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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
FACULDADE DE ECONOMIA
Caroline Santos
Capital Social e Capital Humano: subordinação ou
independência? Uma análise a partir do estudo de caso dos
Conselhos Municipais de Macaé e Resende
Niterói
Abril de 2006
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CAROLINE SANTOS
Capital Social e Capital Humano:
Subordinação ou independência? Uma análise a partir do estudo de caso dos
Conselhos Municipais de Macaé e Resende
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-graduação em Ciências Econômicas da
Universidade Federal Fluminense como requisito
parcial para a obtenção do Grau de Mestre em
Economia.
Orientadora: Profª. Célia de Andrade Lessa Kerstenetzky
Co-orientador: Profº. Antônio Carlos Alkmim dos Reis
Niterói
Abril de 2006
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CAROLINE SANTOS
Capital Social e Capital Humano: subordinação ou independência? Uma análise
a partir do estudo de caso dos Conselhos Municipais de Macaé e Resende
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-graduação em Ciências
Econômicas da Universidade Federal
Fluminense como requisito parcial para a
obtenção do Grau de Mestre em Economia.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________
Presidente, Profª. Doutora Célia de Andrade Lessa Kerstenetzky
_______________________________
Prof. Doutor Antônio Carlos Alkmim dos Reis
_______________________________
Profª. Doutora Maria Lúcia Maciel
_______________________________
Prof. Doutor Leonardo Marco Muls
Niterói
Abril de 2006
Santos, Caroline.
Capital Social e Capital Humano: subordinação ou independência?
Uma análise a partir do estudo de caso nos Conselhos Municipais de
Macaé e Resende / Caroline Santos. - Niterói: [s. n.] 2006.
118f.
Dissertação (Mestrado em Economia) – Universidade Federal
Fluminense, 2006.
1. Capital Social. 2. Capital Humano. 3. Associativismo. 4.
Participação Política. 5. Conselhos Municipais. 6. Macaé (RJ) 7.
Resende (RJ) I. Kerstenetzky, Célia de Andrade Lessa, orientadora.
RESUMO
A análise da relação entre capital social e capital humano vem ganhando
destaque na literatura internacional nos últimos anos. No Brasil, essa literatura
ainda é pouco difundida. Em vista disso, o presente trabalho tem como objetivo
verificar a relação existente entre o capital social e o capital humano, a partir da
análise de um estudo de caso realizado com os membros dos Conselhos
Municipais dos municípios de Macaé e Resende, utilizando indicadores de
capital social que captem a sua dimensão associativa. O associativismo é
considerado como a dimensão central do capital social, inserido por meio da
definição de um conceito específico desenvolvido com base na apresentação de
um arcabouço teórico preliminar.
ABSTRACT
The analysis of the correlation between social capital and human capital has
gained much attention on the international literature in the past few years. In
Brazil, this literature is less difused. The present work has the goal to verify the
relation between the social capital and the human capital, after the analysis of a
case study carried out with members of the Municipal Councills from Macaé
and Resende, using indicators of social capital that acquire its associative
dimension. The associativism is considered as the central dimension of the
social capital, wich is a definition of a specific concept that develops based on
the presentation of a preliminary theoretical outline.
Agradecimentos
Em primeiro lugar gostaria de agradecer ao Programa de Pós-graduação em Ciências
Econômicas da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense à oportunidade
de estudar num ambiente fecundo de idéias emancipadoras e palco de tantos eventos
históricos e políticos.
À minha orientadora, Profª. Drª. Célia Lessa Kerstenetzky pelo constante incentivo,
sempre indicando a direção a ser tomada nos momentos de maior dificuldade, interlocutora
interessada em participar de minhas inquietações e sempre de forma atenciosa e generosa, me
guiou pelos cuidadosos caminhos das Ciências Econômicas. Agradeço ao meu co-orientador,
Profº Dr. Antônio Carlos Alkmim dos Reis, que me deu muita segurança para realizar esse
trabalho com o seu vasto conhecimento e equilíbrio. Ao Prof. Leonardo Muls, que tive o
prazer de conhecer e que dedicou parte do seu tempo a me ajudar, sempre muito atencioso.
Aos professores do CPGE pelas horas de interlocuções e debates enriquecedores para
a minha vida acadêmica, principalmente aqueles que tive a oportunidade de conhecer o
trabalho ou cursar algumas disciplinas: Prof. Carlos Guanziroli, Profª. Hildete Pereira, Profª
Ruth Dweck e Profª. Viviane Luporini.
Gostaria de agradecer também aos amigos Sérgio Roberto e Clarissa Monteagudo, que
de forma sempre presente contribuíram muito para a conclusão dessa dissertação. E também à
amiga Joana D’avila por dedicar seu tempo na correção e sugestões para este trabalho. E,
finalmente, aos amigos de trabalho que seguraram a barra de minhas faltas e angústias na
tentativa de me dividir em duas.
A todos os professores, funcionários e alunos do Programa de Mestrado em Ciências
Econômicas da UFF e todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para a
realização desta dissertação.
Ao meu marido e amigo, Afrânio, pela
confiança, amor, cumplicidade e
paciência.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................8
1 O CONCEITO DE CAPITAL SOCIAL ...............................................................................11
1.1 A CONSTRUÇÃO COLETIVA DO CONCEITO....................................................................................... ...11
1.2 A DEFINIÇÃO DE UM CONCEITO PRELIMINAR DE CAPITAL SOCIAL.............................................37
2 A RELAÇÃO ENTRE CAPITAL HUMANO E CAPITAL SOCIAL: UMA REVISÃO DA
BIBLIOGRAFIA......................................................................................................................41
2.1 O CAPITAL HUMANO E SUA RELAÇÃO COM O CAPITAL SOCIAL NA LITERATURA
BRASILEIRA.........................................................................................................................................41
2.2 O DEBATE INTERNACIONAL SOBRE CAPITAL HUMANO E CAPITAL
SOCIAL..................................................................................................................................................49
2.2.1 O Argumento do Capital Social Não Subordinado.......................................................................50
2.2.2 O Argumento do Capital Social Subordinado...............................................................................58
2.3 CAPITAL SOCIAL COMO PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E COMO ASSOCIATIVISMO: A
CONSTRUÇÃO DE UM CONCEITO ESPECÍFICO...........................................................................66
3 A ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL SOCIAL E O CAPITAL HUMANO
ENTRE OS MEMBROS DOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE MACAÉ E RESENDE....74
3.1 O SURGIMENTO DOS CONSELHOS MUNICIPAIS..................................................................74
3.2 HIPÓTESE E METODOLOGIA DE TRABALHO: A RELAÇÃO ENTRE CAPITAL SOCIAL E
CAPITAL HUMANO ATRAVÉS DA PESQUISA NOS CONSELHOS MUNICIPAIS....................78
3.3 IMPRESSÕES GERAIS DO TRABALHO DE CAMPO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE
RESENDE E MACAÉ...........................................................................................................................84
3.4 RESULTADOS GERAIS................................................................................................................88
3.5 A ESCOLARIDADE EM RELAÇÃO ÀS VARIÁVEIS SÓCIO-ECONÔMICAS.......................93
3.6 A RELAÇÃO ENTRE OS DEMAIS INDICADORES DE CAPITAL SOCIAL DOS
CONSELHEIROS ENTREVISTADOS E A ESCOLARIDADE..........................................................96
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................105
APÊNDICE A – Questionário passado para as Prefeituras ou Secretarias Municipais..........110
APÊNDICE B – Questionário passado para os Conselhos Municipais..................................111
APÊNDICE C – Questionário Individual...............................................................................113
REFERÊNCIAS......................................................................................................................116
8
INTRODUÇÃO
O objetivo do presente trabalho é verificar a relação existente entre o capital social e o
capital humano, a partir da análise de um estudo de caso realizado com os membros dos
Conselhos Municipais dos municípios de Macaé e Resende, utilizando indicadores de capital
social que captem a sua dimensão associativa. Nesse trabalho, o associativismo é considerado
como a dimensão central do capital social, inserido por meio da definição de um conceito
específico que será desenvolvido com base na apresentação de um arcabouço teórico
preliminar. A hipótese a ser verificada é a de que não há uma relação necessária de
dependência entre capital social e capital humano, como afirmam alguns trabalhos que serão
apresentados no segundo capítulo.
O termo capital social surgiu no século XX para chamar à atenção para os caminhos
pelos quais nossas vidas se tornam mais produtivas por meio de vínculos sociais. O capital
social é visto sob diferentes aspectos de acordo com a formação teórica de cada autor. No
primeiro capítulo, com o objetivo de facilitar a compreensão, serão separados os principais
conceitos existentes para, posteriormente, definir aquele que mais se coaduna com o objetivo
deste trabalho. O capítulo apresentará, na primeira seção, a construção coletiva do conceito de
capital social, a partir de uma ordem cronológica, identificando a contribuição de cada um dos
principais trabalhos encontrados na literatura contemporânea sobre o tema. Ao final do
capítulo, de acordo com a bibliografia apresentada, será definido um conceito preliminar de
capital social, utilizando os pontos considerados mais importantes que convergem com alguns
dos trabalhos selecionados.
No segundo capítulo, primeiramente será analisado o debate sobre a relação entre
capital humano e capital social, tanto na literatura brasileira como na internacional. A
9
importância do capital humano para a promoção do desenvolvimento e diminuição das
desigualdades sócio-econômicas no Brasil ganha destaque nos estudos econômicos a partir da
década de 1970. Na literatura brasileira, trabalhos sobre capital humano se detêm a discutir
muito pouco sobre a relação da variável educação com o capital social. Após um vasto
levantamento bibliográfico, foi possível verificar que não há um debate que coloque no centro
da análise a correlação existente entre capital humano e capital social. Isto será demonstrado
na primeira seção do segundo capítulo.
No exterior, o debate sobre a relação que se estabelece entre capital humano e capital
social é bem difundido. Dessa forma, a segunda seção do segundo capítulo constituirá em
uma análise do debate internacional entre a vertente que trata o capital social como uma proxy
do capital humano e, por outro lado, a vertente que acredita não haver uma ligação direta
entre os mesmos, chamadas de argumento do capital social subordinado e argumento do
capital social não subordinado respectivamente. O objetivo nesta etapa do trabalho é realçar
esta segunda vertente, uma vez que o capital social parece constituir-se de várias dimensões
da vida social, das quais nem todas dependem necessariamente da quantidade de capital
humano adquirida por um indivíduo, onde o associativismo pode ser uma delas, como será
discutido na terceira e última seção do capítulo. Ao final do segundo capítulo, pretende-se
destacar e incorporar ao trabalho um conceito específico de capital social que sirva de base
para a definição dos indicadores que serão utilizados no trabalho de campo, capazes de avaliar
a relação entre capital humano e capital social.
O terceiro e último capítulo é uma tentativa de verificar empiricamente a hipótese
levantada no segundo capítulo de que não há uma relação necessária de dependência entre
capital social e capital humano, através de um estudo de caso sobre os membros dos
Conselhos Municipais Setoriais realizado em dois municípios, selecionados de acordo com
uma metodologia que tem por base os dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais
10
de 2001 (MUNIC), que, entre outras coisas, fez um levantamento sobre a estrutura
administrativa das prefeituras de todos os municípios brasileiros. Será apresentada a estrutura
dos conselhos setoriais, bem como as impressões gerais do trabalho de campo na primeira e
segunda seção respectivamente. Na terceira e última seção, serão mostrados os resultados
encontrados no trabalho de campo. Para fins de verificação deste trabalho, as variáveis a
serem utilizadas referem-se a dados sobre os representantes dos conselhos municipais,
retirados por meio de questionário estruturado, e servirão como uma proxy de indicadores de
capital social como associativismo.
11
1 – O CONCEITO DE CAPITAL SOCIAL
Nas últimas décadas o estudo do capital social ganhou uma posição de destaque na
agenda acadêmica, principalmente em países da Europa e nos Estados Unidos. Por se tratar de
um tema muito complexo e com várias dimensões, o capital social encontra-se em pesquisas
na área de desenvolvimento sócio-econômico, desenvolvimento regional, agrário,
desigualdades sociais, democracias e criminologia. Há, portanto, uma vasta literatura sobre o
assunto e é necessário que seja realizada uma pequena resenha bibliográfica, destacando
alguns autores importantes na definição do conceito de capital social.
A literatura selecionada apresenta a contribuição que cada autor acrescenta à análise
do capital social. A resenha bibliográfica do conceito de capital social será elaborada para
cada autor separadamente, obedecendo, na medida do possível, uma ordem cronológica, com
a finalidade de mostrar os pontos que conectam esses trabalhos e de, ao final, definir o
conceito que converge com o objetivo do presente trabalho.
1.1 – A construção coletiva do conceito de capital social
Os autores selecionados possuem uma percepção voltada para o fato de que
desenvolvimento econômico envolve outros fatores tão importantes quanto o crescimento
econômico e a distribuição de renda, dando destaque ao capital social como um deles. As
abordagens escolhidas procuram investigar as relações que o capital social estabelece com a
sociedade, com o Estado, com as instituições de uma forma geral e com o indivíduo com o
objetivo de demonstrar sua importância e alcance no âmbito das ciências sociais e
econômicas. Para a maior parte desses autores há outras motivações envolvidas nas relações
12
sociais além do interesse e, por isso, a análise do comportamento maximizador de utilidade do
indivíduo não é suficiente para compreendê-las.
Bordieu: A Teoria do Senso Prático
Em 1980 o sociólogo francês Pierre Bourdieu iniciou seu trabalho sobre capital social
a partir do estudo sobre a teoria da ação. O autor inaugura a chamada teoria do senso prático,
onde o homem não faz escolhas refletidas; ele age de acordo com as exigências da vida
prática, que demandam por ações urgentes, e segundo o seu habitus, isto é, estruturas de ação
que são assimiladas em parte à estrutura social e em parte são respostas pessoais dos próprios
sujeitos a situações ocorridas ao longo de sua vida. Dessa forma, o autor mostra-se
veementemente contrário à teoria da ação racional, onde os atores sociais agem racionalmente
para atingir seus fins, realizando um cálculo de maximização da utilidade.
Bourdieu define o capital social como [...] “um conjunto de recursos atuais ou
potenciais que estão vinculados a um grupo, por sua vez constituído por um conjunto de
agentes que não só são dotados de propriedades comuns, mas também são unidos por
relações permanentes e úteis.” (BOURDIEU, 1980, p.67). Sua análise parte da observância
dos casos em que diferentes indivíduos obtêm um rendimento muito desigual de um capital
(econômico ou cultural) mais ou menos equivalente, segundo o grau em que eles podem
mobilizar, por procuração, o capital de um grupo (família, antigos alunos de escolas de
“elite”, clube seleto, nobreza, etc.) mais ou menos constituído como tal e mais ou menos
provido de capital.
O volume de capital social que um agente individual possui depende da extensão da
rede de relações que ele pode efetivamente mobilizar e do volume de capital (econômico,
cultural ou simbólico) que é posse exclusiva de cada membro desse grupo. Bourdieu afirma,
13
portanto, que, mesmo o considerando totalmente distinto, o capital social não é
completamente independente do capital econômico e cultural possuído por um indivíduo ou
pelo grupo a quem está ligado, uma vez que as trocas que instituem a confiança mútua exigem
a pré-existência de um mínimo de homogeneidade entre os que o possuem com exclusividade,
exercendo um efeito multiplicador sobre esse capital possuído (BOURDIEU, 1980).
Como observa Portes, o tratamento que Bourdieu dá ao conceito de capital social está
focado sobre os benefícios revertidos para os indivíduos decorrentes da participação nos
grupos e sobre a construção deliberada de sociabilidade. Para Bourdieu, os lucros revertidos
da filiação a um grupo são a base da solidariedade e o que a torna possível. (PORTES, 1998)
A ênfase de Bourdieu em seu trabalho é sobre as diferentes formas de capital e sobre a
redução de todas as formas ao capital econômico. Por isso, através do capital social, os atores
podem ganhar acesso direto a recursos econômicos (empréstimos subsidiados, investimentos,
mercados protegidos); eles podem aumentar seu capital cultural através de contatos com
indivíduos refinados, ou ainda podem filiar-se a instituições que conferem credenciais
valorosas.
Por outro lado, a aquisição de capital social requer investimento deliberado de recurso
cultural e econômico. De acordo com Bourdieu, a capacidade de formar redes sociais não é
um dom natural e deve ser construída através de estratégias de investimento orientadas à
institucionalização de relações de grupos.
Em resumo, capital social para Bourdieu é um ativo individual que determina as
diferenças de vantagens extraídas do capital econômico que um indivíduo possui, adquirido
através das redes de conhecimentos, de influências que ele estabelece ao longo de sua vida.
Um mínimo de capital econômico é o pré-requisito crucial para que ele possa inserir-se em
um grupo, mas, uma vez que isto ocorra, é criado um círculo virtuoso que o desprende da
dependência do capital econômico. Dessa forma, as classes de baixa renda não possuem
14
capital social ou possuem pouco, não obedecendo à mesma dinâmica de interação e de
influências que ocorre nas classes média e alta. O capital social é capaz de gerar uma maior
participação cívica, já que permite a inserção dos indivíduos nas altas camadas de poder
político, econômico e social. Permite uma maior mobilidade social, através da rede de
relações na qual o indivíduo é capaz de inserir-se. Dessa forma, seu acúmulo depende
unicamente de uma dotação prévia de capital cultural, econômico e simbólico acumulados
pelo indivíduo por herança ou por esforço pessoal, ou seja, depende da iniciativa dos agentes.
Apesar de se tratar do sociólogo francês de maior prestígio na contemporaneidade,
Bourdieu não teve seu trabalho muito difundido mundialmente como aconteceu com o
sociólogo americano James Coleman no final da década de 1980.
Coleman: A Teoria da Ação Racional
Coleman colocou o termo capital social na agenda intelectual, usando-o para realçar o
contexto social da educação. O autor define capital social, em seu trabalho intitulado
“Foundations of Social Theory” (1990), como [...] “o conjunto das relações sociais em que
um indivíduo se encontra inserido e que o ajudam a atingir objetivos que, sem tais relações,
seriam inalcançáveis ou somente alcançáveis a um custo mais elevado” (COLEMAN, 1990:
p.304). Esta definição permite compreender melhor como se dão as relações de confiança,
favoráveis à ação coletiva organizada, existentes entre os membros de um grupo de pessoas.
Sem deixar de considerar que os indivíduos podem se utilizar de máquinas, ferramentas,
instalações físicas (capital físico) e de suas habilidades e conhecimentos pessoais (capital
humano) para atingir seus objetivos, Coleman afirma que, na medida em que, entre os atores
sociais, há interdependência, eles somente conseguem satisfazer alguns de seus interesses
agindo conjuntamente. Dentro dos diversos tipos de relações sociais que o autor insere no
conceito de capital social, encontram-se relações de expectativas e obrigações entre
15
indivíduos que trocam favores; a existência de normas, com suas sanções e prêmios aplicáveis
pelos atores beneficiários sobre os subordinados à norma; as relações de autoridade, em que
um indivíduo concorda em ceder a outro o direito sobre suas ações em troca de uma
compensação (financeira ou de outra espécie, como status, honra, deferência, etc.); obtenção
de informações de baixo custo entre indivíduos, o que, neste caso, pode ser enquadrado como
uma troca de favores, obediência a normas ou adequação a uma relação de autoridade. O que
é comum a todos os casos é que está sempre presente a confiança mútua existente entre os
indivíduos:
[...] fazer um favor confiando que o outro retribuirá quando tiver oportunidade;
submeter-se a normas confiando que o outro também submeter-se-á ou será punido
se não o fizer; trabalhar para alguém confiando que receberá o pagamento ajustado
ou, vice-versa, contratar alguém confiando que executará o trabalho proposto
(COLEMAN, 1990, p.305).
Capital social, para Coleman, também constitui tanto as relações formais, registradas
por escrito em leis, portarias, estatutos, etc. quanto as relações informais, tacitamente
reconhecidas e sem contar com registro escrito.
Na associação dos indivíduos com a finalidade de atingir fins comuns, como
organizações sociais, as relações de confiança mútua são desenvolvidas na busca do objetivo
comum. Além disso, o produto gerado dessas relações de confiança, o capital social, poderá
gerar externalidades positivas, sendo utilizado para outros objetivos além dos fins da
organização, onde assume o caráter de bem público. Outro aspecto interessante que o autor
destaca é a não perecibilidade do capital social, pelo contrário, se estas relações são
constantemente ativadas este se torna cada vez mais consolidado (COLEMAN, 1990).
Coleman pauta-se na ação racional, onde os atores sociais agem racionalmente para
atingir seus fins, através de um cálculo de maximização da utilidade, isto é, o alcance do
máximo de resultados favoráveis de acordo com seus objetivos com um mínimo de custos.
Assim, seu surgimento depende da iniciativa dos agentes, só que de forma coletiva, onde o
16
Estado não deve ter participação nesse processo, uma vez que compromete a eficiência das
relações sociais (COLEMAN, 1990).
Portanto, para o autor, capital social é importante porque, através do grau de confiança
existente em determinadas estruturas sociais, promove a formação de arranjos institucionais
capazes de gerar o desenvolvimento econômico de uma determinada comunidade, como nos
casos de associações de crédito rotativo. A densidade das obrigações mútuas existentes nas
relações sociais entre os indivíduos amplia a utilidade total dos recursos tangíveis de
determinada estrutura social, ou seja, o capital social é um ativo que permite a maximização
da utilidade através da disseminação da informação perfeita e dos baixos custos de transação.
Através das relações sociais as informações entre os agentes fluem mais facilmente
facilitando a ação e aperfeiçoando os mercados. Por último, o capital social, na forma de
normas e sanções efetivas, constitui uma poderosa arma contra crimes, porque inibe a ação
criminosa pelas penalidades impostas pela estrutura social. Ainda na forma de normas, o
capital social em alguns casos requer a renúncia à atitude auto-interessada para ceder à ação
voltada ao interesse da coletividade. Sob essa forma de norma, o capital social – reforçado
pelo suporte social, posição social, honra e outras recompensas – fortalece as famílias, por
levar membros familiares a agir desinteressadamente, facilita o desenvolvimento de
movimentos sociais nascentes através de pequenos grupos de membros dedicados e leva as
pessoas a trabalhar para o bem-estar público.
A teoria da ação racional de Coleman também é alvo de críticas de outro autor de
importante destaque na literatura sobre capital social.
17
Mark Granovetter: A teoria dos laços fracos
Mark Granovetter foi um dos responsáveis pela inauguração de uma corrente de
pensamento chamada Nova Sociologia Econômica e define capital social como as relações
sociais que se formam por meio da confiança existente entre os indivíduos e que encontra sua
base mais forte nas redes sociais, moldadas por normas internalizadas e pela moral
convencional que faz com que a confiança generalizada permeie toda a sociedade, que o autor
classifica como laços fracos. Sociedades ricas em capital social possuem como traço marcante
a existência de amplas redes sociais conectadas por vínculos fracos.
De acordo com a linha de pensamento do autor, o agente econômico é influenciado por
diversos fatores que compõem a sociedade e suas ações possuem motivações racionais dentre
muitas outras não racionais. Granovetter faz uma crítica à visão extremista da estrutura social
que existe tanto na ciência econômica quanto na sociologia. Para ele, nem a ciência
econômica nem a sociologia tradicionais dão conta da complexidade do homem como ser
social. Enquanto na primeira ele é subsocializado, uma vez que em mercados competitivos,
produtores e consumidores individuais não influenciam na demanda e na oferta e, por
conseguinte, nos preços ou em outros termos de comércio; na segunda é supersocializado,
pressupondo que os padrões de comportamento foram internalizados, tendo as relações sociais
apenas um efeito periférico sobre o comportamento. O autor propõe substituir essas noções
sub e supersocializadas pela de ator econômico influenciado por contextos sociais e olhá-lo no
interior das redes sociais, que potencializam e fiscalizam as ações econômicas
(GRANOVETTER, 1985).
Granovetter se concentra na análise de duas manifestações comportamentais
historicamente fundadoras do sistema capitalista: a confiança e a má-fé. O autor observou
que alguns economistas apontam que certo grau de confiança deve ser suposto para que
negócios sejam realizados, já que arranjos institucionais por si só não poderiam impedir
18
“força ou fraude”. Uma das explicações dessa fonte de confiança residiria na preferência
generalizada dos indivíduos em estabelecer transações com pessoas e organizações de
reconhecida reputação, e não se aterem apenas à moral ou aos arranjos institucionais para
resguardarem-se contra possíveis problemas (GRANOVETTER, 1985).
Um dos incentivos para não fraudar ou enganar (isto é, não quebrar a confiança e não
agir de má-fé) é o custo de reputação, uma vez que pessoas com boa reputação detém
melhores informações, pois são mais confiáveis. Conseqüentemente, na presença de
informação perfeita, as transações fluem de forma mais eficiente (menor custo e menor
espaço para o oportunismo). O autor defende, portanto, que as relações sociais (redes sociais),
preferivelmente aos arranjos institucionais ou à moral convencionada, são os principais
responsáveis pela produção de confiança na vida econômica (GRANOVETTER, 1985).
Assim, confiança é uma fonte de capital social que afeta a reputação dos agentes
econômicos. A confiança, que move as relações interpessoais, constitui-se na motivação e na
habilidade necessária para a formação de capital social.
Neste sentido, a mais importante contribuição de Mark Granovetter foi qualificar a
natureza de laços sociais. Um laço forte entre dois indivíduos envolve uma elevada dose de
tempo e esforço dedicados à relação, afeição emocional, confiança e reciprocidade. Logo, é
um relacionamento que se molda e auto-reforça ao longo do tempo. Um laço fraco é
exatamente o oposto desta situação, envolvendo transações pontuais entre os agentes,
diretamente permeadas pela moral convencional, ou seja, pelas normas internalizadas pela
sociedade que garante a integridade e a densidade da confiança e da reciprocidade formada no
interior dessa sociedade. Os laços fracos podem ser exemplificados por relações de vizinhança
ou algumas relações de trabalho, onde há uma dinâmica que faz com que os indivíduos se
sintam envolvidos e comprometidos em não infringir uma confiança generalizada estabelecida
socialmente e moralmente, sem que haja necessariamente uma relação intensa e de intimidade
19
estreita. Granovetter mostra que – contrariamente ao senso comum – laços que têm maior
probabilidade de gerar informações novas, e, portanto gerar valor ao relacionamento, são
laços fracos. Isto porque, ao longo do tempo, laços fortes perdem sua funcionalidade: se os
mesmos indivíduos transacionarem por tempo prolongado, pode ocorrer uma “ossificação” do
relacionamento, sendo que questões pessoais se sobrepõem a questões de eficiência e a
possibilidade de inovação é cada vez menor, pois o senso de compromisso coletivo é
substituído pela amizade (GRANOVETTER, 1973).
A teoria dos laços fracos, desenvolvida por Granovetter, foi original porque ela corria
na direção contrária à noção do senso-comum de que redes fortes e fechadas, tais como
aquelas disponíveis através dos círculos familiares, seriam mais efetivas na disseminação de
capital social. O capital social existente nos laços fracos emerge espontaneamente, uma vez
que as normas internalizadas e a cultura são os fatores chave que os permeiam, fazendo parte
do histórico de formação das sociedades. A partir dessa análise de Granovetter, muitos autores
escreveram sua teoria sobre capital social. Um deles é Robert Putnam, um dos mais
importantes autores na literatura sobre capital social, que conceitua capital social através dos
trabalhos de Coleman e Granovetter principalmente.
Putnam I: A preocupação com os indicadores e a classificação “bridging” e “bonding”
Para Putnam capital social é importante porque define as características da sociedade
civil, e estas características afetam a saúde das democracias, das comunidades, dos
indivíduos.
Em seu primeiro trabalho, Comunidade e Democracia (1993), Putnam desenvolveu o
conceito de capital social e sua influência sobre o desenvolvimento econômico das
sociedades. Para o autor, capital social é definido como: [...] “as características das redes de
20
relações sociais, como confiança, normas e sistemas, que contribuam para aumentar a
eficiência da sociedade, facilitando as ações coordenadas” (PUTNAM, 1996, p.177).
Redes envolvem (quase por definição) obrigações mútuas e fomentam vigorosas
normas de reciprocidade. A reciprocidade pode ser específica, onde há a troca de favores
direta e imediata entre os indivíduos envolvidos em uma transação, ou generalizada, onde
ocorre uma relação de troca contínua calcada em expectativas mútuas da retribuição de
favores no futuro. Putnam acredita que uma sociedade caracterizada pela reciprocidade
generalizada é mais eficiente do que uma sociedade marcada pela reciprocidade específica
porque o componente da confiança se encontra disseminado entre sua população, permitindo a
formação de vínculos sociais mais densos e com interações sociais mais abrangentes
(PUTNAM, 1996). Vínculos sociais mais densos fazem a informação circular com mais
eficiência e de forma mais horizontal. Assim, além dos benefícios que informações completas
trazem para uma economia de mercado, os mecanismos de controle sobre a conduta do
indivíduo que definem a sua reputação são mais eficazes. Este é o ponto onde o trabalho de
Putnam e Granovetter convergem quando este último autor fala de laços fortes e fracos.
Putnam, ao sugerir que as normas de reciprocidade generalizada são a base da existência de
capital social em uma sociedade, está se referindo aos laços fracos de Granovetter, pois estes
dizem respeito a normas internalizadas de respeito mútuo e solidariedade, onde a confiança
permeia um amplo sistema de intercâmbio social.
Nesse mesmo trabalho, Putnam não acredita que o Estado sirva como ator mediador na
promoção de capital social, uma vez que sua coerção é menos eficiente, mais sacrificante e
menos satisfatória em sociedades onde o Estado interfere no desenvolvimento econômico,
inibindo a capacidade de inovação de seus cidadãos. O autor também afirma que o capital
social é fruto de raízes históricas e culturais e, por isso, não acredita que possa ser criado ou
21
modificado por meio da instituição de regras de reciprocidade ou sistemas de participação
cívica.
Preocupado em aprofundar seus métodos de mensuração de capital social, Robert
Putnam fez um dos estudos de campo mais completos realizado até hoje sobre capital social,
em seu livro Bowling Alone (2000). A motivação para sua pesquisa foi a observação de que o
número de associados em diferentes instituições reduziu-se de forma drástica nas últimas
décadas nos Estados Unidos. Assim, o autor definiu diversos indicadores de capital social,
agrupando-os de acordo com sua natureza, como participação política, participação cívica,
conexões informais e confiança em busca de formular um indicador universal de capital social
que desse conta de todas a suas dimensões. Putnam analisou o comportamento de cada um de
seus indicadores (voto, filiação a sindicatos, associações voluntárias, grau de confiança social,
etc.) no decorrer das décadas de 1960 a 1990, na tentativa de encontrar uma relação direta
entre o nível de capital social e o comportamento cívico da sociedade americana. Mas dado o
grau de variação de tendências comportamentais na esfera cívica nas diferentes décadas
analisadas e de divergência de resultados entre seus indicadores, Putnam não conseguiu
formular nenhuma resposta sintética e abrangente o suficiente para explicar a relação entre o
nível de capital social e a mudança de comportamento cívico dos americanos nas últimas
décadas.
Para um melhor entendimento da complexidade do capital social e de seu alcance nas
sociedades contemporâneas, Putnam acrescenta novas classificações, das quais a mais
importante é a noção de capital social “bridging” – que será chamado de includente – e
bonding” – que será chamado de excludente. Capital social excludente aproxima pessoas que
são parecidas em aspectos importantes (etnicidade, idade, gênero, classe social, etc), enquanto
que capital social includente refere-se a redes sociais que aproximam pessoas que são
diferentes umas das outras, como movimentos de direitos civis e ambientais. Esta é uma
22
importante distinção, porque os efeitos externos das redes includentes serão provavelmente
positivos, enquanto redes excludentes (limitadas dentro de nichos sociais particulares) correm
um maior risco de produzir externalidades negativas. Isto não quer dizer que grupos
excludentes são necessariamente negativos, apesar de serem mais suscetíveis a produzir
discriminação fora do grupo. Uma sociedade equilibrada deve combinar as duas categorias.
Isto porque capital social excludente é bom para fazer emergir reciprocidade específica e
mobilização de solidariedade. Densas redes em grupos étnicos, por exemplo, promovem um
suporte social e psicológico crucial para seus membros menos afortunados, ao mesmo tempo
em que providenciam maiores oportunidades através, por exemplo, de vagas no mercado de
trabalho para os mesmos (PUTNAM, 2000).
Putnam II: O caráter multidimensional do capital social e as descrições qualitativas
De acordo com as diferentes classificações que atribui ao capital social, Putnam
conclui que, devido ao seu caráter multidimensional e a algumas de suas dimensões serem
objeto de diferentes entendimentos, deve-se tomar cuidado para não levantar questões sobre
transformações sociais somente em termos de mais capital social ou menos capital social. Ao
contrário, devemos descrever as transformações em termos qualitativos.
Foi pensando em sua preocupação com descrições qualitativas, que Putnam publicou
seu mais recente trabalho, Democracies in Flux (2002). Nele, Putnam reuniu artigos de
diversos autores que apresentam os resultados das mais recentes pesquisas sobre o capital
social nas democracias industriais avançadas que fazem parte da OECD. Ao final do trabalho,
Putnam procurou traçar as tendências gerais do capital social nas últimas décadas.
A primeira evidência retirada dos trabalhos analisados pelo autor foi o declínio na
participação em massa nas eleições, partidos políticos, sindicatos e igrejas, os quais
23
representam as principais instituições das três esferas primárias da vida comunitária – política,
trabalho e religião – ou seja, constituem-se no depósito primário de capital social. Estas
formas de capital social eram especialmente importantes para o “empoderamento” dos menos
educados, das menos afluentes porções da população. Estas organizações pregam
solidariedade com os outros. Assim, seu declínio deve estar ligado ao declínio da confiança
social que aparece até mesmo em países com históricos de alta filiação associativa
(PUTNAM, 2002).
Esses declínios observados parecem ser contrabalançados, pelo menos em parte, por
acréscimos nas formas de conexões sociais informais, flexíveis e impessoais. O exemplo mais
comum é o envolvimento nos esportes e em outros grupos de lazer que é crescente. Mas
Putnam destaca a preocupação latente da maioria dos autores com esses novos tipos de
conexões por se tratarem de formas limitadas, menos ligadas e menos focalizadas em
atividades coletivas ou relativas às questões públicas. Putnam chama essa nova tendência de
privatização do capital social, por se tratarem de formas de participação social mais
individualistas e menos solidárias. Complementar a essa tendência, outra característica
comum à maioria dos países estudados é a mudança de perfil que tem se configurado em seus
sindicatos e partidos, que deixaram de ser movimentos sociais para se transformarem em
postos de trabalho assalariado para seus membros (PUTNAM, 2002).
Outra questão destacada por Putnam neste trabalho envolve a evidência de um
comportamento muito diferente se compararmos as gerações passadas e a atual – um grande
número de jovens desinteressados em política, desconfiados dos políticos e dos outros de um
modo geral, cínicos sobre assuntos públicos, e menos inclinados a participar de organizações
sociais permanentes. Os fatores levantados pelo autor como possíveis causas para este
resultado são o surgimento de diversos entretenimentos televisivos e computadorizados que
desviam a atenção dos jovens de questões coletivas; e o elevado índice de desemprego entre
24
os jovens com o conseqüente atraso de sua inserção na força de trabalho e na vida adulta
(PUTNAM, 2002).
Debates recentes sobre tendências na sociedade civil fizeram surgir a visão de que o
crescimento do Estado de Bem-estar no que tange ao gasto social, tem diminuído o estoque de
capital social. Nos EUA há alguma evidência de que a provisão pública tem reduzido
marginalmente a filantropia privada. Mas na maior parte dos autores predomina a visão
oposta de que o Estado de Bem-Estar tem ajudado a sustentar o capital social ao invés de
erodi-lo. Em países como Japão, França e Inglaterra, assim como em algumas partes dos EUA
e Suécia, há evidências de que a provisão social do governo tem tido um efeito positivo sobre
o capital social. O Estado de Bem-estar e suas políticas públicas podem encorajar a
solidariedade (PUTNAM, 2002).
Em resumo, verifica-se que, em seu último trabalho, Putnam está mais preocupado
com as descrições qualitativas do capital social. O autor passa a analisar, através de estudos de
caso, as transformações ocorridas nas formas de capital social em nível micro e macro. Em
nível micro, o autor observa as transformações ocorridas no interior das organizações
associativas, como os sindicatos e partidos, em termos de estrutura e atuação. Já em nível
macro, observa as transformações econômicas e sociais que exerceram influência no
comportamento dos indivíduos de gerações mais recentes.
Como se pode notar, há uma evolução no trabalho de Putnam tanto no que diz respeito
às conseqüências da dotação de capital social de uma sociedade, quanto no papel que o Estado
ocupa na criação desse ativo. Em seu primeiro trabalho, Comunidade e Democracia, Putnam
descartava a possibilidade de o Estado promover políticas públicas capazes de fazer emergir
capital social, uma vez que poderia abafar a capacidade de cooperação voluntária do
indivíduo, além de trazer problemas de mercados ineficientes. Mais que isso, Putnam
enxergava o capital social de uma forma estática porque acreditava que padrões de conexão
25
social eram fixos no tempo e no espaço. Uma mudança considerável pode ser verificada ao
contrastarmos com seu último trabalho apresentado acima, Democracies in Flux.
Evans: A sinergia entre Estado e sociedade
De fato, também para outros autores o capital social pode ser criado ou destruído
através de interações políticas de diferentes grupos da sociedade, onde o Estado ocupa um
papel importante. Peter Evans é um dos autores que compartilha dessa corrente de
pensamento. O autor, com base na análise de casos de políticas realizadas por países em
desenvolvimento, sustenta a idéia do papel central das instituições na formação do capital
social, através de uma sinergia na relação entre Estado e Sociedade civil, quando da
implementação de programas de desenvolvimento local. O autor define capital social como
vínculos sociais baseados em confiança e enraizamento nas interações do dia a dia, que se
desenvolve através da sinergia Estado-sociedade.
As estratégias sinérgicas apontadas por Evans constituem-se nas ações criativas
realizadas por organizações governamentais para criar e disseminar o capital social nas
sociedades; ou na união de cidadãos mobilizados e agências públicas para aumentar a eficácia
do governo. Enfim, a combinação de instituições públicas fortes e comunidades organizadas é
uma poderosa ferramenta para gerar o desenvolvimento (EVANS, 2004).
A despeito das dificuldades criadas pela compreensão convencional, a evidência que é
apresentada por Evans sugere que a permeabilidade das fronteiras público-privado pode ser
reconhecida como uma parte inescapável de muitos programas de desenvolvimento de
sucesso.
A questão mais fundamental que Evans atribui à análise das origens das relações
sinérgicas é a questão do que ele chama de virtudes versus “constructability”. Se a sinergia é
26
resultado das virtudes, que depende da existência prévia de padrões sociais e culturais
historicamente enraizados em sociedades e culturas particulares, então ela deve estar fora do
alcance da maioria dos grupos. Na perspectiva de “constructability”, a sinergia se torna uma
possibilidade latente na maioria dos contextos, porque constitui-se na sua inserção através da
iniciativa governamental.
Sob a perspectiva das virtudes, a mais importante delas, diretamente relacionada à
existência de sinergia, é o estoque de capital social de uma sociedade civil. As propriedades
relevantes das instituições governamentais, como transparência e accountability
1
que
permitem diagnosticar a presença ou ausência de virtudes em determinada sociedade, podem
levar décadas ou gerações para mudar (EVANS, 1995).
Virtudes formadas pelo estoque de capital social são cruciais para a sinergia. A
questão levantada por Evans é se, na maioria dos cenários de países em desenvolvimento, a
falta do requisito de capital social exclui a possibilidade de sinergia ou se as normas e as redes
que caracterizam os países em desenvolvimento constituem terreno suficientemente fértil para
a construção de projetos de desenvolvimento que transpõem a divisa público-privado. O autor
responde que o estoque de capital social prévio não é o fator chave que impede a formação de
sinergia em uma sociedade, uma vez que este parece ser um recurso que está disponível pelo
menos para a maioria dos países em desenvolvimento (EVANS, 1995). Evans separa o capital
social em nível micro, que parte de grupos ou comunidades, como os vínculos sociais entre
vizinhos e amigos, do capital social em nível macro, que parte do governo, como os vínculos
de solidariedade e a ação social em uma escala mais ampla que exerçam força política e
econômica.
Evans afirma que o que falta à sinergia Estado-sociedade baseada na virtudes é um
conjunto de instituições públicas competentes e engajadas para promover o capital social em
1. Prestação de contas
27
nível macro. Como os governos variam dramaticamente em termos de sua habilidade para
agir como reprodutor na criação de organizações cívicas eficientemente desenvolvidas, então
talvez os limites da sinergia estejam localizados no governo ao invés de na sociedade civil.
Instituições públicas robustas e sofisticadas constituem-se em uma vantagem para a formação
do capital social e para a busca de fins desenvolvimentistas, não porque elas são instrumentos
de centralização, mas, pelo contrário, porque elas são capazes de criar os modos mais variados
de distribuição de poder, permitindo, assim, a descentralização e promovendo a autonomia e o
desenvolvimento local (EVANS, 1995).
Outro problema levantado por Evans situa-se no conflito de interesses dos diferentes
grupos da sociedade. Para o autor, tal conflito de interesses pode ser disputado em um
ambiente de competição política ou contido pela repressão. Regimes políticos e estruturas
burocráticas condicionam a possibilidade da formação de sinergia Estado-sociedade e de
capital social. A idéia é que a competitividade política eleva a sinergia, mas o autor ressalta
que para a competição política ter efeitos positivos, ela deve estar limitada por regras
coletivamente aceitas que canalizam energias políticas em esforços de mobilização ou tentam
convencer os cidadãos da eficácia governamental. Incentivos que fomentem a sinergia
derivados da competição política são difíceis de realizar sem uma infra-estrutura
administrativa adequada. Ainda que sociedades igualitárias com burocracias públicas
específicas promovam a base mais fértil para as relações sinérgicas Estado-sociedade, a
maioria dos países em desenvolvimento oferece poucas possibilidades porque sucumbem a
problemas trazidos pela existência de instituições públicas marcadas pela corrupção (EVANS,
1995).
Para solucionar este problema, Evans propõe então que seja analisada a idéia de
“constructability”. Como fazer para que a sinergia se estabeleça, mesmo em ambientes
adversos? O autor sugere que, mesmo quando o contexto político e social é desfavorável,
28
inovações organizacionais e culturais criativas podem ainda produzir resultados. Algumas
vezes a construção de sinergia depende da transformação de visões de mundo estabelecidas.
Outras vezes ela envolve a introdução de inovações tecnológicas em nível organizacional. Ou
ainda, ela envolve simplesmente a reflexão da natureza do problema que determinada agência
do governo está tentando solucionar. Qualquer uma dessas estratégias pode fazer a sinergia
ser construída (EVANS, 1995).
A análise de Evans implica que aqueles interessados em fomentar o capital social,
mesmo entre grupos que são normalmente excluídos e oprimidos, não deveriam assumir
automaticamente que o Estado não deve estar presente. Isto porque, mesmo em regimes
relativamente autoritários, alianças com “reformistas” dentro do Estado podem oferecer
recursos para organizações populares desenvolverem um capital social muito mais forte e
eficaz do que em sociedades democráticas (EVANS, 1995).
Visões como a de Peter Evans que enxergam o Estado como um possível parceiro na
formação e no desenvolvimento de capital social em sociedades em desenvolvimento e com
um histórico de pouca prática cívica têm sido difundidas nos últimos anos por pesquisadores
americanos que realizaram estudos de caso em que o Brasil figura como um dos principais
exemplos. Entre eles encontra-se o economista Richard Locke.
Locke: A construção da confiança
Locke em seu artigo “Construindo confiança” (2003) procura responder a questão se
a confiança pode ou não ser criada e de que forma. Para isso, o autor faz uma breve revisão
bibliográfica da literatura sobre capital social, destacando que a mesma sofre de dois
problemas que limitam sua utilidade no entendimento de como a confiança é criada. O
primeiro problema é que a literatura sobre capital social é estática, ou seja, uma vez que a
29
região analisada apresente um comportamento mais cívico do que outra, esta situação não
pode ser revertida. Locke afirma que a história comprova que sociedades que apresentavam
prévios conflitos civis ou políticos, subdesenvolvimento, corrupção, etc., conseguiram
desenvolver um comportamento confiável. Para ele o capital social pode ser criado através de
interações políticas de diferentes grupos da sociedade.
O segundo problema é que a literatura é excessivamente mecanicista, ou seja, ou as
sociedades possuem a quantidade certa de capital social ou não possuem. O autor afirma que,
pelo contrário, não se pode analisar um único resultado do capital social, uma vez que os
resultados produzidos pela utilização do capital social em determinados grupos podem ser
completamente diversos, inclusive maléficos, como é o caso de grupos nazistas. Dessa forma
a contagem dos grupos e associações formadas não é suficiente para verificar a qualidade do
capital social formado. (LOCKE, 2003).
Locke adota o conceito de confiança, definindo-a como um atributo situacional,
relacional, ou seja, que se manifesta quando os atores econômicos encontram-se expostos ao
risco de um comportamento oportunista, diante de um cenário de incerteza e informação
incompleta, mas acreditam que não serão lesados. Ao adotar este conceito, o autor tem como
objetivo mostrar que a confiança pode ser construída. Sua construção pode se dar por meio de
um processo que combine auto-interesse, intervenção governamental e desenvolvimento de
mecanismos de autogovernança e monitoramento pelos próprios atores. Para ele a confiança
baseia-se no auto-interesse, uma vez que a cooperação na maioria dos casos ocorre para
satisfazer o interesse próprio dos envolvidos.
Mas, além do auto-interesse, Locke destaca que ainda mais fundamental é o papel de
instituições governamentais na utilização da confiança para o desenvolvimento econômico.
Afirma que o governo pode utilizar incentivos para moldar grupos e associações com
30
características de capacidade de inclusão de novos membros, modos cooperativos de
interação, etc. Contudo, Locke não acredita que a intervenção governamental deva ser
prolongada por não possuir capacidade de monitorar o comportamento dos indivíduos. Assim
é essencial o desenvolvimento de mecanismos de autogovernança que assegurem a
estabilidade e longevidade dos empreendimentos cooperativados. (LOCKE, 2003)
Para defender sua proposta, o autor analisa dois estudos de caso em que foi
estabelecido o comportamento confiável em regiões onde o histórico de ausência de capital
social constitui traço marcante no processo de sua formação e de seu desenvolvimento. Os
dois casos compreendem a cooperação entre os produtores de mozzarella de búfala no Sul da
Itália e entre os produtores de manga no Nordeste do Brasil e mostra como essa cooperação
foi sendo consolidada entre seus membros em ambientes marcados por inúmeros problemas
sociais gerados por um histórico de atraso, pobreza e corrupção.
No primeiro estudo de caso, dos produtores de mozzarella, com a finalidade de evitar a
adulteração de seu produto que se tornava uma ameaça à sua credibilidade, alguns produtores
se uniram e, ao longo de vinte anos, conseguiram agregar inúmeros produtores, estabelecer
parcerias com o governo e com universidades, promovendo inovações tecnológicas e
organizando iniciativas coletivas de marketing, vendas, monitoramento e controle de
qualidade.
No segundo estudo de caso, dos produtores de manga do Nordeste, a região de
Petrolina-Juazeiro tornou-se uma área de prósperas fazendas cultivando uma gama de
produtos agrícolas de alto valor agregado, exportados para a Europa e para os Estados Unidos.
Isto só foi possível devido a dois importantes atores: certas agências governamentais que
desenvolveram um importante papel, empregando uma série de políticas de irrigação e
eletrificação para desenvolver a região, além de executar um importante papel regulatório na
31
formação desses empreendimentos; e a associação local de produtores que mobilizou esforços
para diversificar a produção, exterminar pragas, assegurar padrões de qualidade e facilitar
exportações para mercados estrangeiros. (LOCKE, 2003)
Locke não deixa clara a distinção conceitual entre confiança e capital social, como
destaca Maciel (2001), não distinguindo qual a relação causal entre os dois termos, ou seja,
em que medida o capital social pode existir sem a confiança e vice-versa. Também não atribui
a devida importância que as características locais específicas tiveram no sucesso desses
arranjos produtivos para o desenvolvimento local. Mas o autor traz uma contribuição muito
importante para a literatura sobre capital social, uma vez que através dos dois estudos de caso
mostra como o interesse próprio, a política governamental e a auto-governança das
instituições podem desenvolver o capital social local, através da construção da confiança.
Apesar de atribuir a mesma importância à confiança como uma dimensão do capital
social, Francis Fukuyama apresenta uma visão de capital social muito diferente da de Richard
Locke no que se refere à sua criação.
Fukuyama: As grandes corporações de negócios como indicadores de capital social
Na definição de Francis Fukuyama, uma sociedade possui mais ou menos capital
social de acordo com o raio de confiança que seus grupos e comunidades são capazes de
construir, ou seja, de acordo com tamanho do círculo de pessoas entre os quais as normas
cooperativas são compartilhadas. Confiança é a expectativa que nasce de uma comunidade de
comportamento estável, honesto e cooperativo, baseado em normas compartilhadas pelos
membros dessa comunidade. O capital social é uma capacidade que decorre da prevalência de
confiança numa sociedade ou em certas comunidades. Se o capital social de um grupo produz
externalidades positivas, o raio de confiança pode ser mais amplo do que o próprio grupo.
32
Também é possível que o raio de confiança seja menor do que o grupo, como ocorre em
grandes organizações que mantêm normas cooperativas somente entre as lideranças do grupo
ou entre a equipe permanente. Para Fukuyama a sociedade moderna deve ser pensada como
uma série de raios de confiança concêntricos e sobrepostos. (FUKUYAMA, 2000)
A função econômica do capital social é reduzir os custos de transação associados aos
mecanismos de coordenação formal como contratos, hierarquias, e regras burocráticas. É
possível alcançar ações coordenadas entre um grupo de pessoas que não possuem capital
social, mas isto exigiria um sistema de regras e regulamentos que têm de ser negociados,
acordados, litigiados e postos em vigor muitas vezes por meios coercitivos. Uma sociedade
que opere de acordo com um conjunto de normas éticas comuns tem melhores condições de
inovar organizacionalmente, uma vez que o alto grau de confiança permitirá que uma grande
variedade de relacionamentos sociais emerja. Os custos transacionais que a desconfiança
generalizada gera no interior de uma sociedade impõem uma espécie de ônus sobre todas as
formas de atividades econômicas. Deste modo, um bom indicador de capital social para
Fukuyama seria a capacidade maior ou menor das sociedades de criar grandes organizações
de negócios privadas. “Sociedades bem supridas de capital social poderão adotar novas
formas organizacionais mais rapidamente do que as menos providas, à medida que a
tecnologia e os mercados mudarem.” (FUKUYAMA, 1996, p.47).
O autor afirma que o capital social é gerado espontaneamente como o resultado de
interações comunitárias repetidas. As normas cooperativas que surgem dessas interações são
criadas e transmitidas por meio da religião, da tradição ou de traços históricos.
Estes fatores que fazem surgir capital social encontram-se fora do controle do governo.
Assim, Fukuyama acredita que o Estado pode ajudar a manter as já existentes formas de
capital social em uma sociedade, mas dificilmente poderá criá-las. Além disso, o Estado pode
causar sérios impactos negativos sobre o capital social quando começa a responsabilizar-se
33
por atividades que são melhor desenvolvidas se deixadas para o setor privado ou para a
sociedade civil. A habilidade para cooperar é baseada no hábito e na prática. Da mesma forma
que Coleman, o autor acredita que se o Estado interfere nos negócios para organizar tudo, as
pessoas irão se tornar dependentes dele e perder sua habilidade espontânea de cooperar umas
com as outras. No seu ponto de vista, há boas razões econômicas pelas quais os países
deveriam restringir o tamanho de seus setores estatais. Junte-se a elas uma razão cultural de
preservação da esfera da ação individual e da iniciativa na construção de associações civis
(FUKUYAMA, 2002).
Na visão de Fukuyama, a confiança, portanto, está relacionada a fatores históricos e
culturais e não pode ser criada pelo Estado. Além disso, o autor propõe mensurar o capital
social por meio da quantidade de grandes corporações de negócios que uma sociedade possui.
Apesar de suas visões serem distintas, para Francis Fukuyama e Richard Locke a existência
de capital social, de certa forma, reduz-se ao nível de confiança presente em uma sociedade.
Contrariamente, as visões de Russell Hardin e Gary Becker atribuem pouca
importância ao papel que a confiança ocupa na formação de capital social. Essas são visões
muito peculiares e pouco compartilhadas entre os demais autores e serão tratadas a seguir de
forma breve.
Becker: Capital social na função de utilidade individual
A teoria do ator racional disseminada por Coleman ganhou uma notoriedade muito
grande no meio acadêmico e serviu de base para o trabalho de Gary Becker (2001). De acordo
com a definição de Becker, capital social são as ações coletivas e públicas que geram as
influências sociais sobre a utilidade de um indivíduo.
34
Becker afirma que a teoria da escolha racional é crucial no entendimento de como a
estrutura social é determinada. Para o autor isto é possível porque, mesmo em sociedades
onde a cultura prevalece sobre as escolhas individuais no que diz respeito à influência sobre o
comportamento dos indivíduos – sobrando, portanto, pouco espaço para a escolha racional –
as escolhas principais e anteriores, que são a seleção de amigos, vizinhos, de profissão, de
parceiros de casamento, se dão de forma individual e racional. (BECKER, 2001)
Becker propõe um modo direto de analisar como mudanças no ambiente afetam as
escolhas e o comportamento através da mudança na utilidade dos bens. Capital social para o
autor são as ações coletivas e públicas que geram as influências sociais sobre a utilidade de
um indivíduo. A função de utilidade individual (representada por U) de Becker depende do
consumo de bens e serviços de todos os tipos (representados por x e y) e das influências
sociais geradas pelo capital social, isto é, a influência que os outros exercem nas atitudes de
um indivíduo, como freqüentar restaurantes famosos, usar determinadas marcas de roupas, etc
(representadas por S).
U = U (x, y; S)
Mudanças no capital social não deslocam a função de utilidade, mas elevam ou
diminuem o nível de utilidade no interior da função de utilidade estável. A utilidade gerada
pelo uso de drogas, crime, votação democrática ou vestir-se informalmente para trabalhar
depende de se os amigos e vizinhos usam drogas, cometem crimes, votam democraticamente
ou vestem-se informalmente. Além disso, mesmo mudanças externas ao capital social
afetariam o comportamento se estas mudanças elevarem ou diminuírem as utilidades
marginais de diferentes bens (BECKER, 2001).
35
A suposição fundamental de Becker é que a variável bens e serviços, x ou y, e a
variável influências sociais, S, são complementares, tanto que um aumento em S eleva a
utilidade marginal de x e y. Essa complementaridade entre S e x (ou S e y) significa que um
aumento em S eleva a demanda por x (ou y). Ou seja, o consumo de um determinado bem ou
serviço aumenta na medida em que aumentam as influências sociais dos outros sobre esse
consumo. Quando a complementaridade é muito forte, significa que as forças sociais têm um
poder tirânico sobre o comportamento dos indivíduos; que os indivíduos são forçados a
obedecerem às normas sociais, que a cultura é dominante, enfim, que predominam efeitos
poderosos da estrutura social sobre as ações dos indivíduos. Isto não quer dizer que não há
espaço para a escolha individual. Para Becker se a pressão de amigos e outras formas de
capital social têm poderes enormes sobre as escolhas individuais, elas se tornam mais
importantes ainda quando influenciam na escolha dos próprios amigos e de outros
determinantes de capital social (BECKER, 2001). Assim, as normas sociais e o histórico
cultural de uma sociedade predominam sobre as escolhas individuais e modificações no
capital social provocadas pelo próprio indivíduo são praticamente inviáveis, ou seja, as ações
individuais não podem criar capital social.
Hardin: A confiança nas instituições na determinação do capital social
A partir de sua identificação com o trabalho de Gary Becker, Russell Hardin formula
seu conceito de capital social. Hardin concorda com Becker ao afirmar que o capital social
funciona no nível do indivíduo, de forma que pode ser inserido na função de utilidade
individual e seu impacto causal está sobre o indivíduo. Hardin reitera o conceito de Becker,
classificando o capital social como a influência que os outros indivíduos exercem sobre a
36
decisão de consumo de um indivíduo, incluindo o consumo passado relevante e outras
experiências pessoais que afetam as utilidades corrente e futura (HARDIN, 1999).
Para Hardin, seguindo a teoria de Becker, a confiança somente é uma forma de capital
social na medida em que afeta o desempenho do consumo de um indivíduo. Esforços
coletivos prosperam mais facilmente porque ser confiável gera incentivos para que se
estabeleça a cooperação, criando benefícios para mais de uma pessoa. Mesmo inserida no
capital social, Hardin não acredita que a confiança seja ingrediente fundamental para relações
cooperativas, muito menos para o desenvolvimento econômico, apesar de acreditar nos
benefícios que a mesma traz para os dois fenômenos (HARDIN, 1999).
Para explicar seu ponto de vista, Hardin separa a confiança em três tipos. No primeiro
tipo, o autor afirma que a confiança pode ser o resultado de relações baseadas no “interesse
encapsulado”, ou seja, a confiança entre os indivíduos se institui porque eles acreditam que
seus próprios interesses fazem parte do interesse de todos os envolvidos. Assim, há um
interesse final de que esta relação seja mantida ou se repita no futuro entre todos os
envolvidos em uma rede de relações.
O segundo tipo de confiança é o que ele chama de confiança generalizada ou social.
Este fenômeno está além das preocupações com a reputação dos indivíduos. Consiste na
capacidade irrestrita (sem ser irracional) de confiar nos outros, sem que sejam levados em
conta o contexto passado ou o “interesse encapsulado”. Este tipo de confiança encontra-se em
sociedades com um histórico benigno de confiança generalizada que é passado de geração
para geração e é muito de difícil de ser criada quando não existiu previamente, isto é, quando
a sociedade é dotada de um histórico de desconfiança e vigarices. E por último há o terceiro
tipo, onde a confiança é pura e simplesmente obtida a partir da participação de um terceiro
ator institucional que, através de contratos e sanções, concede garantias aos envolvidos nas
relações sociais (HARDIN, 2001).
37
Este último tipo de confiança, segundo Hardin, é o necessário para que uma sociedade
consiga se desenvolver amplamente. Hardin acredita que as sociedades de hoje são muito
complexas para que seja possível sustentá-las sob as bases da confiança generalizada e que é
imprescindível que existam instituições fortes para garantir a confiança no seu sentido mais
restrito, através da utilização de instrumentos amparados pela lei. Assim, mais importante do
que a confiança existente no capital social, é a confiança nas instituições que determina o grau
de desenvolvimento das sociedades e que depende do pleno funcionamento de normas e
sanções regulamentadas pela lei, onde o Estado encontra sua função e suas limitações na
regulamentação e na fiscalização do seu cumprimento (HARDIN, 2001).
O capital social está relacionado à capacidade individual de obter retornos, na forma
de consumo, das relações sociais e não está relacionado ao tipo de confiança que o autor
considera mais importante. Os dois primeiros tipos de confiança que o autor identifica – tanto
a generalizada quanto a encapsulada – apenas facilitam o sucesso dessas relações sociais que
vão gerar um maior bem-estar e uma maior utilidade, mas não determinam a existência do
capital social.
1.2 – A Definição de um Conceito Preliminar de Capital Social
Após uma breve análise do desenvolvimento do conceito de capital social, foi possível
verificar que os trabalhos apresentados divergem sob muitos aspectos e convergem sob
outros. Por exemplo, Fukuyama ao afirmar que os raios de confiança maiores são os de maior
valor para as sociedades modernas, uma vez que promove redes sociais sobrepostas
portadoras de novas idéias e informação, converge com Putnam ao formular a idéia das redes
de confiança generalizada como as mais importantes na solidificação do capital social, ponto
também central na tese defendida por Granovetter. Em suma, os três autores convergem no
38
que diz respeito à importância atribuída aos laços fracos para o fortalecimento do capital
social, mesmo que façam parte de correntes ideológicas completamente distintas.
O contrário ocorre com Gary Becker e James Coleman. Apesar de se dizer um
seguidor da teoria da ação racional formulada por Coleman, Becker apresenta um conceito de
capital social muito diferente, ao classificar o termo como um ativo individual que se encontra
inserido na função de utilidade dos indivíduos, enquanto Coleman trata o capital social como
um ativo de posse coletiva cuja utilidade está em diminuir os custos de ações que seriam
realizadas individualmente.
A respeito da criação de capital social, duas abordagens podem ser definidas dentre os
autores apresentados: uma abordagem em que os autores acreditam que a criação de capital
social depende do estímulo do governo e/ou de agências estatais, chamada de abordagem da
intervenção do Estado, e outra em que os autores acreditam que a criação do capital social se
dá de forma espontânea, dependendo unicamente de iniciativas individuais ou coletivas,
chamada de abordagem da iniciativa dos agentes. O quadro, a seguir, mostra a divisão dos
autores de acordo com cada abordagem:
Quadro 1 – Capital social: classificação pela forma de abordagem
ABORDAGEM: AUTORES:
Peter Evans
Richard Locke
INTERVENÇÃO DO ESTADO
Robert Putnam (Democracies in Flux)
Pierre Bourdieu
Mark Granovetter
James Coleman
Francis Fukuyama
Gary Becker
INICIATIVA DOS AGENTES
Russell Hardin
É necessário, contudo, com base nos trabalhos apresentados, definir um “conceito
coletivo” de capital social que mais se adequa ao presente trabalho com o objetivo de
39
formular uma base teórica que dê sustentação à hipótese levantada sobre a relação entre
capital humano e capital social.
O conceito de capital social adotado une pontos da definição de Bourdieu e Putnam.
De acordo com Putnam, constitui-se em um atributo coletivo capaz de moldar as
características das redes de relações sociais, como normas, confiança e sistemas, que facilitam
as ações coletivas e, consequentemente, contribuem para aumentar a eficiência da sociedade.
Além disso, como afirma Bourdieu, o capital social é importante porque possui um valor
intrínseco na medida em que constrói a base da sociabilidade. Dessa forma, o capital social
promove o “empoderamento” dos grupos que o possuem.
Sua maior contribuição para o desenvolvimento das sociedades se manifesta por meio
das redes de reciprocidade generalizada, seguindo o conceito de Putnam, ou redes unidas por
laços fracos, como define Granovetter. Os laços fracos permitem a formação de vínculos
sociais mais densos e mais disseminados pela sociedade. Eles são importantes porque incidem
sobre os valores morais e sociais internalizados pelos indivíduos e formam sua reputação,
inserindo neles a prática do pensamento coletivo, do respeito mútuo, da solidariedade e do
altruísmo.
Uma das características mais importantes que o capital social assume, diz respeito à
classificação feita por Putnam sobre o eixo “bridging-bonding”, onde os efeitos externos do
capital social que atua por meio das redes sociais são fundamentais na avaliação do alcance e
dos limites que elas impõem à sociedade. Capital social bridging, ou includente, é importante,
pois aproxima pessoas que são diferentes, como é o caso de movimentos de direitos humanos
ou ambientais, emergindo reciprocidade generalizada.
Enquanto que capital social bonding, ou excludente, produz um suporte social para
pessoas parecidas que sofram algum tipo de exclusão, como grupos étnicos, raciais e de
40
gênero, emergindo reciprocidade específica, mas podendo produzir também externalidades
negativas, como segregação entre grupos diferentes.
Outra importante consideração sobre o capital social está na distinção entre a
possibilidade ou não de sua criação e o papel que o Estado ocupa nesse processo. Seguindo o
trabalho de Evans, será considerada de suma importância a presença do Estado na promoção
de interações sinérgicas entre os diferentes grupos da sociedade com o objetivo de criar e
desenvolver capital social. Adota-se, portanto, a abordagem da intervenção do Estado,
definida anteriormente. De acordo com essa abordagem, o capital social pode ser criado, uma
vez que não assume um caráter estático e mecânico como acreditam os adeptos da abordagem
da iniciativa dos agentes. Isso ocorre porque existem inúmeros estudos de caso, inclusive no
Brasil – como mostra Evans e Locke –, em que a ação do governo, baseada em uma agenda
que inclua políticas públicas de fomento e criação de capital social, em ação conjunta com os
empreendedores locais, foi capaz de mudar a dinâmica de regiões marcadas por um histórico
de desconfiança e corrupção.
Portanto, novamente de acordo com Putnam, o capital social possui um caráter
multidimensional e, consequentemente, agrega várias dimensões que atuam de forma
diferente sobre as transformações sociais. E é sobre estas diferentes dimensões que trabalhos
mais recentes se detêm para elaborar diferentes indicadores de capital social capazes de captar
a relação existente entre capital social e capital humano.
Assim, no próximo capítulo serão apresentados alguns trabalhos de maior destaque
que, de acordo com a importância delegada a uma ou mais dimensões do capital social,
procuram formular indicadores para analisar tal relação. A tentativa de elaborar um “conceito
coletivo” de capital social serviu para destacar um conceito mais abrangente que caminhe em
direção à definição de um conceito mais específico de capital social que será elaborado no
segundo capítulo.
41
2 - A RELAÇÃO ENTRE CAPITAL HUMANO E CAPITAL SOCIAL: UMA
REVISÃO DA BIBLIOGRAFIA
No presente capítulo, serão apresentados, na primeira seção, os trabalhos da literatura
brasileira que falam sobre a relação entre capital humano e capital social, ainda que essa
discussão não seja o ponto central de suas análises e não consista em um debate, mas trazem
importantes contribuições ao tema. Na segunda seção, serão apresentados trabalhos onde o
debate sobre a relação entre capital humano e capital social ganha ênfase, mostrando o quão
divergente e controversa é a opinião entre os autores que discutem a relação entre essas duas
variáveis.
Na terceira e última seção, serão apresentados os principais pontos em que se pautam
as hipóteses deste trabalho, ou seja, as observações sobre os indicadores de capital social,
dentro da distinção entre associativismo e participação política, que servirão de base para o
desenvolvimento do terceiro capítulo, onde será realizado o estudo de caso que permitirá
verificar se pode haver uma divergência entre capital social e capital humano.
2.1 – O capital humano e sua relação com o capital social na literatura brasileira
A teoria do capital humano ganhou espaço na literatura econômica no Brasil a partir
da década de 1970, através dos trabalhos de Albert Fishlow e Carlos Langoni. A partir dos
estudos de Langoni (1976), uma boa parte da literatura existente sobre o capital humano
atribui à educação e ao mercado de trabalho o papel de principais determinantes da formação
da renda do indivíduo e, conseqüentemente, determinantes do desenvolvimento sócio-
econômico de um país. Além disso, a partir desses trabalhos ficou comprovado que a
42
educação teria um papel fundamental na diminuição das desigualdades sócio-econômicas,
geradas pela exclusão de grande parte dos indivíduos do sistema econômico vigente.
Para autores mais recentes como Barros et al (2000a), o mercado de trabalho reflete e
amplifica os problemas gerados pela desigualdade educacional, transformando-a em
desigualdade de renda. Estudos mais recentes como os de Barros et al (2000b), Ramos e
Vieira (2000) e Rocha (2000), demonstram essa relação intrínseca, onde o principal fator
explicativo do diferencial de renda do trabalho é a educação.
Ao lado da variável educação, trabalhos como os de Marcelo Neri (2000), Carlos
Hasenbalg e Silva (2000) e Maria Lucia Maciel e Sarita Albagli (2002) se destacam por
chamar a atenção para o capital social, seja como um dos ativos que compõe o nível de bem-
estar social dos indivíduos, no caso de Neri (2000); ou como um importante determinante da
desigualdade educacional no Brasil, no caso de Hasenbalg e Silva (2000); ou ainda como uma
variável importante na promoção do empreendedorismo em um contexto de desenvolvimento
local, no caso de Maciel e Albagli (2002).
Como será mostrado a seguir os trabalhos de Neri, Hasenbalg e Maciel, apesar de
estabelecerem uma relação entre capital humano e capital social, não têm como objeto de
estudo explorar a causalidade existente, ou não, entre estas duas variáveis. Dessa forma, no
Brasil não parece haver ainda um debate amplo que permita esclarecer como o capital
humano interfere na criação de capital social ou vice-versa. Ou ainda, se essa relação
realmente existe ou se são variáveis completamente independentes.
Dos autores supracitados, Neri (2000) é o que realiza o trabalho com o objetivo mais
voltado a explorar essa relação de dependência entre capital humano e capital social para
direcionar a implementação de diferentes políticas de aumento de capital. Para o autor o nível
de bem-estar social pode ser modificado de três maneiras diferentes. São elas: a utilidade
direta extraída do fato de se possuir um maior números de ativos, o aumento da capacidade de
43
geração de renda dos pobres (neste sentido o ativo seria educação, terra, etc.) e ainda a maior
habilidade para lidar com choques adversos. Através de dados da PNAD e da PME, Neri
observou que as alterações nos níveis de pobreza são condicionadas por três fatores:
mudanças na renda per capita, mudanças no grau de desigualdade e mudanças na interseção
desses dois termos, sendo que o segundo exerce maior influência que o primeiro. Os ativos
são formados por três grupos: a) capital físico (ativos financeiros, moradia, terra e transporte);
b) capital humano (escolaridade, idade e educação técnica); c) capital social (emprego,
sindicatos e associações, participação política, etc.). Ao analisar a composição e distribuição
destes ativos entre os indivíduos pobres e não pobres, o autor conclui que “os anos completos
de estudo” é a variável mais importante dentre todas as usadas para explicar a pobreza.
(NERI, 2000). O autor deixa claro que não é que o capital social não tenha influência na
composição dos ativos humanos, mas quando se está olhando sob a perspectiva dos
rendimentos gerados, do mercado de trabalho, do consumo, chega-se à conclusão de que o
capital humano (reduzido à educação formal) é o ativo mais importante a ser estudado no
desenvolvimento sócio-econômico e na diminuição das desigualdades. Além disso, o autor
observou que nos níveis mais elevados de capital humano encontram-se os níveis mais
elevados de capital social, ou seja, capital humano gera capital social e, portanto,
investimentos em capital humano são importantes para garantir uma sociedade rica em capital
social.
Com um argumento assimétrico ao de Neri, o trabalho de Hasenbalg e Silva (2000), a
partir da definição de capital social e da relação entre capital social e capital humano que
Coleman estabelece, toma a direção inversa e mostra como o capital social é uma das
variáveis chave que influencia o desempenho educacional das crianças, agindo como um dos
determinantes das desigualdades educacionais no Brasil. Os autores se propõem a examinar o
quadro evolutivo da desigualdade educacional no Brasil nas décadas de 80 e 90 e quais os
44
fatores que contribuíram para sua configuração, bem como as mudanças nos determinantes
extra-escolares do desempenho escolar no ensino fundamental, separando a contribuição das
melhorias do sistema educacional das que se devem à melhorias nas condições sociais dos
alunos. Seu trabalho é realizado através de dados da PNAD-1998 em comparação com as
PNAD-1976 e 1986.
Os autores chamam a atenção para o fato de que a bibliografia sobre a evolução
educacional das últimas décadas não se preocupa com os efeitos da rápida urbanização e
transição demográfica ocorridos no Brasil sobre as mudanças na composição social das
famílias e dos alunos. Estes fatores resultaram em mudanças na composição, nos recursos e na
estrutura das famílias que promoveram condições sociais mais favoráveis para a população
em idade escolar (HASENBALG; SILVA, 2000). Os autores apontam três dimensões dos
recursos disponíveis para a família, ao avaliar o impacto dessa transição estrutural. A
primeira, e mais estudada, são os recursos econômicos (capital econômico), mensurados
através da renda ou riqueza familiar. A segunda dimensão é a dos recursos educacionais que
os autores chamam de capital cultural que diz respeito à distribuição de educação entre os
membros adultos da família, mensurada através da educação dos pais e que acredita-se ter
influência direta no desempenho educacional dos filhos. A terceira dimensão é a estrutura
familiar, chamada pelo autor de “capital social familiar”, mensurado através do tamanho, da
composição da família e da alocação diferencial de papéis na família, funcionando como um
catalisador do capital econômico e cultural das famílias e transformando-os em desempenho
escolar das crianças.
De acordo com a metodologia definida pelo autor, a queda da fecundidade – ou seja, a
redução do tamanho da família e do número de filhos – foi utilizada como um dos indicadores
de capital social, representando um aumento do capital social disponível para as crianças
dentro de suas famílias, pois favorece a sua escolarização em virtude da maior atenção que os
45
pais dedicam aos filhos. Os dados mostram que a proporção de crianças em idade escolar em
famílias de tamanho reduzido, leia-se com até 2 filhos menores de 14 anos, aumenta de pouco
mais de um quarto em 1976 para 57,2% em 1998. Já no caso de famílias numerosas, com 5 ou
mais filhos, passam de 36,7% para apenas 10,2%.
Outro indicador utilizado pelo autor que, na medida em que aumenta, diminui o capital
social disponível para as crianças desfavorecendo sua escolarização, é a proporção de famílias
chefiadas por mulheres. Resultado de uma crescente instabilidade de casamentos e uniões,
este indicador sofreu um aumento considerável. No caso de crianças de 7 a 14 anos de idade,
a proporção das que pertencem a famílias chefiadas por mulheres aumenta de 10,3% em 1976
para 12,7% em 1986 e 17,9% em 1998. A crescente participação das mulheres no mercado de
trabalho, aumentando o número de mães que trabalham, também é outro indicador de
deficiência de capital social. A parcela de crianças cujas mães trabalham cresce de forma
sistemática no período analisado, de 22,4% em 1976 para 36,9% e, novamente, para mais da
metade, 53,4% em 1998 (HASENBALG; SILVA, 2000).
Os resultados encontrados por Hasenbalg e Silva mostram que a quantidade de
crianças de até 14 anos de idade nas famílias, inversamente relacionado ao capital social
familiar, apresenta um forte efeito no desempenho escolar. Os anos de estudo de crianças de
famílias pequenas, com até dois filhos em idade de até 14 anos, é duas vezes maior que os de
famílias numerosas, com cinco ou mais filhos dessa idade, com médias de 2,9 e 1,5 anos de
estudo completados, respectivamente. Já no caso dos indicadores de capital social
representados pela participação das mulheres no mercado de trabalho e pelo sexo do chefe de
família, estes não apresentaram nenhum efeito sobre o desempenho escolar das crianças, que
para todos os casos se situa em torno de 2,5 anos de estudo. O indicador de participação das
mulheres no mercado de trabalho, ressalta o autor, pode sofrer a interferência do aumento da
renda familiar que favorece o desempenho escolar (HASENBALG; SILVA, 2000).
46
Finalmente, o último e importante resultado encontrado por Hasenbalg et al é o de que
aproximadamente 60% da melhoria educacional devem-se às mudanças nas condições de vida
e à distribuição geográfica das famílias, decorrente da urbanização e da transição
demográfica. Somente os 40% restantes devem-se às melhorias efetivas no sistema
educacional. Uma vez que o capital social encontra-se entre estes fatores, sua importância
torna-se fundamental para o desempenho educacional dos alunos em idade escolar
(HASENBALG; SILVA, 2000).
Esta relação que os autores estabelecem entre capital social e capital humano é muito
parecida com a forma como Coleman trata estes dois ativos, como será visto na próxima
seção. Hasenbalg e Silva, assim como Coleman, invertem a relação entre estas duas variáveis,
colocando o capital humano subordinado ao capital social, mas ao mesmo tempo gerando uma
relação virtuosa, onde mais capital social nas famílias gera mais capital humano nas crianças
que por sua vez ao se tornarem adultos geram mais capital social em uma nova geração de
famílias e assim por diante.
Maciel e Albagli (2002) não realizam um trabalho voltado para a investigação dos
benefícios do capital humano para o bem-estar social, nem para as desigualdades
educacionais. Seu trabalho concentra-se na área de desenvolvimento local e regional através
de empreendedorismo, inovação e tecnologia e tem como objetivo discutir o papel do capital
social como base de implementação do empreendedorismo e de iniciativas empresariais de
micro e pequeno porte, em um contexto de inovação, conhecimento e aprendizado (MACIEL;
ALBAGLI, 2002). Mas Maciel e Albagli (2002) fazem uma consideração importante sobre o
papel do capital humano em um cenário em que o tema do empreendedorismo vem ganhando
um espaço cada vez maior nos meios acadêmicos, no governo, entre empresários e na
sociedade de uma forma geral. Um dos pontos centrais do tema em que se detém o trabalho de
Maciel e Albagli (2002) é a ampliação da capacidade empreendedora dos indivíduos que até
47
hoje foi estritamente associada ao capital humano, via qualificação profissional de indivíduos.
As autoras notam que, entretanto, essa capacidade empreendedora não se resume ao capital
humano apenas. Hoje, reconhece-se que ambientes em que o empreendedorismo se
desenvolve com mais facilidade e solidez são aqueles em que ocorrem processos interativos e
cooperativos de aprendizado e de inovação, tornando-se importante que a capacitação, a
inovação e o aprendizado sejam realizados de forma coletiva e sistêmica (MACIEL;
ALBAGLI, 2002).
Dessa forma, Maciel e Albagli destacam a grande importância do capital social,
representado pelas relações sociais entre os diversos atores, com o objetivo de favorecer
processos de crescimento e desenvolvimento da atividade empreendedora. As autoras
reconhecem que capital humano, via grau de instrução, e capital social encontram-se
intimamente relacionados, uma vez que a educação formal e informal contribui para o
entendimento do que vem a ser a cidadania, e assim, do interesse coletivo. Mas o processo de
acumulação de conhecimento tácito só é possível através da interação dos atores envolvidos e
é ele que fará emergir os laços de interesses coletivos que poderão ser dirigidos para um
esforço de desenvolvimento local (MACIEL; ALBAGLI, 2002). Maciel e Albagli constatam
que a carência de educação básica tem reflexos na capacidade de aprendizado, através de um
estudo realizado no Distrito Federal (Maciel, 1997), onde nas empresas mais inovadoras todos
os empresários têm ensino superior, inclusive em setores tradicionais como movelaria e
confecções. As autoras observam também que em arranjos produtivos bem sucedidos houve a
preocupação em implementar instituições de ensino e pesquisa, principalmente em áreas de
alta tecnologia como é o caso de telecomunicações em Campinas. Para Maciel e Albagli,
capital humano e capital social são ativos que devem andar juntos e têm uma relação de
reciprocidade, onde a dependência é bilateral.
48
Como fica claro nos três trabalhos supracitados aparecem dois argumentos opostos
sobre a relação entre capital humano e capital social. De um lado o trabalho de Neri, inferindo
a relação de dependência do capital social em relação ao capital humano e do outro os
trabalhos de Hasenbalg e Silva e de Maciel e Albagli. Hasenbalg e Silva trabalham no sentido
inverso, mostrando a relação de dependência do capital humano em relação ao capital social.
Já o trabalho de Maciel e Albagli estabelece uma relação de dependência recíproca. Nos três
trabalhos apresentados, a relação entre o capital humano e o capital social é analisada segundo
finalidades diferentes: no caso de Neri para aumentar o nível de bem-estar social, no caso de
Hasenbalg e Silva para diminuir as desigualdades educacionais e no caso de Maciel e Albagli
para promover o empreendedorismo local. Os três trabalhos não constituem claramente um
debate sobre a relação entre capital humano e capital social por não se tratar do tema central
de seus artigos, mas sugerem uma investigação sobre o tema.
Quando o foco é sobre a riqueza, e não sobre a pobreza ou o bem-estar, a educação
aparece como uma variável menos significativa na explicação da desigualdade sócio-
econômica. Trabalhos como o de Marcelo Medeiros, intitulado O Estudo dos Ricos no Brasil
(2005), tem como objetivo mostrar a importância do estudo do estrato dos ricos (que, por falta
de dados, foram classificados através de dados sobre as declarações de imposto de renda,
quando na verdade sabe-se que são insuficientes, já que propriedades e rendimentos não
declarados compõem uma grande parcela do patrimônio dessa classe social) da população
brasileira para o entendimento mais amplo da desigualdade social existente no Brasil.
Analisando o mercado de trabalho, o autor afirma que a escolaridade não é uma condição
suficiente para que os trabalhadores pertençam a uma família rica (leia-se os 1% mais ricos do
Brasil que concentram cerca de metade de todo o patrimônio declarado no país), uma vez que
simulações demonstram que na hipótese de uma elevação expressiva do nível educacional de
todos os trabalhadores brasileiros, não ocorreria uma grande mobilidade das famílias não-
49
ricas para o estrato rico (MEDEIROS, 2005). Medeiros afirma que nem a diferença na
qualidade da educação entre ricos e não ricos justifica a diferença nos rendimentos da ordem
de até sete vezes entre ricos e não ricos. O autor acredita que existem outros fatores que
impedem a entrada de determinadas pessoas nesses estratos mais elevados de renda e que
devem fazer parte de um modelo explicativo da desigualdade, dentre os quais as redes de
relações sociais – o capital social – fazem parte e que não se confunde, nem se subordina a
níveis de escolaridade.
O trabalho de Medeiros é importante, assim como os trabalhos de Hasenbalg e Silva e
de Maciel e Albagli, porque faz parte de uma nova linha de estudos que surgem para entender
o problema da desigualdade sócio-econômica complementar à teoria do capital humano. O
autor demonstra que olhando sob outro prisma, que neste caso é o estrato dos ricos, a
educação não é o determinante na formação da renda desses indivíduos e revela a importância
do capital social para explicar sua riqueza.
2.2 – O debate internacional sobre capital humano e capital social
Na literatura internacional, há um debate amplo e bem difundido sobre a relação entre
capital humano e capital social. Serão separados os argumentos do capital social não
subordinado, ou seja, os trabalhos que afirmam que este ativo não está subordinado ao capital
humano, dos argumentos do capital social subordinado. Neste último argumento, o capital
social está subordinado ao capital humano, uma vez que somente pode ser gerado através de
incrementos neste último. Em outras palavras, que os maiores níveis de capital social
encontram-se em indivíduos que pertencem aos estratos mais altos de escolaridade.
50
2.2.1 – Argumentos do Capital Social Não Subordinado
A corrente de pensamento do capital social não subordinado, se inicia com o trabalho
de James Coleman, Social Capital in the Creation of Human Capital (1988), onde o autor
acredita que o capital social exerça um efeito muito importante sobre a criação de capital
humano para as gerações futuras de uma família ou de uma comunidade.
Coleman afirma que o capital humano, medido pelo grau de educação dos pais,
constitui-se em um ativo que está inserido na estrutura familiar, uma vez que gera o potencial
para a criação de um ambiente cognitivo para a criança ajudando no seu aprendizado. Já o
capital social de uma família é o ativo que os pais possuem que permite a transformação desse
potencial no desenvolvimento efetivo da criança.
Para deixar mais claro o efeito do capital social na família, Coleman cita o exemplo
em que famílias asiáticas imigrantes costumavam tirar duas cópias do mesmo livro para uma
mesma criança nas escolas. Uma das cópias seria para a mãe que dedicaria parte de seu tempo
ajudando nos deveres escolares de seus filhos. Essa dedicação é traduzida por Coleman pelo
nível de capital social familiar que, como nesse caso, mesmo com baixo nível de capital
humano – traduzido em anos de escolaridade dos pais –, é fundamental para o
desenvolvimento intelectual dos filhos. O autor reconhece que as crianças são fortemente
afetadas pelo capital humano possuído por seus pais. Mas esse capital humano pode ser
irrelevante para os resultados das crianças se os pais não são uma parte importante de suas
vidas, se seu capital humano é empregado exclusivamente no trabalho ou em qualquer outro
lugar fora de casa. O capital social familiar é a relação entre crianças e pais (e, quando
famílias incluem outros membros, relações com eles também). Isto é, se o capital humano
possuído pelos pais não é complementado pelo capital social inserido nas relações familiares,
é irrelevante para o crescimento educacional da criança que o parente tenha uma grande
quantidade, ou uma pequena quantidade, de capital humano (COLEMAN, 1988).
51
Coleman destaca que o capital social dentro da família que dá a criança acesso ao
capital humano dos adultos depende da presença física dos adultos na família e da atenção
dada pelos adultos aos filhos. A ausência física dos adultos pode ser descrita como uma
deficiência estrutural no capital social da família. O mais proeminente elemento da deficiência
estrutural nas famílias modernas é a família mono-parental. Contudo, a própria família
nuclear, na qual um ou ambos os pais trabalham fora de casa, pode ser vista como
estruturalmente deficiente, faltando capital social que vem com a presença dos pais durante o
dia, ou com os avós ou tios e tias na família. Coleman observa que a maior taxa de abandono
de estudos, que ele classifica como um indicador de ausência de capital social, encontra-se em
famílias com um maior número de irmãos ou em famílias mono-parentais, onde a dedicação
voltada para a criança é menor (COLEMAN, 1988). Fora da família o capital social também
se encontra manifestado em comunidades, consistindo nas relações sociais que existem entre
pais, nas conexões formadas por esta estrutura de relações, e nas relações dos pais com as
instituições da comunidade. O efeito deste capital social fora da família sobre resultados
educacionais pode ser visto através do número de vezes que a criança muda de escola porque
a família se muda. Para famílias que se mudam freqüentemente, as relações sociais que
constituem o capital social são quebradas a cada mudança.
Nos dados analisados por Coleman, outra variação constitui um indicador útil de
capital social. Isto é, a variação entre escolas públicas, escolas particulares religiosas e escolas
particulares não religiosas. As escolas de base religiosa firmam-se em relações múltiplas,
onde o contato entre as famílias se dá em vários ambientes ao mesmo tempo: na escola, na
igreja e entre gerações. Assim, nessas escolas o grau de desistência entre os alunos é inferior,
mostrando que o capital social dessas escolas e conseqüentemente das comunidades que as
cercam é maior (COLEMAN, 1988).
52
Coleman acredita, portanto, que, uma vez que o capital social esteja presente em uma
família ou comunidade, ocorra a formação de um círculo virtuoso para as gerações futuras.
Uma vez que uma família (ou comunidade) possua mais capital social, mais capital humano
será gerado para seus filhos. Assim ocorre uma relação circular entre os dois ativos,
provocando uma dependência mútua entre os mesmos.
O trabalho de John Field et al (2000), apesar de inserir-se entre os que defendem o
argumento do capital social não subordinado, não compartilha da mesma visão de Coleman,
fazendo de seu trabalho uma crítica à relação entre capital humano e capital social que
Coleman estabelece em seu artigo apresentado acima. Os autores – em seu trabalho intitulado
Social Capital and Human Capital Revisited – preocupam-se em demonstrar que essa relação
entre capital humano e capital social não é linear e ainda é muito frágil (FIELD; SCHÜLLER;
BARON, 2000).
A crítica ao argumento de Coleman pode ser separada em várias dimensões e serão
numeradas a seguir: 1) A maneira como Coleman aborda o capital social enfatizando a sua
capacidade de produzir capital humano traduzido por anos de escolaridade, subestima as
formas pelas quais o capital social pode ser uma fonte de desigualdade e pode servir para
apoiar hierarquias sociais. 2) Coleman coloca um peso muito grande nas formas de conexões
primárias como a família e subestima o peso de conexões secundárias como as redes sociais, o
engajamento cívico e as outras organizações sociais existentes. 3) Ao enfatizar a família como
fonte de capital social e utilizar indicadores de capital social como famílias mono-parentais e
de acordo com o número de filhos, Coleman não leva em conta a existência da desigualdade
de gênero e de capacidades individuais de aprendizado no interior das famílias.
Dessa forma, a visão de Coleman da importância da família sobre o nível de capital
social não se opõe e nem se distingue das visões da teoria do capital humano. Deficiências no
capital social, sejam elas internas ou externas à família, são danosas para o que o autor
53
classifica como o “desenvolvimento cognitivo” de pessoas jovens, e assim para a criação de
capital humano. As ligações que Coleman efetuou entre capital humano, capital social e
equidade estão baseadas em uma concepção de “desenvolvimento cognitivo” onde os
indivíduos são preparados em uma dimensão única de habilidade, que são os anos de
escolaridade, e através disso, são alocados na economia de acordo com o seu quantum de
capital humano. Através de inúmeras pesquisas empíricas, Field et al (2000) concluíram que é
necessário incluir o aprendizado informal em qualquer análise de “conhecimento” humano.
(FIELD; SCHÜLLER; BARON, 2000)
John Field et al (2000) acreditam que capital social e capital humano não encontram-
se em oposição direta entre si, mas em um relacionamento de constante tensão teórica e
pragmática.. Para os autores, a distinção chave entre capital humano e capital social é que o
primeiro focaliza os agentes individuais e o segundo os relacionamentos entre eles e as redes
que eles formam.
Em termos organizacionais, os indivíduos podem (e provavelmente irão) se beneficiar
individualmente da qualificação que o capital humano proporciona, mas o impacto disso sobre
a performance da organização a qual pertencem irá depender de como seu aprendizado é
incorporado na atividade que desenvolvem nessas organizações sociais. Enfim, os autores
sugerem que a relação entre capital humano e capital social é complexa e multidirecional e
que tem vários resultados possíveis dependendo do contexto, dos atributos e do
comportamento dos próprios atores. Field et al (2000) sustentam ainda que os níveis de
educação inicial estão intimamente associados à propensão a participar da vida associativa e,
de fato, a tomar posições de liderança, mas que não necessariamente aqueles que o fazem
estão nos níveis mais elevados de escolaridade. O acesso a novos conhecimentos e
habilidades, independentemente dos anos de educação, pode ajudar a construir e a transformar
o capital social (FIELD; SCHÜLLER; BARON, 2000). Esta posição de Field et al faz com
54
que seu trabalho se insira na corrente de pensamento que não vê o capital social como uma
proxy do capital humano.
Assim os trabalhos de Coleman (1988) e Field et al (2000) convergem apenas no que
diz respeito à delimitação imposta aos dois argumentos, ou seja, ao fato de o capital social não
estar subordinado ao capital humano, mas apresentam posições completamente diferentes.
Field et al (2000) separa o capital social do capital humano, ao afirmar a necessidade de os
dois ativos coexistirem paralelamente. Diferentemente de Coleman que impõe uma
subordinação mútua entre os ativos.
O próximo trabalho a ser apresentado que encontra-se no argumento do capital social
não subordinado é um trabalho que justifica sua posição por meio de análises empíricas,
utilizando indicadores que captam algumas dimensões do capital social, diferente dos
trabalhos de Coleman (1998) e Field et al (2000), que são mais teóricos e que, no caso de
Coleman, analisa o capital social por meio de indicadores de capital humano.
Denny em seu artigo intitulado The Effects of Human Capital on Social Capital (2003)
se pergunta se há realmente evidências nos trabalhos até hoje apresentados que comprovem
que a educação tem um impacto positivo sobre a propensão a participar de assuntos
comunitários e atividades voluntárias. Estes últimos são tomados como os indicadores de
capital social em seu trabalho. A questão central que o autor coloca é: “qual o mecanismo que
leva indivíduos mais educados a praticarem atividades voluntárias com mais freqüência?”
(DENNY, 2003, p.2).
Na primeira parte de seu trabalho, Denny procura mostrar os trabalhos mais recentes e
de maior destaque que procuram responder a esta questão, através da análise da relação entre
capital humano e capital social. Ao mesmo tempo em que vai citando tais trabalhos, o autor
aponta as falhas que estes autores cometeram em suas análises, uma vez que muitos deles
utilizam as mesmas bases de dados, mas encontram resultados diversos. Denny nota que todos
55
os trabalhos analisados procuram mostrar o efeito causal da educação sobre a atividade
voluntária. As falhas encontradas nestes trabalhos ocorreram devido à omissão dos efeitos de
algumas variáveis que estão correlacionadas com a educação ou devido a algum retorno da
variável dependente para a educação não levado em conta.
Se, por exemplo, algumas pessoas têm mais iniciativa ou energia em geral, então elas
podem ser analisadas como portadoras de altos níveis de educação e de prática voluntária,
sem que esse fator esteja incluído como uma variável na análise. Provavelmente, isto
incorrerá em um resultado que encontrará uma correlação positiva, mas ao mesmo tempo
errada, entre educação e voluntariado. Outro problema que o autor encontra em todos os
trabalhos analisados diz respeito à falta de testes para as variáveis endógenas à educação, ou
seja, para aquelas variáveis que causam um efeito direto sobre a educação de um indivíduo
que faz parte da amostra, como, por exemplo, a educação dos pais desse indivíduo, que
influenciam indiretamente o seu nível educacional, mas que aparentemente não causam
nenhum efeito sobre a atividade voluntária (DENNY, 2003).
No segundo momento de seu trabalho, Denny procura analisar duas bases de dados
que, conforme já mencionado, não variaram muito. O primeiro conjunto de dados que o autor
analisa é o International Adult Literacy Survey (IALS), coletado na década de 1990, e que foi
um esforço conjunto entre a OECD, a Statistics Canadá e a UNESCO. O segundo conjunto de
dados analisado foi retirado da pesquisa do Eurobarômetro de novembro de 1998, coletado
pela Comissão Européia (DG X) (DENNY, 2003).
O primeiro problema encontrado em sua análise foi que na IALS não havia nenhuma
informação a respeito da natureza dessas atividades. Foi possível ver uma variação
considerável entre os países pesquisados no que diz respeito aos resultados encontrados a
partir da pergunta “Com que freqüência você participa de atividades na comunidade e de
atividades voluntárias?”. Nos quatro países da Europa Oriental, todos apresentaram uma baixa
56
incidência de prática em atividades voluntárias. Isto pode ter ocorrido não por possuírem uma
população menos educada, mas porque nestes países há uma atuação forte do governo no que
diz respeito à assistência social, o que diminui a necessidade ou o desejo de tal prática. Outro
resultado foi o destaque dos Estados Unidos com um elevado grau de participação em
atividades voluntárias, o que o autor considera não ser nenhuma surpresa e muito menos estar
relacionado com a educação, uma vez que os fatores históricos constituem-se em uma
justificativa mais forte. O autor também encontra um problema que parte da própria forma
como a pergunta foi elaborada, afirmando que os indivíduos estarão mais propensos a super-
estimar sua prática voluntária do que a sub-estimar dependendo de como a pergunta é feita
(DENNY, 2003).
A segunda pesquisa, o Eurobarômetro, pergunta aos indivíduos qual o número de
atividades voluntárias em que eles participam. Diferente da IALS, contudo, ela não pergunta
sobre a freqüência da participação. Somente países da União Européia foram pesquisados. O
tamanho da amostra por país é muito menor, em torno de 1000. As variáveis de base são em
alguns aspectos mais ricas do que na IALS com questões sobre o papel do setor público e
privado. Os indivíduos são perguntados se eles participam de organizações associadas à
caridade, direitos humanos, esportes, cultura, sociedades de consumo, religião, natureza,
jovens, política, hobbies, entre outras. Eles podem se engajar em mais de uma. As primeiras
duas organizações citadas, de caridade e de direitos humanos, são melhor descritas como
altruístas. As onze restantes podem ser atividades que alguém se engaja na busca de interesses
privados. “Religião” aqui exclui trabalho de caridade. A distinção do corte não é claro:
alguém pode perseguir um interesse na política por motivações egoístas ou não egoístas. De
fato, alguém poderia ser motivado por razões menos generosas no caso do apoio a caridade
quando, por exemplo, procura publicidade ou satisfazer seu próprio ego. Nos resultados foi
encontrada uma proporção de quem nunca participou de nada (48%) parecida com a
57
encontrada nos dados da IALS. Direitos humanos e organizações esportivas atraem o maior
número de participação. Olhando entre os países, há um efeito sobre os países Nórdicos de um
baixo nível de participação que pode estar correlacionado com a religião, já que países de
religião católica costumam participar menos de atividades voluntárias (DENNY, 2003).
Finalmente, Denny fecha seu trabalho sem conseguir chegar a um resultado robusto e
preciso sobre a relação entre capital social e capital humano. O autor se preocupa mais em
demonstrar que ainda não há nenhum trabalho no meio acadêmico que tenha conseguido
comprovar que quanto mais capital humano um indivíduo possua, mais capital social será
gerado. Isto acontece em decorrência tanto das falhas existentes nos próprios trabalhos,
quanto das falhas existentes nas próprias fontes de dados analisadas (DENNY, 2003). Seu
questionamento gira em torno não só da subordinação do capital social ao capital humano em
si, mas também da profundidade dessa subordinação. Para o autor, mesmo que haja uma
correlação positiva entre os ativos, até que ponto essa correlação é significativa, até que ponto
fatores externos não são tão, ou mais, importantes do que a possível correlação existente entre
os mesmos.
O argumento do capital social não subordinado se inicia com a apresentação do
trabalho de Coleman (1988), um dos precursores do debate. Coleman (1998) concentra sua
análise da relação entre capital humano e capital social na estrutura das famílias e no
desempenho escolar de seus filhos. O autor utiliza indicadores de educação de crianças e
jovens para mensurar a quantidade de capital social dos indivíduos, mensurando capital social
através de indicadores que dizem respeito à estrutura familiar. Dessa forma, o autor mostra
uma relação circular entre mais capital social e mais capital humano, onde acredita haver uma
dependência mútua entre eles.
Field et al (2000) fazem uma crítica ao trabalho de Coleman (1988), tanto na escolha
das famílias como a forma mais importante de conexão social, quanto nos indicadores de
58
capital social escolhidos pelo autor, causando uma redução do conceito de capital social e
minimizando problemas intrínsecos a diferentes estruturas familiares. Além disso, os autores
acreditam que capital social e capital humano não podem ser comparados pela própria
natureza de definição dos termos, que impõe características coletivas ao primeiro e
individuais ao segundo, delegando uma importância equivalente aos dois ativos. Por fim,
Denny (2003) utiliza indicadores de associativismo tradicionais, que captam o nível de
participação a atividades associativas, e indicadores mais qualitativos, onde a freqüência às
atividades voluntárias capta a intensidade dessa participação. O autor não prova a veracidade
do argumento do capital social não subordinado, mas consegue mostrar a inexistência de
trabalhos que comprovem essa relação de subordinação.
A partir desses três trabalhos apresentados foi possível ver que existe uma forte
corrente de pensamento que acredita que o capital social seja um ativo que emerja de fatores
não necessariamente relacionados ao capital humano e que, por isso, não pode ser
subordinado a ele e precisa ser tratado de forma exclusiva. O fato dos pontos de vista serem
completamente diferentes não prejudica a força do argumento do capital social não
subordinado, já que ele é cercado de diversas justificativas que tentam comprovar sua
veracidade.
2.2.2 – Argumentos do Capital Social Subordinado
Serão analisados agora os trabalhos que defendem o argumento do capital social
subordinado e que são mais homogêneos em sua análise. Um dos primeiros autores a defender
a tese da subordinação do capital social ao capital humano foi Robert Putnam.
Segundo Putnam e Helliwell (1999), a educação é um dos mais importantes
determinantes – de fato o mais importante determinante – de muitas formas de engajamento
59
político e social, desde a votação até o grau de confiança de uma sociedade. Em seu trabalho
intitulado Education and Social Capital (1999), é apresentada uma série de dados para
mostrar os efeitos da educação (individual e média de uma comunidade) sobre a confiança e
sobre o engajamento social, duas variáveis chave freqüentemente usadas como medida de
capital social.
As fontes de dados utilizadas foram séries-temporais e cruzamentos da Pesquisa Social
Geral US (GSS) de 1972 até 1996, e da pesquisa DDB-Needham Life Style de 1975 até 1997.
A GSS elaborou um padrão de questões usado em muitas pesquisas das ciências sociais, com
resultados binários 0 para a resposta não e 1 para a resposta sim: “Falando genericamente,
você poderia dizer que a maioria das pessoas são confiáveis, ou que você não precisa ser
cauteloso demais no relacionamento com as pessoas?” (PUTNAM; HELLIWELL, 1999,
p.3). A questão mais simples da DDB pede aos respondentes para dar uma nota em uma
escala de 0 a 6, de acordo com sua concordância com o enunciado “A maioria das pessoas
são honestas”. A diferença entre as questões das duas pesquisas, bem como na forma pela
qual escalam seus resultados, dificulta a elaboração de comparações precisas.
A partir dessas perguntas foram encontrados resultados sobre os efeitos da educação
individual e da educação média (ambos mensurados em anos de estudo) sobre a confiança
social e a participação. De acordo com os resultados da GSS para confiança social, Putnam e
Helliwell encontraram que cada ano adicional de educação aumenta a probabilidade de um
indivíduo ser confiável em 4,4%. Um aumento de um ano no nível de educação médio na
comunidade aumenta a confiança de um indivíduo em 2,4%. Foram utilizadas variáveis de
controle para a passagem do tempo, para mudanças entre gerações, bem como para diferenças
regionais. Os modelos de regressão estimados mostram efeitos positivos de níveis de
educação individual e média para todas as medidas de confiança social. Esses efeitos
positivos são altamente significativos no modelo de regressão simples, e menores e mais
60
fracos nos modelos totalmente especificados (com todas as variáveis de controle),
presumivelmente porque os modelos mais amplos contêm um número maior de variáveis,
apresentando resultados diferentes quando testadas nas séries temporais e regionais
(PUTNAM; HELLIWELL, 1999).
Da análise da confiança, Putnam e Helliwell (1999) passam para a análise dos
resultados sobre participação cívica. As medidas de participação da DDB representam o
número de vezes que o respondente informa participação em cada uma das seguintes
atividades no ano anterior da pesquisa: (1) freqüentar um encontro de clube, (2) trabalhar em
um projeto comunitário, (3) dar ou estar presente em um jantar beneficiente. Para as três
medidas de engajamento social, a educação individual tem um efeito fortemente positivo
sobre a participação cívica, da ordem de 2,3% por ano de escolaridade (PUTNAM;
HELLIWELL, 1999).
As questões da GSS geraram resultados positivos mais robustos, uma vez que todos os
três tipos de atividades enumeradas anteriormente mostraram efeitos positivos sobre os níveis
de educação média, dois deles com significância estatística, apesar de serem menos precisos.
Um ano aumentado na educação individual leva a um aumento estimado da ordem de 9% na
participação em jantares beneficientes e 14% no número de envolvimentos em projetos
comunitários. Já os efeitos da educação média são mais variados e muito menos precisos. Um
aumento de um ano no nível médio de educação na comunidade aumenta o número de
jantares beneficientes oferecidos ou presenciados em 20%, aumenta o envolvimento em
projetos comunitários em 5%, não tem efeito sobre a presença de encontros de clube ou reduz
o número de associados em torno de 1% (PUTNAM; HELLIWELL, 1999).
O efeito negativo encontrado foi sobre o total de associados em dezesseis diferentes
tipos de associações (fraternas, de serviços, de veteranos, políticas, sindicatos, esportes,
jovem, escola, hobby, igrejas, nacionais, rurais, literárias, profissionais, igrejas e outras) na
61
estimação de níveis de educação média na pesquisa da GSS. O autor admite que o exame dos
resultados do grau de participação para grupos específicos mostra o quão difícil é generalizar
entre grupos com objetivos muito diferentes, membros com habilidades diferentes e grau de
comprometimento requerido dos membros. Os efeitos da educação individual são positivos
para todas as formas de associação exceto para sindicatos, o que pode ser explicado pelo fato
de o grau de associação em sindicatos ser mais elevado entre trabalhadores de chão de fábrica
do que entre trabalhadores que ocupam posições de gerenciamento. Os efeitos da educação
média são em geral pequenos e insignificantes. Efeitos positivos significantes para a educação
média são estimados para grupos de leitura, uma vez que serão provavelmente formados por
indivíduos de elevado grau de escolaridade. Os efeitos da educação média são
significativamente negativos para sindicatos, grupos de igrejas, e organizações rurais no
modelo de regressão múltipla, e para grupos escolares nos modelos de regressão simples
(PUTNAM; HELLIWELL, 1999).
Como foi visto, os autores concentraram sua análise na relação do capital humano, via
anos de escolaridade, com indicadores de capital social voltados para a dimensão da confiança
e do grau de participação em diferentes tipos de associações informais. Outros autores, como
Dee (2003) e Milligan et al (2003), analisam essa relação através do uso de indicadores de
capital social que medem o grau de participação política, como a votação, e a participação em
atividades voluntárias.
Thomas Dee (2003) apresenta uma análise empírica dos efeitos da escolaridade sobre
sua definição de participação e atitudes cívicas. Seu estudo tenta construir evidências
empíricas de que mais altos níveis de escolaridade estão associados a elevações substantivas
na promoção de quantidade e qualidade da participação cívica, pela identificação dos efeitos
causais da escolaridade adicional sobre os comportamentos e conhecimentos cívicos.
Primeiro, usando dados do estudo longitudinal da High School and Beyond (HS&B), o autor
62
estimou os efeitos da admissão na universidade sobre a participação do eleitor mensurada
através do voto e a participação voluntária. Depois, usando dados da pesquisa General Social
Surveys (GSS) de 1972-2000 – a mesma utilizada nos trabalhos de Putnam et al (1999) e
Denny (2003) apresentados anteriormente – estimou os efeitos dos anos de escolaridade sobre
a participação do eleitor mensurada através do voto, sobre a filiação a grupos e sobre a
liberdade de discussão de determinados grupos. Usando os dados da GSS, também foram
estimados os efeitos da escolaridade adicional sobre a freqüência de leitura de jornais, um
resultado que foi usado para medir a denominada consciência cívica.
A análise da primeira base de dados, HS&B – o maior estudo longitudinal conduzido
pelo Departamento de Educação dos Estados Unidos –, começa com um corte de estudantes
de segundo grau em 1980. Dee entrevistou aproximadamente 12.000 estudantes em 1984,
quando a maioria dos respondentes estava com 20 anos, e novamente em 1992, quando a
maioria dos respondentes estava com 28 anos. Na entrevista de 1992, os respondentes eram
perguntados sobre quatro questões relacionadas ao engajamento cívico: se eles atualmente
estavam registrados para votar; se eles tinham votado em uma eleição local, estadual ou
nacional durante o último ano; se eles tinham votado na eleição presidencial de 1988; e se
foram voluntários em alguma coisa no último mês. O indicador que mensurou a educação foi
a admissão (ou não) na universidade definida na entrevista de 1984 (DEE, 2003).
Os resultados encontrados pelo autor foram que os comportamentos cívicos de adultos
são a variável dependente do nível de admissão na universidade. Os resultados do modelo da
HS&B sugerem que a admissão na universidade tem poucos e imprecisos efeitos estimados
sobre a probabilidade de ser um voluntário, mas efeitos positivos amplos e uniformes sobre
cada uma das três medidas de participação no voto. Especificamente, os estimadores
utilizados indicam que a admissão na universidade eleva a participação do eleitor na votação
de 21 a 30 pontos percentuais (DEE, 2003).
63
De acordo com Dee, na pesquisa GSS esses respondentes eram perguntados sobre seu
nível educacional e se eles votaram na última eleição presidencial. Na maioria dos anos da
pesquisa, os respondentes da GSS eram também perguntados sobre com que freqüência eles
liam jornais, sobre suas filiações a grupos (por exemplo, grupos fraternais e de serviços
comunitários, clubes políticos, grupos de jovens ou de escola, grupos de igreja, etc.) e sobre
suas atitudes em relação ao discurso livre de grupos particulares. A freqüência de leitores de
jornais foi baseada em cinco respostas possíveis (nunca, menos do que uma vez por semana,
uma vez por semana, poucas vezes por semana, todos os dias). Esta medida de leitores de
jornais é um meio de indicar se os votantes estão informados sobre os assuntos atuais. Os
estimadores utilizados mensuraram como os anos completos de escolaridade influenciaram
estas medidas de engajamento e atitudes cívicas (DEE, 2003).
Os resultados da GSS indicaram que a escolaridade tem efeitos uniformemente
positivos e estatisticamente significantes sobre a maioria das medidas de engajamento e
atitudes cívicas. As estimações feitas pelo autor encontraram que um ano adicional de
escolaridade eleva a participação no voto na ordem de 6,8 pontos percentuais. As estimativas
também encontraram que a escolaridade eleva a qualidade do engajamento e do conhecimento
cívico. Mais especificamente, os resultados mostraram que um ano adicional de escolaridade
gera uma elevação significante de 2,02% na freqüência de leitura de jornais. O efeito
estimado sobre a filiação a grupos também foi positivo, mas altamente impreciso. Contudo, as
estimativas também mostraram que a escolaridade elevada estimula a liberdade de discussão
entre agnósticos, comunistas e homossexuais, com efeitos estimados entre 8,0 a 12,5 pontos
percentuais a cada ano adicional (DEE, 2003).
Milligan et al (2003) apresentam os mesmos indicadores de Dee para justificar a
associação entre a escolaridade e o capital social, ou seja, o efeito da escolaridade sobre a
probabilidade de um indivíduo estar envolvido politicamente, através da participação do
64
eleitor pelo voto e do seu grau de informação política. As diferenças encontram-se em
algumas de suas variáveis de controle e em sua amostra, retirada de outras bases de dados:
National Elections Studies, November Current Population Surveys, General Election Studies
e a pesquisa Eurobarômetro. Outra diferença é que seu trabalho procurava comparar o grau de
participação política entre os Estados Unidos e o Reino Unido. Os resultados mostraram que
para os Estados Unidos, a influência da graduação na escola secundária sobre a probabilidade
de votar é da ordem de 28,8 a 34,2 pontos percentuais. Já no caso do Reino Unido o maior
acesso educacional não causou uma elevação na participação do eleitor através do voto. Isto
pode ter ocorrido em virtude da diferença na metodologia utilizada entre os dois países. Nos
Estados Unidos, somente foram entrevistadas pessoas que constam no registro de votantes, o
que não ocorreu na amostra de entrevistados do Reino Unido por não haver esse tipo de
obrigatoriedade com seus cidadãos. Portanto, problemas gerados pelas diferenças na
metodologia podem estar proporcionando uma correlação positiva enviesada entre educação e
participação política na amostra dos Estados Unidos, superestimando os resultados. Mas
Milligan et al (2003) encontraram resultados positivos nos dois países para os anos adicionais
de escolaridade sobre o grau de informação política dos respondentes seja sobre os
candidatos, sobre campanhas eleitorais ou sobre a freqüência na leitura de jornais. Assim, os
autores corroboram a hipótese de que níveis adicionais de educação elevam o capital social de
um indivíduo, encontrando-se entre os autores que se inserem no argumento contra-capital
social.
Como pode ser observado, os trabalhos de Putnam e Helliwell (1999), Dee (2003) e
Milligan et al (2000) são trabalhos empíricos, onde há uma forte preocupação com a
mensuração dos indicadores para provar a veracidade do argumento do capital social
subordinado. Mas é possível observar que os trabalhos apresentados não entram em um
consenso em relação ao conceito de capital social no que diz respeito ao engajamento cívico.
65
Cada autor utiliza um tipo de indicador diferente – como o grau de participação política,
participação de atividades voluntárias, filiação a associações – para mensurar a participação
cívica, principalmente se compararmos o trabalho de Putnam e Helliwell (1999) com os de
Dee (2003) ou Milligan et al (2003). Ainda, há diferenças na forma de elaboração de um
mesmo indicador – a pergunta sobre voluntariado e sobre informação política muda em cada
trabalho apresentado –, o que dificulta a comparação entre os trabalhos. Além disso, pode-se
notar que quanto maior o número de variáveis de controle inseridas, como ocorre no trabalho
de Putnam e Helliwell (1999), ou quando modifica-se a amostra, como ocorre no trabalho de
Milligan et al (2003), menor o nível de significância dos resultados positivos para a
dependência do capital social em relação ao capital humano. Isto torna mais frágil o
argumento do capital social subordinado.
* * *
Na seção acima, foi possível observar que o debate da relação entre capital social e
capital humano existe no exterior com maior intensidade do que no Brasil. Foi apresentado o
argumento chamado de capital social não subordinado, onde os trabalhos selecionados
apresentam justificativas que mostram que o capital social não está subordinado ao capital
humano. Compartilham deste argumento os trabalhos de Coleman (1988), Field et al (2000) e
Denny (2003). Coleman (1988), um dos autores que inaugurou o debate, traça uma relação de
dependência mútua entre capital humano e capital social. Para o autor eles existem juntos e
agem um sobre o outro. Field et al (2000) realiza um trabalho de crítica a Coleman, onde,
apesar de compartilhar do mesmo argumento, não concorda com a relação de dependência
mútua que Coleman estabelece entre os termos, pois acredita que são dois ativos que atuam de
formas completamente diferentes, onde a escolaridade deve ser mensurada sobre os agentes
individuais e o capital social sobre os relacionamentos entre eles e as redes que eles formam.
Para o autor a relação entre os dois ativos é multidirecional com um número de resultados
66
possíveis dependendo do contexto, dos atributos e do comportamento dos próprios atores.
Finalmente, Denny (2003) se detém na análise da mensuração de capital social para mostrar a
imprecisão dos resultados dos trabalhos tidos como referência na literatura econômica que
compartilham do argumento contra-capital social.
Posteriormente, foi apresentado o argumento chamado capital social subordinado,
onde os trabalhos selecionados endossam a tese de que capital humano necessariamente gera
capital social. Os trabalhos de Putnam et al (1999), Dee (2003) e Milligan et al (2003) foram
selecionados dentro desta linha de pensamento por se destacarem na literatura sobre capital
social. Putnam et al (1999) selecionam indicadores de confiança e de engajamento cívico para
mostrar sua correlação positiva com a educação. Já Dee (2003) e Milligan et al (2003)
selecionam indicadores de participação política e de engajamento cívico para corroborar a
mesma hipótese. Mas verifica-se uma divergência entre os autores sobre o conceito de
engajamento cívico. Esta divergência, tanto no conceito quanto na forma, entre os indicadores
de capital social será abordada na próxima seção, com a finalidade de estabelecer um conceito
de capital social mais específico que será seguido no estudo de caso elaborado no terceiro
capítulo.
2.3 – Capital social como participação política e como associativismo: a construção de
um conceito específico
Foi possível observar, nos trabalhos de Putnam et al (1999) e Denny (2003)
apresentados anteriormente, que pesquisas com perguntas sobre participação política se
confundem com perguntas sobre associativismo, o que torna necessária uma distinção entre as
duas dimensões de capital social para a definição de indicadores convergentes com o conceito
preliminar de capital social adotado. Somente a partir dessa distinção será possível escolher a
67
dimensão de capital social considerada como mais importante na elaboração de um conceito
mais específico de capital social ao final da seção.
Putnam é o autor que define melhor o que ele considera como indicadores de capital
social, que será fundamental para este trabalho, uma vez que estes serão analisados de acordo
com a relação que estabelecem com o capital humano.
O autor realizou um minucioso trabalho, formulando os indicadores de capital social e
agrupando-os de acordo com sua natureza. O primeiro indicador que o autor define são
aqueles relacionados à participação política. Para Putnam, a participação política inclui, por
ordem de importância, indicadores como a participação através do voto, participação em
campanhas eleitorais, assinatura de abaixo-assinados, participação em piquetes, pois são
atividades desenvolvidas coletivamente.
A segunda forma de capital social é a participação cívica, ou engajamento cívico, que
inclui indicadores de participação em atividades voluntárias, ou seja, fazer parte de
associações voluntárias. As associações voluntárias para o autor subdividem-se em três
categorias: associações comunitárias, religiosas e trabalhistas. Dentro das associações
trabalhistas encontra-se a filiação a sindicatos que o autor classifica como um dos mais
expressivos indicadores de capital social por representarem um locus de solidariedade social,
um mecanismo de assistência mútua e competências compartilhadas. As associações
comunitárias e religiosas estão ligadas ao altruísmo, voluntariado e filantropia que
constituem-se em predicados fundamentais ao engajamento cívico. Ainda dentro do
associativismo, na classificação de participação em associações comunitárias, estão as
conexões sociais informais representadas por indicadores de freqüência de reuniões com os
amigos, seja para jantar, ver TV, jogar ou ainda fazer parte de um grupo de leitura, ou seja,
qualquer forma de envolvimento comunitário informal.
68
Por fim, a última forma de capital social manifesta-se através de indicadores de
confiança. A confiança é o pressuposto direto da reciprocidade generalizada, que para Putnam
aumenta a eficiência de uma sociedade. Um dos problemas observado no trabalho de Putnam
é a ligação direta que o autor faz entre associativismo e participação política, onde o
florescimento da atividade cívica, marcada pelo grau de associativismo, elevaria a
participação política (PUTNAM, 2000).
Neste trabalho, a independência entre associativismo e participação política é
importante porque a hipótese formulada é a de que determinadas formas de capital social não
estão necessariamente relacionadas com altos níveis de capital humano e a que será analisada,
através do estudo de caso, é o grau de associativismo. Com base no trabalho de Kerstenetzky
(2003), a separação entre estas duas formas de capital social será discutida a seguir com a
finalidade de formular um conceito específico de capital social que sirva de base para o estudo
de caso realizado no terceiro capítulo.
Kerstenetzky (2003) mostra que, em primeiro lugar, a participação política, mensurada
através do voto, como uma das variáveis que compõem uma maior ou menor quantidade de
capital social – de acordo com a definição de diversos autores apontados anteriormente, onde
Putnam ocupa posição de destaque – pode ser aplicada de forma equivocada, uma vez que a
não-votação não necessariamente significa apatia política e conseqüentemente falta de capital
social.
A ausência do voto pode, ao contrário, ser uma resposta negativa a um sistema político
típico de estruturas sociais muito desiguais sócio-economicamente. Como afirma a autora:
Na medida em que em uma economia de mercado, funções públicas como geração
de empregos, decisões de produção e de investimentos, fixação de preços,
crescimento e padrões de vida são “exercidas” privadamente por “homens de
negócios”, ocorreria uma contaminação natural da agenda política, estando as
políticas públicas significativamente limitadas pelos interesses das comunidades de
negócios (empresas privadas e poder corporativo). (KERSTENETZKY, 2003, p.5).
69
Assim as limitações impostas à participação sobre os segmentos mais desfavorecidos
da sociedade na esfera política, podem gerar um ajuste de suas preferências, fazendo com que
o conformismo e a apatia política anulem o interesse pelo exercício dessa forma de poder
(KERSTENETZKY, 2003).
Em segundo lugar, Kerstenetzky afirma que, diferentemente do que acredita Putnam e
seus seguidores, o associativismo não gera necessariamente participação política e essas duas
variáveis podem se apresentar de forma completamente distintas. As associações
contemporâneas não se constituem necessariamente em espaços que, através do
fortalecimento deliberativo e de decisão, estimulam sua atuação na esfera pública; ao
contrário, podem apresentar-se ou como locais voltados para a provisão de bens coletivos
específicos, onde a apatia política é produzida, ou em substituição à provisão pública, sem
interferir nas decisões políticas nacionais (KERSTENETZKY, 2003).
Assim, se participação política e associativismo são variáveis distintas, e constituem-
se em duas variáveis importantes na definição do quantum de capital social, sua relação com o
capital humano também pode se estabelecer de forma distinta. Em primeiro lugar, perguntas
referentes à mensuração do grau de participação política através do voto não são válidas como
indicador de capital social no Brasil, uma vez que o voto é obrigatório e sua ausência está
relacionada a sanções punitivas estabelecidas por lei. Em segundo lugar, pesquisas sobre
participação política que incluam perguntas sobre o nome de governantes, como é o caso da
pesquisa realizada pelo IBGE sobre Associativismo, Representação de Interesses e
Intermediação Política (suplemento da PME de 1996), estão muito mais relacionadas ao grau
de informação do respondente do que propriamente ao seu nível de capital social. Neste caso,
o peso da escolaridade realmente será muito maior.
Outro indicador classificado pelo IBGE como forma de participação política é o grau
de participação em atividades político-sociais, entre elas, as únicas que estão de acordo com a
70
definição de participação política de Putnam, são as manifestações de protesto e as greves. A
pesquisa mostra que a participação em greves apresenta uma tendência crescente na medida
em que se eleva o nível de escolaridade, o mesmo ocorrendo com a participação em
manifestações de protesto. Este resultado pode ser justificado através do mesmo argumento
utilizado para a ausência do voto, retirado do trabalho de Kerstenetzky (2003), onde a
submissão e alienação política de estratos sociais em desvantagem pode ser o resultado de [...]
um ajuste de desejos e identidades à sua impotência” (KERSTENETZKY, 2003, p.6) e não
necessariamente o resultado de falta de capital social.
Com relação ao indicador de capital social traduzido pelo grau de associativismo, de
acordo com a definição de Putnam (2000) apresentada acima, estão relacionados indicadores
de participação em associações comunitárias, religiosas e de trabalho, discriminadas conforme
a descrição do autor. Esse indicador encontra-se mais de acordo coma própria definição de
capital social, adotada nesse trabalho, que tem seu desenvolvimento condicionado ao
exercício de relações sociais. De acordo com o conceito abrangente de capital social
formulado, este tem como pré-requisito um “espírito de coletividade” que não pode ser criado
individualmente. As perguntas que dizem respeito à participação política, mencionadas nos
questionários aplicados nos trabalhos acima, têm um caráter mais individualista, não
necessitam da ação coletiva para que sejam realizadas. Já o associativismo está diretamente
relacionado à dimensão central do capital social, relacionado à capacidade de pensar e agir
coletivamente, de abrir mão de escolhas pessoais para beneficiar o grupo, a comunidade ou a
sociedade da qual se pertence.
Os trabalhos apresentados na seção 2.2, que atribuem uma maior quantidade de capital
social à elevações crescentes nos níveis de capital humano – o argumento do capital social
subordinado – mostram alguns resultados interessantes sobre o associativismo e sua relação
com a escolaridade.
71
O trabalho de Putnam e Helliwell (1999), ao avaliar a intervenção da escolaridade no
grau de associativismo através da base de dados DDB, encontra (a cada ano adicional de
escolaridade), aproximadamente, metade da correlação positiva que existe entre escolaridade
e grau de confiança dos indivíduos (2,4% contra 4,4% respectivamente). Além disso, os
resultados para escolaridade média são de correlação quase negativa, de acordo com os
valores apresentados (- 0,24% a cada ano adicional) na DDB e quase todos negativos para os
diferentes tipos de associações consideradas pela GSS. Da mesma forma, os resultados
encontrados por Dee (2003), tanto no modelo da base de dados HS&B quanto no da GSS,
sugerem que a admissão na universidade tem poucos e, quando existentes, imprecisos efeitos
estimados sobre o grau de associativismo. Portanto, esses trabalhos deixam algumas lacunas e
levantam questionamentos sobre a relação entre capital humano e o grau de associativismo
dos indivíduos de uma sociedade ou comunidade.
No caso do Brasil, de acordo com Avritzer (2005), até o início de seu processo de
democratização, havia uma baixa propensão associativa, marcada pela [...] “forma vertical de
organização e fruto de um processo de colonização, que constituiu uma esfera pública fraca e
ampliadora da desigualdade social gerada pela esfera privada” (Avritzer, 2005: p. 2). A
partir do processo de democratização, o panorama associativo muda nas grandes cidades
brasileiras, surgindo três tipos de associações: (1) as associações religiosas, modificando a
forma de atuação da Igreja Católica no Brasil; (2) as associações de classe média, conhecidas
como ONG’s a partir dos anos de 1990, concentradas nas áreas de direitos humanos, meio
ambiente, criança e adolescente; e (3) associações populares concentradas nas áreas de
associativismo comunitário, saúde e educação (AVRITZER, 2005). O associativismo no
Brasil possui, portanto, peculiaridades que podem interferir na sua forma de se relacionar com
o capital humano.
72
Assim, de acordo com as lacunas e questões acima levantadas nos trabalhos
apresentados e com as diferentes características do surgimento do associativismo no Brasil em
relação aos demais países, pode haver uma independência entre capital humano e capital
social, principalmente, ao olhar para o associativismo como dimensão central do capital
social.
Portanto na tentativa de adotar um conceito específico de capital social, o
associativismo constitui a dimensão central do capital social, uma vez que atua na direção do
que Maciel et al (2002) defendem, onde o conhecimento tácito só é possível de ser acumulado
através da interação dos atores envolvidos, fazendo emergir os laços de interesses coletivos
que poderão ser dirigidos para um esforço de desenvolvimento local.
Com o intuito de verificar mais profundamente a relação entre o associativismo
brasileiro e o capital humano, o terceiro capítulo tratará da análise de um estudo de caso com
os membros dos Conselhos Municipais de Macaé e Resende, analisando com mais
detalhamento se há a subordinação dessa dimensão, considerada como central, do capital
social a estratos mais elevados de capital humano.
Conclusão
O presente capítulo é importante porque, após a análise do debate sobre a relação entre
capital social e capital humano na literatura brasileira e internacional, foi possível elaborar um
conceito específico de capital social que sustente a hipótese levantada de que tal relação pode
não haver necessariamente.
A primeira seção apresenta os trabalhos da literatura brasileira que seguem uma linha
de pensamento paralela à do capital humano, analisando a importância do capital social e que,
73
apesar de não constituir um debate, realizam considerações importantes sobre sua relação com
capital humano.
A segunda seção mostra o debate internacional acerca do tema, por meio da separação
dos trabalhos selecionados em dois argumentos que mostram a existência ou não de uma
subordinação do capital social em relação ao capital humano: o argumento contra-capital
social e o argumento pró-capital social respectivamente.
E, por fim, a terceira seção determina a importância da distinção entre participação
política e associativismo, para distinguir a dimensão de capital social que será considerada
mais importante na elaboração de um conceito específico de capital social, que sirva de base
para a definição dos indicadores que serão utilizados no trabalho de campo, capazes de avaliar
a relação entre capital humano e capital social.
74
3 – A ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL SOCIAL E O CAPITAL
HUMANO ENTRE OS MEMBROS DOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE MACAÉ E
RESENDE
Este capítulo trata de um estudo de caso realizado em dois municípios do estado do
Rio de Janeiro, Macaé e Resende, com o objetivo de verificar se há necessariamente uma
relação de dependência entre capital social e estratos mais elevados de capital humano. A
pesquisa de campo foi realizada em alguns Conselhos Municipais Setoriais dos respectivos
municípios.
Na primeira seção será feito um breve resumo sobre o histórico da formação dos
Conselhos Municipais no Brasil, bem como suas funções e forma de atuação. Na segunda
seção, será justificada a escolha dos conselhos municipais como local de investigação da
pesquisa e descrita a metodologia utilizada para a realização do trabalho de campo. Na
terceira seção será feita uma análise descritiva dos resultados encontrados no trabalho de
campo para, ao final, relatar a existência ou não de uma divergência entre capital social, via
associativismo, e capital humano, via educação, no interior dos conselhos pesquisados.
3.1 – O Surgimento dos Conselhos Municipais
Os conselhos municipais estão intimamente relacionados às políticas públicas e são
resultados da mobilização social e dos debates públicos que precederam a formulação da
Constituição brasileira de 1988. De acordo com Cunha (2005?), a possibilidade de apresentar
sugestões e realizar audiências públicas mobilizou movimentos sociais, organizações sindicais
75
e profissionais, militantes políticos, dentre outros representantes de organizações da sociedade
civil e representantes do Estado para a constituição de fóruns, plenários, encontros temáticos
específicos (como os da saúde, da área da criança e do adolescente, da assistência social), de
modo a discutir as propostas a serem defendidas nas audiências. Nesses espaços foram
discutidos temas que deram a oportunidade às minorias e segmentos excluídos socialmente de
tematizar questões de gênero, raça, qualidade de vida, entre outras, envolvendo diversos
grupos de interesses, transformando algumas de suas demandas em direitos (CUNHA, 2005?).
Dentro dessa conjuntura excepcionalmente favorável à participação popular ocorreram
importantes mudanças institucionais no nível local, que originou a criação de Conselhos nas
três esferas governamentais. Os conselhos setoriais são mecanismos criados no interior do
Poder Executivo para a participação da sociedade civil, onde os conselheiros têm o papel de
deliberar, junto ao poder público, sobre as políticas referentes às respectivas áreas em que os
conselhos atuam na tentativa de exercer o controle direto e fiscalizar as ações do governo
(AVRITZER, 2004?).
Um dos primeiros conselhos a serem instituídos de forma legal pela esfera federal foi
o Conselho de Saúde. A partir da década de 1990, com a descentralização das políticas de
saúde, surge um novo modelo de gestão que passou a incluir órgãos colegiados no interior do
Poder Executivo – os Conselhos – nas três esferas de governo. Instituídos pela lei que criou o
Sistema único de Saúde – SUS, estes Conselhos foram dotados de poder deliberativo em
algumas questões de saúde com representação paritária de usuários (por exemplo, portadores
de HIV, associação de moradores, representantes de igrejas, etc.), prestadores de serviços de
saúde (médicos de várias especialidades) e governo. Além disso, sua criação é condição
necessária para o repasse de recursos de outras esferas do governo. (IBGE, 2001)
76
A criação dos Conselhos de Assistência Social vem responder a disposições legais
neste setor de governo, no âmbito federal, como a instituição da Lei Orgânica da Assistência
Social – LOAS, em 1993. Constituem-se em conselhos obrigatoriamente paritários, com
representação da sociedade civil (ONG’s, associação de moradores, entidades filantrópicas,
etc.) e do governo; e contam também com o repasse de verbas vinculados à sua existência. O
Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente foram criados a partir da promulgação da
Lei nº 8.096 de 13 de julho de 1990, nas três esferas de governo. Possuem caráter deliberativo
e paritário, com representação do segmento governamental e da sociedade civil. A
obrigatoriedade de sua existência está também vinculada ao repasse de verbas de Fundos
Especiais das três esferas de governo. Da mesma forma os Conselhos de Trabalho / Emprego
são criados como condição para os municípios receberem recursos para os programas
financiados pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT. Devem ser paritários e tripartites,
com representantes dos trabalhadores, empregadores e governo (IBGE, 2001).
Já a instituição de Conselhos de Educação no âmbito municipal passou a ser
incentivada pela possibilidade que a Constituição Federal de 1998 criou de permitir que cada
município possua um sistema de ensino próprio, mas não há nenhuma lei que os tornem
obrigatórios. Contudo, programas específicos voltados para o setor de ensino, como o Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério –
FUNDEF – e o programa de Merenda /Alimentação Escolar, exigem a sua formação para o
repasse de recursos. Além disso, são conselhos que podem ou não ser paritários, com
representação do governo, de profissionais da área e, em alguns casos, com representação de
usuários (como pais e alunos).
Por fim, a sedimentação dos Conselhos obrigatórios nos municípios abriu espaço para
a demanda de novos conselhos, geralmente ligados à defesa de direitos de grupos específicos,
77
como é o caso do Conselho de Idosos, instituído por lei municipal com paridade não
obrigatória entre representantes do segmento governamental e da sociedade civil, no caso de
Macaé. Também abriu espaço para a criação de conselhos voltados unicamente ao controle
social referente a determinados problemas específicos, como é o caso do Conselho Municipal
Antidrogas que, no caso específico do município de Macaé, também não exige paridade na
sua composição.
Os conselhos funcionam com mandatos de todos os seus membros, inclusive do
presidente, de 4 anos. Em geral os mandatos dos conselheiros e presidente coincidem com as
eleições municipais, exceto nos casos em que esteja discriminada, no regimento interno do
conselho, a obrigatoriedade da realização de eleição em anos diferentes. As pré-conferências
ou plenárias são eventos realizados a fim de promover a eleição dos novos membros dos
conselhos nos diferentes segmentos (corpo técnico, usuários e governo), divulgadas por
jornais e boletins locais. Desta pré-conferência podem participar quaisquer cidadãos
moradores do município, com direito a se candidatar e votar na eleição dos conselheiros. Os
segmentos que representam os profissionais de saúde e o setor governamental também são
convidados a participar dessas pré-conferências, fazendo parte da eleição.
Cada segmento social realiza a eleição de seus membros separadamente. Assim, por
exemplo, os profissionais de saúde (no caso do Conselho de Saúde) elegem seus
representantes no conselho, os usuários idem, etc. Após a realização da eleição e posse dos
novos conselheiros, ocorre a eleição do novo presidente do conselho e a aprovação do
regimento interno realizada através de uma conferência. O presidente, portanto, é eleito por
todos os membros do conselho independente do segmento que representa, com exceção do
Conselho de Educação que teve estabelecido por lei estadual que o presidente passa a ser o
Secretário Municipal de Educação com um mandato de 4 anos. O mandato do presidente dos
78
conselhos, em geral é de 1 ano, podendo ser reeleito por mais um ano no caso de alguns
conselhos. Em geral, a cada ano deve ser eleito como presidente um representante de cada
segmento, que pode ser candidato único se houver um consenso previamente discutido ou
podem concorrer mais de um candidato de cada segmento.
Cada conselho setorial possui também Comissões Municipais, formada por um
número de conselheiros, independente do segmento que representem, para exercer
determinadas atividades como fiscalização, orçamento, planejamento, etc, dependendo do
conselho.
3.2 – Hipótese e Metodologia de Trabalho: A relação entre capital social e capital
humano através da pesquisa nos Conselhos Municipais.
Os Conselhos Municipais constituem-se em uma forma de associação heterogênea,
onde há uma representação de diversos segmentos sociais, com diferentes tipos de atuação e
diferentes pontos de vista no que diz respeito à participação política. A escolha dessas
instituições como local de investigação da pesquisa centra-se na permanência e na
obrigatoriedade de sua existência como um dos principais mecanismos de intermediação de
interesses à disposição da sociedade.
A preocupação com a escolha de uma forma de associação heterogênea vai de
encontro com a hipótese central do trabalho, onde será verificada a relação que se estabelece
entre o capital humano e o capital social dos membros dos Conselhos. A heterogeneidade dos
Conselhos garante, assim, a heterogeneidade dos diferentes níveis de escolaridade presentes
nessa organização de caráter associativo. Outras formas de atividades associativas, como
cooperativas de trabalho, associações de moradores e sindicatos, possuem um viés de
79
escolaridade mais alto ou mais baixo, de acordo com seu objetivo de formação. Assim, por
exemplo, associações de moradores, bem como cooperativas de trabalho, reúnem grupos com
características sócio-econômicas mais parecidas, podendo produzir um resultado enviesado à
análise.
A escolha dos Conselhos Municipais como o local de investigação da pesquisa
também está de acordo com o conceito preliminar de capital social adotado no presente
trabalho, onde a criação de capital social pode ocorrer via indução do Estado, através da
implementação de políticas públicas que atuem diretamente sobre a produção desse ativo. No
caso dos Conselhos Municipais, o associativismo está diretamente relacionado à dimensão
considerada central dentro do conceito específico de capital social definido, ou seja, está
relacionado à capacidade de pensar e agir coletivamente, de abrir mão de escolhas pessoais
em benefício de um grupo, uma comunidade ou uma sociedade.
Dentro dessa perspectiva em que o associativismo ganha destaque, a escolha dos
indicadores de capital social utilizados na pesquisa foi baseada no trabalho de Denny (2003),
que prioriza não só indicadores tradicionais de associativismo em sua análise, como a
participação em associações de classe, mas também insere indicadores que mensurem a
qualidade da associação dos indivíduos, como a freqüência às atividades associativas. Assim
foram inseridos cinco indicadores de capital social na pesquisa: (1) participação nos
conselhos; (2) participação em outras organizações de caráter associativo; (3) freqüência às
reuniões dos conselhos; (4) tempo de participação nos conselhos; e (5) motivo para participar
dos conselhos municipais.
No estudo de caso, primeiramente, será analisado o perfil sócio-econômico dos
membros dos conselhos, com o objetivo de apresentar suas principais características de
acordo com cada município pesquisado. No segundo momento, serão analisados os resultados
80
dos cruzamentos das variáveis sócio-econômicas com a escolaridade dos membros dos
conselhos com o objetivo de observar o comportamento destas variáveis de acordo com a
escolaridade. Os dois primeiros momentos constituem-se em uma análise descritiva,
compondo um quadro geral do perfil dos conselheiros. Além disso, apresentará o resultado do
primeiro indicador de capital social, participação nos conselhos municipais, relacionado ao
capital humano dos entrevistados.
No terceiro e último momento, serão analisados o comportamento dos indicadores de
capital social selecionados na pesquisa de acordo com a escolaridade dos membros dos
conselhos. Nesta parte do trabalho, o objetivo será verificar se a dimensão do capital social
“grau de associativismo” está ou não relacionada com o nível de escolaridade de seus
membros. Esta constituirá a parte central do trabalho, onde será testada a hipótese de o capital
social, presente entre os membros dos conselhos, concentrar-se ou não nos estratos mais
elevados de escolaridade. De acordo com os resultados, essa relação causal e crescente entre
capital humano e capital social poderá não existir para algumas de suas dimensões, como no
caso do associativismo. Para tal, foram selecionados dois municípios do Estado do Rio de
Janeiro, através da metodologia que será descrita a seguir.
Em primeiro lugar foi realizada uma análise comparativa dos 97 municípios do Estado
do Rio de Janeiro de características como PIB, população, taxa de crescimento populacional,
índice de qualidade municipal (IQM), taxa de analfabetismo e outros dados sobre
escolaridade, retirados do Anuário Estatístico do Rio de Janeiro 2002 e do Censo
Demográfico do IBGE 2000, buscando agrupar os municípios com características sócio-
econômicas semelhantes. A partir de então, foram utilizados os dados da Pesquisa de
Informações Básicas Municipais – Gestão Pública 2001 (MUNIC) do IBGE, a fim de retirar
as informações referentes aos Conselhos municipais e a sua estrutura básica. A MUNIC
81
contém informações básicas sobre os Conselhos Municipais de todo o Brasil no que tange à
sua estrutura organizacional, proporcionando um amplo quadro da institucionalidade dos
Conselhos nas gestões locais em todo o país. A MUNIC referente ao ano de 2001 investigou
em todos os municípios brasileiros a existência de Conselhos Municipais em 13 áreas ou
setores de governo que são: Saúde, Educação, Assistência Social, Direitos da Criança e do
Adolescente, Emprego/Trabalho, Turismo, Cultura, Habitação, Meio Ambiente, Transportes,
Política Urbana, Promoção do Desenvolvimento Econômico e Orçamento. Esta pesquisa
também apresentou um quesito que informa sobre a existência de outros Conselhos que não
os anteriormente citados (MUNIC, 2001).
As variáveis encontradas na MUNIC para cada município foram: existência ou não
dos conselhos setoriais de acordo com o que rege a lei, número de conselhos, periodicidade
das reuniões, paridade ou não de cada Conselho, existência de comissões dentro de cada
conselho, existência ou não de outros conselhos (além dos já perguntados) e existência ou não
de Fundo Municipal – verba retirada do orçamento municipal destinada a cada conselho
setorial. Todas as variáveis são binárias, ou seja, com respostas sim ou não, com exceção das
questões número de conselhos e freqüência das reuniões no respectivo ano da pesquisa que
estavam classificadas como: quinzenal, mensal, bimestral/trimestral, semestral e irregular.
Após a análise dessa base de dados, as questões que definiram os critérios de seleção
dos municípios foram o número de conselhos existentes em cada município e a freqüência das
reuniões, onde às alternativas – quinzenal, mensal, bimestral/trimestral, semestral, irregular e
não se aplica – foram atribuídos valores decrescentes e classificados os municípios de acordo
com a análise comparativa tanto das características sócio-econômicas de cada município
como da classificação obtida com o cruzamento das informações dos dados da Pesquisa
MUNIC 2001. Os critérios de seleção dos municípios a serem investigados basearam-se na
82
escolha de municípios com características sócio-econômicas semelhantes, mas com
características em relação à estrutura de conselhos municipais as mais opostas possíveis. A
seleção de dois municípios – mantendo constantes as variáveis sócio-econômicas – com perfis
opostos em relação aos conselhos teve como objetivo evitar um resultado muito tendencioso,
no que diz respeito ao seu histórico de existência, permitindo a confiabilidade da amostra
coletada.
Os dados utilizados para a escolha dos municípios mostram que Macaé e Resende
possuem uma estrutura sócio-econômica muito parecida, mas que apresentam classificações
quanto aos conselhos municipais bem divergentes. Foi escolhido, portanto, Macaé por ser o
município com a menor pontuação feita através da MUNIC, ou seja, por apresentar a pior
infra-estrutura de conselhos entre os municípios que se situavam dentro de uma mesma faixa
sócio-econômica; e Resende por ser o município com a maior pontuação feita através da
MUNIC, ou seja, por apresentar a melhor infra-estrutura de conselhos entre os municípios
dentro dessa mesma faixa.
A partir dos municípios selecionados, seria importante selecionar os mesmos
conselhos setoriais a serem entrevistados, novamente evitando um resultado muito enviesado.
Os conselhos selecionados, então, foram balizados pelo município de Macaé, por apresentar
um menor número de conselhos. Participaram da pesquisa os conselhos municipais de saúde,
de educação, de assistência social, de trabalho e de direitos da criança e do adolescente. No
município de Macaé, houve um problema com os Conselhos de Assistência Social e de
Direitos da Criança e do Adolescente, levando a uma mudança obrigatória nos Conselhos a
serem pesquisados com a preocupação de não prejudicar a confiabilidade dos resultados. No
caso do Conselho Municipal de Assistência Social de Macaé, a gestão acabava de ser
totalmente modificada, mudando inclusive o quadro de conselheiros, que não tinham qualquer
83
experiência no Conselho. Isto impediu que a pesquisa fosse realizada nesse conselho, uma vez
que não havia informações suficientes sobre o mesmo, tanto por parte da presidência do
conselho, quanto por parte de seus demais conselheiros, apesar de ter havido uma boa
receptividade por parte de seu presidente. Em substituição a esse conselho foi escolhido o
Conselho Municipal do Idoso, por ser um dos conselhos que está vinculado à Secretaria de
Promoção Social, ou seja, o mesmo órgão ao qual está vinculado o Conselho de Assistência
Social.
Já no caso do Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente de Macaé
houve uma hostilidade muito grande por parte da presidência do conselho, que se recusou a
fornecer informações importantes (e de caráter público estabelecidas por lei), cuja ausência
comprometeria o bom resultado da pesquisa. Assim, em substituição ao Conselho de Direitos
da Criança e Adolescente, foi escolhido o Conselho Municipal Anti-Drogas que tem relação
direta com o primeiro, uma vez que trata de assuntos correlatos e que possui um quadro de
conselheiros que em muitos casos encontra-se nos dois conselhos.
Foram elaborados três tipos de questionários que se encontram anexados ao trabalho.
O primeiro serviu como base para a análise da estrutura municipal em termos de associações
de classe, onde foram elaboradas perguntas sobre quaisquer tipos de associações,
institucionalizadas ou não, de conhecimento da Prefeitura, desde movimentos sociais, número
de igrejas, até associações que representem os interesses empresariais. Este questionário foi
aplicado nas sedes das Prefeituras nas visitas realizadas aos municípios com o objetivo de
levantar o histórico de formação associativa dos dois municípios (APÊNDICE A).
No segundo questionário, constaram perguntas sobre o funcionamento de cada
conselho em termos de infra-estrutura organizacional e de grau de participação democrática
efetiva. Este questionário foi respondido, em geral, pelo Presidente do Conselho ou pelo
84
secretário direto que representa o Conselho nas visitas realizadas a cada município
(APÊNDICE B).
O terceiro e último questionário foi individual voltado para todos os membros de cada
conselho e para qualquer participante, mesmo sem direito a voto. As perguntas procuravam
captar tanto o perfil sócio-econômico do conselheiro, principalmente no que diz respeito à
escolaridade e à sua experiência na vida associativa, bem como sua opinião sobre o
funcionamento do conselho (APÊNDICE C). Os questionários foram aplicados nas reuniões
dos conselhos, quando possível, ou por contato telefônico ou via e-mail. A amostra totalizou
121 questionários respondidos, dos quais 60 foram aplicados no município de Macaé e 61 no
município de Resende.
Os questionários 1 e 2 servirão de base para uma análise mais detalhada de um
resultado que possa vir a se destacar no questionário 3 sobre um dos municípios ou conselho
específico, caso seja necessário. Portanto, o questionário três é o mais importante e o que será
analisado com maior profundidade na seção seguinte, onde serão mostrados os resultados
pertinentes à verificação da hipótese levantada.
3.3 – Impressões gerais do trabalho de campo nos Conselhos Municipais de Resende e
Macaé
Foram observadas diferenças entre os conselhos analisados na sua forma de
funcionamento em termos de infra-estrutura – como número de funcionários, existência de
uma sede própria, etc. – e na distribuição de seus membros entre os três tipos de segmentos
existentes: governo, técnicos e sociedade civil ou usuários (dependendo do tipo de conselho
como foi descrito anteriormente). Essas diferenças ocorreram pouco entre os conselhos
85
municipais de municípios diferentes, mas se mostraram muito mais fortes e pertinentes entre
os diferentes tipos de conselhos dentro de um mesmo município. Isto significa que o fato de
Resende ter apresentado um perfil que tenderia a apresentar um maior histórico de
participação nos conselhos, dado que o número de conselhos de Resende em 2001 era um dos
mais elevados do Estado do Rio de Janeiro, com cerca de 12 conselhos municipais, não foi
verificado. Assim como também não foi verificado que Macaé, por possuir apenas 5
conselhos à época da pesquisa MUNIC, apresenta um cenário de participação inferior. Além
disso, o número de conselhos municipais presentes no município de Macaé hoje, iguala-se ao
número de conselhos presente no município que Resende apresentava à época da pesquisa e
apresenta até hoje.
Quanto ao perfil mais geral de propensão associativa observado nos municípios, os
dados do questionário 1, apresentados na tabela 1 abaixo, mostram que as associações de
classe reconhecidas pela prefeitura de cada município se fazem mais presentes em Resende do
que em Macaé.
Tabela 1: Associações de Classe reconhecidas pela Prefeitura
ASSOCIAÇÕES DE CLASSE MACAÉ RESENDE
Sindicatos
12 6
ONG’s e Entidades Filantrópicas
9 9
Movimentos Sociais
5 3
Associações de Moradores
80 55
Associações Comerciais
2 3
Igrejas
40 63
TOTAL
148 139
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
Em geral, pôde ser verificado que os dois municípios não apresentaram muitas
divergências na forma de atuação de seus conselhos. Foi possível observar, contudo, que
86
dentro dos dois municípios há conselhos que funcionam de forma completamente diferentes.
A paridade não foi observada em todos os conselhos, mesmo para aqueles em que ela é
exigida por lei. O segmento não-governamental de alguns conselhos é representado em sua
maioria por integrantes de ONG’s que muitas vezes não vivenciam a realidade social da
sociedade civil de fato e apresentam maiores níveis educacionais. A tabela a seguir separa os
diferentes segmentos sociais para mostrar com maior clareza como se dividem os conselhos
municipais em termos de participação.
Tabela 2: Número de representantes por segmento social em cada Conselho Municipal
SEGMENTOS
CONSELHOS
MUNICIPAIS
GOVERNAMENTAL TÉCNICO
ONG’s OU
ENTIDADES
FILANTRÓPICAS
USUÁRIOS
Conselho de Saúde de
Resende
3 6 3 12
CMDCA de Resende* 6 0 5 1
COMAS de Resende* 7 0 7 0
Conselho do Trabalho de
Resende**
4 5 Não se aplica 5
Conselho de Educação de
Resende
6 5 0 0
Conselho de Saúde de
Macaé
5 8 4 8
Conselho Antidrogas de
Macaé
6 6 0 2
Conselho de Idosos de
Macaé
8 1 1 4
Conselho do Trabalho de
Macaé**
4 4 Não se aplica 4
Conselho de Educação de
Macaé
10 4 2 3
TOTAL 59 39 22 39
* CMDCA - Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e COMAS – Conselho de Assistência Social
** No Conselho do Trabalho substituir Técnico por Empregador e Usuários por Empregado
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
87
Alguns têm mais participação popular, como é o caso dos Conselhos de Saúde e do
Trabalho nos dois municípios, onde o segmento do usuário é mais bem representado e tem um
espaço maior de discussão. Apesar de todos os conselhos responderem que as reuniões são
abertas ao público, foi possível notar que não há uma boa divulgação – salvo à exceção do
Conselho de Saúde de Resende – e nem espaço físico para que as reuniões comportem
pessoas de fora.
Os Conselhos de Educação e de Assistência Social de Resende foram os que
apresentaram uma participação do segmento usuários nula, sendo os representantes do
segmento não governamental membros de ONG’s, não havendo representantes de pais e
alunos ou representantes de associação de moradores, por exemplo, nesse segmento.
Em termos de metodologia de aplicação dos questionários, mostrou-se mais eficiente o
tipo de aplicação por email e por telefone, uma vez que, com a posse do cadastro dos
representantes dos conselhos, ficou mais fácil distribuir a amostra de forma mais homogênea
entre os diferentes segmentos representados. Além disso, os entrevistados se sentiram mais à
vontade em responder às perguntas com mais sinceridade, já que nas reuniões os
representantes se sentiam mais cerceados pelos demais colegas e, em geral, pelos presidentes
dos conselhos em responder às perguntas. O único entrave encontrado nas entrevistas por
telefone e email foi a falta de acessibilidade do segmento governamental da maioria dos
diversos conselhos municipais entrevistados.
Os problemas levantados acima dizem respeito ao funcionamento dos conselhos
municipais e podem interferir apenas indiretamente na análise, sem comprometer a
“confiabilidade” dos resultados uma vez que o foco do presente trabalho encontra-se na
análise do comportamento associativo dos membros dos conselhos municipais e não está
relacionado ao grau de eficiência dos conselhos.
88
3.4 – Resultados Gerais
Como resultados gerais oriundos da análise do perfil sócio-econômico e de
informações básicas sobre a participação dos entrevistados nos conselhos municipais dos dois
municípios pesquisados (retirados do questionário 3), pode-se observar questões relevantes de
acordo com as tabelas abaixo. É importante destacar que nesta seção aparece o primeiro
indicador de capital social relacionado à escolaridade, que mensura o percentual de membros
dos conselhos entrevistados de acordo com a escolaridade.
Tabela 3: Percentual dos entrevistados por sexo em cada município e no total da amostra
MUNICÍPIO
SEXO
Macaé Resende
TOTAL
Homens 35,0% 49,2% 42,1%
Mulheres 65,0% 50,8% 57,9%
TOTAL 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
É possível notar que a maioria dos conselheiros em geral é composta por mulheres,
totalizando um percentual de 57,9% da amostra. Esse resultado é sobre-representado no
município de Macaé, já que a diferença entre a participação de homens e mulheres nos
conselhos de Resende não é significativa. É interessante notar que em Macaé a participação
feminina nos conselhos é quase o dobro da masculina, o que não coincide com os dados
demográficos populacionais, onde as mulheres representam 50,71% da população e os
homens 49,29%, segundo o Anuário Estatístico do Rio de Janeiro de 2002. Isto pode indicar
um maior interesse nessa atividade cívica pelas mulheres em Macaé, já que a representação
dos diversos segmentos nos conselhos é voluntária.
89
Tabela 4: Percentual de idade dos entrevistados distribuídos por faixa etária por município e no total da
amostra
MUNICÍPIO
IDADE
Macaé Resende
TOTAL
22 – 31 anos 5,0 4,9 5,0
32 – 41 anos 20,0 23,0 21,5
42 – 51 anos 46,7 39,3 43,0
52 – 61 anos 13,5 27,9 20,7
Mais de 61 anos 14,8 4,9 9,8
Total 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
No quesito idade, a maioria dos conselheiros situa-se na idade entre 42 e 51 anos tanto
no município de Macaé como no de Resende. Comparada à população geral de cada
município, segundo dados do Anuário Estatístico do Rio de Janeiro, essa faixa etária
compreende cerca de 14% do total. As pirâmides etárias dos dois municípios são muito
parecidas e concentram a maior parte de sua população em sua base, com um percentual de
jovens mais elevado. Os dados do Anuário Estatístico do Estado do Rio de Janeiro mostram
que em 2002 cerca de 36% da população dos respectivos municípios situava-se na faixa de 15
a 34 anos, o que sugere uma baixa participação da população jovem nos conselhos municipais
pesquisados.
Tabela 5: Percentual de escolaridade dos conselheiros por município e no total da amostra
MUNICÍPIO
ESCOLARIDADE
Macaé Resende
TOTAL
grau 15,0 11,5 13,2
grau 33,3 29,5 31,4
grau 51,7 59,0 55,4
Total 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
90
O item sobre escolaridade mostra que a escolaridade predominante entre os
conselheiros nos dois municípios é o terceiro grau completo, com um total geral de 55,4% da
amostra. Esse é um resultado que informa sobre o grau de participação nos conselhos
municipais de acordo com o nível de escolaridade, constituindo-se em um indicador de capital
social tradicional na literatura apresentada que investiga a relação entre capital humano e
social dos indivíduos. Olhando para esse resultado, pode-se concordar com a hipótese do
argumento do capital social subordinado, onde o nível de capital social e capital humano estão
positivamente correlacionados. Porém, esse resultado também pode estar relacionado ao fato
de que boa parte dos entrevistados era formada por conselheiros que representavam o
segmento governamental ou, quando houvesse, o segmento técnico formado por profissionais
da área, uma vez que a paridade, principalmente com relação à representação do segmento de
usuários, não foi observada em quase nenhum conselho, mesmo naqueles especificados por
lei
2
. Portanto, o grau de especialização desses dois segmentos tende a exigir um nível de
escolaridade mais elevado, o que gera um viés no resultado. Além disso, o segmento não
governamental representado por ONG’s ou entidades filantrópicas, apesar de classificados
como sociedade civil, não vivenciam a realidade sócio-econômica da população,
principalmente no que diz respeito ao nível de escolaridade. Mas serão feitas algumas
considerações mais à frente que irão permitir verificar com maior detalhamento e precisão
esta questão, para que se possa fazer alguma afirmação a esse respeito.
2. A pergunta sobre o segmento governamental ao qual pertenciam os membros dos conselhos municipais não
foi realizada, mas não compromete os resultados da pesquisa, pois seu foco é sobre os membros dos conselhos,
mais especificamente na relação existente entre seu capital social e humano, e não no funcionamento dos
conselhos municipais.
91
Tabela 6: Percentual da renda familiar dos conselheiros por município e no total da amostra
MUNICÍPIO
RENDA
FAMILIAR
Macaé Resende
TOTAL
Até 2 sm 0,0 6,6 3,3
De 2 a 4 sm 20,0 24,6 22,3
De 4 a 8 sm 40,0 18,0 28,9
De 8 a 12 sm 23,3 19,7 21,5
Acima de 12 sm 16,7 31,1 24,0
Total 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
Em relação à renda familiar dos conselheiros, pode-se observar resultados diferentes
quando se comparam os municípios. Em Macaé, a renda familiar predominante está na faixa
de 4 a 8 salários mínimos. Já em Resende, a renda familiar predominante encontra-se na faixa
acima de 12 salários mínimos. No total da amostra, o resultado encontra-se bem distribuído
entre as faixas de renda, com exceção da faixa até 2 salários mínimos que apresenta um
percentual pouco significativo. Esta divergência de resultados pode estar relacionada ao tipo
de ocupação predominante entre os conselheiros, que, de acordo com a tabela 7 abaixo,
mostra um quadro onde 50,8% dos entrevistados em Resende eram funcionários públicos
contra 28,3% dos entrevistados em Macaé.
Tabela 7: Percentual de ocupação dos conselheiros por município e no total da amostra
MUNICÍPIO
OCUPAÇÃO
Macaé Resende
TOTAL
Empregado 28,3 27,9 28,1
Empregador 10,0 8,2 9,1
Autônomo 15,0 8,2 11,6
Desempregado 0,0 1,6 0,8
Dona de Casa 6,7 3,3 5,0
Funcionário Público 28,3 50,8 39,6
Aposentado 11,7 0,0 5,8
Total 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
92
A análise da variável ocupação também permite fazer outras considerações sobre seus
resultados. O percentual relativamente parecido de empregadores para dois municípios pode
estar relacionado ao fato de o Conselho do Trabalho possuir uma estrutura paritária tripartite,
onde a participação do segmento de empregadores é obrigatória. O percentual divergente de
aposentados para os dois municípios pode ser conseqüência da substituição inesperada do
Conselho de Assistência Social para o Conselho do Idoso como local de entrevista, no caso de
Macaé.
Tabela 8: Percentual de participação em Organizações de Caráter Associativo por município e no total da
amostra
MUNICÍPIO
ORGANIZAÇÕES DE
CARÁTER ASSOCIATIVO
Macaé Resende
TOTAL
Associação de Moradores
23,3 14,8 19,3
Conselhos Populares
30,0 27,9 28,9
Sindicatos
46,7 29,5 38,0
ONG’s
36,7 16,4 26,4
Partidos Políticos
25,0 31,1 28,1
Organizações Religiosas
45,0 27,9 36,4
Entidades Filantrópicas
18,3 18,0 18,2
Movimento Estudantil
1,7 8,2 5,0
Clube Esportivo
8,3 13,1 10,7
Cooperativa
15,0 8,2 11,6
Outras
6,7 9,8 8,3
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
A tabela 8, referente ao percentual de participação em organizações de caráter
associativo, aponta um perfil associativo diferente entre os conselheiros de cada município.
Em Macaé, o maior percentual de filiação está nos sindicatos, com 46,7%, tendo logo atrás a
filiação à organizações religiosas, com 45%. Já em Resende há uma distribuição mais
uniforme entre os diferentes tipos de associações, ficando em primeiro lugar a associação a
partidos políticos, com 31,1%, seguido da associação a sindicatos, com 29,5% e a associação
93
a conselhos populares e organizações religiosas com 27,9% do total de conselheiros do
município. Esta maior filiação a partidos políticos em Resende, que em Macaé ficou em 25%,
também pode indicar um percentual considerável de entrevistados que representam o
segmento governamental. No item “Outras” estão incluídas as associações comerciais, de
segmentos sociais (mulheres, idosos) e projetos comunitários, mas não foram separados por
representarem uma parcela não significativa da amostra.
3.5 – A escolaridade em relação às variáveis sócio-econômicas
Nesta parte do trabalho a amostra foi homogeneizada, ou seja, os resultados dos dois
municípios foram unificados. Serão apresentados os resultados do cruzamento das variáveis
independentes (sexo, idade, renda, etc.) com a escolaridade, com o objetivo de realizar uma
análise descritiva dos membros entrevistados de forma mais aprofundada. Assim, a seguir
será avaliado o perfil sócio-econômico dos conselheiros entrevistados de acordo com os três
tipos de escolaridade definidas (1º grau, 2º grau e 3º grau completos).
Tabela 9: Percentual da Escolaridade x Sexo dos conselheiros
ESCOLARIDADE
SEXO
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Homem 50,0 55,3 32,8 42,1
Mulher 50,0 44,7 67,2 57,9
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
94
A escolaridade medida por sexo mostra que, além da maior participação feminina nos
conselhos, conforme visto na tabela 4, a escolaridade das mulheres é superior à dos homens,
chegando a alcançar mais que o dobro do percentual no caso do terceiro grau completo.
Tabela 10: Percentual do Sexo x Escolaridade dos conselheiros
ESCOLARIDADE HOMEM MULHER
1º grau 15,7 11,4
2º grau 41,2 24,3
3º grau 43,1 64,3
TOTAL 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
Fazendo o trabalho inverso, como mostra a tabela abaixo, as mulheres que apresentam
o 3º grau completo representam 64,29%. Já entre os homens não há diferença significativa
entre os que possuem o 2º e o 3º graus.
Tabela 11: Percentual da Escolaridade x Idade dos conselheiros
ESCOLARIDADE
IDADE
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
22 – 31 anos 0,0 7,9 4,5 5,0
32 – 41 anos 18,8 23,7 20,9 21,5
42 – 51 anos 56,2 39,5 41,8 43,0
52 – 61 anos 25,0 18,4 20,9 20,7
Mais de 61 anos 0,0 10,5 11,9 9,8
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
95
A tabela 11, referente ao cruzamento da idade com a escolaridade, aponta que dentre
os entrevistados os maiores percentuais se situam na faixa etária de 42 a 51 anos em virtude
da maior concentração de conselheiros nessa faixa etária, conforme visto na freqüência
simples mostrada anteriormente. Esta tabela também permite verificar que as pessoas acima
de 41 anos, que possuem o 1º e o 3º grau completos, somam em torno de 80% do total, o que
indica que há uma distribuição bem equilibrada da escolaridade entre as pessoas mais idosas.
Tabela 12: Percentual da Escolaridade x Renda Familiar dos conselheiros
ESCOLARIDADE
RENDA
FAMILIAR
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Até 2 sm 12,5 5,3 0,0 3,3
De 2 a 4 sm 43,8 34,2 10,4 22,3
De 4 a 8 sm 37,5 26,3 28,4 28,9
De 8 a 12 sm 0,0 18,4 28,4 21,5
Acima de 12 sm 6,3 15,8 32,8 24,0
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
A tabela 12 mostra que entrevistados que possuem o 1º grau situam-se,
principalmente, nos estratos inferiores de renda, auferindo renda de até 4 salários mínimos. Já
os entrevistados com 3º grau completo, ao contrário, situam-se no estrato mais elevado, acima
de 12 salários mínimos, corroborando a tese de que maiores níveis de escolaridade elevam a
renda ou vice-versa. Pode-se notar, porém, que a diferença entre os estratos situados na faixa
entre 4 e 12 salários mínimos não é significativa, sugerindo que podem haver outras variáveis
omitidas importantes na composição da renda dos conselheiros, independente do grau de
escolaridade.
96
Tabela 13: Percentual da Escolaridade x Ocupação dos conselheiros
ESCOLARIDADE
OCUPAÇÃO
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Empregado 0,0 44,7 25,4 28,1
Empregador 6,3 5,3 11,9 9,1
Autônomo 25,0 7,9 10,4 11,6
Desempregado 0,0 2,6 0,0 0,8
Dona de Casa 12,5 7,9 1,5 5,0
Funcionário Público 50,0 18,4 49,3 39,6
Aposentado 6,2 13,2 1,5 5,8
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
No cruzamento da escolaridade com a ocupação é possível perceber que entre os
entrevistados que possuem o terceiro grau, os funcionários públicos representam 49,3%, mas
resultado parecido ocorre entre os que possuem o 1º grau, agregando 50% dos entrevistados.
Outro resultado que merece destaque é o percentual de donas de casa que se concentra entre
os entrevistados que possuem o primeiro grau completo, com 12,5%.
3.6 – A relação entre os demais indicadores de capital social dos conselheiros
entrevistados e a escolaridade
Até aqui o único indicador de capital social analisado foi o nível de participação nos
conselhos, caracterizado por um indicador de capital social mais convencional, encontrado
com maior freqüência nos trabalhos que analisam a relação entre capital social e escolaridade.
Nesta parte do trabalho será analisado o comportamento dos indicadores de capital social
(considerados como variáveis dependentes) classificados como indicadores mais qualitativos
97
– se comparados ao indicador “participação nos conselhos municipais” – de acordo com a
escolaridade, uma vez que avaliam a densidade da participação associativa dos entrevistados.
Assim, será possível investigar se a dimensão do capital social presente entre os conselheiros
entrevistados, que mensurem o grau de associativismo dos entrevistados de forma mais
aprofundada, está subordinada a elevados níveis de escolaridade. Quatro indicadores de
capital social serão comparados com o grau de escolaridade: (1) participação dos
entrevistados em outras organizações de caráter associativo; (2) tempo de atuação dos
entrevistados nos conselhos municipais; (3) freqüência às reuniões nos conselhos municipais;
e (4) motivação para participar do conselho municipal.
Tabela 14: Percentual da Escolaridade x Participação em Organizações de Caráter Associativo
ESCOLARIDADE
ORGANIZAÇÕES DE
CARÁTER ASSOCIATIVO
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Associação de Moradores
37,5 18,9 15,2 19,3
Conselhos Populares
37,5 36,8 22,4 28,9
Sindicatos
43,8 47,4 31,3 38,0
ONG’s
25,0 34,2 22,4 26,4
Partidos Políticos
18,8 47,4 19,4 28,1
Organizações Religiosas
50,0 47,4 26,9 36,4
Entidades Filantrópicas
37,5 5,3 20,9 18,2
Movimento Estudantil
6,3 7,9 3,0 5,0
Clube Esportivo
6,3 13,2 10,4 10,7
Cooperativa
12,5 13,2 10,4 11,6
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
Ao confrontarem-se informações sobre os entrevistados que participam de alguma
forma de atividade associativa com sua escolaridade, obtém-se um resultado completamente
diferente do encontrado na participação dos conselhos. É importante destacar que a resposta
sobre a filiação às associações não é excludente, ou seja, um entrevistado pode ser filiado a
98
mais de uma associação e, sendo assim, os resultados não somam 100%. De acordo com a
tabela 14, observa-se que os maiores percentuais de filiação a organizações de caráter
associativo encontram-se entre as pessoas de escolaridade mais baixa. Mesmo no item
sindicatos, onde na maioria das vezes a filiação é compulsória, o percentual de associação é
mais elevado entre os conselheiros que possuem o 2º e o 1º grau completo respectivamente.
Olhando para os entrevistados com terceiro grau completo, nota-se que seu perfil
associativo é o mais baixo, não excedendo os 27%, se desconsiderarmos os sindicatos, de uma
amostra que apresentou nos resultados gerais um percentual mais elevado de entrevistados.
Este resultado levanta mais uma interrogação a respeito da dimensão de capital social que está
mais relacionada ao nível de capital humano. Entre os conselheiros entrevistados pode-se
afirmar que não há uma subordinação do capital social ao capital humano no que diz respeito
à filiação a outras atividades de caráter associativo. O item “Outras” apresentou um
percentual não significativo para cada nível de escolaridade, por isso não foi incluído na
tabela. O maior número de casos foi para associações comerciais, representando 2,5% do
total, que se concentraram entre os entrevistados com nível superior.
Será avaliado, a seguir, o tempo de participação nos conselhos de acordo com o nível
de escolaridade, outra variável importante para mensurar o grau de interesse e compromisso
dos conselheiros com tal atividade.
99
Tabela 15: Percentual da Escolaridade x Tempo de atuação no conselho dos entrevistados
ESCOLARIDADE
TEMPO NO
CONSELHO
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Menos de um ano 6,2 16,6 18,5 16,2
1 ano 25,0 30,6 20,0 23,9
2 a 4 anos 31,3 25,0 32,3 29,9
5 anos ou mais 37,5 27,8 29,2 30,0
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
A tabela acima aponta para um percentual mais elevado de tempo de participação de 5
anos ou mais entre os entrevistados com menor nível de escolaridade, com 37,5%. Os
entrevistados que participam há menos tempo dos conselhos, concentram-se entre os que
possuem o nível superior completo, com 18,5% do total. Este é outro resultado que colabora
para a afirmação de que o exercício da atividade cívica não está necessariamente
correlacionado a altos níveis de escolaridade. No caso dos entrevistados com o primeiro grau,
observa-se a maior concentração desse estrato com maior tempo de atuação nos conselhos,
correspondendo a 37,5% com participação igual ou superior a 5 anos.
Tabela 16: Percentual da Escolaridade x Freqüência às reuniões
ESCOLARIDADE
OCUPAÇÃO
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Quinzenal 37,5 15,8 16,4 19,0
Mensal 56,3 76,3 62,7 66,1
Bimestral/Trimestral 0,0 5,3 1,5 2,5
Semestral 6,2 0,0 1,5 1,7
Irregular 0,0 2,6 17,9 10,7
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
100
Em relação à freqüência dos conselheiros às reuniões, é possível notar que, somando
os percentuais de freqüência quinzenal e mensal, obtém-se um percentual de participação de
93,8% entre os entrevistados com apenas o 1º grau contra 79,1% entre os entrevistados com
nível superior. A soma foi efetuada com o objetivo de alcançar um resultado mais preciso,
pois as reuniões dos conselhos variam entre quinzenais e mensais, dependendo do conselho.
Não há casos entre os conselhos pesquisados que realizem reuniões com freqüências menores
que quinzenais. Assim, verifica-se que os resultados encontrados mostram um maior
comprometimento entre os entrevistados de mais baixa escolaridade. Aqui, novamente, não se
observa uma subordinação do capital social em relação ao capital humano, utilizando a
freqüência às reuniões como um indicador mais qualitativo da dimensão associativa do capital
social. Uma justificativa para tal resultado pode ser a mesma observada por Denny (2003) em
seu trabalho apresentado no segundo capítulo, onde a freqüência de participação em
associações pode estar relacionada a um histórico pessoal de associação a organizações, mas
que não tem a ver com elevados níveis educacionais.
101
Tabela 17: Percentual da Escolaridade x Motivo para participar do conselho dos entrevistados
ESCOLARIDADE
OCUPAÇÃO
1º grau 2º grau 3º grau
TOTAL
Alcançar reivindicações
18,8 2,6 4,5 5,8
Participar da decisão e fiscalização
dos gastos
25,0 21,1 20,9 21,5
Contribuir para melhorar a cidade
18,8 13,2 13,4 14,0
Representar interesses setoriais
6,3 21,0 28,4 23,1
Contribuir para a melhoria das
comunidades carentes
6,3 18,4 14,9 14,9
Histórico de participação em
Movimentos Sociais
12,3 5,3 0,0 3,3
Convicções político-religiosas
0,0 2,6 1,5 1,7
Desejo de servir à comunidade 12,5 15,8 16,4 15,7
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
Dos entrevistados com o terceiro grau completo, 28,4% afirmam que “Representar
interesses setoriais” é a principal motivação para participar dos conselhos, aparecendo como a
resposta mais freqüente entre os mesmos. Nos textos analisados anteriormente, foi possível
notar que existem motivações mais voltadas para o interesse individual – como destaca
Putnam (1993) ao estabelecer relações sociais onde o capital social atua baseado na
reciprocidade específica – e ações que são movidas por valores morais de respeito mútuo e de
base solidária, como destaca Bourdieu (1980) e Granovetter (1985) quando enfatizam o
caráter não econômico das relações sociais. A motivação “representar interesses setoriais” se
aproxima mais de uma ação individual e corporativa, indicando que o motivo para a ação está
estritamente voltado para o interesse privado, ou como afirma Denny (2003), os entrevistados
102
podem se engajar nos conselhos municipais por motivações egoístas, uma vez que os
conselhos envolvem interesses políticos. Portanto, conclui-se que 28,4% dos entrevistados
com terceiro grau, isto é, o maior percentual observado entre o grupo com escolaridade alta,
encontra-se nos conselhos por uma motivação mais egoísta, distanciando-se do padrão de
comportamento necessário ao desenvolvimento da dimensão associativa do capital social em
um grupo ou comunidade, onde predomina o interesse coletivo, a reciprocidade e a
cooperação.
Os resultados da tabela 17 também mostram que o principal motivo para a participação
dos entrevistados com baixa escolaridade encontra-se no item “Participar da decisão e
fiscalização dos gastos”, com 25,0%, mostrando que, apesar de pouca escolaridade, há a forte
presença da “educação cívica” entre esses conselheiros. Este pode ser um indício de que os
fatores que levam à prática associativa certamente envolvem um nível de educação básica,
mas requer outros fatores igualmente importantes, que não são necessariamente absorvidos
por meio de elevações crescentes na escolaridade dos indivíduos.
O quadro resumo mostra mais claramente os resultados encontrados na pesquisa e
quais os indicadores utilizados que apresentaram os resultados esperados.
Quadro 2: Resumo dos Resultados
INDICADORES DE CAPITAL SOCIAL
CORRENTE DE
PENSAMENTO
Indicador Tradicional
Participação nos Conselhos
Municipais
Argumento do Capital Social
Subordinado
1) Participação em outras
organizações associativas
2) Freqüência às reuniões dos
Conselhos Municipais
3) Tempo de participação nos
Conselhos Municipais
Indicadores Mais Qualitativos
4) Motivação para participar nos
Conselhos Municipais
Argumento do Capital Social Não
Subordinado
Fonte: Pesquisa de campo, 2005/2006
103
Conclusão
De acordo com os resultados encontrados nesta última seção que analisa a hipótese
central do trabalho – de que níveis mais elevados de capital humano, via escolaridade, não
geram, necessariamente, mais capital social – nota-se que em um primeiro momento a
escolaridade dos membros entrevistados aparece como uma variável explicativa de forte
relevância para a participação nos conselhos municipais como um indicador tradicional de
capital social. Porém, a análise da paridade entre os segmentos representativos dos conselhos
mostra que este resultado pode se encontrar mascarado pela grande representação dos
segmentos governamental e técnico. Assim, não há como mensurar o grau de capital social
somente através de análises mais superficiais sobre a participação dos entrevistados, sendo
preciso analisar outros indicadores que verifiquem sua efetiva participação nos conselhos.
Para tanto, foram feitas inferências de como a escolaridade se manifesta sobre alguns
indicadores que medem o grau de associativismo. Nessas inferências, verificou-se um
resultado completamente oposto ao encontrado anteriormente. Para todos os demais
indicadores utilizados – como associação a outras organizações de classe, tempo de atuação
no conselho, freqüência às reuniões e motivação para participação no conselho – os membros
com menor escolaridade se destacaram na amostra. Isto deixa claro que, neste estudo de caso,
os mais elevados estratos de escolaridade não necessariamente geram este tipo de capital
social, o associativismo, considerado uma dimensão central do conceito, uma vez que implica
em relações sociais mais intensas e uma capacidade de ação coletiva.
Este resultado vai na direção da corrente de pensamento que adere ao argumento do
capital social não subordinado. Como foi visto no segundo capítulo, Field et al (2000)
acreditam que níveis de educação inicial estão intimamente associados à propensão a
participar da vida associativa, e, de fato, a tomar posições de liderança, mas não
104
necessariamente aqueles que o fazem estão nos níveis mais elevados de escolaridade. O
acesso a diferentes conhecimentos e habilidades, independente dos anos de educação, pode
ajudar a construir a e a transformar o capital social.
Dentro do mesmo argumento, o resultado do trabalho de campo converge com o
trabalho de Denny (2003) que destaca a importância do grau de associativismo como
dimensão central do capital social, fazendo seu questionamento a respeito da veracidade do
argumento contra-capital social através da utilização de dados sobre associativismo. Isto é,
Denny (2003) procura mostrar que o ponto fraco dos trabalhos da corrente contra-capital
social encontra-se justamente na tentativa de relacionar níveis de escolaridade com a
dimensão do capital social que mensura o grau de associação dos indivíduos.
105
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No primeiro capítulo, foi realizada uma revisão bibliográfica do capital social em
termos conceituais, buscando unir a contribuição dos trabalhos de maior destaque na literatura
acadêmica, obedecendo a uma ordem cronológica. De acordo com a exposição dos trabalhos,
ficou claro que eles convergem e divergem em diversos pontos, o que torna difícil traçar uma
linha divisória metodológica que defina posições dicotômicas entre os autores. Isto ocorre
porque cada autor olha para o capital social como um ativo capaz de abranger diferentes
questões. Alguns autores o enxergam como uma fonte de desenvolvimento sócio-econômico,
através da participação cívica, como é o caso de Putnam e Fukuyama. Outros autores o vêem
como a solução para problemas de desigualdades sócio-econômicas, através do
desenvolvimento de atividades produtivas baseadas na cooperação, como Locke e Evans. Há
ainda autores que preocupam-se não com a sua utilidade, mas com sua importância intrínseca
no interior das relações sociais, como é o caso de Granovetter e Bourdieu.
Buscou-se, portanto, em um segundo momento, a definição de um conceito preliminar
de capital social, utilizando os pontos de convergência considerados mais importantes entre
alguns dos trabalhos selecionados e que serviram de base para a elaboração de um conceito
mais específico que defina as variáveis mais importantes do capital social, as quais serão
utilizadas no trabalho de campo.
O segundo capítulo mostrou que, paralelos ao desenvolvimento da teoria do capital
humano, começaram a surgir outros trabalhos que viam o capital social como um outro ativo
– individual ou coletivo, dependendo da linha e pensamento – importante para o
desenvolvimento da sociedade. Apesar de serem considerados como dois ativos capazes de
aumentar a produtividade individual, pouco se discute aqui no Brasil sobre a relação existente
entre capital humano e capital social, mostrando de que forma eles interagem entre si. Por
isso, foram apresentados os trabalhos de maior destaque na literatura acadêmica – que se
106
compreende nos trabalhos de Maciel (2002), Hasenbalg (2000) e Neri (2000) – que
estabelecem de certa forma uma relação entre esses dois ativos, mas não realizam essa análise
como o ponto central de seus trabalhos.
Na segunda seção do capítulo 2 foi demonstrado que, ao contrário do Brasil, há um
intenso debate internacional sobre esse tema. Os trabalhos que adotaram o argumento central
de que há uma relação de dependência entre capital humano e capital social, onde o segundo
encontra-se subordinado ao primeiro, foram classificados dentro do argumento do capital
social subordinado. Já os trabalhos que acreditam que o capital social não necessariamente é
encontrado nos estratos mais elevados de capital humano, ou seja, que não há uma relação
direta e linear entre os dois ativos, foram classificados dentro do argumento do capital social
não subordinado. Nessa seção, foi possível notar que os trabalhos utilizam diferentes variáveis
de capital social para defender seus argumentos, de acordo com o conceito que adotam.
Ainda, permitiu verificar a inconsistência do argumento do capital social subordinado,
principalmente na definição de indicadores de participação política e associativismo.
Na terceira e última seção do segundo capítulo, foi definido o conceito específico de
capital social utilizado neste trabalho e de cada indicador de capital social que se encaixa na
dimensão do associativismo, a fim de dar suporte ao estudo de caso que será examinado no
terceiro capítulo.
O terceiro capítulo tratou do estudo de caso realizado nos conselhos municipais
setoriais de Resende e Macaé com o objetivo de verificar se a dimensão associativa do capital
social está subordinada ao capital humano. A análise da hipótese central do trabalho trata dos
impactos das variáveis sócio-econômicas e dos indicadores, classificados como tradicionais e
qualitativos, de capital social sobre o capital humano dos conselheiros entrevistados.
O primeiro resultado que vai na direção da hipótese do trabalho, utilizando o indicador
de participação nos conselhos, converge com o argumento do capital social subordinado, onde
107
aparece um percentual elevado de entrevistados com alta escolaridade, alcançando 55,4% do
total. Em um primeiro momento a escolaridade dos membros entrevistados aparece como uma
variável explicativa de forte relevância para a participação nos conselhos municipais, como
um indicador tradicional de capital social. Porém, a análise da paridade entre os segmentos
representativos dos conselhos mostra que este resultado pode se encontrar mascarado pela
grande representação dos segmentos governamental, técnico e de alguns representantes de
ONG’s que tendem a ter uma escolaridade mais elevada. Assim, não há como mensurar o
grau de capital social somente através de análises mais superficiais sobre a participação dos
entrevistados, sendo preciso analisar outros indicadores que verifiquem sua efetiva
participação nos conselhos ou em diversas organizações de caráter associativo.
De acordo com os demais resultados encontrados, pode-se afirmar que a verificação
que endossa o argumento do capital social não subordinado encontra-se em quatro indicadores
tomados como proxy do capital humano, via educação: (1) no indicador que mensura o grau
de participação do entrevistado em outras organizações de caráter associativo que não o
conselho; (2) no indicador que avalia a freqüência da participação cívica dos entrevistados nos
conselhos municipais; (3) no indicador que verifica o tempo de participação dos entrevistados
nos conselhos; e (4) no indicador que analisa a motivação que levou o entrevistado a
participar do conselho.
Este segundo caso é mais um indício de que a formulação de indicadores que
procurem mensurar a participação cívica deve ter como principal preocupação a qualidade das
perguntas a serem aplicadas nas pesquisas.
Todos os trabalhos apresentados no segundo capítulo, que fazem parte do argumento
do capital social subordinado, não se aprofundam na questão da qualidade da participação
cívica, via grau de associativismo. Putnam e Helliwell (2002) preocupam-se em separar
dezesseis tipos de organizações associativas, mas não inclui nenhuma pergunta sobre a
108
intensidade dessa participação (como tempo ou freqüência da participação). Dee (2003) se
preocupa com a qualidade da participação cívica, mas, de acordo com sua definição de
participação cívica – que engloba a participação política e que neste trabalho são consideradas
distintas – a pergunta sobre a dimensão da freqüência de participação, diz respeito à
freqüência na leitura de jornais, que como já mencionado, podem estar enviesadas por se
tratarem de perguntas relacionadas ao nível de informação do respondente. Já no argumento
pró-capital social, nota-se uma preocupação no trabalho de Denny (2003) com a freqüência às
associações voluntárias dos respondentes. No que se refere ao tempo de participação, nenhum
dos trabalhos apresentados no segundo capítulo se preocupou em inserir essa pergunta.
Mas pelo que foi observado, de uma forma geral, os trabalhos do argumento do capital
social não subordinado prezaram mais pela qualidade de seus indicadores de capital social.
Isto pode ser percebido pelo fato de que somente um dos trabalhos deteve-se a análises
quantitativas, como ocorreu com o trabalho de Denny (2003). Mas, ainda assim, este foi o
único trabalho que inseriu variáveis de freqüência associativa.
Por exemplo, no presente trabalho, com relação ao resultado que verifica a intensidade
da vida associativa dos entrevistados, percebe-se que para quase todas as opções, os
entrevistados com um menor nível de escolaridade apresentaram percentuais mais elevados de
participação, com 37,5% filiados a entidades filantrópicas, conselhos populares e associações
de moradores, ou ainda 50,0% filiados a associações religiosas. Da mesma forma, o indicador
que mensura o tempo de participação no conselho revela uma vantagem percentual de quase
10% entre os entrevistados de nível de escolaridade baixa que participam há mais de 5 anos
dos conselhos, em relação ao entrevistados de nível superior. Com o indicador que mede a
freqüência não é diferente, onde a vantagem percentual dos entrevistados de menor
escolaridade é de aproximadamente 15% em relação aos entrevistados com o nível superior.
Por último, o indicador que mostra a motivação da participação dos entrevistados revela que
109
as maiores concentrações de respostas voltadas para um maior grau de interesse coletivo, que
fortalecem a reciprocidade generalizada, encontra-se entre os entrevistados com 1º e 2º graus,
ao mesmo tempo em que motivações voltadas para o interesse individual, que fortalecem a
reciprocidade específica, encontram-se com um maior percentual entre os entrevistados com o
3º grau.
Portanto, de acordo com a maior preocupação pela qualidade da análise dos trabalhos
pró-capital social e de acordo com os resultados de campo desses indicadores mais
qualitativos encontrados no presente trabalho, fica clara a opção pelo argumento do capital
social não subordinado que afirma não haver uma subordinação do capital social em relação
ao capital humano, ou seja, para algumas dimensões de capital social, como o associativismo,
não há evidências concretas de que os estratos mais elevados de escolaridade concentram um
nível de capital social mais elevado.
O presente trabalho teve como objetivo analisar a relação entre capital humano e
capital social. A hipótese do trabalho tentou, não só fortalecer o argumento do capital social
subordinado, mas, principalmente, chamar a atenção para um debate que pode ser mais
explorado em pesquisas futuras sobre capital social no Brasil. Estudos mais aprofundados
sobre essa relação capital humano e capital social podem servir de suporte para a formulação
de políticas públicas que fomentem a criação e o desenvolvimento do capital social da
população de forma direta ou que atuem paralelamente às políticas sociais de educação para
combater problemas relacionados a desigualdades sócio-econômicas e promover o
desenvolvimento local. A intenção do trabalho não é, de forma alguma, diminuir a
importância da implementação de políticas educacionais, principalmente, em sociedades
marcadas por grandes níveis de desigualdade e pobreza, mas sim elevar a importância de
estudos, na área das ciências econômicas principalmente, que dêem conta do desenvolvimento
de capital social entre as camadas mais pobres dessas sociedades.
110
APÊNDICE A - Questionário Geral aplicado a Prefeituras e/ou Secretarias Municipais
1 – Quantos sindicatos existem no município?
2 – Quantas ONG’s existem no município?
3 – Os movimentos sociais que estão presentes no município são:
Sim Não
a) Movimentos rurais (ex: MST) ( ) ( )
b) Pré-vestibulares comunitários ( ) ( )
c) Movimentos raciais ( ) ( )
d) Movimentos urbanos (ex: Movimento Sem-Teto) ( ) ( )
e) Movimentos de gênero ( ) ( )
f) Movimentos de portadores de necessidades especiais ( ) ( )
g) Outros. Especifique:_______________________________________________
4 – Quantas associações de moradores há no município?
5 – Quantas associações comerciais há no município?
6 – Quantas igrejas tem envolvimento com a Prefeitura (seja em projetos sociais ou na
participação em Conselhos)?
111
APÊNDICE B – Questionário aplicado aos Conselhos Municipais
(Respondido pelo presidente ou responsável pelo Conselho)
1 – Há quanto tempo existe o Conselho?
( ) _____anos ______meses ( ) Não sabe.
2 – Quantos membros tem o Conselho?
3 – A escolha do presidente do Conselho é realizada por:
a) Indicação do Prefeito.
b) Indicação da Sociedade Civil.
c) Eleição.
d) Outra forma. Especificar:_______________________________________
4 – Quantos candidatos em média concorreram na última eleição para a presidência do
Conselho?
5 – Existem delegados (atuam como elementos de coordenação e de dinamização da atividade
dos conselhos) no Conselho? Quantos?
6 – Existem Comissões Municipais de ____________ (de acordo com o Conselho a ser
perguntado)?
_____________________________________________
7 – O conselho tem sede própria?
_______________________________________
8 – Qual o número de funcionários que trabalham no Conselho?
112
9 – Quais as formas de comunicação utilizadas pelo Conselho com a população?
Sim Não
a) Telefone ( ) ( )
b) Correspondência ( ) ( )
c) Emissora de rádio ( ) ( )
d) Visita de membros do conselho às localidades ( ) ( )
10 – Existe cadastro informatizado dos associados?
( ) Sim ( ) Não ( ) Não Sabe
11 – O Conselho possui home page? Home Page:____________________________
12 – O Conselho possui email? Email:____________________________________
113
APÊNDICE C – Questionário Individual aplicado a todos os participantes das reuniões
dos Conselhos (presidente, conselheiros e ouvintes)
1 – Sexo:
a) Masculino
b) Feminino
2 – Idade:
a) 16 a 21 anos
b) 22 a 31 anos
c) 32 a 41 anos
d) 42 a 51 anos
e) 52 a 61 anos
f) mais de 61 anos
3 – Escolaridade:
a) 1º grau incompleto
b) 1º grau completo
c) 2º grau incompleto
d) 2º grau completo
e) 3º grau incompleto
f) 3º grau completo
4 – Estado Civil:
a) solteiro
b) casado
c) viúvo
d) separado, desquitado ou divorciado
5 – Renda Familiar:
a) até 2 salários mínimos
b) de 2 a 4 salários mínimos
c) de 4 a 8 salários mínimos
d) de 8 a 12 salários mínimos
e) mais de 12 salários mínimos
114
6 – Ocupação:
a) empregado
b) empregador
c) autônomo
d) desempregado
e) dona de casa
f) funcionário público
g) estudante
7 – Atuação em organização de caráter associativo:
Sim Não
a) Associação de moradores ( ) ( )
b) Conselhos populares ( ) ( )
c) Sindicatos ( ) ( )
d) ONG’s ( ) ( )
e) Partidos políticos ( ) ( )
f) Organizações religiosas ( ) ( )
g) Entidades filantrópicas ( ) ( )
h) Movimento estudantil ( ) ( )
i) Clube esportivo ( ) ( )
j) Cooperativa ( ) ( )
k) Outros. Especificar: ______________________________________
8 – Há quanto tempo participa do Conselho?
( ) ___anos ___ meses ( ) Não sabe.
9 – Com que freqüência participa das reuniões do Conselho?
a) Quinzenal. d) Semestral.
b) Mensal. e) Irregular.
c) Bimestral/Trimestral. f) Não sabe.
10 – Qual o principal motivo o levou a participar do Conselho? (Marque apenas uma resposta)
a) Alcançar o atendimento de reivindicações
b) Participar diretamente e coletivamente da definição e fiscalização das prioridades e
dos gastos públicos da cidade
c) Contribuir, colaborar para melhorar a cidade
d) Representar interesses setoriais
e) Reconhecimento das necessidades de regiões carentes e contribuir para a melhoria das
condições nessas comunidades
f) Histórico de participação em organizações de caráter associativo
g) Convicções político-religiosas
h) Influência do movimento comunitário do bairro/comunidade
115
i) Desejo de ser útil, de servir, de ajudar a comunidade
j) Ociosidade
11 – O que você acha do Conselho no que diz respeito seu funcionamento?
a) Excelente. Um espaço democrático onde consigo expor e trocar idéias e interferir na
concretização das reivindicações.
b) Muito bom. Um local para discutir as políticas públicas prioritárias e ficar por dentro
das decisões tomadas.
c) Bom. Uma forma de manter-se informado sobre as políticas públicas setoriais.
d) Regular. Poderia funcionar de uma forma mais participativa.
e) Ruim. Não funciona.
f) Não sabe.
12 – O Conselho atende às demandas da população/comunidade?
a) Muitas vezes. d) Nunca.
b) Algumas vezes. e) Não sabe.
c) Raramente.
13 – Na sua opinião o Conselho tem uma boa articulação com a sociedade civil?
a) Sim.
b) Não.
c) Não sabe.
14 – A Prefeitura tem dado retorno em relação aos recursos reivindicados?
a) A maioria das vezes.
b) Algumas vezes.
c) Raramente.
d) Nunca.
e) Não sabe.
116
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