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unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
Faculdade de Ciências e Letras
Campus de Araraquara - SP
Marco Aurélio Dias de Souza
A abordagem neoconservadora da crise na sociedade estadunidense e
sua influência no governo de George W. Bush.
Araraquara São Paulo
2006
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Marco Aurélio Dias de Souza
A abordagem neoconservadora da crise na sociedade estadunidense e
sua influência no governo de George W. Bush.
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Sociologia da faculdade de Ciências e
Letras Unesp/ Araraquara, como
requisito para a obtenção do título
de mestre.
Linha de pesquisa: Estado,
Desenvolvimento e Políticas
Públicas.
Orientador: Luis Fernando Ayerbe.
Bolsa. CAPS
Araraquara São Paulo
2006
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Marco Aurélio Dias de Souza
A abordagem neoconservadora da crise na sociedade estadunidense e
sua influência no governo de George W. Bush.
Dissertação de Mestrado, apresentada ao
Conselho, Departamento, Programa de
Pós em Sociologia da Faculdade de
Ciências e Letras Unesp/Araraquara,
como requisito para obtenção do título de
Mestre em Sociologia.
Linha de pesquisa: Estado,
Desenvolvimento e Políticas Públicas.
Orientador: Luis Fernando Ayerbe.
Bolsa: CAPS
Data de aprovação: _28__/__03_/__2007__
MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA:
Presidente e Orientador: Prof. Dr. Luis Fernando Ayerbe
Fclar/UNESP
Membro Titular: Profª Drª Maria Ribeiro do Valle
Fclar/UNESP
Membro Titular: Prof. Dr.Marcelo Fernandes de Oliveira.
UNESP/ MARILIA
Local: Universidade Estadual Paulista
Faculdade de Ciências e Letras
UNESP Campus de Araraquara
Dedico essa dissertação aos meus
avós Paulo Dias de Souza e Anita
Neves Minervino e a minha
esposa Renata pelo amor e
braveza.
Agradecimentos.
Ao Prof. Dr. Luis Fernando, pela ótima orientação desde os tempos de iniciação
científica, pela amizade, por acreditar no meu trabalho e, principalmente, por sempre se
preocupar em transmitir seus conhecimentos, de uma maneira que não me impediu de
pensar com minhas idéias.
Aos pesquisadores do Grupo de RI Ariel, Gustavo e Danilo pela amizade e auxílio com
as correções.
Aos amigos do GEICD, Igor, Michelle, Marcos Alan, Fabio, Gustavo, que tanto
colaboraram desde os tempos de graduação.
Às Profªs. Drªs. Karina Pasquariello Mariano e Maria Ribeiro do Valle pelas sugestões
do exame de qualificação.
A Profª. Drª. Sandra H.Pulcinelle (IQ) pelo auxilio no abstract.
A todos os professores e funcionários da pós-graduação.
Aos amigos da faculdade e da pós especialmente a Débora por me suportar, mesmo
depois de meus surtos e sumiços.
A CAPES pelo apoio financeiro.
A meus pais, Alosio e Maria Aurélia, e irmã Giuliana e minha sobrinha Anna pelo
carinho e amor.
Aos meus queridos sogros, Neide e Paulo, pelo abrigo durante os tempos difíceis de
redação desta dissertação e pela correção dos meus equívocos gramaticais bizarros.
A Juliana pela amizade e auxílio nas correções.
Aos amigos, Beto e Alan, pelo companheirismo e ajuda nas minhas duvidas sobre
conceitos de economia.
Aos meus amigos, Vinão e McCoy pelas décadas de amizade e discussões sobre o
futuro do mundo.
Ao Logan pelo companheirismo de todas as tardes.
A minha esposa, Renata, pelo amor e por ter transformado minha vida de uma maneira
muito mais calma e feliz.
SOUZA, M. A. D. de. A abordagem neoconservadora da crise na sociedade
estadunidense e sua influência no governo George W. Bush. 2007. Dissertação
Mestrado em Sociologia Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual
Paulista, Araraquara, ano 2007.
RESUMO.
No final do século XX, no momento em que os Estados Unidos assumem a
liderança inconteste nas relações internacionais, estudos demográficos revelam uma
tendência inédita do crescimento da população não-branca. O aumento desta
população faz com que setores que defendem uma sociedade multicultural e
multiétnica passem a ganhar força em suas críticas aos discursos meritocráticos que
vinculam o sucesso social à competitividade individual, descartando fatores
associados fatores associados à discriminação de origem racial, sexual e de classe,
politizando a discussão sobre o acesso aos benefícios proporcionados pelo American
Way of Life. No outro extremo, encontram-se os Neoconservadores, um grupo de
intelectuais que desde os anos do pós-segunda guerra centrou suas críticas na ex-
União soviética; e agora, após o fim da Guerra Fria, passa a adotar a agenda da
Guerra Cultural, atacando o chamado multiculturalismo crítico, associando-o a
subjugação do capitalismo democrático liberal vitorioso e ao ressentimento dos
“perdedores” da ordem global em formação. Esta dissertação propõe uma análise da
abordagem do Neoconservadorismo, partindo de quatro temas principais que se
concentram em: crise da modernidade, imigração e assimilação de imigrantes,
críticas e soluções ao modelo de estado de bem-estar-social existente e o papel de
valores culturais na ascensão social. Para desenvolver a análise, seguem-se dois
caminhos: a releitura de sua história e a análise das obras de alguns dos principais
nomes desta corrente intelectual, Allan Bloom, Gertrude Himmelfarb, John Fonte,
Linda Chavez, Charles Murray e Francis Fukuyama.
Palavras-chave: Neoconservadorismo. Multiculturalismo. Minorias. Imigração.
Identidade. EUA.
ABSTRACT.
At the end of the XX century, just at the same time as the United States became the
incontest leader in the international relationships, demographic studies have revealed
the inedit trend not-white people growth. As a consequence of this increase, some
sectors that defended multicultural and multiethnic society have improved its criticism
to the meritocratic speech that associated the social success to the individual
competitivity. More than that, factors related discrimination either racial, sexual or class
have been discarded giving rise to a quarrel centered on the accessibility to benefits
generated by American Way of Life. In the other extremity, the Neoconsertives, a group
of intellectuals that since the after-second - war time has criticized the Ex-Soviet Union;
and after the end of Cold War has adopted the Cultural War schedule, attacked the
critical multiculturalism by associating it to the subjugation of the winner liberal
democratic capitalism and to the resentment of that have lost the global order in phase
of formation. In this work, one approach of the Neoconservatism is analyzed from four
main subjects: the modernity crisis, the immigration and its assimilation, the criticism
and the solutions to the welfare state model and the role of cultural values on the social
ascension. To reach these discussions, two ways of analysis have been followed: the
history of this movement was reviewed and some works from the main intellectual
associated workers, like as Allan Bloom, Gertrude Himmelfarb, John Fonte, Linda
Chavez, Charles Murray and Francis Fukuyama, were took into a careful analysis.
Keywords: Neoconservatism. Multiculturalism. Minorities. Immigration. Identity.
USA.
SUMÁRIO
1 Apresentação...........................................................................................................09
2 Características gerais dos Estados Unidos da América (EUA) e sua atual
postura hegemônica...................................................................................................11
2.1 O vencedor derrotado..........................................................................................11
2.2 Cultura e imigração.............................................................................................21
3 O neoconservadorismo em perspectiva histórica.................................................32
4 Autores e obras de referência do pensamento neoconservador..........................53
4.1 O Neoconservadorismo e a Crise da modernidade...........................................54
4.1.1 Allan Bloom: Crise da Universidade, nos relacionamentos e nas relações
com as minorias..........................................................................................................54
4.1.2 Gertrude Himmelfarb. Uma nação e duas culturas......................................64
4.2 Neoconservadorismo, os processos de imigração e inserção de minorias.......71
4.2.1. John Fonte: neoconservadorismo e os processos de Imigração...................71
4.2.2. Linda Chavez: conservadorismo pela unidade.............................................76
4.3. Charles Murray: a adesão ao libertarianismo.................................................86
4.4 Francis Fukuyama: Capital Social e a Ascensão Social...................................92
5Considerações Finais...............................................................................................97
REFERENCIAS.......................................................................................................100
9
1 Apresentação
A pesquisa que desenvolvemos no mestrado decorre de um trabalho realizado
junto ao Grupo de Estudos Interdisciplinares sobre Cultura e Desenvolvimento
(GEICD), sob a orientação do professor Luis Fernando Ayerbe, como parte integrante
de um projeto maior sobre a posição dos Estados Unidos nas relações internacionais
contemporâneas. Durante a graduação no curso de Ciências Sociais, minha
participação específica focou-se na análise de conflitos étnicos dentro da sociedade
estadunidense, ou seja, como a percepção da politização dos grupos minoritários
poderia interferir no modo de vida deste país.
No Mestrado, nos propusemos a observar a especificidade da noção de cultura e
de igualdade de oportunidades vistas sobre a ótica de um grupo de intelectuais que se
autodenominam neoconservadores, cujas abordagens vêem ampliando sua influência
dentro e fora dos Estados Unidos.
O trabalho que estamos realizando aponta para uma perspectiva diferente em
relação à que prevalece entre os analistas do neoconservadorismo no Brasil, percebe
estes intelectuais como um pequeno grupo de arrivistas, preocupando-se apenas com
o seu interesse próprio e conseguiu entusiasmar toda uma nação, inserindo-se no
governo de George W. Bush e influenciando-o em direção a uma postura
intervencionista.
Na leitura que fazemos, considerar essa perspectiva representa uma dificuldade
de percepção do que impulsiona o grupo em questão, por isso a nossa preocupação
em aprofundar a discussão sobre este pensamento, partindo do seu interior para o
exterior, nos concentrando mais na sua coerência do que propriamente em valores que
nos posicionam ideologicamente em choque com esses intelectuais.
A grande questão enfrentada foi como realizar essa análise, porque a maioria
dos textos encontrados sobre o tema no Brasil, adota exatamente a postura que
receávamos não tomar neste trabalho. Partimos então de uma proposta para
concretização deste, que podemos delinear em dois pontos, com o intuito de facilitar a
esquematização: Primeiro precisávamos compreender a origem e as bases intelectuais
desta corrente de pensamento, em segundo necessitávamos esclarecer o trajeto
histórico deste pensamento, ou seja, determinar os períodos em que o mesmo
conseguiu ganhar e perder influência dentro do governo estadunidense.
Nessa perspectiva, organizamos o trabalho em duas partes, que são a base para
os dois primeiros capítulos da dissertação. Primeiramente, uma rápida
contextualização do momento presente e do papel dos EUA no ordenamento do
mundo, inserindo nesta discussão a relação que envolve a construção identitária deste
país e a idéia de multiculturalismo. Fica claro que, até mesmo por tempo e por melhor
organização de prioridades, essa passagem não tem o aprofundamento de um texto
especificamente direcionado ao tema, mas também, não haveria maneira de se iniciar
as discussões aqui propostas sem uma contextualização.
Na segunda parte, buscamos aprofundar a análise histórica do fenômeno do
neoconservadorismo e a identificação de alguns dos seus principais expoentes nos
Estados Unidos. Nela, temos como objetivo mapear as bases teóricas deste
pensamento, sua origem, importância e diferença com outros grupos conservadores
tradicionais, e, principalmente, destacar sua influência dentro do governo de George
W. Bush.
Após a discussão destes capítulos introdutórios partiremos para a parte que
consideramos mais trabalhosa em termos de abordagem, abrindo a exposição de um
terceiro capítulo que consiste em uma análise das obras de autores que consideramos
relevantes ao tema proposto pela nossa pesquisa.
Entre os intelectuais “neocons” ou que mantém interlocução com essa corrente
de pensamento, selecionamos aqueles mais voltados para as discussões sobre cultura
e imigração, especificamente Francis Fukuyama
1
e seus livros Confiança: as
virtudes sociais e a criação da prosperidade, Nosso futuro pós humano e seu último
livro América At the Crossroads: democracy, power and the neoconservative legacy;
Gertrude Himerfarb e seu livro One nation Two Cultures; Linda Chavez e seus
textos on-line publicados pelo Center For Equal Opportunity; John Fonte com os
textos on-line sobre imigração publicados no Hudson Institute; Charles Murray com
os textos on-line publicados no American Interprise Institute e Allan Bloon com seu
livro O Declínio da Cultura Ocidental: da Crise da Universidade à Crise da
Sociedade A análise destas obras permite um aprofundamento na compreensão deste
grupo, principalmente, na tentativa de mapear as características comuns entre os
autores, porque, apesar dos mesmos se definirem, ou, serem definidos como
neoconservadores, existem inúmeras diferenças nas suas maneiras de pensar.
1
Procuraremos, também, nesta análise aprofundar o porquê este autor ter em seu último livro
argumentado que rompeu com o neoconservadorismo.
1 Características gerais dos Estados Unidos da América (EUA) e sua atual
postura hegemônica.
1.1 O vencedor derrotado.
Partimos neste capítulo introdutório de uma rápida análise sobre as principais
características dos EUA, percebendo alguns fatores que caracterizaram a identidade
deste país, aprofundando, também, as conseqüências de seu atual posicionamento nas
relações internacionais. Além disso, procuraremos inserir neste tópico a importância
das discussões sobre cultura na atualidade e como estas se relacionam diretamente
com a permanência ou não dos EUA como principal potência de nossos tempos.
Datamos o ponto de partida de nossa sistematização em novembro de 1989, no
quinto dia deste mês, quando a queda do muro de Berlim acabou marcando também o
declínio do regime soviético. Como conseqüências deste acontecimento surgiram
inúmeras visões, propostas e teorias; criando uma percepção clara de que o mundo
deixaria de se apresentar como política e ideologicamente bipolar, para ocorrer uma
concentração de poder nas mãos do possível vencedor deste conflito.
Como resultado deste processo tem-se o afastamento de grande parte dos
intelectuais conservadores das discussões contrárias ao socialismo, já que, o mesmo
passou a ser considerado, para estes, como adversário não preocupante após o fim da
União Soviética, como se pode perceber na afirmação de Fukuyama:
Nós que vivemos em democracias liberais estáveis e antigas
enfrentamos uma situação fora do comum. No tempo dos nossos
avós, muitas pessoas sensatas podiam prever um futuro socialista
luminoso no qual teriam sido abolidos a propriedade privada e o
capitalismo e no qual a própria política seria uma coisa ultrapassada.
Hoje ao contrário, mal podemos imaginar um mundo radicalmente
melhor do que o nosso ou um futuro que não seja essencialmente
capitalista e democrático. (FUKUYAMA, 1992, p.77).
Em outras palavras, intelectuais que passaram grande parte da época da guerra-
fria criticando o socialismo, começaram a se preocupar, agora, com questões até então
pouco debatidas, como cultura, identidade, grupos minoritários, propagação da
democracia, dentre tantas outras.
A preocupação era perceber qual o destino do vencedor, tentando assegurar que
esta vitória não fosse apenas uma realidade fugaz. Para isto, era necessário que se
tivessem claros quais seriam os novos desafios, sobretudo, porque um novo mundo
surgia dos escombros, erguendo-se em meio à esperança de que os conflitos
sistêmicos tivessem sido soterrados pelos destroços do muro que acabara de ruir.
Todavia, o que surgia no horizonte era um novo mundo repleto de disputas étnicas,
pobreza, injustiças e, especialmente, de novos massacres. Segundo Szayna, nos anos
que se seguiram ao término do socialismo, observamos um número crescente de
conflitos no interior dos estados nações: “Entre 1989 e 1998, apenas sete, entre os 108
conflitos armados deflagrados no mundo, foram de natureza interestatal.” (SZAYNA,
2000, p. 1)
2
.
Temos aqui claramente que o mundo pós-Guerra-fria não se mostrava tão
seguro como se tinha esperança que ele fosse
3
; ele era, na realidade, muito mais
complexo do que nos tempos do conflito bipolar, já que, se antigamente o inimigo era
facilmente demarcado, agora a maioria dos conflitos ocorria por motivos étnicos e
tendiam a resultar em massacres
4
. Parece visível que receber a obrigação de liderar
um mundo com estas características constitui-se muito mais um martírio, do que de
um prazer irrestrito, e é este mundo que os EUA recebem o papel de liderar.
O que temos como decorrência inegável é que alcançar a condição de principal
superpotência levou os EUA a desenvolverem novas obrigações, posicionando este
país como possível responsável pela solução de todos os problemas ainda não
resolvidos no mundo.
5
A questão é que nem mesmo no país existia uma postura
definitiva no sentido de que este deveria, ou não, assumir o “fardo” de melhorar a
situação do mundo
6
.
O que percebemos durante os anos após a queda do muro é que EUA, apesar
das discussões internas, tomou a frente como polícia do mundo, ou, de acordo com os
2
Sendo que grande parte destes aconteceram nos países que deixaram de pertencer ao chamado mundo
socialista.
3
Apesar da constatação de que: os conflitos entre nações, que apresentavam um número maior de mortos,
realmente, foi menor durante o período.
4
Os chamados conflitos intraestatais, ou seja, os conflitos não são realizados entre nações, e sim, no
interior destas, têm como característica principal a dificuldade para que se atinja uma negociação.
5
A leitura da introdução dos artigos federalistas escrita por Isaac Kramnick acaba por nos mostrar que
existem, claramente, duas maneiras de se contar a história dos EUA. Uma primeira que posiciona a
constituição e os seus fundadores com um ar santificado e uma segunda que esclarece que a disputa
ocorrida entre Federalistas e Antifederalistas na verdade foi a disputa entre o capital contra os pequenos
proprietários originada pelo recebimento das dívidas nos Estados. Com a vitória dos federalistas o poder
acaba sendo centralizado, sem que necessariamente ocorra uma preocupação com a questão social.
6
Notamos constantes discussões, especialmente, entre idealistas e realistas, sendo que os primeiros
consideravam que era dever dos Estados Unidos levarem seu modo de vida às outras nações, e os realistas
que consideravam que a melhor saída, para este país, seria a opção se fechar, para que, o mesmo, não
fosse alvo de revanchismo, pelas nações que não conseguiram atingir o mesmo nível, e que veriam na
interferência estadunidense em seu país uma possível causa de seus problemas.
dados de Szayna: “Desde o fim da Guerra Fria de acordo com os dados cobrindo até
1997, as Forças Armadas dos Estados Unidos envolveram-se em 25 operações de
paz”. (TELIIS; SZAYNA; WINNEFELD, 1997).
O que ficou nítido, nos anos que se seguiram aos fatos de novembro de 1989, foi
que a clareza após a vitória contra o inimigo soviético, se restringia apenas ao orgulho
ignóbil de que o legado estadunidense representava o melhor caminho para o mundo,
uma percepção reforçada pela idéia de que o projeto concebido pelos pais fundadores
representaria o ápice da humanidade. A grande complicação deste pressuposto
aparece quando percebemos que a história nos mostrou de forma austera, que nenhum
dos grandes vencedores conseguiu manter-se nesta posição para sempre. Fato
suficientemente forte para que, porções infindáveis de intelectuais, jornalistas e
críticos de política iniciassem, na última década, uma corrida incessante pela
descoberta de fissuras nas estruturas da hegemonia deste país
7
.
As discussões envolvendo o fato dos EUA estarem em crise parecem a cada dia
ganhar mais força. Da mesma maneira, as argumentações de que o país perdeu as
características que lhe garantiam a hegemonia e está sendo obrigado a usar a força
para manter o seu controle sobre o mundo são constantes
8
. Outros, ainda, percebem
no alto crescimento da economia chinesa o possível ponto de oposição a este país.
Estas entre, inúmeras outras previsões, mesmo que profecias ainda não comprovadas,
ao menos voltam a transformar as esperanças no futuro em um caminho incerto.
No âmbito do real, se por um lado, a perspectiva de que o domínio dos EUA
diminua parece cada vez mais próxima, por outro, nenhuma nova formação
ideológica surgiu durante a última década que se apresentasse como alternativa aos
EUA ou ao próprio sistema capitalista.
Este vazio ideológico acaba gerando uma perspectiva que choca grande parte
dos pensadores conservadores. Dentre eles, encontramos o pensamento de Deepak
Lal, conservador indiano radicado nos EUA, que disserta sobre a necessidade dos
EUA assumirem-se de vez como um Império. A posição de Lal foi desenvolvida
através de alguns estudos sobre a história da humanidade, onde, o mesmo, acredita
7
Da mesma maneira como foram os Gregos, os Romanos e os Ingleses entre outros.
8
Ao posicionar esta discussão não estamos afirmando que os EUA não utilizaram da força durante sua
história, a observação que fazemos se restringe especificamente dentro da idéia de como se reorganizaria
o mundo do pós-Guerra-Fria com a vitória deste país.
que as características
9
que envolvem o conceito de Império acabam por gerar uma
melhor organização do mundo
10
(LAL, 2004).
Esta opinião levou-o a preocupação histórica do que representaria a dissolução
do mundo capitalista, mirando-se no exemplo romano, a queda dos EUA resultaria
em uma barbárie imprevisível, o que certamente não seria interessante para a grande
maioria das pessoas do mundo.
O grande problema que encontramos neste processo concentra-se exatamente
neste vazio ideológico. Para tentar compreender este processo procuraremos nos
prender em algumas características do processo de globalização que parece o
principal responsável por esta formação.
Como nos propomos a tratar de questões relativas à identidade e cultura, o que
procuraremos agregar à nossa discussão são as características homogeneizantes deste
processo, onde existe uma constante tentativa de transposição das identidades locais
para o consumo, e para isto, nos apegamos a leitura de Canclini:
Homens e mulheres percebem que muitas das perguntas
próprias dos cidadãos - a que lugar pertenço e que direitos isso
me dá, como posso me informar, quem representa meus
interesses - recebem suas respostas mais através do consumo
privado de bens e dos meios de comunicação de massa do que
de regras abstratas da democracia ou pela participação coletiva
em espaços públicos. (CANCLINI, 1999, p.30).
Ainda sobre o mesmo tema encontramos a importante colaboração do sociólogo
Otavio Ianni, perfazendo uma leitura bastante ampla dos resultados da globalização:
Assim, o capitalismo se apresenta como modo de produção e
processo civilizador, além de acrescentar e mundializar suas forças
produtivas e suas relações de produção, ele interfere nas instituições,
padrões de diversidade cultural, religiosas, lingüísticas, étnicas e de
outros tipos, se desagregam instituições, padrões e valores de acordo
com as exigências indispensáveis para a produção de mercadorias,
sem as quais não existe a mais valia. Os princípios de liberdade,
igualdade e propriedade, articulados jurídica e politicamente, se
impõe e se generalizam em ambientes onde prevalecem tribalismo,
tradicionalismo, patriarcalismo e patrimonialismo. Aos poucos a
comunidade é absorvida pela sociedade, a sociabilidade baseada nas
9
Entre estas características se encontram a formação de um sistema legal transnacional com o intuito da
defesa da propriedade privada, a diminuição dos conflitos étnicos e o aumento do controle na segurança
global, o aumento da prosperidade econômica e na facilidade das relações comerciais entre nações, entre
outras.
10
Lal parte da idéia que, durante a história, os tempos em que existiram grandes impérios possuíam
características muito mais pacíficas e uma melhora substancial na qualidade de vida.
relações pessoais na produção de valores de câmbio. Às vezes, há
uma secularização da cultura e comportamento, o individualismo, a
emergência de um individualismo possessivo, em alguns casos, da
cidadania. (IANNI, 1999, p.93).
Todavia, o processo de globalização que se apresenta ao mundo com
características irreversíveis, ao mesmo tempo em que englobava uma ilusão de
satisfação pessoal pela obtenção de bens, também, se construía através de sua
capacidade de criar um aumento substancial na sensação de conforto, passou a
representar, ao mesmo tempo, o propósito da luta política de inúmeros grupos. Estas
lutas passaram a não mais perceber o sistema capitalista como principal agente da
desigualdade mundial, mais que isto, a proposta da transposição deste sistema
começou a ser deixada de lado por boa parte dos novos atores, que iniciaram o
combate aos seus aspectos excludentes.
Como resquícios deste processo criam-se quatro grupos de cidadãos. Primeiro
aqueles que se consideram plenamente inseridos e satisfeitos com sua posição no
mundo atual, substituindo, por este motivo, sua identidade, nacionalidade e valores,
por outros elementos que se encontram previamente modelados, ou segundo Canclini:
A junção entre estes termos se altera em todo mundo devido a
mudanças econômicas, tecnológicas e culturais, pelas quais as
identidades se organizam cada vez menos em torno de símbolos
nacionais e passam a forma-se a partir do que propõem, por exemplo,
Hollywood, Televisa e MTV. (CANCLINI, 1999, p.14).
Um segundo grupo representado pelos que iniciam uma luta na tentativa de se
incluir e melhorar sua posição no mundo capitalista, utilizando sua identidade como
fator de acesso para cobrar dos governos o direito a competir em igualdade, não sendo
excluídos por suas características étnicas. Como exemplos, destes grupos, podemos
citar os negros, latinos, homossexuais, entre tantos outros.
Para melhor compreender esta discussão parece necessário aprofundar a
definição de grupos étnicos que utilizamos na construção deste trabalho. Optamos
pela definição proposta por Max Weber
11
no primeiro volume de seu livro Economia
e Sociedade, onde fala:
11
Apesar desta definição incomodar grande parte dos antropólogos pois os mesmos consideram que
existem definições mais sofisticadas sobre etnicidade, insistimos na continuidade da mesma neste
trabalho principalmente por esta ser a definição em uso tanto para os neoconservadores, como presente
também em todos os manuais de prevenção de conflitos étnicos existentes no mundo. Por este motivo
consideramos não haver a necessidade de aprofundar outras definições sobre grupos étnicos neste
trabalho já que nossa preocupação é exclusivamente compreender o pensamento neoconservador.
É claro que esta somente conduz a uma “comunidade” quando é
sentida subjetivamente como característica comum, o que ocorre
apenas quando a vizinhança local ou outros vínculos entre pessoas de
raças distintas levam a uma ação comum (na maioria das vezes,
política) ou quando, ao contrário, certo destino comum dos
racialmente homogêneos se liga a algum contraste existente com
outros de características acentuadamente distintas. (WEBER, 2000,
p.267).
Aprofundando essa definição podemos compreender a concepção de grupos
étnicos como sendo uma união realizada com relação a uma posição externa, e que
pode ser percebida tanto por motivos raciais, religiosos ou até mesmo motivada por
interesses em comum.
Além dos dois primeiros grupos que citamos podemos pontuar um terceiro, que
procura se manter em um mundo paralelo ao capitalista, argumentando que sua
cultura deve ser mantida, ao mesmo tempo que, propõe a criação de bolsões que
possuam autonomia ao modelo existente. O atual lema do Fórum Social Mundial se
pauta neste conceito (um mundo onde caibam vários mundos), como representantes
deste grupo, nós podemos citar os zapatistas.
O último grupo pode facilmente ser identificado, e se diferencia dos demais,
porque, de acordo com a visão conservadora, acabam posicionando-se de maneira
anacrônica, questionando algumas características relacionadas ao modelo capitalista,
principalmente, por viverem presos a características tradicionais. Encurralados pelo
processo de globalização acabam adotando decisões não políticas com o intuito de
retaliar o inevitável processo de transformação em sua cultura. Como exemplos
destacam-se: os grupos terroristas ligados ao islamismo, grupos armados de extrema
direita e de extrema esquerda.
A importância de se perceber os resultados destas mudanças é fundamental aos
propósitos deste trabalho, já que, partimos da posição de que os EUA se apresentam
em nossos dias como defensores da cultura ocidental, adotando uma postura que
espalha seu modo de vida pelo mundo através do chamado soft power
12
. Passa a se
destacar a questão da ambigüidade desta transmissão do modo de vida estadunidense
pelo mundo.
12
A definição formulada por Joseph Nye Jr e constantemente discutida por outros autores de Soft Power
consiste na maneira de influenciar, as pessoas a aderirem ao modelo estadunidense sem o uso da Força
Física.
Questionamos aqui que, diferentemente dos outros países que alcançaram o
ápice no âmbito do capitalismo, os EUA não possuem uma identidade de nação
definida. Essa afirmação pode parecer estranha, pois acabamos de destacar, no
parágrafo superior, a exportação de um modo de vida estadunidense para o mundo.
Então porque argumentamos que este país não tem uma identidade fortemente
formada?
Primeiramente temos a percepção, de que este país não possui uma história
13
tão
rica como a maioria dos outros países que lideraram o mundo. Mais do que isso, fica
claro, nas leituras sobre a formação deste país, que sua história foi construída sobre
alguns mitos. Mas o que estes mitos diziam? Podemos aqui afirmar que eles
realmente impulsionaram esta nação a atingir o ponto em que se encontra na
atualidade?
Para responder a essas perguntas, discorreremos aqui sobre quatro dos principais
mitos criadores da nação estadunidense, com o intuito de procurar compreender seus
possíveis resultados. São eles: o mito do pioneiro, o mito da associação entre religião
e trabalho, o mito da inspiração divina da constituição americana e o mito da
sociedade formada por imigrantes.
O primeiro que se encontra intimamente relacionado às características
expansionistas deste país, surgindo logo no princípio da colonização do território, é
impulsionado pela necessidade de avançar pelo continente ainda hostil. O pioneiro
possuiu o papel de abrir o continente, sua missão era de criar novas fazendas em
direção ao interior. Ele teve um papel tão significativo que se mostrou fundamental
para o crescimento da nação, já que os responsáveis por este processo não se fixavam
no local, preparando da região, para que esta fosse futuramente ocupada por outros
grupos em um momento posterior.
Como resultado desse processo, criou-se entre os estadunidenses um grande
desapego ao local, onde as edificações eram construídas partindo de um intuito de que
eram provisórias, e que nos anos seguintes seriam substituídas por construções mais
modernas. E até mesmo o apego à história, que constantemente notamos em outras
nações do mundo, foi substituído pelo apego a transformações e modernizações, ou,
pela leitura de Commager:
13
Algumas leituras sobre a formação dos Estados Unidos citam-no como um país que não se preocupou
com a história, nossa argumentação segue um caminho um pouco diferente ao realizado por estas, o que
discutimos aqui esta centrado na idéia de como os EUA se propõe a “exportar” seu modo de vida sem
possuir uma identidade formada ao longo de uma história longa?
[...] planejava com audácia e estava acostumado a ver ultrapassados
até os seus planos mais visionários; acabou por acreditar que nada
estava fora do alcance de seu poder e tornou-se intolerante para com
todo êxito que não constituísse um triunfo. Tinha pouca noção de
passado ou interesse por ele, não tinha mentalidade histórica e
relegava o interesse pela genealogia a solteironas que não podiam
interessar-se de modo algum pelo futuro. (COMMAGER, 1950,
p.15-16).
O segundo mito explica outra característica importantíssima desta nação, a
liberdade que a fé protestante oferecia para as práticas empreendedoras e para o
acúmulo de riqueza. Weber, ao escrever seu livro A Ética Protestante e o Espírito do
Capitalismo, já argumentava como a doutrina da predestinação Calvinista interferia
diretamente sobre os homens. Segundo esta, não era a bondade e nem a fé que
garantiria a salvação e sim a existência de uma predestinação. Deste modo, qualquer
um poderia ser escolhido para a salvação; entretanto, parecia ser razoável que os
escolhidos mostrassem pelo caráter e pelos modos a qualidade de sua alma e a
natureza do seu destino. A veracidade é que esta crença se tornou um código secular
de conduta que consistia em trabalho, honestidade, seriedade e o uso cuidadoso do
dinheiro e do tempo.
Temos noção que o bom Calvinista não buscava a riqueza a qualquer custo, mas
o fato de alcançá-la não era visto como um pecado como notado na religião católica.
Significava, sim, que a riqueza honesta era um favorecimento divino, ou mesmo, um
sinal de salvação. O que percebemos na história dos EUA é uma exacerbação desta
lógica, segundo a leitura de Commager:
Tudo o que prometia aumentar a riqueza era automàticamente
considerado bom, sendo o norte-americano, portanto, tolerante com a
especulação, a propaganda comercial, a derrubada das florestas e a
exploração dos recursos naturais, suportando pacientemente as piores
manifestações do industrialismo. (COMMAGER, 1950, p.17).
Essa predisposição à acumulação possuía apoio não apenas dentro da
perspectiva religiosa, como também entre as principais correntes filosóficas
desenvolvidas nos EUA. Isto pode ser percebido claramente no livro A Filosofia
Americana: uma introdução (de Edwards a Dewey) de Guy W. Stroh, o qual procura
discutir as origens da filosofia nos EUA, argumentando que a aceitação do lucro era
freqüentemente citada nas três principais frentes fundadoras da filosofia estadunidense,
tanto entre os puritanos, como nos transcendentalistas, quanto nos pais fundadores,
segundo este:
Aos olhos de todos a poupança, o arrojo empreendedor, a justiça, a
honestidade e a prudência eram virtudes. As diferenças estavam na
ênfase e no relacionamento de tais virtudes a um mais largo corpo de
outras doutrinas e credos. Os puritanos estimavam a poupança e as
outras virtudes pela sua piedade, pelo poder que tinham de
disciplinar a alma em conformidade com a vontade do Criador. Os
pais fundadores estimavam-nas pela sua utilidade nesta vida, mais do
que em consideração de algum fim sobrenatural. Os
transcendentalistas estimavam-nas ainda por razões diferentes:
acreditavam que a virtude traz como conseqüência a integridade, e
leva o homem a encontrar-se e aprimorar-se. (STROH, 1968, p.14).
O terceiro mito surge de uma divergência de leituras no processo de
desenvolvimento da constituição estadunidense, onde ocorreu um processo de
santificação da constituição e dos seus idealizadores, deixando a margem os
opositores dela. Este processo fez com que a leitura da formação da constituição fosse
vista sem se levar em conta a disputa de interesses presentes neste acontecimento. A
constituição, que possuía um caráter centralizador, diminuindo assim o poder dos
estados e facilitando a cobrança de impostos e dívidas, principalmente, dos pequenos
proprietários foi através do mito da inspiração divina colocada como um processo
sagrado.
14
Por último, temos o mito que tem maior alcance sobre a análise que fazemos
desta sociedade: a percepção de que esta é uma sociedade formada por imigrantes.
Esta perspectiva, por si só, lança os EUA em posição de vanguarda entre as outras
grandes potencias da história, pois nela encontramos a influência de inúmeras raízes
culturais, ou como comenta Commager:
O caráter norte-americano foi produto de uma interação de herança e
ambiente, tão variados como complexos. Pois a herança não era
apenas inglêsa, mas européia; não só dos séculos XVII e XVIII,
como de dois mil anos. O fato de os Estado Unidos serem rebento da
Grã-Bretanha era reconhecido; de que as raízes de sua cultura e de
suas instituições eram da Grécia, de Roma e da Palestina, não se
podia esquecer; e as instituições básicas do estado, da igreja e da
família, mantidas pelos norte-americanos, bem como os valôres
fundamentais por eles cultivados anunciavam a origem e o
parentesco. (COMMAGER 1950, p.13-14).
14
Ainda hoje quando nos deparamos com a questão da imigração para este país percebemos a cobrança
dentro da idéia de que este novo imigrante deve aceitar a constituição com suas características sagradas.
Da mesma maneira, Tocqueville procura destacar que o princípio democrático
nos EUA surge principalmente devido ao primeiro processo de imigração que
trouxe para o novo continente muitos dos que sofriam perseguições na Europa.
Os imigrantes que vieram fixar-se na América, no começo do século
XVII, isolaram, de algum modo, o princípio da democracia de todos
os outros contra os quais lutavam nas velhas sociedades da Europa, e
transplantaram-no isolado, para as margens do novo mundo. Ai pôde
crescer em liberdade e, adequando-se aos costumes, desenvolver-se
pacificamente nas leis. (TOCQUEVILLE, 1973, p.189).
Na visão de Tocqueville os imigrantes se apegaram aos valores democráticos
como uma reação às inúmeras perseguições que sofriam enquanto estavam no
continente Europeu. Neste contorno, podemos definir a percepção estadunidense do
velho continente como sendo repleto de vícios e com uma total ausência de
virtudes. Todavia, esta leitura desaparece durante a história prevalecendo nos
tempos atuais um esforço em prol dos laços que transferem aos EUA a herança
cultural ocidental.
Podemos facilmente perceber pela leitura, tanto de Tocqueville quanto de
Commager, que em suas visões os EUA surgem com uma nação nova, livre de
conflitos
15
, onde todos procuram discutir os principais temas e tentam entrar em um
consenso para que o bem comum prevaleça sobre os interesses individuais, ou, na
própria frase de Tocqueville: “Na América há facciosos, mas não conspiradores”
16
(TOCQUEVILLE, 1973, p. 229).
Esta perspectiva é constantemente contrariada por uma série de intelectuais
que não aceitam a idéia romantizada de surgimento da nação, como podemos
perceber na leitura feita por Lipset:
O enfoque da história norte-americana, que procura encaixar os
Estados Unidos sob a Rubrica de nações novas, e formular ou
desenvolver proposições acerca dos requisitos de nacionalidade
estribado na experiência estadunidense, tem sido contestado por
outros historiadores, no entender dos quais a Revolução Norte-
americana não fundou uma nova nação no sentido contemporâneo do
15
Tocqueville, ainda, chega a argumentar o problema dos negros como um possível ponto de conflito
dentro desta nação.
16
Esta visão se deve principalmente as grandes assembléias populares que decidiam os destinos das
colônias, antes mesmo da guerra da secessão.
termo, visto que ela foi dirigida pelas elites estabelecidas das
colônias, essencialmente constituídas de ingleses transplantados, que
já possuíam direitos políticos e poder antes da revolução. (LIPSET,
1982, p.74).
A partir da discussão desses quatro mitos, podemos aprofundar os temas
específicos sobre as questões da cultura e, principalmente, sobre o atual crescimento
da população de imigrantes nos EUA, conforme faremos na próxima seção.
1.2 Cultura e imigração.
Nesta seção, além de explicar o que consideramos por cultura, abordaremos o
problema da imigração dentro dos EUA. Para isso, partiremos do questionamento
do porque a idéia de cultura tem ganhado tanta força nos dias atuais.
Em seu prefácio para o livro A Cultura Importa, os valores que definem o
progresso humano
17
, Huntington discorre sobre a importância que foi dada a cultura
durante as duas últimas décadas, o mesmo argumenta que, durante os anos 1940 e
50, a cultura era um elemento crucial para que se pudessem compreender as
sociedades, e que, durante as décadas de 60 e 70 este tipo de trabalho começou a
decair, para só voltar a ter destaque a partir da década de 80: “Os cientistas sociais
voltaram-se, cada vez mais, para fatores culturais em busca de explicação para a
modernização, a democratização política, a estratégia militar, o comportamento de
grupos étnicos e as alianças e os antagonismos entre países” (HUNTINGTON,
2002, p.12).
Como resultado, temos um agigantamento das discussões sobre cultura nestas
últimas décadas, de maneira que, a mesma ganha status de resposta imediata para
qualquer tema, vira questionamento político salvador para qualquer problema,
explicando, desde o porquê um país se desenvolve mais do que outro, até porque
determinados grupos têm mais facilidade para determinada atividade e outros não.
Mas é preciso, aqui, definir melhor o conceito de cultura, pois o mesmo
apresentou inúmeros significados durante as últimas décadas. Restringimos-nos, por
17
O livro surge a partir de uma conferencia entre alguns intelectuais sobre a importância da cultura e sua
relação com o desenvolvimento humano.
este motivo, a definição de cultura presente no livro a que nos referimos no
parágrafo anterior, tanto Huntington como Harrison, seus organizadores, apesar de
não serem neoconservadores, partilham visões com autores próximos dessa
corrente, como Francis Fukuyama, que participa com um capítulo. De acordo com
Huntington:
Neste livro, entretanto, nos interessam os efeitos da cultura sobre o
desenvolvimento da sociedade; se a cultura incluir tudo, não
explicará nada. Por isso, definimos cultura em termos puramente
subjetivos, como os valores, as atitudes, as crenças, as orientações e
os pressupostos subjacentes que predominam entre os membros de
uma sociedade. (HUNTINGTON, 2002, p.13).
Como podemos identificar, a cultura para estes autores se restringe apenas a
construções subjetivas excluindo-se a produção cultural comumente associada a
idéias mais generalizantes de cultura.
Huntington, assim como os outros autores do livro inserem a cultura em uma
visão peculiar de progresso humano, que indica “o movimento rumo ao
desenvolvimento econômico e ao bem-estar material, a justiça sócio-econômica e a
democracia política.”. (HUNTINGTON, 2002, p.13).
Observando esta definição de progresso humano percebemos claramente, uma
postura elitista e profundamente inserida dentro da proposta de um mundo
capitalista e democrático, além de, também, entendermos nela uma constante recusa
às propostas que em sua base teórica relativizam a idéia de cultura. Este relativismo
acaba gerando uma postura de respeito irrestrito as posições que envolvem questões
culturais, não possuindo uma preocupação de que, através destas, se alcance uma
melhoria real nas condições de vida, segundo Lawrence E. Harrison:
A “idéia de progresso” é suspeita para aqueles que estão
comprometidos com o relativismo cultural, para quem cada cultura
define seus próprios objetivos e sua ética, os quais não podem ser
avaliados em comparação com os objetivos e a ética de outra cultura.
Nos casos extremos, os relativistas culturais e os pluralistas culturais
podem argumentar que os ocidentais não têm direito de criticar
instituições como a mutilação genital das mulheres, o suttee
(costume hindu de juntar as viúvas a seus maridos mortos na pira
funerária, queiram elas ou não), e até mesmo a escravidão.
(HARRISON, 2002, p.27).
A inserção desta leitura deixa claro que, para os autores, o padrão ocidental de
progresso humano tem importância fundamental para a construção de um mundo
melhor, já que, o mesmo, atingiu algumas melhorias na qualidade de vida das
pessoas, como o aumento na expectativa de vida, a cura para a maioria das doenças
e os benefícios e facilidades da vida moderna. Destarte, os valores atribuídos às
culturas tradicionais são relacionados ao atraso, ao autoritarismo, a injustiça e ao
baixo desenvolvimento humano, e devem, por este motivo, ser transformados.
Acrescentamos que a grande diferenciação entre a posição dos autores que
estudamos e o posicionamento dos autores liberais clássicos
18
se encontra
exatamente na retomada dos valores culturais como referência do progresso
humano. A característica de suas obras se concentra no esclarecimento de que
valores culturais e morais são determinantes para uma condição de avanço dentro
desta visão de progresso humano.
Como particularidade determinante desta visão, tende-se a uma constante
exportação do modo de vida ocidental, distribuído ao mundo como um modelo
infalível para se atingir à prosperidade. Como estamos especificando que a
liderança do bloco ocidental cabe aos EUA, podemos ousar considerar que estes
valores exportados são, na verdade, valores profundamente estadunidenses, por este
motivo o mundo não tende a uma ocidentalização e sim a uma “Americanização”.
19
Mas o que é americanizar o mundo? No item anterior discutíamos sobre a
inexistência de uma identidade nacional, então como “americanizar” o mundo se
não existe uma definição clara do que significa ser “Americano”? Este
questionamento, já em 1972, era constantemente mencionado como podemos notar
na obra de Allen:
A Americanização do resto do mundo é uma característica do nosso
tempo. Contudo, permanece de pé o problema da identidade norte-
americana, do que significa ser um norte-americano. É um problema
obsedante, para os próprios norte-americanos. Num certo sentido, na
verdade, o problema foi e ainda é o grande tema da literatura norte-
americana. Um dos mais famosos romances norte-americanos é Na
American Tragedy, de Theodore Dreiser. Implícita no título está a
sugestão de que a estória que o romance relata só poderia ocorrer nos
Estados Unidos. Parece que os norte-americanos, hoje tanto quanto
em qualquer outra época, hoje talvez mais do que nunca, tem sempre
que procurar definir e avaliar em que são diferentes dos outros povos
do mundo. São diferentes mesmo, e nesse caso, o que os fez assim?
E, pressupondo que são diferentes, que têm de comum entre si?
(ALLEN, 1972, p.04).
18
Adam Smith e David Hume.
19
Nós relutamos na utilização da definição dos EUA como América, pois esta denominação deveria se
referir a todo o Continente Americano e não apenas a um país da América do Norte.
Destacamos, aqui, o último questionamento deste autor: “E pressupondo que são
diferentes, que têm de comum entre si?” Já dissemos que na formação do caráter
estadunidense a história não possui característica marcante, e aqui esclarecemos que
alguns pontos da história acabam sendo supervalorizados. Estes pontos não são
apenas valorizados, ocorre, na realidade, uma santificação de alguns
acontecimentos da história, onde, se eleva a um patamar sagrado o legado deixado
pelos pais fundadores e pela constituição. Mas qual a importância presente nessa
crença nos pais fundadores, se a sociedade em questão é uma sociedade formada
por imigrantes?
É importante aprofundar esse ponto, já que nós podemos destacá-lo como sendo
o ponto central de toda a complexidade da formação identitária dos EUA. Em sua
origem e, principalmente, em sua origem filosófica, como não haviam pensamentos
já arraigados que disputassem espaço na mentalidade do novo país, ao mesmo
tempo que não existia a presença de instituições fortes o suficiente para gerar uma
autonomia identitária
20
, os estadunidenses puderam incorporar, sem restrições, as
principais idéias existentes no mundo.
Diferentemente de outros países, como os da Europa, que possuíam grandes
escolas intelectuais e que através destas restringiam as idéias de outras partes do
mundo
21
, os Estados Unidos receberam grande parte da filosofia existente e
absorveram, sem reservas, processos científicos e técnicos que lhe pareciam
relevantes. Este processo de apropriação acabou ocorrendo, até mesmo, quando
pensamos em questões como a literatura
22
e a arte, onde percebemos, desde os
primeiros momentos de existência da nação, a despreocupação com a produção
própria, pois podiam usufruir das criações de outras nações, sem que isto causasse
algum processo de desestabilização da nação
23
.
20
É importante lembrar que durante a história, os EUA sempre possuiu um forte apelo pelas decisões do
local em detrimento a uma perspectiva de poder centralizado.
21
Como exemplo perceber as diferenças entre a sociologia e filosofia Alemã da Francesa, ou mesmo
Inglesa.
22
Segundo Carl Van Doren o primeiro romance estadunidense “The Power of Sympathy” (o poder da
simpatia) foi publicado anonimamente por William Hill Brown, em 1789 na cidade de Boston.
23
Esta característica de apropriação aparece presente em todas outras nações que aqui consideraremos
como novas (ou que passaram por um processo de colonização), apesar de em nossa leitura o
posicionamento dos EUA com relação a este processo tenha sido muito mais agressivo.
Esta característica é profundamente vital para se pensar na posição em que este
país se encontra hoje, pois, a perspectiva de se poder selecionar, do mundo, tudo o
que lhe serve, colocou-os vários passos à frente de outras nações do globo.
É exatamente este ponto que destacamos em nosso trabalho sobre a importância
dos grupos imigrantes para a construção dos EUA como nação destacada. Partindo
desta trajetória poderemos esclarecer a leitura que as elites do país fazem do
mesmo, e daquilo que causou uma transformação no posicionamento sobre os
imigrantes nos dias atuais.
Temos claro que o papel do imigrante foi fundamental para a construção da
nação, de uma forma, talvez, um pouco romantizada. O fortalecimento do país
deve-se muito à contribuição dos grupos de imigrantes que o procuraram durante
séculos, seja como refúgio, como possibilidade de ascensão social e liberdade para
desenvolver suas idéias sem restrições. Em troca desses benefícios, os mesmos
deveriam abrir mão de suas identidades antigas, mantendo seus costumes na esfera
privada e adquirindo na vida pública uma casca de “americanidade”. Mas no que,
exatamente, consistia esta casca?
Podemos considerar que funcionava como um conjunto de regras, que se
pautavam em acreditar que trabalhando duro e honestamente, aceitando os pais
fundadores e outros heróis estadunidenses como seus legítimos heróis, se
conseguiria prosperar, tornando-se um autêntico americano
24
, e seria realmente
assimilado. Como restrição maior esse deveria deixar escondida, dentro da
privacidade de seu lar, sua identidade real
25
, aceitando que através de valores e
instituições democráticas o mesmo estaria legitimamente representado, ou segundo
Copjec.
A democracia é o quantificador universal através do qual a América
do Norte o ‘caldeirão’ a ‘nação dos imigrantes’ constitui-se
enquanto nação. Se todos os nossos cidadãos e cidadãs podem ser
chamados de americanos, isto não é pelo fato de compartilharmos
qualquer característica positiva, mas, ao invés disso, pelo fato de ter-
nos sido dado o direito de nos despirmos dessas características, de
nos apresentarmos como descorporificados diante da lei. Eu me
desvisto de identidade positiva, conseqüentemente sou um cidadão.
24
No mais famoso romance de John Fante, Pergunte ao pó isto se mostra bem claro com Arturo Bandini
filho de imigrantes italianos se considera mais “americano”, do que sua namorada descendente de
mexicanos, Camila.
25
Este processo, também, recebeu inúmeras denominações pelos autores durante a história, cadinho de
raças, assimilação patriótica, entre tantas, não temos aqui a preocupação de aprofundar estas definições,
mais estas podem ser facilmente encontradas em obras sobre o tema.
Esta é a lógica peculiar da democracia. (COPEJC apud
MCALAREN, 2000, p.42).
Esta é a principal identidade estadunidense, que cresceu apoiada em um
multiculturalismo conservador
26
, criando, junto a si, uma pressuposição dogmática
que inseriu este país e grande parte do mundo em uma perspectiva de que seu
legado era grandioso, único e nomeadamente eterno.
Como conseqüência, exportou-se o modo de vida, cujo propósito inicial surgia
inserido em um discurso enaltecedor da preocupação em levar a felicidade e a
liberdade às outras nações
27
. O problema é o lado inverso dessa moeda, conforme
já era destacado em 1950 por Commager:
Gerações sucessivas se mostraram igualmente ansiosas por
disseminar a idéia norte-americana pelo globo e se exasperaram com
o fato de idéias estrangeiras se intrometerem nos Estados Unidos, e o
têrmo legal alienígena continha, quase invariavelmente, uma
conotação de repugnância
28
. (COMMAGER, 1950, p. 22).
Apegando-se a esta leitura podemos iniciar uma análise mais aprofundada sobre
a percepção dos imigrantes não-brancos, principalmente, a situação dos latinos
nesta sociedade. Para realizar esta tarefa partiremos de alguns dados, presentes no
censo estadunidense de 2001, onde, é previsto que, até o ano 2050 a porcentagem
de moradores considerados não brancos excederá 50% da população do país.
Destes, mais de 50%, a expectativa é que descenda de populações da América
Latina, população que historicamente sempre ocupou posição de subclasse e hoje
em dia, junto aos negros e os descendentes de indígenas, representam grande parte
da população pobre deste país, segundo Huntington:
26
De acordo com a definição de Peter Mclarem em Multiculturalismo Crítico, onde o mesmo distingue o
multiculturalismo crítico, ou seja, o que afirma sua identidade, do conservador que generaliza em uma
igualdade superficial inserida em um modo de vida específico.
27
Esta é uma crença muito arraigada dentro da tradição política dos Estados Unidos, considerar, pelo
menos em discurso, que sua interferência está acima dos seus interesses e que, esta, possui uma
característica de caridade. A discussão sobre este processo pode ser aprofundada em: A Arrogância do
Poder, escrito pelo Senador J. William Fulbright em 1969.
28
No teatro de Eugene O’neill(1962 intitulado Alem do Horizonte, esta percepção de rejeição é bem
demonstrada, centrando-se na história de dois irmãos, onde o primeiro era considerado frágil e sonhador,
querendo em conhecer o mundo e o segundo um cidadão típico dos EUA, que trabalhava arduamente e
vivia em um mundo bastante fechado. O fato é que durante o texto o irmão sonhador apaixonasse e acaba
deixando de ir viajar pelo mundo, indo o outro irmão em seu lugar. Como resultado desta volta ao mundo,
em sua volta para casa, o mesmo, constantemente reclama dos outros lugares do mundo.
A pobreza ainda persiste nos Estados Unidos, décadas depois da
Grande Sociedade e da Guerra à Pobreza. Os Hispânicos, com 30%
vivendo abaixo da linha da pobreza, tomaram o lugar dos negros
como a grande minoria mais pobre, e em algumas reservas indígenas
o índice de desemprego está acima de 70%. Impressiona o progresso
dos negros, especialmente das mulheres negras, mas 27% dos negros
ainda vivem abaixo da linha da pobreza---- em uma época em que a
economia dos Estados Unidos registrou quase uma década de
crescimento sustentado e baixos índices de desemprego
(HUNTINGTON, 2002, p.19).
Essa proporção causou uma reação imediata no que se refere à política de
imigração, onde existe uma preocupação muito grande com a intensa quantidade de
ilegais, preocupação que se soma à dificuldade de controle das constantes passagens
dos mesmos pela fronteira.
Os atentados de 11 de setembro resultaram em uma maior restrição ao acesso de
imigrantes, gerando uma apologia do aumento da segurança nas fronteiras.
Mas o que diferencia a população latina de tantas outras dentro deste país que a
torna mal vista pelos setores conservadores?
Além da grande quantidade, que chega hoje em dia a um percentual de 12%
29
, o
que acaba lhes dando um importante papel nas decisões do país, o ponto mais
relevante é a forte manutenção da sua identidade, segundo Mario Vargas Llosa:
Creio que pela primeira vez em sua história (dos Estados Unidos), há
um grupo étnico cultural, que o melting pot não conseguiu dissolver:
o latino. É um grupo que está muito consciente de sua própria
identidade, que a defende, e que ademais reclama o direito a mantê-
la dentro do que é o sistema americano. América Latina entra aí da
maneira mais inesperada, com umas conseqüências culturais
indiscutíveis. (VARGAS LLOSA, apud MARRAS 1992, p.125).
Debruçando-nos sobre a citação deste importante escritor latino, nos parece
claro que esta resistência latino-americana interfere diretamente na proposta
conservadora de assimilação, desenvolvida, pelos EUA, durante toda sua história.
30
Grande parte do grupo em questão nega o processo de assimilação cultural
31
,
29
Segundo o jornal Estado de São Paulo o número de latinos nos EUA chegou a 35milhões, valores que
ultrapassaram o número de habitantes negros, estes latinos representam quase metade do crescimento
demográfico do país e foram 6% do coeficiente eleitoral nas eleições de 1998.
30
Com exceção dos afro-americanos que também constantemente politizaram sua identidade e
conseguiram inúmeros avanços dentro da sociedade com este procedimento.
31
Entre este imenso conflito encontramos o choque entre as gerações de latinos, onde os jovens se vêem
entre o choque da cultura transmitida pelos parentes e a cultura local, esta discussão é bem aprofundada
nos Cuadernos Étnicas pelo seu editor Felipe Morente Megías.
potencializando a raiz cultural latina, politizando a aceitação de sua cultura como
parte importante da nação, esse processo acaba criando uma nova nação dentro da
já existente, seguindo uma direção claramente oposta ao que sempre foi pregado
pelas elites dominantes.
As minorias nos EUA têm avançado a cada dia ampliando seus direitos e
inserindo seu modo de vida dentro do país. Temos pela primeira vez nos Estados
Unidos o ensino através de uma proposta bilíngüe; o governo de George W. Bush é
o que possui o maior número de funcionários de alto-escalão de origem não branca
em toda a história nacional
32
. Sem contar os avanços durante as décadas de 60 e 70,
onde os afro-americanos conseguiram a inserção de cotas e programas de ação
afirmativa.
Mesmo assim, os EUA são, entre os países ricos, os que possuem a pior
distribuição de renda, e, dentro de uma realidade ainda mais grave, os programas de
assistência a famílias pobres são constantemente criticados pela grande maioria da
população. Segundo Michael Novak, neoconservador, 71% dos eleitores
estadunidenses preferem a liberdade para progredir à igualdade, e apenas 38% dos
pesquisados consideram que o governo estadunidense possui responsabilidade sobre
as disparidades na distribuição de renda. (Novak, 1997).
Se por um lado, estes dados demonstram claramente uma rejeição pela grande
maioria da população aos programas sociais que pregam a ajuda a grupos
minoritários, por outro, demonstra que o processo de assimilação ainda consegue
absorver grande parte da população que imigrou para o país, já que entre esta
porcentagem de cidadãos que rejeitam os programas sociais muitos, são
representantes de minorias
33
.
Para esclarecer melhor este processo de assimilação ocorrido, remetemos à
compreensão uma citação extraída do capítulo escrito por Manning no Livro El
neoconservadorismo em Estados Unidos una historia concisa:
A chave desta história reside em que a inclusão de novos imigrantes,
através do processo de assimilação cultural, deve seguir as instruções
dos grupos sociais anteriores a eles, isto é, a “receita” do
32
Entre estes, Alberto Gonzáles (o primeiro Hispânico a ocupar um dos quatro cargos mais importantes
dos Estados Unidos, no departamento de Justiça), Condoleezza Rice (primeira negra a ser secretária de
Estado), Margaret Spellings (no departamento de educação), Carlos Gutierrez( cubano indicado ao
comércio)
33
Ver mais sobre este processo em: Questão de Raça de Cornnel West, onde, o mesmo afirma que muitos
dos negros que se beneficiaram dos programas de ação afirmativa passaram a posicionar-se contra o
mesmo, por considerar que aceitando estes programas deixariam de ser estadunidenses.
conformismo anglo-saxão. Assim, com a obrigada eficiência das
forças de mercado no âmbito econômico, este darwinismo cultural
serve para preservar a manifesta superioridade da “cultura comum” -
como foi definida por outros grupos imigrantes anteriores - ao
ridicularizar as minorias que conservam sua cultura tradicional, o
que qualificam como anacronismo social. (MANNING, 1997,
p.228).
Como percebemos neste processo, as populações minoritárias acabam por
sofrer uma absorção, que possui como resultados lógicos duas possibilidades: abrir
mão de sua identidade e adotar o padrão moralmente imposto, ou politizar sua
identidade e ser considerados anacrônicos pela população do país. Este
procedimento de imposição de identidade posiciona-se totalmente contrário à
proposta de multiculturalismo presente na origem desta nação, que ilustraremos
com um fragmento escrito por Huges:
O multiculturalismo afirma que as pessoas com diferentes raízes
podem coexistir, podem aprender a ler os bancos de imagens de
outras, podem e devem olhar além das fronteiras de raça, língua,
gênero e idade sem preconceito ou ilusão, e aprender a pensar no
cenário de uma sociedade hibridizada. Sugere- muito modestamente-
que algumas das coisas mais interessantes da história e da cultura
acontecem na interface entre as culturas. Quer estudar situações
limítrofes, não apenas por serem fascinantes em si, mas porque sua
compreensão pode trazer consigo um pouco de esperança para o
mundo. (HUGES, 1993, p. 75).
Dentro da análise dessa proposta, na qual o multiculturalismo se baseia,
percebemos a grande diferença presente nos EUA. Não que o país tenha se fechado,
de maneira definitiva, para esta troca de informação tão importante para uma
melhoria na vida, já que continua a absorver e a financiar uma grande leva de
pesquisadores de todo o mundo, o problema é que agora existe a negação de que
estes imigrantes contribuam realmente para a Nação, ou segundo John Fonte,
Diretor do Hudson’s Center for American Common Culture, um centro com forte
presença de neoconservadores, ao argumentar sobre a importância do processo de
assimilação: “Eles enfatizam a unidade Americana, não a diversidade --- com o
intuito da produção de uma sociedade livre, e não o fim da mesma” (FONTE,
2002).
A preocupação presente na idéia de John Fonte se restringe, principalmente, no
que notamos que vem acontecendo nas duas últimas décadas, onde são constantes
as explosões urbanas envolvendo grupos minoritários. Exemplos como os ocorridos
em New Orleans em 2005, onde após o furacão Katrina ocorreram diversos saques
e confrontos, ou mesmo os acontecimentos de Los Angeles em 1992 onde a
população tomou as ruas da cidade por três dias. Lembramos que a preocupação
com a manutenção da unidade levou, em 1992, a grande maioria dos intelectuais
conservadores a atribuir os distúrbios ocorridos na cidade à ação das gangues, que
segundo eles foram motivadas pelo ressentimento ao sucesso econômico de grupos
não negros na região central de Los Angeles, ou na leitura feita por Fukuyama:
Na verdade no caso de Los Angeles houve o que parecem ter sido
esforços deliberados e sistemáticos de parte de alguns baderneiros
para atacar estabelecimentos comerciais coreanos, uma enorme
quantidade dos quais foi destruída e danificada. O ressentimento
popular contra lojistas não-negros é desmedido, dando origem a
teorias conspiratórias sobre a maneira como estrangeiros sinistros
tramam implacavelmente a exploração econômica dos afro-
americanos. (FUKUYAMA, 1996, p.316).
Esta leitura se mostrou posteriormente errônea, já que os conflitos de Los
Angeles e mesmo os saques no pós Katrina são na realidade explosões sociais
resultantes da pobreza e as constantes pressões que o modo de vida estadunidense
impõe sobre os grupos minoritários, e isto fica claro na descrição feita por West, em
seu livro Questão de Raça, dos envolvidos na revolta de 1992:
As loquazes tentativas de reduzir seu significado às patologias da
classe negra marginalizada, a ações criminosas de arruaceiros ou a
revolta política das massas oprimidas erram longe o alvo. Entre os
que foram detidos, apenas 36% eram negros, mais de um terço tinha
emprego em período integral e a grande maioria declarou-se avessa à
filiação política. O que testemunhamos em Los Angeles foi
conseqüência de uma combinação de declínio econômico,
decadência cultural e letargia política na vida norte americana. A
raça foi o catalisador visível e não a causa subjacente. (WEST, 1994,
p.17).
Ao observarmos estes acontecimentos percebemos que os EUA se encontram
envoltos em um paradoxo, que consiste em: necessitar do conhecimento e do
trabalho desenvolvido pelos grupos imigrantes, ao mesmo tempo, em que tenta
manter o discurso ufanista de que representa o que existe de melhor na história e é
pressionado por estes grupos em sua luta por inserção e melhoria nas condições de
vida. Este dilema é presenciado de forma clara, sobretudo, quando pensamos na
atual política de imigração, que propõe que os imigrantes venham trabalhar no país,
desde que, por um período de tempo específico e com os trabalhos já definidos. O
intuito central desta política reside no não estabelecimento de um vínculo entre este
imigrante e o país, de forma que esta característica de imigração garanta o controle
sobre as populações latinas, protegendo os trabalhadores não qualificados nascidos
nos EUA. Ao mesmo tempo, não deixa um grande rombo no mercado de trabalho
que necessita desta mão de obra imigrante.
Esse processo acaba restringindo, também, a imigração de indivíduos que vem
de maneira desestruturada, sobretudo, porque obriga que o trabalhador que chega ao
país possuía uma ocupação definida, com um tempo de permanência previamente
estabelecido. Essa proposta, se implantada, terá como resultado o fim do mito da
“América” como a terra das oportunidades, restringindo a participação dos
imigrantes a trabalhos específicos e por tempo determinado quebra-se a esperança
de que trabalhando duramente se possa chegar a ser realmente um estadunidense.
Podemos, a partir deste ponto, fechar esta parte introdutória partindo para a
discussão específica sobre o grupo ao qual nos propomos estudar, os
neoconservadores, favorecendo a compreensão do contexto em que as suas idéias
afloram e se fortalecem.
3 O neoconservadorismo em perspectiva histórica.
Neste capítulo procuraremos aprofundar a discussão sobre a história do
neoconservadorismo, alicerçando a compreensão de algumas de suas características,
que serão profundamente importantes para as análises específicas de algumas das
suas obras representativas.
Temos como objetivo, no desenvolvimento deste texto, observar algumas
particularidades deste movimento, procurando ressaltar tópicos importantes de sua
origem, percebendo suas influências intelectuais, aprofundando os momentos em
que este movimento ganhou ou perdeu força, e compreendendo as características
que o levaram a exercer influência sobre algumas posturas do governo de George
W. Bush.
Em um segundo momento, procuraremos explicar o que diferencia este
movimento de grupos conservadores tradicionais, esclarecendo quais são as suas
posições com relação às discussões envolvendo cultura, igualdade e sucesso dentro
da sociedade estadunidense.
Centramos estes como nossos objetivos fundamentais, entre tantas outras
elucidações sobre este movimento que possuía urgência de serem esclarecidas, já
que, partimos da proposta de fugir às críticas superficiais, com o intuito de tentar,
realmente, compreender este pensamento, atingindo, através deste processo, um
comprometimento com a tentativa de perceber as motivações que geraram este
grupo e não com as críticas que se avolumaram sobre os mesmos durante os últimos
anos.
Procedemos, por este motivo, de uma posição baseada na ótica de que não
podemos pensar o neoconservadorismo como um movimento constituído apenas
por um bando de aproveitadores, que constantemente, durante sua história, mudou
de lado de acordo com seus interesses momentâneos
34
, nem acreditar que as bases
do pensamento neoconservador surgiram de características provincianas, como
afirmou Mario Vargas Llosa no artigo Fundamentalistas e Republicanos
35
, já que
34
Em um artigo intitulado; Os Estados Unidos, o Iraque e as origens do projeto neoconservador, escrito
para a revista Margem Esquerda nº6 Argemiro Ferreira afirma que: “Críticos preferem vê-los como
liberais que se bandearam para o conservadorismo com medo da caça às bruxas do senador Joe McCarthy
na década de 1950”
35
Estado de São Paulo, dia 1 de maio de 2005.
estes pensadores denominados neoconservadores, em sua maioria, possuem uma
formação intelectual profundamente diferenciada.
Também não podemos tomar como verdade que sua chegada ao poder ocorreu
por um acidente, pois, apesar de seus representantes serem numericamente
reduzidos, conseguiram que suas idéias tivessem forte impacto nacional. Negamos
por este motivo a leitura realizada pelo jornalista Ari Shavit e citada por Argemiro
Ferreira (Ferreira, 2005) onde o mesmo argumenta que se umas vinte e cinco
pessoas não estivessem nos EUA, possivelmente as guerras do Iraque e do
Afeganistão não teriam ocorrido.
De fato, os neoconservadores não possuíam uma clareza de que suas idéias
poderiam ter tanto destaque, mas trabalharam, de maneira dura, para que fossem
conhecidas, posicionando-se abertamente sobre inúmeros assuntos
36
. Portanto,
considerar que apenas o isolamento de alguns de seus membros poderia modificar
os acontecimentos dos últimos anos representa um exagero, sobretudo, porque as
idéias destes intelectuais já se encontram há décadas inseridas no debate nacional, o
que chegou a chocar os próprios membros deste movimento. Segundo Shadia B.
Drury “Apesar dos neocons tornarem-se ideologicamente dominantes no partido
republicano nas décadas de 80 e 90, Kristol nunca imaginou que suas idéias
pudessem entrar na psique da nação.” (DRURY, 1999, p.137).
Agora, se observarmos essas idéias relacionando-as com toda a discussão
realizada em nosso capítulo introdutório afirmamos que estas vieram ao encontro
dos anseios da nação, representando o que a mesma esperava de um grupo político.
Isto ocorre, sobretudo, porque os neoconservadores acabam atingindo, de maneira
cirúrgica, os principais pontos que preocupam a grande maioria da população, onde,
diferentemente da maior parte dos grupos políticos, os mesmos não partilham da
insegurança de serem ridicularizados, propondo sem grandes medos soluções
rápidas para os principais problemas que a sociedade estadunidense atravessa
37
.
Para demonstrar isto, nos centramos no exemplo citado por John Micklethwait e
Adrian Wooldridge em seu livro The Right Nation, onde argumentam que apesar do
grande abismo existente entre os inúmeros grupos conservadores presentes nos
36
Em revistas como a Public Interest, Comentary, e em Think Tanks como o Hudson Institute, o AEI, e o
Project for the New American Century.
37
Não estamos afirmando, quando falamos isto, que consideramos as propostas neoconservadoras como
certas ou erradas, simplesmente, esclarecemos que elas são colocadas à mesa de maneira clara, sem a
preocupação de estas serem consideradas absurdas ou não.
EUA, o centro de gravidade na opinião publica deste país pende para a direita. O
principal resultado desta constatação na balança de forças acaba sendo a definição
de que as características conservadoras são consideradas como progressivas. Mas o
que significa considerar o conservadorismo como progressivo?
A questão a ser esclarecida, é que os movimentos conservadores, de uma
maneira geral, conseguiram nas últimas décadas ampliar, de forma crescente, sua
influência na sociedade, principalmente entre casais jovens, onde suas idéias foram
fixadas de tal forma que passaram a ser aceitas como solução possível e verdadeira
no senso-comum. Como resultado deste abraço ao conservadorismo, muitos jovens
estadunidenses defenderam nos últimos anos as propostas de George W. Bush,
reelegendo-o com extrema facilidade após uma primeira eleição no mínimo
duvidosa. Muitos também apoiaram as invasões do Afeganistão e do Iraque, a
diminuição da privacidade interna e a restrição à imigração, entre tantas outras
mudanças que levaram os Estados Unidos a exercerem uma postura muito próxima
à pregada pelos grupos conservadores.
Dentro destes acontecimentos podemos supor dois caminhos que levaram a
sociedade estadunidense a este posicionamento: o primeiro surge através da idéia de
que o medo, especialmente após os atentados de 11 de setembro, enraizou-se,
fazendo com que os mesmos assumissem posturas historicamente ligadas ao
conservadorismo. E não consideramos aqui, apenas, o medo restrito ao ataque físico
à nação e sim um grande ataque à cultura estadunidense.
Este ataque à cultura estadunidense surge como resultado de um conjunto amplo
de fatores que foram desenvolvidos durante as últimas décadas e que facilitaram
esta transformação. Destacamos entre esses, a desestruturação da família, o
aumento do desemprego, o aumento da violência, o aumento de sentimentos ligados
à identidade por grupos minoritários e a resposta conflituosa a este sentimento
realizada pelos grupos até então dominantes, entre tantos outros acontecimentos que
transbordam dentro da perspectiva de que o mundo como era conhecido estaria se
desmanchando.
A segunda hipótese surge do pressuposto de que a sociedade estadunidense
sempre se percebeu como conservadora. Refletir sobre esta perspectiva nos leva a
desfazer a associação que constantemente fazemos quando relacionamos
conservadorismo ao atraso. E este é um ponto bem interessante para se pensar na
questão do neoconservadorismo, pois o mesmo apesar de possuir características
conservadoras, possui também uma perspectiva muito própria da idéia de
modernização. Mas o que significa realmente possuir características conservadoras?
Normalmente a primeira imagem que nos vem à cabeça quando ouvimos a
palavra: conservador é, com certeza, a de algo rígido, que não suporta mudanças e
que quer, a todo custo, manter seus valores, ou mesmo retomar algo que foi
ultrapassado pela história. Segundo Shadia B. Drury, o conservadorismo é muito
mais do que isto:
Mas conservadorismo é muito mais do que uma disposição política,
ele contém um ideal político concreto caracterizado pela hierarquia,
harmonia, unidade, ordem, virtude, reciprocidade, valores
compartilhados e concordância mútua. (DRURY, 1999, p.138).
John Micklethwait e Adrian Wooldridge retomam a definição exposta por Burke
ao discutir as características do conservadorismo, para Burke o conservadorismo se
prende a seis princípios, sendo eles: uma profunda suspeita do poder do estado; a
preferência por liberdade do que igualdade; patriotismo, a crença em instituições e
hierarquias; ceticismo sobre a idéia de progresso, e elitismo.
Talvez, à primeira vista, este parecesse o momento preciso para que fossem
confrontadas as características do movimento neoconservador com as do
conservador, mas preferimos por hora pausar esta discussão, com o intuito de,
primeiramente, refazer parte da trajetória do movimento neoconservador nos EUA.
Consideramos que a compreensão desta história nos levará a construir as diferenças
reais com outros grupos conservadores.
Para abranger melhor esta trajetória é preciso que voltemos um pouco no tempo,
mais precisamente na formação de um grupo denominado Intelectuais de New
York, que surgiu em meados de 1930, tendo sua formação associada a um grupo de
teóricos judeu-trotskistas, que na época escreviam críticas literárias e ensaios
políticos em torno de algumas revistas como Partisan Review, Commentary e New
Leader, entre estes encontramos Sidney Hook, Lionel e Diana Trilling, Elliot
Cohen, William Philips, Dwight Macdonald e Mary McCarthy, entre outros.
Pela leitura realizada por Bloch, os mesmos se distanciam das idéias socialistas
e passam a criticar a União Soviética, partindo de um sentimento de recusa ao
governo Stalinista, passando, após este ponto, a definir sua identidade a partir de
sua diferença, posicionando-se como críticos da esquerda:
E, enquanto no seu princípio se definiam como marxistas radicais e
antiburgueses modernistas, no final dos anos trinta, descobriram os
horrores de Stalin na União soviética e no comunismo, como o
regime totalitário mais recente. (BLOCH,1997, p.51).
Assim, pela leitura deste autor, entre as décadas de 40 e 50 acontece um passo
importante no que se refere à transformação dos intelectuais de New York em
Neocons. Durante as décadas em questão o movimento se avoluma, acontecimento
marcado pela entrada de alguns intelectuais mais jovens como Daniel Bell, Nathan
Glazer, Seymor Martin Lipset, Irving Howe, Irving Kristol, Gertrude Himmelfarb,
Arthur M. Schlesinger Jr, Norman Podhoretz, Midge Decter e Jason Eptein.
Destacamos aqui, nesta lista, a presença de Irving Kristol que é considerado o
grande pai do neoconservadorismo. Kristol, assim como a grande maioria dos
membros da escola de New York, também possui sua origem associada a uma
educação socialista, ou como pode ser esclarecido nas memórias do mesmo no livro
Neoconservatism The Autobiografphy of an Idea:
Eu tive uma excelente educação no comunismo no City College
38
e
no meu jovem grupo Trotskista, e eu conheci que se você segue a
doutrina Marxista-Leninista tão seriamente quanto a liderança
Soviética fez, o amplo perfil para uma apropriada política externa
americana quase delineado por ela mesma. Ser um “linha dura” face-
a-face com a União Soviética ou outro regime Comunista significaria
que é provável que você esteja mais frequentemente mais distante do
certo que do errado. (KRISTOL, 1995, p.34).
É neste período da história, com a entrada destes novos membros, que suas
críticas ao socialismo tomaram um corpo cada vez mais radical, alcançando papel
importante durante a era McCarthy com a criação do American Commite for
Cultural Freedom (ACCF) que nascia com o papel de combater as idéias socialistas
dentro dos EUA. Para ilustrar este momento recorremos novamente a leitura de
Bloch:
Convencidos da existência de uma conspiração comunista e da
responsabilidade que implicava para os liberais a proteção da
democracia nos Estados Unidos, dirigiram seu debate para endurecer
as políticas anti-comunistas. (BLOCH, 1997, p.35).
38
City College of New York.
Se por um lado, a escola de New York defendeu a campanha anticomunista do
senador McCarthy, por outro, eles também passaram a criticar o mesmo por
considerá-lo demagógico e repleto de intenções estúpidas e ineficazes. Elucidamos
que este posicionamento dúbio sempre se manifestou na postura pública dos que
futuramente, se definiriam como neocons, existindo vários episódios em que os
mesmos apoiaram determinadas ações, para logo em seqüência se posicionarem
contra elas no decorrer dos acontecimentos. Este procedimento fez com que muitos
dos seus críticos os considerassem aproveitadores e oportunistas.
É exatamente nesta época que surge pela primeira vez o termo
neoconservadorismo, sendo associado a este grupo pelo crítico Michael Harrington.
O fato é que estes intelectuais, sob diversas denominações (liberais, conservadores),
já exerciam, durante os anos 40 e 50, uma grande influencia nos EUA por sua
participação na ACCF.
Durante o mesmo período, estes intelectuais direcionam-se ao liberalismo,
aceitando-o como opção política e buscando, dentro desta definição, enquadrar-se,
com um modelo que procurava dar ênfase ao pragmatismo em detrimento à
ideologia. Este posicionamento tem sua origem em uma busca de respostas para
uma pergunta que sempre parecia perturbá-los: o que seria realmente um bom
governo? A resposta surgia dentro da referência feita à liberdade conseguida por
estes nos Estados Unidos, já que grande parte deles tinha origem na Europa, onde
sofreram com as guerras mundiais, a ascensão do nazi-fascismo e as perseguições.
Bloch aprofunda esta discussão quando descreve a agudeza que estes intelectuais
tinham do chamado estado liberal:
O pluralismo era percebido como o fundamento do Estado benfeitor
liberal, progressivo e pragmático, junto com outro conceito: o “pós-
industrialismo”. Ele implicava numa ênfase na burocracia, na
tecnologia e no saber cientifico, principalmente na armação do que
os liberais descreviam como a “universidade liberal” estadunidense.
A tarefa que assinaram e essas noções foram o ordenamento e a
radicalização política e da sociedade em prol da ordem pragmática
no ideológico.(BLOCH,1997, p.54).
Mas este posicionamento liberal durou pouco tempo, datando seu término no
momento exato em que se iniciaram os movimentos de contracultura, durante as
décadas de 60 e 70. Estes movimentos acabaram por criar um endurecimento ainda
maior das propostas destes intelectuais, como podemos perceber ainda segundo o
texto de Bloch:
Até meados da década de sessenta o consenso que tinham os liberais
estava colapsando. O liberalismo dos intelectuais de New York e de
seus aliados foi substituído pelo que começou a reconhecer-se como
“neoconservadorismo”, a causa das drásticas mudanças sócio-
políticas que ocorreram nesta década; dado que a reação deste grupo
sobre essas mudanças intensificou seus estilos e opiniões políticas
particulares, brindando um novo caráter a sua ideologia. (BLOCH,
1997, p.55).
É exatamente nesta época que este grupo passa a aceitar a denominação de
neoconservadores, sendo que o primeiro a se identificar com a denominação foi
Irving Kristol. O principal intuito de Kristol foi à necessidade de diferenciar suas
idéias e a dos intelectuais a ele vinculados das idéias defendidas pelos
conservadores tradicionais
39
. Segundo Norman Podhoretz, no artigo
Neoconservatism: A Eulogy, Kristol define o movimento neoconservador como
“liberais assaltados pela realidade”. (PODHORETZ, 1996, p.20).
Por que os movimentos de contracultura levaram esta transformação de
intelectuais que se definiam como liberais, direcionando-os para direita e fazendo
com que os mesmos se definissem como neoconservadores?
Destacamos dois pontos que se entrelaçam e que consideramos responsáveis
pela mudança de postura.
O primeiro assume a visão de que o mundo durante a década de 60 passava por
combates definitivos contra as forças do regime soviético. Por esta leitura, a década
representava um ponto de maior contraposição entre as potências da guerra-fria.
Para os neoconservadores, as críticas realizadas pela nova esquerda estadunidense
acabavam interferindo diretamente neste embate. Lembramos, aqui, que estes
movimentos de contracultura surgem paralelamente com as manifestações que
exigiam o término da guerra do Vietnã, e que os neocons incentivaram a entrada
dos EUA na mesma.
A guerra do Vietnã apresentou-se como divisor de águas no posicionamento do
grupo. É durante a mesma que a nova esquerda entra diretamente em rota de colisão
com seu pensamento. Todavia, esclarecemos que a postura neocon foi dúbia. Ao
mesmo tempo em que apoiaram a guerra, no momento em que os EUA começaram
39
Também comumente chamados de paleoconservadores.
a ser derrotados, assumem uma critica radical à postura do governo Nixon no início
dos anos 70.
É interessante acrescentar, também, que durante a década de 60 a União
Soviética passou a ganhar a corrida espacial. Ao olharmos este ponto, nos dias de
hoje, lembramos que a União Soviética chegou ao espaço primeiramente que os
EUA. A importância deste acontecimento, nesta época, significava na visão mais
comum que o vencedor da corrida espacial ganharia também a guerra-fria. Esta
percepção colocou a sociedade estadunidense em choque e radicaliza ainda mais a
crítica dos neocons aos movimentos da contracultura. Para estes, estava na hora de
vencer a disputa contra os soviéticos investindo neste confronto, abrindo mão dos
interesses individuais.
O segundo ponto parte da interferência que estes movimentos acabaram tendo
na trajetória do liberalismo, inserindo novos hábitos dentro da sociedade
estadunidense: o sexo livre, o aumento no uso de drogas e a crescente busca pelas
religiões orientais. Estas transformações são vistas, pelos intelectuais ligados a
Kristol como motivo de desestruturação dos valores que posicionaram os EUA
como uma potência, enfraquecendo o legado dos pais fundadores.
Nesse aspecto, o movimento neoconservador, assim como os demais
conservadores, se posicionam contra o uso de drogas, contra o aborto e a
pornografia, e defendem a importância de valores religiosos.
Voltando à discussão sobre as características da nova esquerda, além de inserir
na sociedade novos hábitos, também, atacava a ordem liberal, já que apontava para
soluções que interferiam no modo de vida estadunidense, causando um descrédito
na idéia de igualdade perante a lei e obrigando o governo estadunidense a ampliar
os programas de bem estar social.
Esta transformação da sociedade estadunidense acabou afetando a idéia de
igualdade. De acordo com Messadié, intelectual Francês que em 1988 escreveu
sobre a crise do mito Americano, a igualdade é um credo fortemente enraizado
dentro desta sociedade:
Igualmente notável é o fato de que a América se pretende e se
apresenta como igualitarista, e que nela se discorra em abundância
sobre o dogma das “oportunidades iguais”, tanto nas lojas de
ferragens das Mains Streets das pequenas cidades quanto nos salões
dos privilegiados das grandes metrópoles. (MESSADIÉ, 1988, p.62).
Como podemos perceber, a idéia de igualdade era posta como definitiva, como
algo que já havia sido resolvido no Pós-Guerra-Civil. Mesmo com o
posicionamento contrário de inúmeros autores, mesmo a sociedade não sendo
realmente igualitária, a crença de que o fosse era constantemente apresentado como
realidade.
Este posicionamento interferia diretamente na maneira como o
neoconservadorismo observava a sociedade. Na visão de Kristol os confrontos
gerados durante a década de 60 eram desnecessários, especificamente porque
considerava que a sociedade dos EUA era profundamente igualitária, ou como
descreve Shadia B. Drury:
Kristol acredita que a sociedade burguesa americana é tão igualitária
do que qualquer outra sociedade poderia ser. Tanto, que há uma
direta correspondência entre a natural distribuição dos talentos
humanos na população e a Curva de Bell de distribuição de riqueza
na América. (DRURY, 1999, p.142).
É necessário deixar claro que os choques ocorridos entre os que agora se
definiam como neoconservadores e os movimentos de contracultura não foram
originados pela aversão dos mesmos ao Estado de bem estar social, uma vez que na
verdade, muitos deles, imigrantes ou filhos de imigrantes, receberam ajuda destes
programas. O que acabou chocando os neoconservadores foi o que consideravam
um abuso na politização dos movimentos da contracultura e o exagero do governo
em propor benefícios cada vez mais volumosos a estes. Segundo Max Boot:
Mas eles se dirigiram para a direita pelos excessos do final da década
de 1960 e início da década de 1970, quando o crime estava crescendo
nos Estados Unidos, a União Soviética estava ganhando terreno na
guerra-fria, e o braço dominante do partido republicano estava com
pouca vontade para endurecer com estes problemas. (BOOT, 2004,
p.46).
Sobre o mesmo processo de radicalização ocorrido nesta época Bloch descreve a
interferência destes movimentos sobre os pressupostos básicos do liberalismo:
Os movimentos radicais, que surgiram durante os anos sessenta,
sacudiram o liberalismo, posto que suas ideologias rechaçaram por
completo a maioria das convicções liberais básicas. O caminho mais
difícil que enfrentou a ortodoxia liberal foi a presença da nova
esquerda, pois atacava totalmente a ordem liberal; assim para quem
se havia convertido em neoconservadores o que a jovem esquerda
adotava crenças socialistas radicais foi algo mais amenizante; isto
cujas conseqüências não podiam ser toleradas pelos liberais e que,
pelo tanto, provocou um cisma entre eles e a nova
esquerda.(BLOCH, 1997, p.56).
O próprio Kristol posiciona a rebelião estudantil de 60 como o principal evento
ocorrido durante a década, estabelecendo a mesma como ponto central de seu
redirecionamento para valores mais conservadores, destacando em seu texto o
grande choque que esta causou sobre eles e os intelectuais que estavam a sua volta:
O principal evento deste período foi a rebelião estudantil e o
florescer da contracultura, com suas expectativas messiânicas e
pavor apocalíptico. Isto certamente nos causou surpresa, como para
todo mundo. De repente nós descobrimos que não apenas éramos
culturalmente conservadores do principio ao fim. Este choque de
reconhecimento teve profundas conseqüências. Nós éramos tipos
burgueses, todos nós, mas pelos nossos hábitos e instintos do que por
reflexão. (KRISTOL, 1995, p.31).
A seqüência a estes acontecimentos acabou generalizando uma grande discussão
entre os agora neoconservadores e os membros da nova esquerda, onde, os autores
da antiga escola de New York passaram a ser criticados por incentivarem as atitudes
intervencionistas do governo estadunidense, ou como afirma Bloch:
Os radicais, então, acusavam os intelectuais de New York de serem
os responsáveis das políticas imperialistas e de intervencionismo; e
enquanto a ACCF, que já não existia, foi duramente criticada, da
mesma maneira que as posturas macartistas de uma década antes, e
no final dos anos sessenta, supostamente a Cia havia se inserido em
algumas atividades dos liberais. (BLOCH, 1997, p.56).
É necessário neste momento abrir um novo parêntese e voltarmos nossa atenção
à figura mais importante do neoconservadorismo, Irving Kristol. Compreender a
história deste intelectual acaba facilitando muito a compreensão do movimento
neoconservador. Para isto, concentramos nosso olhar sobre a influência que recebeu
de Leo Strauss, seu principal professor.
Leo Strauss (1899-1973) foi um importante pensador conservador, judeu-
alemão, se radicou nos EUA durante a segunda guerra mundial, fugindo do regime
nazista. Lecionou ciência política na Universidade de Chicago e foi autor de quinze
livros, que em sua maioria tratavam de filosofia política.
Kristol herdou grande parte de suas idéias dos ensinamentos de Strauss
40
de
maneira que, para compreendermos o neoconservadorismo é necessário
destacarmos algumas destas idéias com o intuito de perceber como influenciaram o
pensamento neoconservador.
Strauss é mais conhecido, hoje em dia, pelos argumentos baseados na idéia de
que, na sociedade, apenas alguns “intelectuais iluminados” deveriam decidir pelo
resto da nação. Para o mesmo, a grande maioria não consegue tomar a decisão
correta, e este é um papel que cabe a uns poucos. De uma maneira geral eles
possuem como missão direcionar a população a um caminho certo. Segundo
Kenneth R. Weinstein no capítulo Philosophic Roots, the role of Leo Strauss, and
the war in Iraq
41
os neoconservadores são muito influenciados por esta idéia
defendida por Strauss:
Talvez, como Paul Wolfowitz e outros neoconservadores, ele é um
discípulo do filósofo político Leo Strauss. Strauss era um campeão
da “mentira nobre” a idéia que é praticamente um dever mentir
para as massas porque somente uma pequena elite intelectual pode
saber a verdade. (WEINSTEIN, 2004, p.203).
Realmente os neoconservadores, assim como Strauss, assumem esta postura
como verdade escondendo muitas vezes suas reais intenções, com a preocupação do
que seria melhor para o resto da população
42
.
Uma semelhança que encontramos entre Kristol e Strauss, é que os localiza em
posição diferenciada a outros conservadores, é a visão de tradição. Para os
conservadores tradicionais são necessários vários anos para se moldar o caráter de
uma sociedade, ou seja, por esta leitura, a tradição é um depósito de conhecimento
através de diferentes épocas. Na visão de Strauss, a tradição é a consciência criativa
atribuída a um “filósofo iluminado”
43
deste modo, a sociedade não evoluía a partir
de épocas e sim a partir do surgimento deste intelectual.
É importante acrescentar que os neoconservadores se consideram este tipo de
intelectual, e procuram defender que a educação deveria ser realizada através dos
grandes clássicos do ocidente, contrariamente às novas tendências na educação que
40
Drury em seu livro Leo Strauss and the American Rigth posiciona Strauss como principal ponto de
inspiração intelectual para Kristol.
41
Presente no livro Neoconservatism editado por Irwin Steltzer (STELZER, 2004).
42
Aqui retomamos a discussão do porque os Neocons aparentemente mudaram tanto de lado durante sua
história, e percebemos que estas mudanças eram apenas a utilização deste argumento Straussiano.
43
De acordo com a leitura feita por Drury.
buscam a inserção de outros tipos de referências, como o ensino bilíngüe em Inglês
e Espanhol, cursos e autores que reflitam tradições vinculadas a outras regiões além
da Europa.
Outra característica importante que Kristol herda de Strauss, e que nos ajuda a
compreender os valores defendidos pelos neocons, é a percepção da necessidade de
valores religiosos para que se governe uma nação
44
. Assim como Marx, Strauss
considera que a religião é o ópio do povo, mas diferentemente deste, o filósofo
conservador defende a importância dos valores religiosos para que a sociedade
funcione de forma ordenada. Strauss parte da idéia de que sociedades que possuem
valores religiosos acabam possuindo, também, valores morais que facilitam a
governabilidade.
Podemos, a partir de esta idéia, perceber a importância da religião destacando
que, para este pensador, a crise da modernidade se deve ao abandono dos valores
pregados pela moralidade bíblica, e é, exatamente, esta crise da modernidade que
choca os intelectuais receptores dos ensinamentos de Strauss. Bloom, aluno de
Strauss, que abordaremos na terceira parte deste trabalho, descreve exatamente esta
crise no livro O declínio da cultura Ocidental, da crise da universidade à crise da
Sociedade.
Fica claro ao analisarmos as obras de Kristol, que nela existe claramente a
influência do pensamento de Strauss, características que foram relevantes para
formação do pensamento neoconservador e para a diferenciação, do mesmo, de
outros movimentos conservadores existentes nos EUA.
Mas o que, especificamente, muda na visão dos neoconservadores para a visão
de outros conservadores? Para responder esta pergunta destacaremos dois pontos de
observação: o primeiro, um indicativo da sua posição política e ideológica, o
segundo fechado dentro da discussão sobre o sucesso e o insucesso dentro do
American Way of Life.
Com relação ao primeiro ponto, segundo a leitura realizada pelos principais
estudiosos sobre o neoconservadorismo, este movimento destaca-se com um
conservadorismo novo porque está longe da nostalgia do passado de outros
conservadorismos mais tradicionais
45
. A representação desta nostalgia pode ser
percebida no fato dos conservadores tradicionais lamentarem o fim da Idade Média,
44
De acordo com a leitura realizada por Drury, p.148
45
Edmund Burke, Joseph de Maistre e Louis Bonald.
queixando-se que o mundo perdera as características que, para estes, eram tão
importantes nos tempos da aristocracia. Em contraponto a esta visão os neocons
aceitam a sociedade burguesa como seu lugar, ou, como podemos notar pela leitura
de Drury:
Distante de olhar para trás procurando uma sociedade aristocrática, o
novo conservadorismo aceita o presente, o presente burguês, e
sempre celebra o etos burguês e a moderna burguesia econômica.
(DRURY, 1999, p.140).
A mesma Drury argumenta sobre este fascínio exercido pela sociedade burguesa
sobre os neoconservadores, especificando a importância, para estes, da liberdade
para se desenvolver dentro da mesma:
Civilização burguesa compreende o bem comum com segurança e
liberdade sobre a lei. Ela promete um crescimento constante nas
virtudes da sociedade burguesa -honestidade, sobriedade, dirigencia,
e prosperidade- são diretamente conectadas com sucesso mundial.
(DRURY, 1999, p.141).
Ao identificarem a sociedade burguesa como seu lar os neoconservadores abrem
seu leque de discussão com relação a outros grupos conservadores dentro dos EUA,
tornando suas idéias politicamente mais viáveis.
Esta discussão argumenta que os neoconservadores se diferenciam dos outros
conservadores por não se manterem presos ao passado, pode ser facilmente
questionada. Quando nos aprofundamos na leitura que fazem sobre o mundo
percebemos que um dos pontos centrais sobre a sociedade está no posicionamento
de que a modernidade se encontra em crise, o que nos leva a considerar que também
estão presos ao passado, ao mundo que existia antes da ruptura dos anos 60. Em
outras palavras se conservadores tradicionais se posicionaram como defensores da
aristocracia, os neoconservadores defendem em suas idéias a retomada de valores
anteriores à revolução de 1960, ou seja, o fortalecimento da família, a retomada de
valores meritocráticos, entre outros.
Outra argumentação comumente utilizada para distingui-los dos conservadores
tradicionais aparece na diversidade de áreas de conhecimento que abarcam, já que
possuem um domínio sobre economia que a grande maioria dos conservadores
tradicionais não possuem. Kristol destaca este conhecimento como um avanço
substancial do neoconservadorismo:
Neoconservadorismo, por esta parte, estava guarnecendo o
conservadorismo tradicional com uma dimensão intelectual que ia
mais longe às reflexões sobre economia nas raízes da cultural e
social estabilidade. (KRISTOL, 1995, p.37).
De uma maneira mais clara podemos posicionar o movimento neoconservador
com um grupo de intelectuais que associou liberalismo econômico a um forte
conservadorismo social. Ao realizarem este processo os mesmos acabaram
buscando em características culturais explicações que demonstrassem os motivos da
presença de desigualdade na sociedade.
Partindo desta visão, podemos perceber que o movimento neoconservador
possui outra característica que o diferencia dos outros grupos conservadores, ou
seja, a formação intelectual. Quando iniciamos este trabalho, procuramos
compreender as raízes da sociedade estadunidense, observando inúmeros escritos
que descrevem sua formação, enunciando a substituição da filosofia por idéias mais
práticas. Constantemente percebemos, nestas análises, que o estudo aprofundado
das ciências humanas sempre foi deixado de lado, tanto que, durante os dois
primeiros séculos da história estadunidense raramente podemos citar grandes
intelectuais ali nascidos.
Quando ouvimos críticas ao movimento neoconservador, por suas idéias,
constantemente, são acusados de não intelectuais por seus críticos. Percebemos que
esta crítica é realizada de maneira errônea, pois, diferentemente da grande maioria
dos grupos conservadores presentes nos EUA, eles possuem um grande
conhecimento de ciências humanas
46
. Como mostraremos no próximo capítulo, este
domínio pode ser facilmente percebido n a leitura de suas obras, e esta é, sem
duvida, uma diferença crucial entre os neocons e os conservadores estadunidenses
tradicionais.
Podemos, a partir deste ponto, acrescentar a segunda leitura, a que nos
propusemos, com o intuito de diferenciar o neoconservadorismo dos outros
46
O que discutimos aqui não são propriamente as idéias dos neocons, e sim a rica formação intelectual
que os mesmos possuem, dominando grande parte dos clássicos das ciências humanas do mundo.
movimentos conservadores, e para isso precisamos retomar algumas características
presentes na sociedade estadunidense.
Para compreender estas características nos prendemos à leitura feita por
Messadié sobre a importância do filósofo Emerson para o atual modo de vida
estadunidense. Para o autor francês, Emerson é o “patriarca da cultura Americana”,
como podemos perceber pela sua explicação:
Qual a convicção principal de Emerson? É a de que o homem está
só, e deve ficar só. No Address, ele reivindica também a
independência absoluta do indivíduo, nos seguintes termos: “Eu lhes
aconselho mais do que tudo seguir sós o seu caminho, rejeitar os
bons modelos, mesmo aqueles que, na imaginação dos homens, são
sagrados, e ousar amar a Deus sem véu nem mediador.(MESSADIÉ,
1988, p.32).
Na convicção de Emerson existe um caráter fortemente individualista, uma
busca pela solidão e pela liberdade. A necessidade de buscar o caráter individualista
faz com que parte da população estadunidense, negue os programas de ação
afirmativa e qualquer outra ajuda do Estado. Ainda pela leitura de Messadié:
O apelo à solidão de Emerson vem sendo repetido em coro e em
cânticos há cerca de um século e meio, o que constitui um espetáculo
patético e quase humorístico. Por tê-lo formulado, Emerson reforçou
de modo singular a aspiração americana à liberdade total de ação:
para o americano de então, assim como para seus descendentes de
hoje, o homem está só diante de Deus e, no fundo, só tem a
obrigação de prestar contas de seus atos a Ele. (MESSADIÉ, 1988,
p.33).
Ao explicar a celebração realizada pelo movimento neoconservador ao etos
burguês Shadia B. Drury acrescenta um pouco mais sobre a posição dos neocons
sobre a idéia de igualdade:
Pessoas precisam de uma justificação metafísica das desigualdades
econômicas, e não ficam satisfeitas com uma eventual arbitrariedade
de julgamento que esta é baseada na sorte e não no mérito. (DRURY,
1999, p. 141).
Neste ponto podemos aprofundar mais uma grande diferença entre
neoconservadores e conservadores e, para isto, nos apoiaremos em uma descrição
de Messadié sobre a visão dos conservadores tradicionais:
Todos os homens são iguais e não há razão para perturbar a ordem
desejada por Deus promovendo a intervenção da Previdência Social.
Era em nome do respeito à vontade divina que os conservadores
detalhe muitas vezes esquecido- recusavam inicialmente tanto a
anestesia para os partos difíceis quanto o ar condicionado, porque a
primeira pretendia refutar o preceito bíblico “Darás à luz com dor e
sofrimento!” e , o outro, a ordem divina das estações. Quanto a
proteger o indivíduo contra a demissão, ainda que injustificada, a
pobreza, a fome ou a doença, nem pensar! Só se dá aos pobres
porque se tem liberdade de faze-lo mais um traço rousseauísta da
idéia de liberdade- , e não por obrigação imposta pelo Estado. A
própria idéia de uma intervenção do Estado na ordem social é
profundamente antagônica ao que os republicanos de hoje, assim
como os conservadores de ontem, chamam de democracia.
(MESSADIÉ, 1988, p.36).
Podemos então compreender da seguinte maneira as diferenças entre os
neoconservadores e conservadores. Enquanto os conservadores procuraram
defender que a igualdade é algo natural e criado por Deus, de maneira que o Estado
não possui direito a interferir nesta lei divina, os neoconservadores partem de uma
idéia de não oposição ao Estado de bem-estar-social, desde que este seja pautado
em valores realmente justos. Mas no que exatamente se baseia a justiça deste
sistema para os neocons?
Como já descrevemos ao longo deste capítulo, muitos dos autores ligados a
Kristol foram beneficiados pelas políticas de New Deal de Franklin Roosevelt, a
grande diferença é que estes aproveitaram essa oportunidade para melhorar sua
situação dentro da sociedade. Por este motivo, os neocons se posicionam contrários
à maneira como os programas de assistências são desenvolvidos nos dias de hoje.
Em sua literatura, constantemente, percebemos críticas às famílias que vivem
exclusivamente destes auxílios, considerando que se criou um sistema em que é
mais fácil receber auxílio por ser mãe solteira do que procurar um emprego.
Albert Hirschman, em seu livro Retóricas da Intransigência, procura mapear as
principais argumentações conservadoras. Para ele, existem três principais grandes
linhas de argumentações reacionárias dentro da crítica aos resultados da Revolução
Francesa, do Sufrágio Universal, e do Estado de Bem-Estar-Social: a tese da
perversidade, a da futilidade e a de risco. Dada nossa preocupação de realizar uma
comparação entre os neoconservadores e os conservadores tradicionais, nos
prenderemos apenas nas retóricas relacionadas aos programas de bem-estar-social,
fazendo uma rápida discussão de como se manifestam estas três retóricas
conservadoras e se as percebemos dentro do discurso neoconservador.
Primeiramente trataremos aqui sobre a tese da perversidade, a mesma está
intimamente relacionada ao dogma liberal do papel do mercado como regulador. De
uma maneira geral, a principal linha deste argumento se concentra em que toda
mudança ocorrida no sentido de romper com a ordem política e social acaba apenas
agravando os fatores que tenta solucionar. Como exemplo, Hirschman descreve a
formulação de Charles Murray:
A formulação de Charles Murray do efeito perverso da política de
bem-estar-social voltou ao raciocínio vulgar dos defensores da
reforma das Leis dos Pobres na Inglaterra dos princípios do século
XIX Inspirado como eles nas mais sensíveis obviedades econômicas,
argumentava que a assistência pública aos pobres, tal como se da nos
Estados Unidos, atua como incentivo irreversível para os que
trabalham efetiva e potencialmente com baixos salários (seus
famosos “Harold” y “Phyllis”), fazendo-os avançar sobre as listas de
assistência e não se mover de lá.(HIRSCHMAN, 1991, p.45).
O argumento proposto por Charles Murray, que discutiremos mais
detalhadamente quando passarmos a analisar sua obra, surge da idéia de que os
programas assistenciais ao invés de acabarem com a pobreza, na verdade
aumentam-na, portanto, não adiantaria criar programas assistenciais para acabar
com a pobreza.
Como podemos perceber, esta linha de argumentação não se diferencia em nada,
quando comparamos seus resultados finais, com aquilo que é proposto por
conservadores tradicionais, o que ocorre é apenas uma mudança na retórica
utilizada.
A segunda tese que Hirschman descreve, que denomina tese da futilidade,
concentra-se na idéia de que qualquer tentativa de transformar a sociedade acabará
ou não conseguindo transformá-la na realidade, ou mesmo que consiga, não atingirá
quem realmente necessite desta mudança
47
.
47
Hirschman classifica como autores que se utilizam desta linha de argumentação: George Stigler, Martin
Feldstein e Gordon Tullock.
Por último destacamos a tese de Risco que afirma que as mudanças propostas
acabam implicando custos ou conseqüências inaceitáveis, ou seja, que o Estado de
Bem-Estar-Social coloca em risco as liberdades individuais e a democracia
48
.
Quando observamos estas três teses, percebemos facilmente que as mesmas são
constantemente utilizadas pelos neoconservadores no intuito de contestar os
programas assistenciais, isto será verificado no terceiro capítulo, em que a análise
de obras específicas de autores neoconservadores terá como base de apoio as teses
de Hirschman. Assim contrapomos até que ponto os neoconservadores possuem
propostas realmente novas se relacionados aos conservadores tradicionais, ou se,
estes apenas sofisticam a discussão sem que com isto se alterem os resultados
finais, que continuam pautando-o questionamento dos sistemas de auxílio.
Outro ponto de contraste entre o neoconservadorismo e o conservadorismo, que
também destacaremos no próximo capítulo, é sua relação com o movimento
trabalhista. De acordo com Podhoretz:
O velho conservadorismo é uniformemente hostil às uniões
trabalhistas, tanto em principio quanto na prática, todavia o
neoconservadorismo permaneceu como amigo do movimento
trabalhista como eles eram durante seus dias na
esquerda.(PODHORETZ, 1996, p.21).
Podemos, a partir desta rápida definição das principais diferenças entre os
neoconservadores e conservadores procurar retomar a história do grupo, observando
um momento posterior, quando conseguiram inserir suas idéias de forma mais
direta no governo dos EUA, mais especificamente durante a presidência de Ronald
Reagan.
Procuramos deixar claro que apesar destes exercerem grande influência nesse
governo, não eram dominantes nas idéias do mesmo. Segundo Velasco
49
, a base de
apoio do governo Reagan consistia em uma união de quatro grupos, sendo eles: os
neoconservadores, os conservadores tradicionais do partido republicano, o chamado
grupo laico da nova direita
50
, e um setor de economistas representados por Arthur
Laffer e Jude Wanniski
51
.
48
Hirschman cita como autores representativos Friedrch A. Hayek e Samuel P. Huntington.
49
Entrevista realizada com Dr. Jesus Velasco pela Min. Emma Rodríguez em 22 de julho de 2004.
50
Este grupo, segundo o autor, foi muito importante por sua capacidade de mobilização política nas
urnas. Entre eles estavam Jessé Helms e varias organizações como a The Heritage Foundation fundada
em 1973, além, de outras organizações como a National Conservative Political Action Committee dirigida
Ainda segundo Velasco, estes grupos possuíam uma agenda que consistia de
três pontos: a luta militar contra o comunismo, a adoção de um tradicionalismo
social e de um liberalismo econômico denominado libertário:
Com isto queriam dizer que quanto ao comunismo havia que derrotá-
lo com as armas. No caso do tradicionalismo social, apoiava os
valores mais tradicionais, por exemplo, que as mulheres não
trabalhassem, que não existia a liberação feminina, que houvesse
reza nas escolas públicas. Evidentemente, não se aceitava a relação
homossexual, estavam contra o aborto e estavam a favor de que
todos os estadunidenses portem uma arma para se defender, etc.
Finalmente, o libertarianismo econômico, que em poucas palavras
seria deixar em total e absoluta liberdade as forças do mercado.
(VELASCO, 2004).
Também é preciso resgatar que Reagan herda, ao se eleger, um EUA inserido
em uma grande crise política, causada pela derrota na guerra do Vietnam. Se bem
que atinge o poder apoiado pelos Republicanos, na votação para o senado são os
democratas que obtém a grande maioria das cadeiras.
Para destacar as características adotadas por Reagan inspiradas em uma raiz
conservadora, recorreremos novamente à leitura de Messadié. O autor Francês
define algumas idéias importantes, que em nossa análise, podem ter sua origem
associada às idéias propostas pelos grupos que formaram a base de apoio deste
governo, sendo elas: 1) Aumento do combate ao comunismo, que nos pareceu, uma
conseqüência lógica ao aumento da influência dos neocons no poder, pois, desde a
década de 40 os mesmos posicionavam a União Soviética como o grande inimigo
da liberdade, ou segundo a denominação de Reagan, “O Império do Mal”. 2)
aumento dos gastos militares que passou de134 bilhões de dólares em 1980 para
266 bilhões em 1986, em que percebemos o resultado direto da disputa com o
governo Soviético. 3) Cortes com gastos sociais, onde, segundo Messadié:
embora o próprio governo reconheça que 33,4 milhões de
americanos vivem na pobreza (número totalmente teórico, pois
vimos aqui que na realidade se aproxima a 100 milhões), reduziu
para 19 milhões o número de beneficiários dos Food Coupons.
(MESSADIÉ, 1988, P. 59).
por Tery Dolan, um grupo chamado por ele de direita fundamentalista ligada aos evangélicos
radicalizados que pertenciam ao reverendo Jerry Falwell entre outras organizações.
51
Estes propunham a economia ligada à oferta, postulando que à medida que os EUA reduzissem
impostos haveria um maior incentivo a inversão, que refletiria repercussões positivas na economia
estadunidense.
Esclarecemos aqui que a diminuição de gastos com programas de auxílio, no
governo Reagan, não se restringiu apenas aos chamados Food Coupons, e que
Messadié acrescenta, neste mesmo livro, que os gastos foram reduzidos também em
habitação, onde os empréstimos caíram de 90000 unidades para 30000, entre outras
reduções.
Como resultados deste processo percebe-se o aumento da pauperização e da
mortalidade infantil
52
e com isto a necessidade de se reabrirem os albergues e a
volta da distribuição de sopa nas ruas, ação que havia sido, quase, extinta durante os
anos 70.
Com o fim da guerra-fria a percepção neoconservadora concentrava-se na idéia
de que ocorrera a vitória do Império do Bem, e que, o resultado lógico seria a
expansão da “hegemonia liberal”, partindo da idéia de que os neocons estariam à
frente deste processo. Todavia, o que ocorreu foi exatamente o contrário, onde, após
o final da administração Reagan sua influência no governo Estadunidense passou a
decair. Segundo Almeida:
Todavia, a influência dos neoconservadores diminuiu
consideravelmente durante a Presidência de Bush Pai. Por exemplo,
não foram capazes de impor, contra a posição dos conservadores
realistas, como Colin Powell, James Barker e Bent Scowcroft, o
derrube de Saddan Após a Guerra do Golfo de 1991. (ALMEIDA,
2004).
Esta perda de influência acaba se intensificando durante o governo Clinton. Os
neocons acabam passando pelo que Velasco chamou de “entrada no deserto”. O
declínio da influência chegou a se tornar tão presente que até Norman Podhretz, um
dos principais fundadores deste movimento junto a Kristol, passou a questionar o
futuro do movimento, considerando-o como um desaparecido e não como morto,
devido aos resultados do enfraquecimento que o mesmo passava durante os anos 90.
(PODHORETZ, 1996).
Como resistência ao processo de definhamento da sua inserção política, os
neoconservadores tiveram que se posicionar de coadjuvantes, junto aos outros
grupos da base de apoio a Reagan, no antagonismo ao Governo Clinton dos
52
Segundo Messadié: os EUA ocupavam o 18º lugar na incidência de mortalidade infantil entre os países
industrializados.
chamados Theocons
53
, cuja maior presença se dá no marco dos escândalos sexuais
envolvendo este presidente:
A campanha anti-Clinton, centralizada nos casos de sexo, era mais
dos theocons (conservadores teocráticos da direita religiosa,
liderados pelos pastores Pat Robertson (coalizão Cristã) e Jerry
Falwell(maioria Moral)), mas os neocons foram seus aliados
próximos. Até porque o filósofo inspirador do movimento, Leo
Strauss (morto em 1973), considerava a religião a “cola” para manter
a sociedade unida. (FERREIRA, 2005, p.54).
A volta por cima dos neocons tem início com a chegada ao poder de Bush filho,
em boa parte devido aos esforços de Willian Kristol (filho de Irving Kristol) e seus
constantes escritos na revista The Weekly Standard sobre a importância do
neoconservadorismo e a atualidade de suas idéias.
54
.
Segundo Ferreira, a decisão de se reiniciar a Guerra do Golfo é fortemente
influenciada pelos neoconservadores. Bush decide reiniciar a guerra que anos atrás
foi estacionada por seu pai. Os neoconservadores apóiam a guerra como uma
tentativa de redimir-se da derrota política que sofreram durante o governo de Bush
Pai, ou segundo a descrição feita por Ferreira:
Em 2003, depois da NSS, William (Bill) Kristol, editor da Weekly
Standard, porta voz do pensamento neocons, exaltou o triunfo de
Wolfowitz, a quem atribuiu o texto de 1992. declarou-o vingado pela
história e criticou o recuo de Bush I. “ depois do 11 de setembro, o
texto de Wolfowitz, feito nove anos antes, passou a ser visto como
profético”, disse Kristol. (FERREIRA, 2005, p.52).
Pela leitura que fizemos compreendemos com clareza é que, apesar dos
neoconservadores fazerem parte do governo Bush e exercerem grande influência,
representam apenas uma corrente dentro dos EUA, de maneira que, considerá-los
culpados pelas decisões dos governos aos quais estes se integraram é, um equivoco.
Os neoconservadores não são conspiradores que se utilizaram de meios
antidemocráticos para alcançar o poder, suas idéias foram expostas abertamente.
Sua ascensão ao poder é resultado do trabalho árduo de seus membros e do intenso
debate de idéias propostos pelos mesmos durante toda sua história, e por mais que
53
Grupo de conservadores ligado à religião
54
Entre os neocons presentes no primeiro mandato de Bush destacam-se: Paul Wolfowitz (sub-secretário
de defesa) Douglas Feith (também funcionário dna Defesa), Lewis Libby (Chefe de Gabinete de Dick
Cheney), Jonh Bolton (subsecretário de Estado para a segurança internacional e o controle do
armamento) Elliott Abrams (responsável pelo Oriente Médio no Conselho de Segurança Nacional), além
destes, citamos também a indicação frustrada de Linda Chavez para a pasta do trabalho.
não concordemos com as suas propostas, precisamos observá-las com a curiosidade
de compreender qual é o real papel de um grupo intelectual, ou seja, propondo
soluções e defendendo seus pontos de vista.
Podemos, a partir deste ponto, passar à análise das idéias do grupo através de
obras representativas de intelectuais neoconservadores selecionados de acordo com
o foco de nosso trabalho.
4. Autores e obras de referência do pensamento neoconservador.
Podemos, a partir deste ponto, centrar nossa análise sobre a leitura das obras dos
intelectuais neoconservadores, para realizar este trabalho, optamos pela
organização, destes autores dentro de alguns temas maiores aos quais os
associamos. Nosso objetivo ao esquematizar o trabalho desta maneira é abarcar uma
série de temas abordados pelos neoconservadores no que se refere à política interna
dos EUA.
A análise parte do que consideramos ser a principal contribuição de cada um
para a compreensão do pensamento neoconservador. Faremos, primeiramente, uma
descrição das idéias, para logo em seguida contextualizá-las dentro dos ideais gerais
do movimento neoconservador e da época.
Nos concentramos nos seguintes autores-temas: Allan Bloom e Gertrude
Himmelfarb sobre a crise da modernidade provocada pelos movimentos dos anos
60. John Fonte e Linda Chavez sobre as relações entre imigração, Assimilação
Patriótica e a inclusão das minorias. Charles Murray e a crítica ao estado do bem-
estar-social. Francis Fukuyama e o papel de valores culturais para o alcance do
progresso.
4.1 O Neoconservadorismo e a Crise da modernidade.
4.1.1 Allan Bloom: Crise da Universidade, nos relacionamentos e nas relações com
as minorias.
Allan David Bloom nasceu no dia 14 de setembro de 1930 em Indianápolis,
Indiana, e morreu de AIDS no dia 7 de outubro de 1992, quatro anos após ter
escrito sua principal obra: O Declínio da cultura Ocidental, da crise da
universidade à crise da sociedade. Bloom foi aluno de Leo Strauss e se destacou
como filósofo e pensador político. Em sua carreira acadêmica estudou e lecionou
em Paris (1953-55) e Alemanha (1957), retornando para os Estados Unidos para
ensinar na Universidade de Chicago. Após isto, foi professor nas Universidades de
Yale, Cornell, Tel Aviv e Toronto, voltando à Universidade de Chicago no final de
sua carreira.
Bloom destacou-se como professor pela sua proximidade aos alunos, e por uma
virtual indiferença com relação a alguns temas que se relacionavam aos seus
interesses particulares. O desapego do pensador com temas particulares pode ser
visto de forma clara, quando, durante os anos 60, mesmo sendo homossexual
assumido para seus amigos e alguns alunos, este não toma parte das mobilizações
pelos diretos das minorias, por considerar que estes tipos de movimentos acabavam
por se oporem às características que impulsionaram o sucesso da nação
55
.
Neste trabalho, nos propomos a analisar especificamente seu livro mais
importante, procurando aprofundar uma percepção comum presente na obra de
todos os outros neoconservadores, ou seja, a constatação de que a modernidade esta
em crise. Bloom parte, para atingir esta constatação, da análise da universidade,
vendo suas transformações durante as últimas décadas como resultado das disputas
dos anos 60.
É necessário, também, esclarecer que Bloom escreve seu livro do alto de sua
trajetória como professor, onde percebeu na própria pele as mudanças ocorridas
dentro da universidade. Demonstra este processo de maneira profundamente
55
Já que se focavam no interesse de grupos e não no bem geral da nação.
pessoal, característica que faz de seu livro, muito mais, um depoimento do que uma
análise empírica sobre as mudanças ocorridas na universidade.
Por outro lado, a posição de Bloom é tomada de maneira tão clara e apaixonada
que se transforma em importante ponto de reflexão, tanto sobre a situação das
Universidades, quanto da própria sociedade. É precisamente este ponto que revela a
grandiosidade da obra deste autor, não tanto pelo conteúdo de suas idéias,
polêmicas e bastante questionáveis, mas pela dignidade com que se propõe a
demonstrar e a defender seus pontos de vista, o que obriga críticos e defensores de
sua obra a realmente exporem seus pensamentos sem meias ponderações.
Logicamente, percebemos que quando Bloom analisa as mudanças ocorridas na
universidade e na sociedade, este acaba argumentando com um tom melancólico de
saudade do passado, como se as transformações, que para muitos segmentos da
sociedade representaram avanços, acabassem trazendo muito mais problemas
insolúveis do que vantagens satisfatórias. Isto reflete o quanto o pensamento de
Bloom se posiciona conservadoramente, sendo potencializado quando este
argumenta sobre os relacionamentos, tanto no plano das amizades, quanto os
amorosos e a constatação de sua superficialidade.
Esta volatilidade dos relacionamentos mostra-se como preocupação constante na
obra de muitos educadores e pensadores da atualidade
56
. Bloom percebe-a em seu
momento de origem, partindo de uma tentativa de esclarecer a desestruturação da
família burguesa tradicional e a fugacidade de nossa época.
Como metodologicamente optamos por separar a análise dos autores
neoconservadores, partindo de temas relacionados a nossa pesquisa, destacaremos
três pontos importantes presentes na obra de Bloom para abarcarmos o que
consideramos mais expressivo em seu pensamento: a crise do pensamento crítico na
universidade, a crise no relacionamento dos estudantes e o papel das minorias na
perda da unidade e qualidade do ensino superior. Buscando a análise destes três
temas procuraremos alcançar nosso objetivo, ou seja, encontrar a visão de crise da
modernidade presente na obra de Bloom.
Para discutir o primeiro ponto, é necessário esclarecer que, para Bloom, o
universo presente nas instituições superiores dos EUA representa, devido a grande
56
Zigmund Bauman, também escreve sobre este processo, quando define o que ele chama de
modernidade líquida.
pluralidade dos alunos, um micro-universo da nação estadunidense, ou segundo
este:
As origens dos alunos são afinal tão variadas quanto a própria
população dos Estados Unidos. Temos os ateus e os religiosos, os de
esquerda e os de direita, os que pretendem ser cientistas, humanistas,
profissionais liberais ou, então, homens de negócios. Alguns são
pobres; outros, ricos. O que os une é apenas o relativismo e a adesão
à igualdade, ambos correlacionados com uma intenção moral.
(BLOOM, 1989, p.29).
Destacamos a última frase de Bloom como um ponto de profunda relevância
para a compreensão de sua obra. Como explicamos acima o autor procura, através
da análise da Universidade, demonstrar as mudanças ocorridas na sociedade
estadunidense, e, dentro desta última frase do parágrafo citado, é possível
compreender, claramente, o que, para ele, seriam os grandes problemas da
Universidade, ou seja, o relativismo e a adesão da igualdade.
O autor argumenta que as gerações que estiveram nas universidades durante
os anos 80 não passaram por nenhuma forma de preocupação, medo ou privação.
Somado a isto, esta geração foi constantemente pressionada a não se posicionar.
Claramente, na visão de Bloom, os vestígios das disputas pelos direitos civis
criaram uma geração que se nega a expressar sua opinião. Esta não tomada de
posição cresce em meio ao medo de que, ao expressar uma opinião, ao debater uma
idéia, ou mesmo, ao defender uma posição clara, estes estudantes passem a ser
considerados preconceituosos pelo grupo a sua volta.
Segundo Saul Below, no prefácio da obra de Bloom, esta atitude acaba por
enfraquecer a sociedade, por contrariar os valores defendidos pela educação liberal.
Bloom esta lutando exatamente contra este processo, ou, como argumenta Below:
O núcleo do pensamento do professor Bloom reside em que a
universidade, numa sociedade governada pela opinião pública,
deveria ser uma ilha de liberdade intelectual, onde todos os pontos de
vista fossem analisados sem restrições. Com a sua generosidade, a
democracia liberal tornou isto possível, mas a universidade, ao
consentir em desempenhar um papel ativo, “positivo” e participativo
na sociedade, deixou-se inundar e saturar pelo reflexo do
“problemas” dessa mesma sociedade. Preocupados com questões de
saúde, sexo, raça e guerra, os acadêmicos ganham fama e fortuna,
mas a universidade se transformou no depósito conceitual de
influências muitas vezes nocivas da sociedade. Todas as propostas de
reforma da educação liberal, que poderiam levar a universidade a um
conflito com os Estados Unidos por inteiro, são inimagináveis. Cada
vez mais as pessoas que estão “dentro” da universidade se parecem
nos seus apetites e nos seus instintos, com os que estão fora.
(BELOW, 1989, p.18).
Segundo Bloom, criou-se nas Universidades um mito que, construído sobre o
medo de errar, ou, o medo de se posicionar contrariamente a uma idéia, vem
destruindo a capacidade dos alunos de pensar criticamente. Como resultado, para
que qualquer atitude ou idéia não pudessem ser vistas como totalmente erradas,
preferiu-se abdicar do pensamento crítico: “O importante não é corrigir os erros e
ter razão de verdade, mas sim não pensar, de qualquer modo, que estamos certos.”
(BLOOM, 1989, p.30).
Para Bloom, as decorrências deste processo distanciam essas instituições dos
valores que surgiram durante a época em que vigorava o espírito dos pais
fundadores, já que para ele, a sociedade estadunidense foi construída sobre uma
maioria nacional que, pensando no bem comum, defendia a idéia dos direitos
fundamentais. O que ocorre a partir da década de 60 é uma ruptura com estes ideais,
onde o bem comum acaba por desaparecer, rompendo-se, também, o equilíbrio
entre maioria e minoria que existia na constituição
57
. Bloom percebe o relativismo
cultural como uma barreira para o pensamento crítico:
Na verdade, o historicismo e o relativismo cultural são meios para
evitar que se ponham à prova os nossos próprios preconceitos e que
se indague, por exemplo, se os homens são efetivamente iguais ou se
tal opinião não passa de um preconceito democrático. (BLOOM,
1989, p.49).
Por esta definição, os preconceitos não deveriam ser vistos de uma maneira tão
negativa, já que estes representam o pensamento. Por este motivo têm papel de
grande importância no aprendizado e na construção de novas idéias:
Os preconceitos, preconceitos fortes, correspondem a visões de como
as coisas são, a vaticínios sobre a ordem do todo das coisas e,
portanto sobre o caminho para o conhecimento do todo, por meio de
opiniões errôneas a seu respeito. O erro é de fato nosso inimigo, mas
só ele aponta a verdade e por conseguinte, merece tratamento
respeitoso. A mente que não tem preconceitos, a princípio está vazia.
Só pode ter sido formada por um método que não tem consciência da
57
Este equilíbrio existente na constituição e argumentado por Bloom como existente é facilmente
questionado, por autores que discutem os verdadeiros interesses presente nesta constituição, ou como
podemos perceber no prefácio dos Artigos Federalistas.
dificuldade de reconhecer que um preconceito é um preconceito.
(BLOOM, 1989, p.53).
Na mesma página, Bloom acaba aprofundando esta idéia, pautando-se na
necessidade de se buscar a liberdade do pensamento dentro das universidades:
“Talvez a nossa primeira tarefa consista em ressuscitar esses fenômenos, para que
voltemos a ter um mundo ao qual propor as nossas questões e sejamos capazes de
filosofar. Este me parece ser o nosso desafio educacional”. (BLOOM, 1989, p.53).
Para Bloom, a grande mudança que transformou a educação e a sociedade,
ocorreu durante a década de 60, gerando com ela a queda na qualidade e o aumento
de concessões para as minorias:
Em começos da década de 60, eu estava convencido de que se
tornava imprescindível uma educação liberal que desse aos jovens os
meios para analisar sua vida e seu potencial. Era aquilo que as
universidades não tinham condição e nem vontade de oferecer. A
irrequieta e volúvel energia dos estudantes acabou por encontrar
extravasão política. Em meados da década de 60, as universidades já
lhes ofereciam todas as concessões, menos educação, mas a
conciliação fracassou e todo esforço, visando a qualidade do ensino
desapareceu, sem deixar traços. As várias libertações dissiparam
aquela energia e aquela tensão maravilhosa, deixando exausto e
morno o ânimo dos estudantes, capazes de calcular, mas não de um
vislumbre apaixonado. (BLOOM, 1989, p.62).
O principal problema apontado por Bloom, neste processo, concentra-se na
maneira como os jovens chegam à faculdade, ou seja, como estes jovens, através de
um novo processo de constituição moral, desenvolvem seus relacionamentos nos
tempos atuais. Para explicar este processo devemos abrir espaço para o segundo
ponto que consideramos importante na obra de Bloom, e para isto, é necessário
iniciar esta discussão partindo da percepção de que, para o autor, a sociedade
estadunidense passa por uma crise sem precedentes, onde, os valores familiares,
religiosos, patrióticos e de classe foram abandonados:
A pátria pouco lhe pede e muito lhe dá, a religião é tema de libérrima
opção e o mesmo acontece com os envolvimentos sexuais e isso é
que representa novidade. Agora ele pode escolher, mas descobre que
já não tem motivos suficientes para optar não por um vínculo, mas
por um capricho. A reconstrução tornou-se impossível. (BLOOM,
1989, p.138).
Para Bloom, este movimento ocorre devido a uma conjuntura de fenômenos que
receberam influência direta do momento que os EUA passaram durante as últimas
décadas. Se as décadas de 60 e 70 foram décadas de extravagâncias, exageros e
transgressões de limites, as décadas seguintes podem ser demarcadas como seu
fruto direto, ou seja, décadas em que as instituições perdem o controle sobre a
juventude:
Eles não tiveram de enfrentar guerras, tirania ou necessidades e, por
isso não endureceram. As feridas e as rivalidades causadas pelas
diferenças de classe sumiram com o desaparecimento de um sentido
nítido de classe (que já existiu outrora em universidades dos Estados
Unidos e ainda existe, de forma venenosa, na Inglaterra). Os
estudantes estão praticamente livres de coerção e as respectivas
famílias sacrificam-se por eles sem reclamar muito em termos de
obediência ou respeito. A religião e a origem quase não exercem
efeito visível na vida social deles ou na expectativa de carreira.
Embora poucos acreditem no sistema não os devora o sentimento de
estarem sendo vitimas de uma injustiça. As drogas e o sexo, antes
proibidos, estão disponíveis em quantidade suficiente. (BLOOM,
1989, p.104).
Acaba ficando claro, nesta citação, que para Bloom, a grande crise da
modernidade se pauta pelo desinteresse e pelo descompromisso dos jovens. Os
jovens não possuem interesse pela política
58
, mais do que isto, as gerações dos anos
80 e 90 não possuem obrigações com a família, com os valores religiosos, os jovens
são totalmente livres para cuidar de sua vida da maneira que considerarem melhor.
Fora isto, estes ainda encontram a segurança de que se no futuro realizarem
escolhas erradas, não precisarão se preocupar com o envelhecimento dos pais, que
estarão assegurados pelas inúmeras previdências e fundos de aposentadoria
existentes no país:
A previdência social, os fundos de aposentadoria e o seguro-saúde
dos velhos libertam os filhos da obrigação de os ajudar
financeiramente quanto mais da de acolhê-los em suas casas. Quando
o filho vai para a universidade, põe fim à sua conexão vital com a
família, ainda que ele não se aperceba disso na hora. (BLOOM,
1989, p.109-110).
58
É interessante pensar que a geração que se formou nos anos 80 e 90, nasce desinteressada logo em
seguida a uma geração de maior politização da história dos EUA.
O desapego aos valores familiares acaba distorcendo a maneira como este jovem
planeja seu futuro, criando uma desambição em seus objetivos de construção
familiar. Processo que parece claro para Bloom quando este passa a discorrer sobre
os relacionamentos entre os estudantes, demonstrando, que estes relacionamentos
são profundamente superficiais, onde, a troca de parceiros é constante entre o
mesmo grupo de amigos.
Se entre os objetivos dos jovens das décadas anteriores a possibilidade de se
formar uma família aparecia como ponto fundamental, nas gerações atuais, estas
são suprimidas de suas predisposições. A crença de que estes jovens um dia venham
a se casar e constituir uma família duradoura é constantemente desmentida pelos
grandes índices estatísticos de separações, que são vivenciadas e incorporadas pelos
mesmos. Este doloroso processo acaba generalizando, para a juventude, a
expectativa de que o divórcio é algo tecnicamente inevitável dentro de um
relacionamento.
Mesmo existindo uma forte pressão, e, até mesmo, um esforço, na tentativa de se
manter a continuidade dos relacionamentos, Bloom argumenta que os mesmos
acabam sendo destroçados por um sentimento de individualidade e pela luta pelos
interesses próprios:
Nos Estados Unidos, o divórcio constitui a indicação mais palpável
de que as pessoas não existem para viver juntas e que, embora
queiram e precisem criar uma vontade geral a partir das vontades
particulares, estas não fazem se não reimpor-se. Sente-se um esforço,
cada vez mais desesperado, no sentido de juntar de novo os cacos.
Mas é como procurar a quadratura do círculo, pois todos se amam
em primeiro lugar e querem que os outros os amem mais do que a si
mesmos. (BLOOM, 1989, p.149).
Deste modo, Bloom argumenta que a geração atual encontrasse inserida dentro
de inúmeras formas de pressão quando procura seus relacionamentos, onde, de um
lado, existe a possibilidade de buscarem a construção de uma família tradicional, e
de outro, as novas possibilidades abertas durante as últimas décadas que envolvem
crescimento profissional, liberdade sexual e, principalmente, um forte
individualismo.
Claramente, Bloom se posiciona contra a liberação sexual. Para o mesmo, os
métodos anticoncepcionais e a liberação das mulheres acabaram por banalizar a
vida sexual. A liberação sexual dos anos 60 ocupa um papel muito peculiar, já que
resultou em danos muito mais graves para as mulheres, que foram sujeitadas a uma
posição de igualdade enganosa, pois acabaram por acumular funções que
antigamente se encontravam restritas aos homens:
Os tempos modernos prometiam igualdade para todos os seres
humanos, e as mulheres levaram a promessa a sério, revelando-se
contra a velha ordem. Com o sucesso delas, os homens também se
libertaram das velhas repressões e as mulheres, liberadas e
seguindo carreiras iguais, ainda sentem vontade de ter filhos, ainda
que não lhes assista base para reclamar que os homens partilhem
dessa vontade e assumam a responsabilidade pelas crianças. A
natureza, como vemos, pesa mais para elas. Na velha ordem,
estavam subordinadas ao homem e dependiam dele, na ordem atual
estão isoladas, sentindo a falta do homem, mas não podem contar
com sua ajuda e se sentem embaraçadas no livre desenvolvimento de
sua personalidade. A promessa dos tempos modernos não se realizou
para elas. (BLOOM, 1989, p.144).
Outro ponto de grande importância, para nossa pesquisa, presente na obra de
Bloom, se centra na maneira como o autor observa as minorias. Como podemos
perceber, Bloom afirma que os jovens, em sua maioria, são pressionados a negar
qualquer forma de preconceito, fazendo isto, acabam por negar-se a perceber
qualquer diferença entre os seus colegas de faculdade. Bloom defende que os
jovens, na verdade, não percebem a diferença, simplesmente porque para estes, o
credo da igualdade é tão forte que os faz realmente considerar que todos são iguais
e possuem os mesmos direitos:
Seja qual for a sua filiação política, acreditam que todos os homens
e mulheres nascem iguais e têm iguais direitos. Não é tanto uma
crença, mas um instinto, bem arraigado. Ao conhecerem alguém, o
sexo, a cor, a religião, a família, o dinheiro, a nacionalidade não
desempenham nenhum papel em suas reações. Desapareceu a própria
noção de que tais considerações já significaram alguma coisa; isso
agora pertence a mitologia. Talvez essa questão se afigure
surpreendentemente, na medida do interesse que despertam as raízes,
as origens étnicas e o sagrado que antigamente dividiam os
homens, mas justamente por tudo isso haver deixado de ser real é
despertar fascínio. (BLOOM, 1989, p.112).
Para Bloom, existe uma grande ruptura na Universidade, processo ocorrido
devido à abertura realizada pelas universidades para as minorias. Bloom acusa que a
mudança nos critérios de seleção, substituindo a preferência pelos filhos de ex-
alunos por uma seleção através do histórico escolar e pelas provas, acabou por
desvalorizar os grupos que preservavam as classes sociais, substituindo-os por
outros que as destroem
59
.
Este processo, criado com o intuito de quebrar as barreiras raciais, forçou ainda
mais a separação, reforçada principalmente pelos grupos minoritários. O autor
argumenta que os estudantes brancos acabam sentindo-se profundamente
constrangidos por esta separação, já que os mesmos estão profundamente inseridos
dentro da idéia que prega a meritocracia e a igualdade de direitos:
Todos os estudantes são meritocrátas igualitários, crentes em que se
deve permitir ao indivíduo desenvolver suas qualidades especiais
qualidades sem referência a raça, sexo, religião, família, riqueza e
origem nacional. É a única forma de justiça que conhecem, não
sendo capazes de imaginar que haja algum argumento digno de
menção a favor da aristocracia ou da monarquia: são loucuras
inexplicáveis do passado. (BLOOM, 1989, p.114).
Ocorre, na leitura deste autor, uma distinção explícita no comportamento dos
estudantes. Enquanto os brancos não percebem as diferenças, os membros de
grupos minoritários, principalmente, os negros, fazem esforços para se isolar cada
vez mais, reafirmando, desta maneira, sua identidade. Bloom segue em seu
argumento, afirmando que o grande ponto de ruptura da universidade estadunidense
se concentra na relação entre negros e brancos, onde os mesmos não conseguem
manter o laço de amizade e fraternidade que ocorre entre os outros grupos:
Os brancos agem como se as relações com os negros fossem tão
espontâneas e desinibidas como os demais, inclusive os orientais.
Mas, embora os versos estejam certos, a música esta fora de tom.
Reina aqui uma atmosfera bem pensante, de princípio e de projeto
mais de esforço do que de instinto. O caráter automático da
camaradagem estudantil está ausente, parando ai aquela verdadeira
intimidade sem fronteiras. A fraternidade programática dos anos 60
não culminou em integração, antes, se desviou para a separação dos
negros. Os estudantes brancos sofrem com o problema e não gostam
de falar nele. Não é como se presumia que as coisas fossem. Não
combina com a opinião corrente entre eles, segundo a qual todos os
seres humanos são fundamentalmente iguais, e a amizade é outro
aspecto da igualdade de oportunidades. Fingem não reparar nas
mesas separadas dos refeitórios, onde nenhum estudante branco se
sentiria à vontade. Está ai apenas um dos aspectos mais visíveis da
segregação reinante na vida diária das Universidades - na qual se
inclui a separação de moradias e de áreas de estudo, digna de nota
59
Como os negros, os homossexuais entre outros.
principalmente pela escassez de negros em ciência teóricas e
humanas. (BLOOM, 1989, p.116).
É necessário, a partir deste momento, contextualizar a leitura que Bloom faz das
minorias, e a relação existente entre os grupos dentro das universidades.
Claramente, Bloom esta saindo em defesa do chamado Multiculturalismo
conservador, ou seja, do conceito de multiculturalismo arraigado dentro da nação
estadunidense, e que resistiu até as disputas pelos direitos civis dos anos 60. Nesta
leitura, a proposta multicultural tende a igualar todos os grupos no mesmo patamar,
para esta, todos são iguais, ou, em outro sentido, todos deveriam inserir-se dentro
do modo de vida do grupo majoritário.
Os movimentos dos anos 60 levam exatamente a um caminho contrário a esta
idéia, durante estes, as diferenças passam a não ser consideradas como um defeito.
Os grupos se organizam com o intuito de valorizar suas diferenças, querendo ter
direitos iguais, mas, principalmente, querendo ter suas diferenças valorizadas como
qualidades.
O que choca Bloom é exatamente este processo. Ele viveu o tempo em que a
grande maioria na universidade era profundamente igual, vinha do mesmo grupo,
possuía objetivos semelhantes e não encontrava nenhuma barreira que impedisse
demonstrar estes laços de fraternidade que o autor tanto sente falta.
Além disto, Bloom é um defensor de que o ensino deveria ser mantido
dentro de um enfoque que privilegiasse as grandes obras dos pensadores ocidentais,
o que o posiciona contrariamente as transformações curriculares ocorridas na
universidade como o ensino bilíngüe e a inserção de disciplinas relacionadas à
história, literatura e modo de vida das minorias. Para Bloom, esta mudança na
prioridade do ensino faz com que os jovens não adquiram o conhecimento
necessário para se tornarem grandes cidadãos.
Podemos, a partir deste ponto, concluir a análise sobre a obra de Bloom, para
abordarmos a perspectiva de Gertrude Himmelfarb, procurando aprofundar a visão
de crise da modernidade presente na obra neoconservadora.
4.1.2. Gertrude Himmelfarb. Uma nação e duas culturas.
Gertrude Himmelfarb nasceu em uma família judia, no Brooklyn, Nova York,
no dia 8 de agosto de 1922. Himmelfarb é um dos primeiros membros do
movimento neoconservador, junto com Irving Kristol, com o qual é casada desde
1942.
Estudou na New Utrecht High School, no Brooklyn College, no seminário
Judeu de Teologia e na faculdade de Girton, Cambridge. Recebeu seu doutorado
pela Universidade de Chicago em 1950. Atualmente a autora é graduada como
professora emérita da Universidade de New York.
Publicou os livros Lord Acton: A Study of Conscience and Politics (1952),
Darwin and the Darwinian Revolution (1959), Victorian Minds (1968), On Liberty
and Liberalism: The Case of John Stuart Mill (1974), The Idea of Poverty:
England in the Early Industrial Age (1984), Marriage and Morals Among the
Victorians (1986), The New History and the Old (1987), Poverty and Compassion:
The Moral Imagination of the Late Victorians (1991), On Looking into the Abyss:
Untimely Thoughts on Culture and Society (1994), The De-Moralization of Society:
From Victorian Virtues to Modern Values (1995), One Nation, Two Cultures: A
Searching Examination of American Society in the Aftermath of Our Cultural
Revolution (2001), The Roads to Modernity: The British, French, and American
Enlightenments (2004), The Moral Imagination: From Edmund Burke to Lionel
Trilling (2006).
Nossa análise sobre a obra de Himmelfarb desenvolvera-se-a a partir da leitura
de One nation, Two Cultures: A Seaching of American Society in the Aftermath of
Our Cultural Revolution, tendo como objetivo aprofundar a visão de crise da
modernidade presente na obra neoconservadora. A escolha se justifica devido a sua
importância dentro do conservadorismo, reforçada por Charles Murray, no artigo
intitulado Virtue In A Free Society, de 2000 que considera One Nation, Two
Cultures “a mais erudita declaração da posição social conservadora”. (MURRAY,
2000).
Nosso foco se centrará nas discussões estabelecidas por Himmelfarb em
tópicos relacionados aos valores familiares e aos resultados da contracultura da
década de 60. Todavia, para que possamos compreender a maneira como esta
trabalha a relação destes acontecimentos com o tema de seu livro, consideramos
necessário, primeiramente, contextualizar quais os objetivos da autora ao escrever
seu livro.
Para compreendermos esta relação, é preciso esclarecer que Himmelfarb parte
de uma perspectiva que analisa as transformações ocorridas na sociedade
estadunidense, chegando à conclusão da existência de duas culturas distintas dentro
desta sociedade, uma cultura da elite e uma cultura das pessoas comuns. Estas duas
culturas acabam sendo influenciadas por patamares de moralidades diferentes
60
, e,
por isto, a autora procura observar qual é o ponto de origem destes dois padrões de
moralidade.
Pela leitura de Himmelfarb, a cultura das pessoas comuns desenvolveu-se
atrelada aos valores da revolução dos anos 60, encontrando como resultado os
divórcios, o aumento no índice de drogas e o alcoolismo. Himmelfarb percebe
também uma segunda cultura que se encontra nos valores associados às virtudes
republicanas que dominaram a nação até os anos 50, que se prendiam aos valores
religiosos e familiares.
Para visualizar esta separação entre as culturas, Himmelfarb procura discutir
em seu livro quatro instituições vitais para a manutenção de uma sociedade livre,
sendo elas: a sociedade civil, a família, o sistema legal/político e a religião. Como
conclusão a esta discussão, a autora, atinge a constatação de que o declínio moral da
sociedade estadunidense acabou se mostrando como uma transformação
progressiva, começando bem antes dos anos 90 com os escândalos de Clinton, ou
dos 60 com a contracultura, ou mesmo, nos anos 30 com o New Deal. Segundo ela,
desde o período da guerra civil iniciou-se um processo de destruição da unidade e
da moralidade da nação, este processo, que foi aprofundado com o aumento da
imigração e a expansão das fronteiras, teve como resultado o enfraquecimento da
cultura propostas pelos colonos fundadores.
Para uma maior compreensão de sua obra, focaremos nosso trabalho nos anos
60, em que a autora argumenta que o processo de declínio moral se acelerou. De
60
Himmelfarb segue a idéia de duas culturas proposta por Adan Smith.
acordo com Himmelfarb, foi exatamente neste período que a sociedade passou pela
maior transformação, iniciando-se uma ruptura que criou a separação entre os dois
padrões de moralidade: “A sociedade torna-se mais aberta e a economia mais
influente, moralidade e cultura são liberalizadas e democratizadas.
(HIMMELFARB, 2001, p.15).
A questão a ser aprofundada aqui é o porquê, na visão da autora, os movimentos
dos anos 60 foram responsáveis por esta transformação na moralidade da nação:
A contracultura é um embrionário cultural base de novas políticas de
esquerda, o esforço para descobrir novos tipos de comunidades,
novos padrões familiares, novos modos sexuais, novos tipos de
meios de vida, novas formas estéticas, novas identidades pessoais em
um lado distante dos poderes políticos, a casa da burguesia, e da
ética de trabalho protestante. (HIMMELFARB, 2001, p.16).
Para Himmelfarb os avanços desenvolvidos pela revolução dos anos 60
acabaram sendo acompanhados de inúmeras novas criações, que se posicionaram
como responsáveis por grande parte dos problemas encontrados no mundo de hoje.
A autora descreve em seu livro uma grande variedade de campos e de avanços e os
possíveis resultados da combinação destes em nossa época:
De fato, a contracultura progrediu mais rapidamente e muito mais do
que seus mais entusiastas partidários previam, para ele não ser nada
menos do que uma revolução cultural. E sua revolução (inspirada
pelos movimentos por direitos civis); uma revolução sexual
(habilitada pela pílula-anticoncepcional e feminismo); uma
revolução tecnológica (a qual a televisão foi notável pelo produto);
uma revolução demográfica (produzindo uma geração de “baby-
boomers”
61
e uma poderosa cultura contemporânea); uma revolução
política (precipitada pela guerra do Vietnam); uma revolução
econômica (pautada na grande sociedade e na expansão do estado de
bem-estar-social); e o que pode ser chamada de uma revolução
psicológica (a “cultura do narcisismo” como Christopher Lasch
denominou) Cada momento separado ou acompanhado, acabou
aumentando o desafeto com as instituições e autoridades, e uma
rejeição das idéias de modos convencionais e comportamento.
(HIMMELFARB, 2001, p.17).
Destacamos o último parágrafo presente da citação anterior: “Cada momento
separado ou acompanhado, acabou aumentando o desafeto com as instituições e
61
A expressão baby bommers é comumente utilizada em referencia a grande quantidade de crianças que
nascem em famílias desestruturadas.
autoridades, e uma rejeição das idéias de modos convencionais de comportamento”.
A leitura neoconservadora parte da idéia de que a sociedade precisa viver abaixo de
uma autoridade.
Retomando os capítulos anteriores e a discussão realizada pelos neoconservadores
sobre a necessidade de intelectuais iluminados que direcionem a população a um
objetivo, ou mesmo a leitura que Leo Strauss faz da necessidade da religião para
garantir que os homens sejam governados de maneira segura, perceberemos que a
ruptura ocorrida nos anos 60 e o declínio das instituições representam para os
neoconservadores uma possibilidade insustentável, mostrando-se como principal
responsável pela atual crise da modernidade.
Outro ponto que deve ser destacado sobre a obra de Himmelfarb concentra-se em
perceber que assim como Bloom, ela argumenta que os resultados dos anos 60
foram densamente mais cruéis quando se analisa a situação das mulheres. Em sua
leitura, as mulheres acabaram atingindo um patamar que lhes dá uma maior
sensação de liberdade, todavia, o ganho de liberdade foi alcançado através de uma
perda significativa de segurança. Esta troca acabou levando as mulheres a uma
posição de fragilidade, tendo que substituir, em muitos casos, o lugar de chefe de
família com os homens. Em outras palavras, as liberdades alcançadas pelas
mulheres foram muito mais úteis aos homens, que perderam as obrigações de
manutenção financeira da família, do que para as próprias mulheres. Argumentando
sobre o tema, a autora afirma que:
Algumas mulheres fundamentam que elas foram libertadas da casa
em mais do que um sentido. O crescimento no índice de empregos
para mulheres paralelamente ao crescimento dos divórcios e do
índice de mães solteiras. Várias mulheres têm dado entrada no
mercado de trabalho, perdendo seu lugar seguro na casa marital. E
transformando-se em “empregadas gananciosas” (como os
economistas compreendem o termo, elas foram frequentemente
redirecionada para condições de pobreza que acompanha divórcio e
criação dos filhos sozinhas. (HIMMELFARB, 2001, p.17).
Este, entre outros fatores, faz com que Himmelfarb conclua que a situação da
sociedade tornou-se profundamente grave, o que forçou a própria sociedade a tomar
as rédeas em uma tentativa de refrear as transformações. Por este motivo, existiu
uma virtual mudança, em alguns hábitos sociais, principalmente, após os anos 90,
em que aumenta consideravelmente a prosperidade nacional, levando a uma maior
moralização da sociedade
62
.
Gerações depois tinham menos interesses com o incidente do
adoecimento do governo republicano
63
do que com o incidente da
sociedade democrática pobreza, racismo, desemprego,
desigualdade. Mais recentemente nós temos confrontado com outras
espécies de doenças morais e culturais: o colapso dos princípios
étnicos e hábitos, a perda de respeito pelas autoridades e instituições,
a destruição da família, o declínio da civilidade, a vulgarização da
alta cultura e a degradação da cultura popular. De eleição em eleição,
sempre que o auge da prosperidade econômica, uma grande maioria
de pessoas americanas (cerca de dois terços para três quartos)
identificam “a queda da moral” ou “declínio Moral” como um dos
maiores problemas, muitas vezes, o maior problema, confrontado
pelo país. (HIMMELFARB, 2001, p.20).
O grande problema desse processo se centra na constatação de que muitas das
mudanças ocorridas acabaram virtualmente aparecendo apenas como resultados
numéricos de estatísticas, que apenas representam um pequeno retrocesso em
índices que se encontravam por demais elevados por causa da revolução cultural
dos anos 60.
Para demonstrarmos como a autora trabalha com os dados destes avanços,
procuraremos primeiramente descrever as principais mudanças ocorridas a partir
dos anos 90, que foram tomadas como vitórias políticas para, em um segundo
momento, nos prendermos na crítica realizada pela a autora sobre os mesmos
acontecimentos. Partindo dos dados sobre criminalidade:
Algumas destas estatísticas têm melhorado nos últimos anos últimos
poucos anos e existem sinais otimistas para o futuro. O declínio mais
dramático foi no crime. De 1990 a 1997 crimes sérios (roubos
latrocínios, roubos de automóveis) caíram de 9.4 por 100,000 para
6.8, o homicídio de negros por adolescentes jovens (quatorze a
dezessete anos) de 30.2 por 100,000 (em 1993) para 16.5 (em 1997).
(HIMMELFARB, 2001, p.21).
Outro ponto em que a autora demonstra alguns dados referentes à transformação
ocorrida na sociedade após os anos 90, se concentra na constatação de uma
substancial diminuição nos programas de auxilio, no número de nascimentos fora
62
Para a autora em tempos de prosperidade ocorre o aumento das preocupações relativas a moralidade.
63
Os escândalos sexuais envolvendo o ex- presidente Clinton
do casamento, de filhos de adolescentes, do inicio da atividade sexual, dos divórcios
e dos abortos:
O número de pessoas no welfare caiu para mais de um terço, de 14.1
milhões em janeiro de 1993 para 7.6 milhões em Dezembro de 1998.
Menos dramático, mas ainda significantes declínios são registrados
nos nascimentos fora do casamento (de 47 por milhares de mulheres
não casadas em 1994 para 44 em 1997); nascimentos na adolescência
(de 62.9 por milhares em 1991 , para 52.3 em 1997); a atividade
sexual de quinze anos para dezenove nas garotas (de 55% em 1990
para 50% em 1995), e de garotos (de 60.4% em 1988 para 55.2% em
1995); divórcios (de 4.7 por milhar de população em 1990 para 3.9
em 1997), e abortos(de 27.4% por mil mulheres de (18 anos a 44
anos) em 1990 para 22.9 em 1996. (HIMMELFARB, 2001, p.21).
Na realidade, a autora argumenta que muitos destes avanços ocorridos no
caminho para uma maior moralidade na sociedade significaram apenas algumas
transformações ocorridas no todo da sociedade, onde, muitas vezes, ao mesmo
tempo em que melhoraram em alguns pontos, os índices acabaram piorando em
outros setores.
A partir deste ponto, procuraremos destacar os principais aspectos em que a
autora contesta os avanços na sociedade, argumentando que muitos destes, na
verdade, representam distorções das estatísticas. Como exemplo retoma a questão
dos nascimentos fora do casamento, colocando que a diminuição do índice de
nascimento em adolescentes e descasadas, em parte se deve a um declínio na taxa
de nascimento geral
64
. Segundo esta perspectiva, se os nascimentos fora do
casamento, quando pensados em relação a todos os nascimentos, continuam
aumentando, “o número de mães e país solteiros com crianças cresceu, de 24% em
1990 para 27% em 1996”. (HIMMELFARB, 2001, p.23).
Outro ponto questionado por Himmelfarb é a queda das estatísticas envolvendo
o uso de drogas. Segundo ela, apesar do uso de drogas nos indivíduos adultos
mostre queda, este índice quando observado entre os jovens apresenta-se em ampla
expansão: “Em 1990, 27% dos estudantes do último ano do colegial afirmou ter
usado maconha nos anos anteriores; em 1997, era 38.5%. Para estudantes do último
ano da universidade no mesmo período os números cresceram de 29,4% para
31.3%”. (HIMMELFARB, 2001, p.24).
64
Vários fatores são responsáveis por esta diminuição na quantidade de nascimento, desde o
prolongamento da espera da gestação do primeiro filho com o intuito de não prejudicar a carreira
profissional, até a utilização de métodos anticoncepcionais e o medo da Aids.
Com relação aos índices de criminalidade, a autora argumenta que apesar dos
crimes realizados por jovens terem caído a partir de 1993, jovens continuam sendo
responsáveis por uma porção substancial de crimes especialmente os mais
violentos: “O FBI reporta que enquanto assassinatos por arma de fogo realizado por
pessoas com idade acima dos 25 anos caíram em 44% entre 1980 e 1997,
assassinatos semelhantes pelos dezoito aos vinte e quatro anos cresceram em 20%”.
(HIMMELFARB, 2001, p.24).
Outro ponto questionado pela autora concentra-se na atividade sexual entre
garotas adolescentes, que declinou para 50%
65
em 1995. Apesar deste declínio, ela,
continua sendo incrivelmente alta, já que, na década de 1970 eram menor que 30%.
A conclusão da autora é que as estatísticas não representam à totalidade da
situação pela qual passa a sociedade:
As estatísticas, todavia, boas ou ruins, não dizem o todo da história.
A perda da autoridade parental, falta de disciplina nas escolas (sem
falar em facadas e tiros), a escalada da violência e da vulgaridade na
TV, a pronta acessibilidade de pornografia e perversões sexuais na
internet, as obscenidades e o sadismo dos vídeos na musica rap, o
“beber até cair” e os “vícios excessivos” no campus da faculdade,
queda de qualidade da educação em todos os níveis isto também é
parte da patologia social de nosso tempo. (HIMMELFARB, 2001,
p.25).
Como conclusão, podemos traçar um paralelo da percepção neoconservadora
sobre a crise da modernidade. Tanto na obre de Bloom, quanto de Himmelfarb, fica
claro que a crise da modernidade surge exatamente em torno da perda de controle
das instituições e do aumento da liberdade. O caminho irreversível das
transformações ocorridas durante as décadas de 60 e 70 significa para a visão de
mundo neoconservadora, a mesma ruptura que o término da monarquia européia
causou aos conservadores tradicionais.
Por outro lado, a percepção neoconservadora é profundamente pontual, mais do
que uma simples nostalgia de um passado considerado melhor, estes intelectuais
estão acompanhando as transformações e realizando um balanço profundo sobre o
caminho que os EUA trilharam nas últimas décadas e as perspectivas futuras. O
pensamento neoconservador, por mais que discordemos de suas idéias, se mostra
65
Himmelfarb não cita os dados anteriores a esta queda para 50%, pois, o seu ponto de comparação se
concentra nos dados da data de 1970 que se encontrava em valores bem menores.
como uma alternativa pautada nos medos que assombram parte considerável da
nação estadunidense.
Podemos a partir daqui tomar um novo rumo na compreensão das motivações do
pensamento neoconservador, abordando dois autores, John Fonte e Linda Chavez,
que analisam a crise da modernidade com base nos temas da imigração e do
aumento de politização das minorias.
4.2 Neoconservadorismo, os processos de imigração e inserção de minorias.
4.2.1 John Fonte: neoconservadorismo e os processos de Imigração.
John Fonte é Ph.D em história do mundo pela Universidade de Chicago, M.A e
B.A em história na Universidade do Arizona e, desde março de 1999, membro do
Hudson Institute, onde desempenha a função de Sênior fellow e de diretor do Center
for American Common Culture
66
. Fonte faz parte, também, como pesquisador
visitante, do American Interprise Institute (AEI)
67
dirigindo o Committee to Review
National Standarts, sobre a presidência de Lynne V. Cheney.
Fonte destacou-se como pesquisador do Departamento de Educação dos Estados
Unidos, do programa que administrou o National Endowment for the Humanities
(NEH) e como membro do Board of the American Council for Trustees and Alumni
(ACTA).
Alem disto, é consultor do Departamento de Educação da Virgínia, da Agência
de Educação do Texas, da Califórnia Standarts Comission, da Federação Americana
de Professores, e do Ministério de Educação e Ciência da Republica da Lituânia.
Procuraremos analisar, neste trabalho, alguns artigos publicados por Fonte no
Center for American Common Culture. Aqui especificamos que, como nosso intuito
é organizar o trabalho a partir de temas específicos, separamos dois pontos que
procuram esboçar mais uma faceta do pensamento neoconservador, ou seja, a
66
O Center for American Common Culture foi criado com a finalidade de oferecer consultoria política
em educação cívica, cidadania e sobre o futuro da Democracia Liberal Americana
67
Centro com forte presença de intelectuais Neocon.
defesa do processo de assimilação patriótica, inserida na discussão sobre a dupla
lealdade e a dupla cidadania, e as propostas de Fonte no que se refere à imigração e
segurança nacional.
Os dois temas que procuramos separar aqui estão profundamente entrelaçados,
de maneira que encontramos muita dificuldade para realizar sua separação por
tópicos. Por este motivo, optamos pela construção de um texto corrido, realizando
associações entre ambos os temas.
Fonte é um defensor ferrenho do chamado processo de Assimilação Patriótica,
segundo o autor, este processo é o principal responsável pelo sucesso na
assimilação de imigrantes nos EUA. Mas o que exatamente significa a Assimilação
Patriótica?
Segundo Fonte, Assimilação Patriótica é muito mais do que uma assimilação
lingüística dos imigrantes e suas crianças, muito mais do que ler Inglês, ser
assimilado economicamente, ou adentrar para a classe média. O mais importante
deste processo, para o autor, é o imigrante transferir-se politicamente de seu antigo
país para os EUA. Mas o que significa exatamente esta transferência?
Fonte argumenta que a cidadania estadunidense é formada em torno dos ideais
democráticos liberais, não sendo, por este motivo, constituída através de elos
étnicos. De acordo com este, “Cidadania Americana não é baseada no
pertencimento em uma etnicidade particular, mas em uma lealdade política na
democracia americana. Nós somos uma nação cívica, não uma nação étnica”.
(FONTE, 2002).
Por este motivo Fonte argumenta que existiram três grandes projetos de
integração dos imigrantes dentro da sociedade estadunidense, sendo eles: A era da
fundação ocorrida na década de 1790, o período de americanização ocorrido
durante o século 20 e a situação da imigração no pós 11 de setembro de 2001. Pela
explicação de Fonte, o primeiro período se restringia a idéia de que todos os
imigrantes deveriam renunciar a todas as alianças políticas que possuíam com o seu
país de origem e realizar um juramento se propondo a defender a constituição e as
leis dos EUA. Os reflexos desse pensamento se mostram presentes nos atos de
naturalização de 1790 e 1795, centrando-se na visão romantizada dos pais
fundadores, que propunham a possibilidade de que, tanto os cidadãos nascidos nos
EUA, quanto os imigrantes poderiam ser uma pessoa só
68
.
O segundo período ocorre durante a era da imigração em larga escala, onde,
políticos e líderes civis como Theodore Roosevelt e Woodrow Wilson, entre outros,
defendem a manutenção da proposta de um juramento, que represente a renuncia
dos imigrantes a sua antiga nação e a aliança com os EUA. Fonte esclarece as
especificidades deste juramento, destacando três datas relevantes, sendo elas: 1905,
onde a comissão de naturalização apontada pelo presidente Theodore Roosevelt
recomendou o juramento de Renuncia e Aliança como um padrão. Em 1929,
quando se inserem no juramento a necessidade de que o imigrante defenda a
constituição e as leis dos EUA contra todos os inimigos, sendo eles externos ou
internos. Durante a Segunda Guerra Mundial, quando é acrescentado ao juramento
que o imigrante se predisponha a pegar em armas para a defesa dos EUA.
Em nossa leitura, o segundo período é o de real institucionalização do
juramento, em que abandona o seu caráter filosófico abstrato e ganha uma
entonação de lei. É neste período que as imigrações se avolumam e a variedade dos
lugares de origem dos imigrantes se torna maior. É importante lembrar, também,
que a imposição do juramento surge em meio ao período envolvendo as duas
grandes guerras mundiais e representa a preocupação com a segurança.
A terceira era se concentra na dificuldade de se garantir a assimilação quando
esta se encontra associada ao medo referente ao terrorismo. Fonte argumenta que a
proposta de um juramento em nossa época continua sendo crucial, já que o papel do
mesmo funcionaria como uma antena que captaria a percepção do que é ser um
estadunidense. O grande problema é que, pela primeira vez, os EUA foram atingidos
dentro de sua fronteira, o que tornou a idéia de um juramento superficial dentro do
contexto histórico vivido em nossos dias. O fato é que este não garantiria a
segurança, podendo, facilmente, um terrorista realizar o juramento para conseguir
sua entrada no país.
O juramento passa a existir, apenas, com um sentido simbólico, tendo seus
pontos mais importantes incorporados, a partir daqui, em um teste de múltipla
escolha. Apesar destas transformações na maneira de se desenvolver o juramento,
Fonte defende o papel emotivo causado por este sobre os imigrantes, que são
68
Esta idéia surge da necessidade de se garantir que em um país novo, repleto de imigrantes, conseguia-se
se criar uma unidade que facilitasse a convivência.
levados a cada etapa do processo a aproximarem-se cada vez mais da nação, ou, de
acordo com Fonte em Don't Dilute the Oath of Allegiance:
Para um sério programa de orientação que iniciando a partir do
processo quando imigrantes adaptam-se para atingir cidadania,
estudando e passando a história/governo e nos testes de linguagem,
até alcançar a cerimônia final, a experiência de cidadania e de
naturalização deveria ser significativa, dignificante e inspiradora. No
mínimo ela deveria nutrir de patriotismo. Para os novos americanos,
o processo de naturalização deveria ser a maior experiência de
transformação em sua vida. (FONTE, 2004c).
Fonte, também passa a discutir os problemas com a assimilação nos dias de
hoje. Para ele, a principal falha, no que se refere a esta questão, se concentra no fato
das elites estadunidenses, há muito tempo, não se preocuparem em promover a
assimilação. Isto, somado a constantes ataques a chamada assimilação patriótica são
os principais desafios à inserção destes imigrantes na sociedade. No artigo
intitulado Comprehensvely wrong, o mesmo argumenta:
A identidade nacional Americana está sobre assalto por décadas por
uma agenda anti-assimilação que inclui votos bilíngües, educação
bilíngüe, preferência de grupos para novos imigrantes, e dupla
aliança e cidadania. (FONTE, 2006a).
Fonte esclarece que os principais defensores do processo de assimilação são os
conservadores, que de uma maneira geral, estão preocupados com a manutenção da
estrutura social existente. A despreocupação com a assimilação pela maior parte dos
grupos da sociedade estadunidense acaba sendo um resultado claro da contrariedade
da população com os crescentes números de imigrantes. Na realidade, Fonte
argumenta em seu artigo intitulado Assimilation (FONTE, 2006) baseando-se na
recente pesquisa realizada pelo Wall Street Journal, que 48% dos americanos
consideram que a imigração mais enfraquece do que fortalece seu país
69
.
O resultado desta negação do papel do imigrante na construção da nação
representa, primeiramente, um susto com o aumento crescente desta população e,
consequentemente, com o aumento de seu poder político. Num segundo momento,
alcança-se o patamar de crise da definição dos EUA como uma nação de imigrantes
assimilados.
69
Contra 41% que considera que esta fortalece a nação.
Mas o que fazer para frear este processo? Mesmo com a resistência da
população estadunidense aos imigrantes, os números das imigrações ilegais
continuam aumentando, atualmente chegando a um valor de aproximadamente 11
milhões de imigrantes ilegais dentro dos EUA, com um crescimento anual de
400.000. Fonte discute no artigo Imigration and American identity. (FONTE,
2005b) que a solução para o problema da imigração vai muito além da proposta de
deportação dos imigrantes ilegais. Segundo Fonte, o governo deveria investir
principalmente na tentativa de acabar com o trabalho barato. Como exemplo, o
autor propõe o aumento nos investimentos relativos à mecanização da agricultura,
afirmando que sem: este tipo de emprego a imigração tenderia a diminuir.
Além disto, Fonte insiste na necessidade de se assimilar os imigrantes, em uma
tentativa de barrar o interesse dos países que os enviam. Pela leitura do mesmo, o
ponto central dos problemas com as imigrações, nos dias de hoje, concentra-se na
utilização destes imigrantes, pelos seus governos de origem, como força política de
barganha nas relações com os EUA.
Fonte deixa clara esta visão quando passa a discutir o posicionamento do
governo mexicano, país de origem da maioria dos imigrantes:
Em 2001, Juan Hernadez novamente declarou que o México é uma nação, de
123
70
milhões de pessoas; 120 milhões vivem no México e 23 milhões vivendo nos
Estados Unidos. Em 1997 um senador mexicano declarou, citando que, Mexicanos
no exterior são iguais aos que habitam o território nacional do México. Pertencendo
ao México são fixados em laços de cultura e ordem espiritual, em costumes,
aspirações e convicções. Para o autor, somente durante a imigração de Italianos, no
regime de Mussolini, ocorreu algo semelhante, ao ponto do governo do país de
origem insistir na manutenção dos laços com a pátria antiga dos grupos que
deixavam o país
71
.
Segundo Fonte, a situação torna-se ainda mais grave quando se tem a
constatação de que 90% dos imigrantes vêm de países que encorajam a dupla
cidadania. Como resultado, cria-se um grande dilema dentro da nação
70
Há um erro nos valores totais da população mexicana expresso nestes dados, apesar de colocar o valor
de 123 milhões como no artigo de Fonte acreditamos ser um total de 143 milhões, já que o número de
imigrantes mexicanos vivendo nos EUA atualmente são 23,4 milhões.
71
Em Fonte, Dual Allegiance Harms Immigration Reform and Patriotic Assimilation, 2005
estadunidense, já que, em nossos dias, não se poderia simplesmente legalizar ou
deportar os imigrantes ilegais, como já foi feito durante a história do país
72
.
Para avançar nas conclusões sobre a posição de Fonte, é importante retomarmos
o ponto de partida de suas análises no Center for American Common Culture. Os
estudos de Fonte surgem com a preocupação de promover a assimilação dos
imigrantes aos EUA, assimilação que vem sendo minada por inúmeras formas de
posicionamentos externos e internos ao país.
Fonte encontra-se entre o multiculturalismo das minorias, que utilizam de sua
força política para cada vez mais inserir sua cultura dentro da nação, e o
posicionamento feroz de alguns membros da sociedade que partem da proposta
clara de deportação dos imigrantes. A posição de Fonte em meio a este conflito é,
talvez, a mais conciliadora, pois ele percebe a importância dos imigrantes
73
, e
procura a possibilidade da assimilação dos mesmos.
4.2.2 Linda Chavez: conservadorismo pela unidade.
Linda Chavez nasceu no dia 17 de junho de 1947 em Albuquerque, Novo
México, e vem se destacando como uma das mais proeminentes autoras
conservadoras hispano-americanas. Filha de pai mexicano-americano e de mãe
anglo-americana, Chavez é bacharel em artes pela Universidade do Colorado.
No ano de 2001, Chavez foi convidada por Bush para assumir a pasta do
trabalho, mas acabou sendo impossibilitada de tomar posse do cargo devido a fortes
pressões. As principais acusações que culminaram com a desistência de Chavez ao
cargo se restringiram ao fato da mesma, ter empregado a imigrante ilegal Marta
Mercado durante os anos 1991 a 1993, alem de também ter ajudado dois refugiados
vietnamitas e os filhos de uma mulher porto-riquenha.
Atualmente Chavez esta na presidência do Think Tank, Center For Equal
Oportunity (CEOUSA), uma organização conservadora que se opõe aos programas
de ação afirmativa e à educação bilíngüe. De acordo com o próprio site oficial, o
Think Tank tem como preocupação garantir a igualdade de oportunidades sem fazer
72
Em 1986, congresso passou por “uma compreensiva”reforma de imigração que incluiu anistia para
aproximadamente 3 milhões de imigrantes ilegais, reforço na fronteira e no interior(ações trabalhistas)
(19/06 2006).
73
É importante relembrar que a grande maioria dos Neocons é composta por imigrantes assimilados
diferenças étnicas, com o intuito de garantir a harmonia racial, eliminando assim o
impacto causado pelas divisões criadas pelas políticas públicas que visam o
favorecimento da consciência de raças.
O CEOUSA procura atuar em três grandes focos: 1- Nas ações afirmativas, onde
procura dar suporte a políticas públicas “colorblind”, obstruindo a expansão de
preferências raciais, impedindo seu uso no emprego, na instrução, e no direito ao
voto. 2- Na imigração e na assimilação, onde promove a assimilação dos imigrantes
na sociedade, além de pesquisar sobre seu impacto econômico e social nos Estados
Unidos. 3- Na educação bilíngüe e na educação em geral, onde procura promover
políticas educacionais que visem atingir a todos os grupos, centrando na idéia da
educação focada na língua Inglesa e na cultura estadunidense.
Utilizaremos para a análise alguns dos textos publicados pela autora neste Think
Tank procurando perceber como uma hispano-americana pode se posicionar como
neoconservadora e ser contrária aos programas de ação afirmativa e de educação
bilíngüe. Para realizar esta análise nos concentraremos nos três temas de atuação do
CEOUSA, organizando as principais posições da autora sobre estes.
Como primeiro tema relativo à análise da obra de Chavez, partiremos para
análise da maneira como ela percebe os programas de ação afirmativa. Como
característica, Chavez acaba seguindo quatro grandes pontos, que refletem uma
retórica conservadora, sendo eles: 1- Os programas de ação afirmativa não atingem
as camadas que realmente deveriam receber estes programas. 2- Os estudantes que
recebem a ajuda destes programas acabam sendo discriminados dentro das
universidades, ou, quando saem destas para o mercado de trabalho. 3 Mesmo
quando recebem incentivos para entrar nas universidades os membros de minorias,
especialmente latinos e negros, não conseguem obter um rendimento considerável
aceitável. 4 Os programas de ação afirmativa acabam obscurecendo a necessidade
de mudanças que melhorariam a qualidade nas instituições de ensino das camadas
mais pobres.
Para uma melhor esquematização, separaremos estes quatro temas em dois
grandes grupos, um envolvendo a crítica realizada pela autora referente ao primeiro
dos quatro itens, e um que aglutina os outros três, por considerarmos que estes estão
profundamente interligados.
A primeira linha de discussão da autora segue uma das mais tradicionais
retóricas conservadoras, ou, de acordo com a perspectiva de Hirschman antes
abordada, a tese da futilidade, concentrada na idéia de que qualquer forma de
auxílio a minorias acabaria não atingindo quem realmente necessita deste auxílio,
ou, como podemos perceber pela argumentação da própria Chavez:
Eu me oponho as preferências raciais, não somente porque eu penso
que são desleais -- e, quando exigidas pelo governo,
inconstitucionais mas, também, porque não conseguem sua
finalidade pretendida, de ajudarem negros e Hispânicos. (CHAVEZ,
1997).
A autora parte da idéia de que a maioria dos estudantes negros e latinos que
atingem as universidades através das cotas vem, na verdade, de famílias que
conseguiram atingir um grau econômico mais alto, sendo, normalmente,
representantes da classe média:
Muitas, se não a maioria, das escolas admitem os estudantes negros e
latino-americanos que não se encontram dentro das exigências
normais da universidade. Então, não faz pouco ou nada garantir que
estes estudantes mal preparados sucederão realmente. Ironicamente,
muitos dos estudantes das minorias, que se beneficiam de tais
programas, vêm da classe média ou dos grupos afluentes.
(CHAVEZ, 1997).
Apesar de pertencer a uma linha visivelmente conservadora, o que a autora não
esconde, dentro da sua abordagem nos parece irrefutável que membros dos grupos
minoritários que conseguiram atingir um maior nível econômico-social encontraram
vantagens no sistema de cotas. Todavia, a percepção da autora acaba ultrapassando
este ponto partindo para a idéia de que os estudantes que recebem as cotas acabam
sofrendo uma discriminação ainda maior por entrarem nas instituições com um
déficit com relação aos outros grupos.
Podemos, a partir desta idéia, concluir a leitura dos três últimos pontos presentes
na abordagem da autora sobre os programas de ação afirmativa. A principal crítica
presente na obra de Chaves parte da idéia de que os programas de ação afirmativa
não garantem que os membros das minorias que ingressam na universidade
possuam condições reais de competir com os outros grupos, já que vêm de centros
educacionais que não lhes proporcionaram uma educação de qualidade. Deste
modo, para que se resolva o problema entre os grupos minoritários seria necessária
uma delicada reforma na instrução elementar e secundária do país:
O que necessita de emendas não é na ação afirmativa, mas na
instrução. É hora de terminar com todas as políticas públicas que
tratam cidadãos diferentemente, dependendo de sua raça e começar a
discutir sobre uma difícil de reforma em nosso sistema de instrução
elementar e secundário. (CHAVEZ, 1999).
Pela visão da autora, somente garantindo que o ensino de qualidade seja
expandido a todos os grupos poderia se resolver o problema de desigualdade, fora
isto, o país continuaria a ter que abrir inúmeras exceções que serviriam, apenas,
como um instrumento paliativo.
O grande problema do sistema atual se concentra exatamente na idéia de que ao
criar remendos na tentativa de se garantir a igualdade, sem que ocorra uma melhoria
real na educação como um todo, apenas se atinge um prolongamento do problema.
Dessa forma, os precedentes abertos para servirem de soluções para a desigualdade
acabam sendo empurrados de etapa em etapa da vida dos grupos minoritários.
A autora acaba questionando este processo quando passa a argumentar sobre as
críticas realizadas contra os exames de avaliação, utilizando-se como exemplo o
sistema de ensino da Califórnia, onde, de acordo com as críticas, os exames que
deveriam testar o conhecimento geral dos alunos favoreceriam os brancos:
No último mês, o presidente da universidade da Califórnia disse ser a
favor de deixar decair o venerável Teste de Aptidão Escolar que
testes verbais gerais, raciocínios e habilidades gerais de matemática
em favor de testes mais especializados em áreas de conhecimentos
individuais e subjetivas. O presidente Richard Atkinson preocupa-se
que a baixa confiança no Teste de Aptidão Escolar penaliza
injustamente os estudantes negros e latino-americanos, que, na
média, possuem um desempenho pior nos testes, do que, sua parte
correspondente, brancos e Asiáticos. Atkinson é particularmente
sensível a este problema. O sistema de Califórnia, o maior no país,
experimentou um decréscimo nas inscrições de negros e latino-
americanos após a aprovação da Proposição 209 em 1996, que
proibiu as preferências raciais que tinham sido usadas por anos
apoiando o registro das minorias. (CHAVEZ, 2001).
A autora argumenta que este tipo de confrontamento vem sendo historicamente
utilizado em uma tentativa de conseguir justificar as diferenças presentes no preparo
entre os alunos dos mais variados grupos. Para demonstrar como ocorre este
processo a autora cita o exemplo das críticas aos testes realizadas durante os anos
60.
Nos anos 1960, os críticos argumentaram que o teste era racialmente
inclinado. Eles apontavam para questões, eles clamavam que as
perguntas foram pesadamente direcionadas para favorecer as
experiências dos brancos, especialmente, na seção verbal do teste. Os
pretos e Hispânicos não poderiam esperar saber palavras tais como a
“regata” ou “cotillion
74
”, desde que, presumivelmente, poucos deles
possuíram iates ou atenderam a esferas das debutantes.
Naturalmente, a maioria dos brancos que fazem o teste do exame,
não participa de regatas, nem atendem a qualquer um dos cotillion
locais. Não obstante, o Serviço de Teste de Instrução, que administra
o teste de Aptidão escolar, gastou milhões dos dólares para fazer o
teste mais amigável para as minorias. Os recebedores do teste, agora,
podem esperar responder a perguntas sobre os trabalhos de Maya
Angelou
75
e Toni Morrison
76
, assim como de William Faulkner
77
e
Jane Austen
78
. Mas as mudanças não tiveram quase nenhum impacto
em fechar o abismo existente entre as contagens médias dos brancos
e asiáticos, em uma extremidade, e Hispânicos e negros na outra.
(CHAVEZ, 2001).
Chavez considera que a crítica realizada pelas minorias contra os sistemas de
avaliação são resultado do despreparo e desinteresse pela leitura dos mesmos, o que
acabaria se estendendo, também, a muitos dos estudantes brancos.
Para a autora, o problema não está na maneira como os testes são realizados, e
sim na pressão existente pelos grupos em uma tentativa de alterar a grade curricular
e o conteúdo dos testes aproximando a educação a temas relacionados com o
interesse das minorias, afastando os estudantes da obrigatoriedade da leitura dos
principais clássicos da literatura.
Assim como grande parte dos outros neoconservadores, Chavez é uma
descendente de imigrantes assimilada, por isto, parte em defesa da educação e da
cultura estadunidense. Para ela, focalizar a educação nas minorias representa perder
as características que criam o caráter da nação, podendo gerar o enfraquecimento da
sociedade. Chavez argumenta que mesmo sendo descendentes de latinos, não se
sentiu inferiorizada por ler grandes escritores de outras nações, da mesma maneira
que estas leituras foram entendidas mesmo não tendo vivenciado a cultura exposta
nestes livros.
74
Não encontramos uma tradução literal para cotillion, este é uma cerimônia de apresentação de jovens
damas a sociedade, semelhante aos bailes de debutantes existentes em nosso país.
75
Maya Angelou foi a primeira motorista mulher e negra da cidade de São Francisco, assim como
também a primeira roteirista e diretora negra de Hollywood
76
Toni Morrison é uma escritora negra estadunidense que ganhou o prêmio Nobel de literatura em 1993
escrevendo romances sobre as experiências das mulheres negras durante os séculos XIX e XX.
77
Considerado um dos maiores escritores dos EUA.
78
Escritora inglesa considerada por muitos a figura mais proeminente depois de Shakespeare.
Podemos a partir daqui, discutir o segundo ponto referente à obra desta autora,
que se concentra exatamente na crítica à educação voltada para as minorias. Estas
críticas refletem-se no questionamento à educação bilíngüe, a questão a ser
aprofundada aqui, é exatamente até que ponto essa educação pode favorecer ou
causar danos dentro dos EUA.
Chavez parte da necessidade de se integrar os grupos imigrantes, o mais rápido
possível, na cultura estadunidense, daí o papel da linguagem como ponto central da
formação de uma identidade comum. De acordo com a autora existem
aproximadamente três milhões de estudantes da escola pública que não sabem o
inglês
79
. Estas crianças vêm de diversos países e possuem idades das mais variadas,
podendo ter cursado ou não uma escola em seu país de origem.
O grande choque existente nos EUA da atualidade concentra-se em como
educar estas crianças. Parece claro para a autora que existe uma grande disputa que
deveria se restringir, simplesmente, a valores pedagógicos no sentido de escolher o
melhor método para que estas crianças tenham uma melhor adaptação ao novo país.
Esta disputa tornou-se uma guerra política entre grupos.
De acordo com Kátia Maria Santos Mota, este processo passa a ocorrer de
maneira mais agressiva a partir da década de 80, onde a presença de outras línguas
dentro do país passa a exercer um papel preocupante:
No cenário norte-americano, entretanto, é sobretudo a partir do início
da década de 80, quando o perfil de identidade do imigrante nos
EUA apresenta mudanças radicais, principalmente com as
freqüentes ondas migratórias de hispânicos e asiáticos, que a
educação bilíngüe começa a ser vista como uma ameaça à
supremacia do inglês. Surgem, assim, grupos políticos (English only)
que desejam a adoção do inglês na escola como a única língua
nacional, na tentativa de assegurar os princípios democráticos do
ideal norte-americano. (MOTA, 2006).
Se por um lado a população branca começou se mobilizar politicamente em
favor de uma educação construída a partir da língua inglesa, por outro, grupos
latinos passam a exercer pressão no sentido da manutenção de uma educação
bilíngüe. Chavez mostra-se profundamente descrente com o real interesse destes
79
Dados presentes no artigo intitulado We have a ways to go in the bilingual war, publicado no dia
10/061998 no Center for Equal Opportunity.
grupos, ou, como podemos notar em seu artigo Viva bilingual education, publicado
em 23 de março de 2000:
Ironicamente, algumas das mais fortes sustentações da instrução
bilíngüe vêm dos Hispânicos da classe média, muitos dos quais não
falam o espanhol, e lamentam que suas crianças também não falem.
Estes Hispânicos que são um círculo eleitoral natural para classes da
dupla-imersão, e poderiam realmente beneficiar-se delas, apenas
como não-Hispânicos puderam. (CHAVEZ, 2000).
O grande problema constatado pela autora no que se refere à educação bilíngüe
se concentra no fato de que as crianças acabam recebendo uma educação mais fraca
em relação à educação das demais crianças do país. Chavez procura ressaltar esta
disparidade partindo dos estudos realizados por Christine Rossell:
A professora Christine Rossell da universidade de Boston, que
estudou programas dirigidos a crianças limitadas a proficiência em
Inglês por quase duas décadas, notou em uma análise recente sobre o
programa dupla-imersão: “Os estudantes latino-americanos em bem
considerados programas bilíngües de dois caminhos em distritos
escolares reais marcam somente a metade da pontuação dos
estudantes brancos” naqueles mesmos programas. Na River Glen
Elementary, uma escola bilíngüe de dois caminhos em San Jose,
Califórnia, frequentemente angariada como um programa modelo,
estudantes latino-americanos marcaram cerca da metade, também,
em testes de leitura. E em muitas escolas de dupla-língua,
aproximadamente um terço dos estudantes, que falam espanhol, não
aprenderam bastante o inglês para ser testado no todo. Quando estas
escolas relatam ganhos expressivos para estudantes da dupla-
imersão, é porque deixaram os estudantes que não falam inglês fora
da equação. (CHAVEZ, 2001).
Chavez continua sua argumentação contraria aos programas bilíngües
discutindo que a maioria da população latina do país prefere que suas crianças
aprendam a Língua Inglesa o mais rápido possível. Segundo esta, durante um
levantamento realizado pela organização não-lucrativa Public Agenda mostrou-se
que 75% dos pais imigrantes querem suas crianças ensinadas na língua inglesa, um
levantamento semelhante, realizado pelo Center For Equal Opportunity, encontrou
que apenas 17% dos pais latinos americanos querem que suas crianças sejam
ensinadas a ler e escrever, primeiramente, em espanhol
80
.
80
Viva bilingual education?
De acordo com a autora, a grande chave para atingir a qualidade do ensino da
língua para os imigrantes, se concentra na necessidade de se traçar um plano sério
focado no aprendizado destes grupos, partindo da idéia da redução dos alunos por
classe de língua (entre 15 e 20) e, também, investir no treinamento de professores.
Chavez considera também que o ideal seria que os professores compreendessem a
língua nativa de seus estudantes
81
.
O terceiro ponto que consideramos importante discutir na obra de Chavez se
concentra na crítica ao processo de imigração e assimilação. Dentro da
argumentação proposta pela a autora podemos concentrar nossa preocupação dentro
de algumas idéias centrais: 1- a presença dos imigrantes é vital para o
enriquecimento da nação; 2- a preocupação presente com o crescente aumento dos
imigrantes ilegais; 3- como realizar a assimilação destes imigrantes transformando-
os em cidadãos estadunidenses.
No primeiro ponto, percebemos que Chavez é uma defensora da abertura dos
EUA para a imigração:
A maciça imigração legal foi um componente crítico do
crescimento econômico, sobretudo, nas últimas duas décadas,
mas um que nós, frequentemente, ignoramos demasiadamente,
ou, supomos erradamente causar mais dano do que bem.
(CHAVEZ, 2000b).
Chavez possui uma grande preocupação com as atuais propostas de imigração
que visam possibilitar o trabalho temporário para pessoas vindas de fora. O
problema apontado pela autora é não se concentrar em impedir a entrada destes
imigrantes e sim no que fazer com a grande quantidade de ilegais que se encontram
dentro das fronteiras do país
82
:
Estas propostas não podem oferecer a justiça perfeita - quem pode
responsabilizar os prejudicados recompensando os que cruzam a
fronteira com status legal quando os milhões de outros imigrantes
estariam esperando pacientemente para entrar legalmente no país.
Mas “o ganho da legalização” é provavelmente a melhor solução a
um problema largamente intratável. Não há nenhuma maneira que os
Estados Unidos podem encontrar e deportar 8-12 milhões de
estrangeiros ilegais neste país, e mesmo se nós poderíamos, nós
causaríamos mais danos do que o bem. (CHAVEZ, 2004).
81
We have a ways to go in the bilingual war
82
Em: The Bush proposal.
Acaba ocorrendo um grave problema dentro do país por causa dos processos de
imigração, enquanto, de um lado, encontram-se milhões de imigrantes em situação
ilegal, do outro, existem milhões de outros esperando a oportunidade de poder
entrar legalmente. Segundo Chavez o governo Bush deu um passo importante no
que se refere a esta questão, tentando atingir um meio termo entre os interesses
destes dois grupos e o da própria nação.
A decisão tomada pela administração Bush concentra-se em liberar visto de
emprego temporário aos imigrantes que possuem interesse em trabalhar em uma
situação legalizada, ao mesmo tempo em que possibilitou que os ilegais consigam
alguns avanços, com o intuito da obtenção de um ganho em cidadania. Segundo a
autora:
Em estimativa 9 milhões de estrangeiros ilegais da América Latina
vivem nos Estados Unidos, de forma que México, El Salvador,
Honduras e Guatemala têm começado recentemente a emitir cartões
de identificação aos estrangeiros ilegais através de seus escritórios
consular nos EUA. Estes “IDs” dão permissão aos estrangeiros
ilegais que vivem aqui para abrir contas em banco, obter licenças de
motoristas e cartões da biblioteca, e voar em linhas aéreas do
domesticas dos Estados Unidos. (CHAVEZ, 2002).
Para Chavez é inegável a necessidade deste trabalho imigrante no país, e os
grandes desafios concentram-se em garantir que estes imigrantes aceitos no trabalho
temporário realmente voltem para seus países de origem, garantindo, também, que
os que já vivem no país consigam ser assimilados dentro do modo de vida
estadunidense.
Chavez destaca em vários artigos o problema da necessidade de assimilação,
este processo é colocado como ponto principal neste momento da história. Mais do
que isto, a assimilação é posta como um dever histórico dos EUA, o que é
confirmado no artigo intitulado We are Americans:
Nunca houve um momento em nossa história que foi mais importante
recomendar uma assimilação dos milhões de novos moradores que vieram
aos Estados Unidos em anos recentes -- quase 30 milhões vivendo aqui
agora. Não é simplesmente continuar aceitando que muitos milhões de
nascidos no exterior venham viver aqui permanentemente, a menos que nós
estivermos dispostos a ajudar, fazendo deles americanos. Em cada período
da imigração, em grande escalada a este país, nós compreendemos este
como nosso dever -- isso se mantêm recentemente. (CHAVEZ, 2001).
Nesse mesmo artigo, Chavez continua discutindo a necessidade de assimilação,
afirmando que somente com a possibilidade da união da diversidade nacional os
EUA poderão criar uma identidade comum, que consiga manter a unidade e
defender a cultura construída de ataques externos, como o de terroristas. Para que
isto ocorra, a autora, lança mão de um chamado a unidade da nação:
Para o momento, pelo menos, nós parecemos dispostos a pôr de lado
este absurdo. Nós não somos uma nação multicultural. Nós somos
uma nação indivisível. Nós somos uma só pessoa, não obstante nossa
cor ou credo, ou, de quanto tempo nossas famílias estiveram aqui ou
de onde vieram. E nisto, nós somos originais nos anais da história
humana. (CHAVEZ, 2001).
Através da leitura dos artigos escritos por Linda Chavez podemos aproximá-la
da abordagem realizada por John Fonte, já que ambos partem da idéia de como
conseguir assimilar as minorias e os grupos imigrantes sem que estes diluam a
cultura existente nos país.
A abordagem neoconservadora, surge em sua maioria de imigrantes, ou filhos
de imigrantes que percebem a cultura estadunidense como um diferencial
importantíssimo para que se possa formar uma sociedade livre. Estes são imigrantes
profundamente adaptados que receberam sua educação dentro do país e nele
encontraram a possibilidade de progredir, assumindo, por este motivo, uma
identidade com esta nação.
Para os autores abordados, a posição das minorias de negar-se a tomar parte
deste caldeirão cultural, mantendo-se fiel a sua cultura antiga, é vista como algo
fora da realidade. As críticas realizadas por alguns grupos minoritários de que as
oportunidades não são iguais contradizem a experiência vivida pela maioria destes
intelectuais, o que acaba fazendo com estes se posicionem como opositores a estas
críticas.
Como resultado a este processo encontramos nos neoconservadores um plano
claro no que representa atingir o sucesso, um caminho simples que se resume em
ser assimilado lingüística e culturalmente, e que deveria funcionar como um
caminho sem erros.
4.3 Charles Murray: a adesão ao libertarianismo.
Charles Alan Murray nasceu no ano de 1943, sendo bacharel em história pela
Harvard University e Ph.D em ciência política pelo Instituto de Tecnologia de
Massachusetts. Atualmente, Murray é membro do AEI (American Enterprise
Institute), além de publicar artigos em The New Republic, Commentary, The Public
Interest, The New York Times e The Wall Street Journal.
Murray é um dos mais debatidos estudiosos sobre Welfare State e políticas
públicas, desenvolvendo em suas obras
83
pontos importantíssimos que foram
combustíveis para inúmeras discussões durante as últimas décadas. Paralelamente a
este tema, encontramos o livro Bell Curve: Intelligence and Class Struture in
American Life, escrito com Richard Herrnstein, publicado em 1994, onde o autor
passa a discutir as disparidades de inteligência existentes entre as raças.
Ao observarmos os temas estudados por Murray, percebemos que apesar de ser
considerado um autor radical, assim como os outros neoconservadores aqui
analisados, destaca-se na clareza e na plausibilidade dos seus argumentos, o que
acaba gerando uma grande agitação no cenário intelectual, causando choque,
principalmente pelo fato de Murray dialogar com idéias que até então pareciam
esquecidas ou intocáveis.
Em nossa análise destacaremos algumas das idéias de Murray que causaram
maior agitação no momento da sua divulgação, partindo de seus artigos publicados
no American Enterprise Institute. Optamos por estes textos por se encontrarem
abertos ao público em geral, seguindo a proposta, defendida pelos
neoconservadores, de que os temas devem ser debatidos abertamente e expandidos
ao maior número possível de pessoas.
Nossa preocupação durante esta passagem do trabalho é procurar abarcar as
principais posições deste autor, tentando compreender também a reação que estas
idéias causaram.
Para podermos dar inicio ao aprofundamento de sua obra, consideramos
necessário esclarecer um ponto, relativo a uma diferenciação existente entre Murray
83
Lousing Ground: American Social Policy, 1950-1980, publicado em 1984, onde, este realiza uma
crítica aos programas de auxílio do governo estadunidense, e, seu último livro intitulado In Our Hands: A
Plan To Replace the Welfare State, publicado em 2006, onde, o mesmo propõe uma solução para o papel
do estado em auxílio, saúde, previdência, entre outras.
e os outros Neoconservadores. Durante nossa leitura constatamos que, em ocasiões,
Charles Murray definiu-se como um libertário e não como um neoconservador, ao
mesmo tempo, os principais autores que se debruçaram para a análise e o debate
sobre o neoconservadorismo, posicionaram-no como um autor neoconservador. Por
este motivo, consideramos que seria importante, nesta passagem do texto,
aprofundar qual seria a posição dos libertários e quais as diferenças destes com os
neoconservadores.
De acordo com nossa leitura, a corrente política denominada libertarianismo,
surge baseada na idéia de que o melhor governo seria aquele que governa o mínimo
possível. Para esta corrente o papel do governo deveria se restringir, apenas, a
impedir que os direitos fundamentais fossem violados. Portanto, para os libertários,
direitos como saúde, alimentação, entre outros, não deveriam ser obrigações
atribuídas ao governo, que deveria restringir suas responsabilidades as funções de
justiça, de policia e militar.
Murray, em seu artigo Charles Murray’s Libertarian Vison, de março de 1997,
descreve os três pontos essenciais para que exista governabilidade, dentro da idéia
de libertarianismo:
1. Em uma sociedade livre, indivíduos não podem iniciar o uso da
força contra qualquer outro individuo ou grupo.
2. Pessoas em uma sociedade livre não podem ser impedidas de se
engajar no voluntariado e informar transações.
3. Governos existem para garantir os direitos fundamentais das
pessoas livres. (MURRAY, 1997).
O termo libertarianismo acaba aproximando-se muito as idéias do liberalismo,
sendo fortemente empregado nos EUA, o que ocorre é que existe a necessidade de
uma diferenciação entre estes e os liberais já que, nos EUA, os liberais estão muito
mais próximos da social-democracia, do que do liberalismo como o termo é
associado na Europa.
Como característica marcante, destacamos a existência de um partido Libertário
que se posiciona como o terceiro maior partido dentro dos EUA, tendo lançado
candidato próprio nas últimas eleições (Michael Badnarik), contudo, devido ao
sistema político Bipartidário, muitos dos defensores do Libertarianismo acabam
preferindo se diluir dentro dos partidos republicano e democrata em uma tentativa
de inserir suas idéias dentro deles.
A relação do libertarianismo com o neoconservadorismo aparece de maneira
bem estreita, coincidindo sua agenda política em inúmeros pontos como a crítica
realizada sobre os programas de auxilio
84
e a relação do Estado com a economia. Da
mesma forma, esses grupos acabam se distanciando em alguns outros pontos, como
a maneira como encaram o papel do Estado com relação à intervenção em outros
países. A doutrina libertária é totalmente contrária à intervenção de um Estado por
outro, enquanto os neoconservadores defendem a idéia de guerra preventiva
85
.
Outro ponto que percebemos como diferença entre libertários e neocons
encontra-se na maneira como estes enxergam a própria sociedade; os primeiros são
contrários à interferência do Estado em assuntos que digam respeito à sociedade
como a pornografia, o uso de drogas e os valores sociais, justamente o contrário do
que pregam os neoconservadores que constantemente realizam críticas a destruição
moral da sociedade.
Murray é a confirmação mais clara de uma aliança dos libertários com os
neoconservadores, pois absorve as características tanto do libertarianismo quanto do
neoconservadorismo, dialogando constantemente com as duas correntes, sendo
aceito pelas duas.
Com relação à análise das obras de Murray procuraremos discutir dois tópicos
que consideramos de maior importância em sua obra: 1- a crítica que realiza aos
programas de auxílio estadunidense e a solução que propõe para os problemas
destes programas; 2- a discussão feita por Francis Fukuyama sobre as idéias
apresentadas no livro The Bell Curve, antes mencionado.
Com relação ao primeiro tópico, o autor percebe os efeitos dos programas
sociais em duas dimensões diferentes. A primeira, expressa em Lousing Ground
86
,
onde, Murray realiza uma aprofundada análise sobre os programas de auxílio nos
EUA durante as décadas de 1950 a 1980, afirma que estes programas sociais
destinados a ajudar pessoas pobres e desfavorecidas acabaram prejudicando mais do
que ajudando estas pessoas. A segunda, abordando os tempos atuais, busca
suplantar o Welfare State. De acordo com sua leitura, existe um grande problema no
que se refere aos programas de transferência de renda de um cidadão para outro,
84
Retomamos aqui que os neoconservadores não são contrários aos programas de bem-estar-social como
um todo, estes apenas se opõe ao método de realização destes, o que os faz de uma maneira geral aliarem-
se com os libertários durante as críticas aos programas sociais estadunidense.
85
Entre outros que se definem como libertários encontramos Friedrich Hayek' s.
86
As discussões deste livro se encontram na obra de Hirschman.
dentro dos EUA. Estes problemas surgem devido ao excesso de burocracia e a má
utilização do dinheiro arrecadado. O grande problema é que não existe nenhuma
maneira de se controlar para quem esta verba estaria sendo destinada, conforme
afirma em entrevista para Max Borders realizada em março de 2006:
Se isto é pegar de uma pessoa jovem para dar a uma velha, ou se ela
é pega de um secretário no Alabama para dar a uma corporação que
realizou algum favor especial para o governo, todas destas
transferências --- e isto são o que elas são: dinheiro de um indivíduo
americano para outros indivíduos ou corporações - parecem para
mim exemplos clássicos de transferência de dinheiro para
Washington, vendo largas quantias deles derramadas e jogadas fora,
e sendo transferidas para fora de Washington em formas muito
reduzidas para propósitos dúbios. (MURRAY, 2006).
A proposta de Murray acaba consistindo em simplesmente transferir uma
parcela de dinheiro a todos os estadunidenses maiores de 21 anos que não estejam
presos, substituindo através deste método uma série de desperdícios e burocracias.
Segundo o autor, se fossem destinados 10.000 dólares anuais para cada cidadão, o
mesmo poderia com este dinheiro, em suas mãos, optar pela melhor maneira de
gasta-lo, o que acabaria melhorando os serviços como saúde, previdência, e mesmo
a pobreza, já que daria oportunidade aos desfavorecidos de tentarem progredir
economicamente através de seus méritos.
Murray parte para atingir esta conclusão da idéia de loteria da vida, para este,
QI, Beleza, Charme e diligência não são características obrigatórias para que se
alcance o sucesso social e econômico. Por este motivo a possibilidade de se
recomeçar a vida quando se recebe uma soma de dinheiro suficiente é aberta a
qualquer um.
Como resultado final desse plano, apareceria a substituição de todos os
programas de transferências federais estaduais e locais, inclusive segurança social,
Saúde e subsídios a corporações, por esta renda anual que eliminaria os cerca de 36
milhões de pessoas que vivem abaixo da pobreza.
O último ponto sobre as idéias de Murray que nos propomos a analisar é o que
provavelmente causou maior polêmica entre suas obras. Após a publicação de The
Bell Curve, Murray foi sem duvida alguma incluído na listagem dos autores mais
odiados dos EUA.
Não nos preocuparemos aqui propriamente com as idéias propostas neste livro,
o que nos interessa, especificamente nesta obra, se concentra muito mais na reação
que a mesma gerou, tanto no mundo acadêmico quanto com relação ao
posicionamento dos próprios neoconservadores sobre o tema abordado. Nosso
interesse ao analisar esta obra se centra muito mais na possibilidade de novamente
afirmar a ligação de Murray com os neoconservadores, sendo que, para isto,
recorreremos à obra do até então considerado um intelectual neoconservador
(inclusive por ele mesmo), Francis Fukuyama.
Fukuyama dedica grande parte de seu livro Nosso Futuro Pós-Humano:
Conseqüências da Revolução da Biotecnologia a defender e rechaçar as críticas à
obra de Murray e Herrnstein.
Para ficar mais claro todo o processo ocorrido entre a publicação do livro de
Murray e a sua defesa por parte de Fukuyama, procuraremos organizar a leitura de
maneira cronológica. Primeiramente faremos um rápido resumo do que Murray
propõe em seu livro. Como segundo passo, procuraremos contextualizar a reação
que as idéias de Murray causaram, para que finalmente possamos concluir
chegando à defesa feita por Fukuyama.
Podemos dividir a proposta de The Bell Curve em duas idéias principais que são
comprovadas pelos autores através de uma série documentada de estatísticas
extraídas do National Longitude Survey of Youth, sendo que a primeira parte da
afirmação de que 60 a 70% da inteligência é herdada geneticamente; já a segunda,
parte da idéia de que afro-americanos estão geneticamente abaixo dos brancos em
seu desvio padrão no que se refere à inteligência.
Esta colocação posiciona uma nova leitura na questão da ascensão social, que a
partir dela, passaria a ser percebida muito mais como um fator ligado a genes, do
que de background social. Partindo desta posição, os fatores relevantes para o
sucesso posicionariam os cidadãos em níveis hierárquicos de inteligência.
Parece claro que a primeira reação após a publicação destas idéias, só poderia
ter surgido com uma resposta radical, ou, como podemos perceber na análise feita
por Fukuyama:
Não admira que The Bell Curve tenha produzido tanta controvérsia
Murray e Hernstein foram acusados de racistas e fanáticos. Nas
palavras de uma resenha, “por mais ofensivo e alarmante que possa
ser, The Bell Curve (.....) é, simplesmente, mais um capitulo na
persistente economia política do racismo”. Uma linha comum de
ataque foi acusar os autores de serem pseudocientistas, cujos achados
eram tão espúrios e tendencioso que nem sequer mereciam uma
discussão séria, e tentar associa-los com varias organizações de
skinhead e neonazistas. (FUKUYAMA, 2003, p.38-39).
Em um segundo momento, a análise feita por Murray e por Hernstein
funcionou como um catalisador para que houvesse um progresso nos estudos que
relacionavam a inteligência à hereditariedade, ainda segundo Fukuyama:
The Bell Curve ocasionou a publicação de uma série de volumes por
outros psicólogos e especialistas em inteligência que resumiram o
que se sabe atualmente sobre o vínculo entre inteligência e
hereditariedade. Fica claro que a partir dessa literatura que embora
muitos discordem fortemente de Murray e Hernstein em muitas de
suas asserções centrais, a questão que eles identificaram a
importância da inteligência em sociedades modernas e as
implicações de suas possíveis raízes hereditárias não tendem a se
dissipar. (FUKUYAMA, 2003, p.41-42).
E aqui podemos reforçar a principal característica do movimento
neoconservador, ou seja, a possibilidade de expor e encaminhar ao debate idéias
que antes se restringiam aos meios científicos e acadêmicos, possibilitando a
abertura do debate.
Neste ponto destacamos o papel de Fukuyama no livro Nosso Futuro Pós
Humano, onde procura explicar que a discussão envolvendo The Bell Curve é
apenas a ponta de uma discussão muito maior e que vem sendo travada durante
séculos entre conservadores e esquerda envolvendo as possibilidades da
interferência de um governo na correção de abismos entre as hierarquias sociais:
Os conservadores costumam ser simpáticos a assertivas sobre
diferenças sobre diferenças humanas naturais porque querem
justificar hierarquias sociais existentes e são contrários à intervenção
governamental para corrigi-las. A esquerda, em contraposição, não
suporta a idéia de que existem diferenças naturais entre grupos
humanos. Há tantas coisas em jogo numa questão como a
inteligência que elas transbordam imediatamente em controvérsias
metodológicas, com a direita afirmando que a capacidade cognitiva
era algo claramente manifesto e mensurável, e a esquerda
sustentando que ela era indistinta e sujeita a erros grosseiros de
mensuração. (FUKUYAMA, 2003, p.39).
A defesa de Fukuyama desta obra acaba mostrando que mesmo com seus
erros metodológicos, mesmo com todas as críticas recebidas com relação à falhas
analíticas
87
, teve o papel, mais importante para a ciência, de abrir o debate. Somente
através dele pode-se obter contribuições necessárias para que se possam alcançar
métodos que realmente transformem as barreiras existentes entre ricos e pobres.
Podemos, a partir deste ponto, finalizar a leitura de Murray, para nos
concentrarmos em um outro ponto importante da agenda neoconservadora, a relação
entre cultura e ascensão social presente na obra de Francis Fukuyama. Esta
discussão segue um caminho oposto ao adotado por Murray em The Bell Curve,
seguindo a idéia de que valores culturais são responsáveis pelo desenvolvimento
econômico e social de grupos.
4.4 Francis Fukuyama: Capital Social e a Ascensão Social.
Francis Fukuyama nasceu no dia 27 de outubro de 1957, em Chicago, e durante
sua carreira acadêmica destacou-se pela publicação de livros que causaram impacto,
entre eles destacamos O Fim da História e o Último Homem, um dos mais
debatidos da última década. Fukuyama é B.A em estudos clássicos pela
Universidade de Cornell e Ph.D. em Ciência Política pela Harvard University.
É professor de Economia Política Internacional na Paul H. Nitze School of
advanced International Studies, Johns Hopkins University, sendo em 2002
nomeado para o conselho sobre Bioética da presidência dos EUA.
Em sua trajetória intelectual Fukuyama esteve ligado aos neoconservadores,
tendo feito parte do Projeto for the New American Century, Tink Tank que
concentra em suas bases alguns dos principais nomes do neoconservadorismo.
Em livro mais recente, Fukuyama rompe com a corrente neoconservadora. Na
nossa análise, procuraremos esclarecer este rompimento, mas não tomamos este
como ponto de principal relevância com relação a este autor, principalmente porque
87
Quando Fukuyama argumenta que Burt um dos principais estudantes de psicologia da atualidade ao
questionar que o livro The Bell Curve foi construído sobre dados fabricados, o próprio Burt utilizou-se de
dados fabricados para chegar a suas críticas.
nossa preocupação se concentra na sua visão da sociedade estadunidense à época
em que se considerava parte do grupo.
Destacamos que os motivos que fizeram Fukuyama romper com os
neoconservadores dizem respeito à política externa do governo de George W. Bush.
Por este motivo consideramos que em seu pensamento sobre política interna,
Fukuyama continua mantendo laços bem estreitos com a corrente intelectual.
Nesse sentido, dividimos a análise em duas partes. Primeiramente uma rápida
análise sobre seu rompimento com o neoconservadorismo, buscando compreender a
natureza desse rompimento e a importância deste autor para o pensamento
neoconservador. Num segundo momento, analisaremos um ponto específico da sua
obra, procurando aprofundar a maneira como utiliza o conceito de capital social
para explicar as possibilidades de ascensão ou de insucesso dentro da sociedade dos
EUA. Pretendemos através da análise deste conceito, compreender a inserção de
valores culturais associados à economia, relação que é apresentada de maneira
constante nas obras de outros neoconservadores.
O rompimento de Fukuyama com o neoconservadorismo e com a atual
administração de Bush, parte de um sentimento contrário à guerra do Iraque, onde
visualiza quatro pontos fundamentais que surgiram no pós onze de setembro: a
criação de uma nova agencia federal (The Department of Homeland Security), a
invasão do Afeganistão, a doutrina da Guerra preventiva e a Invasão do Iraque. De
acordo com o autor, apenas as duas primeiras foram reações inevitáveis aos ataques
de 11 de setembro.
A postura da administração Bush parte da idéia da existência de uma hegemonia
benéfica dos EUA, a crítica de Fukuyama se concentra exatamente no fato de
considerar que esta crença foi aceita de maneira profundamente exagerada dentro
do governo.
Para compreendermos como Fukuyama observa a atual política externa dos
EUA é necessário refazer a caracterização que o autor propõe das escolas seguidas
pela política externa dentro das relações internacionais. De acordo com Fukuyama
existem quatro grandes escolas: neoconservadorismo (promoção da democracia,
hegemonia benéfica), realista (tradicional balanço de poder), liberal
internacionalista (que busca transcender o poder político através de leis e
instituições internacionais) e nacionalista Jacksoniana (limitada à visão de
segurança aos interesses americanos).
De acordo com o autor a guerra do Iraque é resultado de uma aliança do
neoconservadorismo com os Jacksonianos nacionalistas, e é neste ponto em que se
posiciona contrario à guerra, principalmente porque minimiza o conflito global com
o radicalismo Islâmico, percebendo que este representa apenas um fenômeno
isolado.
Como solução para a crise provocada pelos reflexos da política externa da
administração Bush, Fukuyama procura trabalhar com a idéia de uma nova
abordagem:
Este livro sugere um caminho diferente para a relação com o mundo,
um que não é neoconservador ou realista, Jacksoniano nem
internacionalista Liberal. Ele se esforça para definir um caminho
mais realista para os Estados Unidos promoverem outro
desenvolvimento político e econômico do que o das guerras
preventivas, e abrir uma agenda de múltiplo multilateralismo
apropriada com o real, extinguindo mundo de globalização.
(FUKUYAMA, 2006, p.10).
Parece claro que o rompimento de Fukuyama com a corrente neoconservadora é
motivado basicamente pela maneira como esta influenciou a nova postura externa
dos EUA que levou à invasão do Iraque. Na medida em que nosso foco se dirige às
questões internas, não conseguimos perceber uma ruptura nessa dimensão.
Em boa parte de seu livro Fukuyama refaz a história do neoconservadorismo
destacando em sua leitura a importância deste movimento. Percebemos também que
nas obras anteriores, toda a vez que o autor discute a sociedade estadunidense,
prende-se em tópicos profundamente relacionados à agenda neoconservadora, como
discussões envolvendo a crise da modernidade e da família, entre outras.
De maneira que percebemos com desconfiança este afastamento do autor da
corrente intelectual, já que o neoconservadorismo é muito mais do que a política
externa adotada durante a guerra contra o Iraque. Para que fique mais clara se há ou
não uma ruptura, nos propomos a analisar a visão de Fukuyama da sociedade
estadunidense. Destaca-se aqui a utilização do conceito de capital social associado à
situação dos grupos minoritários e imigrantes nos EUA, para Fukuyama:
O capital social pode ser definido simplesmente como um conjunto
de valores e normas informais partilhados por membros de um grupo
que lhes permite cooperar entre si. Espera-se que os outros
comportem confiável e honestamente, os membros do grupo
acabarão confiando uns nos outros. A confiança age como
lubrificante, levando qualquer grupo ou organização a funcionar com
mais eficiência. (FUKUYAMA, 2002, p.155).
Como característica principal, podemos destacar que qualquer grupo ou
sociedade possui uma quantidade de capital social, a questão é que nem todo capital
social é diretamente responsável pelo progresso econômico e social, ou, segundo o
autor:
Toda sociedade tem um estoque de capital social; a diferença real
entre as sociedades diz respeito ao que poderia ser chamado de “área
de verdade”. Ou seja, normas cooperativas como honestidade e
reciprocidade podem ser partilhadas por grupos e outros na mesma
sociedade. Famílias são, obviamente, fontes importantes de capital
social em toda parte. (FUKUAYAMA, 2002, p.156).
Para compreender melhor como alguns valores conseguem surgir na sociedade
civil e aumentar a confiança entre seus membros, primeiramente, partiremos do
conceito de sociedade civil proposto por Fukuyama:
“Sociedade civil” um complexo e confuso aglomerado de
instituições intermediarias, incluindo companhias, associações
voluntárias, instituições educacionais, clubes sindicatos, mídia,
entidades beneficentes e igrejas assenta-se, por seu turno, na
família, o instrumento primordial pelo qual as pessoas são
socializadas na sua cultura e adquirem os predicados que lhes
permitem viver numa sociedade mais abrangente e por meio da qual
os valores e o reconhecimento dessa sociedade são transmitidos de
geração em geração. (FUKUYAMA, 1996, p.18).
O capital social encontra-se presente em todos os grupos da sociedade, a grande
dificuldade concentra-se no fato de que nem todo o capital social é utilizado de maneira
correta, ou mesmo possibilita o aumento da unidade e da confiança. Fukuyama cita o
exemplo das famílias mafiosas, que apesar de possuírem leis, normas rígidas e respeito
mútuo entre seus membros, possuem um capital social que não é partilhado com o resto da
sociedade. Existem por este motivo alguns requisitos necessários para que se consiga
adquirir prosperidade:
Uma sociedade civil próspera depende de hábitos, costumes e
princípios éticos de sua gente atributos que só podem ser moldados
indiretamente mediante uma política deliberada e que precisam,
outrossim, ser alimentados por meio de uma conscientização e
respeito crescentes pela cultura.(FUKUYAMA, 1996, p.19).
O grande problema é que o acumulo de capital social se dá através de um
processo cultural complicado e que não se pode mapear facilmente, de maneira que
mesmo com os governos procurando desenvolver políticas públicas que tentem
criar e aumentar o capital social, ou mesmo eliminar capitais sociais considerados
maléficos para a sociedade, os resultados deste processo acabam sendo
imprevisíveis.
Podemos a partir da definição de capital social e suas influências no nível de
confiança procurar entender a relação entre a abordagem neoconservadora sobre os
grupos imigrantes e de minorias, e a argumentação de Fukuyama sobre a associação
de valores culturais, assimilação e ascensão social.
Partimos, primeiramente, de uma constatação realizada por Fukuyama em seu
livro Confiança, As Virtudes Sociais e a Criação da Prosperidade, que explicita
uma mudança na confiança existente entre as relações dentro dos EUA. De acordo
com o autor existiu nos EUA uma transformação que tem levado cada vez mais a
população a um individualismo:
Mas os Estados Unidos vêm mudando dramaticamente nas duas
últimas gerações no que se refere à sua arte de associação. De muitas
maneiras, a sociedade americana está se tornando individualista,
como os americanos sempre acreditaram ser: a tendência inerente ao
liberalismo baseado em direitos, a fim de expandir e multiplicar
esses direitos contra a autoridade de virtualmente todas as
comunidades existentes, levou a sua conclusão lógica. O declínio da
confiança e da sociabilidade nos Estados Unidos também é evidente
em qualquer levantamento das mudanças ocorridas na sociedade
americana: o aumento dos índices de violência e dos litígios civis; o
rompimento da estrutura familiar; o declínio de um grande leque de
estruturas sociais intermediárias como vizinhança, igrejas, sindicatos,
clubes e obras de caridade; e o sentimento generalizado entre os
americanos de falta de valores compartilhados e do espírito de
comunidade com os que os cercam. (FUKUYAMA, 1996, p.25).
A crise crescente nos EUA se centra no declínio da confiança e da sociabilidade
provocada pelo aumento do individualismo, agora, quando retomamos a leitura feita
por Chavez e por Fonte nas discussões envolvendo a necessidade de se manter a
unidade em torno de uma cultura comum, percebemos uma relação muito próxima à
abordagem de Fukuyama. As grandes questões seriam: Quais valores são
responsáveis pela criação de confiança e de sociabilidade dentro da nação? Seriam
os valores construídos durante a formação da nação, ou os valores recentes trazidos
pelos imigrantes nas últimas décadas? Os grupos imigrantes possuem um capital
social que consiga enriquecer o estoque nacional?
Se retomarmos as discussões envolvendo Chavez e Fonte, perceberemos que
existe um grande abismo entre a definição de capital social e a realidade das
minorias e imigrantes nos EUA.
Parece lógico que a idéia de que somente adquirindo determinados valores,
atingir-se-á o sucesso econômico e social dentro da sociedade, este processo
funciona como uma explicação limitante aos grupos minoritários e imigrantes,
principalmente se pensarmos que a proposta conservadora de assimilação se
concentra em abrir mão de uma identidade anterior e absorver as já existentes
dentro dos EUA.
Em outro sentido, a argumentação envolvendo a complexidade de se perceber
quais os valores responsáveis pelo aumento da unidade nacional acaba tornando
questionável o próprio processo de assimilação patriótica.
Outro ponto que consideramos importante destacar acaba aproximando a leitura
feita por Fukyama da realizada por Bloom e por Himmelfarb. Fukuyama considera
a família como sendo base da sociabilidade e da entrada dos jovens na sociedade
civil.
Partindo deste principio e da constatação feita pelo autor dos problemas da
sociedade, podemos concluir que este percebe na destruição do modelo familiar
nuclear burguês o inicio de uma crise maior que envolve a dissolução da hegemonia
estadunidense no mundo.
5 Considerações Finais.
Durante a elaboração deste texto procuramos focar nossa análise nos aspectos
que diferenciavam o movimento neoconservador de outros grupos conservadores. O
fato é que durante nossa leitura percebemos que o grande avanço dos
neoconservadores com relação aos conservadores tradicionais se dá naquilo que
assumem do libertarianismo econômico e do distanciamento de argumentos presos
à religião e à natureza, adotando uma busca mais empírica e mais argumentativa de
seus posicionamentos. Todavia, a percepção radical da contraposição existente,
entre a desestruturação de valores e instituições e os avanços apresentados após as
décadas de 1960 e 1970, mostram-se tanto, na obra conservadora, quanto, na obra
neoconservadora como referência que os aproxima em seus ideais políticos.
88
.
Esta aproximação, que foi constatada durante o aprofundamento da história e da
obra de alguns neoconservadores, acabou afastando nossa hipótese primária que
surgia dentro da idéia de que o movimento neoconservador possuía características
totalmente contrárias aos movimentos conservadores tradicionais.
Quanto à análise dos três temas abordados pelos autores neoconservadores, Jonh
Fonte, Linda Chavez, Charles Murray, Allan Bloom, Gertrude Himmelfarb e
Francis Fukuyama, percebemos que existe uma relação bem aprofundada na
maneira como este grupo observa a política interna estadunidense. Uma unidade
que não podemos focar quando analisamos pontos específicos da obra de cada um
destes autores
89
, mas, que podemos pontuar facilmente quando procuramos
organizar suas posições dentro de grandes temas.
Em nossa leitura esta unidade surge atrelada à rejeição criada às transformações
ocorridas durante as últimas décadas, tanto, como resultado da revolução dos anos
60 e 70, quanto, a preocupação com o enfraquecimento da cultura estadunidense e a
inserção cultural dos cada vez mais volumosos grupos imigrantes, que chegam ao
país.
Esta reação surge associada ao medo do enfraquecimento do modo de vida que
enaltecem. Em nossa pesquisa alcançamos à constatação, que a defesa do modo de
vida estadunidense surge incentivada, na maioria dos neoconservadores, por um
sentimento de aceitação a estes valores, relacionando-os como capazes de garantir o
sucesso na sociedade. Esta visão fica ainda mais clara quando percebemos que a
grande maioria dos neoconservadores possui sua origem em famílias vindas de
países estrangeiros, e que, como imigrantes, assimilaram-se com sucesso, refletindo
o mito do imigrante que abre mão de uma identidade anterior, em troca de valores
que lhe garantem a ascensão social.
88
Esta aproximação fica clara em algumas passagens de nossa exposição sobre a história do
neoconservadorismo, como no episódio envolvendo os escândalos do governo Clinton, e a associação de
um movimento neoconservador, na época enfraquecido, a outros grupos conservadores.
89
A grande dificuldade de se observar uma proximidade entre os autores neoconservadores se concentra
na grande variedade de temas trabalhados por estes autores.
Outro ponto que destacamos na abordagem neoconservadora é a facilidade com
que eles posicionam-se no debate sobre temas “obscuros” e impopulares no meio
intelectual. Esta característica que percebemos, como marcante, neste grupo
intelectual surge atrelada a um grande conhecimento, atribuído a educação
privilegiada de seus membros, o que possibilita a eles que se exponham ao dialogo,
mesmo quando suas opiniões são questionadas, ou ridicularizadas.
O posicionamento neoconservador mostra-se, não como, uma construção
intransigente, posicionando-se simplesmente contra os programas de auxílio e os
processos de imigração. Os neoconservadores propõem soluções para as falhas que
estes percebem na sociedade, construindo uma agenda que ultrapassa o plano
teórico e incorporando-se às políticas públicas do governo estadunidense como uma
idéia plausível.
Esclarecemos que não estamos aqui entrando em debate ideológico e político,
sobre o certo ou errado, mas da racionalidade meios-fins de uma corrente de
pensamento que de forma intermitente, de tempos em tempos, atinge forte presença
no debate intelectual e político da maior potência do planeta.
100
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