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JOSÉ ALFREDO BOSI
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA: UMA ALTERNATIVA PARA
NOVOS DESENHOS INSTITUCIONAIS.
A EXPERIÊNCIA NA ÁREA ORÇAMENTÁRIA
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS GRADUADOS EM ADMINISTRAÇÃO
PONTICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
S
ÃO
P
AULO
2007
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J
OSÉ
A
LFREDO
B
OSI
D
EMOCRACIA PARTICIPATIVA
:
UMA ALTERNATIVA PARA NOVOS
DESENHOS INSTITUCIONAIS
.
A EXPERIÊNCIA NA ÁREA ORÇAMENTÁRIA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Administração, sob a orientação do
Prof. Dr. Luciano Antonio Prates Junqueira.
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS GRADUADOS EM ADMINISTRAÇÃO
PUC/SP
São Paulo
2007
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BANCA EXAMINADORA
__________________________________
__________________________________
__________________________________
A
GRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Prof. Luciano, pela seriedade, competência e preciosas
contribuições.
Aos professores Carlos Osmar Bertero, Onésimo de Oliveira Cardoso,
Ladislau Dowbor, Leonardo Nelmi Trevisan, Carlos Kawall Leal Ferreira, Maria
Aparecida Ferreira Aguiar e Arnoldo Hoyos Guevara, mestres que me fizeram sentir
um grande orgulho por cursar o programa na PUC/SP.
A Maurício Jorge Piragino, Pedro Lucas de R. Melo, Carmelita cia Alves e
José Antonio Cox d´Avila pela ajuda oportuna.
A Marcelo Camargo Magano e Jo Luiz Souza Campos pelo
companherismo e pelas sugestões.
Aos meus colegas de mestrado e a todos os funcionários da PUC/SP por
trasnsformarem a instituição em um ambiente fértil para atividades acadêmicas tão
importantes para sociedade.
De maneira muito especial agradeço à minha família: meu pai, Alfredo,
minha mãe, Ecléa, e à minha irmã, Viviana, pela preocupação e apoio constante.
“O diálogo é sempre um discurso de paz e não de guerra.
[...] o diálogo somente pode iniciar quando o confronto
termina, o confronto começa quando o diálogo não é mais
possível.”
Norberto Bobbio
“... things must be as they may.”
W. Shakespeare
R
ESUMO
Diante da notável importância do Estado para a sociedade brasileira e a
coa
2
A
BSTRACT
Considering the State’s remarkable importance for Brazilian society and the
acknowledgement that it hasn’t being working well, the need to think about
alternatives to overcome this challenge arises. How can civil society have more
control over a State that administrates nearly 40% of our economy?
The aim of this paper is to make an account of some important tools that
would guarantee, possibly, a new kind of relationship between civil society and the
State in Brazil.
Although we live in an institutional framework where representative democracy
predominates, certain elements of participative democracy can emerge. This
research is a reflexion about the use of popular participation mechanisms
implemented in a recent period and within municipal scope. Among them, the
participatory budget has a privileged role.
Key-words: State, Democracy, Civil Society, Social Capital, Participatory Budget,
Institutional Drawing.
3
Í
NDICE
RESUMO .............................................................................................................1
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 5
1. QUESTÕES SOBRE A DEMOCRACIA CONTEMPORÂNEA .................... 10
2. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DEMOCRACIA PARTICIPATIVA
............................................................................................................................ 19
2.1 A REPRESENTAÇÃO CLÁSSICA E A INTRODUÇÃO DE NOVOS MECANISMOS..19
2.2 A RESISTÊNCIA À PARTICIPAÇÃO POPULAR ............................................ 23
2.3 A COMPLEMENTARIDADE DAS DEMOCRACIAS .........................................
24
3. ALTERAÇÕES DO DESENHO INSTITUCIONAL E GOVERNANÇA
DEMOCRÁTICA ............................................................................................... 27
3.1 A
VISÃO DE
R. P
UTNAM E O CASO ITALIANO
..........................................
28
3.2 O
DESEMPENHO INSTITUCIONAL
............................................................
29
3.3 N
OVAS PRÁTICAS DE GOVERNANÇA
....................................................... 33
4. PODER LOCAL E MUNICÍPIO NO BRASIL
................................................ 39
5. ORÇAMENTO PÚBLICO E ORÇAMENTO PARTICIPATIVO ................... 48
5.1 E
STRUTURA
B
ÁSICA DO
OP ............................................................... 48
4
5.2 A
EXPERIÊNCIA DE
P
ORTO
A
LEGRE
......................................................
50
5.2.1 E
FEITOS
R
EDISTRIBUTIVOS
......................................................
54
5.2.2
A
VISÃO DE
T
ARSO
G
ENRO E
U
BIRATAN DE
S
OUZA
................... 56
5.3 A
EXPERIÊNCIA DE
S
ANTO
A
NDRÉ
........................................................ 58
5.3.1 A
VISÃO DOS CONSELHEIROS
................................................... 62
5.4 A
EXPERIÊNCIA DE
S. P
AULO
............................................................... 65
6. A INFLUÊNCIA DA PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NO
PROCESSO ORÇAMENTÁRIO ....................................................................... 74
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 85
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................. 93
ANEXO 1 T
ABELAS
A1, A2
E
A3 ..................................................................... 101
T
ABELA
A4 ..................................................................................... 102
ANEXO 2
O R
EGIMENTO
I
NTERNO DO
OP
DE
S
ANTO
A
NDRÉ
............................ 103
ANEXO 3
O R
EGIMENTO
I
NTERNO DO
OP
DE
P
ORTO
A
LEGRE
-
TRECHO
.............. 106
ANEXO 4 .........................................................................................................108
4.1
LDO
DE
S
ÃO
P
AULO
/2001-
TRECHO
............................................ 108
4.2 T
ABELAS
-
RESUMO DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA DO PLANO DE OBRAS
DO
OP 2002-2003
...........................................................................109
5
INTRODUÇÃO
Temos vivido em uma época em que a presença do Estado é de enorme e
crescente importância na vida política, econômica e social dos cidadãos brasileiros.
Não é difícil constatar este fato. Uma das maneiras de aferir o tamanho do Estado é
acompanhar a evolução da carga tributária sobre o PIB, ou seja, qual o percentual
da produção anual da nossa economia que é administrada pelo governo.
Verifica-se, no decorrer do século XX, um expressivo aumento da carga
tributária em diversos países do mundo. No Brasil, se tínhamos uma carga de 15%
sobre o PIB em meados dos anos 50, passamos para cerca de 29% nos anos 90 e
atualmente estamos na casa dos 38% e com tendência de alta. Em países da
Europa não é incomum observarmos taxas acima de 50% sobre o PIB. Este
aumento da participação do Estado na economia ocorre devido não apenas à
necessidade de planejamento estratégico, mas também a questões relativas a
crescentes demandas da sociedade nas áreas de educação, saúde, segurança etc.
No Brasil a presença do Estado se torna especialmente importante também em face
ao nosso crônico problema de concentração de renda.
Segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano da ONU/2005, o Brasil
ocupa a 63
a
posição no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Quando o assunto é distribuição de renda, a nossa posição é pior ainda: se
considerarmos a parcela de renda da população situada na faixa dos 10% mais
pobres, apenas cinco países no mundo tem situação pior.
6
A partir desta constatação, podemos observar pelo menos duas posturas
diante desta realidade: de um lado os que defendem o receituário neoliberal,
reivindicando uma menor carga tributária e conseqüentemente a diminuição do
tamanho do Estado bem como de suas atribuições. Do outro, os que acreditam
que o Estado deve sim assumir responsabilidades maiores no que diz respeito não
apenas às suas funções tradicionais como também implementar políticas mais
contundentes nas áreas sociais visando obter uma melhor distribuição de renda e
um grau maior de inclusão social evidente que existem também outras visões
sobre este tema com seus diversos matizes). Esta tendência está na base do
modelo conhecido como Welfare State, um arranjo político social tipicamente
europeu realizado ao final da Segunda Guerra. Tendências globalizantes e liberais
puseram este modelo em xeque, principalmente a partir dos anos 80.
A reação à tendência neoliberal que acontece na maioria dos países de
economia capitalista é chamada por Boaventura de Souza Santos (2002) de
globalização alternativa. Setores organizados da sociedade civil vão-se dando conta
de que é necessário intervir tanto no Estado como no mercado para que se busque
uma sociedade mais democrática e justa. Sobre esta questão, nesta mesma linha de
pensamento, Dowbor (2003, p. 9) acrescenta que “Como seres humanos de uma
sociedade mais moderna, somos condenados a viver de maneira organizada, e para
isso precisamos de instrumentos de gestão pública mais modernos, e não
necessariamente mais pequenos.”
Independentemente da postura que venhamos a tomar com relação a esta
questão, há um ponto em comum para ambas as visões: é preciso promover uma
redefinição nas relações entre o Estado e a sociedade civil.
Além da crescente importância do Estado, uma constatação preocupante e
corrente na opinião pública contemporânea é de que o governo não tem funcionado
a contento. É visível, principalmente no caso brasileiro, a insatisfação da população
para com os poderes públicos. Existe uma onda de pessimismo crônico a respeito
da eficiência governamental. Esse pessimismo inibe a participação dos eleitores em
eventos ligados à política e à cidadania de um modo geral. Embora haja uma
parcela da população que procura participar e aproveitar os mecanismos disponíveis
7
no quadro institucional, infelizmente o número de cidadãos envolvidos nestes
processos ainda é muito restrito. Um dos objetivos deste trabalho é mostrar que a
tendência ao imobilismo pode e deve ser superada em nome de uma democracia
mais madura e participativa.
É evidente que o papel do Estado na economia torna-se tema privilegiado
neste debate devido à sua função estratégica nas políticas de inclusão social. Cada
vez mais, setores representativos da sociedade clamam por políticas do setor
público que busquem, entre outras coisas, aprimorar a função do Estado, não
apenas no sentido de torná-lo um instrumento eficiente, mas também um legítimo
porta voz dos anseios da população.
Nesse contexto, surgem demandas por mecanismos que tornem o Estado
mais transparente e sobretudo mais aberto à participação popular. A idéia de que
um teconcrata, mesmo que competente, possa resolver questões cruciais para a
sociedade fechado em um gabinete vai ano a ano perdendo força. O nosso desenho
institucional predominante, a democracia representativa, não tem demonstrado
responder às demandas de maior transparência nem tampouco de eficiência.
Uma das maneiras de lidar com esses problemas, embora aqui não tenhamos
a pretensão de apontar nenhum tipo de solução definitiva, pode ser a maior
participação do cidadão na administração pública. Quando falo de administração
participativa no governo não me refiro simplesmente à desconcentração de poderes.
Este tipo de procedimento poderia ser resolvido, por exemplo, apenas com a
delegação de responsabilidades da União para os Estados e municípios. Ou ainda
com um tipo de democratização interna da máquina pública. Refiro-me a um tipo de
descentralização mais profunda onde se criam espaços em que o Estado e a
sociedade civil propõem conjuntamente soluções para a administração das cidades.
De todo modo, a descentralização interna da administração pública tem, na visão de
alguns autores (PONTUAL, 2000; RIBEIRO e GRAZIA, 2003), gerado resultados
muito positivos e também faz parte do contexto geral de democratização da
sociedade.
8
A administração participativa é uma idéia antiga: de acordo com Maximiano
(2000, p. 458), surgiu na Grécia helênica há mais de 2.000 anos. De maneira
abrangente, pode ser definida como uma filosofia ou doutrina que valoriza a
participação das pessoas no processo de tomar decisões sobre diversos aspectos
da administração das organizações”. Embora antigo e de extrema simplicidade, o
princípio tem dificuldades enormes de ganhar espaços significativos tanto no setor
público como no setor privado. Mesmo fazendo parte dos discursos e figurando em
praticamente todo estudo recente de técnicas administrativas, a prática do dia a dia
mostra enormes resistências na hora de se dividir o poder decisório.
Não é difícil constatar que a administração pública no Brasil não tem
contemplado, de maneira muito efetiva, a participação popular quer no
planejamento, quer na execução dos atos governamentais principalmente na área
orçamentária. Entretanto, nos últimos anos, tem havido algumas experiências de
consulta popular em vários municípios. Aqui coloco algumas indagações como tema
para reflexão: seriam mecanismos como o Orçamento Participativo, um caminho
válido e eficiente para democratizar as decisões na esfera pública? Funcionariam
como uma parceria entre o setor público e a sociedade no sentido de aumentar a
transparência dos atos do executivo? Acredito que a relevância destas indagações
legitime a pertinência deste estudo.
O objetivo desta dissertação é fazer uma reflexão de caráter qualitativo sobre
como uma mudança no desenho institucional, a introdução do Orçamento
Participativo, pode causar efeitos sobre a democracia e cidadania.
O estudo foi elaborado com base em dados levantados sobre as experiências
realizadas no Brasil durante a década de 90. Os casos de Porto Alegre, Santo André
e São Paulo (este em um período um pouco mais recente) receberam um
acompanhamento mais próximo. Observei que práticas participativas, realizadas
tanto no Brasil como em outras partes do mundo se incorporam a novos desenhos
institucionais e conferem novos contornos à democracia contemporânea. O conceito
de capital social, desenvolvido principalmente por Putnam, terá também um papel
privilegiado na realização do balanço destas experiências.
9
Nos três primeiros capítulos apresentaremos a contextualização do nosso
atual quadro institucional de predominância do modelo de democracia representativa
bem como um levantamento introdutório das experiências de democracia
participativa. O referencial teórico predominante se encontra em Bobbio, Benevides,
Friedmann e Rousseau. A partir do terceiro capítulo, desenvolvo uma reflexão sobre
efeitos gerados por alterações no desenho institucional. No quarto capítulo realizo
uma ponderação sobre a questão do município e o poder local no Brasil. Em seguida
apresento as experiências de orçamento participativo nas três cidades acima citadas
bem como um exame e um balanço das mesmas.
10
1. QUESTÕES SOBRE A DEMOCRACIA CONTEMPORÂNEA
O termo democracia recebeu diversas definições e diversos sentidos ao longo
da história. O que nos interessa aqui é o conceito contemporâneo, pós revolução
francesa e predominantemente republicano. Para simplificar, referimo-nos à de
independência formal entre os poderes executivo, legislativo e judiciário, eleições
periódicas, direitos civis, enfim, o conhecido estado democrático de direito.
Antes de investigar os mecanismos de participação popular propriamente
ditos, farei um levantamento de algumas características da democracia
contemporânea e, particularmente da democracia brasileira.
Quando nos detemos sobre o estudo da história brasileira, não é difícil
perceber uma forte tradição autocrática e centralizadora que caracterizou o modo de
governar o Brasil desde os primórdios da colonização. Evidentemente a
contextualização precisa ser considerada. A concentração de poder ocorrida no séc.
XVI por ocasião da implantação dos governos gerais pode e deve ser atribuída ao
típico estado absolutista que executava a economia política do mercantilismo. Ao
longo da história do Brasil observamos que a democracia vai aos poucos ganhando
espaço até chegarmos ao atual corpo jurídico no qual alguns direitos fundamentais
foram conquistados. É claro que desde a “constituição da mandioca” outorgada em
1824 até a atual carta promulgada em 1988 deu-se um evidente avanço no desenho
institucional brasileiro em direção ao aprimoramento da democracia. A promulgação
da nossa atual Constituição pode ser considerada a coroação de um processo de
abertura democrática que se iniciou ao menos dez anos antes. A sociedade
11
brasileira clamava por eleições diretas, pelo fim da censura, pelo fortalecimento dos
sindicatos, enfim, pela volta do estado democrático de direito. A Constituição
brasileira, fruto deste processo, contempla, como veremos mais adiante, elementos
de democracia direta. Apesar de suas limitações, é notório que a atual carta contém
diversas conquistas importantes e, de maneira geral, pode ser considerada
democrática e moderna.
Mesmo assim, a democracia é vista com descrédito pelos brasileiros. Estado
ineficiente, corrupção generalizada, eleições caras e políticos demagogos estão
entre as maiores queixas apontadas pelo cidadão comum. E este não é um
fenômeno apenas do nosso país. Norberto Bobbio (2000) descreve uma série de
possíveis mazelas da democracia representativa, como veremos a seguir.
É atribuída à democracia a predominância da representação política do
interesse nacional em contraposição à representação dos interesses. Uma promessa
não cumprida da democracia. No caso de uma eleição legislativa, por exemplo, uma
vez eleito, o parlamentar teria que lutar pelos interesses da nação ao invés de tentar
proteger exclusivamente os grupos que o elegeram. Observando o comportamento
dos parlamentares percebemos que este princípio é invariavelmente violado. Grupos
de interesses específicos ou corporativos estão sempre à espreita no congresso
para tentar direcionar o trabalho dos parlamentares. casos em que a própria
disciplina partidária pode limitar o trabalho do parlamentar e vinculá-lo mais ainda à
representação de interesses pré determinados.
A persistência das oligarquias no poder é mais uma questão a ser enfrentada
pelos regimes democráticos. É comum ver as elites sendo representadas, ao menos
de maneira predominante, durante séculos, e com boa anuência do voto popular. A
derrota do poder oligárquico é mais uma promessa não cumprida pela democracia.
Ainda assim, não podemos desconsiderar o inegável avanço ocorrido desde as
constituições do séc. XIX, que instituíram o voto censitário
1
, até a atual carta de
1988. Apesar dos avanços conquistados, Dowbor (1998) observa que, como a
democracia não consiste apenas no direito ao voto, mas na possibilidade real de
1
Pela carta de 1824 exigia-se uma renda mínima de 100$ anuais para eleitores e valores ainda maiores para os
candidatos (Capítulo VI, Art. nº 92).
12
participação e controle do que está sendo feito com os recursos públicos, assistimos
na realidade a uma reprodução das antigas “democracias” censitárias, em que
votava e podia ser votado quem tinha dinheiro.
Outra controvérsia da democracia, segundo Bobbio, é a limitação do espaço
onde o cidadão pode decidir. A pergunta “quem vota?” poderia ser complementada
com uma outra pergunta “onde se vota?”. A ampliação do número de cidadãos que
pode votar, apesar de ser positiva, ainda não resolve uma questão crucial: os
espaços onde se exerce este direito são limitados. Na administração pública, nas
fábricas e demais organizações o cidadão raramente exerce algum tipo de poder um
pouco mais efetivo. Entretanto, como veremos adiante, mesmo que moderadamente,
podemos observar a ampliação dos espaços de participação do cidadão na
administração pública.
A eliminação do poder invisível é mais um desafio a ser enfrentado pela
democracia. A presença do crime organizado bem como de grupos privados que se
beneficiam ilegalmente dos recursos públicos é um enorme entrave para que o
governo trabalhe com efetiva transparência. A tradição propicia que decisões
importantes ainda sejam tomadas por tecnocratas, longe do olhar indiscreto do
cidadão. Mais do que nunca, o efetivo controle público do poder é uma meta longe
de ser alcançada.
A educação para a cidadania através da prática democrática é, para Bobbio,
outra promessa não cumprida. Esteve muito em voga a idéia de que a educação
para a democracia surgiria do próprio exercício contínuo da mesma. Um termo muito
utilizado para esse fenômeno é o desenvolvimento da chamada cultura política. Mas
o autor nos lembra a apatia do eleitor italiano que não tem grande interesse por
decisões conhecidas como palacianas. Outro procedimento ainda mais danoso é o
clientelismo, o voto di scambio [voto de barganha]. Tocqueville lamentava, em
discurso à Câmara dos Deputados em 1848: “as opiniões, os sentimentos, as idéias
comuns são cada vez mais substituídas pelos interesses particulares”
2
.
2
Apud, Bobbio (2000, p. 45).
13
No Brasil, é notório em muitas situações o uso desmedido do poderio
econômico para o sucesso eleitoral. Fenômenos como o clientelismo e o
coronelismo são ainda hoje vistos em abundância em diversas cidades brasileiras.
Até que ponto as pessoas votam por interesses particulares ao invés de votar
na base de uma opinião? Pontual (1999) demonstra que existem caminhos de
efetiva participação cidadã no jogo democrático. Apesar da persistência de antigos
vícios, espaços onde a sociedade civil diz o que pensa e nem sempre “vende o
voto”. Segundo o autor, a prática do Orçamento Participativo em Santo André teve
um efeito pedagógico importante para os atores do processo.
Uma questão difícil de ser compreendida e bastante questionada nos
governos contemporâneos é o paradoxo tecnocracia x democracia. À medida que as
sociedades evoluíram de uma economia familiar para uma economia mais complexa
cresce uma demanda por administradores que possuem competências técnicas
específicas. Enfrentar desafios como a luta pelo pleno emprego, a inflação e a
distribuição de renda requer conhecimentos técnicos específicos que nem sempre
estão ao alcance do cidadão de mediano conhecimento. Para Bobbio, se o cidadão
comum não pode ser o protagonista neste processo, tecnocracia e democracia são
antitéticas.
O aumento do aparato burocrático hierárquico também é apontado como um
obstáculo não previsto para a plenitude da democracia. Se admitirmos que numa
sociedade democrática o poder iria da base ao vértice, o que observamos é que
devido à estrutura burocrática, o exercício do poder vai em sentido contrário, do
vértice à base. Mais do que uma contradição, existe uma ligação histórica entre
Estado democrático e Estado burocrático. É preciso salientar que, em grande parte,
o aumento do aparato estatal ocorreu devido a pressões legítimas da sociedade por
escolas, hospitais, previdência etc.
O último obstáculo apontado por Bobbio é o baixo rendimento do sistema
como um todo. O processo de emancipação da sociedade civil fez com que o Estado
recebesse uma quantidade inesgotável de demandas às quais é impelido a dar
respostas adequadas. Demandas numerosas e principalmente onerosas que num
14
sistema democrático chegam de forma cada vez mais rápida. A resposta do governo
é invariavelmente lenta e difícil. Comparato (2005, p. 3) é ainda mais severo com o
nosso atual quadro institucional:
“... o estabelecimento de uma autêntica soberania do povo,
usurpada pelos grupos oligárquicos que se sucedem
ininterruptamente no poder, será alcançado mediante o
concurso de duas ações de longo alcance: a criação de
instituições adequadas e a formação generalizada de um espírito
público, isto é, do respeito integral aos valores republicanos e
democráticos.”
Apesar desta visão crítica e rigorosa da democracia contemporânea, com
suas promessas não cumpridas e seus obstáculos, Bobbio me parece lúcido quando
afirma que os regimes democráticos ainda são bem diferentes dos autocráticos.
Existem direitos civis, eleições periódicas e relativa independência entre os poderes.
O que observamos é a existência de democracias mais ou menos sólidas e diversos
graus de aproximação com um modelo ideal. É evidente que também são
necessários procedimentos que aperfeiçoem a democracia representativa
tradicional: reformas partidárias e eleitorais, maior transparência nos atos dos
poderes executivo, legislativo e judiciário, mecanismos mais rígidos no combate à
impunidade etc.
Há também a questão dos valores: as regras formais da democracia estão em
consonância com ideais como tolerância e renovação. Considero também a questão
do dissenso, citada por Bobbio, como fundamental. O respeito ao dissenso diz muito
sobre o nível de amadurecimento e aprofundamento de um regime democrático.
De acordo com Bobbio, Matteucci e Pasquino (2004, p. 364), pelo menos
duas características em regimes que convivem com o dissenso: existência da
possibilidade de manifestá-lo e presença de algum grau de receptividade nestes
regimes. Os autores acrescentam:
15
“...as duas características atrás mencionadas e a
concepção do dissenso como modo de articulação da demanda
política existem e são possíveis num regime democrático.
Mais: um regime será tanto mais democrático quanto mais
evidente for a existência dessas duas características”.
Em outro trabalho importante, Igualdade e liberdade, Bobbio (1997), afirma
que estes valores servem de fundamento para a democracia. Embora as sociedades
livres e iguais sejam apenas hipotéticas, estes ideais devem atuar em um contexto
de aperfeiçoamento da democracia. Acredito que a participação popular
institucionalizada na vida política de um município contempla ambos os valores e
fornece um exemplo prático que nos ajuda a torná-los menos abstratos. Igualdade,
porque permite uma inclusão maior de pessoas menos habituadas a contribuir com o
processo político local. Liberdade, porque os novos arranjos institucionais de
participação popular aumentam o poder de atuação do cidadão em um contexto
tradicionalmente hierárquico e fechado.
John Friedmann (1992), ressalta um aspecto fundamental para a democracia,
se quisermos considerá-la em um sentido mais amplo. Se a sociedade civil se divide
por interesses ideológicos e materiais, torna-se necessário pensarmos com mais
cuidado sobre a expressão democracia inclusiva. O autor defende a idéia de um
desenvolvimento alternativo que permita o “apoderamento” das classes excluídas.
Essa idéia baseia-se na possibilidade de que a população mais pobre possa
conseguir, através da organização local e de práticas participativas, inclusão social,
econômica e política. Acrescenta que devemos pensar em um modelo alternativo ao
atual modelo excludente. O desenvolvimento alternativo não precisa descartar a
eficiência econômica, mas não deve focá-la como objetivo único. Nas palavras do
autor:
16
“In short, an alternative development incorporates a political
dimension (inclusive democracy) as one of its principal ends of
action. It does not make a fetish of economic growth but searches
for an “appropriate” path that includes growth efficiency as one of
several objectives that must be brought into harmony”. (1992, p.
34)
Na mesma linha de pensamento, Dowbor (2006, p.93) valoriza o conceito de
democracia econômica.
“Interesses não representados o influem no processo
decisório, e tendem a gerar tragédias, pois virão se manifestar
quando os prejudicados já atingiram o nível do desespero. A
democracia econômica consiste portanto em inserir nos processos
decisórios os diversos interesses passíveis de serem
prejudicados.”
Uma rápida verificação nas estatísticas relativas à pessoas que vivem abaixo
da linha de pobreza, bem como os números relativos à subnutrição infantil e à
violência no Brasil e no mundo é suficiente para entendermos a importância da
democracia econômica. Na visão do autor, se a realidade se transforma
profundamente, “é natural que mude um instrumento importante da sua
interpretação, a ciência econômica” (2006, p. 3). A teoria econômica tradicional não
abrange uma série de questões relativas à qualidade de vida e à desigualdade
social.
As estatísticas internacionais relativas à distribuição de renda colocam o
Brasil em uma situação extremamente delicada. O Relatório Sobre o
Desenvolvimento Mundial de 1997 traz dados alarmantes sobre a posição do país
face a este quesito.
17
Tabela 1
Distribuição percentual de renda ou do consumo
Países de renda
média alta
Ano da
pesquisa
Índice
de Gini**
10%
inferiores
10%
superiores
África do Sul 1993 58,4 1,4 47,3
México 1992 50,3 1,6 39,2
Brasil* 1989 63,4 0,7 51,3
Rep. Tcheca* 1993 26,6 4,6 23,5
Malásia* 1989 48,4 1,9 37,9
Hungria 1993 27,0 4,0 22,6
Chile* 1994 56,5 1,4 46,1
Eslovênia* 1993 28,2 4,1 23,8
Fonte: Banco Mundial (1997, p. 233). Trecho selecionado.
(*) Os dados referem-se à renda per capita. Nos demais países, à despesa per capita.
(**) Segundo as notas técnicas da publicação (p. 264), “O índice de Gini mede o grau em
que a distribuição de renda (ou, em alguns casos, do consumo) entre indivíduos ou
famílias dentro de uma economia difere de uma distribuição perfeitamente uniforme”. E
complementam: “... um índice de Gini equivalente a zero representa igualdade absoluta e
um índice de 100% desigualdade absoluta.”
O Brasil está, entre os países definidos como de renda média alta, na última
colocação em distribuição de renda. A apropriação de apenas 0,7% da renda
nacional, entre a população situada da faixa dos 10% mais pobres, nos fornece um
subsídio importante para compreendermos a dimensão desta questão.
O termo democracia, apesar de parecer escorregadio e possuir múltiplas
definições, conseguiu um prestígio ímpar no debate político contemporâneo. A
defesa dos princípios ditos democráticos confere, via de regra, uma espécie de
chancela quase universal de legitimação. Isto não significa que a democracia ainda
18
não esteja em fase inicial de implementação e que não existam mais ferramentas
para que ela seja aperfeiçoada e solidificada.
Séculos se passaram, revoluções liberais e socialistas ocorreram. Aos
poucos, o sistema democrático e o estado de direito vão se consolidando e
mostrando, além dos defeitos, qualidades importantes.
19
2. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DEMOCRACIA PARTICIPATIVA
Feitas algumas considerações sobre as características da democracia
contemporânea, vamos introduzir uma breve reflexão sobre os conceitos de
democracia representativa e participativa.
Embora de significado polêmico, os termos em questão têm ganhado espaço
privilegiado no debate político contemporâneo. Não pretendo aqui apresentar uma
visão definitiva dos conceitos de democracia representativa, participativa ou mesmo
direta, mas creio que algumas considerações sejam importantes para os temas que
serão tratados nos capítulos seguintes. Procurarei também situar o orçamento
participativo como mecanismo praticado no contexto destas novas democracias.
2.1 A
REPRESENTAÇÃO CLÁSSICA E A INTRODUÇÃO DE NOVOS MECANISMOS
Considerado por muitos como o pai da democracia, Rousseau questiona o
conceito de representação. Na verdade acredita que este mecanismo desvirtuaria o
verdadeiro sentido da democracia. A representação é vista como uma alienação da
soberania. Afirma no início Do Contrato Social, Livro III (2006, p. 63): “Vimos que o
poder legislativo pertence ao povo, e não pode pertencer se não a ele”. E confirma
a idéia mais adiante:
“... logo os deputados do povo não são, nem podem ser
representantes seus; são comissários dele, e nada podem
concluir decisivamente. É nula, nem é lei aquela que o povo em
20
peso não retifica. Julga-se livre o povo inglês, e muito se engana,
que o é durante e eleição dos membros do parlamento, finda a
qual, hei-lo na escravidão, hei-lo nada”.
Mas por outro lado, Rousseau considerava a verdadeira democracia
impraticável. “Rigorosamente nunca existiu verdadeira democracia, e nunca existirá.
É contra a ordem natural que o grande número governe e seja o pequeno
governado”. E complementa: “Se houvesse um povo de deuses, seria governado
democraticamente, mas aos homens não convém tão perfeito governo”.
Segundo Bobbio (2000, p. 56), democracia representativa “...significa
genericamente que as deliberações coletivas, isto é, as deliberações que dizem
respeito à comunidade inteira, são tomadas não diretamente por aqueles que dela
fazem parte mas por pessoas eleitas para esta finalidade”. Uma definição simples e
clara. As eleições seriam, neste caso, o instrumento por excelência da democracia
representativa.
Sobre os limites da democracia representativa norte-americana, Osborne e
Gaebler (1994, p. 77-78) acreditam que o governo funcionaria melhor se houvesse
maior transferência de responsabilidades para o cidadão por meio da participação
democrática. Aumentar o número de eleições já não faz tanto sentido.
“Nos Estados Unidos, mais eleições do que
virtualmente em qualquer outro país eleições nacionais,
estaduais, municipais, para a administração das cidades, para as
juntas escolares, os distritos de distribuição de água, os conselhos
de trânsito ... Temos em todo o país 504.404 autoridades eleitas,
uma para cada 182 eleitores. Todos conhecemos o sentimento de
perplexidade que nos acomete na cabine de votação, depois das
21
Os autores complementam afirmando que a população gostaria de exercer
maior controle sobre os assuntos que afetam diretamente a sua vida.” Citam uma
pesquisa realizada em 1989 que revelou que cerca de 75% dos norte-americanos
achavam que “a maioria dos membros do Congresso cuida mais de interesses
especiais do que de pessoas como nós.”
Osborne e Gaebler levantaram uma série de novas práticas de governança
participativa, algumas das quais comentaremos mais adiante.
Por democracia participativa compreende-se a utilização de instrumentos por
meio dos quais os atores sociais aproveitam novos espaços abertos
institucionalmente pela administração pública. Num levantamento preliminar,
podemos considerar, como mecanismos de participação popular no Brasil, o
Orçamento Participativo, os Conselhos Gestores, as Audiências Públicas, o
Referendo, o Plebiscito e o Projeto de Lei de Iniciativa Popular.
Os instrumentos de participação popular no país são ainda muito restritos,
embora, estejam contemplados, mesmo que de maneira genérica, tanto na
Constituição Federal, como na legislação infraconstitucional.
Maria Victória Benevides (1991) nos lembra que o art. da Constituição traz
o princípio de que “todo poder emana do povo” e “que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. O texto da
Carta Magna aponta para o caminho da associação da democracia representativa
com mecanismos de democracia direta, ou seja, surge a idéia da democracia
semidireta, defendida pela autora que cita exemplos em países europeus como
Suíça, Itália e França, além de material bibliográfico e documental sobre a
“legislação direta” nos Estados Unidos.
A nossa constituição é mais específica no que se refere a participação
popular quando contempla o referendo, o plebiscito e a iniciativa popular.
Instrumentos importantes para a democracia, sem dúvida, porém utilizados muito
raramente. O que se busca aqui são espaços de participação que, além de
instituídos legalmente, façam parte do dia a dia do cidadão.
22
O artigo 48 da Lei Complementar nº. 101/2000 (a conhecida Lei de
Responsabilidade Fiscal) fala de incentivo à participação popular e realização de
audiências públicas durante o processo de elaboração da peça orçamentária.
Embora insuficiente para garantir uma participação popular efetiva, acredito que o
texto da Lei seja um avanço neste sentido. A Lei nº. 10.257/2001 (Estatuto da
Cidade) também inclui elementos de participação popular no planejamento urbano;
porém, para que esteja em pleno vigor, é necessário que alguns de seus artigos
sejam regulamentados em nível municipal.
Os conselhos gestores (estaduais e municipais) em áreas, como, por
exemplo, educação, saúde e meio ambiente, são um pequeno avanço em termos
de uma administração pública mais participativa. Embora alguns deles tenham um
caráter deliberativo, mantém-se o predomínio de características meramente
consultivas e fiscalizadoras.
Em 1989 surgiu na cidade de Porto Alegre uma nova forma de execução do
orçamento público municipal. O processo de elaboração da Lei Orçamentária Anual,
que tradicionalmente costuma ser feito por técnicos do poder executivo e posto em
prática depois de algumas alterações da Câmara Municipal, ganhou uma nova fase
em sua elaboração. A inovação foi a consulta (devidamente institucionalizada) da
população portoalegrense sobre demandas votadas em assembléias organizadas
por sub-regiões: o Orçamento Participativo.
Tenho, por hipótese, que o Orçamento Participativo seja um elemento válido
como mecanismo de democracia participativa. É o instrumento que, a meu ver, tem
demonstrado maior avanço em direção ao controle do Estado por parte da
sociedade civil organizada, apesar de suas limitações e dificuldades de
implementação. É interessante notar que seja utilizado justamente na área
orçamentária do setor público, a mais delicada e polêmica. É uma mudança no
desenho institucional de algumas cidades brasileiras que terá, como veremos,
diferentes resultados quando aplicado em diferentes lugares.
23
2.2 A
RESISTÊNCIA À PARTICIPAÇÃO POPULAR
O tema da participação popular vai ganhando maturidade à medida que o
"assembleísmo" vai sendo substituído pela visão de que o cidadão participativo pode
e deve contribuir para uma maior eficiência do Estado e das instituições de caráter
público de um modo geral. Mesmo assim, ainda existem muitas resistências à idéia.
Benevides observa que os mecanismos de democracia participativa de fato
corroem o poder dos partidos como detentores da expressão da vontade popular. Na
verdade quebram o monopólio partidário. Na relação entre os partidos e os
mecanismos de democracia participativa, os políticos temem, além da
“impresivibilidade” do eleitorado, perder a direção do processo. Num contexto em
que mecanismos de democracia participativa estejam ativos, receiam que grupos
como sindicatos, associações e lideranças religiosas influenciem o “seu” eleitorado.
Mas, devemos sempre lembrar que a idéia da participação popular não está em
substituir ou esvaziar os poderes legislativo e executivo, mas corrigir seu
distanciamento da população bem como suas omissões em relação a procedimentos
que beneficiem os cidadãos.
Observa-se que muitos argumentos conservadores, tradicionalmente
utilizados contra a democracia, o hoje apresentados para questionar a
participação popular e, ironicamente, defender a democracia representativa
tradicional. Benevides (1991, p. 80) cita alguns: “O povo não sabe votar; é
incompetente, incoerente e irresponsável; é conservador e preconceituoso; o povo
pode ficar apático: “excesso de democracia mata democracia”; é vulnerável aos
grupos de pressão e influenciável pelos “superorganizados” e é dominado pela
“tirania da maioria”. Com o passar dos anos e o amadurecimento democrático, esta
visão negativa da democracia tende a ser relativizada ou amesmo substituída por
um pensamento mais comedido. Sobre este aspecto acredito ser relevante o
24
citado trabalho de Pedro Pontual
3
sobre os aspectos pedagógicos do Orçamento
Participativo.
Algumas críticas específicas a respeito do Orçamento Participativo (OP) creio
que também sejam dignas de nota: “As prefeituras repassam para o OP uma parcela
muito pequena do Orçamento Municipal”, “As assembléias podem ser manipuladas
devido à presença de grupos organizados com interesses específicos” ou ainda
“existem situações em que as demandas votadas e aprovadas no OP não chegam
de fato a ser executadas devido à complexidade do processo orçamentário”.
Acredito que estas observações sejam pertinentes, em algumas conjunturas, e nem
sempre devam ser consideradas como “resistência à participação popular”. Ainda
assim, pode-se afirmar que o OP tem demonstrado ser um canal importante como
mecanismo de democracia participativa.
2.3 A
COMPLEMENTARIDADE DAS DEMOCRACIAS
Bobbio (2004), defende a idéia de que a crítica à democracia representativa
não leva necessariamente à democracia direta. Embora polêmico, o conceito de
representação deve ser entendido e desenvolvido. Se A representa B, é necessário
fazer no mínimo duas indagações: “O que representa?” e “Como representa?”. Até
que ponto o representante possui um mandato imperativo, pelo qual é obrigado a
defender demandas específicas do seu representado? Nas democracias ocidentais
não é assim. O autor lembra o art. 67 da Constituição italiana: “Cada membro do
Parlamento representa a Nação e exerce suas funções sem nculo de mandato”
(muito embora existam em certos setores representações especificamente
orgânicas, como por exemplo, nos sindicatos e entidades estudantis).
Segundo o autor, a democracia representativa teria muito espaço para
crescer e se aprofundar. Tanto no sentido da democratização do Estado como da
3
No capítulo n. 6 desta dissertação veremos mais informações sobre este aspecto da participação popular.
25
sociedade. a democracia direta, na acepção mais rigorosa da palavra, seria de
difícil implantação para o tipo de sociedade em que vivemos.
Benevides (1991) nos traz algumas considerações importantes a respeito
desse tema. Existem empecilhos evidentes para o sucesso da efetiva participação
popular no processo político e administrativo como baixa escolaridade, grandes
disparidades sócio-econômicas e desencanto com a vida política de um modo geral.
Apesar de alguns obstáculos, a democracia participativa tem demonstrado
vantagens evidentes para a melhoria do sistema político como um todo. Não se trata
de substituir a democracia representativa pela direta ou semidireta. Isso seria
inviável. A criação de novos mecanismos institucionais não significa prejuízo algum
para o aperfeiçoamento da tradicional democracia representativa nem para a
melhoria do sistema partidário e eleitoral vigente. A democracia representativa e a
democracia direta não devem ser excludentes, mas complementares. Benevides
(1991) esclarece que o termo democracia direta deve ser situado num contexto atual
e aplicado em situações específicas.
Considero estas colocações pertinentes como resposta aos críticos da
democracia direta que procuram enquadrá-la como uma forma de organização
política impossível devido à complexidade das sociedades contemporâneas. Desta
forma evitamos o equívoco que “reside tanto na metonímia – tomar um aspecto pelo
todo quanto no anacronismo o transplante histórico, sem mediações, para a
realidade contemporânea” (BENEVIDES, 1991, p. 45).
Acredito que um mecanismo como o orçamento participativo seja, em tese,
muito mais próximo da democracia direta do que da representativa. Em uma eleição
tradicional, o cidadão deposita o nome de seu representante na urna e aguarda mais
quatro anos por uma nova votação. No caso de uma cidade que adote o OP como
forma de aprimoramento da democracia, temos a realização de assembléias
informativas e deliberativas com abertura de participação a todos os cidadãos que
residem na região. Nessas assembléias, além da votação das demandas escolhidas
pelos moradores, existe a eleição de delegados e conselheiros. Tais representantes
levarão as demandas para as instâncias técnicas que elaboram a peça
26
orçamentária. Portantanto, rigorosamente falando, existe um certo nível de
representação no processo. No bojo do OP existem componentes tanto de
demoracia direta como também, de representativa.
Assim, para evitar equívocos conceituais e debates desnecessários,
designarei democracia participativa para nomear mecanismos como o Orçamento
Participativo.
27
3. ALTERAÇÕES DO DESENHO INSTITUCIONAL E GOVERNANÇA
DEMOCRÁTICA
Existe, atualmente, uma tendência de que novos desenhos institucionais se
proponham a abrir espaços para a ampliação da cidadania. Veremos, neste capítulo,
algumas situações de parceria do poder público com a sociedade civil. Para o
levantamento de algumas experiências, me foi de grande valia o Relatório do Banco
Mundial. A instituição realizou um trabalho criterioso e abrangente, do qual pude
selecionar casos que apresentavam algum nível de conformidade com os objetivos
dessa dissertação. O livro de Osborne e Gaebler, Reinventando o Governo, me fez
conhecer experiências norte-americanas participativas.
Inicio o capítulo com a visão do cientista político Robert D. Putnam (1993)
sobre a descentralização ocorrida na Itália, bem como seus efeitos em termos de
desempenho institucional. A escolha deste caso como o primeiro das novas práticas
de governança que veremos a seguir, deve-se ao fato de que nele ocorre a
introdução de um conceito fundamental para o entendimento da alteração dos
desenhos institucionais: o capital social.
28
3.1 A VISÃO DE R. PUTNAM E O CASO ITALIANO
Se o Estado não está funcionando a contento, o que é de suma gravidade
para o mundo contemporâneo, estudos que procuram apresentar alternativas para
aumentar, ou ao menos mensurar sua eficiência, ganham pertinência e prioridade.
Além da questão da aplicação de um novo desenho institucional em uma
sociedade heterogênea, o trabalho de Putnam tem outro ponto em comum com a
nossa realidade: a constatação de que tanto como o novo modelo
administrativo surtiu mais efeito em locais onde havia uma tradição de trabalho
comunitário. Ou seja, a presença do capital social. Por estudar alterações no
desenho institucional e pela importância conferida ao capital social, autores como
Putnam nos fornecem um modelo importante para a reflexão sobre os novos
caminhos da democracia.
A Itália estabeleceu entre as décadas de 70 e 90 os chamados governos
regionais. Enquanto o Brasil vivia os anos de chumbo da ditadura militar, a Itália,
durante os anos 70, atravessou uma fase de intensa luta política em prol da
descentralização administrativa e do aperfeiçoamento de suas instituições
democráticas. Putnam realizou um detalhado trabalho (durante 25 anos) explicando
como se deu a reestruturação do desenho institucional na Itália e o porquê dos
diferentes resultados em termos de desempenho institucional nas diversas regiões
do país.
Inicialmente formularam-se algumas questões capitais: por que a região da
Emilia Romagna, por exemplo, obteve melhor desempenho que a região da Puglia?
Quais seriam as variáveis que interferem de maneira significativa na qualidade das
ações do governo? Seria possível medir o desempenho das instituições?
Putnam realizou um estudo sobre a história da Itália em suas diferentes
regiões. Através de um cuidadoso levantamento de aspectos políticos, sociais e
culturais da história recente do país, chegou a algumas conclusões importantes:
29
- Grande disparidade entre o norte e o sul em termos de modernidade
econômica.
- Diferenças entre a qualidade das tradições cívicas nas regiões, que ocorrem
de longa data, desde antes da unificação, que se deu nos meados do século XIX.
Nítidas diferenças também no modo de fazer política: no norte ação coletiva
"horizontal". No sul, práticas "verticais". Práticas que conhecemos no Brasil como
"clientelismo" e "coronelismo".
- Fortes resistências à descentralização. Uma das primeiras reações
importantes ao excesso do poder centralizado em Roma aconteceu, embora de
maneira tímida, na Constituição de 1948. Apenas na década de 70 aconteceram
mudanças mais consistentes com relação a um novo desenho institucional que
conferiam maior autonomia às regiões.
Como veremos a seguir estas diferenças entre as regiões da Itália são de
suma importância para o estudo em questão.
3.2 O
DESEMPENHO INSTITUCIONAL
Putnam destaca duas questões fundamentais em relação às instituições
quando tratamos de um governo representativo: sua sensibilidade e sua eficácia. Se
estivermos falando de um estado democrático de direito, é evidente que a
preocupação básica é a congruência de interesses entre os cidadãos e seus
representantes. É de se esperar que os governantes tenham sensibilidade às
demandas de seu eleitorado.
Mas sensibilidade não basta. É preciso que as coisas funcionem. Um bom
governo, além de atento aos interesses dos eleitores, precisa agir com eficiência.
Para averiguar de modo convincente o desempenho institucional dos governos da
30
Itália, Putnam estabeleceu quatro requisitos que deveriam ser preenchidos pela
instituição:
1. Abrangência
2. Ser internamente coerente
3. Ser confiável
4. Corresponder aos objetivos e critérios dos protagonistas e dos membros da
instituição
A seguir foram estabelecidos 12 indicadores de eficácia governamental em 20
regiões
1. Estabilidade do gabinete
2. Presteza orçamentária
3. Serviços estatísticos e de informação
4. Legislação reformadora
5. Inovação legislativa
6. Creches
7. Clínicas familiares
8. Instrumentos de política industrial
9. Gastos na agricultura
10. Gastos com unidade sanitária
11. Habitação e desenvolvimento urbano
12. Sensibilidade da burocracia
Para aumentar a eficácia da avaliação, foi feito um trabalho detalhado ao
longo do tempo, região por região. Ao final, ela foi comparada com as opiniões de
líderes comunitários e eleitores italianos. A quantidade de indicadores bem como a
correlação entre eles possibilitou coerência e fidedignidade para a avaliação.
Os resultados da pesquisa revelam que certas regiões são nitidamente mais
bem administradas do que outras. A pesquisa mostra também que este desempenho
tem causas evidentes e possíveis de serem aferidas.
O mapa a seguir mostra a Itália com suas regiões e seu ranking em termos de
níveis de civismo e, a seguir, sua correlação com o desempenho institucional.
31
Figura 1 - A comunidade cívica nas regiões italianas
Fonte: Putnam (1997, p. 111)
Figura 2
Fonte: Putnam (1997, p. 112). Siglas no anexo.
32
A análise das figuras acima demonstra uma ótima correlação entre o bom
desempenho do governo regional e as tradições cívicas
4
. Esta correlação é amais
significativa do que a estabelecida entre modernidade econômica e desempenho
institucional.
As conclusões vão ao encontro do que, na literatura, Putnam identificou como
três maneiras de explicar o desempenho institucional:
Projeto institucional - (o próprio desenho das instituições, seu aspecto formal e
jurídico).
Fatores sócio-econômicos - (bem estar e modernidade).
Fatores sócio-culturais - (tradições cívicas, associativas).
Destas, o autor privilegia fortemente a última, embora reconheça também a
importância das duas primeiras.
Putnam conclui que ao final do processo de descentralização efetivamente
ocorreram mudanças na vida dos italianos. Mudanças lentas, porém consistentes.
Um exemplo foi a nítida melhora no planejamento urbano. Observou também que o
eleitor italiano começou a ter uma visão menos ideológica e mais pragmática da
política. Ressaltou a importância do capital social, conceito que envolve confiança,
trabalho em conjunto e redes de relacionamentos. É um aspecto da vida social que
melhora a democracia, a vida cívica em geral e principalmente o desempenho
institucional. O autor constatou que certas regiões são mais bem governadas do que
outras embora com recursos jurídicos e financeiros similares. São justamente
aquelas que apresentam alto peso de tradições cívicas.
4
Para aferir a participação cívica o autor pesquisou dados como número de associações, participação na vida
política, número de leitores de jornais, níveis de confiança e solidariedade etc.
33
3.3
N
OVAS PRÁTICAS DE GOVERNANÇA
Segundo Gohn (2001, p. 38), nas últimas décadas presenciamos o
surgimento de um novo conceito de ciência política: o de governança. Este conceito
surgiu associado a pelo menos dois outros aspectos importantes: o de que a
sociedade civil é um agente cada vez mais importante na execução da
administração pública e que existem direitos civis que precisam ser preservados. A
autora afirma que:
“a esfera pública não-estatal é incorporada via novos
atores, que entraram em cena nas décadas de 1970/80,
pressionando para obter equipamentos coletivos blicos,
melhores condições materiais e ambientais de vida, direitos
sociais, cidadania, identidade de raça, etnia, gênero, geracional
etc.”
O termo também pode ser entendido como boa governança ou simplesmente
governança democrática. Sobre esta última terminologia, Santos Jr., Azevedo e
Ribeiro (2004, p. 19) denominam o termo como:
“...os padrões de interação entre as instituições
governamentais, agentes do mercado e atores sociais que
realizem a coordenação e, simultaneamente promovam ações de
inclusão social e assegurem e ampliem a mais ampla participação
social nos processos decisórios em matéria de políticas públicas.
Tal padrão de interação entre governo e sociedade se expressa
em canais ou arenas, institucionais ou não, de intermediação
entre instituições governamentais e atores sociais.”
O Banco Mundial tem se mostrado bastante preocupado com questões
ligadas à governança e particularmente com a participação do cidadão na esfera
pública. No Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial de 1997, um capítulo
34
inteiro denominado O Estado mais próximo do povo dedicado a este tema. Diz o
texto que, a despeito de uma possível boa vontade em implementar políticas de
inclusão social, um governo distante da população terá poucas possibilidades de
atender eficientemente às necessidades coletivas. O mesmo capítulo procura
examinar mecanismos para fazer com que toda a gama de interesses da sociedade
seja contemplada pelas políticas públicas. A visão da instituição é de que as práticas
participativas aumentam a capacidade institucional em três aspectos: em primeiro
lugar, pelo ganho de credibilidade auferido com a participação ativa do cidadão, em
segundo lugar, com a redução dos problemas relativos à informação fornecida, por
exemplo, por associações cívicas; e em terceiro, pelos benefícios gerados com
parcerias feitas com a sociedade para a prestação de serviços blicos, como por
exemplo, com as ONGs.
Embora seja aceito que certas áreas devam ficar isoladas de pressões
políticas, o Relatório (1997, p. 123) cita os exemplos de produção agrícola e do
sistema de saúde como casos em que a deliberação público-privada é “não
desejável como, de fato, essencial para o sucesso”. Refere também casos em
Botsuana, Chile, Estados Unidos e México como exemplos de nações que
implementaram mecanismos de deliberação sobre “assuntos que vão da política
econômica à reforma institucional”. Instrumentos de informação e consulta são vistos
como essenciais e podem melhorar a qualidade dos serviços públicos. Existem
alternativas especialmente úteis nos casos de limitada capacidade institucional. O
caso de Bangalore, na Índia é lembrado pela utilização de “fichas de avaliação”
feitas por cidadãos usuários de órgãos blicos. Uma organização o
governamental de Bangalore analisa os resultados e ao invés de propor algum tipo
de punição para casos de atendimento inadequado, realiza uma “abordagem
conjunta dos problemas de prestação de serviços, envolvendo os cidadãos e o
governo”. O sucesso deste procedimento fez com que outras cinco cidades da Índia
o utilizassem.
Pesquisas deste tipo também foram realizadas em Uganda e na Nicarágua.
No primeiro caso, o recolhimento de prestações de serviços constatou a
necessidade de uma maior consultoria agrícola entre as famílias rurais. O resultado
deste procedimento foi a instituição de treinamento adicional em vários distritos do
35
país. Na Nicarágua, pesquisas feitas com usuários de transporte público resultaram
em uma série de procedimentos para a melhoria do serviço.
Além dos mecanismos de informação e consulta acima citados, o Banco
Mundial traz também experiências de mecanismos de elaboração e implementação
nos quais existe uma efetiva participação dos interessados na preparação e
implementação de serviços públicos. Neste aspecto, a área de educação aparece
como um campo promissor para estas experiências. Na Nova Zelândia e no Sri
Lanka foram realizadas parcerias promissoras. Seja através de conselhos
deliberativos integrados por pais de alunos, seja pela criação de conselhos de
desenvolvimento escolar com participação comunitária. O Relatório de 1997
acrescenta que nos casos onde houve gestão participativa, as comunidades se
mostraram mais propensas a colaborar no financiamento das escolas. Apesar do
aparente êxito da experiência, um obstáculo foi detectado: na Nova Zelândia deu-se
conta de que seria necessário aplicar aos conselheiros um treinamento que os
habilitasse a uma participação mais produtiva. Em países na África, onde existe
dificuldade de se obter pessoal qualificado para a administração comunitária de
escolas rurais, uma ONG internacional oferece treinamento para associações de
pais e mestres.
Com relação à gestão de recursos ambientais, as práticas participativas têm
se mostrado essenciais em diversos países. Na Índia, a Polícia Florestal Nacional
conta com a crescente participação de ONGs e comunidades locais. Existe uma
gestão conjunta que inclui compartilhamento do poder decisório sobre a receita
florestal. De acordo com o Banco Mundial, o resultado deste processo foi a
diminuição dos conflitos e o aumento da produtividade da terra. No Zimbábue um
programa denominado CAMPFIRE (Programa Comunitário de Administração de
Áreas para os Recursos Nativos) cujo objetivo é demonstrar os benefícios da
proteção da vida silvestre e da fauna para as comunidades locais. Um exemplo
prático do sucesso do programa foi o efeito positivo da proteção aos elefantes nas
receitas relativas ao turismo (SHUMBA, 2006).
Nos anos 80 em Houston, Texas, foi realizada uma experiência participatória
na área de segurança pública bastante significativa. O método de trabalho adotado
36
foi escolhido pelo então chefe da polícia local (Lee Brown, que posteriormente
comandou a polícia de Nova Iorque implantando naquela cidade um programa que
ficou mundialmente conhecido) e está relatado no trabalho de Osborne e Gaebles
(1994). Na ocasião foram instalados 20 minipostos nos bairros, e os policiais foram
orientados a se aproximar das associações comunitárias e igrejas e a visitar as
famílias da região para conversar sobre os problemas de segurança locais. A idéia
era transformar a segurança pública em uma responsabilidade da comunidade e não
apenas da polícia. Essa nova postura levou os policiais a participar de atividades
que transcendiam àquelas normalmente desenvolvidas em uma corporação
tradicional. Tais atividades iam desde ajudar os membros da comunidade a se livrar
de entulhos até a trabalhar com líderes locais para evitar a evasão escolar.
Em Tulsa, Drew Diamond, a polícia estudou casos de detenção que
envolviam problemas relacionados a drogas e problemas de conjuntos residenciais
habitados por famílias de baixa renda. Ao concluir que jovens de um único bairro
residencial eram responsáveis por grande parte dos problemas relacionados às
drogas, o poder público pôde atuar de maneira mais efetiva. Através de uma
parceria entre a comunidade e a polícia, os moradores que ajudavam os traficantes
foram afastados ou processados. Concomitantemente foi criado um programa de
educação contra as drogas e de empregos para jovens
37
no fim do mês. É natural que, quando as comunidades têm o
poder de resolver seus problemas, funcionem melhor do que
aquelas que dependem de serviços fornecidos por outrem.”
(
OSBORNE e GAEBLES,
1994, p.53)
Sem se utilizar dos termos capital social ou densidade associativa, os autores
afirmam que existe nos Estados Unidos uma tradição em organizações de auto-
ajuda e responsabilidade pelos problemas das comunidades “tão antiga quanto a
expansão rumo ao Oeste”. Citam a criação de creches, ligas de clubes locais,
organização de escoteiros e organizações voluntárias de diversos tipos. Em seguida
alertam para o fato de que os assuntos relacionados ao setor público não seguem
esta tradição e estão em muitos casos em mãos de burocratas e distantes da
população. O morador das comunidades é visto mais como um cliente dos serviços
públicos do que como um cidadão, ao qual se poderia atribuir uma rie de
responsabilidades.
Na Bahia, um projeto digno de referência é a Rede Pintadas
5
. Segundo
Fischer e Nascimento (2003), a rede é uma organização informal constituída em
1999, mediante a ação da Prefeitura e das organizações sociais locais (sindicatos,
cooperativas, Igreja Católica etc). Seu objetivo é fomentar o desenvolvimento social
e econômico do município. A rede conta, atualmente, com onze associações e com
o apoio e a parceria de diversas entidades no Brasil e no exterior.
Fazem parte da rede organizações como uma associação de apicultores, uma
rádio comunitária, uma escola agrícola, um cinema vel e até uma cooperativa de
crédito
6
, que exerce funções bancárias tradicionais.
Para sua formação, a rede aproveitou recursos remanescentes de um projeto
de financiamento do BNDES
7
para autogestão agrícola nos anos 80. O projeto,
5
Município localizado na região conhecida como polígono das secas, com cerca de 11 mil habitantes e de
população predominantemente rural.
6
Segundo Fischer e Nascimento (2003), o único banco da cidade foi fechado pelo Governo do Estado em 1997.
A criação da cooperativa de crédito acabou sendo uma resposta surpreendentemente bem sucedida do ponto de
vista da dinamização da economia local.
7
Os autores informam que estes recursos viabilizaram a Construção do Centro Comunitário de Serviços de
Pintadas (CCSP), que atualmente é uma das organizações que compõem a Rede.
38
embora o tenha tido continuidade, ajudou a reforçar o associativismo local, e,
conseqüentemente, facilitou a criação da Rede Pintadas alguns anos depois. Na
visão dos autores, o surgimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), nos
anos 80, também foi fundamental para o desenvolvimento da tradição comunitária
que, posteriormente, deu suporte ao surgimento do projeto.
Ao lermos sobre estas experiências, principalmente sobre a Rede Pintadas, é
importante refletirmos sobre o conceito de parcerias sociais. Mais abrangente do que
a simples cooperação, na visão de Quilici (2006, p. 109):
“...são formas privilegiadas de intervenção sobre os temas
do desenvolvimento humano saúde, expectativa de vida,
trabalho, geração de renda e educação, ou ainda sobre temas do
desenvolvimento social e ambiental, todos eles afetos às
dimensões de sustentabilidade.”
Na mesma linha de pensamento, Sachs (1999), defende um modelo de
desenvolvimento capaz de compatibilizar “vários tipos de eficiência”
8
e que atue no
sentido de:
“...articular os espaços do desenvolvimento, do local ao ao
transnacional;
- promover parcerias entre os principais atores do
desenvolvimento mediante negociação quadripartite envolvendo
os poderes públicos, o empresariado, os trabalhadores e a
sociedade civil organizada – o terceiro setor.”(1999, p. B2)
Existem situações em que estas novas práticas de desenvolvimento local
encontram um terreno fértil em termos de tradição cívica. De maneira geral, como
veremos mais adiante, a presença destas tradições possibilita um desenvolvimento
mais consistente destas novas práticas.
8
Sachs refere-se às seguintes eficiências: alocativa, macroeconômica, inovativa, ecoeficiência e distributiva.
39
4. PODER LOCAL E MUNICÍPIO NO BRASIL
I
Se falamos de participação popular no processo orçamentário, torna-se
fundamental entender algumas questões sobre as cidades brasileiras e importantes
alterações sofridas em um período relativamente recente.
Durante o séc. XX, o Brasil viveu um intenso processo de urbanização. De um
país predominantemente agrário e rural em que vivíamos ao final da República
Velha, passamos para um país fortemente urbano no final do século XX. Isso não
quer dizer que o país seja adequadamente urbanizado, no sentido completo da
palavra. De acordo com os dados do IBGE, o número de pessoas que vivia nas
cidades saltou de 31% em 1940 para mais de 80% no ano 2000 (91,8% na Região
Sudeste e 81,4% na Região Sul). Essa alteração se deu principalmente devido ao
aumento populacional, ao fluxo migratório de pessoas oriundas do campo e também
à incorporação de áreas antes consideradas rurais. Spink (1999) ressalta que ainda
existe uma significativa quantidade de municípios onde é comum perceber um
espaço misto urbano-rural ou urbano-vila-rural que o IBGE considera região urbana.
Acrescenta que houve uma grande evasão de trabalhadores acompanhada pelo
aumento da concentração de terra em latifúndios. Estes dados são especialmente
preocupantes se considerarmos que quase 80% dos empregos no campo são de
responsabilidade de estabelecimentos de menos de cem hectares.
Mesmo considerando que a maioria dos países desenvolvidos possui mais de
75% da população residindo em áreas urbanas, vale acrescentar que este processo
no Brasil ocorreu de maneira desordenada e com uma absoluta falta de
planejamento, salvo raras em exceções.
40
Como resultado, há cerca de 30 municípios no Brasil com mais de 500 mil
habitantes. É digno de nota que todos eles abrigam favelas e assemelhados
9
. Boa
parte da população destas cidades enfrenta problemas graves de falta de
saneamento básico, saúde, educação, transporte e habitação. Todos os três
municípios em que estudamos o processo do Orçamento Participativo apresentam
estas características.
II
A partir da Constituição de 1988, a legislação sobre municípios tem sofrido
alterações importantes com relação à sua autonomia e às suas responsabilidades. A
partir de então, os municípios foram encarregados de elaborar a sua própria
Constituição Municipal (Lei Orgânica do Município). O artigo 23 enumera diversas
tarefas setoriais cujas responsabilidades cabem simultaneamente aos três níveis
governamentais da federação: União, Estados e municípios. São elas: saúde,
educação e cultura, assistência social, segurança alimentar, moradia e meio
ambiente e patrimônio histórico (KRELL, 2003).
Vitale (2004) ressalta a ampliação dos poderes conferidos aos municípios
pela carta magna. Estes ganharam status de ente federativo, obtendo autonomia
política, administrativa e financeira (de acordo com os arts. 18, 29-31, 156, 158 e
159 da CF.). Também estão contemplados o planejamento local e a participação
popular através do art. 29, XII. Em 2001, com a promulgação da lei federal
denominada Estatuto da Cidade, a participação popular no planejamento municipal
ficou mais fortemente amparada pela legislação.
De acordo com o pensamento de Spink (1999, p. 192), a Constituição
sinalizou um desejo do país de reconfigurar três elementos que possuíam um
significado histórico distinto: poder local, município e cidadania. “O primeiro se
referia à oligarquia de mando; o segundo a um território físico e o terceiro a um jogo
simbólico do ter mas não ter”. Esta reconfiguração legal, evidentemente ainda não
9
Fatos e Números. São Paulo, Ed. Abril, 2005.
41
atingiu plenamente sua efetividade operacional. Trata-se apenas de um incipiente
conjunto de medidas no sentido de promover algumas mudanças no desenho
institucional do município enquanto entidade.
A Constituição de 1988 refez o pacto federativo naquilo que é mais polêmico
e delicado: a fração a ser recebida pelas entidades União, Estados e Municípios do
total de tributos arrecadados no país. O percentual de participação dos Estados e
Municípios melhorou significativamente em detrimento da participação da União no
total da receita
10
. A tabela 2 nos mostra alguns resultados destas alterações.
Tabela 2
Gastos totais por nível de governo (%)
País Ano Federal Estadual Local
Canadá 1992 41,3 40,3 18,4
EUA 1992 60,3 17,3 22,4
Áustria 1992 70,4 13,7 16,9
Austrália 1992 52,9 40,4 6,8
Brasil 1987 65,8 24,5 9,6
Brasil 1992 56,0 28,0 16,0
Fonte: Spink (1999, p. 194)
A tabela demonstra uma tendência, entre os países mais desenvolvidos, em
atribuir um percentual melhor de recursos para os municípios do que no Brasil. A
exceção é a Austrália, que possui forte concentração de gastos em nível estadual.
De acordo com visão apresentada no Relatório Sobre o Desenvolvimento
Mundial de 1997 (p. 127-128), não existe uma fórmula universal ideal para o
percentual de gastos a ser atribuído aos entes subnacionais. Cada país possui “uma
estrutura de disposições intergovernamentais” específica a ser considerada. Mas o
10
Uma explicação plausível para esta nova redistribuição das receitas tributárias pode estar em uma possível
debilidade política do poder executivo federal. No decorrer dos anos 90, o governo majorou e instituiu alguns
impostos federais (como por exemplo a CPMF, tributo que não é incluído nos fundos de participação de Estados
e Municípios) visando recuperar a capacidade de financiamento da União.
42
texto complementa afirmando que existem princípios que podem orientar os
responsáveis pelas políticas nacionais:
“O princípio mais claro e importante (freqüentemente
denominado princípio do subsidiarismo) é de que a provisão de
bens e serviços públicos deve ficar a cargo do mais baixo nível de
governo capaz de absorver inteiramente os custos e benefícios.”
Os dados demonstram, para o caso brasileiro, um inequívoco aumento dos
gastos locais, e uma ligeira melhoria dos estaduais, no início da década de 90.
O primeiro efeito prático desta nova divisão dos tributos foi, evidentemente,
um grande reforço na receita dos orçamentos públicos municipais. Este incremento
financeiro pode ser considerado um passo decisivo em termos de maior autonomia
da entidade federativa. Se considerarmos que é no município onde se avistam mais
de perto problemas como miséria, violência e urbanização desordenada, tanto este
novo aporte de recursos como as novas atribuições municipais previstas em lei o
tornam um local especialmente estratégico para o enfrentamento dessas questões.
O Relatório do Banco Mundial de 1997 ressalta que pode existir uma cilada
referente à descentralização política e fiscal. O endividamento subnacional pode
contribuir para a instabilidade macroeconômica. O caso do Brasil, nos anos 90, é
citado pelo Relatório como um exemplo de que é muito importante que a
descentralização fiscal seja proporcional a uma correspondente descentralização
das responsabilidades de despesa. O texto complementa afirmando que: “cumpre
melhorar a capacidade institucional dos governos estaduais e municipais, e o
governo federal deve exigir orçamentos rígidos nas suas relações fiscais e
financeiras com os governos subnacionais”. É interessante lembrar que três anos
após a publicação deste relatório, foi aprovada no Brasil a Lei de Responsabilidade
Fiscal (Lei 101/2000). Esta lei veio a acrescentar uma série de exigências para a
execução do processo orçamentário. Exigências que incluem a adoção de
procedimentos e técnicas administrativas no sentido de limitar gastos às receitas, às
despesas com pessoal bem como publicar relatórios periódicos da gestão fiscal
(CRUZ, 2000).
43
Mais do que o incremento de responsabilidades a serem assumidas pelos
municípios devido a estas novas normas legais (refiro-me aqui principalmente à
Constituição Federal de 1988), o que nos interessa é como o cidadão pode se
apropriar deste poder para influir sobre os destinos de sua comunidade. Apesar
destes novos dispositivos previstos em lei, ainda existe a predominância de centros
decisórios distantes do cotidiano do cidadão.
Com relação à nova Lei Orgânica do Município de São Paulo (LOMSP), cuja
promulgação se deu em abril de 1990, podemos afirmar que neste caso houve um
significativo avanço em termos de abertura para a participação popular. De acordo
com Calderón (1999, p. 159), esta lei
“...tem se caracterizado pela institucionalização de novos
mecanismos de participação popular na administração municipal.
Por institucionalização estamos entendendo, nesse caso, o
estabelecimento de bases legais que possibilitariam a
interferência da sociedade civil nos negócios públicos. Se, antes,
a participação ocorria através de mecanismos informais,
dependentes da vontade dos governos de turno, e o apelo à
participação popular era identificado como um estilo de governar
de determinado membro da classe política, com a
institucionalização a participação assume um novo status,
tornando-se um novo componente, com sustentação jurídica, na
gestão da coisa pública.”
O quadro a seguir mostra alguns destes mecanismos e princípios
consagrados na nova LOMSP.
44
Quadro 1
Princípios, Diretrizes, Instrumentos, Mecanismos de Participação Popular
aprovados na Lei Orgânica do Município de São Paulo
Princípios e Diretrizes que possibilitam a participação popular
O Poder Municipal pertence ao povo, que o exerce através dos
mecanismos contemplados pela Carta Magna, ou seja, o sufrágio
universal, a iniciativa popular o plebiscito e o referendo.
Princípios e diretrizes da organização do município: a prática
democrática, a transparência e controle popular na ação do governo, e
o respeito à autonse63.60059( )-34.6802(d59(p)3.60059(u)-6.8o(n)3.6005987539(o)3.60059(n)3.600594(l)3.5.12476(o)3.60059(s)-0.288)-34.6802(97.10)3.60059(op.6060059(t)-3.809( )-587.08(d)3.60059241107.08(d)3.6005924785(e)3.60059(s)-0.2862ãi)-7.2978841.60059(9o377960059(op.6o)3.60059( )-566.23)3.6005924()3.60059(n)563059(c)-0.287539(i)3.81c ci ci.4059( )-34.6.12476(a2476(a)3.628(d)259(n524)-587.08(d)3.600592411434(a)3.60059(u)3.60059p)3.60059(u)-6.8o(4(a)3.60059(u12476(a24059(9o377960059(op.6o)3.60(4(a)3.600)-07i)-7.297.60059(u)-6.185(b•( )-34.6802(d59(p)A2476(r)-1102(i)3.12476(crmo)3.60059( )-34.6494.6802(d59(p)A2476(r)-5188)14.0232(m22(P)-0.0481(u).60059( )-302(i)3.12476(crmo)3.60059( )-34.6494.6802(38476(r)-1102(i)3.12476.02(38476(r)-1102(i)3.12476r555(o)3.60059 á)3.60059(t)-3.41229(i)3.12476(c)-0.28753524)-587.08(d)3.6005920-)556]TJ-2.6494.6802(35920-)556]p-34.6802(p)-61476(c)-0.28753524)-58.60059(s92crmoM2(3599)55630059( )-34.65(t)-3.41229(a)3.604(r)-0.524185(e)3.60059(s)-0.286266(p)3ê5(o)3.60059 á)3.60059(t)7139(i)3.81c)-07i)-7.293.12476(r)-0.5130059( )-34.65(t)-3.p)3ê5(o)3.60059 á)3.60ti rd59(p)A1059(7539(e63.7059( )613.8349(r)-0.5240(4286266(p)35073338476(r)-4365837(s)-0.287535(o)3.60059 á)3.60t30059(op.6o)3.60.524185(s)-)r)-5188o9o377960059(op.6o)3.60(433sb14(i)3.12476(t)-3.41229c)-0.287539(o)3.60090059(op.6o)3.60(433s)m3R5266(p)3.60050.60059(o)3.60059( )-5945630059( )-34.65(t)-3R5266(p)3v400.4(a)36(o)3.60059(n)39( )-34.6802(e)86(o)059(t)-3.411.65(t)-3R5266(.706.60t)-3.4112476(crmo).287539(e63.60059( )7539(e63.9(t)-3.411.65(t)-3R5266(.706.60t)-3.4112476(crmo).287539(3R5266(.706.60t)-3.4112476(cp)-6.8o(n)3.600598752t34.6802(e)O33.7059( )613.8349(r)-0.5240(4286266(p)35073.286266(r)-0.524185(á)3.600545t)-3.4)A2476(r)-5188)14.0073.286266(r)-0.524185(á)3.600545t)-3.4É6005920-
45
Conselhos na Gestão Municipal
Conselho de Representantes De acordo com a proposta de
descentralização administrativa implícita na LOM, o município de
dividiria em subprefeituras, as Quais teriam um Conselho de
Representantes composto por moradores de uma região
administrativa.
Conselho Municipal da Saúde Órgão deliberativo e normativo, com
estrutura colegiada, composto por representantes do poder público,
trabalhadores de saúde e usuários.
Conselho municipal de Educação – órgão normativo e deliberativo,
com estrutura colegiada, composto por representantes do poder
público, trabalhadores da educação e da comunidade.
Fonte: Calderón (1999, p.161-163). Resumo. O texto original contém referências a
participação popular nas áreas de proteção ambiental, habitacional, segurança do
trabalho e patrimônio histórico.
Alguns destes mecanismos previstos na LOMSP demoraram um certo tempo
para serem regulamentados. A transformação das Administrações Regionais em
Subprefeituras veio a se concretizar mais de dez anos depois, na gestão
2001/2004.
III
Antes de pensarmos em qualquer mecanismo que amplie a participação do
cidadão nos destinos de um município, existem algumas pré-condições que devem
ser consideradas. Neste momento não me refiro a aspectos como tradição cívica ou
capital social. Veremos que estas condições são de fato relevantes, mas existe uma
pré condição elementar e fundamental que é a informação. Os dados relevantes
referentes ao município circulam de baixo para cima ou apenas no interior da
administração pública. Exemplo: da Câmara Municipal para o Tribunal de Contas. É
claro que existem imprensa oficial e os quadros de aviso dos poderes executivo e
legislativo que garantem o princípio constitucional da publicidade da administração
pública. Não é preciso dizer quão restritos estes meios de comunicação são para o
cidadão comum.
diversos sistemas de informação disponíveis para o cidadão: O IBGE, o
SEBRAE, a prefeitura etc. O problema é que estes sistemas são segmentados, não
46
permitem informações articuladas e abrangentes, além do mais, nem sempre são de
fácil acesso para o morador do município. Dowbor (2004) enfatiza que a sociedade
geralmente é vista como fornecedora de informações. Esta visão é coerente com a
idéia de que a sociedade é percebida apenas como usuária, e não como sujeito do
processo decisório.
tecnologias que podem facilitar este processo. Alguns municípios
disponibilizam alguns dados da administração na internet. De maneira geral são
experiências ainda muito incipientes. Dowbor defende a elaboração de uma
metodologia básica de um sistema de informação integrada municipal. O objetivo
seria melhorar a capacidade de geração de informação para a sociedade. Estas
informações podem ser muito importantes o para o munícipe se tornar mais
participativo como também facilitar e agilizar novos empreendimentos e o trabalho
das organizações não governamentais. A informação articulada e acessível constitui
uma importante ferramenta para a racionalização e integração econômica, social e
ambiental.
IV
Na visão de Dowbor (1999, p. 9-20), existem duas fontes que realimentam a
nossa passividade. Por um lado, o liberalismo econômico nos habitua a pensar que
não devemos nos intrometer na construção do mundo que nos cerca e que o
mercado nos conduzirá ao “melhor dos mundos”. Por outro, a visão de que o
planejamento central, a planificação “estatizante” poderia organizar nossas vidas e o
espaço urbano. Parece me pertinente a afirmação de que “as decisões, quando
tomadas longe do cidadão, correspondem muito pouco às suas necessidades”.
O autor acrescenta que a participação do cidadão sobre a transformação
social pode se dar mediante a utilização de três eixos: o político-partidário, o
sindical-trabalhista e o terceiro, que nos interessa de momento, o de participação no
“espaço local” ou “espaço de vida”. Existe uma forte tendência em diversos países
do mundo em criação de organizações relacionadas à participação do cidadão no
sentido de interferir na realidade local. Na Suécia, por exemplo, a média de
47
participação do cidadão é de quatro organizações comunitárias. No Brasil e em
países da América Latina também existem diversas experiências nesse sentido e
com conseqüências práticas importantes para a realidade local. Pode-se detectar
vantagens significativas em termos de qualidade de vida. Desde políticas capazes
de promover distribuição de renda até práticas fundamentais para a preservação do
meio ambiente como a coleta seletiva de lixo.
É evidente que esta evolução depende de aprendizados que vão sendo
adquiridos no decorrer da prática participativa. Dowbor conclui que este “terceiro
eixo” de atuação política tem efeitos renovadores sobre a nossa concepção de
democracia: “na realidade, o que se constata, é uma evolução da democracia
representativa, exercida a cada quatro anos, para uma democracia participativa e
permanente”.
No capítulo que se segue, apreciaremos um aspecto específico da ocupação
de espaços políticos em nível local, que é justamente a participação popular no
processo orçamentário.
48
5. O PROCESSO ORÇAMENTÁRIO E O OAMENTO PARTICIPATIVO
5.1 E
STRUTURA BÁSICA DO
OP
Tradicionalmente não existe no Brasil uma cultura de prestação de contas do
poder público à sociedade. O processo tradicional de elaboração da Lei
Orçamentária Anual (LOA) costuma ser feito por técnicos do Poder Executivo que
enviam o projeto de lei para a Câmara Municipal, que por sua vez, propõe emendas,
autoriza um determinado percentual de remanejamento, vota e devolve para o
prefeito promulgar e publicar (eventualmente com o veto de alguns artigos). De
posse deste documento, o chefe do poder executivo terá autorização legal para
utilizar os recursos públicos entre 1º de janeiro e 31 de dezembro do ano seguinte. A
LOA é como uma peça contábil que de um lado prevê as receitas e de outro autoriza
as despesas. O prefeito não é obrigado a gastar os recursos exatamente como se
encontram na lei, pode remanejar uma parte deles de um projeto para outro dentro
dos limites que a Câmara autorizou. A cada quatro anos também é votado o Plano
Plurianual, cuja finalidade principal é estabelecer os programas e metas
governamentais de longo prazo. Existe também a Lei de Diretrizes Orçamentárias
(LDO), uma espécie de prévia da LOA que é votada no primeiro semestre. A lei
deve conter, entre outras exigências, as prioridades da Administração Pública e
possíveis alterações na legislação tributária.
Este processo se com o desconhecimento da grande maioria da
população. O cidadão comum não sabe o que é Plano Plurianual, Lei de Diretrizes
Orçamentárias nem Lei Orçamentária. Mesmo sabendo como e quando são votadas
estas três leis que compõem o processo orçamentário, os cidadãos não tem acesso
à execução do Orçamento nem imaginam como ele pode ser alterado no decorrer do
ano fiscal. Nesse quadro, parece evidente a necessidade de uma maior
democratização da gestão pública, particularmente nos municípios.
49
Do ponto de vista legal, para que haja implantação do Orçamento
Participativo em um município, é necessário que haja uma alteração na Lei Orgânica
Municipal prevendo esta nova forma de feitura da peça orçamentária (como ocorreu
de fato na cidade de Porto Alegre), ou ao menos que se inclua um artigo na Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO), como aconteceu na implantação do plano piloto do
OP em São Paulo no ano de 2001. Neste segundo caso, a execução do orçamento
de forma participativa só estaria garantida, em princípio, por um ano.
Com a implantação do Orçamento Participativo a cidade é dividida em sub-
regiões e a população se reúne e elege suas prioridades. Na primeira rodada de
plenárias o poder executivo presta contas do que foi realizado no exercício anterior,
do que está sendo realizado no atual, e apresenta os critérios para a aplicação do
orçamento no ano seguinte. Em seguida, ocorrem debates em cada comunidade
para que sejam escolhidas as prioridades. Finalmente, é eleito, com representantes
de cada sub-região, o Conselho do Orçamento Participativo (COP) que vai, com
assessoria do executivo, produzir a Peça Orçamentária. Ao final do ano, o executivo
envia o Orçamento para a Câmara de Vereadores, de acordo com a legislação
vigente.
Desencadeado o processo, julgo provável que a introdução desse novo
mecanismo de feitura da Peça Orçamentária possibilite ao cidadão acompanhar
mais de perto o que acontece com os recursos públicos e, principalmente, exercer
um mínimo de fiscalização sobre o Poder Executivo. Esse instrumento de
participação pode permitir também uma avaliação mais precisa das decisões
políticas tomadas pela Prefeitura. Outro efeito positivo importante é o aprendizado
que as pessoas adquirem sobre questões orçamentárias (aspectos técnicos
geralmente distantes do cidadão comum) e sobre a sua realidade local. Esses
aspectos do OP serão estudados mais detalhadamente neste e no capítulo seguinte.
também limitações evidentes. O longo caminho do processo orçamentário
pode gerar algum nível de desvirtuamento do OP. Primeiro ocorre a fase de
produção da lei orçamentária pelo executivo, em seg
50
técnicos da prefeitura avaliam a viabilidade das demandas aprovadas, a fase
legislativa para a aprovação da Lei Orçamentária Anual e, finalmente, a fase em que
a prefeitura realiza as obras no ano seguinte.
Ano a ano, mais cidades vão adotando este mecanismo. De 12 experiências
no final da década de 80, houve um aumento para cerca de 100 municípios que
adotaram o OP no final dos anos 90. O número de partidos políticos que adotou o
projeto também se diversificou. Foi utilizado por PT, PMDB, PSDB, PSB, PDT, PV,
PPS, PTB e PFL.
Embora atento ao possível uso político e conseqüente desvirtuamento do
processo, um estudo preliminar das experiências de Orçamento Participativo de
Porto Alegre e Santo André me leva a crer que algumas hipóteses presentes no
início deste trabalho puderam ser confirmadas.
5.2 A
EXPERIÊNCIA DE
P
ORTO
A
LEGRE
Iniciado em 1989 com a vitória do Partido dos Trabalhadores nas eleições
municipais, com o passar dos anos o OP de Porto Alegre foi ficando mais
abrangente e concorrido. O número de pessoas presentes nas assembléias cresceu
ano a ano e o OP foi ganhando credibilidade. Construiu-se uma engenharia política
sofisticada e um critério matemático de ponderações para distribuição de recursos
do orçamento com o objetivo de contemplar áreas mais carentes e populosas. A
influência do OP chegou a tal ponto que alguns vereadores de oposição começaram
a reclamar por mais poder para alterar a Lei Orçamentária Anual. O OP de Porto
Alegre tornou-se internacionalmente reconhecido e especialmente emblemático por
se tratar de um mecanismo participativo em uma metrópole de respeitáveis
proporções (cerca de 1.360.000 habitantes) e repleta de problemas sociais. A
Organização das Nações Unidas (ONU) selecionou a experiência de Porto Alegre
entre as 40 melhores de gestão urbana no mundo através do Programa de
Assentamentos Humanos (Habitat/1996).
51
A cidade foi dividida em 16 regiões onde se levou em conta o critério
geográfico e de afinidade cultural. Dentro desta base regional, a população escolhe
quatro prioridades entre oito possíveis temas: saúde, educação, saneamento básico,
política habitacional, transporte e circulação, organização da cidade e pavimentação
comunitária. Dentro de cada tema as obras são hierarquizadas. A comunidade faz o
diagnóstico de suas necessidades por região (GENRO, 1997).
Figura 3 – Mapa das Regiões de Porto Alegre
Fonte: Genro e Souza (1997, p. 79)
Na tabela 3, referente ao calendário de 1997, percebemos uma sofisticada
engenharia administrativa, que além de assembléias informativas e deliberativas,
inclui também regionais e temáticas, para viabilizar a execução do OP.
52
Tabela 3
ORÇAMENTO PARTICIPATIVO 1997
1
a
Rodada
11/MAR a 18/ABR 1 – Prestação de contas Plano de investimentos
2 – Apresentação do Plano de Investimentos
3 Apresentação de critérios e métodos para o
Orçamento
4 – Eleição de delegados
Rodadas Intermediárias
Regiões/Temáticas 1 Órgãos do Governo prestarão informações
técnicas para instituir a discussão da comunidade e
apresentam as propostas do governo nas regiões e
temáticas.
2 Discussão e escolha das prioridades temáticas e
de obras nas regiões.
3 Prioridades de serviços, políticas setoriais e obras
estruturais
4 – Eleição de delegados .
2
a
Rodada
03/JUN a 09/JUL 1- Eleição do Conselho do Orçamento.
2- Apresentação pelo Gaplan e SMF dos grandes
agregados da despesa e estimativa de receita.
3- Entrega pelas 16 regiões e temáticas das
prioridades e obras.
4- Secretarias e Deptos. elaboram a Proposta
Orçamentária.
Elaboração da Proposta
19/JUL
25/JUL a 09/SET
10/SET a 30/SET
01/OUT a 31/DEZ
Posse do novo COP. Definição do cronograma de
discussões (regimento interno, calendário, etc.)
1- Cursos em grupos com o COP sobre Orçamento
Público.
2- Seminário nas regiões e temáticas com os
delegados sobre o mesmo assunto.
Governo compatibiliza prioridades das regiões,
prioridades temáticas e propostas das secretarias.
Conselho discute proposta orçamentária a ser enviada
à Câmara.
Elaboração da Proposta Orçamentária pelo Gaplan.
Entrega da Proposta Orçamentária na Câmara pelo
Prefeito, Gaplan, CRC, Conselheiros e Delegados do
Orçamento Participativo.
Discussão e elaboração do Plano de Investimentos.
Fonte: Genro e Souza (1997, p 69).
53
Como este calendário é referente ao ano de 1997, podemos supor que ele
agrega diversos aspectos acumulados de experiências anteriores. Vale lembrar que,
nesta cidade, o OP é executado desde 1989.
Muitos obstáculos tiveram que ser enfrentados nos primeiros anos. Entre eles
podemos citar a ingenuidade a respeito da transferência de poder, ou seja, a idéia
de que a democracia direta poderia substituir a representação política tradicional.
Outras dificuldades citadas por Genro (1997) o a enorme quantidade de
demandas reprimidas e acumuladas por décadas e a falta de recursos financeiros.
Durante a década de 90 foi feita uma reforma tributária com o intuito de recuperar a
capacidade de investimento do município. De acordo com Santos (2002), o controle
das despesas, combinado com a reforma fiscal municipal e com maiores
transferências federais e estaduais autorizadas pela Constituição de 1988,
constituíram as políticas que aumentaram a percentagem de investimento do
orçamento em 10% (1990), 16,3% (1991) e 17% (1992).
A presença da população nas assembléias do OP na cidade também
aumentou de maneira consistente durante a década de 90 (tabela 4) . É interessante
que a maior presença da população ocorreu em paralelo com o incremento dos
recursos oriundos do orçamento municipal destinados a novos investimentos.
54
Tabela 4
Fonte: Santos (2002, p. 507)
A experiência de Porto Alegre teve o cuidado de aplicar uma progressividade
de recursos a serem aplicados em áreas mais carentes. Para tanto atribuiu-se notas
de 1 a 4 para mensurar as necessidades das regiões. Entre os elementos utilizados
para esta medição estavam a carência em infra-estrutura urbana, poder aquisitivo da
população e densidade populacional. Esses critérios possibilitaram um efeito
redistributivo interessante, pois contemplou regiões mais pobres com um aporte
maior de recursos do orçamento, como veremos a seguir.
5.2.1 E
FEITOS
R
EDISTRIBUTIVOS
A tabela n. 5 demonstra o quanto Porto Alegre é uma típica metrópole
brasileira no que tange às enormes diferenças de poder aquisitivo entre as regiões.
Observa-se, por exemplo que a região Nordeste é a que possui o maior nível de
pobreza enquanto que a região do Centro apresenta indicadores bem superiores.
Através de uma pesquisa que estabelece uma correlação entre a renda dos
habitantes de uma região e o número de obras contempladas, Marquetti ressalta o
55
efeito redistributivo do OP. A tabela a seguir mostra que quanto menor é a renda da
região, tendencialmente, maior é o percentual dos investimentos por grupos de mil
habitantes.
Tabela 5
Distribuição percentual dos valores listados nos planos de investimentos por
região (1992-2000)
Região População
(em 1996)
Salários
mínimos
(em 1991)
Distribuição dos
investimentos
(%) 1992-2000
Humaitá/Navegantes/Ilhas 48.199 4,14 1,56
Noroeste 127.574 7,90 1,96
Leste 110.451 8,63 2,96
Lomba do Pinheiro 48.368 3,33 2,93
Norte 88.614 3,56 2,96
Nordeste 24.261 2,19 1,91
Partenon 114.127 3,88 2,0
Restinga 45.999 2,35 2,23
Glória 37.439 4,00 1,63
Cruzeiro 64.952 5,46 2,29
Cristal 30.054 6,24 1,58
Centro Sul 101.397 4,84 3,56
Extremo Sul 23.905 2,95 2,68
Eixo Baltazar 86.057 4,04 1,9
Sul 62.837 9,47 1,38
Centro 271.294 11,40 1,53
Fonte: PMPA e Gaplan (diversos anos). In: Marquetti (2003) págs. 139 e 141.
Os investimentos contidos nesta tabela totalizam cerca de 35% do total do OP
nestes nove anos. Os outros 65% referem-se a emendas que atingem toda a cidade.
Observamos em diversas regiões uma ótima correlação entre pobreza e
investimentos oriundos do orçamento participativo. A região da Restinga, por
exemplo, muito pobre, mas não tão densamente povoada, recebeu mais recursos do
que regiões menos carentes como Sul, Centro e Noroeste.
56
Importante ressaltar que, segundo o GAPLAN (Gabinete de Planejamento da
Prefeitura de Porto Alegre), 87% das obras estavam concluídas (referente ao
período coberto pela tabela 5) e as demais, na época da pesquisa, estavam em fase
de conclusão ou licitação.
5.2.2 A
VISÃO DE
T
ARSO
G
ENRO E
U
BIRATAN DE
S
OUZA
No livro Orçamento Participativo, a experiência de Porto Alegre, Tarso Genro
observa que as cidades modernas têm sido constante objeto de estudo tanto de
universidades como de ONGs. O processo de urbanização das três últimas cadas
foi muito acelerado e as cidades ficaram sobrecarregadas de problemas. Os
governos locais são pressionados a resolver demandas cada vez mais intensas,
que as soluções “nacionais” revelam-se, em geral, inoperantes.
O novo papel das cidades no atual mundo contemporâneo tem sido, nas
últimas décadas, o centro de estudos dos cientistas sociais. Nesse contexto, surge
com força a idéia de que a reconstrução do Estado nacional deve ser feita não
somente a partir “de cima”, mas também a partir “de baixo”, ou seja, a partir de um
novo tipo de descentralização e de novos processos democratização, que, nas
palavras do autor “possam ser experimentados, fundidos ao cotidiano da população”
(GENRO, 1997, p. 10).
O Orçamento Participativo de Porto Alegre é citado como um exemplo
incomum. Ao invés de apenas “incentivar” a participação popular de uma forma
espontânea ou simplesmente “azeitar” os mecanismos de democracia formal criou-
se um novo “centro decisório” que, “juntamente com o Poder Executivo e o
Legislativo, democratizou efetivamente a ação política e integrou os cidadãos
comuns num novo espaço público”. Esse espaço público também mostrou ter o
efeito de incrementar o exercício dos direitos de cidadania e instigar os cidadãos a
serem mais exigentes e críticos.
57
O autor destaca o fato de que a criação de um novo centro decisório foi
fundamental para gerar distribuição de renda e contribuir para a socialização da
política. “Distribuir renda sem socializar a política é muito pouco e pode ensejar um
certo tipo de paternalismo, que é nocivo à afirmação da autonomia dos indivíduos e
das organizações de base da sociedade.”
Apesar dos avanços conquistados com o Orçamento Participativo na cidade
de Porto Alegre, Tarso Genro (1997, p.14) reconhece que o processo tem limitações.
Este mecanismo de participação popular certamente não é perfeito, e além de estar
em
“...constante mutação, (para renovar-se e adaptar-se ao
próprio crescimento da consciência da cidadania), deve ser visto
como a abertura de um caminho. Um caminho que deve ser
aprimorado constantemente para, de uma parte, recuperar a
credibilidade do Estado mediante uma experiência de nível local
e, de outra, para mostrar que é possível reformá-lo radicalmente.
(Reformá-lo, no sentido de transformar a relação Estado X
Sociedade e também para “tensionar” o próprio Estado,
colocando-o a serviço dos interesses populares.)”
Ubiratan de Souza acrescenta que o OP tem como principal riqueza a
democratização da relação do Estado com a Sociedade. A experiência romperia com
duas maneiras limitadas de encarar esta relação. Superaria ao mesmo tempo as
restrições da democracia representativa tradicional e o socialismo burocrático e
autocrático do antigo Leste Europeu.
Uma contribuição importante do OP seria a criação de uma esfera pública não
estatal em que a sociedade pode controlar o Estado. Souza lembra que o processo
não exclui a democracia representativa. A Câmara dos Vereadores continua com
todas as suas prerrogativas constitucionais, analisando e votando a Lei
Orçamentária.
58
Vale ressaltar que o OP de Porto Alegre está protegido por um artigo da Lei
Orgânica Municipal que diz:
“Fica garantida a participação da comunidade, a partir das
regiões do município, nas etapas de elaboração, definição e
acompanhamento da execução do plano plurianual, de diretrizes
orçamentárias e do orçamento anual.” (Parágrafo 1
o
do art. 116)
Souza (1997) acrescenta que, para ser aplicado, o OP precisaria ainda de
regulamentação, mas esta não seria feita por lei municipal, mas pela própria
sociedade, de maneira autônoma.
5.3 A
EXPERIÊNCIA DE
S
ANTO
A
NDRÉ
Menor do que Porto Alegre, mas também considerada uma cidade de grande
porte (648 mil habitantes, cerca de 630 mil na época da pesquisa efetuada pelo
Instituto Polis), Santo André é uma das pioneiras em implantação e execução de
Orçamento Participativo. Apesar de pertencer à Grande São Paulo, possui algumas
características próprias, como por exemplo o baixo crescimento vegetativo, o que lhe
confere certa estabilidade em relação às demandas públicas, diversamente do que é
observado na capital. Possui uma área de 181 Km² ficando a maior parte em áreas
de manancial.
A cidade é marcada por significativa presença da indústria, principalmente
nos setores químico e metalúrgico, e por forte organização sindical. Embora com
algumas regiões de pobreza mais acentuada - segundo dados da prefeitura 15% da
população - de maneira geral, a cidade dispõe de razoável estrutura urbana de
acordo com os dados relativos à sua rede de água, esgoto e coleta de lixo. No
ranking do Atlas de exclusão social no Brasil (2000), Santo André está na 7
posição entre as cidades de melhor situação social e é vizinha da campeã, São
Caetano do Sul.
59
O foco da pesquisa do Instituto Polis situa-se no OP de 1997/2000, apesar de,
no início dos anos 90, ter havido uma primeira experiência. O prefeito eleito, Celso
Daniel, começou a sua gestão amparado por uma vitória eleitoral no primeiro turno
com 52% dos votos.
A prefeitura criou uma instância decisória denominada Núcleo de Participação
Popular (NPP), no qual um munícipe se encarrega da coordenação do OP. O núcleo
possui agentes de participação popular que desenvolvem diversos tipos de projetos
em diferentes secretarias.
A cidade foi dividida em 18 sub-regiões definidas por critérios geográficos e
identidade dos bairros. Oito temas foram definidos: Saúde, Educação, Habitação,
Saneamento e Meio Ambiente, Cultura, Assistência Social, Desenvolvimento
Econômico e Geração de Emprego e Renda e Funcionalismo. Inicialmente foi
realizada uma primeira rodada de plenárias informativas, para que a população
ficasse a par de questões importantes sobre a cidade e sobre a situação
orçamentária. Nessa fase a prefeitura forneceu informações sobre as finanças do
município e explicou como se dá o processo orçamentário e como o OP se insere
nesta operação. Pontual nos lembra que o efeito pedagógico do processo é ainda
reafirmado com apresentações teatrais e vídeos sobre o OP.
A seguir ocorreram as plenárias deliberativas, onde foram eleitas as
demandas prioritárias e os conselheiros que futuramente comporiam o COP
(Conselho do Orçamento Participativo). Para ser conselheiro, é preciso, de acordo
com o regimento do OP, ser residente na cidade, maior de 16 anos, e não ocupar
cargo comissionado na prefeitura.
De acordo com Pontual (2000), a divulgação e a mobilização para as
plenárias teve início em abril de 97 com a distribuição de material informativo,
colocação de outdoors pela cidade, divulgação nas rádios e imprensa local e a
realização de reuniões com diversos movimentos sociais do município; a primeira
delas foi uma visita do prefeito, vice-prefeito e responsáveis pelo OP à Câmara
Municipal para apresentação e discussão da proposta para o conjunto de
60
vereadores. Este trabalho de mobilização estendeu-se a diversos outros segmentos
sociais do município: movimentos populares, entidades de representação de
trabalhadores, lideranças comunitárias, empresários e outros setores organizados da
sociedade civil, tais como, conselhos municipais (Conselho Municipal de Defesa dos
Direitos da Criança e do Adolescente e Conselho Municipal da Saúde) e os Foruns
de Habitação, Assistência Social, Mulheres, Juventude, Pessoas com deficiência,
Educação e Cidadania, setores das Igrejas (Católica, Protestante, Luterana
Evangélica e Espírita), rádios comunitárias e outros meios de divulgação e imprensa.
61
remanejamento concedido pela Câmara Municipal ao poder executivo (contido em
um dos artigos do orçamento anual) podendo chegar a 100% do que for arrecadado.
A própria Câmara Municipal pode criar empecilhos para a votação da Lei
Orçamentária, e em conseqüência, para a execução das demandas produzidas pelo
OP. Pontual (2000) lembra que, em 97, os conselheiros do OP tiveram que fazer um
trabalho político junto aos vereadores para conseguir a aprovação do orçamento.
Mais do que isso, o próprio poder executivo precisou intervir (neste caso temos o
velho problema da queda de braço entre o Legislativo e o Executivo, a luta pela
hegemonia da Câmara entre situação e oposição, etc.) vetando emendas de
vereadores que alteravam propostas oriundas do OP.
Aos poucos, na medida em que o OP vai se enraizando na cidade e
ganhando credibilidade, a probabilidade de fazer valer suas demandas aumenta.
Uma das variáveis que pode ser utilizada para medir a sua consistência é o número
de pessoas que participa das assembléias.
Segundo dados fornecidos pela prefeitura, houve de 1997 para 1998, um
crescimento significativo de participantes nas plenárias.
Tabela 6
Número de participantes em plenárias do OP/Santo André
Plenárias 1997 1998
Informativa 2.583 3.725
Deliberativa 7.343 9.733
Tabela elaborada com base no texto de Pontual (2000).
De acordo com Pontual (2000), a maior presença nas assembléias de cunho
deliberativo deve-se à maior motivação provocada pela eleição de conselheiros e
pelo fato evidente de que as decisões sobre prioridades são realizadas nestas datas.
Acredito ser relevante também a evolução do número de participantes de um ano
para outro. Demonstra um certo aumento de confiabilidade no processo, embora
estes números possam ter também outras explicações.
62
5.3.1 A
VISÃO DOS CONSELHEIROS
A tabela a seguir mostra algumas opiniões de conselheiros do OP nas
edições 97/98 e 98/99.
Tabela 7
Efeitos que o OP está trazendo para a
cidade (em %)
Cons. da
população
97/98
Cons. da
população
98/99
Cons. do
governo
98/99
Maior consciência política / mobilização /
participação popular
38 47 59
Mudanças/obras em várias partes da
cidade/ governo atendendo às demandas
da população
20 49 15
Exercício/ resgate da cidadania 18 4 15
Mudança de mentalidade / experiência
inovadora/ nova forma de fazer política
16 7 26
Ainda não trouxe nenhum efeito 11 - -
Democratização da informação/ população
melhor informada sobre as ações da
prefeitura
7 9 9
Ainda é cedo para avaliar/ efeitos limitados 7 2 4
Mudança/ melhora em alguns setores 4 2 -
Cidade está mais bonita/ agradável/ com
mais Qualidade de vida
4 13 2
OP/ Governo municipal com mais
credibilidade junto à população
- 7 2
OP como estratégia de promoção/
marketing político da PMSA
- 2 -
Governo conhece melhor as demandas da
população.
- - 15
Amadurecimento da relação governo/
sociedade
- - 9
Possibilidade de diálogo entre setores
sociais diferentes
- - 2
Fonte: Pontual (2000, p. 31-Anexo).
63
Os entrevistados reconhecem no processo, de maneira geral um catalizador
de maior consciência política e participação popular. Ressaltam também que as
obras de fato foram realizadas e isto significa que o governo estaria atendendo as
demandas da população. Pontual (2000) acrescenta que existe uma combinação
entre processo (conscientização, mobilização) e produto (realização de
melhorias/obras) no julgamento do impacto do processo do OP sobre a própria
participação e dos seus efeitos sobre a cidade e apresenta algumas falas dos
conselheiros da população:
melhoria em geral para a cidade, oferecendo mais
qualidade de vida e melhorando a cidadania; mesmo com a
demora, acredito que traz a possibilidade de que acontecem
coisas que dificilmente aconteceriam sem a participação popular;
a população acaba desenvolvendo um poder de pressão e
descobre que não é pequeno; por pequeno que seja, é um efeito
de mudança de poder e inversão de prioridades, onde a
população tem nas mãos uma ferramenta que pode dirigir os
caminhos da cidade; os efeitos são positivos, porque a
comunidade tem acesso às informações que em outros governos
não teria; está mostrando para a cidade que existe uma outra
maneira de governar que é através da população. Antes existia o
prefeito e seus secretários que criavam a peça orçamentária e
eles mesmos decidiam de que forma empregar o dinheiro. Agora
a população quem decide e sabe onde é melhor utilizar; está
gerando alguns comentários de setores contrários. O que é
64
E também comentários críticos ao processo:
“O efeito é positivo. O processo democrático não faz
restrições a ninguém, faz com que se efetive sua cidadania. Mas
está agindo uma parcela muito pequena da cidade pela
importância que tem para o governo. Devem-se encontrar
alternativas para as pessoas entenderem o que é o OP e como
participar melhor; o efeito de mídia de que existe uma participação
do povo na decisão do orçamento, quando na verdade não existe.
Pois o poder continua na mão da prefeitura, pois os conselheiros
não tem o direito de discutir e decidir as receitas e despesa do
conjunto da peça, taxas, impostos, contratação de empresas e
empregados.” (2000, p. 226-227)
Destacam-se também algumas falas de conselheiros do governo que
mostram o impacto do OP sobre a dinâmica da prefeitura:
a máquina da prefeitura está tendo que se adaptar às
cobranças que estão sendo feitas pela população; o OP mostra
que é necessário a prefeitura aperfeiçoar o sistema do fluxo da
informação interna; os funcionários acabam tendo que encarar
suas funções com maior responsabilidade, na medida que ficam
sabendo que determinada obra está sendo executada por ter sido
votada pela população. Acaba valorizando a atividade do próprio
funcionário, ele se sente importante dentro do processo;
proporciona uma visão de conjunto da cidade para a
administração e obriga setores do governo a conhecer outras
áreas da cidade que estão abandonadas e esquecidas; o OP
obriga as secretarias a se estruturarem para democratizar as
informações e discutir as políticas públicas; a pressão feita no
interior do Conselho do Orçamento para obter informações
precisas tem nos obrigado ao planejamento sistemático das
nossas ações embora tenhamos como prática o planejamento
estratégico.” (2000, p. 224-225)
65
Pela fala dos conselheiros nota-se que a estrutura interna da administração
pública também sofre os efeitos da implantação de mecanismos de democracia
participativa. Não é difícil perceber que a adaptação da máquina administrativa é um
longo e recalcitrante processo que envolve o polêmico conceito de mudança de
cultura em uma organização.
Em Santo André, assim como em outras cidades, existem plenárias de
retorno, que analisam o que de fato aconteceu com as demandas votadas no ano
anterior. Apesar de todas as limitações referentes à execução orçamentária, o
Instituto Polis destaca que houve um bom percentual de obras efetivamente
realizadas, ou ao menos em andamento, dentre aquelas que foram aprovadas nas
plenárias do OP
11
.
5.4 A
EXPERIÊNCIA DE
S
ÃO
P
AULO
Por suas características diferenciadas, por ser uma “cidade mundial” - uma
metrópole do Terceiro Mundo extremamente heterogênea - é preciso ponderar sobre
este tipo de projeto de maneira especialmente cautelosa.
São Paulo é um local interessante para refletirmos sobre as contradições de
um processo de urbanização no Terceiro Mundo. A cidade experimentou um
crescimento muito rápido num contexto de pouco planejamento e uma perversa
exclusão social. As tabelas 8 e 9 apresentam alguns dados importantes sobre a
população residente da cidade vis a vis a população brasileira e paulista. Podemos
observar que, em uma mesma área de cerca de 1.500 Km², a população paulistana
quase triplicou em um período de quatro décadas.
11
Cerca de 10% de obras concluídas e 90% em andamento. Dados de 2000 relativos ao Plano de Investimento
de 1988. Para o Plano de Investimentos do ano de 1999, infelizmente houve uma queda neste percentual
(Carvalho e Felgueiras, 2000).
66
Tabela 8
Evolução da População Residente
População Residente (em milhares de hab.)
1960 1970 1980 1991 1996 2000
Brasil
70.191 93.139 119.003 146.825 157.080 169.799
Estado de S. Paulo
12.824 17.772 25.041 31.589 34.121 37.032
Região metrop. de S.
Paulo
4.791 8.140 12.589 15.445 16.683 17.789
67
quadro, o projeto de implantar um mecanismo de participação popular que possibilite
uma melhor alocação de recursos torna-se um desafio crucial.
na gestão de Luiza Erundina (1989/1992) foram criados alguns
mecanismos de participação popular. Naquela oportunidade, os debates realizados
a respeito do orçamento público municipal tiveram um caráter apenas consultivo e
informativo. Essa primeira experiência possibilitou um maior conhecimento por parte
da população em relação a alguns aspectos referentes ao município e ao trâmite
orçamentário, mas não possuía a natureza deliberativa, essencial ao OP (VITALE,
2004). Foi na gestão de Marta Suplicy (2001/2004) que o Orçamento Participativo foi
efetivamente implantado. O formato do OP paulistano tem como principal referência
a experiência de Porto Alegre. Além de São Paulo, muitas cidades que aderiram a
este instrumento, seguem, do ponto de vista metodológico, o exemplo da capital
gaúcha. Porto Alegre além de ter sido uma das primeiras cidades a implementá-lo,
foi a que apresentou continuidade mais consistente.
Assim como nos demais casos estudados, o OP de São Paulo foi instituído
devido à opção política do poder executivo. Dois artigos acrescentados à lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2001 (ver anexo), previam a participação popular
no processo orçamentário. Para efeitos práticos mais imediatos, a Lei municipal
13.169 de 2001 criou a Coordenadoria do Orçamento Participativo, órgão vinculado
tanto ao Gabinete da Prefeita como também à Secretaria do Governo Municipal e
articulado à Secretaria das Finanças. Surge, logo de início, o desafio de adaptar a
estrutura da administração pública e torná-la capaz de exercer novas funções
(VITALE, 2004).
Sánchez (2004), lembra que o mandato da coligação eleita defendia, em seu
programa de governo, além da implementação do OP, a adoção de instrumentos
democratizadores e descentralizadores, como por exemplo, a transformação das
Administrações Regionais em subprefeituras, o que de fato, veio a se concretizar.
Em 2001 foi implantado um plano piloto do OP que se limitava às áreas de
saúde e educação. Sánchez acrescenta que o regimento do primeiro ano do
processo foi elaborado pela administração, mas nos anos subseqüentes, foi
68
produzido pelo Conselho do Orçamento Participativo (CONOP). Este conselho é que
possui, de acordo com o próprio regimento, competência e legitimidade para
produzi-lo. O regimento obriga a prefeitura a promover seminários de capacitação
para os delegados do OP. Estes, por sua vez, teriam, entre outras funções, de atuar
como fiscalizadores das ações do poder público. Temos neste caso, a criação de
uma ferramenta de controle social.
A tabela 10 mostra dados interessantes, principalmente em relação à
evolução do número de participantes nas assembléias.
Tabela 10
NÚMEROS GERAIS DE EVOLUÇÃO DO OP ENTRE 2001 e 2004
OP 2001 OP 2002 OP 2003 OP 2004
de participantes 34 mil 55 mil 80 mil 82 mil
Delegados (as) 1076 1134 2131 2219
Conselheiros (as)
(titulares+suplentes)
112 139 216 241
de assembléias 191 386 450 653
Recursos
movimentados
R$481
milhões
R$ 662
milhões
R$ 1,1
Bilhão
Ainda não
definido
Áreas apreciadas
Saúde e
Educação
Saúde
Educação
e 3ª área.
Todas Todas
Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo. www.prefeitura.sp.gov.br – (Fev/2005).
É evidente que os dados contidos nesta tabela são insuficientes para medir o
bom funcionamento do OP paulistano ou o índice de aprovação por parte da
população ao mecanismo, pois existem inúmeras outras variáveis que poderiam ter
interferido nestes números, como por exemplo, a utilização da estrutura das
administrações regionais de maneira mais incisiva (e de certa forma artificial) em
determinados momentos. Procura-se demonstrar que, tendencialmente, a população
69
da cidade foi se apropriando desse espaço e aumentando sua participação. Nas
assembléias preparatórias e deliberativas do ano de 2001 a Coordenadoria do OP
realizou uma pesquisa com 973 pessoas indagando o grau de importância que estas
atribuíam à participação no processo. Cerca de 90% responderam “muito
importante” e apenas 6% “mais ou menos importante” (SÁNCHEZ, 2004, p. 96).
Acredito que os resultados desta pesquisa combinados com os dados da tabela 10
confiram um certo nível de consistência ao processo.
A exemplo do que foi aplicado em Porto Alegre, o atendimento às prioridades
escolhidas nas assembléias considerava uma fórmula que ponderava a população e
a carência da região em questão. Este procedimento visa atender ao caráter
redistributivo do OP. Outro ponto importante, destacado por Vitale (2004) e Sánchez
(2004) é o fato de segmentos minoritários ou excluídos da sociedade, como por
exemplo negros, mulheres, população de rua, índios e portadores de deficiência,
serem contemplados na representação do Conselho.
Ao mês de Setembro do primeiro ano do OP paulistano, foi entregue à
prefeitura o Plano de Obras e Serviços em Saúde e Educação que foi anexado ao
Orçamento Anual e votado na Câmara Municipal. É sabido que, naquela ocasião, a
Prefeita Marta Suplicy tinha suficiente respaldo entre os vereadores para esta
aprovação. Mesmo assim, segundo Vitale (2004), foi necessária a presença dos
conselheiros do OP na Câmara Municipal para que as emendas apresentadas pelos
vereadores não ferissem as decisões populares aprovadas no OP.
Este fato torna-se relevante quando recordamos os conflitos entre os poderes
legislativo e executivo que permearam, em algumas situações, as execuções dos
OPs de Porto Alegre e Santo André.
A divisão territorial das assembléias obedeceu, no primeiro ano, aos limites
previamente demarcados pelas Administrações Regionais e, posteriormente, pelas
Subprefeituras recém criadas. A contratação de estagiários e a utilização de material
de projeção do Anhembi Turismo também foram de fundamental importância para a
logística do processo.
70
Com relação às características associativas dos participantes do processo, a
tabela 11 nos fornece alguns dados importantes.
Tabela 11
Perfil dos participantes das plenárias do OP/SP
Participação em associações, entidades, sindicatos, partidos e movimentos.
Sim 48%
Não 46%
Preparatórias
Sim 62%
Não 34%
Deliberativas
Fonte: Sánchez (2004, p. 111).
Estes percentuais são apenas ligeiramente superiores à media de
participação geral dos habitantes da cidade segundo o SEADE (tabela 12). Mas
devido às diferentes metodologias, a comparação fica prejudicada. O que se pode
aferir destes dados é que entre os presentes nas assembléias de tipo deliberativo
existe uma nítida maior freqüência de pessoas com prévia participação cívica.
Com relação ao perfil dos participantes das plenárias do OP paulistano,
Sánchez (2004, p. 106-107), nos traz algumas informações bastante relavantes
12
.
Em primeiro lugar, no tocante à situação econômica, o perfil dos participantes não é
muito diferente da média da população paulistana, incluindo alguma participação dos
desempregados. Outro dado significativo é a forte presença da população feminina,
cerca de 60% nas plenárias, ante cerca de 53% na população paulistana. Com
relação à participação das faixas etárias, percebe-se a forte presença dos
segmentos que vão dos 35 aos 59 anos. Nas palavras do autor, “Fato que evidencia
o crescimento da inserção da experiência do OP nas camadas com maior
experiência de vida e trabalho.”
12
Segundo o autor, os dados foram extraídos de uma pesquisa realizada ao final de 2003 com 1.178 entrevistas.
71
Com relação à participação em associações, entidades, sindicatos, partidos e
movimentos entre os participantes do OP, houve uma evolução de 54% em 2001
para 69% em 2003. Para Sánchez,
“O forte relacionamento dos participantes com as
associações comunitárias também é indicativa do crescimento de
uma experiência de vinculação a uma forma diferente das formas
clientelistas e populistas que predominaram em São Paulo nos
últimos 40 anos.”
***
Levy (1997, p. 178-179), selecionou os principais atores que compõem o
associativismo da cidade a partir dos anos 80 e 90. São eles: grandes e médios
empresários, associações comerciais e de lojistas, associações profissionais,
assessorias técnicas (inclusive ONGs), as diversas igrejas, sindicatos, SABs,
instituições filantrópicas e esportivas, movimentos sociais e coletividades
estrangeiras ou minorias. Tais atores “estão envolvidos em networks, dos quais
participam atores o-locais como a Igreja Católica e outras organizações religiosas
internacionais e organizações não-governamentais”. A autora acrescenta que
existem certas regularidades na articulação destas associações. Por exemplo:
movimentos sociais ligados a questões de moradia relacionam-se às CEBs; SABs se
articulam com associações profissionais e entidades filantrópicas a organizações
religiosas. Levy afirma que “a pluralidade de atores que se acabou de citar faz
parecer que a sociedade paulistana está bastante organizada.” E complementa: “O
problema é saber quem participa”.
A tabela 12 mostra o grau de associativismo médio do paulistano e faz uma
divisão de acordo com seu agrupamento sócio econômico.
72
Tabela 12
Distribuição das famílias, por agrupamentos sócio econômicos, segundo tipo
de associação que participam, RMSP, 1990. Em percentagem
Tipo de Associação A B C D Total
Total das famílias 20,5 37,2 19,7 22,6 100
Total 100 100 100 100 100
Nenhuma 44,7 54,7 57,3 64,7 56,0
Políticas 34,7 21,6 23,1 15,0 23,1
Igreja 8,4 19,7 14,9 17,6 16,0
Lazer e outras 9,2 4,0 4,7 2,7 4,9
Fonte: SEADE. In: Levy (1997, p. 180).
A tabela mostra que, na média, quase a metade da população participa de
algum tipo de associação. Porém, dada a heterogeneidade entre as faixas sociais,
constata-se que uma significativa parte dos entrevistados aqueles que se situam
nas faixas C e D não participam em nenhuma associação. Os dados não são
suficientes para medir com exatidão a tradição cívica dos paulistanos, mas mostram
fortes discrepâncias dentro de uma mesma cidade.
Com relação ao percentual de recursos a serem disponibilizados para o OP, a
tabela 13 mostra os dados referentes aos dois primeiros anos de sua execução, bem
como o montante total do orçamento anual paulistano.
73
Tabela 13
Volume de recursos definidos no OP (em R$)
2001/2002 2002/2003
Receita Total
Despesas de capital
(investimentos*)
(% em relação à despesa total)
9.580.000.000
766.400.000
8%
10.593.649.200
902.399.455
9%
Despesas definidas no OP
(% em relação à despesa total)
(% em relação às desp. para
investimentos)
481.250.000
5%
63%
661.883.511
6%
62%
*Contabilizam-se as despesas com obras e instalações, assim como equipamentos e
material permanente. Excluem-se as despesas com amortização da dívida e
inversões financeiras.
Fonte: Vitale (2004, p. 20). Elaborado pela Coordenadoria Especial do Orçamento
Participativo / Secretaria Municipal de Finanças da PMSP.
Tradicionalmente, é repassada para o OP a parte dos recursos orçamentários
relativos a novos investimentos. Percebemos, pela tabela, uma baixa quantidade de
recursos destinada para as assembléias. Esta limitação ocorre porque no início do
processo, foi feito um projeto piloto que visava contemplar apenas os setores de
educação e saúde. No decorrer do OP paulistano, as demais áreas também foram
contempladas. A relação percentual de recursos efetivamente gastos sobre os
orçados apresenta números bastante positivos (apesar de heterogêneos) de acordo
com tabelas disponibilizadas na internet pela prefeitura (anexo). Mesmo assim,
Vitale (2004) ressalta a força da vontade do executivo sobre a população.
74
6. A INFLUÊNCIA DA PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NO PROCESSO
ORÇAMENTÁRIO
E
ste tema requer uma especial prudência e cuidados para não cairmos na
tentação de estabelecer relações de causa e efeito definitivas, embora seja
fundamental levantar e desenvolver pistas consistentes que nos levem a uma
reflexão produtiva.
É preciso considerar uma certa heterogeneidade entre os casos estudados.
Existem alguns pontos em comum, como, por exemplo, o fato de serem grandes
cidades a aplicarem a experiência na mesma época (porém, no caso de São Paulo,
a pesquisa incide nos os anos de 2001 a 2004). Mas é fundamental termos em
mente que as pesquisas foram realizadas em contextos desiguais e que se trata de
um universo complexo e dinâmico.
Uma primeira observação sobre a participação do cidadão na administração
pública me parece relevante: ouvir o que o cidadão tem a dizer não basta. Fosse
assim bastariam as audiências públicas sobre o orçamento municipal e teríamos
um efeito significativo. A participação do cidadão estaria amparada e concluída. É
preciso muito mais do que isso. Mais do que servir, a administração pública precisa
transferir responsabilidades para o cidadão. Em Santo André, algumas obras
demandadas pelo OP foram realizadas em esquema de mutirão com financiamento
e suporte técnico da prefeitura. Pontual (2000) detectou uma série de efeitos
pedagógicos nítidos em benefício dos participantes do processo.
75
De maneira geral, a aprendizagem da democracia participativa foi um aspecto
percebido por alguns autores que pesquisaram experiências deste tipo. No caso de
Porto Alegre, onde o OP começou a ser implantado em 1989, a aprendizagem
institucional chama a atenção pela sua evolução. O grupo político que subiu ao
poder naquele mandato estava formado e inserido em uma cultura de confronto.
Esse confronto se deu tanto entre a prefeitura e a oposição, o que ã
76
“O estado do Rio Grande do Sul, mais particularmente a
cidade de Porto Alegre, sofreu um processo de colonização
diferente do resto do país. Do ponto de vista sócio político, um
importante efeito dessa colonização diferenciada foi a constituição
de uma sociedade civil mais ativa, configurando um campo fértil
ao florescimento de iniciativas de caráter comunitário ou
associativista. Segundo dados levantados pela Fundação IBGE
em 1988, a região Sul do país apresentava as maiores taxas de
filiação em organizações comunitárias (30,7% entre pessoas de
18 anos ou mais) e sindicais (17,8%). Em relação ao conjunto do
país, essas taxas eram, respectivamente 14,3% e 12,3%.”
A tabela 14, produzida pelo Fórum Nacional de Participação Popular (FNPP)
mostra alguns dados importantes sobre experiências do OP no Brasil no período
1997/2000. O objetivo da amostra é detectar o tipo de nculo que o participante do
OP mantinha com organizações da sociedade civil.
Tabela 14
Vínculos dos participantes em reuniões do OP
Organizações da Sociedade Civil (%)
Org. Comunitárias/Associações de Moradores 77
Entidades Religiosas 50
Entidades sindicais 44
Movimento de Saúde 34
Movimento de Educação 33
Entidades assistenciais 23
Movimento de Moradia 19
ONG 18
Entidades empresariais 17
Movimento por creche 12
Movimento de Transporte 10
Movimento de Saneamento 09
Universidades 09
Entidades federativas 07
Organizações rurais 03
Fonte: Ribeiro e Grazia. FNPP (2002, p. 58).
77
Pelos dados da tabela, observa-se claramente que, entre as pessoas que
participaram das reuniões do OP, a maioria faz parte de mais de uma organização
da sociedade civil. A vida social e política na comunidade cívica entre os
participantes do OP neste levantamento é fundamental para refletirmos sobre as
possíveis conseqüências da presença do capital social.
Penso que algumas considerações sejam importantes para refletirmos sobre
o significado do conceito capital social e sua relação com as alterações no desenho
institucional. O estudo do conceito nos abre portas para compreendermos o porquê
da maior efetividade na utilização de novos canais de participação para a sociedade
civil. Mas é preciso ressalvar que o capital social deve ser entendido como um
elemento tendencial e não absolutamente determinante sobre os efeitos provocados
por mudanças no desenho institucional.
A inclusão de tabelas que mostram o grau de associativismo entre
participantes do OP (ou mesmo, de maneira mais genérica, entre os moradores da
cidade) não tem o objetivo de mensurar matematicamente o capital social. Não
acredito que aspectos como cultura humana e confiança interpessoal sejam
passíveis de medição estatística. Isso não quer dizer que o capital social não seja
uma ferramenta fundamental para o bom funcionamento das instituições
democráticas. Como veremos mais adiante, cooperam também outros fatores para
sucesso de um novo desenho institucional.
Segundo Avritzer (2003), a nova forma de execução orçamentária está
baseada em quatro elementos: cessão de soberania, elementos de participação
local, princípios da auto regulamentação soberana e prioridade dos recursos
públicos para setores mais carentes.
É interessante notar a semelhança entre o que o autor chama de
características necessárias para se implantar o OP (que seriam: vontade política,
densidade associativa, desenho institucional, capacidade administrativa/financeira) e
os aspectos que Putnam selecionou entre os cientistas políticos pata explicar o
78
desempenho institucional: o desenho institucional, os fatores sócio-econômicos e os
fatores sócio-culturais.
Sobre este último aspecto Avritzer ressalta que, em Porto Alegre, a boa
tradição em movimentos sociais facilitou a implantação e sobretudo a execução do
OP. Um exemplo desses movimentos foi a UAMPA (União das Associações de
Moradores de Porto Alegre) que ajudou a catalisar este processo. A experiência de
Porto Alegre demonstra a importância do associativismo comunitário em dois
aspectos do OP: na capacidade de forjar o sucesso inicial da proposta participativa e
na capacidade de democratizar a relação entre Estado e sociedade civil, através de
um crescimento constante da participação no OP.
O caso de Porto Alegre mostra, sobretudo que o OP é capaz de se tornar a
forma predominante, senão exclusiva, de deliberação sobre recursos blicos
incidindo de modo positivo sobre a relação entre o Estado e a sociedade. Mesmo
em regiões onde não há tradição associativa, o OP pode ser implantado, mas, neste
caso, são necessárias duas outras variáveis: vontade política e capacidade
financeira. Mesmo assim Avritzer não acredita que o OP seja capaz de gerar, no
curto prazo, uma infra-estrutura associativa nos casos em que ela não existe.
Sobre esta mesma questão, Benevides (1991) acrescenta que nenhum
sistema novo por mais “perfeitoque seja ou aparente ser terá garantido os
resultados previstos se afrontar costumes arraigados da cultura política de um povo.
Não é por acaso, portanto, que os exemplos mais bem sucedidos de experiências
participatórias do mundo contemporâneo ocorram nos Estados Unidos e na Suíça,
países com fortíssima tradição de participação dos cidadãos ou de “cidadania
ativa”.
A visão de ambos os autores vai ao encontro do pensamento de Putnam
(1997, p. 191), que pesquisou as tradições cívicas em diferentes regiões da Itália e
mensurou a presença do capital social. Segundo o autor:
79
“o contexto social e a história condicionam profundamente
o desempenho das instituições. Quando o solo regional é fértil, as
regiões sustentam-se das tradições regionais, mas quando o solo
é ruim, as novas instituições definham. A existência de instituições
eficazes e responsáveis depende, no jargão do humanismo cívico,
das virtudes e práticas republicanas. Tocqueville tinha razão:
diante de uma sociedade civil vigorosa, o governo democrático se
fortalece em vez de enfraquecer”.
13
Schattan (2004) destaca a dificuldade enfrentada pelos conselhos municipais
de saúde (na gestão municipal paulistana de 2001/2004) em implementar novas
políticas e aumentar o controle social do estado por parte do cidadão. Como
empecilhos aponta a fragilidade da vida associativa prévia e a tradição autoritária do
Estado.
Fernandes e Bonfim (2005, p. 19), ressaltam também a importância do capital
social em momentos de alteração das formas de relação entre o Estado e a
sociedade. Seja com o objetivo de reestruturação urbana ou mais especificamente
de inclusão social, a presença de um certo nível de tradição associativa se manifesta
como um aspecto bastante importante. Acerca deste tema, afirmam os autores:
“Junto com o planejamento e as obras de urbanização
torna-se necessário aliar programas sociais como educação
básica, capacitação profissional e conscientização ambiental,
além do fortalecimento da organização comunitária buscando
utilizar e potencializar o capital social das comunidades.”
Notamos, neste caso, a preocupação dos autores também com os efeitos
dos programas, sejam eles governamentais ou o, para o capital social. Acredito
que exista uma relação dialética entre o Estado e a sociedade que possa contribuir
para a melhoria da tradição cívica da população. Embora, vale ressaltar, as tradições
13
Anos depois, Putnam escreveu Bowling Alone. The collapse and revival of american community (2000), onde
ele nos faz perceber que os Estados Unidos segue um caminho inverso: o atual modo de vida americano estaria
diminuindo o capital social existente.
80
de um povo dependam de múltiplos fatores
14
, que se estruturam muito lentamente,
e vão se solidificando através dos séculos. Não vejo evidências significativas de que
uma alteração de desenho institucional, como por exemplo uma prática participativa,
possa gerar efeitos importantes, pelo menos a curto prazo nas tradições de uma
população.
Todos estes autores corroboram a tese da vantagem da preexistência de
tradição cívica. Acredito ter demonstrado que tal convergência de pensamentos não
seja por acaso. O Banco Mundial tem utilizado a partir dos anos 90 a expressão
capital social e considera este elemento como crucial para a avaliação de projetos
de desenvolvimento locais.
Seria possível concluir que não vale a pena implementar novos desenhos
institucionais em locais aonde não haja tradição cívica consistente? As pesquisas
realizadas sobre as experiências de OP no Brasil não apontam para esta direção.
Embora a tradição cívica seja a mais importante das três variáveis geradoras de bom
desempenho institucional, as outras duas, o desenho institucional e os fatores sócio
econômicos também podem fazer a diferença. Avritzer constata que o OP teve
efeitos positivos mesmo em cidades com pouca tradição associativa. Foram em
cidades de pequeno e médio porte onde havia alguma disponibilidade orçamentária
para investimentos.
A tabela 15 deixa claro que as regiões de forte tradição associativa
apresentaram maior média de participação inicial. Apesar da pífia presença nas
primeiras assembléias em regiões com fraca tradição associativa, a partir de 1992
este quadro reverteu de maneira bem consistente.
14
Como vimos no capítulo 3, Putnam estudou a história italiana desde antes de sua unificação, para entender as
tradições de cada região estudada.
81
Tabela 15
Participação em Porto Alegre – regiões e anos/edições selecionados
Região 1990 1992 1994 1996 1998
Regiões com forte tradição associativa
Leste 152 510 339 623 710
Lomba 64 569 575 973 638
Partenon 75 1096 661 809 805
Cruzeiro 181 297 494 649 604
Regiões com fraca tradição associativa
Navegantes 15 165 135 495 624
Nordeste 33 276 350 682 906
Restinga 36 369 1096 763 1348
Centro-Sul 101 591 352 1513 1461
Fonte: Wampler e Avritzer (2004, p. 226) . Elaborado pela Prefeitura Municipal de Porto
Alegre (2000).
Para Wampler e Avritzer (2004, p. 225) os motivos do crescimento da
participação popular nas regiões de menor tradição associativa, deveu-se, além da
efetiva institucionalização do processo, aos “efeitos demonstração”, que incentivam
a participação de pessoas que não estavam previamente ativas. Tais efeitos são o
“resultado da participação direta do cidadão que se envolve na deliberação face a
face, o que auxilia a internalização de uma cultura política da deliberação”.
No caso italiano, embora tenha havido uma maior eficiência do novo desenho
institucional nas regiões de maior tradição cívica, existe consenso de que a
descentralização administrativa nas regiões menos desenvolvidas do sul da Itália
também surtiu efeitos positivos.
Quando falamos sobre alterações no desenho institucional, é
importante que façamos uma reflexão sobre possíveis mudanças nas administrações
municipais envolvidas no processo. Como vimos no capítulo 4, Pontual realizou um
levantamento entre os conselheiros procurando detectar possíveis alterações
82
sofridas pela administração pública durante a implantação do OP. A tabela 16, com
dados coletados pelo FNPP corrobora a visão do autor sobre este aspecto.
Tabela 16
Mudanças na Administração Municipal decorrentes do Orçamento Participativo
(1997 – 2000)
MUDANÇAS
Cit. em 1º
lugar
Cit. em 2º
lugar
Cit. em 3º
lugar
Adoção de novos instrumentos de gestão e
planejamento
25 14 06
Maior articulação de políticas setoriais
20 13 09
Revisão de rotinas administrativas
07 12 09
Aumento do nível de informação da
administração
06 05 04
Não houve mudança
10 01 -
Outra
32 03 04
NR
03 52 19
Total de referência
103 103 103
Fonte: Ribeiro e Grazia. FNPP (2002, p. 103)
Obs: As incidências foram calculadas em relação ao total das experiências
estudadas (103). A questão é de respostas múltiplas ordenadas.
A mudança mais evidente na administração foi a adoção de novos
instrumentos de gestão e planejamento, resultado já esperado devido à própria
lógica interna do OP. A segunda mudança com forte incidência, a maior articulação
de políticas setoriais, vai ao encontro da visão dos conselheiros entrevistados
durante a execução do OP de Santo André (ver págs. 60 a 63)
15
.
Estes fatos nos remetem à questão da cultura organizacional na
administração pública. Pires e Macedo (2006) discutem alguns aspectos importantes
com relação à realidade brasileira. Existe na esfera pública uma tendência a
15
Esta visão
também é corroborada pelos dados da tabela A-1 (ver Anexo 1), onde observamos a
incidência de diversas secretarias municipais envolvidas no processo.
83
complicações como autoritarismo, burocracia, paternalismo, descontinuidade e
excesso de ingerência política. Acrescentam também resistências a mudanças de
procedimento, embora ressaltem que estas características não se aplicam
necessariamente a todas as organizações públicas no Brasil.
Os dados analisados permitem visualizar que a população tem mantido uma
crescente freqüência de participação nas assembléias do OP ao longo dos anos.
Esses dados, posto que relevantes, são insuficientes para concluir que a sociedade
civil tenha decretado a legitimidade do processo. A efetiva realização das obras (no
ano seguinte ao processo do OP, de acordo com o calendário da Lei Orçamentária
Anual) também é de fundamental importância para aferir a sua credibilidade. De
acordo com os dados referentes aos municípios pesquisados, a prefeitura de fato
realizou a maioria das obras demandadas pelas assembléias. Mas, segundo os
dados trazidos por Vitale (2003), há exceções. No caso da cidade de Medianeira
(PR), embora toda a parcela do orçamento anual relativa a investimentos tenha sido
deliberada pelo OP, a arrecadação de receitas não permitiu realizar mais do que
40% das reivindicações. Em Campina Grande (PB), onde se delibera menos da
metade dos investimentos, executa-se cerca de 20% das demandas e não se
apresentam critérios gerais para a distribuição de recursos entre as regiões.
A transferência de poder para as assembléias, mesmo que relativa, nos leva a
refletir sobre um aspecto relevante em relação à implementação do OP: o aumento
em um certo nível de responsividade dos governos eleitos em um sistema
representativo (FRANZESE e PEDROTI, 2005). À medida em que a população
acompanha e delibera sobre o processo orçamentário, tecondições de pressionar
vereadores e prefeitos a atuar de acordo com as preferências dos cidadãos.
As parcerias entre o Estado e a sociedade podem gerar um benefício
importante por serem alternativas para melhorar o padrão de accountability. A
imputação de responsabilidade pelos atos da administração pública tem sido
bastante precária. Tanto no nível horizontal, interno, executado pelos tribunais de
contas e por outros órgãos, como no nível vertical que aferimos através das eleições
periódicas, mecanismo clássico da democracia representativa (O’DONNELL, 1988).
O caso específico do orçamento participativo mostrou um nítido aumento da
84
percepção da população em relação aos atos do poder executivo municipal no que
tange à questão da execução orçamentária. Não existe, neste processo,
mecanismos próprios de responsabilização direta para um prefeito que, por exemplo,
não cumpra uma demanda votada nas assembléias e aprovada na Lei
Orçamentária
16
. Mesmo assim cria-se um ambiente mais propício para que haja
interpelações realizadas por órgãos da administração pública, ou ao menos, uma
resposta eleitoral balizada por informações mais precisas acerca da execução
orçamentária por parte da população.
16
Como foi visto no capílo 5, a Lei Orçamentária é apenas autorizativa.
85
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com relação aos efeitos dos mecanismos de democracia participativa sobre a
nossa democracia, pode-se constatar pelo menos três elementos.
O primeiro é uma alocação de recursos do orçamento de maneira
redistributiva. Os dados relativos à Porto Alegre demonstram este fato. Mesmo
assim, não podemos ter certeza absoluta de que esta redistribuição de recursos
orçamentários destinados a áreas mais carentes não ocorreu, principalmente, devido
à vontade política do poder executivo. Mas não são todas as experiências de OP
que se utilizam do critério redistributivo. Segundo Vitale (2004), os municípios de
Campina Grande e Itapecerica da Serra não colocaram em lugar central a questão
da carência em infra-estrutura e serviços para a distribuição de recursos.
É evidente que o crônico problema de concentração de renda no Brasil não
será resolvido apenas com uma nova política da administração pública municipal. A
União, os Estados e as organizações da sociedade civil têm uma significativa
parcela de responsabilidade quando nos referimos ao desafio da distribuição de
renda. O próprio mercado também pode se organizar de modo a contribuir nesta
questão.
também uma tradição arraigada na administração pública brasileira de
servir fortemente os interesses privados antes dos públicos. Segundo Junqueira
(2005, p. 175):
86
“Entender essa realidade construída socialmente e propor
mudanças na sua forma de agir é uma tarefa complexa nas
organizações públicas estatais, especialmente as gestoras de
políticas sociais. As transformações que vêm ocorrendo nesses
aparatos são um processo relativamente recente, pois é difícil
desalojar os interesses privados que perpassam as estruturas
organizacionais estatais para dar lugar aos interesses coletivos.”
Como exemplo de resistência a este contexto adverso, a dotação
orçamentária da capital gaúcha teve, como percebemos pelos dados constantes no
capítulo 5, um propósito nitidamente redistributivo. Apesar das claras limitações do
município em atacar este problema, Dowbor (1998, p. 35) afirma que atualmente o
município está despontando como um grande agente de justiça social.
“É no nível local que se podem realmente identificar com
clareza as principais ações redistributivas. Essas ações
dependem vitalmente de soluções locais e momentos políticos, e
as propostas demasiadamente globais simplesmente não
funcionam, na medida em que enfrentam interesses dominantes
organizados e complexidades políticas que inviabilizam os
projetos.”
O segundo elemento está relacionado com a própria definição de Orçamento
Participativo: houve uma relativa transferência de poder decisório para as
assembléias do OP. Mesmo considerando o longo caminho do processo
orçamentário, ficou constatado que a maioria das obras demandadas pela
população foram de fato executadas. Se considerarmos os dois elementos acima
citados, podemos concluir que o OP procura gerar uma dupla democratização. Vitale
(2004) comenta que a dupla democratização tem um caráter tanto formal como
material. De um lado, a ampliação do modo de exercício da soberania popular,
criando instâncias diretas de participação que se articulam às representativas. De
outro, redistribuição de bens e serviços públicos, visando democratizar o acesso aos
recursos do orçamento municipal.
87
O terceiro efeito positivo para a democracia está no cerne do trabalho de
Pontual. A democratização das informações, bem como a participação do cidadão
ao longo do processo, mostrou um efeito pedagógico significativo. À medida que a
população vai participando do processo, vai também adquirindo informações
fundamentais sobre questões estratégicas para a formação de um cidadão:
conhecimento sobre a feitura da peça orçamentária, sobre a execução do orçamento
e principalmente informações sobre a realidade local (bairro/cidade) em que o
cidadão reside. Segundo Pontual, também aprendizados em relação à percepção
da necessidade de mobilização, ao exercício da liderança, à ampliação da rede de
relacionamentos pessoais entre outros. É importante salientar que os atores do
governo municipal também vivem um intenso processo de aprendizagem.
Com relação à possível importância do capital social para o bom
funcionamento de novos instrumentos a serem utilizados pela administração pública
em parceria com a sociedade civil, existem alguns aspectos a serem considerados.
Em primeiro lugar, não conviria isolar uma ferramenta como o orçamento
participativo em face do fator capital social; este se revelou importante, embora não
tenha sido o único fator determinante nas pesquisas sobre as experiências de Porto
Alegre, Santo André e São Paulo. Existem, como vimos, diversas ferramentas de
administração participativa em curso no Brasil que também influenciam e são
influenciadas pela tradição cívica detectada em cada cidade ou comunidade. Vale
acrescentar também que, se por um lado, novos desenhos institucionais encontram
limites nos níveis de tradição cívica preexistentes, por outro, existe uma relação
dialética entre o Estado e a sociedade que pode gerar efeitos em ambas as partes.
O impacto do OP na administração pública foi um aspecto importante sentido
pelos participantes do processo. Mas é preciso salientar que a medição da eficiência
governamental não foi o objetivo deste trabalho. Para tanto seria necessária a
aferição de uma grande quantidade de variáveis para medir de maneira
suficientemente significativa o desempenho institucional do governo. Mesmo assim,
a percepção por parte da sociedade civil de que a administração pública reage de
alguma forma às suas demandas (num contexto de novo desenho institucional) é
bastante relevante. Esta constatação é especialmente pertinente quando verificamos
88
que, nas democracias contemporâneas, ocorre, invariavelmente um enorme
distanciamento entre os poderes constituídos e a população. O OP pode ser uma
das ferramentas para superar este distanciamento. Se pensarmos em termos de
reforma do Estado, os mecanismos de democracia participativa podem dar a sua
parcela de contribuição. Sobre esta questão, o relatório do Banco Mundial de 1997,
cita um estudo realizado em 49 países da Ásia, África e América do Sul acerca de
projetos de desenvolvimento rural objetivando testar uma possível relação entre
participação e desempenho. A conclusão dos autores foi a existência de uma forte
correlação entre a participação dos beneficiários e o êxito dos projetos
17
.
Na mesma publicação, o Banco Mundial afirma acreditar que as experiências
participatórias não são fáceis de serem realizadas e requerem a intervenção do setor
público. Diz o texto:
“Contudo, a efetiva participação do cidadão não é fácil de
obter. Uma lição extraída de muitas experiências dessa natureza
é de que a participação efetiva requer uma intervenção
governamental informada, que inclua a melhoria do ambiente
institucional em que se gera capital social e humano.” (1997, p.
116)
Apesar de presente em nosso arcabouço jurídico, é difícil afirmar
categoricamente que o Brasil caminha para a democracia semidireta. Os
mecanismos de democracia participativa recentemente implantados indicam, de todo
modo, uma razoável probabilidade nessa direção. A utilização de plebiscito e mais
recentemente de um referendo também podem estar sinalizando um caminho neste
sentido. Dentro desse contexto de novos paradigmas para a democracia, um
aspecto interessante consiste no fato de que o cidadão ganha soberania diante de
situações que transcendem uma linha partidária.
É consenso geral que vivemos uma crise de confiança nos procedimentos
clássicos da nossa democracia representativa. Embora válidos do ponto de vista da
17
Banco Mundial. Relatório sobre o desenvolvimento mundial/1997.
89
cidadania e com grande potencial de aperfeiçoamento, esses mecanismos não
contemplam de maneira ampla os anseios de participação popular e um maior
controle do Estado pela sociedade. Em face dessa crise, elementos de democracia
participativa, como é o caso do OP, o particularmente bem vindos. Vale ressaltar
que muito dificilmente se implanta o OP sem que haja vontade política do poder
executivo. É um caso de mecanismo de democracia participativa que depende da
iniciativa da tradicional e institucionalizada democracia representativa para que o
“pontapé inicial” seja dado. Não conheço nenhum exemplo em que um vereador da
oposição tenha apresentado um projeto desse porte e tenha conseguido sucesso na
sua implantação sem o acolhimento por parte do poder executivo. Por outro lado,
uma vez iniciado, o Orçamento Participativo dificilmente é abandonado. O prefeito
eleito de Porto Alegre em 2004 (que é de um partido que não tem muita tradição em
implantação de mecanismos de participação popular) declarou que o OP é uma
conquista da cidade e vai continuar. Cumpre ressaltar que o número de prefeituras
que se utiliza deste mecanismo cresce continuamente. De cerca de 12 nas gestões
municipais de 1989 a 1992 passou para mais de 100 entre 1997 e 2000.
Nas últimas décadas assistimos a dois tipos distintos, porém quase
simultâneos, de agigantamento: do Estado e do mercado. Nesse contexto acredito
que se torna necessário que a sociedade civil se organize e crie processos de
transparência e controle de ambos os gigantes que tanto influem sobre a vida do
cidadão do terceiro milênio. Na visão de Ladislau Dowbor (2003, p. 20) “O eixo do
problema não está na relação privado / estatal, e sim na relação poder / sociedade
civil, poder incluindo aqui o poder privado das grandes empresas”. O Orçamento
Participativo bem como os conselhos gestores podem vir a se tornar instrumentos de
controle eficientes do Estado pela sociedade civil.
O OP, assim como outros mecanismos de democracia representativa, abre
espaço para o cidadão comum trazer suas inquietações e seu conhecimento sobre
questões locais que, eventualmente, o administrador público desconhece. De acordo
com os dados coletados vimos que, de maneira geral, estes espaços de fato o
preenchidos e a população tende a aparecer cada vez em maior mero. Vale
acrescentar que o OP, diferentemente dos conselhos gestores de políticas públicas,
90
que possuem um critério mais específico para a participação do cidadão, é aberto a
toda a população, bastando para isso ser morador do bairro.
Embora o OP tenha sob seu controle um percentual muito pequeno do
orçamento anual de um município (a parte referente ao custeio, por exemplo, não
entra no processo), foi possível verificar que esta prática tem algum efeito positivo
em termos de impacto sobre a administração pública e com relação à inclusão
social.
Mesmo tendo sido possível detectar ganhos efetivos em termos de
democracia e aprendizado, não podemos afirmar que a prática do OP seja uma
tendência irreversível ou uma conquista definitiva da sociedade. Ainda assim, as
experiências demonstraram uma crescente capacidade de ganhar a adesão tanto do
cidadão como também da administração pública.
Acredito que, embora existam muitos setores da sociedade conscientes de
que é preciso ocupar os espaços cívicos disponíveis como também criar novos
espaços de participação, a importância do Estado como agente facilitador é de suma
importância. De acordo com Frey (2001, p. 25):
“Para incluir, de forma perene, aqueles setores
tradicionalmente marginalizados e necessitados no processo
político, parece imprescindível o fomento e o apoio à organização
formal desses setores, a fim de que esses possam mostrar-se
mais resistentes contra tentativas de manipulação e formas de
cooptação por parte de futuros chefes políticos. Contudo, a
perseguição do desenvolvimento sustentável dentro de uma
perspectiva democrática exige, pelo menos por enquanto, um
Estado ativo e facilitador”.
Uma forma de participação institucionalmente amparada terá, como vimos,
muito mais fôlego.
91
O aprofundamento da democracia pode se dar em duas frentes: na melhoria
do quadro institucional ligado à democracia representativa tradicional, o que incluiria,
por exemplo, a tão esperada reforma política e na ampliação de espaços
participativos na administração pública para a sociedade civil.
A reforma política está na pauta do congresso para a legislatura de
2007/2010, mas já esteve presente em períodos recentes e não saiu do papel.
Questões como fidelidade partidária, o financiamento público de campanha, a sub
representação do Estado de São Paulo, o voto proporcional e o voto distrital misto
podem entrar na pauta.
É uma nova arena política onde entram iniciativas como o orçamento
participativo, os conselhos gestores e a feitura dos planos diretores municipais de
maneira mais aberta à população local. Os mecanismos de democracia direta
previstos na Constituição Federal, como o referendo e o plebiscito, são utilizados
com muito pouca freqüência. Houve um plebiscito nos anos 90 que contrapôs
república e monarquia, além de presidencialismo e parlamentarismo. Recentemente
tivemos o referendo relacionado ao porte de armas. Muito pouco para uma
legislação que completará 20 anos em 2008.
Sem prejuízo de uma possível ampliação destes procedimentos clássicos de
democracia direta, percebo que os instrumentos de democracia participativa como
um todo vem ganhando importância. Existe uma razoável gama de parcerias entre o
poder público e a sociedade civil no sentido de conferir legitimidade política ao
Estado e também desenvolver o seu aspecto prescritivo. Utilizado pelo Banco
Mundial, este termo está relacionado com a idéia de que o Estado deve ser um
instrumento de superação da pobreza (IVO, 2000). No Brasil, o orçamento
participativo, Plano Diretor participativo e conselhos gestores municipais e estaduais
têm obtido um espaço importante como instrumentos de controle do Estado pela
sociedade.
Um desenho institucional do tipo democrático e republicano, com
independência entre os três poderes, eleições periódicas, mecanismos de
transparência e de participação popular seria fundamental para um bom
92
desempenho da democracia. É claro que ela irá funcionar muito melhor se houver
também boas tradições cívicas locais e condições sócio-econômicas favoráveis.
Apesar dos evidentes limites dos mecanismos de democracia participativa, é
possível perceber que a sociedade civil pode ganhar com eles. A própria democracia
representativa tradicional nos mostra que é preciso um tempo para o
amadurecimento. A educação política é um processo.
93
B
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100
ANEXO 1
Tabela A-1
Órgãos da Administração Municipal Mais Envolvidos no Orçamento
Participativo (1997-2000)
Órgão Incidência (%)
Secretaria de Obras
57
Secretaria de Planejamento 55
Secretaria de Finanças 48
Secretaria de Saúde 46
Secretaria de Educação 35
Gabinete do Prefeito 23
Secretaria de Administração e de Governo 8,5
Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer 08
Secretarias de Desenvolvimento Urbano,
Transporte, Habitação e Serviços Públicos
08
Secretaria da Agricultura 07
Secretaria da Ação Social, Cidadania e
Promoção Social
05
CRC*, Secretaria de Ação Comunitária e de
Assistência à Participação Popular
03
Secretaria do Trabalho 03
Gabinete do Vice-Prefeito 02
Outro 13
NR 05
Fonte: Ribeiro e Grazia FNPP (2002, p. 95).
Obs: A incidência das citações foi calculada em face ao total de casos analisados (103).
* Coordenadoria das Relações com a Comunidade
101
Tabela A-2
Decisão Final do Projeto de Lei Orçamentária
QUEM DECIDE INCIDÊNCIA (%)
Órgão da Prefeitura e/ou Prefeito 77
Instância Municipal do Orçamento Participativo 31
Outro 03
NR 03
Obs: A incidência das citações foi calculada em face ao total de casos analisados (103). A
pergunta que deu origem à tabela não admitia múltipla escolha de alternativas, mas esta
aconteceu durante o levantamento, obrigando à construção de novas alternativas. Desta forma,
registrou-se que 13 municípios assinalaram que a decisão final do projeto de Lei Orçamentária
coube, simultaneamente, à Instância Municipal do Orçamento Participativo e a algum órgão da
prefeitura ou ao prefeito.
Fonte: Ribeiro e Grazia. FNPP (2002, p. 94).
Tabela A-3
Municípios com menor grau de exclusão social
Município (ano 2000)
Posição no
ranking
Índice de
Excl. social
São Caetano do Sul (SP) 0,864
Águas de São Pedro (SP) 0,835
Florianópolis (SC) 0,815
Santos (SP) 0,765
Niterói (RJ) 0,763
Porto Alegre (RS) 0,761
Holambra (SP) 0,756
Vitória (ES) 0,752
Curitiba (PR) 0,730
Vinhedo (SP) 10º 0,720
São Paulo (SP) 30º 0,667
Santo André (SP) 76º 0,637
Fonte: Atlas da exclusão social no Brasil (Pochmann, 2003), pág 215-217.
102
Tabela A-4
Abreviaturas das Regiões Italianas (cap. 3)
Ab Abruzos Ba Basilicata
Cl Calábria Cm Canpânia
Em Emilia-Romagna Fr Friuli-Veneza Giulia
La Lácio Li Ligúria
Lo Lombardia Ma Marche
Mo Molise Pi Piemonte
Pu Puglia Sa Sardenha
Si Sicília To Toscana
Tr Trentino Um Úmbria
Va Valle d’Aosta Ve Venécia
Fonte: Putnan (2000, p. 205)
103
Anexo 2
Regimento Interno do OP de Santo André (1999)
A cidade foi dividida em 19 regiões e em cada uma delas ocorrerá uma plenária informativa,
reuniões intermediárias e uma deliberativa, em que todos os moradores serão convidados a apontar
as prioridades para o seu bairro e região.
Na primeira plenária, de caráter informativo, o governo fará a prestação de
contas do orçamento 99 e apresentará as regras de funcionamento do Orçamento
Participativo.
Em seguida serão realizadas reuniões intermediárias em que os moradores estarão
discutindo as suas prioridades e aprofundando o debate sobre os problemas enfrentados.
Na plenária deliberativa serão indicadas quatro prioridades para a região e duas para a
cidade, além de serem eleitos os conselheiros e o respectivo suplente daquela região.
O mesmo ocorrerá nas discussões temáticas - Saúde, Habitação, Cultura,
Funcionalismo, Educação, Assistência Sócia e Desenvolvimento Econômico e
Geração de Emprego e Renda, que também a partir da realização das plenárias,
definirão suas prioridades e elegerão os seus representantes.
Após este processo, o Conselho de Orçamento Municipal, que terá uma composição paritária
(o mesmo número de representantes do governo e da população) irá, de acordo com a capacidade
financeira da Prefeitura, definir a proposta do Orçamento/2000.
As propostas definidas no Conselho serão, para apreciação e aprovação. A seguir
apresentamos o regimento.
O Regimento
Do Conselho Municipal do Orçamento Participativo e seus fins
Artigo - O Conselho Municipal do Orçamento Participativo é o instrumento legal de controle e
planejamento das ações do Governo Municipal de Santo André.
Artigo 2º - São objetivos, entre outros:
I - Deliberar sobre o projeto de orçamentária a ser enviado pelo poder Executivo à Câmara Municipal
de Santo André;
II - Apreciar e emitir opinião sobre a receita (alíquota dos impostos e taxas de serviços municipais) do
município;
III - Representantes do Governo Municipal em igual número da Sociedade Civil.
Parágrafo Único: Os membros do conselho municipal do orçamento não receberão qualquer tipo de
remuneração por sua participação nas atividades do Conselho.
Artigo 4º - Os representantes do Governo Municipal no Conselho Municipal do Orçamento, serão
indicados pelo Prefeitos e os representantes da Sociedade Civil serão eleitos nas Plenárias
Deliberativas Regionais e Temáticas.
Artigo - O quorum mínimo para eleição dos conselheiros e conselheiras será de 0,5% da
população total da região nas Plenárias Regionais e 100 (cem) pessoas nas plenárias temáticas.
104
Parágrafo 1º - Considera-se como população total da região aquela constante no CENSO IBGE 1991.
Parágrafo - Nas plenárias Regionais realizadas em área de manancial (regiões Q e R), o quorum
mínimo será de 50 (cinqüenta) pessoas.
Parágrafo - As plenárias que não conseguirem obter quorum mínimo exigido, elegerão um
conselheiro/a com direito a voz, mas sem direito a voto.
Artigo 6º - Será eleito/a representante da sociedade civil no Conselho Municipal do Orçamento aquele
ou aquela que possuir maioria simples de votos dos participantes da Plenária Deliberativa. (Regional
ou Temática).
Artigo 7º - Poderão ser candidatos/as ao Conselho aqueles/as que comprovadamente:
I - Sejam munícipes de Santo André;
II - Sejam moradores/as da região em que será candidato/a;
III - Sejam maiores de 16 (dezesseis) anos;
IV - Não sejam detentores ou detentoras de mandato eletivo nos poderes Legislativos ou Executivos
V - Não tenham cargo em comissão no Poder Legislativo ou Executivo.
Parágrafo Único: Poderão ser eleitos ou eleitas representantes da plenária Temática do
Funcionalismo, os servidores e servidoras da Prefeitura Municipal de Santo André, independente de
sua residência.
Artigo 8º - O conselheiro/a só poderá ser eleito/a representante de uma única região ou de uma única
temática.
Parágrafo Único: É permitido aos participantes das plenárias votar em uma Plenária Deliberativa
Regional e em uma Plenária Deliberativa Temática, mas somente poderão candidatar-se em uma
única Plenária Regional ou Temática.
Artigo - O mandato dos conselheiros/as, bem como de seus suplentes, será de um ano, cabendo
uma reeleição consecutiva.
Artigo 10º - São direitos dos conselheiros/as:
I - Votar e ser votado nas reuniões ordinárias e extraordinárias;
II - Exigir o cumprimento das resoluções e decisões tomadas pelo Conselho Municipal do Orçamento;
III - Ter acesso a todas as informações que sejam necessárias para o desenvolvimento de suas
funções.
Artigo 11º - São deveres dos conselheiros/as:
I - Conhecer e fazer cumprir o presente regimento;
II - Comunicar em até dois dias anteriores às reuniões do Conselho, aos suplentes e ao Núcleo de
Participação Popular, eventuais ausências.
Capitulo III
Das Instâncias do Conselho
Artigo 12º - São instâncias do Conselho Municipal do Orçamento:
I - Coordenação Paritária;
II - Secretária Executiva;
III - Grupos de Trabalho
Seção I
Da Coordenação Paritária
Artigo 13º - A Coordenação Paritária será composta por 8 membros, sendo 4 indicados pelo Governo
e 4 indicados pelos representantes da população.
Artigo 14º - Compete à Coordenação Partitária:
I - Convocar e coordenar as reuniões ordinárias e extraordinárias do Conselho;
II - Apresentar para apreciação do Conselho proposta para discussão e definição da peça
orçamentária, das obras e atividades que deverão constar no Plano de Investimento e Custeios;
III - Encaminhar ao Poder Executivo Municipal as deliberações do Conselho;
IV - Discutir e propor as pautas e o calendário das reuniões;
V - Prestar contas de suas atividades do Conselho;
VI - Coordenar e planejar as atividades do Conselho.
Seção III
Da Secretaria Executiva
Artigo 15º - Compete à Secretaria Executiva fornecer a documentação necessária ao funcionamento
do Conselho.
Parágrafo Único: a Secretaria Executiva será de responsabilidade da Administração Municipal que a
exercerá por meio do Núcleo de Participação Popular - N.P.P., que é subordinado ao Gabinete do
Prefeito.
105
Seção III
Dos Grupos de Trabalho
Artigo 16º - Os Grupos de Trabalho compõe a estrutura de apoio ao Conselho, não possuindo caráter
deliberativo.
Parágrafo Único: Os grupos de Trabalho serão formados a partir das demandas surgidas nas
plenárias e da necessidade do Conselho.
Artigo 17º - Compete aos Grupos de Trabalho:
I - Detalhar as demandas e buscar alternativas para o seu atendimento;
II - Propor critérios de priorização no atendimento.
Capítulo IV
Das Reuniões do Conselho
Artigo 18º - O Conselho Municipal do Orçamento de Santo André se reunirá ordinariamente
quinzenalmente, às segundas-feiras, das 19h à 22h e extraordinariamente, sempre que for
necessário.
Artigo 19º - As deliberações do Conselho serão resultantes do voto favorável de, pelo menos, 2/3
(dois terços) dos conselheiros e conselheiras eleitos nas plenárias Deliberativas Regionais e
Temáticas.
Parágrafo Único - Caracterizada uma situação de impasse, caberá à coordenação paritária a decisão
final, sendo necessário 2/3 de votos.
Artigo 20º - As reuniões do Conselho Municipal do Orçamento são públicas, sendo permitida a livre
manifestação dos titulares e suplentes sobre os assuntos em pauta, respeitada a ordem de
inscrições.
Parágrafo 1º - As manifestações dos Conselheiros ou suplentes terão tempo máximo de 3 minutos
para cada manifestação.
Parágrafo - Estando presentes na reunião os titulares e os suplentes, no momento da deliberação,
apenas os titulares ou suplentes no exercício da titularidade tem direito a voto.
Artigo 2- É facultado aos parlamentares o direito a participar das reuniões do Conselho Municipal
do Orçamento, possuindo o direito a voz sem direito a voto.
Artigo 22º - O Conselho Municipal do Orçamento poderá convidar pessoas a prestar esclarecimentos
sobre matérias que estão sendo objeto de apreciação do Conselho.
Capítulo V
Das exclusões
Artigo 2- Poderão ser excluídos os conselheiros/as que descumprirem qualquer dos seus deveres
e/ou infringirem as disposições deste regimento, bem como as determinações de qualquer instância
do Conselho.
Artigo 24º - Serão, ainda, excluídos os conselheiros/as, incluindo os suplentes, que se ausentarem,
sem justificativa, por três vezes consecutivas ou cinco vezes alternadas, assumindo seu/sua suplente
a titularidade no Conselho.
Parágrafo - Não existindo suplente, assumirá o terceiro candidato mais votado na plenária
deliberativa e, em não havendo essa possibilidade, o Conselho convocará uma nova plenária.
Parágrafo 2º - Os conselheiros/as que perderem o mandato não poderão se candidatar novamente ao
Conselho durante um prazo de dois anos.
Capítulo VI
Disposições Gerais
Artigo 25º - Os casos omissos nesse Regimento serão decididos pelo Conselho Municipal do
Orçamento.
Artigo 26º - Anualmente e até o início da discussão pública do Orçamento, fica o Governo Municipal
obrigado a prestar contas sobre a excussão orçamentária.
Artigo 27º - O Conselho Municipal do Orçamento a ser eleito deliberará sobre possíveis modificações
a serem introduzidas para os anos subseqüentes.
Artigo 2- O presente Regimento vigorará a partir do início da primeira rodada de plenárias do
Orçamento Participativo 1999/2000.
Santo André,
Fevereiro de 1999.
Fonte: Orçamento Participativo. Experiências em administrações municipais e estaduais. o Paulo,
Fundação Perseu Abramo (2001). CD-ROM.
106
Anexo 3
Obs: O Regimento do Orçamento de Participativo de Porto Alegre é bem
mais completo, (e muito extenso para este anexo) contém, por exemplo, trechos
(aqui selecionados) que garantem a maior alocação de recursos para áreas mais
carentes e populosas:
Critérios Gerais
CARÊNCIA DO SERVIÇO OU INFRA-ESTRUTURA
PESO 4
DE 0,01% A 20,99% Nota 1
DE 21% A 40,99% Nota 2
DE 41% A 60,99% Nota 3
DE 61% A 79,99% Nota 4
DE 80% em diante Nota 5
POPULAÇÃO TOTAL DA REGIÃO
PESO 2
Até 30.999 habitantes nota 1
De 31.000 a 60.999 habitantes nota 2
De 61.000 a 119.999 habitantes nota 3
Acima de 120.000 habitantes nota 4
Obs.: Fonte de dados do IBGE
PRIORIDADE TEMÁTICA DA REGIÃO
PESO 4
Quinta prioridade nota 1
Quarta prioridade nota 2
Terceira prioridade nota 3
Segunda Prioridade nota 4
Primeira Prioridade nota 5
CRITÉRIOS GERAIS PARA DISTRIBUIÇÃO
DE RECURSOS ENTRE AS REGIÕES
As três Primeiras Prioridades Temáticas das 16 Regiões
Os três critérios gerais (carência do serviço ou infra-estrutura, população total da região,
prioridade temática da região) serão aplicados para a distribuição de recursos nas três
primeiras prioridades temáticas escolhidas globalmente pelas 16 regiões, com exceção do
DMAE, que tem critérios próprios. O cálculo para chegar às três primeiras prioridades globais
deverá ser executado da seguinte forma:
107
a) cada região escolhe 5 prioridades dentro das 12 prioridades temáticas (Saneamento
Básico, Política Habitacional, Pavimentação, Transporte e Circulação, Saúde, Assistência
Social, Educação, Áreas de Lazer, Esporte e Lazer, Organização da Cidade,
Desenvolvimento Econômico, Cultura)
b) são atribuídas notas às prioridades de cada região:
Primeira prioridade Nota 5
Segunda prioridade Nota 4
Terceira prioridade Nota 3
Quarta prioridade Nota 2
Quinta prioridade Nota 1
c) somando as notas de todas prioridades escolhidas pelas 16 regiões chega-se às três
prioridades, que serão aquelas que somarem maior pontuação.
Fonte: Orçamento Participativo. Experiências em administrações municipais e estaduais. o Paulo,
Fundação Perseu Abramo (2001). CD-ROM.
108
Anexo 4
4.1 Trecho da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) - São Paulo/2001.
CAPÍTULO III
DA ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DOS ORÇAMENTOS
Art. 3º - O projeto de lei orçamentária do Município de São Paulo, relativo ao exercício
de 2002, deve assegurar os seguintes princípios de justiça, de controle social e de
transparência na elaboração e execução do orçamento:
I. o princípio de justiça social implica assegurar, na elaboração e execução do
orçamento, projetos e atividades que venham a reduzir as desigualdades entre
indivíduos e regiões da cidade, bem como combater a exclusão social;
II. o princípio de controle social implica assegurar a todo cidadão a participação na
elaboração e no acompanhamento do orçamento, através dos instrumentos previstos
nesta lei;
III. o princípio de transparência implica, além da observação do princípio constitucional
da publicidade, a utilização de todos os meios disponíveis para garantir o real acesso
dos munícipes às informações relativas ao orçamento.
Art. 4º - Será assegurada aos cidadãos a participação no processo de elaboração,
execução e fiscalização do orçamento, por meio de assembléia distritais, a serem
convocadas especialmente para esse fim, pelo governo municipal.
Parágrafo único - O processo de decisão sobre as prioridades que nortearão os
dispêndios com atividades e projetos vinculados a programas será objeto de
regulamentação, a ser publicada com antecedência de no mínimo 30 (trinta) dias do
início das assembléias distritais.
Art. 5º - Fica criado o Conselho de Orçamento Participativo, constituído por
representantes eleitos nas plenárias de delegados distritais do orçamento participativo,
eleitos este últimos pela população presente às assembléias distritais referidas no artigo
4º.
Parágrafo único - O Conselho de que trata o caput deste artigo tem por atribuição
subsidiar a elaboração do projeto de lei orçamentária anual e acompanhar e fiscalizar a
execução orçamentária.
Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo.
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4.2 TABELAS-RESUMO DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA DO PLANO DE
OBRAS DO OP 2002-2003*
1- Secretaria Municipal da Saúde (em milhões de R$)
Tipo Empenhado(B) Liquidado(C)
Construção e Equipamentos 3,821 3,820
Reformas e Ampliações 10,726 10,723
Serviços 233,716 233,151
SUBTOTAL 248,264 247,695
2- Secretaria Municipal de Educação (em milhões de R$)
Tipo Empenhado (B) Liquidado(C)
Obras carregadas do POS 2002 10,678 8,016
Obras Novas 263,525 240,147
Construções-Dotações genéricas 3,592 2,074
Serviços-Dotações genéricas 137,577 123,858
SUBTOTAL 415,373 374,097
3- Total do Plano de Contas (em Milhões de R$)
Secretaria/Área Orçado(A)
Empenhado
(B)
Liquidado
(C)
C/A(%)
Saúde 350,299 248,264 247,695 70,7
Educação 271,134 415,373 374,097 138,0
Melhoria de
Bairros
15,122 6,581 3,300 21,8
Programas
Sociais
(3) 6,219 6,219 (3)
Habitação 25,327 14,282 14,282 56,4
TOTAL 661,882 690,721 645,592 97,5
Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo. (www.prefeitura.sp.gov.br)
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