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ALEXANDRE DE SANTANA LIMA
A Atuação do BNDES no Desenvolvimento Econômico Brasileiro:
1952 - 2002
Mestrado em Economia
PUC/SP
São Paulo
2007
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ALEXANDRE DE SANTANA LIMA
A Atuação do BNDES no Desenvolvimento Econômico Brasileiro:
1952 - 2002
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
MESTRE em Economia Política, houver),
sob a orientação do (a) Prof.(a), Doutor (a)
- Prof. Dr. César Roberto Leite da Silva
PUC/SP
São Paulo
2007
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ALEXANDRE DE SANTANA LIMA
A Atuação do BNDES no Desenvolvimento Econômico Brasileiro:
1952 - 2002
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
MESTRE em Economia Política, houver),
sob a orientação do (a) Prof.(a), Doutor (a)
- Prof. Dr. César Roberto Leite da Silva
Data de Aprovação:
____ / _____ / _____
Banca Examinadora
_________________________________
_________________________________
_________________________________
AOS MEUS PAIS RAIMUNDO E INALDA,
À MINHA ESPOSA ANA PAULA,
AO MEU FILHO GUILHERME,
E AO MEU IRMÃO FÁBIO
DEDICO E OFEREÇO.
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. César Roberto Leite da Silva, pela orientação e paciência no
desenvolvimento do trabalho.
À minha esposa, Ana Paula de Campos Lima, que me apoiou durante todo o
processo de pesquisa e redação do trabalho, e cuidou do nosso filho Guilherme,
durante meus intermináveis momentos de estudo.
A todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para que eu
pudesse realizar esta pesquisa e finalizar este trabalho.
RESUMO
Em 1952, o BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico – foi
criado com os objetivos de suprir a necessidade de financiamento de longo prazo e
guiar a industrialização e o desenvolvimento econômico brasileiro. A criação do
BNDE foi fruto da necessidade de um processo de industrialização acelerada, como
forma de combater o subdesenvolvimento e a dependência externa, derivado da
característica primário-exportadora da economia brasileira. Ao longo de mais de
cinqüenta anos, o Banco vivenciou distintas formas de condução de política
econômica e de desenvolvimento pelos governos brasileiros. Durante seus primeiros
30 anos, esteve diretamente ligado à criação da infra-estrutura e das indústrias de
base, por meio do apoio ao investimento público e ao capital privado nacional. Na
última década do século XX, com a mudança no papel do Estado, de agente para
gerente do desenvolvimento, o Banco tem novas atribuições, como figura principal
no processo de privatização e no desenvolvimento econômico mediante a iniciativa
privada, nacional ou estrangeira, tendo o Estado como tutor. Este trabalho busca
estudar a sua evolução ao longos dos seus primeiros cinqüenta anos de existências,
com ênfase nos no período entre 1990 e 2002.
Palavras-Chave: BNDES, Privatização, Capital Estrangeiro, Desenvolvimento
Econômico, liberalismo
Classificação JEL: O43 – Instituições e Crescimento
ABSTRACT
In 1952, The BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico was created,
with the objectives of providing long term financing and guiding the industrialization
and economic development in Brazil. The creation of BNDES is a consequence of an
accelerated industrialization process; need to reduce under development and the
external dependency, all of which have derived from the primary-exporter
characteristic of the Brazilian economy. For over fifty years, the Bank has gone
through many different economic and development policies that have been
conducted by the Brazilian Government. During its first thirty years, BNDE was tightly
tied to infrastructure foundation and heavy industries, supported by public and
domestic private capital investments. During the last decade of the 20th century, with
the changes in the State’s role, from agent to enabler of development, the Bank has
new attributions, as the main figure in the privatization process and economic
development through private companies, domestic or international, having the State
as the main tutor. This paper’s objective is to study BNDE’s evolution throughout its
first fifty years of existence, focusing on the period between 1990 and 2002.
Key Words: BNDES, Privatization, Foreign Capital, Economic Development,
Liberalism.
JEL Classification: O43 - Institutions and Growth
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento.
BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CADE - Comissão Administrativa de Defesa Econômica
CDI - Certificado de depósito Interbancário (CDI)
CDI - Conselho de Desenvolvimento Industrial
CEPAL - Comissão Econômica para América Latina
CFCE - Conselho Federal de Comércio Exterior
CMBEU - Comissão Mista Brasil - Estados Unidos
CME - Coordenação de Mobilização Econômica
CMN - Conselho Monetário Nacional
CNP - Conselho Nacional do Petróleo
CNPIC - Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial
CPE - Comissão do Planejamento Econômico
CSN - Companhia Siderúrgica Nacional
CTA - Centro Tecnológico Aeroespacial
CTEF - Conselho Técnico de Economia e Finanças
CVRD – Companhia Vale do Rio Doce
DASP - Departamento Administrativo do Serviço Público
ELETROBRÁS - Centrais Elétricas Brasileiras SA
EMBRAMEC - Mecânica Brasileira SA
FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador
FGTS – Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço
FIBASE - Insumos Básicos SA - Financiamentos e Participações
FINAME - Fundo de Financiamento Para Aquisição de Máquinas e Equipamentos
Industriais
FINEM - Financiamento a Empreendimentos
FINSOCIAL - Fundo de Investimento Social
FIPEME - Programa de Financiamento às Pequenas e Médias Empresas
FMI – Fundo Monetário Internacional
FMRI - Fundo de Modernização e Reorganização Industrial
FUNAR - Fundo Agroindustrial de Reconversão
FUNDEPRO - Fundo de Desenvolvimento da Produtividade
FUNTEC - Fundo de Desenvolvimento Técnico e Científico
IBRASA - Investimentos Brasileiros SA,
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados
PAEG - Plano de Ação Econômica do Governo
PAI - Programa de Ação Imediata
PAI - Programa de Ação Imediata
PASEP - Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
PED - Plano Estratégico de Desenvolvimento
PIB – Produto Interno Bruto
PIS - Programa de Integração Social
PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
PND - Plano Nacional de Desestatização
POC - Programa de Operações Conjuntas
PROEX - Programa de Apoio ao Incremento das Exportações
RFFSA - Rede Ferroviária Federal SA
SEST - Secretaria Especial de Controle de Estatais
SIDERBRÁS - Siderurgia Brasileira SA
STI - Secretaria de Tecnologia Industrial
TELEBRÁS - Telecomunicações Brasileiras S.A.
TJLP - Taxa de Juros de Longo Prazo
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico 1 Receita de Privatização por Ano (1991 a 2002).................................109
Gráfico 2 Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) x Certificado de depósito
Interbancário (CDI) – Taxas ao ano...................................................117
Gráfico 3 Participação do BNDES-Exim no total de desembolsos do Sistema
BNDES...............................................................................................119
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Taxas de câmbio – Câmbio Livre do dólar no mercado do Rio de Janeiro -
(Taxa de Venda - Cr$ por US$) ...........................................................13
Tabela 2 Disponibilidades Cambiais (Em US$ Milhoes) - 1945/52 ........................14
Tabela 3 Sistema BNDES - Aprovações segundo os Ramos e Gêneros de
Atividade. (Em CR$ bilhões de 1991) ..................................................49
Tabela 4 Inflação anual – IGP-DI (1950 – 1954)....................................................51
Tabela 5 Inflação anual – IGP-DI (1960 – 1964)....................................................58
Tabela 6 Crescimento PIB (%a.a.) - (1960 – 1964)................................................60
Tabela 7 Aplicações do Sistema BNDES (1962-1965) ..........................................61
Tabela 8 Variação Real Anual do PIB, Importação e Exportação de Bens e
Serviços como percentual do PIB (1947 a 2001).................................69
Tabela 9 Participação das operações aprovadas pelo sistema BNDES por setor
(Em %).................................................................................................70
Tabela 10 Inflação anual – IGP-DI (1969 – 1979).................................................78
Tabela 11 Inflação anual – IGP-DI (1979 – 1984).................................................83
Tabela 12 Distribuição das aplicações do sistema BNDES conforme modalidade e
setor beneficiado (1981 a 1984)...........................................................84
Tabela 13 Distribuição das aplicações do sistema BNDES conforme modalidade e
setor beneficiado (1985 a 1989)...........................................................90
Tabela 14 Inflação (IGP-DI) e Variação anual do PIB (1980-1989) ......................97
Tabela 15 Inflação (IGP-DI) e Variação anual do PIB (1990-1995) ....................101
Tabela 16 Aplicações do Sistema BNDES (1962-1965) .....................................103
Tabela 17 Inflação anual – IGP-DI (1995 – 2002)...............................................105
Tabela 18 Receita de Privatização por Setor entre 1990 e 2002........................110
Tabela 19 Desembolso Anual do Sistema BNDES – por modalidade e produto.
(R$ Milhões Corrente)........................................................................115
Tabela 20 Desembolso Anual do Sistema BNDES – por segmento. (R$ Milhões
Corrente)............................................................................................116
SUMÁRIO
1. Introdução...........................................................................................................1
2. O Nacional-Desenvolvimentismo Brasileiro....................................................5
2.1. Os Governo Vargas (1930 a 1945) e Dutra (1945 a 1950)...........................7
2.2. O Pensamento Econômico Brasileiro (1940 a 1950). .................................17
2.2.1. Pensamento Neoliberal........................................................................23
2.2.2. Pensamento Desenvolvimentista.........................................................28
2.2.3. A CEPAL e a CMBEU..........................................................................38
3. O BNDES...........................................................................................................44
3.1. O Segundo Governo Vargas (1951 a 1954)................................................45
3.2. O PLANO DE METAS (1956 a 2.2.3.
2
termos de troca, entre as economias periféricas e centrais e a dependência
econômica dos produtos industriais, leva à adoção do processo de industrialização
pela substituição de importação, como a única forma de diminuir a distância
econômica entre os países centrais e os periféricos.
No ano de 1950, durante o segundo governo Vargas, em um momento
fortemente marcado pela Guerra Fria, os governos americano e brasileiro selam um
acordo que cria a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (CMBEU), caracterizando a
mudança de rumo na política econômica Norte-americana, com um interesse pelo
desenvolvimento acelerado da América Latina, sob a presidência do democrata
Henry Trumam.
Em 1952 o BNDE é criado, fruto de uma das recomendações do relatório final
da CMBEU, devido à necessidade de um banco oficial de investimentos e de
fomento, instrumental para o planejamento de longo prazo e voltado para a
viabilização de projeto específicos. A necessidade de um banco que pudesse ofertar
recursos de longo prazo para o investimento em infra-estrutura, indústrias de base e
produção de matérias-primas era primordial para uma economia cujo mercado de
capitais era inexistente, e as possibilidades de se conseguir recursos de longo prazo
eram mínimas.
Ele é criado como agente de um momento histórico extremamente importante
para o desenvolvimento industrial e econômico. O Brasil busca deixar de ser uma
economia primário-exportadora e abastecida de produtos industrializados das
economias centrais, para um novo estágio industrial e econômico, por meio da
doutrina cepalina de substituição de importações e da intervenção do Estado como
formulador de política econômica e principal investidor na formação das estruturas
de base para o desenvolvimento econômico do país. O papel do BNDES é crucial
para a execução desse projeto de desenvolvimento nacional, como o agente
financiador e definidor de políticas para o desenvolvimento durante o período que
precede o governo militar em 1964, e para a execução do Plano de Metas proposto
por Juscelino Kubitschek.
3
O modelo de substituição de importações e a participação do Estado como
agente do desenvolvimento econômico sofrem com a volta do liberalismo econômico
nas economias centrais, com a ineficiência das políticas econômicas heterodoxas
diante de problemas de inflação e estagnação econômica, e com a pressão para a
adoção de práticas liberais, pelas economias periféricas, pelos órgãos de ajuda
econômica mundial, como o FMI e Banco Mundial. A pressão para redução do
Estado nas atividades, cedendo lugar à iniciativa privada, principalmente
estrangeira, nos seguimentos industriais e de infra-estrutura no Brasil dá o
andamento da economia brasileira durante os anos 1990. O BNDES não perde a
sua característica no processo de desenvolvimento, mas a sua forma de atuação é
distinta, tornando-se o principal gestor do processo de privatização de empresas
estatais.
O objetivo deste trabalho é estudar a forma de atuação do BNDES ao longo
dos cinqüenta anos, desde a sua criação até o final do segundo mandato do
Presidente Fernando Henrique Cardoso. O período posterior aos anos 1990 será
mais detalhadamente analisado, fruto da mudança de direção do Estado no
processo de desenvolvimento econômico, deixando de ser agente do
desenvolvimento e passando a ser gestor do mesmo. Este é momento em que o
Estado brasileiro começa a transferir para a iniciativa privada a responsabilidade
direta pela industrialização e pela infra-estrutura, cabendo ao Estado a função de
gestão e regulação do processo de desenvolvimento.
Este trabalho está dividido em três partes. A primeira parte do trabalho se
preocupa em avaliar, do ponto de vista histórico, os governos que antecedem a
criação do BNDES dentre o período de 1930 a 1950, verificando as raízes do
nacional-desenvolvimentismo durante o primeiro governo Vargas (1930 a 1945) e a
experiência liberal do início do governo Dutra (1945-1950). Nesta mesma parte,
apresentam-se as linhas de pensamento econômico que marcaram o período e as
características da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos e da CEPAL.
Uma vez discorrido a respeito do que antecedeu a criação do BNDES e
arcabouço econômico e político para a sua criação, procurar-se-á situar os principais
momentos políticos e econômicos e como o BNDES foi se adequando a cada
4
mudança de realidade econômica - além da transição histórica entre ditadura militar
e democracia e a crise dos anos 80.
No último capítulo, será feita uma breve avaliação da evolução do Estado e
sua forma de agir, no mundo e no Brasil durante, principalmente, o século XX, e
como o Estado brasileiro passou de um Estado Agente para um Estado Gerente do
desenvolvimento econômico. Dentro deste último capítulo, analisar-se-ão as
contribuições do BNDES para este novo momento econômico entre 1990 e 2002,
que ocorreu durante o período dos Governos Fernando Collor e Itamar Franco, e nos
dois Governos Fernando Henrique Cardoso, com uma visão do processo de
desestatização de empresas públicas e serviços e da participação do BNDES, assim
como do seu posicionamento frente aos novos rumos de política econômica,
principalmente no que tange ao financiamento da iniciativa privada, da exportação e
ao apoio a pequenas e médias empresas.
5
2. O Nacional-Desenvolvimentismo Brasileiro.
O desenvolvimentismo é a linha de pensamento econômico definida por
Bielschowsky (2000) como sendo o projeto econômico que busca superação da
pobreza e do subdesenvolvimento brasileiro mediante a industrialização integral, o
planejamento do desenvolvimento como função do Estado, devido à ineficiência de
alocação de fatores do mercado e da participação direta do Estado no processo de
expansão, captação e alocação de recursos financeiros, assim como a promoção do
desenvolvimento, como investidor direto nos setores em que a iniciativa privada for
insuficiente.
Ainda segundo Bielschowsky (2000), quatro elementos ideológicos surgem
durante o período de 1930 e 1940 que são fundamentais para o modelo chamado
desenvolvimentista. Primeiro, existe a criação de uma consciência de que é
necessário produzir internamente os insumos e bens de capital para a produção de
bens de consumo; segundo, cria-se a consciência com relação ao problema da
acumulação capitalista e a necessidade de se instituir a centralização de recursos
financeiros que serão propulsores da industrialização; terceiro, juntamente à
formação da idéia do Estado como guardião dos interesses coletivos da nação, o
fato dele prover o sustentáculo para a iniciativa privada e o planejar o
desenvolvimento é visto com bons olhos pelas elites empresariais e técnicas; e
quarto, o nacionalismo econômico ganha um novo impulso por meio do sentimento
anti-imperialista e do desejo da participação do Estado como investidor na infra-
estrutura e nas indústrias de base.
O nacionalismo econômico surge da discussão sobre a forma de intervenção
do Estado na economia. O desenvolvimentismo pressupõe a sua ação como
planejador e definidor das bases do desenvolvimento econômico. O Estado pode ser
agente indireto do desenvolvimento, facilitando o crescimento da indústria nacional,
por meio do protecionismo e da oferta de garantias para que o capital privado exerça
a função de agente da industrialização, assim como o Estado pode ser agente direto
do desenvolvimento, como principal investidor, mediante a criação de empresas
6
estatais com o propósito de acelerar a industrialização. O Estado agente direto do
desenvolvimento caracteriza o nacionalismo econômico.
O Nacional-desenvolvimentismo foi o modelo econômico adotado como forma
de desenvolvimento econômico a partir da década de 1950. Entretanto, as suas
bases e o florescimento de suas idéias, como única forma de superar o
subdesenvolvimento, ocorreram durante as duas décadas que precederam este
momento. O período de 1930 a 1950 compreendeu dois governos, primeiro o
Governo Vargas (1930 a 1945) e posteriormente o Governo Dutra (1945 a 1950).
Ambos alternaram a condução de política econômica ao longo dos seus governos,
saindo de ações inicialmente ortodoxas em direção a uma atuação heterodoxa. A
discussão de ambos os períodos e a análise sobre as linhas de pensamento
econômico existentes no Brasil no período consecutivo ao pós-guerra é o que segue
no próximo capítulo.
7
2.1. Os Governo Vargas (1930 a 1945) e Dutra (1945 a 1950)
Em 1930, ocorre a revolução que leva Getúlio Vargas ao poder, e com ele o
início das alterações das estruturas de governo e a maior participação do Estado
como agente atuante no desenvolvimento econômico. Segundo Bielschowsky
(2000), a interpretação sobre a Revolução de 1930 é de que esta teria rompido a
hegemonia política das oligarquias regionais e aberto espaço para novos agentes
nas elites dirigentes. A Revolução de 1930 não parece ter tido caráter industrialista,
principalmente na fase anterior ao Estado Novo, visto que a política econômica do
primeiro período Vargas tinha um cunho ortodoxo, apesar do viés heterodoxo nas
políticas monetárias, financeiras e cambial.
O processo industrial brasileiro era marginal, quando comparado com a
atenção e o volume de recursos movimentados pela exploração do setor agrícola,
voltado para o abastecimento dos mercados internacionais, principalmente pela
economia cafeeira
1
. A indústria existente tinha como foco a produção de bens de
consumo para uma pequena parte do mercado doméstico, e principalmente para os
segmentos de baixo poder aquisitivo. A principal fonte de abastecimento de produtos
industrializados era o mercado externo, por meio da importação, sendo esta a única
forma de suprir a demanda por produtos industrializados da crescente urbanização
brasileira. A crise e a queda no preço do café, principal gerador de divisas
internacionais, e a necessidade de importação de bens de consumo, dentro de um
ambiente de livre fluxo de capitais, geraram um desequilíbrio nos fluxos de moeda
estrangeira, levando a uma redução e quase eliminação das reservas cambiais do
país, durante o início do Governo Vargas.
No período compreendido entre 1928 e 1931, a moeda (Cruzeiro) se
desvalorizou 68%; no período compreendido entre 1930 e 1938, cerca de 90%,
(Malan et al., 1977). No intervalo entre 1929 e 1931, o preço internacional do café
caiu de 22,5 centavos de dólar por libra peso para 8 centavos, uma queda de
1
A dinâmica da acumulação capitalista cafeeira teve a sua ruptura iniciada, segundo Tavares
(1986), entre 1933/37, ao final da crise de 1930. A acumulação industrial-urbana e a renda fiscal
do governo iniciam a sua desvinculação da economia cafeeira, sendo que, na década de 1950, o
Estado passa a efetivamente controla o desenvolvimento.
8
aproximadamente 64%.(FURTADO, 2003)
2
. Em 1931, foi abandonado o livre fluxo
de capitais, mediante a retomada do monopólio cambial pelo Banco do Brasil, e a
direta intervenção do governo sobre o fluxo de capitais.
A moeda desvalorizada cria um novo cenário para o capital. O mercado
interno se torna extremamente atrativo em comparação com o mercado exportador,
ainda que o setor industrial fosse restrito, e a importação de bens de produção fosse
dificultada pelo custo da importação. A indústria existente, principalmente a indústria
têxtil, toma um grande impulso. Os bens de consumo produzidos no Brasil crescem
com a função de abastecimento interno, por meio do aproveitamento da capacidade
já previamente instalada e do sistema de produção intensivo em mão-de-obra,
fartamente disponível como conseqüência da urbanização das cidades, proveniente
da liberação de uma grande quantidade de mão-de-obra da agricultura cafeeira.
Durante o período de governo anterior à 2ª Guerra Mundial, as políticas
governamentais impulsionaram o desenvolvimento da indústria privada, inclusive a
exportação de bens manufaturados de consumo, não por meio de um processo
concentrado no desenvolvimento, mas de uma mudança na forma da utilização do
capital existente, do setor primário exportador, para o setor industrial mediante o uso
da capacidade já instalada. Em 1937, Getúlio Vargas implanta um regime ditatorial,
conhecido como o Estado Novo, com a centralização do poder e a maior
interferência do Estado na área de desenvolvimento econômico. A Constituição de
1937 é outorgada e o governo demonstra um claro sinal intervencionista e
nacionalista, que irá talhar o desenvolvimento econômico ao longo dos próximos
anos.
O envolvimento do Estado na condução da economia se mostrou forte com a
criação de algumas entidades governamentais de suma importância para o
crescimento econômico. Seis órgãos de planejamento foram criados com o intuito de
definir o desenvolvimento do país. Estes órgãos foram: o Departamento
2
Apesar da queda brutal do preço internacional do café, o preço ao consumidor norte-americano
caiu apenas 32% no mesmo período de tempo, ou seja, metade do preço de transação
internacional, mostrando que a maior parte da perda foi repassada ao produtor brasileiro, e que a
os intermediários conseguiram compor parte de seus preços mediante estes repasses
(FURTADO, 2003).
9
Administrativo do Serviço Público (DASP – 1938), o Conselho Federal de Comércio
Exterior (CFCE – 1934), o Conselho Técnico de Economia e Finanças (CTEF –
1937), a Coordenação de Mobilização Econômica (CME – 1942) e o Conselho
Nacional de Política Industrial e Comercial (CNPIC – 1944). Essas instituições
surgem como uma rápida reação a alguns eventos que marcaram o momento
histórico. A crise do setor externo e o início da guerra foram fatores externos que se
mostraram extremamente danosos para a situação econômica doméstica. A falência
do Estado oligárquico, com a sua substituição pelo Estado centralizador, permitiu
uma rápida criação de estruturas e instituições governamentais.
O DASP foi um órgão que teve um grande poder durante o período do Estado
Novo, com a função de racionalizar a estrutura administrativa do serviço público.
Criou mecanismos de contratação do funcionalismo público por mérito, através de
concursos, buscando a profissionalização e a melhoria da qualidade do serviço
público. Foi também o órgão responsável pelo desenvolvimento de planos de obras
e equipamentos, assim como do orçamento federal.
O CFCE tinha a função de planejar a política de comércio exterior brasileira e,
posteriormente, de estudar e propor medidas para o fomento de todos os setores da
economia nacional. Dentre diversas decisões surgidas no âmbito da CFCE, algumas
importantes empresas foram criadas, como a Companhia Siderúrgica Nacional
(CSN) em 1941, a Companhia Nacional de Álcalis e a Usina Siderúrgica de Volta
Redonda em 1943, assim como o Conselho Nacional do Petróleo (CNP).
A CME organizou a política econômica durante o período da guerra, em
substituição à Comissão de Defesa da Economia Nacional. Dentre as suas diversas
atribuições, estavam; a) orientação das atividades econômicas, como o foco na
produção de matérias-primas e produtos tidos como necessários e urgentes; b)
controle das importações e exportações vias carteiras de importação e exportação
do Banco do Brasil; c) coordenação dos transportes internos e externos; e d)
planejamento e fiscalização do uso de fontes energéticas, como combustíveis. Ary
Torres foi diretor do CME, que teve ativa participação no processo de criação da
CSN, e tornar-se-ia uma pessoa de personalidade desenvolvimentista marcante;
viria a ser futuramente o primeiro presidente do BNDES. (BIELSCHOWSKY, 2000).
10
O Conselho Técnico de Economia e Finanças tinha como objetivo a
realização de estudos e proposição de medidas relativas às finanças nacionais,
incluindo questões relativas à dívida pública e questões cambiais. No decorrer do
seu desenvolvimento, especializou-se no disciplinamento do endividamento externo
e na orientação de orçamento e sistemas tributários do estados e municípios.
O CNPIC, Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial, foi o órgão
que por meio de um relatório elaborado por Roberto Simonsen, apresentou a
proposta “mais claramente articulada em favor de uma industrialização pesada com
o suporte estatal” (BIELSCHOWSKY, 2000, p. 256). O CNIPC tinha como objetivo a
criação de um projeto para de um estudo para o desenvolvimento durante a etapa
posterior ao final da guerra.
Outras entidades e empresas de suma importância para o desenvolvimento
econômico brasileiro, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
em 1938, a Fábrica Nacional de Motores em 1940 e a Superintendência de Moeda e
Crédito em 1945, também foram criadas nesta fase do Governo Vargas. (IANNI,
1971).
O Estado teria as funções de liderança e promoção da integração vertical do
setor manufatureiro, por meio de medidas de incentivo e proteção. O Estado deveria
ser o principal agente de intermediação financeira, garantindo o aporte de capital
financeiro na forma de empréstimos (SOLA,1998) para o projeto de
desenvolvimento. Havia necessidade do aumento da renda nacional, da ampliação
do mercado interno e da eliminação da pobreza para que se pudesse atingir o
desenvolvimento econômico almejado (SOLA,1998).
No ano de 1943, chegou ao Brasil uma missão econômica Norte-americana,
chefiada por Morris Cooke, conhecida como Missão Cooke, fruto de uma solicitação
de Vargas ao presidente norte-americano Roosevelt. Para o Governo norte-
americano, a missão teria como objetivo direcionar o Brasil para a criação de uma
política de substituição de importações, com o claro intuito de aumentar a
contribuição brasileira para o esforço de guerra e reduzir a utilização do transporte
11
marítimo (MALAN ET AL., 1977), de forma a diminuir as pressões sobre os preços
dos fretes dos escassos navios de transporte internacionais, em um claro contraste
com a visão tradicional Norte-americana e o desejo de continuidade da dependência
econômica dos países periféricos.
A Missão Cooke foi a primeira missão que teve a preocupação de estudar
analítica e sistematicamente a estrutura econômica brasileira. Os principais objetivos
eram o aumento da produção local de bens produzidos nos Estados Unidos, a busca
do desenvolvimento de indústrias e processos de obtenção de matérias-primas
substitutas às importadas para a indústria nacional, melhoria das estruturas de
transporte interno e a criação das fundações para o desenvolvimento industrial de
longo prazo no Brasil. O objetivo da missão era dar o direcionamento do
desenvolvimento e a redução da dependência norte-americana, uma vez que neste
momento ainda se acreditava que a guerra não terminaria em um curto espaço de
tempo. A missão não teve nenhuma preocupação com políticas para o setor
agrícola, ou ainda, com o aporte de recursos financeiros americanos neste processo
de desenvolvimento.
O final do primeiro Governo Vargas foi caracterizado por uma série de
contradições políticas e econômicas entre o cenário nacional e internacional. A
ditadura Vargas foi constantemente confrontada com a característica democrática de
todos os países aliados, ao lado dos quais o Brasil havia lutado durante a guerra.
Vargas buscava seu apoio nas massas de trabalhadores, convidando-os para
participar diretamente do desenvolvimento nacional, contrapondo-se às forças e
interesses políticos oligárquicos (IANNI, 1971).
Os choques entre o liberalismo econômico e a política protecionista também
marcaram o final do Governo Vargas. No processo de redemocratização, ao final do
Estado Novo, estavam em jogo os interesses de grupos conservadores brasileiros e
interesses econômicos estrangeiros. Ao lado destes, se organizaram as forças
políticas brasileiras avessas ao nacionalismo econômico, à intervenção estatal e à
participação popular no processo político (IANNI, 1971). Em 29 de outubro de 1945,
ocorre o golpe de estado que depõe Getúlio Vargas.
12
O fim do Governo Vargas e o início do Governo Dutra é um momento de
discussão da condução de política econômica. A crítica à forte intervenção do
Estado na condução e no planejamento econômico é um dos pontos que afetavam
interesses econômicos e sociais distintos. Grupos que haviam sido retirados do
poder e da capacidade de ordenar a economia para o seu interesse pressionavam
por uma alteração no modelo de condução da economia. Segundo Vianna (1990), o
Governo Dutra, que se estende do período do pós-guerra de 1946 ao início de 1951,
pode ser estudado em três momentos distintos que são delimitados: primeiro, pela
mudança do regime cambial e das políticas de comércio exterior; segundo, pela
mudança de política econômica tipicamente ortodoxa e contracionista para uma mais
flexíveis nas metas fiscais e monetárias; e terceiro. pela saída do Ministro da
Fazenda, Correa e Castro em meados de 1949.
A primeira fase do Governo Dutra foi marcada pela ortodoxia econômica e
pela liberdade dos fluxos de capital, sem a restrição ou controle a importações,
assim como pela manutenção da taxa cambial aos mesmos níveis anteriores à
guerra (Tabela 1). Em Dezembro de 1945, o Governo Dutra instituiu a portaria
interministerial que suspendia a licença prévia para a maioria das importações. Este
livre fluxo de capitais, aliado ao valor da moeda estrangeira, levou a uma redução
drástica nas reservas cambiais brasileiras no período de 1946 a 1947, sem que a
contrapartida para a saída de moeda fosse o ingresso de tecnologia ou
equipamentos para o desenvolvimento da indústria nacional, ou o aumento da
produtividade e tecnologia nas áreas agrícolas, mas sim a importação de artigos
supérfluos e viagens de turismo no exterior.(IANNI, 1971).
A partir de 1947, ainda que o saldo de balança comercial fosse positivo,
devido aos superávits comerciais com áreas de moedas inconversíveis
3
, o déficit
com os Estados Unidos e áreas de moeda conversível era crescente, e as reservas
de moedas conversíveis já se tornavam mínimas (Tabela 2). (MALAN ET AL., 1977)
3
Segundo Bielschowsky (2000), neste momento, em que o maior devedor do Brasil era a Inglaterra,
esta torna a libra esterlina uma moeda inconversível.
13
Tabela 1 Taxas de câmbio – Câmbio Livre do dólar no mercado do Rio de
Janeiro - (Taxa de Venda - Cr$ por US$)
Ano Média Anual Dezembro
1938 17,6 17,7
1939 19,2 19,9
1940 19,8 19,7
1941 19,7 19,6
1942 19,6 19,6
1943 19,6 19,6
1944 19,5 19,5
1945 19,5 19,4
1946 19,4 18,7
1947 18,7 18,7
Fonte: Malan et al., 1977 p. 20.
Diante do cenário de instabilidade da balança comercial, o Governo Dutra
adota uma política de controles cambiais e importações ao final de Julho de 1947,
como uma medida emergencial contra a crise cambial, por meio da reativação do
regime de licenças-prévias para as compras de divisas, baseado em uma série de
listas de preferências de importações, incluindo-se importação de máquinas,
combustíveis e matérias-primas, no intuito de controlar e equilibrar as reservas
cambiais
4
. (VIANNA, 1990). O processo de crescimento e diversificação da estrutura
produtiva se mantinha contínuo com o crescimento das atividades urbano-industriais
e, segundo Bielschowsky (2000), o ano de 1947 foi o primeiro ano em que o valor da
produção industrial foi superior ao da produção agrícola.
Em 1948, o governo Dutra participa da elaboração da carta da Organização
dos Estados Americanos, que tinha como intuito intensificar a solidariedade e a
cooperação entre as Américas, com o claro propósito de combater o comunismo.
Nesse mesmo ano, os governos Norte-americanos e Brasileiro instalam uma missão
conjunta, com o intuito de avaliar as condições para a industrialização no Brasil,
chamada Missão Abbink. No cenário internacional, o momento é marcado pelo início
4
Em 1945, fora criada a Superintendência da Moeda e do Crédito, ainda no Governo Vargas. Com
a queda de Vargas e o início do Governo Dutra, é adotado o liberalismo econômico e a liberdade
cambial, com o fim do mercado oficial de Câmbio. Entretanto, em 1947, a Sumoc cria um controle
de importações mais rígido e um sistema de taxa de câmbio fixa. Com isto, a importação de
equipamentos e matérias-primas foram facilitadas, e ao mesmo tempo a importação de bens de
consumo dificultadas, fazendo assim com que a industrialização do mercado de bens de consumo
fosse voltada para produtores nacionais, que se beneficiavam de uma câmbio baixo para a
importação de equipamentos, enquanto a concorrência com produtos importados era quase nula.
14
“oficial” da Guerra Fria, por meio da criação da Doutrina Truman, nos Estados-
Unidos
5
.
Tabela 2 Disponibilidades Cambiais (Em US$ Milhoes) - 1945/52
Anos
Moeda
Conversível
Moedas
Compen-
sadas
Moedas
Bloqueadas
Operações
em
cruzeiros
Total em
moeda
Ouro no
Pais e no
Exterior
Total
1945 ... ... ... --- 269 365 634
1946 92 --- 365 365 730
1947 33 105 216 --- 354 379 733
1948 62 109 154 21 346 342 688
1949 121 43 128 45 337 342 679
1950 128 36 70 16 250 342 592
1951 -30 6 11 15 2 342 344
1952 -24 -111 0 90 -45 342 297
273
Fontes: Malan at al, 1977 – pág. 165
A Missão Abbink possui uma linha de pensamento distinta da missão anterior
(Cooke). O desenvolvimento industrial nacional compartilha o mesmo espaço da
doutrina liberal Norte-americana, que tem como objetivo garantir o livre-comércio,
estabilidade econômica do Brasil, por meio da redução de déficits públicos e a
segurança para o investimento norte-americano privado. Há o reconhecimento de
que a industrialização é um fator preponderante para o desenvolvimento
econômico, e que, conjuntamente a isto, deveria ocorrer um crescimento equilibrado
entre a indústria e a agricultura – assim como se pregava que se deveria reduzir as
dificuldades de importação por meio de uma política de incentivo às exportações e
de substituição de importações. A Missão apoiava uma participação ativa do Estado
no planejamento e na ordenação do investimento em setores básicos, e até mesmo
a participação direta do Estado em atividades produtivas, de forma a apoiar a
iniciativa privada, alinhando-se com o pensamento desenvolvimentista.
(BIELSCHOWSKY, 2000).
5
O criação da Missão Abbink foi uma resposta às reivindicações brasileiras à escassez brasileira e
latino-americana de dólares, devido à acumulação de moedas não conversíveis, fruto de
superávits comerciais com a Europa dos anos de guerra e pós-guerra. Muitos entendiam que o
problema da acumulação de moedas não conversíveis deveria ser compensado pelos Estados
Unidos devido aos anos de apoio às posições norte-americanas. Aliado a isto, a insatisfação com
relação à política externa econômica, voltada à reconstrução da Europa por meio do plano
Marshal e à falta de interesse nas economias da América Latina. (BIELSCHOWSKY, 2000)
15
O relatório de conclusão da Missão Abbink procurava explicar os fatores que
dificultavam ou promoviam o desenvolvimento industrial e econômico brasileiro.
Dentre as principais observações do relatório, as causas mais importantes dos
desequilíbrios estruturais estavam no processo de industrialização acelerada, devido
à rápida absorção de mão-de-obra, matérias-primas e energia, combinado à
urbanização intensiva, sem um aumento na produção agrícola. O mais importante
obstáculo para o crescimento estava na dificuldade em conter a inflação, sendo que
uma das principais razões para a inflação estava no gasto público excessivo. A
Missão recomendava como ações para o desenvolvimento o ajuste econômico, o
controle à expansão do crédito, controles monetários e fiscais, com o fim do
direcionamento do crédito, o aumento da produtividade interna, condições favoráveis
para o capital estrangeiro, o desenvolvimento e estruturação do mercado de capitais,
a eliminação de atrasados comerciais e alteração na legislação sobre remessas de
lucros e transferências de capital. (MALAN ET AL., 1977).
O relatório da comissão sofreu uma série de críticas por parte de vários
técnicos da área econômica, inclusive de Octavio Gouveia de Bulhões, que foi o
chefe da delegação Brasileira. Um dos primeiros pontos foi a crítica à definição de
que a inflação seria de demanda, gerada por uma situação de pleno emprego,
enquanto era do entendimento que a inflação era gerada pela escassez de matérias-
primas, combustíveis e equipamentos importados, assim como a sua constante alta
de preços. Outra crítica estava na não aceitação do entendimento proposto pela
Missão de que o mercado e a iniciativa privada seriam os responsáveis pelo ajuste
estrutural demandado pelo Brasil, havendo, sim, o entendimento de que a
intervenção estatal era obrigatória para este ajuste. Outro ponto de suma
importância estava no fato da exigência de uma política monetária rígida para o
controle da inflação – segundo a missão, a inflação e o desenvolvimento eram
incompatíveis, visão não aceita por muitos técnicos econômicos que acreditavam
que a rigidez monetária afetaria e inibiria o desenvolvimento econômico. (SOLA,
1998)
Em meados de 1949, o Ministro da Fazenda, Correia e Castro, é afastado do
ministério, dando início a uma fase menos ortodoxa e mais flexível nas metas fiscais
e monetárias. Trata-se do início da terceira e última fase do governo Dutra, e mostra
16
o declínio da receita liberal para o desenvolvimento brasileiro e a retomada do
modelo heterodoxo e nacionalista.
Durante este período, o Governo criou o plano SALTE
6
, que surgiu como uma
resposta a críticas ao fato de não se haver perseguido projetos de desenvolvimento
econômico. O plano SALTE era pouco mais que “[...] a simples reunião de projetos
preexistentes em energia, transportes e saúde, somada a uma série de gastos
previstos para a área de alimentação.” (BIELSCHOWSKY, 2000 p. 319). O plano
acabou por não ser posto em prática efetivamente, devido a fatores políticos ainda
comprometidos com a política liberal e anti-intervencionista, mas principalmente por
falta de fontes de financiamento para suprir fundos para os programas propostos, um
problema constante do desenvolvimento industrial brasileiro.
6
O nome SALTE é formado pela inicias dos quatro setores que o governo deveria priorizar para o
desenvolvimento e industrialização do Brasil – Saúde, Alimentação, Transportes e Energia.
17
2.2. O Pensamento Econômico Brasileiro (1940 a 1950).
Dentro do processo de desenvolvimento econômico, a discussão sobre a
eficiência no uso e na melhor alocação possível de fatores se faz crucial para
avaliação de como o Estado pode ou deve intervir no planejamento, ou condução da
economia. A eficiência econômica do uso de fatores pode ser definida quando não
se pode reorganizar a alocação de bens e recursos de outra forma sem que a
condição de um piore, fruto da melhora de condição de outro (HALL ET AL., 2003).
Do ponto de vista alocativo, uma economia em concorrência perfeita deveria
ser eficiente do ponto de vista econômico, levando à melhor alocação de recursos.
Entretanto, a concorrência perfeita não é caso geral, sendo praticamente uma
exceção à regra, visto que os mercados são regularmente caracterizados por uma
concorrência imperfeita, seja por parte do vendedor, por meio de monopólios ou
oligopólios, ou por parte do comprador, por meio de monopsônios ou oligopsônios.
Do ponto de vista de alocação de recursos financeiros, estes buscam investimentos
cujo capital seja remunerado a maiores taxas de retorno.
O Estado surge como elemento potencial capaz de corrigir e melhor alocar os
recursos, como forma de minimizar os efeitos das imperfeições ou falhas de
mercado, agindo como regulador e planejador ou diretamente como executor, de
forma que exista uma oferta adequada de bens e serviços à sociedade (RIANI,
2002). Com isto, torna-se responsabilidade do Estado zelar pela garantia do
interesse coletivo, definir e criar condições para que se corrijam as ineficiências
existentes, garantindo que sejam providos à sociedade os bens individuais e
coletivos, que não sejam adequadamente providos pelo mecanismo autônomo de
mercado.
Segundo Serra (1982), o desenvolvimento do capitalismo no Brasil tem como
fator marcante o significativo papel do Estado, no processo de impulso à
industrialização. O Estado não exerceu apenas suas funções fiscais e monetárias e
de controle do mercado e trabalho, ou ainda a sua função de provedor de bens
públicos, mas sobretudo pela definição, articulação e sustentação financeira dos
18
grandes blocos de investimento que determinaram as principais modificações
estruturais da economia no pós-guerra, e pela criação da infra-estrutura e produção
direta de insumos intermediários indispensáveis à industrialização pesada.
Com relação à disponibilidade de recursos financeiros para o investimento, a
deficiência da existência de fundos emprestáveis de longo prazo no caso brasileiro
merece uma atenção especial. Segundo a visão Keynesiana, para que exista uma
expansão do investimento, é necessário que os agentes privados tenham confiança
de que os lucros serão realizados no futuro, ou seja, de que exista o interesse e ao
mesmo tempo que existam mecanismos e instrumentos adequados (BAER, 1993). O
investimento a longo prazo depende do estado de expectativa de longo prazo. Ou
seja, não depende apenas do prognóstico do investidor ou do poupador do longo
prazo, mas também de quanto este prognóstico é confiável, da capacidade de ele se
realizar. Durante o desenvolvimento econômico e industrial brasileiro, o processo
inflacionário sempre esteve presente. Em um ambiente de instabilidade econômica,
a visão do longo prazo se torna míope e a incerteza sobre o futuro ainda mais
complexa, fazendo assim o interesse do setor privado em dispor de recursos
monetários em empreendimentos de longo prazo ser mínimo.
Dentro desta mesma linha de raciocínio, a obtenção de recursos financeiros
pode ser caracterizado de duas formas, o finance e o funding (BAER, 1993),
dependendo da sua finalidade e do prazo que o mesmo será emprestado. O finance
é o crédito, normalmente bancário, de curto prazo, no qual o investidor o utiliza para
realizar as suas necessidades financeiras de curto prazo, basicamente
caracterizadas pelo capital de giro necessário para a manutenção da sua produção,
diante de um investimento produtivo já existente. Já funding, que é como deveria ser
a forma de financiamento que se aplicaria para o desenvolvimento industrial,
caracteriza-se por ser um recurso de longo prazo, a ser investido na criação de uma
estrutura produtiva. Qualquer recurso investido na construção de uma estrutura
produtiva industrial não terá o seu retorno imediato, assim como o risco associado
será maior, devido justamente ao tempo que este recurso deverá permanecer
investido na produção.
19
Este funding poderá se dar de duas formas possíveis, mediante o de
financiamento por dívida ou patrimônio. Nos casos de mercados financeiros
desenvolvidos, que possuam um mercado de capital maduro e uma estrutura de
bolsa da valores que permita a negociação de títulos e ações em mercado
secundário, o financiamento patrimonial é o mais utilizado. Entretanto, no caso de
economias menos desenvolvidas, cujo mercado de capitais seja incipiente, o
financiamento de longo prazo através de dívida, de contratos ou títulos de dívida e
com pagamento de juros sobre o principal emprestado em uma data fixa se torna a
única solução possível para a deficiência do financiamento
7
.
Sob todos os ângulos, seja no financiamento de curto ou de longo prazo, ou
ainda no financiamento por dívida ou patrimônio, deve-se observar, do ponto de
vista do detentor dos recursos, a preferência pela liquidez. Como já mencionado
anteriormente, caso o horizonte não seja claro, maior o desejo por manter o capital o
mais líquido possível, seja por meio da manutenção dos recursos em moeda e títulos
de liquidez segura, ou por meio de mercado de capitais que permita a livre
negociação das ações. No cenário brasileiro, desde a década de 1930, aliado ao
processo inflacionário, havia o fator limitante dos juros, criado pela lei conhecida
como “Lei da Usura”, que limitava os juros dos contratos de empréstimos à taxa de
juros de 12% a.a. (doze por cento ao ano)
8
. Essa limitação gera problemas
imediatos no ambiente inflacionário, uma vez que a expectativa do futuro é incerta;
um prêmio de risco maior deveria ser associado ao custo do dinheiro para o
tomador, de forma a garantir o risco do devedor. Entretanto, este risco não poderá
ultrapassar o teto limitado por um ato governamental, logo, se ajustam os prazos ao
máximo de juros permitido.
7
“Sendo a oferta de capital determinada pela habilidade e pela propensão a poupar, e a procura de
capital, pelos incentivos a investir, nos países subdesenvolvidos existem deficiências tanto em
relação à oferta quanto à demanda. Do lado da oferta, a capacidade de poupar é baixa em virtude
do reduzido nível de renda real, o qual é conseqüência da baixa produtividade. Esta, por sua vez,
resulta em grande parte da insuficiente formação de capital. No que se refere a demanda, o
estímulo a investir é limitado pelo reduzido poder de consumo da população, provocado pelo baixo
nível de renda real, este também resultado da baixa produtividade.” (RATTNER, 1991). Segundo
Prebish (1968), nos países desenvolvidos o processo de acumulação se deu anteriormente ao
processo de distribuição de renda, enquanto nos países em desenvolvimento ambos os
problemas, acumulação e distribuição, devem ser resolvidos simultaneamente – para isto a
intervenção do Estado se faz obrigatória.
8
Esta limitação é dada pelo decreto nº. 22.626, de 7 de abril de 1933, conhecido como Lei da
Usura, que considerava crime qualquer taxa de juros superior ao dobro da taxa legal, taxa esta de
6% a.a. (seis por cento ao ano).
20
A insegurança do capitalista em empregar um montante financeiro por um
longo prazo, em um cenário de inflação alta, e na condição de taxas de juros
limitadas por lei, é um grande empecilho no processo de desenvolvimento
econômico. O desejo em alocar recursos tanto na forma de funding como de finance
se torna baixo, e passa a existir uma dificuldade de se criar um mercado de fundos
emprestáveis, principalmente de longo prazo, entre capitalistas e empreendedores.
Do ponto de vista do empreendedor, a incerteza em tomar recursos de terceiros
também se torna latente, pois a incerteza na capacidade de repagamento, no prazo
normalmente estipulado pelo emprestador, restringe a sua capacidade de tomador.
A existência de uma bolsa de valores, que permita o lançamento de ações de
companhias para serem adquiridas por investidores, precisa de meios e ajustes para
lograr sucesso, ou, pelo menos, para ganhar momentum, seja pela redução de
tributos para investidores, ou ainda, pela simples garantia de acesso à informação
sobre as empresas que estão investindo. Um ponto crucial para o sucesso e o
desenvolvimento do interesse pelo mercado acionário está na existência de um
mercado secundário. Diferentemente do investimento direto em um negócio, o
mercado de ações pressupõe a negociação destas ações em um mercado
secundário, ou seja, estas são repassadas a novos compradores, de forma a
garantir o acesso à liquidez pelo investidor.
9
Aliado ao fato da incerteza do longo prazo, devido à existência da inflação e à
limitação dos juros, um dos grandes entraves do investimento no desenvolvimento
industrial no Brasil, clássico nas economias subdesenvolvidas, é o problema da
acumulação capitalista
10
e do baixo volume de poupança interna, que leva à
9
É importante notar que o mercado secundário de ações não caracteriza um novo investimento
produtivo. A partir do momento em que um lote de ações foi vendido e o capital integralizado à
empresa, qualquer negociação de ações já emitidas é uma atividade meramente financeira,
baseado em conceitos de análise de valor das firmas, fruto da expectativa de lucros e fluxos de
caixa livres futuros
10
“A disponibilidade de financiamento de longo prazo supões duas condições [...]. Por um lado, que
exista um volume adequado de poupança – isto é, renda acumulada e cujo poder de gasto seja
diferido no tempo – que viabilize alavancar o financiamento de longo prazo. Por outro lado, que o
volume de poupança existente seja efetivamente direcionado para o fim de dar suporte ao
funding.” (BAER, 1993, p.28) Entretanto, cabe a discussão sobre a origem do investimento. Do
ponto de vista clássico, o investimento pressupõe a existência de poupança. Entretanto do ponto
de vista keynesiano, a existência de poupança não é condição suficiente para o investimento,
21
reduzida capacidade de investimento de recursos privados locais. A deficiente
distribuição de renda e da existência de uma economia dual, em que grande parte
da população vivia em condições de quase subsistência, levam a uma baixa taxa de
poupança muito baixa. Ainda que um mercado de capitais existisse, a capacidade de
geração de fundos seria mínima, visto a deficiência na poupança interna.
Segundo Baer (1993), quatro são as vias possíveis de canalizar a poupança
disponível para o financiamento de longo prazo: a) por meio de aplicações
individuais ou de fundos de poupança privado em mercados de capitais; b)
intermediação de recursos por meio de sistema de crédito privado; c) reinvestimento
de lucros das próprias empresas; d) fundos de poupança compulsória administradas
pelo Estado e canalizados para crédito de longo prazo. As duas primeiras opções
pouco se aplicam ao ambiente econômico brasileiro, como já avaliado. O re-
investimento dos lucros é uma opção existente, entretanto, de espectro muito
limitado, pois o ciclo de obtenção do lucro é longo, e os montantes muitas vezes não
chegam a suprir as necessidades no tempo em que ocorrem, e não
necessariamente se ajustam às necessidades da empresa. Uma quinta via pode
também ser elencada, que é a utilização das poupanças externas.
Como atingir níveis superiores de desenvolvimento, diante das deficiências
econômicas e estruturais, são os objetivos das diferentes linhas de pensamento
econômicas reinantes no Brasil entre 1940 e 1950. Em todos os momentos, esta
discussão é influenciada por interesses econômicos que afetam diferentes grupos.
As principais vertentes do pensamento a serem estudadas, e que mais marcaram o
período são a) o neoliberalismo
11
e b) o desenvolvimentismo. Dentre as principais
questões de discussão que caracterizam as distintas vertentes de pensamento, o
processo de industrialização, o planejamento, a participação do Estado, a
participação do capital estrangeiro, o equilíbrio dos gastos públicos e a inflação
deve haver o interesse e o incentivo para o investimento. A “[...] heterodoxia relativa a alocação de
recursos em países subdesenvolvidos não significava apoio à intervenção do Estado para uso
adequado de poupança ociosa, como no caso keynesiano, e sim a existência de protecionismo,
planejamento e outras medidas governamentais como meios de industrializar e maximizar a renda
a partir de poupanças escassas.” (BIELSCHOWSKY, 2000 p. 12).
11
No caso brasileiro, o prefixo “neo” adicionado ao termo “liberal” tem um significado específico,
segundo Bielschowsky (2000): ele representa o fato de pensadores ortodoxos admitirem alguma
intervenção estatal, com o fim de sanear imperfeições de mercado, que afetavam diretamente
economias subdesenvolvidas como a brasileira.
22
serão centrais para a discussão. Cabe também um estudo da contribuição dada pela
Comissão Mista Brasil - Estados Unidos (CMBEU) e da Comissão Econômica para
América Latina (CEPAL), no âmbito do desenvolvimentismo.
23
2.2.1. Pensamento Neoliberal
O pensamento neoliberal teve como principais articuladores, em um primeiro
momento, Eugênio Gudin e, posteriormente, Octávio Gouveia de Bulhões
12
. A
origem do pensamento neoliberal está na escola clássica liberal. Dentre as doutrinas
que marcam o pensamento estão: a) a busca contínua pela defesa do mecanismo
de mercado e a redução do Estado na Economia; b) a busca do equilíbrio monetário
e financeiro; c) a aversão ao planejamento econômico e medidas de apoio ao projeto
de industrialização.
Os economistas da vertente neoliberal acreditavam que o Estado poderia
interferir na economia de forma a corrigir imperfeições e deficiências do
funcionamento do sistema de mercado, mas que este expediente deveria ser evitado
ao máximo, de forma a pouco interferir na sua eficiência alocativa. Segundo Gudin, a
interferência do Estado em atividades que deveriam ser oriundas da iniciativa
privada seria um passo para o socialismo, e um advento contrário à idéia do
capitalismo e à livre iniciativa.
A estatização foi um dos pontos mais complexos do desenvolvimento
econômico, sendo um dos principais motivos de discórdia entre os neoliberais
13
e os
desenvolvimentistas. Os setores de transportes, energia elétrica, petróleo e
siderurgia foram temas centrais do desenvolvimento brasileiro, e os principais
setores de divergência quanto à estatização. Para os liberais, o controle do Estado
era uma passo para o socialismo e uma ameaça aos mecanismos de mercado e ao
capitalismo. Dessa forma, a interferência do Estado como planejador e protecionista
era vista como um retrocesso. Segundo Bielschowsky (2000), Gudin tinha visões
distintas com relação ao protecionismo e ao planejamento, sendo que sua crítica ao
protecionismo tinha uma característica corretiva, enquanto em relação ao
planejamento, a sua crítica era preventiva.
12
Octávio Gouveia de Bulhões em 1945 foi o criador da Superintendência da Moeda e do Crédito
(SUMOC). (BIELSCHOWSKY, 2000)
13
Para os pensadores ortodoxos, o Estado é considerado um mal gerenciador, pois admite-se que o
mesmo não tem a competência empresarial e não busca da excelência e melhoria da eficiência
dos processos, seja devido à deficiência na formação do servidor público, seja devido aos
interesses políticos aos quais as empresas estatais se viam submetidas.
24
Gudin aceitava o argumento da indústria infante e da sua debilidade diante
das indústrias já desenvolvidas de países desenvolvidos. Entretanto, acreditava que
o protecionismo deveria ser melhor organizado, com uma me
25
fortes oscilações cíclicas dos preços dos produtos primários; 3) pouca diversidade
dos produtos de exportação; 4) forte inelasticidade da procura de importações, que
se compunha basicamente de mercadorias essenciais; 5) crescimento demográfico
acentuado. Segundo Bielschowsky (2000), estas questões são comuns aos
pensadores Cepalinos e desenvolvimentistas, entretanto com receitas de soluções
distintas. Desenvolvimentistas viam a industrialização como forma de suprir o
equilíbrio externo estrutural, enquanto os neoliberais viam o desenvolvimento e o
auxílio à agricultura como solução para os problemas, por meio de medidas
compensatórias que atenuassem as oscilações da procura e dos preços dos
produtos primários
14
.
As medidas propostas por Gudin se definiam como medidas de caráter
preventivo e medidas de caráter estrutural. Como medidas de caráter preventivo,
estavam o controle de preços e sobre produção de produtos primários, assim como
forma de conter o impacto inflacionário, a criação de impostos ou bloqueio de saldos
de receita de importação como medidas anticíclicas. Como medidas de caráter
estrutural, o aperfeiçoamento do sistema financeiro nacional e a diversificação da
produção para exportação. Sua crítica com relação ao planejamento, segundo
Bielschowsky (2000), possuía um caráter essencialmente doutrinário, devido a duas
razões básicas: a) a superioridade dos mecanismos de mercado; b) a identidade do
26
normal e reduzir a liquidez monetária, assim como eliminar a inflação mediante
barreiras ao comércio internacional, que seria uma das fórmulas para se alcançar
equilíbrio das contas externas. Um dos problemas geradores da inflação estava no
processo de desvalorização da moeda, que distorcia o processo de importação e
exportação, afetando o poder de compra da moeda nacional, criando assim uma
pressão inflacionária. Gudin aceitava que o controle físico de importação poderia ser
uma solução, aliada à fixação da paridade do câmbio, por algum tempo.
As desvalorizações cambiais prejudicam o controle da inflação, realimentando
o processo inflacionário, deteriorando os termos de troca, uma vez que destorciam o
poder de compra da moeda nacional, agravando o desequilíbrio externo. Esta visão
se opõe à teoria estruturalista cepalina. Os neoliberais acreditavam que o processo
da inflação e do desequilíbrio da balança de pagamento era um problema de causa
e efeito em um círculo fechado - um tendia a causar o outro. A política correta para
atacar a inflação estava em atacar as suas causas primordiais, ou seja, não
relacionadas com o déficit da balança de pagamento, sim nas raízes internas, por
meio da redução dos déficits públicos, redução da oferta creditícia e redução das
elevações salariais. O governo deveria buscar o equilíbrio do seu orçamento,
evitando o dispêndio e reduzindo o acesso ao crédito, diminuindo os investimentos
públicos com o intuito de adequar a demanda à oferta de bens de consumo e
criando mecanismos e estruturas para a privatização de empresas e indústrias
estatais.
O investimento estrangeiro foi o mais explosivo dos temas associados ao
desenvolvimento brasileiro
15
. Para o volume de recursos necessários para o
processo de industrialização do país, os dois únicos agentes capazes de aportar
recursos para o desenvolvimento eram o Estado e o capital estrangeiro. A baixa taxa
de poupança nacional não permitiria que o capital privado nacional fosse agente
atuante neste processo, mostrando-se como a parte fraca do processo. Os
neoliberais acreditavam que a atração dos capitais estrangeiros era crucial para o
projeto de desenvolvimento nacional, de forma a investir no desenvolvimento do
país. Segundo Gudin, o capital estrangeiro contribuía com poupança externa,
15
Segundo Bielschowsky (2000), a questão do capital estrangeiro orbitava em torno de dois pontos
principais: um sobre a sua participação nas atividade de mineração e energia ; outro sobre a
remessa de rendimentos e capital.
27
capacidade administrativa e conhecimento técnico. Inclusive dentro das linhas
desenvolvimentistas, o capital estrangeiro era rechaçado, visto como uma nova
versão do imperialismo, com um discurso alinhado com o desenvolvimento, mas
com fins únicos de repatriação dos lucros e apropriação do excedente capitalista.
Distintamente das visões desenvolvimentistas, que aceitavam o capital
estrangeiro, mas que o queriam sobre a forma de empréstimos externos, Gudin
acreditava que o capital estrangeiro deveria ser trazido ao país, principalmente na
forma de investimento externo direto, pelo fato do capital de risco ser mais estável e
ter uma característica anticíclica. O fato de o capital estar diretamente investido na
indústria sob a forma de risco dificulta a sua saída em períodos recessão ou crise.
28
2.2.2. Pensamento Desenvolvimentista
A discussão do modelo de política do desenvolvimento brasileiro, segundo
Martins (1968), na década de 1950 e 1960 girou em torno do estabelecimento de um
sistema produtivo integrado, capaz de fabricar os bens de capital necessários para o
autodesenvolvimento, sem a dependência externa, assim como qual o grau de
controle nacional, mas precisamente estatal, sobre este sistema e os setores
industriais que este controle deveria ser aplicado.
A intervenção do estado no desenvolvimento econômico sob a égide do
nacional-desenvolvimentismo se dividia em três níveis: “Primeiro, a definição e
coordenação de um projeto de desenvolvimento econômico, a ser viabilizado pelo
planejamento global. Segundo, o exercício, pelo Estado, da função de principal
intermediário interno e externo no processo de mobilização e de transferência de
recursos reais indispensáveis para financiar o desenvolvimento. Finalmente, a
execução das funções empresariais considerados estratégicas do ponto de vista
político e econômico.” (SOLA, 1998, p. 134)
Desenvolvimentismo não corroborava a visão neoliberal da vocação agrária
da economia brasileira, assim como negava a validade da teoria das vantagens
comparativas ricardianas, como a forma a ser adotada pelas economias
subdesenvolvidas para atingir o desenvolvimento. As melhorias obtidas pelo
progresso técnico das economias desenvolvidas acabavam por não serem
repassadas para as economias agrícolas, sendo apropriadas na forma de melhores
condições para as classes trabalhadoras dos países centrais. A única forma de
superar o atraso seria por meio da industrialização como forma de eliminar o
subdesenvolvimento.
O comércio exterior se mostrava como um dos principais pontos
problemáticos do desenvolvimento econômico, uma matriz exportadora muito rígida,
calcada na atividade primário exportadora, que não era capaz de suprir as
necessidades de demanda da população doméstica, assim como uma extrema
dependência de produtos industrializados das economias tidas como centrais. A
29
industrialização por substituição de importações se fazia obrigatória para combater
os problemas de balança de pagamentos e reduzir a suscetibilidade às variações
dos preços dos produtos agrícolas.
Na visão dos desenvolvimentistas, havia um problema de desemprego. A
mão-de-obra pouco especializada é dificilmente reabsorvida com a evolução
tecnológica das atividades agrícolas. O processo de absorção de tecnologias
importadas de economias desenvolvidas é considerado potencialmente inadequado
para o caso de economias subdesenvolvidas, pois os problemas são distintos. No
caso de economias desenvolvidas, a situação do pleno emprego é mais real, o que
leva à utilização de técnicas produtivas mais avançadas como forma de aumentar a
produtividade no trabalho. No caso de economias subdesenvolvidas aliadas à baixa
produtividade, está a abundância da mão-de-obra, que tende a ficar ainda mais
ociosa com a adoção de técnicas de aumento de produtividade. A visão
desenvolvimentista acreditava que havia um excedente de mão-de-obra, que deveria
ser absorvido por meio da melhoria do nível educacional da população e da sua
absorção pelos setores industriais, visto que os setores agrícolas tendiam a sofrer
pressões baixistas devido ao lento aumento da demanda internacional de bens
primários.
O desenvolvimentismo se caracterizava pela defesa do planejamento
econômico. O Estado deveria ser gestor do desenvolvimento, definindo a forma que
o desenvolvimento industrial e econômico deveria ocorrer. A forma de planejamento,
entretanto, foi objeto de divergência dentre os desenvolvimentistas. Apesar de todos
eles acreditarem na industrialização como a via para a superação do
desenvolvimento, estes divergiam em alguns pontos, principalmente no que diz
respeito à participação do Estado, do capital estrangeiro, da política monetária e
inflação.
De forma a analisar as diferentes visões dos desenvolvimentismo, iremos
adotar a conceituação proposta por Bielschowsky (2000), que caracteriza três
30
setores desenvolvimentistas distintos: Setor Privado; Setor Público Não-Nacionalista;
e Setor Público Nacionalista
16
.
Autor das principais controvérsias com os neoliberais, Roberto Simonsen foi o
grande impulsionador do processo do desenvolvimentismo brasileiro dentro do setor
privado. Simonsen acreditava que o Brasil era um país de extrema pobreza, com
baixa produtividade e um baixo rendimento médio per capita. Simonsen entendia
que o Brasil era um país pobre, habitado por uma população pobre e a
industrialização seria a única forma de superar a pobreza. Os desenvolvimentistas
do setor privado consideravam que o governo deveria ter participação ativa no
processo de industrialização, uma vez que os mecanismos de mercado não
atenderiam às necessidade da débil economia brasileira. Entretanto, acreditavam
que o setor privado era preferível à atuação direta do Estado no processo de
industrialização, sendo o papel do Estado o protecionismo e planejamento. O Estado
como planejador deveria ser executor somente nos setores básicos, cuja iniciativa
privada não deveria estar presente.
O pensamento do setor privado pode ser caracterizado pelo: a) crescimento
acelerado da renda nacional, por meio do processo de industrialização do país; b)
expansão e diversificação do mercado interno; c) preocupação com as dimensões
sociais do desenvolvimento, traduzido em propostas concretas de gastos públicos
direcionados a programas de educação e saúde; e d) Estado definidor das diretrizes
de planejamento estrutural de longo prazo (SOLA, 1998)
O investimento estrangeiro era visto positivamente pelo setor privado, desde
que não se tornasse concorrência ao capital privado nacional. Contudo, na ausência
da capacidade do capital privado nacional, acreditavam que o capital privado
estrangeiro era uma melhor opção, exceção feita ao caso do petróleo que
consideravam estratégico para a soberania nacional. Ainda com relação ao capital
16
Segundo Sola(1998), os setores ou grupos poderiam ser divididos em dois, principalmente após o
suicídio de Vargas. Estes poderiam ser divididos entre Cosmopolitas e Nacionalistas, sendo que
os Cosmopolitas englobariam o que Bielschowsky (2000) atribui de Setor Privado e Setor Público
Não-Nacionalista, pois se caracterizam principalmente na forma como o Estado deveria intervir na
economia e o tratamento ao capital estrangeiro.
31
estrangeiro, este deveria ser orientado para atividades comerciais, agrícolas e
industriais, que não fossem exploradas pelo capital nacional.
O desenvolvimentismo do setor privado tem como pontos de defesa a ênfase
na lucratividade das indústrias e na preservação dos mercados, o que sempre traz a
discussão da eficiência dos mercado diante dos investimentos estatais. Ainda na
linha da defesa da lucratividade, possuíam ideais muito específicos com relação à
elevação dos salários e à tributação dos lucros, assim como à defesa da ampliação
do crédito. A preservação do lucro empresarial era um item de suma importância
para o setor privado. Estes defendiam a questão da necessidade da manutenção e
da elevação da lucratividade por meio da tese de que a propensão marginal a
poupar das classes de rendas mais altas era muito superior a propensão marginal a
poupar das classes de rendas mais baixas, logo a elevação da lucratividade
permitiria um aumento da taxa de poupança geral da economia, facilitando assim o
aumento no investimento.
Com relação aos salários, as críticas estavam mais voltadas ao peso dos
encargos trabalhistas e dos reajustes do salário mínimo. Distintamente da
preocupação neoliberal com relação ao aumento de salários e com o crescimento
inflacionário, os desenvolvimentistas do setor privado tinham a preocupação voltada
para a redução das taxas de lucro. O problema inflacionário não foi deixado de lado
por este grupo, entretanto não defendiam a tese de que a contenção do crédito
fosse a forma pela qual o a inflação fosse debelada. O processo de redução da
inflação deveria ser centrado no combate ao déficit público, elevações salariais e
escassez de gêneros alimentícios.
Dentro do setor público havia um grupo de economistas considerados não-
nacionalistas, sendo formado por economistas como Horácio Lafer, Ari Torres,
Glycon Paiva, Lucas Lopes e Roberto Campos
17
. São considerados não-
nacionalistas pelo fato de acreditarem que o Estado deve ter uma função estatizante
apenas em setores específicos, principalmente mineração, tran
32
serviços público e indústrias de base. Entretanto, combatiam a proliferação do
Estado, entendendo que o mesmo deveria participar nos projetos de grande vulto
financeiro, como infra-estrutura e mineração, onde o capital privado nacional não
tinha suficiente porte financeiro e, assim como os desenvolvimentistas do setor
privado, entendiam que o capital estrangeiro deveria ser preferido em relação ao
investimento estatal. Apoiavam medidas de controle da inflação e medidas de
estabilização monetária, por meio do uso de instrumentos monetários, o que
inclusive os levou a ser chamados de monetaristas em alguns momentos,
principalmente pelos desenvolvimentista-nacionalistas.
O pensamento de Roberto Campos foi destaque dentro do grupo dos não-
nacionalistas. Este se mostrava contrário à estatização e defendia o capital
estrangeiro, mas não perdia a sua posição favorável ao planejamento e à
industrialização, principalmente quando esteve na diretoria do BNDE a partir de
1955. Roberto Campos acreditava que o planejamento era crucial para o
desenvolvimento; acreditava também que a existente máquina administrativa seria
incapaz de executar as tarefas do desenvolvimento, e para que isto ocorresse seria
necessária a formação de equipes de planejamento e administração voltadas para a
formulação de um políticas para tal fim. Estas políticas deveriam ser setoriais, ou
seja, objetivando setores específicos da economia. Tanto o desenvolvimento setorial
como a criação de grupos autônomos para a execução e formulação de políticas
para setores específicos foram amplamente utilizados no Plano de Metas de
Juscelino Kubitschek, por meio da definição e localização de pontos de germinação
e pontos de estrangulamento.
Para Campos, o planejamento econômico e a intervenção estatal se faziam
muito mais necessários em países subdesenvolvidos que em países desenvolvidos,
uma vez que é necessário compensar a debilidade da iniciativa privada, a
necessidade de concentrar recursos para viabilizar o investimento, contornando o
problema da inexistência de um mercado de capitais, por meio da tributação sobre
as camadas mais ricas da população. Além disso, o Estado é capaz de tomar
decisões com uma visão de mais longo prazo, considerando o processo de
desenvolvimento econômico, diferentemente do setor privado cuja visão tende a ser
mais imediatista e centrada nos lucros. (BIELSCHOWSKY, 2000) Anteriormente à
33
década de 1950, Campos foi considerado um economista nacionalista. Entretanto, a
partir de 1950, começou a defender a tese de que havia insuficiência de capitais, de
know-how e de capacidade para importar no Brasil, o que o levava a crer que, de
forma a atingir os interesses do desenvolvimento da nação, uma política de atração
de capitais externos deveria ser definida.
As principais discussões sobre o capital estrangeiro sempre estiveram
focadas na mineração, energia e transportes, assim como no fato das remessas.
Com relação à mineração, juntamente com Glycon Paiva, entendia que a riqueza
mineral brasileira era insuficiente e o apego ao nacionalismo levava a uma maior
debilidade na sua evolução. No caso da energia e dos transportes, a rentabilidade
baixa dos investimentos fruto das tarifas era o principal fator limitador do
desenvolvimento e da atratividade do capital, principalmente do investimento
estrangeiro. Com relação à remessa de lucros como defensor da atração dos
capitais, entendia que ela era crucial para o processo. Defendia a tese de que a
remessa de lucros era um montante reduzido do passivo da balança de
pagamentos, não devendo assim se contrapor ao desenvolvimento industrial.
No que tange à inflação, acreditava que o país sofria de um problema de
inflação de demanda. Esta vinha sendo por um excesso de demanda, viabilizada por
déficits no orçamento público e pela expansão de anormal de crédito, provocada por
uma insuficiência de oferta, devido muito mais a uma má gestão da política
econômica, do que a uma rigidez estrutural, como admitida pelos nacionalistas
estruturalistas. Para Campos, as causas da inflação não eram a rigidez da oferta
agrícola e a incapacidade estrutural para importar, mas os erros de política
econômica, muitas vezes devido à incorreta seleção de medidas antiinflacionárias
que violentavam as regras de mercado, distorcendo preços e a alocação de
recursos. (BIELSCHOWSKY, 2000).
Os pensadores do desenvolvimentismo nacionalista, que tiveram como seu
maior expoente Celso Furtado
18
e dentro do Governo foram caracterizados
18
Celso Furtado participou do processo nacionalista proposto por Vargas ainda no Estado Novo,
quando ingressou no DASP, no início de sua carreira em 1944 e atravessou o período neoliberal
do Governo Dutra na França, fazendo o seu Doutorado. Em 1949, ingressou na CEPAL no Chile,
34
inicialmente Assessoria Econômica de Vargas, criada em 1951 sob a chefia de
Rômulo Almeida, defendiam, igualmente aos demais desenvolvimentistas, o
desenvolvimento industrial brasileiro, como forma de superação do desenvolvimento,
mas se distinguiam dos demais pelo desejo da ampliação da intervenção do Estado
na economia, via intervenção direta no processo industrial e no planejamento do
desenvolvimento. O processo de desenvolvimento, que caracterizava o
estruturalismo preconizado por Furtado, considerava que o desenvolvimento deveria
seguir um planejamento integral da economia. Para tanto, o Estado deveria ser o
principal ente do desenvolvimento. Não se poderia deixar o processo de
desenvolvimento à decisão do mercado, assim como forma de manter a acumulação
do capital em setores estratégicos nas mãos do controle do Estado, e,
principalmente, distante do capital estrangeiro.
Os setores considerados estratégicos, como energia, transporte, mineração,
petróleo, assim como a indústria química e a siderurgia deveriam ser coordenados
pelo Estado por se tratar de indústrias prioritárias para o desenvolvimento nacional.
Segundo os nacionalistas, a debilidade dos setores de transporte e energia estava
justamente ligada a sua dominação pelo capital estrangeiro, que buscava os altos
lucros. Logo, o Estado deveria prover estes de forma a garantir que o
desenvolvimento pudesse ocorrer, independentemente da busca incessante por
lucros.
Em setores tidos como não estratégicos, o capital estrangeiro era aceito, com
a ressalva e a preocupação de que fossem controladas as remessas de lucros e
dividendos, de forma a garantir a estabilidade na balança de pagamentos e a criação
de poupança doméstica.
O principal traço de definição do nacionalismo está na forte intervenção do
Estado no processo de desenvolvimento econômico, mas não se pode deixar de
considerar outras características dos nacionalistas. Os economistas nacionalistas
entendiam que a política monetária deveria ser subordinada à política de
onde desenvolveu a teoria estruturalista e a sua aplicabilidade para o Brasil. “Em 1954 e 1955, de
retorno ao país, chefiou o grupo Misto Cepal-BNDE, onde elaborou um estudo de apoio a um
programa de desenvolvimento para o período 1955-62, que constituía a primeira aplicação da
recém-elaborada técnica de programação da Cepal.” (BIELSCHOWSKY, 2000, p. 133)
35
desenvolvimento econômico. Dentro do pensamento estruturalista, a inflação é uma
característica da inadequação da estrutura produtiva extremamente rígida, que não
consegue ter a mobilidade exigida pela rápidas alterações das demandas, devido a
uma falta de diversificação da estrutura produtiva. Baseado nisto, o contracionismo,
via redução do crédito ou do investimento público, retardaria o processo de
desenvolvimento, não causando nenhum bem ao controle do processo inflacionário.
Logo, para os nacionalistas, estruturalistas, medidas de curto prazo e
medidas que reduzam salários e tributações não solucionam o processo estrutural
causador da inflação. Assim como, do ponto de vista dos estruturalistas, o aumento
do lucro das classes de renda mais altas não acarreta uma evolução na atividade
industrial, sob o argumento da propensão marginal a poupar, o que criaria um
potencial aumento na poupança disponível, mas um aumento no consumo de itens
supérfluos e no nível de importações. Em contrapartida, uma melhor política social e
uma maior distribuição de renda levariam a um maior aumento da renda das classes
mais baixas, cuja propensão marginal a consumir é muito superior às classes ricas,
criando assim um mercado interno mais forte, que é umas das bases da teoria
estruturalista.
Segundo a teoria estruturalista defendida por Furtado, as economias
subdesenvolvidas são caracterizadas por estruturas econômicas heterogêneas e
duais. Dentro de uma mesma economia, convivem estruturas desenvolvidas
voltadas para a industrialização, enquanto um grande setor está inserido em uma
economia de subsistência. O desenvolvimento econômico somente se daria por
meio de um processo de industrialização integral, no qual o Estado deveria ser
planejador e agente do desenvolvimento, de forma a corrigir as imperfeições dos
mercados e a homogeneização das estruturas produtivas, alcançando a superação
da pobreza e do subdesenvolvimento.
O modelo estruturalista, que será um dos sustentáculos do processo de
desenvolvimento nacional, segundo Furtado, procurará evidenciar os parâmetros
não-econômicos nos modelos macro-econômicos, sendo que, em economias
subdesenvolvidas, estes parâmetros podem se modificar radicalmente em fases de
mudanças sociais bruscas. Não é possível avaliar e entender a rigidez da oferta de
36
alimentos sem o conhecimento da estrutura agrária, sem o conhecimento do regime
de propriedade de terras, controle de empresas por grupos estrangeiros. Devido ao
modelo nacional-desenvolvimentista e à necessidade da criação de um banco de
fomento e principal fornecedor de fundos de longo prazo, com condições especiais
para o financiamento do desenvolvimento do país, o BNDES
19
veio a ser a solução
para o mercado brasileiro baseado no crédito, principalmente no crédito subsidiado
com taxas de juros abaixo da inflação, durante alguns momentos da história
econômica brasileira.
O processo de desenvolvimento deveria ser coordenado pelo Estado por meio
de uma política de desenvolvimento voltada para a industrialização, através da
substituição de importações. O Estado deveria entender o processo de dinamização
da economia e antever as estruturas produtivas necessárias para fazer frente ao
desenvolvimento econômico. Deve-se, mediante uma avaliação da pauta de
importações, buscar introduzir no Brasil indústrias que substituíssem os itens mais
pesados da pauta de importações.
Um dos principais pontos de discussão da debilidade do processo de
industrialização, caracterizado por uma industrialização heterogênea, pois surgiu
como função de um padrão de demanda criado para cobrir as necessidades das
classes de renda superior, diante das dificuldades de importar, consiste no problema
da baixa capacidade de poupança. Para os nacionalistas, a economia brasileira
possuía uma baixa capacidade de poupança. Esta não seria suprida como viam os
desenvolvimentistas do setor privado com o aumento da poupança das classes mais
ricas, via redução de tributos. As solução seria por meio da elevação da tributação e
o conseqüente aumento do investimento estatal, como forma de melhor aproveitar a
acumulação capitalista.
A visão do investimento estrangeiro, principalmente no setor de mineração e
de fornecimento de energia, era visto como uma forma de imperialismo clássico,
para a visão nacionalista. O único objetivo seria a máxima exploração, remetendo
19
“A tese central – e o objetivo estratégico: o fortalecimento do Estado como um principal
protagonista do desenvolvimento – explica a importância que atribuíam ao fato de estar integrados
aos centros decisórios a Sumoc, o BNDE, o Banco do Brasil.” (SOLA, 1998, p. 139).
37
lucros para as suas respectivas matrizes, gerando, assim, crises nas balanças de
pagamento e reduzindo a capacidade de acumulação doméstica, que se caracteriza
como um problema clássico do subdesenvolvimento.
38
2.2.3. A CEPAL e a CMBEU
A CEPAL se constituiu em um importante marco teórico para a produção de várias
teorias para o desenvolvimento da América Latina, sendo formada por importantes
figuras do pensamento socioeconômico brasileiro, incluindo-se Celso Furtado, Maria
da Conceição Tavares, Carlos Lessa e Fernando H. Cardoso, dentre outros
(MANTEGA, 1992). A principal missão da CEPAL foi a de explicar os porquês do
atraso econômico da América Latina em relação as economias centrais, e a busca
de formas de reduzir estas distâncias. A CEPAL questionava o modelo ricardiano
das vantagens comparativas, e a divisão internacional do trabalho, entendendo que
a vocação agro-exportadora dos países subdesenvolvidos era uma das principais
razões para o problema do desenvolvimento
20
.
De um lado a economia brasileira seguia baseada em um pequeno grupo de
produtos primários, com principal ênfase na produção de café e nas oligarquias
cafeeiras, com um fim exportador, e na falta de dinamismo de suas estruturas
produtivas, com um desenvolvimento industrial e tecnológico mínimo (MANTEGA,
1992), fruto de um dualismo estrutural, tendo regiões com um relativo avanço
tecnológico, frente a outras em um sistema pré-capitalista de produção
21
. Distâncias
geográficas continentais e precárias formas de comunicação entre as regiões,
aumentavam assim a incapacidade de se transferir tecnologias e homogeneizar
sócio-economicamente as diversas regiões do país. De outro lado, países
desenvolvidos, com economias indústrias altamente desenvolvidas, com uma vasta
20
A teoria das vantagens comparativas, que se aplicava no contexto das economias periféricas
através do desenvolvimento e especialização da economia agrícola, caracterizando-as como
principais produtores de gêneros alimentícios e produtos primários a serem trocados por produtos
industrializados fabricados nos países centrais industrializados. As economias periféricas seriam
capazes de manter os preços de seus produtos mais elevados em relação, aos preços de
produtos industrializados. Entretanto, na visão cepalina isto não ocorre, as economias
basicamente primárias vem os termos de troca declinarem, não havendo a transferência do
excedente gerado pelos aumentos de produtividade das economias centrais para as economias
periféricas, sendo que na prática o que ocorre é o inverso, e os incrementos de produtividade
absorvidos pelas economias periféricas são mínimas.
21
Segundo Furtado (1979), o subdesenvolvimento no Brasil é caracterizados pela existência de uma
estrutura dualista, uma parte da sociedade se organizava com objetivo da maximização de lucros
e com formas modernas de consumo, mantendo outra parte em forma pré-capitalistas de
produção. Esta estrutura sócio-econômica dualista é o que origina o processo do
subdesenvolvimento, sendo este um processo histórico e não uma fase do processo evolutivo do
capitalismo, ou seja, não necessariamente as economias desenvolvidas passaram por uma fase
de subdesenvolvimento para atingir a sua maturidade desenvolvida.
39
gama produtos, com principal foco em seus mercados interno (MANTEGA, 1992).
Neste cenário a separação entre centro e periferia, entre produtores industriais e
agrícolas, tendia a se acentuar, uma vez que o centro produtor industrial passava a
impor a periferia, altos preços para seus produtos industrializados absorvendo a
mais-valia obtida pelo aumento da produtividade, demandando preços baixos pelos
produtos agrícolas produzidos pelas economias periféricas, devido a sua
incapacidade de obter os produtos industrializados demandados por sua classe
dominante.
Somando-se ao fato da pressão do centro sobre a periferia, os produtos agrícolas
produzidos no Brasil não eram facilmente absorvidos pela população local, sendo
que o direcionamento da economia agrícola ao atendimento das necessidades
crescentes da urbanização não se fazia possível, matriz agrícola é extremamente
rígida, concentrada em produtos para o mercado externo. Ao mesmo tempo a
elasticidade-renda da demanda de produtos agrícolas é muito baixa, levando ao um
crescimento extremamente lento dos seus preços no mercado mundial
22
.
Do ponto de vista cepalino a solução para este problema esta na implementação de
uma política de desenvolvimento industrial, com um foco na substituição das
importações, e na eliminação da dependência dos países centrais pelas economias
periféricas. A economia deve deixar de ser voltada para a exportação de produtos
primários, e dirigir o seu crescimento para dentro com uma evolução nas estruturas
produtivas, garantindo o desenvolvimento da indústria nacional com o fim de
abastecer o mercado doméstico com produtos anteriormente importados.
A linha heterodoxa
23
adotada pela CEPAL não acreditava na capacidade de auto-
ajuste e alocação eficiente dos fatores no caso de países periféricos, sendo que o
desenvolvimento industrial requer a participação direta do Estado, como agente de
22
Anteriormente já havia sido mencionado, mais ainda é valida a ressalva que as flutuações de
preços são muito mais sentidas pelos produtores, que pelos atravessadores, que em sua grande
parte são empresas situadas fora do mercado nacional.
23
não cabe no caso de economias subdesenvolvidas trabalhar com o conceito de excesso de
poupança, mas sim o caso da insuficiência de poupança. No caso das economias desenvolvidas
um dos principais pontos do keynesianismos estava na intervenção do estado, como forma de
melhor alocar a poupança ociosa, enquanto no caso das economias subdesenvolvidas, esta
heterodoxia estava no existência do planejamento e do protecionismo, de forma a maximizar a
renda e o produto através do uso de poupanças escassas. (BIELSCHOWSKY, 2000)
40
mudança e direcionamento do processo de industrialização. O Estado deveria ser o
maior promotor do desenvolvimento e principal ente planejador das modificações. “O
Estado é tido como o centro racionalizador da economia, com a incumbência de
intervir até mesmo como agente econômico direto, provendo a necessária infra-
estrutura para a expansão industrial e a canalização dos recursos nacionais para as
novas atividades prioritárias” (MANTEGA,1992, p.39).
O nacionalismo é uma forte marca da vertente de desenvolvimento proposta pela
CEPAL, com a busca da acumulação capitalista doméstica e hostilidade ao
imperialismo e a propriedade estrangeira nas economias periféricas. A doutrina
cepalina não é avessa a inserção do capital estrangeiro na economia, mas é mais
favorável ao ingresso dos recursos estrangeiros através da colocação de títulos
governamentais no mercado internacional, obtendo-se assim melhores condições
financeiras nestes empréstimos. As restrições da CEPAL ao capital estrangeiro
estão nos setores de segurança nacional, serviços públicos e principalmente no
transporte ferroviário e energia. (MANTEGA, 1992)
Quase que concomitantemente é criada uma nova comissão Mista Brasil Estados
Unidos (CMBEU), que se origina de uma nova mudança de postura do governo
Norte-Americano, no início da década de 1950, tendo como meta um novo tipo de
alinhamento entre os paises em desenvolvimento do continente americano e os
Estados Unidos. Estes passam a ter um interesse em um projeto de
desenvolvimento acelerado das economias periféricas. Uma das características
marcantes desta nova fase de política externa Norte-Americana em relação aos
países periféricos, é o fato da disposição do governo Norte-Americano financiar o
desenvolvimento da infra-estrutura e equipamentos através de entidades oficiais,
não mais apenas a busca da criação de uma ambiente seguro para o investidor
estrangeiro.
A Comissão Mista estabelecida em 1950, iniciou seus trabalhos em 1951, e teve o
seu relatório final publicado em dezembro de 1953. A CMBEU foi por muitas vezes
vista como uma influência imperialista e hegemônica por economistas brasileiros de
pensamento nacionalistas. Entretanto, o relatório apresentado pela comissão
possuía características muito alinhadas com a abordagem estruturalista e com o
41
pensamento de Celso Furtado, principal economista Brasileiro na CEPAL. (SOLA,
1998). O Relatório “[...] apresentou o mais abrangente diagnóstico contemporâneo
sobre a economia brasileira e, seu conjunto, com análises interessantes e não
dogmáticas sobre os problemas recorrentes da inflação e especialmente, do
desequilíbrio da balança de pagamento.”(MALAN ET AL., 1977, p.62).
As duas principais diretrizes da comissão eram: 1) prioridade a meta de crescimento
acelerado, a ser atingida pelos esforços conjuntos dos governos do Brasil e dos
Estados Unidos; 2) papel decisivo a ser empenhado pelo setor público no
investimento de infra-estrutura, necessário para a criação de oportunidades para o
capitais nacionais e estrangeiros. Os objetivos desta comissão foram muito distintos
aos da Missão Abbink, principalmente no que diz respeito ao diagnóstico da situação
econômica, da profundidade na elaboração de projetos e nas formas de financiá-los.
(SOLA, 1998)
A comissão buscou analisar as razões dos desequilíbrios estruturais, chegando a
uma avaliação muito próxima do que é a avaliação estruturalista, sendo que dentre
os pontos relevantes do desequilíbrio podemos citar os seguintes: 1) concentração
de renda regional desde 1939, devido ao acelerado crescimento da região Centro-
Sul e a piora nos termos de troca com outras regiões; e 2) A industrialização
substitutiva teria avançado graças aos estímulos derivados das crescentes
dificuldades de importação, fruto de desvalorizações e controles cambiais e da
escassez gerada pela segunda Guerra mundial (SOLA, 1998).
O uso de instrumentos de política econômica e medidas governamentais enérgicas
para confrontar as distorções do desenvolvimento espontâneo se faziam
necessárias, para tanto, uma política seletiva de crédito e uma política fiscal
intervencionista, voltada ao objetivo maior de conciliar a obtenção de altos índices
de produtividade e de investimentos, com relativa estabilidade de preços, se fazia
necessária. Modificações drásticas na política de comercio exterior, através de
alterações nas políticas cambiárias, ainda que a política cambiárias de moeda sobre-
valorizada e as restrições quantitativas de exportação tivessem tido seus méritos, as
mesmas não poderiam ser mantidas por um longo prazo, e que uma desvalorização
se fazia necessária. Assim como, esforços verdadeiramente decisivos para executar
42
programas capazes de remover estrangulamentos nos setores de transporte e
energia e de viabilizar, rapidamente, a exploração de fontes domésticas de
combustíveis e energia.
Do ponto de vista estrutural e institucional, os fatores que provocavam o
desequilíbrio eram em primeiro lugar a aumento da distância entre a poupança o
investimento, causado pela intensificação no processo de industrialização e
urbanização, que forneceu novas oportunidades de investimento sem a
contrapartida do aumento da poupança. A poupança era canalizada para
investimentos não produtivos, ficando o investimento dependente do crédito
bancário, devido a inexistência de mercado de capitais. Em segundo lugar a
vulnerabilidade da economia brasileira à pressões inflacionárias fruto a
determinantes de ordem estrutural, os produtos primários exportados (café, açúcar,
etc.), devido a sua natureza, não podiam ser canalizados para o mercado interno,
para atender as demandas de alimentos. A taxa mais lenta de avanço tecnológico
nas culturas de zona tropical em relação as de zona temperada. O baixo aporte de
capital estrangeiro em relação a outros paises com economias semelhantes. A
dependência da industrialização brasileira em face da restrição cambial, e
transferência de recursos do setor exportador para o industrial, fruto de
características das políticas cambiais. (SOLA, 1998)
Segundo a CMBEU o governo brasileiro como principal ente de mudança de
desenvolvimento deveria dar o foco no desenvolvimento da matriz energética, tanto
no que tange o fornecimento, como distribuição da energia, crucial para o
desenvolvimento industrial em todo país, buscando eliminar a concentração no
Centro-sul do país.
Tanto a CMBEU e a CEPAL viam como um dos principais problemas para o
desenvolvimento, a inexistência de uma poupança doméstica, que permitisse a
acumulação doméstica e o financiamento ao investimento, requerido para o
desenvolvimento industrial, devido a esta incapacidade, ambos acreditavam que
solução para o problema do investimento era a utilização da poupança externa.
Entretanto, para que esta poupança externa pudesse ser utilizada, condições que
43
garantissem a captação de recursos externos e seu posterior repagamento deveriam
ser dadas pelo governo Brasileiro.
A CMBEU formou juntamente com a CEPAL, a linha de pensamento que se tornou
base para o nacional-desenvolvimentismo brasileiro, sendo que a CMBEU foi ainda
mais profunda na análise e na caracterização do processo de desenvolvimento a ser
seguido pelo Brasil, um vez que o seu foco era exclusivo no Brasil, enquanto a
CEPAL busca um modelo que se aplicasse a toda a América Latina (Mantega,
1992). O nacionalismo no qual o Estado forte definiria quais as prioridades e
investimentos de interesse nacional, não deixando de utilizar os recursos financeiros
externos foi a característica do pensamento econômico vigente no período que
antecede o golpe militar de 1964.
44
3. O BNDES
Em 1952, o BNDE é criado como um dos principais pontos de convergência
entre as diversas vertentes do pensamento nacionalista. O seu propósito claro era o
de apoiar o desenvolvimento e a diversificação industrial, com a busca de substituir
as importações e completar a estrutura industrial do país. Entretanto, nos seus
primeiros anos, todos os recursos estiveram comprometidos com programas de
infra-estrutura (Lessa, 1981). Somente a partir da segunda metade da década de 50,
o desenvolvimento industrial teria o seu início, durante a execução do Plano de
Metas e por meio das propostas do grupo misto BNDE-CEPAL.
O BNDE surge como órgão formulador da política nacional do
desenvolvimento econômico, sendo o precursor do futuro Ministério do
Planejamento, com a clara missão de buscar reduzir as falhas de mercado, e sendo
investidor e guia do desenvolvimento estatal, em setores não atrativos à iniciativa
privada devido à necessidade de capital e prazos extensos de maturação do capital.
A função do BNDE não seria a substituição do investimento privado no processo de
industrialização; o papel do BNDE era complementar ao processo de
industrialização. O Estado seria o supridor da infra-estrutura e das indústrias de
base, enquanto apoiaria a iniciativa privada no desenvolvimento econômico e
industrial. O Banco deveria se considerar um emprestador residual, ou seja, não
deveria financiar projetos cuja lucratividade fosse capaz de atrair o financiamento do
mercado financeiro privado. (SIMONSEN; CAMPOS, 1979).
Ao longo dos seus mais de cinqüenta anos, o BNDE foi sendo transformando
e sua atuação adequada a realidades econômicas e políticas distintas dentro do
processo evolutivo brasileiro. A assistência financeira prestada e a priorização de
projetos sempre esteviveram ligadas às necessidades reinantes no país em cada um
dos períodos. Seu perfil também se alterou ao longo dos anos, sendo parte de
ministérios distintos e com diferentes necessidades e intenções.
45
3.1. O Segundo Governo Vargas (1951 a 1954)
O segundo Governo Vargas se inicia enfrentando uma série de problemas, “a
inflação, o desequilíbrio na balança de pagamentos, a necessidade de importar
máquinas e equipamentos, insuficiência de energia e transporte, insuficiência de
oferta de gêneros alimentícios para as populações dos centros urbanos em rápida
expansão, etc.” (IANNI, 1971, p. 112).
O projeto inicial patrocinado por Vargas e coordenado pelos técnicos da
Assessoria Econômica do governo, com características extremamente nacionalistas,
introduzia uma política geral de investimentos, juntamente com propostas para
reformas institucionais nas áreas fiscal e administrativa, e a definição dos requisitos
que deveriam orientar a participação do capital estrangeiro na industrialização
nacional. Ele tinha como objetivo o investimento em áreas consideradas estratégicas
para o desenvolvimento do país, com incentivos ao desenvolvimento da indústria
nacional e a restrição à participação direta do capital estrangeiro em setores como
os de bens de capital (SOLA, 1998). Outro ponto que visava este projeto era a
integração vertical do setor manufatureiro, a eliminação dos pontos de
estrangulamento, já anteriormente identificados entre 1946-50, principalmente nos
setores de energia (carvão, petróleo e eletricidade) e transportes (ferrovias, rodovias
e portos) e a criação de infra-estruturas e instituições, para garantir e coordenar a
aceleração do desenvolvimento industrial, por meio da criação de novos órgãos
governamentais, com a finalidade de impulsionar a industrialização (IANNI, 1971)
O modelo de desenvolvimento proposto tinha como objetivo a proteção e a
prioridade ao capital nacional. O Estado deveria agir como ente coordenador e
distribuidor dos recursos financeiros disponíveis, por meio de incentivos ou reduções
tributárias para o capital nacional. O Estado deveria ser o controlador e captador de
recursos no mercado internacional, por meio de instituições de crédito internacional,
e repassá-los ao setor privado. A meta do plano de governo consistia em “reduzir, a
médio prazo, as importações de “bens essenciais”” (SOLA, 1998, p.99), com os
objetivos de “reduzir a vulnerabilidade da economia brasileira às flutuações na
46
capacidade de importar e garantir o controle nacional dos setores que regulam a
dinâmica do processo de acumulação de capital” (SOLA, 1998, p.99).
Após retornar dos Estados Unidos em Setembro de 1951, quando assinou um
acordo final com o Eximbank e o Banco Mundial, o Ministro da Fazenda Horácio
Lafer anuncia o Plano Nacional de Reaparelhamento Econômico, conhecido como
Plano Lafer, sendo um plano qüinqüenal para o desenvolvimento e investimento de
indústrias de base, transportes, energia, frigoríficos e modernização da agricultura.
Os recursos para a execução deste plano seriam obtidos por meio de um aplicação
de “Cr$ 20 bilhões em cinco anos, sendo Cr$ 10 bilhões originários da legislação
especial que seria submetida ao Congresso Nacional e os outros Cr$ 10 bilhões em
recursos em moeda estrangeira obtida no âmbito do acordo realizado.” (VIANNA,
1987, p.41). Os Cr$ 10 bilhões equivaliam a US$ 540 milhões, que era a expectativa
brasileira de recursos a serem provenientes dos Estados Unidos, contra um
montante de 250 milhões de dólares que os norte-americanos pareciam
interessados em desembolsar, em troca da facilitação da exportação de matérias-
primas para os EUA. (IANNI, 1977).
A contrapartida de recursos domésticos viria a constituir o Fundo de
Reaparelhamento Econômico; por meio de recursos gerados por empréstimos
compulsórios sobre a renda, através de um adicional ao imposto sobre a renda, que
seriam destinados exclusivamente ao Plano Nacional de Reaparelhamento
Econômico, com foco nos setores de transportes, energia, portos, armazéns e
frigoríficos (Rattner, 1991), visto como pontos de estrangulamento para o
desenvolvimento econômico pela CMBEU.
“[...] A princípio, instituiu-se sobre o Imposto de Renda de Pessoas
Físicas e Jurídicas um empréstimo compulsório de 15% (que deveria
viger por cinco anos, mas que se estendeu por mais de uma década).
Também se utilizariam 4% dos depósitos da Caixa Econômica Federal
e 3% da receita anual da Previdência (excluída a cota da União)”.
(BNDES, 2002)
47
Segundo Ianni (1971), o Plano Lafer correspondeu à aceitação e oficialização
por parte do Governo Vargas das sugestões e do projetos prioritários elaborados
pela CMBEU. Assim como correspondia à aceitação por parte do governo da
necessidade de impulsionar o desenvolvimento econômico brasileiro, à falta da
recursos (capital e tecnologia) nacionais, e a sua conciliação com a nova fase do
expansionismo Norte-americano.
O BNDE é criado mediante a Lei nº. 1628, de 20 de junho de 1.952. Segundo
Sola (1998), a criação de um banco nacional de investimento e fomento constitui-se,
no caso brasileiro, de um importante instrumental para o planejamento de longo
prazo e viabilização de projetos e, além disto, foi um ponto de convergência entre os
técnicos de diferentes escolas, que estavam envolvidos no processo político e
econômico que marcavam o período. Dentre os que buscavam um alinhamento e
uma busca da cooperação íntima com os Estados Unidos estavam o Ministro da
Fazenda, Horácio Lafer, e o Ministro das Relações Exteriores, Neves da Fontoura.
O BNDE serviria de via de entrada dos recursos externos, que deveria ser
incentivado via empréstimos bancários, mas não como investimento direto em
empresas nacionais, principalmente nas de bens de capital, que estavam no cerne
do processo de substituição de importações, e órgão coordenador do uso dos
mesmos. Outra característica marcante do BNDE seria a permissibilidade de
oferecer garantias do Tesouro a créditos externos, como uma autarquia sob
jurisdição do Ministério da Fazenda (RATTNER, 1991). As principais funções
atribuídas ao BNDE neste momento eram: “[...]a) principal intermediário financeiro
entre as agências de crédito internacional e grupos empresariais privados e/ou
empresas estatais; b) agência de planejamento, encarregada de definir políticas de
investimento e de preparar projetos específicos; c) a redistribuição intra-setorial de
recursos (e de ) poder em favor de certos grupos industriais que operavam o
mercado interno.”(SOLA, 1998 p. 118).
O processo de seleção de projetos do BNDE deveria seguir três critérios
gerais: a) critério estrutural, que versava sobre os projetos capazes de promover a
integração vertical da indústria nacional; b) critério cambial, no qual se daria
preferência a projetos que teriam a capacidade de aliviar pressões sobre a balança
48
de pagamentos, por meio da substituição de importações; c) critério conjuntural, cuja
definição geral seria de projetos que aliviassem os déficits de abastecimento. A
legislação básica que constituiu o BNDE definia prioridades estatutárias e
discricionárias, sendo que as estatutárias eram de natureza setorial, como
transporte, energia elétrica, frigoríficos e armazenamento; ou regional, como, por
exemplo, o fato de que pelo menos 1/4 dos recursos fiscais deveria ser investido nas
regiões menos desenvolvidas do país. (SIMONSEN; CAMPOS, 1979).
O BNDE é criado como uma autarquia, uma entidade estatal autônoma, com
patrimônio e receita próprios, com a participação de técnicos como Lucas Lopes e
Roberto Campos, e políticos como Horácio Lafer e Neves da Fontoura, já citados. O
BNDE passa a ter uma vocação técnica muito forte e com padrão de
profissionalismo administrativo e competência técnica do mais alto nível encontrado
na sociedade brasileira da época. Em um primeiro momento, O BNDE se instalou
nas dependências do Ministério da Fazenda, em salas antes utilizadas pela CMBEU,
transferindo depois a sua sede para um edifício no centro do Rio de Janeiro, em
setembro de 1953. Um dos fatos relevantes que demonstrava a real necessidade da
industrialização brasileira esteve presente na própria formação do BNDE, pois, após
um levantamento de preços, “o Banco precisou encomendar no exterior todo o
equipamento de escritório – como calculadoras e máquinas de escrever.” (BNDES,
2002)
No desenvolvimento da infra-estrutura, priorizou-se o binômio energia-
transporte, tidos como os maiores pontos de estrangulamento estrutural à época,
(LESSA, 1981) e de baixo interesse para a iniciativa privada, seja nacional ou
estrangeira, devido a problemas relacionados aos reajustes de tarifas. O setor
ferroviário recebeu cerca de 54% dos desembolsos efetuados, enquanto o setor de
energia recebeu 22% no período de 1952 a 1955 (vide Tabela 3). Data desta época
a criação das empresas federais: Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA) e das
Centrais Elétricas do Brasil S/A, ambas dentro da estrutura do BNDE. O setor de
transporte foi o primeiro a receber apoio do BNDE, sendo que o único financiamento
aprovado no ano de sua criação (1952) destinou-se à criação da Estrada de Ferro
Central do Brasil. Este financiamento contemplava melhorias na central e
remodelação nas linhas de cargas e passageiros nos percursos entre São Paulo-Rio
49
de Janeiro-Belo Horizonte, substituição de vagões de carga de madeira por outros
de aço, e o incremento do número de vagões para o escoamento da produção
siderúrgica de Volta Redonda. (BNDES, 2002).
O atenção ao setor ferroviário acabou sendo arrefecida, e a necessidade do
desenvolvimento do setor energético se tornou uma das maiores prioridades do
BNDE durante toda a década. A matriz energética constituía um dos grandes pontos
de estrangulamento, e sério entrave no processo industrial. O BNDE foi principal
articulador das políticas de desenvolvimento do setor elétrico e responsável pelo
aumento da oferta de energia até o ano de 1962, quando foi criada a Eletrobrás, que
passou a gerir este desenvolvimento.
Tabela 3 Sistema BNDES - Aprovações segundo os Ramos e Gêneros de
Atividade. (Em CR$ bilhões de 1991)
1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959 1960
Insumos Básicos
Mineração 000000000
Siderurgia 052222917522268
Metalurgia 00221231420
Qímica e Fertilizantes 0 18 0 5 4025445034
Celulose e Papel 0004071590
Produtos de Minerais Não-Metálicos 000000010
Equipamentos
Mecânicos Elétricos 00207101023
Material de Transporte 0 0 13 0 0 10 20 76 5
Outras Indústrias
Têxtil e Calçados 000000000
Produtos Alimentares 000000000
Outras 000000001
Infra-Estrutura
Energia Elétrica 0 37 32 89 37 227 240 112 33
Outros Setores
Transportes
Ferroviário 134 74 174 68 271 75 0 52 15
Rodoviário 000000000
Hidroviário 0110024080
Outras Atividades
Ensino Pesq. E Des. Téc 000000000
Distr. 034316141541
Outras 006000000
Total 134 148 235 173 376 424 533 338 360
Ano
Fonte: BNDES
Ainda na política de desenvolvimento do Governo, havia a preocupação com
o desenvolvimento de indústrias de insumos básicos e indústrias de base, com o
firme intuito do desenvolvimento das políticas de industrializão por substituição de
50
importações. No final de 1952, o republicano Dwight Eisenhower é eleito presidente
norte-americano, acabando assim com um longo período de governos democratas
nos Estados Unidos. Esta mudança teve direto impacto nas relações entre o Brasil e
os Estados Unidos, por meio do endurecimento da postura comercial norte-
americana com a América Latina.
O Banco Mundial passou a exercer uma política de tutor dos países
demandantes de crédito. Esta postura gerou desconfortos nas relações entre o
Banco Mundial e o Eximbank, que passaram a agir separada e conflitantemente.
Este fato causou também efeitos negativos no processo de desenvolvimento previsto
pelo Plano Lafer. O Eximbank assinou um acordo em 1953 com o Brasil, garantindo
um empréstimo de US$ 300 milhões
24
, o que causou a indignação do Banco
Mundial, que suspendeu a sua contrapartida no acordo firmado anteriormente.
Devido a este fato, grande parte dos recursos externos esperados para o
desenvolvimento dos projetos, entendidos como prioritários e trabalhados pelo
BNDE, deixa de ter a contrapartida internacional para a sua execução – apenas
cerca de 50% do montante esperado foi desembolsado, fazendo o montante
estimado de recursos ser reduzido e grande parte dos fundos ser originário da
contrapartida doméstica.
Fruto da mudança de conduta no governo Norte-americano, da postura do
Banco Mundial, mas também dos problemas cambiais brasileiros, a CMBEU foi
extinta
25
. O BNDE, então, fecha um acordo de cooperação com a CEPAL, criando
um grupo misto de estudo de políticas e ações para o desenvolvimento econômico
em 1953. Durante o período de 1953 a 1955, os trabalhos desta comissão foram
desenvolvidos e do relatório realizado se pode extrair como principais pontos: “a
meta de planejar os estágios seguintes do processo de substituição de importações,
em virtude das restrições impostas à capacidade de importar” e “a identificação
prévia dos itens mais ponderáveis da pauta de importações” (SOLA 1998, p. 169),
24
O empréstimo de US$ 300 milhões estava condicionado à regularização de atrasados comerciais
com os credores norte-americanos. O empréstimo seria feito em tranches sendo que a primeira
foi de US$ 60 milhões na primeira semana de abril. Entretanto, como “os atrasados com os
Estados Unidos continuaram a aumentar, em junho, o Eximbank suspendeu o desembolso da
segunda parcela, sugerindo uma renegociação” (VIANNA, 1953, p. 97)
25
“Ao interromper seus trabalhos, a CMBEU tinha aprovado 41 projetos, que exigiam um total de US$
387 milhões, dos quais forma financiados apenas US$ 186 milhões”(VIANNA, 1987, p.94)
51
que, juntamente com os conceitos de pontos de estrangulamento, seriam as bases
para as decisões de investimento na segunda metade da década de 1950, durante o
Governo Juscelino.
Neste mesmo momento, o Governo Vargas tem no ambiente
macroeconômico doméstico um processo inflacionário crescente (Tabela 4), e uma
pressão social para que a mesma fosse controlada. Vários grupos com diferentes
interesses pressionavam pelo controle inflacionário.
Tabela 4 Inflação anual – IGP-DI (1950 – 1954)
Ano Inflação (%a.a.)
1950 12,41
1951 12,34
1952 12,72
1953 20,51
1954 25,87
Fonte: Fundação Getúlio Vargas, Conjuntura Econômica (FGV/Conj. Econômica). Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI). IPEAData.
Durante o período de 1953, até o final do seu mandato, Vargas recrudesce a
sua política nacionalista
26
e começa a gerar desconfortos para o os interesses Norte-
americanos no país. As alterações nas políticas cambiais, e principalmente nas
regras de remessas de lucros e dividendos, passam ao Governo Norte-Americano a
sensação de desconfiança com relação ao cumprimento de acordos e garantias de
remessas e repagamentos de empréstimos. Além disto, a criação da Petrobrás vem
a ser um marco no processo nacionalista, pois se tratava de um item de defesa
nacional, redução da dependência e crescimento da função econômica do Estado
27
.
26
Segundo Vianna (1987), Vargas não tinha a aversão à entrada do capital estrangeiro, conforme é
sugerido por alguns, ao contrário. Inclusive, isto é demonstrado pela Lei 1.807/53, na qual se
determinava que o capital estrangeiro era de grande interesse para a economia nacional.
Entretanto, Vargas tinha a preocupação da manutenção do controle sobre os setores
considerados estratégicos para a segurança e soberania nacional.
27
Ainda que comumente marcado como um ponto de inflexão da política econômica do Governo
Vargas, e tido como um golpe contra os interesses internacionais, conforme Ianni (1971), a criação
da Petrobrás não afetou totalmente os interesses estrangeiros, pois a lei que criava a empresa
não previa a expropriação de bens de empresas estrangeiras, assim como não estabelecia
monopólio na comercialização dos derivados de petróleo, que continuaram a ser comercializados
por empresas estrangeiras e subsidiarias em território nacional. A Petrobrás apenas criou um
monopólio na pesquisa, refino e transporte do petróleo e seus derivados.
52
No decorrer de 1954, já com a escassez dos recursos externos e com a
necessidade de uma reavaliação de preços de projetos, uma vez que os mesmos
ainda estavam baseados em dados de 1952, e haviam sofrido os efeitos
inflacionários muito além dos inicialmente projetados, o BNDES se viu obrigado a
realinhar suas fontes de arrecadação, conforme passagem abaixo:
“Foi preciso compensar a diferença com moeda nacional (o que, por
sua vez, reduziu sensivelmente as reservas do BNDES). Para tanto, o
governo conseguiu aprovar no Congresso a prorrogação dos
mecanismos arrecadatórios do Banco e lhe agregou novos fundos.
Entre estes, estavam o Fundo Federal de Eletrificação (lei nº. 2.308, de
1954); o Fundo da Rede Ferroviária Nacional (decreto nº. 37.686, de
1955); o Fundo Nacional de Pavimentação (lei nº. 2.698, de 1955); e o
Fundo Especial Para Substituição de Ramais Ferroviários Deficitários
(também lei nº. 2.698). Em 1954, ademais, criou-se o Imposto Único
Sobre Energia Elétrica.”(BNDES, 2002)
53
3.2. O PLANO DE METAS (1956 a 1961)
A segunda metade da década de 1950 constitui o período de maior
desenvolvimento industrial promovido no país, por meio do Plano de Metas,
concebido por Juscelino Kubitschek, dentro do conceito desenvolvimentista
defendido por Roberto Campos. O BNDE, como formulador de política industrial, tem
uma função crucial na execução e financiamento deste projeto de desenvolvimento.
Durante este período, o BNDE teve como presidentes Lucas Lopes (1956 a 1958),
que posteriormente viria a ser Ministro da Fazenda, e Roberto Campos (1958 a
1959)
28
, ambos defensores do modelo desenvolvimentista, com uma forte aceitação
do capital internacional e a garantia do desenvolvimento, mantendo-se a política do
desenvolvimento e industrialização mediante a busca de formas de financiamento
não-inflacionárias.
O Plano de Metas foi, senão o melhor, um dos melhores planos concebidos
em prol da industrialização brasileira, assim como, do ponto de vista da sua
execução, seguramente foi o que melhor atingiu as metas de realização propostas,
ou o que mais se aproximou delas. O Plano de Metas tinha como objetivo corrigir
falhas da estrutura industrial brasileira, buscando priorizar o desenvolvimento
verticalizado da pirâmide industrial brasileira, dando continuidade ao processo de
substituição de importações iniciado nos períodos anteriores. (LESSA, 1981) As
linhas gerais do plano passavam pela continuidade no desenvolvimento da infra-
estrutura necessária para o desenvolvimento, ou seja, o desenvolvimento do binômio
energia-transporte e o desenvolvimento de indústrias de base, siderurgia, refino de
petróleo, cimento portland, metais não-ferrosos, álcalis, celulose e papel de
imprensa, borracha e fertilizantes. A indústria naval, mecânica e de elétrica pesada
também foram beneficiados pelo plano, e ainda os setores voltados para
alimentação e educação, principalmente por meio da intervenção estatal.
O modelo geral do plano é dividido em três grandes linhas que eram: a)
eliminação dos Pontos de Estrangulamento Interno, por meio do desenvolvimento da
28
Entre a presidência de ambos durante o mês de Agosto de 1958, Francisco Antunes Maciel esteve
no exercício deste cargo.
54
infra-estrutura necessária para o desenvolvimento econômico, pela ação
governamental sobre os setores de energia, transportes e alimentação, admitindo-se
que estes seriam condições necessárias para que o desenvolvimento pudesse
ocorrer; b) desenvolvimento dos Pontos de Germinação, que era o contraponto à
eliminação dos Pontos de Estrangulamento, um vez que tratava de promover a
criação de novos pólos de desenvolvimento, que viriam a ser beneficiados e atraídos
pela existência das novas estruturas de transporte.
29
; c) eliminação do Pontos de
Estrangulamento Externo, com o intuito de desenvolver a indústria e a produção
local, em setores de oferta deficiente, e na busca da redução da dependência
externa de produtos com grande peso na pauta de importação, dentre eles, o trigo, a
indústria mecânica e a indústria de material elétrico pesado. (LESSA, 1993)
O modelo de investimento no desenvolvimento, poderia ser entendido como
um tripé, formado por empresas multinacionais, estatais e nacionais privadas, que
deveriam formar um pilar para o desenvolvimento. O Plano de Metas cria uma nova
visão da industrialização brasileira, a aceitação do capital estrangeiro é distinta de
períodos anteriores, principalmente com relação ao investimento direto.
Anteriormente ao governo Juscelino, o interregno Café-Filho dá um grande impulso à
entrada do capital estrangeiro, que vem depois a ser continuado pelo Governo
Juscelino, mediante a implementação da Instrução Sumoc 113, que permitia a
“Cacex emitir para empresas estrangeiras licenças de importação sem cobertura
cambial para conjuntos de máquinas destinados a complementação ou
aperfeiçoamento daqueles já existentes no país.” (VIANNA, 1987, p. 124).
Plano de Metas possuía como uma de suas principais preocupações a
atração do capital estrangeiro privado, pois havia a necessidade contínua da
utilização da poupança externa para alavancar o desenvolvimento nacional. A
necessidade da estabilidade política e de políticas cambiais e monetárias sólidas
para a atração do capital estrangeiro sempre esteve no discurso do Governo
Juscelino. A necessidade da interferência do Estado como agente promotor do
desenvolvimento é continuamente notada durante o período do Plano de Metas. A
29
A criação de Brasília, como uma das metas do plano, auxilia o desenvolvimento dos Pontos de
Germinação.A mudança da capital para o interior do país, e a criação de estruturas de acesso,
seja ferroviário ou rodoviário teria como uma das virtudes geral o fluxo entre o interior do país e as
área costeiras, criando assim a possibilidade do desenvolvimento nestes vazios geográficos.
55
busca pela correção das falhas de mercado, seja na oferta de bens públicos,
principalmente infra-estrutura, seja nas formas de obtenção de recursos de longo
prazo, faz-se sentir ao longo do desenvolvimento econômico brasileiro.
Do ponto de vista das indústrias de bens de consumo durável, vale uma
menção especial à indústria automobilística. Segundo Lessa (1981), a criação da
indústria automobilística foi um dos pontos mais importantes do Plano de Metas,
tanto que o Governo criou o GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística),
que tinha como objetivo definir e criar as estruturas para o crescimento desta
indústria
30
. Ao mesmo tempo que o desenvolvimento da indústria automobilística
seguia crescendo, a ênfase no desenvolvimento do transporte ferroviário ia sendo
reduzida, ainda que inicialmente tivesse sido um dos principais focos de
investimento, demonstrando uma falta de alinhamento político entre o discurso e a
prática nas decisões de desenvolvimento.
“Nesse processo, o BNDES cumpria seu papel financiando usinas
hidrelétricas, linhas de transmissão e siderúrgicas, para produzir o aço
com que se fabricavam os eletrodomésticos e automóveis. Novas
estradas faziam circular mais facilmente pessoas, produtos e idéias. Os
números resultantes dos investimentos governamentais feitos no
período JK (inclusive por meio do Banco) tinham sido expressivos. De
6,5 milhões de toneladas de petróleo refinadas em 1957, fomos para
16,5 milhões em 1960-1. De 90 mil toneladas anuais de celulose
56
setor de bens de consumo duráveis. Para que isto ocorresse, havia a necessidade
de se restabelecer a confiança nos organismos de fomento internacional e em
investidores estrangeiros. Em 1956, o Governo brasileiro envia uma missão aos
Estados Unidos, sob a chefia de Lucas Lopes, para apresentar aos diretores do
Export-Import Bank Norte-americano que o governo brasileiro estava comprometido
com um programa de desenvolvimento econômico, e que buscaria as medidas para
“garantir as condições econômicas, financeiras, cambiais, e políticas da confiança
dos empresários, financistas e governos interessados na economia brasileira”
(IANNI, 1971, p. 167).
O papel do BNDE neste contexto de necessidade de oferecer segurança ao
investidor externo é o de assegurar o acesso ao crédito externo por parte de
empresários, como garantidor solidário das operações de empréstimos tomadas no
exterior. Ele se torna responsável pela liquidação da dívida junto à instituição de
crédito externa, no caso do não pagamento por parte do devedor principal; com isto,
o BNDE se investia de poder para orientar o investimento privado. (LESSA, 1981).
Ao mesmo tempo, passava a absorver o risco da ineficiência do empresário no caso
da inadimplência, transferindo assim, para o setor público, parte dos riscos do setor
privado, seja do ponto de vista de performance, seja do ponto de vista de risco
cambial.
Segundo Lessa (1981), durante este período, o BNDE, teve em suas mãos
dois dos instrumentos mais importantes para o desenvolvimento industrial e para o
sucesso do Plano de Metas: a) o poder de conceder financiamento de longo prazo
com baixas taxas de juros, que em um ambiente inflacionário e na ausência de
mercado de capitais era peça fundamental para o processo de industrialização; e b)
a habilidade de conceder avais e decidir sobre a utilização dos financiamentos
externos. Deste ponto de vista, o BNDE é considerado por Lessa (1981) a peça
básica da filosofia do Plano de Metas.
57
3.3. Governos Jânio Quadros e João Goulart (1961-1964)
O Plano de Metas chega ao fim com o final do Governo Juscelino Kubitschek
e em 1961 toma posse um novo presidente, Jânio Quadros. Visto o crescimento do
Brasil, até o começo da década de 60, havia um clima de otimismo e a percepção
de que o país havia passado por uma nova revolução industrial, e que já estava
deixando de ser o país do futuro para se transformar neste país. Para muitos, o ciclo
de crescimento industrial entre 1930 e 1961 completou um importante ciclo industrial
brasileiro. O Brasil possui neste momento todo um parque industrial instalado, desde
bens de consumo leves a bens de consumo duráveis; a indústria de base também
havia sido instalada, ainda que muito precisasse ser feito.
Entretanto, os efeitos colaterais do modelo de desenvolvimento adotado na
década de 1950, seja no Governo Vargas, e ainda mais caracterizado no Governo
Juscelino, passam a ser sentidos de forma mais marcante – dentre estes, a inflação
segue como um dos maiores problemas para o desenvolvimento. As prioridades
estabelecidas pelo Governo Jânio Quadros
31
são a estabilidade econômica, realismo
na política cambial, como resposta à aceleração inflacionária e às pressões na
balança de pagamentos. A causa da instabilidade econômica foi atribuída às
políticas expansionistas e à potencial corrupção existentes nos governos anteriores.
A inflação vinha em níveis superiores a 30% ao ano (Tabela 5), muito acima
da média anual de 1950 a 1958. Dito isto, a política econômica deslocou o seu
núcleo de preocupações da prioridade no desenvolvimento industrial para a
atenuação do processo inflacionário. (LESSA, 1981).
Uma das principais medidas do Governo Jânio foi a reforma cambial de março
de 1961, cujas principais mudanças foram a eliminação do sistema de taxas
múltiplas de câmbio, a atualização da paridade entre o cruzeiro e o dólar, que se
mantinha no mesmo patamar desde 1945, tratamento privilegiado à importação de
31
“Ele [Jânio Quadros] se caracterizou pela dissonância entre o conteúdo do discurso econômico,
severamente antipopulista, e o estilo do novo presidente, que pode ser qualificado de
neopopulista, porque marcado por um intensidade que se pretendia mobilizadora de “novas
energias” populares” (SOLA, 1998, p. 237)
58
bens não produzidos no Brasil, vitais para o processo industrial, e a criação de
depósitos prévios para produtos não listados como prioritários, por meio da compra
de letras do tesouro de maturidade de 150 dias, a taxas de juros de 6% ao ano
32
.
Medidas, estas, que tiveram um caráter positivo sobre o caixa do tesouro e sobre a
balança de pagamentos.
Tabela 5 Inflação anual – IGP-DI (1960 – 1964)
Ano Inflação (%a.a.)
1960 30,46
1961 47,79
1962 51,60
1963 79,91
1964 92,12
Fonte: Fundação Getúlio Vargas, Conjuntura Econômica (FGV/Conj. Econômica). Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI). IPEAData.
Em Agosto de 1962, menos de oito meses completos de sua posse, Jânio
Quadros renuncia. A queda de sua popularidade aliada à ineficiência das políticas
antiinflacionárias fizeram o Governo mudar os rumos de suas políticas em um curto
espaço de tempo, abandonando a preocupação antiinflacionária e novamente
focando no desenvolvimento. Para tanto, segundo Ianni (1975), Jânio Quadros
preparou o seu infrutífero auto Golpe de Estado. Em setembro de 1962, é publicada
a Lei nº. 4.131. Esta lei disciplina a aplicação do capital estrangeiro e as remessas
de valores para o exterior, ao mesmo tempo determina a aplicação dos recursos
captados por entidades de crédito público da união e dos estados. Com esta lei, fica
proibido o financiamento ao setor privado, cuja maior participação acionária estava
sob o controle do capital estrangeiro
33
, pelo BNDES.
32
Cabe a menção de que em um universo inflacionário superior a 30% ao ano, o investimento
forçado em títulos com remuneração equivalente a 6% ao ano leva a uma perda da ordem de pelo
menos 10%, no intervalo de 150 dias. Isto sem contar o efeito do imposto sobre a renda sobre o
lucro auferido nos juros de 6% ao ano.
33
Para que seja possível entender como esta afeta a forma de atuação BNDES vale a transcrição de
três artigos da referida lei:
”Art. 37. O Tesouro Nacional e as entidades oficiais de crédito público da União e dos Estados,
inclusive sociedades de economia mista por eles controladas, só poderão garantir empréstimos,
créditos ou financiamentos obtidos no exterior, por empresas cuja maioria de capital com direito a
voto pertença a pessoas não residentes no País, mediante autorização em decreto do Poder
Executivo.
Art. 38. As empresas com maioria de capital estrangeiro, ou filiais de empresas sediadas no
exterior, não terão acesso ao crédito das entidades e estabelecimentos mencionados no artigo
anterior até o início comprovado de suas operações, excetuados projetos considerados de alto
interesse para a economia nacional, mediante autorização especial do Conselho de Ministros.
59
Passado o momento negativo após a renúncia de Jânio e o governo
provisório que foi instaurado, assume o vice-presidente João Goulart. Dentre as
iniciativas deste período de instabilidade econômica e política, vale ressaltar a
tentativa de estabilização econômica proposta pelo Plano Trienal de
Desenvolvimento Econômico, idealizado por Celso Furtado, cuja idéia básica
consistia na gradual estabilização econômica no triênio (1963/1965), preservando-se
as taxas de crescimento.
Furtado é alçado a ministro do planejamento e, em um período de três meses,
desenvolve o Plano Trienal. Entretanto, o momento histórico se mostra ingrato para
o mais importante articulador do pensamento nacional-desenvolvimentista. Seria a
primeira vez que um típico nacional-desenvolvimentista assumia uma posição de
executor no governo, entretanto o momento econômico não permitia a continuidade
pura do desejo de Furtado
34
, obrigando-o a desenvolver um plano que tinha um
caráter muito mais de estabilização econômica que de desenvolvimento econômico
na linha estruturalista.
O Plano Trienal entendia que as razões para o desequilíbrio financeiro
estavam nos setores externos e públicos, de forma que a sua execução estava
baseada em medidas que elevavam a carga fiscal e reduziam o dispêndio público,
assim como entendia que deveriam ser buscados recursos por meio do mercado de
capitais para investimento. O modelo de investimento governamental deveria ser
Art. 39. As entidades, estabelecimentos de crédito, a que se refere o artigo 37, só poderão
conceder empréstimos, créditos ou financiamentos para novas inversões a serem realizadas no
ativo fixo de empresa cuja maioria de capital, com direito a voto, pertença a pessoas não
residentes no País, quando elas estiverem aplicadas em setores de atividades e regiões
econômicas de alto interesse nacional, definidos e enumerados em decreto do Poder Executivo,
mediante audiência do Conselho Nacional de Economia.
Parágrafo único - Também a aplicação de recursos provenientes de fundos públicos de
investimentos, criados por lei, obedecerá à regra estabelecida neste artigo.” (Brasil, 1962)
Visto isto, o BNDES, enquanto entidade de crédito pertencente a União, tinha a sua atuação
limitada a empréstimo, seja em moeda nacional como em moeda estrangeira, somente a
empresas estrangeiras que fossem consideradas estratégicas e somente via decreto do Poder
Executivo. Isto garantia que os recursos alocados para o BNDES garantissem o desenvolvimento
da indústria nacional, cujo capital pertencesse ao capital privado nacional ou público.
34
Celso Furtado era “um keynesiano atípico. Dado o seu entendimento das características das
economias subdesenvolvidas – insuficiência de poupança, ao invés de excesso, como nas
desenvolvidas –, não cabia, em geral aplicar a macroeconomia keynesiana de forma idêntica ao
que se fazia em economias maduras, nas quais predominava a problemática anti-cíclica.”
(BIELSCHOWSKY, 2000, p. 135).
60
concentrado ainda na infra-estrutura, principalmente em energia-transporte,
enquanto o setor privado continuaria a investir nos insumos básicos e bens de
capital. Entretanto, a equação de redução de gastos governamentais não fechava,
pois o Estado era principal, senão o único, comprador das indústrias de bens de
capital (LESSA, 1981). Logo, qualquer redução de gasto governamental causava um
problema em série na economia. A execução do Plano se tornou impraticável, pois
conciliar o crescimento e a redução do déficit se mostrou impossível, visto que
reformas necessárias não foram obtidas no Congresso nacional, devido à enorme
fragmentação política e à falta de base do governo (Tabela 6)
Tabela 6 Crescimento PIB (%a.a.) - (1960 – 1964)
Ano
PIB - Var. Real
1960 9,40%
1961 8,60%
1962 6,60%
1963 0,60%
1964 3,40%
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de Contas Nacionais (IBGE/SCN Anual)
O Plano Trienal merece um destaque devido à reestruturação do Fundo
Federal de Eletrificação e à constituição de um fundo de investimento em ferrovias,
em 1962, ao mesmo tempo que o BNDE havia deixado de ser o gestor da Rede
Ferroviária Federal SA (RFFSA) e das Centrais Elétricas Brasileiras SA (Eletrobrás)
que foram transformadas em empresas públicas em 1957 e 1962, respectivamente.
O período do Governo João Goulart culmina com a crise econômica e o golpe
militar de 1964. A crise se instalou em 1963 e, na literatura econômica, duas
explicações são encontradas para a crise. Alguns autores a associam
exclusivamente a efeitos conjunturais de política monetária e cambial; outros,
principalmente de origem cepalina, atribuem a crise a um uma tendência inexorável
do processo de industrialização, e diziam que se tratava de um processo de
recessão dos ciclos de investimentos realizados pelo Plano de Metas, gerando uma
situação de super-acumulação de capacidade ociosa, diante de um mercado ainda
pequeno para a demanda existente.(BIELSCHOWSKY, 2000).
61
No tocante à inflação, observa-se uma alteração na sua característica: esta
deixa de ser uma inflação de demanda e passa a ser uma inflação de custos, fruto
da existência de uma capacidade ociosa, devido ao crescimento das indústrias sem
o mesmo crescimento dos mercados consumidores, principalmente nos setores de
bens de consumo.
No ano de 1963, o Governo realizou uma mudança no imposto de renda,
criando o Fundo Nacional de Investimentos, que tinha o fim específico para
subscrição de capital das empresas controladas pelo Governo Federal, diretamente
ou por meio de suas agências. Tratava-se de um adicional de 10% ao imposto sobre
a renda, que vigoraria entre 1963 e 1965, e seria gerido pelo BNDE, com objetivo de
prover o Estado de maior capacidade de absorção de poupança interna, para suprir
as suas necessidades de investimento. Durante a primeira metade da década de
1960, o BNDE ficou à margem de uma série de medidas econômicas e políticas
conflitantes, destinadas ao combate da inflação e à estabilização econômica. A partir
do Governo Militar, uma nova perspectiva e diretriz se abriu para o BNDE.
Tabela 7 Aplicações do Sistema BNDES (1962-1965)
Ano
alor US$ (1)
V
alor R$ de Dez/01 (2)
1962 112.981.234 1.325.817.040
1963 87.347.091 871.391.499
1964 59.325.982 692.556.865
1965 113.723.281 1.242.001.168
Fonte: BNDES 50 anos, 2002.
(1) 1953-80 – valores calculados a partir da cotação média anual do dólar
(2) valores calculados a partir do valor em IGP -DI segundo a cotação do IGP-DI de dez/2001
Tanto durante o período Jânio Quadros (1961), como no período João Goulart
(1961-1964), o BNDE segue com a sua função de desenvolvimento. Entretanto,
devido às restrições econômicas e à inflação existente, este é um período de cautela
e de manutenção estrutural do banco, sem o crescimento visto nos anos anteriores,
isto fica marcado pela redução do volume de desembolsos ocorridos durante o
período entre 1962 e 1965 (Vide Tabela 7).
62
3.4. O Plano de Ação Econômica do Governo (1964-1967)
Além da crise econômica, fatores de ordem política e pressões internacionais
para o alinhamento da política brasileira aos interesses Norte-americanos, levam ao
golpe militar de 1964. Entre os anos 30 e 70, esta seria a segunda
35
vez que o
governo teria um controle direto sobre todas as variáveis, e seu poder de execução
de política não dependeria de apoios ou aprovações políticas.
Em 1964, o Governo Castelo Branco institui o PAEG – Plano de Ação
Econômica do Governo –, que tinha como principais diretrizes; 1) a retomada do
desenvolvimento, interrompido durante os Governos Jânio e Goulart; 2) a contenção
progressiva do processo inflacionário; 3) a redução de desequilíbrios econômicos
setoriais e tensões sociais mediante a melhoria das condições de vida; 4) aumento
da oportunidade de emprego mediante uma política de investimento; 5) redução de
déficits descontrolados no balanço de pagamentos, que ameaçava o processo do
desenvolvimento econômico.
O período de implementação do PAEG foi caracterizado por um grande
esforço de melhoria das condições de planejamento. Segundo Simonsen e Campos
(1979), a importância do PAEG reside muito mais no esforço feito na reforma
institucional e modernização da estrutura governamental, inclusive com a criação do
Ministério do Planejamento, ocupado inicialmente por Roberto Campos, do que na
implementação de metas específicas de redução da inflação e aceleração do
crescimento. Algumas reformas de ordem econômica foram realizadas para
minimizar a crise, durante o período de 1964 a 1966, que viriam permitir a retomada
do crescimento visto a partir de 1967, por Roberto Campos, então Ministro do
Planejamento e ex-presidente do BNDE, e Octavio Gouveia de Bulhões, Ministro da
Fazenda.
A forma de desenvolvimento a ser adotada no país tinha a meta de reduzir a
inflação de forma gradual, mas aceitando que o processo inflacionário era inerente a
este processo. Formas de como conviver com a inflação deveriam ser criadas, como
35
A primeira vez foi no Estado Novo (1937-1945), durante o primeiro Governo Vargas.
63
foi visto com a criação dos instrumentos de correção monetária, assim como a busca
de melhoras no déficit governamental, um melhor direcionamento nas políticas de
investimento público e a realização da reforma bancária, da reforma no mercado de
capitais, da reforma tributária.
No campo da economia internacional, deveriam ser realizadas reformas nas
políticas cambiais e de comércio exterior, no processo de ajuste da dívida externa e
melhoria das condições financeiras do país no exterior, como forma de melhorar a
balança de pagamentos e a obtenção de créditos principalmente de agências
internacionais para o desenvolvimento. Na parte de produtividade social, pregava-se
a busca pela participação dos trabalhadores nos benefícios do desenvolvimento
econômico, aliado ao combate da inflação. Assim como políticas agrária,
habitacional e educacional. (REZENDE, 1990)
Em 31 de dezembro de 1964, é promulgada a Lei 4.595, que realiza a reforma
financeira, regulamentando o Conselho Monetário Nacional com a função de
administrar o Sistema Financeiro Nacional e o Banco Central como órgão de
controle da política monetária. No ano seguinte, em 1965, a Lei 4.728 de 14 de julho
regulamenta o mercado de capitais brasileiro e estabelece os bancos de
investimento e outras instituições do mercado financeiro, definindo suas atividades
específicas e suas regras de atuação
36
. A promulgação destas duas leis trouxe
novas regras para a operação bancária nacional, exigindo do BNDE uma mudança
interna e a criação de fundos de acordo com a sua aplicabilidade. Outro foco
importante foi a descentralização de suas atividades, por meio da decisão de criar
escritórios de representação em diversas áreas do país, sendo um dos primeiros
criados o de Recife, com o objetivo de atender o Nordeste.
O mecanismo da indexação foi criado por meio da Lei 4 357, de 1964, quando
se criou um novo título governamental, a ORTN (Obrigação Reajustável do Tesouro
Nacional), atualizada mensalmente segundo a média móvel do índice de preços por
36
A reforma financeira definiu uma série de novas instituições dentro do sistema financeiro nacional:
a) as Financeiras, para o financiamento do consumo de bens duráveis; b) os Bancos Comerciais,
para o fornecimento do capital de giro das empresas; c) os Bancos de investimento, para o
fornecimento de recursos a longo prazo; d)o Mercado de Ações, criando fundos de investimento
com deduções do imposto de renda; e) o Banco Nacional de Habitação (BNH), com o fim de
operar como agente financeiro, com recursos dos trabalhadores (KON, 1999)
64
atacado, e inicialmente passou a ser aplicada a ativos fixos, ou seja, permitia-se a
correção do valor dos ativos nos balanços patrimoniais e nos impostos atrasados do
Governo. Posteriormente, a ORTN passou a ser incorporada nos mais variados
instrumentos de economia brasileira; a correção monetária nasce da necessidade de
criar mecanismos que tornassem os reajustes de preços automáticos uma
deficiência que sempre foi premente devido à dificuldade do governo de atualizar
suas tarifas, principalmente por razões políticas e de aprovação pública.
37
No caso do BNDE como emprestador de fundos de longo prazo, em um
ambiente inflacionário, grande parte de seus empréstimos se tornava potencialmente
deficitário, uma vez que, em muitos casos, a inflação era muito superior ao juro
nominal apresentado, tornando a operação com juros reais negativos. Ao mesmo
tempo, havia a necessidade de se adequar a existência da “Lei da Usura”, que
limitava o patamar de juros permitidos.
“O BNDES, um dos principais atores da estrutura econômica
governamental, passou por mudanças significativas ante a nova
estratégia adotada. Em 1964, transferiu-se do controle do Ministério da
Fazenda para o do Planejamento, conservando o status de autarquia.”
(BNDES, 2002).
A mudança de pasta, da fazenda para o planejamento, vai em linha com a
característica dominante do BNDE de formulador de políticas de desenvolvimento.
Entretanto, continuava sendo uma autarquia, com suas dotações orçamentárias
subordinadas às determinações anuais do Congresso Nacional e às suas
inclinações políticas. Em 1964, o BNDE cria dois fundos com destinação específica:
o FUNTEC (Fundo de Desenvolvimento Técnico e Científico), cujo foco está no
desenvolvimento tecnológico das empresas nacionais, e o FINAME (Fundo de
Financiamento para Aquisição de Máquinas e Equipamentos Industriais), que
posteriormente seria transformado em uma autarquia, com o nome de Agência
37
Segundo Peláez e Suzigan (1981), a correção monetária surge como causa de duas circunstâncias
históricas, uma como forma de reajuste das tarifas públicas, serviços de infra-estruturas e salários,
que ao longo dos anos não haviam conseguido repor a inflação. E outra como forma de
ultrapassar a barreira imposta pela “Lei da Usura” que limitava os juros a 12%, e, em um ambiente
de inflação anual média superior a 30%, algum mecanismo deveria existir para resolver este
problema.
65
Especial de Financiamento Industrial, mantendo a sigla, mas mudando-se o gênero,
passando a chamar-se “a Finame”. O propósito da Finame era o aumento da
competitividade da maquinaria e do equipamento nacional, por meio do apoio à
nacionalização dos componentes das máquinas e equipamento: para incentivar a
verticalização industrial, quanto maior a participação de componentes nacionais,
melhores as condições de financiamento obtidos para a compra das maquinaria
nacional.
“O Fundo era alimentado por empréstimos ou doações de entidades
internacionais, nacionais e estrangeiras, recursos colocados à
disposição do Banco do Brasil e outras agências financeiras da União
ou dos estados, captados pelo BNDES no mercado interno e externo
de capitais ou oriundos dos rendimentos das próprias operações do
Finame. Constituiu-se uma rede de agentes para financiar a compra e
venda de máquinas e equipamentos, rede esta que hoje se compõe de
160 bancos, com milhares de agências instaladas por todas as regiões
do país.” (BNDES, 2002).
Assim, o BNDE se torna um ícone no sistema financeiro nacional, se tornando
a primeira instituição financeira a oferecer em larga escala e volume empréstimos de
longo prazo, para a aquisição de máquinas e equipamentos nacionais, com taxas
extremamente atrativas. E, ao mesmo tempo, oferecia condições para importação de
bens não fabricados no Brasil destinados à produção industrial. No ano de 1964, o
Governo Castelo Branco promulgou o Estatuto da Terra, e em 1965 foi criado o
Fundo Agroindustrial de Reconversão (Funar), cuja administração foi dada ao BNDE,
com o intuito de financiar os projetos de desenvolvimento agropecuário e
agroindustrial.
O regime austero de combate à inflação e à restrição ao crédito visto no
PAEG gerou uma enorme crise junto às pequenas e médias empresas, isto é,
marcado pelo número de falências e concordatas observadas no Estado de São
Paulo nos períodos de 1963 e 1969. Foram 86 concordatas deferidas em 1963
contra 524 em 1964, e o número de falências de 106 para 896. (IANNI 1971).
66
Devido à necessidade e o foco na manutenção e apoio à pequena e média
indústria, em 1965, é criado o Programa de Financiamento às Pequenas e Médias
Empresas (Fipeme), “utilizando recursos não só dos agentes financeiros do próprio
Fipeme, mas também do BNDES, do BID e do banco alemão Kreditanstalt für
Wiederaufbau (KFW);” (BNDES, 2002). Em 1966, foi criado o FUNDEPRO (Fundo
de Desenvolvimento da Produtividade), com foco no incentivo à indústria,
agropecuária, mineração, comercialização e serviços básicos, vindo a ser substituído
em 1970 pelo Fundo de Modernização e Reorganização Industrial (FMRI). Ao
mesmo tempo, uma das metas dos Governos Militares, que era a redução das
desigualdades regionais e setoriais, foi beneficiada pela criação de 3 programas:
Programa Especial de Apoio Financeiro à Indústria Básica do Nordeste (PIB-NE); o
Programa de Modernização e Reorganização da Comercialização (PMRC) e o
Programa Especial Bancos de Desenvolvimentos (PEB).
O PAEG foi um plano estabelecido para o período de transição econômica,
sendo que ao final do Governo Castelo Branco foi desenvolvido o Plano Decenal,
que formulava estratégias e metas de desenvolvimento para o período de 1967-
1976, definindo orçamentos qüinqüenais, com revisões a serem realizadas
anualmente. O Plano se destacava pela maior atenção aos setores sociais,
principalmente educação, por uma maior atenção na agricultura, além da
preocupação com o aumento da produtividade agrícola e com o planejamento
macroeconômico, buscando conciliar em um largo espectro políticas setoriais, com
políticas monetárias, fiscais e cambiais. (SIMONSEN; CAMPOS, 1979).
67
3.5. O Milagre Econômico Brasileiro (1967 - 1974)
Em 1967, Costa e Silva sucede Castelo Branco na presidência, nomeando
como Ministros do Planejamento Hélio Beltrão e como Ministro da Fazenda Antônio
Delfin Neto. Com o falecimento de Costa e Silva em 1969, assume a presidência o
General Médici, após um breve período de junta militar de transição, mantendo no
Ministério da Fazenda Delfin Neto, e nomeando João Paulo dos Reis Velloso como
Ministro do Planejamento. (LAGO, 1990)
Do ponto de vista da política econômica, o período iniciado em 1967, que
segue até o período de 1973, é conhecido com o período do “Milagre Brasileiro,”
marcado principalmente pela presença de Delfin Neto no Ministério da Fazenda
durante todo este período, e tido como o principal articulador do "Milagre". O
crescimento econômico foi superior a 10% ao ano, enquanto a média do período
posterior à guerra e anterior a 1960 foi de aproximadamente 7% (LAGO, 1990)
(Tabela 8). A partir de 1967, o Brasil entra em um novo ciclo de expansão, a crise
econômica reinante durante o período imediatamente anterior fora debelada por
meio de medidas econômicas austeras, baseadas em reformas necessárias, mas
também no arrocho salarial e na restrição da demanda agregada.
O Governo Costa e Silva foi o primeiro a diagnosticar oficialmente a existência
de uma inflação de custos
38
, que teria como uma das soluções um estímulo à
procura. O combate à inflação, mediante políticas contracionistas, deixaria de ser a
tônica do modelo econômico. O Brasil possuía uma capacidade instalada
39
, que
gerava a inflação; uma das únicas formas de combater esta inflação seria um
aumento do consumo, seja o consumo interno, que requeria um crescimento e uma
melhor distribuição da renda, seja o aumento das exportações. Já no ano de 1968, a
38
A inflação de custos é gerada pela pressão das indústrias em que haja a absorção da sua
produção. Como o mercado não tem a capacidade de absorver todo o produto gerado, a solução
das indústrias é exercer a pressão por algumas formas, que são: o aumento de preços, a pressão
sobre o governo para que o mesmo compre seus produtos, e a pressão sobre os governos e
bancos para que haja uma aumento no crédito.
39
Segundo Serra (1982), o período de semi-estagnação visto durante o período de 1961-1966 criou
uma capacidade ociosa que permitiria a sua utilização no período seguinte, sem grandes
necessidades de investimento. O estoque de capital aumentou 46% entre 1961 e 1966, enquanto
o produto cresceu somente 14% entre 1962 e 1967; em contrapartida entre 1967 e 1972, o
produto cresceu mais que 75%, enquanto o estoque de capital 45% entre 1966 e 1971.
68
economia cresceu 9,8% graças ao crescimento industrial, fruto da utilização de uma
capacidade ociosa existente.
O Plano Decenal foi então substituído pelo Plano Estratégico de
Desenvolvimento, o PED. Três fatores foram os que levaram ao abandono do Plano
Decenal e à adoção do PED. O primeiro fator foi de ordem política, a necessidade de
o novo governo criar uma imagem própria, com diferente enfoque e prioridades. O
segundo fator foi a preocupação em criar a estrutura executiva para a realização dos
projetos; o novo governo admitia que a estrutura de planejamento havia evoluído,
mas a estrutura executiva governamental não havia acompanhado o processo de
evolução, e esta se fazia necessária. E o terceiro, já anteriormente mencionado, é o
diagnóstico de inflação como sendo uma inflação de custos e não mais uma inflação
de demanda, causado principalmente pelas medidas de caráter não inflacionário do
período anterior. (SIMONSEN; CAMPOS, 1979).
“Em 1968, pela primeira vez, o Banco aprovou mais créditos para o
setor privado que para o setor público: NCr$ 536 419 cruzeiros novos,
contra NCr$ 453 970. No ano anterior, os investimentos no setor
privado tinham sido de apenas NCr$ 259 425, contra NCr$ 493 262 no
setor público.” (BNDES, 2002)
Isso demonstrou um direcionamento das políticas BNDE, condizente com a
sua idéia original de apoiar o crescimento industrial, e não fazendo do Estado o
único articulador econômico e agente da industrialização, mas supridor de recursos
e infra-estrutura para o desenvolvimento industrial privado (Tabela 9). Parte disto
devido à saída das empresas estatais que tinham seus recursos e investimentos
administrados pelo BNDE, e pela caracterização da real necessidade do
desenvolvimento da indústria privada nacional.
A década de 70 conhece o maior período de permanência de um presidente
do BNDES no cargo, Marcos Pereira Vianna, entre 1969 a 1979, durante o mesmo
período que o Ministro do Planejamento, Reis Velloso, permaneceu no cargo
40
. Em
40
Reis Velloso também é o Ministro do Planejamento que mais tempo exerceu a função na história
brasileira.
69
setembro de 1970, o Governo lança um novo plano de desenvolvimento, o I PND -
Plano Nacional de Desenvolvimento. Chega-se ao fim do primeiro período de
substituição das importações: é o momento do país se voltar para o mercado
externo.
Tabela 8 Variação Real Anual do PIB, Importação e Exportação de Bens e
Serviços como percentual do PIB (1947 a 2001)
Período
PIB - var. real anual
(1)
Importações - bens
e serviços (2)
Exportações - bens
e serviços (2)
(% a.a.) (% PIB) (% PIB)
1947 - 13,38 12,65
1948 9,70 10,13 11,10
1949 7,70 8,77 8,89
1950 6,80 7,60 9,20
1951 4,90 11,26 9,60
1952 7,30 9,87 7,07
1953 4,70 5,60 6,60
1954 7,80 6,82 6,67
1955 8,80 6,84 7,62
1956 2,90 5,81 6,76
1957 7,70 6,15 5,57
1958 10,80 6,09 5,72
1959 9,80 6,58 5,95
1960 9,40 6,40 5,32
1961 8,60 6,19 5,79
1962 6,60 8,02 6,66
1963 0,60 9,02 8,64
1964 3,40 5,62 6,52
1965 2,40 5,40 7,61
1966 6,70 5,77 6,49
1967 4,20 5,78 5,72
1968 9,80 6,72 5,96
1969 9,50 6,72 6,71
1970 10,40 7,45
7,03
1971 11,34 8,19 6,46
1972 11,94 8,86 7,27
1973 13,97 9,01 7,84
(1) Fonte: Para 1948-1990: Sistema de Contas Nacionais Consolidadas. Obs.: Valor corrigido, para 1980, de
10,2% para 9, 2%.
(2)Fonte: Para 1947-1989: Sistema de Contas Nacionais Consolidadas.
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de Contas Nacionais (IBGE/SCN
Anual).IPEAData
70
Tabela 9 Participação das operações aprovadas pelo sistema BNDES por
setor (Em %).
Ano Setor Público Setor Privado
1952 100,0 -
1953 89,0 11,0
1954 90,4 9,6
1955 77,1 22,9
1956 95,3 4,7
1957 78,8 21,2
1958 86,6 13,4
1959 70,0 30,0
1960 91,8 8,2
1961 90,5 9,5
1962 95,6 4,4
1963 91,0 9,0
1964 94,2 5,8
1965 67,4 32,6
1966 58,1 41,9
1967 65,5 34,5
1968 45,8 54,2
Fonte: BNDES.
“O I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), sob a
responsabilidade do ministro do Planejamento, João Paulo dos Reis
Velloso, estabeleceu as diretrizes para o período 1972-4. Previa-se um
crescimento do PIB em torno de 8% a 9% ao ano, uma inflação anual
abaixo dos 20% e um aumento das reservas cambiais em pelo menos
US$ 100 milhões.” (BNDES, 2002)
Segundo Gremaud e Pires (1999), o I PND tinha como objetivos: a)
modernizar o núcleo mais desenvolvido da sociedade, por meio do desenvolvimento
da empresa nacional, de modo a fortalecer o poder de competição interno e permitir
a expansão para o exterior; b) aproveitar ao máximo os recursos humanos
existentes, mediante a formação do homem brasileiro, seja através da melhoria e
universalização do estudo fundamental, seja através da qualificação e formação
técnica e universitária. c) promover o desenvolvimento e o progresso em áreas
novas e vazias, tirando proveito das dimensões continentais do país, assim como do
ingresso do país na era nuclear e na II Revolução Industrial, em áreas selecionadas,
como a espacial.
71
O BNDE foi peça fundamental para o desenvolvimento do I PND, por meio de
políticas e programas criados com o intuito de alinhar as ações do banco e o
desenvolvimento econômico, planejado para o país. Em 1971, por meio da lei nº.
5.662, de 21 de junho, o BNDE deixa de ser uma autarquia e é transformado em
uma empresa pública, criando assim uma estrutura legal e funcional, alinhada com
suas responsabilidades dentro do processo de desenvolvimento econômico. Isso
facilitou o processo de contratação de técnicos, uma vez que já não havia a
obrigatoriedade de concursos públicos para todos os cargos, obtendo uma maior
liberdade com relação ao seu orçamento e captação de recursos e descentralizando
as tomadas de decisão, devido a uma menor influência política.
41
. Em 1973, a
Siderurgia Brasileira SA (Siderbrás) passa a ser uma empresa pública separada do
BNDE, como acontecerá com RFFSA e a Eletrobrás.
O desenvolvimento econômico esperado pelo Governo Militar, assim como no
Governo de Juscelino Kubitschek, estava baseado em um tripé, formado pela
indústria estatal, pelas empresas estrangeiras e pelas empresas nacionais.
Entretanto, este tripé apresentava um lado mais fraco e de maior risco que era a
empresa nacional, principalmente pela sua debilidade em obter recursos e
financiamento de longo prazo para cumprir com a sua parte no modelo proposto de
desenvolvimento. Para tanto, o Governo entendia que era necessário “criar um
sistema financeiro de apoio à reorganização e modernização dos setores industriais,
assim como dar a elas proteção e os incentivos necessários.” (GREMAUD; PIRES,
1999).
Ao CDI (Conselho de Desenvolvimento Industrial) coube a definição de
algumas formas de se incentivar a produção nacional de bens de capital, por meio
da garantia de depreciação acelerada para os ativos da indústria e créditos de IPI
42
.
41
“Nesse período, deu-se início ao que viria a ser o Sistema BNDES. Este seria formado por
subsidiárias, entre elas a Finame e Centro Brasileiro de Assistência Gerencial à Pequena e Média
Empresa (Cebrae), criado em 1967. Anos depois o Cebrae desvincula-se do Sistema BNDES e
muda sua designação para Sebrae.” (BNDES 2002)
42
Segundo Gremaud e Pires (1999), os mecanismos de estímulo à produção criados pelo CDI
parecem não ter surtido efeito na proporção desejada, uma vez que a importação de bens de
capital cresceu de forma extremamente rápida durante a fase final do Milagre. Em contraponto a
isto, Tavares e Belluzzo (1982) consideram a afirmação de que houve um desvio da demanda
para o exterior, uma vez que o crescimento da indústria de bens de capital cresceu em média 39%
ao ano no período de 1971 a 1973, sendo que o que realmente ocorreu foi um ingresso maior de
bens de capital importado para suprir a demanda interna.
72
O outro mecanismo de incentivo à produção nacional estava na existência da
FINAME, parte do sistema BNDES, que tinha como objetivo o aumento da
quantidade de componentes industriais fabricados no Brasil e o conseqüente
aumento da produção de bens de capital no Brasil, garantindo melhores condições
de financiamento a compra destes, quanto maior fosse o seu índice de
nacionalização.
No processo de integração regional, o BNDE foi responsável pelo
desenvolvimento de algumas regiões do país, como no caso da Bahia, onde se
instalaram a Companhia Petroquímica do Nordeste (Copene) e o Pólo Petroquímico
de Camaçari, onde aproximadamente 60% dos investimentos foram originários do
BNDE. Este, por sua vez, avalizou empréstimos externos a empresas nacionais, de
forma a garantir o cumprimento da legislação vigente, que exigia que os três
capitais, o privado nacional, o privado estrangeiro e o estatal possuíssem um terço
cada de participação em grandes projetos. (BNDES, 2002) As empresas já
instaladas no período da substituição de importações tinham o foco produtivo ligado
ao mercado interno. A busca pela exportação se daria por meio da atração do capital
estrangeiro voltado para o investimento direto através da instalação das empresas,
utilizando o Brasil como fonte para as suas exportações, tirando vantagem da infra-
estrutura industrial já instalada e da abundante mão-de-obra. A contrapartida das
multinacionais estava na sua enorme capacidade de se auto-financiar externamente,
desonerando o Estado desta responsabilidade, e o seu acesso aos mercados
externos
43
.
43
Segundo Bacha (1978), três medidas foram de vital importância para a estratégia de abertura ao
exterior: a) os programas especiais de exportação (Decreto-lei n 1219); b) o transplante de
fábricas (Decreto-lei n 1235) e c) as trading companies. Estas três medidas atingem três questões
básicas: 1) o significado da abertura ao comercio exterior para o atual modelo de
desenvolvimento; 2) o papel do capital estrangeiro nessa nova estratégia; 3) o impacto que a
expansão do comércio externo poderá ter sobre o mercado interno de consumo, que se constitui
na meta mais fundamental do da política de desenvolvimento. Políticas de incentivo à exportação
criam condições para a elevação das taxas de investimento ao assegurar altas taxas de lucro. O
contraponto da vinda de empresas focadas no mercado externo é que invariavelmente parte de
sua produção também se destinará ao mercado doméstico, criando assim uma concorrência
indesejável a empresas atraídas pelo modelo de substituição de importações, com foco no
mercado interno. Desta forma, as trading companies se tornam peça fundamental no processo,
uma vez que abrem a possibilidade a o acesso ao mercado externo a empresas já instaladas sem
o conhecimento deste mercado, como por exemplo para setores têxteis de algodão, calcados e
vestuários que estão a mercê das flutuações do comércio interno de consumo popular.
73
Do ponto de vista do desenvolvimento das áreas de ponta, o BNDE foi
atuante no processo de desenvolvimento do Centro Tecnológico Aeroespacial (CTA)
de São José dos Campos, financiando empresas e indústrias que utilizassem as
tecnologias desenvolvidas pelo CTA na produção de equipamento aeronáutico e
aeroespacial, que até então não eram produzidos no Brasil.
74
3.6. O II Plano Nacional de Desenvolvimento (1974-1979)
Em 1974, inicia-se uma nova fase no Brasil e no Governo: é o início do
processo de abertura e redemocratização do país por meio do presidente Ernesto
Geisel (1974-1979). É também o ano em que o Milagre Econômico chega ao fim, as
condições domésticas e internacionais já não são as mais propícias para o
desenvolvimento acelerado. A primeira crise do petróleo de 1973 demonstra o
primeiro momento do arrefecimento do crescimento e a fragilidade da economia
brasileira quanto a sua matriz energética.
44
Para o Governo, as dificuldades que se mostravam no cenário externo não
poderiam abalar o crescimento interno brasileiro. A crise do petróleo, o final do
padrão ouro e da convertibilidade de moedas por paridades fixas não seriam os
empecilhos para a manutenção do crescimento. Sem dúvida não deveriam ser
abandonados, mas o Brasil deveria se adequar para continuar crescendo. Dentro de
um cenário internacional complexo, e da experiência do período anterior do
desenvolvimento acelerado, surge o II PND, que depois do Plano de Metas, pode
ser considerado o mais bem estruturado e planejado plano de desenvolvimento
econômico brasileiro.
De acordo com Serra (1982), o II PND dá diagnóstico razoavelmente claro
dos problemas que afetaram a economia brasileira ao final de 1973, caracterizado
pelo atraso no setor de bens de produção e de alimentos, devido a uma estrutura
produtiva incompleta, à forte dependência do petróleo e à tendência a um elevado
desequilíbrio externo. Uma vez delineados os problemas, esperava-se combatê-los
todos e ainda obter um expressivo crescimento do produto nacional, com
crescimento do PIB de 10% ao ano, e da indústria em 12% ao ano. (GREMAUD;
PIRES, 1999). Dentre as principais metas do II PND, estavam a substituição das
importações nos setores de bens de capital e insumos básicos; desenvolvimento de
44
“Sobressai por outro lado, a extrema dependência do desenvolvimento da economia brasileira com
relação ao petróleo. Em 1973, aproximadamente 44 por cento do consumo de energia no Brasil
era satisfeito por este produto, proporção extremamente alta se levarmos em conta a abundante
disponibilidade de outras fontes energéticas” (SERRA, 1982, p. 67), em uma clara menção á
necessidade de se alterar a matriz energética brasileira, visto a quantidade de recursos hídrico
existentes no Brasil.
75
grandes projetos de exportação de matérias-primas (celulose, ferro, alumínio e aço);
o aumento da produção interna de petróleo e a capacidade de geração de usinas
hidroelétricas. Para conseguir realizar tais metas, alguns dos pontos de apoio
estavam em:
(i) Obter de financiamento externo a atração de investimento estrangeiros de
risco (sob a forma de joint ventures), principalmente para os projetos de
exportação;
(ii) Redirecionar a poupança compulsória para o sistema BNDE, cujo papel no
fomento da produção de bens de capital deveria ser fortalecido;
(iii) canalizar os estímulos e incentivos aos investimentos por intermédio do
CDI (Conselho de Desenvolvimento Industrial), ao qual competia conceder
isenções relacionadas com importações de máquinas e equipamentos;
(iv) Mobilizar empresas estatais, muitas delas responsáveis integrais pelo
cumprimento dos programas de investimento e produção em seus
respectivos setores de atividade. (GREMAUD; PIRES, 1999).
Ainda em 1974, os recursos Programa de Integração Social (PIS) e o
Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep)
45
, ambos criados
em 1970, passam a ser administrados pelo BNDE, criando assim uma estabilidade
na captação de recursos para atender a demanda de financiamento exigidas pelo II
PND. Ao mesmo tempo, desvincula o BNDE da disputa pelo orçamento fiscal e a
sua busca por participação na arrecadação do imposto de renda, o que reduz a
influência política exercida sobre o BNDE, por diversos parlamentares. A garantia da
existência de um fluxo de capitais, independentemente das dotações orçamentárias
anuais, garante uma maior estabilidade para o empreendedor que contava com o
banco para desembolsos de longo prazo durante a execução de um projeto. Passa a
ser função do BNDE o desenvolvimento de programas especiais de investimento
para a aplicação dos recursos do PIS/PASEP, consoante diretrizes aprovadas pelo
presidente da República
45
Tanto o PIS como o Pasep visavam integrar o empregado, da iniciativa privada ou pública, nos
resultados e no desenvolvimento das empresas, como um sistema de participação nos resultados.
A justificativa da transferência dos fundos do PIS/Pasep para o BNDES estava no fato de se tratar
de um reinvestimento de uma poupança forçada com o intuito de gerar um desenvolvimento
industrial e assim uma maior geração de empregos.
76
Na linha da capitalização de empresas nacionais, para o apoio ao seu
desenvolvimento e ao desenvolvimento de mercado de capitais
46
, três empresas
foram criadas dentro do BNDE. Mecânica Brasileira SA (Embramec), a Insumos
Básicos SA Financiamentos e Participações (Fibase), cuja função era dar apoio aos
empreendimentos do setor privado, onde fosse necessário um maior aporte de
capital de risco, e a Investimentos Brasileiros SA (Ibrasa), que objetivava o
investimento de capital de risco em empresas carentes de capitalização,
principalmente ligadas à importação regional ou setorial (RATTNER, 1991). Em 1976
o BNDES lança o Procap, Programa de Estímulo ao Desenvolvimento do Mercado
de Capitais, para concessão de financiamentos para subscrições de ações, como
garantia firme outorgada a ofertas públicas de títulos. Em 1977, mediante o Decreto
nº 79.459/77 é criado o Fundo de Participação Social (FPS), vinculado ao Fundo de
Participação PIS /Pasep, destinado-o à realização de investimentos sob a forma de
ações ou debêntures conversíveis, com o objetivo da participação dos trabalhadores
nas empresas controladas por capitais nacionais registradas na Comissão de
Valores Mobiliários (CVM). (BNDES, 2002).
Para o desenvolvimento da pequena e média empresa, o BNDE cria o
programa POC (Programa de Operações Conjuntas), dando um maior acesso
destas empresas a um financiamento subsidiado, em substituição ao programa
FIPEME. O intuito deste programa estava na descentralização das decisões de
financiamento a projetos para empresas deste porte. Os projetos a partir de então já
não mais necessitavam passar pelo crivo e reanálise do BNDE, antes de terem os
46
“[...] a Lei de Mercado de Capitais de 1965 foi baixada com a finalidade de criar um arcabouço
institucional para o fortalecimento do mercado de ações (incluía o instrumento, cláusulas relativas
ao fornecimento de informações financeiras, proteção aos acionistas minoritários,
regulamentações comerciais etc.). Essa lei previa, também o estabelecimento de bancos de
investimentos destinados a garantir as emissões de ações novas, bem como incentivar fiscais
para o aumento do fluxo de fundos para o mercado de capitais”(BAER , 1977, p. 228). “A
participação do Governo através do BNDE foi paulatina. O Banco parece ter representado um
instrumento de política muito flexível, sempre deixando uma porta aberta para a redução gradativa
da participação do governo através da venda de sua ações nas empresas. Isso, naturalmente, é
verdadeiro em todas as empresas governamentais que operam como empresas mistas como o
Banco do Brasil , a Companhia Vale do Rio Doce, etc. A diferença, entretanto, está na
possibilidade de um banco de desenvolvimento ajudar no crescimento de certos setores pela
participação direta e, quando esses estiverem funcionando normalmente, vender então suas
ações, ingressando depois em outras áreas cujo desenvolvimento necessita fortes doses de apoio
governamental. Entretanto, um tal retirada poderá não ser muito fácil, ou mesmo possível, em uma
indústria como a do aço, que pode ser muito grande para ser inteiramente absorvida pelo setor
privado.” (BAER, 1977, p. 268)
77
seus recursos aprovados e liberados. A análise passava a ser de cada um dos
agentes repassadores do BNDE, com isto regionalizando as decisões, o que
permitiria um maior conhecimento regional e setorial, agilizando assim os
desembolsos, permitindo também aos Bancos de Desenvolvimento regionais a
criação de programas específicos.
Desde o início da década, a expectativa inflacionária defendida por todos os
Governos foi de uma inflação máxima de 20%, e com a expectativa de decréscimo
ao longo dos anos. Segundo Najberg, isto era comprovado pelo Índice Geral de
Preços, que havia tido uma média de 20% durante todo o período do Milagre
Econômico (1968-1973), Entretanto, em 1974, esta cifra atingiu 34,56% no ano, e
viria a atingir 29,33% no ano de 1975 (Tabela 10). Do ponto de vista governamental,
a inflação de 1974, tratava-se de uma situação atípica, gerada principalmente pelo
aumento mundial do petróleo, não sendo causada por fatores internos. Da mesma
forma que o governo considerava isto atípico, havia um temor por parte do
empresariado em tomar recursos do BNDE e FINAME atrelados à variação da
ORTN.
Como solução para garantir aos devedores e mutuários do BNDE que os
contratos teriam como correção monetária máxima o percentual de 20%, ao final de
1974, por meio da resolução 458/74
47
, o Governo cria um instrumento contratual de
correção monetária parcial, que daria uma estabilidade maior à contratação de
empréstimos, uma vez que o mutuário teria uma garantia de montantes máximos a
serem pagos durante a vigência do contrato
48
.
Nos itens de exportação tidos como prioritários, dentre eles a mineração e a
celulose, o BNDE teve atuação marcante no financiamento do desenvolvimento da
47
Em 1976, é promulgado o Decreto Lei 1.452/76, que estende a limitação de 20% às pequenas e
médias empresas, a setores prioritários e a FINAME (Najberg, 1989).
48
No trabalho apresentado por Najberg (1989), esta estratégia se mostrou equivocada ao longo dos
anos subseqüentes a sua adoção, devido a alguns fatores. Dentre eles, o fato de que a correção
acima dos 20% seria acumulada e deveria ser refinanciada ao término do prazo contratual, logo a
medida se tornava apenas um paliativo. Ao mesmo tempo que a inflação tem um crescendo ao
longo da década, atingindo patamares muito superiores aos projetados, criando assim uma
pressão sobre o Tesouro Nacional, que era o responsável por garantir a diferença de correção
monetária ao BNDE. A limitação de 20% viria a ser substituída por um limite de 70% da ORTN, em
1979.
78
Companhia Vale do Rio Doce, cujo minério extraído de grandes jazidas do Pará e de
Minas Gerais era fundamental na pauta de exportações, assim como geraria um
desenvolvimento associado nas estradas e portos para o escoamento do minério. Na
celulose, o BNDE foi o principal agente financiador da instalação e construção da
companhia Aracruz Celulose no estado do Espírito Santo. (BNDES, 2002). No
campo energético, o setor hidroelétrico teve a participação ativa do BNDE no
financiamento da construção das usinas de Itaipu, o maior projeto hidroelétrico
mundial até a década 1980, e na construção de Tucurui, ambos marcando um
avanço na tecnologia brasileira de construção de barragens de terra.
Tabela 10 Inflação anual – IGP-DI (1969 – 1979)
Ano Inflação (%a.a.)
1969 19,31
1970 19,27
1971 19,48
1972 15,73
1973 15,53
1974 34,56
1975 29,33
1976 46,27
1977 38,79
1978 40,81
1979 77,24
Fonte: Fundação Getúlio Vargas, Conjuntura Econômica (FGV/Conj. Econômica). Índice
Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI). IPEAData.
Em 1979, uma nova crise do petróleo volta a assolar o mundo e, ainda que
houvesse sido tratada como uma meta governamental, a busca pela autonomia e
não-dependência da importação do petróleo não foi alcançada
49
, mantendo-se assim
a dependência externa. Do ponto de vista do problema de substituição do petróleo, o
Governo lança uma iniciativa que é o Pró-Alcool, com a busca de substituir os carros
movidos a gasolina por carros movidos a álcool, produzido através da cana-de-
49
Com relação à redução da dependência do petróleo, ainda que fosse uma meta clara do II PND, foi
realizado muito pouco. Do ponto de vista da demanda, praticamente nada foi feito no sentido de
reduzir o consumo de petróleo. Os investimentos em transportes rodoviários continuaram
mantendo uma posição prioritária, como forma de escoamento da produção industrial e pelo lado
da oferta. Os únicos esforço feitos foram o da prospecção de petróleo no país, especialmente na
plataforma submarina, entretanto até então infrutífera. “Outro grande esforço no campo energético
diz respeito ao programa nuclear, que, além de custoso e intensivo em importações, destina-se a
produzir energia elétrica a um custo três vezes maior do que o das usinas hidrelétricas” (SERRA,
1989, p. 112).
79
açúcar. O BNDE é agente deste processo por meio do financiamento de vários
projetos ligados a esta nova iniciativa, mediante a modernização das indústrias da
cana-de-açúcar e no desenvolvimento de motores a álcool, pela indústria
automobilística.
Ao final da década de 70, em 1979, o BNDES sai novamente da pasta do
planejamento e passa para o do Ministério da Indústria e Comércio, sob a
justificativa de que este ministério já agregava os outros órgãos importantes para o
desenvolvimento da indústria nacional: a Secretaria de Tecnologia Industrial (STI) e
o Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI).
80
3.7. O Governo Figueiredo (1979-1984)
O processo de distensão do regime militar se iniciou no período do Governo
Geisel (1974-1979) e se estendeu no Governo Figueiredo. Os anos 1980 foram
marcados no cenário doméstico por várias mudanças do ponto de vista político.
Depois de 20 anos de ditadura militar, o Brasil veria o processo democrático voltar à
cena política brasileira. O primeiro passo da redemocratização já ocorreu em 1982
com eleições diretas para governadores dos estados. O período é marcado por
problemas de ordem social, com greves por parte dos operários no ABC paulista, um
dos maiores pólos industriais do país, principalmente da indústria automobilística do
país, nos anos 1978, 1979 e 1980.
Dentro deste novo cenário, entre o final da década de 1970 e início da década
de 1980, o papel do BNDE como artífice do modelo de substituição de importações
era tido como já cumprido, e era necessário traçar novos caminhos para o seu
futuro. Em 1978, o Banco lança o seu Plano de Ação para os anos de 1978 a 1981.
“O BNDES era o único órgão do governo que consignava
explicitamente a necessidade de distribuir melhor a renda, aprimorar a
infra-estrutura dos grandes centros, aumentar o número de empregos,
atenuar os desequilíbrios regionais e controlar a inflação. Além disso,
passava a dar mais ênfase à agropecuária, seguindo orientação do
governo federal. A assistência ao setor se concentrou na produção de
fertilizantes, corretivos, máquinas, equipamentos, mudas e sementes
selecionadas e na atualização das usinas de açúcar e álcool.” (BNDES
2002)
Cabe enfatizar que o modelo adotado para o desenvolvimento brasileiro
durante o regime militar foi o do crescimento com dívida externa, aproveitando-se da
abundante oferta de recursos financeiros no mercado internacional
50
, com a busca
50
“O endividamento desse período [1967-1978], portanto, como o aumento das reservas mostra,
estava baseado no aumento da liquidez internacional, ou seja, no aumento de eurodólares
disponíveis para empréstimos externos. A estratégia do Governo era ao mesmo tempo aumentar o
81
da poupança externa para financiar o desenvolvimento, mantendo as reservas
elevadas. Entretanto, nem todo financiamento externo foi usado para o
desenvolvimento da atividade produtiva. Ao mesmo tempo “cerca de dois terços da
dívida externa contratada foram originalmente contratados sob a responsabilidade
do setor público, em suas diversas esferas e empresas” (BONELLI; GUIMARÃES,
1990, p.85). e no final de 1970 e início de 1980, “em torno de três quartos da dívida
externa brasileira de médio e longo prazo estavam contratadas a taxas de juros
flutuantes”(BAER, 1993, p. 75).
51
A partir do final dos anos setenta, alguns fatores de ordem internacional
passam a afetar a economia brasileira de forma bastante negativa, que trará toda
uma crise para os anos oitenta. Três grandes fatos podem ser definidos como
marcantes para a crise da dívida externa brasileira que será vista nos anos oitenta –
a segunda crise do petróleo, a elevação brutal das taxas de juros (nominal e real)
dos empréstimos internacionais, cujos contratos estavam baseados em taxas
flutuantes, e a recessão americana, gerando a contração na disponibilidade de
fundos emprestáveis.
52
Neste cenário de crise, ainda devido à aceleração nos
preços do petróleo, com o início do Governo Figueiredo, o até então Ministro da
Fazenda, Mario Henrique Simonsen, é alçado ao Ministério do Planejamento, e
Delfin Neto, que já fora Ministro da Fazenda durante o Governo Médici, assume a
pasta da agricultura. Simonsen era o principal assessor econômico do Governo
Figueiredo, e prevendo os problemas de balança de pagamento e a expectativa de
inflação da ordem de 40% ao ano
53
, entende que a única forma de controlar uma
mais possível a dívida externa bruta e garantir-se com as reservas também elevadas.”
(BRESSER-PEREIRA, 2003, pág. 192)
51
Segundo Baer (1993) o valor da dívida externa líquida em 1977 era de 29,480 bilhões de dólares,
já em 1982, chega a 79,210 bilhões de dólares, e em 1985 a 91,533 bilhões de dólares. O auge
das taxas de juros internacionais ocorrem no biênio 1981 e 1982, onde as taxas de juros nominais
norte-americanas estão em 18,9% e 14,9% ao ano, e a taxa Libor em 16,7% e a 13,6%. Ao
mesmo tempo o valor do barril do petróleo está em sua máxima cotação em dólares no mesmo
período US$ 33,71 e US$ 31,49, enquanto a produção nacional supre apenas 26,8% do consumo.
52
“O segundo choque do petróleo em 1979, a explosão nas taxas de juros internacionais em 1979-
80, a recessão mundial do triênio 19809-1982 e a súbita contração dos mercados internacionais
de crédito, começando no terceiro trimestre de 1982, levaram o Brasil à beira de um colapso
cambial nos últimos meses de 1982 e as complexas negociações com o FMI e principais credores
internacionais que se projetam até os dias de hoje” (BONELLI; GUIMARÃES, 1990. p.79)
53
Segundo Skidmore (1988), já em 1980 “o diagnóstico anterior de Simonsen parecia comprovado. A
economia brasileira estava sendo atingida pelos dois problemas tão conhecidos desde 1945
aceleração de inflação e emagrecimento das divisas cambiais – com os quais o ministro [Delfin
Neto] não se preocupou no período de 1967–74.” (SKIDMORE, 1988, p. 421).
82
crise vindoura seria por meio de uma política contracionista e recessiva, freando o
crescimento acelerado.
Esta visão, que no futuro se mostraria correta, não era do agrado da elite
industrial brasileira
54
, para a qual uma queda na demanda e um desaquecimento
econômico geraria um problema de capacidade ociosa e a tendência à queda dos
lucros. Neste ínterim, o ex-Ministro da Fazenda Delfin Neto afirma que o modelo
contracionista proposto por Simonsen poderia não ser a melhor solução, e que ele
mesmo conseguiria reviver o milagre econômico, caso lhe fosse dada a chance,
minando assim a situação do atual Ministro do Planejamento. Ainda em 1979, Delfin
Neto é alçado ao cargo de Ministro do Planejamento, cargo que ele permanecerá até
o final do Governo Figueiredo, em substituição a Mario Henrique Simonsen, com a
promessa da continuidade do crescimento econômico.
55
.
Delfin inicia o seu novo ministério, com a apresentação do III PND (Plano
Nacional de Desenvolvimento), que, diferente dos anteriores, não continha dados
nem metas quantitativas; tratava-se de um plano qualitativo. Já em 1980, o Plano se
mostra impraticável, devido à escalada inflacionária (Tabela 11) e os déficits de
balança comercial, levando o Governo a abandonar o processo de crescimento
acelerado.
Um dos principais focos para melhorar a condição de balança comercial
estava na desvalorização da moeda nacional, que reduziria a importação e
aumentaria a competitividade de preços dos manufaturados brasileiros no mercado
externo, conseqüentemente no aumento das exportações. E com base nisto, Delfin
autoriza uma desvalorização de 30% da moeda nacional em relação ao dólar
54
“Forçado a explicar a necessidade de uma recessão, o Ministro do Planejamento tornou-se o alvo
da ira de todos os setores. A comunidade empresarial ficou contrariada por razões mais
imediatas. Somente uma economia vibrante poderia manter suas fábricas com alto índice de
capacidade, garantindo-lhes bons lucros. Qualquer recessão mais significativa levaria à falência
muitas empresas brasileiras com margens perigosamente pequenas de capital de giro
(SKIDMORE, 1988, p. 418).
55
“A designação de Antônio Delfin Neto para o Ministério de Planejamento, em agosto de 1979, teve
esse sentido [agradar a burguesia industrial]. A manutenção das grandes encomendas das
empresas estatais do setor de bens de capital e a manutenção de uma extensa gama de subsídios
a acumulação de capital, quando o déficit orçamentário global do Estado alcançava níveis sem
precedentes e realimentava uma inflação também sem precedentes, são outras demonstrações do
empenho do governo em agradar a burguesia” (BRESSER-PEREIRA, 2003, p. 219)
83
Tabela 11 Inflação anual – IGP-DI (1979 – 1984)
Ano Inflação (%a.a.)
1979 77,24
1980 110,23
1981 95,20
1982 99,73
1983 211,02
1984 223,81
Fonte: Fundação Getúlio Vargas, Conjuntura Econômica (FGV/Conj. Econômica). Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI). IPEAData.
Em maio de 1982, o Governo publica o Decreto-Lei 1.940
56
, que teve como
medida a criação do Fundo de Investimento Social (Finsocial), que tinha como fonte
a contribuição obrigatória de 0,5% da receita bruta das empresas pública e privadas.
Estes recursos passariam a ser administrados pelo BNDE, agora BNDES, e
aplicados em programas e projetos destinados a custear investimentos de caráter
assistencial em alimentação, habitação popular, saúde, educação e amparo ao
pequeno produtor. Ainda em 1982, o BNDES se transfere para o seu novo endereço,
no qual permanece até os dias atuais, na Rua Chile no centro do Rio de Janeiro, ao
lado da sede da Petrobrás. Ainda neste ano, as “três irmãs” Fibase, Embramec e
Ibrasa se fundem, criando assim a BNDESPAR, que passa a ser uma única empresa
responsável pela capitalização da empresa nacional, sem a preocupação de
trabalhar com segmentos específicos. O Banco deixa de ser subordinado ao
Ministério do Comércio e Indústria, subordinando-se à Secretaria do Planejamento.
O BNDES definiu então três metas para atender a este esforço exportador e
auxiliar o país a atravessar este momento de crise: “convergir para um esforço de
economia de reservas em moeda estrangeira; preservar o parque industrial nacional
(já não era possível falar em fazê-lo crescer); e agir de forma decisiva sobre os
problemas sociais mais urgentes” (BNDES, 2002). Em 1984, é criado o Programa de
Apoio ao Incremento das Exportações (Proex), cujo objetivo era “apoiar as empresas
brasileiras que assumissem o compromisso de cumprir metas bienais de aumento
das exportações” (BNDES, 2002).
56
Este mesmo decreto adiciona o “Social” à denominação do BNDE, e a letra “s” à sigla BNDES.
84
Neste momento, o BNDES iniciou um processo de privatização de empresas estatais
que permaneciam em seu controle, originárias do período de desenvolvimento
baseado no investimento público. Dentre as 268 empresas estatais identificadas no
censo realizado em 1979 pela Secretaria Especial de Controle de Estatais (SEST),
que havia sido criada no Governo Figueiredo com o intuito de desestatizar empresas
e controlar os gastos das empresas estatais, várias estavam controladas pelo
BNDES, em muitos casos devido ao não pagamento de empréstimos, que levava o
BNDES a se tornar acionista de empresas deficitárias e insolventes.
Tabela 12 Distribuição das aplicações do sistema BNDES conforme
modalidade e setor beneficiado (1981 a 1984).
Modalidade 1981 1982 1983 1984
Indireta 49% 65% 75% 72%
Direta 51% 35% 25% 28%
Total 100% 100% 100% 100%
Setor Beneficiado 1981 1982 1983 1984
Privado 44% 33% 35% 43%
Público 56% 67% 65% 57%
Total 100% 100% 100% 100%
Ano
Ano
Fonte: Séries Estatisticas BNDES 1981/1990. Sistema BNDES AP/DECOR
Durante o período de 1981 a 1984, vinte empresas foram vendidas, uma
arrendada e oito absorvidas por outras instituições públicas, entretanto todas eram
empresas de pequeno porte
57
. Durante este período, o crescimento dos
financiamentos do BNDES por meio de bancos agentes (modalidade indireta)
ultrapassa o volume de negócios diretos do BNDES, sem intermediação (Tabela 12).
Em 1984, o Brasil se prepara para entrar em um novo momento histórico; em 15 de
Janeiro de 1985, ocorreriam as primeiras eleições para presidente, ainda que
indiretas, após 20 anos de regime ditatorial. O momento econômico já não é tão
complexo do ponto de vista de comércio exterior, as exportações já superam as
57
De acordo com dados do BNDES, 52% dos desembolsos efetuados pelo BNDESPAR entre
1982/85 foram aplicados em empresas controladas pelo BNDE, com o objetivo de custear a
operação das mesmas, atendendo uma necessidade de capital de giro ou para saneamento das
mesmas, reduzindo em muitos momentos a capacidade do BNDES em investir em novos
empreendimentos (PRADO, 1993)
85
importações e o saldo de conta corrente já é positivo em 1984. Entretanto, a inflação
segue em um ritmo forte de crescimento e passa a se tornar um dos grandes
problemas econômicos que marcaram os próximos dez anos juntamente com a
divida externa.
86
3.8. A Nova República (1985-1989)
Em 1985, ocorrem as eleições, ainda indiretas, para presidente, quando o
partido de oposição ao regime militar, o MDB, elege Tancredo Neves como
presidente e José Sarney como vice-presidente. Tancredo não chega a assumir,
pois por problemas de saúde vem a falecer antes mesmo de tomar posse,
assumindo a presidência o seu vice-presidente.
O primeiro governo democrático se inicia demonstrando uma postura de
grande austeridade, com a busca da redução do déficit público, corte de despesas
estatais e congelamento à contratação de servidores públicos (KON, 1999).
Entretanto, a pressão inflacionária seguia. Duas eram as vertentes de pensamento
econômico discutindo as soluções para os problemas brasileiros, uma de ordem
mais ortodoxa, que defendia a eliminação do déficit público, a eliminação da
expansão monetária, a liberação dos preços na economia e a eliminação das formas
de indexação. A outra vertente, de característica heterodoxa, acreditava que o país
vivia uma condição de inflação inercial, que a inflação era realimentada pela própria
inflação e pelo descompasso entre cada evento de reajuste inflacionário,
acreditando que a solução para o problema inflacionário se daria por meio do
congelamento de preços e rendimentos, eliminação da indexação e da reforma
monetária, com a introdução de uma nova moeda (KON, 1999)
Em 1985, dentro do novo regime denominado a Nova República, o BNDES
traça suas novas metas em linha com o Plano de Metas da Nova República para o
período de 1986 a 1989, que projetava reformas, crescimento econômico, com
distribuição de renda e combate à pobreza, optando pela retomada do
desenvolvimento econômico, sob o comando do setor privado.(BNDES 2002). Ainda
em 1985, o BNDES realiza a primeira grande oferta pública de ações já realizada no
Brasil, com a venda de papéis da Petrobras, arrecadando-se cerca de US$ 400
milhões.
“O BNDES retomou a orientação desenvolvimentista. A Finame, por
exemplo, ampliou a participação nos setores de ponta. Investiu em
87
informática, microeletrônica, química fina, biotecnologia e novos
materiais. Mais dois programas foram lançados: o Programa Especial
de Apoio ao Setor de Informática (Proinfo), para dar suporte financeiro
à consolidação e à capacitação tecnológica nesse segmento, e o
Programa Nacional de Pequenas Centrais Hidrelétricas
(PNPCH).”(BNDES 2002)
O então Ministro da Fazenda, Dílson Funaro, que havia sido presidente do
BNDES antes de ser alçado ao cargo de Ministro, no final de 1985 lança algumas
medidas de caráter ortodoxo para a o controle da inflação. Dentre elas as mais
importantes estão: a restrição ao crédito dos estados, municípios e consumidores,
para reduzir a demanda; o aumento de impostos sobre a classe mais favorecida, em
um esforço de distribuição de renda; a eliminação da Conta Movimento do Banco do
Brasil, que permitia que o mesmo emitisse moeda, restringindo esta função ao
Banco Central; Criação da Secretaria do Tesouro, com o intuito de administrar os
orçamentos, inclusive das estatais, para eliminar o déficit público.(KON, 1999).
O modelo adotado não surtiu o efeito desejado e em fevereiro de 1986 o
Governo realiza uma nova tentativa de estabilização, por meio do lançamento do
Plano Cruzado, que caracteriza uma vitória do pensamento heterodoxo, admitindo
que o problema inflacionário brasileiro, neste momento, estava centrado no
problema da inercialidade do processo inflacionário.
58
As medidas surtiram efeitos
positivos imediatos com o arrefecimento da inflação, devido principalmente ao
controle de preços. A estabilidade de preços reduz o interesse pela especulação
financeira, seja por parte das pessoas físicas ou jurídicas, tendendo a um
crescimento no consumo, o que viria depois a mostrar-se um fator inflacionário, pois
a demanda, uma vez que a indústria não estava preparada para um novo
crescimento de consumo, criaria uma pressão sobre os preços mediante o
desaparecimento de produtos no varejo, e ainda da cobrança de ágio sobre alguns
bens, como por exemplo automóveis.
58
Como medidas principais do Plano Cruzado estavam: a introdução de uma nova moeda, o
Cruzado, em substituição ao Cruzeiro; o congelamento amplo de preços por prazo indeterminado;
desindexação dos contratos, não permitindo reajustes para contratos com prazos inferiores a um
ano e correções anuais para contratos com prazos superiores; Política Cambial na qual o governo
estabelecia uma paridade fixa de Cz$ 13,80 por US$ 1,00, que o Banco Central poderia alterar a
qualquer tempo; e a criação do seguro desemprego. (KON,1999)
88
Em novembro de 1985, o Governo Sarney inicia a segunda fase do processo
de privatização. Por meio da publicação do Decreto nº. 91.991 de 1985
59
, o Estado
busca imprimir um ritmo mais forte ao processo de privatização, mediante a venda
de empresas, abertura de capital (privatização parcial), venda de participações
acionárias, ou ainda encerramento de empresas deficitárias. Neste processo, o
BNDES ficou responsável pela seleção e cadastramento da firma de consultoria a
ser contratada, com a responsabilidade de encaminhar as negociações de capital e
transferência de controle acionário. Inicialmente foram leiloados em Bolsas de
Valores os controles da Companhia de Tecidos Nova América (junho de 1987), da
Máquinas Piratininga do Nordeste e da Máquinas Piratininga SA, da Caraíba Metais,
da Sibra, da Celpag e da Siderúrgica Nossa Senhora Aparecida. Esta estratégia
segue um plano já idealizado pela Comissão Especial de Privatização, que havia
sido criada em 1981. Esta comissão havia identificado 140 empresas que poderiam
ser privatizadas e levando cinqüenta delas para venda.
Em junho de 1986, o Governo se vê obrigado a fazer alguns ajustes no Plano
Cruzado, com o intuito de reduzir a demanda agregada e buscar recursos para
fomentar os investimentos no desenvolvimento econômico. Estes ajustes estavam
baseados no incremento de impostos para compra de moeda estrangeira para
viagens internacionais, empréstimos compulsórios
60
sobre a venda de carros novos
e usados (30%) e sobre a venda de álcool combustível e gasolina (28%), elevação
de imposto de renda para investimentos de prazo curto e redução para prazos mais
longos. Estes em um primeiro momento foram positivos, contendo a inflação e a
demanda, entretanto, após as eleições estaduais de novembro de 1986, o governo
autorizou alguns reajustes de preços e flexibilizou a política cambial, o que acabou
sendo o estopim para um novo ciclo inflacionário, e que juntamente com déficits na
balança de pagamento levaria a uma moratória internacional em 1987.
59
Este decreto marca também a abertura da participação do capital estrangeiro neste processo de
privatização, de forma indireta. O decreto permitia a venda apenas a cidadãos brasileiros, mas não
vetava a venda posterior a grupos estrangeiros, como ocorria anteriormente.
60
Os empréstimos compulsórios seriam utilizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento, para
financiar os projetos de investimento público nos setores de transporte e comunicações, energia e
aço, assim como promover o crescimento através da distribuição de renda e erradicação da
pobreza. (KON, 1999)
89
Em 1987, após haver decretado a moratória, o Ministro Dílson Funaro
renuncia em fins de abril, assumindo seu posto o Ministro Luiz Carlos Bresser
Pereira, que em junho de 1987 lança um novo plano de estabilização econômica,
chamado Plano de Consistência Macroeconômica, conhecido como Plano Bresser,
mantendo a política heterodoxa de eliminação de inflação inercial e o controle de
preços por prazo determinado. Segundo Baer (1993), o princípio básico de que era
necessário manter o crescimento da economia brasileira e da incapacidade de
continuar transferindo recursos ao exterior nos níveis exigidos pelos credores era
compartilhado pela nova equipe econômica, mas esta estava disposta a negociar
com os credores internacionais e o FMI as bases para o pagamento da dívida
externa.
O Plano Bresser não tem a ação desejada pela população que queria que a
inflação fosse debelada, uma vez que o processo de desenvolvimento baseado nas
exportações levava a políticas de desvalorizações, que mantinham pressões
inflacionárias. Outro ponto necessário para o sucesso do plano era um processo de
ajuste fiscal, mas, devido à fragmentação política, neste momento do regime
democrático tal ajuste não contava com uma base política para realizá-lo
61
.
Em 1988, várias mudanças novamente acontecem. O Ministério da Fazenda é
agora ocupado por Maílson da Nóbrega, que adota uma política ortodoxa de
redução do déficit público. Política esta que irá ser alterada por um novo plano
heterodoxo, com nuances ortodoxas, que ficou conhecido como Plano Verão,
lançado em 1989, que novamente, por um lado, instituía um congelamento de
preços e uma nova moeda, o “Cruzado Novo”, e, por outro, pregava a redução dos
gastos públicos e as privatizações. Assim como os demais planos do primeiro
governo da Nova República, este acaba em uma espiral inflacionária, que será
herdada pelo próximo Governo.
Em março de 1988, o Banco Central publica a Resolução 1.469, que
contingencia e proíbe novos empréstimos ao setor público. O BNDES é diretamente
61
“[...]até 1987 [...] as elites brasileiras imaginavam que se tratava de uma crise de balanço de
pagamentos. Aos poucos, porém, foi se tornando patente que a crise não era apenas das contas
externas, mas do Estado – uma crise fiscal do Estado e, mais amplamente, do modelo
desenvolvimentista.” (BRESSER-PEREIRA, 2003, p.227).
90
afetado por tal medida, uma vez que vários dos projetos já aprovados pelo BNDES
tiveram seus desembolsos suspensos (vide Tabela 13), como são os casos das
operações da CEMIG, ENERSUL e ACESITA, assim como alguns projetos, como o
da Siderbrás, foram arquivados (COSTA, 2003).
Tabela 13 Distribuição das aplicações do sistema BNDES conforme
modalidade e setor beneficiado (1985 a 1989).
Modalidade 1985 1986 1987 1988 1989
Indireta 63% 52% 40% 49% 46%
Direta 37% 48% 60% 51% 54%
Total 100% 100% 100% 100% 100%
Setor Beneficiado 1985 1986 1987 1988 1989
Privado 43% 53% 65% 68% 81%
Público 57% 47% 35% 32% 19%
Total 100% 100% 100% 100% 100%
Ano
Ano
Fonte: Séries Estatisticas BNDES 1981/1990. Sistema BNDES AP/DECOR
Ainda em 1988, é promulgada a nova constituição brasileira, que solidifica o
processo democrático. Dentre os artigos da Constituição, um se torna de vital
importância para o BNDES, que, ao instituir que o programa do Seguro-Desemprego
seria financiado pelos recursos do PIS-Pasep, assegura que 40% dos recursos
destes fossem destinados ao BNDE. “A aliança entre o seguro-desemprego e o
BNDES dá-se sob a lógica de que a parcela de recursos do FAT que é gerida pelo
BNDES retorna ao segmento produtivo sob a forma de financiamentos a
investimentos geradores de renda e emprego e, portanto, minimiza o desemprego.”
(PROCHNICK, 1995)
91
4. O BNDES e a Reforma do Estado
Ao final dos anos oitenta, o Estado brasileiro inicia um grande processo de
alteração em suas atribuições básicas, não somente nas suas características, mas
também na discussão de qual a sua verdadeira função no processo do
desenvolvimento econômico. Os anos oitenta significaram um marco na condução
de políticas econômicas nos governos mundiais, os modelos heterodoxos de forte
interferência do Estado no desenvolvimento econômico se tornam deficientes para
explicar problemas de estagnação econômica seguida de inflação e modelos
econômicos ortodoxos, com o projeto de um estado minimalista, são adotados em
economias centrais, principalmente Grã-Bretanha e Estados Unidos.
As exigência de políticas de redução de déficit e de liberalização econômica
se tornam ainda mais objetos de discussão de órgãos de fomento e ajuda
econômica mundial, como o FMI e o Banco Mundial, que tornam a adoção do
receituário neoliberal como exigência mínima para obtenção de novos empréstimos
internacionais. A liberalização dos fluxos de capital e a globalização econômica
mudam o cenário dos negócios, e as economias nacionais não mais têm a
habilidade de controlar todas as variáveis influentes no processo macroeconômico
interno, uma vez que o mercado deixa de ter a distinção entre o doméstico e o
internacional, convertendo-se um mercado global.
O Brasil, neste processo, passa por uma série de mudanças internas,
enquanto o mundo está sofrendo grandes transformações na dinâmica de política
econômica. O entendimento destas transformações, e posteriormente como isto
afeta cenário doméstico, são de suma importância para entender o novo
posicionamento do BNDES, nos governos que sucedem o primeiro Governo da Nova
República.
92
4.1. A evolução do Estado
A conceituação de Estado acompanha o próprio desenvolvimento humano. A
existência do mesmo evoluiu com a necessidade de organização de cada
sociedade. O Estado patrimonialista, que foi característico das monarquias
absolutistas pré-capitalistas, tinha como princípio a não distinção entre o patrimônio
público e o privado. O feudalismo não distinguia claramente a propriedade da terra,
senhores feudais não se constituíam proprietários de terra, pois não havia um
Estado de direito que lhes garantisse a propriedade da área que habitavam, mas
possuíam a autorização real de utilizar aquelas terras e de ter servos e vassalos
trabalhando nas mesmas. Com o desenvolvimento do capitalismo, surge o Estado
liberal burguês, baseado em um estado formado pelas classes dominantes, cujas
principais características estavam na proteção à propriedade individual e à liberdade
econômica.
O Estado liberal burguês vem de uma necessidade da nova classe
dominante, para a qual a garantia à propriedade se tornava imperiosa para o
desenvolvimento capitalista. O Estado liberal burguês era um mero articulador das
necessidades da elite dominante, garantindo a proteção ao patrimônio e defendendo
os seus interesses econômicos. O liberalismo econômico, defensor das decisões de
desenvolvimento, investimento e da alocação eficiente dos fatores nas mãos do
mercado, não surtiu o sucesso e o efeito esperados em todas as economias
existentes, gerando assim, no início do século XX, pressões de vários sentidos para
que o modelo liberal fosse revisto ou abandonado. O Estado não intervencionista
garantidor dos interesses privados e da propriedade não atendia as necessidades de
várias economias do ponto de vista social e as necessidades de desenvolvimento,
principalmente das economias em desenvolvimento.
Um dos primeiros movimentos de ruptura dos antigos padrões de Estado,
ocorre na Rússia, com a evolução do socialismo e o fim do czarismo. O modelo de
Estado adotado se definia como um poder do proletariado, por meio da criação de
um Estado autoritário, tido como um governo do povo. Nos países Centrais, os
Estados passam a se desenvolver com um maior interesse social. As pressões
93
sociais vindas das classes operárias, que já não mais suportam a exploração do
trabalho, latente durante os períodos mais selvagens da Revolução Industrial e do
florescimento do capitalismo, levam à criação dos regimes de social-democracia,
onde o Estado passaria a ter uma papel mais atuante no setor social, garantindo
direitos civis e regulando a exploração do trabalho, criando assim o Estado de Bem-
Estar Social.
O Estado de Bem-Estar Social deveria garantir e defender os interesses do
capital, pois estaria inserido em um ambiente capitalista, cujos interesses privados e
individuais devem ser protegidos, mas ao mesmo tempo deve defender os
interesses coletivos e sociais. O Estado se veria obrigado a corrigir as imperfeições
criadas pela economia de mercado, suprindo assim as deficiências que o mercado
não foi capaz de atender, seja por deficiência de recursos, seja por não atratividade
fruto da baixa rentabilidade esperada em relação a outros possíveis investimentos, e
ao mesmo tempo dar condições à livre iniciativa e garantir a propriedade privada. A
partir da década de 1930, é possível definir a existência de três linhagens de Estado:
a) O Estado do Bem-Estar Social, principalmente nos países do chamado primeiro
mundo; b) O Estado Comunista, nos países do segundo mundo; e c) o Estado
Desenvolvimentista, no terceiro mundo. (BRESSER-PEREIRA, 1998).
Nos anos 1970, os modelos de Estado existentes começam a perder a sua
força – uma série de sucessivas crises assolam a capacidade do Estado em se
manter como gestor principal do bem-estar e do desenvolvimento. As crises do
petróleo em 1974 e 1979 aplicam um duro golpe nos custos para todos as
economias mundiais. A crise do endividamento público americano no final dos anos
setenta leva os mesmos a adoção de políticas econômicas ortodoxas, e ao aumento
da taxa de juros como forma de contenção do processo inflacionário. Ao mesmo
tempo, durante os anos 1970 há o desenvolvimento de um mercado financeiro
internacional, em que os recursos podiam se movimentar livremente, criando assim
uma escala global de liquidez, onde os Estados Nacionais passam a perder o
controle sobre a disponibilidade de moeda. (COSTA, 2000)
A inflação crescente durante os anos setenta em grande parte das economias
mundiais, aliadas à estagnação econômica, faz ressurgir ideais do liberalismo
94
econômico. Os custos para a manutenção do bem-estar social e das empresas
públicas, muitas vezes deficitárias, e estruturas governamentais grandiosas são
considerados muito altos e parcialmente responsáveis pela inflação (COSTA, 2000).
Esta crise do Estado
62
é marcada pelas crises fiscais, caracterizada pela
perda do crédito público e da incapacidade do Estado em criar uma poupança
pública, uma vez que a sua principal fonte de recursos está na arrecadação de
impostos, que é reduzida em momentos de recuo econômico, pelo esgotamento nas
formas de intervenção e pela obsolescência da forma burocrática de administração.
A crise se manifestou nos três principais modelos de Estado existentes: “a crise do
welfare state no primeiro mundo, o esgotamento da industrialização por substituição
de importações na maioria dos países em desenvolvimento, e o colapso do
estatismo nos países comunistas.” (BRESSER-PEREIRA, 1998, p. 36).
62
É inegável que o modelo de intervenção estatal serviu para acumulação do capital, sendo marcado
pelo crescimento da indústria bélica, que tem como seu maior comprador os governos nacionais,
principalmente o governo Norte-americano. O modelo de substituição de importações era
alicerçado na participação do Estado como agente de desenvolvimento da infra-estrutura, mas
também como produtor de bens e o modelo protecionista europeu. (COSTA, 2000)
95
4.2. A evolução do Estado Brasileiro
A Primeira República, no Brasil, foi proclamada em 1889 e em 1891 foi
promulgada a Constituição, que pela primeira vez estabelece a separação dos
poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Esta fase apresenta o início da
modernização do país, mesmo que seja defendido por alguns o fato de que o
movimento republicano tenha sido um movimento das classes dominantes, na busca
de um rearranjo e um equilíbrio de forças, caindo assim um governo monárquico e
aristocrata, ascendendo um governo burguês e oligárquico.
O Estado Republicano nasceu em um momento de liberalismo econômico, e
se manteve liberal, possivelmente não tanto pelo desejo de se manter alheio ao
desenvolvimento, mas muito mais pela falta de capacidade financeira, para executar
projetos de infra-estrutura necessários. Era caracterizado por um Estado não-
intervencionista do ponto de vista econômico. Até 1930, a atuação do governo do
ponto de vista do desenvolvimento da infra-estrutura e das indústrias nascentes se
dava de forma indireta, por meio de concessões e benefícios para a sua instalação,
como por exemplo empréstimos especiais para algumas indústrias e garantias de
rendimentos para companhias estrangeiras que realizavam investimentos em infra-
estrutura, principalmente no caso de vias férreas. (BAER, 1977).
Uma das principais práticas intervencionistas do Estado foi a regulação dos
preços do café por meio da compra de estoques excedentes, de forma a garantir a
manutenção dos preços externos. Criou, assim, um enorme endividamento público,
caracterizado pelo endividamento externo, demonstrando claramente as forças que
o Estado representava e os interesses de qual classe social. Em 1930, com a
revolução que levou Getúlio Vargas ao poder, o Brasil inicia um processo de
transformação de um Estado patrimonialista caracterizado até o final da Primeira
República, para um Estado Social-Burocrático.
Em 1936, inicia-se a Reforma Burocrática do Estado brasileiro. Neste ano,
são criados o Conselho Federal do Serviço Público Civil, que posteriormente viria,
em 1938, a se transformar no DASP – Departamento Administrativo de Serviço
96
Público. A criação do DASP representa a afirmação dos princípios centralizadores
hierárquicos da burocracia clássica (BRESSER-PEREIRA, 1998). O movimento que
atingiu a Europa e a América do Norte no século XIX vem a atingir o Brasil nos anos
1930.
O Governo Castelo Branco realizou uma nova reforma no Estado brasileiro,
por meio do Decreto-Lei nº. 200, de 25 de fevereiro de 1967, que tinha como objetivo
a Reforma Administrativa Federal, com o firme intuito de evoluir de uma
administração pública burocrática para um administração desenvolvimentista. Os
seguintes princípios fundamentais deveriam ser seguidos pela Administração
Federal: a) planejamento (foco no desenvolvimento e na segurança nacional); b)
Coordenação (para a execução dos planos e programas de governo); c)
Descentralização ; d) Delegação de Competências (como instrumento de
descentralização administrativa); e) Controle (BRASIL, 1967). Um dos grandes
pontos da reforma estava na descentralização, pela redução da administração direta
e do aumento da administração indireta – administração esta a ser realizada
mediante a criação de fundações de direito privado, empresas públicas e empresas
de economia mistas. A criação de empresas de economia mista daria um caráter
muito mais autônomo e facilitador do desenvolvimento, uma vez que se
descentralizaria o processo decisório.
Segundo Bresser-Pereira (1998), a Reforma foi uma tentativa de superação
da rigidez burocrática e pode ser considerada uma primeira tentativa de se criar uma
administração gerencial no Estado brasileiro. A descentralização promoveu a
transferência de atividades de produção de bens e serviços para autarquias,
fundações, empresas públicas ou de economia mista. Com o final do Governo
Militar, em 1985, e o início da Nova República, uma nova Constituição foi
promulgada. No que tange à reforma do Estado, esta Constituição é a busca ao
retorno do Estado Burocrático dos anos trinta. Ainda conforme Bresser-Pereira
(1998), o chamado “retrocesso burocrático” da Constituição de 1988 foi fruto de uma
reação ao clientelismo existente, mas ao mesmo tempo foi uma afirmação de
privilégios corporativistas e patrimonialistas incompatíveis com o costume
burocrático.
97
A economia brasileira passou a década de 1980 entre dificuldades e
mudanças de ordem política e econômica. Durante o período, o país saiu de um
regime militar de 20 anos para um processo de redemocratização. Do ponto de vista
econômico, sofreu grandes sobressaltos e impactos de políticas erráticas durante
todo o período, fruto de decisões equivocadas recentes e heranças de erros
passados. Ainda, a análise econômica demonstra dois pontos cruciais de atenção, o
crescimento errático do PIB, principalmente entre 1987 e 1988, e a escalada
inflacionária, culminando com um inflação descontrolada, superior aos 3 dígitos ao
final do Governo Sarney.(Tabela 14)
Tabela 14 Inflação (IGP-DI) e Variação anual do PIB (1980-1989)
Ano Inflação (1) (%a.a.)
PIB - var. real anual (2)
(% a.a.)
1980 110,23 9,20
1981 95,20 (4,25)
1982 99,73 0,83
1983 211,02 (2,93)
1984 223,81 5,40
1985 235,13 7,85
1986 65,04 7,49
1987 415,95 3,53
1988 1037,53 (0,06)
1989 1782,85 3,16
Fonte: (1) Fundação Getúlio Vargas, Conjuntura Econômica (FGV/Conj. Econômica). Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI). IPEAData. (2) Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de
Contas Nacionais (IBGE/SCN Anual). IPEAData . Sistema de Contas Nacionais Consolidadas. Obs.: Valor
corrigido, para 1980, de 10,2% para 9,2%.
98
4.2.1. Os Governos Fernando Collor e Itamar Franco (1990 a 1994)
Findo o primeiro Governo da Nova República em 1989, o novo presidente,
Fernando Collor de Melo (1990 a 1992), inicia o seu mandato com uma série de
ações com o intuito de debelar a inflação galopante. Em 1990, o Governo Collor
lança o plano Brasil Novo, conhecido como o Plano Collor. Este tinha como função a
contenção de inflação e do déficit público, por meio de políticas fiscais, de renda e
monetárias. O Plano ficou caracterizado para grande parte da população por sua
intervenção no âmbito monetário, mediante o confisco das poupanças privadas, o
bloqueio dos ativos financeiros e a limitação dos valores que poderiam ser
convertidos e utilizados na nova moeda
63
, ao equivalente à época à
aproximadamente USD 1.000,00. O modelo econômico adotava um congelamento
de preços de curto prazo, e um modelo de reajuste de preços administrado
posteriormente ao fim do congelamento. O bloqueio dos ativos visava à redução da
base monetária, e assim a redução da liquidez de forma a estabilizar a espiral
inflacionária, por meio de uma conceituação ortodoxa monetarista, que admitia que a
causa principal da inflação estava no excesso de liquidez.
Do ponto de vista administrativo de participação do Estado no
desenvolvimento econômico, o Governo Collor tem uma característica
eminentemente neoliberal, com a busca da redução do tamanho do Estado e da sua
influência no processo de desenvolvimento, que deveria ser transferido para a
iniciativa privada. Por meio do Plano Brasil Novo, buscou-se a inserção e a abertura
do país ao processo de globalização econômica. O Plano foi um marco da transição
do protecionismo econômico para um processo de desregulamentação econômica.
O processo de substituição de importações dá lugar a um novo momento baseado
na desregulamentação da economia e na abertura. O processo de mundialização da
economia dá um novo tom ao processo industrial nacional, por meio da busca do
desenvolvimento com foco no mercado mundial. A visão deixa de ser na busca do
processo de auto-suficiência industrial e na criação das estruturas para o
desenvolvimento voltado para dentro, mas no desenvolvimento voltado para fora, na
63
O Plano Brasil Novo introduziu uma nova moeda, o Cruzeiro em substituição ao Cruzado Novo.
99
busca de mercados consumidores de alto poder aquisitivo sem uma preocupação
direta com o desenvolvimento e o crescimento do mercado de consumo interno.
O Plano Nacional de Desestatização (PND), instituído pela Lei nº. 8.031 de
1990, mostra claramente o novo direcionamento do Estado, por meio dos seguintes
objetivos: “I - reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à
iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público; II -
contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das
finanças do setor público; III - permitir a retomada de investimentos nas empresas e
atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada; IV - contribuir para
modernização do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e
reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia; V - permitir
que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a
presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais;
VI - contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da
oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das
empresas que integrarem o Programa.” (BRASIL, 1990)
A Lei nº. 8.031 cria o Conselho Diretor do Programa Nacional de
Desestatização, que tem como principais atribuições definir as empresas a serem
incluídas no Plano Nacional de Desestatização e submetê-las à aprovação do
Presidente da República; submeter o cronograma do PND e divulgar a sua
execução; coordenar, supervisionar e fiscalizar a sua execução; aprovar ajustes de
natureza operacional, contábil ou jurídica, bem como o saneamento financeiro de
empresas, que sejam necessários à implantação dos processos de alienação;
aprovar as condições gerais de venda das ações representativas do controle
acionário, das participações minoritárias e de outros bens e direitos e aprovar a
destinação dos recursos provenientes das alienações. (BRASIL, 1993). Esta mesma
lei cria o Fundo Nacional de Desestatização, que receberá os recursos provenientes
dos processo de desestatização, sendo que o gestor para estes montantes deverá
ser nomeado pelo Conselho Diretor do Programa, para posterior aprovação do
Presidente da República.
100
Em agosto de 1990, após ser apresentado ao Presidente para sua aprovação,
o decreto nº. 99.464, de 16 de agosto, define as empresas a serem incluídas no
processo de privatização, sendo um total de 13 empresas, com um destaque para a
Usiminas (Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais S.A.) e a CST (Companhia
Siderúrgica de Tubarão). Define, também, o BNDES como instituição financeira
gestora do Fundo Nacional de Desestatização. O BNDES se tornou o principal
responsável pela modelagem financeira do processo de privatização, sendo esta
uma de suas atribuições como gestor do fundo. Ao mesmo tempo, o seu poder
decisório no PND acabou se fortalecendo ao longo do processo, principalmente
quando o seu Presidente, Eduardo Modiano, se tornou presidente do Conselho
Diretor do Programa, o qual possuía uma posição de destaque dentro da comissão,
uma vez que o mesmo tinha uma condição de voto especial.
Ao gestor do Fundo caberia, dentre outras obrigações, fornecer apoio
administrativo e operacional, que fossem demandados pela Comissão Diretora do
Programa Nacional de Desestatização, contratar por meio de licitação de empresas
de consultoria econômica, avaliar bens e auditoria necessárias aos processos de
alienação, submeter à Comissão Diretora do Programa Nacional de Desestatização
as condições gerais de venda de ações representativas do controle acionário, de
participações minoritárias e de outros bens e direitos e definir os preços mínimos dos
valores mobiliários a serem alienados. Após a abertura do processo de
“Impeachment” do presidente Fernando Collor, o mesmo renuncia em 29 de
dezembro de 1992, assumindo a presidência seu vice-presidente Itamar Franco,
para cumprir o restante do seu mandato. Do ponto de vista da reforma do Estado, o
então presidente apenas corrigiu erros realizados pelo seu antecessor, via a
recontratação de funcionários públicos demitidos e ajuste de órgãos anteriormente
extintos.
A inflação seguia como o principal desafio da economia brasileira; a tentativa
ortodoxa dos planos Collor se mostraram ineficazes no controle da mesma. O
conceito da inflação inercial volta à baila como uma de suas principais causas. A
inflação se retro-alimenta, levando assim a um processo contínuo de inflação.
(Tabela 15).
101
Com base na aceitação da inflação inercial, o Governo lança o Plano Real,
implementado por Fernando Henrique Cardoso, então Ministro da Fazenda, que foi
elaborado em 3 fases. A primeira, marcada pela busca do equilíbrio das contas
102
inercial da inflação. Durante este período, o país conviveu com duas unidades de
valor inter-relacionadas: o Cruzeiro Real e a URV. As transações deveriam ocorrer
na moeda corrente, o Cruzeiro Real, enquanto as referências de valor eram dadas
pela URV.
Na sua terceira etapa, ocorreu a substituição da URV e do Cruzeiro Real por
uma nova moeda chamada Real, em 1º de Julho de 1994. O Real nasce com uma
paridade de US$ 1,00 para R$ 1,00, buscando assim estabelecer na moeda a sua
função de troca, de conta e de reserva de valor. Em 1.994, na fase de ajuste do PAI,
é lançado o decreto nº. 1.068, que complementa a Lei 8.031, através do processo de
permissão de venda de participações minoritárias de empresas cuja participação
fosse de fundações, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista
e quaisquer outras entidades controladas, direta e indiretamente, pela União.
No período de Governo Collor e Itamar, o governo desestatizou 33 empresas,
sendo 18 empresas controladas e 15 participações minoritárias. No âmbito do
decreto nº. 1.068, foram realizados ainda oito leilões de participações minoritárias.
Esta primeira fase do processo de privatização gerou uma receita de alienação de
US$ 8,6 bilhões, e uma transferência de dívida para o setor privado de US$ 3,3
bilhões, gerando um resultado de US$ 11,9 bilhões. (Vide Gráfico 1). Cabe a
ressalva ao processo de privatização ocorrido no período de 1990 a 1994; a
privatização apenas ocorreu no âmbito do setor industrial e de participações
minoritárias do Estado, entretanto, o montante equivalente a participações
minoritárias foi equivalente a 3,3% do total alienado. O segmento industrial,
principalmente o siderúrgico liderado pela venda da Usiminas, foi responsável por
91,5% do montante total da privatização neste período, em um montante em reais de
R$ 10,9 milhões. (Vide Tabela 18).
Seguindo o processo de redução do Estado e da transferência das
responsabilidades do desenvolvimento industrial para o setor privado, o BNDES se
torna cada vez mais o financiador da iniciativa privada. As companhias recém-
privatizadas passaram a se tornar tomadores do Banco, como as demais empresas
privadas.
103
No ano de 1994, a posição das entidades de crédito público, inclusive o
BNDES, começa a se alterar com relação à proteção ao capital nacional. Em
novembro desse ano, o governo publica o decreto nº. 1.318, o qual altera a
legislação com relação ao repasse de recursos tomados no exterior por entidades
oficiais de crédito público da União e dos Estados, permitindo que as mesmas
possam repassar estes recursos a companhias cujo controle acionário for
pertencente ao capital estrangeiro. Esta primeira abertura à obtenção de recursos do
BNDES por companhias estrangeiras se mostra como um dos fatores de
crescimento dos desembolsos do BNDES durante o período de 1993 a 1996, saindo
de um patamar de R$ 6.7 Bilhões em 1993 para R$ 15,8 Bilhões em 1996 (Tabela
16).
Tabela 16 Aplicações do Sistema BNDES (1962-1965)
Ano
V
alor US$
V
alor R$ de Dez/01 (1)
1993 3.224.244.557 6.733.695.216
1994 5.511.140.961 10.092.774.001
1995 7.678.137.476 12.847.192.471
1996 9.604.997.722 15.833.175.533
(1) valores calculados a partir do valor em IGP -DI segundo a cotação do IGP-DI de dez/2001
Fonte: BNDES 50 anos, 2002.
Em 1990, alinhando-se a busca do apoio à exportação de produtos
industrializados, o BNDES cria o programa Finamex, cujo foco estava no apoio ao
setores de bens de capital. Durante o primeiro ano do programa, o BNDES apoiou
oito exportadores em um total de US$ 32,8 milhões, um montante ainda inexpressivo
diante dos montantes de desembolso do sistema BNDES. Os financiamentos neste
ano foram realizados por meio da modalidade de pré-embarque, que financiava o
processo produtivo até o momento do embarque do bem.(CATERMOL, 2005)
No ano seguinte é criado o Finamex pós-embarque, o qual permitia ao
exportador nacional oferecer termos de financiamento ao importador estrangeiro,
cujo foco estava nos importadores da América Latina, que representaram 100% dos
destinos em 1992 e 1993. A busca era trazer um padrão de competitividade aos
produtos brasileiros no mercado internacional, por meio da oferta de condições de
pagamento aos importadores. Apenas no terceiro ano de utilização, o Finamex
104
começou a atender países fora da América Latina, mais precisamente os
importadores Norte-americanos. (CATERMOL, 2005)
105
4.2.2. O Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2002)
Findo o Governo Itamar Franco, inicia-se o Governo Fernando Henrique,
dentro de um processo de estabilidade política e do controle da inflação (Tabela 17)
em patamares inferiores a 20% (vinte por cento) ao ano durante quase todo o
período. O período também foi caracterizado por pequeno crescimento do PIB anual.
Tabela 17 Inflação anual – IGP-DI (1995 – 2002)
Ano Inflação (1) (%a.a.)
PIB - var. real anual (2)
(% a.a.)
1995 14,77 4,22
1996 9,33 2,66
1997 7,48 3,27
1998 1,71 0,13
1999 19,99 0,79
2000 9,80 4,36
2001 10,40 1,31
2002 26,41 1,93
Fonte: Fundação Getúlio Vargas, Conjuntura Econômica (FGV/Conj. Econômica). Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI). IPEAData.
No ano de 1995, o Governo Federal lança o Plano Diretor da Reforma do
Estado, que tinha como principal articulador e mentor do processo o MARE –
Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado –, por meio do Ministro
Luis Carlos Bresser Pereira, cujos objetivos globais eram:
“- Aumentar a governança do Estado, ou seja, sua capacidade
administrativa de governar com efetividade e eficiência, voltando a
ação dos serviços do Estado para o atendimento dos cidadãos.
- Limitar a ação do Estado àquelas funções que lhe são próprias,
reservando, em princípio, os serviços não-exclusivos para a
propriedade pública não-estatal, e a produção de bens e serviços para
o mercado para a iniciativa privada.
- Transferir da União para os estados e municípios as ações de caráter
local: só em casos de emergência cabe a ação direta da União.
106
- Transferir parcialmente da União para os estados as ações de caráter
regional, de forma a permitir uma maior parceria entre os estados e a
União.” (BRASIL, 1995).
A melhoria da governança se traduz não necessariamente por meio da
redução do Estado, mas, indubitavelmente, por meio do fortalecimento financeiro e
estrutural, com uma clara delimitação da sua área de atuação. O funcionalismo deve
então ser bem treinado e capacitado para exercer as funções que dele é
demandado. A limitação do Estado a funções que lhes são próprias é em grande
parte o cerne da questão quando se discute a participação do Estado no
desenvolvimento econômico. Se discute e avalia até que ponto o Estado deve ser
agente ou gerente de um processo de desenvolvimento, assim como quando este foi
agente e quando deve deixar de ser agente para ser tornar gerente de um processo
de desenvolvimento.
No Plano Diretor de 1995, estão definidos quatro setores de atuação do Estado:
“NÚCLEO ESTRATÉGICO. Corresponde ao governo, em sentido lato.
É o setor que define as leis e as políticas públicas, e cobra o seu
cumprimento. É portanto o setor onde as decisões estratégicas são
tomadas. Corresponde aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao
Ministério Público e, no poder executivo, ao Presidente da República,
aos ministros e aos seus auxiliares e assessores diretos, responsáveis
pelo planejamento e formulação das políticas públicas.
ATIVIDADES EXCLUSIVAS. É o setor em que são prestados serviços
que só o Estado pode realizar. São serviços em que se exerce o poder
extroverso do Estado - o poder de regulamentar, fiscalizar, fomentar.
Como exemplos temos: a cobrança e fiscalização dos impostos, a
polícia, a previdência social básica, o serviço de desemprego, a
fiscalização do cumprimento de normas sanitárias, o serviço de
trânsito, a compra de serviços de saúde pelo Estado, o controle do
107
meio ambiente, o subsídio à educação básica, o serviço de emissão de
passaportes, etc.
SERVIÇOS NÃO EXCLUSIVOS. Corresponde ao setor onde o Estado
atua simultaneamente com outras organizações públicas não-estatais e
108
O mais notável ponto de mudança está nos serviços voltados para o mercado.
Durante todo o processo desenvolvimentista, a criação da infra-estrutura para o
desenvolvimento industrial e o crescimento econômico eram responsabilidades
diretas do Estado. A função de desenvolvimento era um ônus que o Estado iria
arcar, de forma a garantir que o país crescesse. A maioria destes serviços
caracterizados como bens públicos, no caso da malha rodoviária, ou monopólios
naturais, no caso dos sistemas de energia elétrica, são transferidos para a iniciativa
privada. O Estado passaria a ser gerente do processo, por meio da criação de
agências reguladoras, que viriam a garantir a correta execução dos serviços, a
manutenção dos bens envolvidos no processo, a correta precificação e a justa
cobrança destes serviços, mediante a fiscalização e criação de regras para os
setores.
O Estado deixa de ser produtor dos bens não interessantes ao capital privado,
sejam insumos básicos ou bens de capital, tornando-se garantidor das condições à
iniciativa privada, para que esta consiga investir diretamente no desenvolvimento,
principalmente quando se tratar de bens considerados chave para o
desenvolvimento econômico e para o crescimento do país, agindo por meio de
instituições de fomento, subsidiando o processo ou provendo financiamento.
Entretanto, essa mudança de rumo da função do Estado no processo do
desenvolvimento é complexa no caso brasileiro, pois o Estado está extremamente
enraizado no desenvolvimento da infra-estrutura, assim como na oferta de insumos
básicos e bens voltados para o mercado. Como se desfazer destes ativos
64
, de
forma a obter um retorno adequado sobre o investimento já efetuado, e garantir que
os serviços antes ofertados pelo Estado sejam agora ofertados pelo mercado a
preço, ou a custo, justo para a sociedade, e com um nível de qualidade se não
superior ao menos equivalente ao anteriormente ofertado, se torna uma árdua tarefa
para o Estado.
64
Mesmo no caso de empresas paraestatais rentáveis e com gestão profissionalizada, a retórica
neoliberal defende a privatização com base, principalmente, em dois argumentos . O primeiro, de
cunho econômico, procura mostrar que, mesmo rentáveis, o retorno destas empresas para o
capital público ‘normalmente bem inferior ao pago pelas empresas privadas para os seus
acionistas. O segundo, de caráter político, é de que não caberia ao poder público empatar
recursos consideráveis em atividades produtivas, quando este dinheiro poderia ser muito bem
aplicado em investimentos sociais, normalmente muito aquém das demandas mínimas da
população. (AZEVEDO; ANDRADE, 1997).
109
Neste cenário, o processo mais adequado para tirar o Estado da função de
agente parece ser o processo de privatização, que será revisto juntamente com o
processo de reforma do Estado, durante o Governo Fernando Henrique Cardoso.
Buscou-se aliar a venda de ativos do Estado, com a criação de agências
governamentais com o fim de regulação e o gerenciamento destes recém-
privatizados serviços.
Durante a segunda metade da década de 1990, o processo de privatização
encontrou o seu momento mais forte. O processo registrou as maiores receitas de
privatização (R$ 77.8 milhões entre 1995 e 1999 - Gráfico 1), que se caracteriza pela
venda das maiores empresas estatais para o setor privado.
2,0
3,4
4,2
2,3
1,6
6,5
27,7
37,5
4,5
10,7
2,9
2,0
-
5,0
10,0
15,0
20,0
25,0
30,0
35,0
40,0
45,0
50,0
US$ Milhões
1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Gráfico 1 Receita de Privatização por Ano (1991 a 2002)
Fonte: BNDES, Privatização no Brasil: 1990-1994 / 1995-2002
Em 1995, o processo de desestatização iniciou uma segunda fase, a
privatização de empresas de serviços públicos. Em 12 de Fevereiro de 1995, o
Governo publica a Lei nº. 8.987, que define o processo de concessão e permissão
da prestação de serviços públicos, adequando a previsão existente em Constituição,
aplicável à energia elétrica e aos transportes (rodoviário, ferroviário e portuário).
110
Ainda em julho deste mesmo ano, o Governo edita uma nova lei (Lei º 9.074), que
estabelece normas e prorroga prazos de concessão e permissões de serviços
públicos e regulamenta o processo de concessão de energia elétrica. A primeira
empresa a ser privatizada neste novo processo é a Espírito Santo Centrais Elétricas,
(Escelsa) em julho de 1995.
Tabela 18 Receita de Privatização por Setor entre 1990 e 2002.
US$ Million Part. (%) US$ Million Part. (%) US$ Million Part. (%)
Indústria
10.858 91,5% 15.117 16,2% 25.975 24,7%
Siderúrgico
8.187 69,0% - - 8.187 7,8%
Fertilizantes
493 4,2% - - 493 0,5%
Petroquímico
2.178 18,3% 1.522 1,6% 3.700 3,5%
Petróleo
- - 4.840 5,2% 4.840 4,6%
Minerão
- - 8.755 9,4% 8.755 8,3%
Infra-Estrutura e Serviços
- - 73.826 79,0% 73.826 70,1%
Financeiro
- - 6.329 6,8% 6.329 6,0%
Elétrico
- - 29.748 31,8% 29.748 28,3%
Transporte
- - 2.321 2,5% 2.321 2,2%
Portuário
- - 421 0,5% 421 0,4%
Gás/Saneamento - - 2.199 2,4% 2.199 2,1%
Telecomunicações
- - 32.758 35,1% 32.758 31,1%
Informática
- - 50 0,1% 50 0,0%
Participações Minoritárias 396 3,3% 4.481 4,8% 4.877 4,6%
Decreto 1.068 396 3,3% 753 0,8% 1.149 1,1%
Estaduais
- - 3.728 4,0% 3.728 3,5%
Outros
619 5,2% - - 619 0,6%
TOTAL (1)
11.873 11,3% 93.424 88,7% 105.297 100,0%
1990-1994 1995-2002 TOTAL
Setor
Fonte: BNDES, Privatização no Brasil: 1990-1994 / 1995-2002
Em junho deste mesmo ano, o Governo publica o decreto nº. 1.510, que inclui
a Companhia Vale do Rio Doce, a maior companhia de mineração brasileira na lista
das companhias a serem privatizadas, e informa que suas ações em posse da
União, direta ou indiretamente, fossem depositadas no Fundo Nacional de
Desestatização sob a gestão do BNDES.
65
Os anos de 1995 e 1996 ainda se
mostram tímidos em termos de privatização, quando comparados com o biênio
posterior (1997/98). Isto não é causado por um arrefecimento do Governo no
65
A inclusão da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) no processo de privatização revive, sob uma
nova ótica, uma discussão antiga sobre a riqueza mineral do solo brasileiro e a sua posição
estratégica para o desenvolvimento e a soberania do país. Desde a inclusão dentre as empresas a
serem privatizadas até os dias atuais a sua decisão é questionada, principalmente pelo fato da
mesma sempre ter sido uma companhia de vanguarda e rentável nas mãos do Estado.
111
processo de privatização, mas por entraves legais existentes que influenciavam o
processo, assim como por questões de instabilidade na economia mundial,
principalmente a crise do México no ano de 1995.
O ano de 1995 foi caracterizado por um grande número de privatizações
principalmente no setor petroquímico, porém de baixo valor de mercado. Em 1996,
praticamente são realizadas todas as privatizações remanescentes no setor
petroquímico. O ano de 1996 é marcado pela privatização da RFFSA e da LIGHT. A
venda da LIGHT resultou em uma receita de venda de US$ 2.5 milhões no ano de
1996.
O processo de desestatização do serviço de transporte de carga da RFFSA
foi realizado por meio do desmembramento da empresa em sete malhas ferroviárias
regionais, e o seu processo de venda ocorreu durante o ano de 1996, e
posteriormente em 1998, privatizando-se 21.554km, em um total arrecadado de US$
1,7 bilhões. (BNDES, 2002) A RFFSA é uma das empresas que tem sua história
mais relacionada à do BNDES. A RFFSA e o BNDES caminharam
pari passu na
história do desenvolvimento econômico, até o final da década de 1990. O transporte
ferroviário serviria de estrutura para ultrapassar os entraves do desenvolvimento,
que mantinham a economia em um nível de desenvolvimento inferior. A interferência
do Estado, de forma a garantir a existência da condição necessária, se deu
mediante a participação do BNDES na criação da RFFSA, e passados quarenta
anos do seu surgimento, o mesmo se vê como agente do processo de transferência
para a iniciativa privada.
Ainda no ano de 1996, o processo de privatização recebe um grande impulso
por meio da publicação da Lei nº. 9.295 de julho, que permite a concessão do
serviço de telefonia celular, e a utilização do sistema Telebrás para a prestação
deste serviço pela operadoras. O setor de telecomunicações inicia uma vigorosa
mudança, pois não se trata de um processo de privatização, mas da introdução de
um novo serviço de infra-estrutura diretamente nas mãos da iniciativa privada. O Ano
de 1997 foi um ano crucial do ponto de vista das privatizações e para o BNDES,
como agente do processo e como financiador da iniciativa privada. O volume
arrecadado nas privatizações do ano de 1997 cresceu quatro vezes em relação ao
112
ano de 1996, atingindo um valor arrecadado no processo de desestatização de US$
27.7 milhões. Os principais setores privatizados ou desestatizados neste ano foram
o de Energia Elétrica, principalmente as empresas de distribuição, a Companhia
Vale do Rio Doce e a Banda B da telefonia celular.
No caso da CVRD, a privatização ocorreu em maio de 1997 através do leilão
de venda do controle acionário, quando foram vendidas 99 milhões de ações
equivalentes a uma arrecadação de US$ 3,1 bilhões. O processo da CVRD ainda se
completaria por meio da alienação de ações restantes, pertencentes ao Fundo
Nacional de Desestatização, que foram vendidas ao longo dos anos, e da oferta de
compra de ações por parte dos trabalhadores com recursos do fundo de garantia
(FGTS). A despeito da privatização da CVRD haver ocorrido no primeiro semestre
de 1997, as demais privatizações ocorreram fortemente na segunda metade de
1997. Alguns foram os fatores que levaram a esta concentração. Em 16 de julho, o
Governo publica a Lei nº. 9.472, que cria o marco regulatório para a privatização das
empresas de telecomunicações e regulamenta a criação da agência nacional
responsável pelo gerenciamento dos serviços de telecomunicações do país.
A Lei das Teles, como ficou conhecida a Lei nº. 9.472, permitiu o processo de
privatização das companhias de telefonia fixas. Vinte e três empresas de telefonia
foram listadas para o processo de venda, dentre elas a própria Telebrás -
Telecomunicações Brasileiras S.A. –, assim como permitia a venda das companhias
subsidiárias a estas companhias de telefonia que fossem prestadoras de serviço de
telefonia celular, na chamada banda A. As ações destas companhias foram
depositadas no Fundo Nacional de Desestatização sob o controle do BNDES, dando
assim um novo momento de destaque para o gestor do fundo desenvolver o
processo licitatório.
Não somente o fato do arcabouço legal para a privatização do sistema de
telefonia, que aliado ao sistema de energia elétrica foram os principais setores
privatizados no período de 1995 a 2002 (Tabela 18), há um fato maior para o
BNDES, que torna sua participação ainda mais marcante no processo de
desestatização dos serviços públicos e de infra-estrutura. Em 1997, mais
precisamente em maio deste, o decreto nº. 2.233 é promulgado pelo Presidente da
113
República. Este decreto cumpre a determinação da lei 4.131, no qual apenas
setores definidos como estratégicos, pelo poder executivo, poderiam receber
financiamento de entidades de crédito ligadas à União, ainda que o seu controle
acionário estivesse em poder do capital estrangeiro.
“Art. 1º São consideradas de alto interesse nacional para os fins do art.
39 da Lei nº. 4.131, de 3 de setembro de 1962, as atividades
econômicas, desenvolvidas em qualquer parte do território brasileiro,
atinentes aos setores abaixo enumerados:
I - serviços públicos de infra-estrutura dos seguintes segmentos:
a) exploração de fontes energéticas, geração, transmissão e
distribuição de energia de qualquer natureza;
b) telefonia de qualquer natureza;
c) portos e sistemas de transportes, inclusive de carga e
passageiros;
d) saneamento ambiental.
II - complexos industriais dos seguintes segmentos;
a) químico-petroquímico, compreendendo as indústrias químicas de
base, petroquímica, química fina e fertilizantes;
b) minero-metalúrgico,
c) automotivo. compreendendo as indústrias automobilística e de
auto-peças;
d) agroindustrial e florestal, compreendendo desde os fornecedores
de insumos até os processadores e distribuidores de produtos
agropecuários, de alimentos, de bebidas e de painéis de madeira,
papel e celulose,
e) de bens de capital, compreendendo as indústrias fornecedoras de
equipamentos e componentes.
f) eletrônico, compreendendo as indústrias de componentes
eletrônicos, bem como as indústrias eletrônicos de consumo, de
informática, de telecomunicações e de automação.” (BRASIL, 1997)
A lista de setores considerados como de alto interesse e estratégicos incluía
todos os setores envolvidos no programa de privatização do Governo. No setor de
114
serviços estão beneficiados os setores de telefonia, energia elétrica, transportes e
saneamento. No setor industrial, encontram-se listados os segmentos recém-
privatizados pelo governo, o petroquímico e o minero-metalúrgico. Cabe uma
ressalva ainda maior aos segmentos que não foram considerados como
eminentemente nacionalistas, principalmente o automotivo e o eletrônico, cuja quase
totalidade sempre pertenceu ao capital estrangeiro. Neste momento, estes são
considerados estratégicos para o desenvolvimento econômico.
Após a promulgação do decreto nº. 2.233, o processo de privatização
caminhou de uma forma mais acelerada. Durante o segundo semestre de 1997,
nove empresas do setor de energia foram privatizadas, gerando uma receita de US$
9.9 bilhões ao Estado, e a concessão da exploração da chamada Banda B da
telefonia celular foi licitada, gerando um receita de US$ 7.7 bilhões. O Ano de 1997
criou um novo patamar de desembolsos no BNDES, o volume de desembolso quase
duplica em relação ao ano anterior (Tabela 19) – sendo que o grande diferencial de
crescimento em relação aos anos anteriores esteve relacionado a um único produto,
do leque de produtos do sistema BNDES, o FINEM.
O FINEM se trata de um produto voltado ao financiamento de projetos de
implantação, expansão e modernização, assim como à aquisição de máquinas e
equipamentos novos, de fabricação nacional, e à importação de maquinários sem
similar nacional, para segmentos específicos, e capital de giro associado de valor
superior a R$ 10 milhões. O volume de desembolsos do FINEM no ano de 1997 foi
superior ao dobro do ano anterior, chegando a um volume de R$ 8,7 bilhões,
equivalente a aproximadamente cinqüenta por cento de todo o desembolso do
Sistema BNDES neste ano, e aproximadamente o equivalente a 90% do
desembolso total do ano anterior (1996).
Em 1998, as privatizações atingiram o seu recorde em arrecadação para o
Governo, em um montante total de receita de venda de US$ 37,5 bilhões. O ano foi
marcado pelas privatizações dos sistemas de telefonia fixa e celular em todo o país
e de grandes distribuidoras de energia. No sistema de telefonia, o Governo
arrecadou o equivalente a aproximadamente US$ 19,0 bilhões e no de distribuição e
geração de energia, o equivalente a US$ 6.0 bilhões. (BNDES, 2002).
115
Tabela 19 Desembolso Anual do Sistema BNDES – por modalidade e
produto. (R$ Milhões Corrente)
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
MODALIDADE DIRETA
MERCADO DE CAPITAIS
658 1.417 2.328 2.436 1.596 1.982 990 807
FINEM
1.784 3.463 8.748 7.115 5.123 5.522 6.825 13.355
APLICAÇÃO NÃO REEMBOLSÁVEL
3 1 6 25 50 86 52 75
BNDES-EXIM
257 306 759 1.514 2.382 3.406 3.949 7.745
PRESTAÇÃO DE GARANTIAS
-- 1 - - - - -
TOTAL DIRETA
2.702 5.187 11.843 11.089 9.150 10.995 11.816 21.982
PARTICIPÃO
38,1% 53,6% 66,2% 58,4% 50,7% 47,7% 46,9% 58,7%
MODALIDADE INDIRETA
FINEM
391 695 561 865 3.164 4.015 3.705 1.607
APLICAÇÃO NÃO REEMBOLSÁVEL
--- 0 0 0 - -
FINAME
2.622 2.122 2.433 3.299 1.676 2.498 3.304 4.020
FINAME AGRÍCOLA
417 216 345 409 740 1.360 1.848 3.010
FINAME LEASING
--- 128 75 90 200 286
CARTÃO BNDES
--------
BNDES-EXIM
86 86 528 895 1.453 2.328 2.065 4.044
BNDES AUTOMÁTICO
880 1.366 2.184 2.304 1.792 1.760 2.278 2.471
TOTAL INDIRETA
4.396 4.486 6.051 7.902 8.901 12.051 13.400 15.437
PARTICIPÃO
61,9% 46,4% 33,8% 41,6% 49,3% 52,3% 53,1% 41,3%
TOTAL GERAL
7.098 9.673 17.894 18.991 18.052 23.046 25.217 37.419
ANO
Fonte: BNDES
Novamente a participação do BNDES como gestor do Fundo Nacional de
Desestatização foi crucial para o processo de privatização das indústrias, mas ao
mesmo tempo o FINEM continua sendo o grande produto do BNDES neste
momento. No ano de 1998, o montante desembolsado por este programa atinge R$
7,1 bilhões, aproximadamente 37% do total de desembolsos do sistema BNDES
(Tabela 19). Outro ponto extremamente relevante dos desembolsos do sistema
BNDES está na sua distribuição por segmento; a vocação de desenvolvimento
econômico por meio da industrialização cede lugar ao ramo de comércio e serviços,
durante o biênio 1997/1997, e o desembolso para o segmento de comércio e
serviços ultrapassa os desembolsos para o segmento de indústria de transformação
em 60% em 1997 e em 38% em 1998 (Tabela 20).
Em 1994, foi instituída a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), por meio da
Medida Provisória nº. 684, transformada na Lei nº. 9.365 em 1996. A TLJP passaria
a ser forma de remuneração nominal dos recursos do Fundo de Participação PIS-
PASEP, do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e do Fundo da Marinha
Mercante (FMM), repassados ao BNDES ou por este administrados e destinados a
financiamentos. Quando da sua criação, a metodologia de cálculo da TJLP deveria
116
ser rentabilidade nominal média, em moeda nacional, dos títulos da Dívida Pública
externa e interna do período imediatamente anterior ao de sua vigência, sendo esta
vigência válida por três meses a partir da data de sua publicação.
Tabela 20 Desembolso Anual do Sistema BNDES – por segmento. (R$
Milhões Corrente)
Segmento
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Indústria de transformação 4.001 4.242 6.041 7.281 8.166 10.283 12.760 17.178
Comércio e serviços 2.294 4.833 9.710 10.080 8.341 10.734 9.298 15.482
Agropecuária 731 730 1.391 1.349 1.286 1.908 2.762 4.509
Indústria extrativa 72 147 752 282 258 121 396 250
TOTAL 7.098 9.951 17.894 18.991 18.052 23.046 25.217 37.419
ANO
Fonte: BNDES
Entre 1995 e 1998, a TJLP se reduz ao longo dos meses e se mantém
sempre inferior a taxas de juros de mercado financeiro, tendo como referência o CDI
(Certificado de Depósito Interbancário). Ao final de 1998, em meio à crise de
mercados asiáticos, à deterioração do modelo cambial brasileiro e à política
econômica antiinflacionária, mediante a manipulação das taxas de juros como forma
de redução da liquidez, de atração de capital estrangeiro e manutenção do equilíbrio
das reservas cambiais, a TJLP sofre o seu primeiro revés forte saindo de um nível
de aproximadamente 12%a.a. para 18%a.a..
O crescimento da TJLP, principal componente da taxa de juros dos contratos
BNDES, provoca uma reação negativa dos setores beneficiados pelos seus
empréstimos, incluindo neste grupo empresas recém-privatizadas e que haviam
tornado-se devedores do BNDES. Menos de trinta dias após a publicação da TJLP
trimestral no início de dezembro de 1998, o Banco Central publica uma Resolução
(Res. nº. 2.587 de 30 de dezembro de 1998) que altera a metodologia de cálculo da
TJLP, listando os títulos que seriam os utilizados para o cálculo dela, mas define que
a taxa deverá ser a menor entre o cálculo baseado nos títulos da dívida e a média
da TJLP dos últimos 12 meses anteriores a sua publicação, multiplicado por um fator
igual a 1,1. – automaticamente reduzindo a TJLP do início de Janeiro de 1999 ao
patamar de 12%a.a.
117
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
jan/95 jan/96 jan/97 jan/98 jan/99 jan/00 jan/01 jan/02
(% a.a.)
TJLP (% aa) CDI (%a.a.) IGP-DI (%a.a.)
Gráfico 2 Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) x Certificado de depósito
Interbancário (CDI) – Taxas ao ano
Fonte: BNDES; BCB/DPEC
Em setembro de 1999, de forma a adequar a metodologia de cálculo e evitar
o processo de retro-alimentação do cálculo da TJLP, um vez que o processo de
média dos últimos 12 meses tendia a prevalecer em relação ao cálculo das taxas de
remuneração dos títulos públicos, o Banco Central
66
altera a fórmula de obtenção da
TJLP, sendo esta formada a partir de então por dois componentes: i) a meta de
inflação, calculada por rata para os doze meses, baseada nas metas anuais fixadas
pelo Conselho Monetário Nacional (CMN); e ii) o prêmio de risco.
Esta mudança de fórmula de cálculo permite uma maior flexibilidade aos
órgãos de gestão de política econômica, principalmente ao Banco Central, na
determinação da TJLP. O componente prêmio de risco permite uma arbitrariedade e
um poder de manobra na decisão de alteração da taxa, garantindo assim ao Estado
a possibilidade de utilizar a TJLP como instrumento de política econômica,
118
existência da TJLP, esta sempre foi inferior à taxa de juros praticada pelo mercado,
e muitas vezes equivalendo a taxas de juros reais negativas, principalmente durante
o todo o ano de 1999, quando sua regra de cálculo se baseava em dados passados
sobre ela mesma.
Durante o início do ano de 1999, o Real sofre uma grande desvalorização, o
que impacta a economia, provocando uma estagnação nos desembolsos do
BNDES. Entre o ano de 1998 e 1999, houve um pequeno decréscimo no valor
desembolsado em Reais (Tabela 20). O Ano de 1999 foi iniciado com uma forte
desvalorização do Real, a moeda desvalorizada torna os produtos fabricados no
Brasil mais competitivos no mercado internacional. O desenvolvimento das
exportações e a permissão do acesso a multinacionais, principalmente do setor
automobilístico e as indústria de bens de capital, assim como a indústria aeronáutica
brasileira, representada pela Embraer, cria um espaço para os produtos de
exportação do BNDES.
EM 1997, o FINAMEX passa a se chamar BNDES-Exim, deixando de ser um
produto ligado apenas à produção de bens de capital, mas extensivo às demais
indústrias nacionais, incluindo de produtos químicos, petro-químicos, eletrônicos,
calçados alimentos, etc. Durante o ano de 1997, o BNDES-Exim já se torna
responsável por mais de 15% dos desembolsos do BNDES. A participação do
BNDES-Exim irá ser cada vez mais crescente até o ano de 2002, quando atinge a
participação de 33% dos desembolsos do sistema BNDES (Vide Gráfico 3).
O processo de financiamento à exportação tem como seu maior produto o
financiamento pós-embarque, pois permite a oferta de condições competitivas aos
produtos nacionais, em comparação com seus concorrentes. Um dos principais
exemplos de apoio à exportação foi dada a Embraer. A oferta de financiamento ao
comprador em até 100% do valor exportado permitiu uma vantagem competitiva às
aeronaves fabricadas no Brasil, em face de seus concorrentes. Segundo Catermol,
(2005), a partir de 1997 a participação da indústria aeronáutica brasileira vem
crescendo em seu nicho, atingindo em 2002 participação de aproximadamente 17%,
saindo de 5% de participação anteriormente a 1997. Grande parte deste sucesso
119
pode ser atribuído à existência de financiamento à exportação proveniente do
BNDES.
-
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
35.000
40.000
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
BNDES-EXIM TOTAL GERAL Participação
Gráfico 3 Participação do BNDES-Exim no total de desembolsos do Sistema
BNDES
Fonte: BNDES
No caso da indústria automobilística, a participação da mesma na pauta de
exportações vem crescendo desde 1997. No ano de 1995, a participação relativa
das exportações de automóveis de passageiros representava menos de 2% do total
de exportações de bens manufaturados, chegando em 2002 aproximadamente 6%
(Catermol, 2005). Entre os anos de 1997 e 1999, o BNDES reduz acentuadamente o
financiamento ao investimento público, o contingenciamento de crédito ao setor
público (vide Tabela 21). As privatizações e as reformas executadas no governo
Fernando Henrique Cardoso reduzem a participação direta do Estado como agente
do desenvolvimento econômico.
Além do apoio às exportações, O BNDES se caracteriza como financiador da
iniciativa privada de pequeno e médio porte. A participação de empresas com
faturamento até R$ 60 milhões anual nos desembolsos do sistema BNDES atinge
120
22.3% no ano de 2002. Em números absolutos, há um crescimento de mais de cinco
vezes no valor desembolsado entre 1995 a 1997 (vide Tabela 22).
Tabela 21 Participação das operações aprovadas pelo sistema BNDES por
setor (Em %).
Setor Beneficiado 1997 1998 1999
Privado 77% 90% 97%
Público 23% 10% 3%
Total 100% 100% 100%
Fonte: BNDES
Tabela 22 Desembolso Anual do Sistema BNDES – por porte. (R$ Milhões
Corrente)
PORTE
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
MICRO1(1)/PEQUENA(2) 1.426 1.230 2.057 1.379 1.735 3.031 4.223 5.970
MEDIA(3) 152 243 149 916 1.018 1.375 1.562 2.368
MPME
1.578 1.473 2.206 2.295 2.753 4.406 5.785 8.337
PARTICIPAÇÃO
22,2% 15,2% 12,3% 12,1% 15,3% 19,1% 22,9% 22,3%
GRANDE(4)
5.520 8.200 15.688 16.696 15.299 18.640 19.431 29.082
PARTICIPAÇÃO
77,8% 84,8% 87,7% 87,9% 84,7% 80,9% 77,1% 77,7%
TOTAL 7.098 9.673 17.894 18.991 18.052 23.046 25.217 37.419
ANO
Fonte: BNDES
Obs: Micro/Pequena inclui Pessoa Física
(1) Microempresas: receita operacional bruta anual ou anualizada até R$ 1.200 mil (um milhão e duzentos mil
reais).
(2) Pequenas Empresas: receita operacional bruta anual ou anualizada superior a R$ 1.200 mil (um milhão e
duzentos mil reais) e inferior ou igual a R$ 10.500 mil (dez milhões e quinhentos mil reais).
(3) Médias Empresas: receita operacional bruta anual ou anualizada superior a R$ 10.500 mil (dez milhões e
quinhentos mil reais) e inferior ou igual a R$ 60 milhões (sessenta milhões de reais).
(4) Grandes Empresas: receita operacional bruta anual ou anualizada superior a R$ 60 milhões (sessenta
milhões de reais).
Entretanto, é importante ressaltar que o crescimento relativo em valores não
demonstra a magnitude total do crescimento da participação de empresas de
pequeno e médio porte nos desembolsos do BNDES. A despeito da participação
relativa ser ainda inferior a 25% do montante desembolsado, a sua maior
característica está no número de operações realizadas para cada segmento. Em
1996, as operações para pequenas empresas representavam 58,6% do número de
operações do BNDES; em 2002, representa 94% de todas as operações. (vide
Tabela 23)
121
Tabela 23 Desembolso Anual do Sistema BNDES – por porte. (Número de
Operações)
PORTE
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
MICRO1(1)/PEQUENA(2) 34.167 17.681 41.615 25.679 51.400 94.202 132.214 112.342
MEDIA(3) 367 489 361 5.407 3.189 3.914 4.611 5.229
MPME
34.534 18.170 41.976 31.086 54.589 98.116 136.825 117.571
PARTICIPAÇÃO
66,3% 58,6% 74,2% 69,5% 89,7% 93,9% 95,0% 94,0%
GRANDE(4)
17.569 12.857 14.563 13.617 6.257 6.427 7.150 7.560
PARTICIPAÇÃO
33,7% 41,4% 25,8% 30,5% 10,3% 6,1% 5,0% 6,0%
TOTAL 52.103 31.027 56.539 44.703 60.846 104.543 143.975 125.131
ANO
Fonte: BNDES
Obs: Micro/Pequena inclui Pessoa Física
(1) Microempresas: receita operacional bruta anual ou anualizada até R$ 1.200 mil (um milhão e duzentos mil
reais).
(2) Pequenas Empresas: receita operacional bruta anual ou anualizada superior a R$ 1.200 mil (um milhão e
duzentos mil reais) e inferior ou igual a R$ 10.500 mil (dez milhões e quinhentos mil reais).
(3) Médias Empresas: receita operacional bruta anual ou anualizada superior a R$ 10.500 mil (dez milhões e
quinhentos mil reais) e inferior ou igual a R$ 60 milhões (sessenta milhões de reais).
(4) Grandes Empresas: receita operacional bruta anual ou anualizada superior a R$ 60 milhões (sessenta
milhões de reais).
Aliado à participação relativa das operações para empresas de pequeno e
médio porte, o número total de operações cresceu em aproximadamente 123% entre
1997 e 2002, enquanto as operações para empresas de pequeno porte cresceram
em 179% (vide Tabela 23). Este crescimento global e o crescimento relativo
resultaram na exigência da adequação do BNDES aos novos tempos. Os bancos
agentes se tornaram cada vez mais responsáveis pelo sucesso e desembolsos do
BNDES, as instituições financeiras por ele credenciadas tiveram uma participação
ativa no processo de evolução do BNDES neste segmento, sendo os principais
responsáveis e permitindo o acesso dos pequenos empresários aos empréstimos do
sistema BNDES.
122
CONCLUSÃO
A criação de um banco de desenvolvimento e fomento foi fruto de uma
necessidade de recursos de longo prazo, de forma a viabilizar o processo de
desenvolvimento econômico durante os anos 1950. A inexistência de recursos
privados disponíveis para o desenvolvimento autônomo, assim como a falta de
atratividade de alguns setores ao capital privado nacional eram considerados
entraves para o desenvolvimento. A doutrina cepalina de desenvolvimento por
substituição de importações e o nacional desenvolvimentismo tinham o Estado como
principal ator no processo de desenvolvimento econômico.
O BNDES foi criado como uma das principais entidades para executar o
processo de desenvolvimento econômico, responsável por obter e repassar recursos
de longo prazo e de gerir o desenvolvimento do país, definindo e financiando
projetos considerados importantes para o desenvolvimento econômico. O Estado
não deveria ser o substituto da iniciativa privada nacional, mas o supridor da infra-
estrutura e das indústrias de base, que demandavam grandes somas de recursos,
longo prazo de maturação e de retorno do capital investido. Durante grande parte da
existência do BNDES o Estado acabou por ser o seu maior cliente, principalmente
nas áreas de transportes e energia, e nas indústrias de base, como por exemplo a
siderurgia.
A forma de obtenção de recursos para o BNDES no seu início estava
baseada em empréstimos externos e na absorção forçada da poupança interna.
Entretanto, a principal fonte de recursos acabou sendo a poupança interna, por meio
de adicionais de imposto sobre a renda e outros tributos, visto que o aporte de
capital estrangeiro ocorreu, entretanto aquém do esperado. Ao longo da sua
existência, as formas de arrecadação da poupança interna foram se alterando, em
alguns momentos de forma direta, mediante o aumento de impostos sobre a renda,
em outros de forma indireta, mediante fundos e adicionais sobre serviços ou tributos
cobrados da pessoa jurídica.
123
O Plano de Metas de Juscelino Kubitschek foi o marco do desenvolvimento
econômico e industrial brasileiro. Durante este momento, o capital estrangeiro foi
incentivado a investir no país nos setores de bens de capital e bens de consumo
duráveis, principalmente automóveis e caminhões, mas também sob a forma de
empréstimos internacionais. O desenvolvimento das indústrias consideradas
importantes, mas não estratégicas, foram confiadas ao capital estrangeiro, devido à
debilidade do capital privado nacional e à falta de conhecimento tecnológico.
Em 1962, dez anos após a criação do BNDES, e passado o grande momento
do Plano de Metas, são criadas regras específicas para a entrada do capital
estrangeiro no país através da Lei nº. 4.131, que ainda hoje é o principal marco
regulatório dos capitais estrangeiros no país. Esta lei definiu que empresas de
controle acionário estrangeiro não poderiam receber empréstimos,
independentemente da sua fonte, externa ou interna, ou garantias a operações de
financiamento internacional de qualquer banco pertencente ao Estado brasileiro,
direta ou indiretamente, incluindo-se o BNDES, com a exceção de setores
econômicos considerados estratégicos definidos por decreto do poder executivo.
Esta regulamentação demonstra claramente a forma do desenvolvimento
baseado no investimento e fortalecimento da indústria nacional, em poder do capital
público ou privado; demonstra também a marca do BNDES como financiador do
desenvolvimento econômico nacional, apoiando a criação da infra-estrutura e das
indústrias de base por meio das empresas estatais, e apoiando o investimento
privado nacional, considerado a parte fraca do tripé formado pelo capital público,
capital privado nacional e capital privado externo. O capital estrangeiro foi
incentivado a participar, mas sem o acesso às mesmas condições especiais de
apoio dadas aos demais setores.
A forma de atuação adotada na década de 1970, mediante agentes
repassadores como forma de atingir todo o Brasil, mostrou-se um sucesso do ponto
de vista de acesso a recursos do BNDES a todas regiões do país. Devido a sua
estrutura, o BNDES passou a agir diretamente em operações de grande montante.
As operações de menor porte acabaram por ficar nas mãos dos agentes
repassadores, em sua grande maioria bancos comerciais.
124
A estrutura de agente repassador oferece ao agente a possibilidade de
realizar lucro por meio do repasse dos recursos e da cobrança de um
spread
bancário sobre a operação, mas ao mesmo tempo transfere o risco da inadimplência
a este agente, um vez que é sua responsabilidade a análise e avaliação do projeto e
da capacidade de solvência do tomador. Entretanto, a partir do momento que a
grande massa de empresas privadas nacionais precisa obter os recursos do
BNDES, pela mesma via que conseguiriam obter quaisquer outros empréstimos
bancários, a garantia do alinhamento dos empréstimos vinculado ao processo de
desenvolvimento econômico se torna mais complexo, pois a exposição ao risco de
uma instituição financeira privada não necessariamente será o mesmo de um banco
de fomento, voltado ao desenvolvimento econômico.
Desde 1974, os recursos que compõem o orçamento do BNDES são
originários de contribuições e programas ligados ao apoio e desenvolvimento do
trabalhador e programas de integração social. Em 1988, quando se destina um
mínimo de 40% dos recursos do PIS-Pasep ao BNDES, por meio do recém criado
FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, o vínculo deste com a inclusão social e o
125
avaliação de valor e venda das empresas estatais. Esses primeiros processos de
privatização consistiam operações de saneamento de contas públicas, sem o
objetivo de retirar o Estado de sua função de agente do desenvolvimento.
O fim dos anos 1980, após o contingenciamento de crédito ao setor público, e
o início dos anos 1990 – e a definitiva busca da redução da participação direta do
Estado no desenvolvimento econômico, por meio dos planos de privatização de
setores considerados estratégicos, que estavam sob o controle do Estado, como
siderurgia e mineração, e de setores de infra-estrutura, energia e telefonia – trazem
uma nova função para o BNDES, uma função muito distinta da que possuía até
então: a organização da privatização das empresas e setores tidos como
estratégicos.
O BNDES tornou-se, então, agente do processo de privatização, de forma
direta como gestor do Fundo Nacional de Desestatização, e indiretamente por meio
da presença de seu presidente como presidente da Comissão Diretora do Programa
de Desestatização. Este momento questiona a função econômica do BNDES, em
relação ao momento econômico no qual foi criado, como financiador do
desenvolvimento nacional por meio da participação direta do Estado, e agora passa
a ser o mesmo órgão responsável pela alienação das empresas estatais, das quais
foi financiador e gestor em muitos casos, e pelo enxugamento do Estado.
O fato do BNDES ter sido escolhido como peça fundamental do processo de
privatização não necessariamente retira a sua importância no apoio ao
desenvolvimento econômico, mas demonstra a sua adequação aos desejos do
Estado em curso. O Estado não mais seria agente do processo, não mais requeria
os recursos do BNDES com fins de investimento direto no desenvolvimento. O
BNDES foi agente de um processo no qual ele foi inserido, até mesmo devido a falta
de uma diretriz momentânea, uma vez que seu principal cliente, o Estado, já não
mais podia ser o tomador dos seus empréstimos.
Em 1997, o poder executivo publica o decreto nº. 2.233, que define alguns
setores como de suma importância para o desenvolvimento econômico, alterando a
Lei nº. 4.131 e permitindo, assim, que o BNDES possa emprestar recursos
126
originários do mercado doméstico, mais precisamente os recursos da FAT, às
empresas sob controle do capital estrangeiro. Após quarenta e cinco anos de
existência, o BNDES passa agora a financiar o capital estrangeiro, perdendo todo o
seu vínculo com o modelo nacional-desenvolvimentista, baseado no investimento na
empresa privada nacional e na empresa pública, que claramente eram as que mais
careciam de recursos de longo prazo, a condições accessíveis.
A grande onda de privatizações de empresas de energia e telefonia, cujos
valores arrecadados na venda ultrapassaram a marca de US$ 60 bilhões, ocorreu
exatamente após a permissão ao financiamento às empresas de controle acionário
estrangeiro, demonstrando uma clara relação de causa e efeito entre os eventos.
Considerando o efeito temporal da publicação da resolução, ou seja, o fato
que a mesma foi publicada anteriormente às principais privatizações, em uma
primeira análise pode-se pensar que a resolução foi condição
sine qua non para
que pudesse ocorrer a privatização dos setores de energia e telecomunicações.
Entretanto, resta questionar se algum grupo foi especificamente beneficiado, ou
vários o foram.
Para o Estado, o fato de permitir o acesso a recursos a baixo custo financeiro
a potenciais compradores e concessionários, quando comparados a recursos
obtidos no mercado, garante que a avaliação de valor das empresas seja melhor
que em condições normais, induzindo a uma melhor precificação dos ativos a serem
alienados, mesmo que o diferencial de preço esteja sendo reposto a custo dos
recursos do FAT. Desde a década de 1950, o apoio à entrada do capital estrangeiro
sempre esteve ligado a sua habilidade de trazer a poupança externa. Entretanto, a
permissão de obtenção de recursos do BNDES, do FAT, está à contra-mão deste
pensamento.
Para o capital privado objetivo principal não é o desenvolvimento econômico,
mas a busca da sua rentabilidade. O acesso a recursos do BNDES é
indubitavelmente atrativo devido a seu baixo custo. Entretanto, não necessariamente
se trata de condição
sine qua non para a participação do capital estrangeiro no
processo de privatização, pois o não acesso a estes recursos se refletiria em ofertas
127
de compra inferiores às existentes, baseado em algum modelo de rentabilidade do
capital investido. Logo, a oferta de empréstimo não parece ser uma condição
necessária para a possibilidade de venda ou concessão dos serviços de energia e
telecomunicações, mas, do ponto de vista do capital estrangeiro, uma condição mais
proveitosa de rentabilização do capital.
Para o BNDES, a permissão de emprestar ao capital estrangeiro é de grande
valia; a iniciativa privada nacional ainda é pequena e está sendo atendida pelos seus
bancos agentes, que se encarregam da grande massa de empréstimos de baixo
valor. O capital privado estrangeiro se torna principal cliente, pois passa a ser agora
o detentor dos setores de energia e telecomunicações.
Ao mesmo tempo que a economia voltada para dentro, substituição de
importações, cede lugar para economia vo
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