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Comportamento Percolativo do Transporte Elétrico
em Negro de Fumo
Alex Aparecido Ferreira
Orientador: José Francisco de Sampaio
Co-Orientador: Geraldo Mathias Ribeiro
Dissertação apresentada à Universidade Federal de Minas Gerais
como pré-requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Física.
Fevereiro de 2007
I
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Aos meus pais e irmãs
II
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Agradecimentos
Aos meus pais, José Geraldo e Maria Francisca, e à minhas irmãs, Lidiane e Elaine, pelo
carinho, apoio incondicional e incentivo recebidos.
Ao Prof. José Francisco de Sampaio, pela orientação firme e paciente, por sempre valorizar
muito minha formação e por me fazer apreciar ainda mais a ciência. Ao Prof. Geraldo Mathias
Ribeiro, pela co-orientação tranqüila, por investir muito tempo (e paciência) neste trabalho e em
minha formação e por me mostrar que física experimental é, acima de tudo, muita persistência. E
agradeço a ambos, sobretudo, pela amizade, incentivo e confiança nos últimos anos.
Aos meus amigos que desde o início da graduação estão comigo: Gabriela, Júlio César,
Guilherme, Maria Clara, Daniel, Fernanda, Agnaldo, por sempre me apoiar, me incentivar e me
fazer rir. Ao pessoal da turma de graduação de 2001, de onde sempre recebo incentivo e boas
conversas.
Aos todos os amigos da pós-graduação, em especial ao pessoal do Piauí - André, Maurisan,
Jonathan, Irismar e toda a colônia -, ao Geraldo Bahia e Marco Aurélio.
À Maria Helena pelo apoio e incentivo; à Cristina, Viviane e Gisele, pela amizade e
carinho comigo.
À todos no Laboratório de Semicondutores e no Laboratório de Transporte Elétrico Não-
Linear e Caos, em especial ao Coisa, pelo incentivo (há seis meses ele pergunta por esta
dissertação) e ao Rodrigo e Júnior, pelo companheirismo e pelos programas em Labview.
Ao Seu João, Joércio e Raimundo, da oficina mecânica, pela boa vontade; à Shirley, da
Biblioteca, sempre à disposição para ajudar e ao Prof. Klaus Krambrock, por permitir que eu
usasse (e também sujasse) sua sala de preparação de amostras. Aos professores e funcionários do
Departamento, que de alguma forma ajudaram neste trabalho.
Ao CNPq, Fapemig e Finep, pelo apoio financeiro.
III
Resumo
Neste trabalho, estudamos o comportamento percolativo do transporte elétrico em negro de
fumo. Para estudar o comportamento percolativo, medimos a resistividade elétrica ρ deste
material em função de sua densidade volumétrica d. Analisamos os resultados usando duas
abordagens diferentes. A primeira é uma análise que separa as curvas de condutividade versus
densidade em dois regimes: um de mais baixas densidades, considerado como regime
percolativo definido por
, onde t é o expoente cujo valor é esperado ser
universal, e d
t
c
dd
)(
ρ
c
é a densidade crítica onde a resistividade elétrica diverge; e outro, de mais altas
densidades, considerado como regime de campo efetivo. A segunda é a análise usualmente
utilizada na literatura, onde toda a faixa de densidades é considerada como sendo um único
regime. A primeira abordagem representa uma tentativa de se estabelecer e evidenciar uma
região crítica. Em ambas as abordagens, o expoente crítico t é não-universal e apresenta uma
variação com a temperatura entre T = 300 K e T = 10 K. Analisamos também o processo de
transporte elétrico nessas amostras e encontramos que é do tipo de “hopping” de alcance
variável numa ampla faixa de temperatura. Também sugerimos que a variação do expoente
crítico com a temperatura está relacionado com o processo de condução elétrica na amostra.
IV
Abstract
In this work we have studied the percolation like behavior of the electrical transport in carbon
black. We have measured the dependence of the carbon black resistivity ρ on its volumetric
density d , and have analyzed the results by using two approaches. In the first procedure the
conductivity dependence on the density was split into two regimes: the low densities region,
characterized as a power law
whose t exponent is expected to be a universal
value, and d
t
c
dd
)(
ρ
c
is the percolation threshold; and the high densities region, considered as an
effective medium behavior. The second is the usual procedure found in the literature of
considerering the whole density range as just one regime. The former approach is an attempt
to find the percolation critical region. In both approaches the exponent t is non-universal and
presents temperature dependence from T = 300 K to T = 10 K. We have also analyzed the
electrical transport process in this material and have found that variable range hopping can fit
our results in a large temperature range. We suggest an explanation that the exponent
temperature dependence is related with the electrical conduction process in the samples.
V
Sumário
Agradecimentos.........................................................................................................................III
Resumo......................................................................................................................................IV
Abstract.......................................................................................................................................V
1. Introdução.............................................................................................................................01
2. Resistividade em Misturas....................................................................................................03
Seção I: Teorias de Meio Efetivo
I.1) A Aproximação de Clausius-Mossoti.....................................................05
I.2) Os Modelos simétrico e antissimétrico de Bruggeman..........................09
I.3) As Equações fenomenológicas de McLachlan.......................................12
Seção II: Modelo de Percolação................................................................................14
Seção III: Regiões de Validade para Teorias de Condutividade em Misturas..........24
3. Modelos de Condutividade Elétrica
Seção I: Condução por Hopping.............................................................................. 27
Seção II: O Modelo de Sheng...................................................................................32
4. Resultados Experimentais
Seção I: O Negro de Fumo...................................................................................... 34
Seção II: Metodologia e Aparato Experimental.......................................................36
Seção III: Análise das Curvas de Resistividade versus Temperatura.......................41
Seção IV: Análise do Comportamento Percolativo da Resistividade...................... 45
IV.a) Análise do Gráfico da Resistividade versus Densidade em dois
regimes – Modelo de Percolação e Meio efetivo..........................................46
IV.b) Análise do Gráfico da Resistividade versus Densidade com um único
regime............................................................................................................50
IV.c) Análise dos parâmetros percolativos obtidos.......................................53
5. Conclusões............................................................................................................................58
6. Referências Bibliográficas....................................................................................................61
CAPÍTULO 1
Introdução
Sistemas percolativos vêm sendo estudados há várias décadas e, até hoje, não estão
completamente entendidos. No caso de sistemas formados por uma mistura de, por exemplo,
condutores e isolantes elétricos, há uma certa concentração relativa de isolantes, chamada
concentração crítica, na qual o sistema passa por uma transição condutor-isolante. Conceitos de
percolação só são aplicáveis para valores de concentração próximos à transição.
Entretanto, não existe determinação teórica dessa região crítica onde são válidos estes
conceitos. Além do mais, há a idéia de universalidade, na qual os expoentes que determinam as
leis de potências características dessa transição seriam apenas dependentes da dimensionalidade do
sistema, sem considerar as particularidades microscópicas da amostra. Vários resultados
experimentais refutam esta idéia, e alguns modelos teóricos tentam explicar a existência de
expoentes não-universais.
Neste trabalho, apresentaremos resultados experimentais em um sistema percolativo.
Comumente, na literatura, é apresentada a mistura de negro de fumo (carbon black – fase
condutora) e polímero (matriz isolante e contínua) como uma amostra onde estes conceitos podem
ser estudados. Contudo, o estudo dos efeitos do negro de fumo em si no processo de transição é
pobre.
Assim, estudaremos percolação em negro de fumo. Porém, a matriz isolante será apenas o
ar ou o gás criogênico (He), uma vez que não usamos nenhuma matriz isolante. Para isso, usamos
um porta-amostra apropriado, na qual a densidade volumétrica do negro de fumo é variada. Em
alguma densidade crítica d
c
, a amostra deixará de conduzir, mostrando, assim, que o sistema pode
ser estudado através do modelo de percolação.
Vamos discutir, também, em que faixa de densidades podemos usar este modelo, e em que
região podemos usar outras teorias, como os modelos de meio efetivo. Observaremos como isto
influencia na determinação do expoente e, conseqüentemente, na discussão sobre universalidade.
Além do estudo da condutividade do sistema em função de sua densidade volumétrica,
variamos, em cada amostra com um certo valor de densidade, a temperatura de T = 300 K até
T = 10 K. Assim, vamos estudar os efeitos da temperatura no expoente, que seriam determinados
por características microscópicas do sistema, e que comprovariam efeitos destas no valor do
expoente.
1
Para isto, estudaremos a condutividade do negro de fumo em função da temperatura para
todas as amostras, a fim de determinar que processo de condução ocorre nestas amostras.
Avaliaremos os resultados experimentais usando alguns modelos de transporte elétrico disponíveis
na literatura.
Esta dissertação está disposta da seguinte forma: o capítulo seguinte sumariza o estudo de
resistividade em misturas, analisando as teorias de meio efetivo, o modelo de percolação e a
validade dessas idéias. No Capítulo 3, apresentaremos modelos de condutividade elétrica. No
Capítulo 4, mostraremos o que é o negro de fumo, detalharemos os experimentos realizados e
discutiremos os resultados experimentais. Finalmente, no Capítulo 5, apresentaremos as
conclusões deste trabalho.
2
CAPÍTULO 2
Resistividade Elétrica em Misturas
O problema de se determinar a resistividade elétrica em meios heterogêneos já vêm sendo
estudado há algumas décadas
1,2
. Algumas teorias fenomenológicas, que intuitivamente podem ser
explicadas, tentam formular tal problema.
Imagine um sistema formado por uma mistura de dois materiais A e B, com frações
volumétricas p
A
e p
B
com relação ao volume da amostra, respectivamente, e com resistividades
ρ
A
e
ρ
B
. Qual é a resistividade resultante
ρ
m
do sistema? Uma primeira resposta intuitiva seria uma
média ponderada entre as resistividades das fases, ou seja:
mAAB
pp
B
ρ
ρρ
=
+ (2.1)
Sabemos, da física básica, que a associação de dois resistores em série produz uma
resistência resultante que é a soma da resistência dos resistores. Podemos então imaginar que a
equação acima é a situação limite em que as duas fases se orientam em blocos alternados,
perpendiculares ao sentido do fluxo de corrente que, neste cenário, não poderia evitar regiões de
alta resistividade, gerando assim um conjunto, em série, de resistores. Por outro lado, se
imaginarmos que estes blocos se orientam paralelamente ao sentido do fluxo de corrente,
poderíamos propor a seguinte equação para a condutividade elétrica σ
m
da mistura, que é o limite
oposto ao da Eq. 2.1:
mAAB
pp
B
σ
σσ
=
+ (2.2)
Note que as duas equações não são recíprocas, pois representam cenários extremos e
opostos mostrados no parágrafo anterior. É interessante, portanto, testar cada uma das propostas
citadas acima em situações limites, usando o nosso sistema, descrito anteriormente, com a
resistividade de uma das fases tendo um valor infinito (isolante),
A
ρ
→∞, e a outra fase com uma
resistividade finita. Evidentemente, neste cenário, a Eq. 2.1 falha, fornecendo um valor infinito
para
ρ
m
e a Eq. 2.2 resulta em
mB
p
B
σ
=
. Mas, se a mistura fosse de um supercondutor ( 0
A
ρ
=
)
3
com um condutor normal a Eq. 2.1 daria
mB
p
B
ρ
ρ
=
enquanto que a Eq. 2.2 daria resultado
infinito. Uma outra equação, que poderia ser proposta, é:
AB
p
p
mAB
ρρρ
=
(2.3)
Esta equação, proposta por Lichtenecker (cuja citação está na Ref. 1), também falha nos
limites propostos como teste. Evidentemente, porém, essas equações podem ajustar corretamente a
resistividade de certas misturas fora destas situações extremas, como está relatado na Ref. 1.
Podemos ver, portanto, que propor modelos que expliquem corretamente tais sistemas, inclusive
nos valores limites das resistividades das fases, não é simples. Algumas teorias, mais sofisticadas,
têm sido propostas desde o final do século XIX. Porém, se tais modelos são capazes de contornar o
problema quando a razão das resistividades das fases tende a zero (ou infinito), estas podem falhar
se a concentração de uma das fases tende a zero.
Este problema ainda não foi completamente resolvido. Podemos, sucintamente, dizer que a
resistividade em meios heterogêneos pode ser explicada por duas teorias: as teorias de meio
efetivo (TME), que se propõem a explicar a resistividade da mistura de fases cuja razão das
resistividades é finita e diferente de zero (além de ser válida em uma ampla faixa de concentrações
dos componentes) e a teoria de percolação (TP), usada para avaliar sistemas em que uma das fases
é isolante e quando a concentração de uma das fases tende a um valor crítico p
c
, na qual a
resistividade do sistema segue uma lei de potência do tipo
()
t
c
pp
, onde p é a fração do
elemento condutor e p
c
é a concentração crítica onde o sistema sofre uma transição condutor-
isolante. Como veremos adiante, o expoente t é determinado pelas condutividades microscópicas
do sistema e já foi considerado como universal.
Os dois modelos vêm sendo desenvolvidos durante décadas, com contribuições
importantes de diversos autores. Entretanto, uma questão permanece sem avaliação clara: numa
mistura de condutores e isolantes, em que concentração das fases é válida a teoria de meio efetivo
e em que faixa de concentrações devemos usar teoria de percolação? Esta dúvida pode ser
levantada pois, nos últimos anos, alguns autores vem propondo que a TME, com algumas
generalizações, podem descrever misturas de condutores e isolantes.
Vamos discutir este tópico adiante. Antes, para entender de onde surgiu tal questão,
faremos uma revisão dessas teorias desde o século passado até as teorias mais modernas. Na
seção I, discutiremos os modelos de meio efetivo. Primeiramente, analisaremos na subseção I.1 a
4
aproximação de Clausius-Mossotti. A seguir, na subseção I.2 apresentaremos as teorias simétrica e
antissimétrica de Bruggeman para condução em misturas; depois, na subseção I.3, as equações
fenomenológicas de McLachlan. Na seção II apresentaremos as idéias fundamentais da teoria
de percolação, como conceitos de universalidade e sua relação com as características
microscópicas do sistema. Na seção III, apresentaremos uma discussão sobre as regiões de
validade dessas duas teorias, sintetizando-as, com o objetivo de encontrar a melhor maneira de
aplicá-las aos resultados experimentais.
Seção I: Teorias de Meio Efetivo (TME)
I.1) A aproximação de Clausius-Mossotti
A aproximação de Clausius-Mossoti irá ajudar-nos a entender o método usado nas teorias
de meio efetivo.A idéia central é semelhante ao tratamento de Clausius-Mossoti para constante
dielétrica: vamos escolher o menor componente que forma uma das fases (seja esta um grão,
molécula ou partícula qualquer) e calcular o efeito do meio ao redor sobre este componente
escolhido em particular. Nesta seção, veremos que este método é capaz de determinar a
condutividade de um sistema composto de duas ou mais fases. Sendo assim, imagine um
conjunto destes componentes, uma amostra granular, por exemplo. Cada grão deste conjunto
ocupa um certo volume, e este grão, dentro deste volume, sofre a ação de um campo elétrico
resultante da superposição do campo externo (determinado por fontes externas e por todos os
outros grãos da amostra) e o próprio campo (devido a polarização) do grão analisado (é preciso
destacar que os volumes ocupados por cada grão não se sobrepõem). Este campo resultante é
chamado campo local
3
, efetivo ou campo interno.
Para determinar este campo interno, considere a situação da Fig. 2.1: um grão esférico de
raio R e condutividade σ
1
imerso em um meio de condutividade σ
0
e sujeito a um campo externo
(campo dentro da amostra, devido à polarização de outros grãos ou fontes externas).
o
E
ur
5
Figura 2.1: Esfera de condutividade
σ
1
imerso em um meio de condutividade σ
0
e sob
efeito de um cam
p
o externo.
Para resolver este problema, devemos partir da equação de Laplace
4
, , onde Φ é o
potencial elétrico, e usando o fato de que, nesse caso, temos simetria azimutal. Como condições de
contorno, exigimos que tanto o potencial Φ quanto a densidade de corrente devem ser contínuas
na superfície da esfera. Usando também as definições
2
0∇Φ=
J
ur
E
=
−∇Φ
u
rur
e
JE
σ
=
r
r
obtemos o campo
dentro e fora da esfera.
10
00
10
3
10
00
10
2
2
d
f
EE E
R
E
EE
r
r
σ
σ
σσ
σσ
σσ
=−
+
⎛⎞
⎛⎞
=−
⎜⎟
⎜⎟
+
⎝⎠
⎝⎠
ur ur ur
ur ur ur ur r
(2.4)
onde e
d
E
ur
f
E
ur
são os campos dentro e fora da esfera, respectivamente e r é a coordenada radial.
Sabemos que o potencial de um dipolo
4
é:
()
3
0
1
4
dip
r
r
r
γ
πε
Φ=
r
r
r
6
Comparando o gradiente desta equação com Eq. 2.4, obtemos o dipolo elétrico
γ
r
induzido
na esfera:
3
10
0
01 0
42
R
E
σσ
γ
πε σ σ
=
+
r
u
r
(2.5)
Sabendo que a polarização
P
u
r
é o dipolo elétrico por volume da esfera, podemos então
reescrever as Eqs. 2.4:
0
0
0
3
0
3
4
d
f
P
EE
r
EE
r
ε
γ
πε
=−
=−
u
r
ur ur
r
r
ur ur ur
(2.6)
Agora considere a seguinte situação, ilustrada na Fig. 2.2: a esfera agora é uma mistura de
materiais de condutividade σ
1
imerso num meio contínuo de condutividade σ
0
. Esta esfera, por sua
vez, está contida num meio com a mesma condutividade σ
0
, mas sem as inclusões. Sabemos que a
polarização da esfera, como achamos anteriormente, é:
0
0
0
0
3
2
PE
σ
σ
ε
σσ
=
+
u
rur
(2.7)
pois o meio na esfera tem condutividade resultante σ que queremos calcular.
Entretanto, se somarmos os dipolos induzidos nos grãos de condutividade σ
1
dentro da
esfera, usando a Eq. 2.5, e dividirmos pelo volume da esfera, também obtemos a polarização desta:
i
i
esfera
P
V
γ
=
r
ur
7
onde
i
γ
r
é o dipolo induzido da i-ésima partícula com condutividade σ
1
. Quando fizermos a soma
acima, veremos que apenas os volumes das partículas, que podem eventualmente ser diferentes,
contribuirão. Assim, se V
i
é o volume da i-ésima partícula:
Figura 2.2: Neste caso, a esfera é uma mistura de partículas com condutividade
σ
1
(em vermelho)
em um meio de condutividade σ
0
(ou seja, a esfera tem condutividade resultante σ), que por sua
vez está imerso em um meio de condutividade σ
0
10 10
00
10 10
33
22
i
i
esfera
V
PEp
V
σσ σσ
εε
σσ σσ
−−
==
++
E
ur ur ur
(2.8)
onde
i
i
esfera
V
p
V
=
é fração volumétrica do meio de condutividade σ
1
. Porém, obviamente, as Eqs.
2.7 e 2.8 devem ser iguais. Portanto:
01
01
22
p
0
0
σ
σσσ
σ
σσσ
=
++
(2.9)
8
Esta é a equação para condutividades análoga à de Clausius-Mossoti. Agora, considere que
nessa mistura o material contínuo seja feita de um condutor e as inclusões sejam isolantes. Nesse
caso, como
1
0
σ
= , teremos:
+
=
p
p
o
2
1
2
σσ
(2.10)
A Fig. 2.3 mostra a condutividade versus a concentração volumétrica do isolante (curva
pontilhada). Nota-se imediatamente que o sistema deixa de conduzir apenas quando a
concentração do isolante tende a um. Em outras palavras, não existe uma concentração crítica do
sistema enquanto uma mistura.
σ/σ
o
p (concentração de isolantes)
Figura 2.3: Condutividade normalizada versus fração volumétrica p de um isolante elétrico em uma mistura de condutores e
isolantes para o modelo de Clausius-Mossoti (C.M.), modelo simétrico (Br.sim) e antissimétrico (Br.assim) de Bruggeman (ver
Ref. 2)
I.2) Os modelos simétrico e antissimétrico de Bruggeman
Imagine um meio homogêneo, contínuo e tridimensional com condutividade σ
0,
e que
sucessivos volumes esféricos infinitesimais, correspondendo a frações volumétricas dp
1
, que
9
podem se sobrepor, vão sendo retirados. Para facilitar nosso entendimento, vamos partir da Eq. 2.9
com σ
1
= 0 e p = p
1
. Calculando a variação da resistividade deste meio contínuo (ou seja, com um
valor inicial de p
1
= 0) com a retirada desse volume infinitesimal, temos:
1
3
2
d
dp
σ
σ
=−
(2.11)
Quando uma fração volumétrica p do meio condutor já foi retirada, e uma fração
infinitesimal dp
1
é removida, tem-se que:
1
1
dp
dp
p
=
Substituindo esse valor na Eq. 2.11 e integrando, obtemos:
()
3
2
0
1 p
σ
σ
=−
(2.12)
Este é chamado de modelo assimétrico de Bruggeman. É chamado dessa forma por que as
fases do sistema são tratadas de maneira diferente. No caso da equação acima, temos uma matriz
condutora na qual elementos isolantes esféricos foram inseridos. Observe que, no modelo acima, o
elemento isolante é simplesmente o vácuo, com condutividade nula. Notamos imediatamente que
neste modelo o sistema deixa de conduzir apenas para uma concentração
, ou seja, quando o
sistema apresenta apenas o meio isolante, como mostrado na Fig. 2.3 (linha de círculos). Além do
mais, neste cenário, o modelo fornece uma lei de potência similar ao resultado da teoria de
percolação, com expoente crítico
1p =
32t
=
. A Eq. 2.12 pode ser generalizada para um sistema onde,
ao invés de isolantes, os elementos inseridos na matriz teriam uma condutividade diferente de zero
e para uma dimensionalidade d diferente de 3:
()
(1 ) ( )
d
dd
ml
hl
mh
p
σσ
σσ
σσ
−−
= (2.13)
10
onde σ
m
, σ
l
, σ
h
são as condutividades do meio (resultante), das inclusões e da matriz,
respectivamente.
Já o modelo simétrico de Bruggeman é bastante similar à aproximação de Clausius-
Mossoti. Considere um meio formado por dois tipos de grãos, submetidos a um campo elétrico
. Se considerarmos cada grão do tipo 1 como um pequeno dipolo, estes exibirão uma
polarização, com um momento de dipolo dado por uma equação idêntica à Eq. 2.5:
0
E
r
1
0
0
11
2
m
m
E
V
σσ
γ
ε
σσ
=
+
r
u
r
(2.14)
onde σ
m
é a condutividade do meio e V
1
é o volume da região ocupada pelos grãos do tipo 1. Para
grãos do tipo 2, o momento de dipolo terá a mesma forma. Agora, vamos fazer a mesma suposição
descrita na Fig. 2.2, mostrada acima: imagine que uma esfera formada destes dois tipos de grãos
esteja colocada num meio de condutividade σ
m
, ou seja, igual a condutividade da mistura de grãos.
Naturalmente, o momento de dipolo desta esfera será nulo, pois o valor da condutividade é o
mesmo dentro e fora da esfera. Entretanto, ao somarmos os momentos de dipolo dos dois tipos de
grãos e dividirmos pelo volume da esfera, obtemos a polarização desta, como feito anteriormente:
i
i
esfera
P
V
γ
=
r
ur
Portanto:
12
0
1
12
22
mm
mm
Ppp
σσ σσ
σσ σσ
⎛⎞
−−
=+
++
⎝⎠
ur ur
2
E
onde p
1(2)
são as frações volumétricas dos meios 1 (2). Porém, como concluímos acima, esta
expressão deve ser nula. Assim, temos:
12
12
12
0
22
mm
mm
pp
σ
σσσ
σσ σσ
+
=
++
(2.15)
11
A Eq. 2.15 pode ser facilmente invertida para obtermos σ
m
, se considerarmos p
1
= p, p
2
= (1-p),
σ
1
= 0 e σ
2
= σ:
= p
m
3
2
2
3
σ
σ
ou seja, se um dos constituintes é isolante elétrico, o resultado fornece uma lei de potência
semelhante à Eq. 2.12, mas com expoente critico t = 1. Porém, neste modelo observamos uma
concentração critica do elemento condutor diferente de zero. Dos modelos analisados até agora,
este é o primeiro que apresenta esta característica (veja Fig 2.2).
Este modelo é chamado de simétrico pois trata ambas as fases da mesma maneira, ou seja,
não podemos dizer qual das fases é a matriz do sistema. A Eq. 2.15 pode ser estendida a um
sistema de mais de dois componentes e para d = 1, 2 ou 3 dimensões:
0
(1)
im
i
i
im
p
d
σ
σ
σσ
=
+−
(2.16)
Landauer
2
argumenta que teorias de meio efetivo, em concentrações próximas à crítica, não
são adequadas pois, como observamos nas equações acima, é feita sempre a afirmação que os
grãos estão imersos num meio uniforme com condutividade média. Isto não seria correto próximo
à transição, pois nesta situação o sistema apresenta grandes flutuações de densidade, com regiões
da amostra apresentando muitas diferenças entre si. Neste limite, apenas teoria de percolação seria
adequada. Antes de analisar detalhadamente esta teoria, estudaremos uma generalização das
teorias de meio efetivo, e os limites de aplicabilidade desta generalização.
I.3) As equações fenomenológicas de McLachlan
McLachlan
5-7
, numa série de trabalhos, vêm propondo equações que englobem os modelos
simétrico e antissimétrico como casos particulares. Para fazer esta conexão, o autor propõe a
existência de um parâmetro D relacionado à concentração (ou fração volumétrica) crítica p
c
dada
por:
12
1
c
d
p
D
=
(2.17)
onde d é a dimensão euclidiana. O autor justifica a equação da seguinte forma: quando temos uma
mistura de condutores e isolantes, o modelo assimétrico de Bruggeman fornece um valor para a
concentração crítica de isolantes p
c
= 1 para as 3 dimensões. Já o modelo simétrico fornece
0, 1 2
c
p = ou
23
, como pode ser obtido na Eq. 2.16.
No modelo assimétrico, a corrente elétrica tende a se mover em finas regiões externas às
esferas que tendem ser as superfícies topológicas destas. Já no modelo simétrico, a corrente deve
se mover numa disposição aleatória de condutores, cuja dimensão continua a ser a do sistema.
Generalizando, portanto, observa-se que no modelo assimétrico, D = d – 1 e D = d no modelo
simétrico. D, portanto, pode ser considerado como a dimensão fractal do sistema.
Assim, se temos um sistema intermediário entre esses dois modelos, é de se esperar que D
tenha um valor intermediário entre d – 1 e d. Dessa forma, o autor sugere uma equação geral para
uma mistura:
()
()( )
(
)
(
)
()( )
1
0
11 11
lm hm
lmh
pp
dDd dDd
Σ−Σ ΣΣ
m
+
=
Σ+−+ΣΣ+−+Σ⎡⎤⎡⎤
⎣⎦⎣⎦
(2.18)
com
D
d
ii
σ
Σ=
, onde i =l, h ou m, indicam a condutividade das fases dispersa (l), matriz (h) e da
mistura (m) e p é a concentração da fase dispersa. Para D = d, a Eq. 2.18 se iguala a Eq. 2.16 para
i = 2 e converge para a Eq. 2.13 quando
ε
+
=
1dD
e σ
h
= 0, ε sendo um infinitesimal. Note
que a Eq. 2.18 é válida se as condutividades das fases são diferentes de zero. Nas Refs. 7 e 8, o
autor relaciona os parâmetros com a orientação dos grãos que formam a mistura. Com estas
generalizações, a equação obtida vem sendo chamada teoria geral de meio efetivo.
Concluindo este resumo a respeito dos trabalhos de McLachlan
5-8
, vemos que este modelo
propõe leis de potência que se estendem a largas faixas de concentração, em misturas de
condutores e isolantes, diferentemente da teoria de percolação, onde as leis de potência só são
aplicáveis quando
c
p
p . Além do mais, a teoria de meio efetivo generalizada pode ser aplicada
quando a razão das resistividades entre condutores e isolantes não é nula, ao contrário da TP.
Entretanto, os argumentos de McLachlan que levam às suas equações são puramente
13
fenomenológicos, e o próprio autor reconhece que a justificativa para a aplicabilidade de suas
equações são os bons ajustes que estas proporcionam aos dados experimentais.
Posteriormente, veremos que alguns trabalhos semelhantes ao nosso, relatados na literatura
usaram a teoria de meio efetivo de McLachlan para explicar seus dados experimentais.
Seção II: Modelo de Percolação:
Teoria de percolação (TP) vem sendo desenvolvida há algumas décadas
9
. Historicamente, a
idéia matemática de percolação surgiu em 1957 com Broadbent e Hammersley, introduzindo
conceitos de probabilidade. No entanto, o conceito físico já tinha sido formulado durante a
Segunda Guerra Mundial, por Flory e Stockmayer, para explicar o processo em que moléculas se
ligam, formando macromoléculas que, em certo momento, ocupam toda a rede (estes trabalhos
estão citados na Ref. 9).
Embora aspectos matemáticos da TP, descritos pela teoria de escala, possam ser bastante
complicados, a idéia física é muito simples: imagine uma rede quadrada bidimensional formada
por sítios, ou seja, discreta. Cada sítio está igualmente separado por uma distância que, por
simplicidade, vamos considerar fixa e com o mesmo valor para todos os intervalos entre sítios.
Para visualizar ainda melhor a situação, usando um exemplo clássico de onde percolação é
aplicada
9
, imagine que em alguns sítios, correspondendo a uma fração p do total de sítios e
escolhidos aleatoriamente, sejam ocupados por árvores, uma em cada sítio. Agora, suponha que
algum criminoso incendeie uma das árvores numa das bordas desta floresta. Vamos supor,
também, que o fogo só pode passar de uma árvore para outra se elas estão separadas apenas por
um parâmetro de rede (são primeiras vizinhas). Esta última regra exige que o incêndio se alastre de
um sítio para outro apenas se ambos se tocam através de lados, e não pelas esquinas. Colocadas as
características desse incêndio, fazemos a pergunta: qual o tempo de vida do incêndio, supondo que
o fogo em uma única árvore dura um tempo finito?
Este é um exercício tradicional sobre percolação, e a resposta depende da concentração p
de árvores na floresta. Se há poucas, o fogo não tem para onde se alastrar, e o tempo de vida do
incêndio tende a zero quando a concentração tende a ser nula. Se há uma alta concentração, o fogo
atravessa rapidamente a floresta, de modo que quando a concentração tende a um, o tempo de vida
também tende a zero.
14
Entretanto, há um certo valor de concentração de árvores, chamada de concentração crítica,
c
p
, na qual as chamas podem sempre encontrar um caminho para se alastrarem. Neste valor, o
tempo de vida do incêndio tende a divergir ( o tempo de vida diverge para uma floresta infinita ).
Quando observamos a floresta neste valor crítico, vemos que este momento é o limiar de formação
do primeiro caminho ininterrupto ligando as bordas opostas da floresta. Dizemos que, nesta
situação, houve percolação no sistema.
Naturalmente, há várias formas de formular tal problema: podemos permitir que o fogo
possa se alastrar por vizinhos que se tocam nas diagonais dos sítios, por exemplo. Porém, a idéia
básica se mantém: teoria de percolação lida com transições de fase. Se, ao invés de arvores,
tivéssemos elementos que conduzissem (ou não) calor ou corrente elétrica, teríamos uma transição
de fase condutor-isolante da rede.
Uma vez que a idéia do problema foi apresentada, vamos estabelecer alguns conceitos
importantes para a análise física e matemática. Voltando ao arranjo quadrado (veja a Fig. 2.4),
vamos supor que cada sítio possa estar “ocupado” (por um material condutor elétrico, por uma
entidade polarizável ou por uma árvore, como no exemplo acima), cuja probabilidade de ocupação
seja p; ou “desocupado”, com probabilidade 1-p. Numa rede de N sítios, temos pN sítios ocupados
e (1-p)N sítios desocupados. Definimos sítios “vizinhos” aqueles cujas células se tocam apenas
pelos lados, e de “vizinhos próximos” aqueles cujas células se tocam nas “esquinas”. Vamos
chamar de aglomerados os grupos de sítios ocupados que sejam vizinhos. Podemos dizer que a
teoria de percolação é o modelo que analisa os números e propriedades desses aglomerados.
Evidentemente essa definição de aglomerados é arbitrária e limitada, uma vez que estamos
analisando uma rede quadrada e discreta. Podemos admitir que vizinhos próximos façam parte do
mesmo aglomerado, e podemos também analisar redes tridimensionais e contínuas. Vamos
desconsiderar estas complicações, e continuar estudando, por enquanto, este modelo simplificado.
Figura 2.4: Exemplo de um arranjo
quadrado. Os círculos pretos estão
“ocupados”
15
Definiremos, agora, duas maneiras de abordar o problema da percolação numa rede
discreta: a percolação de sítios e a percolação de ligações. A percolação de sítios foi apresentada
acima, no exemplo da floresta quadrada, onde consideramos que cada sítio pode (ou não) ser
ocupado. A transmissão de chamas, neste caso, ocorre entre sítios vizinhos de um mesmo
aglomerado, e a concentração crítica é determinada pela concentração de sítios ocupados.
Já na percolação de ligações, podemos imaginar que haja algum tipo de conexão entre os
sítios, que estão todos ocupados. Se a ocupação dos sítios é feita por algum tipo de material
condutor, as ligações podem ser resistores. Podemos, então, considerar que, ao invés de dispormos
de um arranjo de sítios aleatoriamente ocupados, temos um conjunto de conexões aleatoriamente
dispostas entre sítios da rede. Quando um aglomerado de ligações “varre” todo o sistema, ligando
um lado ao outro da amostra, o sistema percola. Neste caso, podemos supor que a condução se faz
através de ligações “abertas” ou “fechadas”. A concentração de ligações na qual há o primeiro
aglomerado infinito é a concentração crítica.
Assim como a definição de aglomerados, o uso da percolação de sítios ou de ligações é
uma decisão que deve levar em consideração a conveniência do sistema analisado
9
. Porém, há
outras formas de abordar o problema (estabelecendo correlações entre ocupação de sítios ou entre
as ligações, por exemplo).
Os cálculos das propriedades de sistemas percolativos quase sempre exigem simulações
numéricas. Entretanto, alguns modelos podem permitir um cálculo direto. O mais simples e
evidente desses é a percolação de sítios numa rede unidimensional. A concentração crítica de sítios
ocupados, nesse caso, é óbvia:
1
=
c
p
Também podemos calcular o número de aglomerados com s sítios nesta rede:
(2.19)
2
(1 )
s
s
np p=−
válida exceto no valor crítico
9
, quando temos um único aglomerado. Infelizmente, Eq. 2.19 não
pode ser generalizada para uma dimensionalidade maior.
16
Outra rede simples, que permite um cálculo direto de p
c
, e importante para análises futuras,
é a rede de Bethe (também chamada de árvore de Cayley): imagine uma rede onde cada sítio esteja
conectado a z vizinhos, conforme figura abaixo, onde se usou
3
=
z
.
Figura 2.5: Rede de Bethe ou árvore de Cayley com z = 3
A partir do desenho, podemos observar que um sítio tem uma casca de 3 sítios (primeira
geração), uma segunda casca de 6 vizinhos (segunda geração), uma terceira geração com 12
vizinhos, e assim por diante. Por indução, uma “esfera” de r gerações contém
sítios e
uma superfície com
sítios. Quando
223 ×
r
1
23
×
r
r
, metade dos sítios está na superfície e a outra
metade está no interior da “esfera”.
Geometricamente, sabemos que, para um sólido de d dimensões, sua superfície S e volume
V se relacionam por
d
VS
1
1
. Quando
d
,
VS
. Na rede de Bethe, pela análise que
fizemos acima, a razão entre a superfície e volume tendem a um valor finito. Se temos um valor de
conexões z ao invés de 3, esta razão fica
)1()2(
zz
. Para que isso seja consistente, devemos
ter que . Portanto, a rede de Bethe possui infinitas dimensões.
d
Podemos encontrar facilmente a concentração crítica nesse modelo. Considere que um dos
sítios seja considerado como origem do sistema, conectado a um vizinho (na verdade, escolhemos
um caminho dos z possíveis). A partir desse vizinho há (z - 1) caminhos a serem escolhidos. Como
cada sítio tem ocupação p, temos (z – 1)p caminhos, em média, para serem seguidos. Como
precisamos de apenas um caminho ligando duas extremidades da amostra:
17
1
1
c
p
z
=
(2.20)
(consideramos, evidentemente, que não há “loops” na rede. Este valor também é válido na
percolação de ligações).
Podemos calcular várias grandezas, como a probabilidade de um dado sítio pertencer a um
aglomerado infinito e o tamanho médio do aglomerado S no limiar da transição
9
. Este último pode
ser escrito como:
1
c
S
pp
(2.21)
para
. Esta equação ilustra uma característica importante desses fenômenos críticos:
próximos à região de transição, as grandezas se comportam como potências de
.
c
pp
)(
c
pp
Simulações computacionais podem ser usadas para determinar a concentração crítica para
outros tipos de rede. Além dos modelos acima, apenas alguns outros poucos permitem cálculos
matemáticos diretos para o cálculo deste valor.
Outra grandeza importante em sistemas percolativos é a função correlação ou par de
conectividade
, que é a probabilidade de um sítio a uma distância r de um outro ocupado
pertencer a um mesmo aglomerado do sítio de origem. No caso unidimensional citado acima,
temos que:
()gr
()
r
gr p
=
que pode, convenientemente, ser escrito como:
1
ln
ln
()
r
r
rp
p
gr e e e
ξ
=== (2.22)
onde
11
ln
c
ppp
ξ
=− =
(2.23)
18
A última igualdade só é válida para p próximo de p
c
=1; ξ é chamado comprimento de correlação
ou conectividade.
Uma definição geral para o comprimento de correlação é dada da seguinte forma: a função
correlação
é a probabilidade de dois sítios, a uma distância r um do outro, pertencerem a um
mesmo aglomerado. Portanto, podemos definir ξ como uma distância média entre partículas de um
mesmo aglomerado:
()gr
2
2
()
()
r
r
rgr
gr
ξ
=
. (2.24)
É possível provar que:
s
s
s
ss
ns
nsR
=
2
22
2
2
ξ
,
onde R
s
é chamado “raio de giração” do aglomerado. Esta grandeza é uma medida do “tamanho”
do aglomerado:
2
2
2
,
1
2
ij
s
ij
rr
R
s
=
r
v
As duas equações acima são úteis para que provemos uma interessante característica do
comprimento de correlação. Intuitivamente, sabemos que R
s
deve divergir quando .
Portanto, o comprimento de correlação também deve divergir nesse limite. Assim, podemos
escrever que:
c
pp
c
pp
ν
ξ
∝−
quando , (2.25)
c
pp
onde ν é um expoente crítico que, através de teorias de escala, pode ser relacionado à dimensão
fractal do aglomerado.
19
Até agora discutimos características de grandezas importantes para a teoria de percolação,
como o comprimento do aglomerado e o comprimento de correlação. A não ser que estejamos
analisando as amostras microscopicamente ou usando técnicas de espalhamento, por exemplo,
tanto S quanto ξ são inacessíveis experimentalmente Mais eficaz do que analisar incêndios em
florestas, podemos estudar a condutividade de uma mistura de condutores e isolantes.
Vamos voltar a nossa rede quadrada de sítios. Imaginando uma amostra suficientemente
grande, vamos colocar dois contatos elétricos entre os extremos desta e aplicar uma corrente
elétrica. Mediremos a resistência do sistema em função da probabilidade de ocupação dos sítios
por um material condutor. Evidentemente, a condução tende a ser nula para
, já que não há
nenhum aglomerado ligando os dois eletrodos. Em
c
pp <
c
pp
=
, surge o primeiro indício de condução
na amostras, que aumenta à medida que p cresce além de p
c
.
Como já foi descrito, em
c
pp
=
observamos, pela primeira vez, a formação de um
aglomerado, cujo tamanho tende a infinito para amostras infinitas, que por sua vez é responsável
pela condução elétrica através de conexões entre sítios ocupados por um material condutor.
Considere P(p) a probabilidade de um sítio pertencer a um aglomerado infinito. Poderíamos supor
que a condutividade Σ(p) da amostra é proporcional a esta grandeza, o que foi mostrado não ser
verdade. Last e Thouless
10
, medindo a resistividade de uma folha de grafite onde buracos eram
feitos aleatoriamente, mostraram que, embora tanto a condutividade quanto a probabilidade de um
sítio pertencer a um aglomerado infinito apresentarem o mesmo valor crítico de p, a dependência
com a probabilidade das duas grandezas apresentam comportamentos diferentes.
Isto pode ser explicado quando analisamos o formato do aglomerado, mostrado na Fig.
2.6.Imagine que aplicamos uma diferença de potencial entre os limites deste. Muitas conexões
entre sítios não conduzirão corrente, uma vez que levam à sítios isolantes. Estas conexões são
chamadas de “penduradas” ou “mortas”. Se retirarmos todas as conexões mortas, ficaremos apenas
com uma “espinha dorsal”, por onde toda a corrente flui. Simulações numéricas mostram que
grande parte das ligações são conexões mortas, portanto os sítios entre estas ligações não
participam da condução de corrente, mesmo pertencendo ao aglomerado. Por esta razão, Σ(p) e
P(p) não apresentam mesmo comportamento.
20
Figura 2.6: Representação de uma rede aleatória de resistores. As conexões mortas são as tracejadas. As conexões grifadas
representam os “links”, ou seja, ligações diretas entre os dois pontos de medida. Os “blobs” seriam representados pelas conexões de
traço mais fino.
Para avaliar a condução nesse sistema, conhecido como rede de resistores aleatórios (cada
conexão é, na verdade, um resistor), é usada a idéia proposta por Kirkpatrick
11,12
, baseada nas
equações de Kirchhoff. Neste processo, podemos chegar à seguinte lei para a corrente elétrica
9
:
()
ij i j i
j
VV I
σ
=
onde
ij
σ
é a condutância entre os sítios i e j, e (V
i
– V
j
) é a diferença de potencial entre estes dois
sítios, I
i
é a corrente que “sai” de um sítio i, e é não-nula apenas nos sítios das extremidades. Ao
resolver este conjunto de equações, pode-se determinar que a condutividade Σ da amostra segue,
para p próximo de p
c
, uma lei de potência do tipo:
. (2.26)
()
t
c
ppΣ∝
Stauffer e Aharony
9
observam que não há, até o momento, leis de escala exatas que
relacionam este novo expoente t com os anteriores. Consideraremos, assim, que este é um novo
expoente, básico e independente dos demais.
Podemos visualizar a estrutura da rede de resistores aleatórios dividindo a amostra numa
série de caixas, cada uma delas contendo um aglomerado e distantes uma da outra de um valor ξ.
O “mini-aglomerado” inserido dentro desta caixa tem um formato similar ao aglomerado infinito,
devido a dimensão fractal deste. O ponto de contato entre estas caixas é chamado nós (“nodes”, em
inglês). Sabemos que a condução entre as extremidades é feita através da espinha dorsal do
aglomerado. Poderíamos supor que as ligações dessa espinha são simples (“links”), mas uma
análise cuidadosa mostra uma série de resistores paralelos nesta (“blobs”). Este modelo simples,
chamado “links-nodes-blobs”, é bastante usado na análise teórica das redes de resistores aleatórios.
Simulações numéricas mostram que boa parte dos sítios da espinha dorsal pertence aos “blobs”.
21
Numa série de cálculos numéricos, Kirkpatrick
12
previu o valor de t para este modelo em
três dimensões. Ele observou que próximo à transição condutor-isolante, a lei de potência dada
pela Eq. 2.26 era obedecida com o valor
5,1
t
para percolação de sítios e de ligações. No
entanto, o autor supôs que cada resistor teria condutividade 0 ou 1 (na percolação de ligações, ou
seu análogo, na percolação de sítios) .
Vamos considerar, porém, uma rede aleatória de resistores, como as condutâncias
microscópicas g de cada conexão escolhida a partir de uma distribuição de condutâncias f(g) dada
por
13
:
() (1 )() ()fg p g phg
δ
=
−+
(2.27)
onde os isolantes são escolhidos com probabilidade (1-p) e os resistores com probabilidade p estão
distribuídos via função normalizada h(g). Se esta função é bem comportada em toda a faixa de
condutâncias, temos um valor para o expoente t na Eq. 2.26:
2
t
, no caso tridimensional
9
, sendo
este um valor universal, ou seja, independente das particularidades da rede. Na verdade, o
expoente t, neste cenário, dependeria apenas da dimensionalidade do meio.
A possibilidade teórica de expoentes não-universais foi apresentada por Kogut e Straley
13
.
Estes autores supuseram que, se a função h(g) divergisse quando
, ou seja, se a amostra
apresentasse uma alta probabilidade de conter conexões com baixa condutância, o expoente t
deveria ser diferente de dois. Na verdade, Kogut e Straley propuseram a função:
0g
() (1 )hg g
α
α
=− (2.28)
para g < 1, e
, para g > 1, com
0)( =gh
10
<
<
α
. Neste cenário, os autores concluíram que o
expoente t poderia ter um valor diferente do universal t
un
:
1
un
tt
α
α
=+
(2.29)
o que justificaria valores experimentais do expoente diferente do universal.
Baseados nessa justificativa, vários autores relataram modelos onde a não-universalidade
pode ser observada. Um destes é o modelo de percolação numa amostra contínua chamado modelo
22
de “queijo suíço”. Neste modelo, “buracos isolantes” são colocados em um meio contínuo
condutor. Estes buracos podem se sobrepor. Halperin et al
14
mostraram que o mapeamento deste
meio numa rede discreta leva a uma distribuição de condutâncias h(g) divergente para
,
provocada pela distribuição finita
0g
)(
δ
p
da distância
δ
entre as superfícies dos isolantes, quando
0
δ
. Neste caso, para uma amostra tridimensional, temos
.5,2
t
Já o modelo conhecido como “queijo suíço invertido”
15
, na qual “buracos condutores”, que
podem se sobrepor, são dispostos num meio isolante e contínuo, o mapeamento não leva a uma
divergência para h(g) quando
, pois nesse caso os autores obtiveram um valor negativo para
0g
α
. Portanto, neste caso, o expoente t é o universal.
Uma importante contribuição para o entendimento da não-universalidade foi dada por
Balberg
16
, que considerou um sistema onde carbon-black (partículas condutoras) era disperso em
uma matriz isolante de Poli(cloreto de vinila) - PVC. Para explicar a não-universalidade do
expoente neste sistema, o autor supôs que poderia haver correntes de tunelamento dentro da
amostra. Ao calcularmos a distribuição de condutâncias provocada pela distribuição de distâncias
entre as partículas condutoras (e, portanto, pela probabilidade de haver tunelamento entre estas), o
autor conclui que:
1
0
() ln
r
a
g
hg g
g
⎛⎞
⎜⎟
⎝⎠
(2.30)
onde r é a distância característica de tunelamento, a é a distância média entre partículas e g
0
é uma
constante. Para pequenos valores de g e
ra
<
, h(g) tem um comportamento tipo
1
r
a
gg
α
(2.31)
De acordo com a teoria de Kogut e Straley
13
este comportamento leva a expoentes não-
universais. Posteriormente, Balberg
17
mostrou que uma distribuição divergente
)(
δ
p
para
0
δ
no modelo “queijo suíço” poderia elucidar uma série de resultados experimentais em sistemas que
seriam explicados por este modelo, mas que apresentavam valores de expoente muito acima do
valor universal ou daquele previsto por Halperin et al
14
.
23
A dependência do expoente com a dimensionalidade também foi discutida por Straley
18
. O
valor universal, segundo simulações numéricas, já era considerado dependente da dimensão d do
sistema. Entretanto, modelos para o expoente com dependência explícita em d foram propostas. O
cenário “links-nodes-blobs”, discutido acima, foi baseado nas idéias de Skal e Shklovskii e de
Gennes (cujas citações estão na Ref. 18). Podemos supor que cada cadeia, composta de ligações
simples ou não ( “links” ou “blobs” ) e de comprimento ξ, possui uma resistência dada por:
ζ
)(
c
pp
(2.32)
Argumentos simples
18
levam a uma relação entre a dimensão d e os expoentes ν e ζ:
(2)td
ν
ζ
=
−+
(2.33)
ζ é considerado ser próximo da unidade. Straley
19
mostrou que estas idéias podem ser
generalizadas, considerando, adicionalmente, uma distribuição divergente de condutâncias
microscópicas. O autor mostrou que o expoente corresponde ao maior entre seu valor universal e:
α
α
ζνα
++=
1
)2()( dt
(2.34)
Até a presente data, modelos que buscam explicar a não-universalidade tem sido propostos.
Este é um tema ainda em discussão. Vários resultados experimentais apresentam expoentes não-
universais, que serão discutidos posteriormente, junto com nossos dados experimentais. Antes,
porém, é interessante discutir em que faixa de medidas as duas teorias, apresentadas nestas duas
seções, podem ser corretamente aplicadas aos resultados experimentais.
Seção III: Regiões de Validade Para Teorias de Condutividade em Misturas
Landauer
2
argumentou que teorias de meio efetivo, como os modelos de Bruggeman, não
seriam corretamente aplicáveis a misturas onde a concentração de uma das fases tende a zero. Por
outro lado, como vimos na Seção II, o comportamento na forma de lei de potência de
(
)
c
pp
da
teoria de percolação se aplica quando a concentração de uma das fases tende a um valor crítico.
24
Afinal, até que valores de concentrações pode-se usar TME e a partir de que ponto podemos
analisar os resultados com TP? Como a discussão sobre a origem da não-universalidade no
expoente de percolação, este é um tema que até hoje não é bem definido.
Vários autores que se propuseram a estudar sistemas percolativos tiveram que tentar
explicar regiões de concentração onde seus resultados não são corretamente explicados pela TP,
propondo equações de TME, não citadas na Seção I. Um dos primeiros a fazer isto foi
Kirkpatrick
11,12
. Em suas simulações, este autor observou claramente dois comportamentos
diferentes, um para a região crítica, e outro para valores de concentração bem acima do valor
crítico. Assim, este elaborou uma equação para uma rede de resistores aleatórios considerando
flutuações de campo elétrico em um resistor em particular, considerando que todos os demais
resistores tenham sua resistência igual à resistência equivalente da rede. Este modelo usa idéias
similares à teoria simétrica de Bruggeman, e chega a um expoente t = 1 para uma região além da
crítica.
Já Watson e Leath
20
, num experimento semelhante ao de Last e Thouless
10
, e para
determinar com alguma precisão a região crítica, sugeriram um análogo do critério de Ginzburg
para teorias de campo médio na Termodinâmica. Este critério também foi usado por de Gennes
21
para avaliar regiões de validade para determinação de expoentes percolativos em processos de
vulcanização em transições sol-gel. Fora da região de transição, Watson e Leath
20
elaboraram uma
equação de meio efetivo para seu sistema, assim como fez Kirkpatrick
11,12
, e que posteriormente,
foi usada por Levinshtein
22
. Como, experimentalmente, esses autores trabalharam em sistemas
bidimensionais, suas equações permitiram a análise das medidas através da percolação de sítios ou
de ligações.
Se considerarmos que o critério de Ginzburg é realmente válido para determinar a região
crítica, poderemos então avaliá-la dentro de um limite aceitável de erros experimentais. Para
determinar este limite, pode-se usar algumas conexões com a Termodinâmica, que são úteis e vêm
sendo feitas há algum tempo. Vamos voltar à rede de resistores aleatórios formados com
elementos com condutâncias b (com probabilidade p) e a (com probabilidade 1 – p). Se a = 0, b
finito, temos a usual lei de potência para p > p
c
, . Se a é finito,
b
e p < p
c
, a
condutividade diverge segundo a equação . Se a e b são finitos e p = p
c
, então
, onde:
t
c
ppb
)(~
σ
=∞
s
c
ppa
)(~
σ
uu
ba
1
~
σ
25
t
u
st
=
+
(2.35)
Straley
23,24
propôs que, se
0
=
ba
, p = p
c
é um ponto crítico análogo àqueles estudados
em transições de fase e que também podem ser estudadas pelas mesmas representações
matemáticas fornecidas pela teoria de escala. Entretanto, o autor mostra que isto só seria válido
quando o tamanho L da amostra tende a infinito. Portanto, amostras finitas apresentam variação de
amostra para amostra, o que corresponde a uma flutuação no valor da condutividade. Straley
24
mostrou que a flutuação da condutividade está relacionada com o tamanho L e com o comprimento
de correlação ξ a partir da relação:
2
22
~
Σ
L
ξ
δσ
(2.36)
Esta discussão é válida apenas nas proximidades da transição, isto é, na região de validade
do modelo de percolação, e mostra a dependência da flutuação dos erros experimentais, devido às
dimensões das amostras, ou seja, a flutuação de amostra-para-amostra.
Entretanto, a observação dessa flutuação não significa, claramente, que medidas
experimentais foram feitas dentro da região crítica. Dubson e Garland
25
observaram
experimentalmente a Eq. 2.36 em suas medidas experimentais em um sistema bidimensional
discreto, onde buracos isolantes eram colocados em uma folha condutora. Contudo, notaram que a
região crítica se estendia a altos valores de concentração, inclusive para um sistema contínuo. Já
Han et al
26
observaram que o expoente variava à medida que a concentração de buracos isolantes
se aproximava do valor crítico, independente da anisotropia destes, convergindo para um valor
especifico em p
c
.
A partir dessa discussão, observamos que os limites de validade dos modelos de percolação
e meio efetivos ainda não estão claramente definidos. Analisaremos nossos resultados
experimentais sob a luz dessa discussão, na tentativa de obter parâmetros corretos e confiáveis que
permitam o estudo correto do sistema, além de contribuir para elucidação deste tema.
26
CAPÍTULO 3
Modelos de Condutividade Elétrica
Neste capítulo iremos sumarizar alguns modelos de condução elétrica que serão úteis neste
trabalho. Na primeira seção, iremos apresentar os fundamentos que levam ao modelo de hopping,
segundo o qual a resistividade deve variar com a temperatura segundo uma lei do tipo
,
onde T é a temperatura e ν é um expoente cujo valor e significado físico será discutido.
ν
ρ
Tln
Na segunda seção, complementaremos o capítulo apresentando outro modelo de condução
elétrica em função da temperatura, proposto por Sheng e colaboradores.
Seção I: Condução por Hopping
O cenário mais simples que podemos imaginar para condução em um material é em um
cristal perfeito. Neste caso, os sítios estão igualmente espaçados um do outro e representam um
centro “espalhador” para elétrons “viajando” pelo cristal. Podemos, portanto, considerar que o
potencial sob o qual o elétron está submetido é periódico e, portanto, tem a seguinte característica:
()(Ur R Ur+= )
r
r
r
(3.1)
onde
R
r
é um vetor de onda da rede de Bravais. Se
)(r
r
ψ
é solução da equação de Schrödinger
neste potencial, o teorema de Bloch
3
afirma que:
)()( reRr
Rki
r
r
r
r
r
ψ
ψ
=+
para todo
R
r
da rede de Bravais. Alternativamente, o teorema de Bloch pode ser escrito da
seguinte forma
3
:
)()( ruer
k
rki
k
r
r
r
r
r
r
=
ψ
(3.2)
onde é uma função com a mesma periodicidade de
)(ru
k
r
r
)(rU
r
. Portanto, as soluções são, na
verdade, ondas planas moduladas e que, de fato, não sofrem espalhamento dentro do cristal.
27
Na verdade, o potencial a que está submetido o elétron nesse cenário pode ser
extremamente difícil, uma vez que interações entre elétrons e núcleos atômicos ou interações de
par elétron-elétron podem complicar muito a forma de
)(rU
r
. Entretanto, para a análise feita, a
suposição (3.1) é suficiente.
Sabendo disso, vamos simplificar bastante nosso problema. Considere que tenhamos um
elétron submetido a um potencial periódico de um cristal como mostrado na figura abaixo,
juntamente com uma representação pressuposta de sua densidade de estados.
U
Figura 3.1: Potencial periódico simplificado de um cristal e a densidade de estados associada a esta configuração.
Anderson
27,28
propôs que coloquemos algum tipo de desordem ao potencial eletrônico, de
tal forma que
)(rU
r
assuma um formato do tipo mostrado na Fig. 3.2:
28
Uo
U
Figura 3.2: Potencial com profundidade variável, conforme propôs Anderson.
Um dos efeitos provocados por esta desordem é um alargamento da densidade de estados
em função da energia deste sistema
27
, como mostrado na figura abaixo.
Figura 3.3: Densidade de estados associado ao potencial da figura anterior. Note que os estado localizados estão marcados, com
energia menor que o limiar de mobilidade.
Se os poços têm uma profundidade que varia dentro de uma faixa de valores U
0
, como
mostra a figura, observa-se que à medida que o valor de U
0
é aumentado, o gráfico da densidade
de estados é alargada, mostrando um pico menos intenso. Mott
27
discute que isto pode provocar
uma transição condutor-isolante no sistema, já que a condutividade tende a zero quando a
desordem ( a faixa de profundidade ) aumenta. Isto acontece porque, em um certo valor de
0
UB,
onde B é definido como:
()()
τψψ
dRrHRrI
z
I
B
nn 1
2
+
=
=
r
r
r
r
sendo z é o número de coordenação e
n
R
r
são os vetores que determinam os sítios da rede, as
funções de onda do sistema se tornam localizadas espacialmente. Neste caso, a parte espacial da
função de onda do sistema seria do tipo:
29
()
()
0
0
exp RreC
Rr
r
n
i
n
n
n
r
r
r
r
r
=Ψ
ψ
ξ
φ
onde C
n
são constantes e cada elétron encontra-se num certo valor . Diferentemente das
soluções de Bloch, observe que há a inclusão de uma fase e de um fator ξ definido como
comprimento de localização do elétron, que tende a infinito quando a primeira localização ocorre e
decresce quando U
0
R
r
0
cresce. Estes tipos de estados são chamados estados localizados de Anderson.
Um dos critérios usados por Anderson
28
para definir a localização é o cálculo do quadrado
do módulo da função de onda correspondente a um elétron que está, inicialmente, no sítio i, em
função do tempo,
()
2
t
ψ
. Se, quando
t , este valor tende a zero, o estado é não-localizado. Se
o valor tender a um número finito, então o estado é localizado.
Para algum valor crítico de
o
UB, toda a banda é preenchida por estados localizados, num
processo que pode ser tratado por teoria de percolação, levando a transição condutor-isolante. Se
o
UB não é grande o suficiente para oferecer localização em toda a banda, haverá, então, estados
localizados e não-localizados (estendidos) separados em um valor de energia chamada energia do
“limiar de mobilidade”
E
c
. Se a energia de Fermi E
f
de um sistema está acima do limiar de
mobilidade, então este apresenta um comportamento metálico. Caso contrário, a condução elétrica
se faz de dois modos: excitação de um elétron até a energia de limiar de mobilidade ou através de
um processo termicamente ativado, se a densidade de estados nos nível de Fermi
N(E
f
) é finito,
definido como
hopping.
No processo de hopping, um elétron com energia menor do que
E
f
recebe energia de um
fônon e sofre uma transição para o estado de um vizinho mais próximo com energia maior do que
E
f.
. É um processo entre estados localizados, que foi descrito inicialmente por Miller e Abrahams,
quando mostraram que a resistividade
ρ
, neste processo se comporta segundo a seguinte equação:
3
3
exp
B
kT
ε
ρρ
⎛⎞
=
⎝⎠
(3.3)
se
R é a distância entre vizinhos próximos, então
3
3
)(1~ REN
f
ε
.
30
Mott
27,28
descreveu que, a baixas temperaturas, este “salto” pode não ocorrer para seu
vizinho mais próximo. A chamada lei de Mott é baseada no argumento que em baixas
temperaturas, a condução é devida a estados localizados numa região da banda muito próxima à
energia de Fermi. Considerando que, nessa região a densidade de estados é constante e não-nula,
há uma competição entre ativação térmica e tunelamento entre sítios que determina a condição
para condução. A energia que maximiza a condução leva a:
1
4
0
exp
o
T
T
ρρ
⎛⎞
=
⎜⎟
⎝⎠
(3.4)
onde ρ
0
é uma constante e T
0
é inversamente proporcional à densidade de estados no nível de
Fermi
N(E
f
) e ao cubo do raio de localização dos estados a. Nesse caso, temos que
()
3
o
Bf
T
kNE a
β
=
(3.5)
onde k
B
é a constante de Boltzmann
β
é uma constante numérica, que pode ser obtida através do
método de percolação
28
.
Ao calcularmos a distancia média
r de hopping, observamos que
4
1
T
T
r
o
, ou seja, é
uma função da temperatura. Por isso, este processo é chamado “
hopping de alcance variável”. No
processo descrito pela Eq. 3.3, a distância média de “salto” não depende da temperatura, sendo
constante e igual à distância média entre primeiros vizinhos.
Se a interação coulombiana entre elétrons é considerada, Efros e Shklovskii encontraram
que a condutividade deveria seguir a fórmula:
1
2
0
exp
o
T
T
ρρ
⎛⎞
=
⎜⎟
⎝⎠
(3.6)
Este comportamento se deve ao aparecimento de um pequeno “gap” energético no nível de Fermi
que é geralmente percebido em temperaturas baixas. Portanto quando se aumenta a temperatura da
amostra deve-se passar do regime de Efros-Shklovskii para o de Mott.
31
O mesmo comportamento da Eq. (3.5) também foi previsto por Sheng e colaboradores
29
,
para materiais granulares sob ação de campos baixos, usando considerações sobre a estrutura de
metais granulares, como a energia necessária para transferir um elétron entre grãos. Neste caso
Sheng e Klafter
30
argumentaram que, em sistemas desordenados granulares, o expoente seria
14
ν
= para , 0T 12
ν
> mas 1
<
ν
para
T e teria um valor 12
ν
= para temperaturas
intermediárias. Portanto, os regimes de expoentes 1/2 e 1/4 estão em ordem invertida com relação
àquela dos regimes de Efros-Shklovskii e de Mott. Na verdade, na literatura, observa-se o
comportamento
com o expoente ν apresentando diferentes valores. Aharony e
colaboradores
ν
ρ
Tln
30
propuseram que há uma temperatura de interseção entre estes dois
comportamentos, igualando as distâncias de “salto” do elétron (distâncias de
hopping) encontradas
por Mott (densidade de estados constante) e de Efros-Shklovskii (que leva em consideração a
interação coulombiana entre elétrons). Para representar a superposição destes dois modelos, os
autores propuseram uma função heurística, obtida ao maximizar-se a probabilidade de
hopping
quando se leva em consideração as suposições de Mott e Efros-Shklovskii.
Determinar experimentalmente esta temperatura de interseção pode não ser fácil. Neste
trabalho, avaliaremos nossos resultados experimentais usando estes modelos, verificando qual se
aplica melhor ao nosso sistema. Além destes, iremos testar as idéias de Sheng e colaboradores, que
apresentaremos na próxima seção.
Seção II: O modelo de Sheng
Sheng e colaboradores
32
elaboraram um modelo para analisar a condução em compósitos
de carbono-PVC. Neste caso, como discutimos na análise da teoria de percolação, há formação de
aglomerados de carbono, imersos em uma matriz isolante polimérica. Diferentemente de trabalhos
anteriores, onde a energia de ativação para transportar um elétron de um grão para outro tinha um
papel fundamental nos cálculos, os autores consideraram desprezível a energia necessária para um
elétron “pular” de um aglomerado para outro. Assim, o tunelamento, neste caso, pode ser visto
entre o “bulk” de dois condutores. Além do mais, as barreiras de tunelamento são termicamente
moduladas.
32
Baseado nessas hipóteses, para campos elétricos baixos, os autores chegaram à seguinte
equação para a resistividade:
1
0
0
exp
T
TT
ρρ
⎛⎞
=
+
⎝⎠
(3.7)
onde os parâmetros T
0
e T
1
dependem de características como a área e a distância entre as placas
paralelas de um capacitor, por exemplo (este capacitor é uma aproximação para as barreiras entre
os condutores). Embora esta característica seja diferente para cada junção, os autores argumentam
que, para uma distribuição de T
0
e T
1
, a Eq. 3.6 deve descrever bem a resistividade de todo o
compósito. Argumentos semelhantes levam a uma equação para a densidade de corrente em
função do campo aplicado para campos altos.
33
34
CAPÍTULO 4
Resultados Experimentais e Discussão
Neste capítulo, apresentaremos o material que utilizamos nesse trabalho (o negro de fumo),
a montagem e os procedimentos experimentais do nosso trabalho, os resultados obtidos e a
discussão a respeito destes.
Seção I: O Negro de Fumo
O objetivo desta seção é apresentar, sucintamente, algumas características do material que
usamos neste trabalho: o negro de fumo ou “carbon black”.
Segundo a usual definição introdutóriaPPP
33,34
P
, “carbon black” é um nome genérico para um
grupo de produtos industriais, constituídos de uma forma primária, as partículas de negro de fumo,
que se organizam em cadeias chamados agregados, que por sua vez são as menores unidades na
qual o material se dispersa. Estes agregados, por fim, podem se juntar em formações maiores,
chamados aglomerados.
Este produto já vem sendo usado há vários séculos. Chineses e indianos já usavam um
preliminar deste material como pigmentos para tintas desde o século III a.C.P
33
P
. Além de continuar
sendo usado para este fim, o negro de fumo é atualmente usado como pigmento para plásticos,
pneus, fibras e borracha, além de outras aplicaçõesP
34
P
. Seu uso industrial está relacionado às suas
características, como área superficial específica, tamanho da partícula, estrutura e condutividade.
O negro de fumo pode ser produzido, basicamente, por dois métodos: a combustão
incompleta e a decomposição térmica de hidrocarbonetos. A diferença entre estes,
respectivamente, é a presença ou não de oxigênio no processo. Estes dois processos são
responsáveis pela quase totalidade do negro de fumo produzido no mundo, sendo o processo de
combustão incompleta o principal.Cada um destes métodos pode ser subdividido em outros, com
diferentes hidrocarbonetos usados. Controlando as condições experimentais da reação, diferentes
tipos de negro de fumo, com diferentes características, podem ser produzidos.
Ao falarmos da estrutura de negro de fumo, estamos nos referindo a microestrutura de cada
uma das partículas. Cada partícula tem um formato que pode, geralmente, ser aproximada como
esférica, e é formada por planos de grafite, orientados aleatoriamente, formando uma estrutura
amorfa. Estas partículas são extremamente pequenas (com diâmetros geralmente menores do que
35
300 nm), cujo diâmetro pode ser controlado durante a produção, a partir das condições do processo
utilizado.
As partículas primárias se unem através de fortes forças eletrostáticas, organizando
estruturas maiores, os agregados. Estes agregados podem se ramificar em estruturas
tridimensionais complexas, determinando o que chamamos de negro de fumo de altas estruturas.
Caso contrário, o negro de fumo é chamado de baixa estrutura.
Para determinar a estrutura deste material usa-se a técnica de absorção de óleo pelo pó.
Geralmente, determina-se a quantidade de dibutilftalato (DBP) absorvido por 100 g de negro de
fumo. Esse valor determina o grau de ramificação desses agregados: um alto valor de absorção
significa que o pó é altamente estruturado, com agregados ramificados. Um baixo valor de
absorção significa, pelo contrário, que os agregados são pouco ramificados.
Figura 4.1: Figura ilustrativa de um aglomerado de negro de fumo
Aglomerados são compostos de agregados ligados por forças de Van der Walls, ou seja,
podem ser dispersos em unidades menores até, no limite, do tamanho de agregados individuais.
O negro de fumo utilizado é o Vulcan XC72R, cedido pela Cabot Corp
P
34
P
. É um material
muito leve e fofo, de densidade igual a 1,87 g/cm
P
3
P
. Segundo as notas técnicas desta empresa, este
material é de fácil dispersão, com absorção de DBP = 192 mL/100 mg, sendo considerada de
média estrutura, com tamanho de partícula média igual a 30 nm. O tamanho da partícula primária é
obtido a partir de Microscopia Eletrônica de Transmissão, segundo a empresa.
Todas estas informações estão mais detalhadas nas Refs. 33 e 34. Informações adicionais,
especificamente sobre este tipo de negro de fumo, estão na Ref. 35.
36
Seção II: Metodologia e Aparato Experimental
Como não temos uma matriz polimérica para sustentar mecanicamente o negro de fumo,
usamos um porta-amostra para este fim. Este porta-amostra é cilíndrico, feito de material isolante
elétrico, e cujas tampas, feitas de cobre, funcionam como contato elétrico. O carbono é
pressionado dentro deste porta-amostra, de volume conhecido, com diferentes massas de pó,
produzindo assim diferentes densidades volumétricas de negro de fumo. Esta grandeza, a
densidade volumétrica, será utilizada como parâmetro para a análise de percolação.
Um esquema do porta-amostra é mostrado abaixo na Fig. 4.2:
Figura 4.2: Esquema do porta-amostra utilizado
Naturalmente, a densidade de cada amostra é calculada por:
p
m
d
V
=
onde a m é a massa de negro de fumo e V
BBB
p
B é o volume do porta-amostra.
Para medirmos a resistividade, usamos contatos elétricos na forma de “pseudo-4 pontos”.
A palavra pseudo é usada aqui porque, efetivamente, existem apenas dois pontos de contato
elétrico. No entanto, como fica claro pela figura, conectamos dois fios nestes pontos para
aplicarmos corrente elétrica através de uma fonte de corrente e medimos a diferença de potencial
usando um multímetro, a partir de outros dois fios, independentes, mas conectados nestas mesmas
tampas de cobre.
I
V
v
oltímetro
37
Poderíamos aplicar corrente e anotar a diferença de potencial usando apenas dois pontos,
usando uma fonte de corrente apropriada. Entretanto várias amostras têm resistências muito
baixas, da ordem de grandeza da resistência dos fios, o que levaria-nos a um erro experimental. Ao
acrescentarmos, na configuração descrita, o multímetro, que tem em seu circuito interno uma
resistência muito alta, este problema é eliminado.
Os porta-amostras têm formato cilíndrico, como já foi enfatizado. Se A é área da seção reta
deste cilindro e l é seu comprimento, a resistividade
ρ
de cada amostra é dada por:
VA
I
l
ρ
=
onde V é a diferença de potencial lida no multímetro e I é a corrente elétrica aplicada pela fonte de
corrente. O volume do porta-amostra, obviamente, é
p
VAl
=
.
Para estudarmos percolação, medimos a resistividade de várias amostras com diferentes
densidades. É interessante, também, estudarmos este comportamento em várias temperaturas. Para
isso, o experimento foi realizado em um criostato Oxford de imersão em atmosfera de hélio.
Assim, uma terceira variável de nosso problema é a temperatura, o que nos permite avaliar como
esta interfere nos parâmetros percolativos.
Cada amostra, com uma densidade dada, é resfriada de T = 300 K até T = 10 K. A
resistividade é medida durante este processo a partir de um programa de aquisição de dados feito
em Labview. A taxa de resfriamento foi de 2 K/min. O controle de temperatura foi feito por um
controlador de temperatura ITC503 da Oxford. Usamos uma fonte de tensão Keithley modelo 220
e o multímetro digital usado, também da Keithley, é o modelo 196.
As amostras foram mantidas no dessecador, para tentar evitar efeitos da umidade absorvida
pelo carbono. Inicialmente, usamos um porta-amostra cujo cilindro era feito de nylon, ou seja, um
material um pouco flexível. Ao realizarmos as primeiras medidas de resistividade versus
temperatura, observamos um comportamento muito semelhante ao observado em compósitos
P
35
P
,
onde a resistividade diminui durante o resfriamento até um valor mínimo, onde o processo se
inverte e a resistividade passa a aumentar com a diminuição de temperatura.
Este comportamento não era constante para todas as densidades, sendo que para algumas,
sequer existia. Na Fig. 4.3 observamos alguns exemplos disto.
38
0 50 100 150 200 250 300
0,35
0,40
0,45
0,50
0,55
ρ (Ω.cm)
T (K)
0,55 g/cm
3
0 50 100 150 200 250 300
3
4
5
6
ρ (Ω.cm)
T (K)
0,35 g/cm
3
0 50 100 150 200 250 300
2
4
6
8
10
ρ (Ω.cm)
T (K)
0,23 g/cm
3
0 50 100 150 200 250 300
150
225
300
375
450
525
600
675
ρ ( Ω.cm)
T (K)
0,09 g/cm
3
Figura 4.3: Gráficos da resistividade versus temperatura para amostras de negro de fumo em porta-amostra de nylon com
diferentes densidades.
Na literatura, este fenômeno em compósitos é conhecido
P
36
P
como efeito fusível: à medida
que a temperatura diminui, o polímero sofre contração. Neste processo, os aglomerados de negro
de fumo se aproximam, o que favorece a condução elétrica entre eles. Há uma certa temperatura
mínima onde a condução passa a ser dominada pelo tunelamento, termicamente ativado, entre
aglomerados seguindo alguma lei do tipo hoppingP
27,28
P
ou Sheng et alP
32
P
. A concorrência entre estes
dois fenômenos explica tal comportamento da resistividade.
Temos, agora, um problema: se o polímero é responsável pelo efeito fusível, por que as
medidas em negro de fumo apresentam este mesmo comportamento, mesmo sem ser mantido em
alguma rede polimérica? Antes de responder esta questão, é interessante observar a curva de
percolação do negro de fumo a T = 300 K:
39
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6
-1
0
1
2
3
4
5
6
ln ρ ( Ω.cm)
d (g/cm
3
)
T = 300 K
Figura 4.4: Logaritmo da resistividade versus densidade volumétrica d para amostra de negro de fumo em porta-amostra de nylon a
T = 300 K
Naturalmente, esta curva não apresenta um bom “aspecto”. Observamos uma grande
dispersão dos dados, o que nos leva a pensar se não estaríamos cometendo algum tipo de erro
experimental.
Para esclarecermos esta dúvida, decidimos usar um material diferente para fabricarmos o
porta-amostra: quartzo. E neste porta-amostra, o efeito fusível em negro de fumo não foi
observado.
Isto pode ser explicado por argumentos simples: o quartzo, por ser muito mais rígido do
que o nylon, não sofre deformação sob altas pressões, que deve ter sido a causa da dispersão dos
dados na curva de percolação. Além do mais, o quartzo sofre uma contração volumétrica muito
menor do que o nylon, o que nos leva a pensar que a variação volumétrica deste material sob
resfriamento tenha colaborado para o efeito observado inicialmente para o negro de fumo, uma vez
que os grãos ficam mais próximos, diminuindo a resistividade da amostra. Esta seria, portanto,
uma evidência de que o efeito fusível em compósitos seja realmente provocado pelo fenômeno da
dilatação térmica.
Sendo assim, todas as amostras usadas para nossa análise foram medidas em porta-
amostras de quartzo. Observamos que, em todas estas, a resistividade aumenta com a diminuição
da temperatura. Na Fig. 4.5, observamos alguns exemplos:
40
0 50 100 150 200 250 300
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
ρ (Ω.cm)
T (K)
0,52 g/cm
3
0 50 100 150 200 250 300
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
ρ (Ω.cm)
T (K)
0,30 g/cm
3
0 50 100 150 200 250 300
20
40
60
80
100
ρ (Ω.cm)
T ( K )
0,15 g/cm
3
Figura 4.5: Exemplos da variação da resistividade versus temperatura para diferentes amostras com densidades volumétricas
diversas de negro de fumo.
A melhora dos resultados, utilizando-se os porta-amostras de quartzo, pode ser percebida
também pelos gráficos de resistividade versus densidade do negro de fumo abaixo:
0,10,20,30,40,5
0
1x10
3
2x10
3
3x10
3
4x10
3
5x10
3
6x10
3
ρ (Ω.cm)
d (g/cm
3
)
T = 300 K
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
-2
0
2
4
6
8
ln ρ (Ω.cm)
d (g/cm
3
)
T = 300 K
(a) (b)
Figura 4.6: (a) Resistividade versus densidade volumétrica e (b) Logaritmo da resistividade versus
densidade
p
ara o ne
g
ro de fumo a T = 300 K.
41
Este comportamento, qualitativamente, é fácil de ser explicado: à medida que a densidade
volumétrica média aumenta, os grãos de carbono ficam mais próximos, o que favorece a condução
elétrica. Entretanto, mesmo sendo simples, seria interessante comparar este gráfico a outros
apresentados na literatura. Neste ponto, observamos que existem poucos trabalhos neste sentido.
Uma razão para isso, talvez, seja a grande dificuldade experimental de se determinar a região
crítica.
Os poucos trabalhos que encontramos na literatura propõem-se a medir a condutividade do
pó simultaneamente à sua compactação. Desta forma, a mesma quantidade de negro de fumo é
pressionada a partir de altas até baixas densidades volumétricas, e ao mesmo tempo é medida a
resistividade. Embora com este processo seja realmente mais rápido de efetuar o experimento, este
aparato não permite que seja variada a temperatura da amostra. De fato, até o momento, não
encontramos na literatura nenhum trabalho neste sentido no qual o comportamento percolativo é
avaliado sob diferentes temperaturas. Todos estudam a compactação do pó a temperatura
ambiente.
Alguns destes trabalhos não avaliam a região críticaP
37
P
. Estudam a condutividade e outras
grandezas, como a energia necessária para a compressão e a variação do volume da amostra com a
pressão aplicada para diferentes amostras de negro de fumo com diferentes estruturas.
Entre os demais, apenas um artigoP
38
P
aplica a teoria de percolação à seus resultados
experimentais. Os demais usam a teoria de meio efetivo para tratar a variação da resistividade com
a compactação do negro de fumo e outros materiais de carbonoP
39-41
P
. Independente dessas análises e
de quão próximos seus resultados experimentais estão próximos da região crítica, porém, a
resistividade obtida por todos estes autores aumenta com a diminuição da ocupação volumétrica
do negro de fumo, como ocorre com nossos resultados experimentais.
Seção III: Análise das curvas de resistividade versus temperatura
Analisamos os resultados da resistividade em função da temperatura para várias amostras
com diferentes densidades. A análise foi feita à luz dos modelos discutidos no Cap.3, ou seja,
“hopping” de alcance variável (
exp( / )
oo
TT
ν
ρρ
=
) de Mott (
1/4
ν
=
) ou de Efros-Shklovskii
(
1/2
ν
= )P
27,28
P
, modelo de Sheng et alP
32
P
para barreiras moduladas termicamente
(
1
exp
o
o
T
TT
ρρ
⎛⎞
=
⎜⎟
+
⎝⎠
) ou para materiais granularesP
30
P
(igual a Efros-Shklovskii mas em altas
42
temperaturas). Embora o modelo de Sheng para barreiras moduladas termicamente possa ser usado
a baixas temperaturas, percebemos que o modelo de Mott é o mais apropriado por se estender a
uma faixa maior de temperaturas. Na Fig. 4.7 observamos toda a série de curvas experimentais do
logaritmo da resistividade em função de T
P
-0,25
P
para várias densidades volumétricas (veja Eq. 3.4).
Note que, a baixas densidades, as curvas são ruidosas. Isto é explicado tanto pela dificuldade de se
obter repetitividade de amostras nesta faixa, uma vez que o pó dentro do porta-amostra está quase
totalmente livre, sem nada para mantê-lo firme, quanto pela alta dispersão de qualquer grandeza
física devido a pequenas variações da densidade. Assim, qualquer perturbação pode alterar o valor
da medida, e um arranjo diferente dos grãos, mesmo na mesma densidade, poderia levar a
resultados diferentes.
Figura 4.7: Variação da resistividade com a temperatura do negro de fumo para várias amostras. No gráfico, observamos amostras
com densidade que variam entre 0.52 g/cm
P
3
P
(menor resistividade) e 0.06 g/cmP
3
P
(maior resistividade), aproximadamente.
Na Fig. 4.8 observamos algumas dessas amostras, de altas, médias e baixas densidades,
onde notamos a possível transição de dois para um regime de condução elétrica. Para efeito de
comparação, também apresentamos os gráficos do logaritmo da resistividade em função de
5,0
T
.
43
0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
-1,4
-1,2
-1,0
-0,8
-0,6
-0,4
-1,4
-1,2
-1,0
-0,8
-0,6
-0,4
0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35 0,40
ln ρ x T
-0,25
T
-0,25
(K
-0,25
)
ln ρ x T
-0,5
ln ρ (Ω.cm)
0,52 g/cm
3
T
-0,5
(K
-0,5
)
0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
0,5
1,0
1,5
2,0
0,5
1,0
1,5
2,0
0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35
ln ρ x T
-0,25
ln ρ (Ω.cm)
T
-0,25
(K
-0,25
)
T
-0,5
(K
-0,5
)
0,26 g/cm
3
ln ρ x T
-0,5
0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35
ln ρ x T
-0,25
ln ρ (Ω.cm)
T
-0,25
(K
-0,25
)
0,15 g/cm
3
ln ρ x T
-0,5
T
-0,5
(K
-0,5
)
0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
4,0
4,5
5,0
5,5
6,0
0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35
4,0
4,5
5,0
5,5
6,0
ln ρ x T
-0,25
ln ρ (Ω.cm)
T
-0,25
(K
-0,25
)
0,09 g/cm
3
T
-0,5
(K
-0,5
)
ln ρ x T
-0,5
Figura 4.8: Dependência do logaritmo da resistividade com TP
-0,25
P
e com TP
-0,25
P
para amostras de negro de fumo com diferentes
densidades
Para várias amostras de maior densidade observamos duas faixas de temperatura com
diferentes regimes: em temperaturas intermediárias, onde o expoente
ν = 0.25 é o melhor ajuste; e
a altas temperaturas, onde há um regime que não determinamos com precisão . Entretanto, a
extensão destas faixas varia entre as amostras. Aparentemente, amostras de alta densidade
apresentam uma maior “zona de transição” entre estes dois regimes. Já para algumas amostras de
menor densidade, observamos apenas um regime. Além disso, algumas amostras de baixas
densidades apresentam vários “saltos” no gráfico da dependência com a temperatura da
resistividade, provocados pelo rearranjo dos grãos dentro do porta-amostra. Quando ocorrem estas
descontinuidades, a inclinação da curva varia levemente. Outras amostras, porém, apresentam um
pequeno desvio deste comportamento linear à altas temperaturas. Todos estes fatos não
44
permitiram que acompanhássemos com segurança a transição entre os dois regimes destas
amostras.
Além disso, embora a temperatura mais baixa atingida no experimento foi cerca de
T = 10 K, em temperaturas mais baixas parece haver uma transição do regime de Mott para o de
Efros-Shklovskii, pois algumas amostras indicam isso. Contudo, podemos afirmar que, até a
temperatura de 300 K, o modelo de Sheng e Klafter
P
30
P
para hopping em materiais granulares não se
aplica ao nosso sistema uma vez que esse modelo prevê o expoente
ν = 0.50 a altas temperaturas.
Portanto, analisaremos apenas temperaturas intermediárias, onde o ajuste de Mott é consistente
para todas as amostras. É interessante verificar que o parâmetro T
B
o
B tem um comportamento linear
com a densidade:
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
0,8
1,0
1,2
1,4
1,6
1,8
2,0
lnT
0,25
o
= 1,97355 - 2,38155 d
lnT
1/4
o
(K
1/4
)
d (g/cm
3
)
Figura 4.9: Variação do parâmetro TB
o
B da equação de hopping no regime de Mott com densidade volumétrica
De acordo com o ajuste da Fig. 4.9, temos que, aproximadamente:
0,25
0
ln 1,97 - 2,38 Td=
Como observamos na Eq. 3.5 do Cap. 3, o parâmetro
TB
o
B é inversamente proporcional ao
cubo do raio de localização e à densidade de estados do sistema, ou seja,
3
)(/1 aENT
o
. Assim,
comparando com o ajuste obtido, temos que:
45
)52,9exp()(
3
dcaEN =
onde
d é a densidade volumétrica e c é uma constante. Portanto, temos uma descrição do número
de estados de energia por energia num determinado volume definido pelo raio de localização. É de
se esperar, portanto, que à medida que a densidade volumétrica aumenta, esse número de estados
também aumenta. A baixas densidades volumétricas observamos uma dispersão dos pontos,
característicos dos sistemas percolativos.
Seção IV – Análise do Comportamento Percolativo da Resistividade
Já mostramos na Fig. 4.6, para T = 300K, que a resistividade apresenta um comportamento
tipo percolativo com a densidade do negro de fumo. Mostraremos nessa seção que a temperatura
exerce um papel relevante nesse comportamento, como mostra a Fig.4.10. Vimos que o parâmetro
TB
o
B, do modelo de Mott, apresenta dependência com a densidade. Podemos esperar que o
mecanismo de condução por
hopping também influencie os parâmetros da fórmula de percolação,
que podem assim depender da temperatura. Assim estudaremos a variação dos parâmetros
percolativos
ρB
o
B e t com temperatura.
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
-2
0
2
4
6
8
10
300 K
150 K
10 K
ln ρ (Ω.cm)
d (g/cm
3
)
Figura 4.10: Dependência do logaritmo da resistividade com a densidade do negro de fumo para T = 300 K, 150 K e 10 K.
46
Vamos separar esta seção em duas partes: na primeira, utilizaremos a hipótese de que os
dados contêm dois regimes distintos, um onde as leis de potência do modelo de percolação seriam
aplicadas e outro onde deveria se usar o de meio efetivo. Na segunda, analisaremos a curva inteira
como um único regime. Depois disso, compararemos os resultados para verificar se é possível
optar por um ou por outro.
VI.a) Análise do gráfico da resistividade versus densidade em dois regimes – Modelos de
percolação e meio efetivo
Para iniciarmos a análise, observe o gráfico da condutividade versus densidade
volumétrica, onde observamos um comportamento linear a altas densidades. A partir desse fato,
podemos considerar que, nesta faixa, seria válida uma das teorias de meio efetivo com expoente
t = 1. No caso, esta região seria simulada por uma rede de resistores aleatórios, como proposto por
Kirkpatrick
P
11,12
P
. Também poderia ser usada a teoria de meio efetivo geral proposto por
McLachlan
P
5-8
P
para esta região. Entretanto, como veremos, há uma dependência com a temperatura
da densidade crítica, que é mais facilmente explicada pelo modelo anterior.
Na Fig. 4.11 apresentamos o gráfico da condutividade
σ para analisarmos os dados
experimentais usando o modelo de Kirkpatrick:
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
0
1
2
3
4
σ (Ω.cm)
-1
d (g/cm
3
)
T = 300 K
Figura 4.11: Dependência da condutividade com a densidade volumétrica do negro de fumo a T = 300 K.
47
Assim, podemos analisar esta reta a partir de um certo valor de densidade, e, para
densidades menores, o modelo de percolação seria válido. Teríamos, portanto, resolvido o
problema da determinação clara de onde este modelo teria validade. Vamos fazer a análise desses
dois regimes aparentes para comprovar esta afirmação, ajustando a equação de percolação
0
ln ln ln( )
c
tdd
ρ
ρ
=− , onde d é a densidade e dB
c
B é a densidade crítica onde a resistividade
diverge, na curva de resistividade versus densidade para baixas densidades; e uma reta, para altas
densidades, na curva de condutividade.
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
-1,5
0,0
1,5
3,0
4,5
6,0
7,5
9,0
T = 300 K
Equação:
y = a - b*ln(x+c)
a -4.02026
±0.46332
b 2.67468
±0.1425
c -0.04671
±0
ln ρ (Ω.cm)
d (g/cm
3
)
0,26 g/cm
3
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
-2
0
2
4
6
8
10
T = 150 K
Equação:
y = a - b*ln(x+c)
a -3.98594 ±0.49647
b 2.77529 ±0.15269
c -0.04671 ±0
ln ρ (Ω.cm)
d (g/cm
3
)
0,26 g/cm
3
0,10,20,30,40,5
0
2
4
6
8
10
12
T = 10 K
Equação:
y = a - b*ln(x+c)
a -2.91928 ±0.49513
b 2.95978 ±0.15228
c -0.04671 ±0
ln ρ (Ω.cm)
d (g/cm
3
)
0,26 g/cm
3
0,10,20,30,40,5
0
1
2
3
4
300 K
150 K
10 K
σ = -1,44121+5,86126 d
σ = -2,32755+10,66792 d
σ = -2,75547+12,75647 d
σ (Ω.cm)
-1
d (g/cm
3
)
Figura 4.12: Dependência do logaritmo da resistividade com a densidade volumétrica do negro de fumo para: (a) T = 300 K,
(b) T = 150 K e (c) T = 10 K. (d) Dependência da condutividade com a densidade volumétrica para T = 300 K, 150 K e 10 K.
(a) (b)
(c) (d)
48
Note que os ajustes de percolação, considerando-se que tanto a densidade crítica como os
outros parâmetros
ρ
B
o
B e t variam com a temperatura, mostram que a variação da densidade crítica
pode ser desprezada, como se vê na Figura 4.13.
0 50 100 150 200 250 300
0,038
0,040
0,042
0,044
0,046
0,048
0,050
0,052
0,054
0,056
d
c
(g/cm
3
)
T (K)
Figura 4.13: Variação da densidade crítica com a temperatura para o ajuste a baixas densidades
Os erros experimentais, mostrados na barra de erros, foram obtidos a partir de cada gráfico
do logaritmo da resistividade em função da densidade, como mostrados na Fig. 4.12, porém
permitindo que todos os parâmetros flutuassem. O programa para o tratamento de imagens usado
foi o
Origin.
Dessa forma, usamos o valor de
dB
c
B constante e igual a aproximadamente 0,047 g/cmP
3
P
e toda
a dependência com a temperatura é concentrada nos outros parâmetros
ρ
B
o
B e t. Observe que o
expoente, mesmo dentro dos erros experimentais, apresenta uma variação clara com a temperatura,
o que não é previsto por nenhum modelo teórico. O expoente, nesse caso, apresenta o valor
2,67t
para T = 300 K, e
2,96t
para T = 10 K. A baixas temperaturas o expoente se aproxima
do valor
3t = , que é determinado por teoria de percolação em rede de BetheP
18
P
. Valores iguais a
três já foram encontrados na literatura, mas a temperatura ambiente
P
42
P
. A altas temperaturas, o valor
também é superior a valores já estabelecidos para outros modelos, como o de “queijo suíço” e
“queijo suíço invertido”, por exemplo. As dependências com a temperatura do pré-fator
ρB
o
B e do
expoente
t são mostradas na Fig. 4.14.
49
0 50 100 150 200 250 300
0,01
0,02
0,03
0,04
0,05
0,06
0,07
0,08
0,09
ρ
o
(Ωcm)
T (K)
0 50 100 150 200 250 300
2,5
2,6
2,7
2,8
2,9
3,0
3,1
3,2
expoente t
T (K)
Na Fig. 4.15 mostramos um gráfico
(
)
ln ln
c
dd
ρ
×− que explicita o fato de, a baixas
densidades, haver uma grande dispersão experimental, como mencionado anteriormente. Esta
dispersão de dados a baixas densidades volumétricas já era prevista e estimada por Straley
P
24
P
na
Eq. 2.36.
-5,0 -4,5 -4,0 -3,5 -3,0 -2,5 -2,0 -1,5 -1,0 -0,5
-2
0
2
4
6
8
10
ln ρ = -4,02026 - 2,67468 ln (d-d
c
)
ln ρ (Ω.cm)
ln (d-d
c
)(g/cm
3
)
T = 300 K
-5,0 -4,5 -4,0 -3,5 -3,0 -2,5 -2,0 -1,5 -1,0 -0,5
-2
0
2
4
6
8
10
12
ln ρ = -2,91928 - 2,95978 ln(d-d
c
)
ln ρ (Ωcm)
ln (d-d
c
)(g/cm
3
)
10 K
Figura 4.15: Dependência do logaritmo da resistividade com o logaritmo da diferença entre a densidade volumétrica e a densidade
crítica para T = 300 K e 10 K. O ajuste é feito considerando apenas baixas densidades.
Embora essa análise seja bastante interessante, pois determina uma região de validade para
o modelo de percolação, esta pode ser alvo de uma crítica: em compósitos, podemos ir de uma
concentração
p = 0 % até 100 % de negro de fumo. No nosso sistema, seria o mesmo que ir de
uma densidade volumétrica igual a 0 até uma densidade igual ao do “bulk” da partícula de carbono
usada, ou seja,
d = 1, 87 g/cmP
3
P
. Como nossas medidas experimentais não ultrapassam
(b) (a)
Figura 4.14: Dependência do parâmetros percolativos com a temperatura: (a) pré-fator ρB
o
B e (b) expoente t.
50
d = 0,52 g/cmP
3
P
, não podemos afirmar que o comportamento da curva de condutividade com
expoente igual a um realmente se mantém a densidades mais altas. Assim a região do gráfico que
estamos ajustando como linear pode até pertencer à região crítica, seguindo o comportamento
()
t
c
dd , e o comportamento linear previsto por Kirkpatrick então começaria em densidades mais
altas do que as que usamos.
Como já relatamos, o ajuste a mais altas densidades foi feito usando o modelo de resistores
aleatórios de Kirkpatrick
P
12
P
. Neste ajuste, observamos que a densidade crítica apresenta uma
variação considerável, diferente do modelo a baixas densidades. Isso pode ser explicado pois,
neste modelo, a concentração crítica de resistores é
zp
c
/2
=
, onde z é número de coordenação
da rede. No nosso caso, a medida que a temperatura diminui, diminui a distância efetiva de
tunelamento, ou seja, diminui o número de grãos vizinhos disponíveis para se receber um elétron.
Assim, a medida que a temperatura aumenta, d
B
c
B diminui.
0 50 100 150 200 250 300
0,215
0,220
0,225
0,230
0,235
0,240
0,245
0,250
d
c
(g/cm
3
)
T (K)
Figura 4.16: Variação da densidade crítica com a temperatura, obtida pelo ajuste da teoria de meio efetivo para altas densidades.
IV.b) Análise do gráfico da resistividade versus densidade com um único regime
Vamos repetir todo o processo anterior, ajustando os resultados experimentais para toda a
faixa de densidades volumétricas, considerando apenas um regime. Ao obtermos os parâmetros
percolativos, iremos analisá-los desta mesma maneira, e compararemos os métodos.
Dessa forma, na Fig. 4.17, apresentamos o ajuste para três temperaturas diferentes:
51
0,10,20,30,40,5
-2
0
2
4
6
8
10
12
T = 300 K (1)
T = 150 K (2)
T = 10 K (3)
Equação:
y = a - b*ln(x+c)
a -3.48257 ±0.23151
b 2.47413 ±0.07978
c -0.04816 ±0
a_2 -3.39194 ±0.23151
b_2 2.55702 ±0.07978
a_3 -2.74911 ±0.23151
b_3 2.85727 ±0.07978
300 K
150 K
10 K
ln ρ (Ωcm)
d (g/cm
3
)
Figura 4.17: Ajustes da curva de percolação, considerando toda a curva experimental
Novamente, ao analisarmos os gráficos, usamos a equação de percolação:
0
ln ln ln( )
c
tdd
ρ
ρ
=− . Observe que voltamos a manter a dependência com a temperatura nos
parâmetros
t e
ρ
B
0
B, e considerar que a densidade crítica é independente da temperatura. Como
anteriormente, esta suposição se baseia no fato de, ao ajustarmos esta equação para diversas
temperaturas e admitindo dependência com a temperatura para todos os parâmetros, observamos
que
dB
c
B varia muito pouco entre T = 300 K e 10 K. Isto fica claro no gráfico da Fig. 4.18.
Observamos que, de
T = 300 K até 80 K, aproximadamente, dB
c
B é constante, e abaixo desta
temperatura há uma pequena variação deste parâmetro. Como esta variação é também muito
pequena, do ponto de vista experimental, pode ser considerada desprezível. Além do mais, ao
fixarmos este parâmetro, obtemos uma maior precisão no ajuste dos outros parâmetros em função
da temperatura.
52
0 50 100 150 200 250 300
0,044
0,045
0,046
0,047
0,048
0,049
0,050
0,051
d
c
(g/cm
3
)
T (K)
Figura 4.18 : Variação da densidade crítica dB
c
B com a temperatura, considerando toda a curva experimental da Fig. 4.17
Assumindo então um valor constante e aproximadamente igual a 0,048 g/cmP
3
P
, a variação
do expoente
t e do pré-fator
ρ
B
0
B com a temperatura é mostrada na Fig. 4.19:
0 50 100 150 200 250 300
0,02
0,03
0,04
0,05
0,06
0,07
0,08
ρ
o
(Ω.cm)
T (K)
0 50 100 150 200 250 300
2,4
2,5
2,6
2,7
2,8
2,9
3,0
expoente t
T (K)
Figura 4.19: Dependência com a temperatura do pré-fator (a) e do expoente crítico (b), considerando o ajuste de percolação para
toda a curva experimental da Fig. 4.17.
A Fig. 4.19(b) mostra que o expoente
t apresenta valores sempre maiores que dois. Valores
não-universais já são amplamente conhecidos na literatura, obtidos a partir dos mais diversos
sistemas, como compósitos
P
35
. No estudo de percolação em negro de fumo, foram obtidos valores
universais para materiais mais e menos estruturados do que este
P
38
P
. Já nos trabalhos onde o modelo
de meio efetivo foi usado, um valor menor que dois para o expoente do negro de fumo foi
encontrado
P
40
P
. Embora estes trabalhos analisem seus resultados com estes dois modelos (percolação
e meio efetivo), todos estes ajustaram seus resultados analisando toda a curva experimental.
(a) (b)
53
Também fica evidente que o expoente
t varia com a temperatura, assumindo o valor
2, 47t a T = 300 K e 2,86t a T = 10 K. A temperatura ambiente, o sistema apresenta um valor
para t que foi previsto pelo modelo de “queijo suíço”. A baixas temperaturas, como nos ajustes
feitos subseção anterior, o expoente parece tender ao valor determinado pela rede de Bethe.
Vale ressaltar que das idéias de teoria de meio efetivo, além do modelo de Kirkpatrick
P
12
P
avaliado no início deste capítulo, o modelo fenomenológico de McLachlan
P
5-8
P
poderia ser usado na
análise de toda a curva, uma vez que este analisa os resultados experimentais em toda a faixa de
densidades. Entretanto, como visto no Cap. 2, o expoente deste modelo está relacionado apenas às
dimensões euclidiana e fractal, o que significa que, a princípio, não há forma de explicar, a partir
dessas grandezas, a variação do expoente t.
IV.c) Análise dos parâmetros percolativos obtidos
É bastante interessante, observar a variação dos parâmetros percolativos em função de
T
P
-0,25
P
, ou seja, uma dependência semelhante à lei de Mott para hopping de alcance variável, dentro
da faixa de temperaturas onde o ajuste das curvas de resistividade se mostrou consistente neste
modelo.
Na Fig. 4.20 mostramos a dependência com T
P
-0,25
P
do pré-fator ρB
o
B e do expoente t para o
ajuste da curva experimental a baixas densidades. O expoente t é aparentemente linear em baixas
temperaturas, exceto entre T = 120 K e T = 220 K, onde há uma transição para outro regime que,
pela pouca quantidade de pontos nessa região, não é possível identificar.
0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
0,015
0,020
0,025
0,030
0,035
0,040
0,045
0,050
0,055
ρ
o
(Ω.cm)
T
-0,25
(K
-0,25
)
(a) (b)
Figura 4.20: (a) Dependência do pré-fator ρB
o
B com TP
-0,25
P
e (b) Dependência do expoente t com TP
-0,25
para o
ajuste da curva experimental a baixas densidades
0.20 0.25 0.30 0.35 0.40 0.45 0.50 0.55 0.60
2.65
2.70
2.75
2.80
2.85
2.90
2.95
3.00
expoente t
T
-0,25
(K
-0,25
)
T = 100 K
T = 220 K
54
Os parâmetros percolativos, na análise em toda a curva experimental, também apresentam
uma dependência com a temperatura semelhante à lei de Mott para hopping de alcance variável,
como mostrado na Fig. 4.21. Essa dependência também é seguida a baixas temperaturas, exceto
entre T = 150 K e T = 220 K, onde novamente há uma transição para outro regime que não é
possível identificar devido a pouca quantidade de pontos nessa região. Como, independente da
faixa ajustada, este comportamento se repete, somos levados a supor que esta é realmente uma
característica deste sistema.
0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
0,030
0,035
0,040
0,045
0,050
0,055
0,060
0,065
ρ
o
cm)
T
-0.25
(K
-0,25
)
0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
2,45
2,50
2,55
2,60
2,65
2,70
2,75
2,80
2,85
2,90
expoente t
T
-0.25
(K
-0.25
)
T = 220 K
T = 120 K
Figura 4.21: Dependência do pré-fator de percolação ρB
o
B (a) e do expoente t (b) com TP
-0,25
P
obtidos no ajuste em toda a curva
experimental
Uma vez observados os ajustes da equação de percolação para baixas densidades ou para
todo o regime, o passo seguinte é tentar explicar esse comportamento e verificar se algum dos dois
métodos de ajuste se encaixa melhor nos modelos.
Primeiro, vamos voltar a observar as curvas do expoente t em função de T
P
-0, 25
P
, nas
Figs. 4.20b e 4.21b. Observamos que a primeira, proveniente do ajuste apenas a baixas densidades,
tem um ajuste pior do que a segunda , obtido quando se ajusta toda a curva. (Na verdade, a
Fig. 4.20b também apresenta um bom ajuste segundo o modelo de Efros-Shklovskii, entretanto,
consideraremos que o modelo de Mott é o mais adequado devido aos ajustes de condutividade.).
Na Fig. 4.21b, a princípio, o comportamento quase linear do expoente t, seguindo uma lei
semelhante a de Mott, indica que
25,0
Tt , exceto entre aproximadamente 150 K e 220 K, onde
há uma transição para outro regime, que aparentemente também segue uma lei tipo Mott. Na
Fig. 4.20b, o comportamento linear segue exceto entre 120 K e 220 K, além de parecer que a mais
(a) (b)
55
baixas temperaturas há um desvio desse comportamento, que pode ser devido a uma transição para
o regime de Efros-Shklovskii.
Entretanto, ao observarmos a dependência do expoente α, da hipótese de Kogut e Straley
P
13
P
,
que leva a não-universalidade do expoente t definida na Eq. 2.29 e que está relacionado com este
por
()()
12 = tt
α
, notamos que este expoente também tem um comportamento linear, ou seja,
25,0
T
α
. Na Fig. 4.22, mostramos esse comportamento. Note que a baixas temperaturas (abaixo
de T = 120 K) esse regime é mantido para ambos os métodos de análise de percolação. Acima de
T = 200 K há outro regime, aparentemente linear, mas que não pode ser definido pela pouca
quantidade de pontos nessa região.
0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
0,40
0,42
0,44
0,46
0,48
0,50
α = 0.39999+ 0.15635 T
-0.25
α
T
-0,25
(K
-0,25
)
T = 120 K
T = 200 K
0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
0,32
0,34
0,36
0,38
0,40
0,42
0,44
0,46
0,48
α =0.26639+0.34515 T
-0.25
α
T
-0.25
(K
-0.25
)
T = 120 K
T = 200 K
Figura 4.22: (a) Variação do expoente α com TP
-0,25
P
para o ajuste da curva experimental em baixas densidade e (b) para ajuste em
toda a curva experimental
Se considerarmos, portanto, que α ao invés de t é proporcional a T
P
-0,25
P
, podemos então
obter uma expressão para a variação do expoente de percolação t. Partindo do fato de que o
expoente universal, para um sistema tridimensional, é igual a dois, e que
1
25,0
ααα
+= T
o
, então,
pela Eq. 2.29 tem-se:
0,25
1
0,25
1
2
(1 )
o
o
T
t
T
αα
α
α
+
=+
(4.1)
De acordo com a hipótese de Kogut e Straley
P
13
P
, devemos ter 01
α
<≤, o que deve ficar
garantido dentro da faixa de temperaturas em que foram feitas as medidas. A partir da fórmula de
α , e considerando o ajuste para baixas densidades, obtém-se da Fig. 4.22a 16,0
o
α
e
40,0
1
α
.
(a)
(b)
56
Vamos agora considerar os ajustes para toda a faixa de densidades. Pela Fig. 4.22b, temos
que 34,0
o
α
e
27,0
1
α
. Assim, ao considerarmos que o expoente t segue a Eq. 4.1, e
substituindo α
B
o
B e αB
1
B obtidos em ambos os processos, o gráfico do expoente t obtido em cada um
dos respectivos procedimentos é ajustado.
Na Fig. 4.23, apresentamos as curvas do logaritmo do pré-fator com T
P
-0,25
P
, para ambas as
abordagens:
0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
-3,5
-3,4
-3,3
-3,2
-3,1
-3,0
-2,9
-2,8
-2,7
ln ρ
o
(Ω.cm)
T
-0,25
(K
-0,25
)
0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60
-4,2
-4,0
-3,8
-3,6
-3,4
-3,2
-3,0
-2,8
ln ρ
o
(Ω.cm)
T
-0,25
(K
-0,25
)
Figura 4.23: Dependência do Logaritmo do pré-fator com TP
-0,25
P
para (a) o ajuste em toda a curva experimental e (b) para baixas
densidades.
Depois de toda essa discussão, na qual ajustamos as equações de percolação em duas faixas
de densidades volumétricas diferentes, observamos que, qualitativamente, o comportamento dos
parâmetros é o mesmo, não contribuindo para escolher qual das análises é a melhor. Contudo,
assumindo que o ajuste experimental das curvas de percolação a baixas densidades é válido,
teríamos uma evidência para determinação da região crítica, que é até hoje um importante
problema experimental.
Por fim, devemos encontrar alguma justificativa física para argumentar que
1
25,0
ααα
+= T
o
. Pelas idéias de Balberg, onde processos de tunelamento podem levar a não-
universalidade discutidos no Cap. 2, a distribuição de condutâncias tem um comportamento do
tipo
1
r
a
gg
α
, para valores pequenos da condutância microscópica g, onde r é a distância
característica de tunelamento e a é a distância média entre partículas. Como já foi discutido, essa
distribuição divergente de condutâncias leva a não-universalidade do expoente crítico.
(a) (b)
57
No Cap. 3 vimos que a distância média de hopping, no modelo de Mott, deve seguir uma
lei do tipo
1
4
o
T
r
T
⎛⎞
⎜⎟
⎝⎠
. Portanto, para pequenos valores de g, podemos ver que a distribuição de
condutâncias será determinado por um expoente dado por
1
25,0
ααα
+= T
o
, que é o
comportamento observado na Fig. 4.22.
Assim, se supomos
0,25
1o
rr rT
=+ , onde rB
o
B e rB
1
B são constantes com unidades apropriadas,
teríamos:
0,25
0,25
1
1
11
oo
rrT r
r
T
aaa
α
+
⎛⎞
=
−= +
⎜⎟
⎝⎠
Naturalmente, a discussão feita aqui é incompleta. Ainda é necessário determinar a
distribuição de condutâncias, uma vez que encontramos apenas seu comportamento para baixas
temperaturas. Entretanto, fica evidente que o processo de condução elétrica tem um papel
fundamental na determinação dos parâmetros percolativos, e que a distribuição de condutâncias
deve ter alguma dependência semelhante.
Na literatura, como já foi relatado
P
16,43,44
P
, vários trabalhos teóricos e experimentais tentam
explicar a não-universalidade em sistemas onde o tunelamento entre as partículas condutoras do
sistema, relacionando estas duas características. No presente trabalho, mostramos que o expoente α
que determina a não-universalidade apresenta uma dependência com a temperatura semelhante a
hopping de alcance variável, que envolve tunelamento entre partículas, fazendo mais uma conexão
entre não-universalidade e processo de tunelamento na condução elétrica.
58
CAPÍTULO 5
Conclusões
Neste trabalho, estudamos as propriedades de transporte elétrico e comportamento
percolativo em negro de fumo. Usando um porta-amostra adequado, medimos a resistividade deste
material entre T = 300 K e T = 10 K para amostras com diferentes densidades volumétricas. A
partir dessas medidas, concluímos que há uma ligação evidente entre o mecanismo de condução e
os parâmetros percolativos:
Para todas as amostras observamos que o modelo de hopping de alcance variável de MottP
27,28
P
é válido a baixas temperaturas, em faixas que variam de amostra para amostra. Em mais altas
temperaturas há uma transição para um outro regime que não foi possível identificar. À medida
que a densidade diminui, o regime de Mott parece se estender a mais altas temperaturas.
Entretanto, a mais baixas temperaturas, várias amostras parecem apresentar uma transição para o
modelo de Efros-Shklovskii
P
27,28
P
. Isto não pôde ser verificado, já que seriam necessários dados
experimentais a temperaturas ainda mais baixas.
Fazendo, portanto, o ajuste da equação de Mott para temperaturas intermediárias, o
parâmetro T
B
o
B apresenta uma clara dependência linear com a densidade volumétrica para altas
densidades.
Considerando que os parâmetros obtidos na análise do transporte elétrico são influenciados
pelo caráter percolativo do sistema, então o inverso deve ser verdade. Para verificar isso,
estudamos as curvas de resistividade ρ versus densidade volumétrica d dessas amostras, onde
observamos o clássico comportamento percolativo, que é ajustado pela equação
t
co
dd
= )(
ρρ
quando a densidade volumétrica tende para um valor de densidade crítica d
B
c
B. Entretanto, notamos
que, para mais altas densidades, há um comportamento linear. Isso fora previsto pelo modelo de
resistores aleatórios proposto por Kirkpatrick
P
12
P
, sendo um modelo de meio efetivo. Assim,
podemos separar as curvas de resistividade versus densidade em duas regiões: a de mais altas
densidades, onde a teoria de meio efetivo seria válida; e a de baixas densidades, onde a equação de
percolação acima teria validade. Como não existe a certeza de que este comportamento prossegue
em altas densidades, fizemos a análise também para toda a faixa de densidades.
59
Fizemos as duas abordagens para diferentes temperaturas. E em ambas, a densidade crítica dB
c
B
se mostrou aproximadamente constante, e o expoente t mostrou-se não-universal, o que já fora
previsto e observado na literatura. As abordagens diferem apenas por uma pequena variação do
valor do expoente t e um erro experimental maior ao analisarmos os resultados apenas a baixas
densidades, devido a grande dispersão dos pontos nessa região. Esta dispersão é característica dos
sistemas percolativos, próximo à transição, e já foi prevista por Straley
P
24
P
e observada
anteriormente em outros experimentos. Também, nas duas análises, o expoente t apresenta uma
dependência com a temperatura, o que ainda não foi explicado teoricamente.
O expoente t apresenta uma dependência com TP
-0,25
P
.A não-universalidade foi prevista por
Kogut e Straley
P
13
P
, supondo que sistemas que apresentarem uma alta probabilidade de conter
conexões com baixa condutância, o expoente t deveria ser diferente de dois. Se a função de
distribuição h(g) de condutâncias g diverge segundo
α
ggh )( , onde α é uma constante tal que
10 <
α
, então temos
α
α
+=
1
2
t . Observamos que o gráfico de α , assim como o expoente t,
apresenta um comportamento linear com T
P
-0,25
P
, ou seja, semelhante ao regime de hopping no
modelo de Mott. Balberg mostrou que, para baixas condutâncias, o processo de tunelamento pode
levar a
1=
a
r
α
, onde r é a distância característica de tunelamento e a é a distância média entre
os grãos. Como no modelo de Mott,
41
T
r
, isto explica o comportamento do parâmetro α. Este
comportamento, portanto, é uma evidência de que processos de tunelamento realmente levam a
não-universalidade e que este pode explicar a variação com a temperatura deste expoente.
Como, qualitativamente, o comportamento dos parâmetros percolativos é semelhante em
ambas as abordagens (ajuste para toda a curva ou a baixas densidades), não é possível determinar
qual é a mais adequada. Concluímos, porém, que como nessas duas análises o expoente varia
linearmente com
1/4
T
, é razoável supor que o mecanismo da lei de Mott (hopping de alcance
variável) esteja envolvido nos processos de condução e que influa nos parâmetros da lei tipo
percolação.
60
Como há possibilidade de interpretação da curva da resistividade versus densidade
considerando um ou dois regimes, um dos objetivos futuros é determinar e estudar a região crítica
em sistemas percolativos para definir qual abordagem é correta. Como experimentalmente isto
ainda não é completamente entendido na literatura e neste presente trabalho, procuraremos por um
critério que determine corretamente essa região.
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Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
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