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RODRIGO NATHANIEL ARCO E FLEXA
SUPER-HERÓIS DA EBAL
A publicação nacional dos personagens dos ‘comic books’ dos
EUA pela Editora Brasil-América (EBAL), décadas de 1960 e 70
Dissertação apresentada à Área
de Concentração Jornalismo da
Escola de Comunicações e Artes
da Universidade de São Paulo,
como exigência parcial para
obtenção do Título de Mestre em
Ciências da Comunicação.
Orientação
Profª Drª Dulcília Helena
Schroeder Buitoni
ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
SÃO PAULO, MARÇO DE 2006
*
*Versão revisada para digitalização em outubro/novembro de
2006
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2
SUPER-HERÓIS DA EBAL
A publicação nacional dos personagens dos ‘comic books’ dos
EUA pela Editora Brasil-América (EBAL), décadas de 1960 e 70
Dissertação de Mestrado defendida e aprovada em junho de 2006
na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São
Paulo.
Banca Examinadora
Profª Drª Dulcília Helena Schroeder Buitoni
Profª Drª Sonia Bibe Luyten
Prof Dr Waldomiro Vergueiro
A finalização da Dissertação, a partir de agosto de 2005,
teve o apoio de Bolsa de Mestrado do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
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3
Para minha orientadora,
Dulcília Helena Schroeder
Buitoni
4
SUMÁRIO
RESUMO/ABSTRACT ................................... pág.5
INTRODUÇÃO ........................................ pág.11
CAPÍTULO 1
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS: ESTUDOS E PESQUISA.........pág.24
CAPÍTULO 2
IMPRENSA, ‘COMIC BOOKS’ E O MUNDO DO SÉCULO 20......pág.38
CAPÍTULO 3
SUPER-HERÓIS DA EBAL, ANOS 60 E 70 ..................pág.98
CAPÍTULO 4
ICONOGRAFIA E IMAGINÁRIO: PUBLICAÇÕES E LEITORES.....pág.160
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................pág.201
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................pág.207
5
RESUMO
Estudo sobre a publicação nacional dos super-heróis dos comic
books dos EUA pela Editora Brasil-América (EBAL) entre meados
dos anos 60 e 70. Para tanto, será traçado um panorama
histórico, acrescido das coordenadas teóricas que norteiam a
análise da iconografia dessas revistas. Houve uma extensa
pesquisa iconográfica focalizada nas edições da EBAL, além de
levantamento de histórias em quadrinhos de outras editoras e
épocas. Mesmo sendo um produto típico da indústria cultural
do século 20, as histórias em quadrinhos apresentam inflexões
que permitem relacionar arte, cultura, sociedade e
imaginário. O estudo inclui ainda entrevistas com leitores da
EBAL.
ABSTRACT
Study on the publication in Brazil of American comic books
superheroes by Editora Brasil-America (EBAL) from the mid-
60's to the mid-70's. With such an aim, work traces an
historical panorama to which shall be added the theoretical
coordinates guiding the analysis of these magazines
iconography. Extensive iconographic research focused in
EBAL’s publications has been made, besides a survey of comics
from other publishing houses and from other decades as well.
Even being a typical product of 20
th
century cultural
industry, comics show contradictions allowing to establish
relations between art, culture, society and the imaginary.
Study also includes interviews with frequent readers of EBAL
publications.
PALAVRAS-CHAVE
Histórias em quadrinhos (HQs), Imprensa, Comic, Super-herói,
Mídia, Linguagem, Indústria Cultural, Comunicação,EBAL.
6
Realmente,
aconteceu alguma coisa com
os heróis e os super-heróis
de dez anos para cá.
Eles passaram a refletir,
através do mais contundente
meio de comunicação impresso,
as angústias, o medo, as dúvidas,
os desvarios do homem”
Fernando Albagli, diretor da EBAL, em trecho do artigo “Os
Heróis estão na Fossa?” – publicado em maio de 1971 no livro
O Mundo dos Super-Heróis, Editora Vozes.
Ampliação de quadros de “O Ferrão do Escorpião”, aventura protagonizada pelo Capitão América, na qual o
super-herói – um ex-combatente da Segunda Guerra “revivido” nos anos 60 – mostra-se incapaz de compreender
o mundo da época, tanto em sua fala quanto por meio de sua representação gráfica.
História de Stan Lee. Arte de Gene Colan e Joe Sinnott.
(Revista A Maior, 1ª série, n° 5, p. 5, outubro de 1970. EBAL).
7
8
9
10
11
INTRODUÇÃO
Como os antigos impérios, houve o apogeu e a queda. Assim foi
a história da Editora Brasil-América (EBAL), criada em 1945,
no Rio de Janeiro, por Adolfo Aizen (1907-1991). Para muitos
de seus leitores, em especial aqueles das décadas de 1960 e
70, os protagonistas dessa trajetória não são “apenas” seres
comuns, e sim “os mais poderosos do universo”. Eles são os
super-heróis dos comic books – as revistas de histórias em
quadrinhos dos Estados Unidos – publicados e difundidos pela
EBAL no Brasil ao longo de quase quarenta anos, começando pela
revista Superman, lançada em 1947.
Entre meados das décadas de 1960 e 70, as publicações da EBAL
dedicadas ao gênero vivem o seu auge editorial, com a
multiplicação dos títulos estrelados por super-heróis. Trata-
se de um processo que não ocorre ao acaso. Este é o período
que se torna conhecido, nos EUA, como a “Era de Prata das
Histórias em Quadrinhos”. Uma época caracterizada pela
renovação da linguagem das HQs de super-heróis, tanto em
termos gráficos quanto de roteiro. O que acontece apenas uma
década depois deste gênero de histórias em quadrinhos ter sido
considerado praticamente extinto, em seu país de origem, os
Estados Unidos, com o cancelamento da maioria dos comic books
de super-heróis.
12
Nos anos 60, novos personagens – O Homem-Aranha, O Quarteto
Fantástico, Hulk, um Capitão América diferente daquele que
lutou na sua Segunda Guerra, entre diversos outros, da Marvel
Comics, introduzem aspectos psicológicos e existenciais nas
narrativas dos “superseres” das HQs. Os novos títulos,
rapidamente, conquistam os leitores, o que provoca, ao longo
dos anos seguintes, a renovação estética e de conteúdo dos
antigos super-heróis da grande rival da Marvel, a National
(depois rebatizada como DC Comics).
Na virada dos 60 para os 70, seus personagens são
reformulados, com a introdução de temáticas políticas e
sociais, como em Lanterna Verde e Arqueiro Verde, de Dennis
O’Neil e Neal Adams. Superman e Batman também são renovados,
com a elaboração de histórias – tanto em sua forma como
conteúdo - mais adaptadas à realidade da época.
As narrativas dos super-heróis dos quadrinhos do período, de
variadas maneiras, representam (seja isso intencional ou não)
a crise das antigas certezas da luta do “bem contra o mal” –
marcada pela Guerra do Vietnã, a revolução de comportamento,
o avanço da mídia e da tecnologia sobre a sociedade, entre
diversos outros aspectos da sociedade contemporânea.
ADOLFO AIZEN, O EDITOR
A história da Editora Brasil-América é indissociável da
trajetória do seu criador e diretor Adolfo Aizen, reconhecido
por muitos como o maior editor das histórias em quadrinhos
(HQs) no Brasil. Filho de judeus russos, ainda criança, Adolfo
Aizen é trazido por sua família ao Brasil, em fuga da
perseguição política sofrida na terra natal. No Rio de
Janeiro, aos 18 anos, Aizen inicia no jornalismo. Escreve para
veículos como O Globo, de Roberto Marinho, e O Tico Tico (a
primeira publicação nacional de histórias em quadrinhos).
13
O embrião do que viria a ser a Editora Brasil-América começa a
se formar em 1933, quando Adolfo Aizen viaja, pela primeira
vez, aos Estados Unidos, entusiasmando-se com o sucesso
comercial e de público, na imprensa dos EUA, das histórias em
quadrinhos (lá conhecidas pela expressão comics), as quais
eram publicadas em cadernos, suplementos, páginas dominicais e
tiras diárias.
Em 1934, Aizen lança o Suplemento Infantil, depois rebatizado
como Suplemento Juvenil, a primeira publicação nacional
dedicada a grande parte dos principais personagens dos comics
de aventura e de ficção-científica dos EUA, como Príncipe
Valente, Tarzan, Flash Gordon, Mandrake, Jim das Selvas e Dick
Tracy. Nos anos seguintes, publica outros títulos de
relevância na história das HQs no Brasil, como Mirim e O
Lobinho.
A Editora Brasil-América é criada em 18 de maio de 1945 por
Adolfo Aizen. A primeira revista de histórias em quadrinhos a
sair com o selo da editora foi O Heroi (com aventuras de
personagens de aventura, como Sheena e Kionga).
Em 1947, a EBAL lança seu primeiro título de super-heróis:
Superman. Nos anos 50, os maiores sucessos da EBAL, ao lado de
Superman e Batman (cuja revista própria é lançada em 1953),
são os mocinhos do faroeste, Tarzan, além das quadrinizações
de romances da literatura mundial.
A EBAL investe ainda na publicação de revistas e álbuns em
quadrinhos feitos por artistas brasileiros (ou aqui radicados)
sobre fatos da história brasileira, além de adaptações da
literatura nacional, sem falar no lançamento de uma
quadrinização da Bíblia.
14
Artistas reconhecidos por sua contribuição na trajetória das
HQs no Brasil trabalham para a EBAL, como André Le Blanc,
Gutemberg Monteiro, Nico Rosso, Monteiro Filho e Ivan Washt
Rodrigues.
Os títulos aqui produzidos são importantes no lento processo
de legitimação das histórias em quadrinhos no Brasil. Outra
contribuição de Adolfo Aizen é a criação do termo
“quadrinizar”, o qual é incorporado ao Dicionário Aurélio da
Língua Portuguesa. Em 1975, Adolfo Aizen recebe, na Bienal
Internacional de Quadrinhos de Lucca, na Itália, o “Prêmio
Yellow Kid, uma vida dedicada aos quadrinhos”.
Ao longo de sua trajetória, a EBAL (orgulhosamente
autodenominada como “O Reino Encantado das Histórias em
Quadrinhos”) compete com os principais grupos editoriais da
época. Entre eles, O Globo, de Roberto Marinho, Editora Bloch,
de Adolfo Bloch, Diários Associados, de Assis Chateaubriand,
Editora Abril, de Victor Civita, e Fundação Gazeta, de Cásper
Líbero.
Assim, a história da EBAL, em sua amplitude, confunde-se com a
evolução da imprensa no Brasil e seus variados impactos sobre
a sociedade.
SUPER-HERÓIS DA EBAL
Entre meados dos anos 60 e 70, a editora multiplica os títulos
de super-heróis, publicando no país os renovados personagens
do gênero que tanto sucesso fazem nos Estados Unidos. O auge
desta época acontece a partir de 1967, quando a EBAL lança os
personagens da editora Marvel, dos EUA, como Capitão América,
Thor, Hulk, Namor, e Homem de Ferro, e, posteriormente, Homem-
Aranha e o Quarteto Fantástico.
15
Os novos super-heróis, sucesso de vendas nos Estados Unidos,
trazem para o público nacional uma concepção inédita para as
aventuras do gênero, em termos gráficos e de roteiro. São
personagens com dúvidas sobre seu papel na sociedade.
“Superseres”, dotados de habilidades especiais, como seus
antecessores, mas problematizados: com fraquezas e
dificuldades comuns “aos mortais”, sejam elas as mais banais
do dia-a-dia, como a falta de dinheiro para pagar o aluguel,
situação típica enfrentada pelo adolescente Homem-Aranha. Os
chamados super-heróis “neuróticos” da década de 1960 e início
dos anos 70 conquistam novas gerações de leitores no Brasil,
tornando a EBAL a editora brasileira mais identificada,
durante o período, com a publicação nacional dos super-heróis
das HQs.
“Os super-heróis tomaram o lugar dos heróis do faroeste”,
recorda Naumim Aizen, filho de Adolfo que trabalhou como
editor da EBAL (em entrevista ao autor, 2003).
A dissertação desenvolvida teve o apoio decisivo para sua
finalização proporcionado pelo CNPq.
Seu primeiro capítulo apresenta uma revisão da bibliografia
que abrange os fenômenos dos modernos meios de comunicação,
assim como dos estudos que abordam as histórias em quadrinhos
enquanto uma forma de linguagem com características próprias,
as quais permitem sua compreensão de maneira mais específica.
O surgimento dos comic books de super-heróis nos Estados
Unidos, sua chegada ao Brasil, as reações adversas de
diferentes grupos da sociedade e a renovação sofrida pelos
super-heróis nos anos 60 e 70 são aspectos abordados no
segundo capítulo.
16
Foi realizado extenso levantamento documental, iconográfico e
bibliográfico das revistas da Editora Brasil-América, em
especial, dos títulos de super-heróis das décadas de 1960 e 70
– os quais serão abordados especificamente no terceiro
capítulo da dissertação.
A análise contextualiza a trajetória da EBAL, propondo a
leitura de histórias relevantes lançadas pela editora, o que
tem por objetivo discutir as variadas maneiras como imagem e
texto combinam-se nas histórias em quadrinhos, representando e
assim influenciando a sociedade da época. Para tanto, foi
reproduzida, ao longo da dissertação, uma seleção de imagens e
ampliações de fragmentos das narrativas gráficas estudadas.
Por fim, o estudo procura relacionar os elementos pesquisados
com entrevistas realizadas com leitores das revistas de super-
heróis da EBAL, os quais, de alguma maneira, tiveram suas
vidas influenciadas por essas publicações. A dissertação
dedica o quarto e último capítulo às entrevistas colhidas,
destacando comentários dos leitores sobre edições e histórias
da EBAL, acompanhados pela iconografia correspondente.
NOVAS OBRAS NACIONAIS DE REFERÊNCIA
Uma das principais lacunas na bibliografia brasileira sobre
histórias em quadrinhos está na falta de estudos específicos
sobre a trajetória das principais editoras nacionais, assim
como sobre a história da publicação de títulos que marcaram
sua época.
Durante o período de realização da pesquisa (entre o início de
2003 e o começo de 2006, dentro do programa de pós-graduação
da Escola de Comunicações e Artes da USP) duas obras recentes
de autores brasileiros somaram-se à bibliografia fundamental
da dissertação, contribuindo em muito para a elaboração do
17
recorte final do objeto da pesquisa, e dessa maneira para o
desenvolvimento do trabalho em seu conjunto.
O primeiro livro foi Para Reler os Quadrinhos Disney –
Linguagem, Evolução e Análise de HQs (Edições Paulinas), de
Roberto Elíseo dos Santos, lançado em 2002. O autor investiga
um gênero particular de HQs, os “quadrinhos Disney”, já
tachados por estudiosos como meros “veículos de imposição dos
valores capitalistas para jovens e inocentes leitores”. Nos
anos 70, essa crítica foi reforçada pela publicação do livro
Para ler o Pato Donald, de Ariel Dorfman e Armand Mattelart, o
qual afirmava que os quadrinhos Disney eram, na realidade, um
mecanismo de "lavagem cerebral" dos mais jovens.
Atualmente essa interpretação é considerada muito mais um
fruto do contexto da Guerra Fria, dada a sua preocupação
unicamente restrita ao aspecto ideológico dos quadrinhos. Em
nenhum momento, a análise levou em conta as possíveis (e, em
certos caso, evidentes) diferenças, em variados graus, que
existem entre os trabalhos de cada artista que produziu os
chamados “quadrinhos Disney”.
Para Reler os Quadrinhos Disney – Linguagem, Evolução e
Análise de HQs demonstra como mesmo dentro da rotina
industrial de produção das HQs Disney, certos artistas foram
capazes de, anonimamente, criar um estilo, uma forma de
representação gráfica com características próprias, enfim uma
“narrativa de autor”.
O caso mais conhecido é o de Carl Barks, “autor fantasma”
(ghost writer) dos estúdios Disney, entre os anos 40 e 60, que
se tornou reverenciado somente ao final de sua carreira,
depois de descoberta de sua identidade por fãs do mundo
inteiro. Atualmente, Barks, é reconhecido internacionalmente
como autor de uma obra – que combina humor, elementos épicos e
18
fantásticos – que se destaca na produção cultural do século
20, entre todas as maneiras de expressão. Uma crônica notável
(na forma e conteúdo) do mundo ocidental, em particular norte-
americano, das décadas de 1940, 50 e 60.
Roberto Elíseo dos Santos demonstra como Carl Barks não é um
caso isolado. Além dele, há diversos outros artistas
responsáveis pelos quadrinhos Disney cujos trabalhos destacam-
se em meio ao que seria apenas uma linha de produção, como o
norte-americano Don Rosa e o italiano Romano Scarpa, entre
outros de diversas nacionalidades, como os brasileiros – que
sempre trabalharam de maneira anônima – Jorge Kato, Waldyr
Igayara, Renato Canini e Carlos Edgard Herrero.
Esta constatação reforçou a idéia inicial da elaboração deste
projeto de pesquisa: realizar um estudo de um período
particular da produção de HQs no Brasil. A época escolhida foi
então a que se estende de meados dos anos 60 e 70, justamente
o momento em que as publicações de super-heróis da EBAL vivem
seu auge, influenciando o imaginário de tantos leitores (entre
eles, do autor do projeto).
Os chamados “super-heróis dos quadrinhos” também são
costumeiramente vistos de maneira depreciativa,
indiferenciada, como um subproduto da indústria de
entretenimento. Mas, ao longo da história (o que será
desenvolvido nos próximos capítulos), houve roteiristas e
desenhistas que produziram comics de super-heróis que vieram
a se tornar, décadas depois, artistas de reconhecida
contribuição na cultura do século 20, em seu sentido mais
abrangente. São nomes como Jack Kirby, Stan Lee, Neal Adams,
Jim Steranko, Gil Kane, John Romita, Curt Swann, Steve Ditko,
Gene Colan, Wally Wood, Murphy Anderson, entre muitos outros.
19
No Brasil, entre os anos 60 e 70, justamente a época em que
esses autores renovaram os comic books de super-heróis, a EBAL
foi a grande editora nacional de suas histórias. Neste
período, a EBAL publicou os principais personagens do período,
conquistando novas gerações de leitores brasileiros.
Apesar de viver problemas financeiros, neste tempo, a EBAL foi
a grande editora nacional dos super-heróis dos comic books dos
EUA, com dezenas de títulos protagonizados pelos superseres
dos quadrinhos.
Assim, com a definição do recorte do tema da dissertação,
tornou-se necessária sua contextualização histórica. Entender
a publicação dos super-heróis dos quadrinhos pela EBAL nos
anos 60 e 70 dentro de um universo maior – que é o da
trajetória da EBAL e sua contribuição para o desenvolvimento
da imprensa e do mercado de publicações do Brasil, o que
abrange diversas particularidades e conflitos inerentes a este
processo editorial.
Ao final de 2004, houve o lançamento do livro-reportagem A
Guerra dos Gibis – a formação do mercado editorial brasileiro
e a censura aos quadrinhos, 1933-64, do jornalista e escritor
Gonçalo Junior.
Trata-se de um trabalho que veio ao encontro das necessidades
acima relacionadas, sendo de enorme valia para o
desenvolvimento da dissertação e sua contextualização
histórico e editorial.
O livro analisa o papel de Adolfo Aizen no cenário da evolução
da imprensa nacional, em seus variados desdobramentos e
impactos em meio à sociedade, em particular, o preconceito e a
censura aos quadrinhos. Em seus propósitos, é a maior
20
investigação sobre a história dos quadrinhos no Brasil já
realizada.
O livro mostra, apoiado em inúmeras reproduções de jornais,
como o debate em torno da publicação de HQs, entre as décadas
de 1940 e 60, tornou-se uma polêmica nacional. O tema ganhou
manchetes com acaloradas posições a favor e contra os gibis.
Nomes de peso participaram do debate: Gilberto Freyre e Jorge
Amado, do primeiro lado da trincheira, e Carlos Lacerda e
Samuel Wainer, do outro. O autor revela como a “guerra dos
gibis” foi utilizada por diversos grupos da mídia, os quais se
aproveitaram das críticas aos quadrinhos para desacreditar
concorrentes. A obra abrange as tentativas de regulamentação
do mercado de HQs no Brasil, as diversas normas e códigos de
censura adotados pelas próprias editoras para sobreviverem,
encerrando a pesquisa em 1964, ano do golpe militar no país.
ETAPAS DA PESQUISA
A análise, fundamentada em bibliografia específica sobre
histórias em quadrinhos, é acompanhada de uma contextualização
histórica e cultural, estudada em obras que refletem sobre a
comunicação e o desenvolvimento das mídias impressas no mundo
contemporâneo.
Trata-se de uma bibliografia qualitativa, que selecionou
elementos formais e de conteúdo que representam as
características dos super-heróis das histórias em quadrinhos –
em particular, as contradições de seus personagens (sejam
essas intencionais ou não).
Algumas histórias são citadas mais de uma vez devido à
recorrência de comentários sobre as mesmas durante as
entrevistas realizadas para a dissertação.
21
A pesquisa procurou ainda relacionar a análise das revistas do
período estudado com depoimentos de leitores dessas
publicações, os quais se reconhecem, hoje em dia,
influenciados (de variadas maneiras) pelos quadrinhos de
super-heróis da EBAL.
A dissertação tem como proposta a leitura de histórias
lançadas pela EBAL, no período enfocado, que sejam relevantes
em relação à apresentação de elementos gráficos e de roteiro
que demonstram as mencionadas características dos personagens
da época (então inéditas nas histórias em quadrinhos): super-
heróis indecisos, com problemas e fraquezas humanas.
Foram realizadas entrevistas com pesquisadores e editores para
contribuir em termos de informações e de reflexão crítica.
Ao longo da a dissertação, é reproduzida uma seleção de
imagens escolhidas entre a extensa bibliografia de revistas
pesquisadas (da EBAL, de concorrentes, edições estrangeiras e
reedições de histórias do período).
A iconografia escolhida abrange ampliações de fragmentos de
quadrinhos até a reprodução de seqüências de páginas, de
acordo com a relevância dos elementos ali presentes.
O capítulo 4 é o resultado da seleção e edição de dezenas das
entrevistas realizadas, as quais são sempre acompanhadas de
uma iconografia correspondente, escolhida a partir das
referências fornecidas pelos depoimentos – em relação a
tramas, personagens, artistas, além de diversos outros
elementos constitutivos das histórias em quadrinhos.
As diferentes experiências vividas na leitura dos personagens,
colhidas de acordo com a evolução das entrevistas, resultaram
na idéia de se elaborar um quarto capítulo para a dissertação,
22
em seqüência ao desenvolvimento de toda a análise apresentada
pelo trabalho em seus três capítulos.
A proposta, levada adiante, foi a de dar “voz integral” aos
leitores entrevistados, proporcionando assim a evocação de um
variado imaginário iconográfico, significativo para a
contextualização visual do estudo realizado. Assim, aparece
uma pluralidade de vozes, leituras e imagens que deixaram
diferentes marcas.
Além das entrevistas, o quarto capítulo reproduz ainda alguns
parágrafos do texto que se tornou a epígrafe da dissertação:
o artigo “Os Heróis estão na Fossa?”, de Fernando Albagli,
diretor da EBAL. A argumentação de Albagli é aqui acompanhada
pela reprodução integral das três páginas das quais foram
extraídos os três quadrinhos publicados ao lado da epígrafe.
QUADRINHOS, INDÚSTRIA E CULTURA
A difusão mundial dos comic books é, certamente, um processo
que ocorre em escala industrial, submetido a regras
comerciais. Da mesma forma que ocorre com o cinema ou qualquer
outra forma de entretenimento de massa, os quadrinhos são uma
mercadoria cultural, desenvolvida dentro da lógica de obtenção
de lucros.
Tal condição, no entanto, não impede que surjam artistas e
autores que criam e renovam linguagens, conceitos e temáticas.
Esses são aqueles que, trabalhando dentro da rotina produtiva
da indústria, descobrem novas possibilidades narrativas
(formais e de conteúdo) para os quadrinhos. Assim, influenciam
não apenas o desenvolvimento das HQs, mas da cultura em seu
sentido mais abrangente.
23
Muitos desses criadores chegaram ao Brasil justamente por
iniciativa da Editora Brasil-América.
Nos anos 60 e 70, período enfocado na pesquisa, a EBAL difunde
no país as histórias em quadrinhos de nomes como Stan Lee
(roteirista que se tornou o pai do chamado “Universo Marvel”,
que mudou o conceito de quadrinhos de super-heróis nos anos
60); Jack Kirby, artista que, trabalhando em dupla com Lee,
atingiu seu ápice de criatividade visual ao desenhar as
narrativas de personagens como o Quarteto Fantástico, Thor,
Capitão América e inúmeros outros personagens; Steve Ditko (o
primeiro desenhista do Homem-Aranha); Neal Adams (autor do
sombrio Batman da virada dos 60 para os 70); Joe Kubert (de
Tarzan e Sargento Rock); Curt Swan (que concebeu a imagem que
se tornou mais clássica do Super-Homem); Gil Kane (Lanterna
Verde); John Buscema (de quem a EBAL publicou suas versões
para personagens como Namor e Tarzan), entre diversos outros.
Assim, a EBAL influencia gerações de leitores, numa trajetória
editorial que é discutida na dissertação a seguir.
24
CAPÍTULO 1
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS:
ESTUDOS E PESQUISA
Umberto Eco – um dos principais autores de estudos sobre a comunicação na sociedade contemporânea
– é leitura de personagem de uma história de super-heróis dos anos 2000.
X-Force ( Revista X-Men Extra 16, p. 56, abril de 2003. Editora Panini Brasil).
25
26
27
O Brasil é um dos países pioneiros no estudo e na compreensão
das histórias em quadrinhos como uma das linguagens impressas
mais relevantes do século 20. Em 1951, em São Paulo, foi
realizada a I Exposição Internacional de Histórias em
Quadrinhos, uma iniciativa de jovens artistas e desenhistas
aficionados pelas HQs – em sua maioria, “formados” pelo
Suplemento Juvenil de Adolfo Aizen, entre outras publicações
da época.
O grupo foi integrado por Álvaro de Moya, Jayme Cortez
(desenhista português radicado no Brasil), Miguel Penteado,
Reinaldo de Oliveira e Syllas Roberg. A mostra colocou em
exposição, pela primeira vez no mundo, originais de alguns dos
mais importantes autores do período, como Alex Raymond (de
Flash Gordon), Harold Foster (Príncipe Valente), Milton Caniff
(Terry e os Piratas) e Al Capp (Ferdinando).
O pioneirismo da I Exposição Internacional de Histórias em
Quadrinhos está registrado em obras de referência sobre o
assunto, como a Historie Mondiale de la Bande Dessinée (1989),
28
organizada por Claude Moliterni, com a colaboração de
especialistas de variadas nacionalidades.
À época da exposição, aqui mesmo no Brasil, no entanto, não
faltaram comentários depreciativos em relação à iniciativa,
dada a natureza do tema, os quais tinham as mais variadas
matizes ideológicas. “Fomos criticados tanto pela direita
quanto pela esquerda”, recorda Álvaro de Moya (em entrevista
ao autor, 2003).
De acordo com Waldomiro Vergueiro, em “A pesquisa em
quadrinhos no Brasil: a contribuição da universidade”,
capítulo inicial da obra Cultura Pop Japonesa: Mangá e Animê,
organizada por Sonia Bibe Luyten (2005, p.19-20):
“Essa primeira exposição representou o estopim do
interesse pelas histórias em quadrinhos no país – alguns
de seus organizadores mais tarde se dedicaram ao gênero
de forma sistemática. Álvaro de Moya foi o grande
destaque como autor de diversos livros sobre quadrinhos e
uma extensa produção jornalística, enquanto Jayme Cortez,
Reinaldo de Oliveira, Syllas Roberg e Miguel Penteado
enveredaram-se para a área de criação de quadrinhos e
produção editorial. Nos anos seguintes, vários deles
continuaram ligados a eventos sobre quadrinhos e
organizaram a participação do Brasil no Congresso
Internacional de Lucca, colaborando na organização da
exposição de histórias em quadrinhos do Museu de Arte de
São Paulo (Masp), realizada em 1970, incentivando a
fundação da Associação Paulista de Desenhistas e
procurando abrir caminhos para a produção brasileira.”
Nos Estados Unidos dos anos 50, assim como no Brasil da época,
os quadrinhos eram atacados por grupos sociais conservadores,
educadores, políticos e religiosos, os quais diziam que as HQs
constituíam uma influência negativa para os mais novos,
capazes de levar à “preguiça mental” e “incitar a violência”.
A virada dos anos 50 para os 60, internacionalmente, dá início
à mudança no entendimento das HQs como uma espécie de
subliteratura barata para garotos e adultos iletrados. É
essencial, nesse período, o reconhecimento de nomes de peso da
29
cultura mundial que se confessam grandes admiradores da
linguagem dos quadrinhos.
O cineasta francês Alain Resnais, por exemplo – diretor de O
Ano passado em Marienbad, de 1961, filme que faz referência às
histórias de Mandrake –, funda, juntamente com outros artistas
amantes dos quadrinhos, o “Clube dos Amigos da Bande
Dessinée”. Também o diretor Federico Felini e os artistas
plásticos Andy Warhol e Picasso declaram seu entusiasmo pelas
HQs. Sem falar no Museu do Louvre, de Paris, que realiza
mostras de autores de quadrinhos.
Nesse contexto, é importante ressaltar a publicação da obra
Apocalípticos e Integrados, de Umberto Eco, que apresenta uma
nova abordagem para o estudo da chamada “comunicação de
massa”, investigando, entre outros temas, as HQs (o autor será
mais comentado logo a seguir).
ESTUDOS ACADÊMICOS
No Brasil, ao final dos anos 60 e início dos 70, o Rio de
Janeiro torna-se, ao lado de São Paulo, mais um “pólo de
atenção aos quadrinhos”. Entre outras iniciativas, a Editora
Vozes exerce um importante divulgação no debate sobre as HQs e
suas variadas relações com a moderna sociedade da comunicação,
publicando diversos artigos sobre o assunto na Revista de
Cultura Vozes, além edições especiais, como “O Mundo dos
Super-Heróis”, lançada em 1971.
“Entre os participantes dessa revista, dois nomes se
destacaram posteriormente pela constância da abordagem
do tema. O primeiro deles, Sérgio Augusto, foi um dos
primeiros jornalistas do mundo a dedicar-se
profissionalmente à crítica de quadrinhos na impressa
diária, e tinha uma coluna especializada sobre o tema no
Jornal do Brasil. O segundo, Moacy Cirne, professor da
Universidade Federal Fluminense, centrou seus esforços
de pesquisa acadêmica nas histórias em quadrinhos e
30
revelou-se, ao longo dos anos, um dos mais sérios
pesquisadores do tema no país.”
(VERGUEIRO, Waldomiro. 2005, p.20)
Ainda em meados da década de 1960, o professor Francisco
Araújo cria, na Universidade de Brasília (UnB), a primeira
disciplina de graduação do país sobre a linguagem dos
quadrinhos. Já na Faculdade Casper Líbero, em São Paulo, em
1969, o professor José Marques de Melo coordena um estudo
universitário sobre “Quadrinhos no Brasil: estrutura
industrial e conteúdo das mensagens”, o qual abrange
estatísticas e análise das publicações de HQs das maiores
editoras nacionais.
No âmbito da Universidade de São Paulo, ao longo da década de
1970, diversas outras iniciativas do gênero são realizadas,
ampliando o território de pesquisa da academia nacional sobre
os variados aspectos das histórias em quadrinhos.
No começo de 1970, a professora Sonia Bibe Luyten cria, na
Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP uma disciplina
sobre editoração em HQs, dentro do currículo da graduação em
Editoração, que foi ministrada por diversos anos. Nesse
período, é responsável também pelo lançamento da revista
Quadreca, dedicada, entre outros aspectos, ao lançamento de
novos autores e quadrinistas.
Ainda nos anos 70, Sonia Bibe Luyten idealiza o Museu de
Imprensa Júlio de Mesquita, que abrange também as histórias em
quadrinhos. Em 1972, a Escola de Comunicações e Artes da USP
realiza a 1ª Semana de Editoração, que teve como tema central
as HQs.
Em 1975, a editora Ática publica o livro Os Quadrinhos (1975),
de Antônio Luís Cagnin, texto elaborado inicialmente como
31
dissertação de mestrado em teoria literária, sob a orientação
de Antônio Cândido, na Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras da USP. A obra de Cagnin – o qual, posteriormente,
ministra aulas na ECA-USP – investiga problemas próprios e
formais das histórias em quadrinhos. O objetivo do livro,
inédito em sua proposta até então no Brasil, é o de procurar
“estabelecer uma sistemática, uma tipologia e uma prática
analítica” das HQS.
Ao longo dos anos 70 e 80, a ECA-USP continua a agregar
acadêmicos, provindos de diversas áreas, interessados no
desenvolvimento da pesquisa sobre as histórias em quadrinhos,
como Sonia Bibe Luyten, Antônio Luís Cagnin, Álvaro de Moya,
José Marques de Melo e Waldomiro Vergueiro.
"Em 1989, tivemos a idéia de realizar uma ‘Semana Batman na
ECA’, com discussões, exposições e filmes", conta Vergueiro
(entrevista, 2003). O evento obtém boa receptividade (desde
auditórios lotados até cobertura com destaque pela grande
imprensa).
O conjunto dessas iniciativas, ao longo dos anos, proporciona
assim a constituição, em 1990, do Núcleo de Pesquisas de
Histórias em Quadrinhos da Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo. O núcleo (um grupo de estudos
interdisciplinares sobre HQs) é o único sistematizado do
gênero no Brasil, sendo atualmente coordenado pelo professor
Waldomiro Vergueiro
Outra iniciativa de importância para a pesquisa nacional sobre
HQs ocorre no âmbito da Sociedade de Estudos
Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), com a criação,
em 1995 (durante o 18° congresso da instituição), do grupo de
trabalho Humor e Quadrinhos, fundado pelo professor Flávio
Mário de Alcântara Calazans, que o dirige até 2001. No ano
32
seguinte, o grupo de trabalho passa a ser coordenado por Moacy
Cirne, sendo denominado então como Núcleo de Histórias em
Quadrinhos.
O lento processo, por parte da academia nacional, de
reconhecimento das HQs como um objeto de estudo de relevância
é abordado por Vergueiro (2005, p.15):
“Tradicionalmente, as histórias em quadrinhos foram
vistas pelo meio acadêmico em geral como objeto menor
de pesquisa. (...) Acusações de leviandade, de
peculiaridade e de extravagância podiam ocorrer em
função de qualquer pretensão mais séria ao estudar as
histórias em quadrinhos. Isso fez com que histórias
em quadrinhos e universidades nem sempre se tornassem
uma dupla muito dinâmica. Os intelectuais
universitários sempre tiveram uma ressalva quando aos
produtos de massa. Levaram certo tempo para aceitar
os meios de comunicação de impacto mundial
incontestável, como o cinema ou o rádio, e para
acreditar que pudessem representar um objeto de
estudo digno dos bancos acadêmicos ou que pudessem
oferecer como resultado verdadeiras obras de arte.”
O cenário para os quadrinhos no âmbito universitário,
Depois do longo processo para o reconhecimento da importância
do estudo dessa forma de linguagem no Brasil, o cenário atual
mostra-se, cada vez mais, com novas perspectivas. Em
entrevista (2003), Waldomiro Vergueiro comenta:
“Não foi a academia que abriu espaço para os quadrinhos,
mas os estudiosos que forçaram essa abertura. E a
universidade ganhou com isso. Pois as HQs são um objeto
de estudo que proporciona investigações relacionadas aos
mais variados aspectos da sociedade, da cultura à
política"
MÍDIA, HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E CULTURA POP
A dissertação “Super-Heróis da EBAL” tem como ponto de partida
uma bibliografia que aborda os fenômenos da “comunicação de
massa” e da “cultura pop”. Entre os estudos utilizados, estão
33
as pesquisas de Umberto Eco, autor de Apocalípticos e
Integrados. (São Paulo: Perspectiva, 1976)
Em sua análise, Eco demonstra como os produtos da comunicação
de massa são mais complexos, e mesmo contraditórios, do que o
seu entendimento restrito ao aspecto de veículo de propagação
da ideologia capitalista. (1976, p. 19.):
“O que (...) se censura ao apocalíptico é o fato de
jamais tentar, realmente, um estudo concreto dos produtos
e das maneiras pelas quais são eles, na verdade,
consumidos. O apocalíptico não só reduz os consumidores
àquele fetiche indiferenciado que é o homem-massa, mas –
enquanto o acusa de reduzir todo produto artístico, até o
mais válido, a puro fetiche – reduz, ele próprio a
fetiche a cultura de massa. E ao invés de analisá-lo,
caso por caso, para fazer dele emergirem as
características estruturais, nega-o em bloco. Quando o
analisa, trai então uma estranha propensão emotiva e
manifesta um irresoluto complexo de amor-ódio – fazendo
nascer a suspeita de que a primeira e mais ilustre vítima
do produto de massa seja, justamente, o seu crítico
virtuoso”
Seguindo esta proposta teórica, o texto utiliza-se de estudos
como os do norte-americano Douglas Kellner, autor de A Cultura
da Mídia. Kellner investiga como os variados produtos da
indústria cultural proporcionam para o público elementos
materiais e simbólicos para a construção de sua identidade
social – seja em termos de reprodução de padrões vigentes,
seja em termos da sua crítica e transformação.
O autor discute as conseqüências do domínio da cultura
veiculada pela mídia sobre a sociedade em geral. Em sua
análise, aponta esta forma de produção cultural como algo
“novo na natureza humana”. A “cultura da mídia” abrange desde
os produtos da imprensa (de jornais, revistas a histórias em
quadrinhos), passando pelo cinema, vídeo e televisão, até
sistemas de rádio e de reprodução de som, além de produtos
como CDs e fitas.
34
Kellner não limita sua análise ao aspecto ideológico inerente
aos produtos da indústria cultural. Reconhece sua existência.
Mas vai além, investigando outras facetas – simbólicas e
materiais – que interagem na relação com o público, o qual, de
acordo com a argumentação do autor, tem a capacidade de
realizar leituras diversas dos significados originais dos
produtos que consome.
Assim, trata-se de um processo muito mais ativo do que
passivo. Ou seja, o público apropria-se da cultura de massa ao
seu próprio modo, estabelecendo relações que, conforme as
circunstâncias, destoam em muito da visão ideológica que se
pressupunha. Nessa perspectiva, Kellner reforça a importância
de se estudar a especificidade de cada objeto da cultura da
mídia, mostrando o risco de generalizações nesse campo de
conhecimento.
“(...) A cultura da mídia e a de consumo atuam de mãos
dadas no sentido de gerar pensamentos e comportamentos
ajustados aos valores, às instituições, às crenças e às
práticas vigentes. No entanto, o público pode resistir
aos significados e mensagens dominantes, criar sua
própria leitura e seu próprio modo de apropriar-se da
cultura de massa, usando a sua cultura como recurso para
fortalecer-se e inventar significados, identidade e
forma de vida próprios. Além disso, a própria mídia dá
recursos que os indivíduos podem acatar ou rejeitar na
formação de sua identidade em oposição aos modelos
dominantes.”
(KELLNER, Douglas. A Cultura da Mídia. São Paulo: Edusc.
2001, p.11.)
De acordo com essa abordagem, a dissertação também se alinha a
trabalhos como o do pesquisador argentino Néstor Garcia
Canclini, escritor de Culturas Híbridas. Canclini investiga de
que maneiras as tradições culturais populares da América
Latina, assim como as formas cultas da cultura, se combinam e
coexistem com os produtos da chamada modernidade.
35
Deste processo, segundo Néstor Garcia Canclini, resulta um
diálogo complexo e transformador, o qual não pode se
restringir ao mero entendimento de imposição de valores
simbólicos e ideológicos do modo de vida e de produção
dominantes.
Outro teórico que integra os pressupostos de pesquisa da
dissertação é o semiólogo italiano Daniele Barbieri, autor de
I Linguaggi del fumetto (Los Lenguajes del cómic, em sua
versão espanhola), que estuda as particularidades da linguagem
das histórias em quadrinhos e suas relações com outras formas
de expressão artística.
Barbieri, em Los Lenguajes del Comic, contextualiza seus
estudos na concepção de que as linguagens não são meros
instrumentos, mas ambientes nos quais nascem e transitam as
idéias.
Desta maneira, entre outros aspectos, Barbieri mostra como,
por exemplo, os quadrinhos de super-heróis dos anos 60 (os
quais introduziram uma nova dimensão psicológica em seus
personagens) têm como influência formas de expressão provindas
de outras linguagens artísticas, entre elas, o monólogo
teatral.
“Quando nasce o Homem-Aranha parece que não lhe falta
aquela sorte de problemas (conflitos pessoais do
personagem). Sua carreira de herói está sempre
entremeada pela marcha de acontecimentos como seus
estudos, o estado das finanças, assim como suas paixões.
(...) Em suma, o êxito dos novos personagens se deveu em
grande medida ao fato deles exporem sua interioridade.
Mas para demonstrar que tinham tal dimensão era preciso
falar: como personagens de um drama teatral, não tinham
outro modo de expressar a própria interioridade do que
as palavras. (...) Assim, primeiro de maneira mais
incerta, e logo, desde o começo dos 70 em diante, cada
vez com maior decisão, os quadrinhos de super-heróis
foram preenchidos por monólogos e diálogos que não são
diálogos”
(BARBIERI, Daniele. 1998, p. 221)
36
Também é destacada a contribuição das pesquisas do escritor
espanhol Javier Coma, dedicado, particularmente, ao estudo da
“história das histórias em quadrinhos” e do cinema noir, que
organizou a enciclopédia Historia de Los Comics. Da mesma
maneira, são referências escritores que versam sobre a
temática dos quadrinhos por meio da ficção e do roteiro
cinematográfico, como Michael Chabon, autor de As Aventuras de
Kavalier e Clay, romance que venceu o prêmio Pulitzer (trata-
se de uma ficção ambientada em meio ao desenvolvimento da
indústria dos comic books nos Estados Unidos).
Sobre as especificidades que constituem as histórias em
quadrinhos, suas relações com outras formas de linguagem, além
de uma investigação sobre as diferentes leituras que as HQs
permitem para o público, é ainda relevante para a dissertação
a obra Desvendando os Quadrinhos – história, criação, desenho,
animação, roteiro do norte-americano Scott McCloud, escritor,
roteirista e desenhista de comics.
O desenvolvimento da indústria dos comics assim como seus
impactos nas transformações vividas pela juventude do século
20 é o assunto analisado pelo livro Comic Book Nation – The
Transformation of Youth Culture in America, de Bradford
Wright, obra que contribuiu em muito para a contextualização
histórica da indústria dos comics e as maneiras como se
processam as mudanças nas revistas de super-heróis dos anos 60
e 70, além de analisar sua recepção pela sociedade da época.
37
38
CAPÍTULO 2
IMPRENSA, ‘COMIC BOOKS’
E O MUNDO DO SÉCULO 20
Leitura de Superman por um hippie em meio a festival de rock nos Estados Unidos na virada dos anos 60
para os 70 - indústria cultural, inflexões e contradições.
(Comics, Comix and Graphic Novels: a history of comic art, 1996. p. 74).
39
40
A origem das histórias em quadrinhos remonta às pinturas
rupestres dos tempos pré-históricos. Já a constituição das
HQs como uma forma de linguagem com características próprias
– tanto artísticas quanto industriais – tem início a partir
da criação da imprensa, por Gutenberg.
Em Desvendando os Quadrinhos, Scott McCloud aborda de que
maneiras a descoberta dos tipos móveis de Gutenberg
proporcionou o desenvolvimento das histórias em quadrinhos.
“A invenção da impressa (...) é um evento tão marcante na
história dos quadrinhos quanto na história da palavra
escrita. Com a invenção da imprensa, a forma de arte que
servia aos ricos e poderosos agora poderia ser desfrutada
por todos.”
(McCLOUD, Scott. 2005, p. 16)
Na impressa européia do século 18 são publicadas histórias
ilustradas e seriadas, versando sobre o cotidiano, a
sociedade e a política – as quais são atualmente reconhecidas
como as primeiras experiências formais e de conteúdo
precursoras das modernas histórias em quadrinhos.
William Hogarth, chargista inglês, é considerado o autor da
primeira dessas manifestações. Em 1731, realiza peças
ilustradas como O Progresso de uma Prostituta, trabalho
considerado, de acordo com McCloud, como o “apogeu da
sofisticação da história com imagens”.
41
“Apesar de ter poucos quadros, essas figuras contam uma
história rica em detalhes e motivada por fortes
preocupações sociais”. (...) As histórias de Hogarth foram
mostradas pela primeira vez como uma série de pinturas e,
mais tarde, vendidas como portifólio de gravuras. As
pinturas e gravuras eram para ser vistas lado a lado... em
seqüência!”
(McCLOUD. 2005, p. 16 e 17)
Outro nome considerado pilar desse processo, de acordo com
McCloud, é o escritor e pintor suíço Rudolph Töpffer, “cujas
histórias com imagens satíricas, iniciadas em meados do
século 19, empregavam caricaturas e requadros – além de
apresentar a primeira combinação interdependente de palavras
e figuras na Europa”.
“Infelizmente, nem o próprio Töffer conseguiu
compreender todo o potencial de sua invenção, tomando-a
como um simples hobby. (...) Mesmo assim, a contribuição
de Töffer para os quadrinhos é considerável, pois,
apesar de não ser nem desenhista nem escritor ele criou
uma foram que era as duas coisas. Uma linguagem própria.
(...) As revistas inglesas de caricatura mantiveram
vivas as tradições e, à medida que o século 20 se
aproximava, as histórias em quadrinhos começaram a
florescer num fluxo regular de fantasias que continua
até os dias de hoje”
(McCLOUD. 2005, p. 17 e 18)
Angelo Agostini, italiano naturalizado brasileiro, jornalista,
pintor e desenhista, é também um dos precursores das histórias
em quadrinhos da maneira como são conhecidas hoje em dia.
Em 1864, Agostini começa a desenhar para a revista Diabo Coxo,
e, em 1866, torna-se colaborador da revista O Cabrião. Em 30
de janeiro de 1869, Angelo Agostini publica aquela que é
considerada a primeira história em seqüência e com personagem
fixo no Brasil: As aventuras de Nhô Quim ou Impressões de uma
viagem à Corte, na revista Vida Fluminense.
42
A data é, atualmente, comemorada no Brasil como o Dia do
Quadrinho Nacional.
The Yellow Kid (O Menino Amarelo), criado em 1896, nos
Estados Unidos, por Richard Outcalt, e publicado aos
domingos, em cores, pelo Sunday New York Journal (jornal
nova-iorquino de Joseph Pulitzer), torna-se reconhecido,
pelas suas características formais, narrativas e de âmbito
industrial, como a primeira história em quadrinhos moderna.
Richard Outcalt, em seu Menino Amarelo (como veio a ser
conhecido no Brasil), reúne, pela primeira vez, três itens
constitutivos da linguagem das histórias em quadrinhos:
narração em seqüência de imagens; permanência dos mesmos
personagens nas histórias; e utilização da figura gráfica dos
balões (que acomodam falas e pensamentos).
Estudiosos dos Estados Unidos, e mesmo de outros países,
convencionam denominar a publicação de The Yellow Kid como o
marco do início das modernas histórias em quadrinhos - embora
certos aspectos técnicos ainda sejam alvo de divergências,
por exemplo, como o uso obrigatório do balão, elemento não-
presente em obras de autores clássicos das HQs como Harold
Foster.
De qualquer maneira, a convenção é precisa quanto ao aspecto
industrial obtido pela peça de Richard Outcalt, que se torna
sucesso de público, aumentando a venda de jornais. The Yellow
Kid surge, ao final da década de 1890, como mais uma atração
de um novo produto lançado pelos grandes jornais rivais de
Nova York da época, Sunday New York Journal, de Joseph
Pulitzer, e New York Journal, de William Randolph Hearst.
Trata-se dos suplementos dominicais, com narrativas figuradas
semelhantes às da imprensa européia, os quais brigam pela
43
conquista de um público maior, formado por uma massa de
imigrantes considerados “semi-alfabetizados”.
O sucesso de The The Yellow Kid, dessa maneira, é o marco do
início de uma nova linha de produção industrial de
entretenimento em larga escala, que se desdobra em variadas
manifestações ao longo do século 20, até os dias de hoje.
Dessa forma, é importante ressaltar a importância do aspecto
industrial – em todas suas contradições – para a evolução e a
compreensão das histórias em quadrinhos.
“É possível especular que sem a estrutura empresarial
(jornais, editoras, distribuidoras – os syndicates) que
tornou o quadrinho americano um produto comercial, a
narrativa seqüencial impressa não desenvolveria seu
potencial (estético, narrativo e mercadológico.”
(SANTOS, Roberto Elísio. 2002, p. 68)
Inicialmente, os temas preferenciais dos autores são dedicados
a tramas e conflitos do dia-a-dia da família norte-americana.
O humor é uma característica da origem das HQs, daí a
expressão comics, assim como funnies.
Will Eisner, quadrinista norte-americano criador de The Spirit
– autor por muitos chamado como o “Orson Welles dos
quadrinhos” – é o responsável, nas últimas décadas, pela
cunhagem e divulgação da expressão “Arte Seqüencial” para uma
definição mais adequada, tanto formal quanto em aspecto de
conteúdo, para do termo comics, tão popularizado nos EUA.
Moacy Cirne, em seu artigo “Por que ler os quadrinhos”,
publicado no livro Literatura em Quadrinhos no Brasil – Acervo
da Biblioteca Nacional, da editora Nova Fronteira (2003),
aborda esta especificidade:
“Os quadrinhos, antes de mais nada, são uma arte
seqüencial, como diria o mestre Will Eisner. O que isso
44
quer dizer, exatamente? Quer dizer que são uma narrativa
gráfico-visual, com suas particularidades próprias, a
partir do agenciamento de, no mínimo, duas imagens
desenhadas que se relacionam. Entre as imagens, um corte,
que chamamos de corte gráfico – de certo modo, o lugar
que marca o espaço do impulso narrativo. Esse corte tanto
será espacial quanto temporal (aqui, gerando as elipses:
um tempo a ser preenchido, muitas vezes, pela imaginação
do leitor). A passagem entre uma imagem e outra revelará,
se fluente, a marca de um bom narrador, se brusca, para
não ser ríspida, ou dura, será eficaz na medida das
necessidades temáticos do roteiro e/ou do enredo
propriamente dito.”
(CIRNE, Moacy. 2003, p. 14).
O consumo dos comics se alastra nos EUA ao longo da década de
1920, até que, em 1929, surge o que viria a ser reconhecido
como o início dos gêneros de aventura e ficção-científica nas
HQs. Em 1929, são lançados pelos jornais dos EUA as histórias
de Tarzan (adaptadas na forma de quadrinhos por Harold Foster
da obra de Edgar Rice Burroghs), e de Buck Rogers (concepção
de John F. Dille, escrito por Philip Nowlan e desenhado por
Dick Calkins).
Em seu artigo “Era uma vez um menino amarelo”, no livro
Shazam, em que faz um síntese crítica sobre a história das
HQs, Álvaro de Moya aborda a importância da criação Tarzan,
Buck Rogers e o detetive Dick Tracy, lançado logo depois, em
1931, por Chester Gould, na história das histórias em
quadrinhos. “Essas três criações de sucesso, Tarzan, Rogers e
Tracy, produziram uma reviravolta na história dos quadrinhos,
iniciando a chamada Golden Age (‘Era Dourada’) dos comics”.
(MOYA, Álvaro. 1977, p. 43).
Nascem assim os primeiros heróis modernos das HQs, os quais
logo são seguidos por muitos outros, de crescente aceitação
popular, como Flash Gordon, de Alex Raymond, e Príncipe
Valente, de Harold Foster. Ao longo da década de 1930, as
histórias em quadrinhos transformam-se numa indústria de
45
grande produção e concorrência, vendendo entretenimento para
sucessivas gerações de jovens leitores.
Desdobramento natural de sua expansão, os quadrinhos
distribuem-se em diferentes gêneros de histórias, desde os
enredos cômicos sobre dramas familiares, até as tramas de
aventura, que se desdobram, por sua vez, ao longo do tempo, em
outros gêneros, como ficção-científica, mistério e, a partir
do final dos anos 30, “os super-heróis”.
Sobre o uso da categoria gênero para definir diferentes
conteúdos de histórias em quadrinhos, Roberto Elísio dos
Santos, na obra Para Reler os Quadrinhos Disney – Linguagem,
Evolução e Análise de HQs, destaca que:
“Em se tratando de um produto da Cultura Pop,
industrializado e comercial, a História em Quadrinhos
consagra determinadas estruturas narrativas, temas,
ambientações e elementos iconográficos que são facilmente
reconhecidos e reportados a um determinado gênero
ficcional”
(SANTOS, Roberto Elísio. 2002, p. 69)
46
O Bloco (1983). Nova York, década de 1930: “Em seus últimos anos de vida, Jack kirby
evocou o universo do cotidiano das multidões de imigrantes nas quais ele – e os comic
books – emergiram. Pelo traço de Kirby um normal dia de comércio na pobre região do
Lower East Side ganha contornos de dimensão super-heróica”. (JONES, Gerard e JACOBS,
Will. 1997, p. 5. Tradução livre).
47
TESTEMUNHA E ATOR DE UMA NOVA ERA: ADOLFO AIZEN
Em 1933, nos Estados Unidos, justamente no momento em que
entra em ebulição, com todo seu vigor inicial, a indústria dos
comics, um jovem jornalista do Brasil encontra-se no epicentro
da história: Adolfo Aizen.
No início de 1933, Aizen descobre que o Touring Club do Brasil
está organizando um cruzeiro para Chicago, onde será
realizada uma grande feira mundial – evento patrocinado por
clubes de turismo dos EUA para estimular o intercâmbio entre
as nações.
Adolfo entra então em contato, insistentemente, com os
organizadores do cruzeiro. Sua iniciativa resulta num convite
para participar da viagem como assessor de imprensa do
Touring. O embarque ocorre na noite de 17 de agosto de 1933,
no Rio, movimentando a capital brasileira da época. Aizen
acompanha todo o cruzeiro, escrevendo dezenas de reportagens
sobre os Estados Unidos.
Depois, estende sua permanência nos EUA, conhecendo Nova
York. Aizen logo percebe um bom negócio nos suplementos
temáticos que os jornais lançam sobre assuntos como tramas
policiais, esporte e temas femininos. Em especial, chama a
sua atenção os cadernos com tiras de quadrinhos de aventura,
a grande novidade da época.
De acordo com Gonçalo Junior em Guerra dos Gibis (2004, p. 24
e 25):
“Um dos seus passatempos do jornalista era bisbilhotar os
pontos-de-venda de jornais e revista. Aizen encantava-se
com o mercado editorial americano, então impulsionado
pelas modernas tecnologias de impressão, que
possibilitavam tiragens cada vez maiores em menor tempo.
As múltiplas possibilidades gráficas, incluindo o uso da
cor nos suplementos dominicais, e o acabamento perfeito
48
das edições permitiriam o surgimento dos suplementos
semanais temáticos, encartados gratuitamente nos jornais
– eram bancados por anunciantes. (...) Aizen notou ainda
que nenhum caderno fazia mais sucesso que o infanto-
juvenil, que trazia curiosidades, passatempos e muitas
histórias em quadrinhos, os chamados comics.
(...)Impressionou-se com aquele tipo de leitura que era
uma obsessão nacional. Todos os grandes jornais tinham
suas séries de quadrinhos, principalmente com os heróis
de aventuras. Aizen espantou-se ao ver que a continuação
das histórias de Buck Rogers e Tarzan eram acompanhadas
com ansiedade por uma legião de fãs, como se fossem
folhetins. O mais curioso: os comics exerciam fascínio
sobre o público de todas as idades, ao contrário do que
acontecia no Brasil, onde os raros quadrinhos publicados
em revistas como O Tico-Tico eram dirigidos às crianças.
Aquelas histórias em tiras ou páginas seriadas que ele
lia nos Estados Unidos eram desconhecidas no Brasil.”
(JUNIOR, Gonçalo. 2004)
Adolfo Aizen volta ao Brasil eufórico para tornar realidade a
idéia de lançar suplementos temáticos na imprensa do país.
Leva a proposta a Roberto Marinho, dono do jornal O Globo,
que não mostra interesse. Aizen persiste com o projeto. E
assim nasce, encartado em A Nação, o Suplemento Infantil, a
primeira publicação nacional dedicada aos modernos
personagens das HQs, lançando no Brasil as aventuras de
personagens como Flash Gordon, Tarzan, Príncipe Valente e
Mandrake.
Aizen realiza seu sonho com o apoio de João Alberto Lins de
Barros, diretor do jornal A Nação, integrante do movimento
tenentista que levou Getúlio Vargas ao poder em 1930. João
Alberto enxerga com olhos favoráveis as novidades sugeridas
por Aizen.
Assim, A Nação, a partir de março de 1934, começa a publicar
suplementos temáticos, entre eles, o Suplemento Infantil. Em
poucas semanas, o suplemento torna-se um objeto de desejo da
garotada. A circulação do jornal aumenta com a venda do
caderno de HQs. Mas o rápido sucesso, no entanto, não agrada
pessoas ligadas ao jornal A Nação, que descobrem, para seu
49
espanto, que os jovens leitores do Suplemento Infantil jogam
fora A Nação depois de separar seu caderno favorito.
Adolfo Aizen desvincula-se formalmente de A Nação, embora
continue recebendo apoio financeiro de João Alberto Lins de
Barros. Funda então sua própria empresa, Grande Consórcio
Suplementos Nacionais, que publica o rebatizado Suplemento
Juvenil, agora uma publicação independente.
A criação do Grande Consórcio Suplementos Nacionais, no
entanto, gerou um problema para Aizen. Uma lei aprovada em
1934 proibira a presença de estrangeiros na direção de
empresas jornalísticas.
O impedimento tornou-se um dilema para Adolfo Aizen. Não vendo
outra solução, aceitou uma proposta do irmão, forjando uma
identidade brasileira. Aizen “tornou-se” assim, para todos os
efeitos, nascido no Brasil, em 1907, em Juazeiro, na Bahia.
O jornalista realmente nasceu naquele ano. Mas longe do
Brasil, na província russa de Iekatrinoslav (Aldeia de
Catarina). Somente três anos depois é que veio para cá,
trazido pelos pais, judeus russos que fugiam da perseguição
religiosa em seu país.
Adolfo Aizen manteve sua origem em segredo por toda a vida,
mesmo entre seu círculo familiar mais próximo. O segredo
somente veio a público com o lançamento de A Guerra dos Gibis,
no final de 2004.
A verdade é que sua família chegou ao Brasil em 1910, num
navio de refugiados, desembarcando em Santos. O pai resolveu
morar no interior de São Paulo, onde trabalhou como mascate.
Pouco depois, uma tragédia marcou Adolfo, ainda aos 7 anos.
Seu pai foi assassinado. A mãe levou então os filhos para
50
morar com parentes na Bahia. Em 1921, foram para Recife, mas
antes de completar um ano na cidade transferiram-se para o Rio
de Janeiro, onde Adolfo Aizen começou sua carreira.
O Suplemento Juvenil, entre meados dos anos 30 e 40, é
responsável pela formação de gerações de leitores brasileiros
de quadrinhos – os denominados Juvenilistas, expressão criada
pelo próprio Adolfo em suas publicações. Entre os leitores
dessas gerações de juvenilistas, estava o grupo de garotos
que, anos depois, em 1951, organizaria a I Exposição
Internacional de Histórias em Quadrinhos, em São Paulo.
‘COMIC BOOKS’: QUADRINHOS GANHAM SEU VEÍCULO
Nos Estados Unidos, em meados da década de 1930, em meio a
acirrada disputa comercial na luta pelo mercado travada entre
os grandes grupos da mídia impressa, os quadrinhos tornam-se
um elemento estratégico na luta por novos mercados e leitores.
Os editores aproveitam então seleções de comics já publicados
em jornais, remontando-os para o lançamento em um novo formato
editorial, criado na primeira metade da década de 1930, o da
revista de histórias em quadrinhos, o comic book.
“O comic book nasceu de uma idéia simples, porém
revolucionária, pela praticidade de manuseio e também do
ponto de vista comercial. Bastava dobrar o tablóide ao
meio e grampeá-lo para ter uma revista com o dobro de
páginas, mas com custo quase igual – somente algum tempo
depois adotou-se uma campa impressa em papel de melhor
qualidade.”
(JUNIOR, Gonçalo. 2002. p. 66).
Em suas primeiras versões, os comic books trazem apenas
remontagens de tiras de jornais. Mas a necessidade de novas
histórias, porém, leva à contratação de jovens artistas, com o
objetivo de produzir material específico para as revistas.
51
Sem os limites físicos da tira de jornal, o formato de revista
para as histórias em quadrinhos significa então um vasto campo
de experimentação para essa forma de linguagem, tanto em
termos de narrativa visual quanto em aspectos de roteiro e
desenvolvimento de personagens.
Naturalmente, muitas das tentativas iniciais de criação de
quadrinhos para revistas não são bem-sucedidas. De acordo com
o escritor Michael Chabon, autor de As Incríveis Aventuras de
Kavalier e Clay (romance ambientado em meio ao desenvolvimento
da indústria dos comic books nos Estados Unidos):
“No início, as revistas em quadrinhos nada mais foram, de
fato, do que reedições em coletâneas das tiras mais
populares, arrancadas do seu lar nos jornais e
espremidas, não sem violência ou tesouradas, entre um par
de capas baratas em papel brilhante”.
(CHABON. 2002. p. 88)
SUPERMAN E BATMAN
O primeiro personagem que explora eficientemente as novas
possibilidades é Superman (Super-Homem) – um extraterrestre
enviado quando bebê para a Terra, onde adquire habilidades
especiais, as quais jura usar “em defesa da justiça”, na “luta
do bem contra o mal”.
Embora outros heróis já fizessem sucesso nas tiras de jornais,
Super-Homem (o primeiro personagem a trazer a expressão
“Super” em seu nome) é reconhecido como o primeiro super-herói
das HQs. Criado por Jerry Siegel e Joe Shuster, Superman
início a um novo tipo de narrativa para esta forma de
expressão.
52
“O desenhista, Joe Shuster, embora tecnicamente apenas
apto, parecia entender desde o início que a grande
página retangular da revista em quadrinhos oferecia
possibilidades para andamento e composição que eram
dificilmente disponíveis nos jornais; juntou três
quadros verticalmente em um só, para expressar toda a
energia parabólica de um dos saltos entre os arranha-
céus que era a marca patente do ‘Super-Homem’”
(CHABON. 2002. p. 89-90.)
A empatia de Superman com o público é quase imediata, com as
tiragens crescendo aceleradamente. Com Superman, é dado o
início à criação de uma vasta constelação de títulos de comic
books protagonizados por super-heróis.
O segundo da linhagem é Batman, lançado em 1939 (criação de
Bob Kane). O personagem não tem superpoderes especiais como
Superman. Mas é movido pela vingança da morte de seus pais por
criminosos, assassinados diante do filho, ainda criança, na
saída de um teatro.
Para empreender sua tarefa, usa de sua fortuna (seus pais eram
milionários), treina artes marciais, estuda ciências e se
prepara como “nenhum outro mortal jamais havia feito para
enfrentar o crime”.
Bruce Wayne, sua identidade civil (na qual se apresenta como
um playboy falastrão), inspira-se num morcego, pelo medo que
causaria aos bandidos, para conceber sua identidade secreta e
uniforme de super-herói, Batman.
A grande diferença entre o novo personagem e Superman é que
Batman, especialmente em suas primeiras histórias, é
representado de maneira bastante sombria, em traços que
concebem figuras distorcidas e ameaçadoras, o que resulta em
tramas com características expressionistas.
53
Superman e Batman surgem, na segunda metade dos anos 30, num
momento em que os EUA ainda se esforçavam para superar a
depressão econômica da década anterior. Ambos personagens, em
suas primeiras narrativas, lutam contra vilões que colocam em
risco a “ordem social”, como gângsteres e quadrilhas de
mafiosos.
Dessa maneira, constituem-se numa espécie de alento para os
leitores, que ali encontram uma fantasia escapista e redentora
de seu difícil dia-a-dia.
Tanto Superman quanto Batman são protegidos por identidades
secretas, entregando-se assim, de maneira gratuita e anônima
(o gesto mais nobre possível) para a realização da justiça. O
combate ao crime é feito, assim, de acordo com uma compreensão
do mundo absolutamente clara da divisão entre o bem e o mal.
Seguindo o modelo estabelecido pelo sucesso de Superman e
Batman, editores e distribuidores investem no lançamento de
novos super-heróis, lançados às dezenas nos anos seguintes.
Entre eles, Flash, Capitão Marvel e a Mulher-Maravilha, a
primeira super-heroína, escalada para a “luta do bem contra o
mal”, capaz de realizar suas tarefas em condições de igualdade
com os homens, mesmo aqueles dotados de habilidades especiais.
SEGUNDA GUERRA: QUADRINHOS NO FRONT
Os super-heróis multiplicam-se durante a Segunda Guerra
Mundial. Os personagens tornam-se parte integrante e ativa do
esforço de guerra Aliado contra o nazifascismo que dominava a
Europa. Com o ingresso dos Estados Unidos na Guerra, os super-
heróis têm agora como principais inimigos as forças alemãs,
italianas e japonesas.
54
Em suas aventuras, nas quais não existe preocupação com uma
representação realista da guerra, as batalhas sempre são
vencidas. Os inimigos do Eixo, de variadas maneiras, são
desenhados de forma caricata, depreciativa, sendo
invariavelmente derrotados em situações humilhantes.
A idéia que norteia a produção é, antes de tudo, elevar o
ânimo dos EUA até o fim da guerra.
O personagem que mais representa este período é o Capitão
América. Seu lançamento ocorre em 1941, na iminência da
entrada dos EUA no conflito mundial. Criado pelos artistas
Jack Kirby (que décadas depois se consagraria com um dos
maiores artistas da história dos comic books) e Joe Simon, o
Capitão América é a resposta imediata das histórias em
quadrinhos ao esforço de guerra que mobilizou a sociedade
norte-americana durante o conflito mundial.
E assim como Superman e Batman, luta sob uma identidade
secreta, convicto de seus “ideais de liberdade e democracia”.
O sucesso imediato do Capitão América (combatendo primeiro
espiões de Hitler e, depois, engajando-se na linha de frente
de batalha) faz do personagem um item a ser incluído pelo
exército nas mochilas dos soldados norte-americanos.
Em sua primeira história, o personagem é caracterizado como um
típico rapaz branco norte-americano, que toma a iniciativa de
se alistar para lutar contra o nazismo. Magro e fraco, porém,
o jovem é rejeitado pelo exército.
Mas ao então “perdedor” (a figura do looser, tão difundida nos
Estados Unidos) é oferecida uma segunda chance: participar de
uma experiência secreta de criação de supersoldados por meio
da aplicação de um soro especial.
55
Steve Rogers (o nome civil do futuro Capitão América) aceita o
desafio. Injetado o soro, seu corpo transformou-se, adquirindo
enorme capacidade física, além dos padrões normais. A
experiência, no entanto, não tem prosseguimento, pois um
espião nazista infiltrado matou o único cientista detentor da
fórmula do soro.
O primeiro e único supersoldado dos Estados Unidos (cuja
identidade é segredo militar) recebe então um uniforme que
estampa a bandeira de sua pátria. E, como arma, um escudo
quase indestrutível (o que, anos depois, é interpretado como
uma metáfora da política dos EUA de usar sempre o argumento da
defesa do país para justificar a interferência em assuntos
estrangeiros).
Superman, Batman, Mulher Maravilha, O Tocha Humana, a maioria
dos primeiros super-heróis entra na linha de frente da Segunda
Guerra. Namor, “príncipe do Reino Submarino de Atlântida”, que
estreara nos quadrinhos combatendo os “homens da superfície”,
agora integra seu continente às Forças Aliadas, além de
dezenas de outros novos personagens criados dentro do espírito
dos tempos de guerra.
56
Superman, lançado em 1938: um ser de outro planeta que adota a Terra como sua casa, engajando-se
na “luta do bem contra o mal”, um alento durante a recuperação econômica nos EUA da década de
1930. Em suas primeiras aventuras (páginas seguintes), enfrenta políticos corruptos, que colocam em
risco a estabilidade da nação .
57
58
59
Origem “científica” de Superman apresentada em Action Comics n° 1. (Edição Fac Símile Editora Abril).
60
Batman (acima e a seguir) em suas primeiras narrativas, em 1939, por Bob Kane: tramas policiais,
suspense e expressionismo. (Edição Fac Símile Editora Abril).
61
62
63
Wonder Woman, personagem do psiquiatra William Moulton Marston:
a primeira super-heroína de sucesso nos comic books dos EUA.
64
Capitão América: um supersoldado dos Estados Unidos eleva o ânimo contra a ameaça
nazista.A seguir, Namor, o Príncipe Submarino: Atlântida une-se aos Aliados contra o Eixo.
65
66
MIRIM, LOBINHO E, ENFIM, A EBAL
O Grande Consórcio Suplementos Nacionais publica o Suplemento
Juvenil até a primeira metade da década de 1940. Em suas
maiores tiragens, vende 360 mil exemplares, um recorde na
imprensa da época.
Em 1937, a publicação desperta o interesse de Roberto Marinho.
O diretor de O Globo propõe a Aizen uma parceria para
publicação de HQs. Adolfo recusa. Meses depois, chega às
bancas O Globo Juvenil, o jornal de quadrinhos de Marinho.
Aizen ainda perde, pouco depois, o direito de publicação de
alguns de seus principais heróis, como Flash Gordon e Jim das
Selvas. Os mesmos foram adquiridos pelo Globo Juvenil, que
oferece melhores preços para os representantes da venda dos
títulos.
Em 1938, diante do aumento da concorrência, Adolfo Aizen
decide que é o momento de expandir os negócios. Neste ano,
viaja em lua-de-mel aos Estados Unidos, onde novamente toma
contato com as últimas novidades da crescente indústria das
histórias em quadrinhos, além de adquirir novos equipamentos
para o Grande Consórcio Suplementos Nacionais.
67
“Em Nova York, Aizen comprou uma rotativa tipográfica
quatro cores, com o propósito de agilizar a impressão do
Suplemento Juvenil e dos títulos que pretendia lançar. O
editor descobriu um novo formato de publicação que surgia
mo mercado americano e que seria perfeito para as
pretensões de expandir sua editora. Era o comic book, que
chegava para aposentar em definitivo o tablóide,
predominante entre as publicações do gênero. (...) Os
comic books traziam outra novidade: as aventuras
completas em quadrinhos, em vez dos episódios semanais
dos jornais, uma tradição de décadas. Como acontecia nos
Estados Unidos, esse tipo de revista iria, a médio prazo,
dominar o mercado brasileiro de quadrinhos e decretar a
morte do tablóide durante a década de 40. O pioneirismo,
mais uma vez, coube a Aizen, que no dia 16 e maio de 1939
lançou uma revistinha de 32 páginas chamada Mirim, o
primeiro comic book nacional.“
(JUNIOR, Gonçalo. 2004, p. 66-67).
Pouco depois, Adolfo Aizen lança mais um título de quadrinhos
no mercado nacional: O Lobinho. O nome da publicação é uma
resposta ao lançamento, por Roberto Marinho, de O Globo
Juvenil, considerado um plágio por Aizen, pelo uso da
expressão “ji5Sp. Ao sercepor á[()6(lrinh(mais um tcomoho, de )Tj/TT1a )Tj-0.00010J0.2575 T0 Td((O Lobinho)Tj/TT2610J0w 4.2 0 dolfo regma ora. is um tonal: )Tj/TT1 5.9w 32.475 0 Td(O Lobinho)Tj/TT2 1 T1-0.00010J380.23934J0w 4.2 0 inviab de de O Globo
68
Os super-heróis dos “Anos de Ouro” também chegam à editora de
Roberto Marinho, que lança em O Globo Juvenil personagens como
o Capitão Marvel. Já Assis Chateaubriand, dos Diários
Associados, publica, em O Guri, Capitão América, Tocha Humana
e Namor. Assim, os super-heróis dos EUA, no começo dos anos
40, vivem seus “anos de ouro” também no Brasil.
Mas o início da década também traz crescentes dificuldades
para Adolfo Aizen. A Segunda Guerra aumenta os custos do
papel. Surgem mais problemas de distribuição e atrasos do
pagamento de fornecedores.
A situação do Grande Consórcio Suplementos Nacionais torna-se
então insustentável. Em 1942, Adolfo Aizen vende a empresa
para o governo Getúlio Vargas.
Nos anos seguintes, circula por várias redações até tomar a
decisão de começar um novo negócio, aos 38 anos. Recorre
novamente a João Alberto Lins de Barros para que o ajude a
conseguir financiamento no Banco do Brasil, reunindo assim
capital para montar a editora (JUNIOR, Gonçalo. 2004).
Em 18 de maio de 1945, Adolfo Aizen cria a EBAL. Neste
momento, Aizen pensa em editar literatura. O editor já havia
sofrido, durante os anos de sucesso do Suplemento Juvenil,
perseguições e condenações de setores conservadores da
sociedade, os quais viam nos “gibis” uma influência nociva
para os mais jovens. Mas Adolfo Aizen rende-se novamente às
HQs, que conhece tão bem. Afinal, desde o Suplemento Juvenil,
elas mostram-se em condições de oferecer um melhor, e muito
mais rápido, retorno financeiro.
A primeira revista de histórias em quadrinhos a sair com o
selo da EBAL, em julho de 1947, é O Heroi, com aventuras de
personagens de aventura, como Sheena e Kionga.
69
Em 1947, publica o primeiro título de super-heróis da editora:
Superman – o de maior longevidade editorial na EBAL,
circulando até 1983, em várias séries, edições em preto e
branco e coloridas, além de diversos formatos.
Nos anos 50, os maiores sucessos da EBAL, ao lado de Superman
e Batman – cuja revista própria é lançada em 1953 – são os
mocinhos do faroeste (adaptados para os quadrinhos dos filmes
de tanto sucesso entre a garotada da época), assim como era o
caso de Tarzan, além das quadrinizações de romances da
literatura mundial.
Assim, somente quase uma década depois do lançamento de
Superman nos EUA, é que o personagem ganha, no Brasil, seu
primeiro título próprio. O segundo super-herói a ganhar um
título regular na editora é Batman, em 1953.
Os dois personagens, durante a década de 1950, são os únicos
super-heróis com títulos próprios na EBAL, concorrendo em
popularidade com as revistas de mocinhos do faroeste – cujo
sucesso, entre outros motivos, deve-se à extensa filmografia
sobre o assunto, adorada pelos jovens da época, situação
semelhante aos quadrinhos de Tarzan, também entre os mais
lidos.
Ao longo dos anos 50, a EBAL investe seus esforços na
publicação de adaptações de temas históricos e literários do
Brasil, assuntos “sérios”, o que tem por objetivo mostrar como
os quadrinhos poderiam contribuir positivamente para a
formação das crianças.
“Adolfo Aizen tinha muito orgulho dessas revistas, que davam
prestígio para a editora”, lembra Eugênio Colonnese
(entrevista, 2004), artista italiano radicado no Brasil, que
70
desenhou a quadrinização de A Proclamação da República para a
EBAL.
Tais títulos são fundamentais na estratégia de Aizen de
legitimar a publicação de quadrinhos no País. De acordo com
Álvaro de Moya (entrevista, 2003):
“Quando o Adolfo Aizen comprou a coleção ‘Classics
Ilustrated’, e começou a publicar em português aqui no
Brasil, ele teve a idéia de comprar também os direitos dos
escritores daqui para fazer versões nacionais de quadrinhos
de autores brasileiros. Nossa orientação era ser o mais fiel
possível ao texto. Achávamos que se fizéssemos adaptações
muito de vanguarda seria até negativo. Era preciso respeitar
muito o texto, para fazer com que a Academia Brasileira de
Letras, os críticos e a imprensa entendessem que os
quadrinhos também poderiam ser usados de uma forma
educacional. Assim, tínhamos a preocupação de fazer uma coisa
‘acadêmica’, com ilustrações bem-comportadas, mexendo o
mínimo possível no texto original dos autores.”
No Brasil, nos anos 40 e 50, educadores, políticos e
religiosos condenam os gibis por, supostamente, levar à
“preguiça mental”. Isso ocorre ao mesmo tempo em que, nos
Estados Unidos, os comic books são taxados por psiquiatras
como causadores de “delinqüência juvenil”.
Adolfo Aizen defende em artigos, entrevistas e campanhas a
importância educativa dos quadrinhos, argumentando que as HQs,
na realidade, estimulam o hábito da leitura. Assim, suas
publicações mostram um cuidado especial no uso correto da
língua portuguesa.
O jornalista e escritor carioca Sérgio Augusto também é um
apaixonado pelos quadrinhos desde a infância. Ele lembra que
seu primeiro contato com a literatura aconteceu justamente por
meio da Edição Maravilhosa, da EBAL: "Lia as adaptações e
depois procurava os textos originais para descobrir detalhes
que não apareciam nas HQs". (entrevista, 2003). Sérgio Augusto
recorda ainda a expectativa com que aguardava os presentes de
Natal, na forma de HQs. O jornalista conta:
71
"Meus pais compravam os famosos almanaques de quadrinhos,
edições volumosas e cheias de histórias, algo fascinante. Os
‘tesouros’ eram embrulhados e guardados no armário de casa, às
vésperas da festa. Adorava então passar os dedos nos pacotes
para sentir o tamanho da lombada das revistas e assim imaginar
o que me esperava”.
De acordo com Naumim Aizen, filho de Adolfo Aizen, que
trabalhou por décadas na editora do pai, até ser seu diretor
(entrevista, 2003):
“De 1945 a 1995, levando-se em conta que cada geração
corresponde a um período de dez anos (o Dicionário
Aurélio afirma serem 25 anos), foram pelo menos cinco
gerações de meninos e meninas que leram as revistas em
quadrinhos e as edições da EBAL. Posso citar alguns.
João Guimarães Rosa era fã de Mindinho e Edição
Maravilhosa. José Guilherme Merquior, de Edição
Maravilhosa. Fernando Freire, filho de Gilberto, lia
avidamente Epopéia. O compositor Juca Chaves tinha a
coleção completa de Mindinho. Jorge Amado, José Lins do
Rego, Vianna Moog, Barbosa Lima Sobrinho e muitos outros
elogiaram o trabalho da EBAL, sendo que os dois
primeiros queriam ter suas obras quadrinizadas. O
primeiro insistiu muito para que AA aproveitasse o
sucesso de Gabriela, Cravo e Canela e a adaptasse a esse
novo gênero de Literatura e pedia para que comprássemos
os direitos de diversos romances brasileiros. Durante a
sua longa existência, a EBAL editou revistas para os
mais diversos públicos, o que faz com quem várias
gerações (como disse, pelo menos cinco) lessem e
conhecessem a sua obra”.
QUADRINHOS, PRECONCEITO E CENSURA
O pouco espaço que os super-heróis têm entre os títulos da
EBAL nos anos 50 não é algo que ocorre ao acaso. Afinal, nos
Estados Unidos, esse gênero de publicação atravessa grave
crise no período, sendo considerado praticamente “em vias de
extinção”.
Depois da Segunda Guerra, os super-heróis deixam de interessar
às novas gerações de leitores de comic books. Personagens como
o Capitão América (criado para lutar contra Adolf Hitler)
parecem ter perdido a sua razão de ser no mundo formado após o
término do conflito.
72
Centenas de títulos do gênero são cancelados nos EUA. Restam
poucos títulos regulares, entre eles, alguns dos personagens
mais antigos, como Superman, Batman e a Mulher-Maravilha.
Outros gêneros conquistam os leitores dos anos 50, como os
quadrinhos de horror, especialmente aqueles que combinam o
aventuras de terror com alusões sexuais e desenhos que
insinuam as formas femininas. Os comic books de terror, muito
mais ousados do que os dos super-heróis, são cada vez mais
sucesso de público.
Nos anos 50, a Guerra Fria cria nos Estados Unidos a chamada
caça às bruxas do macarthismo (expressão que evoca o senador
norte-americano Joseph Macarthy), que levou à perseguição de
intelectuais e artistas considerados “subversivos” pelo
governo.
Neste contexto político e social, os quadrinhos também são
vistos como um “perigo” para a segurança dos Estados Unidos,
por difundirem entre os jovens “valores contrários” ao “modo
de vida americano”.
Os comic books são taxados então como uma influência nociva
para as crianças, capazes de formar “delinqüentes juvenis”, o
que leva o assunto para discussão no Senado dos EUA.
Grupos religiosos conservadores e políticos promovem atos de
incineração pública de revistas de histórias em quadrinhos.
Nesse contexto, é decisiva na perseguição aos comic books a
publicação do livro A Sedução dos Inocentes do psiquiatra
Frederic Wertham, no final da década de 1940, o qual, por meio
do acompanhamento de hábitos entre jovens delinqüentes,
apontou uma relação direta entre o fenômeno da violência
juvenil e a leitura de histórias em quadrinhos.
73
De acordo com a professora Sonia Bibe Luyten (entrevista,
2003):
“Trata-se de um marco de toda espécie de preconceito
contra as HQs. Sem falar que muitas revistas dos anos 50,
como a Seleções Reader’s Digest’, divulgaram artigos que
atacavam os quadrinhos. Esses textos tinham muita
penetração nos lares e fizeram a cabeça de pais e
professores”
Os principais grupos editoriais de comic books aceitam
submeter suas publicações a um código de censura, formalizado
como Comics Code Autorithy.
De acordo com código, os personagens devem servir como um
exemplo a ser seguido pela juventude, o que leva à proibição
de assuntos entendidos como não-recomendáveis aos mais jovens,
entre eles, quaisquer imagens de horror, violência, alusões
sexuais e comportamentos considerados “fora do padrão”.
É adotado um selo do código de censura, a ser estampado na
capa da revista como uma “aprovação oficial do seu conteúdo”.
Na prática, os comic books que não aceitam se submeter ao selo
de aprovação do conselho do Comics Code Autorithy têm sua
comercialização proibida em supermercados e grandes magazines
dos EUA, os principais pontos de venda das revistas em
quadrinhos no país.
A principal vítima do código são as revistas de terror, em
especial, da EC Comics, cujos títulos, de forma cada ver
maior, disputam a liderança na venda de comic books nos
Estados Unidos. As restrições também atingem os super-heróis,
os poucos que ainda restam nos EUA, limitando seus conteúdos
aos padrões do código de censura.
74
Na virada dos anos 40 para os 50, a maioria dos títulos de super-heróis é cancelada. Histórias de
horror e com insinuações eróticas (página a seguir) são sucesso entre os jovens leitores. Os títulos
provocam polêmica e condenação por seu conteúdo depravado de acordo com setores
conservadores dos EUA.
Acima, The Haunt of Fear 19. Junho 1953
75
Phantom Lady, Abril 1948.
76
Incineração pública de revistas em quadrinhos nos EUA (Nebraska, 1954):
linguagem proibida. (Comics, Comix and Graphic Novels: a history of comic art, 1996. p. 68).
77
Seduction of the Innocent, de Fredric Wertham: marco na perseguição aos comics.
78
Selo do Comic Code Authorith:
aprovação moral para venda de revistas de histórias em quadrinhos.
79
Superman em 1957: censura e regras de mercado impõem “bom comportamento” aos super-heróis.
80
DÉCADA DE 1960: PERSONAGENS PROBLEMATIZADOS
As restrições impostas na década de 1950, no entanto, não
esgotam as possibilidades criativas dos autores de comic
books.
Para o editor de quadrinhos norte-americano Mike Gold,
responsável pela série DC´s Greatest Stories (de republicação
de histórias clássicas dos super-heróis da editora, publicada
no início da década de 1990) esse cenário, por contraditório
que possa parecer, teve como conseqüência o esforço dos
artistas em criar histórias, dentro dos limites impostos, as
quais, ainda assim, conseguissem despertar o interesse dos
leitores. (GOLD, Mike, 1990, p.6-14).
Assim, mesmo com todas as regras estabelecidas, jovens
artistas e veteranos profissionais do meio encontram, a partir
do final dos anos 50 e, particularmente, ao longo da década
seguinte, diversas novas formas narrativas e de conteúdo para
as histórias em quadrinhos. O que acaba por ampliar, de
maneira antes inimaginável, os horizontes da indústria de
comic books.
“A revolução dos comic-books, ao longo dos anos 60,
reuniu um fértil manancial criativo de autores
veteranos, em uma segunda juventude, a jovens capazes de
se expressar com precoce maturidade. A uns e outros
deve-se um histórico ciclo de ficção, possivelmente
irrepetível”
(COMA, Javier. “Mais forte do que a vida”, in COMA, Javier
(org). Historia de Los Comics. Espanha: Toutain Editor, p.
775, s. d.)
O marco desse processo é apontado, de acordo com a maioria das
obras de referência sobre o assunto, como o lançamento, em
81
1957, de uma nova versão para o super-herói Flash, um dos mais
populares dos “Anos de Ouro”.
Resultado de uma parceria entre o editor Julio Scharwtz e o
artista Carmine Infantino, a concepção que norteia a recriação
de Flash, o torna reconhecido como o primeiro super-herói da
chamada “Era de Prata”, renovando os quadrinhos do gênero por
meio de um traço ágil, em sintonia com efeitos e imagens
típicas do cinema da época.
Este processo de renovação da linguagem dos comic books vive o
seu apogeu na década de 1960 e início dos anos 70, não por
acaso um período de grandes transformações culturais e de
comportamento. Por meio da editora Marvel Comics Group,
escritores e artistas como Stan Lee, Jack Kirby e Steve Ditko
lideram a criação de uma nova linhagem de personagens.
“No começo dos anos 60 a Marvel Comics lançou no
mercado uma série de heróis que tinham algumas
características muito diferentes dos heróis que os
haviam precedido: em poucas palavras, os novos heróis
tinham problemas pessoais. Batman e Superman (da DC
Comics) haviam sido personagens que não experimentavam
mais problemas do que derrotar o criminoso de plantão:
nada de problemas de sobrevivência, sentimentais, assim
como nada de complexos estranhos”
(BARBIERI, Daniele. 1998, p. 221.)
Personagens como o Quarteto Fantástico, o Homem-Aranha, Hulk,
Namor, Thor, Homem de Ferro, Demolidor, lançados no início dos
anos 60, são superseres tão fantásticos quanto seus
antecessores no que se refere às suas habilidades especiais.
Os novos super-heróis trazem uma concepção inédita na
elaboração de suas aventuras, em termos gráficos e de roteiro.
Sua dimensão ficcional é diferente, incluindo dúvidas
existenciais e fraquezas humanas. Diversamente de seus
82
antecessores, os super-heróis da década de 1960 questionam-se
sobre a “luta do bem contra o mal”.
O mesmo processo ocorre com o Capitão América, “revivido” nos
anos 60, só que como um personagem desl 2oda dseu tempo,se
83
Consciente ou inconscientemente, muitas vezes por metáforas,
ou “artimanhas” de roteiro, esses criadores transcendem a
censura vigente, ganhando a empatia das novas gerações.
Hulk, um ser monstruoso e verde criado após um acidente
nuclear, alude ao medo da bomba atômica, que tanto marcou a
Guerra Fria. Em suas tramas, é incompreendido pela sociedade e
perseguido pelo exército – uma situação que não seria aceita
pelo código de censura, “uma imagem negativa do exército”, mas
que se justificava no roteiro com o argumento de que os
militares estavam mal informados sobre a criatura verde.
Enquanto o exército persegue Hulk, a mídia e a polícia são
implacáveis com o Homem-Aranha. O herói, um jovem que adquire
poderes aos ser picado por uma aranha radioativa (novamente a
temática nuclear), não é reconhecido como tal em suas sagas.
Pelo contrário, é quase sempre marginalizado.
Mesmo quando a censura se impõe, há artistas que, por meio da
metáfora, conseguem ultrapassar os limites impostos à criação.
Um caso especial nesse sentido é a página final de uma
aventura do agente secreto Nick Fury, um ex-combatente da
Segunda Guerra, personagem coadjuvante das histórias do
Capitão América.
Seu autor, Jim Steranko, termina a história com uma cena que
mostra Fury e sua namorada, abraçados apaixonadamente (nada
explícito, mas com evidente alusão sexual). O quadrinho foi
censurado. Steranko então substituiu o desenho original do
último quadro pela imagem de um revólver enfiado no coldre.
Como disse depois o artista ao documentário Comic Book Super
Heroes Unmasked, “jamais uma metáfora foi tão explícita”.
84
Em meados dos anos 60, a revista norte-americana Esquire,
publica reportagens sobre a crescente popularidade dos
personagens da Marvel entre os universitários dos Estados
Unidos.
Entre outros registros, a revista apresenta depoimentos de
alunos que identificam personagens como Hulk e o Homem-Aranha
com as figuras de líderes contestadores da época.
De acordo com Bradford W. Wright, em Comic Book Nation – The
Transformation of Youth Culture in America:
“A edição da Esquire de setembro de 1966 publicou uma
reportagem sobre o fenômeno Marvel nos campi das
universidades dos EUA. Entre as cartas recebidas diariamente
pela redação da editora mais de 225 eram de estudantes
universitários. (...) Por que os comic books da Marvel eram
tão populares no campus? A revista Esquire entrevistou alunos
de todo o país. Um estudante, de longos cabelos, da Sourthern
Illinois University, dizia-se identificado com Hulk porque o
personagem ‘era contra as instituições’. Já um barbudo aluno
da Stanford University citou O Homem-Aranha como o seu
favorito porque o herói ‘era perseguido, tinha problemas de
falta de dinheiro, e vivia em crise existencial. Ele é um de
nós’. (...)Em 1965, uma sondagem em universidades conduzida
pela Esquire já revelara que estudantes radicais colocavam
Homem-Aranha e Hulk ao lado de figuras como Bob Dylan e Che
Guevara, entre os ícones revolucionários dos quais mais
gostavam.”
(WRIGHT, B., 2003, p. 223. Tradução livre)
A ascensão do “Universo Marvel”, ao longo dos anos 60, é um
momento de inflexão da indústria, cujos de desdobramentos têm
conseqüências até os dias de hoje nas histórias em quadrinhos.
A maior rival da editora, a National (futura DC Comics) vê-se
obrigada a reagir. Personagens coadjuvantes são modificados,
com a introdução de temas já abordados na Marvel, o que foi
concebido pelo editor Julio Scharwtz como “dar um toque DC aos
novos super-heróis” (WRIGHT, B., 2003. tradução livre)
85
Experiências bem-sucedidas, como as novas histórias de
Arqueiro Verde e Lanterna Verde que inserem temáticas como
problemas sociais e drogas, até então evitadas, mostram que é
possível sim modificar e renovar as narrativas e conteúdos dos
antigos personagens da editora.
Assim, na virada da década de 1960 para a de 70, surgem novas
versões para os mais clássicos – e justamente por isso, até
então quase nada modificados - super-heróis da National/DC:
Superman e Batman, cujas tramas tornam-se mais elaboradas,
abordando temas antes ignorados.
Superman, O Homem de Aço – assim definido há décadas em suas
aventuras – reconhece-se então impotente para resolver todos
os problemas de um mundo atolado em crises, guerras e pobreza.
Já Batman, cuja caracterização nos anos 50 e 60 realçava o
lado cômico das histórias, ganha novamente seu aspecto sombrio
original, agora destacado em aventuras mais realistas,
violentas, nas quais o mal não parece ser fruto apenas dos
“vilões”, mas de todo um processo social degenerativo.
E assim por diante, os antigos super-heróis da National/DC
ganham uma nova roupagem. Robin abandona a parceria com Batman
para estudar na universidade. Passa ainda a integrar uma
equipe de super-heróis adolescentes, os Novos Titãs. Supermoça
e a Mulher Maravilha ganham versões inspiradas na “mulher
emancipada dos anos 60”, demonstrando mais “atitude” em suas
histórias.
A representação da figura feminina nos quadrinhos de super-
heróis, depois de feita de maneira tão “casta” nos anos 50,
agora, na virada dos 60 para os 70, também muda radicalmente -
para os padrões até há pouco vigentes - com jovens e vilãs
superpoderosas desenhadas de maneira a valorizar as formas
femininas.
86
Showcase Presents The Flash 4, outubro de 1956.: início da renovação formal das narrativas de super-heróis ,
que se tornou conhecida como a “Era de Prata” das histórias em quadrinhos. Página seguinte: desenho de
Carmine Infantino em que o autor se utiliza do efeito cinemascope, recurso cinematográfico comum ao final dos
anos 50.
87
The Flash 130, agosto de 1962. Arte de Carmine Infantino.
88
Estréia de Fantastic Four (Quarteto Fantástico), de Lee e Kirby, novembro de 1961: marco da “Era Marvel” dos
comic books.
89
O Coisa (The Thing): primeiro super-herói a odiar sua condição especial.
90
Hulk, por Jack Kirby e Stan Lee, início dos 60. Guerra Fria e medo do holocausto nuclear representados nos comics de
super-heróis.
91
Spider-Man (Homem-Aranha), super-herói adolescente perseguido pelo público e mídia conquista
jovens leitores.
92
The Spider-Man 68, janeiro de 1969: protestos na universidade entram no cotidiano do personagem. Arte da
capa: John Romita.
93
Hulk, em 1971: manchete da revista norte-americana Rolling Stone.
94
Página final de aventura do agente Nick Fury, desenhada por Jim Steranko. A tira final da aventura,
insinuando a paixão entre os personagens, foi vetada. A última tira mostra a solução gráfica encontrada pelo
artista para refazer a seqüência vetada (tira anterior):uma arma no coldre. “Jamais uma metáfora foi tão
explícita”, disse Jim Steranko.
95
Acima e a seguir: Lanterna Verde e Arqueiro Verde renovados ao final da década de 1960 pela dupla de
autores O’Neil e Adams. Suas narrativas introduzem temas sociais e políticos de maneira até então jamais vista
na editora de Superman e Batman. (Editora Opera Graphica)
96
97
Fascículo da obra Historia de Los Comics (organizada pelo espanhol Javier Coma): edição discute as
transformações ocorridas nas representações dos super-heróis entre os 60 e 70: “Superheroes Traumatizados”
98
CAPÍTULO 3
SUPER-HERÓIS DA EBAL, ANOS 60 E 70
Capa da aventura em que o Homem-Aranha depara-se com o fracasso: super-herói não impede morte da
namorada pelo vilão. História de Gerry Conway. Arte de Gil Kane e John Romita. Episódio, para diversos
leitores, considerado como o fim da “inocência nos quadrinhos de super-heróis”.
(Revista O Homem-Aranha n° 55, 1ª série, outubro de 1973, EBAL).
99
100
I
nício da década de 1970: a EBAL desponta no cenário nacional
de publicações como a grande editora brasileira dos super-
heróis das HQs dos EUA, tomando as bancas de jornais com
dezenas de títulos protagonizados pelos super-heróis dos
comics books. Adolfo Aizen detém então os direitos de
publicação das principais editoras do gênero, a National
(futura DC) e a Marvel, entre outras. A lista de revistas é
liderada pelos personagens de maior tradição – Superman e
Batman, há décadas entre os mais populares da EBAL.
Os dois heróis são estrelas de diversos títulos regulares
próprios: Superman (em preto e branco), Superman Especial em
Cores, Superman-Bi (P & B), Batman (P & B), Batman Especial em
Cores, Revista O Homem de Aço apresenta: Os Amigos do Super-
Homem - Míriam Lane e Jimmy Olsen (P & B), além de Invictus,
com aventuras dos dois super-heróis juntos (P & B), o qual
ganharia depois uma versão em cores.
Sobre esta revista, recorda Otacílio D'assunção, Ota, autor e
editor de histórias em quadrinhos, que trabalhou na EBAL do
começo dos anos 70, ainda garoto: “Nesta época, a Invictus
vendia mais do que os títulos de Superman e Batman”.
(entrevista, 2005).
101
No começo dos anos 70, além dos personagens consagrados, não
faltam novidades em termos de revistas de super-heróis.
Em especial, as publicações da EBAL dedicadas aos personagens
da Marvel (sucesso nos desenhos animados norte-americanos
exibidos pela TV brasileira da época), como Capitão América,
Hulk, Namor, Thor e O Homem de Ferro.
Estes foram os primeiros super-heróis daqueles criados por
Stan Lee e artistas da Marvel no início dos anos 60 a serem
lançados no Brasil, por Adolfo Aizen, a partir de 1967.
Nos anos seguintes, outros personagens do chamado “Universo
Marvel” ganham títulos também pela EBAL, como as revistas O
Demolidor, Estréia! – Quarteto Fantástico e O Homem-Aranha.
As novidades da EBAL, no começo dos anos 70, ainda abrangem
publicações da National/DC, entre elas, as novas versões para
personagens já tradicionais, como o Gavião Negro, um novo
Superboy, a revista Bonita – A Nova Supermoça, outra Mulher
Maravilha (em As Aventuras de Diana), Elektron, Flash, a Turma
Titã (grupo de adolescentes do qual participa o agora
universitário Robin), entre muitos outros.
ENFIM, SUPER-HERÓIS EM CORES
Os super-heróis são publicados pela EBAL em edições mensais,
bimestrais, extras e especiais, sem falar nos tradicionais
almanaques de fim de ano. Além da variedade, destaca-se a
qualidade gráfica das revistas. Em particular, as edições em
cores dos títulos mais populares da EBAL – uma novidade da
editora iniciada em 1969, depois da maioria da concorrência já
utilizar a impressão em cores.
102
Em alguns casos, como a linha de HQs Disney da Editora Abril
(responsáveL por algumas das maiores tiragens de revistas de
quadrinhos da época no Brasil) o procedimento editorial era
adotado há décadas. Isso sem falar na revista O Guri, lançada
por Assis Chateaubriand ainda no início de 1940, reconhecida
como a primeira publicação nacional de HQs em cores.
A EBAL, salvo em raras edições especiais, manteve, até o final
da década de 1960, a publicação em preto e branco como padrão
para a grande maioria de suas revistas de histórias em
quadrinhos (mesmo se, como ocorria na maioria dos títulos, os
originais fossem coloridos).
Quando lança, enfim, suas edições em cores, a partir de 1969,
o faz em grande estilo, produzindo revistas de histórias em
quadrinhos que marcam época no cenário editorial do Brasil,
dada sua qualidade gráfica. Superman, Batman, Superboy,
Capitão América, entre outros, são alguns dos protagonistas
das primeiras revistas coloridas de super-heróis da EBAL,
publicadas sob a denominação “Edição Especial em Cores”.
As publicações são impressas em papel de boa gramatura. A capa
é feita em papel cartonado plastificado. O tamanho adotado
para a nova linha de revistas segue o formato-padrão da EBAL,
cerca de 18cm x 27cm, pouco maior do que o dos comic books.
Na realidade, os títulos em cores de super-heróis da EBAL –
que se multiplicam e vivem seu auge primeira metade da década
de 1970 – possuem um acabamento editorial muito superior ao
dos originais norte-americanos impressos na época. Aliás,
ainda na década de 1970, nos Estados Unidos, e até quase final
dos anos 80, os comic books continuam a ser publicados com o
“miolo” em papel-jornal barato colorido, envolto por capas
brilhantes (fórmula consagrada desde o final da década de
1930).
103
Nos anos seguintes, a EBAL amplia o número de revistas em
cores, com lançamentos, entre outras, de Shazam (com as
aventuras do Capitão Marvel agora publicadas pela National),
Tarzan Coleção Lança de Ouro (com histórias do personagem de
Edgar Rice Burroughs agora editadas pela National, numa série
desenhada por um dos mais reconhecidos artistas dos comic
books, Joe Kubert), Origem dos Heróis, Supermoça, Mulher
Maravilha em As Aventuras de Diana, entre outras. Já no caso
da Marvel, o título colorido do Capitão América, em 1972, é
substituído pela versão em cores do Homem-Aranha.
“MELHORES GIBIS DO MUNDO”
“No começo da década de 1970 a EBAL era a editora que imprimia
as melhores revistas de super-heróis do mundo”, afirma Franco
de Rosa, autor e editor de histórias em quadrinhos
(entrevista, 2005).
Circunstâncias técnicas e editorias estão envolvidas na
decisão da EBAL em investir nesta linha de publicações
coloridas – que permaneceria em circulação, com suas
principais características, até meados de 1976, quando a
editora adotou o chamado “formatinho” (cerca de 13,5cm x
20,5cm). Até aí, a única perda de qualidade gráfica das
revistas em cores em relação às primeiras edições foi o
término da plastificação das capas nos títulos regulares. O
editor Franco de Rosa comenta essas publicações (entrevista,
2005):
“A EBAL era a preferida por todos devido ao respeito
que a editora possuía pelos seus produtos. Ela sabia
valorizá-los. Também era muito ordeira quanto à
periodicidade. E sabia distinguir e valorizar os
formatos. O que não sabíamos é que a EBAL só imprimia
seus gibis coloridos em papel off-set porque suas
máquinas impressoras eram muito antigas, e só
conseguiam fazer isso naquele tipo de papel ou cuchê,
que é muito mais caro, e era reservado a muitas capas.
Por causa disso, a EBAL acabou por criar clássicos
104
para colecionadores. E na década de 1970 era a editora
que melhor imprimia gibis de super-heróis no mundo.
Com qualidade insuperável. Seus gibis em preto e
branco eram impressos em rotogravura. Também um
processo antigo. E só dava pra imprimir em duas cores.
Por isso alguns deles saíram em preto e magenta
(Solar) e preto e verde (Hulk).”
Já o pesquisador e autor de histórias em quadrinhos Gazy
Andraus (entrevista, 2005) lembra que tomou contato com as
edições em cores da EBAL já na fase e que a editora imprimia
em formatinho.
“Entre meus 8 e 12 anos eu lia poucas histórias da EBAL,
como Korak, Homem-Aranha, Batman e Super-Homem
principalmente, nos formatos grandes, preto e branco e
coloridos, quando eu saía de férias de São Vicente (onde
resido) para Minas Gerais, na casa de meus primos. Há um
cômodo pequeno abarrotado de revistas e gibis, tanto de
humor como super-heróis, e como meus primos são na
maioria mais velhos que eu, eles compravam estas
revistas, inclusive Mandrake e Fantasma, os quais eu não
tinha muito interesse por causa dos desenhos. Os que me
fascinaram na infância e juventude, foram os títulos
coloridos principalmente, do Batman desenhados por Jim
Aparo. Depois me interessei por Neal Adams. A verdade é
que meu gosto pelo desenho se ampliou a partir de meus
treze anos, quando passei a me interessar mesmo por gibis
de super-heróis. O que mais me causa boas lembranças são
os tamanhos grandes das revistas editadas pela EBAL, bem
como a qualidade do papel, na fase em que passaram a ser
coloridas. Eu pegava as revistas, ia lendo, e depois
reabsorvia página a página, quadro a quadro, desenho a
desenho, elegendo meus desenhistas preferidos, e então me
dava uma vontade prazerosa de desenhar de memória
personagens e situações similares às vistas nas revistas
(inclusive nas capas-trailers). Coisa de quem tinha
vontade mesmo de ser desenhista, vencer as dificuldades
da perspectiva e anatomia, mas também de tentar “imitar”
o estilo que mais agradava. Aliás, esta questão de estilo
e gosto pelo desenho e cada estética de desenhistas
distintos, não foi ainda muito questionado e estudado em
nossa civilização. O prazer que me dava em desenhar
depois de ver, e a vontade, era algo quase que beirava um
“vício”, que precisava ser realizado!”
CHAMADA GERAL
Em 1970, a EBAL celebra seus 25 anos de atividade de maneira
ruidosa.
105
Entre outras iniciativas para comemorar a data, publica uma
edição especial do título Epopéia denominada Chamada Geral
(texto de Pedro Anísio e desenhos de Eugênio Colonnese).
O álbum reúne, em uma “visita imaginária à EBAL”, os super-
heróis mais conhecidos da época, além de personagens clássicos
de HQs e figuras da história nacional, “nossos heróis”, como
são apresentadas na narrativa personalidades como Pedro
Álvares Cabral e Tiradentes. A revista é distribuída
gratuitamente para os leitores que recortassem um selo
publicado nas contracapas das publicações da EBAL.
106
Superman Especial em Cores nº 28, julho de 1973 (EBAL)
107
O Homem-Aranha em Cores n° 3, maio/junho de 1974 (EBAL)
108
Batman Cores n° 26, dezembro de 1972 (EBAL)
109
Capitão América Cores n° 9, novembro/dezembro de 1973 (EBAL)
110
AIZEN E A NOVA “ONDA” DOS SUPER-HERÓIS
Se na primeira metade da década de 1970 a EBAL torna-se a
editora do Brasil mais identificada com os super-heróis das
histórias em quadrinhos – uma marca registrada da editora para
gerações de leitores –, tal cenário, no entanto, dificilmente
seria imaginado apenas dez anos antes.
Em 1960, o mercado brasileiro de revistas de HQs tem apenas
três títulos regulares de super-heróis. Dois deles, os mais
antigos, são justamente da EBAL: Superman, circulando
mensalmente desde 1947, e Batman, publicado desde 1953.
O terceiro título de super-herói da época é O Capitão Marvel,
publicado por Roberto Marinho. O Capitão Marvel havia sido
proibido de circular nos EUA em decorrência do processo movido
pela editora de Superman, que o acusara de plágio. No Brasil,
porém, Roberto Marinho deu continuidade ao título de grande
público cativo, utilizando-se da reedição de histórias
antigas, além de publicar novas aventuras para o personagem,
elaboradas por artistas brasileiros de maneira anônima.
No começo da década de 1960, os títulos Superman e Batman
figuram entre as revistas que mais vendem pela EBAL. Em termos
globais, porém, os super-heróis ainda são minoria entre os
títulos da editora.
À época, a EBAL publica regularmente dezenas de títulos de
histórias em quadrinhos dedicados a diferentes gêneros. Os
temas versam desde o faroeste (repleto de “mocinhos” de
sucesso, até o humor dito “infantil”, como Mindinho (com
histórias de Pernalonga, entre outros), além de inúmeras
adaptações históricas e literárias, nacionais e estrangeiras.
111
Em 1965, a EBAL lança seu terceiro título regular de super-
heróis, Superboy, com “as aventuras do Homem de Aço quando
garoto” – as quais inicialmente foram publicadas no Brasil
como histórias complementares nas revistas mensais de Superman
e Batman. O pedido para publicação de uma revista própria para
Superboy era “constante” nas cartas enviadas à editora, como
destacou Adolfo Aizen na contracapa de Superboy 1 (1ª série,
1965): “a pedidos dos nossos leitores”.
Em 1966, mais três revistas da EBAL chegam ao mercado. São, na
realidade, versões bimestrais (com o dobro de páginas, 64) das
três edições mensais de super-heróis: Superman-Bi, Batman-Bi e
Superboy-By. Ainda assim, em 1966, o catálogo de super-heróis
da EBAL restringe-se a apenas seis títulos regulares, além das
edições especiais. No entanto, a partir de 1967, e ao longo de
mais de uma década, a EBAL vem a lançar dezenas de outros
títulos protagonizados por super-heróis, tornando-se, no
período, a grande editora do gênero no Brasil.
“Os super-heróis tomaram o lugar dos heróis do faroeste”,
recorda Naumim Aizen, filho de Adolfo Aizen e editor e diretor
da EBAL (entrevista, 2003).
SUPER-HERÓIS SHELL: MARVEL NO BRASIL
O ano de 1967 é o marco dessa trajetória editorial, que
influenciou gerações de jovens leitores brasileiros. É neste
ano que chegam ao Brasil as histórias em quadrinhos do
“Universo Marvel” – enfim, seis anos depois da estréia do
Quarteto Fantástico, em 1961, nos Estados Unidos.
Na realidade, antes de impressos, os personagens da Marvel
tornaram-se inicialmente conhecidos no país por meio de um
outro veículo de comunicação de massa, a televisão (que vivia
então enorme expansão nacional).
112
Em 1966, estúdios norte-americanos produziram uma série de
desenhos animados adaptados de alguns dos mais populares
super-heróis da época, justamente personagens da Marvel, como
Capitão América, O Homem de Ferro, Hulk, Namor e Thor.
As animações, basicamente, eram remontagens de quadros
originais das HQs dos personagens. E os desenhos chegaram à TV
do Brasil antes dos comics.
Roberto Guedes, em Quando Surgem os Super-Heróis, comenta o
lançamento (2004, p. 88):
“A crescente popularidade dos super-heróis Marvel os
levou à televisão. Em 1966, a ABC Network começou a
produzir desenhos animados do ‘Capitão América’, ‘Thor’,
‘Hulk’, ‘Homem de Ferro’ e ‘Namor’. Um ano depois, já
eram sucesso nacional e internacional, sendo lançados no
Brasil através de uma ação conjunta da Rede Bandeirantes,
a editora carioca EBAL e os Postos Shell (patrocinador
oficial). Embora com uma animação rudimentar, os desenhos
tinham um charme todo especial, pois a arte era retirada
dos próprios gibis e as histórias eram praticamente as
mesmas das revistas. Assim sendo, conseguiram captar a
essência, a atmosfera e o espírito do Universo Marvel. “
Os representantes, no Brasil, dos direitos autorais dos super-
heróis da Marvel procuraram a EBAL para que ela fosse a
editora de seus personagens no país, de acordo com depoimento
de Naumim Aizen.
“Eles nos disseram que já fazíamos um trabalho excelente com
os super-heróis das outras editoras, e, portanto, queriam que
a EBAL publicasse as histórias da Marvel”, conta Naumim Aizen.
(entrevista, 2003).
Os protagonistas das primeiras revistas da EBAL dedicadas aos
novos personagens da Marvel são Capitão América, Hulk, Namor,
Homem de Ferro e Thor.
113
Estampadas como o número “zero”, os títulos são distribuídos
pela rede de postos de gasolina Shell. As novas revistas,
batizadas pela propaganda como “Super-heróis Shell”, são as
seguintes: Título Capitão Z, com aventuras do Capitão América
e O Homem de Ferro, título Super X (estrelado por Hulk e
Namor), e Álbum Gigante (Thor).
A notícia do lançamento é veiculada na TV, além das revistas
EBAL, cartazes e outras iniciativas. A empreitada ainda reuniu
outras empresas, como a Atma, que lança bonecos de super-
heróis feitos de plástico vulcanizado, um “objeto de desejo”
para os garotos que viam os desenhos e liam as HQs.
Não foram poucos, desta maneira, os garotos que mobilizaram
seus pais nos dias que antecederam o lançamento das primeiras
edições, distribuídas para aqueles que abastecessem seus
carros nos postos da Shell.
Giovanni Danilo Voltolini, empresário da área contábil, que se
tornou leitor da EBAL no início dos anos 60, lembra desses
dias (entrevista, 2005):
“Em São Paulo, a divulgação foi muito grande, pois a TV
Bandeirantes começou a passar os desenhos. Era um tal de
passar todos os dias nos postos de gasolina – ia andando
mesmo - para saber se as revistas já tinham chegado” .
Os personagens são lançados em novas séries de títulos já
existentes, uma prática costumeira de Adolfo Aizen. Outra
característica editorial sua era o de começar uma nova série
de revistas para uma publicação que atingisse o seu centésimo
número.
114
A publicação do “Universo Marvel” no Brasil passa, desta
maneira, a alimentar o imaginário de uma nova geração de
leitores brasileiros de histórias em quadrinhos, apresentando
personagens diferentes dos tradicionais.
É o caso do editor Franco de Rosa, que começou a colecionar
revistas de super-heróis justamente em 1967, quando a EBAL
lança as primeiras revistas Marvel no Brasil. De alguma
maneira, o garoto viu naquelas histórias algo que não era o
mesmo. De acordo com Franco de Rosa (entrevista, 2005):
“Os super-heróis da Marvel eram diferentes. Só depois é
que fui saber que o Stan Lee colocou a proposta de vida
cotidiana e problemas humanos nos seus super-heróis. Para
mim, quando contava com onze anos, quando comecei a ler
‘Capitão América’, ‘Homem de Ferro’, ‘Thor’, ‘Hulk’ e
‘Príncipe Submarino’, apenas percebia que as histórias
eram diferentes daquelas de ‘Batman’ e ‘Superman’ que eu
também havia lido. A Marvel apresentava realmente um novo
universo aos apreciadores de super-heróis. E quem gostava
do gênero, acompanhava as histórias no conjunto. Comprando
e colecionando todos os títulos. Porque os personagens
secundários e os vilões apareciam em todas as revistas. Os
coadjuvantes e os vilões da Marvel eram tão interessantes
quantos os heróis. E também os heróis todos faziam
aparições esporádicas nas histórias dos outros. Naquele
mundo de fantasia Nova York era uma cidade onde as pessoas
caminhavam olhando para o alto, sempre vendo algum super-
herói em ação. Eu possuía um hábito maluco. Colecionava as
histórias ‘back ups’. Sempre arrancava as páginas finais
dos gibis. Colecionando e encadernando as aventuras curtas
que completavam as revistas.”
Nos anos seguintes, outros personagens Marvel são lançados
pela EBAL, mas com suas aventuras remontando às histórias
iniciais dos personagens, publicadas no início dos anos 60 nos
Estados Unidos.
Um problema editorial enfrentado pela EBAL ao iniciar a
publicação dos super-heróis Marvel no Brasil foi a cronologia
interdependente que ocorria nos títulos de Stan Lee.
115
A EBAL, quando iniciou, em 1967, a produção das revistas dos
super-heróis da Marvel utilizou histórias recentemente
lançadas nos Estados Unidos (justamente porque muitas delas
correspondiam aos desenhos animados exibidos então no Brasil).
”Acho que foi uma decisão muito acertada. Afinal, os garotos
conheciam identificam os desenhos com os novos quadrinhos”,
conta o editor Roberto Guedes (entrevista, 2004).
Com o advento do “Universo Marvel”, cada vez mais, as
histórias passaram a serem feitas em continuação, estendendo-
se por diversas edições.
Mas quando suas histórias começarem a sair pela EBAL, a
editora tinha como tradição (fato várias vezes comentado nas
cartas do diretor) a publicação de histórias completas. O que,
aliás, era há décadas a “fórmula editorial” adotada pelos
comic books dos EUA.
Como as histórias dos diferentes personagens Marvel tinham
tramas entrelaçadas, com ações ocorridas em um título tendo
conseqüências em um outro, a não-obediência à cronologia
original dos seus personagens dificultava a compreensão dos
leitores.
A vida da Marvel na EBAL foi muito curta quando comparada ao
período de publicação dos super-heróis da National/DC. O
Homem-Aranha, personagem Marvel de maior vida editorial na
EBAL, teve publicadas 70 revistas de seu título próprio,
entre 1969 e janeiro de 1975, pouco menos de seis anos. Já
Superman, da National/DC, foi publicado 35 anos de forma
ininterrupta pela EBAL, entre 1947 até 1983 (o que faz dele o
título de HQ de super-heróis de maior longevidade no mercado
brasileiro até a atualidade).
116
Mesmo assim, por cerca de oito anos, a editora de Aizen
publicou para o leitor brasileiro muitas das narrativas
seminais e mais marcantes do período em que a Marvel – por
meio de Stan Lee, Jack Kirby, Gil Kane, Steve Ditko, Gene
Colan, entre diversos outros artistas cada vez mais
reconhecidos nos dias de hoje – renovou o gênero dos super-
heróis dos quadrinhos, com histórias, personagens e imagens
que se inserem na mitologia urbana ocidental do século 20,
num processo que se estende até os dias de hoje.
117
Propaganda da Shell sobre o lançamento dos super-heróis Marvel no Brasil pela EBAL:
identidade com o público jovem.
Página seguinte: anúncio da EBAL destacando “os heróis na fossa”: Namor e Hulk.
118
119
QUARTETO FANTÁSTICO: HERÓIS PÚBLICOS
A equipe de super-heróis O Quarteto Fantástico, lançada em
1961, nos EUA, por Stan Lee e Jack Kirby, é responsável pelo
início do “Universo Marvel”.
No Brasil, porém, o título não integrou a promoção dos “Super-
Heróis Shell” da EBAL, de 1967.
Somente em 1969 o Quarteto Fantástico inicia suas aventuras no
Brasil, primeiramente na revista de O Demolidor, ganhando
publicação própria em janeiro de 1970 (sob o título Estréia).
A demora deveu-se ao fato do Quarteto Fantástico não fazer
parte da primeira série de desenhos animados da Marvel.
E quando iniciou as aventuras do grupo no Brasil, em histórias
complementares na revista O Demolidor, a editora optou por
publicar o material desde o início. A revista do Quarteto não
teve longa vida, sendo editada pela EBAL até o número 21 (de
novembro/dezembro de 1971).
Mesmo assim, a EBAL publicou algumas dezenas de histórias que
integram justamente os 102 números iniciais do título
Fantastic Four nos Estados Unidos, fase da revista considerada
um dos mais significativos trabalhos da parceria San Lee e
Jack Kirby.
“Essas 102 revistas constituem uma obra única, singular,
seminal, na história dos comic books”, diz o artista Michael
Allred numa entrevista à revista norte-americana Wizard
33(1999, p.84. tradução livre).
O Quarteto Fantástico é uma equipe constituída quase que como
uma família. Além disso, o grupo tem como característica
120
singular não esconder as identidades reais de seus membros da
sociedade. São os primeiros super-heróis públicos (o que,
observado numa perspectiva histórica, representa de alguma
maneira as mudanças de comportamento das pessoas diante dos
novos meios de comunicação do século 20).
O grupo não vive em uma cidade imaginária, como Metrópolis, de
Superman, e Gothan City, de Batman. Seu quartel-general está
localizado, isto sim, no centro de Nova York, em meio à
conhecida paisagem de arranha-céus da megalópole dos EUA. O
edifício, constantemente, é cercado pelos fãs. De certa
maneira, eles são ídolos pop da juventude dos anos 60, tal
como aconteceria ao longo da década com outro quarteto, este
de Liverpool, The Beatles.
São características inéditas até então para o gênero dos
super-heróis das HQs. Seus antecessores, os mais famosos, como
Superman e Batman, tinham como mandamento a regra de que os
super-heróis deveriam permanecer anônimos. O ocultamento da
identidade real do personagem justificava-se, em suas
narrativas, por motivos de segurança - o que também pode ser
associado à idéia básica que norteou a criação dos primeiros
super-heróis, a noção de que o “bem” não apenas deve ser
praticado, mas deve sê-lo feito de maneira gratuita,
desinteressada, portanto anônima.
Particularmente, O Quarteto Fantástico marca a mudança da
representação dos super-heróis, antes personagens que faziam o
bem de maneira anônima, escondida sob uma identidade secreta,
para sua apresentação como figuras públicas, reconhecidos como
“celebridades” de um mundo em que é cada vez maior o impacto
da mídia e das novas tecnologias tecnologia no cotidiano da
sociedade urbana.
121
Como “celebridades”, tornam-se alvo de exploradores, e
conhecem a gangorra da exploração da mídia pelo sucesso e
fracasso dos nomes que fascinam o grande público, além de
enfrentarem problemas muito próximos da realidade.
Reed Richards é o Senhor Fantástico, o qual tem o poder de
esticar seu corpo a limites desconhecidos; Sue Storm, sua
esposa, a Mulher Invisíve; seu irmão, Jonny Storm,o Tocha
Humana – numa versão para o personagem dos anos 40, um
andróide que entreva em chamas. Completa a equipe Ben Grimm (o
Coisa, um ser de grande força mas disforme, assustador, talvez
o personagem mais complexo do grupo, por seu drama pessoal).
Para Bradford W. Wright, em Comic Book Nation – The
Transformation of Youth Culture in América: “Jamais um comic
book havia apresentado a idéia de que possuir o poder de um
super-herói significaria alienar-se da espécie humana”
(WRIGHT. 2005, tradução livre).
Outro problema que interfere nas tramas da equipe está o fato
de que de que combater o crime (ou ainda “ameaças cósmicas”)
exige enormes quantias de dinheiro.
Em uma de suas histórias publicadas pela EBAL, o Quarteto
Fantástico da EBAL encontra-se sem condições de pagar o
aluguel do edifício onde está instalada sua base. A solução
para evitar o despejo é aceitar um convite para filmar em
Hollywood. Conflitos superados durante a produção, a fita
torna-se sucesso de público e crítica (como é apresentado em
ilustração a seguir).
Em 1972, a EBAL perde os direitos do Quarteto Fantástico para
a GEA (Grupo de Editores Associados). Trata-se de uma pequena
editora paulista que lança apenas três edições do grupo, além
de mais algumas edições estreladas por outros personagens
122
Marvel: O Homem de Ferro, Namor e Demolidor. Os títulos da GEA
são impressos em papel jornal colorido e capas bastante
semelhantes aos originais comic books.
Em 1973, o Quarteto Fantástico volta para a EBAL. Agora,
complementando a revista O Homem-Aranha (a mais popular dos
super-heróis Marvel da EBAL), que passa a ter 64 páginas
(números das edições).
Será no título do Homem-Aranha que o Quarteto Fantástico terá
publicada no Brasil uma série de aventuras consideradas,
atualmente, o ápice criativo da dupla Jack Kirby e Stan Lee à
frente do grupo. Muitos leitores apontam a saga em que o
Quarteto Fantástico enfrenta o devorador de Mundos Galactus, e
seu arauto, o Surfista Prateado, como o momento maior das
histórias do grupo. A saga foi publicada pela EBAL em O Homem-
Aranha 63, de 1974 (cerca de oito anos depois de seu
lançamento nos EUA). A última aventura do Quarteto pela EBAL
saiu em O Homem-Aranha 69, de dezembro de 1974.
123
O Quarteto Fantástico 13 Estréia, página 25, janeiro 1971 (EBAL): super-heróis como “celebridades”
124
O Coisa: um super-herói alienado da condição humana. O Homem-Aranha 65, agosto de 1974(EBAL).
125
Quarteto em O Homem Aranha 64, página 45 : quadrinhos épicos
126
Experiência gráfica de Jack Kirby: Quarteto em O Homem-Aranha 65, página 58, agosto 1974 (EBAL).
127
HOMEM-ARANHA: IDENTIDADE COM OS JOVENS
O Homem-Aranha estreou no Brasil na revista estrelada por Thor
(em O Álbum Gigante, nº 11, 1968). A capa da edição anunciava
um “herói diferente”. Enfim, chegava ao Brasil o mais popular
super-herói da Marvel, cujas características o tornaram
sucesso entre os jovens da época (num processo que continuaria
nas décadas seguintes, até colocar o Homem-Aranha num patamar
de igualdade aos mais clássicos super-heróis de todos os
tempos, Superman e Batman).
Lançado em 1962 por Stan Lee e Steve Ditko, em sua identidade
comum, o herói é um estudante, Peter Parker, problemático,
tímido, de difícil relacionamento social e sempre sem
dinheiro. Torna-se fotógrafo e descobre que pode utilizar uma
máquina fotográfica – pendurada com suas teias – para
registrar imagens do Homem-Aranha em ação. Fotos que vende
para o dono do jornal que mais odeia o super-herói, que usa da
imagem do super-herói (sempre denegrida em editoriais) apenas
para aumentar suas vendas.
Entre outras histórias do Homem-Aranha publicadas pela EBAL,
destacam-se algumas do período inicial do personagem, com
roteiro de Stan Lee e desenhos de Steve Ditko. Em uma delas
(republicada anos depois), o Homem-Aranha derrota o vilão
Homem-Areia (recolhido por um aspirador – o humor era uma das
características de suas aventuras).
Mas o super-herói havia se esquecido de sua câmera para
registrar a ação. A necessidade de vender suas fotos, porém,
faz com que ele manipule a realidade, recriando o combate com
terra jogada ao ar. O personagem não mostra maiores escrúpulos
em recorrer ao estratagema, afinal, aquele dinheiro serviria
para a resolução de seus problemas domésticos, o que, em sua
128
concepção, torna a “montagem” fotográfica um ato legítimo de
sua parte.
O Homem-Aranha, costumeiramente, é perseguido pela polícia
(mesmo se fazendo “o bem”) e visto negativamente pela
sociedade em geral. Em uma de suas histórias publicadas pela
EBAL, um vilão passa-se por Homem-Aranha para incriminar o
super-herói. A estratégia rende resultado, com o Homem-Aranha
sendo declarado “ameaça pública”. Sem entender o que ocorre, o
Peter Parker imagina-se com a personalidade dividida, ou algo
assim, recorrendo à ajuda de um psiquiatra (de quem depois
foge com medo de revelar sua identidade secreta).
Em números posteriores, a arte de John Romita e Gil Kane
trouxe uma abordagem mais dramática e sombria para o
personagem. Os roteiros tornaram-s então mais realistas, com a
introdução de temáticas como comentários críticos à Guerra do
Vietnã, problemas estudantis e uso de drogas entre os jovens.
Um dos principais amigos de Peter Parker, Harry Osborn, vive o
drama do vício, sendo retratado em quadrinhos que mostram o
personagem vivenciando alucinações provocadas pelas drogas.
A seqüência de histórias que envolvem a morte da namorada de
Peter Parker pelo Duende Verde, assim como sua injusta
condenação promovida pela imprensa são um exemplo do uso do
monólogo teatral, recurso de linguagem que caracteriza os
personagens problematizados do período.
“Homem-Aranha virou uma autêntica novela, que teve como
ponto culminante a morte de Gwen Stacy, a namorada do
herói. E suas conseqüências, onde o vilão Duende verde,
que matou a mocinha é destruído pelo Aranha. Fatos jamais
antes experimentados nos quadrinhos. Totalmente
arrrebatador.”
(ROSA, Franco, entrevista, 2005)
129
O Homem-Aranha vai ao psiquiatra: O Homem Aranha 9 dezembro 1969
130
Homem-Aranha enfrenta Homem Areia em aventura marcada pelo humor. (Página seguinte): O herói (e fotojornalista),
ao perceber que não registrou as imagens da luta, não sente receio em simular a realidade, fotografando uma
montagem feita pelo próprio do recente combate (transformado em notícia). A imagem jornalística como manipulação
da realidade. História de Stan Lee. Arte de Steve Ditko.
Revista O Homem-Aranha n° 58, janeiro de 1974, páginas 61 e 62 (EBAL).
131
132
O Homem Aranha 64 Julho 1974
133
O Homem Aranha 45,dezembro 1972, página 40: drogas surgem nos quadrinhos de super-
heróis.
134
CAPITÃO AMÉRICA: UM HERÓI ANACRÔNICO
O Capitão América ressurge nos quadrinhos dos anos 60 também
pelas mãos de Stan Lee e Jack Kirby. Para “explicar” o seu
desaparecimento nas décadas anteriores, os artistas criam uma
história na revista do grupo de heróis Os Vingadores, na qual
a referida equipe encontra, em meio a uma missão nos+ extremos
do mundo, o corpo do Capitão América congelado e preservado
por enormes geleiras.
Graças ao soro que havia tomado, o Capitão América permanece
vivo durante as décadas de congelamento. Revivido, o herói
passa a integrar o grupo dos Vingadores e logo ganha aventuras
próprias. No entanto, ele não é mais o mesmo personagem, o
soldado que tinha certeza de sua missão, que acreditava em seu
discurso. É Justamente este período de histórias do personagem
que é publicado no Brasil pela EBAL.
Sentindo-se deslocado em um mundo diferente do que vivera,
cheio de novidades tecnológicas e comportamentos “estranhos”,
ele ainda carrega a culpa pela morte de seu jovem companheiro
Buck, ocorrida num dos últimos combates da Segunda Guerra.
Perseguido pelos fantasmas do passado, sem entender o mundo da
Guerra Fria, no qual vê compatriotas seus – em especial as
novas gerações – saindo às ruas para protestar contra a Guerra
do Vietnã e pedir pela paz mundial, o Capitão América entra em
crise existencial.
Antes, como soldado, sua única missão era lutar por seu país.
Mas no final dos anos 60, ele já não sabe mais qual é a sua
tarefa. Os mais jovens debocham da sua figura ao se depararem
com cartazes de antigos ídolos do cinema ao lado da imagem do
Capitão América. A rebeldia toma o lugar da certeza da guerra,
e o soldado não sabe mais lidar com isso.
135
Talvez o momento mais marcante desta fase do personagem seja
uma seqüência de histórias escritas por Stan Lee e desenhadas
por Gene Colan no final dos anos 60 e começo dos 70, como nas
páginas dos trechos de histórias reproduzidos a partir da
página seguinte.
136
Capitão América Cores 2, julho 1970 (EBAL): “super-herói dinossauro” (acima e a seguir)
137
138
139
NOVOS SUPERMAN E BATMAN NA EBAL
A virada dos anos 60 para os 70 é o momento em que, nos
Estados Unidos, a DC Comics reage – por meio de seu editor
Julius Scharwtz – ao crescimento cada vez maior da Marvel no
mercado de quadrinhos. Um processo que abrange experiências
com personagens coadjuvantes, como O Desafiador, passando por
Lanterna Verde e Arqueiro Verde, até chegar à renovação de
Superman e Batman, particularmente, no começo da década de
1970.
Novamente coube à EBAL o pioneirismo de ter lançado pela
primeira vez no Brasil muitas das histórias mais
significativas da época.
O editor e artista Franco de Rosa, que leu as histórias dessa
época em seu lançamento no Brasil, comenta as transformações
dos antigos super-heróis. (entrevista, 2005):
“Felizmente a DC Comics seguiu a trilha inovadora da
Marvel e adaptou seus personagens para o tipo de histórias
mais realistas, implantadas por Stan Lee. Assim Batman
perde a parceria de Robin, Superman tem seu alter ego
Clark Kent reformulado, passando a ser um repórter de TV,
Diana, a Mulher Maravilha perde seus poderes, e passa a
atuar como uma agente especial. Lanterna Verde e Arqueiro
Verde tornam-se autênticos representantes da filosofia
‘hippie’. ‘Superboy’, ‘Supergirl’, ‘A Legião dos Super-
heróis’, ‘Batgirl’, ‘Robin’ e a ‘Turma Titã’ ganham mais
espaço em histórias antológicas. São os super-heróis
adolescentes que passam a conquistar a atenção do público
leitor na DC.‘A Legião dos Super-heróis’ e ‘Turma Titã’
eram meus títulos preferidos da DC. Os dois gibis eram
publicados pela EBAL em preto e branco. E apresentaram
histórias memoráveis, também porque as vidas comuns dos
personagens, quando não utilizavam super-poderes,
despertavam tanto interesse, ou mais que os seus super-
feitos. (...) A continuidade da Marvel. E os super-heróis
renovados com a Era de Prata, da DC, além de outros, como
da Charlton (‘Judô Máster’) e Gold Key (‘Might Sanson’),
fizeram eu reservar um espaço, cada vez maior para os
super-heróis no meu armário de livros.”
140
Superman é renovado por uma equipe que reúne os desenhistas
Curt Swann e Murphy Anderson, o roteirista Cary Bates e o
editor Julius Schwartz.
Para começar, Clark Kent, repórter da imprensa escrita,
ascende à posição de “âncora” de televisão. E em suas
aventuras, o Homem de Aço (como sempre foi conhecido Superman)
agora demonstra limites no alcance de seus poderes.
Em uma aventura publicada pela EBAL na primeira metade dos
anos 70, Superman chega a se reconhecer impotente para
resolver os problemas de um mundo atolado em crises, guerras e
pobreza (imagens reproduzidas a seguir).
Já Batman, cuja caracterização nos anos 50 e 60 realçava o
lado humorístico das histórias, ganha novamente uma
caracterização sombria. Suas novas aventuras – desenhadas por
Neal Adams e escritas por Dennis O’Neill, e, depois, Bob
Haney, tornam-se mais realistas e violentas.
141
Superman 4ª Série 1, setembro de 1972 (EBAL):
desenho de Neal Adams traz sensualidade inédita ao Homem de Aço.
142
Superman 4ª Série 1 Página 7 (EBAL). Acima e a seguir:
personagem expressa sua impotência diante dos
grandes problemas da humanidade.
143
144
O sucesso dos super-heróis brasileiros ao final dos anos 60
leva a EBAL, no início da década seguinte, a lançar um
personagem brasileiro, O Judoka, um mestre em artes marciais,
que traja uma roupa inspirada na bandeira do Brasil. Outras
editoras lançam então mais super-heróis nacionais, o que
proporciona, por alguns anos, um novo mercado de trabalho
para os quadrinistas brasileiros.
Franco de Rosa, que iniciou sua coleção de quadrinhos de
super-heróis com o lançamento dos personagens Marvel, lembra
que naqueles anos, o universo do gênero para o leitor era
algo amplo, além de um selo editorial norte-americano,
confundindo-se com a própria produção nacional de histórias
de super-heróis da época. (entrevista, 2005)
Não foram só os heróis da Marvel que me fizeram colecionar
os gibis de super-heróis. Também foram ‘Elektron’, ‘Gavião
Negro’, ‘Flash’, ‘Os Justiceiros’ (‘Liga da Justiça’) e
‘Solar’.” E ainda os brasileiros ‘Skorpião’, ‘Fikon’,
‘Super-Heros’ e ‘Pabeyma’ que para mim era o que possuía o
melhor roteiro. Eu não fazia distinção entre brasileiros e
estrangeiros. Para mim super-heróis era um gênero. Eu não
sabia como eram criados os quadrinhos. Gostava das
histórias e dos desenhos.
145
Acima e seguir: Thor em “Aproxima-se Ragnarok!”: quadrinhos épicos e mitologia no mundo dos super-heróis.
História de Stan Lee. Desenhos de Jack Kirby. Arte-final de Vince Coletta. Revista A Maior, 1ª série, n° 20, p. 47 e
54. Junho e Julho de 1972 ( EBAL).
146
147
148
NOTÍCIAS EM QUADRINHOS
Para o editor Roberto Guedes (entrevista, 2004): “Além de bem
cuidadas graficamente, as publicações tinham muito respeito
pelo seu público. O melhor era a seção de cartas ‘Notícias em
Quadrinhos’ publicada nas contracapas das revistas”.
Adolfo Aizen, ao longo da história da editora, desenvolveu o
hábito de conversar com o leitor da EBAL por meio de textos
publicados nas contracapas das revistas.
Entre os anos 50 e 60, o espaço serviu como uma “bancada” de
Aizen em favor dos quadrinhos, no contexto de luta para dar
legitimidade social a esta forma de linguagem, tão criticada
na época. Uma figura gráfica, um bonequinho comprido, era a
representação do diretor da EBAL.
O editor e escritor Fernando Albagli, que trabalhou como
diretor industrial de Aizen, depois de fazer carreira na
editora, lembra a atenção do jornalista com as cartas
recebidas. “Sempre que possível, ele fazia questão de escrever
as respostas”, recorda Albagli (entrevista, 2004).
As páginas endereçadas ao leitor ganharam um novo status
editorial a partir de 1967, com a denominação da página
(sempre na contracapa) como “Notícias em Quadrinhos”.
Além de respostas às questões dos leitores, o espaço
apresentou reportagens de publicações nacionais e estrangeiras
sobre os rumos dos quadrinhos na época – com destaque para as
transformações sofridas pelos super-heróis naqueles anos.
Adolfo Aizen também informava sobre HQs bem-sucedidas de
público, em especial, de autores nacionais, como Maurício de
Sousa (da Turma da Mônica), mesmo se esses fossem publicados
por concorrentes.
149
Nas “Notícias em Quadrinhos” o leitor também acompanhava as
novidades programas pela EBAL para a temporada. Assim como em
1970 foram comemorados os 25 anos da EBAL, com a promoção da
revista Chamada Geral, em 1974, Aizen fez grande divulgação
dos quarenta anos de lançamento do Suplemento Juvenil.
Em 1974, diversas publicações especiais em quadrinhos são
anunciadas para a celebração, algumas sem similares no Brasil
até então: reedições em álbuns de luxo de aventuras clássicas
de Flash Gordon, de Alex Raymond, e Tarzan, de Harold Foster,
além de um álbum dedicado à recontagem da origem de Tarzan,
desenhada por um dos mais renomados autores de super-heróis,
Joe Kubert. Mês a mês, Aizen comenta com seus leitores as
novidades que estão para chegar, com detalhes históricos e
sobre os aspectos gráficos das publicações.
O grande lançamento de 1974, de acordo com o próprio Aizen, é
o álbum de luxo, em formato gigante (aberto mede quase um
metro de extensão), da primeira série das tiras de Flash
Gordon no Planeta Mongo. Editada em formato vertical, para
reproduzir as tiras nas suas dimensões originais, o livro
ganha capa dura, textos introdutórios, além uma edição
minuciosa, como destaca Aizen nas “Notícias em Quadrinhos” (o
que incluiu a restauração das primeiras pranchas de Flash
Gordon feitas por Alex Raymond, algo não-realizado, até então,
mesmo nos EUA e na Europa.
Em 1975, por volta de um ano e meio depois do lançamento do
álbum, as “Notícias em Quadrinhos” estampam, com indisfarçável
orgulho, comentários elogiosos ao álbum Flash Gordon no
Planeta Mongo recebidos de personalidades internacionais do
universo das histórias em quadrinhos, como cartas de Will
Einser e Burne Hogarth, reproduzidas em sua íntegra.
150
151
152
FORMATINHO, ANOS DA QUEDA, E AINDA LANÇAMENTOS
Em 1976 as revistas coloridas da EBAL, justamente seus títulos
mais atrativos, adotam o padrão de impressão em “formatinho”,
a tendência dominante então no mercado nacional. Naumim Aizen
lembra: “Todas as editoras já publicavam em formatinho, o que
tivemos que adotar, pois as revistas em formato grande
tornaram-se caras demais na época”. (entrevista, 2003).
Os super-heróis conhecem nas revistas em “formatinho” o seu
derradeiro período de publicação pela EBAL, o qual se
estenderia até o começo da década de 1980. Mesmo assim, novos
leitores ainda são formados pelos novos títulos lançados na
época, como O Monstro do Pântano, Jonah Hex, O Guerreiro,
Sargento Rock, além dos personagens consagrados pela editora
em suas versões agora em “formatinho”, como Superman e Batman.
Gazy Andraus recorda este tempo (entrevista, 2005):
“Quando comecei a comprar os quadrinhos e super-heróis a
fase já era do formatinho. Da EBAL, eu adquiria Shazam,
Desafiador, Super-Duplas, ficava atrás das HQ da legião
de super-heróis, pela criatividade dos roteiros. Também
lia as revistas da Abril, Heróis da TV, e da RGE,
Almanaque Marvel.
Ainda durante o período do formatinho, a EBAL lança álbuns
gigantes estrelados pelos super-heróis, versões nacionais das
chamadas edições Treasury dos EUA – novamente com uma
qualidade gráfica superior à dos originais dos EUA, entre eles
o primeiro encontro entre personagens da Marvel e DC Comics,
um álbum gigante estrelado por Superman e Homem-Aranha.
“Embora o formatinho tivesse virado padrão, esses álbuns
gigantes eram uma alegria para quem gostava dos super-heróis”,
lembra o jornalista Sidney Gusman (entrevista, 2005).
153
Na segunda metade da década de 1970, no entanto, o poder
econômico da concorrência (grupos de comunicação com outros
produtos, além dos quadrinhos) mina cada vez mais o vigor
editorial da EBAL. A partir daí, a editora inicia sua lenta
retirada do mercado de HQs.
Em 1975, a EBAL perde definitivamente os direitos de
publicação dos personagens da Marvel. A Revista O Homem-Aranha
70 é a última edição da Marvel Comics pela EBAL (tendo
circulado com a data de janeiro de 1975). Depois de divididos
com outras editoras menores, os super-heróis da Marvel deixam
para sempre a EBAL, adquiridos pela Bloch.
Em 1984 termina o contrato da EBAL com a DC. E editora carioca
não demonstra interesse em renová-lo. “A DC queria que
continuássemos a publicar seus personagens, pela tradição no
mercado brasileiro. Mas meu pai decidiu não renovar o
contrato”, lembra Naumim Aizen (entrevista, 2003).
Mesmo sem seus super-heróis, a EBAL ainda atravessa a década
de 1980 lançando títulos de importância para a bibliografia
nacional de história em quadrinhos. A EBAL, no período, por
exemplo, dá continuidade à publicação de álbuns de luxo com
reedições de autores clássicos, com destaque para as coleções
de Flash Gordon e Príncipe Valente.
Adolfo Aizen, dessa maneira, jamais deixa de inovar na
publicação de histórias em quadrinhos no Brasil.
“Li super-heróis quando criança, mas logo me cansei. Procurava
coisas diferentes, fora das fórmulas dos heróis. E a EBAL
também publicou excelentes quadrinhos, nada convencionais,
como a revista AD 2000, Monstro do Pântano e Plop”, diz
Rogério de Campos, jornalista e diretor da editora Conrad
(entrevista, 2005).
154
A partir do final da década de 1960, e até início dos anos 80,
a EBAL lança ainda trabalhos de artistas europeus
contemporâneos, como Esteban Maroto, cujas histórias
apresentam um conteúdo de representação sexual de uma
intensidade jamais vista na história da editora.
No lançamento do álbum Korsar (1980), uma aventura épica e
fantástica de Esteban Maroto, plena de erotismo, Adolfo Aizen
publica artigo de um estudioso que atesta a qualidade do
material apresentado a seguir. No mesmo texto, Aizen deixa
claro que a aprovação de um intelectual de renome para a
publicação de HQs com cenas de sexo, as quais, de acordo com a
análise especializada, “não são pornografia, mas arte da mais
alta qualidade, o que legitima sua publicação”.
Sobre os últimos anos da EBAL, Gazy Andraus comenta
(entrevista, 2005):
“Fui parando de comprar os formatinhos da EBAL, pois além
de serem cada vez menos lançados, estavam meio sem
seqüência, e os da Abril eram melhores nisso (os da Bloch
foram interessantes, mas mal editados e mal coloridos, e
os da RGE eram publicados desorganizadamente). Assim, meu
interesse foi diminuindo cada vez mais, quase certo
também, porque as edições eram em formatinho, e os
desenhos eram prejudicados pelos balões e cores
reticuladas que eram melhores visualizadas nos de tamanho
grande. É claro que só agora tenho consciência disso. Mas
atualmente, olhando para trás, vejo que os gibis da EBAL
foram importantíssimos para minha formação atual,
inclusive pela qualidade e seriedade com que eram
publicados, pois levavam o leitor a sério, e isso fica na
conscientização de uma criança e adolescente, mesmo que
intuitivamente.”
155
Almanaque Super-Homem e o Homem-Aranha 1977 (EBAL)
156
Quadrinhos ingleses na EBAL: Ano 2000.
157
Korsar, de Esteban Maroto, pela EBAL: 1980.
158
Ampliação de quadrinhos do álbum Korsar: sensualidade inédita na EBAL
159
160
CAPÍTULO 4
ICONOGRAFIA E IMAGINÁRIO:
LEITORES E COMENTÁRIOS
Super-homem: personagem, mito e representação. Capa de Superman 19(EBAL, 4ª Série, março, 1974).
161
162
163
As entrevistas realizadas ao longo desta pesquisa trouxeram
dados valiosos e serviram de pano de fundo para as reflexões
e análises sobre os super-heróis e sua publicação pela EBAL,
entre meados dos anos 60 e 70. Em todas as entrevistas
aparece uma recorrência: a leitura dos quadrinhos pontuou,
exerceu influências (as mais variadas) sobre a vida de cada
um. Por isso, este capítulo final tem como proposta
apresentar um quadro de vivência pessoais, entremeadas de
iconografias, de leitores das publicações da EBAL:
164
“EU QUERIA QUE OS OUTROS VISSEM O QUE EU VIA”
“As HQs publicadas pela EBAL deixaram marcas indeléveis
culturalmente, inclusive emocionalmente, e ajudaram, para o
bem ou para o mal, na estratificação de uma cultura baseada
em HQs de super-heróis, da qual eu também fiz parte. O
aspecto do tipo de papel, as cores, as variedades de títulos,
roteiristas e desenhistas (estes principalmente com seus
estilos díspares) me levaram a buscar um ideal nos desenhos,
que estava atrelado ao etilo da época (anos 70 e 80). Os
roteiros de ficção-científica de ‘Super-Homem’ e atrelados à
ciência de ‘Flash’ e ‘Elektron’, bem como os detetivescos e
místicos, como os de ‘Batman’, ‘Monstro do Pântano’ e ‘Demon’
também me fizeram enriquecer culturalmente. Até hoje me
lembro que, no colegial, vivia apontando a alguns amigos –
que não davam muita importância aos gibis – uma HQ do
“Batman” em que o “Elektron” entra em seu ouvido, passando em
vários locais existentes da anatomia, descrevendo-os através
de fala e desenhos de Jim Aparo. Aquilo me marcou! Acho que o
meu interesse em fazer uma tese mostrando as HQs como
informação valiosa vem desse período: Eu queria que os outros
vissem o que eu via.”
Gazy Andraus, doutorando da ECA-USP, artista e pesquisador de
histórias em quadrinhos.
Páginas seguintes: Batman em Cores, 1ª série, n° 56, junho de 1976 (EBAL), trechos da história de capa da
edição. Arte: Jim Aparo.
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“NÃO CONSEGUIA ACREDITAR NAQUILO”
“Os quadrinhos de super-heróis eram indissociáveis da EBAL, a
maior editora do gênero no Brasil em sua época. Os
personagens fascinavam os garotos, cada um tinha o seu
preferido. E o meu era o Homem-Aranha. Ele era diferente. E a
história que mais me marcou, nesta época, foi justamente
aquela em que morre sua namorada. Não era possível acreditar.
Mas era verdade. A garota estava realmente morta. Isso jamais
havia acontecido antes no mundo dos super-heróis.”
Waldomiro Vergueiro, professor da Escola de Comunicações e
Artes e coordenador do Núcleo de Pesquisa de Histórias em
Quadrinhos da USP.
Seqüência da história “O Fim do Duende”, na qual o Homem-Aranha depara-se com o fracasso: super-
herói não impede morte da namorada pelo vilão. Revista O Homem-Aranha n° 55, 1ª série (1974, EBAL).
História de Gerry Conway. Arte de Gil Kane e John Romita.
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“COMO TUDO COMEÇOU”
“Minha história com os gibis começou com uma excursão de
alunos a uma escola de linha norte-americana, onde os
estudantes colocavam coisas sua para venda. Escolhi um gibi,
nada mais, que nem tinha capa, mas cujo personagem me
interessou: era o Lanterna Verde. Por causa desta revista
americana comecei a comprar quadrinhos, assim descobri a
EBAL. Logo descobri outros personagens que também me
marcaram, como O Homem de Ferro, um milionário que se tornava
super-herói graças ao seu dinheiro. Comprava qualquer revista
que me interessasse, sem preocupação em colecionar. Em casa,
minha mãe não se incomodava. Mas certo dia levei na minha
escola uma revista da EBAL chamada Histórias da Casa Mal-
Assombrada, de terror, mas nada pesado. Só que a revista
causou um rebuliço, chamou a atenção da professora, que viu
um aviso na capa que recomendava a revista para adultos. A
professora disse que aquilo não era alguém da minha idade.”
Osni Winkelmann, artista e publicitário.
(A seguir): Misterinho - Histórias da Casa Mal-Assombrada n° 4. Dezembro 1972 (EBAL)
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“ADOLFO AIZEN E STAN LEE”
“Desde o começo da EBAL, Adolfo Aizen desenvolveu o hábito de
conversar com o leitor. Sempre gostei demais das Notícias em
Quadrinhos, que vinham nas contracapas, cheias de
informações, sobre a editora, personagens, artistas, o mundo
dos quadrinhos de uma maneira em geral. De certa maneira,
Aizen foi um precursor de Stan Lee, que, nos anos 60, soube
valorizar a seção de correspondência dos títulos Marvel,
conversando, discutindo, brincando com seus leitores. Esta
forma de se comunicar com o público é algo que me influenciou
muito no trabalho que desenvolvo atualmente como editor de
histórias em quadrinhos.”
Roberto Guedes, editor de HQs e autor dos livros Quando
surgem os Super-Heróis e A Saga dos Super-Heróis Brasileiros
(A seguir) Adolfo Aizen conversa com o leitor da EBAL por meio de sua seção de correspondência, uma das
características que mais identificavam a editora com seu público. Página posterior, capa da revista especial
Chamada Geral, lançada em comemoração aos 25 anos da EBAL, em 1970.
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”AS CAPAS ERAM DECISIVAS NA HORA DE COMPRAR O
GIBI”
“Quando descobri as revistas em quadrinhos não podia me dar
ao luxo de comprar qualquer título. O dinheiro não dava para
isso. Não gostava também de revistas que tinham histórias em
continuação, pois nada me garantia que conseguiria comprar o
próximo número. Assim, na hora da compra, na maioria das
vezes, tomava a decisão sobre qual revista levar escolhendo
pelas capas. Na época, eram comuns as capas-trailer, que
revelavam o conteúdo da história principal.“
Antonio Rodrigues, diretor de arte e publicitário, que afirma
ter encontrado sua carreira profissional por meio dos
quadrinhos da EBAL.
A seguir: capas da EBAL que destacam o conteúdo da trama da história principal da revista.
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Batman Cores 53, março de 1975 (EBAL)
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Superman 3ª Série 97, maio de 1972 (EBAL)
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“PREFERIA O SUPER-HERÓI QUE NÃO ERA TÃO
POPULAR”
“Os gibis de super-heróis da ‘Era de Prata’ foram os que li
quando criança e adolescente. Eles possuem um poder
nostálgico sobre meu coração. Assim, é comum acordar em um
domingo ensolarado, e depois do café, enquanto faço minhas
tarefas domingueiras, acionar um dispositivo em minha mente
onde recordo de cenas destes gibis encantadores. Os gibis de
super-heróis mais memoráveis são aqueles dos três anos de
estréia da Marvel aqui. Com Capitão América, Príncipe
Submarino, Homem de Ferro, Hulk e Thor. E, finalmente, o
Quarteto Fantástico surgia em episódios complementares, que
eu colecionei integralmente. Uma segunda onda trouxe novos
heróis da Marvel em 1969: Homem-Aranha e Demolidor. Que
passaram a ser meus preferidos. O Demolidor me conquistou por
ser ele um jovem cego, porém com poderes complementares muito
interessantes. As primeiras histórias repletas de vilões
exóticos, com histórias transcorridas em situações urbanas de
uma megalópole eram fascinantes. Os desenhos limpos de
Wallace Wood, os elegantes traços de Joe Orlando e depois o
dinamismo do ilustrador Gene Colan fizeram deste super-herói
o meu preferido. Afinal, todo mundo que eu conhecia e lia
gibis lia o Homem-Aranha. Eu preferia colecionar aquele que
não era tão popular e que, de quebra possuía os melhores
desenhos, no caso o de Gene Colan. A quem eu imitava.”
Franco de Rosa, artista e editor de histórias em quadrinhos.
Ao lado, Capitão Z n° 0, primeira revista dos super-heróis Marvel no Brasil.
A seguir, O Demolidor, por Wallace Wood e Gene Colan
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“JAMAIS BATMAN FOI TÃO SELVAGEM E SOMBRIO”
“Jamais Batman, meu personagem favorito, foi desenhado de
maneira tão sombria como fez Neal Adams, na virada dos 60
para os 70, dando fim à caracterização cômica que tanto o
marcara, na televisão e nos próprios quadrinhos dos anos
anteriores. Mesmo com tantos artistas de renome que vieram a
desenhar, décadas depois, Batman, é sua versão de Neal Adams
a que mais me marcou.”
Sidney Gusman, jornalista, editor do site www.universohq.com
Ao lado e a seguir: Batman 3ª série n° 42 (1973, EBAL). “O Demônio Ressuscita”.
História de Dennis O’Neill. Arte de Neal Adams.
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“TUDO COMEÇOU COM OS GIBIS DE AIZEN”
“Quando garoto, vim para São Paulo, nos anos 50, e descobri
os quadrinhos. Mas não podia comprar todas as revistas que
queria. Tomava emprestado, fazia trocas, lia dos amigos. E os
melhores gibis eram os da editora de Aizen. Todos gostavam da
EBAL e sabiam quem era Adolfo Aizen. Muitos anos depois,
quando os negócios melhoraram, comecei a publicar anúncios em
jornais procurando gibis antigos. Não parei mais de
colecionar, procurando tudo aquilo com que sonhava e não
tinha como comprar. E a maior parte da minha coleção é
formada agora pelas revistas da EBAL e as publicações
anteriores de Aizen.”
Antonio José da Silva (mais conhecido pelos amigos como
“Tomzé”), empresário paulista, colecionador que mantém um dos
maiores acervos particulares de HQs nacionais, com cerca de
cem mil revistas.
Algumas peças do acervo de Tom Zé: edições de O Lobinho, Superman e Batman
191
Superman em O Lobinho 36 (março de 1943), de Adolfo Aizen.
192
Superman 1, 1ª série, 1947 (EBAL). Título de maior longevidade de Aizen,
publicado até a primeira metade dos anos 80.
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“CAPITÃO AMÉRICA: PERDIDO EM UMA ÉPOCA QUE AJUDOU A
CRIAR”
“É válido comparar as diversas fases de suas aventuras (a dos
super-heróis), fazendo-se a divisão delas em duas partes
distintas: antes e depois da década de 60 (...) ‘O Capitão
América’ – cujo uniforme é a própria bandeira dos Estados
Unidos – reflete, basicamente, a grande mudança que se operou
na juventude de todo o mundo, particularmente na americana, e,
ao mesmo tempo, a resistência de camadas tradicionais, atadas
ainda à propaganda patriótica governamental. O herói se sente
perdido, numa época que ele mesmo, inconscientemente, ajudou a
criar. Arma da propaganda, mas também recebendo seu impacto,
lembra-se, com nostalgia, do tempo em que a ação – e somente
ela – dominava suas aventuras na Segunda Guerra Mundial.
Passaram-se duas décadas. Ao ser revivido (ficara congelado
num iceberg), encontrou uma guerra diferente. A ação pura, que
era o seu forte, dera lugar à intensificação da Guerra Fria e
da espionagem, ao superdesenvolvimento da guerra de
propaganda, e, principalmente, a uma luta da qual ele estive
sempre afastado – a das idéias.”
Fernando Albagli, em artigo “Os Heróis estão na fossa?” (O
Mundo dos Super-Heróis, editora Vozes, 1971), comentando a
transformação ocorrida na última década nos super-heróis
publicados pela editora.
Páginas iniciais de “O Ferrão do Escorpião”. História de Stan Lee. Desenhos de Gene Colan e Joe Sinnott.
(Revista A Maior n° 5, outubro de 1970, p. 3, 4 e 5. EBAL).
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“REINO ENCANTADO DOS QUADRINHOS”
“Sem dúvida, Adolfo Aizen tinha a chave que abria o reino
encantado das HQs. Com a sua morte, reforçou-se o mito. Para
muito colecionadores que até a virada do milênio veneravam
suas revistas, ele foi uma espécie de senhor do castelo que,
do prédio da EBAL, dava-lhe acesso a um mundo fantástico de
aventura, fantasia e imaginação. Como se só ele tivesse as
chaves. O editor tinha outro mérito: criou uma nova geração
de escritores, jornalistas, poetas, radialistas,
publicitários. Por meio de suas revistas, seduziu-os para o
gosto da leitura.”
Gonçalo Junior, jornalista, autor, entre outros, de A Guerra
dos Gibis – a formação do mercado editorial brasileiro e a
censura aos quadrinhos, 1933-64 (2004, p. 395).
Rosto de Adolfo Aizen desenhado sobre prancha de o Príncipe Valente, de Harold Foster, personagem do tempo
do Rei Arthur considerado um dos preferidos do editor. A homenagem é do artista Eugênio Colonnese.
Reprodução de O Pasquim 21 ( “O Rei dos Quadrinhos”, de Sérgio Augusto. 2002).
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200
201
CONSIDERAÇÕES FINAIS
EBAL: MARCAS E HERANÇAS EDITORIAS
202
Os significados da trajetória da EBAL desdobram-se muito além
da publicação dos super-heróis no Brasil. Durante mais de
quatro décadas, a EBAL exerceu influências variadas em
diversas gerações de leitores, artistas e editores,
contribuindo de forma decisiva, entre outras realizações
editoriais, para dar legitimidade social às histórias em
quadrinhos no Brasil.
Ao longo da história houve roteiristas e desenhistas que
criaram quadrinhos de “super-heróis” (sob grande pressão de
prazos e retorno de popularidade) os quais criaram
representações do mundo de sua época as quais se mostram, cada
vez mais, de relevância cultural – nomes como Jack Kirby, Stan
Lee, Neal Adams, Jim Steranko, Gil Kane, John Romita, Curt
Swann, entre muitos anos.
E nos anos 60 e 70, justamente a época em que esses autores
renovaram os comic books de super-heróis, foi a EBAL a grande
editora do Brasil dessas histórias, agora conhecidas como “OS
Anos de Prata” das HQs dos EUA.
A EBAL publicou e tornou conhecidos para gerações de leitores
brasileiros muitos desses artistas, exercendo variadas
influências.
A partir do enfoque sobre o super-herói problematizado de
meados dos anos 60 e 70 – e suas evidentes relações com o
contexto da social e histórico, foi possível traçar o perfil
de uma editora tão fundamental no mercado brasileiro.
203
Desta maneira, uma das preocupações da pesquisa foi deixar
claro, num esforço de contextualização histórica, de que
maneira os quadrinhos de super-heróis inserem-se num universo
muito maior, que é o da trajetória da EBAL e sua contribuição
para o desenvolvimento da imprensa e do mercado editorial do
Brasil.
É possível entender este momento, o da renovação dos super-
heróis das HQs nas décadas de 1960 e 70, como um ponto de
inflexão na história desta linguagem, definindo em grande o
que vem a ser criado depois, não apenas nos EUA, mas ao redor
do mundo.
Seja como influência, e assim, em última instância, como
repetição meramente comercial de uma fórmula de sucesso já
estabelecida, seja pela procura de narrativas que questionem a
“fórmula” dos super-heróis, a qual torna-se hegemônica no
mercado norte-americano ao longo do século 20.
Super-heróis cujos impactos na indústria cultural, de uma
forma mais abrangente, continuam a ser percebidos nos dias de
hoje. O que é constatado, por exemplo, pela adaptação, cada
vez mais constante, de seus personagens para outras mídias,
como o cinema de Hollywood – que descobriu nas HQs um vasto
veio de roteiros de potencial para novos filmes – passando
pelos games de últimas gerações, até a publicação de antigos
quadrinhos no formato de livros de arte, além da crescente
publicação internacional de obras de referência sobre o
assunto.
Sobre a atualidade das histórias desse período, no que se
refere a suas experiências narrativas, estéticas e temáticas,
é relevante apontar a, cada vez mais freqüente, nos Estados
Unidos e Europa (e aos poucos, aparentemente, uma tendência
também no Brasil), reedição de histórias em quadrinhos
204
consideradas “clássicas” em álbuns de luxo, com textos
introdutórios e restauração de imagens. Nos Estados Unidos,
por exemplo, há grandes coleções com a reprodução das sagas
iniciais de personagens considerados pilares dos chamados
“Anos de Ouro e de Prata” dos comic books.
O mercado editorial brasileiro demonstra, nesse início dos
anos 2000, um interesse crescente, até o presente momento,
pela publicação de livros e obras de referência sobre as
histórias em quadrinhos, escritos por autores nacionais, assim
como trabalhos de escritores estrangeiros. O que,
paulatinamente vem ampliando, cada vez mais, a ainda pequena
bibliografia brasileira sobre o assunto, quando comparada com
a de países como França, Inglaterra, Itália, Espanha e Estados
Unidos.
A dissertação realizada pode perceber os contornos de uma
atividade editorial que se inseria num ciclo industrial e
comercializado cada vez mais complexo, integrando ações de
diferentes mídias: jornal, revista, livros, desenhos animados
no cinema e na TV, promoções publicitárias com grandes
anunciantes. Tudo isso numa antecipação dos mecanismos de
interação entre diferentes mídias e suportes, produzidos por
conglomerados de comunicação. Sintomaticamente, alguns super-
heróis estão exatamente inseridos na indústria da informação,
como conhecidos repórteres e fotógrafos.
Super-heróis que se tornaram mais próximos do mundo, do
cotidiano de seus leitores do mundo contemporâneo, feito de
personagens preocupados, problematizados, traumatizados,
“neuróticos”...
205
“Não fui ensinado a compreender o mundo de
hoje em dia. Talvez os rebeldes estejam
certos. Deveria ter lutado menos e perguntado
mais”
Capitão América (1970, EBAL)
“Infelizmente é verdade! Seriam necessários
milhares de Super-Homens para solver esses
problemas”
Superman (1971, EBAL)
206
207
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março/abril de 1991.
Entrevista com Adolfo Aizen, in Jornal O Pasquim 142, Rio de
Janeiro, edição de 21 a 27 de março de 1972.
“O Rei dos Quadrinhos”, de Sérgio Augusto, in Jornal Pasquim
21, n.º 38. Rio de Janeiro, 05/11/2002.
ENTREVISTADOS
Álvaro de Moya, Eugênio Colonnese, Antonio Rodrigues,
Antonio José da Silva, Fernando Albagli, Franco de Rosa,
Gazy Andraus, Gonçalo Junior, Moacy Cirne, Naumim Aizen,
Osni Winkelmann, Otacílio D'assunção, Roberto Guedes,
Rogério de Campos, Sérgio Augusto, Sidney Gusman, Sonia
Bibe Luyten, Waldomiro Vergueiro.
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