Download PDF
ads:
ALLAN PINHEIRO DA SILVA
COTIDIANO E GUERRA NOS CINEMAS DE BELÉM (1939-
1945)
MESTRADO EM HISTÓRIA SOCIAL
PUC/SP
São Paulo
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
ALLAN PINHEIRO DA SILVA
COTIDIANO E GUERRA NOS CINEMAS DE BELÉM (1939-
1945)
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC/SP, como exigência parcial para a obtenção do
título de Mestre em História Social, sob a orientação
da Prof. Dra. Maria Odila da Silva Dias.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
São Paulo
2007
ads:
3
Banca Examinadora:
_______________________________
_______________________________
_______________________________
4
AGRADECIMENTOS
Tarefa difícil agradecer a tantas pessoas que contribuíram ao longo de dois
anos de elaboração da dissertação. Nesse percurso várias eventualidades
ocorreram para a produção da dissertação, porém foram superadas. Espero corrigir
alguns equívocos da monografia e fazer os devidos agradecimentos.
Inicialmente agradecer a Darlene, do Colegiado de História da UFPA, pelo
apoio constante nos anos da graduação e da pós-graduação. Ao professor e amigo
Décio Guzman pela orientação no projeto e pelos poucos, porém produtivos debates
a cerca da temática pesquisada.
Aos profissionais da Biblioteca Arthur Viana do CENTUR (Setor de
Microfilmagem), Marcos, Simone e Antônio pela grande colaboração e esforço para
ajudar no que fosse possível em relação ao material disponível para a pesquisa do
jornal Folha do Norte.
Ao professores do Programa de Pós-Graduação em História Social da
PUC/SP, especialmente para as professoras Estefânia Knotz, Márcia D’Alessio, Olga
Brites, Denise Bernnuzzi, com as quais o contato intelectual influenciou na
construção deste trabalho. Não esquecendo a secretária do Programa: a famosa
Betinha. Bem como ao CNPq por financiar as pesquisas para a elaboração da
dissertação.
Aos professores que participaram da banca de qualificação, momento
importante para direcionar os rumos tomados na pesquisa e escrita do trabalho,
Janes Jorge e Antonio Pedro Tota. Ao professor Tota devo agradecer pelos debates
em sala de aula e extra-classe, com a exibição de filmes relacionados a ideologia do
“Motion Picture”.
Aos amigos, Cláudio Barbosa, Leônidas (primo) e Luiz, que em diversos
momentos incentivaram a construção deste trabalho, assim como os que conheci
durante minha estadia em São Paulo, abraços Gê, Laci e Lailson. Ao da pós-
graduação: Luana, Mayara e Lene (que caminham comigo desde a graduação na
UFPA), Karine Simey, Paulo, Márcia, Maura, Nivaldo, Agenor, Érika, Herlon, Liliane,
Leno, Toninho. Não poderia deixar de falar do nobre amigo Ipojucan, grande
intelectual com o qual pude (e posso) conviver e “abstrair” o máximo de
conhecimento referente aos estudos da História.
5
Agradecimentos a minha orientadora Maria Odila, pela paciência com o
cumprimento dos prazos e pelas interferências para melhorar o desenvolvimento do
trabalho.
Aos meus pais Eliana e José por acreditarem no meu amor pelo estudo da
História, tendo minha mãe se tornado a principal incentivadora para o ingresso no
Programa de Pós-Graduação em História da PUC/SP, meu sincero amor. Aos meus
irmãos Andrey, amigo dileto que nas ocasiões angustiantes muito me ajudou, e
Tatiane (companheira e amiga com a qual me confortei por estar longe de casa).
Agradeço a minha sogra Clara e meu sogro Amilton e a minha nova família,
pela alegria que tem me proporcionado. Minha companheira e esposa Cleonice, pelo
apoio, amor e compreensão nesses oito anos de convivência. Obrigado por tudo, eu
te amo. Amo também o meu filho, que completou sete meses de vida e nasceu no
meio desse outro processo de “gestação”.
6
RESUMO
A dissertação discute o cinema em Belém durante a Segunda Guerra Mundial,
envolvendo o cotidiano das salas de projeção, a influência dos filmes
hollywoodianos, a passagem dos artistas na cidade, a produção cinematográfica na
Amazônia com Libero Luxardo, a veiculação das informações sobre o conflito
através dos cinejornais e filmes de longas metragens, a propaganda dos países em
guerra e a participação do poder público e outros setores sociais e estatais
comprometidos, direta ou indiretamente, no conflito.
A partir dos anúncios e artigos relativos ao cinema em Belém, publicados no jornal
Folha do Norte e na revista A Semana, a pesquisa procurou refletir sobre a relação
do cinema com a sociedade, como espaço de sociabilidade e propaganda. Nesta
perspectiva procurou-se visualizar como as exibições dos filmes referentes ao
conflito e a utilização das salas de projeção modificaram-se no decorrer do conflito,
assumindo inicialmente uma postura “neutrae com a entrada do Brasil na guerra
aderindo a política antinazista dos países Aliados. Considera-se que esses discursos
apresentados nos filmes procuraram enfatizar a política de Boa Vizinhança
encampada pelo governo norte-americano e pelas pelos principais estúdios
cinematográficos dos Estados Unidos, uma vez que a maioria das películas exibidas
nos cinemas da capital paraense foi produzida em Hollywood.
Assim, buscou-se interpretar a atuação dos sujeitos sociais como partícipes
importantes na construção da relação do cinema como espaço de interesses
diversos, ganhando, durante o segundo conflito, destaque por ser um dos principais
meios de comunicação de massa utilizados na propagação de ideais e interesses
políticos.
Palavras-chave: cinema, política, cotidiano, Segunda Guerra, cidade, propaganda,
antizanismo, Estado Novo.
7
ABSTRACT
The dissertation discuss the cinema in Belém during the World War Second,
involving the daily of the projection rooms, the influence of the hollywood movies, the
passage of artists on town, the cinematographic production in Amazônia with Libero
Luxardo, the transmission of informations about theconflict down the newspaper
cinema and lenght movies, the advertising of countries in war and participation of
public power and others social and state sectors engaged, direct or indirect in conflit.
Begining from advertisement and relatives articles for the cinema in Belém, published
at the Folha do Norte newspaper in the A Semana magazine, the research looked
for reflect about the relation of cinema with the society as space of sociability and
advertising. In this perspective, looked for visualize how the exhibitions of movies
referring to conflit and utilization of projection rooms modify during the conflit,
assuming initialy a “neuter” posture and with the entrance of Brazil in the war
adhering the antinazi of allied countries.To consider that those discourse presented
in the movies looked for emphasize the good-neighborhood politic conducted by
north american government and by principal cinematographic studios of United
States, so the majority of movies exhibited in the cinemas of paraense capital were
produced in Hollywood. So, searched to interpreted the performance of social fellow
as important integrant in the construction of relation of cinema as space of several
interests, winning during the second conflit prominence by to be a for the principal
mass media used in propagation of ideal and politic interests.
Keywords: Cinema, Politic, Daily, Second War, Town, Advertising, Antinazi and New
State.
8
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 09
CAPÍTULO I – O cinema no cotidiano de Belém durante a Segunda Guerra 19
1.1 O cinema em Belém: da chegada do Vistacope ao início da Segunda
Guerra
20
1.2 O “fans” e os artistas em trânsito por Belém 38
1.3 Líbero Luxardo e o cinema na Amazônia 51
CAPÍTULO II – A guerra nos cinemas de Belém: a propaganda nos anúncios
de cinema
69
2.1 A guerra nos cinemas: os filmes e cinejornais norte-americanos 70
2.2 Nem tudo é Hollywood: Alemanha e Itália também produzem filmes 81
2.3 Agora é guerra: a propaganda antinazista nos cinemas 92
CAPÍTULO III – Em tempos de guerra, todos devem lutar 111
3.1 Cinema e Estado: as sessões de filmes educativos 112
3.2 Estamos na luta: a exibição de filmes de guerra 123
CONSIDERAÇÕES FINAIS 143
FONTES E BIBLIOGRAFIA 146
ANEXOS 154
9
APRESENTAÇÃO
10
Desde a primeira apresentação das imagens em movimento feita pelos
irmãos Lumiére no dia 28 de dezembro de 1895, no Grand Café, no Bulevar de
Capucines, em Paris, o cinema vem se desenvolvendo como arte de entretenimento
e, posteriormente, como arma política e de propaganda com o decorrer da Primeira
Guerra. Com aparência inocente de exibir imagens do real, logo foi percebido como
uma importante arma política. Propagado pelo mundo, o cinema se destacou por
suas formas de iludir o blico e levá-lo a um mundo imaginário de encantos e
prazeres.
O cinema passou a destacar-se não pelas imagens em movimentos
criadas a partir de um aparelho, mas também, por seus espaços físicos construídos
para servir à exibição dessas imagens. Essa “perfeita” combinação vem alegrando o
público até os dias atuais, constituindo uma importante força de propagação de
idéias.
Em Belém, as exibições dessas imagens vieram logo em seguida a sua
estréia na Europa. Desde a primeira exibição na cidade, em dezembro de 1896, a
o início da Segunda Guerra Mundial foram criadas várias salas de projeção para a
exibição de filmes. Diante de várias dificuldades encontradas na coleta de
documentos, estudar o cinema em Belém remete à reconstrução do cotidiano
citadino da população e sua interação com as salas de projeção e exibição de
filmes.
Isto ocorre devido o cinema local, enquanto produção, ser bastante incipiente
e muito onerosa na sua execução. Contudo, a partir da década de noventa do século
11
desses vestígios históricos deixados pelo cinema em Belém. Não os filmes
referentes à Segunda Guerra Mundial, ou produzidos no período, que tinham o
objetivo de propaganda, mas mostrando também a sociabilidade criada no cotidiano
do público freqüentador.
1
Os estudos acerca da relação entre o cinema e história das sociedades vêm
crescendo no meio acadêmico. Com a procura de novas fontes de informação a
história diversificou-se em seu campo de pesquisa e saber. Dessa forma, surgiram
novos problemas colocados para o historiador, que não está mais preso somente ao
documento escrito, mas buscando novos métodos de pesquisa historiográfica. O
cinema aparece para o historiador como uma inesgotável fonte para as suas
pesquisas.
Para Costa (1987, p. 26), o cinema:
(...) é aquilo que se decide que ele seja numa determinada sociedade, num
determinado período histórico, num certo estágio de seu desenvolvimento,
numa determinada conjuntura político-cultural ou num determinado grupo
social (...)
2
.
Ou seja, o cinema se estrutura a partir da sociedade em que está inserido,
viabilizando formas de pensamentos e representações que podem ser observados
nas películas.
Estudar o cinema em Belém é um grande desafio, uma vez que na
elaboração desta dissertação trabalhou-se com o espaço físico representado nos
periódicos da época como espaço de convivência no cotidiano dos freqüentadores e
fonte de informação sobre o conflito mundial e propaganda dos países em guerra.
Pretendeu-se, ainda, trabalhar com a análise dos anúncios dos filmes referentes ao
conflito e sua repercussão na imprensa local.
Verifica-se, portanto, a importância do cinema enquanto fonte para os estudos
históricos. Esse destaque dado à relação entre o Cinema e a História ganhou
projeção a partir da década de 70 do século XX, sendo gradativamente incorporado
como objeto de estudo da história e, nesse sentido, Ferro (1992) destaca-se por ser
o primeiro historiador a sistematizar a problemática da relação Cinema e História.
1
Percebe-se, a partir dos diálogos com as fontes pesquisadas, que os artigos e anúncios referentes aos cinemas
em Belém trabalhavam com a idéia de sociedade, ou seja, ao falar sobre os eventos ocorridos nas salas de cinema
ao invés de falar público freqüentador era escrito sociedade.
12
Em seu livro Cinema e História,
3
Ferro (1992) traz diversos ensaios que
deram base para os debates que decorreram a partir da cada de setenta até os
dia atuais, inclusive para os estudos aqui discutidos. Para ele, o cinema é visto por
dirigentes políticos como um meio de propaganda que, bem utilizado, pode ter
grande efeito na sociedade, sendo que trabalha o cinema como agente da história.
O filme, aqui, não está sendo considerado do ponto de vista semiológico.
Também não se trata de estética ou de história do cinema. Ele essendo
observado não como uma obra de arte, mas sim como um produto, uma
imagem-objeto, cujas significações o são somente cinematográficas. Ele
não vale somente por aquilo que testemunha, mas também pela abordagem
sócio-histórica que autoriza.
4
Pode-se destacar da leitura do autor que ele não está preocupado com a
análise dos filmes enquanto obra de arte, ou mesmo fazer uma história do cinema.
Sua preocupação é estudar os filmes enquanto produto social moldado a partir do
contexto histórico em que está inserido e da sociedade que o produz.
Leif Furhammar e Folke Isaksson, no livro Cinema e Política,
5
procuram
discutir o cinema a partir da primeira guerra, como instrumento político com fins de
propaganda. Segundo eles, “(...) geralmente os filmes de propaganda são tanto um
meio de explorar um dado clima de opinião como o de exercer uma influencia (...)
6
.
Por isso, a importância de analisar o momento histórico, social, político e cultural
para travar o debate entre cinema e história.
Continuam suas idéias questionando que a velha idéia de que os filmes
podem ser considerados apenas como diversão ou arte, ou eventualmente ambos, é
atualmente encarado com crescente ceticismo (...)”. E acrescentam ainda:
É amplamente reconhecido que os filmes refletem também as correntes e
atitudes existentes em uma determinada sociedade, sua política. O cinema
não vive num sublime estado de inocência, sem ser afetado pelo mundo,
tem também um conteúdo político, consciente ou inconsciente, escondido ou
declarado
7
.
2
COSTA, Antônio. Compreender o cinema. Tradução: Nilson Moulin Louzado. Rio de Janeiro: Globo, 1987, p.
26.
3
FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
4
Ibid., p. 87.
5
FURHAMMAR, Leif e ISAKSSON, Folke. Cinema e Política. Tradução de Júlio Cezar Montenegro. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1976.
6
Ibid., p. 13.
7
Ibid., p. 06.
13
Como debatido, o cinema não deve ser encarado somente como um
produto de diversão ou uma obra de arte a ser visualizada e apreciada, mas também
como um produto da sociedade em que está inserido, possuindo conteúdo político,
que pode estar implícito ou explicito nas películas. Por isso, o trabalho do historiador
com o cinema deve apontar para essas problemáticas, que também fazem parte da
própria organização da sociedade.
A maioria dos estudos referentes ao cinema na capital paraense parte por
uma análise estética, ou da história do cinema ou desenvolvendo debates acerca da
crítica. A pequena contribuição deste trabalho para a historiografia local tem como
ponto de partida fazer uma leitura histórica do cinema, dando visibilidade para a
apresentação dos filmes (com características de propaganda política e também de
estilos de vida) nos cinemas da cidade, o cotidiano nos espaços de projeção e
também seu reflexo no contexto histórico.
Poucos são os trabalhos referentes ao cinema na cidade. A produção
historiográfica local parte de poucos trabalhos acadêmicos, de cinéfilos ou críticos
de cinema. Destacam-se nessa historiografia os trabalhos de Pedro Veriano, que
escreveu dois livros. O primeiro foi A crítica de cinema em Belém e o segundo
Cinema no Tucupi. Médico de profissão e cinéfilo por opção, Veriano escreveu seu
primeiro artigo sobre cinema em 1953 e continua até hoje.
Seu primeiro livro faz um histórico da chegada do cinema em Belém, bem
como sua afirmação perante a sociedade local e, posteriormente, uma análise dos
sujeitos que iniciaram a crítica de cinema. O segundo parte para uma análise da
história do cinema, destacando personagens que fizeram e atuaram em filmes,
criadores dos espaços para a projeção e suas análises enquanto crítico de cinema.
Trabalhar com o contexto da Segunda Guerra Mundial tem um significado
muito importante, porque, mesmo estando distante do conflito, foi criado na capital
paraense um estado de pavor pela população (bem como no Brasil de uma forma
geral) devido ao perigo iminente de invasão pelo Exército do Terceiro Reich.
Roney Cytrynowicz (2000, p. 85), em seu trabalho discute sobre as
informações divulgadas no cotidiano da cidade de São Paulo enfatizando “a
utilização da imagem da guerra em meio a uma trama urbana. Imagem distante,
remota, aproximada da cidade e (re?) calcada em fantasias produzidas em São
14
Paulo para criar sensações de guerra
8
. As informações veiculadas pelo dio,
impressos e cinema reproduziram diversas fantasias sobre o perigo nazista existente
no país.
Sem dúvida, o cinema era utilizado como um componente estratégico no
conflito para criar comoção e propagar as ideologias dos países em guerra. Segundo
Virilio (1993, p. 15), os filmes foram importantes instrumentos de guerra.
À medida que os modernos combatentes estão decididos a invadir a
totalidade destes campos, impõe-se a idéia de que o verdadeiro filme de
guerra não deve necessariamente mostrar cenas de guerra em si ou de
batalhas. O cinema entra para a categoria das armas a partir do momento
em que está apto a criar a surpresa técnica ou psicológica
9
.
O desenvolvimento do cinema como arma de propaganda ocorre
concomitantemente com a indústria lica, devido o fato de o cinema ser
considerado como uma importante arma psicológica e de representação durantes os
conflitos, viabilizando mais uma frente de combate, destacando outros filmes que
não falam necessariamente sobre o conflito, todavia criavam certa comoção social.
Pesquisar o cinema como frente de combate, sua representação psicológica
perante o público que freqüentava as salas exibidoras durante a Segunda Guerra e
os filmes sobre o conflito, como forma de propaganda dos países envolvidos na
guerra, tem uma visibilidade bastante significativa em Belém.
A imprensa local publicava diversos anúncios e artigos sobre as películas de
guerra. Verificou-se, então, a partir da análise das fontes históricas, que assim como
na Primeira Guerra, momento em que o cinema propaganda “engatinhava” para se
firmar, na Segunda Guerra os países beligerantes tiveram um amadurecimento e
avanço na utilização do cinema como instrumento político de propaganda
10
.
Dessa forma, trabalhar com fontes que possam mostrar o cinema como palco
do cotidiano urbano dos belenenses e da veiculação de informação sobre a guerra
resultou na pesquisa do jornal Folha do Norte e a revista A Semana para, assim,
8
CYTRYNOWICZ, Roney. Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda
Guerra Mundial. São Paulo: Geração Editorial: Editora da Universidade de São Paulo, 2000. p. 85.
9
VIRÍLIO, Paul. Guerra e cinema. São Paulo: Scritta Editorial, 1993, p. 15.
10
Sobre o cinema e os filmes políticos e de propaganda durante a primeira guerra mundial ver: SILVA, Allan
Pinheiro da. O cinema político: a propaganda sobre os filmes bélicos durante a Primeira Guerra Mundial em
Belém. Trabalho de conclusão de curso. Universidade Federal do Pará, 2003.
15
tentar caracterizar a partir da imprensa, o funcionamento dos cinemas quanto ao
anúncio, à exibição de filmes, repercussão de alguns e os referentes ao conflito.
Os poucos vestígios documentais deixados pela história em relação ao
cinema em Belém, remete-nos à imprensa escrita, uma vez que poucos foram os
filmes produzidos na região e, nesses casos, muitos já se perderam enquanto
documento histórico.
A datação proposta na pesquisa são os anos em que decorreram a Segunda
Guerra Mundial, de 1939 a 1945. Sendo que no jornal Folha do Norte encontrava-se
disponível para pesquisa todos os anos referentes à guerra. Porém, para a pesquisa
da revista A Semana foram disponibilizados os anos de 1939 a 1942.
O jornal Folha do Norte era distribuído diariamente na cidade. Na década de
quarenta o jornal passou a ter um segundo caderno chamado Folha Vespertina, que
posteriormente tornou-se independente. Todos os dias havia os anúncios dos
cinemas. Neste período duas empresas dominavam o ramo de salas exibidoras de
filmes: Cinematographica Paraense Ltda e Cardoso e Lopes. Cada uma possuía em
média cinco salas de cinema e era reservado um espaço no esq66834.331.33117( )278]TJ(p)5.67474R85(p)-4.33821(c)9.71032(a)25.67ou5(d)-4.J/R47 12 Tf3.74.J/R47 12 Tf3.74.J16558(e)-4.33056(r)2.80p oreis2.80p es2.45rdisa toddiscu61188(u)-4.33117()3dis, eist erdeuerío142(a)-.33117(r)2.80561(í)7.174( )-292.336(s)-0.23(p)-22.17747.49466( )-s es2.72.384(i)1.879(e)-4.33117(r)2.804-458 17(p)5.6742( )-362.33117(r)2.80T3h1.33117( )24.33h67474(e)-4.331poha e do74.6rps2.417( )271474(e)5.311ea tod0.295585(t)-2-32.1821MR7( )-112.229(e)-4.33.3343117(74.6)-4.7(i)1..337 easaid-0.295585( e.295585( e.295585( e.295585( e.2950áe.295585( e.2950áe.2953-4.7(i)(e)-4.33117( )-32.1820561(a)5)2.804-458 17(p)5.6a(a)-4.33117( )67718(t..33785e)-4.33117(r373113117)-2.33117( )-22.1774(t)-2.16558(o)5117(r3731151.87(s)58(o)5117(r3731151.87(s)154(e)-4.331177(r)2.80T3h1.33117( )221117(r)2.804-458 73(t)-2.164-4.33117(0.295)-102.2 e.295585( e.2950áe.295585( e.2950795585( e.295585( e.29532d)-2187(N)1.57442(2háe.295585( e.2950áe..aa)-4.32873(s)-0.2931485( e.2950795585( e.29-0.295585(t)-2-32.182156r)2.80439.e..aa)-4.32873(s)-h4.33.3343117(74.6)-4117(r373693e.6)-411(p)-4.33117117hi)1.87(s2.417( )271474(eu8i)1.87(s)-0.23s45 -20.64 Td[(d)-4.33056(a2154(d)-4.3336(j)1.87125u33117(u)-4.3316(j)1.8712591821MR7( )-112.229(e)-4.33.334u335.2591821MR7( )-112.229(e)e2.341(e)5.67229(n)-4.3287-112.22937( )271474(u8i)1.87(s)q(e)-4.33115c6)-4.32873(q)5.67718(u)-4.32873(a)-4.33.33564z(n)5.67474(ae536436( )-82.2116(N)1.57564(a)5.67474()556.002]TJ-4.33117( 3102.225(c)-0C7(i)1.87(s)-0.233117(c)-0.[(s)933117(c)(c)-0C7(i)1.87(s)-0.23311.33.334u335.2591821MF64(a)5.67474()556.004.32873(q)5.67713(í)7.1740í)7.13(i)1.87(s)-07474(m)-7.49466( )-10574(m)-7.49497474(m)-7.494)-4.X7442(2háe.2910/(j)1.8712591821MR8.33)1.87(s)-07474(m)-7.49417117hi)135.2591821MR7( )-0.245 -20.64 Td[(d)-4.33056(a)-4.33056( )-(e)5.67227564(a)-4.331177(p)5.672.1821(c)9.71032(a)-(s)-0747(e)5.6723117( )-62-7.4949274(a)2(a)25.6(e)5.6723117( )-62-7.493o23)-72.26-4.334.33056( )-(e)5.67225585(o)-4.33117( )-79(d-0.233117(r)2.e7(e)5.6799d)5.67713(í)7.1740í)7.032(i)1.87o)-651)2.e7(e)5.6799d)5.33117(s)-003e2.341(2.16)d)-4.J/R47 14.33361()-07)-651)2.e7(ex8i)1.87(s2.417( )271474(e17(s)-003e2.341(2.164(a)-4.331177(17(51)-4.311)-17(a)-4.33114.6)-4.7(i)1804/329(d-0(ex8i)1.87(s2.431177(17(51)-4.311)-17(a)-4.33114.6)-4.7()-4.33114.6)-433117(n)5.67474(ú)3(r)2.804-458 7(2474(ú)3(r)2.804-4533117(s)-003eC7(i)1.87(s)--2.33117( )-22.7.i)1.87(s2.0(7n)5.6.117(p)5.6742( )-362.331i)1.87(s8i)1.87(7( )-112.2211)-102.223(1125(p)-4.33.33.3113117(r)5.s)-0.295585(p)-4.3n)-411(p)-33114.6)-4.7()-a)25350áe..aas j6799dssuía em
16
proprietários Manuel Lobato e Alcides Santos (Diretor Geral). Sua localização era à
Rua da Indústria nº 33, no Bairro do Comércio.
12
Esses dois meios de comunicação foram utilizados como fontes principais. É
importante perceber como nas documentações trabalhadas os materiais escritos
sobre cinema não era vinculada somente a cidade de Belém. Vários desses escritos
vinham de outras partes do Brasil e do exterior. Não era somente Hollywood que
informava sobre suas atividades cinematográficas, mas também França, Inglaterra,
Alemanha e Itália, entre outros países que tinham uma constante produção
cinematográfica.
Esses artigos vindos de lugares diversos ocasionaram múltiplos
questionamentos sobre a estima do cinema na cidade, uma vez que, qual seria a
importância para o público das salas de projeção e para os leitores da imprensa
local saberem sobre o casamento de Greta Garbo, da situação internacional que
vivia as empresas cinematográficas norte-americanas com a guerra ou da passagem
de atores hollywoodianos pela cidade do Rio de Janeiro.
Nesse caso, o domínio de Hollywood sobre o público dos cinemas brasileiros
não se deu de imediato com a criação do cinema. Desde sua aparição em Belém até
a Primeira Guerra Mundial os filmes europeus dominaram o mercado
cinematográfico brasileiro. Os filmes vindos da França e da Inglaterra, e amesmo
da Alemanha, faziam sucesso perante o público belenense. Nesse período, o
cinema norte-americano ainda estava constituindo sua base de dominação, que veio
se concretizar nos anos posteriores ao final do primeiro conflito.
Durante a Segunda Guerra Mundial os cinemas de Belém exibiam, em sua
maioria, filmes vindos dos Estados Unidos. De Hollywood surgiam os astros e
estrelas que encantavam o público da cidade. Serviam de modelo e inspiração às
moças e rapazes que sonhavam com o glamour das telas do cinema hollywoodiano.
Greta Garbo, Joan Crawford, Gary Cooper, Henry Fonda, entre tantas outras
estrelas e astros do cinema norte-americano, eram anunciados na imprensa
13
como
mitos a serem venerados e apreciados pelo público.
12
A rua da Indústria hoje é chamada de Gaspar Viana. CRUZ, Ernesto. Ruas de Belém: significado histórico de
suas denominações. 2º. Ed. Belém: CEJUP, 1992.
13
Quando estiver trabalhando com o termo imprensa, está-se referindo ao jornal Folha do Norte e à revista A
Semana. Isso não quer dizer que não havia outros jornais e revistas em circulação por Belém nesse período.
17
Esses atores e atrizes ganhavam destaque, não nas salas de projeção,
mas também nos noticiários da imprensa. Eram veiculadas notícias sobre a sua vida
íntima, com quem se casavam; suas viagens; seus filmes de maior sucesso e quais
os artistas que eram mais apreciados pelo público da cidade.
Esse destaque dado à vida dos astros e estrelas, do funcionamento dos
cinemas em Belém, dos anúncios diários, da situação cinematográfica internacional
durante a Segunda Guerra Mundial, entre tantos encontrados, torna-se relevante
para a análise histórica do cinema nesse momento.
Na procura de vestígios que pudessem mostrar o cotidiano dos cinemas da
cidade de Belém no momento da guerra, servindo como espaço de entretenimento e
fonte de informação sobre o conflito, os anúncios tiveram papel de destaque na
análise dos discursos referentes à Segunda Guerra Mundial.
Ao trabalhar com os anúncios dos filmes e suas descrições, sendo que muito
deles foram conhecidos a partir do contato com as fontes, verifica-se que em seus
conteúdos havia um intenso caráter de propaganda, colocando os países do Eixo
como grandes “demônios” a serem exorcizados do mundo
14
. A democracia era o
grande baluarte da luta contra o nazi-fascismo.
Assim, o cinema passou a fazer parte do ambiente citadino, caracterizando
sua atuação junto ao público como uma relação amorosa parecida com os filmes de
Hollywood, imaginário na sua criação e real para quem assistia.
Um dos grandes desafios desta dissertação é falar de cinema sem
necessariamente ter assistido a maioria dos filmes exibidos durante o segundo
conflito mundial, uma vez que vários outros filmes referentes à guerra e com
finalidade de propaganda, infelizmente não puderam ser encontrados em Belém
para análise. Contudo, esses registros ficaram e podem ser encontrados e
analisados a partir dos jornais e revistas que circulavam na cidade. Assim sendo,
pôde-se também pesquisar o cotidiano dos cinemas na vida dos moradores da
cidade em um período conturbado pelo qual passava a humanidade.
15
14
Neste caso e analisado como referência os filmes produzidos pelos aliados (Estados Unidos, França e
Inglaterra) que eram a maioria exibida em Belém, mas filmes Italianos e alemães também passavam nos cinema
da cidade até o afundamento dos navios brasileiros por submarinos alemães e o rompimento das relações
diplomáticas com os países do Eixo.
15
Um dos trabalhos pioneiros no Brasil sobre o estudo do cotidiano é o da historiadora Maria Odila Leite. Sua
análise sobre as mulheres trabalhadoras (comerciantes, costureiras, lavadeiras...) que ficaram a margem do
sistema é bastante esclarecedor para se entender que o cotidiano, enquanto análise histórica, se faz através de
18
No primeiro capítulo, intitulado “O cinema no cotidiano belenense”, tenta-se
analisar, primeiramente, a chegada do aparelho reprodutor das imagens em
movimento e a consolidação dos espaços para a projeção dos filmes, discutindo-se
o cinema no cotidiano da cidade de Belém e utilizando-se artigos da imprensa local
sobre a interação do cinema com o público. Em outro ponto do trabalho, a
importância dos artistas na propagação dos ideais e da cultura norte-americana,
bem como a influência sobre os fãs da cidade, notícias sobre a atividade
cinematográfica no Brasil e no mundo. E na última parte do capítulo, a atuação do
cineasta Libero Luxardo e seu valor para a produção cinematográfica amazônica.
No segundo capítulo, “A guerra nos cinemas de Belém: a propaganda nos
anúncios cinematográficos” destacou-se, inicialmente, a análise dos anúncios e
artigos referentes aos filmes de guerra e qual o caráter político e de propaganda
desenvolvido principalmente por Hollywood dentro do contexto da Segunda Guerra
Mundial. Na segunda parte, a análise da política getulista, refletida nos anúncios
diante do contexto do conflito, pois houve uma interferência por parte do
Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda na exibição de filmes e
cinejornais nos cinemas de Belém. Com essa análise, pôde-se verificar, inicialmente,
uma ligação entre os países do eixo com o Brasil, a partir da liberação de filmes
vindos da Alemanha e Itália, e depois da declaração guerra a esses países, a
proibição. E por último, a propaganda antinazista propagada pelos Estados Unidos
nos cinemas belenenses.
No terceiro capítulo “Em tempos de guerra, todos devem lutar” foi trabalhada
a análise da participação do governo municipal e estadual na política desenvolvida
contra os regimes totalitários, bem como a participação do Comitê de Coordenação
dos Negócios Inter-Americanos no Estado do Pará e outras organizações da
sociedade civil, promovendo atividades relacionadas ao esforço de guerra do Brasil
e dos países Aliados, dentre elas a exibição de películas informativas e de
propaganda sobre o conflito.
formas peculiares de resistência e luta envolvendo os sujeitos em seu contexto histórico.
DIAS, Maria Odila
Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. São Paulo: Brasiliense, 1995.
19
CAPÍTULO I
O CINEMA NO COTIDIANO DE BELÉM DURANTE A
SEGUNDA GUERRA
20
21
Edson fazia nos Estado Unidos, em seus vários engenhos para chegar ao filme e ao
projetor que hoje se conhece
18
.
O registro da primeira exibição no Brasil das imagens em movimento ocorreu
no Rio de Janeiro na data de oito de julho de 1896. na capital paraense, a
primeira exibição do Vistacope de Thomas Edson à sociedade belenense ocorreu no
Teatro da Paz em 29 de dezembro de 1896. No entanto, a primeira exibição não
obteve grande repercussão por conta de deficiência técnica
19
.
Desde então, o cinema (não contendo nesse momento o espaço físico como
se conhece hoje por salas, mas somente as projeções de imagens em movimento)
se fixou e ganhou ao longo dos anos diversos adeptos de sua arte. Criou vínculos
muito fortes com a população belenense, se enraizou como as grandes mangueiras
e como diz uma música local “quem vai ao Pará, parou”. Sim, realmente ele parou e
estabeleceu moradia em vários bairros e no gosto do público.
Dessa forma, o cinema passou a fazer parte do cotidiano da capital paraense
como um espaço social, servindo não como um evento para o público, mas
também a vários outros propósitos que serão discutidos ao longo do trabalho.
Trabalhar com o cotidiano criado através dos cinemas na sociedade local não
é homogeneizar as relações criadas em torno desse ambiente, mas sim perceber
que as várias formas de se relacionar com o espaço diferem dentro da sociedade.
Ou seja, visualizar a história do cotidiano, apenas como hábitos e rotinas a se
repetirem não leva em consideração as abordagens do cotidiano relacionadas às
tensões e confrontos,
Deixando entrever um mundo onde se multiplicam formas peculiares de
resistência/luta, integração/diferenciação, permanência/ transformação,
onde a mudança não está excluída, mas sim vivenciada de diferentes
formas
20
.
Desse modo, pesquisar o cinema em Belém durante a Segunda Guerra
Mundial é apreender que ele atende a interesses diversificados, tanto do público
quanto do Estado.
18
VERIANO, Pedro (coord.). A crítica de cinema em Belém. Belém: Secretaria de Estado de Cultura, Desportos
e Turismo, 1983, p. 15.
19
VERIANO, Pedro. Cinema no tucupi. Belém: SECULT, 1999, p. 11.
20
MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. Bauru, SP: EDUSC, 2002,
p. 26.
22
Neste período, o continente europeu estava vivendo momentos conturbados
em sua política internacional em fins da cada de trinta, uma vez que se
prenunciava um conflito armado entre seus países devido à progressiva mobilização
do exército do Terceiro Reich que visava à expansão territorial do regime nazista
alemão.
21
Assim, enquanto a Europa havia se transformado em um “barril de
pólvora” pronto para explodir, o jornal Folha do Norte, em Belém, anunciava o
aniversário do cinema Olímpia, uma vez que se comemorava vinte e sete anos de
trabalhosa orientação para agradar a “fina flor” da sociedade belenense.
Os acontecimentos no “velho” continente pareciam não afetar a rotina da
cidade. O “ilustrecinema Olímpia, construído no fim do período áureo do comércio
gomífero em Belém, continuava como o espaço de “soirées” elegantes que levava o
público freqüentador daquela sala de projeção a deleitar-se com as grandes
produções hollywoodianas. Estas falavam de amor e apresentavam os famosos
atores e atrizes como modelos de beleza e valores morais a serem seguidos. Local
de convívio e distração, o cinema incorporava no ambiente citadino um cotidiano de
sensações mistas entre a ficção e a realidade
22
.
O artigo do jornal Folha do Norte intitulado “O anniversario do ‘Olympia’ 27
annos de profícua e laboriosa orientação”
23
mostrava como o cinema era tratado
pela imprensa local quanto a sua utilização. Geralmente, era veiculado como meio
de sociabilidade para o seu público, que ali se encontrava para extravasar suas
alegrias com os filmes e ao mesmo tempo em que se encontrava com amigos e
conhecidos.
O artigo coloca o cinema Olympia como sendo o mais antigo da cidade em
atividade. Durante esse percurso, várias salas de projeção se instalaram, mas
21
Diversas questões podem ser discutidas para entender a posição belicosa da Alemanha durante a década de
trinta. Contudo, um dos fatos destacados pelos historiadores seriam os tratados prejudiciais imposição dos
países vencedores no fim da Primeira Guerra – aos interesses da Alemanha. HOBSBAWM, Eric. Era dos
Extremos: o breve século XX (1914-1991). Tradução de Marcos Satarrita. São Paulo: Companhia das Letras,
1995. VIGEVANI, Tullo. Origens e desenvolvimento da Segunda Guerra: considerações sobre a querela dos
historiadores. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico. São Paulo: Xamã:
Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História, 1995.
22
Segundo Veriano a inauguração do cinema Olympia, nessa época seu nome era escrito com y, no dia 24 de
abril ano de 1912, foi registrada na imprensa como um grande acontecimento para a sociedade no caso as
classes abastadas que se beneficiaram com o comercio da borracha que foram à inauguração em decorrência dos
requintes da sala de projeção que viu na sessão inaugural uma película sobre a tragédia do Titanic, navio que
afundou meses antes da inauguração. No ano de inauguração do Olympia existiam na cidade cerca de 12
cinemas. VERIANO, P. op. cit. p. 18, nota 18.
23
Folha do Norte – Belém, 23 de abril de 1939, p. 06.
23
tiveram vidas efêmeras, tendo o cinema Olímpia passado por diversas fases da
cinematografia: do mudo ao sonoro, dos artistas de “pelliculas de Arte da Scena
Muda” como May Murray, Theda Bara, Thomas Meignan, Willian Powell, Ronald
Colman, Rudolph Valentino, Joan Crawford, Chales Chaplin (Carlitos), aos da “tela
sonora do Olympia que na phase nova do cinema norte-americano e europeu” como
Jeanette Mac Donald, Maurice Chaveller, Henry Garat, Humphrey Bogart, Ingrid
Bergman, entre tantos outros
24
, que encantaram o blico de Belém com sua magia
e beleza.
Jurandir (1960) pondera sobre dois cinemas da capital paraense.
Por isso, iam as Alcântaras ao melhor cinema, de graça. Quanto a Isaura
não dar as entradas aos irmãos. Emília explicava a si mesma: qual dos
dois irmãos ia ao Olímpia? Um sapateiro mexendo nos motores da fábrica
de sapatos, o outro, marceneiro, nem um nem outro ia. A Maga? Mãe
Ciana? Violeta, essa não fazia muito empenho, primeiro porque o Olímpia
pedia traje correspondente, segundo porque no Íris ali no Reduto, com o
subúrbio em peso na fita em série, ela preferia muito mais. Olímpia era dos
patrões do sapateiro e do marceneiro, das pessoas que tinham nome no
jornal, nome nas portas e janelas de escritório, nas tabuletas do comércio,
da indústria e nas residências de doutores de Nazaré e São Jerônimo.
25
A Belém dos anos vinte vivia os resquícios da Belle Epoque paraense, em
decorrência da decadência do comércio da borracha. O autor discorre sobre a vida
de uma família (os Alcântaras: pai, mãe e filha) que viveram o apogeu desse
período, mas que tiveram grandes perdas com o seu declínio.
26
No romance, a
capital paraense é revisitada pelo escritor mostrando diversos aspectos da
sociedade belenense e de sua estrutura urbana, sendo que, em vários momentos,
as salas de projeção foram descritas como parte da ambientação do período. O
destaque foi para o Olímpia que servia para, além da projeção dos filmes, como
ponto de encontro para a elite local. Segundo pensava Emília, a filha de seu Virgílio
24
Folha do Norte – Belém, 23 de abril de 1939, p. 06.
25
JURANDIR, Dalcídio. Belém do Grão Pará. São Paulo: Editora Martins, 1960, p. 117. Dalcídio Jurandir
nasceu em Ponta de Pedras, Ilha do Marajó no Pará, em 10 de janeiro de 1909. Em 1921 partiu para Belém com
o intuito de estudar, sendo que em 1928 viajou para o Rio de Janeiro, antes de concluir o segundo ano ginasial, e
trabalhou como revisor da revista Fon Fon. Ao voltar para Belém em 1931 começa suas atividades políticas e
posteriormente de escritor. Dalcídio Jurandir morreu em 16 de junho em1979 e hoje é considerado um dos
principais escritores da literatura paraense, entre seus livros destaca-se Belém do Grão Pará de 1960.
26
A decadência da borracha na Amazônia começou no ano de 1910, quando os preços iniciaram o processo de
queda devido ao aumento da produção no continente asiático pelos ingleses.WEINSTEIN, Bárbara. A borracha
na Amazônia: expansão de decadência (1850-1920). Tradução de Lólio Lourenço de Oliveira. São Paulo:
HUCITEC: Editora da Universidade de São Paulo, 1993.
24
Alcântara e Dona Inácia, o Olímpia era freqüentado pelos donos de indústria,
advogados e comerciantes que enriqueceram com o comércio da borracha.
Nas imagens da cidade descritas pelo escritor, percebe-se a importância dos
cinemas para a trama citadina "olhava as luzes, os passageiros do bonde. Adiante
era a cidade, os cinemas, o Largo da Pólvora, o Lamarão no Palacete...”.
27
A
paisagem das salas de projeção fazia parte do cotidiano da cidade e da vida dos
moradores.
Em contraposição aos requintes do cinema Olímpia existiam outras salas de
projeção que atendiam a população que tinha poder aquisitivo mais baixo. Dessa
forma, a vontade dos Alcântaras de freqüentar o Olímpia, como forma de reviver o
passado da família no período auge da borracha, era satisfeita com os convites de
Isaura, costureira que ganhava os ingressos por conta de seus serviços prestados à
empresa (Martins e Teixeira) dona do cinema e que convidava Emília e Dona Inácia
por terem roupas adequadas. Sendo assim, o Íris que ficava no Bairro Reduto e
tinha como característica aglutinar a população dos subúrbios, era o cinema
freqüentado pela família de Isaura, que devido suas condições financeiras ia se
divertir indo assistir as fitas em séries que ali passavam.
A estagnação econômica e social vivida nos anos vinte perdurou durante as
décadas de trinta e quarenta. Não obstante, pôde-se perceber que durante o
segundo conflito mundial essas características aglutinadoras dos cinemas de Belém
persistiram como um hábito para parte da população que apreciava os salões de
espera dos cinemas e os vários filmes exibidos nas telas.
A década de quarenta foi marcada pela forte presença dos cinemas no
cotidiano das grandes capitais brasileiras, porém com a introdução da televisão nos
anos cinqüenta, iniciou e, paulatinamente foi se consolidando, a crise em torno das
salas de projeção, que hoje se faz visível.
No entanto, não se pode esquecer que o primórdio das imagens em
movimento, o lugar “sagrado” e muitas vezes o local de convivência dos citadinos
em Belém foi o cinema. Assim, também se observa que esse recinto foi tratado
como espaço físico de projeção de imagens, local de encontro e conversa, com suas
grandes salas de espera, local para os namoros transgressores, ambientes de
emoção vinda através dos olhos com os filmes românticos, dramáticos, as comédias,
as grandes aventuras de far-a-west e os filmes de guerra.
25
Aos vários gostos e sentimentos, os filmes proporcionavam uma viagem ao
mundo de sonhos, oferecida por uma máquina em uma sala escura, pois no dizer de
Morin (1997): “a técnica e o sonho andam, desde o princípio, a par. Em nenhum
momento de sua gênese e do seu desenvolvimento se pode confinar o
cinematógrafo ao campo exclusivo do sonho ou da ciência”.
28
A sala escura, as
trilhas sonoras, o romance e aventura dos filmes, sobrepostas aos telespectadores
por uma máquina de projetar imagens em movimento compunha um ritual que,
misturando ciência e sonho, transportava-os para outra realidade que durava até o
acender das luzes.
No início da primeira década do século XX as projeções em Belém foram
feitas em cines-teatro ou mesmo em projeções volantes (como exemplo na
festividade religiosa do Círio de Nazaré). Esse período:
(...) será caracterizado como a época dos empresários cinematográficos
ambulantes, viajantes brasileiros e estrangeiros, que se deslocam de
cidade em cidade com seu aparelho vendendo ilusões com filmes
comprados ou alugados na França, Estados Unidos, Alemanha e Itália
(...).
29
Essas projeções ambulantes duraram até a construção das primeiras salas de
projeção, como o “Politheama” (que ficava na Rua 28 de setembro, no Bairro do
Comércio) e o “Odeon” (no Bairro de Nazaré).
30
Somente, em 1912 a cidade
“ganhou” seu primeiro cinema de “luxo”. Construído pelos empresários Antonio
Martins e Carlos Augusto Teixeira, o cinema Olímpia, servia para satisfazer a elite da
borracha.
De acordo com os estudos de Maria de Nazaré Sarges sobre o período da
Belle Époque em Belém, entre os anos de 1870 a 1912, o cinema fazia parte do
cotidiano dos citadinos desde fins da primeira década do século XX.
27
JURANDIR, op. cit., p. 87.
28
MORIN, Edgar. O cinema ou o homem imaginário. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 1997. p. 28.
29
COSTA, Selda Vale da. Eldorado das ilusões. Cinema & Sociedade: Manaus (1897/1935). Manaus: Editora
da Universidade do Amazonas, 1996, p. 33.
30
Selda Costa aponta outro fator para a decadência das projeções volantes que caracterizaram o início das
exibições em Manaus, podendo-se estender também para Belém “o truste dos industriais de cinema, ao exigir o
retorno dos filmes aos fabricantes após quatro meses de exploração, proibindo sua venda e aluguel, apressou a
morte do cinema ambulante. O monopólio da produção, distribuição e exibição criará condições para o
crescimento da indústria do cinema com salas fixas de exibição”. Ibid., p. 53.
26
Os “Coronéis da Borracha” davam-se ao prazer de ter suas cocottes
(prostitutas de luxo), muitas delas européias, como ‘Panchita’ (espanhola),
‘Raito de Ouro’ (espanhola), ‘Margot’ (francesa), freqüentadoras das
sessões das sextas-feiras do cinema Olympia. Onde exibiam os vestidos
luxuosos que mandavam buscar na Europa e ias da Casa Krause. Os
‘Coronéis da Borracha’, embora dependentes financeiramente de Londres e
dos Estados Unidos, estavam culturalmente ligados a Paris, uma das
cidades-polos da Belle-Époque, cidade símbolo da fase áurea da
modernidade.
31
Como se observa na citação, a elite da borracha, ou como chama a
historiadora “Coronéis da Borracha”, aproveitavam o espaço do cinema Olímpia
como interação social para que suas “cocottes” (não elas, mas também para as
mulheres de uma forma geral) pudessem mostrar seus luxuosos vestidos vindos da
Europa e as ias da Casa Krause aos freqüentadores e também a elite que
freqüentava a sala de cinema
32
. Nesse momento, as salas de projeção estavam
sendo utilizadas como influenciador do público quanto ao vestuário (pois a moda
paraense seguia a tendência européia) e espaço social para exibi-lo.
33
Contudo, imaginar o cinema somente como produtor de outra realidade, que
dura nas horas em que as luzes estão apagadas é não perceber a força construída
pela indústria que se formou em torno desse empreendimento, no qual a influência
diante da realidade social foi percebida durante a primeira guerra e ganhou muita
força durante o segundo conflito.
34
31
Ver: SARGES, Maria de Nazaré. Belém: riquezas produzindo a Belle-Époque (1870-1912). Belém: Paka-
Tatu, 2002, p. 83.
32
Neste caso faz-se referência à elite, pois o cinema Olympia passou a fazer parte de um Triângulo cultural que
ficava localizado na Praça da República e era freqüentado pela elite comercial da borracha no fim do século XIX
e início do XX. Pedro Veriano afirma que “A criação do cinema Olympia transformaria em quadrado o triângulo
de bom tom com vértices no Palace, no Grande Hotel e no Theatro da Paz, alguns passos adiante. Esse trecho de
rua, ou da Praça da República, que o povo ainda chamava de Largo da Pólvora, era justamente o mais
freqüentado pela elite”. Cf. VERIANO, op. cit., p. 17, nota 19.
33
Segundo Wanessa Cardoso na década de vinte do século XX as mulheres da capital paraense desfilavam com
suas vestimentas compradas na Rua João Alfredo, centro comercial de Belém no período, nos diversos espaços,
tais como os clubes (Assembléia Paraense, Grêmio Literário Português, Clube do Remo), teatros, festividades
religiosas do Círio de Nazaré, os cinemas com as sessões do Olímpia que “também tiveram sua influência nessa
incorporação de hábitos reelaborados pela mulher paraense. O cinema era a diversão moderna mais requisitada
pelas classes médias e altas, os filmes em sua grande maioria eram produzidos nos Estados Unidos ou França
(que na verdade tem a primazia desta arte), trazendo traços e modos de uma mulher outra, diferenciando-se
muito de modelo feminino cultivado em uma sociedade patriarcal como a brasileira”. CARDOSO, Wanessa
Carla Rodrigues. “A Elegância da alma do século XX”: a mulher e a moda na Belém dos modernistas (1923-
1929). Monografia de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Pará, 2001, p. 25.
34
“Os filmes produzidos durante a Primeira Guerra Mundial tinham uma propaganda extremamente patriótica.
Através dos filmes eram exaltadas as políticas nacionalistas dos países em guerra, além de direcionar os países
ainda neutros no conflito. Filmes desse cunho foram presentes durante o conflito. As produções francesas e
italianas foram as mais freqüentes nos cinema de Belém. Ao final de 1915 as imagens captadas e produzidas pelo
cinema foram transmitidas na cidade e transformaram-se num dos principais meios de transmissão do conflito”.
27
Desse modo, a sociedade local pôde desfrutar das imagens em movimento e
das salas de projeção, estruturadas da forma como se conhece hoje e chamado de
cinema. Foram recintos construídos para o entretenimento e espaço de convívio
social de seus freqüentadores.
O papel desempenhado pelo cinema nos anos iniciais, como o de apenas
mostrar imagens em movimento ou, posteriormente, servir como propagador de
moda, logo foi percebido como um importante instrumento de divulgação de idéias
políticas que durante a Primeira Guerra serviu como veículo de informação, através
dos cinejornais, e também de propaganda dos países beligerantes, uma vez que
seus governos patrocinavam a produção de filmes com conteúdos de propaganda
política e social.
35
Na segunda década do século XX os filmes europeus eram os mais exibidos
nos cinemas da cidade. Empresas produtoras, como a Pathé Fréres francesa,
distribuíam para os cinemas do Brasil diversas películas, sendo que nas salas de
projeção da capital paraense a Empresa dividia espaço com outras do mesmo
continente.
36
No decorrer da Primeira Guerra Mundial a maioria dos filmes exibidos nas
salas de cinema em Belém vinha da Europa. Nesse momento, não havia filmes
vindo dos Estados Unidos com grande repercussão. Assim explica Jean-Claude
Bernardet:
(...) até a guerra de 1914/18, o domínio fica com a França, Itália, Alemanha,
Suécia e Dinamarca. Após a guerra, com o enfraquecimento das
cinematografias européias, é a vez dos Estados Unidos que se instalam e
até hoje continuam instalados (...).
37
Cf. SILVA, Allan Pinheiro da. O cinema político: a propaganda sobre os filmes bélicos durante a Primeira
Guerra Mundial em Belém. Monografia de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Pará, 2003, p. 24.
35
Ver: SILVA, A. P. op. cit.
36
Nos estudos realizados para a construção da monografia sobre o cinema e a exibição de filmes na cidade no
período da Primeira Guerra Mundial percebeu-se que a dominação inicial da distribuição de filmes pelos
estúdios cinematográficos europeus nos cinemas “pode ser bastante visualizada durante a Primeira Guerra
Mundial nos cinemas de Belém. A maior parte dos filmes vinha de produtoras como a Pathe (França), Gaumont
(França), Éclair (França), Milano (Itália), Mester Films (Alemanha) e Nordisk (Dinamarca), entre outras que
assim investiam no mercado brasileiro”. Ibid., p. 11. A Pathé Freres alcançou êxito mundial na primeira década
do século XX, conquistando parte do mercado exibidor norte-americano, contudo não influindo no conteúdo dos
filmes e na formação da indústria cinematográfica. SKLAR, Robert. História social do cinema americano.
Tradução de Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Editora Cultrix, 1975, p. 43.
37
BERNARDET, Jean-Claude. Cinema Brasileiro: proposta para uma história. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1979, p. 12.
28
A decadência econômica ocasionada com a Primeira Guerra desestruturou o
parque industrial europeu e, conseqüentemente, a indústria cinematográfica, tendo o
eixo principal de distribuição de filmes, que antes era na Europa, passado para o
controle dos Estados Unidos. Durante a Segunda Guerra os filmes produzidos em
Hollywood dominaram o mercado brasileiro e também encheram de ilusões o público
dos cinemas em Belém.
A dominação do mercado brasileiro pelos filmes estrangeiros dava-se pda
29
No decorrer da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) a cidade de Belém
possuía vários cinemas, sendo que todo dia havia anúncio dos filmes para o público
e leitor do jornal. Durante os anos de guerra duas empresas dominavam o ramo
cinematográfico, eram elas: Cinematographica Paraense S/A (antes Teixeira &
Martins) dona dos cinemas Olímpia, próximo à Praça da República no Bairro do
Comércio; Iracema, em Nazaré; Guarani, na Cidade Velha; Íris, no Reduto; São
João, na Praça Brasil (Umarizal); Popular e Poeira, ambos em Nazaré e à empresa
Cardoso & Lopes pertenciam os cinemas Moderno, em Nazaré; Independência, no
bairro de São Braz; Universal, na Cidade Velha e Rex, no bairro da Pedreira.
41
No final da década de trinta existiam na cidade onze cinemas em atividade
espalhados por alguns bairros, sendo que em Belém residiam aproximadamente 208
mil habitantes distribuídos por um total de vinte bairros, eram eles: Marambaia,
Souza, Sacramenta, Telégrafo sem Fio, Pedreira, Marco, Umarizal, Matinha, São
Braz, Canudos, Terra Firme, Reduto, Nazaré, Cremação, Guamá, Comércio, Batista
Campos, Condor, Cidade Velha e Jurunas.
42
Segundo Penteado (1968), a cidade de Belém, de 1888 a 1920, aumentou
significativamente seu contingente populacional - de 66.000 habitantes passou para
236.000 devido à comercialização da borracha. Contudo, efetivada sua decadência
na década de vinte do século passado houve um declínio populacional, passando a
cidade, no final da década de trinta, a possuir 208.000 habitantes.
As principais atividades econômicas desenvolvidas nesse período eram:
domésticas (98.000 habitantes); prestação de serviços (17.525); Indústria de
transformação (14.611); transporte, comunicações, armazenagens (12.581) e
comércio de mercadoria (12.322). Um dado surpreendente apresentado nos estudos
de Penteado (1968) é o da alfabetização da população na capital paraense, pois
75% dos habitantes sabiam ler e escrever
43
.
Esses dados foram retirados do Recenseamento Geral de 1950, feito pelo
IBGE. São elementos importantes para a reflexão a respeito das atividades em torno
41
Ibid. p. 32-33.
42
Uma obra de grande referência sobre a cidade de Belém na década de quarenta é a de Antônio Rocha
Penteado. Em seu livro Belém – Estudos de geografia urbana, o autor, analisa a hidrografia, o clima, a
vegetação, a evolução da cidade (desde o seu fundamento no século XVII até a década de cinqüenta do XX), a
população e a economia. Cf. PENTEADO, Antônio Rocha. Belém Estudos da geografia urbana. Coleção
Amazônia, série José Veríssimo. Universidade Federal do Pará, 1968. Ver anexo 1.
43
Ibidem.
30
desse cometimento na cidade, pois durante as cadas de vinte e trinta, Belém
sofreu com o declínio demográfico e com a estagnação econômica ocorrida devido à
queda abrupta do comércio gomífero.
No plano político, o Brasil vivia sob a ditadura do Estado Novo. Diniz (1986)
propõe a discussão da centralização do poder sobre dois enfoques: a primeira,
explorada pela ideologia oficial, focaliza o fortalecimento do poder Executivo “contra
a ação desagregadora do privatismo e do localismo”; sendo que a segunda visualiza
a política nacional constituída desde o golpe do Estado Novo, em 10 de novembro
de 1937, como um processo de centralização, ainda mais, do poder de decisão do
Estado como representante dos anseios da nação.
Destacando as transformações econômicas e sociais e a crise política e
hegemônica, com o embate entre os setores das classes dominantes ocorridas
durante as décadas de vinte e trinta, favoreceu a implantação do estado autoritário e
da promulgação da Constituição em benefício do fortalecimento do poder Executivo.
Suas análises se detiveram sobre o segundo enfoque e as características dessa
organização estatal redimensionaram sua atuação:
A centralização e o aumento do grau de coerção do Estado não eliminaram,
entretanto, uma tendência inaugural com a vitória do movimento de trinta,
de combinar uma estrutura de poder elitista com uma base de sustentação
policlassista, como forma de conferir certo grau de legitimidade ao sistema
político em fase de reestruturação.
44
Com o Estado centralizado o controle dos meios de comunicação se
intensificou, culminando com a criação do DIP (Departamento de Imprensa e
Propaganda) em 1939. A estrutura de governo criada desde o movimento de trinta
possibilitou condições para a criação de diversos órgãos ligados ao governo federal
com a finalidade de atrelar e utilizar o rádio, o cinema e a imprensa como
instrumentos de propaganda.
45
A criação do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda no Pará
aconteceu no dia 15 de abril de 1941 com a assinatura do decreto 3718 pelo
Interventor Federal no Estado José da Gama Malcher. O órgão deveria ficar
44
DINIZ, Eli. O Estado Novo: estrutura de poder. Relações de classes. In: História geral da civilização
brasileira: o Brasil republicano. 3. ed. São Paulo: DIFEL, 1986, cap. 2, p. 77-120.
45
“A maioria dos autores reconhece que o Estado decorrente da revolução de 1930 criou uma prole de aparelhos
propagandísticos, do qual o DIP foi o filho mais ilustre”. SOUZA, JoInácio de Melo. O estado contra os
meios de comunicação (1889-1945). São Paulo: Annablume: Fapesp, 2003, p. 13.
31
subordinado ao governo estadual e ao Departamento de Imprensa e Propaganda.
Assim informou o jornal Folha do Norte sobre o decreto-lei:
Art. 1º - Fica criado o Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda,
subordinado, sob o ponto de vista da orientação técnica e doutrinária ao
Departamento de Imprensa e Propaganda.
Art. - Ao Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda compete
colaborar com o Departamento de Imprensa e Propaganda nos serviços
relativos a imprensa, rádio-difusão diversões públicas, propaganda,
publicidade e turismo, os quais ficam assim agrupados:
a) divisão de imprensa;
b) divisão de rádio-difusão e diversões públicas;
c) divisão de propaganda, publicidade e turismo.
46
Os outros artigos do decreto-lei versavam sobre as questões burocráticas
para a instalação do DEIP no Pará, tais como: escolha do diretor geral do Órgão,
que ficaria a cargo do chefe do executivo estadual; as divisões e escolha dos
diretores; a contratação de funcionários; a remuneração dos diretores, dentre outros.
A orientação “doutrinária” estava subordinada aos princípios do órgão nacional que
serviu de instrumento político e de propaganda do Estado Novo.
Apesar da estagnação econômica, a cidade ainda mantinha um número
considerável de salas de projeção e o que se percebe, a partir das fontes, era uma
grande movimentação em torno desse empreendimento. No final da década de trinta
existiam poucas atividades de lazer proporcionadas à população belenense. Como
os cinemas tinham um funcionamento diário ir às salas de exibição era uma
diversão.
Cinema era uma festa. Filme era assunto. As discussões em torno do
colete de Douglas Fairbanks ou da coleira do au au animavam os saraus e
as matinês de uma classe média que se mantinha com poucos réis.
Parecia um papo democrático, embora as patroas visse as “fitas” no
Olympia e a empregada no Poeira. Vale dizer, as estrelas, não apenas o
sol, nasciam para todos.
47
Para o autor a “democratização” do cinema ocorria devido ao seu
atendimento ao público diversificado que assistia aos mais variados e do qual fazia
parte tanto a patroa como a empregada. Esses personagens históricos sonhavam
com as estrelas e os astros de Hollywood, choravam e se emocionavam da mesma
46
Folha do Norte Belém, 17 de abril de 1941, p. 01 do Segundo Caderno. “Departamento de Imprensa e
Propaganda do Pará – A íntegra do decreto-lei creando esse novo órgão público”.
47
VERIANO, P. op. cit. p. 08, nota 19.
32
forma. Tanto para a empregada como para a patroa, Hollywood estava distante,
assim como o sol, que poderia se ver, mas nunca tocar.
O acesso do público às salas de projeção dava-se entre os que tinham muito
e pouco dinheiro, pois havia diferença nos preços de uma sala para a outra. As
empresas proprietárias possuíam seus cinemas de destaque, em que exibiam
primeiro os lançamentos e posteriormente seguiam para outras salas de exibição.
Os cinemas Olímpia, Iracema, Moderno e Independência eram as casas lançadoras,
como se dizia na época a respeito das salas que lançavam os filmes.
48
Para cada cinema existia um público específico, como no caso do Olímpia,
que ficava no centro da cidade. Possuía estrutura mais moderna e tinha preço mais
elevado (custava 4$500 nas “soirees”), atendendo a uma camada social com maior
poder aquisitivo. Os cinemas Moderno e Independência tinham uma característica
peculiar em suas salas, pois se diferenciavam no mesmo espaço, a partir dos
assentos, o público (poltrona 4$000 e platéia 1$800). A poltrona possuía cadeiras
estofadas, enquanto que a platéia possuía bancos de madeira. cinemas como
São João e Rex, que ficavam nos subúrbios, custavam em média 1$100 e atendiam
a camadas sociais mais baixas.
Outras salas de projeção também promoviam suas sessões visando
determinado público, como no caso do cinema Poeira que promovia bailes e sorteios
para a classe proletária. No anúncio do jornal Folha do Norte de 05 de setembro de
1940, com o título “As classes proletárias vão ter sábado próximo, no Poeira, uma
noite de festa!”,
49
destacavam-se as festas promovidas pela empresa proprietária
(Cinematographica Paraense S/A).
Como é por todos sabido, o “Poeira” associando-se as grandes
commemorações que se projectam para encerramento da Semana da
Pátria, vae realizar, sabbado próximo, dia 7, uma grande festa dedicada às
classes proletárias. E, reunindo o útil ao agradável, levará a effeito, após a
sessão da noite, um monumental baile ao ar livre.
50
Os anúncios publicados nos periódicos eram escritos pelas empresas
proprietárias das salas de projeção de acordo com os seus interesses para chamar a
48
PENHA, Fernanda Jardim da. Cinema diário: cotidiano em Belém 1945-1950. Monografia de conclusão de
curso. Universidade Federal do Pará, Belém, 2001.
49
Folha do Norte – Belém, 05 de setembro de 1940, p. 05.
50
Ibid., p. 05.
33
atenção para as sessões e outras atividades festivas. Durante o período pesquisado
era comum em datas comemorativas esse tipo de evento. A influência da cultura
norte-americana era muito visível: “o quadrilátero destinado às danças receberá
ornamentação festiva e iluminação especial, que o transformarão em um ambiente
encantador. Para delícia dos pares, Mario Rocha já tem organizado endiabrada
jazz”.
51
As festas promovidas pelos cinemas em seus salões geralmente tocavam o
“jazz” ou o “fox” que muito se escutava nos filmes de Hollywood. Algumas sessões
passavam filmes musicais, que destacavam o ritmo a ser tocado depois nos bailes.
Acessíveis aos diversos freqüentadores, os anúncios sobre as salas de projeções
procuravam destacar seus ambientes, o público freqüentador e o preço.
Não haverá alteração nos preços habituais das entradas, pois a empresa
não visa interesse outro senão o de, por alguma forma, concorrer também
para dar alegria e diversão ao povo, pugnando pelo regozijo de todos à
passagem da grande data nacional.
52
A tentativa das empresas nos anúncios era de mostrar que sua relação com o
público tinha características bem amistosas, direcionada para a diversão, alegria e
conforto do povo belenense, atendendo as diferenças de renda e servindo como
espaço de aglutinação para as comemorações cívicas.
Goudinho (2005), ao trabalhar com a participação feminina no laicato católico
em Belém, no período de 1939 a 1947, discorre, no terceiro capítulo, a respeito do
discurso da Igreja Católica sobre os locais de diversão existentes no cotidiano
citadino e como alguns eram considerados “inadequados” para participação
feminina. Dentre esses espaços destacava-se o cinema como local propício à
transgressão moral, bem como à exposição de imoralidades contida no conteúdo
dos filmes exibidos, muitas vezes impróprio, condenados pela censura da Igreja
Católica.
53
A preocupação com a moral e bons costumes, apregoados com ardor nesse
período, o convinha somente ao discurso religioso, mas ainda a outras
manifestações de repreensão aos comportamentos imorais dentro desses espaços,
51
Ibid., p. 05.
52
Ibid., p. 05.
53
GOUDINHO, Liliane do socorro Cavalcante. Mulheres em ação... (católica) Belém (1939/1947).
Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2005.
34
como destacado no artigo publicado no jornal Folha do Norte, de 25 de abril de
1939, por um repórter amador, intitulado Meninas de Cinema:
Entre as meninas que preferem as ‘matineis’ às ‘soiries’ do cinema (e
quando digo meninas incluo na jurisdição do epitheto as que vão dos quinze
aos vinte anos) um certo número para quem as fitas do écran’ são
apenas pretexto para se reunirem com os namorados na penumbra de
tolerância e discrição da sala obscurecida (...).
54
No artigo, o repórter amador colocava as salas de cinema e, também, os
filmes, como espaços de imoralidade e agressores do bom comportamento. As
meninas (que categoricamente classifica sua idade) preferiam ir ao cinema pelas
matines, pois pela parte da noite seriam obrigadas a serem acompanhadas pelos
pais ou irmãos. O escurinho do cinema servia como espaço para interação e, ao
mesmo tempo, transgressão da honra e de valores morais. Os grandes romances
proporcionados nas telas pelos atores e atrizes, também fazia parte do imaginário do
público feminino que procurava revivê-los como uma cena de cinema.
55
Com o advento da guerra no cotidiano da cidade, a partir de 1942, o
escurinho das salas de projeção ganhou outro sujeito histórico,
56
como informa a
matéria do jornal Folha do Norte de 14 de abril de 1944.
Estava se tornando verdadeiramente escandaloso o que se assistia nos
cinemas de Belém. Cenas de repugnante devassidão eram ali praticadas
por casais despudorosos, que, inteligentemente, aproveitavam a penumbra
do ambiente. Por isso, o capitão Geolás, chefe de polícia, determinou que,
diariamente sejam destacados investigadores para zelar pelo decoro público
nesses lugares. Ontem, à noite, no cinema “Olímpia”, o investigador
Miranda, ali de serviço, conseguiu apanhar em flagrante, duas jovens
praticando atos de libidinagem com dois cidadãos americanos (...).
57
54
Folha do Norte – Belém, 25 de abril de 1939. p. 01 do 2º caderno.
55
Liliane Goudinho explica que “estar no cinema sem um responsável ou apenas com o namorado era
desaconselhável, uma vez que longe da vigilância da família as moças poderiam se comportar de forma
‘inadequada’. Outra preocupação se dava em relação a como as moças se apresentariam e com qual intenção
iriam a tais locais”. GOUDINHO, op. cit.. p. 131-132.
56
Em outubro de 1941 o Brasil assinou um acordo com o governo dos Estados Unidos de cooperação militar,
sendo que Brasil receberia armas e equipamento, em troca, concederia aos norte-americanos o direito de instalar
bases militares em Macapá, Belém e Natal. Na cidade de Belém foi instalada a base de Val-de-Cans, aonde hoje
é o Aeroporto Internacional de Belém (o bairro que se constituiu ao redor da base levou o mesmo nome), para
abrigar os militares vindo dos Estados Unidos e sua a infra-estrutura teria sido construída pelo seu governo.
GOMES, Raimundo Ney da Cruz. Guerra e Memória: o cotidiano de Belém durante a Segunda Guerra Mundial
– 1939 a 1945. Monografia, Universidade Federal do Pará, 2002, p. 31-34.
57
Folha do Norte – Belém, 14 de abril de 1944, p. 04. “Na polícia e nas ruas – Moralisando os cinemas”.
35
A ocorrência de atos libidinosos fez parte do cotidiano dos cinemas no
período da Segunda Guerra, o que levou à intensificação da intervenção policial
para moralizar esse espaço. Contudo, com a estadia provisória, em terras
paraoaras, dos soldados norte-americanos, mudou de certa forma, o gosto das
moças da cidade. Os patrícios agora tinham que competir com os militares
“importados” da América do Norte na conquista de uma namorada e na utilização da
penumbra das salas de projeção para as paqueras.
58
Voltando aos anos iniciais da guerra, não as empresas escreviam sobre os
filmes, os cinemas e suas atividades. Outros artigos foram escritos a respeito dessa
atividade na cidade, tais como: reclamações sobre o fumo dentro das salas de
projeção, deterioração das salas (que não apresentavam condições mínimas de
conforto), a entrada de menores em sessões noturnas ou vesperais, os anúncios de
tamanho reduzido nos jornais, namoros impróprios...
Em algumas fontes pesquisadas pôde-se perceber uma oposição ao discurso
dos anúncios das empresas proprietárias dos cinemas. A imagem passada sobre a
boa estrutura apresentada pelas salas de projeção se contrapõe aos artigos
publicados por observadores que geralmente não se identificavam. Um artigo
relevante publicado no jornal Folha do Norte, em 1940, de uma pessoa que se
identifica apenas como um observador pode demonstrar aspectos de alguns
cinemas da capital paraense.
crise nos cinemas. A chuva, por um lado; a falta de pagamento ao
funccionalismo, que não recebe os seus vencimentos dois mezes, por
outro, determinam a vasante nas salas de projeção. Está certo. Há, porém,
um terceiro factor: a repetição fatigante das fitas. No “Moderno” ainda se
passa “Juarez”. No “Iracema”, ainda há pouco “Honolulu”.
59
O artigo tinha como título “A crise nos cinemas” e destacava as condições
precárias apresentadas pelas salas de projeção. Enfatiza a chuva, fenômeno natural
freqüente nas tardes paraenses, como causadora de vazantes, evidenciando as más
58
“Até mesmo nas zonas de meretrício da cidade a ‘nefastainfluência norte-americana pode ser observada;
havia bordéis que estavam fechados para brasileiros. Era difícil concorrer com os lares dos americanos.
Quando do fim da mobilização bélica na região e a conseqüente retirada das tropas norte-americanas, foram
muitos os nascimentos de crianças loirinhas, o que denunciava a preferência das mulheres”. GOMES, op. cit., p.
35.
59
Folha do Norte – Belém, 05 de setembro de 1940, p. 01 da Folha Vespertina.
36
condições de suas estruturas, além da falta de pagamento dos funcionários.
Também destacavam as repetições exaustivas de alguns filmes.
O observador criticava as empresas proprietárias como as principais
responsáveis pelo afastamento do público, devido à falta de organização na exibição
do filmes “(...) de hoje, do ‘Moderno’, há duas fitas de aviação, uma das quaes a
repisada e paulificante: ‘Patrulha da Madrugada’. Esquece-se o programador que
não devem figurar no mesmo cartaz filmes de idêntico gênero (...)”
60
. A programação
repetida e a ausência de critérios para a escolha dos filmes a serem exibidos, sem
que se tornassem repetitivos os gêneros, levava ao afastamento dos freqüentadores
das salas de projeção.
Para ele, se os cinemas não ofereciam programações variadas durante a
semana deveria haver declínio nos preços das entradas. Até os “documentários
nacionais” que possuíam preços mais baixos para as empresas tornavam-se
repetitivos, bem como havia repetições de fitas antigas em conjunto com os filmes
recentes e de destaque.
Diante dos argumentos apresentados pelo observador percebe-se que o
discurso apresentado nos anúncios se contrapõe ao de quem freqüenta os cinemas.
Outras críticas às empresas Cardoso e Lopes e a Cinematographica Paraense
apareceram no jornal Folha do Norte. No mesmo ano de 1940, uma pessoa que se
autodenominava repórter-amador analisou a forma como os anúncios dos cinemas
eram apresentados no jornal.
Houve tempo em que os annuncios de cinemas eram lidos com prazer. Os
caracteres typographicos, escolhidos com zelo e a preoccupação de atrahir
leitores, convidavam realmente à leitura. A matéria era disposta com tal
sentido da coordenação e clareza que a gente sabia, com segurança quaes
eram os films que iam em 1º, 2º, 3º ou 4º logar.
61
O autor ressaltava a importância dos anúncios para o leitor e freqüentador
dos cinemas. A visibilidade e a clareza com que os anúncios eram postos no jornal e
a ordem dos filmes influenciava na escolha. A crítica às empresas Cardoso e Lopes
e Cinematographica Paraense por disporem de “annuncios em typos microscópicos,
60
Ibid., p. 01 da Folha Vespertina.
61
Folha do Norte – Belém, 13 de abril de 1940, p. 01 da Folha Vespertina.
37
que exigem lentes ou óculos de grau intenso, a embrulhada dos titulos, nomes,
preconicios, etc., é de tal índole, que deixa o leitor a ver navios”.
62
A propaganda feita pelas empresas proprietárias deveria suprir a curiosidade
do leitor que queria se informar da sua programação. O repórter salientou os lucros
gerados com uma boa propaganda, pois atraía mais freqüentadores e destacou o
caso dos Estados Unidos como bons empreendedores na indústria cinematográfica,
justamente porque utilizavam em grande escala, na divulgação dos filmes, uma
competente propaganda.
Nos primeiros anos da guerra as informações na imprensa local eram diárias.
Os jornais destacavam a guerra na Europa sempre na primeira página. Outra forma
bastante freqüente de veiculação do conflito eram os filmes, fossem eles
documentários ou ficcionais, o tema foi explorado pelos países em guerra. Apesar
de ainda não ter entrado na guerra, os Estados Unidos tiveram papel de destaque
com a produção cinematográfica.
Portanto, a chegada do projetor mecânico, que exibia imagens em movimento
da vida real, na cidade, seus primeiros passos quanto à busca do espaço para as
projeções e sua consolidação com a inauguração do cinema Olímpia transformou a
rotina dos citadinos belenenses com a incorporação de mais uma atividade cultural,
que passou a desempenhar outras funções durante a Segunda Guerra.
62
Ibid. p. 01 da Folha Vespertina.
38
1.2 OS “FANS” E OS ARTISTAS
O cinema é ainda em nosso paiz, a forma mais
prestigiada de divertimento, para o público em geral. A
multiplicidade dos seus aspectos, favorecida anda mais
nos últimos anos, pelas vantagens que o som trouxe ao
écran, deu ao cinema raízes inarrancaveis do coração do
público.
A Semana
63
Ao trabalhar com o cinema durante a Segunda Guerra deve-se mencionar o
mérito da indústria criada em torno do ícone produtor de filmes que se tornou
Hollywood e a criação dos símbolos humanos que se transformaram em astros e
estrelas cultuados em várias partes do globo.
64
A produção cinematográfica desenvolvida nos Estados Unidos criou um
sistema de divisão industrial que envolveu desde a produção, distribuição e exibição
e incorporou diversos países. O Brasil passou a ser rota importante para essa
indústria durante o segundo conflito que, em grande parte, consumiu os filmes
vindos da grande fábrica de ilusões.
No final da década de trinta do século XX, na cidade de Belém, o cinema era
uma das formas de lazer mais freqüentadas pela população citadina, sendo os
filmes produzidos pela indústria cinematográfica de Hollywood os mais exibidos nas
salas de projeção e, também, os mais apreciados. Nota-se nas fontes pesquisadas a
euforia causada nos fãs pela passagem das estrelas cinematográficas na cidade e
pela exibição de suas películas nos cinemas.
As produções cinematográficas norte-americanas eram as grandes
referências artísticas para os leitores dos jornais e revistas da época. Meneguello
(1996), ao trabalhar com o cinema hollywoodiano, destaca as várias etapas inclusas
na produção e exibição de um filme. O consumo por parte do blico dava-se de
diferentes formas, pois assistir a película nos cinemas fazia parte de um ritual que
começava com as publicações na imprensa, os cartazes, os artistas em destaque.
63
A Semana – Belém, 23 de fevereiro de 1939, nº 1024.
64
Na história do cinema americano, Hollywood formou-se em torno do conflito existente entre as grandes
produtoras e os produtores independentes, que buscavam autonomia na produção e comercialização de filmes no
mercado cinematográfico dos Estados Unidos. Sendo assim instalaram-se no Sul da Califórnia concentrando a
produção cinematográfica dando visibilidade para Hollywood “no principio de 1920, quando se falava em fitas
39
Nas décadas de 1930, 40 e 50, o cinema norte-americano ocupou uma
posição estável como produção cinematográfica. Cinema comercial, de
instalação, sedimentação e superação de talentos, manteve-se como dono
de bilheterias e, em larga medida, dono de escolhas estéticas, além de
assumir-se como referencial para uma platéia mundial de milhões de
pessoas. Esta constatação torna no mínimo incompleto referir-se ao Brasil
(ou à América Latina) dos anos 40 e 50 sem dar-se conta da inserção deste
cinema nos debates, referenciais estéticos e comportamentais deste
período.
65
A inserção dos filmes norte-americanos nos cinemas brasileiros foi
conquistada após a primeira guerra mundial e alcançou grande repercussão durante
as décadas de 30, 40 e 50. Em Belém, os debates e referenciais estéticos e
comportamentais são bastante visíveis quando analisados a partir da imprensa local,
sendo que o glamour criado em torno dos astros e estrelas era a primeira forma de
chamar a atenção do público local que, ao ler os anúncios nos periódicos, podia ver
em destaque a foto tirada do filme com o rosto das estrelas, bem como os cartazes
dos filmes nas salas de projeção e a vida desses grandes atores e atrizes, que
apareciam na imprensa com realce para os “fans” da cidade de Belém.
A revista A Semana trazia na sua contracapa a foto de artistas de Hollywood,
geralmente os que estavam estrelando filmes nas salas de projeção da capital
paraense, ou a reportagem intitulada “Para o álbum dos fans”, que vinha com a foto
do artista e um pequeno texto biográfico. A revista dava muita importância para o
estilo de vida dos atores e atrizes dos filmes a serem exibidos, mas também possuía
uma coluna sobre o cinema brasileiro escrita pelo correspondente da revista no Rio
de Janeiro Milton Lacerda; e outra intitulada Focando escrita por Everaldo, que
retratava o cinema e suas estréias na cidade.
As matérias sobre cinema sempre eram direcionadas para os seus
apreciadores e foi assim, para prazer dos fans da sétima arte, que fomos ouvir o
director gerente da Referida Empreza sobre os sucessos a serem apresentados
breve nas telas de seus cinemas”
66
. Os fãs ditavam quem eram os artistas do
momento, quem estava em evidência, ou mesmo aqueles artistas que eram os mais
queridos pelo público.
de cinema norte-americanas, se começava a usar o nome Hollywood para descrever um lugar, uma gente e,
como disseram muitos com o passar dos anos, um estado de espírito”. SKLAR, op. cit., p. 85-105.
65
MENEGUELLO, Cristina. Poeira de estrelas: o cinema hollywoodiano na mídia brasileira das décadas de 40
e 50. Campinas: Editora da UNICAMP, 1996.
66
A Semana – Belém, 23 de fevereiro de 1939, nº 1030.
40
A Semana publicou no dia 06 de maio de 1939 uma reportagem sobre a atriz
Sylvia Sidney destacando sua vida, sua carreira artística e seus principais filmes. Ao
anunciar o novo filme da atriz mencionou “proximamente, vamos tornar a ver a
‘Namorada do Pará’ como é conhecida Sylvia Sidney, em Belém”.
67
Assim a atriz era
conhecida na imprensa da capital paraense, sendo que no jornal Folha do Norte, de
12 de maio de 1939, o título da reportagem sobre a estréia do filme nos cinema
Olímpia e Iracema foi “A ‘Namorada do Pará’ resurge em um grande film ‘Vive-se
uma só vez’ – hoje, no Olympia e Iracema”.
68
Baseado no gosto do público belenense a reportagem destacava a
performance de Sylvia Sidney na cinematografia, tornando-a a namorada do Pará”
devido à preferência pelos seus filmes: “o público paraense que adora Sylvia Sidney
vae ter, á noite de hoje, a grande satisfação de revela no film que vem sendo
apontado unanimemente como o seu melhor desempenho ‘Vive-se uma só vez’.
69
Para as reportagens e anúncios dos filmes a serem lançados nas salas de
projeção da cidade os destaques se davam para as estrelas principais e sua
constelação acompanhante. Fossem homens ou mulheres o direcionamento dos
anúncios tinha a idéia de alcançar o público dos (as) artistas e incentivá-los a
assistirem as exibições “(...) Sylvia Sidney está formidável de sinceridade nesse film
impressionante em que ella tem de novo a seu lado Henry Fonda (...) o público não
resistirá ao desejo de applaudir Sylvia Sidney”.
70
Tanto no jornal quanto na revista, Sylvia Sidney era apresentada como a
“estrellinha” adorada pelos fãs belenenses. Ir às salas de projeção e assistir ao seu
ator ou atriz preferidos fazia parte da rotina de muitos apreciadores de películas. É o
que sugerem as palavras do redator da revista ao tratar sobre o processo de
consolidação do cinema no Brasil e na cidade de Belém.
Jurandir (1960) descreve a primeira sessão de cinema assistida pelo
personagem do seu romance Alfredo, que veio do interior paraense para a capital do
Estado (Belém) estudar. Alfredo conhecia o “famoso” cinema Olímpia somente
através dos relatos de sua mãe e sonhava um dia ir a capital assistir a uma sessão.
67
A Semana – Belém, 06 de maio de 1939, nº 1024.
68
Folha do Norte – Belém, 12 de maio de 1939, p. 03.
69
Ibid. 12 de maio de 1939, p. 03.
70
Ibid. 12 de maio de 1939, p. 03.
41
E pela primeira vez no cinema! O cartaz, lido e relido, à porta do Odeon,
Largo de Nazaré, berrando: ‘O Furacão’, em série, Charles Hutchison no
papel de Robert Darrel. Arrojo! Temeridade! Denodo! (...) Alfredo montava
na motocicleta de Robert Darrel atrás dos bandidos, se ia-que-ia, tão
tamanha velocidade, desce, sobe, voa, voando sempre, e debaixo de tão
tamanho silêncio, correria danada mas tão mudo, mudo. aqui em baixo,
quase de não se dar conta, a musiquinha pinicando quieto, quieto. A artista
a mesma em dois papéis, pra cá, pra lá, era nos beijos, beijos no
bigodinho, o da quadrilha, beijo no bichão da motocicleta, uma beijaria
doida. E Alfredo arriscava o rabo de olho pro lado na d. Inácia, a filha, a
prima... Os olhos! Os bugalhos das três no escuro, puxados pra
tela!desconfiou que a d. Emília tinha o beiço caído ou de bico no ar,
aparando a beijarama... mas eis que a motocicleta salta alto, rompe a tela,
eivém de novo, um raio e o violino pingando devagarzinho as suas gotas
na maior maciota enquanto moto e bandido vai! É um precipício...
Acendeu a luz, acabou. Só na outra quinta feira ‘O Furacão’ continuava.
71
Na motocicleta imaginária do personagem principal (o nome do artista,
Charles Hutchison, dava importância para o personagem) da rie. Alfredo passeou,
realizou a experiência de sua primeira vez em um cinema. A reflexão feita pelo autor
retratou a sensação de qualquer pessoa que fosse pela primeira vez ao cinema nas
décadas iniciais. A vivência construída dentro das salas, o sentimento de possuir as
mesmas qualidades do ator (arrojo, temeridade, denodo) e os romances construídos
nas telas pelos personagens instigavam o desejo de ser ou estar parecido. O
silêncio mostrava a concentração em torno da tela e da trama do filme; os olhos
“esbugalhados” de atenção ou os beiços caídos querendo capturar um beijo do
mocinho ou da mocinha tornavam a película uma excelente diversão que poderia ser
trazida para a realidade.
Os filmes apresentavam novos modelos de vestimenta, produtos
industrializados, bem como palavras utilizadas nas películas, que se incorporavam
no cotidiano da população citadina, tais como “Girls... Uma palavrinha que veio
revolucionar o mundo e criar uma nova técnica do trato com as mulheres”.
72
A
palavra “girls”, que na sua tradução para o português significa garota, assumiu outra
significação em relação a sua utilização, pois o que definia ou representava moça no
termo saxão, no aspecto mais inocente e literal, passou a representar no Brasil a
mulher bonita e envolvente que aparecia nos filmes.
Ora, ahi temos um produto típico do cinema. A garota travessa, surgida dos
desenhos de Betty, porejando saúde, cheia de curvas, que não o
adiposidades, e dispostas a “topar” uma convivência menos cheia de freios
71
JURANDIR, D. op. cit. p. 76.
72
A Semana – Belém, 24 de junho de 1939, nº 1036.
42
e breques. Essa disposição tem que ser coerente; até na indumentária.
Seriamos incapazes de considerar “girl” a menina que se veste como uma
dama, com todo o rigor do “chic” francez. A “girl” típica tem de estar
levemente vestida, esportivamente encadernada. O sapato de cortiça, a
“soquete”, o linho claro, o chepeuzinho equilibrado, sem recruscomanto, no
cocuruto, eis a “girl” “made in Hollywood”.
73
O perfil feminino apresentado pelos filmes “made in Hollywood” demonstrava
uma mudança ocorrida nos aspectos culturais de um Brasil em transformação que,
até então, estava ligado culturalmente às influências européias até a Primeira
Guerra Mundial. Contudo, as diversas mudanças que aconteceram durante as
décadas de vinte e trinta tiveram como característica importante o cinema norte-
americano, que alterou determinadas formas de comportamento da mulher
brasileira, que antes tentava seguir o modelo cultural francês.
A mulher “girl” assumiu aspectos esculturais despojados, eternizando o estilo
norte-americano de vida propagado pelos filmes, definindo como seria a nova forma
de cultuar o corpo feminino, sendo cheia de curvas e revelando uma garota mais
independente. Tornava-se irresistível com uma vestimenta mais leve e sensual, pois
assim era repassado para os “fans” o preito às beldades cinematográficas
hollywoodianas.
Esse artigo intitulado “Cineminha” foi transcrito do jornal Estado de Minas
pelos redatores da revista por “se casar igualmente às bonecas de Belém...”. Do
mesmo modo como se casava com as bonecas de Belém e Minas Gerais, poder-se-
ia estender para as outras capitais brasileiras essas características incorporadas à
cultura de consumo dos produtos norte-americanos.
A respeito da veneração criada em torno das estrelas dos filmes, destaca-se
Morin (1989) como interlocutor das discussões sobre a sedução no cinema.
74
O
autor principiou seu trabalho discutindo a mudança ocorrida nos primeiros anos de
vida do cinema, que se caracterizou pelo reconhecimento das personagens
cinematográficas em detrimento dos atores e atrizes. Contudo, a partir da segunda
década do culo XX ocorreu uma mudança e as estrelas tornaram-se a atração
principal dos filmes.
Essa mudança transformou o culto ao personagem para o culto aos atores e
atrizes, demonstrando o grande significado das várias facetas apresentadas pelas
73
A Semana – Belém, 24 de junho de 1939, nº 1036.
43
estrelas em ascensão em seus filmes e fora deles, tornando-se, dessa forma, alvos
de discussão em volta de suas vidas. Fossem heróis ou vilões, mocinhas bondosas
ou vamps sugadoras de almas, o estereotipo criado para cada astro ou estrela de
Hollywood contribuiu para consolidar o star system.
A estrela não é idealizada apenas em função do seu papel: ela é, pelos
menos potencialmente, idealmente bela. Não é somente glorificada por sua
personagem, ela também a glorifica. Os dois suportes míticos, o herói
imaginário e a beleza da atriz, se interpenetram e se conjugam.
75
Ao analisar o papel desempenhado pelos artistas de cinema na sociedade
podem-se apreender representações imaginárias e culturais desenvolvidas pela
indústria cultural na construção de mitos que serviram de modelo para as gerações
das décadas de 30, 40 e 50. Na cidade de Belém a beleza das estrelas anunciadas
nos cartazes dos filmes ou nos artigos veiculados na imprensa servia para aguçar e
estimular os admiradores a assistirem as sessões, em que as grandes estrelas
foram as principais personagens.
Caminhando paralelamente com o star system, os produtos industrializados e
culturais chegavam às várias partes do país, destacando-se os produtos
indumentários, que geralmente eram os mais ressaltados nos anúncios e artigos de
cinema.
Acresce que um filme de Kay Francis é, infalivelmente, um rico figurino de
Modas, um contínuo desfile de maravilhas em indumentária feminina. E
como estamos em plena mudança de estação, Segredos de uma atriz” é
ainda um filme que as fans vão ver por obrigação, afim de nele, vendo Kay
Francis, formar excelentes planos para radical transformação de guarda-
roupa particular.
76
A ênfase do artigo da revista era a atriz Kay Francis, entretanto o rico figurino
utilizado no filme pela estrela fazia parte da propaganda do filme para atrair público,
especialmente o feminino. Analisando-se o artigo fica explícito o interesse do filme e
da revista em propagar uma transformação, não apenas no vestuário, mas também
na cultura de consumo dos produtos industriais norte-americanos, sendo que a
74
MORIN, Edgar. As estrelas: mitos e sedução no cinema. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1989.
75
Ibid. p. 27.
76
A Semana – Belém, 10 de junho de 1939, nº 1035.
44
“obrigação” das “fans” de assistir ao filme teria como propósito a reformulação de
seus trajes cotidianos para uma tendência exposta no filme.
Dessa forma, sonhar ou imaginar-se sendo estrela de Hollywood fazia parte
do dia-a-dia de diversas mulheres belenenses. Para elas, ir às salas projeção e
assistir nas películas aos desfiles de modas das atrizes, ler na imprensa o glamour
do estilo de vida, dos casamentos e relacionamentos com os atores em evidência
era algo almejado pela maioria.
Você gosta muito de Hollywood. Sonha, pensa e imagina-se em Hollywood.
Onde quer que você vá e onde quer que esteja, a sua imaginação está toda
voltada para lá. Tudo você com aspectos de Hollywood; o céu, a terra, a
paisagem. Quando faz a ‘toillete’ o espelho dá-lhe a impressão dos grandes
‘studios’ e o seu perfume representa a fragrância dos jardins maravilhosos
de Hollywood. Quando sai para o bordado ou para a aula de corte, nas
manhãs de sol, você supõe que vai para filmagem, em Hollywood. Se um
amiguinho lhe fala, nesses momentos de suave devaneio, você tem a
impressão de que ouviu a voz de Clark Gable ou de Nelson Eddy, em
Hollywood. Suas amiguinhas tornam-se insípidas, para você, porque elas
nem sequer sabem pronunciar direito a palavra Hollywood (...)
77
O artigo denominado “Uma palavra pra elas”, de Gibran de Montanabi,
descreve como o cinema estava voltado para criar ilusões a respeito de estilos de
vida, sendo Hollywood a grande produtora de sonhos que levava mulheres, crianças
e homens a criarem mitos, heróis e heroínas que transpunham as telas para se
fixarem na sua imaginação.
O autor transpôs para o seu artigo a imaginação feminina relacionada à
Hollywood. Por isso, imaginar as vozes de Clark Gable ou Nelson Eddy ou estar indo
para as filmagens nos “studios” fazia parte do culto aos astros e ao espaço
caracterizado como sendo referência para a cinematografia mundial. Esse devaneio
alimentado pela indústria cultural proporcionava ao star system lugar cativo na
fantasia e aquelas que não participavam da moda advinda com os filmes tornavam-
se excluídas, ou “insípidas”. Contudo, o devaneio possuía raízes na realidade que
logo vinha à tona ao chegar ao seu lar.
(...) Você diz emocionada: que bom se isto fosse Hollywood! Mas por último
Você volta para casa, minha amiguinha. A imaginação se recolhe, fugidia,
como uma lágrima furtiva. O seu irmãozinho chora, Você o atende
77
A Semana – Belém, 16 de setembro de 1939, nº 1048.
45
carinhosa, deixa escapar um lânguido suspiro e depois cai na realidade,
vendo bem distante e inacessível a cidade de Hollywood.
78
Os efeitos criados a partir da indústria cinematográfica hollywoodiana sobre o
público local fizeram-se sentir na imprensa através de artigos, crônicas, e anúncios
que demonstravam a participação do cinema na vida citadina. Por isso, para o autor,
o devaneio apresentado por qualquer mulher que desejasse ser estrela em
Hollywood logo acabaria ao voltar para a realidade, onde teria que cuidar da casa ou
do irmão pequeno, confirmando o quanto era distante e inacessível esse sonho. No
entanto, essa ilusão perdurava na volta ao cinema para assistir mais um filme.
Assim, todos os dias o jornal Folha do Norte e aos sábados a revista A
Semana divulgavam os filmes em exibição na capital paraense, mostrando nos
anúncios as fotos das cenas dos filmes tendo como destaque os atores e atrizes que
os estrelavam. Procuravam ressaltar nas fotos o enredo das películas, geralmente
os dramas e histórias de amor eram os preferidos para atrair a atenção dos que
freqüentavam as salas de projeção.
Os artistas tiveram grande importância para a consolidação do cinema e
durante a Segunda Guerra Mundial serviram para diversos propósitos políticos,
emocionais e de propaganda dos países envolvidos no conflito. Fossem elas
utilizadas na política de boa vizinhança ou na propaganda beligerante norte-
americana, as estrelas aproveitavam seu carisma para cooperar com os esforços de
guerra e comover as platéias adeptas dos ideais democráticos.
Em Belém, as informações chegavam por telégrafo e eram repassadas pela
imprensa para a população, sendo que antes de setembro de 1939 a movimentação
armamentista dos países europeus já preocupava o mundo, pois uma guerra parecia
iminente.
No meio de tantas notícias de guerra e de allianças guerreiras, de grandes
esquadras que tomam posição no assustado mediterrâneo, de novas
classes chamadas as armas pelos governos facistas, do nervosismo dos
pequeninos paizes dos Balkans, que não sabem ainda para que lado se
virar, no meio de toda essa tragédia internacional contada diariamente pela
imprensa, um telegrammazinho irônico e malicioso veiu trazer um
acontecimento amável, bem differente dos outros.
79
78
A Semana – Belém, 16 de setembro de 1939, nº 1048.
79
Folha do Norte – Belém, 12 de maio de 1939, p. 03. O artigo tem como título “O casamento de Greta Garbo”
e foi escrito por Genolino Amado no Rio de Janeiro e publicado como “Especial para a Folha do Norte”.
46
As notícias sobre a “tragédia internacional” pela qual passava o continente
europeu eram veiculadas diariamente pelos periódicos de Belém com bastante
ênfase. Apesar disso, as reportagens sobre os artistas pareciam confortar os
momentos conturbados e o telegrama diferente falava sobre o casamento de Greta
Garbo.
Não se trata mais de ódio, mais de amôr. Não se trata de desunião entre os
povos, mas de união dum homem e duma mulher. O telegramma dizia
apenas que Greta Garbo vae casar. Apaixonou-se mesmo pelo maestro
Stokowski, essa paradoxal careteira da tela, que no cinema era uma
labareda e fora dele um sorvete de manga, muito louro e muito frio.
80
Um pequeno telegrama publicado para os fãs da estrela, que servia para
consolar diante de tanto horror espalhado pelo mundo. O ódio e a desunião,
espalhado pelos Estados Totalitários entre os povos, pode ser compensado pela
união entre uma mulher e um homem, mas não de uma mulher comum e sim de
uma estrela de cinema (Greta Garbo). Percebe-se com esse artigo o quanto
diversos atores e atrizes tinham destaque para o público da capital paraense, que
o autor escreveu um texto sobre a trajetória amorosa e artística da estrela, dando
mais importância para o fato que o telegrama por ele informado.
Além dos artigos publicados sobre a vida das estrelas e dos astros de
Hollywood a imprensa noticiava os que passavam pela cidade de Belém em transito
pela América, o que no decorrer da guerra configurou-se como política de boa
vizinhança, empreendida pelo governo dos Estados Unidos para cooptar o Brasil na
luta contra o Eixo.
81
80
Ibid. 12 de maio de 1939, p. 03.
81
Carlos Guilherme Mota, em um artigo sobre cultura e política de boa vizinhança entre Brasil e Estados
Unidos, afirma que a vinda dos artistas Genevieve Naylor e Misha Reznikoff tinha como objetivo conhecer a
cultura brasileira e aproximar, politicamente e culturalmente, os dois países durante a Segunda Guerra “Em plena
Segunda Guerra Mundial (1939-1945), tornava-se imperioso o estreitamento das relações interamericanas, o
fortalecimento da união pan-americana no confronto com o assustadoramente crescente esquema bélico-
industrial do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Voltaram-se as idéias de integração continental, os ideais
expressos na velha Doutrina Monroe do século passado, a impressão forte que nossos povos têm uma história em
comum, além de um passado colonial semelhante. A Política de Boas Vizinhança nasce nesse contexto
internacional: o Brasil de Getúlio Vargas e do estado Novo, que oscilara entre as duas forças Aliados versus
Eixo – inclinou-se finalmente para os primeiros. Não sem alguma pressão, inclusive por parte do próprio
presidente Franklin Delano Roosevelt”. MOTA, Carlos Guilherme. Cultura e política de boa vizinhança: dois
artistas norte-americanos no Brasil. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico.
São Paulo: Xamã: Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento
de História, 1995, p. 489-501.
47
Sempre causando alarido, a passagem dos artistas era registrada como um
fato extraordinário para a cidade “Belém, por mais de uma vez, tem sido visitada por
algumas celebridades de Hollywood. Coube a vez, agora, a Henry Fonda, que
esteve, entre nós, hontem, por algumas horas”.
82
Para os fãs do cinema esses
momentos, por pequenos que fossem, eram registrados e rememorados com muito
entusiasmo. O alvoroço começou com o desembarque no aeroporto da Panair e
continuou no Grande Hotel “depois de jantar, enquanto fora a agglomeração de
‘fans’ era intensa; não foi sem custo que o repórter conseguiu alguns minutos de
palestra com o notável ‘astro’”.
83
A revista A Semana também noticiou a passagem do astro americano pela
cidade, realçando uma fotografia do artista com sua esposa e o repórter no hangar
da Panair e outra fotografia com uma cena do filme Bloqueio (que estava em
exibição nos cinemas locais) e mais um pequeno texto sobre os seus filmes de
maior sucesso. Contudo, não poderia deixar de falar sobre a agitação causada com
a presença do astro.
Como era de se esperar, afluíram para o hangar, as mimosas bonecas (o
termo não é nosso...) para verem de perto o seu favorito. Porem com o
adiantado da hora, aos poucos foram desertando, somente dando margem
as mais renitentes, que a todo custo queria ver de perto o fugitivo de “Vive-
se uma só vez.
84
A cidade de Belém era um entreposto entre Hollywood e a capital federal do
Brasil.
85
Seguindo esse roteiro de viagem, aportou na capital paraense Orson
Welles. Sua passagem foi registrada no periódico na data de 08 de fevereiro de
1940.
O Brasil é muito falado nos E. Unidos, porém não tão conhecido nos seus
aspectos gerais, inclusive quanto as suas indústrias e, bem assim, no que
toca a sua parte econômica, não obstante os “films” diversos ali exibidos.
Idealizando temo-lo de fato visto como nação de largas possibilidades,
mostrando as suas riquezas naturais e o seu progresso, Orson Welles, um
dos grandes vultos da cinematografia norte-americana e escritor de renome,
82
Folha do Norte Belém, 12 de maio de 1939, p. 01. A reportagem do Jornal tinha como título “Henry Fonda
passa por Belém e tem alguns minutos de palestra com o repórter da Folha.
83
Ibid. 12 de maio de 1939, p. 01.
84
A Semana – Belém, 20 de maio de 1939, nº 1032.
85
“Belém era uma escala obrigatória para o Rio de Janeiro, sede do governo federal. Por aqui passaram Walt
Disney, Lana Turner, Orson Welles e muitos outros artistas famosos de Hollywood”. VERIANO, Pedro. Cinema
no tucupi. Belém: SECULT, 1999, p. 57.
48
cuja fama se projeta pelo mundo, na qualidade de responsável pela
“Mercury Productions”, em conjunto com a R.K.O., de Hollywood, resolveu
na longa excursão que realiza aos países sul-americanos, visitar
primeiramente, o Brasil.
86
A “decisão” de Hollywwod fazia parte da política desenvolvida pelo governo
dos Estados Unidos de estabelecer o intercambio cultural, com pretensões políticas.
Dentre outros que passaram pela cidade e deixaram os admiradores empolgados
com suas presenças, destaca-se o ator John Boles, “astro do cinema americano”, ao
passar pela capital paraense “não quiz deixar Belém sem fazer uma visita à Basilica
de Nazereth, onde esteve por um bom quarto de hora, admirando os mármores dos
altares”.
87
Pela reportagem do jornal, a cidade apresentava alguns pontos a serem
visitados pelas celebridades de Hollywood. Isso significava que a propaganda feita
49
Portanto, interessava ao Estado norte-americano investir em uma política de
boa vizinhança com o Brasil, intensificada com a atuação do “Office of the
Coordinator of Inter-American Affairs” sob a liderança de Nelson Rockefeller. O
Office desenvolveu uma política amistosa, procurando propagar nos Estados Unidos
o que a América latina tinha de interessante, especialmente o Brasil, tendo como
instrumento o cinema.
Artistas de Hollywood que vinham ao Brasil para promover seus estúdios
muitas vezes cooperavam com o governo americano na tarefa de
implementação da política de aproximação com o nosso país. De modo
geral, colhiam informações para orientar a ação do departamento de
Estado, no sentido de conquistar a opinião pública brasileira para a causa
americana: a defesa das Américas, sob a liderança dos Estados Unidos.
91
Em 1942 a passagem do vice-presidente do estúdio cinematográfico da
R.K.O. foi registrada no jornal Folha do Norte vinculada à política desenvolvida pelo
Office of the Coordinator of Inter-American Affairs, dirigido por Nelson Rockefeller.
Cada dia que passa, aumenta de maneira vertiginosa, nesta cidade de
Santa Maria de Belém, o movimento aviatório e, com ele, o de centenas de
passageiros de quase todas as nacionalidades (...) Instantaneamente
soubemos que estávamos na presença de mr. Reisman, o grande vice-
presidente da “R.K.O. Studios Representative of Rockefeller Foundation
Committe of Inter american Affair”, que tinha parte relevante no trabalho que
realiza Orson Welles no Rio e Janeiro e também em conexão com os
governos dos Estados Unidos e do Brasil para fazer 150 filmes pequenos
do adiantamento das indústrias, costumes e vida nativa do Brasil.
92
Na cidade, a guerra aumentou a movimentação de passageiros, dentre eles
os ilustres artistas de Hollywood incumbidos com a tarefa de desenvolver a política
de boa vizinhança com os países do sul do continente, promovendo o intercâmbio
cultural com a produção de filmes referentes às culturas latino-americanas, bem
como a partir de 1943, com a proposta de alegrar os soldados yankes
50
exemplo, destaca-se a presença da cantora portuguesa Carmen Miranda que foi o
grande expoente brasileiro na cinematografia hollywoodiana.
Em Belém, a notícia da contratação da atriz pelo estúdio da Fox Film Picture
foi informada pela revista em um comunicado repassado pela Empresa Teixeira
Martins & Cia, dona da Cinematographica Paraense, “é com grande prazer que
vimos comunicar a VV. SS., a sensacional notícia do contrato que nossa Companhia
acaba de fazer com a maior estrela do rádio e do cinema brasileiro: Carmen
Miranda”.
93
Carmen Miranda possuía grande prestígio perante o público do dio e do
cinema brasileiro, destacando-se com um tipo de vestimenta e rebolado exótico
conveniente com as características nacionais que seriam apresentadas nos Estados
Unidos. O estúdio de Hollywood fez o seu papel contratando a atriz e explorando a
diversidade cultural do Brasil, pouco conhecida pelos norte-americanos, como uma
forma de conhecer o seu vizinho.
Para a Fox Film Picture o mercado brasileiro possuía reconhecido prestígio
mundial, sendo que “esta formidável aquisição coloca nossa Companhia numa
indiscutível situação de superioridade perante o mercado cinematográfico brasileiro
– em particular (...)”.
94
O investimento feito pela Companhia na contratação de
Carmen Miranda seria recompensado pelo maior prestígio do estúdio diante do
público nacional. Continuando o comunicado “certos de darmos a VV. SS. a
confirmação de um fato importantíssimo para seus interesses comerciais” a Fox Film
do Brasil S/A realça o interesse econômico de ambas as partes.
Durante o período pesquisado, o ultimo artista famoso a pisar o solo da
cidade das mangueiras foi Humphrey Bogart, em fevereiro de 1944. O ator estava de
passagem pela cidade depois de cumprir suas atividades patrióticas animando os
soldados que estavam lutando na Itália e na África.
Ao ser interpelado quanto ao ponto de onde precedia, respondeu-nos que
da Itália e da África, onde estivera em companhia de sua esposa, com os
seus trabalhos artísticos, distraindo os soldados da guerra. Assim, tendo
cumprido o seu dever patriótico, retorna, agora, aos Estados Unidos.
95
93
A Semana – Belém, 18 de novembro de 1939, nº 1057.
94
A Semana – Belém, 18 de novembro de 1939, nº 1057.
95
Folha do Norte – Belém, 08 de fevereiro de 1944, p. 01 do Segundo Caderno.
51
Essas “trocas culturais” serviram para difundir perante a sociedade brasileira
a boa relação existente entre as duas nações. Entretanto, percebe-se a intenção
política por trás dessas trocas, pois após a entrada dos Estados Unidos na Guerra (e
posteriormente o Brasil) ficou mais explícito na imprensa o interesse de ambos em
tirar proveito da política de boa vizinhança no decorrer do conflito.
Essa manipulação da indústria cinematográfica pelos governos que se
envolveram na Segunda Guerra Mundial foi estudada ao longo da dissertação. Ao
iniciar a Segunda Guerra Mundial, em setembro de 1939, as salas de projeção da
cidade serviram como veículo de informação do conflito com a exibição de
cinejornais e filmes referentes ao conflito. Assim como os jornais e revistas da
época, o rádio e o cinema foram utilizados como propagadores de ideais políticos,
sendo que dentro ou fora dos filmes os artistas contribuíram com o esforço de
guerra, ora servindo nas fileiras militares como nobres soldados, ora atrás das
câmeras com filmes de propaganda.
52
1.3 LÍBERO LUXARDO E O CINEMA NA AMAZÔNIA
O nome de Líbero Luxardo dispensa apresentações.
Todos os que têm sentido de perto as lutas e as vitórias
do cinema brasileiro, conhecem o homem que sempre
sonhou com o cinema nacional vitorioso.
A Semana
96
A contribuição de Líbero Luxardo para a cinematografia no Pará tem uma
dimensão tão importante que possibilitaria o desenvolvimento de um trabalho
acadêmico específico e mais aprofundado. Seus vários filmes, produzidos durante
sua vivência na capital paraense, retrataram diversos aspectos do cotidiano citadino
na Amazônia, revelaram segredos e divulgaram a cultura produzida nessa região
para o resto do Brasil.
Obteve o reconhecimento nacional como diretor e produtor, participando das
várias partes da confecção dos seus filmes. Voltou-se, durante sua estadia em
Belém, para a construção de uma indústria cinematográfica na Amazônia e a
divulgação de suas riquezas, bem como na contribuição com o cinema nacional na
produção de filmes com características tipicamente brasileiras.
Apesar de sua extensa vida devotada ao cinema – seu primeiro filme foi
produzido em entre os anos de 1931 e 1932 (“Alma do Brasil”) e o último na cada
de 70 – será dedicado nesse subitem o período estudado na dissertação, ou seja, de
1939 (ano em que chegou a Belém) a 1945, devido a sua participação intensa na
vida política de Belém e da Amazônia, filmando os fatos referentes à política local e
as riquezas da região, culminando com a criação da “Amazônia Films” em parceria
com Felix Roque.
Nascido em 1908 no Estado de São Paulo, Líbero Luxardo começou sua
atividade cinematográfica em Mato Grosso. No livro “Cinema no Tucupi”, de Pedro
Veriano, pode-se encontrar um pequeno relato sobre sua vida e sua carreira como
diretor, desenvolvida durante sua estadia em Belém. Segundo o autor, Líbero
Luxardo chegou a ficar conhecido na cidade como “o cineasta da Amazônia”,
adotando a capital paraense como sua moradia permanente até sua morte, em
1980.
97
96
A Semana – Belém, 05 de agosto de 1939, nº 1042.
97
VERIANO, op. cit., p. 27-31.
53
Depois de fazer filmes em Mato Grosso com Alexandre Wulfes, sócio na
empresa FAM (Filmes Artísticos Mato-grossense), depois FAN (Filmes
Artísticos Nacionais), o paulista Líbero Luxardo (1908-1980) tomou o rumo
do Pará. Chegou a Belém em 1939 com uma cópia de seu maior sucesso,
“Alma do Brasil” (1931/1932) e com a disposição de fazer cinema na
Amazônia.
98
O desejo de “fazer cinema na Amazônia” motivou o cineasta durante toda sua
vida artística. Contudo, esbarrou em vários percalços existentes nesse período na
construção de uma cinematografia nacional independente, tais como: a competição
com a estética hollywoodiana e a falta de incentivos do Estado. Se na Capital
Federal brasileira à época (Rio de Janeiro) a estruturação de políticas voltadas para
o incentivo da produção cinematográfica era ínfima, na região norte era quase
impossível pensar na construção de um estúdio de cinema.
Até o início da Segunda Guerra Mundial, em setembro de 1939, na cidade de
Belém cinema era sinônimo de salas de projeção e filmes norte-americanos. A
exibição de filmes nacionais era pouco significativa nos cinemas locais e as
filmagens de películas era inexpressiva.
No cenário nacional alguns personagens fizeram nome com a indústria
cinematográfica. Adhemar Gonzaga, Humberto Mauro, Carmen Santos, entre outros,
lutaram para desenvolver o cinema brasileiro. Neste sentido, A Semana” trouxe um
artigo sobre “A situação atual da indústria cinematográfica do Brasil”, publicado no
dia 22 de julho de 1939.
99
Nota-se no artigo escrito por J. A. Batista Junior a penúria
pela qual passava o cinema nacional devido à falta de apoio estatal, a complexidade
na aquisição de equipamentos, a competição com os filmes estrangeiros e, ainda, o
idioma português que impedia a exibição em outros países (com exceção de
Portugal). A reflexão desenvolvida por Batista Junior derivou de uma perspectiva
edificada perante os cineastas e a imprensa brasileira.
Devemos dizer, por fim e em abono da verdade, que todas as informações
que se encontrava nesse artigo estávamos habilitados a ministra-las aos
leitores. Da parte do director da Cinédia elas foram apenas confirmadas. O
sr. Adhemar Gonzaga, na convicção que o anima, nunca solicitou do
governo um favor especial para amparo de sua indústria; apenas, continua
98
Ibid., p. 27.
99
A Semana – Belém, 22 de julho de 1939, nº 1040.
54
a trabalhar na esperança de que o seu esforço seja um dia devidamente
compreendida. Porque é um esforço, antes de mais, a favor do Brasil.
100
O esforço pelo bem do Brasil permeou o discurso para o desenvolvimento da
indústria cinematográfica brasileira, pois o cinema teria como função principal educar
as massas contribuindo para o desenvolvimento da nação. Destarte os sujeitos
históricos que participaram ativamente desse debate, durante a década de 30,
compreenderam o papel que desempenharia uma indústria cinematográfica
consolidada na construção de ideais políticos condizentes com a estrutura em vigor.
Para se refletir os discursos que estavam sendo debatidos no bojo dos
segmentos sócios envolvidos com o cinema tomam-se emprestadas as idéias de
Cláudio Aguiar de Almeida.
101
Para o autor, os debates a respeito da indústria
cinematográfica nacional e a produção de películas deveriam ser primeiramente
trabalhados com a finalidade educativa. Para isso, cineastas e educadores
participaram ativamente cobrando do Governo Federal a elaboração de leis que
viessem favorecer a produção de filmes brasileiros.
Por conseguinte, a exibição de películas nacionais esbarrava na pouca
aceitação dos donos das salas de projeção, que resistiam à apresentação desses
filmes, dificultando o desenvolvimento do cinema brasileiro, apesar do Decreto-lei
21.240, de 04 de abril de 1932, no artigo 13, ter promulgado a obrigatoriedade da
exibição de curtas nacionais.
Nesse caso, percebe-se uma grande distância entre o que o decreto-lei
obrigava e o que ocorria de fato no cotidiano dos cinemas brasileiros. Na capital
paraense a matéria publicada na revista, em 1939, demonstrava que o decreto não
surtiu o efeito desejado.
Há, diser-se-á, em vigor, a lei da obrigatoriedade da inclusão dos “shorts”
nos programmas, também chamada a lei dos 100 metros (...) Entretanto,
existe, no Brasil, para mais de 1.600 estabelecimento de exibição
cinematográfica onde as películas brasileiras não encontram colocação!
102
No final da década de trinta a luta pelo progresso do cinema brasileiro era
almejada pelos sujeitos sociais que discutiam as diferentes formas de viabilizar
100
A Semana – Belém, 22 de julho de 1939, nº 1040.
101
ALMEIDA, Cláudio Aguiar. O cinema como “agitador de almas”: argila, uma cena de Estado Novo. o
Paulo: ANNABLUME, 1999.
102
A Semana – Belém, 22 de julho de 1939, nº 1040.
55
condições junto ao Estado ou em empreendimentos individuais. Sendo assim,
durante a década de trinta:
São fundadas duas companhias: a Cinédia, de Adhemar Gonzaga e a Brasil
Vita Filmes, de Carmen Santos, ambas na capital federal, que é onde se
concentrará a produção cinematográfica brasileira durante os anos 30 e
40.
103
Os estúdios da Cinédia, Brasil Vita Filmes e a Sonofilmes (em menor
proporção) eram as principais companhias cinematográficas brasileiras, tendo
construído suas bases em virtude do arrojo de alguns cineastas que viam no modelo
Hollywoodiano as bases para a indústria de cinema.
104
Porém, a autora chama a atenção para a questão da industrialização
brasileira que, iniciada de forma tardia, não comportava condições históricas para se
comparar ao modelo criado nos Estados Unidos. Com efeito, a febre pela
industrialização do cinema no Brasil causava um estado de euforia nos grupos
sociais envolvidos nos embates, proporcionando duas formas de organização da
indústria cinematográfica: uma artesanal, com os pequenos estúdios, e a outra
empresarial com os grandes estúdios.
Os grandes estúdios e seus empreendedores da capital federal tornaram-se
as referências para a cinematografia nacional. A Semana, de 29 de julho de 1939,
um dos redatores da revista escreveu um artigo sobre a produção do filme
“Inconfidência Mineira” de Carmen Santos.
105
Everardo Guilhon, em seu artigo,
expôs, em linhas gerais, a contribuição da atriz, produtora e cineasta para a
formação da indústria do cinema com características empresarias, bem como com a
produção de películas de caráter educativo, como no caso do filme citado. Sua visão
103
FERREIRA, Suzana Cristina de Souza. Cinema carioca nos anos 30 e 40: os filmes nas telas da cidade. São
Paulo: ANNABLUME, 2003, p. 57.
104
Em 1930 foram concluídas as obras do estúdio da Cinédia de Adhemar Gonzaga; em 1934 Carmen Santos
funda a Brasil Vita Filmes e no ano de 1936 foi inaugurado mais um estúdio chamado SonoFilmes, dos
empresários Alberto Byington e Wallace Downey. Ibid., p. 60.
105
A Semana Belém, 29 de julho de 1939, 1041. “Carmen Santos e a ‘Inconfidência Mineira’”. Jean-
Claude e Alcides Freire Ramos fizeram um guia didático de filmes que tratavam sobre temas relacionados à
História do Brasil. Assim escreveram “A Inconfidência Mineira (1938-1948, p&p, Carmen Santos) primeira
incursão pelo gênero histórico empreendida pela Brasil Vita Filmes, de propriedade de Carmen Santos. O filme,
muito caro para a época, não obteve o sucesso esperado. Cabe salientar que o filme desapareceu quase
inteiramente, sobrando alguns trechos disponíveis na Embrafilme sob o título A Inconfidência Mineira: sua
produção (1971, cor e p&b, Jurandir Noronha)”. BERNARDET, Jean-Claude e RAMOS, Alcides Freire. Cinema
e história do Brasil. São Paulo: Ed. Contexto, 1988, p. 75.
56
coincidia com a concepção geral discutida no meio cinematográfico e educacional no
Brasil.
Todos nós, que conhecemos de quanto é capaz Carmen Santos, ficamos
crentes que ela, com sua Inconfidência, marcará época em nosso cinema.
Não será somente suposição, constata-se. Carmen é esforçada; ela, junto
ao Sr. Gonzaga, forma a dupla que mais tem batalhado pela sétima arte no
Brasil (...) Será o drama máximo de nossa independência
cinematográfica...
106
Na perspectiva de Everardo, o cinema brasileiro tinha como seus principais
defensores Adhemar Gonzaga e Carmen Santos. A dupla não se deixava abalar
pelas intempéries da situação, na qual se encontrava a cinematografia nacional,
continuando na luta pela independência do cinema brasileiro com a produção de
filmes de longa metragem. Para isso, o filme Inconfidência Mineira retrataria a luta
pela independência, tanto do Brasil para com a Metrópole portuguesa quanto para a
cinematografia nacional (segundo o autor houve a colaboração de historiadores para
dar fidelidade aos fatos históricos) e seria uma grande produção artística.
Retomando as idéias de Cláudio Aguiar Almeida, no filme, Carmen Santos
tinha como intuito utilizar o cinema como veículo educativo para as massas,
retratando Tiradentes como um homem do povo que superou as dificuldades
impostas pela vida e tornou-se um herói nacional, inspirando, na película, os ideais
de patriotismo e superação.
107
Em Belém, as reportagens veiculadas nos periódicos paraenses refletiram as
discussões desenvolvidas no âmbito nacional, sendo que a contribuição a esses
debates e a produção cinematográfica teve em Líbero Luxardo seu representante na
Amazônia. Retomando a epígrafe, o cineasta dispensava apresentações, pois seu
trabalho era conhecido na cidade e sua luta pelo desenvolvimento do cinema era
reconhecida perante os intelectuais e críticos da área.
Em agosto de 1939 foi noticiada pela A Semana uma entrevista concedida
pelo cineasta que tratava sobre ”sua chegada a terra das mangueiras, fomos ao
Rotisserie Suisse, para ouvir suas impressões de nossa Belém e do que pretende
realizar na Amazônia”.
108
O cinegrafista fez vários elogios à cidade e à hospitalidade
106
A Semana – Belém, 29 de julho de 1939, nº 1041.
107
ALMEIDA, op. cit. p. 104-06.
108
A Semana Belém, 05 de agosto de 1939, 1042. A reportagem da revista tinha como título “Libero
Luxardo: o esforçado e magnânimo cinegrafista brasileiro fala ‘A Semana’”.
57
do povo paraense, demonstrando grande entusiasmo em fazer cinema em prol do
Estado do Pará.
Nesse primeiro momento de sua chegada, Luxardo não tinha ainda definido
seus planos e metas para a produção de filmes na região, possuía somente o
interesse em filmar “as cousas profunda e genuinamente nossas”.
109
Ele falou sobre
suas películas, o esforço para filmá-las no Estado do Mato Grosso e destacou a
mais recente: Aruanã, que ainda não havia sido exibido nos cinemas do Brasil.
O lançamento de Aruanã, “nome de um deus belicoso e iracundo”,
110
provocou expectativas na comunidade cinematográfica, merecendo alguns artigos
publicados na revista, como a crônica escrita pelo próprio cineasta e publicada na
revista Cinearte:
Líbero Luxardo, o cinegrafista que se encontra entre nós, escreveu essa
cronica para ‘Cinearte’, e como se case no momento que antecede ao
lançamento de Aruanã, tomamos a liberdade de transcrever da grande
revista carioca.
111
O texto foi transcrito para A Semana, tendo como título “O segredo da índia
branca”. Tratava-se de um comentário sobre a atuação dos atores e do roteiro do
filme, enfocando os aspectos históricos dos bandeirantes e seu encontro com uma
tribo indígena, tendo como foco o romance entre a filha do cacique e um dos
bandeirantes. Esse filme (assim como outros) não foi encontrado para análise, mas
as informações contidas nos periódicos belenenses ajudaram a reconstruir parte dos
aspectos históricos presentes no filme.
A importância do filme para o cinema nacional advinha do seu roteiro e dos
ambientes filmados, tendo como destaque uma região pouco conhecida dos
brasileiros e, trabalhando com aspectos da historia do Brasil, a película mereceu
reconhecimento quanto ao seu caráter educativo. Lembrando que os debates em
torno do cinema educativo estavam em voga nos discursos dos intelectuais da
educação e críticos de cinema, outro artigo vem elucidar os esforços empreendidos
pelo cinegrafista:
109
Ibid., nº 1042.
110
Ibid., nº 1042.
111
A Semana – Belém, 02 de setembro de 1939, nº 1046.
58
As nossas lendas indianas devem ser conhecidas através dos filmsLarga
publicidade se tem feito em torno de “Aruanã”, o film de grande metragem
que Líbero Luxardo realizou em plena selva das margens do araguaya. Está
por pouco o lançamento desta pellicula na Cinelandia. Antes que possamos
assitil-a para emittirmos a nossa opinião, julgamos interessante
anteciparmos o estado de nosso espírito de referencia a este trabalho.
112
Pelo título, entendem-se os filmes como meio propagador de conhecimento e
informação a serviço da educação e, conseqüentemente, dos governos que a
utilizasse como fonte para sua proposta política. Em se tratando de Aruanã, as
paisagens da selva a serem desbravadas pelas lentes do cinegrafista também
representavam a política de integração desempenhada por Getúlio Vargas durante a
década de quarenta do século passado. Além do espaço físico, os aspectos culturais
seriam conhecidos pelo público, servindo como meio de instrução para os escolares
e os freqüentadores em geral.
Lenharo (1986) é um importante interlocutor no debate concernente à política
desenvolvida pelo Estado Novo na construção do símbolo criado em torno de
Getúlio Vargas. O discurso do Estado procurava enfatizar a integração do interior do
Brasil como um projeto para exaltar a nacionalidade brasileira integrada e sem
conflitos:
O espaço físico unificado constitui o lastro empírico sobre o qual os outros
elementos constitutivos da Nação se apóiam: a unidade étnico-cultural, a
unidade econômica, política, o sentimento comum de ser brasileiro
113
.
Comparando com outros filmes brasileiros, Aruanã possuía um estilo
tipicamente brasileiro, com métodos próprios e sem utilizar o modelo norte-
americano como referência “é o cinema brasileiro feitos com motivos de Brasil. Brasil
indianista tal como o começo do nosso romance”. Assim como a literatura, o cinema
seria outra linguagem, a visual, aplicada como instrumento pedagógico para facilitar
a aprendizagem e o conhecimento “é a paizagem, é a lenda, é o elemento humano
tudo conjugado neste film que iremos ver”.
114
Destarte a chegada de Líbero Luxardo na “cidade das mangueiras” gerou
discussões durante o mês de setembro, devido sua contribuição para o cinema
112
A Semana Belém, 09 de setembro de 1939, 1047. “As nossas lendas indianas devem ser conhecidas
através dos films”.
113
LENHARO, Alcir. Sacralização da política. 2º ed. São Paulo: Papirus, 1986, p. 57.
114
A Semana – Belém, 09 de setembro de 1939, nº 1047.
59
nacional e as expectativas para a cinematografia no Estado do Pará, sua reputação
lhe valeu a apreciação de “Raymundo Magalhães, o brilhando theatrólogo e contista
que com tanta proficiencia e tão agudo senso critico dirige a secção
cinematographica de nosso colega ‘A Noite’”.
115
Na publicação transcrita do jornal A
Noite, do Rio de Janeiro, Raymundo Magalhães define o cineasta como “um dos
valores novos do cinema brasileiro e uma das inteligências mais brilhantes entre os
que nelle empregam a sua actividade, está se dedicando exclusivamente ao cinema
nacional”.
116
O espírito aventureiro e inovador de Luxardo na produção de filmes que
desbravaram regiões pouco conhecidas, mostrando a diversidade do país e seus
habitantes, renderam-lhe prestígio diante da comunidade cinematográfica, mesmo
dispondo de parcos recursos para a elaboração das películas. O teatrólogo finaliza
sua opinião a respeito do cinegrafista discorrendo sobre o desenvolvimento do
cinema brasileiro no final da década de trinta e as expectativas para o futuro.
Oxalá, o cinema nacional, alcance um desenvolvimento maior e, bem
aparelhado, possa lançar-se, em breve, à producção de films de longa
metragem. Líbero Luxardo, precisa de uma nova “chance”. Mas de uma
“chance” real, assegurada uma cooperação financeira e technica efficiente,
porque assim tenho certeza, será capaz de realizar um bello film, cheio de
muita verdade, de muito colorido, de muito Brasil.
117
Mostrar um Brasil desconhecido e rico culturalmente passou a ser a meta do
cineasta e o cinema seria seu meio de apresentá-lo para o restante do país.
Contudo, não dependia somente da vontade e entusiasmo dos indivíduos
empenhados na produção cinematográfica, mas também do auxílio estatal para criar
condições para o estabelecimento da indústria cinematográfica nacional.
As reportagens sobre Libero Luxardo entre setembro de 1939 e agosto de
1940 aparecem de forma esporádica, geralmente informando a respeito da atividade
do cinegrafista. O diretor permaneceu na cidade exercitando sua profissão, porém
sua ambição era filmar outras regiões do Pará e da Amazônia. Assim, em agosto de
1940, o cineasta partiu para uma empreitada no Tapajós, onde:
115
A Semana Belém, 16 de setembro de 1939, nº 1048. “Líbero Luxardo na apreciação de Raymundo
Magalhães”
116
Ibid., nº 1048.
117
Ibid., nº 1048.
60
Colherá aspectos da indústria extractiva da borracha e do panorama
regional, para fins convenientes, que, ao seu tempo, bem conhecidos se
tornarão, com vantagens para o paiz em geral e em particular para o
norte.
118
O extrativismo da borracha, produto que no final do século XIX e início do XX
proporcionou grandes lucros para a região amazônica, voltaria a ser objeto de
desejo dos países aliados durante a Segunda Guerra Mundial. A reportagem já
indicava a borracha como produto preponderante para a integração da Amazônia ao
resto do país, sendo que essa grande extensão de terra, onde o poder central pouco
se fazia presente e distante da capital federal passaria a ser mais conhecida através
das fitas, servindo para elevar o conceito da região norte em relação ao resto do
Brasil.
As iniciativas do cinegrafista em tornar o “panorama regional” da Amazônia
conhecido para os brasileiros foram comumente divulgadas como gesto de
patriotismo e empenho na edificação da nação brasileira. A luta patriótica na região
para filmar as riquezas, paisagens e cultura voltaram a aparecer no periódico no
decorrer de 1941, iniciando em 25 de maio com a reportagem “A Amazônia terá seu
Filme”.
119
Local de difícil acesso, geralmente esquecido pelo poder público federal, o
empreendimento pioneiro trouxe boas expectativas, sendo que:
O cinema, a sétima arte, é o meio de difusão mais expressivo e
convincente. Não poderíamos desejar melhor oportunidade para apresentar
ao mundo a nossa natureza e o nosso humano tão discutidos como pouco
compreendidos.
120
Ênfase para o papel do cinema como instrumento convincente na transmissão
de informações, caracterizando o filme como realista e importante utensílio de
propaganda para divulgar as riquezas culturais da região norte. Com a finalidade de
difundir, através da película, um espaço de construção cotidiana do ser humano na
natureza e seu progresso em domesticá-la, a iniciativa foi reconhecida como uma
“obra de sadio patriotismo ‘O ressurgimento da Amazônia’, merece o apoio franco
dos nossos homens do governo”.
121
Esquecida desde a decadência da borracha no
118
Folha do Norte – Belém, 17 de agosto de 1940, p. 02.
119
Folha do Norte – Belém, 25 de maio de 1941, p. 14.
120
Ibid., p. 14.
121
Folha do Norte – Belém, 25 de maio de 1941, p. 14.
62
nos conhecem através de tradições vagas e de lendas em que os mitos nem
sempre nos são favoráveis”.
125
No geral, os esforços cometidos para a produção de um filme sobre a
Amazônia serviam para interesses múltiplos, tanto do presidente Getúlio Vargas
quanto para os sujeitos sociais da região que, empenhados em difundir suas
riquezas para o mundo, viram no projeto um meio de concretizá-lo. Segundo Joraci
Camargo, teatrólogo e cineasta, Libero Luxardo era um “idealista impenitente, que,
depois de aprofundado na arte para a qual nasceu, como representante de uma
geração que se formou sob os influxos da cinematografia, sentiu-se atraído pelo
maravilhoso cenário da Amazônia”.
126
As considerações feitas por Joraci Camargo sobre o cinegrafista em uma
entrevista para o jornal, expuseram a vontade e idealismo como fatores marcantes
da sua trajetória cinematográfica, mesmo com as dificuldades de fazer cinema no
Brasil, culminando com sua vinda para Belém para produzir filmes sobre a opulência
da Amazônia. Apesar das divergências existentes entre Joraci Camargo e Libero
Luxardo, devido à recusa por parte do cineasta em dirigir um filme de Joraci,
concluiu o teatrólogo.
Devo dizer, entretanto, que o perdoei, logo que ouvi os seus planos, mais
condizentes com a sua capacidade e o seu idealismo, como sejam os de
realizar o grande filme da Amazônia, em todos os seus aspectos com uma
finalidade nobre e elevada, digna da atenção de todos os governos, pois
inclui, além da apresentação de toda a beleza amazônica, a fixação de seus
problemas e a indicação prática de suas soluções, dentro dos postulados do
Estado Novo, sem esquecer a necessária homenagem ao nosso grande
presidente.
127
Percebe-se, a partir das fontes, que o projeto de fazer um filme sobre a
Amazônia fazia parte dos “postulados do Estado Novo” em utilizar o cinema como
instrumento de propaganda das suas atividades políticas. Segundo Roney
Cytrynowicz a integração da região ao restante do país e:
O impulso para a batalha para domar a natureza, impor a ela a vontade da
nação, vontade guerreira, estava definida muito antes de o governo iniciar
125
Folha do Norte – Belém, 27 de maio de 1941, p. 02.
126
Folha do Norte – Belém, 15 de junho de 1941, p. 06.
127
Ibid. 15 de junho de 1941, p. 06.
63
a mobilização de trabalhadores para a Batalha da Borracha’, na Amazônia, a
partir de 1942.
128
Ou seja, desde 1940, quando Líbero Luxardo partiu de Belém para filmar a
região do Tapajós e principalmente a exploração da borracha, falava-se na
contribuição para o fortalecimento da pátria e da propaganda do Estado Novo,
visando um promissor futuro para a Amazônia.
Medeiros (1998) fez uma interessante abordagem sobre a utilização da
fotografia para exaltar a figura de Getúlio Vargas. A autora analisa as fotografias
existentes no acervo do DIP, referentes à imagem do Presidente e como foram
empregadas pelo órgão estatal na criação do símbolo do “pai dos pobres”. Nesse
caso, as fotos foram entendidas como um instrumento de grande valia para a
propaganda forjada pelo DIP na construção do mito Getúlio Vargas, como estratégia
para a conquista das massas.
129
Para os estudos empreendidos nesta dissertação, a análise do cinema no
Estado do Pará não esteve à margem dessa política desenvolvida pelo DIP.
Percebe-se nos artigos dos periódicos uma articulação com o discurso desenvolvido
em outras cidades do Brasil a respeito do uso dos meios de comunicação,
principalmente o cinema, na construção do mito em torno do chefe da nação.
Sendo assim, a borracha parecia ser novamente o “carro-chefe” para o
reconhecimento do território amazônico, pois no cenário da Segunda Guerra Mundial
havia o problema da escassez do produto para os países aliados, principalmente
os Estados Unidos, que foi agravado com a entrada do Japão na guerra e o domínio
das regiões produtoras do Pacífico. Desse modo, outro artigo foi publicado no jornal
sobre as filmagens que Líbero Luxardo havia feito no Baixo Amazonas.
Pelo último correio aéreo, seguiram para a capital do país três filmes
realizados no Baixo Amazonas pelo nosso colaborador, o habilíssimo
repórter cinematográfico Líbero Luxardo. Trata-se de interessantes
trabalhos focalizando Pecuária e Borracha e um terceiro sobre a lendária
região do anfiteatro amazônico, no município de Monte Alegre.
130
128
CYTRYNOWICZ, op. cit., p.199.
129
MEDEIROS, Sabrina Evangelista. O Estado Novo: o mito do pai dos pobres. In: SILVA, Francisco Carlos
Teixeira da. (org.). História e Imagem. Rio de Janeiro: UFRJ, 1998, p. 349-355.
130
Folha do Norte – Belém, 20 de julho de 1941, p. 01 do Segundo Caderno. A reportagem tinha como título “O
cinema e a difusão das riquezas da Amazônia: Líbero Luxardo dá início ao grande programa publicitário das
principais zonas do Baixo Amazonas”.
64
Comumente veiculado como uma obra social para o Norte, o trabalho
cinematográfico do diretor seguiu para o Rio de Janeiro para ser apresentado pela
Distribuidora de Filmes Brasileiros (DFB) para o conhecimento das autoridades a
respeito dos aspectos econômicos, sociais e culturais do território, sendo que “os
filmes são falados e musicados, representando a mais útil contribuição em prol dos
problemas do vale”.
131
A produção de filmes voltados para a difusão das riquezas amazônicas foi
muito elogiada voltando a aparecer na coluna Gazetilhas como um gesto de
patriotismo em prol da nação e uma obra social para os que residiam na região.
A superior categoria da propaganda atinge a de um serviço social, e
também obra de nacionalismo, quando dirigida patrioticamente, com
finalidade de fazer com que o homem ame a sua terra através do
conhecimento que por meio da propaganda venha a ter dela. Nesse sentido,
nosso confrade e cinegrafista bero luxardo, radicado entre nós vários
anos, vem realizando tarefas cinegrafistas tanto mais meritórias quando
todo o norte não conta com outro operador além desse paulista vibrante de
talento e boa vontade. Este jornal, reconhecendo-lhe os méritos de
65
“o qual realizará a mais eficiente propaganda das nossas riquezas e da cultura da
nossa gente”.
134
Enfim, na região norte tentara-se criar uma produção
cinematográfica local para colaborar no desenvolvimento do território e na
propaganda da cultura e da opulência amazônica.
O studio” em instalação ocupa todo o edifício do antigo cinema Odeon, à
Praça Justo Chermon, 140, onde estão sendo investidos capitais no valor
de algumas centenas de contos, para a execução do grande entrecho
intitulado: “O Ressurgimento Amazônico”.
135
As bases foram lançadas para o cinema no Norte do país, com uma produção
voltada para as necessidades do local. O estúdio da Amazônia Filmes trazia ânimo
para os que acreditavam no ressurgimento econômico da região, antes abastada
com as riquezas geradas com a produção da borracha no final de século XIX e início
do XX. Pedro Veriano destaca que durante a Segunda Guerra Mundial construiu um
estúdio na Av. Nazaré, no centro de Belém, produzindo documentários de curta-
metragem. Pretendia simultaneamente, rodar um filme longo no marajó”
136
. Assim
como naquela época áurea em que Belém foi vista como a “Paris dos Trópicos”,
devido seu desenvolvimento urbanístico, esperava-se o mesmo no período da
guerra, pois a borracha tornara-se produto visado pelos países Aliados.
Destarte o produto gomífero era registrado pelas câmeras de Líbero
Luxardo desde o início de 1940, sendo que com a intensificação da exploração da
borracha para suprir as necessidades dos Aliados na guerra, o mês de junho de
1943 foi considerado o mês da borracha, dando força para a “Batalha da Borracha”
ser encampada pelo Governo de Getúlio Vargas. Para isso, uma película produzida
pela Amazônia Filmes foi utilizada como propaganda do regime na luta pela
exploração do produto.
Acaba de ser remetida à capital do país um interessante documentário
cinematográfico, intitulado “A Batalha da Borracha”, realizado por ocasião
da recente visita do coordenador da Mobilização da Economia Brasileira à
Fordilandia e sob a orientação do chefe da Divulgação daquele alto
departamento nacional.
137
134
Folha do Norte – Belém, 06 de fevereiro de 1942, p. 03.
135
Ibid., p. 03.
136
VERIANO. P. op. cit. p. 27.
137
Folha do Norte – Belém, 30 de janeiro de 1943, p. 01 do 2º caderno.
66
Nesse momento, o governo brasileiro havia rompido relações com os
países do eixo, devido o ataque aos navios mercantes nacionais e, também iniciado
o estado de guerra mobilizando o povo brasileiro na luta contra os países nazi-
fascistas. O esforço de guerra brasileiro na Amazônia advinha com a extração da
borracha para ajudar os Aliados no combate mundial, sendo assim:
O DEIP local, que encampou a iniciativa do chefe da Divulgação da
Coordenação Econômica Brasileira, está de parabéns pela excelente
realização do nosso estúdio, muito especialmente por que apresenta o
primeiro trabalho publicitário de vulto sobre a momentosa questão da
borracha.
138
O filme foi utilizado como propaganda na “Batalha da Borracha” pela
Coordenação Econômica Brasileira, tendo o estúdio paraense se destacado como o
primeiro a apresentar uma película sobre a extração do produto na região. Assim, o
trabalho de Luxardo e da Amazônia Filmes continuou com os registros políticos do
Estado, filmando a posse do Coronel Magalhães Barata como Interventor do
governo paraense, em fevereiro de 1943 e outras atividades políticas referentes ao
governo estadual durante a interventoria do Coronel.
Contudo, o grande filme sobre a Amazônia havia sido esquecido, pois não
houve mais notícias a seu respeito, sendo que em outubro de 1943 uma carta
publicada pelo periódico trouxe de volta a produção prometida pelo Estúdio da
Amazônia Filmes.
Senhor redator da FOLHA DO NORTE Peço ... para solicitar uma
informação, certo que a mesma satisfará um grupo de “fans” do Cinema
Brasileiro que, nesta capital, acompanha com interesse a evolução da
extraordinária indústria entre nós. Se o estou enganado, no mês de maio
do corrente ano, o seu conceituado jornal publicou, com muito destaque,
uma sensacional noticia sobre o movimento cinematográfico iniciado pela
“Amazônia Filmes” (...) Venho acompanhando e assistindo todos os
documentários realizados pela “Amazônia Filmes” e devo reconhecer que
são excelentes, muito em particular o realizado por ocasião da chegada do
nosso interventor, v. excia. O coronel Magalhães Barata (...) Entretanto,
senhor redator, a grande produção prometida, salvo engano, era para ser
apresentada durante este mês e até agora os “fans” não tem a menor
informação sobre o desenvolvimento dos trabalhos...
139
138
Ibid., p. 01 do 2º caderno.
139
Folha do Norte Belém, 22 de outubro de 1943, p. 02. A carta foi publicada no jornal com o título “Que
do filme amazônico ‘Terra que acorda’”, tendo a pessoa que escreveu se identificado como “VELHO FAN DE
CINEMA”.
67
O interesse pelo filme foi muito evidente desde o início da criação do estúdio
e o anúncio da produção cinematográfica sobre a Amazônia. A carta trazia uma
cobrança a respeito do filme, pois visava o reconhecimento da região através da
película, o que interessava a todos que viam no cinema um instrumento de
propaganda. Mesmo os fãs da cidade viam o estúdio como importante para o
fortalecimento do cinema nacional e, principalmente, para a região. A carta
continuava seu argumento criticando as informações a respeito do filme, já que
foram publicadas primeiramente na revista carioca Cêna Muda, enquanto que “se
tratando de um filme amazônico, com cenários e artistas nossos, sejamos
justamente nós, os últimos a ter noticias da grande produção”.
140
A reposta veio no dia 27 de outubro com uma carta do Diretor da Amazônia
Filmes, Felix Roque, justificando aos fãs do cinema brasileiro a ausência de notícias
sobre o filme.
Serve a presente para trazer ao conhecimento de V. S. que dentro de
alguns dias iniciaremos a rodagem do filme Terra que acorda, baseado num
argumento do escritor Líbero Luxardo, sócio desta Empresa e diretor
artísticos da referida produção.
141
A presente carta vinha esclarecer ao “Velho fan de cinema” e outros
admiradores do trabalho que a produção se encontrava no início da fase de
gravação e:
Tratando-se de um trabalho de vulto e alto interesse para a região
amazônica, pois o filme romanceia episódios de nossa história, contando o
nosso apogêo, os nossos costumes, sob o cenário insuperável da nossa
paisagem, justo é que solicitemos o apoio desse grande órgão da nossa
imprensa, no sentido de divulgar as múltiplas seqüências de nosso árduo
trabalho, cooperando assim para a feliz realização desta grande obra
publicitária para a Amazônia.
142
Não existem registros de que o filme “Terra que acorda” foi concluído pelo
estúdio da Amazônia Filme. Contudo, Libero Luxardo continuou acompanhando as
atividades políticas do Coronel Magalhães Barata durante sua interventoria estadual,
que durou até 1945 (período de democratização do Brasil).
140
Ibid., p. 02.
141
Folha do Norte – Belém, 27 de outubro de 1943, p. 01 do 2º Caderno.
142
Ibid., p. 01 do 2º Caderno.
68
Desde o início do trabalho de Libero Luxardo na Amazônia suas películas
foram informadas nos periódicos como importantes para a cinematografia nacional e
regional, servindo como propaganda do território amazônico e sua cultura para as
demais regiões do Brasil. Seus filmes tinham cunho patriótico e informativo, servindo
como instrumento educativo condizente com as idéias dos sujeitos sociais no
período do segundo conflito.
69
CAPÍTULO II
A GUERRA NOS CINEMAS DE BELÉM: A PROPAGANDA
NOS ANÚNCIOS CINEMATOGRÁFICOS
70
2.1 A GUERRA NOS CINEMAS: OS FILMES E CINEJORNAIS NORTE
AMERICANOS.
O cinema é a imagem viva dos acontecimentos. Ouvir ou
lêr um fato é bastante diferente do que “vê-lo”, em todos
os seus detalhes. A realidade é sempre mais imaginativa
do que a ficção.
Folha do Norte
143
Desde o início de 1939 os cinemas informavam sobre a movimentação bélica
no continente europeu. Junto aos periódicos locais e o rádio, as salas de projeção
serviram como veículo de informação sobre a Segunda Guerra Mundial, tanto
através dos cinejornais como dos filmes longa metragens que falavam sobre o
conflito. Para a população citadina a “realidade” da guerra repassada através das
películas comovia e influenciava (tentaram influenciar) o público dos cinemas
brasileiros.
O anúncio do cinema Iracema, de janeiro de 1944, focalizava esse espaço
como interativo para adquirir conhecimento sobre os fatos ocorridos no mundo e,
principalmente, mostrava nas telas imagens da “realidade filmadas nos próprios
campos de batalha. O seu título “Não ouça, nem leia! Veja com os seus próprios
olhos...”
144
destacava o que durante o segundo conflito se configurou como
instrumento de informação importante para a população de Belém, que freqüentava
as salas de projeção apreensiva para saber passo a passo o desenrolar da guerra.
Nesse momento, a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial era
iminente e suas tropas se preparavam para ir ao continente europeu lutar a favor da
democracia contra os inimigos nazistas. Cada nova invasão, derrota, avanço, recuo
ou bombardeio era esperado com entusiasmo por muitos, que buscavam nos
diferentes meios de comunicação uma forma de informação sobre o assunto.
Continua o anúncio:
...é por isso que as cidades cultas possuem cinemas especializados em
mostrar flagrantes verídicos e que se passam nos países que não
143
Folha do Norte Belém, 16 de janeiro de 1944, p. 04. “Não ouça, nem leia! Veja com os seus próprios
olhos...”.
144
Ibid. p. 04.
71
conhecemos. Entre nós já temos um cinema que dedica um dia da semana
– as segundas-feiras – a essa finalidade.
145
Desse modo, às segundas-feiras o público podia ter sessões
especializadas em prestar informações sobre os acontecimentos mundiais e, nesse
caso, o cinema Iracema prestaria enorme contribuição para a população da capital
paraense transmitindo imagens do front de combate.
As imagens em movimento da guerra, segundo o anúncio, seriam bem mais
assimiladas se comparadas às reportagens escritas dos periódicos ou ouvidas
através dos rádios. Por isso as cidades “cultas” dispunham de um dia na semana
para informar através das reportagens cinematográficas. Sendo assim, no mesmo
dia, na página anterior, outro anúncio do mesmo cinema destacava “apostamos de
V. não sabe o que se passa no mundo. E isto pela simples razão de que V. é um
homem ocupado que não tem tempo para lêr todas as notícias da guerra”.
146
A euforia criada com a declaração de guerra do Brasil aos países do Eixo em
1942 e as derrotas sofridas pelos exércitos da Alemanha, Itália e Japão pelos
Aliados havia amenizado o perigo de uma invasão nazista no ano de 1944. A
rotina dos cidadãos da cidade de Belém voltava ao normal, porém a guerra não
havia terminado e o inimigo ainda não estava rendido. Assim, havia suspense e
euforia na oportunidade para acompanhar o desenrolar do confronto nas salas de
projeção.
Retrocedendo até o ano de 1939 poder-se-ia dizer que a guerra estava longe,
não, somente por envolver inicialmente apenas os países da Europa, mas porque
não afetou inicialmente o cotidiano dos citadinos belenenses.
147
A “neutralidade
brasileira colocava a nação em uma posição de espectador dos eventos mundiais e,
como bons espectadores, nada melhor que uma tela branca em um salão escuro
para tomar ciência do conflito.
Cytrynowicz (2000) afirma que ao trabalhar com o tema do cotidiano, durante
a Segunda Guerra Mundial em São Paulo, deve-se compreender as intenções do
145
Ibid., p. 04.
146
Folha do Norte – Belém, 16 de janeiro de 1944, p. 03. “Você sabe o que está se passando no mundo?”.
147
A guerra começou com a ocupação da Polônia pelos exércitos nazistas em 1º de setembro de 1939.
Inicialmente confrontaram-se diretamente as principais potências européias, de um lado Alemanha e Itália (Eixo)
e de outro, Inglaterra e França (Aliados), tendo a União Soviética assinado em agosto de 1939 o tratado de
Molotov-Ribbentrop com a Alemanha de não agressão. Configurou-se em um primeiro momento como uma
guerra européia, posteriormente o conflito se expandiu para outras nações do mundo. VIGEVANI, op. cit., p. 15-
35.
72
governo brasileiro de criar um clima de guerra mobilizando a população sem que
esta realmente esteja sofrendo qualquer tipo de ataque inimigo e para isso, o rádio e
o cinema sem dúvida contribuiu significativamente para criar esse sentimento.
A guerra para o Brasil, para São Paulo, mesmo quando estava formalmente
declarada a guerra entre Brasil, Alemanha, Japão e Itália, foi uma notícia
contada pelo Rádio (como seria depois, essencialmente, imagens de
cinema norte americano).
148
O estado de guerra mobilizou as várias cidades do Brasil na luta contra o
perigo nazi-fascista, sendo que, para esse autor, o perigo da invasão inimiga era
muito mais notícia nos meios de comunicação do que a certeza de uma ofensiva.
Percebe-se na análise da documentação que o cinema desde o primórdio do conflito
foi utilizado como meio de divulgação das movimentações bélicas dos países
envolvidos diretamente no conflito. No entanto, como a maioria dos filmes exibidos
nas salas de projeção da cidade de Belém era de procedência norte-americana,
pode-se afirmar que nos ideais propagados através das telas ecoavam a política de
boa vizinhança pregada pelo governo dos Estados Unidos.
Como escreveu Cytrynowicz (2000) as imagens cinematográficas tornaram-se
essenciais na veiculação das informações. Dessa forma, também se observa que,
de acordo com os documentos, as mobilizações dos países beligerantes eram
divulgadas antes da declaração de guerra, em de setembro de 1939.
Não é mais segredo para ninguém, a famosa fortaleza conhecida por “linha
Maginot”, que a França construiu para sua defesa na fronteira da
Allemanha. Sucessivas vezes têm os jornaes se ocupado della, fornecendo
dados minuciosos, que jamais chegaram a satisfazer a curiosidade do
público, porque este não podia ver “ver” com os próprios olhos... Essa
oportunidade chegou finalmente. A linha Maginot poderá ser vista por todos,
amanhã nos cinemas Olympia e Iracema.
149
No anúncio foi destacada a importância da imagem cinematográfica para
noticiar os acontecimentos ocorridos em outros lugares. O anúncio dos cinemas
Olímpia e Iracema de 1939 destacava as reportagens cinematográficas
148
CYTRYNOWICZ, op. cit., p. 47.
149
Folha do Norte Belém 11 de maio de 1939, p. 02. “No cinema a famosa linha Maginot”. A Linha Maginot
foi criada a partir de 1930 pelo governo da França, que após a Primeira Guerra, preocupou-se em resguardar as
fronteiras com a Alemanha e Itália. Sua conclusão ocorreu em 1936, sendo composta por um complexo de
defesa com vias subterrâneas, obstáculos, bateria blindada escalonadas em profundidades, entre outros aparatos
militares.
73
produzidas pelo Jornal da Fox que, além de mostrar imageticamente a fortaleza
criada para conter um provável avanço da Alemanha nazista, também enfocava a
idéia de “ver com os próprios olhos” como interessante, para “satisfazer a
curiosidade do público” em relação aos fatos decorrentes da mobilização militar.
Os anúncios sobre a exibição de cinejornais foram muito freqüentes no
decorrer do conflito. Serviam como complemento para a exibição dos longas-
metragens, contudo ganhavam destaque devido ao conteúdo apresentado. Nesse
momento, os argumentos referentes à mobilização militar começavam a aparecer
nos anúncios das empresas proprietárias das salas de projeção. Com base nos
periódicos locais, pode-se afirmar que os principais estúdios responsáveis pela
distribuição desse gênero cinematográfico eram: Fox, Columbia Paramount e RKO.
Dessas empresas a que mais exibia “programas da actualidade” era o Fox Jornal, da
20º Century Fox.
Junto ao programa de “Vive-se uma vez”, um “Fox Jornal” (a melhor
reportagem cinematográfica) que nos leva ao interior da segura fortaleza
subterrânea de ferro e cimento, mostrando-nos os vários departamentos,
como depósito de munições, refeitórios, dormitórios, controle e manejo dos
canhões que afloram à terra assestados para o possível inimigo que tente
penetrar à “terra de ninguém”.
150
O complemento parecia ter mais importância que a atração principal deste
espetáculo, provavelmente devido ao conteúdo ter um caráter atual e relevante para
o conhecimento público. A preparação para a guerra era assistida longe dos
acontecimentos graças às lentes “objetivas” dos cinegrafistas e deve-se ressaltar
que essa atividade perdurou até o final do conflito ganhando o apoio dos órgãos
estatais dos países Aliados.
A condição de “neutralidade” brasileira permitiu às empresas produtoras a
distribuição de filmes informativos sobre as ações militares. O poderio bélico era
apresentado a partir dos equipamentos militares mais modernos “a realidade é,
muitas vezes, mais sensacional do que a ficção. Eis porque acreditamos que
‘SUBMARINO D-1’ é o maior drama que foi feito para apresentar os methodos
modernos da guerra submarina”.
151
O papel informativo exercido pela produção
cinematográfica não coube somente aos cinejornais, mas também aos filmes longas-
150
Folha do Norte – Belém, 11 de maio de 1939, p. 02.
151
Folha do Norte – Belém, 23 de maio de 1939, p. 04. “SUBMARINO D-1”.
74
metragens que atuaram de forma expressiva na tentativa da construção social de
pensamentos e tendências no decorrer do conflito.
O anúncio dos cinemas Moderno e Independência sobre o filme Submarino D-
1 caracterizou a política desenvolvida nos anos iniciais do combate, com enredos
referentes aos acontecimentos da Segunda Guerra. Ou seja, os fatos de destaque
do conflito como uma invasão, resistência ou confrontos marítimos, terrestres e
aéreos eram apresentados nos anúncios das empresas exibidoras de Belém, de
forma a não proporcionar explicitamente qualquer propaganda que viesse abalar a
“neutralidade” brasileira. A película da Warner Bros por ser filmada no próprio
submarino, e não em um estúdio, passava a idéia de que não se tratava de um filme
de ficção, mostrando a própria realidade aos espectadores.
VEJAM a flotilha de submersíveis dos Estados Unidos da América do
Norte, atacando o inimigo, em meio do turbilhão e do estrepito das grandes
manobras navaes.
VEJAM os tripulantes que pareciam condenados a morrer, prisioneiros
daquelle tumulo naufragado, salvos, finalmente, pelos “pulmões artificiaes”
da moderna invenção.
VEJAM a câmara de salvação submergindo até a profundidade de
duzentos metros, para regressar a superfície do mar revolto, com os
sobreviventes do submarino ferido.
VEJAM os riscos e perigos e as trágicas aventuras dos que vivem no bojo
desses barcos submersíveis e toda sorte de façanhas praticadas pelos
endiabrados marinheiros do Tio Sam.
VEJAM como os modernos submarinos defendem as costas de um paiz
em caso de ataque naval.
VEJAM enfim, o mais surprehendente e moderno que se fez em films
de extraordinárias proporções.
152
As informações contidas no anúncio apresentam uma luta naval entre
submarinos, de um lado, o poderio naval dos Estados Unidos e do outro um inimigo
não apresentado nos anúncios. Tomando por base as idéias trabalhadas por Ferro
(1992) a respeito da Segunda Guerra, poder-se-ia dizer que pela postura tomada
pelo governo norte-americano em relação ao nazismo “o importante é que nos
Estados Unidos foram feitos vários filmes antifascistas bem antes do país entrar em
guerra”.
153
Para o autor, a propaganda antinazista desenvolvida pelo governo dos
Estados Unidos definiu o posicionamento da classe artística de Hollywood em
relação aos regimes totalitários.
152
Folha do Norte – Belém, 23 de maio de 1939, p. 04.
153
FERRO, Marc. História da Segunda Guerra Mundial. Tradução: Mauro Lando e Isa Mara Lando. 2º ed. São
Paulo: Editora Ática, 1997.
75
As demonstrações dos aparelhos militares pareciam servir como um aviso
para uma possível defesa do espaço norte-americano. O envolvimento de
cinegrafistas das forças armadas demonstrava a preocupação do governo com a
propaganda através do cinema:
PAT O’BRIEN GEORGE BRENT WAYNE MORRIS (o heroe de
‘Talhado para Campeão’) e FRANK MAC HUGH à frente de um cast de
valores, no qual estão incluídos technicos e officiaes da Marinha Norte
Americana
154
.
Dentre os vários esforços empreendidos pelos países durante o conflito,
destaca-se a utilização do cinema como espaço para a propaganda, sendo assim as
salas de projeção serviram para vários fins, entre eles a divulgação de ideais
políticos.
Ao escrever sobre a história social do cinema americano, Sklar (1975) afirma
que durante a Segunda Guerra a atuação da indústria cinematográfica dos Estados
Unidos diminuiu minimamente suas atividades relacionadas à produção de filmes, se
comparado com o período de paz. Para o autor, a atuação de Hollywood diminuindo
os custos para a elaboração de películas voltadas para o esforço de guerra, em
conjunto com o governo norte-americano, favoreceu os estúdios, pois sua atuação
não ficou comprometida como outros setores que paralisaram suas atividades em
decorrência da guerra. Contudo, esse acordo firmado entre os estúdios e o governo
foi combatido por alguns setores da sociedade norte-americana. Por conseguinte,
insinuavam:
Que o oferecimento da indústria cinematográfica de produzir filmes para o
governo sem lucro era motivado menos por patriotismo do que pelo desejo
de impedir que as extraordinárias circunstâncias do tempo de guerra
perturbassem o poder do monopólio dos maiores estúdios.
Se foi um gesto patriótico ou não, o cabe aqui discutir. O importante é
entender como os estúdios não pararam de produzir filmes voltados para o esforço
de guerra, fazendo-se sentir seus efeitos com o aumento progressivo da quantidade
de películas concernentes à guerra, exibidas nas salas de projeção da cidade de
Belém.
154
Folha do Norte – Belém, 23 de maio de 1939, p. 04.
76
No decorrer de 1940 as notícias detalhavam os primeiros combates navais e
aéreos e as invasões da Alemanha Nazista. Desse modo, a Inglaterra teve destaque
nas reportagens cinematográficas, pois o front estava, inicialmente, no continente
europeu, tendo como protagonistas principais os dois países.
Em abril de 1940, o anúncio do cinema Poeira anunciava uma reportagem
cinematográfica do Fox Jornal com o título “A Tomada de Varsóvia” retratando o
conflito em toda a diversidade dos acontecimentos.
O Sítio da Cidade Scenas authenticas do bombardeio As destruições e
incêndios causados pelas explosões das granadas A rendição de
Varsóvia Dantzig, vencida recebe a primeira visita de Hitler A Guerra na
Linha Maginot A defesa no canal de Panamá e outras notícias
concernentes ao conflito. Film de absoluta sensação.
155
No anúncio, os registros cinematográficos demonstram as cenas do avanço
nazista na Europa com a conquista das cidades de Varsóvia e Dantzig e uma visita
de Hitler. Contudo, a “imparcialidade” das reportagens estava sob a tutela do Estado
Brasileiro que proibia qualquer manifestação explícita através dos filmes, que
pudessem difamar a imagem de algum país com o qual tivesse relações
diplomáticas. As outras reportagens faziam parte do contexto factual da guerra e da
atitude das produtoras cinematográficas de Hollywood em relação às atividades dos
Aliados e sua resistência em relação ao Estado Alemão.
156
No ano de 1940 os cinesjornais tiveram destaque nas salas de projeção de
Belém como veículo de informação do confronto. A maioria deles de origem norte-
americana. Como ainda não haviam entrado na guerra apresentaram reportagens
sobre diversos aspectos do conflito, sobretudo a luta entre a Inglaterra e Alemanha.
Reportagens cinematográficas como “Combate entre aviões nazistas e um cruzador
inglez”,
157
de 04 de julho de 1940, “Canhões de 24 kilometros de alcance na defesa
155
Folha do Norte – Belém, 14 de abril de 1940, p. 04.
156
O avanço vertiginoso dos exércitos nazistas, bem mais aparelhados militarmente, não encontrou grandes
resistências no continente europeu no decorrer dos anos de 1939, 40 e 41. Fora a ilha inglesa que mantinha
resistência heróica a distância os outros países que se contrapuseram a Alemanha foram derrotados “para fins
práticos, a guerra na Europa acabara. Mesmo que a Alemanha não pudesse invadir a Grã-Bretanha, devido ao
duplo obstáculo do mar e da Real Força Aérea, não havia possibilidade de uma guerra em que os britânicos
pudessem retornar ao continente europeu, quanto mais derrotar a Alemanha. Os meses de 1940-1, quando a Grã-
Bretanha ficou sozinha, são um momento maravilhoso na história do povo britânico, ou pelo menos dos que
tiveram a sorte de vivê-los, mas as possibilidades do país eram exíguas”. HOBSBAWM, op. cit., p.46
157
Folha do Norte – Belém, 04 de julho de 1940, p. 04.
77
da costa britannica”,
158
de 02 de agosto de 1940, que destacava “uma reportagem
rápida, mais incisiva, sobre o systhema de fortificações da costa inglesa, onde
canhões de 24 kilometros de alcance esperava, longo tempo, a promettida
incursão nazista”
159
e “Filme dum ataque aéreo a barcos de guerra inglezes que será
passado, hoje, no Iracema”,
160
de 15 de novembro de 1940, produzido pelo Fox
Jornal “com vários aspectos da guerra, destacando-se: a invasão da Bélgica –
evacuação e incêndio de Nanasos, na Noruega, e vistas sensacionaes dum ataque
aéreo allemão a barcos de guerra inglezes no Mar do Norte”
161
foram citadas devido
sua repercussão no jornal, com anúncios maiores ou artigos sobre o seu conteúdo.
Os anúncios dos cines-jornais faziam questão de ressaltar a autenticidade
das reportagens de guerra. Para dar credibilidade aos fatos apresentados nas telas
dos cinemas às imagens filmadas nos campos de batalhas era preciso imagens
realistas para a construção da mentalidade social do público em relação ao front.
Os jornais de guerra perduraram ao final da Segunda Guerra Mundial, mas
a partir de 1941 foram dividindo o espaço nas telas das salas de projeção da cidade
como veículos de informação e grau de importância com as películas de longa
metragem. Nos anos de 1939 e 1940 poucos foram os filmes referentes ao conflito
que passaram nos cinemas da capital paraense. No entanto, desde o início os
anúncios das películas produzidas por Hollywood ressaltaram como temas principais
o drama patriótico, a apresentação do poderio bélico dos Estados Unidos e os ideais
de liberdade.
Como foi trabalhado o direcionamento político do governo dos Estados
Unidos e de Hollywood, desde antes da Segunda Guerra, foi de repulsa aos ideais
políticos do regime nazista alemão, deixando evidente na opinião pública do país o
quanto era preciso combater o sistema político antidemocrático da Alemanha.
Contudo, até o rompimento do Brasil com os países do Eixo a propaganda feita nos
cinemas da cidade de Belém limitava-se à exaltação do sistema político norte-
americano, seu estilo de vida e suas forças militares.
Em 1941, alguns anúncios quebraram esse circuito, descrevendo as
“façanhas” do exército norte-americano na defesa de seu país. Como exemplo,
158
Folha do Norte – Belém, 02 de agosto de 1940, p. 04.
159
Ibid. p. 04.
160
Folha do Norte – Belém, 15 de novembro de 1940, p. 05.
161
Ibid. p. 05.
78
pode-se citar o filme “Patrulha Submarina”,
162
da 20th Century Fox, exibido no
cinema Olímpia em maio do ano corrente.
UM DRAMA DA GUERRA MODERNA! COMBATES ESPETACULARES
NAS ÁGUAS DO ATLANTICO! CAÇA AOS CORSARIOS GERMANICOS!
Destruição de submarinos. As façanhas incríveis de uma ESQUADRILHA
DE LANCHAS-TORPEDEIRAS AMERICANAS.
163
As letras maiúsculas serviam para dar destaque aos anúncios, exaltando a
capacidade do exército dos Estados Unidos de garantir a defesa do continente
americano contra qualquer invasão nazista. Outro exemplo foi o anúncio do filme “A
Enfermeira Edith Cavell”,
164
exibido em julho de 1941.
UMA PÁGINA DA HISTÓRIA QUE ABALOU O UNIVERSO! UMA MULHER
CONTRA UM EXÉRCITO! A R. K. O. RADIO, apresenta a mais completa
atriz da Inglaterra personificando com naturalidade e perfeição a figura
sublime e meiga de: A ENFERMEIRA Edith Cavell. A descrição dos
acontecimentos que levaram os alemães a fuzilarem a famosa enfermeira
britânica, em Bruxelas, durante a invasão da Bélgica, em 1915.
165
Os temas históricos, principalmente os referentes à Primeira Guerra Mundial,
foram muito utilizados na composição dos enredos cinematográficos e também os
mais exibidos nos cinemas da cidade no segundo semestre de 1941. Serviram para
propagar, implicitamente, as atrocidades cometidas pelos alemães. A figura feminina
representava a sutileza do confronto com o perigo nazista, tendo como princípios o
amor à pátria e à família, misturados com os sentimentos de nobreza e de
compaixão. Nada melhor para causar impacto na população do que uma injustiça
cometida contra uma pessoa, ainda mais se ela tinha como função zelar pela vida
das outras.
Anteriormente, em 1940, numa coluna intitulada o “O Theatro, a Música e o
Cinema na Cidade Maravilhosa”,
166
que informava o movimento cultural no Rio de
Janeiro, o filme foi comentado.
162
Folha do Norte – Belém, 15 de maio de 1941, p. 06.
163
Ibid. p. 06.
164
Folha do Norte – Belém, 25 de julho de 1941, p. 04.
165
Ibid. p. 04.
166
Folha do Norte – Belém, 02 de maio de 1940, p. 04.
79
(...) O film intitulado “A enfermeira Edith Cavell”. Todos conhecem a tragédia
da célebre enfermeira da grande guerra de 1914. Pois sobre sua vida é o
argumento do film, da fábrica RKO Rádio. A protagonista é feita por Anna
Neagle, que realizou o melhor que poude, bem coadjuvada por May
Robson, Zasu Pitts, George Sanders. De um ponto de vista sentimental, o
film pode ser favorável do ponto de vista inglês, que é o de demonstrar que
o fuzilamento de Edith foi uma “barbaridade”. Trata-se, pois de um film mais
de propaganda do que artística...
167
A película foi entendida como propaganda política dos Aliados, pois a
“barbaridade” cometida pelos alemães, na Primeira Guerra, também podia ser
antecipada para o segundo conflito. O filme foi produzido pela RKO, empresa que
compunha a indústria cinematográfica hollywoodiana, demonstrando o compromisso
assumido por esse segmento na campanha contra o nazismo. Mesmo de forma
implícita o filme repassava os ideais encampados pelos países liberal-democratas.
Desse mesmo gênero sobre a Primeira Guerra pode-se citar o filme
“Regimento Heróico”,
168
com os atores James Cagney, Pat O’Brien e George Brent
nos papeis principais, exibido em novembro do ano de 1941. Nele o anúncio
chamava a atenção novamente para o heroísmo dos soldados que lutaram no
continente europeu.
Superprodução da “WARNER BROS” encerrando o heróico desfile dos
que foram, outra vez, ao Velho Mundo, defender os avançados ideais da
DEMOCRACIA, de armas em punho. Espetacular e impressionante
reprodução do que foi o sacrifício norte-americano nas trincheiras do Marne,
na Grande Guerra de 1914-18.
169
Nesse anúncio algumas mudanças na política externa brasileira
apresentavam uma tendência para a adesão à Política de Boa Vizinhança
propagada pelos Estados Unidos no continente americano. A luta pelos ideais
democráticos apareceu pela primeira vez explicitamente escrita em um anúncio e a
exaltação da nação norte-americana começou a tomar forma de aliança política.
Outros filmes exibidos nos cinemas locais chamaram a atenção pelos seus
conteúdos anunciados nos periódicos, como “Patrulha da Morte”
170
(Nova Universal)
e “Além do Inferno”
171
(Metro Godwyn Mayer), exibidos no início de outubro de 1941,
167
Ibid. 02 de maio de 1940, p.04.
168
Folha do Norte – Belém, 09 de novembro de 1941, p. 07.
169
Ibid. p. 07.
170
Folha do Norte – Belém, 03 de outubro de 1941, p. 04.
171
Folha do Norte – Belém, 09 de outubro de 1941, p. 05.
80
que destacavam, no primeiro, a resistência da Finlândia na “luta titânica de uma
pequena nação, mas heróica contra um inimigo tenaz e poderoso”,
172
e o segundo a
guerra submarina “filmada com a cooperação das forças armadas norte-americanas
e a assistência de técnicos da Marinha de Guerra”.
173
Os acontecimentos trágicos da guerra eram narrados nas películas, sendo
uma delas a separação de um casal por possuir nacionalidade conflitante na
Segunda Guerra. O filme “O Espião Submarino”,
174
da Columbia Pictures, narrava a
guerra naval entre a Alemanha e a Inglaterra e como um alemão e uma inglesa que
se amavam tornaram-se inimigos por obrigações a pátria “EU SOU ALEMÃO...
VOCÊ É INGLESA! Estamos em guerra, nossos deveres obrigam que sejamos
inimigos”.
175
Esses filmes continham em seu enredo a propaganda política implícita dos
seus países de origem, condizentes com a censura imposta pelo Departamento de
Imprensa e Propaganda e a política de “neutralidade” desenvolvida pelo governo do
81
2.2 NEM TUDO É HOLLYWOOD: ALEMANHA E ITÁLIA TAMBÉM PRODUZEM
FILMES
Os militares identificavam a produção em massa das
indústrias de bugigangas dos norte-americanos com os
desvarios de uma sociedade excessivamente
materializada e mercantilizada. Naquele momento [início
da Segunda Guerra Mundial], o modelo autárquico
experimentado pela Alemanha nazista era um paradigma
aparentemente mais adequado para muitos militares
brasileiros.
Antonio Pedro Tota
176
O domínio do cinema norte-americano na exibição de filmes nas salas de
projeção brasileiras se consolidou após o advento da Primeira Guerra Mundial,
quando a produção cinematográfica européia entrou em colapso devido ao fim do
conflito. Apesar do domínio dos Estados Unidos na distribuição de películas para o
mercado cinematográfico brasileiro, entretanto, os filmes europeus continuaram a
serem exibidos para o público dos cinemas belenenses.
As películas francesas, inglesas, alemãs e italianas faziam parte do programa
apresentado pelas empresas Cinematographica Paraense e Cardoso & Lopes,
donas das salas de projeção, junto à maioria dos filmes produzidos por Hollywood.
Deve-se ressaltar que nesta parte do trabalho são discutidas a produção e
repercussão de alguns filmes alemães e italianos que foram apresentados nos
cinemas da cidade.
Ao analisar as fontes percebe-se que a política desenvolvida pelo Governo de
Getúlio Vargas, através do DIP e da censura cinematográfica, repercutiu na exibição
de filmes nazi-fascistas, seguindo direcionamentos, às vezes dúbio, às vezes
tendencioso para os países do Eixo.
Augusto (1989), ao trabalhar com o momento político vivido pelo Brasil no
início da Segunda Guerra, descreve a política desempenhada por Vargas em
relação aos Estados Unidos e Alemanha.
O governo brasileiro namora o Eixo e barganha com os ianques. Militares
simpatizantes da ordem e do progresso nazi-fascistas fazem ponto no clube
Germânia, na praia do Flamengo, enquanto Oswaldo Aranha cuida de
nossa proeminência nos quadros da Política da Boa Vizinhança,
pacientemente tecida por Franklin Roosevelt e Nelson Rockefeller. O
176
TOTA, op. cit., p. 23.
82
general Góis Monteiro, eminência verde-oliva de Getúlio, convoca os
empresários do rádio e da imprensa para um conselho: menos notícia sobre
a Inglaterra, mas apreço pela Alemanha.
177
Enquanto Vargas fazia jogo duplo e alianças para barganhar com os dois
países, através de medidas mais propensas aos regimes totalitários europeus, o
reflexo dessa política pode ser visto no cinema a partir dos filmes exibidos nas salas
de projeção da cidade. Apesar da maioria das películas serem de procedência norte-
americana, verificou-se que a exibição dos filmes alemães e italianos não se
extinguiu e possuíam um público que apreciava a arte desenvolvida pela UFA
alemã. Como ressalta uma nota no revista A Semana de novembro de 1942.
Quando teremos novamente os filmes bons da UFA?
A Alemanha se militarizou barbaramente, quando terá outra vez a felicidade
de pensar na arte?
Ou desaparecerá, como todo bruto que esquece de plasmar o espírito para
a plena obtenção da matéria sadia?
Quando nada, esperamos assistir ainda os astros da UFA que nenhuma
culpa tem da tragédia louca em que faz o papel principal de “furioso” o astro
alucinado: Hitler.
178
As perguntas pareciam ter uma resposta óbvia, para a Alemanha voltar a
produzir grandes filmes artísticos o astro do momento precisava sair de cena: Hitler,
além do que, em 1942 a guerra já havia ganhado contornos mundiais com o
envolvimento direto dos países americanos e asiáticos. De fato, o ano de 1942 foi
essencial para definir os rumos da guerra a favor do Aliados, com a entrada dos
Estados Unidos e as derrotas sofridas na segunda frente de combate com a União
Soviética.
Contudo, os ressentimentos expressos na nota podem ser brevemente
debatidos para se entender como a arte na Alemanha nazista voltou-se para outros
fins. Para uma breve análise foram utilizadas as idéias de Diehl (1996) sobre
propaganda e persuasão na Alemanha nazista, fazendo-se um apanhado histórico
do país desde o fim da Primeira Guerra Mundial até a ascensão do regime nazista.
179
177
AUGUSTO, Sérgio. Este mundo é um pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK. São Paulo: Companhia das
Letras, 1989, p. 32.
178
A Semana – Belém, 21 de novembro de 1942, nº 1203.
179
DIEHL, Paula. Propaganda e persuasão na Alemanha nazista. São Paulo: ANNABLUME, 1996.
83
Explica a autora que a constituição da República de Weimar, após a
abdicação do Kaiser Guilherme II em novembro de 1918, foi uma forma de conter o
avanço comunista na Alemanha, formando uma coalizão entre monarquistas e
conservadores. Porém, a assinatura do tratado de Versalhes e a instabilidade
econômica, social e política na Alemanha durante a década de vinte favoreceu a
derrubada da República e a conseqüente subida ao poder do Partido Nacional-
Socialista dos Trabalhadores Alemães em 1933, culminando com a nomeação de
Hitler a chanceler em 30 de janeiro do mesmo ano. Esclarece mais:
Na opinião da alta burguesia alemã, Hitler seria facilmente controlável pela
classe que o favorecia. Mas essa esperança o se concretizaria. Apesar
de favorecer a burguesia nacional, o novo chanceler pouco se curva a suas
exigências, subjugando-a em nome do Estado totalitário. Esse novo Estado
seria celebrado na noite da tomada de posse de Hitler com um desfile
monstruoso da S.A.
180
O regime totalitário nazista se manteve a custa da propaganda e persuasão
imposta à população com a manipulação da realidade, transformada em algo
artificial pelo governo. Sendo assim, com a tomada de poder:
A propaganda terá seu próprio ministério, que trabalhará incessantemente
para, a cada nova campanha, mobilizar a população. Assim a propaganda
se expande ao poucos para o cinema, música, comícios eventos e
arquitetura.
181
Como visto na nota, a produção cinematográfica voltou-se para atender aos
interesses do Partido Nacional-Socialista em propagar e persuadir, a partir dos
ideais nazistas, a população. Com a criação do Ministério da Instrução e
Propaganda, sob o comando de Gobbels e a crescente militarização da Alemanha,
as produções de películas da UFA visavam enaltecer o nacionalismo alemão e sua
estrutura de governo. Em Belém, durante a guerra, esses filmes retrataram o que foi
exposto na nota: a movimentação militar da Alemanha e as vitórias nos anos iniciais
do conflito.
Ao analisar o cinema alemão na imprensa de Porto Alegre e Santa Cruz do
Sul na década de trinta, Isolan (2006) destaca o papel da UFA para o Partido
Nacional-Socialista alemão como um dos principais veículos de informação.
180
Ibid., p. 62.
181
Ibid., p. 82.
84
Ressalta o papel do estúdio alemão como um dos principais distribuidores de filme
na Europa nas décadas de 20 e 30. Para o autor, tanto na República de Weimar
85
era necessário mostrar que o regime nazista estava preparado para rechaçar
qualquer ataque à soberania alemã.
Uma superprodução voltada para fazer uma “pequena demonstração” do
poderio militar do regime nazista foi apresentado ao público pela empresa
cinematográfica alemã.
185
Os filmes de propaganda nazi-fascistas não tiveram a
mesma amplitude, em termo de quantidade, como os produzidos em Hollywood,
mas passaram nos cinemas, reverenciando intensamente os conteúdos políticos
professados pelos regimes totalitários.
Em abril do mesmo ano, o cônsul italiano promoveu uma sessão
cinematográfica na sala de projeção do Olímpia exibindo um filme sobre a viagem de
Adolf Hitler a Roma, sendo que nos periódicos o evento causou polêmica em relação
ao conteúdo. Na reportagem publicada no jornal Folha do Norte de 13 de abril de
1939 o autor, que se identificou pelas iniciais S. M., criticou a postura de
determinados bacharéis em direito por considerarem a sessão como propaganda
política.
A reportagem da FOLHA, que hontem, pela manhã, no foro, “ouviu
commentario de bacharéis em direito sobre a exhibição no Olympia de um
film de intensa propaganda nazista”, andou precipitado, publicando essa
notícia, alias fora de propósito e fora da ethica jornalística (...) A propaganda
seja ella qual for feita por meio de convites especiais, de portas fechadas,
não pode ter o effeito daquella propaganda feita abertamente na praça
pública, na imprensa, nos theatros e nos cinemas, onde, mediante
pagamento, entra quem quer...
186
A iniciativa do Cônsul italiano foi entendida por alguns segmentos da
sociedade como propaganda dos regimes nazi-fascistas, porém para o autor do
artigo a sessão cinematográfica não chegava a se configurar como propaganda pelo
seu efeito restrito na sociedade. Ou seja, por ter sido uma sessão para convidados,
os interesses maiores da propaganda, que seria atingir com ampla intensidade um
número grande de pessoas, não haviam acontecido. Continua a sua idéia criticando
a postura da imprensa por transformar as opiniões sem fundamento em
sensacionalismo jornalístico.
185
FURHAMMAR, e ISAKSSON, op. cit., p. 27-35. A UFA (Universum Film A. G.) foi criada em 1917
durante a Primeira Guerra Mundial pelo General Ludendorff, tendo o Estado Alemão um terço das ações da
empresa. A partir da ascensão nazista a UFA virou a grande expressão da cinematografia na Alemanha
produzindo filmes e cinejornais de caráter político.
186
Folha do Norte Belém, 13 de abril de 1939, p. 03. A reportagem tinha como título “O film italiano sobre a
viagem de Hitler não é propaganda fascista”.
86
Por essa errada theoria, factos dessa natureza, que impressionam um povo,
como visita a museus históricos, paradas militares de terra, mar e céo,
illuminação nocturna de cidade em festa, enthusiasmo das massas, deviam
também, por essa lógica, ser censurados e criticados.
187
Ao se referir aos eventos que expressavam as diversas riquezas de uma
nação, o autor, criticava veementemente aqueles que consideravam o filme como
propaganda, pois essas películas serviam para mostrar ao mundo o grande
desenvolvimento alcançado pela nação Italiana com Benito Mussolini.
188
Se fosse
nocivo aos interesses do governo brasileiro seriam vetados pelos órgãos censores.
ainda outro ponto a rebater: o cônsul da Itália não mandaria certamente
exhibir um film sem prévio consentimento das auctoridades locaes, únicas
competentes, e por isso a tal noticia tornou-se facciosa, ficando em
contradicção com os factos que se passaram.
189
Entende-se que o consentimento das autoridades locais reforçava a política
de “neutralidade” e certo interesse pelo progresso dos países nazi-fascistas e sua
estrutura de governo. Ao expressar sua opinião a respeito do filme, ele considerou
como uma “reportagem fiel, nítida, artística, que orgulhando Roma, demonstra sua
riquezas de Arte, belleza de paysagens... exercícios militares de terra, mar e ceo,
tudo como expressão de uma raça que corajosamente evoluiu...”.
190
Assim concluiu
suas impressões sobre o fato e o filme, exaltando o progresso alcançado com o
governo fascista na Itália.
A Semana de 15 de abril de 1939 noticiou o evento promovido pelo cônsul
como um filme de propaganda “puramente” política, pois o filme mostrava a viagem
de Hitler a Roma e a relação estreita existente entre os dois países.
191
187
Folha do Norte – Belém, 13 de abril de 1939, p. 03.
188
Para Hobsbawm a crise do capitalismo liberal proporcionou condições para a tomada do poder estatal pelos
regimes totalitários de cunho fascistas, na Itália em 1922 com Mussolini e na Alemanha em 1933 com Hitler.
Para ele a combinação de valores conservadores, a invenção de um passado glorioso e uma política antiliberal e
ultradireitista, aliada a crise econômica e social do entre guerra, dentre outros fatores, favoreceu a instalação
desses sistemas de governo, HOBSBAWM, op. cit., p. 113-143.
189
Folha do Norte – Belém, 13 de abril de 1939, p. 03.
190
Ibid., p. 03.
191
Na política de alianças feitas anteriormente ao conflito Alemanha e Itália tornaram-se aliadas em decorrência
da afinidade e de interesses em comum.
87
A reportagem da revista não entrou em detalhes sobre os aspectos que
caracterizaram o filme como propaganda política. Contudo, o que se percebeu ao
analisar o documento foi que por se tratar de uma película referente aos chefes de
estado da Alemanha e da Itália e a sessão ter sido promovida pelo cônsul o
propósito seria divulgar o progresso desses dois países.
O Sr. Vitório Chinsano, nsul italiano no Pará, convidou A Semana para
assistir, quarta feira última, mo magnífico salão do cinema Olympia, um
filme sobre a viagem do Sr. Adolf Hitler, chefe do governo alemão a Roma
(...) O film está muito bem tirado; é nítido, claro; só importunando a vista
quando no que o operador focou com o trem em desabalada carreira. O
salão estava repleto de convidados, não tendo se registrado manifestações
de desagrado ou de aplauso, apesar de se tratar de um film de cor
puramente política.
192
Para os redatores da revista o filme tinha bastante valor quanto a sua
produção artística e sua manifestação política. Dentro da sala de projeção do
Olímpia não houve manifestações a favor ou contra a película, todavia no lado de
fora do cinema “estavam, em apreciável número, os estudantes, que cantaram o
Hino Nacional Brasileiro, vivaram o Presidente Getúlio Vargas e deram vivas à
democracia”.
193
A manifestação estudantil a favor da democracia era contrária à
iniciativa do cônsul italiano em promover uma atividade a favor dos regimes
totalitários.
Na coluna Focando, escrita por Everardo, encontram-se outros comentários
sobre o filme da viagem de Hitler a Roma, porém não houve qualquer manifestação
em relação ao caráter político, somente comentário sobre a película “boa fotografia,
melhor som e espetacular direção... O Sr. Hitler é fotogênico, não acontecendo o
mesmo com Mussolini que estava mal maquillado”.
194
Em junho de 1939 o filme italiano “Scipião, o africano” foi exibido nos cinemas
Independência e Moderno. Segundo Pereira (2003), os filmes de propaganda
política sobre os assuntos do período fascista não tiveram o efeito esperado perante
192
A Semana Belém, 15 de abril de 1939, 1027. A reportagem tinha como título “Films de propaganda
política”.
193
Ibid. 15 de abril de 1939, nº 1027.
194
A Semana – Belém, 15 de abril de 1939, nº 1027.
88
o público italiano. Por isso, foi necessário investir em temas históricos que
pudessem relacionar as vitórias do presente fascista com as do império romano.
195
Dentre esses filmes que caracterizaram o imperialismo colonial pode-se
destacar “Cipião, o Africano”
196
(produzido em 1937), que tinha como enredo a luta
de Roma contra Cartago. Em 26 de junho de 1939 o anúncio do filme apresentava
um resumo sobre o tema central, ressaltando o papel desempenhado pelo general
romano “Scipião” na luta contra Aníbal com seu exercito mercenário e tropas
bárbaras...”.
197
O confronto foi caracterizado como uma dicotomia da civilização
versus barbárie, ou seja, o império romano, símbolo da civilização ocidental e do
regime fascista italiano, contra os bárbaros de Cartago, que poderiam ser
representados pelos países que combatiam as idéias totalitárias da Itália.
No segundo semestre de 1939 e no ano de 1940 as informações sobre o
conflito foram transmitidas, como visto anteriormente, pelas lentes
cinematográficas dos países Aliados através dos cinejornais. Não foram encontrados
nos periódicos locais nem anúncios nem registros da exibição de filmes alemães e
italianos.
No entanto, no ano de 1941 os cinejornais produzidos pela UFA voltaram a
ser exibidos nas salas de projeção da cidade. O avanço alemão no decorrer dos
primeiros anos da guerra foi surpreendente, anexando diversos territórios que se
submeteram às forças das armas do Terceiro Reich. Esses avanços foram
registrados pelos cinegrafistas alemães incumbidos de filmar o que se passava no
front de guerra.
As atualidades [jornais cinematográficos produzidos pelo regime nazista]
são elaboradas com cuidado, como verdadeiros filmes de ficção, tendo, por
exemplo, a música em sintonia com as pistas de som. A partir do verão de
1942 elas perdem um pouco de criatividade, mas continuam sendo as mais
bem feitas de todas as atualidades de guerra. É verdade que os alemães
dispõem de meios materiais consideráveis dezenas de equipes de
cameramen enquanto as produtoras particulares inglesas e americanas
tinham equipes menos numerosas e menores.
198
195
Cf. PEREIRA, Wagner Pinheiro. Cinema e propaganda política no fascismo, nazismo, salazarismo e
franquismo. In: HISTÓRIA: questões & debates. Curitiba, PR: Ed. UFPR, ano 20, n. 38, jan./jun. 2003.
196
Folha do Norte, 26 de junho de 1939, p. 04.
197
Ibid. p. 04.
198
FERRO, M. op. cit. p. 26.
89
A eficiência alemã nos registros cinematográficos dos campos de batalha
europeu foi assistida pelo público belenense nas salas de projeção. Os cinejornais
da UFA exibiram as “BLITZKRIEGS” alemães ocorridas em vários momentos do
confronto. Em 24 de agosto de 1941 o anúncio dos cinemas Independência e
Moderno destacava “a primeira reportagem fotográfica da guerra germano-russa”
intitulada a “BLITZKRIEG CONTRA A RUSSIA”.
199
Na reportagem cinematográfica
foram apresentadas imagens sobre a invasão da União Soviética pelo exército
alemão,
200
ressaltando as façanhas dos “paraquedistas contra as fortificações
russas”.
Em 16 de setembro de 1941, outro anúncio dos cinemas Moderno e
Independência divulgava a reportagem cinematográfica produzida pela empresa
alemã sobre o avanço do Terceiro Reich na Europa. O anúncio realçava A
BATALHA DE CRETA” como “SENSACIONAL!... EMPOLGANTE!...
INACREDITAVEL!...”,
201
com o intuito de incentivar o leitor do jornal e apreciador
das salas de projeção a assistir o transcorrer da luta através das telas e também
destacando:
A sensacional reportagem filmada pelos operadores do alto comando
alemão, vendo-se desde a descida do pára-quedista aa rendição da
‘Ilha Fortaleza’, tomada finalmente por nuvens e nuvens de pára-
quedistas.
202
A participação do alto comando alemão demonstrava o interesse estatal nas
informações transmitidas, repassando através dos cinejornais os ideais propagados
pela Alemanha nazista.
Pode-se verificar a complacência da ditadura varguista com os ideais nazi-
fascistas por meio da liberação dos filmes e cinejornais alemães. Entre tantos outros
exemplos que foram trabalhados, um chamou bastante atenção, não pelo seu
tamanho, mas pelo conteúdo descrito. Em um anúncio da Empresa Cardoso e
199
Folha do Norte – Belém, 24 de agosto de 1941, p. 06.
200
Em 22 de junho de 1941 a Alemanha rompeu o pacto de não agressão, assinado com a União Soviética em 23
de agosto de 1939. Cf. DIEHL, P. op. cit., p. 146.
201
Folha do Norte Belém, 16 de setembro de 1941, p. 05. A invasão desastrosa da Itália na Grécia levou Hitler
a auxiliar o aliado enviando para o território grego a Afrika Korps e a Lufftwaffe alemã. A batalha na Ilha de
Creta ocorreu com intensidade no decorrer do mês de maio de 1941, envolvendo principalmente os pára-
quedistas alemães e o exercito britânico. BALDWIN, Hanson W. Batalhas ganhas e perdidas. Tradução de Cel.
Álvaro Galvão. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1978, p. 77-141.
202
Folha do Norte – Belém, 16 de setembro de 1941, p. 05.
90
Lopes, em que os destaques eram os filmes norte-americanos (sendo um deles
sobre a guerra) um complemento do cinema Moderno informava “O EXÉRCITO
ALEMÃO as poderosas forças do Reich em formação e em movimento e
‘ocupações curiosas’ – educativo”.
203
Os filmes de curta e longa metragem passavam pela avaliação do DIP,
representado nos Estados pelos Departamentos Estaduais de Imprensa e
Propaganda, sendo os anúncios também fiscalizados como os filmes. Dessa forma,
considerando a política empreendida pelo Estado Novo, de compactuar com os
ideais nazistas e o rígido controle do DIP nas informações transmitidas sobre o
conflito para o público dos cinemas da cidade de Belém, advindos da produtora
cinematográfica aleatravés de cinejornal ganhou reforço na propaganda quando
considerado educativo.
204
Por fim, em 12 de outubro de 1941, foi encontrado o último anúncio referente
às reportagens cinematográficas produzidas pela UFA exibidas nas salas de
projeção locais. Tinha como título “A GUERRA RELAMPAGO”
205
e mencionava:
O empolgantissimo filme de longa metragem que relata todas as
“BLITZKRIEG” de 1939 a 1940 A invasão da Polônia, França, Bélgica,
Holanda, Noruega, etc. o armistício com a França e muitas outras
passagens de alto relevo no cenário atual da guerra na Europa.
206
As imagens consideradas de “alto relevo” tornavam-se sugestivas para a
manipulação dos meios de comunicação por parte do Governo Vargas. O
“empolgadissimo filme” reverenciava a política desenvolvida pelas nações nazi-
fascistas. Contudo, esse sentimento de “solidariedade” para com os estados
totalitários (alemão e italiano) teve de ser interrompido pelos ataques aos navios
203
Folha do Norte – Belém, 03 de outubro de 1941, p. 04
204
A fiscalização das atividades cinematográficas era desempenhada pelo DEIP, criado em abril de 1941.
Maria Aparecida Aquino em um artigo sobre a participação dos países do continente americano na guerra
enfatiza a política de “neutralidade” brasileira em decorrência do apego aos ideais dos regimes autoritário
alemão e italiano “a história das oscilações políticas do governo brasileiro que precederam à declaração de
guerra do Brasil ao Eixo com certeza preocuparam muito o governo norte-americano envolvido numa ‘política
de boa vizinhança’ com as nações latino-americanas e buscando, independentemente do conflito mundial que se
desenrolava, consolidar sua liderança no continente”. Citando outros trabalhos a autora discorre sobre uma
possível invasão do Brasil em 1941, a partir do Norte e Nordeste, se a posição de “neutralidade do brasileiro não
fosse definida a favor dos Aliados”. AQUINO, Maria Aparecida. A América vai à guerra. In: COGGIOLA,
Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico. o Paulo: Xamã: Universidade de São Paulo.
Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História, 1995, p. 179-181.
205
Folha do norte – Belém, 12 de outubro de 1941, p. 04.
206
Ibid. p. 04.
91
brasileiros, levando ao fim da “neutralidade” brasileira e a declaração de guerra aos
países do Eixo.
Desse modo, pode-se perceber que os filmes alemães e italianos também
fizeram parte da programação exibida pelas salas de projeção da capital paraense,
divulgando os aspectos da guerra sob a ótica das lentes cinematográficas dos
cineastas nazi-fascistas. Sendo que a política diplomática estabelecida entre o
Estado Novo e esses países propiciou a investida dessas indústrias
cinematográficas até o ataque a Pearl Harbor, em dezembro de 1941.
92
2.3 AGORA É GUERRA: A PROPAGANDA ANTINAZISTA NOS CINEMAS
Enquanto as relações diplomáticas entre o Brasil e os
países nazi-fascistas não foram rompidas, a censura
cinematográfica era obrigada a verdadeiros
malabarismos para demonstrar a nossa “neutralidade. O
primeiro alvo desta política foram os filmes norte-
americanos antinazistas”.
José Inácio de Melo Sousa
207
Como já estudada ao longo desta dissertação, a cinematografia produzida por
Hollywood dominava os cinemas brasileiros com filmes propagando os ideais norte-
americanos a respeito do estilo de vida e da estrutura política democrática. No
decorrer da Segunda Guerra a indústria cinematográfica norte-americana logo
identificou seus inimigos nazistas e se posicionou através da produção de várias
películas contra os regimes totalitários.
Porém, antes do rompimento das relações diplomáticas e a declaração de
guerra do Brasil aos países do Eixo, os filmes antinazistas foram proibidos pela
censura do DIP, pois feria a política de “neutralidade” desenvolvida pelo governo
brasileiro. Somente os cinejornais de atualidades sobre a guerra e os filmes de
cunho patriótico e militar foram liberados para exibição nos anos iniciais do conflito.
Nos cinemas da capital paraense o rompimento das relações diplomáticas
com os países nazi-fascistas, em 1942, foi refletida com a liberação das películas
antinazistas pelo governo do Estado Novo.
208
Filmes de comédia, ação, guerra,
drama, desenhos e outros gêneros serviram para a propaganda dos Estados Unidos
contra o inimigo nazista.
Na luta realizada no campo das imagens, a nação norte-americana levava
vantagens por predominar na distribuição e exibição de filmes para as duas
empresas proprietárias das salas de projeção da cidade, Cinematographica
Paraense e Cardoso & Lopes. Os anos de 1943 a 1945 foram marcados pela
207
Souza, José Inácio de Melo. O estado contra os meios de comunicação (1889-1945). São Paulo:
ANNABLUME: FAPESP, 2003, p. 131-2.
208
Na dissertação a referência ao termo antinazista é em decorrência dos anúncios dos cinemas veiculado nos
periódicos locais que se reportavam aos filmes que tratavam sobre o tema do nazismo dessa forma e da
quantidade de películas exibidas nas salas de projeção que falavam sobre o terror empreendido pela Alemanha
nazista.
93
intensa propaganda através das imagens, com a exibição de películas contrárias aos
ideais nazistas, quase todas as semanas nos cinemas, e pela participação efetiva
dos poderes estatais e do Comitê de Coordenação dos Negócios Inter-Americanos
no Estado do Pará.
No final de 1941 um evento da Segunda Guerra Mundial mudaria
definitivamente a política de “neutralidade” brasileira. Com o ataque a Pearl Harbor,
às 6 horas da manhã do dia 07 de dezembro, os Estados Unidos declararam guerra
aos países do Eixo, acabando com sua política externa de “neutralidade” e lutando
ao lado dos Aliados. Conseqüentemente, a pressão norte-americana para que o
Brasil se posicionasse a favor do seu “irmão maior” do continente aumentou,
influenciando a tomada de posição do governo de Getúlio Vargas.
209
A notícia do ataque à base norte-americana no arquipélago do Havaí foi
transmitida pelos cinejornais nos cinemas locais com o título “As fortificações do
Havaii”, sendo que, além das notícias sobre o ataque a Pearl Harbor, outras
informações foram exibidas:
Primeiras vistas de Pearl Harbour, a famosa base americana do Pacífico,
onde se verificou a agressão japonesa aos Estados Unidos. No mesmo
jornal: A viagem de Saburo Kurusu, emissário especial do Japão, às
conferencias de Washington sobre a questão do Oriente.
210
As repercussões desse evento logo se fizeram visíveis na política externa
brasileira. No final de janeiro de 1942, o Brasil rompia relações diplomáticas com os
alemães e começava a se preparar para o confronto. O perigo da guerra “européia”
chegava ao Brasil e a mobilização cívica contra o perigo nazista tomou conta das
ruas com passeatas a favor da democracia.
Nos cinemas, os meses seguintes, até final de junho, continuaram exibindo
filmes referentes ao conflito, destacando a guerra e a propaganda implícita dos
valores da democracia e liberdade difundidos pelos filmes hollywoodianos. Películas
como: Correspondente estrangeiro, Levanta-te meu amor, Capitão Torson, entre
outras, ressaltavam vários aspectos do conflito, porém suas mensagens anti-
209
O ataque a Pearl Harbor conjuntamente com os afundamentos dos navios brasileiros pelos nazistas foram os
motivos oficias que levaram a nação brasileira a declarar guerra aos regimes totalitários. Contudo a política de
boa vizinhança desenvolvida pelo governo norte-americano nos anos iniciais do conflito já demonstrava a
importância do Brasil para a proteção do continente americano.
210
Folha do Norte – Belém 01 de janeiro de 1942, p. 06.
94
totalitárias apareciam de forma velada e, geralmente, abafadas pelas cenas
românticas ocorridas nos filmes.
Retomando as idéias discutidas por Furhammar e Isaksson, ao trabalhar os
filmes com propósitos políticos e como arma de propaganda, os autores ressaltam a
importância de elementos como surpresa, ameaça, aventura, amor, morte para
tornar os filmes de propagandas mais eficazes na transmissão de mensagens
políticas. Sendo assim a propaganda tem a intenção de forçar as pessoas a
aderirem a um ideal específico, devido a manipulação da imagem cinematográfica
transformar a realidade de acordo com os interesses de quem produziu as películas.
Os autores alertam que mesmo os documentários ou reportagens de guerra tendem
a atuar como filmes de propaganda por apresentarem apenas um lado da
verdade.
211
Em Belém, apesar do fim da “neutralidade” brasileira, poder-se-ia dizer que a
propaganda explicita antinazista através dos filmes iniciou a partir do dia 28 de junho
de 1942, quando foi publicado um artigo sobre o primeiro filme de propaganda
contra o regime totalitário do Reich que seria exibido nas salas de projeção da
cidade, sendo que o artigo tem grande importância para demonstrar a mudança
ocorrida na política do DIP, e do DEIP do Pará, quanto à liberação das películas.
Com o título “A PROPAGANDA ANTI-NAZISTA PELO CINEMA”
95
repugnam e assombram, e que o, na dura realidade, os moldes em que
são fundadas as bases do nazismo.
213
O reconhecimento da importância do cinema na luta contra o inimigo,
transmitindo imagens aos países Aliados do “regimen de escravidão total” imposto a
Europa pelos estados totalitários da Alemanha e Itália (na Ásia esse papel foi
desempenhado pelo Japão), favoreceu a absorção dos ideais democráticos
propagados pelos Estados Unidos, estimulando os brasileiros a assistirem as
películas contra as nações do Eixo.
Nessas condições, alcançando esses princípios, filmes colossais são
lançados à sociedade. Presentemente, “Tempestade d’Alma”, ocupa o
cartaz cinta de valor, decalcada de cenas verídicas que se desenrolam no
inferno germânico, ela deve ser vista por todos os brasileiros.
214
Segundo o artigo, o filme Tempestade d’Alma foi o primeiro filme antinazista
liberado pela censura do DIP. Seu lançamento no Brasil viria estimulado pela
declaração de guerra à Alemanha e à Itália, sendo exibido nos cinemas das
principais capitais do país e “em todos tem alcançado sucesso extraordinário, não só
pelo aprimorado da confecção, como, também, pelo sentido do seu enredo”.
215
Nesse caso, foram enfatizados a qualidade técnica e o enredo do filme como pontos
a serem apreciados na película, mas para o momento o enredo seria relevante pelo
conteúdo referente ao contexto da Segunda Guerra, despertando interesse pelos
poderes públicos dos Estados.
A participação da imprensa local fortaleceu a importância da película incitando
a população belenense a assistir o filme, quando esse estivesse em exibição nas
salas de projeção da cidade “a imprensa conclama o seu valor, aconselhando o
público a ir vê-la, a-fim-de se inteirar do que é, em pequena síntese, o abominável
regimen de Adolf Hitler e seus seguidores querem implantar no mundo”.
216
A entrevista concedida pelo gerente da Metro Goldwyn Mayer de
Pernambuco, Sr. Kurt Maschke, que se encontrava em Belém há vários dias,
ressaltava a importância da película para a atualidade do conflito e sua função para
213
Ibid. p. 01 do 2º Caderno.
214
Folha do Norte – Belém, 28 de junho de 1942, p. 01 do 2º Caderno.
215
Ibid. p. 01 do 2º Caderno.
216
Ibid. p. 01 do 2º Caderno.
96
desmoralizar os ideais políticos alemães. Para finalizar o artigo foram discutidos os
dois momentos da política brasileira em relação aos filmes contra o Reich “depois de
‘Tempestade d’Alma’, outrora proibida pela censura, outro filme de não menos valor
será exibido nas telas paraenses: ‘A Fuga’, extraído do famoso romance que
imortalizou Ethel Vance, sob o título ‘Escape’”.
217
A mudança implementada pela entrada dos norte-americanos na guerra e
pelo rompimento do governo brasileiro das relações diplomáticas com os países do
Eixo, repercutiu posteriormente na política desenvolvida pelo DIP.
Retomando as idéias de Souza (2003) sobre os filmes com conteúdos antinazistas,
como O Grande Ditador de Charles Chaplin, pode-se observar uma polêmica entre a
imprensa de São Paulo e o Departamento de Imprensa e Propaganda, tendo sua
exibição proibida na cidade. Contudo, após janeiro de 1942, a política do DEIP
paulista mudou completamente sua postura, pois “o fim da ‘neutralidade’ trouxe para
o Brasil todos os filmes anti-nazistas que estavam barrados”.
218
Em Belém poder-se-ia dizer que essa política de proibição de filmes que
denegriam o regime nazista não gerou polêmica na imprensa, porém estava refletida
na programação elaborada pelas empresas donas das salas de projeção e
fiscalizadas pelo DEIP paraense. Para o segundo semestre de 1942 e os anos
restantes da Segunda Guerra, a investida na campanha pelo cinema de propaganda
foi intensa, tendo como participantes ativos a população, o poder público paraense e
o Comitê de Coordenação dos Negócios Inter-Americanos no Estado do Pará.
A partir desse momento o Brasil entrava de fato na guerra das imagens, fato
esse que vinha sendo adiado muito tempo por conta da política desenvolvida
nos anos iniciais do conflito. Nessa nova fase de exibições de películas contra a
política nazista, as empresas proprietárias dos cinemas começaram a fazer parte da
luta através das imagens cumprindo o circuito brasileiro de exibição do filme
Tempestade d’Alma. Assim, no dia primeiro de julho de 1942, foi anunciado no jornal
Folha do Norte a exibição da película no cinema Olímpia.
A Empresa Cinematográfica Paraense acaba de firmar um contrato especial
com o sr. Kurt Maschke, representante da “Metro Godwyn Mayer”,
217
Ibid. p. 01 do 2º Caderno.
218
SOUZA, op. cit., p. 135.
97
atualmente nesta cidade, para apresentação do momentoso filme anti-
nazista “Tempestade d’alma”.
219
Na corrida pela programação do momento a Empresa Cinematográfica
Paraense saiu na frente, firmando contrato com o representante da Metro Goldwyn
Mayer para a exibição do filme. O cinema Olímpia continuava como principal sala de
projeção para lançamento das películas que faziam sucesso.
(...) “Tempestade d’alma”, um filme para o momento, uma vibrante
advertência dos povos livres, um grito de alarme contra os nojentos “quinta
colunistas”, que trama contra a segurança das nações que se resguardam,
felizes, à sombra da liberdade (...) essa nova iniciativa dos esforçados
empresários do Olímpia, trazendo para as nossas telas “Tempestade
d’alma”, que é a narração de um capítulo chocante do drama nazista, na
efusão plena e odiosa dos seus métodos.
220
O primeiro passo havia sido dado para um empreendimento poderoso na luta
contra os países totalitários. Os filmes de propaganda antinazistas ganharam espaço
no circuito de exibição dos cinemas belenenses. As películas que tiveram grande
repercussão na imprensa brasileira ganhavam destaque ao serem exibidos nos
cinemas locais.
221
Nas fontes pesquisadas constatou-se que vários filmes antinazistas, com
grande repercussão, duraram até três semanas em exibição nas salas de projeção.
No entanto, outros filmes de menor prestígio também fizeram seu papel divulgando
os ideais das nações democráticas, que lutavam pela liberdade contra os inimigos
nazi-fascistas, tendo essas películas em seu conteúdo uma propaganda tão intensa
quanto às de destaque.
O filme Tempestade d’Alma teve sua estréia no dia 24 de julho de 1942 e no
anúncio do cinema Olímpia, veiculado no jornal Folha do Norte, o destaque era a
foto dos artistas principais, James Stewart e Margaret Sullavan, posicionados para
um beijo e, de forma reduzida, um símbolo da suástica nazista levando um tiro e se
despedaçando. No anúncio dizia: “O filme que 6 países proibiram, inclusive o Brasil!
219
Folha do Norte Belém, 01 de julho de 1942, p. 02. “Foi contratado para o Olímpia o filme anti-nazista
‘Tempestade d’alma’ – Louvável iniciativa da Empresa Cinematográfica Paraense S. A.”
220
Folha do Norte Belém, 01 de julho de 1942, p. 02. “Foi contratado para o Olímpia o filme anti-nazista
‘Tempestade d’alma’ – Louvável iniciativa da Empresa Cinematográfica Paraense S. A.”.
221
Como foi descrito anteriormente o circuito de exibição de filmes seguia uma rota sul/suldeste em direção
ao nordeste e norte, sendo assim essas películas ao chegarem na capital paraense tinham se tornada referência
nos principais cinemas brasileiros.
98
TEPESTADES d’ALMA Um empolgante romance de Amor nas sombras do regime
do III Reich – A 1ª. PELICULA ANTI-NAZISTA liberada pela Censura”.
222
Outros comentários como maior sucesso artístico e de bilheteria no Rio de
Janeiro, “cinco semanas de consagração por multidões entusiásticas!”,
acompanharam com destaque o anúncio de estréia do filme.
O filme possuía os elementos necessários para que atraísse a atenção do
público: um enredo propício para a situação em que a guerra se encontrava
(contando a participação do Brasil no conflito) e um belo romance para agradar a
maioria do público que gostava do gênero. O sucesso no Rio de Janeiro parecia
acompanhar o filme em sua estréia em Belém, pois no dia 26 de julho de 1942 um
artigo comentava a exibição do filme na cidade.
A curiosidade criada em torno de “Tempestade d’Alma” levou sexta-feira ao
Olímpia um público numerosissimo e ávido de ver alguma coisa que outros
filmes não apresentam. E cremos que quantos foram, saíram satisfeitos
do cinema.
“Tempestade d’Alma”, encerra uma história nova e atualíssima, onde as
conseqüências do regimen criado pelo III Reich, são focalizadas com
fidelidade absoluta, mostrando o horror que o nazismo espalhou por toda
Alemanha e a atroz perseguição ao povo judeu.
223
A participação da população comparecendo ao cinema para assistir ao filme
parecia demonstrar a importância da indústria cinematográfica para a atualidade da
guerra, bem como a aceitação e reconhecimento da película para o maior
entendimento do regime nazista. Porém, esse entendimento se caracterizava pela
visão dos Aliados em relação ao conflito, procurando demonstrar os horrores
proporcionados pelo regime totalitário alemão.
Outro fato realçado no artigo dizia respeito à história do filme e sua
veracidade. Nesse caso, as imagens tomam forma do real ao mostrar a encenação
da Alemanha governada por Hitler, evidenciando as imagens cinematográficas da
atualidade como “focalizadas com fidelidade absoluta”.
Tudo é contado com muita inteligência e acerto, numa propaganda sadia
por uma causa que é quase de todo mundo.
222
Folha do Norte – Belém, 24 de julho de 1942, p. 02.
223
Folha do Norte Belém, 26 de julho de 1942, p. 01 do Segundo Caderno. A reportagem tinha como título
“Tempestade d’Alma – Um filme que todos estão obrigados a ver!”.
99
Os produtores tiveram um cuidado todo especial com a atmosfera deste
filme. A impressão dos ambientes é perfeita. Tem-se, às vezes, a convicção
de ser um filme alemão, tal a autenticidade da atmosfera que o cerca.
224
Leite (2003) em seus estudos sobre o cinema questiona se essa arte
manipula a realidade. Para ele, os filmes, ao fazerem uma representação da
realidade, iludem o blico com a falsa aparência de estar diante daquilo que existe
efetivamente, ou seja, reproduzindo com fidelidade o que aconteceu. Contudo, a arte
objetiva e neutra reproduzida pelas câmeras cinematográficas foi questionada, pois:
Não proporcionavam o registro objetivo da realidade, uma vez que as
imagens produzidas eram o resultado de escolhas feitas pelos fotógrafos e
cineastas e que tais escolhas eram condicionadas por seus interesses, suas
crenças, seus valores....
225
A causa propagada pela película tinha como principal articulador o governo
dos Estados Unidos e seu principal representante no mundo do cinema: Hollywood.
A causa da democracia em luta contra os estados totalitários viabilizava diversos
utensílios para a construção dos enredos cinematográficos, que tinha em vista
retratar de forma mais autêntica possível a postura do inimigo para estimular o
público em geral a absorver esses ideais em proveito da campanha Aliada na
guerra: “terminando, queremos insistir na necessidade que da maior divulgação
possível de ‘Tempestade d’Alma’. Achamos mesmo que todos, sem distinção, estão
na obrigação de ver esse filme”.
226
No decorrer do conflito a necessidade de tornar o cinema uma obrigação para
a população belenense e também de reconhecer as temáticas da Segunda Guerra
Mundial, pertinentes aos sentimentos nacionalistas e patrióticos que envolviam os
ideais de liberdade democrática apresentados pelos filmes hollywoodianos, foi
bastante explorado pelas empresas proprietárias das salas de cinema e outros
órgãos estatais.
Os anúncios referentes aos cinejornais também mudaram sua postura quanto
à forma de descrevê-los. Até o fim da “neutralidade” brasileira, em 1942, os textos se
referiam às atualidades cinematográficas sem definir explicitamente para qual
tendência política se direcionavam na guerra. No entanto, essa política foi
224
Ibid. p. 01 do 2º Caderno.
225
LEITE, Sidney Ferreira. O cinema manipula a realidade? São Paulo: Paulus, 2003, p. 16.
226
Folha do Norte – Belém, 26 de julho de 1942, p. 01 do Segundo Caderno.
100
reformulada com a entrada do Brasil na guerra e assim deixando definido quem
eram os inimigos e os Aliados.
Num novo número do Jornal Rápido, que é, inegavelmente, a melhor
reportagem da tela, o Olímpia apresentará, domingo próximo, as primeiras
vistas da batalha e ocupação da colônia francesa de Madagascar e também
da batalha de Midway, onde as fôrças navais americanas tiveram um
grande triunfo.
227
Nessa nova fase da guerra os Aliados passaram a vigorar triunfantes nas
batalhas. As vitórias contra a Alemanha, Itália e Japão foram exaltadas pelos
anúncios dos cinemas, fossem transmitidas através dos cinejornais ou dos filmes,
caracterizando a luta patriótica pela liberdade, as triunfantes vitórias e a coragem
dos combatentes entre outras qualidades atribuídas aos países aliados do Brasil no
conflito.
No lado oposto, os inimigos da democracia foram assinalados como
causadores da penúria, como explicava: “a outra reportagem do aludido Jornal
focaliza as conquistas japonesas na Ásia, dando-nos cênas autenticas dos
bombardeios da Birmânia, onde os nipões espalharam a miséria e a destruição por
toda parte”.
228
Na luta contra os regimes totalitários o era apenas o filme ou a reportagem
cinematográfica que tinha importância, os anúncios transmitiram com intensidade ao
público a propaganda retratada nas telas dos cinemas. Procuraram chamar a
atenção para os horrores e as misérias ocasionadas pelo nazismo, enfatizando nos
anúncios palavras que desqualificavam o inimigo, fossem eles alemães, italianos ou
japoneses.
Com o lado definido no conflito houve benefício mútuo (entre os governos dos
Estados Unidos e do Brasil) com a utilização do cinema na propagação dos ideais
políticos condizentes com a democracia, embora o Brasil vivesse sob a ditadura do
Estado Novo. Para eles a figura do oponente estava bem retratada pelos Estados
Totalitários e o combate no campo das imagens parecia efetivar a participação da
população belenense na guerra. Apesar da declaração de guerra e a mobilização
227
Folha do Norte Belém, 20 de agosto de 1942, p. 02. “As batalhas da Birmânia, Madagascar e Midway
Domingo, no OLÍMPIA”.
228
Ibid. p. 02.
101
interna para defesa contra o ataque nazista, o conflito aparentava ser mais concreto
nas telas dos cinemas que efetivamente na realidade da cidade.
O perigo dos espiões nazistas e da quinta-coluna levou a exibição de vários
filmes que retratavam esses personagens históricos. O medo constituído pela
população brasileira do perigo representado por esses personagens, foi reforçado
pelas películas norte-americanas. Um exemplo foi a exibição do filme Confissões de
um espião nazista em outubro de 1942.
O filme teve sua estréia dia 22 de outubro, mas desde o dia 18 do mesmo
mês já se anunciava a apresentação da película no cinema Moderno, destacando:
CONFISSÕES DE UM ESPIÃO NAZISTA O filme que Hitler daria tudo
para destruir! A obra-libelo que a Warner Bros produziu e teve que ser
guardada pela Polícia Federal dos EE. UU., devido as ameaças constantes
da Gestapo!!!.
229
Aproveitando a situação do Brasil na guerra, a exibição de Confissões de um
espião nazista reforçava uma rie de filmes antinazistas iniciada com Tempestade
d’Alma. Sua estréia foi muito divulgada na imprensa local e a expectativa criada em
relação à película foi intensificada com o anúncio. Segundo Ferro (1992), esse filme
gerou um incidente diplomático entre a Alemanha nazista e os Estados Unidos.
230
A propaganda contra o regime totalitário alemão, contida no filme, expressava
o posicionamento político definido pelo governo norte-americano anteriormente ao
início da Segunda Guerra Mundial, sendo que as companhias cinematográficas
norte-americanas logo se empenharam na produção de películas antinazistas. O
filme Confissões de um espião nazista foi concluído em 1939, mas sua exibição
foi liberada no Brasil em 1942.
A polêmica em torno de seu conteúdo foi descrita no anúncio ressaltando o
empenho de Hitler em destruir, ou mesmo impedir que o filme fosse apresentado em
outros países. Outro ponto interessante para ser destacado sobre o anúncio seria o
arquivamento temporário da película em decorrência das ameaças da Gestapo,
provavelmente essa idéia servia para justificar porque o filme não havia sido exibido
no Brasil anteriormente, escamoteando a política do Estado Novo de
condescendência com os regimes totalitários europeus. Somando-se a esses
229
Folha do Norte – Belém, 18 de outubro de 1942, p. 03.
230
Ferro, M. op. cit. p. 14.
102
assuntos o combate a Quinta Coluna nazista “um documento impressionante das
atividades da espionagem da quinta coluna nazista nos Estados Unidos!”.
231
No dia da estréia do filme no cinema Moderno o anúncio no jornal Folha do
Norte enfatizava:
Admirável e corajosa produção da “WARNER-BROS”, dirigida por ANATOL
LITVAK, foi filmada sob a guarda da POLÍCIA ESPECIAL, pois a GESTAPO
ameaçara de morte todos aqueles que tomassem parte na sua filmagem!
Muitos “astros” negaram-se... Mas, enfrentado as ameaças da Gestapo,
Litvak conseguiu reunir um grupo numeroso de “astros” famosos (...) Um
documento verídico e impressionante das atividades da Quinta-Coluna nos
Estados Unidos.
232
Como mostra o texto, a produção da película gerou desentendimento com o
governo alemão, levando a Gestapo a ameaçar a finalização das filmagens. A
coragem e os valores ressaltados nos filmes também poderiam ser vistos fora das
telas através do empenho dos envolvidos para concluir a produção. A veracidade do
filme, qualificado como documento, dava o sentido de realidade para as imagens
construídas pelas câmeras cinematográficas.
No dia 25 de outubro dois anúncios chamavam a atenção para a importância
da película na divulgação dos ideais contra o sistema político alemão. O primeiro
mostrava o filme como “o primeiro de uma grande série de propaganda contra a
política nefasta do racismo alemão”.
233
Nele, a propaganda contra o nazismo seria
estendida para outras sessões, bem como a veracidade dos fatos que foram
narrados no filme estaria baseada em um inquérito policial. Assim, o perigo da
espionagem nazista ocorrido nos Estados Unidos e a repulsa ao sistema político
implementado na Alemanha direcionaram a propaganda transmitida através das
películas e divulgadas nos anúncios dos cinemas da cidade de Belém.
momentos estupendos, em “CONFISSÕES DE UM ESPIÃO NAZISTA”.
A parada da juventude germano-americana é qualquer coisa de chocante
para a nossa sensibilidade de homens livres. Em momentos como esses, os
incríveis passos-de-ganso se tornam verdadeiramente insuportáveis. A
propaganda nazista é feita em torno da guerra. E, mais uma vez, nos
convencemos de que a megalomania germânica sonhou com a guerra, quis
a guerra, planejou a guerra, fez a guerra.
231
Folha do Norte – Belém, 18 de outubro de 1942, p. 03.
232
Folha do Norte – Belém, 22 de outubro de 1942, p. 03.
233
Folha do Norte – Belém, 25 de outubro de 1942, p. 03.
103
Sendo uma película histórica porque assim se pode chamá-la essas
“confissões” merecem ser ouvidas por todos. São um libelo tremendo contra
a “QUINTA-COLUNA”.
234
O anúncio caracterizava o filme como histórico por expor questões referentes
ao conflito deflagrado no mundo e por sua atuação diante da realidade da guerra
como propagador dos ideais norte-americanos de liberdade e democracia,
acentuando a propaganda nazista voltada para a guerra e o terror que esta causaria.
Novamente, a relevância do filme para o conhecimento das “confissões” do regime
nazista voltou a aparecer como um apelo para a população belenense lutar a favor
da liberdade democrática.
No segundo anúncio, do mesmo dia, o enfoque se deu em torno,
principalmente, da participação nas sessões cinematográficas, pois estas
aconteceram nos três turnos devido a grande quantidade de público.
(...) Dizer do sucesso alcançado nas primeiras exibições de “CONFISSÕES
DE UM ESPIÃO NAZISTA”, nesta capital, é desnecessário, por que outra
cousa não se fala senão a realidade sobre os processos insidiosos do
“Eixo”; os crimes vários na sanha terrível de descontrolar a segurança e a
estabilidade das nações livres.
E, para que todos tenham uma idéia a que ponto chegaram as atividades
nazistas nos Estados Unidos da América do Norte, é preciso que assistam
“CONFISSÕES DE UM ESPIÃO NAZISTA”, HOJE, no MODERNO, em
SESSÕES CONTINUAS, a partir das 19 horas, bem como em MATINAL e
VESPERAL.
235
A peleja que acometia os países livres a defenderem suas aspirações contra
os crimes praticados pelas nações do Eixo, encontrou no campo cinematográfico um
importante aliado levando multidões a conceberem as propostas políticas expostas
nos filmes como verdades incondicionais. A repercussão dos filmes de propaganda
norte-americana foi bastante evidenciada nos anos finais da Segunda Guerra
Mundial.
Dentre as grandes produções hollywoodianas de cunho antitotalitário exibidas
na cidade muitas outras de menor expressão foram apresentadas. Os filmes
anunciados nos periódicos ressaltavam o heroísmo, o patriotismo, a resistência
contra a opressão inimiga em nome dos valores morais das nações democráticas e
livres. Fossem os filmes de batalhas aéreas ou navais, de espionagem, as comédias
234
Folha do Norte – Belém, 25 de outubro de 1942, p. 03.
235
Folha do Norte – Belém, 25 de outubro de 1942, p. 04.
104
parodiando as figuras de Hitler ou Mussolini, a propaganda contra os estados
totalitários aparecia de forma explícita para o público.
Entre novembro de 1942 e fevereiro de 1943 filmes como: Contra
Espionagem, Ultimatum, Revoada das Águias, Traidora, Volga em Chamas, Uma
noite em Lisboa, retrataram a guerra dentro da concepção política vinculada aos
anseios das nações Aliadas contra o Eixo. Nos anúncios percebe-se que estes
filmes apresentados nas salas de projeção de Belém continham os objetivos
políticos dos governos democráticos.
Em março e abril de 1943 quatro filmes de propaganda explicitamente
antinazista foram exibidos nos cinemas: Paris está chamando, O grande Ditador,
Fuga e E as luzes brilharão outra vez. Essas películas tiveram significativa
relevância, pois suas exibições perduraram durante algumas semanas nas salas de
projeção local. O anúncio do filme “O grande ditador” enfocava “uma audaciosa
denuncia às forças opressoras do mal, satirizando os ditadores que ensangüentam o
mundo, esmagam os pequenos países e ameaçam as indestrutíveis américas”.
236
O “mal” passou a ser encarnado nos governos nazi-fascista alemão e italiano.
Como visto anteriormente, esses governos eram símbolos de desenvolvimento e
organização para o Estado brasileiro, mas nesse momento passaram a ser
representados como ditaduras que promoviam a guerra e espalhavam o terror,
ameaçando as nações livres das Américas.
Outro anúncio significativo para se entender o papel desses filmes na
manipulação da opinião pública foi a da película “E as luzes brilharam outra vez”,
que mostrava a resistência francesa contra a opressão imposta pelo nazismo
alemão.
A nítida visão de uma cidade dominada pela GESTAPO, a organização
sinistra de Hitler que invade lar, igrejas, colégios, hospitais em busca de
vítimas inocentes que ousam pensar em Liberdade!... O drama de
sacrifícios e de realismo trágicos vivido na França liberal que a “grande”
Alemanha, em vão, tenta aniquilar.
237
A Gestapo representava a tirania nazista na repressão contra os países
invadidos, personificando o mal quando aniquilava as “vítimas inocentes” nos seus
lares, escolas, hospitais etc. Esse anúncio parecia ser um aviso para a população do
236
Folha do Norte – Belém, 25 de março de 1943, p. 03.
237
Folha do Norte – Belém, 01 de maio de 1943, p. 03.
105
que poderia acontecer caso a Alemanha invadisse o Brasil, estimulando o
sentimento antigermânico e fortalecendo o estado de guerra no cotidiano da cidade
de Belém. A luta travada nas telas dos cinemas refletia nos anúncios com toques
sensacionalistas para chamar atenção do público.
Os gêneros de filmes em exibição se misturavam diante de tanta produção
relativa à guerra, tendo os artistas atuação em papéis de grandes pilotos aéreos,
espiões patriotas, heróis em luta pela liberdade para salvaguardar os interesses das
Américas. Esses heróis não eram representados apenas pelos norte-americanos,
mas também pelos Aliados ou países “neutros”.
(...) Mas cada episódio tem o seu interesse e sua emoção. O primeiro
pertence à Laurence Olivier. Esse ator faz um papel diferente de todos os
outros em que nos veio anteriormente. Vive, com esplendor, um
personagem franco-canadense que, com os argumentos mais simples, põe
por terra todos os mandamentos de Hitler. Anton Walbrook reaparece numa
parte excelente, de grande valor artístico. Como Peter, um camponês
alemão, fiel ao Canadá, impressiona. Leslie Howard reflete o inglês típico,
amante da paz e da ordem. É taxado de covarde pelos nazistas, mas
demonstra mais coragem e arrojo, quando tem que enfrentar o perigo, do
que toda a arrogância forçada dos alemães fugitivos (...) “Invasão de
bárbaros” é um filme que deve ser visto por todos. É um documento
impressionante contra o nazismo. É perfeito no assunto, na interpretação e
na realização.
238
O filme, como documento, foi muito ressaltado nos anúncios, servindo para
reforçar o princípio da veracidade dos fatos descritos nas películas. Sendo assim, a
interpretação dos artistas foi robustecida pelo valor de cada personagem da trama
que, segundo a crítica, estava bem definida no filme. Os alemães espalhavam sua
arrogância avassaladora pelo mundo, enquanto o inglês, o franco-canadense e, até
mesmo o alemão (impregnado das concepções liberal-democráticas), demonstravam
seus valores no combate pela paz. Diante desses fatos, os filmes serviam como
difusores das notícias mundiais.
É na realidade, enorme, o interesse de ‘O Mundo em chamas’ o momentoso
cartaz de hoje, no Olímpia e Iracema. Os acontecime
106
As comédias fizeram parte do rol de filmes que satirizaram a política nazista e
as figuras de Hitler e Mussolini. Os filmes cômicos levaram a sutileza da propaganda
antinazista para o público cansado de notícias ruins, participando com tanta
amplitude, quanto outros gêneros cinematográficos na manipulação da opinião
pública.
Um exemplo para ser citado é o anúncio do filme “3 Marinheiros na chuva”,
240
de setembro de 1943, que abordava as confusões causadas por três marinheiros
britânicos que entraram por engano em um navio alemão “A PRIMEIRA SÁTIRA
ANTINAZISTA DO CINEMA contando as aventuras engraçadíssimas de 3 marujos
britânicos que pegaram à unha um couraçado alemão, depois de uma carraspana
‘daquele jeito’!”.
241
No cinema tudo era possível e válido no combate à tirania
fascista, até três marinheiros dominarem toda uma tripulação de um navio nazista.
O nazismo era o principal alvo das críticas e sátiras cinematográficas
hollywoodianas. Sobre ele várias histórias foram contadas através das películas e
divulgadas para as nações aliadas aos Estados Unidos. A resistência francesa à
presença alemã em seu território e a incessante luta inglesa para conter a invasão
nazista foram bastante explorados pelos filmes norte-americanos exibido nos
cinemas da cidade. Na película “Abandonados”,
242
de outubro de 1943, o anúncio
informava o público sobre o enredo:
Este filme fixa todo o pungente cenário da França de junho de 1940,
sufocada pelo bárbaro invasor... A população em êxodo... Criancinhas e
mulheres indefesas bombardeadas ao longo das rodovias... E comprova a
incompatibilidade absoluta entre as duas concepções de vida: a nazista,
histérica, brutal, egoísta, agressiva e a britânica, tranqüila, delicada e
humana, animada por uma energia extraordinária.
243
A brutalidade alemã se contrapunha à delicadeza e a força inglesa, sendo que
a invasão do território francês pelo “bárbaro” regime nazista foi envolto em
atrocidades de mulheres e crianças indefesas. Além do enredo do filme reforçar o
sentimento antinazista, os anúncios demonstravam para o público e os leitores dos
periódicos os perigos que seriam enfrentados no caso de uma invasão alemã. Era
240
Folha do Norte – Belém, 07 de setembro de 1943, p. 05.
241
Ibid. p.05
242
Folha do Norte – Belém, 14 de outubro de 1943, p. 03.
243
Ibid., p. 03.
107
preciso que a população incorporasse o anseio da luta pela liberdade e constituísse
no seu imaginário o esforço de guerra do front interno.
244
A empreitada norte-americana no combate aos países do Eixo definiu
claramente a política estabelecida por Hollywood na produção cinematográfica. O
perigo não vinha somente da Europa, mas também do continente asiático na figura
dos “maléficos” japoneses. A exibição de filmes antijaponeses não ocorreu de
maneira tão intensa como a propaganda contra os alemães, porém foram
importantes para se compreender que o cinema se empenhou em caracterizar todos
os países que compunham o Eixo como inimigos da democracia e da liberdade tão
almejadas pelo governo dos Estados Unidos e por Hollywood.
O ataque a Pearl Harbor não poderia passar despercebido sem que
Hollywood emitisse sua opinião sobre o fato e evidenciasse a traiçoeira postura dos
japoneses. O filme “Nossos Mortos serão vingados”
245
expressou a comoção
provocada pelos ataques japoneses aos norte-americanos no Pacífico, o que levou
os Estados Unidos a entrarem no conflito. Assim escreveram sobre a película antes
de sua estréia:
Nossos mortos serão vingados não pode ser classificado, apenas, como um
soberbo espetáculo cinematográfico. O filme é, antes vdaO vdaeme6(o)-4.33117(s)-0.295(u)5.67535(a)-4.33056( )-2.16558(e)-R.941998(.33117( )-45733117(s)-0.295583345(v)-6.4-4.55617(t77474(u)-4.32995(e)-4.33117(sn)7(n)1.4422(ã)1.442(i)1.87122(9qs)-017.c)-51.3422(e)1.4422( )-23.3901(s4u(1.3422(e)1.44941998(.33117( )-45733117(s)-0.2955833353)-23.7)-4.33117(a).4424941998(.32.2175(n1.44941998(í17(b)-4.33117(r558533117(d29558333C8)-6.4-4.5561a)-4.33117g85(e)-4.331178hn)1.4422(ã)1.442(i)g-0.293142(o)4.30.5340.294974( )85(e)-4-77 4.33117(e)-41178hn)1.4432873(ç2C.33117(a)-4.33.33117(e)-41178hn)1.44328s)-6.33537( TJ/R47 9.1099(e)]TJ)]TJ)]Ti0(b)1.4422(e)1.4422(r)-47474(o)-4.33(6(o)-4.33117(s)-0.295(u)5.67535(a-4.331175537( )-11.383117(r558941998(28( )-541.781(f)-11.3345(i)5(l)5(m539(s)-0.2959(s)-0.2(f)-11.33450.295585( )-92.2175(n)5.69( )67474(o)-4.(e)-4.33117(sn)7(n)1.4422)-529.725(c)1.44328s)-6.d)9.71032(p)-4.1951(E)-3.39.33.ág.4422(s)-5-32.1821-6.d)9.71032(p)-4.19)9.71(d)-4.33117(a)-42o(28((((((((((((gn-d)9.71032(pe)-4.331178hn)1.4422(ã)58412.406(e)-4s)-6.3339oTf137.605 0 Td[( )-35. )67474)-32.1821(s)33117(r)2.80561(l)1.87( 9.10993056(s)-0l7( 9.109C8)-6.4-4.5561a)-4.331n)1.44328733117(r)099( )-.3339(o)1.445537( )e)1.4422(r)-4(o)-10.6134( )-529.725(c)-6.965585(e)-4.33.9( )-92.2175( )-92.2175.39.33.ág.4( )-.3334ãd)9.71032(p9.725(c)-6.9653125(c)(i)1.8715s)-0.295585( )-4422(ã)58412.406(e)-4s5(f)-11.3345(i)5(l)445537( )e)1.9653125(c)(i)1.8e2(t)0.721099(e)]TJ Tf73(n)1.4422)-517(o)-4.33117(s)-051p1a)-4.331n)1.4432794.33117(s)-051p1a)-4-4.331n)1.447.4422(r)-4(o)-10.6134((a)87( 9.101099(e)]TJ263.324)-1.n9(e)]TJ263.324)-1.n9(e)5.6117(r558922.17263.324)-172422(g)1.4422(r)-4.4941998(.3311.4422(r)-4.494.n9(e)]TJ)2.17(s)ãdrininini5n2 oi3422(e)1.44941998(.3311o)-4.33117(40W4l3.3872(c)-6.3339(3]TJ)2.17(s)ãd)Nso2(e)-4.331147535(a)-4.3376.3.324e
108
Com o título original “Wake Insland”, a tradução voltava-se mais para refletir
os acontecimentos que levaram os Estados Unidos a entrarem na guerra, chamando
a atenção do público para as aspirações das “nações livres” em retaliar as ações
tirânicas do Eixo. O campo de batalha virou referência de coragem e amor à pátria
para as nações Aliadas. Os soldados representaram nos filmes o símbolo da luta
contra a opressão imposta pelos países nazi-fascistas, deste modo, morrendo ou
vivendo, eles transformavam seus atos em exemplos a serem seguidos por todos.
Esse caso pode ser constatado nos anúncios do filme “Sargento York”
248
exibido nas salas de projeção da cidade, em dezembro de 1943. O filme produzido
pela Warner Bros simbolizava a valentia dos soldados norte-americanos e também,
“porque é uma página da vida de um homem que amou sua pátria, seu lar e seus
amigos, com honesta simplicidade e com profundo sentimento”.
249
Diante da
mobilização do exército brasileiro para efetiva participação no combate as nações
inimigas em território europeu, a película teve um grande apelo popular por mostrar
o grande desempenho do Sargento York.
Apesar de suas façanhas ocorrerem durante a Primeira Guerra Mundial o
filme foi “recomendado insistentemente pelo presidente Franklin Roosevelt ao povo
de seu país, como exemplo à Mocidade de hoje que vai ao campo de batalha!”.
250
Essas recomendações serviam igualmente para a população brasileira e belenense,
principalmente para os jovens que estavam ingressando nas fileiras do exército.
Os desenhos animados também participaram da campanha antinazista
desenvolvida por Hollywood e o papel desempenhado por Walt Disney na Política de
Boa Vizinhança, estabelecida com o Brasil nos anos iniciais da guerra, respeitando a
“neutralidade” do país, logo se transformaram em combate aos ideais dos regimes
nazi-fascistas. Desenhos como “Educação para a morte”,
251
exibido em março de
1944, e “Vida de Nazista”,
252
em agosto, tornaram-se exemplos do completo
envolvimento dos gêneros cinematográficos no decorrer do conflito mundial.
Baseado no livro Educando para a Morte, de Gregor Ziemer, o anúncio do
cinema Moderno destacava o filme Educação para a morte como “o desenho
248
Folha do Norte – Belém, 26 de dezembro de 1943, p. 03.
249
Ibid. p. 03.
250
Folha do Norte – Belém, 28 de dezembro de 1943, p. 04.
251
Folha do Norte – Belém, 05 de março de 1944, p. 08.
252
Folha do Norte – Belém, 27 de agosto de 1944, p. 02.
109
ANTI-NAZISTA com o mesmo enredo do grande filme ‘Os Filhos de Hitler’”.
253
O
segundo desenho, Vida de Nazista, fazia uma paródia da figura de Hitler,
envolvendo um personagem dos desenhos animados de Walt Disney muito
conhecido dos brasileiros “uma tira do Pato Donald contra a Alemanha de
Hitler”.
254
As vitórias Aliadas, desde final de 1942, começaram a alterar o cenário da
Segunda Guerra Mundial. A incessante propaganda contra os países do Eixo
começou a esmorecer nos cinemas belenenses, pois a grande quantidade de filmes
exibidos foi diminuindo gradativamente dando espaço para outros gêneros
cinematográficos sem envolver o tema da guerra no seu enredo. Essa mudança foi
110
filmes cômicos seriam mais condizentes para a população apreensiva com o fim do
conflito.
Rir era o melhor remédio para curar, ou amenizar, as dores provocadas pela
guerra. Contudo, não poderia desviar muito do tema bélico, pois o conflito ainda não
havia terminado e o inimigo perecido. Por isso, em 24 de setembro do mesmo ano
outro anúncio dos cinemas Olímpia e Iracema destacava a exibição do filme “Os
planos de Hitler”.
257
Os planos de Hitler, que os cinemas Olímpia e Iracema vão apresentar
quarta-feira próxima, é um importante documentário descrevendo o sonho
de dominação mundial tramado pelos loucos do Instituto de Geografia de
Munich, os quais, depois de conquistar a Europa pretendiam estender as
suas garras sobre a América.
Recorda o filme a guerra civil da Espanha, a Invasão da Noruega, o ataque
sobre Creta, a campanha da África e a situação da Turquia, ressaltando a
situação que Suez, Dakar e Gibraltar representavam para o diabólico plano
de um Império mundial nazista.
258
O filme-documentário explorava os planos de Hitler para conquistar o mundo.
Pode-se perceber que a tentativa ficou apenas na Europa, tendo a América
escapado das “garras” nazistas, o que demonstrava que o perigo alemão estava
cada vez mais distante do Brasil.
O fortalecimento de um ideal comum no decorrer da guerra caracterizou a luta
contra os nazi-fascistas, fosse através da coragem das enfermeiras em salvar vidas
inocentes, como em Coragem de Mulher, exibido em setembro de 1944, ou a
mudança de atitude dos gângsteres do submundo de Nova York lutando contra a
Gestapo, em Balas contra a Gestapo de abril 1944, ou a atuação do herói invisível
desvendando os segredos nazistas, O Espião Invisível de maio de 1944.
Assim, o estudo dos filmes exibidos na cidade de Belém através dos anúncios
das empresas donas das salas de projeção forneceram subsídios para a reflexão da
função desempenhada pelo cinema na formação da opinião pública. Os vários
gêneros cinematográficos e os vários papéis interpretados pelos artistas
contribuíram para o interesse dos Aliados, representados principalmente por
Hollywood.
257
Folha do Norte – Belém, 24 de setembro de 1944, p. 08.
258
Ibid. p. 08.
111
CAPÍTULO III
Em tempos de guerra, todos devem lutar
112
3.1 CINEMA E ESTADO: AS SESSÕES DE FILMES EDUCATIVOS
O cinema, nos dias que correm, é um dos mais
percucientes instrumentos de propaganda das nações
civilizadas.
A Semana
259
O estabelecimento das salas de projeção cinematográfica na cidade de
Belém, no início do século XX, proporcionou a população citadina um novo estilo de
entretenimento urbano que viria a se constituir como um importante meio de
propaganda e veiculação de informações.
Na primeira metade do século XX o cinema registrou diversos acontecimentos
ocorridos no mundo, servindo como instrumento de informação imagética para
milhões de pessoas nos quatro cantos. Como visto nos capítulos anteriores, nos
anos que se seguiram do segundo conflito mundial a veiculação de imagens dos
campos de batalha foram exibidas para os freqüentadores dos cinemas brasileiros
sob forma de cinejornais ou filmes que retratavam a guerra.
Com o golpe do Estado Novo, em 10 de novembro em 1937, assumiu como
Interventor Federal do Estado o Dr. José Carneiro da Gama Malcher no dia 24 de
novembro do mesmo ano. José Malcher exerceu o cargo até o dia 25 de janeiro de
1943, quando deixou a função para Miguel José de Almeida Pernambuco Filho.
Contudo, José Pernambuco Filho ficou como Interventor Federal por um breve
período, logo repassando a função para o Coronel Magalhães Barata em 09 de
fevereiro de 1943, que permaneceu até outubro de 1945.
260
Em relação aos Prefeitos que exerceram a função durante a Segunda Guerra,
Ernesto Cruz explica:
O decreto 19398, de 11 de novembro de 1930, que instituiu o governo
provisório da República, estabeleceu a dissolução das Câmaras municipais,
passando as Intendências à denominação de Prefeituras, cabendo aos
Interventores a nomeação dos respectivos Prefeitos. A 19 do mesmo mês,
259
A Semana – Belém, 25 de novembro de 1939. “O cinema brasileiro e o Dr. Getúlio Vargas”.
260
CRUZ, Ernesto. História do Pará.
113
em virtude dessa Lei, a Intendência passou a denominar-se Prefeitura
Municipal de Belém.
261
Ernesto Cruz deixa uma lacuna com relação aos prefeitos que assumiram o
cargo no período da guerra. Não obstante, o historiador José Valente, em uma
matéria para o jornal O Liberal, de 01 de outubro de 2000, comenta sobre as
administrações municipais de Belém durante os seus 374 anos de existência. Nas
suas pesquisas constatou que o prefeito municipal no período de 1935 a 1943 foi
Alcindo Comba do Amaral Cacela, sendo substituído por Jerônimo Cavalcante entre
os anos de 1943 a 1945.
262
Contudo, podem-se contestar essas informações
114
projeção no Brasil. O artigo do jornal Folha do Norte, de 14 de junho de 1940,
informava a respeito da quantidade de espectadores que freqüentavam os cinemas
cariocas.
RIO. 14 (A.U.) Uma estatística publicada pela Prefeitura do Distrito
Federal comprovou que, durante um anno, enquanto pouco mais de
600.000 pessoas assistiram a partidas de foot-ball, no Rio de Janeiro,
1.340.311 foram a espetáculos theatraes e 23.408.687 assistiram a
sessões de cinema... A predilecção absoluta do povo carioca pelo cinema,
predilecção essa que não errariamos si a extendescemos a todos os
brasileiros, mostra que a creação da indústria cinematographica entre nós
merece ser cuidada pelo poder público. Povo que gosta tanto de cinema
precisa crear sua indústria filmesca. Seria uma obra de patriotismo, que
estaria tão bem como todas as outras que, aqui e alli, se ensaiam ou se
projectam ou se alicerçam e que, muitas vezes, são apenas lyricas. Pense-
se nos milhões de dólares que essa preferência do público encaminha para
o extrangeiro, e veja-se como seria vantajoso para o Brasil que essa caudal
metálica aqui se detivesse... Mudando o circo para o cinema, o que,
emblematicamente vem dar no mesmo, ter-se-ia resolvido, de uma
cajadada, dois problemas.
264
Trata-se de um artigo escrito sobre os cinemas na cidade do Rio de Janeiro e
enviado para o jornal do Pará por telégrafo. A narrativa aponta o cinema como o
preferido do público enquanto programação cultural, vindo em segundo plano o
teatro e o futebol. A análise supõe a mesma preferência para o restante do Brasil.
Apreende-se o destaque dado ao papel do poder público na formação de uma
indústria cinematográfica lucrativa para o governo e ao papel do patriotismo, muito
em evidência nos discursos de Getúlio Vargas e também dos filmes concernentes ao
conflito.
Ao rmino, faz a comparação do circo com o cinema. Sugestivo deste o
título, “Pão e... Cinema”, o artigo enfatizava não o divertimento público, mas a
política empreendida pelo Império Romano de escamotear problemas sociais e
políticos de maior importância, agradando o povo com pão e, sobretudo, com
distrações que impedissem qualquer forma de contestação por parte da população.
Desse modo, fazendo uma analogia da política do pão e circo do Império Romano,
com o governo de Getúlio o circo seria substituído pelo cinema, sendo que seriam
sanados dois problemas: o financeiro e o de oposição ao regime ditatorial instituído
com o Estado Novo.
264
Folha do Norte – Belém, 14 de junho de 1940. Folha Vespertina, p. 04.
115
Apesar do pouco investimento, o cinema brasileiro aos poucos ganhava
destaque e incentivo por parte do governo. Determinadas leis foram criadas para
facilitar a produção cinematográfica nacional.
265
Nesse período, os filmes nacionais
destacavam-se na imprensa local, conquistando o público, sendo que nos cinemas
da cidade a ocorrência de filmes e cinejornais brasileiros tiveram uma participação
expressiva se comparado com os anos anteriores.
Contudo, o se observa nada o significativo quanto à quantidade de filmes
vindos dos Estados Unidos. Segundo dados do DIP, os filmes nacionais ficaram em
segundo lugar na lista de películas
266
exibidas nos cinemas brasileiros, “(...) pelas
estatisticas, os paizes que mais forneceram foram: 1º - Estados Unidos; - Brasil;
- França; Allemanha; - Itália; - Argentina; - Inglaterra; - México. Dos
films censurados, apenas seis foram interdictados”.
267
Os dados fornecidos pelo DIP procuravam demonstrar o crescimento da
produção cinematográfica brasileira. Aliada a esses fatores a tentativa de consolidar
o projeto de alguns setores do Estado na utilização do cinema como meio de educar
a população.
268
Em Belém, durante a Segunda Guerra Mundial, percebe-se o reflexo dessa
política na exibição de filmes educativos, em um primeiro momento promovido pela
Prefeitura em conjunto com a Interventoria Federal do Estado. Em agosto de 1940 o
jornal Folha do Norte noticiava a exibição do filme “III Congresso Eucharistico
Nacional de Recife”.
Em concordancia com o secretario educacional do programma de
instrucção pública adaptada pelo Estado Novo e obedecendo a instrucções
do ilustre interventor federal, dr. José Malcher, o prefeito Abelardo Condurú,
proporcionará aos alunos dos estabelecimentos de ensino da capital, uma
265
O Decreto-Lei de 1932 que previa a obrigatoriedade da exibição de filmes curta metragens nacionais como
complemento as sessões e o Decreto-Lei de 1939 que obrigava a exibição de pelo menos um filme longa
metragem nacional por ano. Vide BERNARDET, op. cit.; ALMEIDA, op. cit.; SIMIS, op. cit.
266
É importante ressaltar que essas películas brasileiras referem-se aos cinejornais, em sua maioria, e os filmes
de longas metragens.
267
Folha do Norte Belém, 04 de junho de 1940, p. 05. Os dados trabalhados foram fornecidos pelo DIP e
veiculado através do jornal Folha do Norte em uma coluna não muito freqüente “O Theatro, a Música e o
Cinema na Cidade Maravilhosa”. Essa coluna aparecia comumente uma vez na semana, sem dia definido, e
informava sobre a programação cultural que estava ocorrendo na cidade do Rio de Janeiro.
268
O empenho feito pelos cineastas brasileiros para a utilização do cinema enquanto recurso educativo surtiu
efeito durante os anos iniciais da década de trinta, conseguindo “o merecido apoio do estado, esses cineastas de
moral elevada conseguiram suprir o mercado com filmes educativos que ocupariam o espaço das fitas chulas,
imorais e apelativas distribuídas por empresas estrangeiras ou ‘cavadores’ nacionais”. ALMEIDA, op. cit., p. 67.
116
sessão especial de filme religioso “III Congresso Eucharistico Nacional de
Recife”, amanhã, quinta-feira pela manhã, no Cine Independencia.
269
Nas informações do periódico, a exibição do filme educativo sobre o
congresso religioso seguia a proposta do Estado Novo para a instrução dos alunos,
utilizando o cinema como veículo de ensino patriótico e religioso dos jovens
estudantes.
270
Nota-se também que como interventores locais, Abelardo Conduru e
José Malcher promoveram outras sessões cinematográficas gratuitas para os
alunos.
A intervenção do Estado dava-se através dos decretos-leis que favoreciam,
mesmo que em pequena escala, a produção cinematográfica brasileira e a produção
de cinejornais através do DIP. Em Belém, Líbero Luxardo e a Amazônia Films
produziram algumas películas jornalísticas em consonância com o poder público
local.
271
Contudo, destacaram-se as sessões promovidas em conjunto com as
empresas proprietárias das salas de projeção.
272
A repercussão da sessão promovida pelo poder público de Belém e do Estado
do Pará levou a contínuas exibições do filme religioso. No dia 12 de agosto de 1940
o periódico informava sobre a continuidade do evento, destacando, novamente, a
participação do Prefeito e do Interventor Federal no Estado orientados pela política
do Estado Novo.
Mais de quatro mil creanças presenciaram o desdobrar da formosa fita,
achando-se superlotada a casa em ambas as sessões. Grande foi o êxito
do espetáculo, grande e instructivo também. E dado o enthusiasmo dos
escolares pela pellícula, o governador da cidade entrou em combinação
com a empresa do cine Independência para, nesse centro diversional, ser
novamente passada a grande e bem feita fita, que assim será focada, ainda
por três vezes: amanhã, quarta e quinta-feira.
273
O interesse pela fita levou um número considerável de alunos à sala de
projeção, destarte as sessões obtiveram resultados quanto a utilização do recurso
269
Folha do Norte – Belém, 07 de agosto de 1940, p. 04. “Um film educacional para os escolares de Belém”.
270
Anita Simis ressalta que durante a década de trinta a intervenção do Estado intensificou o incentivo à
produção de filmes educativos, citando o discurso do Presidente Getúlio Vargas de 1934 em que destacava o
papel pedagógico do cinema. SIMIS, A. op. cit. p. 29-30.
271
Ver primeiro capítulo subitem sobre Líbero Luxardo.
272
Tanto a empresa Cinematográfica Paraense como a Cardoso & Lopes dispunham para as exibições gratuitas
promovidas pelo poder público duas salas de cinema, geralmente uma luxuosa e outra de bairro.
273
Folha do Norte Belém, 12 de agosto de 1940, p. 04 do Caderno (Folha Vespertina). “O cinema a serviço
da educação dos escolares de Belém”.
117
imagético como ferramenta de instrução durante sua gestão como chefe do
executivo local. Pelas informações apresentadas no jornal, as sessões surtiram
efeito diante do público juvenil que apreciava o cinema como entretenimento.
Além da gratuidade das sessões para os escolares a repetição do evento
durante mais três dias parecia refletir os objetivos alcançados com a utilização das
salas de projeção como recurso complementar à educação da população. A
participação das autoridades políticas em uma das sessões demonstrava o interesse
pelo cinema educativo.
O dr. José Malcher e o professor Abelardo Conduru, bem como o dr.
Pernambuco Filho, assistirão o primeiro desses espetáculos, cujos
interesses, ansiosamente desejado pelo mundo infantil da nossas escolas
se acham em distribuição.
274
Observa-se que outros pontos foram destacados nos artigos acerca da do
Congresso Eucarístico, dentre eles o entusiasmo e o interesse causado no público
escolar. No dia 15 de agosto de 1940, o periódico voltou a informar a respeito da
exibição do filme.
Exhibição patrocinada pelo prefeito Abelardo Conduru, em coordenação
com a Diretoria de Educação, grande interesse tem despertado a meninada
escolar, que em número superior a 6000, tem assistido as sessões
especiaes no Cine Independência.
275
O que se pôde observar com essas atividades cinematográficas para os
estudantes de Belém era o interesse desses setores políticos de manter uma
estreita relação com os postulados educacionais do governo Vargas atendendo aos
interesses de alguns setores que viam no cinema um importante meio de
comunicação.
Esses “espetáculos” perduraram outras vezes durante o ano de 1940, sendo
a prefeitura de Belém incentivadora das sessões cinematográficas. Contudo, não
eram somente os filmes documentários ou os cinejornais utilizados para as sessões
de cinema promovidas pelo poder público, mas também os filmes de longa
metragem. Como foi noticiado em outubro de 1940 a respeito do filme Com os
braços abertos” exibido em Belém.
274
Ibid.
118
O Sr. Prefeito de Belém, reconhecendo ser o film “Com os braços abertos”
um espectaculo educativo e cheio de exemplos sãos para a juventude, vae
offerecel-o em exhibições especiaes, gratuitamente, para as creanças das
escolas e para o povo em geral.
276
Diferente da proposta do filme sobre o Congresso Eucarístico essa exibição
se estendeu gratuitamente ao público em geral. Com a tentativa de atingir um
público maior o prefeito estendeu a sessão ao povo, para repassar, não somente um
espetáculo educativo, mas também valores morais propagados pelos filmes
hollywoodianos. Os exemplos sadios, expostos no artigo do jornal, serviriam para a
juventude da capital paraense como referência de solidariedade e civismo difundidos
pelo Estado.
O cinema enquanto espaço político e de propaganda foi incorporado no
itinerário dos chefes do executivo local, viabilizando condições para que as salas de
projeção e as fitas apresentadas servissem aos interesses morais e patrióticos.
277
A
articulação com as empresas proprietárias dos cinemas vai se estender ao longo do
conflito. Nesse caso, a empresa Cinematographica Paraense era quem tinha
disponibilizado as salas de projeção.
Essas exhibições terão lugar, para os collegiaes, nos cinemas Iracemas e
Poeira, quinta e sexta-feira, isto é, amanhã e depois, às 2 horas da tarde,
em ambos, e, na manhã de sabbado, às 9 horas, no cinema Poeira. Para o
povo, em geral, haverá uma única exhibição, quinta-feira, à noite no Poeira.
O filme “Com os braços abertos” teve muita repercussão perante o público
belenense e no jornal Folha do Norte, levando o periódico a promover um concurso
instituído pela Empresa Cinematographica Paranese S.A., em torno das
interpretações de Mickey Rooney e Spencer Tracy na grandiosa pellicula da
‘Metro’...”.
278
Para essas exibições promovidas pela Prefeitura em conjunto com a
Cinematographica Paraense seriam usados dois cinemas, o Iracema e o Poeira. O
275
Folha do Norte – Belém, 15 de agosto de 1940, p. 05.
276
Folha do Norte – Belém, 09 de outubro de 1940, p. 05. “A Prefeitura vae offerecer, para os collegiaes e para o
povo, exhibições gratuitas do film ‘Com os braços abertos’”. O enredo do filme propiciava para uma análise
educativa e incentivadora de ações solidárias, pois tratava sobre questões morais relacionadas a educação dos
jovens que não tinham o amparo da família nem do Estado.
277
A questão do patriotismo vai ser mais bem explorada com a entrada do Brasil na Guerra, mudando o estilo
dos anúncios dos filmes que procuravam manter a política de neutralidade brasileira.
119
Iracema tinha requintes luxuosos voltados para as classes sociais mais abastadas
da capital, diferente do cinema Poeira que estava voltado para o público dos bairros
pobres da cidade, sendo que nesse cinema a exibição foi gratuita ao povo.
Em novembro de 1940 a passagem do presidente Getúlio Vargas pela cidade
de Belém repercutiu perante a população. A visita foi registrada pelas câmeras
cinematográficas e apresentada como uma curta reportagem no cinema Iracema,
novamente promovida pela Prefeitura Municipal.
O prefeito de Belém, professor Abelardo Conduru, fez passar na tela do
“Iracema” hoje, às 9 horas da manhã, em uma sessão especial, interessante
reportagem fotographica da segunda e recente vinda do presidente da
República à nossa capital.
Essa celulóide, embora de processamento curto, nos nitidamente,
flagrantes expressivos de todas as visitas do grande chefe do executivo
nacional. Assim, vemol-o, ao presidente Getúlio Vargas, nas casernas onde
aquarteladas as forças federais, como nos quartéis das tropas estaduais, na
basílica de Nazareth, no Museu Goeldi, no Instituto Agronômico do Norte,
como nas oficinas do SNAPP, em Val-de-Cães, ou inaugurando o Grupo
Escolar Dr. Freitas etc. E reproduz, ainda, em parte, a parada da juventude,
com aspecto do desfile das normalistas, gynasianos do Instituto Gentil
Bitencourt e grupos escolares.
Assistiram a exhibição da pellicula, entre outras, as seguintes pessoas
Interventor José Malcher, acompanhado de seu ajudante de ordens; general
Edgar Faço, comandante da 8º Região; prefeito Abelardo Conduru; dr.
Salvador de Borborema, chefe de polícia; dr. Pernambuco Filho, secretaria
geral interino do Estado; Coronel Wolerand da Silveira, commandante da
26º B. C.
279
A matéria transcrita do periódico paraense revela como os diversos setores
da política estadual interagiam com as salas de projeção, colocando como espaços
divulgadores das atividades do governo. A passagem por Belém do Presidente
Getúlio Vargas foi bastante noticiada pela imprensa local e as tomadas de cena do
presidente pareciam representar o poder simbólico do Estado junto ao povo da
capital paraense.
Os diversos atos de solenidade da qual participou o Presidente faziam parte
da proposta do Estado Novo para a política desenvolvida pelos cinematografistas
que produziam as películas jornalísticas para o governo. Além disso, as autoridades
compareciam as sessões compartilhando com o público das salas de projeção os
postulados propagados.
278
Folha do Norte Belém, 01 de outubro de 1940, p. 04 da Folha Vespertina. “Os vencedores do concurso do
Filme ‘Com os braços abertos’”.
279
Folha do Norte – Belém 28 de novembro de 1940, p. 04.O ‘Film’ da visita a Belém do presidente
brasileiro”.
120
Ao analisar a relação entre Estado e cinema no Brasil, Simis (1996) trabalha
com as teorias debatidas, desde o final da República Velha, em relação à utilização
do cinema como meio de propaganda do estado brasileiro. Esse debate vai ser
adensado com a participação de vários intelectuais e políticos após a implantação
do governo de Getúlio Vargas, em 1930. Nesse caso, visava-se o o cinema
com função educativa para a sociedade brasileira, mas também contribuir para unir
e entrelaçar as forças vivas da nação”.
280
Como visto anteriormente, o cinema tinha como função estabelecer a
comunicação entre as diversas regiões brasileiras, despertando assim o sentimento
patriótico, desvinculando as diferenças de classe existentes no Brasil em prol de
uma integração da nação, tendo como porta voz o Estado.
Não por acaso, durante o Estado Novo, período em que Getúlio Vargas
buscou fazer-se o centro político, o único árbitro e salvador dos
extremismos da direita e da esquerda, mais do que fora como presidente
provisório ou presidente constitucional, a máquina da propaganda expandiu-
se e aperfeiçoou o controle das informações, com a realização de filmes
que procuraram difundir uma imagem carismática de Vargas,
caracterizando-o como ser onipresente e onisciente, mas também simples e
acessível.
281
Acrescenta a autora que a imagem de Getúlio Vargas estava vinculada ao
crescimento do Brasil, sendo que as filmagens produzidas nesse período mostravam
o presidente inaugurando obras e serviços públicos, bem como visitando os diversos
estados e estabelecimentos civis e militares para posteriormente serem editadas e
exibidas através dos cinejornais patrocinados pelo DIP.
A produção dos cinejornais oficiais serviu como “espetáculo” para a
população citadina. Através das sessões promovidas pela Prefeitura e Intendência
Federal do Estado havia uma intensificação dos postulados educacionais, morais,
cívicos e patrióticos propagados com muito entusiasmo pelos governos federal,
estaduais e municipais.
Contudo, pode-se encontrar descontentamentos em relação à ação do
cinema na vida da sociedade brasileira. No artigo intitulado “Sabotagem Moral”, do
Capitão Paulo Vieira da Rosa, de outubro de 1941, os meios de comunicação de
280
SIMIS, A. op. cit., p. 43.
281
Ibid. p. 46.
121
massa, dentre eles a imprensa e o cinema, as artes e a tradição oral minavam o
patriotismo e a confiança da nação em relação a sua história e suas riquezas.
É na insistência dos lugares comuns, pessimistas acerca de tudo que é
nosso, como aquele malfadado “deserto de homens e de idéias”, lugares
comuns falsos que a repetição foro de conceitos reais, da nossa
inferioridade congênita, como se fossemos um país desherdado de Deus
(...)
É, sobretudo, envenenando a juventude, mistificando-a, embrutecendo-a,
corrompendo-a para apoderar-se da alma da criança e formar uma geração
a sua feição, impotente para defender o país contra a dominação
econômica ou militar dos povos fortes.
Ocioso é dizer que se tais são os processos gerais, as armas são
simplesmente a imprensa, o cinema, as pseudo-artes e a tradição oral (...)
O cinema é a força desnacionalizadora por excelência; dirige o espírito
público para os ofuscantes primores de outras terras, criando a sensação de
que nossas coisas são soberanamente chãs e ridículas.
282
Esse artigo foi publicado no mês anterior, no periódico A Defesa Nacional,
sendo enviado pelo DEIP paraense para ser publicado no jornal Folha do Norte.
Alguns aspectos relativos às idéias pessimistas criadas em torno dos objetivos na
nação brasileira são combatidas de forma contundente pelo capitão Paulo Vieira,
principalmente com relação à degradação dos valores morais repassados aos
jovens e as crianças. Percebem-se as divergências com relação ao interesse na
utilização do cinema como recurso pedagógico, mostrando as insatisfações por
parte de alguns setores. Contudo essas matérias que colocavam a ação do cinema
como pernicioso aos interesses nacionais não foram encontrados com freqüência
nos periódicos estudados.
Durante o ano de 1941 a atividade cinematográfica no Estado do Pará
vinculou-se de forma intensa à figura de Líbero Luxardo e à proposta de divulgar as
riquezas da Amazônia. Algumas sessões promovidas estavam vinculadas aos filmes
documentários relacionados à região, ou mesmo, sobre atividades de outros órgãos
governamentais.
283
Os acontecimentos sobre o conflito na Europa eram noticiados pelos meios
de comunicação, sendo as salas de projeção da cidade de Belém um importante
espaço para a exibição das imagens referentes à guerra. No ano de 1942 várias
mudanças se configuravam no decorrer da Segunda Guerra. A entrada dos Estados
Unidos no confronto, após o ataque a Pearl Harbour, em 7 de dezembro de 1941,
282
Folha do Norte – Belém, 26 de outubro de 1941, p. 06. “Sabotagem moral”.
283
Sobre essas atividades cinematográficas ver o capí
122
impulsionou outros países do continente americano a prestarem solidariedade e
cooperação contra os países do Eixo.
Sendo assim, os acontecimentos relacionados às exibições das fitas, fossem
elas cinejornais, documentários ou longa metragem, por parte do poder público
municipal e estadual em comunhão com as empresas cinematográficas, estavam
atrelados a determinados pressupostos do Estado Novo. Destarte, esses eventos
foram debatidos posteriormente, vinculados aos desdobramentos e participação do
Brasil no conflito, pois essas exibições esporádicas ocorridas nos primeiros anos da
Segunda Guerra Mundial irão se intensificar e servir como mais um espaço de
organização e difusão de idéias sobre o conflito.
123
3.2 ESTAMOS EM LUTA: A EXIBIÇÃO DE FILMES SOBRE A GUERRA
A partir de 1942 as tensões se acirraram entre os países americanos, em sua
maioria, e os países que compunham o Eixo (Alemanha, Itália e Japão), devido ao
ataque às bases norte-americanas de Pearl Harbor pelos japoneses. Desde o início
da Segunda Guerra Mundial os Estados Unidos promoveram a política de boa
vizinhança com o Brasil com o intuito de cooptá-lo para o bloco antinazista. Com a
agressão ao vizinho do norte, a pressão aumentou para que o Brasil acabasse com
a “neutralidade” e rompesse as relações com a Alemanha, Itália e o Japão.
Dentre tantos outros acontecimentos relacionados à guerra, nos anos iniciais
percebe-se que na cidade de Belém, assim como no Brasil, o conflito tomara
grandes proporções no continente europeu, porém não oferecia perigo iminente. Nos
periódicos citadinos, a guerra era noticiada constantemente, bem como nos
cinemas, que progressivamente aumentaram a quantidade de filmes e cinejornais
referentes ao confronto.
Contudo, esse estado de relativa paz modificou-se ao longo do ano de 1942.
Primeiro, em virtude do rompimento das relações diplomáticas com os países do
Eixo, em 28 de janeiro de 1942; segundo, em razão dos afundamentos dos navios
brasileiros, a partir de fevereiro de 1942, por submarinos alemães.
284
A mobilização
para a guerra levou a diversas manifestações populares a favor de atitudes
enérgicas por parte do governo brasileiro.
Diante da conjuntura, os debates relacionados ao cinema, nos periódicos,
procuraram demonstrar o bom relacionamento existente entre o Brasil e os Estados
Unidos e a consonância cultural compartilhada entre as duas nações. Nesse sentido,
pode-se destacar a nota referente à entrevista concedida por Assis Figueiredo, do
Departamento de Imprensa e Propaganda, em Hollywood:
O sr. Assis Figueiredo, do DIP, do Brasil, referindo-se ao rádio e cinema do
seu país e dos Estados Unidos, declarou a imprensa não haver grande
diferença nas preferências, pois que qualquer pellicula ou programa de
284
SILVA, Hélio. 1942: guerra no continente. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1972. O autor faz
inicialmente uma cronologia dos fatos ocorridos nos anos de 1939 a 1942. No histórico apresentado as agressões
nazistas começam com o afundamento do navio mercante brasileiro Buarque, em 15 de fevereiro de 1942, pelo
submarino alemão U-432. Sucessivamente outros navios foram sendo bombardeados pelos submarinos e navios
dos países do Eixo na costa americana.
124
radio aceito pelo público norte-americano é igualmente aceito pelos
brasileiros. Disse que se alguns filmes fracassaram no Brasil é porque
haviam fracassado nos Estados Unidos.
285
Os gostos culturais muito “próximos” evidenciavam o bom entendimento
existente entre os dois países, demonstrando o apreço do público brasileiro pelas
películas vindas de Hollywood. Segundo Meneguello (1996), durante a Segunda
Guerra os filmes norte-americanos dominavam cerca de 95% do mercado latino
americano, fator ocasionado, principalmente, devido as restrições impostas pelo
conflito.
286
.
Não obstante, os artigos pesquisados nos periódicos mostravam que a
relação entre Brasil e Estados Unidos dava-se nos diversos âmbitos da organização
da produção cinematográfica, como o caso clássico da contratação da atriz Carmen
Miranda pela 20º Century Fox. Dessa forma, o interesse não se restringiu ao
domínio do mercado distribuidor de filmes, mas também no reconhecimento da
cultura brasileira pelos norte-americanos.
287
O exmo. Sr. prefeito municipal de Belém, em data de 3 do corrente, recebeu
o dr. Raul Bopp, nsul geral do Brasil, em Los Angeles, Estados Unidos, o
telegrama que a seguir estampamos, no qual dá ciência a s. exc. Da
próxima chegada a esta capital dos produtores Elliott e Bernerd,
acompanhados de outros elementos da Companhia Monogramm:
“Prefeito Abelardo Conduru Belém avionarão brevemente a Belém
produtores Elliot, Bernerd e outros elementos da Companhia Monogramm,
filmar cousas marajoaras. Apresentei presado amigo, confiando sua valiosa
assistência dispensar mesmos facilidades possíveis. Obtiveram necessária
licença DIP. Abraços – (a) Raul Bopp – 6606 Sunset BLVD”.
288
Para a política de boa vizinhança empreendida na América Latina, pode-se
considerar os cineastas da indústria de cinema hollywoodiana como grandes
propagadores do “american way of life” e da luta pela democracia nas Américas. Nos
anos da guerra vários diretores, atores e atrizes vieram para o Brasil com a proposta
de combater o nazismo através de películas com conteúdo de propaganda dos
países aliados.
285
Folha do Norte – Belém, 09 de abril de 1942, p. 01. “A exibição de filmes norte-americanos em nosso país”.
286
MENEGUELLO, C. op. cit., p. 12. A guerra inviabilizou a entrada de filmes produzidos por Hollywood nos
mercados europeu e asiático. Deste modo os estúdios norte-aericanos voltaram-se para a América Latina, tendo o
Brasil recebido tenção especial por parte do governo Roosevelt devido as relções políticas e economicas
estabelecidas com a Alemanha nazista.
287
Orson Welles veio para o Brasil filmar It’s all true, com o intuito de fortalecer a política de boa vizinhança e
divulgar alguns aspectos da cultura nacional, como o carnaval.
125
A cidade de Belém fazia parte da rota aeroviária dos artistas de cinema de
Hollywood, assim como outras personalidades políticas, que aportavam em terras
paraenses para divulgar ou registrar informações sobre a região amazônica. Na
matéria citada o redator transcreveu o telegrama escrito pelo cônsul geral do Brasil
em Los Angeles para o prefeito Abelardo Conduru. Tem-se como articulador para
viabilizar o interesse em filmar a cultura marajoara, o poder público que teria a
função meramente assistencialista, sendo que, além do pedido de auxilio aos
cinematografistas da Companhia Monogramm, o cônsul havia recebido
autorização do DIP.
É importante perceber a interação entre esses segmentos sociais, exibidor,
produtor e poder público para que se possa apreender a intervenção durante a
Segunda Guerra, uma vez que para se concretizar a propaganda contra os países
do Eixo esses segmentos vão agir em conjunto para informar e influenciar a
população citadina.
Retomando-se algumas idéias do capítulo segundo, a respeito da luta
empreendida por Hollywood contra o perigo nazista, percebe-se que desde antes do
início do conflito, a indústria cinematográfica dos Estados Unidos se posicionava,
através dos filmes, contra a política desenvolvida pelo estado alemão. Durante a
guerra, a produção de filmes e cinejornais criticando o regime nazista intensificou-se,
bem como a produção de películas sobre instrução militar. Em junho de 1942,
noticiava o jornal Folha do Norte uma matéria a respeito dos filmes voltados para o
estado de guerra.
Washington, 3 (U.P.) O Ministro da Guerra informa que algumas películas
sobre instrução militar, que foram muito eficazes como ajuda para
adestramento de tropas dos EUA, estão sendo reeditadas em espanhol e
português para o seu emprego nos países latino-americanos. A informação
do Ministério da Guerra acrescenta que as primeiras se referiam às armas já
enviadas pela União a algumas dessas nações, na conformidade com a lei
de empréstimo e arrendamento.
289
De acordo com a notícia transcrita, a cooperação militar existente entre os
países americanos para a defesa do continente levou o governo dos Estados Unidos
a enviar para a América Latina as películas que serviram para a instrução militar dos
seus soldados. O auxílio na defesa do continente contra o inimigo externo, com o
288
Folha do Norte – Belém, 06 de janeiro de 1942, p. 03. “Cinegrafistas americanos virão a Belém”.
289
Folha do Norte – Belém, 04 de junho de 1942, p. 01 do Segundo Caderno. “Pellículas úteis a fins de guerra”.
126
envio de equipamentos bélicos, intensificou a partir de 1942, assim como a atuação
das produtoras cinematográficas dos Estados Unidos na elaboração de filmes contra
os países do Eixo a serem exibidos nos cinemas brasileiros.
Nos Estados Unidos o governo Roosevelt (1933-1945) utilizou o cinema para
fins políticos. Hollywood comungando com os interesse do governo mesclou a
produção de filmes, ora voltados para o entretenimento, ora para a propaganda
política. Com o início da e a entrada do país em dezembro de 1941 o cinema serviu
com grande valor aos interesses norte-americanos no conflito.
290
Em Belém, a exibição de filmes concernentes ao conflito mundial aumentou
consideravelmente durante os anos de 1943 e 1944. A atuação das empresas donas
das salas de projeção endossaram plenamente o esforço de guerra empreendido
pelo estado brasileiro. A mobilização da população belenense contra os ataques aos
navios brasileiros, bem como ao inimigo externo, representado pelos países do Eixo,
e ao inimigo interno, representado pelos espiões da Quinta Coluna, foi bastante
noticiada pela imprensa paraense.
Será depois de amanhã a grande passeata cívica dos estudantes
paraenses em protesto às atitudes agressivas do Eixo e de combate contra
a ação traiçoeira da Quinta Coluna.
Por certo que de ser um vibrante espetáculo de entusiasmo e ardor
patrióticos, porque desse desfile participarão todos os estudantes de Belém,
universitários, secundários, normais, comerciais, técnicos e profissionais.
Todas as escolas deram seu apoio irrestrito a essa manifestação pró-
Defesa do Brasil e da Democracia. E ninguém mais do que a mocidade
poderia assumir as responsabilidades dessa defesa com mais vigor e com
mais decisão.
291
Representando os ideais da nação brasileira, a juventude estudantil
incorporou o sentimento de luta contra os inimigos dos países Aliados. A passeata
dos estudantes envolveria as escolas da cidade e outros setores da sociedade,
como os comerciários, fazendo parte da grande mobilização popular ocorrida em
todo Brasil para a declaração de guerra a Alemanha, Itália e Japão.
290
“Considerando que a indústria provou a sua habilidade de informar e entreter, juntamente com a aprovação de
seu compromisso em assumir um papel mais agressivo de propaganda, Roosevelt estava confiante na agenda
política e militar do seu governo e nos interesses comerciais que levariam Hollywood a trabalhar em união com
o governo”. PEREIRA, Wagner Pinheiro. Guerra das imagens: cinema e política nos governos de Adolf Hitler e
Franklin D. Roosevelt (1933-1945). Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003, p.
107.
291
Folha do Norte Belém, 12 de junho de 1942, p. 01 do Segundo Caderno. “A mocidade paraense é, por
vocação e ideais, contra o Eixo e contra as infâmias da Quinta Coluna”.
127
Com o fim da neutralidade as relações rompidas com os Países do Eixo foram
rompidas aumentando a mobilização no front interno. A articulação dos três setores
foi muito destacada nos periódicos da cidade como incentivadores do emprego do
cinema como instrumento de divulgação da guerra; eram eles: União Acadêmica
Paraense, o poder público paraense (tanto o prefeito como o interventor) e o Comitê
Regional da Coordenação dos Negócios Inter-Americanos em Belém.
292
Com os lados definidos no combate procurou-se logo demonstrar os horrores
proporcionados pelo regime nazista.
293
Os diversos filmes produzidos por Hollywood
contra a política empreendida pelo estado alemão chegaram aos cinemas de Belém
como uma “invasão” consentida. Sendo assim, a partir de julho de 1942 o jornal
Folha do Norte noticiava a liberação do primeiro filme antinazista a ser exibido nos
cinemas brasileiros e, também, na cidade.
Tempestade D’Alma, exibido nos cinemas da cidade nos meses de julho e
agosto de 1942, teve grande repercussão na capital paraense, o que levou a
prefeitura municipal a promover uma sessão gratuita para a população, viabilizando
condições para que o filme atingisse um grande público. A sessão foi noticiada no
periódico no dia 20 de agosto de 1942 e enfatizava que A Prefeitura de Belém fará
passar na próxima sexta-feira, 21, em vesperal e a noite, nos cinema ‘Poeira’ e
‘Iracema’, o filme anti-nazista, TEMPESTADE D’ALMA, para o que está distribuindo
ingressos”.
294
Aos montes, os variados temas foram abordados nas películas em favor dos
Aliados como propaganda política pelo governo dos Estados Unidos, sendo
oportunos para o momento de tensão existente no Brasil, uma vez que os combates
navais na costa americana e a política empreendida pelo governo brasileiro tendiam
para a declaração de guerra a Alemanha e Itália, formalizada em 30 de agosto de
1942.
292
Ressaltam-se esses três, pois eram os que mais sem empenhavam na exibição cinematográfica, portanto não
se pode excluir outros segmentos sociais que utilizaram esse recurso. Em relação aos filmes produzidos por
Hollywood sob o direcionamento do governo dos Estados Unidos referentes ao tema da guerra “havia seis
assuntos de guerra que o governo esperava ver tratado nos filmes de longa-metragem, cinejornais e
documentários: as causas (‘por que nós lutamos?’), o inimigo, os aliados, o ‘front interno’, o ‘front de combate’
e as forças armadas norte-americanas”. PEREIRA, op. cit., p. 107.
293
A referência, em sua maioria, ao nazismo dar-se-á em decorrência da quantidade de filmes exibidos na capital
paraense propagandeando as atrocidades promovidas pelo Reich alemão.
294
Folha do Norte – Belém, 20 de agosto de 1942, p. 01 do Segundo Caderno.
128
Seguindo os métodos anteriormente usados, a Prefeitura Municipal
promoveria duas sessões no dia, uma vesperal e outra à noite, nas dependências
dos cinemas Iracema e Poeira, dois cinemas distintos quanto à estrutura e público
freqüentador. Como era uma prática da Prefeitura de Belém promover sessões
cinematográficas para a população, entende-se que ela dava continuidade ao
patrocínio dessa atividade.
Contudo, outras regiões também atentaram para a importância do filme
relacionado ao momento de instabilidade provocado pelas tensões mundiais, como
no caso do secretário de polícia da capital do Ceará Fortaleza O secretário de
polícia mandou estudantes do curso secundarista e superiores a vários cinemas
assistirem o filme antinazista ‘Tempestade D’Alma’”.
295
Como as fitas seguiam a rota
de exibição do sul/sudeste para o nordeste e norte, em Fortaleza o secretário de
polícia já recomendava aos estudantes assistirem ao filme como fonte de informação
sobre o perigo nazista.
As empresas proprietárias dos cinemas da cidade não cooperaram somente
com a exibição dos filmes antinazistas, mas também com a realização de atividades
que pudessem contribuir com a propaganda dos países Aliados e com as timas da
guerra. Como no caso da doação da renda para as vítimas dos navios torpedeados
proporcionada pela Empresa Cinematographica Paraense.
DOANDO nos Dia da Pátria a RENDA TOTAL dos seus cinemas Olímpia,
Iracema, Guarani, Popular, Poeira, Íris e São João Vesperal e à noite
pró-vítimas dos torpedeamentos, a Empresa Cinematográfica Paraense,
oportunidade a que todos os brasileiros desse rincão, mesmo os mais
humildes, acorram, também, com o seu valioso auxílio em favor das famílias
daqueles nossos infortúnios patrícios.
296
Em tempos de guerra, nada mais patriótico do que contribuir para a nação
ajudando as famílias das vítimas do conflito. Dessa, forma a Empresa
Cinematográfica Paraense cooperava levantando fundos junto à população local,
atribuindo valores morais ao gesto de comparecimento nas sessões, solicitando
nesse momento, a união entre os brasileiros, até os mais humildes, em prol da pátria
agredida pelo inimigo. Concluindo o anúncio: BRASILEIROS! Que nenhum de vós
295
Folha do Norte – Belém, 08 de julho de 1942, p. 02.
296
Folha do Norte – Belém, 05 de setembro de 1942, p. 02.
129
deixe de levar à bilheteria de seu bairro a sua contribuição pró-vítimas dos
afundamentos!”.
297
No dia da pátria, gestos patrióticos para enaltecer a nação brasileira, com
apelos para a solidariedade para com os patrícios desafortunados. No mesmo dia,
foi noticiada, pelo periódico, outra manifestação de ajuda às famílias das vítimas dos
navios torpedeados. Os empregados da Empresa Cinematográfica Paraense iriam
contribuir com um dia de salário em favor das famílias.
As Folhas receberam ontem a visita de uma comissão de auxiliares da
Empresa Cinematográfica Paraense, que nos veio comunicar estarem todos
os que ali empregam as suas atividades solidárias com o gesto patriótico
dos bons brasileiros, e que contribuíram, também, com um dia de salário
pró-família dos náufragos dos navios torpedeados pelos corsários do
“eixo”.
298
As atividades solidárias dos empregados da empresa donas das salas de
projeção refletiam os acontecimentos da guerra, aproximando mais do cotidiano da
cidade de Belém e definindo a luta contra os “corsários do eixo”. O patriotismo
demonstrado nessas atividades impulsionava as idas aos cinemas daqueles que,
além de serem freqüentadores das salas, se solidarizavam com as famílias das
vítimas “o povo paraense tem, assim, nos quatro cantos da cidade, onde dar a sua
valiosa contribuição para as famílias das infortunadas vítimas da barbárie eixista, em
troca de um momento de sadia diversão”.
299
O gesto patriótico estendeu-se à Empresa Cardoso, Lopes & Cia que,
também promoveu a doação total da renda em prol das vítimas. Os discursos
expostos nas matérias do jornal são muito similares entre as duas empresas, bem
como o apelo à população para participar das sessões.
A Empresa pede ao POVO PARAENSE compareça em massa aos cinemas
aos cinemas MODERNO, INDEPENDÊNCIA, UNIVERSAL e REX, na
próxima segunda-feira, dia 21, contribuindo, assim, para minorar o
sofrimento dos nossos infelizes, porém gloriosos patrícios.
300
297
Ibid., p. 02.
298
Folha do Norte – Belém, 05 de setembro de 1942, p. 04.
299
Ibid., p. 04.
300
Folha do Norte – Belém, 17 de setembro de 1942, p. 02.
130
Essas atividades de mobilização em torno das salas de projeção foram muito
publicadas nos periódicos, merecendo destaque e atenção por parte dos redatores,
que contribuíam para a divulgação dessas sessões, e de outras organizações, como
o Centro Pan-Americano de Cultura do Pa que publicou uma nota sobre o gesto
patriótico da Empresa.
As conceituadas firmas CARDOSO & LOPES e HERNANI FONSECA,
proprietárias, respectivamente, dos cines “INDEPENDÊNCIA”,
“MODERNO”, “REX” e “UNIVERSAL”, levarão à scena, no próximo dia de
segunda-feira, 21 do corrente, nessas casas de espetáculos, sugestivas
fitas, sendo a renda total revestida em benefício das famílias dos brasileiros
mortos no selvagem afundamento dos nossos navios, pelos corsários do
eixo.
Atendemos ao apelo justo do “CENTRO PAN-AMERICANO DE CULTURA”,
os srs. CARDOSO & LOPES e HERNANI FONSECA compreendem,
perfeitamente, o dever dos que amam a terra em que nasceram ou dos que
nela moram, contribuindo, com o seu esforço para minorar os sofrimentos
de famílias inteiras, atingidas pelas maldades dos totalitários.
301
Note-se que as “maldades” empreendidas pelos regimes totalitários europeus
ganharam a devida atenção, pois, até então, eram pouco divulgadas na imprensa
local, bem como nos cinemas através dos filmes e cinejornais, em virtude da política
de empreendida pelo Brasil nos anos iniciais da guerra. Com o inimigo declarado,
logo as manifestações de desagrado ocorreram e a imagem do inimigo ganhou
contornos maléficos. No período da Segunda Guerra caracterizar o inimigo fazia
parte da política desenvolvida pelo governo Roosevelt, através de Hollywood, para
que tivesse resultado a propaganda política empreendida nos filmes:
Quando os países estão em crise ou em perigo de guerra, uma
necessidade crescente de simplificar as coisas. O outro lado fica totalmente
mau, a própria causa é indiscutivelmente justa, e todos se juntam em volta
dos símbolos da unidade. Os conflitos sociais são rapidamente resolvidos
ou disfarçados. As pessoas parecem muitas vezes desenvolver uma forte
necessidade de perder suas complexidades individuais numa identidade
nacional mais simples. Nesses tempos inseguros a propaganda política é
mais eficiente.
302
No decorrer da nota a evocação do sentimento patriótico parecia ser o ponto
principal para atrair a população para a sessão, ressaltando a participação das
diversas classes sociais, que a luta contra o inimigo externo deveria minorar os
301
Folha do Norte – Belém, 20 de setembro de 1942, p. 01 do Segundo Caderno.
302
FURHAMMAR, e ISAKSSON, op. cit., P. 187.
131
conflitos de classe. O dinheiro arrecadado seria enviado ao Ministro das Relações
Exteriores, Oswaldo Aranha, para ser repassado às famílias das vítimas.
Finalizando, a nota questionou em letras maiúsculas QUAL SEO BRASILEIRO
OU O ESTRANGEIRO AMANTE DO BRASIL QUE NÃO IRÁ ASSISTIR A ESSES
FILMES NA DEMOSNTRAÇÃO DOS SEUS SENTIMENTOS PATRIÓTICOS E
HUMANITÁRIOS?”.
303
Concomitantemente, o segundo semestre de 1942 foi marcado pela “caça”
aos espiões nazistas, representados pela Quinta Coluna, a atuação da polícia
paraense na repressão a qualquer atividade ou a manifestação favorável ao Eixo e a
exibição de filmes antinazistas nos cinemas da cidade. Em Hollywood os artistas
manifestavam-se a favor dos Aliados arrecadando bônus de guerra e produzindo
filmes de propaganda política, ou mesmo, visitando as tropas no front ou
participando do exército como soldados e oficiais.
Destarte, no ano de 1943 tem-se o primeiro registro jornalístico da
participação do Comitê Regional da Coordenação dos Negócios Inter-Americanos,
como fomentador de atividades ligadas ao conflito.
304
Sua primeira atuação deu-se
com a exibição de filmes científicos voltados para a área da saúde.
Na sede da Cruz Vermelha Brasileira todas as terças-feiras, a partir de hoje,
às 20 horas, serão passados filmes científicos pela ação conjunta do Comitê
de Coordenação de Belém e do Diretório de Medicina.
Dado o valor dos mesmos, a Diretoria da Cruz Vermelha Brasileira solicita o
comparecimento de todas as samaritanas.
305
Em conjunto com outros setores da sociedade o Comitê atuou durante os
anos finais da Segunda Guerra, promovendo exibições de filmes sobre o conflito ou
difundindo a cultura norte-americana para a população da capital paraense. Nesse
sentido, ligado à atuação do Diretório de Medicina visava estimular as mulheres a
ingressarem na Cruz Vermelha, a fim de que, se necessário, servissem como
enfermeiras no campo de batalha.
Conforme pesquisou Tota (2000) a respeito da americanização do Brasil na
época da Segunda Guerra Mundial, com a política de “neutralidade” implementada
303
Folha do Norte – Belém, 20 de setembro de 1942, p. 01 do Segundo Caderno.
304
Para a pesquisa sobre cinema não se aprofundou a diversa atividade desenvolvida pelo Comitê Regional, mas
sim as que estavam ligadas a exibição e produção de filmes.
305
Folha do Norte Belém, 06 de abril de 1943, p. 01 do Segundo Caderno. “Exibição de filmes científicos na
Cruz Vermelha Brasileira”.
132
pelo governo dos Estados Unidos nos anos iniciais da Segunda Guerra e a
apreensão do presidente Roosevelt em manter a política isolacionista em relação à
Europa, as atenções voltaram-se para a defesa e a cooperação no continente
americano. Com a vitória nas eleições de 1940, Roosevelt fortaleceu suas bases
políticas ganhando um aliado de peso: Nelson Rockefeller.
306
Continua explicando o autor, que a preocupação do governo norte-americano
com a expansão das ideologias socialistas e nazi-fascistas na América Latina, fez
com que sua atuação se intensificasse nessa parte do continente. Com grande
poder econômico e boas articulações políticas, Nelson Rockefeller conseguiu a
criação, em 16 de agosto de 1940, do Office for Coordination of Commercial and
Cultural Relations between the Américas e a direção do escritório, que um ano
depois passou a se chamar The Office of the Coordinator of Inter-American Affairs
(OCIAA).
A atuação do Office estimulou as relações comerciais entre as Américas do
norte e do sul, bem como procurou propagar o modo de vida norte-americano,
intimamente relacionado ao liberalismo e à democracia vivida nos Estados Unidos.
Destacou-se para esses fins a Divisão de Cinema do OCIAA, que, além de investir
na produção de filmes, voltou-se para exibi-los na América Latina. Essa atuação
estendeu-se até Belém.
A propagação dessas atividades teve repercussão junto à população da
cidade, pois em maio de 1943 destaca-se um artigo escrito por Pedro Borges,
provavelmente um cidadão comum e não uma autoridade, sobre a exibição de filmes
na sede da Cruz Vermelha promovida pelos estudantes.
Não quero deixar em branco a oportunidade de aplaudir os estudantes
paraenses, pelo muito bom cinema que semanalmente vêem exibindo na
sede da Cruz Vermelha. Ótima idéia, essa, dos nossos rapazes. E à palavra
de estimulo de daqui lhes envio, junto o agradecimento pela delicadeza do
convite sempre renovado.
Se o cinema é ou não é arte, falta-me autoridade para opinar. Por simples
questão de sentimento direto, nunca esse espetáculo me despertou emoção
comparável a que tenho experimentado ante certas formas clássicas ou não
de artes. Mas, se damos força de verdade ao conceito wildeano a vida
imita a arte – temos de admitir que o cinema é incontestavelmente uma arte.
E isto pela valorização do gesto sobre a palavra, graças a uns poucos
grandes artistas. È evidente a enorme influência desta supervalorização do
gesto na vida humana atual, tanto no seu aspecto artístico como no
biológico geral. O homem de hoje incorporou ao seu patrimônio anímico
306
TOTA, Antonio Pedro. O imperialismo sedutor: a americanização do Brasil na época da Segunda Guerra. São
Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 41-72.
133
muitos gestos e atitudes estilizadas na tela; e estas formas novas de
expressão influem, ainda que pareça estranho, na sua própria psicologia, da
mesma maneira por que muitas vezes a idéia surge ao espírito como
conseqüência da palavra e da escrita, sem que estas sejam, como se crê,
um fenômeno secundário, a forma externa e passiva do pensamento. Os
escritores, sobretudos os poetas, sabem disso muito bem, embora seja um
fenômeno que diariamente acontece na vida de qualquer mortal. O mesmo
se passa com o gesto e com a conduta. É de um modo cinematográfico que
vemos a maioria das pessoas sentar, caminhar, aflar e até expressar o
amor; e o conteúdo desses gestos, isto é, uma parte importante da
psicologia dessas criaturas, está influenciada pela nova dinâmica
expressiva.
307
A citação é longa, porém necessária para caracterizar a participação
estudantil na mobilização interna e, principalmente, como o cinema servia para a
instrução da população citadina no período de guerra. As queixas do autor em
relação à arte cinematográfica são sobrepostas pela ação eficaz dos filmes sobre a
vida das pessoas. Para o autor, o ser humano havia incorporado a animação das
telas ao seu estilo de vida, reproduzindo para o seu meio, atitudes e gestos
apresentados nas películas, influenciando a conduta do público em geral. Sendo
assim, entende-se que nesse momento de tensão as atividades favoreciam o
esforço de guerra empreendido pelos estudantes. As ações de mobilização no front
interno, promovida pelos estudantes da UNE, buscaram organizar os estudantes do
Brasil em prol da luta contra o perigo dos regimes totalitários, como informa o
periódico.
Entre as forças ativas que se empenham neste momento em unificar a
opinião nacional para o combate ao nazismo, destaca-se sem dúvida pela
excelência dos serviços que prestou no terreno prático contra a infiltração
totalitária em suas várias modalidades – inclusive a brasileira, que é o
integralismo – a União Nacional dos Estudantes.
308
Como destaca a matéria do periódico de janeiro de 1943, a mobilização
nacional contava, nesse momento, com a organização estudantil empenhada em
combater as ações nazistas no Brasil e, também, promover ações que pudessem
contribuir com o esforço de guerra desenvolvido pelo governo brasileiro. Em Belém,
foi criada a União Acadêmica Paraense, que ficou responsável pelas atividades
desenvolvidas na capital paraense, voltadas para a comunidade escolar em geral.
307
Folha do Norte – Belém, 25 de maio de 1943, p. 01 do Segundo Caderno.
308
Folha do Norte Belém, 05 de janeiro de 1943, p. 09. “A União Nacional dos Estudantes e a campanha dos
bônus de guerra”.
134
As idéias apresentadas pelo autor do artigo enfocam esse período de
mobilização geral da sociedade, em decorrência do estado de guerra pelo qual
passava a nação brasileira. As exibições de filmes foram uma das formas utilizadas
para interagir com a sociedade, uma vez que a participação era gratuita e aberta a
todos, mostrando aspectos da guerra e outros temas. As construções de imagens
relativas ao cinema foram destacadas, tais como a valorização da arte
cinematográfica, a influência sobre as pessoas e a representação que faz da
realidade.
Não foram citados os tipos de filme exibidos na sede da Cruz Vermelha, mas
percebe-se que uma ligação entre as atividades iniciadas pelo Comitê e o
Diretório de Medicina, no dia 06 de abril de 1943, com as desenvolvidas pelos
estudantes no mesmo local. Continua Pedro Borges (1943) sua análise sobre a
iniciativa dos estudantes e a influência do cinema na vida das pessoas.
(...) O que eu quero ressaltar aqui é a possibilidade do cinema como
instrumento de pedagogia renovadora, pelo seu infinito poder de difusão. O
que não conseguiram a imprensa, o rádio e os vários meios de locomoção,
conseguiu em pouco tempo o cinema: a universalização de um número
considerável de modalidades da vida contemporânea (...) Em sua tela se
projetam temas de interesse universal. No barracão de telhas da cidade
recôndita em que se reúne a população simples para ver a mesma película
que alguns meses antes contemplou o público luxuoso dos grandes centros
urbanos, assoma um espírito nivelador de inteligências, destrutor de hábitos
típicos; um grande poder monstruoso que sob a aparência de diversão se
apodera das almas, mistura-as, uniformisa-as, e em seguida as devolve a
cada corpo com mais sentido universal e com menos personalidade.
Melhores ou peores, não sabemos: porém, distintas.
309
Para Borges o alcance mundial conquistado pelo cinema levou a interação e
conhecimento entre os diversos aspectos culturais, favorecendo a incorporação de
hábitos culturais vindo de outros países. O tema do cinema educativo, como
construtor de realidades diversas, servindo aos interesses pedagógicos e possuidor
de interesses universais seria um importante instrumento para nivelar o
conhecimento entre as diversas classes sociais, das pessoas simples da zona
campesina até as classes ricas da cidade. O poder de manipular a realidade
transformava a personalidade, se para o bem ou para o mal, Pedro Borges não
adentra na discussão, mas ressalta sua grande utilisa niaaa4(a)-4.ia67474(a)-4.33117( )-6e.61035(o)-4.33117(rT117(r)2.80561(a)-.7(a)-4.3311764 Td[(a)a)-.7(a)- utna
135
(...) o que estão exibindo os estudantes mostra claramente o quanto pode
ser útil a ambientes de cultura embrionários e de métodos de instrução
rudimentares, como a nossa, a organização de cinematografia
pedagógica.
310
A riqueza de informações com a qual trabalha o autor eleva a importância do
cinema como meio de comunicação de massa influenciador dos hábitos humanos.
Indicava os benefícios que pode trazer uma indústria cinematográfica organizada
para a instrução pedagógica com temas voltados para os conhecimentos biológicos,
históricos, ambientais e da saúde do ser humano.
Nessa perspectiva, têm-se outras matérias referentes à exibição de filmes,
organizadas pelos estudantes paraenses, só que agora, destacando o tema da
guerra para o interesse dos citadinos, como informa a matéria veiculada no jornal
Folha do Norte de 25 de junho de 1943.
A União Acadêmica Paraense, com o propósito de experimentar uma
iniciativa de grande utilidade para a classe estudantil, entrou em
entendimento com o Comitê Regional da Coordenação dos Negócios Inter-
Americanos, constituído dos srs. Drs. Edgar Chermont, Carlos Cardoso e
Edmar Jovita, afim de oferecer aos nossos estudantes exibições de filmes
sobre a guerra e outras reportagens de grande interesse.
Como se sabe, esse Comitê, entre outras atividades, tem a seu encargo a
distribuição da revista “Em Guarda” e a exibição gratuita de películas
cinematográficas, cuja variedade de assuntos artes, indústria, medicina,
turismo, esportes, noticiários de guerra e diversos outros facilita a
organização de programas escolhidos de forma a melhor corresponder ao
interesse de cada auditório.
311
Na análise das fontes a intervenção destes setores sociais agregava públicos
específicos, como os estudantes, e setores mais amplos da sociedade com as
exibições ao ar livre. As informações sobre a guerra faziam parte das exibições
promovidas pela UAP em conjunto com o Comitê. A Coordenação dos Negócios
Inter-Americanos foi criada, nos Estados Unidos, com o propósito de coordenar os
esforços de guerra na América Latina. Desse modo, a intencionalidade dessas
ações conjuntas tinha uma finalidade voltada para o esforço de guerra do continente
americano.
312
310
Ibid. Sobre a organização do cinema como instrumento pedagógico nas décadas de 30 e 40 Cf. SIMIS, A. op.
cit. p. 23-38.
311
Folha do Norte Belém, 25 de junho de 1943, p. 02. “EXIBIÇÃO GRATUITA DE FILMES SOBRE A
GUERRA PARA TODOS OS ESTUDANTES. Importante iniciativa da União Acadêmica o primeiro programa
de sábado”.
312
TOTA, A. op. cit.
136
Os filmes sobre a guerra e, mesmo, os filmes “informativos” procuravam de
alguma forma constituir uma visão pré-estabelecida sobre o conflito. A extensão
desses eventos junto à população pode ser constatada a partir da continuidade e da
elaboração de sessões ao ar livre.
Destarte, reafirma-se o inicialmente dito neste trabalho, que os filmes exibidos
e as sessões promovidas pelos sujeitos sociais faziam parte da organização do front
interno na cidade de Belém, uma vez que o cinema era um dos veículos de
informação mais eficazes na transmissão e manipulação da realidade, bem como
instrumento de propaganda política dos países em guerra.
Os estudantes procuraram os meios para manifestar suas indignação contra
os ataques dos alemães e o desrespeito à soberania brasileira, ora fazendo
passeatas nas ruas de Belém, ora promovendo sessões cinematográficas para
arrecadar fundos, ou tornar de conhecimento dos estudantes e do público em geral,
os acontecimentos da guerra.
Serão exibições de filmes sobre a guerra em todos os fronts de batalha que
os nossos aliados empreendem contra o Eixo agressor. Haverá também
outras reportagens sobre aspectos da retaguarda. Isto é, da frente interna, a
de seus problemas de defesa contra os atos da Quinta Coluna, revelando
os processos que esse inimigo usa e ensinando meios e modos para
combatê-lo.
313
Interessante perceber que as sessões serviam como momento de instrução
dos estudantes para combater o inimigo que poderia estar bem próximo, como a
Quinta Coluna. Mais do que somente exibir o que estava ocorrendo no conflito,
precisava se organizar para combater o inimigo nazista dentro e fora da nação:
Num momento em que nosso país se lança inteiramente ao esforço de se
preparar espiritual e materialmente para as eventualidades desse conflito,
não será demais salientar a significação dos esforços patrióticos com que a
União Acadêmica procura contribuir para esse esforço de guerra.
314
O Comitê Regional tinha com uma das responsabilidades patrocinar e
fornecer as fitas usadas nas exibições, trabalhando próximo aos sujeitos sociais
organizados para defender a nação. A ação conjunta com o Comitê promoveu outra
313
Folha do Norte – Belém, 25 de junho de 1943, p. 02.
314
Ibid.
137
sessão, no Instituto Carlos Gomes visando à propaganda dos ideais dos países
Aliados.
Hoje, às 20 horas, serão exibidos no Instituto “Carlos Gomes” vários “filmes”
de propaganda de guerra, os quais condensam as ações conjuntas das
Nações Unidas contra as forças totalitárias.
As referidas cintas foram gentilmente cedidas pelo coordenador de
Assuntos Inter-Americanos.
315
Cumprindo com suas obrigações, o Comitê atuava junto à população
belenense cedendo as fitas para a propaganda de guerra das Nações Unidas,
fortalecendo o ideal de luta contra o Eixo. Essas atividades proporcionaram ao
Comitê uma atuação mais eficaz, utilizando as datas de comemorações cívicas para
transmitir as aspirações dos paises Aliados. Em 12 de outubro de 1943 era
divulgada, no periódico, a celebração do dias das crianças, tendo diversas formas de
entretenimento, dentre elas a exibição de filmes como uma:
Louvável iniciativa do Ministério da Educação e Saúde continua a merecer
todo o apoio do Governo do Estado prosseguem, hoje, as comemorações
sessões cinematográficas promovidas pelo Comitê dos Negócios Inter-
Americanos.
316
Volta à cena o poder blico paraense interagindo com o Comitê na
promoção de eventos para a população. Neste caso, a comemoração foi relativa às
crianças, porém não excluía os outros segmentos sociais nesse sentido, a
Comissão Central, deste Estado, promotora dos festejos da ‘Semana da criança’,
está, igualmente, concitando toda a gente, população e autoridade, a tomar parte
neste movimento de brasilidade
.
317
Para o Estado, promover atividades de cunho patriótico reforçava o
sentimento imposto pela nação com a instituição do Estado Novo, como o de
corporativismo entre as classes e no período de guerra, o patriotismo. Somando-se
a isso, a promoção do próprio governo estadual perante os cidadãos da cidade.
As ações do Comitê tiveram grande valor para a população da capital
paraense, assim como para a política empreendida em todo Brasil. Com o objetivo
de informar sobre as atividades dessa organização uma matéria foi publicada no
315
Folha do Norte – Belém, 31 de julho de 1943, p. 01 do 2º Caderno.
316
Folha do Norte – Belém, 12 de outubro de 1943, p. 01 do Segundo Caderno.
317
Ibid.
138
jornal, em 13 de outubro de 1943, por uma pessoa que se identificava pelas iniciais
A. L. Destacava-se, neste artigo, a valorização da instrução, educação e
divertimento da população citadina, de tal modo o empenho na propagação dos
ideais das Nações Unidas (que lutavam pela democracia e liberdade) em
contraposição aos sentimentos totalitários (propagadores dos horrores e maldades
contra a liberdade), como foi bastante enfocado nas reportagens.
O Comitê de Belém vem proporcionando momentos agradáveis a quantos
tem tido oportunidade de apreciar os magníficos “filmes” oferecidos, através
de aparelhos aperfeiçoados pela sua nitidez, firmeza e sonoridade. Nas
escolas, grupos, agremiações, quartéis etc., tem o Comitê passando filmes
apropriados, principalmente desses cujo fim máximo é tornar aqui
conhecidas as terras americanas, seus hábitos e costumes e, sobretudo, o
seu ingente trabalho em prol da vitória aliada que é nossa também
trabalho em que se congregam todos os esforços dos bons patriotas (...).
318
Pelo exposto, constata-se que a intervenção do Comitê Regional na área da
distribuição e exibição de películas voltadas para a instrução e “divertimento” da
população alcançou êxito, pois sua ação se estendeu a outras atividades
cinematográficas. Sua atuação visou agregar civis e militares na luta contra o perigo
nazista, difundindo a cultura e organização política norte-americana e reforçando os
sentimentos de liberdade entre as nações do continente. Sobre os eventos com os
quais o Comitê participou, destacou-se a Semana da Criança com a exibição de
filmes adequados, cada dia em uma praça pública, ao ar livre, para diversão da
meninada dos diversos bairros”.
319
Silvana Mesquita ao estudar em sua Dissertação a política cultural no Brasil
durante a Segunda Guerra, através das ações do OCIAA e o papel das Seleções
Reader’s Digest, enfoca no segundo capítulo a intervenção do Office, a partir dos
Relatórios da Divisão de Filmes, no Brasil com a criação de Comitês ligados ao
Departamento de Estado dos EUA. Sendo que em relação ao cinema, a Divisão
Cinematográfica e os Jornais Cinematográficos procuraram na produção das
películas:
(1) Conseguir a inclusão de material favorável aos EUA nos rolos de filmes
exportados para a América Latina; (2) Incluir material favorável das
Repúblicas Americanas nos rolos de filmes exportados para o sul, para
318
Folha do Norte – Belém, 13 de outubro de 1943, p. 01 do Segundo Caderno.
319
Ibid.
139
agradar os Latinos-Americanos e, ao mesmo tempo, fazer com que esses
visem o que as outras nações no Hemisfério faziam para eliminar a ameaça
do Eixo; (3) Eliminar maerial desfavorável aos EUA e das outras Repúblicas
americanas dos rolos de filmes indo para o sul; (4) Inserir mais histórias
sobre a América Latina em filmes distribuídos nos EUA para fazer com que
os cidadãos americanos fiquem familiarizados com seus vizinhos do
Hemisfério; (5) Eliminar as Fitas do Eixo.
320
A partir de novembro de 1943, as exibições de filmes saíram dos ambientes
fechados dos cinemas, teatros e outras instituições e procurou atingir um público
maior com apresentações ao ar livre.
321
Como havia ocorrido na semana da criança,
as sessões que se seguiram ocuparam algumas ruas da cidade visando levar
entretenimento e educação.
Por iniciativa do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, e
gentileza do Comitê de Coordenação dos Negócios Inter-Americanos, deste
Estado, realiza-se, amanhã, 7, às 20 horas, na avenida 15 de Agosto, no
trecho compreendido entre a rua Ó de Almeida e Manuel Barata, uma
sessão cinematográfica ao ar livre, educativo-recreativa, destinada à
população belenense. Dita sessão constitui parte dos festejos
comemorativos de 10 de novembro, data magna da criação do Estado
Nacional, pelo eminente presidente dr. Getúlio Vargas.
322
O local escolhido para as sessões compreende um trecho movimentado da
cidade de Belém, pois estava localizada no Bairro do Comércio e era uma das
principais avenidas da cidade (a avenida 15 de agosto é hoje denominada de
Presidente Vargas).
323
As datas importantes para a nação passaram a ser
comemorada com exibições de filmes ao ar livre. Sessões eram proporcionadas pelo
DEIP, Prefeitura, Interventor Estadual e a “gentileza” do Comitê Regional.
Na capital paraense, nos anos finais da guerra, foram praticadas diversas
atividades relacionadas com o cinema e sua influência diante do conflito. Realizar
tais atividades parecia importante para consolidar perante a população a luta contra
os inimigos dos países Aliados, sendo o governo dos Estados Unidos e Hollywood,
320
MESQUITA, Silvana de Queiroz Nery. A Política Cultural norte-americana no Brasil: o caso do OCIAA e o
papel das Seleções Reader’s Digest 1940-1946. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual do Rio de
Janeiro: Rio de Janeiro, 2002, p. 70-71.
321
Nos anos de 1943 e 1944, nos cinemas da cidade, os filmes referentes ao conflito aumentaram
vertiginosamente, com a exibição semanal de pelo menos um filme sobre o conflito.
322
Folha do Norte – Belém, 06 de novembro de 1943, p. 01 do Segundo Caderno.
323
CRUZ, Ernesto. Ruas de Belém: significado histórico de suas denominações. 2º. Ed. Belém: CEJUP, 1992, p.
84.
140
por intermédio do Comitê Regional, eram os maiores distribuidores e exibidores de
filmes no Brasil.
As comemorações da “criaçãodo Estado Novo foram muito noticiadas no
periódico. A sessão na Rua 15 de Agosto seria um dentre tantos outros eventos na
cidade, sessões cinematográficas, palestras e inauguração para celebrar a grande
data da nacionalidade apoio da Interventoria Federal”.
324
Os anúncios ganharam a
primeira página do jornal, sendo a primeira exibição ocorrida no dia 08 de novembro
de 1943 e tendo sido, no dia seguinte, noticiada como um grande acontecimento
para os organizadores.
Alcançou grande sucesso a sessão cinematográfica realizada, ontem, por
iniciativa do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, e por
gentileza do Comitê de Coordenação, em Belém, na avenida 15 de Agosto,
no trecho compreendido entre as ruas Ó de Almeida e Manuel Barata. Ao
local acorreram cerca de 2000 pessoas, desejosas de assistir aos diversos
filmes anunciados. O sucesso foi o mais completo possível. Hoje, às 20
horas, haverá, no mesmo local, nova sessão ao ar livre, educativo-
recreativa, destinada a população belenense. Por essa ocasião serão
exibidos cinco novas celulóides, com uma duração aproximada de 70
minutos.
Nota-se que para uma sessão cinematográfica a presença da população,
levando-se em consideração a quantidade de pessoas mencionadas na reportagem,
foi de um número bastante expressivo. Para o momento de mobilização relacionado
à guerra, os resultados proporcionados com esses eventos pareciam satisfatórios
para os organizadores, no caso o DEIP, Prefeitura e o Comitê Regional. Embora a
permanência dessas sessões tenha perdurado somente durante o primeiro semestre
de 1944.
Fosse para comemorar o fracasso da Intentona Comunista, em 1935, o Dia
do Reservista, ou a passagem do ano, as sessões ocorriam fomentadas pelos
mesmos setores. Contudo, na sessão para comemorar a passagem do Ano Novo,
mostrou-se pela primeira vez, nos anúncios das atividades, a programação: por
essa ocasião, serão exibidos os seguintes filmes: 1) ALASKA, terra da promissão; 2)
A MODA NA CALIFORNIA; 3) VIRTUOSOS DO BILHAR; 4) NOTÍCIAS DO DIA
49 (Campanha da Sicília)”.
325
324
Folha do Norte – Belém, 07 de novembro de 1943, p. 01.
325
Folha do Norte – Belém, 30 de dezembro de 1943, p. 03.
141
A diversidade dos temas demonstra a tentativa de conciliar o divertimento
com as informações sobre a campanha dos Aliados na guerra. Explorar as belezas
naturais do Alaska e a variedade cultural dos Estados Unidos, através da moda, bem
como um jogo típico das camadas populares conflitava com o tema da guerra,
porém parecia aliviar as tensões existentes com o conflito. As investidas Aliadas
galgavam êxitos na Europa e a Campanha da Sicília, ocorrida entre os meses de
julho e agosto de 1943, serviriam também para motivar a população para uma
possível vitória dos Aliados.
326
Buscando incentivar a população a comparecer aos eventos, os anúncios
exaltavam o sucesso ocorrido com as sessões. Segundo o que era escrito, as
atividades ocorriam mesmo com o tempo chuvoso, o que é comum entre os meses
de dezembro a março na capital paraense. As sessões continuaram para a
população, em algumas delas havia a mudança do local, mas o conteúdo e a
finalidade permaneciam as mesmas.
Com o recuo nazista na Europa e as progressivas derrotas do Japão no front
oriental no decorrer do ano de 1944 as atividades relacionadas às exibições foram
diminuindo, bem como a quantidade de filmes de guerra nos cinemas. Com isso, um
evento ainda ocorreu para os militares da FEB que iriam para a guerra no continente
europeu.
327
Em Belém, a Empresa Cinematográfica Paraense promoveu um dia de
sessões gratuitas, em colaboração com o Interventor Federal Magalhães Barata e as
autoridades militares, nos cinemas Poeira e Olímpia.
Sob os auspícios dos exmos. Srs. Coronel Magalhães Barata, D. D.
Interventor Federal no Estado; general Alexandre Zacarias Assunção,
comandante da Região Militar; almirante Teobaldo Gonçalves Pereira,
comandante da Base Naval do Norte; e tenente-coronel Edgar Ferreira da
Silva, comandante interino da 1º Zona Aérea, realizaram-se ontem, nos
cinemas “Olímpia” e “Poeira”, as sessões especiais com que a Empresa
Cinematográfica Paraense mais uma vez homenageou as nossas forças
armadas.
328
326
“A campanha da Sicília, o maior assalto anfíbio da Segunda Guerra Mundial, representou o ‘fim do princípio
no longo percurso aliado para a vitória (...) A conquista da Sicília pelos aliados assegurou as comunicações
inglesas pelo Mediterrâneo e resultou, diretamente, na queda de Mussolini e no colapso da Itália”. BALDWIN,
H. op. cit. p. 230.
327
Os militares da FEB passaram a embarcar para a guerra no continente europeu a partir de julho de 1944.
Sobre a participação da FEB na campanha da Itália ver: NEVES, Luis Felipe da Silva. A Força Expedicionária
Brasileira: 1944-1945. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico. São Paulo:
Xamã: Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de
História, 1995, p. 295-318.
328
Folha do Norte Belém, 19 de agosto de 1944, p. 01 do Segundo Caderno. “Mais de 2500 militares
assistiram ontem ‘Guadalcanal’ no Olímpia e no Poeira O inigualável sucesso das sessões especiais oferecidas
142
O filme Guadalcanal foi um dos que mais teve repercussão nos periódicos
pelo seu conteúdo extremamente político, exaltando o patriotismo e o heroísmo
norte-americano nas batalhas do Pacífico contra os japoneses “a história das
primeiras vitórias norte-americanas no Pacífico, contra o traiçoeiro inimigo japonês!
UM FILME ESPANTOSO DE HEROISMO E SACRIFÍCIOS! A glorificação dos
heróicos soldados de Quadalcanal”.
329
Filme inspirador para os militares que se preparavam para viajar em direção
aos campos de batalha na Europa. Os sentimentos de liberdade, patriotismo e
heroísmo, ressaltados nos filmes produzidos por Hollywood, foram um dos últimos
momentos de inspiração antes do embarque para a luta no front europeu.
A grande quantidade de militares que participaram das sessões vislumbrava o
trabalho desempenhado pelos setores destacados ao longo do trabalho. Para
finalizar o esforço de guerra realizado pelo poder público local, o Comitê Regional de
Coordenação de Assuntos Inter-Americanos, a União Acadêmica Paraense e as
empresas proprietárias das salas de projeção, a realização de um grande evento
para selar com sangue a entrada do Brasil na guerra. Agora, o batalhão estava
pronto para lutar, instruído e motivado pelos valores propagados através do cinema.
as Forças Armadas do Exército, Marinha e Aeronáutica”. As batalhas para recuperar a região do Pacífico tiveram
na conquista de Guadalcanal, próximo a Austrália, um grande incentivo para o exército norte-americano derrotar
o Japão.
329
Folha do Norte – Belém, 16 de agosto de 1944, p. 02.
143
CONSIDERAÇÕES FINAIS
144
O estudo dedicado à relação entre Cinema e História considera a segunda
Guerra Mundial como ápice da propaganda feita pelos Governos em guerra.
Dedicam a Hollywood e ao cinema produzido no período nazista na Alemanha a
prerrogativa de principais incentivadores do uso do cinema como instrumento de
propaganda.
A utilização do cinema como fonte histórica tem proporcionado ao
historiador diferentes formas de compreender a sociedade e o contexto histórico.
Desta forma os estudos históricos dedicados à análise de filmes tem aumentado
consideravelmente no meio acadêmico.
Apesar da insipiente produção cinematográfica na capital paraense no
período estudado, os cinemas serviram a população citadina de diversas formas.
Destarte nos tempos de guerra as imagens cinematográficas deixaram
temporariamente de lado o entretenimento para assumir contornos políticos e de
propaganda em prol de uma causa.
Os diversos filmes, norte-americanos, alemães, franceses, italianos, ingleses
e brasileiros, tiveram registrado sua passagem nas salas de projeção da cidade
através dos anúncios publicados nos periódicos locais. Neste sentido, o que se
pretendeu neste estudo foi enfocar o cinema, enquanto espaço e imagem,
vinculados aos anúncios e artigos publicado nos periódicos Folha do Norte e A
Semana, descortinando a importância do cinema enquanto entretenimento para a
população local, bem como veículo de informação e propaganda durante o segundo
conflito.
Ao longo da dissertação buscou-se discutir a participação do cinema no
cotidiano citadino durante a Segunda Guerra Mundial, descortinando aspectos
peculiares ocorridos durante o conflito relacionados as salas de projeção, a
produção de filmes na Amazônia, a exibição de películas e a participação dos
diversos segmentos sociais que utilizaram os espaços ou as películas relacionadas
a guerra para informar ou propagar valores e ideais políticos.
A relação do cinema com a população citadina, desde a constituição das
primeiras salas de projeção, estava vinculada em sua maioria com a exibição de
filmes estrangeiros, inicialmente com as produções européias e depois da Primeira
145
Guerra com o início do domínio norte-americano. Durante as cadas de trinta e
quarenta, apesar da estagnação econômica ocasionada com a decadência do
comércio da borracha na Amazônia os cinemas se mantiveram como espaço de
entretenimento para a população belenense, chegando a existir na cidade no
período da guerra (1939-1945) cerca de 11 salas de projeção espalhadas por alguns
bairros.
Para os apreciadores da sétima arte, no período decorrente da Segunda
Guerra vários atores e atrizes de Hollywood que se dirigiam a capital federal
aportaram na cidade e passaram algumas horas (e adias). A presença desses
astros e estrelas foi registrada nos periódicos locais dando visibilidade, inicialmente
para a importância do artista para os fãs e posteriormente para a intenção de
desenvolver a “Política de Boa Vizinhança” empregada pelo governo dos EUA na
América Latina.
A exibição de filmes referentes a guerra obedeceu a política de “neutralidade”
do governo brasileiro diante do conflito. As películas produzidas pelos estúdios
norte-americanos dividiram espaço na programação elaborada pelas empresas
donas das salas de projeção com os filmes alemães e italianos. Nesse momento, as
películas liberadas pela censura não podiam conter em seu conteúdo qualquer
manifestação política que invalidasse a “neutralidade” brasileira. Essa política durou
até o rompimento das relações diplomáticas com os países do Eixo em janeiro de
1942, sendo que na cidade a partir de julho do mesmo ano começaram as exibições
de filmes antinazistas, configurando-se até o final da guerra como propaganda
contra o Eixo.
A intervenção do poder público e da sociedade belenense deu-se em conjunto
com o Comitê Regional da Coordenação dos Negócios Inter-Americano (OCIAA),
com a exibição gratuita de filmes referentes ao conflito. Foram atividades
desenvolvidas em ambientes fechados ou ao ar livre com o intuito de organizar o
front interno na cidade.
Assim, com este trabalho não se pretende esgotar o debate relacionado ao
cinema em Belém durante a Segunda Guerra Mundial, mas sim contribuir com a
historiografia local para os estudos relacionados a história e cinema.
146
FONTES E BIBLIOGRAFIA
147
FONTES
BIBLIOTECA ARTHUR VIANA
SETOR DE MICROFILMAGEM
1 – Jornal Folha do Norte: jornal local e diário.
1.1 – Janeiro a dezembro de 1939.
1.2 – Janeiro a dezembro de 1940.
1.3 – Janeiro a dezembro de 1941.
1.4– Janeiro a dezembro de 1942.
1.5 – Janeiro a dezembro de 1943.
1.6 – Janeiro a dezembro de 1944.
1.7 – Janeiro a dezembro de 1945.
SETOR DE OBRAS RARAS
2 – Revista A Semana: revista semanal publica aos sábados
2.1 – Janeiro a dezembro de 1939.
2.2 – Abril e dezembro de 1941.
2.3 – Abril e novembro de 1942.
148
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Cláudio Aguiar. O cinema como “agitador de almas”: argila, uma cena do
estado novo. São Paulo: ANNABLUME, 1999.
AQUINO, Maria Aparecida. A América vai à guerra. In: COGGIOLA, Osvaldo.
Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico. São Paulo: Xamã: Universidade de
São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de
História, 1995.
ARAULO, Vicente de Paula. A Bela Época do cinema brasileiro. São Paulo:
Perspectiva, 1976.
AUGUSTO, Sérgio. Este mundo é um pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK. São
Paulo: Companhia das Letras, 1989.
BALDWIN, H.87122(i)1.87122(o)-4.74717(.)7.84032( )278.389(b)-4..7471c.7(a)-4.3315(i)1.017(o)-4.33117( )-382.389(P1-)-92.2.6.82.389(P1-)-92.2.(-4.33117(r)2.867474(n)-4.33117(h)-4.331.17(m)2.51125(a)-4.3387(c)-0.29558663T18(n)-4.3287121j2.2057(a)-4.33117(84717)-4121j2.2057(A)21.5868(U)-8121j2.2057(0-)-0.294974(t)-2.169.Td[(,)-2.16558( )-.017.149m)2.51125(ã)-4.3311436( )7.84154(1)-4278]TJ/R47 12 Tf122.8 Tf122.16558( 7 12 Tf1(b)-(A)722]TJ21.5868(U8)722]TJ/R773(p)-4.33117(a)5.67471.5868(U)-8Jb95585(o)-4.3323)e“T68.1J/R4nnnnnnnnnnnnnnnnnnn07Q4.33117(r)2.8-P1-21.03 p Ov2.16558(8(C389(2)-12.417(r)2.8-4,)-2.1652.4. V9643)7.84154(1154(11537ú5OC)1.54945.ar)2.82( )7u8-4n07Q4.3311t336( )-82.2116(U)1.52[(ã0-s0243(5.208-4,)-6(U)800H8di)8C9.
149
______. Os arautos do liberalismo: Imprensa Paulista (1920-1945). o Paulo:
Editora Brasiliense, 1989.
CARDOSO, Ciro Flamarion e MAUAD, Ana Maria (org). Domínios da História:
ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
CARDOSO, Wanessa Carla Rodrigues. “A Elegância da alma do culo XX”: a
mulher e a moda na Belém dos modernistas (1923-1929). Monografia de Conclusão
de Curso. Universidade Federal do Pará, Belém, 2001.
CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações. Lisboa:
DIFEL, 1990.
COSTA, Antônio. Compreender o cinema. Tradução: Nilson Moulin Louzado. Rio de
Janeiro: Globo, 1987.
COSTA, Selda Vale da. Eldorado das ilusões. Cinema & Sociedade: Manaus
(1897/1935). Manaus: Editora da Universidade do Amazonas, 1996.
CRUZ, Ernesto. História do Pará. 2ª Volume, Belém: Editado pelo Governo do
Estado do Pará,
______. Ruas de Belém: significado histórico de suas denominações. ed. Belém:
CEJUP, 1992.
CYTRYNOWICZ, Roney. Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São
Paulo durante a Segunda Guerra Mundial
150
______. História da Segunda Guerra Mundial. Trad. Mauro Lando e Isa Mara Lando.
São Paulo: Editora Ática, 1997.
FURHAMMAR, Leif e ISAKSSON, Folke. Cinema e Política. Tradução de Júlio
Cezar Montenegro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: trajetória do subdesenvolvimento. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1980.
GOMES, Raimundo Ney da Cruz. Guerra e Memória: o cotidiano de Belém durante a
Segunda Guerra Mundial 1939 a 1945. Monografia, Universidade Federal do Pará,
2002.
GOUDINHO, Liliane do socorro Cavalcante. Mulheres em ação... (católica) Belém
(1939/1947). Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2005.
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX (1914-1991). Tradução
Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
ISOLAN, Flaviano Bugatti. Das ginas às telas: cinema alemão e imprensa na
década de 1930 (Porto Alegre e Santa Cruz do Sul). Santa Cruz do Sul: EDUNISC,
2006.
JURANDIR, Dalcídio. Belém do Grão Pará. São Paulo: Editora Martins, 1960.
LEITE, Sidney Ferreira. O cinema manipula a realidade? São Paulo: Paulus, 2003.
LENHARO, Alcir. Sacralização da política. 2º ed. São Paulo: Papirus, 1986.
MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho.
Bauru, SP: EDUSC, 2002.
MEDEIROS, Sabrina Evangelista. O Estado Novo: o mito do pai dos pobres. In:
SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. (org.). História e Imagem. Rio de Janeiro:
UFRJ, 1998.
MENEGUELLO, Cristina. Poeira de estrelas: o cinema Hollywoodiano na mídia
brasileira das décadas de 40 e 50. Campinas: Editora da UNICAMP, 1996.
MENEZES, Paulo. O cinema como representificação: verdades e mentiras nas
relações (im)possíveis entre documentário, filme etnográfico e conhecimento. In:
Estudos Socine de Cinema. Porto Alegre: Sulina, 2003.
MESQUITA, Silvana de Queiroz Nery. A Política Cultural norte-americana no Brasil:
o caso do OCIAA e o papel das Seleções Reader’s Digest 1940-1946. Dissertação
de Mestrado. Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2002.
151
MORIN, Edgar. O cinema ou o homem imaginário. Trad. Pedro Vasconcelos. Lisboa:
Relógio D’Água, 1997.
______. As estrelas: mitos e sedução no cinema. Tradução: Luciano Trigo. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1989.
MOTA, Carlos Guilherme. Cultura e política de boa vizinhança: dois artistas norte-
americanos no Brasil. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um
balanço histórico. São Paulo: Xamã: Universidade de São Paulo. Faculdade de
Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História, 1995.
NEVES, Luis Felipe da Silva. A Força Expedicionária Brasileira: 1944-1945. In:
COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico. São Paulo:
Xamã: Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências
Humanas. Departamento de História, 1995.
NEVES, Marlene Nazaré Lins. A Folha do Norte enquanto trincheira política na
história do Pará. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Pará,
Belém, 1993.
NOVA, Cristiane. A “História” diante dos desafios imagéticos. In: Projeto História.
São Paulo, n.21, 2000.
______. O cinema e o conhecimento da história. Salvador, Olho da História, v.1, n.3,
1995.
NÓVOA, Jorge. Imagens, imaginário e representações da História a partir do filme
Gladiador. In: Projeto História. São Paulo, n.21, 2000.
______. Apologia da relação cinema-história. Salvador, Olho da História, v.1, n.1,
1995.
OLIVEIRA, Lúcia Lippi. Sinais da modernidade na era Vargas: vida literária, cinema
e rádio. In: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (org). O tempo
do nacional-estatismo: do início da década de 30 ao apogeu do Estado Novo. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
ORTIZ, Renato. Cultura e Modernidade: A França do século XIX. São Paulo: Ed.
Brasiliense, 1991.
______. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São
Paulo: Brasiliense, 1994.
PENHA, Fernanda Jardim da. Cinema diário: cotidiano em Belém 1945-1950.
Monografia de conclusão de curso. Universidade Federal do Pará, Belém, 2001.
152
PENTEADO, Antonio Rocha. Belém: Estudo da Geografia Urbana. Belém:
Universidade Federal do Pará, 1968.
PEREIRA, Wagner Pinheiro. Cinema e propaganda política no fascismo, nazismo,
salazarismo e franquismo. In: HISTÓRIA: questões & debates. Curitiba, PR: Ed.
UFPR, ano 20, n. 38, jan./jun. 2003.
______. Guerra das imagens: cinema e política nos governos de Adolf Hitler e Franklin D.
Roosevelt (1933-1945). Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, São Paulo,
2003.
ROSSINI, Miriam de Souza. Cinema e História: uma abordagem historiográfica. In:
Revista de Pós-Graduação em História da Universidade do Vale do Rio do Sinos.
São Leopoldo: UNISINOS, 2001.
SANTOS, Márcia Juliana. “It’s all true” e a construção das imagens do Brasil (1942-
93). Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São
Paulo, 2004.
SARGES, Maria de Nazaré. Belém: riquezas produzindo a Belle-Époque (1870-
1912). Belém: Paka-Tatu, 2002.
SILVA, Allan Pinheiro da. O cinema político: a propaganda sobre os filmes bélicos
durante a Primeira Guerra Mundial em Belém. Monografia de Conclusão de Curso.
Universidade Federal do Pará, Belém, 2003.
SILVA, lio. 1942: guerra no continente. Rio de Janeiro: Editora Civilização
Brasileira, 1972.
SIMIS, Anita. Estado e cinema no Brasil. São Paulo: ANNABLUME, 1996.
SIMÕES, Inimá. Roteiro da intolerância: a censura cinematográfica no Brasil. São
Paulo: Ed. SENAC, 1999.
SKLAR, Robert. História social do cinema americano. Tradução de Octávio Mendes
Cajado. São Paulo: Editora CULTRIX, 1978.
SOUZA, Carlos Roberto de. A Fascinante Aventura do Cinema Brasileiro. São
Paulo: Cinemateca Brasileira, 1981.
SOUZA, José Inácio de Melo. O estado contra os meios de comunicação (1889-
1945). São Paulo: ANNABLUME, 2003.
TOTA, Antonio Pedro. O imperialismo sedutor: a americanização do Brasil na época
da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
VERIANO, Pedro (coord.). A crítica do cinema em Belém. Belém: Secretaria de
Estado de Cultura, Desportos e Turismo, 1983.
153
______. Cinema no tucupi. Belém: SECULT, 1999.
VEYNE, Paul Marie. Como se escreve a história; Foucault revoluciona a história.
Trad. De Alda Baltar e Maria Auxiliadora Kneipp. 4ª ed. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1998.
VIANY, Alex. Introdução ao cinema brasileiro. Rio de Janeiro: Alhambra/Embrafilme,
1987.
VIGEVANI, Tullo. Origens e desenvolvimento da Segunda Guerra: considerações
sobre a querela dos historiadores. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra
Mundial: um balanço histórico. São Paulo: Xamã: Universidade de São Paulo.
Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História, 1995.
VIRÍLIO, Paul. Guerra e cinema. São Paulo: Scritta Editorial, 1993.
WEINSTEIN, Bárbara. A borracha na Amazônia: expansão de decadência (1850-
1920). Tradução de lio Lourenço de Oliveira. São Paulo: HUCITEC: Editora da
Universidade de São Paulo, 1993.
XAVIER, Ismail. O discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. 3ª ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2005.
154
ANEXOS
155
Anexo 1. Mapa dos bairros de Belém com a localização dos cinemas
156
PENTEADO, Antonio Rocha. Belém: Estudo da Geografia Urbana. Belém:
Universidade Federal do Pará, 1968.
Anexo 2. Sala de exibição do cinema Moderno na década de 40
VERIANO, Pedro. Cinema no tucupi. Belém: SECULT, 1999, p. 81.
157
Anexo 3. Sala de exibição do cinema Olímpia na década de 20.
VERIANO, Pedro. Cinema no tucupi. Belém: SECULT, 1999, p. 78-79.
158
Anexo 4. Anúncio do cinema Olímpia sobre o “Fox Jornal”
159
Folha do Norte – Belém, 11 de maio de 1939, p. 02.
Anexo 5. Anúncio dos cinemas Moderno e Independência sobre o Filme Submarino
D-1.
160
Folha do Norte – Belém, 23 de maio de 1939, p. 04.
Anexo 6. Anúncio dos cinemas Moderno e Independência sobre o filme
“Scipião, o africano”
161
Folha do Norte – Belém, 25 de junho de 1939, p. 07.
Anexo 7. Anúncio do cinema Poeira sobre Reportagem de Guerra (Fox Jornal)
162
Folha do Norte – Belém, 14 de abril de 1940, p. 04.
Anexo 8. Anúncio do cinema Olímpia sobre o filme “Patrulha Submarina”.
164
Anexo 9. Anúncio dos cinemas Moderno e Independência sobre Reportagem de
Guerra (UFA Jornal)
Folha do Norte – Belém, 16 de setembro de 1941, p. 05.
165
Anexo 10. Anúncio dos cinemas Moderno e Independência sobre filmes de guerra.
Folha do Norte – Belém, 03 de outubro de 1941, p. 04.
166
Anexo 11. Anúncio do cinema Moderno.
Folha do Norte – Belém, 29 de outubro de 1941, p. 05.
167
Anexo 12. Anúncio do cinema Olímpia sobre o filme Tempestade D’Alma.
Folha do Norte – Belém, 24 de julho de 1942, p. 02.
168
Anexo 13. Anúncio dos cinemas Olímpia e Iracema sobre o filme O grande ditador.
Folha do Norte – Belém, 25 de março de 1943, p. 03.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo