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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI – UNIVALI
MARLI ELISE HOLETZ
AVANÇOS E LIMITAÇÕES DO CENTRO DE REFERÊNCIA EM SAÚDE DO
TRABALHADOR DO MUNICÍPIO DE BLUMENAU, QUANTO A EFETIVAÇÃO
DO SUS.
ITAJAÍ (SC) 2007
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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI – UNIVALI
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUÃO, EXTENSÃO E
CULTURA – PROPPEC.
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E
SOCIAIS – CEJURPS.
PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM GESTÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS – PMGPP
AVANÇOS E LIMITAÇÕES DO CENTRO DE REFERÊNCIA EM SAÚDE DO
TRABALHADOR DO MUNICÍPIO DE BLUMENAU, QUANTO A EFETIVAÇÃO
DO SUS.
Marli Elise Holetz
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
no Mestrado Profissionalizante em Gestão de
Políticas Públicas da Universidade do Vale do
Itajaí – UNIVALI, sob a orientação do Dr.
Guillermo Alfredo Johnson, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre em
Gestão de Políticas Públicas / Profissionalizante.
ITAJAÍ (SC) 2007
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RESUMO
O presente estudo foi realizado a partir da análise do CEREST (Centro de
Referência em Saúde do Trabalhador) de Blumenau (SC), procurando registrar
os avanços e as limitações com as quais se deparou, considerando a
implantação do SUS, desde sua criação em 1997 até 2004. Esta análise
baseou-se principalmente em dados obtidos em entrevistas com atores sociais
ligados a saúde do trabalhador do município, além de documentos da
Secretaria Municipal de Saúde e pesquisa bibliográfica. Para viabilizar a
compreensão desta política pública e conseqüentemente do serviço analisado
aprofundou-se a discussão sobre o Trabalho desde seus primórdios até os dias
atuais quando está inserido na ótica capitalista e numa estrutura de Estado
neoliberal. Consideramos imprescindível inserirmos no debate da Saúde do
Trabalhador e do Processo Saúde/doença. Realizamos um percurso que vai
desde a concepção pré-cartesiana, posteriormente a prevalência do modelo
biomédico, para finalmente apresentar as compreensões mais atuais, que
incluem os aspectos psíquicos e sociais, numa concepção mais holística do ser
humano. Foi analisada a política pública de saúde no Brasil, enfatizando o SUS
e a Saúde do Trabalhador nas diversas instancias da federação. Partindo
destes três eixos temáticos iniciou-se a análise do CEREST na atual
conjuntura, que não favorece a implantação e execução da Política Pública de
Saúde do Trabalhador, desta forma as ações intra e inter-setoriais ocorrem
somente em casos isolados. Dentro das duas frentes de trabalho que
caracterizam a atuação dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador,
a Assistência e a Vigilância, observamos que, contrariando os princípios do
SUS, é a primeira que melhor consegue efetivar suas ações. Ocorre uma
oscilação na influência político-partidária na área de Saúde do Trabalhador, de
acordo com os interesses políticos e econômicos. A posição que determinados
partidos ocupam na esfera governamental (situação ou oposição), tamm
influencia suas práticas com relação a esta área. As ações sindicais,
enfraquecidas pela intensa precarização, têm afetado a ação coletiva dos
trabalhadores nas últimas décadas, também quanto à saúde dos trabalhadores.
Portanto, tanto a Saúde/Doença quanto o trabalho são conceitos socialmente
construídos estando sujeitos às diversas influencias da organização societal e,
no momento atual a confluência de vários fatores não prioriza que medidas
eficazes sejam implantadas e executadas quanto a saúde dos trabalhadores.
Palavras-chave: Saúde Pública, Saúde do Trabalhador, Processo de
Trabalho, Processo de Saúde-Doença.
4
RESUMEN
El presente estudio fue realizado a partir del análisis del CEREST (Centro de
Referencia en Salud del Trabajador) de Blumenau (SC), procurando registrar
los avances y las limitaciones con las cuales se deparó, considerando la
implementación del SUS, desde su creación en1997 hasta 2004. Este análisis
se basó principalmente en datos obtenidos a través de entrevistas con actores
sociales ligados a la salud del trabajador del municipio, además de documentos
de la Secretaría Municipal de Salud e investigación bibliográfica.Para hacer
viable la comprensión de esta política pública y consecuentemente del servicio
analizado, se profundizó la discusión sobre el Trabajo desde sus primordios
hasta los días actuales cuando está inserido en la óptica capitalista y en una
estructura de Estado neoliberal. Otra área a ser estudiada por estar
intrínsecamente relacionada al área de Salud del Trabajador es la del Proceso
Salud/enfermedad. De este área temática fue analizada la trayectoria partiendo
de la concepción pre-cartesiana cuando las creencias mágico-religiosas
prevalecían y la enfermedad era considerada una punición divina;
posteriormente el modelo biomédico que trae una concepción de salud
mecanicista estando un agente patológico directamente relacionado a
determinada patología; y, finalmente las comprensiones más actuales que
incluyen los aspectos psíquicos y sociales, en una concepción más holística del
ser humano. Finalmente fue analizada la política pública de salud en el Brasil,
enfatizando el SUS y la Salud del Trabajador en las diversas instancias de la
federación. Partiendo de estos tres ejes temáticos se inició el análisis del
CEREST del cual concluimos, de forma general, que la actual coyuntura de
Estado no favorece la implantación y ejecución de la Política Pública de Salud
del Trabajador, de esta forma las acciones intra e intersectoriales ocurren
solamente en casos aislados. Dentro de los dos frentes de trabajo que
caracterizan la actuación de los Centros de Referencia en Salud del
Trabajador, la Asistencia – que tiene por objetivo prestar atención al trabajador
cuando éste se encuentra accidentado o enfermo; y la Vigilancia que tiene un
enfoque más preventivo dirigiéndose a la intervención en los espacios de
trabajo; contrariando los principios del SUS es la primera que mejor consigue
hacer efectivas sus acciones. Ocurre una oscilación en la influencia político-
partidaria en el área de Salud del Trabajador, de acuerdo con los intereses
políticos y económicos. La posición que determinados partidos ocupan en la
esfera gubernamental (situación u oposición), también influencia sus prácticas
con relación a esta área. La acción sindical, debilitada por la intensa
precariedad que ha afectado a los trabajadores en las últimas décadas,
también, en su gran mayoría tiene una actuación poco relevante cuanto a la
Salud de los Trabajadores.. Así, tanto la Salud/Enfermedad cuanto el Trabajo
son conceptos socialmente construidos estando sujetos a las diversas
influencias de la organización societaria y, en el momento actual la confluencia
de varios factores no prioriza que medidas realmente eficaces sean
implementadas y ejecutadas cuanto a la Salud de los Trabajadores.
Palabras-clave: Salud Pública, Salud del Trabajador, Proceso de Trabajo,
Proceso de Salud-Enfermedad.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 1 – A DINÂMICA SOCIAL DO TRABALHO .................... 9
1.1 Trabalho e Sociedade ..................................................................... 9
1.2 Trabalho na Sociedade Capitalista ................................................. 12
1.2.1 Modo de Produção Capitalista – Taylorismo ................................ 15
1.2.2 Modo de Produção Capitalista – Fordismo ................................... 17
1.2.3 A Organização do Tabalho e do Estado ....................................... 19
1.2.4 Modo de Produção Capitalista – Toyotismo ................................. 21
1.2.5 Organização do Estado no Modelo Neoliberal ............................. 24
CAPÍTULO 2 – TRABALHO E SAÚDE ................................................. 32
2.1 O Trabalho como Fator de Adoecimento .......................................... 32
2.2 Evolução do Conceito Saúde/Doença ............................................... 37
CAPÍTULO 3 – A SAÚDE DO TRABALHADOR NO BRASIL ............... 44
3.1 Processos Históricos e a Saúde no Brasil ......................................... 44
3.1.1 Período Pré -1930 ........................................................................... 44
3.1.2 Período 1930 – 1945 ...................................................................... 46
3.1.3 Período 1945 – 1964 ...................................................................... 47
3.1.4 Período 1964 – 1980 ...................................................................... 48
3.1.5 Período 1980 – a atual ................................................................... 51
3.2 Saúde do Trabalhador no Brasil ........................................................ 56
3.3 Diretrizes do SUS e da Saúde do Trabalhador .................................. 61
3.4 Saúde do Trabalhador em Blumenau ................................................. 72
CAPÍTULO 4 – AVANÇOS E LIMITAÇÕES DA SAÚDE DO
TRABALHADOR EM BLUMENAU ........................................................ 84
4.1 Criação do CEREST ......................................................................... 87
4.2 Principais Ações Desenvolvidas pelo CEREST ................................ 109
4.3 Política de Saúde do Trabalhador ..................................................... 124
4.4 Sugestões e Estratégias .................................................................... 138
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... 146
REFERÊNCIAS ........................................................................................ 155
ANEXOS................................................................................................... 160
6
INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo foi de realizar uma análise da Política de Saúde
do Trabalhador no município de Blumenau no período de 1994 a 2004, a partir
do CEREST (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador), considerando a
efetivação do Sistema Único de Saúde (SUS).
As motivações para buscar ampliar os conhecimentos nesta área
devem-se ao fato da pesquisadora ser psicóloga atuante na Secretaria
Municipal de Blumenau desde 1996 e a partir de 2005 ter ingressado na Saúde
do Trabalhador.
A Saúde do Trabalhador é um tema amplo tendo sido necessário
abordar, para obter uma compreensão adequada do tema, a dinâmica social do
trabalho; o trabalho e sua relação com o processo saúde-doença; e a Política
de Saúde, dentro desta a Saúde do Trabalhador e a forma como esta Política
se efetivou em Blumenau (SC). Os principais aspectos que foram abordados
dentro destas temáticas serão descritos na seqüência.
Com relão à dinâmica social do trabalho partiu-se do princípio de que
o trabalho é um processo social e historicamente construído que passou por
transformações ao longo da história de acordo com o momento político,
econômico, e social. Realizou-se um estudo bibliográfico que abordou desde o
início deste processo até os dias atuais quando as estruturas de Estado e de
sociedade sofrem intensas e velozes transformações. Houve um maior
aprofundamento teórico sobre a dinâmica do trabalho neste último período,
caracterizado por se inserir numa sociedade capitalista com uma estrutura de
Estado neoliberal.
A primeira e mais importante transformação que foi abordada refere-se
ao período no qual o trabalho afastou-se da função ontológica de satisfação de
necessidades básicas do ser humano e passou a ter como objetivo principal o
acúmulo de capital. Mészáros, apud Antunes 2001, denominou este processo
de metabolismo social do capital.
Com o objetivo de ampliar o acúmulo de capital o trabalho sofre
transformações e uma das mais importantes ocorre com a Revolução Industrial
7
quando novas tecnologias possibilitam um aumento na produção e levam a um
grande desenvolvimento do capitalismo. A adoção de novas formas de
organização do processo de trabalho entre elas o taylorismo e o fordismo, se
propunham a controlar cada vez mais o trabalhador e extrair dele mais trabalho
em menos tempo. Estes dois princípios foram fundamentais para a expansão
do capitalismo, porém este período caracterizava-se por intensos conflitos
entre a classe trabalhadora e a burguesia, que fizeram surgir uma nova
organização de Estado, denominado de Welfare State, através do qual
passaram a ser garantido o mínimo social (moradia, saúde, educação) para a
população.
Este modelo funciona adequadamente durante os “anos de ouro” do
capitalismo, porém entra em crise na década de 70. A partir desta crise, que
fragiliza intensamente a classe trabalhadora, cria-se à possibilidade de
implantação dos pressupostos neoliberais que de forma sucinta prevêem a
redução do Estado de Bem Estar Social, liberalização do mercado financeiro e
a criação do desemprego estrutural. Esta nova proposta de estrutura de Estado
expande-se rapidamente para os países capitalistas trazendo conseqüências
vis para a sociedade que se vê desamparada pelo Estado e grandes parcelas
da população passam a ser excluída do mercado de trabalho, impedindo-lhes a
possibilidade de garantir a sobrevivência através do mecanismo de venda da
sua força de trabalho.
A organização do processo de trabalho também passa por
transformações sendo uma das principais tendências o Toyotismo que utiiliza o
conhecimento do trabalhador a favor da empresa, aumenta a flexibilidade dos
contratos de trabalho e reduz sobremaneira os direitos dos trabalhadores. A
lógica do trabalho continua a ser a extração de mais-valia e o acúmulo de
capital. Este conjunto de fatores atinge de forma mais intensa os países
periféricos e, dentro destes, de forma ainda mais significativa às populações de
mais baixa renda. Este último período foi o que teve maior ênfase na
fundamentação teórica realizada, por constituir a realidade atual.
Quanto à relação entre trabalho, adoecimento e morte dos trabalhadores
tamm foi realizado um resgate histórico. A discussão iniciou em 1700 com os
estudos de Ramazzini que analisou várias categorias profissionais identificando
8
quais fatores presentes no trabalho contribuíam para que estes tivessem
determinadas doenças. Posteriormente aprofundaram-se os estudos sobre a
relação entre trabalho e saúde/doença no período capitalista, principalmente
nas últimas décadas por serem as mais relevantes para a análise do CEREST
(Centro de Referência em Saúde do Trabalhador). Considerou-se também o
trabalho inserido num país capitalista, periférico e que adota medidas
neoliberais, apesar de possuir um governo de esquerda. Os problemas
relacionados ao binômio trabalho/doença nesta conjuntura são amplos e
variados, estando relacionados a velhos problemas de Saúde do Trabalhador
como o elevado índice de acidentes e mortes no trabalho, o trabalho infantil, as
intoxicações pela utilização de produtos tóxicos nos processos produtivos;
associada aos problemas mais recentes originados pelo desemprego
estrutural, ao crescimento do mercado informal, à intensa exploração dos
trabalhadores com ritmos frenéticos de trabalho, excesso de horas extras, à
crescente violência que atinge os trabalhadores, a repetitividade de tarefas, às
condições inadequadas de trabalho, à dificuldade de estabelecimento de nexo
causal para as doenças do trabalho, entre outros.
Com relão à Saúde Pública foi realizada uma síntese enfatizando o
período após a Constituição de 1988 na qual foi instituído o SUS e inclusas as
premissas relacionadas à Saúde do Trabalhador. A forma como este processo
ocorreu em Blumenau tamm foi analisado.
Sintetizando a trajetória municipal podemos destacar que a discussão
sobre a Saúde do Trabalhador foi iniciada no município ainda no final da
década de 80, impulsionada pelo movimento sindical e pelos partidos de
esquerda. Os frutos foram colhidos na década de 90 quando foi criado o
Programa de Saúde do Trabalhador em 1994. Em 1997 este Programa é
transformado em Centro de Referência ao assumir o poder o Partido dos
Trabalhadores.
Os princípios do SUS estão estabelecidos em Lei desde a Constituição
de 1988, assim como as atribuições quanto à Saúde do Trabalhador. Isto por si
só, porém, não garante que sejam colocadas em prática, principalmente nesta
área diretamente relacionada à questão do capital. Por isso a importância da
realização de estudos sobre a trajetória da Saúde do Trabalhador no município
de Blumenau. É utópico pensar ou pretender que mudanças significativamente
9
favoráveis à saúde dos trabalhadores ocorram neste momento histórico, pela
própria estrutura de Estado que define a ação das políticas públicas e que ao
priorizar o mercado financeiro penaliza a quase totalidade da sociedade. Mas
a realização de uma análise adequada pode auxiliar no sentido de que as
ações possíveis de serem realizadas pelos atores sociais que constroem esta
área sejam feitas com clareza e que busquem um direcionamento no sentido
da implementação do SUS e da redução dos acidentes de trabalho, das
mutilações e das mortes dos trabalhadores.
10
CAPÍTULO 1
A DINÂMICA SOCIAL DO TRABALHO
1.1 Trabalho e Sociedade
Neste capítulo será apresentada uma breve contextualização do trabalho
da Antiguidade até os dias atuais, enfocando as principais transformações.
Uma delas, e que mudou o significado do trabalho, foi quando este se
distanciou de seu objetivo primeiro, a satisfação de necessidades básicas do
homem, e se transforma num instrumento de acumulação de capital. O
processo de transformação passa por várias fases e continua sempre na ótica
da primazia do capital, o que gerou o avanço do capitalismo e suas
subseqüentes crises. Em cada uma destas fases o processo produtivo e a
própria organização da sociedade sofreram transformações. Ou seja, o capital,
para continuar a crescer adotou novas formas de acumulação, independente
das conseqüências geradas. Atendendo a esta necessidade de ampliação da
acumulação de capitais, foram implantados as políticas neoliberais e os
processos de acumulação flexível que, no seu bojo, prevêem: a perda dos
direitos dos trabalhadores e o aumento da exploração destes, principalmente
nos países periféricos; a negligência com relação à questão ambiental; a
diminuição do tamanho do Estado (o que trás como conseqüência à redução
dos direitos dos mínimos sociais tão duramente conquistados ao longo da
história); ampliação do desemprego estrutural, entre outros. Associados a este
contexto somam-se ainda fatores como o aumento da informatização e da
robótica, das crescentes influências transnacionais, dos efeitos da
globalização, entre outros. É nesta desfavorável conjuntura que se insere a
classe trabalhadora atualmente, o que causa empobrecimento, adoecimento e
exclusão de grandes parcelas desta populão. A situação atual é tão critica
que pode ser comparada ao período anterior à implantação do Welfare State
no qual a população não tinha a garantia dos mínimos sociais. Atualmente a
grande quantidade de desempregados, trabalhadores do mercado informal,
temporário, doméstico, o trabalho nas ruas, entre outras formas de trabalho
11
precarizado é a realidade de uma grande parcela da população que além da
exclusão social tamm está sujeita aos demais grandes problemas da
sociedade atual, como o alto índice de criminalidade, a violência de toda sorte,
a degradação ambiental e a poluição.
Uma breve evolução histórica do trabalho na sociedade será
apresentada, porém será o trabalho dentro da sociedade capitalista atual que
terá considerações mais profundas.
Historicamente, o significado do trabalho tem passado por mudanças,
segundo Albornoz (2000), na Antigüidade, ele aparece ligado às atividades
exercidas pelos escravos. No período clássico remete às atividades dos servos
ligados a terra e, ainda, tem-se o período no qual predominou o trabalho
artesanal que, mais tarde, culminou na produção em série – novidade trazida
pela máquina – que resultou nas multidões que trabalham e pedem emprego
nas portas das fábricas.
Na Grécia Antiga surge o termo ponos, que designava as atividades
penosas e que exigiam esforço físico. Tratava-se de atividades degradantes
que estavam longe de qualquer valorização. As atividades valorizadas eram o
pensamento reflexivo e a contemplação. A concepção de trabalho para os
romanos tamm não diferia muito da dos gregos. Desprezavam o trabalho,
relegando aos escravos a execução das atividades degradantes e penosas.
(MÉDA, 1999).
Com a conversão do Império Romano ao cristianismo, iniciou-se uma
série de mudanças culturais que foram se inscrevendo sobre os antigos
pressupostos romanos. No que se refere ao trabalho, Méda (1999) enfatiza
que, para o pensamento judaico-cristão, tudo o que fosse relacionado às
necessidades físicas continuou a ser considerado atividade penosa e
degradante, pois, como está no livro de Gênesis, o homem ao ser expulso do
paraíso foi “condenado” ao trabalho. Porém este mesmo livro mostra que Deus
tamm trabalhou, o que atribuiu para os cristãos um significado diferente ao
trabalho, ligado ao ato criador.
Já na Idade Média as relações sociais foram demarcadas pela
dominação dos senhores feudais sobre seus servos, caracterizando o
feudalismo. As relações se deram basicamente pelas trocas que ocorreram
12
entre pequenos proprietários, que cederam suas terras aos senhores que, por
sua vez, lhes ofereciam proteção. Dessa maneira, os camponeses
permaneciam nas terras como trabalhadores e uma parte da produção era
destinada ao senhor feudal como pagamento do benefício recebido.
(OLIVEIRA,1987 apud BECKHAUSER; KOEPSEL, 2005 ).
1.2 O Trabalho no Sistema Capitalista
Antes de dar prosseguimento ao resgate histórico do trabalho, serão
apresentados alguns conceitos citados por Antunes (2001) baseados em
Mészáros (1995), e que são importantes para a compreensão do sentido do
trabalho dentro da organização do sistema capitalista.
Uma transformação importante que ocorre quanto ao trabalho refere-se
ao momento em que este se distancia da satisfação de necessidades do ser
humano e passa a ter como objetivo primeiro o acúmulo de capital, este
processo de transformação foi denominado de metabolismo social do capital.
Ao primeiro momento, vinculado à preservação das funções vitais da
reprodução individual e societal, o autor denomina de sistema de mediações de
primeira ordem estando relacionadas à característica ontológica do ser humano
que faz com que, diferentemente dos animais, os homens não possam
sobreviver sem mediação com a natureza. Portanto nesta mediação de
primeira ordem o trabalho tem como função satisfazer necessidades básicas do
ser humano e regular sua relação com a natureza.
A partir do momento em que começa a haver um distanciamento das
funções de primeira ordem, o que ocorre quando a constituição do sistema de
capital supera o sentido do trabalho dentro da perspectiva ontológica do ser
humano, surge o que é denominado de o “sistema de mediações de segunda
ordem”. Nesta segunda etapa o trabalho passa a ser mediado pelo capital e a
finalidade essencial passa a ser a expansão constante do valor de troca
presente em tudo, desde as necessidades humanas mais básicas até as mais
diversas atividades materiais e culturais.
13
A organização e a divisão do trabalho são profundamente afetadas a
partir deste segundo momento, no qual o aumento do capital torna-se o
objetivo prioritário do trabalho. Antunes (2001) destaca algumas destas
transformações, são elas:
1) Separação e alienação entre o trabalhador e os meios de produção;
2) Imposição dessas condições objetivadas e alienadas sobre os
trabalhadores;
3) Personificação do capital como um valor egoísta, voltado para o
atendimento dos imperativos expansionistas do capital;
4) Personificação dos operários com o trabalho o que reduz a
identidade do sujeito, repercutindo sobre sua personalidade a
fragmentação das funções produtivas.
Com relação à perspectiva social do trabalho e como este se constitui
em um instrumento de transformação da natureza podemos citar,
[...] o trabalho é um processo entre o homem e a natureza, um
processo em que o homem, por sua própria ação, media,
regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele põe
em movimento as forças naturais pertencentes à sua
corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de
apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua
própria vida. Ao atuar, por meio deste movimento sobre a
Natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao
mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as
potências nela adormecidas e sujeita o jogo de suas forças a
seu próprio domínio (MARX, 1983, p. 23).
Abordar este processo de transformação do trabalho teve como objetivo
possibilitar a compreensão e o significado do mesmo nas sociedades
capitalistas. Enfocando a mudança ocasionada a partir do momento em que
houve uma inversão de valores entre capital e trabalho, ficando este último
subjugado ao primeiro, deixando de ser o trabalho fonte de satisfação de
necessidades e transformando-se numa alavanca importante para a
acumulação de capital. Tornou-se desta forma um instrumento importante nas
sociedades capitalistas das quais as principais fases serão descritas na
seqüência.
14
Do século XIV ao XVIII, período denominado de mercantilismo, ocorre a
passagem do regime feudal para o capital. Oliveira (1987), mostra que este
período se caracteriza pela nova relação que se estabelece entre Estado e
burguesia. Nessa relação, o Estado disponibiliza seus aparatos de controle e
vigilância em benefício da burguesia que, através de impostos e taxas,
sustenta o Estado. Outro aspecto importante é o declínio da intervenção da
Igreja sobre as decisões do Estado. Durante o mercantilismo o acúmulo de
riquezas anteriormente condenado, passou a representar o objetivo do trabalho
em si.
No século XVIII, a Europa usufruía a riqueza acumulada durante séculos
de exploração de suas colônias ao redor do mundo. O capital angariado
permitiu que investissem em novas tecnologias o que facilitou a produção e o
transporte dos seus produtos para a comercialização destes. Iniciou-se então a
chamada Revolução Industrial. A conseqüência imediata desta revolução foi
reunir um maior número de pessoas envolvidas em torno da confecção de um
mesmo produto, de maneira fragmentada, nas fábricas. Esse fato contribuiu
para o crescimento dos grandes centros urbanos (ALBORNOZ, 2000).
Com esta fragmentação do trabalho, não só os produtos que eram
comercializados, mas também o trabalho, passou a ser tratado como um objeto
de troca. Méda (1999), afirma que ao mesmo tempo em que o trabalho é uma
atividade do homem, ele passa a ser tratado como “desligado do sujeito”.
O trabalho humano é dotado de significado e de intencionalidade, ou
seja, trabalho é um processo consciente por meio do qual o homem se apropria
da natureza para transformar seus materiais em elementos úteis para a sua
vida. A intencionalidade e o significado do trabalho são perdidos pelo
trabalhador dentro da perspectiva capitalista quando este fragmenta de tal
forma o trabalho que o trabalhador muitas vezes só tem conhecimento de uma
pequena parcela do todo, tornando-se alienante. (MARX, 1983).
O trabalho no Sistema Capitalista, além dos aspectos citados por Marx
assume ainda outras características, que são:
1) alienante, porque o trabalhador desconhece o próprio
processo produtivo e o valor que agrega ao produto, além de
15
não se identificar com os produtos de seu trabalho;
2)explorador, devido os objetivos de produção de mais-valia
vinculada ao processo de acumulação de capital;
3)humilhante, porque afeta negativamente a auto-estima;
4)monótono, em sua organização e conteúdo da tarefa; 5)
discriminante, porque classifica os homens à medida que
classifica os trabalhos; 6)embrutecedor, porque, longe de
desenvolver as potencialidades, inibe ou nega usa existência
por meio do contdo pobre, repetitivo e mecânico das tarefas;
7) submisso pela aceitação passiva das características do
trabalho e do emprego, pela imposição da organização interna
do processo de trabalho, pelas relações sociais mais amplas
e, essencialmente, pela força o exército industrial de reserva
[...] (BORGES E YAMAMOTO apud BECKAUSER e
KOEPSEL, 2005, p.23).
O conceito de mais-valia, introduzido por Marx (1983) afirma que se
estabelece de uma relação entre o trabalhador que vende sua força de trabalho
como mercadoria, e o capitalista, que detém os meios de produção e para o
qual o trabalhador vende seu trabalho. Portanto, o capitalista torna-se dono dos
produtos gerados pelos trabalhadores e os paga um valor pré-estabelecido por
isso. Este valor, por sua vez, refere-se ao trabalho executado que envolve um
maior número de produtos confeccionados num determinado momento.
Atendendo a esta necessidade de aumentar a produtividade e
conjuntamente o lucro surgem pensadores que desenvolvem conceitos neste
sentido. Dois dos mais importantes são Taylor e Ford cujas teorias baseiam-se
na fragmentação e cronometração do trabalho. O taylorismo e o fordismo
passaram por inúmeras transformações e adaptações geralmente relacionadas
a momentos de crise do capital. A partir da segunda metade do século XX o
taylorismo e o fordismo já não suprem mais as necessidades, e frente a um
novo momento de crise do capital, surge uma nova proposta, o toyotismo. O
toyotismo aproveita das teorias anteriores alguns aspectos e desenvolve outras
que dão origem a novas formas de exploração do trabalho. Na seqüência serão
apresentados os principais aspectos que caracterizam o modo de produção
taylorista e no fordista. O toyotismo, também uma forma de organização da
produção, foi desenvolvido em outro momento histórico e será apresentado
inserido neste contexto porque então a análise conjunta de vários fatores
possibilitará uma compreensão mais ampla. Conhecer as formas de
organização da produção utilizadas pelo capitalismo é importante para a
16
compreensão do que ocorre no mundo do trabalho na atualidade e para a
forma de viver, de ter saúde e doença dos trabalhadores.
1.2.1. Modo de produção capitalista - Taylorismo
Os pontos fundamentais do taylorismo serão citados baseando-se em
Fleury (1983). Taylor desenvolve sua teoria num momento histórico no qual
havia a necessidade de ampliar a produção para o crescimento do capitalismo
que trazia inerente a ênfase na acumulação de capital. Taylor observou que até
aquele momento a administração tradicional era baseada principalmente no
que ele chamou de o mecanismo de “iniciativa e incentivo”. Neste mecanismo o
administrador deixava a cargo do trabalhador executar as tarefas, sem muito
conhecimento sobre a forma exata como estas eram executadas e cabia ao
administrador recompensar o trabalhador, seja através de salário, gratificação
ou possibilidade de ascensão profissional. Taylor afirmou que este mecanismo
de “iniciativa – incentivo” só teria sucesso quando o administrador tivesse o
controle minucioso do trabalho.
Taylor desenvolve alguns princípios para que se efetive o controle sobre
o trabalhado e o trabalhador. O primeiro deles busca obter uma “análise
científica” do trabalho. Em poucas palavras trata-se do
[...] estudo do movimento elementar de cada operário,
decifrando quais são úteis para eliminar os inúteis, e assim
aumentar a intensificação do trabalho. Tal análise era
acompanhada do registro dos tempos com o intuito de
identificar o “tempo ótimo” para realizar uma tarefa (FLEURY,
1983, p.18).
Após obter o conhecimento detalhado de todas as tarefas a serem
executadas e em qual tempo isto era possível Taylor desenvolve o segundo
princípio, o da seleção e treinamento dos trabalhadores. Ou seja, identificar
trabalhadores com habilidades pessoais específicas para atender a exigência
do trabalho e treiná-los para isto. Este treinamento não envolvia todo o
processo de produção, mas sim aquele número reduzido de tarefas que
aqueles trabalhadores deveriam executar.
17
O terceiro princípio tinha por objetivo delegar ao nível gerencial as
funções de planejamento e controle do trabalho. Criando assim uma clara linha
divisória entre os que pensam e os que executam o trabalho. Dando origem a
uma nova estrutura administrativa na fábrica “[...] surgiram os departamentos
de programação e controle de produção, tempos e métodos, controle de
qualidade, arranjo industrial, ferramentaria, etc.“. (FLEURY, 1983 p.20).
Resumindo, podemos dizer que Taylor, através da administração
científica consolidou a fragmentação do trabalho, a hierarquização e o conceito
de “homem certo no lugar certo”. Algumas das conseqüências da aplicação
prática destes princípios são: a redução do tempo “ocioso” no processo de
trabalho, a desqualificação do trabalhador que passa a executar somente
partes do trabalho perdendo a noção do todo, a alienação deste trabalhador, a
repetitividade de tarefas e de movimentos, um controle muito maior por parte
da administração das empresas sobre o trabalho e os trabalhadores, a divisão
entre os que pensam e os que executam, entre outros.
1.2.2 Modo de Produção Capitalista - Fordismo
A síntese deste modelo de organização do processo de trabalho tamm
será feita com base em Fleury (1983). O Fordismo denomina-se assim por
conta das significativas mudanças na organização do processo de trabalho que
iniciaram na Ford Motors Company. O trabalho nesta empresa por ocasião de
sua fundação, em 1903, era realizado por mecânicos especializados. Isto
exigia profissionais com bom conhecimento técnico e que detinham certo
controle sobre a fabricação dos automóveis. Nesta época a empresa adotava a
linha de montagem para dar seqüência na fabricação dos automóveis.
Com o objetivo de aumentar a produção algumas alterações foram
implantadas na Ford. Uma delas foi à substituição da linha de montagem pela
esteira rolante. A inclusão desta nova ferramenta no processo produtivo
possibilitou a substituição do trabalho qualificado pelo trabalho fragmentado
uma vez que na esteira rolante cada trabalhador realizava apenas uma
pequena parte do trabalho e preferencialmente sempre a mesma. Outra
alteração decorrente da implantação da esteira rolante foi à imposição de um
18
ritmo ao processo de produção que independia da vontade dos trabalhadores
além de eliminar os movimentos desnecessários.
Fazendo uma analogia entre o pensamento de Taylor e Ford podemos
citar que o primeiro já ressaltava a importância da redução do tempo
desperdiçado com movimentos inúteis e com paradas em virtude da falta de
materiais ou suprimentos. Para reduzir estas pausas destacava a importância
do papel gerencial que deveria planejar e coordenar adequadamente a
execução do trabalho evitando o desperdício. Ford segue a linha de Taylor no
sentido de procurar eliminar o tempo ocioso do processo produtivo e com a
implantação da esteira substitui a função antes atribuída ao controle e
planejamento para a máquina.
As peças deslocavam-se automática e ininterruptamente,
suprindo o trabalho de todos os homens da produção, sem
esperas nem paradas. Ao operário só lhe restava seguir essa
cadência, fixo em seu posto de trabalho, e alimentado
continuamente de novos materiais que sofreriam a ação de
seus membros. Para fazer frente a este ritmo produtivo era
impelido a mecanizar os seus movimentos. A linha de
montagem tornava-se, assim, notável instrumento de
intensificação do trabalho (FLEURY, 1983, p. 22).
Neste período histórico o trabalho era visto como fonte de riqueza, por
isso qualquer desperdício deveria ser combatido e a produção deveria gerar o
maior lucro possível. O fordismo vem de encontro a esta concepção de
aumento da lucratividade que é obtida pela desqualificação do trabalhador e
por conseqüência o barateamento da mão-de-obra, assim como com a
intensificação do trabalho imposto pela esteira e a utilização mais intensa dos
equipamentos, instrumentos e instalações evitando a depreciação destes por
obsolência.
Pode-se dizer que o fordismo alcançou seus objetivos, pois um dos
resultados foi um aumento considerável da produção. Por exemplo, a produção
de um chassi que levava 12 horas e 8 minutos para ser construído passou a
necessitar de somente 1 hora e 33 minutos. Uma conseqüência que ocorreu
com a introdução destas novas formas de organização do trabalho foi à retirada
do componente pensante para a execução do trabalho,
[...] fixo em seu posto de trabalho, o homem passou a ser
quase um componente da máquina. Os seus movimentos
19
deveriam ser feitos mecanicamente sem, segundo Ford,
interferência da sua mente, guardando, assim, perfeita
harmonia com o conjunto da linha de montagem (FLEURY,
1983, p.23).
Em termos econômicos é evidente a vantagem do trabalhador
desqualificado sobre o seu antecessor. O trabalhador desqualificado somente
necessita utilizar uma pequena parte do seu complexo organismo para o
trabalho. Ford cita exemplos de várias tarefas dentro da nova concepção
produtiva que poderiam ser realizadas por pessoas cegas, sem pernas, etc., já
que o trabalho estava dividido em várias tarefas extremamente simples de
serem executadas.
1.2.3 A Organização do Trabalho e do Estado
O Taylorismo e o Fordismo foram fundamentais para a expansão do
capitalismo, porém este período caracterizava-se por intensos conflitos entre a
classe trabalhadora e a burguesia. Antunes (2001) destaca que para amenizar
estes conflitos surgem as bases do Welfare State que tinha por objetivo criar
um equilíbrio relativo na relação de forças entre burguesia e proletariado depois
de decênios de lutas. Giddens (1998) cita ainda outros dois objetivos do
Welfare State que são: a criação de uma sociedade mais igual e a proteção
aos indivíduos ao longo de suas vidas. Arretche (1995) cita o direito à
aposentadoria, habitação, educação, saúde, etc como exemplos de programas
de proteção social que foram implantados na maioria dos países de capitalismo
avançado ao implantarem o Welfare State.
Este Estado de Bem Estar Social ou Welfare State, é fortalecido
principalmente após a I Guerra Mundial quando sofreu incontestável expansão
e até mesmo de institucionalização, conforme citado por Arretche (1995).
Antunes (2001) lembra que esta estrutura de organização de estado é
implantada somente nos países centrais e tinha como sustentação a enorme
exploração do trabalho realizada nos países do chamado Terceiro Mundo,
estes últimos excluídos do “compromisso” social-democrata.
Para suprir as demandas criadas a partir do Estado de Bem Estar Social
a maioria dos países montou uma estrutura de Estado denominado de Estados
Grandes. Anderson (1995) cita que durante a década de 50 e 60, quando o
20
capitalismo alcançou seus anos de ouro, toda esta estrutura era bem
suportada. Porém na década seguinte, o capitalismo entra em crise e há uma
diminuição das taxas de crescimento e o aumento das taxas de inflação.
Com relação a crise do Capitalismo, Antunes (2001), destaca os
aspectos apontados por Anderson (1995) e, ainda, outros que identificam a
crise a partir do início da década de 70.
1) queda da taxa de lucro influenciada pelo aumento do preço da força
de trabalho conquistado no período pós-guerra e pelas lutas sociais dos anos
60 que objetivavam o controle social da produção;
2) esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista pela
incapacidade de responder à retração do consumo gerada pelo desemprego
estrutural que se iniciava;
3) hipertrofia da esfera financeira, que ganhava relativa autonomia frente
aos capitais produtivos, colocando-se o capital financeiro como um campo
prioritário para a especulação na nova fase do processo de internacionalização;
4) maior concentração de capitais graças a fusão entre as empresas
monopolistas e oligopolistas;
5) crise do Estado de Bem Estar Social;
6) incremento acentuado das privatizações .
Brenner apud Antunes (2001) faz referência à origem da crise do capital
sendo que esta se origina no excesso da capacidade de produção do setor
manufatureiro internacional, principalmente ao final da década de 60, o que
reduziu as taxas de lucros e acabou gerando um grande deslocamento do
capital para as finanças na década seguinte.
Portanto, além da questão financeira verificada em função do
esgotamento do padrão taylorista/fordista e da maior rentabilidade do mercado
financeiro, outro fator determinante para a eclosão da crise ao final dos anos 60
e inicio dos 70 foi a intensificação das lutas de classe. Estas lutas de classe
ocorreram principalmente nos países de capitalismo avançado sendo
evidenciadas a partir de uma pressão por parte dos trabalhadores que
reivindicavam melhores condições de trabalho, ampliação dos salários e de
direitos sociais. Esta mobilização dos trabalhadores surge quando o Estado de
21
Bem Estar Socialo consegue mais resolver as conflitualidades entre as
classes. Surge o que Antunes (2001) denomina de o operário massa,
constituindo-se como uma parcela hegemônica do proletariado da era
taylorista/fordista que atuava no espaço produtivo. Esta organização dos
trabalhadores, neste período histórico, possibilitou o aumento do valor da força
de trabalho e ainda formaram a base pelas lutas sociais dos anos 60 que
objetivavam o controle social da produção.
A organização dos trabalhadores perturbou o funcionamento do
capitalismo porém, a fragilidade desta organização e, na seqüência, o
desenvolvimento tecnológico que se iniciava constituiram-se como uma
primeira resposta do capital à confrontação aberta do mundo do trabalho.
(ANTUNES, 2001).
No atual momento, influenciado por todas as mudanças que ocorreram
na estruturação do Estado, na priorização do mercado financeiro, na redução
dos postos de trabalho, ocorre uma nova configuração dos movimentos dos
trabalhadores,
O senso de solidariedade que distinguia os movimentos
trabalhadores organizados está em declínio. As negociações
coletivas voltam-se prioritariamente para os trabalhadores do
quadro funcional das empresas e as reivindicações têm como
foco central a manutenção do emprego [... ] MINAYO-GOMEZ;
THEDIM-COSTA, 1999, p.413).
Esta nova realidade abre espaço para a implantação de novas formas
de organização do processo de trabalho, sendo um dos exemplos o toyotismo,
cujos pontos fundamentais serão apresentados na seqüência.
1.2.4 Modo de Produção Capitalista – Toyotismo
As características do toyotismo citadas baseiam-se em Antunes (1995) e
Antunes (2001). O Toyotismo tem sua origem no Japão, na empresa Toyota,
desenvolvidas por Ohno, engenheiro da empresa. Foram quatro as fases que
levaram ao advento desta nova proposta de organização do processo de
trabalho: 1) a introdução na indústria automobilística japonesa, da experiência
22
do ramo têxtil na qual o trabalhador operava em várias máquinas; 2) a
necessidade da empresa de responder à crise financeira, aumentando a
produção sem aumentar o número de trabalhadores; 3) a importação das
técnicas de gestão dos supermercados dos EUA, que deram origem ao kanban
de produzir somente o necessário e no melhor tempo; e 4) a expansão do
método kanban a todas as empresas sub-contratadas e fornecedoras.
Analisando-se as diferenças entre o toyotismo e o fordismo podem ser
destacados os seguintes traços:
1) Produção está vinculada a demanda mais individualizada do
mercado consumidor; o fordismo caracterizava-se pela produção em
série.
2) Fundamenta-se no trabalho operário em equipe, com multivariedade
de funções, rompendo com o caráter parcelar típico do fordismo.
3) Produção se estrutura num processo produtivo flexível, que
possibilita ao trabalhador operar simultaneamente várias máquinas,
alterando-se a relação homem-máquina do período
taylorista/fordista.
4) Tem como princípio o just in time, o melhor aproveitamento possível
do tempo de produção;
5) Funciona segundo o sistema kanban (placas ou senhas de comando
para reposição de peças e estoque), visando operar com menor
estoque mínimo o que diferencia do fordismo.
6) As empresas do complexo produtivo toyotista, inclusive as
terceirizadas, têm uma estrutura horizontalizada, ao contrário da
verticalidade fordista. Enquanto na fábrica fordista aproximadamente
75% da produção era realizada no seu interior, a fábrica toyotista é
responsável por apenas 25% da produção, tendência que vem se
intensificando cada vez mais. Esta última prioriza o que é central em
sua especialidade no processo produtivo e transfere a terceiros
grande parte do que antes era produzido dentro de seu espaço
produtivo.
23
7) Organiza os Círculos de Controle de Qualidade (CCQs), constituindo
grupos de trabalhadores que são instigados pelo capital a discutir
seu trabalho e desempenho, com vistas a melhorar a produtividade
das empresas, convertendo-se num importante instrumento para o
capital apropriar-se do savoir faire intelectual e cognitivo do trabalho,
que o fordismo desprezava.
8) O toyotismo implantou o “emprego vitalício” para uma parcela de
trabalhadores das grandes empresas (cerca de 25 a 30% da
população trabalhadora, onde se presenciava a exclusão das
mulheres), além de ganhos salariais estarem intimamente vinculados
ao aumento de produtividade.
Outros fatores que influenciaram o desenvolvimento do toyotismo no
Japão podem ser citados, um deles seria a crise do pós-guerra neste país que
fez surgir uma demanda por produtos variados e em pequena quantidade. Esta
diversidade encontrava dificuldades para ser atendida somente pela lógica do
taylorismo e do fordismo.
Um aspecto que dificultava a implantação deste novo modelo de gestão
empresarial era a organização sindical japonesa bastante combativa na época.
Porém ocorreu uma sucessão de derrotas dos sindicatos neste país levando
estes a assumir uma postura, do que o autor denomina, de sindicalismo de
empresa, intimamente ligado ao ideário e ao universo patronal, ou seja,
percebe-se o quanto o toyotismo precisava para ser posto em prática no âmbito
dos ideais neoliberais, que conforme vistos anteriormente, necessitam do
desmonte dos sindicatos, trazendo como conseqüência a fragilização dos
trabalhadores. E a clara defesa do Estado em nome do capital eximindo-se de
garantir direitos básicos aos operários.
A perda dos direitos dos trabalhadores dentro do toyotismo é essencial
para que haja a efetiva flexibilização do aparato produtivo. Os trabalhadores
precisam estar sujeitos a direitos cada vez menores, de modo a aceitarem
atender as necessidades do mercado produtivo. Ou seja, o novo mercado
produtivo necessita ter flexibilidade para contratar e demitir, possibilidade de
contar com vínculos temporários e mão-de-obra terceirizada, etc. Esta
flexibilidade no toyotismo é essencial já que a este sistema interessa manter
24
um número mínimo de trabalhadores, havendo a possibilidade de ampliação
através de horas extras ou contando-se com trabalhadores temporários e sub-
contratações.
Desenvolve-se uma estrutura produtiva mais flexível,
recorrendo freqüentemente à desconcentração produtiva, às
empresas terceirizadas, etc. Utiliza-se de novas técnicas de
gestão da força de trabalho, do trabalho em equipe, das
“células de produção”, dos “times de trabalho”, dos grupos
“semi-autônomos”, além de requerer, ao menos no plano
discursivo, o envolvimento participativo dos trabalhadores, em
verdade uma participação manipuladora e que preserva, na
essência, as condições do trabalho alienado e estranhado. O
“trabalho polivalente”, “multifuncional”, “qualificado”,
combinado com uma estrutura mais horizontalizada e
integrada entre diversas empresas, inclusive empresas
terceirizadas, tem como finalidade a redução do tempo do
trabalho (ANTUNES, 2001, p.52).
Algumas das repercussões dessas intensas transformações no processo
produtivo têm resultados imediatos no mundo do trabalho, como por exemplo: a
diminuição enorme dos direitos dos trabalhadores, maior fragmentação no
interior da classe trabalhadora, precarização e terceirização da força humana
que trabalha, transformação do sindicalismo combativo em um sindicalismo de
empresa.
Os métodos do toyotismo foram disseminados a toda a rede de
fornecedores, deste modo kanban, just in time, flexibilização, terceirização,
sub-contratação, CCQ, controle de qualidade total, eliminação do desperdício,
gerência participativa, sindicalismo de empresa, entre outros se propagam
intensamente. Antunes (1995) sugere que, em um universo internacionalizado,
as lições japonesas são copiadas em toda parte porque correspondem à fase
atual de um capitalismo que se caracteriza pelo crescimento da concorrência,
pela diferenciação e pela qualidade.
Ele possibilita ao capital apropriar-se do saber e do fazer do trabalhador.
As transformações são tão significativas que os trabalhadores sofrem a mais
aguda crise deste século, atingindo não só a sua materialidade como tamm a
sua subjetividade.
1.2.5 Organização do Estado Neoliberal
25
Entre os ideais neoliberais destacam-se a liberdade de mercado e a
redução do tamanho do Estado, que se desdobra em desigualdade social e
econômica. Giddens (1998) explicita esta tendência citando a hostilidade ao
“governo grande”, porém destaca a defesa, deste modelo de Estado por um
“Estado Forte”, principalmente para romper com o poder dos sindicatos e para
garantir o controle econômico.
A liberdade de mercado, que tem por objetivo o aumento do acúmulo de
capital, refere-se não apenas ao capital que se origina do modelo tradicional,
baseado na extração de mais valia dos produtos e serviços comercializados,
refere-se também ao mercado financeiro globalizado e que, com o avanço da
informática, consegue gerar lucros muito maiores do que o processo produtivo.
O mercado se encontra globalizado e se caracteriza pela grande mobilidade de
massas de capitais, pelo crescimento de corporações transnacionais e pela
predominância dos investimentos no âmbito financeiro. O mercado financeiro
desponta de tal forma que os fluxos financeiros mundiais correspondem a
aproximadamente 78 vezes dos recursos aplicados produtivamente. (MINAYO-
GOMEZ; THEDIM-COSTA, 1999).
A aplicação dos recursos no mercado produtivo e o local para onde são
designados estão registrados na citação a seguir.
A circulação mundial de capitais produtivos baseia-se
fundamentalmente nos potenciais de mercado, de recursos
naturais, de capacitação estratégica e na busca de eficiência
por meio de investimentos em pesquisa e desenvolvimentos
nos países avaados. Os capitais produtivos dirigem-se,
portanto, para zonas onde a força de trabalho, apesar de cara,
é altamente qualificada, polivalente, com um repertório de
habilidades para adaptar-se às flutuações da demanda e que
tem condições de comercialização e infra-estrutura de
telecomunicações, bem como de manutenção de
equipamentos sofisticados. Em contrapartidas, voltam também
seus investimentos para regiões onde o trabalho é barato, com
inferior, contudo tecnológico, mas com utilização intensiva de
matéria prima e mão-de-obra. (MINAYO-GOMEZ e THEDIM-
COSTA, 1999, p. 57)
Podemos então concluir que a crescente valorização do mercado
financeiro gera o aumento do lucro, que, porém se concentra cada vez mais em
26
uma pequena parcela da população, favorecendo aos grandes investidores
vinculados as transnacionais. O mercado produtivo, por outro lado, tem seus
recursos reduzidos, mas quando estes recursos são aplicados nesta área
podem ser divididos em duas frentes, os trabalhos altamente especializados e
que utilizam tecnologia de ponta, direcionado a países que oferecem infra-
estrutura para abrigar e desenvolver este tipo de trabalho, característico de
países centrais. Já aos países periféricos restam os trabalhos baratos,
desenvolvidos com pouca tecnologia. O Brasil, com raras exceções em
algumas áreas, desde o inicio de sua história sempre teve sua economia
direcionada para o modelo agro-exportador. Ou seja, fornecedor de matérias
primas e produtos com pouca utilização de tecnologia. Portanto “sobra” ao
Brasil dentro da cadeia do capitalismo desempenhar o papel de fornecedor de
mão-de-obra barata e exportar principalmente matérias primas para os países
centrais. Assim o trabalho no País é mal remunerado e temos como agravante
ainda a falta de infra-estrutura, por exemplo, nas estradas mal conservadas,
portos que não atendem as necessidades atuais de exportação, etc.
Esse sistema de movimentação dos recursos financeiros e produtivos
acarreta profundas transformações no trabalho, seja na quantidade e na
qualidade destes, gerando um ônus que atinge toda a sociedade, porém de
forma mais insidiosa as populações mais vulneráveis.
[...] diminuição de postos de trabalho e a fragilidade dos novos
arranjos laborais como a oferta de empregos de tempo parcial
ou duração eventual; as limitações na absorção da força de
trabalho jovem, inclusive qualificada; a instabilidade e
irregularidade ocupacionais; o subemprego e o desemprego
recorrente, duradouro e sem perspectivas de inclusão no
mercado formal; as dificuldades de inserção da mão-de-obra
não qualificada e os rendimentos decrescentes para boa
parcela das populações já empobrecidas (MINAYO-GOMEZ;
THEDIM-COSTA, 1999, p. 59)
Apesar de, como foi visto anteriormente, a crise do capitalismo ser uma
crise estrutural e estar relacionada à própria falência organizacional do
capitalismo a responsabilidade da crise foi lançada sobre os sindicatos,
conforme aponta Anderson (1995), por estes reinvindicarem salários e exigir do
Estado o desenvolvimento de políticas sociais.
27
A Inglaterra foi um dos países onde o Neoliberalismo foi implantado e
algumas das conseqüências foram a negociação individualizada entre capital e
trabalho, diminuição significativa do poder dos sindicatos, aumento de
demissões e do desemprego estrutural. Antunes (2001) cita que a produção
industrial no reino Unido em 1979 contava com mais de 7 milhões de
trabalhadores, ocorrendo uma redução para 3,75 milhões em 1995.
A precarização e flexibilização do trabalho, comuns das novas formas de
organização do Estado e do trabalho, trazem como conseqüência o trabalho
realizado em casa, a necessidade de inclusão do trabalho feminino para o
sustento da família e a redução do trabalho masculino, entre outros, segundo
Antunes (2001).
Este período de intensas transformações afetou todos os países
capitalistas porém este processo de transformação foi ainda mais drástico nos
países que já se encontravam numa posição de exploração e de manutenção
do Estado de Bem Estar Social dos países de capítalismo avançado. Antunes
(2001) explicita esta situação quando cita que ao término do ciclo expansionista
do pós-guerra, presenciou-se a completa desregulamentação dos captiais
produtivos transnacionais, além de forte expansão e liberalização dos capitais
financeiros. Esta fase de intensas modificações produtivas e econômicas
ocorreu de formas diversas nos países capitalistas. Os países que tinham
desenvolvido um capitalismo avançado exerceram um papel de dominção
frente aos demais países. Entre estes últimos encontravam-se aqueles de
industrialização intermediária, como os asiáticos, nestes a transição do modelo
deu-se numa posição de total subordinação e dependência. Nos países do
então chamado Terceiro Mundo esta relação de dominação foi ainda mais
intensa.
São crescentes os exemplos de países excldos do
desenvolvimento, da reposão dos captiais produtivos e
financeiros e do padrão tecnológico necessário, o que acarreta
repercussões profundas no interior desses pses,
particularmente no que diz respeito ao desemprego e à
precarização da força humana de trabalho (ANTUNES, 2001,
p. 33).
28
Esta situação de desproteção da sociedade nos países periféricos como
o Brasil também pode ser identificado a seguir.
Nos países centrais, mecanismos públicos de bem-estar social
e redes de proteção social amenizam essas situações
(desemprego e empobrecimento da população), e impedem,
em alguma medida, que a exclusão social se consuma em
todo seu potencial desagregador. Em países periféricos, como
o Brasil, sua principal dimensão é a continua e crescente
aproximação do empobrecimento (MINAYO-GOMEZ e
THEDIM-COSTA, 1999, p.413).
No Brasil, o Estado de Bem Estar Social não chegou a ser implantado,
registrou-se o chamado período desenvolvimentista que tinha por objetivo
ampliar o potencial de produção de mercadorias e de exportação das mesmas.
Isto levou o Brasil a um grande endividamento. Desta forma, desde meados da
década de 70 até o final da década de 80, o País encontrava-se em um período
de intensas modificações sociais e políticas ocasionadas tanto por pressões
internas quanto externas. Internamente, ocorre o enfraquecimento do partido
de sustentação do regime militar e, além disto, “[...] as classes populares
tornaram-se politicamente mais autônomas e tentaram partilhar valores
materiais e não materiais que antes eram exclusivos das classes média e alta”
(SALLUM, Jr. 2003, p.36). O mesmo autor destaca que externamente o país
sofria uma pressão por parte dos países capitalistas no sentido de adotar as
propostas neoliberais no sentido de ampliar a privatização do Estado, adotar
uma crescente abertura do mercado interno e até mesmo implantar uma
política econômica interna que favorecesse a estes pressupostos. O Brasil
tinha pouca autonomia para não adotar estas medidas considerando a elevada
dívida externa deixada pelo período desenvolvimentista.
A crise do Estado desenvolvimentista foi um dos fatores preponderantes
para o movimento da redução do Estado no Brasil, que segundo Oliveira (1995)
teve início ainda durante a ditadura e prosseguiu no mandato “democrático” de
José Sarney. Tamm no período Collor o desmonte do Estado continuou,
incutindo-se na sociedade uma visão de Estado desperdiçador através da
desmoralização da educação da saúde, do escândalo dos marajás, etc. Esta
manipulação tornou a sociedade favorável à redução do Estado.
29
Outro importante fator que viria a favorecer a implantação de uma
política neoliberal no país foi a hiperinflação que, durante o governo de Itamar,
torna-se uma realidade no país, e que foi implantada artificialmente com o
objetivo de fragilizar economicamente a população tornando-a maleável para a
implantação de um modelo de Estado liberal. É neste cenário político,
econômico e social que Fernando Henrique Cardoso põe em prática um plano
econômico, o Plano Real, “cujo elo principal foi à aliança política entre partidos
de centro e direita em torno de um projeto de tomada de poder e de
reconstrução do Estado em uma perspectiva liberal” (SALLUM JR., 2003, p.
44).
De toda a situação abordada podemos perceber a gravidade da situação
para o Brasil. Primeiramente não chega a estruturar o Estado de Bem Estar
Social porque se encontra fora dos países capitalistas que tem condições de
fazer isto. Ao invés disto, na busca de se distanciar do modelo agro-exportador
e tentar se inserir na industrialização, que estava presente nos países de
capitalismo avançado, aumenta sua dívida externa de onde vêm os recursos
para esta mudança. Este processo de crescente industrialização dá origem ao
Estado Desenvolvimentista que é abalado durante a década de 70 com a crise
do capitalismo. O endividamento do País tornou-o ainda mais suscetível às
pressões transnacionais e dos detentores dos poderes econômicos no sentido
de adotar os ideais neoliberais. As conseqüências da implantação do Estado
Neoliberal são extremamente graves para a população:
[...] trabalhadores sem trabalho, os quais ocupam na
sociedade, literalmente, um lugar de supranumerários, de
inúteis para o mundo. (...) sem espaço na vida econômica, na
produção de bens e servos, com reduzidos direitos sociais e
humanos. Uma força de trabalho atomizada, desprotegida
socialmente, por cujo infortúnio ninguém parece ser
responsável.(MINAYO-GOMEZ; THEDIM-COSTA, 1999,
p.412).
E frente a esta situação, de exclusão de multidões do mercado do
trabalho, o Estado, ao privilegiar o mercado financeiro não adota uma postura
de sanar a situação do desemprego estrutural e de garantir os mínimos sociais
para a grande massa de excluídos. Quando muito cria alternativas de “[...] re-
30
inserção circunstanciais, negociadas com as empresas, por meio de incentivos
financeiros e redução ou isenção de encargos sociais” (MINAYO-
GOMEZ;THEDIM-COSTA, 1999, p.412).
A primazia do mercado financeiro, a crescente automação e
informatização, além das outras medidas neoliberais, reduzem os níveis de
emprego, por isto estes autores tamm fazem uma crítica aos políticos
quando estes prometem a superação da crise e a ampliação do mercado de
trabalho. Eles se baseiam em dados da OIT segundo os quais na América
Latina o setor informal atinge de 40% a 70% do mercado de trabalho, no Brasil
a taxa chega a 55% nas regiões metropolitanas.
A violência é outra das conseqüências das desigualdades sociais que
atingem as sociedades atuais. Este aspecto também pode ser comparado aos
primórdios da revolução industrial, quando a violência afetava a ordem social.
No presente, o embate deriva-se de diversas formas de
exclusão social e conduz a uma violência difusa, forjada no
cruzamento do social, do político do cultural, que se associa a
um estado de degradação, de decomposão social, de
individualismo crescente. (MINAYO-GOMEZ e THEDIM-
COSTA, 1999 p.415)
Durante este capítulo, além da trajetória do trabalho ao longo dos
diversos períodos históricos tivemos uma breve idéia do processo de
implantação de uma política liberal em nosso país, vindo de encontro a uma
pressão transnacional e de interesses da classe dominante visando adequar-se
às exigências do capital. Pudemos perceber também as conseqüências
nefastas que produz na sociedade principalmente nas populações mais
desfavorecidas, as quais estão desamparadas pela estrutura de Estado. O
poder de mobilização sindical tamm está extremamente fragilizado por toda
a situação que configura a realidade (precarização do trabalho, redução
salarial, aumento do trabalho informal, etc.).
A organização do processo de trabalho também foi abordada, levando-
nos a concluir que o trabalho passou por intensas transformações sempre no
sentido de atender aos interesses do capital e, portanto torná-lo mais eficiente
na geração de lucros. Para atender a este objetivo o trabalho foi intensificado,
31
fragmentado, terceirizado, entre outros. Estas características do trabalho na
atualidade, entre outros fatores que serão abordados na seqüência, são
importantes fontes de adoecimento e morte dos trabalhadores. Assim, no
próximo capítulo iremos aprofundar a compreensão sobre o processo
saúde/doença enquanto social e historicamente construído e a correlação
existente com o trabalho.
32
CAPÍTULO 2
TRABALHO E SDE
2.1 O Trabalho como Fator de Adoecimento
A correlação entre trabalho e doença já é antiga, sendo descrita no início
do século XVIII, na obra clássica de Bernardino RamazziniDe Morbis
Artificium Diatriba. O livro relata doenças que acometiam trabalhadores em
mais de cinqüenta ocupações. Entre eles os sapateiros, ferreiros, azeiteiros,
curtidores, queijeiros, pintores, vidraceiros, lavadeiras, carregadores,
tipógrafos, tecelões, escribas, etc. Estes últimos eram os digitadores da época,
e as doenças que apresentavam são o que hoje conhecemos como Lesões por
Esforços Repetitivos, patologia ocupacional considerada “moderna”. (MAENO;
CARMO, 2005).
Apesar dos estudos de Ramazzini já apontarem a correlação existente
entre doença e trabalho nem sempre o adoecimento e a morte de
trabalhadores foi foco de atenção na área da saúde. Incluir o trabalhador na
assistência a saúde ou melhorar as condições de trabalho para diminuir o
adoecimento destes está relacionado ao período histórico analisado,
dependendo da importância que o trabalho e o trabalhador assumem em cada
um destes períodos. Desta forma, no período do trabalho escravo ou no regime
servil, inexistia a preocupação em preservar a saúde dos que eram submetidos
ao trabalho. Este era interpretado como castigo ou estigma.
O trabalhador, o escravo, o servo eram peças de engrenagens
“naturais”, e pertences da terra, assemelhados a animais e
ferramentas, sem história, sem progresso, sem perspectivas,
sem esperança terrestre, até que, consumidos seus corpos,
pudessem voar livres pelos ares ou pelosus da metafísica
(NOSELA apud MINAYO-GOMEZ; THEDIM-COSTA, 1997, p.
22).
Cohn e Marsiglia (1994) citam quatro momentos que caracterizam o
processo produtivo capitalista e fazem uma análise dos fatores que geram
adoecimento em cada um destes momentos. Os três primeiros são baseados
33
em Marx sendo: o período da cooperação simples, da manufatura e da
maquinaria. O último, o período da automação, foi desenvolvido por
Freyssenet. Uma síntese destes momentos e os respectivos riscos de
adoecimento são:
1) Cooperação Simples – A relação se estabelece com base na
propriedade, que pertenciam ao senhor feudal. Ao trabalhador cabia
executar as tarefas que eram variadas, correspondentes as do artesão.
O próprio trabalhador planejava e executava o trabalho. O adoecimento
ocorria em função do excesso de esforço físico empregado para a
execução das tarefas e o contato com substâncias nocivas.
2) Manufatura – Neste período inicia-se o processo de divisão do trabalho
e a partir de então cada trabalhador realizava tarefas parcializadas,
tendo início a precarização do trabalho. Neste período tem-se a
separação entre a concepção e a execução do trabalho. O risco de
adoecimento passa a relacionar-se à divisão técnica do trabalho que se
caracteriza como monótono e repetitivo. Este tipo de trabalho tamm
repercute no equilibro psíquico do trabalhador, agravado pela exigência
de maior concentração na mesma atividade durante uma jornada de
trabalho prolongada.
3) Maquinaria – Nesta etapa a máquina substitui as ferramentas
artesanais, e a fonte energética deixa de ser a força humana. Acentua-
se a separação entre a concepção e a execução do trabalho. O trabalho
é dividido em várias fases que se sucedem e são determinadas pelas
operações da máquina. O trabalhador desqualifica-se ainda mais. Este
período é dividido em dois momentos. No primeiro, a maquinaria
simples, o trabalhador aciona, prepara e ajusta a máquina, isto permite
certo controle sobre o seu ritmo de trabalho. O segundo momento
caracteriza-se como a organização científica do trabalho – representado
pelo taylorismo e pelo fordismo. O trabalhador é transformado em
objeto, os movimentos do trabalhador são determinados pela máquina,
há uma intensificação do trabalho, aumenta a parcialização, procura-se
34
reduzir o tempo gasto em cada atividade para aumentar a produtividade.
Nesta fase do capitalismo o gasto calórico é menor, porém surgem
novos fatores de desgaste como o trabalho por turnos rotativos com
implicações sobre o ciclo circadiano (transtornos gastro-intestinais,
sexuais, distúrbios do sono) e sobre a vida social e familiar do
trabalhador. Os objetos de trabalho são mais diversificados aumentando
os riscos físicos e químicos de adoecimento, há uma intensificação do
ritmo do trabalho, e as técnicas tayloristas e fordistas de gestão
provocam a fadiga física e mental dos trabalhadores.
4) Automação: Na automação ocorre uma redução acentuada da
participação da força de trabalho no processo de produção: sua
participação praticamente restringe-se às funções de vigilância do
processo produtivo. Diminuem os trabalhadores envolvidos no processo
produtivo propriamente dito e aumenta o número de trabalhadores
qualificados para as tarefas de manutenção (Ex.: eletricistas e
soldadores). Este processo tamm pode ser dividido em dois tipos. O
primeiro é o de processos de fluxo contínuo, neste do início ao final do
processo de produção se dá sem a intervenção humana direta, cabe
aos trabalhadores somente acompanhar e controlar os equipamentos
automatizados. A função dos trabalhadores é limitada a vigilância das
operações num processo no qual o trabalhador não tem mais
intervenção direta. A automação é muito usada nos ramos de produção
da área química, petroquímica e na metalúrgica, nos quais os
trabalhadores são expostos a objetos de trabalho de alta periculosidade
e contaminação. Além disso, com a automação os trabalhadores são
submetidos a formas de organização do trabalho que implicam na sua
imobilidade, associada à monotonia e à exigência de grande
concentração de sua parte, gerando situações de grande tensão. A
redução da exigência de esforço físico vem acompanhada, assim, de
significativo desgaste psíquico do trabalhador expresso em
sintomatologias de fadiga, estresse e demais patologias
psicossomáticas e nervosas.
35
Estes quatro momentos do modo de produção capitalista e a correlação
com as principais causas de adoecimento em cada uma delas ilustram como o
processo saúde/doença se modifica conforme ocorrem mudanças na
organização do processo de trabalho. Foi possível perceber que no início do
processo de produção capitalista as principais causas de adoecimento estavam
basicamente relacionadas ao elevado dispêndio de energia por parte do
trabalhador. Posteriormente, o processo de trabalho apresenta maiores e mais
complexas causas de adoecimentos, principalmente após a Revolução
Industrial, quando novas tecnologias e produtos vão sendo inclusos no
processo de trabalho. Isto aumenta não apenas a exposição a produtos
nocivos como tamm afeta o trabalhador em sua estrutura psíquica,
favorecendo o adoecimento mental e do próprio ciclo circadiano.
[...] o ritmo exigido pela produção, a monotonia da atividade, a
exposição do corpo para realizar o trabalho, movimentos
forçados e pesos excessivos, inadequação da máquina ao
corpo do trabalhador, falta de fiscalização ou manutenção das
condições das máquinas e instrumentos, poluição e falta de
higiene de trabalho, utilização de EPIs inadequados, máquinas
inseguras, trabalho em alturas ou em construções defeituosas,
excesso de pessoas em lugares fechados, falta de ventilação,
falta de capacitação para utilizar a tecnologia empregada, e
duração de tempo em que se está desenvolvendo a atividade
(PICALUGA, 1982, p.41).
Além dos fatores citados existem ainda outros que devem ser
considerados como possíveis desencadeadores de patologias físicas ou
psíquicas. Entre eles o tamanho da empresa; a jornada de trabalho (número de
horas trabalhadas, obrigatoriedade de cumprir horas extras, anotação destas
horas extras para efeitos de 13
º
salário, etc.); o tipo de contrato (carteira
assinada, prestação de serviços, “bóias frias”, etc); a forma de pagamento (por
mês, semana, dia, tarefa, etc.); o horário (diurno, noturno, por turnos, etc); a
exigência de conhecimentos técnicos; o sistema de ascensão previsto; a forma
de controle sobre os trabalhadores (no horário do trabalho, nos intervalos, na
utilização dos banheiros, na hora refeições, etc.); o tempo de folga
(cumprimento, ou não da legislação trabalhista); local para refeições e
condições ambientais, etc. (PICALUGA, 1982)
36
Conforme foi citado no início deste capítulo o processo de saúde/doença
sofre influencias dos fatores psicológicos e sociais, entre estes últimos o
trabalho. Dentre os aspectos sociais a estrutura da sociedade, ou seja, do
conjunto de condições em que uma determinada população vive, incluindo as
condições de moradia, alimentação, o dispêndio de energias no trabalho, a
remuneração por este trabalho, se é suficiente ou não para dar conta dos
gastos para a sobrevivência, etc. que também interferem no processo de
adoecimento. Esta situação é agravada à medida que dentro de uma
perspectiva neoliberal a estrutura estatal é reduzida continuamente, assim
[...] não é difícil associar as doenças que afetam as classes
trabalhadoras a partir da oferta de bens de consumo coletivos
tais como transporte, saneamento, urbanização, educação,
assistência médica, segurança social, aposentadoria, etc.
(PICALUGA, 1982, p.37).
Explicitando ainda a questão social que permeia o trabalho e o fator de
adoecimento podemos citar:
[...] emerge um desafio ainda a enfrentar desde velhas
situações praticamente intocadas, como o trabalho escravo e o
trabalho infantil, às decorrentes de um modelo de produção
seletivo e excludente que vem ampliando a dimensão da rua
como espaço de trabalho, com todas as incertezas,
vulnerabilidades e riscos que esse espaço significa, em
relação tanto a acidentes e violências, como à produção da
própria sobrevivência (MINAYO-GOMEZ; THEDIN COSTA,
1997, P. 23).
A partir da compreensão do processo saúde/doença que abrange os
aspectos sociais e psicológicos é possível perceber que este processo não
ocorre de forma igual em todas as sociedades. Conforme foi citado
anteriormente, as condições de trabalho num país central ocorrem de maneira
mais adequada enquanto que nos países periféricos as condições de vida e
trabalho são ainda mais precárias. Dentre estes últimos são ainda piores as
condições para a população de mais baixa renda, que é mais excluída em
todos os sentidos dos direitos sociais como a educação, saúde, emprego,
saneamento básico, etc.
Agora que já identificamos que o trabalho pode ser um importante fator
de adoecimento e que este se modifica conforme modifica o processo produtivo
37
e a organização da sociedade, é importante compreender como estas
mudanças sociais estão relacionadas com as ciências da saúde.
2.2 Evolução do Conceito Saúde/Doença
A história da saúde e da doença é, desde os tempos mais longínquos,
uma história de construções de significões sobre a natureza, as funções e a
estrutura do corpo e ainda sobre as relações corpo-espírito e pessoa-ambiente.
A medicina e as outras ciências da saúde acompanham estes movimentos e
modificações que ocorrem na concepção de saúde e doença, alterando suas
práticas e ideologias. As principais transformações serão apresentadas na
seqüência, assim como a correlação destas com trabalho e o trabalhador.
Albuquerque e Oliveira (2002) referem quatro grandes períodos para
descrever a evolução dos conceitos de saúde e de doença ao longo do
percurso histórico da humanidade: o período pré-cartesiano que perdurou até o
século XVII; o período científico ou biomédico; a primeira revolução da saúde
com o desenvolvimento da saúde pública a partir do século XIX; e a segunda
revolução da saúde iniciada na década de 70.
O período Pré-Cartesiano marca o início do afastamento das crenças
mágico-religiosas. Hipócrates, médico grego, foi quem deu expressão a essa
revolução, defendendo que as doenças eram causadas por causas naturais.
Com ele, a medicina afastou-se do misticismo e do endeusamento e baseou-se
na observação objetiva e no raciocínio dedutivo.
O Modelo Biomédico surgiu quando filósofos como Galileu, Descartes,
Newton, Bacon e outros conceberam a realidade do mundo como uma
máquina. Esta visão mecanicista do Mundo tamm foi adotada pelos médicos
e fisiologistas da época fazendo com que o corpo humano fosse considerado
como uma máquina. O modelo biomédico respondeu às grandes questões de
saúde que se manifestavam na época, definindo a teoria do germe que
postulava que um organismo patogênico específico estava associado a uma
doença específica, fornecendo assim as bases conceptuais necessárias para
combater as epidemias.
38
A Primeira Revolução da Saúde surge como uma resposta ao diversos
problemas que surgiram com a Revolução Industrial onde proliferaram diversas
epidemias oriundas das precárias condições de vida da população. São
utilizados então os conceitos do modelo biomédico que conduziram ao
desenvolvimento de medidas de saúde pública. Quando estas falhavam,
intervinha a medicina curativa que, a partir de meados do século XX, encontrou
nos antibióticos um auxiliar eficaz na destruão desses microorganismos. Este
modelo alcançou um grande sucesso até o final da década de 70. Porém este
modelo omite os aspectos sociais e psicológicos ao considerar somente a
dimensão física do indivíduo.
A Segunda Revolução da Saúde ocorre a partir da mudança do perfil
das doenças, que passaram de infecto-contagiosas a crônico-degenerativas, e
nestas últimas, a influência da etiologia comportamental e social é muito
importante. Dentro desta nova perspectiva a promoção da saúde e estilo de
vida passaram a ser incorporados como conceitos fundamentais para a saúde.
Até o momento discutimos primeiramente o processo saúde-doença
relacionado ao trabalho e posteriormente percebemos que a saúde e a doença
são tamm processos sociais e historicamente construídos. No atual
momento histórico encontramo-nos num período no qual as práticas de saúde
devem considerar todo o avanço técnico e biológico, porém os fatores
psíquicos e sociais também devem ser considerados. Nesta perspectiva é
importante citar a obra de Facchini (1994) que faz uma importante
consideração sobre a influência das causas na determinação das doenças. O
autor demonstra que conforme a compreensão do modelo saúde/doença que
se adota a causalidade se modifica. Este conceito é fundamental para a saúde
do trabalhador e dependo do modelo que se adota a responsabilidade pelo
adoecimento pode ser delegada ao trabalhador sem ser considerada a
variedade de fatores que podem estar presentes no desencadeamento de
diversas doenças, inclusive a atividade laboral.
Facchini (1994) define dois modelos de determinação das doenças:
39
a) o unicausal – que é baseado no modelo da metade do século XIX, na
teoria da microbiologia, de Pasteur, que ainda exerce grande influencia na
medicina atual. Neste modelo a atividade laboral é excluída, sendo considerada
somente em raríssimas situações em que o agente contaminante está
diretamente relacionado à patologia. Ex.: pneumoconiose.
b) o multicausal – neste são considerados vários fatores no
desencadeamento de doenças. Proporciona uma visão mais ampla do
processo saúde doença, porém o autor adverte para o risco de se adotar uma
postura reducionista também neste modelo quando se consideram somente os
aspectos mais próximos. É necessário considerar aspectos como a classe
social, a atividade profissional, os aspectos psicossociais, para um diagnóstico
adequado. Um exemplo são as cardiopatias, quando só se consideram fatores
como dieta, fumo, não considerando, por exemplo, a atividade profissional.
Para ampliar a possibilidade de um diagnóstico mais abrangente é importante a
utilização do instrumental da epidemiologia que com o avanço da tecnologia
pode permitir cruzar vários dados para um completo diagnóstico.
O autor sugere o modelo da Determinação Social da Doença como
alternativa que propõem o modelo que concebe a saúde/doença como um
processo social, já que historicamente os processos biopsíquicos humanos têm
se transformado em função das transformações sociais ocorridas.
Na área da Saúde do Trabalhador o fortalecimento da utilização dos
avanços da epidemiologia num enfoque social possibilita que se considere uma
grande quantidade de fatores que estão relacionados ao trabalho e que
interferem na causalidade das doenças. Como por exemplo, a carga de
trabalho e dos grupos de risco de determinadas categorias profissionais ou
ramos produtivos.
Portanto para uma adequada atuação em Saúde do Trabalhador é
importante que se tenha uma compreensão integral do processo de trabalho,
considerando as peculiaridades que o constituem neste momento histórico,
assim como a forma como este arranjo laboral incide sobre a saúde e doença
dos trabalhadores. O instrumental teórico metodológico que possibilita esta
compreensão holística deve considerar os princípios da epidemiologia numa
perspectiva social.
40
Maeno e Carmo (2005) abordam estas mudanças na área da saúde e
suas interferências nas práticas em Saúde do Trabalhador. Assim temos o
surgimento da Medicina do Trabalho no século XVIII, período da Revolução
Industrial, onde como já foi visto anteriormente surgem muitos problemas de
saúde em função do grande deslocamento da população para a zona urbana e
em precárias condições de vida e trabalho. É um período de grande epidemias
e o modelo biomédico, com sua teoria higienicista e mecanicista influencia as
práticas de saúde. Os crescentes movimentos operários assim como a
necessidade de preservar minimamente a mão-de-obra é o contexto que faz
surgir a Medicina do Trabalho.
[...] surge a Medicina do Trabalho, restrita a uma abordagem
clínica, do trabalhador-paciente, sem preocupação de
identificar e alterar os fatores de risco responsáveis pelo
adoecimento e morte decorrentes do trabalho. Surge como
mais um mediador do conflito entre o trabalhador e o capital
para assegurar o funcionamento da “peça especializada”
(MAENO; CARMO, 2005, p.28).
A Medicina do Trabalho, apesar de aparentemente incoerente ainda é
prática comum nos dias atuais, podendo ser observada quando profissionais
possuem uma compreensão reducionista do ser humano e da doença que o
acomete. Os autores citam como exemplo, na área de Saúde do Trabalhador,
os exames que rotineiramente são solicitados ao trabalhador.
Esses exames tornam-se, na prática predominante, a
contemplação do adoecimento do trabalhador – o indicador
biológico de uma situação conhecida e potencialmente nociva,
sem a necessária intervenção sobre o processo produtivo
(MAENO; CARMO, 2005, p.28).
Os autores evidenciam que existem legislações em vigor no Brasil que,
teoricamente, estabelecem diretrizes que poderiam possibilitar uma atuação
que valorizasse a saúde dos trabalhadores. São as Normas Regulamentadoras
de Segurança e Medicina do Trabalho (NR), contidas na Consolidação das Leis
de Trabalho (CLT), particularmente a NR7 (Programa de Controle Médico de
Saúde Ocupacional – PCMSO) e a NR 9 (Programa de Prevenção de Riscos
Ambientais – PPRA). Freqüentemente são citados como justificativas para a
não aplicabilidade correta destas:
41
[...] os valores relacionados à origem de classe e à formação
acadêmica conservadora da maioria dos médicos, a postura
apática da sociedade, a insuficiente capacidade de pressão
dos trabalhadores, a indiferea dos empregadores e a
ausência de uma política de Estado efetiva, resultam em
sucessivas crônicas de doenças e mortes anunciadas, em que
o PCMSO e o PPRA são transformados em documentos
burocráticos, a serem renovados todos os anos. (MAENO;
CARMO, 2005, p.30).
O modelo restritivo da Medicina do Trabalho começa a não ser mais
suficiente para a vasta gama de doenças que surgem em função da II Guerra
Mundial. Num contexto econômico e político da guerra e do pós-guerra, o custo
provocado pela perda de vidas ocasionadas pelos acidentes de trabalho
começou a ser sentido pelos empregadores. A evolução da tecnologia
industrial também evoluía de forma acelerada, alem da nova divisão
internacional do trabalho. Este conjunto de fatores traz a necessidade de
reorganização da medicina do trabalho.
Como resposta surge a perspectiva de ampliação da atuação médica
direcionada ao trabalhador propondo-se a intervir sobre o ambiente e
incorporando o instrumental de outras disciplinas e profissões. Desta evolução
conceitual surgiu a Saúde Ocupacional. “Com base neste novo paradigma,
somou-se à abordagem clínico-individual o ferramental de outras disciplinas,
em especial da ergonomia, da Higiene do Trabalho e da toxicologia. Medidas
de prevenção passaram a ser preconizadas.” (MAENO; CARMO, 2005, p. 42).
Apesar de a Saúde Ocupacional ampliar o leque de instrumentos e
conhecimentos para a abordagem entre saúde e trabalho, não consegue dar
conta de todos os problemas que circundam a Saúde do Trabalhador. Os
autores apontam como alguns dos pontos negativos alguns preceitos que se
transformaram em verdades incontestáveis, como o de que o ser humano pode
ser exposto a condições insalubres desde que respeitados limites considerados
aceitáveis, e que existem níveis seguros de exposição a substâncias nocivas.
A partir da década de 60, nos países industrializados do mundo
ocidental surge um movimento social de questionamento da vida, do trabalho e
do próprio Estado. Como resposta a este movimento social, novas políticas
sociais são transformadas em leis principalmente quanto a legislação
trabalhista. Esta nova legislação prevê o reconhecimento do exercício de
42
direitos fundamentais dos trabalhadores, como o direito a informação, à recusa
ao trabalho em condições de risco grave para a saúde ou a vida, entre outros.
(MENDES; DIAS, 1991).
Neste intenso processo social de discussões teóricas e de práticas
alternativas, ganha corpo a teoria da determinação social do processo saúde-
doença, cuja centralidade colocada no trabalho – enquanto organizador da vida
social – contribui para aumentar os questionamentos à Medicina do Trabalho e
à Saúde Ocupacional.
A ampla movimentação social e o questionamento da Medicina do
Trabalho e da Saúde Ocupacional fazem surgir a Saúde do Trabalhador.
O objeto da saúde do trabalhador pode ser definido como o
processo saúde e doença dos grupos humanos, em sua
relação com o trabalho. Representa um esforço de
compreensão deste processo – como e porque ocorre – e do
desenvolvimento de alternativas de intervenção que levem à
transformação em direção à apropriação pelos trabalhadores,
da dimensão humana do trabalho, numa perspectiva
teleológica (MENDES; DIAS, 1991, p. 341).
Estes mesmos autores citam ainda as características desta nova área, a
Saúde do Trabalhador, no sentido de integrar o individual x coletivo, o biológico
x social, o técnico x o político, o particular e o geral.
Esta abordagem traz uma nova perspectiva, a de considerar o ser
humano em sua totalidade, ou seja, sua inserção no processo produtivo, na
organização e na divisão do trabalho e nas características específicas de cada
extrato social. “Este enfoque permitiu uma abordagem mais ampla das
necessidades de saúde dos trabalhadores e resultou em um espectro mais
largo e integral de instrumento para sua atenção” (MAENO; CARMO 2005 p.
44).
Esta visão holística do ser humano e do processo saúde/doença é
necessária para que se possa realizar o diagnóstico e a terapêutica,
principalmente das Doenças Relacionadas ao Trabalho, cuja definição
encontra-se na seqüência.
Os agravos à saúde dos trabalhadores englobam, além dos
acidentes de trabalho, as doenças profissionais – aquelas que
apresentam relação nítida com o trabalho, sendo inerentes aos
indiduos que desenvolvem alguma atividade produtiva, que é
a causa inequívoca da doença -, e as doenças relacionadas
ao trabalho aquelas em que não existe pressuposto da
inerência, sendo o trabalho assumido como co-fator na
43
etiologia da doença (WÜNCH FILHO apud SILVA, BARRETO
JUNIOR E SANT’ANA, 2003, p. 1).
Esta nova concepção teórico-metodológica, com a visão integral do
trabalhador, possibilita a integração de vários fatores para que se consiga
estabelecer práticas de saúde adequadas para preservar a saúde dos
trabalhadores. Esta perspectiva amplia a possibilidade da identificação de
doenças relacionadas ao trabalho mesmo quando as causas são diversas e
complexas.
Agora que já identificamos as principais mudanças que ocorrem nas
práticas de saúde bem como estas repercutem na relação com o trabalho
analisaremos como este processo ocorreu no Brasil
44
CAPÍTULO 3
A SAÚDE DO TRABALHADOR NO BRASIL
3.1 Processos Históricos e a Saúde no Brasil
Identificamos o trabalho como um dos fatores que age como
determinante no processo de morbi-mortalidade dos trabalhadores e que este
passa por modificações ao longo da história, o mesmo ocorrendo como o
processo saúde e doença. Baseando-se nesta concepção social é importante
citar alguns fatos históricos que marcaram o País principalmente aqueles que
de alguma forma se relacionam Política Pública de Saúde e à área de Saúde
do Trabalhador.
3.1.1 Período Pré 30
Os principais fatos que caracterizam este período são baseados em
Rocha e Nunes (1994). O período pré-30 tinha sua economia baseada no
modelo agro-exportador e a principal fonte de mão-de-obra era a escrava,
estando estes excluídos de quaisquer ações na área da saúde. Os
trabalhadores rurais apesar de serem fundamentais para a base da economia
tamm não tinham direitos sociais, o que era influenciado pela cultura
existente na qual a aristocracia rural, por ter a posse da terra, considerava que
os camponeses deveriam desempenhar suas funções como uma troca de
favores.
Este período era caracterizado por precárias condições de vida e
trabalho, mesmo assim a Constituição de 1891 previa a não intervenção do
Estado no mercado e nas relações de trabalho.
Neste período tamm houve um significativo aumento da população
urbana, principalmente no Rio de Janeiro de Janeiro e São Paulo. Estes
45
centros apresentavam precárias condições de trabalho o que gerou várias
greves no período de 1901 e 1914, alcançando a quantidade de 129.
O rápido crescimento da população urbana e a emergência de uma
classe média geraram um conflito estrutural entre a classe oligárquica e os
grupos médios que pretendiam ter acesso ao sistema de poder.
Somente em 1919 o Estado começa a intervir nas relações de trabalho
em função da pressão dos trabalhadores e de fontes externas, estas últimas
podendo ser identificadas pela criação da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), ao final da década de 10, que refletia a pressão dos países
capitalistas centrais sobre os periféricos no sentido de que todos enfrentassem
mais ativamente a problemática social e trabalhista.
Estas pressões internas e externas fazem com que surjam as primeiras
leis sobre o Acidente do Trabalho (1919) e a primeira lei sobre Previdência
Social (1923).
As condições de saúde/doença neste período eram compostas por um
predomínio das doenças pestilares (febre amarela, varíola, tuberculose e
malária) o que gerou ações de saúde de caráter sanitarista e campanhista,
visando garantir as condições produtivas do país agro-exportador. Assim estas
ações eram priorizadas para os principais centros agro-exportadores, São
Paulo, Minas Gerais e na Capital Federal (Rio de Janeiro).
Outra mudança importante na área da saúde foi a criação, em 1923, do
Departamento Nacional de Saúde Pública, propondo as seguintes atribuições
federais: saneamento rural e urbano; propaganda sanitária; a higiene infantil,
profissional e industrial; a fiscalização dos portos e o combate às endemias
rurais.
Portanto, neste período histórico podemos concluir que houve a
exclusão de importantes parcelas de trabalhadores das políticas sociais,
principalmente os escravos e os camponeses. Alguma mudança de postura por
parte do Estado somente ocorreu quando houve o fortalecimento da classe
média, somada as pressões internacionais. As ações de saúde tinham por
objetivo garantir as condições para a exportação dos produtos do modelo agro
exportador.
46
3.1.2 Período 30-45
Neste período histórico, tamm baseado em Rocha e Nunes (1994),
ocorreu a crise do modelo agro-exportador e, por outro lado, um grande
desenvolvimento industrial, que aumentou 60% a produção entre 1939 e 1946.
Este desenvolvimento industrial foi influenciado, parcialmente, pela II
Guerra Mundial uma vez que havia a necessidade da instalação de bases
aéreas no território nacional para o trânsito de aviões de guerra.
Em relação ao contexto político, o fato marcante do período foi a
Revolução de 30, que levou a reorganização do Estado brasileiro,
caracterizado pela presença de Getúlio Vargas por um período de 15 anos.
Este período pode ser dividido basicamente em duas fases, até 1937, onde
existia uma crise de hegemonia devido à disputa de diferentes classes na
sucessão da oligarquia cafeeira, e, após 1937 um período com características
ditatoriais.
No primeiro período Vargas ampliou as Políticas Sociais para atender as
reivindicações populares e as pressões internacionais.
Outra questão importante é o controle sindical que inicia ainda no
primeiro período da era Vargas e se agrava substancialmente no segundo
período. Em 1931 surge o decreto 19.770 pelo qual os sindicatos deveriam ser
regulamentados junto ao Ministério do Trabalho, o que não é aceito pela
grande maioria deles e desta forma em 1934 surge outro decreto que assegura
a pluralidade e autonomia sindical. Isto não dura muito tempo e já em 1935,
após a rebelião militar, vários sindicatos são fechados e líderes sindicais são
presos. Com a implantação do Estado Novo, de caráter ditatorial o controle
sobre os sindicatos é ainda mais drástico. Neste período é instituído o imposto
sindical que fornece o alicerce necessário para a manutenção de serviços
assistenciais incentivando a associação dos trabalhadores em busca desses
serviços (médicos e jurídicos), transferindo para os sindicatos uma
responsabilidade que é do Estado.
Em 1943, outro fato importante que marcou este período foi à criação da
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT através do Decreto-Lei n. 5.452.
47
Em termos de saúde continuava uma situação bastante precária, com
más condições de trabalho, alta mortalidade infantil e o predomínio de doenças
infecto-contagiosas.
Surgem os Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs), estes são
criados num contexto econômico de crescimento do processo de
industrialização e num momento político de ampliação da participação do
Estado em termos de políticas sociais. A partir de 1931 definiu-se que a
contribuição das empresas e da União fosse igual à dos segurados, porém o
Governo não repassou os recursos que lhe cabiam e desta forma em 1945 a
dívida da União chegou a 85% das despesas das instituições de Previdência.
Na prática a grande fonte de receita eram os salários dos trabalhadores.
Sintetizando, podemos dizer que neste período destaca-se o modelo
político que tem uma mudança significativa no período pós 37 com a
implantação da ditadura. Isto afeta de forma importante a organização sindical
no Brasil, que passa a ser controlada e direcionada para um padrão
assistencialista, ou seja, de cumprir um papel que deveria ser o do Estado de
garantir direitos como a saúde e assessoria jurídica. O desvio dos recursos dos
fundos de pensões tamm é algo que demonstra o quanto o Estado manipula
os recursos de acordo com seus interesses e necessidades, independente de
estar estabelecido em lei e de afetar a população nos seus direitos adquiridos.
Com base no que foi abordado neste período histórico podemos refletir sobre a
forma como as conquistas sociais e o poder dos sindicatos, são fortemente
influenciadas pelo modelo político e econômico do país, bem como das
pressões internacionais.
3.1.3 Período de 1945 à 1964
Este período, considerando Rocha e Nunes (1994), se caracterizou pelo
grande crescimento industrial saltando o valor da produção industrial de 17
bilhões e meio em 1939 para 116 bilhões e meio de cruzeiros em 1949. Até
1955 a industrialização privilegiou a indústria nacional, porém no governo de
48
Juscelino Kubitscheck (1956-60) iniciou-se o processo de abertura ao capital
estrangeiro.
Em relação ao contexto político, a principal característica é o processo
de redemocratização do país, que ocorre com a queda do Estado Novo. Ao
lado disso, após o final da II Guerra Mundial, surge um movimento internacional
de mudança de postura do Estado, no sentido da ampliação de suas
atribuições sociais.
Quanto à organização sindical os mesmos permaneceram atrelados ao
Estado através do controle político e financeiro, com o objetivo de manter a
classe operária dentro dos limites.
O contexto político democrático populista propiciou um processo de
redemocratização da Previdência Social, com o aumento dos benefícios e
serviços prestados. Estes foram garantidos na legislão, mas não
asseguradas na prática.
Com relação ao processo saúde/doença começa a haver uma
importante modificação do perfil de morbi-mortalidade neste período, reduzindo
as doenças infecto-contagiosas e aumentando as doenças crônico-
degenerativas, estas últimas relacionadas com o desenvolvimento industrial.
Em 1953 o Ministério da Saúde é transformado em ministério autônomo.
Sintetizando, podemos dizer que este período se caracteriza por:
[...] um ascendente crescimento econômico, [...] do ponto de
vista político assistiu-se, a um processo de redemocratização
do país. Associa-se, ainda, a esse período um processo de
pida urbanização. Em relação ao papel do Estado, este se
amplia, fato que ocorre também em muitos outros países,
visando uma ação mais efetiva e operacional no que se refere
às suas atribuições sociais. No caso brasileiro, no período
pós-Estado Novo, ampliam-se os serviços e benefícios
oferecidos pela Previdência Social. Pretendia-se com isto
suavizar as tensões sociais com o estabelecimento de
políticas sociais de caráter populista. O modelo populista
esgota-se durante o Governo JK (ROCHA; NUNES, 1994, p.
111).
3.1.4 Período de 1964 a 1980
49
O período 1964 a 1980, também foi sintetizado a partir de Rocha e
Nunes, e, pode ser identificado como o do Milagre Econômico. Nele ocorre o
crescimento industrial associado ao capital estrangeiro e uma forte
concentração da renda. O Estado desempenhou um papel central no processo
de acumulação e passou a ser a fonte mais importante de capital de
investimento.
Este período pode ser dividido em duas fases 1964/1974 e após 1974. A
primeira fase é conhecida como a fase do “milagre econômico” onde se justifica
o crescimento econômico associado ao arrocho salarial pela teoria de que seria
preciso “deixar o bolo crescer para então dividir”.
A partir de 1974 inicia-se um período de crise econômica interna e
internacional. A crise internacional se reflete no Brasil pelo aumento do preço
do petróleo e pela dificuldade da exportação de café, algodão, açúcar, etc.
Em termos políticos, o fato mais importante foi o golpe militar de 1964,
que representou a instalação de um regime caracterizado pelo autoritarismo,
excluindo a participação dos trabalhadores.
Neste contexto, o crescimento econômico foi acompanhado de um
arrocho salarial e um controle intenso sobre o movimento sindical. Após 1964
os militares recorreram a CLT para intervir nos sindicatos e prenderem os
líderes sindicais.
Em 1974 o descontentamento com o regime de 1964 é manifestado
através do voto maciço na oposição. Este processo acompanha a crise
econômica e torna clara a piora das condições de vida das classes média e
popular. Desta forma, principalmente após 1978 o Estado se vê obrigado a
ampliar paulatinamente a participação dos trabalhadores e coloca a questão
social como prioritária. Um dos exemplos é a Previdência Social, cujo Ministério
é criado nesta época.
Neste período o maior índice de acidentes de trabalho concentrava-se
nos trabalhadores diretamente ligados à produção. No início da década de 70 o
Brasil apresentou uma das taxas mais altas de acidente do trabalho do mundo.
Em 1971 para uma população empregada de 7,3 milhões de pessoas foram
registrados 1.401.922 acidentes, o que corresponde a uma taxa de ocorrência
de acidentes de quase 20%.
50
As condições de saúde no país continuam
[...] precárias, com a associação de doenças ditas como do
desenvolvimento, como as doenças cardiovasculares e as
doenças mentais e, ao mesmo tempo, a presença de elevados
índices de doenças infecciosas, inclusive com endemias antes
tidas como rurais que se expandem aos centros urbanos,
como a doença de Chagas. O duplo perfil de morbi-
mortalidade sugere que os trabalhadores, ao construírem o
progresso, não recebem necessariamente o seu benéfico e
pagam o preço deste progresso em doenças (ROCHA;
NUNES, 1994, p.115).
A resposta do Governo aos elevados índices de acidentes de trabalho
refletiu-se na criação de cursos de Medicina do Trabalho e Engenharia de
Segurança para ampliação dos Serviços de Medicina e Segurança nas
Empresas. Outra medida foi à promulgação da Lei n. 6.367 de Acidentes de
Trabalho em 19/10/1976. Esta Lei determinou que os primeiros 15 dias após o
acidente de trabalho fossem pagos pelo empregador, isto fez com que muitos
acidentes leves, com poucos dias de afastamento, não fossem registrados.
Reduziu-se desta forma o registro dos acidentes de trabalho, mas não a
quantidade real destes. Esta lei também eliminou o pagamento em pecúnio de
pequenas perdas sem repercussão sobre a atividade profissional que
representava 80% dos benefícios concedidos por acidente de trabalho,
gerando uma grande economia com relação aos custos dos acidentes de
trabalho.
Outro aspecto apontado pelos autores quanto às alterações ocasionadas
pela implementação da Lei n. 6.367 foi o reconhecimento de apenas 21
agentes como causadores de doenças profissionais. As outras precisam da
comprovação do nexo-causal e têm o caráter de excepcionalidade.
Os sindicatos neste período começam a se afastar do domínio estatal,
buscam maior autonomia propondo a negociação direta entre empresários e
trabalhadores. Este movimento tem seu marco nas greves de 1978, realizadas
nas indústrias metalúrgicas de São Paulo, onde foi negociada diretamente, em
acordo coletivo, a elevação dos salários.
É neste final da década de 70 que os movimentos sindicais atuam de
forma mais organizada e sistemática em relação à questão da saúde/trabalho.
51
Porém, ainda assim, vários fatores dificultaram uma atuação mais efetiva, entre
eles: falta de autonomia sindical; órgãos sindicais centralizados e com ações
desintegradas; os baixos salários dos trabalhadores e a falta de estabilidade no
emprego. Os dois últimos fatores fazem com que as lutas tenham de ser
centradas nos reajustes salariais para garantir a sobrevivência, ao lado disso o
medo da demissão faz com que os trabalhadores omitam doenças.
Em termos de Saúde surgem grandes problemas, tais como a crise
financeira, com origem nas fraudes e nos desvios de verbas da Previdência
para os mega projetos do governo; aumento de gastos com a saúde que tinha
suas ações baseadas num modelo privatista; e a exclusão de grandes parcelas
da população do acesso à saúde (MINISTÉRIO da SAÚDE, 1997).
Por outro lado começa a haver uma crescente abertura política e o
reaparecimento de atores (parlamentares, trabalhadores, profissionais da
saúde coletiva, etc), dispostos a lutar pelo direito a saúde e construir uma nova
proposta, compondo o movimento da Reforma Sanitária. Este movimento
ganha força e une-se a acontecimentos internacionais como a Conferência de
Alma Ata que ocorreu em 1978, onde surge a proposta internacional de
priorização aos cuidados primários em saúde (MINISTÉRIO da SAÚDE, 1997).
3.1.5 Período de 1980 a atual
A situação da saúde no Brasil, na década de 80, era excludente e
apresentava índices alarmantes quanto à saúde da população, entre eles o
número de acidentes de trabalho. A situação da saúde no país influenciou a
ampliação do direito à saúde, expresso na Constituição de 88. Alguns dos
dados mais relevantes foram:
Crianças morrendo aos milhões devido a diarréia,
sarampo, meningite, entre outros agravos preveníveis,
podendo ser comparada aos piores índices do planeta;
Mulheres sem assistência à gestação e ao parto e com
elevados índices de mortalidade materna e perinatal;
Índices inaceitáveis de acidentes e doenças do trabalho,
segundo organismos internacionais como a OIT
52
(Organização Internacional do Trabalho) (Ministério da
Saúde, 2004, p.3).
Estas precárias condições de Saúde da população, e a confluência de
fatores como o direcionamento internacional, a necessidade de expandir a
assistência médica de baixo custo para as populações excluídas e a pressão
de atores sociais (alguns parlamentares e profissionais de saúde) fez com que
houvesse alguns avanços na área da saúde o que pode ser identificado pela
realização em 1986 da VIII Conferência Nacional de Saúde na qual são
estabelecidas novas diretrizes para a saúde, entre elas:
1) Conceito ampliado de saúde;
2) Saúde como direito e dever do Estado;
3) Instituição do Sistema Único de Saúde.
O conceito ampliado de saúde, definido na VIII Conferência Nacional de
Saúde, 1986 é:
[...] a saúde é resultante, entre outras, das condições de
habitação, alimentação, educação, renda, meio ambiente,
trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e
posse da terra, acesso a serviços de saúde.
Em 1988 é promulgada a nova Constituição do Brasil, a Constituição
cidadã, que incorpora grande parte dos princípios almejados pelo Movimento
da Reforma Sanitária, e estabelecidos em eventos como o de Alma Ata e da
VIII Conferência Nacional de Saúde.
As diversas reivindicações e pressões fizeram com que a Constituição
de 1988 incorporasse varias questões relativas às políticas sociais. Porém na
década de 90 ocorrem novas mudanças na estrutura de Estado o que faz com
que muitas vezes estes direitos inclusos na Constituição não sejam postos em
prática (RIBEIRO, 2004).
O período atual caracteriza-se por uma elevada taxa de desemprego.
Esta se tornou dramática a partir da adoção das políticas neoliberais em 1990.
O governo Collor começou a pô-las em prática, mas foi o governo Fernando
Henrique Cardoso quem efetivamente as implementou no país. O desemprego
53
teve um salto impressionante, segundo Lesbaupin (2004). Conforme dados de
DIEESE/SEADE a taxa variou de 11,7% em 1991, na região metropolitana de
São Paulo, para 20% em 2004 na mesma região.
O desemprego no Brasil é fundamentalmente resultado do baixo
crescimento econômico, conseqüência das políticas neoliberais adotadas. O
que bloqueia o crescimento são os juros altos e o elevado superávit primário -
que impede a expansão das empresas e o investimento nos setores produtivos,
necessários para gerar desenvolvimento. Portanto o desemprego não está
sendo produzido principalmente pela modernização, mas sim pela política
econômica. Esta política tem por objetivo controlar a inflação e, para isto, seu
principal instrumento é o desemprego massivo. A “utilização de elevadas taxas
de juros como instrumento singular para coibir a ameaça de recrudescimento
da inflação acabou fazendo do desemprego a verdadeira âncora da
estabilização dos preços” (LESBAUPIN, 2004, p.7).
A quantidade de acidentes de trabalho também continua extremamente
alta no País repetindo índices de períodos anteriores. De 1999 à 2003 a
Previdência Social registrou 1.875.190 acidentes de trabalho, sendo 15.293
com óbito e 72.020 com incapacidade permanente o que significa uma média
de 3.059 óbitos/ano, entre os trabalhadores formais. O coeficiente médio de
mortalidade no período considerado foi de 14.84/100.000 trabalhadores. A
comparação deste coeficiente com o de outros países como a Finlândia, a
França, o Canadá e a Espanha, demonstra que o risco de morrer por acidente
de trabalho no Brasil chega a ser sete vezes superior (Ministério da Saúde,
2004).
Com relação ao Governo Lula, nos seus primeiros dois anos de
mandato, houve um medíocre crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), não
gerando impacto sobre o emprego e o valor dos salários diminuiu durante este
período (SAMPAIO, 2004). Outro ponto a ser destacado é a grande quantidade
de trabalhadores que atuam na informalidade, atingindo 50% e, destes, ¼
(23,8%, segundo IPEA) possuem renda inferior a 1 (um) salário mínimo.
(LESBAUPIN, 2004, p. 9).
A reforma agrária também não avançou significativamente durante este
54
governo, assim como a reforma urbana que envolveria, por exemplo, a
construção de casas populares.
A utilização do imposto para redistribuição de renda como foi feito em
países da Europa e da América do Norte também não ocorreu no Brasil. “O que
se viu foi uma fúria arrecadadora, completamente indiferente ao fato de que o
sistema tributário vigente onera desproporcionalmente as camadas mais
pobres da população” (SAMPAIO, 2003, p.2)
Os Programas Sociais teoricamente implantados pelo governo Lula não
passaram de ações assistencialistas. “[...] não se conseguiu sair da linha
tradicional do assistencialismo praticado pelas elites dominantes e destinado
meramente a atenuar situações gritantes e explosivas de pobreza” (SAMPAIO,
2003, p.3)
Baseando-se no que foi trazido até o momento percebe-se que as
desigualdades não foram atenuadas durante este governo popular. Segundo
Sampaio (2003), o desmonte neoliberal continua o que pode ser comprovado
com ações como a reforma da Previdência Social, remoção do entrave
constitucional à autonomia do Banco Central; Reforma do Poder Judiciário; Lei
de Falências. Toda esta legislação estruturante, patrocinada a ferro e fogo pelo
governo petista, enquadra-se rigorosamente na receita do consenso de
Washington de Estado Fraco e mercado livre.
O Brasil, para conseguir confiança no mercado financeiro capitalista fez
concessões injustificáveis para as multinacionais de energia e
telecomunicações; isenções indevidas aos especuladores; “vista grossa” às
transgressões das madeireiras estrangeiras; favoreceu as multinacionais dos
transgênicos; entre outras medidas que conduziram a política de ajuste
neoliberal (SAMPAIO, 2003, p.6)
Quanto à organização popular o movimento está mais fraco, mais
confuso, mais dividido do que a anos atrás. Para se ter uma idéia disto, basta
atentar para o fato de que todas as tendências internas do PT "racharam" e
que vários sindicatos importantes desligaram-se ou estão em processo de se
desligar da CUT. Os demais partidos de esquerda e movimentos populares do
campo e da cidade tamm não escaparam desse processo. O governo Lula
55
não reprime a esquerda ou o movimento popular, porém, provoca sua diluição
e fragmentação (SAMPAIO, 2003, p.2)
Podemos concluir que o Estado brasileiro, nos últimos anos, apesar de
ter a sua frente um partido de esquerda que teoricamente representa os
trabalhadores, tem aderido às exigências neoliberais e desta forma não
construído um Estado que se estruture no sentido de garantir os mínimos
sociais da população e nem oportunizado uma maior redistribuição de renda ou
aumento da taxa de empregos. Os sindicatos tamm estão mais frágeis e
dicotomizados do que em períodos anteriores.
Do resgate histórico realizado podemos perceber que houveram várias
modificações na organização da sociedade brasileira durante sua história,
porém esta, sempre sujeita as pressões internacionais, reflexo de se constituir
como um país periférico e portanto sofrendo ainda mais as influências dos
países centrais. Esta situação de submissão piora após o período
desenvolvimentista que elevou a dívida externa do país.
Algumas mudanças no sentido de obter conquistas com relação à
ampliação de direitos sociais somente ocorreram quando, econômica, social e
politicamente foram necessários ao país. Economicamente quando o país
precisava melhorar a infra-estrutura para poder escoar as mercadorias; atender
a normas sanitárias ou trabalhistas internacionais. Politicamente as mudanças
ocorreram quando determinados partidos desejavam ascender ou permanecer
no poder, utilizando-se freqüentemente de práticas populistas. E socialmente,
quando uma parcela significativa da população atinge um determinado status
na sociedade ou ainda quando o poder de mobilização da população ameaça a
estabilidade política ou econômica do país.
As organizações sindicais são vítimas de pressões políticas e
governamentais no sentido de coibir sua atuação como instrumento de
reivindicação da classe trabalhadora. Esta interferência sobre o poder sindical
torna-se ora mais explicita, ora menos, de acordo com a conjuntura histórica do
período. Neste momento, por exemplo, os sindicatos estão em sua grande
maioria desempenhando um papel assistencialista como resultado da política
neoliberal implantada no País e que fragiliza de tal forma a classe trabalhadora
56
que esta perde seu poder de luta por direitos. Portanto, neste contexto a
coerção sobre a organização sindical não precisa ser levada a extremos.
E finalmente a Política de Saúde que por ser uma Política Social sofre a
influência da forma como o Estado se encontra configurado e a postura que
este adota frente à garantia dos direitos sociais da população. Assim, na
década de 80, o panorama nacional possibilitou a inserção na Constituição de
1988 de vários avanços nesta área, já na década seguinte, com a adoção das
medidas neoliberais esta legislão por vezes é ignorada escancaradamente.
Este conjunto de fatores políticos, econômicos e sociais tem reflexos
sobre a saúde da população, bem como sobre a estruturação das políticas
públicas. Na seqüência será apresentada uma síntese da história da Saúde do
Trabalhador, que é uma das áreas da Política de Saúde. Basicamente os
mesmos fatores que oportunizaram a inclusão do SUS na Constituição de
1988, tamm foram os que fizeram com que a Saúde do Trabalhador fosse
incorporada a esta Política Pública.
3.2 Saúde do Trabalhador no Brasil
Apesar da correlação entre o adoecimento e a morte de trabalhadores já
ser apontada em literatura desde 1700, através da obra de Bernardino
Ramazzini, que analisou trabalhadores de várias categorias – os escribas que
são comparados aos atuais digitadores, os trabalhadores de poços e os
limpadores de latrinas, etc – identificando que conforme o trabalho que
realizavam desenvolviam determinadas doenças; mesmo transcorrido tanto
tempo e havendo a constatação da importância do trabalho para o
desenvolvimento de várias doenças nos trabalhadores, a implantação de uma
Política de Saúde do Trabalhador vai sendo construída com avanços e
retrocessos conforme o momento político, econômico e social do País.
Além do elevado índice de acidentes de trabalho a Saúde do
Trabalhador teve um importante avanço num momento em que houve a
confluência de vários fatores que agiram positivamente para o surgimento dos
primeiros Programas de Saúde do Trabalhador (PST). Lacaz (2005) destaca: o
57
fortalecimento do movimento sindical a partir da segunda metade da década de
70; o empenho de alguns profissionais, principalmente militantes de esquerda;
e as pressões internacionais que ocorriam em virtude do elevado índice de
acidentes de trabalho que ocorriam. A década de 80 também se constituiu
como ponto de referência para a consolidação da luta dos trabalhadores e da
sociedade brasileira pela democracia, que culminou com a promulgação da
Constituição de 1988, a chamada “Constituição Cidadã”.
O que é conhecido hoje como Saúde do Trabalhador é, portanto a
resposta institucional a diversos movimentos sociais que entre os anos 70 e 90
confluíram para a reivindicação de que a Saúde do Trabalhador fizesse parte
do direito universal à saúde.
A construção da Saúde do Trabalhador no Brasil será apresentada a
partir de Maeno e Carmo (2005).
Os vários fatores apontados anteriormente por Lacaz fizeram com que
surgissem, ainda antes da promulgação da Constituição de 1988 e da I
Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, as primeiras unidades de
Programa de Saúde do Trabalhador que tiveram inicio no ano de 1984 em São
Paulo e, posteriormente, no Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e
Bahia.
Estes Programas de Saúde do Trabalhador tinham por objetivo
desenvolver ações realmente direcionadas para a Saúde do Trabalhador e num
enfoque que priorizasse os trabalhadores.
Anteriormente já vimos as práticas em saúde relacionadas à área de
Saúde do Trabalhador. Estas inicialmente tinham um caráter biologicista e
mecanicista, repetindo o padrão predominante de compreensão de
saúde/doença da época, e que tinha por objetivo atuar sobre o trabalhador,
sem intervir no processo de trabalho. Este modelo é baseado na Medicina do
Trabalho. Na seqüência surge o modelo da Saúde Ocupacional, que tem uma
visão de saúde um pouco mais ampliada ao integrar novos conhecimentos e
disciplinas na prática em Saúde do Trabalhador. A Saúde Ocupacional a nível
internacional surge ainda na década de 50, inclusive nos Estados Unidos.
Posteriormente a OIT, inclui o caráter preventivo a esta política, lançando a
58
discussão sobre a regulão dos Serviços Médicos nas empresas, através da
“Recomendação para Serviços de Saúde Ocupacional” mais conhecida como
recomendação nº 112. Esta resolução da OIT estabeleceu
[...] que os serviços deveriam proteger os trabalhadores contra
qualquer risco a sua saúde que pudesse decorrer do seu
trabalho ou das condições em que este é realizado; contribuir
para o ajustamento físico e mental do trabalhador, obtido
especialmente pela adaptação do trabalho aos trabalhadores,
e pela colocação destes em atividades profissionais para as
quais tivesse aptidões; e contribuir para o estabelecimento e a
manutenção do mais alto grau posvel de bem-estar físico e
mental dos trabalhadores. Destacava que o papel dos médicos
nas empresas era estruturar um serviço essencialmente
preventivo (MAENO; CARMO, 2005, p. 56).
No Brasil, o que prevalecia nesta época e perdurou por muitos anos
além, foi uma prática médica essencialmente curativa, apesar das resoluções
da OIT.
Outro marco importante para a Saúde do Trabalhador no Brasil é a
criação da Fundacentro, em 1966, vinculada ao Ministério do Trabalho. Esta
fundação teve origem numa proposta de criação de um Centro de Estudos e
Pesquisas no Brasil, ligado a Universidade.
A Fundacentro teve papel fundamental na disseminação de
conhecimentos em Saúde do Trabalhador. Foi através dela que foi ministrado
em quase todos os estados brasileiros um curso básico de Saúde e Segurança
no Trabalho, pré-requisito para a obtenção da qualificação dos médicos do
trabalho e de engenheiros de segurança do trabalho.
Ainda assim os avanços em Saúde do Trabalhador são lentos, como por
exemplo, no período final da ditadura, de 1976 a 1982, quando apesar das
lutas de profissionais de saúde, principalmente alguns ligados ao PCB como
David Capistrano da Costa Filho
1
era difícil implementar uma política de Saúde
do Trabalhador. O objetivo destes profissionais de saúde era:
[...] reorganizar departamentos médicos formatados para um
atendimento próximo a um plano de sde privado, sem
nenhuma valorização da atividade de trabalho do paciente, e
transformá-los em instrumentos de coleta de informações
pertinentes à saúde do operário. Portanto, em uma ferramenta
1
David Capistrano Filho (*1948 a +2000) Médico Sanitarista, Ex -Secretário de Higiene e Saúde
de Bauru/SP (1984-1986). Foi ainda prefeito da cidade paulista de Santos e autor de várias
obras na área de Saúde Pública.
59
de luta pela Saúde do Trabalhador. Assim como os planos da
saúde privados dos ambulatórios dos sindicatos tinham uma
perspectiva estritamente assistencial, sem atividades de
prevenção de agravos relacionados ao trabalho. (MAENO;
CARMO, 2005, p. 61).
Em 1982 ocorreu um avanço na área de Saúde do Trabalhador. Neste
ano muitos médicos ligados politicamente à esquerda, entraram por concurso
no Ministério do Trabalho e passaram a atuar em sintonia com colegas da
Saúde Pública, possibilitando a construção de uma nova prática em defesa da
saúde e segurança dos trabalhadores.
Os autores citam ainda a influência do movimento sindical italiano, que
inspirava vários dos militantes de esquerda da época e, dentre estes, os
profissionais que foram construindo os primórdios da Saúde do Trabalhador no
Brasil. Esta influência veio a gerar frutos concretos a partir de um convênio,
iniciado por David Capistrano Filho, através do qual dezesseis médicos
brasileiros que receberam bolsas de institutos italianos dedicados
exclusivamente a Saúde do Trabalhador.
Como um dos resultados deste intercâmbio, que gradualmente
disseminou-se no Brasil, surgiu o chamado “Mapa de Risco”, uma metodologia
de análise e estimativa dos riscos físicos, químicos, biológicos e de
organização do trabalho aos quais os trabalhadores estão expostos. Era o
primeiro mapa deste tipo feito sem médico, um meio para que os próprios
trabalhadores atuassem como instrumentos e sujeitos de informação e
avaliação. A introdução da obrigatoriedade do mapeamento dos riscos
ocupacionais na nossa legislação trabalhista foi resultado dessa influência, mas
sua forma de aplicação está distante do conceito original, que privilegiava a
participação ativa dos trabalhadores no processo.
Apesar de muitas modificações, foi à influência italiana que contribuiu
para a criação dos serviços de atenção à Saúde do Trabalhador dentro da
estrutura da rede básica de saúde.
O modelo italiano, a grosso modo, preconizava a participação
dos trabalhadores na geração do conhecimento e no controle
dos riscos aos quais estavam expostos no trabalho, ao mesmo
tempo que contemplava a atenção a saúde dos trabalhadores,
com suas especificidades, dentro da estrutura pública, sempre
com a integração entre trabalhadores e quadros técnicos.
(MAENO; CARMO, 2005, p. 64).
60
A proposta de integração da Saúde do Trabalhador na rede básica de
saúde já havia sido apontada, no Brasil, em 1983 porlio Pereira e Koshiro
Otani, após relatório que fizeram e apresentaram no II Congresso Paulista de
Saúde Pública. Neste relatório foram registrados dados obtidos de
trabalhadores que atuavam em duas empresas do ramo metalúrgico do interior
de São Paulo.
A proposta dos dois não foi implantada, porém, no ano seguinte
novamente, David Capistrano Filho, cria a possibilidade para que se organize o
primeiro serviço de Saúde do Trabalhador, que um pouco mais tarde se
transformaria no Programa de Saúde do Trabalhador da Zona Norte de São
Paulo (PST/ZN) Na seqüência foram criados outros Programas de Saúde do
Trabalhador, como por exemplo, o de Bauru e o Centro de Saúde do
Trabalhador (Cesat) da Baixada Santista. Este último teve desde o início, o
entendimento de que as ações de saúde deveriam incluir, além da assistência,
a vigilância, incluindo a vigilância epidemiológica para doenças ocupacionais e
a vigilância sanitária para os fatores de risco nos ambientes de trabalho. Outra
característica do Cesat era sua atuação interinstitucional com diversos
sindicatos, Fundacentro e Secretaria de Relações de Trabalho.
Se, nos anos 80 a participação do movimento sindical foi um dos
aspectos centrais para o desenvolvimento da Saúde do Trabalhador, a partir
dos anos 90, com o avanço da reestruturação produtiva na globalização
neoliberal, os órgãos de representação dos trabalhadores perderam grande
parte de sua representatividade.
O mundo do trabalho, antes dominado pela indústria
taylorista/fordista, espaço que legitimou a atuação dos
sindicatos nos anos 70 e 80, hoje é caracterizado pelo setor
terciário que absorve a maior parcela da força de trabalho,
cujos vínculos de emprego diluíram-se na precarização e no
desemprego. E, neste contexto, a ação sindical perdeu
eficácia e capacidade de representação, tendo pouca
interlocução hoje ao vel das políticas públicas. (LACAZ, 2004
apud LACAZ, 2005, p. 147).
Por outro lado o desafio que se coloca para a Saúde do Trabalhador
continua a ser “a necessidade de unificação de órgãos com vistas a uma
efetiva política de caráter intersetorial, universal, que incorpore a integralidade
da atenção, com participação social”. (LACAZ; MACHADO; PORTO, 2002 apud
LACAZ 2005, p. 147).
61
Estas importantes questões nos possibilitam perceber que a Saúde do
Trabalhador encontra-se atualmente fragilizada, sendo um dos fatores a
redução do poder dos sindicatos. A complexidade da área envolve a ação intra
e intersetorial, conforme apontada pelo autor, ou seja, a aplicação dos
princípios do SUS. Na seqüência serão apresentadas algumas das diretrizes
do SUS, inclusive aquelas que dizem respeito à Saúde do Trabalhador.
3.3 Diretrizes do SUS e da Saúde do Trabalhador
Em 1990 o Sistema Único de Saúde é regulamentado através da Lei
Orgânica da Saúde n 8.080, os objetivos são amplos e visam desenvolver
ações que venham a atender o conceito ampliado de saúde, estabelecido na
VIII Conferência Nacional de Saúde. Especificamente com relação à Saúde do
Trabalhador, os objetivos da Lei 8080/90 são:
A execução de ações de vigilância sanitária, epidemiológica,
de saúde dos trabalhadores de assistência terapêutica integral,
inclusive farmautica.
O SUS é organizado através de princípios doutrinários e organizativos,
que conforme o Ministério da Saúde (1997), tendo por objetivo estabelecer os
parâmetros de conduta e desempenho de cada esfera de governo, do controle
social e da articulação com o setor privado.
Os princípios doutrinários são:
Universalidade: todas as pessoas têm direito ao
atendimento independente de cor, raça, religião, local de
moradia, situação de emprego ou renda, etc. A saúde é
direito de cidadania e dever do governo municipal,
estadual e federal.
Equidade: Todo cidadão é igual perante o Sistema Único
de Saúde e será atendido conforme suas necessidades.
[...] O SUS não pode oferecer o mesmo atendimento à
todas as pessoas [...] o SUS deve tratar desigualmente os
desiguais.
Integralidade: as ações de saúde devem ser combinadas
e voltadas ao mesmo tempo para prevenção e a cura. Os
serviços de saúde devem funcionar atendendo o indivíduo
como um ser humano integral. [...] Desta forma o
atendimento deve ser feito para a sua saúde e não
62
somente para as suas doenças. Isto exige que o
atendimento deva ser feito também para erradicar as
causas e diminuir os riscos, além de tratar os danos. Ou
seja, é preciso garantir o acesso às ações de: Promoção,
Prevenção e Recuperação (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
1997 p. 28)
Os princípios Organizativos são:
Regionalização e hierarquização – a rede de serviços do
SUS deve ser organizada de forma regionalizada e
hierarquizada, permitindo um conhecimento maior dos
problemas de saúde da populão de uma área delimitada,
favorecendo ações de vigilância epidemiológica, sanitária,
controle de vetores, educão em saúde, além dasões
de atenção ambulatorial e hospitalar em todos os níveis de
complexidade. O acesso da população à rede deve se dar
através dos servos de nível primário de atenção, que
devem estar qualificados para atender e resolver os
principais problemas. Os que não forem resolvidos a este
vel deverão ser referenciados para os serviços de maior
complexidade tecnológica.
Resolutividade: é a exigência de que quando um
indiduo buscar o atendimento ou quando surgir um
problema de impacto coletivo sobre a saúde o serviço
correspondente esteja capacitado para enfrentá-lo e
resolve-lo até o nível de sua complexidade.
Descentralização: é entendida como a redistribuição das
responsabilidades às ações e serviços de saúde entre os
vários níveis de governo, a partir da idéia de que quanto
mais perto do fato a decisão for tomada mais chance
haverá de acerto. [...] Este processo recebe o nome de
Municipalização.
Participação dos Cidadãos: é a garantia constitucional
de que a população através de suas entidades
representativas poderá participar do processo de
formulação das políticas de saúde e do controle de sua
execução em todos os níveis de governo.
Complementariedade do Setor Privado: quando por
insuficiência do setor público for necessária a contratação
de serviços privados (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1997, p.
29)
A forma como os municípios devem se organizar e gerenciar a saúde
estão estabelecidos pela NOB 01/96 e são:
Gestão Plena de Atenção Básica – neste tipo de gestão a responsabilidade
do município está direcionada a atenção básica, abrangendo serviços de
Clínica Médica, Pediátrica, Ginecológica e Cirurgia Geral; serviços de Vigilância
Sanitária e ações de Epidemiologia e controle de doenças. Os recursos são
63
repassados baseados na relação habitante/ano. A Saúde do Trabalhador é um
dos programas básicos a ser mantido por este tipo de gestão.
Gestão Plena do Sistema Municipal – o município habilitado para este tipo de
Gestão tem responsabilidades sobre ações de saúde mais complexas. O
Município planeja, controla e avalia todas as unidades ambulatoriais básicas,
especializadas e hospitalares, públicas e privadas, vinculadas ao SUS em seu
território. Os recursos financeiros devem ser correspondentes ao teto
ambulatorial e hospitalar estabelecido.
De acordo com o citado até o momento percebemos como a
regulamentação do SUS é bastante abrangente na legislação, garantindo
acesso a todos à saúde, em todos os níveis de complexidade, inclusive com a
participação da comunidade no controle das ações nesta área. O cumprimento
do Estado com relação a esta regulamentação é o que analisaremos na etapa
final desta pesquisa. Na seqüência serão citadas as principais diretrizes que
definem a atuação na área de Saúde do Trabalhador.
Conforme os Cadernos de Atenção Básica de Saúde do Trabalhador, do
Ministério da Saúde (2002), uma das grandes mudanças de paradigma
estabelecidas pela Constituição está em considerar o trabalho como um fator
determinante e condicionante do processo saúde/doença. Ou seja, as
circunstâncias nas quais o trabalho ocorre, os fatores de risco aos quais os
trabalhadores estão expostos, a organização do processo produtivo, ou ainda a
ausência do trabalho que expõem o cidadão a uma dependência do Estado,
passam a ser fatores que influenciam diretamente no processo saúde/doença.
Antes de citarmos as principais regulamentações quanto a Saúde do
Trabalhador traremos a definição, adotada pelo Ministério da Saúde, dos
termos Acidente de Trabalho e Doenças Relacionadas ao Trabalho, conceitos
fundamentais para a compreensão do que este órgão governamental considera
em cada um dos respectivos casos.
Acidente de Trabalho é definido como: “todos os acidentes que ocorrem
no exercício da atividade laboral ou no percurso de casa para o trabalho e vice-
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versa, podendo o trabalhador estar inserido tanto no mercado formal como
informal de trabalho”.(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).
As principais causas do adoecimento dos trabalhadores são:
[...] o arranjo físico inadequado do espaço de trabalho, falta de
proteção emquinas perigosas, ferramentas defeituosas,
possibilidade de incêndio e explosão, esforço físico intenso,
levantamento manual de peso, posturas e posições
inadequadas, preso da chefia por produtividade, ritmo
acelerado na realização das tarefas, repetitividade de
movimento, extensa jornada de trabalho com freqüente
realização de hora-extra, pausas inexistentes, trabalho noturno
ou em turnos, presença de animais peçonhentos e presença
de substâncias tóxicas nos ambientes de trabalho estão entre
os fatores mais freqüentemente envolvidos na nese dos
acidentes de trabalho. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002, p. 8).
As Doenças Relacionadas ao Trabalho são definidas como:
[...] um conjunto de danos ou agravos que incidem sobre a
saúde dos trabalhadores, causados, desencadeados ou
agravados por fatores de risco presentes nos locais de
trabalho. Manifestam-se de forma lenta, insidiosa, podendo
levar anos, as vezes até mais de 20, para manifestarem o que
na prática, tem demonstrado ser um fator dificultador no
estabelecimento da relação entre uma doença sob
investigação e o trabalho. Também são consideradas as
doenças provenientes de contaminação acidental no exercício
do trabalho e as doenças endêmicas quando contraídas por
exposição ou contato direto, determinado pela natureza do
trabalho realizado (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002, p.8).
Os riscos presentes nos locais de trabalho, segundo o Ministério da
Saúde podem ser classificados em:
Físicos: ruído, vibração, calor, frio, luminosidade, ventilação, umidade,
pressões anormais, radiação, etc.
Químicos: substâncias químicas e tóxicas presentes nos ambientes de
trabalho nas formas de gases, fumo, névoa, neblina e/ou poeira.
Biológicos: bactérias, fungos, parasitas, vírus, etc.
Organização do trabalho: divisão do trabalho, pressão da chefia por
produtividade ou disciplina, ritmo acelerado, repetividade de movimento,
jornadas de trabalho extensas, trabalho noturno ou em turnos, organização do
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espaço físico, esforço físico intenso, levantamento manual de peso, posturas e
posições inadequadas, entre outros.
O Ministério da Saúde (2002) cita ainda algumas doenças como
prioridade para notificação e investigação epidemiológica, sendo que cada
município ou estado pode acrescentar outras conforme houver necessidade.
São elas: Doenças das vias aéreas, pneumoconioses (causadas, por exemplo,
pela poeira de sílica e do absento), asma ocupacional, Perada Auditiva
Induzida por Ruído (PAIR), Lesão por Esforço Repetitivo/Distúrbio
Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (LER/DORT), Intoxicações Exógenas,
Solventes Orgânicos, Dermatoses Ocupacionais, Distúrbios Mentais e
Trabalho.
Agora que já apresentamos a conceituação de Acidente de Trabalho e
Doenças Relacionadas ao Trabalho adotadas pelo Ministério da Saúde
citaremos as principais diretrizes estabelecidas na Lei Orgânica da Saúde
(LOS) e Norma Operacional Básica de Saúde do Trabalhador (NOST – SUS),
norteadoras desta política pública.
A Saúde do Trabalhador já se faz presente desde a implementação da
Lei Orgânica da Saúde (LOS) 8080/90, que regulamenta o SUS devendo ser
organizada de acordo com os princípios básicos estabelecidos nesta Lei.
Na LOS a Saúde do Trabalhador está definida como:
[...] um conjunto de atividades que se destina, através de
ações de vigilância epidemiológica e sanitária, à promoção e
proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa à
recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores
submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de
trabalho (LOS 8080/90).
As ações específicas de Saúde do Trabalhador constantes na LOS
referem-se ao:
[...] atendimento astimas de acidente de trabalho ou
portadores de doença profissional ou do trabalho: a realização
de estudos, pesquisa, avaliação e controle dos riscos e
agravos existentes no processo de trabalho, a informão ao
trabalhador, sindicatos e empresas sobre os riscos de
acidentes bem como resultados de fiscalizações, avaliações
ambientais, exames admissionais, periódicos e demissionais,
respeitada a ética. (LOS 8080/90).
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Ainda quanto à legislão, as ações de Saúde do Trabalhador tamm
estão instituídas através da Norma Operacional Básica de Saúde do
Trabalhador (NOST – SUS) na Portaria n 3908/GM de 30.09.1998. Nela
destacam-se as seguintes atividades:
a)Informações ao trabalhador, à sua respectiva entidade
sindical e às empresas, sobre os riscos de acidentes de
trabalho, doença profissional e do trabalho, bem como os
resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames
de saúde, de admissão, periódicos e de demissão, respeitados
os preceitos da ética profissional;
b)Participação na normalização, fiscalização e controle dos
serviços de saúde do trabalhador nas instituições e empresas
públicas e privadas;
c)Revisão periódica da listagem oficial de doenças originadas
dos processos de trabalho, tendo na sua elaboração, a
participação das entidades sindicais;
d)Garantia ao sindicato dos trabalhadores, de requerer aos
órgãos competentes, a interdição de máquinas, de setores de
serviços ou de todo o ambiente de trabalho, quando houver
exposição a risco iminente para a vida ou saúde do
trabalhador (NOST/SUS Portaria n 3908/GM de 30.09.1998).
Baseando-se nestes princípios norteadores do SUS para com a Saúde
do Trabalhador podemos sintetizar as duas áreas de atuação que os
municípios devem enfocar: a Assistência e a Vigilância em Saúde.
As ações de atenção à saúde do trabalhador devem ser
organizadas para que seja prestada assistência
multiprofissional às vítimas de doenças ocupacionais, de
doenças relacionadas ao trabalho e de acidentes de trabalho,
incluindo ações de diagnóstico, identificação de nexo causal,
tratamento, recuperação e reabilitação, bem como a vigilância
de ambientes de trabalho e prevenção de riscos. As ações de
vigilância têm como objetivo identificar situações de riscos de
acidentes e agravos à saúde e promover melhorias nas
condições de segurança e saúde no trabalho, através de
visitas às empresas e notificação sobre mudanças a serem
realizadas. A assistência ao trabalhadortima de acidente ou
doença do trabalho pode ser feita na rede básica ou em
serviços especializados (SILVA; BARRETO JR.; SANT’ANA,
2003, p. 52).
As ações em Saúde do Trabalhador da rede básica de saúde estão
citadas pelos Cadernos de Atenção Básica do Ministério da Saúde (2002).
Estão relacionadas ações de atribuições de toda a equipe, independentemente
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da forma como se organiza a atenção básica, que pode ser em Programas de
Saúde da Família ou em Centros/Postos de Saúde.
Estas atribuições gerais referem-se ao registro da população
economicamente ativa; das atividades produtivas existentes na área; dos
trabalhadores independentemente de trabalho formal ou informal; do trabalho
de menores, da ocorrência de acidentes e/ou doenças relacionadas ao
trabalho.
Além do registro são ainda atribuições destas unidades: organizar e
analisar os dados de visitas domiciliares; desenvolver ações educativas em
Saúde do Trabalhador; incluir o item ocupação e ramo de atividade nas fichas
de atendimento; planejar ações de vigilância nos locais de trabalho;
desenvolver ações intersetoriais para solucionar os problemas encontrados;
(considerar como evento sentinela o trabalho de menores de 16 anos). Para os
casos de Acidente de Trabalho ou Doença Ocupacional cabe a estas unidades:
1) condução clínica dos casos; 2) encaminhamentos para outros níveis de
complexidade; 3) notificação dos casos nos instrumentos do Ministério da
Saúde; 4) solicitar emissão de CAT e o médico preencher o campo respectivo a
ele da mesma; 5) investigação do local de trabalho; 6) orientações trabalhistas
e previdenciárias; 7) informar e discutir com o trabalhador as causas do seu
adoecimento.
Conforme foi citado anteriormente a Política de Saúde do Trabalhador
deve seguir os mesmos princípios do SUS. E os pressupostos básicos da
NOST/SUS, que identificam esta atuação, podem ser sintetizados em:
universalidade das ações, independentemente de vínculos empregatícios
formais no mercado de trabalho; integralidade das ações, compreendendo
assistência, recuperação de agravos e prevenção por meio de intervenções
nos processos de trabalho; direito à informação e controle social, com a
incorporação dos trabalhadores e seus representantes, em todas as etapas da
vigilância à saúde; e regionalização e hierarquização, através da execução das
ações de saúde do trabalhador em todos os níveis da rede de serviços,
organizado num sistema de referência e contra-referência, local e regional.
Atender aos princípios do SUS traz a tona uma complexidade de ações
e atores que são necessários para que seja efetuada uma política de saúde
inclusiva e resolutiva. As responsabilidades pela atenção à saúde do
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trabalhador devem ser compartilhadas de forma diferenciada por
empregadores, trabalhadores (através de suas representações) e Estado (no
seu papel de mediador e condensador das forças sociais).
A área de Saúde do Trabalhador necessita que as ações sejam de
caráter intra e intersetorial. Nesta atuação transversal, devem estar inclusas as
práticas em parceria com a Previdência Social, o Ministério de Trabalho, o
Ministério Público. Estas articulações são extremamente complexas, sabendo-
se dos entraves burocráticos e das disputas de poder existentes quando a
articulação envolve tantos atores com interesses muitas vezes antagônicos. Na
esfera do Estado, atuam nessa questão os Ministérios do Trabalho, da
Previdência Social, da Saúde e do Meio Ambiente, a Justiça do Trabalho e a
Promotoria Pública. Dias apud Silva; Barreto Jr.; E Sant’Ana (2003) elaborou
um apanhado das atribuições destes diferentes órgãos e ainda do GEISAT,
descritos resumidamente a seguir:
GEISAT - Grupo Executivo Interinstitucional de Saúde do Trabalhador
constituído por representantes dos Ministérios envolvidos com a Saúde
do Trabalhador e que tem como função articular e racionalizar a atuação
dos diferentes setores governamentais, evitar a duplicação de ações e
desperdício de recursos, compatibilizar e integrar as políticas e práticas
de intervenção desenvolvidas pelo Estado.
Ministério do Trabalho e Emprego – cabe a inspeção do trabalho em
nível nacional, fundamentado nos dispositivos da Consolidação das Leis
de Trabalho (CLT), nas Convenções Internacionais ratificadas pelo
Brasil e nas cláusulas dos Contratos Coletivos de Trabalho. Conta com o
apoio técnico da Fundacentro que, entre outras atividades, realiza
estudos e pesquisas e desenvolve programas educacionais sobre
diferentes assuntos que envolvem o trabalhador e respectivas condições
de trabalho.
Previdência Social - cabe, por meio do Instituto Nacional do Seguro
Social – INSS, a responsabilidade pelo pagamento dos benefícios,
enquanto perdure a incapacidade decorrente de acidente do trabalho.
Entre outras atribuições do INSS estão os procedimentos de reabilitação
profissional, de preparo e capacitação para acidentados ou
69
incapacitados para a reinserção no mercado e a coleta, a consolidação e
a divulgação de dados sobre ocorrência de acidentes de trabalho.
Justiça do Trabalho integra o Poder Judiciário e congrega as Juntas de
Conciliação e Julgamento, o Tribunal Regional do Trabalho e o Tribunal
Superior do Trabalho.
Ministério Público - presta assistência jurídica às vitimas de acidentes e
doenças do trabalho e/ou aos seus dependentes, fiscaliza e acompanha
denúncias de descumprimento das Normas de Segurança e Medicina do
Trabalho, impetra ações de reparação de dano, interpreta e elabora
pareceres técnicos que respaldem a atenção à Saúde dos
Trabalhadores.
Sistema Único de Saúdemantém programas ou Centros de
Referência à Saúde do Trabalhador, nos serviços próprios ou
conveniados da rede SUS.
Acabamos de ver as atribuições de cada órgão governamental e
inclusive do órgão específico que tem como finalidade integrá-los com objetivo
de evitar a duplicidade de ações e o desperdício de recursos. Na seqüência
iremos abordar a estratégia adotada pelo Ministério da Saúde para ampliar as
ações em Saúde do Trabalhador nos Estados e municípios, a RENAST (Rede
Nacional de Atenção Integral em Saúde do Trabalhador). Esta abordagem será
baseada em Hoefel, Dias e Silva (2005).
A estratégia para a implementação das ações em Saúde do Trabalhador
foi baseada num modelo de Centros de Referência, que se expandiram pelo
país na década de 90, a maioria destes Centros era vinculado às Secretarias
Municipais de Saúde e em alguns casos a hospitais universitários. Este modelo
de organização das ações em Saúde do Trabalhador contribuiu para o avanço
na área, porém manteve a mesma a margem das políticas de saúde do SUS,
na medida em que estes centros têm “ficado de fora” do sistema como um
todo. Esta problemática levou o Ministério da Saúde a desenvolver novas
estratégias para a inclusão real da Saúde do Trabalhador no SUS. Assim, em
2002 surgiu a proposta de criação da RENAST.
A RENAST pode ser caracterizada como uma rede de atenção
integral à saúde do trabalhador no SUS, estruturada a partir
70
dos centros de referência, das unidades e dos munipios
sentinela, organizada em torno de um dado território. [...] Os
Municípios Sentinela e Núcleos Sentinela tem a tarefa de
desenvolver metodologias e organizar o fluxo de atendimento
aos adoecidos e acidentados do trabalho em todos os níveis
de atenção do SUS: rede básica, média e alta complexidade
de modo articulado com as Vigilâncias Sanitária,
Epidemiológica e Ambiental (HOEFEL; DIAS; SILVA 2005,
p.74).
Para incentivar os gestores municipais a implantarem as ações em
Saúde do Trabalhador foi definido o repasse, na fase inicial da RENAST, de
recursos extrateto, transferidos pelo Fundo Nacional de Saúde aos Fundos
estaduais e municipais de saúde
.
Com a implantação da RENAST o papel dos Centros de Referência
passou a ser de se constituírem como pólos irradiadores da cultura da
produção social das doenças e da centralidade do trabalho nesse processo;
prover suporte técnico adequado às ações de Saúde do Trabalhador; recolher,
sistematizar e difundir informações de interesse para a Saúde do Trabalhador;
viabilizar as ações de vigilância, facilitar os processos de capacitação e
educação permanente para os profissionais e técnicos da rede do SUS e os
participantes do controle social, além de servir de instância facilitadora das
pactuações intra e intersetoriais
.
As ações da RENAST tamm devem fortalecer a intra-setorialidade,
que busca articular as ações de Saúde do Trabalhador dentro do próprio SUS,
seja na rede própria – em todos os níveis de complexidade, ou na conveniada.
E a inter-setorialidade que tem por objetivo promover a integração das ações
em outras instituições de governo (Ministério do Trabalho; Ministério da
Previdência Social; Ministério de Meio Ambiente e Poder Judiciário) e a
organização da sociedade civil. Viabilizar as ações intra e inter-setoriais serão
fundamentais para garantir a atenção integral à saúde dos trabalhadores por
meio da garantia de acesso; cobertura universal; qualidade e estabelecimento
de fluxos de referência e contra-referência em todos os níveis de atenção do
SUS.
As ações em Saúde do Trabalhador devem basear-se na Humanização
da atenção por meio de mudanças nas estratégias de gestão, que permitam a
71
democratização e incorporem os trabalhadores de Saúde no processo de
discussão dos processos de trabalho no SUS e a construção de alternativas,
entre elas a co-gestão e a gestão participativa. O Acolhimento dos
trabalhadores deve ser outra das estratégias utilizadas incorporando o saber do
trabalhador, a co-responsabilização e o envolvimento destes nas ações de
mobilizão e intervenção para transformações. O Fortalecimento do Controle
Social é outra das responsabilidades propostas pela RENAST, além da
incorporação das questões de Saúde do Trabalhador nos Sistema de
Informação.
Alguns dos principais avanços ocorridos após a implantação da
RENAST, verificadas pelos técnicos da COSAT, são: a maior visibilidade da
área de Saúde do Trabalhador; o repasse dos recursos extra-teto e o avanço
do quadro jurídico institucional da área.
Estes mesmos técnicos apontam as principais dificuldades, que são: os
gestores de saúde têm dificuldade para reconhecer o trabalho como um dos
determinantes do processo saúde/doença dos indivíduos e das coletividades;
insuficiência e inadequação técnica e política para a definição dos processos
de informação e vigilância; desconhecimento, por parte dos diferentes
profissionais da saúde sobre os riscos e agravos à saúde relacionados com o
trabalho e despreparo para lidar com estas questões; fragilidade do controle
social; a Saúde do Trabalhador ainda não foi efetivamente incorporada na
Agenda de Saúde do SUS; a confusão de papéis entre as coordenações
estaduais e dos Centros de Referência; certo conflito de território, uma vez que
as áreas de abrangência e atuação dos Centros de Referência em Saúde do
Trabalhador, nem sempre coincidem com as Regionais de Saúde; a forma de
repasse dos recursos tem possibilitado o desvio para outras áreas;
privilegiamento da assistência em detrimento das ações de vigilância,
prejudicando a integralidade das ações e as ações inter-setoriais ainda são
tímidas e localizadas.
Foram citadas as principais normas e diretrizes do SUS enfocando a
Saúde do Trabalhador. As ações e responsabilidades na área de Saúde do
Trabalhador são de caráter amplo envolvendo as ações propriamente ditas que
devem ser desenvolvidas pelos municípios ou estados. Estas ações abrangem
72
a assistência, da prevenção a recuperação; e, a vigilância que trás implícita o
contato direto com as empresas no sentido de identificar e intervir, se
necessário, nos fatores causadores de risco para a Saúde do Trabalhador. A
atuação integrada com os sindicatos é outra característica que diferencia a
Saúde do Trabalhador, mais do que em qualquer outra área da saúde. Na
Saúde do Trabalhador ela se torna primordial, no sentido de muitas vezes
somar forças para intervir na complicada relação capital/trabalho que permeia
esta área. A intra e a intersetorialidade também são extremamente necessárias
para que se alcance maior resolutividade.
Outro ponto a destacar é a iniciativa do Ministério da Saúde de lançar
uma proposta de expansão das ações em Saúde do Trabalhador nos Estados
e Municípios, através da RENAST. Esta proposta tem dificuldades, assim como
os próprios técnicos do Ministério da Saúde apontam, porém não deixam de
ser uma tentativa de tornar a área mais presente na saúde e desta forma
reduzindo o alarmante índice de acidentes de trabalho presentes
historicamente no País.
Em seguida será apresentado um conjunto de informações sobre o
município de Blumenau e a implantação da Saúde do Trabalhador neste.
3. 4 Saúde do Trabalhador em Blumenau
Antes de citarmos o surgimento e a evolução da Saúde do Trabalhador
em Blumenau destacaremos alguns pontos que nos possibilitarão conhecer um
pouco da realidade municipal, seu histórico e brevemente a Saúde Pública
neste município.
O povoamento do Vale do Itajaí tomou impulso, a partir de 1850, com a
Colônia de Blumenau, fundada por Hermann Bruno Otto Blumenau, na
confluência do Rio Itajaí-Açu com o Ribeirão Garcia, a cerca de 65 quilômetros
do litoral. Hermann Blumenau interessou-se pela colonização e veio ao Brasil,
após a negociação com o Governo Provincial de Santa Catarina de quem
obteve uma área de 2 léguas. Chegou acompanhado de 17 colonos, com quem
iniciou a colonização de Blumenau no dia 2 de Setembro de 1850, considerada
a data de fundação da cidade (SINGER, 1977).
73
A principio a colônia manteve-se como propriedade particular do
fundador. Somente em 1880, com o apoio do Governo Imperial, Blumenau foi
elevada a categoria de município. Nesta época contava com uma área de 20
mil km2 e uma população de 15 mil habitantes. (BLUMENAU, 2001).
Na sua fase inicial, a econômica da colônia era baseada na produção
para o auto consumo e possuía uma divisão de trabalho muito incipiente já que
cada família satisfazia, com sua própria produção, quase todas suas
necessidades, mas na medida em que a população crescia, surgiam tamm
às possibilidades de se estabelecer uma maior divisão social do trabalho com
uma economia artesanal, pouco a pouco se diferenciando da atividade agrícola
(SINGER, 1977).
O espaço territorial de Blumenau foi gradativamente sendo reduzido,
passando de uma área de 10.610 Km² em 1934 para apenas 510,3 Km² dos
dias atuais. Desses desmembramentos resultaram nada menos que 37 novos
municípios. Da área atual 192 Km² (37,6%) situam-se em área urbana e 318,3
Km² (62,4%) em área rural. (BLUMENAU, 2001).
Pela sua localização, população e equipamentos, Blumenau é a principal
cidade da região, exercendo sua influência pelos vales do Itajaí-Açú, Itajaí-
Mirim e Benedito. O município é membro da Associação dos Municípios do
Médio Vale do Itajaí – AMMVI – que é formada por 14 municípios. Os
municípios participantes da AMMVI são: Apiúna, Ascurra, Benedito Novo,
Blumenau, Botuverá, Brusque, Dr. Pedrinho, Gaspar, Guabiruba, Indaial,
Pomerode, Rio dos Cedros, Rodeio e Timbó. (BLUMENAU, 2001).
Blumenau inicialmente não foi planejada para ser uma cidade, mas sim,
uma colônia agrícola. Atualmente apresenta problemas urbanos complexos aos
quais se somam as enchentes, as enxurradas e as ocupações de áreas de
risco. Mas,
[...] a questão mais grave que se coloca neste final de século,
é a formação de uma cidade desigual, fruto de um modelo
econômico excludente e concentrador de renda, terra e poder.
Uma Blumenau dividida, de cidadãos e não-cidadãos,
habitando, respectivamente, territórios legais e ilegais.
(SIEBERT, 2000, p.279)
Siebert (2000) apontou ainda a existência de 5.390 residências em
áreas ilegais, o que corresponderia a 8,4% da população total e a FAEMA
74
(Fundação Municipal de Meio Ambiente) chega a estimar em cerca de 10.000
as moradias em ocupações ilegais das quais 30% com risco iminente de
desmoronamento.
Em 2000 o município contava com um total de 261.868 habitantes
(IBGE, 2000). Pelo fato do município ser um município pólo é um dos fatores
que faz com que seja receptor de migrantes, fato este que é considerado
gerador dos muitos problemas sociais da cidade (BLUMENAU, 2001)
Em termos de setores econômicos, Blumenau conta com uma
agricultura de pouca expressão, em razão das sucessivas divisões em seu
território e de constantes divisões de terras por heranças, além do êxodo rural
crescente nos últimos anos. As atividades agrícolas absorvem 1,7 % da
população economicamente ativa (PEA) e é responsável pela menor parcela da
renda gerada na economia. O setor secundário é muito forte, embora tenha
apresentado importante redução na sua participação no total de empregos no
município entre as décadas de 80 e 90. Em 2000, Blumenau possuía 2.712
estabelecimentos industriais, onde se destacavam, os da alimentação, os
metalúrgicos e principalmente os da área têxtil e do vestuário, gerando 38.463
empregos. O setor terciário é atualmente o mais dinâmico e tomou a dianteira
quanto ao número de postos de trabalho no município. O comércio com 7.507
estabelecimentos e com 39.062 empregados é bem desenvolvido, e graças às
festas da cidade, sua economia recebe significativo impulso do setor de
hotelaria e de turismo possuindo 8.267 estabelecimentos de serviço, com
57.681 empregados (BLUMENAU, 2001).
As empresas da cidade, notadamente as do setor têxtil, passaram por
um doloroso processo de reestruturação industrial, que envolveu
desconcentração industrial, automação e terceirização, aumentando, com isso,
o nível de desemprego e o grau de informalidade da economia. As indústrias
têxteis foram atingidas de forma significativa na década de 90 com a
supervalorização da moeda e o aumento no mercado nacional e estrangeiro
dos produtos asiáticos, produzidos com elevada tecnologia e salários baixos.
A estratégia de algumas grandes empresas da região foi de
buscar saída pela guerra fiscal, transferindo investimentos
para o Nordeste e outras áreas do País, onde os salários são
mais baixos e os incentivos foram mais elevados. Essa
estratégia também teve a sua dimensão regional, através da
interiorização de empresas, de seu desmembramento, da
75
terceirização de parte da produção para cooperativas de
costureiras, cuja localização se fazem, em grande parte, em
munipios de microrregiões circunvizinhas (ESPINDOLA;
JOHNSON; SCHMOELLER, 2004, p. 137).
Posteriormente houve a recuperação do mercado têxtil, porém algumas
das estratégias (terceirização, descentralização, etc), adotadas anteriormente,
permaneceram prejudicando o mercado de trabalho na cidade de Blumenau.
Em relação aos aspectos epidemiológicos vamos ressaltar que, em
1980, Blumenau possuía o Coeficiente de Mortalidade Infantil (CMI) de 34,5
apresentando um decréscimo sensível durante toda a década de 80, chegando
a 18,1 por mil nascidos vivos em 1993, elevando-se discretamente em 1994 e
1995, respectivamente 21,2 e 22,6 voltando a entrar em declínio nos últimos
anos e em 2000, o Coeficiente de Mortalidade Infantil (CMI) foi de 10,7 por mil
nascidos vivos, estando muito abaixo da média catarinense que ultrapassa os
20 por mil (BLUMENAU, 2001).
Outros dados extraídos do Plano Municipal de Saúde 2001, referem-se
ao Coeficiente de Mortalidade Geral (CMG) que em Blumenau, nos últimos
anos, ficou em torno de 5 por 1.000/habitantes. As doenças crônico-
degenerativas se destacam, em Blumenau, como responsáveis por mais da
metade dos óbitos da população, o que se deve, certamente, ao aumento da
longevidade. Em contrapartida, as doenças infecciosas vêm apresentando
redução acentuada, apesar de ainda se destacarem entre as dez principais
causas de mortalidade, o que é normal no contexto atual de transição
epidemiológica. As causas externas com tendência ascendente, principalmente
devido aos acidentes de trânsito, aparecem como segunda causa de morte da
população no município.
A área da saúde no município, quanto aos serviços próprios, em 2004
contava com a seguinte estrutura, conforme dados obtidos junto à secretaria
Municipal de Saúde de Blumenau (SEMUS): 08 Unidades Avançadas de
Saúde; 34 Unidades de Programa de Saúde da Família; 07 Ambulatórios
Gerais; 01 Unidade Sanitária de Saúde (que abriga as Vigilâncias Sanitária e
Epidemiológica); 01 Escola Técnica de Saúde; 24 Unidades de Saúde Bucal;
01 Serviço de Quimioterapia; 03 Ambulatórios de Referência em Saúde Mental
(um para adultos, um para crianças e adolescentes e o terceiro para usuários
76
que apresentam dependência química), 01 unidade de Saúde do Trabalhador;
Núcleo Integrado de Atendimento ao Fissurado Lábio Palatal; Ambulatório de
DST/AIDS; 01 Centro de Apoio e Orientação Sorológico (COAS); 01 Centro de
Lactação; 01 Laboratório Municipal de Citopatologia; 01 Laboratório Municipal
de Análises Clínicas e 01 Policlínica de Especialidades.
A rede Hospitalar é composta por 04 hospitais, o Hospital Santo Antonio
que é uma Fundação Hospitalar prestando atendimentos pelo Sistema Único
de Saúde. O Hospital Santa Isabel e o Hospital Misericórdia, estes dois
possuindo convênio com a rede SUS, porém a maioria dos atendimentos
ocorre no primeiro, tendo em vista que o segundo localiza-se fora da região
central da cidade e tem uma estrutura menor. E o Hospital Santa Catarina que
é particular atendendo ao SUS somente em algumas áreas em função da
filantropia.
Após alguns breves dados apresentados sobre a cidade de Blumenau,
vale lembrar Siebert (2000), principalmente quando analisamos uma Política
Pública social como a saúde. O autor chama a atenção para a “imagem
forjada”, a Blumenau estereotipada, de "primeiro mundo", a cidade européia,
sem os problemas do resto á país. Na realidade, se oculta a outra Blumenau
que, cada vez mais pobre e mais parecida com tantas outras cidades
brasileiras, se expande clandestinamente subindo as encostas das periferias,
em áreas ilegais, sem saneamento básico e à mercê de enchentes, enxurradas
e deslizamentos, marginalizadas e esquecidas pelas administrações locais que
as trata como focos de sub moradia ou bolsões de pobreza.
Agora que já conhecemos um pouco da realidade municipal
abordaremos o histórico da Saúde do Trabalhador em Blumenau.
O histórico da Saúde do Trabalhador em Blumenau foi obtido através de
documentos e registros do próprio CEREST, porém foi complementado com
informações importantes oriundas das entrevistas realizadas no decorrer desta
dissertação.
De forma bastante sucinta podemos dizer que a Saúde do Trabalhador
em Blumenau começou a ser discutida em reuniões sindicais ainda na década
de 80 e as questões levantadas foram encaminhadas ao Poder Público da
época, mas efetivamente entraram para a agenda governamental durante o
77
governo de Renato Vianna do PMDB, no período de 1992 a 1996, cujo
secretário de saúde foi o Dr. Luis Eduardo Caminha. É este último que solicita
a realização de um projeto e que posteriormente é colocado em prática com a
criação do Programa de Saúde do Trabalhador (PST), em 1994. O Partido dos
Trabalhadores assume o governo municipal no final de 1996 e em primeiro de
maio do próximo ano transforma o PST no CEREST (Centro de Referência em
Saúde do Trabalhador).
A organização sindical por ocasião das primeiras discussões em
Saúde do Trabalhador era composta pela união de vários sindicatos,
denominada de Intersindical. Posteriormente, a partir desta organização
intersindical foi criado o CISAT (Conselho Intersindical de Saúde e Ambiente de
Trabalho), em 12 de agosto de 1993, com o objetivo de defender a Saúde do
Trabalhador e a Legislação do SUS (Lei 8080 e 8142). Estavam vinculados ao
CISAT 12 sindicatos de trabalhadores de Blumenau e região (Ata da
Assembléia Geral do CISAT, realizada em 14/08/1993; CISAT, 1993). Estes
movimentos sindicais traziam uma ampla participação de pessoas vinculadas a
partidos de esquerda e que buscavam o apoio da base dos trabalhadores para
uma mudança política no município. Estes sindicalistas aprofundaram suas
discussões sobre o SUS e buscaram conhecer experiências em Saúde do
Trabalhador de outros Estados.
O elevado número de Acidentes de Trabalho no município bem como a
falta de assistência que havia com relação aos trabalhadores acidentados foi
outro dos fatores que mobilizou a organização sindical e por sua vez o poder
público. Os acidentados somente recebiam o primeiro atendimento que era
feito nos Prontos Socorros do município, porém a continuidade do atendimento
não era garantida.
Esta confluência de fatores foi fundamental para o início das ações em
Saúde do Trabalhador em Blumenau e serão aprofundados posteriormente nas
entrevistas realizadas.
Quanto aos principais atores sociais envolvidos na construção do CISAT
e da Saúde do Trabalhador de Blumenau podemos destacar o Sr. Amândio
Castellain que ocupou vários cargos de destaque em organizações da
sociedade civil, tal como Coordenador Geral da Pastoral Operária (1984-1988),
Presidente da Simetal - Sindicato dos Metalúrgicos – (1889 a 1995),
78
Coordenador Geral do CISAT (1993 a 2005), Conselheiro Municipal de Saúde
(1990 a 2005), Presidente do Conselho Municipal de Saúde (1998 a 2004) e
ainda o cargo de Superintendente Administrativo Financeiro da Secretaria
Municipal de Saúde (2001 a 2004). Outro ator importante neste processo foi o
Dr. Lúcio Botelho, atual reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, que
colaborou com as discussões sobre o tema da Saúde do Trabalhador
fortalecendo o movimento sindical quanto a implantação de um serviço de
referência nesta especialidade. O Dr. Edson José Adriano foi outro nome de
destaque, sendo inicialmente médico do sindicato dos Metalúrgicos e tamm
colaborando nas discussões sobre Saúde do Trabalhador que originaram o
CISAT. Tamm foi Edson Adriano que elaborou o projeto para a implantação
do Programa de Saúde do Trabalhador e que posteriormente foi o primeiro
médico a integrar este serviço. O secretário de saúde da gestão de 1992 a
1996, Dr. Luis Eduardo Caminha destacou-se por viabilizar a implantação de
uma unidade de saúde específica para o atendimento dos trabalhadores
acidentados em Blumenau.
Outro fato marcante que influenciou o surgimento do Programa de
Saúde do Trabalhador em Blumenau foi o “I Encontro de Saúde dos
Trabalhadores” realizado em 1992, com a presença de 220 trabalhadores de
32 sindicatos de Blumenau e Região, realizado pelo CISAT. Este evento teve
um papel decisivo na apresentação e aprovação de uma proposta de
implantação do Programa de Saúde do Trabalhador na Secretaria Municipal de
Saúde, bem como nos enfrentamentos da representação dos sindicatos de
trabalhadores dentro do CMS (Conselho Municipal de Saúde), em defesa dos
princípios e diretrizes do SUS (ADRIANO, 2003).
O ano de 1994 é importante para a saúde em Blumenau, neste ano
ocorre a habilitação como gestão semiplena, sendo o primeiro município de
Santa Catarina e o oitavo do Brasil, a receber esta aprovação de
enquadramento, de acordo com a NOB-SUS 01/93. Outro fato importante é a
realização da I Conferência Municipal de Saúde tem como tema “Promover
Saúde, Promovendo Qualidade de vida” com a participação de 153 delegados
e sendo precedida por cinco pré-conferências distritais. (ADRIANO, 2003).
Ainda em 1994 é instituído o Código de Saúde do Município de
Blumenau (Blumenau, 1995). Trata-se de um documento sanitário no qual são
79
estabelecidos desde a metodologia a ser utilizada nas ações de vigilância à
saúde e de promoção até as penalidades a serem aplicadas em caso de
infração sanitária. Este Código legitimou as atuações da Vigilância Saniria, da
Vigilância Epidemiológica e da Saúde do Trabalhador, no município de
Blumenau (ADRIANO, 2003).
Em 1994 tamm é criado o Programa de Saúde do Trabalhador,
conforme já foi visto. Este programa inicialmente funcionou na sede da
Prefeitura Municipal de Blumenau, e segundo Edson Adriano, com o objetivo
de atender a uma necessidade da gestão municipal que naquela época estava
tendo uma discussão sobre a questão da insalubridade e da periculosidade dos
funcionários públicos.
A equipe inicialmente era composta por 01 operador administrativo, 01
auxiliar de enfermagem, 02 médicos do trabalho. Em 1996 a equipe foi
ampliada com a contratação de 01 enfermeiro do trabalho.
Edson Adriano cita um segundo momento do Programa de Saúde do
Trabalhador quando este é transferido para a FURB (Fundação Universitária da
Região de Blumenau). Esta transferência ocorreu em parte para atender ao
segundo colocado no concurso público para médico do trabalho, que veio a
integrar a equipe e que já possuía um vínculo trabalhista com a Universidade.
Na Universidade funcionava um ambulatório de especialidades, com convênio
com o SUS. Com esta mudança para a FURB o serviço começa a atender a
toda a população acidentada do município, porém só na área da assistência.
Mesmo com a criação do Programa de Saúde do Trabalhador a
mobilizão sindical continuou buscando ampliar as ações deste programa,
quanto a intersetorialidade e da Vigilância em Saúde do Trabalhador.
Em 1996 foi realizada a II Conferência Municipal de Saúde tendo como
tema “Saúde é Qualidade de Vida” (Ata da reunião ordinária do CMS de
Blumenau realizada em 17/04/96). Nesta Conferência foram deliberados os
seguintes encaminhamentos referentes à Saúde do Trabalhador:
Criação do Fórum Permanente de Vigilância à Saúde do Trabalhador
com participação Interinstitucional das entidades: CISAT, INSS, DRT,
Sindicato Patronal, Promotoria Pública, Vigilância Sanitária, com o
80
município garantindo recursos para sua implementação dentro do prazo
de 30 dias;
Criação e estruturação do Serviço de Vigilância à Saúde do Trabalhador
com implantação de, no máximo, 90 dias;
Em final de 1996 o Partido dos Trabalhadores venceu as eleições e logo
no início do próximo ano definiu a transformação do PST em CEREST, o que
ocorreu em 1º de maio de 1997.
Com a inauguração do CEREST o mesmo sai das dependências da
FURB e ganha uma unidade de saúde individualizada, na região central da
cidade. Neste período tamm começam a ser realizados os encontros
intersetoriais através do Fórum em Sde do Trabalhador definido na
Conferência Municipal de Saúde do ano anterior. Este rum, infelizmente, não
teve prosseguimento porque o Ministério Público ausentou-se das reuniões e a
Secretaria Municipal de Saúde teve uma participação parcial porque com
freqüência se fazia representar por alguém que não estava diretamente
relacionado à Política de Saúde do Trabalhador. Esta posição que a Secretaria
Municipal de Saúde adota frente a este Fórum será analisada juntamente com
as entrevistas.
Além da postura da Secretaria de Saúde a Saúde do Trabalhador
tamm teve que se deparar com dificuldades como a falta de um lugar
adequado para seu funcionamento, reduzido número de profissionais, falta de
equipamentos e materiais.
Em 1999 o CEREST muda novamente de endereço, passando a exercer
suas atividades no Centro de Saúde (antiga estrutura estadual, mas que já
estava sob responsabilidade do município nas últimas décadas). Neste local já
funcionava a Superintendência de Vigilância Sanitária e Epidemiológica, a qual
o CEREST era vinculado. Com o objetivo de unificar esta Superintendência
ocorre a transferência do CEREST.
Em 2003 o CEREST ocorre novo remanejado desta vez sendo
influenciado pela centralização da Vigilância Sanitária e Epidemiológica no
mesmo prédio da Secretaria Municipal de Saúde. O antigo prédio do Centro de
Saúde estava em precárias condições de uso, inclusive das instalações
elétricas.
81
Neste mesmo ano o CEREST passa ainda por nova transformação,
desta vez influenciada pelo Ministério da Saúde/COSAT – Coordenação de
Saúde do Trabalhador, que apresenta uma estratégia de viabilização da Saúde
do Trabalhador no SUS através da RENAST – Rede Nacional de Atenção
Integral à Saúde do Trabalhador para os municípios. A RENAST foi criada em
2002, através da Portaria l.679 e se constitui na principal estratégia de
viabilização da Saúde do Trabalhador no SUS.
Uma definição para esta proposta do Ministério da Saúde é:
A RENAST pode ser caracterizada como uma rede de atenção
integral à saúde do trabalhador no SUS, estruturada a partir
dos centros de referência, das unidades e dos munipios
sentinela, organizada em torno de um dado território. [...] Os
Municípios Sentinela e Núcleos Sentinela tem a tarefa de
desenvolver metodologias e organizar o fluxo de atendimento
aos adoecidos e acidentados do trabalho em todos os níveis
de atenção do SUS: rede básica, Média e alta complexidade
de modo articulado com as Vigilâncias Sanitária,
Epidemiológica e Ambiental (
HOEFEL; DIAS; SILVA, 2005,
p. 75).
Blumenau, que já tinha uma unidade de Saúde do Trabalhador criada
desde 1994 é habilitado, em 29 de agosto de 2003 pela portaria SAES/MS 250
como Centro de Referência em Saúde do Trabalhador do Vale do Itajaí (CRST
Vale do Itajaí nº 36 – tipo B). Com esta habilitação tornou-se referência para
mais 52 municípios, tendo uma população estimada em 1.350.000 habitantes.
A Gerência Estadual em Saúde do Trabalhador, para criar a Rede de
Saúde do Trabalhador no Estado, adotou a divisão macro-regional, seguindo a
lógica de regionalização política administrativa de oito grandes regiões do
governo estadual. Desta forma e de acordo com a portaria l.679 no estado
seriam criados nove CRSTs, um estadual e oito regionais. O CRST Vale do
Itajaí ficaria composto de três regiões, sendo elas:
AMAVI – Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí, com 28
municípios e uma população estimada em 248.555 habitantes, tendo
tamm a base da economia a agropecuária, agricultura, indústria, têxtil,
madeira, comércio, etc.
AMMVI – Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí, com l4
municípios e uma população estimada em 604.644 habitantes, tendo a
82
base de sua economia a indústria têxtil, metal mecânica, construção
civil, confecção, agricultura, etc.
AMFRI – Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí, com l1
municípios e uma população estimada em 471.782 habitantes, tendo a
base da economia a pesca, construção naval, turismo e construção civil,
comércio, serviços, etc.
A partir da inserção na RENAST Blumenau optou pela execução de
quatro subprojetos identificados como prioridade pela equipe do CEREST,
gestor da Saúde do Município e representantes sindicais, sendo os eles:
LER/DORT; Saúde mental; Construção Civil; e, Observatório (coleta, registro e
análise de dados na área de Saúde do Trabalhador).
No ano de 2004 a equipe era multiprofissional composta por: médico do
trabalho, ortopedista, clínico geral, enfermeiro do trabalho, fisioterapeuta,
engenheiro de segurança do trabalho, técnico de segurança, técnico de
enfermagem e equipe de apoio administrativo.
As demandas por avaliações de Doenças Ocupacionais são
significativas no CEREST Na seqüência serão apresentados alguns dados que
permitem caracterizar a dimensão dos atendimentos realizados.
Quadro 1 – Evolução histórica do atendimento ambulatorial do CEREST
ANO – MÊS QUANTIDADE DE ATENDIMENTOS
2003 3.830
2004 3822
2005 4616
2006 (Até julho) 2950
Fonte: SIAST(Sistema de Informações Ambulatoriais em Saúde do Trabalhador)
CEREST (Centro de Referência em Sde do Trabalhador)
SEMUS (Secretaria Municipal de Sde)
83
Quadro 2 – Dados de Doenças do Trabalho – Período 2002 a 2004
Ano 2002 2003 2004
Investigações 146 142 163
Doenças de Pele 01 03 01
Doenças do Sistema Osteomuscular 47 33 44
Transtornos Mentais 01 01 01
Queimadura Labial 01 __ __
Doenças do Sistema Respiratório __ 01 __
Total 50 38 46
Fonte: SIAST(Sistema de Informações Ambulatoriais em Saúde do Trabalhador)
CEREST (Centro de Referência em Sde do Trabalhador)
SEMUS (Secretaria Municipal de Sde)
Quadro 3 – Origem do Encaminhamento dos usuários do CEREST
Local de encaminhamento Porcentagem
Hospital 90%
Unidades Básicas de saúde 2,5%
Empresas 4,5%
Sindicatos 1,0%
Outros 2.0%
Fonte: SIAST(Sistema de Informações Ambulatoriais em Saúde do Trabalhador)
CEREST (Centro de Referência em Sde do Trabalhador)
SEMUS (Secretaria Municipal de Sde)
Analisando conjuntamente os dados das tabelas podemos dizer que as
Doenças do Trabalho são uma demanda significativa do CEREST. Dentre
estes casos as Doenças Osteomusculares destacam-se pela quantidade e
nestas estão inclusas as LER/DORT. Em média 30% das investigações de
Doenças do Trabalho tem nexo positivo.
Outro ponto significativo é o aumento de número de atendimentos nos
últimos anos, sendo em 2003 uma cifra inferior a 4.000 e em 2006, até julho já
alcançou ummero próximo dos 3.000 atendimentos. Se esta elevação
continuar até o final do ano haverá um acréscimo de aproximadamente 50%
dos atendimentos nesta unidade de saúde.
A origem dos encaminhamentos é em 90% dos casos hospitalar, o que
nos leva a supor a severidade nos casos encaminhados ao CEREST. E talvez
uma menor atenção aos acidentes mais leves que são atendidos na rede
84
ambulatorial e que não são identificados como acidentes de trabalho e
encaminhados ao CEREST.
No próximo capítulo daremos inicio a uma análise das entrevistas que
foram realizadas com o objetivo de aprofundar os conhecimentos em Saúde do
Trabalhador a partir da realidade de uma unidade municipal de saúde, o
CEREST.
85
CAPITULO 4
AVANÇOS E LIMITES DA SAÚDE DO TRABALHADOR EM BLUMENAU
Neste capítulo, a Saúde do Trabalhador do município de Blumenau será
analisada a partir da implantação do CEREST, através da análise das
entrevistas, que foram realizadas com vários atores sociais que acompanharam
a implantação deste Centro de Referência e o desenvolvimento das atividades
no período analisado, 1997 a 2004.
Os atores sociais entrevistados representaram o controle social que na
realidade municipal é composto basicamente por sindicalistas; os profissionais
de saúde e um gestor da Secretaria Municipal de Saúde de Blumenau. Dois dos
entrevistados, durante o período analisado, passaram a ocupar outro cargo e
desta forma apresentaram em suas respostas uma compreensão que abrangia
um enfoque governamental e gerencial, bem como a sindical ou de profissional
de saúde. Um deles de sindicalista passou a ocupar um cargo gerencial na
Secretaria Municipal de Saúde e o outro de profissional de saúde exerceu a
função de gestor desta mesma secretaria.
Todos os sindicalistas entrevistados participam ou participaram do
CISAT.
Quadro 4 – Representatividade dos atores sociais entrevistados
Entrevistado Representatividade
Entrevistado 1 Controle Social/sindicalista
Entrevistado 2 Controle Social/sindicalista
Entrevistado 3 Controle Social/sindicalista
Entrevistado 4 Controle Social/sindicalista
Entrevistado 5 Controle Social/sindicalista
Entrevistado 6 Profissional de Saúde
Entrevistado 7 Profissional de Saúde
86
Entrevistado 8 Gestor
A identificação dos entrevistados não foi citada com muitos detalhes para
garantir o anonimato dos mesmos. Os representantes sindicais, por exemplo,
não tiveram o nome dos sindicatos que representam acrescidos, mas foram
escolhidos por estarem vinculados ao CISAT e terem uma atuação importante
na área da Saúde do Trabalhador. Os profissionais de saúde entrevistados
foram escolhidos por integrarem o CEREST desde sua implantação e estarem
vinculados a ele até a presente data o que os fez acompanhar as diversas
trajetórias pelas quais passou este serviço e o gestor foi escolhido por ser o que
por mais tempo ocupou este cargo durante o período de análise deste estudo.
Para a execução da presente dissertação foram utilizados dados quanti e
qualitativos. Os principais dados quantitativos já foram apresentados na
caracterização e histórico da Saúde do Trabalhador em Blumenau. Já para os
dados mais subjetivos foram aplicados métodos da pesquisa qualitativa, sendo
a técnica escolhida a de entrevistas. Estas foram aplicadas a profissionais de
saúde vinculados a Saúde do Trabalhador do município, gestores da Política
de Saúde Municipal e representantes do controle social (representados por
sindicalistas).
Os métodos quanti e qualitativos utilizados não se opõem, na verdade, se
complementam. A pesquisa quantitativa é muito útil para investigar as
qualidades primárias de um objeto, ou seja, a quantidade. Por outro lado, a
qualitativa é a mais recomendada para estudar as qualidades secundárias, que
não podem ser quantificadas: o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes dos seres humanos em suas ações e interações
sociais (MINAYO, 2000).
Quanto à utilização das entrevistas podemos dizer que “A entrevista é um
encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a
respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza
profissional.”(LAKATOS E MARCONI, 2001, p.21). Neste capitulo serão
apresentados os diversos dados obtidos, através das diversas técnicas (dados
bibliográficos, quantitativos e qualitativos) fazendo um entrelaçamento entre
87
eles objetivando compreender melhor a Saúde do Trabalhador de Blumenau,
seus avanços e limitações.
As entrevistas foram realizadas com perguntas abertas, com o objetivo
de possibilitar aos entrevistados explanar com liberdade sobre o tema proposto.
O tema central é a avaliação da política pública de saúde do trabalhador de sua
implantação até 2004. As perguntas foram relacionadas à implantação do
serviço, a funcionalidade do mesmo, a influência ou não de mudanças em nível
da política pública de Saúde do Trabalhador – através da RENAST e sugestões
para uma melhor efetivação da Política de Saúde do Trabalhador de Blumenau.
As perguntas realizadas encontram-se na íntegra no Anexo 1, e foram
analisadas em torno de quatro questões conforme a origem das perguntas.
O primeiro grupo de respostas a ser analisado refere-se à Criação do
CEREST.
4.1. Criação do CEREST
Neste Bloco serão analisados os principais fatores e atores sociais que
influenciaram para a criação do CEREST.
Esta questão trouxe um resgate histórico da trajetória da Saúde do
Trabalhador em Blumenau, sendo que alguns dados das entrevistas
complementaram o item desta dissertação que descreve o Histórico da Saúde
do Trabalhador em Blumenau.
Foi possível identificar a convergência de alguns fatores que tiveram
grande influência tanto na criação do CEREST quanto no desenvolvimento
deste. Os principais fatores citados foram: as influências Político-Partidárias e
do Movimento Sindical; a necessidade de atendimento aos Acidentados e
Portadores de Doenças Ocupacionais; e a Legislação Federal (SUS) e
Municipal (Código de Saúde do Município). Com relação aos principais atores
sociais envolvidos neste processo podemos citar que os militantes de esquerda
e os sindicalistas ocuparam um lugar de destaque no sentido da criação do
Programa de Saúde do Trabalhador e posteriormente no CEREST. Além deste
foram citados ainda alguns profissionais de saúde e a igreja como outros atores
sociais importantes neste processo. Já os empresários e as organizações
88
governamentais foram citados como atores que se ausentaram do processo,
entre estes últimos, inclusive, uma atuação ambivalente por parte da Secretaria
Municipal de Saúde. Na seqüência analisaremos cada um destes fatores.
As influências políticas e sindicais para o surgimento da Saúde do
Trabalhador no município se desenrolaram conjuntamente. Conforme já foi visto
no Histórico do CEREST, havia em Blumenau uma organização do movimento
sindical denominado de Intersindical. Posteriormente, a partir desta organização
foi criado o CISAT (Conselho Intersindical de Saúde e Ambiente de Trabalho).
Estes movimentos sindicais traziam uma ampla participação de pessoas
vinculadas a partidos de esquerda e que buscavam o apoio da base dos
trabalhadores para uma mudança política no município. Dentro desta conjuntura
tanto os partidos de esquerda quanto os sindicatos se constituíram como
importantes atores sociais para a criação inicialmente do Programa de Saúde
do Trabalhador como posteriormente do CEREST.
Blumenau não é exceção no predomínio de militantes de esquerda para
o desenvolvimento das ações em Saúde do Trabalhador. Anteriormente, na
fundamentação teórica, já foi citado o exemplo de São Paulo que também teve
grande influência por parte dos partidos de esquerda para o surgimento dos
primeiros Programas de Saúde do Trabalhador naquele Estado, e que foram os
primeiros do país.
A inclusão na Constituição de 1988 das prerrogativas em Saúde do
Trabalhador também estão relacionadas à pressão dos sindicatos e partidos de
esquerda, além das normativas internacionais em função do elevado número de
acidentes de trabalho, que ocorriam no mundo inteiro, fruto da organização do
trabalho que se verificava, e ainda se verifica, nos países inclusos na ordem
capitalistas. O Brasil conseguiu alcançar um lugar de destaque neste ranking,
sendo um dos países com maior índice de acidentes de trabalho. Na
fundamentação teórica este elevado índice de acidentes foi abordado tanto com
dados do próprio Ministério da Saúde, como também os citados por Rocha e
Nunes (1994) que apresentaram um resgate histórico dos fatos marcantes que
ocorreram nos diversos períodos políticos do país, correlacionando-os a área do
trabalho. Destacaram as precárias condições de trabalho dos escravos e dos
trabalhadores rurais no período da economia baseada no modelo agro-
exportador, posteriormente o grande aumento de acidentes de trabalho que
89
ocorreram durante o período desenvolvimentista quando se acentuou o
processo de industrialização do País, entre outros.
Confirmando a relação da influência político-partidária no
desenvolvimento da Saúde do Trabalhador em Blumenau, citaremos alguns
trechos de entrevistas. Uma delas é a de um dos representantes do controle
social que destacou: “[...] era através da saúde que nós podíamos manifestar
todo pensamento ideológico sem ser contrariado. E isto foi decisivo para falar
de Saúde do Trabalhador porque falando de Saúde do Trabalhador tinha de
falar de saúde, de educação, salário, moradia de todas estas coisas. Então se
eu fosse falar só de moradia, de política de moradia, de política disto ou daquilo
o pessoal iria falar este cara é de esquerda e não sei o que mais. Mas quando
se falava em saúde, independente de trabalhador, de patrão ou qualquer coisa,
as pessoas iriam ouvir. Politicamente este foi um fator” (Entrevistado 1).
Este interesse político foi influenciado pelo fato deste entrevistado ser
candidato a um cargo político na administração municipal pelo Partido dos
Trabalhadores, na seqüência de sua entrevista ele continua a reforçar a relação
entre política e a Saúde do Trabalhador “[...] eu queria dar uma resposta nesta
área, então eu precisava de uma coisa nova em termos políticos e sindicais. Eu
assumi a presidência do sindicato [...] e, eu queria fazer uma coisa diferente do
que existia na cidade, até porque nós tínhamos um projeto político que era de
ganhar esta eleição. E para isto tinha que fazer uma coisa diferente. Eu tinha
que convencer os meus amigos e os outros dirigentes sindicais” (Entrevistado
1).
Outro representante do controle social também faz uma correlação entre
a Saúde do Trabalhador e os partidos de esquerda. “Na época realmente era
um debate muito acirrado, nós sabíamos a diferença entre direita e esquerda. A
direita com o PMDB e o PFL eles não vinham para discutir conosco a questão
dos trabalhadores, sempre acharam que as questões de direitos dos
trabalhadores eram coisas de esquerda, do PT, do PC do B e da CUT. E por
isso eles não vinham quando eram chamados para participarem das
discussões” (Entrevistado 3).
Com relação à influência do movimento sindical são obtidos alguns
depoimentos que identificam esta organização como o principal ator no
90
processo de implantação do CEREST, principalmente através do CISAT.
“[...] com certeza os sindicatos, mais precisamente com o CISAT, é que
foi dado o passo inicial para a criação do CEREST” (Entrevistado 3).
“Eu digo que sem o movimento sindical o CEREST não existiria. Teve o
CISAT [...] este foi o maior batalhador pelo CEREST” (Entrevistado 6).
Um dos representantes do controle social nos mostra uma das razões
para que a organização sindical de Blumenau tenha se tornado uma peça tão
importante na criação do PST e do CEREST, surpreendentemente, a própria
fragilidade dos mesmos. “Por que na época em que começou o controle da
inflação, o sindicato não tinha mais como ficar lutando por reposição salarial
real, e até porque veio a livre negocião. Aí então a gente começou a
perceber que o problema dos trabalhadores não era só o salário. Quando ele
recebia a folha de pagamento a inflão já tinha comido boa parte do seu
salário, então quando vieram o Plano Real, que deu uma segurada na inflação,
que se tornou menor, a gente percebeu que o CISAT, [...] deveria trabalhar as
questões relativas a saúde do trabalhador” (Entrevistado 3).
É coerente a fala do entrevistado ao apontar as mudanças de atuação
que os sindicatos sofrem conforme se altera o momento político e econômico do
país. Estas modificações que ocorrem na esfera sindical já foram discutidas
durante a fundamentação teórica. Resgatando o essencial podemos dizer que
está diretamente vinculado à questão da inserção do país numa perspectiva
neoliberal, onde algumas das premissas são a diminuição do poder dos
sindicatos e a flexibilização dos direitos dos trabalhadores. Lacaz (2005), aponta
a transformação que ocorreu no mundo do trabalho na década de 90,
caracterizado pelo aumento do emprego no setor terciário, pela precarização e
desemprego o que fez com que a ação sindical perdesse sua eficácia e
capacidade de representação, diminuindo tamm sua interlocução ao nível das
políticas públicas.
O poder de reivindicação da classe operária e a negociação dos
sindicatos relacionam-se ao momento histórico, percebe-se que as conquistas
91
são alcançadas em momentos como o da Revolução Industrial e o pós-guerra,
ou seja, em momentos em que a necessidade de produção e de mão-de-obra
aumenta. No Brasil, um pouco desta história de movimentação do poder de
mobilizão da sociedade civil foi citado por Nunes e Rocha, (1994). Estes
autores analisaram, por exemplo, o período após 1964 quando houve por parte
do Estado a intervenção nos sindicatos, submetendo os mesmos a rígidas
regras de funcionamento. Já após 1974, com a crise no país se acentuando e o
descontentamento da população sendo expresso através do voto na oposição,
fez com que o poder público flexibilizasse o controle sindical e ampliasse os
direitos sociais.
Porém, as grandes mudanças que ocorreram na década de 90, período
de implantação do CEREST, levaram a um retrocesso do poder sindical e
conseqüentemente do poder de mobilização dos trabalhadores.
Este período caracteriza-se por moderada recuperação do
crescimento econômico, pela expansão da força de trabalho,
pelo aumento do desemprego e a insuficiente geração de
postos de trabalho, combinados com desaceleração do ritmo
de crescimento do PIB, a não-recuperação do salário mínimo
em termos reais e a evolução do ingresso dos trabalhadores no
emprego informal. Neste quadro econômico, os trabalhadores
ligados a indústrias de pequeno porte, os
autônomos/temporários ou os do setor informal tiveram menos
garantia de emprego. [...] outro fenômeno importante é o
aumento da terceirização que remete a tarefas insalubres,
monótonas e perigosas [...] (Relatório da OIT apud SILVA;
BARRETO JUNIOR e SANT’ANA, 2003, p. 57).
De acordo com o Relatório da OIT podemos perceber o quanto ocorreu a
fragilização dos trabalhadores a partir da década de 90 e concluir que trouxe
profundas conseqüências na capacidade dos trabalhadores de se organizarem.
Estes passam a lutar pela sobrevivência e pela manutenção do emprego,
independentemente do tipo de trabalho a ser realizado.
A continuidade da entrevista do representante do controle social aborda
outra situação interessante que está presente no dia-a-dia dos trabalhadores e
na inserção destes no mercado de trabalho. “Antigamente não se tinha
computador na escola, mas agora já tem e ainda muitos não têm condições de
comprar um computador, porque é caríssimo. E daí quem não tem fica fora do
mercado de trabalho porque a gente sabe que só quem sabe trabalhar com
computador tem lugar no mercado de trabalho. Fica desempregado e
92
marginalizado os trabalhadores que na época não puderam estudar porque
tiveram que trabalhar e que hoje não encontram mais emprego. Vão ter que
trabalhar num trabalho informal, sem registro, sem carteira porque hoje exige-se
que tenha todos os requisitos e que seja bastante qualificado” (Entrevistado 3).
Contextualizando esta situação cabe referir o que foi citado nos capítulos
iniciais, baseado em Minayo-Gomez e Thedim-Costa (1999) que destacam a
redução da aplicação dos recursos financeiros no mercado produtivo, e estes
últimos, são aplicados prioritariamente em países que possuem potencial de
mercado, além de mão de obra qualificada e polivalente, condições de
comercialização e infra-estrutura de telecomunicações e tecnologias, condições
estas apresentadas por países desenvolvidos. Os recursos financeiros tamm
são aplicados em regiões onde o trabalho é barato, com menor utilização de
tecnologia, ocorrendo uma maior exploração da mão de obra e das matérias
primas.
Com base na citação podemos perceber o quanto o mercado de trabalho
e, conseqüentemente, a vida da população trabalhadora, é afetada pela
movimentação da aplicação dos recursos do mercado produtivo. As
conseqüências negativas afetam de forma bem mais intensa aos países pobres
do que os ricos porque as funções produtivas mais rentáveis são destinadas a
estes últimos enquanto que os pior remunerados ou aqueles que apresentam
maiores riscos são direcionados aos países periféricos. Na continuidade os
autores continuam a afirmar que:
Esse quadro de reestruturação das empresas e dos sistemas
produtivos, inquestionáveis numa ótica eminentemente
econômicos, acarreta um peso do ônus [...] que atinge não
apenas as populações consideradas vulneráveis, mas o
conjunto da sociedade, embora de modo diferenciado, muitas
vezes sob o eufemismo de novas formas de trabalho. [...] o que
esconde a diminuição de postos de trabalho e a fragilidade dos
novos arranjos laborais como a oferta de empregos de tempo
parcial ou duração eventual; as limitações na absorção da força
de trabalho jovem, inclusive qualificada; a instabilidade e
irregularidade ocupacionais; o subemprego e o desemprego
recorrente, duradouro e sem perspectivas de inclusão no
mercado formal; as dificuldades de inserção da mão-de-obra
não qualificada e os rendimentos decrescentes para boa
parcela das populações já empobrecidas (MINAYO-GOMEZ;
THEDIM-COSTA, 1999, p.412).
Estas citações acima nos permitem compreender que apesar de toda a
93
sociedade ser afetada pela reestruturação produtiva e econômica esta atinge de
forma mais intensa aos menos qualificados e em situação social mais precária,
que são justamente os citados pelo representante sindical. Estes têm menores
chances de integração ao mercado formal de trabalho e estão sujeitos a rendas
reduzidas. Esta situação é ainda mais drástica nos países periféricos para os
quais são designados trabalhos que exigem menos infra-estrutura e tecnologia,
portanto menos valorizados sob ponto de vista econômico. Esta fragilização da
classe trabalhadora tem repercussões sobre a organização sindical que é o que
foi apontado na entrevista do sindicalista.
A estabilidade da moeda foi outro dos fatores levantados pelo
entrevistado como motivo para a diminuição da representatividade dos
sindicatos. Esta questão também já foi apontada na fundamentação teórica,
principalmente através da obra de Sallum Jr (2003). Segundo este autor,
primeiramente o país foi levado a um período de hiperinflação, que foi
implantada artificialmente, e que levou a fragilização da economia e do mercado
produtivo, além de desvalorizar os salários dos trabalhadores. Esta hiperinflão
foi utilizada como um importante instrumento que tornaria o país apto à
implantação das estratégias neoliberais. Após a grande desestabilização da
economia estavam criadas as condições ideais para que o governo de
Fernando Henrique Cardoso implantasse o Plano Real que previa a estabilidade
da moeda e que o país aderisse ainda mais aos pressupostos neoliberais. Este
processo de adesão ao neoliberalismo teve início durante o Governo de Collor,
porém continua até os dias atuais.
[...] o Governo Lula não conseguiu desfazer-se inteiramente
do conceito neoliberal dos “gastos sociais focalizados”. O
anunciado vetor estruturante destas transferências de renda
aos setores mais pobres não passou do terreno das boas
intenções (SAMPAIO, 2005, p.03).
Ou seja, não houve, no período analisado pelo autor (dois primeiros anos
do governo), redução das desigualdades sociais, havendo continuação do
ajuste neoliberal. No aspecto econômico este citou exemplos como a reforma
da Previdência Social; a remoção do entrave constitucional à autonomia do
94
Banco Central; reforma do Poder Judiciário; e Lei de Falências. Todos estes
exemplos “[...] enquadram-se rigorosamente na receita do Consenso de
Washington - Estado fraco e mercado livre” (SAMPAIO, 2005 p.03).
Dentro deste contexto, os sindicatos que anteriormente lutavam por
salário e condições de trabalho passaram a ter que desenvolver estratégias
para conseguirem se manter. Outra entrevista que ilustra o quanto às medidas
políticas e econômicas afetaram os movimentos sindicais no município de
Blumenau foi a de outro dos representantes sindicais. “Nós tivemos um grande
desemprego [...] nesta época, onde os sindicatos tiveram que fazer acertos nas
negociações coletivas como, por exemplo, o piso livre que na época foi visto
com muito maus olhos pelos sindicatos, nosso sindicato foi alvo de muitas
críticas [...]” Quem aborda este processo de globalização e precarização do
trabalho neste município é Espindola; Johnson e Schmoeller (2001), que
apontam que na década de 90 a estabilização da moeda, a concorrência dos
produtos importados dos países asiáticos, a diminuição de tarifas alfandegárias
e a adoção de uma política de abertura de mercado afetou de forma significativa
a economia do município, principalmente a indústria têxtil. Este movimento da
economia e enfraquecimento das grandes empresas afetou aos trabalhadores e
tamm aos sindicatos. Outro fator que afetou a economia blumenauense e
seus trabalhadores foi à estratégia adotada pelas grandes empresas de
transferir seus investimentos para o Nordeste ou outras áreas do país nos quais
os salários eram mais baixos e nos quais houve maiores incentivos fiscais.
Este contexto de crescente adesão às políticas neoliberais que tiveram
várias repercussões, para as empresas significou terem que se adequar a
globalização e a abertura de mercado, além da supervalorização do mercado
financeiro o que tirou investimentos do setor produtivo. Para os sindicatos
significou uma crescente fragilidade pela flexibilização, precarização do trabalho
e redução dos postos de trabalho, desta forma estas entidades precisavam de
uma “bandeira” para se fortalecer. Politicamente haviam os partidos de
esquerda que almejavam assumir o poder buscando para isto apoio na classe
trabalhadora. Houve, desta forma, uma união com o objetivo de traçar
estratégias que viessem de encontro aos desejos da classe trabalhadora que se
fortaleceu a pressão, junto ao poder público, e que fizeram surgir às primeiras
95
ações em Saúde do Trabalhador no município.
Na seqüência serão analisados outros fatores que se fizeram presentes
para a estruturação da Saúde do Trabalhador no município, que foram a
necessidade de atendimento aos acidentados e aos portadores de Doença
Ocupacional e o desenvolvimento de ações de Vigilância e Fiscalização. Além
destes foram citados ainda a necessidade de atender a Legislação pelo fato do
município aderir ao Modelo de Gestão Plena do Sistema.
Quanto à questão das ações de Assistência um dos fatores que exerceu
influencia para a criação do CEREST foi a situação dos trabalhadores
acidentados de Blumenau que até meados da década de 90 eram atendidos na
rede hospitalar, no Pronto Socorro, a continuidade do tratamento destes
acidentados não era garantida e nem havia um lugar específico para que
ocorresse. O atendimento aos portadores de doença ocupacional era ainda pior.
Não existia até aquele momento o estabelecimento do nexo causal destas
patologias e, conseqüentemente, não havia por parte dos trabalhadores
possibilidade de acessar nem ao tratamento na área da saúde nem aos
benefícios do INSS.
As referências à necessidade de um serviço na área de Saúde do
Trabalhador que realizasse ações de vigilância foram feitas em menor
quantidade pelos entrevistados. Destacam-se as seguintes falas:
A primeira de um dos profissionais de saúde “[...] eu lembro que naquela
época o trabalhador que se acidentava ficava no hospital, sendo atendido e
depois ia direto para o INSS ele não tinha este acompanhamento. A fiscalização
quem fazia era o Ministério do Trabalho [...]” (Entrevistado 7).
O controle social confirma esta precariedade do atendimento “Teve uma
época em que a gente não sabia para onde encaminhar o trabalhador
acidentado ou por doença, porque os ambulatórios diziam que não era
competência deles, que o acidentado tinha que ser do hospital, o hospital dizia
que só fazia o primeiro atendimento [...]” (Entrevistado 2).
O mesmo entrevistado aborda a complicada situação dos que
desenvolvem uma doença do trabalho e acrescenta a necessidade de realizar
ações de vigilância nos ambientes de trabalho. “[...] a necessidade que a gente
viu dentro do movimento sindical de ter uma estrutura para atender os
acidentados e principalmente os portadores de doenças ocupacionais. Até
96
então a gente não tinha nenhuma referência, nenhum estudo, não sabia nem
para onde encaminhar alguém que estava com dor no braço, para ver se era do
trabalho ou não, para fazer uma fiscalização” (Entrevistado 2).
Pelos relatos das entrevistas podemos perceber o quanto o trabalhador
deparava-se com uma difícil problemática, apesar da própria Constituição de
1988 já identificar o trabalho como um fator determinante e condicionante do
processo saúde/doença. Ou seja, as circunstâncias nas quais o trabalho ocorre,
os fatores de risco aos quais os trabalhadores estão expostos, a organização do
processo produtivo, ou ainda a ausência do trabalho que expõem o cidadão a
uma dependência do Estado, estes são fatores que influenciam diretamente no
processo saúde/doença. Apesar desta compreensão mais ampla sobre a forma
como o trabalho interfere no adoecimento dos trabalhadores, as doenças
profissionais e doenças relacionadas ao trabalho, cuja definição foi citada na
íntegra na fundamentação teórica, a partir de Silva, Barreto Jr e Santana (2003),
envolvem um diagnóstico que considere uma maior variedades de causas
interferindo para o surgimento ou agravamento da patologia, não havendo esta
consideração integral não será possível estabelecer a relação entre
adoecimento e a atividade profissional. Quanto maior o conhecimento sobre o
tipo de trabalho que o trabalhador desenvolve, maior será a possibilidade do
profissional de saúde estabelecer um diagnóstico adequado. Esta questão de
considerar a multiplicidade de fatores para a realização do diagnóstico foi
aprofundada através da síntese da obra de Facchini (1994), que analisou a
importância da multicausalidade na compreensão do processo saúde-doença.
Aliás, a relação do trabalho com o adoecimento e a morte de trabalhadores já
foi apontada desde 1700, através dos estudos de Ramazzini, citada nos
capítulos iniciais, porém, infelizmente, esta relação ainda muitas vezes ainda é
ignorada tendo sido um dos fortes fatores que influenciou a criação do
CEREST.
Atender a legislação foi outro dos fatores apontados para a implantação
da atenção em Saúde do Trabalhador em Blumenau, “O principal (fator) de
todos, na época, foi a Lei 8.080, que era uma das Blumenau estar recebendo a
gestão plena” (Entrevistado 6).
Silva, Barreto Jr. e Sant’Ana (2003) desenvolveram uma pesquisa para
avaliar a descentralização das ações em Saúde do Trabalhador em São Paulo.
97
Nesta pesquisa citam que “até 1988 as ações públicas em Saúde do
Trabalhador eram centralizadas e se reduziam as inspeções tradicionais
efetuadas por agentes do Ministério do Trabalho”. Posteriormente com a Lei
Orgânica da Saúde houve a regulamentação dos preceitos constitucionais e
definiu-se a participação do município na execução, controle e avaliação das
ações referentes às condições de trabalho, bem como a execução dos serviços
de saúde do trabalhador. Apesar da mudança na legislação verificou-se que em
1999 somente 42,1% dos municípios analisados, e, que estavam vinculados a
Gestão Plena do Sistema, realizavam ações em Saúde do Trabalhador.
Os municípios que adotaram a Gestão Plena do Sistema deveriam ter
implantado ações específicas em Saúde do Trabalhador, porque:
[...] possuem maior capacidade instalada e oferecessem um rol
mais amplo de ações e serviços em favor da saúde de suas
populões. Além disso, essas cidades possuem maior
autonomia na gestão do sistema local e recebem aportes de
recursos mais significativos do Ministério da Saúde, inclusive
para realizar pagamentos pela prestação de serviços realizados
por prestadores privados e filantrópicos (SILVA; BARRETO
JR.; SANT’ANA, 2003, p. 54).
Portanto, apesar de Blumenau estar vinculada a Gestão Plena do
Sistema, não haveria obrigatoriedade do poder público municipal implantar um
Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, poderia continuar a prestar
algum tipo de atendimento na rede hospitalar e ambulatorial como vinha
ocorrendo até início da década de 90. Desta forma podemos presumir que os
outros três fatores foram mais preponderantes para que esta política viesse a
ser executada, ou seja, a pressão político partidária, a organização do
movimento sindical e a grande quantidade de trabalhadores acidentados e sem
um local adequado para receber atendimento.
Até o presente momento foram analisados os principais fatores citados
como sendo fundamentais para o surgimento do CEREST (políticos, sindicais,
assistenciais e Legais). Os dois primeiros – políticos de esquerda e organização
sindical constituíram-se como os principais atores sociais presentes para a
concretização do CEREST. Além destes, foram citados ainda como atores
importantes alguns profissionais de saúde e a Igreja. Isto pode ser comprovado
pelos trechos das entrevistas que serão apresentados na seqüência.
98
Os profissionais de saúde que tiveram uma importância significativa para
a estruturação desta política já foram citados no item onde foi descrito o
“Histórico da Saúde do Trabalhador em Blumenau”. A colaboração ocorreu no
sentido da elaboração do projeto para a implantação do serviço e para as
discussões teóricas na área. Algumas entrevistas destacam esta participação
dos profissionais de saúde. São elas: “uma figura importantíssima que é o Dr.
Lúcio Bottelho, hoje reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, é ele que
vai trazer a base teórica para nós formarmos o CISAT e termos uma base mais
forte para lutarmos pelo Centro de Referência em Saúde do Trabalhador”. O
mesmo entrevistado cita “[...] outras pessoas que participaram da criação do
CEREST, foi o Dr. Caminha, o Dr. Ernani, o Edson, tinha um pessoal de
Florianópolis, o Dr. Flavio Valente, [...]” (Entrevistado 1).
Relembrando que Dr. Caminha era o Secretário Municipal de Saúde de
Blumenau no período 1992 – 1996, no qual foi criado o Programa de Saúde do
Trabalhador, e, realizado concurso público para estruturar o serviço; Dr. Ernani
e Dr. Edson os dois primeiros médicos do Trabalho concursados para a
Secretaria Municipal de Saúde em 1994 e que passaram a integrar o Programa
de Saúde do Trabalhador de Blumenau. O Dr. Edson Adriano foi o profissional
que realizou o projeto para a implantação do PST e tamm teve uma
participação fundamental para a estruturação do CISAT.
Outro entrevistado destaca o papel do profissional de saúde no dia-a-dia
do serviço. “Não pode ser só o movimento sindical, se os profissionais de saúde
não tiverem este entendimento (de prestar um bom atendimento aos
trabalhadores), não estiverem do lado dos trabalhadores, só o movimento
sindical, por mais vontade que tenha, nunca vai fazer acontecer. A parte que
está ali atendendo mesmo é de fundamental importância” (Entrevistado 2).
O controle social citou ainda “A igreja através das pastorais tamm
participou na luta pela construção do CEREST” (Entrevistado 3).
Além dos atores sociais citados e que tiveram um envolvimento positivo
com a área, existem tamm aqueles que permaneceram alheios a este
processo. Este segundo grupo se refere à classe empresarial e aos órgãos
públicos, inclusive a Secretaria Municipal de Saúde.
Uma das entrevistas que é bastante interessante no aspecto da ausência
de determinados atores sociais, cita: “Teria sido importante à participação de
99
outros atores sociais para a criação do CEREST, ficou sem força, mesmo sendo
um pessoal que estava naquela época no movimento sindical, eles eram muito
fortes, e alguns ainda fazem parte do movimento sindical até hoje em
Blumenau, mas eu diria que o próprio poder público em si mais eficiente e o
empresarial, sabe [...] mais entidades mais fortes de Blumenau [...]”
(Entrevistado 6).
Ao final da fala este entrevistado mostra o quanto teria sido importante à
integração com o setor empresarial, e continua destacando que o mesmo
poderia obter vantagens com um bom serviço na área de Saúde do
Trabalhador. “[...] o empresário estava vendo este tipo de serviço como um
“bicho papão”, como algo que só iria arruinar a empresa e não beneficiar, mas
com isso quem tamm está ganhando é a empresa, com este controle de dias
parados, com o atendimento assistencial, a fiscalizações – as orientações das
fiscalizações” (Entrevistado 6).
Na seqüência temos o registro de outra entrevista de um dos
representantes do controle social que tem uma visão diferenciada com relação à
ausência da classe empresarial. “O empresário só quer saber se o trabalhador
está bom para o trabalho. Se não está afasta ele e quando a perícia determinar
que está apto ao trabalho retorna. Eles não têm esta preocupação com o
trabalhador acidentado, eles jogam isto para o SUS, para o INSS, e se eximem
de outras responsabilidades até sociais” (Entrevistado 3).
Temos ainda outro representante do controle social, que cita o exemplo
de duas empresas de Blumenau e que possibilita ter uma idéia da gravidade da
situação a que estão expostos os trabalhadores do município de Blumenau. “[...]
isto foi uma coisa assim maravilhosa e dolorida tamm (referindo-se as
primeiras fiscalizações realizadas por profissionais do Programa de Saúde do
Trabalhador em parceria com o CISAT). Porque nós chegamos na [...]
2
(empresa metalúrgica de Blumenau) e no fichário de mais 500 trabalhadores
480 tinham perda auditiva acima de 50 decibéis. Trinta trabalhadores estavam
condenados à morte por pneumoconiose, porque os “caras” trabalhavam dentro
de um fosso que tinha lá. Nós chegamos na [...], de 120 trabalhadores tinha 80
que tinham perda auditiva.”
Analisando de forma conjunta as citações destes três importantes atores
2
O nome das empresas foi omitido propositadamente para respeitar a ética da pesquisa acadêmica.
100
sociais para a Saúde do Trabalhador de Blumenau, percebemos que a primeira,
de um profissional de saúde destaca o aspecto positivo da participação dos
empresários nas ações de saúde do trabalhador, já os representantes do
controle sociais têm uma visão mais dura com relação à realidade e a
articulação entre a classe empresarial e a classe operária. Serão citadas na
seqüência algumas fundamentações teóricas que nos possibilitarão tecer
algumas considerações a respeito.
O empregador detém o poder porque tem dinheiro para
comprar a força de trabalho e os trabalhadores se submetem,
porque precisam vendê-la para sobreviver. Uma relação
permanentemente conflituosa: o empregador quer pagar menos
e extrair mais força de trabalho, mesmo que isto importe na
degradação das condições e relações sociais de trabalho e na
perda da saúde do trabalhador; o trabalhador, por sua vez,
tenta aumentar o valor de suas horas de trabalho e preservar
sua saúde e capacidade de trabalho (RIBEIRO, 2004, p. 5).
Continuando sua análise o autor cita que:
[...] além de conflituosa, a relão entre o empregado e o
empregador vai além da simples subordinação: é uma relação
de submissão imposta por um poder determinado
unilateralmente por interesse econômico do empregador,
respaldado na coação e capacidade de retaliação; uma
submissão tanto maior quanto menor for a organização e
resistência dos trabalhadores e maior sua necessidade de
sobrevivência (Ibidem).
Esta relação de poder que foi apontada pelo autor e tão claramente
relacionada à questão da extração da mais valia, não é neutra e está
intrinsecamente relacionada ao que foi citado no início do primeiro capítulo, da
obra de Mészáros (1995) apud Antunes (2001), que aborda a questão do
metabolismo social do capital, processo que ocorre quando o trabalho não se
destina mais somente à satisfação das necessidades do ser humano, mas
passa a ter como função primordial o acúmulo de capital. Isto produz profundas
transformações no trabalho sendo uma delas a personificação do capital como
um valor egoísta, voltado para o atendimento dos imperativos expansionistas do
capital. Isto nos leva a concluir que os objetivos da classe trabalhadora e da
classe empresarial são completamente diferentes e é difícil atender a
expectativas tão diversas. Na verdade a empresa pode ser beneficiada, como
foi citado pelo profissional de saúde, com uma maior agilidade no atendimento
101
ao acidentado fazendo com que o mesmo retorne mais rapidamente ao
trabalho. Porém, este não é o objetivo primeiro de um Centro de Referência em
Saúde do Trabalhador.
A mola propulsora de um Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador deve ser o elevado índice de acidentes, doenças e mortes que
atingem os trabalhadores no Brasil. Conforme já foi citado, o Brasil apresenta
dados alarmantes neste quesito. E este cenário somente sofre mudanças
favoráveis aos trabalhadores quando interfere na lucratividade, ou quando os
movimentos sociais conseguem mobilizar o poder público por melhores
condições de vida. Houve um avanço na década de 80 e posteriormente, na
década de 90 apresentou um retrocesso em virtude da crescente adesão aos
ideais neoliberais. O relatório da Organização Internacional de Trabalho – OIT,
de 1999 apud Silva, Barreto Junior e Sant’Ana (2003), mostra claramente esta
situação, este relatório aponta que houve um aumento considerável da
precarização do trabalho o que diminuiu as garantias trabalhistas, o aumento
das funções terceirizadas com excesso de tarefas insalubres, monótonas e
perigosas, aliado a isto o crescimento econômico dos países da América Latina
foi somente considerado moderado. Podemos concluir, portanto que o poder de
pressão dos trabalhadores está bastante fragilizado e desta forma mudanças
substanciais quanto às condições de trabalho não devem ser conquistadas
neste momento histórico do país, o que dificulta a atuação de um Centro de
Referência em Saúde do Trabalhador.
Quanto à função que um serviço na área de Saúde do Trabalhador deve
executar, podemos citar a obra de Maeno e Carmo (2005) que relatam os
primórdios da Saúde do Trabalhador no Brasil. Ao final da década de 70 e início
da de 80 (final da ditadura), alguns profissionais da saúde lutavam para
reorganizar os departamentos médicos das empresas que tinham por objetivo
um atendimento estritamente assistencial sem nenhuma valorização da
atividade de trabalho do paciente, e transformá-los em instrumentos de coleta
de informações pertinentes à saúde do operário, possibilitando uma atuação
preventiva nos agravos relacionados ao trabalho. Estes autores tamm
destacam a influencia do Movimento Operário Italiano como base para a
implantação dos primeiros Programas de Saúde do Trabalhador no Brasil. De
102
forma bastante resumida podemos dizer que um grande diferencial do
Movimento Italiano foi o de considerar o conhecimento do trabalhador sobre seu
próprio trabalho e articular este conhecimento ao conhecimento técnico para
buscar soluções para as diversas situações que geram o adoecimento dos
trabalhadores no ambiente de trabalho. Portanto um Centro de Referência em
Saúde do Trabalhador deve, primeiramente, buscar a intervenção preventiva no
ambiente de trabalho e considerar o conhecimento que o trabalhador tem sobre
a organização do seu trabalho, o que pode conter informações importantes para
a identificação de fatores de adoecimento dentro das empresas. A abordagem
teórica utilizada por estes centros tamm deve incluir além dos aspectos
clínicos, os sociais e psicológicos, abrangendo a complexidade de fatores que
constitui o trabalho (e o não trabalho) na atualidade.
Pela entrevista do representante do controle social é possível perceber a
gravidade da situação da Saúde do Trabalhador em Blumenau e o quanto para
determinadas empresas, adoecer, mutilar ou matar seus trabalhadores é mais
econômico do que modificar intensamente o seu processo produtivo, até mesmo
porque a maioria dos trabalhadores desconhece seus direitos como o próprio
entrevistado cita: “Quer dizer, todos estes trabalhadores desconhecem seus
direitos quanto a Previdência, eles poderiam mover ação de indenização por
doença ocupacional.”Entrevistado 1.
Conforme relatou o outro entrevistado, quando o trabalhador es
adoecido a responsabilidade é transferida aos órgãos públicos. Portanto a
parceria entre CEREST e empresários é um tanto utópica se o primeiro exercer
um papel de intervenção nos processos de trabalho.
Após analisar a difícil articulação entre trabalhadores e empresários, bem
como a atuação do CEREST junto a estes, cabe-nos analisar a participação dos
órgãos governamentais na Saúde do Trabalhador de Blumenau.
A questão da Intersetorialidade, principalmente na Saúde do
Trabalhador, é extremamente importante pela necessidade de envolvimento de
vários órgãos governamentais e não governamentais para a resolução das
problemáticas que envolvem o trabalho. Podemos citar o Ministério Público, o
Ministério do Trabalho e Emprego, o Ministério da Previdência Social, o
Ministério da Saúde, os empresários, entre outros. Cada qual com sua
estrutura, recursos e objetivos diferenciados. Em alguns aspectos os órgãos
103
governamentais deveriam se complementar, porém pela diferença de objetivos
e pela falta de uma política de integração eles não se tornam parceiros e não
ocorre a complementação das ações.
Silva, Barreto Jr. e Sant’Ana (2003), abordam a importância da
intersetorialidade na Saúde do Trabalhador, referem que a reestruturação
produtiva na globalização da economia, as transformações urbanas (por
exemplo, com a rápida mudança que houve no Brasil com relação à saída da
população da zona rural para a urbana), as mudanças organizacionais no
trabalho, os fatores de risco industriais e ambientais e os aspectos psicofísicos
do trabalho exigem uma atuação mais ampla. Os problemas de saúde do
trabalhador dificilmente poderão ser resolvidos por ações exclusivas do setor
saúde.
Infelizmente, como veremos na seqüência, baseado no relato dos
entrevistados a participação destes órgãos governamentais não foi e não está
sendo favorável. Registramos um relato de um dos entrevistados,
representando o controle social, que expressa: “Zero, a intersetorialidade é
zero. Nós tivemos a oportunidade, enquanto CISAT, de trazer a Previdência
Social para as reuniões que ocorriam mensalmente. Nos prometeram,
prometeram, prometeram... Mas quando aparece o primeiro caso de doença
ocupacional em Blumenau, e vai acontecer com a nossa presença, o Dr.
Francisco que participava das nossas reuniões na última hora estava dizendo: -
Mas, meu filho, tu não tivesse quando pequeno asma? Quer dizer o cara se
aposentou doente, não chegou nem a receber o dinheiro da aposentadoria
porque morreu [...] Era uma pneumoconiose da [...]
3
, era um destes
condenados” (Entrevistado 1).
Outro relato interessante quanto à dificuldade de participação das esferas
governamentais é de um dos representantes do controle social, “não acredito
que tenha havido a participação de outros atores, nem do INSS e muito menos
do Ministério do Trabalho. Já que eles são totalmente alheios a esta situação de
acidentes e reabilitação do trabalhador, tanto é que o INSS tem o seu espaço
de reabilitação dos trabalhadores e, pouco faz ou nada faz, neste sentido”
(Entrevistado 4). Esta citação identifica a situação no momento atual, ou seja,
de desarticulação entre os órgãos.
3
Nome da empresa omitido para fins de sigilo e ética da pesquisa acadêmica.
104
Um dos profissionais de saúde entrevistados tamm identifica esta falta
de articulação entre os órgãos governamentais “[...] tem uma rixa entre
Ministério do Trabalho e Ministério da Saúde, principalmente na questão da
fiscalização. O Ministério do Trabalho não aceita a interferência de fiscais do
Ministério da Saúde, do SUS, nos ambientes e postos de trabalho” (Entrevistado
7). Este mesmo profissional ainda se refere ao INSS “[...] a previdência nunca
foi contra o nosso trabalho, mas a preocupação maior deles era com a
concessão do benefício e a emissão da CAT. Mais era a concessão do
benefício, aí discutiam aquela questão que prevalece até hoje, que é melhor
conceder benefício por auxilio doença do que por auxílio doença do trabalho ou
acidente de trabalho” (Entrevistado 7). Este registro sobre o INSS é um
indicativo de o quanto este órgão público privilegia a classe empresarial já que
adota uma postura que dificulta a notificação de acidentes de trabalho e impede
o trabalhador de acessar seus direitos.
Silva, Barreto Jr. e Sant’Ana (2003) fazem algumas considerações sobre
os diversos órgãos públicos presentes na Saúde do Trabalhador e citam a
Constituição de 1988 como referência para direcionar a atuação destes. As
responsabilidades pela atenção a Saúde do Trabalhador devem ser
compartilhadas de forma diferenciada por empregadores, trabalhadores (através
de suas representações) e Estado (no seu papel de mediador e condensador
das forças sociais). Na esfera do Estado atuam nessa questão os Ministérios do
Trabalho, da Previdência Social, da Saúde e do Meio Ambiente, a Justiça do
Trabalho e a Promotoria Pública, e, com o objetivo de obter a integração entre
todos eles existe o Grupo Executivo Interinstitucional de Saúde do Trabalhador
– GEISAT – constituído por representantes dos Ministérios envolvidos com a
questão, procurando articular e racionalizar a atuação dos diferentes setores
governamentais, evitando a duplicação de ações e o desperdício de recursos,
além de compatibilizar e integrar as políticas e práticas de intervenção
desenvolvidas pelo Estado.
Quanto à questão do INSS tamm citada pelos entrevistados podemos
citar:
O INSS, por intermédio dos médicos peritos, tem a
incumbência de dizer se há incapacidade, qual o tamanho dela
105
e, principalmente, se é ocupacional ou não, mediante a relação
que a Previdência Social estabelece, numa visão individualista,
entre o diagnóstico e a ocupação; entre o acidente e a lesão;
entre acidente e causa mortis do trabalhador (OLIVEIRA, 2005,
p.111).
O autor destaca ainda que o Sistema Previdenciário é movido a CAT
(Comunicação de Acidente de Trabalho) e que esta, por razões políticas,
econômicas, jurídicas e sociais é sonegada escancaradamente. Destacam-se
os seguintes aspectos: Empresas não querem que o trabalhador acesse ao
direito da estabilidade (1 ano após a data de retorno) e nem efetuar a
contribuição do FGTS no período do afastamento; as empresas não querem
reconhecer a presença de agente nocivo causador da doença do trabalho ou
profissional para não custear aposentadorias especiais; a CAT é ato médico –
o INSS não aceita CAT sem a seção do atestado médico; o INSS condiciona a
concessão do benefício acidentário a apresentação da CAT; entre outros.
Podemos perceber o quanto o INSS penaliza o trabalhador, valoriza a
emissão da CAT que muitas vezes é negada pela empresa (pelas várias razões
apontadas acima), além de estar submetida a um diagnóstico estritamente
médico. Privilegia o afastamento por auxilio doença no qual o aspecto trabalho é
totalmente desconsiderado e desta forma o trabalhador é prejudicado por perder
a estabilidade, o depósito do FGTS e fica praticamente impossibilitado de
buscar seus direitos juridicamente.
Ainda com relação à ação das esferas governamentais e a classe
empresarial cabe citar:
Seria demasiada ingenuidade política a simultaneidade da
desobediência do Estado e do empresariado para com os
direitos sociais constitucionalizados, como mera coincidência,
quando é sinal de convergência de interesses dos grupos
econômicos e políticos que empolgam os Poderes da
República. Perderam um pouco o pé com a implantão do
Estado de Direito, consolidada com a Constituição de 88, mas
recuperaram as forças na década de 90 (RIBEIRO, 2004, p 3).
Podemos concluir que o Estado tem descumprido com a própria
legislação, bem como o setor empresarial e atribui este fato ao atual momento
histórico, de fragilização dos sindicatos e trabalhadores, e o fortalecimento do
mercado financeiro que ocorreu a partir da década de 90. O que pode ser
106
comprovado, segundo este autor, pelas ações coletivas, públicas e de
inconstitucionalidade que se multiplicam no Judiciário, especialmente em áreas
como a Previdência Social e a Saúde.
Esta compreensão de Ribeiro (2004) mostra o quanto o poder
econômico, aliado aos interesses políticos, subvertem a própria Constituição e
então podemos lembrar a citação de Minayo-Gomez e Thedim-Costa, (1999)
que comparam o momento atual com as condições existentes antes da
instituição do Estado de Direito, na primeira metade do século XIX, ocasionado
pela precarização do trabalho e do não trabalho o que faz surgir uma enorme
massa de desempregados excluídos dos direitos humanos e sociais e pelos
quais ninguém, nem mesmo o Estado, parece ser responsável.
Apesar da dificuldade de se articular estes diferentes órgãos
governamentais constatou-se, através das entrevistas um interessante processo
onde uma parte das pessoas interessadas na estruturação da Saúde do
Trabalhador em Blumenau organizou encontros entre os diversos atores sociais
que tinham ligação com a área, denominado de Fórum de Saúde do
Trabalhador, que ocorreu nos primeiros dois anos após a formação do
CEREST, com o objetivo de promover a intersetorialidade e desta forma dar
resolutividade as questões de Saúde do Trabalhador. E, por incrível que parece
num primeiro momento, é a Secretaria de Saúde que tem uma participação um
tanto questionável conforme será possível perceber com os relatos dos
entrevistados.
Um dos entrevistados explica o que era este Fórum: “[...] um Fórum
envolvendo as entidades que eram: o Ministério Público, o INSS, Sindicatos e
hospitais que atendiam acidentes de trabalho. [...] Era um espaço para a
discussão de assuntos relacionados à Saúde do Trabalhador. Sempre era feito
e havia a participação de todos, o único empecilho, que acabou ocasionando o
fim do Fórum é que a Secretaria de Saúde mandava um representante que não
era uma pessoa que tinha conhecimento em Saúde do Trabalhador, que dava
muita “bola fora”, vamos dizer assim, ai as outras entidades, principalmente
Ministério do Trabalho e INSS e até mesmo os sindicatos começaram a cobrar a
participação, nestas reuniões, do secretario municipal de saúde. Ele não vinha e
delegava sempre alguém que não era do CEREST, era alguém da
administração da secretaria de saúde, um assessor do secretário, inclusive em
107
duas ou três vezes o CEREST estava conseguindo passos importantes para
gerenciar a Saúde do Trabalhador em nossa cidade, quando estava se
fechando, principalmente a questão do atendimento com os hospitais este
representante abria a boca e tudo ia por água abaixo. Aí começaram a solicitar
a presença do secretário, o secretário não ia, dizia que tinha outros
compromissos, entre aspas, só que as reuniões do Fórum eram sempre
agendadas de um mês para o outro, então começou a desestimular outros
profissionais [...] Então acabaram as reuniões mensais. Estas reuniões duraram
mais ou menos um ano, um ano e pouco, isto em 97, já era o CEREST. [...]
como não se trazia soluções, terminava-se uma reunião com alguns
encaminhamentos para a próxima reunião, chegava na próxima reunião não se
tinha às definições, ou tinha questões que envolviam o gestor de saúde, então
acabaram as reuniões.” (Entrevistado 7).
Este afastamento da Secretaria Municipal de Saúde gerou o término de
uma importante tentativa de articulação entre os diversos órgãos e segmentos
na Saúde do Trabalhador. Isto pode levar ao questionamento de qual a real
intenção ao se estruturar uma política pública na área da Saúde do Trabalhador.
No início da questão já foi analisada a influencia dos partidos de
esquerda, em grande parte aliados ao movimento sindical e que exerceram
pressão sobre o poder público para a criação do Programa de Saúde do
Trabalhador. Posteriormente um destes partidos de esquerda assume o
governo municipal e então o primeiro serviço a ser inaugurado na área da saúde
é o CEREST. E quem assume a Secretaria Municipal de Saúde é o profissional
que acompanhou o processo de discussão da Saúde do Trabalhador no
município, elaborou o primeiro projeto para a viabilização do mesmo e
posteriormente foi o primeiro colocado no concurso público realizado para
compor esta unidade de saúde. Mesmo assim, a participação no Fórum de
Saúde do Trabalhador foi relegada a um segundo plano.
Parece que houve muito mais uma motivação política do que realmente
uma vontade de reduzir os acidentes de trabalho no município e intervir junto
aos empresários para modificações importantes no processo de trabalho. Um
dos trechos que pode ser indicativo desta motivação política é: “[...] em 97
definiu-se que 1º de maio era uma data importante para a criação do CEREST,
que era o dia do trabalhador, então tinha que inaugurar o CEREST nesta data.
108
Então se reuniu um pouco antes os integrantes do Programa de Saúde do
Trabalhador, que funcionava no Ambulatório da FURB, que o mesmo teria sede
própria e que iria sair do ambulatório da FURB”. Uma atuação deste tipo por
parte de um órgão público pode sugerir um desinteresse da esfera
governamental pela população referido nas obras de Ribeiro (2004) e Minayo-
Gomez e Thedim-Costa, (1999), citadas nesta questão e que explicitaram o
interesse da esfera governamental em privilegiar o poder econômico.
Outra possível explicação para tamanho afastamento pode ser a questão
da posição que o partido assume. Quando iniciaram as discussões acerca da
Saúde do Trabalhador o Partido dos Trabalhadores era oposição e tinha um
objetivo claro que era o de acessar ao poder e para isto seria importante contar
com o apoio (e os votos) de grande parte da população trabalhadora.
Posteriormente, ao assumir o poder, deixa de ser oposição e então,
provavelmente, em nome da governabilidade, não tem mais interesse em se
confrontar com a classe empresarial. Um depoimento que dá um indicativo
neste sentido vem do representante da gestão: “Décio veio do meio sindical,
contou muito com o apoio deles para se eleger. Porém os sindicatos perderam
força e o Décio tamm se afastou do movimento sindical, acho que foi o
grande erro do PT em Blumenau” (Entrevistado 8).
Na seqüência será citado um trecho de uma entrevista que vem de
encontro a esta questão da governabilidade de um partido de oposição quando
assume o poder: “[...] você sabe que queira ou não, a pessoa que foi eleita, o
prefeito Décio Lima, tinha uma visão muito de poder e deixou-se levar por ele.
Entre perder o poder ou agradar os poderosos, ele preferiu agradar aos
poderosos. E daí, na estrutura do CEREST, que é uma estrutura mais de
esquerda, dos movimentos sindicais que atinge justamente aquilo que a direita
não quer, que é defender os trabalhadores dos empregadores que estão
mutilando os trabalhadores dentro das empresas [...] Daí começa o conflito de
idéias entre o movimento sindical e da própria executiva da prefeitura, que nem
todos eram do partido dos trabalhadores, alguns tinham uma aliança e aí houve
uma guerra e pessoas do partido que foram para o governo acabaram
esquecendo das suas raízes, um pouco dos seus objetivos e dando prioridade a
questões relativas a outras prioridades e o CEREST ficou um pouco para trás”
(Entrevistado 3).
109
Analisando-se a estrutura política do país após a Constituição de 88
constata-se que não importa qual partido assuma o poder, este mantém a
política econômica para não mexer nos interesses do capital.
Pode parecer estranho, mas não é, porque os partidos políticos
da situação e da oposição, que têm se alternado no poder, são
extremamente parecidos no que diz respeito à condução da
política econômica, essencialmente conservadora e voltada aos
interesses do capital financeiro e especulativo (RIBEIRO, 2004,
p. 3).
O autor tamm analisa o SUS dentro desta política de Estado,
apontando a incoerência que ocorre porque os governos elogiam e se propõem
a expandir o SUS através de projetos como o PSF e o SAMU, porém submetem
o mesmo a asfixia financeira a mais de uma década. Quanto à saúde do
trabalhador também se verifica uma grande incoerência, pois ao mesmo tempo
em que as esferas governamentais realizam-se conferências sobre o tema,
praticam a precarização do trabalho que atinge de 30 a 50% de sua força de
trabalho. Os dados financeiros do SUS também são ilustrativos da real política
de saúde adotada e que interferem na quantidade e qualidade dos serviços
prestados. Assim, às camadas mais pobres da população são destinados 35
bilhões de reais para atender os 150 milhões de brasileiros, enquanto o dobro
deste dinheiro é gasto com serviços privados de saúde destinados aos 45
milhões de brasileiros de maior renda.
Podemos concluir nesta questão que os principais fatores e atores
sociais envolvidos na Saúde do Trabalhador ocorreram em função de interesses
outros que não a Saúde do Trabalhador propriamente dita. Ou seja,
mobilizaram-se para garantir um poder governamental e de legitimação da
organização sindical. Os segmentos mais diretamente relacionados à questão
do capital mantiveram-se afastados, entre eles a classe empresarial e os órgãos
governamentais, entre estes últimos sendo citados vários exemplos de como
atuam no sentido da preservação do capital fator que será abordado no tópico
de análise de entrevistas que se refere à Política de Saúde do Trabalhador.
4.2 Principais Ações Desenvolvidas pelo CEREST
110
Este segundo bloco tem como objetivo identificar as ações que se
esperava que fossem realizadas e aquelas que efetivamente foram pelo
CEREST. Antes de iniciarmos a análise das Entrevistas apresentaremos uma
breve explanação sobre as formas de organização da atenção a Saúde dos
Trabalhadores e as principais ações de responsabilidade nesta área. A
apresentação será sucinta porque já foi realizada na fundamentação teórica dos
catulos iniciais.
As ações em Saúde do Trabalhador podem ser realizadas na rede básica
de saúde ou em serviços de referência, como é o caso de Blumenau. Para
Ribeiro (2004) o atendimento ao trabalhador deve ser nas unidades básicas de
saúde e não em centros de referência. A Política de Saúde do Trabalhador deve
ser gerida pelos próprios trabalhadores e não por estes centros. Quanto aos
profissionais de saúde do SUS, ao atender o trabalhador deverão simplesmente
fazer a pergunta já sugerida por Ramazzini em 1700 “Que arte exerce?”
Na seqüência podemos citar uma posição de defesa da organização dos
serviços em Saúde do Trabalhador em nível de especialidades.
Apesar das críticas dirigidas à atenção diferenciada e
especializada, considerada verticalizada e de alcance restrito
enquanto estratégia de atuação em saúde pública, a
implementação dos Programas de Saúde do Trabalhador e dos
Centros de Referência tem facilitado o desenvolvimento de
ações que compõem a prescrão legal de competência do
SUS e que contribuem com a transformação das condições
adoecedoras existentes no processo de trabalho.
(SILVA;
BARRETO JR.; SANTA’ANA ,2003, p.53).
Podemos concluir que o ideal seria a posição de Ribeiro, ou seja, que
todos os profissionais de saúde, nos diferentes níveis de atenção, tivessem a
compreensão da importância do trabalho para o desencadeamento de diversas
patologias. Chegar a este nível de desenvolvimento em termos de saúde do
trabalhador tornaria muito mais fácil atender aos princípios do SUS. Porém não
é esta a realidade nacional, e, desta forma, a existência dos Centros de
Referência pode ser essencial para que as ações em Saúde do Trabalhador se
efetivem.
Estes Centros de Referência devem de forma geral atuar em duas
grandes áreas. A assistencial, que é onde ocorre o atendimento e o tratamento
ao trabalhador acidentado ou portador de doença ocupacional e a área de
111
Vigilância e Fiscalização onde ocorre o processo de fiscalização junto às
empresas com o objetivo de avaliar o processo e o ambiente de trabalho,
visando reduzir os riscos de acidentes de trabalho. Pinheiro, Ribeiro e Machado
(2005), referem que estas duas áreas da Saúde do Trabalhador estão presentes
desde o início nos serviços desta área, e que as discussões sempre giraram em
torno da necessidade de que o cerne das ações deveriam ser o enfrentamento
dos determinantes e condicionantes da saúde (causas), sem perder ou
negligenciar a responsabilidade pela assistência (efeitos). Ou seja, as propostas
em Saúde do Trabalhador sempre visaram uma atuação integral do trabalhador,
com ações de prevenção e tamm de recuperação.
Agora que já citamos os parâmetros básicos que devem estruturar uma
unidade de Saúde do Trabalhador relacionaremos as ações, que segundo os
entrevistados eram de responsabilidade do CEREST, por ocasião de sua
criação e se estas foram alcançadas.
O cenário que compunha o período da criação do CEREST era
aparentemente bastante favorável entre eles o partido de esquerda que
participou ativamente das discussões e exerceu pressão para que a área de
saúde do trabalhador se tornasse uma realidade no município, assumiu a
gestão municipal. Edson Adriano, primeiro médico do trabalho do Programa de
Saúde do Trabalhador assume a gestão da Secretaria Municipal de Saúde. O
movimento sindical estava composto por pessoas atuantes e possuía uma certa
consonância com o Partido dos Trabalhadores. Este conjunto de fatores gerou
“A expectativa era muito grande, mesmo sendo criado da noite para o dia
porque tinha a vontade de alguns segmentos do controle social [...] A
expectativa que nós profissionais do CEREST, principalmente da enfermagem
era de que era um governo popular e que nós tínhamos um secretario de saúde
que era médico do trabalho, então a expectativa era a maior possível”
(Entrevistado 7).
Dentro deste contexto, aparentemente tão favorável, surge por parte dos
atores sociais entrevistados a expectativa de que o CEREST desenvolvesse
ações amplas e que viessem a atender tanto a área de Assistência, quanto à de
Prevenção e Promoção à saúde.
Uma das expectativas apresentada é a de que o Estado assumisse a
função de realizar os exames admissionais, periódicos e demissionais. Esta
112
expectativa foi apresentada por um dos representantes do controle social. “A
minha expectativa maior era que nós tivéssemos um Centro de Referência onde
nós pudéssemos cuidar mesmo do trabalhador, desde sua admissão, fazer
exames periódicos, avaliando riscos no demissional [...] esta parte dos exames
periódicos e admissionais é mais ou menos como uma criança que têm todas as
suas vacinas, e tal, para saber tudo o que ela tem” (Entrevistado 1).
Segundo a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) é de
responsabilidade do empregador a realização dos exames admissionais,
periódicos e demissionais, expresso no capítulo das Medidas Preventivas de
Medicina do Trabalho, no art. 168 que diz: Será obrigatório exame médico, por
conta do empregador, nas condições estabelecidas neste Art. e nas instruções
complementares a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho:
I - na admissão;
II - na demissão;
III – periodicamente.
Com base no exposto concluímos que os exames dos trabalhadores são
de responsabilidade da empresa, conforme a legislação trabalhista vigente.
Infelizmente esta área esta cercada de dificuldades conforme apontam Maeno e
Carmo (2005) e Oliveira (2005), citados nos capítulos iniciais, que ressaltam a
criação na legislação de Programas que tem como objetivo reduzir o número de
acidentes de trabalho (PPRA - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais e
PCMSO - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional), porém os
autores destacam que com freqüência ocorre simplesmente o cumprimento
cartorário das normas trabalhistas, atendendo aos interesses do cliente (o
empregador). Desta forma mais uma vez podemos perceber que o fato de haver
uma legislação não impede que se encontrem alternativas para burlar a mesma.
Concordo com a posição do entrevistado de que há uma incoerência ao delegar
as empresas à realização dos exames dos seus trabalhadores. Elas são as
maiores interessadas de que o número de acidentes de trabalho e o
desenvolvimento de doenças ocupacionais em seu ambiente de trabalho não
seja notificado, portanto agirá de forma a que este adoecimento não seja
113
perceptível, nem para o trabalhador (que passará a ter alguns direitos como a
estabilidade, o depósito do fundo de garantia durante o período de afastamento,
além de que teria provas para uma possível ação trabalhista), nem para os
órgãos fiscalizatórios que poderiam deflagrar um processo de vigilância na
empresa.
De qualquer forma o exemplo citado pelo entrevistado de comparar a
Atenção a Saúde Infantil e a Saúde do Trabalhador é ótimo para esclarecer a
questão dos diversos interesses políticos que circundam a Saúde do
Trabalhador. Se tomarmos a atenção infantil, qual é o gestor que não deseja
reduzir a mortalidade infantil? Aumentar a cobertura vacinal? Reduzir a
quantidade de cáries de suas crianças e adolescentes? Usando a nossa
criatividade poderemos até imaginar as belíssimas fotos e imagens que sempre
se fazem presentes nas campanhas publicirias as vésperas das eleições,
acrescidas de algum índice obtido pelas ações direcionadas a atenção materno-
infantil. Agora tomando a Saúde do Trabalhador, qual é o gestor que quer
mostrar que em seu município os casos de câncer ocupacional não têm sido
reduzidos e que na maioria das vezes não são nem ao menos diagnosticados, e
se incentivar o diagnóstico ao invés de reduzir o índice irá aumentá-lo porque
reduzirá a subnotificação, e o tratamento terá um custo bastante elevado com
resultados nem sempre positivos? Que as doenças ocupacionais continuam se
alastrado porque a pressão das empresas por maior produtividade não diminui?
Que as amputações continuam ocorrendo porque muitas empresas utilizam
equipamentos obsoletos e a fiscalização não é suficiente para parar ou ao
menos reduzir significativamente este processo de mutilação,... Apontando
índices deste tipo um gestor terá, para atuar preventivamente, que intervir nas
empresas; e por outro lado, qual é o candidato que não tem em entre seus
compromissos de campanha a garantia de aumentar o emprego? E quem
fornece empregos se não os empresários? Além é óbvio de que movimentam o
mercado produtivo e financeiro.
Quem esclarece esta questão do emprego na sociedade atual é Forrester
(1997) apud Minayo-Gomez e Thedim-Costa, 1999, este autor condena a
hipocrisia de políticos e governantes ao prometerem reiteradamente a
superação da crise e a ampliação do mercado de trabalho. Considera falacioso
querer impor a inserção social através do vínculo com o mundo do trabalho
114
quando, na prática, ela é negada porque deixou de existir. Estes autores citam
alguns dados que ilustram que a cidadania através do trabalho formal deixou de
existir, baseando-se na OIT. Segundo este órgão, na América Latina, o setor
informal situa-se entre 40% e 70% do mercado de trabalho, com uma taxa de
crescimento anual superior a 4%. No Brasil, em apenas uma década, a
ocupação predominante alterou-se de formal para informal, atingindo no final de
1998 a proporção alarmante de 55% da força de trabalho metropolitana. A
perda de um posto de trabalho no setor formal determinou uma queda no
rendimento médio do trabalhador entre 30% a 40%.
Podemos concluir que a expectativa do entrevistado é extremamente
adequada, porém o Estado na atual conjuntura não tem valorizado os direitos
duramente conquistados pela população e expressos na Constituição de 1988.
A priorização da esfera econômica por parte dos políticos tem dificultado a
adoção de práticas que venham a favor do trabalhador.
Na seqüência temos outro dos representantes do controle social que
sintetiza em sua fala as diversidade e amplitude das ações que se esperava
fossem executadas pelo CEREST. “A expectativa era de que todo trabalhador
que passasse por uma situação de acidente de trabalho ou doença do trabalho
tivesse um órgão que o atendesse e também que denunciasse as empresas e
fizesse com que estas empresas mudassem os setores onde estão mutilando
os trabalhadores e desta forma liquidando com isto, resolvendo isto. Nós
sabemos que existem empresas em que não adianta só o CEREST encaminhar
a CAT, mandar para o INSS e afastar a pessoa, porque outros que vão
substituir aquele trabalhador, vão continuar adoecendo [...] Algo tem que ser
feito, mudar o número de horas de trabalho, ou acabar com o setor ou alterar o
número de acidentes. Para isto o CEREST deverá demandar profissionais para
fazer pesquisas, e resolver os problemas gerados ao trabalhador. Apenas
afastá-lo e encaminhá-lo ao INSS, isto não resolve. É necessário prevenir e não
remediar” (Entrevistado 3).
Outro representante do controle social acrescenta a necessidade de
elaborar de um perfil epidemiológico para direcionar as ações do Centro de
Referência. “A maior expectativa nossa é que poderia haver assim um centro de
pesquisa, formando assim, como se fosse um perfil epidemiológico dos
trabalhadores” (Entrevistado 2).
115
Com base nos relatos apresentados podemos perceber que a grande
maioria deles aponta no sentido do desenvolvimento de ações adequadamente
planejadas e que incluam a prevenção e a promoção a saúde dos
trabalhadores, vindo de encontro ao estabelecido na legislação do SUS.
Apesar da expectativa ser de uma atuação integral na área da saúde do
trabalhador foi a área de Assistência que obteve um maior avanço e impacto.
Isto pode ser identificado nas entrevistas de alguns representantes do controle
social, citadas na seqüência:
“ A mudança principal foi ter um espaço de referência para o atendimento dos
trabalhadores acidentados, (...) onde ele busca as informações, orientações, e a
recuperação. Então este espaço para os trabalhadores foi um avanço ...”
Entrevistado 4.
“... o assistencial faz parte do CEREST. As próprias empresas passam a
reconhecer que o serviço é de qualidade. Os médicos das empresas passam a
reconhecer que com o CEREST a empresa tinha um ganho. A pessoa se
tratando no CEREST é bem cuidada. Nisso aí, no restante é resto.” Entrevistado
1.
“ a principal mudança é o trabalhador ter um ponto de referência, chegando lá
vocês encaminham para onde precisa, para INSS, para sindicato, ... E tamm
quando precisa de buscar junto a empresa, a fiscalização, para ver o que o
trabalhador tem. Porque antes nunca tinha doenças do trabalho, foi a partir do
CEREST que começou a aparecer as CATs e o INSS a aceitar. Antes do
CEREST por mais que se dizia que era doença ocupacional não tinha o nexo e
quando ia para o INSS este descaracterizava e ficava por isto mesmo. Agora há
um acompanhamento do CEREST que diz que o nexo é positivo e o INSS
dando nexo negativo, juridicamente vai para uma ação contra a empresa onde o
empregado que foi demitido consegue provar que sua doença é do trabalho e
daí dá para cobrar a responsabilidade da empresa, a indenização. Existem
vários e vários casos que a gente conseguiu cobrar até valores altos por causa
do relatório do CEREST dando nexo positivo.”Entrevistado 2.
A fala de um dos profissionais de saúde também aponta vários aspectos
116
que sofreram mudanças positivas após a implantação do CEREST, “... de forma
geral a saúde do trabalhador, para Blumenau, depois da criação do CEREST,
centralizou, consegue-se ver o número de Acidentes de Trabalho que
acontecem, de um jeito ou de outro, os Acidentes de Trabalho graves, estão
sendo vistos. Por exemplo, uma amputação todo mundo escondia, uma morte
todo mundo escondia, entre aspas eu digo que todo mundo escondia... A
subnotificação era ainda maior, acontece ainda, mas diminuiu bastante. Com as
visitas, com as fiscalizações e vigilâncias da equipe na empresa as empresas
estão mais conscientes. Este contato do CEREST com as empresas é muito
importante. E o próprio assistencial o trabalhador foi lá, vai no Pronto Socorro,
ele tem um atendimento melhor porque se ele ficasse lá do jeito que ele estava
nos anos 80, o acompanhamento, a infecção, a medicação, este
acompanhamento do tratamento está bem diferenciado. Então a gente sabe
como está, se ele está fazendo direito, não está, então este lado beneficiou
bastante o trabalhador acidentado. Ele tem para onde ir, ele não fica perdido
pelo município: Onde que eu vou fazer o curativo agora? Em termos
epidemiológicos, as vacinas – a vacina contra o tétano, as orientações sobre
enfermagem que são feitas, teve um avanço considerável.” Entrevistado 6.
Analisando as expectativas e as mudanças da Assistência que ocorreram
após a implantação do Programa de Saúde do Trabalhador e posteriormente do
CEREST, podemos dizer que estas mudanças podem ser resumidas em: ter um
local específico para a assistência e a continuidade do atendimento;
estabelecimento de nexo causal para as doenças ocupacionais onde já é
necessária uma compreensão mais geral sobre o processo de trabalho e o
adoecimento do trabalhador; e a redução da subnotificação.
Uma das mudanças mais substanciais, portanto, foi quanto ao
estabelecimento de nexo causal para as doenças ocupacionais, este processo
baseando nos na teoria apresentada nos capítulos iniciais, podemos tecer
algumas considerações com relação à causalidade das doenças, conceito
fundamental quando se trata de doenças ocupacionais ou relacionadas ao
trabalho. Este conceito foi abordado por Facchini (1994) que faz um paralelo
entre a causalidade e a concepção de saúde/doença que se adota e os reflexos
que isto trás para a saúde do trabalhador. O autor faz uma distinção entre o
117
modelo unicausal - que é baseado na concepção de saúde/doença da metade
do século XIX, na teoria da microbiologia, de Pasteur, esta ainda exerce uma
grande influencia na medicina atual. Posteriormente o autor identifica o modelo
Multicausal que ocorre quando são considerados vários fatores no
desencadeamento de doenças. Este segundo modelo traz um avanço com
relação ao primeiro, mas se forem considerados somente os aspectos mais
próximos, numa visão reducionista também será prejudicial ao trabalhador.
Também transfere para ele a responsabilidade pelo adoecimento ou ignora
outros aspectos importantes para o adoecimento deste que não os mais
aparentes. É necessário considerar também aspectos da classe social, da
atividade profissional, psicossociais, entre outros para um diagnóstico
adequado. O autor cita como exemplo as cardiopatias que se forem analisadas
numa visão reducionista serão levados em conta fatores como dieta e fumo.
Nesta perspectiva o desenvolvimento da patologia será de total
responsabilidade do trabalhador pelos hábitos que adota em sua vida. Porém se
conjuntamente a estes fatores forem considerados a atividade profissional, a
classe social e os fatores psicossociais a compreensão poderá ser totalmente
diferente. Destaca-se ainda a importância da Epidemiologia, que com o avanço
da tecnologia, pode permitir cruzar vários dados para um completo diagnóstico,
aliado a fatores sociais.
A Assistência, como já foi citado no item anterior, evidencia menos
conflitos, e inclusive serve aos interesses dos empresários porque proporciona
agilidade no atendimento do trabalhador acidentado, ocorre um controle da
quantidade de dias de afastamento, enfim, de forma geral faz com que o
trabalhador retorne num menor espaço de tempo ao trabalho e recuperado de
seu acidente. Desta forma é uma área mais fácil de ser colocada em prática.
O processo de Vigilância e Fiscalização questiona a organização e os
processos de trabalho das empresas, avalia se a empresa legalmente cumpre
suas responsabilidades quanto à saúde do trabalhador, e no caso de
descumprimento podem autuar a empresa ou mesmo interditar determinadas
áreas de uma empresa ou toda ela. Portanto uma diferença bastante drástica o
que faz com que esta segunda área seja mais difícil de ser implementada, o que
pode ser confirmado pela citação a seguir:
A vigilância é compreendida como uma prática política de
118
saúde, complexa, ampla, permeada por interesses conflitivos,
inserida visceralmente na sociedade, uma ptica de
empoderamento dos trabalhadores na luta pela preservação de
sua saúde e não meramente como uma prática neutra,
padronizada e estritamente técnica. (PINHEIRO; RIBEIRO;
MACHADO, 2005, p. 169).
Uma das entrevistas que aponta no sentido de o quanto é difícil à
atuação na Vigilância e Fiscalização, inclusive porque nesta área é necessário
que se amplie a intersetorialidade, é a do representante da gestão “A
intersetorialidade sempre foi muito difícil, principalmente com o INSS, o diálogo
era muito complicado. O CEREST também não surgiu para atender aos
interesses dos empresários, mas sim dos trabalhadores [...] A Fiscalização do
CEREST era insipiente, foi tentada uma parceria com a DRT (Delegacia
Regional do Trabalho) o que também não trouxe resultados” (Entrevistado 8).
Outra dificuldade para a execução das ações em Vigilância e
Fiscalização é apontada na próxima entrevista. “A expectativa é que ele (o
CEREST) funcionasse muito bem nas fiscalizações. As fiscalizações no inicio
não tinha fiscais, não tinha estrutura, não tinha como ir. A equipe entrava um,
saía outro, entrava um, saía outro,... nunca tivemos uma equipe bem afinada,
bem estruturada como equipe e visando um objetivo único.” Entrevistado 6.
Temos ainda a entrevista de um dos representantes do controle social,
que enfoca a questão governamental, abordando inclusive a economia que
ocorreria na área da saúde com um trabalho mais direcionado para a área
preventiva. “Cabendo a Secretaria de Saúde a responsabilidade total pela
saúde dos indivíduos teria que se preocupar mais com a prevenção e não só
com a recuperação porque o preço da recuperação é dez, trinta ou cinqüenta
vezes, ou até sem previsão do custo da recuperação com relação ao
investimento da prevenção. O que está acontecendo pouco é a prevenção (...)
deveria ter oito ou dez pessoas capacitadas, com poder coercitivo de visitar os
locais de trabalho e verificar se as legislações municipais, estaduais ou federais
estejam sendo cumpridas no que diz respeito à segurança e a medicina do
trabalho. Acho que o município daria um grande salto de qualidade se investisse
na prevenção o que não me parece que é preocupação do poder político em
relação a prevenção de acidentes. (...) Só querem tratar, o que é importante ,
mas prevenir é muito mais.” Entrevistado 4.
119
As entrevistas citadas até o momento identificam uma série de
dificuldades que colaboram para que as ações de Vigilância tenham maior
dificuldade de serem viabilizadas, entre as apontadas: a difícil atuação
intersetorial, equipe insuficiente e com alta rotatividade, além da pouca
efetividade por parte da política governamental para a priorização das ações de
prevenção na Saúde dos Trabalhadores. Na teoria podemos novamente
perceber o quanto à realidade municipal se repete a nível nacional e que
algumas dificuldades perduram ao longo da construção da história da Saúde do
Trabalhador.
Alguns conflitos são marcos desde os anos iniciais e persistem
até o momento: dificuldades legais de acesso e intervenção
nos ambientes de trabalho, atritos intersetoriais, sobretudo com
o Ministério do Trabalho, baixo envolvimento da Previdência
Social, desintegração e desarticulações intra-setoriais na esfera
da saúde, baixa prioridade para a área de Saúde do
Trabalhador no SUS e nos demais setores afins, sistema de
informação parcial e segmentado, resistência do grande
empresariado às ações do SUS, participação dos trabalhadores
assistemática e mais restrita ao setor formal e urbano, número
restrito e insuficiente de profissionais de saúde lotado nas
ações de vigilância. Tudo isto num macro cenário globalizado,
neoliberal, de desemprego estrutural, de baixos salários, de
flexibilização e precarização no trabalho além de limitações e
fragilidades no interior dos movimentos associativos e sindicais
dos trabalhadores (PINHEIRO, RIBEIRO; MACHADO, 2005, p.
170).
Uma das entrevistas citadas referiu-se a economia que poderia ser feita
na área da saúde se as ações de caráter preventivo fossem mais intensamente
implementadas, afinal a não adoção destas práticas vai contra a própria
legislação do SUS, que tem como um de seus princípios básicos a atuação na
área preventiva. Esta atuação na área preventiva tanto reduz custos do ponto
de vista financeiro quanto melhora a qualidade de vida da população ao intervir
antes que a doença ou o acidente ocorra. Observa-se aqui mais uma vez a
diversidade de fatores, principalmente políticos e econômicos que cerceiam a
área de Saúde do Trabalhador, fazendo com que as ações governamentais
quanto a esta área se tornem incompreensíveis, se não houver um olhar que
englobe os fatores políticos e econômicos. Esta aparente incoerência dos
órgãos públicos também é citada com relação ao Ministério da Previdência
Social para quem
120
A vigilância poderia ser extremamente útil e essencial no
sentido de cessar e controlar os riscos nos processos de
trabalho. Enquanto órgão da seguridade social é a instância
que paga a conta dos agravos e acidentes decorrentes do
trabalho, portanto deveria ser um dos maiores interessados no
êxito da vigilância (PINHEIRO; RIBEIRO; MACHADO, 2005, p.
170)
Portanto podemos perceber que não existe um interesse real na saúde
dos trabalhadores e nem na economia que poderia ser gerada havendo um
maior controle dos ambientes e dos processos de trabalho. A influência política
e econômica supera o enfoque da saúde e vida dos trabalhadores neste país. A
classe empresarial tamm exerce um poder de pressão externa e assume uma
postura de caráter imperial e confrontadora utilizando o poder econômico que
detém, e, inclusive o papel de financiador do Estado que assumem para se
eximirem da responsabilidade pela justiça social. (PINHEIRO, RIBEIRO e
MACHADO, 2005)
Outro aspecto levantado como dificultador para o processo de Vigilância
e Fiscalização é a questão dos profissionais que atuam na área de Saúde do
Trabalhador, quando estes se deparam com o conflito do público/privado,
principalmente a categoria médica. Uma das entrevistas que ilustra esta
situação é a de um dos sindicalistas que inicialmente chama a atenção para um
retrocesso que houve nesta área (Vigilância e Fiscalização) do período de
criação do Programa de Saúde do Trabalhador e em momentos posteriores. “...
nós tivemos no início, um início maravilhoso. Nós fizemos semanalmente, com
um carro cedido pela Vigilância Sanitária, colocado a disposição pelo Caminha
(secretário de Saúde da época do Programa de Saúde do Trabalhador). Ali ia
um técnico da Vigilância Sanitária, ia mais um médico de Saúde do
Trabalhador, que era o Ernani ou o Edson Adriano, e os sindicalistas. Nós
adentramos nas fábricas e o médico indo lá no departamento médico da
empresa e olhando todos os fichários para ver tudo o que estava acontecendo
dentro daquela empresa e nós olhando todas as dependências da empresa, o
local de trabalho, o refeitório, as condições das máquinas, tudo o que a gente
enquanto sindicalista podia estar observando. Qual máquina que podia estar
prejudicando o trabalhador e assim por diante.” Foi questionado ao entrevistado
o que foi que interrompeu este início tão favorável e obtivemos a seguinte
resposta: “O que vai brecar aí já não é mais governo, o que vai brecar é sempre
121
a consciência de classe. A vontade política de fazer esta política. O Ernani e o
Edson vão montar uma empresa de segurança do trabalho e aí os dois não vão
mais querer fazer visitas nas empresas porque então eles vão esbarrar em
empresas onde eles eram contratados para fazer Saúde do Trabalhador...”
Entrevistado 1.
Outros atores sociais entrevistados tamm indicaram dificuldades com
relação à atuação dos profissionais médicos do CEREST. Podemos citar: “Acho
que alguns profissionais médicos não queriam criar vínculo com a Saúde do
Trabalhador, ele tinha outras perspectivas... (...) tem profissional que, mesmo
fazendo a descrição do cargo conforme solicitado pela secretaria de saúde, ele
foi claro que não faria fiscalização e vigilância. (...) Este profissional ainda cita
em sua entrevista “... o médico do trabalho do CEREST, o que ele faz aqui, é
clínica e não medicina do trabalho. (...) o trabalhador vai para o Pronto Socorro
faz o primeiro atendimento, depois vem ao CEREST . A ortopedia, a ortopedia
nem tem noção do que vem a ser o acidente de trabalho, como é que o
acidentado se acidentou lá naquela máquina. Ele vai fazer a parte curativa, falta
um profissional médico que faça medicina do trabalho, só que não se encontra.
Uma é a questão salarial, e outra é porque não tem interesse aqui... Se
começar a fazer muita Medicina do Trabalho dentro do CEREST vai se
“queimar” lá fora perante as empresas, daí se de repente ele precisar de uma
vaga lá numa empresa ele não vai conseguir.” Entrevistado 7.
Outra entrevista ilustrativa quanto aos profissionais médicos é: “Um dos
fatores que está atravancando a questão do CEREST é a questão dos médicos,
você tem pessoas comprometidas politicamente com o trabalhador, mas você
não tem médicos comprometidos. Muitas vezes os médicos que vão atuar no
CEREST já tem uma linha, já vem de uma formação diferente e aí você acaba
conflitando as idéias, o que o movimento sindical pensa e na idéia do médico
pensa. E, para nós, muitas vezes não esta a contento as decisões do médico.
Ele não atende da maneira que deveria atender, mas ele é um profissional que
foi criado assim, foi educado assim, é um direito dele. Política e informação,
talvez até na faculdade deveria ter para os profissionais médicos uma formação
adequada para este tipo de atendimento. Porque se você pegar um médico que
trabalha numa empresa grande como a CIA Hering e como você quer que ele
vá contra as deliberações da empresa, uma vez que lá provavelmente ele
122
ganha muito mais do que aqui. Então complicam as idéias, se ele está
trabalhando lá ele já deve ter as idéias mais favoráveis a empresa e se ele vem
para o CEREST ele não vai ter uma idéia diferente, ele vai continuar com a
mesma idéia. Aí conflita com o movimento sindical que quer pessoas
comprometidas com a saúde dos trabalhadores.” Entrevistado 3.
A área de Vigilância, conforme foi citado anteriormente, é uma área que
explicita muitos conflitos.
A VISAT (Vigilância em Saúde do Trabalhador), se insere nas
práticas de um Estado que é modificado pela correlação de
forças históricas e sociais. Desta forma, quanto mais a VISAT
avança no sentido de intervir nos ambientes de trabalho mais
conflitos trará a tona. (PINHEIRO, 1996 apud PINHEIRO,
RIBEIRO e MACHADO, 2005 p.169).
Obviamente que estes conflitos tamm afetam aos profissionais que
atuam na Saúde do Trabalhador. Maeno e Carmo (2005) tamm se referem à
atuação dos profissionais médicos e citaram como sendo um dos fatores que
dificultam a realização de ações de prevenção no ambiente laboral os valores
relacionados à origem de classe e à formação acadêmica conservadora da
maioria dos médicos. Este aspecto foi citado por um dos entrevistados.
Quanto ao conflito destes profissionais e a sua relação com as
instituições privadas podemos fazer uma correlação com a questão do capital.
Dentro de uma sociedade capitalista praticamente tudo está submetido à lógica
do capital (MÉDA, 1999) O trabalho configurando-se como objeto de troca faz
com que seja negociado como um produto, sendo vendido a quem paga mais
ou oferece melhores condições. Evidencia-se esta mercantilização do valor de
troca principalmente na categoria médica.
No sentido de apontar possibilidades para esta importante área da Saúde
do Trabalhador, a Vigilância, podemos citar uma experiência desenvolvida pela
Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, descrita por Vasconcellos e
Ribeiro (1997).
Estes autores evidenciam a necessidade de superar as Vigilâncias
tradicionais e pontuais e desenvolver ações que incluem uma ação
transdisciplinar, com a participação de diversos atores sociais. A atuação
transdisciplinar supera uma ação onde cada um faz a sua parte. O que cria a
possibilidade de uma atuação diferenciada para a saúde do trabalhador é a
123
Constituição de 1988 a partir do conceito ampliado de saúde e do movimento da
Reforma Sanitária, com uma visão holística para a área, sendo responsável
pela assistência, pesquisa, sistematização das informações e intervenção nos
fatores de risco.
Essa experiência é denominada como “Intervenções Éticas de Impacto”,
através desta estratégia são identificados locais ou áreas específicas de
atuação já que não é possível abranger a todas as demandas por Vigilância e
Fiscalização em saúde do trabalhador. Nestes locais serão realizadas as
fiscalizações e são chamados a integrar a ação diversos atores sociais o que
garante transparência ao processo, agilidade e resolutividade.
Os atores sociais envolvidos são: Secretarias Estaduais e Municipais,
Universidades, Poder Legislativo, Poder Judiciário, Imprensa, movimentos
sociais e sindicais.
A proposta do trabalho pode ser sintetizada:
Conjugando-se os setores progressistas e não corrompíveis no
âmbito do Estado, com setores combativos da sociedade civil
organizada, no esforço comum da intervenção, é possível forjar
uma aliança de contraposição do poder mobilizante do Estado
“não ético”, em conluio com os setores produtivos predatórios.
O impacto é dado na medida da eleição do aonde intervir de
forma a servir como medida exemplar. (VASCONCELLOS,
1994, apud VASCONCELLOS; RIBEIRO, 1997, p.5).
As intervenções em vigilância são definidas a partir de:
Solicitação Sindical – neste modo o sindicato encaminha uma
situação problema, e na medida do possível as ações desencadeadas
são estendidas as empresas vinculadas a entidade sindical
desencadeante da ação inicial.
Ramo Produtivo – a atuação tamm é feita conjuntamente com o
sindicato de trabalhadores e abrangendo a todas as empresas com o
mesmo perfil de produção.
Evento sentinela – a ação de Vigilância e Fiscalização é
desencadeada pelos casos que chegam a Vigilância, existe a
preocupação de aprofundar a investigação para identificar outros
casos semelhantes.
Microrregional – baseia-se num espaço geográfico politicamente
124
constituído, onde são feitas as identificações das situações de risco
para os trabalhadores. A partir deste mapeamento ocorre o
planejamento da intervenção em parceria com os serviços de saúde
da região.
Apresentar uma síntese da experiência do Rio de Janeiro teve o intuito
de identificar algumas estratégias para a superação dos problemas identificados
na área e alcançar resultados positivos. A atuação direcionada pode dar
aumentar o impacto das ações, abrangendo uma maior quantidade de
trabalhadores, assim como a transdisciplinariedade pode auxiliar a driblar
situações como a identificada em Blumenau onde alguns profissionais médicos
se recusam a fazer este processo. Não que a participação destes e o
conhecimento específico que possuem não seja importante e nem que será
suprido pelas demais áreas, mas talvez o impacto possa ser reduzido.
Sintetizando podemos dizer que as expectativas com relação às ações a
serem desenvolvidas pelo CEREST foram amplas abrangendo desde ações de
prevenção e promoção até as de assistência e recuperação. Considerando as
duas grandes áreas que compõem um Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador percebemos que as de Assistência alcançaram melhores
resultados, destacando-se aqui o importante avanço quanto a identificação de
Doenças Ocupacionais, principalmente as LER/DORT. A Vigilância não
conseguiu atingir uma posição de destaque, salvo em seus primeiros
momentos. Os fatores que influenciaram para um retrocesso nesta área podem
ser correlacionados a questão política e governamental (que ao assumir o poder
não deseja mais de defrontar abertamente com a classe empresarial); a
redução do poder dos sindicatos e o fato de muitos deles estarem vinculados ao
partido governamental, portanto tamm não querendo um confronto direto; a
subordinação da atuação dos profissionais de saúde, mais especificamente os
médicos, ao capital.
4.3 Política de Saúde do Trabalhador
125
Este tópico teve por objetivo analisar a Política de Saúde do Trabalhador
a partir da concepção dos atores sociais entrevistados. Ao serem questionados
sobre a viabilidade da implantação da Política de Saúde do Trabalhador, os
entrevistados responderam afirmativamente, mas, ressaltaram a importância da
posição política e governamental assim como a necessidade da pressão da
sociedade civil organizada para impulsionar o poder público no sentido de
executar estas ações. A parceria com o setor empresarial para implantar esta
política tamm foi citada.
Quanto à questão política registramos a fala de um dos representantes
do controle social: “Pode e deve ser implantada, mas ela só vai ser implantada
se tiver vontade política. (...) se não tiver uma formação para os movimentos
sindicais e sociais para com os trabalhadores, que elegem os nossos
representantes, vamos ter dificuldades porque, eu tenho este entendimento, se
eu votar num “cara” da direita eu achar que vai implantar uma política de saúde
do trabalhador estou me enganando. Porque ele vai ter sempre que dar
prioridade a política das empresas, por isso ele é candidato apoiado e investido
pelas empresas para que elas continuem cada vez mais explorando os
trabalhadores tirando o máximo que ela pode tirar de lucro, porque nenhuma
empresa, nenhum capitalista vai querer tirar do seu bolso para tratar um
trabalhador doente ou para evitar que o trabalhador fique doente. Porque no
mercado tem um monte de trabalhador sem emprego e um monte de
trabalhador novo. O trabalhador doente, o Empresário, manda para o CEREST,
para o INSS, afasta, aposenta, mas nós queremos trabalhador novo para nós
podermos ficar lucrando cada vez mais. Não existe interesse por parte dos
órgãos para que a direita venha realmente resolver os problemas dos
trabalhadores. A política de saúde do Trabalhador só vai ser implantada se nós,
os movimentos sindicais, conseguirmos colocar na cabeça dos trabalhadores
que votam a necessidade do comprometimento dos nossos governantes com a
Política de Saúde do Trabalhador.” Entrevistado 3.
Nesta passagem da entrevista do representante do controle social
podemos destacar várias das facetas que compõem a Saúde do Trabalhador,
todas elas na verdade interligadas. Podemos identificar: o contexto de
exploração capitalista, a questão política de direita e esquerda e ainda o
conhecimento para que haja maior poder de reivindicação e mobilização dos
126
trabalhadores. Como estes fatores permeiam a saúde do trabalhador de alguma
forma já foram abordados anteriormente, mas vale a pena tecer algumas
considerações.
Primeiramente a situação da estrutura capitalista inserida dentro de uma
ótica neoliberal enfatiza a necessidade de liberação do mercado financeiro, esta
predominância da esfera financeira faz com que a mesma tome proporções
desproporcionais com relão às outras esferas que compõem uma estrutura de
Estado. Claus Offe (1999), contextualiza a estrutura de Estado neste momento
histórico e segundo este autor são três as instâncias que compõem o Estado: a
sociedade, o governo e o mercado, estas deverão se articular sendo, porém
sempre uma relação conflituosa. O autor cita
Soluções mais promissoras são essencialmente “impuras” : não
se deve utilizar nenhum dos três princípios da ordem social
exclusivamente, mas a todos eles deve ser reservado um papel
em um arranjo institucional complexo e composto. Esses três
componentes da ordem social em precária relação entre si: de
um lado, eles se baseiam um no outro, já que cada
componente depende do funcionamento dos outros dois; de
outro entretanto, a sua relação é antagônica, já que a
predominância de um deles põe em risco a viabilidade dos
outros dois (OFFE, 1999, p.128).
Para uma melhor compreensão o autor faz um comparativo entre os
elementos da organização social e uma capacidade de relacionamento humano.
O Estado pode ser considerado como a Razão, já que surge como um contrato
racional. O Mercado é movido pelos interesses humanos na aquisição de bens
individuais sem grandes considerações sobre o que estas aquisições farão para
os outros ou para o futuro. Já a Comunidade pode ser equiparada à paixão
(amor, honra, orgulho, sentimento de crença), são estes sentimentos que geram
um sentimento de compromisso de pertencimento.
Quando há predominância excessiva de um dos elementos ou ainda
quando um dos elementos é praticamente desconsiderado na organização das
sociedades ocorrem problemas. No contexto de uma organização societal com
princípios neoliberais, que se caracteriza pelo Estado mínimo, pela liberdade
quase irrestrita do mercado financeiro e por negligenciar a Comunidade,
enquadram-se três dos seis arranjos de Estado citados por este autor, que são:
1) Governo pequeno demais – O Estado no seu mínimo deve ser
127
chamado a proteger a vida, a propriedade e a liberdade dos cidadãos
(Locke). Com o objetivo de levar a cabo essas funções que são
essenciais para o Estado, os Estados devem ser capazes de extrair
os recursos necessários para a performance destas funções através
dos impostos. O que ocorre em muitas situações é a existência de um
Estado superdimensionado com uma performance abaixo do
necessário.
2) Falácia do mercado excessivo – Os mercados são arranjos
institucionais muito peculiares, em que a alocação de competitiva de
fatores e resultados da produção é mediada através da sinalização de
preços. Os mercados são conhecidos por sua surdez e cegueira: são
surdos as externalidades negativas, por eles causadas, por exemplo
de natureza ambiental, ao mesmo tempo que são cegos às
conseqüências de longo prazo que as transações de mercado podem
causar aqueles envolvidos com elas.
3) Falácia de Negligenciar Comunidades e Identidades – Comunidades
como família, associações religiosas ou noções étnicas oferecem aos
indivíduos uma sensação de sentido e missão. Estas representam um
papel importante na reprodução das tradições culturais e valores
étnicos. A cessão e a garantia do necessário espaço para que a ação
política e social dessas diversas comunidades possam promover suas
práticas associativas (em vez de substituí-las por ação estatal
paternalista e/ou repressiva) aparecem como uma pré-condição
necessária para o aprofundamento do uso benéfico coletivo destas
forças comunitárias e modos de ação.
A síntese sobre a estrutura e Estado nos possibilita refletir sobre qual
arranjo de Estado temos na atualidade e quais conseqüências isto acarreta.
Podemos concluir que a atual estrutura é composta por um Estado cada vez
mais mínimo que se exime cada vez mais de suas responsabilidades quanto a
vida, a propriedade e a liberdade. As comunidades e os valores que este
deveria desenvolver na população estão substancialmente afetados levando a
uma sensação de não pertencimento causada pela excessiva negligência, que
se verifica no modelo de Estado atual pela Comunidade. Este pode ser citado
128
como um dos fatores que aumentam a criminalidade, além é obvio da ausência
do Estado que ao não promover os mínimos sociais faz com que o indivíduo
procure uma inserção para garantir sua sobrevivência, por vezes o faz na
informalidade do mercado de trabalho e em outras no poder paralelo que se
forma no mundo do crime. E por fim, quando o mercado financeiro é dilatado,
baseando-se somente na lucratividade e ficando surdo e mudo às demais
instâncias, ou seja, assumindo uma postura onde os fins (lucros) justificam os
meios (degradação ambiental, exclusão social em massa, etc.). Todos estes
componentes colaboram para a enorme dificuldade que há em realmente
implementar uma política pública de saúde do trabalhador.
Podemos citar ainda outra análise sobre a grande influência que o
mercado financeiro ocupa na conjuntura atual, onde os fluxos financeiros
mundiais correspondem a aproximadamente 78 vezes a quantidade de recursos
aplicados produtivamente. Esta redução do Mercado Produtivo é um dos fatores
que diminui quantidade de postos de trabalho e direciona os recursos de
maneira diferente entre os países. Aos desenvolvidos cabem as tarefas que são
melhor remuneradas e que exigem melhor infra-estrutura e desenvolvimento
tecnológico, já os países periféricos ficam com os trabalhos pior remunerados e
realizados em condições mais desfavoráveis como por exemplo a utilização de
produtos, que pela toxicidade já foram eliminados do processo produtivo de
países centrais. Estas características do mercado financeiro e do mercado
produtivo atingem a toda a população, porém de forma mais intensa as
camadas mais vulneráveis. O mercado de trabalho, nesta conjuntura, tamm
assume novas formas que não deixam de significar a fragilização deste, o que
pode ser exemplificado, por exemplo, nos empregos de tempo parcial, no
subemprego e no desemprego, além da curva decrescente de rendimentos para
grandes parcelas da população (MINAYO-GOMEZ e THEDIM-COSTA, 1999).
Finalmente, estes mesmos autores, depois de fazerem este estudo sobre
a forma como a supremacia do mercado financeiro afeta a toda a população,
mesmo que de forma mais intensa a classe menos favorecida, identificam o
papel do Estado que:
[...] frente ao enorme contingente do moderno “exército
129
industrial de reserva” gerado pelo desemprego em massa,
oferece, quando muito, alternativas de re-inserção
circunstanciais negociadas com as empresas, por meio de
incentivos financeiros e redução ou isenção de encargos
sociais (MINAYO-GOMEZ; THEDIM-COSTA, 1999, p.412).
Através dos pontos destacados pelos autores podemos constatar que a
configuração de Sociedade atual é extremamente precária com relação a
Comunidade. Desta forma a implantação de uma política de Estado direcionada
para este segmento não tem grande possibilidade de obter avanços
significativos, porque as outras duas instâncias prevalecem sobre esta.
O entrevistado se refere ainda à questão política de direita e esquerda,
que já foi abordada baseado em Ribeiro (2004), segundo o qual
independentemente da ideologia política de um partido quando este assume o
poder alia-se aos interesses do poder econômico. Offe (1999), também faz um
apanhado geral sobre a forma como a globalização sobre o comportamento dos
Estados e que à medida que as fronteiras dos Estados são transpostas e
tornadas permeáveis, o poder das forças políticas locais diminui. As fronteiras
perderam não apenas sua característica de limite, mas também protetora e,
portanto, capacitadora de respostas independentes e autônomas. Ou seja, na
atual estrutura de Estado a autonomia deste diminui, principalmente dos países
periféricos que ficam mais submetidos às pressões transnacionais e
econômicas.
A mesma entrevista apresenta ainda a questão da consciência dos
trabalhadores, os conhecimentos para que elejam representantes que estejam
comprometidos com suas necessidades. Uma maior consciência crítica com
certeza faz com que as pessoas tenham maior poder de reivindicação,
conhecimento de seus direitos, e se tornem menos propensos a serem massa
de manobra. Porém, é necessário considerar à relação de poder que se
estabelece entre o empregador e o trabalhador.
Percebe-se que, além de conflituosa, a relação entre o
empregado e o empregador vai além da simples subordinação:
é uma relação de submissão imposta por um poder
determinado unilateralmente por interesse econômico do
empregador, respaldado na coação e capacidade de retaliação;
uma submiso tanto maior quanto menor for a organização e
resistência dos trabalhadores e maior sua necessidade de
sobrevivência. (...) Na relação autoritária, o sujeito colocado no
pólo dominante do poder faz do sujeito situado no outro pólo,
130
um simples objeto. Esta relação de coisificação é comum na
relação de poder do empregador com seus empregados.” “...o
desconhecimento do outro, é um dos traços da sociedade
brasileira fundada na exploração do trabalho escravo. (...) os
grilhões desapareceram, mas os trabalhadores continuam
virtualmente presos nos postos de trabalho (RIBEIRO, 2004,
p.6)
Esta posição de submissão do trabalhador, aliado ao que foi apontado
anteriormente da obra de Minayo-Gomes e Thedin-Costa (1999), que ilustram a
situação de precariedade do trabalho nos dias atuais e ainda Ribeiro (2004) que
tamm teceu uma reflexão sobre a redução do poder dos sindicatos e o
sentimento de individualismo que se instalou nos trabalhadores oriundo da
necessidade de sobrevivência a qual estão expostos pela precarização das
relações de trabalho, faz com que o desejo de se engajarem na luta pelos seus
direitos estejam reduzidos, precisam se preocupar em manter seus empregos e
sobreviver.
Com todas as considerações feitas à política de Saúde do Trabalhador
vem na contra-mão da lógica neoliberal que prevê cada vez mais autonomia e
flexibilidade para que a esfera econômica e produtiva se desenvolva no sentido
da primazia do capital e relegando a um segundo plano a vida humana e a
questão ambiental, ou seja, a implantação de um Estado cada vez mais mínimo.
A próxima entrevista que tamm abre uma discussão sobre a questão
política, porém já faz uma análise diferenciada com relação à atuação dos
partidos de Direita e Esquerda, e que é bastante interessante principalmente por
vir de um representante sindical e que posteriormente ocupou um cargo
estratégico dentro da Secretaria Municipal de Saúde, e que vem de encontro ao
que foi citado por Ribeiro (2004) e Offe (1999) Este refere: “Para o Estado não
interessa (referindo-se a Política de Saúde do Trabalhador), e isto independe se
é direita ou esquerda. Vai depender da boa vontade das pessoas de avançar ou
não dentro deste processo. Mesmo dentro de um partido de esquerda, nós
estivemos lá e fomos bloqueados, barrados, porque não interessa... (...) A
verdade que eu tenho dentro de mim, que quando eu chego ao poder, é uma
verdade escondida que eu só vou manifestar lá.” Entrevistado 1. Como
podemos perceber este ator social aponta para a dificuldade de implementar
uma real Política de Saúde do Trabalhador, independentemente da ideologia
político-partidária e das pressões que ocorrem para que a área não tome lugar
131
de destaque, evitando assim explicitar a relação capital/trabalho entre
empregadores e trabalhadores.
Apesar da ausência do Estado na real implementação da Política de
Saúde do Trabalhador, o Ministério da Saúde lançou em 2002 a RENAST com o
objetivo de expandir as ações em saúde do trabalhador nos municípios
brasileiros já que somente uma pequena parcela deles assume suas
responsabilidades quanto à saúde do trabalhador. Através da RENAST foram
disponibilizados recursos financeiros para a área, principalmente para
municípios que foram habilitados, assim como Blumenau, como Centros de
Referência em Saúde do Trabalhador. Estes municípios passaram a assumir
uma responsabilidade regional, no caso de Blumenau referindo-se a 52
municípios além do próprio.
A habilitação de Blumenau ocorreu em 2003 e os entrevistados foram
abordados sobre os reflexos desta habilitação para a Saúde do Trabalhador em
Blumenau.
Serão citados alguns itens do que os entrevistados destacaram e que
possibilitarão uma breve idéia de como ocorreu este processo em Blumenau.
Uma das entrevistas de um dos representantes do controle social
abordou um aspecto interessante, a motivação que a habilitação do CEREST
trouxe para a organização sindical, e infelizmente mostra ao final como o poder
público ao ser tantas vezes inoperante leva a um desejo de afastamento, de
distanciamento. “... quando veio a RENAST, na época, houve aquela vontade
enorme, o Fabiano era o coordenador, ele trouxe aquilo e nós fizemos vários
projetos, conversamos muito. Já era para sair à cartilha da LER/DORT, o
projeto da construção civil, já iríamos ver a questão da saúde mental dos
trabalhadores, estava uma coisa toda fogosa. Nós já estávamos organizando
grupos para formar grupos de formadores para ir para dentro das fábricas para
falar com os trabalhadores, mas de repente a coisa mudou e mudou muito. Eu
não sei se foi na mudança de governo ou o que foi e daí tudo ficou muito difícil.
Até saiu a cartilha do CEREST, mas foi um parto, o que acaba, assim, a gente
deixando de participar por desanimo mesmo. É reunião, reunião e aquela coisa
não andava. E neste sentido eu não vi muita mudança não. Com a RENAST
antes e agora.”Entrevistado 2
A próxima fala a ser citada é a de outro representante sindical. “A
132
RENAST trouxe recursos, mas existem entraves políticos que não conseguem
destravar o andamento da RENAST. Os recursos existentes poderiam dar
vazão para as demandas de acidentes de trabalho, o que poderia ser “puxado”
com esta verba. (...) seriam as ações de prevenção e que não tem acontecido.
Me parece que não existe interesse político para que esta situação venha de
fato a se concretizar.” Entrevistado 4.
Os profissionais de saúde tamm não sentiram avanço do CEREST,
nem mesmo com o repasse dos recursos. “Não trouxe mudança, para mim
continua a mesma coisa. Eu até acho que com a RENAST no início até andou,
mas depois eu não vejo mudanças, não vejo ações na regional. Apesar de ser
habilitado para mais 52 municípios eu não vejo nada.” Entrevistado 7.
A fala do representante da gestão mostra o recebimento de recursos e
uma constatação de que a área não avançou, mesmo havendo incentivo
financeiro. “A RENAST trouxe maior incentivo financeiro para a área
possibilitando a compra de equipamentos e cursos de capacitação. No segundo
governo do Décio
4
poderia ter avançado bem mais, mas infelizmente não
avançou. A RENAST trás recursos para a área de Saúde do Trabalhador, mas
que agora, com a mudança nos financiamentos do Ministério da Saúde, não
serão mais repassados exclusivamente para este fim, passando a ser
incorporados pela média e alta complexidade. Isto deve prejudicar a área de
Saúde do Trabalhador. Nós sabemos o quanto o financiamento é importante na
área da saúde, a área que tem recursos próprios deslancha.” Entrevistado 8.
Conforme foi possível perceber a RENAST não conseguiu atingir seus
objetivos de acordo com os atores sociais da Saúde do Trabalhador envolvidos
nesta pesquisa, apesar de contar com recursos específicos para a área.
As responsabilidades dos Centros de Referência em Saúde do
Trabalhador habilitados pelo Ministério da Saúde são bastante amplos,
sintetizando Hoefel, Dias e Silva (2005), podemos dizer que devem ser pólos
irradiadores para discutir a centralidade do trabalho no adoecimento dos
trabalhadores; desenvolver ações de informação, capacitação e educação
continuada, para profissionais do SUS e para o controle social; ampliar a
informatização e sistematização dos dados em saúde do trabalhador;
desenvolver ações de vigilância; atuar de forma inter e intrasetorial; prestar
4
Décio Lima foi prefeito de Blumenau na gestão 1997-2000 e 2001-2004.
133
atenção integral ao trabalhador através de práticas que visem a humanização e
o acolhimento; apoiar e incentivar o fortalecimento do controle social.
Infelizmente em Blumenau apesar do caráter regional que foi conferido pela
regionalização não houve avanço significativo na política de saúde do
trabalhador após a habilitação do CEREST.
A dificuldade de implantação da RENAST não é uma realidade apenas
municipal, tamm foi tema de discussão do Sindicato dos Químicos Unificados
de São Paulo, em 2003 que onde se realizou uma avaliação sobre o processo
de implantação da RENAST nos diversos estados brasileiros, em Santa
Catarina alguns dos aspectos apontados foram: problemas com médicos peritos
do INSS e com médicos responsáveis em estabelecer o nexo entre a doença e
o trabalho; problemas com profissionais que atuam na esfera pública e privada
concomitantemente; falta de interesse de muitos Sindicatos; falta de medidas de
prevenção e de tratamento. (Relatório dos Militantes segundo os Estados da
Federação, 2003)
Algumas das principais dificuldades para a implantação da RENAST a
nível federal, baseada em dados dos técnicos do Ministério da Saúde, foram
citadas nos capítulo 3 quando se abordou a Política de Saúde do Trabalhador
no Brasil, sucintamente podemos dizer que se referem a falta de conhecimento
de gestores e profissionais pela área, fragilidade do controle social; Saúde do
Trabalhador não efetivamente integrada ao SUS; conflito de território (Centros
de Referência em Saúde do Trabalhador com as Regionais de Saúde);
privilegiamento da assistência, e insipiência das ações intersetoriais (HOEFEL;
DIAS; SILVA, 2005).
Os técnicos do Ministério da Saúde destacam alguns aspectos positivos
que ocorreram após a implantação da RENAST que são: uma maior visibilidade
da área e o avanço do quadro jurídico institucional permitido uma melhor
estruturação no SUS.
Um dos aspectos que foi citado como positivo para a implantação desta
política na área de saúde do trabalhador, o financiamento extra-teto, será
encerrado este ano (2007) o que deverá ampliar os problemas para o progresso
nesta área, principalmente o interesse de alguns gestores.
Comparando os dados sobre as responsabilidades de um Centro de
134
abrangência Regional; os registros que temos sobre a RENAST em Blumenau;
e, na seqüência os dados avaliativos a nível estadual (realizada por
representantes do controle social) e na esfera federal, podemos perceber que
em muitos casos a problemática se repete, ou seja, na dificuldade de
articulação inter e intrasetorial, na conflituosa relação capitalista que afeta
principalmente a categoria médica. Na avaliação de técnicos do Ministério da
Saúde podemos perceber que eles apontam vários problemas que atingem a
saúde do trabalhador no país. Ou seja, apesar de haver “A disponibilidade de
recursos extra-teto que tem facilitado a conversa com os gestores e o
planejamento de intervenções com os trabalhadores, particularmente com
aqueles inseridos no setor formal” (HOEFEL; DIAS; SILVA, 2005, p. 115), por
outro lado, existem problemas importantes que dificilmente serão superados por
um Centro de Referência em Saúde do Trabalhador já que envolvem definições
governamentais e nas três esferas de governo. Um dos exemplos é a
regionalização da Saúde do Trabalhador que ao ser diferenciada do restante da
rede SUS exige pactuações específicas o que dificulta o avanço das ações,
principalmente se considerarmos a complexidade da área com todas as
transformações que vem ocorrendo com relação ao trabalho e ao
desconhecimento de gestores e profissionais sobre a influencia deste no
adoecimento e morte dos trabalhadores.
Com base nas entrevistas podemos perceber que tentativa do poder
público de ampliar as ações em saúde do trabalhador, através da RENAST, nas
várias instâncias da federação alcança resultados parciais, e em Blumenau,
nem ao menos perceptíveis por parte dos entrevistados. Isto leva ao
questionamento de até onde realmente se tem como objetivo o avanço das
ações nesta área e uma maior efetividade na implementação desta política
pública. Erros estruturais, como por exemplo, a saúde do trabalhador seguir
uma regionalização diferente das demais áreas da saúde, obviamente dificulta a
ação. Primeiramente necessitaria que ações estruturais fossem adotadas, como
por exemplo, a articulação entre os diferentes órgãos governamentais. O
controle social precisa ser fortalecido e capacitado para que possa realmente
atuar no sentido da implantação desta política, os empresários precisam ser
responsabilizados pelos acidentes e doenças que causam. Enquanto só houver
o repasse de uma determinada quantidade de verba para um município que
135
deverá se tornar parcialmente responsável por mais inúmeros municípios nesta
complexa área de saúde do trabalhador a política poderá até ter alguns
avanços, mas não muda a essência do problema.
Apenas para concluir citaremos uma entrevista que aponta para a
necessidade de articulação da sociedade civil organizada, é a de um dos
representantes sindicais, que diz: “Só falta é decisão política de dar condições e
implementar (referindo-se a implantação da política de saúde do trabalhador).
Agora se não tiver esta vontade não vai nunca se implementar. Somente vai ser
implementada se os movimentos sociais, sindicatos dos trabalhadores,
sindicatos patronais e sociedade civil organizada cobrarem de quem tem
responsabilidade de dar esta condição adequada aos trabalhadores, cobrar
para que de fato façam, senão não vão fazer mesmo. Agora que tem condições
isto eu não tenho a menor dúvida. E se os sindicatos têm condições, sem poder
coercitivo nenhum e estão diariamente nos canteiros de obras orientando os
trabalhadores, orientando as empresas e verificando as irregularidades
existentes porque que uma Secretaria de Saúde, uma Vigilância Sanitária não
podem implementar isto? Só não implementam porque não querem.”
Entrevistado 4.
A fala bastante positiva deste representante sindical é interessante
porque em entrevistas de outros atores sociais ele foi apontado como sendo o
responsável por desenvolver um trabalho diferenciado em Saúde do
Trabalhador no município, na área da construção civil, portanto, identificando
que apesar das dificuldades para uma real implantação de uma Política de
Saúde do Trabalhador algumas ações importantes são possíveis e podem gerar
resultados significativos. Algumas falas que ilustram esta atuação diferenciada
deste sindicato são:
“Uma pessoa que vem fazendo um trabalho a mais de 15 anos em
Blumenau, como o Alberto, a Secretaria de Saúde deveria reconhecer o
trabalho deste sindicato, pelo que eles fazem lá... Vai ver o número de mortes
que existia na construção civil antes do Alberto e em todo este período em que
ele está no sindicato...” Entrevistado 1.
“Eu particularmente posso dizer que tem um sindicato que realmente faz
Saúde do Trabalhador, que é o da Construção Civil...” Entrevistado 7.
Após estas entrevistas que demonstram a importância do
136
posicionamento do Estado para a execução das ações em saúde do trabalhador
e da mobilização da sociedade civil organizada iremos analisar alguns trechos
nos quais os entrevistados ressaltam a necessidade de parceria com as
empresas.
“... as empresas hoje não estão para perder, então no momento em que se o
CEREST fizer um trabalho com elas, elas vão abrir as portas, (...) ainda hoje o
CEREST é um “bicho papão” para elas. Quando elas estiverem conscientes que
o CEREST está aí só para ajudar e não para prejudicar, elas vão abrir as
portas.” Entrevistado 6.
“Porque ninguém quer “sacanear” as empresas, a gente só quer (...) qualidade
de vida dentro das empresas para os trabalhadores. (...) Por exemplo, com um
calor deste olha a pressão que dá este calor e alguém trabalhando sem um
ventilador ou sem um ar condicionado e quantas doenças vão estar sendo
geradas, as vezes só por falta de uma boa ventilão. A gente poder fazer este
trabalho dentro das fábricas, eu vejo que dá para fazer.” Entrevistado 2.
Analisando as respostas podemos concluir que um grupo dos
entrevistados tem uma visão de que a implantação e posteriormente a
viabilização da política de saúde do trabalhador depende em grande parte do
Estado. Citam a questão político-partidária e a pressão dos movimentos
sindicais. Porém é ainda mais abrangente do que isto. É realmente uma posição
de Estado, porque se realmente a Saúde dos Trabalhadores fosse uma
prioridade ocorreria uma integração entre os órgãos governamentais que tem
responsabilidade quanto a esta área. Porque então quando se trata da saúde do
trabalhador não existe integração entre os órgãos, há falta de recursos
humanos, há falta de estrutura adequada, a informatização que tanto apressa
os processos na área econômica na área da saúde do trabalhador engatinha?
Um dos entrevistados aborda esta questão da dificuldade de articulação entre
os órgãos governamentais, “O Ministério do Trabalho nem está para nós. É até
um favor para eles porque eles estão sucateados, não tem pessoal, apesar da
rixa nacional que tem Ministério do Trabalho e Ministério da Saúde, onde o
Ministério do Trabalho diz que o Ministério da Saúde está entrando no campo
dele...” Entrevistado 7.
137
Trata-se, portanto, de uma questão de prioridade de Estado, para ilustrar
podemos citar alguns exemplos bem simples que nos ajudam a compreender
que onde o Estado tem prioridade as coisas avançam e tem toda a estrutura
necessária. Um dos exemplos é o sistema de votação no país, nosso sistema é
informatizado, distribuído em todo o território nacional, a validação e contagem
dos votos é feita em poucas horas, e o Brasil exporta o modelo e a tecnologia
para vários outros países. Outro exemplo é o do Imposto de Renda, tamm
todo informatizado, com possibilidade crescente de cruzamento de dados entre
diversas fontes, possibilidade de identificação de falhas com rapidez e eficiência
(principalmente nas declarações da classe assalariada que não tem como omitir
ganhos e tem seu desconto efetuado diretamente da folha de pagamento).
Já as entrevistas que ressaltam a parceria com as empresas novamente
recaem na questão, de como diz o dito popular: de ser impossível servir a dois
senhores ao mesmo tempo. Inclusive uma das entrevistas que usa a expressão
“ as empresas não estão para perder”, dá a impressão de que o CEREST teria
como foco de atenção as empresas. Este não deveria ser o foco de um serviço
de saúde do trabalhador, isto não quer dizer que como conseqüência de seu
trabalho o CEREST não possa favorecer a empresa, por exemplo, quando
presta um adequado atendimento ao trabalhador acidentado e fazendo com que
este retorne com maior rapidez e melhor recuperado ao ambiente de trabalho.
Porém, na maioria das vezes, a atuação do CEREST deveria vir de encontro a
uma atuação com foco no trabalhador, principalmente através das ações de
prevenção e de intervenção no processo de trabalho. Em questões anteriores já
destacamos que exemplos citados pelos nossos entrevistados de empresas que
são extremamente adoecedoras e que os investimentos para reduzir ou eliminar
estes riscos aos trabalhadores tem um alto custo e a responsabilidade pelo
trabalhador adoecido é repassada para o poder público, além disto, a facilidade
de substituição dos trabalhadores é alta justamente pela elevada taxa de
desemprego que se registra em todo o país.
Apesar da dificuldade de se implantar uma real política em saúde do
trabalhador, por se tratar de uma questão estrutural de Estado, é na minha
compreensão, positiva a visão dos entrevistados de que é possível implantar tal
política e avançar dentro dela. A dificuldade pode levar ao imobilismo e neste
caso bastante favorável aos interesses daqueles que não tem interesse de que
138
a saúde do trabalhador avance (Estado, empresários, etc.). Por outro lado,
experiências como a do Sindicato da Construção Civil, que consegue agir
preventivamente e reduzir o número de acidentes num ramo produtivo onde
estes são, não apenas numerosos, mas tamm muito graves e com alta
incidência de óbitos, mantém viva a motivação e a esperança de que algo pela
vida dos trabalhadores pode ser feito.
Cabe citar um pequeno trecho de outra entrevista que tamm é muito
interessante neste aspecto motivacional: “talvez eu seja um pouco sonhadora
(quando se refere a possibilidade de implantação da política de saúde do
trabalhador). Eu sei que nunca vai atingir a todos mas [...] é aquela história do
incêndio na floresta, é nós fazermos a nossa parte. Nós talvez não vamos
conseguir atingir a todos os trabalhadores mas se a gente ver aquele
trabalhador que não vai mais passar por aquela dificuldade nós vamos ser
aquele pássaro que está lá tentando apagar aquele incêndio. Eu jamais vou
querer deixar de fazer a minha parte. É isto que eu penso.” Entrevistada 2.
4.4 Sugestões e Estratégias
Neste último bloco estão relacionadas às estratégias e sugestões que os
entrevistados consideram importantes para uma melhor implementação das
ações em saúde do trabalhador no município.
De forma geral as respostas apontaram no sentido de ações e
estratégias direcionadas a estrutura e organização interna do CEREST (equipe;
estrutura física e material; e, execução das ações – dados epidemiológicos,
informatização, parceria com universidades) e, externamente se referindo a
atuação da esfera governamental e a uma maior participação dos sindicatos.
Quanto aos aspectos internos podemos citar inicialmente a equipe de
profissionais.
“Em primeiro lugar o servidor público, que trabalha nesta área tem que ter
consciência de classe. (...) ele precisa entender modos de produção, (...) qual é
a política de massa que as empresas adotam para cima deste trabalhador, e o
médico (...) precisa ter uma consciência de como é que este trabalhador fica
doente e porque que fica doente. E ser apaixonado por isto.” Entrevistado 1
Esta citação mostra o quanto à motivação pela área é necessária assim
139
como o conhecimento sobre os processos e a organização do trabalho. A
motivação pode estar relacionada ao que foi apontado anteriormente, do
trabalho ter se transformado em valor de troca para muitos profissionais que
então venderão sua força de trabalho onde houver a melhor possibilidade de
lucratividade, além de adequarem suas práticas a uma forma de não se
defrontarem com os possíveis compradores deste objeto de troca, o trabalho.
Com relação ao conhecimento podemos considerar que na Saúde do
Trabalhador,
[...] emerge um desafio ainda a enfrentar desde velhas
situações praticamente intocadas, como o trabalho escravo e o
trabalho infantil, às decorrentes de um modelo de produção
seletivo e excludente que vem ampliando a dimensão da rua
como espaço de trabalho, com todas as incertezas,
vulnerabilidades e riscos que esse espaço significa, em relação
tanto a acidentes e violências, como à produção da própria
sobrevivência (MINAYO-GOMEZ; THEDIN COSTA, 1997, p.
23).
Enfim uma complexidade de fatores, conforme os apontados na citação
acima, que somente poderão ter uma intervenção efetiva se integrarem os
conhecimentos, como por exemplo, os da Medicina Social que incorpora o
caráter interdisciplinar e intersetorial e não deixa de considerar o acúmulo de
conhecimentos da Medicina do Trabalho e da Saúde Ocupacional. Outro fator
que dificulta a execução das ações em saúde do trabalhador são “...os valores
relacionados a origem de classe e à formação acadêmica conservadora da
maioria dos médicos...”. (MAENO; CARMO, 2005 p.44).
Ainda quanto aos aspectos internos, porém relacionados à estrutura
física e operacional podemos citar:
“Primeiramente tem que estruturar tem que dar condições para os profissionais
para atender os trabalhadores” (Entrevistado 4).
“os formulários lá são tão precários, para ele apresentar em qualquer órgão,
parece uma coisa que veio lá do pobrezinho. Tem que usar os mesmos
formulários como se estivesse lá no consultório particular. Aquilo que vem
escrito lá de qualquer jeito, com uma data e pronto, é uma folha sem um
timbre...” Entrevistado nº 2
140
“... fazer uma análise dos campos onde realmente os trabalhadores estão sendo
atingidos, ficando doentes e daí juntamente com os órgãos sociais e sindicais
formar cartilhas, informando a comunidade e principalmente os empresários.”
Entrevistado nº 3
“Um outro ponto fazer um planejamento de políticas de ação, (...) fazer uma
pesquisa para ver o que mais está atingindo...” e cita o exemplo da Associação
dos Portadores de LER/DORT que surgiu a partir de um estágio do curso de
psicologia da FURB. “... estagiários de psicologia que iniciaram um grupo e hoje
o que nós temos? Uma associação com mais de 500 pessoas sindicalizadas e
não tem uma reunião ali que não tenha mais de 100 pessoas.” Entrevistado nº 2
“... nós temos que continuar a fazer fiscalização e as questões de trabalhar por
grupos tamm. Os grupos de LER/DORT, os grupos de amputados,... A
doença mental que tem que ter algum trabalho, o stress do trabalhador, então
tem muitas coisas que podem ser trabalhadas no CEREST e em conjunto com
sindicatos e outros órgãos...” Entrevistado nº 2
Estes dados são interessantes porque apontam uma diversidade de
ações que são de abrangência de um Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador, destacando-se o planejamento das ações baseadas em dados
epidemiológicos e as parcerias que devem ser buscadas tanto com instituições
de ensino como com setor empresarial e sindical.
Quanto aos aspectos externos, serão citados inicialmente os referentes a
esfera governamental.
Um dos entrevistados faz uma sugestão, que para ser viabilizada
precisaria de uma definição governamental. “que o empresário ao criar uma
empresa teria que passar por um curso, um treinamento, uma formação
principalmente na área de saúde...”. Na verdade existem uma série de
legislações federais, estaduais e municipais que estabelecem normas que as
empresas precisam cumprir quanto à saúde do trabalhador, porém o que já
vimos na fundamentação teórica é que estas são na maioria das vezes
141
descumpridas escancaradamente como é o caso dos PCMSOs e os PPRA na
maioria das vezes feitos de qualquer jeito, criando inclusive um grande comércio
na produção em escala destes instrumentos, e os órgãos públicos não
fiscalizam adequadamente, abrindo desta forma a possibilidade de fraudar a
legislação e prejudicar a saúde dos trabalhadores. Entrevistado nº 3.
Este mesmo entrevistado cita ainda “[...] eu tenho observado que muitos
companheiros nossos, que foram de luta (...) e agora quando eles abrem uma
empresa, uma micro-empresa, eles esquecem de ver a questão da saúde.
Muitas vezes são pessoas que não conseguem mais emprego e abrem uma
empresa e aí mais para frente eles vão enfrentar o mesmo problema, que era a
questão da saúde. Porque se você começa (...) uma empresa nova e você
esquece que o seu empregado é tamm um ser humano e que ele vai adoecer
e que você não tem estrutura para que ele não adoeça, para que ele possa ser
tratado, para que ele não trabalhe num ambiente insalubre, você certamente vai
ter problemas com o seu empregado e aí então é que muitas empresas, muitos
trabalhadores que já se sentem fora do mercado procuram estas empresas
informais para poder ter um salário, um recurso financeiro e aí acabam se
submetendo ainda mais a este trabalho que vai adoecer, e aí, fica mais uma vez
o órgão que é o CEREST para resolver estes problemas,...” Entrevistado nº 3.
Esta entrevista aponta a difícil trama que circunda a saúde do
trabalhador, levantando vários itens para discussão. Um deles, o pequeno
empresário que abre seu negócio. Pela entrevista podemos ver que este muitas
vezes é feito na informalidade justamente para fugir dos elevados gastos fiscais
existentes no País. O pequeno empresário de vítima, passa num instante a
tirano, aquele que não dá as condições necessárias para que o trabalhador
tenha as condições necessárias para não adoecer ou morrer pelo trabalho. Não
se trata, portanto de uma falta de conhecimento, porque ninguém melhor para
conhecer um posto de trabalho e os fatores que nele adoecem do que quem já
vivenciou este processo. Este princípio, de considerar o conhecimento do
trabalhador, inclusive foi a base da teoria utilizada pelo movimento operário
italiano que influenciou o desenvolvimento das ações em saúde do trabalhador
no Brasil (CARMO e MAENO, 2005). Talvez falte conhecimento técnico para
estes micro empresários solucionarem os problemas de saúde que surgem em
seus estabelecimentos, mas não desconhecimento da existência deste.
142
Podemos nos questionar o que leva aquele que já enfrentou toda esta situação
a submeter outros a mesma penúria? A resposta está no processo de
acumulação de capital que gera a necessidade de exploração da mais valia, o
que da forma como a sociedade ocidental está organizada justifica tudo. Então
para obter mais lucros, as empresas formais ou informais, ampliam a jornada de
trabalho; reduzem a utilização de equipamentos de segurança individuais ou
coletivos, seja pelos custos destes ou pelo fato de em alguns casos ampliarem
o tempo de execução do processo produtivo; entre outras medidas que ampliam
a lucratividade e reduzem a segurança dos trabalhadores.
Esta entrevista tamm é esclarecedora quanto a uma importante
parcela da população que procura estas empresas informais para a obtenção do
seu recurso financeiro que lhes possibilita a sobrevivência, justamente os
excluídos, seja por idade, por falta de qualificação ou outros. Enfim, em poucas
palavras este entrevistado apontou o círculo da informalidade, partindo dos
pequenos empresários, com escassos recursos financeiros muitas vezes
abrindo suas tamm pequenas empresas em algummodo da casa, com
equipamentos sucateados. E os trabalhadores que adentram a este mercado,
são justamente os excluídos do processo formal de trabalho. Na seqüência ele
completa o círculo citando a atuação dos órgãos públicos ao referir que os que
adoecem neste processo desprovido de qualquer regulamentação irão
engrossar as filas do CEREST, ou a subnotificação porque como não são
vinculados ao mercado formal, tanto os próprios trabalhadores quanto os
profissionais de saúde, muitas vezes não tem a compreensão de que mesmo
não havendo uma vinculação formal ao ocorrer um acidente, este será sim um
acidente de trabalho ou uma doença ocupacional e, portanto, necessitando da
devida notificação.
Temos ainda outro entrevistado que tamm ressalta a questão
governamental como decisiva na execução da Política de Saúde do
Trabalhador. “Decisão Política. Interesse de querer e ter a visão do que é
importante. Tem que dar prioridade. (...) Falta, portanto vontade política de se
fazer e se investir na prevenção que é o caminho principal, o outro (referindo-se
a assistência) é acessório.” Entrevistado nº 4
Os atores sociais têm razão em apontar a decisão política como um dos
fatores primordiais para a realização das ações na área de saúde do
143
trabalhador, porém a redução do Estado que se acentuou a partir da década de
90 e a diversidade de fatores que tão bem foram abordados nas citações
anteriores que evidenciam a organização do trabalho informal dentro desta
estrutura de Estado, dificultam este processo.
Essa foi uma década que, a despeito da instituição dos direitos
sociais, entre os quais o da saúde, se caracterizou por perdas
de salários, empregos e renda da classe trabalhadora. Daí a
privatizão da coisa e serviçosblicos e a desqualificação
das necessidades sociais transformadas em simples atos de
assistencialismo e caridade (RIBEIRO, 2004).
Ou seja, o poder público ao reduzir a estrutura de Estado investe menos
nas políticas sociais, deixando grandes parcelas da população a mercê da
própria sorte e freqüentemente se eximindo de intervir em áreas que trazem a
tão enfronhada relação capital/trabalho como a saúde do trabalhador. O que há
de positivo é que a Constituição de 1988 estabelece uma série de direitos a
população que precisa muitas vezes ser buscar juridicamente, ou através de
estratégias como o exemplo do processo de Fiscalização realizado no Rio de
Janeiro – e citado anteriormente - onde se busca a confluência de vários atores
sociais e que garante a execução das ações. Outra possibilidade para que as
ações em saúde do trabalhador aconteçam é a pressão do movimento sindical,
que será analisado posteriormente.
Quanto a necessidade de maior envolvimento da esfera sindical
podemos destacar as seguintes falas:
“Também os órgãos sociais, sindicais teriam de se reunir novamente para
pressionar e, juntamente com a população e os trabalhadores das empresas,
reivindicar ações mais concretas para que ele (CEREST) venha a funcionar.
Somente esperar que o governo venha a dar condições acho difícil.”
Entrevistado nº 3
“ ... abrir espaço para que de fato outras pessoas das organizações e da
sociedade participarem ativamente e ter acolhida as reivindicações dos
sindicatos.” Entrevistado nº 4
“As instituições tem que estar se organizando, o cidadão tem que estar se
144
organizando e este é um grande problema nosso. Tem muita dificuldade de se
organizar, (...) nós somos muito pacíficos. Aí eu digo para você porque que nós
somos assim? Nós somos filhos da ditadura, nós não podíamos nos organizar
em grupos porque nós íamos presos e isso passou para nós. (...) Nós temos
uma situação que está acontecendo hoje no Brasil, a situação dos deputados
com aumento de salário de 90%, isto é motivo de “fechar o tempo”. Isto é motivo
da gente ir para a rua, com faixas e invadir o palácio. Ah! Mas o presidente não
tem culpa,.... Mas os deputados, nós elegemos eles e aí... (...) como a gente tá
desorganizado realmente acontece tudo isso. (...) Se fosse outro país o “pau
tava quebrando” hoje. O país entrava em colapso...” Entrevistado nº 5
Analisando de forma conjunta as respostas podemos iniciar pela questão
política apontada na última citação, na qual o entrevistado identifica períodos
anteriores na história em que havia uma maior mobilização da população,
como por exemplo a da década de 80, quando ao término da ditadura houve a
grande influencia dos movimentos sindicais e a população organizada
reivindicando seus direitos. Porém na seqüência ocorre a crescente adoção no
país dos ideais neoliberais que precarizaram o emprego, reduziram salários,
diminuíram propositadamente o poder de mobilização dos sindicatos,
incentivaram o individualismo através do qual cada um é responsável por si
mesmo reduzindo o espírito coletivo, uma ausência bastante significativa do
Estado nas políticas sociais o que faz com que cada um tenha que buscar sua
própria sobrevivência em praticamente todos os momentos de sua vida, etc.
Todos estes fatores acabam gerando o imobilismo citado pelo entrevistado. Os
fatos causam indignação, mas na maioria das vezes não levam a ação.
(ROCHA; NUNES, 1994; ANTUNES, 2001).
A situação atual de imobilização da sociedade civil e a forma como isto
repercute na área da saúde está bem configurada na citação abaixo:
A mobilização dos segmentos excluídos/despossuídos, sua
afirmação como sujeitos sociais, potencialmente capazes de
“assumir ações mais ousadas, uma vez que (...)não tem mais
nada a perder no universo da sociabilidade do capital”(Antunes,
1995), impulsionaria, por certo, a procura de maior equidade no
direcionamento das solões. Mas, no contexto atual,
extremamente desfavorável ao pólo trabalho e, em virtude da
fragilidade na aglutinação efetiva desses segmentos, as
propostas destinadas ao crescimento do nível de emprego
145
voltam-se para alternativas como: incentivos à contratação,
manutenção e capacitação da mão-de-obra; acordos mais
flexíveis de tempo de trabalho, limitações de horas extras,
redução da jornada de trabalho e até a reformulação do
seguro-desemprego. A luta pela manutenção do emprego
torna-se, portanto, prioritária e obriga a relegar as questões de
saúde, que começava a tomar corpo, a um plano secundário
nas agendas sindicais (MINAYO-GOMEZ; THEDIN COSTA,
1997, p. 30)
Apesar do contexto, um dos entrevistados aponta a importância de ter
ampliada a participação da organização sindical no CEREST. Esta participação
está garantida pelas normativas do SUS, através dos Conselhos de Saúde e
das Conferências como espaços deliberativos e de participação da sociedade
civil na estruturação e elaboração da política de saúde. Estes espaços
infelizmente em alguns casos acabam por não atender as necessidades pelas
quais são criados.
Mesmo a Saúde dos Trabalhadores não sendo prioridade para o
movimento sindical, pela precariedade na qual se encontra o trabalho
atualmente, a organização sindical de Blumenau, principalmente através do
CISAT conta com um grande número de trabalhadores vinculados o que lhes
garante um poder que pode vir a influenciar novamente as decisões políticas e
técnicas na área de saúde do trabalhador, como ocorreu por ocasião do
surgimento do Programa de Saúde do Trabalhador e posteriormente do
CEREST.
146
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisar os avanços e as limitações de uma unidade de Saúde do
Trabalhador exige que o Trabalho e o Processo Saúde/Doença sejam
considerados como processos historicamente construídos. Desta forma, é
necessário considerar a estrutura societal na qual esta unidade de saúde está
inserida.
Analisando-se a estrutura da sociedade é possível concluir que o Brasil,
atualmente, caracteriza-se como um país periférico, dentro de uma conjuntura
capitalista, que adotou os pressupostos Neoliberais como forma de
organização do Estado. Este modelo de Estado não se modificou
substancialmente com o Governo Lula nos últimos anos. Alguns dos principais
pressupostos do neoliberalismo são: a redução do Estado, o que leva a
crescente redução dos direitos sociais conquistados em décadas anteriores; as
privatizações do aparelho estatal; a maior liberalização do mercado financeiro;
a criação do desemprego estrutural; a fragilização dos sindicatos, entre outros.
Dentro desta estrutura de Estado Neoliberal e no conjunto de medidas
estabelecidas por este, prevalece uma organização do trabalho baseada no
Toyotismo, que prevê entre outras coisas, a flexibilização da produção (que
tem como objetivo atender a demandas específicas) e a flexibilização do
trabalho. Esta última etapa se torna possível através da redução dos direitos
trabalhistas, tendo como pano de fundo o desemprego estrutural. O resultado é
um mercado de trabalho cada vez mais escasso, precarizado, flexibilizado e
terceirizado.
As conseqüências desta estrutura de Estado Neoliberal associado às
formas de produção extremamente maleáveis e a priorização do mercado
financeiro, causam um impacto sobre os trabalhadores. Como por exemplo, o
aumento de desempregados, a redução de trabalhadores no mercado formal e
uma modificação no perfil de morbi-mortalidade dos trabalhadores.
Quanto a Saúde dos Trabalhadores, a partir destas intensas
modificações ocorridas nas últimas décadas, podemos dizer que os
trabalhadores continuam expostos a acidentes de trabalho em índices
147
extremamente altos e o país continua não adotando medidas eficazes para
reduzi-los; o mesmo ocorre com as sub-notificações que, tamm, continuam a
ser uma realidade. Novas formas de adoecimento foram inclusas às anteriores,
como o aumento das doenças mentais relacionadas ao trabalho, ocasionadas
pelo aumento do stress, pela intensificação do trabalho e pelo temor de perder
o emprego; os trabalhos repetitivos e fragmentados que continuam a
caracterizar vários ramos produtivos; a utilização de novas substâncias e
tecnologias, que causam efeitos não totalmente identificáveis; além das
questões ambientais e sociais como o aumento da violência, principalmente,
nos grandes centros urbanos. Todas estas questões que afetam a saúde dos
trabalhadores estão inseridas num contexto de crescente distanciamento do
Estado das políticas sociais.
O impacto desta estrutura de Estado sobre a Política Pública de Saúde,
tamm, é importante de ser citada. Na década de 80 houve uma série de
avanços com relação a esta política pública, vindo a atender uma demanda
interna (mobilização da classe média que almejava direitos somente garantidos
às classes mais abastadas; situação extremamente precária em termos de
saúde à grandes parcelas da população brasileira, entre eles, o elevado índice
de mortalidade materna e infantil e os acidentes de trabalho; havia ainda
mobilizão de profissionais de saúde e alguns políticos) e a pressões
internacionais que ocorriam no sentido de garantir assistência básica de saúde
à toda população e redução do número de acidentes de trabalho. Estes fatores
favoreceram a inclusão na Constituição de 1988 do Direito a Saúde, inclusive a
Saúde do Trabalhador.
Infelizmente, na década seguinte este cenário sofre significativas
mudanças pela adesão ao modelo Neoliberal, ocasionando uma crescente
privatização e redução dos recursos para a política pública de saúde. Além do
descumprimento da legislação, tanto por parte do Estado quanto dos
empresários.
Todos estes aspectos que caracterizam a organização de Estado na
atualidade, tamm, estão presentes em Blumenau, apesar da imagem tão
amplamente divulgada de cidade que segue os moldes europeus e que,
portanto, não apresentaria os mesmos problemas do restante do país, o que é
uma falácia. Blumenau não conseguiu se eximir do panorama nacional de
148
adesão ao Neoliberalismo e, na década de 90, teve sua economia fortemente
afetada. Desta forma, a indústria têxtil, base da economia no município, sofreu
intensamente as conseqüências desta estrutura de Estado e das políticas
econômicas adotadas. Assim, várias empresas tiveram dificuldades de se
adaptar a esta nova realidade, por terem seu parque fabril não condizente com
as últimas tendências tecnológicas e poucas possibilidades de comercializar
seus produtos em um mercado sem marcos regulatórios e globalizado. Estas
empresas adotaram várias das tendências do toyotismo, o que as levou a
demitir muitos trabalhadores e terceirizar grande parte do seu processo de
trabalho. As conseqüências destas intensas modificações foram o aumento das
condições de precarização e da informalidade no trabalho. Mesmo quando a
fase mais aguda da crise passou, as empresas continuaram com os métodos
de trabalho implantados anteriormente.
É dentro desta configuração de Estado, de Trabalho e de
Saúde/Doença, que se insere o CEREST e na qual foi realizada a análise dos
avanços e limitações.
Primeiramente, quanto a criação do CEREST constatou-se a confluência
de vários fatores e atores sociais, entre estes, a organização sindical do
município, partidos de oposição, atuação de alguns profissionais de saúde,
legislação do SUS e um elevado índice de acidentes de trabalho.
Dentre estes fatores podemos destacar a mobilizão da organizão
sindical, que aliada a vários integrantes de partidos de esquerda,
principalmente do PT, promoveram diversas discussões sobre a Saúde do
Trabalhador. O Partido dos Trabalhadores tinha um objetivo claro que era o de
assumir o poder na administração municipal, desta forma, a Saúde do
Trabalhador tornou-se uma “bandeira” para o mesmo. A organização sindical,
tamm, utilizou a Saúde do Trabalhador como instrumento de mobilização da
classe trabalhadora, já que não havia a possibilidade de buscarem melhores
salários para seus associados, num momento de altas taxas de desemprego e
estabilidade da moeda após um longo período de hiperinflação, que tinha por
objetivo facilitar a implantação dos ideais neoliberais.
É possível identificar, desta forma, que a motivação que levou estes
atores sociais a lutar pela implantação de um Centro de Referência em Saúde
do Trabalhador não foi, prioritariamente, o trabalhador em si, mas sim, um
149
interesse de mobilização da classe trabalhadora para que seus objetivos
políticos partidários e de perpetuação das organizações sindicais fossem
alcançados. Esta compreensão é fundamental porque influencia no parcial
afastamento destes dois atores sociais, principalmente, por parte do poder
público municipal que alcançou seu objetivo ao assumir a Prefeitura durante
dois mandatos consecutivos (1996 – 2004).
Com relação ao afastamento do poder público municipal, cabe uma
reflexão, considerando a estrutura de Estado Neoliberal que preconiza,
conforme já foi abordado, a redução do Estado, o que significa o afastamento
deste das Políticas Sociais, entre elas, a da Saúde. Outro ponto fundamental é
a priorização do capital dentro desta estrutura de Estado, desta forma, mesmo
tendo assumido o governo municipal um partido de esquerda e que, teve em
sua base de apoio a classe trabalhadora, verificou-se o afastamento no que
tange a Política de Saúde do Trabalhador, levando-nos a considerar que,
independentemente da questão político-partidária, os ideais neoliberais
prevalecem. É mais confortável para o poder público manter-se afastado da
forma de organização do processo de trabalho que as empresas e indústrias
adotam, do que se confrontar com a classe empresarial, que detém uma
parcela do poder econômico, utilizada inclusive para o financiamento da política
partidária dentro da sociedade.
Os movimentos sindicais, apesar de terem uma participação decisiva
para o surgimento das ações em Saúde Trabalhador no município, tamm
tiveram um desempenho aquém do esperado nesta área, em parte porque não
desejavam fazer oposição a um governo do qual faziam parte. Outro fator foi a
fragilização do poder sindical, característica de um Estado Neoliberal. A
grande maioria dos sindicatos, atualmente, tem como objetivo principal a
manutenção do emprego dos trabalhadores. As condições nas quais este
ocorre, infelizmente, não consegue ser o foco da atuação sindical, visto a
fragilização que atinge os trabalhadores dentro da perspectiva neoliberal de
desemprego estrutural, redução dos salários, precarização e terceirização do
trabalho, isto faz com que assumam uma postura individualista (cada um
desejando manter o seu próprio emprego) em detrimento do senso de
solidariedade e de grupalidade, que caracterizava os trabalhadores de épocas
anteriores.
150
Com relação as ações desenvolvidas pelo CEREST, pode-se concluir
que o projeto inicial para este Centro tinha um enfoque amplo, incluindo as
áreas de assistência, de vigilância e fiscalização, pesquisa e informação,
baseando-se nos pressupostos do SUS. Destas diversas funções foi a
Assistência a que mais atingiu seus objetivos ao garantir ao trabalhador a
continuidade do atendimento, que em anos anteriores não tinha um local
definido para ser realizado. Esta continuidade do atendimento aumentou a
resolutividade quanto aos acidentes de trabalho, possibilitando uma
recuperação mais rápida do trabalhador. Neste aspecto, favoreceu, tamm, as
empresas que reduziram o tempo de afastamento do trabalhador por acidentes.
Outro avanço quanto a assistência foi o estabelecimento de nexo causal para
as doenças ocupacionais, principalmente as LER/DORT. A média de nexos
positivos dentre as doenças ocupacionais é de 30%.
Esta ampliação na identificação de doenças ocupacionais é um avanço
importante porque as doenças ocupacionais necessitam de uma compreensão
por parte dos profissionais de saúde, principalmente, do médico, a quem cabe
a responsabilidade de estabelecer o nexo causal baseado numa perspectiva de
saúde/doença pautada pela multicausalidade e considerando o trabalho como
um dos fatores presentes no adoecimento.
Apesar do registro das doenças ocupacionais se tornar uma realidade no
município de Blumenau a partir do CEREST, esta é uma área que necessita de
estudos mais aprofundados. Como as doenças ocupacionais não são tão
facilmente identificáveis como os acidentes de trabalho (compreensão do
processo saúde/doença precisa ser multicausal e não unicausal), é provável
que haja uma subnotificação ainda maior do que no caso dos Acidentes de
Trabalho, que já são enormes. Muitos trabalhadores adoecidos devem estar
sendo assistidos na rede pública ou privada por suas patologias sem que o
trabalho tenha sido considerado como um importante fator neste adoecimento.
O pouco conhecimento de gestores e profissionais de saúde quanto a este
aspecto passam a ser um dos fatores que influenciam na subnotificação.
Já na área da Vigilância, os avanços não ocorreram da mesma forma
que na Assistência. Houve uma transformação neste processo do seu período
inicial até o final do período analisado. No inicio do Programa de Saúde do
Trabalhador (1994 a 1996) houve uma atuação que realmente considerava
151
intervir no processo e na organização do trabalho e, desta forma, impedir o
adoecimento dos trabalhadores. Neste período, a Vigilância era feita com a
participação de profissionais do Programa de Saúde do Trabalhador, inclusive
da área médica, e havia, ainda, a parceria com os Sindicatos. Este processo
identificou, por exemplo, empresas que tinham mais de 50% de seus
trabalhadores adoecidos. Posteriormente, os profissionais médicos se
afastaram deste processo, o que gerou um retrocesso na área. Este retrocesso
torna-se tão significativo tendo em vista a centralidade que caracteriza a
profissão médica dentre as demais profissões da saúde. Com relação à Saúde
do Trabalhador, esta centralidade pode ser constatada pelas CATs, que
possuem um campo restrito ao profissional médico e sem o devido
preenchimento deste a CAT não é aceita pelo INSS. O estabelecimento do
nexo causal é outro exemplo da supervalorização desta categoria numa área
em que a multidisciplinariedade deveria ser uma constante.
Outro fator que influenciou negativamente um maior avanço na área de
Saúde do Trabalhador, principalmente na Vigilância, foi a mercantilização do
trabalho dos profissionais de saúde, sobretudo o dos médicos. Este conflito
evidencia-se, principalmente, quando há o interesse de conciliar a atuação na
esfera pública e privada.
Conforme visto anteriormente, na medida em que a Assistência cumpre
com seu papel junto aos trabalhadores há uma maior resolutividade. Porém, se
considerarmos o princípio da Integralidade, veremos que as ações em Saúde
do Trabalhador não atingem seus objetivos plenamente, já que esta prevê que
sejam desenvolvidas ações de prevenção, de promoção e de assistência ou
recuperação. As ações de prevenção para serem colocadas em prática
necessitam de uma atuação eficaz na área de Vigilância, porque, desta forma,
haverá uma intervenção no processo produtivo no sentido de adequá-lo para
reduzir os riscos de acidentes de trabalho. A não priorização das ações de
Vigilância traz conseqüências negativas tanto para o poder público, gerando
custos mais elevados no tratamento e na recuperação dos trabalhadores,
quanto para os trabalhadores que ficam expostos a maiores riscos de
acidentes e doenças, sofrendo as conseqüências de um processo produtivo
organizado para a valorização do capital e do poder público que se ausenta de
sua responsabilidade.
152
A promoção à saúde, outro dos aspectos da integralidade da atenção,
engloba uma atuação intersetorial. Esta atuação tamm é extremamente
precária no que diz respeito à Saúde do Trabalhador. Observa-se a existência
de vários órgãos públicos que tem interface direta com o trabalhador e sua
saúde, porém, a organização e os objetivos destas instâncias governamentais
não seguem um mesmo padrão. Mesmo a criação de um órgão específico para
esta função de articulação entre os diversos Ministérios - o Geisat - não
consegue solucionar as principais problemáticas da saúde do trabalhador. Uma
das principais áreas de conflito para o trabalhador é o INSS, que adota uma
postura de privilegiar a classe empresarial. Isto ocorre quando este órgão
público, preferencialmente, caracteriza o benefício do trabalhador como auxílio-
doença e não como auxílio acidente de trabalho. Isto lesa o trabalhador que
não terá a estabilidade no emprego e nem seu FGTS depositado durante o
período de afastamento. A relação com o Ministério do Trabalho e Emprego
tamm é superficial, dificilmente possibilitando o desenvolvimento de ações
conjuntas. A precária articulação destes diferentes Ministérios quanto à saúde
do Trabalhador serve como exemplo para identificar a redução do Estado
quanto às políticas sociais.
Quanto a Regionalização e Hierarquização, concluímos que Blumenau
foi um dos primeiros municípios do País a aderir ao modelo de Gestão Plena.
Nesta modalidade de gestão, o município torna-se responsável por uma maior
quantidade e complexidade de ações na área da saúde. Blumenau optou por
executar as ações em Saúde do Trabalhador num Centro de Referência
específico. Alguns teóricos apontam que esta não é a maneira ideal de prestar
o atendimento aos trabalhadores; outros reforçam que desta forma ocorrem
alguns avanços que quando a Saúde dos Trabalhadores está inserida nas
demais unidades não consegue alcançar. O ideal com certeza é a primeira, que
supõem que os profissionais de toda a rede de atenção tenham conhecimentos
necessários na área de Saúde do Trabalhador, o que não é fácil, visto a
complexidade do que caracteriza o mundo do trabalho na atualidade. Esta
dificuldade de identificação dos acidentes de trabalho, bem como das doenças
ocupacionais, pode ser identificado através dos dados do CEREST os quais
apontam que 90% dos encaminhamentos para esta unidade de saúde são
feitos pela rede hospitalar, ou seja, toda a rede básica de saúde composta por
153
mais de 30 Unidades do Programa de Saúde da Família, além dos 07
Ambulatórios Gerais, não realiza nem 3% dos encaminhamentos para o
CEREST. A segunda posição apresentada parece, dentro deste contexto,
como mais coerente, pois, a criação de um Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador no município possibilitou um avanço no atendimento dos
acidentados bem como na identificação de doenças ocupacionais. Maiores
avanços devem ser buscados por este Centro de Referência, quanto a
Vigilância e Fiscalização e as demais áreas de competência desta unidade de
saúde.
Com relação a política de saúde do trabalhador, a maioria dos
entrevistados afirmou a possibilidade de implantação desta política, mas,
percebe-se que fizeram uma leitura muito restrita desta realidade,
considerando a necessidade de pressionar o poder público através da
organização sindical. Esta mobilização local pode surtir alguns efeitos positivos,
porém, a conjuntura de organização do Estado, no momento atual, não
possibilita avanços significativos com relação a política pública de saúde, nem
com relação a ampliação dos direitos dos trabalhadores. Considerando esta
concepção macro, torna-se possível compreender porque a proposta do
Ministério da Saúde de implantação da RENAST, que tem como objetivo a
ampliação das ações em Saúde do Trabalhador nos municípios brasileiros, não
alcança seus objetivos de forma ampla.
Blumenau foi um dos Centros habilitados dentro desta política e, de
acordo com os atores sociais entrevistados, não trouxe mudança significativa,
assim como a nível estadual, confirmam-se os mesmos índices a partir da
avaliação realizada pelo Sindicato dos Químicos Unificados. O próprio
Ministério da Saúde ressalta alguns fatores dificultadores para a efetivação da
RENAST, entre eles, a nova configuração de regionalização adotada. Esta não
segue a regionalização que os municípios adotam nas outras pactuações da
área da saúde configurando-se uma nova região específica para a saúde do
trabalhador, o que cria uma problemática com relação a difícil articulação entre
gestores de diferentes micro-regiões. O pouco conhecimento dos gestores
sobre o Trabalho como um importante fator de adoecimento, tamm, foi citado
pelo Ministério da Saúde como dificultador para a implementação da política.
Portanto, a RENAST traz alguns recursos e amplia a discussão sobre a
154
temática de Saúde do Trabalhador, mas não garante a efetividade das ações
nesta difícil área da Saúde Pública.
Quanto a universalidade e a eqüidade da atenção, estes dois princípios
se deparam com dois problemas estruturais da área da Saúde do Trabalhador.
O primeiro refere-se a crescente ausência do Estado quanto as Políticas
Públicas Sociais, lançando cada vez mais a responsabilidade dos mínimos
sociais sobre o próprio indivíduo, eximindo-se o poder público de efetivar estas
ações. O segundo está relacionado a configuração do trabalho na sociedade
capitalista das últimas décadas, onde o trabalho se caracteriza por vínculos
precários ou pela informalidade, este último, muitas vezes, realizado dentro do
próprio domilio. Portanto, a redução da estrutura de Estado para prestar o
atendimento à população quanto aos direitos fundamentais como a fragilidade
do mercado de trabalho para os trabalhadores são fatores que dificultam o
acesso e a identificação (notificação) dos trabalhadores vítimas de acidente de
trabalho ou doença ocupacional a rede SUS.
Apesar do contexto negativo que circunda os trabalhadores e seus
direitos, foi importante perceber a motivação de alguns dos entrevistados
quanto a saúde do trabalhador e, principalmente, a atuação de um dos
Sindicatos, que foi citado pelos atores sociais entrevistados, como exemplo, na
realização de ações de prevenção nesta área, reduzindo significativamente a
quantidade de acidentes de trabalho entre os trabalhadores a ele vinculados. O
avanço quanto a identificação das Doenças Ocupacionais e do atendimento
aos trabalhadores acidentados, tamm, não podem ser menosprezados, por
mais que se constate a necessidade urgente do avanço na área da prevenção
e da promoção.
A postura a ser adotada com relação à implantação de uma política
pública, que vem na contra-mão do modelo hegemônico, pode ser comparada
ao que foi citado por um dos entrevistados representando o controle social - A
Fábula do Pássaro e o Incêndio na Floresta.
Certo dia houve um grande incêndio na floresta e todas as
áreas foram cercadas por um fogo denso. Os animais,
atônitos, não sabiam o que fazer e nem para onde correr. De
repente, todos pararam e viram que o beija-flor ia até a
margem do rio, mergulhava, pegava em seu bico algumas
gotas de água, voava até o fogo e deixava a gotinha cair sobre
155
as labaredas. O elefante, vendo aquilo, disse-lhe: “Você está
louco? Acredita que esta simples gota pode apagar um
incêndio tão grande?”. Ao que o passarinho respondeu: “Eu
estou fazendo a minha parte e se todo mundo ajudar, com
certeza, conseguiremos alguma coisa”.
156
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1997.
161
ANEXO 1
Questionário aplicado aos Atores Sociais entrevistados para a análise do
CEREST.
As perguntas realizadas foram:
1) Quais foram os principais fatores que influenciaram para a
criação do CEREST?
2) Os atores sociais que estavam envolvidos na criação do
CEREST foram suficientes? Porque o envolvimento de mais
organizações ou movimentos não foi maior?
3) Qual era a expectativa com relação a criação do CEREST?
4) Estas expectativas foram atendidas?
5) Quais os fatores ou aspectos que podem ser relacionados para
alcançar os objetivos propostos?
6) Quais foram as mudanças que ocorreram em relação a Saúde
do Trabalhador após a implantação do CEREST?
7) Em 2003 o CEREST foi habilitado como CRST pela RENAST.
Este credenciamento trouxe mudanças significativas para a
Política de Saúde do Trabalhador em Blumenau?
8) O Sr. (a) acha que a Política de Saúde do Trabalhador pode
realmente ser implantada? Comente sua resposta.
9) Quais são suas sugestões para uma melhor atuação da Saúde
do Trabalhador no município de Blumenau?
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