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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA III – CURRÍCULO, CULTURA E SOCIEDADE
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA-TECNOLÓGICA-DIGITAL E PLATAFORMA
LATTES: QUAIS POSSIBILIDADES?
PATRÍCIA DOS SANTOS NUNES
SÃO LEOPOLDO, 2006.
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PATRÍCIA DOS SANTOS NUNES
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA-TECNOLÓGICA-DIGITAL E PLATAFORMA
LATTES: QUAIS POSSIBILIDADES?
Dissertação de Mestrado apresentada como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em Educação,
Programa de Pós-Graduação em Educação, Área de
Ciências Humanas, Universidade do Vale do Rio dos
Sinos - UNISINOS.
São Leopoldo
2006
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PATRÍCIA DOS SANTOS NUNES
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA-TECNOLÓGICA-DIGITAL E PLATAFORMA LATTES:
QUAIS POSSIBILIDADES?
Dissertação apresentada à Universidade do Vale do Rio
dos Sinos como requisito parcial para a obtenção do
título de Mestre em Educação.
Aprovada em 15 de março de 2006.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________
Dr. Attico Inácio Chassot (orientador – UNISINOS)
_______________________________________________________
Dra. Eliane Schlemmer (UNISINOS)
_______________________________________________________
Dra. Julieta Beatriz Ramos Desaulniers (PUCRS)
4
DEDICATÓRIA
Dedico esta dissertação à minha filha, Letícia Nunes dos Santos, que, com sua
existência, me possibilitou olhar o mundo com muito mais alegria, me ensinou o significado
do amor sublime e me concedeu o título mais importante de minha vida: o de MÃE.
5
AGRADECIMENTOS
Ao apresentar a versão final desta disse tação, é preciso agradecer a muitas pessoas que
colaboraram para a sua realização. Durante esta pesquisa, convivi com pessoas que não só
acreditaram na minha capacidade, como também entenderam e respeitaram a seriedade e
importância deste trabalho na minha vida e se dispuseram a contribuir sempre que precisei.
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Primeiramente, agradeço à minha filha Letícia, por existir e ter trazido muita luz e alegria à minha
vida, tornando a realização desta pesquisa uma vitó ia e uma produção ainda mais especial e
significativa.
Ao meu marido, Jeferson Monteiro dos Santos, pelo amor, companheirismo e amizade, pelo incansável
apoio e incen ivo em todos os momentos em que precisei, pelo cuidado dispensado à nossa filha,
principalmente durante a elaboração da versão final desta dissertação
À minha mãe, Lidia, por me ajudar nos momentos difíceis pelos quais passei ao longo do curso, por
ajudar a cuidar de minha filha e, principalmente, pela presença marcante em minha vida, po ter me
ensinado, por meio de seu amor e carinho, a acreditar em minha capacidade e a correr atrás de meus
sonhos.
Ao meu pai Paulo, que sempre me apoiou em minhas decisões e possibilitou meus estudos até este
momento.
À minha cunhada, Milene, que acreditou no meu sonho e possibilitou, com seu apoio incondicional a
realização deste projeto de vida, aqui vai um agradecimento especial pela sua generosidade e
confiança.
Às minhas irmãs, Michelle e Paula, e meu irmão, Alessandro, que são pessoas de vital importância na
minha vida e que me apoia am de diferentes
maneiras ao longo do curso de Mestrado.
Ao meu orien ador, prof. Attico Chassot, pela brilhante orientação, pela paciência e confiança em
mim depositada, pelo apoio, incen ivo e carinho
dispensados a mim e à minha família, um
agradecimento especial.
6
À professora Gelsa Knijnik pelo carinho demonstrado e pela con ribuição intelectual que muito
auxiliou na versão final desta dissertação.
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À professora Eliane Schlemmer, pela importante con ribuição na qualificação do projeto desta
disser ação.
À professora Julieta Desaulniers, por ter aceitado prontamente mesmo sem ter participado da
qualificação, o convite para compor a banca da
sessão de defesa desta dissertação.
À minha colega Leonete Cassol, que, durante as muitas idas e vindas para a Unisinos, se mostrou
uma amiga e colega de inestimável valor
Às minhas colegas de Linha, Paula Henning, Rosália Mello e Delci Arnold, pela ajuda prestada de
diversas formas, pelas discussões teóricas
realizadas, pelas dúvidas e angústias divididas.
À coordenadora pedagógica Cláudia, da Escola Parobé, pelas entrevistas concedidas e por ter
permitido a realização des a pesquisa no turno da
noite da Escola.
Ao professor Dagoberto, por ter cedido espaço no período de suas aulas de Informática da turma
1N1, pelo apoio, pelas intervenções realizadas,
pelas entrevistas concedidas e por ter acreditado
na seriedade desta pesquisa.
Às alunas e aos alunos da turma 1N1 da Escola Parobé, pelo acolhimento, pela disponibilidade
demonstrada ao terem acreditado nesta pesquisa e
por sua contribuição.
Aos professores e professoras do curso de Mestrado, em especial aos
da Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade, pelas contribuições
teóricas que possibilitaram importantes reflexões pa a esta dissertação.
7
Ao Programa de Concessão de Bolsas de Estudo Filantropia –
Mestrado e Doutorado desta Universidade, que financiou parte desta
pesquisa.
8
RESUMO
Esta dissertação tem como objetivo problematizar a experiência pedagógica que
envolveu alunos e alunas de uma Escola de Ensino Médio da rede pública estadual do Rio
Grande do Sul, realizada durante o segundo semestre de 2006. A experiência teve como
lócus
o laboratório de Informática. O objetivo principal foi envolver os estudantes em
atividades que utilizaram como recurso a Internet, mais especificamente, a Plataforma Lattes
do CNPq, com vistas ao processo de
alfabetização científica-tecnológica-digital
dos mesmos,
esta
entendida como a possibilidade de realizar
uma melhor lei ura
de
mundo
, através da
linguagem da Ciência, aliada à
capacidade de lidar com os artefatos tecnológicos
, em
especial a Informática, o que
permi e uma apropriação crítica dos códigos digitais.
Apoiada
em tal concepção, são analisados os enunciados dos alunos, dando o sentido da
pesquisadora para os sentidos dados pelos mesmos à experiência pedagógica vivida. Para
tanto, fez-se necessário investigar o universo que permeia a inter-relação entre Ciência,
Tecnologia, Cultura, Educação e Sociedade. Com esta pesquisa, espera-se contribuir para a
inclusão científica-tecnológica-digital dos agentes envolvidos, criando, através de uma
experiência pedagógica que pode ser vista como uma prática curricular, possibilidades de
exercício de uma cidadania mais crítica.
A dissertação divide-se em cinco capítulos, nos
quais busco responder a questionamentos através de problematizações que envolvem o
universo da temática em questão, aliadas aos tensionamentos da experiência pedagógica
vivida. Apresento, para analisar algumas “
ve dades provisórias
” encontradas durante esta
produção, três unidades de sentido: 1) A alfabetização científica-tecnológica-digital como
instrumento de construção da cidadania; 2) A alfabetização científica-tecnológica-digital
como forma de inclusão (ciber)cultural e social; 3) A Plataforma Lattes como um instrumento
pedagógico na Escola e no cotidiano de homens e mulheres que se envolvem com Ciências.
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Palavras chaves: Alfabetização científica / Alfabetização tecnológica / Alfabetização
digital / Ciência / Cultura / Inclusão / Plataforma Lattes
9
ABSTRACT
This dissertation has as objective to present the problematic of a pedagogic
experience accomplished during the second semester of 2006 involving students of a public
Secondary School of the state of Rio Grande do Sul. The experience had as locus the
school’s Computer science laboratory. The main goal was to involve the students in activities
that used the Internet as resource, more specifically the Lattes Plataform of CNPq, directing
them to the process of scientific-technological-digital literacy. The Internet is seen as the
possibility of achieve a better world understanding, through the language of the Science,
allied to the capacity to work with the technological tools, especially the Computer science,
which allows a critical appropriation of the digital codes. Using such conception, the students'
statements are analyzed, giving the researcher's sense for the senses given by the students
to the pedagogic experience. For this, it was necessary to investigate the universe that
permeates the interrelation among Science, Technology, Culture, Education and Society.
With this study, the hope is to contribute for the scientific-technological-digital inclusion of
involved agents creating possibilities to exercise a more critical citizenship through a
pedagogic experience that can be seen as a practice curricular. This work is separated in five
chapters where the questions are tried to be answered through the presentation of the
problems belonging to the universe of the thematic in subject allied to the ones of the
pedagogic experience. To analyze some "temporary truths" found during this study are
presented three units of sense: 1) the scientific-technological-digital literacy as instrument of
construction of the citizenship; 2) the scientific-technological-digital literacy as (ciber)cultural
and social inclusion form; 3) the Lattes Plataform as pedagogic instrument in the School and
in the day of men and women that work with Sciences.
Key words: Scientific literacy / Technological Literacy / Digital Literacy / Science /
Culture / Inclusion / Lattes Plataform
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Foto da palestra “O que é Ciência?”........................................................97
Figura 2 – Foto dos alunos da turma 1N1 no laboratório de Informática ..................98
Figura 3 - Foto dos alunos e alunas da turma 1N1.................................................108
Figura 4 - Foto dos alunos e alunas do 3º ano do Ensino Médio .............................109
Figura 5 - Foto dos alunos e alunas do 3º ano do Ensino Médio .............................109
Figura 6 – Foto dos alunos e alunas da turma 1N1 no laboratório de Informática.....119
Figura 7 – Foto dos alunos e alunas da turma 1N1 no laboratório de Informática......119
Figura 8 - Foto dos alunos e alunas explorando a Plataforma Lattes.........................123
Figura 9 - Foto da pesquisadora com alunos e alunas da turma 1N1.........................129
Figura 10 - Foto da pesquisadora com alunos e alunas da turma 1N1........................129
11
LISTA DE APÊNDICES
Apêndice A – Informações da Escola Técnica Parobé ...................................................143
Apêndice B – Sistemas de buscas e telas da Plataforma Lattes .....................................145
Apêndice C – Resultado da pesquisa dos estudantes sobre Cesar Lattes .......................149
Apêndice D – Questionário aplicado ao corpo docente da turma 1N1.............................151
Apêndice E – Questionário aplicado aos estudantes da turma 1N1 ................................153
Apêndice F – Instrumento de apoio para buscas na Plataforma Lattes ..........................156
Apêndice G – Questionário aplicado aos bolsistas de Iniciação Científica .......................158
Apêndice H – Instrumento de apoio para buscas na Plataforma Lattes utilizando filtros..160
Apêndice I – Instrumento de apoio para buscas sobre “A Ciência é masculina?” ............163
12
LISTA DE QUADRO
QUADRO 1 - Novas formas de acesso à informação segundo Lévy ............. 62
13
SUMÁRIO
Apresentação
1. Mestrado em Educação: quais tensionamentos? ........................................18
2. Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais pressupostos?..............35
2.1 Ciência e alfabetização científica: quais entendimentos? ........................................36
2.2 Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais necessidades? ............................47
2.2.1 Máquinas e seres humanos: quais limites? ................................................50
2.2.2 Ciência-tecnologia-Educação: quais relações? ............................................58
3. Alfabetização científica-tecnológica-digital e (ciber)cultura: quais
conexões? ........................................................................................................65
3.1 Cibercultura e exclusão: quais ligações? ...............................................................70
3.2 Plataforma Lattes CNPq e Sistemas de Buscas: quais possibilidades? .....................80
3.3 Alfabetização científica-tecnológica-digital e currículo: quais considerações? ...........87
4. Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
caminhos? .........................................................................................................92
4.1 Plataforma Lattes e turma 1N1: quais sentidos? .................................................110
4.1.1 A alfabetização científica-tecnológica-digital como instrumento de construção
da cidadania. ..........................................................................................................112
4.1.2 A alfabetização científica-tecnológica-digital como forma de inclusão
(ciber)cultural e social. ............................................................................................117
4.1.3 A Plataforma Lattes como um instrumento pedagógico na Escola e no
cotidiano de homens e mulheres que se envolvem com Ciências. ...............................121
5. Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
verdades provisórias? ...............................................................................126
Referências ....................................................................................................134
Apêndices .......................................................................................................142
14
Apresentação
Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter a riscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer
Queria ter aceitado as pessoas como elas são
Cada um sabe a alegria e a dor que traz no coração
O acaso vai me proteger
Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr
Devia ter me importado menos
Com problemas pequenos
Ter mor ido de amor
Queria ter aceitado a vida como ela é
A cada um cabe alegrias e a tristeza que vier
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído [...]
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Letra da música Epitáfio - Titãs
Apesar do título ‘Introdução’, estas páginas que os leitores lêem por primeiro estão
sendo as últimas que escrevo, quando quase considero finalizada a versão final desta
dissertação. Ela representa uma realização pessoal que envolve muitos de meus sonhos e
desejos. A defesa deste trabalho me permitirá obter o título de Mestre em Educação. Isso
significa a realização de um projeto em minha vida que teve início no meu primeiro semestre
de graduação (2000/1) e que, durante o período em que fui bolsista de Iniciação Científica
do CNPq, foi devidamente planejado, sistematizado e posto em prática.
Ter ingressado no Mestrado e agora estar finalizando-o é uma conquista que
representa muito para mim em diferentes lugares que ocupo, significando uma realização em
nível pessoal e profissional que se constitui como:
a realização de uma mulher, esposa e mãe que, durante os dois anos como
aluna do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNISINOS, constituiu
família e passou por inúmeros problemas pessoais e dificuldades para terminar
o curso e a dissertação;
a vitória de uma filha, considerando o quanto meus pais batalharam, me
apoiaram e me ajudaram, não sem inúmeros obstáculos, para que eu chegasse
até o Mestrado;
uma necessidade para a minha formação, considerando as salutares e cada vez
maiores exigências para aquelas e aqueles que desejam ser profissionais da
Educação.
15
Entendo que este trabalho não foi realizado de forma isolada. Ele contou com a
colaboração de muitas pessoas: da minha família, que me estimulou e auxiliou sempre que
senti necessidade; de meu marido, que muitas vezes teve que me incentivar, apoiar e me
ajudar nesta empreitada; de minha filha, que, desde a gestação, me encorajava a seguir em
frente através de nosso elo de amor; de meu orientador, guerreiro incansável na busca de
uma alfabetização científica, que muitas vezes precisou me apoiar e me empurrar para a
frente; de professores e professoras
1
do PPGE da UNISINOS que ministraram os Seminários
do curso; de colegas, professores e professoras da Linha de Pesquisa III – Currículo, Cultura
e Sociedade –, que contribuíram de forma ímpar para tal produção, sem esquecer dos
parceiros teóricos que, com suas leituras, também contribuíram na construção desta
dissertação.
Não foi por acaso que escolhi a letra da música
Epitáfio
para introduzir minha
dissertação; embora ela possa ter um tom melancólico ou de lamentação, não foi por esse
motivo que a escolhi. Pelo contrário, ela representa uma vontade de “querer mais”, aliada a
um sentimento de que poderia ter feito mais: queria ter participado de mais eventos,
apresentado mais trabalhos, escrito mais artigos, lido mais autores, participado de mais
discussões teóricas, ido mais vezes à biblioteca, conversado mais com meus colegas e dado
mais risadas nos corredores.
Deveria ter arriscado mais. Deveria ter....
Muitos foram os motivos que me impossibilitaram de fazer mais coisas: dificuldades
financeiras (considerando que cursei o 1º ano do Mestrado sem bolsa), minha gravidez (de
setembro de 2004 a maio de 2005) e o nascimento de minha filha, o melhor presente que
ganhei e que me concedeu o título máximo que uma mulher pode ter, o de MÃE, mas que
também acarretou inúmeras demandas que dificultaram cursar o Mestrado com todo o
empenho que eu havia planejado.
Mas tudo o que vivi, ao longo destes dois anos de Mestrado, foi produtivo, e
entendo que a experiência vivida, além de marcar minha vida e minha trajetória profissional,
serviu para que eu desenvolvesse uma maior sensibilidade e cuidado com a minha pesquisa.
Isso possibilitou que eu atribuísse maior importância para a obtenção do título, pois, com o
nascimento de minha filha, minhas responsabilidades aumentaram, assim como as minhas
esperanças na construção de um mundo melhor, onde se diminuam as desigualdades sociais
1
Demonstro, com essa distinção entre homens e mulheres, que estou atenta às questões de gênero. Apesar de
elas não serem o tema desta pesquisa, os estudos proporcionados pela Linha de Pesquisa à qual me vinculo
Currículo, Cultura e Sociedade – levaram-me /levam-me a exercitar a inclusão de ambos os gêneros, e não
somente o masculino. Sei que, muitas vezes, tal atitude torna o texto pesado para o leitor e, por isso, em alguns
momentos, não fiz tal flexibilização, mas, como autora deste estudo, senti a necessidade de apresentar / incluir os
dois gêneros .
16
e a Educação seja uma instância privilegiada que contribua efetivamente para a formação do
cidadão e da cidadã do século XXI.
É movida por tal esperança que apresento a versão final de minha dissertação,
acreditando que ela possibilita instigar discussões, pensamentos e práticas para todos e
todas que a ela tiverem acesso e que estiverem engajados em ações que envolvam fazer
Educação.
Ainda nesta introdução, apresento como se constitui este texto. Dividi-o em cinco
capítulos. Mesmo que cada um seja
lócus
de distintas proposituras, muitas vezes vi os
capítulos interpenetrando-se – acredito que tenha inclusive superado a dicotomia entre
teoria e prática. Mas, mesmo com essa pretensão de fugir a capítulos engessados, com
temas estanques, trago a seguir uma sinopse de cada um deles.
No primeiro capítulo –
Mestrado em Educação: quais tensionamentos?
–, trago
alguns tensionamentos instigados pela minha trajetória profissional e minha vivência no
Mestrado, apresentando a temática, as hipóteses e os questionamentos desta pesquisa.
Defino, então, um problema de pesquisa e justifico as razões que me levaram a investigá-lo.
No Capítulo 2 –
Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais pressupostos?
–,
aponto alguns pressupostos teóricos que sustentam a dissertação, apresentando um breve
histórico da constituição da Ciência Moderna e algumas bases epistemológicas da Ciência
Pós-Moderna com o intuito de problematizar a necessidade de uma alfabetização científica-
tecnológica-digital. Entender o que é Ciência e fazer com que um número cada vez maior de
homens e de mulheres possam usar a Ciência como um dos óculos para ler o mundo é uma
das propostas que envolvem o problema pesquisado e que justificam a maioria de minhas
ações. Ainda nesse capítulo, realizo alguns questionamentos sobre os limites entre as
máquinas e os humanos, além de tensionar a interrelação entre Ciência, Tecnologia e
Educação.
No Capítulo 3 –
Alfabetização científica-tecnológica-digital e (ciber)cultura: quais
conexões?
–, intento fazer algumas relações entre alfabetização científica-tecnológica-digital,
questões culturais e exclusão social, partindo da problematização do termo “cultura”. Ainda
nesse capítulo, descrevo e fundamento teoricamente algumas possibilidades de utilização
dos sistemas de buscas da Plataforma Lattes e apresento algumas discussões sobre
alfabetização científica-tecnológica-digital e currículo tendo como base os estudos realizados
nos Seminários da Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade, tendo como foco a
experiência pedagógica realizada na turma 1N1 da Escola Parobé.
17
No Capítulo 4 –
Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
caminhos?
–, descrevo e problematizo os caminhos investigativos e metodológicos que foram
seguidos e apresento as unidades de sentido decorrentes da prática pedagógica realizada
junto à turma 1N1 do Colégio Parobé. Num trabalho mais clássico, poderia dizer que esse é
o “capítulo da metodologia”. Tentei ir um pouco além. Espero evidenciar que tenha
conseguido, pois, mais do que descrever trajetórias de pesquisa, trouxe alunas e alunos do
Parobé para falar sobre a pesquisa. Quis superar a prática de tê-los apenas como “sujeitos”
de pesquisa.
No Capítulo 5 –
Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
verdades provisórias?
–, vivi dificuldades. Sabia que não podia dizer:
“... e, então, concluí
que...”.
Por outro lado, via que era realmente difícil concluir. Gostaria de ter escrito mais,
mesmo sabendo que tenha trazido, nesse capítulo, não apenas minhas realizações, como
também expectativas do que é possível fazer a partir deste trabalho.
Assim, acredito que posso convidar cada uma e cada um que quiser fazer-me
companhia para se aventurar e conhecer, através desta pesquisa, quais os sentidos dados
por alunas e alunos da turma 1N1 da Escola Estadual Parobé à experiência pedagógica vivida
durante a utilização da Plataforma Lattes como instrumento de alfabetização científica-
tecnológica-digital.
18
1. Mestrado em Educação: quais tensionamentos?
Vivemos em tempos de rapidação
2
, em que as incertezas e os avanços científicos-
tecnológicos-digitais não findam, trazendo novos desafios e demandas à Educação em todas
as suas instâncias, inclusive no Programa de Pós-Graduação em Educação da UNISINOS,
onde cursei o Mestrado em Educação e realizei a presente dissertação.
Antes de fazer qualquer aproximação de meu objeto de estudo, parece oportuno
tentar problematizar um pouco este tempo em que vivemos. É evidente que, sobre algo tão
complexo e controvertido, não farei mais que uma tentativa, até porque existe um grande
impasse teórico e epistemológico acerca disso. Muitos autores afirmam que vivemos em
tempos pós-modernos, outros, que vivemos a Modernidade Líquida, outros preferem dizer
que ainda estamos na Modernidade, e há também quem afirme que jamais fomos modernos.
Discutir tal impasse não é o meu objetivo principal nesta dissertação, porém sinto
necessidade e quase uma obrigação, enquanto pesquisadora, de tentar entender e
problematizar que mundo e tempo são estes em que estamos vivendo e atuando, isto é, de
que lugar estou falando e qual é o meu entendimento deste tempo presente. Acerca dos
entornos que os “pós” envolvem, poderíamos acompanhar diferenciações propostas por A. I.
Pérez Gómez (2001):
Pós-Modernidade, também chamada de Condição Pós-Moderna, entendida
como uma “condição social própria da vida contemporânea” (p.25);
Pensamento pós-moderno, entendido como um pensamento filosófico e
científico que se desenvolve criticando os cânones da modernidade, enfatizando “a
descontinuidade, a pluralidade, a diversidade e a incerteza na cultura, nas
ciências, na filosofia e nas artes” (p. 25);
Pós-Modernismo, que se refere “à cultura e à ideologia social
contemporâneas”, derivadas da Condição Pós-Moderna (p. 25)
.
2
Este neologismo, não dicionarizado, pretende reunir as idéias de rapidez + ação.
19
Dessa forma, o autor entende que o pensamento pós-moderno e o Pós-Modernismo
são efeitos da Pós-Modernidade ou Condição Pós-Moderna. Michael Peters (2000) também
atribui ao sentido filosófico e histórico de Pós-Modernismo a referência teórica a um período,
que, nesse caso, seria a Pós-Modernidade. Esses autores ajudam-nos a sistematizar tais
entendimentos, mas tais idéias ainda não são suficientes para melhor entendermos quais as
características da Pós-Modernidade e do pensamento pós-moderno.
Mais do que dar nomes e rotular tal época, temos de reconhecer que estamos num
momento histórico em que as idéias de razão e racionalidade totalizantes e universais que
foram difundidas pelo Iluminismo a grande marca legada pelos enciclopedistas do século
XVIII e pelo Projeto da Modernidade não nos dão mais as respostas de que precisamos e
também não conseguem explicar o mundo complexo
3
em que vivemos.
Este tempo atual, que vou chamar de pós-moderno, utilizando, para isso, concepções
trazidas por Tomaz Tadeu da Silva, diferencia-se da Modernidade
4
, sem ter a pretensão de
ser melhor do que ela ou de negá-la, mas sim de colocar sob suspeita a noção de progresso
que está no centro do Projeto Moderno. Segundo Silva (2002):
[...] o Pós-Modernismo tem uma desconfiança profunda, antes de mais
nada, relativamente às pretensões totalizantes de saber do pensamento
moderno (p.112).
O Pós-Modernismo privilegia o pastiche, a colagem, a paródia e a ironia;
[...] não apenas tolera, mas privilegia a mistura, o hibridismo e a
mestiçagem – de culturas, de estilos, de modos de vida (p.114).
Silva (2002) ajuda-nos a entender que as metanarrativas da Modernidade tornaram-
se ou tornam-se, em certa medida, obsoletas e que a concepção de um sujeito essencialista,
racional e guiado unicamente por sua razão não é mais tolerável como verdade única.
Alfredo Veiga-Neto (1995) entende que não é só o modelo de racionalidade científica
da Modernidade
5
que entra em crise, mas também
a “maneira pela qual pensamos o mundo”
(p.10)
.
Essa nova maneira de pensar o mundo, baseada em leituras que trazem a marca da
incerteza, constitui-se em um dos principais elementos do pensamento pós-moderno. Isso
não significa que não existe racionalidade, mas que esta está subordinada a um
a priori
histórico, fazendo com que a razão se desloque do campo da
transcendência
(que traz na
razão a sua explicação ou causa de ser) para o da a
contingência (
não trazendo em si a
razão como causa de sua explicação ou existência).
3
Complexo entendido como múltiplo, “que abrange ou encerra muitos elementos ou partes”
(MINIDICIONÁRIO AURÉLIO).
4
Época histórica iniciada com a Renascença (século XVI) e consolidada com o Iluminismo (século
XVIII).
5
A Modernidade será objeto de análise mais extensa no Capítulo Alfabetização científica-tecnológica-
digital: quais pressupostos?
20
Com isso, entende-se que, ao utilizarmos as lentes do Pós-Modernismo em uma
pesquisa científica, estamos construindo ou edificando um pensamento a partir do mundo, e
não partindo do pensamento (razão) para explicar o mundo (VEIGA-NETO, 1995). É nessa
linha de pensamento que busquei aproximações com uma Ciência que posso chamar de pós-
moderna nesta dissertação. Tentei sintonizar minha posição, buscando coerência com as
bases teóricas da Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade, com que tenho meu
vínculo acadêmico.
Isso não quer dizer que não utilizei autores que falam de outros lugares e que
trabalham em outras perspectivas, mas sim que as tessituras que realizei neste trabalho
foram tramadas buscando aprimorar um olhar Pós-moderno. Isso não foi uma tarefa fácil,
uma vez que meu próprio pensamento encontra-se encharcado de características da
Modernidade, pois me constitui como sujeito a partir de suas premissas, especialmente na
Escola na acepção de instituição que faz ensino formal, em qualquer nível de
escolarização, por isso grafada com inicial maiúscula, significando, nas considerações destes
tempos de globalização, um amplo espectro, desde a Escola infantil até a Universidade.
A multiplicidade e a ambigüidade da sociedade atual não condizem mais com idéias
universais e totalizantes – não que estas não existam mais, mas não retratam a
complexidade da sociedade pós-moderna. A sociedade globalizada em que vivemos hoje é
interpelada e mediada constantemente pelas tecnologias
6
, pelos meios de comunicação, pela
Ciência, pelas diferentes culturas, estilos, modos de vida e identidades dos sujeitos.
Este trabalho pretende lançar um olhar com a perspectiva da Educação sobre os
avanços científico-tecnológicos, em especial as chamadas (Novas) Tecnologias de
Comunicação e Informação
7
, que, em tempos muito recentes, produziram novas
características culturais, econômicas e sociais em praticamente todo o Planeta, promovendo
novas formas de ensinar e de aprender que extrapolam a sala de aula e os muros da Escola.
Os saberes e o conhecimento, juntamente com as formas de ensinar e de aprender, não se
encontram mais somente no domínio da escola e, nesse caso, de professores e professoras.
Por isso é tão importante entender e conhecer os outros espaços, instâncias e meios que
ensinam ou educam nossas crianças e jovens em sua formação cultural, social e pedagógica.
6
Tecnologia entendida neste momento como uma aplicação ou produto da Ciência. Tal concepção é
devidamente discutida no item 2.2 – Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais necessidades?
7
As (Novas) Tecnologias de Comunicação e Informação serão objeto de explicitação mais extensa
no Capítulo 2 - Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais pressupostos?
.
21
Alice Ribeiro Casemiro Lopes (1999) traz uma discussão sobre o que pode ser
entendido por
saber
e
conhecimento
. Fazendo uso dos óculos da epistemologia, a autora
afirma que os termos poderiam ser considerados sinônimos. Adotando Foucault como
referencial, Lopes diferencia saber de conhecimento, entendendo conhecimento como “[...]
as formulações consideradas válidas pela epistemologia”
8
(p.94) e saber como algo “[...]
mais amplo, por envolver todas as demais formulações [...]”. Assim, para que exista um
saber, só é necessário que exista uma prática discursiva
9
, ao passo que, para que exista
conhecimento, se faz necessária uma base de organização epistemológica.
Passo, então, a entender o saber numa perspectiva pluralista e heterogênea:
“existem diferentes formas de conhecer, capazes de constituir diferentes instâncias de saber,
frutos de diferentes práticas, que podem ou não adquirir um estatuto científico” (LOPES,
1999, p. 95). Desse modo, faz-se necessário aceitar que existam outros tipos de saberes,
que não somente o escolar ou científico, fugindo-se, assim, de uma perspectiva
homogeneizadora. Acredito que este seja o papel da Escola: considerar osoutros tipos de
saberes no espaço escolar, e não apenas os saberes científicos ou escolares elencados,
privilegiados e selecionados como parte do currículo escolar
10
.
Sinalizados alguns entendimentos teóricos, busco, a partir de agora, explicitar
brevemente como se deu/se dá a trajetória que me faz Educadora e também pesquisadora.
Tento dar visibilidade às vivências que me permitiram chegar ao Mestrado e ao meu objeto
de investigação, bem como à importância deste projeto na minha constituição enquanto
sujeito que atua na Educação.
Minha relação com as tecnologias, por exemplo, sempre foi tranqüila, pois sou de
uma geração que já na infância e adolescência desfrutava de brinquedos eletrônicos,
televisões, videocassetes,
video games
e aparelhos tecnológicos diversos. É significativo
destacar aqui o quanto a minha geração teve acesso diferenciado às tecnologias, se
comparada com a geração de meus pais. Pude acompanhar, por exemplo, a entrada dos
microcomputadores (PCs) na vida doméstica e senti a necessidade de saber utilizá-los ao
ingressar no mercado de trabalho. Creio que foi dessa forma que iniciei minha alfabetização
tecnológica – entendida por Lígia Lopes Leite e Marisa Costa Sampaio como a “capacidade
de lidar com o avanço tecnológico [...] através do contato (com as tecnologias existentes) e
8
Epistemologia: estudo crítico dos princípios, hipóteses e resultados das ciências já constituídas;
teoria das ciências (MINIDICIONÁRIO AURÉLIO, p. 214).
9
O discurso, para Foucault, é entendido “como uma prática que forma sistematicamente os objetos
de que fala” (FOUCAULT, 1987, p. 55).
10
Os conhecimentos e saberes ensinados na escola são selecionados através do currículo escolar.
Ver problematização sobre currículo no Capítulo 3.
22
da análise crítica de sua utilização e de suas linguagens” (LEITE; SAMPAIO, 1999, p. 15), o
que pode ser desenvolvido por meio da interação com tais tecnologias.
Arrisco-me a utilizar, neste momento, essa concepção de alfabetização tecnológica
como forma de anunciar meu objeto de pesquisa, mesmo que possa ser acusada de
reducionista, pois há muito o que problematizar acerca dessa definição até porque o
próprio ato de “definir” pode ser problemático, uma vez que
fixa
o sentido que damos a
determinada palavra. Mas, no momento, tal significado parece-me pertinente
11
.
Penso que a escolha pela temática foi instigada pela minha formação acadêmica,
no curso de graduação, uma vez que sou Pedagoga com habilitação em Multimeios e
Informática Educativa. Também percebo o papel da postura crítica e problematizadora que
sempre tive frente às novas tecnologias de comunicação e informação, em especial em
relação à informática, com a qual me envolvi profissionalmente mesmo antes de entrar no
curso de Graduação.
Sempre fascinou-me a idéia de utilizar a informática como um recurso educativo, e
não somente com intenções mercadológicas (mercado de trabalho). Já nas primeiras
disciplinas do curso de Graduação, percebi que tinha feito a escolha certa, pois, apesar de
ter um longo caminho pela frente, devido à minha falta de experiência e conhecimento
teórico da área da Educação, todas as disciplinas me pareciam riquíssimas e eu estava
encantada e motivada com a profissão.
Desde o primeiro semestre, procurei estágio, pois intuía que de nada valeria o
subsídio teórico que a universidade me possibilitava se não tivesse a prática pedagógica
junto a alunos e alunas. Tive dificuldades em conseguir um estágio devido à habilitação do
curso, mas já no segundo semestre comecei a trabalhar
voluntariamente na área de
Informática Educativa numa escola de Educação Infantil. Essa experiência foi muito
produtiva, pois pude acompanhar crianças nas suas primeiras interações com o computador.
Senti-me desafiada e instigada a trabalhar com as crianças daquela faixa etária (3 a 6 anos),
e a mediação
12
da aprendizagem das crianças com o computador foi extremamente
prazerosa, além de me oportunizar o tensionamento do referencial teórico com a prática
realizada com as crianças.
11
No capítulo Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais pressupostos?, discuto as
necessidades dessa alfabetização.
12
A mediação pedagógica, para Maria Cândida Moraes (2003, p. 210), constitui-se em “[...] um
processo comunicacional, conversacional, de co-construção de significados [...]. Assim, a mediação
ocorre através da interação entre professor e aluno, em que ambos são co-autores e co-produtores
da construção do conhecimento gerado por tal relação. A autora trabalha no enfoque da
complexidade (ver nota 15).
23
Essa vivência com as crianças na Educação Infantil fez-me perceber que a utilização
da Informática com crianças tão pequenas, além de possibilitar o desenvolvimento de
diferentes habilidades (coordenação motora, raciocínio lógico, etc.), permitia a alfabetização
dessas crianças na linguagem digital, pois, para interagir com o computador, mesmo através
de
so wares
próprios para Educação Infantil – em sua maioria, lúdicos e intuitivos –, era
necessário que as crianças compreendessem ou “lessem” as telas dos programas. As
crianças que utilizavam computador em casa já conheciam e reconheciam a linguagem
imagística (imagens, ícones, etc.), ao passo que as crianças que não dominavam tal
linguagem precisavam de mais ajuda para interagir com os programas.
ft
Instigada por tais percepções, minha intenção inicial ao ingressar no Mestrado era
dar continuidade ao trabalho monográfico realizado na Graduação sobre como se dava a
alfabetização visual em crianças através da exploração de
softwares
educacionais
13
. Embora,
por diferentes motivos, não tenha podido dar continuidade àquela pesquisa, hoje percebo
que a alfabetização visual faz parte da alfabetização digital, que acabou se constituindo
como um dos elementos de minha pesquisa, uma vez que a imagem é um dos elementos
constituintes da linguagem digital.
Foi ainda no curso de Graduação, nas disciplinas de pesquisa, que fui apresentada a
uma atividade acadêmica que até então desconhecia:
a pesquisa científica
. Decidi, então,
movida pela paixão de tal descoberta, candidatar-me a uma bolsa de Iniciação Científica. Até
conseguir a bolsa, continuei com minhas atividades de Informática Educativa na Educação
Infantil, já como estagiária efetiva.
Finalmente, em outubro de 2001, foi oportunizada a bolsa de Iniciação Científica
14
.
Quando procurei a bolsa de pesquisa, meu objetivo principal era aprender a fazer pesquisa.
Com a vivência proporcionada pela bolsa, pude aprender a ser uma “jovem pesquisadora”,
pois acredito que pesquisa não se faz, se vive através de práticas.
As práticas e demandas advindas desse projeto foram muitas e diversas. A equipe
que atuava no projeto era composta por bolsistas de IC (iniciação científica), AT (apoio
técnico), RD (recém doutoras), pesquisadores (mestrandos/mestrandas e
doutorandos/doutorandas), jovens pesquisadores e pesquisadores voluntários das mais
13
NUNES, Patrícia dos Santos. Educação Estética e Alfabetização Visual Infantil: explorando
softwares educativos. 2003. 71 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Pedagogia Multimeios e
Informática Educativa) - Faculdade de Educação, PUCRS, Porto Alegre, 2003.
14
(BIC/CNPq) Projeto Integrado Gestão Estratégica de Competências e a Formação do Cidadão
Trabalhador do Século XXI CNPq / FAPERGS (Plano Sul de Pesquisa), coordenado pela professora
Dra. Julieta Beatriz Ramos Desaulniers na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
24
diversas áreas do conhecimento, o que me possibilitou uma visão complexa
15
e
interdisciplinar de altíssimo valor.
Com as atividades proporcionadas pela bolsa de Iniciação Científica, pude aprimorar
meus conhecimentos científicos e assim dar a início ao que posso chamar hoje de minha
alfabetização científica
16
, apontada por Attico Chassot como “[...] o conjunto de
conhecimentos que facilitariam aos homens e mulheres uma leitura do mundo onde vivem”
(CHASSOT, 2003a, p. 38). Para não correr o risco, mais uma vez, de ser acusada de
reducionista, aviso que problematizarei e argumentarei tal entendimento no capítulo
seguinte.
Mesmo tendo estudado desde as Séries Iniciais os conteúdos científicos, creio que
somente na Graduação é que pude começar a compreender a Ciência como constituidora da
visão de mundo de homens e mulheres. Passei a compreender os saberes e fenômenos
científicos de um outro lugar mais crítico que não aceita verdades e generalizações únicas e
absolutas. Hoje percebo que muitos dos conteúdos que estudei no Ensino Fundamental e
Médio foram “inúteis”
17
ou não me auxiliaram suficientemente na compreensão do mundo
em que vivo. Talvez se eu tivesse estudado a Ciência ou as Ciências de uma outra forma e
na perspectiva de uma alfabetização científica, teria sido muito mais proveitoso.
Foi movida por essas e outras vivências e inquietações que construí / desconstruí
continuamente, ao longo dos dois anos do Mestrado, meu objeto de investigação. Hoje
compreendo que a Ciência não é produzida somente na academia, como supunha
inicialmente; pelo contrário, a Ciência é construída e instituída culturalmente e, por isso,
dissipa-se e difere nos diferentes tipos de culturas, sociedades, níveis sociais, etc. Porém,
para melhor objetivar minha pesquisa, ao falar de Ciência ou produção científica, estarei me
referindo às produções científicas de pesquisadores e pesquisadoras que atuam em
universidades ou institutos de pesquisas de diferentes áreas de conhecimento, conforme
reconhecem os órgãos de fomento à pesquisa.
Acredito que as práticas realizadas na Iniciação Científica vieram ao encontro da
minha formação no curso de graduação, complementando-a, juntamente com os estágios e
práticas realizadas ao longo dos quatro anos do curso. Desde o início da bolsa de IC, tinha
como projeto pessoal ingressar no Curso de Mestrado em Educação, pois acreditava que
15
O pensamento da complexidade apresenta-se como um novo paradigma que nasce do
desenvolvimento e dos limites da Ciência contemporânea. Não abandona os princípios da Ciência
clássica, e sim os integra a um esquema mais amplo e mais rico (MORIN, 2000b, p.20).
16
O estudo da História da Ciência contribuiu enormemente para minha Alfabetização Científica.
25
essa seria a forma de avançar no campo da pesquisa e em minha trajetória acadêmica,
instigada pelo prazer de pesquisar e produzir Ciência.
Ainda sobre a bolsa de IC vale destacar a assessoria em multimeios e informática
educativa que realizei na Escola Estadual Germano Witrock, situada em Canoas/RS, e que
era uma das unidades de pesquisa do Projeto maior ao qual me vinculava. Essa atividade foi
de suma importância na minha trajetória profissional também na construção de meu projeto
de dissertação, pois pude perceber durante a assessoria a dificuldade e a falta de preparo de
professores com relação às novas tecnologias de comunicação e informação (NTCI
18
)
naquela escola.
Coordenando o subprojeto intitulado Inclusão Digital, realizei meus primeiros
esforços na busca de uma inclusão digital
19
que naquele momento teve como foco os
professores e professoras, alunos e alunas da Escola Germano Witrock. A estratégia utilizada
foi propor situações práticas para amenizar tal falta de capacitação do corpo docente
(diagnosticada através de questionários, observações e entrevistas) por meio de oficinas,
seminários e encontros. O objetivo principal do projeto era implementar um laboratório de
Informática na Escola.
Apesar de todos os esforços realizados pela direção da Escola, comunidade escolar
e equipe do Projeto no qual era bolsista, infelizmente não foi possível instalar efetivamente o
laboratório de Informática na escola. Pois, mesmo tendo conseguido organizar um espaço
físico e até um número razoável de máquinas (adquiridas por meio de doações e rifas), não
foi possível obter apoio financeiro e técnico para a instalação dos programas na escola.
Ter sido coordenadora do Projeto oportunizou-me um significativo aprendizado, pois
pude vivenciar as dificuldades que uma Escola Pública, destinada a oferecer Educação a uma
população de baixo poder aquisitivo, enfrentou ao buscar acesso às tecnologias e tentar
capacitar seu corpo docente. As parcerias estabelecidas ao longo do Projeto foram de grande
importância, mas, mesmo tendo procurado uma Ong
20
e empresas, isso não foi suficiente
17
No capítulo Plataforma Lattes e Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais caminhos?,
apresento uma discussão acerca da palavra “útil”.
18
Os anos 80 viram o prenúncio do horizonte contemporâneo da multimídia. A informática perdeu,
pouco a pouco, seu status de técnica, saindo do setor industrial para começar a fundir-se com as
telecomunicações, a editoração, o cinema e a televisão; [...] as tecnologias digitais surgiram, então,
de sociabilidade, de organização e de transação, mas também do novo mercado da informação e do
conhecimento” (LÉVY, 1999, p. 32).
19
No Capítulo 2, problematizo o entendimento de Inclusão Digital.
20
CDI – Comitê para a Democratização da Inclusão Digital é uma organização sem fins lucrativos e
não-governamental estabelecida para dar às crianças e aos adolescentes de baixa renda a
oportunidade de participar no mundo dos computadores. O CDI foi a primeira ONG a brasileira a criar
escola de informática e de direitos civis em favelas do Rio de Janeiro, ensinando Informática para os
26
para implementar o laboratório de Informática na Escola. Mesmo assim, a assessoria
realizada na Escola instigou-me a estudar e desenvolver iniciativas e práticas ligadas à
Inclusão Digital.
Uma outra vivência que tive durante a Graduação e que vale descrever no contexto
desta dissertação foi o estágio que realizei no setor audiovisual do Colégio João XXIII.
Apesar de ser uma escola privada e de ter muitos recursos tecnológicos disponíveis (dois
laboratórios de Informática, setor audiovisual com filmadora, máquina fotográfica digital e
multimídia em auditório), pude perceber que muitos professores e professoras tinham
aversão à utilização das tecnologias no ambiente escolar.
Ainda no Colégio João XXIII, trabalhei voluntariamente em um Projeto também
intitulado Inclusão Digital. O objetivo do Projeto, que era resultado de uma parceria com
escolas da periferia, era ensinar Informática Básica a alunos e alunas previamente
selecionados, com vistas à inserção dos estudantes no mercado de trabalho.
Como se pode perceber, meu objeto de pesquisa muito tem a ver com minha
trajetória profissional e pessoal. Considero isso imprescindível no ato de pesquisar, pois tais
experiências e vivências impulsionaram, permitiram e instigaram o meu envolvimento e
empenho na realização desta pesquisa.
Conforme já relatei, ao ingressar no Mestrado, tinha como objetivo estudar a
alfabetização tecnológica com outro enfoque, porém, depois de várias sessões com meu
orientador e estudos acerca da alfabetização científica, percebi o quanto fazia sentido unir
essas “alfabetizações”, pois através da Ciência produzimos tecnologias e através das
tecnologias também podemos produzir Ciência. Assim sendo, entendo que se faz necessário
investigar o universo que permeia a inter-relação entre alfabetização científica-tecnológica-
digital
21
que surge da inter-relação entre Ciência, tecnologia e sociedade, tendo como
pressuposto a centralidade da cultura e a necessidade de uma inclusão científica-
tecnológica-digital a partir da utilização da Plataforma Lattes
22
em uma Escola de Ensino
Médio.
menos privilegiados – informação retirada do Mapa da Inclusão Digital da Fundação Getúlio Vargas
(
http://www.fgv.br
). Essa ONG existe desde 1995 e também oferece ajuda para a implementação de
laboratórios de Informática em escolas de baixo poder aquisitivo.
21
Apesar de ver tais alfabetizações como interdependentes e relacionais, em alguns momentos, no
decorrer do trabalho, trago-as separadas para melhor estruturar e sustentar teoricamente este
trabalho, uma vez que não encontrei autores e autoras que utilizassem satisfatoriamente o termo em
conjunto, conforme optei por utilizar.
22
Ferramenta disponibilizada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
www.cnpq.br
para a comunidade científica brasileira fazer e atualizar digitalmente (online ou offline)
27
Aliás, foi durante as atividades de Iniciação Científica que fui apresentada à
Plataforma Lattes, que curiosamente hoje se torna meu objeto de pesquisa. Na condição de
gerente da Rede de Pesquisa Formação, Trabalho, Organização
23
, tive como uma de minhas
incumbências estudar a Plataforma e o programa que gerava / gera o Currículo Lattes, com
a finalidade de capacitar os integrantes da Rede de Pesquisa para o preenchimento do
Currículo Lattes, que, na época (2001), passou a ser uma exigência no reconhecimento dos
pesquisadores e pesquisadoras pelas agências financiadoras de pesquisa, em especial o
CNPq.
Percebi, durante a assessoria ao preenchimento do currículo, que faltava aos
usuários da plataforma
alfabetização tecnológica
, pois muitos tinham resistência e até uma
certa aversão ao computador, o que dificultava ainda mais o preenchimento digital do
currículo. Entendo que, mais do que uma alfabetização tecnológica, o programa exige uma
alfabetização digital
24
, isto é, faz-se necessário não só saber utilizar a tecnologia (que, no
caso, é o computador e a Informática), como também saber utilizar a linguagem digital e os
códigos digitais para o preenchimento do Currículo Lattes.
Assim, minha intenção ao longo do curso do Mestrado e durante a realização desta
dissertação foi aprofundar e ampliar meus conhecimentos acerca das relações que homens e
mulheres têm com “essas máquinas que às vezes se aproximam da fronteira do quase-
humano”
25
, pois preocupa-me muito, e pude perceber isso durante as práticas profissionais e
estágios realizados durante o curso de Graduação e também ao longo do Mestrado, a falta
de conhecimentos e a pouca utilização de tecnologias por professores e professoras dos
diferentes níveis educacionais (Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior),
especialmente com relação às Novas Tecnologias de Comunicação e Informação.
Acredito que a não-utilização dessas tecnologias no campo pedagógico põe em
desvantagem alunos e alunas, uma vez que eles e elas estarão sendo excluídos do processo
tecnológico que está instaurado em nossa sociedade e que cada vez se sofistica mais, até
porque acredito que:
sua produção científica, o que explicitarei melhor no Capítulo 3 (item 3.2) – Plataforma Lattes, CNPq
e Sistemas de buscas: quais possibilidades?
23
Coordenada pela prof. Drª. Julieta Ramos Desaulniers na Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
24
Entendido, nesse momento, como a capacidade de utilizar os códigos digitais, esse conceito será
devidamente problematizado no Capítulo 2 (item 2.2), Alfabetização científica-tecnológica-digital:
quais necessidades?
25
No capítulo Alfabetização científica-tecnológica-digital e (ciber)cultura: quais conexões?, amplio a
discussão acerca das fronteiras entre o humano e o não-humano.
28
[...] o papel da educação deve voltar-se também para a democratização do
acesso ao conhecimento, produção e interpretação das tecnologias, suas
linguagens e conseqüências. Para isto, torna-se necessário preparar o
professor para utilizar pedagogicamente as tecnologias na formação de
cidadãos que deverão produzir e interpretar as novas linguagens do mundo
atual e futuro (LEITE; SAMPAIO, 1999, p. 20).
É em busca do aprimoramento de tal preparo, apontado pelas autoras, que realizei
a presente pesquisa, entendendo que a experiência vivida, as discussões e as práticas
realizadas a partir da investigação se tornam pertinentes em um contexto que relacione
Educação, Ciência e Novas Tecnologias.
Foi movida pelos tensionamentos, questionamentos e inquietudes que me senti
instigada pelas vivências descritas e escolhi como (e fui escolhida pela) temática central
alfabetização científica-tecnológica-digital
. Realizei uma experiência pedagógica
26
no
laboratório de Informática da Escola Estadual Parobé
27
, em uma turma do 1º ano do Ensino
Médio (turma 1N1). Nessa vivência, realizei, junto a alunos e alunas da turma 1N1, uma
experiência pedagógica que envolveu pesquisar os Sistemas de Buscas da Plataforma
Lattes
28
como instrumento e material de pesquisa em uma perspectiva de alfabetização
científica-tecnológica-digital. Com relação à unidade de pesquisa (Centro Tecnológico
Estadual / Escola Técnica Estadual Parobé), tive como base para tal escolha a exclusão
digital que pressupunha sofressem alunas e alunos de instituições públicas. Embora a escola
escolhida possua dois laboratórios de Informática (o que ainda é quase exceção no universo
da rede pública brasileira), percebo que a presença de laboratórios não garante que estes
sejam usados para fazer aquilo que entendo ser inclusão digital e que explicitarei melhor no
item 3.1 do Capítulo 3 –
Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
caminhos?
Cabe esclarecer que a Plataforma Lattes é abastecida pelos currículos de
pesquisadores e pesquisadoras de todo o Brasil, disponibilizando, através da Internet e do
site
do CNPq (http://www.cnpq.br), uma base de dados complexa e consistente que pode
ser acessada através de mecanismos de buscas. Isso possibilita o conhecimento panorâmico
da Ciência brasileira atual, através de diferentes parâmetros: palavras-chave, área do
conhecimento, regiões, etc.
29
26
No sentido dado por Larrosa (2002), como “[...] aquilo que nos passa” e “[...] aquilo que nos toca”
(p.136).
27
Também chamada Centro Tecnológico Parobé. Maiores informações sobre a Escola no Apêndice A
(p.143).
28
Brevemente descritos no Capítulo 3 e Apêndice B (p.145).
29
Maiores informações no item 3.3 – Plataforma Lattes e mecanismos de buscas: quais
possibilidades? e no Apêndice C (p. 149).
29
Dessa forma, busquei entender durante a realização da presente pesquisa:
quais
os sentidos dados por alunas e alunos da turma 1N1 da Escola Estadual Parobé à
experiência pedagógica vivida durante a utilização da Plataforma Lattes como
instrumento de alfabetização científica-tecnológ ca-digital?
i
Lembro que, até o momento da qualificação do projeto desta dissertação, minha
intenção era estudar
de que forma a Plataforma Lattes poderia ser utilizada como
ferramenta de pesquisa na busca de uma alfabetização científica-tecnológica-digital
. Porém,
ao adentrar no campo empírico da pesquisa e conhecer os estudantes da turma escolhida,
que até aquele momento se constituíam como “sujeitos descorporificados”, instigada pelas
discussões do III Seminário
30
da Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade, pude
perceber que minha pergunta estava no mínimo equivocada, uma vez que trazia consigo a
idéia de aplicação de um instrumento, no sentido de experimentação, e não no sentido de
experiência indicado por Larrosa.
Assim, apesar de sentir-me, num primeiro momento, desestruturada e insegura,
penso que, num segundo momento, pude desconstruir tal idéia de aplicação e produzir um
outro olhar sobre o meu objeto de pesquisa. Consegui perceber que meu problema de
pesquisa era os sentidos que os estudantes dariam à utilização da Plataforma Lattes, e não a
Plataforma Lattes em si. Penso que tal percepção possibilitou um salto qualitativo em minha
pesquisa.
Mesmo supondo que a Plataforma Lattes pudesse ser utilizada com a finalidade de
contribuir para uma alfabetização científica-tecnológica-digital, também busquei
compreender de que forma exatamente ela poderia ser utilizada como ferramenta de
pesquisa em uma escola de Ensino Médio. Assim, a presente pesquisa buscou, entre outros
possíveis objetivos:
realizar uma experiência pedagógica junto a alunas e alunos do Ensino
Médio no laboratório de Informática, tendo como ferramenta a Plataforma
Lattes do CNPq;
retirar da Plataforma Lattes subprodutos que usualmente não são
explorados nessa ferramenta por alunos e alunas do Ensino Médio;
envolver alunas e alunos da turma 1N1 da Escola Estadual Parobé com a
Ciência brasileira;
30
Coordenado pela professora Dr.ª Gelsa Knijnik, que merece um agradecimento especial pela “co-
orientação” realizada durante o trabalho empírico desta pesquisa.
30
promover, através da experiência pedagógica realizada, a inclusão científica-
tecnológica-digital de alunos e alunas da Escola Estadual Parobé.
Minha investigação partiu da possibilidade de a referida ferramenta ter usos
diferenciados daquele para a qual foi concebida. Para isso, utilizei os dados disponibilizados
pela Plataforma Lattes junto a alunos e alunas da Escola Parobé, instigando-os e
propiciando-lhes tomar conhecimento, mesmo que parcial, da Ciência produzida no Brasil
hoje, em suas múltiplas facetas. Esperava poder desenvolver a alfabetização científica-
tecnológica-digital nos envolvidos na pesquisa e assim propor práticas que possibilitassem
uma inclusão científica-tecnológica-digital através da utilização da Plataforma Lattes como
instrumento de pesquisa, trazendo uma outra possibilidade de olhar a Ciência.
Segundo Chassot (2003b), a Ciência muitas vezes é utilizada de forma “inútil” desde
o Ensino Médio, pois os conteúdos são explorados de forma acrítica. O autor aponta, ainda,
a pouca familiaridade que alunos e alunas têm com a história da construção do
conhecimento, sendo que essa deficiência poderia ser amenizada através da alfabetização
científica. Chassot propõe a História da Ciência como um catalisador para facilitação da
alfabetização científica.
A História da Ciência constitui-se numa ferramenta para o processo de alfabetização
científica. Pressuponho que, no Ensino Médio, pouco se estudem as produções da Ciência
brasileira, onde é produzida e quais as áreas de conhecimento que estão mais desenvolvidas
cientificamente. Assim, entendo que de certa forma, trouxe nas ações desse projeto, a
familiarização ou, pelo menos, uma iniciação com a História da Ciência, particularmente com
História da Ciência brasileira, pois É nesse sentido que se espera contribuir para a
alfabetização científica-tecnológica-digital dos agentes envolvidos, fazendo com que
conheçam a produção da Ciência e aqueles que se envolvem com ela na atualidade, tendo
como base diferentes referenciais e dimensões (regiões brasileiras, classe social, gênero,
etc.) possibilitadas pelos dados extraídos da Plataforma Lattes do CNPq
31
.
Ao defender a emergência de uma alfabetização científica-tecnológica-digital, torna-
se necessário compreender o que entendo por Ciência, o que será feito oportunamente e
31
Sei o quanto posso ser acusada de reducionista ao afirmar que a Plataforma Lattes possibilita
conhecer a atual produção científica brasileira. Esse é um entendimento que permitiu objetivar o
presente estudo. Portanto, cabe problematizar que não vejo cientista como sinônimo de pesquisador,
uma vez que nem todo cientista se envolve em pesquisas ou produções científicas do tipo
acadêmicas (como as que comumente encontramos na Plataforma Lattes). Assim, envolver-se em
pesquisa é uma das práticas possíveis de um cientista, mas, considerando a importância do CNPq e
de sua base de dados, que muito tem a ver com a produção científica brasileira atual, compreendo
que posso afirmar que, através da Plataforma Lattes, podemos ver o “estado da arte” da Ciência no
Brasil.
31
com a devida profundidade no capítulo
Alfabetização científica-tecnológica-digital e
(ciber)cultura: quais conexões?
Por ora, vale destacar que Chassot considera a Ciência “uma
linguagem construída pelos homens e pelas mulheres para explicar o mundo natural”
(CHASSOT, 2003a, p. 37). Tal linguagem é um constructo humano e, portanto, mutável,
falível, detentora de verdades provisórias e passível de erros. Foi movida por essa concepção
de Ciência que desenvolvi minha pesquisa. É preciso enfatizar que essa percepção de Ciência
era novidade para alunas e alunos envolvidos nesta pesquisa e que, mesmo para o professor
da turma, essa não era uma leitura usual.
A alfabetização científica tem como objetivos facilitar a leitura do mundo natural,
tornando os conhecimentos científicos “úteis” no exercício da cidadania, e contribuir para
que alunos e alunas se tornem pessoas mais críticas e participativas na sociedade
(CHASSOT, 2003b). Dessa maneira, a alfabetização científica-tecnológica-digital que busco
desenvolver com este trabalho pressupõe a adesão a um novo espírito científico que venha
ao encontro da era globalizada em que vivemos.
Edgar Morin (2000a) afirma que romper com o dogma reducionista e a
compartimentação do saber é o principal desafio no campo científico. Para ele, a educação
baseada na cultura científica desconsidera a cultura das humanidades (no seu sentido
antropológico); assim, literatura, poesia e cinema deveriam ser considerados objetos de
estudo em seus múltiplos sentidos
.
É tendo a cultura como categoria central neste trabalho
32
que vejo que as tecnologias também deveriam estar incluídas no contexto escolar.
Logo, a Plataforma Lattes passa a ser vista como um artefato cultural e surge como
um recurso na busca de uma Ciência
exo éricat
33
(aberta, fluída), e não
esotérica
(fechada,
oculta), que torne os conhecimentos científicos aplicáveis e práticos. O que se está buscando
através da experiência realizada é abrir a caixa preta em que os cientistas converteram a
Ciência, procurando-se fazer uma migração do esoterismo ao exoterismo (Chassot, 2003b).
Se hoje vivemos num mundo globalizado, onde as inovações tecnológicas não
cessam, trazendo consigo implicações culturais que são constantemente atravessadas pelas
questões sociais, políticas, econômicas, éticas e educacionais, é impossível não surgirem
reflexos de tais mudanças na área pedagógica e científica. Por isso, além da necessidade de
alunos e alunas se alfabetizarem cientificamente, compreendo que urge que conheçam as
32
No capítulo Alfabetização científica-tecnológica-digital e (ciber)cultura: quais conexões?, trago
discussões acerca da cultura.
33
Esotérico: diz-se de ensinamento reservado a poucos (MINIDICIONÁRIO AURÉLIO). Exotérico:
diz-se de ensinamento transmitido ao público sem restrição (MINIDICIONÁRIO AURÉLIO).
32
tecnologias, delas se apropriem, com elas interajam e as utilizem, uma vez que fazem parte
de suas vidasfora edentro da escola. Esse é o principal objetivo da alfabetização
científica-tecnológica-digital, entendida como possibilidade de interação com as novas
tecnologias.
As novas tecnologias, segundo Raquel Almeida de Moraes (2000), são:
[...] algo mais do que simples inovações no campo das Ciências e
Tecnologia [...] essas técnicas representam um domínio sem precedentes
do homem sobre a natureza do universo, em seus aspectos genéticos,
microeletrônicos, com graves repercussões na vida social, econômica,
política e cultural dos povos. [...] E, entre elas, a Informática aparece como
uma tecnologia que está mudando nosso modo de viver [...] (p.13).
Dessa forma, a alfabetização tecnológica de professores e professoras, alunos e
alunas permitirá, através da utilização dos diferentes meios tecnológicos que podem ser
utilizados na escola, a aproximação, a familiarização e a interação com artefatos tecnológicos
existentes na sociedade. Assim, as tecnologias poderão ser desmistificadas e
democratizadas, contribuindo na formação de cidadãs e cidadãos mais participativos e
críticos com a possibilidade de utilização da Informática.
A alfabetização científica se inter-relaciona com a alfabetização tecnológica, com ela
contribui e vice-versa se considerarmos que ambas poderão auxiliar na leitura de mundo de
professores e professoras e de alunos e alunas. Para isso ser instigado dentro da sala de
aula, o professor necessita ter clareza do papel de ambas enquanto instrumentos que
ajudam na construção de uma cidadania que tenha como objetivo possibilitar atuação,
construção e transformação no mundo em que vivemos de forma positiva.
Segundo Leite e Sampaio (1999), a “alfabetização tecnológica” do professor ou
professora refere-se à sua capacidade de lidar com as diversas tecnologias e interpretar sua
linguagem, além da sua capacidade de distinguir como, quando e por que são importantes e
devem ser usadas como ferramentas de apoio no processo de ensino e aprendizagem. Essa
alfabetização significa, portanto, um domínio inicial das técnicas e suas linguagens, mas
envolve também um permanente exercício de aperfeiçoamento mediante o contato diário
com as tecnologias. Relaciona-se ao conhecimento técnico e pedagógico que o professor ou
professora deve buscar das tecnologias e de seu potencial pedagógico. É nesse exercício
permanente que realizei esta pesquisa e fui a campo interessada em ver quais as
possibilidades de se fazer alfabetização científica-tecnológica-digital através da Plataforma
Lattes.
33
Tive como pressuposto para tal imersão no campo empírico desta pesquisa a
existência de uma inter-relação entre tais alfabetizações científica, tecnológica e digital.
Mesmo tendo achado conceituações fragmentadas para elas, arrisco realizar tal conexão,
propondo o entendimento de que uma alfabetização científica-tecnológica-digital possibilitará
não só uma
melhor leitura de mundo
(alfabetização científica, segundo Chassot), mas
também
a capacidade de lidar com os artefatos tecnológicos
(alfabetização tecnológica,
conforme Leite e Sampaio), em especial a informática, através da
apropriação crítica dos
códigos digitais
(alfabetização digital, segundo apontam Pierre Lévy e Castells).
Considero muito pertinentes as afirmações de Leite e Sampaio e estou ciente de
que teria sido muito mais enriquecedor para o contexto de minha pesquisa incluir o corpo
docente da Escola em minha pesquisa. Mas, infelizmente, depois de vencer ingentes óbices
para conseguir uma turma para realizar a pesquisa, parecia pretensão descabida envolver os
professores e professoras da turma 1N1 da Escola Estadual Parobé mesmo que a
participação do professor titular de Informática tenha superado em muito os propósitos
iniciais na experiência pedagógica que realizei junto à turma. Conforme Côrtes,
A introdução das novas tecnologias de comunicação e informação em
grande parte das atividades humanas (...) faz emergir a necessidade de
preparar um profissional da educação que esteja devidamente habilitado
para lidar com as implicações pedagógicas dessa realidade e demonstre
estar qualificado para o aproveitamento educativo de recursos tão
poderosos (CÔRTES, p. 193, 2002).
Com as idéias de Helena Sporleder Côrtes, argumento que o professor e a
professora necessitam se envolver no uso pedagógico das tecnologias porque elas estão no
mundo, participam da produção cultural e econômica da sociedade. As tecnologias são
utilizadas cotidianamente nas lojas, nos bancos, nos centros de lazer, na vida em geral. Por
isso, não se justifica que o professor seja preparado apenas para utilizá-las como recurso
pedagógico, sem que tenha algum conhecimento de como essas tecnologias podem ter seu
uso ampliado ou até inovado, como pretensiosamente acredito ter feito durante esta
pesquisa, utilizando a Plataforma Lattes como propulsora de uma alfabetização científica-
tecnológica-digital de alunos e alunas da turma 1N1. Como destaco em
Plataforma Lattes e
alfabetização científica-tecnológica-digital: quais verdades provisórias?
, houve, ao lado de
não poucas frustrações, resultados que superaram minhas expectativas.
Dentre as diferentes tecnologias existentes, muitos autores apontam a Informática
como uma das mais promissoras, que pode propiciar uma verdadeira revolução no processo
de ensino e de aprendizagem. Sanmya Feitosa Tajra (2000) e Côrtes (2002) igualmente
acreditam que a capacidade do professor ou professora para desenvolver e explorar os
34
programas adequados ao contexto específico é que fará a diferença no uso do computador
na área educacional.
A intenção que tive ao utilizar a Plataforma Lattes como ferramenta pedagógica no
processo de alfabetização científica-tecnológica de alunos e alunas da Escola Parobé vem ao
encontro da expectativa proposta por essas autoras. Através dos recursos possibilitados pela
Informática, mais especificamente o sítio do CNPq na Internet, foi possível ensinar os
estudantes a buscarem dados de pesquisadores e pesquisadoras brasileiros, cujas produções
podem ser extraídas, exploradas e analisadas por professores e professoras, alunos e alunas,
permitindo o mapeamento da realidade científica brasileira atual sob os mais diversos
ângulos, como relato em
Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digi al:
quais caminhos?
t
Mostrei um pouco dos desafios a que fui submetida para fazer um Mestrado em
Educação e com ele fazer-me pesquisadora. Trouxe também minhas esperanças, que são
muito maiores que o volume de páginas que preciso produzir para escrever esta dissertação,
a qual, em alguns momentos, parecia não ter fim. Mas sempre restavam os desafios que
catalisavam esperanças, e elas fazem com que, no capítulo seguinte, destaque a
Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais pressupostos?
35
2. Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais pressupostos teóricos?
Visando a sustentar teoricamente este trabalho, neste capítulo, realizo algumas
balizações e aproximações teóricas acerca do objeto estudado. Os pressupostos teóricos
serviram de alicerce no decorrer da parte empírica desta dissertação, provocando muitas
reflexões durante a experiência pedagógica realizada na turma 1N1 da Escola Parobé.
Problematizarei a noção de Ciência por mim defendida apresentando uma breve
historicização da Ciência moderna e pós-moderna. Essa mirada histórica é trazida aqui,
primeiro, por uma necessidade que tive de fazer incursão na História da Ciência, área em
que sou neófita e, especialmente, porque minhas ações com alunas e alunos exigiam uma
permanente atenção ao trazer esses estudos,
No decorrer do capítulo, apresento as bases teóricas que fundamentaram meu
entendimento sobre alfabetização científica-tecnológica-digital e problematizo a necessidade
desta para a formação do cidadão no século XXI. A meta principal é o processo de inclusão
social, aqui entendido como trazer alunas e alunos para o uso de tecnologias de
comunicação e informação como recurso para conhecer melhor a Ciência.
Associo a essa dimensão a vinculação desta dissertação às investigações que
ocorrem na Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade, do Programa de Pós-
Graduação em Educação, na qual me insiro, que
estuda a Educação a partir da compreensão
da centralidade da cultura. Problematiza o currículo escolar e as pedagogias culturais em
diferentes campos do saber: as Ciências, a Educação Especial, a Ética, a História e a
Matemática
34
. Procuro vincular também minha pesquisa aos trabalhos de meu orientador,
que
examina a história da construção do conhecimento, estabelecendo articulações e
interações entre sabe es populares, saberes escolares e saberes acadêmicos. Problematiza a
concepção da Ciência como uma linguagem e discute o conhecimento científico como
instância privilegiada de relações de poder. Estuda a alfabetização científica na perspectiva
r
34
Extraído do sítio oficial do Programa de Pós-Graduação em Educação – UNISINOS
36
da inclusão social
35
.
Assim, foi dentro dessas balizas da Linha de Pesquisa Currículo, Cultura
e Sociedade, estabelecidas nos diferentes seminários que cursei, que busquei conduzir meus
estudos e minha pesquisa de maneira continuada.
2.1 Ciência e alfabetização científica: quais entendimentos?
36
A Ciência estuda a vida em geral.
A Ciência tenta explicar as grandes perguntas e facilitar a vida do ser humano.
As frases apresentadas acima foram respostas de alunos da turma 1N1 da Escola
Parobé ao serem questionados sobre o que entendiam por Ciência. Não tenho como
pretensão problematizar tais entendimentos, pois acho que não conseguiria fazer tal
problematização neste momento com a devida competência. Porém, utilizo tais frases como
facilitadores para introduzir meu entendimento sobre a Ciência.
Permito-me repetir o conceito de Ciência já apresentado no capítulo anterior: “é
uma linguagem construída pelos homens e pelas mulheres para explicar o mundo natural”
(CHASSOT, 2003a, p. 37). Tal definição satisfaz minhas expectativas e torna possível balizar
este trabalho. Assumo a Ciência como uma linguagem que possibilita uma melhor leitura do
mundo natural, mesmo que essa concepção possa ser acusada de reducionista, entendendo
tal definição como sendo suficientemente instrumental para discussões acerca de uma
alfabetização científica. Também, como já anunciei, considerar um construto humano é um
facilitador para discutir o não-dogmatismo da Ciência.
Assim, utilizei-me de uma das linguagens da Ciência, na sua mais recente e
revolucionária produção tecnológica a informatização. Meu objetivo foi fazer com que
alunas e alunos da Escola Parobé pudessem, nas práticas, apropriar-se dessa linguagem
para terem uma participação mais efetiva no mundo, que é mostrado à sociedade através de
artefatos culturais muitas vezes quase inacessíveis, como no caso da Informática.
Mais do que problematizar meu entendimento de Ciência, creio que seja pertinente
tentar entender como essa linguagem científica foi e vem sendo construída ao longo de um
35
Idem à nota anterior.
36
Este ícone representa a fala de uma aluna ou um aluno da turma 1N1 da Escola Parobé.
Portanto, sempre que aparecer, sinalizará ao leitor que o texto é uma transcrição da fala dos
estudantes.
37
determinado período histórico para que entendamos qual a necessidade de alfabetização
científica em uma perspectiva de inclusão social. Como bem lembra Tomas Kuhn (1996), a
Ciência constrói modelos que se tornam paradigmas com o objetivo de aproximar-se da
realidade. O autor afirma que o avanço científico não é linear e que as revoluções científicas
(quebras de paradigmas quando um determinado paradigma não mais consegue ser
resposta a determinado modelo de explicação da natureza) ocorrem quando há uma ruptura
no que ele chama de “Ciência normal”
37
.
Dessa forma, os exemplos ou modelos (leis, teorias, aplicações e instrumentos)
aceitos pela Ciência normal acabam por definir os paradigmas da ciência. O estudo da
História da Ciência permite que entendamos como os paradigmas foram e são estabelecidos
pela “Ciência normal” e pelas revoluções científicas, além de ser fundamental na busca da
alfabetização científica, uma vez que permite compreender como se dão / se deram as
“descobertas” e avanços científicos.
A História da Ciência é uma facilitadora ou, ainda mais enfaticamente, uma
produtora da alfabetização científica do cidadão e da cidadã. Defendo
buscarmos um ensino mais histórico como uma alternativa para nos opor
ao nefasto conteudismo. [...] Acredito que buscar ver como se enraíza e é
enraizada a construção do conhecimento é cada vez mais uma necessidade
para que possamos melhorar nossa prática docente (CHASSOT, 2003b,
p.273).
Embora não seja o objetivo deste trabalho proceder a um aprofundamento teórico
acerca da História da Ciência, creio que seja pertinente, como anunciei na abertura deste
capítulo, trazer para o cenário desta dissertação alguns pontos cruciais da história. Cabe
ressaltar que o estudo da História da Ciência foi de vital importância na minha constituição
como pesquisadora, no meu processo de alfabetização científica, como sinaliza Chassot, e na
construção de meu
habitus
científico
38
. Mesmo que muitos autores e autoras já tenham
trazido tal historicização, entendo que esse olhar panorâmico que apresentarei também
37
Quando determinados tipos de conhecimentos científicos são aceitos pela comunidade científica
como razoáveis explicações para as propostas de modelos para se entender o mundo natural ou, nas
palavras do autor: “Ciência normal significa a pesquisa firmemente baseada em uma ou mais
realizações científicas passadas. Essas realizações são aceitas por algum tempo por alguma
comunidade científica específica como proporcionando os fundamentos para sua prática posterior”
(KUHN, 1996, p. 29).
38
Julieta Beatriz Ramos Desaulniers(2000), apoiada em Bourdieu, afirma que o habitus científico
assume a “forma de um conjunto de relações históricas ‘depositadas’ nos corpos individuais sob a
forma de esquemas mentais e corporais de percepção” (BOURDIEU apud Desaulniers, 2000, p.25),
constituindo-se, assim, como uma condição na formação de pesquisadores e pesquisadoras
competentes através do desenvolvimento de múltiplas habilidades indispensáveis para a realização
de um estudo científico. No Capítulo 5 – Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-
digital: quais verdades provisórias? –, analiso algumas posturas e habilidades indicadas pela autora.
38
permitirá mostrar o quanto os tempos que nos são mais próximos tiveram uma “aceleração’”
nas transformações das leituras da natureza.
Começo esta breve mirada histórica com o surgimento da chamada Ciência
Moderna
39
(século XVII). Nomes como Copérnico, Galileu, Bacon, Descartes e Newton são
imprescindíveis para que entendamos quais foram as descobertas e revoluções científicas
que tiveram como conseqüência a instauração do paradigma da Ciência Moderna, muitos dos
quais se perpetuam até hoje e servem como balizadores de muitas práticas científicas, como
bem lembra Hilton Japiassu:
A gênese dos grandes princípios da Ciência Moderna processou-se no
interior de uma concepção, acreditando na unidade do pensamento
humano, especialmente em suas formas mais elaboradas: pensamento
humano, pensamento filosófico, pensamento religioso e pensamento
científico. Por isso, não temos o direito de desvincular o pensamento
científico da evolução das idéias extra ou transcientíficas (JAPIASSU, 1982,
p. 23).
Nicolau Copérnico (1473-1543) tinha como proposta revolucionária para a época
uma visão de universo diferente da defendida pela Igreja até então – ele afirmava que o
centro do universo não era a Terra, e sim o Sol. Essa teoria marca a mudança do
Geocentrismo para o Heliocentrismo, que traz como conseqüência uma visão de mundo
diferente da criada por Aristóteles. Por esse motivo, na época, Copérnico, juntamente com
sua principal teoria, foi ignorado pelos cientistas e líderes religiosos. Chassot (2004) refere
ainda as contribuições importantes na consolidação da teoria copernicana feitas por
Giordano Bruno (1548-1600), talvez a mais emblemática figura da História da Ciência, Tycho
Brahe (1546-1601) e Johannes Kepler (1571-1630), estes dois com ratificações e
aperfeiçoamento do modelo heliocêntrico.
Nos estudos de Galileu Galilei (1564-1642), que é considerado um dos criadores da
Ciência Moderna, a teoria de Copérnico consegue reconhecimento na restrita comunidade
dos que então fazem Ciência, mas continua proibida pelo magistério da Igreja, tanto que sua
obra que define o sistema heliocêntrico,
Sobre as revoluções das esferas celestes
, dedicada
39
Faço tal escolha ciente de que produções científicas existem muito antes deste século (Ciência
Pré-Moderna), porém tomo como marco tal época considerando que “chegamos a um período em
que paradigmas tidos quase como imutáveis são rompidos. Isso só ocorre porque regras e verdades
são violadas. [...] há rupturas com o senso comum e com o fundamentalismo religioso. Um e outro
são óbices na (re)leitura que a Ciência fez e faz do mundo natural” (CHASSOT, 2003, p. 136).
Também não desconheço que houve civilizações marginais nas leituras eurocêntricas do que hoje se
chama América, apenas para ficar geograficamente próxima – por exemplo, as civilizações
consideradas pré-colombianas, que desenvolveram uma Ciência e uma Tecnologia muito mais
avançadas do que as da Europa de então (IDEM, 2004).
39
em 1543 ao papa Paulo III
,
permaneceu no
Index librorum prohibitorum
40
,
sendo proibida
sua leitura por católicos até 1835
41
. Galileu foi também responsável por inúmeras
descobertas, entre elas, a geometrização do movimento. É especialmente reconhecido pela
introdução da experimentação na Ciência, mesmo que isso seja algo que tenha também
marcas de mito.
O apoio de Galileu às idéias de Copérnico fez com que a Igreja (que doutrinava de
maneira oficial na época, para toda a Cristandade, não apenas no que se referia à fé) o
impedisse de ensinar, exercer opiniões ou elaborar trabalhos, isso com o intuito de obrigá-lo
a não defender as idéias geocêntricas. Em 1616, foi obrigado a negar suas teses, sendo
condenado ao silêncio e à prisão perpétua (em Roma) pelo Santo Ofício.
Galileu foi um homem ímpar que ajudou a realizar a grande revolução nas ciências.
Os historiadores referem-se ao corte galilaico, que, na formação da física, é o corte
epistemológico, o ponto sem regresso a partir do qual a física moderna (ou mesmo a Ciência
moderna) começa. Esse ponto tem seu marco histórico nos trabalhos de Galileu sobre a
queda dos corpos.
[...] Sua crítica ao sistema geocêntrico e a defesa das idéias copernicanas
abriram caminho para o desenvolvimento da moderna física e da
astronomia. [...] afirmava que o
livro da natureza é escrito em linguagem
matemática
(CHASSOT, 2003a, p. 147).
Ao descrever geometricamente o movimento, Galileu construiu uma Física
Matemática. Utilizava como método a observação e a interpretação (foi o responsável pela
criação do telescópio). Silvia Catarina Gioia (2001) afirma que, a partir dos estudos de
Galileu, a Ciência Moderna começa a adquirir um caráter empírico e concreto, em oposição
ao caráter abstrato e livresco da Ciência Clássica e Medieval. Precisa-se destacar, entretanto,
que essa referência um tanto preconceituosa à Ciência anterior a Galileu traz também as
marcas do modo como o Renascimento considerou as produções medievais.
Outro cientista que teve uma colaboração muito significativa na Ciência Moderna foi
Francis Bacon (1561-1626). Propôs um método o método científico que, segundo ele,
possibilitaria a construção de um conhecimento correto dos fenômenos. Para ele, a Ciência
tinha como função contribuir para a melhoria das condições de vida do ser humano.
40
Documento que listava os livros proibidos aos católicos – foi instituído em 1559 (ainda atualizado
em 1948) – e que teve a sua última impressão em 1966, quando só então foi abandonado, em
decorrência do Concílio Vaticano II (1962-1965).
41
Curiosamente, mais de 150 anos depois de Newton ter publicado sua obra famosa: Princípios
matemáticos de filosofia natural.
40
A marca do método científico baconiano está ainda muito presente no ensino de
Ciência, tanto que não são raros os livros de ensino de Ciências do Ensino Fundamental que
apresentam o método científico como a cartilha universal para a produção da Ciência. Às
vezes, esse método científico apresentado como OHERIC (Observação / Hipótese /
Experimentação / Resultado / Interpretação / Conclusão) fomenta concepções ingênuas, já
que cria nos estudantes a ilusão de que, se o seguirem, obterão resultados análogos aos dos
cientistas.
Bacon entendia que o bem-estar do ser humano dependia do controle científico
obtido por ele sobre a natureza, o que levaria à facilitação da sua vida. Assim, julgava
imprescindível o domínio do ser humano sobre a natureza, a partir do conhecimento de suas
leis, como bem lembra Maria Elisa Mazzili Pereira (2001).
Para Bacon, o que interessava eram os resultados práticos dos conhecimentos ou
conjuntos de saberes científicos. Ele acreditava que o conhecimento era obtido por via
empírica e experimental através do contato com a natureza. Dessa forma, seu método
experimental adquiria um sentido amplo que se referia à qualquer interferência intencional
na natureza.
Bacon preocupou-se, ainda, com as “noções falsas” da Ciência, que, segundo ele, não
permitiam aos sábios alcançar “a verdade”. Propôs o Método Indutivo (ou Método da
Indução), que permite separar o fenômeno que buscamos conhecer (que se mistura com
outros fenômenos da natureza) de tudo o que não faz parte dele através de um processo de
eliminação e comprovação prática. Dessa maneira, como aponta Pereira (2001) Bacon
imprime um caráter empírico e indutivo à Ciência.
O resultado da indução é provisório [...] Para se chegar a um resultado
definitivo, Bacon propõe o uso de “aulios mais poderosos” à razão, dentre
os quais, inclui os “fatos privilegiados”, que se refeririam a fenômenos mais
prováveis de esclarecer de forma definitiva o objeto de estudo (IBIDEM, p.
199).
René Descartes (1596-1650) é o cientista que dá ênfase ao método matemático
(sua obra mais conhecida é o
Discurso do Método
), pois via o mundo de forma
matematizada, através do pensamento dito cartesiano. Descartes entende que o
conhecimento será obtido através de deduções racionais partindo-se de princípios gerais. A
observação e a experimentação igualmente submetem-se à razão. Partindo da dúvida
metódica, Descartes justifica o poder da razão de perceber o mundo por meio de idéias
claras e distintas (CHASSOT, 2004).
Para Denize Rosana Rubano e Melania Moroz (2001), o método proposto por
Descartes baseado no modelo matemático de raciocínio permitia que se chegasse a certezas
41
claras e distintas evitando-se o erro. “Em outras palavras, o método é o ‘mecanismo’ que
assegura o emprego adequado da razão nas suas duas operações intelectuais fundamentais:
a intuição e a dedução” (RUBANO; MOROZ, 2001, p. 204).
Outro cientista que também se baseou em modelos matemáticos foi Isaac Newton
(1642-1727), considerado um dos maiores gênios da Ciência, pois contribuiu de maneira
muito significativa para o avanço científico em diferentes áreas (Matemática, Astronomia,
Física, etc.). Porém, para Newton, a Matemática tinha a necessidade de aliar-se à
experiência. Propôs um sistema geral de pensar o céu (mecânica celeste) que possibilitou o
entendimento tanto da matéria na Terra quanto dos fenômenos celestes através da
demonstração dos movimentos dos planetas. Instituiu, dessa forma, conceitos e leis que são
considerados universais, como a inércia e a gravitação, por exemplo, atribuindo um caráter
de universalidade à Ciência Moderna.
De acordo com Mônica Helena Tieppo Alves Gianfaldoni (2001), Newton foi o símbolo
da Revolução Científica Européia. Sua visão de mundo sintetizava uma nova forma de
conhecer os fenômenos, na qual “[...] o universo é infinito e pode ser conhecido
quantitativamente; as leis são universais e, portanto, abarcam todos os fenômenos da
natureza; as explicações devem ser causais e não finalistas” (GIANFALDONI, 2001, p. 245).
Newton trabalhava com um método que se perpetuou durante séculos na Ciência.
Esse método operava com hipóteses deduzidas dos fenômenos: a observação como critério
para a produção e aceitação do conhecimento; a possibilidade da quantificação dos
fenômenos; a utilização da análise e da síntese, por meio da indução, para explicar os
eventos naturais (IBIDEM). No caso de fenômenos que não podiam ser explicados dessa
forma ou através de seu método, Newton recorria a explicações metafísicas, ligando sua
mecânica à teologia e, assim, tornando o universo totalmente explicável.
Desse modo, a Ciência Moderna construiu seus alicerces, conforme mostra
Boaventura de Souza Santos (2003), em leis universais e pressupostos epistemológicos e
teóricos que defendem a idéia de ordem e estabilidade do mundo, como se o passado se
repetisse no futuro (modelo mecanicista).
A consciência filosófica da Ciência Moderna, que tivera no racionalismo
cartesiano e no empirismo baconiano as suas primeiras formulações, veio a
condensar-se no positivismo oitocentista. Dado que, segundo este, só há
duas formas de conhecimento científico – as disciplinas formais da lógica e
da matemática e as ciências empíricas segundo o modelo mecanicista das
ciências naturais – as ciências sociais nasceram para serem empíricas
(SANTOS, 2003, p. 33).
42
A partir das idéias de Santos, podemos perceber que nascem duas vertentes nas
chamadas Ciências Sociais. Na primeira, os fenômenos naturais universais passaram a
explicar também os fenômenos sociais. Assim, as Ciências Sociais começaram uma longa
batalha para serem reconhecidas como válidas, uma vez que os fenômenos sociais não são
universais, e sim locais e historicamente condicionados. Na segunda vertente, as Ciências
Sociais reivindicam um estatuto metodológico próprio no qual a subjetividade começa a ter
importância, e não somente a objetividade, defendida e imposta pelas chamadas Ciências
Naturais.
Mesmo com a segunda vertente demonstrando alguns sinais de crise no paradigma
científico dominante, Santos (2003) aponta que as duas vertentes ainda estão
epistemologicamente enraizadas na Ciência Moderna. Segundo o autor, a característica
fundamental do modelo de racionalidade que preside a Ciência Moderna foi desenvolvida
basicamente no domínio das Ciências Naturais, dirigindo-se às Ciências Sociais somente no
século XIX. O papel da Matemática e, com essa, mais especificamente, da mensuração para
fazer a comprovação, conforme já referi anteriormente, foi central na constituição da Ciência
Moderna, uma vez que conhecer significava quantificar, o que atribui ao rigor científico o
rigor das medições.
Dessa forma, o método científico, paradigma assumido pela Ciência Moderna, reduz
a complexidade do objeto, pois o que não é quantificável é cientificamente irrelevante. Além
de operar numa visão quantificável do objeto, a Ciência Moderna não operava com
incertezas, pois estas não eram cientificamente (e matematicamente) admitidas. É preciso
destacar que se podem considerar como legado de Newton as marcas fortes do positivismo
em nossa maneira de fazer Ciência. Uma frase atribuída a Lord Kelvin
42
“só se pode falar a
respeito do que se pode medir”
– ilustra o quanto a medida passa a determinar nossas
posturas para validar o conhecimento. Essa afirmação foi (e talvez o tempo verbal devesse
estar ainda no presente:
é
) empecilho muito forte para aquelas e aqueles que fazem uma
mediação entre o conhecimento científico e a Educação.
O modelo de racionalidade científica determinado pela Ciência Moderna (século
XVII), conforme aponta Santos (2003), perpetuou-se através de seus métodos, teorias e
metodologias científicas, mas esse paradigma entrou e ainda encontra-se em crise, que “[...]
não só é profunda como irreversível” (p. 40). Isso significa dizer que está prestes a sofrer ou
42
Kelvin, William Thomson, 1st Baron (1824-1907), matemático e físico britânico, um dos principais
cientistas e maiores professores de seu tempo. Conhecido também como Lord Kelvin. Investigou
junto com Joule o fenômeno de resfriamento dos corpos conhecido como fenômeno Joule-Thomson.
A escala de Temperatura Absoluta também leva o nome de Temperatura Kelvin, em sua
homenagem.
43
que já vem sofrendo uma revolução, no sentido dado por Kuhn, uma vez que já não dá
conta de explicar a complexidade do mundo hoje.
Há nesse momento a necessidade de se pensar a Ciência com posturas mais
holísticas - isto é, uma ciência que contemple aspectos históricos, dimensões
ambientais, posturas éticas e políticas, e também encharcada no estudo de
saberes populares e nas dimensões das etnociências
43
– proposta que traz
nítidas vantagens, especialmente se pensarmos na ciência que se aprende
como um saber escolar (CHASSOT, 2004, p. 256).
Essa é uma das grandes rupturas científicas que impulsionaram / impulsionam a
quebra de paradigma da Ciência Moderna. Segundo o autor, a Ciência deixa de ser pensada
como pronta e acabada
.
“A marca da ciência dos nossos dias é a incerteza” (CHASSOT,
2003a, p. 256). Tais incertezas são uma realidade que marcam a chamada Ciência Pós-
moderna, que opera numa lógica de possibilidades e complexidade, e não de certezas
absolutas.
pr Para Kuhn, fazer Ciência é como montar um quebra-cabeça, porém com a radical
violação de uma regra básica, presente naquilo que se constitui o domínio público em termos
de montar um quebra-cabeça: quando se faz Ciência, podem faltar ou sobrar peças.
Concordemos que ser kuhniano é ter uma postura diferente daquela que usualmente nos foi
/ é passada em relação à Ciência. Para Kuhn, não há uma
Ciência pronta. A Ciência normal
pode entrar em crise – isto é, o paradigma que a explicava torna-se obsoleto e deixa de ser
uma descrição ou um bom modelo, provocando o surgimento de um outro modelo para
explicar determinado acontecimento científico. Há situações em que a mudança é tão radical
que Kuhn a denomina de “revolução científica”. Por exemplo, a passagem do criacionismo
para o evolucionismo é conhecida como revolução darwiniana – na linguagem kuhniana, há
uma mudança de paradigma.
O novo paradigma científico opõe a incerteza da razão entregue a si mesma à
certeza da experiência ordenada e avança pela observação descomprometida, livre e
sistemática dos fenômenos naturais. Maria Cândida de Moraes (2003) afirma que um
paradigma determina, através de suas teorias e ideologias, uma visão de mundo
44
. Segundo
a autora, vem surgindo na contemporaneidade uma nova maneira de pensar e compreender
a realidade, o que ela chama de Paradigma Emergente. Tal paradigma tem como base “uma
visão sistêmica, complexa e transdiciplinar dos fenômenos, eventos e processos que
43
Etnociências: refere-se ao conjunto de conhecimentos tidos por um determinado grupo. Assim,
podemos falar na etnomatemática dos sem-terra; na etnobotânica de uma tribo indígena. Por
exemplo, a etnoastronomia refere-se ao estudo dos conhecimentos astronômicos segundo a
formulação que estes recebem nas culturas dos diversos povos e grupos sociais [...] (nota
pertencente ao texto citado).
44
caracterizam o quadro epistêmico atual [...]” (MORAES, 2003, p. 142). A autora afirma que o
paradigma da
Complexidade
, defendido por Edgar Morin, permite um pensamento complexo
e sistêmico, ao invés de um pensamento fragmentado e simplificado, o que vai ao encontro
da
episteme a ciência
do mundo contemporâneo
45
, pois
[...] a atual dinamicidade dos processos de construção do conhecimento, a
evolução da ciência e da tecnologia vêm exigindo, além de novos espaços
para trafegar o conhecimento, também novas metodologias, novas práticas
pedagógicas fundamentadas em novos paradigmas da Ciência [...]
(MORAES, 2003, p. 143).
Nesse novo paradigma científico
46
apontado por Moraes (2003), os fundamentos
baseados nos conceitos mecanicistas, cartesianos e positivistas perderam espaço para
conceitos mais sistêmicos que permitem uma visão de totalidade indivisível, na qual o
universo passa a constituir “uma grande teia onde tudo está interconectado” (IBIDEM, p.
149).
Morin (2000b) afirma que a Ciência estimada para o século XXI se baseia na
incerteza, ao contrário da Ciência do século XX, que se baseou nas certezas. Para o autor, as
incertezas físicas, biológicas e a própria incerteza humana (cognitiva e histórica) existem
desde os primórdios da humanidade – a Educação e a Ciência é que sempre fizeram questão
de negá-las
47
.
Claude Chrétien (1994) chama a atenção para o que ele intitula de “lucidez de
novos cientistas cautelosos” (p. 32). Estes trabalham numa perspectiva científica que
estabelece um diálogo imprevisível com a natureza, o que, segundo o autor, adquire um tom
socrático: “só sei que nada sei...”. Argumenta-se que não há o que ser “desvelado”,
“revelado” ou “descoberto” na natureza, termos muito utilizados até hoje por cientistas que
trabalham em busca da “verdade”.
44
Para Moraes (2003, p. 147), paradigmas “[...] influenciam comportamentos, padrões, valores,
símbolos e produtos resultantes dos sistemas de referências que estão sendo utilizados [...]”.
45
No sentido de atual, de atualidade.
46
Para Moraes, as teorias que sustentam tal paradigma têm como base “[...] a nova biologia, a nova
física, a cibernética [...]” (MORAES, 2003, p. 148). Segundo ela, as contribuições das teorias
biológicas, em especial as teorias de Humberto Maturana & Varela, também embasam o paradigma
emergente, uma vez que, conforme as idéias dos autores, “[...] a organização de um sistema vivo
resulta do conjunto de relações entre os componentes do sistema [...] Trata-se, portanto, de uma rede
de processos de produção nos quais a função de cada componente consiste em participar da
produção ou transformação de outros componentes da rede. [...] toda a rede produz continuamente a
si mesma. Ela é ao mesmo tempo, produzida pelos seus componentes e, por sua vez, os produz”
(MORAES, 2003, p. 151). Dessa forma, é condição necessária a existência da autopoiese, entendida
como a força de autocriação e auto-organização.
47
De acordo com Morin (2000), o papel da Educação frente às incertezas é o de preparar os alunos
para enfrentá-las, “conscientizando-os” de que a sua própria vida é uma aventura incerta.
45
Vale ter presente que cada Ciência produz a sua verdade, assim como constrói
também os seus critérios para análise de sua veracidade. Porém é bom recordar que tais
verdades têm de ser vistas como provisórias. O que hoje é tido como certo amanhã pode
não ser. Paul Feyerabend (1977), em seu importante livro
Contra o Método
já no título
mostrando-se como um libelo ao método científico –, assume a postura de um anarquista
epistemológico, o que pode ser mostrado, por exemplo, na afirmação seguinte:
dada uma regra qualquer, por “fundamental” e “necessária” que se afigure
para a Ciência, sempre haverá circunstância em que se torna conveniente
ignorá-la, como adotar regra oposta. [...] Qualquer idéia, embora antiga e
absurda, é capaz de aperfeiçoar nosso conhecimento. [...] o conhecimento
de hoje pode, amanhã, passar a ser visto como conto de fadas; essa é a via
pela qual o mito mais ridículo pode vir a transformar-se na mais sólida peça
da Ciência (1985, p. 71).
Aceito que não seja fácil ser feyerabendiano, mas vale a pena ensaiarmos posturas
que se aproximem daquelas que ele apresenta. Isso exige, muitas vezes, novos
posicionamentos no nosso fazer e ensinar Ciência. Veiga Neto (2002) afirma que, no
pensamento pós-moderno, que embasa a concepção de uma Ciência Pós-Moderna, o que
interessa é problematizar todas as certezas. Na perspectiva pós-moderna, o pesquisador ou
cientista assume uma “humildade epistemológica” que busca
insights
, e não uma verdade
absoluta ou uma maneira privilegiada de analisá-lo, como querem os cientistas que atuam a
partir dos pressupostos epistemológicos da Ciência Moderna.
Assim, é na busca de um olhar inspirado no pensamento Pós-Moderno que busco
rupturas. Passei / passo a ver meu objeto de pesquisa fundamentada numa visão de Ciência
que, além de ser vista como uma
linguagem
e um
constructo humano
, portanto, falível,
busca combater o cientificismo, que é a crença exagerada no “poder” da Ciência como
detentora da verdade e/ou suposição de que ela traz efeitos apenas benéficos
(CHASSOT,
2003c). Chrétien (1994) explica que o cientificismo, por sua vez, atribui um sentido
mitológico à Ciência, como se ela fosse superior a todas as demais formas de conhecimento,
ditando regras e atingindo todas as instâncias: cultural, educativa, política, econômica, etc.
Permeando e constituindo, dessa forma, todo o tecido social.
É dentro de uma perspectiva que se oponha ao cientificismo que defendo uma
alfabetização científica e um estudo da Ciência que permitam o entendimento e a
compreensão dos saberes científicos. Tal estudo permitirá que os estudantes consigam
descrever a natureza numa linguagem dita científica
48
.
48
Podemos ler o mundo de diferentes formas, usando, para isso, diferentes “lentes”. Olhar o mundo a
partir das lentes da Ciência é apenas uma das maneiras de se compreender o mundo natural, o que
não significa que seja a melhor ou a mais correta.
46
Compreendo que, para desenvolver uma alfabetização científica, também faz-se
necessário compreender o ensino da Ciência (ou das Ciências) não mais como um acúmulo
de informações (saberes, teorias ou explicações científicas), mas sim como uma
possibilidade de leitura científica dos fenômenos naturais (manifestações do universo). O
analfabeto científico é aquele ou aquela que não consegue fazer uma leitura do universo. É
como tentar entender um texto em um idioma que não conhecemos ou em que não somos
alfabetizados: por mais que tentemos, acabamos não compreendendo o conteúdo do texto
(CHASSOT 2003c).
Parece que merece ser questionado, liminarmente, se essa
alfabetização científica
é
algo próprio, ou melhor, se é de interesse apenas daqueles que estão diretamente ligados à
Ciência. Usualmente, conhecer a Ciência é assunto quase vedado àqueles que não
pertencem a essa esotérica comunidade científica. Quanto mais ensinarmos conhecimentos
inúteis que servirão para serem vomitados em avaliações de conteúdos, estaremos excluindo
mais pessoas do acesso à alfabetização científica e, assim, de uma cidadania crítica.
Há, todavia, uma outra dimensão em termos de exigências: propiciar aos
homens e mulheres uma alfabetização científica na perspectiva da inclusão
social. Há uma continuada necessidade de fazermos com que a Ciência
possa ser não apenas medianamente entendida por todos, mas, e
principalmente, facilitadora do estar fazendo parte do mundo (IDEM, 2003b,
p. 35).
André Giordan e Mariana Sanmartino (2004) atentam para o quanto a produção
científica é essencial na produção do conhecimento e quanto atua diretamente na melhoria
de vida da população e no avanço tecnológico. Por isso, tal produção não pode ser privilégio
dos
experts
de determinada área. Os conhecimentos científicos e tecnológicos devem /
deveriam ser considerados como ferramentas a serviço dos indivíduos, de forma a serem
aplicados a situações reais (que carecem de sentido) junto a alunos e alunas no campo
educacional.
Afortunadamente, damo-nos conta – e isso é algo bastante recente – do quanto há
necessidade de aqueles que ensinam disciplinas escolares, especialmente as da área de
Ciências, fazerem a migração do
esote ismo
para o
exote ismo
, diferentemente do que
defendem alguns, que preferem ver valorizado um conteúdo elitista, asséptico e dogmático,
desvinculado da formação pedagógica. Cabe também a uma dissertação gerada em um
Programa de Pós-Graduação em Educação ajudar a tentar abrir a caixa preta em que os
cientistas com sua linguagem hermética e esotérica converteram a Ciência. É nesse
convencimento que se sustenta esta dissertação.
r r
47
Essa perspectiva é a que mais tenho buscado e a que esteve como um de meus
objetivos ao realizar este trabalho dissertativo: promover discussões não só na escrita desta
dissertação, mas também na experiência pedagógica realizada junto aos alunos,
contribuindo para o processo de inclusão científica dos estudantes do Ensino Médio (mais
especificamente da turma 1N1 da Escola Parobé). Isso porque conhecer a Ciência e
compreendê-la acabou / acaba se constituindo como um privilégio da comunidade
acadêmica.
Já discuti em diversos textos o quanto há necessidade de nós professores e
professoras de disciplinas científicas fazermos a migração do
esoterismo
para o
exote ismo
. Assim a primeira explicação para exclusão que
decretamos a muitos é fazermos do nosso instrumental de leitura da
natureza algo hermético ou esotérico (CHASSOT, 2003b, p. 37).
r
Buscando amenizar tal exclusão apontada por Chassot, pretendi, na experiência
pedagógica realizada, aproximar a
Ciência da Universidade
da
Ciência da Escola
, utilizando a
Plataforma Lattes como ferramenta de pesquisa. Permitir o acesso à Produção Científica da
Universidade e de outras instituições ligadas à Ciência através da exploração dos currículos
de pesquisadoras e pesquisadoras pode ser entendido como uma possibilidade de inclusão
científica. No caso dos estudantes da Escola Parobé, tal vivência permitiu a apresentação e o
conhecimento de um universo que era até o momento desconhecido, “vedado” e inacessível
a eles.
2.2 Alfabetização científica-tecnológica-digital: quais necessidades?
Apresentados alguns pressupostos teóricos acerca da alfabetização científica, cabe
neste momento problematizar a necessidade da alfabetização científica-tecnológica-digital,
considerando-se uma argumentação baseada nas relações que envolvem Ciência e
Tecnologia e suas implicações na sociedade contemporânea.
Gilles Gaston Granger (1994) problematiza a relação entre Ciência e tecnologia. O
autor analisa como se desenvolveu o processo progressivo de associação dos saberes
técnicos aos saberes científicos ou à Ciência. A partir de uma vertente histórica, Granger faz
uma distinção entre “técnicas empíricas” e “técnicas científicas”. As técnicas empíricas são
aquelas tecnologias que não estão penetradas de saberes científicos e que são derivadas de
experiências e práticas, não necessariamente de explicações teóricas “científicamente
48
comprovadas”, ao passo que as “técnicas científicas” são aquelas tecnologias que derivam
ou são produtos de conhecimentos científicos.
As técnicas empíricas, embora eficazes, foram / são vistas muitas vezes como
produtos de crenças supersticiosas ou consideradas sem fundamento (uma vez que não são
consideradas “científicas”). Nessa perspectiva, “[...] os progressos (tecnológicos) são, então,
no sentido pleno da palavra,
invenções
devidas à engenhosidade ou ao gênio (ou
genialidade) de alguns indivíduos, que na maioria das vezes foram precedidas, é verdade,
por tentativas, menos felizes, mas sugestivas [...]” (GRANGER, 1994, p. 26).
Esses
inventores
, em sua maioria, também eram artistas (Leonardo da Vinci
49
1452-1519 é um bom exemplo). Essa integração (Arte-técnicas), que começa a ocorrer na
época do Renascimento, facilitou a instauração de uma relação mais estreita entre Ciência e
técnica, pois tais descobertas já não ficavam mais à margem da corrente geral de evolução
do pensamento. Dessa forma, “as técnicas tenderam progressiva e desigualmente a
desenvolver as aplicações da Ciência, as Ciências também lucraram com problemas
inspirados por técnicos
(IBIDEM, p. 26).
Mas é somente a partir da segunda metade do século XVIII, com a Grande Revolução
Industrial européia, que se perpetua um saber técnico fundamentado nos conhecimentos
científicos propriamente ditos. Apesar de o autor conceber a história das técnicas de forma
autônoma à história da Ciência, reforça que os progressos técnicos não se dão isoladamente
– dependem de contextos globais que incluem o progresso da Ciência, bem como de
circunstâncias econômicas e sociais. Hoje a relação entre Ciência e tecnologia é estreita, e
quase não podemos conceber as novas tecnologias que não tenham como base dados
científicos
50
(GRANGER, 1994). Talvez pudesse antes acrescentar que a extensão das
discussões entre Ciência e Tecnologia são quase infindáveis
51
.
49
Leonardo da Vinci, além de ser um excelente artista e ter múltiplas profissões, tornou-se um
grande cientista, abordando a Ciência pelo seu lado prático, admitindo como métodos científicos a
observação da natureza e a experimentação (ROSSI, 1992).
50
As idéias do autor permitem entender tecnologia e técnica como sinônimos.
51
Para exemplificar o quanto, muitas vezes, é complexo tentar explicar ou definir algo, trago o
exemplo de uma obra recente que, em mais de 1300 páginas, traz discussões acerca do que é
tecnologia. [VIEIRA PINTO, Álvaro. O Conceito de Tecnologia, (vol. 1) 532 págs e (vol. 2), 796
págs. Rio de Janeiro: Ed. Contraponto, 2005] Esse mesmo conceito, talvez com duas ou três linhas,
estaria explicado ao dizermos, segundo registros de dicionários
como o Aurélio e o Houaiss, que
tecnologia é o conjunto de conhecimentos, particularmente princípios científicos, que se aplicam
a um determinado ramo de atividade; ou é teoria geral e/ou o estudo sistemático sobre técnicas,
processos, métodos, meios e instrumentos de um ou mais ofícios ou domínios da atividade humana
(p.ex., indústria, ciência etc.). Na obra referida, resenhada no caderno Mais! da Folha de São Paulo
de 21 de agosto de 2005, Álvaro Vieira Pinto critica o deslumbramento contemporâneo com a
tecnologia, livrando-a da condição de panacéia ou de causadora dos males modernos, detalhes que,
por exemplo, não aparecem numa definição reducionista como aquela antes apresentada.
49
Quando falamos em novas tecnologias, é válido ainda tensionar o próprio conceito
de novo. O que é novo? O telefone celular com dois anos de uso ou o telefone fixo com 10
anos? Há 15 anos, o CD destronou o LP e hoje ele já está com dias contados. Vivemos uma
neopatia.
Ela atinge gravemente nossos fazeres. Neopatia
52
é a doença moderna cuja
característica é ter sempre tudo novo: o último carro, o último computador, a última versão
do Windows. Aliás, essa doença tem diferentes síndromes, que afetam as pessoas em
momentos diferentes. Há alguns dias, era ter o último modelo de telefone. Hoje o surto
através do qual a neopatia se manifesta é o de ter o último modelo de câmara fotográfica.
Amanhã será... isso nenhum de nós sabe. Mas breve o mercado definirá.
Nilva Schroeder (2001), em sua dissertação de Mestrado, analisa alguns significados
atribuídos à palavra
tecnologia
53
. A autora apresenta duas perspectivas de definições: uma
que liga o termo à produção de bens materiais e serviços e outra que permite uma visão
mais ampla, que “[...] concebe a tecnologia como atividade humana” (SCHROEDER, 2001, p.
53).
Para Tajra (2000, p.33), o termo
tecnologia
vai muito além de equipamentos,
aparatos ou instrumentos tecnológicos. A autora classifica as tecnologias em três grandes
grupos: tecnologias físicas, tecnologias organizadoras e tecnologias simbólicas. As
tecnologias físicas “são as inovações de instrumentais físicas
[...] (computador, celular,
satélite, telefone, etc.) que estão relacionadas com a Física, Química, Biologia”. As
tecnologias organizadoras são
as formas de como nos relacionamos com o mundo [...] os
métodos de ensino, seja tradicional, construtivista, montessiorano, são tecnologias
organizadoras de aprendizagem”. As tecnologias simbólicas são os símbolos de comunicação.
Todas as tecnologias se inter-relacionam e estão interligadas.
Nesse sentido, para a autora, as escolas também são tecnologias na medida em que
apresentam “alternativas de solução” para a educação e o processo de ensino e de
aprendizagem. Essa conceituação mais ampla (e filosófica) do termo “tecnologia” permite
uma visão mais complexa da influência das tecnologias nas mudanças que vêm ocorrendo na
sociedade a partir do surgimento das novas tecnologias, em especial as Novas Tecnologias
52
O neologismo neopatia é usado por Chassot, que, por sua vez, o viu sendo usado por primeiro pelo
Prof. Dr. Guy Bajoit, da Universidade Católica de Louvain, em 9 de setembro de 1998, então
professor visitante do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNISINOS.
53
A autora realizou uma densa pesquisa sobre o termo tecnologia e afirma, a partir de tal análise, que
o termo seguidamente indica um artefato (como computador, televisão, aparelho celular, etc.). Já no
que tange à relação entre Ciência e tecnologia, é corriqueiro definir a tecnologia como aplicação da
Ciência. Algumas vezes, tecnologia também é definida como “[...] uma técnica que utiliza
conhecimento científico” (SCHROEDER, 2001, p. 48).
50
de Comunicação e Informação, mais especificamente, a Informática e a Internet, focos desta
pesquisa.
O advento de novas tecnologias na sociedade traz consigo novas demandas nos
campos cultural, social, econômico e político. A tecnologia alterou as formas de trabalho em
fábricas, escritórios, bancos, etc. Sem que percebamos, ela faz parte de nosso cotidiano.
Atualmente, em muitos casos, informar só o endereço no qual residimos já não é suficiente;
é comum, ao preenchermos fichas ou cadastros, que nos peçam nosso endereço eletrônico.
Isso demonstra o impacto das tecnologias em nossas vidas
54
.
Com relação ao termo
impacto
, que eu mesma utilizei acima, o filósofo francês
Pierre Lévy (2003) faz críticas à sua utilização. Para ele, a idéia de “
impacto tecnológico
” é
inadequada, já que a tecnologia se torna comparável a um “
projétil (pedra, obus, míssil
)”, o
que compreende uma leitura inadequada do fenômeno, como se as técnicas viessem de
outro planeta ou de um mundo que não fosse o humano, e sim o das máquinas.
Parece-me, pelo contrário, que não somente as técnicas são imaginadas,
fabricadas e reinterpretadas durante seu uso pelos homens, como também
é o próprio uso intensivo de ferramentas que constitui a humanidade
enquanto tal (junto com a linguagem e as instituições complexas) (LÉVY,
2000, p. 21).
Nessa perspectiva, a tecnologia não é um ator autônomo que faz parte de um
mundo exterior ao mundo dos homens ou que existe / existiria independentemente do resto
– “a técnica é um ângulo de análise dos sistemas sócio-técnicos globais, “[...] um ponto de
vista que enfatiza a parte material e artificial dos seres humanos [...]” (LÉVY, 2000, p. 22)
.
Assim, o mundo humano também é um mundo técnico, tornando-se impossível separar as
pessoas vivas e pensantes (humanos) de entidades materiais e artificiais (tecnologias ou
máquinas). Ao invés de separação, existe uma inter-relação nas atividades humanas entre
esses elementos.
2.2.1 Máquinas e seres humanos: quais limites?
Integre-se, pois, à corrente. Plugue-se. Ligue-se. A uma tomada. Ou a uma
máquina. Ou a outro humano. Ou a um ciborgue. Torne-se um: devir-
ciborgue. Eletrifique-se. O humano se dissolve como unidade. É só
eletricidade. Tá ligado? (SILVA, 2000, p.16).
54
Alguém ligado ao mundo da academia, por exemplo, que não tiver endereço eletrônico se torna um
excluído da comunidade, não podendo trocar informações com seus pares. Não ter acesso à Internet
quase determina hoje muitas restrições para se fazer pesquisa nas mais diferentes áreas do
conhecimento.
51
Talvez aqui coubesse uma discussão mais extensa do cada vez mais imperceptível
limite das fronteiras do humano. Dou-me conta de que isso, inclusive, foi tema do IV
Congresso Internacional de Educação, realizado em 2005 em nosso Programa de Pós-
Graduação em Educação na UNISINOS. Assumo que sou pretensiosa ao tentar trazer, nesta
dissertação, uma discussão acerca desse tema, utilizando autores como Attico Chassot,
Donna Haraway, Manuel Castells, Timoty Lenoir e Tomaz Tadeu da Silva.
Castells (2001) afirma que há uma crescente integração entre seres humanos e
máquinas e que muitas tecnologias podem ser vistas como amplificadores e extensão da
mente humana. Tal integração, relação (ou seria fusão?) vem alterando fundamentalmente
“o modo pelo qual nascemos, vivemos, aprendemos, trabalhamos, produzimos, consumimos,
sonhamos, lutamos ou morremo
s
” (p. 69).
É a partir de tal integração que entendo que, aos poucos, vamos nos tornando
ciborgues
55
, como aponta Haraway (2000). Nesse sentido, Silva (2000) levanta algumas
questões que vejo como pertinentes para problematizar a relação máquina-humano. Para o
autor, é na questão da subjetividade humana que a figura do ciborgue nos põe a pensar
sobre o cruzamento de fronteiras entre “humanos e não-humanos, cultura e natureza e
entre diferentes tipos de subjetividade” (p.19).
Para o autor, de um lado, temos “[...] a mecanização, a eletrização dos humanos e,
de outro, [...] a humanização ou subjetivação da máquina” (SILVA, 2000, p. 14). A simbiose
da máquina com o organismo, como no caso de uma pessoa que usa marcapasso ou uma
perna mecânica, por exemplo, põe-nos a pensar: onde começa o humano e onde termina a
máquina? Assim, a imagem do ciborgue significa borramento e transgressão de fronteiras, o
que fica evidente a partir do momento em que já não sabemos responder tal
questionamento.
Lenoir (2005) contribui para a discussão sobre as fronteiras entre máquinas e
humanos argumentando que o futuro pós-humano já está acontecendo com a evolução de
áreas como a Robótica Celular e a Nano Tecnologia, em que há uma fusão entre o digital e o
“real”, como no caso dos chamados ciborgues. O tecnohumanismo, pensado pelo autor
como “uma nova espécie de abordagem crítica que se concentra em objetivos humanísticos
por meio da tecnologia”, tem como preocupação “buscar uma prática crítica que leve a uma
parceria positiva entre a natureza, os seres humanos e as máquinas inteligentes [...]”
(LENOIR, 2005, p. 66-67).
55
“Ciborgue” é definido por Haraway (2000, p. 41) como “um organismo cibernético, um acoplamento
de máquina e humanismo, uma criatura de realidade social e também uma criatura de ficção”.
52
Apesar de parecer estranho para alguns afirmar que as fronteiras entre homem e
máquina estejam diminuindo ou se diluindo e embora a idéia de ciborgue e robôs pareça
possível somente em filmes de ficção científica, compreendo que convivemos e utilizamos
robôs cotidianamente, como quando recebemos uma mensagem no celular ou por correio
eletrônico – quem nos escreve a mensagem é humano, mas quem nos envia a mensagem
nada mais é que uma máquina robótica. Como bem lembra Silva (2000), as tecnologias
ciborguianas
56
permitem tensionar o que caracteriza a máquina e o que caracteriza o
humano e problematizar, baseada nas teorias pós-modernas, em uma análise mais profunda
e filosófica, a idéia de um sujeito essencialista, visto como unidade e centro, que tem sua
raiz nas idéias modernas. Dessa forma, “a
imagem
do ciborgue nos
estimula
a repensar a
subjetividade humana; sua realidade nos obriga a
deslocá-la
[grifos do autor]
(SILVA, 2000,
p. 15). Cabe uma continuada reflexão crítica acerca de quais modos de subjetivação e
subjetividades as tecnologias produzem.
Ao dissertar sobre tais tensionamentos, dou-me conta de que, por exemplo, na
elaboração deste trabalho, meu companheiro inseparável foi o computador, logicamente
aliado aos livros e a seus respectivos autores. Não foram poucas as vezes que, na parte final
da escrita, deixei de viajar porque não tenho computador portátil (
no ebook
). Cheguei a
levar comigo meu computador pessoal (imaginem o transtorno), pois entendia que não
poderia dar andamento à minha produção textual (mesmo que pudesse ler e rascunhar ou,
ainda, escrever em papel o mesmo texto para posteriormente digitá-lo). Criou-se, assim, um
sentimento de dependência, como se a máquina fosse minha extensão, da qual eu
necessitava imprescindivelmente para trabalhar ou terminar esta dissertação
t
57
. Buscando
aproximações teóricas, utilizo as idéias de Chassot proferidas durante o já referido congresso
na UNISINOS:
[...] Se eu pedisse para que construíssem no imaginário de cada um de
vocês “um robô”, muito provavelmente fariam um desses monstrengos que
conhecemos de filmes de ficção científica. Vocês já imaginaram que a
maioria das mensagens eletrônicas que recebem, mesmo aquelas que
carinhosamente lhes chamam pelo nome, usualmente até com uma
indisfarçável intimidade, pelo primeiro nome, são robôs que as enviam [...]
(CHASSOT, 2005).
56
Silva, baseado em Gray, Mentor e Figueroa Sarriera (1995, p. 3), afirma que as tecnologias
ciborguianas podem ser: “1. restauradoras: permitem restaurar funções e substituir órgãos e membros
perdidos; 2. normalizadoras: retornam as criaturas a uma indiferente normalidade; 3.
reconfiguradoras: criam criaturas pós-humanas que são iguais aos seres humanos e, ao mesmo
tempo, diferentes deles; 4. melhoradoras: criam criaturas melhoradas, relativamente ao ser humano”
(SILVA, 2000b, p. 14).
57
Acredito que isso não acontece / aconteceu somente comigo, pois já existem muitos estudos em
diferentes áreas, como Psicologia, Sociologia e Educação, que se destinam a pesquisar sobre as
relações que se estabelecem entre os seres humanos e as máquinas ou as relações entre humanos
que têm início através das máquinas, em especial os computadores.
53
Chassot (2005) contribui para a discussão trazendo uma outra abordagem, que
atenta para as parcerias que estabelecemos com as máquinas ou “robôs”, como, por
exemplo, buscadores na Internet, como o Google e assemelhados. É preciso reconhecer que
uma busca na Internet através desses mecanismos é muito mais eficiente e ágil (além da
capacidade e velocidade de informação) se comparada com a atuação humana para o
mesmo fim. Imagine realizar a mesma pesqui sa presencialmente em uma biblioteca
certamente levaríamos dias para rastrear uma quantidade de dados igual à que o
computador nos mostra quase instantaneamente.
Em nosso dia-a-dia, quantas de nossas atividades rotineiras são feitas em
comunhão com máquinas... Cotidianamente, interagimos com artefatos tecnológicos sem
nos darmos conta disso. Alguns artefatos são bem sofisticados (possuem “cérebro” e
memória), como no caso de nosso computador pessoal; outros nem tanto, como nosso
aparelho de televisão, microondas, etc. Isso sem falar nas NTCI, que aumentam
consideravelmente o grau de interatividade
58
que podemos alcançar com ou através dessas
tecnologias. Basta olhar, por exemplo, o crescimento da venda de aparelhos celulares dos
últimos anos, que traduz um aumento dos humanos com extensões tecnológicas. Na área
cirúrgica, por exemplo, quantos de nós já não fomos operados por robôs sem que nos
déssemos conta disso? Chassot (2005) traz um exemplo interessante:
Há uma novidade mais recente, que talvez dentro de não muitos anos seja
algo obsoleto: o corpo humano sendo suporte para transmissão internéticas.
Notícias dos jornais
59
de menos de duas semanas passadas, dizia que no
Japão está em funcionamento dispositivo que aproveita os campos elétricos
existentes na superfície da pele para transmitir informações a velocidades
quase 50 vezes superior a dos acessos por linha discada. Assim, por exemplo
um casal poderá trocar arquivos de músicas e vídeos enquanto namora ou
poderá fazer o download de músicas enquanto dança (IBIDEM, p. 6)
Mesmo parecendo surreal imaginar tal situação, cabe advertir que muitas tecnologias
hoje presentes cotidianamente em nossas vidas, na época em que foram anunciadas (como
no caso da reportagem acima), eram pensadas como distantes, inacessíveis ou até “inúteis”.
A própria Internet, utilizada como material de pesquisa nesta dissertação, quando foi
anunciada na década de 80 não pretendia se tornar uma tecnologia tão difundida e
acessível, nem afetar tanto os modos de comunicação e de produção na sociedade como
vem afetando.
58
Segundo Marco Silva (1999), não há precisão no surgimento do termo interatividade, mas muitos
autores apontam para a metade dos anos 80. Enquanto interação é um termo genérico utilizado nas
diversas áreas do conhecimento, o termo interatividade surge da necessidade da informática e dos
meios de comunicação em especificar a interação propiciada pelas novas tecnologias. Assim, a
interatividade contempla “complexidade, multiplicidade, não-linearidade, bidirecionalidade,
potencialidade, imprevisibilidade (...)” (SILVA, 1999, pg. 132).
54
Muitas vezes, não percebemos as fantásticas modificações que existem em nosso
redor, muitas delas propiciadas pelas novas tecnologias. Há não muitos dias, ouvi um relato
sobre uma menina recém alfabetizada (em português) que, ao ser convidada pela sua avó a
fazer escolhas de ovos de páscoa, disse: “Vó, fiz uma pesquisa no Google e vi que coelho de
páscoa não existe, é uma invenção dos adultos”. É na consciência dessas realidades que me
proponho a investigar o quanto precisamos usar novas tecnologias para fazer Educação,
uma vez que novas tecnologias cada vez mais sofisticadas produzem efeitos que atravessam
nosso cotidiano escolar como no exemplo citado acima.
Áreas como a Educação a Distância
60
, com o advento das novas tecnologias de
comunicação e informação, ganharam novas possibilidades de exploração. O surgimento de
tecnologias como a Realidade Virtual
61
(RV) permitiu / permite formas de interatividade
jamais pensadas em tempos não tão remotos. Daniele Guimarães Alves
et al
(2005) definem
Realidade Virtual como sendo uma forma avançada de interação do usuário com o
computador.
A oportunidade de interagir com os chamados “mundos virtuais”, que também podem
ser denominados como Ambientes Virtuais (AV), pode / poderá permitir experiências
interessantíssimas, já que “o usuário não estará mais em frente ao monitor, mas sim, sentir-
se-á dentro da interface”, como afirmam Fabio Camargo
et al
(2005, p. 2). A exploração (ou
seria melhor dizer imersão) de tais mundos-se através de ambientes construídos em três
dimensões (3D). Torna-se possível realizar aplicações, manipulações e interações dos
“dados” em tempo real, usando-se não só os sentidos para tal exploração, mas, em alguns
casos, todos os demais membros do corpo. Muitos programas de simulação utilizam tal
tecnologia e permitem esse tipo de interatividade. Entendo que, na exploração de “mundos
virtuais”, fica difícil definir os limites entre a máquina e o humano, até porque o limite
imposto por tal experiência não é o da tecnologia, mas sim o da criatividade e imaginação
59
Por exemplo: Zero Hora, dia 24 mar. 05, p. 24 (nota pertencente ao texto citado).
54
Conforme Maria Umblina Caiafa Salgado (2004): “Nos últimos anos, vem crescendo o
reconhecimento da importância da EAD como alternativa para a formação de professores e outros
profissionais. A própria Lei de Diretrizes e Bases (LDB) incentiva esse tipo de estratégia, e a recente
abertura trazida pela portaria Ministerial nº 2.253 de 18/01/01 estimulou a apresentação de inúmeros
projetos por diferentes instituições de ensino superior e outros órgãos como secretarias de educação
e o próprio MEC” (SALGADO, 2005, p.154). A Educação a Distância caracteriza-se geralmente pela
distância geográfica (física) entre o aluno e a instituição de ensino e ainda entre professor e aluno. As
tecnologias de informação e comunicação permitiram um grande avanço nessa área, principalmente
com o advento da Internet, como aponta Jean Loiselle (2002).
61
O termo virtual mereceria uma extensa discussão, tanto que Pierre Lévy tem um livro inteiro
intitulado O que é o virtual para realizar tal discussão. Por ora, entendo, a partir do autor, que “[...]
virtual é o que existe em potência e não em ato [...]. Com todo rigor filosófico, o virtual não se opõe ao
real, mas ao atual: virtualidade e atualidade são somente duas maneiras de ser diferentes”
(LÉVY,
1997, p. 13).
55
do humano. Desse modo, pode-se dizer que organismo e máquina se tornam “um só” no
momento em que vivem tal interatividade.
Uma outra tecnologia que vale a pena ser trazida no âmbito desta discussão é a dos
agentes virtuais comunicativos, programas utilizados em ambientes virtuais que apresentam
características autônomas durante a comunicação / interação. Algumas pesquisas recentes,
como a apresentada por Felipe Maino Bica
et al
(2006), buscam o desenvolvimento de um
Agente Comunicativo Autônomo Emocionado, que
[...] é um tipo específico de agente autônomo sintético que visa estabelecer
diálogos amigáveis com o usuário, podendo ser utilizado como interface
para sistemas, assim como aplicações de entretenimento e auxiliar no uso
de ferramentas profissionais e de ensino.
O agente comunicativo emocionado foi / está sendo criado para expressar
emoções e reações durante a interação com o ser humano. Em programas de televisão e em
desenhos animados, técnicas semelhantes são aplicadas. A diferença é que, ao assisti-los,
não interagimos com as animações, ao passo que os agentes comunicativos possuem um
alto grau de interatividade, apresentando reações durante a interação com o usuário.
Conforme relatado pelos pesquisadores que criaram tal agente, este foi nomeado
ou “batizado” de MECA. Concordo que soa estranho falar em “batizado robótico” e suponho
não ter havido uma cerimônia de batismo, mas essas são idéias e possibilidades do tempo
tecnologizado em que vivemos. Chassot (2005) traz uma contribuição acerca desses
questionamentos:
[...] Até não parece muito fora de propósito discussões de alguns teólogos
acerca da oportunidade de conferir o sacramento do batismo a robôs.
Talvez não tardará o dia que veremos correndo pregões matrimoniais para
permitir acasalamentos robóticos. [...]
Se discussões acerca da concessão
de sacramentos a robôs podem parecer bizantinas, muito provavelmente há
uma classe de robôs que muito cedo serão excomungados. Estão em testes
novas possibilidades de arbitragens para o futebol. Os jogadores portarão
nas canelas ou nas chuteiras chips que enviarão mensagens a um robô que
arbitrará se o jogador foi atingido pelo adversário ou definirá, por exemplo,
sobre o sempre tão discutido impedimento, que tem duas sumárias leituras:
ou é evidente que o craque de nosso time estava em posição legal ou não
há dúvidas que o jogador do time adversário estava impedido. Quando um
robô apitar diferente disso, excomunguemo-lo, independente de ter sido
batizado ou não [...] (IBIDEM, p. 8).
Recentemente, chamou-me a atenção uma reportagem do jornal
Zero Hora
62
que
falava da suspensão da fabricação (por motivos financeiros) de um cão-robô – “batizado de
Aibo” – que fora comprado por cerca de 150 mil pessoas no mundo todo. Aibo é uma
espécie de mascote-eletrônico criado por uma conhecida empresa de eletrônicos, que
62
TAUB, Eric. A última ninhada do cãozinho robô. Zero Hora , Porto Alegre, 6 de fev. de 2006. Global
Tech, p. 1.
56
através da tecnologia de Inteligência Artificial, realiza todas as ações de um cachorro da
espécie animal (orgânico): late, caminha, reconhece a voz do dono, brinca, etc. Conforme o
texto da reportagem, os fãs ou donos do cãozinho estão muito desapontados com a notícia,
e a maioria o considera “muito mais do que uma peça de plástico dotada de motores e
processadores. Para alguns, as máquinas ganharam vida e personalidades próprias”. Cabe-
me perguntar mais uma vez: onde está o limite entre o humano e o não-humano? Quais as
fronteiras entre a máquina e o ser humano? Quais as relações que estabelecemos com tais
máquinas?
Presumo que, com tais novidades, fique ainda mais difícil limitar as fronteiras do
humano e do não-humano. Tais fronteiras borram-se, cruzam-se, possibilitando novas
percepções de mundo que muitas vezes podem parecer imaginativas ou surreais, mas outras
vezes podem ser reais
63
. Neste momento, tenho mais perguntas do que respostas. Embora
traga discussões e questionamentos acerca dos limites entre humano e máquina, vale
ressaltar que não me considero uma “militante”
64
, não sou defensora da tecnologia do tipo
“boba feliz” e também não me vejo como pertencente ao grupo que sofre de uma espécie de
“tecnofobia incondicional”, conforme aponta Dona Haraway, citada por Silva (2000). Apenas
(e acho que isso não é pouco) acredito que promover uma inclusão científica-tecnológica-
digital na Escola através de uma alfabetização científica-tecnológica-digital (não só dos
estudantes, mas também de professoras e professores) é uma necessidade cultural que
permitiria / permitirá aos agentes escolares o exercício de uma cidadania mais crítica.
Não tenho a intenção de defender que as tecnologias são ou serão a “salvação” da
Educação, apenas considero que elas deveriam integrar-se ao contexto escolar. Entendo que
as tecnologias, juntamente com os saberes e conhecimentos informáticos, fazem parte da
cultura de nosso tempo, atravessando todas as instâncias: cultural, econômica e social e
educacional. Além disso, entendo que nem todos os “avanços tecnológicos” e as chamadas
“descobertas científicas” são socialmente benéficos.
Mas, afinal, as novas tecnologias são boas ou ruins para a sociedade? Resposta: os
dois. Se as tecnologias podem ser vistas como um produto ou uma aplicação da Ciência,
como tal produz ora efeitos positivos, ora efeitos negativos.
Essa pergunta dicotômica (que
pode ser acusada ainda de simplista, como toda dicotomia) é problematizada por Haraway
(2000), que, através da imagem e metáfora do ciborgue, vai além e põe em xeque não os
63
Muitos filmes podem / poderiam ajudar a discussão sobre os limites do humano e das máquinas:
Matrix, Inteligência Artificial, Minority Report, Eu, Robô, entre outros.
57
aspectos positivos ou negativos das tecnologias, mas sim a relação entre o humano e a
máquina (representada pelo mito do ciborgue), tensionando outras dicotomias, como mente
/ corpo, organismo / máquina, natureza / cultura.
Talvez pudesse trazer para a tecnologia a situação que Chassot (2004, p. 13) traz
para a ciência – nem fada, nem bruxa ou nem fada, nem ogro. A tecnologia seria um Golem,
como explica:
[...] há um tempo dicotomizava a Ciência como sendo ora uma fada benfazeja
ou ora uma bruxa; ao fazer outras leituras acerca da bruxaria, que estão no
livro
Educação conSCiência
(Chassot, 2003, p. 211-234) revisitados
vários conceitos acerca das bruxas, tendo-as como pólo das disputas pelo
conhecimento, entre homens e mulheres, passei a falar que a Ciência era ora
uma fada benfazeja ou ora um ogro maligno, ficando no eterno duelo entre o
Bem e o Mal, que diferia da anterior apenas na personificação do Mal. Mais
recentemente, abandonei essa dicotomia, e adiro a uma outra metáfora para
Ciência, que aprendi com Colins & Pinch (2003), mesmo que seja mais
polêmica, me parece mais adequada, dizendo que a Ciência se parece mais ao
Golem
(Goilem), aquele ente da mitologia judaica que é descrito com um
gigante de barro que desconhece sua verdadeira força e se assemelha muito a
um bobão, mas que tem ações, às vezes, de sábio e outras de sabido.
Assim, podemos pensar na tecnologia como uma fada, como uma bruxa ou como
um
Golem
, como indica Chassot, mas o mais importante é que percebamos que existe, sim,
uma relação (ou relações) entre humanos e máquinas. Para isso, basta olhar a tecnologia (e
a Ciência) como uma invenção humana, fruto de sua / nossa inteligência.
Poderíamos aplicar o mesmo questionamento à Educação, perguntando: as
tecnologias educacionais trazem benefícios ou malefícios ao campo educacional? Juana M.
Sancho (1998) ajuda-nos a problematizar possíveis respostas afirmando que existem duas
posturas profissionais quase extremas quando se fala em tecnologia educativa ou
educacional
65
, classificando-as em
tecnofilia
e
tecnofobia
. De um lado, situam-se o que a
autora chama de tecnófobos, que seriam aqueles para quem o uso de qualquer tecnologia
que não tenha feito parte de sua infância ou de suas vidas pessoais ou profissionais
representa uma ameaça; os ditos tecnófobos, por vezes, apresentam aversão à utilização de
64
“Diz-se daquele que está engajado na luta por uma causa , uma idéia, um partido, etc.” ou, ainda,
“aquele que adere sem restrições a uma organização política, sindical, etc. e que participa
intensamente da vida dessa organização” (MINIDICIONÁRIO AURÉLIO).
65
Mariana Maggio (1997) problematiza algumas concepções do que tem sido denominado como
Tecnologia Educacional. A autora aponta duas vertentes. Nas décadas de 50 e 60, a tecnologia
educacional estudou os meios como geradores de aprendizagem, mas, a partir dos anos 70,
promoveu-se o estudo do ensino como processo tecnológico; já nos anos 90, este conceito vem
sofrendo diferentes reconceitualizações. A definição de Litwin, apud Maggio (1997, p. 13), faz-se
pertinente no contexto desta dissertação quando afirma que a Tecnologia Educacional “preocupa-se
com as práticas de ensino [...] inclui entre suas preocupações o exame da teoria da comunicação e
dos novos desenvolvimentos tecnológicos: a informática, hoje em primeiro lugar, o vídeo, a TV, o
rádio, o áudio e os impressos velhos ou novos, desde os cartazes até os livros”.
58
tecnologias como recurso educativo. É significativo registrar, por exemplo, que há
professores doutores com atuação em Programas de Pós-Graduação que se negam a
preencher o Currículo Lattes ou até redigir uma mensagem em correio eletrônico. De outro
lado, encontram-se os tecnófilos, entendidos como aqueles que acreditam que muitas das
soluções para o âmbito educativo podem estar situadas nas inovações tecnológicas, em
especial nas Novas Tecnologias de Comunicação e Informação.
A visão de Sancho pode ser acusada de radical e reducionista, uma vez que
apresenta uma brusca generalização, mas pode ajudar a pensar por que muitas vezes é tão
difícil enfrentar as resistências e aversões da utilização da Informática por parte dos
professores. Na Escola Parobé, que foi minha unidade de pesquisa, por exemplo, pude
perceber que a maioria dos professores e professoras da turma 1N1, embora achem
importante utilizar a Informática na Educação, apresentam / apresentaram resistência ou
desinteresse no uso da informática em sala de aula, mesmo tendo um laboratório de
Informática à disposição. Dito isso, passo a tensionar, no item 2.2.2, as relações existentes
entre Ciência, tecnologia e Educação.
2.2.2 Ciência-tecnologia-Educação: quais relações?
Os futuristas prevêem que no fim deste século [século XX]
aproximadamente dois terços de todo o trabalho envolverão algum tipo de
informação computadorizada. Por isso, é importante que todos os alunos [e
alunas, professores / professoras] aprendam a acessar, analisar e
comunicar informações eletrônicas de maneira eficiente (HEIDE;
STILBORNE, 2000, p. 24).
Conforme essas autoras, dentre as diferentes tecnologias existentes, a tecnologia
da informação é a força direcionadora de nossa cultura e economia e a que mais cresce
atualmente. Assim, a partir dessa linha de pensamento, a Internet passa a ser vista como
um sistema de comunicação em que se baseia um conjunto de atividades (cultural,
econômica, política, social) importantes da sociedade atual, conforme indica Castells (2005).
Cabe realizar algumas reflexões acerca das mudanças que tal tecnologia da
informação provocou no modo de vida dos seres humanos e na sociedade. Evoco, para
iniciar essa discussão, Piérre Lévy:
Novas maneiras de pensar e conviver estão sendo elaboradas no mundo
das telecomunicações e da informática. As relações entre os homens, o
trabalho, a própria inteligência dependem, na verdade, da metamorfose
incessante de dispositivos informacionais de todos os tipos. Escrita, leitura,
visão, audição, criação, aprendizagem são capturados por uma informática
cada vez mais avançada (LÉVY, 2001. p.7).
59
Chassot (2003b), ao analisar tais mudanças na área da Educação é importante
referir que não cabe, neste momento, julgar se tais mudanças foram / são / serão positivas
ou negativas, mas sim compreender quais são os efeitos que produziram / produzem /
produzirão na área cultural e educativa e no
ofício de professor”,
no que agora me
detenho, referencia o computador, juntamente com a Internet, como responsável por uma
ruptura na atuação desse professor ou professora, que não é mais visto como o detentor do
saber ou transmissor do conteúdo. Tal entendimento já está superado, uma vez que a
informação e o saber estão cada vez mais disponíveis em outros espaços que também
ensinam (como a televisão, jornais, revistas e a própria Internet, que agrega todas essas
mídias), e não somente na Escola. Assim, “[...] o professor formador ou a professora
formadora será cada vez mais importante nesta virada no milênio” (CHASSOT, 2003a, p.83).
As Novas tecnologias de Comunicação e Informação possibilitam novas realidades à
Escola sob diversos aspectos. O crescimento da Internet, por exemplo, revolucionou o
acesso à informação e os modos de interagir com ela e explorá-la. Pode-se citar como
exemplo o crescimento da área de Educação à Distância, tornado possível com a expansão
dos artefatos informáticos. Muitos cursos de Graduação podem atualmente ser feitos
virtualmente, o que modifica profundamente as noções de espaço (que passa a ser também
o virtual, e não somente o físico) e de tempo (que passa a ser síncrono e assíncrono) do
fazer pedagógico “tradicional”.
A crescente produção dos chamados
softwares
(programas de informática)
educa ivos ou educacionais
t
66
suscita novos e diferentes níveis de interatividade, uma vez que
muitos programas se caracterizam pela utilização em ambientes multimídias que podem
proporcionar novas e diferentes vivências a alunos e alunas. Como bem lembra Juana M.
Sancho (1998, p. 45): “a multimídia estimula a exploração, a auto-expressão e um sentido
de propriedade quando permite que o estudantes manipulem os seus componentes. [...] O
ambiente multimídia torna a aprendizagem estimulante, atraente e divertida.”
66
Existem softwares ou aplicativos desenvolvidos para determinados tipos de tarefas (editores de
textos, planilhas eletrônicas, bancos de dados, etc.) que também são utilizados com finalidade
pedagógica. Porém, existem softwares desenvolvidos especificamente para a educação, comumente
chamados de softwares educacionais. Conforme Valiati (2000), softwares educacionais são
programas de computador criados com o propósito de auxiliar no desenvolvimento de habilidades e
no processo de ensino e de aprendizagem, contendo objetivos pedagógicos estabelecidos desde a
sua concepção. Podemos ainda definir como software educacional, segundo Chaves (2003), “aquele
programa que pode ser usado para algum objetivo educacional, qualquer que seja a natureza ou
finalidade para a qual tenha sido criado“ (CHAVES, 2003, p. 2).
60
Porém a mediação por parte dos professores e professoras de recursos tecnológicos
educativos como a Internet e os
softwares
educativos
67
pressupõe um domínio técnico e
crítico da tecnologia, ou seja, o conhecimento ou apropriação da linguagem em que a
tecnologia opera, uma
alfabetização tecnológica
, no sentido dado por Leite e Sampaio
(1999). Assim, para interagir com a informática, faz-se necessário dominar os códigos de sua
linguagem, que, nesse caso, é a digital. Entendo que esse domínio pode ocorrer em dois
níveis: nível de programação, que exige conhecimento dos códigos binários e de linguagem
de programação, em que os programas informatizados são criados, e nível de usuário, que
exige domínio e compreensão da interface na qual determinado programa se apresenta.
Cada interface, como a de um programa de computador, por exemplo, exigirá determinado
tipo de alfabetização do usuário para que este consiga interagir. É no segundo nível que me
detenho neste trabalho
68
.
Moran (2001) aponta como um dos efeitos educacionais da chamada era da
informação uma nova situação de aprendizagem em que as crianças e os jovens anseiam por
respostas imediatas e assimilações instantâneas, semelhantes às que obtêm com a televisão,
por exemplo. Assim, “[...] adoram as pesquisas síncronas, as que acontecem em tempo real
e que apresentam respostas quase instantâneas [...]” (IBIDEM, p. 21). Cada vez mais
utilizamos o que o autor chama de “processamento ou conhecimento multimídico”, que tem
como características a rapidez e a dinamicidade, além de permitir a leitura de várias
67
Entendo ser pertinente apresentar uma classificação dos softwares educacionais proposta por Tajra
(2001) com o intuito de demonstrar as possibilidades pedagógicas que eles apresentam. Os
softwares educacionais podem ser classificados, de um modo geral, em grandes grupos, com as
seguintes características: TUTORIAIS - são os softwares que apresentam conceitos e instruções para
realizar algumas tarefas em específico e possuem baixa interatividade; EXERCÍCIO E PRÁTICA - são
aqueles que possibilitam atividades interativas por meio de respostas às questões apresentadas;
INVESTIGAÇÃO - são os programas em que podemos localizar várias informações a respeito de
assuntos diversos. Exemplo: enciclopédias eletrônicas; SIMULADORES - são softwares que fazem
simulações de diversos fenômenos, experimentos e situações diversas; JOGOS EDUCATIVOS - são
programas de entretenimento, de caráter extremamente lúdico, que se apresentam em forma de
jogos interativos para realizar atividades pedagógicas; SOFTWARES DE PROGRAMAÇÃO - são os
que possibilitam que o usuário programe o computador, criando programas de sua autoria;
SOFTWARES ABERTOS - são os que possibilitam produções e explorações livres (sem atividades
educativas pré-programadas desde a sua criação). Para a autora, os softwares aplicativos (editores
de textos, planilhas, etc.) podem ser classificados como Softwares Educacionais Abertos (TAJRA,
2001). Assim, pode-se afirmar que a Escola Técnica Parobé trabalha basicamente com os Softwares
Educacionais Abertos.
68
Podemos tomar como exemplo o computador que tenha um sistema operacional que utilize ícones
(imagens) para realizar determinadas ações, como no caso do Windows. Se o usuário não
compreende que ação determinada imagem desencadeia ou que tipo de informação a mesma mostra
ou gera, não conseguirá interagir com a interface. Isto é, se faz necessário operar na lógica do
sistema que é hipertextual.
61
linguagem superpostas (imagem, som, texto escrito, etc.), como no caso da televisão e da
hipermídia
69
presente na cibercultura.
Uma das análises mais interessantes que Lévy (2001) faz sobre a cibercultura e
suas implicações culturais é a classificação das técnicas fundamentais de comunicação em
categorias gerais, que trago aqui com o intuito de fundamentar a necessidade de
alfabetização digital, entendida como a apropriação da linguagem digital. Lévy classifica-as
em Oralidade Primária (palavra), Oralidade Secundária (Escrita) e Informática.
A oralidade primária remete ao papel da palavra antes que uma sociedade
tenha adotado a escrita, a oralidade secundária está relacionada a um
estatuto da palavra que é complementar ao da escrita, tal como o
conhecemos hoje. Na oralidade primária, a palavra tem como função básica
a gestão da memória social, e não apenas a livre expressão das pessoas ou
a comunicação prática cotidiana. [...] o mundo da oralidade primária, por
outro lado, situa-se antes de qualquer distinção escrito/falado (LÉVY, 2001,
p.77).
Isso significa dizer que, nas culturas primitivas, a palavra tinha papel de memória
social, pois era através da palavra que os conhecimentos eram passados de geração para
geração. Vale ressaltar que a oralidade primária continua, pois, mesmo com artifícios para a
memorização, como a escrita e a informática, muitos dos conhecimentos que usamos na vida
cotidiana foram-nos ensinados oralmente.
Na oralidade secundária, o surgimento da escrita e do alfabeto, juntamente com a
impressão, desempenharam papel fundamental inclusive no estabelecimento da Ciência
como modo de conhecimento dominante. A escrita foi inventada diversas vezes e
separadamente nas grandes civilizações da Antiguidade. Não me cabe aqui o papel de fazer
um histórico sobre seu surgimento. Apenas atento para o quanto foi crucial sua criação (de
forma sistematizada) para que se estabelecesse uma prática de comunicação radicalmente
nova
70
. A escrita está restrita a uma fidelidade diferente da transmissão oral, uma vez que é
rígida e fica registrada. Isso implica uma sistematização dos conhecimentos, em que a
interpretação e atribuição de sentidos começam a ter uma relevância que jamais haviam tido
antes, tanto por parte do “leitor” quanto do “autor”.
69
“Hipermídia é, portanto, uma forma combinatória, permutacional e interativa de multimídia, em que
textos, sons ou imagens (estáticas e em movimento) estão ligados entre si por elos probabilísticos e
móveis, que podem ser configurados pelos receptores de diferentes maneiras [...] ” (MACHADO,
1997, p. 146).
70
Permito-me, como exemplo dessa história, ficar dentro da civilização ocidental e citar o livro How
26 letters shaped the Western World [MAN, John. New York: Barnes & Nobles, 2005], que
conta como a escrita alfabética revolucionou o Ocidente de uma maneira diversa da que ocorreu no
Oriente, com as diferentes escritas criptogrâmicas.
62
Com a escrita, as representações perduram em outros formatos que não o
canto ou a narrativa, tendência ainda maior quando passamos do
manuscrito ao impresso e à medida que o uso dos signos escriturários torna-
se mais intenso e difundido na sociedade (LÉVY, 2001, p. 92).
O autor sugere, ainda, que a escrita condiciona o pensamento filosófico e racional e,
desse modo, constitui a Filosofia, as Ciências, a História e o Direito. Isso porque os saberes,
a partir da escrita, passam a ficar disponíveis, estocados, consultáveis, estabelecendo um
tipo de memória objetiva e impessoal que independe dos sujeitos que a comunicam
71
.
Com o surgimento da informática, novamente os processos de comunicação e
memória mudaram. Passamos, então, da linguagem oral para a linguagem escrita; com o
advento da Internet, passamos do texto para o hipertexto
72
e, assim, da linguagem escrita
linear para a linguagem digital e hipertextual. Com a progressão de diferentes técnicas e
áreas do conhecimento, a informática juntamente com o processo de digitalização, atinge
todas as formas de comunicação e processamento de informação, agregando em seu
tecido
eletrônico
o cinema, a televisão, o jornalismo, a edição, a música, as telecomunicações e a
informática (LÉVY, 2001)
.
Lévy afirma que as novas formas de acesso à informação, juntamente com as
chamadas (segundo ele mesmo) tecnologias intelectuais, possibilitam / permitem a
exteriorização e alteração de muitas funções cognitivas
73
humanas. Ana Vilma Tijboy (2001,
p.49) apresenta tais idéias do autor de forma sintética em um quadro, que me permito trazer
na íntegra:
FUNÇÕES COGNITIVAS TECNOLOGIAS INTELECTUAIS
A memória Banco de dados
Hipertextos
Fichários digitais
A imaginação Simulações
A percepção Sensores digitais
Telepresença
Realidades virtuais
Os raciocínios Inteligência artificial
Modelização
Quadro 1 – Novas formas de acesso à informação segundo Lévy
74
.
71
Vale destacar, ainda, a invenção da impressão, realizada por Gutenberg, que proporcionou uma
revolução no modo de armazenamento e transmissão de informações, trazendo mudanças
significativas em todo o tecido social.
72
Assim, passamos da linguagem escrita linear para a linguagem escrita hipertextual, que, por sua
vez, possibilita alto grau de interatividade, tornando o “leitor” co-autor do texto (SILVA, 2005).
73
Cognitivo – relativo ao conhecimento (MINIDICIONÁRIO AURÉLIO).
74
TIJBOY, ANA VILMA. As novas tecnologias e a incerteza na educação. In: SILVA, Mozart Linhares
da (org.). Novas tecnologias – educação e sociedade na era da informação. Belo Horizonte:
Autêntica, 2001.
63
Lévy (2001) aponta quatro
pólos funcionais
que fazem com que a informática seja
uma das maiores inovações em matéria de tecnologias intelectuais, comparável com a
invenção da imprensa e da escrita:
a produção ou composição de dados, de programas ou
de representações audiovisuais; a seleção, recepção e tratamento dos dados dos sons ou
das imagens; a transmissão
(de dados);
e, finalmente,
as funções de armazenamento.
Ao
analisar o quadro acima, podemos perceber que todas as tecnologias intelectuais citadas por
Tijboy, baseada em Lévy, são recursos que fazem parte da Informática / Internet, o que
mais uma vez assinala a importância cultural, social, educacional e, por que não dizer,
cognitiva de uma alfabetização científica-tecnológica-digital.
,
Se analisarmos os quatro pólos mencionados pelo autor, podemos entender uma
série de fenômenos e práticas culturais e sociais que se desencadearam a partir dessa
evolução digital: podemos nos comunicar por correio eletrônico ou até através de câmeras
digitais (
Webcam
), e não mais somente por carta ou telefone; podemos efetuar compras
através da Internet (inclusive acessar supermercados), efetuar pagamentos, consultar
extratos bancários, acessar notícias, assistir a programas televisivos (vídeos), além de
estabelecer relações, comunicação e contatos com pessoas de diferentes lugares do mundo
(através dos diferentes serviços disponíveis na Internet).
75
A comunicação em tempos digitais e internéticos exige apropriação de novos
códigos, diferentes daqueles utilizados na Oralidade Primária e Secundária É justamente
assim que entendo que, para interagir com a Informática, se faz necessária uma
alfabetização digital que permitirá uma melhor interação do usuário com o computador. Esta
pesquisa defende que a busca por uma alfabetização científica-tecnológica-digital
75
Entendo ser relevante destacar alguns serviços da Internet apontados por Tajra (2000) e que
conferem novas possibilidades ao campo educacional, além de possibilitarem a instauração de novas
práticas culturais e sociais.
CHAT/Bate-Papo: É uma das maneiras de efetuarmos comunicação na Internet. Ela ocorre de forma
instantânea entre receptor e emissor; portanto, é necessário que no momento de utilização desse
serviço as pessoas interessadas em se comunicar estejam simultaneamente acessando a Internet e
estejam na mesma sala de chat; LISTA DE DISCUSSÃO: Funciona de forma semelhante à do correio
eletrônico. A diferença é que as pessoas inscritas na lista são as emissoras e receptoras
simultaneamente e a comunicação é coletiva. As listas são montadas por pessoas / empresas /
entidades que têm interesse de agrupar indivíduos com os mesmos objetivos sobre determinados
assuntos; FÓRUM: Funciona de modo parecido com a lista de discussões, só que, ao invés de as
mensagens serem enviadas para o e-mail das pessoas cadastradas, essas mensagens ficam no site
no qual o fórum está cadastrado, ou seja, é preciso utilizar o www para acessar as informações
disponibilizadas pelos usuários previamente cadastrados. Ocorre também de maneira assíncrona.
REDE DE RELACIONAMENTOS: O serviço tem como objetivo possibilitar o reencontro de antigos
amigos e fazer novas amizades. Podem-se conhecer pessoas com os mesmos interesses e, a partir
disso, criar ou integrar comunidades para todos os gostos. Seus amigos poderão deixar testemunhos
e recados sobre você e vice-versa. Exemplo: ORKUT.
64
possibilitará, além de uma
melhor leitura de mundo
(alfabetização científica), a capacidade
de lidar com os artefatos tecnológicos (alfabetização tecnológica) através da apropriação
crítica dos códigos digitais (alfabetização digital).
No capítulo seguinte,
Alfabetização Científica-tecnológica-digital e (ciber)cultura
quais conexões?,
pretendo realizar algumas tessituras que permitam conectar alfabetização
digital com questões culturais, partindo da problematização do termo “cultura” até chegar a
uma definição que me parece pertinente. A seguir, problematizo as ligações entre a
cibercultura e processos de exclusão digital. Apresento alguns tensionamentos que envolvem
a Plataforma Lattes, vista como um artefato cultural, e suas possibilidades de pesquisa,
propiciadas através de seus mecanismos de buscas. Realizo, ainda, uma breve discussão
envolvendo as questões curriculares e a alfabetização científica-tecnológica-digital, tendo
como base os referenciais teóricos trabalhados na Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e
Sociedade e a experiência pedagógica vivida na turma 1N1 da Escola Parobé.
:
65
3. Alfabetização científica-tecnológica-digital e cultura: Quais relações?
As implicações culturais e sociais do digital se aprofundam e se diferenciam
a cada nova interface, a cada aumento de potência ou capacidade, a cada
nova ramificação para outros conjuntos de técnicas [...] (Lévy, 2003, p.13).
A cibercultura, que pode ser entendida como a cultura que envolve o uso da
Internet ou como a cultura do ciberespaço
76
, traz consigo inúmeras implicações. Na
perspectiva deste trabalho, encontrar-se excluído de tal cultura, isto é, não ser um
cibernauta ou usuário de um espaço virtual ou de uma rede internacional de telemática
77
,
acarreta algumas tensões que problematizarei neste capítulo.
Antes de adentrar em tais problematizações, é válido discutir primeiramente, ainda
que de forma breve, o conceito de “cultura” e o entendimento que parece mais pertinente
para este estudo. Veiga-Neto (2003, p. 7) já anuncia: “escrever algo novo sobre as relações
entre cultura e educação é um desafio”, isso porque os dois termos possuem múltiplos
sentidos e são complexos. Por isso, vêm ganhando várias ressignificações ao longo do
tempo.
Os significados e sentidos atribuídos à palavra
cultura
vêm sofrendo deslocamentos e
modificações. A discussão teórica acerca da cultura não é recente. Entre as décadas de 20 e
50 doculo XX, houve uma grande “explosão da “teorização cultural”, como analisa Adam
Kuper (2002) na Introdução de seu livro
Cultu a: a visão dos antropólogos
. Tais discursos
sobre cultura não são inventados por acaso, “eles remontam a determinadas tradições
intelectuais que persistiram (ou persistem) por gerações” (p. 31).
r
Assim, Kuper traz um importante resgate histórico a respeito da evolução das
correntes de pensamento sobre cultura. Uma das definições trazida pelo autor
78
que entendo
ser significativa para o presente trabalho é o entendimento de
cultura como um sistema
76
Espaço das comunicações por redes de computação.
77
Conjunto de serviços informáticos fornecidos através de uma rede de telecomunicações ou ciência
que trata da transmissão, a longa distância, de informação computadorizada .
78
Para Kuper, tal concepção foi tida como consenso durante algum tempo entre os antropólogos
estadunidenses.
66
simbólico que diz respeito à “uma a i ude mental coletiva
(p. 288) que inclui idéias, valores,
estética e princípios morais expressos através de símbolos.
t t
Lopes (1999) problematiza as diferentes acepções de cultura, partindo de definições
que produzem a idéia de que “ter cultura significa ter inteligência, refinamento, estar em um
plano superior na escala social” (IBIDEM, p. 65). Entendo que essa concepção de cultura,
também criticada pela autora, é problemática e, em certa medida, preconceituosa e
excludente, pois nem sequer reconhece a existência de outras culturas – como se existisse
uma cultura “legítima” e superior que tem a ver com os conhecimentos específicos de uma
elite.
A cultura dentro dos referenciais modernos foi marcada pela universalidade (assim
como a ciência) e dizia respeito ao que havia sido produzido (nas artes, filosofia, ciência,
etc.) de “melhor” na humanidade. “Assim, a Modernidade esteve por muito tempo
mergulhada numa epistemologia monocultural” (VEIGA-NETO, 2003, p. 9). A cultura
baseada numa perspectiva Moderna tem como marcas um caráter diferenciador (no sentido
de distinção,
status
) e elitista, além de um caráter único, unificador e idealista.
Para Marisa Vorraber Costa (2002b), é da crítica a uma visão elitista e hierárquica de
cultura, vigente desde a segunda metade do século XIX, que dominou “[...] por mais de cem
anos as análises culturais do Ocidente” (p. 135), que surge uma movimentação teórica e
política que simbolizaria uma
virada cultural
79
.
As primeiras rupturas, deslocamentos e problematizações do conceito de cultura,
num viés moderno, surgiram no início do século XX (anos 20). Os Estudos Culturais
80
têm
grande responsabilidade sobre tais rupturas. É a partir da contribuição desse campo teórico
que se destina a estudar a estudar as questões culturais, que começa a fazer sentido falar
de
culturas
e não de
cultura
, já que todos os tipos de cultura passam a ser considerados e
ocupam o mesmo nível, não havendo, dessa forma, hegemonia cultural.
79
A partir da virada chamada revolução cultural (que ocorreu ao longo do século XX), a cultura passa
a ser vista e estudada considerando-se seu papel constitutivo em todos os aspectos da vida social.
“Essa centralidade da cultura ressaltada entre tantos pensadores como Stuart Hall, Fredric
Jameson, Néstor Canclini, Beatriz Sarlo, David Harvey – tem uma dimensão epistemológica, que vem
sendo denominada “virada cultural”, referindo-se a esse poder instituidor de que são dotados os
discursos circulantes no circuito da cultura”. As manifestações ou também chamados textos culturais
são tidos como “artefatos produtivos, práticas de representação que inventam sentidos que operam
nas arenas culturais [...]” (COSTA; SILVEIRA; SOMMER, 2003, p. 38).
80
Pode-se dizer sinteticamente que o campo teórico dos Estudos Culturais está preocupado com “[...]
questões que se situam na conexão entre cultura, significação, identidade e poder”, conforme aponta
Silva (2001, p. 134).
67
Cultura
transmuta-se de um conceito impregnado de distinção, hierarquia e
elitismos segregacionistas para um outro eixo de significados em que se
abre um amplo leque de sentidos cambiantes e versáteis. Cultura deixa de
ser um domínio exclusivo da erudição, da tradição literária e artística, de
padrões estéticos elitizados e passa a contemplar, também, o gosto das
multidões. Em sua flexão plural –
cul uras
– e o adjetivado, o conceito
incorpora novas e diferentes possibilidades de sentido (COSTA; SILVEIRA;
SOMMER, 2003, p.36).
t
A partir das teorizações que envolvem a chamada “
virada lingüística
81
e com base no
campo teórico dos Estudos Culturais, Dagmar Estermann Meyer (1998, p. 370) afirma que a
cultura deixa de ser entendida como “conjunto de experiências, crenças e valores, tradições
e comportamentos compartilhados” e passa a ser vista como “um campo de luta e
contestação, que envolve também, mas não apenas, estes (e/ou outros) sentidos
compartilhados” (p. 370). Tal visão de cultura leva em consideração as relações de poder
existentes e preocupa-se com as formas de produção através de artefatos ou textos culturais
dos sistemas de significação instaurados nas diferentes culturas.
É muito difícil “definir” um termo que possui múltiplos sentidos e é ambíguo. A
própria intenção de defini-lo pode ser problemática, uma vez que o fixa e o “aprisiona”, mas
creio que seja necessário, mais do que problematizar discursos e conceitos sobre cultura,
apresentar o entendimento de
cultura
que tomo emprestado de Stuart Hall para sustentar
este trabalho:
[...] a Cultura tem a ver com a produção e o intercâmbio de significados – o
“dar e receber significados” – entre os membros de uma sociedade ou
grupo. [...] Assim sendo, a cultura depende de que seus participantes
interpretem de forma significativa o que esteja ocorrendo ao seu redor, e
“entendam” o mundo de forma geral semelhante (HALL, 1997, p.2).
Na apropriação das idéias de Hall, balizo a abordagem cultural de meu trabalho,
entendendo que é no campo da representação e da significação (constituídas através da
linguagem) que a cultura se determina em um grupo social. Podemos afirmar que duas
pessoas pertencem ao mesmo grupo cultural na medida em que atribuem significados e
representações similares em suas interpretações de mundo.
A partir dos estudos realizados na Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade, a
análise dos significados e sentidos que alunos e alunas deram à utilização da Plataforma
Lattes (vista como um artefato cultural da Cultura Científica-Acadêmica) ganha uma
81
Marisa Vorraber Costa (2002b) afirma que a “expressão virada lingüística refere-se às
movimentações no campo da filosofia em que o discurso e a linguagem passam a ser considerados
como constituidores da realidade. Segundo as concepções que se afinam com a virada lingüística,
nosso acesso a uma suposta realidade é sempre mediado por discursos que não apenas a
representam, falam dela, mas a instituem. Quando se fala de algo também se inventa algo” (COSTA,
2002, p. 140).
68
dimensão cultural, atribuindo-se à cultura um papel central na experiência pedagógica
realizada.
Dentro da perspectiva teórica de que busco aproximações, atribuir uma importância
central à
cultura
não significa que esta seja superior às demais instâncias sociais (como as
instâncias política, econômica, social), “mas sim que atravessa tudo o que é do social
(VEIGA-NETO, 2003, p. 5). Assim sendo, a análise da necessidade de uma alfabetização
científica-tecnológica-digital pode ser considerada como uma questão cultural.
Relacionando Educação e Cultura numa perspectiva monocultural, teremos, como
aponta ainda Veiga-Neto (2003), sob o ponto de vista ético, uma pedagogia totalitária que
ensina o que é o mundo produzindo uma postura intelectual que pode ser considerada
arrogante. Mas, adentrando no multiculturalismo e pensando em
culturas
ao invés de
cultura
, teremos, no mínimo, uma postura pedagógica mais humilde (pelo menos
epistemologicamente), uma vez que se assume que não se pretende mostrar como é o
mundo, mas sim “mostrar como o mundo é constituído nos jogos de poder/saber por
aqueles que falam nele e dele e como se pode criar outras formas de estar nele” (p. 11).
Acredito que apresentar a Plataforma Lattes para os estudantes da turma 1N1 da
Escola Parobé se configurou como uma possibilidade de adentrar no multiculturalismo
Busquei exercer uma postura pedagógica que pretendeu, através de uma alfabetização
científica, mostrar uma outra forma de compreender o mundo através das lentes da Ciência.
Penso que, ao aproximar a cultura científica ou acadêmica (da qual a Plataforma
Lattes parece ser um bom exemplo, até pelo elitismo em seu uso) dos estudantes do Parobé,
posso ter contribuído, mesmo que em algumas poucas (ou pequenas) situações, para a
alfabetização científica de tais estudantes, mas também ter possibilitado “uma outra forma
de estar no mundo”, já que, nas atividades realizadas no laboratório de Informática, eles
puderam observar como e onde é produzida a Ciência no Brasil, inclusive podendo distinguir
a produção diferenciada dessa Ciência.
O olhar que lanço sobre esse assunto permite utilizar o termo no plural e falar sobre
culturas
. Não entendo que exista uma cultura dominante, distinta, permanente ou exemplar,
mas sim que existem diferentes tipos de culturas e que a escola é um dos espaços em que
diversos tipos de culturas se encontram e que, por sua vez, institui sua própria cultura
(cultura escolar).
Creio que seja nessa linha de pensamento que ainda posso tecer algumas
considerações sobre Educação e Cultura(s). Veiga-Neto (2003) aponta para o atrelamento da
69
Pedagogia e da escola moderna ao conceito de cultura, mostrando como se constitui essa
relação. Durante muito tempo, a Educação, numa concepção elitista, foi pensada como o
“caminho para o atingimento das formas mais elevadas de cultura” (p. 12). A chamada “alta
cultura” é que era válida e ensinada na escola, servindo de modelo, e a “baixa cultura” era a
cultura dos considerados “menos cultos”.
Dessa visão de Cultura, que persiste até hoje em muitos estratos sociais, é que
nasceram / nascem comentários do tipo: “fulano é culto” (VEIGA-NETO, 2003, p. 13), como
se “ser culto” fosse atingir determinados conhecimentos que dariam tal
status
ou adjetivo.
Tal visão torna-se obsoleta para a pedagogia multiculturalista, isso porque, se assim fosse,
não poderíamos reconhecer a cultura de uma tribo indígena, por exemplo, que pode até ser
vista como cultura popular, mas tem de ser reconhecida como Cultura, uma vez que nela
existem práticas culturais específicas de tal tribo.
Hoje fala-se em cruzamento de culturas e borramento de fronteiras entre elas. Pérez
Gomez (1998) considera a escola como um espaço ecológico e sistêmico: “[...] Já propus
considerar a escola como um espaço ecológico de cruzamento de culturas, cuja
responsabilidade específica a distingue de outras instâncias de socialização [...]” (PÉREZ
GOMEZ, 1998, p. 17).
Assim, entendo que utilizar a Plataforma Lattes como um artefato cultural que
produziu diferentes sentidos numa perspectiva multiculturalista significa, no contexto deste
trabalho, cruzar, tensionar e envolver diferentes culturas no espaço escolar. Ao tensionar
minha reflexão teórica com a empiria desta pesquisa, questionei, num primeiro momento, se
poderia considerar a cibercultura ou a própria cultura científica como não fazendo parte do
cotidiano ou da “cultura” dos estudantes; nesse caso, minha pesquisa poderia parecer
“frágil” ou até mesmo “inútil”.
Porém, num segundo momento, percebi que, embora tais alunos e alunas possam
não ter acesso à Informática ou à Internet cotidianamente, no dia-a-dia são interpelados e
instigados por outros meios que levam / levariam à utilização do ciberespaço
82
, como
programas televisivos, por exemplo. Por não obterem acesso àquelas tecnologias, são
excluídos de tais práticas.
Explicarei melhor tal exemplificação: uma boa parte dos programas, no final,
apresenta seu endereço eletrônico. Existem muitos programas que, inclusive, possibilitam a
interação e participação do telespectador através de
e-mail
,
chats
e outros recursos da
82
Tais percepções são resultado das observações realizadas durante a mediação da experiência
pedagógica realizada no laboratório de Informática.
70
Internet. Pude perceber o quanto alunos e alunas são interpelados pela mídia quando
permitia que acessassem a Internet de forma livre. Muitos acessavam
sites
de programas de
auditório, de novelas e de rádios.
É seguindo esse raciocínio que entendo haver o que chamo de “exclusão
cibercultural” desses cidadãos e cidadãs quando ou não têm acesso à rede mundial de
computadores, ou, ao acessá-la, não dispõem, no mínimo, do que se considerou ser uma
alfabetização científica-tecnológica-digital. Penso que minha intervenção junto ao grupo
possa ter contribuído, pelo menos no momento em que estava ocorrendo, para diminuir esse
distanciamento ou abismo cultural, já que os estudantes utilizaram a Informática e a
Internet como ferramenta durante a experiência pedagógica.
3.1 Cibercultura e exclusão científica-tecnológica-digital: quais ligações?
O binômio exclusão/inclusão permite um muito amplo espectro de discussões. Por
ora, cabe dizer o quanto o processo de inclusão depende, paradoxalmente, de um processo
de exclusão. Com as novas tecnologias de informação e comunicação, não foi / não é
diferente, pois “cada novo sistema de comunicação fabrica seus excluídos” (LÉVY, 2003, p.
237). Tal exclusão / inclusão pode ser entendida através das questões culturais e
relacionando Ciência-tecnologia-Sociedade-Educação.
Recorro a Castells (2005) para balizar meus entendimentos acerca da exclusão
digital. Embora o autor fale especificamente da Internet, entendo que as idéias trazidas
valem para a utilização da informática em geral. Para o autor, existem três grandes formas
de ser excluído digitalmente:
não ter acesso à rede de computadores (ou não ter acesso à Informática);
ter acesso, mas ter capacidade técnica muito baixa para interagir na rede
(ou possuir computador, mas não possuir habilidades técnicas para sua
utilização);
estar conectado e não saber qual acesso usar, qual informação buscar, como
combinar uma com a outra (não ter criticidade para depurar as informações
obtidas no computador) [...] (CASTELLS, 2005, p. 6).
Assim, o sentido que dou para as palavras de Castells permite-me argumentar que
existem três níveis de exclusão digital. Encontrar-se excluído digitalmente não é somente
71
não ter acesso, é também não possuir as habilidades técnicas necessárias para interagir com
o computador e, mais ainda e em um nível mais profundo e mais grave, conforme aponta o
autor, é possuir acesso, ter a capacidade técnica necessária, mas, mesmo assim, não
conseguir interagir de forma crítica com a Informática (informações, imagens e textos
acessados). “[...]
Esta é a mais grave porque amplia, aprofunda a exclusão mais séria de
toda a História; é a exclusão da educação e da cultura porque o mundo digital se incrementa
extraordinariamente [grifo meu]”
(CASTELLS, 2005, p. 06).
Problematizando a fundamentação teórica apresentada e meu objeto de pesquisa,
entendo que os alunos e alunas da turma 1N1 da Escola Estadual Parobé se encontram
excluídos digitalmente nos níveis apontados por Castells, inclusive, da forma mais grave e
preocupante. Na Escola, eles podem acessar a rede, não só no laboratório de Informática,
como também na Biblioteca, mesmo que de forma limitada, (considerando o número de
máquinas disponíveis – aproximadamente 20 máquinas por laboratório), porém não possuem
domínio técnico necessário (não são alfabetizados digitalmente) e ainda têm dificuldade em
“manipular e utilizar” de forma crítica as informações acessadas.
Atento que as idéias do autor vêm ao encontro de minhas perspectivas teóricas no
momento em que, assim como ele, vejo a Educação como uma ferramenta de igualdade e
democracia, acreditando que a difusão e a apropriação dos conhecimentos científicos-
tecnológicos-digitais por parte de alunos e alunas, professores e professoras funcionariam
como uma forma de inclusão social. Na perspectiva de Giordan; Sanmartino (2004), a
Educação, juntamente com a alfabetização científica-tecnológica – e incluo digital – têm
grande responsabilidade na formação da visão de mundo e imaginário, tornando-se meios
privilegiados para enfrentar os desafios de uma sociedade em transformação. A busca por
uma inclusão científica-tecnológica-digital torna-se uma necessidade para aqueles que estão
excluídos do campo científico-tecnológico-digital.
Reitero, fundamentada em Lévy, que, ao falar de tal exclusão, não estou falando
apenas de condições de acesso, pois, supondo que todos os alunos e alunas tivessem fácil
acesso à tecnologia, poderia ainda haver como barreira para tal inclusão “obstáculos
humanos”, tais como
[...] freios institucionais, políticos e culturais para formas de
comunicação comunitárias, transversais e interativas (e) [...] em seguida os sentimentos de
incompetência e de desqualificação frente às novas tecnologias” (LÉVY, 2003, p. 236).
Lévy (2003) afirma que a Cibercultura pode ser vista como uma fonte de exclusão,
mas busca possíveis respostas que permitem / permitiriam relativizar tal problema. Para o
filósofo,
os
excluídos serão cada vez menos, considerando o crescimento de acesso que
72
houve mundialmente da década de 80 até o final da década de 90; “será mais fácil e mais
barato conectar-se; qualquer avanço nos sistemas de comunicação acarreta necessariamente
alguma exclusão
(p. 237). Em termos de Brasil, mesmo considerando as perspectivas do
autor e o crescimento do número de usuários nos últimos anos
83
, creio que a Informática e a
Internet estão longe de não ser fontes de exclusão, pois ainda não são tecnologias acessíveis
a todos, sendo privilégio de alguns.
Conforme Castells (2002), a sociedade atual organiza-se em Redes de Informação
84
.
Tal organização foi impulsionada pelos avanços das tecnologias de informação. Em sua obra
A Sociedade em Rede
, o autor tem como ponto de partida para sua análise a revolução da
tecnologia de informação. Isso não significa que não existam outras possibilidades de análise
ou ainda que a tecnologia é que determina a sociedade, mas a consideração trazida pelo
autor torna-se pertinente no contexto deste trabalho, uma vez que
[...] estuda o surgimento de uma nova estrutura social, manifestada sob
várias formas conforme a diversidade de culturas e instituições em todo o
planeta. Essa nova estrutura social está associada ao surgimento de um
novo modo de desenvolvimento, o informacionalismo, historicamente
moldado pela reestruturação do modo capitalista de produção, no final do
Século XX (CASTELLS, 2003, p. 51)
85
.
Assim, o avanço das tecnologias, em especial das tecnologias de informação,
remodela a base material da sociedade em um ritmo frenético, proporcionando mudanças
econômicas (interdependência global), sociais e culturais. As transformações no final do
século XX são muitas e ocorrem em diferentes dimensões sociais. Podem-se apontar
algumas, como o enfraquecimento do patriarcalismo, o aumento da consciência ambiental, a
redefinição das relações entre homens, mulheres e crianças (família, sexualidade,
personalidade), o aumento do fundamentalismo religioso, a fragmentação dos movimentos
sociais, a crise estrutural de legitimidade nos sistemas políticos e o aumento da busca de
uma identidade coletiva ou individual
86
.
83
Segundo pesquisa divulgada no jornal de Porto Alegre Zero Hora, no dia 8 de janeiro de 2006, p.22
e 23, o número de internautas domiciliares cresceu de 11,4 milhões em 2004 para 12,53 milhões em
2005.
84
Segundo André Parente, a representação de uma rede “possui permanentemente diversos centros
que são como pontas luminosas perpetuamente móveis, saltando de um nó a outro, trazendo ao
redor de si uma ramificação infinita de pequenas raízes, de risomas (imagem de rede, infinitude,
multiplicidade, acentramento, metamorfose, auto-organização,[...] )” (PARENTE, 2000, p. 80).
85
A perspectiva teórica que fundamenta a análise de Castells percebe o informacionalismo como um
modo de desenvolvimento (que tem como objetivo principal o avanço tecnológico) e postula que “as
sociedades são organizadas em processos estruturados por relações historicamente determinadas de
produção, experiência e poder (CASTELLS, 2002, p. 51).
86
“[...] a identidade está se tornando a principal e, às vezes, única fonte de significado em um período
histórico caracterizado pela ampla desestruturação das organizações, deslegitimação das instituições,
enfraquecimento de importantes movimentos sociais e expressões culturais efêmeras. Cada vez
73
Dessa maneira, o modelo de sociedade industrializada
87
, que fora tomada de
empréstimo à geometria e/ou à mecânica, não reflete mais os avanços e a complexidade da
sociedade atual. Falar em sociedade informacional ou sociedade da informação ganha um
sentido mais condizente com a contemporaneidade. Ao invés de sustentar os modos de
produção (trabalho) sob três pilares –
unidade de local, de tempo
e
de função –
, a sociedade
informacional descentraliza as tarefas,
dessincroniza as a ividades e desmaterializa as trocas
(ROSNAY, 2000).
t
Surgem, então, novas práticas, principalmente pelos usuários da Internet, que
utilizam como base uma nova mercadoria: a informação. Assim começa a existir a “troca de
informações” entre as pessoas de forma mais contundente, seja através de um simples
correio eletrônico ou através da troca de músicas, imagens, jogos, filmes em forma de
arquivos e programas, muitas vezes criados por “anônimos”, que oferecem “gratuitamente”
88
diferentes tipos de informações.
Esse é o caso, por exemplo, das músicas, que são facilmente “baixadas”
89
por
qualquer pessoa que tenha acesso à
web
, deixando de ser monopólio das gravadoras. Isso
gerou problemas éticos e financeiros para os músicos e artistas, pois, na maioria das vezes,
as músicas são acessadas gratuitamente. Atualmente, vem ocorrendo o mesmo fenômeno
com os filmes, que podem ser gravados gratuitamente, na íntegra e com qualidade, inclusive
em DVD, pelos internautas
90
.
Na
web
não há um núcleo central, criando-se, desse modo, uma forma de
comunicação de “todos para todos”, já que “qualquer pessoa”
91
pode acessar e incluir o tipo
de informação que desejar no ciberespaço. Assim, a “memória”, os textos, os hipertextos, a
mais, as pessoas organizam seu significado não em torno do que fazem, mas com base no que elas
são ou acreditam que são. [...] Nossas sociedades estão cada vez mais estruturadas em uma
oposição bipolar entre a Rede e o Ser [grifo do autor]” (CASTELLS, 2002, p. 41).
87
Caracterizada por Jöel de Rosnay (2000), no texto “O salto do milênio”, pela “centralização dos
modos de produção, pela distribuição em massa de objetos padronizados, pela especialização das
tarefas e pelo controle hierárquico destas [...] (p. 217).
88
Gratuitamente na Internet merece questionamento, uma vez que, para acessar a rede, sempre se
faz necessário pagar alguma coisa, seja pelo provedor, seja pela conexão. No caso de casas
específicas para acesso à Internet (como as Lan Houses ou Cibercafés), também se paga,
normalmente por hora de acesso.
89
É possível copiar o arquivo de música da Internet para a máquina local ou computador pessoal.
90
Não tenho a intenção de defender ou fazer apologia desse tipo de prática, uma vez que esta
envolve questões éticas e penais, como pirataria e direitos autorais; apenas a utilizo como exemplo
da desmonopolização da informação.
91
O termo “qualquer pessoa”, utilizado por Rosnay (2000), merece uma breve problematização, já
que, para realizar tal ação, são necessários, além de acesso à rede, conhecimentos técnicos e
alfabetização digital que permita a realização de tal interação.
74
hipermídia
92
da Internet emergem da interação dos usuários através de uma comunicação
interativa e coletiva. Daí termos a presença virtual do todo em qualquer ponto, como, por
exemplo, em um computador que ofereça acesso à Internet.
Obviamente, a comunicação de “todos para todos” pode / poderia dizer respeito
somente aos usuários da rede, uma vez que muitas pessoas se encontram excluídas de tal
cultura internética. Porém essas pessoas não se encontram excluídas de outras práticas
sociais que têm como base a emissão ou troca de informação, pois existem outros
dispositivos midiáticos que se baseiam em tal característica da sociedade informacional
(LÉVY, 2000).
Castells (2003) argumenta que a desigualdade de acesso à Internet provoca uma
divisão digital. O autor entende que os grupos dominantes da sociedade atual desenvolvem
funções que cada vez mais giram em torno da Internet; por isso o acesso à Internet torna-se
um pré-requisito para superar a desigualdade social. O autor analisa o que ele chama de
dinâmica de evolução de acesso à Internet em países latino-americanos e hispânicos e
entende que tal evolução de acesso cresceu / cresce impulsionada por uma necessidade de
domínio da informática no trabalho.
Aparentemente, o acesso de grupos sociais de baixa renda vem aumentando,
porém, à medida que a tecnologia de acesso à Internet (modos de conexão) se torna mais
sofisticada e complexa, fica mais distante de grupos de menor renda e nível educacional,
tornando a desigualdade maior. Nesse sentido, Castells atenta que a forma de conexão
também se constitui em uma forma de exclusão. Vale lembrar que somente acessar a
Internet pouco valerá se não soubermos utilizar seus recursos de forma positiva e eficiente.
Um bom exemplo é a parte empírica deste trabalho. De nada adianta o colégio
público em questão ter laboratórios de Informática se os professores e professoras e
estudantes não o utilizam porque não conhecem os recursos disponíveis ou não sabem
acessar ou realizar pesquisas na Internet. Esta acabará sendo mais um artefato de
entretenimento, e não um recurso pedagógico. A própria Plataforma Lattes, ferramenta
desta pesquisa, não é conhecida em todo o seu potencial e recursos sequer pela comunidade
acadêmica que a utiliza. É nesse enfoque que, com esta dissertação, procuro contribuir para
92
“Hipermídia é, portanto, uma forma combinatória, permutacional e interativa de multimídia, em que
textos, sons ou imagens (estáticas e em movimento) estão ligados entre si por elos probabilísticos e
móveis, que podem ser configurados pelos receptores de diferentes maneiras [...] ” (MACHADO,
1997, p. 146).
75
a alfabetização científica-tecnológica-digital de alunas e alunos, oportunizando que
conheçam a ferramenta e suas possibilidades de exploração.
Antes de adentrar em questionamentos e balizamentos que tensionem inclusão
digital e Educação, farei um breve histórico da recente utilização da Informática na
Educação. A inserção da informática no campo educacional teve início na década de 1980.
Algumas ações do governo ocorreram antes que fosse criado o 1º projeto oficial – EDUCOM
(1983) – para a inserção de computadores em escolas públicas. As principais ações foram: I
e II Seminário Nacional de Informática na Educação, promovido pelo SEI, MEC
93
, CNPq
(1881 e 1982), e criação da Comissão Especial de Informática na Educação (1983).
O Projeto EDUCOM foi fruto do I Seminário, e seu objetivo principal foi estimular o
desenvolvimento da pesquisa multidisciplinar voltada para a Informática Educativa em
entidades públicas federais. Para isso, foram escolhidas cinco instituições que atuaram como
centros-piloto (UFRJ, UFPE, UFMG, UFRGS, UNICAMP)
94
. Em 1986 e 1987, foi criado o
Comitê Assessor de Informática para a Educação de 1º e 2º Graus, subordinado ao MEC e
conveniado às Secretarias Estaduais e Municipais, tendo como objetivo definir a política
nacional de Informática Educacional a partir do Projeto EDUCOM.
Posteriormente, foi elaborado o Programa de Ação Imediata em Informática na
Educação, que teve dois importantes subprojetos:
Proje o Formar,
cujo objetivo era a
formação de recursos humanos, e
Projeto Cied,
que tinha como meta implementar Centros
de Informática e Educação (CIE), que já haviam sido propostos pelo Comissão Especial de
Informática na Educação.
t
Em 1995, foi criado o PROINFO, projeto que visou à formação de Núcleos de
Tecnologias Educacionais (NTEs) e que vigora até os dias atuais. Esse programa é definido
como o “Programa educacional que visa à introdução das Novas Tecnologias de Informação
e Comunicação na escola pública como ferramenta de apoio ao processo ensino-
aprendizagem”
95
.
Esse programa oferece formação em Informática educativa para professores que
atuam em instituições públicas, dividindo-os em dois níveis: os multiplicadores e os de
escolas. Os multiplicadores são os que capacitam os professores atuantes nas instituições. O
PROINFO tem ainda como objetivos informatizar as escolas públicas e estimular a tradução,
93
SEI – Secretaria Especial de Informática; MEC – Ministério Brasileiro de Educação.
94
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Federal de Pernambuco, Universidade
Federal de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Universidade Estadual de
Campinas.
95
Informação retirada do sítio do Ministério da Educação (MEC).
76
adaptação e produção de
softwares
educacionais. Vale referir que os laboratórios de
Informática da Escola Estadual Parobé são frutos do PROINFO, pois foram obtidos com
recursos desse programa do governo.
Atualmente, vêm sendo criados pelo governo federal muitos Projetos de Inclusão
Digital, como o PC CONECTADO, CASA BRASIL e COMPUTADOR PARA TODOS
96
. Todos têm
como objetivo promover a inclusão digital (possibilidade de acesso). Tais programas
permitem a pessoas de baixa renda adquirirem um computador por custo menor do aquele
de mercado, com condições de pagamento. Outro esforço que merece destaque é a criação
de telecentros
97
, em periferias urbanas, que permitem acesso à Internet à população de
baixa renda.
Valente, ao analisar as ações e políticas de Informática na Educação do Brasil,
afirma que, “[...] inquestionavelmente, temos conhecimento e experiências sobre a
informática na educação instalados nas diversas instituições do país” (VALENTE, p. 15,
1999). Entendo que a afirmação do autor é um tanto quanto otimista, senão utópica, pois,
apesar de haver um considerável esforço do governo por meio de políticas públicas para
possibilitar o acesso das Escolas às novas tecnologias, ainda são poucas as Escolas que se
encontram incluídas digitalmente, pois muitas são as resistências e as dificuldades, como no
caso da Escola Parobé, que, mesmo tendo sido beneficiada por um programa do governo,
não explora o laboratório de Informática em uma perspectiva inclusiva e crítica.
Segundo Tajra (2000), as escolas da rede privada têm demonstrado grandes
atuações e avanços na área de informática educativa, o que demonstra que a informática
educativa vem sendo utilizada e implementada em escolas da rede pública e privada, nestas
últimas com mais êxito e velocidade. A questão econômica determina, assim,
desenvolvimento desigual, se compararmos a rede pública com a rede particular, em
qualquer um dos níveis de ensino. Portanto, torna-se importante, quando se fala em
possibilidade de acesso à Informática, termos presente a quem nos referimos. O custo de
implementação de um laboratório em uma escola não é baixo, o que muitas vezes pode
dificultar a obtenção de recursos financeiros pelas escolas públicas, sejam elas municipais,
estaduais ou federais. Outra questão importante é o custo alto dos
softwares
comumente
utilizados em Informática, como no caso do Windows. Por isso, o mercado dos chamados
96
Informações retiradas do sítio www.gessac.gov.br - Gessac é abreviatura de Governo Eletrônico
Serviço de Atendimento ao Cidadão.
97
Telecentros são espaços com computadores conectados à Internet banda larga. Cada unidade
possui normalmente entre 10 e 20 micros. O uso livre dos equipamentos, cursos de informática
básica e oficinas especiais são as principais atividades oferecidas à população. Informações retiradas
do sítio http://www.id.brasil.gov.br.
77
softwares
livres
98
vem crescendo ultimamente, do mesmo modo que a sua utilização, não só
em escolas, como também em instituições, empresas e até entre usuários domiciliares.
Para Castells, a divisão digital na instância educacional ocorre em quatro níveis: as
diferenciações institucionais (pública / privada), classe social e raça; a exigência de melhor
qualificação dos professores e professoras; estilos e concepções pedagógicas (as escolas de
classe alta e média são mais abertas para inovações pedagógicas dos que as de classe
baixa) e nível cultural e educacional das famílias (as famílias assumem a instrução dos filhos
na área de Informática porque têm acesso à rede em casa).
[...] na ausência de medidas corretivas, o uso da Internet, tanto na escola
quanto na vida profissional, poderia ampliar as diferenças sociais enraizadas
em classe, educação, gênero e etnia. Essa talvez seja a dimensão mais
fundamental da divisão digital que está emergindo na aurora da Era da
Internet (CASTELLS, 2003, p. 213).
A visão do autor contribui para a discussão, mas merece alguns tensionamentos.
Concordo que o uso da Internet pode / poderá ampliar as diferenças sociais, mas
compreendo que, ao nivelar a divisão digital, alguns parâmetros poderiam ficar de fora ou
não estar corretos, pelo menos em termos de Brasil. Por exemplo, não sei se poderíamos
afirmar que as escolas de classe alta e média são realmente mais abertas às inovações
pedagógicas. Suspeito, com base em algumas vivências que tive nesse universo, que,
mesmo em tais instituições, há resistências com relação ao uso de tecnologias educacionais.
Também entendo que não são todas as famílias que assumem a instrução de Informática,
mesmo que possuam acesso a computadores e Internet em casa. Quando o autor se refere
ao “nível cultural”, parece-me que o sentido dado pelo autor (alta cultura X baixa cultura)
não condiz com a minha compreensão sobre cultura, como já problematizei na parte inicial
deste capítulo.
Castells (2003) afirma, ainda, que o crescimento no acesso à rede só é vantajoso
quando os professores ou professoras estão preparados metodológica e pedagogicamente
para a utilização da rede. A afirmação do autor ressalta a importância da alfabetização
tecnológica do professor ou professora. Em sociedades avançadas, as escolas estão se
98
Roberto Hexsel (2006, p. 1) define Software Livre (Free Software) como “o software disponível
com a permissão para qualquer um usá-lo, copiá-lo, e distribuí-lo, seja na sua forma original ou com
modificações, seja gratuitamente ou com custo. Em especial, a possibilidade de modificações implica
que o código fonte esteja disponível. Se um programa é livre, potencialmente ele pode ser incluído
em um sistema operacional também livre. É importante não confundir software livre com software
grátis porque a liberdade associada ao software livre de copiar, modificar e redistribuir, independe de
gratuidade. Existem programas que podem ser obtidos gratuitamente, mas que não podem ser
modificados, nem redistribuídos”.
78
conectando rapidamente à Internet. Nos Estados Unidos, por exemplo, em 1994, apenas
34% das escolas estavam conectadas na rede; este número chega a quase 100% em 2001.
Vejo que a centralidade da Internet em muitas áreas da atividade social, econômica e
política equivale à marginalidade para aqueles que não têm acesso a ela ou que têm apenas
um acesso limitado, bem como para os que são incapazes de usá-la eficazmente (CASTELLS,
2003, p. 203).
Apresento a seguir alguns dados e informações retiradas do Mapa da Exclusão
Digital (MED)
99
com o objetivo de argumentar que, ao contribuir para uma alfabetização
científica-tecnológica-digital, como no caso desta pesquisa, estaremos promovendo também
a inclusão cultural e social e o exercício da cidadania dos alunos e alunas envolvidos.
Na chamada era do conhecimento, ID (Inclusão Digital) é uma questão
básica de cidadania, como o é no acesso a serviços públicos, educação e
saúde. Isso implica, na prática, expandir as medidas usadas de bem-estar
social com a posse de recursos físicos, conhecimentos e redes ligadas ao uso
de tecnologia de informática (MED, 2003, p. 25).
O Mapa da Exclusão Digital é um estudo que foi realizado em todo o Brasil tendo
como objetivo apresentar dados, perfis, subsídios e parâmetros sobre a Exclusão Digital que
pudessem servir como base para políticas ou ações de Inclusão Digital. Tenta-se dar ênfase
ao acesso à tecnologia digital no âmbito doméstico (principalmente), mas também nas
escolas, no trabalho, nos negócios e nos serviços públicos em geral, que são considerados,
pelos pesquisadores envolvidos na elaboração da pesquisa, os “Canais de Inclusão Digital.”
Reuni alguns dados que entendo serem significativos não somente para esta
pesquisa, mas as pesquisas e estudos realizados nos Seminários da Linha de Pesquisa
Currículo, Cultura e Sociedade. A questão de gênero é apresentada no MED, e o número de
mulheres que têm acesso ao computador é um pouco maior do que o dos homens (52,11%
contra 47,89). Porém, ao combinarem-se nível de escolaridade, renda e outros parâmetros
relevantes, a pesquisa mostra que os homens possuem 11% a mais de chance de possuir
acesso à Internet, o que configura “uma brecha condicionada entre os sexos” (MED, 2003,
p.33).
Tendo como parâmetro a idade dos usuários de computador, o estudo mostra que
os jovens são os que menos têm acesso à tecnologia, porém a chance de um jovem com
menos de 15 anos possuir um computador em seu domicílio é muito maior do que a dos
indivíduos da faixa etária de 35 a 40 anos. O estudo conclui que “crianças e adolescentes
são mais excluídos do que qualquer grupo etário, mas menos no caso da tecnologia digital
79
doméstica, o que suscita algum otimismo quanto ao futuro das novas gerações” (idem, p.
36).
Com relação à escolaridade, o acesso a computador para as pessoas que possuem
mais de 12 anos de estudo é de 58,9%, e o acesso à Internet é de 46,8%. Já entre os
analfabetos (em língua materna - português), as taxas caem para 4,1% e 3,4%,
respectivamente. Os indivíduos com nível superior completo estão hiper-representados entre
os incluídos digitais.
Apresento ainda alguns dados que vejo como pertinentes à discussão sobre
alfabetização científica-tecnológica-digital: das pessoas que vivem em áreas urbanas,
12,42% têm acesso ao computador em casa contra apenas 1,55% das que vivem em áreas
rurais; 4% dos negros estão incluídos digitalmente contra 15,14% dos brancos, 3,72% dos
pardos e 41,66% dos amarelos. Isso permite afirmar que a maioria das pessoas com acesso
à Internet vive em áreas urbanas e pertence à raça amarela.
A questão financeira é, sob o ponto de vista cultural e educacional, importantíssima
e é analisada no MED. Assim, vê-se nitidamente, nos dados apresentados, que a população
mais carente é a que mais se encontra excluída digitalmente. Os mais pobres não possuem
despesas digitais, enquanto os mais ricos gastam em torno de 1,06% de seus gastos totais
com computadores e acessórios.
Com relação à exclusão / inclusão digital em escolas, o MED traz alguns dados que
me parecem relevantes e que trago na íntegra:
Os dados nos mostram que do total de alunos matriculados no ensino
fundamental regular, em 1997, apenas 10,8% estavam matriculados em
escolas com laboratório de informática e já em 2001 esse número aumenta
para 23,09%. No caso do Ensino Médio regular, em 1997, 29,1% dos
alunos estavam matriculados em escolas com laboratórios de informática e
em 2001 esse número sobe para 55, 9%, ou seja, pouco mais da metade
de todos os alunos do ensino regular médio já tinham acesso a laboratórios
de Informática em 2001(IDEM, p. 36).
Considerando que esses dados se referem ao ano de 2001 e que já estamos em
2006, muitas informações devem estar ultrapassadas vale afirmar, lateralmente, que não
há área do conhecimento em que os dados se desatualizam de maneira tão rápida quanto
aqueles que se referem ao acesso à rede mundial de computadores , mas a pesquisa
demonstra um aumento significativo de laboratórios em escolas. Cabe problematizar, porém,
que a pesquisa não teve como preocupação avaliar de que forma (qual abordagem
pedagógica / curricular) e com que freqüência os laboratórios são acessados, o que, no meu
99
Realizado pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas em 2003 e retirado do sítio
80
entendimento, fragiliza enormemente a pesquisa, uma vez que reduz a inclusão digital à
possibilidade de acesso a microcomputadores.
Uma outra preocupação da pesquisa que vale trazer é com a infra-estrutura dos
laboratórios das escolas no que tange à conexão à Internet. Segundo os dados
apresentados, 25,39% dos alunos e alunas do Ensino Fundamental estão ligados à Internet.
Essa taxa aumenta para 45,64% entre alunos do Ensino Médio, o que nos faz perceber que,
no Ensino Médio, os alunos são mais beneficiados com relação ao acesso à Internet.
Ao analisar o relatório MED, damo-nos conta que ainda há muito a ser feito para
combater a exclusão digital, que, conforme demonstrado na pesquisa, atinge a sociedade
brasileira de diferentes formas. Tal exclusão envolve questões culturais, políticas,
econômicas e sociais, e por isso é tão complexo combatê-la. Assim, possuir um computador
com acesso à Internet acaba se tornando um privilégio de alguns, ao passo que deveria ser
um direito de todos os cidadãos e cidadãs.
Percebo, então, que a turma 1N1 da Escola Parobé acaba sendo privilegiada no que
diz respeito ao acesso a microcomputores e Internet no ambiente escolar. Fica a
preocupação com uma dimensão maior de inclusão digital que tem a ver com o acesso, com
uma alfabetização científica-tecnológica-digital e com a utilização crítica das tecnologias de
Informação. Entendo, a partir dessa ótica, que utilizar a Plataforma Lattes, artefato cultural
que detalharei no sub-item 3.3, como ferramenta de pesquisa se constitui como uma
possibilidade de inclusão científica-tecnológica-digital para os estudantes envolvidos na
experiência pedagógica.
3.2 Plataforma Lattes CNPq e Sistemas de Buscas: quais possibilidades?
Em um texto escrito, parece não caber uma extensa descrição da Plataforma
Lattes, já que ela é um instrumento para existência em versão digital. Todavia, ainda na
observância das normas de apresentação de uma dissertação de Mestrado, talvez seja
adequado trazer algo de sua história e de seus recursos, mesmo que de forma breve. Aqui
não cabe o propósito de trazer muito mais do que aquilo que está com muitos detalhes no
sítio onde o instrumento é usado. Vou privilegiar alguns pontos que poderão ser mais
adequadamente usados naquilo que é um dos objetivos desta dissertação: utilizar a
da Fundação Getúlio Vargas.
81
Plataforma Lattes como instrumento de pesquisa na busca de alfabetização científica-
tecnológica-digital entre alunas e alunos do Ensino Médio.
Quando refiro o histórico, parece oportuno salientar a homenagem que a mais
destacada agência financiadora de pesquisa brasileira, criadora da Plataforma Lattes, fez a
um dos mais insignes nomes da Ciência mundial. O CNPq – Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico escolheu o nome
Lattes
, de
Cesare Mansueto
Giulio Lattes
, ou simplesmente
Cesar Lattes
,
para denominar aquele que é o instrumento
mais significativo de coleta e disponibilização de dados da Ciência brasileira, inclusive
referência em outros países.
Verifiquei, em uma investigação informal entre colegas e professores, que muitos
desconheciam por que a base de currículos usada se chamava Lattes. Também para mim
esse cientista brasileiro era desconhecido. Assim, incluí aqui, também pelas razões que
constam na nota seguinte, algo acerca de César Lattes, sem, contudo, buscar fazer
mitificações. As fontes do que aparece a seguir foram jornais e revistas, em versões digital e
papel, especialmente os extensos obituários publicados em março de 2005.
Cesar Lattes nasceu em Curitiba em 11 de julho de 1924 e morreu no dia 8 de
março de 2005 (portanto, durante a elaboração do projeto desta dissertação). É numa breve
biografia que eu o homenageio aqui, até porque presumo que muitos brasileiros não o
conheçam ou o conheçam muito pouco, incluindo muitos dos milhares de brasileiros que
preenchem o
Currículo
Lattes
periodicamente
100
. Este brasileiro teve uma notável carreira
científica e, pelo menos em duas oportunidades,
quase
ganhou o Prêmio Nobel de Física. E
nesse
quase
ficaram também outros brasileiros, pois nenhum ainda está entre o quase um
milhar de homens e mulheres e pessoas jurídicas que ganharam uma das seis modalidades
de Prêmios Nobel distribuídas, desde 1901, em outubro de cada ano.
Lattes foi um dos cientistas brasileiros que mais próximo chegou ao Prêmio Nobel,
por ter descoberto, na prática, na altitude dos Andes da Bolívia, em 1947, a existência dos
mésons pi
. Cesar foi o responsável pela descoberta do méson pi em um acelerador de
partículas. Essa descoberta teve um significado ímpar, pois foi a partir disso que a chamada
física de partículas elementares ou de altas energias teve início. Graduou-se em Física e
100
Foi baseada em tais entendimentos que achei necessário propor aos alunos e alunas da turma
1N1 do Parobé uma pesquisa sobre Cesar Lattes, pois entendia que, antes de começar a utilizar a
Plataforma Lattes, os estudantes teriam a oportunidade de conhecer quem foi o cientista e por que foi
homenageado pelo CNPq. Descrevo e problematizo tal prática com maiores detalhes no Capítulo 4 –
Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais caminhos?
82
Matemática pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo em
1943. Sempre precoce, aos 23 anos, participou da fundação do Centro Brasileiro de
Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio de Janeiro. No ano seguinte, já estava produzindo, ao lado
do norte-americano Eugene Garden, o méson pi a partir da aceleração das partículas alfa, no
cíclotron da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos.
Foi discípulo de outros físicos, como Gleb Wataghin e Giuseppe Occhialini, na
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), localizada nas proximidades de onde estava
sua casa, na qual morreu aos 80 anos, com a saúde debilitada já há algum tempo. Lattes
não gostava muito da pós-graduação e não escondia isso de ninguém, apesar de concordar
que era sempre preciso dar uma certa ordem à carreira de um jovem pesquisador – achava
que era “coisa da América do Norte”.
Acreditava na espiritualidade e dizia-se adepto de todas as religiões. Defendia mais
um ambiente criador do que um curso calcado no formalismo puro e simples. Daí vinha o
gosto de reproduzir a frase de Pasteur: "Não há ciência pura e ciência aplicada, há ciência e
aplicações da ciência".
Sobre o Prêmio Nobel a que o próprio Lattes, sempre humilde, nunca deu muita
importância , talvez os louros tivessem sido apenas mais um fardo para a vida do
pesquisador, avesso a qualquer tipo de badalação. Mesmo quando falava de seu senso
apurado de observação e de sua astúcia científica quando decidiu fazer os experimentos
nos Andes –, Lattes era comedido, sem nenhuma ponta de arrogância. Mesmo com tal
postura, muito se falou sobre ele e muito se falará
101
, e Cesar Lattes será sempre lembrado
por meio da homenagem que recebeu do CNPq através da Plataforma Lattes.
A Plataforma Lattes, material ou ferramenta de pesquisa desta dissertação, pode ser
definida conforme indicado no próprio
site
do CNPq:
A Plataforma Lattes representa a experiência do CNPq no que se refere à
integração de seus sistemas de informações gerenciais, instrumento
fundamental não só para as atividades de fomento operadas pela Agência
mas também para tratamento e difusão das informações necessárias à
formulação e à gestão de políticas de ciência e tecnologia (
www.cnpq.br
).
A Plataforma Lattes surgiu há cinco anos, tendo como objetivo coletar digitalmente,
via Internet, as informações sobre a produção científica de pesquisadores no Brasil. A
Plataforma integra quatro sistemas de informações: Sistema Eletrônico de Currículos,
101
O próprio Isaac Asimov , na obra Gênios da Humanidade, dedicou alguns parágrafos para o físico
brasileiro.
83
Diretório de Grupos de Pesquisa no Brasil, Diretório de Instituições e Sistema Gerencial de
Fomento
102
.
O Sistema Eletrônico de Currículos (CV – Lattes) é o responsável pela emissão dos
currículos dos atores institucionais e da comunidade científica brasileira. Em 2002, tornou-se
compulsório para todos os pesquisadores vinculados a instituições de ensino superior ou
qualquer tipo de empresa que desenvolva atividades na área científica e tecnológica que de
alguma forma tenha vínculo com o CNPq. Esse sistema exige o preenchimento do Currículo
Lattes através de um programa e senha obtidos no sítio do CNPq na Internet ou via ligação
telefônica. Atualmente, a base de currículos conta com aproximadamente 590 mil currículos
atualizados
103
.
Fazem uso desse sistema pesquisadores, estudantes, gestores, profissionais
e demais atores do sistema nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. No
CNPq, suas informações [geradas pelo preenchimento do Curriculum Vitae]
são aplicadas [por exemplo]: na avaliação da competência de candidatos à
obtenção de bolsas e auxílios; na seleção de consultores, de membros de
comitês e de grupos assessores; no subsídio à avaliação da pesquisa e da
pós-graduação brasileiras. (
http://lattes.cnpq.br/curriculo/
)
Pretensiosamente, poderíamos incluir na informação do CNPq recém citada,
considerando a proposta desta dissertação: “fazem uso desse sistema alunos e alunas do
Ensino Médio” e “as informações disponibilizadas pela Plataforma Lattes são aplicadas na sua
alfabetização científica-tecnológica-digital”. Assim, utilizar a Plataforma Lattes como
instrumento de pesquisa com a intenção de promover inclusão científica-tecnológica-digital
acaba se tornando uma
inovação
uma prática
inovadora ou uma experiência inovadora ,
uma vez que possibilita uma utilização não-usual, diferente daquela para a qual a Plataforma
foi concebida.
Aqui, quanto à
inovação
, adiro à concepção de Desaulniers(2000) que apresenta
definições para o termo “inovação” (que, em sua pesquisa, se constitui em uma categoria de
análise). Tomo emprestadas da autora algumas definições e dimensões do termo que
entendo serem cabíveis no sentido que estou dando para a palavra “inovação”: “[...] ação
nova e deliberadamente introduzida em dado processo por um ou mais indivíduos [...]” (p.
157) ou, ainda, “Inovação implica: ação deliberada; uma mudança; algo novo, inovador; [...]
processo; tem a capacidade de ameaçar a identidade original de uma instituição ou
organização [...]” (p. 159).
102
Ver Apêndice B(p. 145), no qual trago uma breve descrição de cada sistema de busca, bem como
suas telas de acesso.
103
Dado retirado do site do CNPq em novembro de 2005.
84
Ainda na fase de elaboração do então projeto desta dissertação, enquanto redigia
informações acerca das possibilidades investigativas da Plataforma Lattes, soube que uma
professora do Programa de Pós Graduação em Educação encontrara, conforme relatou "
uma
inusual utilidade do Currículo Lattes
"
104
. Transcrevo seu depoimento acerca de um uso da
Plataforma Lates que é, pelo menos, exótico aos propósitos para os quais esse instrumental
foi concebido:
A pedido da autora do projeto de dissertação, presto um depoimento sobre
uma experiência que tive vinculada ao currículo Lattes. Ao longo de minha
vida, fico muito mobilizada internamente sempre que se faz necessária a
escolha de um médico. Afinal, trata-se de curar nossos corpos que, se
enfermos, “acabam por fazer adoecer também nossa alma”. Assim, quando
me deparei com uma alteração na córnea de difícil diagnóstico, sem saber
como encontrar caminhos para ouvir outras opiniões sobre o que atingia
minha visão, lembrei de recorrer ao sistema de currículos que de modo
simplificado chamamos “Lattes”. Entrando na página da rede de uma
universidade, busquei seu Departamento de Oftalmologia e, através dele,
obtive os nomes de seus professores-pesquisadores. De posse da lista,
examinei seus currículos Lattes, observando as temáticas que investigavam
e suas publicações mais recentes, de modo a qualificar minha escolha. Foi
nesta ocasião que o “Lattes” que por razões meramente acadêmicas
muito já tinha me exigido em termos de tempo gasto em seu
preenchimento se mostrou um poderoso auxiliar na definição de algo,
literalmente, vital. Graças à pesquisa realizada, pude encontrar um
profissional que, apoiado em trabalho investigativo, fez um diagnóstico
adequado e encaminhou um tratamento que levaram à cura da
enfermidade.
Uso tal declaração como exemplo do quanto a Plataforma Lattes pode ser explorada
de diferentes maneiras e com objetivos diversos por meio de práticas que podem ser
consideradas
inovadoras
. Esse depoimento serve-me / serviu-me como incentivo na
elaboração dos caminhos a serem seguidos no campo empírico, demonstrando o potencial
informativo da ferramenta digital que escolhi como material de pesquisa, a ser explorada por
alunos e alunas do Ensino Médio.
Considerando a velocidade com que podemos acessar diferentes bases de dados,
que, por sua vez, se tornam cada vez mais consistentes e complexas, pode-se afirmar que,
com o surgimento e proliferação da utilização da Internet, foram produzidas novas
possibilidades educacionais sob diferentes aspectos
105
. Deter-me-ei, neste momento, na
perspectiva de pesquisa na rede, pois, concordando com Tajra (1999), a Internet é a maior
fonte de informações disponível na atualidade.
104
Agradeço à professora Dra. Gelsa Knijnik por atender meu pedido fazendo-me um relato de uma
experiência de busca de saúde na Plataforma Lattes.
105
A Internet possibilita recursos que podem ser explorados com finalidades pedagógicas, como
conversas síncronas e não-síncronas; envio de mensagens; transferência de arquivos; visita a
museus e bibliotecas virtuais; visita a universidades e livrarias; leitura de jornais, revistas; acesso a
mundos virtuais, etc. (TAJRA, 1999).
85
Ao realizarmos uma busca nas páginas da rede, através de uma exploração
hipertextual, isto é, não-seqüencial, freqüentemente deparamo-nos com uma enorme
quantidade de informações sobre a mesma temática. Por isso, é importante considerarmos a
fidedignidade das informações obtidas. Esse é um dos novos desafios impostos aos
agentes
escolares, em especial ao professor ou professora que atua como mediador ou mediadora de
tal processo de pesquisa. Assim, “pesquisar eficazmente na Internet significa conhecer a
extensão das diferentes ferramentas de pesquisa disponíveis e dominar técnicas para
desenvolver e aprimorar suas pesquisas” (HEIDE; STILBORNE, 2001, p. 101).
Um dos principais instrumentais para a realização de uma pesquisa são os sistemas
de buscas. Estes, dentre todos os serviços disponíveis na rede, exercem / exercerão um
papel fundamental na hora de realizarmos uma pesquisa na rede. No Capítulo 2, item 2.2.1
(Máquinas e seres humanos: quais limites?), falei lateralmente das parcerias que
estabelecemos, por exemplo, com buscadores, como o Google e assemelhados, indefinindo-
se os limites entre o humano e o não-humano. É preciso notar que esses buscadores são dos
melhores auxiliares de pesquisa que temos e fazem com maior eficiência o que um humano
fazia aqui uso de propósito o verbo no passado no rastreamento do que já foi publicado
sobre um determinado assunto. Aliás, a eficiência dos buscadores está relacionada com dois
parâmetros com os quais um humano não pode competir: velocidade e número de fontes de
acesso. Por isso, incluí o uso de buscas na pesquisa que realizei com a turma 1N1 da Escola
Parobé durante a experiência pedagógica.
O objetivo primordial de uma busca na Internet é localizar com a maior precisão
possível os documentos ou sítios que contenham o tema que o usuário deseja. Com base na
afirmação das autoras, entendo que é preciso compreender como se dá / se dão os
processos de buscas na Internet. Por isso, compartilho, neste momento, alguns dados mais
técnicos sobre os sistemas de buscas, uma vez que tive que estudá-los para uma melhor
mediação / intervenção junto aos estudantes da turma 1N1. Heide e Stilborne (2001)
diferenciam os sítios de buscas da seguinte forma:
Árvores de assunto – as árvores de assunto, também conhecidas como
diretórios da Web, conforme indica Maria Ercília (2001), permitem que os dados sejam
explorados através de uma lista organizada de categorias e subcategorias. Exemplo:
http://www.yahoo.com.br
e http://www.cade.com.br (ambos dividem as informações em
áreas mais amplas).
Metapesquisa – os sistemas de metapesquisa permitem uma consulta a
vários sistemas ao mesmo tempo. Esse recurso é útil quando não se deseja realizar uma
86
busca refinada ou somente para ver o que existe sobre determinado assunto na rede.
Exemplo:
http://www.dogpile.com
e o
software
Miner.
Sistemas de Pesquisa ou Pesquisa por palavras-chave – através de
sites
específicos de buscas por meio de um “marcador específico” sobre o tema a ser
pesquisado, esse recurso possibilita acharmos informações através de uma palavra
(geralmente digitada entre aspas), frase ou conjunto de palavras. Exemplo:
http://www.google.com.br
. Dentro dos sistemas de buscas, podemos ainda realizar
pesquisas por Meta-palavras ou buscas lógicas complexas, conforme indicam Heide e
Stilborne (2001).
Meta-palavras – essa é uma classificação utilizada por Heide e Stilborne
(2001); são palavras prefixadas que estipulam o local do documento fonte em HTML
(linguagem de programação utilizada nas páginas), onde a busca deve ser realizada. Para
utilizar esse recurso, é necessário domínio da linguagem html.
Buscas lógicas complexas - esse método permite combinar várias palavras-
chave ou frases de maneiras específicas, de tal forma que a busca seja concentrada sobre o
objetivo, não deixando escapar nada e excluindo aqueles que não interessam.
Para realizar uma busca com sucesso nas páginas da rede, é preciso que o usuário,
seja ele professor ou aluno, saiba utilizar minimamente os sistemas (ou sítios) de buscas e
também os chamados catálogos
on-line
disponíveis na rede. Atualmente, existem sítios de
busca específicos para pesquisa escolar, como o
http://scholar.google.com/. Esse endereço
vasculha as informações na rede em sítios de universidades e instituições escolares,
tornando-se uma ferramenta eficaz por objetivar a pesquisa em áreas educacionais e trazer
informações de fontes supostamente mais fidedignas.
O professor, como mediador do processo de aprendizagem de seus alunos,
conhecendo tecnicamente como funcionam os sítios de busca, poderá contribuir de forma
mais significativa no processo de pesquisa dos estudantes. Assim sendo, tive a preocupação,
durante a experiência pedagógica, de desenvolver nas alunas e alunos da turma 1N1
habilidades técnicas que possibilitassem realizar buscas e pesquisas na Internet, num
primeiro momento, através de
sites
de buscas e, num segundo momento, nos sistemas de
buscas por currículos da Plataforma Lattes. Estes últimos permitem / permitiram, no meu
entendimento, buscas mais complexas por possibilitarem a combinação de diferentes
parâmetros em uma mesma operação de busca.
87
Entendo ser uma necessidade (ciber)cultural saber utilizar os sistemas de buscas da
Internet, em especial os da Plataforma Lattes, ferramenta de pesquisa que pode ser
entendida como um artefato da cultura acadêmica ou científica. A base de dados dos
Currículos Lattes pode ser explorada livremente por qualquer pessoa que acessar a Internet
e o sítio do CNPq, mas acredito que tal sistema acaba sendo utilizado somente pelas pessoas
envolvidas em atividades científicas. Dessa maneira, a Plataforma Lattes, como recurso de
pesquisa junto aos estudantes da Escola Parobé, acabou se constituindo ainda, mesmo que
pretensiosamente, como uma maneira de promover inclusão (ciber)cultural e social.
3.3 Alfabetização científica-tecnológica-digital e currículo: quais
considerações?
Pretendo aqui apresentar algumas considerações acerca das teorias curriculares e
da relação entre currículo e alfabetização científica-tecnológica-digital, tendo como base os
estudos realizados nos Seminários da Linha de Pesquisa na qual me insiro. Quando procuro
evidenciar uma aproximação teórica com os estudos de currículo, inicio com as perspectivas
que estão presentes na Linha de Pesquisa Currículo, Cultura e Sociedade e que podem ser
sintetizadas na afirmação de Tomaz Tadeu da Silva:
Da perspectiva do pós-estruturalismo [...] é impossível separar a descrição
simbólica, lingüística da realidade – isto é, a teoria – de seus “efeitos de
realidade”. A teoria não se limitaria, pois, a descobrir, a descrever, a explicar
a realidade: a teoria estaria irremediavelmente implicada na sua produção
(SILVA, 2002, p.11).
Buscando uma aproximação com as idéias de Silva, compreendo que as teorias
curriculares
106
, ao descreverem o currículo, o “inventam” e o constituem. Ao descrever
textualmente o currículo, produzimos uma noção particular sobre ele. Isso significa que as
teorias do currículo trazem consigo questões que giram em torno de “subjetividades” e
“identidades”. Nessa perspectiva, vale destacar que o currículo é visto como um campo de
disputa permeado por relações de poder.
Segundo Silva, é justamente a questão do poder e o modo como este é visto que
separam as teorias curriculares tradicionais das teorias críticas e pós-críticas. Enquanto as
teorias tradicionais pretendem ser “neutras”, as teorias críticas e pós-críticas entendem que
qualquer teoria está, “inevitavelmente, implicada em relações de poder” (2002, p. 16).
106
A expressão “Teorias do currículo” é entendida por Veiga-Neto (1999) como “[...] um amplo campo
de conhecimentos que se vale ora da sociologia, ora da história, ora da pedagogia, ora da economia,
ora da epistemologia, ora da lingüística – e todas elas nas suas mais variadas escolas, tendências ou
perspectivas – para descrever, analisar – e às vezes, intervir [grifos do autor] sobre – aquilo que [...]
vem sendo designado, nos últimos quatrocentos anos, de ‘currículo’[...]” (VEIGA-NETO, 1999, p. 94).
88
Entendo ser relevante trazer uma breve caracterização de tais teorias e sei que, ao fazer
isso, estarei sendo reducionista, pois falar de teorias do currículo constitui-se em uma
discussão complexa que valeria nada menos que uma nova dissertação. Meus comentários
constituem-se em informações sobre o pano de fundo de minha pesquisa que não foi sobre
currículo, mas com currículo
107
.
As teorias tradicionais do currículo vêem-no a partir de um processo de
racionalização de resultados educacionais e têm como preocupação ordenar
metodologicamente os conteúdos do currículo. O campo especializado sobre currículo,
classificado por Silva (2002) como “teoria tradicional do currículo”, surge nos Estados Unidos
a partir da obra de Bobbit (1918), inspirado em modelos empresariais, mecanicistas e
industriais. Assim, as teorias tradicionais preocupam-se com o desenvolvimento de técnicas
educativas sem fazer qualquer questionamento mais radical sobre o sistema educacional da
época. As idéias de ensino, aprendizagem, avaliação, metodologia, didática, organização,
planejamento, eficiência e objetivos são os tópicos que preocupavam / preocupam as teorias
tradicionais do currículo (IBIDEM, 2002).
Já as teorias críticas do currículo surgem na década de 1960 e contam com teóricos
tão dispares quanto Paulo Freire, Althusser, Bourdieu e Passeror, Baudelot e Establet. A
preocupação desses teóricos críticos, diferente do foco dos teóricos tradicionais, centra-se
em “como fazer” o currículo, colocando sob suspeita os pressupostos dos arranjos sociais e
educacionais tradicionais. “As teorias críticas desconfiam do
status quo
,
responsabilizando-o pelas desigualdades e injustiças sociais”, como afirma Silva (2002, p.
30). Assim, os tópicos que ganham sentido a partir dessas teorias e que se tornam
preocupações curriculares são: ideologia; reprodução cultural e social; poder; classe social;
capitalismo; relações sociais de produção; conscientização; emancipação e libertação;
currículo oculto e resistência (SILVA, 2002).
Por sua vez, as teorias pós-críticas do currículo, campo com o qual busco
aproximações, têm a ver com: identidade; alteridade; diferença; subjetividade; significação e
discurso; saber-poder; representação; cultura; raça; gênero; etnia; sexualidade e
multiculturalismo (IBIDEM).
Portanto, cabe problematizar o entendimento que tenho sobre currículo tendo como
inspiração autores que se filiam às teorias pós-críticas do currículo e ao pós-
107
Para maiores adensamentos, ver SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de identidade: uma
introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
89
estruturalismo
108
. Veiga-Neto (1999) aponta o currículo como um artefato da educação
escolarizada que fora inventado na passagem do século XVI para o século XVII. Pode-se
dizer que o currículo é fruto da Modernidade e que surge com o intuito de ordenar os
saberes educativos de uma “Ciência Nova, a Ciência Pedagógica”, conforme indica Ireno
Antonio Berticelli (1999). Como produto do Projeto da Modernidade, o currículo herda muitas
das características da Ciência Moderna. Assim, o currículo pode ser visto como um artefato
que permitiu a produção escolarizada do “sujeito moderno”, criando uma forma de “estar no
mundo” particular que priorizava os ideais da Modernidade e toda a sua episteme
109
,
adquirindo um caráter ordenador, hierarquizador e representacional, como bem lembra
Veiga-Neto (1999, 2004).
Sandra Corazza (2001, p. 9) apresenta algumas teorizações na busca de
entendimento do currículo. Este, segundo a autora, é uma linguagem em que identificamos
“significados, significantes, sons, imagens, conceitos, falas, língua, posições discursivas,
representações, metáforas, metonímias, ironias, invenções, fluxos, cortes, etc.” O currículo
pensado dessa maneira tem uma função constitutiva daquilo que enuncia como sendo
escola, aluno, professor, pedagogia e a própria palavra
currículo
, tornando-se um dispositivo
de saber-poder-verdade.
O currículo apresenta, portanto, dimensões políticas, sociais, culturais e educativas,
não podendo ser reduzido ou entendido somente como aquilo que acontece ou que se
ensina em sala de aula. A partir de uma visão pós-crítica do currículo, tendo como inspiração
os Estudos Culturais, pode-se afirmar que “o cultural torna-se pedagógico e o pedagógico
torna-se cultural” (SILVA, 2001, p. 140). Assim, mesmo as instâncias ou práticas culturais
mais amplas, que muitas vezes parecem distantes da escola, como a publicidade, a
televisão, as artes visuais e a música, também possuem “
um currículo
”, pois também
“ensinam coisas”, mesmo que não tenham o objetivo pré-planejado de ensinar
“determinados conhecimentos”, como no caso do currículo propriamente escolar
110
.
108
Peters (2000) compreende pós-estruturalismo como um estilo de filosofar, uma forma de escrita ou
um “movimento de pensamento”, que corporifica práticas interdisciplinares, já que se ramifica em
diferentes correntes de pensamento que têm como objetivo questionar as bases do estruturalismo.
Assim, o pós-estruturalismo “ [...] questiona o racionalismo e o realismo que o estruturalismo havia
retomado do positivismo, com sua fé no progresso e na capacidade transformativa do método
científico, colocando em dúvida, além disso, a pretensão estruturalista de identificar as estruturas
universais que seriam comuns a todas as culturas e à mente humana em geral” (p. 39).
109
No Capítulo 2, já foram apresentadas algumas características do paradigma da Modernidade.
110
“Isso significa as pedagogias culturais e currículos culturais em andamento dentro e fora das
instituições educacionais, estruturados de acordo com as forças que regem a dinâmica comercial,
política e cultural dominante no mundo contemporâneo” (COSTA, 2002, p. 144). A partir desse
entendimento, o campo teórico das Pedagogias Culturais propõe-se a estudar os currículos de
diferentes instâncias culturais ou da chamada indústria cultural.
90
Na perspectiva teórica em que se insere Corazza (2001), não se faz mais a
pesquisa “do currículo” no sentido global, mas sim a pesquisa de “um currículo”. Utilizo-me
de tais noções para entender meu trabalho no campo empírico junto a alunos e alunas do
Ensino Médio como uma prática curricular que busca / buscou, fazendo uso da Plataforma
Lattes, produzir outros sentidos com as informações dela retiradas. Nesse sentido, a prática
desta pesquisa de currículo tem / teve como pretensão ser aproveitável por outros
pesquisadores / pesquisadores que poderão até encontrar nesta dissertação uma
[...] ‘sementeira’ de sentidos imprevistos [...] Para isto, importa perguntar
se tudo o que vimos, até agora, nas propostas curriculares, é tudo o que
pode ser visto, e se tudo o que dissemos é tudo o que pode ser dito.
Fabricar outros óculos e outra linguagem para ver e dizer as coisas e as
palavras de “nossos” currículos (IBIDEM, p. 112).
Utilizar a Plataforma Lattes da forma como proponho pressupõe lançar um outro
olhar (ou utilizar outros óculos) sobre o fenômeno pesquisado, constituindo-se em uma
prática curricular ou “
um currículo
, como aponta Corazza. Depois de minha imersão nesses
estudos e com o envolvimento nesta pesquisa, vejo o currículo de forma mais ampla,
entendendo que ele não diz respeito somente à grade curricular ou aos conteúdos propostos
para trabalho em sala de aula; entendo currículo como um artefato social e cultural, o que
significa que ele
[...] não é um elemento inocente e neutro de transmissão desinteressada do
conhecimento social. O currículo está implicado em relações de poder, o
currículo transmite visões sociais particulares e interessadas, o currículo
produz identidades individuais e sociais particulares. O currículo não é um
elemento transcendente e atemporal – ele tem uma história, vinculada a
formas específicas e contingentes de organização da sociedade e da
educação (SILVA, 1996, p. 83).
E é nessa dimensão que entendo que examinar possibilidades de fazer inclusão
científica-tecnológica-digital no Ensino Médio utilizando a Plataforma Lattes não é uma
prática desinteressada; pelo contrário, como pesquisadora, vou a campo interessada em
contribuir para a alfabetização científica-tecnológica-digital dos estudantes, o que se
constitui em uma prática não só cultural, conforme já mencionei anteriormente, mas
também em uma prática curricular, uma vez que estou / estive não apenas intervindo num
currículo, mas
produzindo currículo
com a experiência vivida na turma 1N1 da Escola Parobé.
Veiga-Neto (2003) contribui para essa discussão afirmando que a Escola, através do
currículo, realiza uma mediação na relação de interdependência entre currículo e o mundo
social e cultural, pois é por meio do currículo que a prática de uma cultura é trazida para ser
ensinada. “Em outras palavras, o currículo ajuda a construir / constituir a sociedade e a
cultura ao mesmo tempo em que é por estas construído / constituído” (p. 166).
91
Dessa maneira, a seleção curricular passa a ser uma seleção cultural. Quer dizer: se
analisarmos um currículo escolar (grade curricular de conteúdos) a partir dos conteúdos e
conhecimentos elencados, poderemos perceber implicitamente ou explicitamente quais
conhecimentos são vistos como importantes naquela cultura ou questionar por que alguns
conteúdos são priorizados em detrimentos de outros. É buscando conexões entre Escola
(vista como instituição formal que produz ensino e aqui assim pensada nos diferentes graus
do ensino formal), cultura e currículo que poderemos achar possíveis respostas (VEIGA-
NETO, 2004).
Examinando o currículo da turma 1N1 da Escola Parobé, por exemplo, poderemos
perceber que a Escola busca, com a inserção da Informática Básica no currículo do 1º ano
do Ensino Médio, sintonizar-se com algumas das características da cultura de nosso tempo
(cibercultura ou cultura digital). Acredito que esse é um esforço válido da instituição e da
coordenação pedagógica (que elaborou o currículo da Escola), o que já pode ser visto como
uma tentativa, mesmo que muito tímida, de inclusão digital. Dentro dessa linha de
pensamento, permito-me afirmar que a alfabetização científica-tecnológica não só é uma
necessidade cultural, conforme já problematizei anteriormente, como também é uma
necessidade curricular decisiva para as transformações que se deseja ver catalisadas pela
Escola.
Corazza (2001) refere-se ao currículo como uma “coisa”, que pode ser uma lista de
conteúdo ou uma grade curricular, mas que acaba sendo aquilo que fazemos com ela. Mas
não é só isso. A partir do momento em que fazemos algo com as “coisas” do currículo, estas
também fazem “coisas” com as pessoas que estão envolvidas nas práticas curriculares.
Assim, o currículo passa a ser visto (SILVA, 1996) sob o aspecto político como produtivo.
O currículo é aquilo que nós, professores/as e estudantes fazemos com as
coisas, mas é também aquilo que as coisas que fazemos fazem a nós. [...]
tem que ser visto em suas ações (aquilo que fazemos) e em seus efeitos (o
que ele nos faz). Nós fazemos o currículo e o currículo nos faz (SILVA, 1996,
p. 194).
Analisar os efeitos produzidos por “um currículo” é uma das alternativas para quem
se aventura a realizar uma pesquisa com inspirações pós-estruturalistas. De certa forma,
creio que farei / fiz tal análise no Capítulo 4 –
Plataforma Lattes e alfabetização científica
tecnológica-digital: quais verdades provisórias?
,
quando apresento o sentido dado por mim
ao sentidos dados pelos alunos e alunas à experiência pedagógica vivida na turma 1N1 da
Escola Parobé.
-
92
Fui a campo fortemente marcada por inúmeros questionamentos provocados pelos
entendimentos teóricos que edifiquei sobre currículo, cultura, sociedade, Escola e Educação:
será que realmente contribuí / contribuirei para a alfabetização científica de alunas e alunos
da turma 1N1 da Escola Parobé? Consegui / conseguirei, através da experiência pedagógica
(vista como uma prática curricular e cultural), promover, mesmo que apenas na dimensão de
despertar a curiosidade, uma inclusão científica-tecnológica-digital? Estarei lançando
realmente um outro olhar sobre a grade curricular da escola, onde muitas vezes são
estudadas “coisas” (in)úteis pretensiosamente fazendo uma atividade curricular?
As dúvidas são muitas, e as certezas, poucas ou quase nenhuma. Mas valeria
aventurar-se na pesquisa em Educação se já soubéssemos as respostas que encontraríamos?
É nessas incertezas que desejei fazer desta dissertação uma produção científica que incluiu
estudo teórico e uma prática empírica que objetivaram conduzir a modificações curriculares,
primeiro em mim e depois na turma 1N1 da Escola Parobé. O quanto consegui mostro não
apenas no capítulo
Pla aforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
verdades
provisórias?
, que escrevo à guisa de conclusão, mas também aqui, onde trago
todas as minhas inquietações ao envolver-me com currículo de uma maneira diferente do
modo como o concebia antes de ingressar em um Programa de Pós-Graduação em
Educação.
t
Assim, marcada e movida por muitas inquietudes, provocadas e instigadas
processualmente pela minha história de vida e pela experiência pedagógica junto à turma
1N1, e atravessada pela base teórica que sustenta este trabalho, passo a tecer, nos
próximos dois capítulos (4 e 5), possíveis respostas, ou melhor, respostas provisórias para os
questionamentos e objetivos propostos por esta dissertação.
93
4. Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
caminhos?
Neste capítulo, apresento alguns caminhos metodológicos que foram seguidos
durante a elaboração desta dissertação. Narro também dificuldades encontradas, bem como
dúvidas e angústias não poucas que foram surgindo nesse caminhar. Realizo, ainda,
algumas tessituras e tensionamentos entre a prática pedagógica e os referenciais teóricos
que a embasaram. Minha intenção não é somente relatar ou simplesmente descrever como
tudo foi acontecendo durante a experiência pedagógica (por isso, não seguirei uma lógica
linear), mas também problematizar as respostas encontradas durante a pesquisa, mesmo
tendo presente que elas são e serão sempre provisórias, e analisar minha caminhada como
pesquisadora e educadora.
Cabe retomar, mais uma vez, que até o momento da qualificação do projeto desta
dissertação tive dificuldades na minha aproximação com o campo empírico, pois muitos
foram os desencontros e contatos por
e-mail
e telefone para que finalmente conseguisse
realizar uma primeira entrevista com a supervisora. Eu nem sequer conhecia os estudantes
com quem iria trabalhar posteriormente, durante quase quatro meses (setembro, outubro,
novembro e dezembro).
Após a qualificação, já mergulhada no campo empírico, o tensionamento sobre meu
projeto de pesquisa foi algo inevitável e constante, pois muitas das minhas expectativas e
hipóteses foram sendo contestadas. Creio que esse tensionamento foi fortemente
impulsionado pelo fato de ter elaborado o projeto desta dissertação tendo como base
sujeitos que até aquele momento estavam “descorporificados”. Tomei como fundamento
metodológico durante tal processo uma postura científica que não pretendia / pretendeu
revelar a “verdade” ou “verdades absolutas”, mas problematizar todas as minhas certezas,
entendendo, como Alfredo Veiga-Neto, que
não há uma perspectiva privilegiada a partir da qual possamos ver e
entender melhor a realidade social, cultural, econômica, educacional, etc.
[...] o que interessa é problematizar todas as certezas, todas as declarações
de princípios [universais]. [...] Isso significa, sim, que tudo aquilo que
94
pensamos sobre nossas ações e tudo aquilo que fazemos tem de ser
contínua e permanentemente questionado, revisado e criticado (VEIGA-
NETO, 2002, p. 34).
A partir disso, entendo que a pesquisa que realizei não teve como pretensão
generalizar ou universalizar seus resultados – estes dizem respeito somente à escola ou,
num recorte mais detalhado, a uma turma de alunas e alunos do 1º ano do Ensino Médio de
uma Escola Estadual que foi objeto de minha investigação. Tudo o que apresentei /
apresento / apresentarei sobre tal instituição nada mais é do que a minha visão, o meu olhar
sobre a Escola Parobé, mais especificamente sobre os alunos e alunas das aulas de
Informática da turma 1N1. Provavelmente, se outro pesquisador realizasse a mesma
pesquisa, encontraria outros sentidos e respostas diferentes das que encontrei durante as
entrevistas, questionários, práticas pedagógicas e observações realizadas.
As primeiras informações que tive foram obtidas na entrevista
111
realizada em 18 de
abril de 2005 com a supervisora, quando selecionamos a turma de 1° ano do Ensino Médio
do turno da noite para realizar minha intervenção pedagógica, considerando que: as turmas
do 1° ano têm acesso semanal ao laboratório; apesar de a turma ter 30 alunos matriculados
nesse turno, somente 15 freqüentam assiduamente as aulas – uma amostra da evasão que
ocorre no ensino público noturno. Tal opção pela série também foi sugestão da supervisora,
por razões de presença da Informática na grade curricular dessa turma.
Mais tarde, aconteceu uma segunda entrevista (categorizada como aberta ou semi-
estruturada), apoiada em um roteiro de objetivos e perguntas prévias e realizada com a
supervisora e com o professor de Informática da turma. Considerando tal escolha, busquei
como pesquisadora ter uma postura rigorosa (e não rígida), que teve como pressuposto um
cuidado epistemológico que permitisse não ouvir e considerar a
“voz”
do entrevistado, vista
como fonte reveladora da “realidade ou verdade”, mas promover uma escuta mais sensível,
que desse ouvidos às
“vozes”
desses sujeitos pesquisados, tendo como princípio a idéia de
que todos ocupam posições móveis e escorregadias. Assim, tenho de considerar também o
entorno e a complexidade na hora da entrevista e da sua análise (cenário, posturas,
discursos, etc.), percebendo-a como um jogo de poder que instiga o questionamento
constante das respostas do(s) entrevistado(s) / entrevistada(s) e entrevistador /
entrevistadora, observando suas regularidades para somente depois formular hipóteses,
suspeitas e sentidos aos discursos que circulam no evento entrevista, conforme aponta Rosa
Maria Hessel da Silveira (2002, p. 120):
111
Aqui devo referir que essa entrevista só se tornou concretizável depois de seis idas infrutíferas à
Escola e sucessivas transferências de pessoas indicadas para que eu contatasse.
95
[...] olhar as entrevistas como eventos discursivos complexos, forjados não
só pela dupla: entrevistador / entrevistado, mas também pelas imagens,
representações, expectativas que circulam – de parte a parte – no
momento e situação de realização das mesmas e, posteriormente, de sua
escuta e análise.
Acredito haver alguns elementos significativos a serem pensados nas entrevistas
(houve mais de uma) que realizei com a supervisora e o professor de Informática. Um dos
elementos que se relacionam direto com meu foco de pesquisa é a perspectiva de
alfabetização digital. A própria supervisora apontou que o nível de conhecimento de
professoras e professores é extremamente baixo e que a maioria não utiliza o laboratório
como recurso pedagógico por não possuir conhecimentos técnicos e/ou interesse suficiente
para isso.
A coordenadora pedagógica do Ensino Médio do turno da noite relatou que a
coordenação pedagógica elaborou e realizou projetos que incluíam a utilização do laboratório
por diferentes disciplinas, mas estes não obtiveram sucesso devido à falta de alfabetização
digital e de interesse de professores e professoras da Escola. Por isso, a escola optou pela
utilização da Informática somente com o objetivo de aprender a manusear os programas
básicos (editores de texto, planilhas, Internet, etc.). Assim, senti-me desencorajada para
trabalhar o Projeto junto aos demais professores, pois o professor de Informática, que
trabalha há muitos anos na escola, também me disse que esse poderia não ser um bom
caminho, considerando a resistência que o corpo docente da escola demonstrou / demonstra
ter com relação à Informática
112
.
Na primeira entrevista com o professor de Informática responsável pelo laboratório
à noite
113
, além de mostrar minha proposta de trabalho, com que ele já havia concordado e
de que já tinha uma cópia impressa, busquei entender quais conhecimentos informáticos
eram ensinados, quais atividades eram realizadas semanalmente no laboratório e qual o
nível de aprendizagem tecnológica-digital de alunos e alunas.
Acho válido destacar algumas informações trazidas pelo professor (que atua há 28
anos na escola) que foram importantes para que eu desse início ao meu trabalho e
questionamentos:
112
Um dado curioso é que, ao aplicar um questionário junto ao corpo docente da turma, quase todos,
com exceção de um professor, apontaram que teriam interesse em utilizar a Informática como recurso
pedagógico, porém, apesar de terem tal possibilidade disponível e a estrutura da escola permitir, não
a utilizavam.
113
Esse profissional é licenciado em Biologia e pós-graduado (especialização) em Informática na
Educação. Trabalha 20 horas semanais na Escola Parobé, onde leciona Informática para os 1
os
anos
e Biologia para os 3
os
anos do Ensino Médio, além de atuar em mais duas escolas particulares de
Porto Alegre, também no Ensino Médio, e ainda lecionar em um curso pré-vestibular no município de
Canoas (Grande Porto Alegre).
96
a Informática é uma disciplina que aprova ou reprova como qualquer outra;
embora a freqüência às aulas não seja obrigatória, todos devem realizar a
prova;
os alunos e alunas que não precisam assistir às aulas por já saberem
Informática e que não concordam em ser monitores ajudando os demais
colegas, são dispensados;
muitos alunos e alunas têm dificuldade em comandos básicos da Informática;
a maioria não tem acesso fora da escola ao computador;
são considerados (pelo professor) como analfabetos científicos, uma vez que
tiveram um Ensino Fundamental considerado “fraco”;
a maioria não demonstra ter preocupação com o vestibular;
desconhecem a História da Ciência, Áreas do Conhecimento e, quase como
conseqüência, agências de financiamento de atividades científicas.
Embora a Informática esteja na grade curricular, nem todos os alunos são
obrigados a participar das aulas. Ao ingressarem na escola, realizam um teste: os que
demonstram domínio razoável em Informática básica (Windows, Word, Internet) são
dispensados das aulas e apenas realizam as provas trimestrais; os que não possuem domínio
devem (deveriam) freqüentar as aulas.
Uma das minhas grandes dificuldades durante a experiência pedagógica foi
exatamente nesse ponto. Muitos alunos que “deveriam” freqüentar as aulas regularmente
não o faziam, aparecendo no laboratório de Informática esporadicamente. Isso prejudicou
muito o trabalho, pois sempre tive que planejar atividades extras ou retomar o que estava
fazendo para dar conta de tais estudantes. O número de freqüentadores assíduos de minhas
aulas foi, em média, de seis a oito estudantes de uma turma com 30 matriculados.
Chamo atenção aqui para um fato interessante: nas aulas de Informática, em geral
o professor titular não realiza chamada regularmente; dessa forma, os alunos não se sentem
“pressionados” a assistir a todas as aulas. Porém, depois que passei a observá-los e a
participar de outras áreas de convivência junto aos estudantes (pátio, corredores, etc.),
percebi que eles se sentiram “envolvidos” ou talvez instigados a participarem dos encontros.
Assim, à medida que fui estabelecendo relações com os estudantes e eles perceberam minha
presença em outros espaços e lugares da Escola, não somente nas aulas de Informática no
97
laboratório, passei a contar com um número maior de alunos regulares que se tornaram
mais participativos.
A minha mediação junto à turma deu-se a partir de uma palestra intitulada “O que
é Ciência?”, que o prof. Dr. Attico Chassot realizou na turma 1N1. Alunas e alunos foram
apresentados e convidados oficialmente (já os acompanhava, mas não havia feito até então
intervenções como mediadora / pesquisadora junto à turma) a participar de minha pesquisa.
A receptividade dos estudantes foi positiva e concordaram, estimulados pelo professor
Chassot, pelo professor de Informática e por mim, em participar do projeto de pesquisa
intitulado, perante a turma, Projeto Plataforma Lattes. Abaixo segue uma foto
114
da
palestra.
Professor Attico
Chassot
respondendo
questionamento
de um aluno da
turma 1N1,
durante a
palestra “O que
é Ciência?”.
Figura 1 – Foto da palestra “O que é Ciência?”
A primeira atividade que realizei com os estudantes, na semana seguinte da
palestra, foi uma pesquisa em
sites
de busca sobre César Lattes. O desafio era que os alunos
e alunas conhecessem esse cientista e sua produção, pois seu nome estava envolvido no
nome da Plataforma que era central em minha investigação e também porque havia sido
notícia recente na imprensa em função de seu falecimento. Pude perceber, acompanhando
tal atividade, o quanto seria desafiador trabalhar com essa turma, pois muitos não tinham
grande domínio nas ferramentas utilizadas (Word e Internet). Posso dizer que o nível de
alfabetização digital desses estudantes, apesar de interagirem e estudarem Informática há
114
Utilizo algumas fotos neste capítulo e no capítulo seguinte como um recurso textual e não
meramente ilustrativo. Para tanto, passo a entender tais fotografias (tiradas pela própria
pesquisadora) como textos culturais que “nos ‘contam’ coisas sobre si e sobre o contexto em que
circulam e foram produzidos” (COSTA et al, 2002, p. 138). Assim, apresento no quadro ao lado das
imagens o sentido que dou para tais textos culturais.
98
pelo menos seis meses (nas aulas na Escola), era baixo. Aparentemente, todos estavam
realizando a atividade, mas, ao assessorá-los individualmente, constatei que muitos tinham
grandes dificuldades, inclusive para trabalhar com dois programas (ou duas janelas)
simultaneamente.
A
lunos da turma
1N1 no
momento em
que tentavam
realizar buscas
sobre Cesar
Lattes.
Trabalhavam
m grupo para
pesquisar sobre
o cientista.
e
Figura 2 – Foto dos alunos da turma 1N1 no laboratório de Informática
O resultado da pesquisa que os estudantes realizaram deveria ser enviado para
mim por correio eletrônico
115
. Surgiu, assim, mais uma dificuldade: comunicar-se por correio
eletrônico – muitos não sabiam como acessar seus endereços eletrônicos ou nem sequer
sabiam que a Escola disponibilizava para toda a sua comunidade
e-mail
gratuito que poderia
ser acessado através de seu
site
. Para tal acesso, bastava saber o número de matrícula e a
senha (que é igualmente, para todos, a data de aniversário). Assim, muitas vezes, acabei
utilizando boa parte do tempo que me fora disponível semanalmente ensinando-lhes
recursos básicos, como enviar
e-mail
ou acessar a Internet, em vez de explorar a Plataforma
Lattes. Não vejo negativamente tal situação, uma vez que compreendo que tais
ensinamentos fazem parte da alfabetização científica-tecnológica-digital.
Uma outra dimensão que pode ser pensada a partir da atividade de pesquisa
realizada sobre Cesar Lattes, é a questão da informação e do conhecimento. Pesquisar na
Internet, conforme já problematizei no capítulo anterior, constitui-se em um grande desafio
se considerarmos a imensa quantidade de informações que podemos encontrar na rede
mundial de computadores. Com tais alunos e alunas não foi diferente, e recebi alguns
resultados (que não foram maioria) que nada tinham a ver com o cientista em questão.
Suponho, dessa forma, que tais informações apenas foram “retiradas” (ou copiadas) e
“enviadas” (ou coladas) da Internet, sem que tenha havido uma efetiva construção de
115
O resultado da pesquisa realizada foi socializado a todos por e-mail. Após receber os arquivos dos
estudantes, depurei as informações e gerei um arquivo-texto, com um resumo das informações que
os próprios alunos haviam me enviado, e o reenviei por e-mail. Esse material encontra-se no
Apêndice C (p. 149).
99
conhecimento (saberes) ou elaboração de um pensamento crítico
116
por parte de alguns
estudantes.
Ao falar de Internet como recurso de pesquisa, concordo com Fabiane Raquel
Carlotto
117
quando argumenta que o ato de pesquisar na Internet é complexo na medida em
que
a Internet potencializa a construção de conhecimentos, tendo em vista que
as informações estão mais acessíveis, aumentando as chances de
interagirmos com elas e, conseqüentemente, de construirmos novos
conhecimentos. Recursivamente, estes novos conhecimentos aumentam as
chances de produzirmos novas informações. Trata-se de um processo,
simultaneamente, recursivo e retroativo, porque na mesma medida em que
as informações possibilitam a construção de conhecimentos, é também
devido à construção de conhecimento que construímos novas informações
(CARLOTTO, 2003, p. 100).
Portanto, entendo que a prática de pesquisa realizada com os alunos sobre César
Lattes foi extremamente produtiva e me permitiu problematizar a questão do conhecimento
versus
informação. A impressão que tive ao analisar os arquivos e textos que me foram
enviados é que alguns alunos e alunas produziram materiais que oportunizaram o
aprendizado sobre quem foi o cientista, outros alunos somente “capturaram” informações
sobre o cientista e, nesse caso, acabaram por repassar as informações encontradas na
web
sem
a elaboração de um
conhecimen o pertinen e
, no sentido dado por Morin (2000a):
t t
O conhecimento pertinente é o que é capaz de situar qualquer informação
no seu contexto e, se possível, no conjunto em que está inscrito. O
conhecimento progride, não tanto por sofisticação, formalização e
abstração, mas principalmente, pela capacidade de contextualizar e
englobar (MORIN, 2000a, p. 15).
Percebi ainda que, embora a maioria dos estudantes tenha conseguido buscar as
informações nos
sites
de buscas (pesquisa simples por palavra-chave), eles não
necessariamente souberam operar, construir, contextualizar ou dar sentido às informações
encontradas. Em uma das diversas entrevistas que realizei com o professor de Informática,
também foi sinalizada por ele tal dificuldade. Ele mostrou preocupação com a
116
Utilizo as idéias de Carlos Lucena para caracterizar pensamento crítico “como todas as atividades
nas quais os estudantes são chamados a identificar os pontos principais de determinados temas, a
buscar causa e efeito, identificar padrões e relações, ordenar idéias, organizar linhas de tempo,
construir taxonomias ou categorizações, fazer comparações e estabelecer contrastes, examinar
relações de custos versus benefícios e interligar idéias” (LUCENA, 2000, p. 78).
117
A autora trabalha na perspectiva da Complexidade, trazendo dois conceitos chave para o
pensamento complexo, segundo Edgar Morin (2000): o Princípio do anel retroativo, que “Rompe com
o princípio de causalidade linear, a causa age sobre o efeito, e este sobre a causa, como no sistema
de aquecimento no qual o termostato regula a situação da caldeira” (p. 32), e o Princípio do anel
recursivo, que “supera a noção de regulação com a de autoprodução e auto-organização. E um anel
gerador, no qual os produtos e os efeitos são produtores e causadores do que os produz” (p. 33).
100
118
dificuldade, falta de interesse ou “aparente preguiça” que os alunos e alunas
demonstram na hora de depurar ou refinar as informações
.
t
Através de uma das observações / participações fora do laboratório de Informática,
presenciei uma conversa do professor de Filosofia, que também reclamava da mesma
dificuldade junto aos alunos e alunas, pois estes deveriam ter realizado uma pesquisa sobre
a Arte da Bienal do Mercosul 2005, que então era destaque entre as ações culturais em
curso em Porto Alegre. Portanto, acredito que essa possa ser uma característica ou
dificuldade da turma em diferentes disciplinas, isso porque alguns professores e professoras
da turma que responderam a um questionário que elaborei
119
também apontaram essa
dificuldade como característica da turma:
Normalmente eles só copiam e não têm nem o trabalho de lerem todo o
con eúdo que estão baixando.
Vale ressaltar também que elaborei dois questionários
120
também para os
estudantes, que foram enviados e respondidos por correio eletrônico, nos quais eles
afirmavam que estavam acostumados a realizar pesquisas na Internet, portanto, eu não
imaginava que, ao pesquisar sobre César Lattes, os alunos e alunas pudessem apresentar
tais dificuldades. Cabe destacar aqui também a autenticidade das informações usualmente
fornecidas como respostas a questionários de pesquisa, especialmente aquelas que possam
denotar deficiências em algum saber.
Ainda sobre os questionários, outro elemento que me chamou a atenção foi que a
grande maioria me respondeu que acessava
e-mail
fora do laboratório da escola, por isso
combinamos que o
e-mail
seria um canal de comunicação usual entre nós. Assim,
semanalmente, enviei-lhes no mínimo dois
e-mails
. Porém, após quase dois meses de envio
de mensagens, não havia recebido respostas de praticamente ninguém, e, por isso, tal canal
de comunicação pareceu-me inviável de ser utilizado. Questionei presencialmente junto aos
alunos e alunas tal fato, e alguns argumentaram que não haviam recebido as mensagens ou
não tinham aberto seus correios eletrônicos. Foi então que decidi, temporariamente, não
118
Este ícone representa a fala de um professor ou professora da turma 1N1 da Escola Parobé.
Portanto, sempre que aparecer, sinaliza ao leitor que o texto se trata de uma transcrição da fala dos
professores.
119
Ver Apêndice D(p. 151).
120
Ver Apêndice E(p. 153).
101
lhes enviar mais mensagens. Mas, surpreendentemente, acabei sendo cobrada pelos
estudantes
121
:
Pô, pro, agora que comecei a olhar as mensagens você não as enviou
mais...sacanagem!
,
t
A sôra não gosta mais de mim, não me mandou mais nenhuma mensagem.
Então, a partir de tais manifestações, comecei novamente a mandar-lhes
mensagens e, inclusive, instruções para a aula seguinte através de
e-mail
. Percebi, assim,
que o que faltava para a turma era não somente o domínio do recurso (inicialmente, não
sabiam anexar um arquivo), mas também estímulo e o hábito de comunicar-se por
e-mail
,
até porque muitos liam as mensagens, mas não as respondiam.
Penso que o nível de alfabetização tecnológica-digital na perspectiva que trago
neste trabalho fez / faria toda a diferença em qualquer uma das atividades propostas
durante a realização de minha mediação junto aos alunos e às alunas, pois muitas tarefas,
apesar de parecerem bastante simples para alguém que possua um nível médio de
conhecimento dos códigos digitais (como eu, por exemplo), para os estudantes, pareceram
atividades complicadas e dificultosas, tamanha era a falta de conhecimento da linguagem
digital por parte deles. Exemplo disso foi o preenchimento dos questionários já referidos.
Tive que dedicar dois períodos (um encontro inteiro) para que todos os alunos e alunas
pudessem responder e enviar-me tais respostas.
Minha intervenção junto à turma não começou diretamente com a utilização da
Plataforma Lattes. Primeiro, tive que, além de construir relações com os estudantes,
conhecê-los e saber o nível de habilidades digitais que possuíam. Isso levou quase metade
do tempo em que estive presente na escola. Os sentidos que atribuí às atividades que
utilizaram como recurso a Plataforma Lattes serão devidamente apresentados no item 4.1.
Mas acho oportuno neste momento trazer outros elementos que foram surgindo durante
minha mediação junto à turma como forma de melhor explicitar a experiência pedagógica
vivida com o grupo de estudantes.
Em uma das aulas, o
si e
do CNPq estava fora do ar; por isso, acabei liberando a
Internet para exploração livre (tal atividade já havia sido sugerida pelo professor de
Informática). Foi muito interessante perceber quais eram os focos de interesse dos
estudantes na rede: lojas de compras,
sites
de rádios e emissoras de televisão e,
121
Nas duas transcrições que se seguem e em todas as demais que aparecem sinalizadas pelo ícone
, apresento as falas dos alunos e alunas na linguagem coloquial em que foram enunciadas.
102
principalmente,
Fotologs
e
Blogs,
além de MSN (comunicação instantânea) e acesso ao
correio eletrônico.
Acho produtivo destacar que, para visitar ou utilizar tais recursos, os alunos e alunas
interagiam com poucas dificuldades e com muito envolvimento. Mas alguns não se sentiam
autorizados a interagir de forma autônoma e, por isso, preferiam ficar conversando em vez
de utilizar a Internet. Entendi que a turma estava acostumada com atividades solicitadas de
forma tutorial e que respondia melhor a esse tipo de proposta – era necessário dizer passo a
passo o que os estudantes teriam de realizar. Essa característica da turma frustrou um
pouco minhas pretensões, principalmente dentro das atividades que queria propor, pois era
necessário que os alunos e alunas tivessem um pouco mais de iniciativa. Muitas vezes, ouvi
frases do tipo:
Tá, e agora, o que é para fazer? Qual é o próximo passo? Já terminei, sôra, e ago a? r
Mesmo diante de tal dificuldade, tentei envolvê-los e instigá-los a interagir de forma
mais autônoma. Posso citar como exemplo uma das aulas em que pedi que os alunos e as
alunas pesquisassem temas da área científica que lhes parecessem interessantes para que
pudéssemos fazer as buscas sobre tal tema na Plataforma Lattes e assim poder ver quais
eram as pessoas envolvidas com essa temática através dos currículos, pois entendia que era
importante buscar trabalhar dentro do foco de interesses dos estudantes.
Apesar de saberem realizar pesquisas em
sites
de buscas, como eu mesma já havia
percebido, eles e elas só começaram a buscar as temáticas depois que indiquei alguns
sites
e, mesmo assim, apenas dois ou três alunos enviaram-me o
e-mail
(conforme solicitado)
sugerindo temas para trabalharmos na Plataforma Lattes. Tal atitude fortalece a idéia de que
faltava autonomia em alguns alunos e alunas. Sendo assim, entendi que a questão da
autonomia (ou, em alguns momentos, a falta dela) dos estudantes se configurava / se
configura como um elemento importante nas aulas de Informática. Garrison ajuda-nos a
entender isso, afirmando que tal conceito não é sinônimo de indivíduos independentes:
A autonomia é um conceito relacional (somos sempre autônomos de
alguém ou de alguma coisa) pelo que a sua ação se exerce sempre
num contexto de interdependência e num sistema de relações. A
autonomia é também um conceito que exprime um certo grau de
relatividade: somos mais, ou menos, autônomos; podemos ser
autônomos em relação a umas coisas e não o ser em relação a outras.
A autonomia é, por isso, uma maneira de gerir, orientar, as diversas
dependências em que os indivíduos e os grupos se encontram no seu
meio biológico ou social, de acordo com as suas próprias leis
(GARRISON, 1992, p. 17).
103
Todos esses acontecimentos acabavam se constituindo como um grande desafio para
a continuidade de minha pesquisa. Não foram poucas as vezes que tive que redimensionar
meus planos de aula e reavaliar minha própria postura enquanto mediadora da turma. Para
tanto, o apoio do professor titular de Informática foi muito importante, pois ele já conhecia a
turma e estava mais acostumado com ela. Muitas vezes, ele sugeriu atividades e
encaminhamentos e interveio de forma pertinente nas aulas.
Um outro fator que me tensionou constantemente foi o fato de que muitas das
atividades propostas acabavam levando mais tempo do que havia previsto. Posso citar como
exemplo a utilização do correio eletrônico – tive que ensiná-los repetidas vezes a acessar o
correio, a anexar e/ou salvar arquivos e responder mensagens. Entendi que, para aqueles
que não era um hábito se comunicar por correio eletrônico, não fazia muito sentido
responder as mensagens. Mas, aos poucos, depois de insistir com eles, comecei a receber
respostas, inclusive fora dos horários de aula. Alguns alunos e alunas que já tinham como
hábito comunicar-se por
e-mail
me respondiam prontamente as mensagens. Esse fato muito
tem haver não só com sua alfabetização digital, como também com a questão cultural, da
chamada cibercultura ou cultura da Internet, que alguns estudantes vivenciavam e outros
não.
Busquei não ignorar as questões culturais para dar andamento ao Projeto de modo
que a experiência pedagógica que estava propondo pudesse realmente fazer algum sentido
para os estudantes. Muitos foram os meus questionamentos. Em alguns momentos, em sala
de aula, pensava que não estava sendo realmente compreendido o que eu estava propondo,
mas todas as vezes que questionei os alunos e alunas, eles pareciam, sim, estar
compreendendo o trabalho proposto. Recebia respostas como:
C
laro que sei! Estamos conhecendo o currículo de pessoas que estão
envolvidas na Ciência do Brasil!
Iniciei, então, o trabalho com a Plataforma Lattes, explorando-a digitalmente e
analisando em conjunto com os alunos e as alunas o meu currículo Lattes. Essa foi uma
estratégia para que pudessem conhecer a
cientista Patrícia Nunes
, o que se constitui numa
experiência interessante. À medida que íamos conhecendo e navegando no meu currículo,
eu ia explicando as informações. Em seguida, acessamos o currículo de meu orientador e
comparamos os dois.
Essa não foi uma tarefa simples, pois sentia necessidade de explicar, mesmo que
rapidamente, cada item de meu currículo, uma vez que os alunos e alunas não tinham
104
aproximações e não estavam acostumados a analisar produções científicas. Felizmente (ou
talvez fosse melhor usar a palavra surpreendentemente), contei com a colaboração e o
interesse de todos – e, nesse dia, estavam presentes cerca de 12 estudantes, o que era um
número alto, considerando-se sua freqüência nas aulas de informática. Esse foi um momento
chave do trabalho, pois foi justamente nessa primeira exploração que tive que me empenhar
em seduzi-los e aproximá-los do universo da Plataforma Lattes do CNPq.
Uma outra atividade que serviu como forma de aproximação dos alunos e alunas com
o Currículo Lattes, visto aqui como um artefato cultural, foi o preenchimento de seus
próprios currículos. O mais interessante é que eu havia comentado que qualquer pessoa
poderia preencher o currículo e cadastrar-se no CNPq, mas já havia até desistido de
preencher os currículos com os estudantes. No entanto, eles ficaram interessadíssimos e
insistiram no preenchimento de seus currículos, mesmo que a grande maioria não tivesse
muitas informações a serem cadastradas ou envolvimento com produções científicas para
incluir no Lattes.
Essa atividade levou de duas a três semanas para ser finalizada. Após o
preenchimento do Currículo Lattes, que todos fizeram questão de realizar, inclusive aqueles
alunos e alunas que não freqüentavam regularmente as aulas de informática, comecei a
explorar os mecanismos de buscas do Currículo Lattes.
Os alunos e as alunas acessaram o currículo dos próprios colegas para depois
realizar algumas buscas por nomes de pessoas. Mas percebi, que por não fazer parte do
cotidiano desses estudantes a convivência com o meio acadêmico ou científico, fazia mais
sentido explorar os currículos utilizando como filtro um determinado assunto.
Sugeri que começássemos a pesquisar a produção científica de pessoas envolvidas
com a
febre aftosa
, até porque esse assunto estava sendo muito explorado pela mídia, dada
a emergência de alguns focos na região Norte e Centro-Oeste do Brasil, e pareceu oportuno
pesquisar assuntos emergentes. Para tanto, criei um instrumento
122
que orientaria as
primeiras explorações dos estudantes na Plataforma Lattes, considerando a complexidade de
informações e os diferentes tipos de filtros que poderiam ser utilizados para tal pesquisa.
Fiquei surpresa com o interesse e empenho com que alunos e alunas realizaram o
preenchimento do currículo e os primeiros exercícios de buscas, pois sei, pela experiência
que tive na Graduação e como bolsista de Iniciação Científica IC, que, mesmo em nível
122
Ver Apêndice F(p. 156). Cabe destacar que todos os instrumentos que serviram de roteiro / base
na exploração da Plataforma Lattes foram preenchidos e reenviados para minha caixa postal pelos
105
universitário, estudantes e/ou professores e professoras apresentam dificuldade em
preencher o currículo Lattes. Mas não foi em todas as aulas que o interesse e empenho dos
estudantes foi assim; algumas vezes, estavam agitados e pareciam pouco interessados e
dispersos. Com o tempo, à medida que fui acompanhando a turma em outras ocasiões e
espaços, percebi que essa era uma característica do grupo e que alguns alunos realmente
não mostravam interesse por coisa alguma, também parecendo dispersos e agitados com
professores de outras áreas de conhecimento.
De qualquer forma, tal comportamento da turma gerou muita tensão, pois, em
alguns momentos, cheguei a pensar que havia sido um grande erro realizar minha pesquisa
junto a estudantes de Ensino Médio, considerando o distanciamento que tinham da produção
científica. Porém, em outros momentos, parecia estar convencida de que justamente por não
conhecerem este tipo de produção é que seria uma oportunidade ímpar participarem do
Projeto e pelo menos serem apresentados, mesmo que minimamente, ao universo da
Produção Científica do Brasil. Essa era uma perspectiva de inclusão científica-tecnológica-
digital que me encantava e me dava ânimo para seguir adiante.
Foi assim que, depois de muito conversar com meu orientador, encorajada e
apoiada por ele, decidi que poderia ser interessante incluir na pesquisa também bolsistas de
IC, até para fazer uma comparação entre o Ensino Médio e a Graduação. Mas, mais uma
vez, os (des)caminhos a serem seguidos não eram tão fáceis quanto pareciam. Depois de
alguns contatos com professores que tinham bolsistas de IC e de muitos encontros e
desencontros na tentativa de achar alguém que aderisse ao Projeto, um destacado professor
da área de Ciências da Saúde da UNISINOS concordou em apoiar minha pesquisa e
disponibilizar seus bolsistas de IC.
A essa altura, o projeto na Escola Parobé já estava em pleno andamento e o tempo
que eu teria para trabalhar com os bolsistas não era muito; mesmo assim, parecia que
valeria a pena tentar. Depois de aguardar por praticamente duas semanas para receber os
e-mails
dos bolsistas, realizei um primeiro contato com dois bolsistas por correio eletrônico,
supondo (pela informação que o próprio professor disponibilizou) que já teriam um bom
nível de alfabetização científica-tecnológica-digital. Mas, após aguardar por mais duas
semanas por resposta, acabei desistindo de seguir adiante com esse grupo, que, na verdade,
era formado apenas por uma acadêmica e um acadêmico do curso de Biologia. Apesar de
estudantes; assim pude acompanhar de forma mais sistemática as pesquisas e os resultados obtidos
por alunos e alunas.
106
demonstrarem aparente disponibilidade, percebi que não havia grande interesse nem tempo
para a realização da pesquisa com esses bolsistas e acabei desistindo de incluí-los.
As dificuldades que encontrei para realizar a pesquisa, em nível acadêmico, se
constituíram em uma surpresa para mim, pois supunha que, por se tratar de pessoas já
envolvidas em produções cientificas, a disponibilidade, interesse e contribuição seriam
maiores, mas parece que esse meio foi inatingível como respondentes de minha pesquisa.
De qualquer forma, enviei-lhes um questionário
123
que foi respondido por um dos bolsistas e
que acho pertinente considerar nesta dissertação: o bolsista afirmou já utilizar a Plataforma
Lattes como recurso de pesquisa para encontrar pessoas e produções que tivessem a ver
como seus interesses, declarando que achava uma atividade complexa o preenchimento do
Currículo Lattes.
Acredito que as afirmações do respondente nos ajudam a pensar sobre o quanto é
mais familiar para algumas pessoas envolvidas na área acadêmica falar em recursos de
busca da Plataforma Lattes, mas isso não quer dizer que todas as pessoas envolvidas em
pesquisas acadêmicas, como no caso de bolsistas, mestrandos ou doutorandos e até mesmo
professores, conheçam tais recursos. Durante os dois anos em que cursei o Mestrado,
diversas vezes apresentei meu projeto de dissertação a colegas e docentes do Programa de
Pós-Graduação em Educação, que às vezes se mostravam surpresos ao conhecerem meu
objeto de pesquisa, uma vez que não sabiam da existência de recursos de pesquisa da
Plataforma Lattes do CNPq.
Na experiência pedagógica junto à turma do Parobé, não foi diferente. Alunos e
alunas não conheciam, nem sequer tinham ouvido falar dos recursos de pesquisa da
Plataforma Lattes, mas concordaram em explorá-los junto comigo. A partir das primeiras
buscas por currículo sobre
febre aftosa
, comecei a entender que, mesmo não fazendo parte
diretamente do cotidiano desses jovens, estava sendo pertinente realizar tais buscas.
O olhar que os estudantes lançavam sobre as informações diferenciava-se,
provavelmente, do olhar que teriam pessoas já envolvidas com a Ciência, uma vez que lhes
chamavam a atenção informações como o local de trabalho do pesquisador ou da
pesquisadora, os diferentes idiomas que sabia falar, ler ou escrever e ainda a quantidade de
publicações ou produções bibliográficas. Ainda assim, percebi que estavam aprendendo
elementos sobre produções científicas e que eu estava contribuindo para sua alfabetização
científica. Ouvi comentários do tipo:
123
Ver Apêndice G(p.158).
107
Bah, esse cara fala mais de três línguas, é fera!
t
Puxa! Que currículo grande. Essa mulherpublicou mais de dez livros!
Conforme fui sentindo o avanço no domínio das ferramentas de buscas, fui
desafiando os estudantes a utilizarem diferentes filtros de buscas e a irem refinando suas
pesquisas. Para tanto, elaborei mais um instrumento
124
para que pudessem operar com as
informações obtidas nos currículos encontrados e interagir. Sei que corri riscos e que esta
não era a postura ideal, pois, ao orientar as pesquisas dos alunos e alunas, acabei por limitar
um pouco a interação. A lógica da cibercultura é justamente oposta, pressupondo uma
interação
hipertextual, múltipla, interativa, imaterial, virtual, em tempo real, mul issensorial e
multidirecional
, conforme aponta Marco Silva (2005), tendo como base autores como André
Lemos (2002) e Lévy (1999) e mesmo outros teóricos envolvidos com as questões da
cibercultura.
Ao sistematizar as atividades de forma “linear”, sei que acabei por diminuir a
hipertextualidade própria da Internet, mas, conforme já relatei anteriormente, as
características da turma obrigaram-me a organizar de forma mais meticulosa a exploração
dos recursos de buscas. Mesmo assim, alguns alunos acabavam por experimentar outros
parâmetros e filtros e sempre faziam questão de compartilhar comigo tais resultados, o que
acabei vendo como um fator positivo. Em alguns momentos, percebi que foi difícil para
alguns estudantes compreenderem os parâmetros que deveriam utilizar e acredito que tal
dificuldade se deu devido à pouca experiência que eles tinham em atividades de pesquisas
mais complexas e ainda ao baixo nível de alfabetização digital em que se encontram.
Os alunos e as alunas foram complexificando suas pesquisas e utilizando
parâmetros como região do país, formação acadêmica e atividade profissional para localizar
currículos de pesquisadores. Ao localizar determinados currículos, tiveram que navegar por
entre alguns e escolher um pesquisador para destacar. Acredito que esse tenha sido um
momento de muita aprendizagem, pois parecia que eles estavam se sentindo desafiados e se
empenhavam para conseguir realizar as buscas com êxito.
Cabe mencionar que, mesmo tendo elaborado o material que orientou as buscas
dos estudantes, minha mediação junto a eles na hora da pesquisa era de quem os desafiava
a sair do planejado, de experimentar coisas novas, descobrir novos parâmetros e assim obter
novas respostas. Mais do que ver os resultados encontrados, entendia que o importante era
124
Ver Apêndice H(p.160).
108
vê-los explorando e interagindo com os sistemas de buscas da Plataforma Lattes. Esse
também era o aprendizado que buscava provocar nos estudantes.
Uma das dificuldades que tive no final do trimestre, justamente no momento em
que estava explorando os filtros de buscas, foi a quantidade de feriados, paralisações e
conselhos de classe que caíram na terça-feira, dia de meu único contato semanal no
laboratório com o grupo, pois era nesse dia que se concentravam as aulas de Informática.
Os alunos e alunas, algumas vezes, acabaram ficando quase quinze dias sem contato com a
pesquisa. Dessa forma, se um aluno ou aluna faltasse à aula na semana posterior ao feriado,
ficava praticamente três semanas sem aula, o que prejudicou muito o rendimento da turma
e o andamento da experiência pedagógica. Mas cerca de cinco ou seis alunos e alunas foram
presença "cativa", e passei, então, a observá-los com mais atenção, entendendo que, por
terem atuado de forma mais processual na prática pedagógica, acabaram se constituindo
como
corpus
de minha pesquisa.
Um outro momento que vale destacar foi a palestra “
A Ciência é masculina”
,
ministrada pelo meu orientador, professor Doutor Attico Chassot, não somente para a turma
1N1, mas também para todos os terceiros anos noturnos. Penso, pela reação e relato dos
alunos e alunas da turma 1N1 que participaram da palestra, que foi muito produtivo tal
participação, pois o assunto dava suporte teórico e muito tinha a ver com as pesquisas que
vínhamos realizando com a Plataforma Lattes.
A
lunos da turma
1N1 assistindo
atentamente a
palestra “A
Ciência é
masculina?”
ministrada pelo
professor Attico
Chassot.
Figura 3 – Foto de alunos da turma 1N1
109
Alunas do 3º ano do Ensino Médio
conversando e comentando sobre as
idéias apresentadas pelo palestrante
sobre “A Ciência é masculina?”
A
lunas e alunos do 3º ano do Ensino Médio da
Escola Parobé assistindo e participando da
palestra “A Ciência é masculina?”
Figura 4 e Figura 5 – Foto dos alunos e alunas do 3º ano do Ensino Médio
Após a palestra, pretendia realizar algumas buscas utilizando como filtro as áreas
do conhecimento e assim fazer algumas comparações sobre gênero, tendo como base as
chamadas ciências humanas e as ciências exatas. Para tanto, elaborei um instrumento
125
que
serviria como orientador para tal pesquisa, mas que não chegou a ser explorado em virtude
do calendário escolar. Não tive tempo de explorar mais o assunto da palestra na Plataforma
Lattes, apenas comentei oralmente e via correio eletrônico algumas idéias e dúvidas com os
estudantes no laboratório de Informática.
Uma das últimas atividades que fiz com eles foi ensiná-los a utilizar o fórum de
discussão como recurso da Internet. Pedi que escrevessem sobre o que estava significando
minha mediação junto à turma
126
. Pretendia ter associado ao uso da Plataforma Lattes
outros recursos da Internet, como
chat
, mas tal serviço não era permitido na escola e, em
virtude do tempo e de dificuldades já narradas, acabei optando por utilizar somente o correio
eletrônico e o fórum para dinamizar as discussões em torno da experiência pedagógica. Silva
(2004) considera o fórum um recurso importante que possibilita que o professor ou
professora provoque os alunos com textos ou outras mensagens que podem se desdobrar,
dependendo da participação dos alunos e alunas, em elos dinâmicos de discussões.
125
Ver Apêndice I(p. 163).
126
Para ver tais depoimentos, acessar http://foruns.terravista.pt/Sforum
110
Os alunos e alunas demoraram um pouco para entender como funcionava tal
recurso, mas, assim que aprenderam e entenderam como funcionava o fórum, prontamente
escreveram depoimentos breves, que posteriormente serviram de base para uma discussão
oral realizada no último dia de aula que serviu de base para fundamentar a parte final desta
dissertação, na qual dou o meu sentido para os sentidos dados pelos estudantes para a
prática pedagógica que realizei junto à turma 1N1. Cabe ressaltar que, mais uma vez ,não
pude explorar o recurso como gostaria, pois não foi possível dinamizar as discussões no
fórum em virtude do tempo, mas já considero um avanço para o contexto da turma
conhecer tal recurso.
4.1 Plataforma Lattes e turma 1N1: quais sentidos?
Apesar de não ter respostas
a priori
, fui a campo com algumas hipóteses construídas
e objetivos especificados. Meu olhar junto ao grupo era o de quem queria ver quais os
sentidos que uma experiência pedagógica que utilizou como recurso a Plataforma Lattes
poderia produzir em alunos e alunas de Ensino Médio numa perspectiva de inclusão
científica-tecnológica-digital.
Utilizei como orientação metodológica o sentido de experiência dado por Jorge
Larrosa: “a experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca” (2004, p.
116). Assim, a experiência realizada na escola passa a ser vista como produtora de sentidos,
atuando de forma subjetiva junto aos alunos e alunas da turma 1N1, e o saber resultante de
tal experiência é que considero como resultante de minha mediação junto aos estudantes.
Tal significado de experiência difere da idéia científica (moderna) de experimento. Para que
tal experiência ocorra, é preciso que estejamos abertos, permitindo que algo nos aconteça.
Apesar de sermos interpelados continuamente por diferentes estímulos, raramente somos
tocados de forma que o resultado seja um saber decorrente da experiência.
Para Larrosa (2002), o conhecimento advindo da experiência é aquele que resulta
numa formação ou numa transformação daquilo que somos. Para o autor, a experiência é
cada vez mais rara por excesso de informação, excesso de opinião, falta de tempo e excesso
de trabalho. Dessa forma, a experiência requer
(...) parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais
devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar, parar para sentir,
sentir mais devagar e escutar mais devagar, demorar-se nos detalhes,
suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o
automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os
111
ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar os
outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo
e espaço (LARROSA, p. 122).
Ao apossar-me das concepções de Larrosa, observava que não somente o saber dos
estudantes estava em jogo, como também o meu próprio saber, resultante da experiência
com a turma (e por isso trouxe a citação literalmente). Aprender que aquilo que temos como
“verdades” pode ser diferente é um exercício muito significativo. Todos os movimentos
descritos acima pelo autor foram, muitas vezes, utilizados por mim no caminhar da pesquisa
e durante a minha mediação junto à turma, o que significa dizer que me propunha a estar
aberta à experiência, criando condições de possibilidade para que ela ocorresse. Creio que
isso contribuiu significativamente para a minha formação como profissional que atua na área
da Educação. Arrisco afirmar, pela análise que fiz das narrativas dos alunos e alunas durante
as aulas, que para eles a exploração da Plataforma Lattes também possa ter resultado em
um
saber de experiência
no sentido que estou apresentando.
Já nas primeiras aulas como mediadora dos estudantes, atentei para novos e
diferentes sentidos que iam surgindo como possibilidades para as tarefas desenvolvidas. À
medida que fui me sentindo mais próxima de todos, pude dar sentido aos sentidos que os
estudantes estavam dando à experiência do Projeto Plataforma Lattes.
Realizei a análise da experiência pedagógica partindo não só da experiência vivida
semana a semana durante praticamente quatro meses, mas também dos enunciados dos
depoimentos postados no
fórum
e do debate que realizei junto aos alunos e alunas, e
apoiando-me no referencial teórico escolhido, que inclui autores como Chassot, Castells,
Silva e Lévy. Destaco três unidades de sentido para problematizar e tensionar a experiência
pedagógica:
A alfabetização científica-tecnológica-digital como instrumento para
construção da cidadania;
A alfabetização científica-tecnológica-digital como forma de inclusão
(ciber)cultural e social;
A Plataforma Lattes como um instrumento pedagógico na Escola e no
cotidiano de homens e mulheres que se envolvem com Ciências.
Vale ressaltar que optei pela apresentação de três unidades de sentido por razões
metodológicas, mas vejo tais unidades como interdependentes, uma vez que uma não exclui
necessariamente a outra; pelo contrário, elas se complementam, se relacionam, se
comunicam.
112
4.1.1 A alfabetização científica-tecnológica-digital como instrumento de
construção da cidadania
A nossa responsabilidade maior no ensinar Ciência é procurar que nossos
alunos e alunas se transformem, com o ensino que fazemos, em homens e
mulheres mais críticos. Sonhamos, que, com o nosso fazer Educação, os
estudantes possam tornar-se agentes de transformações – para melhor –
do mundo em que vivemos (CHASSOT, 2003a, p. 31).
As palavras de Chassot expressam o sentimento e o comprometimento ético que
tenho como educadora e que tive ao realizar a experiência pedagógica junto aos alunos e
alunas da turma 1N1. Entendo que a alfabetização científica-tecnológica-digital pode ser
vista como uma possibilidade de construção de uma cidadania mais crítica e mais atuante,
que condiz com uma educação mais comprometida com as questões culturais.
A partir das interações dos alunos e alunas com os sistemas de buscas da Plataforma
Lattes, foram surgindo desdobramentos que atravessaram minha proposta inicial. Mesmo
que teoricamente visse a alfabetização científica-tecnológica-digital como um elemento
importante na construção da cidadania, não havia percebido, até então, muitas das
dimensões de tal perspectiva. A partir do vivido na experiência pedagógica, percebi que
muitos acontecimentos e desdobramentos poderiam efetivamente ser vistos como produtivos
na construção da cidadania dos estudantes.
Posso destacar como exemplo a atividade em que os estudantes tinham que
preencher seus currículos. Era necessária a utilização do CPF para adquirir a senha junto ao
CNPq. Alguns alunos (cerca de quatro) não tinham ainda feito o documento (nem sequer
tinham documento de identidade). Insisti, juntamente com o professor de informática, que
sempre acompanhou minhas atividades, que essa era uma questão de cidadania e que tal
documento era importante para muitas outras atividades fora da escola.
Minha intervenção e meu incentivo surtiram efeito, pois dois alunos, antes do final do
trimestre, estavam com o documento em mãos. Embora nem todos tenham providenciado o
CPF, já vejo como um resultado positivo de minha mediação que pelo menos dois alunos
tenham tomado a iniciativa de providenciar o documento. Quando se observam no mundo
movimentos dos
sans papiers
(
sem documentos
127
), muitas vezes nos surpreendemos com o
quanto essa exclusão está também perto de nós.
As duas palestras promovidas por minhas ações na turma que foi
lócus
de minha
pesquisa também podem ser vistas como iniciativas que proporcionaram um exercício muito
rico na busca de uma alfabetização científica, constituindo-se como um espaço que instigou
127
Acerca das repercussões mundiais do movimento dos sans papiers, ver, por exemplo,
http://www.bok.net/pajol/.
113
pensar sobre a Ciência de um outro lugar, diferente daquele com que os jovens estavam
acostumados. Por exemplo, após a última palestra intitulada “A Ciência é masculina?”, um
dos alunos exclamou:
Puxa, sora, nunca havia parado para pensar como a Ciência faz parte do
nosso cotidiano e de nossa forma de pensar!
Pode-se fazer uma análise e assim dar um sentido mais refinado para a afirmação do
aluno: ele nunca havia percebido o quanto o discurso e o pensamento científico
influenciaram sua constituição como sujeito, uma vez que “cada sujeito conhece, pensa e
age de acordo com os paradigmas que estão inscritos culturalmente nele”, conforme aponta
Moraes (2003, p. 140) . Outra aluna, ainda sobre a palestra, afirmou
Bah, sora, agora entendi por que esses guris são tão machistas Também, a
religião e a Ciência ensinaram isso para eles. Gostei da palestra, mas ambém fiquei
indignada...
.
t
Percebi, através das falas, que as alunas foram “tocadas”, interpeladas de forma
diferente dos alunos durante a palestra, e isso pode ser percebido nas suas manifestações.
Enquanto os meninos se identificavam, achando graça de algumas idéias machistas
problematizadas pelo palestrante, as meninas acabavam reclamando, sentindo-se
incomodadas e discriminadas.
As aulas de Informática foram oportunidade para aprender sobre pessoas que
marcaram o nosso mundo!
Um aluno postou no fórum a mensagem acima. Ao ser questionado presencialmente
sobre tal afirmação, esclareceu que, na verdade, estava pensando nas duas palestras
assistidas, que ele considerou como eventos importantes e diferentes das aulas de
Informática. Percebi, então, que as palestras realizadas foram muito produtivas e acabaram
se constituindo como um elemento marcante na alfabetização científica-tecnológica-digital
dos jovens da turma 1N1.
Chassot (2003b, p. 95) traz, baseado em Woolgar (1991), uma metáfora que é muito
válida no contexto desta dissertação: “Ao tentar abrir aquela caixa preta em que os
cientistas - transformaram a Ciência”, percebemos que a Ciência não descobre o mundo,
mas sim o mundo a descobre, pois o mundo é / existe independente da Ciência, que apenas
o torna inteligível. Posso parecer pretensiosa, mas compreendo que a Plataforma Lattes
114
pode ser vista como uma ferramenta que permite / permitiu “
abrir a caixa preta
”, pelo
menos durante os momentos em que a utilizávamos, pois parte do universo cientifico
tornou-se disponível, visível e acessível aos alunos e alunas que não tinham sequer a noção
de como se dava a produção científica no Brasil.
Fazer a migração do
eso erismo
para o
exo erismo
, como sugere Chassot (2003a),
constitui-se numa tarefa difícil. Isso porque a linguagem da Ciência, na maioria das vezes, é
hermética e fechada, podendo ser entendida somente por pessoas privilegiadas que se
encontram envolvidas com os saberes científicos. Trazer a Plataforma Lattes para ser
explorada e conhecida por alunos e alunas do Ensino Médio pode ser entendido como uma
tentativa de realizar tal migração.
t t
,
Não tinha a menor idéia do quanto era preciso estudar pesquisar e produzir para
ser considerado um cientista ou pesquisador do CNPq.
Através dos relatos dos alunos e alunas, como no caso da aluna que enunciou a frase
acima, acredito que tenham entendido quais produções são exigidas pelas agências de
financiamento da Ciência (publicação de livros, artigos, participações em eventos, etc.).
Percebi também que, ao interagir com os resultados de buscas, alguns alunos e alunas
comparavam os currículos e as produções dos pesquisadores. Mesmo que essa não tenha
sido a minha intenção inicial, passei a ver como produtiva tal comparação, que só pode ser
realizada porque a forma de organização dos currículos pesquisados era/é hipertextual, o
que possibilitou navegação e exploração por parte dos alunos e alunas.
Essa é uma das vantagens que pode ser destacada na utilização da Web como
recurso pedagógico, pois os
sites
hipertextuais permitem, como aponta Silva (2004),
intertextualidade, que são conexões com outros documentos;
Intratextualidade, que são conexões com o mesmo documento, como no
caso do Currículo Lattes;
Multivocalidade, que são múltiplos pontos de vistas;
Navegabilidade.
Lévy (2001) traz uma idéia de hipertexto que refina as noções que Silva apresenta,
argumentando que os hipertextos podem ser vistos como “mundos de significação” (p. 25)
onde os princípios de metamorfose, multiplicidade, exterioridade, topologia e mobilidade dos
centros são suas características principais.
115
Essa multiplicidade de possibilidades da Internet vista como uma rede hipertextual
acaba se constituindo como uma desvantagem, pois não são poucas as vezes em que
perdemos ou mudamos o rumo de nossa navegação ou pesquisa ao “clicar” em determinado
link
. Na experiência realizada na escola, não foi diferente. Ao explorarem o
site
do CNPq e a
Plataforma Lattes, alguns alunos e alunas acabavam por navegar em outros
sites
ou
caminhos ainda não percorridos ou não solicitados por mim. Só a descoberta que fizeram
dessas possibilidades pode ser considerada um subproduto muito válido desta pesquisa,
mesmo que se possa argumentar que para isso não se necessitasse de um projeto de tal
envergadura. Considerando-se o tempo exíguo e a quantidade de alunos (que em algumas
aulas chegava a 15) essa multiplicidade de opções acabou se constituindo como uma
dificuldade na mediação das atividades propostas. Mas, levando-se em conta a perspectiva
de alfabetização científica-tecnológica-digital, tal navegação acabou sendo positiva, já que a
interatividade é um dos elementos constituintes da linguagem digital.
Como bem lembra Silva (2004), construir cidadania na era digital e educar na
cibercultura é garantir a possibilidade de significações livres e plurais a alunos e alunas,
através dos múltiplos caminhos proporcionados pela rede digital (Internet). Para o autor, o
hipertexto e a interatividade próprios da
web
podem se constituir como uma “valiosa atitude
de inclusão cidadã na cibercultura” (IBIDEM, 2004, p. 67).
É lamentável não ter tido oportunidade mais extensa para depurar ou trabalhar
melhor com os estudantes os dados retirados da Plataforma Lattes, mas acredito que tenha
conseguido “mostrar o caminho” ou “o mapa da mina”, possibilitando que aqueles que
tenham o interesse possam conhecer o
site
do CNPq e seus recursos de buscas por
currículos. Isso já foi uma iniciativa válida na tentativa da construção da cidadania em nosso
tempo, que é mediado e interpelado incessantemente pela Ciência, pela tecnologia e pela
informática.
Acredito que, se tivesse conseguido realizar a união da informática com pelo menos
uma disciplina, como a Biologia, a Física ou a Química, como era o propósito inicial de minha
pesquisa, teria conseguido atribuir mais sentidos aos dados pesquisados, mas esse espaço
não me foi cedido por nenhum professor ou professora. Como pesquisadora, tenho que
respeitar os limites impostos pela Escola que me acolheu para fazer dela meu
lócus
de
pesquisa.
Aqui vale fazer uma crítica à compartimentação das disciplinas escolares, tão
característica na Escola e até em Universidades. Morin (2000) é um dos autores que criticam
a especialização ou hiperespecialização, apontando-a como um dos desafios da Educação:
116
vencer a especialização e a compartimentação dos saberes. Mesmo que o currículo
disciplinar tenha sido substituído, com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio
(PCNEM), pelo currículo em áreas, isso ainda, para algumas escolas e para muitos docentes,
é quase uma ficção.
A organização do conhecimento escolar para o Ensino Médio foi estabelecida em três
áreas:
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
(Língua Portuguesa, Língua Estrangeira
Moderna, Educação Física, Artes e Informática),
Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias
(Biologia, Física, Química e Matemática) e
Ciências Humanas e suas Tecnologias
(História, Geografia, Filosofia, Antropologia & Política e Sociologia). Essa divisão numa
proposta oficial tem como base reunir em uma mesma área aqueles
conhecimentos que
compartilham objetos de estudo e portan o, que mais facilmente se comunicam
, t
128
,
criando
condições para uma prática escolar de interdisciplinaridade dentro de uma perspectiva
interdisciplinar e contextualizada, em oposição à fragmentação e descontextualização do
ensino disciplinar.
É fácil entender o quanto as determinações oficiais buscam definir, por exemplo, o
ensino de Química como parte da área das Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias. Tenho observado e permito-me inferir que há muitos envolvidos com esse
ensino que não se dão conta de onde e como estão localizadas a Física ou a Química nas
propostas curriculares. Isso parece ter ocorrido logo da trazida dos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio, no final dos da última década, e também mais recentemente,
(2005) quando o Ministério de Educação reavaliou os PCNEM. Assim, a proposta que relato
aqui, poderia ser muito melhor viabilizada se tivesse abrigo nesses pressupostos legais, que
parecem ainda distantes de onde fiz minha pesquisa. Atribuo meu insucesso na pretensão de
realizar uma prática inter ou multidisciplinar, conforme aspirei e anunciei na qualificação do
projeto desta dissertação, à compartimentação das disciplinas, à separação das áreas de
conhecimento e à falta de conexão entre professores e professoras das diferentes áreas
apresentadas na Escola Parobé.
128
Ministério da Educação – MEC, Secretaria de Educação Média e Tecnológica – SEMTEC.
Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília, MEC/SEMTEC, 1999, 4 volumes
(Versão disponível no sítio do MEC).
117
4.1.2 A alfabetização científica-tecnológ ca-digital como forma de
inclusão (ciber)cultural e social
i
. r
t
Se a escola não inclui a Internet na Educação das novas gerações, ela está
na contramão da história, alheia ao espírito do tempo e, criminosamente,
produzindo exclusão social ou exclusão da cibercultura. Quando o professor
convida o aprendiz a um site, ele não apenas lança mão de uma nova mídia
para potencializar a aprendizagem de um conteúdo curricular, mas contribui
pedagogicamente para a inclusão desse aprendiz na cibercultura (SILVA,
2004, p. 63).
Entendo que promover a inclusão através da Internet, como sugere Silva (2004),
significa superar a pedagogia da transmissão, significa experimentar novos espaços de
interação onde estudantes, juntamente com professores e professoras, possam fazer do
hipertexto e da interatividade próprios da mídia
on-line
uma atitude de inclusão cidadã na
cibercultura. Por outro lado, aceitando a radicalidade da postura do autor, aceito,
pretensiosamente, que meu trabalho tenha contribuído para não produzir “criminosamente”
exclusão social ou exclusão da cibercultura.
Uma outra perspectiva de inclusão que já apresentei na fundamentação teórica
desta dissertação, mas que parece válido retomar neste momento, é a defendida por Castells
(2005), que entende que incluir digitalmente não é somente permitir o acesso às tecnologias
digitais, mas saber utilizá-las de forma produtiva no dia-a-dia – no caso desta pesquisa, a
informática. Entendo que cabe / caberia à Escola, como espaço de aprendizagem, permitir
esse acesso e também ensinar alunos e alunas a utilizarem as possibilidades da rede mundial
de computadores de forma que possam efetivamente estar incluídos no mundo digital.
Ao ser questionado sobre o que tinha significado a experiência pedagógica
vivenciada, um aluno respondeu no Fórum:
Eu acho ótimo Podermos ap ender sobre outros programas que nos ajudem em
diversos assuntos, sem ser aqueles
sites
que a é já cansamos de entrar porque é a mesma
coisa sempre. Além disso, expandimos nossos conhecimentos na área de Informática
.
Esse aluno que escreveu o depoimento já possui um nível de alfabetização digital e
acessa a Internet não somente na escola. Percebi que o fato de interagir com a Plataforma
Lattes possibilitou que ele ampliasse tal alfabetização, principalmente no que tange à
utilização de mecanismos de buscas e utilização de fóruns, ambos os recursos disponíveis da
Internet que podem ser entendidos como artefatos da cibercultura.
Muitos foram os relatos e depoimentos de estudantes que apontaram que, ao
serem convidados e desafiados a utilizar a Plataforma Lattes como instrumento de pesquisa,
118
acabaram desenvolvendo mais segurança na utilização do computador e da Internet, a qual
ainda não havia sido muito explorada pelo professor titular da turma.
Sora! Tenho gostado muito de nossas aulas e agora entendo mui o mais
de informática.
t
.
t
Ao serem questionados sobre o que exatamente a utilização da Plataforma Lattes
como ferramenta de pesquisa lhes ensinou na área de Informática (alfabetização digital),
alguns alunos e alunas explicitaram que adquiriram mais habilidades de pesquisa. Também
apontaram que não conheciam e nunca haviam utilizado mecanismos de buscas como os do
Currículo Lattes, que utilizavam filtros e parâmetros durante a pesquisa de forma tão
sistematizada e complexa.
Acho pertinente trazer mais alguns depoimentos postados no Fórum que expressam
o significado da experiência vivida numa perspectiva de alfabetização científica-tecnológica-
digital:
Oi, achei interessante, pois descobri coisas novas e muito gratificantes O teu trabalho
está sendo legal, pois mudou nossa maneira de pesquisar algumas coisas na Internet, então,
sem mais delongas, um grande abraço
e a é a próxima.
Na minha opinião, as atividades realizadas em aula são muito importantes, pois, além de
ampliarem nossos conhecimentos, nos proporcionam uma alternativa a mais nas aulas de
Informática
.
Creio que não posso dizer que, a partir da buscas realizadas, os alunos e alunas
tenham desenvolvido domínio total de habilidades de pesquisa na Internet, mas creio que os
exercícios realizados puderam dar mais segurança para que eles possam utilizar outras
ferramentas de busca. Vejo tal crença como uma boa possibilidade de inclusão cibercultural.
O preenchimento do currículo foi uma atividade produtiva sob vários aspectos. Como
foi realizado
on-line
, os alunos puderam desenvolver algumas habilidades necessárias para a
utilização de formulários eletrônicos na Internet, o que, na perspectiva de uma alfabetização
digital, foi um exercício pertinente.
O fato de os alunos providenciarem o CPF (conforme já relatado) para o
preenchimento do currículo também demonstrou que eles estavam realmente interessados
na atividade proposta. Percebi, através de suas atitudes, que nascia um sentimento de
orgulho, de pertencimento e de inclusão no grupo ao preencherem o currículo Lattes,
conforme um aluno mesmo postou no Fórum:
119
As aulas estão sendo boas para aprender sobre algumas coisas que até hoje não
ínhamos visto, como a platafo ma, que pode ser muito útil para o nosso u uro. Gostei
muito das aulas, que nós podemos fazer parte fazendo o currículo e podendo fazer parte do
CNPq, é um grande orgulho. bjs
t r f t
Aluna da turma 1N1 realizando cadastro
no CNPq para preenchimento de seu
Currículo Lattes.
O aluno da turma 1N1 realizando o
preenchimento de seu currículo, após
adquirir CPF e RG.
Figura 6 e Figura 7 – alunos e alunas da turma 1N1 no laboratório de
Informática
Acredito que tenha sido uma boa estratégia para aproximar os alunos e alunas do
universo do CNPq e da Plataforma Lattes o preenchimento do currículo, pois assim puderam
conhecer, e talvez até entender, de que forma a base de dados do CNPq é abastecida e que
tipo de informação e produção é exigida das pessoas que se envolvem com a pesquisa no
Brasil. Muitos estudantes destacaram essa atividade como bastante gratificante, mas vale
salientar que tive que fazer muitas intervenções e explicar passo a passo como deveriam
preencher o currículo, já que tais estudantes se encontravam distantes da cultura científica
ou acadêmica da qual a Currículo Lattes faz parte. Parece importante que refira a aceitação
de que possa ser considerada, por qualquer leitor desta dissertação, como por demais
exótica para os estudantes do Ensino Médio envolver-se com a Plataforma Lattes; poderia
argumentar, em defesa da proposta, que nós mesmos, na academia, também nos sentimos
muitas vezes alienígenas em muitas situações em que somos introduzidos e para as quais,
não sem razões, oferecemos, às vezes, resistências.
Entendo que, ao realizar uma experiência que buscou desenvolver a alfabetização
científica-tecnológica-digital de estudantes, acabei fazendo uma inclusão que pode ser vista
120
sob o ponto de vista cultural, central neste trabalho, mas também sob o ponto de vista
social, como aponta Chassot (2003b, p. 99):
[...] poderíamos pensar que alfabetização científica signifique possibilidades
de que a grande maioria da população disponha de conhecimentos
científicos e tecnológicos necessários para se desenvolver na vida diária,
ajudar a resolver os problemas e as necessidades de saúde e sobrevivência
básica, tomar consciência das complexas relações entre Ciência e Sociedade
(FURIÓ et alii, 2001). Parece válido considerar a Ciência como uma parte
da cultura de nosso tempo (SÉRRES, 1991).
Ao defender a alfabetização científica como uma possibilidade de inclusão social,
Chassot (2003a) argumenta, ainda, que conhecer a linguagem da Ciência não só permitiria
aos homens e mulheres realizar uma leitura do mundo (natural) onde vivem, mas também
transformá-lo, preferencialmente para melhor. Concordo com as idéias do autor e entendo
que, mesmo que pareça utópica fazer de cada homem e de cada mulher atores não
presentes nas transformações que ocorrem no planeta, mas artífices críticos na qualidade
das transformações produzidas , essa é a dimensão social que atravessa a alfabetização
científica-tecnológica-digital.
Uma outra perspectiva da experiência sobre a qual cabe refletir é a oportunidade de
utilização da Plataforma Lattes num outro sentido, diferente daquele pelo qual o Currículo
Lattes foi concebido pelo CNPq. Penso que possibilitar que alunos e alunas do Ensino Médio
explorem um universo que é acessado quase exclusivamente pela comunidade científica foi
uma experiência que permitiu o entendimento de que a Ciência não precisa ser vista como
um ente mitológico ou descorporificado, mas como uma linguagem desenvolvida e exercida
(falada) por pessoas que estão envolvidas em atividades científicas de diferentes níveis e
mais perto do universo dos estudantes do que talvez possam imaginar.
Pretendia propiciar o contato dos alunos e alunas com os pesquisadores que eles
“conheceram” virtualmente através do currículo Lattes, mas não houve oportunidade, por
problemas de tempo, de realizar tal atividade. Penso que teria sido uma ótima ocasião para
promover a inclusão desses estudantes no mundo da Ciência e também de proporcionar-lhes
a utilização da web em toda a sua potencialidade como recurso de comunicação.
Suponho que as informações disponibilizadas na Plataforma Lattes são quase de
domínio exclusivo da Academia e que mesmo boa parte da comunidade acadêmica não tem
conhecimento nem explora a Plataforma Lattes em toda sua potencialidade, uma vez que
esta é vista ou tida, muitas vezes, como uma mera exigência (no preenchimento do
currículo) dos órgãos de fomento e instituições de pesquisa. Essa suposição permite pensar
que tal inclusão pode ser feita também em nível acadêmico. A proposta aqui descrita parece
121
relevante, por exemplo, para uma significativa parcela de cursos de Graduação,
especialmente se nos damos conta de que grande parte dos universitários não continua seus
estudos em nível de Pós-Graduação, quando usualmente conhecem o Currículo Lattes.
4.1.3 A Plataforma Lattes como um instrumento pedagóg co na Escola e
no cotidiano de homens e mulheres envolvidos com Ciências
i
t
[...] Parece que se pode afirmar que em tempos que nos são muito
próximos houve uma inversão no fluxo do conhecimento. Se antes o
sentido era da Escola para a comunidade, hoje é o mundo exterior que
invade a Escola. Talvez não diríamos isso há 10 anos. A Escola pode não ter
mudado; entretanto, pode-se afirmar que ela foi mudada. Este é o novo
velho cenário onde ocorre Educação (CHASSOT, 2003c, p. 27).
A experiência pedagógica vivida por mim e por alunas e alunos da Escola Parobé,
especificamente da turma 1N1, fez-me pensar sobre o fazer Educação e o papel da Escola
dentro de nossas vidas. Da minha parte, posso afirmar que entendo a Escola como uma
instituição social típica da modernidade “que faz ensino formal, em qualquer nível de
escolarização desde a Escola Infantil até a Universidade” (CHASSOT, 2003c, p. 22). Ao ver a
Escola como uma instituição marcadamente moderna, posso afirmar, ainda, que esta acabe
por ter suas bases epistemológicas enraizadas nos cânones e nos moldes do pensamento
moderno, o que vem a constituir-se como um problema, considerando-se as características
dos tempos contemporâneos.
Cabe comentar que, ao ver a escola como a instituição que faz o ensino formal, não
estou afirmando que é apenas na Escola que se ensina; muito pelo contrário, acredito que
somos interpelados constantemente por artefatos culturais que nos ensinam muitas coisas
que não aprendemos necessariamente na Escola, conforme nos aponta o campo teórico dos
Estudos Culturais e Pedagogias Culturais. Assim, não é sem razão que aqueles que estudam
dimensões mais amplas de currículo referem-se, por exemplo, ao currículo dos
shopping
cen ers
, das novelas televisas ou até de programas, como os chamados
reality show
s.
A Escola e a Educação
129
podem ser vistas de diferentes formas, dependendo das
referências teóricas utilizadas. Por exemplo, Maria Luiza Merino Xavier (2003) e Veiga-Neto
(2000), autores que trabalham em uma perspectiva pós-estruturalista, vêem a Escola como
um espaço de disciplina mento onde os corpos são domesticados e disciplinados. Xavier
129
Compreendo que educar tem um sentido mais amplo do que ensinar; por isso, não vejo Escola e
Educação como sinônimos. Educa-se através do ensino, mas nem todo ensino pode ser considerado
como constitutivo da Educação.
122
(2003) aponta que a Escola acabou se constituindo como o espaço privilegiado de produção
do sujeito moderno.
É justamente nesse sentido que entendo ser válida uma reflexão, mesmo que
breve, sobre o papel da Escola na contemporaneidade. Trago as afirmações de Chassot
(2003c) citadas diretamente na abertura deste sub-item como pertinentes para tal reflexão.
O autor argumenta que a globalização confere novas realidades à Educação
(2003b, 2003c) e que Escola não pode ser vista como um ente alienígena no mundo onde
vivemos, como se existisse um outro mundo fora dela. Ao contrário, ao fazer parte do
mundo, acaba sendo modificada por ele e, mesmo que tente resistir a tais mudanças, a
Escola acaba por ser mudada, uma vez que os sujeitos que a compõem também já não são
mais os mesmos. O mundo exterior entra de diferentes e múltiplas formas na sala de aula, e
a própria sala de aula acaba por exteriorizar-se também de múltiplas formas.
Trazendo tal reflexão para o contexto desta dissertação, coube / cabe a mim
perguntar: quem eram / são os sujeitos com quem convivi durante quatro meses? Qual o
papel da Escola e qual o sentido que a Educação realizada na Escola tem em suas vidas?
Esses são alguns questionamentos que foram surgindo durante a parte empírica
desta pesquisa e que aos poucos foram sendo respondidos. Tentei buscar tais respostas
durante todo o tempo em que estive realizando a parte empírica da pesquisa. Para saber
quais os sentidos que os estudantes estavam dando para a utilização da Plataforma Lattes
como instrumento educativo, precisava primeiramente saber quem eram essas pessoas, de
que lugar falavam, quais suas experiências de vida. Os questionários
130
ajudaram-me
inicialmente, mas, à medida que fui convivendo com os estudantes, o melhor instrumento
foram as conversas “informais” realizadas muitas vezes, inclusive fora do ambiente da sala
de aula ou até da Escola.
Embora visse os alunos e alunas em suas singularidades, evitando generalizações
bruscas a partir das respostas aos questionários, aos poucos pude formar uma razoável
caracterização da turma
131
, o que me ajudou de maneira significativa na hora de programar
as atividades e, principalmente, me levou a perceber os sentidos que as alunas e alunos
atribuíram à experiência vivida e a eles dar sentido.
130
Ver Apêndice E(p. 153).
131
Muitos dos alunos e alunas não trabalhavam; os que trabalhavam o faziam em turno integral. A
maioria não morava perto da Escola, o que justifica seu atraso nas aulas. A maioria tem como
hobbies preferidos ver televisão e ouvir música. Na Internet, gostam de acessar sites de
relacionamentos e blogs, além de sites de emissoras de televisão e rádio.
123
E daí? No que isso vai mudar a minha vida?
Freqüentemente, questionei se o que eu estava fazendo seria ou estava sendo
realmente “útil” para aqueles estudantes, pois, algumas vezes, parecia que eles não estavam
entendendo o que estavam fazendo; outras vezes, parecia-me que estavam compreendendo
e, melhor, aprendendo muito com as atividades propostas.
É nesse contexto que evoco a frase de um dos alunos (transcrita acima), para
quem não pareciam estar causando motivação alguma tais atividades. Mas o mal-estar que
essas atividades poderiam estar causando em tal aluno já pode ser considerado produtivo,
pois ele se sentiu incomodado, desafiado ou quem sabe até provocado.
Que currículo grande! Um dia quero ter um igual!
Eu quero chegar ao Pós-Doutorado!! Como faço?
As frases apresentadas acima foram exclamadas por alunas no instante em que
correram os olhos pela tela de meu currículo. A partir da reação dessas alunas, comecei a
atentar para outras reações dos alunos e alunas durante as aulas, pensando em outros
sentidos que não somente a perspectiva de uma alfabetização científica-tecnológica-digital.
Que ações o meu trabalho na turma 1N1 catalisou? O sentido que dou para algumas frases,
gestos, olhares e
comentários dos alunos e das alunas tem a ver com uma perspectiva que
até então não havia pensado: a Plataforma Lattes e as atividades que propus poderiam
servir como um elemento motivador para uma possível carreira acadêmica ou para a busca
de uma melhor formação dos estudantes. Dessa forma, posso afirmar que a utilização da
Plataforma Lattes acabou sendo útil na Escola, servindo como um instrumento na Educação
dos estudantes.
A
lunos e alunas
da turma 1N1,
utilizando
atentamente a
Plataforma
Lattes para
buscas e
análises de
currículos. Tal
atividade foi útil
de diferentes
formas na
Educação dos
estudantes.
Figura 8 – Foto dos alunos e alunas explorando a Plataforma Lattes.
124
O próprio conceito de
útil
merece ser questionado, mesmo que brevemente, e
Chassot (1995) contribui para tal discussão. A palavra “útil” é vista pelo autor como uma
categoria de qualidade que pode significar
(...) aquilo que é útil ou proveitoso, vantajoso. Em geral, chama-se de útil
tudo aquilo que pode servir para alguma coisa. (...) Mais especificamente,
diz-se que é útil tudo o que serve para satisfazer necessidades humanas,
individuais ou coletivas (CHASSOT, 1995, p. 75).
Já o tipo de utilidade de determinada coisa dependerá da esfera onde se aplica o
conceito de
útil
. Muitas vezes, o conceito de utilidade também é associado ao conceito de
prazer ou bem-estar. Dessa forma, algo tem sua utilidade fundamentada no prazer que
possa produzir. Algumas vezes, ainda, o útil passa a ser distinguido de outros valores,
acabando por ser considerado em uma escala inferior, visto como um valor meramente
instrumental, como se fosse um meio de conseguir atingir outro fim. Tais significados
atribuídos acima ao termo “útil” podem ser aplicados na experiência pedagógica realizada
neste estudo. Permitam-me repetir um depoimento já citado:
As aulas estão sendo boas para aprender algumas coisas que até hoje não tínhamos
visto, como a Plata orma, que pode ser muito útil para o nosso futuro.
f
f
t
O aluno, ao ser questionado sobre tal declaração, argumentou que ter conhecido e
aprendido a utilizar as buscas por currículos Lattes poderá ajudá-lo futuramente na escolha
de uma faculdade, de uma profissão ou até em trabalhos acadêmicos ou escolares, uma vez
que o recurso pode localizar pessoas envolvidas em produções científicas de seu interesse.
Esse é um dos sentidos que podemos atribuir à Plataforma Lattes como instrumento na
Educação. Um outro depoimento de uma aluna pode trazer mais desdobramentos sobre a
utilidade da Plataforma Lattes:
Os conteúdos são bastante complexos e sérios. Não acho empolgante, mas é
undamental. Você tem desenvolvido otimamente bem o seu trabalho, Patrícia, com
con eúdos precisos. Acho que as melhores aulas foram quando começamos a elaborar
nossos currículos na Plataforma Lattes, faz a gente se dar conta um pouco que, às vezes,
temos que nos mexer. Meu fechamento é que poderíamos ter trabalhado assuntos mais
polêmicos.
Entendo, pelo que a aluna escreveu e enunciou verbalmente, que ela achou válidas
e úteis as atividades realizadas, porém não achou prazeroso realizá-las. Dessa forma, a
utilidade do trabalho não está diretamente relacionada com o prazer proporcionado.
A expressão “temos que nos mexer” atribui uma outra utilidade educacional aos
sentidos produzidos na exploração da Plataforma Lattes (conforme já enunciei
125
anteriormente), que pode ser vista como uma ferramenta que produziu motivação, como
uma espécie de "mola propulsora" que incentiva os estudantes a continuarem seus estudos,
a aprimorar sua formação e a melhorar sua qualificação.
Como já referi anteriormente, compreendi que as alunas e os alunos se sentiram
tocados ao preencherem seus currículos e ao serem questionados sobre quais os sentidos
que atribuíram a tal experiência. Alguns afirmaram:
Foi impo ante porque nos damos con a de que não temos nada para colocar no
currículo, mesmo que este não fosse destinado para atividades cientificas!
rt t
t
t
r
Desejei er futuramente um currículo que fosse tão completo e cheio quanto os
que acessei.
Achei que as a ividades realizadas foram um bom começo para pensar na
minha carrei a profissional.
No momento em que percebi o efeito produzido pelo preenchimento e análises dos
currículos, comecei a incentivar os alunos a aperfeiçoarem sua formação, instiguei-os a
pensar qual profissão gostariam de ter, estimulando que realizassem pesquisas em
sites
de
universidades, participassem de eventos
132
e estudassem, assim que fosse possível, outros
idiomas. Compreendo que as atividades realizadas foram úteis e produtivas também no
sentido descrito acima.
Com base nas reflexões realizadas em cima do referencial teórico escolhido e da
experiência vivida, creio que posso afirmar que muitas foram as utilidades educacionais e
pedagógicas da exploração da Plataforma Lattes com alunos de Ensino Médio, tanto na
perspectiva de uma inclusão científica-tecnológica-digital, quanto na perspectiva de uma
inclusão cultural e social.
Creio que ter visto a Plataforma Lattes como um artefato cultural e utilizá-la como
recurso pedagógico criou a possibilidade de se fazer alfabetização científica-tecnológica-
digital tendo em vista a construção de uma cidadania mais crítica nos alunos e alunas da
Escola Parobé, da turma 1N1.
132
A Escola Parobé realiza anualmente uma feira de Ciência e Tecnologia intitulada PAROTEC.
Estimulei os alunos e alunas a participarem de tal evento para que pudessem, além de conhecer e
aprender coisas novas, incluir tal evento no Lattes.
126
5. Plataforma Lattes e alfabetização científica-tecnológica-digital: quais
verdades provisórias?
O que estamos inclinados/as a reconhecer, hoje, e para isso tem sido crucial a critica
antifundacionalista empreendida pelas reflexões pós-modernas, é que não existe a tal
verdade verdadeira
;
ela é sonho, pura ficção.
(COSTA, 2002, p.15)
Reconheço, como Marisa Vorraber Costa, que não existe uma verdade
verdadeira
e,
em nenhum momento, a busquei nesta pesquisa. Isso não significa que não tenha aplicado o
rigor exigido em um trabalho das dimensões de uma dissertação de Mestrado e nas
pesquisas que são validadas por portarem o rótulo de
científicas
. Mas vejo que tal rigor não
se baseia em pressupostos epistemológicos, na idéia de neutralidade ou objetividade. Ao
realizar este processo investigativo, procurei “superar as limitações impostas pelo formalismo
metodológico imposto pela ciência moderna” (COSTA, 2002, p. 14).
Relato que isso não foi / não é uma tarefa fácil. Pelo contrário, é muito difícil – fui
socializada, domesticada, sujeitada, moldada e constituída como sujeito em bases
epistêmicas marcadas pelo pensamento moderno, que, por sua vez, é marcado pelo
cartesianismo e pelo positivismo. Agora, exercitei um outro olhar, buscando ou pelo menos
tentando aprender a buscar um estranhamento do que nos parece familiar e naturalizado.
Isso proporcionou que pelo menos eu pudesse colocar outros óculos para observar a
Educação.
Assim, aqui e agora, exponho algumas análises que partiram de minha reflexão
133
sobre a elaboração desta dissertação, bem como o aprendizado vivido durante os dois anos
do curso de Mestrado. Não apresento verdades absolutas e generalizáveis, mas algumas
afirmações e entendimentos provisórios, não somente sobre a pesquisa realizada, mas
principalmente sobre a minha caminhada como pesquisadora.
133
Reflexão é entendida como “a capacidade que permite ao ser humano, e somente a ele,
perceber-se como chave para a compreensão do universo, como centro de perspectiva do real, onde
ocupa um lugar decisivo e estruturante, com base em seu saber e em seu fazer, chegando assim a
conhecer mediante sua atuação no mundo” (MORAES, 2003, p. 173).
127
Os apontamentos de Bourdieu
apud
Desaulniers(1997, p. 186) sobre a construção
do
habitus
científico tornam-se pertinentes na busca de tais entendimentos. Assim, faz-se
necessário para a instauração de tal
habitus
uma série de atitudes ou disposições que
Bourdieu aponta. Destaco, a seguir, algumas que fazem sentido ao analisar minha trajetória
e avanços como pesquisadora que se propôs a realizar um trabalho no nível de Pós
Graduação – Mestrado em Educação:
Apreender a pesquisa como uma atividade racional;
Pensar relacionalmente;
Aceitar correr riscos;
Participar efetivamente de um trabalho de pesquisa;
Problematizar o objeto a ser pesquisado a partir de suas rupturas;
Rejeitar a divisão entre a teoria e a metodologia;
Praticar a dúvida radical para romper com o senso comum e também para
evitar as aparências da cientificidade;
Dominar o saber adquirido da área ou disciplina em que se situa a pesquisa.
Para Desaulniers(1997) a relação entre pesquisa e formação, principalmente no
meio acadêmico, é de vital importância na construção de novos pesquisadores. Penso que
muitas das atitudes indicadas pela autora, fundamentada em Bourdieu foram / estão sendo
incorporadas ao meu processo de formação para e pela pesquisa, que, conforme já indiquei,
iniciou na Graduação e foi enriquecido através das práticas vividas na bolsa de IC. Mas cabe
apontar que não foi / não é fácil praticar ou exercer tais atitudes, principalmente num curso
de Mestrado, que exige alto nível rigor científico, aumentando minhas responsabilidades
éticas como pesquisadora e educadora.
Muitas foram as rupturas sofridas. Exercer o pensamento relacional e considerar as
relações da unidade de pesquisa com todo o seu entorno também não se constituíram em
tarefas simples. Por vezes, senti-me insegura com as escolhas feitas, discussões e
intervenções realizadas, mas “aceitei correr riscos”, principalmente ao aventurar-me em
realizar uma pesquisa que procurou aproximações com o pós-modernismo e o pós-
estruturalismo, entendendo que se sentir insegura fazia / faz parte de tal disposição.
Não foram poucas as vezes em que ouvi, por exemplo, durante os seminários e
disciplinas do curso de Mestrado, perguntas sobre a “metodologia”, que até então não havia
sido “definida”, mas não me afetava com tais questionamentos, pois entendia que a
metodologia não se encontra fragmentada, separada da empiria da pesquisa; pelo contrário,
vai sendo construída juntamente com ela. Penso, ainda, que as disciplinas cursadas, as
128
leituras realizadas, a experiência vivida, bem como o exercício da escrita, foram práticas e
estratégias que me ajudaram a dominar o saber da área em que se situou minha pesquisa.
Assim sendo, conhecer o campo dos Estudos Culturais e estudar autores pós-
estruturalistas, pós-críticos e pós-modernos constituíram-se numa experiência que me
envolveu profundamente, e não foram poucos os momentos de
caos
134
e de crises
epistemológicas em que me sentia instigada a realizar uma pesquisa diferente daquelas que
vinha realizando (com as marcas da Ciência Moderna), mas literalmente não sabia
como
,
de
que forma,
qual
caminho percorrer para isso. Para realizar minha pesquisa, efetuei muitos
deslocamentos e passei a atribuir às palavras um valor que jamais tinha imaginado e, por
isso, cada frase desta dissertação foi pensada, repensada, vista e revista.
Agora, relendo o que escrevi, sou levada a reconhecer que, mesmo que este
trabalho não seja totalmente fundamentado no pós-estruturalismo, busquei aproximações
desse campo, principalmente no que diz respeito à minha postura como pesquisadora. Vale
apontar também que tal atividade foi muito produtiva para mim como ser humano, mulher
que, ao fazer esta dissertação também se tornou mãe, o que exigiu afastamentos
imprevistos do cenário acadêmico , pedagoga e futura Mestre em Educação, pois me
possibilitou trilhar novos e diferentes caminhos, tanto na perspectiva teórica quanto na
prática desta dissertação. Assim, na medida em que produzo esta pesquisa, esta pesquisa
também me produz e me constitui como pesquisadora e profissional da Educação. Acredito
que, metodologicamente, não existe distanciamento, e sim envolvimento com o objeto de
pesquisa, conforme aponta Veiga-Neto (2002, p. 36):
[...] total impossibilidade do distanciamento e assepsia metodológica ao
lançar nossos olhares sobre o mundo. Isso não significa falta de rigor, mas
significa que devemos ter sempre presente que somos irremediavelmente
parte daquilo que analisamos e que, tantas vezes, queremos modificar. Isso
diminui nossa ingenuidade e pode nos deixar bem mais atentos...
Dentro do referencial que fundamentou a parte metodológica de minha pesquisa,
foi impossível manter distanciamento. A experiência, para Larrosa (2004), acontece de
maneira subjetiva e nunca é igual de uma pessoa para outra. As sensações, percepções e os
sentidos que dei para tal experiência e que apresentei nesta dissertação, assim como os
sentidos dados pelas alunas e alunos, são únicos e subjetivos. Dentro dessa concepção de
experiência, pedi que os estudantes expressassem, através de uma palavra ou termo, quais
134
Ilya Prigogine (1917-2003), prêmio Nobel de Química em 1977, atribui à palavra caos um sentido
científico positivo, que significa imprevisibilidade.
129
as sensações que tiveram durante o trimestre em que trabalhamos juntos. Eis emoções de
alguns deles:
Conhecimento
Prazer imenso
Profissionalismo
Essencial para a vida
Interessante
Produtivo
Sensação boa
Suave
Inesquecível
Desenvolvimento pessoal educativo e profissional
Sensação de que não conheceu um décimo do que existe na Plataforma Lattes
Um bom começo
Tais enunciados produzem em mim uma sensação boa, pois percebo, através das
falas dos estudantes, que eles foram pelo menos parcialmente tocados pela experiência
vivida e que realmente foi produtivo para eles, tanto quanto para mim, a realização da parte
empírica deste trabalho. Acredito que, apesar do pouco tempo em que estive com eles, pude
estabelecer uma boa relação com praticamente todos e criei alguns vínculos que continuam
até hoje, pois continuo a me comunicar com alguns através de correio eletrônico.
Alunos e alunas da turma 1N1 e a professora/pesquisadora Patrícia, em clima de despedida, após a
realização da última atividade (discussão e análise), do Projeto de Pesquisa Plataforma Lattes.
Figura 9 e Figura 10 – Foto da pesquisadora com alunos e alunas da turma 1N1.
130
Na aula em que realizei o encerramento do trimestre, (em que foram tiradas as
fotos acima) pedi também que os estudantes avaliassem a participação e o envolvimento da
turma no Projeto, e alguns apontaram que deveríamos ter tido mais momentos de discussão
para reorientar o trabalho quando necessário. Alguns também indicaram que havia faltado
interesse e empenho de alguns alunos (principalmente os que não freqüentavam
assiduamente as aulas) na realização de algumas atividades e que isso, em certos
momentos, comprometeu o rendimento da turma no geral. Também atribuíram a falta de
iniciativa ou de autonomia ao fato de não conhecerem a Plataforma Lattes e não dominarem
completamente os recursos do computador. Se hoje sei que há pelo menos um aluno que,
pelo trabalho desenvolvido na Turma 1N1 da Escola Parobé, tem carteira de identidade e
está no CIC, posso dizer que para mim valeu a pena, mesmo que para tal não se precise
fazer Mestrado em Educação.
Penso que, ainda que o trabalho não tenha sido empolgante, como apontaram
algumas alunas e alguns alunos, eles souberam respeitá-lo e realizaram com seriedade as
tarefas solicitadas. Percebi o crescimento de alguns no que diz respeito ao domínio das
ferramentas, como no caso de envio de correio eletrônico com arquivos anexados, o que é
muito gratificante e vai ao encontro de minhas expectativas de contribuir para a
alfabetização científica-tecnológica-digital dos estudantes.
Vale destacar que algumas alunas e alguns alunos comentaram que, a partir das
atividades realizadas no Currículo Lattes (preenchimento e análise de currículos), começaram
a pensar em qual profissão gostariam de seguir. Inclusive, alguns até apontaram já ter
descoberto para qual curso pretendem prestar vestibular. Vejo a preocupação com a
formação, por parte dos estudantes, demonstrada durante nosso último encontro, como um
efeito positivo de minha intervenção / mediação junto à turma.
Outra dimensão que me parece oportuna analisar é que, com a experiência
proporcionada, alunos e alunas também se tornaram pesquisadores e pesquisadoras, na
medida em que
realizaram atividades de pesquisa ou, por que não dizer, atividades
científicas-tecnológicas-digitais não-usuais em cima dos recursos de busca da Plataforma
Lattes. Acredito que as atividades que propus possibilitaram desenvolvimento de pelo menos
algumas habilidades necessárias para se pesquisar na Internet, principalmente no âmbito
técnico (domínio da ferramenta digital) e contribuíram para a alfabetização científica-
tecnológica-digital dos estudantes.
Desta forma, posso afirmar que a Plataforma Lattes se constitui em um artefato
cultural que pode auxiliar na alfabetização científica-tecnológica-digital de alunas e alunos do
131
Ensino Médio, podendo ainda ser utilizada como um instrumento de construção da
cidadania; como um instrumento pedagógico na Escola e no cotidiano de homens e
mulheres que se envolvem com Ciências e ainda como forma de inclusão (ciber)cultural,
conforme vivenciado na turma 1N1 da Escola Parobé, unidade de pesquisa desta dissertação.
Com relação à inclusão científica-tecnológica-digital, que foi um dos objetivos desta
pesquisa, acredito que os alunos puderam exercitar práticas de inclusão digital, mas não
posso afirmar que, a partir da experiência vivida, não se encontram mais excluídos da
chamada cibercultura. Eles tiveram a oportunidade de conhecer algumas ferramentas,
programas e recursos e assim experimentaram, vivenciaram e se aproximaram de muitos
elementos que fazem parte da cultura internética. Considerando o entendimento de Inclusão
Digital proposto por Castells e argumentado no Capítulo 3, item 3.1 (Cibercultura e exclusão
científica-tecnológica-digital: quais ligações?), pode-se dizer que os estudantes viveram
momentos de inclusão, uma vez que tiveram acesso à rede e puderam dispor de uma
oportunidade para não só aprimorarem suas capacidades técnicas, mas também exercitarem
um pensamento crítico através da depuração das informações obtidas.
Entendo que qualquer esforço de profissionais da área da Educação que possibilite
práticas de inclusão junto a estudantes que se encontram em situação desprivilegiada com
relação a práticas culturais que envolvam a telemática e as Novas Tecnologias de
Comunicação e Informação, como no caso dos alunos da turma 1N1 do Colégio Parobé, tem
de ser visto como vitorioso. Esse é um dos grandes desafios impostos à Educação pela
globalização, que “vem rompendo espaços, fronteiras, barreiras e sistemas de vida, ao
mesmo tempo em que vem desvelando mais uma forma de exclusão, a exclusão digital,
como a mais nova modalidade de marginalização socioeconômica e cultural da atualidade”,
como bem lembra Moraes (2003, p. 167).
Porém, tal esforço, para refletir-se em um nível que chegue a mudar dados
preocupantes, como os apresentados no Mapa da Inclusão Digital
135
, principalmente nas
instituições escolares públicas, deveria / deverá incluir questões que dizem respeito às
políticas públicas (através dos programas de inclusão digital do governo) e que envolvem
preocupações culturais, econômicas e sociais, bem como questões curriculares e a formação
de professores e professoras.
135
Ver item 3.1 (Cibercultura e exclusão: quais ligações?).
132
Antonio Mendes da Silva Filho (2003) aponta três pilares que sustentam /
sustentariam o processo de Inclusão digital: as Tecnologias de Informação, renda e
Educação. Portanto, para Silva Filho, qualquer prática que tenha como objetivo colaborar
para o processo de inclusão digital envolveria esse tripé. Vejo coerência nas idéias do autor,
porém, instigada pelos estudos realizados até o momento, acrescentaria na fundamentação
apresentada pelo autor a questão cultural, que acaba sendo atravessada pelas demais
instâncias (como a econômica, educacional e social, já consideradas pelo autor). Concordo
com Filho, quando este afirma que as ações que visam a inclusão digital deveriam incluir ou
estimular “parcerias entre governos (nas esferas federal, estadual e municipal), empresas
privadas, organizações não governamentais (ONGs), escolas e universidades” (FILHO, 2003,
p.2).
Entendo que possuir dois laboratórios de informática, como possui a Escola Parobé,
é um privilégio, considerando-se a realidade de muitas outras escolas públicas, que foi
conquistado a partir de parcerias estabelecidas entre a comunidade escolar e o governo. Mas
isso não significa que dentro dessa instituição não ocorra uma exclusão científica-
tecnológica-digital – se não forem desenvolvidas cotidianamente atividades ou práticas
pedagógicas que possibilitem um uso crítico da tecnologia digital.
Não foi intenção desta dissertação apresentar soluções para o fenômeno da
exclusão científica-tecnológica-digital, mas sim indicar algumas possibilidades que permitam
uma inclusão científica-tecnológica-digital através de práticas ou experiências pedagógicas.
Claro que, utopicamente, gostaria que num futuro não muito distante todos os cidadãos e
todas as cidadãs pudessem estar incluídos cultural e socialmente nos processos científicos-
tecnológicos-digitais. Quando e se esse dia chegar, imagino que pesquisas como esta que
realizei e que aqui apresentei em forma de dissertação não façam mais sentido algum ou se
tornem obsoletos. É também nesse sentido que entendo que todas as afirmações e reflexões
que apresentei possuem um caráter provisório, como toda produção dita “científica”.
Se realizar Ciência é montar um quebra cabeça, só que às vezes faltam ou sobram
peças, conforme ensina Kuhn (1996), nesta dissertação não foi diferente. Muitas foram as
peças que sobraram, e muitas foram as peças que faltaram, uma vez que não foram poucas
as idas e vindas, muitos foram os progressos e regressos, muitas foram as leituras
realizadas, muitas foram as páginas digitadas e que acabaram não sendo incluídas nesta
versão final. Muito material que surgiu do campo empírico acabou não sendo sistematizado
ou citado, além das muitas reflexões e estudos que talvez fossem pertinentes ao contexto
desta dissertação e que não foram efetivados por diferentes motivos.
133
Para finalizar – mas sem concluir –, entendo que a realização desta pesquisa foi um
trabalho muito produtivo, além de prazeroso e, espero, útil para as pessoas envolvidas no
fazer Educação. Chego ao fim desta dissertação com a sensação de que ainda tenho muito
caminho para trilhar, seja sobre essa temática ou sobre qualquer outra. Assim, utilizando as
palavras de Prigogine (1996),
“eu só tenho uma cer eza, as minhas incer ezas!”
. Suponho
que essa postura científica, marcada pela processual desestabilização de minhas certezas, se
constitui em um dos elementos mais importantes de minha aprendizagem como profissional
envolvida com Educação, o que me dá fôlego e coragem de continuar me aventurando no
campo científico, envolvida em práticas que contribuam para a produção da Ciência e para o
entendimento de sua linguagem no meio acadêmico, onde é comumente estudada, ou na
Escola (Ensino Fundamental ou Médio), onde espero que um dia ela tenha seu espaço
garantido.
t t
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SCHROEDER, Nilva. O trabalho educativo escolar no mundo das tranformações das
tecnologias. 2001. 162 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de
Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, 2001.
SILVA, Marco. A Internet na escola e inclusão. In: Integração das Tecnologias na
Educação: Salto para o Futuro / Secretaria da Educação a Distância. Brasília:
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_______________. Sala de aula interativa. Rio de Janeiro: Quartet, 1999.
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culturais em Educação.
Rio de Janeiro: Vozes, 1995.
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humano
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Belo Horizonte: Autêntica, 2000.
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currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
_____________________. Identidades terminais
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Petrópolis: Vozes, 1996.
140
SILVEIRA, Rosa M. Hessel. “Olha quem está falando agora!”- A escuta das vozes na
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SILVEIRA, Rosa M. Hessel. A entrevista em educação – uma arena de significados. In:
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TAJRA, Sanmya Feitosa. Informática na educação: novas ferramentas para o
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VALIATI, Eliane Regina de Almeida. Elaboração e avaliação de um guia de
recomendações para auxílio no desenvolvimento de interfaces com usabilidade
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______________________. Olhares. In: In: COSTA, Marisa Vorraber (org.). Caminhos
Investigativos: novos olhares na pesquisa em Educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
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Sulina, 1995.
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XAVIER, Maria Luiza Merino. Os incluídos na escola: o disciplinamento nos processos
emancipatórios. Tese de doutorado. PPGE Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
2003.
142
APÊNDICES
143
APÊNDICE A
144
CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA TÉCNICA PAROBÉ
Apresento neste material em anexo uma breve caracterização da Escola que se
constitui na Unidade de Pesquisa desta dissertação. Tais informações foram retiradas
basicamente do site da Escola.
A Escola Técnica Parobé oferece para a comunidade Ensino Médio e Ensino Técnico.
Os cursos técnicos oferecidos têm duração de 2 anos e são: Edificações, Eletrônica,
Eletrotécnica, Mecânica e Estradas. Já o Ensino Médio tem como objetivos a “formação de
um cidadão crítico e responsável, capaz de tomar decisões adequadas aos problemas do
cotidiano. Além disso, visa a preparação do aluno para o trabalho” (da fonte citada).
A escola foi criada em 1906, por professores da Escola de Engenharia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tendo como patrono o ex-
diretor da Engenharia, Professor Engenheiro João Pereira Parobé. Ao longo
de quase 100 anos, formou técnicos e cidadãos disputados pelas empresas
e com destaque na sociedade. (http://www.cteparobe.com.br)
A escola possui uma estrutura que conta com laboratórios de Física, Química,
Biologia, Informática e ainda uma Biblioteca. O Ensino Médio conta com dois laboratórios de
Informática e o 1° ano contêm na grade curricular (carga horária) aulas de Informática
Básica. Com relação ao “currículo” constitui-se
[...] de duas partes: uma base nacional comum, que engloba 75% do
conteúdo, dividida em três áreas de conhecimento e outra diversificada, que
corresponde aos 25% restantes.
As áreas de conhecimento que fazem parte da base nacional comum são:
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, constituídas pelas disciplinas de Língua Portuguesa,
Língua Estrangeira, Arte, Informática e Educação Física; Ciências da Natureza, Matemática e
suas Tecnologias, constituídas pelas disciplinas de Matemática, Física, Química e biologia;
Ciências Humanas e suas tecnologias, constituídas pelas disciplinas de História, Geografia,
Filosofia, sociologia e Relações Humanas (http://www.cteparobe.com.br)
A comunidade escolar se organiza em iniciativas e grupos como: Grêmio Estudantil,
Clube da Melhor Idade, Grupo de Escoteiros, Estação de Radioamador, Centro dos
Professores, Associação Ex-Alunos e Associação de Engenheiros Professores.
145
APÊNDICE B
146
Sistemas de Busca da Plataforma Lattes: quais são?
A Plataforma Lattes, que se constituiu na ferramenta de pesquisa utilizada
durante esta investigação, conta com inúmeros sistemas de busca, que podem ser
explorados livremente por qualquer pessoa que acessar a internet e sítio do CNPq. A
seguir explicarei alguns recursos disponíveis e apresentarei as imagens das telas de
buscas da Plataforma Lattes capturadas no endereço http://cnpq.br/lattes
. Vale
ressaltar que este material refere-se somente aos sistemas e respectivas telas que
foram exploradas pelos estudantes da turma 1N1 da Escola Parobé durante a
experiência pedagógica realizada.
Tela Principal Plataforma Lattes
No menu “Buscas” da tela principal da Plataforma, partindo do link Currículo Lattes,
podemos acessar os currículos dos pesquisadores cadastrados a partir de três opções: “Por
Currículos”, “Por Pesquisadores C” e “Por Produção”.
147
Tela de busca por currículo
A busca por currículo pode ser realizada através do nome do pesquisador ou por
assunto (no qual o pesquisador desenvolve suas atividades científicas). Podemos ainda
utilizar filtros que facilitam a busca específica do currículo: Formação Acadêmica, Atividade
Profissional, Área de Atuação e Idioma, Produção C,T e A e Pesquisador. O Sistema mostra
como resultado os últimos 25, 50 ou 100 registros de currículos atualizados nos últimos 18
meses de acordo com a opção feita pelo usuário.
Vou dar um exemplo de busca na tentativa de explicar na linguagem escrita o que é
compreendido interativamente na linguagem digital: posso realizar uma busca por currículos
escolhendo “Por assunto” utilizando como palavra chave o tema desta dissertação
“alfabetização científica”, encontrarei cerca de 1035 currículos de pesquisadores vinculados a
esta temática; “alfabetização tecnológica245 currículos; “alfabetização digital” 240
currículos, se quisesse obter mais detalhes como por exemplo, quantos destes pesquisadores
atuam na Região Sul, posso aplicar um filtro que neste caso seria “Atividade Profissional”.
Assim, o sistema de Busca da PL analisa em sua base de dados todos os currículos tendo
como parâmetros além do assunto, pesquisadores que realizem atividades profissionais no
país Brasil e na Região Sul desta forma saberei quantos pesquisadores atuam na Região Sul
pesquisando esta temática. Foi basicamente este tipo de exploração, usando diferentes
parâmetros pré-estabelecidos, que as alunas e alunos da turma 1N1 da Escola Parobé
utilizaram para pesquisarem currículos na Plataforma Lattes.
Tela Busca Avançada
148
Tela busca avançada com filtros.
149
APÊNDICE C
150
Cesare Mansueto Giulio Lattes, foi um físico brasileiro que nasceu em Curitiba no
dia 11 de julho de 1924 e faleceu dia 8 de março de 2005 em Campinas, no Hospital das
Clínicas da UNICAMP.
César Lattes, como ficou conhecido, foi da primeira turma de física da Faculdade de
Filosofia e Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP) e se graduou em 1943.
Depois de formado, foi trabalhar no exterior, conseguiu reconhecimento mundial ao
comprovar experimentalmente a existência de partículas subatômicas. Em 1949 retornou ao
Brasil, onde ajudou a criar o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, entidade da qual nunca
se afastou. Dois anos mais tarde, participou da fundação do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o CNPq.
Sua carreira científica teve início em meados dos anos 40, no então Departamento
de Física da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo,
quando publicou trabalho científico sobre a abundância de núcleos no universo, sob a
orientação de Gleb Wataghin.
Desde então teve seu nome ligado a resultados científicos da maior repercussão e
a iniciativas das mais fecundas para o progresso da ciência no Brasil e na América do Sul. A
descoberta do píon em 1947, em colaboração com G.Occhialini e C.F.Powell, foi o marco
em sua carreira que se fez acompanhar das mais significativas conseqüências.
Por sua descoberta e sua contribuição ao conhecimento científico, Lattes foi
incluído como verbete na Enciclopédia Britânica e em outros livros sobre a história da
ciência. O professor Cesár Lattes, foi um nome importante para a ciência brasileira. O
reconhecimento internacional que o curitibano conseguiu em sua carreira trouxe notoriedade
e investimento para o país.
Apesar de toda a contribuição para o desenvolvimento da física nacional e mundial,
Lattes não conseguiu abocanhar o prêmio mais cobiçado entre os cientistas: o Nobel. Em
verdade, passou de raspão por ele em duas ocasiões. Na primeira, Powell foi agraciado, em
1950, com o método de emulsão fotográfica que desenvolveu. Apesar da contribuição de
Lattes para o avanço, ele não fez o suficiente para dividir a honraria com a dupla, interpretou
a Academia Real de Ciências da Suécia. Na segunda, poderia ter ganho com Gardner, pela
descoberta do méson pi em acelerador de partículas, mas o americano morreu cedo, e a
academia não premia cientistas falecidos.
151
APÊNDICE D
152
Prezado(a) colega.
Durante segundo semestre deste ano trabalhei semanalmente com a turma 1N1
no Laboratório de Informática, com vistas a obtenção de material empírico para a
elaboração de dissertação de mestrado ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA-TECNOLÓGICA-
DIGITAL E PLATAFORMA LATTES: QUAIS POSSIBILIDADES? no Programa de Pós-
Graduação em Educação da UNISINOS.
Agora, ao encerrar minhas atividades preciso da ajuda de professoras e
professores da turma e assim peço a colaboração de vocês respondendo as
perguntas que seguem.
Agradeço a ajuda,
Patrícia Nunes [email protected]
QUESTIONÁRIO – TURMA 1NI
DISCIPLINA: ___________________________________________
PROFESSOR(A):_________________________________________
1) Como você caracterizaria a turma 1NI?
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
____________________________________________use o verso, se necessário!
2) Você utiliza a Informática (editores de texto, planilhas de dados, correio eletrônico
ou Internet) cotidianamente? Para quais finalidades?
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
3) Você acha importante que os alunos e alunas aprendam informática na escola? Por
quê?
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
___________________________________________________________
4) Você utiliza recursos tecnológicos(vídeo, retroprojetor, slides, multimídia, etc.) em
sala de aula? Com quais finalidades? Em quais ocasiões?
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
___________________________________________________________
5) Você tem/teria interesse em utilizar a Informática como recurso pedagógico? Por
quê?
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
___________________________________________________________
6) Você aceita/estimula que os estudantes utilizem a Internet como recurso de
pesquisa? Justifique.
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
___________________________________________________________
153
APÊNDICE E
154
QUESTIONÁRIO 1
1. Você já tinha contato com a Informática antes de ingressar na escola?
Em quais lugares?
2. Você utiliza a informática atualmente fora da escola? Com que
freqüência? Em que ocasiões?
3. Você já havia utilizado a Internet anteriormente? Onde?
4. Destaque algumas atividades e programas utilizados em sala de aula
que mais lhe agradam.
5. Quais as maiores dificuldades que enfrenta nas aulas de informática?
6. Acha importante aprender Informática na escola? Por quê?
155
QUESTIONÁRIO 2
1. Você trabalha ou só estuda? O que faz nas horas vagas?
2. Você costuma assistir televisão? Cite quais os programas que você
assiste?
3. Que tipo de músicas você ouve?
4. Costuma ler livros, revistas, jornais, história em quadrinhos, etc?
Quais?
5. Quando acessa a Internet fora da sala de aula quais sites visita (ou
gostaria) de visitar ou conhecer?
156
APÊNDICE F
157
PROJETO PLATAFORMA LATTES
25/10/05
Busca por assunto:
Nº de Resultados encontrados:
Selecionar 10 pesquisadores
Gênero Masculino
Feminino
Nível de formação
Atuação Profissional
(Estado)
e-mail
Atua em projetos de
pesquisa?
SIM NÃO
Tem livros ou capítulos de
livros publicados?
Qual?
SIM NÃO
Área de atuação
Destaque um tipo de produção que considera interessante deste
pesquisador/pesquisadora
158
APÊNDICE G
159
QUESTIONÁRIO
1. Você já tinha conhecimento da existência da Plataforma Lattes antes
de ser selecionado para bolsa de IC?
2. Você sentiu dificuldade(s) para preencher o seu Currículo Lattes?
Especifique.
3. Você costuma utilizar os Sistemas de Busca da Plataforma Lattes?
Para quais tipos de pesquisa?
4. Conhece e ou utiliza os filtros de busca disponíveis na Plataforma
Lattes? Acha que os mesmos são fáceis de operar e eficazes na
pesquisa?
5. Conhece os demais dados disponibilizados na Plataforma (relatórios
e demais sistemas de busca)?
160
APÊNDICE H
161
PROJETO PLATAFORMA LATTES
08/11/05 – PESQUISA REFINADA (FILTROS)
Busca por assunto:
Nº de Resultados encontrados:
Perguntas:
ATENÇÃO - FILTRO: FORMAÇÃO ACADÊMICA
1. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras estudam a FEBRE AFTOSA e se formaram na
Região Sul?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
2. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras estudam a FEBRE AFTOSA e se formaram na
Região Norte?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
3. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras estudam a FEBRE AFTOSA e se formaram no
Estado do Rio Grande do Sul?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
4. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras estudam a FEBRE AFTOSA e se formaram no
Estado de Santa Catarina?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
5. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Graduação estudam a FEBRE AFTOSA e se
formaram no Estado do Rio Grande do Sul?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
6. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Mestrado estudam a FEBRE AFTOSA e têm
formação acadêmica realizada no Estado do Rio Grande do Sul?
162
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
7. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Mestrado estudam a FEBRE AFTOSA no
Estado do Rio Grande do Sul e que são formados na UFRGS?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
8. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Especialização estudam a FEBRE AFTOSA
no Estado do Rio Grande do Sul que são formados na PUCRS?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
ATENÇÃO - NOVO FILTRO: ATIVIDADE PROFISSIONAL
9. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Especialização estudam a FEBRE AFTOSA
que se formaram no Estado do Rio Grande do Sul e que trabalham / atuam na PUCRS?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
10. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Especialização estudam a FEBRE AFTOSA
que se formaram no Estado do Rio Grande do Sul e que trabalham / atuam na UFRGS?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
11. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Especialização estudam a FEBRE AFTOSA
que se formaram no Estado do Rio Grande do Sul e que trabalham / atuam em projetos
de pesquisa na UFRGS?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
12. Quantos pesquisadores ou pesquisadoras com Doutorado estudam a FEBRE AFTOSA que
se formaram no Estado do Rio Grande do Sul e que trabalham / atuam em Ensino de
Graduação na PUCRS?
FILTRO
UTILIZADO
Parâmetro Nº de resultados
encontrados:
Destaque 1
pesquisador:
163
APÊNDICE I
164
PROJETO PLATAFORMA LATTES
21/11/2005
BUSCA AVANÇADA POR ASSUNTO E ÁREA DE CONHECIMENTO
AIDS
FILTRO
UTILIZADO
ÁREA E
GRANDE ÁREA
Nº de resultados
encontrados
Destaque 1 produção
de 1 pesquisador ou 1
pesquisadora
ÁREA DE
ATUAÇÃO
Livros Grátis
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Milhares de Livros para Download:
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