Download PDF
ads:
1
SÍLVIA BARRETO VALENTE
“ANÁLISE DA VISITAÇÃO DOS PARQUES DE
DIVERSÕES BRASILEIROS COMO OPÇÃO DE
LAZER”
Dissertação apresentada à Área de Concentração:
Ciências da Comunicação da Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção do
Título de Mestre em Ciências da Comunicação, sob
a orientação da Profa. Dra. Beatriz Helena Gelas
Lage.
SÃO PAULO
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
COMISSÃO JULGADORA
_____________________________________
Profa. Dra. Beatriz Helena Gelas Lage
______________________________________
______________________________________
ads:
3
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à
minha filha Giulia.
A sua existência
foi minha maior fonte de inspiração.
Um dia certamente você entenderá
as minhas ausências e compreenderá
porque a mamãe estuda tanto.
4
AGRADECIMENTOS
Como pesquisadora, tive que dividir meu tempo também como mãe, esposa,
profissional e dona-de-casa, feito que só as mulheres que gerenciam tantas
funções conseguem compreender. Entretanto, considero-me uma pessoa de sorte,
por ter tido a oportunidade de realizar meus estudos na USP e a chance de ter
aprendido com profissionais e colegas de alto nível, e principalmente por estar
rodeada de tantas pessoas maravilhosas, sendo que cada uma, do seu jeito, foi
importante para a concretização desse trabalho. Por isso, o meu mais sincero,
carinhoso e profundo MUITO OBRIGADA a estas pessoas muito especiais:
À minha orientadora, Profa. Dra. Beatriz Helena Gelas Lage, por ter depositado sua
confiança e apostado no meu potencial, desde a minha graduação;
A todos meus familiares que deram sua ajuda oferecendo seu tempo, paciência,
carinho ou mesmo um laptop. Um agradecimento mais que especial aos meus pais
pelo apoio e pela querida prima Silvana, que sempre tem uma palavra certa;
Aos meus caros colegas professores da Universidade Anhembi Morumbi pelas
idéias, comentários e valiosas sugestões;
À amiga Flávia por sua força;
Aos Senhores Gyorgi Galfi, Jorge Vernaglia, Francisco Lopes e Alain Baldacci
por seus preciosos tempos e por dividirem comigo suas experiências e know-how na
área de Parques de Diversões, e sem os quais essa pesquisa seria praticamente
impossível de ser completada;
E principalmente ao meu marido Salvador, pelo amor, suporte, compreensão e por
me agüentar, especialmente nos meses finais, dividindo todas as minhas dores e
conquistas.
5
“Pesquisar implica renúncia, esforço,
dedicação,paciência
e a firme crença em que não existem problemas insolúveis”.
(Sérgio Costa)
6
RESUMO
Esse trabalho explorou como objeto de estudo os parques de diversões no Brasil.
Esses empreendimentos são uma manifestação de entretenimento e opção de lazer
e Turismo bastante recente no país, e por isso, carecem de uma investigação
científica mais aprofundada. Em virtude de diversos fatores, que foram analisados,
a indústria de parques de diversões no Brasil ainda não se consolidou, e os
empreendimentos enfrentam sérias dificuldades financeiras, apesar de ser um país
com enorme potencial consumidor e turístico. Com o objetivo de obter respostas
consistentes, optou-se por entrevistar uma amostra de renomados especialistas
brasileiros na área. Esta pesquisa concentrou-se em investigar os fatores que
interferem na visitação, por compreender que a principal fonte de receita dos
parques é com a venda de ingressos, e por isso, necessitam continuamente atrair
visitantes. Detectou-se com este estudo que a renda discricionária baixa, falta de
cultura do brasileiro e qualidade da oferta como fatores preponderantes para
explicar a visitação de parques de diversões no Brasil.
Palavras chave: Parques de Diversões; Visitação; Lazer; Turismo; Brasil.
7
ABSTRACT
This present work has explored as subject of study Brazilian’s Amusement Parks.
These entrepreneurships are a very recent entertainment manifestation in the
country as well as an option of leisure and Tourism, and therefore, require a deeper
scientific investigation. Because of many factors, that have been analyzed, the
industry of Amusement Parks in Brazil has not consolidated yet, and the
entrepreneurships face several financial problems, despite of the country having an
enormous potential in terms of consume and tourism. Aiming to achieve consistent
answers, it has been decided to interview a sample of renowned Brazilian
specialists in this field. This research has concentrated in investigating the factors
which interfere in the visitation of the parks, for understanding that its main source of
revenue are from the sale of tickets, and that is why they need to continually attract
visitors. It has been detected with this study that low income, lack of culture of
Brazilians and the quality of the offer as important factors to explain the visitation of
Amusement Parks in Brazil.
Keywords: Amusement Parks; Visitation; Leisure; Tourism; Brazil.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO 1: LAZER E ENTRETENIMENTO NA SOCIEDADE MODERNA 17
1.1. Os Parques de Diversões como espaço para o Lazer 23
1.3. Relação entre a Indústria de Entretenimento e Lazer 28
CAPÍTULO 2: PARQUES DE DIVERSÕES – CONCEITOS, CLASSIFICAÇÃO
E HISTÓRICO GERAL
33
2.1. Classificação dos Parques de Diversões 37
2.2. Perspectiva Histórica Mundial 44
2.3. Evolução Histórica no Brasil 49
2.3. Principais Parques Brasileiros 52
2.4.1. Hopi Hari 52
2.4.2. Beto Carrero World 53
2.4.3.Playcenter 54
2.4.4.Wet´n Wild 54
2.4.5. Beach Park 55
2.4.6. Parque da Mônica São Paulo 55
2.4.7. O Mundo da Xuxa 56
2.5. O Mercado Atual 57
CAPÍTULO 3: METODOLOGIA E ANÁLISE DOS RESULTADOS DA
PESQUISA
63
3.1. A Disney como Referência para os Parques de Diversões Brasileiros 65
3.2. A Qualidade da Prestação de Serviços nos Parques de Diversões 77
3.3. A Questão Cultural e sua influência na Visitação dos Parques 86
3.4. Perspectivas para a área de Parques de Diversões no Brasil 96
CONSIDERAÇÕES FINAIS 101
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 110
APÊNDICES 114
9
INTRODUÇÃO
Os parques de diversões são hoje uma realidade como opção de lazer nas
principais cidades brasileiras. Entretanto, esse conceito moderno de
entretenimento é um fenômeno muito recente no Brasil. Pode-se afirmar que os
primeiros grandes projetos de parques de diversões tenham surgido no país a partir
da década de 1990, e por isso, é uma atividade que ainda está em processo de
estruturação e amadurecimento.
Informações da ADIBRA – principal Associação Brasileira da área - apontam
que
os parques brasileiros receberam, nos últimos anos, investimentos da ordem
de US$ 1,2 bilhão, o que serviu para o crescimento e fortalecimento do setor nas
últimas duas décadas.
Entretanto, um fato que merece análise relaciona-se à constatação de que a
maioria dos parques de diversões brasileiros passa por sérias dificuldades
financeiras. Alguns até encerraram suas atividades após alguns anos de
funcionamento, como é o caso do Magic Park, localizado na cidade de Aparecida,
São Paulo. Esse parque foi o resultado de um ambicioso projeto, com
investimentos da ordem de 70 milhões de reais, e localizado numa das cidades que
mais recebem turistas no Brasil.
Apesar de grandes conquistas financeiras e de público, alcançadas por sua
administração, esse projeto foi muito mal dimensionado para a realidade brasileira,
e dificilmente conseguiria atingir os resultados necessários para a saúde financeira
da operação e o retorno de seus investidores, e por isso mesmo teve suas
atividades encerradas. Mas esse parque não é um fato isolado, como será
10
mostrado nesta pesquisa, e, portanto, partiu-se desse problema central como
estímulo para o desenvolvimento deste estudo.
Além disso, outro elemento que merece destaque é o fato dos equipamentos
usados pelos parques, ou seja, suas atrações, serem importadas, o que é um
importante fator limitador da implantação de novos projetos, e mesmo com relação
aos atuais, uma vez que esses empreendimentos necessitam periodicamente
reformular esses equipamentos para continuarem com seu poder de atratividade da
demanda. Deve-se considerar também que o retorno sobre o investimento desses
negócios é geralmente de longo prazo, por envolver altas cifras, e por isso, é
fundamental um estudo sobre o perfil de consumo da demanda.
Tudo isso porque não existe uma indústria de parques de diversões no Brasil
bem estruturada e madura. Seguiu-se, principalmente, o modelo norte-americano
que é pioneiro na área, mas trata-se de um mercado com perfil de consumo bem
diferente do nacional. Portanto, torna-se bastante difícil certificar-se se os parques
de diversões brasileiros estão adaptados à sua própria cultura. Pesquisas são
realizadas antes de criarem e implantarem um projeto de um novo parque, mas é
possível e importante ainda investigar quais as ações administrativas e
mercadológicas que esses empreendimentos se utilizam para continuarem
competitivos e se desenvolvendo.
É possível ir um pouco mais além com esse questionamento. Seguindo um
pouco mais a linha de uma pesquisa de lazer, que é o que os parques de diversões
se propõem a oferecer, cabe questionar se o seu público-alvo está satisfeito com a
oferta de atrações. E o que pode fazer com que um dia de lazer num parque de
diversões seja especial em comparação à realização de qualquer outra atividade. A
11
área ainda carece de uma análise sociológica mais profunda, e pesquisas nessa
linha seriam, sem dúvida, de grande contribuição.
Isso porque, ao sair de um parque de diversões, as pessoas levam consigo
uma experiência, uma vivência. Dessa forma, a oferta do produto ou serviço deve
ser a mais atraente e completa possível. Na verdade, os visitantes usufruem um
serviço intangível, e por isso, as percepções e impressões são necessárias para se
obter a resposta das visitas. Atualmente, existe a crença, entre os especialistas em
marketing, de que as empresas não comercializam produtos ou serviços, e sim
experiências. Compreender esse conceito é particularmente importante no negócio
de parque de diversões, por ser considerada a indústria dos “sonhos e fantasias”.
Portanto, após intensa investigação, adotou-se como objetivo principal desta
pesquisa o levantamento dos fatores que influenciam a visitação dos parques de
diversões no país, fazendo com que sejam bem-sucedidos ou não. E, após a
análise da situação atual, objetiva-se também levantar quais as perspectivas dessa
atividade para o futuro.
Dentro deste panorama é que se enquadra o objeto de estudo deste
trabalho. A pesquisa que será relatada nas páginas que se seguem partiu,
portanto, de alguns pressupostos ou hipóteses, que serviram como respostas
provisórias e direcionamento da investigação científica, e que ao final, serão aceitas
ou não.
São três as hipóteses levantadas para este problema. A primeira delas
aponta que é uma questão de ordem econômica, ou seja, de falta de renda
suficiente para o consumo desses serviços, pois o valor dos ingressos seria
impeditivo para o poder de compra dos brasileiros. Uma outra hipótese seria o fato
de uma possível falta de cultura do brasileiro de visitarem parques de diversões, ou
12
seja, não faz parte do seu hábito de consumo de lazer visitar esses
empreendimentos. A terceira hipótese proposta relaciona-se com a questão da
qualidade, ou seja, parte-se do princípio que os parques brasileiros não possuem
um padrão satisfatório de qualidade, sendo esse o problema que impediria a
atração de visitantes.
Baseado no histórico e atuação das empresas Disney no mundo, e em especial
dos seus parques temáticos, detectou-se a necessidade de levantar os elementos
que fazem esses parques serem tão fascinantes ao seu público e continuarem
atraindo milhares de visitantes anualmente, encantando geração após geração,
como meio de comparação com a realidade brasileira, e assim descobrir o que falta
aos parques no nosso país para atingirem esse padrão de excelência.
Este foi o estímulo e o ponto de partida para o levantamento bibliográfico sobre
o assunto, quando, então, descobriu-se a escassez de publicações sobre o tema e
a falta de estatísticas e de pesquisas sobre o setor, sendo possível afirmar que,
certamente, a obtenção de dados e informações sobre essa indústria no Brasil é
uma dificuldade muito grande. Por outro lado, a ADIBRA carece de recursos
suficientes para realizar pesquisas que tracem um panorama desse mercado de
forma mais apurada. Somente alguns parques realizam pesquisas internamente
para orientar suas estratégias e, por isso mesmo, este trabalho ganha importância.
Recentemente, esse setor tem sido alvo de alguns trabalhos científicos, porém,
esta produção acadêmica ainda não conseguiu mapear de forma abrangente toda a
complexidade que o tema apresenta. Mesmo a publicação de livros sobre o assunto
ainda é extremamente tímida.
Com uma visão crítica acerca dessa produção científica, foi sentida a
necessidade de fazer um trabalho que, mais do que servisse de suporte a outras
13
pesquisas, respondesse questões estruturais e mercadológicas sobre essa
indústria no Brasil, procurando estabelecer conceitos que contribuam para a
compreensão da atuação de um parque de diversões no Brasil, pois esse mercado
deve ser entendido como um negócio que merece ser tratado com toda a
seriedade, como bem expressou Salomão (2000) ao mencionar que bilhões de
dólares são movimentados anualmente pela indústria de sonhos e magia que
representam os parques de diversões, que acabam transformando em realidade o
mundo da fantasia, dos contos de fadas, mas que acima de tudo, trata-se de um
negócio como qualquer outro, que visa lucro como objetivo final.
As raízes deste trabalho estão, portanto, estruturadas em dois pilares. O
primeiro relaciona-se com a sociologia do lazer e o outro com a administração
mercadológica ou marketing. Isto porque, por um lado, a análise sociológica do
lazer fornece subsídios importantes para o entendimento do papel dos parques de
diversões no lazer da sociedade moderna. Por outro lado, os conceitos de
marketing são necessários para embasar questões relacionadas ao planejamento
estratégico desses empreendimentos e relevantes para o entendimento da relação
entre oferta e demanda. Vale afirmar também que vários conceitos sobre turismo
foram usados, partindo do pressuposto que os parques de diversões devem ser
considerados como parte da oferta turística e que podem agregar valor ao destino
que estão instalados.
Além desta pesquisa de levantamento de informações em fontes
secundárias, optou-se também pelo método de coleta de dados de entrevistas com
alguns especialistas na área, que foram escolhidos em função de suas experiências
e visões distintas dentro do setor, por serem capazes de fornecer informações e
14
pareceres consistentes sobre a questão da visitação dos parques de diversões no
Brasil.
Desta forma, apresentado o problema central da pesquisa, os objetivos e
hipóteses científicas, este trabalho foi estruturado em três capítulos, de forma a
fornecer uma abordagem coerente com relação ao assunto proposto, sendo
estruturados da seguinte forma:
O Capítulo 1 traça uma análise da questão do Lazer na sociedade moderna,
apresentando algumas conceituações e o pensamento dos principais estudiosos na
área. Esse preâmbulo é importante para se entender como os parques de diversões
podem ser considerados espaços de lazer, e também em que momento da vida das
pessoas elas usufruem dessas atividades. Em seguida, é trabalhada a relação
entre entretenimento e lazer, por serem conceitos muito próximos acabam gerando
distorções, cuja compreensão é particularmente importante no estudo desses
empreendimentos.
O Capítulo 2 apresenta uma breve perspectiva histórica mundial da
atividade, apontando o berço dos primeiros projetos de parques de diversões, que
foi a Europa, mas cujo mercado foi depois dominado e aprimorado pelos norte-
americanos. Depois, a análise situa o desenvolvimento histórico no Brasil,
apontando a fundação dos principais parques de diversões nacionais. Em seguida,
é apresentada a descrição dos principais parques da atualidade. Por fim, é feito um
panorama desse mercado no Brasil.
Os principais números da Associação Brasileira de Parques de Diversões,
entre outros, são fornecidos com o intuito de esclarecer o perfil dessa atividade.
Este capítulo é dedicado também a dar um embasamento teórico sobre importantes
conceitos para este trabalho. Primeiro busca-se por uma definição sobre parques
15
de diversões, tendo em vista que existem muitos desencontros de informações
entre diferentes estudos, o que muitas vezes atrapalha sua compreensão. Em
seguida, são apresentadas as diferentes tipologias e classificações possíveis sobre
parques, necessárias para compreender a dinâmica do mercado e os tipos de
empreendimento citados neste estudo.
O Capítulo 3 apura as questões relacionadas ao problema da visitação dos
parques de diversões no Brasil. As entrevistas realizadas com os especialistas
foram transcritas em sua íntegra, e estão disponíveis para leitura e análise como
Anexo desta pesquisa. Optou-se pela compilação das principais idéias e opiniões
obtidas com essas entrevistas, organizadas e divididas em quatro subcapítulos:
O primeiro oferece uma base de comparação entre os parques brasileiros e
os parques da Disney, tidos como referência na área, e que balizam a criação e
operação dos empreendimentos de entretenimento em todo o mundo, inclusive no
Brasil, foram analisados os principais conceitos relacionados à sua filosofia,
enquanto uma das principais organizações mundiais na área de entretenimento,
bem como o sistema de treinamento de seus funcionários, considerado a base de
seu sucesso.
O segundo busca a resposta para a questão da qualidade, ou melhor, dos
fatores que interferem ou que garantam uma prestação de serviços de qualidade, e
que contribuam para a captação da demanda para um parque de diversões.
O terceiro analisa detalhadamente a existência ou não daquilo que os
especialistas citam como cultura de visitação dos parques de diversões, em todos
os possíveis fatores que expliquem e justifiquem a visitação num parque.
Por fim, o quarto subcapítulo é dedicado a apresentar as possíveis
perspectivas sobre o desenvolvimento desse setor. Sem buscar respostas fáceis, e
16
sem a pretensão de prever o futuro, foi possível após traçar um perfil do mercado e
uma comparação entre os principais parques, detectando alguns padrões de
comportamento da demanda, que interferem no futuro da atividade.
A última parte deste trabalho destina-se às considerações finais e
conclusões evidenciadas através da pesquisa realizada, juntamente com as idéias
e opiniões coletadas nas entrevistas. São também analisadas as hipóteses
apresentadas, verificando-se se estas são aceitas ou refutadas. E, finalmente,
algumas recomendações foram elaboradas no intuito de colaboração e sugestões
às novas pesquisas no setor.
Em síntese, estas são as linhas mestras deste trabalho, ao qual se somam
estudos nas áreas de sociologia do lazer, marketing e turismo. As questões aqui
levantadas parecem pertinentes, na medida em que, para se poder traçar os
objetivos futuros para o desenvolvimento dos parques de diversões no Brasil, é
fundamental que se tenha a consciência dos erros e acertos do presente e
passado.
17
CAPÍTULO 1: LAZER E ENTRETENIMENTO NA SOCIEDADE
MODERNA
As divergências de conceituações entre os diversos estudiosos do tema do
lazer são uma das principais dificuldades para a devida compreensão dessa
atividade.
O lazer engloba desde o turismo até a arte, passando pela culinária.
Viagens de férias, passeios de fim de semana, cinema, teatro,
danceterias, bares, restaurantes e parques de diversões estão
incluídos nesta categoria de comportamento. Incluídas estão ainda
listas extensas de atividades caseiras como: ver televisão, jogar
vídeo-game, ouvir música, ler ou simplesmente juntar os amigos
para o churrasco de domingo. Estas atividades são passíveis de
uma miríade de classificações, como, por exemplo, ativas ou
passivas, indoor ou outdoor (SALOMÃO, 2000, p. 23).
Na verdade, o termo lazer vem do latim da palavra licere, que pode ser
traduzido como ser lícito, permitido. Dessa forma, estudiosos afirmam que o lazer
pode ser compreendido como uma questão de atitude e estado de espírito, mais do
que uma questão de tempo. Ou seja, o lazer seria uma questão de exercer com
prazer as atividades em todas as esferas da vida, tanto no trabalho, na família, na
religião e na política. Para dirimir equívocos, o ideal para uma melhor compreensão
do lazer é considerar que este nasce da relação entre tempo livre e atitude.
Nesse caso, concorda-se bastante com a seguinte definição de lazer, que,
aliás, é de um sociólogo brasileiro, importante pesquisador do estudo de lazer:
18
Cultura vivenciada (praticada ou fruída) no tempo disponível
1
. O
traço definidor é o caráter desinteressado desta vivência. Não se
busca, fundamentalmente outra recompensa além da satisfação
provocada pela situação. A disponibilidade de tempo significa
possibilidade de opção pela atividade prática ou contemplativa
(MARCELLINO, 1997, p. 31).
Entretanto, para os fins dessa pesquisa, mais importante que conceituar o
termo lazer, é necessário compreender em que momento da vida das pessoas ele é
usufruído ou consumido. Isso porque, os parques de diversões são geralmente
freqüentados num tempo denominado de tempo livre que, de uma forma bem
simplista, pode ser explicado como um tempo que resulta do tempo liberado após o
trabalho. Tempo este destinado às atividades necessárias à vida social do homem
moderno. E é durante o tempo livre que a maioria das pessoas usufruem as
atividades de lazer.
É importante ainda acrescentar que o lazer pode ser vivenciado basicamente
em três momentos: durante um tempo diário, limitado a algumas horas, após o
trabalho ou estudo; durante os finais de semana ou feriados, certamente um tempo
maior, já que envolve dias inteiros; e por fim, o tempo das férias, que a legislação
brasileira prevê como trinta dias.
Sob um enfoque histórico, vários estudiosos do assunto enfatizam a idéia de
que os conceitos de lazer e ócio fazem parte da vida humana desde tempos
remotos, mas que tinham abordagens diferentes em função da cultura inserida.
Camargo (1998) esclarece que o termo lazer surgiu na civilização greco-romana, e
relacionava-se como o oposto ao trabalho. Já a palavra trabalho é designada do
termo latino tripalium que significava um instrumento de tortura. A seguinte frase
1
Esse pesquisador defende a idéia de que na verdade tempo algum pode ser considerado “livre”, pois de
sempre estamos envolvidos com alguma forma de norma ou conduta social, o que nos impede de decidirmos
integralmente sobre nossas ações ou escolhas. Dessa forma, ele emprega o termo tempo “disponível”, como
pode ser visto nessa definição. Mesmo sendo bastante pertinente e contundente tal posicionamento, para efeitos
dessa pesquisa, será usado o termo tempo livre para padronizar a discussão.
19
deste mesmo autor explica claramente a relação entre lazer e trabalho naquela
época:
As caçadas, os exercícios físicos, as artes, as letras, a filosofia, a
especulação científica eram as únicas ocupações dignas de um
homem livre e aceitas pelos seus pares. Como deveres, no máximo
se admitiam as atividades militar e política. Tamanho gosto pela
ociosidade somente era possível porque havia um exército de
imigrantes, servos e escravos que faziam o “serviço sujo” – o
trabalho nas minas, nas residências, nas cidades, nos ateliês semi-
industriais, etc. (CAMARGO, 1998, p. 27).
Entretanto, com a revolução industrial, a sociedade capitalista passou a ter
uma relação com o trabalho e dinheiro que vieram a moldar todas as demais
relações humanas, inclusive a questão do lazer, no que se refere ao seu consumo e
fruição. Ou seja, o binômio trabalho e gozar a vida ficaram mais nitidamente
separados, após o fenômeno da industrialização.
Aliado a esse fato testemunhou-se o surgimento de uma classe assalariada
que passou a dispor de recursos financeiros para investir em atividades de lazer
pagas, o que resultou por rees
20
Existe pouca criatividade espontânea, embora os níveis de
oportunidades oferecidas, por exemplo, para o deleite da música ou
da arte dramática sejam potencialmente maiores do que jamais o
foram (PARKER, 1978, p. 122).
Para Dumazedier (1999) as principais funções do lazer referem-se ao
descanso, divertimento e desenvolvimento pessoal e/ou social. Ele acredita que o
lazer não pode ser compreendido como o antagonismo do trabalho, e nem mesmo
como ociosidade, num sentido pejorativo, como a falta do que se fazer, comumente
relacionado por muitas pessoas ou instituições. Vale dizer que, apesar dos avanços
de estudos de várias áreas a respeito da importância do lazer, existe ainda
preconceito.
Parker (1978) questiona, entretanto, se o conceito de lazer pode ser usado
para crianças em idade pré-escolar, uma vez que o seu tempo não pode ser tão
facilmente dividido em atividades obrigatórias e não-obrigatórias. Por outro lado,
pondera que o lazer pode contribuir para vários objetivos educacionais. A
pedagogia da educação moderna já se deu conta há muito tempo da importância do
jogo e do brinquedo na educação infantil. De acordo com Bomtempo; Hussein &
Zamberlan (1986) é brincando que a criança se apropria dos valores da sua cultura,
sendo um importante veículo para seu desenvolvimento social, emocional e
intelectual.
Isto, provavelmente, explica o fato de tantas escolas levarem seus alunos
aos parques de diversões, com o intuito não só de lhes proporcionar divertimento,
mas também como uma forma de integrar o ensino com o lúdico, apostando na
idéia de que a criança aprende enquanto brinca. Aliás, já existe um conceito atual
sobre essa questão, denominado de Edutainment, uma união de duas palavras da
língua inglesa: Education e Enterteinment, que significam Educação e
21
Entretenimento, respectivamente, que pode ser explicado como a união de
atividades culturais e educacionais.
Outra questão que merece ser discutida com relação ao lazer infantil refere-
se às privações que as crianças sofrem, principalmente nos grandes centros
urbanos. Tais privações podem ser afetivas, sócio-econômicas, privações de
espaço físico, de tempo livre, privação da natureza, entre as principais. Defende-se
que: “Os novos espaços lúdicos necessitam assumir um ar provocativo, ser
capazes de instigar a curiosidade e suscitar desafios na criança (GARCIA, 1996, p.
28), principalmente para agirem como uma contraposição aos brinquedos
industrializados que banalizam e empobrecem a inteligência das crianças, em
especial a televisão e os vídeo-games.
É importante pontuar que a criança deve ser entendida como um “ser duplo”,
pois é um indivíduo que deve ser respeitado com relação às suas necessidades e
interesses que devem ser atendidos no presente, e uma promessa de um ser
adulto, um cidadão do futuro. E, acredita-se que: “é no lúdico que se encontra a
costura entre essa dupla dimensão infantil” (GARCIA, 1996, p. 25). É durante os
momentos lúdicos que a criança tem a possibilidade de testar várias possibilidades,
de construir vários mundos e realidades na sua imaginação, que serão importantes
por moldar sua personalidade e preparar suas escolhas para o futuro.
Camargo (1998), por sua vez, questiona por que é tão difícil para as pessoas
se divertirem, apesar de ser uma necessidade e um direito do chamado Homo
Faber (o ser humano quando trabalha) e do Homo Ludens (o ser humano que se
diverte). E não entende o que afinal o homem busca na diversão. A resposta para
Camargo (1998), baseia-se no sociólogo francês Roger Caillois, que alega existir
quatro categorias para o lúdico, e que também podem ser entendidas como as
22
motivações para qualquer forma de diversão, e que são: a aventura, a competição,
a vertigem e a fantasia.
Acrescenta que na aventura as pessoas procuram algo novo. O cotidiano
repetitivo e monótono pode ser compreendido como um importante encorajador
pela busca da novidade. “A viagem é a própria síntese dessa busca de aventura
(CAMARGO, 1998, p. 34). A base da aventura está, portanto, na curiosidade.
Competição é a segunda motivação para a diversão. Faz parte da natureza
humana a superação, e é nesse sentido que: “Competição não significa
necessariamente disputa com outro. Pode ser uma disputa consigo mesmo: ser
melhor do que da última vez” (CAMARGO,1998, p. 36). O esporte, por exemplo, é
considerado como uma rica lição e metáfora para a vida, pois ensina ao homem a
lidar com o fato de que um dia ele ganha e no outro ele perde.
Seguindo nesse raciocínio, a vertigem aparece como a terceira forma
motivacional da diversão. Nessa categoria aparece como exemplos o vídeo-game,
o escorregador, a montanha-russa e até mesmo a sala escura do cinema. Este
mesmo autor explica que: “Ao contrário da competição, em que se exigem controle
e disciplina, aqui se exercita a capacidade de se deixar levar, de perder o controle e
correr riscos em segurança” (CAMARGO, 1998, p. 38).
E por fim, a fantasia é a quarta forma de motivação do lúdico. Explicando a
fantasia, o autor acima afirma:
A expressão mais forte e espontânea da fantasia é o devaneio: o
pensamento corre sem amarras, levando-nos para os mais variados
lugares e situações, e nele nos tornamos diferentes. A fantasia está
presente na vontade de ser diferente, de experimentar ser o outro,
mesmo que por alguns dias ou horas (CAMARGO, 1998, p. 39).
23
Baseando-se nessas colocações sobre as motivações da diversão é possível
afirmar que um parque de diversões consegue fazer uso dessas quatro
ferramentas. Primeiro, ele necessita constantemente renovar suas atrações para
que os visitantes sempre tenham a motivação do novo, da busca da aventura. Já a
vertigem e a competição podem ser exploradas dentro das próprias atrações.
Usando como exemplo a clássica montanha-russa, que é um dos maiores
ícones dos parques, pode-se afirmar que dentro dessa atração, as pessoas
conseguem experimentar claramente a sensação da vertigem, da queda. A
competição também pode ser vivenciada nessa mesma atração, se for considerado
que a competição pode ser entendida como a quebra de limites individuais, de
superação de medos. A fantasia é outro elemento que pode ser também muito bem
trabalhado dentro de um parque, principalmente os temáticos, como será visto mais
adiante nesta pesquisa, onde os visitantes entregam-se à brincadeira de entrarem
numa outra realidade.
1.1. Os Parques de Diversões como Espaço para o Lazer
Os parques de diversões nasceram com o objetivo de preencher a lacuna de
áreas denominadas não produtivas voltadas para o descanso, o lazer, jogos,
recreação e divertimento. Isto porque, com a promessa do desenvolvimento urbano
como decorrência da industrialização das cidades, o uso dos espaços ganhou um
caráter utilitarista. Niemeyer (2002) apresenta um detalhado relato de como se
desenvolveu a noção do urbanismo moderno como resposta à degradação das
cidades industriais. Esclarece que:
24
Ao reconhecer-se o tempo livre como algo necessário ao
desempenho de todas as classes sob o aspecto econômico, cultural
e político, abre-se um amplo leque de possibilidades de organização
e planejamento das atividades de lazer dentro das chamadas
políticas urbanas (NIEMEYER, 2002, p. 42).
Assim, segundo este pesquisador, os parques Infantis tornaram-se prioridade
no programa municipal da cidade de São Paulo no que se refere ao
desenvolvimento e à promoção do lazer, principalmente a partir da gestão de Mário
de Andrade em meados da década de 1930. Tais iniciativas tinham finalidades
recreativas, lúdicas, mas também de inclusão social e até sanitaristas, uma vez que
já se tinha conhecimento dos benefícios à saúde das práticas esportivas e do
contato com o meio ambiente.
Pode-se entender que esses parques tenham influenciado a concepção dos
projetos dos parques de diversões modernos. Através de um detalhado relato do
desenvolvimento e declínio dessas áreas urbanas na cidade de São Paulo voltadas
para o lazer infantil, Niemeyer (2002) argumenta e justifica que a administração do
lazer é uma questão de cidadania.
Garcia (1996) defende, entretanto, a idéia de que a produção social do
espaço lúdico ainda está em desenvolvimento, não é uma história acabada. Ele
esclarece que ao se pensar no espaço de lazer, se esbarra na questão do
utilitarismo e pragmatismo imposto por uma sociedade que valoriza o espaço
produtivo em função do trabalho. Por outro lado, cada vez mais, se enfrenta o
desafio da busca de uma maior qualidade de vida, que por sua vez, demanda
espaços onde os indivíduos possam gozar de mais liberdade, chamados de
espaços não-produtivos, como: praças, parques, jardins.
Esses espaços não-produtivos, em grandes cidades como São Paulo,
localizavam-se geralmente em espaços pouco valorizados economicamente, como
25
várzeas e brejos, e dessa forma, de alto custo para uma possível urbanização.
Portanto, ali é que a maioria dos clubes recreativos, esportivos, circos e parques de
diversões itinerantes instalaram-se. Segundo Garcia (1996) daí se originou o
famoso futebol de várzea.
Entretanto, foi somente a partir da década de 1960 que o Estado passou a
administrar de uma forma mais substancial os espaços públicos, visando também
as práticas do lazer, visivelmente pressionado por uma profunda revolução social e
cultural. Foi com a redução da jornada de trabalho, fruto de anos de lutas sindicais,
que conseqüentemente, houve o aumento do tempo livre. Aliado a esse fator, uma
sensível reconfiguração dos papéis sociais dos indivíduos, principalmente o
feminino, implicaram numa mudança de valores, que abriram terreno para o prazer,
o lúdico, o lazer.
Mais recentemente, a lógica capitalista foi alterada. Os espaços não-
produtivos viraram bons negócios, extremamente lucrativos. Surgiram os
shoppings centers. Outros exemplos são os modernos projetos dos
empreendimentos residenciais, que destinam grandes áreas ao lazer, como
playgrounds, salas de jogos, sala de ginástica, piscinas.
Assim, se quase desapareceram os circos de periferia e os antigos,
nostálgicos e precários parques de diversões – porque o espaço
lhes fora “requisitado” para finalidades mais “úteis” – surgiram os
grandes complexos da indústria de diversão, a indústria da vertigem
e do risco simulado, que faz imenso sucesso em todo o mundo
(GARCIA, 1996, p. 21)
É válido acrescentar também que os parques de diversões são considerados
equipamentos de lazer, os quais podem ser divididos em específicos e em não-
específicos, sendo que os específicos são aqueles que são construídos com a
26
finalidade de abrigar atividades e programas de lazer, como esclarece Pellegrin
(2004), que apresenta a seguinte definição para o termo equipamentos de lazer:
Edificação ou instalação onde acontecem eventos e atividades de lazer de
um modo geral. Podemos enquadrar na categoria geral de equipamentos
de lazer os clubes, ginásios, centros culturais, piscinas, cinemas, parques,
bibliotecas, centros esportivos, quadras, teatros, museus, etc.,
independentemente de serem públicos ou privados (PELLEGRIN, 2004, p.
69).
Para complementar esse raciocínio, vale dizer que Pellegrin (2004) pontua a
diferença entre os termos equipamentos e espaço de lazer. Afirma que a discussão
dessas terminologias na área acadêmica é bastante recente, ou seja, começou a
ganhar força a partir da década de 1970 quando a produção teórica brasileira
ganhou impulso. Assim, são conceitos que ainda podem ser redefinidos ou
remodelados.
Para esta mesma pesquisadora, espaço de lazer pode ser entendido como:
Termo genérico que diz respeito aos lugares em que se desenvolvem ações,
atividades, projetos e programas de lazer de um modo geral” (PELLEGRIN, 2004,
p. 73). Entretanto, pondera que tal conceituação é possível dentro de um contexto
restrito, mas que de uma abordagem mais ampla os espaços de lazer podem ser
analisados como aspectos de uma política de lazer, afirmação que corrobora a
visão de Niemeyer (2002) sobre lazer e cidadania.
Por outro lado, vale a ponderação de Werneck (2001) que afirma que o
aspecto econômico do lazer como gerador de receitas, de investimentos e
crescimento, às vezes, é supervalorizado na sociedade contemporânea, mas que
não deve ser analisado somente sob esse enfoque. A redução do tempo de
trabalho é visto como argumento para mobilizar a indústria do lazer e incentivar
investimentos na construção de equipamentos como Parques de Diversões, por
27
exemplo, e de várias iniciativas para a formação de profissionais para trabalharem
nesse mercado.
Entretanto, apesar de tantas conquistas trabalhistas nos últimos anos, a
grande maioria dos pesquisadores nos estudos de lazer parece concordar que, ao
contrário do que se pregava há alguns anos atrás de que o futuro da sociedade
seria uma sociedade com mais tempo para o lazer, o que se testemunha é uma
população que trabalha cada vez mais, e conseqüentemente com menos tempo e
menos disposição para desenvolver atividades de lazer.
Krippendorf (2001) também parece concordar com essa visão, afirmando que
os valores do “ter” suplantam os valores do “ser” na nossa sociedade, com uma
economia com forte tendência à concentração, ao domínio do poder econômico em
detrimento de pequenos negócios. Afirma também este autor que no objetivo da
criação de empregos, produz-se para trabalhar, e não mais se trabalha para
produzir, e com isso a humanidade entra num ciclo vicioso e devorador de
crescimento.
Aliado a essa questão, afirma ainda que as cidades não estão muito
preocupadas com a necessidade de lazer e relaxamento de seus habitantes, visto
que estão estruturadas para o trabalho. Assim: não se pergunta às pessoas o que
elas fazem nas férias e sim para “aonde” vão? E muito sabiamente questiona: “E o
que será daqueles que são obrigados a ficar?” (KRIPPENDORF, 2001, p. 39).
Dessa forma, esse sociólogo prega que é necessário que a economia se
descentralize, que os valores humanos voltem a acentuar mais o “ser” do que o
“ter” e lembra que os recursos naturais não são inesgotáveis. Entretanto, lembra
que essa deve ser uma luta conjunta de toda uma sociedade. Enquanto isso,
destaca que o turismo e as atividades de lazer são uma válvula de escape das
28
tensões modernas. Para ele: “O lazer é uma droga aprovada pela sociedade, uma
analgésico que dá a ilusão de uma melhora passageira, mas que não pode curar a
doença em si”. (KRIPPENDORF, 2001, p. 46). Complementa esse raciocínio
dizendo que na verdade, essa fuga da realidade é uma forma de fugir da
responsabilidade de transformar a própria situação.
1.2. Relação Entre a Indústria de Entretenimento e Lazer
Uma das dificuldades enfrentadas no desenvolvimento deste trabalho foi a
de encontrar um conceito para a palavra entretenimento. Isso porque, a maioria dos
autores pesquisados utiliza os termos entretenimento e lazer como sinônimos e de
formas deliberadas, como se já fossem de domínio comum, e sem o cuidado de um
olhar mais criterioso com relação a tais conceituações. Vale notar também que
muitos professores das áreas de Turismo e Lazer, quando consultados, não
conseguem apresentar uma esclarecedora diferenciação. Assim, foi sentida a
necessidade de identificar de que forma lazer e entretenimento seriam abordados
nesta pesquisa.
Trigo (2003) em sua tese de pós-doutorado intitulada “Entretenimento: uma
Análise Cultural e Econômica” apresenta um importante esclarecimento a respeito
das diferenças entre entretenimento e lazer. Afirma que é uma atividade
relativamente nova no mundo, e talvez por isso mesmo, cause ainda tantas
dúvidas. Este autor afirma que:
O termo está ligado a conceitos expressos especialmente pelo
empresariado norte-americano, da mesma forma que conceitos
como “lazer” remetem a sociólogos europeus, sendo os nomes mais
conhecidos no Brasil o francês Joffre Dumazedier e o polêmico
italiano Domenico de Masi (TRIGO, 2003, p. 11).
29
Além disso, acrescenta também que o entretenimento está geralmente ligado
a atividades programadas e pagas, o que pode ser considerada uma importante
diferença, uma vez que as pessoas têm à sua disposição várias atividades que
podem exercer durante seus momentos de lazer, e muitas delas gratuitas. Tem-se
também que entretenimento: “É o conjunto das atividades relacionadas à qualidade
de vida, e que se refere aos locais destinados a propiciar divertimento, dotados de
equipamentos e serviços indispensáveis à atividade turística” (BRUNO e FRANZINI,
1999, p. 94).
O interessante é notar que essas autoras relacionam entretenimento com a
necessidade de locais para sua ocorrência. Complementam o raciocínio sobre os
locais, afirmando:
Mas está faltando o mais poderoso deles, os parques de diversões,
que mobilizam milhões em investimentos, atraem multidões de
vários pontos do país e geram muitos empregos, sejam diretos ou
indiretos (BRUNO e FRANZINI, 1999, p. 94).
Não é o foco dessa pesquisa se aprofundar na discussão nem mesmo numa
conceituação sobre entretenimento, mas essas considerações acima pontuadas
parecem ser bem pertinentes e fazem sentido, ressaltando certamente o papel dos
parques de diversões, que é associado à qualidade de vida moderna. Além disso,
vale ressaltar também o fato, como bem destacado, do papel econômico que os
parques representam na sociedade que estão inseridos, pelo fato de gerarem
muitos empregos e envolverem altas cifras em termos de investimentos.
Salomão (2000) apresenta uma pesquisa realizada por Pine e Gilmore
(1999) que difere em parte do ponto de vista de Trigo (2003). Tais pesquisadores
30
identificaram existir quatro dimensões da experiência humana: entretenimento,
educação, estética e escapista.
2
Focando na questão do entretenimento, eles a classificam como uma
atividade que ocorre quando as pessoas passivamente absorvem experiências
através de seus sentidos, no momento, por exemplo, que lêem um livro, assistem
um filme ou ouvem música. E é provavelmente no que tange à palavra
“passivamente” que o entretenimento gera tantos preconceitos. Isto porque são
atividades consideradas por vários teóricos, ou como Trigo (2003) classifica de
“elites culturais”, como de extrema fragilidade e vulnerabilidade intelectual.
Os parques de diversões recebem também duras críticas de alguns
pesquisadores, principalmente os parques da Disney, classificados como vertente
da força do imperialismo norte-americano. É válido ressaltar que a Disney, na
França, teve vários problemas na época de sua implantação, pois não foi bem
aceita pelos franceses, que criaram uma enorme resistência em aceitar a
importação de um produto cultural genuinamente norte-americano; fruto de uma
cultura que eles sempre rejeitaram.
3
Cooper et al. (1998) lembram que a preocupação de mostrarem aos turistas
a paisagem e o estilo de vida real da comunidade receptora é muito válida entre os
pesquisadores sociais. Isso porque, em muitos casos, os turistas só recebem uma
versão distorcida da realidade, com falta de autenticidade. Por outro lado, afirmam
que: “É claro que alguns turistas não querem uma experiência autêntica: o
propósito de irem a parques de lazer ou temáticos é de entretenimento e diversão
2
De uma forma bem resumida, SALOMÃO (2000) esclarece que uma experiência educativa visa a
aprendizagem, na escapista a atenção é dada ao fazer, na de entretenimento o sentir, e a experiência estética o
objetivo é simplesmente o de “estar lá”.
3
A questão das dificuldades enfrentadas pela Disneylândia de Paris na época de sua implantação serão melhor
abordadas no Capítulo 3 deste trabalho.
31
(COOPER et al, 1998, p. 343). Dessa forma, de acordo com esses pesquisadores,
os visitantes dos parques de diversões buscam uma vivência de fantasia, na ida a
um mundo idílico, e em alguns casos, da fuga da realidade. Como será também
aprofundado mais adiante neste trabalho, essa foi justamente a idéia de Walt
Disney ao projetar seus parques, de levar seus visitantes a experimentarem durante
algumas horas a vivência da fantasia, num espaço construído para esse propósito.
Por outro lado, como lembra Rodrigues (2001, p. 27), muitas vezes a
insatisfação da vida urbana é exacerbada, e dessa forma, o espaço turístico é
vendido como solução, como paraíso. Ao tratar do espaço turístico afirma ainda
que:
O espaço turístico resulta, em muitos casos, da captação do
imaginário coletivo na tentativa de resposta. Por outro lado, o
espaço criado é reforçado pela mídia que gera e alimenta o
processo fantasioso. Portanto, até que ponto é incentivo ou
resposta? Trata-se de um processo gravitacional em torno das
aspirações individuais, cujos estímulos e respostas interagem
reciprocamente (RODRIGUES, 2001, p. 26-27).
Ao completar esse raciocínio, explica o autor acima que no espaço global é
produzido um lugar, que nega o local, pois é artificial, é imposto, e dessa maneira, o
define como sendo um não-lugar. Assim, defende que nesse caso o turista viaja
falsamente, pois não sai do seu lugar, e assim, quase nada acrescentando à sua
experiência pessoal.
Por outro lado, “uma coisa é certa: a maioria dos turistas não sente a
necessidade urgente de se aproximar dos habitantes das regiões visitadas
(KRIPPENDORF, 2001, p. 48). Uma provável explicação seria o fato de que nos
momentos de lazer, e mais especificamente durante as viagens turísticas, as
pessoas estão mais interessadas em se divertir, podendo assumir um
“personagem” diferente do que assumem no cotidiano, como uma forma de evasão
32
pessoal, em detrimento do contato com o “outro”. Este estudioso defende o aspecto
de que enquanto as pessoas não reverem essa postura egoísta, não será possível
existir o que ele denomina de um turismo melhor. Dessa forma, defende que:
Aquele que não pode desabrochar em sua própria casa também não encontrará a
felicidade nas férias” (KRIPPENDORF, 2001, p. 92).
A questão é que o entretenimento é uma realidade da sociedade moderna,
cuja importância sócio-econômica e cultural são inegáveis. E como não é o foco
deste trabalho se aprofundar nesta discussão, cabe aqui tal colocação: “Com tudo
isso o entretenimento é mesmo divertido, fácil, sensacional, irracional, previsível e
subversivo [...] é exatamente por isso que tantas pessoas o adoram” (TRIGO, 2003,
p. 15).
É, portanto, esse o enfoque que será usado neste trabalho para
entretenimento. E, se este visa a distração, a recreação e o divertimento, só se
pode concluir que os parques de diversões podem ser considerados como
atividades de entretenimento, pois são pagos, provocam diferentes sensações nos
visitantes e as pessoas os usufruem durante seu tempo de lazer.
Como seqüência desse raciocínio, o próximo capítulo fornecerá importantes
conceituações sobre parques de diversões, iniciando com uma visão histórica da
atividade e mapeando um panorama da atividade na atualidade.
33
CAPÍTULO 2: PARQUES DE DIVERSÕES -
CONCEITOS, CLASSIFICAÇÃO E HISTÓRICO GERAL
Por ser uma área de estudo científica muito recente, não existe um consenso
entre os autores sobre o que são parques de diversões e o que são parques
temáticos. Alguns estudiosos usam os termos como sinônimos, outros, ressaltam
diferenças, e outros ainda utilizam o termo parques temáticos como nome genérico
da atividade, como é o caso do estudo da Empresa Brasileira de Viagens e Turismo
(EMBRATUR, 1998), intitulado: “Estudo Econômico Financeiro dos Meios de
Hospedagem e Parques Temáticos no Brasil”
4
, que no Capítulo 11 apresenta um
panorama da indústria de parques no país.
Aliás, cabe ressaltar uma crítica à definição apontada por esse importante
estudo, uma vez que apresenta uma conceituação bastante confusa e contraditória,
e que por ter sido realizada por um órgão governamental, que serve de base para
tantos outros estudos, infelizmente não cumpriu o papel de fornecer tais
esclarecimentos. Apresenta-se aqui, na íntegra, tal definição:
Os parques temáticos ou de diversão fixos se utilizam de temas
diferenciados na ambientação física de suas atrações e têm como
um de seus objetivos mercadológicos o estímulo da atividade
turística. Esta definição se aplica aos parques de entretenimento
com temas específicos, tais como o Beto Carrero World e a Turma
da Mônica, os aquáticos, como o Beach Park e o Wet’n Wild, e os
parques de diversão, dos quais o mais antigo é o Playcenter. Os
mais antigos, com 30 anos, em média de funcionamento, são os de
diversão, ao passo que os temáticos específicos e os aquáticos têm
entre 5 e 6 anos de funcionamento, em média (EMBRATUR, 1998,
p. 160-161).
4
Apesar de ter sido lançado há quase uma década, e, portanto, seus dados estarem um pouco defasados, esse
estudo da Embratur é uma importante fonte de pesquisa sobre a indústria de Parques de Diversões no Brasil por
ter sido realizado por um órgão governamental e por apresentar um detalhado panorama do mercado de parques
no país. Infelizmente, a área ainda carece de informações e dados estatísticos mais atualizados.
34
Como pode ser observado, primeiro nos fazem entender que os parques
temáticos e de diversões fixos podem ser considerados sinônimos, pois empregam
a palavra ou para dizer que fazem o uso de temas na sua ambientação, o que já
pode ser considerada como uma certa inconsistência, pois se são a mesma coisa
então deveriam escolher apenas uma nomenclatura.
Entretanto, o mais confuso é que em seguida, criam uma outra
denominação, que são os parques de entretenimento com temas específicos. Ou
seja, não basta o parque ter um tema, existem parques com temas específicos,
conceituação que não faz sentido, pois é uma redundância, uma vez que tematizar
já é um recurso que trabalha um tema específico. Além disso, cabe também saber o
que consideram ser a diferença entre parques de diversão e parques de
entretenimento.
Seguindo com tal definição, outra inconsistência que pode ser apontada é o
fato de usarem o critério do tempo de funcionamento ou criação dos parques como
forma de classificação. Como bem ressaltou Salomão (2000), que também faz
críticas a tal definição, seguindo-se esse raciocínio da EMBRATUR (1998), a
Disneylândia, por ter mais de trinta anos de existência, deveria ser considerada um
parque de diversões, e não um parque temático. Entretanto, a Disney é a principal
referência mundial e maior exemplo do que seria um parque temático, uma vez que
usa seus personagens de animação, internacionalmente conhecidos, como
principal tema das suas atrações.
Chon e Sparrowe (2003) sugerem uma definição que aponta a diferença
entre parques temáticos e de diversão, mas que também merecem ressalvas, uma
vez que sugerem que os parques temáticos são maiores do que os de diversão.
Talvez o mais correto é que não se assumisse essa idéia, uma vez que se
35
encontram parques de diversões construídos em áreas tão grandes quanto parques
temáticos e esses, por sua vez, em áreas reduzidas, como, por exemplo, é o caso
dos parques da Mônica e O Mundo da Xuxa, instalados dentro de shopping centers
na capital paulista.
Para Beni (1998), segundo sua teoria do Sistema do Turismo, os parques
encontram-se dentro da subdivisão “Recreação e Entretenimento”, que por sua vez
pertence aos “Equipamentos e Serviços Turísticos”. Este autor também diferencia
o termo parque de diversões do termo parque temático, que seriam
respectivamente:
Terrenos delimitados (áreas protegidas) com equipamentos para
recreação de crianças e adultos; e, [...] a atração básica dos
parques temáticos é um tema dominante – daí seu nome -, que
permite reviver acontecimentos ou realizar fantasias. Ele os
classifica em três categorias: entretenimento, histórico e safáris
(BENI, 1998, p. 305-306).
Na verdade, o próprio termo “temático” causa várias distorções e desacertos.
A bem da verdade é que muitos estabelecimentos, como restaurantes, lojas, hotéis
e parques se autodenominam temáticos para ganharem destaque mercadológico, e
assim atraírem mais demanda. O problema também é que, muitas vezes, segundo
Fontinelli (1999)
5
, consultor e especialista na área, esses empreendimentos são na
verdade apenas “decorados”.
Um empreendimento para ser considerado temático, portanto, precisa utilizar
e incorporar esse tema em toda sua construção. E mais do que isso, tematizar
significa conteúdo. É, segundo Fontinelli (1999), contar uma estória de modo a
5
Diretor da empresa Imagic; Arquiteto, Especializado em Design de Entretenimento por Harvard e
Representante da América Latina da Themed Entertainment Association (Associação de Entretenimento
Temático). Informações obtidas em palestra realizada em Evento da BSH – Consultoria Hoteleira, no ano de
1999, em São Paulo.
36
conseguir uma resposta emocional, envolvendo o espectador ou convidado na
fantasia que se quer criar.
Na verdade, o termo “temático” é um anglicismo proveniente do termo
Theme Park, inventado pelos norte-americanos. Pode-se afirmar que a estratégia
em tematizar um parque de diversões é a de agregar valor mercadológico, e dessa
forma, atrair mais visitantes. Bertaso (2001, p. 190) confirma esse raciocínio ao
afirmar que: “A tematização permite que se imponha uma narrativa ao local”.
Dessa forma, acredita-se que o nome genérico para esses empreendimentos
de lazer deve ser
Parque de Diversões, uma vez que a palavra diversões é mais
abrangente do que a palavra temático, e identifica um dos principais propósitos
desses empreendimentos, que é o de fornecer diversão. Assim, aqueles parques
que fazem uso da estratégia de utilizarem um tema para ganharem destaque
mercadológico, aí sim, podem ser considerados temáticos.
Já Ribeiro (2004) sugere a seguinte definição do verbete “parques”, contido
no livro “Dicionário Crítico do Lazer”:
São áreas extensas e delimitadas, podendo ter áreas verdes, com
finalidade lúdica, educacional e cultural. Tendo em vista a principal
finalidade, a vivência do lúdico, os parques têm sido denominados
genericamente de ‘parques de diversões’, por possuírem diferentes
equipamentos denominados ‘atrações’, que variam desde os
tradicionais ‘roda gigante’, ‘carrossel’ e ‘montanha russa’, até os
equipamentos em que são utilizadas modernas tecnologias
mecânicas, elétricas, eletrônicas e informatizadas (RIBEIRO, 2004,
p. 172).
Boiteux e Werber (2002) apresentam uma definição bem mais simples. Para
estes autores, os parques podem ser definidos como áreas de diversão,
destacando que podem ser fixas ou móveis e onde se instalam as atrações
diversas. Tal conceito por ser tão sucinto abre margem para muitos
questionamentos, e principalmente porque dentro dessa definição vários locais
37
poderiam ser considerados como parques, uma vez que a palavra atrações é muito
abrangente. Dessa maneira, não pode ser considerada uma boa definição.
Bertaso (2001) propõe uma visão, talvez, mais romântica em relação aos
parques de diversões, mas bastante pertinente, pois com sua visão de arquiteta,
foca a questão da utilização do espaço. Além disso, ela destaca também a questão
dos parques serem espaços construídos com o propósito de serem ambientes de
sonhos e magia, um espaço concebido com a intenção de transportarem seus
visitantes a outro tempo e lugar, distante somente de um bilhete pago. Segundo a
autora:
Os ambientes de sonhos atuais tiveram sua característica principal
modificada. Antigamente o paraíso era resultado de expressões
individuais, tome-se o exemplo do castelo de Ludwig, fonte de
inspiração para o castelo de Disneyworld. O paraíso atual pode ser
atingido através dos portais de um parque temático. Porém, é
necessário que o acesso ao paraíso, espaço público por definição,
agora equipamento comercial privado, seja pago (BERTASO, 2001,
p. 212)
Assim, para esse trabalho, os parques de diversões serão entendidos como
equipamentos técnicos de lazer; empreendimentos que são fruto de extenso
planejamento de mercado e são construídos com o objetivo de propor atividades
lúdicas e momentos de recreação e descontração aos seus visitantes, num
ambiente simulado e controlado, com segurança, comodidade, e com objetivos
comerciais claros.
2.1. Classificação dos Parques de Diversões
Em termos de classificação, Salomão (2000)
6
propõe que os parques de
diversões podem ser subdivididos em: Parques Móveis e Fixos, entre eles, Secos e
6
Para mais detalhes, consultar: SALOMÃO, Marcelo. Parques de Diversões no Brasil - Entretenimento,
Consumo & Negócios. Rio de Janeiro: Mauad, 2000. Nesse livro, o autor apresenta uma completa análise sobre
38
Molhados. Parques Locais, Regionais e de Destino Turístico, além dos parques
indoor e outdoors. Esse sistema de classificação fica mais nítido quando observada
a Figura 1, apresentada a seguir.
Figura 1: Classificação dos Parques de Diversões
PARQUES DE DIVERSÕES
PARQUES FIXOS PARQUES MÓVEIS
PARQUES AQUÁTICOS PARQUES SECOS
DESTINOS REGIONAIS LOCAIS
Fonte: Salomão (2000, p. 88)
Os Parques Fixos são aqueles construídos num local com endereço único e
fixo, diferenciando-se dos Móveis, que são montados em diferentes locais ao longo
do ano, viajando por várias cidades, e que por isso mesmo, possuem uma estrutura
menor e menos complexa. Possuem geralmente as mesmas atrações: as
classificação dos Parques de Diversões, sendo uma importante fonte de consulta e embasamento para a
classificação apresentada nesse trabalho. Além disso, oferece um detalhado estudo sobre a estrutura da indústria
dos parques de diversões no Brasil, destacando-se sua análise dos macroambientes que influenciam essa
indústria e dos grupos estratégicos.
39
tradicionais montanhas-russas, rodas-gigantes, carros fantasmas, para citar as
principais.
Dentre os parques Fixos, é possível separá-los entre Secos e Molhados. A
definição de Parques Molhados surgiu para compreender os chamados parques
Aquáticos, como o Parque Wet´ n Wild em São Paulo e o Beach Park em Fortaleza.
Ou seja, são parques que têm a maioria das suas atrações montadas e
funcionando movidas à água. Com relação aos termos indoors e outdoors, referem-
se ao fato de serem construídos em áreas fechadas ou abertas, respectivamente,
pois se referem a palavras de origem inglesa, sendo indoors para fechado e
outdoors para abertos.
Para completar essa análise é importante pontuar também o conceito de
Centro de Entretenimento Familiar (CEF´s), pois são espaços dedicados ao lazer
familiar, ou seja, para que pais e filhos possam brincar e se divertir juntos. Esses
projetos são instalados geralmente dentro de shopping centers e incluem
equipamentos mecânicos de pequeno porte, diversões eletrônicas, equipamentos
infláveis, dentre as principais atrações. Atualmente, muitos deles possuem também
áreas dedicadas a festas de aniversários. A empresa Playland é uma das maiores
operadoras desses empreendimentos no país.
Salomão (2000) ainda destaca que na busca de ofertas originais, alguns
parques lançaram mão da estratégia do que ele chama de modelo híbrido, ou seja,
uma combinação de vários tipos de parques dentro de um só, como por exemplo,
um parque aquático que também é temático.
A outra classificação possível está relacionada com a proveniência da
demanda desses empreendimentos. Isto é, um parque pode ser considerado local
se a maioria de seus visitantes forem provenientes de uma área próxima a ele, ou
40
seja, numa distância inferior a trinta minutos ou 40 km. Dessa forma, visam atingir
consumidores em locais de grande circulação, como shopping centers, perto de
suas residências ou locais de trabalho. Um bom exemplo é o Parque da Mônica
São Paulo, que tem como público-alvo principal as famílias e escolas provenientes
da cidade e da grande cidade de São Paulo.
Os regionais visam atrair pessoas de uma região mais abrangente, distantes
de cerca de duas horas ou cerca de 160 km. O Hopi Hari pode ser considerado um
bom exemplo de um parque regional, já que a maioria da sua demanda está
localizada na cidade de São Paulo, cerca de 75 km de distância. Já os parques
considerados como destinos turísticos, como é o caso dos parques da Disney em
Orlando, Estados Unidos, visam atrair visitantes de uma área ilimitada, atraindo
visitantes do mundo inteiro, pois o objetivo é que estes fiquem alguns dias nessa
localidade. No Brasil, o Beto Carrero World, por exemplo, procurou se estruturar
como um destino turístico. As operadoras turísticas montam pacotes vendendo
esse parque no Brasil inteiro dentro de um conjunto de outras atrações.
É válido destacar, entretanto, que o fato de um parque ser considerado
Regional ou de Destino Turístico não significa que não possam atrair uma demanda
da própria localidade. E a recíproca também é verdadeira. Ou seja, um parque
Local pode muito bem atrair turistas de um raio de influência superior ao apontado
acima.
Assim, vale reforçar que tal classificação serve como um parâmetro para que
tais empreendimentos possam focar suas estratégias de marketing e comunicação
num público-alvo mais bem definido. A Tabela 2 apresenta de forma resumida
essas informações destacadas, propiciando uma visão mais clara sobre essa forma
de classificação proposta por Salomão (2000):
41
Tabela 1 - Tipologia de Parques de Diversões
Tipo Mercado-Alvo Raio de
Influência
Nível de
Investimento
Permanência
Média
Fluxo de
Visitantes
Local Nichos
<30 min
Baixo 1-5 horas
< 1MM
Regional Segmentos
<2 h
Médio Até 1 dia 1-3 MM
Destino Coletividade Sem limites Alto + 1 dia
> 3MM
Fonte: Salomão (2000, p. 87)
Analisando a Tabela 2, é possível ressaltar também que o nível de
investimento demandado é diferente para cada tipo de empreendimento, sendo
que os parques considerados como destino são os que requerem um valor mais
alto de investimento, e os parques locais os mais baixos. A principal explicação
baseia-se no fato de que para atraírem uma demanda mais distante, os parques
de destino precisam montar uma infra-estrutura completa e garantir que suas
atrações sejam bastante atraentes e competitivas. Além disso, a própria
dimensão desses negócios, de grande porte, também justifica o alto
investimento.
Por outro lado, o tempo médio de permanência dos visitantes nesses
parques também é maior em virtude da variada gama de atrações e
comodidades ofertadas. Até porque, pelo fato de ter percorrido uma distância
maior, o visitante espera usufruir um produto diferenciado, que tenha um valor
agregado superior, pois também o valor do ingresso é maior, se comparado com
o dos parques locais e regionais, justamente para garantir o retorno do
investimento. Assim, o fluxo de visitantes para cada perfil destes
empreendimentos também é diferente. É possível afirmar que o estudo da
visitação dos parques de diversões precisa levar em consideração todas as
42
suas características estruturais e mercadológicas, pois o perfil de consumo da
demanda varia sensivelmente.
Aprofundando-se um pouco mais nessa análise, é válido esclarecer que a
idéia do complexo Disney, na Flórida, Estados Unidos, é a de permitir o lazer
familiar, ou seja, otimizando assim o tempo livre, colocando em um mesmo
espaço pais e filhos. Essa foi a idéia inicial de Walt Disney ao conceber seu
primeiro parque, e tal conceito deu tão certo que perdura até os dias atuais.
Na sociedade contemporânea, na qual o tempo de convivência familiar é
tão reduzido, por vezes escassos, essa concepção encaixa-se perfeitamente. É
interessante notar que essa visão do lazer familiar também é compartilhada por
Maurício de Sousa, criador dos personagens da Turma da Mônica e idealizador
do Parque da Mônica. Segundo ele, sua idéia ao construir o parque era a de
poder reunir famílias num lugar onde se sentissem à vontade e que fosse
resgatado o que chamou de “quintal perdido”.
Segundo Boiteux e Werner (2002) os parques de diversões configuram-se
como um atrativo da oferta turística, pois têm como objetivo o estímulo
mercadológico de atrair os visitantes para o núcleo receptor, e, além disso,
aumentar a renda desse núcleo através do aumento do tempo de permanência
desses visitantes. Esta abordagem acerca dos parques de diversões apresenta-se
bastante pertinente se observada pela ótica do desenvolvimento da atividade
turística.
Lickorish e Jenkins (2000) parecem concordar com essa visão e esclarecem
que alguns parques temáticos estão começando a se desenvolver com um conceito
diferenciado, ou seja, como destinos de resorts, incluindo toda a infra-estrutura de
acomodações e de lazer com o objetivo de alongarem a estadia de seus visitantes
43
e, conseqüentemente, gerarem mais receita. Complementam esse raciocínio
afirmando que:
A Disneyland de Paris, antigamente EuroDisney, foi construída
como um destino de resort com diversos hotéis antes de abrir suas
portas, e em Orlando, na Flórida,diversos parques temáticos
concorrentes e outras atrações que ajudam a manter a ocupação
dos hotéis e aumentar a média de estada (LICKORISH e JENKINS,
2000, p.167-168).
Em termos de rentabilidade econômica da atividade turística, uma ótima
estratégia é a de aumentar a taxa média de permanência dos turistas na localidade,
bem como, aumentar o gasto médio do turista. Esta estratégia é adotada, por
exemplo, pelos Estados Unidos. Dessa forma, segundo fontes da Organização
Mundial de Turismo (OMT, 2000), apesar de não ser o país que mais recebe
visitantes estrangeiros dentro do panorama mundial, ficando atrás da França e
Espanha, os Estados Unidos é o que mais lucra com a atividade turística. Isso
porque eles conseguem fazer a gestão dessa atividade de uma forma muito
competente
7
.
Dessa maneira, para ser considerado turista, o visitante deve pernoitar no
destino visitado, além de usufruir toda infra-estrutura de apoio ao turista da
localidade, como hospedagem, alimentação, meio de transporte, entre outros. Essa
constatação nos leva a concluir, portanto que, para os parques de diversões
7
Dentro desse contexto, faz-se necessário conceituar a diferença entre turista e excursionista. Segundo
definição da OMT (2000): “Turistas: São todos aqueles que visitam determinado local, diferente de seu local
habitual, e que permanecem mais de 24horas, ocupando um alojamento coletivo ou privado no lugar visitado
por uma noite ao menos.” e “Excursionistas: compreendem todos os visitantes que não permanecem mais de
24 horas no local visitado, não ocupando conseqüentemente um alojamento coletivo ou privado para passar a
noite.”
44
atraírem demanda turística, devem estar localizados em áreas que possuam essa
infra-estrutura turística.
É pertinente destacar que já existem ações no Brasil no sentido de agregarem
os parques de diversões na gama de oferta turística das localidades, como pôde
ser observado em recentes campanhas publicitárias do São Paulo Convention and
Visitors Bureau
8
, nas quais se apresentam os parques de diversões de São Paulo
como atrações turísticas da cidade.
Uma vez apresentadas as principais conceituações e um panorama da
chamada indústria de parques de diversões no Brasil, apresenta-se o histórico
desses parques, no Brasil e no mundo.
2.2. Perspectiva Histórica Mundial
A Europa testemunhou durante séculos a existência de um gênero de
construção denominado Pleasure Gardens (Jardins dos Prazeres), locais descritos
por possuírem imensos jardins e alamedas, e atrações para crianças e adultos,
como carrosséis e balanços. Parte do seu sucesso pode ser explicada por ser a
contraposição dos conturbados aglomerados urbanos, formados pela
contemporânea Revolução Industrial. Existem, entretanto, registros desses
parques desde o século XI. Já no século XIII, esses parques eram encontrados em
castelos e monastérios, e os jardins eram usados primordialmente para caçadas.
Esse formato foi passando por outras transformações ao longo dos anos, e
no século XVI eram utilizados pela aristocracia, tornando-se sinônimo de status.
Era usado para deleite e divertimento dessa classe social que passou a sair do
8
O Convention and Visitors Bureau é uma associação da iniciativa privada, que congrega empresas do trade
turístico, e tem como principal objetivo atrair turistas para sua área de influência, que pode ser um município,
região, estado e até um país. Além disso, tem um importante papel de divulgar as atrações turísticas de sua
região para os núcleos emissores de turistas.
45
campo em busca da cidade. Chegou, entretanto, ao seu apogeu nos séculos XVII e
XVIII, onde se registravam naquele continente cerca de 65 exemplares desses
“Jardim dos Prazeres”.
Trigo (2003) aponta, entretanto, que o mais antigo parque de diversão do
mundo é o Bakken, localizado na Dinamarca, sendo que está aberto à visitação até
os dias atuais. Já o termo parque público foi pela primeira vez utilizado em Londres
no ano de 1661 para o Saint James Park, atual Green Park. Foi quando o povo
passou a ter acesso a esses espaços.
Com o aumento da criminalidade nos grandes aglomerados urbanos
europeus, o formato dos Pleasure Gardens foi se deteriorando e testemunhando
uma queda freqüente de visitação. Com o aumento populacional, o aumento da
produção industrial, o desenvolvimento dos transportes e dos sistemas de
comunicação, surgiram as primeiras Exposições Universais, que de certa forma
assemelhavam-se às antigas feiras de mercadorias, que existiam em anos
anteriores.
O registro da primeira Exposição Universal foi em Londres, no Hyde Park,
em 1851. Dois anos mais tarde, Nova Iorque montou sua Exposição em Coney
Island. Depois, em 1858 foi a vez de outra importante metrópole da época: Paris,
que depois em 1867, montou uma área de lazer que ficou permanente. Outro
importante destaque das Exposições Universais foi quando em 1873, em Viena,
foram apresentadas atrações ao ar livre, com enorme sucesso. Um importante
marco de um dos primeiros parques de diversões modernos surgiu durante a
exposição realizada em Chicago, em 1893, a World’s Columbian Exposition.
Durante esse evento, a Roda-gigante foi apresentada pela primeira vez, e ainda
hoje é um dos mais importantes símbolos dos parques de diversões.
46
Essa exposição é citada como um marco da ousadia com várias edificações,
e que incorporava uma enorme infra-estrutura de apoio com restaurantes, locais de
entretenimento e vilarejos étnicos. Anos depois, na Inglaterra, foi inaugurado o
Blackpool Pleasure Beach, que é um dos mais antigos parques em funcionamento.
(RODRIGUES, 2004).
Entretanto, mesmo que a Europa possa ter influenciado vários projetos, o
berço dessa atividade, como é conhecida atualmente, é mesmo os Estados Unidos,
sendo ainda hoje um dos maiores mercados mundiais, e a principal referência de
produção e consumo dessa área.
Coney Island, localizada no Estado de Nova Iorque, nos Estados Unidos, foi
no início do século XX, a mais nítida expressão de divertimento proporcionada por
um parque, e se espelhou na Midway Pleasance, uma das áreas da exposição de
Chicago. Surgiu ali também o conceito da delimitação de área fechada e
controlada, promovendo mais segurança, e do pagamento de ingresso único pela
entrada. (SALOMÃO, 2000)
Também em Coney Island, em 1903, foi aberto o Luna Park, parque que
usava a lua como tema central de suas atrações, uma idéia embrionária dos atuais
parques temáticos. Estima-se que, em 1919, existiam nos Estados Unidos cerca de
1500 parques de diversões, mas que após a queda da bolsa de Nova York, em
1929, esse número tenha caído pela metade, em virtude da recessão econômica.
Salomão (2000) descreve a transformação que os norte-americanos
vivenciaram naquela época, e que marcou profundamente aquela sociedade:
Neste mesmo período, observou-se o estabelecimento do parque de
diversões como uma instituição nos Estados Unidos, como
conseqüência direta de uma curiosa sinergia deste negócio com a
atividade das empresas responsáveis pelos bondes elétricos das
grandes cidades (SALOMÃO, 2000, p. 37).
47
É curiosa a relação das empresas de bondes nessa história. Salomão
(2000) esclarece que, para diluir os custos fixos das tarifas de energia elétrica, as
empresas de bondes precisavam aumentar o fluxo de passageiros. Para isso,
construíam áreas de lazer próximas ao ponto final das linhas dos bondes. Tais
áreas eram dotadas de várias instalações, atividades e de vários “maquinários”
como carrossel e montanha-russa, os quais ficaram conhecidos como “trolley
parks”.
Entretanto, o mais importante marco da indústria de parques de diversões
moderna certamente ocorreu com a abertura da Disneylândia, em 1955
9
.
Novamente, o sistema de transporte estava envolvido na estratégia de lançamento,
mas nesse caso, era contando com a popularização do automóvel. Acreditando no
poder econômico da afluente classe média daquele país, Walt Disney levou a frente
seu sonho, mesmo com duras críticas contra sua idéia.
A fórmula dos parques de diversões tradicionais estava se degradando nos
Estados Unidos, principalmente em função da popularização da televisão, do
crescimento das zonas residenciais em subúrbios, resultado da migração de um
grande contingente populacional que saíam dos grandes centros em virtude da
violência urbana.
Mas Walt Disney ao invés de visualizar, como muitos, que o setor de
parques de diversões estava fadado ao desaparecimento, vislumbrou na verdade
uma oportunidade de mercado, e com sua aclamada qualidade de um empresário
visionário, desenvolveu um novo conceito de parques, que teria um tema central
para suas atrações e apostando que toda a família pudesse se divertir junto. O
9
Em 1955, a Disney inaugurou a Disneylândia em Anaheim, Califórnia. As reconstruções de caráter histórico e
atrações inovadoras e espetaculares concederam a esse parque fama e sucesso absoluto, se tornado até hoje um
dos principais atrativos turísticos dos Estados Unidos.
48
desenvolvimento desses parques, por outro lado, foi ajudado com o a alta taxa de
nascimento na década de 1970.
Chon e Sparrowe (2003) afirmam existir uma lenda em torno da visão que
Walt Disney teve ao imaginar seu primeiro parque. Ele estava sentado observando
suas filhas brincarem num carrossel e imaginou uma maneira de proporcionar
diversão para todas as idades, de um modo que os adultos também se divertissem,
ao invés de só pagarem as contas.
Segundo Connellan (1998), o encantamento em torno dos parques da
Disney existe justamente porque a “magia” é levada a sério nessa empresa, a qual
afirma ter obsessão pelos detalhes, tese que será abordada com mais profundidade
no próximo capítulo da presente pesquisa.
Além da Disney, outros importantes grupos corporativos norte-americanos,
como Universal Studios Inc, Busch Entertainment e Six Flags Inc.
10
, também se
destacam no mercado de Parques de Diversões na América do Norte. O formato do
Parque Six Flags over Texas fez também muito sucesso nos Estados Unidos,
atraindo uma demanda em busca de fortes emoções e aventura, famoso por
montanhas-russas radicais.
Esses modelos dos parques norte-americanos espalharam-se pela Europa e
Japão na década de 1980, e na China, Brasil e América Latina a partir da década
de 1990. Esse fenômeno é apontado por Bertaso (2000) como a
internacionalização dos parques. Essa indústria, desde então, não pára de crescer,
lançando novidades, além de continuar muito rentável, ao menos para as grandes
empresas, principalmente as sediadas na América do Norte.
10
Segundo o Amusement Business Year-End Issue, 1999 (apud SALOMÃO, 2000), as dez maiores cadeias
mundiais de Parques de Diversões, por ordem, são: Walt Disney Attractions, Premier Parks, Universal Studios
Inc., Anheuser-Busch Theme Parks, Cedar Fair Ltd., Paramount Parks, Grupo Mágico, Blackpool Pleasure
Beach Co., The Tusseaud Group e Silver Dollar City Inc.
49
2.3. Evolução Histórica no Brasil
No caso brasileiro, existe uma grande dificuldade de se remontar a história
dos parques de diversões, principalmente dada à falta de registros e bibliografia
disponível. Salomão (2000) é uma das mais importantes referências nacionais com
relação a esse estudo do país, e assim, segundo seu relato:
A história da indústria no país ainda não foi devidamente
desvendada e descrita. Atualmente ela é restrita, em grande p
50
Entretanto, antes desse, o Parque Fluminense merece ser destacado. Uma
das evidências históricas mais antigas apontam esse Parque, com data de
fundação no ano de 1899. A figura de Paschoal Segreto é apontada como um
importante articulador da área e pioneiro no ramo de entretenimento. Era, inclusive,
conhecido como Ministro das Diversões. Tal parque era um importante ponto de
encontro da afluente sociedade carioca. Nesse mesmo local, Segreto instalou anos
mais tarde atrações trazidas da Exposição Internacional de Paris.
Após a década de 1920, o país testemunhou uma proliferação de pequenos
parques itinerantes que percorriam todo o país. Esses parques eram operados em
sua maioria por imigrantes italianos e norte-americanos, que traziam seu expertise
de seus países de origem. Até hoje, tanto a Itália quanto os Estados Unidos, são
duas importantes referências mundiais na produção de atrações desse setor.
Depois, com o crescimento econômico de São Paulo, nos anos que se seguiram,
houve uma gradual transferência de projetos de lazer do Rio de Janeiro para lá. E
ainda hoje, o estado de São Paulo concentra o maior número e importantes
parques de diversões do Brasil (ADIBRA, 2005).
Outro importante marco brasileiro foi o parque montado no Parque Ibirapuera
em São Paulo, em comemoração ao quarto centenário da cidade de São Paulo, nas
décadas de 1950-1960. O mercado sofreu uma forte estagnação quando no
governo de Geisel (1974 a 1979) foi proibida a importação de equipamentos para
parques de diversões.
Só no governo de Fernando Collor de Mello, na década de 1990, é que foi
abolido esse veto às importações, e com a redução do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI), no governo de Fernando Henrique Cardoso, juntamente com
a abertura de algumas linhas de financiamento do Banco Nacional de
51
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), esse setor alavancou um grande
desenvolvimento.
Entretanto, não é objetivo deste estudo remontar esse histórico, até porque
outros pesquisadores
11
já se dedicaram a fazê-lo. É interessante para este estudo
apontar as datas de inauguração dos principais projetos de parques mais
recentemente instalados no Brasil, conforme demonstra a Tabela abaixo:
Tabela 2: Fundação dos Principais Parques de Diversões Brasileiros
Nome do Parque Data de
Fundação
Localização
A Cidade da Criança 1968 São Bernardo do Campo/ SP
Playcenter 1973 São Paulo – SP
Beach Park 1988 Fortaleza CE
Beto Carrero World 1991 Penha SC
Parque da Mônica 1992 São Paulo – SP
Intermares Water Park 1993 João Pessoa –PB
Playcenter Pernambuco 1994 Recife –PE
Acquamania 1995 Vitória ES
Wet’n Wild 1996 Salvador Bahia
Hot Park 1997 Caldas Novas – GO
Paradise Water Park 1997 Porto Seguro – BA
Parque do Gugu 1997 São Paulo – SP
Terra Encantada 1998 Rio de Janeiro – RJ
Parque da Mônica 1998 Curitiba – PR
Rio Water Planet 1998 Rio de Janeiro – RJ
Magic Park 1998 Aparecida – SP
Wet’n Wild 1998 São Paulo – SP
Hopi Hari 1999 Vinhedo – São Paulo
Parque da Mônica 1999 Rio de Janeiro – RJ
O Mundo da Xuxa
12
2002 São Paulo – SP
Fonte: TRIGO (2002, p. 221-223)
11
Mais informações a respeito de importantes datas e marcos históricos na indústria turística e de parques de
diversões no Brasil encontram-se em TRIGO (2002).
12
Esse parque foi acrescentado pela autora, pois foi inaugurado após a publicação da obra de TRIGO (2002). É
pertinente que ele faça parte desta listagem, pois se configura como um importante projeto.
52
Para completar esta análise é importante pontuar como essa indústria
cresceu e como está estruturada nos tempos atuais. Atualmente, segundo fonte da
ADIBRA, existem no Brasil 30 parques de diversões, 22 parques aquáticos, 11
parques temáticos, 27 parques móveis e 105 Family Entertainment Centers (FECs),
ou melhor, Centros de Entretenimento Familiar
13
(CEF’s), como são denominados
no Brasil.
2.4. Principais Parques Brasileiros
Para uma melhor compreensão do mercado brasileiro de parques de
diversões da atualidade, faz-se necessária uma breve apresentação dos principais
empreendimentos. Essa explanação será importante também, pois esses parques
serão citados ao longo do trabalho. A descrição apresentada não segue nenhuma
ordem de classificação ou importância. A maioria das informações obtidas para
estruturar essas descrições veio dos sites de cada empreendimento
14
.
2.4.1. Hopi Hari
Esse parque está localizado na cidade de Vinhedo, a cerca de 72 km da
cidade de São Paulo, sendo essa proximidade um dos fatores da escolha do local.
13
Onde se detalha a tipologia dos parques, se explica melhor esses empreendimentos.
14
No caso dos Parques da Mônica e O Mundo da Xuxa, contou-se também com material fornecido pela
assessoria de imprensa desses empreendimentos, que foram os únicos parques que responderam a e-mails
enviados, solicitando tais informações.
53
A construção do parque ocorreu graças a uma parceria entre a GP Investimentos e
a PlayHolding S/A, detentora do Playcenter. O parque foi inaugurado em novembro
de 1999, após ter sido revisto e readaptado o conceito do projeto inicial, do parque
que seria chamado Great Adventure. Foi uma decisão estratégica, pois acreditaram
que o apelo de um parque temático seria muito maior do que um simples parque de
diversões. O conceito, então, adotado foi o de um novo país, com idioma oficial e
várias áreas temáticas que servem para contar sua história, e que são: Kaminda
Mundi, Infantasia, Mistieri, Aribabiba e Wild West. Os investimentos totais foram da
ordem de 320 milhões de reais.
É considerado o mais importante parque temático do país em virtude do seu
projeto ambicioso e de sua complexidade. Tem capacidade para cerca de 20 mil
visitantes e emprega aproximadamente 1.300 funcionários, ou habitantes, como
são chamados.
2.4.2. Beto Carrero World
É considerado um dos maiores parques temáticos da América Latina,
instalado numa área de cerca de dez milhões de metros quadrados, sendo que o
parque em si ocupa um milhão e meio de metros quadrados. Localizado na Praia
de Armação, município de Penha, Santa Catarina. Sua construção constitui-se em
um dos importantes marcos na história dos parques de diversões no Brasil. Foi
criado no ano de 1991, pela empresa JBWorld, do empresário João Batista Sérgio
Murad, que personifica o personagem Beto Carrero, inspiração do tema central do
empreendimento. O parque é dividido em sete áreas temáticas, mas conta também
54
com atrações circenses e um mini zoológico. Trabalham no parque cerca de 1300
pessoas.
2.4.3. Playcenter
Foi inaugurado em julho de 1973, na Marginal Tietê, na cidade de São Paulo,
transformando-se numa marca registrada da cidade, já tendo recebido a visita de
mais de 57 milhões de pessoas. A idéia de criação desse Parque surgiu de um
grupo de jovens empresários que decidiram implantar em São Paulo um parque nos
moldes dos encontrados em grandes cidades da Europa e dos Estados Unidos. Em
2002, iniciou-se no Parque um projeto de revitalização em toda sua infra-estrutura e
instalaram-se novas atrações, com investimentos de mais de cinco milhões de
reais. Conta, atualmente, com mais de trinta atrações para crianças, jovens e
adultos.
2.4.4. Wet´n Wild
Esse parque foi inaugurado em outubro de 1998, na cidade de Itupeva, São
Paulo, na rodovia dos Bandeirantes, próximo ao Shopping Serrazul. É o maior da
rede Wet’n Wild operando no Brasil. Na verdade, foi aberto um ano antes, mas foi
interditado pela justiça por faltar um estudo de impactos ambientais o EIA/Rima.
Outra particularidade desse empreendimento é a de que é o primeiro a ser operado
conjuntamente com a empresa franqueadora da marca, que é norte-americana,
justamente pela grandeza do projeto, e por ser estrategicamente importante para a
55
marca Wet´n Wild. Estima-se que foram investidos cerca de 47 milhões de dólares
nesse projeto.
2.4.5. Beach Park
Foi inaugurado em 1989, como sendo o primeiro parque aquático do país.
Está localizado em Porto de Dunas a 22 km de Fortaleza. É considerado um dos
maiores e mais importantes Parques Aquáticos da América Latina, sendo membro
da WWA. Pertence a um complexo que compreende, além do parque, um hotel e
um centro de convenções, que foram construídos depois de sentirem a
necessidade de uma maior infra-estrutura turística, sendo que a área do parque é
de cerca de 35 mil metros quadrados, de uma área total de 170 mil metros
quadrados.
2.4.6. Parque da Mônica São Paulo
Instalado no Shopping Eldorado, na cidade de São Paulo, um dos maiores
centros de compras da capital paulista, o Parque da Mônica São Paulo, ocupa uma
área de dez mil metros quadrados. Foi inaugurado em 1993, fruto da associação
Maurício de Sousa Produções e da RTS Empreendimentos e Participações S/A. O
Parque da Mônica foi o primeiro parque temático coberto (ou indoor) da América
Latina. É totalmente climatizado e é coberto por uma cúpula transparente que
permite a entrada de luz natural, permitindo, dessa forma, receber visitantes
durante o ano inteiro. Segundo os dirigentes, a concepção do projeto do Parque se
norteou em três conceitos modernos de lazer:
56
- temático: onde todas as atrações são baseadas nos personagens da
Turma da Mônica;
- interativo: a criança é o grande motor das atrações, que dependem de sua
energia para funcionar;
- educativo: todas as atrações são pensadas para que a criança utilize sua
energia e criatividade, aprendendo e brincando ao mesmo tempo.
O Parque da Mônica São Paulo foi o primeiro parque de diversões da
Maurício de Sousa Produções, criado em 1993. Depois desse, foi inaugurado o
Parque da Mônica em Curitiba, Paraná, em 1998, no complexo da Estação Plaza
Show numa área de seis mil metros quadrados, e, em 1999, no Rio de Janeiro, no
Cittá América Shopping, na Barra da Tijuca, sendo que este último, em janeiro de
2005, encerrou suas atividades.
2.4.7. O Mundo da Xuxa
Inaugurado em 17 de julho de 2003, o Parque "O Mundo da Xuxa" ocupa um
espaço com mais de 15 mil metros quadrados. Todo o Parque apresenta cenários e
brinquedos gigantes, personalizados com a marca da apresentadora Xuxa
Meneguel. Instalado dentro do Shopping SP Market, de São Paulo, a infra-estrutura
do parque conta com fraldário e banheiros que foram planejados e construídos
especialmente para os pais.
A área de alimentação tem cadeiras e mesas tematizadas distribuídas por
todo o parque. Um dos primeiros patrocinadores a se engajar no projeto foi o Mc
Donald’s, que conta com um cardápio diferenciado que inclui um quiosque de
pipoca e cachorro-quente. Além disso, possui também um espaço reservado
57
somente para a realização de festas de aniversário. Na saída do parque, existe a
loja onde são comercializados souvenirs e produtos licenciados.
2.5. O Mercado Atual
Informações da ADIBRA (2005) demonstram que, no Brasil, no ano 2000, a
visitação aos parques chegou a 19 milhões de pessoas, e o faturamento passou de
R$ 334 milhões para R$ 430 milhões, num crescimento da ordem de 25%. Para
atender essa demanda de consumo esse setor emprega no país cerca de dez
pessoas diretamente.
Por outro lado, o Boletim Setorial do BNDES relata que no ano de 1998 os
parques brasileiros receberam cerca de 6,5 milhões de visitantes por ano, com
faturamento proveniente de venda de ingressos em torno de US$ 120 milhões. À
título de comparação, esse mesmo estudo aponta que nos Estados Unidos, em
1996, apenas os cinqüenta principais parques americanos tiveram a visita de 147
milhões de pessoas, com receita de US$ 4,3 bilhões.
Como pode ser evidenciada por esses números, a diferença entre a indústria
desses dois países é colossal, em vários aspectos. Além disso, a quantidade de
parques existentes na América do Norte é também muito superior à brasileira.
Salomão (2000) destaca que naquele país, em todas as cidades de médio porte
encontram-se um parque do porte do Playcenter, que nos Estados Unidos são
denominados de Hyde Parks, termo que não tem uma tradução para a língua
portuguesa.
E a indústria de entretenimento representa um dos negócios mais rentáveis
da atualidade. Salomão (2000) aponta dados dos relatórios oficiais do Bureau do
58
Censo norte-americano nos Estados Unidos, nos quais demonstram que tal
atividade emprega mais de 2,5 milhões de pessoas, sendo que mais de 400 bilhões
de dólares anuais são gastos no consumo de entretenimento, ou 8,3% de todo o
orçamento doméstico norte-americano.
Aliás, os pesquisadores e seus estudos referentes a essa atividade são
unânimes em afirmar que tais empreendimentos apesar de demandarem altos
investimentos, por outro lado, propiciam desenvolvimento sócio-econômico das
regiões as quais estão instalados. Tedesco (2001) argumenta que a região onde o
parque Beto Carrero World está instalado depois de sua implantação, vivenciou um
crescimento de 7% em sete anos.
Dentro desse contexto, é valido apresentar os resultados de algumas
pesquisas realizadas pela Associação da Indústria de Viagens Norte-Americana
(TIA, 2005) com relação a parques temáticos e parques de diversões, como
parâmetro comparativo com o mercado brasileiro. Elas apuraram que no ano de
2004, 79 milhões de norte-americanos realizaram viagens com o propósito de
visitarem parques.
A pesquisa concluiu que o destino de praias ou de parques (temáticos ou de
diversões) é um mercado muito lucrativo. Esses viajantes tendem a fazer viagens
mais longas e gastarem mais dinheiro, em comparação à média geral dos turistas
daquele país. Vale ressaltar a seguinte frase dessa pesquisa, por ser bastante
esclarecedora:
Viajantes que optam pelo roteiro de Parques Temáticos gastam uma
média de $ 839 por viagem, excluindo transporte aos destinos,
comparado com apenas $ 433 da média das viagens nos Estados
Unidos. Eles também incluem estadias mais longas (5,4 noites)
comparadas com a média das viagens nos Estados Unidos (4,1
59
noites). A visita a praias ou a Parques Temáticos ou de Diversões é
sem dúvida uma viagem familiar (TIA, 2005, p. 2).
15
O fato é que os gastos com atividades de entretenimento estão fortemente
ligados com a renda disponível, e esta é muito menor no Brasil que nos Estados
Unidos. Além disso, segundo Salomão (2000) o mercado brasileiro de parques de
diversões representa menos de 2% do mercado mundial, dominado pelos norte-
americanos, que detém quase que a metade desse mercado. Ou seja,
no mundo, esse
setor movimentou em 1997, mais de US$ 14 bilhões, sendo que cerca de US$ 8 bilhões estão
concentrados somente nos Estados Unidos e Canadá, mas o mais impressionante é que a taxa de
crescimento dessa atividade na América do Norte é sempre crescente.
De qualquer forma, as informações dessa pesquisa da TIA são bastante
encorajadoras, demonstrando que os turistas que optam pelo destino de parques
tendem a ser um mercado rentável, porque gastam acima da média e realizam
viagens mais longas. Uma das possíveis explicações relaciona-se ao fato de ser um
roteiro tipicamente familiar, como também afirmado pela pesquisa, e dessa
maneira, provavelmente é uma viagem mais bem planejada e que inclui a
contratação de vários serviços, como hospedagem, transporte, alimentação, aluguel
de carros, com a principal finalidade de proporcionar conforto para a família.
Todavia, essa é uma área extremamente recente no Brasil. Como já foi
apontado, o primeiro grande parque de diversões nos moldes modernos no país
surgiu em São Paulo, na década de 1970, que foi o Playcenter. Só a título de
comparação, nesse mesmo período nos Estados Unidos, a Disney abria o Epcot
Center
16
na Flórida, um projeto ambicioso que demorou anos de planejamento e
15
Tradução livre para fins da pesquisa do trecho: “Theme parks travelers spent an average of $839 per trip,
excluding transportation to their destination, compared to just $433 on the average U.S. trip. They also included
longer overnight stays (5.4 nights) compared to the average U.S. trip (4.1 nights). Visiting a beach or a theme
park is definitely a family affair”.
16
A sigla EPCOT significa na língua inglesa: Experimental Prototype Community of Tomorrow” (ou numa
tradução livre: “Protótipo Experimental da Comunidade de Amanhã”). A configuração atual desse parque está
60
milhões de dólares para ser concretizado, fruto de um maior amadurecimento e
desenvolvimento do setor naquele país.
Já a ADIBRA foi criada somente em 1989, com o principal propósito de
fortalecer e aumentar a representatividade dessa atividade em expansão no Brasil.
Desde então é a única entidade brasileira ligada à IAAPA, com sede nos Estados
Unidos. Já a sede da ADIBRA está localizada na cidade de São Paulo e conta com
aproximadamente 180 membros, segundo suas informações.
Entretanto, foi na década de 1990 que o Brasil testemunhou a ebulição de
projetos de parques de diversões, certamente em virtude de altos investimentos
provenientes do BNDES, principalmente no ano de 1997, com um montante
investido na ordem de US$ 71,10 milhões. Com esses incentivos, projetos como o
do Beto Carrero World e do Parque da Mônica em São Paulo foram concretizados
nos anos de
1991 e 1993, respectivamente. Para complementar, cabe informar
que:
No Brasil, a indústria tornou-se um verdadeiro pólo de convergência
de negócios. Na captação de investimentos, grandes bancos como
o Garantia, Schahin Cury, Opportunity, Norchen e Bozano
Simonsen dão seu aval aos projetos de investimento, respaldados
pelos fundos de pensão como o Funcep (Caixa Econômica) e Previ
(Banco do Brasil). Novos projetos nascem com a composição de
fundos imobiliários e lançamento de debêntures, em quantias até
então impensáveis (SALOMÃO, 2000, p.32).
Vários especialistas são unânimes em afirmar que a grande evolução desses
projetos em meados dos anos 1990 foi o reflexo direto de um processo de
estabilidade econômica que o país testemunhou durante esse período, dando maior
confiança para empresários investirem em projetos de lazer. Isso porque, com uma
bem distante do sonho inicial de Walt Disney. Sua intenção era construir uma cidade real onde milhares de
pessoas pudessem trabalhar e viver com as últimas tecnologias produzidas por empresas americanas. Com a sua
morte, a idéia visionária de Disney perdeu força e o projeto original foi alterado. De qualquer maneira, esse
parque é considerado uma das obras-primas de Walt Disney.
61
moeda mais forte e estável, as famílias podiam reservar uma parcela maior do
orçamento doméstico para o consumo de produtos de lazer, que na verdade, são
considerados supérfluos, pois ao contrário dos itens de necessidade básica, como
alimentação, moradia, educação, os produtos e serviços relacionados ao lazer só
passam a ser consumidos uma vez que existe renda disponível.
É válido destacar, entretanto, que a questão da má distribuição de renda no
Brasil é um fator negativo para o setor de entretenimento, uma vez que somente
uma parcela da população tem condições financeiras para ter acesso a esses
produtos e serviços. Esse fator provavelmente explica o fato de que, segundo
Salomão (2000) os brasileiros ainda investem menos em lazer quando comparados
a outros países. Estatísticas ilustram que a participação da indústria de parques no
Produto Interno Bruto (PIB), no Brasil é, proporcionalmente, cerca de um terço
daquela observada no mercado americano.
Dentro de uma análise sócio-econômica, como já foi mencionado, o fator
renda é fundamental para compreender essa diferença de consumo do lazer entre
brasileiros e norte-americanos. É válido apontar que no Brasil tanto a renda per
capita, quanto a renda discricionária - que é a parcela de renda que resta depois
que o indivíduo ou a família possuem depois de quitar suas dívidas - é bem menor
em relação aos Estados Unidos. Esse fator pode ser uma possível explicação,
portanto, da diferença desses dois mercados no que se refere ao consumo dos
parques de diversões.
Por outro lado, o Brasil possui um enorme mercado consumidor em
potencial, pois nossa população é de cerca de 180 milhões de habitantes. E, uma
vez existindo um incremento da renda ou do poder de compra das pessoas, a
tendência é que os consumidores dediquem uma maior parcela dessa renda ao
62
consumo do lazer, tornando os negócios dos parques de diversões um mercado
bastante promissor.
Entretanto, essa análise não pode ser tão simplista, ou seja, se
aumentarmos a renda da população, os parques de diversões brasileiros sofrerão
um impacto imediato. Vê-se confirmada esta hipótese ao se notar a seguinte
afirmação:
(...) decerto, o ambiente competitivo com muitas lacunas indica
grande potencial de crescimento para esta indústria nos próximos
anos. Entretanto, o sucesso destes empreendimentos não é
garantido, já que múltiplos fatores têm influência neste processo.
Sabe-se que as condições macroeconômicas e a disponibilidade de
renda são fatores-chave para este setor. Ademais, a oferta de um
serviço de valor superior depende de excelência operacional, e esta
só é atingida com pesados investimentos em treinamento e
tecnologia (SALOMÃO, 2000, p. 34).
Assim, o próximo capítulo, traz uma análise mais consistente sobre essa
questão dos fatores que interferem na visitação dos parques de diversões. A
análise dos fatores que interferem a visitação desses empreendimentos é muito
importante para o entendimento do estágio atual desse mercado, e a partir dessa
análise é impossível pensar como deverá ser o comportamento desse mercado no
futuro.
63
CAPÍTULO 3: METODOLOGIA E
ANÁLISE DOS RESULTADOS DA PESQUISA
Conforme consta da Introdução deste trabalho, a metodologia aplicada neste
estudo envolveu dois tipos de pesquisa: uma bibliográfica, extraída de livros,
revistas especializadas, jornais, boletins informativos, artigos da Internet. Outra de
campo, com cunho qualitativo, valendo-se de poucas, mas substanciais entrevistas
com quatro importantes especialistas
17
brasileiros que são referência na área de
Parques de Diversões.
Os entrevistados foram os senhores Gyorgy Galfi, Jorge Vernaglia, Francisco
Lopes e Alain Baldacci. A seguir, apresenta-se um resumo do perfil profissional de
cada um deles. Como poderá ser observado, esses profissionais foram
selecionados a partir do critério de possuírem vasta experiência dentro do cenário
do mercado de parques de diversões e por terem vivências diferentes, sendo que
esses diversos pontos de vista foram fundamentais na montagem de um panorama
mais completo sobre a questão da visitação dos parques do país.
Gyorgy Galfi: Ocupa atualmente o cargo de Diretor Executivo da ADIBRA.
Representante nacional da IAAPA. Ex-diretor de operações do Playcenter e
Playland entre 1984 e 1991. Diretor Executivo do Parque do Gugu. Diretor Geral do
Playcenter de 2003 a 2004. Consultor de gestão empresarial para a indústria da
Hospitalidade. Um dos seus últimos trabalhos foi como consultor de inauguração
do parque O Mundo da Xuxa. Foi também por 17 anos Diretor da empresa Coca-
cola no Brasil.
17
As quatro entrevistas estão relatadas nos Anexos B,C,D e E. Vale acrescentar que todas as entrevistas foram
gravadas com o consentimento dos entrevistados, depois foram transcritas na íntegra e que são apresentadas
como Anexo. Idéias e depoimentos dos entrevistados estão sendo utilizados neste capítulo, e apontados por seus
sobrenomes.
64
Jorge Vernaglia: Engenheiro civil, líder de projeto da implantação e
construção do Parque Hopi Hari. Diretor-geral de operações desse parque durante
8 meses, no período chamado de start-up, ou seja, de início das operações.
Consultor de empresas e sócio de uma empresa de engenharia e gestão.
Francisco Lopes: Engenheiro eletricista, administrador de empresas. MBA
(Executivo Internacional) pela FIA-USP. Trabalhou vários anos em indústrias,
implantando a ISO 9000. Depois trabalhou no grupo Iguatemi, responsável pela
implantação de todos os parques da rede Fantasy Place no Brasil. Foi convidado
então pelo próprio Maurício de Sousa a assumir a direção do Parque da Mônica,
onde ficou de 1998 a 2005. Foi também presidente da ADIBRA por quatro anos e
ainda é vice-presidente do SINDEPAT.
Alain Baldacci: Engenheiro civil de formação. Proprietário de uma empresa
na área de lazer chamada Interplay, pioneira na instalação de Parques em
shopping centers, como a Playland, com a expansão na área do Nordeste. Em
1991, trouxe a representação do Wet´n Wild para o Brasil, fazendo projetos para
Salvador, Rio de Janeiro, Ribeirão Preto e São Paulo. Participou também do
planejamento do antigo Parque do Gugu, entre outros projetos. Presidente do
Conselho Mundial da IAAPA. Fundou a Associação Brasileira (ADIBRA) e do
México em 1989, sendo presidente de 1992 a 1996. Em 2001 assumiu a
presidência da Associação Mundial (IAAPA). Em 2003 fundou o SINDEPAT.
Atualmente é diretor executivo do Sindicato e membro dos Conselhos Municipal,
Estadual e Nacional de Turismo.
A coleta de dados deu-se através de uma entrevista semi-estruturada, cujo
questionário contém quatro perguntas básicas, especificadas a seguir, às quais
65
foram acrescentadas outras questões pertinentes no decorrer das conversas
informais que se fizeram presente.
1. A Disney é uma boa referência de qualidade para os Parques
de Diversões brasileiros?
2. Quais os pontos mais importantes para garantirmos o nível de
excelência de qualidade de prestação de serviços em Parques
de Diversões no Brasil?
3. Como garantir a revisitação dos Parques de Diversões no
Brasil?
4. Quais as perspectivas dessa área para o futuro? A realidade
aponta à criação de novos Parques ou à remodelação dos
existentes?
A construção deste Capítulo deu-se, portanto, com o cruzamento das
respostas obtidas com os entrevistados, embasada com o referencial teórico
estruturado nos Capítulos anteriores. O objetivo foi o de disseca
66
grande. Até hoje, esses parques balizam a criação e operação dos
empreendimentos de entretenimento em todo o mundo, inclusive no Brasil.
É por isso que a primeira pergunta feita aos entrevistados foi se realmente a
Disney pode ser considerada uma referência de parques para o Brasil, mesmo com
realidades tão distintas. Todos os entrevistados foram unânimes em afirmar que
sim, que a Disney é padrão mundial de qualidade nessa área. Baldacci
complementou dizendo que: “o nível de excelência e o nível de conceito que Disney
desenvolveu há mais de 50 anos, tornou-se paradigma para a indústria mundial”.
E se Disney é o parâmetro máximo de comparação, é importante conhecer
um pouco melhor de seu histórico e atuação, para desta forma, levantar aspectos
que podem ser copiados e comparados. Especialistas na área são também
unânimes em dizer que compreender a figura de Walt Disney como empresário que
vislumbrou todo seu império é fundamental para entender o sucesso de seus
parques. Galfi, inclusive, o chamou de guru.
Walt Disney nasceu em 1901 em Chicago, nos Estados Unidos. Foi
desenhista, produtor e diretor de desenhos animados. “Branca de Neve e os Sete
Anões”, de 1937, foi o primeiro desenho animado da história, mas Walt Disney
ganhou fama mesmo com a criação de Mickey Mouse, o seu personagem mais
famoso.
18
No livro “Feitas para Durar – Práticas bem-sucedidas de empresas
visionárias”, os autores Collins e Porras (1995) descreveram quais devem ser as
principais práticas das melhores empresas do mundo, líderes em seus setores,
para passarem à frente de seus rivais. Essas empresas são descritas por tais
18
A criação do personagem Mickey Mouse tem uma história interessante. Diz-se que Disney se inspirou num
pequeno rato que habitava seu apartamento alugado quando durante certo tempo morou em Nova Iorque,
tentando se estabelecer como desenhista. Esse rato alimentava-se de seu resto de comida e era quem lhe fazia
companhia durante uma fase sombria de sua vida. Ele viu nesse animal a inspiração para criar o Mickey Mouse
e assim criar todo o seu império.
67
autores como as melhores das melhores, ou empresas visionárias. No caso, a Walt
Disney Company é comparada com a Columbia Pictures no setor de
entretenimento.
No caso de Walt Disney, fica claro que Walt usou sua imaginação e seu
talento pessoal para criar a Disney” (COLLINS E PORRAS, 1995, p. 67). Sua
dedicação e empenho à empresa perduraram durante toda sua vida, e com relação
à sua preocupação com o legado da empresa, “Walt ia morrer, mas a capacidade
da Disney de alegrar as pessoas, deixar as crianças felizes, causar risos e
lágrimas, não morreria junto”. (COLLINS e PORRAS, 1995, p.68).
Não foi, a princípio, fácil a transição da alta cúpula administrativa da Walt
Disney Company, após a morte de seu criador: Walter Elias Disney, em 1966, pois
este era o gênio criador e inspirador de todos os funcionários, e isto deixou os
executivos inseguros na tomada de decisões. A empresa viveu um momento crítico
na década de 1980, até que Michael Eisner e Frank Wells, assumiram a direção e
mudaram a estratégia da companhia, fazendo-a crescer e prosperar, o primeiro
como chairman e chefe-executivo e o segundo como presidente e chefe de
operações (NADER, 2003).
A figura de Walt Disney foi muito carismática e é ainda hoje usada na
empresa como modelo e referência, pois na verdade, todo esse império surgiu em
função da história de sua vida. Disneylândia nada mais é que a Terra de Disney
(numa tradução literal), onde ele recriou os locais mais importantes e marcantes
onde viveu, principalmente durante sua infância. Por exemplo, o trenzinho que
circula no parque Magic Kingdom (Reino Encantado) é uma pequena réplica do
trem que passava por sua cidade natal, Marceline.
68
E é justamente nesse aspecto que Vernaglia defende sua tese de que a
empresa Disney não é comparação em termos do que o próprio Walt Disney define
como “encantamento”, pois ela tem um encantamento próprio, que se refere à
própria vida de Walt Disney, ou seja, “Disney resolveu contar sua vida através de
um parque, e isso não tem comparação”. Uma prova da importância que dão para a
criação da magia é o fato da empresa possuir um departamento chamado de
Imagineering Division, união das palavras Imagination (Imaginação) e Engeneering
(Engenharia), responsável pelo design arquitetônico dos parques.
Depois desse, todos os demais parques tentaram copiar a idéia da
tematização, procurando “vestir” (termo usado por Vernaglia) um tema em suas
atrações, o que em muitos casos, citando o Hopi Hari como exemplo, não surtiu o
efeito desejado, pois essa narrativa adotada ao parque foi inventada sem base num
personagem ou fato conhecido pelo público. E como não existe uma ligação, um
apelo emocional, como nos parques da Disney, a tematização perde sentido e
importância. Em determinada pesquisa de Mestrado sobre o Hopi Hari confirma-se
essa premissa ao detectar que: “Somente 33% dos entrevistados conheciam os
personagens do Parque Hopi Hari, que são os personagens do Vila Sésamo, na
área da Infantasia”
19
(ALCOBIA, 2004, p. 104).
Vernaglia fala com a propriedade de um profissional que acompanhou a
construção e operação do Hopi Hari nos primeiros oito meses de sua implantação.
Ele afirma que tal projeto é o melhor exemplo brasileiro que buscou contextualizar e
dar conceito a um parque. O problema, disse ele, é que todas suas atrações foram
compradas de uma empresa, já com típicas áreas de parques americanos, como o
Velho Oeste, que pouca relação têm com a cultura brasileira, e áreas que, segundo
19
Infantasia é o nome da área dedicada a atrações infantis dentro do Hopi Hari.
69
Vernaglia, mal se comunicam entre si. E quando o consumidor não se identifica ou
não reconhece a tematização de um parque, essa estratégia não surti o efeito
desejado em termos de mercado, que é o de agregar conceito, e
conseqüentemente, atrair mais público.
Conforme Vernaglia, no Brasil existe potencial de construção de parques
temáticos usando as figuras de Maurício de Sousa e de Monteiro Lobato, devido ao
fato de estarem muito próximos e vivos na cultura brasileira, e porque possuem um
vasto manancial de personagens que podem ser explorados em diferentes
atrações. O Parque da Mônica, segundo ele, apesar de ser também um parque
temático, e de propriedade do próprio Maurício de Sousa, adotou um conceito
diferenciado e não pode ser comparado com a estrutura de um Hopi Hari ou de um
Beto Carrero World, como será melhor explicado adiante.
Esse especialista lembra que o fato de estar presente na mídia é um fator
preponderante para deixar os personagens “vivos” na mente das pessoas. O
próprio Walt Disney tinha um programa de televisão que passava no mundo inteiro,
chamado Disneylândia, onde ele mesmo apresentava, e fez com que gerações e
gerações conhecessem seus parques e tivessem vontade de visitá-los.
Outra idéia de Walt Disney, que também foi copiada, era a de criar um
parque voltado às famílias, onde pais e filhos pudessem brincar juntos. Além disso,
ao contrário dos parques de diversões de seu tempo, deveria ser limpo e seguro, e
mais do que isso, sua intenção era a de fornecer momentos de fantasia, além da
diversão aos visitantes. E para que esse sonho fosse viabilizado, acreditava que os
visitantes não podiam ter contato nenhum com o mundo exterior, o mundo real,
para que a fantasia não fosse quebrada enquanto estavam dentro dos parques.
70
Assim, a fórmula de sucesso dos parques temáticos da Disney foi criada:
muita importância ao paisagismo, ambientes impecavelmente limpos, investimentos
em moderna tecnologia, funcionários atenciosos e, principalmente, toda magia e
encanto de seus personagens em todas as atrações, distribuídas num imenso
cenário, cujo um dos principais objetivos é o de transportar os visitantes a outro
tempo e lugar. Numa linguagem mais mercadológica, é proporcionar tantas
sensações que as pessoas percam a noção de tempo, ficando assim mais tempo
nos parques, e conseqüentemente, consumindo mais
20
.
Lopes acredita que além do padrão de qualidade superior, os parques da
Disney têm a “magia” que outras empresas não têm, afirmação que vai muito de
encontro com as convicções de Vernaglia. E, dentro desse contexto, cabe a
seguinte afirmação, que relaciona a estratégia da criação de um ambiente de magia
nos parques temáticos como uma forma de oferecer hospitalidade aos visitantes:
Percebe-se que realmente se trabalha com magia em um parque
temático: uma palavra não muito utilizada no mundo de negócios,
nem no acadêmico. Mas, é, sobretudo isso que o parque temático
vende – essa magia diluída em todos os fatores que compõem as
sensações da hospitalidade. Pode-se até fazer uma correlação
entre as duas palavras – magia sendo sinônimo de hospitalidade
(ALCOBIA, 2004, p. 114).
Para Connellan (1998), o encantamento em torno dos parques da Disney
existe justamente porque a magia é levada a sério nessa empresa, a qual afirma ter
obsessão pelos detalhes. “Walt Disney é o exemplo mais bem-acabado de alguém
que ousou sonhar”. (CONNELLAN, 1998, p. 5). Cita ainda este autor diversos
20
É válido destacar que essa fórmula de negócios funcionou tão bem nos Estados Unidos, que foi adotada por
outros empreendimentos. Um dos exemplos mais notórios são os cassinos localizados em Las Vegas, no Estado
de Nevada, popularmente conhecidos como Parque de Diversões de Adultos. Isso porque, esses cassinos
oferecem uma gama tão grande de atrações que os turistas perdem a noção de tempo quando ali estão.
Conseqüentemente, acabam ficando mais tempo e consumindo mais.
71
exemplos de detalhes que fazem a diferença estão presentes em todos os parques
da Disney. A idéia apresentada por ele, defendida pelos dirigentes desses
empreendimentos, é a de que se o visitante tiver algo novo para descobrir todas as
vezes que visitar o parque estaria ainda mais disposto a retornar.
Exemplos inusitados dessa preocupação por detalhes é o fato de que a tinta
dourada usada para pintar o carrossel do famoso parque Magic Kingdom (ou Reino
Encantado) é à base de pó de ouro de 23k, ou o fato de que os tecidos usados
numa determinada atração de cunho histórico são fabricados usando velhos
métodos, bem como os pontos usados para costurá-los. Essas questões ajudam a
entender porque os parques da Disney são referência em qualidade nessa área.
Entretanto, conforme lembrou Vernaglia, quando o Hopi Hari foi inaugurado,
também faziam uma manutenção diária, consertando e preocupando-se com
pequenos detalhes, e por isso, afirmou que quando esse parque abriu estava num
nível muito alto de excelência em termos de padrões internacionais. Hoje, acredita
que está num nível de 70% do que poderia ser considerado um nível de excelência,
e a principal explicação para essa questão é simples: economia.
Isto é, quando um parque precisa cortar gastos, essa economia acaba
refletindo-se na qualidade, pois alguns itens são privilegiados em detrimento de
outros. Os dirigentes dos parques têm consciência e desejam manter seus parques
impecáveis, mas em função de um orçamento mais enxuto, precisam fazer
escolhas, como, por exemplo, preferem investir na manutenção operacional
garantindo a segurança das atrações, do que investir na pintura ou cuidado diário
dos jardins. “Economiza-se onde a percepção do brasileiro não é grande
(VERNAGLIA).
72
Com relação a essa filosofia da Disney, há também o outro lado dessa visão,
que é a questão dos negócios que regem a organização:
Só que não se pode esquecer que um parque temático é um
empreendimento baseado na magia e na fantasia. É óbvio que o
principal motivo do parque temático existir é porque atrás dele existe
uma corporação que visa ao lucro com seus negócios. E se o
fundador queria um ambiente seguro, limpo e organizado, para que
seus convidados se divertissem, esquecessem um pouco da vida
externa, a corporação atendeu a seus pedidos. Mesmo que os
fatores subliminares do negócio, de gerar lucro, estejam
comandando tudo (ALCOBIA, 2004, p. 21).
É importante destacar que, como raciocina Nader (2003), uma das principais
razões do sucesso dos parques da Disney está no fato de que existe uma poderosa
indústria cinematográfica muito atuante e forte, e que dá sustentação e
principalmente, perpetua a fantasia e encantamento dos personagens. Além disso,
são milhares de produtos de merchandising
21
comercializados em todo o mundo, o
que reforçam as marcas e, mais, garantem que os personagens sejam conhecidos
de geração em geração. Essa estudiosa da Disney apresenta os seguintes dados:
A Disney Consumer Products controla, só nos Estados Unidos,
quase três mil empresas que fabricam mais de quatorze mil
produtos licenciados em mais de cinqüenta países, com uma venda
anual de US$ 300 milhões e, em constante crescimento (NADER,
2003, p. 67).
Para reforçar essa tese da amplitude e interelacionamento dos negócios da
Disney, bem como de outras grandes empresas no setor, como a Universal, que se
beneficiam de um estúdio cinematográfico para dar sustentação aos seus parques,
vale lembrar que:
21
Outra estratégia de merchandising utilizada e muito eficiente, é que na saída de todas as atrações dos parques
da Disney, o visitante obrigatoriamente depara-se com uma loja que vende uma enorme quantidade de produtos
confeccionados usando aquela atração como tema. Assim, incentiva-se a compra através do impulso, onde o
consumidor ainda envolvido emocionalmente com aquela atração tem uma propensão muito maior a gastar,
gerando uma enorme receita à operação do negócio.
73
A matéria-prima principal dessas grandes corporações é o
“conteúdo” por elas criado ou licenciado: um conjunto de marcas,
personagens (reais ou fantásticos) e histórias que são
continuamente materializadas em diversas linhas de negócios, na
forma de produtos e serviços que promovem continuamente uns aos
outros (SALOMÃO, 2000, p. 15).
Aliás, cabe dizer que a Disney já construiu parques de diversões, além da
Flórida e da Califórnia, nos Estados Unidos, na França, China e Japão, numa clara
estratégia de expandir negócios e de disseminar a cultura norte-americana em
vários lugares do planeta. Com exceção da Euro Disney, na França, que teve
muitos problemas durante o período de sua implantação, os parques na China e no
Japão dão um resultado muito positivo à empresa. Aliás, o sucesso desses parques
é tão grande que fez com que a empresa estudasse a criação de mais parques
nesses dois países.
O parque japonês, por exemplo, a Tóquio Disneylândia é o que mais
recebe visitantes entre todos eles, com 17,4 milhões de turistas, 2,2
milhões a mais que o Magic Kingdom na Flórida, que nos Estados
Unidos é campeão de público por três anos consecutivos. No total,
os cinqüenta maiores parques nos Estados Unidos receberam
juntos, em 1999, 170,5 milhões de pessoas (NADER, 2003, p. 92).
Um outro ponto que merece destaque com relação aos ensinamentos da
Disney, e que foi especialmente citado por Galfi, é que o negócio de parques de
diversões é um negócio de pessoas. Esse argumento é comprovado a partir do
estudo da apostila Disney Traditions
22
, utilizada pela Disney University, empresa
22
Segundo essa apostila, sete são as diretrizes para o atendimento aos visitantes: Preserve a experiência
“mágica” do visitante (Preserve the “magical” guest experience); Mantenha contato visual e Sorria (Make eye
contact and smile); Cumprimente e Dê as boas-vindas a Cada e Todo Visitante (Greet and Welcome Each and
Every Guest); Procure pelo Contato com o Visitante (Seek Out Guess Contact); Forneça Serviço de Reparo
Imediato (Provide Immediate Service Recovery); Mostre uma Linguagem Corporal Apropriada todo o tempo
(Display Appropriate Body Language at All Times); Agradeça Cada e Todo Visitante (Thank Each and Every
Guest).
74
criada pelo grupo da Disney para treinamento dos funcionários, ou como eles
preferem chamar de membros de elenco.
Isso porque, eles acreditam que toda vez que um parque de diversões abre
suas portas, os visitantes devem ser transportados para esse mundo de magia, que
foi concebido como um grande espetáculo, e para isso, cada funcionário deve se
comportar como um membro do elenco desse show. Por isso, dedicam grande
atenção ao processo de seleção, recrutamento e treinamento dos funcionários. A
seguinte frase extraída dessa apostila citada confirma a visão da empresa: “Você
pode sonhar, criar, desenhar e construir o mais maravilhoso local no mundo... mas
ele necessita de pessoas para transformar o sonho em realidade”.
23
Outra frase
interessante encontrada é quando afirmam aos funcionários: “Você faz a Magia!”
24
A Disney ainda foi pioneira no emprego de fibras óticas e sistemas
computadorizados de grande porte, mas o grande destaque nos
projetos dos parques da Disney, e que começou com a Disneyworld,
inaugurada em 1971, foi a construção de túneis subterrâneos
especialmente desenhados para reunir áreas operacionais e de
manutenção (NADER, 1998, p.40).
Conforme a autora, embaixo desses parques existe uma enorme infra-
estrutura, como a de qualquer grande empresa. É como se o parque estivesse no
segundo andar de um edifício, e no primeiro funcionasse essa parte administrativa.
Entretanto, o principal objetivo dessa estrutura é garantir que o visitante não tenha
nenhum contato com a realidade quando estiver aproveitando seu dia no parque,
para não quebrar a magia. Os “membros do elenco” entram nos parques através
de passagens secretas, imperceptíveis ao público. Destaca-se também o figurino
23
Tradução livre para fins da pesquisa da frase: You can dream, create, design and build the most wonderful
place in the world...but it requires people to make the dream a reality.
24
Tradução livre para fins da pesquisa da frase: You Make the Magic!
75
dessa empresa, considerado um dos maiores e mais completos do mundo.
Complementando esse raciocínio, afirma-se que:
Mas a principal revolução introduzida foi a ênfase no treinamento e
formação interna de seus funcionários. Com a criação da Disney
University, a empresa criou um padrão de qualidade de prestação
de serviços que se tornou modelo para todos os setores intensivos
de mão-de-obra em todo o mundo (NADER, 1998, p.41).
Por outro lado, mesmo com tanta atenção ao treinamento, a dura realidade
de um trabalho repetitivo, do cansaço físico, do trabalho em finais-de-semana e
feriado, dos problemas de saúde, podem comprometer a “magia”. Vernaglia
pondera que muitos dos trabalhadores da Disney são imigrantes e aposentados,
que por falta de opção e necessidade, sujeitam-se a salários mais baixos, pagos
por essa empresa, criando um problema salarial grave na cidade de Orlando, mas
essas questões ficam quase sempre encobertas. Acredita que, para algumas
funções, é possível transformar o funcionário em personagem, mas para outras,
como um “chapeiro”
25
, fica mais difícil, tornando o sorriso necessário, um grande
desafio.
Vernaglia acredita ainda que, no caso de alguns parques brasileiros, como o
Hopi Hari, que contrata um grande contingente de pessoas, sendo que a maioria
desses trabalhadores é da própria região, para conseguir o componente da
motivação, é preciso compreender e respeitar o histórico e diferenças culturais
desses trabalhadores, pois assim aumenta o comprometimento de cada um com o
negócio.
Galfi defende a opinião de que em primeiro lugar é necessária uma
automotivação. É preciso, segundo esse especialista, que o funcionário goste de
25
Nome dado ao funcionário que exerce na lanchonete a função de cuidar da chapa que frita os hambúrgueres,
daí o nome popular de chapeiro.
76
gente, de interagir, de relações humanas, pois nenhuma atividade humana funciona
sem entusiasmo e comprometimento. Entretanto, para Galfi há carência no Brasil
de profissionais comprometidos, com amor à sua profissão e com conhecimento
profundo de seu serviço. Na opinião de outro autor:
Ainda na sua infância, a indústria de parques enfrenta uma séria
dificuldade: a falta de profissionais qualificados para gerenciar e
operar os empreendimentos que estão em fase embrionária.
Enquanto nos Estados Unidos existem cerca de 500 cursos de
graduação em lazer e algo em torno de 250 cursos de pós-
graduação nessa área, há escassez de instrumentos que permitam
o desenvolvimento de conhecimento científico de lazer em território
nacional (SALOMÃO, 2000, p. 97).
É preciso, todavia considerar que para se atingir um nível de excelência de
prestação de serviços, de acordo com os padrões da Disney, a carga de
treinamento deve ser elevada, pois como ressaltou Lopes, a rotatividade é alta e a
maioria dos trabalhadores de parques de diversões no Brasil é composta de jovens
de primeiro emprego, que precisam de bastante treinamento, e treinamento custa
caro, pois deve ser constante para surtir resultado; todavia, infelizmente, é um dos
primeiros itens que os executivos cortam quando precisam reduzir gastos.
E o comprometimento do funcionário surge a partir do momento que sente
que faz parte de uma organização próspera, quando é adequadamente
remunerado, e, principalmente, quando percebe que pode fazer a diferença em
fazer com que um dia num parque de diversões seja uma das experiências mais
agradáveis na vida de um visitante.
Assim, pode-se dizer que um dos principais entraves para o desenvolvimento
dos parques brasileiros seja de ordem financeira, e que por sua vez acaba
refletindo na remuneração e contratação da mão-de-obra, fatores que serão melhor
77
descritos adiante, e por isso não é possível acreditar que o brasileiro seja menos
capaz profissionalmente que outros povos.
Ao contrário, o brasileiro tem características de criatividade, simpatia,
flexibilidade, ou seja, tende a ser bastante hospitaleiro, o que é essencial para esse
negócio. Além disso, é fato também que todos os anos centenas de estudantes
brasileiros, principalmente dos cursos de turismo, vão trabalhar na Disney por
alguns meses do ano, como parte de um programa internacional daquela empresa,
e a maioria desses estudantes participam desse programa como uma forma de
terem uma vivência profissional internacional, e só não trabalham em parques no
Brasil devido à baixa remuneração.
Após essa análise sobre a atuação da Disney e seus principais
ensinamentos, e como se tornou referência no setor, o texto prossegue com as
variáveis que asseguram um padrão de qualidade aos parques, focalizando o caso
brasileiro.
3.2. A Qualidade da Prestação de Serviços nos Parques de
Diversões
78
retorno do visitante. Entretanto, as respostas foram muito mais complexas do que
se suponha anteriormente.
Na verdade, o termo qualidade é muito abstrato, e por isso, muito difícil de se
conceituar, o que provavelmente explica as diferentes respostas obtidas. Tomando
como comparação os pressupostos do marketing turístico, uma vez que é possível
considerar que os parques de diversões fazem parte da oferta turística de um
determinado destino turístico, e também se constituem numa forma de prestação de
serviço, vale destacar que no cerne dessa questão está o consumidor, ou o
visitante de um parque de diversões.
Isto equivale a dizer que o que importa é a qualidade por ele valorizada e
percebida. Segundo Ruschmann (1990), o cliente compra, na verdade, promessas
de satisfação. Um mercado se desenvolve em termos de prestação de serviços de
qualidade quando existe concorrência, pois numa competição saudável, todas as
empresas buscam se superar para atrair a atenção e a fidelização dos clientes.
Por isso, quando se afirma que o mercado brasileiro de parques de diversões
está num processo de amadurecimento é porque as empresas foram criadas muito
recentemente, e a concorrência não está bem estabelecida. Dessa forma, fica difícil
para o brasileiro estabelecer padrões de comparação. “A própria competição
estabelece o padrão de qualidade. O mundo é dinâmico. Todo mundo quer oferecer
algo melhor, algo mais seguro, algo mais gostoso” (LOPES).
Entretanto, os brasileiros correspondem a um dos principais grupos de
estrangeiros que visitam os parques da Flórida nos Estados Unidos, e, dessa
forma, poderiam usar o padrão de qualidade que vivenciam nesses parques e
buscar um padrão semelhante no Brasil. Baldacci, todavia explicou que se
considerando quantos habitantes existem no Brasil e quantos já visitaram os
79
parques da Disney que, como já foi demonstrado representam a principal referência
de qualidade na área, tem-se uma parcela muito pequena de pessoas.
Ele fez o seguinte cálculo: considerando que o Brasil envia cerca de cem mil
turistas por ano, multiplicando por vinte anos, considerando o índice de revisitação,
pode-se dizer que cerca de dez milhões de brasileiros já foram à Disney, nos
Estados Unidos. Além disso, explica que a maioria dessas pessoas pertence a
uma classe social superior de renda, mas os parques de diversões são feitos para
atenderem às massas, disse ele, ou seja, à classe média, por ser mais numerosa.
Dessa forma, Baldacci defende a idéia de que a Disney não é percebida pela
maioria dos brasileiros como referência de qualidade, o que faz muito sentido. Por
outro lado, é um fator positivo para os parques brasileiros, que têm a oportunidade
de desenvolver seu próprio padrão de qualidade para seu público, pois buscar a
imitação da Disney seria muito dispendioso, e os parques do país não possuem os
mesmos recursos financeiros.
Nesta questão de qualidade, Vernaglia esclarece que é fundamental fazer
uma clara separação entre o que representam os parques temáticos e os parques
de diversões. Se parques de diversões formam um termo genérico da atividade,
conforme já apontado anteriormente, os parques temáticos ao usarem um tema
central para montarem suas atrações, buscam um conceito diferenciado para se
sobressaírem no mercado. E todos os entrevistados concordam em dizer que neste
aspecto, o conceito, o encantamento e a magia criada pelos parques da Disney é
muito difícil ser copiado em termos de padrão de qualidade.
Para Vernaglia a motivação das pessoas de visitarem um parque de
diversões, principalmente o temático, pode ser dividida em duas fases. A primeira é
a do encantamento, aquela sensação sentida, principalmente, pelas crianças ao
80
saírem de férias, quando a preparação, o pensar e o sonhar com a viagem são,
muitas vezes, mais interessantes e prazerosos do que a própria viagem. Mas, essa
fase do encantamento é muito subjetiva. A segunda fase é a da experiência. É o
encantamento que atrai o visitante ao parque, mas é a experiência positiva que faz
com que o visitante queira retornar, ou como é comumente denominado no
mercado, de revisitar, e é por isso que esse negócio é também chamado de repeat
business (ou o negócio da repetição). “A experiência faz com que você volte porque
tudo o que você sonhou se transformou em realidade” (VERNAGLIA).
Compreender bem essa questão é particularmente importante nesse
negócio, pois o que se vende é uma vivência. O produto é abstrato, e conforme
Lopes esse produto vai sendo entregue na medida que vai sendo consumido. Ao
ser indagado como se encanta alguém, Vernaglia respondeu que essa questão é
extremamente complexa, remetendo a questões antropológicas e até mitológicas,
porque são desejos reclusos individuais.
Por isso, não se busca encantar um tipo de pessoa, mas alguns tipos, o que
em marketing é denominado de segmentação, ou de nichos de mercado. Explicou
que os principais nichos dos parques são formados por famílias, pelos caçadores
de aventuras (que buscam emoção e adrenalina), e grupo do custo-benefício (são
aqueles que a questão financeira é importante e fazem contas antes de optarem
pela visita), entre outros, que certamente varia de um empreendimento a outro.
Vernaglia disse também que não conseguiria listar itens que podem definir,
principalmente a questão do encantamento. Usou como exemplo o Instituto
“Homem Americano” no Piauí, a 560 km de Petrolina, onde existe o maior sítio
arqueológico do mundo de pinturas rupestres. Os administradores o procuraram
81
porque queriam fomentar a visitação, que se resumia a não mais de 300 pessoas
por ano.
Todavia, em função da distância e do difícil acesso, muito provavelmente
existe no mundo somente essa quantidade de interessados, que em função do seu
“encantamento” com o tema sujeitam-se a pagar e a enfrentar os desafios de se
chegar até esse local. Assim, falar de encantamento é difícil e complexo. O certo é
que ele precisa existir, mas não existem fórmulas prontas que garantam que o
visitante vá até o parque.
Entretanto, quando fala da experiência, aponta alguns dos muitos
componentes que contribuam para essa experiência positiva num parque de
diversões. Um dos mais importantes segredos, disse, é o que o visitante tenha a
menor percepção possível do mundo exterior, conforme os ensinamentos dos
parques da Disney, porque para garantir o encantamento é preciso quebrar a
relação tempo-espaço. Aliás, evitam que qualquer manutenção, com exceção da
limpeza, seja realizada durante o horário de funcionamento do parque.
Outro item citado é a segurança, que segundo Vernaglia, todos buscam uma
experiência saudável e segura, principalmente nos parques onde têm grande oferta
de atrações nos quais o visitante busca a “adrenalina”. Além deste, a limpeza, o
acolhimento e o conceito também foram citados.
Para esclarecer o que significa o termo “conceito”, vale tomar a Disney
novamente como exemplo. Nader (2003) apresenta que o conceito dos quatro
principais parques da Disney são: “Fantasia” para o Magic Kingdom; “Descoberta”
para o Epcot Center; “Ação” para o Disney MGM; e “Aventura” para o Animal
Kingdom. O conceito pode, portanto, se resumir a uma palavra, expressando qual
a principal sensação que o visitante vivenciará com a visita. O conceito é uma
82
imagem formada que exprime o principal significado de um local. Lynch (1997)
desenvolveu uma expressão cunhada de “imagibilidade”, que pode ser
compreendida como a capacidade de um determinado local evocar imagens
mentais no observador. Essa teoria pode ser um interessante ponto de partida no
sentido de fornecer ferramentas aos parques para a criação ou aprimoramento do
seu conceito.
Assim, em sua análise, Vernaglia separa claramente os fatores importantes
numa visitação e na revisitação, o que parece ser uma visão bastante interessante
e consistente.
Já Lopes, com uma vasta experiência em ISO 9000, um sistema que certifica
a qualidade em empresas, garante que para uma empresa ter qualidade não basta
ser segura ou ter um bom corpo diretivo. A empresa, primeiro precisa ter a noção
de que se ela quer ter qualidade, precisa estar na sua filosofia, na sua liderança, na
política, na sua missão, nos seus valores, e o mais importante, ser uma empresa
dirigida ao mercado, pois só através do cliente satisfeito vai ter sucesso, apregoa.
Depois dessa visão conceitual, vêm questões como segurança, limpeza,
atendimento, manutenção, como itens importantes para assegurar a qualidade.
Um parque de diversões, portanto, precisa ser gerenciado como qualquer
outra grande empresa, com muita seriedade, com planejamento estratégico, com
bons profissionais, estabilidade gerencial, atendendo todos os componentes ou
stakeholders envolvidos no processo, que além dos clientes, engloba também os
acionistas, os funcionários, a comunidade, o governo, a imprensa, para citar os
mais importantes.
A agravante desse setor, alerta Baldacci, é que um parque de diversões é
um tipo de empresa das mais complexas do mundo. Usou a analogia de administrar
83
uma cidade, com preocupações de instalações de água, esgoto, central elétrica,
limpeza, brigada de incêndio, logística de abastecimento de alimentação, serviço
médico, proteção contra intempéries da natureza, como ventos e chuvas fortes, etc.
De uma forma bem humorada, Galfi ao explicar a dificuldade de administrar tais
empreendimentos, afirmou que: só é preciso cuidar de 500 mil pequenos detalhes.
Se você cuida de 499.998, aqueles dois pequenos detalhes são capazes de
comprometer todo o resto”.
Outra característica da prestação de serviços, que merece ser destacada,
relaciona-se ao fato de que é formado por uma série de componentes que se
relacionam e se complementam. “Para o turista, o produto engloba a experiência
completa, desde o momento que sai de casa para viajar, até o retorno
(RUSCHMANN, 1990, p. 26). Pode-se dizer que a visita a um parque começa antes
mesmo do visitante entrar no estacionamento do empreendimento. Os especialistas
da área defendem que a experiência da visita começa no momento em que o
cliente levanta informações a respeito daquele parque. Envolve, portanto, o
atendimento telefônico, a sinalização, a cordialidade dos funcionários, além, é claro,
da visita ao parque em si.
É por isso que Baldacci respondeu que na sua visão, a qualidade poderia se
resumir em apenas uma palavra: a Qualidade da Experiência. Defende que de
nada adianta um parque estar impecavelmente limpo, se os funcionários não forem
solícitos. Ou então, os funcionários serem muito bem preparados e treinados, mas
se o parque não tiver uma eficiente manutenção, as atrações quebrarão ou pararão
no meio do dia, o que certamente pesará negativamente na experiência.
Assim, todos os itens, segundo esse especialista, são igualmente
importantes, e a qualidade aparecerá quando todos os detalhes forem pensados e
84
cuidados. Usando sua própria frase: “Não se pode negligenciar nenhum desses
aspectos se quiser atingir excelência”. Portanto, pode-se afirmar que a qualidade se
manifesta através de vários aspectos, inclusive o preço, pois se for inacessível ao
público-alvo, de nada adiantará uma experiência maravilhosa, se o consumidor não
tiver acesso ou se sentir ultrajado.
A opinião de Galfi distancia-se um pouco dessas apresentadas acima. Esse
experiente “parqueiro” como ele mesmo se autodenomina, coloca bastante ênfase
nos funcionários, se os parques quiserem atingir a excelência nos negócios,
sempre utilizando a Disney como padrão de qualidade superior. De dez pontos
citados, sete se referem aos funcionários, listando aspectos como seleção e
recrutamento, treinamento contínuo, construção de confiança mútua entre
colaboradores e corpo diretivo, boa comunicação interna, reconhecimento dos
talentos, oportunidades de desenvolvimento e segurança, envolvendo o público
interno e externo. E, por último, é preciso transformar a capacidade em
competência, ou seja, de nada adianta aplicar os nove itens, que também incluem
manutenção e gerenciamento de crise interna, se o parque não tiver resultado.
Esse ponto levantado é muito importante em termos de negócios, pois a
qualidade deve existir e ser percebida para agregar valor ao cliente, e assim,
resultar de forma concreta na melhoria financeira das empresas, o que Galfi se
referiu a resultado. É por isso também que os parques privilegiam investir na
qualidade da operação que é percebida pelo seu público-alvo.
Defende que é um negócio de pessoas feito para pessoas. Acredita também
que o grande desafio é manter o nível alto de satisfação dos visitantes, ou de
sedução, em todos os setores, todo o tempo. “O século XXI além de ser o século
das comunicações, é também o século dos espetáculos” (GALFI). E, segundo a
85
cultura das organizações Disney, para surtir o efeito desejado, de que os visitantes
percebam a qualidade, o amor e entusiasmo que Walt Disney transmitiu a toda sua
organização é relembrado e reforçado diariamente, na crença de que se os
funcionários forem bem tratados, eles tenderão a seguir o mesmo padrão com os
visitantes.
Para encerrar esse raciocínio, é válido apresentar o exemplo do Programa
de Qualidade do Parque da Mônica, descrito por Lopes, e que foi montado e
aplicado em sua gestão, e pode certamente ser entendido como um bom exemplo
da adaptação brasileira aos conceitos de qualidade, em virtude de todas as
limitações financeiras que os parques brasileiros enfrentam.
É importante dizer que o Parque da Mônica de São Paulo é um dos mais
antigos, conhecidos e visitados do Brasil, e muito provavelmente esse recorde é
fruto de uma administração eficiente. O Programa foi chamado de “AAA”, cujas
letras se referem à Atração, Ambiente e Atendimento. Com relação às Atrações,
explica Lopes, elas precisam ser montadas e mantidas de modo a encantar o seu
público-alvo, que no caso específico são as crianças.
Já o Ambiente precisa ser concebido para oferecer uma infra-estrutura
adequada ao seu tamanho, público e ser funcional, de modo a ser agradável e fazer
com que o cliente permaneça no parque o maior tempo o possível. O terceiro “A”
se refere ao atendimento, em termos de não exceder a capacidade de visitantes
diária, em termos de cortesia e de padrão de informação passada ao cliente.
Além disso, para que esse Programa fosse implantado com sucesso,
desenvolveram uma clara Política de Recursos Humanos, com avaliação de
desempenho, com reconhecimento daqueles funcionários que se destacassem, e
política de cargos e salários, ações que podem ser realizadas por empresas de
86
todos os portes, e o mais interessante é que esse Programa surtiu efeitos em
termos de retorno dos clientes. Além disso, o parque foi reconhecido dois anos
consecutivos com o prêmio de melhor parque brasileiro em shopping centers.
Segundo as palavras do próprio LOPES:Não precisa ser uma Disney para ter
qualidade!”.
Ao se analisar o mercado brasileiro, Lopes disse que, por ser um segmento
novo, os parques tiveram erros e acertos. Aquelas empresas que não agüentaram
esses erros fecharam ou mudaram de atividade. As que permanecem no mercado,
estão sempre se reinventando buscando novas soluções e alternativas adaptadas à
realidade brasileira. Conseqüentemente, como afirmou, nos remete à seguinte
pergunta, usando como base a velha história do ovo e da galinha: “Não tem cultura
porque não tem parque, ou não tem parque porque não tem cultura?”. Usando esta
linha de raciocínio, escreveu-se o próximo item.
3.3. A Questão Cultural e sua influência na Visitação dos Parques
Muitos especialistas e estudiosos na área apostam que um dos principais
problemas enfrentados pelos parques, no Brasil, e que acarretam tantas
dificuldades financeiras, seja uma questão de ordem cultural. Ou seja, uma
suposição é que os brasileiros não têm o hábito de freqüentar parques de
diversões, como fazem os norte-americanos, por exemplo, e também de
“revisitarem” um parque, expressão usada como linguajar comum na área. E o
termo cultura será entendido nesse trabalho como uma questão de hábito e de
perfil de consumo.
87
Para Vernaglia, a falta do encantamento dos parques, conforme analisado
anteriormente, dificulta atrair o visitante. Na sua opinião é mais difícil no Brasil
captar o visitante do que fazê-lo voltar, pois, provavelmente, a experiência da visita
será muito positiva. Baldacci também defende que as sensações como adrenalina,
vertigem, encantamento, ofertadas por um parque temático são únicas e exclusivas,
se comparadas com a realização de qualquer outra atividade concentrada num
único local.
O problema é de que não basta que um parque receba constantemente
novos visitantes, esses visitantes precisam voltar mais vezes. Por outro lado, os
gestores precisam investir continuamente em novas atrações, justamente para
manterem seu poder de atração da demanda, como também na manutenção de
uma boa infra-estrutura. Conseqüentemente, os custos elevam-se, criando um
círculo vicioso de crescimento, porque sempre precisará de mais visitantes para se
pagar por essas novas atrações e pela infra-estrutura de apoio montada, como
lanchonetes, banheiros, vestiários, armários, berçários, entre outros.
No Brasil, essa equação sofreu ainda um golpe muito duro em virtude da
conjuntura econômica. O fato é que, o período de 1995 a 1998, foi decisivo para a
construção de vários projetos de parques no país. Os recursos para esses
empreendimentos foram obtidos através de financiamentos privados, geralmente
provenientes do BNDES, com taxas mais baixas e prazos mais longos de
pagamentos. Foram também utilizados investidores Institucionais formados pelos
fundos de pensão, como a Previ, a Petros e a Funcef
26
. (SALOMÃO, 2000)
26
Os Fundos de Pensão são administradores dos recursos previdenciários dos funcionários de determinadas
empresas. A Previ, a Petros e a Funcef correspondem respectivamente aos fundos de pensão das empresas do
Banco do Brasil, Petrobrás e da Caixa Econômica Federal.
88
A então Ministra Dorothea Werneck concedeu uma série de isenções fiscais
para os empresários investirem nesses empreendimentos. O problema foi que tais
investimentos foram feitos na época da paridade cambial, ou seja, US$1,00
equivalia a R$1,00.
27
Entretanto, com a maxi desvalorização da moeda brasileira
iniciada em 1999, o retorno do capital investido ficou praticamente impossível de
ser obtido, uma vez que as dívidas contraídas cresceram sensivelmente.
É importante destacar também que os parques de diversões, principalmente
os temáticos, demandam investimentos de alto valor, e cujo período de maturação,
ou retorno sobre o investimento é de longo prazo, e por isso esses
empreendimentos foram os que mais se prejudicaram com esse problema cambial.
Além disso, o custo operacional
28
é muito alto num parque de diversões.
Essa constatação justifica em parte porque o tíquete médio, ou o preço dos
ingressos costuma ser tão alto para o padrão de consumo e renda dos brasileiros.
É por isso, também, que os parques têm que trabalhar outras formas de receitas,
como a venda de alimentos e bebidas, e a venda de produtos licenciados para
complementarem receita.
Dentro desse contexto, vale ainda dizer que um parque de diversões não
pode funcionar com a operação ociosa, ou seja, com atrações em mau
funcionamento ou fora de operação. É preciso estar com todo seu potencial de
atratividade ativo. Isso significa afirmar que os parques ao abrirem suas portas ao
27
Esse regime cambial é denominado também como currency board, o que significa a paridade de moedas
imposta por determinação governamental.
28
Será considerado para essa análise o custo operacional como a somatória de todos os custos fixos e variáveis
envolvidos na operação de um parque, como salários, impostos, manutenção das atrações, energia elétrica,
água, segurança, limpeza, para citar os principais. É importante destacar que o tem manutenção das atrações é
uma área extremamente importante no gerenciamento de um Parque de Diversões, visto que a segurança dos
usuários é um item primordial. Deve-se considerar que a ocorrência de qualquer acidente pode ser muito danosa
à imagem institucional desses empreendimentos, como conseqüência, geraria uma grande dificuldade de atrair
novos visitantes,e o que seria extremamente danoso para os negócios.
89
público estão com elevado custo operacional, independentemente da quantidade de
pessoas que receberem durante aquele dia. Assim, precisam contar com uma
receita constante para diluir tais custos, e assim garantir sua sobrevivência.
Lopes disse que hoje os parques enfrentam uma equação muito complicada,
um paradoxo. Isso porque, quando os parques foram construídos, fizeram seus
estudos de viabilidade numa dada situação econômica, e por questões exógenas,
de conjuntura econômica, os investidores não tiveram suas expectativas cumpridas.
E apesar do profissionalismo dos gestores, e apesar de todas as dificuldades e
limitações, os parques são bem operados, mas os investidores não querem investir
mais. E, se os parques não investem em novas atrações, não conseguem trazer o
visitante novamente.
Nader (2003) colocou que a filosofia de Walt Disney é que os parques
deveriam crescer e se aprimorar sempre, por os considerar “coisas vivas”. E quanto
mais competitivo for o mercado, menor é o tempo requerido para a troca ou a
adição de novas atrações, afirmou Lopes, citando o exemplo dos parques dos
Estados Unidos que instalavam novas atrações praticamente todo ano.
Já, no Brasil, depende muito de cada empreendimento, mas se fala num
prazo de dois a cinco anos para que essas renovações aconteçam. Ressaltou
ainda que não existe atualmente no Brasil nenhuma política governamental que
induza ou favoreça os investimentos, o que é outro fator limitante.
Baldacci defende de que no Brasil além de não ter a cultura, existe a
dificuldade de absorver cultura, porque a cultura se cria com a repetição. Citou
como forma de comparação a paixão do brasileiro pelo futebol, lembrando que
desde que nasce, a criança já tem contato com esse esporte. Desde cedo, vai ao
90
estádio assistir o jogo ao vivo, ou pode acompanhar pela televisão, e que conta
com uma mídia que se dedica exaustivamente ao assunto.
E o desenvolvimento de criação de cultura é um processo de longa
maturação, que se transmite geração após geração. Explicou também que é por
isso que os parques visam atrair crianças e, principalmente, jovens, pois eles serão
os futuros pais, ou os futuros consumidores. E se essa nova geração não criar
desde já o hábito de visitar parques, o futuro da atividade estará comprometido.
Acredita que a falta de cultura também foi sentida com a construção da
Disney na Europa
29
, mas apesar dos europeus terem sido refratários no início, essa
barreira da falta de cultura foi mais facilmente vencida pelo poder aquisitivo alto dos
habitantes daquele continente. Atualmente, a Disneylândia de Paris opera muito
bem, mas serviu de lição para a indústria de uma forma geral, da importância de se
respeitarem os hábitos de consumo e culturais da localidade onde os parques estão
inseridos.
Assim, é possível supor que se a Disney resolvesse abrir um parque no
Brasil provavelmente não enfrentaria uma barreira cultural, pois a grande maioria
dos brasileiros é bastante receptiva à cultura norte-americana. O maior problema
desses parques certamente seria do valor a ser cobrado pelos ingressos, de forma
que se adequassem ao padrão de renda do brasileiro e fosse satisfatório para
garantir um resultado financeiro positivo, problema que não difere dos demais
parques.
29
Cooper et al. (1998) defendem que além da questão cultural que geraram grandes tensões tanto para os
funcionários quanto para os clientes, outros fatores podem explicar o insucesso do projeto da Disneylândia de
Paris, que foi relançada com esse nome, pois os dirigentes detectaram que o nome original de Euro Disney era
mais fraco que o esperado. Eles defendem que os preços cobrados eram percebidos como altos para os padrões
europeus, refletindo, por exemplo, na despesa adicional dentro do parque, que foi abaixo da esperada. O clima
no local da construção do parque é bastante desagradável em grande parte do ano, além do fato de que a Europa
vivia uma fase de recessão no período da instalação do empreendimento.
91
Os parques da Disney de Tóquio e Hong Kong também são um sucesso,
batendo vários recordes de público. Baldacci, como ex-presidente da Associação
Internacional (IAAPA), acredita que a Disney de Tóquio foi instalada num período
muito adequado, pois foi pré-revolução digital. Isto porque, pensa que, atualmente,
as famílias de classe média possuem um gasto extra com filhos desde a idade pré-
adolescente, que é a conta do telefone celular. Para os jovens, um outro
concorrente dos parques é a “balada”. O problema é que a renda familiar
discricionária é única e precisa ser direcionada para todos esses gastos.
Lopes aposta que se fossem construídos mais parques no Brasil, e se estes
começassem a fazer propaganda, expondo-se mais na mídia, e não só na mídia
paga por eles próprios, e sim através de matérias e propagandas de outros
produtos, onde o parque apareça como pano de fundo e como sinônimo de
diversão e descontração, então, a partir daí, os parques passariam a ficar mais
vivos na mente dos consumidores, aumentando sua predisposição de visitá-los.
E, principalmente, se houver um aumento da renda, o parque de diversões
será mais facilmente incorporado pelo brasileiro como opção de lazer. Essa
premissa é compartilhada por todos os entrevistados. A falta da cultura não é um
fator isolado. O baixo poder aquisitivo é sem dúvida um fator que limita a visitação
dos parques, e a base de pessoas que têm condições financeiras de visitarem os
parques no Brasil é pequena. Para uma família de classe média paulistana visitar o
Hopi Hari ou o Wet´n Wild, por exemplo, é difícil, devido ao valor muito alto. Uma
recente reportagem vai de encontro com esta afirmação, a qual relata que:
Basta olhar a situação dos grandes parques de diversões do País e
o equilíbrio financeiro praticado pelos produtores de shows e
espetáculos brasileiros para perceber que o Brasil está a anos-luz
dos Estados Unidos, da Europa e mesmo do México no que diz
respeito à indústria do entretenimento. Apesar do raquitismo no
setor, onde cada brasileiro gasta apenas 2% da renda com
diversão, há exemplos de sucesso e o mais vistoso deles é
justamente a empresa que trará o Cirque du Soleil, a CIE Brasil (O
92
ESTADO DE SÃO PAULO – Caderno de Economia, 8 de janeiro de
2005, p. 10)
Boiteux e Werner (2002) também concordam que a falta de cultura do
brasileiro de visitar parques de diversões é um entrave para o desenvolvimento
desses empreendimentos. Segundo esses autores, esse foi um dos motivos
principais que explicariam o fracasso do parque “Terra Encantada”, um ambicioso
projeto, construído na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, em 1998, com
investimentos da ordem de 280 milhões de reais. O parque enfrentou vários
problemas financeiros e teve que fechar as portas alguns anos mais tarde. E como
lamentou Vernaglia: “Esse parque bate o triste recorde de ter um McDonald´s que
não vendeu nenhum hambúrguer num dia”.
E como se sabe, os parques de diversões representam uma das inúmeras
possibilidades que as pessoas possuem para usufruírem seu tempo livre. Dentre
essas várias possibilidades, muitas são gratuitas ou muito mais baratas se
comparadas ao preço cobrado pelos ingressos dos parques, o que certamente é
outro fator limitante de demanda.
Galfi cita a praia e o shopping center como grandes concorrentes dos
parques de diversões no Brasil. E alguns até consideram o shopping center como
um grande parque de diversões, no sentido que oferecem atrações ou opções de
lazer, além da comodidade para todas as idades e membros da família, com a
grande vantagem que o visitante não paga para entrar. A seguinte frase confirma e
complementa a visão de Galfi:
Depois da casa, os lugares mais seguros são os shopping centers que
procuram na sua artificialidade recriar a vida exterior, simulando ruas,
praças, alamedas, bulevares, implementando praças de alimentação e
outros equipamentos de lazer como cinemas, discotecas, parques de
diversões, circos, pistas de patinação, exibindo shows, desfiles de moda,
exposições de arte, só para citar alguns. Longe de resgatar a vida social
93
tradicional dos antigos bairros, as relações são impessoais, garantindo o
anonimato, tão afeito ao individualismo pós-moderno (RODRIGUES,
2001, p. 35).
Alguns especialistas, como Baldacci defendem que a praia é uma forma de lazer
barato, e uma das formas mais democráticas de lazer que o brasileiro tem acesso.
Todavia, essa análise não é tão simplista. Uma família paulistana, por exemplo, tem
a praia e o Hopi Hari praticamente na mesma distância. Os custos de alimentação e
do deslocamento são praticamente os mesmos. Os custos das entradas no parque
e de um pernoite para a família também podem ser equivalentes. Portanto, é
possível afirmar que entre visitar uma praia ou um parque é, portanto, uma questão
de preferência de consumo, e não só de custos.
Outra variável que deve ser considerada, explicada por Vernaglia, é que
alguns parques constituem-se como atividades gregárias, ou seja, o conceito de
grupo, de família, de excursão. Para esse tipo de atividade, todas as pessoas
envolvidas devem estar dispostas naquele mesmo período, de realizarem tal
atividade, o que certamente dificulta a tomada de decisão.
Assim, parques como o da Mônica e o da Xuxa optaram por uma
estrutura e um conceito diferenciado. Mesmo sendo parques temáticos, são
menores, localizados dentro de shopping centers, com uma série de comodidades,
e também dentro da capital paulista, e por isso são considerados parques de lazer
urbano. Dessa forma, os custos de deslocamento são menores.
Além disso, esses parques investiram muito menos na sua infra-estrutura,
se comparado a um grande parque temático, e por isso, podem cobrar um valor de
ingresso menor. E Vernaglia acrescenta ainda que não são considerados parques
gregários, pois o pai e a mãe decidem levar seus filhos para passar algumas horas
94
de diversão num local perto de casa. São, portanto, produtos diferentes e por isso
trabalham com segmentos de mercado diferentes.
Dessa forma, seguindo o raciocínio dos parques indoors em shoppings
centers, uma possível solução seria a construção de parques temáticos dentro de
grandes capitais, focando como público-alvo a população local, apostando no
menor tempo e facilidade de deslocamento um facilitador da visitação. O grande
problema é que nesses locais os terrenos são mais caros, e conseqüentemente,
demandaria um maior investimento, cujo tempo de retorno do capital investido seria
muito maior ou até mesmo impraticável.
Por outro lado, para Salomão (2000), o complexo de parques da Flórida
exerce uma grande atração para os brasileiros, que se constituem um dos mais
numerosos grupos de estrangeiros que freqüentam esses parques, cumprindo uma
função muito mais de status do que de hábito de consumo. Segundo ele: “É ritual
de auto-afirmação o envio de filhos a Walt Disney World, no cumprimento de uma
etapa “obrigatória” de sua educação” (SALOMÃO, 2000, p. 124).
Para esse mesmo especialista brasileiro no estudo de parques de diversões,
os brasileiros vivem ainda numa fase que ele chama de aprendizado, pois devido à
pouca quantidade desses empreendimentos no país, o povo brasileiro ainda não
possui o hábito de freqüentar esses estabelecimentos.
Entretanto, todos os entrevistados defendem que os parques da Flórida
atraem os brasileiros porque estão inseridos num importante destino turístico.
Dentro desse contexto, a indústria do turismo merece ser mencionada. É uma
atividade de grande impacto econômico e social na atualidade. O mercado
brasileiro está longe de seu pleno desenvolvimento. No entanto, grandes avanços
foram dados nas últimas décadas no sentido da profissionalização dessa indústria.
95
O setor de parques de diversões certamente sentiu os reflexos do desenvolvimento
do turismo no Brasil.
Dentro da análise sistêmica da atividade turística
30
, os parques de diversões
são considerados como atrativos artificiais, pois diferente das atrações naturais e
culturais, são criados e planejados com o fim de serem explorados como negócios
nas áreas de lazer e/ou turismo. Costumam ser negócios de grande porte, exigindo
altos investimentos, análises de mercado, em projeto, além do alto custo de
implantação. Além disso, investem também na contratação e treinamento de vasta
mão-de-obra, gerando muitas oportunidades de empregos.
O estado de São Paulo concentra o maior número e os mais significativos
desses empreendimentos no país. A principal explicação para essa constatação é o
fato de São Paulo ser o estado mais rico e mais populoso do Brasil. Além disso,
esse estado destaca-se também por ter uma boa infra-estrutura de apoio ao
desenvolvimento turístico e um setor de serviços amadurecido, ambos elementos
importantes ao desenvolvimento dos parques, como confirma um estudo da
EMBRATUR de 1998 intitulado: Estudo Econômico-Financeiro dos Meios de
Hospedagem e Parques Temáticos no Brasil.
Por outro lado, quanto mais opções de lazer à disposição das pessoas,
torna-se mais difícil a fidelização e a criação de hábitos de consumo, e no caso
específico da cidade de São Paulo o desafio é ainda maior, pois a oferta de
atividades de lazer, passeios e atrações é muito variada e extensa.
É por tudo isso que se pode afirmar que os parques de diversões brasileiros
passam por dificuldades financeiras. Ou seja, fatores como a questão cultural da
falta de revisitação, a falta do encantamento que não propicia a visitação, aliada a
30
A visão sistêmica do Turismo é uma possibilidade de estudar estruturalmente essa atividade, compreendendo
os diversos componentes de causa e efeito que se interagem para formá-la. Para mais detalhes, consultar: BENI,
Mário Carlos. Análise Estrutural do Turismo. 2ed. São Paulo: Editora Senac, 1998.
96
uma renda discricionária baixa, e comprometida pelos altos custos operacionais dos
parques, bem como a dificuldade de captação de recursos para investimentos,
tornam a viabilidade financeira dos projetos deste segmento extremamente
complicada no Brasil. Resta saber, portanto, o que o futuro reserva para essa
atividade.
3.4. Perspectivas para a Área de Parques de Diversões no Brasil
Nenhum dos entrevistados mostrou-se confiante na previsão da construção
de novos parques de diversões no Brasil, no futuro, em curto e médio prazos.
Apesar de alguns se dizerem otimistas, são conscientes das dificuldades
financeiras enfrentadas pelos parques durante esse período de existência da
atividade no país, que teve início na década de 1990. É uma trajetória muito curta,
com cerca de quinze anos e ainda esses negócios enfrentam um período de
maturação e aprendizagem.
Lopes ressaltou a falta de políticas governamentais consistentes que não só
estimulem, mas facilitem o desenvolvimento dessa atividade, como por exemplo, a
questão da tributação. Os parques de diversões são considerados bens de
consumo e não bens de capital perante a legislação brasileira. Como os
equipamentos ou atrações são todas importadas, esse é um problema sério, pois a
carga tributária é maior para os produtos de bens de consumo, chegando em
alguns casos, a 80% do valor do equipamento.
Além disso, esses equipamentos são comprados em dólar e os ingressos
são cobrados em reais. Essa disparidade de moeda dificulta que os parques
fechem a equação financeira. Isto é, o retorno do investimento fica sensivelmente
97
comprometido. Então, fica difícil acreditar na construção de novos parques, uma
vez que os atuais passam por tantas dificuldades financeiras.
Dentro desse contexto, outra questão que merece ser mencionada para uma
melhor compreensão dessa indústria foi que as expectativas geradas pelos
investidores, pela imprensa e pelo mercado em geral com a construção dos
parques foram excessivas, e como o retorno não foi o esperado, causou um
descrédito muito grande, principalmente por parte dos investidores.
Os entrevistados, principalmente Baldacci e Vernaglia, defendem como
possível solução a idéia de que os parques de diversões, em especial os temáticos,
devem ser construídos em destinos turísticos, como é o caso do Beach Park e do
Beto Carrero World, cuja venda de ingressos esteja atrelada a um pacote turístico.
Isso porque, os turistas garantem uma visitação constante, essencial para o
planejamento e retorno financeiro desses empreendimentos.
Nader (1998) aponta alguns dados encorajadores, retratados na Tabela 3,
mostrando como a abertura da Walt Disney World Resort impactou no
desenvolvimento de Orlando, levando esse destino do 75° para o 18° lugar no
ranking americano de vendas no varejo.
Tabela 3 - Mudanças ocorridas na Flórida com a construção do
Walt Disney World Resort
Fatores de Ocorrência de Mudanças Ano de 1970 Ano de 1990
População (n
°
de habitantes)
450 mil 1 milhão
Tráfego aéreo (n
°
de passageiros)
1 milhão 7,2 milhões
Quartos de Hotéis (n
°
de unidades)
4 mil 100 mil
Mão-de-obra (n
°
de trabalhadores)
185 mil 600 mil
Turismo na Flórida (n
°
de turistas)
23 milhões 50 milhões
Fonte: Nader (1998, p. 90)
O fato é que as pessoas quando estão viajando, de um modo geral, têm uma
predisposição de gastos muito maior, e geralmente estão mais dispostos a
98
vivenciarem novas experiências. Como argumentou Baldacci, apesar do Hopi Hari
ser mais moderno e possuir um produto superior ao Beto Carrero World, esse
último consegue cobrar um ingresso duas vezes maior que o Hopi Hari, justamente
pelo fato desse parque estar localizado num destino turístico, que é Penha, e a
visitação dos turistas é essencial em virtude da sazonalidade, principalmente na
baixa estação. Para reforçar essa tese, cabe a seguinte declaração:
Os parques de diversões, assim como uma gama variada de
atrações, representam uma série de vantagens para o setor
turístico, na medida em que atraem um grande número de pessoas
para um lazer eminentemente familiar, aumentando a estadia média
do visitante, promovendo a repetição da viagem e minimizando os
efeitos sazonais dessa atividade nas economias locais. Como
contrapartida, esses mesmos parques comumente dependem do
fluxo turístico de uma região para incrementar sua freqüência e
inflar seus gastos per capita médios, já que turistas usualmente
estão propensos a despesas mais elevadas (SALOMÃO, 2000, p.
30).
Como defende Vernaglia, o visitante do parque durante as férias “não faz
conta”, ao contrário do visitante que usa o tempo livre dos feriados e finais-de-
semana, o qual tem à sua disposição uma série de opções de atividades que
acabam competindo entre si. Na verdade, relatou Baldacci, que o projeto inicial era
o de criar um complexo turístico completo em Vinhedo – São Paulo, onde além do
Hopi Hari e do Wet´n Wild, seria construído um Simba Safári, um parque de
Esportes Radicais, contaria também com vários hotéis e centro de convenções,
justificando dessa forma, a vinda de turistas e garantindo um prazo de permanência
de três a quatro dias.
Infelizmente, o projeto fracassou em virtude de estruturações mal executadas
do projeto, com a agravante da especulação imobiliária
31
, e também da ganância
31
Um dos exemplos mais célebres dessa indústria sobre essa questão foi a história da construção do parque
Disney da Califórnia, que após sua construção, várias empresas compraram terrenos no entorno do daquele
parque para construírem hotéis, lojas, restaurantes, postos de gasolina, vislumbrando beneficiarem-se com o
99
dos proprietários, justificou Baldacci, cuja empresa foi a criadora da idéia inicial
desse projeto.
Lopes acrescenta que os fatores climáticos são muito favoráveis no Brasil
para esse negócio, ou seja, com altas temperaturas durante todo o ano. É por isso,
que uma das apostas de Galfi e Vernaglia de possíveis tendências para o setor seja
a construção de parques aquáticos. Isso porque, um importante aspecto que
100
na maioria das vezes não o faz, por questões econômicas. Aliás, como já foi
mencionado antes, a questão da baixa renda discricionária e da má distribuição de
renda são entraves importantes, que inibem o desenvolvimento dessa atividade no
país.
Por outro lado, sob um enfoque mais otimista, ao afirmar que os brasileiros
“tropicalizaram” a gestão dos parques, Lopes vai de encontro com a visão de Galfi
de que, apesar de todos os problemas, os administradores dos parques brasileiros
conseguiram encontrar soluções muito criativas para dinamizar a visitação, com a
criação de shows de música, eventos, promoções como a “Noite do Terror” do
Playcenter ou a “Hora do Horror” do Hopi Hari; com a criação de novos produtos
como festas de aniversários, dinamizando com atividades como o arvorismo ou
escalada, para citar algumas estratégias adotadas. Lopes chega a afirmar que: “o
parque está virando um espaço multiuso com diversas facilidades”.
Para finalizar esta pesquisa, cabe concluir todas as idéias apresentadas, o
que será feito a seguir, na última parte deste relatório.
101
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É fato que o setor de parques de diversões no Brasil ainda passa por uma
fase de aprendizado e maturação, pois a maioria dos grandes projetos surgiu no
país a partir da década de 1990. Esta pesquisa apontou que o conceito de um
parque de diversões é muito antigo, mas a forma que ele é conhecido na atualidade
é recente, sendo que um dos principais marcos dos primeiros parques de diversões
modernos foi a construção da Disneylândia, em 1955.
Entretanto, a consolidação da indústria nacional não foi atingida por uma
série de fatores que foram analisados nesta pesquisa, cujo principal foco de análise
foi a questão da sua visitação, partindo-se do pressuposto que a principal fonte de
renda dessas empresas depende da venda de ingressos, ou melhor, da quantidade
de visitantes que recebem.
O setor sofreu um duro golpe devido à conjuntura macroeconômica do país.
Após a construção dos parques, houve uma alteração cambial que fortemente
impactou a gestão financeira desses empreendimentos, pois o estudo da
viabilidade financeira ocorreu num período de paridade cambial entre a moeda
brasileira e o dólar.
Entretanto, com a desvalorização da moeda nacional, os parques, ou melhor,
seus acionistas, tiveram muita dificuldade em obter o retorno do investimento,
também porque as atrações são e foram todas importadas, e assim pagas em
dólar, porém os ingressos são cobrados em reais. Como conseqüência, existe hoje
uma descrença e relutância por parte dos investidores em novos investimentos,
tanto na construção de novos parques, como na compra de novas atrações para
aumentar o poder de atratividade da demanda.
102
Aliada a essa constatação, esta pesquisa ressaltou a importância do lazer na
vida moderna, e que os parques de diversões representam uma das inúmeras
possibilidades de lazer disponíveis, mas que ainda não foi bem assimilada como
hábito de consumo do brasileiro, que não visita esses locais com a freqüência e na
quantidade necessária, conforme foi previsto durante o estudo de viabilidade dos
projetos.
Em virtude da carência de pesquisas e publicações sobre este assunto no
país, optou-se pela entrevista de quatro renomados especialistas brasileiros no
setor em busca de explicações sobre esse mercado. O confronto de todas as
opiniões e idéias desses especialistas, aliado ao embasamento teórico obtido em
publicações e estudos das áreas de sociologia do lazer, marketing e turismo, levou
a algumas importantes conclusões.
A primeira delas é que a Disney é reconhecida como a principal referência
mundial nessa área, inclusive no Brasil, como o padrão máximo de qualidade na
prestação de serviços a ser alcançado pelos gestores desses empreendimentos.
Entretanto, concluiu-se que o consumidor brasileiro em sua maioria não utiliza a
Disney como comparação, pois uma minoria da população já visitou algum dos
parques dessa empresa.
Entretanto, ao se estudar a filosofia que rege a organização, seu histórico
atrelado à figura genial de seu criador Walt Disney, é possível afirmar que os
parques da Disney não podem ser usados como comparação para o Brasil em
termos de projeto, infra-estrutura e principalmente no que se refere à sua “magia” e
“encantamento”, dois termos subjetivos em termos de negócios e na área
acadêmica, portanto, difíceis de serem conceituados, mas certamente fundamentais
para o sucesso dos parques de diversões, principalmente os temáticos, crença
103
compartilhada também pelos entrevistados. Entretanto, além disso, a Disney
também possui uma forte e poderosa indústria cinematográfica que dá sustentação
aos seus negócios.
Os parques brasileiros parecem reconhecer a necessidade de criar essa
imagem mental nos visitantes do encantamento, visto que o Hopi Hari é descrito
como o país da alegria, diversão e da aventura; o sonho de Maurício de Sousa que
impulsionou a construção do Parque da Mônica foi o de recuperar o que descreveu
como o quintal perdido; e Xuxa afirma que seu parque nasceu de um sonho.
Foi abordada também a diferença conceitual entre parques, sendo que o
termo Parques de Diversões deve ser o nome genérico da atividade. Já os parques
temáticos devem usar um tema central para suas atrações, de modo a agregar
valor para os visitantes. Entretanto, esse tema deve ser reconhecido e identificado
pelo público-alvo, devendo estar presente no imaginário das pessoas ou, então,
amplamente disseminado pelas mídias de massa para atrair a curiosidade, e por
conseqüência, levando as pessoas a visitarem o parque. Entretanto, constatou-se
que a maioria dos parques de diversões brasileiros peca por justamente não
conseguir criar o encantamento nas pessoas, salvo algumas exceções.
Entretanto, foi salientado na pesquisa que os parques devem adotar duas
estratégias, uma para atrair a visitação e outra para assegurar a revisitação. Para
alguns especialistas, a falta do encantamento é um fator agravante de atrair
visitantes, mas geralmente os visitantes saem satisfeitos com a experiência da
visita, e, por isso, tendem a voltar. Detectou-se, portanto, que atrair um visitante a
um parque de diversões tende a ser mais difícil do que fazê-lo retornar.
Dessa forma, é possível afirmar que existe uma diferença entre a qualidade
da expectativa e da experimentação, conforme foi abordado nesta pesquisa. Com
104
relação à experimentação, os entrevistados divergiram um pouco entre si sobre
quais os possíveis fatores que interferem na qualidade, até porque definir qualidade
é muito complexo e às vezes até abstrato, mas pode-se citar que todos
concordaram com alguns fatores imprescindíveis como segurança, limpeza, boa
manutenção e cordialidade dos funcionários, itens que dentro dos limites de verba
dos empreendimentos são todos trabalhados e implantados dentro dos parques
brasileiros.
Portanto,
a hipótese que pregava que os parques brasileiros não possuem
um padrão satisfatório de qualidade não responde satisfatoriamente essa questão,
pois a qualidade deve ser dividida em qualidade da expectativa e qualidade da
experimentação. Assim, pode-se dizer que o principal problema dos parques de
diversões brasileiros é a qualidade da expectativa, e não da experimentação, isto é,
do ponto de vista do consumidor, pois é ele quem percebe a qualidade, os parques
brasileiros não são muito atraentes, não geram uma expectativa necessária para
atrair os visitantes, ou seja, possuem uma baixa qualidade da expectativa.
Entretanto, de uma forma geral, a vivência, a experimentação dos momentos de
lazer dentro dos parques brasileiros não foram apontados como problemático pelos
entrevistados, ao contrário, afirmam que os parques tendem a gerenciar bem essa
questão. Isso equivale a dizer que uma vez atraídos para os parques, os brasileiros
aprovam a experiência, ficando mais propensos a revisitarem tal parque.
Vale reforçar que esses empreendimentos devem ser reconhecidos e
tratados com toda a seriedade de qualquer grande negócio, e por isso, necessitam
de uma gestão profissional comprometida com resultados. Em outras palavras,
conforme afirmado no trabalho, um padrão de qualidade começa na filosofia e
política da sua liderança, o que acaba refletindo em todas as suas ações.
105
Entretanto, como em qualquer forma de prestação de serviços, os detalhes fazem a
diferença; sendo assim, não se pode negligenciar nenhum desses itens se o parque
desejar atingir um padrão internacional de qualidade.
Outra importante conclusão diz respeito à constatação que os parques
localizados em destinos turísticos, como o Beto Carrero World, e dessa forma,
funcionando como uma importante atração turística daquela localidade, são os que
apresentam um melhor desempenho na captação de visitantes. Isto porque, esses
parques trabalham com a pré-venda dos ingressos atrelada à venda dos pacotes
turísticos.
Esta estratégia parece funcionar não só no Brasil, como também em outros
países, em especial nos parques de Orlando, na Flórida, que representam um dos
mais importantes destinos turísticos dos Estados Unidos e do mundo. Os visitantes
não se sentem atraídos somente por conhecerem a terra de Disney e seus
personagens, como também em usufruir os demais atrativos daquela localidade. O
fato também de Orlando concentrar uma enorme quantidade de parques, amplia o
poder de atração da demanda e faz com que o visitante amplie seu tempo de
estadia, e conseqüentemente consuma mais.
A pesquisa ressaltou que existia um projeto de transformar a cidade de
Vinhedo num grande pólo ou destino de parques temáticos no Brasil, e que seria o
projeto nacional que mais se aproximaria aos moldes de destino como Orlando. No
entanto, a tentativa foi frustrada e o projeto que deveria reunir uma série de
empreendimentos, que além de parques contaria também com hotéis e centros de
convenções, ficou restrito a dois parques e um único hotel.
A idéia de retomar o projeto inicial parece bastante distante, em virtude da
especulação imobiliária que aumentou o valor das terras daquela região e pela
106
dificuldade de investidores interessados, uma vez que o histórico da atividade não
favorece a busca de novos investidores, aliado a uma alta tributação, que, aliás, é
outra importante constatação desta pesquisa, que muito dificulta o desenvolvimento
da atividade no país.
Portanto, acredita-se que uma alternativa viável seja a criação de um roteiro
turístico de parques de diversões, no caso específico do estado de São Paulo, por
concentrar vários parques que poderiam ser organizados num pacote, como o
Playcenter, o Parque da Mônica, O Mundo da Xuxa, o Wet´n Wild e o Hopi Hari e
porque o Estado dispõe de uma completa infra-estrutura de apoio turístico.
Sabe-se que já existe um movimento dentro dos Conselhos e Secretarias de
Turismo, e até mesmo do Ministério do Turismo de se montar esse produto, mas de
concreto pouco foi feito. Portanto, essa pode ser uma aposta para o
desenvolvimento da atividade no futuro, valendo destacar que possui a vantagem
de ser uma oferta renovável e que atinge diferentes nichos de mercado.
Este trabalho permitiu também que se refletisse que o formato dos parques
indoors, localizados em shoppings centers, geralmente em capitais, parecem ser
uma solução interessante. Por demandarem investimentos menores, terem custos
operacionais reduzidos, estarem mais próximos do seu público-alvo, e
principalmente por explorarem sua tematização baseada em personagens
conhecidos pelo imaginário infantil brasileiro, enfrentam menores problemas em
atrair visitantes.
Entretanto, a análise do comportamento do consumidor é muito complexa,
pois, se de um lado o Parque da Mônica São Paulo pode ser considerado um dos
mais antigos e estáveis empreendimentos do país, esse mesmo parque no Rio de
Janeiro encerrou suas atividades no ano passado, após alguns anos de existência,
107
sendo que ambos adotavam o mesmo formato indoor e usavam o mesmo tema
central. Outros grandes projetos brasileiros como o Terra Encantada e o Magic
Park, frutos de ambiciosos projetos, também fecharam.
Portanto, após intensa investigação, aliado à visão dos especialistas
entrevistados, chegou-se à conclusão que vários fatores estão relacionados para
explicar o fenômeno da baixa visitação no Brasil, ou seja, o problema da visitação
dos parques brasileiros não é fruto de uma variável isolada.
O primeiro fator relaciona-se com a baixa renda discricionária do brasileiro.
A falta de renda disponível faz com que as pessoas busquem alternativas de lazer
mais baratas ou gratuitas. O fato de alguns parques serem atividades gregárias, ou
seja, voltadas para grupo de amigos ou famílias é outro fator limitador, pois a
tomada de decisão da visita é coletiva. Portanto,
a hipótese que argumentava da
falta de renda suficiente para o consumo desses serviços não foi rejeitada.
Por outro lado, é possível concluir também que no Brasil basta uma única
visita para conhecer um parque e não se tem mais interesse de retorno, pois a
oferta de atrações não é renovada, apesar de necessária, e quando ela acontece
não é da forma idealizada pelos gestores, particularmente por uma questão de falta
de receita suficiente, obviamente, decorrente de resultados operacionais
insatisfatórios. Dessa forma, o visitante perde o estímulo de retornar àquele parque.
Existe também uma questão de ordem cultural, expressa como segunda
hipótese desta pesquisa. Ou seja, não faz parte do hábito de consumo de lazer do
brasileiro visitar esses empreendimentos. Entretanto, como se abordou durante a
pesquisa, a cultura se cria com a repetição, e esse é um processo de longa
maturação.
108
Como a construção de parques é muito recente, obviamente não existia essa
opção de lazer, e depois o brasileiro não absorveu esse hábito, principalmente, por
falta de renda, entrando assim num ciclo vicioso de crescimento. Assim, sem
visitação, os parques não conseguem renovar suas atrações, o que dificulta
também a revisitação, e sem visitantes, os parques não têm recursos para investir
em propaganda para atrair mais pessoas, e as pessoas não indo aos parques não
se cria a cultura. Dessa forma,
não se rejeita a hipótese de falta de cultura do
brasileiro em visitar parques de diversões.
Portanto, apesar de toda a complexidade e dificuldade que essa indústria
enfrenta no país, os gestores decidiram investir em diferentes formas de promoção
de preço, de agregar atividades para dinamizar a visitação, e principalmente na
realização de eventos, o que, na maioria dos casos, surtiu um efeito desejado.
Essas ações não resolveram os problemas financeiros estruturais, mas foi uma
forma “tropicalizada”, como alguns o definiram, de enfrentar o problema, evitando
que os parques encerrem suas atividades, até porque a infra-estrutura já está toda
montada e existe uma remota possibilidade dos parques receberem novos
investimentos.
Por outro lado, o Brasil ainda representa um país com enorme potencial, em
virtude de possuir um imenso mercado consumidor. Portanto, se houver um
incremento efetivo na renda, a tendência é que esse mercado se beneficie, pois
com o aumento da renda discricionária, os parques podem fazer parte do hábito de
consumo de uma parcela maior da população, e a tendência é que se quebre
aquele ciclo vicioso de crescimento.
Todavia, para servir como um estímulo ao desenvolvimento dessa atividade,
vale como mensagem final a célebre frase encorajadora de Walt Disney, o grande
109
gênio idealizador e precursor deste moderno conceito de entretenimento, que foi
capaz de construir um império a partir de um “rato” e num local que era um imenso
pântano: “Se você pode sonhar, você pode realizar”!
Seria interessante que mais brasileiros tivessem acesso a essa forma
moderna e diferenciada de lazer, pois as sensações e emoções ofertadas pelos
parques de diversões, em especial os temáticos, são únicas, concentradas no
mesmo tempo e espaço. Por outro lado, caracterizam-se por um tipo de negócio
que emprega uma vasta mão-de-obra e muito pode contribuir para o
desenvolvimento turístico de diversas localidades. Esta pesquisa encerra-se com a
expectativa que o setor possa resolver seus problemas financeiros estruturais, e
dessa forma, possa continuar se desenvolvendo e levando o sonho e a magia a
várias outras gerações.
110
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALCOBIA, Rodrigo Araújo. Dimensões da hospitalidade nos parques temáticos.
São Paulo, 2004. 128f. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade
Anhembi Morumbi.
BENI, Mário Carlos. Análise estrutural do turismo. São Paulo: SENAC, 1998.
BERTASO, Maria Stella Tedesco. Parques temáticos: arquitetura embalada para
consumo. São Paulo, 2001. 232f. Dissertação de Mestrado apresentada à
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo.
BOITEUX, B e WERNER, M. Promoção, entretenimento e planejamento
turístico. São Paulo: Aleph, 2002.
BOMTEMPO, E.; HUSSEIN, C. e ZAMBERLAN, M. Psicologia do brinquedo. São
Paulo: Nova Stella/EDUSP, 1986.
BRUNO, P. e FRANZINI, R. Os parques temáticos e a indústria do
entretenimento. In: ANSARAH, Marília G. dos Reis (Org.). Turismo: segmentação
de mercado. São Paulo: Futura, 1999.
CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. Educação para o lazer. São Paulo: Moderna,
1998.
____________________________. O que é lazer? São Paulo: Brasiliense, 1992.
COOPER, C. et. al. Turismo: princípios e prática. 2 ed. São Paulo: Artmed, 1998.
CHON, K. e SPARROWE, R. Hospitalidade: conceitos e aplicações. São Paulo:
Thomson Learning, 2003.
CONNELLAN, Tom. Nos bastidores da Disney: os segredos do sucesso da
mais poderosa empresa de diversões do mundo. São Paulo: Futura, 1998.
COSTA, Sérgio Francisco. Método científico: os caminhos da investigação. São
Paulo: Harbra, 2001.
DIAS, Reinaldo. Planejamento do turismo: política e desenvolvimento do
turismo no Brasil. São Paulo: Atlas, 2003.
DUMAZEDIER, Joffre. Sociologia empírica do lazer. São Paulo:
Perspectiva/SESC, 1999.
EMBRATUR – Empresa Brasileira de Viagens e Turismo. Estudo econômico-
financeiro dos meios de hospedagem e parques temáticos no Brasil. Brasília:
FADE-UFPE, s.n., 1998.
111
GARCIA, Erivelto Busto. Ação cultural, espaços lúdicos e brinquedos
interativos In: MIRANDA, Danilo Santos (org.). O parque e a arquitetura uma
proposta lúdica. 2. ed. Campinas: Papirus, 1996.
GOELDNER, C. e RITCHIE, J. R. Turismo: princípios, práticas e filosofias. São
Paulo: Bookman, 2002.
KRIPPENDORF, Jost. Sociologia do Turismo: para uma nova compreensão do
lazer e das viagens. São Paulo, Aleph, 2001.
LAGE, Beatriz Helena e MILONE, Paulo César. Economia do turismo. São Paulo:
Atlas, 2001.
__________________________. Turismo, teoria e prática. São Paulo: Atlas,
2000.
LICKORISH, L. e JENKINS, C. Introdução ao turismo. Rio de Janeiro: Campus,
2000.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
MARCELLINO, Nelson Carvalho. Lazer e educação. 10 ed. Campinas: Papirus,
1987.
___________________________. Pedagogia da animação. 2 ed. Campinas:
Papirus, 1997.
MATTAR, Fauze N. Pesquisa de marketing. São Paulo: Atlas, 1996.
MIRANDA, Danilo Santos (org.). O parque e a arquitetura uma proposta lúdica.
2. ed. Campinas: Papirus, 1996.
NADER, Ginha. Walt Disney um século de sonho: as organizações Disney,
gestão empresarial, excelência e qualidade. 2 ed. São Paulo: Senac, 2003.
NIEMEYER, Carlos Augusto da Costa. Parques infantis de São Paulo: lazer
como expressão da cidadania. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2002.
PELEGRIN, Ana de. Equipamento de lazer e espaço de lazer In: GOMES,
Christianne Luce (Org.). Dicionário crítico do lazer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
PARQUES TEMÁTICOS. Legislação, investimento e mercado: centro de
estudos das américas. Rio de Janeiro: Signo Grapho, 1998.
PARKER, Stanley. A sociologia do lazer. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
PIRES, Mário Jorge. Lazer e turismo cultural. São Paulo: Manole, 2002.
RIBEIRO, Olívia C. F. Parques. In: GOMES, Christianne Luce (Org.). Dicionário
crítico do lazer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
112
RODRIGUES, Adyr Balastreri. Turismo e espaço: rumo a um conhecimento
transdisciplinar. 3 ed. São Paulo: Hucitec, 2001.
SALOMÃO, Marcelo. Parques de diversões no Brasil: entretenimento, consumo
e negócios. Rio de Janeiro: Mauad, 2000.
SANDOVAL, Oscar R. D. S. Contribuição ao estudo da gestão de operações em
serviços de entretenimento: os parques de diversões e temáticos. São Paulo,
1999, 140f. Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Economia e
Administração, Universidade de São Paulo.
RODRIGUES, A. M. A. Estudo de metodologias para formatação de
empreendimentos voltados para o segmento de parques temáticos. São
Paulo, 2004, 131f. Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de
Engenharia, Universidade de São Paulo.
TRIGO, Luiz Gonzaga Godói. Entretenimento: uma análise cultural e
econômica. São Paulo, 2003, 142f. Tese de Livre-Docência apresentada à Escola
de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo.
________________________. A sociedade pós-industrial e o profissional em
turismo. 5 ed. Campinas: Papirus, 1998.
________________________. Viagem na memória: guia histórico das viagens e
do turismo no Brasil. São Paulo: SENAC, 2002.
WERNECK, C.; STOPPA, E.; ISAYAMA, H. Lazer e mercado. Campinas: Papirus,
2001.
FASCÍCULOS
TEICH, Daniel Hessel. O ESTADO DE SÃO PAULO. O circo que virou um
negócio de US$ 1,2 bilhão. São Paulo, p. 10, 8/jan/2005. Caderno de Economia.
TURISMO EM NÚMEROS. O Brasil se diverte e cresce. São Paulo, ano 1, 4 ed.,
04/jan/2002.
UNDERHILL, William NEEWSEEK. Travel – the new golden age. New York, p.
30-67, 19-26/abril/2004.
DOCUMENTOS ELETRÔNICOS
113
ADIBRA - Associação Brasileira de Parques de Diversões. Disponível em:
<http://www.adibra.com.br.> Coletado em: out/2005.
BEACH PARK. Disponível em: <
http://www.beachpark.com.br.> Coletado em:
out/2005.
BETO CARRERO WORLD. Disponível em: <
http://www.betocarrero.com.br.>
Coletado em: out/2005.
DISNEYWORLD. Disponível em: <
http://www.mundodisney.net.> Coletado em:
out/2005.
HOPI HARI. Disponível em: <
http://www.hopihari.com.br.> Coletado em: out/2005.
IAAPA - International Association of Amusement Parks. Disponível em:
<
http://www.iaapa.org.> Coletado em: out/2005.
O MUNDO DA XUXA. Disponível em: <
http://www.omundodaxuxa.com.br.>
Coletado em out/2005.
PARQUE DA MÔNICA. Disponível em: <
http://www.monica.com.br/parques.>
Coletado em: out/2005.
PLAYCENTER. Disponível em: <
http://www.playcenter.com.br.> Coletado em:
out/2005.
THE WALT DISNEY FAMILY MUSEUM. Disponível em: <
http://www.disney-
go.com.> Coletado em: nov/2005.
TOURISM INFORMATION OF AMERICA. Disponível em: <
http://www.tia.org.>
Coletado em: nov/2005.
WORLD TRAVEL AND TOURISMO COUNCIL. Disponível em: <
http://www.world-
tourism.org.> Coletado em: nov/2005.
114
APÊNDICE A
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADIBRA Associação Brasileira dos Parques de Diversões
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
EMBRATUR Empresa Brasileira de Turismo
IAAPA International Association of Amusement Parks and Attractions ou
Associação Internacional da Indústria dos Parques de Diversões
32
OMT Organização Mundial de Turismo
PIB Produto Interno Bruto
SINDEPAT Sindicato Nacional de Parques e Atrações Turísticas
TIA Travel Industry Association of América
WWA World Waterpark Association ou Associação Mundial de Parques
Aquáticos
33
32
Tradução livre para fins da pesquisa.
33
Tradução livre para fins da pesquisa.
115
APÊNDICE B
Entrevista realizada com o Gyorgy Galfi em 29/11/2005
116
O segmento de turismo, de entretenimento, carece de verdadeiros
profissionais, temos muito pseudo-profissionais, um pessoal que
mercadologicamente é extraordinário porque vende o que não tem. Mas
carecemos de profissionais que têm conhecimento profundo de seu serviço,
trabalho, produto e comprometimento e relação com sua profissão, além de amor e
entusiasmo, que Disney transmitiu a toda a organização, e que é alimentado
diariamente.
Nenhuma atividade humana funciona sem entusiasmo, sem
comprometimento. No show business que estamos, no espetáculo, entusiasmo é
fundamental. Isso vale para os músicos e atores, que não vivem só do aplauso e
do dinheiro, mas sem paixão e sem amor, não funciona.
E da onde vem essa motivação?
Primeiro, portanto, precisa da auto-motivação. E aquele que não gosta de
gente, interagir, de relações humanas, então está no ramo errado. Uma coisa é
certa: o século XXI além de ser o século das comunicações é também o século dos
espetáculos. Hoje tudo é espetáculo. Em qualquer loja ou negócio faz tudo para
seduzir, criar emoções, experiências vivenciais. Tem vários livros publicados a
esse respeito sobre o espetáculo dos negócios: da importância de seduzir o seu
interlocutor, o seu visitante, excedendo as suas expectativas.
Podemos dizer que o pro99.1C0 0 10z01984 Tm(3839 Tc 1.3118 Tw 1270 0 12 125.27997 180.az tudo par)Tjoje0 0 19 125.27997 180.o psrtD004rs8 Tm(v Tm4 Tm( vivem)Tj12 078312 125.27997 180. Hoje 004uzir o seu)Tj12 0 0383 125.27997 180. C0 0 10z016Tf-0.0008 Tc 0.02251 Tw 12 0 0003.4799 221.47ões, exuzir o seu
117
passear com eles pelos parques em Orlando, e enquanto ele andava, todos o
cumprimentavam. Ele fazia questão de almoçar com os seus funcionários, ou
melhor, com seus membros do elenco. Esse é o espírito. Além disso, ele sabia
operar todos os brinquedos/atrações, conhecia o ambiente e não tinha aquela
distância que muitos dirigentes constroem.
Muitos executivos falam da importância de uma gestão empresarial de portas
abertas, mas muitos só falam e não executam. Entre a teoria e a prática existe um
abismo. Não se pode trabalhar turismo ou parques temáticos através de cursos de
correspondência. A expressão correta é: hands on the job (ou mãos na prática).
Você deve saber o objetivo da sua função, o motivo que a executa, as técnicas
necessárias da melhor forma possível.
E como motivar um funcionário muitas vezes mal pago, mal treinado a
exercer corretamente essa função? Porque a Disney tem condições e subsídios. É
possível fazer isso no Brasil?
Sim, é possível. Primeiramente, é indispensável a auto-motivação, ter
interesse. Segundo, ter condições com ambiente de trabalho favorável. Como
esperar que seu colaborador atenda bem o público se não oferece alimentação
adequada, sobrecarga de trabalho, não ter uma gestão de benefícios adequada,
infra-estrutura decente? É isso que a Disney oferece aos seus funcionários, porque
assim ele pode ficar motivado, e consegue se considerar parte do show. Não tenha
dúvida, de que o mau atendimento também pode ser encontrado nos Estados
Unidos. É um trabalho muito grande elevar o nível de atendimento numa qualidade
e eficácia de nível mundial. O maior desafio, entretanto, é manter esse padrão.
118
Em parques de diversões o desafio é o seguinte: um parque é composto de
vários setores, e a responsabilidade é em todo o processo. Começa no
estacionamento e termina até o visitante sair do estacionamento. O desafio é
manter o alto nível de qualidade e sedução em todos os setores o tempo todo.
Esse é um dos pontos principais da minha pesquisa. Portanto, será que o
senhor pode elencar quais seriam os pontos mais importantes para garantirmos
esse nível de excelência de qualidade?
Primeiro ponto: seleção e recrutamento. A história começa aqui. Se não é
bem feito, ou seja, se não escolhemos o perfil necessário, já se começa com
problemas.
2. Treinamento e desenvolvimento contínuo, pois sempre tem algo a ser melhorado.
O problema é que no Brasil, caiu o movimento, o primeiro item que se corta é o
treinamento. E isso é um problema.
3. Ter filosofia, objetivos e visão do futuro bem definidas. Para onde estamos
caminhando? O que queremos para liderar? A questão é que a direção tem que
demonstrar confiança. Tem que se construir a mútua confiança entre os
colaboradores com a direção.
4. Comunicação interna. Os colaboradores/ artistas devem saber o que acontece,
quando, como e porque acontece. Uma comunicação constante.
5. Valorização contínua e reconhecimento dos membros do elenco.
6. Oportunidades de desenvolvimento profissional e pessoal.
7. Segurança absoluta para o público interno e externo. Segurança no trabalho, uso
de equipamentos de segurança. Ser o que os americanos chamam de ser safety
119
minded (ou conscientes pela segurança). Além disso, fazer todos os ensaios de
simulação de acidentes, primeiros socorros, evacuação da área.
8. Manutenção rigorosa e confiável. Eu passei uma noite inteira no Magic Kingdom.
Eles transmitiam música a todos os funcionários que faziam a limpeza e
manutenção durante a madrugada, para criar esse ambiente. Existe depois a pausa
para a refeição. No ano passado voltei ao Playcenter como gerente geral e
realmente carecemos de profissionais com esse perfil no Brasil, porque ser
profissional nessa área é uma opção de vida, porque se trabalha nos finais de
semana, feriados, durante as noites.
E muitos brasileiros se recusam a aceitar esse tipo de trabalho, preferindo
ficar desempregado a trabalhar nesses dias e horários. E isso funciona para todo o
show business. Ano passado trabalhei mais de três mil horas no Playcenter, e
quando queria ver minha família, ela ia ao parque.
9. Preparar a equipe e os responsáveis para o gerenciamento de crise interna. É
essencial. Por exemplo, alguém caiu de uma atração. O que e como se deve
proceder? Como se vai conduzir esse sistema, os problemas? É um método.
Normalmente, as empresas treinam os funcionários para a operação padrão,
mas são em momentos de crise que vemos se os funcionários são bem treinados.
Muitas vezes o cliente tem razão, mas em outras vezes, precisamos fazer com o
que o cliente ache que ele tenha razão, quando ele está enganado. Entre milhares
de pessoas, se uma tem uma experiência ruim, essa pode manchar a reputação da
empresa. Segundo o guru do marketing, Philip Kotler, uma pessoa satisfeita, feliz,
conta sua experiência para algumas, uma insatisfeita conta para dezenas.
120
Isso é o que Jan Carlzon chama de linha de frente, que deve ser a mais bem
preparada da organização porque ela lida com a hora da verdade, que é o
atendimento com o cliente?
Isso é profundamente verdadeiro. As organizações Disney fazem isso muito
bem.
10. Procurar em todos os setores a máxima competência, ou seja, você ter o seu
elenco capaz, porque todos são capazes. Mas o que é transformar essa
capacidade, essa competência? É transformar em resultado. Não adianta fazer
todos esse nove itens se não tiver resultado. Se o seu pessoal não trabalhar e não
atender direito, então você não transformou essa capacidade em competência.
Todos somos capazes. Tem que fazer acontecer. Não basta o treinamento.
A Disneylândia de Paris enfrentou muitas dificuldades. Acredito que o parque
deveria ter sido construído em outro país, como a Espanha, por exemplo. Eles
tiveram que mudar parte da famosa parada para incluir elementos da cultura
francesa, mas que se destoam do conjunto, não é compatível, não é o espírito da
Disney. Já o Asterix é um belo parque, que usa da cultura francesa como tema. O
americano é pródigo em transformar cada fato turístico numa grande atração.
No Brasil, nossa cultura e recursos são muito diferentes. Enfrentamos um
outro problema básico: a falta de educação. Lá na Disney existem vários
universitários que trabalham, inclusive brasileiros, e muitos deles limpando o chão.
Quando um universitário brasileiro se proporia a esse serviço aqui no Brasil? É um
grande paradoxo.
A nossa cultura não valoriza suficientemente o trabalho. Temos essa visão
de enxergar o trabalho como um sacrifício, uma obrigação, uma necessidade. Se
um dia conseguirmos transformar esse dever num prazer será muito melhor. Deixo
121
claro que já trabalhei com muitos brasileiros que são não assim, não se pode
generalizar. O problema é que acordar de manhã com aquela obrigação é muito
ruim.
Concordo também com a idéia de que o brasileiro tem características de ser
criativo, imaginativo, hospitaleiro, com jogo de cintura, isso falado inclusive pelos
professores em escola de guerra onde freqüentei, quando analisando o arquétipo
do brasileiro. O nosso povo, no entanto, tem dificuldade em trabalhar em equipe.
O individualismo, se sobressair sozinho, querer tirar vantagens de todos se arraigou
na nossa cultura. Einstein disse que é mais fácil quebrar um átomo do que mudar
um hábito.
Hábito de não trabalhar nos finais-de-semana, de querer tirar vantagem de
tudo, de não ter o espírito de solidariedade, da falta de nacionalismo, precisam ser
mudados. Devemos lembrar, entretanto, que a nossa diferença histórica é
importante, ou seja, quando o Brasil foi descoberto, a Europa estava vivenciando o
Renascimento no auge. É difícil fazer, portanto, as comparações.
Acredito que no Brasil o problema/desafio é o gerenciamento deficiente: ou
bad management. Enquanto que os políticos e dirigentes não amarem essa pátria
como nós gringos a amam, essa transformação vai ser difícil. É claro que existe
corrupção e malandragem em outros países, mas lá as conseqüências são
desastrosas.
Estou certo também que estamos num momento de mudanças. A
potencialidade do Brasil, sua pujança é maravilhosa, existem pessoas boníssimas e
tenho certeza de que o país vai encontrar seu papel histórico inevitavelmente. É
uma questão de tempo.
122
Pergunta final. Como então garantir a visitação ou revisitação dos parques
no Brasil? O senhor acredita que existe uma falta de cultura de visitação, ou o
problema é a falta de um bom produto de qualidade, ou até de renda?
É um fato que não conseguimos renovar os equipamentos, porque os
impostos e o câmbio não permitem. Mas não coloco esse extremismo, de limitar
tudo a um fator. É fato também que o brasileiro não tem essa cultura, esse hábito,
como o americano. E também não tem dinheiro. Uma família paulista para ir ao
Hopi Hari com duas crianças é uma fortuna. Portanto, essa análise deve ser feita
dentro desse conjunto de variáveis. Além disso, tem também a questão da
concorrência. Hoje o shopping center é um grande concorrente, a praia é outro.
Nos Estados Unidos, em Atlanta, por exemplo, as pessoas não têm muitas
opções, por isso vão a parques, além de ser muito frio. Como pesquisadora é
necessário você levar em consideração os mais variados componentes nessa
análise. A questão da segurança urbana também é um problema no Brasil. Além
disso, nós não temos ainda os recursos de investidores.
Os custos operacionais dos parques como mão-de-obra, energia elétrica,
aluguel, manutenção, aumentam constantemente, e por outro lado, não
conseguimos aumentar o preço do ingresso de maneira proporcional a fazer frente
a esses custos. Todos estamos no vermelho. Se você aumenta o valor do
ingresso, o público não vem porque não tem dinheiro, então os parques fazem
promoção atrás de promoção, reduzindo o preço para se ter uma massa crítica.
Hoje a Disney cobra de entrada US$55,00. O Playcenter cobra US$10,00/12,00. A
realidade brasileira tanto do ponto de vista cultural, operacional é totalmente
diferente.
123
E quais as perspectivas?
Boas.
Por que?
Porque aprendemos cotidianamente com os nossos grandes desafios. Se
não podemos trazer os equipamentos, as atrações, estamos trazendo os eventos
nos parques, os espetáculos. No Playcenter, levaram também os esportes radicais,
como arvorismo, parede de escalada. Outro produto como a “Noite do Terror”, e a
“Hora do Horror” no Hopi Hari. A idéia da “Noite do Terror” foi minha há dezoito
anos atrás. Ninguém acredita em Halloween no Brasil nessa época. Foi quando vi
isso num parque na Califórnia onde levaram 35 mil pessoas. E hoje tem dezoito
anos de muito sucesso. Quando fiz na primeira vez a verba foi muito pequena, pois
ninguém acreditava.
Mas a perspectiva é de se criarem novos parques ou remodelar/investir os
existentes?
Os novos projetos são de construção de parques dentro de shopping
centers, parques internos, existem também projetos de parques aquáticos, porque
nosso clima permite e up grade ou salto qualitativo dos parques atuais. Ou seja,
criar o hábito de freqüência ou fidelizar os visitantes como Disney faz, mas não só
pelas atrações, mas pelo atendimento, comida gostosa, serviço, todo aquele
ambiente. Você tem que entrar no clima. Walter Elias Disney disse: “Eu não quero
que o visitante dentro do parque viva sua realidade, eu quero transportá-los a uma
outra realidade, da magia, do sonho, da emoção”.
124
Mas, se o atendimento dentro do parque é igual como é na rua, você está
longe desse sonho, dessa magia. Aí que entra o cenário, a ambientação, a música.
Isso explica as milhares de fantasias nos subterrâneos da Disney, que são
impecáveis, sem nenhum pingo de sujeira.
A questão da obsessão pelos detalhes?
Certamente. O sucesso está nos detalhes. Para encerrar, como executivo e
treinador e educador da área de parques: gerenciar um parque de diversões é uma
das coisas mais fáceis. Só é preciso cuidar de 500 mil pequenos detalhes. Se você
cuida de 499.998, aqueles dois pequenos detalhes são capazes de comprometer
todo o resto.
Quando levei um grupo de pessoas do Playcenter para um treinamento na
Disneyland, naquele dia tinham oitenta mil pessoas no parque. Se alguém se
esquece de onde estacionou o carro, naquele estacionamento gigantesco, apesar
de ter passado um dia maravilhoso, mas se às vinte horas não sabe onde está o
carro, a experiência acaba, e o problema é do parque. É nisso que os funcionários
são treinados e orientados. Se um falha, quebra a magia. Todos têm que saber seu
papel e função dentro de um script (roteiro) pré-estabelecido.
125
APÊNDICE C
Entrevista realizada com Jorge Vernaglia em 01/12/2005
Parque de Diversões é um nome genérico para Parques Temáticos e para
Hyde Parks, que não temos um nome específico em português, que o exemplo
mais clássico é um Playcenter, que seria um parque de atrações de diversões
variadas. E um outro conjunto interessante que temos aqui é um Parque Híbrido,
que seria um zoológico e mais alguma coisa, ou um Safári ou um Ibirapuera, que é
um parque que pode ter algumas composições. Onde que está na minha opinião a
grande confusão no Brasil e no mundo quando falamos de Disney em nível de
excelência.
Podemos ter as duas coisas: hoje eu não sei se o Hopi Hari está num nível
de excelência, mas eu posso afirmar que quando ele abriu, estava num nível muito
alto de qualidade. Hoje em função da questão econômica, de se tentar fazer
ajustes de economia, então passa a refletir na qualidade. Eu diria que está num
nível de 70% do que poderia ser considerado um padrão de excelência,
comparando-o num nível internacional.
Qualidade é uma coisa ligada ao experimento. Antes disso, vem o
encantamento. Quando pensamos no Mickey, quem pode dizer que ele é um rato,
um animal asqueroso? O Mickey é um personagem cheio de encantamento.
Primeiro, a Disney que todo mundo busca comparação, tem um
encantamento próprio que se refere à própria vida do Walt Disney. Esse é o
encantamento. Daí pra frente todo mundo saiu correndo atrás desse modelo de
Parque temático, buscando um tema. A Disney não é comparação em termos de
126
encantamento, não em tecnologia ou na qualidade dos serviços prestados. Disney
inventou contar sua vida através de um parque, e isso não tem comparação. O que
se pode comparar é a parte operacional do parque. É posvel encontrar nos
Estados Unidos e Europa outros parques com o mesmo padrão de qualidade, em
termos de higiene, limpeza. E nesses pontos, no Brasil têm parques que chegam
muito próximo. Entretanto o nível da riqueza de detalhes, retratado no livro “Nos
Bastidores da Disney” aqui não tem, porque custa muito caro. Já teve, mas
economicamente não se sustenta.
Você se refere àquela questão retratada nesse livro citado sobre pintar as
atrações todo dia, por exemplo?
Sim. No meu tempo no Hopi Hari nós fazíamos isso. Mas, quando tem que
cortar gastos, não se mexe no item segurança, por exemplo, então cortam
despesas em itens que não são percebidos pelo cliente, que no caso do Hopi Hari é
o cliente que busca diversão. Tem clientes que estão em busca do ambiente, do
lúdico, mas o prioritário é o cliente da diversão. Então alguns itens são
privilegiados economicamente. Existe um grupo de engenheiros que trabalham no
parque, e com certeza a parte operacional está em dia, em detrimento desse tipo
de detalhe. Economiza-se onde a percepção do brasileiro não é grande. Com isso,
economiza-se dinheiro para se ganhar um fôlego empresarial para voltar aquele
estágio inicial. Quando se fala com os dirigentes, todos têm esse mesmo desejo e
percebem os detalhes, mas não podem fazer porque têm que privilegiar outras
coisas. Há cinco anos atrás todos compraram os livros da Disney e seguiram seu
modelo, ninguém criou. O que está tentando se criar aqui agora, e que está
127
amadurecendo no país, tentando responder a questão dos
eir” nt
128
central das atrações, e o fato de ser conhecida pelos brasileiros, ou melhor, pelo
público infantil, já que é um parque voltado para esse público?
Na minha opinião, esses parques devem ser considerados como Centro de
Entretenimento. É um pequeno espaço de diversão, com um público bem especial.
Ou seja, é infantil mesmo, no sentido de que estão bem direcionados ao seu
propósito. E todo parque de sucesso é um pParque família, que é a idéia da
Disney. E quando o Hopi Hari mudou o seu conceito, mudou para um parque
família. E por que tem que ser família?
Primeiro, um parque temático precisa de uma grande área para ser construído, e
por isso, estão fora dos grandes centros pe
129
Voltando ao raciocínio do Hopi Hari, em sendo um parque família, família no
sentido de ir uma família ou ir um grupo. Esse é o conceito. Isto é, o parque é uma
atividade gregária. O parque não é como cinema, teatro, que a pessoa vai sozinha
ou deixa os filhos na casa da mãe. Ou então faz a conta de que o Hopi Hari custa
R$40,00 e o cinema custa R$20,00. Não é esse o raciocínio para analisarmos essa
atividade, do caro ou barato. Na atividade gregária mais do que fazer o cálculo do
custo do deslocamento, do valor da entrada, e que nunca é unitário, é sempre
multiplicado por “n”, o sujeito tem que estar disposto, motivado.
E o que motiva as pessoas?
Volto a dizer, é o encantamento. Aquela história de quando éramos crianças e
íamos sair de férias. Era muito melhor antes, a preparação, do que o durante. Tudo
que encanta é assim. Então você tem a primeira fase do encantamento e depois a
segunda fase da experiência. E quando falamos de qualidade estamos falando da
fase da experiência. E ao falarmos de parque, temos que ter: fase 1: encantamento
e fase 2: experiência.
Na fase 1 do encantamento é o desejo de não sei o que. Ninguém vai à
Disney só pelas atrações, ou pelo brinquedo novo. Ele vai por algo maior e
subjetivo. É claro que um parque deve estar sempre se atualizando porque a
repetição da experiência é o que faz você voltar. O encantamento leva você. A
experiência leva você a voltar, ou o que chamamos também de revisitação. É o
que alguns “parqueiros” gostam de chamar de repeat business. A experiência faz
com que você volte porque tudo o que você sonhou se transformou em realidade,
numa boa experiência e eu quero experimentar novamente, embora não tenha o
130
mesmo encantamento, porque o encantamento vai se diluindo ao longo do tempo e
o que fica é uma boa experiência.
Na minha opinião, a primeira coisa que falta aqui no Brasil é o encantamento,
ou seja, eu vejo na linha do Disney dois tipos de possibilidades aqui no país que
são Maurício de Sousa e Monteiro Lobato, que podem oferecer uma possibilidade
mais lúdica e que crie um encantamento infanto-juvenil, e que se arraste por toda a
vida da pessoa, que mesmo quando adulto ou velho tenha boas lembranças ricas
da sua infância e juventude. Esses dois personagens têm um arsenal, que se bem
trabalhados, têm matéria-prima para se criar um encantamento como desejo. Você
precisa de matéria-prima para isso.
No caso do Monteiro Lobato, personagens como a Cuca, a Emília, Visconde
de Sabugosa, dá pra se explorar muita coisa, mesmo o folclore brasileiro com a
Mula sem cabeça, por exemplo. Do mesmo jeito com o Maurício de Sousa. A
minha filha aprendeu a ler antes da escola por causa da Mônica. Eu sou fã dele. A
primeira tentativa de um parque do Maurício de Sousa eu acompanhei. Foi em
Paulínia, um parque chamado “Brasil 500”, para comemorar os 500 anos do
descobrimento do Brasil, um projeto do Ruy Otakhe. Eu trabalhava com o Ruy
nessa época, e o parque não deu certo, pois na verdade eles se preservaram
porque sabem das dificuldades.
Por isso, a opção por esse modelo reduzido do Parque da Mônica, indoor,
dentro de grandes centros, onde posso pegar a minha filha e ir brincar durante
algumas horas e voltar para casa, porque não é gregário. O parque gregário é bom
reforçar que não é só família, mas é turminha, grupo espontâneo e não de
excursão. E quando a turma se reúne e fala “vamos!”, tem uma série de variáveis
131
que precisam ser consideradas, como transporte, se todos estão dispostos, pois se
um prefere, por exemplo, ir ao cinema, todos mudam de idéia.
E ninguém acorda morrendo de vontade de ir a um parque de diversões.
Existe toda uma pré-venda. Disney e outros parques nos Estados Unidos tiveram
uma fase que foram muito mal. Depois de 20-25 anos, começaram a mudar. Então
demora um tempo para dar retorno. A Disneylândia fechou 40 dias depois da sua
inauguração, pois percebeu que a infra-estrutura estava deficitária, não tinha
comida e banheiro suficientes. Ou seja, embora o encantamento fosse forte, a
experiência foi uma porcaria. Ninguém acorda morrendo de vontade de ir a um
parque no Brasil porque não tem encantamento. Se você conseguir “arrastar”
alguém até lá ele vai gostar, porque a experiência pode ser boa.
Então você está dizendo que aqui no Brasil é mais difícil levar um visitante a
fazer sua primeira visita do que fazê-lo revisitar um Parque?
Sem dúvida. Esse é um fator importante, mas não é único. Novamente, vale
lembrar que por ser uma atividade gregária, não adianta só um gostar e querer
voltar, todos devem querer no mesmo tempo. Existe todo um estudo dos parques a
respeito da concorrência.
E por que o Parque da Mônica Rio fechou?
Porque ele não compete com a praia. É um engano. Acho que ele compete
com o Barra Shopping. Existe parque melhor que esse? Na minha opinião lá é um
parque de diversões, que tem atrações variadas para todos os membros da família,
com comodidade, ar-condicionado, estacionamento, e não paga para entrar.
132
Para montar uma infra-estrutura como um Hopi Hari é muito difícil. O Hopi Hari
buscou uma âncora do lúdico que é o “Vila Sésamo”. Hoje, durante a apresentação
do teatro do Hopi Hari onde os personagens do “Vila Sésamo” se apresentam são
os pais segurando seus filhos no colo, explicando quem são os personagens. O
encantamento fica por conta da experiência, porque são personagens chamativos e
coloridos, pois aqui no Brasil o programa não passa mais na televisão e quando sai
da mídia, morrem. Existia inclusive uma intenção da rede Globo de retornar o
programa no ar, mas não o fez até porque a própria Rede Globo queria fazer um
parque de diversões próprio, no Rio.
O Walt Disney conseguiu passar a imagem da Disneylândia, porque ele tinha
um programa de televisão, que passava no Brasil aos domingos, às seis horas da
tarde e que se chamava Disneylândia, e passava quase no mundo inteiro quando
ele mesmo apresentava. Ele apresentava o próprio personagem Walt Disney, e
sua vida e sua terra, que é a terra do Disney, onde, por exemplo, na main street (ou
rua principal) é recriada sua cidade natal, Marceline. O cinema recriado também
relembra um cinema onde Disney entrou escondido quando era criança e onde
estava passando o filme “Branca de Neve e os Sete Anões”, cinema mudo branco e
preto. E esse foi primeiro desenho animado que ele fez, e que foi um grande
sucesso.
Ou seja, tudo o que é retratado na Disneylândia é referente a momentos de
sua vida. Disney é uma pessoa muito conflitante, pois ao mesmo tempo em que ia
do extremo da fantasia, ia ao extremo do concretismo, com uma vida marcada por
muita depressão. O primeiro desenho animado que ele criou, um coelho chamado
Oswald, a idéia foi rechaçada na época e até depois roubada. Depois, ficou
depressivo e sozinho num apartamento em Nova Iorque, onde tinha um
133
camundongo que comia os restos de sua comida. Então, na sua fantasia num
momento psicótico aquele animal era quem lhe fazia companhia, e em cima desse
rato que criou seu mais famoso personagem que é o Mickey.
O Mickey é um camundongo, um animal asqueroso. Ele transcendeu num
animal uma outra figura: ele viu um companheiro, alguém que conseguiu retirá-lo
daquele lugar e daquele momento depressivo. E é justamente isso que gera o
encantamento nos parques Disney, porque tem sentido, tem conteúdo, pois os
parques retratam sua experiência de vida. As atrações não precisam “vestir” uma
história, pois a história é real. Não tem nada sem a participação da vida de Disney.
Por isso que eu digo que vejo no Brasil que Monteiro Lobato e Maurício de
Sousa têm condições de fazer algo parecido. Outra vantagem dos parques da
Disney é que foram pioneiros. Ele criou o conceito de parque temático, ele criou o
complexo da Disney. Por um lado, você erra, mas é o primeiro. Isso tudo para
voltar a falar de encantamento. Já a experiência é uma outra história.
Quando estava certa vez na Disney, puxei conversa com uma vendedora de
pipoca dentro do parque. Era uma colombiana muito triste, pois estava lá porque
não tinha para onde ir. Orlando é o lugar que mais mal paga nos Estados Unidos,
mas que todo mundo mantém essa aura porque precisa do trabalho. Eu convivi 8
meses trabalhando com esses funcionários, durante a época do start-up do Hopi
Hari, e sei que é muito duro. Problemas de saúde, cansaço, desânimo, ameaças
de greve, a repetição dos dias, o sorriso necessário, e para isso precisa de muita
motivação.
Passou da linha amarela, como na Disney, o funcionário vira um
personagem. Aqui também se usa esse modelo para um grupo de pessoas, que
viram esse personagem. Mas em algumas funções, como chapeiro do hambúrguer
134
é difícil cobrar que ele seja esse personagem, como acho que na Disney ele
também não consegue.
Para completar a história da pipoqueira da Disney, até o momento que ela
estava vivendo o personagem e dando seu sorriso, tudo estava bem, até se puxar
conversa e ela ser indagada, a magia acaba, e ela despenca. É muito frágil. Posso
dizer que existem cenários mais bonitos que a Disney, como a Universal, mas
nenhum tem o encantamento que tem a Disney.
E no Brasil? Quais os parques que dão certo na área do turismo?
O Beto Carrero World e o Beach Park, porque se você for para Fortaleza ou
para o sul, dentro do pacote turístico, você ganha os ingressos para esses parques,
querendo ou não. Isso alavanca muitos visitantes. Já no Hopi Hari isso não
acontece, pois o turista representa muito pouco em relação ao total de visitantes, ao
se considerar as regiões de residência primária, secundária e terciária, que são de
80km, 160km e 240 km, respectivamente. É um modelo americano, que diz que
para uma pessoa realizar uma atividade de entretenimento deve andar no máximo
1 a 2 horas de carro. Essa faixa aqui em São Paulo tem quase 30 milhões de
habitantes. Foi usado um redutor drástico na taxa de penetração dos parques, na
época de implantação do Hopi Hari, pois não existia nenhum estudo realizado antes
no Brasil de parque temático, então usaram um modelo americano com
adaptações.
Quando o mesmo acionista do Hopi Hari comprou o Playcenter, ele queria
acabar com o Playcenter para fazer crescer o Hopi Hari, mas ao mesmo tempo ele
morria de medo de outro grupo construir um outro Hyde Park, porque uma grande
capital como São Paulo tem demanda de um parque assim. O Playcenter recebe
135
anualmente cerca de 2 milhões de visitantes, uma média muito boa para um
parque, até porque antes de sua reforma, estava caindo aos pedaços. O
Playcenter atende os anseios de demanda por pura diversão, onde ninguém
procura o encantamento, e não pode ser considerado gregário. É outro conceito. Já
o Hopi Hari não espera receber turistas. Ele conta com sua taxa de penetração
nesse mercado. Só que os interesses dos visitantes, pouca gente estudou, isto é,
qual a motivação desse grupo de pessoas por esse tipo de entretenimento. E por
isso o Hopi Hari pode ser considerado um Hyde Park disfarçado, porque não
conhece sua demanda e não cria o encantamento necessário, e com todas as
dificuldades de estar localizado longe de São Paulo, de pedágio, combustível,
depender de carro. Se ele tivesse sido construído dentro de São Paulo, seria
certamente muito diferente. Quando o parque não tem encantamento, o visitante
faz conta, quando tem, não faz.
Podemos então concordar com Marcelo Salomão autor do livro “Parques de
Diversões no Brasil” quando ele diz que o que justifica a Disney ter tanto brasileiro é
uma questão de status?
Eu não acho. A história do destino é importante, ou seja, o parque temático
como destino. O parque é um atributo, uma atração dentro de um destino, que no
caso de Orlando tem um forte apelo de compras, de alugar uma casa americana,
de dirigir um carro americano, de viver o american way of life por alguns dias.
Outra questão importante é que durante as férias o tempo é diferente, a energia é
outra e as pessoas só fazem conta quando voltam, por isso estão mais dispostas a
gastarem.
136
No dia-a-dia você faz conta durante a atividade. E o Hopi Hari não foi destinado
ao turista, e sim à população residente. Raramente quem vai a esse parque está
de férias. Num estudo feito pelo Hopi Hari, esse número chega a 11%.
Mas já existe um roteiro turístico que inclui os principais Parques de Diversões
de São Paulo para agregá-los.
Sim, porque assim os parques viram destino. Como é que criamos um
destino em São Paulo? Criando um conjunto de produtos. Hoje o turismo cultural
em São Paulo é muito maior do que o que podemos chamar de turismo adrenalina.
Hoje vem gente do Brasil inteiro para assistir o espetáculo “Fantasma da Ópera”,
por exemplo. Têm também os roteiros de luxo e da saúde, e São Paulo comporta
todos esses tipos de públicos.
Voltando a falar dos quesitos que definem a qualidade dos serviços num
Parque de Diversões. Quais seriam?
De um lado existe o encantamento e do outro a experiência. O mais
complicado é o encantamento, que não é um produto. Como se encanta alguém? A
grande interpretação é o desejo recluso de cada alma, uma expectativa. É muito
profundo, remetendo a questões antropológicas e mitológicas. E não tem uma
receita. Quem você quer encantar? E não se quer encantar um tipo de pessoa, e
sim alguns tipos de pessoas. E mesmo dentro desses tipos de pessoas, temos
qualificações diferentes. Um deles é a família, e apesar de estar encantado
depende de todo um grupo. O outro é um caçador de aventuras. Outro ainda quer
o custo-benefício, e apesar de encantado, tem que fazer conta. São vários nichos.
137
Como então encantar todas essas matizes de interesses?
É sério e complicado. É fundamental ter o encantamento, mas é quase
impossível se elencar itens que podem definir ou estipular como um Parque de
Diversões pode trabalhar esse encantamento. Cito como exemplo o Instituto
“Homem Americano” em São Raimundo Nonato, no Piauí a 560km de Petrolina. Lá
existe o maior sítio arqueológico de pintura rupestre do mundo. É um lugar super
bem cuidado, e queria atrair turistas, porque recebe em média de 200 a 300
pessoas por ano. Mas é capaz de ter só essa quantidade de interessados no
mundo que possam e queiram fazer esse tipo de viagem. Se a pessoa é uma
estudiosa e esse assunto a encanta, ela paga o preço que for para realizar tal
viagem, mas será que existem mais pessoas interessadas e dispostas a realizar
uma viagem tão longa?
Hoje o que encanta tem que ter conteúdo e o conteúdo deve agregar valores
educacionais fortes. Quando falamos em educacionais podemos desenrolar vários
aspectos. E daí remete a Domenico de Mais, que diz que a sociedade pós-
industrial quer o ócio criativo: trabalho, educação e diversão. Essas três figuras
conjugadas são a chave para entendermos essa sociedade. E quem freqüenta um
parque desses é a sociedade pós-industrial. São Paulo é uma cidade de serviços,
pós-industrial. E é nessa convergência, na minha opinião, que podemos buscar o
encantamento.
O Hopi Hari tem hoje um tremendo programa educacional, porque para a
criança a escola é um trabalho. E a criatividade é o lúdico que vira o concreto, pois
não basta uma boa idéia se ela não é colocada em prática, e isso é o ócio criativo.
Isso seria o que chamam de Edutainment?
138
Sim. No Hopi Hari ensina-se às crianças as leis da física através do estudo
da Montanha-russa. Esse programa é muito recente, e ainda não se sabe muito
bem quais os resultados, mas o encantamento pode vir daí, que é a experiência do
ensinamento ligado ao conteúdo. O item da Diversão é o encantamento do lúdico,
o espetáculo, por isso a ambientação é tão
ncia dlo, Moecenpara ca nslo, Mr47aspeor 7astem
139
- Conceito. O Conceito pode ser através de um parque de diversões, onde
as pessoas buscam a diversão, ou Temático, que seria um modo de agregar valor a
essa diversão, encaixada dentro de um contexto. Mas é importante que esse
conceito seja claro e bem percebido pelo visitante.
Para concluir, na questão da visitação de um parque de diversões é preciso
separar a visitação da revisitação. Para a visitação é necessário ter atributos de
expectativa de atração do público. Para a revisitação, os atributos são variáveis
mais fáceis de serem controladas porque elas são mais concretas e conhecidas. O
difícil é entender o encantamento.
Em termos de amadurecimento é montar a história do destino, criar um
segmento turístico que se introduza o produto parque dentro do contexto. Já
existem dois destinos que a Secretaria do Estado de São Paulo montou para essa
região, que é o circuito das frutas e o de Ciência e Tecnologia, e tem outro que o
Ministério do Turismo montou que inclui os Parques numa visita a São Paulo. O
futuro espera isso: montar circuitos. Tem que se criar demanda regular, ou seja,
independente se chova ou esfrie. É uma demanda de pré-venda de pacote, que
inclua o Parque.
O fato de o turismo ter uma incidência forte na economia do Nordeste é em
função deles serem muito melhor articulados do que nós aqui em São Paulo. Fala-
se que São Paulo é turismo de negócios, mas o fato é que o turismo de negócios é
muito mal trabalhado, faltam ganchos, falta um melhor planejamento. E como é
que a indústria amadurece? Quando amadurece esse conceito de cluster. Isto é,
nenhum negócio funciona bem sozinho, e por isso, afirma-se que a concorrência
nessa área é racional, pois os parques convivem muito bem com os outros parques,
e é bom que tenham vários, como no caso de Orlando, pois também contribui para
140
o desenvolvimento do conceito de destino, pois o visitante pode se programar de
cada dia visitar um parque diferente. Não existe canibalismo. Certamente que os
parques devem ser diferentes entre si.
E você vê a perspectiva da construção de novos parques de diversões no Brasil?
Não, e não digo só a curto prazo, mas a médio prazo. Isso porque os projetos
que existiram fracassaram, e os que restaram não se consolidaram conforme as
premissas de projeto da engenharia financeira, ou sejam, o retorno de capital não
aconteceu. Isso não consolidou a indústria dos parques temáticos. Os parques de
diversões é um pouco diferente, mas eles já estão com a preocupação como o
Playcenter de se readequarem, diminuindo os custos e até de tamanho, estar se
modernizando, despoluindo o rio, isto é, criando uma série de atributos. Outra
coisa muito importante também em termos de conceito holístico do parque, da
atividade.
Quando falo holístico envolve todos os apelos do homem moderno, o ecológico,
a educação, a socialização, a ética, atributos que têm que ficar percebidos no seu
produto, para o seu público. Tudo isso contribui para responder outra questão que
é em relação à motivação dos funcionários. É motivador para o funcionário que
trabalha num parque assim sentir esses atributos, quer dizer, ele é um meio, um
agente ambiental, um educador para implementar isso. Tem que fazer parte de
uma componente de vida dele.
O Hopi Hari chegou a fazer durante um ano e meio um trabalho de
espiritualidade com seus funcionários, sem nada a ver com religiosidade, pois o
grande agente de mudanças é o lado espiritual humano. Outra componente
antropológica forte é de que todos que trabalham no parque são da região, e o perfil
141
dessas pessoas é de descendentes dos imigrantes trabalhadores rurais, que depois
passaram a trabalhar na indústria operando máquinas e hoje têm que trabalhar
encantando gente! É um choque cultural muito grande e que deve ser considerado,
que aconteceu em 50-60 anos, ou seja, foi um processo muito rápido.
Na Disney, muitas das pessoas que lá trabalham são por falta de opção.
Muitos são aposentados, imigrantes, porque são baratos. Existem muitas
oportunidades de trabalho, mas por outro lado existe um problema salarial grave.
Essas questões ficam muito encobertas. Bom ou ruim é um outro critério de
avaliação. Quero dizer que é muito mais complicado para o trabalhador do parque
se ele não se sentir agente desses atributos subjetivos e que fazem parte da sua
espiritualidade, como agente transformador. E a grande maioria dos trabalhadores,
no caso do Hopi Hari, é composta de jovens que trabalham por sobrevivência,
ninguém faz por um ideal. É claro que existem exceções.
Você está dizendo que é importante que um parque contrate pessoas daquela
localidade?
É importante para ter um vínculo, mas em contrapartida dá muito mais
trabalho, pois precisa compreender toda uma componente cultural para dar
motivação. É o caso do Clube Mediterranée, que tem pessoas do mundo inteiro, e
não existe vínculo com o local.
E em termos de perspectivas?
Parque Aquático é um conceito interessante, mas o problema é que no Brasil
ele compete com o litoral, e para se fazer no interior, não tem demografia, ou seja,
público suficiente para mantê-lo.
142
A questão envolve uma situação econômica e uma questão cultural. Ou
seja, se a pessoa tem dinheiro para o entretenimento, poucas optam pelo parque, e
digo isso baseado em pesquisa séria desenvolvida por encomenda de um grande
parque brasileiro. Vale dizer que a praia não é um passeio barato. As pessoas só
têm a sensação de que é barato, mas segunda essa pesquisa é a principal
preferência da maioria dos brasileiros, o que comprova a tese da falta de cultura, e
mostra também a falta de encantamento dos parques. Tenho que dizer também
que se os personagens não fizerem parte do componente lúdico das pessoas não
vira cultura. Por isso que o personagem Beto Carrero participa de tantos
programas de televisão, como também fazia o Walt Disney. Estamos falando sobre
motivação, como levar as pessoas até o parque, e essa cultura precisa ser criada.
Precisa se trabalhar a componente afetiva, cognitiva, comportamental do visitante,
ou seja, o poder de motivação. Não é que o brasileiro não tem cultura. O problema
é que não tem o produto. O rodeio é uma invenção americana, e hoje o campeão
mundial é um brasileiro. E essa atividade hoje emprega 300 mil pessoas por ano,
gerando 1 bilhão e meio de dólares de receita. A festa do Peão de Boiadeiro é um
case de sucesso.
143
APÊNDICE D
Entrevista realizada com Francisco Lopes em 28/12/2005
Não podemos dizer se a Disney é uma boa ou uma má comparação, e sim,
uma referência. A Disney é o padrão. Porém, quando falamos em qualidade é uma
palavra extremamente abrangente. Eu posso falar em qualidade como um padrão
referencial, de segurança, de procedimentos operacionais, de atendimento ao
visitante, enfim, de projeto, de lay out, de comunicação, de uma série de fatores.
Então, eu acredito que enquanto falamos nessas questões a Disney é uma
referência, e de que é possível termos no Brasil um padrão de qualidade onde
podermos sonhar em atingir um certo padrão num momento futuro, ou em algumas
áreas, eu poderia dizer que até já temos.
Mas se falarmos em termos de conceito, de projeto, de infra-estrutura em
parque, realmente é uma questão que vai ser muito difícil, porque ela tem fatores
externos que efetivamente impactam nessa possibilidade, que é o estudo de
viabilidade daquele investimento perante o mercado que você tem. Se
compararmos o PIB americano e o brasileiro, o primeiro é dez vezes maior que o
brasileiro. Aliado a outros fatores que inibem esse tipo de investimento, que é a
tributação, a legislação, as leis trabalhistas, a distribuição de renda, a política macro
econômica, etc. A Disney então é uma referência, é um standard, um padrão a ser
buscado. Todos os aspectos, as vertentes que entendemos por qualidade.
Você apontaria outra empresa no setor como outra fonte de referência ou
seria só a Disney mesmo?
144
Sim, tem outras empresas, mas a Disney além do padrão de qualidade tem a
magia que talvez as outras empresas não tenham. Muitas outras empresas no
Estados Unidos e Europa têm o mesmo padrão de qualidade e referencia, mesmo
em infra-estrutura. Tem a Universal, independente do porte, tem também o Grupo
Cedar Fair que é dono do Cedar Point e de tantos outros parques. Nos Estados
Unidos tem a rede Six Flags, dona de uma rede enorme de parques dotada de uma
enorme infra-estrutura, de grande investimento, e tem o Mickey, a Minnie e
companhia.
Mas em termos de padrão de qualidade o consumidor, e isso acontece em
qualquer lugar do mundo, quando ele tem a oferta de um determinado produto, que
estabelece um determinado padrão de qualidade, se os concorrentes não
chegarem perto, estão mortos. Essa competição é saudável, pois faz com que
todos busquem novos padrões de qualidade. Isso acontece freqüentemente.
Mas quando se traduz para o mercado brasileiro, aí efetivamente temos essa
questão que você colocou: é um segmento novo, estamos iniciando, onde tivemos
erros e acertos. Algumas empresas não agüentaram os erros, e então sumiram, se
reestruturaram ou mudaram de atividade. As que agüentaram tiveram aí um
caminho trilhado que efetivamente estão se reinventando e buscando alternativas.
Isso leva aquela velha história: o que vem primeiro o ovo ou a galinha? Não tem
cultura porque não tem parque ou não tem parque porque não tem cultura?
Eu acredito sinceramente que, efetivamente na medida em que se inicia a
oferta de um novo produto, de um novo serviço, começa a criar ainda numa área de
influência menor, mais localizada, o interesse das pessoas. Hoje, eu diria para
você que é natural aqui em São Paulo as pessoas considerarem num fim-de-
semana, num feriado, numas férias uma visita num parque, de maneira
145
espontânea. Porque, tem empreendimentos de qualidade, são seguros, com uma
oferta de equipamentos, de atrações, tem um bom atendimento, tem uma política
de preços, uma estratégia de comunicação. Então, as pessoas hoje se sentem
confortáveis em visitá-los.
E na medida que esses parques começam a aumentar de número, começam
a fazer mais propaganda, começa a se expor mais na mídia, começam a ficar na
mente das pessoas, e não é só na mídia do parque. Se você pegar a quantidade
de matérias ou de propagandas que de pano de fundo aparecem os parques,
começam a crescer, porque é um negócio bacana.
Outro dia, por exemplo, eu vi uma propaganda de plano de saúde, que tem
um parque no pano de fundo. O que isso significa? Na mente do consumidor,
quando você fala de posicionamento de mercado, o que leva a ter aventura?
Montanha-russa leva a ter aventura, mas se a pessoa nunca viu uma montanha-
russa na vida, não tem uma referência. Quando os outros produtos começam a
usar, cenas, equipamentos, coisas relacionadas a parques nas suas estratégias de
comunicação, é sinal de que já está começando a fazer uma marca na mente
daquele público-alvo.
Então podemos dizer que a cultura da visitação só existe quando já se tem
uma oferta consistente?
Exatamente. É natural, mas não é um processo rápido, é lento, e precisa ser
reforçado. Entretanto, tem outras questões que podem impactar positiva ou
negativamente para o futuro. Como a base de clientes de parques, infelizmente, é
muito pequena no Brasil, ou seja, pessoas que têm condições de ir a um parque, de
146
pagar e gastar são um número pequeno, porque não tem renda discricionária. As
pessoas não têm dinheiro sobrando para gastar em lazer.
E para fazer com que aumente o número de repetição de visitas dessa base
pequena, tem que gerar atratividade. Tem que adicionar coisas novas ou trocar
coisas velhas por novas e comunicar. Isso leva a algumas questões, algumas
delas são estruturais e conjunturais.
Existem questões, por exemplo, de que quando as empresas que estão aí
quando foram montadas e viabilizadas, do ponto de vista econômico e financeiro,
elas fizeram seus estudos numa situação econômica, passaram por toda uma
turbulência das mais diversas naturezas, e estão numa equação complicada, ou
seja, hoje vivemos um paradoxo. Essas empresas têm um bom padrão de parque,
tem um bom padrão de atendimento, discutível aqui e ali, mas têm segurança, têm
preocupação, têm gestão, têm executivos trabalhando, têm profissionais, uma série
de coisas. É inegável. Tem profissionalismo. Ou seja, operam bem o produto que
têm ali. Procuram levar as pessoas, fazem suas estratégias de preço e
comunicação, etc. E por outro lado, nós temos uma estrutura de capital e
investidores que tinham uma expectativa e não tiveram essa expectativa cumprida.
Infelizmente, foram fatores exógenos, fatores absolutamente externos, que não
dependem da operação. A maioria dos parques passou por essa situação e hoje
não querem investir mais. E se não investir mais, não conseguem trazer esse
visitante novamente. Ou seja, estamos diante de uma equação, ou melhor, de uma
“inequação”. E qual a solução? Isto é, o futuro dos parques depende da solução
desse paradoxo.
Por outro lado, querendo investir, não tem hoje nenhuma política
governamental que induza ou favoreça ao investimento. Por exemplo, nós não
147
temos a fabricação de equipamentos no Brasil. Para trazer de fora, até que o
câmbio está favorecendo agora, mas têm outros impeditivos. Primeiro:
equipamento de parque não é considerado bem de capital. É considerado bem de
consumo, por incrível que pareça. Então, não se aplicam as regras do BNDES, por
exemplo. Porque o conceito de bem de capital é um bem que gera emprego, que
gera produção, como uma máquina, e bem de consumo não. O equipamento de
parque não é bem de capital, pois quando é bem de capital, ele se enquadra em
regimes especiais de tributação, depreciação, etc. Esse é um problema já.
Segundo, não têm linhas de financiamento para esses equipamentos
importados. Terceiro, tem uma carga tributária absurda de IPI, ICMS e impostos de
importação, que chega em alguns casos a 80% do valor do equipamento. Veja só,
para se colocar uma novidade, é preciso pagar duas vezes praticamente o valor do
equipamento em dólar para cobrar aqui em reais, ou seja, não fecha a conta!
E as atrações devem ser trocadas a cada quanto tempo?
Depende do público, da revisitação, mas o usual é de que a cada dois ou
três anos, não é preciso ser trocado, mas de que se adicionem novas atrações, e
quanto mais competitivo for o mercado, menor é esse tempo. Mas eu penso que no
Brasil esse tempo possa ser maior. Por exemplo, o Hopi Hari que abriu em 2000, já
era ano em 2005 de ter colocado uma atração de peso. Nos Estados Unidos, como
o mercado é muito competitivo, eles instalam novas atrações praticamente todo o
ano. Esses dois problemas carecem ainda de soluções.
Uma possível solução seria uma nova linha de financiamento? Um apoio
governamental?
148
Exato. Mas na verdade é uma conjunção de fatores. Nos Estados Unidos os
parques são considerados equipamentos turísticos. No Brasil estamos começando
com esse raciocínio. Ele ainda não é considerado um equipamento de lazer, como
um destino, como uma atração turística. E como vantagem, é uma atração turística
renovável, onde se pode colocar coisas novas, fazer eventos. E assim ele não está
comunicado na Embratur ou nas Secretarias Estaduais ou Municipais de Turismo
como um pólo efetivamente gerador de atração.
Eu sempre defendi uma tese quando participava dos Conselhos Nacional e
Estadual de Turismo, na época em que fui presidente da ADIBRA durante quatro
anos, de que São Paulo é turismo de negócios, mas nada impede de trazer o turista
de negócios, que vem, por exemplo, para uma convenção de que ele pode ficar
hospedado durante o final de semana, num preço competitivo, levar os filhos a um
parque de diversões, fazer compras num shopping center, assistir uma boa peça de
teatro ou a um filme no cinema, ir a um restaurante diferente e ter um pacote
turístico. Na prática, infelizmente isso não acontece. Parece que agora na
Secretaria Municipal de Turismo está começando um movimento de
conscientização. Tive uma reunião recentemente porque gosto muito desse setor,
apesar de agora estar um pouco afastado
34
.
E se você tem um negócio onde a terra é fértil, você planta, cuida direito, a
planta nasce. E então se planta mais, e aí o vizinho também planta, e começa a se
criar uma competição saudável, o que é natural do mercado, se atrai mais gente,
cresce mais, começa a atrair mais profissionais. A própria competição estabelece o
34
No dia 15 de dezembro de 2005, o Sr. Francisco Lopes assumiu a Superintendência do Shopping
Jardim Sul na capital paulista, um pouco antes, portanto, dessa entrevista ter sido realizada. Apesar
de não mais no comando do Parque da Mônica, sua experiência de 8 anos na frente desse Parque,
entre outras funções exercidas dentro da indústria de Parques, fazem com que ele seja ainda uma
das principais referências na área. Além disso, o contato para a realização dessa entrevista foi feito
antes dessa mudança, ou seja, quando ainda era diretor do Parque da Mônica de São Paulo.
149
padrão de qualidade. O mundo é dinâmico. Tudo mundo quer oferecer algo
melhor, algo mais seguro, algo mais gostoso.
Lá no Parque da Mônica nós montamos um programa chamado de AAA. O
primeiro “A” era de Atração. Então o parque precisa ser atrativo, ter novidades
sempre. As atrações precisam ser bonitas, pintadas, seguras. As atrações
precisam piscar o olhinho da criança. O parque como um todo precisa encantar.
O segundo “A” é de Ambiente, que é muito importante. O ambiente precisa
ser confortável, funcional, seguro, bem sinalizado, adequado, precisa ter uma oferta
de serviços, porque muitas vezes a gente quer ir embora de um determinado local e
não sabe a razão, só sabe que não está confortável. Será que é o ruído? Queremos
ir embora porque não se sente bem. Às vezes, não é um processo racional
estruturado. É muito intuitivo. Um parque tem que ter lugar para sentar, num
parque aberto tem que ter sombra. Tem que ter banheiro, lugar para fazer
compras, para se alimentar, ou seja, ter funcionalidade, além da beleza, tem que
ser agradável, um local onde façam com que as pessoas lá permaneçam. Isso
porque um parque, além de levar o visitante, tem que fazer com que ele fique o
maior tempo possível para gastar mais lá dentro.
E o terceiro “A” é o do atendimento. E atendimento não é só em termos de
qualidade de atendimento. É atender a capacidade que você tem, não querer se
exceder, não querer ganhar todo dinheiro num dia só, e porque tem gente na porta.
É atendimento em termos de padrão de informação que você dá ao cliente. A
informação deve ser a mesma que você dá ao telefone, no site, do atendente, da
pessoa dentro do parque. É também atendimento em termos de cortesia,
agradabilidade, sem criar atritos e sem ser conivente com a quebra de regras.
150
A Raquel Felício, do departamento de marketing faz um trabalho fantástico.
Ela começou como monitora e eu que a promovi a gerente. Quando entrei,
implantei esse esquema de atendimento. Penso que quando alguém envia um
email, gostaria de ser atendido no mesmo dia, no máximo no dia seguinte. É óbvio
que quando você envia um email espera receber uma resposta. Eu posso dizer
que o Parque da Mônica, e isso a gente recebeu de feedback de vários clientes,
que nós temos falhas, mas nós fomos premiados durante dois anos seguidos com o
prêmio “All Shopping” como o melhor parque de dentro de shoppings.
Tem reconhecimento, tem um trabalho sério, além de todo um outro lado de
ser educativo, interativo, de criar um ambiente de magia, dentro das limitações de
verba, capital, que nós temos aqui no Brasil. Isso é fundamental e está dentro da
política de atendimento. Eu pessoalmente quando no parque, apesar de todas as
minhas atribuições, acompanhava cada manifestação de cliente, fosse reclamação,
elogio, sugestão. E nós nas estatísticas de performance mensal, abríamos para
cada manifestação de cliente uma ficha. E na verdade, algumas manifestações
fazem sentido e outras não. Precisa aprender a separar, o que aplicável ou não.
Além disso, a gente conseguiu criar com a CIPA (Comissão Interna de
Prevenção de Acidentes) um trabalho de prevenção de acidentes em prol do
cliente, fazendo a identificação de potenciais locais a ter acidentes no parque. É
muito comum o seguinte aconteceu um acidente lá, então vai lá e conserta. Então
vamos nos antecipar e consertar. É muito fácil ser reativo, ainda que aqui no Brasil,
infelizmente, não o são, mas ser pró-ativo, excede. E foram vários programas
implantados.
Mas tudo isso leva tempo. E precisa ter uma filosofia de trabalho, tem que
ter missão, valores, ter respeito às pessoas, tem que tratar bem. E para ter clientes
151
satisfeitos, tem que ter funcionários satisfeitos, dentro do que se permite a questão.
Satisfeitos, bem treinados, bem selecionados e motivados. Conseguimos criar lá
no Parque da Mônica um programa de avaliação de desempenho dos funcionários,
que foi bem legal. Porque parque é mão-de-obra. Além do encantamento, é claro.
E essa é uma importante pregação da Disney, com relação aos seus funcionários,
certo?
Sem dúvida, e eu fiz um curso na Disney há anos atrás, e era justamente
isso. Enfim, avaliávamos tanto aspectos objetivos e subjetivos. Aspectos objetivos
do funcionário eram, por exemplo, assiduidade, pontualidade no local de trabalho,
uso correto do uniforme, higiene pessoal, e isso tudo para ele saber, precisa ter um
regulamento de pessoal. Ele tem que saber o que é esperado dele. Ele precisa ter
sido “brifado” do que se espera daquela função. Aliado a isso, você avalia também
postura no local de trabalho, boa vontade, simpatia, cortesia.
Existia também alguma forma de avaliação como cliente oculto?
Sim, e além do cliente oculto, tinha avaliação cruzada de chefes de uma área
avaliando funcionários de outra área. Isso tinha um sistema de pontuação mensal,
e aí se tinha a classificação de “satisfatório”, “acima do esperado”, e para esse tinha
um prêmio, que variava a cada mês, que podia ser um jantar, ou ingresso para
outro Parque, um vale-presente, e até dinheiro. Tinha o “abaixo do esperado”.
Essa pessoa era merecedora de uma conversa. E tinha o “crítico”. Com duas
classificações de “crítico”, era demitido. O “crítico” depois de orientado e que não
mudou não tem jeito, não entendeu o espírito do negócio.
152
Ou seja, tinha uma política clara de Recursos Humanos?
Sim, diria uma política de avaliação de desempenho, além de já ter uma
política de cargos e salários. E isso tudo não precisa ser uma empresa grande para
estruturar. Basta ter conhecimento, e gente que estruture, que toque, cobre e
avalie. São coisas simples. Você pode ter um parque bacana e funcional. Não
precisa ser uma Disney para ter qualidade!
Sem dúvida, e acho que você já está se antecipando de tocar em pontos que
gostaria de perguntar. Uma delas é de como motivar um funcionário. Porque a
Disney fala muito de motivação, do espírito da Disney, do treinamento. E no Brasil
temos uma realidade bem diferente, apesar de sabermos que a Disney é uma das
empresas que mais mal paga no estado da Flórida, mas como você disse uma boa
seleção e um treinamento eficiente são fundamentais?
Sim, além de respeito, valor às pessoas, imparcialidade, senso de justiça, são
questões simples e fundamentais na gestão de pessoas.
E você acredita existir carência de mão-de-obra nessa área no Brasil?
Não. Um país que tem um desemprego que nós temos, e pela característica
dos parques que empregam basicamente jovens do primeiro emprego, que é o
principal foco do problema, a gente não pode dizer que tem carência, mas mais
uma vez tem a questão de como o governo poderia ajudar muito, incentivando as
empresas, não sei se com a verba do Fundo do Amparo ao Trabalhador,
incentivando programas de treinamento para esse tipo de profissional que hoje são
bancados pelas empresas.
153
O funcionário do primeiro emprego precisa de uma carga de treinamento do
básico até o avançado. E poderia ter uma força governamental, como existe o
SENAI, o SESI, o SENAC, enfim, que prepara mão-de-obra para esses setores.
Para o turismo, para os parques, não tem. Isso faz falta porque tem que sair do
capital de giro da empresa. E a carga de treinamento para se ter um padrão de
qualidade é alta. E não adianta treinar só uma vez, porque também o turnover
35
é
alto. Aliado a isso, tem a estrutura da filosofia da companhia. Tem que estar
próximo, tem que dar o exemplo, tem que estabelecer coisas que sejam factíveis,
coisas que funcionem, tem que elogiar, tem que punir, tem que fazer aquelas coisas
que considero meio básicas em termos de gestão.
Então voltando às minhas questões, como garantir a revisitação dos parques
no Brasil?
Com campanhas promocionais na baixa estação, adotando medidas legais.
Aliás, meu trabalho final de conclusão do meu MBA na FIA-USP foi sobre o
reposicionamento estratégico de marketing do Parque da Mônica, onde eu abordo
tudo isso, como o programa do AAA, do produto de festas de aniversário, de
formatura de pré-escolas, de como fazer políticas promocionais em época de baixa
estação, entre outras questões mercadológicas.
Você acha que é possível elencarmos alguns pontos que possam garantir
esse nível de excelência de qualidade em parques de diversões no Brasil?
Não diria por área. Uma empresa de qualidade você percebe pelo
atendimento telefônico. Uma empresa pode ser segura, ter um bom corpo de
35
Turnover é um termo em inglês empregado para designar o percentual de empregados que saem
de uma empresa dentro do período de um ano, ou seja, a rotatividade.
154
diretores, mas não garante a qualidade. Para uma empresa ter qualidade, o mais
importante é ter a noção de que precisa estar na filosofia, na política dessa
empresa de que se quer ter uma empresa de qualidade, de ser uma empresa
dirigida para o mercado. Tem empresas que são ótimas, mas que são dirigidas
para os donos, ou para os funcionários, para produtos, para preços.
A empresa precisa ser dirigida ao cliente, e só esse tipo de empresa tem
consciência plena de que só através do cliente satisfeito vai ter sucesso, e para se
ter clientes satisfeitos é preciso ter políticas plenas, de qualidade, de gente
treinada, de métodos, processos, procedimentos adequados, e precisa ter isso
incorporado na visão, na missão da empresa. Isso é o primeiro passo. E se você
tem isso na liderança da empresa.
Precisa ter uma liderança que enxergue que qualidade é um fator importante.
A seqüência disso vem a segurança que é importante, atendimento é importante,
limpeza, manutenção, e tudo isso está no conceito do “AAA”. E tudo isso é
conceitual, e a partir desse conceito, começa-se a estabelecer, por exemplo, o
procedimento de abertura do parque. É muito chato o cliente chegar no brinquedo
e ele não estar funcionando. Então, alguém tem que ter passado ali antes e ver se
estava funcionando, e isso envolve métodos e procedimentos.
Eu não sei se eu Francisco, por ter trabalhado em indústrias muitos anos, por
ter implantado ISO 9000 onde trabalhei, por ter sido auditor de ISO 9000, tenha
levado isso para dentro do parque. Tem que estar na cultura da empresa. É um
conjunto de ações, que começa com a conscientização liderança de quer ter um
produto de qualidade, e a partir daí tem que se identificar o cliente alvo, o que ele
valoriza, qual o padrão que ele quer. Isso parte de exigências, de se estabelecer os
padrões.
155
Ou seja, um parque de diversões é um negócio como qualquer outro, e
precisa ser encarado profissionalmente?
Com certeza, com todas suas características e qualidades, com a agravante
de que é um serviço, e um serviço que está sendo entregue na medida que está
sendo consumido. E a pessoa sai com uma experiência e que se não gostar não
pode devolver. Então uma empresa precisa ter missão, visão, valores e princípios
e isso precisa ser divulgado para todo mundo. Precisa ter um bom planejamento
estratégico, um bom orçamento operacional, seriedade, precisa ter bons
profissionais trabalhando, estabilidade gerencial, e essas coisas todas vão acarretar
em qualidade, em padrões, processos, em funcionários satisfeitos, em resultado.
Ou seja, precisa ter requisitos que atendam todos os stakeholders envolvidos no
processo, como em qualquer outra empresa. Acionistas, funcionários, comunidade,
clientes, governo, etc.
Para encerrarmos, cabe uma última pergunta. Quais as perspectivas dessa
área para o futuro no Brasil?
Eu sou muito otimista. Quando a gente olha para tudo que envolve esse
setor, eu acho que as possibilidades são bem bacanas. Evidentemente, vai
depender de se criar condições para que a área cresça e floresça. Eu diria que o
solo é fértil, e se bem trabalhado, se bem tratado, se bem adubado, ele vai frutificar.
Porque, primeiro porque é uma característica do consumidor brasileiro. O
consumidor brasileiro, no geral, gosta de se socializar, de sair, gosta de interagir, de
curtir, gosta de passear, e muitas vezes só não vai porque não tem dinheiro. Então,
essa é uma característica importante. Se por exemplo, formos abrir um parque na
Finlândia, não se tem essa característica. Tem fatores climáticos absolutamente
156
favoráveis no Brasil como um todo. Tem um potencial turístico fantástico, também
se bem trabalhado. Tem empreendedores, ou seja, gente com interesse em
investir. Eu recebia semanalmente ligação de interessados em abrir Parque da
Mônica pelo Brasil inteiro.
O Brasil carece efetivamente de políticas governamentais que pode ser um
dificultador ou um facilitador, e tem também o problema da renda, que é um fator
que efetivamente pode impactar. Além disso, tem outro fator importante que os
Parques que estão funcionando, estão aprendendo a criar estratégias de trabalho
diferentes. Podemos dizer que “tropicalizaram” a gestão, criando evento, como
shows de músicas, promoções específicas, criando novos produtos, que é uma
forma criativa de gestão. Ou seja, o parque está virando um espaço multiuso com
diversas facilidades.
Isso tudo só me resta a entender que o futuro é promissor. Mas pode
também não acontecer, se tivermos, por exemplo, leis que inibam. Tem também a
questão da tecnologia do home entertainment, que se fala muito, mas pela
característica do povo brasileiro, ele não quer ficar em casa, ele quer sair. Por
essas características somadas e pelo ganho de experiência nos últimos anos, eu
creio que o futuro pode ser promissor. Se a política macro econômica produzir
queda de juros, melhoria na renda, melhoria no emprego, viabilizam qualquer setor.
E aí se cria a cultura de visitação?
A cultura é decorrência disso tudo. Não é primeiro um depois o outro. As
coisas evoluem juntas. Renda gera mais movimento, têm mais propaganda, mais
pessoas ficam sabendo, aparece na mídia, mais gente usa e aí aparece na novela
e então as pessoas vão mais, e aí conta para o outro, depois volta no próximo ano
157
e então considera o passeio lá nas férias e assim sucessivamente. É um círculo
virtuoso.
Entretanto, infelizmente, acho que tem um ponto ainda que é muito negativo.
A imprensa brasileira de um modo geral ainda só vende notícias ruins, então fica
difícil falar bem dos parques. Sempre que eu dei alguma entrevista, eu separava as
coisas dessas duas vertentes. Agora está cheio de gente para falar mal. Eu dei
uma vez uma entrevista para uma moça da revista Exame sobre o Beach Park, e
ela queria que eu falasse alguma coisa de mal que poderia acontecer aquele
parque, e eu disse que só um desastre, e então não saiu nada na revista.
Eu sempre fui um generalista. Eu sempre olhei para o negócio como um
negócio, de forma profissional. Comparar um parque a um shopping center, a
minha visão é muito parecida. Você precisa saber quem é seu cliente, seu público-
alvo, quem você quer servir, qual o posicionamento de mercado que você quer ter,
de que maneira vai gerenciar.
Mas para obter essas informações é necessário pesquisa de mercado. Por
que se faz tão pouco no Brasil? Por que elas são caras?
Sim, são caras. Aliás, quando saí do Parque da Mônica, tinha acabado de
contratar uma pesquisa, que chegou essa semana. São caras, as pessoas não dão
a importância devida e não sabem interpretá-las e implementá-las na prática.
Mas os parques costumam fazer pesquisas?
Poucas, profissionais são poucas. O Parque da Mônica é um dos poucos
que fazem.
158
Mesmo a ADIBRA, ela não faz pesquisa, não é mesmo?
Não faz porque não tem dinheiro. Esse assunto foi levantado já diversas
vezes. E tem outra coisa. O empresário brasileiro gosta de ouvir mentira. Ele não
gosta de ouvir a verdade, gosta de ser enganado. A pesquisa diz para não fazer
uma coisa, mas ele é teimoso, vai lá e faz, porque acha que sabe. Mas isso faz
parte do processo de experiência, de aprendizado. Aliás, em negócios, isso se
chama curva de aprendizado, que pode ter um coeficiente angular maior ou menor,
um tempo maior ou menor, dependendo do tipo de negócio.
Mas, como disse, se você perguntar a um brasileiro quantas vezes você quer
ir a um parque de diversões, ele vai responder todo dia. Por isso, é importante
saber interpretar, você vai concluir que o potencial é fantástico. Então, quando se
pergunta: você pode ir quantas vezes pagando o ingresso? A resposta é outra. A
pessoa gostaria de ir todo dia, mas não pode. Então também precisa saber
perguntar.
Esse boom dos parques criou uma grande expectativa em todo mundo. Na
imprensa, no mercado, no investidor, e foi uma coisa excessiva, como se fosse a
grande fórmula de se ganhar dinheiro. E em tudo que se cria uma expectativa
muito grande e depois não entrega o esperado, gera uma frustração muito grande.
Isso serve não só para investimento, mas para o produto. Se eu faço uma
propaganda do parque, ou se as pessoas falam, cria-se uma expectativa. Baseado
nisso, faço uma especificação da minha oferta, depois traduzo essa especificação
para as pessoas no serviço entregue, e comparado com a expectativa criada, tenho
uma resultante que pode ser satisfatória, excedente ou abaixo do esperado.
Dependendo da resposta, gera uma frustração maior ou menor, e que gera um
círculo vicioso negativo.
159
E dizem as estatísticas que quando se fala bem de alguma coisa, se fala
para três ou quatro pessoas, mas quando se fala mal, se fala para nove ou dez
pessoas. Aliás, eu estou lendo um livro agora chamado “The Tipping Point” de
Malcolm Gladwell, que fala justamente sobre isso, ou seja, como pequenas coisas
podem fazer uma diferença muito grande num negócio, como se faz para contagiar
as pessoas, o que é muito importante nesse negócio.
160
APÊNDICE E
Entrevista realizada com Alain Baldacci em 05/01/2006
Existe uma diferença conceitual entre parques de diversões e parques
temáticos, por exemplo, profissionalmente os parques temáticos têm obrigações
conceituais maiores que os parques de diversões. Qualquer parque é um parque
de diversões. Qualquer parque que tenha alguma atração é um parque de
diversões. Os parques temáticos elevaram esse nível num outro conceito,
trabalhando a experiência do visitante.
Portanto, quando se fala na Disney, se ela pode ser um parâmetro, ela é
referência não só ao Brasil, mas no mundo todo, para a Ásia, África, Europa, o que
importa é que o nível de excelência e o nível de conceito que Disney desenvolveu
há mais de 50 anos, tornou-se paradigma para a indústria mundial.
Todos os setores econômicos em qualquer lugar do mundo querem buscar a
excelência, principalmente na prestação de serviços. Então, em se considerando
que temos que buscar excelência na prestação de serviços, a Disney é sim um
parâmetro máximo para o mundo tudo. Eu fui presidente da Associação Mundial, e
lá na Austrália o objetivo é atingir o padrão Disney, de conceituação, de
atendimento. Na China hoje com todos os parques que estão sendo feitos lá, esse
também é o objetivo. E por que alguns podem alcançar padrões semelhantes ou
não já é uma questão inerente a cada mercado.
161
Que itens podem garantir essa qualidade de prestação de serviços de
excelência?
Eu resumiria num único item, que é a Qualidade da Experiência. Quando você
vai a um parque de diversões, vai espontaneamente, não é obrigado, e vai
esperando alegria e diversão. Isso não se faz só com o produto que é oferecido, ou
seja, não é só a montanha-russa que vai te dar essa experiência positiva, ela faz
parte de uma experiência, e que começa desde a sinalização até chegar ao local,
da informação obtida no
162
Sim, vamos supor que você vai a um parque excepcionalmente limpo, mas as
pessoas te atendem mal. Então vamos inverter, o atendimento é mais importante.
Todos os funcionários estão sorridentes, alegres, prestativos, mas se o parque
estiver imundo, o equipamento sujo ou quebrado, também não vai garantir uma boa
experiência. Então o conjunto dessas atividades, com a atenção nos mínimos
detalhes físicos, da ambientação, informação correta dentro do parque, como o
tempo de fila de determinada atração. Não se pode negligenciar nenhum desses
aspectos se quiser atingir excelência.
Então podemos concluir que a administração de um parque de diversões é
muito complexa?
Sim, é uma das empresas mais complexas que existem no mundo, porque ao
administrar um parque, está se administrando uma cidade. Se fizer uma analogia,
você tem um visitante que está vindo para essa cidade e pagando para receber em
troca, e você tem tudo que uma cidade tem, como instalações de água, esgoto,
tratamento, central elétrica, limpeza, brigada de incêndio, a parte logística de
abastecimento de alimentação.
Uma Disney recebe 100 mil pessoas por dia, então precisa ter uma logística
para se atender essas pessoas, que comem, bebem, se machucam, com enfarte,
insolação, tem trânsito, movimentação de pessoas, impacto ambiental, segurança,
proteção contra chuvas, ventos, enfim é uma cidade que se administra com
pessoas pagantes e se não receberem esse serviço elas simplesmente deixam de
visitar e passam essa imagem ao mercado.
163
E o complexo dessa experiência é que ela é intangível. O que as pessoas
levam para casa, uma fantasia?
Sim, e é por isso que as pessoas tendem a levar um souvenir, que tem ligação
direta com a experiência, porque se existe uma experiência positiva, a tendência é
querer materializar a memória dessa experiência, e se ela for ruim, a tendência é
querer esquecer tal experiência. Tudo isso é qualidade dos produtos. O preço que
pratica. Não adianta oferecer uma experiência maravilhosa com um preço
inacessível. Tudo é uma questão custo-benefício. Se para se conseguir aquela
experiência, limitar muito a questão do custo, cobrar muito, por exemplo, cobrando
um sorvete a R$20,00, você terá o retorno do seu investimento, mas as pessoas
vão se sentir ultrajadas. Então preço também é uma questão de qualidade. Tudo é
importante. Não diria que nada é indispensável num parque se quiser se atingir a
excelência. Na hora que começa a se priorizar, está sacrificando uma parte da
experiência. Como disse, vamos deixar o parque limpo, mas tem a questão do
atendimento. E a qualidade da comida, sinalização, etc.
Por que falo de excelência de qualidade? Pois sem qualidade, não se garante a
experiência positiva e assim não garante que a pessoa volte. A outra questão está
ligada a que fatores influenciam na visitação ou revisitação dos parques no Brasil?
Fala-se muito da questão da falta de cultura. O problema é a falta de cultura do
brasileiro?
Existem dois tipos de mercado. Existe um mercado maduro, que é o mercado
americano, onde não só o público está habituado a ir a parques, como a
concorrência é muito grande. Então esses dois fatores são muito relevantes. Por
um lado você tem um público pronto a participar dessas atividades e do outro a
164
concorrência terrível. Então isso eleva o nível de expectativa dos visitantes, e que
eles têm há anos. Eles têm parâmetros. Estão do lado da Disney e da Universal.
Ou seja, se eles forem conhecer um parque lá em Canoby Lake, uma
cidadezinha de cinco mil habitantes, e se estiverem de férias, terão a expectativa de
encontrar aquele tipo de serviço. No Brasil nós não temos essa cultura, e não
temos muitos parâmetros. Se você pegar quem já foi à Disney dentro do mercado
brasileiro é muito pouco.
Mas os brasileiros não são um dos grupos que mais visitam a Disney?
Sim, mas se considerarmos quantos habitantes temos no Brasil, a parcela é
pequena. Se forem cem mil turistas por ano, em dez-vinte anos, contando com a
revisitação, não dá dez milhões de pessoas. Diria cinco milhões de brasileiros que
já conhecem a Disney, num país de 180 milhões de habitantes é insignificante. E a
maioria está ligada numa classe superior de renda e um parque é feito para as
massas. O problema da visitação está ligado a obviamente ao poder aquisitivo. No
momento em que a classe média brasileira não tem disponibilidade de separar
recursos para o lazer de qualidade, é mais difícil dessa cultura maturar, porque para
um parque poder oferecer um produto de qualidade, o investimento é muito alto.
E o custo de manutenção é extremamente elevado, e por isso não pode ter um
preço de ingresso baixo. Então quando se trabalha num país com renda familiar
discricionária boa, este tipo de equipamento matura mais rápido. No Brasil, não se
tem a cultura e tem a dificuldade de absorver a cultura. A classe média ainda não
tem essa disponibilidade. Outra coisa é que ultimamente, na minha opinião, vêm
surgindo outros fatores para a classe média, além da perda do poder aquisitivo,
165
fatores que vêm demandando mais recursos, que eu colocaria hoje que as famílias
gastam muito com as crianças com o uso de telefone celular.
A telefonia passou a ser um item destacado de consumo que não existia há dez
anos atrás. Se uma família de classe média tem três filhos em casa, a partir dos
oito, nove anos de idade, gasta uma despesa mensal média de R$50,00 por criança
só de conta de telefone, mesmo nas classes até mais baixas.
Esse gasto com telefonia faz com que as famílias deixem de gastar em parques
de diversões?
Certamente. Porque a renda vem do mesmo bolso. Outra coisa é que nos
últimos vinte anos mudou o setor no mundo inteiro. O lazer das pessoas está
mudando. O conceito de férias está mudando. Antigamente, as famílias tiravam
veraneio, o que correspondia a três meses no final do ano mais um mês em julho
inteiro, onde pelo menos a mãe e os filhos passavam as férias, e o pai ia encontrar
a família no final-de-semana. Hoje em dia não existe mais isso. Hoje tem o
working couple” o pai e a mãe trabalham, e tem férias nem sempre coincidentes,
os períodos em férias são cada vez menores, as férias em família são cada vez
mais raras e curtas, e as opções são muito variadas. As pessoas preferem às
vezes escolher destinos diferenciados, usar aqueles recursos em viagens não mais
repetitivas.
É difícil fidelizar?
Sim, e assim criar cultura, porque a cultura se cria com a repetição. E a
repetição se dá quando se tem poucas alternativas. Mesmo nos Estados Unidos as
novas gerações têm uma relação diferente com os parques, embora elas já
166
costumam ir há muito tempo, embora hoje já tenham muitas variações, e o
americano é móvel no sentido profissional, ou seja, ele aceita mobilidade social de
trabalhar em estados difer90.6n1T8o
167
Então é uma questão essencialmente de ordem econômica?
Sim, porque a diferença de produto entre uma balada e um parque temático é
que num parque temático realmente as sensações são únicas e exclusivas. Não se
têm as sensações de uma montanha-russa no computador, não se tem a sensação
de uma torre numa balada, e se não entrar no mundo das drogas, ou seja, a
sensação sadia, o parque temático dá adrenalina, um maior conjunto de
experiências bonitas e sociais junto com seus amigos e família.
Você está colocando bastante a questão dos jovens, que, aliás, é muito
interessante essa análise sociológica que você fez.
Porque os jovens são os futuros pais, que não foram consumidores de parques
quando crianças porque não existiam antes.
Você diria que os parques temáticos focam mais os jovens? É mais fácil
trabalhar com os jovens?
É mais difícil trabalhar com os jovens, pois se cria cultura com as crianças indo
a parques, pois jovens continuarão indo, e na idade adulta vão levar os filhos. Os
grandes parques brasileiros começaram na década de 90, há mais de dez anos. As
crianças devem ser levadas pelos pais, e como esse início foi difícil, as crianças
não estão indo a parques, e também esses jovens não tiveram a experiência
quando crianças e agora também não estão indo. Não têm hábito das pessoas.
Hoje os jovens preferem as baladas aos parques.
Então para se garantir a visitação, a questão da renda precisa ser trabalhada
aliada à cultura?
168
Sim, pois com o aumento da renda vai colocar o parque como opção de lazer, e
aí vai começar o ciclo da cultura. A renda influencia a visitação, e a visitação
repetida cria a cultura. Se não tiver gerações indo a parques não vai existir cultura.
Por que o futebol faz parte da nossa cultura? Porque a criança já nasce com o pai
torcendo, e leva a camisa do time ao berçário. Isso é cultura.
Então a criança que mal acabou de nascer já tem contato com aquilo. Depois
na escola, vai encontrar seus amigos também com a camisa dos times, o pai vai
levar ao estádio, vai assistir os jogos na escola, na televisão. Essa cultura começa
na infância, que vai levar à juventude, e quando for pai tende a repetir a mesma
coisa. Já o americano vai assistir jogo de futebol americano e beisebol. Se fizer
um campeonato de no beisebol Brasil... E cultura não se forma uma geração.
Forma-se em várias gerações. Cria-se o hábito.
Você poderia dizer que essa falta de cultura também impacta na Europa e em
outros países no mundo, uma vez que lá também os parques são recentes?
Sim. Impacta fortemente. Só que a Europa se contrabalança pelo poder
aquisitivo. Embora os europeus tenham sido até refratários aos parques, num
continente com 400 milhões de pessoas, a Disney em seu primeiro ano de
atividades, mesmo com todos os problemas, teve dez milhões de visitantes a um
preço per capita alto. Então, essa barreira da falta de cultura vai ser vencida muito
mais facilmente. Agora já estamos da segunda para a terceira geração que têm
parques na Europa, e muitos já pensam em levar seus filhos, coisa que os
primeiros pais eram totalmente refratários por acharem que era coisa de americano.
169
O Japão já não teve esse problema, não é verdade?
Sim, mas são coisas difíceis de serem explicadas. O japonês tem um grande
fascínio pela cultura ocidental, e também tem o poder aquisitivo muito alto. O
produto que foi levado ao Japão foi um produto igual aos dos Estados Unidos, a
Tóquio Disney. Hoje inclusive no Japão tem o parque Disney Sea, que é mais
sofisticado que nos Estados Unidos, e a Disney mais visitada no mundo é a de
Tóquio, devido ao alto poder aquisitivo, a raras formas de lazer e foi pré-internet,
pré-revolução digital, então entrou num mercado absolutamente carente que já
tinha simpatia por valores ocidentais, por isso foi um sucesso.
A Disney de Hong Kong também é um sucesso, e já bate recordes de público.
Novamente, é o poder aquisitivo e volume de pessoas. Essa combinação
adicionada de um bom produto como é a Disney....
Mas no Brasil não existe também um outro fator que é a questão da praia como
concorrente dos parques de diversões?
É problema de recursos. É mais barato ir a praia do que a um parque. De São
Paulo para o Hopi Hari ou a uma praia é a mesma distância de deslocamento.
Quando chega na praia gasta muito menos que no Hopi Hari.
Será?
Com certeza. A praia é um lazer democrático, onde se gasta o quanto se pode
gastar.
170
Então você diria que existe a perspectiva de construção de novos parques ou é
mais provável se remodelar os existentes? Além disso, quais os formatos mais
adequados à realidade brasileira? Parques indoors, aquáticos?
Se houver um acréscimo da renda média discricionária das famílias,
principalmente da classe média, os novos parques devem ser localizados em
destinos turísticos, como é o caso do Beach Park, do Beto Carrero, do Hot Park.
Todos os parques localizados em destinos turísticos estão muito bem, expandindo
e crescendo porque o turista já vai com uma disponibilidade de gasto maior do que
uma pessoa local e vai disposto a ser expor a novas experiências.
O turista que está em Fortaleza, quer ir ao Beach Park. O turista que está em
Penha quer ir ao Beto Carrero. E no Beto Carrero o turista paga o dobro que paga
no Hopi Hari. E você pode pensar que o Hopi Hari é um dos melhores parques do
Brasil, perto do maior centro econômico do país. O paulista não vai ao Hopi Hari.
Ele vai ao Beto Carrero e ao Beach Park, ou à Disney.
Mas não temos o lazer só no período de férias, e o lazer do final-de-semana e
feriado?
Aí se compete com aquelas outras variáveis que já comentamos antes.
É uma questão de hábito de consumo muito interessante, porque se tomarmos
como exemplo o Parque da Mônica em São Paulo, é um modelo que parece dar
muito certo.
Sim, esses parques urbanos, que têm a característica de serem pequenos,
cobertos, climatizados. Não tem como colocar o Hopi Hari dentro de um shopping
center e cobrir, e geralmente é voltado a crianças pequenas de três a nove anos de
171
idade, e aí sim, os pais querem visitar, porque não compete com o celular, com a
internet ou a balada, e é uma decisão dos pais, não das crianças.
Tem também a questão da segurança, com um produto de boa qualidade,
acessível, e pode oferecer um preço acessível porque seu investimento foi
infinitamente menor que um Hopi Hari. Além disso, é uma visita rápida. Não
precisa passar o dia inteiro no Parque da Mônica ou no Parque da Xuxa. No Hopi
Hari é para ficar o dia todo. Esses parques urbanos também estão dentro de
shoppings e oferecem também a possibilidade das crianças ficarem lá enquanto os
pais estão fazendo compras.
Podemos dizer então que é um outro produto e por isso requerem uma análise
diferente?
É um outro segmento muito específico. Não se pode comparar o Parque da
Mônica com o Beach Park, por exemplo. Os dois são parques temáticos, sem
dúvida, mas são enfoques muito diferentes.
E construir um novo Hopi Hari no Brasil é muito difícil?
Depende. Mas eu faria num destino turístico, onde já exista um fluxo de
visitantes relativamente grande, independente dessa atração, e que ofereça uma
experiência a mais, pois os visitantes que estão lá, estão dispostos a gastar, pois
quando o turista está num ambiente de viagem seu gasto é muito mais alto, muito
mais propenso a gastar, mas por outro lado tem que ser estimulado a gastar. Essa
é a diferença. Você cria uma experiência tão gostosa, que a pessoa quer
materializar essa experiência e levá-la para casa.
172
E aquele projeto de unir o Hopi Hari, o Wet´n Wild e mais alguns hotéis,
transformando num destino turístico?
Essa idéia foi da minha empresa, de criar um complexo turístico completo, com
um simba safári, um Parque de Esportes, com vários hotéis, um centro de
convenções, o que faria sentido de ter o estímulo da pessoa vir e se divertir três,
quatro dias. Se a pessoa sai, vamos supor de Campo Grande no Mato Grosso para
o Hopi Hari, ficando um dia e mais meio no Wet´n Wild, não compensa dela vir. Se
tivesse um centro de entretenimento noturno fantástico ou um Centro de
Convenções, ou se o Hopi Hari fosse mais atualizado com montanhas-russas mais
radicais, já se justificava o destino. E é no que eu acredito: tem que se formar
destino.
Eu penso que poderia ser inclusive um destino para a América Latina, por que
não?
Sem dúvida. O problema é que foi previsto esse projeto, mas entre a previsão e
a execução teve um grande “gap”. Acho que os próprios proprietários tiveram um
pouco de ganância e uma série de estruturações mal executadas em termos de
desenvolvimento de produto. Ao invés de se fazer vários produtos bem feitos,
foram tentar tirar lucro com poucos empreendimentos para tentar se valorizar a
terra no entorno, e acabaram dando um tiro no pé, pois um complexo que foi
desenhado há quinze anos atrás e ficou só com dois parques. Agora que está
saindo um hotel.
Atualmente cerca de 95% dos parques de diversões no mundo são controlados
por empresas familiares, e no Brasil são esses que possuem os melhores
resultados financeiros, como é o caso do Beach Park, do Beto Carrero, pelo fato de
173
terem comprometimento com o futuro. Aqueles como o Magic Park, que foram fruto
de investimentos via Fundos de Pensão, deram todos errado, porque os
proprietários depois de tirarem seus lucros, não tinham mais interesse com o
desenvolvimento desses empreendimentos. Esse é um outro fator importante que
explica o mercado brasileiro.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo