Nos anos 1950 e 1960 a libertação feminina passa pelo controle da fecundidade, o
que vem a gerar uma reivindicação pela disposição do próprio corpo, na forma da
tentativa de legalização da contracepção, refere Mossuz-Lavau. A gravidez, nesse
contexto, se indesejada, é tida como algo que lesiona o livre exercício das potencialidades
femininas, pois passa a ser compreendido que a mulher “já não é apenas mãe” (1995, p.
80). Isso porque, com contraceptivos eficazes, a maternidade torna-se escolha e não mais
pode ser caracterizada como destino natural, o que permite que a mulher adquira
também outros papéis sociais.
O advento desses novos métodos contraceptivos está, para Lefaucheur, na origem
da “revolução das relações entre os sexos no que respeita à iniciativa e ao controlo da
concepção e, talvez, ao conjunto da vida sexual”. A pílula anticoncepcional,
especialmente, reduz as limitações nas relações sexuais e é muito mais confiável do que
os métodos anteriormente utilizados. Ressalta-se que os novos métodos contraceptivos
são de iniciativa feminina, permitindo às mulheres a decisão antecipada sobre a
concepção gerada pelas suas relações sexuais, sobre o número de gestações a que querem
se expor, bem como sobre o momento em que pretendem ter filhos. Deixa-se, então de
evitar os filhos, passando-se a desejá-los. A utilização desses métodos também permite às
mulheres, pela primeira vez, a não exposição contra a sua vontade ao risco de uma
gravidez, fazendo com que o desejo de paternidade também se torne tributário da
vontade da maternidade (1995, p. 489 e 490).
Foi a utilização de métodos contraceptivos, especialmente da pílula
anticoncepcional, fundamental para a explosão da sexualidade verificada durante os
anos 1960, afirmam Toscano e Goldenberg. Nesse contexto, a mulher passa a ser vista
como um ser com necessidades sexuais, que devem ser satisfeitas pelo seu parceiro. Ao
mesmo tempo, a não repressão do desejo não era mais somente uma regra masculina.
Foi porque o prazer sexual estava dissociado da procriação e a decisão acerca de ter um
filho era algo que podia e devia ser planejada que o exercício da sexualidade foi
modificado (1992, p. 70 e 71).
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Essa nova visão acerca da mulher também está
profundamente conectada com a segunda onda do movimento feminista, que emerge
nesse período.
2.1.2.1.2 A emergência do movimento feminista
A emergência do movimento feminista nessa época não se constitui num fator
isolado. Está profundamente associado com essa dissociação entre o exercício da
sexualidade e a reprodução, a partir da possibilidade do controle da fecundidade, bem
como com a emergência de novas mulheres, que tinham maior acesso à educação e que
entraram no mercado de trabalho. Diante disso, buscam modificações nas suas vidas,
reivindicando, a partir de uma mobilização, direitos.
As mobilizações feministas ocorridas nos anos 1960 e 1970 foram em grande
parte reflexo dos conteúdos políticos produzidos nesse contexto histórico (DURAND;
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O medo da gravidez, segundo as autoras, sempre foi uma espécie de freio ao livre exercício da sexualidade
feminina. Por isso a pílula era vista como uma verdadeira revolução no controle da sexualidade, já que seria
possível a busca do prazer sexual sem estar presente a preocupação com uma gestação indesejada. A gravidez
passa a ser uma opção, e não uma obrigação à qual todas as mulheres estão sujeitas e o exercício da sexualidade
passa a ser possível para mulheres de diferentes idades e dentro ou fora do casamento (TOSCANO;
GOLDENBERG, 1993, p. 71).