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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
I
NSTITUTO DE ASTRONOMIA, GEOFÍSICA E CIÊNCIAS ATMOSFÉRICAS
D
EPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ATMOSFÉRICAS
ANÁLISE DA VARIABILIDADE CLIMÁTICA DE
UM
MODELO DO CLIMA DA AMÉRICA DO SUL
NO PRESENTE E EM 6 KA AP
CANDIDA DE FREITAS DEWES
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
ORIENTADOR: PROF. DR. PEDRO LEITE DA SILVA DIAS
SÃO PAULO, FEVEREIRO DE 2007
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AGRADECIMENTOS
Ao CNPq e à FAPESP, cuja bolsa possibilitou a minha integral dedicação a esta pesquisa; e
ao IAI, por recursos destinados a esta pesquisa através do programa PROSUR.
Ao meu orientador, Pedro Dias, por ter apostado em mim. Também pela proposta de pesquisa
e pela independência concedida na sua execução – o que no início assustou mas no final
tornou-se um grande aprendizado. As conversas em que se discutiu os progressos no
trabalho sempre foram muito ricas e empolgantes. Gostaria de ter conseguido levar a cabo
todas as idéias que ele levantou ao longo destes dois anos…
Aos professores Leila, Edmilson e Charles, cujas valiosas dicas foram imprescindíveis para
que eu superasse certos obstáculos.
À Ana Elizabethe, à Tatiana, ao Marcos, ao PauloTak, ao Aravéquia, ao Schneider, à Isabel e
ao Márcio, pelo auxílio prestado em determinadas etapas da execução deste trabalho.
Ao laboratório MASTER, pela resolução dos problemas de hardware e software.
À Luciana, ao Samuel e ao Sebastião, da Seção de Informática deste departamento; à Rose e
ao Marcel da Secretaria de Pós-Graduação – pelo atendimento sempre prontamente
prestado.
Ao amigo Chico Aquino, por ter-me gentilmente cedido o seu iMac, sem o qual esta
dissertação não teria sido escrita na tranqüilidade do lar…
Aos grandes amigos que levarei do IAG: Nathalie, Fabrício, Bruno e Santiago, pelo
companheirismo, incentivo e apoio em todas as horas.
Ao Vinícius, à Vivian, à Selma e a todos os meus amigos do Clube Alpino Paulista, por terem
tornado a minha vida em São Paulo tão mais bacana!
Last but not least… à minha família que, mesmo longe, se fez presente em todos os
momentos, me apoiando e me incentivando a seguir em frente. A saudade está valendo a
pena!
RESUMO
Este estudo avalia as relações entre a temperatura da superfície do mar (TSM) e a
variabilidade climática na América do Sul, no presente e no Holoceno Médio (HM),
enfatizando a análise dos modos de variabilidade dos oceanos adjacentes e sua influência
sobre o sistema monçônico deste continente. Também é avaliado o desempenho do modelo
quanto à variabilidade climática no presente e no HM, através dos índices da Oscilação Sul,
do Niño3, da PDO e da AMO. A análise baseia-se nos resultados da versão IPSL_CM4 do
modelo do Institut Pierre Simon Laplace (IPSL), que integra o Paleoclimate Modelling
Intercomparision Project. O modelo acopla quatro componentes: atmosfera, oceano, gelo
marinho e superfície continental.
Diferenças no clima médio entre as simulações do presente e do HM indicam mudanças
no sistema monçônico, por conta da diminuição do contraste térmico continente-oceano no
HM. O resfriamento sobre o continente provoca aumento da pressão atmosférica nos meses de
verão, enfraquecendo o gradiente de pressão, e assim os alísios. Isto resulta em menor
transporte de umidade para o continente, menos atividade convectiva no interior e menor taxa
de precipitação.
Os índices de va riabilidade cli mática são analisados comparando-se os escalogramas de
ondeleta dos dados observados e das duas simulações do modelo. No presente, de modo geral, o
modelo aprese nta sinal de va riabilidade de bai xa freqüência, ma s existem dife renças si gnificativas
com relação às observações. As flutuações melhor simuladas estão relacionadas ao ENSO; a
componente atmosférica, no entanto, tem energia subestimada, enquanto a componente oceânica
tem energia superestimada nesta escala de variabilidade. A PDO, no modelo, é mascarada por
uma série de ruídos embutidos no índice. A AMO surge não como multidecadal (de 60 anos,
como observado), e sim na escala de 15 anos. Na simulação do HM, os dois índices do ENSO
apresentam menor energia nesta escala, indicando que o ENSO teria sido mais fraco. A PDO
é semelhante ao índice observado, mas no índice da AMO não aparece nenhuma oscilação
persistente que possa ser caracterizada como multidecadal.
Os modos de variabilidade dos oceanos Atlântico e Pacífico são definidos por EOFs. As
suas componentes principais são relacionadas ao índice de monção da América do Sul através
de ondeletas cruzadas. Os resultados para a simulação do presente indicam alta coerência
entre a variabilidade deste sistema e a dos oceanos nas escalas do ENSO e decadal. Na
simulação do HM, porém, a coerência nestas escalas é maior e mais persistente. Isto ocorre
porque o ENSO, apesar de mais fraco neste período, tinha maior regularidade.
ABSTRACT
An evaluation of the relationship between sea surface temperature (SST) and climatic
variability in South America in the present and during the mid-Holocene (MH) is the
objective of this work. Special emphasis is given to the role of the SST anomalies in the
summer monsoon system. The analyses are based on results of the most recent Institut Pierre
Simon Laplace (IPSL) climate model (version IPSL_CM4), which is part of the Paleoclimate
Modelling Intercomparision Project. The model couples four components: atmosphere,
ocean, sea-ice and continental surface. The metric for evaluation of the model results is based
on analyses of climatic indices such as SOI, Niño3, PDO and AMO.
In the mean climate, differences between the present and MH simulations indicate
changes in the monsoon system, caused by the weaker continent-ocean thermal contrast in the
MH. The cooling over the continent causes higher atmospheric pressure during summertime,
weakening the pressure gradient and thus the trade winds. This results in less moisture
transport to the continent, less convective activity and less precipitation.
The climatic variability indices are analised by comparing the wavelet spectra of
observed and model data. For the present climate simulation, the model broadly reproduces
the low-frequency variability, but there are important differences with respect to the
observations. The best simulated fluctuations are those related to ENSO. However, the energy
of the atmospheric component is underestimated, while the energy of the oceanic component
is overestimated. The modelled PDO is diluted by noise embedded in the time series of the
index. The AMO appears not as a multidecadal oscillation (of 60 years, as observed), but at
the 15-year scale. In the MH-simulation, both ENSO-indices present lower energy at this
scale, indicating a weaker ENSO. The PDO is similar to the observed index, but in the AMO-
index no persistent oscillation appears at the multidecadal scale.
The Atlantic and Pacific variability modes are defined by EOF analyses. Their principal
components are related to the South America monsoon index as shown by the cross-wavelet
analysis. The results for the present-climate simulation show high coherence between the
variability of this system and that of the oceans at the ENSO and decadal scales. However, in
the MH coherence at these scales is even higher and more persistant. This happens because
ENSO, despite being weaker, occurs more regularly during the MH simulation
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
iv
ÍNDICE
Índice de figuras ........................................................................................................................ vi
Índice de tabelas ........................................................................................................................ x
Índice de abreviaturas ............................................................................................................... xi
Capítulo 1: Introdução ............................................................................................................ 1
1.1. Propósito do estudo .......................................................................................................... 1
1.2. Índices de variabilidade climática .................................................................................... 5
1.3. O clima da América do Sul e o sistema monçônico ......................................................... 8
1.3.1. Diversidade climática ................................................. .............................. ............. 8
1.3.2. O sistema monçônico da América do Sul ............................................................. 12
1.4. Variabilidade dos oceanos Atlântico e Pacífico ............................................................... 16
1.5. Holoceno Médio ............................................................................................................... 18
1.5.1. Modelagem do Holoceno Médio ........................................................................... 19
1.5.2. Indicadores paleoclimáticos (proxies) na América do Sul .................................... 23
Capítulo 2: Dados e Metodologia............................................................................................ 27
2.1. Descrição do modelo ........................................................................................................ 27
2.2. Simulações ........................................................................................................................ 28
2.3. Observações ...................................................................................................................... 29
2.4. Metodologia ...................................................................................................................... 30
2.4.1. Análise por diferenças dos campos médios mensais ............................................. 30
2.4.2. Análise por Funções Ortogonais Empíricas (EOFs) ............................................. 31
2.4.3. Análise da variabilidade temporal por Transformada de Ondeleta (TO) .............. 34
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP............................................................. 39
3.1. Clima médio no presente .................................................................................................. 39
3.2. Clima médio na América do Sul em 6 ka AP ................................................................... 49
Índices
v
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP .......................................... 59
4.1. Índices de variabilidade climática ..................................................................................... 59
4.2. EOFs dos oceanos Atlântico e Pacífico ............................................................................ 65
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP ....... 77
5.1. Índice de monção na América do Sul (LISAM) ............................................................... 77
5.2. Influência dos oceanos na monção na América do Sul ..................................................... 80
Capítulo 6: Conclusões............................................................................................................. 91
Referências Bibliográficas ....................................................................................................... 95
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
vi
ÍNDICE DE FIGURAS
Fig. 1.1: Ciclos de Milankovitch: figuras ilustrativas das variações nos parâmetros orbitais da
Terra. Os gráficos indicam a evolução temporal destes parâmetros nos últimos 800 ka e
a freqüência aproximada de um ciclo na (a) excentricidade da órbita, (b) obliqüidade
eclíptica, (c) precessão do eixo de rotação .............................................. ...... ................ 2
Fig. 1.2: Representação esquemática da interação oceano-atmosfera sobre o Pacífico em
condições normais, anos de El Niño, anos de La Niña ................................................... 6
Fig. 1.3: PDO. (a) TSM baseada no padrão de TSM da 1
a
EOF da bacia do Pacífico ao norte de
20°N, para o período 1911–2004, e projetada para o oceano global; (b) série temporal
anual e série suavizada com filtro decadal...................................................................... 7
Fig. 1.4: a AMO desde o início das observaçõ es instrumentais ............................................... .... 8
Fig. 1.5: Mapa topográfico da América do Sul, com altitude dada pela escala de cores. Setas
indicam regiões de entrada das massas de ar marítima equatorial, tropical e polar ....... 9
Fig. 1.6: Ilustrações esquemáticas do sistema monçônico da América do Sul ........................... 13
Fig. 1.7: Padrões da 1a EOFc representados por correlações entre a componente principal e as
anomalias sazonais de (a) precipitação do GPCP, (b) umidade específica, (c)
temperatura, (d) vento zonal e (e) vento meridional ..................................................... 15
Fig. 1.8: Parâmetros orbitais para o presente e para 6 ka AP ..................................................... 19
Fig. 1.9:
Distribuição da insolação mensal, por latitude, no presente e a diferença desta no HM,
com relação ao presente ................................................................................................ 19
Fig. 3.1: PPT climatológica do GPCP, de 2L24 e a diferença 2L24–GPCP, para os trimestres
DJF, MAM, JJA e SON ................................................................................................ 40
Fig. 3.2: Diferença entre campos médios da ROL climatológica de 2L24 e da reanálise
NCEP/NCAR, para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON .......................................... 41
Fig. 3.3: Diferença entre campos médios de Q2M climatológica de 2L24 e da reanálise
NCEP/NCAR, para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON .......................................... 42
Índices
vii
Fig. 3.4: T2M climatológica da reanálise NCEP/NCAR, de 2L24 e a diferença 2L24–Reanálise,
para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON .................................................................. 43
Fig. 3.5: PNM climatológica da reanálise NCEP/NCAR, de 2L24 e a diferença 2L24–Reanálise,
para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON .................................................................. 45
Fig. 3.6: Vento climatológico em 200 hPa da reanálise NCEP/NCAR, de 2L24 e a diferença
2L24–Reanálise, para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON ...................................... 46
Fig. 3.7: Vento climatológico em 850 hPa da reanálise NCEP/NCAR, de 2L24 e a diferença
2L24–Reanálise, para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON ...................................... 47
Fig. 3.8: Diferença entre a TSM climatológica de 2L24 e do conjunto NOAA para DJF, MAM,
JJA e SON .................................................................................................................... 48
Fig. 3.9: Diferença entre a TSM climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e
SON .............................................................................................................................. 49
Fig. 3.10: Diferença entre a PPT climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e
SON .............................................................................................................................. 50
Fig. 3.11: Diferença entre a ROL no TOA climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM,
JJA e SON .................................................................................................................... 50
Fig. 3.12: Diferença entre a Q2M climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e
SON .............................................................................................................................. 51
Fig. 3.13: Diferença entre a T2M climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e
SON .............................................................................................................................. 51
Fig. 3.14: Diferença entre a PNM climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e
SON .............................................................................................................................. 52
Fig. 3.15: Diferença entre o vento climatológico em 200 hPa de HOL04 e de 2L24 para DJF,
MAM, JJA e SON ........................................................................................................ 52
Fig. 3.16: Diferença entre a direção do vento climatológico em 850 hPa de HOL04 e de 2L24
para DJF, MAM, JJA e SON ........................................................................................ 53
Fig. 3.17: Localidades da América do Sul selecionadas para análise do ciclo anual, da média e do
desvio-padrão da precipitação ...................................................................................... 53
Fig. 3.18: Ciclo anual da PPT no presente (triângulos) e no HM (círculos), das localidades
selecionadas da América do Sul ................................................................................... 54
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
viii
Fig. 4.1: Série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da ondeleta e espectro de
ondeleta global do SOI, calculado com dados de PNM (a) observados, do Climate
Research Unit, (b) em 2L24 e (c) em HOL04 .............................................................. 60
Fig. 4.2: Série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da ondeleta e espectro de
ondeleta global do Niño3, obtido com anomalias de TSM (a) observadas (Rayner et al.,
2003), (b) de 2L24 e (c) de HOL04 .............................................................................. 61
Fig. 4.3: Série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da ondeleta e espectro de
ondeleta global da PDO, representada pela 1
a
EOF das anomalias de TSM do Pacífico
ao norte de 20°N, obtida com dados (a) observados (Mantua et al., 1997), (b) de 2L24 e
(c) de HOL04 ................................................................................................................ 63
Fig. 4.4: Série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da ondeleta e espectro de
ondeleta global da AMO, representada pelas anomalias de TSM do Atlântico Norte (0–
70°N) (a) observadas (Kaplan et al., 1998), (b) em 2L24 e (c) em HOL04 ................. 64
Fig. 4.5: Variância explicada pelas quatro primeiras EOFs do Atlântico, em 2L24 e HOL04 .. 65
Fig. 4.6: Padrão espacial da 1
a
EOF do Atlântico em 2L24 e HOL04, junto com os respectivos
coeficientes de expansão ........................... .............................. ...... .............................. .. 66
Fig. 4.7: Padrão espacial da 2
a
EOF do Atlântico em 2L24 e HOL04, junto com os respectivos
coeficientes de expansão ........................... .............................. ...... .............................. .. 68
Fig. 4.8: Padrão espacial da 3
a
EOF do Atlântico em 2L24 e HOL04, junto com os respectivos
coeficientes de expansão ........................... .............................. ...... .............................. .. 69
Fig. 4.9: Variância explicada pelas quatro primeiras EOFs do Pacífico, em 2L24 e HOL04 .... 70
Fig. 4.10: Padrão espacial da 1
a
EOF do Pacífico em 2L24 e HOL04, junto com os r espectivos
coeficientes de expansão ........................... .............................. ...... .............................. .. 71
Fig. 4.11: Padrão espacial da 1
a
EOF do Pacífico em 2L24 e HOL04, junto com os r espectivos
coeficientes de expansão ........................... .............................. ...... .............................. .. 73
Fig. 4.12: Padrão espacial da 1
a
EOF do Pacífico em 2L24 e HOL04, junto com os r espectivos
coeficientes de expansão ........................... .............................. ...... .............................. .. 75
Fig. 5.1: Campos de correlação entre o LISAM e as anomalias sazonais de (a) PPT, (b) Q850, (c)
T850, (d) U850 e (e) V850 em 2L24 ............................................................................ 78
Fig. 5.2: Campos de correlação entre o LISAM e as anomalias sazonais de (a) PPT, (b) Q850, (c)
T850, (d) U850 e (e) V850 em HOL04 ........................................................................ 79
Índices
ix
Fig. 5.3: O LISAM em 2L24 e em HOL04. A série temporal do índice e a energia do seu ciclo
anual, dada pelo escalograma dos coeficientes da ondeleta e pelo espectro de ondeleta
global ............................................................................................................................ 79
Fig. 5.4: As séries de anomalias do LISAM em 2L24 e em HOL04. A variabilidade do índice é
dada pelo escalograma de fase das anomalias e pelo espectro de ondeleta global ...... 80
Fig. 5.5: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 1
a
EOF do Atlântico Tropical em 2L24 .................................................. 81
Fig. 5.6: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 2
a
EOF do Atlântico Tropical em 2L24 .................................................. 82
Fig. 5.7: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 1
a
EOF do Pacífico Tropical em 2L24 .................................................... 83
Fig. 5.8: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 2
a
EOF do Pacífico Tropical em 2L24 .................................................... 84
Fig. 5.9: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 1
a
EOF do Atlântico Tropical em HOL04 ............................................... 85
Fig. 5.10: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 2
a
EOF do Atlântico Tropical em HOL04 ............................................... 86
Fig. 5.11: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 1
a
EOF do Pacífico Tropical em HOL04 ................................................ 87
Fig. 5.12: Transformada de Ondeletas Cruzadas entre as séries temporais das anomalias do
LISAM e da 2
a
EOF do Pacífico Tropical em HOL04 ................................................ 88
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
x
ÍNDICE DE TABELAS
Tab. 3.1: média e desvio-padrão da PPT nos 100 anos das simulações 2L24 e HOL04 das
localidades selecionadas da América do Sul .............................................................. 56
Índices
x
i
ÍNDICE DE ABREVIATURAS
2L24 simulação climática do presente
AB Alta da Bolívia
AMO Oscilação Multi-Decadal do Atlântico
ASAN Alta Subtropical do Atlântico Norte
ASAS Alta Subtropical do Atlântico Sul
ASPN Alta Subtropical do Pacífico Norte
ASPS Alta Subtropical do Pacífico Sul
CCMs Complexos Convectivos de Mesoescala
DJF dezembro-janeiro-fevereiro
EN El Niño
ENSO El Niño–Oscilação Sul
EOFs Empirical Othogonal Functions
GCMs Modelos de Circulação Geral
GPCP Global Precipitation Climatology Project
HM Holoce no Médio
HOL04 simulação climática do Holocendo Médio
IPSL Institut Pierre Simon Laplace
JBN Jato de Baixos Níveis
JJA junho-julho-agosto
ka AP mil an os antes do pr esente
LISAM Large-scale Index for South America Monsoon
LN La Niña
MAM março-abril-maio
NCAR National Center for Atmospheric Research
NCEP National Center for Environmental Prediction
PDO Oscilação Decadal do Pacífico
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
x
ii
PMIP Paleoclimate Modeling Intercomparision Project
PNM pressão ao nível do mar
PPT precipitação
Q2M umidade específica a 2 m
Q850 umidade específica em 850 hPa
ROL radiação de onda longa emergente no topo da atmosfera
SO Oscilação Sul
SOI Índice da Oscilação Sul
SON setembro-outubro-novembro
T2M temperatura do ar a 2 m
T850 temperatura do ar em 850 hPa
TF Transformada de Fourier
TO Transformada de Ondeleta
TOA topo da atmosfera
TSM temperatura da superfície do mar
U200 componente zonal do vento em 200 hPa
U850 componente zonal do vento em 850 hPa
V200 componente meridional do vento em 200 hPa
V850 componente meridional do vento em 850 hPa
ZCAS Zona de Convergência do Atlântico Sul
ZCIT Zona de Convergência Intertropical
ZCPS Zona de Convergência do Pacífico Sul
ZFB Zona Frontal do Baiu
ZSPs Zonas Subtropicais de Precipitação
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO
1.1. Propósito do estudo
O entendimento dos mecanismos e da história da variabilidade climática natural é
importante para o aprimoramento da previsibilidade do clima e a atribuição apropriada das
mudanças climáticas em curso a forçantes humanas e naturais. O registro paleoclimático
fornece indícios da variabilidade climática do passado e contém um espectro de
mudanças/variações climáticas muito maior, em termos de duração e amplitude, do que o
registro instrumental. O registro paleoclimático pode, portanto, fornecer noções de como o
sistema climático responde quando forçado por forçantes não-antropogênicas (Jansen e
Weaver, 2006).
Uma outra forma de avaliar os mecanismos associados à variabilidade climática é
através de modelos climáticos. Modelos climáticos são ferramentas úteis para estudar as
complexas relações entre as várias forçantes e as respectivas respostas do sistema climático.
Modelos climáticos diferentes, quando sujeitos à(s) mesma(s) forçante(s), produzem aspectos
globais das mudanças climáticas qualitativamente similares; no entanto a magnitude e os
padrões das respostas é que variam substancialmente de um modelo para o outro, em função
das parametrizações estabelecidas no código de cada um.
A modelagem de paleoclimas é bastante útil para testar os Modelos de Circulação Geral
(GCMs), pois permite a intercomparação entre simulações de modelos diferentes e a sua
habilidade de simular mudanças climáticas pode ser validada por séries mais longas de dados
fornecidos pelas reconstruções paleoclimáticas (Clauzet et al., 2006). Os modelos também
permitem a investigação de causa e efeito em mudanças climáticas do passado. São eles que
preenchem as lacunas entre as escalas local e global, uma vez que a informação
paleoclimática é quase sempre esparsa, fragmentada e sazonal. Um longo registro de
testemunho de gelo, por exemplo, mostra uma forte correlação entre a temperatura local na
Antártica e a concentração global de CO
2
e gás metano, mas as conexões entre estas variáveis
só podem ser exploradas com o auxílio de modelos. Desenvolver um entendimento
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
2
quantitativo dos mecanismos é a melhor forma de conhecer o clima passado para projetar o
clima futuro, uma vez que não há analogias diretas do clima futuro no passado.
Ao considerar mudanças climáticas mediante a distribuição de continentes e oceanos tal
como tem-se hoje, a forçante primária em dezenas de milhares de anos está relacionada aos
parâmetros orbitais da Terra – que oscilam nos chamados ciclos de Milankovitch (Fig. 1.1) –
que modulam a distribuição sazonal e latitudinal (obliqüidade e precessão) e o aporte total de
radiação solar incidente (excentricidade) (Burroughs, 1992). A forçante orbital, causada pelas
forças gravitacionais dos planetas, é a única forçante que pode ser precisamente calculada
para muitos milhões de anos passados bem como para o futuro (Beer, 2006). A compreensão
das reações desencadeadas por esta forçante nos vários componentes do sistema climático
torna-se, portanto, providencial.
Fig. 1.1: Ciclos de Milankovitch: figuras ilustrativas das variações nos parâmetros orbitais da Terra. Os gráficos
indicam a evolução temporal destes parâmetros nos últimos 800 ka e a freqüência aproximada de um ciclo na
(a) excentricidade da órbita, (b) obliqüidade eclíptica, (c) precessão do eixo de rotação (figuras obtidas nos sites
http://www.im.ntu.edu.tw/~b90048/scorpius/milankovitch.jpg e http://strata.geol.sc.edu/images/Milankovitch.jpg).
O Paleoclimate Modeling Intercomparision Project (PMIP – Joussaume e Taylor, 1995)
foi criado para coordenar e incentivar o estudo sistemático de modelos climáticos para
períodos chave do passado. Trata-se de um projeto internacional que envolve 19 grupos de
modelagem climática, respaldado pelo IGBP (International Geosphere Biosphere Project
Capítulo 1: Introdução
3
sub-área Past Global Changes) e pelo WCRP (World Climate Research Program – grupo de
trabalho Modelos Acoplados). Inicialmente, o foco deste projeto foi em dois períodos: o
Último Máximo Glacial (21 ka AP) e o Holoceno Médio (HM) (6 ka AP). O Último Máximo
Glacial provê a oportunidade de testar a habilidade dos modelos em simular condições
extremamente frias, e estudar os mecanismos de retroalimentação associados tanto ao
decréscimo na concentração do CO
2
atmosférico quanto à presença de mantos de gelo de 2 a 3
km sobre a América do Norte e o norte da Europa. Já o HM foi escolhido para testar a
resposta do sistema climático a uma mudança no contraste sazonal da radiação solar incidente
no topo da atmosfera (Braconnot et al., 2003, 2004), devida a variações nos parâmetros
orbitais da Terra.
Na primeira fase do PMIP, as simulações para o HM foram feitas com GCMs
atmosféricos. Tanto a cobertura vegetal quanto o ciclo sazonal médio da temperatura da
superfície do mar (TSM) eram prescritas com as condições atuais (Valdes, 2000; Zhao et al.,
2005). Assim, estas simulações testavam somente a sensibilidade da atmosfera e da superfície
continental a mudanças na insolação, negligenciando mudanças na circulação oceânica. A
discrepância constatada entre modelos e dados levou à conclusão de que somente a resposta
atmosférica à forçante orbital não era suficiente para explicar mudanças observadas na
vegetação e no ciclo hidrológico (Braconnot et al., 2002).
Atualmente na sua segunda fase (PMIP-II – Harrison et al., 2002; Braconnot et al.,
2003), o projeto direciona o foco para simulações de modelos acoplados, i.e. onde a dinâmica
da atmosfera interage com a dinâmica dos oceanos – alguns modelos incluem ainda a
dinâmica da vegetação, hidrologia de superfícies continentais e gelo marinho. As simulações
acopladas permitem considerar novas questões como o papel da circulação termohalina nas
mudanças climáticas, ou mudanças na variabilidade interanual a multidecadal e como a
retroalimentação oceânica e da vegetação modulam estas mudanças (Braconnot et al., 2003;
Zhao et al., 2005). Nesta fase outros períodos são também considerados: o início do Holoceno
(9 ka AP), quando a forçante da insolação era ainda maior do que em 6 ka; o início da última
glaciação (115 ka AP), para entender que processos são necessários para amplificar a forçante
de insolação e ainda trazer o sistema climático de um estado interglacial quente para um
estado glacial frio (Harrison et al., 2002; Braconnot et al., 2003); e dois períodos de
resfriamento abrupto, o Younger Dryas (observado em diferentes regiões do Hemisfério Norte
entre 12,7 e 11,7 ka AP) e o evento de 8,2 ka AP, importantes para obter informações sobre a
estabilidade da circulação oceânica (Crucifix et al., 2005).
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
4
Neste contexto, o presente estudo analisa simulações de um modelo acoplado produzido
no Institut Pierre Simon Laplace (IPSL, Paris), uma das instituições participantes do PMIP. O
estudo tem como objetivo central a avaliação das relações entre a TSM e a variabilidade
climática na América do Sul, nas simulações do presente e de 6 ka AP. Ênfase é dada à
análise dos modos de variabilidade dos oceanos adjacentes a este continente e sua influência
sobre os regimes de precipitação e circulação atmosférica sobre o mesmo, buscando assim
caracterizar a variabilidade da monção da América do Sul e sua dependência das condições de
TSM durante este período do passado, em contraste com o controle atualmente exercido. Este
Capítulo 1: Introdução
5
1.2. Índices de variabilidade climática
O clima global tem diversos padrões preferenciais de variabilidade que constituem o
clima da superfície. Alguns padrões refletem-se na circulação atmosférica, outros na oceânica,
e muitos evoluem em função do acoplamento entre atmosfera e oceano. São chamados
padrões de teleconexão, pois tratam-se de fenômenos ondulatórios que transportam energia
para regiões distantes da fonte de perturbação, tornando a relação de causa-efeito bastante
complexa, tanto espacial quanto temporalmente.
A análise de teleconexões tem empregado uma perspectiva tipicamente linear, que
assume um padrão espacial básico variando continuamente numa amplitude que tem
polaridades positivas e negativas espelhadas (e.g. Hurrell, 1995; Quadrelli e Wallace, 2004);
atualmente, porém, interpretações não-lineares da variabilidade climática têm sido cada vez
mais aplicadas (Wang e Wang, 1996; Palmer, 1999; Corti et al., 1999; Monahan et al., 2001).
Valendo-se da facilidade de que alguns padrões de teleconexão são representados por
índices (e portanto séries temporais), neste trabalho investigou-se como o modelo do IPSL
reproduz a variabilidade do sistema climático. Para tanto foi adotada uma perspectiva não-
linear, i.e. procurou-se determinar não só o período de variação dos índices climáticos, mas
também como se dá a sua evolução no tempo. Foram selecionados quatro índices
representativos dos principais padrões climáticos envolvendo os oceanos Atlântico e Pacífico.
Os eventos El Niño–Oscilação Sul (ENSO) são fenômenos do sistema acoplado oceano-
atmosfera. O El Niño (EN) envolve o aquecimento das águas superficiais do Pacífico Tropical
na região entre a Linha Internacional de Data e a costa oeste da América do Sul, com
mudanças na circulação oceânica a ele associadas. Está intimamente ligado à contrapartida
atmosférica, a Oscilação Sul (SO), que envolve mudanças nos ventos alísios e circulação
tropical associada. O fenômeno por inteiro é conhecido como ENSO. El Niño é a fase quente
do ENSO e La Niña (LN) a fase fria (Fig. 1.2). Historicamente, eventos EN ocorrem a cada 3-
7 anos e alternam com a fase oposta, de temperaturas abaixo da média no Pacífico Tropical
(LN). O ENSO tem impactos globais, manifestando maior força nos meses de inverno de
ambos hemisférios. Anomalias de pressão ao nível do mar (PNM) são muito maiores nos
extratrópicos, enquanto nos trópicos se observam maiores variações na precipitação
(Bjerknes, 1969; Cane, 2005; Ambrizzi et al., 2006).
Para diagnosticar a ocorrência dos eventos de maneira simples e confiável (pela
natureza dos dados), e também para permitir um acompanhamento da intensidade e freqüência
dos eventos, a comunidade científica internacional definiu índices representativos das
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
6
componentes atmosférica e oceânica do fenômeno. São eles: o Índice da Oscilação Sul (SOI)
e o Niño3, respectivamente.
Fig. 1.2: Representação esquemática da interação oceano-atmosfera sobre o Pacífico em (da esq. para a dir.):
condições normais, anos de El Niño, anos de La Niña (Ambrizzi et al., 2006).
O Niño3 refere-se às anomalias de TSM com relação à média da região do Pacífico
Central definida pelo quadrilátero 5°N–5°S e 150°–90°W (Trenberth, 1997). Já o SOI é
definido como a diferença normalizada de PNM entre Tahiti, no Pacífico Central, e Darwin,
na Austrália (Troup, 1965; Ropelewski e Jones, 1987). A pressiño6.hcisé ()isa2cisnt9.12(10.éoleSM com)4 -0.96 refBT12 (93 6 ref(6 )adom)f.5(relw[(7(utuasen)ica fa.hcisa do fenôs opo12(1, sin)ica u) normando. São 195re)]TJ16.72 0 TD12 0002 Tcum “.15ito gangorra”. Em6.6(aa)-0EN,defindo. São -195M com)4 -0.96 r12 0 TD1990009 Tcataçcenos 10águ.4(oi)-1.6(da regiã)3.7(i)o Cér6eân
Capítulo 1: Introdução
7
O estudo de Wang e Wang (1996) levanta também a hipótese de uma variabilidade
interdecadal modular o sinal do ENSO, porém não oferece explicações. Foi o trabalho de
Mantua et al. (1997) que consagrou a existência de um padrão de flutuação interdecadal no
Pacífico Norte, que mais tarde mostrou-se influente em toda a bacia oceânica.
A Oscilação Decadal do Pacífico (PDO), como ficou conhecida, tem como índice o
coeficiente de expansão (i.e., a série temporal) do primeiro modo de variabilidade (1
a
EOF)
das anomalias mensais de TSM do Pacífico ao norte de 20°N (Hare, 1996). A PDO possui
uma assinatura espacial bastante semelhante à do EN (Fig. 1.3a), no entanto o seu padrão de
TSM é menos confinado equatorialmente no Pacífico Leste e apresenta uma estrutura
importante no Pacífico Norte Extratropical (Zhang et al., 1997). Tal como o ENSO, a PDO é
também um fenômeno resultante do acoplamento oceano-atmosfera, pois associadas a ele
estão variações na intensidade do sistema de baixa pressão das Aleutas. As flutuações do
ENSO, porém, são predominantemente interanuais, enquanto as da PDO são basicamente
interdecadais (Mantua e Hare, 2002). A PDO e o ENSO podem ter efeitos combinados em
distribuições anômalas de precipitação, por exemplo, agindo construtivamente (com
anomalias fortes e bem definidas) quando estão na mesma fase e destrutivamente (com
anomalias fracas e ruidosas) quando estão em fases opostas (Andreoli e Kayano, 2005). Em
uma série do índice da PDO que remete ao início do século XX, teriam ocorrido inversões de
fase em 1925, 1947 e 1977 (Fig. 1.3b), cada uma delas caracterizando mudanças abruptas no
regime climático. De fato, fases quentes (frias) do ENSO tendem a coincidir com anos de
polaridade positiva (negativa) da PDO (Mantua e Hare, 2002).
Fig.1.3: PDO. (a) TSM baseada no padrão de TSM da 1
a
EOF da bacia do Pacífico ao norte de 20°N, para o
período 1911–2004, e projetada para o oceano global (unidades adimensionais); (b) série temporal anual e série
suavizada com filtro decadal (curva preta) (IPCC, 2007, atualizando Mantua et al., 1997).
A TSM do Atlântico Norte mostra, desde o início das observações instrumentais, um
ciclo de 65-75 anos (amplitude de ~0,4°C), com fases aparentemente quentes entre 1860-1880
e 1930-1960 e fases frias entre 1905-1925 e 1965-1990 (Fig. 1.4) (Schlesinger e Ramankutty,
1994). Este padrão foi denominado Oscilação Multi-Decadal do Atlântico (AMO) (Kerr,
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
8
2000). O seu índice é dado pela média das anomalias de TSM da bacia do Atlântico Norte, de
0 a 70°N (Enfield et al., 2001). As observações instrumentais captam somente dois ciclos
completos, logo foi preciso confirmar a significância do sinal utilizando proxies. Oscilações
similares (e quase-estacionárias) na faixa de 60-110 anos foram encontradas em reconstruções
paleoclimáticas do Atlântico Norte dos últimos 500 anos (Gray et al., 2004). Tanto as
observações quanto simulações em modelos implicam em mudanças na intensidade da
circulação termohalina sendo a fonte primária de variabilidade multidecadal e sugerem uma
possível componente oscilatória ao seu comportamento. Aparentemente, a AMO modula a
intensidade e freqüência de furacões, secas no NE brasileiro e no Sahel, as teleconexões do
ENSO e pode até mesmo estar contribuindo para o aquecimento global constatado nos
últimos anos (Kerr, 2000 e 2005; Enfield et al., 2001).
Fig. 1.4: a AMO desde o início das observações instrumentais (Enfield et al., 2001).
1.3. O clima da América do Sul e o sistema monçônico
1.3.1. Diversidade climática
O continente sul-americano compreende uma gama de feições climáticas. Sua extensão
desde os trópicos até altas latitudes, sua forma triangular e a cordilheira dos Andes,
acompanhando toda a costa do Pacífico (Fig. 1.5), contribuem para gerar grande diversidade
de climas nos seus 17,6 milhões de km
2
(Ambrizzi et al., 2006).
Na zona tropical, a oeste da cordilheira, o clima é controlado por dois elementos da
circulação geral: a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) e a Alta Subtropical do
Pacífico Sul (ASPS). Este anticiclone sustenta a corrente oceânica de Humboldt (ou do Peru),
que transporta águas frias do sul ao longo da costa e mantém as águas costeiras relativamente
frias para tal latitude – quase no equador – inibindo o deslocamento para o sul da ZCIT
(Nieuwolt, 1977). É por isto (e também por estar sob a porção subsidente da ASPS) que o sul
do Peru e a metade norte do Chile (entre o equador e 20°S) compõem uma das regiões mais
Capítulo 1: Introdução
9
áridas do planeta, um enorme contraste com a região tropical úmida do lado leste da
cordilheira.
A ASPS é bastante forte e persistente ao longo do ano (Trewartha, 1961). Os alísios
associados à ASPS têm orientação SSW, mas nos níveis mais baixos são defletidos pela
cordilheira assumindo orientação paralela à costa, provocando ressurgência e baixando a
temperatura da superfície do mar já fria (Nieuwolt, 1977).
Fig. 1.5: Mapa topográfico da América do Sul, com altitude dada pela escala de cores. Setas indicam regiões de
entrada das massas de ar marítima equatorial (Em), tropical (Tm) e polar (Pm) (Ambrizzi et al., 2006).
O extremo NW do continente (a Colômbia, basicamente), é uma região constantemente
úmida por estar sob influência da ZCIT o ano inteiro. Associado a ela estão os ventos
equatoriais de oeste (NW no norte e SW no sul), trazendo umidade do Pacífico. Junto à costa,
as águas deste são quentes, trazidas pela contra-corrente equatorial (de oeste). As massas de ar
que chegam ao continente por este setor são quentes e úmidas, e a convergência dos ventos
associada à forçante orográfica dos Andes provoca chuvas abundantes o ano inteiro. Nos
meses dezembro-janeiro a chuva é relativamente menos abundante porque a ZCIT afasta-se
em direção ao sul.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
10
Ao sul desta região, no centro e norte do Peru (ao norte do deserto), está uma região de
transição onde chove somente durante parte do ano. Julho e agosto são meses secos pois é
quando a ASPS está mais fortalecida. Afastando-se um pouco para o interior do continente, a
encosta dos Andes recebe precipitação o ano inteiro devido à forçante orográfica (Nieuwolt,
1977).
A metade sul do Chile apresenta chuvas abundantes no inverno. Na região central, os
verões são secos, pois é quando a ASPS está mais intensa (Satyamurty et al., 1998). No
inverno ela enfraquece e predomina a atividade ciclônica (transientes). Mais ao sul, os verões
não são secos – mas ainda chove menos do que no inverno – pois mais constantes são os
ventos de oeste e mais freqüente a passagem dos ciclones móveis formados sobre o Pacífico
Sul, muitas vezes barrados pela cordilheira dos Andes (Trewartha, 1961).
Já do outro lado da cordilheira, no extremo sul da América do Sul, a distribuição
sazonal de precipitação é proporcionalmente equivalente à mesma latitude a oeste da
cordilheira, o que sugere que os controles operando na vertente do Pacífico estendem sua
influência ao lado leste. À medida que avança em direção à costa atlântica, no entanto, o
volume anual de chuva cai para índices de deserto. As causas estão na circulação em altos
níveis. No extremo sul do continente, os Andes vão diminuindo em altitude e o escoamento
de oeste consegue transpô-los. Ao ascender sobre as montanhas, a coluna de ar é comprimida
verticalmente contra a tropopausa. Ao descender, a sotavento, a coluna se estica, o que resulta
no desenvolvimento de uma crista anticiclônica em altos níveis sobre a cordilheira, enquanto
um cavado com orientação meridional é gerado mais a leste, sobre o oceano. Este sistema
crista-cavado faz com que os ventos sobre a Patagônia sejam de sudoeste, caracterizados por
curvatura anticiclônica e pela subsidência a ela associada. Os ciclones móveis que chegam no
continente ao sul de 50°S deslocam-se de SW para NE, acompanhando o escoamento
anticiclônico de altos níveis, porém perdendo intensidade devido à subsidência (Trewartha,
1961).
Mais ao norte, porém, no centro-leste da Argentina, Uruguai e Rio Grande do Sul (a
bacia do rio da Prata), o escoamento de altos níveis torna-se ciclônico, e os sistemas
ciclônicos formados (ou regenerados) nesta latitude são fortalecidos pelo encontro com
massas de ar tropical e pela convergência de ar próximo à costa atlântica (Trewartha, 1961). É
sobre esta área que se formam as frentes frias, principal determinante do regime de
precipitação anual. Algumas vezes massas de ar polar entram com tanta força que conseguem
atravessar esta extensa planície até a bacia Amazônica – fenômeno conhecido como friagem
(Satyamurty et al., 1998; Ambrizzi et al., 2006). As frentes frias são mais freqüentes no
Capítulo 1: Introdução
11
outono e no inverno, período em que o volume de chuvas é ligeiramente maior. No verão,
além da passagem de frentes frias mais rápidas, esta região recebe precipitação de sistemas
convectivos formados sobre o norte da Argentina – a Baixa do Chaco – devido ao intenso
aquecimento desta planície.
O norte da Argentina, Paraguai e sul da Bolívia formam uma região marcada por verões
chuvosos e invernos relativamente secos. Mais próxima da cordilheira dos Andes, que nesta
latitude é bastante alta e intransponível para a circulação de baixos níveis, esta região recebe
umidade oriunda da Amazônia, transportada por ventos de N e NW. Estes ventos esbarram na
cordilheira e são defletidos para S e SE. Ao defletir, intensificam, formando o chamado Jato
de Baixos Níveis (JBN). O intenso aquecimento no verão e a convergência de umidade,
quando associados à corrente de jato subtropical posicionada na vertical em altos níveis,
podem gerar os Complexos Convectivos de Mesoescala (CCMs), sistemas convectivos de
vida curta mas que provocam, em geral, muita precipitação (Satyamurty et al., 1998). Nos
meses de inverno o aquecimento não é suficiente para a formação destes sistemas, ao mesmo
tempo em que os ciclones móveis que chegam pelo sul têm trajetórias mais próximas à costa
atlântica, por isto os invernos são mais secos.
A intensa atividade convectiva sobre esta região e sobre a região amazônica nos meses
de verão libera grande quantidade de calor latente, que sustenta o movimento ascendente
formando um anticiclone em altos níveis centrado sobre o Platô Boliviano – a Alta da Bolívia
(AB). Esta circulação anticiclônica é bastante forte, principalmente ao sul e a leste do centro.
Os ventos de sul no seu lado leste, porém, em seguida perdem vorticidade anticiclônica e
adquirem vorticidade ciclônica sobre a costa do NE brasileiro, formando um cavado em altos
níveis a nordeste da AB. Muitas vezes este cavado se fecha formando um vórtice ciclônico
com núcleo frio, provocando subsidência no seu centro e atividade convectiva nas suas
bordas, principalmente ao norte (Satyamurty et al., 1998).
A costa do NE brasileiro recebe boa parte de sua precipitação anual nos meses de março
a maio, devido à atuação de linhas de estabilidade (Ondas de Leste) que se formam ao longo
da costa quase todas as tardes, trazidas por circulação de brisa. Estas linhas acompanham a
migração da ZCIT, que neste período está entre 2°S e 4°N (Figueroa e Nobre, 1990).
A região tropical a leste dos Andes é predominantemente plana com centro baixo,
contornada ao norte e a sudeste por cadeias montanhosas de altitude média (1000 m, em
geral). Compreende a bacia Amazônica, região coberta pela floresta úmida equatorial e que
ocupa quase 30% da área do continente. A enorme superfície d’água disposta pelo rio e seus
inúmeros tributários tem um impacto significativo no clima (Ambrizzi et al., 2006). A
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
12
circulação geral sobre esta área é controlada pela posição da ZCIT, que em julho é
relativamente difusa em torno de 7-9°N, portanto a região está sob atuação dos alísios de SE.
Estes são ventos secos, originários da Alta Subtropical do Atlântico Sul (ASAS). De abril a
outubro, as massas de ar são relativamente estáveis. Nesta época, com a ZCIT ao norte, os
alísios de SE avançam sobre o continente, aquecendo-se e acumulando umidade por baixo
devido à abundante vegetação da bacia Amazônica, que acaba precipitando sobre o extremo
norte do Brasil e a região das Guianas (Nieuwolt, 1977). De novembro a março, com a ZCIT
deslocada para o sul, as condições sobre a bacia Amazônica são excelentes para a acumulação
de massas de ar marítimas (quentes e úmidas) que chegam impulsionadas pelos alísios de NE
da periferia da Alta dos Açores, no Atlântico Norte. Ali elas adquirem características de
massas de ar equatorial e são transportadas adiante para a bacia do Prata e planícies adjacentes
(Ambrizzi et al., 2006).
O centro-oeste brasileiro possui estação seca bem definida, entre maio e agosto. Nesta
época a ZCIT está deslocada para o Hemisfério Norte, e arrasta consigo a corrente de jato
subtropical, cujo núcleo indica a posição da porção descendente da célula de Hadley. Toda a
região permanece sob forte subsidência de ar seco da alta troposfera (Figueroa e Nobre,
1990).
O clima sem estação seca ocupa áreas equatoriais da bacia Amazônica e as Guianas,
pois a quantidade de pântanos e vegetação abundante produz umidade o ano inteiro,
rompendo a
Capítulo 1: Introdução
13
altos níveis, intenso escoamento em baixos níveis trazendo umidade para o continente, tudo
isso associado a mudanças sazonais na precipitação (Zhou e Lau, 1998; Vera et al., 2005).
A fase madura da monção da América do Sul ocorre entre o final de novembro e o final
de fevereiro. Neste período, ventos adentram o continente pela sua borda norte e, ao atingirem
os Andes, defletem para o sul e SE da América do Sul. De fato, a circulação de verão
acompanha a topografia do continente conduzindo ar quente e úmido desde a região
amazônica até a bacia do Prata, criando o ambiente necessário para gerar ali os CCMs. Parte
deste fluxo adquire uma orientação NW-SE, gerando a Zona de Convergência do Atlântico
Sul (ZCAS). Este sistema atmosférico é definido como uma banda convectiva alongada,
originada tipicamente na Amazônia, extendendo-se em direção ao SE brasileiro e avançando
sobre o oceano Altântico subtropical (Figueroa e Nobre, 1990; Satyamurty et al., 1998;
Ambrizzi et al., 2006).
A atividade convectiva fica centrada sobre o Brasil Central e ligada à ZCAS. A
circulação de altos-níveis apresenta feições bem definidas nesta época: um anticiclone
centrado em 65°W e 15°S (a AB) e um cavado próximo à costa do NE brasileiro. Em baixos
níveis, a Baixa do Chaco forma, juntamente com a AB, a principal resposta da circulação
troposférica ao intenso aquecimento sobre a Amazônia e o Brasil central. O giro de escala
continental que se organiza transporta umidade desde o Atlântico Tropical, passando sobre a
bacia Amazônica e, ao encontrar a barreira montanhosa dos Andes, deflete para o sul em
direção aos extra-trópicos. O aquecimento diabático liberado na região da monção é que
promove este giro, e que sustenta a ASAS (Vera et al., 2005). As figuras 1.6 ilustram este
sistema.
Fig. 1.6: Ilustrações esquemáticas do sistema monçônico da América do Sul. No mapa, escala sombreada indica
precipitação, linhas pontilhadas pretas indicam zonas de convergência, setas pequenas mostram vento em
900 hPa, setas largas representam o JBN, H indica a alta subtropical em superfície e A indica o anticiclone
monçônico. No desenho à direita, seção vertical na direção SW-NE, indicando regiões de convecção profunda e
de JBN (Mechoso et al., 2005).
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
14
Silva e Carvalho (2006) propuseram um índice de larga escala representativo da monção
da América do Sul, com a intenção de (entre outras) determinar as feições espaciais do
sistema e obter uma série temporal que permita estudar a sua variabilidade interanual. Este
índice foi batizado de LISAM (Large-scale Index for South America Monsoon) e é dado pelo
coeficiente de expansão da 1
a
EOF combinada das variáveis precipitação, umidade específica,
temperatura do ar e componentes zonal e meridional do vento (todas em 850 hPa, exceto a
precipitação), no domínio espacial entre 0-40°S e 65°-20°W. A 1
a
EOF combinada explica
23% da variância total dos dados observados.
A Fig. 1.7 mostra os padrões de correlação obtidos por Silva e Carvalho entre o índice e
as anomalias de cada uma das variáveis. A precipitação apresenta correlação positiva em
grande parte da área tropical do continente, semelhante ao padrão da ZCAS. Sobre o Atlântico
Equatorial, correlações também positivas confirmam a ação da ZCIT. A alta correlação
positiva no campo de umidade, observada sobre o leste da América do Sul tropical e o
Atlântico Subtropical, é também consistente com a presença da ZCAS. No campo de vento
zonal percebe-se um dipolo nas correlações da variável com o índice. Em associação com os
padrões de precipitação e umidade, tem-se que a intensificação (enfraquecimento) destes
sobre a América do Sul tropical ocorre quando há ventos de oeste (leste) sobre o norte e
centro do Brasil e ventos de leste (oeste) sobre o sul do Brasil. Da mesma forma, as
correlações negativas sobre o norte e nordeste da América do Sul, no campo de vento
meridional, indicam que ventos de norte (sul) estão associados com a organização
(decaimento) do sistema monçônico. Estes padrões confirmam a importância do transporte de
umidade das latitudes tropicais/equatoriais para o continente sul-americano, aspecto-chave do
regime de monção. O padrão de correlações do LISAM com a temperatura do ar indica que o
sistema intensifica mediante anomalias positivas de temperatura nos subtrópicos e áreas
costeiras do continente, bem como sobre o oceano Atlântico.
Alguns estudos apontam que os principais modos de variabilidade interanual da
precipitação monçônica na América do Sul estão associados ao ENSO (e.g. Ropelewski e
Halpert, 1987; Paegle e Mo, 2002). Grimm et al. (1998) constataram que a fase quente do
ENSO tende a aumentar a precipitação no SE da América do Sul e no Chile central, e
diminuí-la no centro-leste da Amazônia e NE brasileiro.
Além do ENSO, a TSM de outras regiões têm efeitos nas monções que podem ser locais
e/ou remotos. Anomalias de TSM próximas à costa do Peru podem afetar a precipitação da
América do Sul ao alterar o contraste térmico ar-mar (Yu e Mechoso, 1999). Anomalias de
TSM do Atlântico Tropical têm forte influência na precipitação da América do Sul tropical, e
Capítulo 1: Introdução
15
o gradiente destas anomalias entre o Atlântico Norte e Sul, em particular, modula a
localização da ZCIT e parece ser o elemento-chave associado às anomalias de precipitação
sobre o NE brasileiro e centro-leste da Amazônia (Paegle e Mo, 2002; Vera et al., 2006).
Fig. 1.7: Padrões da 1
a
EOFc representados por correlações entre a componente principal e as anomalias sazonais
de (a) precipitação do GPCP, (b) umidade específica, (c) temperatura, (d) vento zonal e (e) vento meridional.
Variáveis (b)-(e) referem-se ao nível 850hPa. Sombreamento indica correlações estatisticamente significantes no
nível de 5%, com número de eventos independentes igual ao número de ciclos sazonais (Silva e Carvalho, 2006).
Anomalias na precipitação de verão estão correlacionadas com anomalias de TSM no
setor oeste do Altântico sul subtropical (Diaz et al., 1998), sendo que as anomalias positivas
(negativas) de TSM nesta região estão associadas com transporte de umidade de latitudes
tropicais para sudeste (para o leste), e também com anomalias positivas de precipitação sobre
o nordeste da Argentina e sudeste do Brasil (Doyle e Barros, 2002; Robertson e Mechoso,
2000). A estrutura dipolar das anomalias de TSM destas região do Altântico acompanham
variações interanuais da ZCAS (Vera et al., 2006).
Simulações com modelos de oceano-atmosfera acoplados indicam que anomalias
quentes de TSM no Atlântico Sul levam à intensificação da ZCAS e ao seu deslocamento para
o norte, ao passo que uma ZCAS intensificada tende a resfriar a TSM abaixo dela (Chavez e
Nobre, 2004).
Diversos estudos reportaram a existência de variabilidade decadal e multidecadal na
precipitação da América do Sul, relacionada a mudanças na superfície oceânicas nestas
escalas de tempo, tanto no Pacífico quanto no Altântico. Robertson e Mechoso (2000)
observaram variabilidade interdecadal na escala de 15 anos na atividade da ZCAS e na TSM
do Atlântico sudoeste. Garcia e Kayano (2006) sugerem que a variabilidade de baixa
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
16
freqüência constatada na monção da América do Sul esteja relacionada à PDO, uma vez que
ela estava enfraquecida antes de 1976 e intensificou-se após a inversão de fase (de fria para
quente) da oscilação do Pacífico.
Andreoli e Kayano (2005) investigaram a influência do ENSO nas anomalias de
precipitação na América do Sul, levando em conta a fase da PDO. Os resultados indicam que
sinais do EN são mais notáveis durante a fase quente da PDO. Durante o regime quente,
anomalias negativas de precipitação sobre o NE brasileiro e positivas mais ao sul são
explicadas pela presença de um centro ciclônico em altos níveis sobre o leste e NE do Brasil e
de um centro anticiclônico fraco sobre o SE da América do Sul.
1.4. Variabilidade dos oceanos Atlântico e Pacífico
Venegas et al. (1997), investigaram os modos de variabilidade da TSM do Atlântico
Sul, na região limitada por 0-40°S e 70°W-20°E, utilizando anomalias mensais de um período
de 40 anos (1953-1992). Neste estudo também foi investigado o acoplamento dos modos
oceânicos com a variabilidade atmosférica na região. Os três primeiros modos encontrados
explicam, juntos, 47% da variância total dos dados. O primeiro, responsável por 30% da
variância explicada, exibe um padrão de monopolo que se extende por todo o domínio. As
flutuações mais importantes ocorrem na costa da África, numa escala de tempo de 6-7 anos. O
segundo, explicando 11% da variância dos dados, dispõe uma relação de fases opostas
(dipolar) entre as anomalias ao norte e ao sul de 25-30°S. Este modo é marcado por flutuações
interanuais e interdecadais, em especial na escala de 14 anos. O terceiro modo responde por
6% da variância dos dados, com um padrão caracterizado por três bandas latitudinais com
centros de ação de sinais alternados. Este padrão oscila basicamente em escala interanual. Os
autores apontam uma correlação significativa deste modo com o SOI, sugerindo a existência
de um sinal discernível do ENSO no Atlântico Sul.
Cardoso (2001) também investigou os modos de variabilidade do Atlântico, focando sua
análise, porém, no setores tropical e sul do oceano durante os meses de inverno (1950-1996).
O domínio escolhido está compreendido entre 15°N-40°S e 60°W-20°E. A autora encontrou
quatro modos significativos, que juntos explicam quase 66% da variância dos dados. O
primeiro, com 33,4%, é caracterizado por uma estrutura de monopolo, com coeficientes
positivos dispostos numa banda NW-SE, similar ao primeiro modo encontrado por Venegas
et al. (1997). O componente temporal deste modo apresenta flutuações interanuais e
interdecadais, com tendência ao aumento de amplitude. O segundo modo explica 12,5% da
Capítulo 1: Introdução
17
variância e tem padrão espacial também semelhante ao encontrado por Venegas et al.,
caracterizado por um dipolo com coeficientes positivos desde a costa sul e SE do Brasil até o
centro leste do Atlântico e coeficientes negativos do centro do Atlântico Tropical à costa da
África. As flutuações deste modo também são interanuais e interdecadais. O terceiro modo,
com 12% da variância, representa o giro do Atlântico Sul. As oscilações predominam na
escala interanual e bienal, e podem estar associadas ao ENSO. O quarto modo, com 8% da
variância, apresenta padrão dipolar leste-oeste e foi apontado por Cardoso como similar ao
terceiro modo encontrado por Venegas et al.. As flutuações predominam na escala interanual
e também estariam associadas ao ENSO.
Dommenget e Latif (2000) defendem que o suposto dipolo interhemisférico do
Atlântico não existe em escalas de variabilidade menores que 25 anos. Eles concluíram que a
variabilidade da TSM nos dois hemisférios do Atlântico Tropical são basicamente
independentes. Ao contrário do que acontece no Pacífico, onde a variabilidade da região
equatorial domina a da região tropical, o Atlântico Equatorial não tem influência sobre os
padrões dominantes de TSM.
Andreoli e Kayano (2004) utilizaram transformadas de ondeletas cruzadas para
investigar a coerência entre as séries do Altântico norte tropical e do Atlântico Sul Tropical.
Os resultados indicam que a coerência é alta em vários intervalos ao longo do período
analisado, mas que apenas quando a diferença de fase for igual a ±180° é que implica no
estabelecimento de um padrão de dipolo, o que raramente ocorre. Analisando as séries
individualmente, as autoras identificaram no Atlântico Norte uma variabilidade dominante na
escala de 9,8 anos, e no Atlântico Sul, 12,7 anos.
No oceano Pacífico Tropical o padrão ENSO é a anomalia climática interanual
dominante, sendo esta a fonte primária de variabilidade interanual ao redor do globo (Meyers
et al., 1999). Zhang et al. (1997) filtraram as anomalias de TSM do Pacífico entre 20°S e
60°N de modo a obter dois conjuntos de dados, um contendo a variabilidade de alta
freqüência (AF) – escalas de 6 anos ou menos – e outro contendo variabilidade de baixa
freqüência (BF) – escalas de tempo maiores que 6 anos. Para cada conjunto de dados, os
autores analisaram o padrão espacial do modo dominante. Eles constataram grande
semelhança qualitativa entre os padrões de AF e BF, com grande anomalias no Pacífico
Tropical (maiores a leste), anomalias de polaridade oposta na região central do Pacífico Norte
extratropical e um alto grau de simetria equatorial (nitidamente o padrão ENSO). A
correlação espacial entre os dois conjuntos é de 0,75. O máximo equatorial no leste do
Pacífico é mais pronunciado e confinado ao longo do equador no padrão de AF, enquanto as
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
18
flutuações de TSM na região central do Pacífico Norte Extratropical são mais proeminentes
no padrão de BF.
Os resultados de Mo e Hakkinen (2001) evidenciam que as anomalias de TSM no
Pacífico contribuem para o aquecimento (ou resfriamento) sobre o Atlântico Tropical Sul. Um
padrão similar ao padrão interdecadal do tipo ENSO, com anomalias quentes no Pacífico
Central e frias nos subtrópicos, aparece 7-8 anos antes do aquecimento sobre o Atlântico
Tropical Sul. As anomalias do Pacífico enfraquecem após dois anos, mas no Atlântico a TSM
evolui alternando anomalias positivas e negativas. As anomalias do Atlântico e do Pacífico
Tropical podem não variar como um modo único; as interações entre os dois ocorrem quando
as anomalias do Pacífico são fortes o suficiente para gerar um trem de ondas na atmosfera que
enviará sinais para o Atlântico. Quando este oceano recebe os sinais atmosféricos, a dinâmica
local atua para fortalecer ou enfraquecer a TSM no seu setor tropical sul.
1.5. Holoceno Médio
A simulação do HM é motivada (a) pela existência de inúmeros proxies bem
documentados, que permitem uma reconstrução mais detalhada de climas regionais, e (b) por
indicativos de um clima que difere, pelo menos regional e sazonalmente, do atual (Clauzet
et al., 2006). O segundo motivo deve-se a mudanças no ciclo sazonal da radiação solar
incidente, principal forçante externa do sistema climático terrestre, por conta de variações nos
parâmetros orbitais da Terra (Fig. 1.1). As mudanças na insolação devem-se, basicamente, à
precessão dos equinócios, que provoca o deslocamento da longitude do periélio
1
; mudanças
nos demais parâmetros são pequenas (Braconnot et al., 2004; Clauzet et al., 2006).
Atualmente, o periélio ocorre em dezembro, i.e. inverno (verão) no Hemisfério Norte (Sul).
Em 6 ka AP, ele ocorria no final de agosto ou início de setembro (Fig. 1.8). Esta alteração
amplifica (atenua) o ciclo sazonal da insolação no Hemisfério Norte (Sul) com relação ao
presente, mas não provoca qualquer mudança na energia média global recebida pela Terra
(Braconnot et al., 2002; Harrison et al., 2003; Liu et al., 2004; Silva Dias et al., 2006). A
quantidade de insolação em cada latitude é, portanto, a diferença mais importante entre o
presente e o HM. Berger (1978) calculou os parâmetros orbitais de cada período e a insolação
resultante. A Fig. 1.9 mostra a distribuição mensal, por latitude, da insolação no presente e
sua a diferença para o HM.
1
Periélio é a posição na órbita terrestre em que o planeta se encontra mais próximo ao Sol.
Capítulo 1: Introdução
19
Fig. 1.8: Parâmetros orbitais para o presente e para 6 ka AP, onde e é a excentricidade,
ε
a obliqüidade e
ω
a
longitude do periélio (
ω
–180 é o ângulo entre o equinócio de outono e o periélio). Os solstícios de verão e
inverno (SV, SI) e equinócios de primavera e outono (EP, EO) são dados para o Hemisfério Sul (adaptado de
Joussaume e Braconnot, 1997).
Fig. 1.9: Distribuição da insolação mensal, por latitude, no presente e a diferença desta no HM, com relação ao
presente (dados obtidos em PMIP-II, 2005).
1.5.1. Modelagem do Holoceno Médio
Nos experimentos do PMIP para o HM, todos os 19 grupos de modelagem utilizaram as
mesmas condições de fronteira para a inicialização de seus modelos, que são deliberadamente
simples. As simulações de 6 ka AP devem diferir das suas simulações de controle (do clima
do presente) em apenas dois aspectos: nos parâmetros orbitais e na concentração de gás
metano na atmosfera, que nas simulações de controle são de 760 ppb e nas do HM, 650 ppb.
A concentração de CO
2
, nas simulações dos dois períodos, é mantida no nível da Era Pré-
Industrial (280 ppm, segundo Raynaud et al., 1993). Os parâmetros orbitais das simulações de
controle são especificados para 1950 A.D., e os do HM são dados por Berger (1978). São eles,
respectivamente: excentricidade, 0.016724 e 0.018682; obliqüidade, 23.446 e 24.105; e
precessão angular, 102.04 e 0.87 (PMIP-II, 2005).
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
20
Partindo destas condições iniciais, diversos estudos com diferentes modelos climáticos
vêm sendo realizados acerca do clima no HM em vários continentes. A maioria dos estudos,
no entanto, concentra atenções no Hemisfério Norte, onde o ciclo sazonal é amplificado. As
mudanças mais pronunciadas ocorrem sobre as regiões de monções da África e da Ásia, onde
o aumento do contraste oceano-continental e o conseqüente aumento da convergência em
baixos níveis provoca um grande fortalecimento destes sistemas.
O que ainda não está totalmente esclarecido é o papel dos oceanos nas alterações
desencadeadas pela forçante da insolação. Braconnot et al. (2000) investigaram o impacto da
resposta oceânica à insolação de 6 ka AP e da sua retroalimentação no ciclo sazonal da
monção africana. Para tanto os autores compararam dois experimentos, um com um modelo
que acopla oceano e atmosfera sem correção de fluxos na interface ar-mar, e o outro com um
modelo atmosférico forçado com TSM moderna prescrita. Os resultados mostram que no HM
a alteração no ciclo hidrológico é maior quando a atmosfera está acoplada ao oceano, e que a
monção de verão é mais intensa e penetra mais ao norte sobre o deserto do Saara. Resultados
do experimento acoplado são mais consistentes com os proxies da região. A resposta da TSM
está defasada em 2-3 meses da forçante de insolação, o que tem impacto na duração da
monção (inicia um mês antes e retrocede mais lentamente).
A resposta dos oceanos tropicais à forçante da insolação e como ela afeta as monções da
África e da Ásia foi investigada por Zhao et al. (2005). Ao avaliar sete modelos com oceano e
atmosfera acoplados, estes autores também perceberam que a incorporação da
retroalimentação oceânica introduz um retardo (de 1-2 meses) na resposta do ciclo sazonal à
forçante orbital, por conta da inércia dos oceanos, que intensifica tanto a monção africana
quanto a asiática. Na África, o aumento na precipitação está associado a uma estrutura dipolar
mais intensa no Atlântico, com TSM mais quente ao norte de 5
o
N e mais fria ao sul. Tal
dipolo é criado pelo aumento na insolação e fortalecido por uma forte retroalimentação
vento/evaporação em torno de 15
o
N, que contribui para o aquecimento na região. A baixa
monçônica se aprofunda sobre as águas mais quentes, aumentando a advecção de umidade
para o continente. Estes mecanismos também são responsáveis pelo aquecimento do NW do
oceano Índico no final do verão. Lá, no entanto, o efeito da convergência do vento sobre
águas quentes no aumento da precipitação é mais direto.
O comportamento do ENSO no HM foi investigado por Liu et al. (2000). O modelo
acoplado (oceano-atmosfera) por eles utilizado simulou o fenômeno com intensidade
reduzida, o que os autores atribuíram a duas causas: (a) a intensificação da monção asiática
pela forçante de insolação fortalece os alísios e diminui as temperaturas do Pacífico
Capítulo 1: Introdução
21
Equatorial, suprimindo eventos quentes do ENSO; e (b) o aumento da insolação de inverno no
Hemisfério Sul aquece a superfície do Pacífico Sul, cujas correntes transportam águas mais
quentes para o equador e enfraquecem a termoclina equatorial média, contribuindo para a
supressão de eventos quentes.
Clement et al. (1999), utilizando um modelo do ENSO com complexidade
intermediária, forçado por variações na insolação devidas à forçante orbital, mostraram que o
ENSO tinha atividade mais fraca no início e meio do Holoceno do que no final. Uma
simulação mais recente (Kitoh e Murakami, 2002) mostra que a temperatura do Pacífico
Tropical e os padrões de circulação em 6 ka AP são similares àqueles observados nos
períodos de LN atuais.
Rimbu et al. (2004) realizaram experimentos com modelos acoplados associados a
proxies de TSM para investigar a variabilidade climática do Atlântico Norte e Tropical
acoplados nos últimos 10 ka. Eles constataram que do início do Holoceno ao HM, TSMs
relativamente altas no setor leste do Atlântico Norte são acompanhadas por TSMs
relativamente baixas no setor tropical (que configuram as condições durante eventos tipo LN).
Mudanças na superfície continental (i.e. na cobertura vegetal) também podem ser
consideradas retroalimentadoras do sistema climático, principalmente por implicar em
mudanças no albedo. Estudos do impacto das mudanças na superfície continental do norte da
África no HM indicam que a diminuição do albedo induzida pela vegetação leva ao
aquecimento do continente, aumentando o contraste deste com o oceano e também a advecção
de umidade do oceano para o continente. A presença da vegetação intensifica o aquecimento
na primavera provocando o início precoce da precipitação monçônica. Outro efeito é
prolongamento da estação chuvosa até o outono, pois a vegetação reduz a dependência da
advecção de umidade e ainda mantém condições monçônicas através da reciclagem de
umidade (Harrison, 2006).
Wohlfahrt et al. (2004) testaram o acoplamento de um modelo de vegetação com a
versão anterior do modelo do IPSL (que tem oceano e atmosfera acoplados) para avaliar os
impactos da retroalimentação oceânica e da vegetação – e a sua sinergia – em latitudes ao
norte de 40°N. Os autores mostraram que a resposta atmosférica à forçante orbital do HM
produz um aquecimento de 1,2°C sobre os continentes no verão e um resfriamento no resto do
ano. A resposta do oceano reforça o resfriamento na primavera mas contrapõe o resfriamento
no outono e no inverno. A resposta da vegetação provoca aquecimento em todas as estações,
sendo maior na primavera (1,0°C). A vegetação e o oceano em conjunto levam a um maior
aquecimento (sinergia). A combinação dos efeitos atmosfera-oceano-vegetação faz com que
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
22
as altas latitudes do norte sejam mais quentes ao longo do ano. As mudanças resultantes na
vegetação simulada são consistentes com padrões de vegetação observados no HM (por
proxies). A retroalimentação também tem efeitos na precipitação: a resposta atmosférica
reduz a precipitação ao longo do ano; a resposta oceânica reduz a aridez no outono, inverno e
primavera, mas não afeta a precipitação de verão; a resposta da vegetação aumenta a
precipitação de primavera mas diminui-a no verão. A sinergia entre as respostas aumentam a
precipitação no outono, inverno e primavera e reduzem-na no verão. As mudanças
combinadas resultam na amplificação do contraste sazonal.
Poucos estudos tiveram a América do Sul e o seu sistema monçônico como foco.
Modelar mudanças climáticas sobre a América do Sul representa um desafio aos modelos
climáticos computacionais. A baixa resolução da maioria dos GCMs implica na representação
bastante pobre da cordilheira dos Andes, devido à sua grande altitude e pequena extensão
zonal. Isto causa impacto significativo não só no potencial dos modelos em simular mudanças
nos Andes, mas também na sua habilidade de simular bloqueios e efeito de “sombra de
chuva” provocado pela montanha. Ainda, as mudanças nas planícies tropicais são fortemente
dependentes da habilidade dos modelos em simular precisamente a convecção, a cobertura de
nuvens e os processos de superfície. Dados tanto marinhos quanto terrestres são relativamente
esparsos em comparação ao Hemisfério Norte (Valdes, 2000).
O estudo de Valdes (2000) é o primeiro centrado no clima do continente sul-americano
durante o HM. Analisando todos os modelos do PMIP em conjunto, Valdes constatou um
resfriamento generalizado sobre a América do Sul no trimestre dezembro-janeiro-fevereiro
(DJF) e aquecimento em junho-julho-agosto (JJA), tal qual o esperado pelas mudanças
orbitais, embora a magnitude da variação média anual não ultrapassasse 0,2°C. A precipitação
apresenta um sinal sazonal bem marcado, com supressão generalizada em DJF (exceto no NE
brasileiro) e aumento em JJA que prossegue em setembro-outubro-novembro (SON). As
mudanças em DJF são maiores em magnitude portanto a média anual aponta condições mais
secas que o presente para quase todo o continente. A pressão média ao nível do mar sobre o
continente aparece maior no HM em DJF, o que corresponde a uma redução na convecção
sobre a região e é consistente com condições mais secas e frias.
Liu et al. (2004) investigaram a resposta dos seis maiores sistemas monçônicos de verão
(monções da América do Norte, do norte da África, da Ásia, do norte da Australásia, da
América do Sul e do sul da África) à forçante orbital do HM, utilizando um GCM com oceano
e atmosfera acoplados (FOAM), com foco nos papéis distintos que exercem a forçante direta
da insolação e a retroalimentação oceânica. Harrison et al. (2003) compararam os resultados
Capítulo 1: Introdução
23
deste modelo com os resultados do NCAR-CSM na análise das monções do continente
americano. Ambos modelos (FOAM e NCAR-CSM) mostram que a monção da América do
Sul é enfraquecida pela redução da insolação no verão. A temperatura continental diminui, a
pressão atmosférica sobre o continente aumenta, diminuindo assim o contraste oceano-
continente e, portanto, o efeito da circulação e o transporte de umidade; logo a precipitação é
significativamente reduzida no interior do continente. A mudança no ciclo sazonal da TSM é
uma resposta direta à mudança na insolação, que ocorre, em geral, com defasagem de 1-2
meses devido à capacidade térmica dos oceanos. A retroalimentação oceânica contribui para a
redução da precipitação – com exceção do extremo sul do continente, onde o aumento da
TSM no leste do Pacífico e o enfraquecimento do anticiclone podem influenciar o regime de
precipitação – porém a evolução sazonal mostra que a forçante orbital (i.e. variação na
insolação) é dominante (Harrison et al., 2003; Liu et al., 2004).
Jorgetti (2004) utilizou uma versão anterior do modelo do IPSL para estudar a relação
entre a TSM e o clima da América do Sul no HM. Este modelo acopla oceano e atmosfera e
contém uma interação simplificada da vegetação com o clima. Seus resultados mostram uma
redução no ciclo sazonal da temperatura bem como o enfraquecimento do sistema monçônico.
As principais mudanças no campo de precipitação são o deslocamento para o sul da ZCIT e
enfraquecimento da ZCAS com uma pequena transposição para norte. A suposta tendência de
resfriamento sobre quase todo o continente só foi detectada no SE brasileiro. As diferenças
mais evidentes constatadas com a inclusão da vegetação interativa foram no NE brasileiro e
na Argentina e provavelmente estão associadas ao efeito profundidade de raiz/
evapotranspiração.
1.5.2. Indicadores paleoclimáticos (proxies) na América do Sul
Apesar de se ter, no Hemisfério Norte, uma cobertura espacial e temporal de registros
paleoclimáticos muito maior, com os proxies coletados no Hemisfério Sul já é possível um
entedimento, mesmo que por vezes vago, das condições climáticas do HM.
Dunas eólicas foram reconhecidas em diversos sítios da Amazônia. Elas são
consideradas indicativos de períodos mais secos no passado, pois não poderiam se
desenvolver sob o tipo de vegetação presente ali atualmente. Mesmo em campos de dunas nas
regiões de savanas, o conteúdo de umidade do solo deve ser baixo, a fim de permitir a
migração da duna, que só ocorre em estações secas prolongadas. Ainda assim, os campos de
dunas identificados estão localizados próximo aos limites da floresta atual. A sua datação
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
24
varia de um sítio para o outro, mas o conjunto indica o HM como sendo o final de sua fase
ativa (Albuquerque et al., 2006).
O desenvolvimento de lagos nas planícies tropicais marca o início do clima úmido do
meio para o final do Holoceno. Sedimentos de matéria orgânica mostram uma tendência de
aumento no nível dos lagos que se perpetua até os dias atuais, quando ele é máximo (Turcq
et al., 2002). Um estudo palinológico em dois lagos na Amazônia equatorial mostra o
desenvolvimento da floresta desde o início do Holoceno, com uma fase mais seca que o
presente entre 6,8 e 1,6 ka AP (Colinvaux et al., 1988). Na Amazônia colombiana, depósitos
do lago Loma Linda mostram o desenvolvimento da floresta a partir de 6 ka AP, indicando
uma transição para um clima mais úmido. A vegetação da época teria sido dominada por
savana, com precipitação reduzida e maior sazonalidade (Behling e Hooghiemstra, 2000). Na
Amazônia boliviana, estudos palinológicos nos lagos Bella Vista e Chaplin indicam que a
floresta só teria aparecido mais tarde – entre 3 ka e 660 anos AP – nestes sítios localizados
próximo ao limite da floresta atual. O período entre 7 e 3 ka AP teria sido marcado pelo
predomínio da savana e maior freqüência de queimadas, devido ao posicionamento mais ao
norte da ZCIT no verão (Mayle et al., 2000).
Na Serra dos Carajás, no leste da Amazônia, o HM é marcado por um aumento no
número de espécies de gramíneas e outros elementos pioneiros, constatado em registros de
pólen. Como não se observou o desenvolvimento de elementos de savana neste período, que
seriam indicativos de um clima com estação seca, esta mudança na vegetação foi interpretada
como conseqüência de incêndios mais freqüentes na região (Turcq et al., 1998).
Análises de sedimentos do lago Caçó, no NE brasileiro, indicam um clima mais seco do
que o atual durante o HM (Sifeddine et al., 2003).
Depósitos lacustres nos Andes, entre 14°-20°S, indicam que o nível dos lagos atingiu
seu mínimo em 6-5 ka AP. O aumento do nível, depois desse período, começou a ocorrer
antes nos lagos mais ao norte (Abbot et al., 2003). Já um lago mais ao sul deste conjunto, em
torno de 24°S, apresenta um comportamento climático diferente, com nível alto entre 6 e 3,5
ka AP e queda acentuada entre 3,5 e 2 ka AP, voltando a subir depois disso (Grosjean et al.,
2001). Baker et al. (2001) estudaram sedimentos do lago Titicaca (17°S) e verificaram que a
máxima aridez e o nível mais baixo ocorreram entre 8 e 5,5 ka AP. Atualmente o aumento no
nível do lago e condições úmidas na Amazônia são correlacionadas com anomalias de TSM
frias no Atlântico Equatorial Norte. Durante o período de deglaciação ocorreram diversas
fases úmidas de escala milenial no Altiplano e na Amazônia, que coincidem com períodos
frios anômalos no Atlântico Equatorial Norte e em altas latitudes.
Capítulo 1: Introdução
25
Depósito eólicos na região dos pampas (a planície centro-norte argentina, ao sul do
Chaco – 30°-38°S), indicam uma fase árida que durou entre 7 ka e 1000 AP anos (Tonni
et al., 2001), coincidindo com a expansão em direção ao sul da fauna subtropical (Tonni et al.,
1999).
Registros de pólen do sudoeste brasileiro indicam condições ambientais mais secas em
6 ka do que no presente (Liu et al., 2004). Outros registros indicam um HM mais úmido no
sul do Brasil. Na Serra da Boa Vista (27°42’S-49°09’W, 1160 m de altitude), elementos da
floresta de Araucária e da Mata Altântica são dominantes no período entre 7,8 e 3,2 ka AP
(Behling, 1995).
Kim et al. (2002) investigaram dois testemunhos marinhos próximos a Valparaíso,
Chile, e encontraram temperaturas extraordinariamente quentes no SE do Pacífico no período
entre 7,5-5 ka AP. Segundo os autores, elas podem ser explicadas por um enfraquecimento na
variabilidade/intensidade do ENSO. Durante fases quentes do ENSO, a pressão é
anomalamente baixa sobre o SE do Pacífico, causando o enfraquecimento da ASPS e seu
deslocamento para o norte, levando consigo o cinturão de ventos de oeste. Isto implica que
mudanças na variabilidade/intensidade do ENSO no passado estão intimamente relacionadas à
intensidade da ASPS e mudanças na faixa latitudinal dos ventos de oeste. As altas TSMs no
sudeste do Pacífico podem ter sido causadas por dois processos conjuntos: aquecimento
devido ao deslocamento para o sul das águas frias do oceano Austral, associado à transposição
dos ventos de oeste; e um aquecimento extra devido à advecção de águas mais quentes pelo
flanco sul do giro subtropical, que também estaria deslocado para o sul. Tal suposição implica
ainda que o giro subtropical estivesse fortalecido no HM.
Varvitos encontrados em lagos equatorianos (Rodbell et al., 1999) e corais de Papua
Nova Guiné (Tudhope et al., 2001) indicam que eventos ENSO eram consideravelmente mais
fracos no período entre 8,8 e 5,8 ka AP.
Analisando a variabilidade dos depósitos de titânio e ferro na bacia do Cariaco
(Venezuela), Haug et al. (2001) constataram maior deposição no período entre 8 e 5 ka AP
devido a um aumento na descarga de rios, por conta da posição média anual da ZCIT estar
deslocada para o norte. Após 5 ka AP, a ZCIT teria se deslocado para o sul, pois os registros
indicam transição para um clima mais seco na Venezuela. Os autores interpretam este período
(pós 5 ka AP) como de reativação de condições do tipo EN mais intensas.
Koutavas et al. (2006) confirmam a forte relação entre a posição da ZCIT, a TSM
equatorial e o ENSO ao longo do Holoceno. A ZCIT deslocada ao norte favorece ventos
equatoriais, que induzem ressurgência, abaixam a TSM e ajudam a manter a ZCIT ao norte.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
26
Proxies do setor leste do Pacífico Equatorial revelam um histórico consistente de TSMs,
marcado por um mínimo entre 9-5 ka AP. Reconstruções do Pacífico oeste indicam o
contrário: condições mais quentes prevalecem até 5 ka AP. Estas tendências opostas mostram
um gradiente zonal de TSM ao longo do equador entre 20-30% maior no HM, um padrão
remanescente da fase fria do ENSO, i.e. LN.
CAPÍTULO 2: DADOS E METODOLOGIA
2.1. Descrição do modelo
A versão IPSL_CM4 é a mais recente do modelo climático do IPSL e acopla quatro
componentes: a atmosférica, a de superfície continental, a oceânica e a de gelo marinho
(Marti et al., 2006).
A componente atmosférica é um modelo clássico de circulação geral (LMDZ) (Hourdin
et al., 2006), que utiliza equações primitivas baseadas em diferenças finitas. Possui uma grade
expansível tanto em latitude quanto em longitude, com 96 pontos igualmente espaçados em
longitude (∆λ = 3,75°) e 72 pontos igualmente espaçados em latitude (∆ϕ = 2,535°). Na
vertical, o modelo utiliza a coordenada híbrida σ-p, com 19 níveis desigualmente espaçados.
Esta coordenada foi definida de maneira tal que a pressão P
n
no nível n seja função da pressão
na superfície P
s
, tal que P
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
28
meridional que varia com o cosseno da latitude. No Hemisfério Norte a grade horizontal tem
dois pólos (um sobre a Ásia e outro sobre a América do Norte), para que a taxa de anisotropia
seja praticamente igual a um em todo o domínio. O espaçamento de grade é refinado próximo
ao equador para aprimorar a dinâmica equatorial. Na vertical, o domínio estende-se da
superfície até 5000 m de profundidade, dividido em 31 níveis, sendo 10 nos primeiros 100 m.
Como forçantes, o oceano recebe calor, água doce e fluxos de momentum da atmosfera e do
gelo marinho (através das respectivas componentes).
Finalmente, há a componente que acopla a dinâmica e termodinâmica do gelo marinho à
componente oceânica (LIM) (Fichefet e Morales Maqueda, 1997) e que, utilizando a mesma
grade horizontal desta, determina o calor latente e sensível armazenados e os fluxos de calor
na vertical, parametriza o albedo de superfície, entre outras interações relativamente
complexas que sejam função da temperatura de superfície e da espessura da neve e do gelo
(Marti et al., 2006).
2.2. Simulações
A simulação de controle escolhida (2L24 – Controle Pré-industrial) carrega, no seu
estado básico, uma concentração de gases traço prescritas a valores anteriores à Revolução
Industrial. O propósito de considerar tal condição é testar a sensibilidade do modelo à
forçante orbital, somente (Braconnot et al., 2004). 2L24 é considerada aqui a simulação do
clima do presente, e a rodada já ultrapassou 800 anos. As saídas são mensais, e para esta
análise utilizou-se as séries de médias mensais de 100 anos (o século entre os anos 400 e 500
da simulação). Evitou-se o período inicial da simulação em função dos ajustes dos modos
acoplados entre o oceano e a atmosfera, que levam poucas centenas de anos para atingirem o
equilíbrio (PMIP-II, 2005)
A simulação do clima do Holoceno Médio (HOL04) difere da primeira nos parâmetros
orbitais, que definem a distribuição global da insolação no topo da atmosfera (TOA). A
simulação possui 300 anos com saídas também mensais, porém só estabiliza após o ano 170
(apresenta uma tendência bastante forte de aumento na temperatura média global até este
ponto). Assim, foram utilizadas as séries temporais dos últimos 100 anos desta simulação.
Tanto em 2L24 quanto em HOL04 foram utilizadas as seguintes variáveis atmosféricas
– precipitação (PPT), radiação de onda longa emergente no topo da atmosfera (ROL),
umidade específica a 2 m (Q2M) e em 850 hPa (Q850), temperatura do ar a 2 m (T2M) e em
850 hPa (T850), PNM, componentes zonal (U) e meridional (V) do vento em 850 e 200 hPa –
e a TSM. Os campos de todas as variáveis foram interpolados horizontalmente para uma
grade regular 2,5°x2,5°, para facilitar a comparação com observações disponíveis nesta grade.
Capítulo 2: Dados e Metodologia
29
Para a validação e análise dos campos médios de TSM, especificamente, a grade desta
variável foi interpolada para 2°x2°. As variáveis umidade, temperatura e vento foram
interpoladas verticalmente para obtê-las nos níveis de pressão supracitados.
2.3. Observações
Dados observacionais, de origens diversas, foram utilizados para validar o clima médio
e a sua variabilidade reproduzidos pela simulação de controle.
Para a validação da PPT, utilizou-se a climatologia mensal do Global Precipitation
Climatology Project (GPCP; Alder et al., 2003), referente a um período de 24 anos (1979–
2002). Os dados são distribuídos globalmente por pontos de grade com uma resolução
espacial de 2,5°x2,5°.
Para as variáveis ROL, Q2M, T2M, PNM, U e V em 850 e 200 hPa, foram obtidas
séries temporais mensais da reanálise do NCEP/NCAR (National Center for Environmental
Prediction e National Center for Atmospheric Research; Kalnay et al., 1996), que cobrem o
período 1948–2005 com resolução espacial também de 2,5°x2,5°.
A TSM observada, utilizada para a validação da TSM média de 2L24, foi obtida do
conjunto NOAA Extended Reconstructed Sea Surface Temperature Data Set v.2 (Smith e
Reynolds, 2004), que vem a ser uma reconstrução do Comprehensive Ocean-Atmosphere
Data Set (COADS) através do uso de métodos estatísticos para preenchimento de dados
esparsos. Os dados utilizados abrangem a faixa latitudinal entre 50°S e 50°N, em uma grade
2°x2°, cobrindo o período 1903–2002. O conjunto está disponível em
http://www.cdc.noaa.gov/cdc/data.noaa.ersst.html.
A variabilidade climática do modelo foi avaliada nos dois períodos simulados (presente
e em 6 ka AP), através dos índices descritos anteriormente (SOI, Niño3, PDO e AMO). A
validação do SOI modelado foi feita confrontando-o com o índice dado pelo Climate
Research Unit, Inglaterra (http://www.cru.uea.ac.uk/cru/data/soi.htm), calculado com base no
método de Ropelewski e Jones (1987). Para o cálculo do índice com dados simulados também
utilizou-se este método. A resolução temporal dos dados observados é mensal, cobrindo o
período 1866–2005. As anomalias de TSM da região do Niño3 foram obtidas do conjunto
HadISST1, uma reconstrução feita para o período 1871–2005 a partir de dados observados
desde 1981 (Rayner et al., 2003) [série disponibilizada pelo Climate Diagnostics Center
(CDC), em http://www.cdc.noaa.gov/Pressure/Timeseries/Nino3]. O índice da PDO
observada foi calculado a partir das anomalias mensais de TSM do período 1900–2004
(Mantua et al., 1997) [série obtida em http://www.atmos.washington.edu/~mantua/
abst.PDO.html]. Por fim, o índice da AMO, disponibilizado também pelo CDC
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
30
(http://www.cdc.noaa.gov/Timeseries/AMO), foi construído a partir das anomalias mensais de
TSM do conjunto Kaplan Extended SST v.2 (Kaplan et al., 1998), para o período 1906–2005.
O comprimento da série temporal de cada índice do modelo (nas duas simulações) foi
estabelecido conforme a série do respectivo índice observado.
2.4. Metodologia
Este trabalho foi desenvolvido com base em três tipos de análises: (a) por diferenças
entre campos médios mensais, onde avaliou-se as discrepâncias entre o clima simulado em
2L24 e o clima observado e também a variação do clima em HOL04 com relação ao clima da
simulação do presente; (b) análise dos padrões espaciais através de funções ortogonais
empíricas (EOFs – Empirical Othogonal Functions), onde investigou-se os modos de
variabilidade dos oceanos Atlântico e Pacífico, e também determinou-se o índice
representativo da monção da América do Sul (LISAM), através de EOFs combinadas; (c)
análise da variabilidade temporal de alguns padrões clássicos de variabilidade climática
através da transformada de ondeleta, onde avaliou-se as escalas temporais típicas dos índices
da SO, Niño3, da PDO, da AMO e dos principais modos de variabilidade dos oceanos
Atlântico e Pacífico, e ainda a correlação temporal entre estes modos de variabilidade e a
monção da América do Sul através do escalograma de ondeletas cruzadas. As análises (b) e
(c) foram executadas de maneira idêntica nas duas simulações (2L24 e HOL04).
2.4.1. Análise por diferenças dos campos médios mensais
Baseada no procedimento aplicado em Jorgetti (2004), esta análise teve como objetivo,
primeiramente, quantificar o desvio do clima simulado com relação ao clima observado (o
“bias” do modelo), tomando por base médias sazonais. Para cada variável da simulação de
controle foram calculadas médias mensais climatológicas, conforme a equação 2.1. Estas
foram agrupadas em trimestres (calculando-se a média dos três meses) – DJF, MAM, JJA,
SON – para caracterizar o clima médio em cada estação do ano. O mesmo foi feito para os
campos das variáveis observadas. Subtraiu-se então os campos médios sazonais
observacionais dos respectivos campos médios da simulação de controle, obtendo assim os
campos de diferenças sazonais.
n
=i
j)y(i,
n
=(j)
1
1
µ
(2.1)
onde
µ
(j) é a média para um mês j, i é o índice que indica o ano e n é o número de anos.
Capítulo 2: Dados e Metodologia
31
Posteriormente esta mesma análise foi utilizada para verificar mudanças no clima médio
do Holoceno com relação ao clima médio do presente, subtraindo-se os campos médios
sazonais de 2L24 dos campos médios de HOL04.
2.4.2. Análise por Funções Ortogonais Empíricas (EOFs)
O clima é considerado uma média de longo prazo do tempo meteorológico, i.e. a
integral do tempo (meteorológico) no tempo em um determinado intervalo. Variações
climáticas são também resultado de interações não-lineares extremamente complexas que
ocorrem entre diversos modos, em diversas escalas, fazendo com que o clima seja
caracterizado por uma alta dimensionalidade (Hannachi, 2004). Torna-se, portanto, um
desafio reduzir a dimensionalidade do sistema e encontrar os padrões que mais importam para
explicar as variações.
Também denominada Análise de Componentes Principais, a análise por EOFs visa
extrair da evolução temporal dos campos de uma determinada variável os padrões espaciais de
variabilidade e a sua variação no tempo, fornecendo a magnitude da “importância” de cada
padrão (ou modo). Esta magnitude é dada pelo percentual da variância explicada do modo
(Björnsson e Venegas, 1997). Esta técnica tornou-se bastante popular em ciências
atmosféricas pois reduz de forma eficiente um grande conjunto de dados para poucas
combinações lineares que contenham a maior parte da variância presente nos dados originais.
A literatura apresenta-se bastante confusa quanto à terminologia relacionada a este método,
portanto este estudo segue a proposta em Björnsson e Venegas: o padrão espacial da oscilação
denominar-se-á EOF e a sua série temporal, componente principal ou coeficiente de
expansão.
O objetivo desta análise foi determinar os modos de variabilidade dominantes da TSM
simulada em cada um dos oceanos Atlântico e Pacífico, isoladamente. Tomando a série de
campos mensais dos 100 anos de ambas as simulações, foram setorizadas áreas nas bacias do
Atlântico (entre 40ºS-30ºN e 70ºW-20ºE) e do Pacífico (entre 40ºS-30ºN e 140ºE-70ºW) que
priorizassem a região tropical.
Os dados brutos (campos de TSM média mensal) receberam um tratamento preliminar,
antes de serem submetidos à análise por EOFs. Supondo inicialmente a série temporal de cada
ponto de grade, buscou-se primeiro remover a sua tendência linear, caso contrário o modo
dominante da variabilidade dos dados poderia ser mascarado por esta tendência. Foi utilizado
o método de regressão linear para obter uma reta de tendência (eq. 2.2) para a série de cada
ponto de grade (y):
y(t)=a+bt , (2.2)
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
32
com:
()
2
2
ttn
yttyn
=b
e
n
tby
=a
,
onde
y(t) é o valor predito da série temporal; t é o índice do tempo; a é o valor de y(t) quando
t é zero e b é o coeficiente angular da reta. A série sem tendência linear foi obtida subtraindo-
se
y(t) de y.
O passo seguinte foi remover o ciclo anual. Tomando as séries temporais sem tendência,
calculou-se as médias climatológicas de cada mês (eq. 2.1). De cada valor mensal da série
sem tendência foi subtraída a média climatológica do respectivo mês, eliminando assim o
ciclo anual e obtendo uma série de anomalias. Estas anomalias foram então padronizadas,
dividindo-se cada valor pelo desvio-padrão da série (eq. 2.3).
σ
µ
(j)j)y(i,
=y'
(2.3)
Com base nos campos mensais de anomalias padronizadas de TSM, cobrindo 100 anos
em cada simulação, foi então iniciada a análise das EOFs, seguindo o procedimento proposto
em Björnsson e Venegas (1997) e Hannachi (2004).
Primeiramente, as anomalias foram transpostas para uma matriz
t x p, onde cada linha
representa o tempo
t e cada coluna um ponto de grade p. A partir desta matriz calculou-se a
matriz de covariância, dada por:
Y'Y'
n
=R
T
1
1
(2.4)
onde Y’ é a matriz t x p das anomalias padronizadas, Y’
T
é a matriz transposta de Y’, e R é uma
matriz p x p cujos elementos diagonais são as variâncias dos p pontos e os outros elementos
são as covariâncias entre os p pontos.
A meta principal desta técnica consiste em encontrar a combinação linear entre todas as
variáveis, i.e. pontos de grade, que explica a variância máxima (Hannachi, 2004). Isto
significa encontrar uma direção
c = (c
1
,…,c
p
)
T
tal que Y’c tenha máxima variabilidade. A
variância da série temporal Y’
c é dada por:
cccccc R=)(Y')(Y'
n
=Y'
n
=)(Y'
TT
1
1
1
1
var
2
(2.5)
O problema em questão é, portanto, maximizar c
T
Rc ao limite tal que c
T
c=I (i.e. que o
vetor c seja unitário; I é a matriz-identidade). A solução para isto é simplesmente resolver o
problema de autovalor
Rc = λc , (2.6)
onde λ é a matriz diagonal contendo os autovalores λ
i
de R (a matriz de covariância, por
definição, é simétrica e portanto diagonalizável), e os vetores-coluna c
i
de c são os
Capítulo 2: Dados e Metodologia
33
autovetores de R correspondentes aos autovalores λ
i
. Tanto λ quanto c têm dimensões p x p. O
i-ésimo vetor-coluna c
i
vem a ser a i-ésima EOF, logo as EOFs estão ordenadas de acordo
com o tamanho dos autovalores associados (e λ
1
λ
2
λp). Assim, a 1
a
EOF é o
autovetor associado ao maior autovalor, aquele associado ao segundo maior autovalor é a 2
a
EOF, etc (Björnsson e Venegas, 1997; Hannachi, 2004).
Conforme foi definido para a resolução do problema de autovalor, a matriz c, de
autovetores, tem a propriedade c
T
c=I. Isto implica que os autovetores sejam ortogonais entre
si – por isso o nome Funções Ortogonais Empíricas – ou seja, são linearmente independentes.
O significado físico desta propriedade é que as EOFs não estão correlacionadas no espaço.
Cada autovetor pode ser entendido como um mapa (i.e. a distribuição espacial do
modo), se reposicionados os pontos p na grade original. O padrão aí obtido representa uma
oscilação permanente, estacionária. A evolução temporal de uma EOF demonstra como esse
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
34
América do Sul (0°-40°S e 20°-60°W – domínio limitado em 60°W, ao invés de 65°W,
devido aos pontos de grade com valores indefinidos na área ocupada pelos Andes, em
850 hPa).
Aplicou-se a mesma técnica de EOFs combinadas utilizada em Silva e Carvalho (2006).
Ela difere da técnica descrita acima quanto à matriz de entrada dos dados: por se tratar de
campos de cinco variáveis ao invés de uma só, a matriz dos dados originais X possui
dimensões t x 5p, contendo em cada linha de tempo t os pontos de grade p dos campos de
todas as variáveis. Como o número de pontos no espaço é consideravelmente maior do que o
número de pontos no tempo, o cálculo dos autovalores e autovetores é feito a partir da matriz
de correlação L (Hirose e Kutzbach, 1969). Esta matriz está relacionada à matriz de
covariância R através da seguinte forma:
L = D
–1
R D
–1
(2.10)
onde D é a chamada matriz diagonal – os elementos de sua diagonal são os desvios-padrão da
amostra original X, ou seja, os elementos diagonais são a raiz quadrada dos correspondentes
em R, sendo nulos os outros elementos; e D
–1
é a matriz inversa de D (Wilks, 2006). Quando
os dados são padronizados (como no caso das anomalias de TSM, mas não no caso do
LISAM), L e R são equivalentes.
Sendo assim, os coeficientes resultantes dos autovetores da matriz de correlação não são
representativos do seu padrão espacial – tal como na matriz de covariância – e sim da sua
série temporal. Os autovetores, portanto, representam aqui a componente principal, e não a
EOF. Como o LISAM é dado pelo coeficiente de expansão da primeira EOF combinada,
somente este foi considerado na análise. O padrão espacial do modo é obtido projetando o
índice na série de campos de cada variável, individualmente, na forma de mapas de
correlação.
2.4.3.
Análise da variabilidade temporal por Transformada de Ondeleta (TO)
De maneira geral, um sinal climático representa o somatório de interações entre
processos físicos que operam numa vasta gama de escalas temporais e espaciais. Muitas
vezes, na tentativa de detectar um sinal, calcula-se a média de um parâmetro climático
qualquer, sobre um grande domínio espacial – que pode ser o globo inteiro, um hemisfério,
um continente, os oceanos, etc. Ao passo que isto elimina algumas das flutuações de alta
freqüência, a série temporal resultante pode ainda possuir grande variabilidade no domínio do
tempo (Lau e Weng, 1995). A análise por TO é uma técnica bastante eficiente na
determinação de escalas temporais relevantes, permitindo assim o melhor entendimento de
fenômenos que ocorrem em múltiplas escalas de tempo (Vitorino et al., 2006). Ao decompor
Capítulo 2: Dados e Metodologia
35
uma série temporal no domínio de tempo-freqüência, é possível determinar os modos de
variabilidade dominantes e como estes modos variam no tempo (Torrence e Compo, 1998).
Sob esta ótica, a análise por TO foi aplicada a diversas séries temporais neste estudo: (i)
nas séries dos índices de variabilidade climática (SOI, Niño3, PDO e AMO), comparando os
índices observados com os índices da simulação de controle, para validação da variabilidade
apresentada pelo modelo, e comparando as simulações do presente e do HM entre si, para
avaliar mudanças no padrão de variabilidade de um mesmo índice simulado com diferentes
condições iniciais; (ii) nas componentes principais das anomalias de TSM dos oceanos
Atlântico e Pacífico, em ambas as simulações; e (iii) nas séries do LISAM calculados também
para ambas as simulações.
Quase sempre um sinal climático é não-estacionário, consistindo numa grande
variedade de regimes de freqüência que podem ser localizáveis no tempo ou podem abranger
porção considerável do período estudado. A simples análise da sua distribuição de densidade
espectral – através da Transformada de Fourier (TF) – identifica as freqüências fundamentais
e suas contribuições relativas à série temporal, mas não mostra nenhuma informação referente
à sua localização temporal. Sinais não-estacionários que aparecem somente num curto
intervalo de tempo podem não ser detectados pela TF, pois estes sinais são diluídos ao se
calcular a média de todo o domínio do tempo. Ao buscar estruturas fundamentais no domínio
tempo-freqüência, algumas freqüências, embora de sinal fraco, podem ainda ser importantes
se fizerem parte de uma hierarquia de freqüências (Weng e Lau, 1994). É por isto que a
análise por ondeletas é superior à análise de Fourier, uma vez que ela decompõe a série em
escalas de tempo e freqüência (em um escalograma), permitindo a localização no tempo de
sinais não-estacionários (Weng e Lau, 1994; Torrence e Compo, 1998).
Matematicamente, a TO decompõe o sinal s(t) em termos de algumas funções
elementares
ψ
a,b
(t), (denominadas ondeletas-filhas, ou simplesmente ondeletas) derivadas da
ondeleta-mãe
ψ
(t) por dilatações [e.g.,
ψ
(t)
ψ
(2t)] e translações [e.g.,
ψ
(t)
ψ
(t+1)]
(Weng e Lau, 1994; Lau e Weng, 1995). Com escala de dilatação positiva a e em posição
transladada b (ambos números reais, contínuos ou discretos), as ondeletas-filhas estão
definidas por:
1
a
bt
a
=(t)
ba,
ψ
. (2.11)
O fator a
-1/2
é de normalização da energia, i.e. mantém a energia das ondeletas igual à da
ondeleta-mãe, assim como elas mantêm a mesma forma (Weng e Lau, 1994).
A TO do sinal real s(t) com relação à
ψ
(t) pode ser definida como uma integral de
convolução, ou o produto interno entre a função s(t) e as ondeletas, i.e.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
36
()
= dt
a
bt
s(t)
a
=sbaW
ba
*
1
,,
,
ψψ
, (2.12)
onde
ψ
* indica o complexo conjugado da função (Weng e Lau, 1994; Lau e Weng, 1995;
Torrence e Compo, 1998).
Para caracterizar uma função ondeleta-mãe,
ψ
(t) deve ser quadraticamente integrável no
tempo e no espaço, i.e. deve possuir energia finita, além de ter média zero (condição de
admissibilidade). Também deve ser uma função centrada em zero e, no limite | t | , deve
decair rapidamente a zero (Farge, 1992; Meyers et al., 1993).
A função ondeleta utilizada neste estudo é a de Morlet, que representa uma onda
modulada por um envelope gaussiano:
2/
2
0
)(
t
tiw
eet
=
ψ
. (2.13)
É a mais indicada para sinais climáticos devido à sua forma ondulada, apresentando variações
no tempo tão suaves quanto íngremes. Por ser complexa, ela é capaz de detectar tanto a
amplitude quanto a fase (em função do tempo) para diferentes freqüências exibidas na série
temporal de um sinal meteorológico (Weng e Lau, 1994). O parâmetro w
0
indica uma
freqüência adimensional, e w
0
= 6 é o que melhor satisfaz a condição de admissibilidade
(Farge, 1992; Torrence e Compo, 1998; Grinsted et al., 2004; Maraun e Kurths, 2004). Neste
estudo, porém, a análise de TO foi executada com w
0
= 5,4, conforme Weng e Lau (1994) e a
recomendação do autor do código utilizado (JL Mélice, IRD, comunicação pessoal).
As ondeletas derivadas da função Morlet seguem a equação 2.14:
()
2
,
2
0
1
=
a
bt
a
bt
iw
ba
ee
a
. (2.14)
Sendo a função
ψ
(t) complexa, a TO W
(a,b)
é também complexa. A TO pode ser dividida
em parte real {W
(a,b)
} e parte imaginária {W
(a,b)
}, ou em amplitude |W
(a,b)
| e fase
tan
–1
[{W
(a,b)
}/ {W
(a,b)
}]. Pode-se também definir a energia do escalograma de ondeleta por
|W
(a,b)
|
2
, o que dá a medida da variância da série em cada escala a cada tempo. A fase das
funções de ondeleta definidas no espaço dos números reais não é definida, pois a parte
imaginária é nula (Torrence e Compo, 1998).
Após a definição da ondeleta-mãe, é necesrio escolher a série de escalas a serem
representadas na TO. Para a ondeleta Morlet, que é contínua, é conveniente escolher escalas
como derivadas da potência de dois:
s
j
= s
0
2
j
δ
j
, com j = 0,1,…,J (2.15)
J =
δ
j
-1
log
2
(N
δ
j / s
0
) , (2.16)
Capítulo 2: Dados e Metodologia
37
onde s
0
é a menor escala resolvível e J determina a maior escala. A menor escala pode ser
pelo menos 2
δ
t, e o maior valor de
δ
j que continua a dar amostragem adequada é de
aproximadamente 0,5 para a ondeleta Morlet. Quanto menor
δ
j, mais fina será a resolução do
escalograma.
O espectro de ondeleta global consiste na média (por escala s) da potência da TO sobre
todo o período da série (eq. 2.17) (Torrence e Compo, 1998). É equivalente ao espectro de
Fourier suavizado pela função ondeleta Morlet no espaço de Fourier (Farge, 1992).
=
=
1
0
2
2
)(
1
)(
N
i
i
sW
N
sW (2.17)
A TO em um ponto no tempo t
i
sempre contém informações dos pontos vizinhos. A
quantidade de pontos vizinhos considerados vai depender da ondeleta-mãe escolhida e das
escalas consideradas. Assim, se a ondeleta está centrada próxima ao início ou ao final da
série, ocorrem erros de borda. Define-se, portanto, o cone de influência (COI), que é a região
do escalograma de ondeletas fora da qual os efeitos de borda não podem ser ignorados. O COI
é dado pela área onde, por conta de uma descontinuidade na borda, a potência da ondeleta
sofre decaimento de fator e
–2
(Maraun e Kurths, 2004; Grinsted et al., 2004).
Uma das deficiências da análise de TO é a falta de um teste de significância apropriado
para processos não-estacionários. Quase todos os testes de significância tradicionais
pressupõem que ciclos idênticos se repetem nestes processos, o que contradiz a justificativa
de aplicação da técnica em questão (Lau e Weng, 1995). Uma alternativa é utilizar métodos
de Monte Carlo, tal como é proposto em Torrence e Compo (1998). Lau e Weng descartam
esta alternativa por considerar tais métodos insatisfatórios no contexto de sistemas não-
lineares, onde procura-se localizar freqüências que podem ser parte de uma hierarquia de
estruturas de freqüências relacionadas às freqüências fundamentais que governam o sistema.
Alguns dos harmônicos mais altos têm pequenas amplitudes e pode ser difícil distingüí-los de
ruído. Ainda assim, sua presença em conjunto com as freqüências fundamentais é fisicamente
importante, porém não necessariamente estatisticamente significante no sentido tradicional.
Torrence e Compo (1998) contra-argumentam que testes de significância devem, sim,
ser aplicados, mesmo que se pressuponha estacionaridade. Segundo eles, a associação de
métodos de Monte Carlo com o teste qui-quadrado poderia ser utilizada desde que observada
a coerência dos resultados. Já Vitorino et al. (2006) concluíram que tal método de fato é
inviável para a análise de TO. Diante destas incertezas e no intuito de simplificar a análise,
optou-se no presente estudo pela não-realização de qualquer teste de significância.
Uma última análise foi feita no intuito de detectar alguma relação entre os modos de
variabilidade da TSM dos oceanos e a variabilidade das monções na América do Sul, dada
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
38
pelo LISAM. Para tanto aplicou-se a análise de ondeletas cruzadas: dadas duas séries
temporais x(t
i
) e y(t
i
), com transformadas de ondeleta W
i
x
(s)e W
i
y
(s), onde i é o índice do
tempo e s é a escala, é possível definir o escalograma de ondeletas cruzadas como:
W
i
xy
(s) = W
i
x
(s).W
i
y
*(s) , (2.18)
onde W
i
y
*(s) é o conjugado complexo de W
i
y
(s). O escalograma de ondeletas cruzadas é
complexo, de tal forma que pode ser decomposto em amplitude (potência) |W
i
xy
(s)| e diferença
de fase
φ
i
(s), esta dada pelo argumento complexo (Torrence e Compo, 1998; Maraun e
Kurths, 2004; Grinsted et al., 2004).
A potência das ondeletas cruzadas revela as áreas (no tempo e na freqüência) em que as
duas séries têm grandes amplitudes em comum. Outra maneira de mensurar isto é o quão
coerente a transformada de ondeletas cruzadas é no espaço de tempo-freqüência (Grinsted
et al., 2004). A coerência da ondeleta é definida como o quadrado da amplitude do
escalograma de ondeletas cruzadas, suavizado e normalizado pela potência da ondeleta de
cada série, suavizada individualmente:
2
1
2
1
2
1
2
)()(
)(
)(
sWssWs
sWs
sR
y
i
x
i
xy
i
i
= , (2.19)
onde . indica suavização no tempo e na escala. O fator s
-1
serve para converter a uma
densidade de energia. Com estas definições, 0
R
i
2
(s)
1 (Torrence e Webster, 1999). Pelo
fato da TO conservar a variância, a coerência da ondeleta é uma representação bastante
precisa da covariância (normalizada) entre as séries temporais.
A diferença de fase da coerência de ondeletas é dada por (Torrence e Webster, 1999):
{
}
{}
=
)(
)(
tan)(
1
1
1
sWs
sWs
s
xy
i
xy
i
i
φ
(2.20)
A análise de coerência e diferença de fase do escalograma de ondeletas cruzadas foi
aplicado entre o LISAM e cada um dos modos do Atlântico e do Pacífico, em 2L24 e em
HOL04. Foram utilizados os códigos para Matlab desenvolvidos por Torrence e Webster
(1999) e adaptados por Aravéquia (2003).
CAPÍTULO 3: CLIMA MÉDIO NO PRESENTE E EM 6 KA AP
Este capítulo está dividido em duas partes. Na primeira é exposta uma avaliação do
clima médio do modelo para o presente, em campos globais sazonais. Feita a partir de
comparações com o clima observado, esta análise tem como objetivo maior a validação do
modelo, i.e. a determinação da magnitude e da localização dos desvios (bias) do modelo com
relação aos dados reais do ponto de vista médio sazonal. Na segunda parte o enfoque é a
América do Sul, e o objetivo da análise é determinar as diferenças entre o clima médio
sazonal em HOL04 e em 2L24 sobre o continente.
3.1. Clima médio no presente
Na comparação entre os campos médios de PPT observada (GPCP) e do modelo (2L24)
(Fig. 3.1), a maior discrepância é a ocorrência, no modelo, de uma “ZCIT dupla” sobre o
oceano Pacífico em praticamente todas as estações. Este bias é bastante comum em modelos
acoplados e está relacionado à tendência em orientar a Zona de Convergência do Pacífico Sul
(ZCPS)
paralela às latitudes e estendê-la excessivamente para o leste (IPCC, 2007).
Kodama (1992, 1993) descreve como Zonas Subtropicais de Precipitação (ZSPs) a
ZCPS, a ZCAS e a Zona Frontal do Baiu (ZFB), esta última sobre o leste da Ásia e o oeste do
Pacífico Norte. São zonas de forte convergência de umidade em baixos e médios níveis com
precipitação abundante, que se formam e permanecem ativas durante os meses de verão. As
ZSPs estendem-se das regiões de convecção monçônica nos trópicos para leste em direção aos
subtrópicos (até ~25°S e 30°N). O aporte de umidade que as sustenta advém tanto do fluxo de
ar (vindo dos continentes) orientado na direção das ZSPs quanto da circulação periférica das
altas subtropicais, vinda de latitudes mais baixas.
A simulação de controle não reproduz o correto posicionamento da ZCPS. Esta banda
de precipitação, como pode ser verificado nos campos de PPT do GPCP, é orientada na
direção NW-SE sobre o sudoeste do Pacífico e presente o ano todo mas mais intensa nos
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
40
meses DJF e MAM. Em 2L24 a ZCPS parece se desenvolver mais zonalmente e mais
próxima do equador, contribuindo para o efeito de duplicação da ZCIT.
A formação da ZCAS durante os meses de verão está bem representada pelo modelo,
porém com taxa de PPT subestimada na região Amazônica e no Brasil central. Na versão
anterior deste modelo foi constatado que a PPT na ZCAS era superestimada enquanto que a
PPT produzida pelo modelo na região Amazônica foi substancialmente subestimada (Jorgetti,
2004). Há uma superestimativa da PPT no extremo noroeste da América do Sul, durante o ano
inteiro, porém mais intensa e abrangendo área maior em DJF e MAM. Em SON essa
discrepância estende-se para sudeste, sobre o continente, indicando que o modelo simula o
desenvolvimento da ZCAS mais tarde do que o observado.
Fig. 3.1: PPT climatológica do GPCP (à esq.), de 2L24 (no meio) e a diferença 2L24–GPCP (à dir.), para os
trimestres DJF, MAM, JJA e SON.
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
41
Sobre o Atlântico e a costa norte do continente sul-americano, a ZCIT do modelo está
enfraquecida nos meses DJF e MAM, também apresentando indícios de duplicação. Em JJA
ela é mais intensa do que o observado. No extremo sul da América do Sul, a oeste dos Andes,
o volume de PPT provocado por sistemas transientes é maior em 2L24.
A ZFB aparece enfraquecida no modelo, não atingindo, ao longo do seu ciclo, os
máximos observados pelo GPCP. Sobre a Indonésia, no extremo oeste do Pacífico Equatorial,
a PPT é superestimada em todos os trimestres. No trimestre em que ocorre a monção asiática
de verão (JJA), a PPT sobre a Índia é subestimada pelo modelo, bem como sobre o norte da
Austrália em DJF.
Fig. 3.2: Diferença entre campos médios da ROL climatológica de 2L24 e da reanálise NCEP/NCAR, para os
trimestres DJF, MAM, JJA e SON.
A análise das diferenças entre os campos médios de ROL (Fig. 3.2) corrobora as
principais discrepâncias encontradas nos campos de PPT. Merecem destaque a região tropical
sobre o Pacífico, onde o excesso de ROL simulado (em todas as estações) indica uma
supressão generalizada de nebulosidade convectiva, e o continente sul-americano. A carência
de PPT sobre toda a região central e norte/nordeste da América do Sul no modelo fica
evidente a partir dos campos de ROL. O expressivo desvio positivo de 2L24 com relação à
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
42
reanálise expõe a ineficácia do modelo na formação da nebulosidade profunda típica da
região, principalmente em DJF (quando a ZCIT aparece mais fraca) e em SON (pelo atraso no
desenvolvimento da ZCAS).
Os campos de diferenças entre a Q2M simulada em 2L24 e a Q2M da reanálise
(Fig. 3.3) indicam que, sobre praticamente toda a América do Sul (excetuando a extensão de
sua costa ocidental), o modelo apresenta concentrações de umidade bem menores do que as
observadas: a diferença é de pelo menos 2 g/kg ao longo do ano, chegando a 7 g/kg em SON.
O mesmo acontece sobre as florestas equatoriais do todo o planeta. Sobre algumas regiões
desérticas (e.g. o Platô Tibetano, o sudoeste dos EUA, a metade norte do Chile, a metade
oeste da Austrália e o leste da África) o modelo tende a superestimar a umidade presente no ar
próxima à superfície.
Fig. 3.3: Diferença entre campos médios de Q2M climatológica de 2L24 e da reanálise NCEP/NCAR, para os
trimestres DJF, MAM, JJA e SON.
Uma das possíveis causas de grandes bias na Q2M deste modelo está na interpolação da
umidade entre o primeiro nível de pressão e a superfície para obter a umidade a 2 m. Pode ser
que o primeiro nível do modelo acoplado não seja exatamente igual ao primeiro nível da
reanálise, o que daria representatividade diferente à concentração de umidade em cada um dos
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
43
casos. Interpolações que partem de valores diferentes – não necessariamente errados – pode m
potencializar as diferenças, sem que isto invalide a variável no modelo. A comparação entre
os campos sazonais de diferenças de Q2M e as diferenças na PPT mostra, no entanto, que a
causa dos erros do modelo nos padrões de PPT não está na umidade próxima à superfície,
uma vez que as diferenças não são coincidentes em toda parte. Mais adiante será mostrado
que é mais provável que os erros do modelo estejam na convergência horizontal de umidade,
o que evidencia um problema de circulação.
Fig. 3.4: T2M climatológica da reanálise NCEP/NCAR (à esq.), de 2L24 (no meio) e a diferença 2L24–
Reanálise (à dir.), para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON.
A distribuição espacial de T2M, em geral, segue o mesmo padrão no modelo e na
reanálise (Fig. 3.4). Sobre a América do Sul, porém, a média sazonal é pelo menos 1°C maior
no modelo em quase todas as estações, em particular sobre a Amazônia nos meses SON,
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
44
quando esta diferença ultrapassa 5°C – o que provavelmente está relacionado ao déficit
pluviométrico de 2L24 sobre esta região nesta estação do ano. Em JJA ocorrem diferenças
(entre o modelo e a reanálise) positivas na zona equatorial do continente e negativas daí para
o sul, mas as magnitudes destas diferenças ficam entre 1 e 5°C.
Os campos sazonais de T2M evidenciam que a cordilheira dos Andes não é bem
resolvida no modelo, uma vez que subestimam a diminuição de temperatura próxima à
superfície conforme o aumento da altitude (tendo em vista a baixa resolução horizontal do
modelo atmosférico, as altitudes médias são menores que as reais). Por este motivo toda a
faixa costeira do Pacífico, na América do Sul, apresenta diferenças positivas de T2M. Em
todo o planeta, as discrepâncias mais expressivas de T2M são encontradas nas latitudes mais
altas, particularmente sobre a Antártica – onde também ocorrem altitudes maiores – em MAM
e JJA. Sobre o Himalaia e o Platô Tibetano, região onde a altitude média também é grande, o
modelo também apresenta erro na T2M, apontando temperaturas mais baixas. Esta questão
dos erros em função da altitude ainda será abordada a seguir.
A análise das diferenças nos campos sazonais de PNM (Fig. 3.5) aponta distorções
importantes (em todos as estações) em latitudes mais altas, um problema já constatado na
versão anterior do modelo (Jorgetti, 2004). A Baixa das Aleutas, no extremo norte do
Pacífico, aparece bem mais intensa do que na reanálise nos meses de inverno e primavera –
principalmente em DJF. A evolução sazonal dos anticiclones subtropicais sobre os oceanos
Pacífico e Atlântico é razoavelmente reproduzida pelo modelo. A Alta Subtropical do
Atlântico Norte (ASAN) é mais intensa em 2L24 do que na reanálise em todas as estações,
sobretudo nos meses JJA e SON. A Alta Subtropical do Pacífico Norte (ASPN) é sempre mais
fraca no modelo, possivelmente devido à maior intensidade simulada da Baixa das Aleutas
(tendência de redução da pressão sobre todo o setor norte da bacia do Pacífico). A ASPS,
embora apresente-se mais fraca no modelo em todas as estações do ano, ainda assim apresenta
configuração e evolução de acordo com o observado. O ciclo anômalo da ASAS – ao
contrário das outras altas subtropicais, que são mais intensas no verão (Rodwell e Hoskins,
2001), a ASAS é mais intensa no inverno, pois no verão ela é enfraquecida pela proximidade
da ZCAS (Satyamurty et al., 1998) – é relativamente bem representado pelo modelo, estando
o centro do anticiclone apenas um pouco mais intenso e alargado nos meses MAM, quando
ele de fato está se expandindo.
Em uma faixa zonal sobre o oceano Austral, ao sul da Oceania, a PNM é subestimada
pelo modelo, o que evidencia um leve deslocamento para o norte do cinturão de baixas
pressões do Hemisfério Sul em 2L24. No interior da Ásia, sobre o Platô Tibetano, bem como
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
45
sobre as regiões polares continentais (Antártica e Groenlândia), a PNM é bastante
superestimada. Estas regiões têm em comum uma altitude média elevada (entre 2000 e
4000 m na Ásia e na Antártica e cerca de 2000 m na Groenlândia), o que sugere um problema
de ajuste na redução da pressão atmosférica ao nível do mar. Este problema está relacionado à
temperatura, pois a redução da altitude é calculada com base na lei da hidrostática. Uma vez
que a baixa resolução horizontal do modelo provoca erros na temperatura (conforme foi
ressaltado na comparação dos campos de T2M), erros na redução da pressão atmosférica são
conseqüência direta.
Fig. 3.5: PNM climatológica da reanálise NCEP/NCAR (à esq.), de 2L24 (no meio) e a diferença 2L24–
Reanálise (à dir.), para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON.
Cabe aqui ressaltar que a própria reanálise, por sua natureza, também não representa
precisamente a realidade. Não se trata de um banco de dados estritamente observacionais, e
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
46
sim de um modelo alimentado pela maior quantidade possível de dados medidos (seja
remo ta men te , s ej a in situ). Não há, porém, a cobertura completa de todas as regiões do globo;
torna-se necessária a interpolação dos campos sobre as regiões mais remotas onde a oferta de
dados observados é escassa, introduzindo, assim, determinada margem de erro nos resultados
da reanálise. Em algumas regiões, com menor cobertura de dados, a influência da estimativa
inicial da análise do modelo (dada por previsões de curto prazo) é maior, podendo levar a
diferenças mais significativas para o clima real.
Fig. 3.6: Vento climatológico em 200 hPa da reanálise NCEP/NCAR (à esq.), de 2L24 (no meio) e a diferença
2L24–Reanálise (à dir.), para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON. As regiões sombreadas nas figuras à direita
indicam diferenças na magnitude do vento.
Os campos de vento em 200 hPa (Fig. 3.6) mostram que em 2L24 os núcleos dos jatos
subtropicais (sobre o Pacífico, principalmente) são bem mais intensos e zonalmente
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
47
concentrados que nos campos observados – por isto as importantes diferenças negativas no
seu lado polar. Sobre o setor norte do Pacífico, a superestimativa do jato, no modelo, pode
estar relacionada ao abaixamento da PNM sobre as Aleutas, ao induzir a convergência na
superfície. A circulação em baixos níveis (850 hPa) (Fig. 3.7) reafirma esta hipótese, pois nos
campos de 2L24 a circulação ciclônica sobre o extremo norte do Pacífico é mais intensa do
que nos campos observados, em todas as estações.
Fig. 3.7: Vento climatológico em 850 hPa da reanálise NCEP/NCAR (à esq.), de 2L24 (no meio) e a diferença
2L24–Reanálise (à dir.), para os trimestres DJF, MAM, JJA e SON.
De acordo com os campos de vento em 850 hPa (Fig. 3.7), as circulações anticiclônicas
relacionadas às altas subtropicais não são muito bem representadas em 2L24. A circulação da
ASPN só aparece nos meses JJA e SON, época em que ela realmente está mais fortalecida. A
ASAN ganha evidência em MAM, tal qual na observação, e em JJA e SON o modelo a
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
48
simula bem mais intensa do que realmente é, confirmando as diferenças constatadas nos
campos de PNM. A ASPS é, talvez, o anticiclone cuja evolução sazonal é melhor simulada;
apenas em DJF é mais fraco do que o observado. A ASAS é mais fraca em 2L24 em DJF, mas
nas demais estações aparece progressivamente mais intensa do que na reanálise.
Ainda nos campos da Fig. 3.7, pode-se verificar algumas discrepâncias na circulação de
baixos níveis sobre a América do Sul, relacionadas principalmente à ASAS e à ASAN. Em
DJF, meses de maior atividade monçônica, os alísios de NE que avançam sobre o continente
impulsionados pela ASAN estão mais fracos em 2L24 do que no campo observado,
justamente por causa do enfraquecimento do anticiclone na simulação, nesta época. O mesmo
é constatado com relação aos alísios de SE, impulsionados pela ASAS. Este diagnóstico
explica a subestimativa da PPT e Q2M sobre a região, bem como o excesso de ROL. O JBN
pode ser percebido no campo da reanálise, também em DJF, mas não aparece em 2L24. Todas
estas discrepâncias no transporte de umidade sobre o continente justificam o fraco
desenvolvimento da ZCAS na simulação do clima do presente.
A Fig. 3.8 mostra os campos globais de diferenças entre a TSM média sazonal
modelada (2L24) e a observada (conjunto NOAA). Na maior parte da faixa intertropical dos
oceanos as diferenças não ultrapassam ±1°C, com exceção dos setores leste das bacias
oceânicas – onde o modelo apresenta temperaturas superestimadas em até 6°C. No oceano
Atlântico a TSM é subestimada (em até 4°C) mesmo em latitudes tropicais, diferenças estas
que avançam para leste na direção dos pólos. Nas latitudes mais altas, em todos os oceanos, o
modelo aponta TSM climatológica mais baixa do que a observada, alcançando até 8°C de
diferença.
Fig. 3.8: Diferença entre a TSM climatológica de 2L24 e do conjunto NOAA para DJF, MAM, JJA e SON.
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
49
3.2. Clima médio na América do Sul em 6 ka AP
A análise do clima médio na simulação HOL04 foi focada na América do Sul, em um
domínio que se estende de 90-30°W e 60°S-20°N, e descrita a partir dos desvios sazonais do
clima do HM com relação ao clima do presente (da simulação 2L24). A análise da TSM
média sazonal do HM, no entanto, foi mantida no domínio global.
Os campos de diferenças da TSM global entre os climas presente e passado simulados
pelo modelo (Fig. 3.9) indicam resfriamento generalizado (embora de pequena magnitude)
dos oceanos, durante o HM em relação ao presente. Apenas nos meses SON é que a TSM
média foi maior (no máximo 0,5°C) em algumas regiões. As maiores diferenças negativas
ocorreram em MAM, tendo a superfície do mar sido até 2°C mais fria há 6 ka AP, em todos
os oceanos.
Fig. 3.9: Diferença entre a TSM climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
A precipitação, segundo o modelo, era discretamente menor sobre a maior parte do
continente sul-americano durante o HM (Fig. 3.10) nos meses DJF e MAM, devido à
atividade convectiva (associada à ZCAS) menos intensa no passado. Ao NW (sobre a
Colômbia, Equador e Peru), esta diferença era maior. Sobre o NE brasileiro, no entanto,
chovia mais em 6 ka AP. Isto sugere que o deslocamento para o sul da ZCIT em DJF teria
sido limitado neste período – devido ao seu posicionamento médio estar deslocado mais para
o norte (Haug et al., 2001; Koutavas et al., 2006) – com a convergência permanecendo sobre
o NE, resultando em diferenças positivas neste setor. Nos meses JJA e SON a situação se
invertia: sobre a costa NW do continente, próximo e logo ao sul do equador, chovia mais em 6
ka AP do que no presente, o que possivelmente está relacionado ao aquecimento do Pacífico
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
50
Equatorial Leste nesta época do ano, especificamente (Fig. 3.9). Sobre toda a costa norte da
América do Sul, ocorria o contrário. Diferenças negativas de PPT, ainda maiores no NE, são
indícios de que a ZCIT deslocava-se mais além sobre o oceano Atlântico no verão do
Hemisfério Norte.
Fig. 3.10: Diferença entre a PPT climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
A análise das diferenças entre os campos médios de ROL de 6 ka AP e do presente
(Fig. 3.11) corrobora as principais diferenças encontradas nos campos de PPT. Sobre o
noroeste da América do Sul, durante os meses DJF e MAM do HM, a ROL era mais intensa
do que no presente, i.e. a cobertura média de nuvens era menor, implicando em menos
precipitação. Nas demais estações do ano a situação era inversa. Já para região equatorial
sobre o NE da América do Sul, a maior emissão de ROL em JJA e SON confirma a hipótese
de uma ZCIT deslocada mais para o Hemisfério Norte, durante o HM.
Fig. 3.11: Diferença entre a ROL no TOA climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
Com exceção dos meses de primavera (SON), nas demais épocas do ano o clima na
América do Sul era mais seco no HM do que no presente (Fig. 3.12). A diferença é maior em
MAM, principalmente sobre a zona intertropical. Nos meses de primavera, a região central da
América do Sul apresentava um clima mais úmido há 6 ka AP.
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
51
Fig. 3.12: Diferença entre a Q2M climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
Tal como esperado, os campos de diferenças entre a temperatura média no HM e no
presente (Fig. 3.13) apontam a redução do ciclo sazonal, causada pela forçante orbital. A
temperatura sobre o continente era menor durante o HM nos meses de verão e outono do
Hemisfério Sul; a mudança na outra fase do ciclo não é muito notável no inverno (não há
grande variação na temperatura média na região central do continente); ela é melhor
caracterizada nos meses de primavera, quando a temperatura média era maior no HM do que
no presente. A este aumento na temperatura média da primavera está associado o aumento na
umidade mencionado anteriormente. O aumento da umidade, em função da temperatura, pode
ocorrer através de duas formas: (1) maior evaporação e (2) mudanças no gradiente de pressão
que aumentam a convergência de umidade. Ambos processos podem ser importantes para
definir o início da estação chuvosa sobre o continente, questão que será explorada adiante.
Fig. 3.13: Diferença entre a T2M climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
As diferenças entre os campos sazonais de PNM das simulações HOL04 e 2L24
(Fig. 3.14) concordam com as diferenças de temperatura. O menor aquecimento sobre os
continentes no passado implica em pressão atmosférica maior, e vice-versa. A intensificação
do gradiente de pressão em SON confirma a hipótese de aumento na convergência de
umidade sobre o continente.
A zona de pressão mais baixa durante o HM nas latitudes subtropicais, entre 30-50°S, se
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
52
considerada junto com as diferenças positivas de pressão em latitudes ainda mais altas, podem
ser indicativas de que o cinturão das baixas pressões mantinha-se mais ao norte nos meses de
verão e outono, o que concorda com a hipótese de Kim et al. (2002).
Fig. 3.14: Diferença entre a PNM climatológica de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
Com relação ao vento em altos níveis (Fig. 3.15), os contra-alísios (ventos equatoriais
de oeste, em altitude) sobre a costa noroeste da América do Sul eram mais intensos nos meses
DJF e MAM durante o HM. Nos meses de inverno e primavera do Hemisfério Sul, a baixa
pressão relativa sobre o continente induzia uma tendência anticiclônica na circulação de altos
níveis há 6 ka AP, mais intensa em SON. Não há variações importantes com relação às
correntes de jato subtropical e polar.
Fig. 3.15: Diferença entre o vento climatológico em 200 hPa de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM, JJA e SON.
O vetor indica a diferença na direção do vento; a área sombreada, a diferença na magnitude.
Os campos de diferenças do vento em baixos níveis (Fig. 3.16) sustentam a hipótese de
que o cinturão de baixas pressões teria se mantido mais ao norte durante os meses DJF e
MAM no HM, devido à presença de tendência ciclônica na mesma faixa latitudinal.
O vetor resultante da diferença do vento entre HOL04 e 2L24 na região do JBN, em
DJF, aponta para NW, indicando uma tendência de enfraquecimento do vento que
normalmente seria de NW. Da mesma forma, percebe-se o enfraquecimento dos ventos de
leste (alísios de NE e SE) em todas as estações, mas principalmente em DJF e MAM. Em
SON percebe-se o fortalecimento do JBN. Isto pode estar associado ao maior acúmulo de
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
53
umidade na região central da América do Sul, mas não é suficiente para provocar maior taxa
de PPT na região nos meses de primavera. Os efeitos deste acúmulo de umidade devem,
portanto, ser analisados localmente, a fim de detalhar possíveis mudanças com relação ao
início da estação chuvosa.
Fig. 3.16: Diferença entre a direção do vento climatológico em 850 hPa de HOL04 e de 2L24 para DJF, MAM,
JJA e SON.
Para investigar mudanças locais na precipitação sobre a América do Sul, entre o
presente e o HM, foram selecionadas as localidades destacadas na Fig. 3.17 e delas obtidas as
séries de PPT mensal. A análise consistiu na avaliação de mudanças no ciclo anual, na média
e no desvio-padrão (como medida da variabilidade) da PPT sobre cada uma das localidades. A
Fig. 3.18 ilustra os resultados da análise do ciclo anual, onde as curvas com triângulos
referem-se a 2L24 e as curvas com círculos, a HOL04. As variações nas médias e desvios-
padrão são apresentados na Tab. 3.1.
Fig. 3.17: Localidades da América do Sul selecionadas para análise do ciclo anual, da média e do desvio-padrão
da precipitação.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
54
Fig. 3.18: Ciclo anual da PPT no presente (triângulos) e no HM (círculos), das localidades selecionadas da
América do Sul (Fig. 3.17).
Na localidade representativa da Venezuela – extremo norte da América do Sul – o
período chuvoso é entre março e agosto e está diretamente relacionado à sazonalidade da
ZCIT. A taxa de PPT na estação chuvosa é menor no HM, devido ao já constatado
enfraquecimento da ZCIT nos meses em que ela migra para o Hemisfério Norte. Por conta
desta diminuição na taxa diária, a PPT média também é menor no HM, bem como a sua
variabilidade.
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
55
Na localidade da Amazônia, o ciclo sazonal da PPT sofre influência tanto dos
deslocamentos da ZCIT quanto da evolução da ZCAS. O seu gráfico indica, para o HM,
menor taxa de PPT na estação chuvosa e maior taxa na estação em que normalmente chove
menos, uma sutil resposta à atenuação do ciclo sazonal da insolação no Hemisfério Sul, em
6 ka AP. Na média, porém, a PPT é menor no HM, assim como a sua variabilidade.
Nas localidades do Pará, Maranhão e Ceará, cuja PPT está relacionada à migração da
ZCIT para o Hemisfério Sul, a taxa de PPT nos meses de dezembro a abril era maior no HM.
Com relação à PPT média, as diferenças entre as duas épocas são mínimas, apenas um
pequeno aumento no Maranhão, no HM. No Ceará a variabilidade é um pouco maior no HM.
No ponto sobre o Lago Titicaca, as mudanças na insolação também resultam numa
resposta discreta do ciclo anual da PPT. O seu mínimo ocorre em junho-julho, e o aumento
relativo da insolação nesta época do ano, no HM, provoca um pequeno aumento na taxa de
PPT durante os meses junho-novembro. A redução da insolação nos meses de verão, no
entanto, é maior, provocando diminuição na taxa de PPT entre fevereiro-abril. Por esta
diminuição da PPT no verão ser maior do que o aumento na primavera, a PPT média acaba
sendo menor no HM, com diminuição também na sua variabilidade.
Em Goiás e em Minas Gerais a PPT está relacionada à ZCAS, e sua sazonalidade é
dependente da atividade convectiva que predomina sobre o continente nos meses de verão do
Hemisfério Sul. Goiás, que possui uma estação realmente seca nos meses de inverno, não
chega a presenciar uma antecipação da estação chuvosa; apenas a sua redução entre janeiro-
março. Em Minas Gerais o mês de outubro no HM é mais chuvoso, mas todos os demais
meses da estação chuvosa também apresentam redução da PPT.
Sobre a região do Pantanal, no Mato Grosso do Sul, o excesso de umidade e maior
aquecimento na primavera faz com que o mês de outubro apresente ligeira diferença positiva
na PPT do HM. Também aqui isto não chega a representar uma antecipação da estação
chuvosa, pois nos demais meses de verão a chuva no HM é menor. A média e o desvio-padrão
da PPT no HM também são menores que no presente.
O ponto sobre o Chaco, no extremo norte da Argentina, representa a região de maior
atuação dos CCMs – tanto que nos meses de inatividade destes sistemas a PPT cai a índices
muito baixos. Aqui também o mês de outubro do HM apresenta maior PPT do que no
presente, enquanto o resto da estação chuvosa apresenta redução em 6 ka AP.
No ponto sobre o Rio Uruguai o maior volume de chuva ocorre no verão e deve-se
principalmente aos CCMs, sendo a precipitação nos meses de inverno relacionada à passagem
de sistemas frontais. O seu gráfico indica taxas de PPT para esta estação um pouco maiores no
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
56
HM, provavelmente relacionada ao deslocamento para o norte do cinturão de baixas pressões
do Hemisfério Sul, impulsionando maior número de sistemas transientes a passarem sobre o
local. O pequeno acréscimo de PPT na primavera (outubro-novembro) também pode ser
percebido nesta região, porém a diminuição em janeiro-abril é muito mais notável – tanto que
a PPT média no HM.
Tab. 3.1: média e desvio-padrão da PPT nos 100 anos das simulações 2L24 e HOL04 das localidades
selecionadas da Am éri ca do Sul (co nf o rme mapa da Fig. 3.17).
PPT (mm/dia)
2L24 HOL04
Região
média desvio-padrão média desvio-padrão
1. Venezuela 3,41 4,56 2,93 3,98
2. Amazonas 3,19 2,37 3,05 2,21
3. Pará 2,68 2,82 2,68 2,90
4. Maranhão 1,99 2,34 2,08 2,39
5. Cea 1,92 2,19 1,93 2,33
6. Lago Titicaca 5,32 4,03 5,01 3,80
7. Goiás 1,99 2,87 1,86 2,61
8. Minas Gerais 2,15 2,69 2,18 2,56
9. Pantanal 1,61 1,76 1,46 1,58
10. Chaco 0,52 0,56 0,46 0,50
11. Rio Uruguai 1,3 5 1,13 1,21 1,01
Esta versão do modelo do IPSL apresenta algumas melhorias com relação à versão
anterior, cujas simulações foram analisadas por Jorgetti (2004) e Silva Dias et al. (2006). O
clima mais seco no HM, generalizado sobre a América do Sul, verificado nas análises com
proxies bem como em outros estudos de modelagem paleoclimática (e.g. Valdes, 2000;
Harrison et al., 2003), pode ser verificado também em HOL04, principalmente através dos
campos de diferenças de Q2M. O resfriamento no verão do Hemisfério Sul, demonstrado por
Valdes (2000), foi constatado nesta simulação, porém com maior magnitude.
As diferenças nos campos sazonais de PPT e vento em baixos níveis, associadas à
análise local do ciclo anual da PPT, indicam mudanças no sistema monçônico da América do
Sul. A causa principal seria a diminuição do contraste térmico do continente (com
temperaturas menores) em relação ao oceano. Por conta do resfriamento ocorre o aumento da
PNM sobre o continente nos meses de verão, enfraquecendo o gradiente de pressão, e por
conseqüência os alísios. O resultado é o menor transporte de umidade para o continente,
menos atividade convectiva no interior e menor taxa de PPT.
O trimestre SON, época em que normal mente inicia a monção de verão na América do
Sul tropical, apresenta-se mais quente em 6 ka AP. Paralelamente, os campos de Q2M e vento
em 850 hPa indicam um quadro favorável à convergência e acúmulo de umidade, o que
poderia gerar uma antecipação da estação chuvosa no HM. Na análise local, porém, observa-
Capítulo 3: Clima Médio no Presente e em 6 ka AP
57
se apenas um mínimo aumento relativo da PPT no mês de outubro, acompanhado de uma
inversão nesta tendência nos meses subseqüentes (i.e. diminuição da PPT no HM com relação
ao presente). Isto mostra maior influência da redução da insolação no verão do Hemisfério
Sul.
Jorgetti (2004) também constatou o enfraquecimento e antecipação da monção, atrelado
ao desenvolvimento da ZCAS e mudanças na circulação associada. Seu estudo indica porém,
maior precipitação em SON por conta desta antecipação, o que não foi verificado aqui.
Apenas no volume de Q2M foi verificado um aumento na primavera, que se reverteu num
aumento significativo da PPT somente no oeste da América do Sul tropical. Não foi
diagnosticado aqui um início precipitado da estação chuvosa em toda a região sob influência
da ZCAS.
Mudanças no comportamento sazonal da ZCIT constatadas aqui coincidem com as
indicações de proxies de uma posição média anual deslocada para o norte. A intensificação da
PPT sobre o NE brasileiro em DJF (com menor PPT mai s ao sul) e o enfraquecimento da
ZCIT sobre o Atlântico em JJA e SON faz sentido quando se assume a hipótese de que a sua
migração para o sul é atenuada. A causa disto seria a amplificação do ciclo anual no
Hemisfério Norte em 6 ka AP.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
58
CAPÍTULO 4: MODOS DE VARIABILIDADE NO PRESENTE E EM 6 KA AP
No capítulo anterior discutiu-se o comportamento médio sazonal do clima modelado no
presente e em 6 ka AP. No entanto, o clima também é representado pela variabilidade. Neste
capítulo, portanto, são apresentados os resultados de duas análises: na primeira seção, a
análise por transformada de ondeleta dos índices de variabilidade climática (SOI, Niño3, PDO
e AMO), comparando as duas simulações com dados observados; na segunda seção, a análise
da variabilidade espacial e temporal da TSM dos oceanos Atlântico e Pacífico em cada uma
das simulações, através de EOFs e da transformada de ondeleta, respectivamente.
4.1. Índices de variabilidade climática
O espectro de ondeleta global da série observada do SOI (Fig. 4.1a), mostra energia
concentrada na escala entre 2-16 anos, sendo que o pico ocorre para flutuações com período
da ordem de 2-4 anos. Este espectro aponta, conforme esperado, o ENSO como modo
dominante (que ocorre na escala de 2-7 anos). No entanto este sinal não é estacionário na
série. O escalograma da parte real dos coeficientes da ondeleta aponta enfraquecimento na
energia do sinal de 2-4 anos na década de 1880 e nos períodos 1935-45 e 1955-65. Estes
foram períodos de domínio da energia na escala entre 4-8 anos. Nesta escala ocorreram
amplitudes mais importantes nos períodos 1875-90, 1910-25, 1940-60 e 1970-2000. Na escala
de 12-15 anos surgiram maiores amplitudes a partir de 1980, sendo que no final desta década
percebe-se a transferência de energia para freqüências mais altas, o que pode ter contribuído
para a maior intensidade do ENSO (os eventos EN de 1986/87 e LN de 88/89). Na escala de
40-50 anos existe um pulso fraco cujo sinal aparece crescente ao longo da série, no entanto ele
já está praticamente fora do cone de influência e sua confiabilidade é reduzida. Os resultados
aqui encontrados são consistentes com os de Wang e Wang (1996).
O espectro de ondeleta global do SOI da simulação do presente (Fig. 4.1b) confirma o
que o gráfico da série temporal já sugere: a magnitude das amplitudes em 2L24 é menor do
que nos dados observados e portanto têm menor energia. A flutuação mais energética também
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
60
ocorre na escala de 2-4 anos, porém maior energia está sendo atribuída a oscilações
interdecadais (15-30 anos) do que na observação (principalmente entre os anos 30 e 70 da
série). O modelo também atribui maior energia à oscilações de mais alta freqüência (escala de
1,5 ano). Na escala de atuação do ENSO (2-4 anos), os períodos mais energéticos são entre os
anos 60-90 e 120-135.
Na simulação do HM (Fig. 4.1c) o espectro de ondeleta global do SOI é similar ao da
simulação 2L24, porém com menor energia. O sinal do ENSO aparece mais fraco e
perturbado por ruídos de mais alta freqüência, mas mesmo assim há um pico de energia por
volta de 3,5 anos. Nesta escala, os períodos mais energéticos são entre os anos 20-30, 50-70 e
85-110. Oscilações interdecadais também aparecem nesta simulação (ainda que com menos
energia do que em 2L24, nesta escala ela é proporcionalmente maior em relação ao restante
do espectro), e percebe-se nitidamente como elas modulam os sinais de mais alta freqüência.
Entre os anos 60 e 80, maiores amplitudes na escala de 16-30 anos transferem energia e
provocam aumento da amplitude de uma oscilação na escala de 6 anos (entre os anos 70-80),
que por sua vez transmite essa energia para a escala de 3 anos.
Fig. 4.1: Série temporal, escalograma
da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global
do SOI, calculado com dados de PNM
(a) observados, do Climate Research
Unit, (b) em 2L24 e (c) em HOL04.
Período dado em anos.
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
61
Para a série de anomalias de TSM observada na região do Niño3 (Fig. 4.2a), o espectro
global indica maior energia na escala de 2-8 anos, tal como esperado devido ao ENSO. Pode-
se observar três períodos mais energéticos nesta série de 135 anos: de 1875 até 1910, com a
variabilidade praticamente confinada na escala de 2-4 anos; de 1910 a 1960, quando as
oscilações mais energéticas diminuem a freqüência, permanecendo na escala entre 4-8 anos; e
da década de 1970 até o presente, quando as maiores amplitudes voltam para freqüências mais
altas, ampliando o intervalo das escalas para 2-8 anos. Sinais mais fracos aparecem
irregularmente na escala interdecadal, de aproximadamente 10-20 anos, ao longo do período
analisado. Apesar de ser menor, em magnitude, do que o sinal aparente no SOI,
aproximadamente nesta escala, a partir de 1980, também percebe-se a transferência de energia
para freqüências mais altas, o que poderia ter fortalecido os eventos ENSO importantes desta
década. É importante observar que o sinal interdecadal que afeta o ENSO manifesta-se mais
intensamente em latitudes mais altas do Pacífico Norte, portanto é natural que na TSM da
região do Niño3 a sua assinatura espectral não seja tão marcante. De maneira geral, o
escalograma do Niño3 é consistente com o do SOI, bem como com os resultados de Wang e
Wang (1996).
Fig. 4.2: Série temporal, escalograma
da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global
do Niño3, obtido com anomalias de
TSM (a) observadas (Rayner et al.,
2003), (b) de 2L24 e (c) de HOL04.
Período dado em anos.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
62
O espectro de ondeleta global da série de anomalias de TSM na região do Niño3, gerada
pelo modelo em 2L24 (Fig. 4.2b), coloca quase toda a energia na escala de 2-4 anos, e o
escalograma de ondeleta apresenta extremos de amplitude ocorrendo irregularmente, nesta
escala, ao longo de todo o período da série (135 anos). Os períodos mais energéticos são entre
os anos 1-20, 40-90 e 110-130 da série. Fica evidente que o modelo reproduz o ENSO, ainda
que com uma freqüência maior, e a energia atribuída a esta oscilação está bastante
superestimada em relação ao observado. Oscilações na escala interdecadal são praticamente
desprezíveis.
O mesmo ocorre em HOL04 (Fig. 4.2c), porém a magnitude da energia atribuída ao
ENSO nesta simulação é um pouco menor do que em 2L24, significando um fenômeno ENSO
enfraquecido. As amplitudes mais energéticas transitam entre as escalas de 2-5 anos,
continuamente ao longo da série. Oscilações interdecadais têm pouca ou nenhuma
importância no espectro.
No espectro global do índice da PDO observada (Fig. 4.3a) a energia está distribuída em
várias escalas. O pico maior aparece entre 4-7 anos, sendo que no escalograma, as amplitudes
nesta escala são mais importantes entre as décadas de 1930-60 e depois no final do período, a
partir da década de 90. Esta escala de variabilidade refere-se ao ENSO, uma vez que o padrão
espacial da PDO é bastante similar ao desse fenômeno. Outros picos no espectro de energia
também estão presentes nas escalas inter e multidecadais de 16-30 e 40-60. Apesar de tantas
oscilações estarem contidas no índice da PDO, aquela que a caracteriza é a da escala
multidecadal, com ciclo de aproximadamente 50 anos. No escalograma esta oscilação aparece
fora do cone de influência pois a série não é longa o suficiente para captar mais de um ciclo
completo sem que ocorram efeitos de borda. No entanto, a energia atribuída a esta flutuação é
uma das mais importantes do espectro global. São características conhecidas da PDO a fase
fria, ocorrida entre 1947-76, e a inversão para a fase quente, a partir de 1977 (Mantua et al.,
1997), inversão esta que teria causado as mudanças na variabilidade temporal do ENSO a
partir da década de 1970 (Zhang et al., 1997), constatadas no escalograma do Niño3 (Fig.
4.2a). Outras evidências da modulação do ENSO pela PDO, são o evento LN de 1956 –
historicamente um dos mais intensos (Wang e Wang, 1996) – ocorreu durante a fase fria da
PDO, e indícios de transferência de energia desde a escala multidecadal até as mais altas
freqüências, fortalecendo as amplitudes negativas na escala de variabilidade do ENSO.
O espectro de ondeleta global do índice da PDO em 2L24 (Fig. 4.3b) não apresenta uma
escala de variabilidade dominante ao longo do período de 105 anos. Flutuações irregulares
aparecem nas escalas de 3, 5 e 8-9 anos, sendo as duas primeiras possíveis resultantes da não-
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
63
estacionaridade do ENSO. Um sinal menos energético porém mais persistente surge nas
escalas de aproximadamente 15-18 e 35-50 anos, sendo que este último pode ser considerado
correspondente à PDO observada, pois o pico de energia ocorre na mesma escala de
variabilidade e apresenta a mesma magnitude.
O espectro global do índice da PDO na simulação do HM (Fig. 4.3c) aproxima-se mais
do observado do que da simulação do presente; o escalograma, porém, difere bastante de
ambos os anteriores. Um pico em torno da escala de 7 anos, de magnitude equivalente ao pico
da série observada, refere-se a uma oscilação que se manifesta de forma mais ou menos
constante a partir do ano 30 da série, quando surge como resultado da interação de flutuações
nas escalas de 4-5 e 9-10 anos. Com relação à variabilidade interdecadal, o espectro de
ondeleta global desta série indica uma oscilação na escala de aproximadamente 45 anos, que
no escalograma aparece semi-estacionária ao longo do período analisado, devido a uma
tendência de aumento da freqüência. A energia desta oscilação tem magnitude comparável à
da PDO observada.
A série de anomalias de TSM observadas no Atlântico Norte tem como oscilação mais
forte e persistente a multidecadal – a própria AMO, como pode ser verificado no escalograma
Fig. 4.3: Série temporal, escalograma da
parte real dos coeficientes da ondeleta e
espectro de ondeleta global da PDO,
representada pela 1
a
EOF das anomalias de
TSM do Pacífico ao norte de 20°N, obtida
com dados (a) observados (Mantua et al.,
1997), (b) de 2L24 e (c) de HOL04. Período
dado em anos.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
64
da parte real dos coeficientes da ondeleta da Fig. 4.4a – em torno de 60 anos. A oscilação é
evidente na própria série temporal. As épocas em que ocorreram inversões de fase (segundo o
escalograma) são consistentes com as datas mencionadas por Enfield et al. (2001) e
Schlesinger e Ramankutty (1994). Destaque também deve ser atribuído à flutuação que, da
década de 1930 até o final do período, transita entre as escalas de 6 a 10 anos, e para outra na
escala de 3-4 anos, menos regular, embora ambas com menor energia do que a multidecadal.
A oscilação de 3-4 anos pode ser um indício do sinal do ENSO no Atlântico Norte.
No espectro global das anomalias de TSM do Atlântico Norte (Fig. 4.4b), a oscilação
mais forte e persistente aparece na escala de 15 anos, com energia equivalente à do sinal da
AMO observada. O escalograma mostra que este sinal é quase estacionário com uma
perturbação entre os anos 30 e 50 da série composta pelos 100 últimos anos da simulação.
Esta perturbação pode ter sido originada pela transferência de energia de uma banda de
freqüências mais baixas, na escala de 30-35 anos. A variabilidade na escala de 3-4 anos
também aparece na TSM modelada, um pouco mais energética que a observada, porém com a
mesma irregularidade, sugerindo que o ENSO também influencia a TSM no Atlântico no
modelo.
Fig. 4.4: Série temporal, escalograma
da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global
da AMO, representada pelas
anomalias de TSM do Atlântico Norte
(0-70°N) (a) observadas (Kaplan et al.,
1998), (b) em 2L24 e (c) em HOL04.
Período dado em anos.
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
65
Na análise da série que representa o índice da AMO em HOL04 (Fig. 4.4c), não aparece
nenhuma oscilação persistente na escala de variabilidade em questão (que possa ser
caracterizada como multidecadal). O pico mais energético no espectro global é referente à
suposta influência do ENSO no Atlântico, na escala de 3-4 anos, bastante irregular ao longo
do período da série. Na escala de 12 anos, o segundo maior pico do espectro de ondeleta
global indica uma flutuação que começa forte no início da série e diminui a sua amplitude até
o ano 50, aproximadamente, e entre os anos 55-80 mantém-se (com menores amplitudes) na
escala de 8 anos.
4.2. EOFs dos oceanos Atlântico e Pacífico
A análise por EOFs foi realizada com anomalias de TSM nos oceanos Atlântico e
Pacífico entre as latitudes 40°S e 30°N, em cada uma das simulações, para identificar os
principais modos de variabilidade nas regiões tropicais no presente e no HM, e para explorar
o efeito da forçante de insolação.
Fig. 4.5: Variância explicada pelas quatro primeiras EOFs do Atlântico, em 2L24 (à esq.) e HOL04 (à dir.).
Após o cálculo dos autovalores e autovetores da matriz de covariância dos dados do
Atlântico, os quatro primeiros modos foram identificados como sendo os mais importantes,
em ambas as simulações, pois somados eles explicam mais de 60% da variância dos dados. A
independência entre os autovalores é dada pela regra de North (North et al., 1992), quando as
barras de erro amostral dos autovalores plotados em um espectro não se interceptarem
(Fig. 4.5). Nas duas simulações, a diferença entre o terceiro e o quarto autovalor é comparável
à magnitude de seus erros amostrais, o que significa que os erros nas EOFs podem ser do
tamanho das próprias EOFs. Assim, estes modos não estão bem separados um do outro e a
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
66
decomposição entre eles pode não ser estável. No entanto o terceiro modo foi mantido na
análise por conter, nas duas simulações, importantes flutuações na escala decadal.
Fig. 4.6: Padrão espacial da 1
a
EOF do Atlântico (à esq.) em 2L24 (acima) e HOL04 (abaixo), junto com os
respectivos coeficientes de expansão (à dir.: série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global). Período dado em anos.
A primeira EOF do oceano Atlântico (Fig. 4.6) na simulação do presente explica 36%
da variância dos dados. Este modo exibe um padrão de monopolo que se estende por toda a
região tropical, com o seu máximo (0,1) situado na faixa zonal em torno de 5°N; apenas ao
sul de 25°S esta polaridade se inverte, mas a magnitude do pólo de sinal oposto (–0,02) é
muito menor do que a do pólo dominante. A transformada de ondeleta do coeficiente de
expansão deste modo indica que a sua variabilidade temporal é dominada pelo ENSO,
fenômeno que no modelo ocorre na escala entre 2-4 anos e com energia comparável à do pico
no espectro de ondeleta global da série da EOF. Os períodos com maiores amplitudes nesta
escala, indicados pelo escalograma da parte real dos coeficientes da ondeleta, coincidem com
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
67
os períodos indicados pelo escalograma do índice do Niño3 (Fig. 4.2b – considerando aquela
série a partir do ano 35, somente).
Na simulação do HM, o padrão espacial do primeiro modo do Atlântico explica 35,9%
da variância dos dados e não apresenta muitas diferenças do padrão de 2L24, apenas as
amplitudes próximas à costa norte da América do Sul e no centro do Atlântico Sul são
maiores (o máximo na banda em torno de 5°N chega a 1,2). A análise do coeficiente de
expansão mostra que também no HM o primeiro modo era dominado pelo ENSO, porém o
pico de energia no espectro global está na escala de 4 anos. Os períodos com maiores
amplitudes também são coincidentes com aqueles indicados pelos índice do Niño3 (Fig. 4.2c
– a partir do ano 35).
Jorgetti (2004), que também analisou os modos de variabilidade dos oceanos simulados
pelo modelo do IPSL (versão anterior) no presente e em 6 ka AP, encontrou padrões
semelhantes na versão anterior do modelo acoplado oceano-atmosfera do IPSL mas
explicando variâncias bem menores – 18,9% no presente e 16% no HM – para o primeiro
modo do Atlântico. Ela encontrou também maiores diferenças entre os modos do presente e
do HM, sendo que no modo de 6 ka AP o dipolo ao sul de 25°S intensificou-se. A
variabilidade temporal dominante deste modo no presente é decadal, segundo os resultados de
Jorgetti, e no HM dominam períodos mais longos com potência menor.
Cardoso (2001) também encontrou um padrão espacial similar para o primeiro modo do
Atlântico, explicando 33,4% da variância dos dados, porém a sua análise foi concentrada nos
meses de inverno (maio-setembro) e baseada em dados de TSM efetivamente observados.
A segunda EOF do oceano Atlântico (Fig. 4.7) explica 13,5% da variância total dos
dados em 2L24, e seu padrão espacial apresenta um tripolo sobre a região enquadrada, com
um pólo negativo sobre as latitudes do Hemisfério Norte, um positivo com centro em 20°S e
outro negativo centrado em 37°S, sendo este o mais intenso. A variabilidade temporal deste
modo é predominantemente interanual, onde as maiores amplitudes transitam progressiva e
sucessivamente entre as escalas de 2 a 8 anos.
Em HOL04 a segunda EOF do Atlântico, além de explicar uma fração menor da
variância dos dados (11,3%), também tem o padrão espacial um pouco diferente do presente.
O pólo negativo do Hemisfério Norte é mais intenso e aparece dividido em dois máximos, um
centrado em 5°N e o outro em 22°N, enquanto os dois pólos sobre o Atlântico Sul aparecem
um pouco mais fracos do que no presente. A variabilidade temporal, porém, muda bastante
em 6 ka AP. O pico mais energético do espectro de ondeleta global ocorre na escala bienal,
sinal este que se mantém durante quase todo o período. Flutuações nas escalas de 4 e 8 anos
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
68
ganham força durante algumas décadas, mas não persistem. Na escala interdecadal (15 anos),
uma oscilação mantém-se fraca porém quase-estacionária, sendo afetada por transferências
ocasionais de um sinal multidecadal de baixa energia.
Fig. 4.7: Padrão espacial da 2
a
EOF do Atlântico (à esq.) em 2L24 (acima) e HOL04 (abaixo), junto com os
respectivos coeficientes de expansão (à dir.: série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global). Período dado em anos.
Estes resultados são bastante semelhantes aos de Jorgetti (2004) na versão anterior do
modelo do IPSL, que encontrou variância de 13,2% explicada pelo segundo modo do
Atlântico no presente e 11,1% no HM. O padrão espacial nos seus dados também é o de um
tripolo, porém ela não constatou mudanças no padrão do HM para o presente. A variabilidade
por ela encontrada é dominada, no presente, por um período de 15-16 anos, e no HM por
períodos mais longos. A variabilidade interanual tem mais importância neste modo do que no
primeiro.
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
69
Venegas et al. (1997) e Cardoso (2001) também obtiveram, em dados observados, como
segunda EOF um padrão de dipolo no Atlântico Sul, sendo que Cardoso estendeu sua área de
análise até os 15°N e também obteve um terceiro pólo no Hemisfério Norte. Venegas et al.
sugerem um acoplamento da variabilidade oceânica com a atmosférica, em que o
fortalecimento e enfraquecimento da ASAS forçam flutuações na TSM em uma estrutura de
dipolo norte-sul por processos associados ao vento.
Fig. 4.8: Padrão espacial da 3
a
EOF do Atlântico (à esq.) em 2L24 (acima) e HOL04 (abaixo), junto com os
respectivos coeficientes de expansão (à dir.: série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global). Período dado em anos.
A terceira EOF do oceano Atlântico (Fig. 4.8) é responsável, na simulação 2L24, por
7,6% da variância dos dados. O seu padrão espacial tem no Atlântico Norte Subtropical as
maiores amplitudes (0,12), e próximo ao equador, amplitudes com o sinal oposto (–0,06). No
Atlântico Sul há um fraco dipolo nordeste-sudoeste, com amplitudes bem menores do que as
do Atlântico Norte. A variabilidade temporal deste modo tem duas flutuações dominantes,
uma na escala interanual (2-4 anos, possivelmente modulada pelo ENSO do modelo) e outra
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
70
na escala interdecadal (16 anos), que entre os anos 45 e 90 da série apresenta amplitudes
maiores e transfere energia para escalas de mais alta freqüência (e.g. 8 anos).
Na simulação HOL04 este modo representa 8,6% da variância dos dados, e um padrão
espacial modificado com relação ao de 2L24. A estrutura de um dipolo está mais organizada
sobre todo o domínio espacial, com amplitudes ainda importantes no Atlântico Norte e um
pólo de sinal oposto no Atlântico Subtropical Sul, também intensificado. A variabilidade
interdecadal deste modo aumenta sua freqüência para 12 anos e a interanual diminui para 4
anos, mas ainda são importantes os sinais de mais alta freqüência, principalmente na escala
bienal.
Não foram encontrados na literatura padrões consistentes com os resultados aqui
diagnosticados, que possam validar este modo da variabilidade do Atlântico simulado pelo
modelo. Até mesmo Jorgetti (2004), que utilizou a versão anterior deste mesmo modelo,
encontrou padrões (espaciais e temporais) diferentes para a terceira EOF do Atlântico no
presente e no HM. O padrão encontrado por Cardoso (2001) para a terceira EOF tamm
contém um dipolo nordeste-sudoeste no Atlântico Sul, porém ele está deslocado para o norte,
e a polaridade atribuída às flutuações no Atlântico Norte, no mesmo contexto do dipolo no
sul, é oposta à encontrada neste estudo.
Para o oceano Pacífico, os quatro primeiros modos somam quase 70% da variância
explicada em cada simulação, sendo que o primeiro modo explica sozinho praticamente 50%
da variância dos dados. Ao plotar o espectro dos autovalores (Fig. 4.9), também foi constatada
a pequena diferença entre a terceira e a quarta EOF; novamente a terceira foi mantida, nas
duas simulações, por conter uma forte componente decadal na sua variabilidade, o que é de
grande interesse para este estudo.
Fig. 4.9: Variância explicada pelas quatro primeiras EOFs do Pacífico, em 2L24 (à esq.) e HOL04 (à dir.).
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
71
A primeira EOF do oceano Pacífico (Fig. 4.10) explica, na simulação 2L24, 49% da
variância total dos dados. Sua estrutura espacial apresenta amplitudes que crescem a partir do
setor sudeste tropical e atingem o máximo na faixa centro-equatorial, padrão este que se
traduz no ENSO, i.e. o aquecimento (ou resfriamento) anômalo no Pacífico Tropical Leste
que se estende ao Pacífico Central. A variabilidade temporal deste modo apresenta energia
máxima na escala interanual (2-4 anos, mesma escala em que ocorre o ENSO no modelo), e o
escalograma de ondeletas do seu coeficiente de expansão é bastante similar ao escalograma do
índice do Niño3 da mesma simulação (Fig. 4.2b, a partir do ano 35 daquela série). A
variabilidade interdecadal (16-18 anos) deste modo aparece um pouco mais energética do que
no Niño3.
Fig. 4.10: Padrão espacial da 1
a
EOF do Pacífico (à esq.) em 2L24 (acima) e HOL04 (abaixo), junto com os
respectivos coeficientes de expansão (à dir.: série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global). Período dado em anos.
No HM, a primeira EOF do Pacífico explica quase 53% da variância, mas o padrão
espacial é praticamente idêntico ao do presente, não fosse pela inversão de sinal. O espectro
de ondeleta global do coeficiente de expansão apresenta, tal como no índice do Niño3, energia
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
72
menor com relação à simulação 2L24, indicando um ENSO menos intenso. O escalograma
deste modo também é consistente com o escalograma do Niño3 em HOL04 (Fig. 4.2c).
Diversos estudos observacionais encontraram o padrão do ENSO como primeiro modo
do Pacífico (e.g. Weare e Nasstrom, 1982; Kang, 1996, que comparou observações com
padrões modelados; Lau e Weng, 1999; Cardoso, 2001).
Weare e Nasstrom (1982), através de EOFs estendidas, analisaram a evolução temporal
deste modo após 3 e 6 meses. Seus resultados indicam alta persistência do padrão, que estaria
relacionado ao movimento de máxima variabilidade ao longo do equador, desde a costa da
América do Sul. No período analisado por estes autores (1957-76), este modo explica 23,7%
da variância dos dados.
Utilizando médias anuais de TSM, Lau e Weng (1999) realizaram análise de EOFs com
domínio global e também encontraram o padrão do ENSO bem definido sobre o Pacífico.
Neste estudo, tal modo explica 32,7% da variância dos dados. O seu componente principal
indica que uma tendência de aquecimento sobrepõe a variabilidade interanual e interdecadal
presente nos dados, e as anomalias extremas na escala interanual podem ser identificadas
como os eventos quentes e frios mais importantes do Pacífico Tropical. Isto sugere que o
ENSO estaria modulado por uma tendência de aquecimento na TSM global.
Cardoso (2001) considerou somente os meses de inverno na sua análise de EOFs do
Pacífico, e encontrou variância de 34,5% explicada pelo primeiro modo (o ENSO). Além da
variabilidade interanual, seu estudo identificou ainda oscilações de baixa freqüência.
Kang (1996) confronta os padrões de TSM obtidos de médias anuais observacionais
com padrões obtidos por modelagem. Ambos apresentam a fase madura do ENSO como
primeiro modo, porém no seu modelo este modo explica 23,6% da variância total e nas
observações, 39,1%. A variabilidade temporal no modelo caracteriza-se por oscilações
interanuais (4-5 anos) e interdecadais (20 anos), estas de maior amplitude. No modo
observado, a variabilidade temporal concentra-se na escala interanual; oscilações
interdecadais são difíceis de perceber, fato que o autor atribui à pequena extensão dos dados.
A versão anterior do modelo do IPSL (Jorgetti, 2004) não apresentava a configuração
do ENSO tão clara quanto a produzida por esta nova versão (nem no presente, nem no HM), e
a primeira EOF representava apenas 16,8% da variância total (20,5% em 6 ka AP).
A segunda EOF do oceano Pacífico Tropical (Fig. 4.11) em 2L24 contém 9,9% da
variância explicada e um padrão simétrico com amplitudes positivas na região centro-leste do
Pacífico, ao longo do equador, e negativas em ambos os lados norte e sul, na região tropical,
estendendo-se para oeste. Nas regiões subtropicais norte e sul a polaridade novamente se
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
73
inverte, porém com menores amplitudes. A análise de ondeleta do coeficiente temporal
mostra que o sinal do ENSO aparece novamente no segundo modo, acompanhado agora de
um sinal interdecadal (na escala de 15-18 anos) mais energético, principalmente na primeira
metade da série. Na segunda metade da série surge, com energia fraca, um sinal multidecadal.
O mesmo padrão simétrico aparece em HOL04, explicando 8,8% da variância, porém as
amplitudes no Pacífico Equatorial aparecem mais intensas e com o máximo deslocado para
leste. As amplitudes negativas na região tropical (ao norte e ao sul) espalham-se pelo Pacífico
Central na direção leste. A variabilidade temporal concentra-se na escala interanual (do
ENSO, com energia mais fraca), apenas o sinal na escala multidecadal aparece mais forte do
que em 2L24.
Fig. 4.11: Padrão espacial da 2
a
EOF do Pacífico (à esq.) em 2L24 (acima) e HOL04 (abaixo), junto com os
respectivos coeficientes de expansão (à dir.: série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global). Período dado em anos.
A estrutura deste modo na simulação do presente assemelha-se com o padrão da
segunda EOF estendida de Weare e Nasstrom (1982) após 6 meses, quando as amplitudes
positivas avançam ao longo do equador, partindo da costa do Peru em direção ao Pacífico
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
74
Central, ao mesmo tempo em que as amplitudes negativas do Hemisfério Norte retraem-se
para as latitudes mais altas.
Já a segunda EOF obtida por Kang (1996) a partir da TSM observada apresenta padrão
espacial bastante parecido com o encontrado no presente estudo, explicando 14,1% da
variância dos dados. Kang observa que tanto a primeira quanto a segunda EOF descrevem
diferentes fases do ENSO na escala interanual.
Cardoso (2001) aponta também o segundo modo do Pacífico como representante de
uma fase do ENSO, com cerca de 10% da variância das anomalias de TSM do inverno.
Jorgetti (2004) obteve um segundo modo bastante distinto deste e dos demais estudos da
variabilidade do Pacífico, um padrão que em nada assemelha-se à estrutura do ENSO.
A terceira EOF do Pacífico (Fig. 4.12) representa, na simulação do presente, 4,8% da
variância dos dados. Sua estrutura espacial compreende amplitudes negativas em todo o setor
oeste da bacia oceânica; do centro para o leste estendem-se pólos positivos – ao norte e ao sul
– com outro pólo negativo na região equatorial-leste. O espectro de ondeleta global do
coeficiente de expansão indica variabilidade dominante na escala de 1,5 ano, mas um pico na
escala interdecadal (15 anos) tem quase a mesma energia que o primeiro e o sinal é quase-
estacionário, com pequeno aumento nas amplitudes entre os anos 35 e 80 da série.
Na simulação do HM, este modo – com 4,35% da variância explicada – tem os sinais
invertidos e amplitudes maiores nas latitudes acima de 20
o
, nos dois hemisférios. A
variabilidade interdecadal passa a dominar o espectro global, porém a interanual (1,5-5 anos)
ainda mostra influência no modo.
O trabalho de Cardoso (2001) foi o único encontrado na literatura a descrever a terceira
EOF do Pacífico, porém os padrões encontrados aqui não se assemelham aos padrões
descritos por essa autora. O terceiro modo encontrado por Jorgetti (2004) apresenta feições
similares ao modo encontrado aqui, com variância explicada um pouco maior (6,9%), mas
também com variabilidade interanual tão importante quanto a decadal. Na versão anterior do
modelo do IPSL, a variabilidade interdecadal também passou a ser mais importante no HM,
apesar do padrão espacial de 6 ka AP ter se diferenciado mais da versão mais recente do
modelo.
Capítulo 4: Modos de Variabilidade no Presente e em 6 ka AP
75
Fig. 4.12: Padrão espacial da 3
a
EOF do Pacífico (à esq.) em 2L24 (acima) e HOL04 (abaixo), junto com os
respectivos coeficientes de expansão (à dir.: série temporal, escalograma da parte real dos coeficientes da
ondeleta e espectro de ondeleta global). Período dado em anos.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
76
CAPÍTULO 5: VARIABILIDADE DA MONÇÃO NA AMÉRICA DO SUL
NO
PRESENTE E EM 6 KA AP
Este capítulo apresenta os resultados da investigação da variabilidade climática da
monção da América do Sul, induzida por variações da TSM dos oceanos adjacentes.
Calculou-se o índice representativo deste sistema – o LISAM (Silva e Carvalho, 2006;
detalhes no Capítulo 2, página 33) – nas duas simulações do modelo, para avaliar diferenças
na sua estrutura espacial, na energia do seu ciclo anual e na sua variabilidade temporal, entre
o presente e o HM. Por fim, utilizou-se a análise de ondeletas cruzadas para estabelecer uma
relação temporal entre o LISAM e cada um dos modos de variabilidade da TSM dos oceanos
Atlântico e Pacífico, definidos no capítulo anterior.
5.1. Índice de monção na América do Sul (LISAM)
O LISAM, em cada um das simulações, foi obtido calculando-se o coeficiente de
expansão da 1
a
EOF combinada das variáveis PPT, Q850, T850, U850 e V850, no domínio
espacial entre 0-40°S e 60°-20°W.
A Fig. 5.1 mostra os padrões espaciais da monção em 2L24, obtidos correlacionando o
LISAM com as anomalias de cada uma das variáveis envolvidas. Os campos são bastante
parecidos com aqueles encontrados por Silva e Carvalho (2006) a partir de dados
observacionais (Fig. 1.7). Aqui o padrão de precipitação também apresenta correlação
positiva em grande parte da área tropical do continente, evidenciando a presença da ZCAS e
da ZCIT, embora esta, no modelo, esteja deslocada mais ao sul. Outra diferença surge no sul
do Brasil, que no padrão observado não consta como região de correlações significativas, mas
no padrão da simulação é uma região que tem anomalias positivas de PPT relacionadas à
monção da América do Sul.
As correlações positivas mais altas no campo de umidade são também consistentes com
a presença da ZCAS, embora sua configuração espacial seja, no modelo diferente, do
observado (vide Fig. 1.7). Em 2L24 elas formam um centro alongado na direção NW-SE, tal
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
78
como a ZCAS, mas estão posicionadas mais ao sul. O norte do continente parece contribuir
menos para o fortalecimento da monção no modelo do que no observado; o contrário vale
para a região central da Amazônia.
No campo de vento zonal percebe-se o mesmo dipolo nas correlações da variável com o
LISAM, demonstrando que ventos de oeste (leste) sobre o norte e centro do Brasil e de leste
(oeste) sobre o sul do Brasil fortalecem (enfraquecem) o sistema monçônico. Em 2L24 este
dipolo expande-se zonalmente sobre o Atlântico, com correlações maiores (positiva e
negativamente) sobre o oceano do que no observado (Fig. 1.7). No campo de vento
meridional, as correlações negativas sobre o norte e nordeste da América do Sul, tal como no
campo observado, indicam que ventos de norte (sul) estão associados com a organização
(decaimento) do sistema monçônico. As maiores correlações positivas estendem-se mais ao
sul no modelo. Os padrões de vento correlacionados com o LISAM, em 2L24, estão
consistentes com a dinâmica do transporte de umidade das latitudes tropicais/equatoriais para
o interior do continente, essencial para sustentar o sistema monçônico.
As correlações positivas do LISAM com a temperatura do ar, no modelo, avançam bem
mais em direção ao interior do continente do que no observado (Fig. 1.7), indicando que o
sistema se fortalece com anomalias positivas de temperatura em quase todo o domínio
(incluindo o oceano), exceto no extremo NW.
Fig. 5.1: Campos de correlação entre o LISAM e as anomalias sazonais de (a) PPT, (b) Q850, (c) T850, (d) U850
e (e) V850 em 2L24. Sombreamento indica correlações estatisticamente significantes no nível de 5%, com
número de eventos independentes igual ao número de ciclos sazonais (100).
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP
79
Os campos de correlações do LISAM com cada uma das variáveis na simulação do HM
(Fig. 5.2) são praticamente idênticos aos respectivos da simulação de controle, indicando que
a estrutura espacial do sistema monçônico na América do Sul não sofre alterações
significativas por conta da diferença na forçante de insolação em 6 ka AP.
Fig. 5.2: Campos de correlação entre o LISAM e as anomalias sazonais de (a) PPT, (b) Q850, (c) T850, (d) U850
e (e) V850 em HOL04. Sombreamento indica correlações estatisticamente significantes no nível de 5%, com
número de eventos independentes igual ao número de ciclos sazonais (100).
Investigou-se, então, se de fato houve mudanças na sua intensidade, já que a principal
hipótese acerca da forçante de insolação no HM é a atenuação do seu ciclo sazonal no
Hemisfério Sul e, conseqüentemente, o enfraquecimento da monção da América do Sul.
Fig. 5.3: O LISAM em 2L24 (à esq.) e em HOL04 (à dir.). A série temé39(n)-4.Am03 Tc0.09(n5( )-6(Hín.09(n7(r7.52585.5630.0003 Tc1.0611 Tw[(aquecce a)7)]Tergiaeu ciclo sazon-19.1803 cc0.37 TD-0.003 Tc1.0003 Tw[(a um)8o dla)1.9,ã)-0.m)80a91.98(r)44.8esca(a91.98g e asra7( )-.9(m)1)-5dosHc0r
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
80
variabilidade. O escalograma dos coeficientes da ondeleta mostra que este ciclo apresenta,
esporadicamente, pequenas variações de amplitude, mas o espectro de ondeleta global não
indica em que escala de tempo estas variações ocorrem – o único pico visível no espectro é na
escala de 12 meses. Não são perceptíveis variações na energia do ciclo anual de 2L24 para
HOL04. Isto sugere que a suposta atenuação do ciclo sazonal da insolação no HM,
exclusivamente, não seja suficiente para enfraquecer o sistema monçônico da América do Sul.
Para analisar a variabilidade temporal do LISAM foi extraído o ciclo anual de cada uma
das séries, na tentativa de evidenciar escalas de variabilidade com menor energia. A Fig. 5.4
mostra as TOs das séries de anomalias do LISAM, em 2L24 e em HOL04. Ainda são
dominantes as oscilações de alta freqüência, em escalas menores que dois anos. Pelo espectro
de ondeleta global das duas simulações, a energia vai decaindo quanto maior a escala, até
períodos de 20 anos, aproximadamente. Em 2L24 há um sinal fraco porém persistente na
escala de 14-15 anos entre os anos 10 e 70 da série, cujas fases negativas sempre transferem
energia para freqüências mais altas. Nos últimos 20 anos da série uma flutuação na escala de
4-8 anos ganha energia. Em HOL04 observa-se um sinal na escala de 3-4 anos que ganha
energia na década de 50, e a partir do ano 65 transfere-se para a escala de 6 anos, decaindo no
início da década de 90.
Fig. 5.4: As séries de anomalias do LISAM em 2L24 (à esq.) e em HOL04 (à dir.). A variabilidade do índice é
dada pelo escalograma de fase das anomalias e pelo espectro de ondeleta global. Período dado em anos.
5.2. Influência dos oceanos na monção da América do Sul
A última etapa deste estudo consistiu na investigação da variabilidade conjunta da
monção da América do Sul e da TSM dos oceanos Atlântico e Pacífico. Foram empregados na
análise o LISAM e as duas primeiras EOFs de cada oceano, de cada simulação. As 3
as
EOFs
dos dois oceanos foram descartadas pela inconsistência constatada entre os padrões de TSM
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP
81
da simulação do presente e da TSM observada, ou pela falta de referências aos mesmos na
literatura consultada. Utilizou-se a técnica do cruzamento e coerência de ondeletas; a análise
foi feita cruzando a série de anomalias do LISAM com o coeficiente de expansão de cada uma
das EOFs, individualmente.
Fig. 5.5: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 1
a
EOF do Atlântico Tropical (vermelho) em
2L24; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as ondeletas
das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no cruzamento das
ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo; um a cada 4
vetores é plotado na escala.
Iniciando a análise pela simulação 2L24, a Fig. 5.5 apresenta o cruzamento de ondeletas
do LISAM com a 1
a
EOF do oceano Atlântico. Os picos de energia no escalograma (b)
ocorrem na escala entre 2-4 anos e em intervalos de tempo que coincidem com as amplitudes
máximas da ondeleta simples deste modo do Atlântico (Fig. 4.6), que por sua vez é modulado
pelo ENSO (Figs 4.1 e 4.2). Máximos de energia aparecem no escalograma cruzado também
na escala decadal (8-20 anos), particularmente no primeiro terço da série. No restante da série
esta energia fica confinada na escala de 16-20 anos, mas a persistência da energia na escala
decadal faz com que seja o segundo maior pico no espectro de coerência média (Fig. 5.5c),
com 0,5. O maior pico, que atinge a coerência máxima (1,0), corresponde a escalas maiores
de 35 anos e persiste ao longo de todo o período analisado, porém fora do cone de influência.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
82
O escalograma de coerência e diferença de fase (d) aponta alta coerência (> 0,8) nas escalas
semi-anual, anual e bienal, intermitentemente ao longo da período. No entanto o escalograma
de energia (b) não mostra alta energia nestas escalas e a coerência média (c) também é
extremamente baixa, sugerindo que os picos de alta coerência sejam resultado de ruído. O
primeiro terço das séries também apresenta coerência alta nas escalas entre 5-10 anos e 16
anos, com diferença de fase também próxima de 180°. Na escala entre 2-4 anos, o
escalograma aponta coerência média-alta (> 0,7) com as duas séries novamente fora de fase.
A Fig. 5.6 mostra a TO cruzada para o LISAM e a 2
a
EOF do Atlântico em 2L24. O
espectro de coerência média (c) aponta um pico (0,5) na escala de 8 anos, uma das mais
energéticas na análise de ondeleta simples deste modo do Atlântico (Fig. 4.7). No
escalograma cruzado (Fig. 5.6b) a energia nesta escala é máxima entre os anos 15-30 e 70-100
da série. Na escala de 4-7 anos ocorrem intervalos de energia máxima entre os anos 5-30 e 60-
65 da série. A escala multidecadal (> 30 anos) também é bastante energética até o ano 60,
porém está fora do cone de influência.
Fig. 5.6: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 2
a
EOF do Atlântico Tropical (vermelho) em
2L24; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as ondeletas
das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no cruzamento das
ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo; um a cada 4
vetores é plotado na escala.
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP
83
O escalograma de coerência e diferença de fase (Fig. 5.6d) aponta alta coerência (> 0,8)
entre as duas séries em escalas menores que a anual, novamente sem que apareça alta energia
no escalograma de (b). Na escala decadal (8-16 anos) a coerência também é alta nos primeiros
e nos últimos 20 anos da série, com diferença de fase de 180° no primeiro período e de 100°,
aproximadamente, no segundo. Alta coerência aparece persistente na escala de 32 anos, até a
década de 70, com diferença de fase de –140°. Esta região, porém, está praticamente fora do
cone de influência.
Fig. 5.7: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 1
a
EOF do Pacífico Tropical (vermelho) em
2L24; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as ondeletas
das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no cruzamento das
oQq4o tetas de (a). Vetores são ptotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo; um a cada 4
vetores é plotado na escala.
A estrutura espacial e temporal da 1
a
EOF do Pacífico em 2L24 corresponde ao próprio
ENSO (Fig. 4.10) e, tal como esperado, é o seu sinal que aparece no escalograma cruzado das
odeletas do LISAM e desta EOF (Fig. 5.7b), na escala entre 2-6 anos, como um dos mais
energéticos. Na escala decadal (8-20 anos) também aparecem máximos de energia entre os
anos 10 e 80 da série. Por conta desta persistência, nesta escala a coerência média ultrapassa
0,75 (c), ficando abaixo apenas do pico da escala multidecadal (> 40 anos) – esta bastante
energética e persistente, porém fora do cone de influência. No escalograma da coerência e
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
84
diferença de fase (d), alta coerência (> 0,8) só ocorre em intervalos esparsos na escala semi-
anual e anual, nos primeiros e nos últimos 30 anos da série (que podem ser desconsiderados).
Entre os anos 30 e 70, ocorrem picos quase isolados de coerência média-alta (> 0,7) na escala
de 1-4 anos, e um sinal persistente de coerência média na escala de aproximadamente 18 anos.
A diferença de fase é sempre 180°.
A 2
a
EOF do Pacífico, em 2L24, é também modulada pelo ENSO (Fig. 4.11), logo é
esperado que o seu sinal também apareça no escalograma cruzado desta série com a série do
LISAM (Fig. 5.8b). A energia desta oscilação, no entanto, não é tão forte nem persistente ao
longo da série, perdendo em importância para o sinal decadal (8-20 anos) que abrange os
primeiros 80 anos. Este sinal, que também é importante na variabilidade temporal da 2
a
EOF
isoladamente, atinge 0,7 de coerência média na TO cruzada com o LISAM (c).
Fig. 5.8: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 2
a
EOF do Pacífico Tropical (vermelho) em
2L24; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as ondeletas
das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no cruzamento das
ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo; um a cada 4
vetores é plotado na escala.
O escalograma de coerência e diferença de fase (Fig. 5.8d) mostra, porém, alta
coerência (> 0,8) somente nos primeiros 20 anos da série na escala de 8-12 anos. A última
década da série também apresenta alta coerência nesta escala, porém está fora do cone de
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP
85
influência. Em ambos os casos a diferença de fase é de aproximadamente 150°. Coerência
média (0,6-0,8) na escala de 2-7 anos ocorre entre os anos 30 e 70, com diferença de fase em
torno de 180°.
Analisando a variabilidade conjunta das séries do LISAM e da 1
a
EOF do Atlântico
obtidas com dados da simulação HOL04 (Fig 5.9), importantes diferenças foram
identificadas. Maior energia (b) é atribuída aos picos na escala do ENSO (aqui em torno de 4
anos), respondendo à maior energia que esta flutuação representa na série da EOF (Fig. 4.6).
A coerência média (Fig 5.9c) nesta escala também é maior do que em 2L24. Na escala
decadal e interdecadal a energia, além de maior, é mais persistente. Na primeira metade do
período de 100 anos, alta energia aparece confinada nas escalas de 8-14 anos e 20-30 anos, e
do ano 50 até o ano 90, transfere-se para a escala de 16-20 anos.
Fig. 5.9: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 1
a
EOF do Atlântico Tropical (vermelho) em
HOL04; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as
ondeletas das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no
cruzamento das ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo;
um a cada 4 vetores é plotado na escala.
O escalograma de coerência (Fig 5.9d) mostra coerência bastante alta (> 0,85) na escala
do ENSO entre os anos 15 e 65 da série, e um pouco menor (0,7-0,8) entre os anos 75 e 90,
sempre com diferença de 180° na fase (tendendo para 150° entre os anos 30 e 65 na escala de
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
86
3 anos). Na escala interdecadal (16-30 anos), coerência acima de 0,85 é praticamente
constante ao longo do período, com diferença de fase em torno de 160°.
No escalograma cruzado das ondeletas do LISAM e da 2
a
EOF do Atlântico no HM
(Fig. 5.10b) a energia avança, com o tempo, nas escalas entre 2 e 8 anos. Entre os anos 55 e
95 da série a energia nesta progressão é máxima e constante. Outras escalas também são
importantes, como a de 8-16 anos nos intervalos 5-25 e 60-90 da série; e a de 18-25 anos entre
os anos 40 e 60. Pelo escalograma de coerência e diferença de fase (d) a coerência entre o
LISAM e a 2
a
EOF do Atlântico em HOL04 é alta (> 0,8) somente na primeira década, na
escala anual-bienal, e entre os anos 30-50, na escala de 2-5 anos. A diferença de fase nestes
períodos é de 100-120°.
Fig. 5.10: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 2
a
EOF do Atlântico Tropical (vermelho) em
HOL04; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as
ondeletas das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no
cruzamento das ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo;
um a cada 4 vetores é plotado na escala.
Em HOL04 (Fig. 5.11) o sinal decadal no escalograma cruzado (b) das ondeletas do
LISAM e da 1
a
EOF do Pacífico perde energia, evidenciando o domínio do ENSO. Restam
ainda, porém, picos de energia menores na escala de 12 e de 30 anos, entre os anos 10 e 40 da
série, e 16 anos, entre os anos 70 e 90 da série. Nesta escala a coerência média (c) chega a 0,7,
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP
87
devido à persistência do sinal. Na escala do ENSO a coerência média é de 0,5, por causa da
não-estacionaridade desta flutuação, no entanto ainda é bem maior do que na simulação do
presente. No escalograma de coerência e diferença de fase, o intervalo entre os anos 30 e 70 é
o de maior coerência na escala entre 1,5 e 5 anos, com máximos chegando a 0,9. Nos últimos
25 anos da série, alta coerência (> 0,85) marca a escala de 8 anos. Em todos estes intervalos a
diferença de fase é de 180°.
Fig. 5.11: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 1
a
EOF do Pacífico Tropical (vermelho) em
HOL04; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as
ondeletas das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no
cruzamento das ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo;
um a cada 4 vetores é plotado na escala.
A 2
a
EOF do Pacífico, na simulação do HM, apresenta sinal basicamente interanual,
com diversas flutuações que atuam simultaneamente na escala entre 2-6 anos, e um pulso
mais fraco em torno da escala decadal (8-10 anos) (Fig. 4.11). São nestas escalas que ocorrem
os picos de energia no escalograma cruzado das ondeletas do LISAM e da 2
a
EOF
(Fig. 5.12b), que também coincidem nos intervalos. Já pelo escalograma de coerência e
diferença de fase (d), a maior e mais persistente coerência entre as séries está mesmo na
escala decadal (8-30 anos). Até o ano 50, a coerência é alta (> 0,85) em duas escalas: 8-16
anos, com diferença de fase de 180°, e 16-30 anos, com diferença de fase de –100°. Do ano 60
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
88
ao final da série, a maior coerência está na escala de 8-20 anos, com diferença de fase de
150°. Em escalas menores que 4 anos tamm ocorrem intervalos de coerência alta, porém
são esparsos e quase nada persistentes.
Fig. 5.12: (a) séries temporais das anomalias do LISAM (azul) e da 2
a
EOF do Pacífico Tropical (vermelho) em
HOL04; (b) energia do escalograma cruzado das ondeletas das séries de (a); (c) coerência média entre as
ondeletas das séries de (a); e (d) escalograma da coerência (contornos) e diferença de fase (vetores) no
cruzamento das ondeletas de (a). Vetores são plotados para coerência maior do que 0,4 e a cada 2 anos no tempo;
um a cada 4 vetores é plotado na escala.
Comparando as análises de cada simulação, algumas diferenças gerais podem ser
percebidas. Em 2L24, a variabilidade da monção apresenta coerência média-alta na escala de
variabilidade do ENSO, porém esta coerência não é persistente na escala (é episódica, i.e. é
alta apenas durante a ocorrência dos eventos mais intensos). Na escala decadal a coerência
também é alta, principalmente no início da série. Em HOL04, o LISAM apresenta coerência
maior e mais persistente com a variabilidade dos oceanos na escala do ENSO, principalmente
com relação ao sinal do Atlântico. A escala decadal também ganha maior importância: a
monção é coerente com a variabilidade do Atlântico na escala entre 16-30 anos ao longo de
todo o período analisado, e com o Pacífico na escala de 8-30 anos.
A principal causa da maior coerência e persistência do LISAM com a variabilidade dos
oceanos na escala do ENSO, constatada no HM, pode ser atribuída à variabilidade temporal
Capítulo 5: Variabilidade da Monção na América do Sul no Presente e em 6 ka AP
89
do próprio fenômeno ENSO neste período. Apesar do ENSO aparecer enfraquecido na
simulação do HM, o seu sinal é mais regular, i.e. mais próximo da estacionaridade (vide Figs.
4.2 e 4.10). Na simulação do presente os eventos do ENSO aparentemente são mais intensos,
porém irregulares, por isto a alta coerência com a monção da América do Sul é episódica. Já
no HM, com um sinal mais constante, a coerência apresenta maior persistência, o que leva a
maiores valores na coerência média.
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
90
CAPÍTULO 6: CONCLUSÕES
A etapa inicial deste estudo consistiu em uma análise de consistência dos campos
médios sazonais de PPT, ROL, Q2M, T2M, PNM, vento em 200 e 850 hPa e TSM simulados
pelo modelo para o clima do presente (campos globais). O modelo, embora reproduza as
principais feições climatológicas esperadas, apresenta algumas diferenças relevantes com
relação ao clima observado.
A análise do clima médio na simulação do HM foi focada na América do Sul. O clima
mais seco neste período, indicado por proxies bem como por outros estudos de modelagem
paleoclimática (e.g. Valdes, 2000; Harrison et al., 2003) foi verificado também em HOL04,
principalmente através dos campos de diferenças de umidade. O resfriamento sobre o
continente no verão do Hemisfério Sul, demonstrado por Valdes (2000), foi constatado nesta
simulação, porém com maior magnitude.
As diferenças nos campos sazonais de PPT e vento em baixos níveis, associadas a
análises localizadas do ciclo anual da PPT, indicam mudanças no sistema monçônico da
América do Sul, causadas, principalmente pela diminuição do contraste térmico do continente
(com temperaturas menores) em relação ao oceano. Por conta do resfriamento ocorre o
aumento da PNM sobre o continente nos meses de verão, enfraquecendo o gradiente de
pressão, e por conseqüência os ventos alísios. O resultado é o menor transporte de umidade
para o continente, menos atividade convectiva no interior e menor taxa de PPT.
Durante a primavera do Hemisfério Sul, em particular – época em que normalmente
inicia a monção de verão na América do Sul tropical – a temperatura do ar próximo à
superfície (T2M) apresenta-se maior em 6 ka AP. Paralelamente, os campos de Q2M e vento
em 850 hPa indicam um quadro favorável à convergência e acúmulo de umidade, o que
poderia gerar uma antecipação da estação chuvosa no HM. No entanto a análise do ciclo anual
da PPT, realizada localmente sobre a região de maior aquecimento e concentração de
umidade, indica apenas um pequeno aumento relativo da PPT no mês de outubro,
acompanhado de uma inversão nesta tendência nos meses subseqüentes (i.e. diminuição da
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
92
PPT no HM com relação ao presente). Isto mostra que influência da redução da insolação no
verão domina o comportamento médio da monção da América do Sul.
Mudanças no comportamento sazonal da ZCIT constatadas aqui coincidem com as
indicações de proxies de uma posição média anual deslocada para o norte durante o HM. A
intensificação da PPT sobre o NE brasileiro em DJF (com menor PPT mais ao sul) e o
enfraquecimento da ZCIT sobre o Atlântico em JJA e SON faz sentido quando se assume a
hipótese de que a sua migração para o sul é atenuada. A causa disto seria a amplificação do
ciclo anual no Hemisfério Norte em 6 ka AP.
Através da Transformada de Ondeleta avaliou-se a variabilidade temporal dos seguintes
índices de variabilidade climática: SOI, Niño3, PDO e AMO. Na simulação do presente
obteve-se resultados razoáveis, em que o modelo apresentou diferenças não-desprezíveis com
relação aos modos de variabilidade observados no sistema oceano-atmosfera. O índices
melhor simulados são os relativos ao fenômeno ENSO (SOI e Niño3).
A componente atmosférica do ENSO (SOI) tem a sua energia subestimada no modelo
na escala entre 2-4 anos. Já oscilações interdecadais têm maior energia que no índice
observado. Por outro lado, a componente oceânica do ENSO (TSM Niño3) apresenta, no
modelo, energia superestimada e confinada na escala de 2-4 anos, freqüência um pouco mais
alta do que aquela que TSM observada aponta para o fenômeno. O sinal interdecadal contido
neste índice, na simulação do presente, é praticamente desprezível.
A PDO, cujo padrão de distribuição da TSM assemelha-se ao padrão do El Niño,
aparece na simulação do presente acompanhada de ruídos que mascaram a importância da sua
variabilidade interdecadal. A oscilação de baixa freqüência predominante do Atlântico surge
não como multidecadal (cerca de 60 anos) tal como observado, e sim na escala de 15 anos.
Na simulação do HM todos os índices analisados apresentam diferenças com relação
aos respectivos da simulação do presente; alguns conservam as características esperadas,
outros não. O SOI de HOL04 é similar ao de 2L24 porém apresenta menor energia na escala
do ENSO. O mesmo acontece no índice Niño3, que ainda amplia discretamente a banda de
freqüência do ENSO. A coerência entre as mudanças nestes dois índices é um indicativo da
hipótese de que o ENSO teria sido mais fraco durante o HM (Kim et al., 2002).
O índice da PDO no HM assemelha-se mais ao índice observado do que ao da
simulação do presente. A oscilação esperada na escala entre 30-60 anos está presente, porém
outras flutuações persistentes e mais energéticas, que não são identificáveis nem nos dados
observados nem em 2L24, também estão. Na análise do índice da AMO no HM, não aparece
nenhuma oscilação persistente que possa ser caracterizada como multidecadal.
Capítulo 6: Conclusões
93
O índice que representa a monção da América do Sul (Silva e Carvalho, 2006),
calculado para as duas simulações, apresenta no presente e no HM configuração espacial
bastante semelhante à observada. O escalograma de energia da série temporal deste índice não
aponta diferenças entre a potência do ciclo anual nestes dois períodos, sugerindo que a
atenuação do ciclo sazonal da insolação no HM não teria sido suficiente para enfraquecer o
sistema monçônico da América do Sul. O ciclo anual foi então extraído para avaliar
flutuações com freqüências menores que 1 ano. O escalograma da série de anomalias do
índice mostra que nas duas simulações o índice é modulado por oscilações que variam entre
as escalas de 1 e 20 anos, com a energia do espectro global decrescendo quanto maior a
escala.
A última etapa do trabalho compreendeu a análise de ondeletas cruzadas entre o índice
de monção da América do Sul e os dois primeiros modos de variabilidade de cada um dos
oceanos, no presente e no HM. Comparando as análises de cada simulação, algumas
diferenças gerais podem ser percebidas. No presente, a coerência entre o índice da monção e a
variabilidade da TSM dos oceanos é média-alta na escala de variabilidade do ENSO, porém
esta coerência não é persistente na escala (é alta apenas durante a ocorrência dos eventos). Na
simulação do HM, o índice da monção apresenta coerência maior e mais persistente com a
variabilidade dos oceanos na escala do ENSO, principalmente do Atlântico. A escala decadal
também ganha maior importância neste período.
A principal causa da maior coerência e persistência da monção com a variabilidade dos
oceanos na escala do ENSO, constatada no HM, pode ser atribuída à variabilidade temporal
do próprio fenômeno ENSO neste período. Apesar do ENSO aparecer enfraquecido na
simulação do HM, o seu sinal era mais regular. Na simulação do presente os eventos do
ENSO aparentemente eram mais intensos, porém irregulares, por isto a alta coerência com a
monção da América do Sul é episódica. Já no HM, com um sinal mais constante, a coerência
apresenta maior persistência.
Sugestões para trabalhos futuros
A análise da variabilidade acoplada entre a monção da América do Sul e a TSM dos
oceanos precisa ser aprofundada, para melhor determinar os níveis de coerência constatados
neste estudo. O ENSO mostrou ser uma influência importante, portanto a mesma análise por
transformada de ondeletas cruzadas poderia ser aplicada utilizando o índice do Niño3. Da
mesma forma, seria interessante setorizar a análise em áreas menores dos oceanos, e.g. em
Análise da variabilidade climática de um modelo do clima da América do Sul no presente e em 6 ka AP
94
Atlântico Sul, Equatorial e Norte, possibilitando assim identificar qual setor exerce maior
influência sobre o sistema monçônico do continente.
Outra abordagem possível é regionalizar também a análise sobre áreas continentais.
Poderiam ser avaliados os níveis de coerência entre a precipitação de regiões distintas da
América do Sul – e.g. o NE brasileiro, a Amazônia, o norte da Argentina/Paraguai e o SE do
Brasil – e os diversos setores oceânicos. Sugere-se realizar investigação análoga com o vento
em baixos níveis. Isto resultaria num quadro muito mais detalhado do sistema monçônico,
evidenciando também a variabilidade espacial.
As forçantes remotas que afetam o sistema monçônico da América do Sul também
poderiam ser avaliadas através de Funções de Influência. Situando pontos-alvo sobre as
regiões onde se espera atividade convectiva sobre o continente, obtêm-se, com esta análise, as
regiões de origem dos padrões de teleconexão (i.e. as forçantes remotas) que interferem nesta
atividade. Esta análise complementaria a investigação acerca da influência de setores
específicos dos oceanos sobre regiões distintas de atuação da monção.
As mudanças do ENSO entre o HM e o presente neste modelo também necessitam ser
melhor investigadas. Os resultados deste estudo sugerem que, em 6 ka AP, os eventos teriam
sido mais fracos porém mais regulares; ainda assim, aparentemente exerciam maior influência
sobre o regime de precipitação monçônica na América do Sul. Análises de correlação entre o
índice mensal Niño3 e as variáveis atmosféricas (PPT, vento e PNM) na América do Sul,
utilizando o método SVD (Singular Value Decomposition), isoladamente para os eventos
mais intensos, possibilitaria determinar os padrões em que se estabelece a coerência com a
monção.
É também evidente que uma análise multi-modelo deve ser realizada para que os
resultados possam ter maior significância estatística. Modelos distintos levam, em geral, a
climas distintos, pelo menos no que se refere aos padrões de variabilidade. Estes modelos
diferem menos entre si no clima médio do que nos modos de variabilidade.
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