apresentam
comportamentos inadequados quando ela está explicando. Infere-se que a
professora acredita que a explicação não é entendida por falta de envolvimento dos
alunos nas atividades, não percebendo que as instruções dadas não são claras, com
muitas solicitações. Tal fato pode interferir na execução incorreta da atividade e na
ocorrência de comportamentos inadequados, isto é, não relacionados às atividades
desenvolvidas.
Observou-se ainda, nas três aulas analisadas, que a atuação de S1 está sob
controle de comportamentos acadêmicos dos alunos, aspecto que se considera
adequado na atuação pedagógica de S1. Quando as atividades estão sendo
desenvolvidas pelos alunos, ela está interagindo com o executante, ora elogiando,
ora corrigindo o movimento.
Como pode ser observado no exemplo, enquanto o G1 está com uma
atividade de troca bola em forma de ataque, S1 aplica um exercício individual com o
levantador. Pode-se perceber que S1 durante o exercício apresenta constante
interação com o executante. S1 elogia, orienta e corrige o aluno.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P lança a bola. A5G1 desloca-se, toca
a bola para o carrinho e
acerta.
O resto do G1 bate bola
dois a dois.
74
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A5G1 desloca-se, toca
a bola para o carrinho e
acerta. O resto do G1
bate bola dois a dois.
P olha A5G1 e diz: “tem
que sair alta até cair no
carrinho”.
A5G1 toca a bola e
acerta fora do carrinho.
P diz: "olha onde você
está e olha o carrinho”.
A5G1 executa o
exercício.
P diz “aí muito bem”. “o
carrinho está onde eles
vão bater a bola”
A5G1 executa. P diz: "muito bem
A5G1"
A5G1 executa. P diz: "você es
chutando
17
muito, pega
mais na frente da bola”.
A5G1 executa. O resto
do G1 bate bola dois a
dois.
P vai até a rede e da
instrução para o resto
do G1.
G1 vai executar.
Outro exemplo que demonstra que S1 está sob controle dos comportamentos
acadêmicos dos alunos pôde ser percebido no momento de aquecimento. Nessa
atividade, S1 se mantém sempre observando, incentivando individualmente alguns
alunos, elogiando-os para motivar a realização dos exercícios. Por se tratar de
exercícios de aquecimento, a característica principal é a repetição; com isso, S1
precisa incentivar os alunos para que eles não parem o exercício. O grupo
constantemente verbaliza ou faz gestos ou caretas, demonstrando que a atividade
não é motivadora. Nesta etapa, S1 fica, quase todo o tempo, elogiando e
incentivando o grupo; sendo que nos momentos em que não fazia isso, os alunos
praticamente paravam de executar os exercícios ou diminuíam consideravelmente o
ritmo. Por exemplo, A1 depois de algum tempo em exercícios de aquecimento pára
e vai sentar na arquibancada. A professora vai até A1 e o chama de volta para a
atividade. A1 volta fazendo careta. Os momentos em que ela deixa de interagir
pedagogicamente com os alunos são aqueles em que está resolvendo alguma
situação que envolve a ocorrência de comportamento não acadêmico.
Além de estar sob controle dos comportamentos acadêmicos dos alunos, S1
também propõe atividades diferentes para a mesma habilidade. Nas três aulas
17
O termo chutando, no voleibol, refere-se a velocidade, trajetória e potência com que a bola é tocada pelo levantador para a
preparação do ataque. Neste caso, a bola chutada deve sair da mão do levantador numa trajetória reta, rente à rede com
velocidade média.
75
observadas, apareceram variações em relação ao mesmo movimento, o que pode
ser considerado um indicador de domínio sobre o conteúdo específico da disciplina.
Em suma, pela análise das aulas pré-intervenção, foi possível observar que
S1 é uma professora envolvida com a aula e com seus alunos; demonstra dominar
os conteúdos relativos à sua modalidade, propondo novos exercícios e maneiras de
ensinar as habilidades envolvidas em sua prática. Quando os alunos estão
realizando as atividades, ela está, na maioria das vezes, corrigindo e elogiando-os.
No entanto, pudemos perceber que apresenta objetivos amplos e aparentemente
não planejados, desorganização na definição das turmas, deixando alunos de G2
participarem das atividades de G1, o que é claramente aversivo para G1, e que não
apresenta um início formal das aulas, ficando os alunos sem saber quando esta se
inicia. Além disso, verificou-se que, ao dar instruções para o desenvolvimento das
atividades, S1 apresenta número elevado de informações, o que torna a instrução
pouco clara.
Estes aspectos aparecem relacionados ao uso de práticas coercitivas
(reforçamento negativo e punições) efetivadas, ou sob forma de ameaças, para
controlar comportamentos inadequados e para comportamentos ineficientes, isto é,
movimentos que não atingem o padrão esperado. Práticas coercitivas são utilizadas
também para pretensamente “motivar” o engajamento dos alunos na realização dos
exercícios. Além do uso abundante, tais práticas não eram aplicadas de forma
consistente.
Estes aspectos nos direcionaram para a escolha dos “momentos da aula” que
seriam apresentados a S1 durante intervenção. Como levantado anteriormente,
após as observações, três “momentos da aula” foram destacados para análise.
Intervenção
Apresentamos, a seguir, um quadro com informações sobre as dez aulas
observadas de S1. O quadro apresenta, além de informações quantitativas como
datas, horários e número de alunos, os objetivos formulados pela professora, os
critérios escolhidos para conduzir os encontros de formação e uma sucinta descrição
dos episódios selecionados.
Quadro 4: Informações gerais, objetivos e critérios utilizados nos encontros de
formação de S1.
76
S1 Aula 1 (G1) Aula 2 (G1)
Data
14/04/2006 19/04/2006
Horário
14:52 as 15:40 15:11 as 15:40
Num de alunos
06 alunos 06 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Trabalhar o posicionamento da manchete e toque Posicionar a defesa na quadra. Ataque.
Critério 1: situação
de processo ensino-
aprendizagem
produtiva
A. estão na quadra executando as atividades, P desloca-se pela quadra
corrigindo, incentivando, elogiando, dando dicas.
cpto aluno: acadêmico
cpto S1: incentivo, elogio, dicas.
-
Critério 2: Práticas
em relação a
comportamentos
“inadequados”
18
ou
em relação a
comportamentos
“incorretos”
19
dos
alunos
A. observam a explicação de P. P diz: “Corre na rede, salta e bloqueia.
Quem se pendurar na rede paga 10 abdominais, não 30 abdominais” A.
executam exercício.
cpto aluno: acadêmico, ineficiente.
cpto S1: ameaça com realização de abdominais.
Uma criança bate em outra. P faz um carinho na que apanhou e
ameaça retirar da aula a que bateu.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: ameaça tirar da aula o aluno que bateu.
P utiliza crianças de G2
20
, que apresentavam comportamentos
inadequados, para segurarem bambolês na aula de G1
21
.
P chama aluno do G2, que apresentava comportamento
inadequado, para tomar conta do saco de bolas e não deixar que
ninguém pegue as bolas.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: coloca G2 como “auxiliares”.
Critério 3: Escolha
da Pesq.
A. sacam. P diz: “acertou em mim ou nela <pesquisadora> paga 50
<abdominais>”, A. acerta em P. P diz: “depois vai pagar”. No entanto,
A.não faz os abdominais.
cpto S1: ameaça o comportamento ineficiente, mas não cumpriu.
O G2 atrapalhou o G1. P tenta várias soluções: pede para que
aluna do G2 mande os outros guardarem as bolas; pede para
alunos do G2 guardarem as bolas; conversa pedindo para que
eles permaneçam sentados na arquibancada.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: coloca G2 como “auxiliar”, solicita não
movimentação de G2 (ineficiente).
18
Comportamentos Inadequados: comportamentos dos alunos não relacionados às atividades de ensino desenvolvidas. Por exemplo, jogar futebol durante aula da outra turma, bater nos colegas,
xingar e etc...
19
Comportamentos Acadêmicos Ineficientes: comportamentos dos alunos relacionados às atividades de ensino desenvolvidas, mas que não alcançam a performance pretendida por S1. Por
exemplo, num exercício de cortada direcionada os alunos erram o local de destino da bola.
20
G2 grupo de crianças que estão na quadra mas não estão em aula. São crianças de outra turma ou crianças do Centro da Juventude. (Grupo Iniciante)
21
G1 grupo de alunos que estão em aula (Grupo Avançado)
77
S1 Aula 3 (G1) Aula 4 (G2)
Data
26/04/2006 05/05/2006
Horário
15:08 às 15:45 16:02 às 17:00
Num de alunos
8 alunos 8 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Ataque e defesa Aprendizagem e treinamento do toque.
Critério 1: situação de
processo ensino-
aprendizagem
produtiva
P explica para as crianças os critérios para inserção dos G1 e G2
(idade, horários de aula, participação). A. observam.
cpto aluno: acadêmico.
cpto S1: fornece informações sobre organização das aulas.
P elogia, dá dicas, incentiva. P acena com jogo coletivo e a aula
ganha mais participação dos alunos embora não facilite a
aprendizagem da habilidade toque. (P diz: “vamos galera que daqui a
pouco tem jogo”)
cpto aluno: acadêmico.
cpto S1: reforça a participação de G1.
Critério 2: Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados” ou em
relação a
comportamentos
incorretos dos alunos
A1 usa palavrão após executar o movimento errado. P diz: “pode
parar A2. Não tem graça. Se vai continuar pode ir embora.”
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: ameaça retirar o aluno da aula.
A2 pula o muro. P diz: “bom, não pula mais, você pode se machucar.
Se pular vai voltar para casa, não vai fazer aula”.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: ameaça impedir participação na aula.
Critério 3: Escolha da
Pesq.
No trabalho de bloqueio, P introduz ataque na rede para quem
realizar o bloqueio correto (possível reforçador). O aluno que
apresenta desempenho ineficiente refaz o movimento.
cpto aluno: acadêmico
cpto S1: introdução de possível reforçador (situação ensino-
aprendizagem produtiva).
A. executam atividade de toque. P propõe jogo apenas com toque o
que desmotiva a turma; alunos querem o jogo com ataque.
cpto aluno: acadêmico.
cpto S1: propõe atividade não reforçadora. (ineficiente)
78
S1 Aula 5 (G1) Aula 6 (G1)
Data
12/05/2006 26/05/2006
Horário
15:25 às 16:20 16:02 às 17:05
Num de alunos
7 alunos 10 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Passe. Passar na posição correta e direcionar o ataque. Defesa e ataque
Critério 1: situação de
processo ensino-
aprendizagem
produtiva
-
P inicia o jogo coletivo e se dirige para a G2. G1 fica jogando
sozinhos e não ocorrem discussões entre eles. As divergências que
aparecem durante o jogo são resolvidas entre eles.
* trecho selecionado para mostrar a S1 a possibilidade de os
alunos atuarem independentemente.
Critério 2: Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados” ou em
relação a
comportamentos
incorretos dos alunos
As. executam exercício, mas a performance não está satisfatória. P.
ameaça fixar o levantador. P diz: “se começar a passar no meio eu
vou prender o levantador da P2
22
para forçar vocês a passarem na
P2”
cpto aluno: ineficiente.
cpto S1: ameaça impedir aluno de se movimentar.
Na execução do exercício A. passa a mão na bunda do colega. P diz:
“se começar com gracinha vai sair”
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: ameaça retirar A. da atividade..
Critério 3: Escolha da
Pesq.
Um exercício realizado pelo G1 foi interrompido pela P (que estava
com G2), sob argumento de que estava incorreto.
cpto aluno: acadêmico.
cpto S1:não acompanha atividade, interrompe sua execução.
(ineficiente)
Começa a instruir sobre exercício a ser executado, fornecendo
quantidade elevada de informações (15 informações para o mesmo
exercício)
cpto aluno: As. não conseguem realizar o exercício apresentado.
(ineficiente).
cpto S1: excesso de instruções na atividade. (ineficiente)
22
Taticamente a quadra de voleibol é dividida em posições (P1, P2, P3, P4, P5 e P6). A posição mais comum do levantador se colocar é na P2
79
S1 Aula 7 (G1) Aula 8 (G1)
Data
02/06/2006 09/06/2006
Horário
15:10 às 16:10 15:00 às 16:10
Num de alunos
15 alunos 14 alunos
Objetivo da Aula
Ataque, refinamento da habilidade Trabalho de passe e saque.
Critério 1: situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P propõe exercício com bolinha de tênis (refinamento
da habilidade cortada) acoplado à possibilidade de
cortada na rede (atividade de que os alunos mais
gostam)
cpto aluno: acadêmico.
cpto S1: associa realização adequada à possível
reforçador.
A2 não ataca direcionado e quase a certa um outro aluno. P diz: “A2 se você for
bom acerta aqui neste círculo” A2 acerta no círculo.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: propõe condição desafiadora (acertar determinado local).
Critério 2: Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados” ou em
relação a
comportamentos
incorretos dos alunos
A aprendizagem do movimento não está eficaz. P
ameaça com a retirada do jogo coletivo.
cpto aluno: incorreto.
cpto S1: ameaça com retirado do jogo coletivo
(possível reforçador).
A2 não executa atividade e vai sentar na arquibancada. P diz: “Você vai ficar
sentado? Só pra saber? Por que se ficar sentado já pode ir embora”.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: ameaça retirar aluno da aula.
Critério 3: Escolha da
Pesq.
P coloca aluno que fez o movimento correto com a
bolinha de tênis como modelo para aluno que não
consegue fazer o movimento.
cpto aluno: acadêmico.
cpto S1: utiliza aluno como modelo (eficiente).
Durante realização de atividade, o passe não sai em direção ao levantador. P
pergunta para o levantador sobre a qualidade do passe. O levantador olha para P.
fazendo sinal de que o passe está ruim. P instrui a movimentação correta dos
alunos.
* trecho selecionado para mostrar à S1 situação em que sua interferência
poderia ter sido desnecessária.
80
S1 Aula 9 (G1) Aula 10 (G2)
Data
23/06/2006 30/06/02006
Horário
15:31 às 16:45 15:45 às 16:47
Num de alunos
11 alunos 15 alunos
Objetivo da Aula
Trabalho de ataque. Aprendizagem do toque e da manchete e início do ataque.
Critério 1: situação de
processo ensino-aprendizagem
“efetiva”
P fornece instrução curta e clara. (3 instruções) Há mais
participação dos alunos.
cpto aluno: atuam conforme instrução.
cpto S1: instrui claramente os alunos.
P propõe um exercício e três alunos abandonam a quadra. P
chama as alunas para o grupo e estabelece condições
(possibilidade de ataque) que faz com que o grupo faça a
atividade estabelecida.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: indica possível reforçador à comportamento
acadêmico.
Critério 2: Práticas em relação
a comportamentos
“inadequados” ou em relação a
comportamentos incorretos
dos alunos
Ao chegarem atrasados à aula, P não realiza o jogo coletivo.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: não realiza jogo coletivo.
Os alunos vão chegando (não há início formal da aula). A cada
aluno que chega, P repete a explicação do exercício. Em
determinado momento, P ameaça não repetir a explicação para os
que chegarem atrasados para tentar evitar atrasos.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: ameaça não explicar o exercício para os atrasados.
Critério 3: Escolha da Pesq.
P fornece instrução curta e clara. A. realizam atividade
corretamente. (4 instruções no mesmo exercício)
cpto aluno: atuam conforme instrução
cpto S1: instrui claramente os alunos. (efetivo)
P. interrompe a atividade de G1. G1 chuta bola no gol. No início da
aula de G2, A2, pertencente a G1, se afasta reclamando. P continua
dando aula para G2. A2 vai embora, juntamente com o G1.
cpto aluno: inadequado.
cpto S1: não responde a provocações de A2 (eficiente).
81
Na intervenção, o foco foi o tratamento das práticas coercitivas, de modo a
levar a professora a substituí-las por práticas não coercitivas. Como a ocorrência
de tais práticas frente a comportamentos inadequados parecia ter relação com
dois fatores - a não delimitação do início das aulas e a não constituição das
turmas de alunos-, estes foram alvo da intervenção realizada.
a) Aspectos relativos à organização das aulas. Um dos focos da
intervenção foi no sentido de levar S1 a delimitar claramente, para os alunos, o
início das aulas. No quadro acima podemos perceber que S1 não apresenta um
horário fixo para início e término das aulas de G1. No planejamento do curso, a
aula de voleibol, englobando as de G1 e G2, deveria acontecer no horário entre as
14 e 17 horas. Como S1 teria os encontros de discussão antes do início das aulas,
no período de intervenção, foram estipulados novos horários para o início das
aulas. As aulas deveriam ser, então, das 14 h e 30 min às 16 horas para o G1 e
das 16 horas até as 17 horas para os iniciantes. No total das aulas observadas no
G1 (aulas 1, 2, 3, 5, 6, 7, 8 e 9), em nenhuma S1 iniciou no horário planejado. Na
maioria das vezes, as aulas de G1 tiveram início por volta das 15 horas e
terminaram por volta das 16h, para, em seguida, serem iniciadas as aulas de G2.
Pudemos observar, ainda, que em três ocasiões (aulas 5, 6 e 9) as aulas tiveram
início apenas depois das 15 h 30 min. Nas aulas observadas no G2 (aulas 4 e 10)
as aulas tiveram início conforme o planejamento.
Em discussão com S1, ela explicita a dificuldade de fazer com que os
alunos cheguem no horário para dar início às aulas. Não sei o que acontece, eles
não chegam no horário, chegam sempre atrasados e ainda andando, na boa,
como se nada tivesse acontecendo. Eu disse que vou diminuir o treino, que não
vou deixar entrar, que não precisa nem vir, mas nada adianta. Quando
questionada se ela cumprira as ameaças, que eles chegaram atrasados ela
diz: “Não, é só para eles ficarem espertos que eu posso cumprir
Também explicita o quanto explicar várias vezes o mesmo exercício, o que
ocorre em função do atraso dos alunos, é improdutivo e cansativo para ela. É
cansativo ficar repetindo a mesma coisa trezentas vezes; tem horas que eu me
82
perco, nem sei mais o que eu expliquei, o que eu tenho que olhar para corrigir,
fica uma bagunça.S1 percebe que, em vários momentos, como o grupo não está
com o mesmo exercício, ela mesma não consegue lembrar quais as duplas
instruídas sobre um movimento e quais as duplas ainda não foram instruídas.
Tem horas que eu mesma já não entendo nada”.
Sua justificativa para realizar a explicação do exercício, mesmo para os que
chegam atrasados, é a da necessidade de seqüênciar o próximo movimento,
que o segundo exercício planejado depende da execução do primeiro; S1 diz: Eu
penso assim, ele chegou tarde pelo menos aproveita o começo, tanto que eles
nem alongam ou aquecem muito”.
Nos encontros de discussão, salientamos que esta situação, que tanto a
incomoda, é gerada por ela mesma, pois: a) embora tente resolver o problema de
atraso dos alunos ameaçando-os com a retirada do treino, a ameaça não é
cumprida; b) acaba por reforçar o comportamento inadequado dos alunos
explicando o mesmo exercício a todas as crianças que chegam atrasadas; c)
liberar os alunos do alongamento e aquecimento pode ser fator relacionado a
chegar atrasado, pois os alunos, como se verificou na pré-intervenção, não
demonstram gostar muito nem dessas atividades, que são pré-requisitos para
atividades físicas.
Sendo assim salientamos a necessidade de estabelecer explicitamente as
regras (qual o horário de início do treino), iniciar efetivamente neste horário,
independentemente do número de alunos, propor maneiras de reforçar os que
chegaram no horário, em vez de ameaçar os que chegavam atrasados. Na maioria
das aulas, mesmo não ameaçando mais os alunos que chegavam atrasados, S1
não conseguia: a) iniciar as aulas no horário estabelecido; em vários momentos,
ela ficava conversando com os alunos ou colocando a rede, até chegarem outros
alunos, e; b) não propôs atividades reforçadoras para os que chegavam no
horário.
Pudemos perceber que, apenas na aula 9, S1 não realiza o coletivo
explicando para eles que foi por causa do atraso
23
.
23
Neste dia todos os alunos de G1 chegaram às 15:30hs (uma hora após o início oficial da aula).
83
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Reúne. Hoje
não vamos ter coletivo
por causa do horário
que vocês chegaram.”
G olha para P e fazem
comentários de
desagrado. “Assim não
venho mesmo”, “Pô
não acredito”, “Não
acredito que ela vai
cumprir”
P diz: “Segunda
cheguem no horário
que tem coletivo. A
quantidade de aula é a
mesma. Se chegar no
horário muito jogo
coletivo, se chegar
atrasado pouco ou
nenhum jogo coletivo.
Lanche”.
G desloca-se em
direção a
arquibancada.
S1 explicita tanto na aula para os alunos, quanto no encontro durante a
intervenção, que o coletivo não foi realizado por eles terem chegado atrasados. S1
diz: Não coloquei o jogo coletivo para não reforçar o comportamento inadequado
deles de chegarem atrasados. Não foi para punir o atraso, foi para não reforçar o
comportamento inadequado. Por que se eu dou o jogo coletivo mesmo eles
chegando atrasado estou dizendo: tudo bem, pode chegar atrasado que mesmo
assim eu vou dar jogo coletivo, diminuo a aula e dou jogo coletivo (o reforço). Esta
vez eu pensei: não dou o jogo coletivo e aviso que o tempo de aula é o mesmo se
eles chegam no horário pra dar a aula e muito jogo coletivo, se chegarem um
pouco atrasados é aula e pouco jogo coletivo, se for muito atrasado é aula.
Como foi hojeApesar de esta cena ocorrer na aula 9, esta foi a primeira vez que
S1 conseguiu identificar que as ações dela poderiam ter efeito sobre a
pontualidade dos alunos.
Não pudemos verificar se S1 manteve a regra (realização de jogo
contingente a iniciar a aula no horário correto) e se os alunos chegaram no
horário. Há, no entanto, informações sugestivas de que S1 não conseguiu, de fato,
dar início a aula com os alunos chegando no horário. Isto porque, embora a aula
observada fosse de G2, na última sessão de intervenção, um dos momentos de
aula selecionados para discussão é relativo ao não cumprimento do horário; se
isto ocorreu com G2, que tinha aulas após G1, muito provavelmente continuou a
84
ocorrer com G1. Pudemos observar que, na aula 10, S1 não consegue reforçar os
alunos que chegam no horário; na verdade, S1 continuou reforçando os alunos
que chegaram atrasados porque não lhes atenção explicando o que deverá
ser feito, como chega até mesmo a interromper a atividade de aluno que havia
chegado no horário para ser “modelo” para os que chegaram atrasados, como fica
claro no trecho, a seguir.
S1 explica um exercício para o grupo de alunos que está no início da
aula. Após a explicação e organização do exercício, dois outros alunos
chegam atrasados e iniciam uma atividade paralela (batem bola). S1 vai
até eles e explica o exercício para ambos; neste momento, S1 tira um
aluno do grupo dos que chegaram no horário para demonstrar o que
fazer aos que chegaram atrasados. Depois desta segunda explicação
S1 começa a observar a execução do exercício. Após duas
intervenções de correções, outros dois outros alunos chegam e iniciam
uma atividade paralela (batem bola). S1 intervém, mas ambos se
mantêm em atividade paralela. S1 volta para o grupo e depois de algum
tempo retorna para ambos para explicar o exercício. Depois de algum
tempo de execução, S1 reúne o grupo e explica a necessidade de
chegarem no horário para inicio da atividade e ameaça com a não
explicação para os que chegarem atrasados. O curioso da situação é
que, em seguida, outro aluno chega atrasado e S1 integra-o
diretamente no grupo e explica novamente o exercício.
Fica evidente, nesta última aula observada, que: a) com as explicações
para os grupos que chegam atrasados, S1 continua reforçando este
comportamento; b) continua não cumprindo a ameaça, pois diz ao grupo que não
haverá explicação para os atrasados, mas o aluno que chega é recebido com
explicação do exercício.
Nesta sessão de intervenção, ela chega a sugerir deixar os alunos batendo
bola até acabar o exercício, mas imediatamente diz que, para o aluno, bater bola
aleatoriamente é melhor (reforçador) que entrar atrasado no exercício. Durante a
discussão, considerando a necessidade de reforçar os alunos que estão chegando
no início da aula, S1, com o auxílio da pesquisadora, levanta a proposta de: a)
iniciar a aula exatamente no horário combinado; b) explicar um exercício para o
grupo que se encontra na quadra; c) instruir os que chegarem atrasados para
fazer alongamentos e esperar o término do exercício iniciado para receber as
instruções; d) permitir ao grupo que iniciou no horário correto, se acabar antes, ou
85
executar com mais eficiência, ficar “batendo bola” aleatoriamente, enquanto os
alunos atrasados fazem as seqüências necessárias. Desta maneira, esperava-se
reforçar com o “bate bola” aleatório os alunos que chegassem no início correto da
aula. Como esta proposta ocorreu na aula 10, e a coleta de dados do pós-teste foi
adiada, nós não pudemos checar seu resultado imediato.
Apesar do tema “início das aulas” ter voltado várias vezes durante a
intervenção, não pudemos perceber uma efetiva melhora neste aspecto.
Além de intervir no sentido de levar S1 a estabelecer o horário inicial da
aula, durante a intervenção procurou-se levar a professora a organizar diferentes
turmas. Como salientado na pré-intervenção, a falta de organização estrutural das
aulas pareceu ser um agente facilitador na eclosão de comportamentos
inadequados por parte dos alunos e, conseqüentemente, fez com que S1 usasse
constantemente punições e ameaças. Não havia definição das idades limites das
turmas, ocorrendo a participação de alunos mais velhos e mais novos; também
havia a presença de crianças que não eram alunos do voleibol na quadra,
atrapalhando consideravelmente a aula do G1.
A seguir, apresentamos exemplos de, principalmente, três ocorrências: a)
os comportamentos inadequados dos alunos do G2 interferindo nas aulas de G1;
b) as tentativas, sem sucesso, de S1 solucionar estes problemas (conversas e
ajudantes), e c) a proposta concebida por S1, no encontro de discussão, para
solução desta ocorrência.
Contexto: S1 ensina manchete para G1
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P desloca-se em
direção a outra dupla e
diz para o G: “Agora
manchete”.
G executa o mesmo
exercício só que agora
com a habilidade
manchete. A3
apresenta dificuldade
de realizar o
movimento de
manchete e a
habilidade sai errada.
A3 diz: “É assim P?”
86
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G executa o mesmo
exercício só que agora
com a habilidade
manchete. A3
apresenta dificuldade
de realizar o
movimento de
manchete e a
habilidade sai errada.
A3 diz: “É assim P?”
<...>
Uma criança vai até P
e pergunta se pode
fazer voleibol.
P olha para a criança e
diz: “Quantos anos
você tem? Ainda não
pode fazer voleibol,
tem que esperar mais
dois anos”.
A criança faz uma
careta <parece ficar
descontente> e sai
andando em direção a
outras crianças que
brincam com uma bola
perto da trave do
futebol.
P volta a olhar o grupo.
E diz: “Vamos galera!
Parece robô”.
P volta a olhar o grupo.
E diz: “Vamos galera!
Parece robô”.
G executa.
G executa. P vai em direção de A4
e demonstra.
A4 executa e erra. P diz: “Você deixa a
bola te dominar”.
A4 observa. P toca em A4
demonstrando o
movimento do braço.
A4 diz: “Minha perna é
torta”.
P diz: “Abre paralela e
dá um passo para
frente (posição antero-
posterior) e agora
flexiona os joelhos”.
A4 faz o movimento e
erra.
P pega no braço de
A4, arruma a
manchete e diz: “agora
vai”.
A4 executa a primeira
vez certa e depois
errada.
P diz: “vai tentando”. P
desloca-se observando
outra dupla e diz: “A6
tá de lado”.
A4 continua
executando. A6
executa a manchete.
P diz: “Você domina,
não ela”.
A6 executa. <...>
87
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
Duas crianças da outra
aula se batem na
lateral da quadra.
P vai até elas separa-
as e diz: “A2G2 não
pode bater em A3G2,
fica sentado na
arquibancada até
chegar a hora da sua
aula” P retorna ao
grupo.
A6 executa e diz: “Ta
bom P?”.
P diz: “essa eu não vi”.
A6 executa de novo e
diz: “Agora errei”.
P diz: “Por que tá de
lado. Não existe
manchete de lado”.
A6 observa P e
executa.
<...>
P coloca cones na
quadra.
G1 observa.
88
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G2 corre para sentar
novamente na
arquibancada.
<inclusive A4G2 e
A5G2>
P retorna para a
quadra e para G1
P retorna para a
quadra e para G1.
G1 faz manchete 2 a 2.
No exemplo, ocorrido na aula 2, percebemos a existência de alguns fatos
que contribuem para o aparecimento de comportamentos inadequados. Vários
alunos pertencentes ao G2 estão na quadra desde o início da aula de G1,
correndo, jogando bola, subindo nas arquibancadas e grades de proteção na
espera da sua aula. Podemos perceber que S1 tem que parar a observação de G1
para resolver problemas de comportamentos inadequados dos alunos do G2.
Na primeira passagem do exemplo, um aluno com dificuldade na realização
da manchete solicita a observação e correção da professora, mas com a
intervenção de criança que não é do G1, a professora não observa e não corrige o
movimento do aluno de G1. Quando volta a interagir com G1, faz um comentário
geral sobre incorreção do movimento sem ter, de fato, observado os movimentos.
Passagem semelhante ocorre alguns minutos mais tarde quando dois
alunos se batem na lateral da quadra. No momento em que S1 vai até eles, para
verificar o ocorrido e tentar solucionar o problema, usando a ameaça de não dar
treinos se eles continuarem se batendo aluno do G1, que executa movimento, não
é observado em sua prática. Percebemos, assim, que S1 não consegue se manter
atuando em relação ao G1 porque sofre constantes interrupções do G2 ou de
crianças que nem pertencem a este grupo.
Nos exemplos, a seguir, apresentamos as formas que S1 cria para tentar
diminuir a interferência do G2 na aula de G1.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P vai até o G2 e diz:
“Bola depois, vocês
agora atrapalham a P.
Vamos galera
coloquem as bolas
aqui”.
G2 colocam as bolas
no carrinho. A3g2 não
coloca a bola no
carrinho.
89
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G2 colocam as bolas
no carrinho. A3g2 não
coloca a bola no
carrinho.
P diz: “A3g2 coloca a
bola aqui.”
A3g2 corre com a bola. P diz: “A3g2 coloca a
bola aqui.”
A3g2 quica a bola até o
carrinho e devolve.
P diz para G1: “aquece
dois a dois” P pede
para G2 sentarem na
arquibancada e diz:
“Vou falar uma coisa.
Primeiro vocês entram
pelo cantinho e fala oi
para a professora.
Depois ficam sentados
na arquibancada. Se
vocês pegarem as
bolas vão atrapalhar,
se ficar desfilando pela
quadra vão tomar
boladas forte. Deu para
entender? Preciso
repetir”.
G1 aquece dois a dois
e G2 diz, em coro:
“não”
P retorna para G1. G1 aquece dois a dois.
G2 fica na
arquibancada.
G1 aquece dois a dois.
G2 fica na
arquibancada.
P dá instrução para
G1.
G1 executa. A maioria
do G2 sai andando
pela grade de proteção
que fica em volta da
quadra.
P observa.
G1 executa
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P volta para quadra
com G1.
Alunos do G1
executam manchete 2
a 2.
P pede para duas
crianças do G2 virem
ajudá-la.
Crianças do G2 correm
até P.
P pede para que elas
segurem dois arcos em
uma determinada
posição.
A1g2 e A5g2 correm
com os arcos para os
locais. G1 para de
executar e reúne com
P.
P diz: “Presta atenção.
Passa pelo bambolê,
depois defende a bola
que o outro ataca”.
A1 e A5 do g2 seguram
os bambolês e G1
executa.
90
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1 e A5 do g2 seguram
os bambolês e G1
executa.
P diz: “vamos A5g1!
Não é desfile de moda
não”
A5g1 olha para P e
acelera o movimento.
P observa G1,
segurando saco de
bolas.
G1 executa. <...>
Alunos do G2 pegam
bolas para chutar.
P recolhe as bolas e
pede para um dos
alunos do G2, que
estava andando na
grade de proteção e é
maior que os outros,
segurar o saco de
bolas para ela e não
entregar para nenhum
aluno do G2.
Aluno do G2 pega o
saco de bolas e fica do
lado da quadra.
P retorna para G.
Após colocar a rede pede para que G2 devolva as bolas, precisando repetir
o pedido para um aluno que continuou brincando, e em seguida pede para que
sentem na arquibancada. Neste momento, ela vai até o grupo e pede para que
eles fiquem permanecendo sentados até o início da aula deles, com início para
aproximadamente uma hora e meia mais tarde. A tentativa de S1 não surtiu efeito,
pois as crianças de G2 retornam para o local de aula de G1, assim que S1 se
dirige a G1.
Durante a intervenção, S1 demonstra-se muito incomodada com o
comportamento dos alunos. Tem muita gente falando ao mesmo tempo, e ai eu
quero atender a todos e não consigo e deixo de corrigir alguns exercícios que eu
acho necessário, pernas, posicionamento, esse tipo de coisa”. S1 também
identifica que as crianças de G2 (que entram na quadra para esperar sua aula e
pegam as bolas) atrapalham bastante o andamento da aula, mas justifica criança
com bola é assim mesmo não conseguem ficar quietas”.
Durante a discussão, S1 consegue pontuar e destacar que a intervenção
constante de G2 é uma condição que está prejudicando o andamento de sua aula,
e que apenas falar para G2 ficar aguardando (1 hora e meia) não surte efeito.
Antes eu não conseguia ver isso, hoje eu sei que falar não adianta, não sei ainda
91
o que fazer mas sei o que não certo. Às vezes eu acho que sou eu que não
consigo trabalhar com pequenos, não dá, é uma coisa que me limita. Eu não sei
se sou eu ou são eles que são demais, ou se a aula que é chata. Com os mais
velhos eu consigo falar, eles conseguem me entender. Senta é senta, vai pegar
água e lanche eles vão de uma maneira sossegada, vamos reunir que eu vou
explicar, eles vem de uma maneira sossegada, e com os pequenos eu não tenho
esse domínio
S1 consegue perceber a ineficiência da instrução e percebe que a bola é
reforçadora. Eu queria saber por que não funcionou minha instrução, não sei se é
por que eu falo meio calma, ou se é por que bola fascina; se você deixar uma bola
lá, a criança é tentada a ir lá pegar a bola e ficar jogando
24
No segundo exemplo, S1 concebe estratégias para tentar solucionar o
comportamento inadequado dos alunos do G2 de outras formas. Num primeiro
momento, pede a ajuda para duas crianças do G2 para auxiliar na aula dos
maiores. Elas ficam segurando os bambolês e, neste momento, não emitem
nenhum comportamento inadequado. Num segundo momento S1 pede a ajuda de
um aluno, que está andando na grade, para segurar o saco de bolas e não deixar
nenhum aluno do G2 pegar as bolas. Enquanto segura o saco de bolas, o aluno
não emite o comportamento inadequado. Apesar de conseguir manter alunos de
G2 sem comportamentos inadequados, S1 não conseguiu dar aula para G1 sem
ser interrompida.
Durante a intervenção, S1 identifica que manter as crianças ocupadas
diminui a ocorrência de comportamentos inadequados, mas também identifica que
manter G2 ocupado faz com que ela não consiga dar andamento à aula do G1,
seu principal foco.
Eu usei essa estratégia. Elas param de atormentar e de bater na
criançada. Elas ficam ajudando, pelo menos elas estavam ajudando. Foi um
recurso que eu tentei utilizar e deu certo. Toda a vez que alguém está me
atrapalhando muito no treino eu mando, por exemplo, ir buscar o lanche, vai
falar com a Lúcia tal coisa, vai pegar a chave com o Mauro, pra ver se eles se
92
ocupam e param de atrapalhar as crianças. ...Acho que falar não resolve, mas se
eu colocar alguma atividade junto como auxiliares me ajuda. O problema é que eu
não posso usar todo mundo e aí volta a complicar.
Durante a intervenção, a partir dos trechos escolhidos, juntamente com a
pesquisadora, foi elaborada uma proposta de modificação para a aula seguinte
(aula 3). Inicialmente, ela propõe não deixar a bola à mostra (não deixar o
reforçador acessível). Primeiro eu tirava a bola, a bola sempre andando
comigo. Vou parecer uma tartaruga, mas a as bolas ficam comigo” <parecer
tartaruga por que S1 coloca o saco de bolas nas costas preso pelas alças em seus
ombros>. S1 salienta, no entanto, que esta é uma estratégia parcial porque os
alunos continuariam na quadra mesmo sem bola, correndo, subindo nas grades e
arquibancadas e brigando entre si.
Neste momento, sugerimos: a) explicação e definição clara das divisões de
turmas (G1 e G2) em função da idade de ingresso na atividade de voleibol; b) não
permitir alunos de outras turmas fora de seu horário de aula. Salientamos, para
S1, a necessidade de não abrir exceções para nenhum aluno, ao que concorda. “É
né, eu preciso me controlar. Não posso deixar que uns fiquem outros não, que uns
peguem bolas outros não. Tenho que me policiar porque aqueles olhinhos me
pedindo, e eu acho que um não tem problema, e quando vejo são
quinhentos. Eles se proliferam”.
A intervenção mostrou-se eficaz, pois, na aula seguinte (aula 3), S1 explica
para alguns alunos do G2 as regras de participação nas aulas e não deixa que
fiquem na quadra durante a aula do G1. Além disso, S1 se mantém com as bolas,
não possibilitando, assim, que o G2 tenha possibilidade de seu uso. Vale salientar
que S1 iniciou a aula com as bolas guardadas; não houve necessidade de
formulação de ameaças para inibir seu uso.
O comportamento de S1 em não deixar as crianças na quadra, mandando
que eles voltem para o CJ até o momento do início da sua aula, ou se dirijam para
a capoeira, ou subam para o parque, faz com que G1 passe a ter a aula sem
interferência, o que possivelmente é reforçador para G1.
24
Nesse momento eu intervenho e denomino a bola como reforçadora para as crianças: criança vê bola e quer começar a
93
A partir da colocação dessas regras com as crianças de G2, S1 evitou que
permanecessem em quadra durante as aulas de G1. Assim, dirigiam-se para a
aula de voleibol no início do período vespertino apenas os alunos que podiam
estar fazendo aula pela idade mínima estabelecida e pelo nível de habilidade (isto
é G1). A partir desta sessão (aula 3), a aula de voleibol fica formalmente dividida
em dois grupos: G1, os maiores e mais avançados, que têm aula no início da
tarde, e G2 os menores e iniciantes, que têm aula após a de G1.
A partir da divisão em turmas, pudemos observar uma evidente melhora
nas aulas do G1, que passou a apresentar menor freqüência de comportamentos
inadequados, confirmando que a presença de G2 era fator que interferia
negativamente na aula. No entanto, é preciso salientar que ainda ocorreram
situações em que S1 permitia a presença de G2 o que ocorria no período final
da aula de G1-, o que interferia na atividade de G1. Com o passar das aulas,
mesmo com restrições, G2 tendia a chegar um pouco antes (por volta de 20
minutos) do início de sua aula. Neste caso, G2, mesmo que minimamente
organizado, pegava uma bola e ficava trocando toque e manchetes nas laterais da
quadra. Apesar de o apresentar bagunça generalizada, como ocorria
anteriormente, a presença de G2 volta a comprometer a aula dos maiores.
Pudemos perceber que, apesar de G2 ser altamente aversivo para G1, S1 tem
dificuldade em manter o cumprimento das regras antes estabelecidas.
Um exemplo, apresentado a seguir, mostra a interferência de G2 no
processo ensino-aprendizagem de G1, com a ocorrência, inclusive, de práticas
coercitivas por S1.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Reúne”. Divide o
grupo em dois grupos
de quatro e diz: “Agora
quem saca vai ser
vocês. O levantador
está correndo muito,
tem que colocar a bola
pelo menos até a linha
de três metros. Presta
atenção no passe”.
G1 observa, divide-se e
executa.
chutar, manipular e brincar “Então fascina quer dizer reforça né?”.
94
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G1 executa. <o passe
não está sendo bem
direcionado para o
levantador>
G1 executa. <o passe
não está sendo bem
direcionado para o
levantador>
P observa e diz: “troca,
quem estava passando
saca”.
Aluno que saca erra o
saque.
P diz: “Como vai sair o
exercício se quem tá
sacando nem acerta o
saque?”
G1 observa e retoma o
exercício.
P observa e arruma o
posicionamento de A4
no passe.
G1 executa. <...>
P reúne e diz: “Um
grupo sozinho, quem
daquele lado joga
independente de quem
tá desse lado. Vão rolar
dois joguinhos”.
G1 fica parado
olhando. <demonstra
não ter entendido>
P explica novamente. G1 continua parado.
<continua
demonstrando não
entender>
P vai até a quadra e
demonstra.
G1 inicia exercício. G2
está na quadra,
sentado na
arquibancada fazendo
alongamento.
P vai até G2 e passa
instrução.
G1 executa e G2
observa P.
P completa
demonstração.
G2 inicia o exercício.
P diz: “Vai até o cone e
o outro lança a bola, vai
andando até o outro
cone e repete”.
G2 executa. <encontra
dificuldade em
executar>
G2 executa. <encontra
dificuldade em
executar>
P observa.
A1G2 diz: “P melhor
do outro jeito, esse
nunca vai sair”.
P diz: “Não, hoje tem
que fazer assim. Um
lança outro toca,
depois troca”.
G2 executa. A1G2 faz
careta. <demonstra
não gostar de ser
contrariada>
P observa e diz:
“Vamos fazer duas
vezes lançando e
depois fazer os dois
tocando”.
95
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1G2 faz careta.
<demonstra não estar
gostando do
exercício>
P observa e vai
corrigindo
posicionamento de
A1G2 e A2G2.
G2 executa, G1
continua fazendo
exercício.
<...>
P vai até G1. G1 executa o exercício.
G1 executa o
exercício.
P corrige alguns
posicionamentos de
corpo.
G1 executa. <o
exercício parece muito
motivador, por que
eles vão executando
sem reclamar ou
brigar>
P observa G1.
G2 vai até P e diz: “E
agora P?”
P diz: “Agora toque
direto”
G2 executa. <o
movimento não sai
correto>.
<...>
P reúne G1 e diz:
“Primeiro era no cone,
depois foi o direcionar
para o levantador,
agora tudo direcionado.
Saque, passe e
levantamento.
Entenderam?”.
G1 se divide na
quadra.
P diz: “Não pode largar
até a linha de três
metros”.
G1 executa.
P vai para G2 e troca o
exercício.
G2 fica olhando G1
jogando na quadra.
P diz: “Entenderam?” G2 diz: “Não”
P repete. G2 observa P e inicia
exercício.
G2 observa P e inicia
exercício.
P observa e corrige
movimento.
G2 executa. <...>
P vai até G1 G1 executa.
G1 executa. S1 observa jogo. <os
fundamentos não saem
corretos>
G1 executa. P diz: “Meu Deus!
tudo errado. O passe
não sai o resto também
não vai sair”
G1 observa. P diz: “Pode parar
tudo, depois a gente
continua”.
96
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G1 observa e diz: “Ah
professora vai se nem
viu direito”.
P diz: “Não agora
lanche”.
G1 vai tomar lanche.
G2 fica na quadra.
Pode-se observar S1 passando um exercício para o G1 e interrompendo o
acompanhamento das atividades do grupo, encaminhando-se para G2, para lhes
dar instruções sobre um exercício. Verifica-se que o exercício não é executado
eficientemente por G1, poucas correções, e G1 acaba, no final, sendo punido
por este erro de execução. Ao assim proceder, S1 não atende corretamente G1,
que é seu foco, e nem atua adequadamente com G2.
No encontro de discussão, S1 enfatiza que G1 não se empenha em realizar
corretamente os exercícios. Eles não se empenham para fazer. Se a bola cai a
um metro de onde eles estão, nem se mexem. Pode cair uma bomba que o bicho
não se mexe e ainda reclama com o outro e aí a coisa só cresce.”.
S1 não percebe que a presença de G2 e sua ausência durante a execução
do exercício por G1 são determinantes no desempenho de G1. Quando
apresentamos estes aspectos para S1, ela se mostra surpresa e salienta que
acreditava que justamente o contrário era o que acontecia. Achei que eu indo pra
G2 passar um exercício era até melhor por que quando eles jogam sozinhos, tudo
acontece, todo mundo jogando, falando. Quando eu chego, não sei o que
acontece, eles começam a brigar por qualquer coisa. eu corrijo, mando mudar
isso, pego no pé, no sentido de correção e eles brigam e em a culpa no
outro.” A própria S1 levanta a possível causa deste comportamento. Será que é
porque eu sempre estou criticando eles? Mas não é para prejudicar, é para corrigir
para que eles façam melhor.”
b) Instruções. Além de colocar em foco a necessidade de cumprimento de
horário (por alunos e professora) e de organização das turmas, na intervenção
ressaltou-se a necessidade de apresentar instruções claras, com número reduzido
de informações. Verificou-se que instruções continham elevado número de
97
informações, impedindo que o aluno soubesse o que deveria fazer e em que
seqüência.
Talvez a presença de muitas informações estivesse relacionada aos
objetivos propostos por S1, que também não eram claros. Em relação aos
objetivos das aulas, pudemos identificar duas características: a) S1 centra seus
objetivos, principalmente para o G1, em aspectos táticos do voleibol, mas o nível
de habilidades dos alunos é limitante para o cumprimento de tais objetivos. Em
outras palavras, os exercícios, muitas vezes, não eram executados
eficientemente, não pela apresentação de comportamentos inadequados, mas sim
por falta de habilidade técnica. Como identificado na pré-intervenção,
detectamos ações coercitivas não frente a ocorrência de comportamentos
inadequados, mas também pela apresentação de comportamentos ineficientes. b)
S1 apresenta objetivos amplos e sempre centrados no que ela irá realizar para a
formulação da aula. o conseguimos verificar, em seus objetivos, o que S1 quer
que seus alunos consigam realizar.
Nos objetivos formulados para G1 encontramos a presença de: 1)
elementos técnicos do vôlei (ataque, defesa, levantamento, passe), como por
exemplo: ataque e defesa (aula 3); refinamento da habilidade ataque (aula 7); 2)
construção de elementos táticos para o jogo: posicionar a defesa na quadra (aula
2), trabalho de passe e saque (aula 8). Apesar do G1 não apresentar as
habilidades específicas, como toque, cortada, bloqueio e etc... em um nível
avançado, em nenhuma das aulas observadas S1 explicita que tem por objetivo o
aperfeiçoamento de tais habilidades, que são fundamentais para técnicas e táticas
de jogo; no entanto, em vários momentos das aulas, pudemos identificar tanto a
realização de exercícios que teriam a ver com habilidades específicas, muito
embora o objetivo das aulas formulado por S1 fosse outro (técnica e tática),
quanto a realização de treino técnico ou tático, sem que os alunos dominassem
minimamente habilidades específicas. Em sendo assim, é lícito inferir que S1
propunha atividades, inclusive com variações, sem saber exatamente para quê
tais atividades eram treinadas.
98
Em nenhuma aula os objetivos identificavam as ações específicas que S1
gostaria que seus alunos alcançassem. Isto pode ser verificado, por exemplo, no
objetivo da aula 3: ataque e defesa. Estes dois fundamentos podem ser
trabalhados tecnicamente (melhora na habilidade da cortada, no caso do ataque, e
melhora na habilidade manchete e toque, no caso da defesa) e taticamente
(construção de uma jogada ensaiada, melhora do ataque na rede, melhora do
ataque de fundo, ensaio da defesa centro recuado ou centro avançado, entre
outros). Não existe, por parte da formulação dos objetivos, nenhuma informação
do que S1 espera que seus alunos realizem. Desta maneira, as atividades
propostas por S1 poderiam não ser as mais adequadas, além de não permitirem a
verificação da aprendizagem de fundamentos.
De fato, as atividades propostas se mostraram não adequadas. Em vários
momentos em que os alunos não conseguiam realizar os exercícios propostos por
S1, poderíamos levantar a hipótese de que a não realização ocorria por falta de
habilidade específica, como por exemplo na aula 5.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Reúne. Fila no
fundo da quadra. A1 vai
na P2
25
. Vai ser
individual. Eu vou soltar
a bola, vocês têm que
entrar e passar para
A1.Quando entra pela
direita, perna esquerda
à frente. Quer que
demonstre?”.
G1 observa e diz:
“Sim”.
P pede para A2
demonstrar.
A2 vai para o fundo da
quadra entra pela
direita e mostra a perna
esquerda à frente.
P vai explicando o
movimento de A2.
“Sempre virado para
A1”
G1 observa e pergunta:
“Depois quem ataca?”
G1 observa e
pergunta: “Depois
quem ataca?”
P diz: “O contrário, se
quem passou entrou
pela direita, ataque na
esquerda. Ou vice
versa”.
25
Taticamente a quadra de voleibol é dividida em posições (P1, P2, P3, P4, P5 e P6). A posição mais comum do levantador
se colocar é na P2.
99
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G1 observa. P diz: “Se começar a
passar no meio eu vou
prender o levantador
da P2 para forçar
vocês a passarem na
P2”
P diz: “Se começar a
passar no meio eu vou
prender o levantador da
P2 para forçar vocês a
passarem na P2”
G1 vai se
movimentando e
colocando-se nas filas
e na quadra.
P diz: “Ah! Esqueci.
Tem que acertar os
cones”.
G1 se posiciona.
P lança a bola (em
forma de saque por
baixo).
Primeiros da fila entram
na quadra, um deles
passa e o outro ataca.
<o passe sai ruim (não
na mão do levantador)
e o ataque sai para
fora>
Primeiros da fila
entram na quadra, um
deles passa e o outro
ataca. <o passe sai
ruim (não na mão do
levantador) e o ataque
sai para fora>
P observa e diz: “Tá
passando em pé. Não
vai chegar nunca” e
saca novamente.
G1 executa. P observa e diz: “Tá
todo mundo passando
em pé. Olha só”. P
demonstra.
G1 observa e reinicia
o exercício.
P saca. G1 executa
G1 executa P. observa os alunos
G1 executa. P corrige os alunos.
G1 executa. <...>
P coloca dois na
posição de passe e diz:
“Agora vai entrar dois
na quadra. Se o A2
passar o A3 ataca.
Sempre o contrário”.
G1 observa.
P diz: “Galera. O
levantador tá correndo
muito, ele é o único que
não deveria correr”.
G1 observa.
P saca. G1 executa.
G1 executa. P observa e corrige
movimento.
G1 executa. P pára de sacar vai até
A3 e demonstra qual
deve ser o movimento.
100
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A3 observa. P saca.
P saca. A3 entra com a perna
certa e acerta o passe.
A4 diz: “Aí meu
garotão” A3 olha para
A4 e faz careta.
<demonstra desprezo
pelo elogio>
A3 entra com a perna
certa e acerta o passe.
A4 diz: “Aí meu
garotão” A3 olha para
A4 e faz careta.
<demonstra desprezo
pelo elogio>
P observa e corrige
movimento do
levantador.
G1 executa. <...>
No trecho acima podemos perceber que: a) os alunos não conseguem
realizar o exercício por não conseguirem executar a manchete (habilidade
específica) corretamente. Um erro apresentado no exemplo é não flexionar as
pernas, durante a execução da manchete, como corrigido por S1, “Tá passando
em pé. Não vai chegar nunca” ou “Tá todo mundo passando em pé. Olha só”. S1
mostra correções da estrutura básica da manchete. Portanto, os alunos não
conseguiam realizar o exercício (técnica: passe para determinado local) por falta
de habilidade específica (manchete), o que torna o movimento ineficiente. O
problemático de tal situação é o fato de S1 apresentar práticas coercitivas frente a
comportamentos ineficientes dos alunos. b) o número de informações fornecidas
por S1 para a realização do exercício é elevado, aspecto que será focalizado a
seguir.
As instruções fornecidas, para um mesmo exercício, apresentam elevado
número de informações diferentes, como exemplificado, no trecho a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P explica exercício. G reunido observa.
P diz: “Vamos dividir o
grupo em dois. O G2
faz apoio e o G1
executa, depois
inverte.”.
G observa.
101
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P coloca alguns cones
espalhados pela
quadra (em pontos
estratégicos) e pede
para os alunos do G2
se espalharem entre os
bambolês (segurar o
bambolê) e para fazer
o ataque .
G2 se desloca até o
material, G1 observa
P diz: “Presta atenção.
A1 vai entrar (passar
por dentro) pelo
bambolê, e pegar a
largada, vai de costas
até o cone, passa pelo
segundo bambolê pega
a segunda largada, vai
de costa até o cone,
passa pelo terceiro
bambolê, pega a
terceira largada, passa
por baixo da rede faz
cinco bloqueios, passa
por de trás do cone
defende um ataque,
posiciona-se defende
outro ataque e se a
bola chegar na mão do
levantador realiza um
ataque, se não devolve
a bola para o
carrinho.”.
G1 observa, e conversa
entre si. <faz cara de
que não entendeu>
P diz: “Preciso explicar
novamente?”.
G1 faz que sim com a
cabeça.
P pede para que um
aluno demonstre e vai
dizendo novamente
todas as etapas.
G1 observa.
P diz: “Entenderam?” G1 fica olhando para P.
<faz cara que não>
P diz: “Vamos começar
que eu ajudo”
G1 faz uma fila e o
primeiro sai correndo e
não passa pelo
bambolê.
G1 faz uma fila e o
primeiro sai correndo e
não passa pelo
bambolê.
P diz: “Volta tem que
passar pelo bambolê”
A1 sorri e volta. P observa.
Em um exercício que combina defesa e ataque, S1 apresenta 15
informações diferentes. Verifica-se que a quantidade de informações torna
102
complexo o que está sendo instruído, mesmo para um grupo que se diz em
treinamento. O exercício em questão apresenta a união de quatro aspectos táticos
diferentes: a) defesa de bola largada; b) bloqueio; c) defesa de ataque, e d)
ataque. Somado a isto, para realizar estas habilidades havia quatro
deslocamentos diferenciados: a) passar por dentro do bambolê, b) deslocamento
de costas ao cone, c) passar por baixo da rede, e d) deslocamento para atacar.
O desempenho do grupo em tal exercício é ineficiente, sem conseguir executar
tudo o que foi solicitado. Poucos alunos conseguiram realizar o exercício por
completo. S1 repete a instrução, com um aluno servindo de modelo, e mesmo
assim o exercício não tem sua execução correta.
Durante a intervenção, quando tal instrução é lida para S1, ela própria se
espanta com o número de informações, “Nossa! Quanta coisa. Exagerei. Acho que
no fim nem eu sabia o começo”. Neste exemplo, mostrou-se para S1 que se
exigira um número grande de passos, para se completar a seqüência (que
culminaria com o ataque) e, com isso, o número de alunos que conseguira chegar
até obtenção do reforçador (ataque) fora mínimo. Na intervenção, a pesquisadora
propôs a divisão de tal exercício em dois ou três, de modo a que o reforçador
fosse obtido a partir de um menor número de passos; por exemplo, passar pelo
bambolê, defender (pegar) a largada, ir de costas até o cone, passar pelo segundo
bambolê, defender a segunda largada e, se conseguir pegar a segunda largada,
atacar uma bola na rede. Dividindo o exercício, de modo a ser conseqüenciado
com possíveis reforçadores, provavelmente sua execução fosse mais eficaz.
A intervenção feita parece ter surtido efeito porque já a partir da aula
seguinte S1 instruções com menor número de informações e, portanto,
passíveis de serem executadas eficientemente.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Parou. Agora
sem cone, recebe a
bola do saque, levanta
e ataca. 10 bolas”
G começa a executar.
A2 saca viagem e A3
erra o passe.
P diz: A2 saca
direcionado.
103
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 olha para P e saca.
<faz cara de
desdenho> A5 passa
com a perna errada.
P diz: A5 a outra perna
no passe.
A5 olha para as pernas
trocadas e ri.
P observa
A2 saca novamente.
A5 passa, A7 levanta e
A3 ataca.
P observa e diz: “Muito
bem, quando o passe
sai o ataque tá bem
colocado. Vai de novo.”
A5 e A3 sorriem. P observa
A2 saca forte. A5
passa errado, A7 se
desloca e levanta, A3
ataca e diz: “Giba”
P observa e diz: “Boa
A7. Não tá na mão?
Corre atrás dela”
A2 saca. A5 erra e diz:
“Perna trocada sua
anta”
P observa.
A2 saca, A5 acerta o
passe, A7 levanta e A5
ataca.
P diz: “Isso mesmo,
olha a perna como
estava certa. Viu a
diferença?”
G executa. P diz: “Pessoal, Deu!
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P reúne G e diz: “vocês
continuam com os trios
que estavam, cada trio
pega um cone, vamos
trabalhar os três trios
na quadra. Um no
saque, outro passa e o
outro com o cone,
encaixa a bola
passada. 15 saques,
troca.”
G observa.
P demonstra. G observa. <G fica
conversando baixo e
dizendo que é chato>
P diz: “Quem tá com o
cone não pode se
mexer mais que um
passo. Não pode ir até
a linha dos três metros,
nem até a capoeira”.
G vai se posicionando
na quadra.
P diz: “Vamos lá
pessoal. To esperando,
é para ontem
G executa. <nenhum
trio consegue encaixar
a bola no cone>
G executa. <nenhum
trio consegue encaixar
a bola no cone>
P anda pela quadra e
observa.
104
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G executa acerta e diz:
“Nossa acertei!”. <G
vai se motivando>
P observa.
G executa e vai
acertando mais as
bolas no cone.
P observa.
G executa. P observa.
A1 passa a bola baixa.
A2 tem que abaixar o
cone.
P diz: A1 é para passar
alto, não é para colocar
a bola dentro do cone.
A1 olha para P e
continua executando o
passe.
P observa.
A4 salta para passar. P diz: “A4 não salta
quando passa. Pés no
chão”
A4 olha para P e ri. P observa.
A7 passa sem abaixar
o quadril.
P diz: “Você não vai
abaixar não?”
A7 diz: “Ah é” e abaixa. P observa.
A3 diz: “Você viu como
eu estou boa P?”
P diz: “É verdade to
vendo”.
A3 executa e erra. P diz: “Só porque eu
falei.”
G executa. P anda pela quadra
observando. P vai em
direção à rede.
A2 diz: “Parou,
pessoal”.
P diz: “Que parou
nada. Continua”
G executa. P observa.
Na aula 9 percebemos que em dois momentos S1 aplica exercícios com
instruções com um número bem inferior de informações. S1 apresenta a instrução
de um exercício com três informações e outro, contendo quatro informações e o
resultado é a participação efetiva da turma e uma performance mais eficaz. Com o
desempenho eficiente, parte das práticas coercitivas deixa de ocorrer.
c) Propiciar ambiente reforçador.
Além de atuar sobre a organização da aula (definição de turmas e horário) e
sobre as instruções, procurou-se levar S1 a propiciar um ambiente reforçador.
Como salientado, verificou-se na pré-intervenção que, além de punir
comportamentos inadequados e ineficientes, S1 usava de ameaças constantes
supostamente como forma de evitar a ocorrência de tais comportamentos, bem
como de “motivar” o aluno (por exemplo, quem não fizer x, paga 30 abdominais) a
105
realizar as atividades. Durante a intervenção, procurou-se levar S1 a substituir o
uso de práticas coercitivas por reforço subseqüente aos movimentos eficientes e
comportamentos acadêmicos dos alunos. Para tanto, um aspecto fundamental foi
identificar o que seria reforçador para os alunos; tal identificação foi feita durante o
processo de intervenção.
Foi ficando claro para S1 que algumas atividades de voleibol não são
reforçadoras, especialmente as relativas ao treino de habilidades (toque) e táticos
(fixar o levantador numa posição). Dos movimentos do voleibol, o que se
apresenta como reforçador é a cortada consubstanciada no ataque. Como
explicitou S1 num dado momento do processo de intervenção, “O jogo que eles
querem não é jogo com toque..., é o jogo que tem cortada. O que tem todo um
espetáculo. O que eles acham que está parecido com o da televisão”. Também o
bate-bola aleatório é uma atividade reforçadora, podendo ser utilizado durante
atividades de ensino.
Em relação aos comportamentos inadequados, além de intervir no sentido
de eliminar variáveis que poderiam produzi-los e de identificar possíveis
reforçadores, procurou-se levar S1 a utilizar práticas reforçadoras. Durante a
intervenção, discutiu-se a diferença, do ponto de vista dos resultados, entre a
utilização de práticas coercitivas e de práticas reforçadoras na instalação e
modificação dos comportamentos dos alunos.
Como já salientado, durante a pré-intervenção pudemos detectar que S1
não só faz o uso de punições como repetidas vezes faz ameaças antes mesmo do
aparecimento dos comportamentos inadequados, o mesmo ocorrendo durante a
intervenção. Quando analisamos duas interações da primeira aula, podemos
identificar a sinalização de punição para possíveis comportamentos inadequados
(pendurar-se na rede).
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1 chega perto de P e
pergunta: “Bola
Professora?”
P responde: “Ainda
não”.
A1 solta o carrinho e
retorna ao grupo.
P observa G.
106
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Agora fila. Corre
na rede, salta e
bloqueia. Quem se
pendurar na rede paga
10 abdominais, não 30
abdominais”.
G sorri, conversa entre
si e executa.
P recolhe os cones e
observa o grupo.
G executa. <nenhum
aluno pendura-se na
rede>
P diz: “Dois a dois com
bola. Rápido gente!”.
G corre, pega bolas no
carrinho e começa a
aquecer dois a dois.
P coloca rede na
antena com ajuda de
um garoto que estava
observando na
arquibancada.
G aquece com bola.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P vai para o outro lado
da quadra e lança a
bola. <saque fácil>
Um dos A. que estão
na quadra passa para
o levantador e ataca.
P saca mais bolas. G executa. Um aluno
que está fazendo o
ataque, corta bem
perto da pesquisadora.
G executa. Um aluno
que está fazendo o
ataque, corta bem
perto da pesquisadora.
P diz: “acertou em mim
ou nela paga 50”.
<pesquisadora>
G executa. Um aluno
corta e acerta em P.
P diz: “depois vai
pagar”
O aluno sorri diz
“Sorry” e continua
atacando.
P diz: “Fila agora na
saída” <posição da
quadra de saída de
rede>
G muda a posição da
fila e reinicia o
exercício.
No primeiro trecho, verifica-se que após dar a instrução Agora fila. Corre
na rede, salta e bloqueia.” S1 sinaliza com a punição para eventual
comportamento inadequado Quem se pendurar na rede paga 10 abdominais, não
30 abdominais” que não foi apresentado. Aparentemente S1 tenta, com a ameaça,
evitar a ocorrência do comportamento inadequado. De fato tal ameaça é
justificada por S1 por, em outras aulas, esse comportamento inadequado ter
aparecido. “Eles sempre se penduravam, então já fui avisando
107
No segundo trecho da aula, pode ser identificado novamente o uso de
ameaça antes da apresentação de comportamento inadequado, mas nessa
passagem, verificamos que o comportamento ocorre e, mesmo com a ameaça
apresentada, S1 não efetiva a punição. Ainda, verifica-se que o número de
abdominais é maior; de fato, nas ameaças S1 vai aumentando o número de
abdominais que, nesse momento, é de 50.
No encontro de discussão, ao serem apresentados esses dois trechos, S1
justifica-se dizendo que, apesar de sinalizar com a punição, considera muito difícil
seu cumprimento. Eles falam Oh! Professora ele se pendurou. - Eu falo que no
final ele paga, e acaba não pagando, é para ele não fazerem. De vez em
quando eu faço paga.”. Quando questionada se ela acredita que isto resolva seu
problema ela responde que algumas vezes não, mas diminuiu bastante as vezes
que eles se penduravam”.
O comportamento de S1, seja com punição seja com a ameaça de punição,
resolve seu problema imediatamente; desta maneira, verifica-se que a
conseqüência imediata está reforçando S1 a usar práticas coercitivas, sem que ela
se dê conta de que, a curto prazo, esses comportamentos podem diminuir, mas
não são eliminados, voltando a ocorrer posteriormente.
Na intervenção, S1 vai tendo consciência de que apresenta práticas
coercitivas e chega, num dado momento, a avaliá-las como inadequadas, como
exemplificado, no trecho a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P mostra como se
coloca a mão para
executar o toque.
A1 posiciona a mão
A1 posiciona a mão P arruma a mão de A1
A1 executa e A2
pergunta “Onde posso
tomar água” <é a
primeira vez que A2
vai fazer vôlei>
P continua observando
A1 e diz: “na portaria”.
A2 diz: “não sei onde
fica”
P diz: “Por onde você
entrou”.
A2 diz: “Eu pulei o
muro”.
P diz: “mas não pode
pular o muro”
108
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 diz: “mas eu pulei,
olhei e pulei”.
P diz: “bom, não pula
mais, você pode se
machucar. Se pular vai
voltar para casa, não
vai fazer aula. Sobe até
a portaria, tem uma
torneira lá”.
A2 corre. P diz: “rapidão hein!” e
volta a olhar A1
Durante a análise deste trecho na intervenção, S1 afirma que o uso de
ameaça foi inadequado, pois era a primeira vez que a criança vinha para a aula de
vôlei e desconhecia a entrada correta. Essa eu fui péssima, o moleque mal me
conhece e eu vou ameaçando ele. Nunca mais vai voltar ?Neste encontro
discutimos que um ambiente ameaçador nas aulas pode gerar a desistência de
muitos alunos.De fato ocorreu a desistência do referido aluno que não retornou
mais às aulas.
S1 explicita que, às vezes, não consegue pensar em alternativas não-
coercitivas, quando ocorrem comportamentos inadequados dos alunos. O trecho,
a seguir, foi selecionado para exemplificar tal situação.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 executa. P observa.
A2 executa, quando
passa no segundo
bambolê, A5 que está
sentado segurando o
bambolê, passa a mão
na bunda de A2.
P olha para A5 e diz:
“Se começar com
gracinha vai sair.”.
A5 olha para P e sorri.
<parece pedir
desculpas>
P volta a largar bolas.
A5 executa. P volta a largar bolas.
Ao refletir sobre este trecho, S1 afirmou que percebeu que iria ameaçar,
tentou pensar em alguma outra alternativa, mas como tinha que agir rápido, não
teve outra solução. Na intervenção, refletiu-se sobre a possibilidade de evitar a
ocorrência de tal comportamento, por exemplo, criando situação que favorecesse
a ocorrência de comportamentos incompatíveis (Por exemplo, se A5 tivesse que
109
segurar o bambolê com duas mãos, o fato não teria provavelmente ocorrido, e não
seria necessária a utilização de ameaça).
Foram identificadas punições e ameaças a comportamentos inadequados
de um aluno, em especial (A2). O exposto a seguir indica o modo como S1 analisa
o comportamento de A2 e, em parte, o seu próprio comportamento de ameaçar.
Fazendo referência a um comportamento inadequado de A2 <falar merda, ao
realizar movimento de forma ineficiente>, S1 afirma que o aluno apresenta atitude
clara de provocação, mas admite “eu tento ignorar, fingir que não ouvi, mas A2 me
irrita e ele sabe que isso me irrita, por que tem os pequenos e ele não tem nada
que ficar falando palavrão. Vitória dele, ele conseguiu me irritar”. Quando
questionada como resolver este comportamento inadequado de A2 sem a
utilização de ameaças, S1 apresenta um questionamento “Ele parou não parou?
Se deu certo por que não pode usar? assim de vez em quando?Em outra
sessão do processo de intervenção, S1 comenta em relação à A2. Se viu como
ele me provoca, foi eu falar que ia acabar para ele levantar e se juntar ao
grupo. Parece que estava testando minha autoridade. Eu juro que saquei a
provocação, e tentei me controlar, tentei, tentei, mas me irrita e eu “tasco” uma
ameaça. Fiz tudo errado”. Em relação a A2, em especial, discutiu-se a
necessidade de S1 não responder aos comportamentos inadequados de A2 com
ameaças, pois possivelmente esta sua atuação estaria reforçando o
comportamento de A2.
Em relação aos comportamentos inadequados, durante o processo de
intervenção verificou-se que S1 não passou a ter consciência de que usava
práticas coercitivas, mas também a propor alternativas não coercitivas, muito
embora expressasse que, em determinadas ocasiões, não conseguisse propô-las.
A forma como conseguiu agir diante de comportamentos inadequados de A2, a
seguir exemplificadas, mostra mudança clara no modo como passou a agir.
No primeiro trecho, fica claro que S1 não ameaça e propõe uma forma de
A2 apresentar comportamento acadêmico.
110
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G executa. A2 corta
uma bola curta.
P diz: “Longa, eu pedi
longa”
A2 diz: “Que, que eu
posso fazer?”
P diz: “Se vira, quero
longa”
G executa. P diz: “Vamos
A2 corta, pega na rede
e quase acerta um
aluno.
P diz: “Cuidado A2
quero longa”
A2 diz: “foi sem querer”
A2 diz com ironia
P observa e diz: “É
sempre sem querer” P
diz com ironia
G executa. P observa e diz: “A2 se
você for bom acerta
aqui nesse circulo” P
desenha um círculo
pequeno no chão.
A2 volta para posição. P vai até o local onde
está A4 e diz: “É aqui
que eu quero”.
A2 diz: “Ai P?” P diz: “É, bem aqui”
A2 corta e acerta. P diz: “Viu é só querer”
A2 corta. P diz “Boa, mas uma
vez é sorte. Quero ver
de novo.”
A2 corta e acerta o
circulo.
P diz: “Vamos ver
quantas vezes você
acerta em dez
tentativas”
A2 executa. P observa.
A2 acerta 7 vezes no
circulo.
P diz: “Boa A2”
Verifica-se que S1, diante da possibilidade de A2 acertar os colegas com a
cortada, elabora um alvo e um desafio para o aluno. A estratégia mostra-se eficaz:
promove o comportamento acadêmico de A2 e evita o uso de ameaça para um
possível comportamento inadequado.
No encontro, S1 apresenta-se muito satisfeita por ter conseguido uma
forma não ameaçadora. Fui mais esperta que ele. Quando vi que ele ia começar,
já arranjei algo para não ter que ameaçar. Esperta essa professora não é?”.
O outro trecho evidencia que S1 ignora o comportamento inadequado de
S2, o que surte efeito.
111
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
Alunos de G1 cuja aula
já terminou, jogam bola
na outra quadra.
<chutam bola ao gol>
P observa.
Alunos chutam forte a
bola no gol.
P vai até eles e diz:
“Podem parar agora
por que vocês vão
atrapalhar a aula dos
pequenos. Guarda a
bola e até segunda”
Alunos páram a bola
guardam e começam a
reclamar. A2 diz:
“Segunda feira vocês
vão ver se nos
atrapalharem
P retorna a G2 e
observa de longe os
alunos do G1.
Alunos do G1 vão
dirigindo-se a saída da
quadra e vão
reclamando.
P observa a execução
do exercício de G2 e
observa alunos de G1
indo embora.
A2 diz: “Vocês
podem chegar às três
e meia. Se chegarem 1
minuto antes vai ter
porrada”
P corrige alunos do G2.
Alunos de G1 vão
embora. G2 executa o
exercício.
P observa.
No encontro de discussão S1 apresenta-se eufórica com a não utilização de
ameaça para o comportamento inadequado de A2. Ele me provocou, porque
sabia que eu ia revidar, ameaçar e ficar brava. Quando eu apenas mandei parar e
voltei para a aula de G2 e não dei mais bola pra eles, ele ficou uma arara. Falou,
falou, mas como eu o ignorei foi embora Se eu fizer isso muitas vezes talvez ele
pare de me provocar né, porque ele vai perceber que não tem efeito não é?”
Nesses dois trechos, percebemos que S1 apresenta maior consciência da
sua utilização de ameaças e consegue propor outras soluções frente aos
comportamentos inadequados dos alunos, neste caso de um aluno em particular
(A2). Podemos perceber que tais elaborações aparecem nas aulas finais (aula 8 e
aula 10) o que pode sugerir que os encontros de discussão deram subsídio para
que S1 conseguisse elaborar alternativas.
Em relação aos comportamentos acadêmicos não eficientes, além de
intervir no sentido de levar S1 a elaborar instruções com menos informação, o que
112
aumentaria a chance de os alunos executarem a seqüência, procurou-se levá-la a
utilizar reforçadores como conseqüência da emissão de comportamento
acadêmico ou do nível de eficiência apresentado.
Nos trechos a seguir, fica claro que S1 passa a apresentar reforçadores
como conseqüência para o comportamento acadêmico. A aula 3, a seguir, foi a
primeira vez em que S1 utiliza reforçador, consequenciando comportamento
eficiente – no caso realizar bloqueio.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
113
Neste trecho, observamos que S1 inicia o exercício com a execução de um
ataque, mas os ataques subseqüentes estão vinculados à execução do bloqueio.
Em outras palavras, percebemos que S1 incorpora um possível reforçador
subseqüente à performance de bloquear durante o exercício. Neste exercício, o
que está sendo trabalhado é a performance de bloquear e não o movimento de
bloqueio, isto é, S1 vincula o reforçador a conseguir bloquear o ataque adversário
e não necessariamente à movimentação correta de bloquear. Em outras palavras,
um aluno que bloqueasse o ataque, mas apresentasse movimento incorreto do
bloqueio (por exemplo bloquear com os braços abertos, pouca impulsão no salto)
teria o direito de ir para a fila de ataque. S1 justifica: “que adianta no jogo bloquear
bonito e não pegar o ataque do adversário; o importante para mim era bloquear,
se ele bloqueou foi para o ataque
Nesta passagem, verifica-se que um aluno, que o havia feito o bloqueio
(A5) e se encaminhava direto para a fila de ataque, é advertido, primeiro por um
companheiro e depois diretamente por S1. Durante a intervenção, S1 salienta que
elaborou o exercício e ficou atenta para que os alunos cumprissem o combinado,
para depois serem reforçados. Fiquei prestando atenção para ver se todos
bloqueavam. No começo A5 até tentou burlar, mas depois que eles viram que eu
estava esperta nem tentaram mais burlar e tratavam de fazer o bloqueio bem feito
para ir atacar logo.” Quando colocado em discussão a qualidade do movimento de
A5 <salto displicente>, S1 comenta na hora eu até ia mandar ele voltar, mas
pensei: o que eu combinei, bloquear o ataque ou bloquear corretamente? Foi
bloquear o adversário então eu não poderia mandá-lo refazer”.
Numa das aulas, em que realizou apenas atividades de toque, S1 se
deparou com a desmotivação do grupo e acenou com jogo, após o término dos
exercícios de toque; o aceno, que provocou a retomada das atividades pelos
alunos, deixou de ter função reforçadora quando S1 esclareceu que o “jogo seria
de toque”. Quando questionada sobre o que alterar para efetivar este reforço e
continuar objetivando o toque no jogo, S1 levanta a possibilidade de usar um
tempo ou um número estipulado de toque e em seguida liberar a cortada. S1
analisa: “Nessa aula eu errei por deixar muito tempo só toque. Devia ter estipulado
114
um tempo ou um número de toques para liberar cortada. Podia ter liberado ataque
só para recreação deles. Por que ficou chato. Depois eu fiquei pensando e poderia
ter liberado não é?”.
115
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1 executa o
movimento correto.
P diz: “Ai A1, boa bola”.
P diz: “Agora pega a
bola de vôlei”.
G corre para o carrinho
e pegam as bolas.
No exemplo acima, S1 propõe como exercício de refinamento de habilidade
o toque com bolinhas de tênis. A realização do exercício é de alta complexidade
para os alunos e S1 coloca a realização de atividade como condição para o jogo
coletivo (reforçador). No entanto, podemos perceber que, em dado momento,
apesar de os alunos estarem envolvidos na tarefa, S1 ameaça com a retirada do
jogo coletivo, por o apresentarem o movimento na performance esperada.
Portanto, a ameaça ocorre diante do comportamento ineficiente.
Em outro momento da aula, S1 atrela ao exercício de refinamento de
habilidade com bolinha de tênis a possibilidade de ataque livre na rede, que para o
aluno é reforçador.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P pega as bolinhas de
tênis e distribui para os
alunos e diz: “Vai
segurar a bolinha de
tênis, atacar primeiro
com a bola de vôlei
normal, depois cinco
vezes com a bolinha de
tênis lá trás”.
G observa. <demonstra
não ter entendido a
parte das bolinhas>
P repete: “Ataca na
rede com a bola de
vôlei, depois vai até a
parede e, com calma,
faz as passadas, une
os braços e ataca com
a bolinha de tênis. Fez
a parte da bolinha de
tênis certa, já pode
voltar para a rede e
atacar com a bola de
vôlei. Vou ficar olhando
a parte das bolinhas,
acertou vai pra rede”.
G observa. <demonstra
ter entendido>
G executa P observa a realização
da atividade no local
que eles fazem com as
bolinhas de tênis.
116
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 faz as passadas na
bolinha bem devagar.
P diz: “A2 você não
está passeando no
bosque. Corre.”.
A2 acelera o
movimento.
P observa.
A2 executa P observa e diz: “Agora
perfeito. Pode ir atacar
na rede”.
A3 faz o movimento
sem levantar os dois
braços juntos.
P diz: “A outra mão
não tem que subir
também?”.
A3 executa. P observa e diz: “Bom,
pode ir”
A3 corre para rede e
diz: “Giba agora na
rede. Segura Brasil”
<...>
Neste exemplo percebemos que S1 repete a estratégia - vincula o reforço à
execução do movimento com bolinhas de tênis. Ainda, num outro momento desta
aula, S1 continua a utilizar o possível reforçador (a cortada) e adiciona uma outra
estratégia para facilitar a aprendizagem do movimento com bolinha de tênis. S1
utiliza um aluno com modelo para a aprendizagem da sincronia das passadas com
o movimento dos braços.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Reúne”. G reúne.
P diz: “Em vez de bater
na ponta, agora o
ataque das bolas é na
saída”.
G observa. <demonstra
não ter entendido>
P repete. “A mesma
coisa só que agora o
ataque é na saída da
rede. Ataca faz o
movimento da bolinha
cinco vezes, executou
pode ir para a rede e
atacar com a bola de
vôlei”.
G observa.
P diz: “Vai mudar o
movimento da bolinha.
Olha.” P demonstra.
G observa. <demonstra
não ter entendido>
P diz: “Repara, vou
terminar com a bolinha
na mesma mão.
Certo?”.
G observa < demonstra
continuar não
entendendo>
117
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P demonstra o
movimento bem
devagar enfatizando o
movimento de troca da
bolinha pelas mãos.
G observa.
P diz: “Vamos tentar
que eu vou corrigindo”
G executa.
G executa. A4 dirige-se
até a parede e faz o
movimento.
P observa e identifica
que A4 está fazendo
correto e diz: “A4 faz
para todos verem”.
G reúne. A4 sorri e
executa o movimento
com a bolinha.
P diz: “Olha só como a
bola passa de uma
mão para a outra”.
G observa e começa a
executar.
P observa.
A2 executa errado. P explica novamente
para A2
A2 executa errado. P demonstra o
movimento.
A2 observa e executa
errado.
P diz: “A4 vem cá”
A4 se aproxima de P e
A2.
P diz: “Faz o
movimento com ela.
Junto um do lado do
outro”.
A4 e A2 executam o
movimento
coreografado.
P observa.
A4 e A2 executam
novamente.
P observa.
A2 executa sozinha e
consegue.
P diz: “Viu. Parabéns.
Pode ir atacar na
rede”.
A2 corre para a rede. <...>
A1 executa errado. P diz: “O problema
está na passada da
bolinha para a outra
mão”
A1 executa. P observa e chama A4
A1 e A4 executam em
coreografia. A1
executa errado
P observa e diz:
“repara na passada”.
A1 executa novamente
com A4
P observa.
A1 executa melhor o
movimento e diz: “eu
troco o pé toda a vez”
P diz: “o importante é
que você percebeu o
que está fazendo de
errado” A1 agora vai
dar certo.
118
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1 executa junto com
A4, e diz: “viu P é a
perna, é só prestar a
tenção na perna” A1
bate a mão com A4
P observa.
A1 executa sozinha P observa e diz:
“Parabéns, pode ir
atacar”
Podemos perceber, nesta passagem, que a utilização de A4 como modelo
parece ter sido, além de facilitadora da aprendizagem do movimento, muito
valorizada pelo grupo e pelo próprio A4. Na discussão, durante a intervenção, S1
demonstra ter percebido que sua primeira tentativa com a ameaça de retirada de
reforçador não era a mais adequada, substituindo em seguida pela apresentação
de reforço vinculado à apresentação do comportamento adequado. S1 comenta:
Você como é engraçado e automático, na hora eu falei vou tirar o jogo hein!
Daí quando eles estavam fazendo o exercício eu pensei: Nossa! já faz mais de um
mês que a gente conversa que ameaçar não é legal e eu continuo ameaçando.
Vou mudar. mudei no mesmo exercício e deu certo, se viu? Todo mundo fez e
ainda saíram felizes porque atacaram o tempo todo. Nem perceberam que aquele
exercício da bolinha é muito chato”. Nesta passagem podemos perceber que S1
começa a identificar o uso que faz de ameaças e a propor algumas alterações na
sua prática.
Na aula 9, durante a intervenção, S1 relatou que tinha como objetivo
principal a melhora no posicionamento para o passe, mostrando para os alunos a
necessidade do posicionamento correto das pernas para o direcionamento da bola
para o levantador. Afirmou que, quando ela elaborou o exercício, ficou atenta para
colocar um possível reforçador para efetivar o posicionamento das pernas. Se eu
não colocasse o ataque, se a bola chegasse ou não na mão do levantador era
tanto faz, mas quando eu coloquei o ataque era necessário que a bola chegasse
boa para que o levantador tivesse condições para executar um bom levantamento
e um possível ataque. Na verdade o ataque não era importante para mim, mas fez
com que eles prestassem mais atenção no passe e na colocação das pernas.
Quando questionada como ela tinha pensado neste exercício S1, pela primeira
119
vez, faz referência à importância do planejar a aula antecipadamente à aplicação
da mesma. Quando vopensa direitinho no que quer e como fazer para deixar
legal, dá trabalho antes, mas depois fica mais fácil para aplicar e ver funcionar”.
Na aula 10, observamos que S1 novamente conseqüência a realização da
atividade acadêmica com um reforçador (ataque).
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Divide em trios
A gente fez toque.
Agora fica um do outro
lado e vai lançar a bola
alta. Quem fica aqui vai
parar a bola, olha o
posicionamento da
mão, olha o
posicionamento da
perna e joga (toca)
para a outra que está
perto da rede. Esta
devolve a bola para
quem está do outro
lado lançando. Uma
vez de toque outra de
manchete”
G observa. A2 diz:
“Posso falar? Eu vou
lançar de onde?”
G observa. A2 diz:
“Posso falar? Eu vou
lançar de onde?”
P mostra posição de
lançamento.
A2 diz: “Ah tá”. Três
alunas vão sentar na
arquibancada.
P diz: “Vocês não vão
fazer?”
As duas (A1 e A4)
ficam olhando uma
para outra. A3 desvia o
olhar
P diz: “Vem aqui”
A1 diz: “É muito chato,
e eu já sou muito boa
em toque”
P diz: “Vem cá.” P
posiciona as meninas
na quadra.
A1 e A4 vão para a
quadra. A3 olha para
P.
P explica novamente.
P explica novamente e
diz: “Quem acertar
duas vezes a bola na
mão do companheiro
levanta a bola com a
mão e o que acertou
pode atacar duas
bolas”.
G sorri e diz “Ehhhhh”
em coro. G corre para
a quadra e inicia. A3
corre para a quadra.
120
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G sorri e diz “Ehhhhh”
em coro. G corre para
a quadra e inicia. A3
corre para a quadra.
P observa.
A1, A3 e A4 executam.
A4 acerta duas bolas
em A3 e A1 levanta a
bola para ela atacar.
A4 ataca.
P observa e elogia.
G excuta. P observa.
Mais uma vez, neste exemplo, identifica-se o uso de reforço
consequenciando o movimento acadêmico (toque e manchete) dos alunos. É
possível verificar que, quando S1 explicita para os alunos a relação entre a
realização da proposta e a possibilidade de ataque (liberação do reforçador), além
de todo o grupo comemorar, uma aluna que havia abandonado o grupo, afirmando
que o exercício era chato, volta para a realização da atividade.
No encontro de intervenção, S1 salientou a volta das alunas sem a
necessidade do uso de ameaças. Se viu como elas voltaram rapidinho na hora
que eu falei do ataque depois do movimento?. ficando craque; toda vez agora
que vejo uma dificuldade fico tentando bolar reforços. Vou me chamar de
<professora> do reforço”
d) outras mudanças observadas
Para finalizar, dois outros fatores podem ser considerados indicativos de
que S1 foi alterando seu comportamento, de modo a propiciar um ambiente de
ensino reforçador: - os momentos selecionados pela pesquisadora para, durante a
intervenção, ilustrar a adequação da atuação de S1, e o número de alunos
freqüentando as aulas.
Como salientado, cada sessão de intervenção iniciava-se apresentando
momento da aula que ilustrava práticas educativas adequadas, nas quais a
interação professor-aluno se dava em função do objeto de ensino estabelecido por
S1.
Como detectado na pré-intervenção, durante a intervenção S1 mantinha-se
sob controle dos comportamentos dos alunos quando estes estavam engajados
121
nas atividades acadêmicas; neste caso, constantemente instruiu, observou,
orientou, corrigiu e demonstrou, ora apresentando-se como modelo, ora utilizando
um aluno como tal, como pode ser observado, no trecho selecionado, em que G1
está trabalhando o refinamento da habilidade toque e manchete.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P retorna. G continua a executar o
exercício.
G continua a executar o
exercício.
P desloca-se pela
quadra, observa uma
dupla e diz para A6:
“sobe a bola A6”
A6 executa. P diz: “Flexionar a perna
não tem né? Tem que
flexionar a perna”.
A6 que retornou ao local
de início observa P e
sorri. A5 inicia o
exercício.
P diz: “Flexiona a perna
se não a bola nunca vai
chegar”.
A5 executa a flexão dos
joelhos e diz: “é ruim!”.
P desloca-se em
direção a outra dupla e
diz para o G: “Agora
manchete”.
G executa o mesmo
exercício só que agora
com a habilidade
manchete. A3 apresenta
dificuldade de realizar o
movimento de manchete
e a habilidade sai
errada. A3 diz: “É assim
P?”
P diz: “Muito bem A3.
Vamos galera! Parece
robô”.
G executa. P vai em direção de A4
e demonstra.
A4 executa e erra. P diz: “Você deixa a
bola te dominar”.
A4 observa. P toca em A4
demonstrando o
movimento do braço.
A4 diz: “Minha perna é
torta”.
P diz: “Abre paralela e
dá um passo para frente
(posição antero-
posterior) e agora
flexiona os joelhos”.
A4 faz o movimento e
erra.
P pega no braço de A4,
arruma a manchete e
diz: “agora vai”.
A4 executa a primeira
vez certa e depois
errada.
P diz: “vai tentando”. P
desloca-se observando
outra dupla e diz: “A6 tá
de lado”.
A4 continua executando.
A6 executa a manchete.
P diz: “Você domina,
não ela”.
122
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A6 executa e diz: “Ta
bom P?”.
P diz: “essa eu não vi”.
A6 executa de novo e
diz: “Agora errei”.
P diz: “Por que tá de
lado. Não existe
manchete de lado”.
A6 observa P e executa. <...>
Verifica-se que, em todos os momentos, S1 está interagindo com os alunos.
S1 elogia “muito bem A3, corrige “abre paralela e um passo para frente, dá
dicas “flexiona a perna senão a bola nunca vai chegar”, utiliza demonstração pelo
aluno “P vai em direção a A4 e demonstra”. Neste exemplo, a constante
interferência de S1 e a conseqüente realização do exercício pelo aluno indica um
momento produtivo do processo ensino-aprendizagem. Tal comportamento é
esperado do professor no processo ensino-aprendizagem, daí que momentos
como estes foram apresentados a S1, visando reforçar sua atuação.
Aspecto interessante, e que é um indicador de que S1 foi alterando sua
forma de atuar na direção esperada, é que durante o processo de intervenção,
puderam ser selecionados, para ilustrar a adequação de sua atuação, momentos
em que S1 atuou de forma reforçadora.
Um outro dado que poderia indicar que houve alteração, para melhor, no
desempenho de S1, é o número de alunos freqüentando as aulas. Pudemos
comprovar que, com o passar das aulas, a freqüência vai aumentando
efetivamente. No G1, o número de alunos nas primeiras aulas é de 6 a 8; a partir
da aula em diante, o número de alunos passa a variar entre 10 e 15. No G2,
apesar de apenas duas observações, o número de alunos passa de 8 para 15
alunos. Verificando-se estes números podemos inferir que a mudança nas ações
de S1 podem ter atraído novos alunos para sua aula, além de manter os que
estavam inscritos.
O conjunto de dados relativos ao processo de intervenção são indicativos
de que este foi eficiente no sentido de produzir mudanças na atuação de S1 na
direção esperada: levar S1 a desenvolver suas atividades pedagógicas em um
ambiente educativo mais reforçador.
123
Pós - intervenção
De forma similar à pré-Intervenção, foram observadas três aulas de S1,
sem a intervenção da pesquisadora, a fim de que pudéssemos verificar se as
mudanças ocorridas durante a intervenção se mantinham, passando a fazer parte
do processo de ensino-aprendizagem de S1. Como salientado anteriormente, a
pós-intervenção, aconteceu no mês de agosto, portanto após um período de 23
dias, por problemas na instituição. As três aulas foram observadas na mesma
semana e para a mesma turma, G1. Nestas três aulas observadas foram
detectados alguns aspetos que serão apresentados a seguir.
Nas aulas s-intervenção, continuamos a detectar que S1 permanece sob
controle dos comportamentos acadêmicos dos alunos: S1 elogia constantemente,
dicas, demonstra, ajuda a posicionar o corpo do aluno e mantém-se sempre
observando os alunos. Embora tal atuação não seja derivada do processo de
intervenção, vale ressaltar que S1 mantém tal desempenho.
A divisão das turmas G1 e G2 permaneceu, indicando que a intervenção
surtiu o efeito desejado. Os alunos do G2, nas aulas observadas, chegaram perto
do horário de início da sua aula, e desta maneira não interferiram na aula do G1;
conseqüentemente, não ocorreram comportamentos inadequados dos alunos.
Em relação aos objetivos para essas aulas: refinamento do toque e
manchete (aula 1), saque com direcionamento (aula 2), e ataque e bloqueio (aula
3), pudemos detectar que habilidades, e não apenas aspectos técnicos e táticos,
passam a ser objetivos da aula, com uma seqüência nas habilidades trabalhadas.
Com G1, grupo com mais habilidade técnica, S1 retoma o trabalho nas habilidades
específicas, centrando no seu refinamento, e não tanto em aspectos técnicos
como observado na pré-intervenção e na intervenção. Este ponto é importante,
pois, nas aulas de pós-intervenção houve uma diminuição dos comportamentos
ineficientes apresentados pelos alunos e, quando ocorreram, não foi utilizada
coerção.
Em relação à falta de um início formal no horário, encontramos algumas
alterações. Nas três aulas observadas, S1 inicia a aula com um aquecimento
formal, isto é, ela não começa a aula diretamente com exercícios de voleibol, mas
124
com exercícios de preparação física (circuitos com salto, corridas, agilidade,
velocidade). Pudemos até observar os alunos comentando que a aula estava
começando, pois eles tinham feito a corrida. Desta maneira, podemos concluir
que há algum indício, para os alunos, de início formal das atividades.
Percebemos uma tentativa de reforçar os que chegaram no horário: S1
estabeleceu a regra de que as atividades de voleibol só seriam iniciadas pelos que
tivessem feito o aquecimento; assim, quem chegasse atrasado deveria começar
pelo aquecimento antes de se integrar aos exercícios de voleibol. Como o
aquecimento não poderia ser igual ao dos que chegaram no horário, os atrasados
deveriam correr em volta da quadra por 5 minutos, o que foi observado em uma
das aulas.
Apesar de o início das aulas passar a ser melhor estabelecido, quando
examinamos o horário em que a aula iniciou, não encontramos alterações no
desempenho de S1; em nenhuma das aulas observadas, S1 começou no horário
previsto, sendo que os atrasos variaram entre 15 minutos e 45 minutos (na aula
três). Certamente este comportamento de S1 interfere no atraso dos alunos,
devendo ainda ser alvo de intervenção, já que esta não foi eficiente.
Uma das alterações mais evidentes foi observada na quantidade de
informações contida nas instruções. Nas aulas analisadas, nenhuma das
instruções fornecidas apresentava mais de quatro informações. Tanto que não
notamos nenhum uso de coerção para comportamentos ineficientes. Foram
detectados erros de execução e correção da S1, mas não foi detectado o uso de
ameaças para comportamentos ineficientes. Os trechos, a seguir, servem como
ilustração.
1 - P diz: Em dupla, coloca a mão em posição de toque e faz um toque
longo, um curto e passa para o companheiro que repete.
2 - P diz: Toca cinco vezes seguida e passa para o outro que está no outro
lado da rede.
3 - P diz: Saca para o passador que recebe e envia para o levantador.
Levantador segura a bola e devolve para o sacador por baixo da rede. Se estiver
fácil saca por cima.
125
4 - P diz: O atacante vai atacar aqui (indica local da rede), dois bloqueiam,
quando acertar o bloqueio quem bloqueou vai cortar quem atacou vai para o
bloqueio.
Nos trechos selecionados, podemos perceber que, além da diminuição no
número de informações nas instruções, S1 trabalha mais no refinamento das
habilidades básicas (toque, manchete, saque, ataque e bloqueio), o que facilita a
performance dos alunos, como abordado anteriormente.
Uma outra alteração que parece ter sido incorporada às práticas educativas
de S1 diz respeito ao uso de reforço como conseqüência do comportamento
acadêmico do aluno.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Saca por baixo,
passa para o
levantador, se a bola
chegar boa na mão do
levantador já corre
para atacar.”
G começa a executar.
A1 saca e A3 erra o
passe.
P diz: Presta atenção
do posicionamento das
pernas.
A1 olha para P e saca.
A3 passa correto e
corre para atacar e diz:
“Se viu, se viu, P. foi
show.”.
P diz: “Boa bola, tudo é
uma questão de
passe”.
A1 saca novamente e
A3 passa correto e
corre par atacar.
P observa.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P organiza cones na
quadra <são três linhas
de cones na quadra
(perto da rede, no meio
da quadra e perto da
linha de fundo)> e diz:
“Vai sacar. Se acertar
na primeira linha de
cone ganha duas
cortadas, se acertar na
do meio uma cortada e
se acertar na linha do
fundo, cinco cortadas.
Vai sacar por três
minutos e vão atacar.”
G comemora e corre
para fundo da quadra.
126
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G1 saca e vão
contanto os pontos.
P observa e recoloca
os cones.
G1 saca. P observa e apita ao
término de três
minutos.
G1 corre par atacar na
rede.
P diz: “repete”.
Podemos perceber por esses exemplos que S1, conseqüencia o
comportamento acadêmico dos alunos com reforço (ataque). No primeiro trecho,
quem realiza o passe corretamente ataca em seguida. No segundo exemplo, o
aluno acumula cortadas, dependendo dos cones acertados pelo saque. Este
exemplo é importante porque mostra que o reforço é associado, também, ao nível
de performance apresentado. Nos dois exemplos, a aceitação do grupo é imediata
e, o que é fundamental, os exercícios têm um grande número de acerto (todos os
alunos realizaram cortadas e vários o fizeram por mais que 15 vezes).
Em relação ao uso de ações coercitivas para comportamentos
inadequados, podemos perceber uma diminuição, mas ainda constatamos o uso
de tal prática. O trecho, a seguir, serve como ilustração.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “saca no
passador e quem es
passando pega a bola
com a mão e rola por
baixo da rede
devolvendo para quem
sacou. Saca dez vezes
e troca.”
G1 se divide e se
posiciona no fundo da
quadra.
A1 saca, A2 saca. P observa e corrige A1.
A1 saca e A4 e A5, que
estão devolvendo as
bola, devolvem
chutando.
P observa e diz: A4, A5
é rolando não
chutando”.
A1 saca, A4 chuta a
bola.
P. diz: “A4 dá pra você
rolar a bolinha”
A1 saca, A4 chuta a
bola.
P diz: “A próxima vez
que chutar a bola pode
ir embora”.
A1 saca, A4 rola a
bola.
P. observa.
127
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “muda, ao invés
de rolar a bola, já pega
a bola e devolve em
forma de saque
também
G1 saca.
G1 saca. P observa.
Nas três aulas observadas, este foi o único momento em que observamos o
uso de ameaça para o comportamento inadequado de um aluno, o que indica que
sua diminuição. Notamos também que S1 tem consciência quando usa coerção;
na ocorrência acima, assim que falou para A4 que este iria embora, S1 olhou para
a pesquisadora, sorriu e, em seguida, alterou o exercício, numa tentativa clara de
impedir a possibilidade de chute e, conseqüentemente, a possibilidade de ter que
cumprir a ameaça para o comportamento inadequado de chutar a bola. Tal
proposta foi acertada, pois a partir daquela mudança nem A4 nem outro aluno
qualquer chutou a bola. Após a mudança proposta, S1 voltou a olhar para a
pesquisadora, sorriu, piscou e colocou a mão na cabeça, como se indicasse que
“pensando” podemos alterar a prática.
128
Concepções e Práticas Educativas de S2
S2 tem 36 anos, é separado, reside em bairro próximo da escola, e seu
tempo de deslocamento para a instituição é pequeno. Fez ensino regular em
escola pública e não ingressou em nenhum curso de graduação.
Aprendeu capoeira quando criança em um bairro da periferia de Santo
André. Participou do grupo do mestre Bimba até o final da sua adolescência
quando foi batizado mestre em capoeira. Após formar-se mestre, viajou por dois
anos para Londres com um grupo de dançarinos brasileiros para difundir na
Europa a capoeira e o samba de roda. Retornando ao Brasil formou seu próprio
grupo, que é uma referência de campeão (S2 foi campeão por dez anos
consecutivos na roda da República
26
) e na formação de bons capoeiristas. No
meio da capoeira, S2 é conhecido internacionalmente como um capoeirista de
estilo duro e até mesmo violento. S2 justifica esta fama por ter sido um capoeirista
que, quando entrava na roda, fazia o seu melhor. “Não sou e nunca fui violento,
mas naquela época quando pegava o ônibus para a República, a adrenalina ia
subindo. Quando chegava lá, estava tremendo de vontade de jogar, e jogava
bem e sério. Por isso me achavam duro e violento. Eu chamo isso de respeito.
Após essa época de competição, S2 afastou-se de torneios e passou a priorizar a
formação de capoeiristas e a difusão da capoeira em âmbito nacional e
internacional.
Atualmente, S2 não participa mais de rodas competitivas e difunde a
capoeira em eventos, aulas aberta de técnica e batizados
27
.
No ano de 2005, S2 participou de pelo menos 30 batizados, no Brasil,
convidado por outros grupos, e viajou três vezes para o exterior. Em uma das
viagens ficou na Europa durante um mês proferindo palestras, aulas abertas e
participando de batizados, e, em outra, ficou no Japão por duas semanas,
participando de um batizado e de aulas em uma universidade japonesa. No ano de
26
A Roda da República era um evento que acontecia todos os domingos na praça da República. Nesta roda, era livre a
participação de qualquer grupo de capoeira, desta maneira, vários mestres se enfrentavam para consolidar seus nomes e o
nome de seus grupos no meio da Capoeira. O evento foi proibido em 1994 por ter se tornado muito violento.
27
Na linguagem da capoeira, Batizado é um evento para a graduação inicial de novos capoeristas (cordão branco) e a troca
de graduação dos capoeristas antigos. Neste evento, o grupo que está organizando o batizado convida outros grupos para
participar do evento.
129
2006, S2 foi, por duas vezes, capa da revista Capoeira, quando foi entrevistado
para falar sobre seu projeto social na presente instituição. Também, S2 teve uma
viajem para Amsterdã antecipada, e, por este motivo, a coleta de dados teve que
ser alterada, sendo realizadas apenas oito sessões de intervenção.
S2 é um profissional respeitado, com projeção em sua área de atuação, o
mesmo ocorrendo na instituição, onde trabalha há 6 anos, sendo considerado uma
referência de sucesso. Sua história de ascensão social pela capoeira, títulos
conquistados, viagens, e sua própria constituição física, são apreciados pelas
crianças e também pelos adultos da instituição. S2 conversa muito com as
crianças sobre a sua história pessoal e sobre a importância de valorizar a raça
negra, a história desse povo, e sobre ser perseverante para conquistar o que se
quer. Eu converso com essas crianças que eu era que nem elas e poderia ter ido
para o lado ruim também, mas me agarrei na capoeira e pude conquistar muitas
coisas, mas não foi fácil não, precisei treinar, treinar e treinar muito.” Esta
admiração por S2 pode ser comprovada quando andamos ao seu lado na
instituição. Por várias vezes as crianças vêm cumprimentá-lo - “Oi mestre” - e as
pessoas gostam de perguntar sobre a última viagem. Quando foi capa de revista,
várias crianças trouxeram a revista ou a fotocópia da reportagem para S2
autografá-la.
Apesar de não ter curso de graduação, S2 sempre atuou como professor no
ensino da capoeira em clubes, academias e escolas. Durante a coleta dos dados,
trabalhava na instituição, com uma carga horária de nove horas semanais,
distribuídos em três dias da semana, e em uma escola de crianças pré-escolares
com o ensino de capoeira para crianças de três a seis anos.
Em relação ao grupo de adolescentes com que trabalha, S2 acredita que a
contribuição da capoeira pode ser percebida não apenas na aquisição de
movimentos específicos. A contribuição da capoeira pode ser vista sob rios
aspectos. Vai desde a parte do ritmo, da musicalidade por parte da aprendizagem
dos instrumentos, até a coordenação motora dos movimentos específicos. Mas
passa também pela aquisição de conhecimento cultural da nossa história, da
nossa cultura e o orgulho desta história, pela aquisição da flexibilidade, equilíbrio,
130
coordenação, força e tantas outras capacidades. Pode-se ver que a capoeira, para
esta população, é muito complexa, muito ampla”.
No seu entender, sua principal função é educar num sentido amplo, levando
o aluno a aprender regras sociais, a ter respeito pelo mestre, e a se distanciar de
bagunças”, e para tanto vale usar ações coercitivas. “Educar de um modo bem
amplo. Vai desde o bom dia, boa tarde, até tudo. Eles aprendem a respeitar o
mestre, ouvir o mestre. (...) Pra mim, fazer o movimento certo ou não é apenas um
detalhe, porque aprender ele vai, uma hora ele aprende. O importante é eu mantê-
lo comigo aqui perto de mim, sob minha vigilância, e longe das bagunças”. S2 não
prioriza a performance, tanto que uma vez por ano faz o batizado do seu grupo e
todas as crianças e adolescentes são agraciados com cordões de iniciantes ou de
graduação superior. Apesar de não fazer referência à performance, sua aula tem
como foco a aprendizagem de movimentos da capoeira.
S2 diz que planeja com a periodicidade semestral, mas apenas por uma
questão de obrigatoriedade da instituição, pois todo o planejamento já está em sua
cabeça. Quando perguntado sobre o que significava planejar/preparar aulas, ele
se reporta ao seu vasto conhecimento na capoeira, evidenciando que não julga
necessário planejar as aulas. “Como eu trabalho há muitos anos com a capoeira, e
com esse público, eu tenho muita experiência, então eu tenho um
planejamento básico. Aí eu vou planejando na hora de acordo com a necessidade,
quantidade de alunos, faixa etária”. S2 concebe o planejamento como
conhecimento da modalidade e não como comportamentos que deveriam ser
aprendidos pelos seus alunos. Ele não deixa claro quais comportamentos gostaria
que seus alunos adquirissem. Esta falta de clareza sobre o que espera que o
aluno aprenda é evidenciada quando, ao ser perguntado sobre como seria uma
aula boa, diz que, por trabalhar com sica e ritmo, é quando tem uma resposta
boa, uma energia”. Ao ser questionado sobre o que seria “uma energia”, limita-se
a dizer que na hora da roda, quando todo mundo está cantando, você passa uma
energia e essa energia volta em forma das palmas, dos cantos, no jogo”.
Quando solicitado sobre o objetivo, o conteúdo, a estratégia e a avaliação
de uma aula considerada boa, S2 aponta como objetivo fazer uma roda e que
131
nessa roda eles conseguissem aplicar um pouco daquilo que eles aprenderam”.
Como conteúdo apresenta os movimentos de projeções, acrobacias, movimentos
específicos da capoeira e trabalhei também em duplas e individualmente e as
partes do jogo para depois montar a roda e ver isso aplicadoe sobre estratégia,
afirma eu sempre uso os alunos mais graduados com os mais novos, eles vão
ajudando os menores e treinando para a roda.”. Com relação à avaliação, volta
a fazer referência à energia, como tudo foi bom, essa energia voltou boa. Como
produto final a roda foi muito boa, eles jogaram bem, estavam alegres, tinha uma
boa energia”.
Com esta ilustração, podemos perceber que a atividade de ensino de
capoeira, tal como descrito por S2, não se apresenta como uma atividade
planejada em função de objetivos a serem atingidos pelos alunos, mas sim como a
aplicação da “roda” de capoeira.
Em suma, S2 tem muito tempo de prática no ensino de capoeira, embora
sem formação acadêmica. Por ter uma história pessoal de ascensão social,
prêmios e conquistas, é admirado como um ídolo pelas crianças e adolescentes
da instituição.
Mesmo trabalhando com uma modalidade esportiva, S2 afirma ter
preocupação com a educação geral das crianças e adolescentes, e não com
performance. Um aspecto que evidencia esta preocupação é a valorização da raça
negra, a partir da difusão da história, música e cultura da capoeira, e o batizado
das crianças, independentemente da performance. No entanto, como se verá
posteriormente, S2 atua, durante as aulas, em função da aquisição, pelos alunos,
dos comportamentos motores específicos desta modalidade esportiva. Por
trabalhar com uma modalidade que une música, ritmo e movimentos, e estar na
área muito tempo, S2 afirma não planejar ou estruturar as aulas
antecipadamente.
132
Pré - Intervenção
Foram observadas três aulas de S2, sem a intervenção da pesquisadora,
para que pudéssemos conhecer melhor a maneira como o professor atuava. Neste
conjunto de aulas foram detectados alguns aspectos, apresentados a seguir.
Como ocorreu com os demais sujeitos, foi perguntado para S2, em todas as
aulas, qual seria o objetivo da aula a ser ministrada. Em todas as aulas o objetivo
apresentado em forma oral era “A aprendizagem das várias formas de gingar,
outros movimentos da capoeira e roda”. S2 argumenta que este objetivo pode ser
o mesmo em todas as aulas, pois “... na capoe”4 74(o)-4.33117(i)1.83117( )-1521 Td[(n)5.67474(18e)-4.3316 12 Tf214.086 0 T72.16436( )20.6436(i)1.87122(v)9.33117( )-52.1939(e)-4.331e”4 és res3
133
jogando com os mais avançados e este desnivelamento de performance pareceu
não influenciar na roda.
Como esperado pela falta de planejamento anterior, verificou-se na aula
de S2 que o uma seqüência entre os golpes nem durante a aula, nem entre
as aulas; ao que parece, S2 vai falando o nome de golpes de forma aleatória e os
alunos vão executando.
Diferentemente do que ocorre com S1, S2 dividiu os alunos em duas turmas
bem definidas. A primeira turma (G1) é composta por crianças e adolescentes da
comunidade e tem aula no horário das 14 às 15h 30 min. A segunda turma (G2) é
composta por crianças e adolescentes preferivelmente vindos do projeto Gente
Jovem e tem aula das 15h 30 min às 17 horas. A divisão seguiu um critério
estabelecido pelo próprio S2. Esta divisão formal não impede que crianças e
jovens da comunidade participem de G2, desde que sistematicamente, e que
alunos participem das duas aulas.
Apesar de a divisão das turmas ser bem definida, ocorreu interferência das
crianças de G2 no final da aula do G1. Apesar da aula do G2 iniciar às 15h 30 min,
a partir das 15h15 min alguns alunos desciam para a quadra, momento em que
G1 estava fazendo a roda. Os alunos que chegavam mais cedo ficavam correndo,
imitando golpes, subindo na grade de proteção e, por vezes, brigando entre si.
Este é contexto que gera comportamentos inadequados dos alunos de G2; S2,
que está tocando berimbau na roda de G1, usa constantemente de olhares e até
de ameaça de não haver aula, como forma de impedir que G2 não atrapalhe G1.
Foi neste contexto que primeiramente observamos o uso de olhares de S2 frente a
comportamentos inadequados dos alunos. Este “olhar” era usado diversas vezes,
até que, ao não surtir efeito, havia a ameaça: “Se não ficarem sentados, não vai
ter aula”
A presença dos alunos do G2 parecia ser um fator de desagrado para os
alunos de G1, que vários deles fazem caretas, bufam e dizem, entre si, frases
de desagrado. Porém, nenhum deles demonstra diretamente tal desagrado,
aguardando S2 resolver o problema.
134
Outro contexto gerador de comportamentos inadequados e,
conseqüentemente, do uso de práticas coercitivas eram as filas, para a execução
dos golpes. Os alunos deviam formar duas filas e, sob a instrução de S2, os
primeiros iam executando, repetidas vezes, o golpe em deslocamento, ao longo da
distância da quadra. Chegando ao lado oposto, esperavam todos os colegas, para
executar novamente, até retornarem ao local de origem, onde dependendo da
instrução, mudavam o golpe repetindo o processo.
Foram observados vários comportamentos inadequados durante este parte
da aula. Havia disputa muito grande para ser o primeiro aluno da fila; quando o
aquecimento chegava ao fim, os alunos corriam para o local em que se fariam as
filas, apesar de S2 preferir que o primeiro fosse um aluno mais graduado, para
servir de modelo. Durante as atividades realizadas em fila, observamos: brigas e
discussões entre os alunos; alunos empurrando outros da fila e todos caindo no
chão; alunos tentando entrar na frente do outro, “furando a fila”; e competição
entre alunos das duas filas, tentando fazer o golpe mais rápido e chegar do outro
lado antes. Apesar de S2 dizer, em vários momentos, “não tem competição pra ver
quem chega na frente, todo mundo vai fazer o mesmo golpe, tem que fazer bonito
e não rápido”, a competição entre as filas e nela própria parecia ser o foco
principal dos alunos.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “duas filas”. G sai correndo para as
filas e empurram para
ficar em primeiro
P diz: "sem agarrar". G divide-se em duas
filas.
P divide as filas. G se olham e se
empurram. A5 diz: “P
ele cuspiu”.
G se olham e se
empurram. A5 diz: “P
ele cuspiu”.
P olha para A9 (aluno
que cuspiu) e diz: "não
se cospe no chão. Aqui
é sua sala de aula. Se
você vai pôr a mão no
chão, pode colocar a
mão no seu cuspe”.
A9 olha para P e põe o
pé no cuspe.
<...>
P diz: "gingando". G executa.
135
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G executa. P observa chamando
os alunos pelo nome.
G executa. P diz: "olha a ginga
com o braço no rosto".
G executa, A3 chuta o
aluno da frente (A3 faz
o movimento mais
rápido).
P olha para A3 (com
expressão de
desaprovação) e diz:
"não é para chutar o
amigo da frente tem
que ter espaço".
A3 diminui a
velocidade dos golpes.
G executa.
P observa e diz o nome
de alguns alunos.
Alunos executam os
golpes e olham para P.
P observa.
A3 pega A7 pela
camiseta e tenta girá-
lo.
P olha para A3 vai até
ele e diz: "sem se
agarrar".
A3 olha para P e solta
o colega.
<...>
P diz: "pode voltar". G executa.
G executa. P diz nomes.
G executa. P observa.
A4 chega no fim da fila
e agarra A6 pela
cintura e fica puxando.
P olha para A4 e diz:
"para de agarrar. -
machuca mesmo".
A4 olha para P. A4
pergunta para P:
"posso te chamar
como?".
P olha para A4 (com
expressão de
desaprovação) e
responde: "como você
quiser”.
Nesse exemplo, retirado da segunda aula, podemos exemplificar algumas
das ocorrências citadas acima: os alunos brigam para ver quem fica em primeiro,
brigam na fila e no percurso executando o movimento. S2 intervém frente aos
comportamentos inadequados, primeiro olhando para os alunos com expressão de
desaprovação e dizendo que não deviam se comportar daquela maneira. O olhar,
parece suficiente para fazer cessar tais comportamentos (alunos param de brigar,
param de chutar), o que permite inferir que o “olhar” de S2 é uma ão punitiva
maior do que a própria fala. O efeito, porém, é temporário, que o
comportamento inadequado pára apenas momentaneamente, voltando a ser
apresentado em seguida. Verificamos que os alunos apresentam comportamentos
inadequados nos momentos em que S2 supostamente não os está observando.
136
Como verificado no questionário inicial, na visão de S2 é de sua
responsabilidade a educação ampla de seus alunos; percebemos esta intenção
em algumas passagens das aulas.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "turma da
capoeira tira a meia".
G corre tirando a meia
e indo para o centro da
quadra.
P diz: "ei, ei onde
vocês vão? Primeiro
tem que cumprimentar
o Mestre.".
Alunos vão até o P e o
cumprimentam com
uma batida de mão
característica.
(...) P diz para um aluno:
“quero falar com você e
com seu irmão”.
A1 chama A2. P diz: "eu vi isso e não
gostei. Você gostaria
que eu puxasse suas
orelhas? Então não
faça isso com os
menores".
A1 e A2 se olham e
dizem que não vão
fazer mais isso.
P diz: "se fizer é melhor nem
descer para a capoeira".
A1 e A2 correm para o
local do aquecimento.
<...>
P toca pandeiro e diz:
"é para correr e
quando parar o
pandeiro é para fazer a
cocorinha".
G faz movimento. A3
joga papel de bala no
chão.
G faz movimento. A3
joga papel de bala no
chão.
P observa.
A3 sai andando. P olha para A3 (com
expressão de
desagrado) e diz: “A3
pode pegar o papel
que você jogou no
chão e joga no lixo,
senão pode voltar para
o CJ.”.
A3 sai do G e vai para
o lixo jogar o papel.
<...>
Podemos perceber, neste exemplo, três situações: 1) todos os alunos
devem cumprimentar o mestre, antes do início das aulas; 2) S2 chama dois alunos
e os ameaça com a retirada da aula, se o comportamento inadequado ocorrer
novamente; 3) S2 olha e ameaça um aluno que jogou um papel no chão; verificou-
137
se que, assim que S2 olhou para A3, ele foi pegar o papel; a frase de S2 sobre
pegar o papel ou voltar para o CJ ocorreu quando a ação de buscar o papel
estava sendo cumprida.
A atenção S2 parece ser muito reforçadora para os alunos. Verificou-se,
durante a realização dos golpes, em filas, que ao executarem os movimentos, ou
logo após sua execução, os alunos olham para S2, como se estivessem
esperando um elogio ou uma correção. O trecho, a seguir, exemplifica o exposto.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P toca pandeiro. G corre. Alguns do
grupo correm pegando
uns aos outros.
G corre. Alguns do
grupo correm pegando
uns aos outros.
P diz: “não é pega-
pega. Sem tocar no
colega”.
G corre
desordenadamente
quando para o
pandeiro fazem
cocorinha.
P observa.
A3 e A5 continuam
brincando de pega-
pega.
P organiza o G: “A5
aqui no canto, A3 lá no
outro. Já falei que não
é para brincar de pega-
pega”.
A5 e A3 vão ao local
indicado. G faz
movimento.
<...>
P troca movimento. G executa.
A5 vai se deslocando
para perto de A3.
P olha para A5.
A5 volta correndo para
o local anteriormente
estipulado por S2.
<...>
P muda exercício: bate
duas palmas à frente
do corpo e duas
palmas laterais.
G executa e A4
pergunta: “Pode bater
atrás?”.
G executa e A4
pergunta: “Pode bater
atrás?”.
<...>
P diz: “agora mais
difícil” (bate três vezes
para frente, três para
trás).
G executa.
P diz: "mão lá na
frente”.
A5 diz: "P é assim?"
P diz "agora cocorinha" G executa.
138
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P estica a perna com
as duas mãos.
G executa. A1 diz:
“Assim oh P?” A2 diz:
“Assim oh P”.
P observa geral. P
pega pandeiro e diz:
"gingando".
G executa.
P diz: “estátua na
posição de ginga para
ver se dá certo”.
G faz estátua.
P toca pandeiro. G faz movimento.
Por fim, pudemos observar, nas três aulas, que S2 mantém-se sob controle
dos comportamentos acadêmicos dos alunos, aspecto que se considera adequado
na sua atuação acadêmica. Quando os movimentos são executados, pelos alunos,
S2 desloca-se pela quadra observando-os ora elogiando, ora corrigindo o
movimento, ora dizendo alto o nome das crianças, como pode ser observado no
exemplo a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "meia-lua de
compasso com as duas
mãos para baixo”.
G executa.
P aumenta o ritmo do
pandeiro e diz: "todo
movimento de capoeira
tem que ter ritmo". "Oh!
A3 que linda”.
G executa.
P toca e canta. G executa. A3
movimenta o braço
errado.
G executa. A3
movimenta o braço
errado.
P diz: "braço tá errado
na ginga A3".
A3 executa. <...>
P toca e desloca-se. G executa.
P diz: "esquiva baixa
com um rolê".
A3 e A2 demonstram o
movimento.
P diz: "pegou
movimento?" P toca o
pandeiro e canta.
G executa.
P diz: "tão cansados
já? Quem tá cansado
aí? Vamos fazer mais
uma vez para
descansar”.
G executa.
G executa. P toca pandeiro e diz o
“A4 tá cansado? Sim
ou não?”.
139
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A4 acaba de executar
o movimento e vai para
o fim da fila sorrindo.
<...>
P diz: "martelinho de
ouro”
G vai executando o
movimento.
G vai executando o
movimento.
P observa e diz:
“vamos A2! chuta mais
alto".
A2 aumenta a altura do
chute.
P diz: “Bonito meu
garotão”
G vai executando o
movimento.
P diz "A3 andou
treinando em casa
hein!!!". "melhorou hein
A1".
A3 e A1 executam e
sorriem.
<...>
<...> P diz: "A5 cuidado para
A2 não acertar o pé em
você”. P olhando para
A2 diz: "você com o
chute tão alto que tem
que tomar cuidado com
o amigo".
A2 olha, põe a mão na
cabeça faz sinal de sim
com a cabeça e sorri.
<...>
P diz: "a sensação é
que a coisa vai passar
do gosto".
G executa.
P diz: "alavanca, força
e flexibilidade meu
irmão!".
G executa.
Em suma, pela análise das aulas de pré-intervenção, pudemos perceber
que S2 é um professor envolvido com a aula e com seus alunos e demonstra
dominar os conteúdos relativos à capoeira, muito embora não apresente objetivos
claros para suas aulas. As turmas são bem delimitadas e, embora os alunos
respeitem a divisão, a presença de alunos da turma de G2 no final da aula de
G1, o que é aversivo tanto para G1 como para S2. A aula de S2 parece obedecer
a uma mesma rotina - alongamento, aquecimento, golpes em fila e roda sendo
que o contexto de atividades em filas é o que mais gera comportamentos
inadequados. Pudemos perceber que, para comportamentos inadequados, S2 faz
o uso abundante de práticas coercitivas. Pudemos perceber ainda que o “olhar” de
S2 e suas verbalizações sobre não participação ou retirada da aula são formas de
140
punir comportamentos inadequados; por outro lado, sua atenção é reforçadora
para os alunos, sendo utilizada frente a comportamentos acadêmicos.
Estes aspectos nos direcionaram para a escolha dos “momentos da aula”
que seriam apresentados a S2 durante a intervenção. Como levantado
anteriormente, após as observações, três “momentos da aula” foram destacados
para as discussões.
Intervenção
Apresentamos, a seguir, um quadro com informações sobre as nove aulas
observadas de S2. O quadro apresenta, além de informações quantitativas como
datas, horários e número de alunos, os objetivos formulados pelo professor, os
critérios escolhidos para conduzir os encontros de formação e uma sucinta
descrição dos episódios selecionados.
Quadro 5: Informações gerais, objetivos e critérios utilizados nos encontros
de formação de S2.
141
S2 Aula 1 Aula 2
Data
28/04/2006 05/05/2006
Horário
14:40 às 16:20 15:12 às 16:00
Num de alunos
25 alunos 25 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Trabalhar o gingar Trabalhar as várias formas do gingar
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
O grupo corre pela quadra e P diz: “não pode bater, esbarrar nem
trombar” G2 Corre pela quadra. P diz: “Sabe o que é difícil? É não
tocar no amigo e desviar do amigo. Isto que é difícil para um bom
capoerista. Vamos ver quem consegue?” G2 corre pela quadra
sem esbarrar nos colegas
cpto aluno: acadêmico
cpto S2: desafio para G2.
G2 está sentado no chão perto de P que está sentado na
arquibancada. P toca berimbau. G2 acompanha batendo
palmas. P diz: “quem consegue bater palmas e cantar.
Acho muito difícil”. G2 canta e bate palmas no ritmo do
berimbau.
cpto aluno: acadêmico.
cpto S2: desafio.
Critério 2:
Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados”
28
ou em relação a
comportamentos
“incorretos”
29
dos alunos
G2 está em fila para realizar um exercício. Crianças ficam se
empurrando para ver quem fica na frente. P ameaça retirar da
aula quem está empurrando.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: ameaça tirar da aula.
G2 corre pela quadra ao som do pandeiro, quando o
pandeiro para G2 deve fazer um movimento da capoeira
(cocorinha). A5 brinca de pega-pega no momento de
deslocamento da quadra. P olha para A5 <com cara de
reprovação> e diz: “A5 não é para brincar de pega-pega, é
para correr em todas as direções”. A5 volta a correr e fica
olhando para P, quando este não está olhando, A5 volta a
brincar de pega-pega”.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: “olhar” + verbal (reprovando).
Critério 3:
Escolha da Pesq.
A7 chacoalha colega. P vai até A7 chacoalha ele e diz: “Viu não é
gostoso né?”. A7 sorri e diz para colega “viu ele me chacoalhou”.
cpto aluno: inadequado
cpto S2: uso de contato corporal.
P diz: “eu quero ver quem consegue fazer ginga para os
dois lados?” A5 faz ginga muito próximo de A4. P diz para
A5: “Não é para fazer ginga em cima dos outros. A5 tem
que respeitar o P, tem que fazer o que eu peço e não o
que você quer.”.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: verbaliza reprovando.
28
Comportamentos Inadequados: comportamentos dos alunos não relacionados às atividades de ensino desenvolvidas. Por exemplo, jogar futebol durante aula da outra turma, bater
nos colegas, xingar e etc...
29
Comportamentos Acadêmicos Ineficientes: comportamentos dos alunos relacionados às atividades de ensino desenvolvidas, mas que não alcançam a performance pretendida por
S2. Por exemplo, num exercício de ginga os alunos erram a movimentação.
142
S2 Aula 3 Aula 4
Data
08/05/2006 10/05/2006
Horário
15:03 às 15:46 15:48 às 16:30
Num de alunos
10 alunos 15 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Trabalhar o movimento da ginga Trabalhar o movimento da ginga
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P diz: “Presta bastante atenção que este é muito difícil. De
cocorinha, estica uma perna e a outra dobra, essa perna que
esticou não pode mais dobrar.”. G1 observa <indica que não
entendeu> P pede para aluno mais graduado demonstrar. G1
executa. P observa, e vai dizendo o nome dos alunos. G1
executa e sorri.
cpto aluno: acadêmico
cpto S2: identifica aluno pelo nome.
P canta com o G2. A1 se afasta da cantoria e vai sentar
perto do alambrado. A2 pergunta para P se ele quer que
ele vá buscá-lo. P diz: “Não, deixa que ele vem” P
continua cantando. P coloca o nome de cada criança no
refrão. G2 canta junto. P coloca o nome de A1 e A1
levanta e volta correndo para o grupo.
cpto aluno: inadequado de A1.
cpto S2: ignora comportamento inadequado.
Critério 2:
Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados”
ou em relação a
comportamentos
“incorretos” dos
alunos.
P está fazendo roda com G1. Crianças de G2 começam a chegar,
tiram os sapatos e começam a fazer os movimentos de capoeira
perto da grade. P diz: “G2 qual o nosso combinado?”. G2
responde em coro “Se não ficar sentado não faz capoeira.”, P
olha para G2, G2 corre de volta para perto da grade.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: relembra um “combinado” (ameaça de não ocorrer a
atividade).
A5 e A4 correm pela quadra atrás de uma bolinha de tênis
<bolinha que pertence a aula de vôlei> P pega a bolinha e
pergunta de quem é a bolinha? A5 diz: “É minha. Minha
mãe me deu” P diz: “A5 mentir é feio. O bom capoerista
não mente, está bolinha é do vôlei, não é?” A5 responde
“É igual, mas esta minha mãe me deu” P diz: “Vou
perguntar para a professora de vôlei, se você estiver
mentindo não vai fazer aula”. A5 diz: “Pode ser que esteja
enganado, pode devolver.”. P diz: “Ah, bom”
cpto aluno: inadequado de A5.
cpto S2: ameaça não fazer a aula.
Critério 3:
Escolha da Pesq.
P faz roda com G1, crianças de G2 correm pela quadra, fazem
movimentos de capoeira, escalam o alambrado. P chama pelo
nome e pede para sentar. G2 senta e em seguida voltam a correr
e escalar o alambrado. P encerra a roda de G1.
cpto aluno: adequado de G1.
cpto S2: encerramento da atividade (punição).
P diz: “Hoje a corrida é de... <P faz suspense>. G2 para e
olha para P. P diz: “de... pega-pega” G2 pula
(expressando contentamento). P diz: quando for pego faz
cocorinha e fica de estátua. Para ser salvo é só fazer meia
lua de frente. Não tem pegador fixo.” G2 corre pela
quadra.
cpto aluno: acadêmico.
cpto S2: propõem atividade de ensino efetivo.
143
S2 Aula 5 Aula 6
Data
12/05/2006 17/05/2006
Horário
14:30 às 15:05 15:27 às 16:15
Num de alunos
20 alunos 20 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Fazer com que eles conheçam a ginga Trabalhar a ginga. Trabalhar todos os movimentos da
capoeira e priorizar a ginga.
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P diz: “Agora vamos fazer o máximo do capoerista. Bater palmas,
cantar acompanhando o berimbau.” G1 bate palma fora do ritmo.
P diz: “Presta atenção” <P. cadencia mais o berimbau> G1 canta
e bate palmas correta. P diz: “Ai meu Deus que lindo” G1 sorri.
cpto aluno: acadêmico
cpto S2: diminui complexidade da atividade e elogia.
G2 está em fila fazendo movimentos. P desloca-se pela
quadra e para cada criança que passa pela sua frente, P
fala o nome e alguma coisa certa no movimento”
cpto aluno: acadêmico.
cpto S2: elogia nominalmente.
Critério 2:
Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados”
ou em relação a
comportamentos
“incorretos” dos
alunos.
P toca berimbau e quando para G1 faz cocorinha. P diz: “Tô
vendo menininho com bumbum no chão, cocorinha é sem
bumbum no chão”. G1 de cocorinha ri e volta a correr ao som do
berimbau. Quando P pára de tocar, várias crianças colocam
bumbum no chão <aparentemente de propósito>
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: reforça o inadequado
A4 faz aquecimento. P desloca-se pela quadra
observando. A4 segura a camiseta da criança da frente. P
olha para A4. A4 volta para a atividade. P muda a
atividade. A4 volta a agarrar a camiseta. P volta a olhar
para A4. A4 volta para a atividade. P muda a atividade. A4
bate na criança da frente P vai até A4 e diz: “Na próxima
pode por o sapato e voltar para o CJ” A4 volta para o
aquecimento.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: “olhar” + verbal (ameaça retirar da atividade).
Critério 3:
Escolha da Pesq.
P toca pandeiro pela quadra. A1 diz: “E o samba P?” P toca no
ritmo do samba G1 samba. A2 fica parado. P diz: “Vem cá A2
samba com o mestre, é assim” <P demonstra o passo de samba>
A2 samba com P. sorrindo.
cpto aluno: acadêmico
cpto S2: propõem atividade de ensino efetivo.
G2 está na roda. P encerra a roda e diz: ”Tá bom mas tá
ruim. Pode melhorar.” G2 vai embora comentando: “Nunca
ta bom pra ele”
cpto aluno: acadêmico.
cpto S2: elogia e critica.
144
S2 Aula 7 Aula 8
Data
19/05/2006 22/05/2006
Horário
15:30 às 16:10 15:45 às 16:30
Num de alunos
20 alunos 20 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Trabalhar a ginga. Trabalhar todos os movimentos da capoeira e
priorizar a ginga.
Trabalhar a ginga. Trabalhar todos os movimentos da
capoeira e priorizar a ginga.
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P diz: “Agora passar a série na fila.” G2
corre
para ver quem fica
em primeiro. P diz: “Só que a fila é diferente. Todos de frente para
mim, quando eu falar o movimento todos vem devagar, fazendo o
golpe. Vou ficar aqui na frente e falar o nome das crianças que
tiverem fazendo o golpe bem bonito e não quem chegar primeiro”.
G2 faz movimentos. P vai dizendo os nomes.
cpto aluno: acadêmico
cpto S2: reforça o movimento bem executado.
G2 está em roda. P
encerra
e diz: “Hoje foi bonito que só
vendo. Tá bom mas... Tá muito bom” G2 sorri.
cpto aluno: adequado.
cpto S2: elogia.
Critério 2:
Práticas em
relação a
comportamentos
“inadequados”
ou em relação a
comportamentos
“incorretos” dos
alunos
G1 está fazendo roda com P e G2 chega na quadra. G2 começa
a correr pela quadra. P diz: “tem que ficar sentado, se não, não
vou dar roda para vocês”, G2 corre e senta. G2 volta a correr P
diz: “Se correr de novo não vai ter aula” G2 corre e senta. G2
volta a correr. P diz: “Assim vocês não vão ser bons capoeristas”
G2 corre e senta. G2 volta a correr. P diz: “Assim não vou fazer o
batizado com vocês” G2 corre e senta.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: ameaça não ter atividade (constante).
P desloca-se pela quadra observando. A2 cospe em A1.
A1 vai até P e mostra. P vai até A2 e diz: “A2 assim pode
subir, capoerista que cospe é malandro e eu não gosto de
malandro” A2 olha para P e retorna para a atividade.
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: ameaça retirar da aula.
Critério 3:
Escolha da Pesq.
No fim da aula P chama G2 e diz: “Não vou fazer roda porque
vocês não se comportaram no começo.” G2 diz em coro “por
favor vai P a gente não vai mais fazer” P diz: “Vocês prometem
que não vão fazer de novo?”. G2 diz em coro: “Sim”. P inicia a
roda.
cpto aluno: inadequado
cpto S2: ameaça não fazer atividade (roda), mas não cumpre.
G2 chega e começa a correr pela quadra. P diz: “Vocês
me prometeram não correr antes da aula, para ter roda”
G2 corre e senta, mas em seguida já está correndo de
novo. No fim da aula P diz: “Hoje não vamos fazer roda,
por que vocês ficaram correndo no começo da aula” G2
diz: “a gente não vai fazer mais” P diz: “Então na aula que
vem vocês mostram e aí eu dou roda”
cpto aluno: inadequado.
cpto S2: não realiza a atividade (punição)
145
Na intervenção, tínhamos como foco, identificar e alterar o uso de práticas
coercitivas, levando o professor a substituí-las por práticas não coercitivas. A
ocorrência de tais práticas frente a comportamentos inadequados parecia ter
relação com dois fatores a organização das aulas e a rotina das atividades na
aula.
a) Aspectos relativos à organização das aulas – Foi detectado na pré-
intervenção que, apesar de os grupos serem bem divididos, a transição entre a
aula do G1 e do G2 era um momento que gerava o aparecimento de
comportamentos inadequados, principalmente do G2.
Como dito anteriormente, as crianças do G2 chegavam um pouco mais
cedo e ficavam correndo pela quadra, subindo no alambrado, fazendo golpes ou
brigando entre si. Percebemos que tais comportamentos incomodam muito S2,
que emprega várias ões coercitivas, além de deixar de atentar para G1,
chegando até mesmo a interromper as atividades que estavam sendo
desenvolvidas, conforme exemplificado nos trechos, a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Olha para o
colega da frente e não
para mim. No jogo tem
que ficar atento se não
pimba, toma uma na
cabeça”.
G1 bate palmas. A6 que
está jogando olha para
frente. Nesse momento
alunos de G2 vão
entrando na aula e
correndo pela quadra.
G1 bate palmas. A6
que está jogando
olha para frente.
Nesse momento
alunos de G2 vão
entrando na aula e
correndo pela
quadra.
P diz para G2: “Qual é o
nosso combinado?”
G2 responde: “Se
não ficar sentado
não faz capoeira”
P chega perto do grupo
e diz: “Na hora da
capoeira a gente faz os
movimentos de
capoeira”
G2 olha para P. P diz: “Agora não é para
agarrar”. P vai
chamando aluno por
aluno e pedindo para
que fique sentado.
146
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G olha para P. P volta para G1 e diz:
“continua que ta bonito”.
P volta para G1 e diz:
“continua que ta bonito”.
G1 joga e G2 senta.
P diz: “tá jóia, vai
jogando”.
G executa. Crianças do
G2 sobem na grade e
correm pela quadra.
Crianças do G2
sobem na grade e
correm pela quadra.
P diz: “Olha só, se ficar
pendurado vai cair o
teto da quadra. A gente
vai ficar sem teto e vai
se molhar todo quando
chover”.
G2 observa p e olha
para o teto da
quadra.
P diz: “Já vai começar e
hoje vai ter muitas
brincadeiras”.
G2 diz em coro
“Oba, oba”.
P volta para G1
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P volta para G1 e pede
outro movimento.
G1 joga. G2 volta a
correr e subir na grade.
G1 joga. G2 volta a
correr e subir na
grade.
P observa e pega
berimbau. P diz para G2:
“O que nós
combinamos?” P chama
as crianças pelo nome.
G2 corre para
sentar.
P observa.
P toca berimbau e diz
para alunas que
começaram hoje: “Hoje
vocês não vão jogar,
vão apenas olhar”.
G1 joga na roda. G2
volta a correr, subir na
grade e fazer
movimentos de
capoeira.
G1 joga na roda. G2
volta a correr, subir
na grade e fazer
movimentos de
capoeira.
P olha para
Pesquisadora e diz:
“Tenho inveja da P(S1)
que desliga. Eu não
consigo, isso vai me
matando”.
G1 joga, G2 corre
pela quadra e sobe
na grade.
P encerra a aula de G1.
G1 olha para P e
cumprimenta P.
<fazem cara de
desagrado por terem
acabado a aula
antes por causa de
G2>
147
Durante a intervenção, colocou-se em foco o fato de que o grupo punido
com o término precoce da roda foi G1, exatamente o grupo que estava
apresentando comportamento acadêmico, isto é, o comportamento adequado à
atividade, sendo que a ação de S2, começando mais cedo a aula de G2, acabou
reforçando o comportamento inadequado de interferir na aula de G1. A
aversividade da interferência de G2 fica clara no depoimento de S2: É difícil não é
Bel, na hora estava tão irritado, perdi o controle. Queria começar logo a aula
deles, para poder acabar com aquela bagunça toda, acabei trocando tudo”.
Durante a intervenção, verificou-se que S2 age de diferentes formas frente
aos comportamentos inadequados: utiliza olhar de reprovação, diz para pararem a
atividade, verbalizando seu descontentamento, ameaça não realizar uma atividade
em especial (a roda), ameaça retirar o aluno da aula, chegando mesmo à ameaça
de retirada do batizado.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "vamos formar
uma roda".
G1 se desloca
formando uma roda.
Alguns alunos G2
voltam a fazer
movimentos de
capoeira.
P observa G2 e diz:
"pessoal sentado".
P observa G2 e diz:
"pessoal sentado!”
G1 bate palma e joga.
Alunos de G2 sentam,
mas alguns continuam
jogando sozinhos.
P toca berimbau. G1 joga.
P toca berimbau. P diz
para G1 que es
jogando: "quando a
gente está na roda, tem
que prestar atenção na
roda, senão pode
acertar no rosto do
companheiro".
G joga. G2 volta a
correr pela quadra.
G1 joga. G2 volta a
correr pela quadra.
P olha para G2 e diz:
“tem que ficar sentado,
se não, não vou dar
roda para vocês".
Os alunos de G2
correm e sentam, G1
inicia a roda
novamente.
<...>
P toca berimbau e diz:
“vamos A1 vamos”.
Dois alunos jogam,
outros batem palma.
148
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
Dois alunos de G2
levantam e ficam
fazendo movimentos.
P olha para eles e diz:
"se fizer de novo não
vai ter aula".
Os alunos de G2
voltam e sentam.
P volta para G1
P toca berimbau e diz:
"olha a palma de mão”.
G1 bate palma. G2
continua fazendo
alguns movimentos
perto da grade.
G2 continua fazendo
alguns movimentos
perto da grade.
P diz “assim vocês não
vão ser bons
capoeiristas”
G2 corre e senta no
lugar.
P volta para G1.
P volta para G1. G1 joga e alguns
alunos de G2 brigam.
G1 joga e alguns
alunos de G2 brigam.
P sai da roda, aumenta
a voz e diz: “assim não
vou fazer batizado com
vocês”
G2 corre e senta na
quadra.
P volta para G1
P volta para G1 G1 joga e G2 fica
sentado.
P observa e depois de
cerca de 10 minutos
encerra a roda
G1 vai tomar lanche e
G2 cumprimenta P.
Podemos observar, neste exemplo, que o professor utilizou várias
ameaças, que só surtiram o efeito com o aumento do tom de voz e com o aumento
do grau da ameaça feita: a retirada deles do batizado
30
, evidenciando que é
momentânea a efetividade da punição, dada a recorrência dos comportamentos
inadequados. Alem disso, observou-se que, em diversas vezes, o que foi
ameaçado não foi concretizado, sendo efetivado em apenas uma ocasião.
Frente a ameaças, as crianças freqüentemente param com o
comportamento inadequado, chegando, inclusive, a prometer mudanças para
ocasiões futuras, mudanças que não se concretizam.
Durante a intervenção, foi colocada em foco a ação de S2. Ele aceitou a
promessa das crianças de que mudariam a forma de agir no futuro (aula seguinte),
e, nesse sentido, verifica-se que o aceite pode ter sido uma forma de esquiva de
situação aversiva para S2 (no caso, permanecer desenvolvendo a atividade em
30
O batizado, que ocorre uma vez por ano no mês de outubro, é o momento mais esperado pelas crianças. Além de
participarem do evento em si, eles ganham uniforme de capoeirista e trocam ou ganham seu primeiro cordão.
149
filas), pois ele sorri e diz: Eu sabia que não ia adiantar, mas pensei: melhor isso
do que ficar com eles nas colunas até o final”.
Durante a intervenção, a pesquisadora e S2 construíram alternativas para
diminuir os comportamentos inadequados dos alunos e conseqüentemente o uso
de coerção. Uma das alternativas foi a de colocar os alunos do G2 participando
como espectadores na roda de G1 para ajudar a cantar e bater palmas; em nosso
entender, se eles se mantivessem na roda, deixariam de correr e de brigar entre
si. Uma outra alternativa foi a de pedir para os educadores do CJ deixarem as
crianças descerem no horário próximo às 15h e 30 minutos. Como estas
alternativas foram propostas nas aulas 7 e 8, em virtude da interrupção da
intervenção para a viagem de S2, pudemos verificar estas ações serem
empregadas na pós-intervenção.
b) Aspectos relativos à rotina da aula. Um dos aspectos identificado na pré-
intervenção, e comprovado na observação durante a intervenção, foi a rotina da
aula, que era sempre a mesma. Como dito anteriormente, a aula sempre seguia a
mesma seqüência: cumprimento ao mestre, aquecimento, alongamento,
comandado por um aluno mais graduado, execução dos golpes em duas filas e
roda. Durante a execução desta rotina, havia momentos em que sistematicamente
ocorriam comportamentos inadequados, que se mostravam muito aversivos para
S2, que agia de forma coercitiva.
1) aquecimento - Pudemos identificar o aparecimento de vários
comportamentos inadequados em G1 e principalmente nas aulas de G2, cujas
crianças chegavam antecipadamente e, conseqüentemente, já estavam aquecidas
no início da aula. Brincar de pega-pega, puxar a camiseta do colega, são
exemplos do que ocorre durante o aquecimento.
Embora tais atividades não fossem incompatíveis com os exercícios de
aquecimento, S2 age no sentido de parar sua ocorrência e, para tanto, utiliza os
recursos citados: olhar de forma reprovadora, falar explicitamente para parar a
atividade, ameaçar não haver roda, ameaçar retirar a criança da aula.
150
O trecho, a seguir, exemplifica um momento em que S2 faz o uso de
ameaças de retirar a criança da aula como forma de cessar os comportamentos
inadequados.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Capoeristas
estacionando os
chinelos para o
aquecimento”.
G2 coloca o chinelo do
canto da quadra e
correm para o meio da
quadra.
P diz: “Correndo sem
encostar no colega”
G2 começa a correr
pela quadra. A4 segura
a camiseta da criança
da frente.
G2 começa a correr
pela quadra. A4
segura a camiseta
da criança da frente.
P olha para A4.
A4 solta a camiseta
e continua correndo.
P observa G2.
P diz: “Pessoal mudou o
exercício. Agora
correndo de lado”.
G2 corre lateralmente.
P observa. G2 corre. A4 correndo
bate na criança da
frente.
G2 corre. A4
correndo bate na
criança da frente.
P olha para A4.
A4 continua
correndo.
P observa.
P diz: “muda de lado,
não precisa ser em fila.
Correndo para todos os
lados”.
G2 corre lateralmente.
P observa. A4 agarra novamente a
camiseta da mesma
criança.
A4 agarra
novamente a
camiseta da mesma
criança.
P vai até A4 e diz: “Na
próxima vez que eu te
ver atrapalhando
alguém pode por o
sapato e voltar para o
CJ”
A4 volta para o
grupo.
<...>
P diz: “Olha a ponte Rio-
Niterói. Quem consegue
fazer a ponte?”
G2 faz o movimento de
ponte.
151
Verificamos que S2 tenta cessar o comportamento inadequado de A4,
usando o olhar; com a recorrência do comportamento inadequado, ele ameaça
com a sua retirada do aluno da aula. Momentaneamente tal procedimento fez com
que o comportamento inadequado parasse, embora voltasse a ocorrer.
S2 identifica que o aquecimento é um momento crítico para o surgimento de
problemas. Essa hora é fogo, todos juntos correndo, eles sempre inventam algo e
brigam. Eu tenho dificuldade com esta turma (G2) e fico tentando evitar que eles
se peguem muito, se batam muito. Eu tento controlar, mas se você quiser
controlar muito você não vai conseguir. Ai eu parei e encerrei a aula. Eu vi que
eles estavam muito agitados, e não ia dar para continuar, então parei pedi o
lanche, sentei e encerrei a aula.”
No encontro com S2, questionamos se manter a “ordem”, aspecto
levantado como fundamental por S2, seria requisito necessário para o
aquecimento. S2 deixa claro que tem a ver com respeito, eles fazerem o que eu
peço.”, muito embora ele admita que, por serem as crianças, possa haver
brincadeiras. Não sei se é o dia que não tem aquela energia boa, ou aquele
estado de espírito legal. Vodiz: - Oh, não faz isso eles são crianças, eles vão
brincar, vão se distrair. A proposta da aula não é que eles façam tudo certinho,
que eles não brinquem ou fiquem na fila sem dar um pio. Isso é que eu falo de ter
controle sobre tudo, às vezes eu me pego querendo ter controle de tudo. Quando
eu me encontro assim, a aula não flui.
Como visto no depoimento, para S2 educar é ensinar a ter respeito, e este
é expresso pela obediência a suas determinações. Esta é a forma de educar
correta. As crianças devem seguir suas ordens. Esta característica de obediência
está muito presente na capoeira, na qual o mestre é aquele que dita o que deve
ser seguido pelos graduandos, e parece estar tão enraizada em S2 que até o fim
da intervenção não conseguimos alterar sua concepção.
Usando os exemplos acima mostramos, para S2, que a brincadeira de A5
de pega-pega não interferia no desenvolvimento do exercício e que a “chamada
de atenção” e ameaça não extinguiram o comportamento inadequado de A5 e
questionamos: Por que não brincar de pega-pega no aquecimento? Por que não
152
usar brincadeiras sugeridas pelas crianças para aquecer e colocar elementos da
capoeira nestas brincadeiras? Diante do questionamento, S2 sorri e diz que pode
ser uma boa idéia. De fato, a estratégia foi usada em aulas seguintes, diminuindo
bastante o número de comportamentos inadequados na atividade. O exemplo, a
seguir, mostra que o uso do pega-pega, com elementos da capoeira, fez com que
a atividade se desenrolasse sem a ocorrência de nenhum comportamento
inadequado dos alunos.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Hoje a corrida
é de...” <P faz
suspense>
G2 olha para P.
P diz: “de... pega-
pega”
G2 diz em coro:
“Oba, oba”.
P diz: “Quando for
pego faz cocorinha e
fica estátua. Para ser
salvo é só fazer uma
meia lua de frente.
Não tem pegador
fixo”.
G2 olha para P e
começa a correr.
P diz: “Só não vale
arrancar a cabeça do
amigo na meia lua de
frente”.
G2 ri e corre.
P toca pandeiro. G2 corre e brinca de
pega-pega.
P toca, observa G2 e
diz: “Pegou agachou”
G2 brinca.
P diz: “venham todos
para cá fazer
alongamento para
crescer
G reúne. A5 vai para
frente do grupo e
começa a puxar o
alongamento.
P observa. G faz alongamento.
Um aspecto que se evidenciou é que o “chamar a atenção” por vezes
parecia ser reforçador, e não punitivo. Num contexto em que S2 é admirado pelos
alunos, conseguir “chamar a atenção” de S2, mesmo por comportamentos
inadequados, parece ser mais importante para o aluno do que evitar a
conseqüência de ser retirado da aula, especialmente quando ameaças não são
cumpridas. A função reforçadora da atenção de S2 se evidenciou em outro
exemplo: quando S2 corrigiu um movimento errado em um aluno, imediatamente
153
verificou-se que este mesmo movimento passou a ser executado por várias
crianças.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Eu vou tocar
berimbau. Quando eu
parar vocês vão à ginga”
G1 observa P.
P diz: “Ginga que eu
quero aprender”
G1 começa a correr
pela quadra.
P toca berimbau e de
repente para.
G1 corre pela quadra e
quando o berimbau
para faz cocorinha.
<apesar de P ter
pedido ginga o G faz
outro movimento a
cocorinha>
<...> P diz: “Estou vendo
menininho de bumbum
no chão”
Aluno que estava
com o movimento
incorreto levanta o
quadril, mas G1, de
cocorinha, ri. < várias
crianças que
estavam com o
movimento correto
põem o bumbum no
chão e esperam P
falar sobre o
bumbum>
P repete o berimbau e a
frase do bumbum.
G1 executa e sorri. <...>
P diz: “Agora quando
parar o berimbau ginga”
P demonstra.
G1 executa.
Nesse trecho, podemos perceber algumas mudanças em S2: a) mesmo
pedindo ginga, e os alunos executando outro movimento (“cocorinha”), S2 segue
com a atividade, solicitando-a, em seguida, com demonstração; b) S2 não ameaça
o comportamento incorreto e altera a instrução.
Durante a intervenção, S2 percebe que seu comentário gerou o
aparecimento do movimento por outras crianças (colocar o bumbum no chão). Eu
percebi que meu comentário acabou fazendo com que rias crianças fizessem o
movimento com o bumbum no chão. Eu chamei a atenção pra uma coisa que não
precisava. Eu devia ter chegado perto da criança e corrigido, ou não devia ter
154
chamado a atenção pra isso, porque todo mundo fez para fazer graça e chamar
minha atenção
Ainda em relação ao aquecimento uma outra questão foi abordada. Como
salientado, os alunos de G2 parecem chegar aquecidos, e a agitação parece
ser uma constante. S2 percebe que tal agitação interfere na realização do
aquecimento e, junto com a pesquisadora, constrói uma alternativa. eu comecei a
fazer uma reflexão sobre isso. Por que essas crianças chegam tão agitadas. Eles,
quando descem para fazer a capoeira, estão num ambiente de sala de aula,
carteira, sentados ou fazendo alguma atividade de correr ou coisa que agita muito.
Mas tudo dentro do CJ. Quando eles saem do CJ, saem naquela coisa de
liberdade, vêem uma quadra enorme como essa e ficam agitados. Então, agora
vou colocar umas atividades de acalmar para preparar a galera pro aquecimento”.
Uma das atividades propostas é ilustrada, a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P chama novamente. Todas as crianças do
G2 se aproximam do P.
A maioria senta e
algumas ainda estão de
pé.
P vai chamando pelo
nome e pedindo para
sentar.
Todas as crianças
estão sentadas na
frente do P. <P está
sentada na
arquibancada e as
crianças no chão>
P diz: “Vamos bater
palmas acompanhando o
berimbau. É muito difícil”
G2 começa a bater
palmas.
P diz: “vamos montar um
ritmo. Não pode
acelerar”
G2 bate palmas.
P diz: “Quem consegue
cantar e bater palmas.
Eu acho que é muito
difícil”.
G2 começa a cantar e
bater palmas.
P diz: “Como vocês
sabem essa música”.
G2 canta bem alto
batendo palmas.
<quase gritando>
P diz: “Primeiro só as
palmas”
G2 bate palmas.
155
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P introduz a música G2 começa a cantar e
bater palmas. Quase
todo o grupo canta, ou
tenta acompanhar o
canto.
P diz: “Eu vi gente que
não cantou...”
G2 olha para P e para a
criança que não cantou.
P diz: “Agora vou por o
berimbau que aí é que
começa a ficar muito
difícil”
G2 bate palma.
P acompanha com o
berimbau.
G2 canta e bate palma.
P diz: “que bonito” G2 canta alto e bate
palma forte. Muitos
sorriem.
P diz: “Agora eu canto
uma parte e vocês
respondem com esta
parte”. <P repete o
refrão com as crianças>
P canta.
G2 responde com o
refrão e bate palma.
P toca berimbau e canta. G2 canta o refrão.
P diz: “Caramba! Que
beleza”
G2 canta e sorri.
S2 propõe a G2 cantar e acompanhar com palmas, antes do início do
aquecimento, o que faz com que o exercício tenha início sem a ocorrência de
comportamentos inadequados. A partir desta intervenção, S2 colocou muitas
vezes atividades antes do aquecimento.
No exemplo, a seguir, em que é proposta atividade para “acalmar” as
crianças, verifica-se a ocorrência de ações produtivas de S2: a) em vez de chamar
a atenção de um comportamento inadequado, S2 ignora-o e constrói uma
alternativa para trazer o aluno de volta para a aula; 2) S2 elogia o desempenho
adequado do grupo, logo após o término da atividade.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Hoje vou pegar
o pandeiro”
G2 observa.
P toca pandeiro. G2 bate palmas.
P diz: “Bonito, já de
primeira”
G2 bate palmas.
156
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “agora vou tocar
bem lento, quero ver
quem acompanha”
G2 bate palmas no
ritmo. A1 se afasta do
grupo. <vai até o local
onde ficam os
sapatos>
G2 bate palmas no
ritmo. A1 se afasta do
grupo. <vai até o local
onde ficam os
sapatos>
P toca pandeiro e diz:
“A1 vem, estamos
esperando você.
Depois vêm os golpes
e os saltos”.
G2 bate palmas. A1
continua afastado. A3
pergunta para P se ele
quer que ele vá buscar
A1.
P diz para A3: “Não,
deixa ele lá. Se quiser
ele mesmo vem”.
G2 canta e bate
palmas.
<...>
P diz: “que música a
gente canta?”
A2 começa a cantar
uma música.
P diz: “essa é boa,
vamos lá” P começa a
cantar a música.
G2 repete o refrão.
P canta a música e vai
chamando cada
criança pelo nome no
refrão.
G2 canta e criança que
foi chamada responde
com o nome no refrão.
P coloca no refrão o
nome do garoto que se
afastou
A1 levanta correndo e
volta para o grupo. G2
canta o refrão.
P coloca outros nomes G2 canta. A1 mantém-
se no grupo.
P diz <com tom de voz
sério e alto>: “Vou falar
uma coisa muito séria.”
G2 olha para P. <olha
com cara assustada
devido ao tom de voz>
P diz: “Vocês estão de
parabéns no canto”.
G2 sorri.
Em uma destas atividades denominadas, por S2, de “levar a calma”, a
complexidade proposta por S2 é alta, fazendo com que as crianças não consigam
acompanhá-lo. Ele próprio percebe, altera e recupera a atenção e a execução da
atividade, culminando com o elogio ao que havia sido feito pelas crianças.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P monta o berimbau e
começa a tocar.
G1 começa a bater
palmas, fora do ritmo.
P toca berimbau. G1 bate palmas fora
do ritmo.
157
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Ih! Tá tudo meio
torto, espera ai”
G1 para de bater
palmas e olha para P.
P diz: “Vamos bater
palmas. Como é que
bate palmas na
capoeira?”
G1 diz em coro: “1, 2,
3 batendo palma”.
P diz: “Agora sem contar
alto. Vou ouvir só as
palmas”
G1 bate palmas sem
contar.
P diz: “O capoerista bate
palma acompanhando o
ritmo do berimbau”
G1 observa batendo
palmas.
P diz: “Se eu tocar lento
tem que bater palmas
como?”
G1 responde em coro:
“devagar”.
P diz: “Isso mesmo” e
começa a tocar lento.
G1 bate palmas
devagar.
P aumenta o ritmo do
berimbau.
G1 vai batendo
palmas mais rápido.
P diz: “Vamos agora
fazer o máximo do
capoerista. Bater palmas,
cantar e acompanhar o
berimbau”
G1 começa a cantar e
bater palmas.
P diz: “Ai meu Deus, que
lindo”.
G1 canta.
S2 percebe que, com a diminuição da complexidade da atividade, o grupo
participa ativamente. No começo pensei, - Ih! Vai dar tudo errado. ia
encerrar, mas pensei. Vou simplificar as palmas. E começou a dar tudo certo,
eles se envolveram e foi bem legal. A energia foi dez
Em suma, podemos inferir que a colocação desta atividade na rotina das
aulas de S2 foi bem positiva. As crianças, que verdadeiramente chegam muito
agitadas para as aulas de capoeira, vão se acalmando, o que tornou o
aquecimento mais efetivo, com menos ocorrência de comportamentos
inadequados. S2 elogia o desempenho do grupo como um todo, logo após a
atividade terminar, o que não era feito anteriormente à intervenção.
2. Execução de atividades em filas é nesta etapa da aula que pudemos
perceber vários comportamentos inadequados, o que indica que a própria
dinâmica da atividade colabora para a eclosão de tais comportamentos. Ficar, por
alguns minutos, esperando a vez para realizar um movimento parece não ser o
158
ideal para esta idade. S2 defende o uso de filas, porque, no seu entender, o
objetivo da fila é para que a gente possa aplicar o conteúdo da aula de uma forma
que eles não se cansem, porque vai passando um, depois vai o outro, para
descansar. tempo de fazer uma atividade legal da capoeira, com bastante
fundamento, sem cansar. Toda a capoeira usa essa metodologia”. S2 credita os
comportamentos inadequados a características da idade: eles não têm noção do
corpo no espaço, eu digo para eles ficarem longe e eles vão se agrupando”, e não
a características da estratégia proposta para a execução da atividade que envolve
alto tempo de espera, muita proximidade corporal, ou elevada repetição da
atividade.
na pré-intervenção percebemos que as atividades propostas para as
filas, uma ao lado da outra, com 10 participantes cada, eram realizadas sempre da
mesma forma. Após instrução verbal ou com demonstração do golpe, os alunos
executavam o golpe proposto pela extensão total da quadra; quando todos
atingiam o ponto de chegada, repetiam o mesmo golpe voltando à posição inicial,
momento em que havia a troca de golpe. S2 ficava olhando a realização dos
golpes e, algumas vezes, fazia correção, comentário ou elogio nominal, como
podemos verificar no exemplo a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Presta bastante
atenção que este é
muito difícil. De
cocorinha, estica uma
perna e a outra dobra,
essa perna que esticou
não pode mais dobrar”.
Enquanto P vai falando
o aluno mais graduado
demonstra para o G.
G2 se posiciona com a
perna esticada e
chama P para olhar.
G2 se posiciona com
a perna esticada e
chama P para olhar
P observa e diz: “É isso
mesmo” para as
crianças que
perguntaram.
G2 executa. A5 fica
parada.
P diz: “E aí A5?”
A5 olha para P e diz:
“não consigo”.
P diz: “Olha como o A3
faz e tenta fazer igual”.
A5 olha para A3 e
executa.
P observa e diz: “muito
bem, isso mesmo”.
159
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G2 executa. P observa.
<...> P diz: “A6 olha que
beleza. Você já sabia
fazer?” <P muda a voz
para dizer que beleza>
A6 olha para P, diz:
“eu já sabia fazer” e
sorri. <mostra
orgulho>
P diz: “Agora a benção.
Levanta bem a perna. O
máximo que conseguir”
G2 executa. A6 faz o
movimento olhando
para P.
P diz: “Olha para o
colega da frente e não
para mim. No jogo é ele
que vai jogar com você
e não eu”.
G2 executa. A6 olha
para frente.
Neste exemplo verificamos que S2 mantém-se sob controle dos
comportamentos acadêmicos dos alunos - elogia, corrige e explica os golpes para
os alunos com dificuldade. Diferentemente do que foi observado com S1, S2 não
pune o comportamento ineficiente dos alunos.
Porém, principalmente durante as primeiras sessões de intervenção,
verificamos que S2 utiliza práticas coercitivas frente a comportamentos
inadequados, o que ocorre com muita freqüência. Para S2, esse momento (o de
exercícios dos golpes em filas) é um dos maiores problemas da sua aula. Essa
fila, tá louco viu! Eles ficam brigando pelo lugar”. Os trechos, a seguir,
exemplificam a dinâmica deste momento da aula.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P chama o G para
formarem duas colunas.
G corre para formar as
colunas, várias crianças
se empurram. <todos
querem ser os
primeiros>
G corre para formar
as colunas, várias
crianças se
empurram. <todos
querem ser os
primeiros>
P diz: “Não vale
encostar. Não tem
lugar, não pode
encostar. Vão mais
para trás, tem que dar
espaço. Quem
empurrar eu vou tirar da
coluna”.
160
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G vai se arrumando,
mas ocorrem vários
empurrões e brigas.
A2 empurra a
criança da frente.
P diz: “A2 não pode
empurrar”.
A2 empurra colega
para ficar na frente.
P diz: “A2 vem cá”.
A2 empurra colega. P vai até A2 e diz: “A2
vem aqui para a outra
coluna”.
A2 olha para a
colega <faz uma
cara de brava> e vai
para a outra coluna.
<...>
P diz: “Vamos até o fim
da quadra gingando”.
G ginga. Durante o
percurso A2 tenta passar
na frente da colega.
G ginga. Durante o
percurso A2 tenta
passar na frente da
colega.
P observa a fila e diz
“A2 não precisa ter
pressa, não precisa
empurrar, todo mundo
vai fazer. Se ficar
tentando passar na
frente vai sentar na
arquibancada”.
A2 executa a ginga
na frente da colega.
<...>
P vai chamando pelo
nome e observando G.
G executa e todas as
crianças chamadas
sorriem para P.
<...> P chama A5, A3, A2 tira
da fila e diz: “É para
ajudar os menores. Não
é para passar na frente
deles”
Alunos voltam para
G e executam
movimento.
P observa.
G executa, mas
algumas crianças
se empurram na
coluna.
P diz: “Não tem lugar
na coluna. A2 todo
mundo vai fazer os
mesmos exercícios,
entendeu?”
A2 acena
afirmativamente
com a cabeça.
P observa.
G executa. A2
passa na frente da
colega.
P olha para A2 e a
reprova com o olhar.
161
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 olha com o
canto do olho e
cabeça baixa
<timidamente> para
P e continua
executando
movimento
<...>
P desloca-se e chama
A5 <que está em
primeiro de uma das
filas e não começou o
exercício>
A5 olha para a outra
coluna e começa
rapidamente o
movimento.
A5 olha para a outra
coluna e começa
rapidamente o
movimento.
P diz: “Tá errado”. E
demonstra o correto
. G executa. <...>
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G executa. A7 bate
no colega da fila.
P diz para A7 “não
quero ver você fazendo
isso nos menores”.
A7 olha para P. P vai até A7 o segura
pelos ombros e o
chacoalha. (fraco)
A7 ri. P diz: “Viu não é
gostoso né?”
A7 volta para a fila e
diz para colega
sorrindo: “viu ele me
chacoalhou”.
<...>
P dá instrução de novo
movimento.
G executa e A2 bate na
colega que revida.
G executa e A2 bate
na colega que
revida.
P diz: “A2 lembra o que
eu falei? Você é tão
linda”.
A2 olha para P. P diz: “Vou falar uma
coisa para vocês. Tô
meio triste com vocês,
não adianta ser
bonita. Tem que ser
educada também”.
A2 e fila olham para
P.
<...>
P dá instrução de novo
movimento.
G executa.
No início do primeiro exemplo observamos que a organização inicial das
colunas gera vários comportamentos inadequados, pois as crianças querem ficar
nos primeiros lugares e, quando isto não é possível, querem ficar em um lugar
162
específico. S2 tenta, inicialmente, organizar a fila por comandos de organização,
no entanto, acaba por ameaçar com a retirada da atividade. Durante a
intervenção, sugeriu-se que o rodízio dos primeiros lugares da fila poderia ajudar a
minimizar a ocorrência de atritos entre os alunos, sem que fosse necessária a
utilização de ameaça. Como se verá, posteriormente, este foi um aspecto
incorporado por S2, durante a intervenção.
Em outro momento, desta vez com um aluno específico, S2 ameaça retirá-
lo da atividade. Apesar de ameaçar constantemente, S2 não cumpre, sua ameaça.
Durante a intervenção, quando questionado sobre o uso de ameaças e sua não
aplicação, S2 diz: Eu não quero tirar da aula, porque vai me dar mais trabalho
ainda, mas o vejo outra solução. É tapa, empurrão, soco, eu ameaço e eles
param. Eu viro as costas e começa tudo de novo”. Durante a intervenção,
salientou-se a ineficiência do uso de ameaça para a efetiva aprendizagem, pois
apenas a presença do ameaçador efetiva a obediência; assim, não houve
aprendizagem de como agir, mas a esquiva frente à ameaça. Por isso, quando o
agente punidor sai (S2 “vira as costas”), os comportamentos inadequados voltam
a ocorrer. Além disso, salientou-se o efeito negativo de ameaças que não são
efetivadas, aspecto recorrente nas práticas de S2.
No encontro, mostramos que não existe apenas a forma oral de ameaça; o
“olhar” tem o mesmo efeito prático. S2 admite que utiliza o olhar como forma de
levar o aluno a obedecer, e novamente deixa transparecer que, em sua
concepção, tal obediência é respeito. Eu consigo brecar no olhar. Eles tremem
quando me vêem olhar assim. Isto é respeito pelo mestre. Este é aquele respeito
que eu te expliquei sobre a roda da República”. Salientarmos que este olhar
constitui uma forma de prática coercitiva e que por dela não aprendizagem
efetiva. Salientamos também que este mesmo olhar, em outros momentos, tem
função reforçadora positiva, como se fosse um elogio, um encorajamento. Assim,
não se pode ignorar a força de um olhar.
Nas aulas seguintes, em alguns momentos, pudemos perceber que S2
tenta algumas alternativas para diminuir o uso de ações coercitivas na fila.
163
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Vamos na nossa
fila. Na fila hoje tem nova
regra. Não pode encostar
no amigo da frente. Em
duplas, vamos gingando
até o outro lado da
quadra”.
G2 executa.
P vai dizendo todos os
nomes das crianças das
filas. E fazendo elogios
esporádicos.
G2 ginga ida e volta.
A4 pede para P se
pode tomar água.
G2 ginga ida e volta.
A4 pede para P se
pode tomar água.
P diz: “Pode ir só
que volta rapidão. É
pá pum”.
G2 ginga. A4 sai
correndo.
P diz: “Agora atenção
capoeristas. Troca de
negativa. Difícil hein!!” P
troca o primeiro das duas
filas. <coloca novas
crianças para puxar o
exercício>
G2 executa. <os novos
puxadores executam
demonstrando orgulho>
P vai dizendo todos os
nomes das crianças da
fila e elogiando
esporadicamente.
G2 executa. A5 diz: “P
olha só minha mão de
capoerista”
G2 executa. A5 diz: “P
olha só minha mão de
capoerista”
P olha e diz: “Tá
esperto hein!
Treinando em casa
né?”
A5 sorri e continua. G
executa.
P observa.
P observa. G2 executa.
P diz: “Lembra do nosso
combinado né? Sem
tocar, sem bater”.
G2 olha para P.
P diz: “Meia lua de
compasso com a cabeça
para baixo” P repete a
instrução só que meio
cantarolado.
G2 executa e um grupo
de meninas repete a
instrução cantarolando
como P. A4 retorna e
diz: “Olha P já cheguei”
G2 executa e um
grupo de meninas
repete a instrução
cantarolando com P.
A4 retorna e diz: “Olha
P já cheguei”
P diz: “Nossa A4 foi
pá pum hein, gostei
de ver”.
A4 retorna ao G2. P sorri e observa G2.
G2 executa. P vai dizendo os
nomes das crianças.
164
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G2 executa e A4 diz:
“P ela saiu da outra fila
e veio para cá”. <A4
aponta para A5>
P diz: “Tudo bem,
seja bem vinda a
esta coluna”.
G2 executa. A5
executa movimento na
nova coluna
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Agora passar a
série na fila.”
G2 corre para ver
quem fica em
primeiro.
G2 corre para ver
quem fica em
primeiro.
P diz: “Só que a fila é
diferente. Todos de
frente para mim, quando
eu falar o movimento
todos vem devagar,
fazendo o golpe. Vou
ficar aqui na frente e
falar o nome das
crianças que tiverem
fazendo o golpe bem
bonito e não quem
chegar primeiro”
G2 se posiciona, uns
do lado dos outros.
P observa e vai falando
o nome das crianças que
estão fazendo os golpes
devagar. (não
necessariamente
corretos)
P diz: “Continua assim.
Agora meia lua de
frente”
G2 executa.
G2 executa. P diz: “Bem A2 a perna
está direitinho, A4 presta
atenção na perna”
P diz: “Armada” G2 executa.
G2 executa. P olha e sorri.
Nos dois exemplos apresentados, verificamos a criação de alternativas para
a construção das filas. No primeiro, S2 vai alterando o primeiro da fila;
efetivamente todas as crianças passaram, pelo menos uma vez, como
comandantes. No segundo, S2 altera a formação completa da fila: em vez de se
posicionarem um atrás do outro, as crianças se posicionam um ao lado do outro,
permitindo que todos executem os golpes ao mesmo tempo.
165
Em ambos os exemplos, verificamos também que S2 fica sob controle dos
comportamentos acadêmicos dos alunos, elogiando, comentando, orientando.
Durante a intervenção, ao mostrarmos estes trechos, S2 diz: Uma coisa que eu
tentei fazer foi procurar, dentro da individualidade de cada criança e respeitando o
limite de cada criança, procurar uma coisa boa, um elogio. Isso funcionou, mas
tem que ser verdadeira, porque criança não é boba. Se você elogiar uma coisa
que ele sabe que não está fazendo bem, não vai adiantar”. Além da percepção
sobre a eficiência do elogio, S2 também percebe que não apresentou práticas
coercitivas - você viu que nesta atividade não dei dura” -, que praticamente não
houve comportamentos inadequados
3) Roda O momento designado como roda era o mais apreciado pelas
crianças. A roda constitui-se de um momento em que todos os alunos,
posicionados em forma de roda, jogam capoeira. O professor comanda a roda ao
som do berimbau e um aluno mais graduado o acompanha com o pandeiro ou
com o atabaque. O professor canta uma canção e todos os alunos devem seguir a
canção batendo palmas e repetindo o refrão. Ao sinal do professor (abaixar o
berimbau), os alunos posicionados mais próximos ao professor, dos dois lados,
entram na roda e jogam capoeira por um tempo controlado pelo professor, sendo
em seguida substituídos por outros dois, e assim por diante. Eu acho que este
momento é o que eles mais gostam. É o momento que eles se exibem, é o
momento do show. O bom da capoeira é que todo mundo pode jogar com todo
mundo por que mesmo jogando com alguém bem inferior ao seu nível de
habilidade o jogo pode sair bem bonito”. Durante a intervenção, colocamos para
S2 o quanto o momento da roda é reforçador para as crianças, pois elas executam
as outras partes da aula objetivando, ao final, o momento da exibição individual, a
roda. S2 se espanta com tal colocação. Até concordo que a roda seja o momento
que eles mais gostam, mas o que reforça é quando eu elogio, quando eu transmito
uma satisfação, faço uma alegria para eles”. Com esta observação, nota-se que
ele não consegue conceber um reforço que não seja mediado por ele próprio. Esta
parece ser uma característica muito presente em S2 - seus alunos devem sempre
166
ser dependentes dele. Em algumas sessões nos posicionamos sobre a
necessidade de alterar esta relação, de forma que os alunos passem a ser
reforçados pela capoeira e não pelo professor; salientamos que, com esta
alteração, se o professor sair, as crianças permanecem na capoeira, que não
vão para a capoeira apenas por que S2 está lá.
Durante a intervenção, verifica-se que S2 passa a reforçar mais os alunos,
e, muito embora ainda ocorram punições, estas são menos freqüentes. Nos
exemplos abaixo, podemos identificar tal mudança, a partir da reação da própria
turma.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "vamos formar
uma roda".
G2 se desloca
formando uma roda.
P toca berimbau. G2 joga.
G2 joga. P toca berimbau. P diz
para G2 que es
jogando: "quando a
gente tá na roda tem
que prestar atenção na
roda, senão pode
acertar no rosto do
companheiro".
<...> P toca berimbau e diz:
“vamos A1 vamos”.
Dois alunos jogam,
outros batem palma.
P observa.
G2 bate palma.
G2 joga na roda.
P toca berimbau e diz:
"olha a palma de mão”.
G2 joga. P toca berimbau.P diz:
"tem uma coisa. Não tá
valendo quantos golpes
cada um faz, não pode
cruzar, mais calma, não
tem pressa”.
P diz: “Está bom, mas
está ruim. Vai
melhorar”. P pára de
tocar berimbau. P
cumprimenta todos os
alunos.
G2 vai embora. G2
comenta entre si
“Nunca tá bom pra
ele”
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P toca berimbau. G2 bate palmas e
dois alunos jogam por
vez.
167
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G2 bate palmas e
dois alunos jogam
por vez.
P escolhe outros dois na
roda.
G2 joga.
G2 joga. P toca berimbau e
observa.
G2 joga. P diz: “Beleza, isso aí.”
G2 joga. Os dois
saem pelo meio da
roda.
P diz: “Sempre sai por
onde entrou”
Alunos voltam para a
roda e saem pelo
local correto.
P chama menina nova e
pede que seu aluno mais
velho jogue com ela
Aluno joga com aluna
nova.
Aluno joga com aluna
nova.
P diz: “olha só. O mais
graduado jogando com a
aluna nova. Capoeirista
é assim.”
G2 bate palma.
P diz: “Quem ainda não
foi”
Quatro alunos
levantam a mão.
P escolhe dois e manda
entrar na roda.
G2 joga.
G2 joga. P diz: “Beleza, gostei.
Sai por aqui” P mostra
local para aluna nova.
Alunos saem e outros
entram.
P diz: “Olha a roda.
Vamos ficar de pé”.
G2 levanta e bate
palmas.
P diz: “Vamos fazer jogo
de corte”
G2 joga, algumas
crianças jogam e
outras vão entrando
no jogo.
G2 joga, algumas
crianças jogam e
outras vão entrando
no jogo.
P toca e observa.
G2 joga.
P encerra e diz: “Hoje foi
bonito que só vendo. Tá
bom mas...”
G2 responde em coro
“mas ta ruim, pode
melhorar”
P com cara de espanto
“mas tá muito bom”
G2 sorri. A2 diz para
A3 “tá louco ou
cheirou cola”
Nestes dois exemplos, que ocorreram nas aulas 6 e 8, respectivamente,
pudemos verificar a alteração de postura na finalização da roda. No primeiro
168
exemplo, ao dizer que “Está bom, mas, está ruim precisa melhorar”, o comentário
que se segue dos alunos é que, para S2, nunca está bom, a cobrança é muito
alta. No segundo exemplo, fica claro o espanto dos alunos diante do elogio,
indicando que seu elogio no momento da roda não é esperado. Infelizmente não é
possível descrever precisamente a cara de orgulho com que esse grupo foi
embora da aula depois deste elogio.
Pós - Intervenção
De forma similar à pré-intervenção, foram observadas três aulas de S2, sem
a intervenção da pesquisadora, a fim de que pudéssemos verificar se as
mudanças ocorridas durante a intervenção se mantiveram, passando a fazer parte
do repertório de S2. Como salientado anteriormente, a pós-intervenção ocorreu no
mês de agosto, portanto 46 dias após a última aula de S2 (já que, como informado
anteriormente, S2 não esteve no Brasil).
No dia em que S2 retornou, após a viagem, evidenciou-se, mais uma vez, o
quanto S2 é admirado pelas crianças, e funcionários da instituição. Neste dia,
mesmo estando planejada aula normal, ele conseguiu descer para a quadra no
final do horário de aula. Todas as crianças ficavam andando em volta de S2, os
funcionários queriam saber novidades dos países e cursos e as mais diversas
perguntas eram feitas.
Em conversa informal sobre a viagem, evidenciou-se uma forte hierarquia
na capoeira. Por exemplo, em Amsterdã, as pessoas que estavam no Batizado
ficaram hospedadas na casa de um professor de capoeira. A residência tinha
um quarto, que foi cedido para S2, pois este era o mestre de maior renome no
local. Todos os outros capoeiristas dormiram em colchonetes na sala. Nas
refeições, S2 não tivera que cozinhar nem lavar seus utensílios. Evidenciou-se,
nessa conversa informal, que para a capoeira, a divisão de tarefas e regalias é
considerada “normal” e que expressa respeito pelo mestre. Este “respeito” é
presente e cultivado entre seus praticantes. Em sendo assim, não é de se
estranhar que a noção de “respeito pelo mestre” deva ser alvo de ensino, e de
aprendizagem por parte dos alunos, que devem expressá-lo pela obediência.
169
No exemplo, a seguir, retirado da última aula de pós-intervenção,
observamos que S2 continua cultuando a necessidade de obter “respeito” dos
alunos, do que concluímos que, para ele, é mais importante a freqüência dos
alunos por sua causa do que pela atividade de capoeira, em si.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Olha a roda.
Vamos ficar de pé”.
G2 levanta e bate
palmas.
P diz: “Vamos fazer jogo
de corte, presta atenção
que qualquer um pode
entrar”.
G2 joga, algumas
crianças jogam e outras
vão entrando no jogo.
G2 joga, algumas
crianças jogam e
outras vão entrando
no jogo.
P toca e observa.
G2 joga.
P diz: “Bonito, podem ir
tomar lanche”
G2 correm em direção
ao lanche
G2 correm em
direção ao lanche
P diz: ”Ei, ei. Podem
voltar e cumprimentar o
mestre, onde já se viu
sair de um roda sem
cumprimentar o mestre.
Se fosse na minha
época o meu mestre já
tinha me dado uns
cascudos”
. G2 corre de volta e
cumprimenta o
mestre
P diz: “O mestre manda
e o que é esperto
obedece”
G2 sorri e corre para o
lanche.
Por esse exemplo, podemos perceber que a hierarquia antes comentada, é
muito interiorizada na capoeira e, provavelmente, seria necessária uma
intervenção maior, de modo a possibilitar que S2 alterasse determinadas práticas
comuns a esta visão.
Nas aulas de s-intervenção pudemos perceber que S2, no momento de
troca das turmas, usou ambas as opções elaboradas durante a intervenção no
último encontro. S2 pediu para que os educadores do projeto Gente Jovem
liberassem seus alunos no horário mais próximo das 15h 30 min e, quando estes
chegaram à aula, S2 os incorporou à roda, na participação com canto e palmas.
170
Pudemos perceber uma roda mais bonita, com mais palmas e cantos. Não
observamos o uso de ações coercitivas neste momento da troca, pois todos os
alunos estavam envolvidos na atividade. Podemos concluir que a intervenção
surtiu o efeito desejado.
Em relação à rotina, não percebemos variação na seqüência da aula, mas
percebemos que dentro da rotina, S2 conseguia variar mais as atividades. Por
exemplo, no aquecimento foi observada a inserção de novas atividades
conhecidas pelas crianças. Em uma aula, vimos a atividade gato e rato (entre as
meninas e os meninos) junto com o movimento de gingar, vimos algumas
variações do pega-pega combinadas com movimentos da capoeira e vimos a
construção de um aquecimento junto com S2 que pareceu ser muito reforçadora.
S2 ficava no meio da quadra e fazia o papel da águia; as crianças deveriam correr
de um lado para o outro sem deixar a águia pegá-los. Foi a primeira vez que vimos
S2 participar como componente de uma atividade. Enfim, percebemos que S2
mantém a rotina preestabelecida, mas começa a variar as atividades. Verificou-se
que nestas atividades houve pouco uso de ações coercitivas. Podemos inferir que
a intervenção pode ter auxiliado S2 a perceber a necessidade de alterar as
atividades, e desta forma menor emergência de comportamentos inadequados,
e, portanto, menor uso de práticas coercitivas. No entanto, não podemos esquecer
que a chegada de S2 da viagem também pode ter contribuído para que as aulas
se desenvolvessem de forma produtiva.
Ainda no item rotina, em relação às filas, foi possível observar que S2
voltara à formação inicial de duas filas e à passagem de golpes pré-escolhidos por
ele. S2 apresenta-se na maioria das vezes sob controle dos comportamentos
acadêmicos dos alunos, mas quando observamos o aparecimento de algum
comportamento inadequado, verificamos que S2 ainda faz o uso de ameaças.
171
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Vamos na nossa
fila. Precisamos inventar
coisinhas novas, ou os
meus capoeiristas
agüentam coluna de
172
capoeirista grande é com fila e que estratégias novas (inventar coisinhas novas) é
aula “para neném”. Fica claro, pois, que mesmo depois da intervenção, S2 não
associa o aparecimento de comportamentos inadequados à dinâmica das
atividades de ensino.
Em suma, pudemos perceber que S2 alterou sua prática e que novas
estratégias foram colocadas em sua rotina, diminuindo a emissão de
comportamentos inadequados por parte dos alunos, porém verificamos também
que S2 mantém a crença de que é necessário que os alunos obedeçam a suas
ordens, demonstrando respeito pelo mestre. Esta concepção de respeito parece
ser enraizada em S2 e frequentemente reforçada no meio em que ele freqüenta.
173
Concepções e Práticas Educativas de S3
S3 tem 21 anos, é solteiro, reside num bairro afastado da instituição, mas
como já se encontra em outros trabalhos e se locomove usando motocicleta,
afirma não demorar muito para chegar. Fez ensino regular em escola pública e
ingressou diretamente na faculdade de Educação Física. Atualmente cursa o
ano e deve-se graduar no final do ano. Pretende, em seguida, iniciar o curso de
licenciatura na mesma universidade.
A modalidade de futsal, na instituição, é a que tem maior número de
crianças. As turmas estão com a totalidade das vagas preenchidas, considerando-
se o número necessário para manter a qualidade do trabalho, contando com lista
de espera muito grande. Neste ano, com a ocorrência da copa do mundo, a
procura parece ter sido maior ainda.
É a primeira vez que S3 trabalha com a modalidade futsal; sua experiência
era com musculação (atividade que exercia) e capoeira (atividade de que é
praticante desde a adolescência, mas não profissionalmente). Além de cursar a
faculdade, e de atuar na instituição, S3 trabalha em vários outros locais. Em
academia, como instrutor de musculação cumpre uma carga de 20 horas
semanais e outras 20 horas semanais na organização esportiva. Podemos
verificar que cursar a faculdade não é compatível com o cumprimento de todas
estas horas de trabalho, mas S3 sorri e diz: “a gente vai dando em jeitinho, sai um
pouquinho mais cedo, assina e vai embora, vai fazendo rolo. O que precisa é
da grana no final do mês”.
Na instituição, S3 está há um ano e meio e atua como estagiário. As turmas
de futsal, por terem um grande número de crianças inscritas, comportam um
professor e um estagiário. O número total de crianças na modalidade de futsal
chega a aproximadamente 120; divididas em três turmas, que treinam em horários
preestabelecidos. Esta divisão é feita conforme quadro a seguir:
174
Turmas Idade Dias da
semana
Horário Professor
responsável
menores 7/8 quart/sex 17:00/18:00 S3
médios 9/10/11 seg/quart/sex 17:00/18:30 (seg)
18:00/19:00 (quart/sex)
outro professor
(S3 é auxiliar)
maiores 12/13/14 seg/quart/sex 18:30/20:00 (seg)
19:00/20:00 (quart/sex)
outro professor
(S3 é auxiliar)
Quadro 6: Idade e horário das turmas de futsal
Como podemos verificar no Quadro, S2 é responsável por comandar as
aulas do grupo dos menores. O outro professor também deve estar presente, mas,
com esta turma, atua apenas como apoio. Nas outras duas turmas, o papel se
inverte: o outro professor atua efetivamente e S3 é auxiliar. Desta maneira, na
turma dos menores, S3 é o responsável pelo planejamento das aulas e pela
condução das atividades; o professor de apoio ajuda na organização das
atividades, em alguma correção individual, em alguma ocorrência de emergência,
como, por exemplo, socorrer algum aluno que se machuque; também é função do
apoio arrumar o lanche para a turma em atividade (o lanche, que desce do
refeitório, é oferecido para as três turmas). Sendo assim, quem arruma o lanche
(separar a quantia correta de lanche e dividir o suco), na turma dos menores, é o
outro professor, mas quem leva as crianças para o lanche, após o término da aula,
é S3, para que o outro professor possa dar início à aula da outra turma.
Em relação ao grupo com que trabalha, S3 acredita que a maior
contribuição da sua modalidade para a formação dos alunos é social. Acredita
que, trabalhando um esporte, as crianças não ficam na rua aprendendo coisas
ruins, como tráfico de drogas, ou se metendo em encrenca. Além desta função, S3
acredita que, com o futsal, também trabalha situações de frustração (saber ganhar
ou perder), e aumenta o acervo motor das crianças. S3 acredita ser um formador
de opinião das crianças, por isso preocupa-se em ser um bom modelo para elas.
Vários alunos se espelham no professor, às vezes o pai e a mãe falam e eles não
estão nem aí, mas o professor fala e eles ouvem”.
Quando perguntado o que significava planejar/preparar aulas, S3 consegue
atribuir ao termo planejar o significado de uma ação para que a aprendizagem
175
ocorra. Como afirma, Planejar é traçar os meios para alcançar um objetivo
estipulado, é um roteiro”. S3 ressalta a possibilidade de alteração deste “roteiro”
durante a atuação - dependendo da situação da aula, tem que mudar alguma
coisasendo que a alteração, na visão dele, deve ser anotada para, quando for
necessário usar o planejamento novamente, saber que para atingir o objetivo será
necessária tal alteração.
No seu entender, a maior dificuldade que encontra para planejar é a de
passar para o papel o que pensou. A maior dificuldade de fazer um planejamento
é fazer e ser entendido por outra pessoa”. Quando questionado por que outra
pessoa deveria entender seu planejamento, se é ele que vai usá-lo, S3 sorri e diz:
“É pra voque pede nossos planejamentos”. Para planejar, S3 afirma utilizar-se
de informações e conhecimentos adquiridos na graduação, informações de
professores e informações recebidas em cursos e palestras. Mesmo com um
grande número de atividades semanais, S3 ainda faz um curso, aos sábados, de
fisiologia do exercício.
Embora faça referência ao planejamento das aulas, pudemos verificar
durante a observação, que S3 não tem planejamento escrito e não parece ter a
aula planejada “na cabeça”. Aparentemente, S3 definia o que faria no momento
em que eu perguntava para ele qual seria o objetivo daquela aula.
Quando perguntado como seria uma aula considerada boa, ele afirma que
... é uma aula que tenha uma proposta, separar time e fazer coletivo, isso
qualquer pessoa faz não precisava ser professor.Ele salienta que esta proposta
tem que motivar, e ser dinâmica. Se sempre for igual não motiva, eu prefiro as
atividades que eles executem e já possam voltar a executar, sem ficar esperando”.
Quando solicitado a apresentar o objetivo, o conteúdo, a estratégia e a avaliação
de uma aula considerada boa, S3 tem dificuldade em explicitar as informações.
Sobre os objetivos afirma: O meu objetivo maior era conseguir chamar a atenção
deles sem ter que usar o autoritarismo”; quanto ao conteúdo, S3 elenca
aquecimento em forma de pega-pega americano, alongamento da musculatura
que ia ser utilizada e depois chute a gol, encerrando com um jogo coletivo. As
estratégias utilizadas foram a instrução, a demonstração e o feedback: eu uso o
176
exemplo de alguém, eu sempre pergunto alguém entendeu? eles vão
executando e eu vou dando um feedback corrigindo alguma informação que as
crianças não conseguiram captar”. Na avaliação, S3 refere-se ao “chute a gol” que
percebeu ter sido utilizado no coletivo e que, em sua opinião, teve uma maior
eficiência.
Podemos verificar por essas falas que S3 não apresenta objetivo, que
explicite, de forma clara, os comportamentos que desejaria que seus alunos
manifestassem; no item de conteúdo, S3 não delimita os conteúdos necessários
177
quadra. Como se pode verificar, os objetivos, muito abrangentes, o estão
focados nos comportamentos que os alunos devem apresentar.
Todas as aulas de S3 parecem seguir uma rotina parecida. O grupo de
crianças espera o professor no centro da quadra, que chega e cumprimenta o
grupo, explica a atividade de aquecimento e, em seguida, um trabalho de
habilidades básicas do futsal e a aula finaliza com um jogo coletivo. Durante a
execução desta rotina, pudemos observar que S3 altera bastante as atividades e
as aulas parecem bem motivadoras. De todas as modalidades observadas, o
futsal é a que parece ser mais motivadora. Por se tratar de uma atividade muito
valorizada em nosso país e ser um ano de copa do mundo (Copa da Alemanha)
as crianças parecem verdadeiramente envolvidas com a modalidade.
Pudemos perceber em vários momentos que S3 permanece na maior parte
do tempo sob controle dos comportamentos acadêmicos de seus alunos, S3
elogia, corrige, dá dicas e frequentemente acompanha a realização dos
movimentos. Por muitas vezes, verificamos que S3 elogia nominalmente uma
criança, fazendo um comentário positivo sobre a execução do seu movimento.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "Vamos trocar de
lado. Presta atenção.
Jogador de futebol tem
que saber chutar de
direita e esquerda. É
lógico que a gente
prefere um lado, mas
tem que aprender com
as duas pernas. Tem
alguém aí que não sabe
qual é à esquerda”. (P
demonstra).
G observa e mostra a
perna esquerda.
P diz: "Isso aí!" G observa.
P diz: “Pode ir” A5 (primeiro da fila)
corre para chutar a
bola
A5 (primeiro da fila)
corre para chutar a
bola e chuta errado.
P observa e corrige. P
diz: "A5 volta lá e presta
atenção no pé que você
vai sair correndo,
sempre contrário ao que
você vai chutar. Qual é
então?."
178
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A5 olha para P e diz:
“se eu vou bater com
o esquerdo tenho
que começar com o
direito é isso?”
P sorri e faz sinal de
positivo.
A5 corre e faz
correto.
P diz: "Viu! Bom"
A5 sorri e volta para
a fila.
<...>
P diz: "vai de chapa". A7 corre e executa.
A7 corre e executa. P diz: “Aí A7, bom chute.
Você viu que de chapa
coloca a bola bem onde
quer?”
A7 olha para P, faz
sinal de afirmativo
com a cabeça e sai
balançando os
braços para os
outros alunos na fila
que o
cumprimentam.
<...>
P diz: "vai A8, quero ver
agora que é a perna
boa"
A8 (que é canhoto)
corre e chuta.
A8 (que é canhoto)
corre e chuta.
P diz: “Agora é sua praia
né”
A8 acerta o chute. P observa e diz: "Viu!
Bom!".
A8 sorri e volta para
a fila.
<...>
P diz: "Vai" A9 corre e chuta.
A9 corre e chuta. P diz: "Aí! Boa bola".
A9 olha para
professor e sorri
<...>
P apita e diz: "quem está
com bola guarda no
saco, quem não está
senta no meio. Como o
exercício foi bom vamos
aumentar o coletivo".
G corre para guardar
bolas e outros vão
para o centro.
Outro aspecto evidenciado foi o uso de práticas coercitivas para
comportamentos inadequados das crianças. Um dos momentos que mais
propiciavam o aparecimento destes comportamentos foi o que envolveu filas.
Como visto anteriormente em S2, a estratégia de formação de filas facilita o
179
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: "vou chamar
algumas duplas. A1
aqui, A2 aqui de frente
para o gol, A3 aqui".
G vai ao local e
espera.
P arruma o G todo. G espera.
P pega o saco de bola,
e diz: "vai ter as bolas
espalhadas aqui,
quando eu apitar corre e
chuta para o gol. Vai
atrás da bola pega
devolve no lugar e volta
para a fila".
G olha e ouvem as
instruções.
P diz: "pode sair o
segundo da fila?".
G responde em coro:
"não"
P diz: “e se sair?” G responde “não vai
jogar no coletivo”
P arruma as bolas. G observa.
P apita. Aluno que estava em
primeiro corre, chuta,
continua correndo
para pegar a bola e a
deixa no lugar.
Aluno que está
esperando corre e
chuta.
P para a bola e diz: "é
só quando eu apitar.
Senão, vai voltar".
Aluno sorri, volta e
espera.
P diz: "põe a bola no
lugar e espera eu
apitar".
G espera. A2 diz para
A1: "isso, isso, chuta,
corre e pega a bola.
Você vai ver meu
chute de Roberto
Carlos".
A1 olha para A2 e se
prepara para correr
(espera o sinal do
professor)
<...>
A1 corre, chuta bola e
diz: "sai da frente que
lá vai Ronaldo".
A1 corre, chuta bola e
diz: "sai da frente que
lá vai Ronaldo".
P observa e apita.
P diz: "Agora de chapa,
parte interna do pé
(demonstra movimento).
Ah, mas eu chuto
melhor de bico. Mas
agora é de chapa,
vamos treinar o chute
de chapa".
G correm para a bola.
P diz: "só quando eu
apitar".
G volta.
180
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P apita. A1 que está em
primeiro da coluna
corre.
A1 que está em
primeiro corre.
P observa e diz: "não
pode arrumar a bola, no
jogo não dá para
arrumar".
A1 retorna e refaz o
movimento. G
observa.
P diz: “Perfeito garotão”
P apita. A2 corre, A3 e A4 se
empurram na coluna.
A2 corre, A3 e A4 se
empurram na coluna.
P olha para os dois e
diz: “Não acredito que
vou ter que tirar dois do
coletivo”
A3 diz: “Ele quer
entrar na minha
frente”
P diz: “A4 o A3 estava
na sua frente, vai fazer
graça agora?”
A4 olha para A3 (faz
uma careta) e volta
para trás dele
<...>
P diz: "Presta atenção.
A gente chutou de?".
G em coro: "de
chapa".
Pudemos perceber que S3 utiliza a ameaça para cessar a emissão de
comportamentos inadequados nas filas. A possibilidade de retirada do coletivo
parece ser a punição mais temida por eles. Percebemos que quando S3 utiliza a
ameaça, ele sempre sinaliza com a não participação no coletivo.
No entanto, apesar de várias vezes ter sido feita a ameaça, não
observamos a efetivação da mesma e nenhuma criança ficou sem o coletivo. Pelo
que ouvimos entre as crianças, tal efetivação tinha ocorrido algumas vezes, por
isso inferimos que seu uso surte um efeito tão imediato - a criança que ouve a
ameaça cessa o comportamento inadequado; observamos, porém, que ele volta a
ocorrer, mas no momento da ameaça ele cessa imediatamente.
No exemplo, a seguir, evidencia-se que o coletivo é a atividade reforçadora
da modalidade futsal.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P vai mudando o
pegador.
G corre. A3 é pego,
senta, levanta vai até
P e diz: “posso ir
beber água?”
181
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G corre. A3 é pego,
senta, levanta vai até
P e diz: “posso ir
beber água?”
P diz: “Mais um
pouquinho e vamos
todos.”
A3 volta a sentar para
continuar brincando
de pega-pega.
<...>
<...> G corre.
P diz: “Agora dois
pegadores”
G corre. A3 é
novamente pego e vai
até P e diz: “eu não
posso correr muito
porque minha mãe
disse que eu canso
muito”
G corre. A3 é
novamente pego e vai
até P e diz: “eu não
posso correr muito
porque minha mãe
disse que eu canso
muito”
P diz: “É alguma
recomendação médica?”
A3 diz: “Não” P diz: “Então é melhor
não jogar hoje, porque
jogar futebol tem que
correr e se você cansa
muito pode te fazer mal”
A3 diz: “Não, olha já
passou, tô novo em
folha” . A3 sai
correndo para a
brincadeira de pega-
pega.
P sorri.
P sorri. G corre.
Nota-se que, durante o aquecimento com atividade de pega-pega, A3 tenta
se afastar do aquecimento, utilizando-se de alguns artifícios (beber água, a mãe
diz que ele cansa muito); no momento que S3 diz para não participar do jogo
porque tem muita corrida, A3 rapidamente altera o comportamento e passa a
participar ativamente do aquecimento.
Assim, o momento do coletivo parece ser a atividade mais reforçadora da
aula: todos participam ativamente e quando a ativid
182
experiência com a modalidade, demonstra dominar bem os conteúdos a serem
trabalhados. Quando os alunos estão realizando as atividades, ele está, na
maioria das vezes corrigindo, ou elogiando-os. Percebemos ainda que S3
apresenta objetivos amplos e, aparentemente, não planejados com antecedência.
Apesar de ter sido observado o uso de ações coercitivas em alguns momentos por
S3, seu uso não é constante.
Intervenção
Apresentaremos, a seguir, um quadro com informações sobre as dez aulas
observadas de S3. O quadro apresenta, além de informações quantitativas como
datas, horários e número de alunos, os objetivos formulados pelo professor, os
critérios escolhidos para conduzir os encontros de formação e uma sucinta
descrição dos episódios selecionados.
Quadro 7: Informações gerais, objetivos e critérios utilizados nos encontros
de formação de S3.
183
S3 Aula 1 Aula 2
Data
28/04/2006 12/05/2006
Horário
17:05 às 18:00 17:10 às 18:05
Num de alunos
23 alunos 25 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Coletivo Coletivo
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
Dois times estão jogando, times ficam passando a bola e não chutam
(o jogo dura 5 minutos ou quem fizer o gol permanece e o time que
levar deve sair para a entrada do próximo). P diz: Falta um minuto de
jogo. Times começam a chutar e time bege faz gol
este exemplo serviu para mostrar para S3 como o coletivo era
uma atividade reforçadora para este grupo
P explica aquecimento (quem perder o colete deve sair,
quem pegou entregar o colete para P). G começa a jogar,
crianças que perdem o colete e saem recebem novamente o
colete e voltam para atividade.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: oferece oportunidade para a criança atuar
constantemente.
Critério 2: Práticas
em relação a
comportamentos
“inadequados”
31
Alunos fazem aquecimento correndo em fila e conversando. P diz:
“se tão conversando é porque está fácil. Então vamos dar mais duas
voltas”
cpto aluno: conversa julgada inadequada pelo P.
cpto S3: aumenta a atividade de aquecimento
Dois alunos se batem, P diz: “O próximo que eu vir batendo
vai ficar sem coletivo”.
cpto aluno: inadequado
cpto S3: ameaça tirar do coletivo
Critério 3: Escolha
da Pesq.
A2, que está no time que espera para entrar no jogo sobe na grade.
P diz: “não preciso nem dizer né?”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: ameaça tirar da aula
Um aluno do time amarelo pede para seus colegas se
organizarem rápido; outro aluno do time azul vê e pede para
seu time fazer o mesmo, os outros dois times ficam
desorganizados. P chama os times organizados para
começar jogando.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: escolhe os que apresentam o comportamento
adequado (reforça)
31
Comportamentos Inadequados: comportamentos dos alunos não relacionados às atividades de ensino desenvolvidas. Por exemplo, jogar futebol durante aula da outra turma, bater
nos colegas, xingar e etc...
184
S3 Aula 3 Aula 4
Data
19/05/2006 26/05/2006
Horário
17:07 às 18:05 17:10 às 18:10
Num de alunos
25 alunos 24 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Trabalhar parte física Coletivo
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P explica exercício com cones fazendo referência aos jogadores
profissionais do futebol. G executa o exercício.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: faz referência a jogadores profissionais (elemento
motivador)
A. esperam a aula sem interferir na aula de vôlei. P elogia
grupo por não terem atrapalhado a aula de voleibol e diz:
“Hoje só um aquecimento e coletivo”
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: aumenta o período de coletivo (reforça)
Critério 2: Práticas
em relação a
comportamentos
“inadequados”
Alguns alunos atrapalharam o final da aula de vôlei e destruíram
material de construção, P reúne grupo e diz: “Eu acho melhor
começar a mudar. Eu e o P2 não agüentamos ouvir mais
reclamações de vocês. Nós não gostamos de dar bronca. Só
aprende tirando o coletivo”. A2 cochicha com amigo: “desde que
começou o ano já é a sexta dura”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: tira o coletivo
Quando estão jogando a maioria das crianças correm todas
juntas atrás da bola. P diz: “Hoje vou marcar falta quando
tiver um bolo de gente”
cpto aluno: incorreto
cpto S3: aplicar falta
Critério 3: Escolha
da Pesq.
G executa exercício físico A1 pergunta: “P vai ter jogo?”. P diz: “Não
sei, já começou errado, se começar a se comportar bem talvez”. A1
cochicha com A2 “Vai sim, vai sim”. No final da aula P não realiza
coletivo e ainda ameaça que da próxima vez que atrapalharem a
aula de vôlei ficarão sem coletivo por dois dias
cpto aluno: inadequado
cpto S3: tira o coletivo e ameaça retirar por mais tempo
Time amarelo faz gol, time verde entra e time vermelho sai da
quadra com A1 chorando. A1 vai até P chorando tira o colete
joga no chão e diz: “Nem peguei na bola, não vale assim” P
diz: “A1 é assim mesmo, uma hora se perde outra ganha.
Você já vai voltar, vem por o colete” A1 sai andando
chorando. P diz: “Já vou chamar, quem estiver sem colete
não pode entrar e vou colocar outro no lugar” A1 volta
correndo pega o colete se atrapalha todo para vestir olha
para P e diz: “Já estou pronto juiz. Desta vez você vai ver o
Ronaldinho em campo”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: ignora o comportamento inadequado
185
S3 Aula 5 Aula 6
Data
02/06/2006 09/06/2006
Horário
17:00 às 18:05 17:05 às 18:10
Num de alunos
22 alunos 25 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Introdução das regras oficiais para o amistoso. Trabalhar a troca de passes
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P divide as equipes e P(apoio) sugere: “deixa só os times que vão
pro amistoso jogar” P diz: “Não aí já é punição demais. Já não vão
no amistoso e hoje não jogam quase nada.
este exemplo serviu para mostrar para S3 como ele percebe que
a retirada do coletivo para o grupo seria uma punição gratuita.
Time perdeu o amistoso. As. estão sentados e A2 diz para
A3: “Hoje só vai ter física, porque perdemos o jogo” A3
balança a cabeça afirmativamente. P diz: “O que faltou pra
gente no domingo?” Alguns respondem “tocar mais a bola” P
diz: “Então hoje já vamos começar o aquecimento com esta
atividade. Dois a dois tocando a bola correndo pela quadra”
este exemplo serviu para mostrar para S3 como ele
alterou seu comportamento frente aos alunos. Em vez de
punir a derrota, identificou o erro mais aparente com o
grupo e trabalhou tal conteúdo.
Critério 2: Práticas
em relação a
comportamentos
“inadequados”
A. sentados observando P. P diz: “Pro jogo de domingo não vai dar
para levar todo mundo. Vamos levar dois times. Quem não for agora
vai no próximo. Quem sair chorando, chutando não vai nem no
próximo” G observa.
cpto S3: ameaça com a retirada do amistoso frente a
possibilidade de comportamento inadequado.
G realiza atividade, A1 e A2 nas colunas brigam pelo lugar. P
diz: “quanto mais demora para fazer o exercício menos
tempo vocês têm de coletivo”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: ameaça retirar o coletivo
Critério 3: Escolha
da Pesq.
A. sentados observando P. P diz: “O Parreira não chamou 23
jogadores para a Copa. E os outros jogadores, chutaram, brigaram?”
G responde em coro “Não” P diz: “Então não precisa brigar”
cpto S3: relaciona com comportamento adequado de jogadores.
P diz: “Deu pra perceber que precisamos melhorar muito,
mas foi muito boa a aula, bem proveitosa e por isso vamos
para o coletivo com bola nova” G grita “Viva
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: P coloca bola nova (possível reforçador)
186
S3 Aula 7 Aula 8
Data
16/06/2006 23/06/2006
Horário
17:15 às 18:00 17:12 às 18:10
Num de alunos
23 alunos 25 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Chute de pênalti Coletivo com troca de passes.
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
P explica um exercício de aquecimento. G fica conversando. P diz:
“Vamos galera, quanto mais rápido aqui, mais rápido a gente vai
para o coletivo”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: sinaliza com o reforço para comportamento acadêmico.
Times jogam A4 chora na grade. P vai até A4 e pergunta por
que ele está chorando. A4 diz que não quer atuar na posição
de goleiro. P diz: “Não precisa chorar. Uma hora é um, outra
hora é outro. Esta é sua vez”. A4 diz: “Eu não vou” P diz: “De
qualquer maneira você está jogando. O time é feito por
todos”. A4 diz: “Eu não vou”. P diz: “então vou colocar
alguém para te substituir” P chama outro aluno que corre
para o gol. Depois que o jogo se iniciou A4 vai até o lado de
P e diz: “Tudo bem vai, eu vou entrar no gol” P diz: “Agora só
no próximo jogo”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: ignora comportamento inadequado; estabelece
regra para ingresso na atividade.
Critério 2: Práticas
em relação a
comportamentos
“inadequados” ou
em relação a
comportamentos
incorretos dos
alunos
P diz: “quem chegou atrasado senta aqui” Alunos atrasados sentam
perto de P. P diz: “quem chega atrasado tem que se comportar se
não, não precisa nem vir”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: ameaça não participar da aula. Obs.: não ocorreu comportamento inadequado.
Critério 3: Escolha
da Pesq.
P divide as equipe e observa-as baterem os pênaltis. P elogia
individualmente os alunos.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: elogia o movimento nominalmente
A1 está sentado de meia e chinelo, P diz: “Cadê o tênis?” A1
diz: “Minha mãe vai trazer. Fico no gol” P diz: “Não, espera
sua mãe chegar e aí se joga. Não pode jogar de meias,
mesmo no gol”
cpto aluno: inadequado
cpto S3 estabelece regra para ingresso na atividade:
187
S3 Aula 9 Aula 10
Data
30/06/2006 07/07/2006
Horário
17:10 às 18:10 17:00 às 18:00
Num de alunos
25 alunos 21 alunos
Objetivo da aula,
formulado pela
professora
Coletivo Coletivo
Critério 1:
situação de
processo ensino-
aprendizagem
“efetiva”
Atividade de aquecimento. G começa a diminuir a intensidade e P
passa a incentivá-los nominalmente. G retorna o exercício.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: incentiva
G corre em aquecimento.A3 diz: Quanto tempo P?” P diz: “Se
correrem bem em dupla, correm pouco tempo” G corre
organizado.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: reforça comportamento acadêmico
Critério 2: Práticas
em relação a
comportamentos
“inadequados” ou
em relação a
comportamentos
incorretos dos
alunos
Dois times estão jogando e P apita pênalti. A3 corre pra cima de P e
diz: “Não foi pênalti se tá louco” A4 diz: “FDP”. P chama os dois
alunos e diz: “Cartão vermelho para os dois. Podem ir embora pra
casa”
cpto aluno: inadequado
cpto S3: utiliza regra do futsal (punição)
Obs.: não ocorreu comportamento inadequado.
Critério 3: Escolha
da Pesq.
Um aluno do time bege chuta uma bola e pega no nariz de A5 que
começa a sangrar. A5 chora P vai até ele e diz: “Calma que é coisa
de jogo. Pode chorar porque dói, mas acontece em jogo” A4 olha
para P e diz: “vou morrer” P diz: “Nada campeão. Vamos por gelo.
Jogador é assim cai, machuca, concerta e volta”. P (apoio) coloca
gelo em A5 e pergunta se ele vai voltar, A5 diz: “Jogador não para,
vou voltar preciso ajudar minha equipe”. P recoloca-o no jogo e times
o aplaudem.
cpto aluno: acadêmico
cpto S3: reforça participação de A5
P divide equipes e diz: “antes de entrar na quadra já escolhe
quem vai ser o primeiro, segundo e terceiro goleiro para
depois não ter problema de não querer. O combinado não é
caro”. G conversa entre si.
cpto S3: propõe situação que diminui a possibilidade de
ocorrência de comportamento inadequado (no caso,
criança recusar-se a jogar como goleiro).
Na intervenção, tínhamos como foco, identificar e alterar o uso de práticas
coercitivas, levando o professor a substituí-las por práticas não coercitivas. A
ocorrência de tais práticas frente a comportamentos inadequados parecia ter relação
com alguns fatores as estratégias utilizadas (no caso, as filas) para ensinar
habilidades específicas e os objetivos muito amplos.
Pudemos perceber, na pré-intervenção, e comprovar na intervenção, que a
modalidade de futsal parece ser a atividade em que existe a maior organização das
turmas, idades e horários.
Como pode ser observado no Quadro 7, as aulas iniciavam quase sempre no
horário estipulado e terminava também perto do horário previsto. A rotina
preestabelecida parecia cumprir um papel organizacional muito importante para as
crianças. Como as atividades, dentro da rotina, eram sempre modificadas, a rotina
não se tornava desestimulante, como ocorria na modalidade da capoeira. Em todas
as aulas observadas, quando o professor descia as escadas para a quadra, a
maioria das crianças já corria para o centro da quadra, enquanto outras corriam para
pegar, com o professor, as redes para as traves. As redes eram instaladas pelas
próprias crianças que se penduravam na trave (devido à baixa estatura) e a
encaixavam nos ganchos das traves. Enquanto isto ocorria sem a supervisão direta
do professor, este pegava a chamada e ia ao encontro deles, no centro da quadra. O
professor sempre cumprimentava o grupo, fazia algum comentário geral ou pessoal
com a turma, fazia chamada nominal, em muitos momentos perguntava se alguém
tinha notícia de alguma criança faltante e, em seguida, explicava a atividade de
aquecimento. No final da aula, novamente o professor reunia a turma no centro da
quadra e rapidamente fazia algum comentário elogioso sobre o desempenho dos
alunos, despedia-se e se dirigia com eles para o lanche. Pudemos observar que esta
organização parece ser favorecedora de comportamentos acadêmicos,
incompatíveis com a eclosão de comportamentos inadequados.
A freqüência nas aulas de futsal sempre foi um fato que nos chamou a
atenção, que dificilmente alunos faltavam ou chegavam atrasados. Parece que a
rotina de sentar no centro da quadra com as crianças, fazer chamada nominal e
perguntar sobre os faltantes ajudava a dar um início formal à atividade. Inferimos
que apesar de detectarmos práticas coercitivas, o ambiente das aulas de futsal era
mais reforçador do que coercitivo.
188
189
De fato, pudemos perceber que a ocorrência de comportamentos
inadequados nesta modalidade era bem inferior ao observado nas duas outras;
apesar disso, havia estratégias que, aparentemente, eram favorecedoras da eclosão
de comportamentos inadequados, aspecto que passou a ser alvo da intervenção da
pesquisadora. Também verificamos a ocorrência de objetivos amplos, o que impedia
S3 de saber o que esperar de seus alunos e, por isso, eventualmente, utilizar
práticas coercitivas. Assim, na intervenção atuou-se em relação a estes dois tópicos.
a) objetivos amplos Na pré-intervenção, pudemos constatar que S3 não
apresenta objetivos claros e suas aulas não são bem estruturadas. Não se consegue
detectar quais são os comportamentos que ele quer que seus alunos apresentem,
nem quais habilidades eles devem adquirir, e, por essa razão, muitos exercícios
pareciam não ter continuidade ou seqüência com outros.
A falta de clareza dos objetivos pode fazer com que o professor julgue um
comportamento como inadequado, quando efetivamente tal comportamento não
prejudica ou impede o desenvolvimento da atividade.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Se ele corre
rápido a fila toda tem
que correr. Futebol é
equipe”.
G responde em coro
“sim”.
P diz para os primeiros
da fila: “Corre maneiro”.
P diz pode sair.
G corre, mas depois da
primeira curva o fim da
fila já está separada do
começo.
G corre, mas depois da
primeira curva o fim da
fila já está separada do
começo.
P diz: “É para correr
todo mundo junto,
galera”.
G corre, mas não se
acerta.
P diz: “Pode parar
aqui”.
G chega até P e para. P diz: “Tem que fazer o
exercício correto, junto”.
P diz: “Tem que fazer o
exercício correto, junto”.
G observa P.
P diz: “quem está na
frente presta atenção se
a fila está junta, senão
corre mais devagar por
um tempo, quem está
atrás presta atenção
para estar sempre
junto”.
G observa P.
190
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Vamos tentar de
novo. Agora é pra valer
hein!”.
G sai correndo e as
fileiras vão juntas.
G sai correndo e as
fileiras vão juntas.
P observa.
G corre e conversa. P diz: “Se está
conversando é porque
está fácil. Então vamos
dar mais duas voltas”
G corre. P observa.
G corre. P diz: “Agora sim está
bom. Quando cruzar a
linha pode andar”.
G corre até a linha e
pára.
<...>
Este exemplo, retirado da primeira aula, pode nos mostrar uma incoerência no
comportamento de S3. Mesmo executando a atividade solicitada, S3 pune o grupo
acrescentando mais duas voltas ao aquecimento. No encontro de formação,
questionamos S3 o por quê da aplicação da punição. Numa primeira resposta, S3
diz que foi porque eles estavam conversando enquanto corriam. Ao ser questionado
sob a punição, quando a instrução não havia sido informada ao grupo, S3 olhou para
a pesquisadora, leu novamente a passagem e disse “sabe que agora que eu estou
lendo é que vi o quanto eu fui incoerente? Eu tinha mandado correr junto, não tinha
falado nada em relação à conversa, então por que eu puni a conversa?”. Neste
encontro, pela primeira vez conversamos sobre a necessidade de ter objetivos
claros nas atividades de ensino, salientando que é necessário que o professor tenha
clareza de quais os comportamentos que ele deseja alterar no aluno, para que sua
avaliação do desempenho do aluno também possa ser clara.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Antes de começar
vou falar de novo.
191
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Pois é. Mas por
que então fica um bolo de
gente correndo atrás da
bola e chutando a canela
do outro? Eu só quero um
chegando na bola e
outros marcando os
adversários. Os
adversários um com a
bola e os outros se
desmarcando para ficar
livre e pedir a bola.”.
G observa.
P diz: “Hoje vou marcar
falta quando isto
acontecer. Todo mundo
vai jogar”.
G observa.
No exemplo acima, exemplificamos para S3 que a punição está sendo
utilizada na emissão de comportamentos incorretos e não na emissão de
comportamentos inadequados. Salientamos que os alunos, em fase de
aprendizagem, executam as habilidades com muitas incorreções; tais incorreções
ocorrem até se chegar a uma aprendizagem efetiva.
b) estratégias utilizadas para o ensino de habilidades específicas um dos
focos da intervenção foi no sentido de levar S3 a perceber que um grande número
de comportamentos inadequados eclodia em momentos em que a estratégia da
atividade exigia das crianças a espera para realizar a atividade. Esta espera ocorria,
quase sempre, em exercícios em que as crianças ou eram dispostas em filas ou
faziam parte de times que tinham que esperar os outros jogarem.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Presta atenção.
Não adianta os dois
ficarem aqui esperando
a bola, um abre e o outro
recebe a bola, depois
passa”.
Os dois mudam de
posição e continuam
jogando. A2 que
espera sobe na grade.
A2 que espera sobe na
grade.
P olha para A2 e diz: “A2
não preciso nem dizer
não é?”
A2 olha para P e
desce.
P observa times
jogando.
Times jogam e A2
sobe novamente na
grade.
P apita o jogo e olha
para A2.
A2 desce da grade. P apita.
192
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 sobe na grade. P olha para A2 e diz: “Dá
para parar com o portão
que vai machucar. Se te
pegar de novo não vai
entrar”.
A2 solta a grade e o
portão.
P apita e observa times
jogando.
A2 volta para a grade. P diz: “A2 fica sentado
ali fica”.
A2 desce e senta do
lado do time.
P apita e observa times
jogando
P apita e observa times
jogando.
Time verde faz gol. O
time Amarelo, que
estava fora, corre para
a quadra. A2 corre
para a quadra.
P apita. Times jogam.
No exemplo, S3 primeiro ameaça com o olhar e, em seguida, vendo que o
comportamento não foi extinto, ameaça verbalmente com a retirada do coletivo.
Observamos que, em seguida, A2 repete o comportamento inadequado e S3 adverte
novamente e não cumpre a ameaça. Durante a intervenção, salientou-se que a
ameaça cessa momentaneamente o comportamento, mas não garante que este não
ocorra novamente; a ameaça não é eficiente para ensinar o comportamento
acadêmico que A2 deveria ter. O questionamento de S3 - se eu não devo ameaçar
e você diz que ameaça não ensina, o que devo fazer para ele não subir na grade?” –
indica que a ação coercitiva ocorre por desconhecimento de alternativas de atuação.
Salientou-se que seria mais efetivo achar soluções para fazer com que o
comportamento inadequado não fosse emitido (ele não subisse na grade), do que
propor formas de coibir o comportamento depois de acontecido.
S3 identifica que os comportamentos ocorrem porque eles não estão fazendo
atividades (estão esperando), o que crianças desta faixa etária não agüentam.
Argumentou-se que, se eles estivessem envolvidos em outra atividade,
provavelmente o comportamento não teria ocorrido. Talvez se o professor de apoio
ficasse fazendo alguma coisa com eles, trabalhando tática ou coisa assim, talvez
eles não ficassem subindo na grade,argumento que não foi eficiente, pois não
observamos mudanças nesta direção.
Para tornar menos provável a emergência de comportamentos inadequados,
considerou-se a possibilidade de encurtar os momentos em filas e, quando não
fosse possível, fazer com que a atividade fosse realizada mais vezes pela criança
193
com menor tempo de espera. Durante a intervenção verificou-se que S3 mudou a
forma de agir nas atividades realizadas em filas, no sentido de levar a criança a ficar
constantemente em atividade.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “quem perder o
colete senta do meu
lado, quem pegou
entrega o colete para
mim”
G vai dirigindo-se para
o meio da quadra.
P diz: “quero ver o colete
de todo mundo”
G vai mostrando o
colete colocado no
calção.
P diz: “valendo” G corre pela quadra.
Os alunos pegos vão
voltando e os alunos
que pegaram os
coletes vão trazendo
para P.
P vai devolvendo os
coletes para os alunos
que foram pegos.
Alunos vão retornando
para o jogo. G brinca.
P observa e devolve
coletes.
G brinca.
P diz: “Deu... Põem os
coletes aqui e senta no
centro”.
G reúne.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Os últimos de cada
coluna fazem uma nova
coluna aqui”
G se organiza.
P diz: “Atenção, vai sair
correndo até a linha
amarela. Corre de frente
bate a mão na linha, volta
de costas” <P vai
mostrando as linhas>
G observa.
194
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Agora vamos fazer
de novo”
G se prepara
P apita. G corre. .
G corre. P observa e diz:
“Vai, vai, vai”
G corre. P diz: “Agora é a
ultima vez. Tem que
dar tudo”
G se prepara. P apita.
P apita. G corre.
G corre. P observa e diz:
“Vai, vai, corre,
corre”
G corre. <...>
P diz: “Reúne. Pode sentar” G reúne no centro da
quadra.
No primeiro exemplo, observamos que S3 repõe instantaneamente os coletes
nas crianças que foram pegas; desta forma, as crianças não ficam paradas depois
que foram pegas pelo colega. Durante a reflexão sobre o ocorrido, S3 afirma:
“solucionei dois problemas, ninguém ficou parado atrapalhando ou brigando e eles
se aqueceram por mais tempo. Como vocês falam, evitei a eclosão de
comportamentos inadequados, pra mim ninguém me encheu a paciência.” No
segundo exemplo, S3 criou um número maior de filas, deixando um número menor
de crianças por fila (5 crianças), e ficou incentivando durante a atividade, o que fez
com que todos permanecessem envolvidos.
Em outro exemplo observamos que S3, quando usa o coletivo para motivar a
execução de uma atividade, esclarece o quanto eles estão perdendo de coletivo por
demorarem ou não se organizarem para a atividade.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P realiza o lançamento
para o segundo aluno.
A2 executa.
A2 executa. P diz: “Abre, Aí! Bom
chute".
G espera. A3 corre. P diz: "Vai A3".
A3 executa. P observa A3 e diz:
"volta é de chapa".
A3 volta e chuta. P observa e diz: "Volta é
de chapa, parte interna
do pé" (P demonstra).
A3 diz: "Ah! De
novo!".
P diz: "Lógico, você
sabe fazer".
A3 chuta de chapa. P diz: "Viu! Como você
sabe!".
195
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A3 corre atrás da
bola e devolve ao
grupo.
<...>
P olha para A4. A4 chuta
A4 chuta P diz: "Aí, bom!".
A5 e A6 que estão na
fila brigam pelo lugar.
P observa e espera.
A5 e A6 param de
brigar e olham para
P.
P diz para G: "se
continuar a bagunça
mais tempo a gente
perde de coletivo. Não
quero mais nenhum
empurra, empurra aí
atrás."
G executa atividade <...>
P diz: "Vamos trocar de
lado. Presta atenção.
Jogador de futebol tem
que saber chutar de
direita e esquerda. É
lógico que a gente
prefere um lado, mas
tem que aprender com
as duas pernas. Tem
alguém aí que não sabe
qual é a esquerda”. (P
demonstra).
G observa e mostra a
perna esquerda.
Tendo observado que S3 destacava o que os alunos faziam de errado,
sugeriu-se que ele poderia inverter salientando que, se fizessem a atividade
efetivamente e rapidamente, eles estariam ganhando mais tempo para o coletivo.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Vamos. Presta
atenção, nós vamos
fazer um pega-pega. Só
que é diferente. Eu vou
falar quem é para ser
pego. Se eu falar calção
azul, tem que pegar
quem está de calção
azul. Se eu falar calça.
Tem que pegar todo
mundo que está de
calça”
G observa., levanta e
dá pulinhos.
P diz: “è só para
encostar”
G diz: “Tá” G fica
conversando na
quadra.
G diz: “Tá” G fica
conversando na
quadra.
P diz: “Vamos galera!
Quanto mais rápido aqui,
mais rápido a gente vai
para o coletivo”
G vai se espalhando
pela quadra
rapidamente.
P diz: “Então vamos lá.
Todo mundo trotando”
196
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
G trota pela quadra. P diz: “chuteira amarela”
G corre e pega o
garoto de chuteira
amarela e também os
de camiseta amarela.
P diz: “Eu disse chuteira
amarela”
G ri. P diz: “Agora calça azul”
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
<...> Alunos colocam rede
nas traves de futebol.
Alunos colocam rede
nas traves de futebol.
P diz: “Boa, levou menos
que 2 minutos. Assim
vamos jogar muito”
Alunos sentam no
centro da quadra.
<...>
P diz: “Vamos fazer que
nem os grandes. Duas
colunas dois a dois.”.
G levanta, corre para a
lateral do campo e se
arruma em duas
colunas.
G levanta, corre para
a lateral do campo e
se arruma em duas
colunas.
P ajuda grupo na
organização das colunas.
G se organiza.
P diz: “Mantém o trote,
não precisa ultrapassar.
Cada um mantém o
ritmo”
G executa atividade
G executa atividade P diz: “Se precisar eu falo
para acelerar”.
G executa. Alunos
olham para trás???
P diz: “Olhando para
frente, por que ninguém
corre olhando para trás”
G executa.A1 diz:
“Quanto tempo P?”
P diz: “Se correr bem, em
dupla, organizado, corre
menos tempo e vamos
mais rápido para o
coletivo”
P diz: “Tudo certo?
Correndo”
G correndo.
G correndo. P observa.
P diz: “Corre batendo o
calcanhar atrás”
G executa atividade
G executa atividade P observa.
P diz: “Joelho elevado” G executa atividade
G executa atividade P observa.
P diz: “Bom, bom, bom.
Pode andar porque foi
bom demais”
G anda e sorri para P.
S3 mostra que se eles se organizarem e forem efetivos na realização, mais
tempo vai sobrar para o coletivo. Pudemos observar que, nestas duas atividades,
não houve a emissão de comportamentos inadequados, e, portanto, não foram
utilizadas práticas coercitivas. O próprio S3 afirma legal estas diquinhas que você
197
dá, não é que mude muita coisa, mas deixa a aula mais leve, mais gostosa”. Apesar
de não reconhecer grandes mudanças, S3 começa a diminuir o uso de práticas
coercitivas.
A seguir, serão abordados exemplos que evidenciam a mudança; há indícios
de que, com a intervenção, ele vai se tornando mais consciente de que usa coerção,
e de mudança em sua prática pedagógica, de forma a favorecer a ocorrência de
comportamentos acadêmicos incompatíveis com os inadequados.
Em relação ao uso de punição frente a comportamentos inadequados, S3
demonstra ter consciência de tê-la utilizado em algumas situações; no entanto,
também afirma a necessidade de reforçar comportamentos adequados, e, de fato,
isto é feito, como se mostrará posteriormente.
O primeiro episódio a ser relatado ocorreu na terceira aula da intervenção.
Alguns alunos do futsal chegavam por volta das 16h 30 min para esperar a aula, que
tinha início às 17 horas; neste horário, como sempre, a professora de voleibol ainda
estava ministrando sua aula. Algumas crianças (efetivamente cinco), que chegaram
mais cedo, entraram na quadra e ficaram chutando as bolas de vôlei, correndo,
invadindo a quadra e jogando futebol com uma garrafa PET. Quando a professora
de voleibol as expulsou da quadra, eles subiram até o parque e destruíram vários
tijolos que estavam para a obra que estava sendo realizada na creche. Por volta
das 17 horas, a rotina seguiu o padrão habitual das aulas de futsal; quando o
professor estava descendo para a quadra, todos os alunos, inclusive os cinco,
correram para o centro da quadra e alguns pegaram a rede para colocá-las na trave.
Quando o professor entrou na sala dos professores, encontrou a professora de vôlei,
que relatou o episódio. S3 desceu para a quadra com uma expressão muito ria
(mostrava-se bravo), reuniu a turma e conversou duramente com eles.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Eu vou perguntar
uma vez só. Quero ver
quem vai assumir.
Quem estava
atrapalhando a aula de
vôlei?”
G fica quieto e alguns
começam a dizer: “Foi ele,
foi ele” e as crianças que
iam sendo delatadas
diziam “Eu não, eu não” ou
“Eu cheguei agora”. <as
crianças que estavam na
aula de vôlei não se
acusaram>
P diz: “Alguém vem
chutar a bola de
vocês?”.
G olha para P e diz: “Não”.
198
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “E os tijolos que
estavam lá? É para
quebrar tijolos?”
G observa calado.
P diz: “Se vocês têm o
direito de quebrar o que
é deles, eles vão poder
vir aqui e quebrar o que
é de vocês”.
G observa e A1 diz: “Eu
não quebrei” <A1 foi uma
das crianças que mais
atrapalhou na aula de vôlei
e mais quebrou tijolos>
P diz: “Quantas vezes
eu já falei que não é
para atrapalhar a aula
de vôlei?”
G observa calado.
P diz: “Depois o
professor que é chato,
não deixa jogar, não
tem coletivo”.
G observa. <a maioria das
crianças faz cara de
descontentamento>
P diz: “Aí, pega tijolo na
cabeça e a gente faz
como? Não tem
ninguém para socorrer
nessa hora.”.
G observa e A2 diz: “Desde
o começo do ano essa já é
a sexta dura”.
P (apoio) chega no
grupo e fica ouvindo e
olhando para o grupo. P
diz: “Eu acho melhor
começar a mudar. Eu e
o P (apoio) não
agüentamos mais ouvir
reclamações de vocês.
Nós não gostamos de
dar bronca. Só aprende
tirando o jogo?”
G observa calado.
P diz: “Agora nós
vamos fazer assim. É
para chegar na hora da
aula de futsal e não
mais cedo, se chegar
mais cedo não é para
descer para a quadra,
fica no parquinho, mas
por favor não quebrem
nada. Vou pedir para a
P de vôlei anotar o
nome de quem está
atrapalhando e quem
for será cortado do
grupo.”.
G observa calado.
P (apoio) diz: “Nós
temos uma lista de
espera grande. Vamos
começar a colocar
quem quer treinar futsal
de verdade e não quem
vem aqui para
atrapalhar os outros.”.
G observa e conversa entre
si.
199
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P1 dia: “tem gente que
nem devia estar
ouvindo isso, mas grupo
é grupo, um responde
pelo outro”.
G observa.
P diz: “Hoje não vamos
ter coletivo e também
por causa disso só
parte física”.
Alunos fazem caretas
(demonstrando desagrado).
Na intervenção, S3 chega comentando sobre o episódio relatado no
primeiro trecho: Esta eu fiz bem consciente. Sei que puni, não dando o coletivo,
mas foi demais. Veja se eu raciocinei certo. Primeiro eles fizeram isso (atrapalharam
a aula e quebraram os tijolos) porque estavam sem atividade, como a gente
conversou antes; pra isso eu tentei resolver pedindo para eles chegarem no horário
ou ficarem no parquinho. Tudo bem que depois disse sobre a professora marcar o
nome, mas é o costume. Depois tirei o coletivo, puni não é?, Mas aí eu me liguei e ia
dar o coletivo, mas no fim pensei - Se eu der vou estar fazendo aquele negócio de
ameaçar e não cumprir. Então cumpri e, para a próxima aula, se eles não fizerem
bagunça, vou tentar reforçar este comportamento”. Fica claro que não a punição
foi consciente, mas também que ele julga necessário reforçar o comportamento
acadêmico dos alunos (o que será exemplificado no terceiro trecho).
Durante a intervenção, além de se tornar consciente de suas práticas, S3 vai
alterando a sua atuação, mostrando-se não apenas atento ao comportamento
adequado das crianças, o que fazia na pré-intervenção, mas passa a reforçá-lo
mais sistematicamente não apenas elogiando, mas possibilitando a realização de
coletivo (quase toda a aula), além de colocar a possibilidade de aumentar o período
do coletivo final de cada semana (toda 6ª feira).
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Boa tarde,
senhores.”.
G responde em coro:
“Boa tarde, professor”
P diz: “Quando é para
chamara atenção, a
gente chama, quando é
para dar parabéns, a
gente dá parabéns.
Parabéns senhores.
Pelas informações da
Professora de voleibol
vocês se comportaram
muito bem.”.
G observa, se mexe e
faz movimentos de
vitória.
200
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Isso sim que é
trabalho de equipe.
Quando alguém já ia
descendo, o outro
avisava e pedia para
ficar lá em cima.
Ninguém precisou ficar
chamando atenção.”.
G observa.
P diz: “Só que precisa
ser todo o dia assim, e
não daqui a duas
semanas começar a
bagunçar de novo. Cada
semana que a
professora de vôlei
disser que não teve
problema com as
crianças do futsal eu vou
aumentar 15 minutos do
último coletivo na
semana. Combinado?”.
G comemora.
P diz: “Hoje vamos
quase sair jogando.”.
G observa e diz: “eba,
eba”.
P faz chamada. G responde.
O exemplo mostra o que aconteceu na aula que se seguiu ao problema com a
aula de vôlei. A atuação de S3 (que propôs o aumento do coletivo atrelado à
permanência na quadra de futebol) foi eficiente, pois não ocorreram mais problemas
com a professora de vôlei, nem destruição de material, durante as outras sessões de
intervenção. S3 afirmou durante a intervenção “eu tentei colocar os 15 minutos para
mantê-los fora da bagunça”. Neste episódio, verifica-se que S3 está consciente das
instruções dadas e da necessidade de criar alternativas que inibam os
comportamentos inadequados dos alunos.
Um outro episódio, também trabalhado com S3, ocorreu nas aulas 5 e 6. A
instituição fora convidada para participar de uma série de jogos amistosos em uma
escola próxima. Para este amistoso eles teriam que fazer o deslocamento por
ônibus, usariam uniformes da instituição, contariam com alimentação e desfilariam
na escola. Tudo isso fez com que o evento causasse uma grande excitação nas
crianças. Para a categoria das crianças observadas seriam dois jogos, por isso os
professores optaram por levar apenas dois times, pois se todos fossem, muitos não
poderiam jogar e seria mais difícil mantê-los ocupados.
A escolha das crianças foi feita pelos professores, que levaram como critério,
nível de habilidade e conhecimento tático. Como eles estariam marcando novos
amistosos, garantindo a participação de todas as crianças em pelo menos um
201
202
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P vai chamando os
alunos e dividindo-os em
quatro times.
Alunos vão para os
locais indicados.
P diz: “Vamos começar o
coletivo com estes dois”.
Times escolhidos
levantam põem os
coletes e vão para a
quadra.
P apita. Times jogam.
No primeiro trecho, vemos que S3 explica para o grupo que nem todos
poderão ir para o amistoso, mas não deixa claro qual será o critério de escolha. S3
adverte o grupo de que os alunos que não forem escalados e saírem “chorando e
chutando” os colegas não irão nem num próximo amistoso. Ao apresentar este
trecho para S3, ele diz: Eu saquei que tinha levantado um ameaça que não
cumpriria, pois não teria coragem de não deixar algum garoto ir em pelo menos um
amistoso, daí tentei conversar levando de exemplo os jogadores convocados da
seleção
S3 percebe o uso de ameaça e tenta criar uma outra alternativa para o
evento. não sei se eles não brigaram por medo de não ir num próximo amistoso
ou por causa dos jogadores da seleção”. Durante a observação, pudemos verificar
uma conversa entre S3 e o Professor (apoio). Na opinião do Professor (apoio), na
aula 5, deveriam treinar apenas os times que iriam no amistoso. Quando levantada
essa hipótese para S3, ele discorda, justificando que: a) o objetivo maior deles não
era performance, então não precisavam excluir os outros do treino, e b) seria muita
punição para os que não foram escolhidos. não iam ao amistoso e na aula ainda
não iriam jogar também. Decidiram por manter o treino com todos os alunos. A aula
transcorreu bem; apesar de vários saírem tristes, não observamos a ocorrência de
nenhum comportamento inadequado. O amistoso ocorreu no final de semana e eles
perderam os dois jogos.
Na semana seguinte, aula 6, pudemos observar novamente indícios de que
S3 estava mais consciente de suas práticas. No início do treino, no momento em
que estavam no centro da quadra, a conversa que se ouvia das crianças era a de
que, como tinham perdido os amistosos, na aula eles fariam apenas treino físico.
Hoje só vai ter física porque perdemos o jogo, vamos correr que nem camelos” (A1).
É como se esperassem que, por terem perdido, seriam punidos com a realização de
exercícios e retirada do coletivo. O trecho, a seguir, mostra que isto não ocorreu.
203
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “No jogo de
domingo, o que faltou
para nós?”
G olha P e alguns
respondem “Tocar a
bola”
P diz: “Então vamos
fazer um exercício para a
gente melhorar o nosso
passe. Vamos começar
já desde o aquecimento
com bola”
G observa.
P diz: “Vai parar com a
bola no pé e tocar de
chapa para o colega”.
G observa.
P diz: “na hora do jogo
eu não vi fazer, então
vamos treinar bastante”.
G observa.
P diz: “Vamos ver um trio
fazer e depois todo
mundo faz”.
G observa., e começa a
falar e comentar entre
si o fato de não terem
que fazer só parte
física.
Verifica-se que S3 reuniu o grupo, conversou com eles sobre a suposta falha
para a derrota e começou o treino já trabalhando tal habilidade. Ao refletir sobre este
trecho, S3 afirma: Em outro momento da minha vida eu teria tirado o coletivo,
mas agora eu pensei mesmo no ginásio. - Em vez de punir vou trabalhar mais o
que falta.” O conteúdo da aula foi todo voltado para a troca de passe em
deslocamento. No final da aula, S3 ainda faz o coletivo com um possível reforçador,
a bola nova.
Num outro exemplo, logo após as primeiras intervenções, S3 passa a se
preocupar com o uso de possíveis reforçadores para aumentar a emissão de
comportamentos adequados, em vez de punir os inadequados.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P escolhe alunos para
escolherem os times.
G fica pedindo para
ser o escolhido.
P chama quatro
crianças.
Os escolhidos vão
para frente e
escolhem os times.
Os escolhidos vão para
frente e escolhem os
times. O aluno do time
amarelo fala para os
outros irem sentando e
ficando quietos e
sentados
P observa a escolha.
204
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
Alunos (do time
amarelo) sentam e
olham para P. Os
alunos do time vermelho
(que estão do lado)
percebem e fazem a
mesma coisa. Os outros
dois times têm crianças
em pé e conversando.
P observa a escolha.
Alunos (do time
vermelho) sentam e
ficam quietos.
P observa a escolha.
G acaba de escolher os
últimos.
P diz: “Atenção. Os dois
times que ficaram
sentados vão começar
jogando”
Os dois times correm
para a quadra, os outros
dois vão para o canto
da quadra.
Durante a intervenção, ao se deparar com este trecho, S3 comenta “não
precisei brigar com ninguém, apenas exaltei quem tinha feito o que era certo”.
Verificou-se ainda que S3 passa a ignorar os inadequados, sinalizando com
possíveis reforçadores para os adequados, como no exemplo, a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
Time amarelo faz gol. P apita.
P apita. Time amarelo fez gol e
fica na quadra. Time
Verde entra correndo
e o Vermelho sai. Um
aluno do Vermelho
começa a chorar
porque perdeu e tira o
colete e o joga no
chão.
Time amarelo fez gol e
fica na quadra. Time
Verde entra correndo
e o Vermelho sai. Um
aluno do vermelho
começa a chorar por
que perdeu e tira o
colete e o joga no
chão.
P se aproxima desse
aluno e diz: “Vamos A1,
uma hora se perde outra
se ganha”
A1 continua chorando
e reclama que nem
pegou na bola. Nem
uma vez só.
P sorri e diz: “É assim
mesmo A1”.
205
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A1 olha para P e sai
andando fazendo
careta (parece estar
bravo).
P diz: “Você já vai voltar
a jogar. Vem colocar o
colete. Já vou chamar,
quem estiver sem colete
não pode entrar e vou
chamar outro no lugar”.
A1 volta correndo para
P, pega o colete e se
atrapalha todo para
colocar o colete.
P ajuda A1 a colocar o
colete.
A1 começa a rir e diz:
“Já estou pronto juiz.
Desta vez você vai ver
o Ronaldinho em
campo”.
P olha para A1, passa a
mão na sua cabeça. P
apita.
Neste trecho, verifica-se que, diante do comportamento inadequado do aluno,
S3 ignora a inadequação e sinaliza com a possibilidade do jogo se o comportamento
adequado ocorrer. Ao ser apresentado este trecho para S3, ele comenta: Na hora
que vi A1 todo bravinho, jogando colete no chão e chorando resolvi inverter; em vez
de ameaçar dizendo que se ele não parasse não jogaria tentei mostrar que se ele
não estivesse pronto não daria pra voltar a jogar”.
Outro trecho mostra que S3 não permanece dando atenção ao
comportamento inadequado de um aluno, ao contrário atenção aos
comportamentos dos alunos executando as atividades propostas.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Correndo todo
mundo atrás um do outro
não adianta”.
Times jogam.
Times jogam. Um
aluno chora na grade.
P observa e diz: “O que
acontece aqui?”
A4 diz: “Eu não quero
catar no gol.” A4
chora
P diz: “Não precisa
chorar. Uma hora é um,
outra hora é outro. Esta
vez é você”
A4 olha para P e diz:
“Eu não vou”
P diz: “Aquela vez você
catou bem no gol”.
A4 olha para P. <...>
Times jogam P observa jogo.
Times jogam. Time
amarelo faz gol.
P diz: “Boa bola. Troca”
Time verde entra,
mas A4 não entra
para o gol.
P diz: “Você não vai no
gol? De qualquer
maneira você es
jogando. O time é feito
por todos”
A4 olha e diz: “Não
vou”
P diz: “Então vou por
outro no seu lugar”
206
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A4 observa P. e
chora.
P chama outro garoto.
A4 olha para P. e
chora. Times jogam.
P observa jogo.
Times jogam. P observa jogo.
A4 vai até P e diz:
“Posso entrar?”
P diz: “Agora só no
próximo jogo”
Times jogam.
A4 fica olhando o
jogo.
P observa.
Durante a intervenção, o comentário de S3 indica que ele atua no sentido de
não reforçar comportamentos inadequados. Eu tentei explicar e colocá-lo no jogo,
mas o ia ficar esperando... , então coloquei outro no lugar. Quando ele percebeu
que eu não ia colocá-lo na quadra em outra posição e não dei bola pro choro, ele me
pediu pra voltar. eu disse “na próxima você entra”, não é quando ele quer. Na
outra partida ele entrou e jogou super bem no gol”.
Um novo exemplo mostra que S3 tem consciência de que a atenção ao
comportamento inadequado reforça tal comportamento, daí procurar ignorá-lo,
procurando outras alternativas para envolver o aluno na atividade.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P apita. Times jogam. Um aluno
do time vermelho chuta
e a bola acerta no rosto
de A2 que cai na quadra
Times jogam. Um
aluno do time
vermelho chuta e a
bola acerta no rosto
de A2 que cai na
quadra
P vai até o local.
A2 chora com o nariz
sangrando.
P diz: “Calma que é
coisa de jogo. Pode
chorar porque dói, mas
acontece em jogo”
A2 olha para P e diz:
“Vou morrer?”
P diz: “Nada campeão.
Vamos por gelo.
Jogador é assim cai,
machuca, concerta e
volta”
A2 olha para P. P diz: “Vai colocar gelo
com P (apoio) e se der
volta”
A2 vai por gelo com P
(apoio)
<...>
A2 volta com P
(apoio). O nariz não
sangra mais.
P diz: “Quer voltar ou
está doendo?”
207
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
A2 diz: “Jogador não
pára, vou voltar,
preciso ajudar minha
equipe”.
P diz: “Muito bem é
assim mesmo que os
profissionais fazem”
Aluno sorri e volta
correndo. Amigos vão
cumprimentá-lo.
<...>
P apita. Times jogam.
Durante a intervenção, S3 afirma: A2 já é charmoso, se a gente ainda ficasse
paparicando é que não dava certo, quando você leva a solução e não fica
mimando muito a coisa acontece melhor. Parece que o que eles querem mesmo é
atenção, então tem que dar atenção no limite certo, senão vira coisa de mãe.
No próximo exemplo, que ocorreu na aula 10, verifica-se que a atuação de S3
vai além, pois ele atua no sentido de que o comportamento inadequado não
apareça.
PROFESSOR ALUNO ALUNOI PROFESSOR
P vai chamando os
nomes dos alunos para
formarem os times.
Alunos vão levantando
e se posicionando atrás
“dos cabeças de times”.
P diz para os cabeças
de times: “cada um
pega uma cor de colete
e distribui para os
colegas”
Alunos levantam e vão
correndo pegar os
coletes.
P diz: “Antes de entrar
na quadra já escolhe
quem vai ser o primeiro,
segundo terceiro e
quarto goleiro para
depois não ter problema
de não querer. O
combinado não é caro.”.
G conversa entre si.
P diz: “O Brasil tá fora
ou dentro da Copa?”
G responde em coro
“Fora”
Ele pede para que os times combinem antes quem vai ser o goleiro e, desta
maneira, evita que o comportamento inadequado venha a acontecer. Um aspecto
salientado durante a intervenção, e que S3 parece ter incorporado, é que instruções
claras favorecem a ocorrência dos comportamentos acadêmicos; assim, quanto mais
claras forem as instruções menos chances de eclodirem comportamentos
inadequados.
Podemos inferir, por esse conjunto de exemplos, que S3 vai, com o passar
das intervenções, passando a ter práticas reforçadoras para comportamentos
208
adequados, chegando mesmo a atuar no sentido de evitar que comportamentos
inadequados surjam. Esta alteração nas práticas de S3 surte efeito porque
verificamos diminuição na emissão de comportamentos inadequados por parte dos
alunos. Tanto que, a partir da intervenção 7, tivemos dificuldades de elencar práticas
em relação a comportamentos inadequados dos alunos.
Pós-intervenção
De forma similar à pré-intervenção, foram observadas três aulas de S3, sem a
intervenção da pesquisadora, a fim de que pudéssemos verificar se as mudanças
ocorridas durante a intervenção se mantinham, passando a fazer parte do repertório
de S3. Como salientado anteriormente, a pós-intervenção ocorreu no mês de
agosto, portanto após um período de 28 dias, por problemas na instituição. As aulas
foram observadas em seqüência cronológica.
Nas aulas de pós-intervenção pudemos perceber que S3 continua sob
controle dos comportamentos acadêmicos dos alunos. S3 elogia individualmente
constantemente, dicas, demonstra e solicita demonstração das crianças. Embora
tal atuação já ocorresse antes da intervenção, vale ressaltar que tal prática se
mantém e se torna mais sistemática.
Pudemos perceber que a maior mudança de S3 deu-se em relação à
utilização de práticas coercitivas, diminuindo sua ocorrência, principalmente de
ameaças para comportamentos inadequados, e criando situações para evitar a
emissão de tais comportamentos. Tendo em vista as mudanças na dinâmica da
aula, suas reflexões sobre seus comportamentos durante a intervenção, mesmo que
o planejamento ainda não esteja ocorrendo formalmente, verifica-se que S3 está
criando condições mais adequadas para que o aluno tenha possibilidade de
aprender movimentos/ habilidades motoras da modalidade futsal.
Por exemplo, quando S3 altera a estratégia passando de duas para quatro
colunas, ele faz com que o número de repetições por aluno aumente e que o tempo
de espera na fila diminua sensivelmente (e, com isso, diminui os comportamentos
inadequados). Na s-intervenção, pudemos perceber que S3 passou a trabalhar
quase que continuamente com quatro ou mais filas.
Também houve alteração em relação ao uso de ameaças de retirar o aluno do
jogo coletivo, quando havia ocorrência de comportamento inadequado.
Diferentemente, ele passa a utilizar o coletivo como reforçador para comportamentos
209
acadêmicos. Mas, o só. Também para melhorar a eficiência do movimento, como
se observa no exemplo a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P diz: “Vamos fazer um
exercício muito difícil,
mas muito legal. Presta
atenção. Senta todo
mundo aqui”.
G senta na frente de P.
P diz: “Quatro colunas, a
bola vai ficar parada na
frente, tem que correr
com a bola controlada no
pé e quando chegar nesta
linha chutar para o gol”
G observa.
P diz: “Cada gol soma um
minuto a mais para
coletivo. Só vai valer o gol
se a corrida for certa”
G balança os braços em e
diz: “viva”
P diz: “vou ficar aqui
observando”
G levanta e se organiza.
P apita. Os primeiros de cada
coluna saem com a bola
nos pés, chutam e erram o
gol.
Os primeiros de cada
coluna saem com a
bola nos pés, chutam
e erram o gol.
P diz: “Está bom, só
faltou um pouco de
mira, corre na fila que
já vai de novo”
Alunos voltam,
deixam a bola na
posição e voltam
para a coluna
P observa.
Alunos executam,
muitos fazem gols
P vai observando e
contando o número e
gols.
P vai observando e
contando o número e
gols.
G senta na frente de
P.
P diz: “Assim só vai ter
coletivo, nunca vi tanto
gol. Vamos adicionar o
tempo de 10 minutos no
nosso coletivo. Parabéns”
G bate palmas para eles
mesmos.
P diz: “Vamos dividir para
o coletivo”
G balança as mãos.
O trecho acima mostra que, diferentemente da pré-intervenção, S3 utiliza o
coletivo para levar os alunos a apresentarem de forma mais efetiva habilidades, ao
propor minutos extras de jogo, premiando a eficiência em determinada habilidade
(controle da bola). Como o exercício era difícil, achei que iam fazer poucos gols,
pensei, vou colocar um minuto extra de coletivo para estimular eles. Nossa! Foi um
210
chuva de gols. É incrível como esse negócio funciona com eles. Falou aumento de
coletivo, eles fazem bem feito
As alterações na atuação de S3 fazem com que a ocorrência de
comportamentos inadequados diminua consideravelmente, tanto que nas três aulas
da pós-intervenção verificamos apenas a emissão de um episódio de
comportamento inadequado, que foi corretamente administrado, conforme
apresentado, a seguir.
PROFESSOR ALUNO ALUNO PROFESSOR
P pede para quatro
alunos sentarem na
frente para dividirem os
times.
Os quatro se levantam
e vão sentar na frente.
P divide as equipes. Alunos vão sentando
nos times. Alguns
alunos reclamam para
o time que vão sendo
mandados.
P divide. Alguns alunos riem de
um time. <considerado
mais fraco>
P diz: “Quem está rindo
dos outros, cuidado,
porque todo mundo
falava da grande
seleção brasileira, de
todos os grande atletas,
dos melhores do
mundo e quem chegou
entre os quatro foi
Portugal, que ninguém
falava nada e era
considerada uma
seleção fraca.Futebol
se ganha na quadra”
G olha para P e pára de
rir.
P diz: “Começa jogando
Amarelo e bege”
Times correm para a
quadra.
Verificamos que S3, ao perceber que os alunos estão rindo de um time mais
fraco (comportamento inadequado), ao invés de ameaçá-los com a não participação
do coletivo, adverte-os, apresentando um exemplo atual e de grande repercussão
para eles (a derrota na copa do mundo). O exemplo foi muito adequado porque,
nesta aula, o time considerado mais fraco ganhou algumas partidas e recebeu o
apelido de Portugal.
Em suma podemos afirmar que S3 foi o sujeito da pesquisa que menos
apresentava o uso de práticas coercitivas e foi o que mais conseguiu apresentar
211
alteração na sua prática educacional na questão dos comportamentos inadequados.
Em todas as intervenções S3 foi o sujeito mais participativo e o que mais trazia
questionamentos e propostas de intervenção. O resultado foi uma melhora na
qualidade de sua aula e, conseqüentemente, os alunos apresentaram
comportamentos acadêmicos, praticamente sem a ocorrência de comportamentos
inadequados, o que favorece a aprendizagem daquilo que está sendo ensinado.
212
Considerações Finais
213
graduados jogam com iniciantes e, nos jogos amistosos, propostos por S3,
alternância dos alunos para a composição das equipes, sendo que todos participam
de campeonatos, ao longo do ano. Se considerarmos que o objetivo do ensino
dessas modalidades, na instituição, é o ensino de habilidades que desenvolvam o
movimento corpóreo dos alunos, e não a exigência de níveis elevados de
performance, constata-se que as práticas dos professores correspondem ao
esperado.
No entanto, verificou-se que, ao focar o desenvolvimento de habilidades, os
professores apresentavam práticas educativas coercitivas, aspecto denunciado, por
Skinner (1972a) e que a literatura indica ser ainda comum na área de Educação
Física, Cillo (2002), Weinberg e Gould (2001) e Martin (1983). Como salientado
pelos autores, o uso de práticas coercitivas no esporte e na aprendizagem de
movimentos são comuns na área de Educação Física, pois os profissionais
acreditam que, com a apresentação de conseqüências coercitivas, é possível levar o
aluno a apresentar as respostas desejadas.
No entanto, tais práticas, como destacado por Skinner, não são produtivas,
porque não facilitam a aprendizagem e geram subprodutos perniciosos, como, por
exemplo, fuga, esquiva, contra-ataque e emoções e sentimentos indesejáveis.
Assim, propostas de intervenção que promovam a formação do professor no
sentido de levá-lo a desenvolver as atividades pedagógicas em um contexto
reforçador, e não coercitivo, são necessárias.
Comportamentos inadequados e incorretos – alvo das práticas coercitivas
Observar as práticas educativas dos docentes, no seu cotidiano de ensino, permitiu
identificar interações pedagógicas tanto produtivas, quanto interações em que havia
a utilização de práticas coercitivas. Chamou-nos a atenção a percepção dos
momentos em que os docentes apresentavam comportamentos que indicavam estar
sob controle dos comportamentos acadêmicos dos alunos. Após propor as
atividades, os professores acompanhavam sua realização, fornecendo aos alunos o
feedback sobre o desempenho. É possível observar a inter-relação entre o proposto
pelo professor e o realizado pelo aluno, como momentos produtivos no
desenvolvimento das aulas.
214
Pudemos identificar, também, na pré-intervenção, que os três professores
faziam constante uso de práticas coercitivas. Isso poderia parecer contraditório,
que, como salientado, mostravam-se preocupados com a aprendizagem dos alunos.
Indagando sobre as circunstâncias frente às quais havia a utilização de tais práticas,
detectou-se o uso de práticas coercitivas em três situações: a) na ocorrência de
comportamentos inadequados pelos alunos. Por exemplo, quando o professor, na
tentativa de eliminar tais comportamentos, ameaça de e/ou realiza a retirada do
aluno da aula ou de uma determinada atividade; b) na ocorrência de
comportamentos incorretos. Por exemplo, o professor impinge uma condição
aversiva (realização de abdominais) ao aluno, por executar o movimento errado, e c)
como forma de “motivar” a turma. Por exemplo, o professor ameaça, com uma
possível condição aversiva, o aluno que não se engaja nas atividades, para fazer
com que os demais se empenhem ainda mais na atividade que estão realizando.
Frente a comportamentos inadequados, os três professores utilizavam-se de
ações coercitivas. A prática mais utilizada era a ameaça de retirada do aluno da
atividade mais reforçadora da aula (jogo, nas aulas de vôlei e futsal, e roda, na
capoeira). Apesar de a ameaça de retirar reforçador não diminuir a emissão de
comportamentos inadequados em momentos posteriores, sua eficácia imediata era
observada, do que inferimos que o efeito imediato era o que controlava o uso de
ameaças e/ou a efetivação de punição pelo professor. Como salienta Millenson
(1967), a punição acaba sendo muito utilizada, não por que funcione bem (mudando
a probabilidade de ocorrência futura do comportamento), mas porque tem efeito
imediato, de cessar o comportamento inadequado, que tem efeito negativamente
reforçador para a pessoa que administra a punição, no caso o professor.
Vale fazer referência ao alerta Skinner (1972a), de que o professor pode
despender boa parte de seu tempo estabelecendo interações inadequadas com
seus alunos, em vez de relações acadêmicas produtivas, por desconhecer os efeitos
do controle aversivo e sua ineficiência na aquisição de novos e desejáveis
comportamentos.
Ficou evidente que punir comportamentos inadequados não produziu os
comportamentos desejados e também ficou claro que outras práticas, adotadas
pelos professores, foram ineficazes para a diminuição da emissão daqueles
comportamentos, como, por exemplo, pedir para que permanecessem sentados ou
fazer acordos para que aguardassem um determinado horário.
215
Se punir um comportamento indesejado não garante a ocorrência do
comportamento desejado, também “fazer combinados para permanecer esperando o
momento adequado”, ou “conversar com o aluno”, por exemplo, não têm o efeito
esperado pelo professor. Esse ponto é muito importante porque, cotidianamente,
professores alegam que, diante de comportamentos inadequados, atuam
“conversando para conscientizar o aluno a não agir daquela forma novamente”. Ora,
essa alegação se fundamenta na suposição de que diminua a ocorrência de
comportamento similar no futuro; no entanto, tal como ocorre com a punição, o efeito
de tais práticas parece ser apenas imediato e fugaz.
Em relação ao uso de práticas coercitivas para corrigir comportamentos
incorretos, pudemos observar que os professores usam, embora em menor
freqüência do que em relação aos comportamentos inadequados, quando os alunos
executavam o movimento errado. Vale relembrar que, apesar de identificar o uso
desse tipo de prática pelos três docentes, com um deles essas práticas eram
comuns.
Segundo Weinberg e Gould (2001), muitos técnicos e professores acreditam
que, punindo seus atletas/alunos, podem eliminar tais erros, pois supõem que, se os
alunos/atletas temerem os erros, eles se esforçarão mais para acertar. Entretanto,
comungando com por Skinner, os autores enfatizam que devem ser reforçadas as
aproximações dos movimentos corretos, salientando que, quando um aluno está em
processo de aprendizagem, ao realizar o movimento solicitado, apresenta tudo o que
tem condições de fazer. Muitas vezes, o resultado da habilidade está fora do
controle do executante e, por essa razão, punir o resultado da ação é ineficiente. O
educador deveria, segundo os autores, focar-se no desempenho do aluno, em vez
de no resultado do desempenho.
Finalmente, nota-se o uso de práticas coercitivas com o objetivo de “motivar”
os alunos. Verificamos que um professor, em especial, apresentava tais práticas
com maior freqüência, muito provavelmente na crença de que o aluno iria se
esforçar mais. Segundo Weinberg e Gould (2001), os alunos não atingem seu
potencial nessas situações, porque as práticas coercitivas não desenvolvem
motivação interna para que se esforcem consistentemente, porque os alunos
procuram apenas evitar a punição.
216
Fatores relacionados à ocorrência de práticas coercitivas
A ocorrência de práticas coercitivas evidenciou-se como decorrente da
inabilidade dos professores no desempenho de sua função. Pôde-se observar que
determinados contextos das aulas favoreciam o aparecimento de comportamentos
inadequados e, consequentemente, do uso de práticas coercitivas. Verificou-se que
algumas condições propiciavam a eclosão de comportamentos inadequados nas
aulas: a) a falta de organização durante as atividades de ensino; b) o uso freqüente
de filas; c) o número excessivo de informações nas instruções; d) a falta de
planejamento das aulas; e e) a atenção do professor consequenciando
comportamentos inadequados e não os comportamentos acadêmicos.
A falta de organização das aulas foi observada principalmente em relação a
um dos professores, cuja aula mostrou-se confusa: sem um horário oficial de início,
sem a delimitação de turmas; sem regras ou procedimentos que impedissem a
interferência de crianças de outros grupos; enfim com ambiente propício ao
aparecimento de comportamentos inadequados.
Como contraponto, verificou-se que nas aulas de outra modalidade (futsal), as
atividades se desenvolviam de forma muito organizada. Havia uma rotina inicial,
seguida pelos alunos (sentar no centro da quadra, cumprimentar o professor,
responder à chamada, receber as instruções sobre o aquecimento e início da
atividade), e uma rotina final (o próprio professor levava o grupo de alunos para o
lanche, enquanto a aula de outra turma tinha início). Praticamente não havia, nessa
modalidade, a emissão de comportamentos inadequados, o que pode ser
considerado mais um indicador de que a organização da aula ajuda a inibir a
eclosão de comportamentos inadequados.
Um outro contexto que parece favorecer a ocorrência de comportamentos
inadequados, e consequentemente do uso de práticas coercitivas, é o de atividades
envolvendo fila. Em duas modalidades, nessa situação, verificou-se o surgimento de
comportamentos inadequados. Numa das modalidades, notou-se a disputa entre os
alunos pelos primeiros lugares, e, nas próprias filas, durante a espera para a
realização das atividades.
Interessante destacar que comportamentos inadequados pareciam estar
sendo reforçados, em alguns alunos, a despeito de os professores aplicarem
práticas pretensamente coercitivas. Como destacado por Skinner, o professor pode
contribuir, inadvertidamente, para o fortalecimento do comportamento indesejado do
217
aluno, mesmo fazendo uso de práticas que poderiam ser, para outros alunos,
punitivas. Também Weinberg e Gould (2001) advertem que o professor pode acabar
reforçando involuntariamente os comportamentos indesejáveis do aluno exatamente
por dar atenção a ele. De fato, verificou-se que, apesar de o professor chamar a
atenção, ameaçar de retirada da aula ou da atividade, alguns alunos permaneciam
com comportamentos inadequados, chegando inclusive, em alguns casos, a
comentar sobre a atenção recebida. Pode ser que a crítica fosse a única forma de o
aluno conseguir a atenção do professor e, nesse sentido, as práticas acabavam
sendo reforçadoras do comportamento que deveriam eliminar.
Em relação à ocorrência de comportamentos incorretos, frente aos quais
havia o uso de práticas coercitivas, foram identificados fatores que pouco favoreciam
interações pedagógicas produtivas.
Um fatores está relacionado ao uso de instruções com muitas informações. O
elevado número de informações pode ser dificultador da performance do aluno,
que vários alunos demonstravam não se recordar da seqüência para a realização da
atividade. Um segundo fator diz respeito ao grau de clareza das instruções, que;
especialmente em uma das modalidades, a não clareza das instruções leva à
repetição constante das mesmas informações. Um terceiro fator diz respeito à
complexidade das atividades propostas. As atividades muito complexas,
comparativamente ao nível de habilidade dos alunos faz com que a possibilidade de
um aluno ser reforçado seja pequena, pois, para o aluno ser consequenciado
positivamente pelo desempenho, ele precisa executar um amplo conjunto de
movimentos.
A literatura indica que é importante que o professor reforce a ação do aluno
logo após ele se comportar da maneira esperada. O professor deveria apresentar
uma conseqüência que aumentasse a probabilidade de que a ação voltasse a
ocorrer, uma conseqüência reforçadora. Principalmente, no momento de
aprendizagem de uma nova habilidade o reforço ganha uma ênfase maior, pois, com
afirmam Weinberg e Gould (2001), é nesse período que é fácil perder a confiança,
se a habilidade não for executada corretamente. Com a utilização do reforço
imediato, a resposta é fortalecida e, consequentemente, a aprendizagem é
efetivada.
Skinner (1972a) afirma que a educação se constitui em ação planejada, pelo
professor, destinada ao aluno. Essa ação deve proporcionar, ao aprendiz, a
218
aquisição e/ou o aprimoramento de repertório comportamental variado, tornando-o
capaz de agir (no presente e em tempo futuro) sobre si mesmo, seu grupo social,
sua realidade e sobre a cultura, de maneira geral. Em outras palavras, para a
abordagem comportamental, o ato de planejar o ensino é uma prática educativa
indispensável a todos os profissionais da educação que tenham como compromisso
o aprendizado dos alunos.
Destacamos, a seguir, outros indicadores de que, de fato, os objetivos, em
termos dos comportamentos a serem emitidos pelos alunos, não dirigiam a atuação
dos professores pesquisados. Embora planejassem por escrito suas atividades, o
planejamento parece ser mais o cumprimento de uma norma da instituição, pois
nenhum dos professores utiliza efetivamente esse instrumento em suas aulas, bem
como não indicadores de que eles usassem seqüências de atividades
anteriormente planejadas. Dois dos professores definem planejamento como uma
ação necessária para efetivar a aprendizagem, e afirmam que o planejar é uma ação
para que o professor escolha os seus conteúdos para a aplicação na turma.
Entretanto, não relacionam o planejamento aos objetivos, nem informam quais
comportamentos desejariam que seus alunos adquirissem. Pudemos verificar que
ambos associam o planejar à execução de suas próprias ações, e não às ações que
deveriam ser apresentadas pelos alunos. O outro professor descarta o
planejamento, justificando que para ele não necessidade de planejar em vista de
sua longa prática, na modalidade esportiva que ministra. Nota-se que, para ele,
planejar está baseado nas ações do professor (já que ele sabe o que fazer); e, em
sendo assim, os objetivos não seriam entendidos como os comportamentos que
deveriam ser adquirido pelos alunos.
Conforme a literatura indica (Skinner, 1972a; Hall, 1973; Catania, 1999 e
Zanotto, 2000), para o Behaviorismo Radical, o ensinar está intimamente
relacionado com o planejar contingências de reforçamento. para possibilitar que a
aprendizagem ocorra de modo mais eficiente. Zanotto (2000) afirma que um ensino
cuidadosamente programado possibilita agilizar e maximizar as mudanças nos
comportamentos pretendidos e que a falta de tal planejamento pode fazer com que
tais mudanças ocorram muito lentamente ou até não ocorram. Para tanto, é
necessário saber qual comportamento o professor quer que seu aluno apresente,
para daí arranjar determinadas contingências de reforçamento.
219
Como salientado por Skinner (1972a), os objetivos devem ser expressos em
termos de comportamentos do aluno, isto é, deve haver a explicitação das ações a
ocorrer, de modo a possibilitar o estabelecimento das condições (antecedentes) que
as propiciam, bem como as conseqüências para tais ações. O planejamento deve
estar centrado nos comportamentos que o professor quer que seu aluno adquira e
não nas ações dos professores, pois como ressalta Zanotto (2000) o primeiro passo
para “arranjar contingências de ensino” é ter clareza das mudanças
comportamentais que se quer obter.
No caso dos professores analisados, verificou-se que eles não têm clareza de
quais comportamentos eles querem que seus alunos adquiram. Desta maneira, o
ensino torna-se assistemático, que impedimento não para avaliar se os
alunos estão se aproximando do que era esperado, como também para identificar as
falhas do próprio professor, impossibilitando a revisão do trabalho. A falta de
responsabilidade daquele que ensina em relação ao processo e ao produto de seu
trabalho propicia a atribuição de culpa aos alunos. De fato, os três professores
analisados, em algum momento durante o processo de intervenção, culpam seus
alunos por não conseguirem “aprender”. “A turma é muito bagunçada, ninguém
aprende nada. Se eles ficassem quietos eles aprenderiam, mas ninguém nem me
ouve(S1) ou A culpa não é minha, acho que eles têm tantos problemas fora
que é demais eu ainda querer que ele faça uma ginga correta (S2), Eles não
conseguem aprender porque fazem muita bagunça” (S3)
Enfim, verificou-se que os professores não têm claro o que esperar do aluno e
a falta de clareza pode ser considerada um dos fatores relacionados ao uso de
práticas coercitivas pelos professores.
Mudando as práticas educativas dos professores a contribuição a partir da
abordagem comportamental
Como visto, a literatura indica que os professores e profissionais de Educação
Física utilizam práticas coercitivas durante as atividades de ensino e que tais
práticas não promovem interações pedagógicas produtivas, o que também foi
constatado em nosso estudo.
Entretanto, não se pode culpar exclusivamente o professor, pela forma como
atua, pois seu desempenho está de acordo com sua formação e, como afirma
Skinner, é notória a negligência em relação à formação docente no que diz respeito
220
aos métodos de ensino. Nesse sentido, o necessárias propostas que forneçam
parâmetros para que o professor avalie e reveja suas ações e os procedimentos
adotados ao ensinar.
Nos encontros durante a intervenção, procurou-se valorizar as ações dos
professores envolvidos em interações acadêmicas produtivas, além de levá-los a
distinguir interações produtivas e interações que envolviam práticas coercitivas.
A valorização das interações pedagógicas produtivas teve o efeito esperado:
continuaram a ser implementadas, passando a ser mais freqüentes. Vale destacar
que, a partir da intervenção, o professor passou a reforçar o engajamento do aluno
na tarefa e quando o desempenho em uma atividade era o esperado, o professor
apresentava conseqüências reforçadoras, sob a forma de elogios e mostrando sua
satisfação por sorrisos e gestos. Quando o desempenho não era o esperado,
solicitava que a atividade fosse refeita. O professor tanto reforçava individualmente o
aluno, quanto passou a apresentar reforçamento positivo coletivo, como, por
exemplo, aumentando o tempo de jogo coletivo para o grupo.
Em relação ao uso de práticas coercitivas, a intervenção foi no sentido de
levar o professor a identificar suas ações e as circunstâncias frente às quais
ocorriam essas práticas, os efeitos que produziam nos comportamentos dos alunos;
finalmente, discutia-se com o professor forma alternativa de atuar, envolvendo
conseqüências reforçadoras. Como o próprio Skinner adverte, somente retirar o
controle aversivo não vai resolver os problemas no caso, comportamentos
inadequados e incorretos e a falta de “motivação” dos alunos -, como se fosse um
passe de mágica. O que deve ser feito é uma tentativa de levar o professor a
compreender os eventos relacionados a essa situação, a fim de prepará-lo para lidar
com ela da melhor forma possível. Em vista disso, o processo de intervenção
envolveu o apenas focalizar as práticas coercitivas, mas também os
procedimentos pedagógicos (os métodos de ensino), que os comportamentos
inadequados e incorretos, e até a “motivação”, frente aos quais práticas coercitivas
eram aplicadas, tinham interferência de tais procedimentos.
A intervenção mostrou-se eficiente, que houve alteração das ações dos
professores, no sentido de criar um ambiente reforçador, e não coercitivo. Verificou-
se que os três professores diminuíram o uso de ameaças frente a comportamentos
inadequados. Além disso, os professores começaram a criar situações que eram
incompatíveis ou minimizadoras da emissão de comportamentos inadequados pelos
221
alunos, e passaram a apresentar conseqüências reforçadoras para comportamentos
acadêmicos.
Dois exemplos mostram que as atividades reforçadoras não envolvem
necessariamente trabalho extra para o professor; ao contrário, é possível aproveitar
as atividades que fazem parte do cotidiano da modalidade. O primeiro quando, ao
invés de ameaçar o aluno que chutasse a bola (comportamento inadequado), o
professor pede que a bola seja devolvida em forma de saque (atividade reforçadora).
Em outro exemplo, o professor passa a incluir, na atividade, que é executada ao final
da aula de uma turma, os alunos da turma posterior, que chegavam mais cedo. A
inserção ocorria como forma de acompanhamento rítmico, sem impedir que a
atividade fosse desempenhada a contento pelos alunos da turma que finalizava a
aula.
Um fator que contribuiu para a diminuição na emissão de comportamentos
inadequados foi a organização da turma. Para uma das modalidades, a
desorganização das turmas pareceu ter sido o fator que mais contribuía para a
eclosão de comportamentos inadequados. A definição de regras para a composição
das turmas, e, consequentemente, a organização dos horários, fez com que as aulas
apresentassem um ambiente muito mais propício à emissão de comportamentos
acadêmicos pelos alunos.
Algumas modificações foram observadas em relação às filas. Ao longo das
intervenções, verificou-se que, em algumas aulas, o professor diminuiu o tamanho
das filas, aumentando o número das mesmas; trabalhou as atividades com formação
diferente; alterou a escolhas dos primeiros alunos das filas; enfim, implementou
alternativas, o que levou à, diminuição dos comportamentos indesejados.
A alteração na atuação do professor foi evidenciada também em relação ao
comportamento acadêmico. Mesmo o docente que, no período da pré-intervenção,
praticamente não reforçava a emissão do comportamento acadêmico esperado, com
o passar das sessões de intervenção, passa a atuar nessa direção. Mais importante,
ele passa a criar condições que favorecem a emissão correta do comportamento, ao
propor atividades mais compatíveis com a possibilidade de desempenho do aluno;
exigir menor número de passos, numa seqüência de comportamentos, e alterar as
instruções, deixando-as mais claras e com menos informações.
O tipo de instruções sobre as atividades mostrou-se essencial. Tais instruções
podem ser relativas ao conjunto das atividades a serem realizadas durante a aula ou
222
relativas a uma dada atividade, que estava sendo desenvolvida. Conforme exposto
por Smith (1994), o fornecimento da instrução é de grande relevância, pois quando o
professor explicita, para um aluno ou para a turma, como deve agir em determinada
circunstância, está ensinando como espera que seus alunos se comportem em
relação a certos aspectos do ambiente. As instruções podem descrever o
comportamento que o aluno deve apresentar (como fazer) e podem especificar as
relações de contingência para o comportamento (o porquê fazer e em que ocasiões).
Assim, é possível afirmar que dar instruções adequadas, tanto na quantidade quanto
na clareza, aumenta a chance de que o aluno, sabendo o que é dele esperado, se
engaje na atividade.
O exemplo de um professor(a), em especial, mostra claramente o que é
defendido por Skinner (1972a) - a aprendizagem do aluno depende diretamente do
ensino ministrado pelo professor. A alteração nas condições oferecidas aos alunos
afetou diretamente a aprendizagem do aluno. Os exercícios passaram a ser
apresentados com instruções com poucas informações (3 ou 4 informações) - assim,
as instruções passaram a ser curtas e claras; além disso, havia apresentação do
reforço imediato à realização do comportamento desejado. Essa alteração produziu
efeitos, não sobre os alunos, que passaram a se empenhar mais, como também
foi percebida por um dos docentes, que identificou uma diminuição na emissão de
comportamentos inadequados “Agora eles fazem os exercícios em vez de ficarem se
batendo ou cutucando o outro”.
Finalmente, em relação à “motivação” dos alunos, nos primeiros encontros
de intervenção, houve modificação da atuação docente; em vez de ameaçar com
punições, o professor passou a acenar com possíveis reforçadores a realização das
atividades propostas. Inferimos que a alteração das contingências de ensino
contribuiu efetivamente para a manutenção dos alunos na modalidade, e detectamos
que o número de alunos foi aumentando com o passar das aulas. Corroborando com
a literatura, verificou-se que a substituição de práticas coercitivas por reforçadoras
promoveu o tão desejado engajamento dos alunos.
A alteração da postura dos docentes confirma, tal como enfatizado por
Skinner (1972a), que há possibilidade de superação do uso de práticas coercitivas, e
tal superação se pela programação de novas contingências. Com elas, como
apresenta Zanotto (2000), é possível tornar mais provável que os alunos se engajem
em comportamentos acadêmicos; de fato, ficou evidenciado, no presente trabalho
223
que o professor pode construir um espaço de ensino que gere e mantenha tais
comportamentos, um espaço constituído por interações pedagógicas produtivas.
No entanto, o professor só fará isto se for ensinado a fazê-lo. No momento em
que observamos o professor utilizar, por exemplo, o jogo coletivo como reforçador
de comportamento acadêmico ou alterar a dinâmica da atividade para criar um
224
reforçador para os alunos, pode ser utilizado pelo professor. No caso das diferentes
modalidades da Educação Física, é preciso identificar as atividades que podem ser
aversivas, e das quais os alunos tendem a se esquivar e fugir, e aquelas que têm
maior importância/valor para os alunos. Com a clareza de tais reforçadores, fica
mais fácil para o professor construir ambientes onde tais atividades apareçam como
conseqüência de comportamentos acadêmicos dos alunos, aumentando a
probabilidade de sua ocorrência.
Podemos, assim, responder à nossa questão: afinal, é possível diminuir a
ocorrência de práticas coercitivas e aumentar a ocorrência de práticas reforçadoras
pelos professores que atuam na área de Educação Física? A resposta é afirmativa,
pois os professores alteraram suas práticas, tornando as aulas mais reforçadoras.
Em sendo assim, o que seria imprescindível a uma proposta de intervenção que
tenha como objetivo substituir práticas coercitivas por reforçadoras?
Considerando o ensino como o arranjo planejado de contingências
(envolvendo a proposição de objetivos, procedimentos de ensino, escolha de
recursos, procedimentos e avaliação) a serem dispostas de modo a atingir o
estabelecimento e/ou aprimoramento de determinados comportamentos,
consideramos que propostas de intervenção, dentre outros aspectos, precisariam
levar o professor a:
identificar as atividades reforçadoras para os alunos, sendo tal
identificação um dos principais instrumentos que o professor tem para
o desenvolvimento das atividades de ensino;
ficar atento às instruções, tanto quanto ao número de informações
quanto em relação à clareza delas, para que os alunos possam ser
conhecedores dos aspectos do seu desempenho que o professor está
julgando como principais;
manter-se o maior tempo possível sob controle dos comportamentos
acadêmicos dos alunos, elogiando, comentando, dando dicas sobre
sua performance;
ignorar comportamentos inadequados de alunos, para não reforçá-los
inadvertidamente;
225
construir, na medida do possível, um ambiente que impossibilite, ao
aluno, apresentar comportamentos inadequados, através da solicitação
de comportamentos que lhes sejam incompatíveis.
A presente pesquisa, além de ter possibilitado a identificação de práticas
coercitivas presentes durante o processo de ensino, também permitiu-nos conhecer
alguns dos aspectos do contexto das aulas de Educação Física que estão
relacionados à ocorrência de tais práticas. A despeito de reconhecermos que a
discussão sobre a atuação de professores nas aulas traz consigo uma rie de
outros aspectos que mereceriam destaque, acreditamos ser de suma importância a
substituição de práticas coercitivas por práticas reforçadoras nas aulas de Educação
Física.
226
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comportamento. São Paulo – EDUC.
ZANOTTO,M.L.B.; MOROZ,M.; GIÓIA,P.S. (2000) Behaviorismo Radical e
Educação. Revista da APG. São Paulo, ano IX n.23, p. 217-237.
230
ANEXO 1
TERMO DE AUTORIZAÇÃO
Eu, _______________________________________________, autorizo que as
informações por mim concedidas sejam utilizadas no desenvolvimento da pesquisa
de doutorado realizada por Isabel Coelho Mola.
Cumpre ressaltar que a utilização das referidas informações restringe-se a fins
estritamente científicos, garantindo-se total confidencialidade, privacidade e sigilo
das mesmas. Os resultados, após sistematização, serão devidamente
disponibilizados a todos os interessados.
São Paulo, ______ de _____________ de 2006.
_______________________
Assinatura do(a) participante
_______________________
Assinatura da pesquisadora
231
ANEXO 2
QUESTIONÁRIO
Caro(a) professor(a),
Este instrumento tem como objetivo levantar informações sobre a prática docente de
professores.
Qualquer informação que possa identificá-lo(a) será mantido em sigilo.
Coloco-me a disposição para esclarecimentos.
Agradeço sua colaboração.
Isabel Mola
Doutoranda em Psicologia da Educação na PUC/SP
I. Informações pessoais.
1. Sexo:
Masculino Feminino
2. Idade:
menos 20 anos 31 a 35 anos 46 a 50 anos
20 a 25 anos 36 a 40 anos 51 ou mais
26 a 30 anos 41 a 45 anos
II. Informações sobre experiência profissional.
1. Em relação a sua atuação anterior, em quais atividades você já atuou?
Clubes Quanto tempo?____________
Academias. Quanto tempo? __________
Escolas Quanto tempo? __________
Recreação Quanto tempo? __________
Outro. Qual?____________________ Quanto tempo? __________
2. Atualmente, você atua:
Local
Atividade
Carga horária
(total
horas/semanal)
Clube a. _____________________________________
b. _____________________________________
c. _____________________________________
d. _____________________________________
a. __________
b. __________
c. __________
d. __________
Academia a. _____________________________________
b. _____________________________________
c. _____________________________________
d. _____________________________________
a. __________
b. __________
c. __________
d. __________
Escola a. 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental I (Ciclo I)
b. Ensino Médio
c. Escolinha de Esporte
d. Outro? Especifique:
______________________
a. __________
b. __________
c. __________
d. __________
Outro?
Especifique.
232
3. Você desenvolve outra(s) atividade(s) profissional(is) além da docência?
Não Sim
Por favor, especifique qual a área e carga horária semanal de trabalho: _________
4. Em relação ao seu trabalho na Instituição:
a. Há quanto tempo trabalha nesta instituição?__________
b. Quais modalidades que leciona?____________________
c. Qual o número de alunos (aproximadamente). Por turma: ______ Total:_____
d. Qual a sua carga horária de trabalho semanal (total) como professor nesta
instituição?___________
Para responder as próximas questões, por favor, considere apenas sua
atuação na atividade desenvolvida na Instituição.
III. Informações sobre ações pedagógicas.
1. Na sua opinião, qual(is) a(s) contribuição(ões) da sua modalidade para a
formação do aluno? Qual a sua função, qual o seu papel nesta formação?
Resposta gravada
2. Na sua opinião, o que significa planejar/ preparar aulas” ? Explique.
Resposta gravada
3. Qual a periodicidade com que você planeja suas aulas?
Não planeja Bimestralmente
Semanalmente Semestralmente
Mensalmente Anualmente
4. Escreva no espaço em branco, o número da opção que você acha mais adequado
para completar a frase: Ao planejar uma aula, você considera mais
freqüentemente:
(1) Sempre (2) Muitas vezes (3) Raramente (4) Nunca
a.____ Informações e conhecimentos adquiridos durante a graduação.
b.____ Informações e conhecimentos adquiridos em cursos, palestras, oficinas.
c.____ Conhecimentos adquiridos durante experiência como professor(a).
d.____ Informações obtidas com outros professores.
e.____ Informações obtidas junto aos alunos.
f. ____ Informações obtidas em livros, revistas, jornais e internet.
Outra alternativa, por favor, especifique: ___________________________________
5. Quando planeja/prepara uma aula, quais as maiores dificuldades que você
encontra? Cite um exemplo.
Resposta gravada
6. Assinale 3 recursos pedagógicos mais utilizados por você nas aulas:
bolas arcos elástico
quadra cordas
cones plinto
Outro, por favor, especifique: ____________________
7. Escreva no espaço em branco, o número da opção que você acha mais adequado
para completar a frase:
Durante as aulas na Instituição, eu:
(1) Sempre (2) Muitas vezes (3) Raramente (4) Nunca
a. ____proponho atividades individuais.
b. ____proponho atividades em dupla ou pequenos grupos.
c. ____proponho atividades com todo o grupo.
d. ____proponho atividades para casa.
233
e. ____proponho atividades de desafios.
f. ____proponho atividades de modelo.
g. ____coordeno experiências, jogos e dinâmicas.
h. ____coordeno debates e conversas com os alunos.
Outro, por favor, especifique: ____________________________________________
8. Na sua opinião, quais as características de uma aula considerada muito boa?
Resposta gravada
9. Para responder as questões abaixo, considere uma aula ministrada por você
na Instituição que você considera que foi muito boa.
a. Qual(is) o(s) objetivo(s) que você definiu para esta aula?
Resposta gravada
b. Qual(is) o(s) conteúdo(s) que você trabalhou nesta aula?
Resposta gravada
c. Qual(is) a(s) estratégia(s) que você utilizou para ensinar aos alunos nesta aula?
(Por exemplo: aula demonstrativa, por meio de demonstração de um movimento,
etc). Por favor, especifique.
Resposta gravada
d. Como você avaliou (ou pretende avaliar) o aprendizado dos alunos nesta aula?
Resposta gravada
e. Durante a aula, você encontrou alguma dificuldade ou problema?
Não Sim
Em caso positivo, descreva-a(s) e comente o que você fez ou gostaria de fazer
diante de tal situação.
Resposta gravada
10. Assinale com X os três itens que você considera que mais comprometem o
desenvolvimento da aula.
Desinteresse dos alunos.
Comportamento inadequado dos alunos (movimentação, conversa paralela, etc).
Movimentação e sons externos ao local.
Número elevado de alunos por sala.
Infra-estrutura inadequada no local (mobília, ventilação, iluminação, etc).
Falta de tempo para preparar aula.
Outro, por favor, especifique:____________________________________________
11. Assinale com X os itens mais freqüentes. Diante de acertos dos alunos na
realização de uma atividade o que você costuma fazer:
Continuo a explicação ou desenvolvimento da atividade.
Parabenizo (com elogios, manifestações de alegria) os alunos.
Proponho outra atividade.
Sinalizo os acertos com elogios.
Tento aumentar o interesse e motivação dos mesmos.
Permito que realizem outras atividades (jogos, brincadeiras, etc).
Outra alternativa. Por favor, especifique.______________________
12. Assinale com X os itens mais freqüentes. Diante de erros dos alunos na
realização de uma atividade o que você costuma fazer:
Continuo a explicação ou desenvolvimento da atividade.
Mudo de atividade, mas com o mesmo conteúdo.
Sinalizo com palavras e/ou expressões, gestos o erro do aluno.
Retomo a explicação da atividade.
Converso com o aluno individualmente.
Outra alternativa. Por favor, especifique:______________________
234
13. Escreva no espaço em branco, o número da opção que você acha mais
adequado para demonstrar os itens que mais estão presentes em sua atuação
pedagógica na Instituição.
(1) Sempre (2) Muitas vezes (3) Raramente (4) Nunca
a. ____ Explicação do conteúdo repetidas vezes.
b. ____ Chamar a atenção dos alunos para as atividades.
c. ____ Organização do tempo em relação ao ritmo dos alunos.
d. ____ Atenção às solicitações dos alunos individualmente.
e. ____ Correção das atividades propostas individualmente.
f. ____ Promoção de debates e conversas envolvendo todos os alunos.
e. ____ Outra alternativa. Especifique._______________________________
14. Quando você encontra alguma dificuldade em sala de aula, quem é a primeira
pessoa que você recorre/conversa? ______________________
Em que esta pessoa te auxilia? Por favor, especifique:_____________________
IV. Informações sobre formação acadêmica.
1. Ensino Médio Instituição Início e Término
Ensino Regular
Magistério
Outro.
Qual?_______________
Pública
Particular
Outra. Qual?______________
Ano de início:_______
Ano de término:______
2. Ensino Superior Instituição Início e Término
Curso
1:_________________
Pública
Particular
Outra. Qual?______________
Ano de início:______
Ano de término:_____
Curso
2:_________________
Pública
Particular
Outra. Qual?____________
Ano de início:______
Ano de término:_____
V. Informações sobre formação continuada.
1. Nos últimos 3 anos, você participou de cursos, palestras, oficinas, etc?
Não Sim
1.a. Caso sua resposta seja afirmativa, por favor, destaque até 3 eventos que, na
sua opinião, trouxeram benefícios para você.
Evento
1:__________________________________________________________________
Tema:______________________________________________________________
Carga horária: ____________________________
Promovido por:_______________________________________________________
Que tipo de benefício trouxe? Por favor, especifique. Resposta gravada
Evento
2:_________________________________________________________________
Tema:______________________________________________________________
Carga horária: ____________________________
Promovido por:_______________________________________________________
Que tipo de benefício trouxe? Por favor, especifique. Resposta gravada
235
Evento
3:________________________________________________________________
Tema:____________________________________________________________
Carga horária: ____________________________
Promovido por:______________________________________________________
Que tipo de benefício trouxe? Por favor, especifique. Resposta gravada
VI. Informações adicionais.
Sua participação foi fundamental obter informações sobre o processo de ensino e
aprendizagem na Instituição. Muito obrigado!
Caso ache necessário, este espaço foi reservado para você registrar alguma
informação que queira acrescentar.
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