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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGROECOSSISTEMAS
A POLÍTICA PARA A FEBRE AFTOSA EM SANTA CATARINA E
SUAS IMPLICAÇÕES SOBRE O BEM-ESTAR HUMANO E ANIMAL
BARBARA MARINS PETTRES
FLORIANÓPOLIS – SC, março/2007
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BARBARA MARINS PETTRES
A POLÍTICA PARA A FEBRE AFTOSA EM SANTA CATARINA E
SUAS IMPLICAÇÕES SOBRE O BEM-ESTAR HUMANO E ANIMAL
Dissertação apresentada como requisito parcial
à obtenção do título de Mestre em Agroecossistemas
Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas
Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal
de Santa Catarina.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos Pinheiro Machado
Co-orientadoras: Profª. Drª. Maria José Hötzel
Profª. Drª. Tania Maria de Paula Lyra
FLORIANÓPOLIS
2007
2
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FICHA CATALOGRÁFICA
3
Pettres, Barbara Marins
A política para a febre aftosa em Santa Catarina e suas implicações sobre o
bem-estar humano e animal / Barbara Marins Pettres. - Florianópolis, 2007.
132 f. :il., grafs., tabs.
Orientador: Luiz Carlos Pinheiro Machado
Dissertação (Mestrado em Agroecossistemas) – Universidade Federal de
Santa Catarina, Centro de Ciências Agrárias.
Bibliografia: f. 113-119.
1. Febre aftosa – Teses. 2.Bem-estar animal – Teses. 3. Políticas públicas
Teses. 4. Desenvolvimento rural – Teses. I. Título.
TERMO DE APROVAÇÃO
BARBARA MARINS PETTRES
A POLÍTICA PARA A FEBRE AFTOSA EM SANTA CATARINA E SUAS
IMPLICAÇÕES SOBRE O BEM-ESTAR HUMANO E ANIMAL
Dissertação aprovada em 22/03/2007, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre
no Programa de Pós-graduação em Agroecossistemas, Centro de Ciências Agrárias,
Universidade Federal de Santa Catarina, pela seguinte banca examinadora
__________________________________ ________________________
Prof. Dr. Luiz Carlos Pinheiro Machado Profª Drª Maria José Hötzel
Orientador Co-orientadora (UFSC)
_____________________________
Profª Drª Tania Maria de Paula Lyra
Co-orientadora (UNIPLAC)
BANCA EXAMINADORA:
___________________________ ____________________________________
Profª Drª Maria José Hötzel Prof. Dr. Sérgio Augusto Ferreira de Quadros
Presidente (UFSC) Membro (UFSC)
__________________________ ______________________________
Prof. Dr. Hélio Ademar Schuch Profª Drª Tania Maria de Paula Lyra
Membro (UFSC) Membro (UNIPLAC)
______________________________________
Prof. Dr. Luiz Carlos Pinheiro Machado Filho
Coordenador do PGA
FLORIANÓPOLIS, 22 DE MARÇO DE 2007
4
Dedico
ao meu pai querido, Abel, e à minha mãe,
Terezinha, por terem me despertado
para a leitura e estudo, começando pelos gibis,
muita saudade.
Aos meus irmãos, Ana, Angela e Cassiano.
Ao Luciano pelo companheirismo, amor e
amizade, todos esses anos.
5
Tão delicados (mais que um arbusto) e correm e
correm de um lado para o outro, sempre esquecidos
de alguma coisa. Certamente falta-lhes
não sei que atributo essencial, posto se apresentem
nobres e graves, por vezes. Ah, espantosamente graves,
até sinistros. Coitados, dir-se-ia que não escutam
nem o canto do ar nem os segredos do feno,
como também parecem não enxergar o que é vivel
e comum a cada um de nós, no espaço. E ficam tristes
e no rasto da tristeza chegam à crueldade.
[...]
Um boi vê os homens
Carlos Drummond de Andrade
Num mundo mais velho e mais completo que o nosso,
eles (os animais) se movem completos e confiantes,
dotados de extensões de sentidos que nós perdemos ou
nunca possuímos, guiando-se por vozes que nós nunca
ouviremos. Eles não são irmãos [...]. Eles são outras
nações, presos conosco nesta vida e neste tempo,
prisioneiros do esplendor e trabalho da terra.
[...]
Trecho de The Outermost House, de Henry Benton,
citado no filme Earthlings (Terráqueos)
6
AGRADECIMENTOS
Ao professor Luiz Carlos Pinheiro Machado, que aceitou me orientar em meio a suas
andanças pelo mundo, muito obrigada pelas contribuições e toda a atenção a mim dispensada.
À professora Maria José Hötzel, pelo incentivo, e por ter me despertado o interesse
pela área de bem-estar animal.
À professora Tania Maria de Paula Lyra, que com muita gentileza aceitou contribuir
com seus conhecimentos neste trabalho.
Aos professores e colegas de mestrado, pelo tempo bom passado em sala de aula e fora
dela. À Janete, pela solicitude e competência.
À Tanice Andreatta e sua família, pela acolhida em ia, ajuda na selão dos
entrevistados, acompanhamento nas entrevistas e por todas as informações preciosas.
Aos entrevistados em Jóia, pela hospitalidade e por me abrirem suas histórias.
7
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE FOTOS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE SIGLAS
LISTA DE TABELAS
RESUMO
ABSTRACT
1 INTRODUÇÃO...............................................................................................................17
1.1 OBJETIVOS..................................................................................................................19
2 REFERENCIAL TEÓRICO...........................................................................................21
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA FEBRE AFTOSA.................................................................21
2.2 O PAPEL DA INGLATERRA NA CONSTRUÇÃO DE UM PROBLEMA
MUNDIAL...........................................................................................................................22
2.2.1 Reflexos sobre o comércio internacional.......................................................................25
2.2.1 Vacinação e animal portador........................................................................................27
2.3 A FEBRE AFTOSA NA AMÉRICA DO SUL................................................................28
2.3.1 A enfermidade no Brasil...............................................................................................32
2.4 ÉTICA E BEM-ESTAR ANIMAL..................................................................................38
2.4.1 Considerações sobre a discussão ética e cienfica em torno dos animais.......................38
2.4.2 Ética e avaliação de risco na erradicação da febre aftosa...............................................42
3. METODOLOGIA...........................................................................................................46
3.1 NATUREZA E ETAPAS DA PESQUISA......................................................................46
3.2 GRUPOS ENTREVISTADOS........................................................................................48
3.3 INTERPRETAÇÃO DOS DADOS.................................................................................50
3.4 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO DE CASO...........................................51
4. RESULTADOS...............................................................................................................52
4.1 RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA FEBRE AFTOSA NO CIRCUITO PECUÁRIO
SUL......................................................................................................................................52
4.1.1 A reintrodução no Rio Grande do Sul...........................................................................52
4.1.2 A enfermidade em Santa Catarina.................................................................................56
4.2 CARACTERIZAÇÃO DOS ENTREVISTADOS...........................................................63
4.2.1 Jóia..............................................................................................................................63
4.2.2 Instituições agrícolas....................................................................................................65
4.3 A POLÍTICA DE ERRADICÃO NA OPINIÃO DOS CRIADORES DE
JÓIA.....................................................................................................................................66
4.3.1 Avaliação da política no Rio Grande do Sul..................................................................66
4.3.2 Vacinação e não vacinação...........................................................................................66
4.3.2.1 Adequação do retorno à vacinação............................................................................66
4.3.2.2 Comparação entre vacinação e não vacinação........................................................... 67
4.3.3 Comunicação do surto..................................................................................................69
8
4.3.4 Sacrifício......................................................................................................................69
4.3.5 Bem-estar animal .........................................................................................................70
4.3.6 Bem-estar humano.......................................................................................................74
4.3.7 Reflexos sobre a renda e a atividade econômica............................................................76
4.3.8 Comunicação...............................................................................................................78
4.3.9 Consumo......................................................................................................................79
4.4 A POLÍTICA DE ERRADICAÇÃO NA OPINIÃO DAS INSTITUIÇÕES
AGRÍCOLAS.......................................................................................................................79
4.4.1 Adequação da política..................................................................................................79
4.4.2 Vacinação e não vacinação...........................................................................................80
4.4.2.1 Manutenção da não vacinação...................................................................................80
4.4.2.2 Apoio dos criadores..................................................................................................82
4.4.2.3 Comparação entre vacinação e não vacinação............................................................84
4.4.2.4 Vantagens do atual status sanitário............................................................................86
4.4.2.5 Voltar a adotar a vacina.............................................................................................87
4.3.2.6 Vacinação em anel.....................................................................................................87
4.3.3 Sacrifício......................................................................................................................88
4.3.4 Bem-estar animal..........................................................................................................89
4.3.5 Bem-estar humano.......................................................................................................90
4.3.6 Comunicação...............................................................................................................91
4.3.7 Consumo.....................................................................................................................93
5. DISCUSSÃO...................................................................................................................94
5.1 ERRADICAÇÃO, VACINAÇÃO E PARTES INTERESSADAS...................................94
5.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE A POLÍTICA.................................................97
5.2.1 Setor agropecuário de Santa Catarina...........................................................................97
5.2.1.1 Bem-estar humano e animal e as ações de controle da doença....................................99
5.2.2 Agricultores de Jóia....................................................................................................102
5.2.3 Riscos e oportunidades da política sanitária de Santa Catarina....................................104
6. CONCLUSÕES.............................................................................................................109
7. NOTA SOBRE A METODOLOGIA...........................................................................112
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................113
ANEXOS...........................................................................................................................120
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Representação geográfica da densidade de focos de febre aftosa ocorridos no Cone
Sul a partir do ano 2000........................................................................................................32
Figura 2. Caracterização epidemiológica da febre aftosa em Santa Catarina – Cidasc/SC, 1971
a 1993...................................................................................................................................35
Figura 3. Focos de febre aftosa no Brasil no período de 1970 a 2001.....................................38
Figura 4. Comparação da cobertura vacinal e ocorrência de febre aftosa Cidasc/SC 1971 a
2000.....................................................................................................................................58
10
LISTA DE FOTOS
Foto 1. Animais sendo conduzidos para a vala......................................................................72
Foto 2. Animais sendo contidos na vala para posterior sacrifício...........................................72
Foto 3. Abertura das cavidades torácica e abdominal............................................................73
11
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Evolução histórica do combate à febre aftosa na Europa.......................................24
Quadro 2. Cronologia da condição sanitária para febre aftosa nos países e estados que
compõem o PHEFA – Cone Sul - Bacia do Rio do Prata, 1981a 2006. .................................31
12
LISTA DE SIGLAS
ACCS - Associação Catarinense de Criadores de Suínos
CAFASC – Campanha de Combate à Febre Aftosa em Santa Catarina
CIDASC – Companhia Integrada de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina
DFA/SC - Departamento Federal de Agricultura de Santa Catarina
EMATER/RS - Associação Rio-Grandense de Empreendimentos de Assistência Técnica e
Extensão Rural
FA – Febre aftosa
FAESC - Federação da Agricultura de Santa Catarina
FETAESC - Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Santa Catarina
FETRAF-SUL – Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar – Sul
FMDFoot and mouth disease
MAFF - Ministry of Agriculture, Fisheries and Food (Inglaterra)
MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
OIE – Organização Mundial de Saúde Animal
PANAFTOSA – Centro Panamericano de Febre Aftosa
PNEFA - Programa Nacional de Erradicação da Febre Aftosa
PHEFA – Programa Hemisférico de Erradicação da Febre Aftosa
RS – Rio Grande do Sul
SAR – Secretaria de Estado da Agricultura e Desenvolvimento Rural de Santa Catarina
SC – Santa Catarina
SINDICARNE - Sindicato dos Produtores de Carne de Santa Catarina
13
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Idade, escolaridade e gênero dos 11 agricultores....................................................64
Tabela 2. Tamanho das propriedades estudadas e condição do uso da terra...........................64
Tabela 3. Rebanhos totais antes e depois do surto.................................................................65
Tabela 4. Idade e escolaridade dos 9 entrevistados nas instituições agrícolas.........................65
Tabela 5. Comparação entre respostas para a vacinação e não vacinação em Jóia..................67
Tabela 6. Comparação entre respostas para a vacinação e não vacinação Instituições
agrícolas...............................................................................................................................85
14
RESUMO
A febre aftosa é uma doença que afeta animais de casco bipartido. Caracteriza-se por ser de
baixa letalidade nos animais suscetíveis, porém de alta morbidade, sem ameaça às vidas
humanas. É considerada uma doença que restringe o acesso a mercados internacionais de
carne. A política de controle e erradicação da enfermidade tida como ideal é baseada no
sacrifício sanitário dos animais infectados e contatos e a vacinação se constitui em barreira
comercial. Santa Catarina é o único Estado brasileiro que não imuniza o rebanho bovino contra
a doença. O objetivo do trabalho foi discutir a política para a febre aftosa adotada em Santa
Catarina, especialmente a não-vacinação, e relacionar essa política a aspectos éticos e voltados
ao bem-estar humano e animal. Um estudo de caso foi realizado em Jóia/RS, onde ocorreu um
surto em 2000 e foram sacrificados 11.067 mil animais, a maioria rebanho leiteiro. Foram
entrevistados nove representantes de instituições agrícolas catarinenses e sete famílias de
agricultores que tiveram seus rebanhos sacrificados em Jóia. A abordagem utilizada no estudo
de caso e nas entrevistas em Santa Catarina foi a da pesquisa qualitativa, complementada com
dados quantitativos. Os resultados do trabalho apontaram que a maioria das instituições
agrícolas catarinenses ouvidas é contrária à vacinação, a fim de manter e ampliar mercados às
exportações de carne suína e de aves. Preocupações sobre repercussões sociais tenderam a se
concentrar em efeitos sobre a renda das famílias afetadas. O estudo de caso em Jóia
demonstrou que houve uma ruptura prolongada nos modos de vida no meio rural afetado,
efeitos sobre a saúde mental das pessoas, perda de renda e alterações na economia local.
Depoimentos de agricultores e de alguns representantes de instituições agrícolas indicam que a
realizão do rifle sanitário apresentou problemas de manejo e bem-estar pobre na ação de
sacrifício. Aceitando a premissa de que animais o seres sensitivos, tal tratamento é
inaceitável. Os entrevistados em Jóia foram favoráveis ao retorno à vacinação no Estado do
Rio Grande do Sul e consideraram a imunização efetiva como um fator de segurança. O
trabalho conclui que a experiência real de um surto resulta em conseqüências traumáticas e
duradouras e existe a necessidade de planejar políticas públicas que incluam aspectos sociais,
éticos, ambientais, de bem-estar animal e avaliação de impactos em outras áreas da economia,
como o turismo. Esses efeitos não foram previstos no programa oficial de erradicação no Rio
Grande do Sul e não estão contemplados na política catarinense.
15
ABSTRACT
Foot and mouth disease is a disease that affects animals of bipartite hoof. It is characterized for
being of low lethality in the susceptible animals, however of high morbidity, and is not a threat
to human beings. It is considered an illness that restricts the access to international meat
markets. The politics of control and eradication of the disease considered as ideal is based on
the sanitary sacrifice of all infected animals and contacts, while vaccination constitutes in trade
barrier. Santa Catarina is the only one Brazilian state that does not immunize the bovine herd
against the illness. The objective of this study was to discuss the politics for the foot and
mouth disease adopted by Santa Catarina, especially the non-vaccination, and to relate this
politics with ethical and human and animal welfare issues. A case study was carried out in Jóia
- Rio Grande do Sul, Brazil, where foot and mouth disease occurred in 2000, which involved
the sacrifice of 11.067 animals, most of them dairy animals. Nine representatives of agricultural
institutions in Santa Catarina and seven families of farmers who had their flocks sacrificed were
interviewed in Jóia. The approach used in the case study and the interviews were those of the
qualitative research, complemented with quantitative data. The results of the study pointed out
that the majority of the agricultural institutions in Santa Catarina are contrary to vaccination, in
order to keep and to extend pig and poultry export markets. Concerns on social repercussions
tended to concentrate on the effects on the income of the affected families. The case study in
Jóia demonstrated that the ways of life of the affected farmers was deeply disturbed, through
effects on human mental health, loss of income and changes in the local economy. Statement of
farmers and some representatives of agricultural institutions indicate that sanitary rifle involved
problems of handling and poor animal welfare in the action of sacrifice. Accepting the premise
that animals are sentient beings such treatment is unacceptable. Those interviewed in Jóia were
favorable to the return to the vaccination in the Rio Grande do Sul State and considered the
immunization a security factor. The study concludes that the experience of foot and mouth
disease results in traumatic and long term consequences and there is a need for policies that
include social, ethical, environmental, of animal welfare aspects; the impacts on other areas of
the economy, as the tourism, need to be considered. Such effects were not anticipated in the
official program of eradication in the Rio Grande do Sul and are not contemplated in the
politicy in Santa Catarina either.
16
1. INTRODUÇÃO
A febre aftosa é considerada a doença animal que causa as maiores restrições
econômicas e como tal, a política de controle e erradicação tende a se concentrar nos seus
efeitos econômicos, porém a aplicação dessa política resulta em conseqüências sociais,
ambientais e sobre o bem-estar animal nas populações afetadas.
A doença não se constitui numa ameaça às vidas humanas e as espécies suscetíveis têm
convivido e evoluído com o vírus, que foi descrito por Fracastorius, em 1546. No entanto, o
sacrifício dos animais infectados passou a ser considerado a forma ideal de controle e
erradicação, depois que alguns países a erradicaram de seu território (Inglaterra, Estados
Unidos, 1929, Canadá, 1953, México 1954). Práticas como o isolamento e a vacinação
preventiva tornaram-se barreiras comerciais não-tarifárias, pois, de acordo com normas
internacionais, países que praticam vacinação e não sacrificam os rebanhos infectados pela
febre aftosa sofrem sanções comerciais para exportar animais suscetíveis vivos e seus
produtos.
O status de área livre de febre aftosa sem vacinação tornou-se o principal objetivo a ser
conquistado conforme as regras atuais. Entretanto, países ou regiões que deixam de imunizar
os animais tornam seus rebanhos vulneráveis, o que pode acarretar conseqüências sociais e
perda de renda no meio rural e grande perda de bem-estar animal no caso de um surto. No
Brasil, o aparecimento da doença no Rio Grande do Sul, em 2000 e 2001, e no Mato Grosso
do Sul, em 2005, embora numa escala menor, teve repercussões sociais semelhantes ao que
ocorreu na grande epidemia em 2001, na Grã-Bretanha, quando foram sacrificados milhões de
animais e outros setores da economia foram fortemente afetados.
Esta pesquisa concentra-se na política de erradicação da febre aftosa, especialmente no
17
caso de Santa Catarina, único Estado brasileiro que, desde 2000, não imuniza os bovinos e
possui o status de área livre de febre aftosa sem vacinação, concedido pelo Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), e reconhecido nacionalmente devido à
condição sanitária diferenciada dos Estados e países vizinhos. Todos os demais Estados
aplicam a vacinação e, no caso da existência de um foco da doença, realizam sacrifício dos
animais infectados e seus contatos
1
.
Santa Catarina e o Estado vizinho, Rio Grande do Sul, em 1998, foram considerados
pela Organização Mundial de Saúde Animal/OIE, zona livre de febre aftosa com vacinação. O
próximo passo era a obtenção, da OIE, do certificado internacional de zona livre sem
vacinação, que está em vias de ser homologado
2
. Para obter essa condição, em 2000, a
imunização nos dois Estados foi suspensa para iniciar o processo dessa certificação. Nesse
mesmo ano, a doença reapareceu no Rio Grande do Sul e a vacinação foi retomada ali. Santa
Catarina, no entanto, manteve a não-imunização.
Este trabalho consiste principalmente numa abordagem qualitativa do problema da
política para febre aftosa. Para tanto, foram entrevistadas as principais instituições públicas e
de classe do setor agrícola de Santa Catarina. Um estudo de caso foi realizado em Jóia/RS,
onde a doença foi diagnosticada em 2000, e 543 propriedades de agricultura familiar e
assentamentos da reforma agrária tiveram seus rebanhos eliminados. No episódio foram
sacrificados 11.067 animais, sendo a maior parte rebanho leiteiro, colocando-se entre os
maiores quantitativos de animais destruídos para a erradicação da doença no Brasil, sendo a
maior parte rebanho leiteiro de pequenas propriedades.
O trabalho apresenta na primeira parte do Capítulo 2 uma revisão sumária da literatura,
relativa ao contexto histórico da doença, a construção dos métodos de controle e erradicação
1
Animais que tenham sido expostos ao contágio por contato direto e indireto com agente patógeno.
2
A Comissão Técnica da OIE aprovou em 23 de fevereiro de 2007, em Paris, o reconhecimento de Santa
Catarina como área livre de aftosa sem vacinação. A decisão técnica provavelmente será homologada na
assembléia geral da OIE em 25 de maio de 2007.
18
utilizados internacionalmente e o status sanitário sul-americano e brasileiro para febre aftosa. A
segunda parte do capítulo traz uma revisão bibliográfica sobre bem-estar animal e ética,
demonstrando que essas duas disciplinas são convergentes, o que contribui para a
compreensão contemporânea da condição dos animais. No Capítulo 3 é apresentada a
metodologia do trabalho e a caracterização dos grupos entrevistados (instituições agrícolas e
agricultores de Jóia). O Capítulo 4 refere-se aos resultados da pesquisa, iniciando com uma
reconstrução histórica sobre a reintrodução do rus no território gaúcho, em 2000 e 2001, e
sobre a evolução e estágio atual da política de erradicação em Santa Catarina, seguida da
caracterização dos grupos entrevistados e de suas opiniões sobre as políticas efetivadas no Rio
Grande do Sul e em Santa Catarina. No Capítulo 5 se a discussão dos resultados, seguida
de conclusão no Capítulo 6 e uma nota sobre a metodologia no Capítulo 7.
1.1 OBJETIVOS
A política de não-vacinação, no caso da existência de um surto, pode resultar em
perdas econômicas, impactos sociais e psicológicos entre os produtores devido ao sacrifício do
rebanho suscetível, em condições que podem atentar o bem-estar animal. Nesse contexto, este
trabalho propõe como Objetivo Geral discutir a política para a febre aftosa adotada em Santa
Catarina, especialmente a não-vacinação, e relacionar essa política a aspectos éticos e voltados
ao bem-estar humano e animal.
Como Objetivos Específicos, são propostos:
a) Identificar as representações sociais sobre a política sanitária para a febre
aftosa dos pontos de vista do setor agropecuário de Santa Catarina e de
agricultores familiares de Jóia-RS, onde ocorreu um foco em área livre sem
19
vacinação;
b) Verificar riscos e oportunidades da política sanitária de Santa Catarina,
especialmente no que se refere às repercussões sociais e sobre o bem-estar dos
animais;
c) Verificar a possibilidade de compatibilizar o bem-estar das pessoas
envolvidas e dos animais com as ações de erradicação da doença.
20
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Caracterização da febre aftosa
A febre aftosa (FA) é uma doença infecciosa, causada por um vírus que afeta todos os
mamíferos de cascos bipartidos, como bovinos, bubalinos, ovinos, caprinos, suínos e espécies
silvestres, como o javali, o tatu, o veado e a capivara. Os animais apresentam febre alta, aftas
na boca, gengiva ou ngua e feridas nos cascos e nos úberes. Perdem o apetite ou não
conseguem se alimentar e têm dificuldades em manter-se de pé.
O vírus da aftosa pertence à família Picornaviridae, gênero Aphtovirus, e possui sete
tipos e 61 subtipos. Na América Latina são encontrados os tipos A, O e C. Os tipos SAT 1, 2
e 3 ocorrem na África e na Ásia é encontrado o Ásia 1 (MAYEN, 2003). O vírus é geralmente
transmitido pelo leite, carne ou saliva do animal doente, e permanece vivo na medula óssea
mesmo após a morte do animal.
A transmissão indireta pode ocorrer de muitas maneiras, como por meio de pessoas,
veículos, equipamentos que tiveram contato com o rus, pela forragem e cama infectadas com
fezes e urina de animais doentes, por movimentações ilegais de animais e por correntes de ar,
que, conforme as condições ambientais, podem atingir grandes distâncias (SUTMOLLER et
al, 2003). A disseminação do rus de forma mecânica pode ocorrer, por exemplo, por meio de
pássaros e ratos.
A doença apresenta baixa letalidade, isto é, poucos animais morrem, a maioria se
recupera, mas a taxa de morbidade é alta, o que significa que praticamente todos os animais
21
suscetíveis expostos ao vírus adoecem, tornam-se infectados e mostram sinais clínicos da
doença. Os sintomas variam em intensidade, afetam mais animais jovens, nos quais a
mortalidade ocorre. Em vacas gestantes é freqüente a ocorrência de abortos. Na sua forma
mais severa causam comprometimento cardíaco. A infecção humana é rara, e pessoas
infectadas podem ocasionalmente apresentar sintomas passageiros como febre, dor de cabeça e
depressão.
2.2 O PAPEL DA INGLATERRA NA CONSTRUÇÃO DE UM
PROBLEMA MUNDIAL
A Inglaterra, onde a febre aftosa foi constatada pela primeira vez em 1839, é
responsável pela política de erradicação com sacrifício sanitário e pela criação de barreiras
comerciais aos países endêmicos ou que praticam vacinação. A posição inglesa foi seguida por
muitos países e, segundo Woods (2004), os métodos utilizados para o controle são mais
temidos do que a própria doença.
Na época do seu aparecimento, a febre aftosa era vista como uma doença transitória,
inevitável, da qual os animais podiam se recuperar, tornando-se mais resistentes numa nova
infecção. Os animais eram tratados
3
e isolados para prevenir a disseminação da infecção e era
feita aftização, que induzia a infecção deliberada do rebanho e sua proteção à amostra do rus
incidente, evitando assim um período de incerteza nas propriedades (SUTMOLLER et al,
2003, p. 102). Para Woods (2004, p. 3), em meados do século 19, veterinários e fazendeiros
acreditavam que os sintomas da doença e sua capacidade de difusão eram influenciados por
fatores como o estado da atmosfera, presença de sujeira e umidade, conforme a teoria
3
O tratamento previa sangria e purgação, cuidado com as lesões da boca e dos cascos e isolamento para
prevenir a disseminação da infecção.
22
miasmática da origem das doenças que predominava na época, e também pela constituição
hereditária dos animais, seu estado nutricional e emocional, revelando uma compreensão
“sofisticada” da enfermidade. Albert Howard, em seus experimentos com bovinos na Índia,
verificou que animais sadios e bem alimentados com forragem e grãos produzidos em solo
fértil não se infectavam com o vírus da febre aftosa. O gado não era isolado e nem vacinado e
entrava em contato direto com animais enfermos de propriedades vizinhas (HOWARD, 1947).
O entendimento da doença se modificou, ao longo dos anos, por influência de
aristocratas, parlamentares e criadores de raças de pedigree. A quarentena foi substituída em
1892 pelo sacrifício sanitário (stamping-out) de todos os animais infectados e contatos
suscetíveis. Para Woods, a legislação usada para controlar a aftosa foi o principal fator para
transformá-la em praga. Isso influenciou a compreensão da doença, que se tornou “temida e
vista como uma das piores pragas animais do mundo”, o contagiosa e devastadora quanto a
peste bovina, de alta letalidade. Dessa forma, foi uma praga manufaturada, ou seja, “produto
dos processos envolvidos em seu controle” (WOODS, 2004, p. 16).
A política de sacrifício sanitário passou a ser adotada em escala mundial a partir de
1992 (Quadro 1), devido ao processo de globalização quando foi acordada como política
sanitária comum pelos membros da União Européia antes de transformar-se em Bloco (LYRA,
2003). A própria Inglaterra foi responsável pelo recrudescimento dessa política, no ano de
2001, quando a doença retornou ao país após 30 anos de ausência, vindo na seqüência de
epidemias de BSE
4
e febre suína e atingindo Irlanda, França e Holanda. O MAFF, ministério da
Agricultura ings
5
adotou uma forma nova e ampliada de sacricio sanitário, o contiguous
cull”, que se concretizou na eliminação de todos os animais suspeitos ou não de infecção no
local num período de 24 horas e nas propriedades vizinhas em até 48 horas, num raio de três
4
Encefalopatia espongiforme bovina, ou doença da vaca louca.
5
Ministry of Agriculture, Fisheries and Food – MAFF.
23
quimetros de cada foco. Foram mortos em torno de 10 milhões de animais
6
, números nunca
vistos nas epidemias anteriores
7
.
Quadro 1. Evolução histórica do combate à febre aftosa na Europa e América do Norte
Data País/região Fato
1546 Itália Descoberta da febre aftosa, por Girolamo Fracastorius
1781 Alemanha Regulamentada por lei a aftização, a infecção deliberada dos rebanhos
1839 Inglaterra Introdução da doença no país
1865-67 Inglaterra
Numa epidemia de peste bovina, é aplicado sacrifício de todos os
animais infectados e seus contatos
1892 Inglaterra
“Stamping-out” é adotado pela primeira vez para a febre aftosa, e no
ano seguinte, estabelecido como política
1922-24 Inglaterra
Sacrifício sanitário é utilizado pela primeira vez para controlar uma
epidemia com mais de 3,8 mil focos. Sacrificados 356 mil animais,
carcaças enterradas ou queimadas. Sofrimento social, financeiro e
psicológico no meio rural
1929
Estados
Unidos
Erradicação da febre aftosa, usando sacrifício sanitário
1952 Europa
Aprovados planos de restrição à movimentação de animais, seguida
de uma ou mais ações: sacrifício; sacrifício e vacinação; vacinação
para manter a imunização da totalidade da população animal ou
vacinação em zonas ao longo das fronteiras. Institucionalização
internacional da visão inglesa de controle da doença e do ideal de
nação livre
1946-53 México
Implantado o programa de controle e sacrificados 500 mil bovinos e
380 mil ovelhas e suínos. Ações geram tensão social nas comunidades
rurais e alguns veterinários e inspetores são assassinados por
fazendeiros
1950 Europa
Epidemia pan-européia, com mais de 900 mil focos. Alguns países
adotam vacinação nas fronteiras. Imunização passa a ser usada na
América do Sul, com bons resultados
1967-68 Inglaterra
Epidemia: 2.228 focos, destruição de 450 mil animais. Práticas
intensivas de criação e transporte rodoviário em grande escala
aumentam o tamanho da epidemia
1980 Europa Setores agrícolas pressionam pelo fim da vacinação
1992 Europa
União Européia decide pelo fim da vacinação, adoção do sacrifício e
banimento de importação de rebanho vacinado. O uso de anel de
vacinação em áreas de entorno de focos poderia ser uma opção
2000-01
A febre aftosa se propaga pelo mundo e chega a países livres
muitos anos, caso do Japão, desde 1908, Coréia do Sul, desde 1934
2001 Inglaterra
Retorno da doença na Inglaterra. Adoção do “contiguos cull e
sacrifício de milhões de animais.
Fontes: WOODS (2004), SUTMOLLER et al (2003)
6
Conforme CRISPIN et al (2002) foram sacrificados 5,5 milhões de ovinos, 759 mil bovinos, 432 mil suínos e
7 mil indivíduos de outras espécies, como caprinos e veados, além de extermínio adicional de 3 a 4 milhões de
ovinos de ovelhas prenhes, 100 mil bezerros e um número não estimado de leitões.
7
Foram declarados infectados 2.026 locais, e, no entanto, o extermínio antecipado atingiu 10.509 locais.
Desses, apenas 2.370 locais foram testados para verificar a presença da doença.
24
Os números elevados de animais sacrificados no Reino Unido foram também resultado
do uso de modelos matemáticos de computador para simular a propagação do vírus
(CAMPBELL e LEE, 2003). Para Woods (2004, p. 140), a razão da “carnificina” não foi a
doença em si, mas a resposta “manufaturada” do governo. Para os críticos, o abate contíguo
foi um método injustifícável, não cienfico, anti-ético e bárbaro e a vacinão e abate mais
discriminado teriam atingido a mesma meta, com custos econômicos e pessoais muito menores.
2.2.1 Reflexos sobre o comércio internacional
Conforme as regras internacionais que se estabeleceram, os países passaram a adotar
diferentes políticas de controle:
- sacrifício dos animais nos locais infectados e dos contatos diretos com potencial de
contágio;
- sacrifício dos animais infectados e criação de uma área (anel) com os animais em
isolamento, para posteriormente serem abatidos;
- sacrifício nos locais infectados, criação de anel ou área de vacinação seguida de abate
de todos os animais vacinados (vacinação supressiva);
- sacrifício nos locais infectados, criação de anel ou área de vacinação (vacinação
protetora);
- anel de vacinação sem o sacrifício de todos os animais nos locais infectados e abate
dos animais vacinados;
- adoção da estratégia de vacinação geral.
Em 1994, a Rodada Uruguai do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (General
Agreement on Tariffs and Trade - GATT) e a Organização Mundial do Comércio (OMC),
25
permitiram a criação, sob condições epidemiológicas especiais, de zonas ou países livres com
vacinação, um estado temporário intermediário para obter o reconhecimento definitivo. Para
tanto, a OMC estabeleceu algumas condições, como análise de risco, transparência na
comunicação e a atenção às exigências da OIE (SARAIVA, S.D.).
Após a epidemia na Grã-Bretanha, o intervalo de tempo para recuperação do status
sanitário aos países ou zonas que aplicam vacinação foi reduzido (KITCHING, 2002), mas na
prática existem sanções comerciais a países que vacinam ou que não praticam sacrifício. As
regras da Organização Mundial de Saúde Animal estabelecem as seguintes situações e
estratégias para recuperação do status sanitário (ORGANIZÃO..., 2006a):
1. Se a FA ocorre em um país ou zona livre onde a vacinação não é praticada:
a) três meses após o último caso
8
da doença, se são aplicados sacricio sanitário e
vigilância sorológica;
b) três meses após o sacrifício de todos os animais vacinados, se for feita vacinão
emergencial (supressiva), sacrifício sanitário dos infectados e vigilância sorológica;
c) seis meses após o último caso ou a última vacinação, quando o sacrifício sanitário, a
vacinação emergencial e a vigilância sorológica
9
não é seguida pelo sacrifício de todos os
animais vacinados.
2. Se a FA ocorre em um país ou zona livre onde a vacinação é praticada:
a) seis meses
10
após o último caso, quando é feito o sacrifício sanitário, vacinação
emergencial e vigilância sorológica;
b) 18 meses
11
após o último caso quando o sacricio sanitário não é aplicado, mas sim
vacinação emergencial e vigincia sorológica;
8
Caso se refere a animal infectado, com os sem sinais clínicos aparentes; foco designa o surgimento de um ou
mais casos em uma unidade epidemiológica, que pode ser uma propriedade (ORGANIZAÇÃO, 2006a).
9
A sorologia baseada na detecção de anticorpos a proteínas não estruturais do vírus pode demonstrar a ausência
de infecção na população vacinada.
10
Esse período era de 12 meses.
11
O prazo anterior era de 24 meses.
26
De acordo com a OIE (ORGANIZAÇÃO...., 2006c)
12
, dos 168 países membros, 57
países são isentos de febre aftosa sem vacinação e três são isentos com vacinação (Paraguai,
Uruguai e Taipei China). Em 10 países são reconhecidas zonas livres: seis deles sem vacinação
e dois onde a vacinação é praticada. Argentina e Colômbia têm a particularidade de possuírem
zonas com e sem vacinação.
2.2.2 Vacinação e animal portador
Um dos argumentos mais freqüentemente utilizados contra a vacinação é o de que
animal vacinado pode ser um portador do vírus e iniciar uma nova infecção. O termo portador,
em epidemiologia, se refere aos animais capazes de disseminar uma infecção, ainda que não
demonstrem sinais clínicos da doença (SUTMOLLER et al, 2003, p.114-120; 137). Portadores
são animais convalescentes ou com infecção subclínica nos quais o vírus da febre aftosa
persiste na região faríngea por mais de quatro semanas após a infecção. Porém, segundo os
autores, isto não implica que estes animais sejam contagiosos. Os argumentos são aqui
resumidos:
- a população vacinada pode ter infecção subclínica, mas são geradas quantidades
muito baixas de vírus (baixa morbidade). Isso explicaria porque a vacinação tem tido sucesso
apesar de baixos níveis de biossegurança;
- a transmissão de bovinos portadores para animais não vacinados ou outras espécies
não tem sido observada;
- não foi demonstrado que suínos convalescentes tenham infecção persistente;
12
Lista atualizada em agosto de 2006.
27
- a evidência de transmissão do rus por animais recuperados em mais de 100 anos se
limita a poucos casos;
- testes para discriminar animais portadores de vacinados têm sido amplamente
utilizados e os resultados são, em geral, aceitos internacionalmente.
2.3 A FEBRE AFTOSA NA AMÉRICA DO SUL
No continente americano, o vírus da febre aftosa foi introduzido com o gado que veio
com os colonizadores europeus. A doença foi reconhecida quase simultaneamente por volta de
1870, em Buenos Aires, na Argentina, na região central do Chile, no Uruguai, no Sul do Brasil
e na costa noroeste dos Estados Unidos (CORREA MELO e LÓPEZ, 2002). No Brasil, surgiu
em 1895, no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais e se espalhou pelo restante do país no
início do século 20, para então aparecer em outros países da América do Sul: Paraguai e Peru
(1910), Bolívia (1912), Venezuela (1950), Colômbia (1950-51) e Equador (1956) (CASAS
OLASCOAGA et al, 1999). A doença era vista na região, como foi o caso da Argentina, como
“suave e insignificante” (WOODS, 2004, p. 60), e nos anos 30 não figurava entre uma série de
doenças que obrigavam o sacrifício dos animais infectados no Brasil
13
.
Nos anos 50 foi criado um dos principais órgãos para controlar a doença, o
PANAFTOSA Centro Panamericano de Febre Aftosa, sediado no Rio de Janeiro, em 1951,
que estimulou a criação de instituições e programas em diversos países (FERNANDES e
13
É interessante notar que o Decreto 24.548, de 03/07/1934 (BRASIL, 1934), que instituiu o Serviço de Defesa
Sanitária Animal, determinava o sacrifício de todos os animais atacados por mormo, raiva e pseudo-raiva,
tuberculose, salmonela pulorum e peste suína. Nos casos de peste bovina, peripneumonia contagiosa, para-
tuberculose ou outra doença infecto-contagiosa ainda não reconhecida era obrigatório o sacrifício dos animais
atingidos e de outros que o serviço sanitário considerasse necessário. A febre aftosa não constava nessas listas.
O artigo 27, § 2º, trata do impedimento da circulação de trens que transportassem animais atacados de febre
aftosa ou de outras doenças infecciosas. Os animais teriam que ser reconduzidos ao ponto de partida,
demonstrando assim que a doença era considerada um mal bem menor diante de outras.
28
GOIC, 1972). Em 1972 surgiu outro órgão regional, a Comissão Sul-Americana de Luta
contra a Febre Aftosa (COSALFA).
Outros programas implantados foram o Sistema de Informação e Vigilância das
Enfermidades Vesiculares das Américas, nos anos 70, que demonstrou a existência de uma
forte associação entre o comportamento da febre aftosa e as formas da organização produtiva
pecuária em uma determinada área ou região (CORREA MELO e LÓPEZ, 2002), e anos 80, o
Plano Hemisférico de Erradicação da Febre Aftosa (PHEFA), que estabeleceu a meta de
erradicar a doença na América do Sul até 2009. O PHEFA permitiu caracterizar os
ecossistemas da doença e adaptar os planos de controle à situação particular de cada região.
Os Estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul fazem parte do programa sub-
regional Cone Sul – Bacia do Prata, junto com Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai e zonas da
Bolívia (SARAIVA, S.D.).
A estratégia do PHEFA baseia-se na diminuição da difusão do vírus, por meio do
controle de trânsito entre áreas com forte relação produtiva, do controle de focos e da
vacinação de bovinos. Como resultado do trabalho do PHEFA e dos programas nacionais, os
índices de febre aftosa decresceram na América do Sul na última década (SARAIVA, S.D.).
Nos anos 90 até início de 2000, países e Estados que compõem o convênio no Cone
Sul obtiveram reconhecimento internacional de seus status sanitários e deixaram de vacinar.
No entanto, a doença reapareceu de uma forma violenta em 2000 e 2001. Na América do Sul,
invadiu a Argentina, o Uruguai, e a fronteira brasileira, no Estado do Rio Grande do Sul,
causando mudanças nas classificões sanitárias.
De acordo com Sutmoller et al (2003), a descontinuação da vacinação expôs a região a
severos riscos do retorno da febre aftosa, decorrente dos seguintes fatores:
- perda progressiva de proteção contra a doença de grande população de bovinos em
29
um curto período de tempo;
- perigo de disseminação da doença em áreas que permaneceram endêmicas para
rebanho suscetível;
- movimento de grande número de animais jovens para áreas de engorda;
- falha na vigincia epidemiológica e nos sistemas de comunicão entre países e
aumento da vulnerabilidade à propagação da doença além das fronteiras dos países;
- deficiências na barreira primária de prevenção sanitária (controles de movimentação),
devido a limitações de recursos humanos e suporte logístico insuficiente;
- redução na educação e treinamento de recursos humanos públicos e privados e nos
serviços veterinários;
- insuficiente avaliação de risco e planos de contingência incompletos para a transição a
uma política de não-vacinação;
- predomincia de interesses políticos e comerciais sobre exigências sanitárias;
- omissões no cumprimento das normas do Código Internacional de Saúde Animal e
acordos internacionais e falta de transparência na informação da situação sanitária.
O Uruguai enfrentou a maior epidemia recente na Arica do Sul. A partir da
notificação da presença da doença, em outubro de 2000, foram registrados 2.057 focos
14
. De
acordo com Sutmoller et al (2003, p. 129-131), no início foi aplicado o sacrifício sanitário,
suspenso em três dias, devido à resistência dos fazendeiros e à descoberta de novos focos. Em
seguida, foi feita vacinação massiva em toda a população bovina. O último foco ocorreu em
agosto de 2001 e o status de país livre foi retomado no mês de outubro do mesmo ano.
Para os autores, a experncia do Uruguai demonstrou que a vacinação somente do
rebanho bovino, em combinação com a paralisação da movimentação dos animais, pode
14
Como visto anteriormente, a epidemia de 2001 da Grã-Bretanha teve um número de focos um pouco menor
que a do Uruguai, 2.026 focos, mas o sacrifício atingiu 10 milhões de animais e apenas os custos com a
erradicação somaram US$ 8 bilhões.
30
controlar uma grande erupção da doença em um período curto, com mínimo rompimento da
sociedade e economia rural (SUTMOLLER et al, 2003, p. 130).
O Quadro 2 mostra os principais acontecimentos relativos ao status sanitário da febre
aftosa no Cone Sul nas últimas décadas e os episódios recentes:
Quadro 2. Cronologia da condição sanitária para febre aftosa nos países e estados que compõem o PHEFA
Cone Sul - Bacia do Rio do Prata, 1981a 2006.
Países/regiões Último (s)
foco (s)
1
Livre com
vacinação
Proibição
vacinação
Livre sem
vacinação
Reintro-
dução
Retorno
vacinação
Último
foco
Status
Atual
Argentina Abr/1994 1997 Abr/1999 Abr/2001
Mai/2005
Dividido
por zonas
2
Bolívia Dividido
por zonas
3
Chile 1984/87 1981/1988 Livre sem
Vacinação
Brasil:
Santa Catarina
1993 1998 Mai/2000 ____ _____ Livre com
vacinação
4
Rio Grande
do Sul
1993 1998 Mai/2000 Ago/2000
Mai/2001
Mai/2001 Jul/2001 Livre com
vacinação
Paraná 2000 Livre com
vacinação
(suspenso)
5
Paraguai Set/1994 Ago/1999 ___ 1997 _____ Out/2000 Livre com
vacinação
Uruguai Jun/1990 1996 Out/2000
Abr/2001
Abr/mai
2001
Ago/2001 Livre com
vacinação
1
Último foco registrado ou último ocorrido anteriormente ao reconhecimento internacional da situação
sanitária.
2
Zona livre sem vacinação situada ao Sul dos 42º do paralelo e zona livre com vacinação acima dos 42º do
paralelo.
3
Zona livre com vacinação em Chiquitania, desde 2003
4
Definido pela OIE. O status de zona livre sem vacinação é reconhecido apenas nacionalmente, pelo MAPA.
5
Status suspenso desde outubro de 2005. O exame de sorologia no rebanho suspeito de aftosa no Para revelou
que a suspeita, na verdade, era um caso de “falso positivo” da resposta vacinal.
Fontes: Adaptado de ORGANIZAÇÃO...(2006c), BRASIL (2002), SOUZA (2004), SUTMOLLER et al (2003).
A Figura 1 demonstra a extensão da epidemia de febre aftosa que atingiu o Cone Sul
em 2000:
31
Figura 1. Representação geográfica da densidade de focos de febre aftosa no Cone Sul a partir de 2000.
Fonte: BRASIL (2002a)
2.3.1 A enfermidade no Brasil
No Brasil, o aparecimento da febre aftosa ocorreu em 1895, após sua descrição na
Argentina e Uruguai, e coincidiu com a importação de reprodutores bovinos de raças
européias no surgimento da indústria frigorífica. Em 1909, a doença contribuiu para a criação
do Ministério da Agricultura (LYRA e SILVA, 2002a).
De acordo com Mayen (2003), as primeiras medidas de controle foram estipuladas em
1919, no Código Sanitário da Política de Saúde Sanitária e o Estado de São Paulo foi o
primeiro a instituir um programa regional de luta contra a doença em 1926/27. O Decreto
32
Província de Formosa, Argentina
Registro do primeiro caso (vírus Tipo O
1
)
Obs.: a distribuição dos pontos vermelhos representa a densidade de focos, não há relação com localização
geográfica (1 ponto = 1 foco)
24.548, de 03/07/1934, do governo federal, instituiu o Serviço de Defesa Sanitária Animal. A
primeira vacina foi aplicada a partir de 1938. A implementação do controle oficial da vacinação
de animais começou três anos depois.
Em 1963, medidas nacionais de profilaxia e de controle foram instituídas pelo Decreto
52.344, e iniciadas dois anos depois, a partir do Rio Grande do Sul. Em 1966 a campanha
começou em São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Minas Gerais. Um encontro sobre controle
de Febre Aftosa e Zoonoses na América Latina, em 1968, determinou políticas, ações e
legislação para campanhas para a doença na região, incluindo cobertura vacinal. O suporte
financeiro para as ações foi dado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)
(MAYEN, 2003).
Conforme relatam Lyra e Silva (2002a), o sistema de informação sobre febre aftosa,
sob coordenação do Panaftosa, foi implantado em 1971. Como resultado, o número de focos
relatados aumentou em relação à década anterior, em virtude da maior vigilância e
identificação mais apurada da doença. Foram detectados na década pouco mais de 66 mil
focos. Ao longo dos anos 70 o número de focos foi diminuindo, porém devido à
desestruturação do programa oficial de controle e carência de vacinas em quantidade e
qualidade, manteve-se a disseminação da doença, pois animais levados de áreas endêmicas
difundiam o vírus para as regiões receptoras.
A doença permaneceu endêmica a os anos 80, quando os focos foram reduzidos e
passou-se a considerar a caracterização dos ecossistemas e a estrutura de produção como
fatores determinantes do seu aparecimento. Nesse período destaca-se a realização de alguns
estudos regionais sobre epidemiologia da enfermidade, um deles focado sobre o território
catarinense. Nesse estudo, Martins (1984), a partir de dados históricos do período de 1971 a
1980 do sistema de informação estadual sobre a febre aftosa, verificou a estacionalidade da
febre aftosa no Estado e criou uma série de indicadores que permitiram classificar as regiões
33
catarinenses porveis de risco, diretamente ligados à forma de exploração animal existente.
De acordo com a caracterização epidemiológica (Figura 3), os Campos de Lages, no
Planalto, representavam a Região Endêmica Primária, caracterizada pelo ciclo completo da
criação de bovino de corte. Constituía um pólo irradiador da doença para as microrregiões de
Florianópolis, Litoral de Laguna, Carbonífera e Litoral Sul.
A Região Endêmica Secundária era representada por Florianópolis, Litoral de Laguna,
Carbonífera, Litoral Sul e Colonial Sul Catarinense e era o principal pólo receptor da
enfermidade e via de ingresso de bovinos de Estados vizinhos.
As microrregiões Colonial do Rio do Peixe e Colonial Oeste Catarinense foram
classificadas como Região Paraendêmica I. As principais atividades produtivas são
suinocultura e avicultura e tamm bovinocultura de corte. O aparecimento da doença era
ocasional, mas quase sempre com característica epidêmica. A Região Paraendêmica II A, nos
Campos de Curitibanos e Planalto de Canoinhas, local de criação de bovinos de corte de ciclo
completo e misto, também apresentava a doença ocasionalmente. A última divisão
correspondia à Região Paraendêmica II B, Colonial de Joinville, Litoral de Itajaí, Colonial de
Itajaí Norte, Colonial do Alto Itajaí e Colonial Serrana Catarinense, local de exploração de
bovinos de leite e abate de suínos e aves, que possuía o menor grau de endemismo no estado
(MARTINS, 1984).
34
Figura 2. Caracterização epidemiológica da febre aftosa em Santa Catarina – Cidasc/SC, 1971 a 1993.
Fonte: COMPANHIA... (S.D.)
Nos anos 90 a política brasileira de controle realizada até então foi substituída pela de
erradicação e o Programa Nacional de Erradicação da Febre Aftosa (PNEFA) estabeleceu a
meta de país livre, que deveria ocorrer em 2005. A redução de focos foi significativa e a
década terminou com apenas 37 focos, em 1999. Colaboraram para essa situação o uso de
vacinas oleosas e a co-responsabilidade do produtor no programa de erradicação (LYRA e
SILVA, 2002a).
Em 1992, a OIE, que reconhecia somente países livres da FA, passou a reconhecer zo-
nas livres dentro dos países. Seis anos depois, Santa Catarina e Rio Grande do Sul obtiveram a
certificação da OIE de zona livre com vacinação. A Portaria 121, de 29 de março de 1993,
do Ministério da Agricultura, que introduziu as condições para áreas livres com vacinação no
Brasil e a erradicação por meio de sacrifício sanitário
15
, regulamenta que para ser considerada
como tal, a área deve ter as seguintes características:
15
O sacrifício passa a ser adotado no Brasil 100 anos depois da criação dessa política na Inglaterra.
35
a) ausência de casos clínicos de febre aftosa há pelo menos dois anos;
b) existência de um serviço oficial de vigilância sanitária eficiente;
c) existência de dispositivos legais para a proteção e luta contra a doença;
d) utilizão de vacinas aprovadas.
Em 1993 foram registrados os últimos focos da década no Rio Grande do Sul e em
Santa Catarina, nos municípios de Santa Rosa e Frederico Westphalen/RS e de São Miguel do
Oeste/SC.
Por meio da Portaria nº. 194 de 29 de Dezembro de 1994, do Ministério da
Agricultura, os Estados foram classificados em circuitos pecuários, para facilitar a
coordenação das ações do PNEFA. Santa Catarina e Rio Grande do Sul passaram a formar o
Circuito Pecuário Sul. O Circuito Pecuário Centro-Oeste abrange Distrito Federal, Goiás,
Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná,o Paulo e Tocantins e o Circuito
Pecuário Leste compreende Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Outra Portaria do Ministério da Agricultura, a de No. 50 de 19 de maio de 1996,
estabeleceu a classificão dos Estados por seis níveis de risco para a doença, que aumentam
gradativamente: BR-D ou risco desprezível, BR-1 ou risco mínimo, BR-2 ou baixo risco, BR-3
ou médio risco, BR-4 ou alto risco e BR-N ou risco não conhecido ou não classificado. Santa
Catarina e Rio Grande do Sul são os dois Estados que possuem a classificão BR-1.
Estando isentos da doença desde 1993, em 1988 Santa Catarina e Rio Grande do Sul
foram reconhecidos pela OIE como zonas livres de febre aftosa com vacinão. Em maio de
2000, a vacinação foi interrompida e os dois Estados obtiveram a certificação nacional, pelo
Ministério da Agricultura, de área livre sem vacinação, que conforme a Portaria nº 121/1993, é
a área que tem as seguintes características:
a) ausência de casos clínicos de febre aftosa há pelo menos dois anos;
36
b) ausência de vacinação contra a febre aftosa há pelo menos 12 meses;
c) com perfeita delimitação e separação do restante do país, de países vizinhos ou de
regiões distintas dentro de um mesmo estado, por uma zona de vigilância de, pelo menos, 10
km de largura.
d) existência de dispositivos legais para a proteção e luta contra a doença;
e) existência de um serviço oficial de vigilância sanitária eficiente, inclusive na zona de
vigilância;
f) ausência de introdução na área de qualquer animal vacinado contra febre aftosa, após
a interrupção total da vacinação.
Em agosto desse mesmo ano (2000), a doença retornou em Jóia-RS e a vacinação foi
retomada numa segunda reintrodução do vírus, em 2001. Santa Catarina, desde então, não
voltou a imunizar o rebanho bovino.
Em 2001, o Ministério da Agricultura declarou “áreas livres onde a vacinação é
praticada”, os Estados da Bahia, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,
Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo, Sergipe, Tocantins, Rondônia e Distrito
Federal. Os demais Estados do Nordeste e Norte eram considerados zona infectada.
Atualmente, a OIE considera os Estados do Acre e de Rondônia e dois municípios do
Amazonas, juntamente com Rio Grande do Sul e Santa Catarina, como zonas livres com
vacinação.
No lançamento da proposta de erradicação, o ano de 2005 foi estipulado para o
cumprimento da meta para o país ser livre da doença (LYRA e SILVA, 2002a). O primeiro
ano com ausência de febre aftosa no Brasil foi 2002, situação que se repetiu em 2003. Em
2004 a doença retornou e foram registrados cinco focos, 34 em 2005 e sete em 2006. A Figura
2 demonstra, ano a ano, de 1970 até 2002, o comportamento decrescente da FA:
37
Figura 2. Focos de febre aftosa no Brasil no período de 1970 a 2002
Fonte: LYRA e SILVA (2002a).
2.4 ÉTICA E BEM-ESTAR ANIMAL
2.4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A DISCUSSÃO ÉTICA E CIENTÍFICA
EM TORNO DOS ANIMAIS
O interesse social em torno de bem-estar animal e a produção científica sobre o tema
têm aumentado nas últimas décadas. Essa atenção crescente é, em boa parte, uma reação aos
processos de industrialização da agropecuária, que levaram aos sistemas intensivos de
produção para atender mercados internos e externos, em que a xima produtividade é o
principal objetivo.
O termo bem-estar animal surgiu a partir da sociedade para expressar preocupações
éticas sobre a qualidade de vida de animais, especialmente os utilizados pelos seres humanos na
produção agrícola (DUNCAN, 2005). As inquietações éticas são também o principal
fundamento para o estudo científico do bem-estar animal (HÖTZEL, 2005).
No entanto, existe uma dificuldade para definir bem-estar e Duncan (2005) trata
38
mesmo da impossibilidade de dar ao termo uma definição científica precisa. Após uma revisão
do tema, Duncan e Marian Dawkins listaram que uma ampla descrição de bem-estar poderia
incluir noções do animal em completa saúde mental e sica, em harmonia com o seu ambiente,
dele ser capaz de se adaptar sem sofrimento a um ambiente artificial provido pelos seres
humanos e de que seus sentimentos deveriam ser levados em conta de alguma forma.
dois grupos principais dentro da pesquisa em bem-estar animal: a escola que se
dedica ao funcionamento biológico adequado dos animais como indicador de bem-estar e a
escola dos sentimentos. A primeira diz que bem-estar está relacionado à ausência de resposta
fisiológica ao estresse, que o animal deve ser capaz de “suportar” seu ambiente e de satisfazer
suas necessidades biológicas. Para a escola dos sentimentos, bem-estar guarda relação com a
ausência de estados emocionais negativos, que caracterizam o sofrimento, incluindo dor,
medo, frustração, deprivação e tédio, este para algumas espécies, e com a presença de estados
emocionais positivos, de prazer.
Antes, Fraser et al (1997) apontaram uma outra linha de pesquisa, ao lado do
funcionamento biológico e da escola dos sentimentos, a de que os animais devem viver suas
“vidas naturais”. A linha escolhida irá refletir as concepções éticas dos pesquisadores. Essas
concepções são baseadas em valores, que questionam o que é pior ou melhor para os animais,
no entanto argumentam que nenhuma das posições isoladamente seria satisfatória para guiar a
pesquisa e propõem uma integração dos diferentes modelos.
Ainda segundo esses autores, a concepção que se interessa pelas vidas naturais dos
animais entende que eles podem ter seu bem-estar reduzido se não puderem desempenhar seu
repertório comportamental, sendo esse argumento uma resposta à manutenção dos animais de
maneiras restritivas e não normais. Para Rollin (1993), um alto vel de bem-estar requer a
realizão daquilo que é geneticamente natural, ou seja, o animal deve viver de acordo com o
seu telos. No caso da linha de que bem-estar animal pode ser definido em termos dos
39
sentimentos dos animais, alguns dos representantes são Hurnik (1993) e Singer (1990).
McGlone (1993) e Baxter (1993) são dois dos autores que pesquisam bem-estar em termos de
funcionamento biológico.
Hurnik (1992, p. 236-237) aponta que os animais passam a ser considerados na
modernidade como “entidades psicológicas”, que têm sentimentos e emoções análogos aos
humanos. Ele define bem-estar como “o estado de harmonia entre o animal e seu ambiente,
caracterizado por condições sicas e psicológicas ótimas e alta qualidade da vida animal”. A
resposta dos animais a estímulos de seu entorno é classificada por Hurnik em quatro categorias
psicológicas: a atração (motivada por estímulos positivos), a aversão (quando o organismo é
motivado a evitar um estímulo), a deprivação (resultante da inabilidade ou incapacidade para
experimentar um estímulo desejado) e a placidez (a calmaria após a cessão de um estímulo
aversivo).
Darwin admitia a existência de emoções nos animais no seu livro A expressão das
emoções no homem e nos animais, de 1872. As expressões são resultado da evolução natural e
têm uma função de adaptação do indivíduo ao meio. Cita exemplos da identificação de
emoções nos animais como medo, dor e sofrimento e mesmo emoções mais complexas como
amor, ciúme, impaciência e espanto (DARWIN, 2000).
Admitir que os animais sejam capazes de ter emoções ficou conhecido pelo termo
sensitividade, que expressa “a qualidade de sentir” (FERREIRA, 1999, citado por HÖTZEL,
2005). A discussão em torno dessa capacidade e também da existência ou não de conscncia
nos animais ficou mais conhecida pelo público de uma forma geral depois que filósofos
retomaram esses temas em trabalhos como Libertação Animal, de Peter Singer (1975), The
case for animal rights, de Tom Regan (1983) e Farm Animal Welfare, de Bernard Rollin
(1995).
Essas discussões têm como fundo questões éticas antigas, do tipo: “o que são os
40
animais?”, “qual é seu status moral? e “como eles devem ser tratados?”. Entende-se ética
como estudo das questões morais e algo é moral se pertence mais ao certo do que ao errado
(BROOM, 2006).
Conforme relata Paixão (2001), no Ocidente esse debate possivelmente iniciou, na
Grécia, com Pitágoras, para quem pessoas e animais tinham almas do mesmo tipo. Platão
considerava os animais seres humanos reencarnados. Os humanos precediam os animais, os
quais teriam uma parte racional da alma.
A “ruptura” entre humanos e animais teve início com Aristóteles, ao negar a razão aos
animais e estabelecer que possuir razão é o que nos distingue dos animais. As diferenças
alcançam um significado moral. Existe uma escala entre os seres vivos e cada criatura deveria
servir ao que lhe é superior. Assim, os humanos teriam o direito de usar os animais para
satisfazerem seus propósitos.
As escolas filosóficas do estoicismo e do epicurismo tinham uma teoria de justiça, e,
além da racionalidade, negaram a justiça aos animais. Para os estóicos os animais não têm
sintaxe, portanto não merecem consideração, pois a justiça deve se dirigir aos seres racionais.
Para Epicuro, a justiça se estende apenas àqueles que são capazes de fazer contratos,
novamente aos seres racionais (SORABIJ, 1995, citado por PAIXÃO, 2001, p. 49). Essa
argumentação se constitui na referência na modernidade para o pensamento contratualista de
Hobbes (1588-1679), que consiste basicamente na doutrina que reconhece como origem do
Estado (ou da comunidade civil) uma convenção ou contrato entre seus membros.
Descartes (1596-1650) defendeu a idéia de que os animais funcionavam como
máquinas. Para ele, os processos de pensamento e sensibilidade faziam parte da alma. Como na
sua concepção os animais não tinham alma, não havia sequer a possibilidade de sentirem dor.
Desta forma, justificava-se a experimentação com animais e práticas como a da vivissecção
16
.
16
Segundo Paixão (2001), o termo "vivissecção" tem sua origem no latim, uninso vivus (vivo) e sectio
(corte, secção). Portanto, quer dizer “cortar um corpo vivo”. "Dissecção" refere-se a "cortar um corpo morto".
41
O fisiologista inglês Ferguson, em 1760, teria sido o primeiro a levantar implicações
éticas desse tipo de experimentação (FELIPE, 2005). Humphrey Primatt, em 1776, publicou
um ensaio sobre condição animal, no qual atribuía a todos os seres senveis a mesma
igualdade moral. Para ele, a capacidade animal de sofrer é da mesma ordem que a humana.
Jeremy Bentham publicou na Inglaterra, em 1789, o livro “An Introduction to the Principles
of Moral and Legislation”, que tratava do aperfeiçoamento moral do homem através da
inclusão, na comunidade moral humana, dos interesses de todos os animais dotados de
sensibilidade e capazes de sofrer. Inspirado na Revolução Francesa e na bandeira da igualdade
entre seres humanos, ele reivindicava liberdade dos animais dos interesses dos humanos.
Bentham, citado por Felipe (2005), lançou a base para a posição atualmente utilizada para a
proteção dos animais. “A questão não é se eles podem raciocinar, nem se podem falar, mas,
podem sofrer?”.
2.4.2 Ética e avaliação de risco na erradicação da febre aftosa
A política em torno da febre aftosa é um bom modelo para analisar as implicações
éticas e sobre o bem-estar humano e animal dessa estratégia, que é motivada por propósitos
comerciais e econômicos e não devido a ameaças às vidas humanas e de todo o rebanho
(ANTHONY, 2004).
Episódios como os ocorridos na Grã-Bretanha e em Jóia-RS são exemplos do resultado
da industrialização na agropecuária, que levou à produção de alimentos mais abundantes e
baratos, para atender os mercados internos e externos, estes mais exigentes e restritivos quanto
à sanidade animal, por exemplo. Conforme Appleby et al (2003b), esse processo tem gerado
uma série de problemas, como incertezas na renda agrícola, pressões nos produtores de
42
pequena escala, preocupações relacionadas à segurança alimentar, perda de competitividade de
produtores de países em desenvolvimento, problemas de bem-estar animal e danos ambientais.
Esse tipo de produção incorre em custos que não são refletidos no preço de venda,
custos que são externos à economia agrícola, tanto em aspectos quantifiveis quanto em não
quantifiveis (APPLEBY, 2003a), como a poluição e o impacto nas comunidades rurais e
sobre os animais em casos de erupção de doenças, como a doença da vaca louca e a febre
aftosa.
Anthony (2004) sugere algumas questões éticas que necessitam de avaliação em
futuros planos de contingência para a febre aftosa, entre elas: é justo para todos os envolvidos
(inclusive os animais) sustentar que não meta maior do que preservar o status de livre de
aftosa? É justo para os animais e produtores rurais não permitir que os animais se recuperem e
continuem a ser produtivos ou que desenvolvam imunidade através da quarentena e/ou da
vacinação? Qual animal é um contato “perigoso”? Pois, dependendo da definição, mais ou
menos animais serão sacrificados. A que vel a perda de peso e a diminuição da produção de
leite se tornam intoleráveis? É aceitável ignorar “falsos positivos em animais clinicamente
saudáveis, e matá-los em vez de aguardar se testes posteriores serão negativos?
O autor tamm observa que sensos de risco diferentes para avaliar uma crise
agrícola. O modelo tradicional de risco é baseado em avaliações científicas, que incluem
quantificação do risco em termos de probabilidade, margens de segurança e grau de dano. A
concepção pública de risco tende a considerar outros parâmetros, como confiança, ansiedade,
vulnerabilidade e sentimentos de segurança e bem-estar.
Essas concepções diversas sobre risco e os valores que estão em jogo, tanto do
governo quanto do público, podem resultar em problemas de comunicação quando as políticas
são estabelecidas, sejam as ações de erradicação, sejam as decisões sobre vacinão e não
vacinação, especialmente quando o maior número de envolvidos não participa das decisões.
43
O controle da epidemia de febre aftosa na Inglaterra resultou em uma série de
problemas de desrespeito bem-estar animal e a um intenso questionamento público da política
de sacrifício, devido à ampla cobertura da mídia, retroalimentando a questão do que é aceitável
em busca da manutenção do status de área livre e da manutenção das exportações. Algumas
situações são ilustrativas, conforme sumarizam Crispin et al (2002, p. 879-881)
17
:
- atrasos no abate de animais infectados;
- animais aguardando sacrifício sendo mantidos perto e à vista de outros sendo
sacrificados;
- manejo incompetente dos animais e abate não-humanitário (por ex. manejadores
inexperientes, falta de treinamento, falta de compaixão);
- pagamento aos sacrificadores por animal e não por hora, levando à falta de cuidado
- supervisão veteriria inadequada;
- falha em matar efetivamente os animais (principalmente associada ao uso de
barbitúricos e atordoamento), e retorno à consciência na seqüência;
- métodos de abate inadequados, como uso de armas ou munição sem suficiente poder
para matar os animais na primeira tentativa;
- escape de animais, sendo caçados e feridos por sacrificadores com balas perdidas;
- transporte de animais incapacitados, como fêmeas prenhes sendo transportadas para o
abate, dando à luz no caminho ou enquanto estavam sendo sacrificadas;
- fetos em gestação tardia morrendo de anoxia e colapso circulatório porque as mães
foram mortas.
Problemas de bem-estar associados ao impedimento da movimentação de animais
também surgiram, como:
- incapacidade de mover animais pré-parturientes e fêmeas dando à luz em condições
17
Algumas dessas situações ocorreram também em Jóia, como se verá no capítulo 4.
44
inadequadas, resultando em alta mortalidade materna e perinatal;
- fazendas com estoque excessivo de animais, levando à falta de alimento e abrigo;
18
- criadores vivendo sob extremo estresse, porque não podiam cuidar de seus animais
adequadamente.
18
Devido à impossibilidade, pelas restrições, de levar animais a outras pastagens.
45
3. METODOLOGIA
3.1 NATUREZA E ETAPAS DA PESQUISA
O procedimento metodológico utilizado neste trabalho, que busca compreender os
efeitos sociais e sobre o bem-estar animal da efetivão da política de erradicação da febre
aftosa no Estado de Santa Catarina, foi, principalmente, o da pesquisa qualitativa. Um estudo
de caso sobre a epidemia ocorrida em 2001 em Jóia/RS complementa o trabalho.
A pesquisa qualitativa foi escolhida para analisar uma situação que está além da
quantificação de variáveis. Conforme Minayo (1994), é uma prática metodológica que se
ocupa do universo de significados, motivações, valores e atitudes de uma determinada
situação. Essa prática busca compreender os fenômenos a partir da ótica dos entrevistados e
estabelecer relações entre diversas varveis advindas das entrevistas, em lugar de produzir
novos dados quantitativos. Seu objetivo, conforme Richardson (1993, p. 102):
[...] não reside na produção de opiniões representativas e
objetivamente mensuráveis de um grupo; es no aprofundamento da
compreensão de um fenômeno social por meio de entrevistas em
profundidade e análises qualitativas da consciência articulada dos
atores envolvidos no fenômeno.
Os estudos de caso são geralmente empregados para reconhecer situações específicas,
que podem ser "generalizáveis" com o objetivo de contribuir para a compreensão de situações
análogas. Partindo de uma perspectiva qualitativa, a preocupação se "menos com a
generalização e mais com o aprofundamento e abrangência da compreensão" (MINAYO,
46
1992, p.102).
O desenvolvimento da pesquisa consistiu nas fases de coleta e produção,
sistematização, análise e interpretação dos dados. A primeira etapa compreendeu a busca de
dados secundários e a revisão da literatura. Entre as fontes secundárias de informação estão a
OIE, MAPA, CIDASC, EPAGRI/CEPA, EMATER de Jóia e outras instituições. Outra parte
dos dados secundários foi obtida por meio de levantamento de notícias sobre febre aftosa,
realizado de três formas: na CIDASC, em arquivos de jornais entre 2000 e 2002, no Sistema
GNG de clipagem eletrônica do governo de Santa Catarina (pesquisa entre os anos de 2003 e
2006) e em arquivos pessoais de uma entrevistada e uma pesquisadora em Jóia. Foram
selecionadas 73 notícias.
Os dados primários da análise qualitativa foram obtidos por meio de entrevistas com
nove entre as principais instituições agropecuárias de Santa Catarina e com sete propriedades
de agricultores familiares em Jóia
19
(totalizando 11 pessoas entrevistadas). Foram realizadas
entrevistas em profundidade e aplicado um questionário semi-estruturado, com questões
fechadas e abertas (Anexos B e C). As entrevistas tiveram duração de uma hora, em média, e
foram gravadas e transcritas. A transcrição procurou manter a forma coloquial do discurso,
mas foram feitas algumas alterações para melhor compreensão das falas.
As questões foram agrupadas em sete temas: adequação das estratégias de controle;
vacinação e não vacinação; sacricio em caso de surto da doença; bem-estar animal; bem-estar
humano; comunicação e consumo da carne, totalizando 29 perguntas para as instituições
19
Não foram feitas entrevistas com agricultores em Santa Catarina. Na proposta metodológica inicial, seriam
entrevistados agricultores que tiveram rebanhos bovinos infectados na epidemia de 1990-91, inicialmente na
região de Lages, onde se concentrou mero significativo de focos. No entanto, os arquivos da CIDASC
guardavam registro de apenas cinco propriedades afetadas nessa região. Foram feitos contatos com todos esses
proprietários, mas apenas dois poderiam ser entrevistados, o que levou à desistência devido à pequena amostra.
No Oeste, outra região que teve grande número de focos, a CIDASC de São Miguel do Oeste não possuía os
arquivos de propriedades afetadas. Uma investigação para encontrar possíveis entrevistados que não fosse feita
a partir de arquivos oficiais levaria mais tempo e exigiria recursos financeiros que não estavam disponíveis,
mesmos motivos pelos quais o foram entrevistados agricultores catarinenses que não passaram por um foco,
num município de características semelhantes a Jóia/RS, o que teria enriquecido o trabalho.
47
agrícolas catarinenses. Para os agricultores de Jóia, o questionário teve 26 perguntas e foi
estruturado nos mesmos temas, acrescido de questões em torno do surto. Nas questões
fechadas, poderia ser marcada mais de uma alternativa.
As entrevistas com as instituições agropecuárias foram feitas em Florianópolis, durante
os meses de agosto e setembro de 2006, e com os agricultores em Jóia, em dezembro de 2006.
Foi realizada também uma entrevista com um informante-chave em Lages-SC, sobre o início
da campanha vacinal anti-aftosa em Santa Catarina e sobre a percepção dos criadores em
relação a não vacinação.
O método quantitativo foi usado para complementar e quantificar alguns dados
objetivos, como idade, escolaridade, características da propriedade, bem como dados
secundários de pesquisas estatísticas na análise documental.
3.2 GRUPOS ENTREVISTADOS
O grupo das instituições agropecuárias foi formado por órgãos públicos e por algumas
das entidades de classe mais representativas da cadeia da carne em Santa Catarina, totalizando
nove entrevistas. Os órgãos públicos entrevistados foram a Secretaria de Estado da
Agricultura/SC, a CIDASC, órgão que atua na defesa sanitária animal e vegetal do Estado, e o
Departamento Federal de Agricultura/SC, órgão do Ministério da Agricultura. As entidades
entrevistadas foram: Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), Sindicato dos
Produtores de Carne de Santa Catarina (SINDICARNE), Sindicato Rural de Lages, Federação
da Agricultura de Santa Catarina (FAESC), Federação dos Trabalhadores na Agricultura do
Estado de Santa Catarina (FETAESC) e Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar
(FETRAF-SUL).
48
A escolha do município de Jóia para o estudo de caso se deveu aos seguintes fatores:
ser o munipio mais próximo de Santa Catarina a ter um surto de febre aftosa nos últimos
anos, e onde as ões de erradicação levaram ao sacricio de um dos maiores números de
animais na história brasileira
20
; ter o mesmo status sanitário entre Santa Catarina e Rio Grande
do Sul e a interrupção da vacinação ser seguida de um surto; a ocorrência da doença ter sido
numa região de pequenas propriedades e assentamentos rurais que exploravam a bovinocultura
de leite, em que as conseqüências sociais na comunidade rural poderiam ser melhor
visualizadas. A doença surgiu numa região de pequenas propriedades familiares, caracterizada
como colônia italiana, e em três dos seis assentamentos da reforma agrária existentes no
município.
Para o estudo de caso foram realizadas pesquisa documental e entrevistas com sete
famílias de agricultores que tinham gado leiteiro e cujo rebanho foi sacrificado em 2000
21
. O
critério para seleção do grupo se baseou na escolha de informantes representativos, que
tiveram intenso envolvimento no episódio da febre aftosa. Assim, todos os entrevistados
residem na área de emergência sanitária onde foram descobertos os primeiros casos e alguns
são vizinhos da propriedade onde foi realizada a execução e o enterro dos animais. Uma das
famílias foi a primeira a ter o rebanho sacrificado, outra foi a primeira a passar pela vistoria do
rebanho para verificar a presença ou não da doença. Foram entrevistados ainda um técnico, um
der político e comunitário, uma das últimas falias a ter o rebanho sacrificado e duas famílias
que vivem em um assentamento da reforma agrária, também atingido.
20
Nos episódios em 2005 e 2006, no Mato Grosso do Sul, foram eliminados 33,8 mil animais (VALOR
ECONÔMICO, 2006).
21
Com exceção de uma delas, mas o entrevistado esteve envolvido desde o diagnóstico da doença até a fase de
indenização.
49
3.3 INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Para a interpretação das entrevistas foi utilizada a alise de conteúdo, a fim de
identificar os significados, motivações e valores em torno das representações sociais do atual
status sanitário da febre aftosa em Santa Catarina para os órgãos oficiais e de classe. A partir
do estudo de caso em Jóia se obteve um exemplo real da aplicação da política sanitária, e a sob
o ponto de vista das famílias entrevistadas emergiram também os seus significados e valores na
avalião da política empregada. Representações sociais são definidas nas Ciências Sociais
“como categorias de pensamento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou
questionando-a” (MINAYO, 1995, p. 89). Manifestam-se por meio de palavras, sentimentos e
condutas e se institucionalizam, o que permite analisá-las “a partir da compreensão das
estruturas e dos comportamentos sociais (MINAYO, id., p. 108).
A interpretação das entrevistas foi feita a partir dos temas elencados no roteiro de
questões e por temas que eventualmente emergiram a partir dos entrevistados. Nas perguntas
abertas e naquelas que pediam complementação de uma resposta, em cada um dos temas,
procurou-se classificar as respostas em categorias para facilitar a análise (MINAYO, 1994;
RICHARDSON, 1993), observando-se os critérios de um princípio único de classificão,
categorias exaustivas (para permitir a inclusão de qualquer resposta numa das categorias) e
categorias mutuamente exclusivas (uma resposta não pode ser incluída em mais de uma
categoria). Essas categorias remeteram a uma categoria maior, a de representação social em
torno da política para a febre aftosa, dos agricultores de Jóia e das instituições agrícolas
catarinenses. A identificão da opino dos agricultores foi feita pelo número da propriedade,
seguido do gênero do entrevistado, pelas letras H (homem) e M (mulher). Nas instituições
agrícolas, foi utilizada a sigla do órgão.
50
3.4 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DO ESTUDO DE CASO
O município de Jóia está localizado no Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
(Anexo A). Possui área territorial de 1.236 km
2
e população estimada em 2005 pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 8.771 habitantes. De acordo com o Censo
Demográfico de 2000 do IBGE a população rural corresponde a 6.298 habitantes,
representando 76,15% da população total
22
. No Censo Agropecuário de 95/96 havia 1.144
estabelecimentos agropecuários, sendo que 65,8% deles possuíam entre 10 e menos de 100
hectares; 14,10% dos estabelecimentos possuíam mais 100 hectares de terra.
Conforme dados de 2003 do IBGE, na pecuária o maior rebanho é o bovino, com 42
mil animais, sendo 4.700 vacas de leite. Com relação à produção vegetal, destaca-se nas
lavouras temporárias a soja, com produção de 192 mil toneladas, numa área plantada de 64 mil
ha; trigo, com a produção de 23 mil toneladas em área plantada de 10 mil ha; e milho, com
28.800 toneladas numa área de 8 mil ha. A média da produção diária de leite, por propriedade,
é de 60 litros, que são entregues a três plantas leiteiras (BRASIL, 2002a).
22
Porcentagem relativa à população de 8.270 habitantes, de acordo com o Censo de 2000 do IBGE.
51
4. RESULTADOS
4.1 RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA SOBRE A FEBRE AFTOSA NO
CIRCUITO PECUÁRIO SUL
4.1.1 A reintrodução da doença no Rio Grande do Sul
Em 2000, quando se iniciava um período de 12 meses para obter a certificação
internacional de área livre de febre aftosa sem vacinação em Santa Catarina e no Rio Grande
do Sul, a doença retornou em Jóia, a 145 quimetros da fronteira com a Argentina, em
pequenas propriedades (área média de 20,2 ha) produtoras de grão e de leite e em três
assentamentos da reforma agrária. Ao todo, 543 famílias foram afetadas, 300 delas nos
assentamentos
23
(BRASIL, 2002a). A principal atividade é a produção de grãos (soja, milho,
trigo), porém a bovinocultura de leite era uma atividade estratégica que garantia renda mensal,
principalmente aos agricultores familiares (ANDREATTA, 2003).
Conforme o relatório do MAPA (BRASIL, 2002a), a notificação da suspeita foi feita
no dia de agosto, em uma propriedade
24
. No dia 11 de agosto, a doença foi notificada em
outras três propriedades em Jóia. O resultado definitivo do diagnóstico, realizado no
Laboratório Nacional de Diagnóstico do Ministério da Agricultura, em Recife, Pernambuco,
somente foi divulgado no dia 22. O vírus era do tipo O
1
Campos. A OIE e os países vizinhos
foram notificados em 23 de agosto. Apenas no dia seguinte teve icio o estado de emergência
sanitária.
De acordo com a Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul, o surto
provavelmente se iniciou pelo fato de que no rebanho de 42 mil bovinos, em torno de 10 mil
23
O jornal gaúcho Zero Hora divulgou que o mero de famílias atingidas foi de 600 e que 563 delas haviam
recebido indenização até outubro de 2000. (SANTOS, 2000)
24
Na localidade de São Roque.
52
não haviam sido vacinados e outros 12 mil eram gado clandestino que vinham para engorda
nos pastos da região (WAGNER, 2000).
Foram estabelecidas áreas de segurança em torno dos focos (25 km de raio), divididas
em três subáreas: área infectada (3 km a partir dos focos), área de vigincia (7 km a partir dos
limites da área infectada) e área tampão (15 km a partir dos limites da área de vigilância), com
interdição das propriedades existentes. Ao todo foram interditadas 1.719 propriedades rurais,
que somavam rebanhos de 58 mil bovinos, 14 mil ovinos, oito mil suínos e 198 caprinos.
Com o atraso no estabelecimento das medidas de controle
25
, de Jóia a doença se
difundiu para Eugênio de Castro, Augusto Pestana e São Miguel das Missões. Foram
registrados 22 focos, sendo 19 deles em Jóia. Das propriedades afetadas em Jóia, 11 delas
tinham até 40 bovinos, quatro entre 41 e 70 bovinos e as outras três possuíam rebanhos com
105, 149 e 505 bovinos.
Os focos foram identificados desde o dia 1º de agosto até 22 de setembro. Uma área de
segurança foi constituída, além de Jóia, por outros 10 municípios, onde todo o trânsito de
animais suscetíveis à febre aftosa, de produtos e subprodutos, foi proibido. Foram instalados
76 postos de fiscalização e 29 barreiras sanitárias, a cargo da Secretaria de Agricultura e
Brigada Militar
26
, onde veículos eram vistoriados e desinfectados, e mais 47 postos fixos de
contenção. Isso fez com que a região ficasse praticamente sitiada e a circulação de pessoas
ficou restrita aos moradores (CIGANA, 2000). O leite deixou de ser recolhido pelas indústrias.
Em Jóia, eram 28 mil litros/dia e em Augusto Pestana, 63 mil litros/dia, representando um
prejuízo de R$ 600 mil (NETTO, 2000). A maior parte do leite era descartada.
As ões de sacrifício duraram 46 dias. Toda a operação envolveu 946 pessoas.
Inicialmente, o Ministério da Agricultura divulgou que seriam mortos 216 bovinos e seis
25
O surgimento da doença coincidiu com os preparativos para a Expointer, feira internacional de pecuária,
realizada em Esteio/RS.
26
No Rio Grande do Sul a Polícia Militar é chamada de Brigada Militar.
53
suínos (CIGANA, 2000). Com o atraso do controle e a disseminação da doença, foram
destruídos ao todo 11.067 animais (8.185 bovinos, 2.106 suínos, 722 ovinos e 4 caprinos). O
custo estimado na operação, incluindo o pagamento de indenização aos proprietários, foi de
US$ 3,7 milhões.
Em seu relatório, o MAPA reconheceu como principais dificuldades da operação, além
das fortes chuvas, “o grande apego das pessoas com seus animais, causando transtornos
emocionais, sendo muitas vezes necessário amparo psicológico e remoção das famílias para
longe de suas casas” (BRASIL, 2002a, p.164).
A febre aftosa em Jóia se caracterizou pelo baixo número de animais doentes. Nos 19
focos registrados, a taxa de ataque global para bovinos foi de 6%, com a maior média sendo de
21% (nas propriedades com até 40 bovinos) e a menor, de apenas 2% nas com mais de 100
bovinos. Dos 67 ovinos existentes nenhum se infectou. Dos 132 suínos existentes, em duas
propriedades, apenas 17 foram infectados. De acordo com MAPA (BRASIL, 2002a, p. 163),
uma parte da explicação do baixo número de animais doentes, revelando taxas de ataque
27
incompatíveis com a epidemiologia da febre aftosa, se deve à imunidade induzida durante as
campanhas de vacinação, que foram suspensas apenas a partir de de maio de 2000. A taxa
de ataque foi menor nos rebanhos mais numerosos, onde a vacinação ocorria de maneira
sistemática, revelando maior preocupação dos proprietários em proceder a imunização
adequadamente.
Seguiram-se as fases de limpeza, desinfecção e vazio sanitário de pelo menos 30 dias
nas propriedades despovoadas. Após, foram introduzidos animais sentinelas, por outros 30
dias, pelo menos, houve repovoamento dos animais e investigação soroepidemiológica para
avalião de atividade viral. Todo esse processo, no entanto, se estendeu até em torno de seis
meses, em que as famílias não puderam desenvolver suas atividades normais, impactando
27
Taxa de ataque significa o número de animais doentes na propriedade.
54
fortemente a renda e os modos de vida. Num estudo com 40 propriedades atingidas no surto
em Jóia, Andreatta (2003) verificou mudanças profundas nos sistemas de produção, após a
ocorrência da doença. Antes do surto, a autora identificou três sistemas de criação que
envolviam animais para produção de leite e derivados e seis sistemas de produção comercial de
leite, juntamente com grãos. Após o surto, foram identificados três sistemas que tinham
animais leiteiros, cinco sistemas que retomaram a produção comercial de leite e outros três que
não reimplementaram a pecuária leiteira. Mais de dois anos depois da ocorrência dos focos,
entre oito sistemas de produção identificados após a doença, somente dois registraram
evolução positiva nos indicadores de renda relacionados às atividades agropecuárias, e um
deles não tinha mais a produção de leite em escala comercial.
Em 5 maio de 2001 foi notificada a presença clínica da febre aftosa novamente no Rio
Grande do Sul, no município de Santana do Livramento, divisa com o Uruguai, desta vez com
o vírus do tipo A. Em 9 de maio, devido ao fim do sacrifício sanitário no Uruguai, e
considerando que o rebanho gaúcho estava vulnerável, foi autorizada a vacinação de todo o
rebanho bovino e bufalino. A doença se espalhou resultando em 30 focos nos municípios de
Barra do Quaraí, Dom Pedrito, Alegrete, Rio Grande e Jari. Rio Grande, região de
bovinocultura leiteira em propriedades familiares, concentrou o maior número de focos, 18.
Foram interditadas 2.348 propriedades.
Na primeira etapa de vacinão, em 30 dias, foram vacinados 13,2 milhões de animais
(98% do total), em mais de 334 mil propriedades. Na segunda etapa, 30 a 45 dias após a
primeira, foram revacinados 13,2 milhões de animais. Apesar do retorno à vacinação, animais
infectados e possíveis contatos foram mortos. De acordo com o relatório do MAPA (BRASIL,
2002a, p. 31), houve resistência da comunidade, devido às ações de emergência sanitária de
2000 (em Jóia e municípios vizinhos), aos impactos negativos pela divulgação na imprensa da
eliminação dos focos no Reino Unido, que iniciaram em fevereiro de 2001, e à grande
55
dispersão da doença verificada na Argentina e no Uruguai. Após intensa negociação, os
proprietários aceitaram a destruição dos animais doentes. Desta vez, as ações foram divididas:
foram destruídos
28
1.168 bovinos e 29 ovinos, até o dia 8 de julho, e sacrificados
29
8.549
bovinos e 5.010 ovinos. Entre os animais destrdos e sacrificados estavam muitos bezerros
que haviam nascido durante o período transcorrido entre a interdição e a eliminação dos
animais. No período nasceram 199 bezerros. Os últimos abates se estenderam até 5 de
outubro, cinco meses depois da notificação da existência de febre aftosa.
Após as fases de limpeza, desinfecção e vazio sanitário, foram introduzidos animais
sentinelas e realizados testes de sorologia. Entre as amostras de mais de 87 mil bovinos, 4.793
animais foram reagentes. Segundo o MAPA, independente da possibilidade de interferência
vacinal nos resultados dos testes, todos os reagentes foram sacrificados, em frigoríficos não
habilitados ao mercado internacional, entre fevereiro e março de 2002. Portanto, 10 meses
após o surgimento da doença, a comunidade rural ainda convivia com o sacrifício dos seus
animais, estes possivelmente saudáveis.
Rio Grande do Sul e Santa Catarina perderam a certificação internacional de zona livre
com vacinação. Apesar do Rio Grande do Sul ter voltado a imunizar o rebanho, Santa Catarina
manteve a não-vacinação, priorizando uma política de controle sanitário das fronteiras e da
circulação de animais, de produtos e subprodutos de origem animal. Em novembro de 2002 a
OIE restituiu o status dos dois Estados como zona livre de febre aftosa com vacinação.
4.1.2 A enfermidade em Santa Catarina
A Campanha de Combate à Febre Aftosa em Santa Catarina (CAFASC) iniciou em
28
Abatidos e enterrados na propriedade.
29
Abate sanitário realizado em abatedouros não habilitados à exportação, sendo a carne submetida a tratamento
térmico e os ossos incinerados.
56
1965, e a aplicação de vacinas a partir de 1967. Em Lages, a imunização começou por
iniciativa de um veterinário vindo do Rio de Janeiro, Alberto Santos, em três propriedades.
Conforme o engenheiro agrônomo Affonso Maximiliano Ribeiro, um dos três criadores
pioneiros na vacinação do rebanho, o primeiro resultado não foi aparente e houve descrédito,
porém na seqüência de aplicações os resultados começaram a aparecer. As dificuldades eram
acentuadas pelo manejo e pela cultura local. “Não tinha bretes, o gado era vacinado no
campo, a laço, e havia grande rebeldia dos produtores que não aceitavam a vacinação, pela
vivência, pela tradição. Outros, por comodismo, ou ignorância, jogavam a vacina fora”.
Problemas de acondicionamento da vacina e condução na aplicão também ocorriam.
Mais tarde foi instituída a campanha oficial, e a vacinação começou a ser feita por técnicos nas
propriedades, às vezes com ajuda de força policial. “Nem se poderia imaginar que a doença
fosse erradicada. Foi um mérito da classe veterinária e do governo que entendeu essa
necessidade” (Affonso Ribeiro, informação pessoal, 2007).
Conforme Companhia... (S. D.), a 1983 foram realizadas três vacinações anuais,
diminuídas para duas, mais tarde, a partir da realizão do estudo que fez a caracterização
epidemiológica da doença (MARTINS, 1984). Com a queda da atividade viral no campo e
registro de apenas dois focos em 1986, houve diminuição da vacinação, seguida do retorno de
focos freqüentes. Após uma missão da União Européia, em 1988, foi retomada a vacinação
ampla, com venda direta das vacinas aos criadores, atingindo 90% das propriedades. Os
criadores, entretanto, só vacinavam mediante o risco de um foco.
Entre 1971 e 1983, a incidência de febre aftosa era alta no Estado, com uma dia de
462 focos/ano. A média caiu para 54 focos/ano no período entre 1984 e 1990. Em outubro de
1990 houve a última epidemia de grandes proporções. Iniciada na região do Planalto,
estendeu-se por quase todo o Estado até julho de 1991, totalizando 338 focos, causados pelo
rus C
3
Indaial (VERAN, 2000). A partir de então, a CIDASC iniciou uma campanha de
57
vacinação chamada de “agulha oficial”, com a contratação de 2.500 vacinadores, que
imunizaram em torno de 3 milhões de bovinos.
A Figura 4 mostra o comportamento da febre aftosa em comparação com a vacinação:
Figura 4. Comparação da cobertura vacinal e ocorrência de febre aftosa – 1971 a 2000.
Fonte: COMPANHIA... (S.D.)
A vacinação foi efetuada no Estado até maio de 2000. A efetividade da campanha
“agulha oficial” levou à erradicação da doença. A classificação epidemiológica atual do Estado
é como área paraendêmica, de ocorrência esporádica de febre aftosa.
A posição geográfica é considerada privilegiada para evitar o ingresso do vírus:
presença de barreiras naturais como os rios Uruguai e Pelotas, na divisa com o Rio Grande do
Sul, e pelos rios Iguaçu e Negro, na divisa com o Paraná (BRASIL, 2002). No Oeste uma
área de florestas a a Argentina. O ponto considerado mais vulnerável é a fronteira seca na
região de Lages (SINDICARNE, Pesquisa de campo, 2006).
A partir de 1994, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul passaram a formar o
Circuito Pecuário Sul. Em 1993, foi registrado o último foco em território catarinense, no
58
frigorífico da cooperativa Coopercentral, em São Miguel do Oeste. Foi adotado o sacrifício
sanitário, no próprio frigorífico, e mortos 1.007 suínos. Esta foi a primeira e única vez que essa
ação foi praticada em Santa Catarina para o controle desta doença.
Depois de obter a certificação nacional de zona livre sem vacinação, o Estado manteve
a resolução de não-vacinar, mesmo com os focos que tinham ocorrido no Rio Grande do Sul,
Argentina e Uruguai em 2000 e 2001. Essa política não foi adotada sem controvérsias.
Criadores questionaram como seriam as indenizações no caso do aparecimento de um foco e
quais seriam as responsabilidades do Estado ao assumir o risco de não imunizar (A NOTÍCIA,
2001a). A questão levantou uma crise. A Secretaria de Agricultura de Santa Catarina quis
impedir judicialmente a realização de um encontro para discutir a volta da vacinação em São
Miguel do Oeste/SC, que teria a presença de agricultores de Jóia, alegando que os visitantes
poderiam trazer o vírus para o Estado e que o evento era uma iniciativa político-ideológica
contra a vacinação (A NOTÍCIA, 2001b; DIÁRIO CATARINENSE, 2001; NOTISUL, 2001).
Após a crise, foi criado o Fundo de Defesa Sanitária Animal (FUNDESA), por meio
da lei estadual n° 204, de 8 de janeiro de 2001 (SANTA CATARINA, 2001) para indenização
pelo abate e sacrifício sanitário de animais suspeitos ou atingidos por febre aftosa e outras
doenças infecto-contagiosas e para suplementar ações de vigilância em saúde animal e
educação sanitária
30
. Os recursos do fundo são compostos por uma dotação de até R$ 15
miles para indenizão de bovinos e R$ 12 milhões para suínos. Dos recursos do
FUNDESA, 50% são para indenizão de animais sacrificados, 30% para indenização em caso
de outras doenças e 20% para serviços de vigilância e educação. O fundo, no entanto, não
inclui o pagamento do lucro cessante aos criadores no caso do abate do rebanho.
Os recursos são formados pelo orçamento estadual, por outras receitas de convênios e
ainda por receitas provenientes do recolhimento da taxa de vigilância sanitária vigilância
30
O programa é desenvolvido em escolas e junto a criadores e consumidores. Foram criadas também
Comissões Municipais de Saúde Agropecuária (Comusas) e Comitês de Saúde Animal e Vegetal (Cosav).
59
animal. As taxas foram regulamentadas pela lei estadual 13.667, de 28 de dezembro de
2005, e são decorrentes do controle, fiscalização e certificação em saúde animal em
exposições, feiras, rodeios, leilões e outras aglomerações de animais; no trânsito de animais,
produtos e subprodutos; e em qualquer propriedade ou estabelecimento de criação de animais.
A lei estabelece que o Fundo para o Desenvolvimento da Suinocultura e o Fundo de Reserva
para Indenização de Avicultores depositarão no FUNDESA 30% do total arrecadado
mensalmente, em substituição ao recolhimento das taxas de vigilância sanitária.
Existe um fundo privado administrado pela Associação Catarinense de Criadores de
Suínos que possui aproximadamente R$ 14 miles para melhorar a qualidade sanitária nas
fronteiras (ACCS, Pesquisa de campo, 2006). Dos recursos, R$ 9 milhões foram gastos para
pagamento de lucro cessante para criadores de suínos, no Programa de Erradicação de
Aujeszky
31
. Em torno de 57 mil suínos foram eliminados, em etapas sucessivas de
despovoamento (DEBONA, 2002).
Atualmente, a CIDASC conta com 340 veterinários na defesa sanitária animal, 119 de-
les (com um auxiliar cada) conveniados com a indústria da carne, por meio do Instituto Catari-
nense de Sanidade Agropecuária (ICASA) (SAR, Pesquisa de campo, 2006). Existem 69 bar-
reiras sanitárias nas fronteiras com o Paraná, o Rio Grande do Sul e com a Argentina. A CI-
DASC possui uma estrutura de 450 veículos, 980 funcionários e 250 barreiristas contratados,
ao custo de R$ 22 miles ao ano (DEBONA, 2005).
Desde 2000, conforme a Instrução Normativa nº 13, de 19 de maio de 2000, é proibido
o ingresso em Santa Catarina de animais, produtos e subprodutos de origem animal, produtos
veterinários e materiais ou substâncias que possam veicular o vírus da febre aftosa. A entrada
somente é autorizada quando procedentes de zonas ou país de situação sanitária idêntica. Todo
31
O último surto de Aujeszky ocorreu em julho de 2004. No programa de erradicação da doença, implantado
em 2001, foram aplicados R$ 11 milhões para examinar todas as propriedades que criam suínos no estado, aba-
ter os animais infectados, indenizar os produtores e vacinar os animais. Atualmente Santa Catarina é livre de
Aujeszky sem vacinação. (MORÉS e ZANELLA, 2003).
60
animal suscetível que ingressa fora das normas na zona livre é sacrificado ou destruído e as
cargas de produtos animais são incineradas ou submetidas a tratamentos que inativem o vírus.
A destruição ocorre em geral no local ou próximo onde ocorreu a apreensão. Os animais são
mortos por rifle sanitário e as carcaças são enterradas ou incineradas.
Santa Catarina é o principal produtor e exportador brasileiro de suínos e o segundo
produtor e exportador de aves (EPAGRI/CEPA. 2006). De acordo com o Levantamento
Agropecuário Catarinense (LAC), o rebanho de suínos é composto por 5,6 milhões de animais,
distribuídos em 59,8 mil estabelecimentos agropecuários (SANTA CATARINA, 2005). A
maior parte da criação é no sistema industrial de confinamento. Conforme Machado Filho et al
(2001), com base em dados do IBGE, em 1985 em torno de 57% do rebanho suíno catarinense
era confinado. Em 1996 esse percentual cresceu para 75%. O rebanho de suínos manteve a
tendência de crescimento com forte concentração. Nos dados preliminares do LAC, verificou-
se que em 1996, 130 mil estabelecimentos tinham suínos e em 2003 o número caiu para apenas
54 mil estabelecimentos. Desse total, 8,3 mil criadores controlam 90,87 do efetivo. Existe a
presença maca de pequenos produtores, sendo que 34.555 produtores (63,53%) criam até 10
animais, criando para subsistência ou participando marginalmente do mercado (SANTA
CATARINA, 2004). As agroindústrias de Santa Catarina detêm 60% dos abates e 70% da
economia suinícola do país. O Estado responde por 45% do total nacional de exportações de
carne suína (ASSOCIAÇÃO CATARINENSE..., 2005).
O rebanho bovino é formado por 3,2 milhões de animais, que vivem em 151,5 mil esta-
belecimentos (entre estabelecimentos agropecuários e outros locais, como sítios de lazer, ho-
téis e pousadas). Em 95,7 mil estabelecimentos agropecuários 520,3 mil meas em lacta-
ção, que produzem 1,2 milhão de litros de leite (SANTA CATARINA, 2005). São importadas
anualmente em torno de 60 mil toneladas para atender a demanda interna de carne
(EPAGRI/CEPA, 2006).
61
O fato de Santa Catarina ter sido considerado nacionalmente como área livre de febre
aftosa sem vacinação aumentou a produção de suínos em 22 mil toneladas e as exportações ti-
veram um incremento de 138 mil toneladas, o que correspondeu a 43,7% da produção, compa-
rando-se os anos de 2001 e 2003. Os valores das exportações também se expandiram. A partir
de 2000 houve um aumento nos valores passando no setor de aves de US$ 434 milhões para
624 milhões (FOB) em 2001. O setor de suínos apresentou um incremento passando de US$
99 milhões em 2000 para 237 milhões (FOB) em 2001 (VERAN, 2005). Em 2005, a produção
da avicultura foi de 1.470 toneladas (54% desse volume exportado) e os valores subiram para
US$ 1.063 bilhão. A produção catarinense de suínos subiu para 658,4 mil toneladas (43% ex-
portadas) em 2005 e os valores já eram de US$ 504,6 milhões (FOB) (EPAGRI/CEPA, 2006).
Os ganhos monetários desse tipo de produção têm como contrapartida conseqüências
não incluídas nos custos ou não-quantificáveis, como a poluição hídrica e do solo por dejetos,
especialmente dos suínos. Nas zonas rurais das regiões exploradoras de suínos no Oeste de
Santa Catarina, 85% das fontes de água estão contaminadas por coliformes fecais, devido ao
laamento direto do esterco de suínos em cursos ou mananciais de água (LOHMANN, 1999,
citado por MACHADO FILHO et al, 2001). A contaminação da água subterrânea por meio da
perfuração de poços artesianos ameaça o Aqüífero Guarani, maior reservatório da América do
Sul. A concentração, o acúmulo de dejetos e o manejo inadequado podem resultar na emissão
de óxido nitroso, um dos gases responsáveis pelo efeito estufa, que parece ter um potencial da-
noso superior ao do CO
2
(MACHADO FILHO et al, 2001). Rios e cidades malcheirosas, ex-
cesso de borrachudos, transmissão de doenças pela água e impactos no turismo são outros re-
sultados da suinocultura intensiva (BRASIL, 2002b).
O status sanitário atual, único no país, não impede embargos de exportações de carne
resultantes do surgimento de febre aftosa em Estados vizinhos, como o caso do embargo
62
russo, imposto em dezembro de 2005 devido a focos no Mato Grosso do Sul
32
e mais tarde
pela suspeita de focos no Paraná, que não se confirmou
33
. Atualmente, Santa Catarina busca
separar-se do Rio Grande do Sul no Circuito Pecuário Sul, tendo assim uma situação única no
país, para obter, junto à OIE, a certificação de zona livre de aftosa sem vacinação, que está
prestes a ser homologada. Com isso, espera-se abrir novos mercados para exportação, da
União Européia, Japão e Coréia do Sul.
4.2 CARACTERIZAÇÃO DOS ENTREVISTADOS
4.2.1 Jóia
Foram realizadas entrevistas em sete propriedades rurais em Jóia, duas delas
pertencentes ao Assentamento Ceres de reforma agrária. Ao todo, participaram e responderam
o questionário 11 pessoas. Em todas as situações estava presente o chefe da família. Em duas
das entrevistas o casal proprietário estava presente e em duas outras situações foram ouvidas
duas pessoas da falia (pai e a filha e mãe e filho). As idades variaram entre 31 e 74 anos.
Quanto à escolaridade, apenas um dos entrevistados destoou do conjunto, tendo educação
superior e pós-graduação, conforme se vê na Tabela 1:
32
Em janeiro de 2007, o embargo ainda é mantido para a carne de Santa Catarina. o embargo russo à carne
de Mato Grosso, estado vizinho ao Mato Grosso do Sul, onde ocorreram os focos, foi revogado em agosto de
2006, oito meses após o reingresso da doença. Para a Rússia foram destinados 63% das exportações de suínos
em 2004. Essa porcentagem subiu para 78% em 2005 (EPAGRI/CEPA, 2005)
33
Apesar disso, conforme a Agência de Notícias do governo paranaense, 6.781 animais foram sacrificados
em sete propriedades dos municípios de Loanda, Marin e Bela Vista do Paraíso.
63
Tabela 1. Idade, escolaridade e gênero dos 11 agricultores
As propriedades foram estratificadas conforme seu tamanho (Tabela 2). Todas elas,
exceto uma que se dedica à atividade leiteira, têm produção vegetal, com destaque para
soja, milho e aveia e uma delas ampliou a produção de uva depois do surto de aftosa. São
cultivadas tamm frutas e hortaliças para consumo próprio.
Tabela 2. Tamanho das propriedades estudadas e condição do uso da terra
Na Tabela 3 se observa a redução dos rebanhos bovino e suíno nas propriedades
estudadas, numa comparação antes do surto (até agosto de 2000) e depois do surto (dados de
dezembro de 2007). Os números de bovinos se referem ao total de animais (leite e corte).
Antes do surto, a grande maioria era de vacas de leite. No período posterior à doença, as
propriedades 2 e 5 voltaram-se à exploração de gado de corte. Em apenas uma das
propriedades o rebanho leiteiro aumentou, e de forma substancial, pois o proprietário passou a
se dedicar mais intensamente à atividade leiteira.
64
Idade Total
de 31 a 40 anos 3 Escolaridade Total
de 41 a 50 anos 4 de 2ª a 5ª série F 7 nero Total
de 51 a 60 anos 1 de 6ª a 8ª série F 3 Masculino 6
mais de 60 anos 3 pós-graduação 1 Feminino 5
Propriedade Ppria Arrendada Área total
1 20 20
2 90 90
3 15 15
4 7 7
5 6,5 80 86,5
6 13 13
7 16,5 16,5
Tabela 3. Rebanhos totais antes e depois do surto
4.2.2 Instituições agrícolas
Nas instituições agrícolas de Santa Catarina, todos os informantes eram os dirigentes
dos órgãos ou o responsável pela área de saúde animal, todos do gênero masculino. As idades
variaram entre 36 e 62 anos (Tabela 4). Quanto à formação, dos nove entrevistados, seis são
médicos veterinários, e um deles tem pós-graduação na área de epidemiologia.
Tabela 4. Idade e escolaridade dos 9 entrevistados nas instituições agrícolas de Santa Catarina
65
Antes do surto Depois do surto
Propriedade Bovinos Suínos Bovinos Suínos
1 23 20
2 37 4 25
3 15 90
4 13 8
5 42 18
6 13 2 4 1
7 19 13 18 4
Idade Total Escolaridade Total
de 31 a 40 anos 1 ensino fundamental 1
de 41 a 50 anos 2 médio 1
de 51 a 60 anos 5 superior 5
mais de 60 anos 1 pós-graduação 2
4.3 A POLÍTICA DE ERRADICAÇÃO NA OPINIÃO DOS
AGRICULTORES DE JÓIA
4.3.1 Avaliação da política de erradicação no Rio Grande do Sul
O retorno da febre aftosa ao Rio Grande do Sul é considerado provável em cinco das
sete entrevistas com os agricultores. As causas tiveram o seguinte mero de respostas:
existência da doença no Brasil e países vizinhos (3) e falhas no sistema de vigilância e na
vacinação (4). Dois dos informantes consideraram que as medidas adotadas são seguras. A
avalião da segurança do sistema de vigincia teve este número de respostas: alto sistema
confiável, equipes e recursos suficientes (1), médio, sistema confiável, mas equipes
insuficientes (2), médio sistema confvel, mas recursos insuficientes (2) e nível baixo o
sistema tem falhas (2). As falhas apontadas foram insuficiência de barreiras sanitárias e a
possibilidade de entrada de cargas com animais ou produtos animais. A fiscalização nas
fronteiras Oeste e Sul foi apontada como frágil.
4.3.2 Vacinação e não vacinação
4.3.2.1 Adequação do retorno à vacinação
Nas sete entrevistas, a conclusão foi de que o retorno à vacinação no Rio Grande do
Sul foi adequado, principalmente como um fator de segurança, como se observa nos seguintes
trechos: “Se não tivessem vacinado de repente ia estourar mais, foi a única saída pro Rio
66
Grande, não tinha outra” (1H). “E demoraram (para voltar a vacinar), não precisava matar
todo o gado, podia matar em todo o Rio Grande do Sul e não ia terminar (5H).
Na época (não vacinar) era uma vantagem, o RS comemorava, mas
daí apareceu a doença e tudo voltou como era antigamente. Isso
ganha no caso de exportação para alguns países, mas no nosso caso
aqui não. Não temos segurança para ficar sem vacina, acho que não
seria válido (4H).
4.3.2.2 Comparação entre vacinação e não-vacinação
O número de respostas positivas à vacinação foi maior que para a não vacinação.
Nenhum dos informantes considerou não ver vantagens na vacinão. Um problema apontado
por quatro entrevistados, entretanto, foi o estresse provocado nos animais e reações pós-
vacinais
34
, como se vê: “Isso é verdade, incha, judia da vaca de leite, reação no animal,
depois passa, mas tem umas que duram um tempo, febre” (4M); “Cria um caroço, leva
um tempo, tem umas que cria furo,bicha, febre, mas não interfere no leite”. (7M)
Tabela 5. Comparação entre respostas para a vacinação e não vacinação em Jóia
34
As reações podem ser de anaxifilia (choque anafilático e reação anafilática), alergia, distúrbios na gestação
(incluindo abortos e nascimento prematuro), reação local no ponto de inoculação e mudança temporária na
quantidade e qualidade do leite (MAYR e MUSSGAY, 1969, citados por VERAN, 2000).
67
Vantagens da vacinação Nº de respostas
Proteção do rebanho 7
Evita sacrifício em massa e destruição de animais saudáveis 7
Diminui a possibilidade de retorno da doença 7
Custos com sacrifício superiores à vacinação 6
Evita conseqüências sociais e perda de bem-estar animal 7
Vantagens da não vacinação Nº de respostas
Ganhos econômicos área livre sem vacinação 3
Evita custos com vacinação 1
Evita estresse dos animais na aplicação da vacina 4
Não vê vantagens 2
Os informantes que consideraram haver ganhos econômicos na área livre sem
vacinação relativizaram a questão quanto à escala da produção e quanto a assegurar que a
doença não ingresse no território, como se observa nos depoimentos:
Área livre sem vacinar, sou a favor, só que é muito complicado, como
aqui, quantos anos estava sem vacinação, daí estourou. Acho que se
conseguisse ficar sem vacinação é melhor, como Santa Catarina que
é exportador de suínos e frangos. A primeira grande meta é ser área
livre, do grande exportador, mas daí atinge o pequeno (5H).
Para ser área livre sem vacinação acho que teria que ter uma
barreira sanitária muito grande, com isolamento, vigilância e
rastreamento do gado, com acompanhamento das tropas de gado
que levam pra e pra cá. Teria ganho sim, mas teria que ter todo
esse processo (1H).
O atual programa de vacinação é considerado falho por todos os entrevistados que
vivem na região de colônia. Nesse caso, os agricultores recebem
35
e têm a função de aplicar a
vacina. Nos assentamentos, a aplicação é feita por técnicos oficiais, uma vez ao ano para os
animais adultos, além de um reforço para os terneiros. Na colônia, os agricultores dizem que
não fiscalização da aplicação e acreditam que alguns produtores joguem as vacinas fora,
como ocorria antes do surto. também a insegurança quanto ao procedimento adequado, do
transporte à aplicação:
Fiscalização não tem, muita gente joga hoje a vacina no mato. Essa
vacina não pode ser distribuída nas inspetorias, tem que dar pra um
veterinário aplicar, que o governo não tem ninguém pra fazer,
veterinários têm que formar a equipe deles e aplicar na propriedade
(3H)
Assistência técnica aqui na área de risco existe, mas acho que ainda
falha. Eu fui lá, peguei e vacinei, mas é aquele dilema, será que eu
fiz bem, eu conduzi direito, na hora de aplicar? Na minha opinião
segue da mesma maneira, vai na confiança que o produtor vai
vacinar. (5H)
35
A vacina é gratuita para os agricultores que têm crédito do Pronaf.
68
4.3.3 Comunicação do surto
A administração do surto de febre aftosa em Jóia se caracterizou pela demora em
oficializar a existência da doença e iniciar as medidas de controle e erradicação. Essa situação
colaborou para a disseminação do rus, surgiram novos focos e foi ampliado o número de
animais que seriam sacrificados. Os agricultores declararam que não houve clareza na
comunicação por parte do governo, gerando falta de entendimento sobre as medidas que
seriam tomadas e um sentimento de impotência, como se observa:
Houve um atraso do dia ao dia 23 de agosto para começar as
barreiras, o sacrifício começou um dia depois. Antes disso os técnicos
mesmo entravam com o carro num foco de aftosa e iam pra outro
canto, inclusive os caminhões leiteiros, tudo isso ajudou a disseminar.
Produtores que estavam com medo começaram a espalhar animais,
tirando animais de perto de onde estava um foco (3H).
O dia que constataram que era aftosa deviam ter fechado tudo
acredito que não teria se espalhado, ia ficar aqui. Essa a
irresponsabilidade de demorar tanto pra dizer que era (5H).
Se hoje acontecesse no estado um negócio desses, o governo do
estado e federal tinham que explicar para os produtores, vai ser
matado um raio de 3 quilômetros, e vai ter indenização, e não foi
assim (1H).
Para nós na época chegou como uma ordem, a gente não tinha
experiência, não deu nem pra reagir, não tinha como. Dizem que é
necessário, será que é? Isso vem mais por necessidade ou porque é
uma lei internacional que nós temos que obedecer? Acho que tem
mais lei do que necessidade. Mas isso não cabe, não temos como
mudar. (4H)
4.3.4 Sacrifício
69
Seis dos sete agricultores consideraram correto o sacrifício dos animais infectados,
principalmente das vacas leiteiras, devido ao sofrimento causado pela viruncia do ataque da
doença. Um se posicionou contra: Na minha região dava aftosa, mas o gado a gente
curava
36
. Vacinando o gado, como é preciso, não precisa abater” (7H). Quanto ao sacrifício
dos contatos, seis consideraram não ser correto e um concordou com o abate.
Houve incompreensão quanto à extensão da matança dos animais contatos,
especialmente porque foram feitos poucos testes de sorologia para verificar se os contatos
estavam ou não infectados, como revela a entrevistada 1M: “O gado doente sacrifica, mas o
gado são não, faz a sorologia, se o animal não infectado, vacina, imediatamente, mas
mata o gado contaminado. A lei pode ser mudada”. Outro argumento foi de que alguns
animais tinham se recuperado quando foram levados para o sacrifício.
A falta de experiência dos veterinários sobre a manifestação clínica da febre aftosa
ajudou a ampliar o mero de sacrificados:
Se o (veterinário) não tem a lida do campo, não sabe o que é. Como
foi com a aftosa aqui, botaram soda na boca de uma vaca
37
, era
aftosa, via uma vaca com a gengiva machucada, é aftosa. A questão
é que tinha a doença sim, mas pela falta de experiência, pelo sim pelo
não, muitos animais foram sacrificados. Você não pode desfazer o
que foi feito. (3H)
4.3.5 Bem-estar animal
A demora em sacrificar os animais infectados levou a diversas situações de falta de
36
A prática mais comentada foi a de que animais eram colocados no barro, conforme alguns, para refrescar e
conforme outros para não criar “bicheira no casco.
37
Dois dos entrevistados se referiram à desonestidade de agricultores que colocaram soda na boca dos animais
ou que misturaram animais sadios com infectados, a fim de receber indenização.
70
bem-estar, antes do recolhimento para o abate e durante a eliminação. No período anterior, o
sofrimento se deveu à própria evolução da doença: “Caía os pedaços das bocas das vacas. O
gado apodreceu em pé” (2H); “tinha terneirinho pequeno que nem caminhava mais” (4M).
Alguns agricultores tentaram isolar os animais ou tratar as aftas e ferimentos. Nas vacas que
apresentavam sinais clínicos mais fortes, a ordenha diária deixou de ser feita, como contam as
informantes:
A vaca leiteira empedrava tudo o ubre, dava muita febre, e a gente
não sabia o que era. Depois é que deu a notícia que era aftosa, foi
deixado de tirar leite, não dava mais, trancava os tetos das vacas. A
gente ia botar a mão no teto delas, elas se encolhiam, coitada das
vacas, elas sentem (2M).
A primeira casa da avaliação foi aqui, pelo mapa que fizeram. Levou
mais uma semana pra dizer que iam sacrificar. O marido tratava, não
agüentava ver os bichos sofrendo (1M).
A destruição e o enterro da maior parte dos animais em valas
38
foram realizados no
campo da propriedade onde foi diagnosticado o primeiro foco, em São Roque. Conforme
relatório do MAPA (BRASIL, 2002a), os animais eram ali dispostos e executados por
atiradores de elite da Brigada Militar
39
com armas de calibres 22 ou 38, que ficavam na parte
de cima da vala. Ressalte-se que é grande a possibilidade de que os atiradores não acertassem
em pontos vitais de animais em pânico na primeira tentativa, sendo necessários mais tiros para
matar efetivamente.
A observação das fotografias que constam no relatório do Ministério da Agricultura
para a OIE demonstra que houve problemas de manejo e abate não humanitário, e mesmo,
crueldade. Conforme mostra a Foto (1), os caminhões eram posicionados na beira da vala e os
animais eram forçados a pular, pois a rampa tinha uma grande declividade. Na queda,
38
As valas tinham 4 metros de profundidade, 5 metros de largura e 37 metros de comprimento.
39
Brigada Militar é como é chamada a Polícia Militar no Rio Grande do Sul.
71
poderiam ocorrer quebraduras e ferimentos. Dentro da vala, era colocada uma cerca e então se
iniciava a execução (Foto 2). Depois do sacrifício eram abertos o tórax e o abdômen dos
animais, para evitar o acúmulo de gases da putrefação (Foto 3).
Foto 1. Animais sendo conduzidos para a vala
Foto 2. Animais sendo contidos na vala para posterior sacrifício
72
Foto 3. Abertura da caixa torácica e abdominal.
Fonte: BRASIL (2002a)
Conforme o entrevistado 3H, que foi testemunha do início da operação de sacricio,
nos primeiros dias ocorreram mais problemas:
A forma de sacrifício foi totalmente perversa no começo. Botavam
dentro da vala, tapavam com o caminhão e ficavam atirando na
barriga, na cabeça, no pescoço, ali no meio do buraco. Eles não
tinham por onde sair, então um corria contra o outro e muitos
homens em cima do barranco atirando, como quem brinca de tiro ao
alvo. Estavam fazendo um negócio errado aqui. Quando passou essa
primeira fase fizeram um negócio mais correto. (3H)
O depoimento é corroborado por outro entrevistado: “O acordo era matar com um
tiro na testa e ajeitar todas elas dentro da vala, mas só que eram tantas, quando mataram 11
mil virou uma 'anarquia'” (5H).
Na área ingressavam somente as equipes da emergência sanitária. Mesmo a imprensa
teve acesso limitado e foram divulgadas poucas fotografias e imagens do sacrifício
40
. Apesar da
40
Numa comparação com a cobertura da imprensa mundial na epidemia inglesa. A publicação de imagens
chocantes sobre a eliminação e disposição das carcaças de animais deu margem a controvérsias públicas em
73
comunidade não ter acompanhado o sacricio, os informantes relataram algumas outras
situações:
: - “Mataram vacas dando cria, dando leite(2H)
- “Colocaram a polícia para atirar, atiraram até no de um técnico” (3H)
(revelando falta de habilidade)
- “Eles atiravam, escapava gado baleado” (2H)
- “Uma vaca escapou e veio em casa, de volta, ainda foi tirado o leite, de dó, e foi
levada de volta” (7H).
4.3.6 Bem-estar humano
O surto de febre aftosa e a forma como foi administrado teve repercussões no estado
psicológico das pessoas envolvidas e causou uma ruptura prolongada no modo de vida das
comunidades, assim como representou impacto econômico e perda da renda. A partir da
descoberta do primeiro caso, seguiram-se o período de incerteza em relação às medidas que
seriam tomadas, o estado de emergência sanitária, a etapa de limpeza e desinfecção, o vazio
sanitário e o repovoamento, até o retorno ou o abandono das atividades anteriores, que
ocorreu um ano ou mais após o início do surto.
A ruptura da rotina foi causa de apreensão, como relata este informante: “No primeiro
domingo que começaram a matança, a cada 30 metros tinha um soldado, era uma guerra.
Até a polícia de choque de Porto Alegre tava aqui (1H). O estado de emergência sanitária
acabou limitando a circulação da comunidade. Foram instalados 76 postos fixos de fiscalização
e 29 barreiras sanitárias. A situação levou ao isolamento e ao medo de que se pudesse
colaborar com a disseminação do vírus, como nestes casos: “Podia sair, não com nada
torno de questões científicas, econômicas e éticas (WOODS, 2004; SCOTT et al, 2004)
74
daqui, nem trazer (produtos animais). As pessoas iam na cidade, mas não iam pras casas,
passear” (2M). “Os que não estavam dentro do foco não ajudavam nós na organização, na
luta, porque tinham medo que pudessem levar a doença, então não vinham aqui” (5H).
O preconceito e a atribuição de culpa contribram para o isolamento e a
marginalização
41
dos agricultores que estavam no foco, como relatam estes informantes: “Nós
fomos julgados, ah, esses gringos
42
não vacinavam o gado [...] quando a gente ia em outras
cidades, diziam que viemos trazer aftosa, não é assim. Chamavam a gente de aftoso” (1M).
“Na época houve uma pressão muito grande, em cima de todos nós” (5H).
O sacrifício podia ser visto da janela da casa em uma das propriedades onde ficaram as
valas (CIGANA, 2000). Outras casas ficavam próximas, algumas a um quilômetro e era
possível ouvir os tiros e os berros dos animais. Os estados emocionais mais relatados foram de
estresse e depressão. As famílias se revezavam para levar o gado dos vizinhos para o abate e
tiravam mulheres e crianças de casa durante essa etapa. A presença maca de veículos e
policiais, o transporte contínuo de animais para o abate, o som dos tiros não permitiam
retomar a normalidade da vida, como se observa nestas declarações: Teve veterinário que
veio aqui, deu depressão, eles também não agüentaram essa matança, não foi só nós” . (2H)
Eu que passava nas propriedades, quando sobrava pra mim explicar,
quase fiquei em depressão. Chegava nas casas tinha mulher, menino,
homem chorando, você começa a baquear, se questionar se fez o
negócio certo, não fez, e virou totalmente pra outro lado que não era
o técnico, não podia voltar atrás. (3H)
Vi todos os dias (caminhão de gado) passar aqui. E aqui perto é que
era o sacrifício, a gente ouvia até os tiros daqui, quando matavam os
animais. É muito triste, cuida tanto dos bichos pra depois jogarem no
buraco. (4M)
41
Marginalização se refere à perda de cultura diante de sérias mudanças que causam uma ruptura na rotina
conhecida (HAAFTEN et al, 2004).
42
Termo popular para designar os descendentes de italianos.
75
O vazio sanitário
43
foi relatado como o pior período, devido à ausência quase total de
animais e à interrupção das atividades diárias, como a ordenha. O vazio alcançou a duração de
seis meses. O impacto, especialmente nas mulheres, responsáveis pela ordenha e que tinham
um contato mais próximo com os animais, pode ser identificado por estes depoimentos:
Não tinha um bicho pra lidar, nada. Levantava de manhã pra tomar
chimarrão e ficava olhando um pro outro. Antes, um ia tratar os
porcos, ou ia tratar as vacas, depois terminou tudo ali (2H). E a
gente se lembrar que quem criou os filhos foi as vacas, na
mamadeira. A gente bota tudo na cabeça, se acordava de noite
sonhando que tava tirando leite, e pensar bem que antes tinha vaca,
depois não tinha mais nada. (2M)
Era um silêncio, tu não ouvia um berro de um terneiro, de uma
ovelha. O vazio é o pior. Não tinha graça, tu não ia olhar mais nada,
não sentia vontade. Ficou um capoeirão alto (no campo). Até as
mangueiras
44
, caía tudo, o pessoal começava a desmanchar cerca pra
plantar. (1M)
Foi muito ruim, o cara acostumado a lidar com vaca de leite, foi a
coisa mais triste, ficamos aqui num deserto, com as galinhas,
perdido, foi-se. (7H)
4.3.7 Reflexos sobre a renda e a atividade ecomica
As famílias afetadas receberam indenizão pelos animais abatidos, pelo lucro cessante
e cestas básicas. Os agricultores relatam que os valores pagos foram justos, entretanto, até o
recebimento das indenizações, a renda mensal ficou comprometida. O lucro cessante foi pago
por três ou no máximo quatro meses, enquanto que o vazio sanitário durou em torno de seis
meses, resultando num período sem renda para alguns agricultores. A ausência de renda
43
Período em que não se pode introduzir nenhum animal suscetível, com exceção dos sentinelas, que servem de
cobaia para verificar se há atividade viral no campo.
44
Curral de gado.
76
aumentou considerando que o repovoamento de animais não foi imediato (ANDREATTA,
2003). Alguns produtores procuraram diversificar as atividades econômicas, voltaram-se ao
plantio de soja
45
ou foram em busca de empregos não-agrícolas. Os entrevistados da
propriedade 7 resumem a importância da renda com o leite e as adversidades com a soja:
Soja é uma vez por ano, todo mundo plantou, o preço foi em
cima e depois caiu. No leite, chova ou vente, aquele dinheirinho
sempre tem (7H). Teve muita gente que recebeu o dinheiro e gastou e
agora passa necessidade. Não compravam (vacas de leite) porque
achavam que não ia ter o retorno e que a soja ia continuar boa
sempre, mas foi aquele ano, e depois começou a seca, e quem não
lida com leite aqui dentro, como é que fica? (7M)
Nas famílias dos assentamentos os efeitos econômicos do surto de febre aftosa
possivelmente foram mais negativos:
Alguns botaram fora o dinheiro (da indenização). O povo aqui não se
endireita mais, depois que mataram aquelas vacas. A cooperativa
fechou, porque não conseguiu mais se equilibrar. Agora aqui a
atividade é leite de novo, mas não como o pessoal tinha. (6M)
Para o entrevistado 5H, faltou incentivo do poder público para organizar os produtores
em busca de atividades econômicas alternativas e para o repovoamento dos animais. “Se
tivesse se organizado e procurado animais bons, o pessoal tava com o dinheiro na mão, mas
cada um pegou o seu dinheiro e foi no município vizinho comprar” (5H). Como resultado,
observa que os animais adquiridos tinham qualidade genética inferior, os preços foram
inflacionados e houve problemas de adaptação do gado adquirido.
Duas entre as sete propriedades abandonaram totalmente a exploração leiteira. Em
45
A soja plantada na região é transgênica. O plantio da soja transgênica na fazenda Guabiju, em Jóia, foi
objeto de investigação pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, em 2002, conforme o Processo
2002.04.01.019115-7/RS (TRIBUNAL..., 2002). O Rio Grande do Sul foi o primeiro Estado brasileiro a
plantar ilegalmente variedades geneticamente modificadas de soja, resistentes ao herbicida glifosato, da
Monsanto. As sementes eram contrabandeadas da Argentina e plantadas desde 1997. A lei 11.092, de 12 de
janeiro de 2005, regulamentou e autorizou o plantio de soja transgênica na safra 2004/2005 (LIMA, 2005).
77
outras houve demora em reiniciar, ou retomada seguida de novo abandono ou ainda sensível
diminuão do rebanho, com exceção de um produtor, que aumentou em seis vezes o rebanho
leiteiro. As diferentes situações e motivações podem ser observadas nos depoimentos:
Passei quatro anos sem vender leite, daí voltei dois anos e parei
agora, não era uma coisa muito profissional, era mais familiar,
não tinha grande investimento. Acho que abriu a cabeça da gente pra
diversificar mais, porque tu ter uma fonte de renda também não
dá, se acontece de dar um problema. (4H)
Trabalhar com leite, tu perde a vontade, mas depois vai devagarinho.
Eu tinha prometido que não ia voltar a tirar leite, faz três anos que
estamos tirando. (1M)
O pessoal tá voltando pro leite mais pela necessidade de ter uma
renda, uma das poucas atividades na nossa região que dá. Aqui pra
hortifrutigranjeiro não dá, é longe do centro. Fruta não pode investir
por causa dos venenos da lavoura, aqui é grande extensão de lavoura
com secante e outras coisas, e aqui não tem suínos e aves. (5H)
4.3.8 Comunicação
Como visto anteriormente, a comunicação com os agricultores no surgimento da
doença apresentou uma série de falhas. Na questão fechada do roteiro em que a entrevista foi
baseada, sobre a informação que a sociedade tem a respeito da febre aftosa, cinco
entrevistados consideraram que o público tem pouco entendimento sobre os motivos do
sacrifício sanitário, como fica claro nestes depoimentos:Por que foi decidido matar acho que
tem dúvida, porque no começo ninguém entendia, antigamente conviviam e não precisava
matar e agora matar uma quantidade dessa”. (4H)
Essa questão do Estado esclarecer o público, acho que o governo
procura mais esconder, mas aftosa não se esconde, nós aprendemos
isso, e mais cedo ou mais tarde vai estourar, num lugar e no outro e
se estoura no pequeno produtor, deus o livre, o cara fica louco. (5H)
78
Três informantes apontaram que as pessoas têm dúvidas se a doença afeta ou não os
humanos, apenas um considerou que existe preocupação dos órgãos oficiais em esclarecer
sobre a doença quando surtos próximos e um outro acha que os meios de comunicação
esclarecem adequadamente sobre a doença.
4.3.9 Consumo
Para cinco entrevistados, não risco em consumir carne dos animais infectados ou
contatos, mas não houve clareza sobre se o risco inexiste de uma forma geral ou somente não
risco se a carne for desossada e maturada. Dois outros não responderam.
Com relação à liberação ou não para o consumo, houve quatro respostas favoráveis à
liberação da carne para a venda ou doação, quatro favoráveis à liberação desde que a carne
passasse por processos de inativação do vírus e uma resposta favorável a não liberação.
4.4 A POLÍTICA DE ERRADICAÇÃO NA OPINIÃO DAS
INSTITUIÇÕES AGRÍCOLAS DE SANTA CATARINA
4.4.1 Adequação da política
Todos os nove informantes nas instituições agrícolas catarinenses consideraram que
risco na introdução do vírus, mas um apontou que, apesar do risco, as medidas adotadas são
seguras. Para três dos nove entrevistados, a falta de vacinação é um fator de risco para o
79
ressurgimento da doença. A avaliação do nível de segurança do sistema de vigilância
epidemiológica teve o seguinte número de respostas positivas: alto, sistema plenamente
confiável, equipes e orçamento suficientes (4); médio, sistema confiável, mas equipes
insuficientes (1); médio, sistema confiável, mas orçamento insuficiente (2); baixo, o sistema
tem falhas (1).
Quatro informantes avaliaram que o vel de segurança das barreiras sanitárias é alto e
que existem em número suficiente. Para outros quatro, a segurança é média, pois
necessidade da existência de mais barreiras. Um dos entrevistados considerou que existe risco
da entrada de carne com osso de outros estados que vacinam e do exterior, em meio às cargas
em caminhões lacrados que vão aos frigoríficos. Outro entrevistado considerou que a
segurança é baixa, pois podem passar cargas de animais e produtos animais por estradas
vicinais não fiscalizadas.
4.4.2 Vacinação e não vacinação
4.4.2.1 A manutenção da não vacinação
A política de não vacinação em Santa Catarina teve as seguintes respostas: totalmente
adequada (sete de nove entrevistados), parcialmente adequada (um de nove) e inadequada (um
de nove). As justificativas às respostas foram agrupadas em quatro categorias. À categoria
segue um depoimento que ilustra as diferentes posições:
- Categoria 1: confiança - boa qualidade do sistema de defesa e posição geográfica
privilegiada (2 respostas)
80
Temos toda a base de prevenção primária, que são as barreiras, o
trabalho educativo no campo, equipes emergenciais que estamos
treinando pra qualquer surto que possa ocorrer, todos os
profissionais que foram contratados, toda a ajuda da iniciativa
privada, apoio do governo faz com que essa situação não seja sorte, é
investimento que está sendo feito aqui. (CIDASC)
- Categoria 2: processo - evolução do processo de erradicação da doença (2 respostas)
A vacinação garantiu a erradicação, não justifica hoje voltar a
vacinar. Esse é um estágio buscado por todos os países, o de
excelência sanitária de não vacinar, adquirimos esse status, devemos
sempre seguir nessa metodologia sem regredir. (SAR)
- Categoria 3: motivação econômica - maior acesso a mercados internacionais e
agregação de valor à carne (3 respostas)
O Estado está politicamente correto nesse trabalho de não vacinação,
porque isso agrega muito valor ao nosso Estado, traz retorno
econômico, ajuda a manter as propriedades pequenas através da
suinocultura e avicultura e com isso gera uma cadeia econo-
micamente ativa que movimenta transporte, empregos, equipamentos
e que tem salvado o interior de Santa Catarina. (FAESC)
- Categoria 4: preocupação sócio-econômica (com prejuízos devido a um surto,
principalmente na bovinocultura de leite) – (2 respostas)
Se o Estado continua se beneficiando economicamente por não
vacinar, precisamos construir no futuro políticas que possam dar essa
garantia para o produtor. Como se em outros estados, quem paga
a conta econômica e social se acontecer qualquer problema é o
produtor. A produção de leite é uma das principais rendas de grande
parte dos agricultores familiares. Os agricultores, quando atingidos,
vão, com certeza, perder sua renda. (FETRAF-SUL)
Não vacinar é um risco desnecessário para Santa Catarina. Pelo
argumento econômico, até hoje não ganhamos nada. Pode ter foco
pela imigração de outros animais que entram no Estado, pode ser
instalado um foco até criminalmente, e nós temos um rebanho
totalmente descoberto, sem imunização nenhuma, e o impacto será
81
muito maior. [...] Criou-se nos órgãos e nas pessoas que estão na
representação e no governo a questão de que hoje se vacinar é um
atraso sem precedentes, que se Rio Grande do Sul, Paraná e Santa
Catarina fossem uma área livre que não tivesse risco nenhum, nós até
poderíamos manter, mas estamos num país que tem riscos
epidemiológicos da circulação dos animais. (FETAESC)
4.4.2.2 Apoio dos criadores
Para oito dos nove entrevistados, a maioria dos criadores em Santa Catarina concorda
com a não vacinação e para um deles, a concordância é da minoria. As respostas abertas à
avalião do apoio foram enquadradas em níveis de intensidade, que são: apoio positivo (maior
grau de aprovação), apoio parcial (graus diferentes de aprovação) e apoio negativo (menor
grau de aprovação). As respostas foram enquadradas em seis categorias:
Apoio positivo:
- Categoria 1: motivação econômica (benefícios futuros às exportações, redução de
custos por não precisar comprar a vacina) e comodidade para o agricultor (não precisar se
mobilizar para a aplicação da vacina, evita o estresse dos animais) - (2 respostas)
- Categoria 2: resultado de processo educativo-sanitário (agricultores sabiam que a
vacinação seria seguida da não vacinação) - (2 respostas)
Apoio parcial:
- Categoria 3: apoio de suinocultores e avicultores, parcela de bovinocultores e
contrários – (2 respostas)
- Categoria 4: apoio de suinocultores e avicultores favoráveis, parcela de
bovinocultores e “grupos ideológicos” contrários – (1 resposta)
Apoio negativo:
- Categoria 5: desconhecimento (pouco entendimento sobre vacinação e não vacinação
82
e sobre a doença) - (1 resposta)
- Categoria 6: preocupação sócio-econômica (perda do rebanho e da renda) - (1
resposta)
Os diferentes níveis de apoio podem ser observados a partir dos depoimentos que
seguem:
Apoio positivo:
A cadeia produtiva dos bovinos colaborou muito com a vacinação, o
criador contribuiu pagando a vacina, a aplicação [...] eles sempre
tinham a idéia, repassada através das orientações da educação
sanitária, que chegaria o momento, depois de vacinar, que iríamos
retirar. (CIDASC)
Apoio parcial:
Os produtores catarinenses de suínos e aves apóiam, em quase sua
totalidade, considerando a viabilização de mercados internacionais
interessantes. O mesmo não ocorre com todos os produtores de
bovinos, Santa Catarina não é auto- suficiente na bovinocultura de
corte, o segmento não participa do comércio internacional. A
execução do programa exige a implementação de controles como o
trânsito de animais, que demandam dedicação extra por parte dos
bovinocultores [...] produtores de estados vizinhos são contrários à
definição de Santa Catarina de manter seu plantel bovino sem vaciná-
lo contra a febre aftosa. (DFA-SC)
O que existem são grupos ideológicos dentro da agricultura familiar
contra o agronegócio, contra as exportações, que não concordam,
porque corre risco a vaca de leite que ele tem, que são
problemas sanitários, que no futuro, não teríamos condições nem de
exportar lácteos [...] alguns produtores de bovinos reclamam porque
estão impedidos de comercializar, de trazer animais, não entendem
muito bem economicamente essa questão, são as duas classes
contrárias. (FAESC)
Na bovinocultura estamos limitados no melhoramento genético, pela
impossibilidade de importar reprodutores, é um problema, outro é
que Estado não tem produção suficiente de bovinos, temos que
importar. No futuro pensamos que vamos colher os frutos desse
sacrifício momentâneo, imediatamente estamos pagando o preço por
ter essa condição diferenciada. (Sindicato Rural de Lages)
83
Apoio negativo:
As pessoas não têm muita noção do que é de fato, é uma questão
bastante técnica e grande parte dos agricultores normalmente tem a
opinião de não vacinar por causa do custo, do trabalho, não
imaginam o que significaria uma doença como aconteceu no Mato
Grosso do Sul, onde num assentamento todos os animais foram
mortos e o assentamento perdeu uma renda importante na área do
leite e da carne. As pessoas não imaginam porque a maioria da
juventude não conhece o que é essa infecção, porque faz muitos anos.
(FETRAF-SUL)
4.4.2.3 Comparação entre vacinação e não vacinação
Nas questões fechadas que apresentavam alternativas sobre vantagens da vacinação e
da não vacinação, todos os entrevistados apontaram alguns pontos positivos em vacinar
(comparação entre as opiniões na Tabela 6), sendo o maior mero de respostas relativo à
proteção do rebanho, se as vacinas forem de qualidade (especialmente com coadjuvante
oleoso), e a aplicão for feita de forma adequada e profitica. Como “outras vantagens da
vacinação” foi apontada a manutenção de um parque industrial para produção da vacina,
criação de empregos e comércio nacional e internacional da vacina.
84
Tabela 6. Comparação entre respostas positivas para a vacinação e não vacinação – Instituições agrícolas
Quanto às vantagens da não vacinação, um argumento utilizado por quatro
entrevistados é de que a vacinação pode esconder a presença do vírus. Dois deles citaram os
testes de sorologia que podem verificar a presença de vírus no campo. Nenhum citou testes
que podem distinguir entre animais vacinados e não vacinados. A opinião corrente contra a
vacinação é observada neste depoimento:
Hoje, em termos de epidemiologia da doença, entende-se que animal
vacinado pode ser um animal infectado, porque a doença pode não
aparecer porque ele está protegido, razão pela qual não vêm bovinos
de nenhum estado brasileiro para dentro de SC, eles passam por
aqui, através de corredores. (CIDASC)
O argumento principal para sete dos entrevistados são os ganhos econômicos que se
concretizariam com um maior volume de exportações, principalmente na exploração de suínos,
como esclarece o entrevistado do SINDICARNE:
O comprador do mercado europeu, do Japão e Coréia do Sul, paga
melhor o suíno, mas eles não compram (suínos) de país que vacina os
bovinos. A única chance do Brasil e Santa Catarina exportarem para
esses países, a condição primeira é ser livre sem vacinação, depois
85
Vantagens da vacinação
Nº de respostas
Proteção do rebanho 7
Evita sacrifício em massa e destruição de animais saudáveis 5
Diminui a possibilidade de retorno da doença 6
Evita conseqüências sociais e perda de bem-estar animal 4
Outras vantagens 1
Vantagens da não vacinação Nº de respostas
Ganhos econômicos área livre sem vacinação 8
Retorno em 6 meses status de livre, após surto 3
Evita custos com vacinação 6
Evita estresse dos animais na aplicação da vacina 4
A vacinação perpetua a infecção 4
Não vê vantagens 1
Outras vantagens 1
terão outras exigências, mas esta é a primeira [...] A aftosa hoje é
mais um problema pra suíno, do que pra bovino ou outra coisa aqui
no estado.
O entrevistado complementa que esses países importam do Brasil carne de bovinos
vacinados porque um processo de maturação da carne
46
, e no suíno não trabalhos
científicos que comprovem que, fazendo maturação da mesma forma que a carne bovina, se
elimine o vírus que porventura esteja presente na carne.
Como “outras vantagens da vacinação”, foi apontado que a suspensão da vacinação e a
erradicação de doenças pode vir a despertar uma cultura sanitária importante.
4.4.2.4 Vantagens do atual status sanitário
A avaliação da vantagem do status de área livre de aftosa sem vacinação, reconhecido
apenas nacionalmente, em relação aos embargos de exportações que também atingem a carne
catarinense quando surtos em Estados e países vizinhos teve as seguintes respostas
positivas: os países importadores reconhecem a situação sanitária de Santa Catarina (1), apesar
dos prejuízos momentâneos, depois as compras se regularizam (5), os importadores tendem a
considerar o país como infectado (4). A classificação do Estado somente será diferenciada se
houver reconhecimento pela OIE, conforme avalia este informante:
Hoje Santa Catarina na prática não tem vantagem sobre esse status
sanitário. A partir do momento em que a OIE reconhecer, pode ser
que se consiga (vantagem real), mas esse é o primeiro passo, tem
muito mais exigências, de biosseguridade, controle de resíduos, (a
carne ser) livre de drogas
47
. (SINDICARNE)
46
A mudança de Ph destrói o vírus, se estiver presente.
47
Livre de resíduos de medicamentos veterinários.
86
4.4.2.5 Voltar a adotar a vacina
Sete informantes consideram que um programa de vacinação não deve ser adotado
novamente em Santa Catarina, um deles apontou que seria necessário rediscutir os riscos em
caso de surto e outro se referiu à necessidade de retomar a vacinação. Para os entrevistados
que não querem o retorno da vacinação, as justificativas foram as seguintes: “Vacinar é
retroagir” (ACCS, SAR, Sindicato Rural), “não se quiser atingir mercados globais”
(FAESC), “não, porque houve um trabalho educativo de base” (CIDASC) e “não, teria que
ter um descontrole total, entrar um animal portador em Santa Catarina, é muito difícil”
(SINDICARNE).
A opinião favorável se referiu a um controle sanitário com a vacinação e preocupação
com a economia da agricultura familiar:
Teria um controle sanitário maior, possibilidades de ter garantia na
entrada (de animais). Se der de um foco em Santa Catarina, o impacto
sócio-econômico na agricultura familiar será assustador, o estado
geralmente não cobre todos os custos deles, talvez cubra os
investimentos nos animais, mas como é que vai ser a sobrevivência
dele no decorrer do tempo? (FETAESC).
4.4.2.6 Vacinação em anel
Seis entrevistados foram favoráveis à adoção da vacinação perifocal, para controlar um
foco, um à vacinação preventiva de todo o rebanho bovino e outros três afirmaram que deve
haver apenas o sacrifício. Em relação à primeira afirmativa, houve os seguintes comentários:
É o correto, essa foi a nossa defesa na época (quando se retirou a vacinação)” (FETRAF-
SUL). “Essa seria uma das medidas, vai depender de um estudo das circunstâncias. Se os
animais estão isolados, não tem necessidade nem de fazer vacinação, se tiver que fazer um
87
controle, se faz sorologia” (SINDICARNE); “foi o que o Rio Grande do Sul fez no começo
(2001), para prevenir a disseminação da doença. Não seria suficiente também só o sacrifício,
o vírus deve estar em algum lugar à volta, inclusive nos animais silvestres” (Sindicato Rural
de Lages).
Quanto aos que se posicionaram contra, houve este comentário: “Não está
inviabilizada essa possibilidade, mas existe o risco se for mantido um foco ativo, então
melhor seria o sacrifício dos animais, elimina totalmente o problema” (SAR).
4.4.3 Sacrifício
O sacrifício dos animais infectados é correto na opinião dos nove entrevistados. Duas
categorias puderam ser definidas a partir das respostas:
- Categoria 1: motivação econômica (rapidez nas ações, retorno ao status sanitário
anterior) – (5 respostas)
- Categoria 2: restrição do surto (evitar a contaminação de outros animais) - (4
respostas)
Este depoimento resume a postura favorável quanto a motivação é econômica:
“Sacrifício é muito mais do que eliminar a doença, é mostrar seriedade, confiabilidade,
transparência, mostrar que se faz o dever de casa” (ACCS).
A eliminação dos animais contato é correta para oito informantes, um deles não
respondeu. Quatro entrevistados afirmaram que os contatos podem ser portadores e têm que
ser eliminados, dois outros disseram que é preciso avaliar quais animais representam um
contato perigoso, como mostra este trecho:
88
Dependendo da situação do foco, o contato não tem necessidade de
ser eliminado, depende de um estudo pra ver que providência tem que
ser tomada, e ela não deve ser tomada assim, contato se elimina, que
às vezes o contato não está tão próximo. (SINDICARNE)
4.4.4 Bem-estar animal
Cinco entrevistados opinaram que existe preocupação com o bem-estar animal no
sacrifício sanitário e as ações são feitas de acordo com as normas da OIE e às leis de proteção
aos animais. Dois responderam que existe essa preocupação, mas, devido à urgência das ações,
podem ocorrer falhas de bem-estar. Para outros dois, a supressão dos animais não leva em
conta o bem-estar.
A crença de que as ações atendem o bem-estar animal pode ser observada nesta fala:
De acordo com as normas da OIE (o sacrifício) é através de tiro, que
é forma que usada nos abatedouros, é a forma menos dolorosa de
abater. Tudo isso foi tecnicamente estudado, qual seria a melhor
forma de se abater, creio que não haveria outra forma melhor agora.
(FAESC)
Quanto à urgência das ações, outro informante observou que no caso de haver um
mero elevado de animais a ser sacrificado podem ocorrer mais falhas:
Eles têm que ser sacrificados na beira, agora, se joga, quebra a
perna, se machuca, não fica morto, o problema é quando se tem um
número muito grande pra sacrificar, aí fica um pouco mais
complicado, mas o pessoal preparado pra fazer isso.
(SINDICARNE)
A forma de sacrifício teria que ser a menos traumática possível.
Teriam que ser conduzidos até a cova de uma forma mais humana
[...], no rifle sanitário (o tiro) pode pegar em animais que não vão
morrer, é preciso ter bons atiradores, procurar fazer com que as
coisas sejam abreviadas, os animais não merecem. (Sindicato Rural).
89
A inexistência de preocupação com o bem-estar dos animais no sacrifício sanitário é
explicitada neste depoimento:
Não preocupação nenhuma, mas não quer dizer que não deva ter.
Acho muito errado, quando se pensa em bem-estar animal se pensa
na hora da morte dele. Bem-estar deve ser pensado durante a vida
dele. É lógico, no abate tem que ter métodos pra fazer isso que não
signifiquem uma dor expressiva ou algo irracional sobre os animais,
existem técnicas que eliminam a dor. Hoje não se leva em
consideração, apesar de que todos os animais são sacrificados com
rifle, não tem insensibilização. (SAR)
4.4.5 Bem-estar humano
Quanto à contemplação do bem-estar dos criadores na política de erradicação de febre
aftosa, as respostas tenderam a se concentrar em prejuízos econômicos e na perda de renda
com a ocorrência de um surto. Apenas dois depoimentos demonstraram preocupação com
impactos sociais mais amplos:
É uma preocupação que sempre está presente pra todos nós, é um
impacto não econômico, é social, cultural, existe uma história de
produção que pode romper de uma hora pra outra, e é um pouco
(uma questão de) como se lida com os animais, como se lida com uma
doença dessas. A gente teve momentos mais difíceis, e agora como
o Estado tem muitos anos sem aftosa, sem vacinação, aumenta a
confiança dos próprios agricultores, mas também isso pode ser um
problema porque deixa muito de lado o processo de diálogo, de
prevenção, de conscientização das pessoas. (FETRAF-SUL)
Entendo que é trágico principalmente pras famílias, pras pessoas que
convivem ali [...] uma pressão muito forte, imagine as pessoas,
os produtores, a comunidade que está envolvida, se der um surto de
aftosa tu tem que literalmente fechar tudo, tu é visto como um
bandido, mas se comparar, a vantagem de não vacinar sempre é
maior. [...] não saberia se acontecesse na minha granja como é que
90
eu iria me comportar, mas de qualquer forma o remédio amargo é
aquele que cura, tem que ser por aí. (ACCS)
Os nove entrevistados disseram que não existe uma forma de proteção ou assistência
psicológica, apenas a indenização pelo rebanho sacrificado, como demonstra a opinião do
informante do SINDICARNE: “Não existe apoio, tenho impressão que não existe em nenhum
lugar do mundo” .
Na opinião do entrevistado da SAR, os prejuízos econômicos são a principal
preocupação dos criadores:
O criador vai sentir muito mais a questão econômica, a não ser
aqueles que têm rebanhos leiteiros, que se apegam mais aos animais,
não me dedicaria a estabelecer um programa de apoio psicológico ao
criador, mas não posso dizer que não é um caminho.
A qualidade do sistema de defesa sanitária é apontada como um fator que pode impedir
que o ingresso da doença represente uma tragédia social:
Não existe em parte nenhuma do mundo um programa tão preparado
pro combate como em Santa Catarina, a estrutura técnica que existe
[...] que imediatamente isso será estancado [...] Nós não podemos
desfazer a nossa guarda, é por isso que não creio que aqui (se houver
um foco) vai ser um desastre social. (FAESC)
Em relação aos profissionais que participam de sacrifício sanitário, como policiais e
veterinários, oito entrevistados responderam que deveria haver acompanhamento psicológico,
um deles considerou que não é necessário esse acompanhamento, por se tratar de policiais e
soldados das forças armadas, treinados para agir em situações como essa.
4.4.6 Comunicação
Sobre o conhecimento público sobre a febre aftosa, seis entrevistados pensam que
91
existe preocupação do governo em esclarecer quando surto em estados e países próximos,
mas apesar disso seis deles consideraram que o público tem dúvidas sobre se a doença afeta ou
não humanos; e para quatro deles existe pouco entendimento sobre a não vacinação e o
sacrifício dos animais em caso de surto. O papel dos meios de comunicação no esclarecimento
da doença foi visto como adequado por três informantes e outros quatro não consideram
adequado.
Em relação à comunicação do governo com os criadores sobre a febre aftosa, quatro
entrevistados consideraram que a comunicação é eficiente e resultado do programa de
educação sanitária existente, como explica este entrevistado: “Foi feito um trabalho de base
durante anos pra se parar de vacinar, que os criadores entenderam, muitos podem não
aceitar o processo, mas sabem porque foi feito aquilo, o criador sim, mas não a população”.
(FAESC)
Um informante ressaltou que a qualidade da comunicação é resultado de uma boa
relação entre governo e as entidades que representam diferentes setores da agricultura:
Temos uma relação muito grande com todas as associações de
criadores e bovinos e bubalinos, elas fazem parte de câmaras
setoriais coordenadas pela secretaria, de carne e de leite, através do
conselho regional de vigilância rural, temos outras entidades que
representam os criadores nas regiões e municípios, o Estado tem
procurado manter uma boa relação não só sobre a febre aftosa, mas
também sobre outras enfermidades animais e vegetais. (SAR)
Para cinco entrevistados, a comunicação é falha e o criador tem pouca informação e
entendimento da política adotada, como se observa:
O pessoal não tem informação, não tem dimensão do que é, então é
difícil o produtor tomar posição, ele toma posição muito por alguém
que induz, tanto o Estado, como as organizações, o técnico, o
veterinário que vai lá. (FETRAF-SUL)
92
Os agricultores nem sabem porque não estão vacinando, os motivos,
definiu-se que não se vacina e pronto e o agricultor em alguns
momentos gosta, até por que não tem custo de comprar a vacina, não
comunicação nenhuma, a não ser quando um surto, se as
reportagens por aí. (FETAESC)
4.4.7 Consumo
Sete entrevistados opinaram que não existe risco em consumir carne desossada e
maturada de animais infectados e de contatos. Dois não responderam. Apesar disso, seis deles
observaram que a carne não deve ser liberada para consumo. Esta posição é resumida aqui: “É
mais uma questão de segurança de que aquilo está sendo destruído e não vai representar
nenhum problema” (SINDICARNE). Três consideraram que a carne deve ser liberada para a
venda ou doada, desde que passe por processos que inativem o rus.
93
5. DISCUSSÃO
5.1 ERRADICAÇÃO, VACINAÇÃO E PARTES INTERESSADAS
A compreensão sobre a febre aftosa afastou-se de uma forma natural de aceitar e
conviver com retornos periódicos e transitórios da enfermidade, corrente entre os agricultores,
e se dirigiu para uma concepção, reforçada pelas instituões oficiais agrícolas e econômicas e
pelo agronegócio, de doença que causa restrições econômicas e deve ser erradicada (WOODS,
2004).
Os resultados deste trabalho mostram que a aplicação da política de controle e
erradicação não contempla devidamente questões sociais, éticas, de bem-estar animal e
ambientais. O combate a um surto é dispendioso e pode transformar de forma abrupta os
modos de vida no meio rural e levar a situações de extrema pobreza de bem-estar das pessoas
e dos animais, como visto no caso de Jóia e em outros episódios.
O relatório da Conferência Internacional sobre Prevenção e Controle da Febre Aftosa,
realizada em Bruxelas (CONFERÊNCIA..., 2001), sinaliza que o crescente interesse público
em torno da qualidade de vida dos animais, o papel das instituições de proteção animal e a
divulgação global pelos meios de comunicação de ações como as de sacricio sanitário, podem
tornar a política baseada na “aniquilação dos animais inaceitável social e politicamente e
novas abordagens devem ser encontradas, opinião corroborada por Kitching (2002). Ocorre
que a estratégia de “contiguous cull utilizada pela Grã-Bretanha, em 2001, do abate
preventivo em propriedades afetadas e vizinhas, abriu um precedente mundial para que possa
ser adotada em novos surtos.
94
No Brasil, o que se viu foi uma comoção temporária com o ocorrido em Jóia, mas na
segunda reintrodução da doença no Rio Grande do Sul, em 2001, o número de animais
sacrificados, mesmo vacinados, foi ainda maior do que em Jóia, e em 2005, no Mato Grosso
do Sul, esse quantitativo superou os 30 mil animais. No Paraná, em 2006, houve primeiro
sacrifício para depois ser feita autópsia no rebanho, para mais tarde se comprovar que se
tratava apenas de reação da vacina, e não da presença do vírus ativo.
A principal meta dos países exportadores de carnes é tornar-se zona livre de aftosa sem
vacinação. A vacinação anti-aftosa se constitui em mais uma barreira comercial internacional,
porém na base da questão, conforme o relatório da Conferência de Bruxelas, pode estar o fato
de que “existe o falso pressuposto de que animais vacinados têm valor inferior aos não-
vacinados” (CONFERÊNCIA..., 2001, p. 22). Essa suposição, complementa o relatório, pode
conduzir a políticas de controle contrárias ao bem-estar.
De outro lado, houve uma flexibilização das regras para readquirir o status sanitário
nos países ou zonas que vacinam, caindo de 12 meses para seis meses no caso da aplicação de
sacrifício e vacinação emergencial, e de 24 para 18 meses, quando os animais não são
sacrificados (ORGANIZAÇÃO..., 2006a). Mesmo assim, a posição oficial em Santa Catarina é
de não utilizar a imunização emergencial em caso de foco, para beneficiar-se do período de
três meses
48
para voltar a exportar, apenas três meses a menos do que o prazo previsto para
que uma área livre com vacinão recupere seu status.
Três inqritos realizados na Grã-Bretanha após a epidemia (Policy Comission of
Farming and Future, Lessons Learned e Royal Society Inquery), recomendaram que no futuro
a política incorporasse a vacinação. A Royal Society afirmou que não havia quaisquer
“barreiras técnicas, científicas ou culturais para o uso da vacina” (WOODS, 2004, p. 149).
Outra conclusão foi de que o papel do animal portador tinha sido exagerado e elevou o
48
De acordo com a OIE, mas na prática, o importador pode definir os prazos, como ocorreu com a Rússia nos
casos recentes.
95
mero de animais mortos. Para Barteling e Sutmoller (S.D., p. 1), existe um dogma na
medicina veterinária de que “vacinação contra febre aftosa previne os sintomas mas não
erradica a doença”. Argumentam que onde o controle de focos ocorreu por vacinação
consistente, com vacinas qualificadas, a doença não retornou e que não há casos
documentados de que bovinos vacinados com vacinas qualificadas causaram novos focos. Os
autores referem que o risco de portadores vacinados é próximo a zero.
Para Duffy (S.D.), se fosse possível controlar as fontes de infecção ou aumentar a
resistência dos animais ao vírus da febre aftosa de forma que não fossem mais suscetíveis à
infecção, ou se evitasse o contato dos animais com as fontes de infecção, o rus desapareceria
normalmente da população pela eliminação dos reservatórios virais e das fontes de infecção ou
pela inativação do agente viral.
Essas formas de controle são cada vez menos adotadas, já que os animais utilizados na
produção vivem sob total controle da humanidade e o comércio internacional dita regras
progressivamente mais restritivas. Pode-se considerar, então, que a vacinão de todo o
rebanho, mesmo com os inconvenientes de custo e estresse dos animas, seja o método que
mais protege contra a introdução do vírus e previne o sofrimento causado pela própria doença
e pelos atuais métodos de controle. Se não é utilizada a vacinação protetora, de todo o
rebanho, a vacinação de emergência, sem abate dos animais vacinados, pode representar a
alternativa mais aceitável para atender os interesses de uma parcela maior de envolvidos. Para
Sutmoller et al (2003, p. 134), ela evita as desvantagens do sacrifício em massa e a destruição
de animais saudáveis, pode fazer parar a difusão da doença, prevenir o sofrimento dos animais
e “assegurar que em poucas semanas depois da vacinação a vida na área afetada tome seu
curso normal, com mínimas conseqüências sócio-econômicas”. [to ensure that a few weeks af-
ter vaccination life in the affected area can resume its normal course, with minimal socio-eco-
96
nomic consequences]. Em torno de quatro a cinco dias são necessários para estimular a
imunização e criar uma área na qual os animais estão protegidos antes do primeiro contato
com o vírus.
5.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE A POLÍTICA
5.2.1 Setor agropecuário de Santa Catarina
O principal interesse da maioria das instituões agrícolas catarinenses ouvidas é a
manutenção do status de área livre de febre aftosa sem vacinação e a conquista da certificação
internacional para ampliar as exportações. Esta situação privilegia particularmente os setores
da suinocultura e da avicultura no Estado e traz alguns impedimentos para a bovinocultura. De
outro lado, as instituições que representam a agricultura familiar tenderam a se preocupar com
efeitos sócio-econômicos nas propriedades, no entanto, centrados na perda de renda.
A clara opção do Estado e do agronegócio pela suinocultura e avicultura industrial
trouxe retornos econômicos inegáveis. Como conseqüência, porém, aumentou a degradação
ambiental, especialmente causada pela suinocultura
49
, situação que tende a se acelerar com o
incremento das explorações, em virtude da obtenção do certificado da OIE de área livre sem
vacinação. O caso da suinocultura em Santa Catarina pode ser entendido como um exemplo do
que a teoria da economia ecológica chama de “troca ecologicamente desigual(MARTÍNEZ
ALIER, 1994) em que os preços praticados pelo mercado infravaloram ou desconsideram o
desgaste ambiental que pode ocorrer no local da produção ou extração da mercadoria. A
49
Conforme Machado Filho et al (2001), a produção agroecológica de suínos é superior à convencional em
termos ambientais, energéticos e de bem-estar animal, mas deve ser uma opção para toda a agricultura, e não
somente para pequenos produtores.
97
forma industrial desse tipo de exploração não estima a capacidade de suporte dos
geossistemas, num mundo que é materialmente limitado, e tem alto custo energético e
entrópico, ao utilizar largamente combustíveis fósseis nas etapas de produção e transformar
insumos de baixa entropia e alto valor, como a água, em produtos finais de dejetos sem valor
(de alta entropia) (GEORGESCU-ROEGEN, 1975). As soluções para armazenamento e
distribuão dos dejetos são muitas vezes ineficazes. Esterqueiras, bioesterqueiras e lagoas de
tratamento produzem gases que comprometem a qualidade do ar e vazamentos são comuns,
contaminando águas superficiais e profundas e o solo. Recursos econômicos, humanos e
maquinário para distribuir os dejetos nas lavouras (atribuição em geral das prefeituras) são
insuficientes (GUIVANT e MIRANDA, 1999). Suínos e aves também competem com os seres
humanos, pois a proteína vegetal de alta qualidade que compõe as suas dietas serviria ao
consumo humano direto. Para Lund et al (2003) seu papel deveria ser marginal nos
agroecossistemas.
A situação sanitária diferenciada dos Estados e países vizinhos não impede o retorno da
febre aftosa a Santa Catarina. O risco do retorno da doença é apontado por todos os
entrevistados, porém prevaleceu a crença de que a qualidade do sistema de defesa
epidemiológica catarinense é capaz de minimizar esse risco e, no caso do surgimento de um
foco, conter a disseminação da doença com rapidez. No discurso, fica clara essa posição:
“Não existe em parte nenhuma do mundo um programa tão preparado para o combate como
em Santa Catarina
50
(FAESC), alcançamos o estágio de excelência sanitária de não
vacinar [...] somos considerados uma vitrine, o que está acontecendo aqui é o futuro do
Brasil, uma experiência que tem que ser conquistada pelo Brasil inteiro
51
(CIDASC).
A febre aftosa é entendida como uma doença que restringe o comércio internacional de
50
Esta posição é reforçada também por ações políticas. Em junho de 2006, veterinários e técnicos da CIDASC
foram homenageados na Assembléia Legislativa de Santa Catarina como “heróis anônimos”.
51
Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás e Tocantins foram apontados pelo informante do Sindicarne como estados
que teriam condições de retirar a vacinação.
98
carnes, como se vê: “É a doença comercial mais temida, a pior doença de animais do
mundo” (SAR), “embora seja uma doença altamente contagiosa entre os animais
suscetíveis, o efeito é muito mais na área econômica” (CIDASC).
5.2.1.1 Bem-estar humano e animal e as ações de controle da doença
Os efeitos sobre o bem-estar humano foram pouco mencionados. Para contemplar
aspectos sociais, os mecanismos que o Estado possui restringem-se ao pagamento de
indenizações pelos animais sacrificados (não do lucro cessante pela paralisação das
explorações) e ao programa de educação sanitária, que proporciona esclarecimentos aos
criadores sobre a importância da defesa sanitária e dos todos que são postos em prática.
O conflito de interesses entre o agronegócio exportador de carnes e a agricultura
familiar torna-se evidente. Apoiados pela política oficial, os setores exportadores beneficiam-se
do enquadramento do Estado nas normas internacionais mais rápidas para retomar o comércio
internacional em caso de surgimento de um foco de febre aftosa, ao passo que o setor agrícola
do Estado, formado por propriedades familiares em sua vasta maioria (das quais as
participantes como integradas no sistema industrial de criação animal m decrescendo) pode
ser afetado na sua economia e modos de vida. E não apenas os produtores familiares de leite,
como se depreende das falas de algumas das instituições e mesmo em documento oficial do
MAPA. Nesse caso, é considerado que os exploradores de pecuária leiteira sentiriam mais. A
vaca de leite é vista como um indivíduo útil, mas que também é objeto de afeão e de alguma
consideração moral. Quanto aos outros animais suscetíveis utilizados na produção (suínos,
ovinos, caprinos e gado de corte), a visão tende para a do animal-máquina, coisa semovente e
não indivíduo, e então o sofrimento para o criador que tivesse seu rebanho sacrificado seria
99
menor ou ausente. No lugar do sofrimento, haveria o prejuízo econômico.
O mesmo argumento está implícito quando o foco é bem-estar animal. Ao prevalecer a
vio do animal-máquina, a forma de sacrifício não é questionada, apenas se constata que
podem ocorrer falhas no abate devido à urgência. Como o rifle sanitário é utilizado para todas
as espécies suscetíveis, a vaca de leite, para quem se abre uma exceção moral, tem o mesmo
destino. As instituições oficiais consideram que a questão de bem-estar animal está
contemplada nas normativas da OIE que são seguidas em caso de surto e que as ões
tomadas o corretas e eficientes, fruto de anos de experiência internacional. o houve
sugestões de aprimoramento do método. Santa Catarina optou pelo uso de rifle sanitário para
controlar um foco e a adoção de vacinação emergencial não está prevista, como observa o
entrevistado da CIDASC:
No status em que nós nos encontramos, temos que sacrificar os
infectados, doentes e contatos, isso (a vacinação) foi feito pelo Rio
Grande do Sul, que perdeu o status nacional de livre sem vacinação,
como não queremos que isso aconteça, orientamos só o sacrifício.
Essa forma é que mais pode afetar o bem-estar dos animais suscetíveis. Em primeiro
lugar, não existe a proteção primária da vacina. Apesar da atuação do sistema de vigilância e
defesa sanitária, o rebanho está vulnerável. Com a introdução do vírus, os animais podem
sofrer com a evolução da doença (se o sacrifício não for imediato), e com o rifle sanitário. A
definição de quais animais contato são “perigosos” pode aumentar a extensão dos que serão
sacrificados.
Para debelar um foco, o rifle sanitário é uma das formas mais utilizadas no mundo
52
. A
OIE (ORGANIZAÇÃO..., 2006b) observa que para ser eficaz, entre outros cuidados, o
52
Além do rifle sanitário, recomendado para abater bovinos, suínos, caprinos e ovinos, a OIE elaborou uma
lista com os métodos para diferentes espécies e idade dos animais. Entre eles estão o uso de armas penetrantes,
como a pistola de ar comprimido, seguido de sangramento, choque elétrico, barbitúricos e medicamentos e uso
de gases (ORGANIZAÇÃO..., 2006b)
100
atirador deve se assegurar que o animal não se move e está na posição correta para receber o
tiro, de que a distância seja a mais curta possível e de que seja utilizado o cartucho, calibre e
tipo correto para cada espécie, idade e tamanho do animal. Como vantagens do método,
considera que é a forma mais rápida e eficaz de sacrifício, requer pouca ou nenhuma sujeição
do animal, pode-se matar à distância e é o método adequado para sacrifício de animais
nervosos em espaço aberto. Mas como desvantagens, aponta que o método pode ser perigoso
para pessoas e outros animais no local, o ferimento pode não ser mortal e a perda de fluidos
corporais pode ser um risco para a biossegurança e disseminar o rus que se queria erradicar.
Em ações como o rifle sanitário, configura-se um estado de exceção em que a
legislação a respeito do tratamento dos animais é posta à margem e se ignora que animais são
seres sensitivos e não podem ser tratados dessa maneira. No Brasil, as principais leis são o
Decreto lei 24.645, de julho de 1934 (BRASIL, 1934), sobre atos de crueldade contra animais,
a Instrução Normativa 3 do Ministério da Agricultura e Abastecimento, de janeiro de 2000
(MMA, 2000), que trata do abate de animais, e a Lei dos Crimes Ambientais, 9.605, de 12
de fevereiro de 1998 (BRASIL, 1998).
A possibilidade de problemas de manejo, crueldade e sofrimento com os animais é
sempre presente no rifle sanitário, situação que tende a se tornar mais crítica quando os
rebanhos são maiores. Animais suscetíveis de todas as idade e fêmeas prenhes são executados
da mesma forma, conjuntamente. E as conseqüências traumáticas são sofridas por criadores e
vizinhos da área de execução, que passam a viver em um clima de guerra.
Para Crispin et al (2002, p.880-881), planejamentos futuros de qualquer política que
envolva eutanásia
53
de animais como meio de controle de doenças devem assegurar que os
métodos de sacrifício usados sejam científicos e “humanitários” e que métodos para condições
53
Eutanásia significa, literalmente, “boa morte”, “morte calma, sem sofrimento/prática pela qual se provoca a
morte para se poupar dores a um paciente incurável” (LUFT, 2000). A utilização do termo eutanásia é
questionável quando se trata de febre aftosa. Cabe apenas aos animais comprovadamente infectados e não a
animais saudáveis, que quando testados não apresentam infecção subclínica.
101
de emergência necessitam ser identificados, assim como uma “política ética, socialmente
integrada e aceitável para o controle de doenças infecciosas em animais para produção de
alimentos deve ser desenvolvida”.
Kitching (2002) sugere que futuras pesquisas sobre febre aftosa são necessárias nas
seguintes áreas: o papel da infecção persistente, aprimoramento de testes de diagnóstico para
distinguir entre um animal que pode estar se recuperando de uma infecção e um animal
vacinado, aprimoramento da qualidade das vacinas e o envolvimento da vida selvagem na
disseminação e manutenção da doença.
Conforme Lyra e Silva (2002b), as ações sanitárias governamentais devem ser
direcionadas aos pequenos produtores, para evitar a ocorrência de doenças e, conscientizá-los
da necessidade e importância de uma atuação emergencial, no caso de ocorrência de foco.
Esse trabalho deve ser feito por unidades locais de defesa sanitária.
5.2.2 Agricultores de Jóia
Segurança e bem-estar são valores prezados e apontados diversas vezes nos
depoimentos dos agricultores. Como observou Anthony (2004), a concepção pública de risco
inclui critérios subjetivos como confiança, ansiedade, vulnerabilidade e sentimentos de
segurança e bem-estar. Para todos os entrevistados, a vacinação efetiva do rebanho representa
segurança e previne repercussões sociais e sobre o bem-estar animal. Essa preocupação foi
menor nas instituões agrícolas catarinenses, apenas três apontaram essas conseqüências.
Para definir o surto em ia, os agricultores utilizaram palavras como “choque”,
“tragédia”, “desastre”, “absurdo”, inferno”, “desespero”, “trauma”, “acidente”, “pânico”
“caos”. Foi freqüente utilizar metáforas de guerra para avaliar o que ocorreu
54
: Quando
54
No surto foram também criados símbolos. Os carros da vigilância sanitária, que eram brancos, foram
102
começou a matança, era uma guerra, era um desespero, parecia no Iraque(1M), e de efeito
de bombas: Mais cedo ou mais tarde vai estourar, num lugar ou no outro e se estoura no
pequeno produtor, o cara fica louco(5H), quando era de tardezinho começavam a detonar
(os animais nas valas)” (7H). A Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul tamm
utilizou o argumento de que se tratava de uma operação de guerra (CIGANA e BAHIA,
2000). Conforme Nerlich (2001), a metáfora de guerra aberta contra o inimigo, a doença, foi
predominante no discurso de políticos, imprensa e agricultores na epidemia no Reino Unido.
Metáforas servem para dar sentido ao mundo que nos rodeia, e para os autores, no discurso
político foi usada para reforçar que o sacrifício era inevitável e preferível a outras alternativas.
A febre aftosa não apresenta riscos para a saúde humana, no entanto, as soluções
usadas para combatê-la podem apresentar, nos casos de impactos ambientais (NERLICH,
2001) e da saúde mental e sica dos envolvidos. Num estudo feito com 66 produtores de leite
na Holanda, que tiveram seus rebanhos sacrificados na epidemia de aftosa, em 2001, Haaften
et al (2004) identificaram comportamentos de estresse, depressão e marginalização entre os
produtores e comunidade. O estresse tem conseqüências psico-biológicas, é relacionado à
saúde mental e pode motivar problemas físicos e comprometer o sistema imunológico. A
marginalização tem relação com a perda de cultura diante de sérias alterações na rotina, como
por exemplo em caso de tragédias naturais, e a depressão é fortemente correlacionada com os
dois estados anteriores. Appleby (2003) relata que alguns agricultores cometeram suicídio na
epidemia inglesa.
Em Jóia, um grupo em especial sofreu os efeitos da marginalização, o das mulheres,
que passaram pela interrupção abrupta de suas tarefas na ordenha e cuidado das vacas,
atividades predominantemente femininas, e se viram diante da perda da renda e da ociosidade
decorrente disso, como resumiu a entrevistada 2M: “O colono não tendo o leite, a vaca, tem
chamados de corvos brancos, que vinham anunciar a morte do rebanho: “Uma criança que visse um carro
branco chegar se escondia, era um símbolo, chamavam de corvo branco” (PESQUISA DE CAMPO, 2006)
103
que ter alguma coisa pra se entreter”. Conforme Andreatta (2002), num estudo em 28
propriedades diretamente atingidas pela febre aftosa em Jóia, as mulheres participavam
efetivamente na exploração leiteira em 23 delas. Em 2002, dois anos após o surto, 12 dessas
propriedades não haviam retornado a essa atividade e em oito delas as mulheres não
desenvolviam nenhuma atividade remunerada. Antes, a renda do leite colaborava no orçamento
da família e proporcionava às mulheres uma certa autonomia financeira. Em outro estudo
sobre o impacto da febre aftosa na economia de 40 propriedades, a autora verificou alterações
estruturais profundas nos sistemas de produção agrícola em Jóia (ANDREATTA, 2003).
A necessidade de atendimento à saúde mental e sica nas comunidades envolvidas não
foi suficientemente dimensionada na administração da crise. Em Jóia, na equipe de 946
profissionais envolvidos com o controle do surto, havia apenas um psicológico, dois médicos e
dois enfermeiros para atendimento de saúde (BRASIL, 2002). Na equipe de 77 profissionais
da Emater, dois eram extensionistas de bem-estar social (ASSOCIAÇÃO..., 2001).
5.3 Riscos e oportunidades da política sanitária de Santa Catarina
O Estado não registra a presença de febre aftosa desde 1993 e descontinuou a
vacinação em 2000, portanto, devido a esse período de tempo, diminuiu ou inexiste a memória
imunológica do rebanho bovino. Para Kitching (2002), não é possível fazer qualquer
generalização do que esperar de um foco, dada a existência de sete sorotipos do rus da febre
aftosa e suas diferentes cepas, que apresentam comportamentos diversificados.
Rosenberg e Astudillo (1978), citados por Lyra e Silva (2002a), demonstraram que os
três tipos de vírus existentes na América do Sul (O, A e C) comportam-se de formas
diferentes: o tipo O apresenta ciclos epimicos de quatro a cinco anos, possivelmente
104
relacionado ao tempo de vida dos bovinos. O tipo A dá origem a surtos irregulares no tempo e
no espaço e o tipo C resulta em epidemias bastante difundidas em intervalos longos e
permanece pouco manifesto nos períodos interepidêmicos. O rus tipo A foi responsável pelas
principais epidemias. O tipo C foi o de menor incidência entre os três tipos diagnosticados no
Brasil.
Outra condição existente em Santa Catarina, que pode potencializar a gravidade de um
surto, é a criação de suínos em confinamento, que favorece a disseminão do vírus e é a
forma mais praticada no Estado. Os suínos são os maiores produtores de vírus na forma
aerógena, embora bovinos produzam em média uma magnitude muito maior de vírus e sejam
provavelmente a principal fonte de contaminação ambiental (SUTMOLLER et al, 2003).
Observando-se os efetivos de suínos e bovinos por abrangência geográfica, verifica-se
que os maiores rebanhos dessas duas espécies suscetíveis estão concentrados nos municípios
pertencentes a praticamente às mesmas Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDRs). As
cinco maiores concentrações de suínos, em ordem decrescente, estão nas SDRs de Concórdia,
Xanxerê, Videira, Joaçaba e Tubarão e de bovinos, em Lages, Concórdia, São Miguel do
Oeste, Joaçaba e Tubarão (SANTA CATARINA, 2005).
A preocupação com biossegurança foi manifestada por quatro entrevistados, dois deles
consideraram a possibilidade de que um surto possa ser iniciado criminalmente e outros dois a
transmissão por meio de animais silvestres suscetíveis, como o javali. Uma manada estimada
em 8 mil javalis, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA), está se reproduzindo entre os municípios catarinenses de Caçador e
Vargeão, região de fronteira com o Paraná, e pode ameaçar a condição de zona livre de febre
aftosa (ALVES, 2006).
Quanto aos aspectos sociais, o FUNDESA, fundo de indenização, não prevê o
pagamento de lucro cessante no período de vazio sanitário. Para estar apto a receber a
105
indenização pelos animais sacrificados, o criador tem que se enquadrar em algumas condições,
como ter locais apropriados para os animais e boas condições de manejo, nutrição, higiene e
profilaxia de doenças e de proteção ao meio ambiente, estar adimplente com tributos referentes
aos serviços de vigincia, controle, erradicação, fiscalização e certificação sanitária e com
débitos de tributos estaduais (SANTA CATARINA, 2001). Esta é uma situação ideal que
pode não constituir a realidade das propriedades agrícolas afetadas no momento da avaliação
para o recebimento da indenização. O criador será ainda mais penalizado, pois não terá direito
à compensação financeira.
Ao atender a meta maior de ser livre sem vacinação, os programas oficiais demostram
ignorar outras conseqüências sobre o bem-estar da população envolvida e dos animais. O
sacrifício sanitário no caso de febre aftosa nunca foi realizado em Santa Catarina em
propriedades rurais. Como visto em Jóia, o meio rural pode se desestruturar por um longo
período. Conseqüências (quantificáveis ou não), são externas aos custos dos programas.
Caso se mantenha a mesma política e haja um foco em Santa Catarina, com base neste
estudo de caso e em Andreatta (2003), pôde-se observar a necessidade de planejar políticas
públicas em vários campos:
- buscar outras atividades econômicas para substituir as que foram interrompidas desde
o estado de emergência sanitária até o repovoamento;
- repensar de forma global as atividades econômicas locais, incentivar a diversificação
da economia;
- encontrar formas de sacrifício (se necessário) mais éticas e menos desrespeitosas ao
bem-estar animal;
- organizar o repovoamento dos animais;
- proporcionar atendimento psicológico efetivo para criadores, comunidade rural e
equipes que trabalham diretamente nas ações de sacrifício;
106
- proporcionar atividades econômicas e de ocupação social para as mulheres,
especialmente se a região afetada se dedicar à exploração leiteira.
Outras questões não observadas neste estudo, no entanto presentes em outros surtos
epimicos de febre aftosa, e que não estão contempladas no planejamento da política de
defesa sanitária de Santa Catarina são:
- impactos sobre atividades não agrícolas, como o turismo. Em Santa Catarina, o
turismo é uma das principais atividades econômicas e a vocação turística é incentivada pelo
governo do Estado. Existem rotas especializadas em todas as regiões (KAISER, S.D.),
algumas delas nas zonas rurais, como o turismo rural na serra catarinense
55
(região que explora
a pecuária de corte e de leite), os caminhos europeus e festas étnicas no Vale do Itajaí (bacia
leiteira), e a Rota da Amizade, nos caminhos do Contestado, na região Oeste (exploração da
suinocultura).
- impactos ambientais, que envolvem riscos à contaminação do lençol freático pelas
valas sanitárias
56
e pelos produtos utilizados na desinfecção das propriedades
57
; poluição do ar,
se for usada incineração das carcaças, gerando outros problemas, como a disposão das cinzas
(ROSSIDES, 2002; NERLICH, 2001). Produtos vegetais, produtos animais, como o leite,
alimentos e cama dos animais, são destruídos nas propriedades afetadas. A forma de destruição
(incineração, enterro, despejo na terra ou nos rios), também pode causar problemas ambientais.
A febre aftosa se revelou como um problema não somente agrícola, que afeta outras
áreas da economia e diretamente as vidas de pessoas e animais (WOODS, 2004). Scott et al
(2004), observaram que o impacto da doença abre uma série de perspectivas para estudos em
sociologia rural. O espaço rural é considerado um bem público para a agricultura e para o
55
Região mais vulnerável ao ingresso do vírus da febre aftosa, conforme a classificação da CIDASC.
56
Há uma série de exigências a ser cumpridas para se estabelecer um cemitério, mas, pela urgência das ações,
margem para que isso não seja respeitado. Segundo a CIDASC (Pesquisa de campo, 2006), existem planos
municipais de emergência sanitária que estabelecem locais para os cemitérios, caso haja surto.
57
Detergente, formol, permanganato de potássio, GLP (gás liquefeito de petróleo) e iodo foram as substâncias
utilizadas na desinfecção em 533 propriedades em Jóia, conforme o MAPA (BRASIL, 2002a).
107
turismo rural e novos estudos poderiam discutir o papel da governança e da participação em
vel rural e a oportunidade de desenvolver administrações que enfatizem as difereas de
perspectiva, na direção de futuras políticas rurais.
A discussão pode ser ampliada em Santa Catarina com a participação de representantes
de outras áreas no Conselho de Desenvolvimento Rural (CEDERURAL). Scudamore e Harris
(2002), sugeriram para a Grã-Bretanha a criação de um conselho cienfico independente para
avaliar e aprimorar a política de erradicação, iniciativa que poderia ser seguida em Santa
Catarina.
108
6. CONCLUSÕES
A política de controle e erradicação da febre aftosa, baseada no sacrifício sanitário de
animais infectados e dos contatos foi implantada pela Inglaterra, no século 19, e atendeu
interesses econômicos da aristocracia, políticos e criadores de raças de pedigree. No Brasil, da
mesma forma, a política oficial beneficia os setores exportadores de carnes e em Santa
Catarina, particularmente a suinocultura e a avicultura. A vacinação protetora e emergencial
do rebanho se tornou uma barreira comercial e a certificação de zona livre da doença sem
vacinação passou a ser o ideal dos países exportadores de carne, com mais ênfase a partir de
1992, nos países membros da União Européia e na América do Sul.
Os controles da febre aftosa passaram da quarentena e aftização, formas pragmáticas
dos agricultores de lidar com uma doença inevitável, à vacinão e à adoção de sacrifício
sanitário e finalmente, à maximização dessa política, com o externio dos animais nas
propriedades afetadas e abate antecipado nas propriedades vizinhas, na Grã-Bretanha, em
2001, que abriu um precedente mundial para se possa ser utilizado novamente.
A política atende interesses econômicos, porém sua aplicação abrange aspectos sociais,
éticos, ambientais, de bem-estar animal, e impactos em outras áreas da economia, como o
turismo, que não estão devidamente contemplados nos programas oficiais. Os controles da
doença, com objetivo de recuperação do status sanitário, podem provocar mais danos do que a
própria enfermidade, que não ameaça as vidas humanas e se caracteriza por ser de baixa
letalidade nos animais suscetíveis, porém de alta morbidade. Considera-se que a erradicação
baseada na “aniquilação” dos animais torne-se inaceitável, porém o que parece existir é uma
comoção transitória e o retorno à mesma política.
109
Santa Catarina é o único Estado brasileiro que possui uma classificação diferenciada, de
zona livre de febre aftosa onde a vacinação não é praticada, que está prestes a ser reconhecido
internacionalmente, pela Organização Mundial de Saúde Animal. A opinião da maioria das
instituições agrícolas ouvidas neste trabalho é contrária à vacinação. A posição da CIDASC,
órgão estadual de defesa sanitária animal, é de utilização do rifle sanitário e de não adotar a
vacinação emergencial em caso de surto, forma que mais que pode afetar o bem-estar dos
animais suscetíveis e também das populações envolvidas. Repercussões sociais, mencionadas
principalmente por instituições ligadas à agricultura familiar, tenderam a se concentrar em
efeitos sobre a renda das famílias afetadas e não em situar o problema em implicações mais
amplas. É evidente a existência de conflito de interesses entre o agronegócio exportador de
suínos e aves, fortemente apoiado pela política oficial (apesar de causar séria degradação
ambiental), e os produtores familiares, que podem ser profundamente afetados em sua
economia e modos de vida com a experiência de um surto.
O estudo de caso em Jóia demonstrou que após o controle da doença e sacrifício do
rebanho, principalmente leiteiro, houve uma ruptura prolongada na cultura e atividades locais,
efeitos sobre a saúde mental das pessoas, perda de renda e alterações na economia. A
realizão do rifle sanitário apresentou problemas de manejo, bem-estar pobre e mesmo
crueldade no sacrifício de 11.067 mil animais. Todos os entrevistados em Jóia foram favoráveis
ao retorno à vacinação no Estado do Rio Grande do Sul e consideram a imunização efetiva
como um fator de segurança.
O retorno do vírus a Santa Catarina é provável para todos os entrevistados, porém se
acredita na qualidade do sistema de defesa sanitária e na localização geográfica privilegiada
para impedir o ingresso da doença.
Ao estabelecer como meta primordial a de ser livre sem vacinação, outras
conseqüências sobre o bem-estar da comunidade e animais são secundárias e mesmo
110
ignoradas. É preciso admitir que animais são seres sensitivos e dar-lhes um tratamento que
proteja seu bem-estar e o das pessoas que sofrem os resultados traumáticos e duradouros nos
locais onde é aplicada a atual política. Uma política mais justa e ética, que atenda interesses de
um maior número de envolvidos, ainda está para ser construída.
111
7. NOTA SOBRE A METODOLOGIA
Algumas considerações cabem em torno da metodologia utilizada neste trabalho. O uso
de um roteiro de questões semi-estruturadas tornou a entrevista mais flexível e permitiu que se
esclarecessem temas que haviam ficado muito abstratos no questionário, como as perguntas
que tratavam de aspectos éticos. A entrevista feita dessa forma também permitiu que os
informantes trouxessem elementos de sua experncia que não haviam sido previstos no roteiro
de questões, como o impacto do “vazio sanitário”.
Um período maior de convivência em Jóia certamente traria mais elementos para a
pesquisa, mas pode-se considerar que o mero de entrevistas e a escolha das famílias foram
adequados para a obtenção das informações necessárias, por se tratar de famílias que tiveram
grande envolvimento no episódio.
A literatura utilizada sobre impactos sociais e no bem-estar animal concentrou-se no
caso inglês porque praticamente não havia referências de casos brasileiros, sendo mais
numerosas as notícias de jornais.
Os resultados deste trabalho apresentam limites quanto à generalização da realidade
estudada. necessidade de verificar os impactos sociais do sacrifício sanitário em
propriedades que exploram gado de corte e suínos.
A partir deste trabalho observou-se que estudos futuros podem se direcionar sobre a
qualidade e efetividade da educação sanitária oficial; sobre a percepção social urbana da
política de erradicação e, na área da medicina veteriria, sobre formas alternativas de controle
da enfermidade.
112
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118
___________. Sanidade requer R$ 22 milhões. Diário Catarinense. Florianópolis, 28 de abril de 2005.
DIÁRIO CATARINENSE. Zonta processa produtores. Secretário de Agricultura quer evitar reunião que pode
defender a vacinação. Florianópolis, 10 de julho de 2001. 1p.
NETTO, R. Jóia tenta reconstruir economia. Zero Hora, Porto Alegre, 10 de outubro de 2000. 1p.
NOTISUL. Pecuaristas do RS não participam do evento. Secretaria municipal espera desculpas oficiais do
governo. Tubarão, 14 e 15 de julho de 2001.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL REGIÃO. Mantida investigação sobre cultivo de soja transgênica
em fazenda gaúcha. Disponível em <http://www.trf4.gov.br/trf4/noticias/noticia_detalhes.php?id=2115>
Acesso em 20 de fevereiro de 2007.
VALOR ECONÔMICO. Um ano depois, aftosa ainda prejudica o país. São Paulo, 11 de outubro de 2006.
WAGNER, C. Pastos da região atraíram rebanho clandestino. Zero Hora, Porto Alegre, 30 de agosto de
2000. 1p.
119
ANEXOS
ANEXO A. LOCALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE JÓIA
120
ANEXO B
ROTEIRO DE ENTREVISTAS COM INSTITUIÇÕES AGRÍCOLAS
N° da entrevista: ______
Data: ____/____/_______
Local da Entrevista: _____________________________
DADOS SOCIOMÉTRICOS
Nome:
Instituição:
Endereço:
Contato:
Sexo:
Idade:
Formação:
I – Dados do Entrevistado
a)Função:
b)Tempo de permanência na função:
c)Renda: Até 5 salários mínimos
De 5 a 10 salários mínimos
Mais de 10 salários mínimos
II – Adequação das estratégias de controle
1. Acredita que Santa Catarina corre risco do ressurgimento da aftosa?
a) Sim, mesmo sendo adotadas as medidas sanitárias, pois se trata de doença altamente transmissível e
existente no país e América do Sul
b) Sim, principalmente devido à falta de vacinação
c) Não, as medidas sanitárias adotadas são seguras
d) Não, o estado está livre já 13 anos.
2. Qual o nível de segurança/confiabilidade das barreiras sanitárias:
a) Alto, as barreiras são confiáveis e existem em número suficiente
b) Médio, as barreiras são confiáveis, mas o número não é suficiente
c) Baixo, não é possível garantir que não passem cargas com animais ou produtos animais.
3. Qual o nível de segurança do sistema de atenção/vigilância epidemiológica:
a) Alto, o sistema é plenamente confiável e existem equipes e orçamento suficiente
b) Médio, o sistema é confiável, mas as equipes são insuficientes
c) Médio, o sistema é confiável, mas o orçamento é insuficiente
d) Baixo, o sistema tem falhas (apontar).
121
4. A introdução do vírus pode ocorrer:
a) Através de animais vivos e produtos de origem animal
b) Através de pessoas
c) Pelo ar.
III – Vacinação e não vacinação
5. A política de não-vacinação contra a aftosa em Santa Catarina é:
a) Totalmente adequada. Justificar.
b) Parcialmente adequada. Justificar.
c) Inadequada. Justificar.
6. A política atual tem apoio dos criadores?
a) A maioria concorda com a política. Justificar.
b) A minoria concorda com a política. Justificar.
7. Vantagens da não-vacinação:
a) Ganhos econômicos com o status de área livre sem vacinação
b) Após um surto, o sacrifício dos animais e a vigilância sorológica garantem retorno em seis meses ao status
de livre da doença.
c) Evita os custos com vacinação
d) Evita o estresse dos animais nas aplicações da vacina
e) A vacinação perpetua a infecção
f) Não vê vantagens
g) Outras vantagens/Quais?___
8. Vantagens da vacinação:
a) Proteção do rebanho, se as vacinas forem utilizadas de maneira adequada
58
.
b) A vacinação diminui a possibilidade de sacrifícios em massa e destruição de animais saudáveis
c) A vacinação diminui a possibilidade de retorno da doença
d) Os custos econômicos com o sacrifício são superiores aos da vacinação
e) Evita conseqüências sociais e perda de bem-estar animal em caso de surto
f) Não vê vantagens
g) Outras vantagens/Quais?___
9. Se concorda com a vacinação, ela deveria ocorrer em Santa Catarina:
a) Somente em áreas com mais possibilidade de retorno do vírus
b) Em todo o território
10. Existe vantagem do atual status sanitário em relação aos embargos de exportações devido a surtos em
outros estados?
a) Sim, os países importadores reconhecem a situação sanitária de Santa Catarina
b) Sim, apesar dos prejuízos momentâneos, depois as compras se regularizam
c) Não, os importadores tendem a considerar o país como infectado
d) Não, os prejuízos econômicos são irrecuperáveis
11. A vacinação deveria voltar a ser adotada? Justificar.
12. Do ponto de vista ético, não vacinar é:
a) Correto/Por quê___
b) Incorreto/ Por quê ___
III – Sacrifício no caso de surto da doença
58
Mantidas em refrigeração, até o momento do uso.
122
13. O que pensa sobre o sacrifício em massa dos animais infectados?
a) É correto/necessário/ Por quê ___
b) É incorreto/desnecessário Por quê ___
14. E sobre sacrifício de animais contatos no caso de um surto?
a) É correto/necessário/ Por quê ___
b) É incorreto/desnecessário/Por quê ___
15. O combate a um surto no estado poderia ser feito com a eliminação dos animais infectados associado à
vacinação em anel?
a) Sim, dessa forma se previne a disseminação da doença
b) Não, deve haver apenas o sacrifício
c) Não, deve haver apenas isolamento e vacinação
16. O sacrifício poderia deixar de ser uma estratégia de combate a um foco?
17. No caso de foco, o que pensa sobre não sacrificar os animais, fazer isolamento e vacinação em anel,
permitir que os animais infectados se recuperem, abatê-los sob inspeção veterinária, em abate sanitário
com aproveitamento da carne, da mesma forma que os vacinados?
18. O que pensa sobre conviver com a doença (fazendo isolamento) e tolerar a perda de peso e a
diminuição da produção de leite dos animais infectados?
V - Bem-estar animal
19. ouviu falar em etologia, a ciência do comportamento animal?
a) Sim, conheço o assunto
b) Sim, mas conheço pouco
c) Sim, mas não me interesso
d) Não.
20. preocupação com o bem-estar dos animais no caso de sacrifício?
a) Sim, as ações são feitas de acordo com as normas da OIE e às leis de proteção aos animais
b) Sim, mas as ações são urgentes e podem ocorrer falhas de bem-estar
c) Não, a supressão dos animaiso leva em conta o bem-estar
21. Acredita que os animais sentem e têm emoções?
VI – Bem-estar humano
22. O bem-estar dos criadores de animais é considerado nas ações de prevenção e controle?
a) Sim, existe assistência social e apoio psicológico aos criadores
b) Não, os criadores recebem apenas indenização
23. Os profissionais que fazem sacrifício deveriam ter apoio psicológico?
a) Sim/Por quê
b) Não é necessário
VII – Comunicação
24. A sociedade está suficientemente informada sobre a febre aftosa?
a) Existe preocupação do governo em esclarecer o público quando surto em estados e países próximos
b) Os meios de comunicação esclarecem adequadamente sobre a doença
c) Os meios de comunicação não esclarecem adequadamente sobre a doença
d) As pessoas têm dúvidas sobre se a doença afeta humanos
123
e) O público tem pouco entendimento sobre a não-vacinação e o sacrifício de animais
25. A comunicação do governo com os criadores em relação à aftosa é adequada?
VIII – Consumo
26. Existe risco em consumir carne dos animais afetados pela aftosa?
a) Sim, o vírus permanece na carne e nos ossos dos animais infectados
b) Não há risco em comer carne maturada e desossada
27. E há risco em consumir carne dos animais em contato e que serão sacrificados?
a) Sim, o vírus permanece na carne e nos ossos dos animais que tiveram contato com os doentes
b) Não há risco em comer carne maturada e desossada desses animais
28. Se considera que não existe risco em consumir a carne maturada e desossada, o que acha que o
governo deveria fazer?
a) Liberar para a venda ao mercado
b) Distribuir a carne a pessoas carentes
c) Liberar a carne para venda, desde que passe por processos que inativem o vírus
d) Não liberar
29. Dê uma definição ou comentário final sobre a febre aftosa.
124
ANEXO C
ROTEIRO DE ENTREVISTAS COM CRIADORES
N° da entrevista: ______
Data: ____/____/_______
Local da Entrevista: _____________________________
Nome:
Contato:
Parte 1 – DADOS SOCIOMÉTRICOS
I – Composição familiar
Nome Parentesco Sexo Idade Escolaridade
1
2
3
4
5
Legenda:
Parentesco: 1 – cônjuge, 2 – filho(a), 3 – irmão(ã), 4 – Tio(a), 5 – Pai/mãe, 6 – outro:
Sexo: M – masculino, F – feminino.
Escolaridade: A – analfabeto, 1F a 8F – 1ª a série do ensino fundamental, 1M a 3M – 1ª a 3ª série do
ensino médio, GI – graduação incompleta, GC – graduação completa.
II – Descrição da propriedade
a) Área (hectares):________________________________________________________
própria ( ) parceria ( ) de terceiro ( ) para terceiro ( )
b) Rebanho total: antes do surto_____________________________________________
Depois do surto:_______________________________________________________
c) Produção anual de leite: ________________________________________________
Venda: ___________ Consumo próprio:____________________________________
d) Produção vegetal (produtos e área):________________________________________
_______________________________________________________________________
e) Renda mensal da família: Até 5 saláriosnimos
De 6 a 10 salários mínimos
125
Mais de 10 salários mínimos
Parte 2 – QUESTIONÁRIO:
1. Acredita que o Rio Grande do Sul corre risco do retorno da aftosa?
a) Sim, mesmo sendo adotadas as medidas sanitárias, pois é uma doença transmissível, existente no Brasil e
países vizinhos
b) Sim, principalmente devido a falhas no sistema de vigilância e na vacinação
c) Não, as medidas sanitárias adotadas são seguras
2. Qual o nível de segurança das barreiras sanitárias:
a) Alto, as barreiras são confiáveis e existem em número suficiente
b) Médio, as barreiras são confiáveis, mas o número não é suficiente.
c) Baixo, não é possível garantir que não passem cargas com animais ou produtos animais
3. Qual o nível de segurança do sistema de vigilância epidemiológica:
a) Alto, o sistema é confiável e existem equipes e recursos suficientes
b) Médio, o sistema é confiável, mas as equipes são insuficientes
c) Médio, o sistema é confiável, mas os recursos são insuficientes
d) Baixo, o sistema tem falhas (apontar)
4. A introdução do vírus pode ocorrer:
a) Através de animais vivos e produtos de origem animal
b) Através de pessoas
c) Pelo ar
III – Vacinação e não vacinação
5. Acha que foi adequado voltar a vacinar o rebanho contra a febre aftosa no Rio Grande do Sul?
a) Totalmente adequado. Justificar
b) Parcialmente adequado. Justificar.
c) Inadequado. Justificar.
6. A vacinação tem apoio dos criadores?
a) A maioria concorda. Justificar.
b) A minoria concorda. Justificar.
7. Vantagens da vacinação:
a) Proteção do rebanho, se as vacinas forem utilizadas de maneira adequada
59
.
b) A vacinação evita sacrifícios em massa e destruição de animais saudáveis
c) A vacinação diminui a possibilidade de retorno da doença
d) Os custos econômicos com o sacrifício são superiores aos da vacinação
e) Evita conseqüências sociais e perda de bem-estar animal em caso de surto
f) Não vê vantagens
g) Outras vantagens/Quais?___
8. Vantagens da não-vacinação:
a) Ganhos econômicos com o status de área livre sem vacinação
b) Após um surto, o sacrifício dos animais e a vigilância sorológica garantem retorno em seis meses ao status
de livre da doença.
c) Evita os custos com vacinação
d) Evita o estresse dos animais nas aplicações da vacina
e) A vacinação perpetua a infecção
f) Não vê vantagens
59
Mantidas em refrigeração, até o momento do uso.
126
g) Outras vantagens/Quais?___
9. Se concorda com a manutenção da vacinação, ela deve ocorrer no Rio Grande do Sul:
a) Somente em áreas de risco (com mais possibilidade de retorno do vírus)
b) Em todo o território
10. Como é atualmente a vacinação? Existe assistência técnica?
11. Se não concorda com a vacinação, acha que deveria ser interrompida? Justificar.
III – Sacrifício em caso de surto da doença
12. Como foi o surto de aftosa em sua propriedade e quais foram as conseqüências?
13. O que pensa sobre o sacrifício em massa dos animais infectados?
a) É correto/necessário/ Por quê ___
b) É incorreto/desnecessário/ Por quê ___
14. E sobre o sacrifício de animais contatos?
a) É correto/necessário/ Por quê ___
b) É incorreto/desnecessário/Por quê ___
15. Quando surgem focos de aftosa em estados e países vizinhos, qual é o sentimento entre os criadores?
16. Como foram as indenizações (rebanho sacrificado, lucro cessante, cestas básicas) e por quanto tempo?
17. O que acontecia, no passado, com o gado infectado pela aftosa? Havia isolamento ou tratamento para
os animais?
18. No caso de foco, o que pensa sobre não sacrificar os animais, fazer isolamento e revacinação em torno
do foco, permitir que os animais infectados se recuperem, abatê-los sob inspeção veterinária, em abate
sanitário com aproveitamento da carne?
19. O que pensa sobre conviver com a doença e tolerar a perda de peso e a diminuição da produção de
leite dos animais infectados?
20. Acredita que os animais sentem e têm emoções?
VI – Bem-estar humano
21. Como foi a atitude do governo na sua propriedade quando houve o foco? Houve preocupação em
esclarecer as pessoas sobre o sacrifício sanitário?
22. Houve algum tipo de atendimento psicológico para os criadores , comunidade e para quem fazia o
sacrifício na época do surto?
VII – Comunicação
23. A sociedade está informada sobre a febre aftosa?
a) Existe preocupação do governo em esclarecer o público quando surto em estados próximos
b) Os meios de comunicação esclarecem sobre a doença
c) Não, as pessoas têm dúvidas sobre se a doença afeta humanos.
d) Não, o público tem pouco entendimento sobre o sacrifício de animais
VIII – Consumo
127
24. Existe risco em consumir carne dos animais afetados pela aftosa?
a) Sim, o vírus permanece na carne e nos ossos dos animais infectados
b) Não há risco em comer carne desossada e maturada
25. risco em consumir carne dos animais em contato e que serão sacrificados?
a) Sim, o vírus permanece na carne e nos ossos dos animais que tiveram contato com os doentes
b) Não há risco em comer carne desossada e maturada desses animais
26. Se considera que não existe risco em consumir a carne desossada e maturada, o que acha que o
governo deveria fazer?
a) Liberar a venda para o mercado
b) Distribuir a carne a pessoas carentes
c) Liberar a carne para venda, desde que seja submetida a processos que inativem o vírus
d) Não liberar.
128
ANEXO D
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DOS ANIMAIS
(Proclamada em assembléia da Unesco, em Bruxelas, em 27 de janeiro de 1978)
Art. 1
o
Todos os animais nascem iguais diante da vida e têm o mesmo direito à existência.
Art. 2
o
a) Cada animal tem o direito a respeito.
b) O homem, enquanto espécie animal,o pode atribuir-se o direito de exterminar os outros animais
ou explorá-los, violando esse direito. Ele tem o dever de colocar sua consciência a serviço dos outros
animais.
c) Cada animal tem o direito a consideração, à cura e à proteção do homem.
Art. 3
o
a) Nenhum animal será submetido a mau trato e a atos cruéis.
b) Se a morte de um animal for necessária, deve ser instantânea, sem dor nem angústia.
Art. 4
o
a) Cada animal que pertence a uma espécie selvagem tem o direito de viver livre no seu ambiente
natural terrestre, aéreo ou aquático, e tem o direito de reproduzir-se.
b) A privação da liberdade, ainda que para fins educativos, é contrária a esse direito
Art. 5
o
a) Cada animal pertencente a uma espécie que vive habitualmente no ambiente do homem, tem o
direito de viver e crescer segundo o ritmo e as condições de vida e de liberdade que são próprias a sua
espécie.
b) Toda modificação desse ritmo e dessas condições , imposta pelo homem para fins mercantis, é
129
contrária a esse direito
Art. 6
o
a) Cada animal que o homem escolher para seu companheiro tem o direito a uma duração de vida
conforme sua natural longevidade.
b) O abandono de um animal é um ato cruel e degradante.
Art. 7
o
Cada animal que trabalha tem o direito a uma razoável limitação do tempo e intensidade do
trabalho, a uma alimentação adequada e ao repouso.
Art. 8
o
a) A experimentação animal, que implica um sofrimento físico, é incompatível com os direitos do
animal, quer seja uma experiência médica, científica, comercial ou qualquer outra;
b) As técnicas substitutivas devem ser utilizadas e desenvolvidas.
Art. 9
o
No caso de o animal ser criado para servir de alimentação, deve ser nutrido, alojado, transportado e
morto sem que para ele resulte ansiedade ou dor.
Art. 10
o
Nenhum animal deve ser usado para divertimento do homem. A exibição dos animais e os espetáculos
que utilizam animais são incompatíveis com a dignidade do animal.
Art. 11
o
O ato que leva à morte de um animal sem necessidade é um biocídio, ou seja, um delito contra a vida.
Art. 12
o
a) Cada ato que leva à morte um grande número de animais selvagens é um genocídio, ou seja, um
delito contra a espécie.
130
b) O aniquilamento e a destruição do meio ambiente natural levam ao genocídio.
Art.13
o
a) O animal morto deve ser tratado com respeito.
b) Cenas de violência de que os animais são vítimas devem ser proibidas no cinema e na televisão, a
menos que tenham como fim mostrar um atentado aos direitos do animal.
Art.14
o
a) As associações de proteção e salvaguarda dos animais devem ser representadas a nível de governo.
b) Os direitos do animal devem ser defendidos por leis, como os direitos do homem.
131
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