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Raquel Costa Cardoso Lusardo
AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL: CONCEPÇÕES
DE PROFESSORAS SOBRE O PAPEL DO PORTFÓLIO
Juiz de Fora
2007
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Raquel Costa Cardoso Lusardo
AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL: CONCEPÇÕES
DE PROFESSORAS SOBRE O PAPEL DO PORTFÓLIO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal
de Juiz de Fora, na linha de pesquisa Linguagem,
Conhecimento e Formação de Professores como
requisito parcial à obtenção do título de mestre.
Orientadora: Profª. Drª. Léa Stahlschmidt Pinto
Silva.
Juiz de Fora
2007
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TERMO DE APROVAÇÃO
RAQUEL COSTA CARDOSO LUSARDO
AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL: CONCEPÇÕES DE PROFESSORAS
SOBRE O PAPEL DO PORTFÓLIO
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre no Programa
de Pós-Graduação em Educação Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de
Fora, pela seguinte banca examinadora:
______________________________________________
Profª. Drª. Léa Stahlschmidt Pinto Silva
(Orientadora)
Programa de Pós-Graduação em Educação, UFJF
______________________________________________
Profª. Drª. Luciana Pacheco Marques
Programa de Pós-Graduação em Educação, UFJF
______________________________________________
Prof. Dr. Jader Janer Moreira Lopes
Programa de Pós-Graduação em Educação, UFF
Juiz de Fora, 23 de março de 2007.
4
Aos professores e às crianças
da Educação Infantil que compartilham
a aprendizagem com autonomia e esperança.
5
AGRADECIMENTOS
Ao meu Deus pelo infinito amor, pela graça inspiradora e pelas eternas misericórdias
que me guardam em todo tempo.
Ao meu esposo Luiz Alberto pelo amor e apoio constante, pelas leituras críticas que
muito me ajudaram neste trabalho.
À minha filha Vitória por ensinar-me o que significa ser criança.
À minha mãe Neusa por suas orações e por seus sábios conselhos.
Aos meus familiares pelo incentivo aos estudos.
À Professora e Orientadora Drª. Léa Stahlschmidt Pinto Silva pela dedicação e
disponibilidade nas orientações, pelo respeito ao meu trabalho e pela mediação na
aprendizagem.
Aos Professores Drª. Luciana Pacheco Marques e Dr. Jader Janer Moreira Lopes pelas
sugestões no exame de qualificação.
Às professoras que participaram da pesquisa pela aprendizagem e à direção e
coordenação pedagógica da escola pela oportunidade de realizar este trabalho.
Aos muitos amigos que fizeram sugestões, compartilharam experiências e ofereceram
ajuda.
A todos, muito obrigada.
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RESUMO
Este trabalho teve como objetivo investigar a compreensão de professoras acerca do papel do
portfólio no processo de avaliação das crianças que freqüentam as classes de Educação
Infantil. Para tal, utilizou-se como perspectiva teórico-metodológica a abordagem sócio-
histórica, com ênfase nos processos mediadores, tendo relacionado o mesmo ao paradigma
indiciário com base em Ginzburg (1989). Os sujeitos foram quatro professoras que atuam com
crianças na faixa etária de 3 a 6 anos de idade. O contexto da pesquisa foi uma escola
particular localizada na cidade de Juiz de Fora. Utilizou-se para a coleta de dados a entrevista
semi-estruturada com as professoras e a observação na sala de atividades de situações que
envolviam a avaliação e o uso dos portfólios. A análise e interpretação dos dados foram
realizadas através das pistas e dos indícios encontrados. Considerou-se que o portfólio
envolve a participação da criança, da família e do professor e contribui para a avaliação da
aprendizagem, desde que esteja embasado na avaliação formativa e mediadora. Tal
instrumento de registro relaciona-se com as concepções do professor sobre avaliação,
aprendizagem, criança e infância, concepções que interferem na construção do portfólio e nas
ações docentes com a educação das crianças.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Infantil; avaliação; portfólio; criança; infância.
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ABSTRACT
This work was aimed at investigating the perception of the teachers about the role of the
portfolio in the evaluation process of primary school children. In order to do so, it was utilized
the socio-historical approach as theoretical-methodolgical perspective, emphasizing the
mediator processes, relating it to the indiciary paradigm with base in Ginzburg (1989). The
subjects were four teachers who work with children ranging from 3 to 6 in age. The research
was carried out in a private school in Juiz de Fora. As for the methodology, a semi-structured
interview was applied to the teachers, and classroom observation concerning evaluation and
the use of portfolios was also performed. Data analysis and conclusions were drawn from the
clues found. The portfolio has been found to involve the child’s participation, as well as the
family’s and the teacher’s and to contribute to the learning process evaluation as long as it is
based on formative and mediating evaluation. Such record tool is related to the teacher’s
conception on evaluation, learning, children and childhood, which interfere with the filling of
the portfolio and the actions taken in teaching children.
KEY WORDS: child education, evaluation, portfolio, child, infancy.
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SUMÁRIO
LISTA DE ANEXOS 09
A BUSCA PELA PESQUISA: ONDE TEORIA E PRÁTICA SE ENCONTRAM 10
1. A ESCOLHA DE UM CAMINHO METODOLÓGICO 22
1.1 Enveredando pelo caminho das pistas 22
1.2 A inserção no campo 26
2. DIALOGANDO COM OS AUTORES E COM AS PROFESSORAS PARA
COMPREENDER A AVALIAÇÃO EM DIFERENTES CONTEXTOS 34
2.1 Avaliação: conceitos e práticas construídos historicamente 36
2.2 Avaliação: diferentes significados, modalidades e intenções 46
2.3 Avaliação na Educação Infantil e a perspectiva da avaliação mediadora 60
3. PORTFÓLIO: INSTRUMENTO DE DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA E
AVALIAÇÃO 74
3.1 Origem, definições, objetivos e conteúdos do portfólio 81
3.2 Pistas e indícios sobre o papel do portfólio na avaliação da Educação
Infantil 85
3.3 Possibilidades e dificuldades na prática 99
CONSIDERAÇÕES FINAIS 110
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 116
ANEXOS 123
9
LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 – Roteiro de Observação
Anexo 2 – Roteiro de Entrevista
Anexo 3 – Ficha Individual de Observação do Aluno
Anexo 4 – Registro de Observação da Criança
Anexo 5 – Termo de Consentimento para realização de pesquisa
10
A BUSCA PELA PESQUISA: ONDE TEORIA E PRÁTICA SE ENCONTRAM
Os motivos que geraram a busca pela pesquisa e, conseqüentemente, a questão a ser
estudada, fundamentam-se em minha trajetória pessoal, acadêmica e profissional. Nessa
perspectiva, elaborei a construção de meu portfólio pessoaqüs 6618.67 l41525(d)7 l41[(p)-0.2941o[ oD
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comportamento mais gido com todos os alunos sentados e quietos. Além disso, aquelas
letras, que antes eram levadas na brincadeira, agora se tornavam um conteúdo a ser aprendido
por meio de técnicas especializadas, seguindo a influência do tecnicismo da época.
Minha alfabetização não foi difícil, o que parecia estranho era escrever as letras de
maneira cursiva, já que na pré-escola eu as conhecia como letra de forma (ou “letra palito”).
Apesar dessas modificações com relação à escola, continuei gostando muito daquele
convívio com “tias” e colegas novos. Vencida a série, prossegui sem maiores dificuldades.
Como a escola em que estudava oferecia até a série, quando a concluí, vi-me obrigada a
transferir-me. Até essa fase (4ª série), meu sonho de “quando crescer” era ser professora.
Em 1987, fui matriculada em uma escola particular para cursar a série do antigo
ginásio, aos onze anos de idade. Essa mudança foi muito significativa devido às diferenças
entre a escola pública e a escola particular. Outro ponto também interessante diz respeito à
passagem do ensino de 1ª a 4ª para o de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental.
A “tia” não era mais “tia” e sim a professora. E não era a única: cada matéria tinha um
professor específico. Essas alterações foram bem recebidas, eu considerava tudo novo e
diferente, apesar de sentir falta do contato com a “tia”, eu sabia que estava crescendo e que
por isso tinha que me comportar e cumprir as tarefas solicitadas. Prossegui meus estudos
nessa escola até a 8ª série, concluída em 1990.
O meu antigo sonho em “ser professora” foi modificado no período de 5ª a série.
Muitos professores reclamavam de seus baixos salários, comentando sobre a desvalorização
da carreira. Alguns até aconselhavam a seguir qualquer profissão, menos a de professor.
Devido a esse fato, desisti de ser professora, entretanto não sabia o que escolher no
ensino médio (antigo 2º grau). O curso Científico preparava para o ingresso no Ensino
Superior, mas não para o mercado de trabalho. Naquela época, foi muito discutida pelos
professores e pelos meios de comunicação a questão do desenvolvimento relacionado com a
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educação, no sentido de promover o ensino técnico e profissional, preparando para o mercado
de trabalho. Assim, a ênfase do ensino estava em se ter uma profissão e não apenas um
diploma de 2º grau.
Influenciada por essas idéias, em 1991, fui para uma escola particular e iniciei o curso
Técnico em Contabilidade, com duração de três anos, concluindo-o em 1993. Embora tal
curso estivesse na área das Ciências Exatas, gostei dele, não tendo problemas em finalizá-lo.
No ano de 1994 comecei a trabalhar exercendo minha profissão” como auxiliar de
escritório. Esse ano foi muito importante para minha decisão acadêmica. O meu trabalho não
correspondia com o que eu realmente desejava: a dinâmica escolar e as interações em sala de
aula.
No final daquele ano, pedi demissão do emprego e resolvi matricular-me, em 1995, em
um curso pré-vestibular, para concorrer a uma vaga no Curso de Pedagogia da Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF). Fui aprovada no vestibular e iniciei minha vida acadêmica em
1996, formando-me em 1999.
Apesar da desvalorização econômica e social do professor, durante o curso de
Pedagogia meu interesse se voltou para a importante tarefa da docência.
Depois dos primeiros períodos do curso, tive a oportunidade de vivenciar a prática de
uma sala de aula (1ª série) em uma escola pública, durante um ano letivo, fazendo estágio
como voluntária, no qual pude substituir, quando necessário, a professora, efetuando o meu
primeiro contato com uma classe de alfabetização.
No segundo semestre de 1998 (6º período), ingressei como bolsista em um Projeto de
Extensão do Núcleo de Apoio Psicopedagógico (NAPP), permanecendo nele até o final da
Graduação. No projeto pude ter contato com crianças que tinham histórias de fracasso escolar
e, através da intervenção do projeto, muitas delas avançaram na aprendizagem. Essas
13
experiências me ensinaram a acreditar que a aprendizagem é possível, mesmo quando as
crianças se sentem ou são consideradas fracassadas.
Durante o curso de Pedagogia, muitas indagações referentes ao processo de ensino-
aprendizagem afloraram em minhas reflexões sobre a Educação. Como a criança aprende?
Que recursos presentes no seu contexto ela utiliza? Como o professor pode fazer a mediação
entre a criança e o objeto de conhecimento? Como avaliar o processo de aprendizagem?
Procurei compreender essas questões ao participar de pesquisas desenvolvidas pelo NAPP
(Núcleo de Apoio Psicopedagógico) da Faculdade de Educação, onde compartilhei
conhecimentos e tive o primeiro contato com a pesquisa científica (LUSARDO et al, 1999).
Para continuar os estudos sobre as questões apontadas acima, em 2000, ingressei no
curso de Especialização em Alfabetização e Linguagem, do NUPEL (Núcleo de Pesquisa e
Ensino em Linguagem) da Faculdade de Educação da UFJF, com o propósito de aprofundar
meus conhecimentos acerca da alfabetização e seu desenvolvimento.
Durante o processo de construção da monografia “Aprendizagem da escrita: fracassos,
conquistas e desafios”, com base em uma pesquisa qualitativa (LUSARDO, 2002) em que
investiguei como o professor conduzia o processo de aprendizagem da escrita junto às
crianças com história de fracasso escolar, percebi que a concepção do professor sobre
aprendizagem, escrita e avaliação interferiam no processo de ensino-aprendizagem e, em
especial, a relação professor e aluno no que se refere à avaliação.
Assim, esse tema aguçou meu interesse e procurei estudá-lo através da leitura e da
participação em grupos de pesquisa e eventos na área da Educação e, mais recentemente, na
minha atuação profissional como supervisora pedagógica e professora de escola pública.
Ao trabalhar com a Educação Infantil e com as ries iniciais do Ensino Fundamental
(1ª a séries ou Ciclo Inicial e Complementar de Alfabetização), percebi que, durante o
curso de Pedagogia, não cursara disciplinas que abordassem a Educação Infantil, sua história,
14
políticas, teorias e fundamentos. Desse modo, senti necessidade de aprofundar esse assunto
para o aperfeiçoamento de minha prática profissional, passando, então, a relacionar o estudo
da Educação Infantil com a avaliação, que inicialmente me instigara.
Em outubro de 2000, recebi um convite para participar da Rede de Pesquisa Contextos
Integrados de Educação Infantil coordenada pelas professoras: Júlia Formosinho
(Universidade do Minho - Instituição Criança - Braga - Portugal), Tizuko Morchida
Kishimoto (Faculdade de Educação - USP - Brasil) e Léa Stahlschmidt Pinto Silva
(Universidade Federal de Juiz de Fora), que coordenou o grupo de pesquisa de Juiz de Fora -
MG. Essa rede fundamentou-se nos três pilares da Formação de Professores em Contexto:
formação, pesquisa e intervenção e contou com a participação de vários grupos de pesquisa no
Brasil, os quais se comprometeram a trocar bibliografias e experiências desenvolvidas em
suas pesquisas.
A Formação em Contexto trabalha com a formação profissional centrada na escola e
envolve a instituição, as crianças, suas famílias, os professores e pesquisadores em um
movimento de reflexão, através do diálogo, na busca de práticas inovadoras para os problemas
encontrados na dinâmica escolar.
O grupo de Juiz de Fora desenvolveu a pesquisa “Concepção de qualidade em
educação infantil: um estudo de caso” (SILVA e MICARELLO, 2005), na qual se investigou
a concepção de qualidade de um grupo de professoras que atuam na Educação Infantil de uma
escola particular na cidade de Juiz de Fora / MG. A pesquisa contribuiu grandemente para
minhas reflexões sobre os aspectos relacionados com a qualidade na Educação Infantil
(ZABALZA, 1998; OLIVEIRA-FORMOSINHO & FORMOSINHO, 2001), tais como o
currículo, a organização dos espaços, a autonomia da criança, entre outros, e notadamente o
papel do portfólio, como registro da aprendizagem e instrumento de reflexão para o professor
perceber como a criança está construindo o seu conhecimento.
15
A reflexão promovida sobre o que significa uma educação infantil de qualidade
encontrou discussões e opiniões diversas acerca do tema, visto que a qualidade é construída
coletivamente, de acordo com o contexto social e com o que as pessoas envolvidas no
processo entendem por qualidade. Esta não é neutra, nem isenta de valores e não possui uma
única definição, mas apontou o que o grupo de professoras participantes da pesquisa
considerou como necessidades da educação infantil, representadas pelos interesses das
crianças, dos pais e das professoras em conjunto.
Durante a pesquisa, “Concepção de qualidade em educação infantil: um estudo de
caso” (SILVA e MICARELLO, 2005), as professoras levantaram questões em torno das
expectativas dos pais em relação à aprendizagem dos filhos. Devido à concepção de escola e
de aprendizagem, muitos pais consideraram fundamental a aprendizagem de conteúdos
escolarizados, como, por exemplo, a alfabetização, a caligrafia bonita, produções perfeitas
sem erros, exercícios de controle motor, entre outros.
Assim, as professoras demonstraram uma preocupação em envolver os pais nas
atividades escolares, no sentido de que os pais pudessem compreender o trabalho educativo
desenvolvido na escola, que se tornara diferente de suas expectativas ou do modelo
vivenciado enquanto alunos. Para as professoras, a participação dos pais era um ponto crucial
na construção de uma educação de qualidade para as crianças de zero a seis anos.
Diante desse conflito, que envolve as expectativas dos pais em relação à presença na
escola do que consideram importante para a educação infantil, as professoras perceberam a
necessidade de compartilhar com os pais o desenvolvimento da criança e sua aprendizagem,
dentro de uma perspectiva que considera a aprendizagem como uma construção significativa,
um processo constante, com conquistas realizadas diariamente e que nem sempre são
percebidas pela família. Para envolver os pais no processo educativo, as professoras buscaram
16
novas alternativas de trabalho, como, por exemplo, a construção do portfólio da criança e o
diálogo sobre as atividades desenvolvidas pela escola.
Embora as professoras tenham sugerido a construção dos portfólios como forma de
documentar o processo educativo e envolver a participação dos pais na aprendizagem da
criança, foi possível observar uma resistência inicial das professoras participantes da pesquisa
(SILVA e MICARELLO, 2005) em adotar práticas de registro escrito, com a justificativa de
que tal instrumento poderia ser substituído pela oralidade.
A proposta de construção do portfólio para compartilhar com os pais a aprendizagem
dos filhos, como alternativa para o envolvimento dos pais na escola, trouxe possibilidades e
dificuldades na prática das professoras.
Entre as dificuldades, as professoras apontaram: o registro escrito, o aumento do
trabalho do professor, falta de disponibilidade de tempo, entre outras.
Durante a pesquisa (op. cit.), o grupo de professoras refletiu sobre algumas questões
que remetem à avaliação, como, por exemplo, as expectativas dos pais em relação à
aprendizagem dos filhos com ênfase em conteúdos escolarizados, o reconhecimento do
trabalho desenvolvido pelas professoras, e a necessidade de mostrar para os pais as produções
realizadas pela criança, com base em sua aprendizagem, enfatizando o processo percorrido e
os avanços alcançados. A despeito do fato de as professoras reconhecerem que a utilização do
portfólio, ao proceder ao registro das informações, facilita a avaliação do trabalho e das
conquistas das crianças, elas demonstraram resistência à sua utilização, alegando falta de
tempo para anotar as observações. Ainda assim, consideraram que o instrumento mostrava-se
importante, principalmente nas ocasiões em que necessidade de se retomar informações,
um vez que o registro impede que dados preciosos sejam perdidos com o passar do tempo.
Com base nos achados da referida pesquisa, percebi que a construção do portfólio
implica algumas transformações sobre a concepção de avaliação. Tal processo, entretanto, é
17
difícil, visto que requer uma constante reflexão com relação à prática docente e à
aprendizagem das crianças. Esse assunto despertou a minha atenção, suscitando questões
sobre como as professoras de Educação Infantil compreendem o papel do portfólio na
avaliação da criança.
Diante dessas considerações, algumas indagações sobre o portfólio na Educação
Infantil me instigaram: Como o professor percebe a utilização do portfólio em seu trabalho
pedagógico? O uso do portfólio possibilita o envolvimento da criança e dos pais com a escola
ou é considerado como apenas uma exigência da instituição e das famílias para informar o
trabalho do professor com as crianças? Os portfólios construídos pelas crianças são analisados
por elas próprias e seus pais? Existem portfólios c
18
embasamentos influenciam o olhar do professor sobre a aprendizagem. As concepções do
professor acerca da avaliação, criança e infância interferem na sua prática educacional e,
conseqüentemente, no processo de construção do portfólio.
No âmbito educacional, o portfólio representa uma reconstrução da trajetória escolar
em que as conquistas e as dificuldades na aprendizagem são registradas para possibilitar uma
reflexão conjunta do professor com a criança e com a família sobre as estratégias que podem
auxiliar no processo educativo. Dessa forma, através dos portfólios, o registro é fundamental e
torna-se um aliado do professor para fundamentar as considerações sobre a aprendizagem da
criança.
As consultas realizadas ao banco de dados da Fundação Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), da Fundação Carlos Chagas, com a
publicação dos Cadernos de Pesquisa (COSTA, 2004) e da Associação Nacional de Pós-
Graduação e Pesquisa (ANPED) demonstram que não existem muitas pesquisas sobre
avaliação em educação infantil e o uso dos portfólios.
Sobre a avaliação relacionada ao contexto educativo, cito como referência duas teses
de doutorado. A tese de Sandra Maria Zakia Lian Souza (2004), “Avaliação da
Aprendizagem: natureza e contribuições da pesquisa no Brasil, no período de 1980 a 1990”,
que fez uma apreciação do movimento teórico brasileiro nos anos 1980 e 1990 sobre a
avaliação da aprendizagem e a tese de Ângela Imaculada Loureiro de Freitas Dalben (1998),
“Avaliação Escolar: um processo de reflexão da prática docente e da formação do professor
no trabalho”, que estudou os processos de avaliação escolar concebidos e praticados pelo
professor durante a implantação do projeto político “Escola Plural”, na rede municipal de
Belo Horizonte MG. Ambos os trabalhos trazem um rico histórico sobre a avaliação escolar
e discutem suas concepções e práticas.
19
Destaco também algumas dissertações de mestrado que abordam a questão da
avaliação. Suzana Maria Barrios Luis (2000), com a dissertação “Formação docente e
avaliação: dos processos formativos ao exercício profissional”, analisou a formação docente
em nível superior de professores que atuam no Ensino Fundamental e na Educação Infantil,
no que se refere à prática de avaliação da aprendizagem. Sônia Maria de Sousa Fabrício Neiva
(2003), com a dissertação “Ciclos de Formação: caminho para re-significação da avaliação em
uma escola de ensino fundamental”, abordou as práticas avaliativas de uma escola organizada
em ciclos de formação. E Marilda Trecenti Gomes (2003), em cuja dissertação “O Portfólio
na avaliação da aprendizagem escolar”, apresentou possibilidades de utilização do portfólio
como recurso de avaliação da aprendizagem para alunos e professores de Matemática.
Quanto à avaliação na Educação Infantil, cito como referência algumas dissertações
encontradas. Sonia Larrubia Val Verde (1994), com a dissertação “Relatórios de Avaliação
das EMEIS de São Paulo: uma necessidade ou exigência legal?”, em que analisou os
relatórios de avaliação desenvolvidos em escolas municipais de Educação Infantil e seu
significado para professores e pais. Elisandra Giraldelli Godoi (2000), com a dissertação
“Educação Infantil: avaliação escolar antecipada?”, em que enfatizou a existência de crianças
com mais de seis anos de idade freqüentando as sala
20
Sobre avaliação em Educação Infantil através do uso do portfólio, encontrei apenas
dois trabalhos. A dissertação de mestrado de Silvia Helena Raimundo de Carvalho (2002),
“Avaliação na Educação Infantil: considerações a partir de uma experiência”, que abordou a
construção de uma proposta de avaliação para a Educação Infantil com base em uma
avaliação formativa, através do portfólio como ferramenta principal. A autora enfatizou que,
apesar de a utilização do portfólio ser trabalhosa, o resultado é enriquecedor e significativo
para a aprendizagem. E, em especial, a tese de doutorado de Maria Cristina Cristo Parente
(2004), A Construção de Práticas Alternativas de Avaliação na Pedagogia da Infância: sete
jornadas de aprendizagem”, tese apresentada à Universidade do Minho, em Braga – Portugal.
Parente (2004) buscou compreender, descrever e interpretar as percepções e práticas
de avaliação de um grupo de educadoras da infância que participou de um processo de
formação em contexto, com relação à avaliação alternativa. Através de um estudo de caso
participativo, a autora identificou jornadas de aprendizagem construídas por cada educadora
no que se refere à realização dos portfólios como uma estratégia de avaliação dentro da
perspectiva da avaliação alternativa.
Com base no trabalho desenvolvido por Parente (2004), a partir dos estudos realizados
e do trabalho de campo, pesquisei como as professoras de Educação Infantil compreendem o
papel do portfólio na avaliação da criança. O objetivo deste trabalho foi investigar como as
professoras compreendem o papel do portfólio no processo de avaliação das crianças que
freqüentam a Educação Infantil. Nesta investigação, os sujeitos foram quatro professoras que
participaram anteriormente da pesquisa “Concepção de qualidade em educação infantil: um
estudo de caso” (SILVA e MICARELLO, 2005).
O referencial teórico fundamentou-se em Lev S. Vygotsky (2004, 2000, 1998a,1998b,
1996). A contribuição de Vygotsky gira em torno da mediação em que a criança tem papel
ativo e aprende em interação com o outro através da atuação na Zona de Desenvolvimento
21
Proximal. Amplio essa visão com a colaboração de autores das Ciências Sociais trazendo a
perspectiva em que a criança é vista como produtora de cultura. Outra contribuição para o
embasamento teórico desta dissertação, foi a idéia da avaliação mediadora proposta por
Hoffmann (2005a, 2005b, 2003a, 2003b, 2000) que atua no processo educativo como um
instrumento de reflexão sobre a aprendizagem da criança. A autora desenvolveu pesquisas
significativas sobre avaliação em educação infantil, o que auxiliou na discussão do tema.
Dessa forma estruturei o trabalho da seguinte maneira: no primeiro capítulo explicitei
o caminho metodológico percorrido, definindo a abordagem da pesquisa, os fundamentos
metodológicos, bem como o foco da pesquisa, os procedimentos metodológicos, a estratégia
de investigação, a perspectiva de análise, o contexto e os sujeitos investigados.
No segundo capítulo analisei a questão da avaliação, sua história, suas concepções,
definições e práticas, considerando algumas modalidades avaliativas e a sua implicação na
Educação Infantil, fundamentada na teoria sócio-histórica. Também refleti sobre as pistas e
indícios encontrados sobre as concepções de avaliação, aprendizagem, criança e infância, que
se relacionaram com a avaliação por meio do portfólio.
O terceiro capítulo abordou a documentação pedagógica e a avaliação através do
portfólio, sua origem, suas definições, objetivos, conteúdos e práticas como estratégia de
aprendizagem e instrumento de avaliação e registro, com base nas pistas e indícios sobre as
produções da criança e sobre sua autonomia nas atividades. Analisei a construção do portfólio
com o envolvimento da criança, da família e do professor no que se refere às possibilidades e
dificuldades desse processo.
Por último, teci minhas considerações finais sobre a pesquisa, mostrando o papel do
portfólio na avaliação da criança e suas implicações no contexto educacional.
22
1. A ESCOLHA DE UM CAMINHO METODOLÓGICO
Se a realidade é opaca,
existem zonas privilegiadas – sinais,
indícios – que permitem decifrá-la.
(GINZBURG, 1989, p. 177)
A escolha de um caminho metodológico para esta pesquisa fundamentou-se na
abordagem sócio-histórica (PINO, 2005), considerando as contribuições de Vygotsky (1998a)
embasadas no materialismo histórico-dialético.
Essa abordagem reconhece a subjetividade do investigador com consciência de que
não há neutralidade entre o pesquisador e as sujeitos pesquisados, visto que existe uma
influência recíproca entre eles. Os sujeitos participam do processo de pesquisa, são históricos
e concretos, trazendo influências de suas concepções e experiências, produzidas
culturalmente. Dessa forma, o investigador procura compreender o processo de pesquisa
através da interpretação dos fatos, que representa o seu olhar sobre a investigação.
Assim, os dados foram analisados de acordo com a interpretação do que se busca
compreender, sem o intuito de generalizar os resultados da pesquisa, mas sugerir pistas para
investigações futuras e possíveis intervenções.
1.1 Enveredando pelo caminho das pistas
Ao seguir o caminho das pistas, investiguei a compreensão das professoras sobre o
papel do portfólio no processo de avaliação das crianças que freqüentam as classes de
Educação Infantil de acordo com o paradigma indiciário de cunho qualitativo (GINZBURG,
1989), que é fundado no detalhe, no singular e orienta a relação a ser estabelecida entre o
investigador e os dados obtidos, “na busca daqueles que se podem constituir em indícios
reveladores do fenômeno que se busca compreender” (ABAURRE, 1997, p.14).
23
De acordo com Ginzburg (1989, 1983), o paradigma indiciário surgido nas Ciências
Humanas, no final do século XIX, fundamenta-se na semiótica, definida por Charles S. Pierce
(1839-1914) como ciência geral dos signos. A semiótica teve suas raízes em uma tríplice
analogia que une os procedimentos de investigação de Giovanni Morelli (1811-1891),
Sigmund Freud (1856-1939) e Arthur Conan Doyle (1859-1930), através de sua criação
fictícia Sherlock Holmes.
O método de Morelli consiste em investigar os signos pictóricos dos quadros pintados
por artistas e atribuir o quadro ao seu verdadeiro autor. Para Morelli, os museus continham
várias obras atribuídas de maneira incorreta. Ele analisou essas obras buscando distinguir os
originais das cópias, além de investigar as obras não-assinadas para descobrir seus autores.
Ao analisar as obras de arte, Morelli não baseou seu método nos traços mais visíveis
ou que chamam a atenção, pois, segundo ele, esses traços seriam fáceis de imitar, mas
priorizou os pormenores mais desprezados, os detalhes que realmente representavam as
características do autor e não tinham tanta influência da escola artística à qual o pintor
pertencia. Dessa forma, Morelli sugeriu novas atribuições às obras de arte expostas em vários
museus da Europa e catalogou traços e formas utilizados por diversos autores, trazendo
ilustrações que distinguem um pintor do outro.
Segundo Ginzburg (1989, 1983), Freud tomou conhecimento dos estudos de Morelli
antes de escrever a teoria psicanalítica e relacionou o método de Morelli com a técnica da
psicanálise médica, que procura compreender os sintomas dos pacientes através de elementos
concretos e ocultos, que não são percebidos ou são descartados na observação. Assim, Freud
propôs um método interpretativo centrado em pormenores considerados sem importância, mas
que são reveladores do que se busca compreender.
Conan Doyle, através de sua obra literária Sherlock Holmes, expressou um método de
investigação em que o detetive Holmes descobre o autor do crime com base em pistas e
24
indícios imperceptíveis para os outros, como, por exemplo, ao interpretar pegadas na lama ou
cinzas de cigarro. A análise de detalhes aparentemente insignificantes conduzia a investigação
e decifrava os crimes misteriosos.
Essa tríade, Morelli, Freud e Conan Doyle, fundamenta o método do paradigma
indiciário para o qual Ginzburg (1989, p.150-1) tem a seguinte explicação de analogia:
Como se explica essa tripla analogia? A resposta, à primeira vista, é muito
simples. Freud era médico; Morelli formou-se em medicina; Conan Doyle
havia sido médico antes de dedicar-se à literatura. Nos três casos, entrevê-
se o modelo da semiótica médica: a disciplina que permite diagnosticar as
doenças inacessíveis à observação direta na base de sintomas superficiais,
às vezes irrelevantes aos olhos do leigo [...].
Dessa forma, esse saber se caracteriza pela reconstrução da realidade através de dados
aparentemente negligenciáveis, mas que são importantes e fundamentais para a sua
compreensão.
Ginzburg (1989, 1983) relata que esse tipo de saber também acontecera com relação à
caça, lembrando que, por milênios, o homem fora caçador e aprendera a reconstruir formas e
movimentos das presas ao farejar, registrar, interpretar e classificar pistas deixadas pelos
animais em uma perseguição. Várias gerações de caçadores enriqueceram e transmitiram esse
tipo de conhecimento para seus descendentes.
Pino (2005, 1991), ao utilizar o paradigma indiciário em sua obra, complementa que
procurar indícios de um processo é muito diferente de estabelecer relações causais entre fatos
pesquisados, visto que, para ele, esse processo requer uma análise que siga pistas, sinais,
inferências e não as causas. O autor, ao relacionar esse tipo de abordagem da análise
semiótica com a teoria sócio-histórica, aborda as idéias de Vygotsky e destaca que:
Assim, se interpretar indícios é procurar a significação que eles têm para o
olhar interpretativo do pesquisador, esse olhar deve levar em conta a
natureza dialética do processo de que os indícios participaram. Dessa
maneira, o olhar do pesquisador no ato de interpretá-los será coerente com
o quadro teórico de referência, não só com o método. (PINO, 2005, p.189).
25
Desse modo, com base no paradigma indiciário, busquei pistas e indícios sobre como
as professoras de Educação Infantil compreendem o papel do portfólio na avaliação da
criança. O portfólio está inserido na prática de avaliação investigativa, na avaliação como
recurso para a compreensão da aprendizagem infantil.
Nessa perspectiva, o portfólio é um instrumento de avaliação e registro do processo de
aprendizagem, ao mesmo tempo em que demonstra como a criança es construindo seu
conhecimento e os momentos significativos que embasam a intervenção do professor através
da mediação.
Assim como o portfólio forneceu pistas sobre a aprendizagem e o desenvolvimento da
criança e sobre a mediação do professor, durante a escrita da dissertação, estive buscando
indícios e pistas sobre como as professoras compreendem o papel do portfólio e sua
construção como instrumento de avaliação investigativa, que nesse caso, a busca por pistas
e indícios requer um olhar observador sobre os detalhes, sobre o que é aparentemente comum,
mas que pode revelar algo novo. Ou ainda no que se destaca como diferente e mesmo que
não seja valorizado como um indício importante, pode revelar o que se busca compreender.
Nesse sentido, ressalto que as pistas são diferentes da construção de categorias a que
se refere Bardin (1977), pois as pistas ou indícios dificilmente se repetem. No trabalho de
campo tive a oportunidade de encontrar pistas únicas que foram importantes. Os pequenos
detalhes revelaram as concepções de avaliação, de criança e de infância, no que se refere à
educação infantil, como, por exemplo, cito o fragmento a seguir, em que a pista “esponjinha”
embora tenha aparecido uma única vez, mostrou-se fundamental para definir a concepção da
professora sobre criança e aprendizagem.
Mara (turma – 06 anos): Olha, a criança, a meu ver, é um ser que está em constante
formação, e muito ávido por informação e daí eu acho que é nossa responsabilidade em lidar
com criança, porque como eles estão começando a trilhar, tudo que a gente estiver passando
para eles é igual uma esponjinha, vai ser sugado, e sabe-se como vai ser usado. Então, a
26
informação que é vinculada para a criança tem muita importância. (Transcrição da entrevista
do dia 30 de junho de 2006)
Nesse contexto, pequenos detalhes, uma pista que é encontrada uma única vez, são
importantes para a investigação. De acordo com o paradigma indiciário de Ginzburg (1983, p.
119), “esta investigação pode ser comparada ao ato de seguir os fios em um tear. Chegamos
ao ponto no qual eles podem ser observados compondo um todo, [...]. Para chegar à coerência
do padrão, percorremos com o olhar as diferentes linhas.”
Assim, no trabalho em questão, as pistas percebidas através da observação do uso do
portfólio e das entrevistas com as professoras podem ser comparadas com os fios em um tear.
Essas pistas e indícios formaram o todo investigado, que representou como o professor de
Educação Infantil compreende o papel do portfólio na avaliação da criança.
1.2 A inserção no campo
O contato com a escola e com as professoras para apresentação da proposta de
pesquisa e dos acordos quanto à sua realização ocorreu em fevereiro de 2006, com a
assinatura do Termo de Consentimento para realização de pesquisa (ANEXO 5). O fato de
tanto a escola, como as professoras que foram sujeitos desta investigação, terem demonstrado
receptividade ao trabalho, possibilitou uma relação de colaboração no processo da pesquisa.
Os instrumentos escolhidos para a coleta de dados foram: observação na sala de
atividades
1
de práticas que envolviam a avaliação, o uso dos portfólios e entrevistas semi-
estruturadas com as professoras. Os roteiros da observação e da entrevista podem ser
consultados nos anexos 1 e 2 respectivamente.
1
Na Educação Infantil utiliza-se o termo sala de atividades e não sala de aula como no Ensino Fundamental.
27
A utilização das observações como procedimento metodológico contou com a
contribuição de Vianna (2003). Tais observações aconteceram no período de março a julho do
ano de 2006, sendo realizadas três vezes por semana, em dias alternados, totalizando noventa
e seis observações, que foram registradas em um diário de campo e, posteriormente,
convertidas em notas expandidas.
Durante essa etapa, percorri as quatro salas da educação infantil da escola,
permanecendo em cada uma delas em torno de uma hora, registrando as pistas e indícios
relevantes para a pesquisa. Priorizei nas minhas observações a avaliação na Educação Infantil
demonstrada pela conduta da professora no processo de construção do portfólio, pela
mediação com a criança e pelo envolvimento dos pais.
Com base nas observações, encontrei pistas e indícios revelados pelos trabalhos
expostos nos murais, pelas atividades desenvolvidas na sala e pela autonomia em que a
criança exercia as atividades. Por exemplo, observei em uma das salas um trabalho exposto no
mural que demonstrava o rosto de um coelho amarelo, que fora colorido pela criança, com
algodão colado nas orelhas e cola colorida vermelha no nariz. Os trabalhos estavam
confeccionados da mesma forma, coloridos com a mesma cor, apresentando grande
semelhança entre eles, como se fosse seguido um modelo determinado. Assim, a grande
semelhança entre os trabalhos apontou-se como pista, que demonstrara falta de autonomia
da criança em realizar a atividade e direcionamento por parte da professora.
As entrevistas, áudio-gravadas e depois transcritas, ocorreram em junho de 2006. Cada
professora foi entrevistada separadamente e em dias previamente marcados, nos horários
disponíveis em que os alunos estavam com as professoras das aulas especializadas, como, por
exemplo, educação física ou informática. As entrevistas abordaram a concepção das
professoras sobre o papel do portfólio como instrumento de avaliação e registro, permitindo-
28
me compreender a concepção de criança e de infância que fundamentam as suas práticas na
Educação Infantil.
A análise e a interpretação dos dados se constituíram a partir dos indícios e das pistas
por mim encontrados, tendo como foco a compreensão das professoras sobre o papel do
portfólio na avaliação da criança.
O contexto em que a pesquisa foi realizada se refere a uma escola particular que
trabalha com Educação Infantil desde 1999 na cidade de Juiz de Fora. Tal instituição oferece
também o Ensino Fundamental e Médio, além de possuir tradição em cursos de Graduação no
ensino superior.
Conforme citado anteriormente, os sujeitos foram quatro professoras que haviam
participado da “Concepção de qualidade em educação infantil: um estudo de caso” (SILVA e
MICARELLO, 2005), na qual haviam iniciado uma discussão sobre o processo de construção
do portfólio e sua possível contribuição para a avaliação.
Desde 1999, as professoras atuam na escola pesquisada, com a Educação Infantil,
trabalhando com crianças na faixa etária de 03 a 06 anos de idade. Nesta investigação as
identidades das professoras e das crianças foram preservadas com a utilização de nomes
fictícios, de acordo com o Termo de Consentimento para realização de pesquisa (ANEXO 5).
Procedo, então, à apresentação das professoras.
A professora Berenice trabalha com a turma do maternal, composta por oito crianças
com idade em torno de três anos. Berenice é graduada em Pedagogia e tem 22 anos de
experiência trabalhando com educação de crianças nessa faixa etária.
A professora Noemi atua junto à turma do período, com 06 crianças de 04 anos de
idade. Noemi é pedagoga e possui duas especializações, uma em educação ambiental e a outra
em gestão empresarial. Ela atua na Educação Infantil há 11 anos.
29
A professora Talita é formada em Pedagogia e concluiu a especialização em Educação
Infantil recentemente, sua experiência nessa área é de 16 anos. Ela trabalha com 15 crianças
em uma turma de 2º período com idade aproximada de cinco anos.
A professora Mara atua com a turma do período, com 15 crianças de 06 anos de
idade. Mara também é Pedagoga e fez Pós-Graduação em Recursos Humanos e em Gestão
Empresarial. Na Educação Infantil, ela tem 17 anos de experiência.
O ambiente físico das salas de Educação Infantil da escola pesquisada apresenta
muitas semelhanças em relação aos materiais disponíveis que compõem os seus espaços. A
distribuição dos móveis e materiais são similares nas salas, com exceção da sala do 3º
período, que apresenta algumas peculiaridades. Além de se encontrar afastada das outras
salas, possui uma disposição do espaço físico diferente, apresentando muitas características
dos espaços utilizados no Ensino Fundamental.
Devido às mudanças na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96
(BRASIL, 1996) determinadas pela Lei 11273 de fevereiro de 2006, que dispõe sobre a
duração de 9 (nove) anos para o Ensino Fundamental, o período, ou sala de 06 anos, está
inserido no Ensino Fundamental e não pertence mais à Educação Infantil. Embora muitas
discussões estejam ocorrendo sobre essa alteração e suas implicações pedagógicas, não
abordarei aqui esse assunto que foge do foco desta pesquisa.
Apresento uma breve descrição das salas de atividades para complementar o
entendimento das observações e reflexões realizadas durante o trabalho de campo.
Entrando na sala de atividades da turma de 03 anos, percebi que a sala é bem ampla e
iluminada. Na parede lateral, à esquerda da porta de entrada da sala, um mural com fotos
das crianças e outro com trabalhos expostos; são cartazes sobre “Ajudantes do Dia”, “Sobre
como está o tempo”, “Quem somos”, “Aniversariantes do Mês” e estantes com brinquedos
diversos, aquário com um peixinho beta, quadro de avisos utilizado pela professora, cabide
30
para pendurar mochilas, pastas e merendeiras, armário da professora com geladeira pequena,
onde as crianças guardam os sucos, água e iogurtes, enfim todo o alimento que precisa ser
conservado em ambiente refrigerado. As outras turmas da Educação Infantil também trazem
sucos e outros alimentos para serem conservados na geladeira dessa sala.
Na parede à frente da porta de entrada da sala, encontram-se estantes de plástico
formadas por cestas que se encaixam, onde o guardados diversos brinquedos, além do
cantinho de leitura com livros variados. Durante o tempo livre as crianças pegavam os livros e
contavam histórias para a professora e os colegas. Nessa parede temos também o cabide para
pendurar as canecas para beber água e o filtro, ambos ao alcance das crianças.
Na outra parede, à direita da porta de entrada, estão as janelas, o tapete de letras com
almofadas, varal com trabalhos das crianças, outras estantes com brinquedos diversos, cabide
para toalhinhas, escovas de dente, a pia onde as crianças lavam as mãos e a lixeira.
Na parede em que fica localizada a porta de entrada existe um espelho, o quadro para
giz, cabide com fantasias, caixa com algum material pedagógico, como, por exemplo, folhas,
cartolinas e outros tipos de papéis: crepom, laminado, entre outros.
No centro da sala visualiza-se uma mesa oval grande com as cadeiras adequadas ao
tamanho das crianças, onde freqüentemente elas lancham e fazem as atividades como
desenho, massinha plástica para modelagem, entre outras. Perto do cantinho de leitura um
tapete grande de letras com almofadas, onde as crianças sentam, ouvem histórias, lêem os
livros e fazem a rodinha.
A sala da turma de 04 anos é menor que a sala do maternal. Na parede da porta de
entrada encontra-se o cantinho de leitura, o espelho, o quadro, o cabide para pendurar
mochilas e merendeiras e o armário da professora. Na parede à esquerda da porta de entrada,
temos as janelas, debaixo das quais se localizam: o varal com a rotina diária, o cabide com as
canecas para beber água, as escovas de dente, a pia, o filtro de água e a lixeira.
31
Na outra parede, em frente à porta de entrada da sala, estão as estantes com as cestas
onde os alunos guardam seus materiais pessoais como canetinha, cola colorida, avental, entre
outros. Existem também outras estantes com cestas de brinquedos diversos e outros
brinquedos maiores como, por exemplo, o fogão de madeira em tamanho próprio para as
crianças. Nessa parede também se podem visualizar os cartazes “Ajudantes do Dia”, “Quem
somos” e “Aniversariante do mês”.
Na parede à direita da porta de entrada, estão organizadas as fantasias, outros
brinquedos, palco para teatrinho e os murais com trabalhos expostos das crianças. No centro
da sala encontram-se duas mesas pequenas com quatro cadeiras em cada uma.
A sala da turma de 05 anos também é menor que a sala do maternal. Os objetos e
móveis da sala trazem a seguinte disposição: em uma parede, à esquerda da porta de entrada,
encontra-se o cabide para pendurar mochilas, pastas e merendeiras e o armário da professora
com diversos materiais. Acima do cabide e do armário (que não é alto) podem-se visualizar os
murais onde ficam expostos os trabalhos das crianças. Na outra parede, à frente da porta de
entrada, estão estantes baixas com diversos brinquedos, cartazes “Quem Somos”,
“Aniversariantes do Mês” e “Ajudantes do Dia”, cabide para pendurar as canecas para beber
água, o filtro e a lixeira.
Na parede à direita da porta de entrada, há a pia, as janelas, cabide para pendurar as
toalhas de mão e estantes com brinquedos. Na parede da porta de entrada, encontra-se o
cantinho de leitura, o quadro para giz, o varal da rotina diária abaixo do quadro de giz,
espelho e uma mesa onde são colocados os estojos com canetinhas, lápis de cor e outros
materiais das crianças. No centro da sala temos quatro mesas pequenas, que permitem o
assento de quatro crianças cada uma.
A sala da turma de 06 anos localiza-se no lado oposto das demais, depois do pátio
coberto, que é utilizado pelo Ensino Fundamental. Possui dimensões maiores do que as outras
32
salas a que me referi. Observo, ao entrar, que as mesas e cadeiras são individuais e estão em
cinco fileiras, cada fileira com três mesas, uma atrás da outra, o que lembra o modelo de
disposição adotado pelo Ensino Fundamental em grande parte das escolas.
Na parede da porta de entrada para a sala encontram-se dois murais grandes onde
estão expostos os trabalhos das crianças. Abaixo desses murais estão os cabides para pendurar
as mochilas, pastas e merendeiras. Na outra parede, à esquerda da porta de entrada, estão a
mesa e a cadeira da professora, um enfeite de madeira mostrando o humor da professora ou
das crianças com carinhas diferentes, o cantinho de leitura, o quadro para giz, cartazes
“Ajudantes do Dia”, “Aniversariantes do Mês” e “Quantos Somos”, cabide para pendurar as
canecas que as crianças utilizam para beber água, filtro, lixeira e cabide para toalhas de mão.
Na parede à frente da porta de entrada, encontram-se vários murais com trabalhos
expostos das crianças, estantes com diversos brinquedos e o armário da professora. Na outra
parede, à direita da porta de entrada, temos vários brinquedos, espelho, fantasias, cabana de
índio e caixa com folhas, cartolinas, papel pardo, entre outros materiais.
A sala da turma de 06 anos não possui pia como as outras salas descritas, outra
diferença é o fato de ser a única sala contendo a mesa e a cadeira específica da professora, já
que nas outras salas de atividades as professoras sentam junto com as crianças.
No decorrer da pesquisa, as professoras demonstraram uma boa convivência entre si e
também com a coordenadora pedagógica. Compartilharam idéias e experiências umas com as
outras; fizeram um planejamento coletivo juntamente com a coordenadora, além do
planejamento individual.
No planejamento coletivo, em reunião com a coordenadora, elas discutiram as
unidades temáticas ou conteúdos a serem trabalhados nos bimestres, planejaram as atividades
e programaram os trabalhos com as datas comemorativas, como, por exemplo, Dia das Mães e
Festa Junina.
33
No planejamento individual, entregue para a coordenadora, cada professora abordou as
necessidades específicas da sua turma dentro das unidades a serem desenvolvidas e
planejaram outras atividades enriquecedoras.
Devido ao fato de as professoras compartilharem as atividades entre si há grande
semelhança das práticas desenvolvidas nas turmas, pois elas seguem a mesma unidade
temática e caminham juntas, utilizando atividades similares. Assim, tive oportunidade de
observar uma mesma proposta de atividade ser desenvolvida nas quatro turmas.
Somente a professora Talita, que atua na turma de alunos com 05 anos, ao desenvolver
seu planejamento, acrescentou atividades diferentes.
Durante o trabalho de campo, também participei de reuniões de planejamento da
coordenadora pedagógica com as professoras e de reuniões de pais. Além disso, pude coletar
alguns materiais como as fichas de avaliação utilizadas pelas professoras.
O trabalho de campo promoveu o contato direto com a realidade a ser pesquisada e
trouxe pistas e indícios significativos a serem analisados nos capítulos subseqüentes.
34
2. DIALOGANDO COM OS AUTORES E COM AS PROFESSORAS PARA
COMPREENDER A AVALIAÇÃO EM DIFERENTES CONTEXTOS
Defino a avaliação da aprendizagem como
um ato amoroso, no sentido de que a avaliação, por si,
é um ato acolhedor, integrativo, inclusivo. Para compreender
isso, importa distinguir avaliação de julgamento.
(LUCKESI, 2005, p. 172)
Neste capítulo abordarei a questão da avaliação, de acordo com a perspectiva de
Ludke e Mediano (1992), Perrenoud (1999), Afonso (2000) e Luckesi (2005), levando em
consideração que a avaliação não é neutra, visto que tem uma orientação social e política que,
por sua vez, está enquadrada nos interesses de mercado que conduzem o campo dos saberes e
a sociedade (SANTOMÉ, 2004, 1998).
Embora eu não desconsidere as contribuições de outras áreas, como, por exemplo, a
psicologia e a didática, concordo com Perrenoud (op. cit.), quando explicita que é preciso
abordar a questão da avaliação a partir de um olhar sociológico, que a avaliação envolve
questões sociais que englobam controle e poder.
Bem antes de regular as aprendizagens, a avaliação regula o trabalho, as
atividades, as relações de autoridade e a cooperação em aula e, de uma
certa forma, as relações entre a família e a escola ou entre profissionais da
educação. Um olhar sociológico tenta constantemente considerar as lógicas
do sistema que dizem respeito ao tratamento das diferenças e das
desigualdades, e ao mesmo tempo, as lógicas dos agentes, que envolvem
questões mais cotidianas, de coexistência, de controle, de poder.
(PERRENOUD, 1999, p.11)
A avaliação tem se constituído em um amplo tema de estudos no meio acadêmico.
Afonso (op. cit.) identifica que a avaliação pode ser analisada dentro dos sentidos: mega,
macro, meso e micro.
O contexto mega se refere à avaliação internacional, com estudos de escolas e grupos
de alunos de países diferentes, estabelecendo comparações e discutindo modelos avaliativos a
35
serem adotados de um país para outro. Como exemplo, menciono o Programa Internacional de
Avaliação de Alunos (PISA), desenvolvido e coordenado internacionalmente pela
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No Brasil o programa
é coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira”
(INEP). O PISA possui o objetivo de produzir indicadores sobre a efetividade dos sistemas
educacionais, avaliando o desempenho de alunos na faixa dos 15 anos, idade em que se sugere
o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. A proposta do programa
avalia até que ponto os alunos que estão terminando a educação obrigatória adquiriram
conhecimentos e habilidades essenciais para a participação efetiva na sociedade. As
avaliações do PISA enfatizam três áreas: Leitura, Matemática e Ciências.
O sentido macro enfoca os sistemas educativos dentro de um mesmo país, em que se
podem estabelecer comparações sobre o desempenho das escolas, dentro de um sistema de
ensino. No contexto brasileiro, cito, como exemplo, a avaliação realizada pelo Ministério da
Educação e do Desporto (MEC) através do Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Básica (SAEB).
Já no sentido meso aborda-se a avaliação dentro de uma escola, com base na avaliação
institucional, com ênfase na escola como um todo. A instituição escolar pode analisar como
está o desenvolvimento de suas ações, quais os seus objetivos, o que tem favorecido o
processo de ensino-aprendizagem, o que tem prejudicado, o que precisa ser revisto ou que
alterações são necessárias para os ajustes diante dos problemas enfrentados pela instituição.
Entretanto, muitas vezes, observa-se que essa avaliação tem se limitado a estabelecer
comparações entre turmas de alunos dentro da escola.
O sentido micro analisa a avaliação dentro da sala de aula, na relação professor-aluno,
voltada para a aprendizagem. Quase sempre essa avaliação prioriza constantemente o aluno e
36
seu rendimento. Algumas escolas até avaliam o professor e o método de ensino, mas o aluno
tem sido colocado como referência dessa ação.
Apesar da amplitude do tema e dos diferentes contextos em que ele pode ser analisado,
neste trabalho, priorizei o sentido micro que se refere à sala de aula, dentro do foco proposto
nesta pesquisa, que é a avaliação na educação infantil. Nesse caso, a pesquisa foi
desenvolvida com o olhar voltado para a sala de atividades na educação infantil.
Contudo, é necessário destacar alguns aspectos da avaliação educacional com o intuito
de visualizar os caminhos percorridos através das diversas modalidades e perspectivas
relacionadas ao tema, de modo que a sua aplicação na educação infantil seja compreendida,
uma vez que a concepção de avaliação está ligada às concepções de infância, criança e
aprendizagem.
Primeiramente, relatarei a origem da avaliação e como os conceitos sobre avaliação
foram construídos ao longo do tempo, fato que se reflete nas práticas adotadas nos dias atuais,
demonstradas pelas pistas retiradas das entrevistas e das observações desta investigação. Em
seguida, enfocarei o que significa avaliar e o que envolve esse processo. E, finalmente,
abordarei a avaliação dentro do contexto da educação infantil, trazendo as contribuições
teóricas e analisando os indícios encontrados no trabalho de campo.
2.1 Avaliação: conceitos e práticas construídos historicamente
Sobre a história da avaliação compreendo que a ela está diretamente ligada a
concepção de escola e de educação. Alguns autores analisam essa relação, construída
historicamente, em que a avaliação é o instrumento de controle, poder e seletividade. Dentre
eles, destaco as contribuições de Ludke e Mediano (1992), Penna Firme (1994), Saul (1994),
37
Dalben (1998), Perrenoud (1999), Afonso (2000), Barriga (2003), Esteban (2003a, 2003b),
Garcia (2003) e Luckesi (2005).
Os estudos sobre o surgimento da avaliação fazem referência ao exame adotado pela
burocracia chinesa para selecionar os candidatos a um cargo público (BARRIGA, 2003;
GARCIA, 2003). Tal o exame não estava associado a uma questão educativa, constituindo-se
como um instrumento de controle social (AFONSO, 2000).
No âmbito educacional, Garcia (op. cit.) relata que Durkheim fez referência ao exame
na universidade medieval no século XV, em que os candidatos a bacharel, a licenciado e a
doutor passavam por um ritual para mostrar os conhecimentos intelectuais adquiridos durante
a escolaridade.
Na Idade Média, o ensino estava ligado ao domínio da Igreja e a avaliação era
representada por uma submissão ao que era ensinado e à ordem natural das coisas, em que as
condições sociais eram estabelecidas pelo nascimento, sendo o ensino destinado àqueles que
tinham o dom de aprender, dom que era reforçado pelas condições financeiras da família.
Segundo Le Goff (1989, p. 57), com o surgimento dos intelectuais na Alta Idade
Média, as relações entre ensino e ofício mudam, visto que os intelectuais associaram o pensar
e o ensinar a uma profissão, a de professor, a quem cabia oferecer o conhecimento,
perspectiva que ganha força com o surgimento das cidades.
Homem de ofício, o intelectual tem consciência da profissão a assumir. Ele
reconhece a ligação necessária entre ciência e ensino. Não julga mais que a
ciência deve ser entesourada, mas está persuadido de que deve ser posta em
circulação. As escolas são as oficinas de onde se exportam as idéias como
mercadorias. No espaço urbano, o professor se aproxima, no mesmo
impulso produtivo, do artesão e do mercador.
Petitat (1994) conta que, na Idade Média, a regra era o aprendizado direto, sendo
transmitido pela família. Nas cidades começaram as primeiras inovações que favoreceram o
38
surgimento dos colégios e de escolas com instrumentos de avaliação ainda adotados
atualmente.
Nas cidades, as comunidades profissionais de artesãos e comerciantes iniciaram
pequenas corporações que ensinavam ao aprendiz o ofício pretendido. A família interessada
fazia um contrato com o mestre para que o filho pudesse aprender o ofício. No contrato eram
estabelecidos os preços, os deveres do mestre e do aprendiz e a duração da aprendizagem. O
aprendiz deixava sua família e passava a conviver com o mestre, trabalhando e aprendendo na
corporação.
Depois do cumprimento do contrato, o aprendiz era considerado “companheiro” e, se
tivesse condições financeiras para comprar as ferramentas necessárias, poderia montar o seu
próprio negócio e tornar-se mestre. Caso não possuísse recursos, poderia oferecer seus
serviços como assalariado no mercado de trabalho.
Dessa forma, com o desenvolvimento das cidades, a escola não estava totalmente
vinculada e dependente da Igreja, os comerciantes podiam criar escolas de acordo com os seus
interesses, priorizando, assim, o ensino para o trabalho.
Desse modo, surgiram as escolas elementares, com o intuito de alfabetizar e ensinar o
cálculo, com um currículo de acordo com as necessidades do contexto e não simplesmente
seguindo o currículo com conteúdos religiosos, mas adaptando-o à realidade local, com base
nos interesses comerciais.
Segundo Petitat (1994), algumas dessas escolas ministraram o ensino em uma única
sala, freqüentada por todos os alunos, não havia divisão de séries e o aluno que demorava a
aprender não era eliminado, apenas permanecia mais tempo na escola. A avaliação era
realizada informalmente, de acordo com os conhecimentos demonstrados pelo aluno e não
tinha cunho punitivo, somente indicava se o aluno necessitava de mais tempo para aprender.
39
O ensino era voltado para o comércio e para o aprendizado futuro dos alunos que iriam
continuar seus estudos.
Por outro lado, as universidades da Idade Média, compostas por comunidades de
mestres e estudantes, também atacaram o monopólio de ensino vinculado à Igreja e adotaram
princípios de associação corporativa, o que facilitou a autonomia das universidades em
relação aos poderes religiosos e civis. Nas universidades, em geral, os estudantes escolhiam
os professores, que ministravam aulas em salas alugadas ou em domicílio. Não existia
separação entre estudantes novatos e veteranos. Todos assistiam às mesmas aulas e o ensino
não era ministrado em um único estabelecimento.
Petitat (1994) considera que nessas universidades não havia ênfase em exames ou
promoções anuais para verificação de aprendizagem. Na realidade, o exame era uma
consagração ritual do saber adquirido e não uma avaliação com o intuito de medir ou verificar
a aprendizagem. Entretanto, esse tipo de avaliação sofreu mudanças com o surgimento dos
colégios a partir do século XVI e com as transformações na estrutura da escola.
O autor informa que a maioria dos colégios foi criada pelo poder civil, em colaboração
com igrejas e com o intuito de alojar estudantes pobres. Aos poucos, essas casas de estudantes
foram se transformando em estabelecimentos de ensino, com características próprias, tais
como gradação das matérias, concentração dos cursos dentro dos estabelecimentos,
supervisão, disciplina e controle dos conteúdos adquiridos.
Alguns colégios começaram a introduzir a divisão dos alunos por classes, adotaram
um mestre específico para cada turma de alunos e a gradação das matérias, defendida com o
objetivo de adaptar os conteúdos ao desenvolvimento do aluno. As divisões em classes
serviam para organizar o ensino e manter os estudantes ao controle do mestre.
Assim, com essa nova estrutura escolar, os alunos passaram a ter um tempo limitado
para assimilar os conteúdos, executar suas atividades escolares e se submeter a um exame. O
40
desempenho escolar era enfatizado com censuras ou recompensas. A partir daí, os alunos que
correspondiam ao bom desempenho eram promovidos e os que demonstravam um mau
desempenho eram rebaixados ou até eliminados. Outro ponto que merece destaque refere-se
aos exercícios orais que foram substituídos por provas e exercícios escritos.
Dessa forma, a avaliação começa a desempenhar a função seletiva de premiar os
melhores e de punir os que não correspondiam aos padrões estabelecidos de aprendizagem.
No século XVI, a pedagogia dos jesuítas definida pela Ratio Studiorum (GOMES,
1996) contava com normas para a orientação dos estudos escolásticos e com atenção especial
ao ritual de provas e exames (LUCKESI, 2005). Durante a colonização do Brasil, a pedagogia
jesuítica também exerceu grande influência através do ensino e da catequização, com a
utilização de provas e exames para verificar a aprendizagem e ter o domínio dos
conhecimentos ensinados.
Garcia (2003) afirma que, no século XVII, o exame foi institucionalizado através de
Comenius com a Didactica Magna, em 1657, e por meio de La Salle com Guia das Escolas
Cristãs, em 1720. Comenius considerava o exame como um problema metodológico com o
intuito de promover a aprendizagem e, caso esta não acontecesse, caberia ao educador
repensar seu método. Por outro lado, La Salle enfatizou o exame como uma supervisão
permanente sobre o aluno, dando ênfase ao controle sobre a aprendizagem. De acordo com a
autora, até hoje essas idéias interferem na avaliação escolar, que pode ser entendida como
problema metodológico ou como forma de controle.
Dalben (1998) relata a história da avaliação naquela época e afirma que as lutas
travadas nos séculos XVI e XVII, culminando com a Revolução Francesa no século XVIII,
reforçaram a superação das estruturas feudais e facilitaram o advento do capitalismo, uma vez
que promoveram uma mudança de paradigmas na sociedade.
41
A partir da metade do século XVIII, com a Revolução Industrial e a expansão de
novos conhecimentos, decorrentes das grandes navegações e da imprensa, ocorreu uma crise
na própria visão de mundo (SANTOMÉ, 2004, 1998) e muitas mudanças surgiram na
sociedade, na escola e, conseqüentemente, na avaliação.
Até o século XVIII os sistemas escolares excluíam a maioria das crianças pobres,
provenientes das populações sem recursos financeiros. Essa exclusão social era reforçada pela
avaliação, que valorizava o conhecimento prévio dos alunos proveniente de famílias ricas,
comparando com a falta de instrução do aluno pobre.
Essa diferença entre a avaliação do aluno rico e do aluno pobre pode ser encontrada
nos dias de hoje, em que os recursos sociais e financeiros são considerados na avaliação,
como demonstra o fragmento a seguir:
Berenice (turma 03 anos): As crianças são pequenas, mas hoje a gente uma diferença
muito grande [...] parece que vêm mais maduras para a gente, chegam com uma carga
maior até de conhecimento de tudo [...] elas chegam bem espertas, é um pulinho para
desenvolver mesmo. Eu acho que é assim, principalmente na nossa área aqui que é um nível
também melhor, é como é que eu posso te dizer, a gente acaba que essa diferença assim
mais gritante, do que em outro nível social [...] m com muita informação também de
casa. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
A professora Berenice considera que a criança de um nível social mais elevado tem
mais facilidade de se desenvolver em relação à criança de outro meio social menos
privilegiado. Como as informações trazidas de casa e o conhecimento prévio fazem com que
essas crianças sejam mais espertas que outras, a avaliação não enfoca somente o desempenho
do aluno, mas os recursos sociais a que a criança tem acesso.
Diante dessa idéia que diferencia a avaliação da criança rica e da criança pobre,
Dalben (1998) analisa que, com a criação dos modernos Estados Nacionais nos séculos XVIII
e XIX, o poder público reconheceu a necessidade de estabelecer uma escola para o povo.
42
Dessa forma, vários interesses apareceram em torno de um ensino popular com a preocupação
em formar o cidadão e o futuro trabalhador.
O ambiente urbano trouxe inovações à sociedade, bem como à constituição dos
colégios e escolas. A modificação nas estruturas das famílias, com a incorporação dos
homens e mulheres ao mercado de trabalho, favoreceu o interesse pela escola como
instituição adequada para formar as crianças como mão-de-obra para o mercado de trabalho,
respeitando a ordem social a que pertencia, sendo educada para aceitar o seu lugar na
sociedade. A escola também possuía a função seletiva através da qual atribuía a
responsabilidade pelo sucesso ou fracasso ao aluno com base nas aptidões biologicamente
herdadas pelo indivíduo. Assim, a estrutura de ensino reproduzia as relações sociais,
reforçando a desigualdade.
Segundo Perrenoud (1999), a avaliação foi estabelecida com o nascimento dos
colégios, no século XVII e, a partir do século XIX, passou a ser associada ao ensino de massa
com a escolaridade obrigatória.
Nesse contexto, a avaliação originou o que Luckesi (2005) denomina de “pedagogia
do exame”, em que a prática educativa é direcionada pela avaliação e não pelo processo de
ensino-aprendizagem. Segundo o autor, a “pedagogia do exame” traz várias conseqüências
que podem ser resumidas no sentido pedagógico, psicológico e sociológico. No âmbito
pedagógico, a atenção educativa é centrada no exame e não auxilia na aprendizagem do aluno,
visto que somente classifica e exclui, não procurando melhorar a aprendizagem em si; no
sentido psicológico, é utilizada para desenvolver comportamentos e personalidades submissas
e, no sentido sociológico, reforça o processo de seletividade social.
Assim, a “pedagogia do exame” favorece a manutenção de uma sociedade de classes, a
serviço de um modelo social dominante:
43
Essa característica das provas/exames não é graciosa. Ela está
comprometida, como tenho denunciado em textos e falas, com o modelo de
prática educativa e, conseqüentemente, com o modelo de sociedade, ao qual
serve. A prática de provas/exames escolares que conhecemos tem sua
origem na escola moderna, que se sistematizou a partir dos séculos XVI e
XVII, com a cristalização da sociedade burguesa. As pedagogias jesuítica
(séc. XVI), comeniana (séc.XVII), lassalista (fins do século XVII e inícios do
XVIII) são expressões das experiências pedagógicas desse período e
sistematizadoras do modo de agir com provas/exames. A prática que
conhecemos é herdeira dessa época, do momento histórico da cristalização
da sociedade burguesa, que se constitui pela exclusão e marginalização de
grande parte dos elementos da sociedade. (LUCKESI, 2005, p. 196)
Dessa forma, fica claro que a educação e as práticas avaliativas não são neutras, elas
sempre estão servindo aos interesses e intenções de quem conduz o conhecimento associado
ao poder econômico.
Ainda sobre a avaliação dentro desse processo de seleção social, a nota é enfatizada a
partir do século XIX como critério de seleção, sendo que, no século XX, embora o discurso
pedagógico tenha substituído o termo exame pelas palavras teste e prova objetiva, continuou-
se com o mesmo objetivo de controlar o desempenho escolar em virtude de preparar os mais
aptos para o mercado de trabalho. Posteriormente, os termos teste e prova foram substituídos
por avaliação (BARRIGA, 2003).
Conforme Penna Firme (1994) e Parente (2004), a avaliação, durante o século XX,
passou por quatro gerações, em que assumiu características peculiares. Na primeira geração,
nas décadas de 1920 e 1930, a avaliação esteve estreitamente ligada à medida, por isso é
chamada de geração da medida. O avaliador exerceu um papel técnico e os instrumentos
utilizados para medir o rendimento escolar foram os testes de aptidão, os exames e a
classificação do aluno.
Nas décadas de 1930 e 1940, a avaliação tornou-se mais abrangente e descritiva, o que
constitui sua segunda geração. É denominada a geração da descrição. O currículo foi revisto e
os registros de comportamento, as escalas, os inventários eram os recursos utilizados com o
intuito de informar sobre o desenvolvimento da aprendizagem, de acordo com os objetivos
44
curriculares. O papel do avaliador era descrever padrões e identificar limites e potencialidades
dentro dos objetivos educativos.
A terceira geração ocorreu entre as décadas de 1950 e 1980, em que a avaliação
priorizou o sentido de julgamento, através do juízo de valor e da preocupação com o mérito e
com resultados positivos. O avaliador exercia o papel de julgar com base em funções técnicas
e descritivas. Os instrumentos englobavam a mensuração e a descrição.
Nessa época, a partir da segunda metade do século XX, a avaliação foi norteada pela
dimensão técnica (BARRIGA, 2003). Havia grande ênfase na educação com a intenção de
eliminar os hábitos inadequados e ensinar conhecimentos que atendessem aos interesses da
indústria. O papel da escola era preparar o homem para o trabalho e a avaliação selecionava
os melhores candidatos.
A quarta geração analisada por Penna Firme (1994) e também por Parente (2004)
ocorreu na década de 1990, quando se adotou a negociação e o consenso como critério de
avaliação. As escolhas avaliativas eram fundamentadas no paradigma construtivista, com
ênfase no processo interativo e negociado, sendo a avaliação abrangente e flexível,
comportando diferentes olhares.
Barriga (2003) considera que, apesar dos avanços, a idéia de avaliação ainda remete à
medição e, muitas vezes, o critério de medida é baseado no resultado final, que é fruto de uma
ação pontual, descontínua e opressora, em que a escola nega suas funções sociais quando
atribui a cada aluno a responsabilidade por seu desempenho. Nesse caso, considero que o
processo de avaliação escolar ainda tem fomentado a competitividade, a rivalidade e o
individualismo.
Apesar da proposta da última geração de avaliação ser aberta e dinâmica, os outros
tipos de avaliação descritas nas gerações anteriores ainda se encontram presentes nos dias de
46
partir de suas vivências no grupo.” Na avaliação da criança pequena não cabem
generalizações em que atitudes são esperadas e valorizadas dentro de um mesmo padrão que
resume a avaliação em uma ficha para todas as crianças como se elas fossem iguais, não
levando em consideração a diversidade de aprendizagem.
Considero que nos aspectos expostos nas fichas estão mescladas influências das quatro
gerações de avaliação explicitadas anteriormente. A medida é realizada pela freqüência das
situações, cada item traz uma série de descrições voltadas para o desenvolvimento social,
emocional, cognitivo e formação de hábitos adequados. A ficha também enfoca participação,
cooperação e autonomia, que são aspectos enfatizados pela quarta geração fundamentada no
paradigma construtivista. Dessa forma, há uma mistura de modelos de avaliação, o que
implica uma falta de definição quanto à sua concepção.
Percebo também que o trajeto percorrido pela avaliação, em seus conceitos e em suas
práticas, foi construído historicamente e interfere na escola nos dias de hoje. Para
compreender esse processo, é necessário analisar o que significa avaliar, algumas
modalidades avaliativas e suas atuais implicações pedagógicas.
2.2 Avaliação: diferentes significados, modalidades e intenções
É possível encontrar várias definições sobre avaliação, como também uma diversidade
de modalidades nas práticas avaliativas. Nesse contexto, Afonso (2000, p. 27) analisa que:
Sendo a avaliação um dos processos pedagógicos mais importantes, pode
afirmar-se, por analogia, que a escola socializa através da avaliação, mas
não de uma maneira mecanicista. Assim, as diferentes modalidades de
avaliação terão, elas próprias, impactos muitos diferentes na socialização
dos indivíduos em escolarização e nem todas serão igualmente funcionais
para o mundo do trabalho.
47
Considerando que a escola socializa através da avaliação, neste trabalho, discutirei
algumas dessas definições e modalidades que expressam intenções sobre o papel da avaliação
no contexto escolar.
Luckesi (2005, p. 69) define avaliação como “um juízo de qualidade sobre dados
relevantes, tendo em vista uma tomada de decisão.” O autor analisa que, para cumprir o seu
papel, o ato de avaliar trabalha com três variáveis: juízo de qualidade, dados relevantes e
tomada de decisão.
O juízo de qualidade estabelece comparações com um “padrão ideal de julgamento”
determinado por quem avalia. Por exemplo, o professor compara a aprendizagem do aluno
com suas expectativas, que correspondem ao seu padrão ideal de julgamento, e emite uma
qualidade ao desempenho do aluno.
Dentro da avaliação, o juízo de qualidade é baseado em “dados relevantes da
realidade”, ou seja, no desempenho do aluno, que pode ser demonstrado através de notas,
provas, exercícios ou do comportamento na sala de aula. Esses dados relevantes mostram
também se a aprendizagem foi satisfatória ou não. A partir desses dados, acontece a “tomada
de decisão” que envolve assumir uma posição a favor ou contra aquilo que foi julgado. Dessa
forma, engloba uma decisão de quais atitudes tomar diante do aluno em relação à
aprendizagem.
Assim, penso que a ficha individual de observação do aluno reflete o que o autor diz
sobre juízo de qualidade, pois representa um padrão a ser seguido. Os dados relevantes são
embasados nas situações ou comportamentos previstos na descrição dos itens da ficha. A
tomada de decisão envolve a escola, na figura da professora, e a família, visto que a ficha é
entregue na reunião de pais. Eles recebem a ficha, analisam, assinam no lugar correspondente
ao bimestre avaliado e a devolvem para a professora. Na ocasião, os pais conversam com a
professora sobre a avaliação exposta na ficha e tomam uma decisão sobre o que fazer em
48
relação à criança quando registro de algum problema, como, por exemplo, agressividade
em relação aos colegas ou com a professora.
Luckesi (2005, p. 92) faz uma distinção importante entre verificar e avaliar. De acordo
com o autor, o termo verificar vem do latim e significa “fazer verdadeiro”, refere-se a
“investigar a verdade de alguma coisa”. O termo avaliar também se origina do latim e
significa “dar valor a ...”, implica “atribuir um valor ou qualidade a alguma coisa, ato ou curso
de ação.” O autor analisa que a verificação constata algo sobre o objeto, permanecendo
estática; por outro lado, a avaliação atribui uma qualidade e direciona uma ação ao objeto,
uma ação com base na tomada de decisão que requer uma postura diante da situação
encontrada.
Outros autores como Esteban (2003a, 2003b) e Hoffmann (2003a, 2003b, 2005a,
2005b) também enfatizam que a avaliação implica reflexão e ação. Concordo com esses
autores e penso que a avaliação somente tem razão de existir se estiver vinculada a uma
reflexão e ação, visto que uma avaliação punitiva e excludente não traz contribuições para a
aprendizagem e para a criança.
Conforme o Dicionário de Sinônimos e Antônimos da Língua Portuguesa
(FERNANDES, 1995), avaliar significa: “Orçar, computar, calcular, estimar, apreciar,
apreçar, aquilatar, taxar, arbitrar, cotar, julgar, louvar, medir, pesar, ponderar (...)”.
Dessa forma, constato que avaliar envolve um julgamento, uma apreciação, o que me
faz perceber que o ato de avaliar depende de quem avalia, uma vez que representa um olhar
do outro sobre o indivíduo que está sendo avaliado.
Outro ponto interessante nessa definição é que avaliar significa “louvar”, ou seja,
elogiar. Nesse sentido, compreendo que avaliar não remete a um julgamento somente, mas em
reconhecer as possibilidades e os avanços alcançados. Entretanto, analiso que muitas vezes os
49
elogios são esquecidos ou abafados em razão de práticas avaliativas voltadas para a punição e
classificação.
Outra definição sobre avaliação pode ser encontrada no Novo Dicionário da Língua
Portuguesa (FERREIRA, 1986):
1. Ato ou efeito de avaliar (-se).
2. Apreciação, análise.
3. Valor determinado pelos avaliadores.
Avaliação formativa. Processo de avaliação realizado no decorrer de um
programa instrucional visando aperfeiçoamento.
Avaliação somativa. Processo de avaliação final de um programa
instrucional visando aperfeiçoamento
.
Nessa definição visualizo três conceitos e duas modalidades avaliativas explicitadas.
Primeiramente avaliação remete a um ato, uma prática, uma ação de avaliar alguém ou
alguma coisa ou avaliar a si mesmo, ou seja, uma auto-avaliação. Aqui percebo que avaliação
engloba o olhar do outro e o olhar sobre si mesmo.
Dalben (1998) afirma que a avaliação está presente na atividade humana em todos os
seus domínios; seja em uma simples escolha de qual caminho tomar para o trabalho ou nas
reflexões mais complexas sobre nossos pensamentos e decisões que direcionam nossas
atitudes.
O ser humano avalia-se constantemente no decorrer de toda sua vida, na medida em
que vivencia situações em que é necessário escolher, tomar decisões, dialogar e refletir sobre
as ações. A avaliação está constantemente ligada ao processo de reflexão (ALARCÃO, 2004).
Assim, a escola é uma instituição composta por pessoas, seres humanos que avaliam e se
avaliam com base em suas histórias, experiências e identidades.
Hoffmann (2003a, p. 148-49) também compartilha dessa visão e diz que avaliamos
nossos atos diários como uma tentativa de melhorar nossas vidas. Isso ocorre em todo tempo,
sempre procuramos melhores soluções para um problema vivenciado e aprendemos com
50
nossos erros. Dessa forma, a autora questiona: “Se a avaliação na vida tem gosto de
recomeçar, de partir para melhor, de fazer muitas outras tentativas, por que na escola, se
mantém o significado sentencivo, de constatação, provas de fracasso, periodicidade rígida?
Percebo que, quando a escola pensa a avaliação como julgamento e punição, essa
forma de avaliar está baseada em suas concepções sobre o papel da escola e do aluno nesse
processo, uma vez que se a escola se considera como detentora do saber, o aluno é visto como
um recipiente onde esse saber é depositado (FREIRE, 1996).
Desse modo, constato que a avaliação, muitas vezes, tem sido usada como um recurso
para punir alunos e, por outro lado, os próprios professores e as escolas. Quando se questiona
a capacidade de um professor ao ensinar ou quando se estabelecem critérios para comparar as
escolas umas com as outras, a avaliação está sendo um instrumento de exclusão.
Contudo, entendo que é preciso mudar essa visão sobre a avaliação, transformando-a
em um instrumento que favoreça toda a comunidade escolar. Concordo com Santomé (2004,
p. 28) quando afirma que:
Promover aprendizagens mais ricas, prestando atenção a destrezas
cognitivas mais complexas como a reflexão, a análise, a avaliação da
informação, assim como as dimensões sociais, emocionais e morais
implicadas em todo o processo de aprendizagem foi o que criou um
determinado consenso na comunidade educativa sobre a necessidade de
formas de avaliação mais qualitativas, de busca de estratégias menos
precisas, contudo mais adequadas ao prosseguimento dos estudos por parte
dos estudantes. Fomentar este tipo de aprendizagens obrigou a potenciar
metodologias didácticas e estratégias de avaliação que têm de prestar
atenção, não aos conteúdos trabalhados nas aulas, como também aos
processos cognitivos, às dimensões sociais, emocionais e morais implicadas
no processo de ensino de aprendizagem.
Em continuidade com as discussões acima sobre avaliação, a segunda definição
apresentada pelo Novo Dicionário da Língua Portuguesa (FERREIRA, 1986) aponta uma
apreciação, uma análise, o que sugere algo mais profundo e global. Já o terceiro conceito
51
afirma que avaliação é um valor determinado por outras pessoas, por avaliadores, novamente
avaliar representa um juízo de valor.
Ainda o Novo Dicionário (FERREIRA, op. cit.) traz dois tipos de avaliação. Uma,
formativa, em que o processo é priorizado, e outra, somativa, com base no resultado final. É
importante destacar que ambas as avaliações têm o objetivo de aperfeiçoar, o que difere é o
tempo em que elas são realizadas, uma no decorrer do processo e outra no final.
Essas definições exemplificam o que ocorre no cotidiano escolar. Geralmente a escola
adota uma avaliação somativa ou formativa ou, ainda, faz uma junção dessas duas
modalidades, o que demonstra que se podem renovar algumas práticas, com referência a uma
avaliação formativa, mantendo, porém, a concepção somativa na avaliação (PERRENOUD,
1999).
Essa mistura pode ser visualizada nas fichas de avaliação: “Ficha Individual de
observação do aluno” e “Registros de Observação da Criança” da escola pesquisada (ANEXO
3 e 4), como demonstra o fragmento a seguir:
Noemi (turma 04 anos): Primeiro a gente tem uma ficha de avaliação, que vem [com] a
rotina do dia nessa ficha, então ali, geralmente [observa] três alunos por dia,[é] que às vezes
não[dá] tempo três[alunos por dia] por causa do ritmo do trabalho, [então] eu avalio um item
de um aluno:[por exemplo] socialização, momento de socialização, o outro[aluno no]
momento da rodinha, momento do parque, como que a criança interagiu nesse momento, se
ela ficou envolvida pela atividade ou não. Então, faço esse registro, a gente faz um resumo
[registro] mensal, por exemplo, agora do bimestre, [...] o que chamou mais a atenção do mês
de maio, junho, julho. [Registro de Observação da Criança] Isto é por mês e tem a ficha
também, a ficha cognitiva [Ficha Individual de observação do aluno] que foram os conteúdos
daquele mês, é uma ficha como ela se relacionou com os amigos, [...] fala de hábitos também
diários. (Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Com base no fragmento acima, entendo que uma mistura entre a avaliação
formativa e somativa expressa nas fichas de avaliação. Os registros de observação trazem uma
avaliação formativa, enquanto que a ficha individual de observação do aluno está
52
fundamentada em uma avaliação somativa demonstrada pela freqüência de atitudes
previamente esperadas com relação aos conteúdos ensinados e à formação de hábitos.
De acordo com Afonso (2000), as diferentes modalidades avaliativas envolvem várias
funções, explícitas ou não. No entanto, é importante compreender que “a própria escolha das
modalidades e técnicas de avaliação dos alunos supõe e implica uma determinada orientação
política.” (p.20)
Dessa forma, a avaliação engloba “jogos de poder” e “processos de negociação” em
que as intenções direcionam o seu objetivo. Essas intenções podem estar relacionadas com o
controle, com a classificação e com a exclusão. Nesse sentido, o autor analisa que o poder de
avaliar engloba outros poderes, como, por exemplo, o poder disciplinar, o poder físico, o
poder de recompensa, o poder de sanção, e o poder cognoscitivo, entre outros. Esses poderes
fazem parte dos “julgamentos de excelência” que, de acordo com Afonso (2000, p. 21),
De modo similar àqueles julgamentos que ocorrem nas instituições
psiquiátricas e judiciárias, os julgamentos de excelência, que ocorrem no
quotidiano da escola e da sala de aula, contribuem para fabricar imagens e
representações sociais positivas ou negativas, que, consoante os casos,
levam à promoção ou estigmatização dos alunos, justificando a sua
distribuição diferencial na hierarquia escolar.
Dentro desse jogo de poderes e dos julgamentos realizados, a avaliação esassociada
à criação de “hierarquias de excelência” (PERRENOUD, 1999, p. 11). A escola cria essas
hierarquias que se tornam leis estabelecidas e têm o poder de declarar quem têm êxito e quem
fracassa. Essas leis diferem de escola para escola, de um sistema de ensino para outro e, até
mesmo, de um professor para outro.
De acordo com Perrenoud (op. cit.), essas regras ou leis são formadas através da
grande diversidade de concepções e práticas adotadas na escola. Devido a essa diversidade,
não existe um consenso definido sobre as modalidades de avaliação.
53
Avaliar é cedo ou tarde criar hierarquias de excelência, em função das
quais se decidirão a progressão no curso seguido, a seleção no início do
secundário, a orientação para diversos tipos de estudos, a certificação antes
da entrada no mercado de trabalho e, freqüentemente, a contratação.
Avaliar é também privilegiar um modo de estar em aula e no mundo,
valorizar formas e normas de excelência, definir um aluno modelo, aplicado
e dócil para uns, imaginativo e autônomo para outros... Como, dentro dessa
problemática, sonhar com um consenso sobre a forma ou o conteúdo dos
exames ou da avaliação contínua praticada em aula? (PERRENOUD, 1999,
p. 9)
Afonso (2000) analisa algumas modalidades de avaliação que são divididas em dois
sentidos distintos: o primeiro diz sobre a avaliação sumativa (de sumário) e normativa ou
também chamada de tradicional, que abrange os testes estandardizados para medir a
inteligência e se relacionam com os interesses e objetivos da administração; o segundo diz
sobre a avaliação criterial, diagnóstica e formativa e refere-se aos propósitos e interesses
pedagógicos.
Segundo o autor, a avaliação normativa promove a competição e comparação como
valores educativos e atua com base em provas e testes, enfatizando a classificação. Por outro
lado, a avaliação criterial enfatiza a aprendizagem de cada aluno de acordo com os objetivos
traçados e verifica o desempenho individual, sem realizar comparações entre os resultados. A
partir dos resultados do aluno, atividades de compensação são programadas com o intuito de
sanar alguma dificuldade na aprendizagem.
Quanto à avaliação sumativa, Parente (2004) explica que se trata de uma apreciação
global da aprendizagem com base no controle da qualidade educacional. Nessa modalidade
podem-se utilizar exames para se verificar a qualidade do ensino.
Quanto à avaliação diagnóstica, a análise de Luckesi (2005) destaca que ela representa
um instrumento fundamental para ajudar o educando no processo de aprendizagem voltado
para a autonomia. O autor defende essa modalidade, justificando que:
Com isso, queremos dizer que a primeira coisa a ser feita, para que a
avaliação sirva à democratização do ensino, é modificar a sua utilização de
classificatória para diagnóstica. Ou seja, a avaliação deverá ser assumida
54
como um instrumento de compreensão do estágio de aprendizagem em que
se encontra o aluno, tendo em vista tomar decisões suficientes e
satisfatórias para que possa avançar no seu processo de aprendizagem.
(LUCKESI, 2005, p.81)
Nesse sentido, o diagnóstico na avaliação favorece a compreensão dos processos de
aprendizagem vivenciados pelo educando. O diagnóstico não julga o desempenho do aluno,
antes implica conhecer a situação de aprendizagem, objetivando uma tomada de decisão
diante do processo educativo.
Para Luckesi (op. cit.), a avaliação diagnóstica tem algumas funções fundamentais:
propiciar a autocompreensão do educando e também do educador, com a conscientização de
onde se está na aprendizagem e quais os caminhos possíveis; motivar o crescimento, com o
desejo de avançar no conhecimento e aprofundar a aprendizagem, identificando
potencialidades e auxiliando nas dificuldades a serem superadas. Nesse caso, com tal
modalidade é utilizada em benefício do educando, em minha percepção, registra-se um
significativo avanço em determinado pontos.
Completando os avanços da avaliação diagnóstica, a avaliação formativa envolve a
formação completa do educando. Assim, a avaliação é contínua e prioriza o processo de
aprendizagem voltado para a autonomia, não ocorrendo somente no início do ano ou no final,
mas durante a aprendizagem.
Perrenoud (1999) alerta que o diagnóstico somente pode ser útil se envolver uma ação
apropriada. Daí a avaliação formativa implicar uma “intervenção diferenciada a qual
proporciona não o reconhecimento dos avanços obtidos, mas também uma constante busca
pela aprendizagem, intervindo no processo de forma dinâmica. É mister ressaltar que a
avaliação formativa demanda uma relação de ajuda mútua entre o professor, o aluno e seus
pares.
Apesar dos avanços propostos pela avaliação formativa, como, por exemplo, a
continuidade do processo de aprendizagem e a intervenção pedagógica desafiadora, Hoffmann
55
(2005b, p. 20) considera que “Muda-se o jeito de fazer algumas coisas, mas não as
concepções dos professores. Assim ocorre também com alterações nos registros escolares e
sistemas de registros.” Dessa forma, percebo que muitas mudanças na avaliação são
superficiais. A despeito de, em muitas escolas, as notas tenham sido substituídas por
conceitos, o resultado é o mesmo: a classificação do desempenho do aluno.
Nesse sentido, Hoffmann (2005b) conclui que somente a postura mediadora do
professor pode fazer toda a diferença na avaliação formativa. Para isso, a autora propõe a
avaliação mediadora com base nas contribuições de Vygotsky.
A mediação promove o encontro através do diálogo entre educador e educando. O
professor ensina e aprende e o aluno também ensina e aprende, ao mesmo tempo. É um
diálogo constante, em que não existe julgamento, classificação ou fracasso. Todavia, é um
espaço de aceitação do outro, das diferenças e das potencialidades para a aprendizagem.
Nessa perspectiva, Esteban (2003, p. 18) afirma que “Ao dialogar com o aluno, ainda
que brevemente, e ao se dispor a aprender com ele, o professor desfaz muros e estabelece
laços.” Nesse contexto de relações, acredito que o professor pode estabelecer laços de
aprendizagem com seus alunos, através da mediação.
A avaliação mediadora possibilita um processo de “ação-reflexão-ação”
(HOFFMANN, 2005a, p. 37) tanto do professor, quanto do próprio aluno. Um educador
consciente de seu papel como mediador pode proporcionar situações de aprendizagem de
acordo com as necessidades do educando. O aluno, por sua vez, pode refletir sobre sua
aprendizagem e analisar suas conquistas e inquietações.
É importante ressaltar que a postura do professor como mediador interfere na dinâmica
escolar. É fundamental que o professor compreenda que a mediação acontece no processo de
construção do conhecimento e interfere na aprendizagem.
56
Como a Educação Infantil representa o primeiro contato da criança com a instituição
educacional, as experiências vindas dessa primeira experiência podem marcar profundamente
a criança e sua visão sobre a escola, o professor e a aprendizagem. Dessa forma, considero
fundamental que a avaliação na Educação Infantil esteja pautada nas contribuições de
Vygotsky (2004, 2000, 1998a, 1998b, 1996) sobre o desenvolvimento infantil na perspectiva
mediadora.
Para Vygotsky (op. cit.), o desenvolvimento infantil não deve ser visto como algo
periodizado ou fracionado de acordo com processos externos como a idade ou a
escolarização, ou ainda com base em processos internos de maturação, mas sim como um
processo que acontece num movimento dialético, não possuindo caráter evolutivo ou linear,
mas revolucionário, com alternância entre períodos estáveis e períodos de crises que são
fundamentais para as formações novas.
Pelo fato de as crises fazerem parte do desenvolvimento infantil, não conseguimos
detectar seu início e seu fim, porém, é possível perceber as mudanças na aprendizagem, seja
na relação que a criança estabelece com o contexto escolar, seja através da perda do interesse
pela escola.
Na Educação Infantil, esse conhecimento sobre as crises no desenvolvimento infantil
pode proporcionar ao professor a compreensão de situações vividas pelas crianças, visto que o
desenvolvimento humano ocorre na e através da interação social, em que a criança constrói
seu conhecimento e a si mesma enquanto sujeito com base nas relações sociais.
O desenvolvimento infantil é um processo dialético com idas e vindas, com
reviravoltas, crises e conflitos. Tudo isso é necessário para que a criança construa formações
novas, ou seja, seu conhecimento.
Vygotsky (1998a) afirma que a aprendizagem infantil começa muito antes de as
crianças ingressarem na escola. Para o autor, aprendizagem e desenvolvimento estão inter-
57
relacionados desde quando a criança nasce, devendo a aprendizagem ir além do
desenvolvimento. Para favorecer essa aprendizagem, o autor cria o conceito de zona de
desenvolvimento proximal, que é definida a seguir:
Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma
determinar através da solução independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas
sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais
capazes. (VYGOTSKY, 1998a, p. 112)
Assim, a zona de desenvolvimento proximal atua no que a criança pode fazer com a
colaboração do outro. Nesse sentido, aquilo que hoje a criança realiza em colaboração com o
outro, amanhã ela pode estar realizando sozinha. O processo de ensino-aprendizagem, nessa
perspectiva, está voltado para o que a criança não sabe fazer sozinha, mas que poderá realizar
através da mediação do outro.
Propomos que um aspecto essencial do aprendizado é o fato de ele criar a
zona de desenvolvimento proximal; ou seja, o aprendizado desperta vários
processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente
quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em
cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses
processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento independente
da criança. (VYGOTSKY, 1998a, p. 117, 118)
Dessa forma, percebo que a atuação da Educação Infantil demanda uma atuação de
acordo com o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. Uma ação voltada para a
aprendizagem que se adianta ao desenvolvimento, através da mediação do professor, o que
requer uma avaliação pautada na mediação e na inovação da prática pedagógica.
Conforme a proposta de Hoffmann (2005b, p. 25), a prática avaliativa mediadora
possui três princípios fundamentais: o princípio dialógico/interpretativo da avaliação; o
princípio da reflexão prospectiva e o princípio da reflexão-na-ação.
58
O primeiro princípio prioriza a avaliação como processo dialógico, com muitos
sentidos, que se convergem na construção conjunta de conhecimentos. O segundo princípio
aborda a avaliação através de leituras positivas sobre o processo de aprendizagem, deixando
de lado as expectativas ou modelos pré-concebidos, com um olhar aberto para a descoberta,
para inovações e indagações. O terceiro princípio focaliza a avaliação como um processo
mediador construído na prática. O professor reflete sobre sua atuação, aprende a aprender,
intervém na prática pedagógica a partir do diálogo com os alunos, consigo mesmo e com
outros educadores, com intuito de transformar o seu fazer pedagógico.
Apesar de as professoras apresentarem uma concepção mista de avaliação, que mescla
a avaliação somativa e formativa, os princípios expostos acima sobre a avaliação na
perspectiva mediadora foram encontrados na concepção das professoras sobre aprendizagem,
conforme as pistas encontradas nos fragmentos a seguir:
Berenice (turma 03 anos): Eu acho que a aprendizagem se faz a todo o momento [...]
aprende com o outro, aprende com o professor, aprende com outras salas, [...] tem o colega
que divide muito a experiência dele, troca de informação o tempo todo e tem tudo que a gente
oferece para ele. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): Aprendizagem para mim seria esse processo de descoberta, de
descobrir o novo, de interagir com o outro, com o objeto, com os amigos e está [...]
organizando o pensamento, descobrindo coisas novas, criando outras coisas. (Transcrição da
entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Talita (turma 05 anos): Aprendizagem é troca, eu acho que a todo o momento a gente está
aprendendo. [...] Aprendizagem é troca, é uma interação com as pessoas. (Transcrição da
entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Mara (turma 06 anos): Eu acho que aprendizagem é um momento de troca, eu não acredito
na aprendizagem de um, a gente troca o tempo todo, a todo o momento, [...] é um momento
de troca. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
59
Como se pôde constatar nas falas anteriores, as professoras afirmaram que a
aprendizagem acontece em todo o momento e não somente em ocasiões específicas em que é
ministrado o ensino. Outra pista que considero importante é o fato de a aprendizagem estar
ligada à troca, em que as pessoas interagem entre si, compartilham descobertas, idéias e
experiências.
Entendo que as professoras possuem uma concepção de aprendizagem fundamentada
na perspectiva interacionista, composta pelo construtivismo de Piaget e a teoria sócio-
histórica de Vygotsky, conforme Marques (2001, p. 73) explica:
Piaget (cognitivista-interacionista) trabalhou fundamentalmente a interação
do suje.776877819(e)-1.9nt-
60
2.3 Avaliação na Educação Infantil e a perspectiva da avaliação mediadora
A compreensão da avaliação na Educação Infantil requer um retorno histórico sobre a
concepção de criança, de infância e, conseqüentemente, de educação infantil.
Philippe Áries (1981), com sua obra História Social da Criança e da Família, foi
pioneiro em estudar a história da criança enquanto ser diferente do adulto o que ocorreu por
volta dos séculos XVI e XVII.
De acordo com Del Priore (1999, p. 105), “Entre os séculos XVI e XVII, com a
percepção da criança como algo diferente do adulto, vimos surgir uma preocupação educativa
que traduzia-se em sensíveis cuidados de ordem psicológica e pedagógica.”
Dessa forma, o reconhecimento da criança como ser diferente do adulto trouxe
preocupação com a forma de cuidar e educar. A família não seria mais a única responsável
pela criança, devendo tal responsabilidade ser dividida com a escola.
Os estudos e pesquisas sobre a criança apontaram para o seu reconhecimento como
sujeito de direitos, trazendo a idéia de infância como construção social.
Sarmento (2001, p. 13-4) afirma que:
A verdade é que se houve sempre crianças, não houve sempre infância. A
consideração das crianças como um grupo etário próprio, com
características identitárias distintas e com necessidades e direitos genuínos,
é muito recente, é mesmo um projecto inacabado da modernidade.
Assim, é possível perceber que, embora a criança seja um ser único que sempre existiu
na sociedade, em alguns momentos e, em alguns lugares, não é reconhecida como sujeito.
Kuhlmann Jr. e Fernandes (2004, p.15) explicam que:
Podemos compreender a infância como a concepção ou a representação
que os adultos fazem sobre o período inicial da vida, ou como o próprio
período vivido pela criança, o sujeito real que vive essa fase da vida. A
61
história da infância seria então a história da relação da sociedade, da
cultura dos adultos, com essa classe de idade, e a história da criança seria
a história da relação das crianças entre si e com os adultos, com a cultura e
a sociedade. Ao se considerar a infância como condição das crianças,
caberia perguntar como elas vivem ou viveram esse período, em diferentes
tempos e lugares.
Nessa perspectiva, entendo que o modo de ver e compreender a criança implica a
prática de relações com a própria criança, que não pode ser imobilizada em imagens sociais
ou teorias (SMOLKA, 2002), pois as crianças mudam, o mundo se transforma, as relações são
alteradas não havendo uma concepção ou conceito que consiga visualizar todas essas
mudanças, com base na construção social de uma infância única.
Nas entrevistas com as professoras, encontrei pistas sobre como elas compreendem
criança e infância, revelando concepções distintas que interferem na avaliação da criança e na
prática da educação infantil. Os fragmentos abaixo trazem pistas sobre a concepção de
criança:
Berenice (turma – 03 anos): Ah, eu acho que ser criança é a principal, como é que se fala, é a
base de toda uma formação. Ser criança é ser inocente, é ser espontânea, é ser... sei lá, eu
acho que é tudo. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): A criança, ela é um ser em desenvolvimento, que é receptiva a
tudo, que gosta de tudo, gosta de participar de tudo, muito interessada gosta de descobrir
tudo, é aberta ao mundo, aberta ao novo e aberta sempre a descobrir coisas novas.
(Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Talita (turma de 05 anos): Para mim ser criança é um ser que está em pleno desenvolvimento
e a criança está sempre muito aberta a receber um carinho, uma informação, pergunta,
resposta, a criança ela é muito questionadora. Ela questiona a todo o momento, na
participação dela, ela questiona o porquê daquilo ou por que que tem que fazer aquilo, ela é
muito questionadora. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Mara (turma – 06 anos): Olha, a criança, a meu ver, é um ser que está em constante
formação, e muito ávido por informação e daí eu acho que é nossa responsabilidade em lidar
com criança, porque como eles estão começando a trilhar, tudo que a gente estiver passando
para eles é igual uma esponjinha, vai ser sugado, e sabe-se como vai ser usado. Então, a
informação que é vinculada para a criança tem muita importância. (Transcrição da entrevista
do dia 30 de junho de 2006)
62
A professora Berenice revelou uma concepção de criança pautada na teoria de
Rousseau (1968), como ser inocente e puro que é corrompido pela sociedade. A professora
afirma que, como a criança é a base da formação humana, educando a criança hoje se prepara
o adulto de amanhã. Nesse sentido, a criança é um ser em preparação, um “vir a ser”, o
cidadão do futuro que precisa ser educado hoje.
A professora Noemi traz outra concepção de criança, compartilhada pela professora
Talita, ao falar da criança como ser em desenvolvimento com autonomia. Como sujeitos do
seu próprio desenvolvimento, as crianças são aberta
63
criança é criança em alguns locais dentro do local, pois esse mesmo mundo adulto
destina diferentes parcelas do espaço físico para a materialização de suas
infâncias.
Assim, entendo que a visão das professoras sobre a criança estabelece um lugar de
criança, em que os adultos definem os limites de sua vivência, em que se materializa a
infância. Nesse caso, a concepção de criança está relacionada com a concepção de infância, a
criança representa o sujeito em si e a infância se refere a uma construção social, aos lugares
destinados à criança pelo mundo adulto.
Sobre infância, apenas a professora Noemi não diferenciou criança e infância, que
ela volta a afirmar sua visão de criança:
Noemi (turma 04 anos): Eu volto no que é criança, que é esse momento, é a fase do prazer,
do lúdico, da descoberta, da criação de novas coisas, do interesse de descobrir o mundo.
(Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
As pistas encontradas nas entrevistas com as outras professoras revelaram uma forte
influência da teoria de Rousseau (1968) na concepç ão de infância, de acordo com os
fragmentos a seguir:
Berenice (turma – 03 anos): Eu acho que a melhor fase da vida [...] acho que a gente tem que
valorizar muito, a gente tem que aprender muito com eles [...]. E a gente aprende assim nas
pequenas coisas com eles também, porque na infância é que eles estão livres de tudo, de
preconceitos, de idéias formadas, então eles falam o que eles acham aqui, da forma como
eles entendem espontaneamente, verdadeiramente e a gente tem que valorizar o máximo
possível [...]. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Talita (turma 05 anos): É a melhor fase da vida. Eu vejo a infância como um momento da
vida de pureza, eu acho que a infância assim, é a pessoa ser pura, alegre, está sempre com
energia, [...]. Então, eu acho assim que a infância é uma fase muito importante no
desenvolvimento do ser humano, é a primordial para o desenvolvimento do ser humano.
(Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Mara (turma 06 anos): Eu acho que é o momento mais bonito talvez da vida do ser humano.
É o momento que a gente ainda, talvez por isso eu esteja na educação infantil, eu lido com
adultos também, mas a educação infantil me renova, é um momento que você entra em
contato com aquilo que a gente perdeu, que é aquela coisa de acreditar no ser humano, de
ainda ter aquela fantasia ainda muito à flor da pele, achar que todo mundo é bom, ser feliz.
Eu acho que a maior característica da infância é ser feliz sem precisar de muita coisa, à
64
medida que a gente cresce, como eu te disse, eu lido com adultos, precisa de muita coisa para
estar feliz, a criança não. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
De acordo com as professoras, a infância é um período de inocência e pureza, por isso
é considerada como a melhor fase da vida. Observo que os indícios revelam a concepção de
infância atrelada ao saudosismo de voltar a essa fase da vida, com o lamento pela perda da
beleza e bondade consideradas naturais na infância e sufocadas pelo sujeito enquanto adulto
que vive em uma sociedade corrompida.
A professora Berenice afirma que a infância deve ser valorizada por ser a melhor fase
da vida, concluindo que a infância por ser livre de preconceitos, pode ter muito a ensinar para
os adultos. Essa concepção de valorizar traz também o sentido de preservar a infância de
mazelas sociais vivenciadas no mundo adulto, revelando que, para a professora, a infância
afigura-se como algo a ser protegido.
Na concepção de Talita, na qual existe também a ênfase na infância como a melhor
fase da vida, destaco as pistas sobre infância como um momento puro, alegre, cheio de
energia, por isso uma fase fundamental para o desenvolvimento do ser humano. Nesse caso,
analiso que a infância é interpretada como uma fase preparatória para o ingresso no mundo
adulto em que preocupação em manter a pureza, a alegria e a energia dessa fase como base
para o homem de amanhã.
A professora Mara demonstra um saudosismo em relação à infância, como algo que
foi perdido ao entrar na fase adulta. Outra pista interessante é o trabalho com a infância ser
considerado um renovo e uma motivação no sentido de justificar o interesse da professora
pela área da educação infantil. Ela enfatiza também a fantasia, a bondade em acreditar nas
pessoas e o fato de se ser feliz na infância sem precisar de muita coisa. A professora compara
que no mundo adulto o sentido de realização pessoal na busca pela felicidade tem muitos
65
obstáculos a serem superados, enquanto que na infância existe a felicidade nas pequenas
coisas, consideradas, às vezes, pelos adultos como insignificantes.
Kohan (2004, p. 53), ao analisar a questão da criança como ser em desenvolvimento e
da infância como etapa da vida relacionada com a educação infantil, conclui que:
O conceito de infância que se desprende dessas passagens é nítido. Ela é
uma etapa da vida, a primeira, o começo, que adquire sentido em função de
sua projeção no tempo: o ser humano está pensado como um ser em
desenvolvimento, numa relação de continuidade entre o passado, o presente
e o futuro. A intervenção educacional tem um papel preponderante nessa
linha contínua. Ela se torna desejável e necessária na medida em que as
crianças não têm um ser definido: elas são, sobretudo, possibilidades,
potencialidade: elas serão o que devem ser. Assim, a educação terá a marca
de uma normativa estética, ética e política instaurada pelos legisladores,
para o bem dos que atualmente habitam a infância, para assegurar seu
futuro, para fazê-los partícipes de um mundo mais belo, melhor. A infância é
o material dos sonhos políticos a realizar. A educação é o instrumento para
realizar tais sonhos.
Assim, considero que a visão das professoras sobre criança como ser em
desenvolvimento e sobre a concepção de infância como a melhor fase da vida reflete no papel
da educação infantil enquanto instrumento na realização dos sonhos sobre criança e infância.
Como as concepções sobre criança e infância influenciam o trabalho na educação
infantil, para compreender essas implicações na atualidade, é necessário proceder a uma
reflexão sobre a constituição dessa etapa da educação no Brasil.
A história da Educação Infantil no contexto brasileiro (KRAMER, 2004, 1995;
KUHLMANN, 1998) demonstra que, através dos movimentos sociais nas décadas de 1970 e
1980, a Educação Infantil foi reconhecida como direito na Constituição de 1988:
O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
(...) atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de
idade. (BRASIL, 1999, Artigo 208, Inciso IV, p. 117)
66
Em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069/90, confirma esse
direito no Artigo 54, Inciso IV: É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: (...)
atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 (zero) a 6 (seis) anos de idade;”
(BRASIL, 1999).
Entretanto, não basta a Educação Infantil estar assegurada como direito da criança e
dever do Estado, pois as diferentes concepções sobre criança, infância, escola e sociedade irão
interferir nas práticas adotadas na Educação Infantil que, ao longo dos anos foi entendida
como educação compensatória, no intuito de minimizar as carências culturais das crianças
pobres e como assistencialismo, no sentido de livrar a criança dos riscos da marginalidade.
Dessa forma, a educação infantil esteve entre a dicotomia de cuidar e de educar, em
alguns momentos privilegiando a ênfase na higiene e proteção das crianças e em outros
proclamando a formação com base em conteúdos escolarizados.
O fragmento a seguir demonstra essa preocupação entre cuidar e educar nos dias de
hoje:
Berenice (turma 03 anos): Acho que a gente tem que tomar todo cuidado em ser mãezona,
mas também tem que ser firme, votem que dar bronca, tem que ensinar o tempo todo, você
tem que corrigir. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
A professora Berenice reconhece que seu trabalho na educação infantil tem dois lados,
um lado de mãe que cuida e protege e outro de professora que ensina o tempo todo, é firme e
corrige. Percebo que a avaliação está ligada ao próprio papel de professora, no sentido de que
ser professora exige ensinar e corrigir os alunos.
Embora essa dicotomia entre cuidar e educar continue nos dias de hoje, com a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 (BRASIL, 1996), nos Artigos 29, 30 e
31, fica perceptível um avanço ao estabelecer a Educação Infantil como primeira etapa da
Educação Básica e em dispor como será realizada a avaliação:
67
Art. 29 – A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, completando a ação da
família e da comunidade.
Art. 30 – A educação infantil será oferecida em:
I. creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três
anos de idade;
II. pré-escolas para as crianças de quatro a seis anos de idade.
Art. 31 Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante
acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de
promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.
De acordo com a LDB 9394/96, o objetivo da Educação Infantil é o
desenvolvimento integral da criança, o que é enfatizado nas avaliações, entretanto, muitas
escolas enfatizam os conteúdos escolarizados, como, por exemplo, a alfabetização,
priorizando somente o desenvolvimento intelectual, esquecendo os aspectos físico,
psicológico e social.
Outro ponto destacado pela LDB nº 9394/96 é o fato de a avaliação nesse contexto não
ter o objetivo de promover ou aprovar para o acesso ao Ensino Fundamental. Todavia, alguns
estudos, como o de Godoi (2004) e de Hofmann (2000), têm demonstrado que em muitas
escolas as crianças são retidas na Educação Infantil e ficam impedidas de seguirem para o
Ensino Fundamental, por serem consideradas sem preparo para esse nível de ensino.
A LDB 9394/96 também afirma que a avaliação será efetuada através de
acompanhamento e registro do desenvolvimento infantil. Porém, na pesquisa realizada por
Godoi (2004), foi constatado o uso de práticas avaliativas que seguem o modelo do Ensino
Fundamental.
A autora conclui que: “(...) a educação infantil está sofrendo muita influência das
práticas de avaliação que ocorrem no Ensino Fundamental e, nesse sentido, pode acabar
antecipando os mecanismos de seleção e exclusão presentes nesse nível escolar, tão
prejudiciais às crianças. (GODOI, 2004, p. 20) Assim, a Educação Infantil, que poderia
68
proporcionar aprendizagens significativas, inclusão, convivência, na verdade está
selecionando e excluindo as crianças.
Dessa forma, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL,
1998) propõe uma avaliação formativa com ênfase no processo de desenvolvimento infantil e
demonstra preocupação com o fato de a avaliação na Educação Infantil ser utilizada como
seleção para o Ensino Fundamental.
Existem ainda no Brasil práticas na educação infantil que possuem um
entendimento equivocado da avaliação nessa etapa da educação, o que vem
gerando sérios problemas, com conseqüências preocupantes, sobretudo,
para as crianças de determinadas camadas da sociedade. A mais grave é a
existência das chamadas ‘classes de alfabetização’ que conferem à
educação infantil o caráter de terminalidade. São classes que atendem
crianças a partir de seis anos, retendo-as até que sejam alfabetizadas. As
crianças que freqüentam essas classes não ingressam na primeira série do
ensino fundamental, até que tenham atingido os padrões desejáveis de
aprendizagem da leitura e escrita. A essas crianças têm sido vedado, assim,
o direito constitucional de serem matriculadas na primeira série do ensino
fundamental aos sete anos de idade.Outras práticas de avaliação conferem
às produções das crianças: notas, conceitos, estrelas, carimbos com
desenhos de caras tristes ou alegres conforme o julgamento do professor. A
avaliação nessa etapa deve ser processual e destinada a auxiliar o processo
de aprendizagem, fortalecendo a auto-estima das crianças. (BRASIL, 1998,
vol. 1, p. 59)
Nesse contexto, algumas considerações podem ser analisadas. Apesar de a LDB
9394/96 afirmar que a Educação Infantil não visa à promoção, percebe-se que a Lei não altera
as concepções sobre avaliação da escola e de seus professores e, conseqüentemente, não
transforma as práticas avaliativas adotadas.
Isso pode ocorrer também na utilização do portfólio, instrumento cujo fundamento é
uma concepção de avaliação formativa e mediadora. Se o professor não compartilha dessa
concepção, pode construir um portfólio que será um arquivo de documentos, mas não um
instrumento de reflexão sobre a aprendizagem.
Concordo com Hoffmann (2005a, 2003a) quando analisa que decretos e leis não
modificam a essência da avaliação. Embora se modifique a forma de registrar e os
69
instrumentos de avaliação, as concepções que fundamentam as práticas escolares continuam
deixando conseqüências na aprendizagem dos alunos.
A avaliação pode ser realizada na Educação Infantil (BASSEDAS, HUGUET, SOLÉ,
1999) com base em procedimentos escritos, como, por exemplo, fichas, testes, provas e
exercícios, que representam observações, percepções e conceitos que o professor tem sobre a
criança e que podem incluir comentários do cotidiano, ou conversas no ambiente escolar, na
sala dos professores, ou com os pais.
Essa avaliação representa um juízo de valor sobre a competência, a inteligência, a
personalidade e o comportamento da criança, entretanto, nem sempre tal avaliação se
sistematizada através de um registro escrito (VILLAS BOAS, 2004).
A avaliação na Educação Infantil permite esse tipo de abertura, em que os
procedimentos avaliativos, que circulam entre a formalidade do registro escrito e a
informalidade de comentários orais, têm grande influência no planejamento das atividades e
no olhar do professor sobre a criança.
Todavia, considero fundamental deslocar o olhar avaliador voltado somente para a
criança e focalizar também todo o contexto educativo e suas práticas que interferem na
formação da criança como sujeito autônomo (BECCHI e BONDIOLI, 2003).
Essa mudança de foco implica uma transformação na concepção de avaliação,
passando de uma avaliação tradicional, classificatória e excludente para uma avaliação
formativa com a postura do professor como mediador.
Dentro da perspectiva da avaliação formativa, também denominada por Parente (2004)
de avaliação alternativa ou autêntica e por Saul (1994) de avaliação emancipatória, os
procedimentos avaliativos são definidos com base em princípios de emancipação, autonomia
e participação da criança. Nesse sentido, o portfólio está inserido como instrumento
avaliativo, permitindo o envolvimento das crianças na avaliação.
70
Hoffmann (2000) descreve alguns princípios norteadores para a avaliação mediadora
na Educação Infantil, que englobam o olhar investigativo do professor sobre a criança;
observações provisórias, como leituras que estão em constante desenvolvimento e o
acompanhamento da trajetória da criança, revendo hipóteses sobre o desenvolvimento infantil.
Nesse caso, o professor procura compreender a criança em seu processo de aprendizagem e
tem o olhar aberto para os constantes avanços do educando.
A avaliação mediadora amplia o olhar do educador sobre o seu fazer pedagógico, o
que interfere em suas ações educativas e permite reconhecer a criança como sujeito de
aprendizagem, exercendo sua autonomia.
Nas entrevistas, embora as professoras tenham falado que avaliam as crianças
pequenas no trabalho com a educação infantil através da observação, a forma como cada
professora conduz a observação é diferente, revelando concepções de avaliação diversas. Os
fragmentos abaixo apresentam algumas pistas encontradas sobre tais concepções:
Berenice (turma 03 anos): A gente faz uma fichinha que a gente observa na medida do
possível, até acho que só funciona pela turma ser pequena, porque se fosse grande não daria.
[...] A gente faz essa observação, mas ela não tem uma obrigatoriedade não. No dia que dá,
como dá. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): Nós avaliamos, e eu vou botar nós, porque é a proposta da
escola, de forma integral, não de um conteúdo apenas, mas é no emocional, no intelectual,
no cognitivo, emocionalmente, na socialização, assim que nós avaliamos. (Transcrição da
entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Talita (turma 05 anos): O meu processo de avaliação ele é a todo o momento e a forma
como eu avalio principalmente é a observação. É através da observação que eu vou
percebendo se aquela criança está correspondendo ao que eu estou solicitando, igual à
rodinha que a gente costuma fazer muito, a gente joga as atividades, então ali a todo
momento voestá indagando, você está dando suporte para ela te dar um retorno e ali eu
observo se ela está compreendendo ou não. Às vezes a gente tem até que mudar a forma de
como está colocando, porque às vezes o que você está falando ela o está entendendo, às
vezes você muda a palavra, ela já entende de uma outra forma. [...] Eu registro essa
observação. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
71
Mara (turma 06 anos): Atravéss
72
acontecendo a todo o momento, com o sentido de processo, de algo contínuo, que não é
determinado por algumas atividades ou comportamentos, mas que pode mudar a todo instante
no decorrer da aprendizagem. A segunda pista diz sobre o principal instrumento de avaliação
que é a observação na compreensão da aprendizagem. Na educação infantil, como as crianças
são pequenas e ainda estão estruturando a fala e na maioria das vezes o utilizam a escrita,
na perspectiva da avaliação formativa e mediadora utiliza-se a observação do professor como
meio de compreender a aprendizagem das crianças (BECCHI e BONDIOLI, 2003).
A terceira pista demonstra a mediação da professora que, quando percebe que a
criança não está entendendo, procura outros meios, fazendo perguntas, mudando a palavra,
buscando estabelecer a mediação entre o conhecimento e a criança. A última pista encontrada
no fragmento para embasar a concepção de avaliação formativa e mediadora é o registro da
observação por parte da professora. Considero que observar sem registrar não é avaliar na
perspectiva mediadora, pode ser julgar, comparar, mas não avaliar com o intuito de refletir
sobre a aprendizagem. Concordo com Hoffmann (2000, p. 81) quando diz que “A avaliação,
enquanto mediação, insere-se no processo educativo como instrumento de reflexão, que
auxilie o professor a tomar consciência das mudanças a operar em sua ação, a comprovar e /
ou refutar suas hipóteses sobre os processos vividos pelas crianças.”
Dessa forma, percebo que Talita tem uma concepção de avaliação definida como
formativa e mediadora, quando procura refletir sobre a aprendizagem das crianças e mudar
sua prática para mediar esse processo.
Por último, observo, através das pistas, que, a despeito de a professora Mara utilizar a
observação como instrumento avaliativo, ela tem uma concepção de avaliação com o sentido
de julgamento, quando afirma que, através da convivência e da observação, consegue dizer
como é cada aluno e que tipo de personalidade a criança possui.
73
A avaliação mediadora não julga personalidades, antes procura compreender o
processo de aprendizagem do sujeito com o intuito de contribuir e não de definir a
personalidade. Tal preocupação da professora revela uma avaliação pautada na comparação
de determinado tipo de comportamento, de um aluno em relação ao outro, o que favorece a
criação de rótulos, como, por exemplo, “esse aluno é calmo” ou “esse aluno é agitado”.
Quando o foco da avaliação é a personalidade, que é algo subjetivo e difícil de definir,
necessidade da colaboração de outros profissionais que tenham o conhecimento específico
nessa área.
Diante das diferentes concepções das professoras sobre a avaliação, considero que
essas concepções implicam práticas adotadas na sala de atividades juntamente com as
crianças. Assim, no capítulo subseqüente, procederei à análise de tais práticas a partir das
minhas observações e entrevistas sobre o papel do portfólio na avaliação da criança.
74
3. PORTFÓLIO: INSTRUMENTO DE DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA E
AVALIAÇÃO
Aprender para nós é construir,
reconstruir, constatar para mudar, o que não
se faz sem abertura ao risco e à aventura do espírito.
(FREIRE, 1996, p. 77)
Após discutir as concepções das professoras sobre criança, infância e avaliação,
reconheço a necessidade de iniciar este capítulo com um breve histórico sobre o registro e a
documentação pedagógica, trazendo implicações quanto ao registro das produções infantis e
também sobre as reflexões do professor. Em seguida, apresento o portfólio como instrumento
de documentação pedagógica, tecendo comentários sobre seu papel na avaliação da criança de
acordo com as pistas e os indícios encontrados nas observações e nas entrevistas realizadas
com as professoras nesta pesquisa.
Compreendo como documentação pedagógica todos os documentos do aluno, desde o
ingresso na escola com a matrícula, até os registro
75
todo o momento, sendo, portanto, não algo fechado e acabado, mas um registro vivo que se
modifica conforme as reflexões de seu autor.
Para resgatar o percurso histórico humano e seu desenvolvimento, o homem utilizou a
memória coletiva, através da linguagem oral, em que as gerações antigas contavam para as
gerações mais novas os conhecimentos importantes a serem passados e as leis, como forma de
perpetuação da cultura de um povo ou de uma família. Dessa forma, as tradições orais eram
registradas na memória popular.
Além dos relatos orais, a reconstrução dos acontecimentos antigos era realizada
através de ruínas, roupas, utensílios, entre outros objetos históricos e, posteriormente, com o
registro escrito.
Segundo Le Goff (1994), a história representa uma forma científica de registrar os
acontecimentos através de dois tipos de materiais: os documentos e os monumentos.
Os monumentos englobam tudo aquilo que evoca o passado e perpetua uma
recordação, seja de uma obra comemorativa como, por exemplo, um pórtico, uma coluna, um
troféu, ou seja, um monumento funerário, como no caso das pirâmides no Egito, que servem
para perpetuar a recordação de uma pessoa e seu domínio.
Por outro lado, os documentos envolvem a escolha do historiador que apresenta uma
prova histórica através do registro de um fato, quase sempre através de um testemunho
escrito.
Nesse caso, Le Goff (1994, p. 535) afirma que:
De fato, o que sobrevive não é o conjunto daquilo que existiu no passado,
mas uma escolha efetuada quer pelas forças que operam no
desenvolvimento temporal do mundo e da humanidade, quer pelos que se
dedicam à ciência do passado e do tempo que passa, os historiadores.
O autor mostra que o relato histórico está sujeito a forças que operam no passado que
realmente aconteceu e nas escolhas dos historiadores sobre como contaram e documentaram o
76
fato em si. O documento é fruto do que a sociedade cultivou, de acordo com as relações de
forças que possuem o poder de decidir e escolher os fatos que podem ser documentados e os
que devem ser omitidos (GINZBURG, 2002, 1987).
Nesse contexto, o historiador, que faz a escolha dos fatos a serem registrados e das
versões documentadas para a construção da história, tem um papel fundamental no processo
de registro histórico, já que, ao definir o registro e validá-lo, não se apresenta de forma neutra.
A intervenção do historiador que escolhe o documento, extraindo-o do
conjunto dos dados do passado, preferindo-o a outros, atribuindo-lhe um
valor de testemunho que, pelo menos em parte, depende da sua própria
posição na sociedade da sua época e da sua organização mental, insere-se
numa situação inicial que é ainda menos ‘neutra’ do que a sua intervenção.
O documento não é inócuo. É antes de mais nada o resultado de uma
montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade
que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais
continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser
manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que
dura, e o testemunho, o ensinamento (...) que ele traz devem ser em primeiro
lugar analisados desmistificando-lhe o seu significado aparente. O
documento é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas para
impor ao futuro voluntária ou involuntariamente determinada imagem
de si próprias. (LE GOFF, 1994, p. 547-48)
Assim, entendo que o olhar do historiador interfere na construção do registro histórico,
sendo importante analisar o documento como um monumento, como uma recordação perpétua
do que ficou, da imagem produzida pelos múltiplos olhares. Olhares dos sujeitos que
vivenciaram o fato e o olhar do historiador que reconstruiu a leitura dos fatos, através da
documentação.
Com isso, percebo que a documentação traz contribuições históricas, com o registro do
passado, ressaltando-se que não podemos pensar em uma documentação neutra, sem o olhar
do historiador e sua intervenção.
77
Dessa forma, a compreensão do documento como produto de um olhar, de uma leitura
histórica, envolve reflexões sobre outros tipos de documentos, que também não são neutros,
como, por exemplo, a documentação pedagógica.
Concordo com Dahlberg, Moss e Pence (2003, p. 193) quando afirmam que:
O que documentamos representa uma escolha, uma escolha entre muitas
outras escolhas, uma escolha de que os próprios pedagogos estão
participando. Da mesma forma, aquilo que não escolhemos é também uma
escolha. [...] Conseqüentemente, quando documentamos, somos co-
construtores das vidas das crianças e incorporamos nossos pensamentos
implícitos do que consideramos serem ações valiosas em uma prática
pedagógica. A documentação nos diz algo sobre como construímos a
criança, assim como nós mesmos como pedagogos.
Nessa perspectiva, compreendo que o registro histórico da infância representa um
olhar sobre a criança, um olhar fundado em uma concepção de infância e de criança
(KUHLMANN JÚNIOR, 1998), que não percebe a criança como sujeito produtor de cultura e
capaz de registrar seus conhecimentos.
Dentro dessa perspectiva, muitas vezes a documentação pedagógica possui somente o
olhar do professor e o seu registro dos fatos, sendo necessário uma mudança de olhar que
valorize a documentação pedagógica a partir das produções infantis.
A documentação pedagógica na Educação Infantil, além de registrar trabalhos
pedagógicos, revela uma concepção de infância, de criança e de aprendizagem que regem o
processo de documentação.
Nesse sentido, Gobbi (2002) afirma que, a despeito de as crianças terem feito e
fazerem parte da História, não encontramos registros deixados por elas de sua passagem ao
longo da história humana, o que revela uma concepção de infância que demonstra a visão do
adulto sobre a criança como ser incapaz de produzir cultura.
78
Para que a documentação pedagógica seja o registro das produções infantis, faz-se
necessário reconhecer que as crianças pequenas são portadoras e criadoras de cultura, são
sujeitos da própria história e suas produções devem ser conhecidas, valorizadas e respeitadas.
A autora analisa os desenhos infantis como produções culturais que revelam não o
pensamento das crianças, mas a forma como elas compreendem seu mundo e suas relações.
Para a autora, os desenhos são como documentos que permitem conhecer os sujeitos e suas
percepções da realidade vivida pelas crianças, são como textos visuais que podem ser olhados,
sentidos e lidos. As fotografias e os desenhos são instrumentos que documentam as
concepções infantis.
De acordo com Dahlberg, Moss e Pence (2003), a documentação pedagógica é um
instrumento que possibilita a prática pedagógica reflexiva e democrática e envolve a
responsabilidade pela construção de significados e decisões sobre os acontecimentos no
processo de ensino-aprendizagem.
Através da documentação pedagógica, o professor pode compreender a aprendizagem
da criança e refletir sobre sua prática enquanto educador, em busca de possíveis soluções para
os problemas encontrados de forma que seu trabalho seja aprimorado.
A documentação pedagógica envolve um processo e um conteúdo. O conteúdo é o
material registrado sobre o que as crianças estão dizendo e fazendo no contexto educacional.
O processo engloba o uso do material registrado como um recurso para refletir sobre o
trabalho pedagógico, envolvendo reflexão crítica e ação. O professor analisa sua prática e
procura agir em torno das possibilidades ou problemas encontrados.
Dessa forma, entendo que a documentação pedagógica faz parte da aprendizagem da
criança e do professor, representando as interações e relações no processo de ensino-
aprendizagem, como demonstra o fragmento a seguir:
79
Observo no cartaz “Quem somos” as fichas em que os alunos escreveram o nome e se
desenharam. Uma vez por s a professora Talita [turma 05 anos] pede que eles façam
novas fichas, eles têm a oportunidade de escrever o nome novamente e se desenharem. A
professora contou para mim o caso de um aluno que não conseguia escrever o nome com
todas as letras, e que ela percebeu o avanço deste aluno através das fichas com o nome. A
professora disse que vai guardar a ficha para colocar no portfólio deste aluno, no primeiro
dia ele escreveu o nome de um jeito e em cada ficha foi fazendo novas tentativas de escrever
o nome corretamente, até que conseguiu fazê-lo. (Notas expandidas das observações do dia 27
de março de 2006)
Considerando que a documentação pedagógica envolve o registro da criança e do
professor, a análise do fragmento aponta tal aspecto, uma vez que as novas tentativas de
escrita feitas pelo aluno foram registradas no portfólio, o que permitiu a organização das
produções da criança e os avanços empreendidos no processo da escrita de seu nome. Na
documentação pedagógica por meio do portfólio é possível refletir sobre a aprendizagem da
criança juntamente com as percepções do professor.
Outro ponto enfatizado por Dahlberg, Moss e Pence (2003) é o esclarecimento sobre o
que não é documentação pedagógica, em que os autores alertam para que não se confunda a
“observação da criança” no preenchimento de fichas pré-determinadas como documentação
pedagógica.
O enfoque nessas observações não são os processos de aprendizagem das
crianças, mas a idéia de classificá-las e categorizá-las em relação a um
esquema geral de níveis de estágio desenvolvimentais. Encaradas dessa
maneira, as “observações da criança” são uma tecnologia de normatização
relacionadas às construções da criança como natureza e como reprodutora
de conhecimento. Podem também estar relacionadas à construção da
instituição dedicada à primeira infância como produtora de resultados da
criança, incluindo o progresso desenvolvimental. Por isso, a “observação
da criança” diz respeito principalmente à avaliação do fato de ela estar
adaptada a um conjunto de padrões. A “documentação pedagógica”, em
contraste a isso, diz respeito principalmente à tentativa de enxergar e
entender o que está acontecendo no trabalho pedagógico e o que a criança é
capaz de fazer sem qualquer estrutura predeterminada de expectativas e
normas. (DAHLBERG, MOSS e PENCE, 2003, p. 191-2)
80
Durante a realização da pesquisa, percebi que as professoras, além de utilizarem a
documentação pedagógica através da construção do portfólio, confundem essa documentação
com a “Ficha Individual de Observação do Aluno” (ANEXO 3), ao mesmo tempo que
procuram registrar e organizar as produções das crianças no portfólio. Elas também se
preocupam em preencher a ficha que consta do anexo 3, na qual se encontram registrados
comportamentos e atitudes previamente determinados.
Mara (turma 06 anos): A gente utiliza o portfólio, então a gente trabalha com observação,
depois vai registrando aqueles momentos que são significativos para a gente, para depois de
acordo com as regras [fichas de avaliação] que a gente utiliza para estar fazendo isso, além
do registro [portfólio], a gente estar passando isso [portfólio e fichas de avaliação] para os
pais. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Assim, na reunião de pais, eles têm acesso a essa ficha avaliativa em que podem
verificar como as crianças estão se desenvolvendo. Os pais também recebem as produções das
crianças documentadas no portfólio, através dos trabalhos realizados na escola. Geralmente a
professora organiza os trabalhos por data, colocando-os em um envelope que será entregue
aos pais em uma reunião específica para conversarem sobre as crianças. Porém, entendo que,
nesse processo, a ficha influencia a compreensão dos pais sobre a aprendizagem dos filhos,
visto que eles analisam, assinam a ficha e entregam-na para a professora. Os trabalhos
recebidos são levados para casa para serem vistos juntamente com as crianças. Tal fato,
porém, faz com que se me apresente um questionamento: se tal processo realmente se efetiva
em casa e, ainda que seja realizado, até que ponto o olhar dos pais, que tinham recebido a
ficha avaliativa, não seria contaminado pelas informações ali registradas.
Para não correr esse risco, considero que, na própria reunião de pais, o processo de
avaliação poderia ser demonstrado através da documentação pedagógica, em conjunto com a
própria criança, com destaque para as suas produções. As fichas poderiam ser eliminadas e
substituídas por relatórios que descrevessem as aprendizagens e registros das produções.
81
No contexto da educação infantil, a documentação pedagógica pode ser viabilizada
através do portfólio como instrumento de registro e reflexão sobre a aprendizagem da criança
e a atuação do professor.
3.1 Origem, definições, objetivos e conteúdos do portfólio
O portfólio originou-se no campo da arte, como uma modalidade de documentação e
avaliação em que desenhistas, artistas e arquitetos selecionavam mostras de sua trajetória para
apresentar momentos significativos e, ao mesmo tempo, uma visão global de seu trabalho a
um examinador ou cliente. Posteriormente, o portfólio também foi adotado no campo
administrativo financeiro como um conjunto de documentos sobre um assunto.
No campo educacional, o portfólio começou a ser difundido nos âmbitos escolar e
universitário através das novas visões e práticas sobre a avaliação e das reflexões sobre o
processo de ensino e aprendizagem. Dessa forma, “a função do portfólio se apresenta como
facilitadora da reconstrução e reelaboração, por parte de cada estudante, de seu processo ao
longo de um curso ou de um período de ensino.” (HERNÁNDEZ, 2000, p. 165).
Dentro dessa perspectiva, que apresenta a reconstrução pelo estudante do seu processo
educativo, o portfólio pode ser utilizado como estratégia de aprendizagem e avaliação desde a
Educação Infantil, passando pelo Ensino Fundamental e pelo Ensino Médio, até o Ensino
Superior.
Villas Boas (2004) apresenta trabalhos de pesquisa sobre avaliação e a utilização do
portfólio nos diversos veis de ensino, contudo, neste trabalho, priorizei as discussões
referentes ao portfólio na Educação Infantil. Segundo a autora, o portfólio é uma coleção de
produções do aluno que apresentam evidências de sua aprendizagem.
82
Outra definição aponta que o portfólio de avaliação é uma coleção que documenta o
processo de aprendizagem e permite a tomada de decisões sobre a continuidade do processo
educativo (PARENTE, 2004)mRe d 4o
83
Outro ponto importante sobre o uso do portfólio refere-se ao tempo. Não é possível
criar um portfólio rapidamente com apenas uma observação da criança ou com alguns
registros feitos pelo professor. O portfólio envolve um tempo a ser percorrido. O
desenvolvimento infantil e a aprendizagem não são imediatos. É preciso acompanhar o
processo escolar, registrando fatos interessantes, observando o cotidiano dos alunos e
percebendo as situações que revelam indícios importantes para a percepção de como a criança
está caminhando.
Quanto ao conteúdo do portfólio, Shores e Grace (2001) afirmam que liberdade de
escolha sobre o que irá compor o portfólio, constituindo-se a criatividade como única
referência capaz de limitar os conteúdos selecionados.
A coleção de itens que formam o portfólio pode incluir trabalhos das crianças,
produções individuais e coletivas, desenhos, registros escritos, fotografias, gravações de áudio
e vídeo, observações da professora, informações dos pais, entrevistas, relatórios, enfim, o que
for necessário para reconstituir o caminho percorrido durante a aprendizagem.
Nesse sentido, o portfólio não representa somente uma seleção de trabalhos,
observações e registros, mas demanda um envolvimento maior em que o estudante e o
educador possam analisar os problemas que foram localizados e resolvidos, bem como as
estratégias de aprendizagem utilizadas. De acordo com Alarcão (2004, p.56), o portfólio é
“uma construção pessoal do seu autor, que seleciona os seus trabalhos, os organiza, os explica
e lhes coerência. A sua originalidade faz deles peças únicas, singulares, peculiares.” Dessa
forma, o portfólio possibilita pensar acerca da trajetória de aprendizagem, os caminhos
trilhados e suas escolhas, firmando-se na realização de um diário reflexivo.
De acordo com Shores e Grace (2001), os portfólios permitem um ensino centrado na
criança, pois trazem informações úteis sobre o conhecimento dos alunos e o desenvolvimento
infantil. Permitem ainda perceber que, como as crianças são diferentes uma das outras, as
84
atividades pedagógicas são significadas por elas de maneira diversificada, o que requer do
educador uma postura de aceitação das diferenças durante cada atividade.
Os autores apresentam três tipos de portfólios. O primeiro refere-se ao portfólio
particular que se constitui através de anotações específicas da criança, tais como históricos
médicos, telefone dos pais, registro de conversas com os pais, enfim, informações importantes
e que requerem privacidade quanto ao seu conteúdo.
O segundo tipo, chamado de portfólio de aprendizagem, é mais amplo e utilizado com
mais freqüência. Envolve anotações da criança e do professor, amostras de trabalho e o diário
de aprendizagem da criança. Como o portfólio de aprendizagem é o acervo de suas produções,
o acesso a ele é facultado constantemente à criança.
O terceiro tipo representa o portfólio demonstrativo em que os avanços importantes ou
problemas ocorridos são registrados. Os pais, as crianças e professores participam dessa
construção e podem apresentar o portfólio demonstrativo para os futuros professores a fim de
que conheçam o desenvolvimento e particularidades de cada aluno.
A seguir estão alguns fragmentos, retirados das entrevistas, sobre como as professoras
organizam o portfólio demonstrativo:
Berenice (turma 03 anos): A idéia é guardar uma ou duas atividades a cada bimestre, [...]
se a gente achar uma outra coisa que a gente acha interessante e quiser guardar também a
gente guarda. A gente recolhe e anexa numa pasta, essa pasta do maternal, por exemplo,
quando termina o ano ela vai para o primeiro período, ela não vai para os pais não,
mostra [na reunião de pais], o pai e a gente explica que é um trabalho que a gente vai
guardar para ver o desenvolvimento da criança até o final da escolaridade deles. [...]
(Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): Tem o portfólio [demonstrativo] também que entra [na avaliação]
que é aquele trabalhinho, uma atividade que a criança fez que eu acho relevante e que foi
relevante para ela também, que eu faço anotação atrás [da folha] e guardo em uma ficha,
numa pastinha que eles têm. [...] Inclusive esse portfólio passa [para outros anos], eu tenho
dos meninos porque são do primeiro período e eu tenho do maternal, quando eles estavam no
maternal, que veio para mim, o meu [portfólio demonstrativo da turma] eu vou passar para o
85
segundo período. Quer dizer, é um acompanhamento do desenvolvimento da criança.
(Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
De acordo com o relato das professoras, percebo que elas compreenderam o sentido do
portfólio demonstrativo de acompanhar a criança em sua história de aprendizagem e ser
analisado por outras professoras (SHORES e GRACE, 2001). O portfólio documenta o
processo, enfatizando o percurso, as conquistas trilhadas, que são registradas com base na
concepção de avaliação formativa e mediadora. O portfólio revela como a criança está
aprendendo e permite intervenções futuras do professor com o intuito de mediar a
aprendizagem e compreendê-la.
Outra pista importante é o fato de a professora Noemi escolher para o portfólio
demonstrativo não somente o que ela considera interessante, mas o que foi relevante para a
criança também. a professora Berenice tem outra postura, ela seleciona o que pensa ser
interessante, independente da participação da criança, o que me leva a perceber que as
professoras adotam ações diferentes na construção do portfólio e essas ações revelam indícios
sobre o papel do portfólio na avaliação.
3.2 Pistas e indícios sobre o papel do portfólio na avaliação da Educação Infantil
Apresento a seguir algumas pistas e indícios que demonstram como as professoras
compreendem o papel do portfólio na avaliação das crianças:
Berenice (turma 03 anos): Igual o Davi, ontem, ele desenhou ele, achei muito legal porque
ele desenhou e pôs um monte de pontinhos assim batendo com a caneta e disse: ‘sou eu
soltando estalinho’. Então quer dizer, ele relacionou o estalinhos aos pontos que ele está
jogando na folha, até inclusive eu guardei para o portfólio. Eu vou colocar como um
registro de como ele captou a festa [junina], ele sentiu a festa como um momento alegre, pelo
que eu entendi ali, no desenho dele, e ele soube registrar, soube passar para o papel. [...]
(Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
86
Noemi (turma 04 anos): [O portfólio] seria o registro do desenvolvimento da criança,
porque ali também registra o desenvolvimento dela [para] realmente perceber, acompanhar o
desenvolvimento dela. (Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Talita (turma 05 anos): [O portfólio] mostra o processo de desenvolvimento dela [criança],
eu acho que através do portfólio a gente consegue perceber esse processo. Na pasta do
Daniel, no início do ano, no nome dele, trocava as letras, faltava as letras, eu até coloquei no
portfólio, depois de quinze dias ela escreveu o nome perfeito [...], então eu colei as duas
folhas, do primeiro dia de aula e a outra mais para frente, fiz a observação [registro] então
quer dizer, me deu suporte de ver como ele está desenvolvendo, então mostra para a gente
esse processo. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Mara (turma 06 anos): [O portfólio] ele é um registro, fica registrado naquele momento o
que você achou significativo, principalmente quando a gente está observando um caso onde a
criança precisa ter algum tipo de melhora, eu acho que ele [portfólio] é uma referência.
Então à medida que você que a criança piora ou melhora, aquilo fica registrado, [...] se
não ficar registrado, talvez você não seja tão fiel na hora de ter uma atitude com a criança,
de indicar um caminho no seu trabalho e às vezes você tem que mudar muito a direção do
trabalho, até pelo rendimento da criança que é muito diferente um do outro. (Transcrição da
entrevista do dia 30 de junho de 2006)
A professora Berenice relata um episódio em que uma criança registra o que
considerara mais significativo na festa junina, através do desenho de si mesmo “soltando
estalinho”. A professora fez o registro da fala da criança no desenho e guardou para colocar
no portfólio, como documentação da aprendizagem. Nesse fragmento, percebo uma pista que
demonstra a compreensão do portfólio como registro de aprendizagem significativa para a
criança e também para o professor.
Para a professora Noemi, o portfólio é o registro do desenvolvimento da criança, que
permite perceber e acompanhar seu desenvolvimento. Dessa forma, o papel do portfólio está
ligado à compreensão do desenvolvimento da criança.
A professora Talita também diz que o portfólio mostra o processo de desenvolvimento
da criança para o professor, exemplificando isso através de uma criança que progride na
escrita do próprio nome. A professora guarda a atividade no portfólio e registra escrevendo
suas considerações sobre como a criança desenvolvera a escrita do próprio nome. Entendo
87
que, para Talita, o papel do portfólio está relacionado com a compreensão do processo de
desenvolvimento da criança como algo em constante transformação, um dia a criança registra
o nome de uma forma, depois de um tempo, ela avança nessa construção, até o registro do
nome de maneira correta. Para a professora, isso é um suporte para suas percepções quanto ao
desenvolvimento da criança.
A professora Mara enfatiza que o portfólio é um registro sobre o desempenho da
criança. A pista que embasa minha afirmação está no fato de que, para a professora, a criança
melhora ou piora, referindo-se ao bom ou mau desempenho. Ao final do fragmento, ela deixa
outra pista, ao falar de rendimento, que é diferente de um aluno para o outro. Percebo que a
professora, ao fazer comparações entre os rendimentos das crianças, pensa poder afirmar se a
criança apresenta melhoras ou não. Assim, analiso que o fato de Mara declarar ser o portfólio
uma referência aponta que o registro do desempenho funciona como indicativo para a tomada
de atitudes no trabalho da professora e também em relação às crianças.
Outra pista interessante é a importância do registro como base para “ser fiel na hora de
ter uma atitude com a criança”. No meu ponto de vista, esse registro está fundamentado em
uma concepção de avaliação punitiva, que separa os alunos com bom desempenho de outros
considerados ruins.
A concepção de avaliação demonstrada pela professora Mara não condiz com a
construção do portfólio como instrumento da avaliação formativa e mediadora. Ao se utilizar
o portfólio em uma perspectiva de avaliação punitiva, evidencia-se a concepção de avaliação
subjacente no uso do instrumento.
Concordo com Villas Boas (2004, p.62) quando diz que: “A avaliação por meio do
portfólio exige do professor postura avaliativa diferente da tradicional: ele não ‘ensina’ para
que os alunos ‘tirem boas notas’ e sejam aprovados. Ele coordena o trabalho pedagógico por
meio do qual os alunos aprendam e se desenvolvam como pessoas.”
88
Villas Boas (2004) também ressalta que o trabalho com o portfólio implica assumir
riscos ao mudar, tendo o cuidado de não fazer o portfólio reduzir-se a uma pasta de arquivo e
a um modismo na educação. Considero que, quando o trabalho com o portfólio não está
embasado na avaliação formativa e mediadora, grande possibilidade de incorrer nesses
riscos alertados pela autora.
De acordo com uma avaliação formativa e mediadora, o portfólio permite refletir
acerca dos caminhos trilhados e das escolhas estabelecidas durante o percurso do
conhecimento, em que a criança e o professor podem construir um diário reflexivo sobre as
conquistas alcançadas e sobre as necessidades específicas de aprendizagem.
Durante as entrevistas, as professoras também relataram situações significativas de
aprendizagem das crianças que foram colocadas no portfólio com o objetivo de registrar e
refletir sobre essas construções, como demonstram os fragmentos abaixo:
Berenice (turma 03 anos): O Davi estava na fase de rabiscação e agora ele está fazendo
carinha, na carinha ele põe o olhinho, o nariz, a boca, tudo direitinho e já puxa os bracinhos,
coisa que em fevereiro, quando iniciou, ele não fazia ainda, então quer dizer, vai ser muito
interessante guardar o que ele tem do maternal [...] e agora a gente vai vendo todo o
processo como é que está acontecendo esse desenvolvimento dele. Como vão surgindo as
mudanças e como que é rápido. E a gente vai passando [o portfólio demonstrativo] do
primeiro período para o segundo, do segundo para o terceiro, e agora está colocando na
primeira série. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): O portfólio, ele é montado a partir dos trabalhinhos de uma
atividade que foi relevante que eu vi, que chamou a atenção das crianças, que ela fez
espontaneamente uma coisa, que ela fez que foi interessante. Eu mesma estava com uma
aluna que estava desenhando de cabeça para baixo. Então o portfólio me serviu, eu observei
isso registrei e guardei. Esse bimestre eu vi que ela superou, então quer dizer vai ser o
registro dessa superação dela, também que ela venceu, essa atividade vai entrar [no
portfólio] também. (Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Talita (turma – 05 anos): A gente separa a atividade, coloca a data nela, depois mais tarde eu
faço uma observação [registro] daquela atividade [...] uma atividade que você que ele
apresentou um progresso no desenvolvimento dele, às vezes no horário livre costuma muito
surgir essas atividades que a gente separa para o portfólio, as meninas [alunas] pegam para
desenhar e elas começam a tentar escrever e aí elas me entregam: tia, olha o que eu fiz para
89
você esse desenho. Então você observa várias tentativas de escrita, então você fala assim,
olha, ela está despertando para essa questão da esc
90
necessário que o outro exerça a passividade, os dois podem ter papéis ativos ao mesmo tempo.
Para que isso ocorra, é preciso que a autonomia seja compartilhada através da mediação
(VYGOTSKY, 1998).
Nesse sentido, considero que a autonomia pode ser compartilhada, relativa e negada.
Ela é compartilhada quando duas ou mais pessoas, seja a criança com o professor ou com seus
pares, exercem autonomia, compartilhando a aprendizagem. Assim, não é o professor que
somente ensina, mas a criança também ensina e os dois aprendem juntos.
Quando, porém, o professor concede que a criança exerça autonomia apenas em
determinadas situações a autonomia é relativa, pois se apresenta atrelada ao contexto. Como
exemplo, cito os fragmentos abaixo:
Tenho observado os horários do lanche na turma da professora Berenice [turma 03 anos] e
percebo que a professora permite que a criança exerça autonomia ao se alimentar, comendo
sozinha. Isso é feito como um exercício de autonomia, que consiste em lavar as mãos sem
ajuda, organizar o lanche colocando a toalha sobre a mesa e os alimentos em cima, comer
devagar, com cuidado para não sujar o uniforme e a mesa, guardar o que sobrou dos
alimentos, jogar fora no lixo as embalagens vazias, guardar a toalha e os potes na
merendeira, lavar a colher utilizada para tomar o iogurte, pegar a escova de dente com a
pasta que foi colocada pela professora, escovar os dentes, enxugar com a toalha pendurada
perto da pia e por último guardar a escova de dente no armário da professora. (Notas
expandidas das observações do dia 05 de abril de 2006)
Na atividade, que consiste em montar um porquinho de papel, a professora Berenice [turma –
03 anos] entrega um círculo grande vermelho que é o corpo do porquinho, as crianças
molham o dedo na cola e colam o círculo na folha de papel A4. Em seguida a professora
entrega um círculo pequeno amarelo que será o focinho do animal, depois a professora
entrega duas orelhas. Berenice pinga a cola no lugar onde a criança deverá colar as orelhas,
depois entrega os pés do porquinho e pinga a cola onde as crianças deverão colar. (Notas
expandidas das observações do dia 17 de maio de 2006)
A autonomia negada é a que ocorre quando o professor dirige constantemente as ações
das crianças, não permitindo que elas façam escolhas com liberdade e autonomia durante a
aprendizagem, ficando a criança presa a uma passividade em que somente faz aquilo que lhe é
solicitado.
91
Na turma da professora Mara [turma – 06 anos] as crianças estão fazendo uma atividade que
consiste em montar uma casa de palitos de fósforos colados em uma folha A4. Durante a
atividade registro algumas falas da professora para as crianças: “Não é hora de conversa”,
“Cada um faz o seu senão desconcentra”. Observo que as crianças tentam conversar entre si
sobre a atividade, para trocar idéias, comentando como estão fazendo as casas, porém a
professora não aproveita esse momento de interação entre e com as crianças. (Notas
expandidas das observações do dia 17 de maio de 2006)
A professora Mara [turma 06 anos] explica para as crianças que ela entregará um copo
pequeno de plástico, um pedaço de algodão e feijões para as crianças plantarem. Ela explica
que depois terão que molhar um pouco com água. A professora pede para as crianças
pegarem o lápis e escrever o nome na etiqueta para colar no copo de plástico. Mara
direciona a atividade e não faz perguntas sobre como as crianças irão plantar os feijões, ela
distribui o algodão e em seguidas quatro feijões para cada criança. Depois que as crianças
colocaram o algodão e os feijões dentro do copo de plástico, a professora pega um copo com
água e vai molhando os feijões no copo. Após o plantio do feijão, Mara fala para as crianças
que elas vão anotar a experiência que elas fizeram. A professora escreve no quadro como
plantaram os feijões e as crianças copiam no caderno. (Notas expandidas das observações do
dia 31 de maio de 2006)
Na realização da pesquisa, percebi que a prática das professoras gira em torno desses
três tipos de autonomia: compartilhada, relativa ou negada, sendo que algumas professoras
mesclam um tipo de autonomia com o outro. A autonomia da criança é fundamentada na
interação, na liberdade e no exercício de autoria nos trabalhos. Esse é um princípio
imprescindível para a construção do portfólio (VILLAS BOAS, 2004; PARENTE, 2004) e
para a avaliação formativa e mediadora (HOFFMANN, 2005a, 2005b, 2003a, 2003b, 2000).
Assim, a maneira como a professora lida com a autonomia interfere no papel do portfólio na
avaliação da criança.
Observei a autonomia da criança em contextos diferentes, como na rotina diária que
pode ser definida como uma categoria pedagógica (BARBOSA, 2006) em que se estrutura o
desenvolvimento do trabalho cotidiano na Educação Infantil. Assim, analisei a autonomia da
criança na exposição dos trabalhos, na conduta das atividades propostas, nas produções da
criança, no uso do espaço físico e dos materiais disponíveis, nas brincadeiras, na oralidade, no
92
cuidado com hábitos de higiene e formação, na escrita, enfim, durante o processo de
construção do portfólio.
Na rotina diária que engloba o planejamento do dia-a-dia na escola, observei que as
professoras Berenice, Noemi e Mara direcionavam a escolha das atividades e mantinham uma
rotina mais constante, com a mesma disposição das atividades de acordo com o dia da
semana. Nesse caso, na rotina, a autonomia era negada, as professoras informavam quais eram
as atividades do dia e colocavam a rotina pendurada no varal, de forma que nas segundas-
feiras era seguida uma rotina já estabelecida, nas terças, outra rotina e assim sucessivamente.
Durante as observações, percebi que a professora Talita utilizava uma rotina diária
com base na autonomia compartilhada, em que planejava a rotina com as crianças e
perguntava-lhes sobre suas preferências, por exemplo, qual atividade gostariam de ter no final
do período escolar naquele dia.
A professora Talita interage com as crianças e programam a nova rotina do dia trocando os
desenhos feitos pelas crianças do varal. A professora deixa as crianças escolherem se no
final do dia irão querer massinha ou brincadeiras. As crianças votam pelas brincadeiras. A
professora contou para mim que ela modifica a forma de trabalhar a rotina com as crianças
93
colado o algodão das orelhas do coelho de papel, ou apontar onde devem ser coladas as
sementes que compõem o miolo da flor. Em alguns momentos as professoras Berenice e Mara
permitiam uma autonomia relativa, dependendo da atividade proposta, no caso de pintura ou
desenho livre.
as professoras Noemi e Talita demonstraram uma postura diferente, as produções
priorizavam a criatividade e diversidade da criança, a conduta das atividades não era
direcionada somente pela professora, sendo concedido ao aluno o direito de intervir, sugerir e
modificar a proposta da atividade, o que revela a autonomia compartilhada. Os trabalhos eram
sempre expostos, com grande rotatividade, sendo que essas professoras procuravam meios de
expor os trabalhos mesmo quando os excog81643(c)3.74(o)-0.(o)-0.29843(c)3.74(o)-0.(o)-0.29iv(r)-7.20151(o)-0.295585(c7.2312(s)-1.2312(a)30.1525).d[(p)-0.2955h85(a22997( )-20.1596(t)-2.16558(r)2.80561(a)3.ea)3.74( )-110.212(d)-0.295585(i)-2.16436(f)-7.2074024( )1643(c)3.66843(c)3.74(o85(a)3.74(m)-2.46239( )-4)-2.1n.74(x)-10.3009(746239( )-4)-2.1nter0.295.2315 Td[(v)-0.295585(i)-2.16436(d)mss de363( )-20.1596(q)-0.295585(u)-0.295585(a)70.1879(d)-0295585(i)-2.16436(d)-0.295585(a)W7( )-30.1643(s)-1.23125(i)-2.16436(.1596(m)-2.4599TnE5(a)585(s)-1.22997( )--1.2312( )436(v)-0.295585(i)-2.16436(d)-0.295585(a)3.74(d)-10.3015(e)3.74024(,)-0.146571(.295585(a)3.74244(l)45585(u)-0.2955852(a)3.74(s)-1.2312( )-406(q)-0.4974(h)-0.294974(o(a)3.ea)3.0.294974(oín)-10.ba)3.ea)3558(c)3 974(0.ba)3.eac0.295585(o)-0.eac9u 9( )-20.1596.295585v(l)-nuos9( )-2955.170nsq rde
94
entrada, quando é permitido que as crianças brinquem livremente, enquanto os colegas ainda
estão chegando e a professora está organizando a sala ou seu planejamento. Observei que a
professora Berenice utilizou a autonomia relativa em relação às brincadeiras, em alguns
momentos elas se limitavam aos horários escolares e em outros era permitida livremente.
Na questão da oralidade, as professoras Berenice, Noemi e Talita lidavam com uma
autonomia compartilhada, as crianças podiam conversar, contar histórias, cantar músicas e se
expressarem oralmente. Percebi que somente a professora Mara utilizava a autonomia
relativa, em alguns momentos permitia a oralidade, em outros pedia silêncio, principalmente
quando as crianças estavam copiando algum texto do quadro de giz.
Sobre os hábitos de higiene e formação todas as professoras demonstraram autonomia
compartilhada. Uma pista interessante foi que muitas vezes era exigido da criança lavar as
mãos, lanchar sem sujar o chão, escovar os dentes e guardar seus objetos de forma
independente, exercendo autonomia, ao passo que, com relação às suas produções nem
sempre era concedido às crianças o direito de serem autônomas.
Quanto à escrita observei duas pistas, uma que visualiza a escrita como cópia e outra
que a percebe como construção. As professoras Noemi e Mara utilizavam a autonomia
relativa, em alguns momentos a escrita era construção, em outros era pia do nome ou de
pequenos textos. A professora Berenice mostrou autonomia compartilhada ao registrar o que
as crianças dizem sobre suas produções, quando elas não escrevem, a professora faz o
registro. A professora Talita também demonstrou autonomia compartilhada na compreensão
da escrita como construção e registro.
Na documentação pedagógica com a utilização do portfólio, é fundamental que as
crianças e os pais e professores participem ativamente desse processo com base na autonomia
compartilhada. A criança pode selecionar algum trabalho, desenhar, escrever algo, registrando
a atividade à sua maneira. Depois de algum tempo poderá rever as amostras de seus trabalhos
95
e colaborar com o professor na avaliação de seu progresso. Os pais podem cooperar até
mesmo trazendo alguma atividade realizada em casa, alguma fotografia ou registro que
envolva o desenvolvimento de seus filhos.
Para os pais, o portfólio oportuniza a participação no ambiente escolar e o
envolvimento e a compreensão no processo de aprendizagem da criança. Com isso, os pais
podem participar e oferecer contribuições para o processo educativo.
Entretanto, durante a realização da pesquisa, tive a oportunidade de acompanhar duas
reuniões de pais juntamente com as professoras e, de acordo com os fragmentos abaixo
retirados das entrevistas, percebo que a participação dos pais se limita em receber a ficha
avaliativa e os trabalhos das crianças através do portfólio sem que se efetue uma reflexão
conjunta a seu respeito.
Berenice (turma 03 anos): Para os pais a gente entrega a ficha de avaliação, é atitudinais e
a de conteúdos [ficha que envolve atitudes, comportamento e conteúdos], que a gente faz um
pequeno resumo do que está sendo trabalhado. Se os objetivos foram alcançados sim ou não,
ou parcialmente. E para as atitudes, atitudes mesmo de comportamento com o coleguinha,
como que lancha, como que faz o trabalho, se guarda seus objetos. São coisas mais
atitudinais mesmo. Essa vai para os pais todo bimestre. (Transcrição da entrevista do dia 29
de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): Passa para os pais essas [fichas] que são dos aspectos cognitivos e
afetivos, que em sala de aula acompanha o ano inteiro. E essa [ficha] que foi do cognitivo,
mesmo dos conteúdos que foram trabalhados, esse resumo mensal também do que as crianças
fizeram em sala de aula, também fica com os pais, essa [ficha de observação] que eu anoto
diariamente fica comigo, nem mostro para os pais. (Transcrição da entrevista do dia 28 de
junho de 2006)
Mara (turma de 06 anos): Algumas [atividades] a gente seleciona para o portfólio, umas que a
gente observa que tem acontecido alguma coisa mais significativa a gente seleciona e fica
arquivado no portfólio que os pais têm acesso, mas bimestralmente, a gente entrega o
trabalho bimestral deles, são esses trabalhinhos que são agrupados e vão para casa, junto
com uma ficha de avaliação do comportamento, do relacionamento. Então é uma ficha
atitudinal junto com o portfólio. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
96
Através desses fragmentos podemos perceber algumas pistas sobre o envolvimento
dos pais no processo de aprendizagem das crianças. Eles recebem uma ficha avaliativa
(ANEXO 3) que aborda atitudes e comportamentos e também os conteúdos trabalhados.
Nesse caso, é entregue aos pais um produto final que representa os resultados alcançados
naquele bimestre, o que me leva a analisar que eles não participam do processo, somente
recebem os resultados. Essa prática condiz com uma avaliação somativa, que se preocupa com
o produto final e não com o processo de aprendizagem em si.
Outra pista que destaco é o fato de a professora Noemi relatar que, embora faça um
registro diariamente, com base em suas observações, não mostra essa ficha de observação
(ANEXO 4) para os pais. A ficha de observação traz comentários da professora sobre algo
significativo que ela observou na aprendizagem da criança, fato que demonstra que essa ficha
traz uma avaliação do processo, na medida que é mais descritiva sobre situações ocorridas na
sala de atividades. Considero que tais observações apresentariam uma possibilidade muito
ampla no sentido de contribuir para a compreensão dos pais sobre o que acontece nas salas da
Educação Infantil, o que parece não ser percebido pela professora, que essa ficha não é
valorizada como uma avaliação formativa nas reuniões de pais.
A professora Mara demonstra uma postura diferente em relação à ficha de observação,
quando diz que a ficha faz parte do portfólio a que os pais têm acesso. O portfólio é
representado pelos trabalhos das crianças e pela ficha de observação preenchida pela
professora, todavia, a ficha de avaliação do comportamento e do relacionamento também é
entregue juntamente com o portfólio. Pela sistemática adotada, penso que para os pais, o que
fica mais evidente é a ficha avaliativa de atitudes e comportamento, que é analisada, assinada
e devolvida na própria reunião de pais, ficando na escola. Os trabalhos das crianças são
levados para casa e podem ser vistos posteriormente.
97
Percebo que a ficha avaliativa funciona como um retorno para os pais sobre como os
98
facilitar o envolvimento dos pais, enfatizando o processo de aprendizagem construído no
portfólio. O fato de também utilizar a ficha avaliativa parece ser para cumprir um
procedimento da escola, entretanto, percebe-se que, pelo encaminhamento dado pela
professora na condução da reunião de pais, ela demonstra uma concepção de avaliação
formativa e mediadora.
Por último, quero analisar outra pista que se refere ao modo como a professora
organiza o portfólio de aprendizagem com as crianças. Talita afirma que junta as atividades
expostas no painel ou mural, a cada bimestre, e faz um envelope com as crianças. Durante as
observações na sala de atividades, foi possível observar esse momento e, posteriormente, na
entrevista, a professora também contou como faz esse retorno do portfólio com a criança. A
professora Talita foi a única professora a demonstrar essa prática em que as crianças
organizam seu portfólio e retornam às atividades realizadas através de suas produções.
Talita (turma – 05 anos): [...] eu pego todas as atividades, levo para roda e aí eu vou lendo os
nomes e vou entregando a atividade para eles ajudarem a organizar, [...]. Eles começam a
ver, a relembrar da atividade, essa atividade eu fiz olha o quê que eu fiz, até acho esse
momento de interação deles me ajudar, estar arrumando o próprio trabalhinho que vai levar
para casa. O envelope são eles que confeccionam geralmente eu peço sugestão a eles sobre o
que pode ser colocado [como capa] no envelope, se eles querem colocar uma atividade que já
foi feita na unidade, ou uma outra atividade, é sempre muita troca entre eu e eles.
(Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Nesse momento de retorno às atividades para a organização do portfólio de
aprendizagem, percebi que a professora interage com as crianças através da autonomia
compartilhada, em que as crianças podem relembrar suas produções, recordando o que foi
significativo. Além disso, as próprias crianças mostram seus trabalhos para os colegas e
interagem entre si.
99
Dessa forma, o portfólio é uma forma de registrar a aprendizagem através da
documentação pedagógica. É inegável que esse processo sofre interferências das concepções
de criança, infância, aprendizagem e avaliação das professoras e da própria escola.
É preciso salientar que, embora a utilização do portfólio traga muitas possibilidades
para uma avaliação formativa e mediadora, sua construção não é fácil e rápida como
preencher uma ficha avaliativa, demandando uma postura diferente daquela baseada na
avaliação tradicional.
3.3 Possibilidades e dificuldades na prática
O portfólio possibilita a avaliação na Educação Infantil com vantagens significativas
para a criança, para o professor, para os pais, enfim, para o processo educativo como um todo.
Para a criança, o envolvimento constante na avaliação promove uma compreensão de
sua aprendizagem através de uma auto-avaliação contínua. Com isso, ela percebe que o
trabalho escolar lhe pertence e pode demonstrar sua identidade na seleção das produções,
fazer escolhas e tomar decisões sobre a construção do seu portfólio.
Nesse caso, essa construção implica um processo de reflexão, em que a criança
conquista sua autonomia ao analisar as atividades realizadas e ao registrar suas percepções e
sentimentos (VILLAS BOAS, 2004).
Ao reconhecer suas potencialidades e fragilidades, a criança desenvolve a habilidade
crítica, sentindo-se participante do processo educativo. Além disso, o portfólio permite o
desenvolvimento da criatividade, pois possibilita inovar e ousar, criando sempre novas
alternativas de aprendizagem.
Na Educação Infantil, a construção do portfólio valoriza a linguagem oral e não
somente os trabalhos escritos. Quando a criança ainda não domina a linguagem escrita, a
100
criança pode “ditar” para o professor seus comentários sobre a atividade (SHORES e
GRACE, 2001). Assim, a criança tem oportunidades de exercitar a autonomia e tecer
considerações sobre como está percebendo a realização das atividades. Durante as
observações, percebi que as professoras têm a prática de registrarem o que a criança diz sobre
um desenho ou sobre outra produção.
Para o professor, a utilização do portfólio oferece a possibilidade de compreender
como as crianças estão aprendendo e de aprimorar o trabalho pedagógico com reflexões sobre
a sua conduta profissional.
De acordo com Shores e Grace (2001, p.27):
A avaliação contínua com o portfólio pode proporcionar um aumento de
conhecimentos e de habilidades que os profissionais em educação infantil
necessitam, incluindo os conhecimentos do desenvolvimento infantil, uma
ampla variedade de técnicas de entrevista e de observação, a habilidade de
adaptar ambientes de aprendizagem para suprir as necessidades individuais
de certas crianças, os métodos de envolvimento curricular centrados na
criança e nas técnicas para envolver as famílias na vida de seus filhos nos
centros de ensino ou escolas, trazendo sua vivência de casa para a sala de
aula.
Com o conhecimento do desenvolvimento infantil e com o envolvimento dos pais no
processo de ensino-aprendizagem, o professor estabelece parcerias de aprendizagem com a
criança e com os pais, não se constituindo como o único responsável pelo processo educativo.
Apresento a seguir um fragmento em que a professora Berenice confirma que o
registro no portfólio facilita a compreensão dos pais sobre a aprendizagem dos filhos.
Berenice (turma 03 anos): É interessante para os pais que estão vendo, saber [a
importância] que o brincar e o rabiscar [têm], como é que surgem coisas interessantes. Como
que o aprendizado está ali, porque às vezes chega em casa com aquele desenho rabiscado
que para a mãe é um rabisco, para ele [aluno] tem sentido totalmente diferente. Por isso que
eu acho interessante enquanto estão desenhando a gente escrever se a criança comentar, não
que a gente fique cobrando, mas se a criança fala a gente puxa rapidinho a folha e escreve,
para a gente não perder essa informação, porque ali está toda a brincadeira dele, mas
também todo um acontecimento[de aprendizagem], talvez quando a mãe dele for ver o
101
trabalho junto com ele, nem ele lembre naquele momento o que ele fez. (Transcrição da
entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Além de auxiliar os pais, o portfólio pode ser utilizado pelo professor como seu diário
reflexivo (ALARCÃO, 2004), visto que ele pode criar seu próprio portfólio, com anotações
não de experiências bem sucedidas, como também de suas dúvidas e angústias quanto a
problemas específicos vivenciados na sala com seus alunos. A construção de um diário
reflexivo favorece o entendimento de situações cotidianas e a busca por possíveis soluções
diante das dificuldades encontradas.
O portfólio docente revela o percurso profissional do professor e tem a finalidade de
desenvolver seus conhecimentos para aprimorar sua prática. A avaliação por meio do
portfólio também envolve a auto-avaliação do professor.
Além disso, os portfólios permitem que o professor analise sua atividade profissional e
busque enriquecê-la a partir das necessidades que surgem no desempenho de sua função.
Nas entrevistas, ainda que nenhuma professora tenha declarado a prática de se elaborar
o portfólio docente, elas expressaram as contribuições do portfólio para suas práticas
pedagógicas, como demonstram os fragmentos a seguir.
Berenice (turma – 03 anos): Algumas vezes na hora em que a gente está anotando, a gente
a nossa fala neles, a gente atitudes nossas nas atitudes deles e quando a gente começa a
olhar isso com um olhar mais observador, quando você está disposta a escrever, você capta
esses momentos mais delicadamente e que talvez passem despercebidos. Então você a sua
fala, você as suas atitudes, você muitas vezes reproduzindo as atitudes dos pais, do que
acontece em casa, então são alguns momentos em que você fica realmente mais atento.
(Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Noemi (turma 04 anos): Você propõe uma atividade e você que o aluno não fez com
interesse, não gostou, você começa a repensar, será que eu estou indo no caminho certo,
será que eu devo mudar, será que essa unidade de trabalho está legal, está havendo interesse.
(Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
102
Talita (turma 05 anos): [...] você percebe que o seu trabalho está fluindo [...]. O portfólio,
na hora que você pega uma atividade [que foi observada e registrada], é o concreto, é o que
você ensinou, porque na educação infantil tem muita coisa abstrata, muita coisa de observar,
que você que o aluno está desenvolvendo, que muitas vezes você não tem como mostrar
aquilo ao pai numa atividade, eu acho que o portfólio ajuda que nessa atividade você pode
falar com o pai, [por exemplo,] olha ela está demonstrando interesse pela escrita, no período
livre, que ela poderia estar brincando com jogos, com bonecas, ela estava ali tentando
escrever alguma coisa, então eu acho que essa avaliação é importante [...]. (Transcrição da
entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Mara (turma 06 anos): Ele [o portfólio] é uma referência para a gente o tempo todo, você
usa isso também para a sua prática, a partir do momento analisando uma anotação que você
fez de um comportamento de um aluno, você não tem como desvincular a sua figura [...] será
que eu agi corretamente dando esse tipo de atividade, será que foi a mais coerente, [...] os
alunos são muito diferentes, então às vezes uma atividade que é significativa para um, é um
desafio negativo para o outro. [...] situações que eles não consigam realizar uma atividade
com êxito que esperavam, fica um pouco uma sensação de derrota, então isso a gente não
pode deixar que o aluno sinta e a gente tem que perceber essa situação e o portfólio auxilia.
(Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Apesar dos benefícios que o portfólio proporciona como a reflexão sobre a prática
docente na aprendizagem da criança e o envolvimento dos pais no processo educativo, as
professoras também relataram algumas dificuldades relacionadas com a utilização desse
instrumento. As dificuldades apontadas pelas professoras também apareceram em outras
pesquisas que foram realizadas por Parente (2004) e por Villas Boas (2004) sobre a
construção do portfólio.
Berenice (turma – 03 anos): Eu acho mais complicado é o dia-a-dia porque muitas vezes você
não pode parar para fazer anotação, e quando você o dia passou e você não anotou, e
depois você chega em casa tem que escrever, mais já não é a mesma coisa[...]. A maior
dificuldade é encontrar tempo para você parar[e registrar], parece que o relógio vai embora,
é uma sucessão de acontecimentos que quando você acha que está parando [a criança]
entornou o suco, o outro quer ir ao banheiro, o outro está batendo no colega, o outro
está querendo fazer outra brincadeira, o outro está sugerindo brincar disso daqui assim,
assim. E você vai emendando uma coisa na outra e na hora que você vê, passou.
(Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de 2006)
Talita (turma 05 anos): A princípio a gente se depara com uma coisa que a gente não está
acostumada a fazer, então a gente estranha um pouco, a gente tem que ficar muito atenta,
porque se você não ficar observando, não ficar atenta, quando chega ao final do mês você
103
não pegou [uma] atividade para estar registrando. Então, às vezes, um pouco de dificuldade
que eu sinto é nesse sentido da gente ficar um pouco ansiosa, porque às vezes tem alguma
criança que fica [sem atividade registrada], eu falo assim, gente eu não consegui ainda
resgatar nenhuma atividade dessa criança, até hoje ele não demonstrou nenhum significado
nessa atividade, é o mesmo comportamento em todas as atividades, então cria uma angústia
da gente estar separando essa atividade. Aqui, nem tanto, porque o número de crianças é
bem limitado, tem quinze, então a gente consegue o manejo de separar uma [atividade]; numa
sala de aula com muita criança eu acredito que seja mais trabalhoso para o professor de
estar observando, tirando essas atividades, então tem que estar sempre atenta a isso para não
deixar acumular, porque se acumular, ela vai ficar perdida. (Transcrição da entrevista do dia
30 de junho de 2006)
Mara (turma 06 anos): A minha sala tem quinze alunos, se tivesse mais, eu acho que não
seria viável, porque é um processo [de construção do portfólio] que demanda atenção,
demanda um certo tempo, se você tiver uma ajudante, não tem nenhum problema [...].
(Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
As queixas das professoras giraram em torno da falta de tempo para registrar, da
quantidade de alunos, do portfólio ser algo novo que foge à rotina da professora e da
ansiedade docente na construção do portfólio.
Sobre a falta de tempo relacionada com o número de crianças na sala de atividades,
Parente (2004) pesquisou a utilização do portfólio como prática de avaliação investigativa em
salas com até 25 crianças e encontrou professoras construindo o portfólio juntamente com as
crianças, afirmando ser possível usá-lo como instrumento de avaliação, mesmo com um
número de alunos mais elevado, como foi o caso de sua pesquisa.
Villas Boas (2004, p.171) também relata essas dificuldades encontradas pelos
professores durante a construção do portfólio. Segundo a autora, os professores consideraram
que o portfólio “é bom”, mas é trabalhoso, cansativo e demanda muito tempo.
A autora analisa que, para o professor, o portfólio pode representar mais trabalho
devido a uma concepção tradicional de avaliação, fundamentada em procedimentos
repetitivos sem reflexão e inovações. Destaca que, em alguns casos, até se muda o
instrumento, mas a concepção de educação, de criança, de infância e de avaliação continuam a
mesma.
104
Durante a pesquisa, percebi que a construção do portfólio implica algumas
transformações sobre a concepção de avaliação, processo que não se afigura como fácil, uma
vez que requer uma constante reflexão com relação à prática docente e à aprendizagem das
crianças.
Sobre o portfólio ser algo novo, ressalto que sua utilização do mesmo demanda que o
professor assuma riscos em mudar (VILLAS BOAS, 2004), em sair da rotina, em
experimentar algo diferente. Para isso, reconheço a necessidade de conhecer profundamente o
processo de construção do portfólio dentro da perspectiva da avaliação formativa e mediadora
como prática de investigação, que implica um olhar aberto para o novo, para o diferente, para
os pequenos detalhes que revelam como a criança está aprendendo.
Entre as professoras entrevistadas, somente a professora Noemi não relatou
dificuldades com relação ao portfólio. Para ela, a facilidade advém do fato de a sua turma ser
pequena e de ter tido oportunidade de estudar sobre o portfólio antes de utilizá-lo.
Noemi (turma 04 anos): Não, não vejo dificuldade não. Primeiro porque é uma turma
pequena então fica mais fácil de você manter, dar conta de tudo isso, dessa organização,
ajuda muito. E também porque foi uma coisa que nós viemos de um estudo também, eu não
peguei cheguei com ele aqui pronto e comecei a trabalhar, vem de um estudo, que foi
construído. (Transcrição da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Considero que o estudo anterior sobre o processo de construção do portfólio fortaleceu
a compreensão da professora sobre a implantação desse procedimento. O portfólio não deve
ser visto como um modismo em que as professores mudam o instrumento, mas continuam
com a mesma concepção de avaliação como produto final e meio de exclusão. Compreendo
que, para fundamentar a construção do portfólio, é necessária uma mudança na concepção de
avaliação.
105
Outras pistas sobre o papel do portfólio na avaliação da criança podem ser visualizadas
através dos fragmentos abaixo, em que as professoras trazem sugestões sobre o uso do
portfólio.
Berenice (turma 03 anos): Primeiro observações breves, [...]se você fizer uma observação
longa, você vai acabar saindo da realidade, tem que ser observações rápidas, breves. E na
medida do possível, porque nem sempre vai dar. Não que isso daí seja uma rotina, é o dia em
que dá, porque infelizmente não para vo ficar metodicamente seguindo o portfólio,
porque senão você se perde mais ainda, você se enrola, porque você vai ter mais uma
obrigação dentro da sala, e é uma obrigação que foge ao momento em que você está junto
com as crianças, porque por mais que você tente você não consegue fazer essa observação
junto com as crianças. [...] Então assim, sendo breve e realista, na hora que der vofaz,
você vai fazer melhor do que você ficar naquela obrigatoriedade de fazer e não conseguir
fazer porque não conta de fazer [...]. (Transcrição da entrevista do dia 29 de junho de
2006)
Noemi (turma 04 anos): É que realmente ele [portfólio] seja um acompanhamento, não se
faça isso no final de cada bimestre. Primeiro que se você deixa acumular, você vai perder
algumas informações, então tem que ser feito durante todo o processo, durante todo o
bimestre no caso, que o nosso entregamos bimestralmente, e fechamos a cada bimestre,
então que ele seja feito realmente, que seja um acompanhamento, não seja apenas um final,
que haja realmente uma participação constante, na confecção desse portfólio. (Transcrição
da entrevista do dia 28 de junho de 2006)
Talita (turma 05 anos): Que [a professora] seja bem organizada em relação a isso
[portfólio], que tenha certo em mente o objetivo do portfólio com é que ele vai ser trabalhado,
como é que ele vai ser observado, como que essa atividade vai ser tirada [observada e
registrada], no caso do relatório, não deixar acumular, que se deixar acumular depois acaba
que no final perde o significado. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
Mara (turma 06 anos): [O portfólio] é um instrumento muito significativo no processo
educacional, que o que eu recomendo é que a gente não deixe para anotar depois, porque
a informação se perde, [...] você o vai estar sendo realmente fiel ao acontecimento, não
pode deixar acumular, se você não anotou naquele dia, é preferível deixar aquele momento e
esperar o próximo, porque senão ele fica um pouco sem sentido, a gente mesmo se perde na
anotação. (Transcrição da entrevista do dia 30 de junho de 2006)
A professora Berenice sugere observações breves, justificando que as observações
longas fogem da realidade, posição da qual discordo, que me leva a entender que tal sugestão
é uma pista que demonstra sua resistência ao registro. Considero que observações breves ou
106
muito rápidas correm o risco de cair em rótulos ou expressões sem sentido. Um registro
descritivo sobre uma situação observada traz mais detalhes que podem ser fundamentais para
a compreensão do que se observa. Outra pista revelada no fragmento diz sobre a questão de
registrar na medida do possível, sem obrigatoriedade. Penso que novamente Berenice mostra
resistência em registrar e em assumir um compromisso que exija uma documentação diária.
Pela fala da professora, analiso que ela compreende o portfólio como uma obrigação a
cumprir e não como uma necessidade para sua prática docente em relação à aprendizagem das
crianças.
Para a professora Noemi, o papel do portfólio é acompanhar o processo de
aprendizagem, ela ressalta que não se pode deixar a construção do portfólio para o final do
bimestre, visto que isso acontece durante o processo e não somente no resultado final.
Segundo a professora, o acúmulo de informações no final do bimestre pode comprometer o
processo de construçãoa ede5(e)3.74.-2.16436585(a-)-0.(9(e)2.8( )-280.313(c585[( )-100.206(c)3.74(o)-0.295585(n)-0.295585(s)-1.2312(t)-2.1642997(av2)015(e)-6.26.p0.295585(i)-2.16436(ncvn)-0.295585(s)2997(av2)015(e)-6.26.p0.2955b4( )-100.206(e)3.03374( )-2599773(o))267.998 74(s)-1.22997(s)-1.22(e)3.033)267.998 74(s)2.80439(295585(o)-1142(i)-2.16)3.74(l)-2.16436( )-100.206(d)-0.295585(o)-0.295585( )-100.206(b)-0.295585(i)-2.16436(m)-2.45995(2)-0.29555t1.22997(s)-1.22997(o)-0.295585( 2.80439(295582)-0.2955-0.295585(e)-6.26(p)-10.3015(o)-0.2)-1142(i)-207pb7pr3(u)-0.2949-6.0.295585epi5(e)395(o)-0.29515(o)-0.2n295582edam o 558580439((av9n)-222(e)3.033h( )]TJ27.20151(a)3.74(n)-0.295585(t)-2.16436(3374( )-2599779(295582)-0.29.80439(o)-182)-0.29e)3.74244(s)-1.23129(ç)-6.v595(r)2.80439(o)-0.2931412(avâ244(s)-1.23122931412)37(n)-10.3015(ã)3.74(o)-0.295585( )-10.1537(c51(a)3.74(n)-0Q436(x)-10.30.295585(t223129(ç)-6.80439(o)-0.2931412)4974(r3(5t1.22997(s)-1.22997(o)-00.29)-0.2955(o)-98 74(s).22997(o)-06998 74(s).22997(o)-06t0439(o)-182)-.2)-.6(n)-0.2h3.74( )-25(e)310.1525(p)-0.295585(a)3.74(r)-7.20151(a)3.74( )-10.1o 2.80439(29558 l)-2.16436(7925809556.0.295585e)-6.26(p)-0.2955-0.295585eop795585(m)-231679515(o)-0.2nnnaal am5(e(c)3.74(o)-0.295585(n436(s)-11.2371( )-40.1677(d)]TJ253.469 0 Td585( 2.80439(295582)-0.301( )-40.16585(s)-1.22999)-23142( )250]TJ-257.552)-2702)-0.29552915(e078 -3015(f9(295582)27d)]TJ253.469e)3(e(c).4-0e)3.742489(295582)27d
107
A professora Mara confirma a sugestão das outras professoras em não deixar as
informações se acumularem durante a construção do portfólio, pois se o espaço entre a
observação e o registro for grande, a professora não consegue ser fiel ao que foi observado e o
registro pode ficar comprometido. Novamente, percebo que o papel do portfólio está ligado ao
registro da aprendizagem.
Villas Boas (2004) complementa que o portfólio como procedimento de avaliação está
ligado a um novo olhar e a uma nova prática, que concebe a avaliação como investigação.
Para a autora, avaliação é investigação.
Nesse sentido, percebo que a avaliação implica investigar a aprendizagem da criança.
Assim, considero que na avaliação investigativa o portfólio abre caminhos para que o
professor desenvolva um olhar observador sobre a aprendizagem infantil e sobre seu trabalho
docente. Ao analisar sua atividade profissional, o professor pode enriquecê-la a partir das
necessidades que surgem no desempenho de sua função.
Concordando com Esteban (2003a, p. 24):
Investigando o processo de ensino/aprendizagem o professor redefine o
sentido da prática avaliativa. A avaliação como um processo de reflexão
sobre e para a ação contribui para que o professor se torne cada vez mais
capaz de recolher indícios, de atingir níveis de complexidade de
interpretação de seus significados, e de incorporá-los como eventos
relevantes para a dinâmica ensino/aprendizagem. Investigando, refina seus
sentidos e exercita/desenvolve diversos conhecimentos com o objetivo de
agir conforme as necessidades de seus alunos, individual e coletivamente
considerados.
Dessa forma, percebo que o portfólio possibilita a prática avaliativa fundamentada na
investigação. O portfólio enfoca as produções da criança a partir de um olhar reflexivo crítico
em que cada avanço é importante. Nessa concepção, a aprendizagem está em constante
evolução e as reflexões estabelecidas em torno da aprendizagem constituem a base para a
ação do professor no processo educativo.
108
Na investigação é permitido interrogar, inovar, questionar e buscar respostas. Nessa
busca o olhar do professor está aberto para o que é peculiar, para o diferente e também para as
ações que sempre acontecem e se repetem no cotidiano e que podem revelar algo novo.
O olhar investigador não tem o intuito de acusar, julgar ou excluir, mas descobrir
como a criança está aprendendo, os avanços, as conquistas, em que ela precisa de ajuda e o
que pode fazer sozinha.
Nesse contexto, é fundamental refletir sobre o conceito de Zona de Desenvolvimento
Proximal de Vygotsky (1998a), em que a criança, através da interação com o outro, que pode
ser o professor, ou um colega, ou os pais, aprende e avança na construção de seu
conhecimento, sendo capaz de caminhar na aprendizagem.
Para compreender a trajetória de aprendizagem, a avaliação investigativa utiliza o
portfólio como instrumento de reflexão e documentação, em que é possível construir outro
olhar sobre as situações escolares, as produções das crianças e sobre sua própria atividade
docente.
O portfólio como instrumento de documentação pedagógica e avaliação investigativa
possibilita o registro da aprendizagem infantil, de modo que os avanços fiquem guardados e
não se percam durante o caminho educativo. O registro é fundamental para valorizar a
produção infantil e documentar esta cultura produzida pela criança, que representa suas
percepções sobre o contexto escolar e sua aprendizagem.
Com a construção dos portfólios, a documentação pedagógica permite refletir sobre o
processo significativo de aprendizagem, que não é imediato, mas está em contínuo
crescimento.
Apesar das dificuldades que envolvem o uso do portfólio, ele proporciona ao professor
a possibilidade de compreender a aprendizagem das crianças e analisar sua prática pedagógica
109
ao refletir sobre suas ações, que interferem no desenvolvimento da criança, em seu trabalho
diário.
Assim, a documentação pedagógica com o uso do portfólio, além de possibilitar o
aprimoramento do processo educativo, também valoriza as produções da criança como forma
de registro de sua compreensão de mundo.
110
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criança é feita de cem. A criança tem cem mãos,
cem pensamentos,cem modos de pensar, de jogar e de falar.
A criança tem cem linguagens (e depois cem cem cem) mas
roubaram-lhe noventa e nove. A escola e a cultura lhe separaram
a cabeça do corpo. [...] Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho, a realidade
e a fantasia,a ciência e a imaginação, o céu e a terra, a razão e o sonho
são coisas que não estão juntas. Dizem-lhe que as cem não existem.
A criança diz: ao contrário, as cem existem.
(MALAGUZZI, 1999, p. v)
Ao final desta dissertação, desejo voltar ao começo, em minha questão que se tornou o
foco desta investigação. Pesquisei como as professoras de Educação Infantil compreendem o
papel do portfólio na avaliação da criança. Essa pergunta norteou os caminhos percorridos
durante a pesquisa e foi discutida anteriormente nos outros capítulos, com base nas
observações e entrevistas que revelaram pistas e indícios encontrados no campo.
A compreensão das professoras sobre o papel do portfólio remeteu à concepção de
avaliação, de aprendizagem, de criança e de infância. Essas concepções foram construídas
pelas professoras de acordo com influências recebidas e experiências vivenciadas enquanto
sujeitos: como crianças, como alunos, como mulheres e como profissionais da educação de
crianças pequenas.
Considero que as professoras reconheceram a importância de se utilizar o portfólio na
Educação Infantil, contudo, nem todas compartilhavam com a concepção de avaliação
formativa e mediadora que fundamenta a construção do portfólio.
Nesse caso, havia uma proposta nova de organizar o portfólio, que trazia também
resquícios de uma avaliação somativa, que pôde ser visualizada nas fichas avaliativas. Essa
mistura comprometia a clareza e o objetivo na utilização do portfólio que, em alguns
momentos foi instrumento e procedimento de avaliação formativa, e, em outras ocasiões
funcionou apenas como um instrumento a serviço de uma avaliação determinista.
111
As professoras organizaram portfólios contendo seus registros sobre as crianças e a
aprendizagem. Nas entrevistas elas reconheceram a necessidade de observar e registrar as
observações para que o olhar delas estivesse atento às conquistas das crianças, de modo que
os avanços fossem percebidos e registrados. Em que pese o fato de elas terem relatado que o
portfólio proporcionou algumas reflexões sobre a aprendizagem das crianças, percebi que,
quando a professora tinha uma concepção de avaliação tradicional, isso influenciava a
construção do portfólio, que era direcionada quase sempre pela professora, limitando a
participação da criança em executar apenas as atividades que lhe eram propostas.
Tal atitude não condiz com os princípios do portfólio, expostos no capítulo anterior,
que englobam construção, processo, reflexão, participação, autonomia, criatividade, parceria e
auto-avaliação (VILLAS BOAS, 2004).
Quando a professora assumia para si a responsabilidade pela construção e organização
do portfólio, ele se tornava um peso no sentido que aumentava as obrigações da professora no
seu trabalho diário com as crianças. Por isso, as professoras expressaram que o portfólio
aumenta o trabalho docente, exige compromisso, não sendo tarefa fácil conciliar o número de
crianças com as demandas do portfólio.
Entendo que isso ocorre quando a professora não compreende o papel do portfólio
como um processo de aprendizagem em conjunto com as crianças e com a família,
conduzindo ela mesma sua construção como uma obrigação da professora, não tendo em
mente a criança como autora do portfólio.
Em relação a essa questão, considero que a criança pode exercer a autoria no registro
de sua aprendizagem, ainda que não domine a escrita, visto que cabe ao professor escrever o
que a criança diz sobre suas produções. Todavia, de acordo com a pesquisa realizada, o uso do
portfólio nem sempre possibilitou esse envolvimento da criança, fato demonstrado através das
112
pistas sobre a autonomia das crianças que, algumas vezes, era compartilhada, em outras era
negada e em algumas ocasiões foi relativa, conforme o contexto da atividade.
Se a criança não participa do portfólio com autonomia, ele se torna um conjunto de
registros do professor sobre a criança e perde o sentido de auto-avaliação em que a criança
reconhece em suas produções sua aprendizagem. Somente uma professora demonstrou que as
crianças retomam seu portfólio com o intuito de refletir sobre a aprendizagem,
compartilhando com os colegas seus trabalhos.
Frente ao exposto, percebo que o papel do portfólio depende das concepções dos
professores sobre a criança, sobre infância, sobre avaliação e sobre aprendizagem. Quando se
utiliza o portfólio com base em uma concepção tradicional de avaliação, ele pode ser reduzido
a um arquivo de papéis, em que as produções são guardadas e ficam no esquecimento ou
depois são entregues aos pais sem um processo de reflexão conjunta.
Quanto ao envolvimento da família, evidencia-se igualmente uma limitação pelas
fichas avaliativas cujo objetivo era informar, ou prestar contas, sobre como as crianças
estavam se desenvolvendo e como as professoras estavam trabalhando com elas, qual
conteúdo era abordado, quais atitudes e comportamentos eram formados. Tais fichas, além de
não condizerem com a avaliação formativa e mediadora, serviam como mecanismo de
redução da avaliação a expressões deterministas quanto ao desenvolvimento da criança.
A despeito de o portfólio e as fichas avaliativas buscarem representar o retorno para os
pais, quando a escola mostrava o seu desempenho na educação das crianças, ressalto a
contrariedade presente no uso desses dois instrumentos, visto que representam concepções
diferentes de avaliação. Entendo que, para a escola, o portfólio era uma forma de mostrar aos
pais o que os filhos estão fazendo no tempo que permanecem na instituição, constituindo-se
mais como um instrumento informativo do que um efetivo instrumento de reflexão da
aprendizagem.
113
A participação dos pais consistia em comparecer às reuniões, olhar as fichas
avaliativas, assinar, devolver para a professora e
114
produções de forma que perceba sua aprendizagem. Para os pais, o portfólio demonstra como
a criança está aprendendo e proporciona o envolvimento nesse processo. Para o professor, o
portfólio também documenta a aprendizagem da criança e se constitui em um diário reflexivo
em que o professor registra sua atuação e reflete sobre seu papel enquanto educador.
Por outro lado, o diário reflexivo do professor representa o seu portfólio profissional
em que registra suas aprendizagens no exercício sua profissão, no qual aponta dúvidas ou
dificuldades, além de documentar suas experiências.
Com base na pesquisa realizada, percebi que as professoras não possuem a prática do
portfólio como registro reflexivo de seu próprio trabalho, que elas registram e refletem
sobre o portfólio da criança. Tal atitude demonstra que elas não compreenderam a
possibilidade de o portfólio docente servir como instrumento de reflexão, como um diário
reflexivo.
Penso que isso remete à concepção de avaliação, no que tange à auto-avaliação do
próprio trabalho docente, processo que não se afigura como simples, já que implica assumir o
risco de admitir, expor falhas e procurar ajuda para as dúvidas e os problemas encontrados.
Por outro lado, esse risco envolve inovar, descobrir, aprender, compartilhar com colegas,
trocar idéias, sugestões, enfim, movimentar-se diante de uma prática estagnada, com o intuito
de dinamizar sua atuação.
Percebo que uma possibilidade para a reflexão crítica do professor é a formação em
contexto (SILVA e MICARELLO, 2005) baseada em três pilares: formação, pesquisa e
intervenção, formação em que se utilize a prática reflexiva como método de trabalho e de
aprendizagem em colaboração com o outro. Dessa forma, a formação em contexto acontece
na própria escola, com ênfase no diálogo e na experiência do professor que, em conjunto com
o pesquisador, investigam a prática pedagógica.
115
Entendo que na prática docente o professor expressa suas concepções sobre educação,
avaliação, criança e infância. Considero que somente uma mudança de concepção pode
proporcionar a transformação do trabalho do professor, com práticas mais participativas e de
autonomia para as crianças.
Portanto, acredito que, na formação em contexto, os professores tenham a
oportunidade de discutir as concepções que fundamentam suas ações e possam modificar sua
forma de pensar e sua prática, tendo abertura para mudanças e inovações que contribuam para
a aprendizagem coletiva das crianças, dos pais e dos próprios professores.
116
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Edições Feme, 2005.
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Moysés. (orgs.) Os intelectuais na história da infância. São Paulo: Cortez, 2002.
SOUZA, Sandra M. Zákia Lian. Avaliação do rendimento escolar como instrumento de gestão
educacional. In: OLIVEIRA, Dalila Andrade (org.) Gestão democrática da educação.
Petrópolis: Vozes, 1997.
______. Avaliação da aprendizagem: natureza e contribuições da pesquisa no Brasil, no
período de 1980 a 1990. Tese (Doutorado) USP, 1994.
VAL VERDE, Sonia Larrubia. Relatórios de avaliação das EMEIS de São Paulo: uma
necessidade ou exigência legal? Dissertação (Mestrado) PUC/SP, 1994.
122
VIANNA, Heraldo Marelim. Pesquisa em educação: a observação. Brasília: Plano
Editora, 2003.
VILLAS BOAS, Benigna Maria de Freitas. Portfólio, avaliação e trabalho pedagógico.
Campinas, SP: Papirus, 2004.
VYGOTSKY, Lev Semenovich. Psicologia pedagógica. Trad. Paulo Bezerra. 2 ed. São
Paulo: Martins Fontes, 2004.
______. A construção do pensamento e da linguagem. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo:
Martins Fontes, 2000.
______. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos
superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
______. O desenvolvimento psicológico na infância. Trad. Claudia Berliner. São Paulo:
Martins Fontes, 1998.
______. Obras Escogidas IV. Madrid: Visor, 1996.
ZABALZA, Miguel A. A qualidade em educação infantil. Porto Alegre: Artes Médicas,
1998.
123
ANEXOS
124
ANEXO 1. ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO
Construção do portfólio
Produções das crianças
Participação da criança
Participação da professora
Participação dos pais
Mediação: criança / criança e professora / criança
Conteúdos do portfólio
Exposição do portfólio
Arquivo do portfólio
Acesso ao portfólio
Retorno do portfólio
Portfólio e avaliação na Educação Infantil
125
ANEXO 2. ROTEIRO DE ENTREVISTA
Formação e percurso profissional
Avaliação na Educação Infantil: teoria e prática
Concepção de criança e infância.
Portfólio: definição e construção
Objetivos do Portfólio
Participação da criança
Participação dos pais
Conteúdos do portfólio
Exposição do portfólio
Arquivo do portfólio
Acesso ao portfólio
Retorno para a criança
Retorno para os pais
Retorno para a professora
Dificuldades em relação ao portfólio
Contribuições do portfólio
Recomendações para outras educadoras sobre o portfólio
Portfólio e avaliação na Educação Infantil
Portfólio como instrumento de reflexão para o professor
126
ANEXO 3. FICHA INDIVIDUAL DE OBSERVAÇÃO DO ALUNO
127
ANEXO 4. REGISTROS DE OBSERVAÇÃO DA CRIANÇA
128
ANEXO 5. TERMO DE CONSENTIMENTO PARA REALIZAÇÃO DE PESQUISA
A professora Raquel Costa Cardoso Lusardo solicitou-me consentimento para
participar de seu projeto de pesquisa “AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL:
CONCEPÇÕES DE PROFESSORAS SOBRE O PAPEL DO PORTFÓLIO”, a ser realizado
com a turma na qual atuo como Professora Regente.
Fui informada através de um encontro com a pesquisadora sobre os objetivos da
pesquisa, características e procedimentos metodológicos.
Ficou acordado que os instrumentos utilizados serão observações na sala de atividades
e entrevista gravada em áudio.
Entendo que os materiais produzidos em sala, tanto pelos alunos quanto por mim,
também poderão ser utilizados caso sejam pertinentes aos objetivos da pesquisa.
Concordo voluntariamente em participar deste estudo, sabendo que poderei retirar o
meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante a realização do mesmo, sem que
haja qualquer restrição da pesquisadora.
É de meu pleno conhecimento que a divulgação dos dados da pesquisa servirão a fins
puramente científicos, acadêmicos e/ou didáticos, sendo resguardada minha identidade, a
confidencialidade das informações e dos demais envolvidos no estudo.
Juiz de Fora, ____ de março de 2006.
________________________________________________
Professora
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