Download PDF
ads:
LARISSA ORTIZ TAVARES COSTA
COMUNICAÇÃO E VALORES DO MASCULINO.
A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NA RELAÇÃO ENTRE CORPO E MODA
_____________________________________________________________
COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
PUC/SP
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifica Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de MESTRE
em Comunicação e Semiótica, sob a
orientação da Professora Doutora Ana
Claudia Mei Alves de Oliveira.
São Paulo
-
SP
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
1
Banca Examinadora
__________________________________________
_________________________________________
__________________________________________
ads:
2
A
GRADECIMENTO ESPECIAL
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos
a reprodução total ou
parcial desta Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura:________________________Local e Data:_____________________
3
Á
minha mãe,
ZULEIDA,
a quem devo
o ensinamento de que
a maior riqueza
é a conquista
moral e intelectual do espírito
.
E a certeza de que este sonho era possível.
AGRADECIMENTOS
4
À minha orientadora, Profa. Dra. ANA CLAUDIA DE OLIVEIRA, por me contagiar
com sua paixão à s
emiótica
d
iscursiva
e pela
insistência
em aplicar meus
conhecimentos profissionais nos estudos acadêmicos.
À ROGÉRIO BELLINI FERREIRA, meu marido, que soube compreender as minhas
ausências.
À MATEUS TAVARES COSTA FERREIRA, meu filho, por fazer esta pesquisa ter um
sentido maior.
Ao meu pai, EMANOEL TAVARES COSTA, pelo exemplo de uma vida construída
com m
ui
to trabalho e honestidade.
Aos meus
irmão
s, LEILA ORTIZ, LUCIANA ORTIZ e EMANOEL TAVARES COSTA
JUNIOR
, e minha cunhada, DEBORA LOBATO,
pelo apoio
incondicional.
Aos meus amigos do centro de pesquisas sociossemiótica, principalmente à Claudia
Garcia e Mariana Cortez
, pelo tempo generosame
nte dedicado a me ajudar.
Aos professores do Centro de Pesquisas Sociossemiótica, pelos cursos ministrados
,
indispensáveis para a construção deste trabalho.
À
Deus, por estar sempre ao meu lado.
RESUMO
5
Na transição do século XX ao século
XX
I, os valores
masculino
s passam
por
significativas mudanças advindas das reorganizações que sofrem suas condições
de vida. A moda, como meio de comunicação que nos possibilita compreender e
construir a identidade destes sujeitos, impulsionou-
nos
a investigar como a roupa, em
particular
a camisa, participa desse processo de transformações. Descrevendo o
plano da expressão da camisa pela articulação dos formantes eidéticos, matéricos,
cromáticos e topológicos, destacamos o grande desenvolvimento da
materialidade
para compreender como os tecidos se transformaram, concretizando as novas buscas
vestimentares do homem contemporâneo. A relação da roupa com o corpo equaciona
um novo comportamento e novos padrões de medidas de configuração, que alteram a
pl
ástica da vestimenta. Nesta alteração, o corpo contido, ocultado, é evidenciado e
posto em valor. A pesquisa tem como fundamento teórico e metodológico a
Semiótica
Discursiva
proposta por Algirdas Julien Greimas e seus colaboradores. Também
utilizamos os estudos da semiótica plástica, bem como da sociossemiótica proposta
por Eric Landowski, que nos oferece mecanismos para a construção da identidade e
alteridade por meio dos regimes de visibilidade, que nos propiciaram entender como
este novo homem posicio
na
-se e cria sentidos pelos modos de vestir-se. O
corpus
foi levantado por
dados
mercadológicos, com as principais empresas de moda
masculina no Brasil, num recorte de tipos de camisas mais vendidas no período de
junho de 2004 a abril de 2005, em que
ocorreram
as coleções outono-inverno e
primavera
-verão. Com essa seleção explor
am
-
se
as variantes e invariantes
constituintes, do que resultou
uma
proposição de tipologia dos usuários. Cada um dos
tipos de usuário, a saber: subjetal
versus
objetal; pragmático v
ersus
simbólico,
figurativiza um simulacro do masculino que, concluímos, constrói sua aparência e
identidade de seu ser e agir no seio da vida social.
Palavras
-
chave
: semiótica discursiva, masculin
idade
,
identidade, corpo, moda
ABSTRACT
6
In the transition between the 20th to the 21st centuries the masculine values
have passed by significant change that came upon their conditions of life
reorganization.
The fashion, as the media which allows us to comprehend and build
the identity of these characters, has pushed us to investigate how clothing and
specially the shirt plays a role in this transformation process. Describing the level of
expression of the shirt by articulating eidétics, materics, chromatic and topological
formants, we highlight the great development of materiality to understand how fabrics
have been altered to become visible to the contemporary quest for menswear. The
relationship between cloth and body equations a new behavior and new standards for
the measurement of configuration, which alters the wear mould. In such process of
altering, the contained, hidden body is evidenced and added value. The theoretical
and methodological basis for the present research is the Discursive Semiotics
suggested by Algirdas Julien Greimas and his collaborators. We also make use of
studies of plastic semiotics, together with the
social
-
semiotics
proposed by Eric
Landowski, that give us tools to build up identity and alterability by means of visibility
regimes, which allows us to understand how the new man takes position and
creates senses by the way he dresses himself. The
corpus
was surveyed in the
market, in the main companies for menswear in Brazil, in a cut of the most sold shirt
type in the period between June 2004 to April 2005, when the autumn-winter and
spring
-summer collections were presented. With such selection we explored the
variant and non-variant constituents, resulting in a proposition of customer typology.
We concluded that each type of user i.e. subjective
versus
objective, p
ragmatic
versus
symbolic; figures a simulacrum of the masculine that builds his appearance
and identity by his being and acting in the framework of the social life.
Keywords: discursive semiotics
, masculin
ity
,
identity
, body,
fashion.
SUMÁRI
O
7
INTRODUÇÃO
.......................................................................................................................
08
Moda como prática social
.............................................................................................
..........
08
1
-
A camisa na construção do masculino
...............................................................................
16
2
-
Na história da camisa, corpos
.....................................................................................
.......
20
3-
A camisa na contemporaneidade
........................................................................................
39
3
.1
Camisa Objetal
..........................................................................................
41
3
.2
Camisa Pragmática
48
3
.3
Camisa Subjetal
.
54
3
.4
Camisa Simbólica
..
60
4
Pelos tecidos, transformações do masculino
.........................................................
............
65
5
Costurando relações.........................................................................................................
77
5.1
Regime de visibilidade..............................................................................
.
83
CONSIDERAÇÕES FINAIS
....................................................................................................
87
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
........................................................................................
89
INTRODUÇÃO
8
Moda como prática social
_______________________________________________
A moda é um fenômeno social que
emergiu
no Ocidente no fim da Idade
Média e início do Renascimento. Sobre
este assunto
Lipovetsky esclarece que:
a partir do final da Idade Média é possível reconhecer a ordem
própria da moda, a moda como sistema, com suas metamorfoses
incessantes, seus movimentos bruscos, suas extravagâncias. A
renovação das formas se torna um valor mundano, a fantasia exibe
seus
artifícios e seus exageros na alta sociedade, a inconstância em
matéria de formas e ornamentações não é exceção, mas regra
permanente: a moda nasceu
1
.
Nes
se período, era usada pela corte como um elemento de diferenciação
e distanciamento das camadas burguesas. Durante séculos, as leis sumptuárias
2
determinavam quais tecidos, cores e formas cada camada da sociedade poderia
usar. Após a Revolução Industrial, houve um grande avanço tecnológico no setor
têxtil,
e
a moda passou a se industrializar, chegando às camadas mais pobres. No
entanto, sempre houve por parte da burguesia uma necessidade de imitar as classes
mais elevadas. Lipovetsky afirma que As classes inferiores correm para imitar os
outros que lhes são superiores, e estes, por sua vez, partem em busca de algo novo
que os diferencie
3
. Assim, podemos articular que, como fenômeno, a moda se
organiza a partir de definições do vestir as pessoas de vários segmentos da
sociedade, assumindo uma função distintiva entre as classes sociais.
Desde o seu surgimento a moda, se caracteriza como um sistema
prescritivo, com regras de construções ditadas por um restrito grupo da sociedade.
Se antes era a corte que ditava o que era estar na moda, nas sociedades capitalistas
1
Gilles LIPOVETSKY, O Império do Efêmero: a moda e seu destino nas sociedades moderna . Trad. Maria
Lucia Machado. São Paulo. Companhia das Letras, 1989, p. 23
2
Leis sumptuarias: leis que se destinavam a limitar os excessos do luxo e a regulamentar os sinais exteriores do
prestígio.
3
Gilles LIPOVETSKY,
op.cit
, p.34.
9
de hoje este poder pertence a um pequeno grupo de marcas e empresas que,
soberanamente, ditam o que é estar na moda . Na atualidade existe uma relativa
liberdade de escolha do que vestir, a qual possibilita fazer parte ou não de
determinados grupos da sociedade. Sobre a moda, Landovwski afirma
que:
O fato de estar na moda , no sentido absoluto da expressão, foi,
por muito tempo, e talvez ainda seja, a marca e o privilégio de um
grupo social determinado, de uma elite que se orgulha de dar o
tom ; mas os outros meios, inclusive os menos grã-
finos,
evidentemente não deixam de ter, também, suas próprias maneiras,
suas próprias palavras de passe e suas senhas ao gosto do dia
4
.
A moda da contemporaneidade já não é, então, ditada apenas pelas
classes sociais mais elevadas. Concordando com Landowski, a moda ou, as modas
pode
m surgir dos movimentos periféricos da sociedade, levando à inversão de
papéis quando são eles os ditadores de novas modas.
Des
sa maneira, a moda se caracteriza por um fenômeno social complexo
e efêmero, que se articula em torno de uma busca incessante do novo, do diferente,
do surpreendente. Com a aceleração do capitalismo e o aumento do consumo, o
avanço e as novas descobertas tecnológicas impuseram à moda um ritmo acelerado
que precisa estar
em constante mudança para alim
entar a própria indústria da moda,
um dos maiores vetores econômicos do século XX. Segundo Landowski o que a
moda faz advir é certa sensação do tempo
5
. A busca dos sujeitos é e
10
bastante promissor. Pela necessidade de profissionais capacitados, o número de
cursos de graduação se multiplica, assim como se multiplicam as confecções e os
profissionais da moda
, que hoje
são investidores e geradores de renda.
No Brasil, este setor produziu no ano passado 5,6 bilhões de peças de
vestuário, meias e acessórios e consumiu 1 milhão de toneladas de tecido, gerando
US$ 15,9 bilhões de faturamento e 1,1 milhão de empregos. O investimento das 17,5
mil empresas que atuam no segmento foi da ordem de US$ 103,6 milhões
6
. Estes
números nos mostram a relevância do estudo da moda como fenômeno social.
Em todos os países, as empresas do segmento têxtil investem
pesadamente neste promissor setor, para oferecer aos consumidores novidades
tecnológicas. No Brasil, no período de 1990 a 2000, fatos marcantes modificaram
radicalmente a estrutura do setor têxtil. Com a abertura do mercado externo, os
produtores nacionais foram obrigados a investir em maquinários novos e reciclados,
que possibilitam o uso de novas tecnologias na fabricação de tecidos, mais
precisamente a utilização de fibras sintéticas como o poliéster
7
e a poliamida
8
e
novos recursos de acabamentos que mudam o aspecto final do tecido como, por
exemplo: tecidos com aparência de amassado.
Os consumidores estão cada vez mais ávidos por novidades. Com isso,
as coleções chegam às lojas a cada três meses, diferentemente de antes, quando
eram lançadas apenas duas vezes ao ano. Com tanta novidade, existe uma imensa
gama de produtos para construir, pela moda, padrões do modo de ser.
Oliveira
afirma que:
(...)
atualmente a moda é de modas, ou seja, de modos de ser e de
vestir que se enovelam acompanhando os modos de vida, uma vez
mais é um sentido da vida que a moda constrói. Pela moda, entrevê-
se então como um sujeito vestido está no mundo e como esse
6
ASSOCIAÇÂO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA TÊXTIL E DE CONFECÇÃO. Perfil do setor têxtil e de
confecções
. São Paulo: ABIT, 2001. Encarte técnico.
7
Poliéster: fibra sintética. Sua principal característica é a pouca absorção de umidade. É a fibra química que
tende a apresentar maior crescimento e poder de competição, em decorrência do seu baixo custo, sendo a mais
barata das fibras. Com os avanços tecnológicos tende a ficar cada vez mais parecida com as fibras naturais,
como o algodão e a seda.
8
Poliamida: fibra química de polímero sintético, também conhecida como
nylon.
Considerada a mais nobre das
fibras sintéticas. A poliamida, além de uma excelente resistência, tem uma boa aceitação de acabamentos têxteis,
o que permite a obtenção de tecidos com aspecto
s visuais diferenciados.
11
mundo o faz ser segundo uma certa moda, ou seja, seus modos de
presença imbricam
-se com os da moda
9
.
Desta forma, o estudo deste fenômeno social que constrói modos de ser
e modos de vida, mostr
ou
que os períodos da sazonalidade de seus ditames, por
outro
lado
, f
izeram
que coexistam no vestir várias modas, vários estilos, e mesmo
combinados entre si, produz
em
um outro fruto da criatividade do usuário. A moda,
com seus modos, possibilita um melhor entendimento e aprofundamento de como
vivem, pe
nsam e agem os sujeitos do mundo moderno.
Para construírem os modos de ser , os sujeitos podem escolher estar
dentro ou não do padrão estabelecido pelas tendências de moda . As coleções
lançadas que chegam às lojas invadem toda a dia das revistas es
pecializadas,
jornais, televisão e
outdoors.
Ocorre organizadamente u
m verdadeiro bombardeio de
informações, ditando as regras de como é preciso fazer para estar em conjunto com
o grupo de referência , que é formado
por
personalidades criadas pelas várias
mídias. A televisão é hoje o meio de comunicação que mais dita as regras para
estar na moda . Nela
aparecem
personagens de novelas, âncoras dos telejornais e
propagandas que são vinculadas nos intervalos comerciais. Todo tipo de normas
como
: quais cores, formas, acessórios, cabelos e maquiagem devem ser usados
para que os sujeitos se sintam inseridos no padrão de regras estabelecido. Oliveira,
ao tratar das estratégias da moda explica que: Nas configurações desse novo que a
moda anuncia como ruptura, a sua ação organiza-se em termos de manipulação: os
consumidores são convidados a agir segundo o que ela dita
10
.
Quando estudamos a vestimenta e suas possibilidades de escolha, a
moda pode ser entendida como um sistema, que se compõe de todas as unidades
mínimas e das regras de suas possibilidades combinatórias. Em relação aos demais
membros da sociedade, os sujeitos colocam este sistema em uso e estruturam pelas
possibilidades concretas do que escolhem para se vestir, formas de sua
apresentação pessoal,
o
que chamamos processo. Do sistema da moda eis que é o
processo, a atualização em texto, que nos interessa neste estudo. O estudo do
sistema leva ao eixo paradigmático, ao passo que o processo conduz ao eixo
9
Ana Claudia de OLIVEIRA
Semiótica e moda. Por um estudo da identidade . CD. I Colóquio de Moda
Ribeirão Preto, 2005.
10
Ana Claudia de OLIVEIRA, Por uma semiótica da Moda in A moda do corpo, o corpo da moda . Kátia
Castilho e D
iana Galvão (orgs.) Editora Esfera, 2003, p.128.
12
sintagmático. No primeiro
uma relação de exclusão, umas escolhas entre os
possíveis,
e no segundo, as relações de adição que põem as várias escolhas em
dado encadeamento no vestir o corpo. A moda, então, é um mecanismo articulador
da aparência que os seres humanos utilizam para manter ou alterar os seus corpos
pela plástica vestimentar. Greimas esclarece que: o sistema tem alguma
probabilidade de ser apreendido e explicitado pelo exame dos processos
semióticos
11
. Dessa forma, o presente trabalho vai deter-se no âmbito processual
da moda, para entender como o homem faz as suas escolhas ao vestir-
se,
construindo assim a sua aparência. Geraldi afirma que: vestir o corpo humano é o
ato de fazer escolhas com o objetivo de alterar sua exteri
t
c0119 c8 -0.0Tj(.87 0 0 -0.09187 6371 4339 Tm(e)Tj0.09181)Tj63 Tm(e)7 0 0 -0.09187 8488 3709 Tm(r)Tj/F9 Tm(a)Tj0.09187 0 0 -0.09187 5839 435839 79187 68317 0 6049 Tm(t)Tj0.09187 0 0 -03 3098 43387 6995 40248.09187
13
mencionados, fica claro que o ser humano utiliza a vestimenta para produzir
significação e significar
-
se.
Es
ta significação da história da indumentária tem sido realizada em vários
âmbitos, ou seja, como
14
Dando continuidade às caracterizações dos dois planos, os semioticistas
da plástica dos textos postularam que o plano da expressão é articulado a partir de
unidades mínimas, chamadas formantes, que são organizados em feixes para
constituir as chamadas figuras da expressão. Assim, o fo
rmante cromático é ligado à
cor,
o
eidético às formas,
o
matérico aos materiais e procedimentos, e o formante
topológico é a distribuição dos formantes eidéticos, cromáticos e matéricos em dada
superfície.
O plano do conteúdo é constituído pelos níveis: fundamental, narrativo e
discursivo, sendo os dois primeiros ligados às estruturas mais profundas, ou semio-
narrativas, e o terceiro às estruturas superficia
15
identidade e da alteridade (um outro do eu que é desenvolvido em Presenças03 Tm(a)Tj0.09187 0 0 -0.0918-0.091503 Tm(a)Tj0.09187 0 0 -0.09Ó (s)Tj,7 0 0 -0.09109187 6675 16187 0865 161790 -0..4187 0 0i2 47 0 0 -08e0919959S0919959S0919909187 74959j 167 -08e
16
________________________________________________________
Segundo reportagem sobre a moda masculina veiculada na revista
especializada
Prêt à Porter Paris, publicada em agosto de 2006, neste novo milênio,
o universo masculino ressurge com uma nova atitude. A saúde e o bem estar
passam a ocupar o primeiro lugar. Novos hábitos, como os esportes radicais e a
ioga, substituem o futebol, assim como o gosto pela decoração e a gastronomia, que
expõem uma diversificação de interesses do homem. A mulher está cada vez mais
presente no mercado de trabalho e o homem se vê obrigado a dividir com ela
atividades
antes consideradas femininas, como cuidar da casa e dos filhos. A sua
vida profissional fica em segundo plano e assim o homem consegue dividir melhor o
seu tempo. Passa a freqüentar os salões e as clínicas de beleza especializadas, as
academias e os
shopp
ings
. Ao ler o jornal, além de política e esporte, inclui nas
leituras os cadernos referentes a
design
e,
notadamente
, a tendências de moda.
A camisa acompanha as transformações no modo de vida do homem
contemporâneo, e seu uso vem sofrendo grandes alterações, assim como o seu
arranjo plástico, termo este que usaremos para indicar o estudo do plano da
expressão.
Se antes era uma peça da qual se via apenas pelo colarinho e punhos,
pois ficava escondida por baixo dos paletós, agora ela esta cada vez mais visível. A
camisa hoje se transforma numa vestimenta que mostra diacronicamente um modo
de estar do corpo masculino. Ela passa a mostrar, apresentar e alterar o parecer
daquele que a veste.
Desde o início do século XXI este novo homem coloca como priorid
ade
a sua saúde e, conseqüentemente, a preocupação com as medidas do seu corpo. A
saúde
, na verdade, é vinculada a uma tematização de bem estar e de conforto que
cria um corpo não apenas magro, mas esculpido pela massa muscular, o corpo
sarado passa a ser contornado e exposto pela vestimenta que acompanha tal
mudança e cada vez mais sofre ajustes nas formas e nos materiais que as
constituem. Castilho afirma que:
17
A estrutura física e morfológica do corpo se constitui em uma das
possibilidades de integração do sujeito com o mundo, ou ainda, uma
das formas de estabelecimento de suas relações com o outro. O
corpo, neste contexto, deve ser entendido como veiculo de
significação primordial, indubitavelmente, o primeiro meio que
possibilita nossa interação no contexto sócio-cultural. Ele é um dos
canais de materialização do pensamento, do perceber e do sentir o
circundante e o responsável por conectar o ser com o mundo que se
habita
21
.
Assim, o estudo da plástica da vestimenta do homem contemporâneo,
poderá contribuir para entender que papéis assume no mundo que o cerca. O
diálogo entre corpo e moda torna-se fundamental na contemporaneidade para o
entendimento de uma identidade, alteridade do gênero masculino. Este corpo passa
a ser valor
izado
pela roupa e em muitos casos o torna parte significativa da
aparência masculina.
Com essa nova maneira de ser e estar, assistimos ao surgimento deste
novo homem , que passa a assumir o seu tronco como parte significativa de sua
masculinidade, que está sendo construída no contemporâneo. Dessa forma, a
camisa se transforma, evidenciando diferentes concepções e valores do homem e
do masculino.
Antenados com essa mudança, os criadores de moda focam as suas
atenções para descobrir quem é este novo homem. As marcas existentes dão
maior visibilidade na coleção masculina e surgem aquelas especializadas em
atender aos desejos deste novo consumidor. Em toda a história humana, o gênero
masculino usou a vestimenta para confirmar poder, força, riqueza e condição social.
Em alguns momentos, chegou a ofuscar as mulheres com tamanho exagero de
adornos e, em outros, utilizou a discrição de formas e cores para afirmar a sua
elegância. Em ambos os casos, a preocupação com a aparência vem marcar a
maneira pela qual esses sujeitos querem
estar no mundo
.
A revista Veja de 26 de maio de 2004, traz como reportagem de capa a
importância
da busca pelo estilo e pela aparência, e como estes se tornaram
21
Káthia CASTILHO, Configurações de uma plástica: do corpo à moda
. Dis
sertação de mestrado. Orientação
Prof. Dra. Ana Claudia de Oliveira. Comunicação e Semiótica, PUC
SP, 1998, p. 15.
18
fundamentais no mundo da atualidade, decidindo o sucesso ou o fracasso das
pessoas, empresas e produtos. Se antes a busca pelo ideal de beleza perseguia
apenas as mulheres, hoje, esta ditadura também é imposta para o sexo masculino.
Obedecer a esses padrões,
tornou
-
se
quase uma obrigação podendo ajudar não
nas relações emocionais, mas também no sucesso profissional
.
A plástica da
vestimenta sempre foi usada pelo homem para cobrir e reconstruir o próprio corpo.
Antes, a aparência e o estilo eram marcados pelo excesso de tecidos e acessórios.
Hoje a roupa coloca a ver o próprio corpo, que precisa estar dentro d
os
padrões de
medidas estabelecidos pela mídia.
Na conclusão do estudo sobre a história da construção da plástica do
corpo e da moda, finalizado em 1998, Castilho afirma que: Ao longo deste trabalho,
percebemos inclusive que o papel dos trajes ou adornos significa de maneiras
diferentes quando é usado pelo homem e, quando é usado pela mulher e conclui
que os homens usam a vestimenta para com objetos que representam sua força,
sejam sinônimos de virilidade
22
. O que se questiona nesta pesquisa é
:
com o
surgimento deste novo homem do século XXI o homem modificou a maneira como
utiliza a vestimenta na relação com o corpo para uma manifestação textual?
Atravé
19
para definirmos importantes características que serão pertinentes para uma tentativa
da construção de uma tipologia do masculino e
da
identifica
ção
dos regimes de
visibilidade deste homem brasileiro.
2
NA HISTÓRIA DA CAMISA, CORPOS
20
_________________________________________
Pela roupa podemos estabelecer uma relação com o meio em que
vive
mos, utilizando diversos tipos de tecidos, modelagens, cores e estampas para
aumentar, minimizar ou destacar as diversas partes constitutivas do nosso corpo.
No decorrer da história, estes artifícios sempre foram usados pelo homem para
personificar a sua presença em diferentes contextos sociais. Através do vestuário é
possível compreender e revelar informações sobre os sujeitos que se constroem em
diferentes discursos. Desta forma, o estudo da vestimenta masculina
po
de revelar
como o homem usou a moda nas rearticulações significantes de sua presença no
mundo, conforme afirma
Castilho:
O corpo torna-se, assim, o suporte ideal de discursos que o
revestem significativamente, capacitando-o como sujeito do fazer,
dotado de competências performáticas, para assumir diferentes
papéis actanciais que são desempenhados, e, devidamente
caracterizados pela decoração corpórea, que torna-se, então, traço
inerente de sua atuação no mundo
23
.
O
interesse nesta incursão temporal pela vestimenta masculina não é
apenas o de um levantamento histórico e sim o de desmembrar
segundo
uma
análise semiótica, a relação que o homem estabeleceu entre a roupa e o seu
próprio corpo. Desta forma, tentaremos entender quais foram os papéis actanciais
que estes sujeitos obtiveram ao longo dos tempos para, enfim, compreendermos o
seu papel na atualidade. Acreditamos que a moda se constrói na interação do corpo
com a roupa e que é desta relação que nasce a significação, conforme nos
esclarece Oliveira:
(...) o texto-objeto da moda
a roup
a
produz sentido em
situação , ou seja, no interagir com o corpo sobre qual age, que, por
sua 406 5700 6928 Tm(ã)Tj0.0(ã)Tj0.08406 6493 11525 5556 11267 468-0.08406 0 -0.09187 3004 9516 Tm(i)Tj0.09j0.08406 0 0 -0.08406 78808Tm(6 3530 11842 Tm(s)Tj0.0.08406 7942 0 -0.09187 3004 9516 Tm(i)Tj0.09j0.0.09187 0 0 -0.09187 8394 9)Tj0.08406 43u
21
atualizar
-se, torna-se apreensível a moda enquanto configuração
sensível, que são veiculados pelo corpo que a porta, fazendo com
que outros apreendam a sua significação, que se põe a repercutir em
seu entorno, pois, o sentido é fonte de vida, é o modo de cada
época, cada grupo social viver, assumindo
-se e ao seu vir a ser .
24
Focando nosso estudo para a evolução da cami
t
22
tronco masculino. As mangas eram feitas com grande quantidade de tecido,
cola
bora
ndo para a produção de um efeito de sentido de um corpo grande e forte.
Este traje explora a horizontalidade com um volume de tecido nas laterais que saem
dos ombros para os braços. Estas sobreposições de estrutura arredondada
oferecem volume ao corpo e criam a imagem de um tórax totalmente reconstruído
pela plástica da vestimenta. A riqueza dos detalhes e o excesso de acessórios vão
indicar um simulacro de homem que usava a roupa para construir sua aparência,
evidenciando a sua elevada posição social. A roupa, então, passa a figurativizar o
poder e a força do rei da França.
Fig. 1: Jean Clouet Francisco I da
França.
Rei da França. Início do
século XVI. Camisa aparente no
decote e nos punhos
Os decotes dos casacos começam a ficar mais baixos e quadrados e a
camisa começa a ficar mais visível. Na fig. 2, verificamos que na extremidade do
contorno do pescoço era colocado um cordão, que, quando puxado, formava
pequenas pregas no sentido do pescoço e do rosto do usuário. No punho ela
também aparece e dá às mãos a mesma importância do colo. Observamos o mesmo
volume nos ombros e braços da imagem anterior, mas a parte superior do tronco é
destacada pelo uso da camisa, o contraste da cor branca com o resto da
roupa
corrobora
essa
valoração que guia o olhar do observador para o rosto. O uso de
23
tecidos pesados, como a pele e o veludo, e o jogo entre o claro e escuro, liso e
quadriculado são usados para aumentar o volume nas laterais na parte superior dos
braços,
o que produz, mais uma vez, um efeito de sentido de um corpo forte,
figurativizando uma masculinidade que busca a força física para se fazer presente.
Fig
2 Retrato de um homem
desconhecido, anterior a 1540
.
A
camisa mais aparente no decote
com um cordão costurado
nas
pontas formando um leve franzido
.
No final do século XVI a moda espanhola invade a Europa, trazendo o
ajuste das formas e cores brias, principalmente o preto, conforme imagem da fig.
3. Este ajuste, mormente no tórax, modd
24
para parecer ser de posição social elevada. O contraste do branco da camisa com o
resto da roupa guia o olhar do observador para o rosto e as mãos do usuário.
Fig. 3
Pierre Quthe, de François Clouet, 1562.
A materialidade da camisa indica
status
social
Com o surgimento do rufo, tipo de gola grande e rendada, que engomada
ficava dura e levantada, conforme vemos na fig. 4, acentua ainda mais o valor do
rosto e das mãos. Também usado na moda feminina, o rufo foi ficando cada vez
maior, e a plasticidade dos formantes: eidéticos: (excesso de tamanho); matérico
(sofisticação da renda); cromático (o valor da cor branca) mostra um sujeito que,
pela roupa, assume uma postura do não fazer, o que é um indicativo de que, ness
e
período, os homens da corte não se preocupavam com o trabalho pesado e tinham
uma função quase decorativa, por isso a vestimenta limitava os seus movimentos. O
trabalho era considerado uma indignidade. A gola prendia totalmente o pescoço e
fazia com que a cabeça se posicionasse para cima, obrigando o sujeito vestido a
manter seu corpo em posição reta e elevada para o alto, assumindo uma postura de
superioridade e altivez. A cabeça, então, era destacada pela gola, dando importância
à mente e à inteligência dos homens. O tronco era contornado por uma estrutura
gida e a cintura era demarcada e suspensa, os quadris aparentavam ser maiores
25
pelo volume de tecidos nesta região, e a modelagem da roupa achatava o corpo do
usuário, dando visibilidade às pernas. Os ombros eram acentuados pelo recorte e
por um sutil enchimento, aparentando serem maiores, figurativizando a sua
masculinidade. O tórax era emoldurado pelo tecido e recebia a aplicação de
bordados que davam, por sua colocação, continuidade ao corpo.
Fig 4 Richard Sackville, de Isaac
Ol
iver, 1616
.
Postura elevada pelo
uso do rufo
Observando esta imagem nota-se que o rosto e as mãos recebem
destaque que, conforme vimos, mostra o valor dado à intelectualidade mais do
que à força sica. Por outro lado, as linhas centrais e laterais do corpete apontam
para o centro do corpo e se unem ao bico formado logo abaixo da cintura. Estas
linhas retas levam o olhar para a região genital, apontando a importância não da
sua inteligência, mas também da sua virilidade. Nos estudos sobre a relação da
moda com o corpo, Castilho identifica sinais claros de que o homem sempre exaltou
a sua sexualidade através da plástica vestimentar e afirma que: resgatando o
universo de criação vestimentar desde as civilizações arcaicas, na origem do traje,
26
os órgãos sexuais se encontram sublinhados, destacados o que fez a sexualidade
ser não só demarcada, mas também sublinhada
25
.
Posteriormente, a silhueta masculina foi totalmente modificada. Os
ingleses, no fim do século XVII, mantinham fortes relações com a
rs
ia, e
trouxeram à Europa o uso de túnicas e sobre elas um casaco solto, o que muitos
estudiosos acreditam estar na origem do colete e do paletó. No lugar daquela
imagem rígida, sem movimentos, a moda turca , como era chamada, trazia uma
indumentária com formas mais amplas. Com o uso do casaco a gola caída
desaparece e lugar ao plastrom. Talvez o princípio da gravata, o plastrom
consistia numa tira larga de tecido, usado em volta do pescoço e laçado abaixo do
queixo. Seu uso cobria totalmente o pescoço, era amarrado com vários tipos de nós,
mas sempre caído para baixo, chamando a atenção para o centro do tórax.
Fig. 5 Duque de Borgonha,
c.
1695 Fig. 6 Fidalgo
tocando violoncelo,
c.
1695
.
A moda turca com
silhuetas na continuidade do corpo
Nas figu
ras 5 e 6, esta nova plasticidade no traje masculino é apresentada
nas vestes (tipo de vestido até o joelho), nos casacos e no plastrom que seguem as
linhas retas da continuidade do corpo, o que produz um efeito de alongamento da
silhueta. O uso do sapato de salto alto e da peruca, que na parte superior da
cabeça, aponta para cima, reiteram este efeito de sentido. As mangas são cortadas
com um ajuste próximo aos ombros que se abre no punho, e a camisa acompanha
25
Káthia CASTILHO
, op. cit,
p 72.
27
esta modelagem e ganha
ndo
destaque com grandes babados próximos às mãos,
reafirmando o
alongamento no sentido da verticalidade.
Após a Revolução Francesa a indumentária masculina sofreu grandes
alterações. Na tentativa de encontrar uma vestimenta mais prática, confortável e
econômica, foi-se diminuindo a largura das roupas e grandes enfeites e bordados
foram substituídos por debruns estreitos e pequenos detalhes. No entanto, por volta
de 1770, ao cortar parte das extremidades da frente da casaca, imitando o casaco
de equitação inglês, surgiu o fraque, dando uma nova forma à silhueta masculina.
Conforme
fig. 7 o fraque
constitui
-se de linhas retas que começam na frente e
termina
m atrás, deixando o corpo esguio e ereto apontando para cima. As pernas
são salientadas e a nova silhueta alonga o corpo do u
suário. A camisa colabora para
este alongamento contornando o pescoço e aparecendo no término das mangas
dando continuidade
à
casaca. O colete também foi encurtado e ajustado ao corpo.
Segundo James Laver, em A Roupa e a Moda
26
, por volta de 1840,
acontece o desaparecimento da extravagância das roupas masculinas, as cores
ficam escuras e as formas passam a ser mais justas ao corpo. Neste período, toda a
Europa passa por uma grande crise econômica. A indústria enfrenta a
superprodução, e com a queda do cons
umo
, as fábricas dispensam funcionários, o
que faz cresce o desemprego. A partir da Revolução Industrial, o homem passa a
assumir mais responsabilidades. As roupas vistosas são consideradas deselegantes,
o homem começa a se preocupar cada vez mais com os negócios e a vestimenta se
adapta para esse contexto. Neste período, mais do que em outras épocas, a
vestimenta masculina se diferencia totalmente da feminina, tanto nas formas como
nos tecidos e nas cores. Os homens passam a abolir totalmente os exageros e são
relegados
a uma existência sombria onde a beleza está ausente .
27
26
James LAVER,
A roupa a moda, uma história concisa
. São Paulo. Trad. Glória M. de Mello Carvalho. Cia
das Letras, 2002.
27
Gilda de MELLO e SOUZA
O Espírito das Roupas
. São Paulo: Cia das Letras, 1987, p. 71.
28
Fig. 7 Trajes masculinos, 1834. Silhueta na
verticalidade traçada ela modelagem
acinturada e quadris arredondados. O
comprimento do casaco no joelho alonga a
altura do tronco. Produz efeito de crescimento
do homem
A plástica da roupa acompanha esta nova maneira de viver e o ajuste das
formas proporciona mais liberdade
aos
movimentos para este homem que visa a
praticidade. Na fig. 7, os trajes masculinos mostram o tórax acentuado pelo colete
que se ajusta ao corpo e demarca a cintura. O casaco também é ajustado nas
mangas e no corpo,
e
na parte de trás, as pregas que saem na altura da cintura
eleva
m a postura do usuário. O uso da calça comprida alonga as pernas e, mais
uma vez, a vestimenta produz um alongamento da silhueta e também indica a
necessidade de mobilidade dos homens, que agora se preocupam com a agilidade
de seus movimentos. O plastrom também é ajustado e dá lugar ao lenço que,
cobrindo todo o pescoço, salienta a linha central do corpo reiterado pelo
abotoamento do colete, que é continuado pelas linhas horizontais da calça.
Ainda na fig. 7, o uso de acessórios como o chapéu e a bengala, com
formas retas e compridas, contribuem para um efeito de sentido de alongamento do
corpo. Estes demarcam um simulacro do homem que se preocupa com a aparência,
que usa de estratégias para se fazer visível. O chapéu chama a atenção do
observador pelo seu tamanho e formato retangular apontado para cima, e a bengala
29
não tem um uso funcional, pois está evidente que estes homens não precisam dela
para caminhar e seu uso, então, é totalmente estético,
permitindo
ao usuário
moviment
ar
os braços e as mãos.
No início do século XX, o corpo masculino é totalmente coberto pela
plástica da vestimenta. A cintura, que antes era bem acentuada pelo ajuste da
modelagem, agora não é mais vista, acentuando ainda mais a diferença entre a
vestimenta masculina e feminina. Na fig. 8 observa-se o formato quadrado na região
do tórax e mesmo o colete que antes era ajustado ao corpo, agora tem um formato
amplo. O paletó fica mais curto e largo, quebrando a orientação vertical da calça.
Nesse trajar a camisa é evidenciada pelo colarinho e, sutilmente, nos
punhos.
O lenço é totalmente abolido e passa a ser usada gravata comprida ou
borboleta
, conforme Figs. 8 e 9. Ainda sempre usada na cor branca, chama a
atenção do olhar do observador para o centro do corpo próximo ao pescoço.
Diferentemente de antes, em que o rufo e as mangas rendadas limitavam os
movimentos das mãos e do pescoço, agora nos punhos quase não aparece e a gola
é ajustada ao pescoço. Com o tecido enrijecido, o pescoço é emoldurado dando
Fig. 9
Traje masculino,
1907. Tronco totalmente
coberto pelo casaco, que
ressalta o cor
po retangular
sem formas.
Fig.8
Terno masculino, 1902
Alongamento da silhueta pela
calça. A cintura
desaparece
com o corte quadrado do
paletó e do colete
.
30
ênfase ao rosto do usuário. O traje masculino reconstrói totalmente o corpo, com
formas retas e amplas. O uso do sobretudo, um longo casaco usado sobre o terno,
conforme fig. 9, expande a altura do homem na vertical pelo seu comprimento e
aumenta o corpo na horizontalidade com o seu formato quadrado.
Pelas figuras da expressão
analisadas
, vamos apreender que a
horizontalidade da vestimenta achata a silhueta e dificulta os movimentos do usuário
numa relação de descontinuidade com o corpo, mostrando um não fazer do sujeito.
Ao contrário disto, temos a verticalidade que alonga a silhueta, proporcionando uma
mobilidade e agilidade na relação de continuidade do corpo, proporcionando assim o
fazer daquele que a porta. Na vestimenta masculina predomina a necessidade de
uma mobilidade maior que na feminina,
segundo
afirma Castilho: a relação entre a
plástica do corpo e a plástica da moda apresenta o masculino como um sujeito
atuante, em plena posse das funções a que se destinam as articulações e
movimentação...
28
.
Desde a Revolução Industrial o homem veste uma nova plasticidade que
é indicativa de uma mudança no seu modo de vida. Suas preocupações voltam-
se
cada vez mais para o mundo do trabalho e a vestimenta fica cada vez mais solta,
indicando essa necessidade de articulação do corpo. Conforme já vimos nas figs. 8
e
9, a preocupação com a estética é colocada de lado e a vestimenta masculina fica
praticamente intacta durante aproximadamente cem anos. Apenas nos anos 50 do
século XX, após a II Guerra Mundial,
ela
começa
a sofrer significativas
transformações, quando os jovens do mundo ocidental assumem uma nova atitude.
Nes
se período, métodos cada vez melhores de produção industrializada de roupas
prontas
, levaram ao surgimento de grandes companhias nos Estados Unidos e o
jeans explodiu em todo o mundo
29
. A camisa, que antes era usada como uma roupa
interior, passa a ser usada com a camiseta, por baixo sem paletó. Ambos, jeans e
camisa, formam uma nova maneira de se vestir. Com a popularização da televisão e
do cinema, Hollywood
,
com suas estrelas
,
passou a instituir um
padrão de beleza e a
ditar novas tendências de moda em todo o mundo.
28
Káthia CASTILHO,
op.cit.,
p. 121
29
Fonte:
http: //pt.wikipedia.org.
acesso em 16/11/2006
31
No Brasil, na década de 60, explode o movimento estudantil que toma
força e se organiza contra a ditadura. Os jovens, que no fim da década de 50,
haviam se rebelado contra a moral gida, começam a se liberar sexualmente e
aumenta o uso das drogas. As idéias desse período se refletem na produção cultural
de diferentes maneiras, homens e mulheres expressam pela plástica da roupa a
mudança de comportamento. Nas figuras 10 e 11, o ator Marlon Brando, símbolo
mundial de uma juventude transviada e de um ideal de beleza, veste-
se de maneira
totalmente diferente dos padrões vigentes pelas formas, cores e materiais. A
mudança na atitude se reflete no vestir, com o uso da camisa sem o paletó ou com a
jaqueta de tecido quadriculado. A camisa começa a ser feita com novas cores e com
outros tipos de tecidos.
A camisa de cambraia de linho
,
(Fig. 10)
que,
tam
bém conhecida no Brasil
como camisa panamá , tem na sua materialili
32
aumenta o tórax. Mais do que uma vestimenta, é uma nova maneira de vida do
homem.
Nes
se período, o corpo começa sutilmente a ficar evidenciado pela
plástica da camisa. Ao falar sobre a mudança na moda masculina na década de 50
Castilho afirma que:
Os decotes, ou golas abertas se incorporam à estética masculina e
o corpo assume a presença do traje sem sobreposição que o
formatam ou dissimulam partes de seu corpo. A roupa masculina
c
omeça a fazer
-
se presente nas categorias do quadrado semiótico de
sedução, isto é, participar do jogo velar/revelar presente na
vestimenta feminina
30
A camisa perde aquela rigidez, em especial nas golas e nos punhos.
Desde sua criação sempre foi usada debaixo de alguma peça e neste momento
passa a ser uma vestimenta única e por isso fica mais evidente. Com o uso de
outros tecidos e cores torna
-
se
uma peça inserida no cotidiano masculino.
Na década de 70, a vestimenta masculina realmente passou a exteriori
zar
a nova maneira de viver. A visualidade da imagem dura que perdurou por tanto
tempo, com o uso de calça, camisa com gravata, colete e paletó, é colocada de lado.
O movimento hippie teve grande influência na mudança da vestimenta. Jovens de
todos os lugares do mundo adotam uma postura de mobilização e contestação. No
Brasil
, surgiu o movimento chamado Tropicalismo que, através da irreverência,
deboche e improvisação, criticava o governo e lutava pela liberdade de expressão do
povo brasileiro. Os tropicalistas influenciaram não a música e a política, mas
também o comportamento, a moral, o sexo, e o modo de se vestir. Surgiu, então,
uma contracultura que colocava em dúvida valores centrais vigentes e instituições da
cultura ocidental. O movimento hippie, a música rock, uma certa movimentação das
universidades, viagens de mochila e o uso de drogas demarcaram uma mudança na
maneira de viver e de se vestir de homens e mulheres.
30
Káthia CASTILHO,
op. c
it
, p.142.
33
Fig. 13
-
músico trajado co
m vestuário hippie
Com influência oriental
de
caráter religioso e místico, as camisas se
transformam em batas , sem a abertura central da frente, sem as golas e os
punhos,
usadas para fora da calça,
e pod
iam ser de vários comprimentos e de
diversas cores. A sua materialidade é constituída de cambraia de algodão, tecido de
estrutura muito leve, nunca antes usada na indumentária masculina. Com linhas
retas e soltas alongavam a silhueta masculina e proporcionavam conforto, dando
mobilidade de expressão. Diferentemente da década de 50 e 60, em que a
vestimenta foi usada para um jogo entre mostrar ou não o corpo, nos anos 70 a
mente passa a ser mais importante. O corpo, então, é coberto por uma vestimenta
leve e solta na sua continuidade, proporcionando conforto ao usuário. A cabeça é
destacada pelo uso de cabelos compridos e fitas amarradas sobre a testa,
chamadas de caê ,
ressaltando
a importância da mente. É o valor: a
intelectualidade voltada para a espiritualidade, expressa no pensamento oriental
mente s
ã, corpo são
.
Posteriormente
, as formas começam a se ajustar ao corpo novamente,
conforme Fig. 14. A calça é usada na modelagem boca de sino cujo corte é justo
na parte de cima, valorizando a região da coxa e depois se abre do joelho pra baixo,
alon
gando as pernas. A região do tórax é evidenciada, com o ajuste das formas. A
camisa é usada desabotoada e aberta, como se quisesse sair de baixo do colete e
do paletó, figurativizando um homem em busca da liberdade não só dos seus
34
pensamentos, mas dos seus movimentos. Depois de uma década despendendo
energia em busca de uma sociedade utópica, homens e mulheres são levados a
investir neles próprios, voltando a ser a órbita do seu fazer. Esse universo da saúde
e das coerções das formas do corpo a um modelo de elegância ditado pela
atualidade reaproxima o homem do universo da aparência e da moda. Retorna o
culto do eu, que elege o corpo como sua grande síntese.
Fig. 14 - John Travolta, anos 80
do século XX
.
A camisa em preto
mais aparente
No e
nta
nto, é apenas no início do século XXI que observa-
se
uma grande
e significativa mudança na vestimenta masculina. Aliado a uma mente saudável,
o próprio culto ao corpo pelo qual se edifica a busca por um padrão de medidas
ditado pelas campanhas publicitá
rias de todas as áreas e pelos ícones da moda, que
evidenciam a grande obsessão em fazer parte dos padrões de medidas
estabelecidos. A estética do corpo contemporâneo torna-se tão importante no nosso
cotidiano
, que é o centro do debate com os novos métodos de cirurgias plásticas e
próteses artificiais, exercícios de musculação e tratamentos estéticos para homens e
mulheres. Essa preocu
é
h
35
Na história da vestimenta masculina o corpo sempre foi totalmente
coberto e sua plasticidade mostra uma imagem rígida e compacta. Desde meados
do século XX o homem está em processo de transformação em lugar da rigidez, o
vestir se dá na busca pela leveza e fluidez da forma. O mercado de m
oda no Brasil e
no mundo,
em
face
desse novo modo de vida, foi levado a modificar totalmente o
processo de criação das coleções masculinas. Se antes quase não havia grandes
alterações entre uma estação e outra, sendo lançadas apenas duas coleções ao
ano
,
(
primavera
-verão e outono-inverno), hoje a agilidade é comparada aos
lançamentos da moda feminina
e,
mais ou menos a cada três meses uma nova
coleção precisa chegar às lojas. Este novo homem é atento aos lançamentos
internacionais, conhece e sobre o assunto e por isso, fica cada vez mais exigente
e quer novos produtos para se sentir atual e inserido no grupo.
O escritor e jornalista Mark Simpson, em novembro de 1994, estudando o
comportamento do gênero masculino desde o século XX, abordou pela primeira vez
a palavra metrossexual no artigo: Here come the mirror men
( vêm os homens
do espelho), no jornal inglês The Independent, no qual previa um novo tipo de
gênero masculino surgido nas grandes cidades. Em 2002, o colunista voltou a
abordar o tema no texto Meet the metrosexual
(Conheça o metrossexual), na
revista
online
Salon
, ocasião em que o termo foi vulgarizado e ficou conhecido em
todo o mundo. Metrossexual une as palavras metrópole e heterossexual para
definir um consumidor específico. Simpson nomeia o aparecimento do homem
urbano que gasta 30% do seu salário com cosméticos e roupas, freqüenta
manicure/pedicure e adora fazer compras no shopping. Seria o inverso do conceito
de retrossexual , ou seja, aquele homem que gosta de carros, cerveja e futebol,
termo este também criado pelo escritor. Em entrevista à revista Veja
online
de
agosto de 2004
31
Simpson, explica que o metrossexual desfez-se de todos os
códigos oficiais de masculinidade inculcados nos últimos cem anos e afirma
também q
ue este homem é extremamente egocêntrico e narcisista.
Apenas dois anos depois de popularizar o termo, o mesmo autor propõe
agora um novo conceito, o uberssexual , para definir a nova tendência de
masculinidade. De acordo com pesquisas, homens que usam cremes, roupas e
acessórios femininos, depilam-
se
e fazem as unhas não estão mais na moda.
Segundo o autor, o novo termo está ligado à recuperação de um
certo
estereótipo de
31
Dados coletados no
site:
www.veja.com.br
-
8/12/2006
36
masculino que, na opinião do estudioso,
perdeu
-
se
nos últimos anos. Assim, o
uberssexual será aquele que confia em si mesmo sem se tornar egocêntrico, tem
um aspecto masculino, mas com muito estilo. Segundo Marian Salzmain, publicitária
que tornou conhecido o termo metrossexual , em entrevista ao Jornal da Globo de
01 de novembro de 2005, o novo homem Se preocupa com a aparência de uma
maneira moderada, gasta mais tempo cuidando da cabeça do que do cabelo. Ele é
sensível, mas não margem para que duvidem da sua masculinidade. Uber vem
do alemão e significa super , o que está além. O uberssexual é másculo, mas
sensível e admira as mulheres fortes
.
As discussões e pesquisas para entender o gênero masculino deste novo
século são de grande valia para
este
trabalho, que busca entender de que forma a
plástica vestimentar vem se alterando para atender aos anseios e desejos desta
nova maneira de viver e como esses diversos tipos de homens utilizam a moda para
exteriorizar este novo comportamento.
O homem faz da moda uma forma de expressar o seu novo modo de ser.
Nas figs 15 e 16, o corpo é colocado para ser visto pela maneira como o usuário
veste a camisa. Num jogo de sedução, entre estar ou não vestido, o corpo é quase
que oferecido aquele que o observa. Na fig. 16, a camisa apresenta um brilho pela
sua cor intensa, dando destaque
à pele bronzeada. A cueca aparece acima da calça,
37
Com este breve histórico da indumentária masculina, conforme
observamos nas imagens acima,
constata
-se que a camisa perdurou por todas as
épocas e ainda é hoje considerada uma peça fundamental no guarda roupa do
homem contemporâneo. A vestimenta masculina vem sofrendo grandes
transformações para acompanhar esta nova maneira de viver, em que a
preocupação com o corpo está em primeiro lugar. Neste novo século, o homem vem
buscando novos hábitos, e
torna
-se cada vez mais versátil nas suas atividades
profissionais e sociais, e a camisa pode estar presente em todos estes momentos. A
moda n
s
38
A camisa é uma peça vestimentar que traz em si a construção das
maneiras de viver do homem e ainda é hoje a concretização do seu transformar. O
mercado de roupa no Brasil cresce aceleradamente com a abertura dos shoppings
para todos os segmentos sociais, nos quais a explosão dos grandes
magazines
pr
opicia a população de baixa renda ter acesso às principais tendências de moda e,
conseqüentemente, obrigam as marcas mais importantes a serem mais ágeis nos
lançamentos das novas coleções. O que se observa é que o homem cada vez mais
passa a se preocupar com a aparência e fica mais atento
às
novidades da moda
.
Para atender a demanda deste mercado masculino emergente que vai às compras
antes restritas a certos produtos essenciais à família e ao trabalho, escolhendo o
que veste, o homem impulsionou não as marcas existentes, mas também
novas
empresas a investir
em
n
a
criação
de roupas masculinas.
Essas mudanças resultam em vários estudos para entender as diversas
mutações do homem e de sua identidade que se diversifica. Guiadas nestas
pesquisas, o mercado de moda tende a focar suas coleções de acordo com
o
segmento de perfis que se dividem em vários tipos de consumidores. Para isso,
procuram entender quem é este homem, o que gosta de fazer nos momentos de
lazer, o que gosta de comer, que filmes assist
e
, qu
e viagens costuma fazer, quais as
atuais
constituições de família,
os
novos valores sexuais, saúde e lazer. Criar moda
para homens já não é tão simples como antes,
quando
as coleções praticamente
não passavam por alterações. Hoje, o ritmo de lançamentos acompanha o da moda
feminina com uma gama imensa de novos produtos.
Com tantas mudanças no mundo, a camisa permanece presente no
cotidiano masculino. Desde as marcas mais sofisticadas, às comercializadas nos
grandes magazines, nos grandes centros de roupas populares, a camisa é peça do
vestuário presente nesta heterogeneidade de pontos de venda e marcas. Não
importa o tipo de homem para quem estas empresas se dirigem seja para os mais
formais, os informais, os que seguem e os que estão dentro da moda, até aos mais
sensíveis, todos mantêm a camisa como peça fundamental em seus lançamentos.
Entre as mudanças que atingiram os valores e papé
is
, do homem atual
assim como é a permanência da camisa na composição do vestir, vamos encontrar
uma alteração quanto à modelagem, vários materiais e tecnologias com o uso das
fibras sintéticas que diversificam os tipos de tecidos com novas texturas, estampas,
39
aspectos de bordados e gamas de cores figurativizando um masculino emergente,
caracterizado como mais sensíve
is
e delicados, aptos a sentir e experimentar novas
formas com valores inusitados instaurados.
Romper o aprisionamento ocasionado pelo uso da entretela; a aspereza
ocasionada por um tipo de estampa, a coerção do corpo numa modelagem rígida
que, pelo sentir disfórico impulsiona o querer sentir a sensação de conforto
proporcionado pelo uso do algodão ou pelo formato amplo e quadrado que constitui
determinada camisa.
Com essa panorâmica de especificas mudanças na oferta da mesma peça
vestimentar, a camisa, nossa pesquisa selecionou um conjunto exemplar pelo
critério mercadológico de sua circulação e consumo na moda masculina.
3
.1
Camisa
O
bjetal
_________________________________________________________
40
Fig. 17
Camisa
o
bjetal
A camisa social se caracteriza por ser a mais clássica encontrada hoje no
mercado brasileiro. Começou a ser usada
no
o final do século XIX, e o início do
século XX. Marcou um período de quase
cem
anos, em que a
classe
masculina
passou a vestir-se de maneira discreta para afirmar sua seriedade e seu interesse
pelos negócios. Os homens passaram a buscar a elegância com formas, cores e
materiais extremamente austeros
,
fugindo de qualquer tipo de exageros.
No nível mais profundo das estruturas discursivas, observa-se que o
enunciador instala uma debreagem enunciativa espacial, com o aqui do homem
da atualidade em relação ao dos homens de outrora. Esse tipo de camisa
é
usada para atender às necessidades de um simulacro de homem que est
á
preocupado em ser fiel aos costumes de antigamente, do tempo em que a
sobriedade demarcava a seriedade na maneira de viver e que
ainda
são válidos,
por várias imposições até a atualidade. Por uma série de imposição que instituiu a
permanência da camisa social para o exercício das atividades profissionais, assim
41
como em ocasiões formais. Advém do uso social desta camisa a adoção do termo
social como nome comercial.
Evidentemente que no mercado atual podemos encontrar esta camisa
de diversas cores e padrões que vão dos tons mais pastéis como o branco, tons
de azuis e beges, salmão e rosa, como também a cartela infinita de cores mais
fortes
, inclusive o preto. No entanto, a cor mais vendida no mercado nacional é o
branco. Por muito tempo esta foi a cor única da camisa social e por isso o branco
carrega os valores axiológicos
32
do tempo em que começou a ser usada. A opção
por vesti-la faz
com que se
s
inta
protegido de não estar adequado aos padrões de
elegância considerado clássico e indiscutível, o que faz a camisa funcionar como
uma opção segura e programada pelo social para o homem ter o desempenho
que é dele esperado. Como o pretinho básico , que é considerado uma peça
fundamental no guarda-roupa feminino, ocorre o mesmo com a camisa branca
em
relação ao
guarda
-roupa masculino. É uma peça cuja escolha não expõe o
usuário a correr nenhum risco na sua presença formal e no social.
O tecido de que a camisa é feita é o tricoline, que é dotado de leveza
e da resistência do algodão. Ele pode ser liso, listrado ou xadrez em 100% algodão.
Normalmente é utilizado para confecção de camisaria por se tratar de uma estrutura
tela, construção de ligação de tecido plano, caracterizada pela simetria da
distribuição dos fios na proporção 1 fio por 1 fio entre trama
33
e urdume
34
. Esta
construção distribucional simétrica do tecido em tela proporciona uma superfície
plana e regular extremamente leve e confortável para o usuário. Este tecido é feito
com os fios sem coloração, isto é, em cru. Desta forma, o tecido sai do tear sem
definição de cor. Apenas depois de passar por um processo químico que prepara os
fios para o banho de cor, o tecido vai para a barca de tingimento
35
. A composição
dos fios de um tecido determina a temperatura máxima que poderá atingir no banho
de tingimento para pegar a coloração desejada. As fibras naturais, diferentemente
das sintéticas não podem ser levadas a uma alta temperatura no tingimento,
32
Em semiótica o termo axiologia compreende-se geralmente por teoria e/ ou a descrição dos sistemas de
valores ( morais lógicos, estéticos) Algirdas. Julien GREIMAS e Joseph COURTÉS, Dicionário de
semiótica
o
42
conseqüentemente, a camisa, de 100% algodão, tem sempre uma única cor. A
junção da fibra de algodão com o ligamento tela resulta numa superfície opaca, sem
brilho, características essas produzidas pelo formante matérico.
Segundo
Garcia
,
essa propriedade classifica a opacidade como categoria matérica e não cromática,
uma vez que o brilho advêm da materialidade inerente ao fio e ao seu tratamento
industrial
36
.
Ele
também é resultante do tipo de ligamento utilizado para tramar o
tecido
, como é o caso do cetim de seda, cuja forma de distribuição dos fios da trama
e do urdume vão produzir o brilho. Este efeito também pode ser obtido pelo tipo de
acabamento denominado por mercerização que leva o tecido depois de sair do tear
para um banho especial que ressalta o brilho das fibras.
No contato com o corpo
,
a tricoline é extremamente confortável, mas duas
operações
vão neutralizar o efeito que o natural/vegetal de algodão pode
proporcionar à pele pela excelente possibilidade de respiração, gerando sensação
de conforto. O primeiro é dado pelo uso da entretela na gola e nos punhos que
enrijecem essa materialidade torn
ando
-a
rígida, dura e desconfortável para o usuário
(Fig
s. 18/19). As regiões do pescoço e dos punhos são comprimidas pelo tecido
enrijecido no uso da entretela
.
A segunda neutralização é produzida pela
modelagem retangular que ajusta a camisa ao corpo. Estas neutralizações alteram o
sentir a materialidade do tecido no corpo do usuário, que vai passar a produzir efeito
contrário pelo enrijecimento. A materialidade do tecido em seu corpo instala uma
descontinuidade tátil pelas oposições duro (tricoline com entretela) vs mole
(tricoline). Esta descontinuidade causa uma tensão no uso da camisa, e um certo
desconforto.
36
Claudia GARCIA,
Estudos semiótico das lingeries na construção dos regimes de visibilidade da mulher
brasileira .
Dissertação de mestrado. Orientação Prof. Dra. Ana Claudia de Oliveira, PUC
-
SP, 2005, p. 31
43
Fig.1
8 - gola clássica
Fig
.
19
-
punho com entretela
Nos estudos sobre a diferença da materialidade da roupa no contato
com o corpo e sua importância na construção de uma interação entre pele e
vestimenta, Garcia esclarece que:
No plano da expressão, o sensível convoca o inteligível do
enunciatário na apreensão dos sentidos, da oposição entre duro
vs
mole, da materialidade que se põe em relação, depreende-se o
seu fazer na manifestação textual. Poderíamos dizer que o
material, na sua própria constituição, é utilizado para manipular a
destinatária para um modo de interagir (...).
37
O traçado das linhas retas na região do tórax forma dois retângulos que
são unidos por botões em uma tira de tecido duplo. Os botões são de coloração
próxima à do tecido e cumprem a função de fechar a camisa sem uma função
estética, são apenas funcionais. Em toda a peça as costuras são empregadas pela
sua funcionalidade dada pela ação de unir as partes retangulares separadas. Esse
agir funcional é concretizado pelo uso da linha da mesma cor do tecido: br
anco
sobre branco, resultando numa impressão de que as costuras não existem. Os
retângulos das partes unidas retangularizam o corpo. A modelagem retangular que
ajusta a camisa ao corpo vai determinar a ação do formante eidético na construção
des
t
e tipo de
camisa.
37
Claudia
GARCIA,
op. cit
, p. 51
44
A
s
linhas verticais formam figuras
regulares que são reiteradas quatro vezes
Na horizontal, duas linhas paralelas que são traçadas de uma cava a
outra
,
estendem
-
se
das cavas ao colarinho (Fig. 21)
colocada
s topologicamente
sobre os ombros. Esse recorte de linhas retas tem, como toda a camisa, o formato
de um retângulo. Na parte do colarinho forma-se uma curva que acomoda o
retângulo na região do pescoço. Quanto a mangas e punhos é, de novo, a figura do
retângulo que reaparece. O retângulo da manga é afunilado na altura dos punhos
,
onde é interrompido e contorna o punho por outra forma retangular. Todas essas
reiterações de retângulos acompanham a forma retangular do tórax e essa forma
enrijecida é enfatizada pela neutralização da tric
oline
. Assim é que para fazer a
topologia geométrica do tronco masculino deixa de mostrar a região peitoral e a
cintura
, ocultando o que há de circular e angular
.
Fig. 20
Visualização dos formantes
45
Fig. 21
-
reiterações de retângulos aprisionam o usuário
O bolso localizado do lado esquerdo do tórax tem o formato de um
retângulo(Fig.22). Na parte de cima, não possui uma lapela para fechamento, assim
se mantém aberto, propiciando ao usuário uma comodidade e uma praticidade no
seu uso funcional. Normalmente, o usuário dessa cami
sa utiliza
-
se da facilidade para
guardar ali um instrumento importante do seu fazer cotidiano: a caneta.
O
bservarmos
que
o enunciador coloca o bolso para atender à prática de um fazer,
em que o enunciatário por um gesto tem ao alcance das mãos a caneta, que fica
escondid
a
debaixo do paletó.
Podemos dizer que o retângulo do tronco é
retomado
pelo retângulo da
camisa
, em um espelhamento que acentua a imobilização do corpo pela roupa. O
Fig.22
-
bolso formato
retangular
-
como na
faixa da abertura a parte
dupla de tecido que enfatiza
o tronco.
46
retângulo do corpo está confinado, o que caracteriza esse tipo de camisa por
um
agir coercitivo que faz o corpo se mostrar pela camisa.
Em termos de categoria de expressão tem-
se
como
arranjo plástico:
formante matérico: rigidez (entretela)
versus
flexível(algodão); leve (fibra natural
de algodão)
versus
peso (entretela); simetria (ligamento tela) versus.
assimetria
(ausente); fosco (algodão e ligamento tela)
versus
. brilhante (ausente neste
modelo);
Formante cromático: policromático (traço ausente)
versus
monocromático (branco, preferível neste modelo); Formante
eidético
: retas
(tórax/mangas/punho/bolso)
versus
curvas (colarinho/barra frontal); verticalidade
(tronco, mangas)
versus
horizontalidade(recorte das costas).
Estas oposições do plano da expressão, formam categoria pela
descontinuidade da plástica vestimentar na relação com o corpo, homologando no
nível fundamental do plano do conteúdo a oposição liberdade
versus
opressão. Ao
cobrir o corpo, este usuário
demonstra
uma preocupação em atender aos padrões
vigentes para alcançar o objeto-valor elegância e formalidade. A privação da
liberdade mostrada pelo arranjo plástico da peça indica um simulacro de homem
que não problematiza a posição do homem atual. Evidentemente que a sua maior
preocupação não é a de cuidar do corpo. A camisa cobre o seu corpo e
proporciona a ele a certeza e a segurança de estar cumprindo com as normas
estabelecidas. O seu vestir se para o social, para o encontro com o outro em
relação ao trabalho predominantemente e em situações formais eventualmente.
47
3
.2
Camisa
Pragmática
__
_________________________________________________
Esse tipo de camisa é a mais vendid4sm(d)Tj0.0417 670.0417 670.0417 670.0417 6702007002007 0 763z 704 0 7 0 0 -0.09187 4548 10 7 0 763z 17 670.0417 670.0417 670.0417 67020085
s
48
uma maneira a deixá-lo mais livre e solto para a sua movimentação. A cintura
passou a ser ocultada pela plástica da roupa e as formas foram ficando, na largura,
cada vez mais amplas, reconfigurando o retângulo do tronco em uma variante
quadriláter
a, o quadrado. A camisa tradicional, assim como é denominada
comercialmente, possibilita ao usuário manter uma postura de relaxamento corporal
uma vez que o seu formato esconde as formas do corpo, conforme veremos na
análise a seguir.
Lisa
L
istrada
Xadrez
O formante eidético é constituído
por
linhas retas,
delineando
um
quadrado na região do tórax. A medida do ombro é menor que a medida abaixo da
cintura
; havendo um leve aumento de tamanho de cima para baixo, a cintura
desaparece e o corpo fica totalmente ocultado. As mangas também são amplas na
cava e vão se afunilando com duas pregas contornando os braços até o punho, que
é
constituído
de duas partes de tecido costuradas com uma entretela. Esta entretela
do punho e da gola é bem fina sendo apenas demarcadora das regiões do pescoço
e dos punhos. Assim possibilita um demarcar flexível que permite ao usuário
manejar essas partes na duração do seu uso.
49
Fig. 24
-
gola
usada sem abotoamento
Fig. 25
punho descontinuidades das listras
Quanto ao punho, as duas extremidades do recorte retangular são
previstas de se juntar pelo
abotoamento
. Porém essa reunião das partes é
neutralizada e o uso comum é com os punhos dobrados. Na maior parte das vezes o
usuário dobra o punho pelo menos duas vezes (Fig. 25) Esta prática do uso da
camisa vai acentuando o total relaxamento do corpo que exibe uma atitude
descontraída d
este usuário.
Fig. 26
punho dobrado
Fig. 27
-
bolso continuidade das listras
O bolso colocado topologicamente do lado esquerdo do tórax na região
peitoral quase não é notado (fig. 27). O enunciador utiliza-se do encontro perfeito
das listras para dar continuidade no sentido da verticalidade do corpo, cuja a ênfase
é marcada pelo fato do enunciador reiterar o mesmo procedimento na costura
central da parte frontal retangular. Os botões pequenos e delicados são usados para
50
o abotoamento que une as partes separadas, ao se dar a não quebra ou
interferência na dinâmica das verticais paralelas. (fig.23). Assim tanto o bolso como
a costura central não têm uma função estética, mas apenas funcional, que o
homem usualmente não utiliza bolsa e precisa de um lugar para colocar seus
pertences. A estratégia de não haver quebras das listras na verticalidade do corpo
na região do tórax usada pelo enunciador produz um alongamento da silhueta
comumente explorada na vestimenta masculina. Se de um lado concordamos com
Castilho
, quando afirma que a exploração da verticalidade é para marcar a
aproximação maior do traje masculino ao corpo do homem
38
também
perce
be
-
se
um modo de destacar a dimensão pragmática e performática do homem na
sociedade. Essa direção vertical simbolizaria então a sua força de atuar no mundo,
de transformar o seu circundante que caracterizou a sua evolução. Essa direção
semântica vai ser mais enfatizada sobre os ombros. Um recorte sobre esta região
dispõe as listras na horizontalidade em contraste com a exploração feita da
verticalidade.
Dessa forma, ele chama a nossa atenção para a região superior das
costas
, local em que se entrecruzam os movimentos dos ombros e braços. Esse
recorte é o destaque da força física, que para ser empregada, exige uma soltura
dessas partes do corpo.
No nível narrativo, o destinador estabelece um contrato de manipulação
por tentação, oferecendo ao destinatário um conforto incomparável pelo uso do fio
de algodão 80. Essa manipulação é feita primeiramente pela etiqueta localizada na
parte de dentro do colarinho: RICHARD S ALGODÃO EXTRA, e é reiterada por um
grande
tag
com o papel de informar ao destinatár
io
, as qualidades distintivas do
tecido (Figs. 28/
29
).
Como explica Oliveira: A compra é um ato mediante o qual o
sujeito
-comprador quer poder se reconhecer-se auto-
identificar
- tanto quanto um ato
de aquisição objetiva
39
.
Neste
tag
, a marca informa, por meio de um texto, a importância da
qualidade da fibra de algodão de titulagem
40
fio 80: nos um tecido nobre, de
fibras longas e de qualidade incomparável . Mostrando-se detentora de um saber e
um poder, ela praticamente cria uma marca de algodão, quando diz: O algodão
Extra Richard s mantém o brilho, textura e maciez, mesmo após inúmeras lavagens,
38
Káthia CASTILHO,
op. cit
, p. 83
39
Ana Claudia de OLIVEIRA,
Vitrines: acidentes estéticos na cotidianidade
, São Paulo, EDUC,1997, p.43.
40
Titulagem: sendo praticamente impossível medir o diâmetro ou espessura do fio, devido à f
ácil deformação da
secção, usa-se o método da titulagem. O título do fio é a relação entre massa e o comprimento ou a relação
inversa onde, dependendo do sistema, um deles é fixo e o outro variável.
51
garantindo a beleza da sua camisa e o seu prazer em vesti-la durante muitos anos .
Neste contrato de manipulação, o destinador oferece conforto no uso desta camisa,
criando o simulacro de um homem preocupado com o sentir a peça no contato com
a pele com o sentir
-
se bem e à vontade. Oferece ainda uma longa durabilidade para
esse modelo de camisa que permanece no tempo sem ter uma vida útil ameaçada
pelo
sair da moda e cair em desuso.
Fig.28
-
Tag
Outra importante característica desta cam
52
Fig. 30
formante cromático (
fio turquesa com brilho)
No formante cromático,
a cor turquesa aparece com m
aior intensidade
em
virtude
da sua materialidade de aspecto acetinado e brilhante. O branco aparece
como se estivesse ao fundo do restante das listras em marrom e kaqui. Na região do
tórax e dos braços, estas listras estão na verticalidade do tórax, assinalando a
continuidade do fazer do masculino.O branco que profundidade, reitera o
alongamento da silhueta.
Em contraste com o aprisionamento do corpo contido em suas ações pelo
tipo de camisa social, essa camisa libera o corpo dando-lhe livre ação. Na gola, a
posição das listras contorna o pescoço do usuário, o que faz com que todo esse
dinamismo mostre a força de transformação
resultante
na
competência racional.
Organizando a análise do plano da expressão vamos encontrar as
oposições: formante matérico: macio (100 % algodão extra fio 80)
versus
áspero
(não presente neste modelo); brilho( ligamento cetim fio tinto turquesa)
versus
O
paco
(ligamento tricoline fio tinto branco, marrom e kaqui); formante eidético: linhas
curvas (colarinho)
versus
linhas restas (tórax, mangas, punho, bolso, recorte);
vertical (tórax, mangas)
versus
horizontal (punho, recorte); formante cromático:
monocromático (ausente neste modelo)
41
versus
policromático (branco, turquesa,
marrom e kaqui); brilho (ligamento cetim)
versus
opaco (ligamento tela); formante
topológico: englobante (camisa)
versus
englobado (corpo).
As características plásticas da peça instauram uma descontinuidade em
relação ao eidos corpóreo: descontinuidade. No plano do conteúdo, esta oposiç
ão
vai
homologar a busca do usuário pelo objeto-valor, conforto e praticidade. No nível
41
Lembra
-
se que neste tipo de camisa o tecido pode ser ta
mbém de uma única cor.
53
discursivo
, o relaxamento corporal indica um simulacro de homem que não está
preocupado com a busca do corpo perfeito e priva pela sua comodidade no uso de
uma camisa que pode ser usada
em vários momentos do dia.
3
.3
Camisa
Subjetal
________________________________________________________
Fig. 31
a camisa no seu uso
Neste modelo encontramos uma ruptura do que muito tempo foi
considerada uma camisa masculina. O ajuste das formas que contornam o corpo
indica uma mudança de comportamento do homem da atualidade. No segmento do
54
mercado de moda, convencionou-se a chamar esta modelagem de fit
que significa
magro . Como o próprio nome
sugere
, a camisa é toda ajustada no tórax, nas
mangas e também no seu comprimento. O corpo então, passa a ser evidenciado.
Diferentemente dos dois primeiros modelos, em que identificamos reconstruções do
corpo. Na camisa social ocorre uma reconstrução por duplicação,
ao passo que
na
camisa funcional, informal uma reconstrução por uma forma quadrilátera variante do
retângulo: o quadrado. Evidentemente que nossa escolha particulariza uma das
muitas reconstruções do corpo efetuada por esse terceiro tipo de camisa existente no
mercado com esta modelagem
e
com diversos tipos de tecidos, cores, estampas e
bordados. No entanto, as características plásticas do plano da expressão são sempre
as mesmas.
O tecido desta camisa, especificamente, é constituído pela tricoline
semelhante da camisa
objetal
, porém, neste caso, os fios de algodão são tingidos
antes de ir para o tear, por isso são chamados de fios tintos.
Os
fios são dispostos no
sentido do urdume e da trama, para que, ao serem batidos no tear se entrelacem,
formando o desenho que, neste
tecido
, é um xadrez. Quando temos o processo
inverso, conforme análise da camisa
objetal
em que os fios são tingidos com o tecido
batido,
acontece
a neutralização do urdume e da trama. Nesta camisa, o
procedimento de constituição do tecido acentua os dois sentidos: a trama e o
urdume, deixando em evidência o desenho do xadrez.
O xadrez sempre foi tradicionalmente usado por homens do campo, da
fazenda, em
que o trabalho braçal implica necessidade de uma força física. Há muito
tempo também é usado pelos cowboys americanos , e hoje faz parte do
look
obrigatório dos rodeios brasileiros. Assim, o xadrez traz a figuratividade do macho,
da virilidade, da força física como sendo fundamentais para se tornar um homem de
verdade.
Na camisa encontramos, em oposição a este machismo figurativizado
pelo xadrez, o desenho de um florido. Esta estampa foi feita por um processo muito
antigo e manual. Neste tipo de estamparia, o desenho fica chapado sobre a
superfície com aspecto rugoso e áspero que salta para fora como um convite para
aquele que o observa
,
tocá
-
lo
, como se este homem extremamente viril, forte
mostrasse
, o seu lado feminino. O xadrez passou por uma corrosão que apaga
levemente alguns pontos do desenho, como se o lado macho estivesse sendo
suavizado ao mesmo tempo, em que a estampa florida ganha destaque. É o lado
55
feminino, sensível e delicado que
aparece
em primeiro plano
,
mais destacado e
evidenciado. Este homem potencializa-se num visual mais vigoroso, forte e ao
mesmo tempo delicado, dócil e detalhista.
Fig. 32
-
foto da estampa florida
Fig. 33
-
foto do t
ecido com corrosão
Esta corrosão do tecido tem sido muito utilizado, como tendência de
moda, e passa um efeito de sentido de que a roupa não é nova, como se na
verdade
, a pessoa que a veste não estivesse preocupada com a sua aparência. No
entan
to, é exatamente o contrário, que o seu uso nos mostra que este homem
está antenado com as novidades da moda.
Ao analisarmos as qualidades empregadas do tecido tricoline de algodão,
destaca-se como principal característica o conforto e o bom toque no contato com a
pele,
mas encontramos um contraste com a região onde este tecido recebeu a
estampa, que o deixou com um toque áspero e duro. Temos então a oposição liso vs
áspero
ocasionado pela mudança na característica do matérico que desperta a
atençã
o, levando-nos a pensar
em
qual
seria o seu sentido. Como um sentido
sentido não guardaria esta não a visibilidade, mas também a tatilidade como
proposições da manifestação das transgressões de papéis do masculino no social.
Esta diferença, ou contraste, é fundamental para o surgimento de sentido no texto,
conforme nos esclarecem Greimas e Courtés
42
. Esta oposição é sentida tanto pelo
42
Algirdas. Julien GREIMAS e Joseph COURTÉS, Dicionário de semiótica , trad. Alceu Dias Lima, Diana
Luz Pessoa de Barros, Eduardo Peñeuela Cañizal, Edward Lpoes, Ignácio Assis da Silva, Maria Jose Castagnetti
e Tieko Yamaguchi, Sã
o Paulo,, Editora Cultrix, p. 122.
56
usuário da camisa, bem como pelo observador, que percebe a diferença da
materialidade
por intermédio
da diferença da textura e da coloração da estampa para
o tecido xadrez.
Fig. 34
-
oposição
linhas retas(xadrez)
Fig. 35
-
estampa lado direito em cima
linhas curvas
( estampa)
do bolso
No formante cromático, passeamos o olhar no xadrez em cores suaves
que vão do branco, do kaqui ao bege, e do vinho ao rosa para o desenho florido
colocado topologicamente do lado esquerdo daquele que o porta, o lado do coração
que exterioriza que também o homem tem afetos e é por estes afetado,
caracterizado pela dimensão sensível ou das paixões. Esta estampa choca pelas
cores em desarmonia com o xadrez.
Observamos
como cores pr
incipais
, o amarelo
e o verde, que estão nos galhos d
57
para a forma corpórea. Também esta oposição é vista nas linhas retas do xadrez em
oposição às curvas do desenho estampado.
As linhas retas ganham destaque na região dos dois bolsos. Estes estão
localizados topologicamente sobre o peito do enunciatário, acentuando esta região e
dando a impressão de serem grandes. O corte da camisa ajustado ao corpo vai
reiterar este aumento da região peitoral. Os bolsos são feitos para serem vistos, pois
a lapela salta para fora da camisa e estão com as listras da direção contrária do
sentido da peça (Fig. 37). Diferentemente da camisa tradicional, em que o bolso é
imperceptível pelo encontro das listras e que alonga a silhueta, neste caso o bolso
realça a região peitoral qualificada por um tórax forte e musculoso.
Fig. 36
Visualização dos formantes
58
Os bolsos retangulares têm, cada um uma lapela em forma retangular
que
, apontando em ângulo agudo para o botão, exalta o ponto circular da projeção
para fora do mamilo e faz ostensivamente visível o formato que até então era latente
ao físico masculino e até considerado o elemento não marcante, e que essa
reconstrução plasmada na camisa põe
em questionamento.
Fig.37
-
foto do bolso da camisa
As análises do plano da expressão levam nos às seguintes oposições:
formante matérico: macio (tecido tricoline 100% algodão)
versus
áspero (a estampa
florida); formante cromático: cores complementares (bege, kaqui, vinho, cor de rosa)
vs
primárias (branco, amarelo, verde, vermelho, azul); quentes (xadrez)
versus
frias
(estampado); formante eidético: retas (xadrez/ ombros, punhos, bolsos e costura
central)
vs
curvas (desenho florido/ colarinho, cintura); vertical (
trama
)
versus
horizontal (urdume); formante topológico: englobado( tronco) englobante (camisa);
alto (região peitoral; bolsos) baixo (traço ausente).
Estas oposições homologam o plano do conteúdo no nível narrativo pela
categoria do querer ser um homem forte, viril e ao mesmo tempo sensível e aberto
para mudanças. A própria constituição dos formantes eidéticos e cromáticos que
envolvem o corpo com as formas e o mostra pelas cores, não do xadrez, mas
sobretudo as do estampado florido, constrói um sujeito que quer ser notado. A
camisa desenha no sentido de ser posicionada como concepção e ideação de um
novo design do masculino. A isotopia criada pelas figuratividades propostas,
trazem
-
nos
a construção de um simulacro de homem que se ocupa da sua imagem
59
no mundo. Ao evidenciar o corpo pela plástica da roupa, ele torna-se o agente que
argumenta o discurso de uma nova maneira de viver.
3
.4
Camisa Simbólica
____________________________________________________
Acompanhando o surgimento de novos tipos de tecidos, o setor de
camisaria masculina constrói a mais radical inovação tecnológica. As tecelagens
deste setor, desde o início deste novo milênio, tem sido
introduzi
das
novas
construções têxteis e diversificaram no uso de novas fibras. Até o final do século XX,
os tecidos para camisaria masculina eram sempre feitos de fibras naturais como o
Fig. 38
Visualização dos formantes
60
algodão, o linho ou a seda. Conforme veremos nesta análise, as fibras sintéticas
passar
am a ter uma importância muito grande na invenção de novos tipos de tecidos
para este segmento, pois proporcionam maior possibilidade de criação de novas
texturas e cores.
A princípio, o uso das fibras sintéticas encontrou muita resistência das
principai
s marcas de confecção masculina no Brasil. Seu uso era associado apenas
a uma questão econômica, já que enfrentamos, em 1995, a abertura do mercado
interno aos produtos importados, e houve uma grande quantidade de tecidos da
China fabricados com uma mão de obra barata e fios sintéticos de qualidade. No
entanto, a fibra sintética de boa qualidade pôde proporcionar uma infinita diversidade
deste segmento, não
na
camisaria, mas no mercado de confecção como um
todo.
A camisa monofilamento (Fig. 38) é um exemplo desta mudança. O tecido
é constituído da mistura de fios de algodão, fibra natural, com uma fibra sintétic
a,
chamada de poliamida monofilamento
,
que tem como característica
ser
um fio de
diâmetro extremamente fino, como um fio de cabelo, propriedade que confere ao
tecido uma leve transparência e um aspecto empapelado. Expliquemo-
nos.
Normalmente
, os tecidos transparentes são moles e possuem uma caída no
contato com o corpo.
C
om o uso des
s
a fibra, o resultado é um tecido muito fino, mas
que manté
m
uma certa estrutura, sendo um pouco duro, firme, o que resulta no que
comercialmente é chamado de empapelado.
Tal efeito é reiterado com o aspecto amassado do tecido, que é obtido
com o aquecimento das fibras a uma alta temperatura para fixar e deixar
es
s
e
acabamento permanente, r
esulta
m num tecido que expõe um usuário antes não
identificável neste meio. Esta é uma importante mudança da moda masculina, pois,
ao usar uma camisa com aspecto amarrotado, o usuário se mostra despojado e
despreocupado dos rigores do vestir social. O amassado se contrapõe à silhueta
dura e rígida que sempre esteve presente na vestimenta masculina.
O formante cromático se constitui de três cores, sendo que as listras
branca e marrom escuro parecem saltar sobre o rosa. Isto acontece porque foi
utilizada nestas listras uma espessura de fio de algodão mais grosso, ou seja, pelo
matérico alteração do cromático, outra importante característica dos novos
tecidos para camisaria. uma exploração de texturas nas camisas, como se o
61
usuário quisesse ser tocado e notado por aquele que o observa. Sobre este sentir a
materialidade
, Garcia afirma que: Além de influenciar o cromatismo, os diferentes
materiais também influenciam a maneira como o corpo percebe este material de
encontro à pele, ou seja, a relação tátil entre peça e pele
43
. Este sentir a
materialidade no uso da roupa sobre a pele indica uma nova maneira no ato de se
vestir. Esse tecido de fibra sintética de toque empapelado, acabamento amassado e
mistura de fios com espessuras
mais grossas é valorizado esteticamente
, entretanto
,
deixa muito a desejar no quesito conforto. O homem por muito tempo não abriu mão
das fibras vegetais, conforme já vimos, pois propicia um enorme bem estar no
contato com a pele. Estar disposto a perder esta sensação no vestir uma camisa em
nome do embelezamento é indicativo do surgimento de uma nova maneira de vida.
É então, a estética que est
á
em primeiro lugar.
Fig. 39
-
gola
Fig. 40
recorte das costas
Na região do tórax e das mangas, as listras estão posicionadas na
vertical,
dando
continuidade do corpo, o que confere um efeito de sentido de
alongamento da silhueta. Nos punhos e no recorte da parte de cima das costas,
perto da gola, as listras estão no sentido contrário chamando a atenção do olhar do
observador
, fazendo com que pareçam maiores. Com o alongamento da silhueta e a
valor
ização
dessas regiões notaremos uma construção de um corpo magro
,
forte e
musculoso nos ombros
.
43
Claudia GARCIA,
op.cit
, p. 28.
62
A camisa é feita com uma modelagem um pouco mais ajustada ao corpo
do que a camisa social e a tradicional, mas não tão justa como a camisa de
modelagem
fit . Esta se constitui de um sutil ajustamento ao corpo na região da
cin
tura e uma diminuição no comprimento. Isso é feito como uma estratégia do
destinador para que o usuário use a camisa para fora da calça. Com isso a peça fica
mais aparente e ganha destaque.
Fig. 4
1
forma ajustada
Fig. 4
2
a camisa mais curta
Pelas análises do plano da expressão podemos organizar as seguintes
oposições: formante eidétido; linha reta (mangas; recorte costas; punhos)
versus
linha curva (cintura); formante matérico: sintético (pol
iamida)
versus
vegetal
(algodão); t
ransparente
(poliamida fio fino)
versus
obscuro (algodão fio grosso);
duro/empapelado (tecido)
versus
mole (ausente); amassado (tecido)
versus
liso (não
presente neste modelo); formante cromático: claro (branco)
versus
escuro
(marrom;rosa);
primária( branco)
versus
complementares (rosa; marrom).
Conforme vimos, a camisa ganha destaque por ser usada para fora da
calça. No entanto, é pela sua materialidade que chama a atenção. A cor e a
mod
elagem não apresentam nenhuma novidade, diferentemente do tecido que salta
aos olhos. O monofilamento é apenas um exemplo da diversidade de tipos de
tecidos que estão no mercado. Esses tecidos possuem diferentes composições e
características de acabamentos e estão cada vez mais invadindo o vestuário
masculino, especificamente as camisas. Diversas possibilidades de texturas, fios
diferenciados, aspectos enrugados, amassados e com leves transparências. Estas
63
novas tecnologias são usadas por um grupo restrito de marcas que se caracterizam
por lançarem no mercado de moda
,
produtos diferenciados e vanguardistas.
Nos estudos sobre a
lingerie
, Garcia fala sobre a importância da
materialidade como significante por si mesma
44
, destacando que a diferença se os
fios,
com os quais são feitos os tecidos, são sintéticos ou naturais, dado no contato
com o corpo, esses vão gerar efeitos de sentido de maciez ou aspereza, flexibilidade
ou rigidez, lisura ou rugosidade e ainda, transparência ou opacidade , e ainda
afirma
:
Os formantes de uma vestimenta fazem sentido em situação , ao interagir
com o corpo do sujeito, no qual propõem uma convocação das ordens sensoriais
para o seu sentido manifestar
45
. No vestir esta camisa, o usuário busca uma nova
experiência estética e est
ésica
, que uma nova tecnologia de tecido pode
proporcionar no uso e
no
contato com a pele.
4
44
Claudia GARCIA,
op. cit
, p. 23.
45
Ibidem
, p. 23.
64
PELOS TECIDOS, TRANSFORMAÇÕES DO MASCULINO.
______________________________________________
(...) é somente pela mediação da matéria, do significante e,
finalmente, de seu corpo que o sujeito constrói suas relações com
o mundo circundante enquanto universo de valores e presença de
sentido .
46
A vestimenta faz sentido na interação com o corpo. No momento em
que a pele entra em contato com a roupa
,,
o sujeito passa a interagir com as
propriedades conferidas aos tipos de materiais. Conforme veremos, os novos
tecidos para camisaria vão propiciar diferentes sensações e interações que são
apreendidas com as qualidades inerentes aos diversos tipos de fios, ligamentos e
acabamentos. O homem sempre buscou na roupa o conforto, a sensação de
leveza e a maciez conferidos aos tecidos feitos de fibra natural, mais
especificamente o algodão, o linho e a seda. Até mesmo no período dos rufo
s,
grandes golas e punhos, a renda ficava apenas nessas regiões e, no corpo e nos
braços, a camisa era feita de algodão para proteger a pele do contato com as
peças mais grosseiras.
Desde o início do século XXI, a indústria têxtil vem sentido a
necessidad
e
de
diversificar os tecidos para camisaria, a fim de atender aos
desejos de uma mudança de comportamento que se reflete na vestimenta
masculina. Se antes o tecido sempre teve uma superfície lisa, fosca e compacta,
hoje possui diferentes texturas, relevos e brilhos que constroem diferentes
contrastes, criando novas formas de apreensão dos sentidos.
O contraste é um instrumento essencial de estratégias de controle
dos efeitos visuais, e, conseqüentemente, do significado (...) Em
46
Eric LANDOWSKI, Viagens à Nascentes do sentido .
In Corpo e sentido. I. A. (org) São Paulo, UNESP,
1996, p. 23.
65
termos básicos nossa apreensão do liso é mais profunda quando o
contrapomos ao áspero. É um fenômeno físico o fato de que,
quando tocamos em alguma coisa áspera e granulosa, e em
seguida tocamos uma superfície lisa, o liso parecerá ainda mais
liso.
47
É dessa necessidade de se criar diferentes significados que os tecidos
passam a representar uma nova maneira de querer ver-se e querer ser visto, uma
vez que esses novos tecidos proporcionam uma experiência estésica ao usuário e
estética para o observador. É pela evolução dos materiais que vemos um novo
comportamento na vida e no cotidiano masculino.
Fig. 4
3
( tecido de algodão/poliéster)
Para se conseguir esses diferentes tipos de tecidos, a indústria têxtil
passou a utilizar inúmeras misturas de fibras naturais e sintéticas na construção
dessas superfícies (Fig. 43). Evidentemente que essas misturas, que propiciam a
criação de relevos e texturas, modificam a maneira como é sentida a camisa no
contato com a pele. Uma superfície mais plana desliza sobre o corpo, dando
conforto ao usuário, ao passo que superfícies contendo relevos e texturas entram
em atrito pelo seu aspecto e característica rugosa. Ao estudar a importância da
materialidade na construção de uma tipologia das usuárias de
lingeries
brasileiras,
Garcia afirma que:
47
D. DONDIS A,
Sinta
xe da linguagem visual
. Trad. J. L. Camargo, São Paulo, Martins Fontes, 1997, p. 119.
66
As sensações provocadas pelos tecidos, dos quais são feitas as
lingeries
, como o frio do cetim, a maciez aconchegante do algodão,
o conforto adaptável provocado pela elasticidade do
nylon
, a
sutileza das rendas e os relevos dos bordados permitem-
nos
pensar
que a distribuição de formas e cores com certeza atraem o
olhar do sujeito, mas as estratégias da vestimenta de sedução ou
aquelas de ajustamento para manter um tipo de contato com o
destinatário extrapolam o domínio da visualidade .
48
Fig. 4
4 -
tecido com fio e amarração especial
Fig. 4
5
fio propicia textura ao tecido
Além do uso de misturas de fibras, a indústria têxtil passou a utilizar
fios com espessuras mais grossas ( Figs. 44
/4
5) e suas amarraç
ões
, feitas para
que fiquem totalmente à mostra como se saltassem do restante da superfície,
assim relevo e textura ao tecido. Esse efeito fica localizado apenas do lado direito
do tecido, o que vai ficar exposto para aquele que observa. Por dentro da cam
isa
,
a superfície é lisa para minimizar o atrito do tecido com a pele do usuário. Isto
porque, com o uso do fio mais grosso, o tecido fica mais pesado se comparado a
um tecido de tricoline de algodão, conforme ocorre na camisa social.
Diferentemente das fibras naturais em que a opacidade é uma de suas
características, as fibras sintéticas proporcionam um leque infinito de opções de
cores
, e ainda podem conferir um brilho com mais intensidade no tecido. Na
amostra da fig. 47, o fio de poliéster foi utilizado para dar um detalhe brilhoso e
reluzente; esse efeito vem sendo aplicado aos t
67
no contato com a pele, o poliéster quase não é sentido, que é usado apenas
como um detalhe. Conferir brilho à camisa é uma importante mudança na
materialidade da vestimenta masculina. O brilho sempre foi usado pelas mulheres
como sofisticação e para chamar a atenção, por isso, mesmo que usado
sutilmente, este efeito brilhoso figurativiza a presença feminina no vestir do
homem contemporâneo.
Fig. 4
6
maquinetas com leve brilho
Fig. 4
7
fio de poliéster com brilho
Assim como fios diferenciados, o acabamento final do tecido também
vem sendo utilizado para produzir diferentes aspectos. Anteriormente, o
acabamento servia para apenas dar toque no processo final de fabricação
por
intermédio
de um amaciamento. Com isso, a superfície se mantinha lisa, e o
resultado era sempre uma camisa que precisava ser passada, e às vezes,
engomada.
Com base no que foi observado na camisa monofilamento, neste novo
século surgiu uma forte tendência na moda, a de dar à roupa um aspecto
amarrotado e amassado. O resultado é uma desestruturação da imagem e,
sobretudo,
leva
-nos a perceber uma mudança de comportamento do homem, pois
com este acabamento, a camisa não precisa ser passada, e muito menos
engomada. A materialidade se modifica para atender a uma necessidade do
mundo contemporâneo, em que
o tempo é precioso.
Com o uso do amassado, a camisa simplesmente é lavada e, ao
secar
, está pronta para o uso. No exemplo da fig.
48
, dois tipos de tecnologia
foram empregados: o uso do fio space die, que além de mudar de coloração,
também cria relevo na superfície; e o acabamento amassado. O jogo de cores
forma um
degradé
que se mistura ao fio diferenciado space die. Este fio é de uma
68
espessura grossa, e confere ao tecido um certo peso e efeito de sentido de
aspereza.
Fig.
48
tecido
com fio mescla e acabamento amassado.
Esta aspereza faz nos ver um simulacro de homem que precisa estar
propício a sentir a materialidade em sua pele, que busca uma inovação na
tecnologia para estar inserido nas tendências de moda. Na Fig.
49
, este efeito é
ainda mais acentuado com uma técnica chamada
searsucker.
Este processo
consiste na amarração de alguns fios da trama, que no tingimento sofrem um
encolhimento. O usuário dessa camisa sente o peso do tecido roçar sobre a pele,
e a materialidade desestrutura a silhueta do tronco masculino. É também a busca
por uma comodidade do não passar, da praticidade indicativa de uma vida corrida
e atribulada no seu cotidiano, significando igualmente uma maneira de
despojamento e descontração.
69
Fig. 49
tecido com aspecto enrugado
(searsucker
)
Esse tipo de processo produz um efeito de sentido rusticidade,
figurativizando um fazer artesanal, como se este tecido tivesse sido feito com
teares antigos, como sacos de estopas. Esta é uma importante característica de
tendência da moda que constantemente nos remete a um tempo de outrora,
criando isotopias que figurativizam o exclusivo. A diferença é que, atualmente, a
indústria de camisaria vem descobrindo novas tecnologias para produzir em
grande escala
,
efeitos
de sentidos de algo produzido à mão. Na fig. 5
0,
observa
-
se
que no fio de algodão mais grosso foi entrelaçada uma linha de coloração bege
com um ponto espaçado, que nos remete a um trabalho feito em agulha de mão
,
e
reitera essa isotopia de um fazer manua
l.
70
Fig.
5
0 -
fio mais grosso entrelaçado imitando um ponto manual
Nesta mesma amostra (Fig. 50), foi utilizado o fio de linho. Como
vimos, a camisa sempre foi feita com fios de uma única fibra, sendo uma delas o
linho. Hoje a mistura de composição propicia efeitos como tramar esta fibra de
maneira a deixá-la como uma listra. O tecido de linho carrega valores axiológicos
de nobreza e antiguidade. Não se sabe ao certo quando foi utilizado pela primeira
vez, mas 2.500 anos a C., o linho era cultivado no Egito, e o livro de Moisés
refere
-se à perda de uma colheita de linho como uma praga , indicando a sua
importância
49
. Atualmente o fio de linho está entre as matérias-primas têxteis mais
caras no Brasil. A camisa de linho foi muito usada em meados das décadas de 50
e 60 do século XX e era conhecida como camisa panamá . Um dos motivos do
seu desaparecimento
,
foi a dificuldade em se manter lisa. Muitas vezes era preciso
engomar a camisa para deixá-la em condição de uso. A aceleração do ritmo de
vi
da obrigou homens e mulheres a buscarem a praticidade no vestir, e assim foi
desaparecendo do mercado.
O uso do linho, hoje, ressurge com uma nova proposta (fig. 50
/5
1). Ele
aparece como um detalhe para baratear e possibilitar o acabamento amassado,
reiter
ando a figuratividade de rusticidade. No contato com a pele, o linho é
extremamente fresco, por apresentar uma alta absorção de calor. Com a mistura
49
Informações adquiridas no site:
www.wikipedia.org/wiki/Linho
-
09/
12/2006
71
de fios mais grossos, o tecido cria um efeito de sentido de certa aspereza e
rugosidade no contato com a pe
le.
Fig.
5
1
o uso de linho, algodão, viscose com relevos de fios mais grossos.
Essa complexidade na construção de um tecido para camisa vai nos
indicar uma mudança do universo masculino. Observamos que, até aqui, a
materialidade ficou mais visível e passou a ter uma importância muito grande na
vestimenta, ficando cada vez mais cheia de detalhes. O
jacquard
, tipo de tear que
possibilita um efeito de bordado sobre a superfície, também aparece como
tendência na camisaria masculina. Nas amostras Fig. 52
/5
3
/5
4, temos
representados desenhos de
jacquard
que figurativizam a imagem feminina com os
arranjos de flores de traços delicados. Esses bordados estão sobre as listras
normalmente usadas na vestimenta masculina, como se o lado feminino estivesse
sobre ou entre a masculinidade. O
jacquard
é extremamente leve, e não altera o
peso do tecido, que tem na sua composição a mistura do algodão e do poliéster.
Este é um exemplo de que, o uso de fibras sintéticas de boa qualidade pode
resultar num tecido com riqueza de detalhes, proporcionando ao usuário uma
sensação de leveza e maciez. Na fig. 55, nota-se que também foi utilizado o
72
acabamento amassado, e o desenho dos ramos mescla-se ainda mais com as
listras.
Fig.
5
2
bordado floral sobre as listr
as
Fig.
5
3
ramos delicados sobre as listras
O estudo do tecido para camisaria vem, cada vez mais, buscando um
aspecto artesanal com diversos tipos de misturas e acabamentos, que vão
reproduzir detalhes de um fazer manual. Este tipo de trabalho sempre foi muito
utilizado pela vestimenta feminina e o resultado é um aspecto delicado. Na fig. 54,
o
jacquard
foi feito para reproduzir um bordado de fitas que lembra o ponto cruz,
tipo de bordado feito à mão. Entre um bordado e outro, formam-
se
pequenas
pregas que deixam a camisa com um outro tipo de amassado. No contato com a
pele este, bordado é um pouco rugoso, por ter uma espessura mais grossa que a
do rest
ante
do tecido.
Es
sa amostra nos remete a tecidos para decoração, utilizados na
confe
cção de cortinas, almofadas, etc. A materialidade traz a temática do
ambiente doméstico na vestimenta masculina. Este homem utiliza-se de
elementos que, antes, eram considerados femininos, para mostrar a mudança do
seu modo de vida.
Com
a inserção crescente da mulher no mercado de trabalho o
homem passou a participar mais dos afazeres domésticos. A vestimenta mostra,
por meio de
recursos tecnológicos, um novo cotidiano do gênero masculino.
73
Fig.
54
tecido de jacquard com desen
hos femininos
Neste mesmo contexto,
observamos na amostra Fig. 5
5, o uso do fio de
chenille
, que tem como principal característica o aspecto felpudo. Esse fio é usado
na produção de toalhas de banho, e vem sendo utilizado nos tecidos de camisaria
como um
detalhe. Mais uma vez a materialidade vai reiterar esta figurativização do
ambiente doméstico. Assim uma identidade de masculino se constrói, conforme
Floch afirma no estudo sobre o
look
de Chanel:
c
omo um
74
Fig.
55
fio de chenille normalmente usado em toalhas de banho
É então, pela escolha de uma determinada cor, forma e material, que
construiremos a identidade do gênero masculino. Vestir-se com uma camisa que
apresenta um fio usado no urdimento de toalhas de banho, aponta-nos uma
disposição de sentir a materialidade do tecido.
Neste capítulo, apresentamos os novos tipos de tecidos usados para a
confecção da camisa contemporânea. Observamos que a nova materialidade é
composta de diversas texturas, relevos e acabamentos que deixam o tecido um
pouco mais pesado e, em alguns casos, com uma rugosidade no contato com a
pele. Por essas características plásticas, a camisa monofilamento é a mais usada
nessa modelagem por representar um meio termo, pois não é muito larga nem
quadrada, como a camisa pragmática, o que ocasiona certo volume, nem tão justa
ao corpo como a camisa subjetal, que oferece certo desconforto no ajuste e no
roçar na pele
do usuário.
Mas o uso desses materiais não é feito apenas
no intuito de oferecerem
um bom resultado estético. De acordo com o resultado verificado nas análises, as
camisas constroem identidades do universo masculino. A camisa monofilamento
constrói
um suj
eito que busca uma nova tecnologia para se sentir atual.
Esta busca pela atualidade, para estar inserido no grupo, é envolta de
estar propicio a sentir novas sensações no uso da roupa no contato com a pele.
Por isso, também não é possível ser usada na camisa social que, por suas
qualidades plásticas, aprisionam os movimentos do usuário
que
busca na
75
materialidade uma maneira de amenizar esta sensação, usando tecidos com fibras
naturais, principalmente o algodão. A seguir, objetivamos construir uma tipol
ogia
do gênero masculino utilizando as informações apresentadas até aqui.
5
76
COSTURANDO RELAÇÕES
_____________________________________________
(...) as criações da moda multiplicam identidades seriadas do
mesmo, do diferente, enfim, de tipos para ser adotados pelos
usuários. Nessas várias direções identificadoras, a moda muito
tem colaborado para o entendimento da complexidade do
sujeito moderno.
51
A moda, então, possibilita-nos construir e compreender as diferentes
identidades do homem atual. Por esse prisma é que objetivamos nesta etapa,
construir uma proposta de tipologia do gênero masculino da atualidade, buscando a
relação entre a camisa e o corpo na construção do gênero masculino. Assim,
levantaremos os pontos mais importantes das análises feitas para a nossa
fundamentação e articulação.
Na camisa objetal (fig. 17), a plasticidade reveste o sujeito com um
invólucro de proteção contra qualquer risco de não atender às exigências e rigores
dos padrões sociais estabelecidos. As qualidades de maciez e leveza, conferidas
à materialidade do tecido de tricoline de algodão, são neutralizadas pelo corte
retangular e principalmente pelo uso da entretela dura da gola e dos punhos, que
ocasionam um efeito de sentido de desconforto e aprisionamento estabelecendo
uma relação de subordinação do corpo à roupa. Dessa forma, o usuário é
comprimido nos seus movimentos pela sobreposição de retângulos que delimitam o
espaço do corpo que se mostra pela roupa.
Nesta camisa, a cor branca perdura ao longo do tempo, carregando os
valores de sobriedade e formalidade, advindos do inicio da sua criação. Como o
pretinho básico , que carrega axiológicamente uma garantia de um vestir social e
discreto, a camisa branca , também conhecida como camisa social clássica,
funciona como um curinga de um vestir para não ser notado. Essa brancura tem
como característica a opacidade que contribui para o uso da camisa pela discrição.
É o vestir-se para um estilo normalizado e incontestável em que a roupa estabelece
51
Ana Cla
udia de OLIVEIRA, op. cit., p. 5
77
uma relação de descontinuidade com o corpo pela tensão causada no uso da peça,
onde o corpo é subordinado ao aprisionamento da roupa.
Em oposição a ela, temos a camisa subjetal (fig. 36), que apresenta, nas
suas qualidades plásticas, uma ruptura nos padrões da vestimenta masculina. A
modelagem
fit contorna o corpo pelo ajuste das medidas em toda a peça,
principalmente na região da cintura, ocasionando uma circularidade antes não usada
pelo homem. Assim, o corpo é valorizado estabelecendo uma relação intersomática
que indica-nos um masculino que mostra-se através da roupa e do próprio corpo.
Este se apresenta com uma nova configuração, uma nova plasticidade que elege um
formato que expõe a parte de cima do tronco, aumentando a região peitoral com
curvas circulares esculpidas pelo exercício físico, e criando uma cintura masculina,
também trabalhada e delineada pelos músculos, sem nenhuma gordura. É a imagem
de um corpo sarado que exibe uma nova maneira de vida e que mostra um sujeito
que se descobre e se valoriza por intermédio e junto com a roupa. Essas
características originam um efeito de sentido de continuidade da roupa com o corpo
do usuário, estabelecendo uma reação dialógica. Sobre tal interação, Oliveira
esclarece que:
A roupa se ajusta ao corpo que ela modela, ao mesmo tempo em
que a roupa é modelada pelo corpo. Nesse ajustamento, corpo e
roupa estão numa relação de união em que um não anula o outro e o
estado de alma é aquele
de espreita de sim mesmo, por si mesmo.
52
Este novo corpo é ainda mais evidenciado com suas características
cromáticas e matéricas. Esta camisa choca pelo contraste do xadrez, que figurativiza
uma imagem do macho, do viril, com o (Fig. 36) da estampa florida e delicada,
usualmente encontrada na vestimenta feminina. O xadrez é levemente apagado pelo
acabamento de corrosão do tecido, que tem na sua materialidade um toque macio e
confortável, ao passo que a estampa florida ganha destaque pelas cores primárias e
pelo processo manual de estamparia que fica sobre a superfície, resultando numa
aspereza e rugosidade no contato com a pele. O jogo de figuratividades entre a
imagem do macho e a delicadeza feminina, é reiterado com a diferença tátil entre
52
Ana Claudia OLIVEIRA,
op. cit,
p. 6.
78
tecido tricoline, macio, e estampa manual, áspera. Este sentir a materialidade
evidencia a relação do sujeito com o seu próprio eu , e revela-nos uma nova
maneira do masculino sentir a sua presença do mundo.
A vestimenta torna-se um meio de exteriorizar plasticamente um novo
tipo de homem, sensível e delicado, e que busca o cuidado com o corpo e o seu
bem estar. Por meio da roupa, ele almeja encontrar sua individualidade singular para
criar seu próprio estilo, destacando
-
se por chocar os padrões sociais.
As relações entre a roupa e o corpo, analisadas nestes dois primeiros
tipos de camisa, constroem uma relação de contradição. Na primeira, o vestir-se é
para o social, para atender aos ditames dos padrões sociais. No plano da expressão,
estes rigores são concretizados pela sobreposição de retângulos, que reconstrói e
mobiliza o corpo do usuário estabelecendo uma relação de descontinuidade e
subordinação do corpo à vestimenta. Na relação contrária, temos o vestir-se para si,
um vestir subjetal, numa relação dialógica entre corpo e roupa. As formas circulares
que contornam o corpo ocasionam uma continuidade da peça ao corpo. Assim,
podemos articular essas relações da seguinte maneira:
Camisa Objetal ........................ Camisa Suvjeta
l
Veste formas coletivas Veste formas singulares
para seguir estilo normalizado para construir seu próprio estilo
Roupa e corpo objetal
: relação subordinação
Roupa e corpo
: relação dialógica
descontinuidade continuidade
Numa relação de subordinação com a camisa objetal, no mesmo eixo da
posição de subcontrária, temos a camisa pragmática (fig. 23). Esta se caracteriza
por um vestir funcional na qual o sujeito busca a praticidade no vestir-se. Apresenta
no seu arranjo plástico uma variante do retângulo: o quadrado, que possibilita o
relaxamento do corpo pelas formas amplas que escondem totalmente o físico do
usuário. Este relaxar é reiterado no uso de uma entretela muito fina nas golas e nos
punhos, propiciando o dobrar das mangas e o soltar do colarinho para o usuário
obter uma maior mobilidade corporal. A materialidade de tecido 100% algodão de fio
80, fibra vegetal de excelente qualidade, proporciona um efeito de sentido de maciez
no contato com a pele, reiterando a busca pelo conforto
para um vestir pratico.
79
Esta camisa atende à necessidade do homem que busca livre ação no
seu cotidiano, e que simplesmente quer cobrir o corpo, deixando-o solto para suas
atividades cotidianas. Na região dos ombros, o recorte acomoda o ombro do usuário,
que é acentuado pela posição de horizontalidade em contraste com a verticalidade
de toda a peça, comumente empregada na vestimenta masculina, e que vai
proporcionar aos ombros e braços liberdade de ação. Simboliza uma maneira do
sujeito atuar no mundo, est
abelecendo uma relação de não
-continuidade entre roupa
e corpo.
No outro eixo do subcontrário do quadrado semiótico está a camisa
simbólica (fig. 38). Ela se caracteriza por ser feita com tecidos de última tecnologia,
como o monofilamento, e faz parte de um tipo de camisa que utiliza novos tipos de
texturas, acabamentos, fios diferenciados, desenho com aparência de bordados,
leves transparências, enrugados e amassados que simbolizam o novo . Essas
construções são conseguidas a partir da junção de fibras na
turais, especificamente o
algodão, com fibras sintéticas, como a poliamida e o poliéster. Tais fibras ampliam o
leque de possibilidades estéticas, mas no contato com a pele apresentam certo
desconforto, convocando as ordens sensoriais do usuário que se mostra apto a
perder o conforto para sentir-se atual. São utilizados por um grupo seleto de marcas
que lançam tendências de moda, e que são reconhecidas como vanguardistas no
mercado de roupa. A modelagem apresenta um meio termo entre a camisa objetal,
formas
retangulares, e a camisa subjetal, forma circulares. Um leve ajuste na cintura
e uma diminuição do comprimento, fazem ( Fig. 38) que o usuário vista a peça para
fora da calça, ganhando mais destaque. Não possui nem bolso nem costuras,
reiterando a não
d
escontinuidade do corpo em relação à roupa.
Ao vestir essa camisa, o sujeito busca um
status
social, mostrando-
se
pelo uso de uma roupa de marca, o que lhe confere a identidade de fazer parte de
um grupo seleto de homens. Como valor, eles partilham os avanços tecnológicos
que os situam como atualizados, homens de seu tempo. Como diz Oliveira: a roupa
valoriza o corpo e o corpo se conforma aos símbolos que a roupa lhe confere
53
Assim é que o corpo passa a ser vestido não por uma camisa, mas também p
ela
axiologia de um novo masculino , Ela veste o corpo que a porta, e que mostra-
se
preocupado com os lançamentos do mundo da moda e apto a sentir uma nova
materialidade.
53
Ana Claudia OLIVEIRA,
op.cit,
p.6
80
As estruturas semânticas dos valores investidos na articulação entre
roupa e
corpo
, vão organizar as relações sintáticas semânticas do nível fundamental
que são construídas ao longo do percurso gerativo do sentido no quadrado
semiótico. Segundo Oliveira identificamos:
(...) as quatro matrizes; ao reconhecer e analisar os tipos
corr
espondentes (...) Por intermédio das relações sintáticas
assinaladas, encontramos nelas as relações semânticas, igualmente
determinadas relacionalmente. (...) Projetado no diagrama
quadrangular familiar aos semioticistas, esse percurso lógico-
semântico profundo articula os valores em sistema axiológico e, por
conversão das relações paradigmáticas em relações dinâmicas,
permite prever os processos de transformação no nível narrativo de
superfície, quer dizer, as condições necessárias para passar de um
tipo
a outro.
54
Essas passagens articulam as quatro posições que nos
possibilitam um diagramar global dos tipos de camisas que balizam nosso
corpus
. São elas:
54
Ana Claudia de OLIVEIRA,
Vitrinas: acidentes estéticos na cotidianidade
. São Paulo, 1997, p. 115
-
116.
81
Camisa Objetal
Camisa Subjetal
Veste formas coletivas Veste formas singulares
para seguir estilo normalizado para construi
r seu próprio estilo
Roupa e corpo objetal
: relação subordinação
Roupa e corpo subjetal: relação dialógica
descontinuidade continuidade
Camisa Pragmática .............................. Camisa Simbólica
Veste formas práticas Veste ditames das tendências para
para cobrir o t
ronco adequar
-
se a um grupo seleto dos que
segmentam a moda
R
oupa e corpo pragmático
: relação funcional
Roupa e corpo simbólicos
: relação de
status
social
55
não
continuidade não
-
descontinuidade
5.1
55
Em termos gerais essa quadratura axiológica retoma a da abordagem desenvolvida por Ana Claudia de
Oliveira Semiótica e moda. Por um estudo de identidade , CD. I, pag. 7, que mantendo a coerência com o
que descrevemos e analisados nos tipos de camisa.
82
Regime de visibilidade
__________________________________
Com este esquema de polaridades apresentado no quadrado semiótico,
encontramos duas oposições semânticas que mostra-nos a relação entre a roupa e
o corpo. Essa teia de articulações nos faz pensar na maneira como estes sujeitos
utilizam a vestimenta para estar presentes no mundo estabelecendo, uma relação
com o outro a sua volta.
Entendendo a roupa como uma modalização do querer vestir-se para si
mesmo ou para o outro, de acordo com as proposições de Landowski
56
pretendemos
organizar uma proposta de tipologia em que as posições assumidas pelos sujeitos
através do uso das camisas, possibilitem compreendermos os diferentes tipos de
masculinos na contemporaneidade.
A camisa objetal cobre o corpo com uma sobreposição de retângulos,
modificando a sua forma. Essa relação de subordinação do corpo à roupa pelas
formas retangulares, é assumida pelo usuário para atender aos rigores e padrões
sociais, mostrando-se preocupado com o julgamento da sociedade, por isso
estabelece uma relação de vestir-se para querer ser visto pelos padrões sociais e
formais.
Na posição contrária, a camisa subjetal, o usuário imbricado com as
formas do corpo e da camisa, veste-se para querer ver-se, e nesta relação dialógica
mostra
-se (Fig. 36) pela roupa que toma o formato de um novo corpo , arredondado
pelos músculos delineados pelo exercício físico. A camisa envolve esta forma
co
rpórea circular, moldando
-
a e mostrando
-
se com e pelo corpo
.
Assim, nesta primeira oposição encontramos duas maneiras totalmente
contrárias assumidas pelos actantes querer ver-se e querer ser visto, sendo estas
manifestadas pelas formas circulares e retangulares respectivamente, conforme
esquema abaixo:
CORPO RETANGULAR ..........................
CORPO CIRCULAR
56
Eric LANDOWSKI,
A sociedade refletid
a ensaios de sociossemiotica
. Trad. E. Brandão. São Paulo,
EDUC., 1992
83
querer ser visto querer ver
-
se
pelos padrões sociais
por suas própria formas
Nos dois eixos subcontrários desta modalização do querer, encontramos
a camisa pragmática, que cobre totalmente o corpo do usuário com uma modelagem
ampla e quadrada, por meio da qual o sujeito estabelece uma relação do não querer
ser visto. O vestir-se é organizado para uma função funcional, em que o corpo tem
liberdade para os movimentos referentes às ações cotidianas. E por fim, a camisa
simbólica é adequada ao corpo de maneira a não moldá-lo, configurando um
ajustamento relativo, em que a materialidade simboliza um vestir-se atual pelos
investimentos tecnológicos advindos dos lançamentos de moda. Esta forma
ajustável por um vestir de acordo com as tendências estabelece um não querer não
s
er visto.
Tomando por base estas articulações, faremos a relação que estes
sujeitos estabelecem com o outro, identificando as transformações do corpo pela
vestimenta, e como estas se constroem plasticamente figurativizando tipos
de masculino. Correlacionamos abaixo as formas mantidas e alteradas pela roupa,
sobre e pelo corpo, com uma adequação dos regimes de visibilidade propostos por
Landowski
57
e termos neologistas referentes a esses tipos.
Diagramando essas articulações de regimes de visibilidade e
conceituações de tipos de masculinos, temos a seguinte representação visual:
57
Eric LANDOWSKI
,
A sociedade Refletida: ensaios de sociossemiotica
. Trad. E. Brandão. São Paulo,
EDUC, 1992
84
Camisa Objetal Camisa Subjetal
CORPO RETANGULAR CORPO CIRCULAR
Querer ser visto querer ver
-s
e
pelos padrões sociais e formais por suas próprias formas
( PADRÃOSSEXUAL ) (
METROSSEXUAL
)
Camisa pragmátic
a Camisa simbólica
CORPO QUADRADO CORPO AJUSTÁVEL
querer não ser visto não querer não ser visto
sem as formas da roup
a pelas tendências da moda
(
RETROSSEXUAL
) ( UBERSSEXUAL )
Estas posições revelam maneiras diversas do homem atual se fazer
presente no mundo. Conforme Mark Simpson, estudioso do comportamento do
gênero masculino contemporâneo e criador dos termos dispostos no quadrado:
metrossexual , uberssexual e retrossexual , conceituações apresentadas no
capítulo 3
58
, o homem vem assumindo novas identidades resultantes desta busca
pelo seu bem estar, o que faz o corpo tornar-se o agente que argumenta esta nova
maneira de viver. Encontramos no homem metrossexual , um usuário que se
apresenta pelo próprio corpo, cultuado para atender a um novo padrão de medidas,
em que os músculos são trabalhados resultando em uma forma circular, acentuadas
e valorizadas pelo ajustamento da vestimenta. O homem do espelho é reconhecido
58
Termos criados pelo estudioso do comportamento do gênero masculino, M
ark Simpson . Conceituações
apresentadas no capitulo 3, págs. 35 e 36.
85
pelo seu narcisismo e o exagero no cuidado da aparência e, ao vestir-se, ele o
faz
para querer ver
-
se pelas próprias formas.
Na posição de subcontrária do quadrado, o termo uberssexual
caracteriza
-se por um cuidar da aparência de maneira moderada. A preocupação
pelo corpo é mais voltada para a sua saúde do que para atender aos padrões de
medidas. Esta vaidade é evidenciada pela necessidade de sentir
-
se atual no uso das
últimas tendências de moda. No estudo da camisaria, a materialidade transforma-
se
rapidamente, e demarca um tempo moderno e tecnológico. A camisa recebe uma
modelagem
com um sutil ajustamento, destacando-se pelos novos tecidos utilizados
na sua confecção. O homem uberssexual veste-se para não querer não ser visto
pelas tendências de moda.
Mark Simpson define o uberssexual como o homem que gosta de carro,
cerveja e futebol. Nessa perspectiva, não é nem um pouco preocupado com a
aparência, muito menos com o cuidado ao corpo. A roupa vai esconder o tronco pelo
formato amplo e quadrado, mostrando um querer não ser visto sem as forma da
roupa.
No entanto, ao estudarmos os tipos de camisas para a construção da
identidade masculina pela relação da roupa com o corpo, reconhecemos um tipo de
homem não conceituado pelo estudioso, criador dos termos que hoje classificam a
panorâmica do homem atual. Dessa maneira, atrevemo-nos a nomear de
padrãossexual a primeira posição do nosso quadrado semiótico. Este termo define
o tipo de homem que busca no vestir, um querer ser visto, com a certeza de estar
obedecendo às regras e aos padrões sociais. A camisa aprisiona os seus
movime
ntos pelo uso da entretela e pelas sobreposições de retângulos, demarcando
um agir coercitivo.
Mas o que nos parece relevante neste estudo, é identificar de que maneira
o cenário atual brasileiro absorve estas inovações segundo a exteriorização da su
a
aparência, fazendo ver como a moda possibilita alterar ou manter tipos diversos de
ser e estar no mundo.
Considerações finais
86
__________________________________
Através
do estudo sobre a camisa, pudemos observar que o seu uso
atr
avessou diversas épocas demonstrando a padronização do vestir masculino. Até
meados do século XX, era usada apenas como um complemento da roupa, pois
ficava por baixo de casacas, fraques e paletós. Somente por volta da década de 50,
tornou
-se uma peça única e ficou totalmente visível, indicando uma mudança de
comportamento do homem que passou a buscar a liberdade de expressão,
culminando na busca por uma vestimenta que possibilitasse maior disponibilidade de
movimento do corpo. Desde então, vem acompanhando as transformações do
homem, e permanece como uma vestimenta importante no seu cotidiano.
A partir do final do século XX, início do século XXI, diversos estudiosos
procuram compreender a mudança de comportamento do gênero masculino. Estes
estudos apontam para o surgimento de um novo homem , que se caracteriza pela
preocupação com o corpo e o exagero no cu0 0 -0.09187 2014 3514 Tm(a)T02 6666 Tm(o)Tj( )Tj0.09187 0 0 40.09187 0 5169 6 2637 41444151 0 -0.09187 6161 6351187 0 0 -0.09187 1752 4775 Tm51 Tm(n)Tj( )Tj0.091om(o)Tj( )Tj0.09187 0 0 -0.09187 3474 1187 0 0 -0.6187 0 0 -0.6187 0 0 -0.67 6351 Tm187 0 0 -0.6187 0 0 -0.67 6351 Tm131(a)T02 6666 Tm(o)Tj( )Tj0.09187 0 0 0 -0.098.670 -0.091578 0 0 -0.09187 2327 6666 Tm(p)Tj0.570 -0.09187 7c46.18 -120 45.37 -115 4
87
decide
-se pelo conforto e pela praticidade do vestir-se pragmático. Nessa dinâmica
de manutenção
versus
alteração concordamos com Landowski:
(...) ao mesmo tempo que reflete globalmente a segm
entação do corpo
social, e até, enquanto contribui para estabilizá-la sob a forma de
maneiras de ser e de fazer colocadas diferencialmente para cada
grupo como a norma do momento, a moda contribui, pelos jogos do
parecer que torna possíveis, para certa labilidade das relações sociais
diferenciação das identidades no interior do espaço das relações
intersubjetivas e regulação temporal das formas de manifestação
dessas identidades(...)
59
Assim, o cenário masculino brasileiro da atualidade se constrói por est
a
movimentação de tipos de masculinidade, que se dão a ver de maneiras distintas
pela construção da relação entre corpo e
roupa.
Na constatação de que é somente
nessa relação que a moda produz sentido, finalizamos
esta
pesquisa
com o
ensinamento do mestre:
(...) a vestimenta não adquire sentido a não ser quando el
88
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRAFICAS
BARNARD, Malcolm. Moda e comunicação. Trad. Lúcia Olinto. Rio de Janeiro,
Rocco, 2003.
BA
RROS, Diana Luz Pessoa de.
Teoria Semiótica do Texto
. São Paulo: Ática, 2001.
CASTILHO, Káthia. Configurações de uma plástica: do corpo à moda. Dissertação
de Mestrado. PUC
-
SP
-
1998.
________.
Moda e linguagem
. São Paulo, Ed. Anhembi Morumbi, 2004.
_____
___ e GALVÃO, Diana (orgs.). A moda do corpo o corpo da moda. São Paulo,
Ed. AnhembiMorumbi, 2003
FECHINE, Yvana. O sensível expandido: pressuposto para uma abordagem nas
mídias . Caderno de Discussão do Centro de Pesquisas
Sociossemióticas
, São
Paulo, 2
005.
________. Televisão, hábito e estesia . Caderno de Discussão do Centro
de
Pesquisas Sociossemióticas
, São Paulo, 2004.
FERREIRA, Joyce Maria B. S.
Desenho como sistema e processo comunicacional: a
materialidade significante. Dissertação de mestrado. Comunicação e Semiótica
PUC
-
SP, 2001.
________. Lápis e papel na articulação do sentido
.
Caderno de Discussão do
Centro de Pesquisas Sociossemióticas,
São Paulo, 2003.
FIORIN, José Luiz. Elementos de análise do discurso. São Paulo, Editora Context
o,
1992.
89
FLOCH, Jean Marie.
Alguns conceitos fundamentais em semiótica geral.
Documentos de estudo do Centro de Pesquisas Sociossemióticas. Trad. Analice
Dutra Pilar. São Paulo: Edições CPS, 2001.
________. Semiótica plástica e linguagem publicitária . Análise de um anúncio da
campanha de lançamento do cigarro News . Trad. José Luiz Fiorin. Revista
Significação, 6. p37. São Paulo, 1987.
FREYRE, Gilberto. Modos de homem e modas de mulher. Rio de Janeiro, Record,
1997.
GARCIA, Claudia. Estudo semiótico das lingeries na construção dos regimes de
visibilidade da mulher brasileira. Conceituações do formante matérico. Dissertação
de mestrado. Comunicação e semiótica, PUC
-
SP,2005.
GERALDI, Maria Carolina. Moda e identidade no cenário contemporâneo brasileir
o,
uma análise semiótica das coleções de Ronaldo Fraga. Dissertação de mestrado.
Comunicação e Semiótica, PUC
-
SP, 2002.
GREIMAS, Algirdas Julien. Da imperfeição. Trad. Ana Claudia de Oliveira. São
Paulo, Hacker, 2002.
________ e COUTÉS, Joseph.
Dicionári
o de Semiótica. Trad. Alceu Dias Lima et al
.
São Paulo, Cultrix, 1985, p. 122.
________ e COURTÉS, Joseph. Diccionario razonado de la teoria del lenguage
.
Trad. para o espanhol de Enrique Ballón Aguirre. Madrid, Editorial Gredos, 1991.
________ La soupe au pistou ou la construction d un objet de valeur
.
In: Greimas,
A. J.,
Du sens II. Essais sémiotiques
. Paris, Seuil, 1983.
________.
Semântica Estrutural. Trad. Hakira Ozakabe e Izidoro Bliskstein, São
Paulo, Cultrix/ Edusp, 1973
90
GUIMARÃES, Lincoln Di
as.
A materialidade na pintura de Nuno Ramos. Dissertação
de Mestrado, Comunicação e Semiótica, PUC
-
SP, 1997.
________. Presenças da materialidade
.
Caderno de Discussão do Centro de
Pesquisas Sociossemióticas
, São Paulo, 2000.
LANDOWSKI, Eric. O semioticista e seu duplo. In: Ana Claudia de Oliveia e Eric
Landowski (eds.). Do inteligível ao sensível. Em torno da obra de Algirdas Julien
Greimas.
São Paulo, EDUC, 1995.
________.
A Sociedade Refletida. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo, Educ/
Pontes, 1992
________. Flagrantes delitos e retratos
,
in
Galáxia
Revista Transdisciplinar de
Comunicação, Semiótica, Cultura, 8. Trad. Dílson Ferreira da Cruz. São Paulo:
EDUC, 2004.
________. Para uma abordagem sócio-semiótica da literatura
.
Trad. Ana Claud
ia
de Olievira, in
Significação
revista brasileira de semiótica. São Paulo, Annablume
CES, setembro de 1996.
________.
Presenças do outro. Trad. Mary Amazonas Leite de Barros. São Paulo,
Perspectiva, 2002.
________. O olhar comprometido
,
in
Galáx
ia
Revista Transdisciplinar de
Comunicação, Semiótica, Cultura, 2. Trad. Ana Claudia de Oliveira e Márcia da
Vinci. São Paulo: EDUC, 2001.
________.
Viagens às nascentes do sentido. In: Silva, A. I. (org.) Corpo e Sentido
.
São Paulo, UNESP, 1996.
__
______ e FIORIN, José Luiz (eds.) O gosto da gente, o gosto das coisas:
abordagem semiótica
. São Paulo, EDUC, 1995.
LAVER, James.
A roupa e a moda
. Trad. Glória M. Carvalho. São Paulo, Companhia
das Letras, 1989.
91
LIPOVETSKI, Gilles. O império de efêmero: a moda e o seu destino nas sociedades
modernas.
Trad. Maria Lúcia Machado. São Paulo, Companhia das Letras, 1989.
________.
A terceira mulher. Trad. Maria Lúcia Machado. São Paulo, Companhia
das Letras, 1985.
MELLO e Souza, Gilda. O espírito das roupas. São Paulo, Companhia das Letras,
1987.
O HARA, Georgina.
Enciclopédia da moda: de 1840 à década de 80
. Trad. Glória M.
Carvalho. São Paulo, Companhia das Letras, 1992
.
________. A dança das ordens sensoriais . In: Eric Landowski, Raúl Dorra, Ana
Clau
dia de Oliveira (eds.) Semiótica, estesis, estética. EDUC/UAP, São
Paulo/Puebla, 1999.
________.
Vitrinas. Acidentes estéticos na cotidianeidade.
São Paulo, Educ, 1997.
________. Semioses pictóricas . in
Face
revista da semiótica e da comunicação
,
São
Paulo, vol.4, nº 2, 1995.
________.(org.)
Semiótica plástica.
São Paulo, Hacker Editores, 2004.
PONTY
Merleau, Maurice. Fenomenologia da percepção. Trad. de C. A. R. de
Moura. São Paulo, Martins Fontes, 1994.
RICARD
-Vicent, Françoise. As espirais da
moda
. Trad. Maria Inês Rolim. Rio de
Janeiro, Editora Paz e Terra, 1989.
STEELE, Valérie.
Fetiche, moda, sexo e poder
. Trad. de Alexandre A. Jordão. Rio de
Janeiro, Rocco, 1997.
Cadernos de Discussão do Centro de Pesquisas Sociossemióticas
anos
1998/20
01/2002/2003/2004/2005.
92
Sites consultados:
Disponível em http://
www.modabrasil.com.br
último acesso em novembro de 2006.
Disponível em
http://www.casapinto.com.br
último
acesso em janeiro de 2007.
This document was created with Win2PDF available at http://www.win2pdf.com.
The unregistered version of Win2PDF is for evaluation or non-commercial use only.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo