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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Josiane Carolina Soares Ramos do Amaral
A TRAJETÓRIA DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NA REDE
ESTADUAL DE ENSINO DO RIO GRANDE DO SUL
Porto Alegre
2006
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2
Josiane Carolina Soares Ramos do Amaral
A TRAJETÓRIA DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NA
REDE ESTADUAL DE ENSINO DO RIO GRANDE DO SUL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Faculdade de Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como
requisito parcial para a obtenção do título de Mestre
em Educação.
Orientador: Profª. Drª. Vera Maria Vidal Peroni
Porto Alegre
2006
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AGRADECIMENTOS
Ao concluir este trabalho quero agradecer:
- À minha querida orientadora, Profª Drª. Vera Maria Vidal Peroni, pelo incansável
incentivo, pelo profundo respeito e confiança depositados em mim no percurso
desta pesquisa, pela amizade, pelo exemplo de pesquisadora.
- Ao grupo de pesquisa: Lúcia Camini, Marilda de Oliveira, Liane Bernardi Hello,
Maria Otília Susin, Romir Rodrigues, Diórgenes Lima, Dalva Guttierrez e Juliana
Lumertz pelas contribuições e disposição constante em me ajudar.
- À todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em especial à Profª. Maria Beatriz
Luce e a Profª. Nalú Farenzena pelas sugestões para o desenvolvimento desta
pesquisa.
- A todas as pessoas que fazem parte do Núcleo de Estudos de Políticas e Gestão
da Educação.
- Ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul pela oportunidade de realizar este curso.
- Aos meus pais: Roberto Ferreira Ramos e Maria de Lourdes Soares Ramos,
guerreiros, exemplos de vida, de caráter, de dedicação, que sempre lutaram por
mim, me incentivando e me apoiando nos diferentes momentos da minha vida.
- Ao meu esposo José Antônio, pela tolerância na minha ansiedade, encorajador
constante em meio a tantas dificuldades e fonte de inspiração para meus estudos.
- Às minhas tias: Glaci de Jesus Soares e Ondina de Jesus Soares, que sempre
me incentivaram nos meus estudos.
- À banca de qualificação que me apontaram caminhos, contribuindo nesta
jornada.
- Aos meus colegas de trabalho da Equipe Diretiva do Colégio Estadual Presidente
Arthur da Costa e Silva que cotidianamente me fazem acreditar que é possível
uma educação pública de qualidade.
- A todas as pessoas que, na sua singularidade, contribuíram para me constituir no
que sou e no que sei.
4
“É preciso que nos lembremos sempre de um fato: a democracia
não é um estado, é um processo; não constitui um estágio, mas
um processo. O processo pelo qual a soberania popular vai
controlando e aumentando os direitos e os deveres são
prolongados, implicando um avanço muito grande dentro da
sociedade. Não há estágio democrático, mas há processo
democrático pelo qual a vontade da maioria ou a vontade geral vai
assegurando o controle sobre os interesses da administração
pública” (VIEIRA, 1998, p.12).
5
A TRAJETÓRIA DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NA REDE
ESTADUAL DE ENSINO DO RIO GRANDE DO SUL (1985 – 2001)
Josiane Carolina Soares Ramos
Resumo: Este trabalho versa sobre o processo de construção da gestão
democrática da educação na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul. O
Objetivo desta investigação é percorrer a trajetória da gestão democrática da
educação na rede estadual do Rio Grande do Sul de 1985 a 2001. Esta análise
levou em consideração as influências das políticas neoliberais no decorrer dos
anos 1990 e seus impactos nas políticas de gestão da educação. Foi utilizada uma
abordagem qualitativa, com a análise da legislação educacional sobre o tema,
atas de reuniões, programas de governo e entrevistas semi-estruturadas com os
diferentes os sujeitos participantes deste processo. Embasando-se nos dados
coletados, assim como na análise conjuntural de desenvolvimento deste processo,
concluiu-se que os movimentos iniciados pelo CPERS/Sindicato na década de
1980 muito estimularam o debate sobre a proposta de gestão democrática, assim
como os embates e as negociações com os diferentes governos estaduais do
período pesquisado. Existiram algumas rupturas neste processo, porém a
sociedade civil organizada soube reivindicar seus direitos tendo no governo Olívio
Dutra uma discussão mais apurada sobre o tema. As resistências do poder
legislativo, dos professores e da mídia para com o Governo Olívio Dutra acabaram
originando alguns entraves para a ampliação da gestão democrática da educação.
No entanto, a legislação construída foi um importante instrumento indutor de
mudanças nas práticas escolares, fazendo parte do processo que está em pleno
desenvolvimento.
Palavras-Chave: Política educacional, gestão democrática da educação e reforma
do Estado.
6
TRAJECTORY OF THE EDUCATION DEMOCRATIC MANAGEMENT IN THE
STATE EDUCATIONAL NETWORK IN RIO GRANDE DO SUL (1985 – 2001)
Josiane Carolina Soares Ramos
Abstract: This work approaches the process of construction of the education
democratic management in the state educational network in Rio Grande do Sul
from 1985 to 2001. It analyzes the correlation of forces in the process, as well as
its subjects, proposals and confrontations. This analysis has taken into
consideration the influences of neo-liberal policies along the 1990s and their
impacts on the policies of education management. A qualitative approach has been
adopted, involving the analysis of educational legislation on the theme, meetings
records, government programs and semi-structured interviews with different
subjects participating in this process. Based on data collected, as well as on the
conjunctional analysis of development of this process, it was concluded that the
movements initiated by CPERS/Union in the 1980s encouraged the debate about
the proposal of democratic management, along with the confrontation and
negotiations with different state governments during the period investigated. There
were some disruptions in this process, yet the organized civil society was able to
claim their rights, having a more accurate discussion about the theme during Olívio
Dutra government. The resistances by the legislative power, teachers and media to
Olívio Dutra government ended up giving rise to some hindrances for spreading
the democratic management in education. However, the legislation constructed
was an important means to induce changes in school practices, as part of the
process that is being developed.
Key words: Educational Policy, Democratic Management in Education and State
Reform.
7
LISTA DE QUADROS
1. Mecanismos de gestão democrática para o PNE – Sociedade Civil ......... 94
2. Síntese das Ações/Investimentos da Capacitação dos dirigentes escolares
– 1995 ...................................................................................................... 120
3. Síntese das Ações/Investimentos da Capacitação dos Dirigentes Escolares
– 1997 ...................................................................................................... 121
4. Demonstrativo da Aplicação do Programa de Avaliação Externa ............ 125
5. Demonstrativo da Aplicação do Programa de Avaliação Externa ............ 125
6. Demonstrativo da Aplicação do Programa de Avaliação Externa ............ 126
7. Análise Comparativa do PL 171/2001 e o Substitutivo Nº2 ..................... 137
8
LISTA DE SIGLAS
ABESC - Associação Brasileira de Escolas Superiores Católicas
ADERGS - Associação dos Administradores de Educação do Rio Grande do Sul
AEC - Associação de Educação Católica
AELAC - Associação de Educadores da América Latina e do Caribe
ACPM – Associação dos Círculos de pais e Mestres
ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade
ANC - Assembléia Nacional Constituinte
ANDE - Associação Nacional de Educação
ANDES - Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior
ANFOPE - Associação Nacional pela Formação dos profissionais da Educação
ANPED - Associação Nacional de Pedagogia
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento
BM – Banco Mundial
BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento
CCQ - Círculos de Controle de Qualidade
CCJ – Comissão de Constituição e Justiça
C.E – Conselho Escolar
CEED – Conselho Estadual de Educação
CEDES - Centro de Estudos Educação e Sociedade
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e Caribe
C.F – Constituição Federal
CIEP - Centros Integrados de Educação Popular
CNBB - Confederação Nacional dos Bispos do Brasil
9
CONED - Congresso Nacional de Educação
CONSED - Conselho Nacional de Secretários de Educação
CONTEE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de
Ensino
COREDES - Conselhos Regionais de Desenvolvimento
CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
CPM – Círculo de Pais e Mestres
CPERS/Sindicato - Centro dos professores do Estado do Rio Grande do Sul /
Sindicato dos Trabalhadores em Educação
CRE – Coordenadoria Regional de Educação
CRUB - Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras
CUT - Central Única dos Trabalhadores
ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
ENADE - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes
ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio
ES – Espírito Santo
FACED – Faculdade de Educação
FASUBRA SINDICAL - Federação de Sindicatos de Trabalhadores das
Universidades Brasileiras
FAURGS – Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
FDRH – Fundação de Desenvolvimento em Recursos Humanos
FEE – Fundação de Economia e Estatística
FENEM - Federação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino
FGDEP – Fórum Gaúcho em Defesa da Escola Pública
FHC – Fernando Henrique Cardoso
10
FMI – Fundo Monetário Internacional
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FNDEP Nacional em Defesa da Escola Pública
FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério
GQT - Gestão ou Gerência para a Qualidade Total
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICMS - Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte
Interestadual e de Comunicações
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MARE - Ministério
da Administração Federal e Reforma do Estado
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MG – Minas Gerais
MP – Medida Provisória
OMC – Organização Mundial do Comércio
PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais
PDDE – Programa Dinheiro Direto na Escola
PDRAE – Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado
PDS – Partido Democrático Social
PL – Projeto de Lei
PLC – Projeto de Lei da Câmara dos Deputados
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PMDE - Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental
PNAC - Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania
11
PNE – Plano Nacional de Educação
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PRN – Partido da Reconstrução Nacional
PSO – Public Service Orientation
PT – Partido dos Trabalhadores
RS – Rio Grande do Sul
SARH – Secretaria de Administração e Recursos Humanos
SAEB - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
SE – Secretaria de Educação
SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
SINPRO-RS – Sindicato dos Professores do Ensino Particular do Rio Grande do
Sul
UBES - União Brasileira dos Estudantes Secundarista
UDN – União Democrática Nacional
Uex – Unidade Executora
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UGES – União Gaúcha dos Estudantes
UNDIME - União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
UNE – União Nacional dos Estudantes
UNICAMP – Universidade de Campinas
USAID - United States Agency for International Development
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................14
1 ESTADO, POLÍTICAS SOCIAIS, DEMOCRACIA E GESTÃO.......................23
1.1 Discutindo conceitos básicos: Educação, Democracia, Estado, Política
Social e Política Educacional ..........................................................................23
1.2 Nova República e Democracia ............................................................. 30
1.3 Redefinição do papel do Estado e gestão pública ............................ 34
1.3.1 A década de 1990 e a reforma do Estado no Brasil ................... 39
1.3.1.1 Gerencialismo Puro ............................................................. 47
1.3.1.2 Consumerism....................................................................... 48
1.3.1.3 Public Service Orientation - PSO ......................................... 50
1.4 O novo padrão de gestão pública.................................................................... 52
2 A GESTÃO DA EDUCAÇÃO............................................................................. 56
2.1 Propostas de gestão da educação nas décadas de 1980 e 1990 ............59
2.1.1 O princípio de gestão democrática da educação na Constituição
Federal de 1988 e na Constituição Estadual de 1989 ................................ 64
2.1.2 A Política educacional a partir da Nova República .........................69
2.1.3 O princípio de gestão democrática da educação na LDBEN/96 e
no Plano Nacional de Educação ......................................................... 88
2.1.4 Políticas de gestão da educação e os organismos
internacionais................................................................................... 96
3 A GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NA REDE ESTADUAL DE
ENSINO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (1985 – 2001 ......................101
3.1 Caracterização do Estado do Rio Grande do Sul e da Rede Estadual de
Ensino.................................................................................................................. 102
3.2 O processo de construção da gestão democrática da educação na rede
estadual de ensino do Estado do Rio Grande do Sul.......................................... 104
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 141
13
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................153
APÊNDICE.......................................................................................................... 168
14
INTRODUÇÃO
A partir do início da década de 1970, a crise no capital é expandida,
surgindo uma nova forma de acumulação de capital, denominada por David
Harvey (1989) de “acumulação flexível”. Diante deste contexto, a crise financeira e
política alastra-se pelos diferentes países, e o conflito entre capital e trabalho
intensifica-se. No Brasil, a ditadura militar entra em derrocada, iniciando um
processo gradual de abertura política, mais conhecido como a “Nova República“
(FERNANDES, 1986).
No entanto, não podemos ignorar os efeitos perversos que a crise no capital
(MÉSZÀROS, 2002) tem provocado no mundo. As estratégias para a superação
desta crise encontram-se, de acordo com Vera Peroni (2003), no neoliberalismo,
na globalização, na reestruturação produtiva e na terceira via. Para o
neoliberalismo, não é o capitalismo que está em crise, e sim o Estado. Tendo
como diagnóstico da crise no Estado, esta corrente ideológica acredita que o
Estado deve diminuir a sua atuação (Estado mínimo) ou ser reformado.
Esta reforma é baseada na lógica mercantil, crendo que ela possa fazer o
Estado tornar-se mais ágil e eficiente. Por sua vez, estas estratégias de superação
produzem efeitos nas políticas sociais. Sobre isso, Vera Peroni (2006) afirma que
as prescrições destas reformas para as políticas sociais seriam a racionalização
de recursos e o esvaziamento do poder das instituições públicas, pois são
“permeáveis às pressões e demandas da população, além de serem consideradas
como improdutivas pela lógica de mercado” (2006, p.14). Por isso, a execução
destas políticas devem ser repassadas para a sociedade através da privatização,
do quase-mercado ou pelo “público não-estatal”
1
.
1
O conceito de quase-mercado e “público não-estatal” será desenvolvido no Capítulo I e II.
15
As políticas educacionais também são afetadas pelas conseqüências
destas estratégias e reformas. No Brasil, a partir de 1995, temos o Plano Diretor
de Reforma do Aparelho do Estado – PDRAE, que objetiva a redefinição das
ações econômicas e sociais do Estado. Segundo o PDRAE, a educação é um
serviço não-exclusivo do Estado, e por isso deve ser publicizada
2
.
A partir deste plano, foram desenvolvidas diversas políticas educacionais
voltadas para a gestão educacional
3
, buscando desenvolver uma postura mais ágil
e eficiente nos gestores. Com isso, a gestão da educação tornou-se um tema
bastante importante na agenda educacional da atualidade.
Em diferentes períodos históricos, tivemos debates sobre a importância da
educação e da escola e sua relação com a sociedade. Dependendo do período,
estas relações foram atenuadas ou intensificadas, resultantes do processo de
correlação de forças de diferentes concepções sobre as responsabilidades do
Estado, da função social da educação e da escola.
Neste sentido, entendemos que “a política educacional é um dos
instrumentos para se projetar as pessoas de que uma sociedade necessita”
(MARTINS, 1993, p.09). Por isso a política educacional é “carregada de intenções”
(Idem, p.10). De acordo com estas políticas, podemos perceber que tipo de
sociedade se quer formar.
No Brasil, em meados da década de 1970, inicia-se toda uma mobilização
por parte da classe trabalhadora que reivindicava o direito de seus filhos à escola
pública, assim como a reflexão dos motivos pela falta de vagas, pelas condições
precárias nas instalações escolares, entre outros fatores. Junto com essa
mobilização, os profissionais da educação começaram a se organizar em
sindicatos, a conquistar planos de carreira, valorizando sua formação e
questionando a organização burocrática e hierárquica da administração escolar
(MEDEIROS & LUCE, 2006).
2
Este conceito será tratado no Capítulo I.
3
O CONSED desenvolve um projeto desde agosto de 1996, denominado RENAGESTE (Rede
Nacional de Referência em Gestão Educacional); outro projeto criado em 1998 pelo CONSED, a
UNDIME, a UNESCO e a Fundação Roberto Marinho foi o Prêmio Nacional de Referência em
Gestão Escolar.
16
É neste contexto que surge a expressão “gestão democrática da educação”.
Esta forma de gestão é sustentada por mecanismos, como o processo de eleição
para diretor, a constituição e funcionamento de Conselhos Escolares, mecanismos
esses para a autonomia administrativa, ao que se soma a reivindicação de
autonomia financeira e pedagógica escolar. A presente pesquisa analisa como se
deu a construção destes mecanismos na rede estadual de ensino do Rio Grande
do Sul,acreditando que a legislação promulgada é o resultado dos embates deste
processo.
Num primeiro momento, o mecanismo mais reivindicado pelos professores
da rede estadual foi a eleição de diretor. De acordo com Erasto Mendonça (2001),
a eleição de diretores foi o processo que melhor materializou a luta contra o
clientelismo e o autoritarismo na administração da educação. Anteriormente os
diretores eram escolhidos pelo executivo. No entanto, ainda há estados que não
colocaram a obrigatoriedade na eleição para diretor
4
.
Logo em seguida, na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul, foi
garantida a constituição dos Conselhos Escolares como principal órgão de
representação da comunidade. Outra medida, também muito importante e muito
reivindicada, foi a autonomia da escola, que passou a fazer parte do processo de
democratização da gestão escolar, avançando em termos de abertura das
instituições públicas.
Essas medidas foram regulamentadas por leis, o processo de embates para
a formulação dessas leis é o foco desta pesquisa. No entanto, antes de traçar as
diretrizes do trabalho, convém destacar o interesse pelo objeto pesquisado.
Iniciei minha trajetória profissional em escolas estaduais, como professora
dos anos iniciais e da educação infantil. Como professora, percebi que muitos de
meus colegas não consideravam importante a luta política; acreditavam que a
categoria já tinha reivindicado tudo o que poderia, conseguindo alguns feitos e
desistindo de outros. Esse contexto de desmobilização incentivou-me a buscar
4
Como exemplo, temos a rede estadual de ensino de São Paulo que realiza concurso para o cargo
de diretor.
17
informações sobre os acontecimentos que fizeram com que esses professores
ficassem desmotivados.
Com isso, iniciei um Curso de Especialização em Gestão da Educação na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. No decorrer desse curso, fui
convidada a assumir o cargo de coordenadora pedagógica da escola em que eu
lecionava. Para mim, foi um grande desafio: participar da gestão da escola,
buscando levar estímulos aos professores tanto na parte pedagógica quanto na
parte política.
Diante desses fatos, iniciei meus estudos sobre o tema gestão democrática
da educação. Percebi que era um tema polêmico dentro da escola pública, pois
ainda existem posicionamentos diferentes, e muitos desses professores não
obtinham argumentos nem esclarecimentos sobre os reais acontecimentos. Este
fato acabou instigando-me, o que me levou ao objeto de pesquisa: a trajetória de
construção da gestão democrática na rede estadual do Rio Grande do Sul.
A relevância deste estudo dá-se principalmente por existir uma lacuna
sobre o tema na rede estadual
5
, contribuindo para o debate sobre a gestão
democrática. Apesar de uma grande parcela da comunidade escolar ter
participado de todo este processo, boa parte ficou de fora e desconhece o tema
por diferentes fatores
6
. Mesmo uma década após a Lei 10.576 de 1995, ainda
existe o desconhecimento dos mecanismos que amparam a gestão democrática
da educação dentro da instituição escolar.
Nesse aspecto, as razões que confirmaram a realização desta pesquisa
decorreram da observação dos tensionamentos do poder executivo com as
entidades ligadas à educação. Constatou-se que a Assembléia Legislativa foi o
campo de disputa política, havendo muitos avanços, porém muitos limites
também. Com isso, surge a necessidade de uma sistematização dos fatos
ocorridos e dos embates que construíram a gestão democrática na rede estadual.
No decorrer da pesquisa, a partir dos dados coletados e do aprofundamento
teórico que embasou a investigação, alguns questionamentos foram provocados:
5
Os estudos encontrados sobre o tema seriam o de Maria Elizabete Mousquer (2003) e Maria Fani
Scheibel (2002).
6
No caso desta pesquisa, esses fatores não farão parte do estudo.
18
A partir das transformações econômicas, políticas e sociais que ocorreram no
Rio Grande do Sul nos últimos dezessete anos (1985 – 2001), quais foram os
principais embates sobre o tema gestão democrática da educação?
Como estes embates se materializaram em políticas de gestão democrática da
educação?
Quais foram os seus avanços e limites?
O período a ser investigado foi determinado pela promulgação da primeira
lei que regulamentou a eleição para diretor em escolas públicas estaduais (Lei
8.025/85) e pela última alteração da Lei de gestão democrática da rede estadual
(Lei 11.195/01). Por isso, a escolha de iniciar o estudo em 1985, finalizando em
2001.
A partir dos questionamentos levantados, foram estabelecidos os seguintes
objetivos para a pesquisa:
Analisar a correlação de forças existente em todo o processo de construção
da gestão democrática no Rio Grande do Sul, seus sujeitos e seus embates.
Analisar o processo de construção da gestão democrática na rede estadual
de ensino do Rio Grande do Sul, levando em consideração as reivindicações dos
setores educacionais e as políticas instituídas no período a ser pesquisado.
Analisar a implantação de políticas neoliberais no decorrer dos anos 1990 e
seus impactos na gestão da educação na rede estadual de ensino do estado do
Rio Grande do Sul.
Caracterizar as políticas educacionais voltadas para a gestão da educação
e contidas nos diferentes programas de governo para o estado do Rio Grande do
Sul.
Antes de tudo, é necessário exprimir a concepção de método utilizada nesta
dissertação:
Admite-se a existência de um método quando se segue determinado
“caminho”, uma trajetória teórica, buscando atingir um fim
antecipadamente colocado, em geral o exame de certo objeto. Qualquer
método se opõe ao mero acaso, porque o método representa, sobretudo,
19
uma ordenação, uma sistematização intelectual, expressa através de um
conjunto coerente de leis, categorias e conceitos. Um método consiste
num “caminho” que pode levar a outros “caminhos”, alcançando o fim
proposto e também vários fins não indicados, certamente inatingíveis por
meio do acaso (VIEIRA, 1992, p.29).
Evaldo Vieira (1992) afirma que método é um caminho, um conjunto de
conceitos utilizados para a análise de um objeto. A escolha de um método é um
fator relevante, pois “métodos distintos acarretam diferentes entendimentos [...]”
(Idem, p.29) sobre o problema investigado. Portanto, pressupõe-se que o caminho
percorrido pelas análises provém dos conceitos utilizados na pesquisa, e,
portanto, se os conceitos forem modificados, outros caminhos serão indicados.
Considerando que as teorias com as quais trabalhamos revelam a nossa
maneira de apreciar o mundo, esta pesquisa embasou-se no método histórico-
dialético que, de acordo com Augusto Triviños (2001, p.50), fundamenta-se “[...]
nas contradições que apresentam os fenômenos [...] cujos aspectos orientadores
se dirigem, especialmente, aos elementos contraditórios que possam apresentar
os fenômenos em foco”.
Nesta perspectiva, para a coleta de dados, utilizei entrevistas semi-
estruturadas, buscando fazer “[...] um estudo exploratório da problemática da
existência do entrevistado” (Idem, p.37). As entrevistas foram realizadas durante a
construção do objeto de pesquisa. Foi utilizado um total de onze entrevistas entre
representantes de entidades ligadas à educação e secretários de educação do
período pesquisado. Para a realização das entrevistas, foi usado um Termo de
Consentimento Informado, em que os entrevistados concordaram que seus nomes
fossem utilizados em trabalhos científicos.
Como representantes, foram entrevistados José Clóvis de Azevedo
(Conselheiro do CPERS/Sindicato na década de 1980), Neiva Lazzarotto
(representante do CPERS/Sindicato na Comissão Paritária de discussão do texto
legal de gestão democrática da educação), Maria Beatriz Luce (Presidente do
Fórum Gaúcho em Defesa da Escola Pública), Inajara Ferreira (Representante da
Secretaria de Educação na Comissão Paritária de discussão do texto legal de
gestão democrática da educação), Marlene Schuck (técnica da Secretaria de
20
Educação), Raul Gomes de Oliveira Filho (ex-presidente da ACPM/Federação e
participante da Comissão Paritária para discussão do texto legal de gestão
democrática da educação), Antônio Carlos Fallavena (ex-presidente da
ACPM/Federação), Aquilino Girardi (atual presidente da Associação dos
Administradores de Educação do Rio Grande do Sul – ADERGS), Neuza
Canabarro (Secretária de Educação do Governo Alceu Collares), Iara Wortmann
(Secretária de Educação do Governo Sinval Guazzelli e do Governo Antônio
Britto) e Lúcia Camini (Secretária de Educação do Governo Olívio Dutra).
Não consegui entrar em contato com o secretário de educação do governo
Jair Soares. Nem todas as entrevistas foram realizadas por mim; utilizei-me de
algumas entrevistas já realizadas pelo Núcleo de Estudos de Políticas e Gestão da
Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul para as análises que se procedem.
Acreditando na “realidade como um processo, em movimento, em
transformação, contraditório” (TRIVIÑOS, 2001, p.49), além de entrevistas, utilizei
também a análise de documentos, como Projetos de Leis (PL Nº 410/95, PL Nº
172/99 e PL Nº 171/01), a legislação que regulamenta a gestão democrática da
educação na rede estadual do Rio Grande do Sul, as Atas de Comissões para a
discussão do texto legal, Programas de governo, jornais do CPERS/Sindicato,
Relatórios de governo, entre outros.
Esta pesquisa, sendo de natureza qualitativa, analisou as informações
coletadas no desenvolvimento do processo de investigação, admitindo um certo
grau de flexibilidade da mesma. Augusto Triviños (2001, p.93) afirma que, no
desenvolvimento da pesquisa, podem-se levantar outras hipóteses “surgidas das
respostas, atitudes ou dos comportamentos dos sujeitos que participam na
pesquisa”.
Para a pesquisa, foram levadas em consideração a descrição, análise e
compreensão “não só imediata, mas também mediata do fenômeno” (Idem, p.94).
Portanto, buscou-se analisar a totalidade histórico-concreta da realidade, trazendo
as propriedades imediatas e secundárias, tendo como objetivo,
21
[...] sobretudo, destacar as transformações que tem sofrido o fenômeno
em seu desenvolvimento; não exclusivamente essas transformações,
mas também as que possam possivelmente produzir-se dadas
determinadas condições que os resultados da pesquisa mostram que têm
perspectivas de acontecer (TRIVIÑOS, 2001, p.102).
Por isso, se procurou analisar o resultado do desenvolvimento histórico do
conhecimento e da prática social relacionada com a gestão democrática da
educação, embasando-se em propriedades como a “luta dos contrários” (Ibidem).
Esta luta resulta processos de desenvolvimento, regressão e movimento circular,
onde “[...] o novo significa um novo objeto [...]; porém o novo tem muitas
propriedades do antigo fenômeno [...]” (TRIVIÑOS, 2001, p.120).
O texto é estruturado por três capítulos e as considerações finais. No
primeiro capítulo, apresento os conceitos de Educação, Estado, Democracia,
Política Social e Política Educacional que embasaram a pesquisa. Faço
referências à crise no capitalismo e às suas relações com a reforma do Estado e
da administração pública. Com isso, discuto a interferência destas reformas nas
políticas sociais, mais precisamente nas políticas voltadas para a gestão da
educação.
No segundo capítulo, descrevo as diferentes concepções de gestão da
educação e as suas influências na escola pública, detendo-me mais
especificamente nas concepções de gestão democrática e nos mecanismos que a
sustentam. Neste capítulo, há referências sobre o desenvolvimento das
reivindicações da sociedade em prol de uma educação democrática; com isso,
percebemos os movimentos que se formaram e as suas concepções de gestão
democrática.
Há uma revisão sobre os processos de construção que tratam da gestão
democrática na educação na Constituição Federal de 1988, na Constituição do
Estado do Rio Grande do Sul de 1989, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996 e no Plano Nacional de Educação de 2001.
22
Além destes processos, são apresentados documentos educacionais do
governo federal e do Banco Mundial de modo a explicitar suas tendências, tanto
na década de 1980, como na década de 1990. A descrição do cenário educacional
do período a ser pesquisado é fundamental para o entendimento deste processo
de construção da gestão democrática, mostrando as interferências causadas pela
economia. Segundo Evaldo Vieira (1992), a política social está intimamente
relacionada com a política econômica.
No terceiro capítulo, faço a descrição dos dados coletados e a
sistematização dos mesmos. Nesta sistematização, busco revelar os embates e as
contradições contidas neste processo de construção da gestão democrática da
educação na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul, mostrando as
influências das políticas educacionais do governo federal nas políticas
educacionais gaúchas.
Nas considerações finais da pesquisa, resgatam-se os elementos
desenvolvidos nos capítulos anteriores, relacionando-os, procurando inicialmente
confirmar ou refutar a hipótese construída no princípio da pesquisa que foi:
- Na década de 1980 e 1990 ocorreram muitos embates entre as forças políticas e
sociais na busca pela gestão democrática da educação. Com isso, surgiram
concepções diferentes de gestão educacional, uma de cunho democrático,
advinda das reivindicações dos movimentos sociais vinculados à educação, e
outra de cunho neoliberal vinculada às propostas dos organismos internacionais.
Estas concepções influenciaram os projetos governamentais que, por sua vez,
foram implementados na rede estadual de ensino do RS.
Busca-se explicitar as conclusões sobre os dados coletados, assim como
os limites encontrados, indicando novas investigações. Estas considerações finais
sintetizam o trabalho, sendo um espaço para uma reflexão crítica sobre a gestão
democrática da educação na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul.
23
1 ESTADO, POLÍTICAS SOCIAIS, DEMOCRACIA E GESTÃO
O presente capítulo contextualiza o tema da pesquisa, traz as referências
teóricas e uma interpretação de seus conceitos. Esta dissertação enfoca a
trajetória da gestão democrática na rede estadual de ensino do estado do Rio
Grande do Sul de 1985 – 2001, suas contradições, seus limites e avanços.
As análises iniciam-se no período da “Nova República” (FERNANDES,
1986) ou na fase de transição democrática que, segundo Atilio Boron (1994, p.07),
foi acompanhada por um “saudável ressurgimento do interesse em discutir a rica
multiplicidade de significados contidos na proposta democrática”. Com isso,
conheceremos os contextos nos quais a proposta democrática foi gerida,
destacando a área da educação.
Segundo Maria da Glória Gohn (1995),
Em síntese, podemos dizer que as ações coletivas nos anos 70 e 80,
no Brasil, foram impulsionadas pelos anseios de redemocratização do
país, pela crença no poder [...] da participação popular, pelo desejo de
democratização dos órgãos, das coisas e das causas públicas, pela
vontade de se construir algo a partir de ações que envolviam os
interesses imediatos dos indivíduos e grupos (GOHN, 1995, p.203).
Posteriormente, a década de 1990, período inicial das políticas neoliberais
no Brasil, inseriu uma lógica mercantil a tudo, obtendo também reflexos nas
diferentes políticas sociais. É nesse período que a concepção de gestão das
instituições públicas é repensada e re-contextualizada.
A análise do longo período histórico (dezesseis anos) que a presente
pesquisa aborda, tem por suporte os conceitos enumerados a seguir: Educação,
Democracia, Estado, Políticas Sociais, Políticas Educacionais e Gestão Pública,
bem como as suas inter-relações.
1.1 Discutindo conceitos básicos: Educação, Democracia, Estado, Política
Social e Política Educacional.
24
Discorrer sobre gestão democrática da educação nos remete a alguns
conceitos básicos para obtermos um melhor entendimento da trajetória percorrida
pelo tema. Educação, Democracia, Estado, Política Social e Política Educacional
se inter-relacionam de tal maneira que é relevante iniciar esta dissertação
deixando claro quais as concepções utilizadas.
Entendemos que o Estado “[...] retrata uma relação de dominação dos
homens sobre os homens, baseada na força. Esta força se manifesta mais
comumente através da imperatividade da lei” (VIEIRA, 1992, p.20). A
obrigatoriedade da lei, conforme o autor (1992), origina-se de um Estado de
direito, e, portanto, este Estado constitui-se por princípios básicos, como o
domínio da lei, a divisão dos poderes, a legalidade da administração e a garantia
dos direitos e liberdades fundamentais.
Para o autor, um Estado de direito democrático requer o princípio da
soberania popular, ou seja, Estado e governo necessitam da legitimidade popular.
Por isso, “[...] o Estado de direito impõe a condição de que a lei se origine de um
órgão popular representativo, que expresse a vontade geral” (VIEIRA, 1992, p.20).
Conseqüentemente esta lei deve relacionar-se e estar subordinada a uma
Constituição (Idem, p.09). Para Evaldo Vieira, o que sustenta o Estado de direito é
a sociedade democrática.
Sociedade democrática é aquela na qual ocorre real participação de
todos os indivíduos nos mecanismos de controle das decisões, havendo,
portanto real participação deles nos rendimentos da produção (VIEIRA,
1992, p.13).
Esta sociedade democrática é possível a partir de uma educação que
permita uma experiência cidadã. Como pensar na formação de cidadãos em uma
instituição educacional hierarquizada, vertical e autoritária? A gestão democrática
da escola e da educação é de grande importância neste contexto de preparação
para a cidadania ou para a constituição de uma sociedade com maior justiça social
e menos desigualdades.
25
Atilio Boron (1994) nos mostra que a transição democrática estimulou a
sociedade civil a iniciar um processo de discussão dos significados contidos na
proposta democrática. Segundo o autor, existem duas concepções de democracia.
A primeira, concebida pelos representantes das posições
neoconservadoras, acredita que “a democracia é um projeto que se esgota na
‘normalização’ das instituições políticas” (BORON, 1994, p.07). Com isso, a
democracia reduz-se à institucionalização de um sistema de regras do jogo
político, abstraindo seus conteúdos éticos e os antagonismos sociais, depositando
seus problemas na governabilidade e na eficácia administrativa (Ibidem).
A segunda concebe a democracia como um projeto indivisível, possuindo
duas exigências. A primeira exigência seria a criação de um conjunto de regras do
jogo político com o objetivo de “[...] institucionalizar – e provisoriamente resolver –
os antagonismos sociais e chegar a resultados ‘incertos’, isto é, nem sempre
necessariamente favoráveis aos interesses das classes dominantes” (BORON,
1994, p. 08). A segunda exigência seria a articulação entre a igualdade concreta
dos produtores de idéias, de leis, de bens materiais, etc. e a liberdade efetiva dos
cidadãos, na qual se deriva “[...] uma proposta de reforma social que suprima as
flagrantes injustiças do capitalismo [...]” (Idem, p.09).
Diante destas concepções de democracia, Atílio Boron afirma que, na
América do Sul, nunca existiu uma democracia genuína. José Nun (1989, apud
BORON, 1994, p.09) discute a dimensão prática destas concepções de
democracia.
Acontece que uma coisa é conceber a democracia como um método
para a formulação e tomada de decisões no âmbito estatal, e outra bem
distinta imaginá-la como uma forma de vida, como um modo cotidiano de
relação entre homens e mulheres que orienta e que regula o conjunto das
atividades de uma comunidade. Estou aludindo ao contraste entre uma
democracia governada e uma democracia governante, isto é, genuína
(NUN, 1989, apud BORON, 1994, p.09).
Segundo o autor, a primeira concepção de democracia seria uma
democracia governada, ou seja, um método de governo ou uma “engenharia
política [...] o desenho e funcionamento das instituições ‘públicas’” (BORON, 1994,
26
p.09), já a segunda concepção seria uma democracia governante genuína, onde
as relações humanas se diferem.
Para Vitor Paro, a democracia não deve ser vista apenas pela sua
conotação etimológica (“governo do povo”) ou pelo conceito formal de “vontade da
maioria”, mas pelo “[...] seu significado mais amplo e atual de mediação para a
construção da liberdade e da convivência social, que inclui todos os meios e
esforços que se utilizam para concretizar o entendimento entre grupos e pessoas
[...]” (2001, p.10).
Neste sentido, a gestão democrática da educação configura-se como uma
importante política social. Para que esta política se efetive, devemos formular uma
legislação que a regulamente, que determine como esta gestão democrática
funcionará na prática. Esta legislação é o resultado da pressão popular, advinda
de muitos embates entre as forças sociais, pois se origina de um órgão que
representa os diferentes setores da sociedade.
Evaldo Vieira (1992, p.13) afirma, que “no Brasil, ele [o Estado de Direito] é
débil ao enfrentar a voragem dos que, por um ou outro motivo, acabam
desrespeitando as regras do jogo político”. Ao invés da real participação, o que
temos é uma participação formal imaginária ou passiva.
Neste contexto, falar em uma gestão da educação participativa ou
democrática remete-nos a uma concepção de Política Social. Logo, concordamos
com a concepção de Política Social sistematizada por José Germano, que,
baseando-se nas idéias de Evaldo Vieira, afirma:
[...] a política social [...] consiste numa estratégia utilizada pelo Estado,
voltada para o chamado desenvolvimento econômico com o objetivo de
interferir na correlação de forças sociais que se defrontam em
determinado contexto histórico. Ela expressa, de certa maneira, as
relações entre Estado e Economia, demonstrando, por conseguinte, a
existência de uma unidade entre política econômica e política social
(GERMANO, 1992, p.21-22).
Desta forma, a política social é uma estratégia que atende parte da
população, originando-se da busca, por parte do governo, pela sua legitimidade
social, aceitando aquelas reivindicações populares que são do seu interesse. A
27
política social está agregada à política econômica, exprimindo, conforme José
Germano (1992, p.22), “mudanças nas relações entre as classes sociais ou
relações entre os distintos grupos sociais existentes no interior de uma só classe”.
O autor ainda fala que, embora tais políticas sejam estabelecidas em
função da acumulação do capital, especialmente a política social, não se derivam
exclusivamente da vontade dos capitalistas e da tecnocracia. Apoiando-se nas
idéias de Marx, José Germano (1992) defende que a política social é uma “síntese
de múltiplas determinações que, no caso da política educacional, se corporifica
através de um conjunto de relações sociais pertinentes ao aparelho de ensino”,
por vezes atendendo às necessidades e demandas das classes populares, como
também aliviando as tensões e conflitos.
Sobre esta problemática, Evaldo Vieira (1997) descreve a trajetória das
políticas sociais no Brasil no último século. O primeiro período, conhecido como o
“controle da política”, corresponde à ditadura de Getúlio Vargas e ao populismo
nacionalista; o segundo período, conhecido como “política de controle”, é relativo à
ditadura militar até o período constituinte em 1988; e o terceiro, denominado de
“políticas sociais sem direitos sociais”, acontece a partir da Constituição de 1988.
A idéia de gestão democrática foi construída no segundo período, chamado
“política de controle”; porém, ela só se transformou em política no terceiro período,
o de “políticas sociais sem direitos sociais”. No caso da política de gestão
democrática, o Estado atendeu às demandas da década de 1980, atenuando os
conflitos existentes no período.
Para Evaldo Vieira (1992), não tem havido política social desligada dos
reclamos populares.
Os direitos sociais significam, antes de mais nada, a consagração
jurídica de reivindicações dos trabalhadores. Não significam a
consagração de todas as reivindicações populares, e sim a consagração
daquilo que é aceitável para o grupo dirigente do momento. Adotar
bandeiras pertencentes à classe operária, mesmo quando isto configure
melhoria nas condições humanas, patenteia também a necessidade de
manter a dominação política (VIEIRA, 1992, p.23).
28
A gestão democrática da educação foi uma bandeira pertencente aos
movimentos sociais vinculados à educação a partir de 1980. Somente no final da
década de 1980, obtivemos a sua legalização em âmbito nacional por meio da
Constituição Federal de 1988. Neste sentido, o estado do Rio Grande do Sul se
configura na vanguarda, tendo promulgado a primeira legislação sobre o tema em
1985. A partir da década de 1990, o que ocorre é um movimento de
ressignificação da gestão democrática, objetivando enquadrar-se no modelo
difundido pelos organismos internacionais e pelas correntes do novo padrão de
gestão pública.
A lei, além de provir sempre de um órgão representativo da sociedade,
deverá também expressar a vontade geral da sociedade. O desenvolvimento do
processo de construção da gestão democrática da educação na rede estadual de
ensino do Rio Grande do Sul demonstra o movimento da sociedade civil
organizada na busca pelo atendimento aos seus anseios. Houve pressão da
comunidade escolar, porém nem sempre as idéias destes setores prevaleceram
no texto legal, havendo muitos embates na Assembléia Legislativa do Estado do
Rio Grande do Sul.
Diante destes fatos é necessário colocar que
A democracia não constitui um estágio, ela constitui um processo. O
processo pelo qual a soberania popular vai controlando e aumentando os
direitos e os deveres é um processo prolongado, implicando avanço
muito grande dentro da sociedade. Quanto mais coletiva é a decisão,
mais democrática ela é. [...] Quanto mais o interesse geral envolve um
conjunto de decisões, mais democráticas elas são. O Estado e o governo
sofrem processo de democratização ou de antidemocratização. Quanto
menos interesses coletivos, quanto menos coletivização existe nas
decisões e, portanto, quanto mais particularização nas decisões, menos
democrático ou nada democrático é o governo (VIEIRA, 2001, p.14).
Quanto mais coletivas forem as decisões, maior a soberania popular; no
entanto, se a decisão for pautada pela individualidade, menos legitimidade social
terá. A presente pesquisa irá abordar como aconteceram essas decisões em
relação à política de gestão democrática da educação na rede estadual, suas
discussões, contrastando com a apresentação de propostas diferenciadas.
29
Vivemos em um sistema capitalista extremamente desigual, em que há
uma classe social mais beneficiada que outras. Diante desta constatação, é
necessário a identificação das forças sociais, suas relações e seus embates na
construção de uma política pública de gestão democrática. Com isso,
desvelaremos as concepções inseridas no posicionamento de cada sujeito social.
Evaldo Vieira (1992, p.21) afirma que “não se pode analisar a política social
sem se remeter à questão do desenvolvimento econômico, ou seja, à
transformação quantitativa e qualitativa das relações econômicas, decorrentes do
processo de acumulação [...] de capital”. Por isso, há a necessidade da análise do
campo social e econômico em cada período contextualizado, pois assim
visualizaremos as dificuldades de cada período, construindo um estudo mais
denso, voltando ao “trajeto percorrido, desde a gestação até a eventual execução”
(Idem, p.25) e, acima de tudo, levando em consideração todos os fatores na
construção das políticas educacionais, visando à gestão democrática da
educação.
Para podermos discutir sobre educação, devemos antes de tudo pensar em
que tipo de ser humano se acredita e se quer construir com esta educação.
Acreditar em uma concepção de ser humano como sujeito histórico que age, que
pensa, ou seja, que faz a história, exige, segundo Vitor Paro (2001), que se
considere as relações entre cidadania, democracia e educação. Estas relações se
dão em tal reciprocidade e imbricação que cada um dos termos contém
necessariamente os demais.
Para a formação deste “ser humano histórico”, a educação deve ser
compreendida como a apropriação do saber historicamente produzido; ela é o
recurso que as sociedades dispõem para a produção cultural da humanidade
(PARO, 2001). É por meio dela que obteremos a transformação social,
construindo conhecimentos, atitudes e valores que formem sujeitos críticos,
solidários, éticos e participativos.
A democracia, para Vitor Paro (2001, p.11), não pode ser imaginada sem a
atualização histórico-cultural dos cidadãos proporcionada pela educação, pois ela
mesma é construída historicamente. Com isso, o autor acredita que “[...] a
30
verdadeira educação deve ser necessariamente democrática posto que, por seu
caráter histórico, supõe a relação entre sujeitos autônomos [...]” (Ibidem), ou seja,
cidadãos.
A partir desta concepção, Clélia Martins fala sobre o significado da Política
Educacional:
[...] a política educacional, muito mais que um rol de metas e planos
setoriais, é um processo complexo que não se esgota em programas de
governo, mas está presente e atua na subjetividade humana. Ao tratar de
educação, que deve ser transmitida de geração a geração, a política
educacional está interferindo no corpo de regras sociais constituintes da
moralidade de um grupo, podendo assim incluir ou excluir valores e
acaba delimitando o próprio processo de formação subjetiva do ser
humano, que envolve os sentimentos e as disposições emocionais que
vão regular a sua conduta (MARTINS, 1993, p.11-12).
Conforme a autora, a política educacional relaciona-se diretamente com o
contexto e a organização política de cada sociedade. Se a cultura de um povo é
democrática, provavelmente sua política educacional irá acatar as sugestões e
anseios da população; no entanto, em um contexto autoritário, provavelmente sua
política educacional também o será.
Portanto, se acreditamos em uma educação baseada na democracia, para
a constituição de sujeitos atuantes na sociedade, devemos insistir em políticas
educacionais que propaguem este valor. A autora mostra que, muito mais que
objetivos e planos, a política educacional atua na formação do ser humano,
condicionando sua conduta. Daí a necessidade de uma reflexão sobre estes
conceitos.
1.2 Nova República e Democracia
Atilio Boron (1994, p. 11) demonstra que, na América Latina, a democracia
nos anos 1980 foi “depositária de todo o messianismo e o desespero gerados
pelas ditaduras”, sendo interpretada erroneamente como a derrota da economia
nas mãos da política. “Deste modo, a democracia recuperava sua ‘dignidade’ às
custas de um arriscado e efêmero desprezo dos fatores econômicos [...]” (Ibidem).
31
Para os nossos governantes, a redemocratização bastava para sanar os
problemas estruturais do capitalismo (BORON, 1994, p. 12).
Esta fase de redemocratização do país foi marcada por uma piora das
condições de vida da população. Contudo, a conquista mais importante deste
período foi que as lutas populares foram fundamentadas em aspirações
democráticas, ou seja, pela justiça e igualdade social. Estas lutas populares
conseguiram mobilizar diferentes setores da sociedade civil na luta pela abertura
política e na recuperação da democracia.
A crise da ditadura, segundo Florestan Fernandes (1986, p.10), “[...]
constitui uma chave para a descrição e a interpretação do que está morrendo no
Brasil, tanto quanto do que está nascendo”. Com isso, o Brasil inicia um período
de transição do regime militar (autoritário) para um regime democrático.
A ditadura foi um meio de impedir que a revolução nacional e
democrática interferisse “negativamente” na eclosão do capitalismo
monopolista; manter o máximo de ditadura possível, quando esta poderia
ser reduzida a pó de traque é, por sua vez, uma forma de “segurar” a
revolução nacional e democrática montante, de garantir ritmos lentos,
graduais e seguros de transição política. [...] Uma ditadura em crise, que
logra determinar o que vem depois, assegurando a seus pares e a seus
aliados uma transição e conferindo-lhe um teor especificamente político,
é uma ditadura semigloriosa, que amarga uma derrota com sabor de
vitória (FERNANDES, 1986, p.10-11).
O autor denomina o mudancismo como condutor deste processo, ou seja,
apesar da abertura política, o que aconteceu foi o não rompimento das
composições que geraram primeiro a ditadura e, em seguida, a transição
conservadora. Este movimento de “pacto pelo alto
7
” foi o que sempre determinou
a história brasileira, e esta transferência de poder “converteu-se numa troca de
nomes” (FERNANDES, 1986).
Este mudancismo foi caracterizado na luta pela redemocratização, na
campanha das “Diretas já” em 1984. A partir de 1985, com o primeiro governo civil
pós-ditadura, eleito por meio de eleições indiretas, o Brasil iniciava um outro
período, denominado de “Nova República” (FERNANDES, 1986). A “Nova
7
Seriam pactos conciliatórios dos grupos do poder (FERNANDES, 1986).
32
República” não rompeu com o passado remoto ou recente e também não
combateu de frente a ditadura; ao contrário, contornou-a e prolongou-a .
O governo sucessor à ditadura “nasce marcado por sua ineficiência e
impotência” (Idem, p.20). Em 1984 foram realizadas as eleições indiretas para a
presidência da república, em que o candidato Tancredo Neves do PMDB foi eleito
pelo Colégio Eleitoral. No entanto, em 15 de março de 1985, quem toma posse é o
vice-presidente José Sarney
8
, do então PDS.
O novo governo confunde cooptação com democracia, quer agradar o
grande capital, mas não pode fazê-lo sem acabar com as empresas estatais e
semi-estatais, transferindo-as para o setor privado (Ibidem). Florestan Fernandes
(1986), referindo-se à busca por um falso consenso, caracterizou o novo governo
da seguinte maneira:
No lugar de uma ditadura unificada pelo fuzil contra-revolucionário,
temos uma miríade de pequenas ditaduras, zelosas pela consolidação de
absolutismos nanicos desarticulados entre si. [...] ao mesmo tempo em
que busca alargar a sua base social de sustentação política, o governo
compele os estratos mais ou menos conservadores da burguesia a
procurar nele o seu eixo privilegiado de equilíbrio político. Nesse sentido,
o atual governo não é o oposto da ditadura, mas a sua reprodução
fragmentada e compartimentada (FERNANDES, 1986, p.29).
De acordo com Florestan Fernandes (1986, p.22), o movimento das diretas
”[...] forneceu uma radiografia política da sociedade brasileira”; com isso, os
conservadores descobriram que a “[...] inquietação social campeava mais solta e
mais forte que em 1964” (Ibidem). O movimento pelas diretas e a Constituinte
ressuscita a paranóia da revolução social; isso tudo culmina, segundo Florestan
Fernandes (1986), em um “Frankestein”, que seria uma montagem política e
ideológica de uma falsa vitória do povo brasileiro pela democracia.
A “Nova República” surge com melhores expectativas em relação à
reestruturação da situação econômica, política e social brasileira. No entanto, a
crise perdura, sem ganhos para o social. De acordo com Emir Sader (2003, p.137)
8
“Saído das fileiras do PDS, partido fiel à ditadura, no ano anterior (1984) votara contra a emenda
que propunha restabelecer as eleições diretas” (ARANHA, 1996, p.217). José Sarney acabou
tomando posse, pois Tancredo Neves, internado em um hospital de Brasília um dia antes da sua
posse com fortes dores abdominais, veio a falecer em 21 de abril de 1985.
33
“[...] representou a hegemonia de um novo consenso [...] o consenso da
democratização política e o do combate ao déficit social deixado por um
crescimento econômico que havia feito expandir a economia, mas não havia
distribuído renda”.
Conforme o autor, este novo consenso advinha da nova esquerda, que
congregava:
“[...] uma ampla gama de setores com um potencial anticapitalista, mas
apostando fortemente na democratização do país, à qual pretendiam
aportar uma dimensão fortemente social e popular” (SADER, 2003,
p.146).
Esta nova esquerda se organizou basicamente em sindicatos e partidos
políticos (como exemplo, podemos citar o Partido dos Trabalhadores), propondo
políticas democráticas para o Estado, combatendo a exclusão social, participando
da correlação de forças da época. Nesse sentido, as propostas democráticas, em
relação à gestão, estariam baseadas no controle social da administração das
instituições públicas por meio de Conselhos ou Colegiados formados pelos
diferentes setores da comunidade
9
, valorizando a transparência, a
descentralização, a autonomia e a participação. Para Evaldo Vieira (2001, p.14),
“como forma de ação democrática, o controle social da administração pública
representa um dos elementos mais importantes da democracia”.
Conforme Francisco de Oliveira (1995), esta gestão democrática assinala
uma reflexão e uma prática que partem da nova capacidade da sociedade entrar
em diálogo com o governo, sob suas várias formas. Essas propostas
desenvolveriam um controle social do Estado através dos tensionamentos entre
sociedade civil e Estado, gerando a democracia, a construção e vivência da
cidadania e a participação popular.
9
No Brasil, no final da década de 1980, já existiam experiências de gestão democrática das
instituições públicas, principalmente em âmbito municipal. Um exemplo importante seria a
Prefeitura Municipal de Porto Alegre – RS.
34
1.3 Redefinição do papel do Estado e gestão pública
Segundo István Mészáros (2004), o capital, mesmo sendo um sistema
totalizante, não se isentou das crises; porém, elas sempre foram vistas como
sendo conjunturais, regulares, apresentando períodos de crescimento e
“decrescimento”
10
. Desde o final dos anos 1960 e início dos anos 1970, o sistema
assumiu uma crise que se mostrou permanente, “cumulativa, endêmica, crônica,
com a perspectiva de uma profunda crise estrutural” (ANTUNES, 2003), em que
se passaram mais de trinta anos sem indícios de superação.
O início dessa crise acontece após um período de grande acúmulo de
capital, o período pós-guerra, mais conhecido como o Estado de bem-estar
social
11
, nos países desenvolvidos, e o Estado desenvolvimentista
12
, nos países
do terceiro mundo. Segundo David Harvey (1989), as características
demonstradas pelo Estado de bem-estar social são o controle dos ciclos
econômicos, o direcionamento de políticas para o investimento público, a
seguridade social, a assistência médica, a educação e a habitação, portanto um
Estado de direitos.
Para David Harvey (1989, p.133), este Estado deveria garantir no mínimo
“[...] alguma espécie de salário social adequado para todos ou
engajar-se em políticas redistributivas ou ações legais que remediassem
ativamente as desigualdades, combatessem o relativo empobrecimento e
a exclusão das minorias”.
É importante frisar que o Estado de bem-estar social não se concretizou da
mesma forma em todos os países, a exemplo da América Latina, que não
conseguiu implementar a maioria dessas políticas.
Este antigo modelo de intervenção estatal obtinha três dimensões:
econômica, social e política, todas interligadas (ABRÚCIO, 1999). A parte
10
István Mészáros em Conferência proferida no lançamento do manifesto ATTAC Porto Alegre em
2004.
11
É um modelo de Estado desenvolvido na Europa e nos Estados Unidos no pós-guerra,
conhecido também como Welfare State que tinha como estratégias administrativas planificar e
fazer intervenções estatais na economia para estabilizar o capitalismo. Este modelo tinha como
expoente o economista John Maynard Keynes.
12
Ver SADER, Emir. A vingança da História. São Paulo: Boitempo Editorial, 2003.
35
econômica se caracterizava pela intervenção estatal na economia (Keynesiana); a
dimensão social ou Welfare State era caracterizado pela implementação de
diversas políticas públicas na área da educação, saúde, previdência social,
habitação, etc, garantindo assim as necessidades básicas da população; a
dimensão política ou administrativa caracterizava-se pelo modelo burocrático
weberiano, “[...] ao qual cabia o papel de manter a impessoalidade, a neutralidade
e a racionalidade do aparato governamental” (ABRÚCIO, 1999, p.175).
Com a expansão da crise do capital, começaram a surgir sinais de um
quadro crítico para este período. Segundo Ricardo Antunes (2003), estes sinais se
materializavam pela queda na taxa de lucro (devido à superprodução), pelo
esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista
13
, pela hipertrofia da
esfera financeira (com o desprendimento do capital do setor produtivo e o
aumento do capital volátil), pela concentração de capital via fusão de empresas
(transnacionais), pela crise dos mecanismos do Estado de bem-estar social
(resultando em crise fiscal com a necessidade de diminuição dos gastos públicos),
e, por fim, pelo aumento de privatizações (desregulamentação e flexibilização do
processo produtivo).
Todo este quadro estabeleceu uma mudança radical no processo de
acumulação de capital, dando passagem, segundo David Harvey (1989), para a
“acumulação flexível”. Na era da acumulação flexível, o que não faltaram foram
soluções para sanar a crise, desde a flexibilização dos mercados de trabalho até a
desregulamentação do setor financeiro (HARVEY, 1989), passando
conseqüentemente pelas diferentes propostas de administração pública.
Segundo Theresa Adrião (2001, p.12), “o novo padrão de acumulação seria
antes uma resposta do capital financeiro à crise do que uma resposta do
tradicional capital produtivo”. Sendo assim, a resposta estava sendo dada aos
financiadores das dívidas e do crédito, ou seja, a quem realmente interessava,
devido à relevância do capital fictício na composição das economias públicas e
privadas (Ibidem).
13
Segundo Ricardo Antunes (2003, p.36), este padrão de acumulação “baseava-se na produção
em massa de mercadorias, que se estruturava a partir de uma produção mais homogeneizada e
enormemente verticalizada”.
36
Neste novo modelo de acumulação, o Estado teria como função regular as
atividades do capital corporativo em prol da nação, criando um bom clima de
negócios, com o objetivo de contenção da “fuga de capital para pastagens mais
verdes e mais lucrativas” (HARVEY, 1989, p.160), ou seja, para países mais
abertos ao capital internacional, que apresentassem uma economia mais estável.
Como resposta à sua própria crise, iniciou-se um processo de
reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político de
dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do
neoliberalismo, com a privatização do Estado, a desregulamentação dos
direitos do trabalho e a desmontagem de setor produtivo estatal [...]
(ANTUNES, 2003, p.31).
Como estratégias
14
para a superação dessa crise surgiram a reestruturação
produtiva, o neoliberalismo, a globalização e a terceira via (PERONI, 2003). Para
esta pesquisa, irei deter-me no neoliberalismo e na terceira via, pois, neste
trabalho, os principais conceitos instituídos na gestão pública decorrem destas
correntes de pensamento, como veremos a seguir.
Nesse momento histórico, segundo Vera Peroni (2003, p.26), há a
necessidade “de uma ideologia para que tais particularidades sejam aceitas e
incorporadas, e o neoliberalismo
15
é a ideologia própria desta fase do capitalismo”.
Para esta ideologia, o principal inimigo era visualizado no Estado de bem-
estar social e nas centrais sindicais, pois estes organismos faziam com que o
Estado investisse em áreas sem perspectivas de retorno, impondo despesas
desnecessárias. Para os países em desenvolvimento, esta corrente de
pensamento realizou algumas adaptações; sendo assim, o inimigo se encontraria
no modelo de governo gerado pelas ideologias nacionalistas que desperdiçavam
recursos públicos.
14
Ver Vera Peroni (2003) e Theresa Adrião & Vera Peroni (2005).
15
É uma corrente de pensamento liderada por Friedrich Von Hayek e sistematizada em seu livro “O
caminho da servidão” (1944). Segundo Vera Peroni (2003, p. 27), no período pós-guerra, “[...]
Hayek, um dos principais expoentes do neoliberalismo, polemizava com Keynes, disputando o
debate intelectual e política da época. [...] Keynes venceu naquele contexto, e Hayek só voltou à
cena mais tarde com a crise do Estado de bem-estar social”. Existem três grandes escolas
neoliberais: a escola austríaca de Friedrich Von Hayek, a escola de Chicago de Milton Friedman e
a escola de Virgínia ou Public Choice de James M. Buchanan.
37
Segundo Reginaldo Moraes (2001, p.28-29), a argumentação neoliberal
tem uma estratégia similar à do sermão. Primeiro, desenha um diagnóstico
apocalíptico. “Em seguida, prega uma receita salvacionista [...], que sempre é a
mesma: libertar o capital dos controles civilizadores que lhe foram impostos [...]”.
Para o neoliberalismo, a crise encontra-se no Estado, e, portanto, a solução
seria “acabar com este mal”, originando o “Estado mínimo”. Com isso, surgem
certas exigências, como privatizar empresas estatais, barrar as interferências
estatais nos empreendimentos privados, transferindo para o setor privado as
atividades produtivas. O mercado, para os neoliberais, é visto como fonte de
criação e somente no mercado a justiça prevalecerá, ganhando o melhor, o mais
preparado.
A corrente neoliberal chamada Public Choice (escola neoliberal liderada por
James M. Buchanan, conhecida também como Escola de Virgínia) entende “[...]
que os fenômenos macropolíticos teriam microfundamentos no comportamento
individual” (MORAES, 2001, p.45). O objetivo desta escola era o de descobrir
como pensamentos diferentes e até divergentes seriam agregados por uma
escolha coletiva.
Para a escola de Virgínia existem dois universos: o mercado e o público. O
objetivo é tornar as decisões do “não-mercado” mais próximas daquelas do
“mercado”. No mercado, os consumidores manifestam suas vontades por meio
das cédulas de dinheiro. A apuração destas necessidades e demandas sociais se
dá pelo voto corporificado pelo dinheiro; cada indivíduo vota com as “cédulas que
dispõe”, “[...] quem não paga... não pega” (MORAES, 2001, p.54), aplicando-se aí
o princípio de exclusão.
No entanto, com bens públicos, este princípio não pode ser aplicado de
forma eficaz, pois o consumo destes bens não depende do pagamento, e,
portanto, as preferências não são reveladas. Nesse caso, não há demanda e sim
uma pseudodemanda e um “quase-mercado”. No entendimento desta corrente
neoliberal, para revelar as preferências desta pseudodemanda no processo
político, teríamos os seguintes mecanismos: o voto, as pressões, os motins, etc.
38
Cada consumidor vota com um número incerto de cédulas e desse
modo determina o que a sociedade vai ser, para onde vai se inclinar a
configuração produtiva, isto é, quantos e quais efetivamente virão a ser
sapateiros, açougueiros, padeiros, cervejeiros, etc. Compra literal,
votação metafórica. No caso dos bens públicos, analogamente, mas
invertendo os termos, teríamos um simulacro do mercado (uma quase
demanda) e um real processo de votação (MORAES, 2001, p.56).
O mercado é o mundo das escolhas individuais, onde a preferência revela-
se por meio da adesão ou abandono do cliente a um fornecedor. Já a esfera
estatal ou o quase-mercado, como os estudiosos desta corrente a denominam, é o
mundo das escolhas coletivas, consumidas em comum, portanto [...] as
preferências apareceriam sob a forma de programas em disputa numa
determinada arena política” (Idem, p.55), por meio do apoio ou o veto a programas
políticos.
No caso das políticas sociais, que se encontram no “quase-mercado”, a
estratégia a ser utilizada é viabilizar para o cidadão, “[...] aqui já convertido em
usuário ou consumidor, a escolha entre fornecedores, criando situações que
permitam este tipo de comportamento” (MORAES, 2001, p.58), construindo
regras, processos, procedimentos que simulem o mercado na esfera pública.
Outra estratégia do capital para a superação da crise é chamada de terceira
via
16
. A terceira via seria uma “nova postura, que procura um caminho alternativo
dado pela preservação de um traço social-democrático associado a elementos
básicos do neoliberalismo” (ANTUNES, 2003, p.95).
Nascida na Inglaterra, a terceira via é a nova social-democracia de John
Maynard Keynes, porém com profundas mudanças realizadas por Tony Blair
17
,
respaldado intelectualmente por Anthony Giddens e David Miliband (Ibidem). Para
esta corrente, a proposta para a suplantação da crise estaria na reconstrução ou
reforma do Estado, pois eles acreditam que o Estado deve tornar-se um
16
Conhecida também por New Labour ou “novo trabalhismo”. Ver Ricardo Antunes (2003, p.95-99)
e Anthony Giddens (2001).
17
A partir de 1994, Tony Blair acirrou um debate em torno da eliminação da cláusula 4 da
Constituição Partidária do Labour Party, ou Partido Trabalhista Inglês. Esta cláusula defendia a
propriedade comum dos meios de produção. Em substituição a esta cláusula, propôs a
propriedade coletiva e a defesa do mercado, ou seja, retirou o vínculo socialista mais forte do
Labour Party e passou a defender a economia livre de mercado, unindo-se às idéias neoliberais
(ANTUNES, 2003).
39
administrador competente como uma grande empresa. Para essa administração
competente, esta corrente aposta nas parcerias com empresas e com o terceiro
setor.
Estas parcerias são vistas como fator de ampliação da democracia e,
conseqüentemente, da cidadania. Desta forma, “envolvendo o público”, a
administração seria reestruturada, controlando suas metas, decidindo de forma
mais flexível com maior participação da sociedade
18
, ou seja, incutindo a lógica
empresarial (a competição) nas instituições públicas (GIDDENS, 2001).
De acordo com a premissa de que a crise está no Estado (diagnóstico
neoliberal e reafirmado pela terceira via), juntamente com a proposta de reforma
deste Estado (sugerido pela terceira via), Fernando Abrúcio (1999) afirma que, a
partir do final da década de 1970, instituiu-se, em âmbito mundial, um amplo
movimento de reforma da administração pública devido à crise do modelo
burocrático. Novos conceitos surgem: administração por objetivos, serviços
públicos voltados aos “consumidores”, qualidade total, diferentes formas de
descentralização. Todas estas propostas surgem para superar o antigo modelo de
organização da administração pública: o burocrático.
Para Fernando Abrúcio (1999), estas alternativas constituem-se em um
pluralismo organizacional, pois “[...] percebe-se que uma série de medidas vem
sendo tomada em prol da constituição de um modelo pós-burocrático que não é
completamente coerente e, ademais, não há uma via única adotada por todas as
nações” (ABRÚCIO, 1999, p.174). Vejamos a seguir o caso brasileiro.
1.3.1 A década de 1990 e a reforma do Estado no Brasil
Seguindo as aspirações democráticas da sociedade, as eleições de 1989
foram muito importantes, pois, enquanto no plano internacional as mudanças e os
ajustes neoliberais estavam em pleno andamento, no Brasil realizava-se a
primeira eleição direta para Presidente da República. Com a vitória de Fernando
18
Portanto, a participação da sociedade iria auxiliar o combate ao declínio cívico no
enfraquecimento do senso de solidariedade e no controle do governo, com ênfase na periferia,
onde se encontra um maior número de violência e criminalidade (GIDDENS, 2001).
40
Collor de Mello, iniciou-se um ciclo de reformas sob a égide de políticas
neoliberais, com promessas da entrada do Brasil para a modernidade.
A campanha de Fernando Collor pautou-se em promessas de
modernização do país, no combate à corrupção e na moralização da
administração pública (MENEZES, 2001). Esta modernização viria com a
adequação às exigências do receituário neoliberal (PERONI, 2003).
No discurso utilizado por Fernando Collor, estavam presentes as idéias de
diminuição do Estado por meio da descentralização de atividades, com o repasse
de incumbências para outros níveis do governo (estados e municípios) ou para a
iniciativa privada (MENEZES, 2001). Na área da educação, segundo Sofia Lerche
Vieira (2000, p.90), surgem vários projetos e propostas, como o Programa
Nacional de Alfabetização e Cidadania – PNAC, de setembro de 1990, o
Programa Setorial de Ação do Governo Collor na área da Educação 1991 – 1995,
de dezembro de 1990 e Brasil: um projeto de reconstrução nacional, de fevereiro
de 1991.
No entanto, pode-se dizer que esse foi um período de “muito discurso e
pouca ação” (VIEIRA,2000), pois vários programas foram lançados, mas poucos
se efetivaram. Antes de terminar o seu mandato, a partir de denúncias de
corrupção, em meio a pressões populares, Fernando Collor de Mello passou por
uma Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, o que resultou no impedimento do
seu mandato, em 1992. Com isso, assume a Presidência da República o seu vice,
Itamar Franco.
Em seu governo, Itamar Franco nomeou Fernando Henrique Cardoso para
assumir o Ministério da Fazenda. Destacou-se no mandato de Itamar Franco o
Plano Real que foi proposto para “solucionar as dificuldades econômicas
agravadas pela inflação” (VIEIRA, 2000, p.116). Esse Plano propôs medidas de
contenção de gastos públicos, estímulo à privatização e ao aumento de juros, com
a abertura à exportação.
O Estado, por sua vez, pressionado pelas taxas estratosféricas de
juros e pelo ingresso de capitais especulativos, multiplicou seu
endividamento por cinco, ao contrário do saneamento fiscal prometido
pelos planos de ajuste, apesar da privatização de grande parte de um
41
patrimônio público que havia sido um dos protagonistas fundamentais do
acelerado crescimento das décadas anteriores. A dívida pública que era
de 54 bilhões em 1994 – ano de entrada em vigor do Plano de
estabilidade monetária de Cardoso –, passou para 550 bilhões seis anos
depois [...]. Em outras palavras, substituiu-se a inflação pelo
endividamento [...] (SADER, 2003, p.138).
Apesar de demonstrar vontade de mudança, o Brasil continuava a viver a
crise da dívida externa
19
. Em 1995, assumiu a Presidência da República Fernando
Henrique Cardoso – FHC, argumentando que a estabilização financeira seria
imprescindível para as reformas futuras (MENEZES, 2001). O diagnóstico da crise
brasileira é colocado no grande tamanho do Estado e nos gastos desnecessários.
Para instituir a inadiável reforma, Fernando Henrique Cardoso nomeou Luiz
Carlos Bresser-Pereira
20
para o Ministério da Administração Federal e Reforma do
Estado – MARE. Com isso, iniciou-se o período do governo autodenominado de
centro-esquerda pragmática
21
, que, a partir do diagnóstico da crise do Estado,
promoveu propostas de ajuste fiscal e reformas orientadas para o mercado
(SIMIONATO, 2004a). No que diz respeito à educação, os problemas
diagnosticados, segundo o governo, não eram resultantes da carência de
recursos, e sim da sua má gestão (MENEZES, 2001).
Neste contexto, organizou-se uma reforma política, mais conhecida como o
Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado – PDRAE, visando, segundo
Luiz Carlos Bresser Pereira (1998), à recuperação da poupança pública e
superação da crise fiscal, à redefinição das intervenções no econômico e no
social, via organizações públicas não-estatais e à reforma da administração para
um modelo gerencial mais ágil e eficiente, além da racionalização dos gastos.
Segundo Laura Tavares Soares (2002),
19
Ver Vera Peroni, 2003, p.47 - 52.
20
Tornou-se Ministro da Fazenda do governo Sarney em 1987. Em 1988, desligou-se do PMDB e
participou da fundação do PSDB. Em 1995, depois de ocupar a tesouraria da campanha de
Fernando Henrique Cardoso para a presidência da república, assumiu o Ministério da
Administração Federal e Reforma do Estado – MARE no primeiro mandato de FHC.
21
Termo utilizado por Luiz Carlos Bresser Pereira (1995) para denominar um dos grupos políticos
que participavam da correlação de forças do momento. Segundo o autor, cada grupo dava
respostas à crise de acordo com o seu posicionamento. Existiam, então, a esquerda tradicional, a
centro-esquerda pragmática ou social-democrática ou social-liberal, a centro-direita pragmática e a
direita neoliberal.
42
Um dos componentes ideológicos por trás desse tipo de proposta é a
idéia de que o setor público caracteriza-se, por princípio, em qualquer
circunstância, como ineficiente e ineficaz, ao contrário do setor privado, o
único a possuir uma ‘racionalidade’ e uma ‘vocação’ capazes de levar ao
crescimento econômico (SOARES, 2002, p.40).
Para alcançar estes objetivos, surgem a Lei Nº 9.637/98 que dispõe sobre a
qualificação de entidades como Organizações Sociais – OS, a Lei Nº 9.790/99 que
dispõe sobre a qualificação como pessoas jurídicas de direito privado, sem fins
lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP,
o Decreto Nº 3.100/99 que regulamenta a Lei nº 9.790/99 e atualmente a Lei
11.079/04 que dispõe sobre a Parceria Público-Privado. Todas estas leis tinham
por objetivo a transferência das responsabilidades da execução e do controle de
políticas públicas, principalmente as sociais, para a sociedade civil ou para a
esfera privada.
Com o argumento de controle dos gastos, da necessidade de diminuição da
esfera pública e das reivindicações dos setores da sociedade civil pela
democratização do Estado
22
, no final dos anos 1970 e 1980, as novas políticas
visavam à desconcentração de responsabilidades na execução e à concentração
na regulação de acordo com as diretrizes sugeridas pelos organismos
internacionais, diferentemente das reivindicações por políticas descentralizadoras
no final da década de 1970 e na década de 1980 que almejavam a
democratização dos mecanismos decisórios (MENEZES, 2001) e não a
desconcentração da execução e o repasse de responsabilidades.
Desta maneira, redefini-se o papel do Estado “que deixa de ser o
responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção
de bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse
desenvolvimento” (PDRAE, 1995, p.17). Para Christian Laval (2004), este tipo de
Estado é denominado “Estado regulador”. O autor utiliza a expressão proposta por
Bernard Charlot, falando que este “Estado regulador” delega “[...] aos escalões
22
Ver Neusa Batista (2003), Afrânio Catani & Luiz Gustavo Guttierrez in Naura Syria Carapeto
Ferreira (1998) e Theresa Adrião (2001).
43
inferiores e aos serviços descentralizados, a ação cotidiana, racionalizada
segundo as regras de um gerenciamento dito ‘participativo’” (LAVAL, 2004, p.13).
Percebe-se a utilização de conceitos, tais como participação e descentralização
para difundir uma retórica gerencialista, que acredita que a forma de gestão da
esfera privada é mais eficiente que a gestão da esfera pública, entendida como
burocrática.
O Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado assumiu estratégias
utilizadas pela terceira via e pelo neoliberalismo. Podemos visualizar esta
afirmação por um dos componentes básicos da reforma que seria a delimitação
das funções do Estado. Segundo este componente, o Estado deveria reduzir seu
tamanho por meio da privatização, da terceirização e da publicização
23
.
Segundo o PDRAE (1995), há quatro setores nas ações estatais: o
estratégico (elaboração das políticas e da legislação e cumprimento das
mesmas), as atividades exclusivas (garantia do cumprimento das leis e na
viabilização das políticas), os serviços não-exclusivos (serviços oferecidos pelo
Estado, mas como não se relacionam diretamente com o poder estatal, podem ser
oferecidos pela iniciativa privada ou pelo setor “público não-estatal”) e o setor de
produção de bens e serviços (empresas estatais).
No caso das políticas sociais que se inserem no setor dos serviços não-
exclusivos, a estratégia defendida é a publicização. Na acepção do PDRAE,
publicização significaria passar por um processo de transformação de uma
“organização estatal em uma organização de direito privado, mas pública não-
estatal” (BRESSER PEREIRA, 1998, p.60). Existe a propriedade privada e a
propriedade pública (sempre vista como estatal); no entanto, com o PDRAE, surge
uma terceira propriedade: a pública não-estatal.
A propriedade pública não-estatal torna mais fácil e direto o controle
social, através da participação nos conselhos de administração dos
diversos segmentos envolvidos, ao mesmo tempo em que favorece a
parceria entre sociedade e Estado. As organizações nesse setor gozam
de uma autonomia administrativa muito maior do que aquela possível
dentro do aparelho do Estado. Em compensação, seus dirigentes são
23
Termo utilizado por Luiz Carlos Bresser Pereira e alterado do significado dado pelos setores da
sociedade na época de democratização do Brasil, na década de 1980.
44
chamados a assumir a responsabilidade maior em conjunto com a
sociedade, na gestão da instituição (MARE, 1995, p.17).
Entendemos que o “público não-estatal” abrange as organizações privadas,
sem fins lucrativos com interesse público, porém não correspondentes ao Estado.
Para tornar as organizações públicas democráticas, estabelece-se o “público não-
estatal”. Percebe-se aí, a existência de uma estratégia privatista para a superação
da crise, em que a sociedade civil é chamada para administrar e executar os
serviços públicos, já que este “público” é ineficiente.
Segundo Lúcia Bruno (2002), a dissociação dos termos estatal e público
tem uma fundamentação ideológica. Primeiro, tenta justificar o descompromisso
do Estado quanto ao financiamento e à implementação de políticas
compensatórias cujo alvo é a classe trabalhadora. Depois, expressa a
reorganização do poder atual, nesta fase de globalização, que desloca o poder do
aparelho do Estado Nacional para vários centros inter-relacionados (empresas
transnacionais e organismos financeiros).
Segundo Theresa Adrião (2001), a justificativa para esta parceria com a
sociedade civil encontra-se no fato da natureza não-estatal, do não pertencimento
de sua propriedade ao aparelho de Estado. Com o repasse da execução para a
sociedade civil, os mecanismos de transparência e eficiência na gestão estariam
alcançados. Neste repasse para a sociedade, entendido como uma administração
via Organização Social, caberiam o financiamento, a criação de novas fontes de
arrecadação e o controle dos resultados dos serviços prestados.
Os defensores destas parcerias acreditam que, desta forma, a
democratização se efetiva, fazendo com que este movimento não dependa do
Estado, mas da comunidade local, reafirmando a idéia de que o público é
ineficiente e, portanto, há a necessidade da intervenção da esfera privada para
agilizar e desburocratizar os serviços.
Sobre esta necessidade, David Osborne e Ted Gaebler (1995) afirmam:
[...] o tipo de governo que se desenvolveu durante a era industrial, com
suas burocracias lentas e centralizadas, preocupado com normas e
45
regulamentos, sujeito a cadeias de comando hierárquicas, deixou de
funcionar bem. Na sua época, esses governos foram capazes de grandes
realizações, mas, ao longo do tempo, se afastaram das nossas
necessidades. Tornaram-se inchados, ineficientes, funcionando com
desperdício (OSBORNE & GAEBLER, 1995, p.12).
A esfera “pública não-estatal” ratifica a idéia de ineficiência do setor público.
Para modernizar o setor público, deve-se ter uma nova esfera, caracterizando uma
“nova modalidade de instituições públicas” (OSBORNE & GAEBLER, 1995, p.12)
e uma nova lógica de gestão para tornarem-se “mais flexíveis, inovativas e
empreendedoras” (Idem, p.13). A comunidade local passa a se responsabilizar
tanto pelo sucesso, quanto pelo insucesso destas instituições públicas, fazendo
com que o Estado se desobrigue da responsabilidade pela execução das políticas
sociais.
Segundo Luiz Carlos Bresser Pereira (1998), dando uma maior autonomia
na gestão dos recursos e na captação dos mesmos, os beneficiários destas
políticas ou cidadãos-clientes
24
poderiam controlar a sua aplicação e decidir as
suas prioridades, agilizando e otimizando o processo de repasse, retirando os
trâmites intermediários que antes existiam e geravam toda uma corrupção no seu
gerenciamento pela falta de transparência.
Estas propostas de reforma seriam “um processo de aprofundamento e
ampliação da democracia” (GIDDENS, 2001, p.79), no entendimento dos
defensores da terceira via, pois o objetivo era de agir em parceria com a
sociedade civil para o desenvolvimento da própria sociedade. No entanto, com o
argumento de democratização, o Estado repassa suas responsabilidades para a
sociedade, preocupando-se apenas com a avaliação dos resultados destas
políticas.
Conforme as prescrições da perspectiva neoliberal e da perspectiva da
terceira via, a forma encontrada para incutir os mecanismos de mercado e uma
administração mais ágil e transparente nas instituições públicas, foi a instituição do
24
Termo utilizado por Luiz Carlos Bresser Pereira no Plano Diretor de Reforma do Aparelho do
Estado (1995) para definir aqueles que compram os serviços públicos.
46
“quase-mercado” e da esfera “pública não-estatal”. Estes dois movimentos serão
tratados de forma mais detalhada na área educacional, no Capítulo 2.
No que tange à administração pública, este foi um período de redução de
gastos com pessoal e a necessidade de aumentar a eficiência governamental.
Fernando Abrúcio (1999) afirma que há uma ênfase nos meios, pensados como
instrumentos técnicos neutros, mas não se discutem os significados e a função da
administração pública.
Junto com estas idéias de reforma na gestão pública, somou-se o ideário
neoliberal de Friedrich Von Hayek e da Public Choice, abrindo um grande espaço
para a crítica do antigo modelo de organização do setor público. Portanto, ao
sentimento antiburocrático aliava-se a crença neoliberal de que o setor privado
possuía o modelo ideal de gestão
25
, assim como a crença de reforma do Estado. A
escassez dos recursos públicos, o enfraquecimento do poder estatal, assim como
o avanço da ideologia neoliberal fizeram com que o modelo burocrático entrasse
em uma profunda crise.
De acordo com Fernando Abrúcio (1999), diante deste quadro, surge um
debate nos Estados Unidos
26
e na Grã-Bretanha a partir da década de 1980 sobre
diferentes modelos de gestão, principalmente pelas condições políticas
existentes
27
. Segundo o autor, a tentativa de superação do modelo burocrático
deriva-se de três visões ou correntes: o “Gerencialismo puro”, o “Consumerism” e
a “Public Service Orientation – PSO”.
Vale destacar que não há uma utilizão pura de uma destas correntes,
mas diferentes arranjos em diferentes estados. Conforme Theresa Adrião (2001,p.
29), o eixo central do Gerencialismo Puro “é o aumento da produtividade do setor
público por meio da diminuição de gastos”. Já o Consumerism “parte da
necessidade de agregar novos significados ao gerencialismo recém-implantado”
(Idem, p.30), utilizando mecanismos de avaliação e preocupando-se com
25
“Não por acaso Margaret Thatcher levou ao Estado um administrador do setor privado (Dereck
Rayner) para comandar seu plano de reforma administrativa” (ABRÚCIO, 1999, p. 177).
26
Mesmo com a dificuldade da descentralização do poder presente no federalismo norte-
americano (ABRÚCIO, 1999).
27
Na Grã-Bretanha, temos o bipartidarismo, o parlamentarismo, o alto grau de centralização
político-administrativo e a liderança de Margaret Thatcher.
47
indicadores de produtividade. A Public Service Orientation tem seu eixo na “defesa
da esfera pública como espaço de aprendizagem política, além de instância de
participação dos cidadãos” (Ibidem).
Após a caracterização geral destas visões, serão analisadas cada uma com
as suas peculiaridades.
1.3.1.1 Gerencialismo Puro
O Gerencialismo puro tem como principal objetivo a redução de custos no
setor público e o aumento da sua produtividade (privatização de empresas
nacionalizadas no pós-guerra, desregulamentação, devolução de atividades
governamentais à iniciativa privada ou à comunidade para redução de gastos).
O período em que o gerencialismo puro foi utilizado caracterizava-se pela
retração da máquina estatal. Esta técnica de administração pública teve como
principal argumento a questão financeira, cortando custos e pessoal, enxugando o
Estado.
A burocracia é definida como rígida e centralizada (ABRÚCIO, 1999), e por
isso, surgiram os seguintes objetivos para esta nova forma de administração: a
definição das responsabilidades de cada funcionário nas instituições públicas, a
definição de objetivos organizacionais para cada uma dessas instituições e a
maximização da relação financeira entre recursos iniciais e gastos realizados na
produção de políticas, observando os resultados destes gastos conforme os seus
objetivos.
Para cumprir esses objetivos, surgiram alguns instrumentos gerenciais, tais
como formas de racionalização orçamentária, técnicas de avaliação de
desempenho e controle orçamentário. Conseqüentemente, essas técnicas
orçamentárias impulsionaram outras técnicas, como instrumentos de avaliação de
desempenho organizacional, com o objetivo de mensuração da performance
governamental.
Conforme Fernando Abrúcio (1999), o governo inglês adotou dois
mecanismos no âmbito das instituições públicas e dos funcionários públicos. O
primeiro seria a assimilação de uma administração pautada por objetivos
48
(management by objectives) a fim de uma futura avaliação de desempenho
baseada na comparação dos resultados. O segundo foi a estratégia da
descentralização administrativa, dando maior autonomia para as agências e
departamentos do setor público. O autor coloca que esta descentralização “[...] foi
concebida a partir de uma definição clara dos objetivos de cada agência, os quais
deveriam ser cumpridos sob a vigilância e o controle do poder central” (ABRÚCIO,
1999, p.183). Portanto, esta descentralização era meramente uma
desconcentração de poder.
Para se contrapor ao antigo modelo burocrático weberiano, o Gerencialismo
puro quis moldar os gerentes com habilidades como a criatividade, a fim de
encontrar soluções para o setor público aumentar a sua eficiência, porém, ao
enfocar em demasia a eficiência, surge um problema, o fato de que, ao dar maior
importância à eficiência, a efetividade dos serviços públicos estaria relegada a
segundo plano.
É importante ressaltar que esta forma de gestão pública tinha como
pressuposto a separação entre a política e a administração. Com isso, cabia aos
técnicos, aos administradores ou reformadores a implantação desta forma de
gestão independentemente da dimensão política.
1.3.1.2 Consumerism
A despolitização da administração pública, juntamente com a ênfase dada
à eficiência governamental, fez com que, na segunda metade da década de 1980,
se desenvolvesse uma nova forma de constituição dos serviços públicos: o
Consumerism. O Consumerism incorpora novos significados não considerados
pelo Gerencialismo puro.
O primeiro significado incorporado por esta forma de gestão seria a
qualidade, ou seja, a avaliação da qualidade dos serviços públicos. Houve com
isso uma modificação na forma de conceber o sucesso e o desempenho dos
empregados e das instituições, surgindo então a “qualidade total” (ABRÚCIO,
1999). Conforme Fernando Abrúcio (1999, p.186), “[...] a busca permanente da
qualidade tem relação direta com o direcionamento da produção para o
49
atendimento dos anseios dos consumidores”. Com isso, evidencia-se uma
administração pública voltada para o atendimento dos anseios dos seus
clientes/consumidores (Ibidem).
Portanto, para atender à demanda dos clientes/consumidores, esta forma
de gestão adota algumas medidas para superar o antigo modelo burocrático e o
Gerencialismo puro. Estas medidas seriam a descentralização, ou seja, uma
desconcentração de poder e não uma descentralização política, a competição,
pois somente a descentralização não basta para aumentar o poder do consumidor
e, segundo os idealizadores do Consumerism, “[...] quando não há competição
entre os serviços surge uma situação de monopólio e, portanto, os consumidores
não têm alternativa de escolha” (Idem, p.187) e a adoção de um novo modelo
contratual para os serviços públicos.
Este novo modelo contratual seria a abertura das relações contratuais para
o fornecimento de serviços públicos entre o setor público, o setor privado e o
voluntário/não-lucrativo, criando, assim, um pluralismo institucional, superando o
antigo monopólio estatal. Ainda neste novo modelo contratual, haveria a extensão
das relações contratuais no próprio setor público, com a descentralização, a
delegação de autoridade, o mecanismo de quase-mercado, que seria a inserção
da lógica do setor privado no setor público e o estabelecimento de contratos de
qualidade entre prestadores de serviço e consumidores.
Os pressupostos destas relações contratuais estariam baseados em uma
situação em que, mesmo com a escassez de recursos, poder-se-ia aumentar a
qualidade dos serviços prestados com a introdução da competição e do controle,
evitando o monopólio e, conseqüentemente, oferecendo ao consumidor o poder
de escolha, pois ele pode avaliar e controlar o andamento dos serviços públicos
conforme a sua preferência.
O Consumerism superou o Gerencialismo puro em diversas dimensões,
porém recebeu uma crítica que seria a transformação de conceitos, como a
relação entre o governo como prestador de serviços e a população ou
clientes/consumidores. Conforme Fernando Abrúcio (1999), há uma diferença
entre o consumidor de bens do mercado e o consumidor de serviços públicos. Não
50
basta somente permitir a escolha de serviços; para o autor, o conceito de
consumidor deveria ser substituído pelo de cidadão, pois é mais amplo, “[...] já que
cidadania implica direitos e deveres e não só a liberdade de escolher serviços
públicos” (STEWART & WALSH, 1992, p.507 apud ABRÚCIO, 1999, p.188).
O autor também traz referência à eqüidade, pois o conceito de consumidor
não atende adequadamente ao problema da eqüidade, valor fundamental na
administração pública. Este problema pode se agravar se houver competição entre
as instituições públicas, pois a unidade melhor classificada receberá
provavelmente mais recursos; seus funcionários terão melhores rendimentos, e,
portanto, os consumidores tenderão a utilizar esse serviço continuamente, ou seja,
há a inserção de um “círculo vicioso”. Há também a possibilidade de este círculo
se transformar em um “jogo de soma–zero” (ABRÚCIO, 1999, p.189), onde uma
pessoa poderá ser mais cidadã que outra, pois uma poderá estar recebendo os
serviços da instituição melhor classificada ou “vencedora” e outra da instituição
“perdedora”.
1.3.1.3 Public Service Orientation – PSO
Fernando Abrúcio (1999) baseia-se nos estudos de Christopher Pollit
28
, que
coloca que a PSO faz parte de um debate recente na Grã-Bretanha; com isso,
seus conceitos estão ainda na fase de aprofundamento. No entanto, a PSO não
deixa de ser uma tentativa que traz novas questões ao debate sobre gestão
pública, questionando antigos valores.
A PSO tenta preencher as lacunas deixadas pelo Gerencialismo puro e pelo
Consumerism. Esta forma de administração utiliza-se de conceitos como o
accountability, a transparência, a participação política, a eqüidade e a justiça,
todas estas questões ausentes em debates anteriores (ABRÚCIO, 1999).
Fernando Abrúcio chama a atenção para o fato de que o “[...] objeto que
gerou a corrente da PSO foi ‘criado’ pelo modelo Gerencial” (Idem, p.190). Este
objeto ou problemática é a descentralização. Para a PSO,
28
Principalmente em seu livro Managereialism and the public services – the Anglo-American
experience. Oxford, Massachussets: Brasil Blackwell, 1990.
51
A justificativa central para defender o governo local não é que ele é
um bom meio para prover os serviços [públicos] necessários, o que de
fato ele é, mas que ele [o governo local] capacita os cidadãos a participar
das decisões que afetam suas vidas e as de suas comunidades.
(HAMBLETOM, 1992, p. 11 apud ABRÚCIO, 1999, p. 190)
Portanto, a PSO defende a descentralização política; no Gerencialismo
puro, a descentralização era vista como uma mera estratégia para tornar as
políticas públicas mais eficazes e, no Consumerism, a descentralização era vista
como um meio de fornecer o direito da escolha para os clientes/consumidores,
conforme a crença ter mais ou menos qualidade. No entanto, o que muda na PSO
é o significado do termo “cidadão”. Para esta corrente, o termo cidadão tem
sentido coletivo e não um sentido individual como o termo consumidor ou cliente
demonstra (ABRÚCIO, 1999, p.190).
Os teóricos da PSO acreditam que o accountability, ou seja, a transparência
e a participação social, traz novas formas de intervenção estatal, superando o
clientelismo e o corporativismo, ampliando a esfera pública (ABRÚCIO, 1999).
Para estes teóricos, a esfera pública é um lócus de transparência e de
aprendizagem social e não apenas de participação, ou seja, os cidadãos
aprendem durante o processo participativo, por meio de debates públicos (Idem).
Outro conceito ressignificado nesta corrente administrativa é a competição
das instituições públicas. Segundo os pensadores desta forma de gestão, a
cooperação entre as instituições é mais importante que a competição, porém esta
não é negada. Eles acreditam que, por meio da cooperação, se consegue obter
um melhor resultado global dos serviços públicos; conseqüentemente, também se
consegue adquirir uma eqüidade destes serviços, conceito este fundamental para
esta corrente.
A PSO conjuga o conceito de accountability com a questão da
justiça/eqüidade e, para que isso ocorra, é preciso um “[...] aprendizado social na
esfera pública” (Idem, p.191), criando uma cultura cívica, agrupando políticos,
servidores públicos e cidadãos.
52
Segundo Fernando Abrúcio (1999), embora a PSO não negue os
mecanismos competitivos, existe a tentativa de aperfeiçoá-los em um contexto de
esfera pública. Para o autor, o único empecilho deste modelo de gestão estaria no
fato de que ela foi pensada em termos do poder local, em que a sociedade ou os
cidadãos conseguiriam com maior facilidade exercer o controle sobre a qualidade
dos serviços públicos, concepção extremamente otimista. Fica o questionamento
de como fazer para coordenar o serviço público no âmbito nacional.
1.4 O novo padrão de gestão pública
O novo padrão de gestão pública pode ser entendido como uma trama de
múltiplas correntes de gestão articuladas em torno de um único objetivo: tornar a
gestão pública mais eficiente, diminuindo os gastos do Estado, desobrigando-o de
suas responsabilidades, estimulando a competição das instituições para a entrada
na economia globalizada. No entendimento dos defensores deste novo padrão,
estes valores traduzem uma modernização das instituições públicas, sendo
sinônimos de progresso, democracia e contemporaneidade.
Estas correntes estão presentes na gestão pública de diversos países,
principalmente nos países da América Latina, onde a inserção destas idéias na
administração ficou conhecida como “Nova Gestão Pública
29
”. Neste trabalho de
pesquisa serão utilizados diferentes termos para denominar este novo padrão de
gestão pública, pois não existe consenso entre os pesquisadores sobre a
denominação desta multiplicidade de correntes. Este novo padrão é denominado
por Fernando Abrúcio (1999) como modelo “Pós-burocrático”; por Luiz Carlos
Bresser Pereira (2006), como “Gerencialismo”; por Carles Ramió Matas (2006),
como “Nova Gestão Pública”; por David Osborne e Ted Gaebler (1995), como
“Governo empreendedor”.
Carles Ramió Matas (2006) coloca que a Nova Gestão Pública é muito mais
que um conjunto de técnicas que nasceu nos países anglo-saxões, pois, antes da
29
Utilizarei a denominação “Nova Gestão Pública” ou “Reforma gerencial” ou “Reforma da gestão
pública” ou, ainda, somente “Gerencialismo” para referendar o novo pluralismo organizacional
existente na atualidade.
53
aplicação destas técnicas, estes países definiram previamente o seu modelo de
Estado, fato este não ocorrido na América Latina.
En este sentido hay que abandonar la idea que la Nueva Gestión
Pública es sólo um conjunto de instrumentos para la mejora de la gestión
sino que hay que tener em cuenta que también llevan incorporados
valores ideológicos y administrativos (MATAS, 2006, p. 07).
Carles Ramió Matas (2006) fala que, na América Latina, a “Nova Gestão
Pública” foi incorporada sem um planejamento prévio ou uma definição concreta
de que tipo de Estado a sociedade civil queria. O autor também chama atenção
para os valores ideológicos incorporados nesta reforma. Sobre isto, Celina Souza
(2001) revela:
[...] as reformas e tudo que há em relação a elas deixam claro que
defendem um objetivo ideologicamente neutro e de difícil contestação, ou
seja, elas defendem uma gestão mais eficiente do setor público. Nada
mais neutro, portanto; pode-se estar à direita, à esquerda, ao centro, não
importa, é algo que passa acima de qualquer ideologia e que ninguém
pode contestar. Não se pode defender o modelo velho, reconhecendo
sua ineficiência. De toda forma, esse gerencialismo, como o novo modelo
é chamado, seja como doutrina, seja como ideologia administrativa, tem
enorme sucesso, e é interessante observar que esse sucesso, embora
não estando ligado a nenhuma comprovação empírica de seus
pressupostos, tem sido muito bem aceito (SOUZA, 2001, p.48).
A autora fala sobre a “pretensa” neutralidade deste modelo ou destas
correntes, pois independe da posição política que se tenha, o importante é que,
reconhecendo a ineficiência do modelo antigo, é preciso reformar o mesmo. Com
isso, este novo padrão de gestão pública surge como uma verdadeira “doutrina a
ser seguida”, mesmo que seus pressupostos não tenham nenhuma comprovação
empírica.
O papel do Estado foi redefinido a partir da década de 1990 (PERONI,
1999; PERONI, 2003); conseqüentemente, a reforma da administração pública
tornou-se um dos temas mais relevantes deste período. Embora a análise de
Fernando Abrúcio (1999) seja feita sobre o caso inglês, e a análise de David
Osborne e Ted Gaebler (1995) tenham sido sobre o caso americano, estes
54
modelos podem “[...] constituir em instrumento para a análise das alterações na
gestão do aparelho estatal [...]” (ADRIÃO, 2001, p.30) brasileiro e das políticas
públicas voltadas à gestão democrática da educação na rede estadual de ensino
do Rio Grande do Sul, objeto de estudo desta pesquisa.
Para Luiz Carlos Bresser Pereira (2006), no Brasil aconteceram quatro
reformas administrativas. De acordo com o autor, a primeira, em 1936, conhecida
como reforma burocrática, estabeleceu os princípios da administração pública
burocrática. A segunda, estabelecida pelo regime militar com o Decreto-Lei nº 200
de 1967. A terceira, em 1988, com a Constituição Cidadã, estabeleceu novamente
a democracia e restabeleceu regras burocráticas. E a quarta, em 1995, conhecida
como “Reforma Gerencial”, com o Plano Diretor de Reforma do Aparelho do
Estado PDRAE, submeteu ao Congresso uma emenda constitucional ao capítulo
sobre a administração pública na Constituição de 1988.
De acordo com Theresa Adrião (2001), o PDRAE apresenta mecanismos do
Gerencialismo Puro e do Consumerism, reforçando a afirmação de Fernando
Abrúcio sobre a “[...] possibilidade de coexistência de diferentes modelos em um
mesmo Estado” (ADRIÃO, 2001, p.31). Para a autora, a preocupação com o
aumento da produtividade e da diminuição dos gastos no setor público, somando-
se à necessidade de definir os objetivos organizacionais a serem alcançados,
relaciona-se à corrente denominada Gerencialismo puro.
A avaliação do desempenho das instituições públicas e dos funcionários, a
desconcentração administrativa com a diminuição dos níveis hierárquicos, a
introdução da concorrência entre unidades administrativas, a pluralidade
institucional, o aumento da autonomia, junto com a responsabilização das
organizações e de seus funcionários sobre os resultados e a criação de
organizações públicas “não-estatais” relacionam-se à corrente denominada
Consumerism.
Para Theresa Adrião (2001), mecanismos da corrente denominada PSO não
aparecem no PDRAE, pois estes mecanismos estariam mais próximos de uma
gestão participativa e transparente.
55
Esta constatação corrobora teses e reflexões que vêem com
preocupação os rumos que tem tomado a gestão da “coisa pública” no
Brasil, na perspectiva de saber se os novos modelos de gestão pautados
no binômio eficiência/eficácia, adotados com o objetivo de reduzir gastos
e introduzir critérios concorrenciais como mecanismos de indução à
mudança na administração pública, são os mais adequados quando se
pensa em garantir direitos e diminuir desigualdades (ADRIÃO, 2001,
p.32).
Certamente esta preocupação é real, pois a “Nova Gestão Pública” tem por
objetivos valores adequados ao mercado, não garantindo direitos, muito menos
diminuindo as igualdades. No momento em que agregamos a competição entre
instituições públicas, estamos inserindo a segregação. No momento em que
damos maior relevância ao produto e esquecemos de considerar o processo,
estamos baseando-nos em critérios de exclusão.
Portanto, é de grande importância a análise destas correntes, assim como
os valores que as agregam, pois este novo padrão de gestão pública é propagado
em diferentes áreas, sem um olhar crítico. A política educacional, sendo um
campo estratégico para o desenvolvimento da sociedade, é uma das áreas que
mais demonstrou influências destas correntes de gestão pública, como veremos a
seguir.
56
2 A GESTÃO DA EDUCAÇÃO
Este capítulo tem por objetivo discutir o tema gestão da educação,
analisando suas diferentes concepções em diferentes períodos históricos, tais
como as décadas de 1980 e de 1990 e a conjuntura atual. De acordo com
Genuíno Bordignon & Regina Vinhaes Gracindo (2001, p.147), o ato de “analisar a
gestão da educação [...] implica em refletir sobre as políticas de educação”. Nesse
sentido, é importante salientar que este capítulo abordará a gestão educacional,
tendo como foco privilegiado a gestão democrática da educação e sua relação
com as políticas educacionais instituídas no Brasil nos períodos históricos acima
referidos, momento em que a análise das políticas educacionais irá mostrar as
diferentes influências na gestão pública da educação.
Perceberemos que, no decorrer da história, existiram muitos movimentos
em prol de uma democratização da gestão das instituições públicas,
conseqüentemente da escola. Portanto, para que se entenda a trajetória de
construção da gestão democrática da educação, devemos entender os diversos
fatores que compõem a gestão da educação em um contexto de redefinição do
papel do Estado
30
.
Entende-se por gestão democrática da educação um
[...] processo de aprendizado e de luta política que não se circunscreve
aos limites da prática educativa, mas vislumbra, nas especificidades
dessa prática social e de sua relativa autonomia, a possibilidade de
criação de canais de efetiva participação e de aprendizado do “jogo”
democrático e, conseqüentemente, do repensar das estruturas de poder
autoritário que permeiam as relações sociais e, no seio dessas, as
práticas educativas (DOURADO, 1998, p.79).
Acreditamos que a gestão democrática é um processo de aprendizagem
constante, em que todos os segmentos vinculados à educação participam de
forma efetiva, colocando em prática a sua cidadania. Esta participação gera, por si
30
Ver PERONI, Vera. A redefinição do papel do Estado e a política educacional no Brasil dos anos
90. São Paulo: PUC, 1999. Tese de Doutorado.
57
só, uma discussão em torno das estruturas existentes na sociedade e,
conseqüentemente, faz com que a correlação de forças seja intensificada,
produzindo a democracia.
A afirmação da natureza processual da gestão democrática acentua sua
historicidade, sugerindo sua inconstância. Sobre isso, Dirce Nei de Freitas (2003)
afirma que esta forma de gestão possui movimentos de mudança-permanência, de
desenvolvimento-estagnação, de estabilidade-instabilidade. Sendo assim,
conforme a autora, a gestão democrática se dá por meio do “aprendizado” e da
“luta política”.
O aprendizado deste processo aponta para o desenvolvimento pessoal e
social, mediante a aquisição de valores e conhecimentos indispensáveis para isso.
Já, a luta política indica intervenção na produção e reprodução do poder,
garantindo a concretização de direitos e deveres de cidadania na construção de
uma autonomia que gere sujeitos coletivos e instituições comprometidas com a
transformação social (FREITAS, 2003).
Portanto, este processo se compromete com a perspectiva futura. Segundo
Dirce Nei de Freitas (2003, p.209), “os meios devem refletir e assegurar a
natureza do processo a ser dirigido pelo e para o fim maior visado”, pois tão
importante quanto as estratégias de gestão democrática (eleição para diretor,
conselhos escolares, etc.) são o seu caráter e os seus objetivos.
No decorrer da história da administração educacional, temos diferentes
objetivos. Segundo Erasto Mendonça (2000), num primeiro momento, temos a
influência tecnicista, destacando a preocupação com a eficiência e a busca de
uma racionalidade econômica. Num segundo momento, o compromisso é com a
eficácia para o alcance dos objetivos educacionais voltados para o lado
psicossociológico da escola. Por último, temos a busca pela efetividade política,
manifestada através da redemocratização do país. Com isso, a gestão
democrática da educação está vinculada a uma determinada abordagem da
administração da educação que, segundo o autor, “[...] resultou do caminho
percorrido entre diferentes enfoques e ganhou corpo nas duas últimas décadas
(MENDONÇA, 200, p.90).
58
Desse modo, do ponto de vista da evolução do campo da
administração escolar no Brasil, pode-se afirmar que a gestão
democrática surge como um contraponto à ênfase organizacional e
tecnicista, bem como ao reducionismo normativista da busca da eficiência
pela racionalização de processos. Em particular, a luta pela gestão
democrática da educação marcou um combate às teorias e aos
procedimentos administrativos que, no campo escolar, propugnam pela
aplicação dos princípios da gerência científica – advinda da divisão
pormenorizada do trabalho – para os quais a escola e os sistemas
educacionais não ficam de fora da lógica gerencial da fábrica capitalista
(MENDONÇA, 2000, p.92-93).
Segundo Erasto Mendonça, a evolução no campo da administração
educacional passou por diferentes enfoques, em que a gestão democrática surgiu
para superar procedimentos antigos e tecnicistas, também conhecida como uma
“prática administrativa neutra”. No entanto, esta neutralidade permanece sendo
política, pois expressa formas conscientes ou não de engajamento com alguma
idéia (DOURADO, 1998).
A gestão democrática da educação foi muito reivindicada na década de
1980. Nessa década, a bandeira defendida de gestão democrática era a luta
contra o autoritarismo (MENDONÇA, 2000) e a busca pela implantação de
mecanismos de descentralização administrativa, financeira e pedagógica,
juntamente com a autonomia escolar, contrariando a lógica mercantil. Contudo, na
década de 1990, com os ajustes estruturais do Banco Mundial e do Fundo
Monetário Internacional e as suas influências nas políticas econômicas e sociais
instituídas no Brasil, houve uma redefinição da gestão democrática da educação,
cujo embate atualmente, segundo Erasto Mendonça (2000), encontra-se na
relação público – privado.
A análise presente neste capítulo tem o seu início a partir do final do regime
militar. Vera Peroni (2003) coloca que, durante a década de 1980, no Brasil, houve
a organização dos setores da sociedade no período de transição democrática,
culminando em alianças de diferentes forças da sociedade na luta pela
democracia. Estes setores organizados iniciaram um processo de reivindicação
59
em prol de uma educação de qualidade. Vejamos, então, as propostas de gestão
da educação contidas por estes setores nas duas últimas décadas do século XX.
2.1 Propostas de gestão da educação nas décadas de 1980 e 1990
A grande dívida contraída em termos de democratização da
educação, determinada pelas formas possíveis pelas quais se
desenvolveu a luta contra os governos militares, parece que será paga
pelas gerações vindouras (CUNHA, 1991, p.479).
Por meio das discussões nascidas sob a égide de um período autoritário, a
sociedade civil passou a reivindicar do governo a abertura política e o resgate do
caráter público da coisa pública. Segundo Márcia Ângela Aguiar (1987, p.14), a
gestão democrática da educação é uma questão “[...] que emerge no bojo da
própria movimentação da sociedade civil e da reorganização do aparelho estatal
em face das exigências suscitadas pelas determinações sócio-político-econômicas
da conjuntura atual”, ou seja da época em questão. Neste contexto salientado pela
autora, o setor educacional passou a requerer a democratização da gestão e o
resgate da educação pública, mas, para que isso fosse possível, seria necessária
a construção de uma consciência cidadã, ou seja, a construção de uma cultura de
participação popular.
No decorrer da história da educação no Brasil e no Rio Grande do Sul,
percebemos a luta de vários segmentos da sociedade civil em busca da
democratização da gestão educacional. A questão da democratização da gestão
da educação inaugurou algumas conquistas somente a partir do final da década
de 1970 (OLIVEIRA, 2001). Segundo Dalila A. Oliveira (1994), os movimentos de
resistência ao regime militar tiveram uma expressão dicotômica:
[...] por um lado, apareceram como uma luta pela democratização do
ensino e autonomia da instituição, na denúncia do sucateamento da
escola pública refletido na falta de verbas, no abandono dos prédios, na
carência da (re) qualificação dos profissionais; por outro, num movimento
por reivindicações salariais e condições de trabalho mais dignas, no
reconhecimento destes trabalhadores enquanto categoria profissional,
portadora do direito à organização sindical (OLIVEIRA, 1994, p.96).
60
O período que se iniciou na década de 1970 até os anos 80 foi marcado
pela centralização do poder e pela ampliação do papel econômico do Estado, “[...]
tanto na regulação quanto na condução da acumulação, o que resultou na
ampliação da burocracia e na gestão autoritária da máquina estatal” (PERONI,
2003, p.39). A partir de 1980, houve um processo de descentralização do poder
político e das políticas educacionais, pois se entendia que a ditadura militar estava
ligada à centralização e, conseqüentemente, a fase de abertura política deveria
estar ligada à descentralização. No Brasil, a luta pela educação ligou a concepção
de democratização à idéia de universalização, por isso, muitas vezes, os aspectos
quantitativos superaram os qualitativos.
Acreditamos que o Estado se materializa por meio das suas políticas
sociais que são entendidas como uma estratégia utilizada pelo próprio Estado
para o desenvolvimento econômico, atuando diretamente na correlação de forças
sociais (VIEIRA, 1995). Com isso, o Estado é o responsável por serviços como
saúde, educação, previdência, entre outros. A educação configurou-se como uma
política importante no desenvolvimento e na avaliação dos últimos governos
31
,
principalmente pós-ditadura militar. A partir da década de 1980, houve muitos
movimentos reivindicando a democratização da educação, apesar da “montagem
de uma trama privatizante na educação” nos governos militares (GERMANO,
1994) e das
[...] negociações, alianças, pactos, construção de estratégias num
longo processo de transição, que esperávamos que fosse na direção
das idéias dos anos 60, sufocados e arduamente defendidos nos anos
70 (GOHN, 1992, p.54).
Segundo José W. Germano (1994), esse quadro evidenciou-se por motivos
pelos quais o Estado gradativamente desobrigou-se com o investimento na
Educação Pública. Maria Lúcia de Arruda Aranha (1996), por sua vez, esclarece
que, após a herança deixada pela ditadura na área educacional, há uma
necessária recuperação da escola pública que fora empobrecida nesse período.
31
Governo José Sarney, Governo Fernando Collor de Mello e Governo Fernando Henrique
Cardoso.
61
Diante dessa situação, iniciou-se no setor educacional uma organização
dos diversos segmentos vinculados à educação contra o regime militar. Na década
de 1970, ressurgia a União Nacional dos Estudantes – UNE, a formação de
associações de docentes universitários e a realização de greves por parte dos
professores, todos em oposição ao regime, reivindicando a democratização do
Estado.
A partir de 1974, em Recife, iniciaram-se as reuniões anuais da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC; em 1975 realizou-se na
UNICAMP um seminário para discutir o autoritarismo na América Latina; em 1978,
novamente na UNICAMP, realizou-se o “I Seminário Brasileiro de Educação”; dois
anos após esse I Seminário, aconteceu o “II Seminário Brasileiro de Educação”
que, a partir daí, transformou-se em “Conferência Brasileira de Educação
32
”.
A “III Conferência Brasileira de Educação” desenvolveu-se em Niterói no
ano de 1984. Segundo Paulo Ghiraldelli Júnior (1994, p.229), este encontro se
transformou no principal evento educacional no país; “as discussões nelas
ocorridas e as sugestões delas decorrentes têm ecoado em todas as frentes”. A
“III Conferência” ocorreu em um momento propício de grande intensidade política,
pois houve uma renovação dos governos eleitos no âmbito estadual e municipal,
fazendo com que os educadores brasileiros tomassem consciência da abertura
democrática e da importância para a efetivação de uma gestão democrática da
educação.
Em setembro de 1986, em Goiânia, aconteceu a “IV Conferência Brasileira
de Educação”. Nesse evento, houve a divulgação de resoluções votadas por mais
de cinco mil participantes do evento, vindo de todos os estados, que debateram
temas da educação brasileira, a fim de construir propostas para a nova
Constituição Nacional (GHIRALDELLI JR., 1994).
32
Realizada bienalmente por instituições educacionais da sociedade civil: pelo Centro de Estudos
Educação e Sociedade – CEDES, pela Associação Nacional de Educação – ANDE e pela
Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação – ANPED (GERMANO, 1994).
62
Essas propostas ficaram conhecidas como a “Carta de Goiânia” que
colocava como princípios a educação escolar como direito de todos, gratuita e
laica em estabelecimentos públicos, o ensino fundamental obrigatório, com
duração de oito anos, o Estado garantindo à sociedade civil o controle da
execução da política educacional (em todos os níveis de governo, por meio de
organismos colegiados, constituídos democraticamente), o Estado assegurando
formas democráticas de participação e mecanismos que garantam o cumprimento
e o controle social efetivo de suas obrigações referentes à educação pública,
gratuita e de boa qualidade, em todos os níveis de ensino.
Outro movimento social na área da educação, também muito importante
neste contexto de luta contra a ditadura, foi o Fórum Nacional em Defesa da
Escola Pública – FNDEP. O FNDEP teve o seu início em 1986, em meio às
articulações para a elaboração da Constituição Federal. Segundo Maria da Glória
Gohn (1992), o FNDEP foi lançado oficialmente em Brasília no dia 09 de abril de
1987, por meio da Campanha Nacional pela Escola Pública e Gratuita
33
. Seguindo
a tradição dos educadores brasileiros desde a década de 1930
34
, o Fórum teve
seu lançamento acompanhado por um “Manifesto em Defesa da Escola Pública e
Gratuita”. O Fórum surgiu como um espaço privilegiado de debate para a
construção de um projeto de educação, expressando a vontade por parte dos
intelectuais brasileiros e de várias entidades educacionais
35
, pela
redemocratização da educação, acompanhando o movimento de abertura política
do país.
33
Denominado inicialmente de Fórum da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e
Gratuito (GOHN, 1992).
34
O autor nos remete ao “Manifesto dos Pioneiros da Educação”.
35
Constituído na época pela Associação de Educadores da América Latina e do Caribe (Aelac),
Associação Nacional de Educação (ANDE), Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de
Ensino Superior (Andes), Associação Nacional pela Formação dos profissionais da Educação
(Anfope), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), Central Única dos
Trabalhadores (CUT), Federação de Sindicatos de Trabalhadores das Universidades Brasileiras
(Fasubra Sindical), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Educação (Undime), União Nacional dos Estudantes (UNE), Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Centro de Estudos de Educação e
Sociedade (Cedes), entre outros.
63
De acordo com Dalila Oliveira (1994), era a primeira vez que os
trabalhadores da educação questionavam a gestão da educação. Esses
trabalhadores exigiam uma redefinição do papel da escola, denunciando uma
divisão hierárquica, verticalizada e discriminadora do trabalho na escola.
Questionavam também a divisão do tempo e dos conteúdos, assim como o
autoritarismo e a burocracia na educação. Com isso, a gestão da educação
transformou-se na pauta do dia, surgindo experiências com formas participativas e
coletivas da administração escolar, o que mais tarde, depois de muitas lutas,
resultaria na constituição de Conselhos escolares, na eleição direta para diretor e
na autonomia das instituições escolares como resposta às reivindicações de
participação popular no interior da escola.
Segundo Theresa Adrião e Rubens de Camargo (2001), no Brasil, a partir
das eleições de 1982
36
, já se notavam perspectivas participativas e democráticas
tanto da sociedade civil, como dos partidos em oposição ao regime militar. Os
autores utilizaram o exemplo da Constituinte de 1987 – 1988, que se apresentou
como um espaço de embates entre diferentes interesses, muitas vezes
antagônicos, e o resultado foi a síntese desses conflitos.
A Constituição Federal de 1988 foi inédita em termos de gestão da
educação, pois pela primeira vez uma Constituição brasileira utilizava a gestão
democrática como princípio para a educação pública. Como veremos a seguir, a
Constituição Federal de 1988 legitimou as reivindicações de democratização da
gestão da educação realizadas no período ditatorial e, apesar dos entraves no
processo Constituinte, foram conseguidas vitórias expressivas, graças aos
embates da sociedade civil organizada.
2.1.1 O princípio de gestão democrática da educação na Constituição
Federal de 1988 e na Constituição Estadual de 1989
Em 1987, no Governo José Sarney, por vontade popular acorreu a
Assembléia Nacional Constituinte – ANC, “[...] marcada por intensa mobilização da
36
Em 1982 ocorreram as primeiras eleições diretas estaduais, dentro de um contexto de abertura
lenta e gradual.
64
sociedade nos debates em torno da nova Carta Magna, que veio a ser promulgada
em outubro de 1988 – a então chamada Constituição Cidadã” (VIEIRA, 2000,
p.22). Um dos pontos mais polêmicos da ANC foi o capítulo da Educação, no qual
foram travadas lutas entre as mais diversas entidades e organizações ligadas aos
setores de educação. Segundo Sofia Lerche Vieira (2000, p.22), “[...] não se
percebe, ainda, um novo projeto capaz de responder aos tempos de transição e às
demandas por educação que nele se colocam”.
Neste período, o debate educacional ficou em torno de temas como
centralização como sinônimo de autoritarismo, descentralização como sinônimo de
democratização, correlação de forças entre o público e o privado e a questão
qualidade – quantidade.
Conforme Nalú Farenzena (2001), para a elaboração do texto
constitucional, a ANC organizou Subcomissões Temáticas, Comissões Temáticas,
Comissão de Sistematização e a Comissão de Redação. Na Subcomissão da
Educação, Cultura e Esportes presidida por Hermes Zanetti
37
(PMDB/RS) e
relatada por João Calmon (PMDB/ES) desenvolveram-se momentos de debates
diretos com a sociedade civil por meio de audiências públicas. Nesse período,
foram ouvidas diversas instituições / órgãos ligados à educação, com diferentes
interesses.
Na ANC, o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública FNDEP teve
uma participação efetiva, apresentando à Assembléia Constituinte as propostas
que estavam reunidas na chamada “Carta de Goiânia” (RODRIGUES, 2004). Em
relação à gestão democrática da educação, a Carta de Goiânia “documento-
síntese da IV Conferência Brasileira de Educação em 1986” (Idem, p.129), fez as
seguintes propostas para o texto constitucional:
19 – O Estado deverá garantir à sociedade civil o controle da execução
da política educacional em todos os níveis (federal, estadual e municipal),
através de organismos colegiados, democraticamente constituídos.
20 – O Estado assegurará formas democráticas de participação e
mecanismos que garantam o cumprimento e o controle social efetivo de
suas obrigações referentes à educação pública, gratuita e de boa
37
Deputado Federal vinculado ao PMDB que acumulou força política por meio da presidência de
um dos principais sindicatos de professores do Brasil, o CPERS/Sindicato.
65
qualidade, em todos os níveis de ensino (Carta de Goiânia, apud
GHIRALDELLI JR, 1994, p.229).
A Carta de Goiânia define a participação da sociedade civil na fiscalização e
na execução das políticas educacionais, assegurando a qualidade do ensino
público. As propostas eram avançadas, porém a aprovação das mesmas não foi
um processo fácil.
O processo de construção da CF/1988 foi bastante conturbado, pois
ocorreram vários embates entre importantes movimentos voltados à
redemocratização do Estado e ao apoio às políticas descentralizadoras
fomentadas pelo Estado. O primeiro segmento englobava o grupo que fazia parte
do FNDEP
38
, e seu posicionamento em relação à gestão educacional foi a defesa
da participação dos usuários (comunidade escolar) na definição das políticas
educacionais a serem instituídas nestes espaços, democratizando-os.
O único momento de ruptura no posicionamento do FNDEP ocorreu pelo
fato da polêmica em torno da destinação de verbas públicas, pois parte dos
representantes deste movimento era vinculado à Igreja
39
e apoiavam as escolas
comunitárias (PERONI, 1999). A partir dessa ruptura passou a Fórum Nacional da
Educação para Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (Idem). É importante
salientar que a idéia da não exclusividade de verbas públicas para entidades
públicas foi vitoriosa nesse processo.
O segundo segmento se referia aos interesses privados na educação
40
,
composto pelos empresários da educação. No parlamento, este grupo ficou
conhecido como “Centrão”. O “Centrão” também defendeu a participação, porém
de forma superficial, simplesmente como mera colaboração dos pais na
implantação de medidas previamente decididas (Idem).
38
Num primeiro momento, contou com quinze entidades e, pela diversidade de interesses,
surgiram dois núcleos que se articulavam conforme a reivindicação. Os principais pontos de debate
eram em torno da defesa da escola pública e do posicionamento político-partidário de oposição ao
regime militar (PERONI, 1999).
39
A polêmica em torno da Igreja Católica ocorre desde o Manifesto dos Pioneiros da Educação em
1930.
40
Representados pela Federação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino – FENEN, pela
Associação Brasileira de Escolas Superiores Católicas – ABESC, pela Associação de Educação
Católica – AEC, pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB e pelo Conselho de
Reitores das Universidades Brasileiras – CRUB.
66
A pressão exercida pelas entidades integrantes do FNDEP acabou sendo
insuficiente para a inclusão das suas propostas de gestão democrática no texto
constitucional. O processo de discussão acabou “omitindo qualquer referência ao
controle social, à participação da sociedade civil na definição e no
acompanhamento da política educacional” (RODRIGUES, 2004, p.130). Ou seja,
“o processo constituinte deu-se em meio a essa correlação de forças” (PERONI,
2003, p. 74).
Uma análise mais percuciente indica, entretanto, que assim como
estes conflitos não podem ser localizados simplesmente por afiliações
partidárias, religiosas ou de investimento no setor e que é importante dar
conta dos subgrupos e posições hegemônicas intra-institucionais para
que melhor se compreendam as convicções e posturas dos indivíduos e
frentes que se manifestam, os temas de consenso e conflito no que se
refere aos preceitos constitucionais sobre a educação permanecem ainda
inacessíveis e elitizados (LUCE, 1987, p.24).
Segundo Theresa Adrião & Rubens de Camargo (2001, p.73), para o
FNDEP, a formação de “cidadãos para uma sociedade participativa e igualitária
pressuporia vivências democráticas no cotidiano escolar, traduzidas na presença
de mecanismos participativos de gestão na própria escola e nos sistemas de
ensino”. Essa proposição se referia tanto aos sistemas de ensino público, como
para o ensino privado, e esse era justamente o posicionamento que diferiria do
segundo segmento.
No anteprojeto da Constituição Federal, o conceito de gestão democrática
do primeiro segmento (FNDEP) foi incorporado; porém, no Plenário, o conceito foi
alterado por uma emenda dos setores conservadores (ADRIÃO & CAMARGO,
2001). Com isso, a gestão democrática abrangeria apenas os sistemas de
educação pública. Entende-se que “esse dispositivo parece legitimar a conversão
neoliberal da educação em um serviço, cuja oferta é regida pela lógica mercantil”
(RODRIGUES, 2004, p.130).
Theresa Adrião e Rubens de Camargo (2001, p.78) afirmam que é na
gestão escolar que o princípio da democratização do ensino se consolida como
prática concreta. Portanto, “cabe entender os limites e as possibilidades da lei,
menos como expressão de normas jurídicas e genéricas e mais como instrumento
67
indutor de modificações de práticas sociais concretas, neste caso, das práticas
escolares”.
Apesar dessa trajetória, a Constituição Federal de 1988 inovou, trazendo
como princípio a gestão democrática do ensino público (Art.206, VI). No entanto,
“esse texto significa apenas uma declaração de intenções, precisando de
regulamentação” (OLIVEIRA & CATANI, 1993). Esta regulamentação se deu pela
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996.
Por sua vez, a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul de 1989
41
também declarou a gestão democrática como princípio (Art.197, VI), baseando-se
na CF/88. Segundo a Constituição Estadual de 1989, a gestão democrática da
educação é constituída por um tripé: participação da comunidade escolar,
autonomia escolar com o repasse de verbas estaduais para a conservação e a
manutenção da escola (Art. 202, §2º Constituição Estadual do Rio Grande do Sul)
e eleição para diretor.
Em relação aos princípios e instrumentos de gestão democrática contidos
na Constituição Estadual de 1989 muito se deve ao Fórum Gaúcho em Defesa da
Escola Pública – FGDEP
42
. O FGDEP foi um espaço aberto às discussões sobre a
educação pública, e diversas entidades participaram dos debates. Neste período,
41
Segundo Oliveira & Catani (1993), o Art.206 Inciso VI da CF/88 serviu de modelo, além do Rio
Grande do Sul (Art. 197, VI), para o Mato Grosso do Sul (Art. 189, VI), para Goiás (Art.156, VI),
para Rondônia (Art. 187, VI), para o Piauí (Art. 217, VI), para a Paraíba (Art. 207, V), para
Pernambuco (Art.178, VII), para Sergipe (Art. 215, VI) e para Minas Gerais (Art.196, VII).
42
O FGDEP congregava as seguintes entidades: ACPM/RS (Associação do Círculo de Pais e
Mestres do RS), ADERGS (Associação dos Administradores de Educação do Estado do RS),
AOERGS (Associação dos Orientadores Educacionais do RS), ADUFRGS (Associação dos
Docentes da Universidade Federal do Rio gRande do Sul), AFPERS (Associação dos Funcionários
Públicos Estaduais do RS), AIERGS (Associação dos Inspetores de Educação do RS), ANPAE
(Associação dos Profissionais de Administração da Educação), ANPED (Associação Nacional de
Pós Graduação e Pesquisa em Educação), APEF/RS (Associação dos Professores de Educação
Física/ RS), APMPA (Associação dos Professores do Município de Porto Alegre, atualmente
ATEMPA), ASSERS (Associação de Supervisores de Educação do RS), CEDES (Centro de
Estudos, Educação e Sociedade), CONSEME (Conselhos de Secretários Municipais de Educação),
SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), CPERS/ SINDICATO, CUT (Central
Única dos Trabalhadores), FETAG (Federação dos Trabalhadores da Agricultura Gaúcha),
FETEE/SUL (Federação dos Trabalhadores dos Estabelecimentos de Ensino do Sul ), FRACAB
(Federação das Associações de Bairro de Porto Alegre), MDJH/RS (Movimento Defesa dos
Direitos Humanos e Justiça RS), OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), SE (Secretaria de
Educação do estado do RS), SECERS (Secretaria da Cultura do Estado do RS), SINPRO
(Sindicato dos Profissionais da Educação Privada), UEE/ RS (União Estadual dos Estudantes do
RS), UGES (União Gaúcha de Estudantes Secundaristas), UMESPA (União Municipal de
Estudantes de Porto Alegre).
68
“a esquerda era majoritária e bem definida” (LUCE, 2006) [entrevista]. Este grupo
mantinha um constante diálogo com o Fórum, defendendo a democratização da
sociedade.
O FGDEP reunia-se semanalmente para preparação das emendas que
seriam apresentadas junto à subcomissão de educação. A Constituinte estadual
funcionou nos mesmos moldes da Constituinte Federal. “As pautas nacionais
foram recolocadas na discussão estadual e havia acúmulo e consenso das
entidades sobre um grande número de questões” (LUCE, 2006) [entrevista]. Em
termos de gestão democrática da educação, as discussões foram tranqüilas, pois
todas as entidades entendiam que a eleição direta para diretor, a construção dos
Conselhos escolares e a autonomia financeira eram fatores imprescindíveis para a
democratização da educação.
Ao estabelecer como princípio fundamental a gestão democrática, tanto a
União quanto o estado do Rio Grande do Sul apenas institucionalizaram as
práticas que já vinham ocorrendo, devido às demandas no período de
redemocratização do país e as experiências locais. Muito dessas práticas já
vinham ocorrendo em redes municipais.
Em termos de luta pela cidadania, a Constituição Estadual trouxe muitas
inovações, principalmente sobre o tema gestão democrática. O Art. 212
possibilitou que pais, alunos, funcionários e professores se organizassem em
associações e grêmios, sem o impedimento por parte do diretor na sua
organização efetiva. Já, o Art. 213 definiu o Conselho Escolar como órgão
representativo de todos os setores da escola, auxiliando na gestão educacional.
A Constituição Estadual de 1989 estabeleceu ainda a eleição direta e
uninominal de diretores, como um instrumento democrático na educação. Mesmo
com este avanço da Constituição Estadual de 1989, o processo de
democratização do sistema estadual de ensino do Rio Grande do Sul teve o seu
início um pouco antes, nas discussões sobre a redemocratização do Estado e da
educação em meados de 1985 com a Lei 8.025/85, que dispunha sobre a eleição
para diretor.
69
Este processo se evidenciou na primeira metade da década de 1980, com
discussões e debates sobre a problemática educacional. Já, na segunda metade
da década, fim da ditadura militar, época de abertura política, surgiram
movimentos de reivindicação por participação da comunidade escolar na
educação, reivindicando uma gestão escolar mais participativa, fazendo com que
o diretor juntamente com o Conselho Escolar gerissem a escola a partir da
autonomia escolar (administrativa, pedagógica e financeira). Autonomia essa
permitiria que a própria escola pudesse tomar decisões de acordo com as suas
necessidades. Porém, esta última reivindicação só veio a ser regulamentada em
1995, com a Lei 10.576.
2.1.2 A Política educacional a partir da Nova República
A partir dessas discussões, já se concebia que, para se ter uma educação
pública de qualidade, era preciso ter como princípio a gestão democrática da
educação. A gestão democrática nesse período foi entendida “[...] não apenas
como um princípio do novo paradigma, mas também como um objetivo a ser
sempre perseguido e aprimorado, além de configurar-se como uma prática
cotidiana nos ambientes educativos” (BORDIGNON & GRACINDO, 2001, p.165).
Heloísa Lück (1997), apud Genuíno Bordignon & Regina Vinhaes Gracindo
(2001), apresenta cinco mudanças para que a gestão democrática da educação
aconteça: sair da ótica fragmentada para uma ótica globalizadora; sair da limitação
de responsabilidade para a sua expansão; sair da ação episódica para o processo
contínuo; retirar a hierarquização e a burocratização para a coordenação; sair da
ação individual para uma ação coletiva. Ou seja, para que a gestão democrática
da educação seja efetivada, é preciso uma mudança estrutural a ser realizada nos
sistemas educacionais.
Em plena “Nova República”, no governo de José Sarney, as políticas
educacionais pretendidas em relação à gestão educacional se mostraram pelos
seguintes documentos: Educação para todos – caminhos para a mudança (MEC,
ago./85), texto síntese do Dia Nacional de Debate sobre Educação (MEC,
nov./1985) e pelo I Plano Nacional de Desenvolvimento da Nova República 1986 –
70
1989 (Brasil, jun./1986) (VIEIRA, 2000). De uma forma geral, estes documentos
destacavam as seguintes intenções: ampliação do acesso e assistência ao aluno
carente, qualificação das escolas e dos professores e aumento de verbas para a
educação, fazendo com que a gestão escolar tivesse uma administração eficiente
e democrática.
Esse processo de democratização da gestão foi marcado pela participação
da sociedade civil nas discussões realizadas em diferentes momentos da década
de 1980. A partir da década de 1990, esse processo de discussão foi substituído
por um processo de implementação de políticas neoliberais
43
, culminando com a
reforma do aparelho estatal brasileiro em 1995. Com isso, as políticas
educacionais instituídas nesse período não se revelaram democráticas, pois
escondiam interesses do mercado, com o objetivo de diminuição do Estado, ou,
como afirma Vera Peroni (2003, p.51), “[...] Estado máximo para o capital e
mínimo para as políticas sociais”.
Reginaldo Moraes (2001, p.36) critica esta situação, falando que estas
políticas buscam “[...] proteger o cidadão das desgraças da sorte; o Estado
aparentemente benfeitor acaba na verdade produzindo um inferno de ineficácia e
clientelismo, pesadamente pago pelo mesmo cidadão que à primeira vista
procurava socorrer”. Conforme esta crítica de Reginaldo Moraes sobre a
perspectiva neoliberal, a educação pública, fazendo parte deste “Estado benfeitor”,
torna-se um obstáculo à seleção natural da sociedade, sendo ineficiente e
produtora do clientelismo.
Conforme Dalila Oliveira (2001),
Diante de grandes pressões populares pela democratização,
sobretudo da educação básica, implicando a exigência de seu acesso,
mas também na qualidade de seus serviços – fator indispensável à
permanência dos alunos na escola e à conclusão de sua escolaridade ,
o Estado procura atender de forma ambivalente a essa demanda. Por um
lado, dispõe de medidas que procuram dar respostas imediatas às
manifestações sociais mais patentes e, por outro, tenta compatibilizar o
atendimento das demandas com uma política de contenção dos gastos
públicos sem, contudo, abrir mão da direção do processo de mudanças
(OLIVEIRA, 2001, p.95).
43
Políticas de privatização, desregulamentação e reformas políticas.
71
Segundo a autora, na década de 1980, o setor educacional não conseguiu
responder quantitativa nem qualitativamente às pressões sociais em torno da
educação pública. Por isso, detectou-se a crise que inicialmente fora percebida
por uma descompensação entre o número de vagas nas instituições públicas de
ensino e a população que demandava por escola (Ibidem). Portanto, aos olhos
dos gestores da educação pública, a crise na educação se apresentou como um
problema econômico, de ordem administrativa, ou seja, um “problema de
ineficiência das redes públicas” (OLIVEIRA, 2001, p.98). A crise educacional foi
diagnosticada inicialmente no final da década de 1980, mas, somente a partir da
década de 1990, passou a compor prioritariamente a agenda de reformas do
governo (Ibidem).
No Brasil, a década de 1990 iniciou com muitas expectativas da sociedade
civil organizada, principalmente em relação à consolidação da democracia. No
campo da educação, iniciou-se um período de debates para a construção do
Plano Decenal de Educação para Todos (1993); realiza-se também a Conferência
Nacional de Educação para Todos (1994), inspirada na Conferência Mundial de
Educação para Todos, realizada em Jomtien – Tailândia em 1990 e,
principalmente, o Fórum de Educação para Todos em 1993, onde os nove países
mais populosos do mundo (Brasil, Bangladesh, China, Egito, Índia, Indonésia,
Paquistão, México e Nigéria) assinaram a Declaração de Nova Delhi, que,
segundo Sofia Lerche Vieira (2000), trouxe novos rumos para a educação
brasileira.
A Declaração de Nova Delhi comporta alguns destaques
interessantes, que expressam sintonias entre os compromissos
internacionais e as orientações da política educacional brasileira, quais
sejam: a ênfase na melhoria qualitativa dos sistemas educacionais,
filosofia da atenção integral, entendimento da questão educacional como
responsabilidade de toda a sociedade, foco na questão do magistério e
direcionamento de recursos para a “educação básica e melhoria do
gerenciamento dos recursos educacionais’” (VIEIRA, 2000, p. 152).
72
O acordo, firmado nesta última conferência, estabelecia um conjunto de
compromissos entre as esferas governamentais, entidades representativas dos
educadores e outros segmentos da sociedade, definindo as responsabilidades de
cada instância para com a educação básica (Ibidem). O encontro de Nova Delhi foi
composto pelos nove países integrantes do EFA-9
44
, com objetivo de desenvolver
iniciativas conjuntas, debatendo problemas comuns a todos os países
participantes.
Na década de 1990, inicia-se no Brasil o período de Fernando Collor de
Mello na Presidência da República, sendo caracterizado por “muito discurso e
pouca ação”, cujos planos e programas foram efetivados parcialmente ou nunca
chegaram a sair do papel (VIEIRA, 2000, p.113). Segundo Sofia Lerche Vieira
(2000, p.90), “[...] o governo Collor não chega a traduzir um novo quadro político,
mas, antes, aprofunda uma das marcas herdadas do governo anterior – o
clientelismo [...]”.
Nesse período, aconteceram dois momentos de debate na área da gestão
educacional no Brasil. Nesse período, as concepções da “Nova Gestão Pública”
inseriram-se na agenda educacional, porém a sua efetivação só se deu com o
PDRAE, em 1995. Os dois momentos de debate foram o Simpósio “O desafio da
escola básica – qualidade e eqüidade”, realizado em setembro de 1990 pelo
Senado Federal e o Seminário “Qualidade, eficiência e eqüidade na Educação
Básica”, realizado em novembro de 1991, promovido pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada – IPEA (VIEIRA,2000.)
O Simpósio discutiu algumas experiências inovadoras na gestão escolar em
busca da eficácia no ensino fundamental, e o Seminário foi mais abrangente, pois
contemplou quatro eixos: “políticas e estratégias governamentais na perspectiva
da qualidade, relações entre atores e gestores do sistema educacional gestão
educacional e fontes de financiamento” (GOMES, 1992, p.01, apud VIEIRA, 2000,
p.106).
44
Também conhecido como E-9 Countries ou “Education for All”, criado a partir da Conferência de
Jomtien. Este grupo é integrado por nove países em desenvolvimento de maior população do
mundo com problemas de analfabetismo e universalização da Educação Básica. Os países são:
Bangladesh, Brasil, China, Egito, Índia, Indonésia, México, Nigéria e Paquistão.
73
As discussões resultantes desse Seminário foram colocadas em um livro
intitulado “Qualidade, eficiência e eqüidade na Educação Básica” (1992), tendo
como organizadores Cândido Alberto Gomes
45
e José Amaral Sobrinho
46
.
Segundo Sofia Lerche Vieira (2000), o debate sobre a relação entre os atores e
gestores do sistema educacional desenvolveu-se em duas dimensões: a política e
a técnica.
A primeira analisa a possibilidade de um novo sistema de
relacionamento entre União, estados e municípios, com a sugestão da
incorporação de novos atores na discussão de alternativas, como o
empresariado, a sociedade civil, representadas pelas organizações não-
governamentais, e a própria escola. A segunda coloca a definição de
critérios, a identificação de padrões de qualidade, a padronização e
informatização das estatísticas educacionais como instrumentos para um
melhor entrosamento e cooperação entre as instâncias gestoras do
sistema educacional (GOMES & AMARAL SOBRINHO, 1992, p.02, apud
VIEIRA, 2000, p.107).
Com isso, percebemos que, na dimensão política, o debate foi em relação à
alternativa de um novo relacionamento entre as três esferas governamentais,
juntamente com a abertura de uma discussão com os diferentes segmentos da
sociedade para encontrar alternativas para a crise educacional. Já na dimensão
técnica, o debate foi em relação aos critérios de um padrão de qualidade na
educação, junto com a importância dada às estatísticas educacionais para uma
melhor avaliação dos sistemas educacionais. Ou seja, o debate trouxe como
“inovações” a participação e a parceria com a sociedade civil (empresários,
Organizações Não-Governamentais,...), assim como a discussão e fixação de
critérios de qualidade para uma melhor avaliação dos sistemas educacionais.
Em relação à gestão educacional, foi discutida também a questão da
autonomia escolar. Sofia Lerche Vieira (2000) fala da ênfase colocada na
necessidade de repensar os sistemas de ensino no que diz respeito aos recursos
humanos, pois os sistemas de ensino apresentavam-se gigantes e burocráticos.
Destacou-se a seguinte proposta sobre a autonomia escolar: a elaboração do seu
45
Professor Titular da Universidade Católica de Brasília (UCB/DF).
46
Técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA.
74
próprio projeto institucional e pedagógico, visando à melhoria da qualidade e
eqüidade.
Com isso, o papel das instâncias centrais seria de estabelecer as diretrizes
mínimas para a avaliação dos resultados obtidos. Sobre isso, Eneida Oto Shiroma
(2006) afirma que esta autonomia tem sido uma “[...] autonomia regulada,
controlada pela avaliação que incide sobre o produto”, fazendo referência ao viés
mercadológico fixado nas políticas de gestão educacional desse período.
Sobre a idéia de avaliação, Christian Laval (2004) ainda fala que
Esse vasto movimento de avaliação [...] é inseparável da
subordinação crescente da escola aos imperativos econômicos. Ela
acompanha a “obrigação de resultados” conhecida por se impor tanto à
escola como a toda organização produtora de serviços. Nisso, ela
participa das reformas “centradas na competitividade” visando a fixar e
elevar os níveis escolares esperados e, para isso, a normalizar os
métodos e conteúdos do ensino (LAVAL, 2004, p.209).
O autor nos mostra que uma gestão pautada no resultado supõe a
avaliação como uma técnica neutra, sendo guiada pelo princípio da eficiência.
Esta perspectiva de avaliação veio a se consolidar no Brasil com os Parâmetros
Curriculares Nacionais – PCN’s e com o resgate das avaliações dos diferentes
níveis de educação
47
: o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
SAEB, o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – ENADE e o Exame
Nacional do Ensino Médio – ENEM.
O período de Itamar Franco
48
na Presidência da República ficou marcado
por um estilo diferente de gestão, configurando-se como momentos de ouvir a
sociedade e de apontar um horizonte futuro para a educação brasileira (VIEIRA,
2000), diferentemente do período anterior. Esses momentos deram-se
principalmente por causa da construção do Plano Decenal de Educação para
Todos (1993).
47
Ver Vera Peroni (2003), Capítulo II.
48
Presidente do Brasil de 1992 a 1994, assumindo o mandato após o impeachment de Fernando
Collor de Mello.
75
O Plano Decenal de Educação foi elaborado no período do governo de
Itamar Franco, porém deveria ter sido iniciado no governo de Fernando Collor de
Mello. Contudo, o Plano Decenal não se configurou como um “plano concebido a
toque de caixa, como tantas vezes se faz na burocracia estatal” (VIEIRA, 2000,
p.131); para o início da elaboração do plano foram criados dois grupos: o Grupo
Executivo e o Grupo Consultivo. O Grupo Executivo compreendia representantes
do Ministério da Educação MEC, do Conselho Nacional de Secretários de
Educação CONSED e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação UNDIME, e o Grupo Consultivo era composto por representantes de
entidades governamentais e não-governamentais. As etapas seguintes foram a
realização de diversas discussões nas escolas, nos municípios e nos estados, “[...]
incorporando ao longo de todo o processo contribuições da sociedade civil” (Idem,
p.131).
Os conteúdos do Plano Decenal não se distanciam dos temas do
debate sobre educação no âmbito governamental. Faz-se um diagnóstico
corajoso dos problemas existentes e são colocadas alternativas para sua
superação. O Plano não chega propriamente a inovar, apresentando uma
agenda consensual. O discurso reitera o que vem sendo dito em planos
anteriores, situando a tarefa inadiável de que a educação se constitua
como prioridade política da Nação, aí incluindo sociedade política e
sociedade civil. O elemento novo desse processo é a participação e a
mobilização social. Atores, até então pouco presentes no cenário da
gestação das políticas públicas, começam a ocupar o palco [...] (VIEIRA,
2000, p.136).
O Plano Decenal marcou a chamada efetiva da sociedade civil para a
discussão de um projeto para a educação brasileira. Entidades governamentais e
não governamentais vinculadas à educação, sindicatos, empresários, todos foram
ouvidos e participaram desse processo, inclusive o FNDEP. Esse processo foi
conflituoso, porém obteve muitos avanços. No entanto, mesmo com o Plano
Decenal de Educação, a descontinuidade das políticas educacionais continuaram.
Em 1995 iniciou-se o mandato para a Presidência da República de
Fernando Henrique Cardoso, surgindo uma mudança na concepção de gestão da
76
educação no Brasil. Foi a época das reformas educacionais. De acordo com o
documento “Planejamento político-estratégico” de 1995,
[...] é exclusivamente na escola que os resultados podem ser
alcançados. A escola, portanto, sintetiza o nível gerencial-operacional do
sistema: a escola fundamental, a escola de ensino médio, a instituição de
ensino superior. É na escola que estão os problemas e é na escola que
está a solução (VIEIRA, 2001, p.138).
De acordo com este trecho do documento “Planejamento político-
estratégico” (1995) do governo de Fernando Henrique Cardoso, a escola se
apresenta como foco da crise educacional, e é na escola que se encontra também
a solução para sanar a crise. A mudança na concepção de gestão surge
principalmente das necessidades de fazer com que a educação fosse subordinada
ao desenvolvimento econômico do país, agora com a hegemonia dos organismos
internacionais como o FMI e o BM.
Nos anos 1990, na América Latina, começamos a observar sinais daquilo
que, em outros lugares do mundo, já vinha ocorrendo: a ofensiva
neoliberal e a sua proposta de globalização da economia. Nas propostas
de elaboração curricular, essa tendência materializou-se na forte
presença dos organismos internacionais, que passaram a estabelecer a
pauta de discussões, substituindo a ‘população usuária da escola’, como
era próprio nos anos 1980 [...] (PERONI, 2003, p.103).
Diante da crise educacional, diagnosticada por alguns organismos
internacionais e por Luiz Carlos Bresser Pereira (1998), a educação mostrou-se
ineficiente, não tendo qualidade para atender às expectativas dos “cidadãos-
clientes
49
”; portanto, seria urgente a sua substituição por uma administração
pública gerencial, visando à produtividade com o racionamento de recursos.
49
Termo utilizado por Luiz Carlos Bresser-Pereira no Plano Diretor de Reforma do Aparelho do
Estado (1995) que indica cidadãos consumidores.
77
Para atender a estes propósitos, em 1995 organizou-se a reforma
administrativa no Brasil, conhecida como o Plano Diretor de Reforma do Aparelho
do Estado – PDRAE. Este Plano visava à reformulação do Estado para o
atendimento das demandas do mercado, conforme as diretrizes suscitadas pelos
organismos internacionais. Em relação à educação, esta reforma insere novas
formas de gestão e controle dos serviços públicos, surgindo características de
focalização e redistribuição no financiamento, descentralização (transferindo
responsabilidades a esferas menores para a execução das políticas), inserção de
parcerias (com a colaboração da sociedade civil na gestão educacional) e a
avaliação do ensino como forma de regulação do sistema educacional.
É importante salientar que, nesse período, de acordo com o PDRAE e o
documento do IPEA Subsídios para a reforma do Estado (BRASIL, 1994), a
descentralização é entendida como
privatização, isto é, transferência para a propriedade privada de patrimônios e
serviços públicos,
transferência de serviços da administração pública para a administração privada
do serviço público,
terceirização dos serviços de apoio à administração pública,
participação da sociedade civil na gestão pública e no controle social,
combinação das formas acima descritas.
Em relação à descentralização, Vera Peroni (2003, p.68) afirma que “a
proposta do MARE, [...] é mais uma forma de desobrigação do Estado, o qual quer
repassar tarefas para a sociedade que, até então, eram suas [...]”. Com isso,
percebemos que o processo de descentralização, previsto pela reforma do
aparelho do Estado no Brasil, acaba por realçar as desigualdades entre as
dependências estaduais, incentivando a sociedade a captar recursos na
comunidade, promovendo parcerias e eventos para conseguir suprir a escola.
De acordo com esta reforma, o novo formato para as políticas sociais e
educacionais, seria “[...] a transferência de fundos públicos para o setor privado, já
78
que o terceiro setor em geral não tem condições de auto-financiamento” (ADRIÃO
& PERONI, 2005, p.143). Com isso, institui-se uma parceria entre Estado e
sociedade civil, em que o Estado financia e a sociedade civil executa. Portanto,
insere-se nas políticas educacionais uma nova esfera: a “pública não estatal”.
A esfera pública não-estatal é uma forma institucional proposto pelo
PDRAE e implementado na educação pública. Materializando esta proposta do
PDRAE, temos, a partir de 1995, o Programa de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino Fundamental – PMDE
50
(que, a partir de 1997, passou a ser chamado
de Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE).
Seguindo a diretriz do PDRAE,
As políticas sociais assumiriam uma nova conotação, pois seriam
consideradas pelo plano diretor da reforma, serviços não-exclusivos do
Estado e, assim sendo, de propriedade pública não-estatal ou privada
(PERONI & ADRIÃO, 2005, p.144).
Com isso, o Programa Dinheiro Direto na Escola passou a ser um programa
que, como o próprio nome já diz, faria a passagem de recursos federais para as
instituições públicas de educação. Os recursos que compõem este Programa
advêm do Salário-Educação e são distribuídos pela autarquia Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação – FNDE, de acordo com as matrículas informadas
para o Ensino Fundamental (PERONI & ADRIÃO, 2005).
Este programa visa ao repasse direto de recursos financeiros para as
escolas públicas de Ensino Fundamental e para as organizações não-
governamentais sem fins lucrativos que atuam com a Educação Especial
51
. O
repasse desta verba ocorre de duas formas: para secretaria de educação do
estado ou do município, se a instituição escolar não obtiver uma Unidade
Executora, ou diretamente para as escolas, através da sua Unidade Executora
(Idem).
50
Resolução nº12, de 10 de maio de 1995.
51
Este último caso regulamentado somente a partir de 1998, com a Medida Provisória nº 1.784.
79
Sua destinação voltava-se exclusivamente para o custeio das
despesas das escolas: manutenção e conservação do prédio escolar,
aquisição de material necessário ao funcionamento da escola,
capacitação e aperfeiçoamento de profissionais da educação, avaliação
da aprendizagem, implementação do projeto pedagógico, aquisição de
material didático/pedagógico e desenvolvimento de atividades
educacionais diversas (PERONI & ADRIÃO, 2005, p.147).
A Unidade Executora, Uex, é uma organização social de direito privado,
sem fins lucrativos
52
, órgão representativo de pais, professores, funcionários da
escola e comunidade em geral (MEC, Secretaria de Educação Fundamental,
1996), tendo algumas peculiaridades de acordo com cada região brasileira
53
. Na
rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul, a UEx é o Círculo de Pais e
Mestres – CPM; este órgão representa somente pais e professores, deixando de
lado os demais segmentos da comunidade escolar.
Sendo a UEx uma entidade jurídica de direito privado, ela possui a
autonomia necessária para exercer direitos e deveres com os recursos recebidos
dos órgãos governamentais, de entidades públicas e privadas, doações e outros
tipos de arrecadação (PERONI & ADRIÂO, 2005). Esta autonomia surge na
mesma direção das políticas de colaboração e de parceria com a sociedade civil,
tendo como exemplo, no Rio Grande do Sul, a Lei 11.126/98
54
.
Segundo o manual de procedimentos operacionais para a transferência de
recursos para as escolas, distribuído pelo Ministério da Educação e do Desporto –
MEC em 1995, houve um compromisso na campanha eleitoral de Fernando
Henrique Cardoso com a melhoria do ensino público e, portanto, seriam
necessárias medidas racionalizadoras que simplificassem a transferência de
recursos, tornando este processo mais ágil. Por isso, a necessidade da
52
Regulamentada pela Lei Nº 9.637/98 e Lei Nº 9.790/99.
53
Mais detalhes, ver Relatório final da Pesquisa “PROGRAMA DINHEIRO DIRETO NA ESCOLA:
uma proposta de redefinição do papel do Estado na educação?” Coordenada nacionalmente pela
Profª. Vera Maria Vidal Peroni (UFRGS), com a participação da autora no estudo do caso da rede
estadual de ensino do Rio Grande do Sul.
54
Esta Lei será analisada no Capítulo III.
80
constituição de uma Unidade Executora nas escolas que, a partir de 1997, passou
a ser exigência para o repasse do dinheiro.
Esta obrigatoriedade, segundo Vera Peroni & Theresa Adrião (2005),
constituiu uma “[...] estrutura formal de gestão paralela à do estabelecimento
público de ensino”. Com isso, percebemos a intenção de adequação da educação
pública com o PDRAE, com a inserção de organizações ‘públicas não-estatais’”
(Idem, p.150).
De acordo com este novo conceito, as instituições educativas continuariam
sendo públicas, porém contendo uma organização de direito privado (não-estatal)
com interesse público, auxiliando na gestão e no controle das políticas
implantadas. Portanto, o ex-PMDE, atual PDDE, racionaliza e desburocratiza a
transferência de recursos, democratizando as relações escolares no entendimento
do governo, pois necessita de apoio da sociedade civil (comunidade escolar) para
o seu recebimento e para as decisões relativas ao seu gasto, colocando em
prática o princípio de transparência na gestão dos recursos financeiros.
Essas transferências são propostas como modelos de participação
social ainda que, se considerarmos a filosofia que as inspira, essa
participação não suponha uma maior democratização do sistema, já que
a idéia básica sobre a qual se assenta ao interesse individual e às
possibilidades materiais de cada um, no marco de uma sociedade
competitiva (BIANCHETTI, 1996, p. 102).
Segundo Luiz Carlos Bresser Pereira (1998), dando uma maior autonomia
na gestão dos recursos e na captação dos mesmos, os beneficiários destas
políticas, ou cidadãos-clientes, poderiam controlar a sua aplicação e decidir as
suas prioridades, agilizando e otimizando o processo de repasse. Com isso,
poderiam também retirar os trâmites intermediários que antes existiam e geravam
toda uma corrupção no seu gerenciamento, pela falta de transparência. Estas
propostas de reforma, segundo Anthony Giddens (2001, p.79), se configurariam
num “processo de aprofundamento e ampliação da democracia”, pois o objetivo
era de agir em parceria com a sociedade civil para o desenvolvimento da própria
sociedade.
81
Para alcançar os objetivos dessa reforma, instituiu-se no Brasil uma
legislação, transferindo as responsabilidades da execução e do controle das
políticas sociais para a sociedade civil ou para a esfera privada, tendo como
argumentos o controle dos gastos e a diminuição da esfera pública. As novas
políticas tinham por objetivo a desconcentração de responsabilidades,
descentralizando os recursos financeiros; portanto, aí estava a dita
democratização da gestão educacional. O poder de decisão não foi
descentralizado, somente a execução.
Por isso, a comunidade escolar teria de contribuir com a escola por meio
dos seus serviços, captando recursos ou “contribuindo voluntariamente” com a sua
mão-de-obra. Nesse sentido, Marcos Bassi (1996) afirma que não há garantias de
que a gestão autônoma possa realmente levar à melhoria da qualidade do ensino
e à democratização da gestão.
Clélia Martins (1993) também não acredita nestas garantias e chama a
atenção para as intenções ocultas nestas políticas.
[...] em muitos casos, as intenções dessa defesa mais ocultam a pouca
vontade do Estado de assegurar recursos públicos para o ensino
elementar do que propriamente traduzem interesses verdadeiros relativos
à melhoria da qualidade de ensino por meio da participação (MARTINS,
1993, p.30).
Fernando Henrique Cardoso (1998, p.06) denominou de “onda rosa” esse
novo movimento, que se traduziria pela “ânsia por novas formas de solidariedade
que minimizem os efeitos desagregadores da precarização do trabalho [...] e da
pouca atenção às questões sociais [...] contemporâneas”. A cidadania para o
PDRAE é entendida apenas como a participação solidária da comunidade nas
políticas sociais. A participação da comunidade na escola passou a ser concebida
não mais com o objetivo da melhoria do processo educacional, e sim, como um
instrumento na captação de recursos ou mera técnica administrativa. Esta
concepção alterou o verdadeiro sentido da luta pela democratização da gestão
educacional.
82
Vista desta forma, a descentralização também foi reivindicada por vários
setores da educação
55
no final da década de 1970 e na década de 1980, porém
estes setores almejavam a democratização dos mecanismos decisórios
(MENEZES, 2001) e não a desconcentração da execução e o repasse de
responsabilidades, ou seja, a desobrigação do Estado.
Segundo Vera Peroni (2003, p.181), “constatamos que o conteúdo da
descentralização é construído no embate entre forças que defendem projetos de
sociedade e de educação antagônicos”. Portanto, o sentido do termo
“descentralização” é definido pelo tipo de projeto de sociedade em evidência no
momento histórico, que, neste caso, eram os organismos internacionais e os
setores que acreditavam na reforma do Estado.
O outro conceito inserido nas políticas educacionais por meio do PDRAE e
também dos documentos do Banco Mundial foi o de “quase-mercado”, advindo do
receituário neoliberal. Segundo a perspectiva da Escola de Chicago, a reforma
educacional instituiu ao ensino público uma administração gerencial, pois, de
acordo com esta corrente neoliberal, os setores em que a privatização não levaria
à livre concorrência, deveriam levar um “choque de mercado” (ADRIÃO &
PERONI, 2005, p. 140), definido como a inserção de um “quase-mercado”.
Sendo a educação pública um desses setores, a introdução do “quase-
mercado” era imprescindível para o sucesso da reforma. O “quase-mercado” se
caracterizaria pela “proposição adequada àquelas organizações que, embora não
pudessem integrar o mercado, disputariam no mercado [...] vantagens adicionais
como condição para o aumento de sua eficiência” (ADRIÃO, 2001, apud ADRIÃO
& PERONI, 2005, p.140).
Sendo assim, a estratégia é investir na qualidade e na eficiência. Eleitas
como valores universais, estes dois conceitos significam “satisfação do cliente”.
Conforme Christian Laval (2004), a concepção de eficácia que foi imposta
progressivamente na educação, é sempre mensurável, relacionando-se com
55
Especialmente pelo grupo que fazia parte do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública.
83
dispositivos, técnicas e métodos padronizados e reprodutíveis em grande escala,
supondo uma comparação dos resultados obtidos.
Nesta perspectiva, todos envolvidos na educação são clientes: professores,
pais, alunos, etc. Segundo Dalila Oliveira (1994, p.99), esta situação revela que
“[...] o conflito Capital e Trabalho é camuflado, uma vez que a relação nega o seu
real espaço – a produção – e localiza-se no mercado – onde todos são
consumidores”. Portanto, este mecanismo oculta a desigualdade na relação
produtiva, onde há a supressão do termo produtor por consumidor/cliente (Idem).
Para a superação da gestão estatal – centralizada – burocrática –
ineficiente foram introduzidas “concepções de gestão privada nas instituições
públicas sem alterar a propriedade das mesmas” (OLIVEIRA & SOUZA 2003,
p.876). Deste modo, a responsabilidade da gestão permanece com a esfera
estatal, porém sob outra lógica, uma lógica mercadológica, de eficiência e de
resultados, fazendo simulações do mercado dentro das instituições públicas,
modernizando-as.
Sobre esta lógica privada, Christian Laval
56
(2004) afirma que a
administração escolar
[...] buscou assimilar os modos de gerenciamento do setor privado e
definiu uma via de “reforma da escola” que tem como referência a
empresa e cujo princípio consiste na analogia sistemática com o mundo
econômico, sua organização, seus modos de avaliação, sua
produtividade (LAVAL, 2004, p.202).
Para Christian Laval, o padrão de referência é a empresa; além de simular
o mercado, a escola deverá atuar em conformidade com o mundo globalizado,
onde a produtividade e a eficiência são palavras-chave da modernidade. É
importante salientar que este padrão de referência surgiu em meados da década
56
Christian Laval é professor de ciências econômicas e sociais num colégio parisiense; também é
muito atuante num sindicato de docentes, membro da importante Federação dos Sindicatos
Unificados (FSU). Em seu livro “A escola não é uma empresa: o neo-liberalismo em ataque ao
ensino público”, Christian Laval analisa as reformas instituídas a partir de 1990 na França e as
suas influências no sistema público de ensino francês.
84
de 1970, onde o modelo empresarial já era visto como o melhor. No entanto,
apesar de manter os mesmos parâmetros, nesta perspectiva atual questões como
eficiência, racionalização de recursos financeiros e humanos, assim como a
qualidade total agregam este novo padrão. Definindo novas estratégias a serem
utilizadas para a efetivação deste modelo. Para David Osborne e Ted Gaebler
(1995),
[...] as empresas passaram a última década promovendo mudanças
revolucionárias: descentralizando a autoridade, reduzindo a hierarquia,
privilegiando a qualidade, aproximando-se dos clientes – tudo isso num
esforço para manter sua competitividade no novo mercado global
(OSBORNE & GAEBLER, 1995, p.13).
Sendo assim, a gestão pautada na empresa revela uma continuidade,
porém agrega novos conceitos e ressignifica outros: como a “democratização”.
Diante destas idéias, Licínio Lima (2002) faz a seguinte crítica:
[...] o discurso da democratização não é completamente afastado, mas
antes reconvertido e subordinado à ideologia da modernização, e com ela
compatibilizado, dados os elevados ganhos simbólicos e de legitimidade
que daí provêm. Neste sentido, as prioridades políticas tendem a ser
estabelecidas em função da segunda, e não do primeiro, ao mesmo
tempo que se constrói uma nova semântica da modernização que
permite utilizar as mesmas palavras (democratização, participação,
autonomia, descentralização, justiça social, etc.) com novos significados
(LIMA, 2002, p.22).
O autor afirma que a perspectiva de modernização faz ressurgir as teorias
organizacionais clássicas. A autonomia torna-se um instrumento de construção da
cultura da empresa; a descentralização respeita a liberdade individual e garante a
eficiência; a participação é reduzida a uma técnica de gestão, fator de coesão e
consenso (Idem).
Todas as correntes apresentadas no capítulo anterior deste novo padrão de
gestão pública se complementam. Estas correntes influenciaram as políticas de
gestão da educação
57
, daí a sua relevância para o entendimento das mesmas.
57
Conforme Eneida Oto Shiroma (2006), a filiação da reforma educacional brasileira à reforma
educacional britânica pode ser observada pelas ações desenvolvidas pelo CONSED, coordenador
85
David Osborne e Ted Gaebler (1995) colocam que essas novas formas de
administração surgiram diante da necessidade de qualificar os serviços prestados
à sociedade civil, pois “[...] precisamos de melhor governo” (Idem, p.25) e não
mais ou menos governo, por isso a solução encontrada foi a instituição da lógica
privada no serviço público, fixando o “quase-mercado”.
Para Jarbas Santos Vieira (2004), nesta perspectiva, a escola
[...] deve incorporar uma lógica, um discurso e uma orientação
conectados à modernização e à melhoria dos seus processos de gestão,
de acordo com as exigências do mercado. Esta é a questão chave: os
novos desafios sociais e econômicos somente podem ser alcançados
com uma nova concepção de gestão, não mais reduzida à idéia de
administração de recursos e/ou organização da produção, mas estendida
à cultura das instituições e à conduta das pessoas (VIEIRA, 2004, p.28).
Na educação, o discurso gerencialista introduziu uma nova linguagem para
promover mudanças nas formas de gestão. Segundo Eneida Oto Shiroma (2002),
embasada na ideologia técnica-burocrática, esta linguagem incorpora o discurso
participativo da transformação, do empreendedorismo, fala de planejamento
estratégico e de alcance de metas, busca transformar o servidor burocrático num
líder dinâmico, evocando imagens motivadoras, agindo na subjetividade dos
educadores. No entanto, faz com que o fracasso na gestão das escolas seja
entendido como fracasso pessoal das pessoas que nelas trabalham.
A partir desta concepção, insere-se a idéia de uma gestão educacional
voltada para a qualidade total, em que “o controle do trabalho alheio, expande-se
dos órgãos de cúpula para as relações entre os trabalhadores [...]” (PARO, 2001,
p.26). As ordens continuam vindo de cima. O objetivo principal da escola é a
aquisição do maior número de conhecimento, pois há uma preparação “para viver
de acordo com a ordem vigente e para exercer uma função no mercado” (Idem,
p.27).
Para Luiz Carlos Bresser Pereira (2006), esta nova forma de gestão seria
um estágio superior da administração burocrática, pois dada a complexidade dos
do Pro-Gestão no Brasil, que, junto com o British Council e a Fundação Victor Civita, promove
intercâmbios de dirigentes de escolas brasileiras e britâncias.
86
problemas modernos que os governos enfrentam em um mundo de rápidas
mudanças, a eficiência é fator essencial para sua resolução. Este novo padrão de
gestão pública coloca o discurso neoliberal como o único capaz de superar os
problemas da educação.
Este pluralismo organizacional trata a educação como um negócio e, como
tal, sua gestão deve ser embasada nos preceitos empresariais. Os governos, os
empresários e os intelectuais que acreditam nesta perspectiva gerencial para
educação alinham-se com as idéias neoliberais e demonstram profunda
incompreensão do ato de “educar”.
Não podemos gerir uma instituição pública educacional como uma empresa
que visa ao lucro. A educação não é uma mercadoria, e a competição não traz
benefícios, pelo contrário, só dificulta o processo de cooperação e de participação
da comunidade.
Em relação à gestão educacional, a legislação existente demonstra uma
preocupação com a participação da comunidade escolar e o controle social para
tornar a gestão mais transparente e eficiente. A implantação de mecanismos de
“quase-mercado”, com a inserção de uma esfera “pública não-estatal”, não deixa
dúvidas das tendências que os últimos governos tiveram para com a educação, ou
seja, a adequação da educação pública com as leis de mercado.
Para compreendermos de que forma as medidas do PDRAE e as diretrizes
propostas pelo Banco Mundial
58
incidiram na educação, é necessário remetermo-
nos à gestão da escola pública. A gestão democrática da escola pública, a partir
da Constituição Federal de 1988 foi estimulada pela maioria dos governos
59
, tanto
aqueles que obtinham propostas democráticas quanto aqueles que se utilizavam
deste discurso para conseguir alguma legitimidade social.
A descentralização da execução, a autonomia da escola para a captação de
recursos, a mudança na lógica de gestão, juntamente com a inserção de uma
nova esfera nas escolas surgem como medidas do governo de Fernando Henrique
58
As diretrizes do Banco Mundial para a educação serão analisadas no item 2.1.4.
59
Nem todos os governos federais e estaduais estimularam à gestão democrática da educação,
porém o Estado do Rio Grande do Sul foi um importante agente na construção da política de
gestão democrática, como veremos no Capítulo III.
87
Cardoso para a superação da crise educacional. A autonomia financeira (tanto na
decisão da aplicação quanto para providenciar outras formas de arrecadação
financeira), a participação da comunidade (quando entendida para a arrecadação)
e a lógica privada na gestão escolar são funcionais para esta nova perspectiva de
reformas que, no entendimento desse governo, visam ao desenvolvimento de uma
educação universal e de qualidade.
Estas medidas seguem a lógica de mercado, não superando questões
como a competição, a exclusão e a diminuição das responsabilidades do Estado
para com a população. Todas estas medidas demonstram influências neoliberais e
da terceira via, indo contra uma perspectiva de Estado que financia e executa
políticas sociais democráticas, construídas pela comunidade.
A democratização do ambiente escolar surge como condição fundamental e
iminente para uma mudança na sociedade, pois se espera que a escola construa
“a apropriação de valores de cidadania e o desenvolvimento de comportamentos
compatíveis com a colaboração recíproca entre os homens, para além das leis
naturais do mercado” (PARO, 2001, p.28). Por meio de pesquisas de campo, Vitor
Paro (2001) percebeu que foi possível reconhecer efeitos positivos em escolas
com uma gestão democrática; foi constatada uma melhoria no relacionamento
humano, pois as pessoas foram elevadas “à condição de sujeitos desse processo”
(Idem, p.29). Sobre isto, Maurício Tragtenberg in Oliveira & Rosar (2002) afirma:
A possibilidade de desvincular saber de poder, no plano escolar,
reside na criação de estruturas horizontais em que professores, alunos e
funcionários formem uma comunidade real. É um resultado que só pode
provir de muitas lutas, de vitórias setoriais, derrotas, também. [...] Sem a
escola democrática, não há regime democrático. Portanto, a
democratização da escola é fundamental e urgente, pois ela forma o
homem, o futuro cidadão (p.16).
Percebemos, portanto, que, mesmo com toda a luta pela democratização,
pela participação da comunidade escolar nas discussões sobre educação, o que
marcou a década de 1990 foram os consensos e a influência direta dos
organismos internacionais. Há uma interrupção nesse processo de
88
democratização das relações, que passam a ser regidas pelo FMI e pelo BM.
Concomitante à luta dos movimentos sociais dos anos 1980 e às influências do
Banco Mundial nos anos 1990, acontece a tramitação da nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional. Vejamos os fatos ocorridos durante este processo
de construção da principal legislação no campo educacional do Brasil.
2.1.3 O princípio de gestão democrática da educação na LDBEN/96 e no
Plano Nacional de Educação
Em meados da década de 1980, foi desencadeado o processo de
elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, a Lei
9.394 de 1996 - onde também acorreram muitos embates políticos, a exemplo da
Constituição Federal de 1988. O Projeto de LDBEN tramitou no poder legislativo
por oito anos, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988.
A LDBEN teve uma trajetória semelhante ao capítulo da educação na
CF/88; de um texto avançado, preparado a partir de idéias da academia e dos
movimentos sociais, resultou em um projeto alinhado às posições do Ministério da
Educação, apesar das mediações que acorreram. O processo de tramitação da
LDBEN foi longo, descontínuo e tumultuado (FARENZENA, 2001). Este processo
teve seu início no Poder Legislativo com o então Deputado Octávio Elísio
(PMDB/MG), que fundamentava seu Projeto (PL Nº 1.258/88) nos estudos
elaborados na XI Reunião Anual da Associação Nacional de Pesquisadores em
Educação – ANPED, realizada em Porto Alegre em 1988.
Para a sociedade brasileira, era de extrema importância o ato de traçar os
rumos da educação, encontrando dois desafios: a universalização da educação
básica e a constituição de um sistema nacional de educação, garantindo um
padrão de qualidade. A partir disto, o Projeto de LDBEN passou para a Comissão
de Educação, Cultura, Esporte e Turismo, permanecendo até 1990, sendo
aprovado na Câmara em 1993, passando para o Senado Federal. O Projeto de
LDBEN permaneceu no Senado até o ano da sua promulgação, em 1996.
89
Segundo o relator, Deputado Jorge Hage, as questões mais polêmicas
seriam o Sistema Nacional de Educação, o Fórum Nacional de Educação, o
Conselho Nacional de Educação, o regime de colaboração entre as três esferas
governamentais, a restrição do repasse de recursos públicos para as instituições
particulares, defendido pelo Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, e o
ensino religioso, o mais longo dos impasses (FARENZENA, 2001).
Um dos pontos polêmicos que ocorreram no processo de construção da
LDBEN foi a repetição do inciso VII do Artigo 206 da CF/88 no inciso VIII do Artigo
3º, “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos
sistemas de ensino. Segundo Vitor Paro (2001),
Numa sociedade que se quer democrática, é possível, a pretexto de
se garantir a liberdade de ensino à iniciativa privada, pensar-se que a
educação – a própria atividade de atualização histórica do homem, pela
apreensão do saber – possa fazer-se sem levar em conta os princípios
democráticos? (PARO, 2001, p.54).
Percebe-se, neste ponto, a grande influência de lobbies dos interesses
privados, permitindo “que a lógica de mercado se sobreponha à razão e aos
interesses da sociedade” (Ibidem).
Outro fator que Vitor Paro (2001) nos chama a atenção são os princípios
que nortearão a gestão democrática do ensino público na educação básica.
Art. 14 – Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão
democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as
suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
I. participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto
pedagógico da escola;
II.participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares
ou equivalentes (Lei Nº 9.394/96).
Vitor Paro afirma que o artigo “é de uma pobreza sem par”, pois os
princípios são óbvios em se tratando de uma gestão construída por todas as
pessoas envolvidas num processo educativo. Ele coloca que este artigo “sequer
estabelece o caráter deliberativo que deve orientar a ação desses conselhos”
90
(Idem, p.55). A LDBEN não regulamenta os Conselhos Escolares, só os cita como
parte do processo de democratização da gestão.
Outro ponto que Vitor Paro (2001) discute é a questão da autonomia
escolar, “que deixou de estar presente apenas na fala dos educadores
progressistas para fazer parte também do discurso conservador e privatista da
educação”.
Art. 15 – Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares
públicas de educação básica que os integram progressivos graus de
autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira,
observadas as normas gerais de direito financeiro público (Lei Nº
9.394/96).
Segundo o autor, o que ocorre é a confusão entre descentralização de
poder com a desconcentração de tarefas no cotidiano escolar; “[...] no que
concerne à gestão financeira, não identificar autonomia com abandono e
privatização” (PARO, 2001, p.57). Em relação à descentralização de poder, a
participação efetiva dos destinatários dos serviços nas decisões é obrigatória,
porém não basta somente a desconcentração da execução; ela deve deter um
mínimo de poder de decisão “[...] que possa ser compartilhado com seus usuários
com a finalidade de servi-los de maneira mais efetiva” (Ibidem).
Num estudo comparativo entre o Projeto de Lei 1258/88 da Câmara dos
Deputados, o substitutivo de Darcy Ribeiro (Parecer 691/95) e o texto final
aprovado no Senado em 1996 em relação às propostas de gestão democrática,
percebe-se que o PL 1258/88 propunha que
Art.7º Parágrafo Único. A gestão democrática será definida nesta Lei e na
legislação do respectivo sistema de ensino para as instituições públicas
e, quanto às instituições privadas, conforme dispuserem os respectivos
estatutos e regimentos (PL 1258/88).
No entanto, o substitutivo de Darcy Ribeiro não colocava este tema em seu
texto, nem o texto final. Ainda em relação à gestão democrática, o PL propunha
mecanismos de gestão e formas de escolha do dirigente escolar:
91
Art.21. As instituições públicas de educação básica e as que recebem
recursos públicos para sua manutenção observarão, em sua organização
e administração, as seguintes diretrizes:
I – constituição de conselhos escolares, com representação da
comunidade;
II – obrigatoriedade de prestação de contas e divulgação de informações
referentes ao uso de recursos e qualidade dos serviços prestados;
III – avaliação do desempenho institucional;
IV – elaboração do planejamento anual da escola, de forma participativa,
valorizando a experiência da comunidade.
§ 1º Os sistemas de ensino definirão a forma de escolha dos dirigentes
das escolas públicas, admitindo-se, entre outras:
I – escolha pelo dirigente do órgão responsável pela administração da
educação;
II – escolha pela comunidade escolar;
III – concurso público;
IV – ascensão na carreira. (PL 1258/88).
Novamente o substitutivo de Darcy Ribeiro e o texto aprovado também não
fazem referência aos mecanismos de gestão democrática nem à escolha dos
dirigentes escolares. Ao contrário, fala sinteticamente sobre o tema, restringindo a
gestão democrática somente para o ensino público, ficando desta forma no texto
final.
No que diz respeito à gestão democrática, a LDBEN deixou muito a desejar,
pois a Constituição Federal de 1988, apesar de demonstrar uma postura sintética
em relação ao assunto, aprovou este princípio depois de muitos embates. A
proposta, construída coletivamente por diversas entidades educacionais,
detalhava os critérios de gestão democrática, porém muito se perdeu no
substitutivo de Darcy Ribeiro.
A LDBEN, como a lei que regulamenta a educação, repassou esta
responsabilidade para a legislação dos estados e municípios, deixando a critério
de cada estado e município brasileiro a regulamentação da gestão democrática.
Segundo Vitor Paro (2001, p.55), além de furtar-se a avançar na adequação de
importantes aspectos da gestão escolar, como a própria reestruturação do poder e
da autoridade no interior da escola, “deixava também à iniciativa de estados e
municípios cujos governos poderão ou não estar articulados com interesses
democráticos”.
92
A grande frustração com relação à regulamentação da gestão
democrática do ensino público pela LDB deriva da ausência de regras
que pelo menos acenem para uma mudança estrutural de maneira de
distribuir-se o poder e a autoridade no interior da escola. Para isso,
seria preciso que, além de uma organização calcada na colaboração
recíproca e fundada não na imposição, mas na convivência e no
diálogo, se previssem instituições e práticas que garantissem a
participação efetiva tanto dos servidores (professores e demais
funcionários) quanto dos usuários (alunos e pais) nas decisões da
escola (PARO, 2001, p.62).
A ausência de regras na LDBEN/1996 causou muita frustração em alguns
setores vinculados à educação, pois foram anos de tramitação com muitas
discussões, impasses e embates. Mesmo com esta ausência, alguns estados não
se furtaram desta prerrogativa e construíram a sua legislação para regulamentar a
gestão democrática da educação.
No Rio Grande do Sul, a lei que regulamenta a gestão democrática foi
construída apenas em 1995, seis anos após a Constituição Estadual instituir a
gestão democrática como princípio educacional (Art. 197, VI). Esta lei foi
promulgada no governo de Antônio Britto.
Quase uma década após a CF/1988 e um ano após a LDBEN/1996, a
correlação de forças entre os movimentos em prol da escola pública e os setores
privatistas e governamentais continuava. Segundo João Baptista Bastos (2001),
esta correlação de forças seria representada por dois Planos Nacionais de
Educação: um da sociedade civil – proposta democrática de massas e outro do
governo – proposta liberal corporativa, sendo que o plano aprovado pelo
congresso foi o governamental.
O Art. 87, §1º da LDBEN, estabeleceu a construção de um Plano Nacional
de Educação – PNE que deveria ser definido no prazo máximo de um ano, a partir
da sua publicação, o encaminhamento ao Congresso Nacional de um Plano
Nacional de Educação com diretrizes e metas a serem cumpridas nos dez anos
seguintes, de acordo com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos.
O Plano Nacional de Educação Proposta da sociedade brasileira foi
organizado por meio de diversos debates, sendo finalizado no “II Congresso
93
Nacional de Educação – II CONED
60
” realizado em Belo Horizonte em novembro
de 1997. Este Plano teve “[...] como horizonte a democracia e a inclusão social
[...]”, para “[...] fazer cumprir a Constituição Federal e, assim, dar curso às
transformações necessárias para melhorar a qualidade de vida da maioria da
população [...]” (PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÂO – proposta da sociedade
brasileira 1997, p.03). No que diz respeito à gestão democrática, o Plano defende
que:
A gestão deve estar inserida no processo de relação da instituição
educacional com a sociedade, de tal forma a possibilitar aos seus
agentes a utilização de mecanismos de construção e de conquista da
qualidade social na educação (Idem, p.49).
O Plano Nacional de Educação – Proposta da sociedade brasileira
61
resgata a luta pela democratização da educação e a construção de um Estado
democrático. Para isto, o Plano recuperou o Fórum Nacional de Educação como
instância deliberativa do Sistema Nacional de Educação e os Conselhos
(escolares e universitários) como instrumentos de gestão democrática, a fim de
uma “instituição educacional pública como um espaço de direito” (PNE –
Sociedade Civil, 1997, p.50), conquistado através de diversas lutas dos
educadores e da sociedade civil.
O Plano defende que a gestão da educação tenha uma relação aberta com
a sociedade e que as práticas sejam participativas e o poder seja descentralizado,
pois “a socialização das decisões desencadeia um permanente exercício de
conquista da cidadania” (Idem, p.49).
Como principais mecanismos para a efetivação de uma gestão democrática
da educação estariam a composição de conselhos (Conselho Escolar dentro da
escola e os Conselhos Municipais e Estaduais de Educação para os respectivos
60
Os Congressos Nacionais de Educação CONED são organizados pelo Fórum Nacional em
Defesa da Escola Pública com o objetivo de mobilizar a sociedade civil para propor e exigir ações
governamentais em defesa da educação pública, gratuita, laica, democrática e de qualidade social.
61
Apresentado pelo Deputado Federal Ivan Valente (PT/ São Paulo) e outros.
94
sistemas) que devem ser participativos e representativos dos segmentos sociais;
a eleição direta para diretor; a construção de um Projeto Político-Pedagógico
participativo garantindo o trabalho coletivo de todos os segmentos da
comunidade e a realização de uma avaliação interna e externa, baseadas nos
recursos, na organização e nas condições de trabalho
62
.
Segundo Melânia Rodrigues (2004), o PNE da sociedade civil prevê a
instauração dos seguintes mecanismos na democratização da gestão para as
instituições:
Quadro I – Mecanismos de gestão democrática para o PNE –
Sociedade Civil
Instituições Mecanismos para a gestão
democrática
De Formação profissional Conselhos Paritários
De Educação básica Eleições diretas e paritárias de dirigentes e
Conselhos Escolares deliberativos e
paritários.
De ensino superior Eleições diretas e paritárias de dirigentes,
Conselhos Sociais e órgãos decisórios
paritários.
Quadro elaborado por Josiane Carolina Soares Ramos do Amaral.
Através destes mecanismos, o PNE – proposta da sociedade civil
acreditava na inserção e na manutenção da gestão democrática como fator de
qualificação do processo educativo, assumindo “[...] a garantia e o incentivo às
organizações tanto dos estudantes da educação básica quanto dos trabalhadores
em educação” (RODRIGUES, 2004, p.135).
Já, o Plano Nacional de Educação, proposto pelo poder executivo,
percorreu um caminho diferente do PNE – Proposta da sociedade civil. Mesmo
62
Na reivindicação destes princípios, as entidades nacionais de trabalhadores da educação,
estudantes, pais, pesquisadores e entidades educacionais foram articulados por meio do Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública na busca de uma participação da comunidade escolar e da
sociedade civil na construção das políticas educacionais em nível municipal, estadual e federal.
95
com a proposta da sociedade já sistematizada, prevaleceu a mesma postura
autocrática revelada na tramitação do projeto de LDBEN, desprezando os debates
públicos. Apesar de esta proposta fazer referência a consultas realizadas para a
construção do plano a entidades como o CONSED e a UNDIME, o processo
decisório ficou ao encargo do MEC.
O Plano aprovado
63
estabeleceu que o espaço de definição dos rumos da
educação brasileira fosse o MEC, impedindo qualquer tipo de participação da
sociedade. As propostas de composição do Sistema Nacional de Educação e do
Fórum Nacional de Educação foram retiradas, desarticulando e fragilizando os
sistemas de ensino e, conseqüentemente, a democratização da gestão.
Em termos de gestão da educação, o Plano proposto pelo governo de
Fernando Henrique Cardoso, coordenado pelo Ministro da Educação Paulo
Renato de Souza, teve como objetivo a racionalização de recursos e o estímulo à
produtividade. De acordo com a proposta do Executivo, a prioridade encontra-se
“[...] na promoção de uma gestão eficiente e eficaz dos recursos disponíveis” (PNE
– Proposta do Executivo, 1998).
Conforme o Plano, o gerenciamento educacional seria baseado na
transparência da gestão dos recursos financeiros e no controle social como fatores
de otimização do processo democrático. Para a efetivação deste controle social, o
Plano determinava que a descentralização fosse instituída, “[...] através de uma
maior autonomia das escolas, às quais devem ser repassados, automaticamente,
os recursos necessários à manutenção do cotidiano escolar” (Idem). A
materialização desta autonomia, controle social e eficiência seria proveniente pelo
PDRAE das organizações “públicas não-estatais” ou Unidades Executoras.
Todos estes embates políticos, advindos do próprio processo de tramitação
da LDBEN, assim como as políticas educacionais implantadas neste período,
mostram que, apesar de algumas vitórias com o atendimento de algumas
reivindicações dos setores mais progressistas na área da educação, também
sofremos muitas perdas significativas. A busca por uma gestão democrática da
63
Lei Nº 10.172/01.
96
educação foi uma vitória importante, porém deu margem a diversas
interpretações, conforme os interesses dos grupos que estão no poder.
2.1.4 Políticas de gestão da educação e os organismos internacionais
Sobre as propostas para a educação dos organismos internacionais, Fúlvia
Rosemberg (2000) afirma que estas proposições direcionadas para o Brasil e para
a América Latina são inadequadas, pois não contextualizam as demandas aqui
encontradas. E, ainda, estas propostas do Banco Mundial somente serão
materializadas com uma “contrapartida”, mais conhecida como “toma lá, dá cá”
(Idem), ou seja, para que o financiamento seja colocado em prática são impostas
algumas condições prévias na área econômica, com o objetivo de um
desenvolvimento econômico eficaz. Este desenvolvimento econômico está
vinculado aos fatores sociais, como a educação.
Segundo Jon Lauglo (1997), por meio do FMI, o Banco Mundial exerce
grande influência na política macroeconômica e conseqüentemente acaba
influenciando a política educacional dos países que reivindicaram os seus
empréstimos. Sérgio Haddad (1998, p.43) coloca que os documentos do BIRD e
do BID “revelam uma clara aprovação das políticas de ajuste e desenvolvimento
realizadas pelo atual governo brasileiro”. Estas manifestações de apoio ao que
está sendo proposto e desenvolvido no Brasil em relação ao plano político,
econômico e social fazem com que o país se integre cada vez mais à economia
global, segundo os organismos e o grupo de poder.
Referindo-se ao ministro da Educação na época, Sérgio Haddad (1998)
afirma:
O atual ministro da Educação Paulo Renato, economista, com
trajetória anterior nos organismos multilaterais e experiência no Executivo
do setor público da educação [...]. Está absolutamente alinhado com as
diretrizes mais gerais de reforma do Estado e apoio à iniciativa privada
(HADDAD, 1998, p.46).
97
Com isso, em meio ao governo de Fernando Henrique Cardoso na
presidência da república e de Paulo Renato no Ministério da Educação, foi
construído, em 1996, um relatório sobre as diretrizes para a educação pelo Banco
Mundial intitulado “Prioridades e Estrategias para la Educación”. Este documento
construído pelo Banco é um documento político, cujos principais atores estão no
próprio Banco (Idem).
Os documentos do Banco Mundial se baseiam em estudos e pesquisas
internos, em que a seleção de temas e as avaliações estão sempre de acordo com
as idéias do Banco. Jon Lauglo (1997, p.29) diz que o Banco “estará predisposto a
assimilar aqueles resultados que não contradigam sua orientação geral favorável
aos mercados, ao desenvolvimento dos setores modernos e ao Estado centrado
na aprendizagem”.
Segundo o relatório “Prioridades e Estrategias para la Educación”, os
países em desenvolvimento, principalmente os da América Latina, encontram-se
num período de sérios problemas educacionais, com uma grande escassez de
recursos, com baixa qualidade do ensino, com o acesso discriminatório, com a
distribuição inadequada e com o aumento do número de analfabetos (LAUGLO,
1997).
Portanto, para solucionar estes problemas, o Banco Mundial estabeleceu
um planejamento com o objetivo de aumentar a qualidade do ensino e da
aprendizagem, assim como o aumento do financiamento para a educação e o
acesso mais eqüitativo.
As propostas para a educação contidas nas políticas educacionais
desenvolvidas na década de 1990, no Brasil, vêm ao encontro do modelo
econômico derivado do Banco Mundial. Por isso, no “plano das políticas públicas,
a atuação no campo da educação vem ocorrendo através de uma profunda
reforma educacional conduzida prioritariamente pelo governo federal, produzindo
impactos no plano estadual e municipal” (HADDAD, 1998, p.47).
O Brasil claramente adotou uma nova visão de desenvolvimento –
incorporando reformas para o crescimento estável e sustentado, com
98
redução da pobreza e o aumento da eqüidade – que está sendo
fortemente traduzido na agenda de políticas de uma administração cujos
resultados econômicos são os melhores de uma geração (BIRD, 1995,
apud HADDAD, 1998, P.47).
Segundo Sérgio Haddad (1998), as principais características da reforma
educativa implantada no Brasil, apoiada pelos bancos multilaterais, seriam a
focalização do gasto social com ênfase no ensino fundamental, a descentralização
por meio da municipalização, caracterizada como “[...] um jogo de empurra do que
propriamente através de uma política articulada de colaboração entre as diversas
instâncias de governo” (Idem, p.48), a privatização que, no Brasil, não seria
caracterizada pela passagem dos serviços públicos ao setor privado, mas pela
construção de um “[...] mercado de consumo de serviços educacionais, o que
ocorre pela omissão ou saída do Estado em diversos âmbitos educativos e pela
deterioração dos serviços públicos” (Idem, p.48) e, por fim, pela
desregulamentação através de ajustes na legislação e nos métodos de gestão,
com o objetivo de assegurar “[...] ao governo central o controle do sistema
educacional, particularmente mediante a fixação de parâmetros curriculares
nacionais e o desenvolvimento de sistemas de avaliação” (Idem, p.49). Ou seja, o
governo flexibiliza a gestão, repassa a execução para as comunidades locais e
tenta controlar o produto final.
No documento “Prioridades y estratégias para la educación” (BIRD, 1996), a
reforma da educação possui seis aspectos essenciais, cuja ordem de prioridade
dependerá das circunstâncias de cada país. As propostas seriam a
descentralização, visando às instituições escolares autônomas, a prioridade nos
resultados estatísticos fundados na produtividade e na competitividade, a
convocação da comunidade escolar para a participação em assuntos escolares, a
ênfase no autofinanciamento e nas formas alternativas para a captação de
recursos e ao estímulo ao setor privado (empresários e organismos não-
governamentais) como agente no âmbito educacional capaz de tomar decisões,
implementar reformas e redefinir as atribuições do Estado, visando à retirada
gradual da oferta dos serviços públicos como a educação.
99
Este documento propõe que o Estado deva implantar políticas educacionais
seguindo as leis do mercado, racionalizando os recursos e estimulando a
competitividade. O documento afirma que os aspectos acima citados dependem
da situação de cada país, porém o objetivo final seria sempre atingir todas as
metas traçadas pelo BM. De certa forma, a partir de 1995, todos estes aspectos
foram implementados no Brasil através das políticas educacionais.
Segundo as prescrições do Banco Mundial, em todos os países com estes
problemas, deve acontecer uma especificação clara dos objetivos a serem
alcançados com um maior controle de insumos e resultados (LAUGLO, 1997).
Com isso, deve ocorrer uma descentralização, ou seja, um menor gerenciamento
de estruturas burocráticas e centralizadoras para um gerenciamento por objetivos
e indicadores de resultados, por meio de um controle social.
As instituições educacionais devem ser mais autônomas, tendo “[...] menos
burocracia estatal [...] e mais flexibilidade local”, realizando um acompanhamento
direto dos seus usuários, ou de seus “clientes
64
” (LAUGLO, 1997, p.23). Com este
acompanhamento, haverá menos desvios de recursos, otimizando o processo de
gerenciamento, atendendo a demanda pelos serviços educacionais com maior
qualidade.
È importante salientar que o controle local democratiza as relações
escolares, assim como desenvolve o pensamento crítico e a cultura da
participação, porém, neste caso, as diretrizes já estão traçadas, e o controle local
vem para ajudar somente na execução das políticas e não nas decisões das
mesmas. Jon Lauglo (1997, p.24) nos mostra que o controle local nem sempre se
mostrará “[...] mais eficiente e democrático”. “Em alguns países, ‘flexibilidade’ local
pode significar mais poder patronal para aqueles que dominam a política
clientelista local” (Ibidem). O Brasil, sendo um desses países, faz com que o
controle local conceda poder maior a um determinado grupo, onde este grupo é
64
Estas idéias são encontradas no Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado, construído
por Luíz Carlos Bresser Pereira no Ministério da Administração e Reforma do Estado - MARE, no
primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso na Presidência do Brasil.
100
quem determina o quê e como deve ser feito, somente repassando para a
comunidade a execução dos serviços.
Diante de todas essas práticas, em que observamos avanços e retrocessos,
conforme as diretrizes seguidas pelos governos em determinados períodos,
concluímos primeiramente que gestão, acima de tudo, é tomada de decisão
(FERREIRA, 2001). São princípios e práticas que afirmam ou não as idéias que as
geram, porém estes princípios não são aqueles como concebia a administração
clássica
65
, mas princípios sociais, “[...] visto que a gestão da educação se destina
à promoção humana” (FERREIRA, 2001, p.306).
Com isso, no momento em que alguma política educacional se propõe a ser
democrática, ela deve promover a formação humana de cidadãos e não as idéias
inerentes ao mercado. Educar não é transmitir conhecimentos, mas conscientizar,
“[...] construir, libertar o ser humano das cadeias do determinismo neoliberal,
reconhecendo que a história é um campo aberto de possibilidades” (MÉSZÁROS,
2005, p.13). A gestão democrática deve ter como objetivo a qualidade social,
desenvolvendo o aprendizado da cidadania e da democracia.
65
Onde haveria princípios intrínsecos ao ato de gerir (FERREIRA, 2001).
101
3 A GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NA REDE ESTADUAL DE
ENSINO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (1985 – 2001)
Este capítulo tem por objetivo a contextualização do processo de
construção da gestão democrática da educação na rede estadual de ensino do Rio
Grande do Sul, fazendo relações entre as propostas governamentais e as
reivindicações da sociedade organizada. Iremos analisar os diferentes conflitos
que ocorreram neste processo, desvelando o posicionamento de cada sujeito
social que atuou no processo de co-relação de forças.
Jarbas Santos Vieira (2004) identifica dois conjuntos de reformas
educacionais propostos ou executados pelos governos locais: mudança na forma
de gestão das escolas e redes de ensino e mudança nos currículos. Para o autor,
o primeiro conjunto refere-se às políticas de descentralização, aqui entendidas
como responsabilização pela execução das instituições locais, promovendo
significativamente a introdução de modelos de gestão empresarial. O segundo
conjunto reporta-se às políticas de controle da qualidade do ensino, revelado pelas
taxas de aprovação e reprovação dos alunos.
Estes conjuntos de reformas instituíram uma cultura avaliativa, em que o
produto é controlado conforme as demandas do mercado. O alcance destes
objetivos virá, segundo os defensores destas reformas, da competitividade
(VIEIRA, 2004), mostrando-nos alguns fatores vinculados a este tipo de discurso:
Enfim, os discursos procuram mostrar, com pretensa objetividade e
clareza, a neutralidade do gesto em favor da educação. Uma
neutralidade que tem se tornado marca da empresa educadora
neoliberal, produzindo legitimidade à missão da educação para o
mercado. A neutralidade pretendida também assegura a inocência do
governante. A estratégia de inocência desses discursos é a estratégia de
inocência do mercado, servindo para justificar a retórica de dominação
neoliberal (VIEIRA, 2004, p.72).
Estes artifícios mostrados pelo autor [neutralidade e inocência] permeiam
discursos e políticas, escondendo seu cunho controlador e o privatista. No
102
decorrer deste capítulo, visualizaremos políticas que implementam uma cultura
gerencial na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul.
3.1 Caracterização do Estado do Rio Grande do Sul e da Rede Estadual de
Ensino
O estado do Rio Grande do Sul tem o seu Índice de Desenvolvimento
Humano entre os melhores do país, abrigando 6% da população brasileira em seu
território (FEE, 2004). O estado do Rio Grande do Sul possui 497 municípios e o
número de habitantes atinge o índice de 10,6 milhões; segundo o IDESE
66
,
apenas um município gaúcho é considerado de baixo desenvolvimento, sendo o
restante situado na faixa de médio desenvolvimento e alguns despontando com
alto desenvolvimento.
O estado do Rio Grande do Sul combina distribuição relativamente
equilibrada da sua renda ao alto índice de escolaridade. Junto a isso, encontram-
se outros fatores como um baixo índice de analfabetismo e a elevada expectativa
de vida, que pode chegar a 73 anos em algumas regiões do estado (LUCE, 2000).
O estado tem altos índices de industrialização, o que resulta em uma
população eminentemente urbana; possui uma considerável malha rodoviária, um
grande número de portos e aeroportos, bem como uma ótima rede de
saneamento. Seu PIB de quase 90 bilhões de reais faz com que a renda per
capita seja de cerca de 8.600 reais, considerada alta em relação aos padrões
nacionais. Sua matriz industrial é estabelecida sobre quatro grandes eixos
principais: agroindústria, em que predomina a exportação de grãos, a indústria
metal-mecânica, a indústria coureiro-calçadista e a indústria petroquímica. Tanto a
indústria metal-mecânica quanto a automobilística foram reforçadas nos últimos
anos pela vinda de montadoras de automóveis.
O Rio Grande do Sul exporta seus produtos principalmente para os Estados
Unidos, a União Européia, o Mercosul e, recentemente, o sudeste asiático.
66
O Índice de Desenvolvimento Sócio-econômico é calculado pela Fundação de Economia e
Estatística através de variáveis diversas, como educação, renda, saneamento, habitação, saúde,
etc.
103
Representa a terceira maior taxa de exportação entre os estados do país, ficando
atrás somente de São Paulo e Minas Gerais. Os produtos exportados são
calçados, soja (óleo e grãos), fumo, entre outros.
Em relação à educação pública estadual, o estado possui a Secretaria de
Educação que é organizada por departamentos. O gabinete do Secretário,
juntamente com as suas assessorias administram todos os outros departamentos.
A Secretaria é dividida em dois grandes setores: o da Superintendência da
Educação Profissional e o da Diretoria Geral. A Superintendência cuida de todos
os assuntos relativos à Educação Profissional nas escolas estaduais e a Diretoria
Geral cuida dos demais assuntos (planejamento, programas federais, ...).
Fonte: DEPLAN/SEC – 2005
SECRETÁRIA DE
ESTADO
CEED
CRD
A
SSESSORIA DE
COMUNICAÇÃO
SOCIAL
A
SSESSORIA
JURÍDICA
A
SSESSORIA
TÉCNICA
GABINETE
SUPERINTENDÊNCIA
DA EDUCAÇÃO
PROFISSIONAL
DEPARTAMENTO
ADMINISTRATIVO
DEPARTAMENTO
PLANEJAMENTO
DEPARTAMENTO
DE
COORDENAÇÃO
DAS REGIONAIS
DEPARTAMENTO
DE RECURSOS
HUMANOS
DEPARTAMENTO
PEDAGÓGICO
DEPARETAMENT
O DE DESPORTO
FADERG
S
FLSVC
DIRETORIA
GERAL
ORGANOGRAMA DA SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO
104
Para organizar as escolas estaduais, a Secretaria possui órgãos
denominados Coordenadorias Regionais de Educação (CRE), que dividem o
estado em 29 seções, cada uma sob responsabilidade de uma CRE. No ano de
2004, a Rede Estadual de Ensino do Rio Grande do Sul possuía 3.002 instituições
educacionais, atendendo 1.445.801 educandos (SIE/RS – SIED/MEC 2005) em
todas as etapas da Educação Básica.
3.2 O processo de construção da gestão democrática da educação na rede
estadual de ensino do Estado do Rio Grande do Sul
A análise das possibilidades da administração da educação como
prática educacional destinada não à manutenção, mas à construção
coletiva e organizacional da instituição educativa vinculada ao projeto
político pedagógico da escola, tendo como referencial o contexto global e
as teorias contemporâneas que valorizam a potencialidade e a
capacidade participativa do ser humano, ressignificam o valor dessa
prática, conferindo à gestão da educação uma práxis que tenderá a
superar nas organizações educacionais, as fraquezas institucionais e
humanas que resultam em exclusão, desigualdades e injustiça
(FERREIRA, 2001, p.297).
A década de 1980 foi um período de grande inquietação popular advinda do
processo de abertura política e redemocratização do país. Nesse período, no
campo educacional, houve a realização de muitas discussões sobre um projeto de
educação democrático, cuja culminância foram as diversas greves de professores.
Naquele momento, os profissionais da educação queriam discutir qual o tipo de
educação que se desejava: uma educação democrática com o objetivo de
universalização.
Como exemplo de movimento social que se mobilizou para a
democratização da educação no Rio Grande Sul, temos o Centro dos Professores
do Estado do Rio Grande do Sul / Sindicato dos Trabalhadores em Educação, ou
seja, o CPERS/Sindicato. Fundado em 1946, é a “mais forte de todas as entidades
105
de professores públicos de 1º e 2º graus” (CUNHA, 1991, p.77), tendo mais de 70
mil sócios
67
.
O
magistério tornou-se a categoria mais organizada do estado, construindo
a base sindical no Rio Grande do Sul, participando também da luta de
democratização da educação. A partir de 1976, o CPERS/Sindicato iniciou uma
discussão pública sobre as reivindicações da categoria de professores, havendo
inúmeras manifestações da comunidade a favor destas questões.
Em 1979 aconteceu a primeira greve, “[...] houve uma grande mobilização
para a época, pois estávamos em plena ditadura militar” (AZEVEDO, 2005)
[entrevista]
68
. Cerca de duas mil pessoas se reuniram para a reivindicação de seus
direitos em relação à questão salarial. Esta greve durou cerca de quinze dias e
teve 40% de paralisação da rede; tinha um amplo apoio da imprensa, pois
coincidia com a época do movimento pela anistia.
A década de 1980 mostrou-se decisiva para a construção e a efetivação da
democracia, diante de um quadro em que o governo estadual não cumprira suas
promessas de campanha; o CPERS/Sindicato pressionou com a declaração de
greve. A greve de 1980 durou 21 dias, a adesão foi quase total (MAGISTER,
ago/set 1993), conseguindo o chamado “Acordo/80”, “[...] que pretendeu garantir
as reivindicações voltadas para uma educação democrática e com estabilidade
salarial” (Idem). Esta greve foi muito importante, pois constituiu lideranças novas
dentro do CPERS/Sindicato. “Os grupos de esquerda
69
foram fortalecidos,
juntamente com a efervescência em torno da questão da educação” (AZEVEDO,
2005) [entrevista].
Em 1980 os professores conquistaram um vencimento básico equivalente a
2,5 salários mínimos que passava a vigorar em 1982; esta conquista estava
contida no “Acordo de 1980”. A partir deste acordo, foi constituída uma Comissão
Mista entre a Secretaria Estadual de Educação – SEC e o CPERS. Nesta
67
Atualmente o CPERS/Sindicato possui mais de 86 mil afiliados.
68
Quando os dados coletados por meio de entrevistas estiverem fora do corpo do texto foi adotada
a inserção de caixas de texto para diferenciá-las, quando estiverem no corpo do texto será utilizado
[entrevista].
69
Lideranças importantes foram fortalecidas, como Ênio Mânica, Clóvis de Oliveira e José Clóvis
de Azevedo (AZEVEDO, 2005) [ENTREVISTA].
106
Comissão, foram discutidas diversas reivindicações do magistério, entre elas a
participação de um representante do CPERS no Conselho Estadual de Educação
– CEED, através de indicação por lista tríplice, a participação de um conselheiro
do SINPRO-RS, 25% do orçamento do Estado para a Educação e a eleição para
diretor de escola. Esta última questão gerou um processo de negociação de mais
de dois anos.
O ano de 1980 mostra-se decisivo nesta série de lutas do magistério. O
governo não cumpre suas promessas, e a classe pressiona com a
declaração de greve em novembro. A adesão é quase total, e o
movimento consegue o Acordo/80 que pretende garantir as
reivindicações voltadas para uma educação democrática e estabilidade
salarial
70
(MAGISTER, Fev/Mar, 1985).
Mesmo antes da constituição da Comissão Mista, o CPERS fazia um amplo
debate com a categoria sobre as questões democráticas. Em abril de 1979, foi
colocado que: “[...] todo professor continua convidado a prestar depoimento sobre
a situação real da educação e, dessa forma, participar de um debate de idéias que
nortearão os resultados desta comissão e do próprio pensamento do CPERS”
(MAGISTER). Nesse período, quem integrava a Comissão Mista de Educação era:
Zilah Totta, Arete Saldanha Vargas, Edy Przybylsky, Glacy Holanda Rolim Corrêa,
Maria Fani Scheibel e Mariana Mazzaferro. Segundo José Clóvis de Azevedo
(2005) [entrevista], Conselheiro do CPERS/Sindicato na época, com esta
comissão surgiram propostas mais consistentes, aumentando a politização da
educação, visando à sua qualificação.
Em 1981, durante o processo de negociação da Comissão Mista, o
magistério defendeu a eleição uninominal dos diretores somente com a
participação dos professores (BULHÕES & ABREU, 1992). Em 1982, o magistério
modificou o seu posicionamento, aceitando a lista tríplice, com a participação dos
segmentos da comunidade escolar na eleição, “ainda que com 1/3 dos votos”
(Idem, p.46).
70
Conforme o Magister (Fev/Mar, 1985), em 1980 acontece o primeiro Encontro Estadual da
Educação promovido pelo CPERS/Sindicato com o tema “Ensino e Democracia”. O CPERS
intermediou o diálogo entre professores e Governo Estadual.
107
Quem assumiu o governo do Estado do Rio Grande do Sul a partir de 1983
foi Jair Soares
71
. O seu Plano de Governo demonstrava que já se tinha uma
proposta de governo mais aberta à participação da comunidade escolar. Em
termos de administração da educação, já se pretendia realizar uma discussão com
os diferentes setores da comunidade escolar sobre as suas verdadeiras
necessidades (PLANO DE GOVERNO JAIR SOARES, 1983-1987, p.145).
Em julho de 1983, a professora Zilah Totta
72
, juntamente com a Comissão
Mista, entregou ao Secretário de Educação Francisco Salzano Vieira da Cunha o
anteprojeto para a eleição de diretor, assim como as justificativas para a aceitação
do mesmo. As principais justificativas seriam a constante busca do
aperfeiçoamento educacional e a decisão unânime do magistério gaúcho e
ressaltava-se a “[...] contribuição que essa eleição, realizada pela comunidade,
professores – alunos – funcionários – pais, trará para o aperfeiçoamento do
processo educacional e para o aprendizado da prática democrática” (MAGISTER,
Ago, 1983).
A partir 1984, o CPERS/Sindicato intensificou a sua luta, onde as questões
prioritárias seriam: o cumprimento dos 2,5 salários mínimos de vencimento básico,
o reajuste semestral, o 13º salário, os 25% do orçamento do estado para a
Educação e a eleição dos diretores de escolas “[...] nos termos do projeto da
Comissão Mista SEC – CPERS” (BULHÕES & ABREU, 1992, p.48). A eleição
para diretor foi fortalecida e prioritária devido à “Campanha das Diretas”. Estas
questões tornaram-se centrais na greve de 1985.
Em 1985, o magistério gaúcho realizou uma greve que durou sessenta dias
e obteve amplo apoio da comunidade escolar (Grêmios Estudantis, Associação de
CPMs de Porto Alegre). Segundo Jocelim Azambuja, presidente da Associação de
CPMs – ACPM/Federação de Porto Alegre:
Se os professores não tiveram vitórias no plano econômico à altura
do que mereciam, conseguiram vitórias que serão insuperáveis até o
resto de nossos dias. Vai ficar na História que, a partir de 1985, houve
71
Eleito para Governador do Estado do Rio Grande do Sul em 1982, por meio de eleições diretas,
pelo PDS com 34, 09% dos votos (NOLL & TRINDADE, 2004).
72
Então Presidente da CPERS/Sindicato de1981 – 1984.
108
uma grande transformação no Estado do Rio Grande do Sul, não
provocada por autoridades ou por algum governador, mas pela
comunidade de professores e pais (MAGISTER, jul/ago 1985).
Esta greve assegurou as reivindicações a favor da democratização da
educação, resultando na aprovação da Lei 8.025, que dispunha sobre a eleição
para diretor e da Lei 8.026, que tratava sobre vantagens do Magistério Público
Estadual, instituía o 13º vencimento e considerava como efetivo exercício os dias
em que os professores participaram do movimento reivindicatório, ambas do dia
14 de agosto de 1985, sob o governo de Jair Soares. De acordo com José Clóvis
de Azevedo (2005) [entrevista], esta greve foi a mais consistente, pois tinha
propostas e as discutia com a comunidade escolar, dialogando com a qualidade
de ensino.
Iniciou-se aí o processo de normatização da gestão democrática no estado
do Rio Grande do Sul, ainda que timidamente. Segundo Lúcia Camini (2004)
[entrevista], “estas leis foram promulgadas por meio das pressões do
CPERS/Sindicato”.
Em 1985, ampliaram-se as liberdades de manifestação política com a
instalação da Nova República e, em 1986, iniciava-se o processo de
reorganização institucional, com a convocação da Assembléia Nacional
Constituinte (BULHÕES & ABREU, 1992, p. 48).
O governo Jair Soares fez a primeira tentativa de um atendimento às
demandas, necessidades e peculiaridades de cada região, município e escola
para a elevação da sua qualidade, é o que mostra seu Plano de Governo (1983 –
1987). O seu Plano de governo demonstra a tentativa de criar condições para a
participação da comunidade, porém de uma forma tímida e não detalhada dos
mecanismos a serem utilizados. Um dos objetivos principais para a educação era
“[...] exercer a administração co-participada, com a audiência de entidades
públicas e privadas, representativas de diferentes segmentos da comunidade nos
assuntos da educação, [...] nos níveis de decisão e execução” (PLANO DE
GOVERNO JAIR SOARES, 1983 – 1987, p.145).
109
Desse modo, pretende-se criar condições à população escolar e à
comunidade em geral, para que possam exercer o direito de participação
efetiva no processo de desenvolvimento do indivíduo e da sociedade,
assegurando-lhes a ampliação das oportunidades, através do
entrosamento da educação, da cultura e do desporto, em termos de:
acesso, percurso, qualidade do processo educacional (PLANO DE
GOVERNO, 1983, p.137).
Como exemplo desta tímida iniciativa, juntamente com a pressão do
Sindicato dos Professores, temos a lei 8.025/85 que estabelecia as normas para a
escolha de diretores nas escolas estaduais por meio de uma lista tríplice: a escola
elegia três nomes, e a Secretaria de Educação nomeava um deles. Segundo Iara
Wortmann (2005) [entrevista], “quase sempre o escolhido pela Secretaria de
Educação era o mais votado na comunidade”. O mandato do diretor correspondia
ao período de três anos. A votação da lista tríplice era feita pela comunidade
escolar (50% pais e alunos, 50% magistério e servidores) e, para o direito ao voto,
os alunos deveriam ter, como idade mínima, 14 anos.
Portanto, apesar da pressão dos movimentos vinculados à educação e das
reivindicações para a abertura política do país, o estado do Rio Grande do Sul
obteve uma pequena, lenta e conturbada abertura política e democrática na
educação, mesmo sendo um dos primeiros estados a regulamentar a escolha para
o dirigente escolar.
Para Maria da Graça Bulhões e Mariza Abreu (1992, p.55) no período 1981-
1986 o governo do Estado “[...] não reconhecia a legitimidade do conflito social e
do movimento, nem a negociação como caminho de solução para os conflitos
existentes na sociedade”. Tanto a questão salarial quanto a questão educacional
foram discutidas por meio de muitas pressões, e, em relação à democratização da
educação, “[...] o Governo mostrou-se muito mais resistente” (Idem, p.56). Apesar
do acordo realizado em 1980, das discussões da Comissão Mista, da entrega do
anteprojeto em 1983 para o Secretário da Educação, somente em 1985 seria
conquistada a Lei 8.025.
Em 1987 foi deflagrada mais uma greve. Esta greve durou noventa e seis
dias, foi a maior greve já feita. Nessa greve o CPERS/Sindicato construiu
110
estratégias ousadas, montando até mesmo um acampamento em frente ao
Palácio Pitratini
73
.
Em 1988 – 1989, houve a Constituinte estadual, em que o Fórum Gaúcho
em Defesa da Escola Pública – FGDEP atuou na articulação da discussão para a
construção da Lei. A Constituinte Estadual funcionou com a mesma dinâmica da
Constituinte Federal, ou seja, escutando e realizando debates com os diferentes
setores vinculados à educação.
Para a construção do texto legal, cada emenda popular necessitava de três
assinaturas de entidades que compunham o Fórum. A Universidade Federal do
Rio Grande do Sul era uma grande articuladora. Na verdade, as pautas nacionais
foram recolocadas na discussão estadual e havia consenso das entidades sobre a
maioria das questões. Segundo Maria Beatriz Moreira Luce (2006) [entrevista],
professora da UFRGS, membro do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública
representando a ADURGS, participante da Constituinte Federal e primeira
Presidente do Fórum Gaúcho em Defesa da Escola Pública, “[...] em alguns
momentos apareciam questões mais corporativas de uma ou outra entidade, que
mobilizavam mais uma ou outra instituição [...]”, no entanto todas as instituições
participaram, e o CPERS/Sindicato foi muito atuante neste processo [entrevista].
Em 1987 assume o governo do Estado do Rio Grande do Sul Pedro Simon
(PMDB). Como estratégia administrativa, o seu Plano de governo deixa claro que:
Nada é mais urgente do que a modernização do setor público;
entende-se como tal o seu integral reordenamento através de métodos e
processo de trabalho que lhe dêem transparência e eficiência.
Transparência, para que sejam permitidos controles sociais efetivos, e
eficiência, para que, reduzindo seus custos, se liberem recursos para
financiar os serviços que estão faltando (DIRETRIZES DE AÇÃO PEDRO
SIMON 1987 – 1991, p.30).
73
Sede do governo do estado do Rio Grande do Sul.
111
Portanto, esta diretriz demonstra a crença por parte do governo de
modernização do aparato administrativo público por meio da diminuição de custos,
obtendo diferentes entendimentos de descentralização e participação. Conforme
as Diretrizes da Ação de Pedro Simon (1987 – 1991), a descentralização é
entendida como a transferência de tarefas e recursos para as prefeituras, iniciando
um processo de municipalização. E a participação, um simples mecanismo que
envolve os setores da sociedade interessados na solução de problemas, criando
conselhos regionais e locais para a discussão destes (Idem).
A partir da década de 1990, com a pressão do CPERS/Sindicato,
juntamente com a ACPM/Federação e UGES em prol de uma gestão mais
democrática da educação no estado do Rio Grande do Sul, em 13 de fevereiro de
1991 foi implantada a Lei 9.233/91, sob o governo de Sinval Guazelli
74
. Esta lei
regulamentava a eleição de diretores nas escolas públicas estaduais.
Segundo esta lei, o diretor e o vice-diretor deveriam ser eleitos pela
comunidade escolar via eleição direta e uninominal por chapas. Estas chapas
corresponderiam à composição da direção prevista no regimento de cada escola.
O mandato do diretor continuava sendo de três anos, a idade mínima para um
aluno votar era 14 anos, continuava o respeito à proporcionalidade de 50% para
pais e alunos e 50% para o magistério e funcionários. Essa modificação em
relação à lei anterior – da eleição por meio de chapas – conferiu maior grau de
abertura democrática na escola.
Esta abertura também foi caracterizada pela Lei 9.232/91, também de 13 de
fevereiro de 1991, que regulamentava e instituía os Conselhos Escolares.
Segundo esta lei “os Conselhos Escolares terão funções consultiva, deliberativa e
fiscalizadoras constituindo-se no órgão máximo de discussão ao nível de escola”
(Art.2º).
O Conselho Escolar era composto pelo Diretor, professores, alunos, pais e
funcionários de escola. As atribuições dos Conselhos Escolares eram a
elaboração do seu regimento, a modificação e aprovação do Plano Anual
74
Eleito pelo PMDB como Vice-Governador do estado do Rio Grande do Sul em 1986, ficou no
lugar de Pedro Simon (PMDB) que saiu de seu cargo para candidatar-se ao Senado.
112
formulado pela direção, a criação e garantia de mecanismos de participação
efetiva e democrática da comunidade escolar na definição do projeto político-
administrativo pedagógico da unidade escolar, a escolha, num prazo de dez dias,
de uma das três pessoas indicadas pelo diretor da escola para ser o vice-diretor, a
divulgação periódica e sistemática de informações referentes aos recursos
financeiros, a coordenação do processo de discussão, elaboração ou alteração do
regimento escolar, a convocação de assembléias dos segmentos da comunidade
escolar, o encaminhamento à autoridade competente de proposta para instrução
de sindicância para os fins de destituição de diretor ou vice-diretor da escola e a
recorrência a instâncias superiores sobre decisões a que não se julgar apto a
decidir.
Segundo Flávia Obino Werle (2003):
[...] o Conselho Escolar é um local de desprendimento, gratuidade e
desenvolvimento do espírito público [...]; compreende em si uma
dimensão de dinamização da gestão escolar, por considerar os
componentes da comunidade escolar agentes de gestão e planejamento
da educação (p.12).
Com a regulamentação do Conselho Escolar, o estado do Rio Grande do
Sul obteve grandes avanços democráticos, pois, sendo um espaço de relações de
poder, “ocorrem aprendizagens vivenciais de democracia e participação” (Ibidem),
importantes para a constituição de uma sociedade mais justa.
A Lei 9.233/91 foi aprovada no final do mandato de Sinval Guazelli, este
encerrado em 15 de março de 1991; logo após assume o governo do Estado do
Rio Grande do Sul Alceu Collares
75
, e Neuza Canabarro assume a Secretaria de
Educação.
De acordo com o Plano de governo de Alceu Collares, a administração
pública seria desenvolvida com a participação da população por meio de
Conselhos Regionais de Desenvolvimento – COREDES. Esses COREDES
fundamentavam-se nas idéias de descentralização política, desconcentração
75
Eleito em 1990 pelo PDT, foi para o segundo turno com Nelson Marchezan (PDS) e eleito com
45, 66% dos votos (NOLL & TRINDADE, 2004).
113
econômica e integração regional. Esses Conselhos teriam a representação de
diversos segmentos sociais presentes em cada região, tais como representação
política, empresarial, universitária, cooperativista, sindicatos, igrejas, etc
(PROJETO “POVO GRANDE DO SUL” ALCEU COLLARES 1991-1994).
Para a educação, as propostas estariam no reaproveitamento integral dos
espaços escolares (Calendário Rotativo), na constituição dos Centros Integrados
de Educação Popular – CIEPs e em Projetos Especiais. Estes projetos
envolveriam meninos de rua, educação indígena, educação nos assentamentos
agrícolas, atendimento ao idoso, inclusão de língua estrangeira nas séries iniciais,
educação ecológica, Conselhos Escolares e C.P.M e ensino noturno (Idem).
Conforme a legislação vigente, a eleição para diretor deveria ocorrer no
final de 1991. Em 5 de junho de 1991, instituiu-se a Lei 9.263. Esta Lei alterava a
anterior em alguns aspectos: a eleição continuava a ser direta, porém sem
chapas; diminuía a idade mínima para votar (12 anos). No entanto, segundo a
Secretária Neuza Canabarro (2005):
Diante desse acontecimento
76
, houve uma reunião entre a secretária de
educação e os representantes deste movimento, em que os mesmos
reivindicavam uma administração independente; o Estado somente repassaria os
recursos financeiros (CANABARRO, 2005) [entrevista]. Com isso, o governador do
estado argüiu a inconstitucionalidade das Leis 9.233/91 e 9.263/91, embasando-se
no §1º do Art. 213 da Constituição Estadual, que falava que os diretores das
76
A ata desta reunião foi procurada, no entanto, conforme Aquilino Girardi (2006) [entrevista], atual
presidente da ADERGS, essa reunião no Colégio Júlio de Castilhos teria ocorrido, porém os
materiais desse período não se encontravam na sede da Associação dos Administradores de
Educação do Rio Grande do Sul. De acordo com o presidente da entidade, esses materiais ficaram
sob os cuidados da ex-presidente da ADERGS Marlú Carvalho Simões (presidente do período em
questão). Tentei entrar em contato com a mesma, porém não consegui encontrá-la.
[...] essa era uma tese [eleição de diretor] que eu defendia e eu fui surpreendida [...]
com um grupo de diretores e representantes do CPERS que foram no meu gabinete,
onde me entregaram um ofício, com o qual eles me comunicavam que, em reunião no
auditório do Colégio Júlio de Castilhos, haviam decidido a Associação dos diretores de
escolas estaduais que não mais acatariam nenhuma determinação da Secretária ou do
Governador (CANABARRO, 2005).
114
escolas públicas estaduais deveriam ser escolhidos mediante eleição direta e
uninominal pela comunidade escolar. Segundo Alceu Collares, essas leis seriam
inconstitucionais porque subtraíam ao chefe do Poder Executivo a competência
que lhe é própria, por meio da CF, Art.84, II e XXV, de escolher as pessoas de
confiança para os cargos mencionados.
O Supremo Tribunal Federal, em Plenária no dia 3 de março de 1999,
julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Processo nº 578-2). O Tribunal, por
meio dos Senhores Ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence, julgou
procedente a ação e declarou a inconstitucionalidade (ADI 578-2), sendo
publicado oficialmente somente em 18 de maio de 2001. Portanto, no governo
Alceu Collares, estando a ação para ser julgada, os cargos para a direção nas
escolas foram efetivados por meio de indicações, e as pessoas indicadas ficaram
conhecidas como “interventores”.
Segundo a secretária de educação Neuza Canabarro (2005) [entrevista],
“só o que eu fiz foi o suficiente, porque as pessoas estavam se rebelando contra o
poder constituído do executivo”. O critério para a escolha dos dirigentes escolares
foi basicamente técnico e partidário (Idem) [entrevista]; o processo de seleção
aconteceu em dezembro de 1991.
Conforme Neuza Canabarro (2005) [entrevista], no mês de novembro, a
Secretaria estava aberta para os diretores que estavam no cargo e gostariam de
permanecer, pois acreditavam no projeto do governo. Esta seleção foi rápida e
34% dos diretores permaneceram em seus cargos (CANABARRO, 2005)
[entrevista]. Por isso, segundo a secretária de educação, este processo seletivo,
para tornar-se um interventor,
Neuza Canabarro referiu-se à Deputada Estadual Virgínia Rossinolo (PDT-
RS) que indicou uma pessoa para o CIEP de Rosário do Sul que possuía o perfil
[...] tinha o critério especificamente técnico, aonde nós tínhamos um diretor do partido
do PDT e que apresentava todos os critérios estabelecidos no perfil de diretor era o
escolhido, sem dúvida nenhuma, mas, aonde não tínhamos, nós escolhíamos outro
que havia se candidatado e o bom exemplo disso, da seriedade do nosso trabalho,
que nós perdemos uma deputada (CANABARRO, 2005).
115
para a direção escolar; porém, no meio do processo de treinamento, a deputada
indicou uma outra pessoa que não obtinha o perfil designado e, então, decidiu
retirar-se do partido.
Com esse acontecimento de introdução de interventores nas escolas
estaduais, o RS retrocedeu no seu processo de desenvolvimento da gestão
democrática da educação, voltando a um período autoritário. Segundo
Valdemarina Souza & Elaine Turk Faria (1994, p.16) “[...] tal medida repressora
trouxe implicações como atitudes de resistência e descomprometimento em
relação aos profissionais que assumiram a tarefa de administrar as escolas [...]”
por parte dos professores.
Em 1995, o governo Antônio Britto
77
implantou a Lei 10.576/95 que
dispunha sobre a Gestão Democrática do Ensino Público e que, segundo Scheibel
(2002, p.14), tinha o objetivo de subsidiar as escolas na busca da vivência
democrática e cidadã.
Esta Lei (10.576/95) teve como princípios a autonomia dos
estabelecimentos de ensino na gestão administrativa, financeira e pedagógica, a
livre organização dos segmentos da comunidade escolar, a participação dos
segmentos da comunidade escolar nos processos decisórios e em órgãos
colegiados, a transparência dos mecanismos administrativos, financeiros e
pedagógicos, a garantia da descentralização do processo educacional, a
valorização dos profissionais da educação e a eleição para diretor.
A eleição para diretor seria direta e uninominal, sendo que, antes da
eleição, o candidato deveria ser aprovado em um curso de qualificação. A
proporcionalidade continuava, a comunidade escolar votava (alunos maiores de 12
anos) e o mandato passou a ser de dois anos.
No entanto, como a Ação Direta de Inconstitucionalidade 578-2 sob-júdice
no Supremo Tribunal Federal, o Executivo teve de achar um “[...] remédio jurídico
para não ferir aquilo que estava sendo contestado pelo estado [...]”, por isso foi
utilizado, na Lei 10.576/95, o termo “indicar” ao invés de eleger (WORTMANN,
77
Eleito em 1994 pelo PMDB; foi para segundo turno com Olívio Dutra (PT) e acabou vencendo as
eleições com 49, 57% dos votos (NOLL & TRINDADE, 2004).
116
2005) [entrevista]. Segundo a Secretária de Educação da época, Iara Wortmann
(2005), o termo indicação
Com isso, o texto legal ficou redigido da seguinte maneira:
Art. 7º - Os Diretores das escolas públicas estaduais poderão ser
indicados [grifo meu] pela comunidade escolar de cada estabelecimento
de ensino mediante votação direta (LEI Nº 10.576/95).
Com esta passagem, percebemos que a lei permite ou não a indicação do
diretor pela comunidade escolar. No entanto, não efetiva a obrigatoriedade da
eleição, deixando à livre interpretação dos governos estaduais a realização ou não
das eleições para diretor.
De acordo com o Plano de governo de Antônio Britto, era necessário um
choque de eficiência nas instituições estatais, promovendo uma agilidade e
melhoria nos serviços com a redução de custos. As estratégias utilizadas seriam
contratos de gestão, em que o governo definiria metas e objetivos para as
empresas estatais, responsabilizando seus funcionários pelo cumprimento
das mesmas;
parceria com o setor privado, “devolvendo à sociedade serviços e encargos
em mãos do setor público” (DIRETRIZES DO GOVERNO ANTÔNIO
BRITTO 1994-1998, p.07);
modernização da Companhia Rio-grandense de Telecomunicações – CRT
e da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE
78
.
Para as políticas educacionais, as diretrizes a serem seguidas seriam a
implantação de uma nova proposta pedagógica, a descentralização, a
municipalização, a realização de parcerias com a iniciativa privada, a valorização
78
Ambas estatais foram privatizadas durante o governo de Antônio Brito no Rio Grande do Sul.
[...]“suaviza um pouco”, mas o que aconteceu foi uma indicação por meio de eleição
direta (WORTMANN, 2005).
117
do professorado e da comunidade pela participação na gestão do sistema e da
escola pública, principalmente por meio dos Conselhos Escolares (Idem).
Segundo o Relatório da Secretaria de Educação, as políticas relacionadas
com a gestão democrática foram organizadas em três eixos principais:
qualificação, autonomia e descentralização. “Pretendeu-se oportunizar avanços
físicos, técnicos e metodológicos reclamados pelas comunidades escolares”
(RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO 1998, p.07). No que se refere à
autonomia, “[...] procurou-se demonstrar a crença nas ações e soluções
emergentes de cada região e de cada escola” (Idem) e, em relação à
descentralização, “[...] buscou-se reforçar e apoiar ações regionais, por entendê-
las ser de retorno mais ágil e adequado às demandas locais” (Idem).
A lei de gestão democrática da educação do governo Antônio Britto não
deixou de ser uma conquista histórica. “A gestão democrática do ensino público
foi, assim, uma inspiração e uma afirmação diuturna nas iniciativas e
empreendimentos do Governo do Estado” (RELATÓRIO DA SECRETARIA DE
EDUCAÇÃO, 1998, p. 08). Segundo a Secretária de Educação, Iara Wortmann
O relatório da Secretaria de Educação e a retórica da secretária de
educação atestam idéias que se aliam aos interesses da maioria da população,
conquistando a legitimidade da sociedade. No entanto, utiliza um discurso que
esconde as estratégias que Jarbas Santos Vieira (2004) demonstrou em seu
trabalho: neutralidade e inocência.
A tramitação desta lei foi bastante conflituosa. Nesta época o parlamento
estadual era formado por quatorze deputados do PPB (Atual Partido Progressista
– PP), seis deputados do PT, dez deputados do PMDB, oito deputados do PDT,
Nós entendíamos que eleger um diretor era muito importante, mas junto com isso a
escola tinha que ter autonomia financeira, tinha que ter autonomia pedagógica, a escola
tinha que construir seu projeto. Pela lei que se encaminhou, os conselhos escolares
tinham que ter funções deliberativas, a lei que se encaminhou a Assembléia foi mais
ampla, inclusive fazendo com que os diretores eleitos passassem por um curso de
qualificação para que pudessem exercer esta função tão nobre na escola [...]
(WORTMANN, 2005).
118
dez deputados do PTB, três deputados do PSB, um deputado do PT do B, um
deputado do PC do B, um deputado do PL e um deputado do PSDB. O Projeto de
Lei 410/95 que tratava sobre a gestão democrática do ensino público foi enviado à
Assembléia Legislativa pelo poder executivo em agosto de 1995, obtendo na
Comissão de Constituição e Justiça
79
parecer favorável em outubro de 1995. O
parecer chamava atenção para a questão da centralização – descentralização:
[...] o Projeto está a percorrer, no particular, caminho inverso ao que
pretende o Governo, como política global, extinguindo empresas e
autarquias para incorporá-las à administração direta, como fez com a
Companhia Intermunicipal de Estradas Alimentadoras do Estado do Rio
Grande do Sul – CINTEA e Departamento Aeroviário do Estado do Rio
Grande do Sul – DAE. Neste PL 410/95, ao invés de centralizar a
administração do ensino, está a descentralizá-la, criando, na prática,
milhares de autarquias. Cada escola em razão da autonomia
administrativa e financeira, [...] passa a ser uma mini autarquia, faltando-
lhe apenas a gestão do pessoal próprio, estando a reclamar uma
ampliação de recursos humanos e materiais do Tribunal de Contas para
poder exercer tamanha fiscalização (PL 410/95).
O parecer da Comissão de Constituição e Justiça fala sobre a proposta de
autonomia do então governo, transformando as escolas em “mini autarquias”. A
questão é que esta proposta demonstra suas influências advindas das políticas
desenvolvidas pelo governo federal.
Foi apresentado um total de 69 emendas durante a tramitação do PL
410/95 na Assembléia e um substitutivo. O conteúdo geral das emendas referia-se
a critérios para o cargo de diretor, formas de eleição (uninominal ou chapas),
tempo de mandato do diretor, troca da expressão “indicação da comunidade
escolar”, proposta pelo Executivo, por “escolha da comunidade escolar”, formas de
propaganda eleitoral, retirada do curso preparatório proposto pelo Executivo,
escolha do ordenador de despesas (diretor, Conselho Escolar ou Coordenadorias
Regionais de Administração Financeira da Secretaria da Fazenda), troca da
expressão “Avaliação Externa”, proposto pelo Executivo, para “Avaliação do
79
Seu relator foi o Deputado Valdir Andrés PPB-RS.
119
Sistema Estadual de Educação”, retirada dos artigos que prevêem a adoção de
escolas estaduais por pessoas físicas ou jurídicas, entre outros.
O substitutivo Nº1 foi apresentado pelos deputados Pompeo de Matos
(PDT), Flávio Koutzi (PT), Jussara Cony (PC do B) e Maria Augusta Feldman
(PSB). O substitutivo apresentado pelos deputados foi o trabalho realizado nas
discussões com entidades vinculadas à educação, tais como o CPERS/Sindicato,
a União Gaúcha dos Estudantes Secundaristas – UGES, a Federação das
Associações de Círculos de Pais e Mestres – ACPM e alguns técnicos da
Secretaria de Educação. Este substitutivo visava à preservação do princípio de
justiça e democracia, inclusive tendo sido pauta de uma Assembléia Geral dos
Professores organizada pelo CPERS. Os professores aprovaram o substitutivo em
assembléia.
Segundo a justificativa do substitutivo,
O referido Projeto de Lei teve por base o texto do atual substitutivo
alterado, pelo trabalho de uma outra Comissão, que atuava, sem parceria
e sem comunicar suas pretensões ou suas conclusões, embora se
reunisse concomitantemente com a Comissão Oficial, na Secretaria de
Educação, sem que aquela tivesse conhecimento desta (PL 410/95).
De acordo com a justificativa do substitutivo Nº1, o PL 410 proposto pelo
Executivo foi embasado nas discussões realizadas pela Comissão das entidades
ligadas à educação chamada de “Comissão oficial”. No entanto, conforme a
justificativa, havia uma segunda Comissão que se reunia e rediscutia as propostas
da “Comissão oficial”, alterando as principais diretrizes acordadas. Este fato era
desconhecido pela “Comissão oficial”.
Mesmo com todos os esforços, na plenária do dia 08 de novembro de 1995,
este substitutivo não foi levado em consideração, permanecendo a proposta do
governo com algumas alterações devido às emendas aprovadas.
Eles participaram juntos, mas como sempre, o sindicato disse que aquela lei que nós
construímos e encaminhamos para a Assembléia não era aquela lei que o sindicato
assinava. Mas, ela foi superdemocrática [grifo meu], na sua concepção e na sua
construção (WORTMANN, 2005).
120
No entendimento da secretária de educação Iara Wortmann, o Projeto de
Lei encaminhado pelo Executivo para a Assembléia Legislativa originou-se do
grupo de discussão entre o sindicato de professores, a UGES e a ACPM. No
entanto, o CPERS/Sindicato afirmava que o Projeto enviado pelo executivo não
era o mesmo discutido pelas entidades. Houve um embate muito forte nesse
momento na Assembléia Legislativa.
Conforme o Art.19 da Lei 10.576/95, o processo de indicação de diretores
seria desenvolvido, num primeiro momento, por um curso de qualificação sobre o
exercício da função de diretor, organizado pela Secretaria de Educação e, num
segundo momento, a indicação da comunidade escolar mediante a votação direta.
Este curso de qualificação para diretor foi um ponto polêmico, pelo fato do
pouco tempo que a Secretaria tinha para organizar as eleições para diretor
80
; o
curso, nas primeiras eleições, ficou para depois; porém, na proposta do governo, o
curso ou prova dar-se-ia antes do processo eleitoral. Segundo José Clóvis de
Azevedo (1995), esse curso era uma “pseudo-capacitação” que determinava quem
poderia participar da eleição.
Nas eleições de 1995, para a capacitação dos professores eleitos para o
cargo de diretor, foi realizado, em janeiro de 1996, um “Seminário de
Sensibilização e Mobilização” que teve como objetivos sensibilizar os dirigentes
escolares e seus substitutos (vice-diretores) em todos os aspectos referentes à Lei
de Gestão Democrática do Ensino Público e instrumentalizar os participantes
quanto aos aspectos operacionais da Lei no que se referia à autonomia
administrativa, financeira e pedagógica. Foi realizado também, durante o ano de
1996, um “Curso de Qualificação para Diretores e Vice-Diretores” (RELATÓRIO
DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, 1998).
Quadro 2: Síntese das Ações/Investimentos da Capacitação dos
dirigentes escolares
80
Segundo Iara Wortmann (2005), a Lei 10.576/95 foi aprovada em novembro e as eleições seriam
realizadas em dezembro.
121
1995
AÇÕES
NÚMERO DE
PARTICIPANTES
RECURSO
FINANCEIRO
Seminário de Sensibilização e
Mobilização de Diretores
3.366
R$ 92.500,00
Realização de 118 ciclos de
Estudos em parcerias com
Instituições de Ensino
Superior (Curso de
Qualificação para Diretores e
Vice-Diretores)
3.366 Diretores
1.586 Vice-Diretores
120 Técnicos das Delegacias
de Educação e da Secretaria
de Educação
R$1.662.939,08
TOTAL:
R$1.755.439,08
Fonte: RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO 1998.
Quadro elaborado por Josiane Carolina Soares Ramos do Amaral
No ano de 1996, foram realizados encontros para tirar as dúvidas dos
diretores e vice-diretores em relação à nova legislação. O governo utilizou uma
verba considerável do estado para a constituição desta formação por meio de
parcerias com instituições de Ensino Superior.
Já para as eleições de 1997, foram preparadas provas, conforme o Artigo
19 da Lei 10.576/95. Segundo o Relatório da Secretaria de Educação, “[...] a
qualificação enfatizou ações de autopreparação dos dirigentes através de
programa coordenado pela Secretaria de Educação e da distribuição de
bibliografia básica” (1998, p.28).
QUADRO 3: Síntese das Ações/Investimentos da Capacitação dos
Dirigentes Escolares
1997
AÇÕES NÚMERO DE
PARTICIPANTES
RECURSOS
FINANCEIROS
Publicação de cadernos e
Leis Nº10.576/95 e
9.394/96
4.735
R$70.429,68
Realização de Provas 4.444 R$51.280,72
TOTAL GERAL 4.735 R$121.710,40
Fonte: RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, 1998.
122
Esta autopreparação que o Relatório da Secretaria de Educação nos fala é
a distribuição dos diversos cadernos publicados pela própria Secretaria para os
possíveis candidatos. No caso, essa distribuição se deu no sentido de que cada
“possível candidato” deveria estudar este material para realizar a prova preparada
pela Secretaria de Educação.
Conforme Jarbas Santos Vieira (2004), uma das estratégias construídas
pelo Governo de Antônio Britto foi a formação dos administradores de escolas
[diretores]. Segundo o autor, esta formação se dava:
[...] a distância, no treinamento em serviço e em outras formas orientadas
pelo modelo empresarial, como a profissionalização dos quadros
dirigentes da escola. Uma profissionalização que tem duas dimensões:
de um lado, tratava-se de dar um caráter técnico aos postos de comando
das escolas, racionalizando a gestão de recursos e padronizando as
práticas administrativas; de outro lado, tratava-se de reduzir ou limitar a
participação docente às “coisas” do ensino, aos problemas de sala-de-
aula, numa clara ressignificação de democracia escolar (VIEIRA, 2004,
p.77).
Portanto, Jarbas Santos Vieira (2004) acredita que esta concepção de
formação dos dirigentes de escolas deixa implícitas idéias gerenciais, sob a lógica
do receituário dos organismos internacionais para a educação. Esta
profissionalização traz o caráter neutro da técnica, persuadindo as pessoas pela
crença da qualidade administrativa.
Nessas eleições, foram proibidos o livre debate e a propaganda das
propostas de gestão para a escola; o vice-diretor voltava a ser indicado pelo
diretor, assim como a livre nomeação de um técnico de finanças, mais conhecido
como Assistente Financeiro
81
, com uma função gratificada
82
. Ou seja, a eleição
81
Cargo previsto nos Artigos 92 e 93 da Lei 10.576/95, tendo como atribuições a coordenação e
execução das atividades nas áreas administrativa e financeira da escola que, segundo o Relatório
da Secretaria de Educação (1998, p.12), “[...] integram o quadro de Cargos de Confiança e
Funções Gratificadas da Secretaria da Educação embora, destinem-se, exclusivamente, para o
desempenho da atividade”.
82
A função gratificada corresponde a uma quantia em dinheiro que os professores da rede estadual
de ensino do Rio Grande do Sul que trabalham em cargos de confiança, como assistente
financeiro ou vice-diretores, recebem durante o período de gestão.
123
para diretor é “marcada pela restrição à participação e à decisão dos usuários da
escola” (AZEVEDO, 1995, p.33).
José Clóvis de Azevedo (1995) acredita que esta restrição da participação
da comunidade escolar se deu pela desconsideração do processo coletivo da
escola, pois esta prova instituída pelo Governo Antônio Britto representou “[...]
uma cassação prévia do direito das comunidades para estabelecer critérios de
legitimação de suas lideranças” (Idem). Com isso, o governo pré-determina quem
está apto ou não para ser escolhido pela comunidade.
Para Neuza Canabarro (2005) [entrevista], a eleição para diretor se
transformou em um campo de disputa político-partidária, trazendo muitos conflitos
para dentro da escola. Segundo a secretária de educação do governo Alceu
Collares, a eleição
Para José Clóvis de Azevedo (
1995),
[...] a proposta de gestão democrática [do Governo Antônio Britto] não
passa de um processo de gerenciamento tutelado das escolas onde a
participação da comunidade ficará restrita a deliberações secundárias e à
sustentação financeira das escolas (p.33).
Sendo assim, dispõe medidas para uma gestão da educação baseada no
[...] controle na dimensão pedagógica, a autonomia para gerar e
gerenciar recursos, passando gradativamente as responsabilidades de
sustentação do estado para as comunidades usuárias. Percebe-se
nitidamente a lógica do Estado mínimo, esquivando-se da manutenção
dos serviços sociais [...] (AZEVEDO, 1995, p.33).
Em 1998, no mesmo governo, instituiu-se a Lei 11.126/98, que implanta o
Plano de Desenvolvimento e Valorização do Ensino Público Estadual, dispondo
[...] transferiu pra dentro da escola, onde não se deveria ter mais que a bandeira da
criança, da educação e a criança como centro do processo, nós passamos a ter uma
questão política, ideologias políticas que não têm nada a ver (CANABARRO, 2005)
124
sobre mecanismos de parceria e colaboração e o Programa de Avaliação da
Produtividade Docente.
A avaliação impõe-se como necessidade decorrente da conquista e
do exercício da autonomia, sobretudo do ponto de vista pedagógico, pois
só a partir do conhecimento da realidade educacional e de suas
deficiências poderão as escolas assumir as responsabilidades e o
compromisso decorrente do ensino que ministraram (RELATÓRIO DA
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO 1998, p.29).
Nessa lei há a implantação da parceria com setores privados a fim de
melhorar a qualidade da escola pública.
Fica autorizada a adoção de mecanismos de parceria e colaboração,
visando à otimização dos recursos humanos, materiais e financeiros, bem
como ao compartilhamento de fontes de financiamento, para o
atendimento da rede de ensino público do estado. (Art. 5º)
Art. 26 - Fica instituído o Programa de Avaliação da Produtividade
Docente, para todos os titulares de cargos de provimento efetivo de
Professor do Magistério Público Estadual, independentemente do Plano
de Carreira e do Quadro que integrarem, visando ao desenvolvimento do
ensino público estadual e à valorização do Magistério.
§ 1º - O Programa de Avaliação da Produtividade Docente introduz
mecanismos de incentivo à atividade profissional, visando à obtenção de
resultados concretos de melhoria de desempenho dos Professores, que
possibilitem a redução dos desperdícios relativos à capacidade potencial
dos recursos humanos e financeiros, bem como o estímulo a projetos
inovadores.
§ 2º - O Programa será coordenado e supervisionado por Comitê de
Avaliação da Produtividade Docente, a ser criado, mediante decreto, pelo
Chefe do Poder Executivo, na Secretaria da Educação, e composto por
representantes do Governo do Estado, do Magistério Público Estadual,
dos alunos e das associações de pais e mestres.
§ 3º - O Comitê de Avaliação da Produtividade Docente estabelecerá,
mediante regulamento, os requisitos e as formas de participação dos
Professores no Programa, e determinará metas anuais a serem atingidas,
em consonância com as estabelecidas pelo Conselho Escolar do
respectivo estabelecimento de ensino, para a consecução dos objetivos
da política educacional (Lei 11.126/98).
Neste mesmo sentido, o Artigo 78 da lei 10.576/95 informa que todas as
escolas serão avaliadas anualmente pela Secretaria de Educação, com o objetivo
125
de divulgação a toda comunidade (Art. 80), e a Lei 11.126 reforça a avaliação
como forma de regulação do sistema de ensino público. A escola que obtiver o
melhor desempenho ganha estímulo através do prêmio, e as outras que não
ganharam recursos, conseqüentemente não irão conseguir melhorar o seu
desempenho.
De acordo com Cláudio Francisco Accurso (RELATÓRIO DA SECRETARIA
DE EDUCAÇÃO 1998), Diretor do DEPLAN, a avaliação externa é um recurso que
busca primeiramente a qualidade de ensino, pois há o confronto da liberdade
individual de ensinar com o interesse coletivo. Segundo ele,
A avaliação externa, no fundo, confere, no campo da educação, a
eqüidade que por direito deve abranger a todos. É o compromisso com
essa eqüidade que faz da avaliação externa um instrumento
indispensável de complementação às condições e circunstâncias
imperantes em cada caso. Só o fato de identificar as desigualdades,
mesmo quando despidas de suas causas, já é algo positivo na procura
de soluções. (Idem, ANEXOS, p.7)
O Diretor do DEPLAN utiliza o objetivo da qualificação das instituições e do
ensino, pautado por “parâmetros produtivistas e eficientistas que cercam os
modelos empresariais” (VIEIRA, 2004, p.60). O Programa de Avaliação Externa do
governo do estado demonstra, segundo José Clóvis de Azevedo (1995, p.34), “[...]
a sua identidade política neoliberal ao instituir o prêmio de qualidade para as
escolas que apresentarem os melhores resultados”, demonstrando, assim, que
concebe a educação como uma mercadoria, moldando “[...] indivíduos destinados
para o mercado e destituídos de qualquer sensibilidade democrática e
humanística”.
A aplicação deste programa, nos anos de 1996, 1997 e 1998 é apresentada
pelos Quadros abaixo:
QUADRO 4, 5 e 6: Demonstrativo da Aplicação do Programa de Avaliação
Externa
126
ANO 1996 Nº de
alunos
Participantes Público Disciplina Recursos
Financeiros
Ensino
Fundamental
374.837 Alunos de
2ª, 5ª e 7ª
séries
Português e
Matemática
Ensino
Médio
79.706
3.355 Escolas
de Rede
Estadual
Alunos de
2ª série
Questionário
Avaliação da
Gestão
Escolar
R$428.900,00
(Contrato
com a FDRH)
Fonte: RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO 1998, p.30.
ANO 1997 Nº de
alunos
Participantes Público Disciplina Recursos
Financeiros
Ensino
Fundamental
Estado
157.593
Município
38.115
Alunos de
4ª e 8ª
séries
Português +
Redação e
Matemática
Ensino
Médio
Estado
30.564
Município
150
Rede
Estadual
3.297
Rede
Municipal
3.476
Alunos de
3ª série
Questionário
Sócio
Econômico-
Cultural
R$1.002.631,00
(Contrato com
a FAURGS)
Fonte: RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO 1998, p.30.
ANO 1998 Nº de
alunos
Participantes Público Disciplina Recursos
Financeiros
Ensino
Fundamental
Estado
211.156
Município
46.650
Alunos de
4ª e 8ª
séries
Português,
Redação,
Matemática,
Ciências
(Física,
Química e
Biologia)
Ensino
Médio
Estado
60.000
Município
100
Rede
Estadual
3.297
Rede
Municipal
2.719
Alunos de
3ª série
Questionário
aspectos
pedagógicos
de
Português e
Matemática
R$1.341.738,33
(Contrato com
a FAURGS)
Fonte: RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO 1998, p.30.
Esta concepção de avaliação reforça a idéia da importância da competição
neste mercado globalizado, construindo um padrão para o produto. Segundo
Jarbas Santos Vieira (2004), esta precisão do produto “pode ser obtida através de
127
uma reorientação gerencial das escolas, tendo como fundamento básico o foco no
cliente [...]” (p.62).
Por meio dos quadros, percebemos que a Secretaria de Educação
contratou uma entidade de direito privado sem fins lucrativos para a formulação e
realização da avaliação. Os recursos financeiros destinados ao Programa de
Avaliação Externa das escolas estaduais entre 1996-1998 foram quase triplicado.
Os quadros demonstram que houve uma pequena diminuição na quantidade de
alunos da rede estadual que realizaram a avaliação. Outro dado evidenciado foi o
público destinado e as disciplinas avaliadas; houve uma escolha diferenciada do
público e das disciplinas em 1996 para 1997; em 1998 aumentou-se o número de
disciplinas avaliadas. Os quadros ainda revelam que o processo de gestão
democrática é desconsiderado, dando ênfase somente nos resultados obtidos por
uma prova.
É importante salientar que o governo do Rio Grande do Sul, nesse período,
executa as mesmas ações do MEC em relação à avaliação institucional. O
processo de terceirização é implantado para a construção das provas. Sendo
assim, o governo não se envolve com o operativo, pois o fundamental é o
resultado dessas avaliações. E esse resultado é visto como um todo, não levando
em consideração as diferenças de escola para escola; o objetivo principal é
estabelecer um padrão único.
As políticas estabelecidas pelo governo de Antônio Britto, “na essência, têm
o mesmo sentido político do projeto da União” (AZEVEDO, 1995, p.33). O projeto
desse governo estadual percorreu o mesmo trajeto que as políticas nacionais para
a educação, imprimindo a lógica neoliberal de desobrigação e de diminuição do
Estado.
As reivindicações para o aperfeiçoamento da gestão democrática da
educação continuavam, a correlação de forças foi intensificada pela eleição para
governador do estado de 1998. Olívio Dutra
83
assume o governo do estado em
83
Eleito pela Frente Popular em 1998, integrando partidos como o PT, PCdoB, PCB, PSB e PDT;
foi para o segundo turno com Antônio Britto (PMDB), ganhando as eleições com 49,49% dos votos
(NOLL & TRINDADE, 2004).
128
1999, e nos primeiros dias de seu governo promulga-se a primeira alteração da
Lei de gestão democrática (10.576/95): a Lei 11.304.
Esta lei foi aprovada em 14 de janeiro de 1999; ela somente alterava a
eleição para diretor. No caso, o candidato deixava de ser aprovado no curso de
qualificação antes da eleição para comprometer-se em freqüentar esse curso após
a sua nomeação. Uma mudança pequena, porém significativa em termos
democráticos, pois acaba abolindo a política restritiva para o cargo de diretor.
Em abril de 1999, no governo Olívio Dutra, foi desencadeado o processo
denominado “Constituinte Escolar”, instrumento para a construção da democracia
participativa do governo do estado do Rio Grande do Sul para a área de educação
(CAMINI, 2002). Pela primeira vez, temos um governo que inicia com uma
proposta de participação efetiva da comunidade escolar na construção de políticas
educacionais.
Os pressupostos desse processo se baseavam na Educação como direito
de todos e no desenvolvimento social. A partir disso, cinco eixos foram propostos
pelo governo: democratização do acesso, democratização da gestão,
democratização do conhecimento, valorização dos trabalhadores e das
trabalhadoras em educação e regime de colaboração com a União, estado e
municípios e, por fim, a reconstrução curricular.
A Constituinte Escolar foi um processo de construção coletiva das políticas
educacionais para o estado do Rio Grande do Sul. Segundo o Programa de
Governo de Olívio Dutra,
Os princípios e diretrizes da Política Educacional passarão por
intensa discussão das comunidades escolares, urbanas e rurais. A
mantenedora organizará com as escolas e as entidades ligadas à
educação, a Constituinte Escolar que culminará com o 1º Congresso
Constituinte da Rede Pública Estadual de Ensino. O Congresso
definirá as linhas básicas da Política Educacional a ser implementada
pelo Governo Popular. (PROGRAMA DE GOVERNO NA EDUCAÇÃO:
AÇÕES 1999 – 2002, p.06).
129
O movimento Constituinte Escolar
84
chamou a comunidade escolar para
repensar a escola. Segundo a secretária de educação Lúcia Camini (2002), este
processo foi organizado em cinco momentos:
1º) Elaboração da proposta, sensibilização e lançamento da Constituinte.
2º) Estudo da realidade regional contextualizada.
3º) Aprofundamento dos temas e temáticas levantados num segundo momento.
4º) Definição dos princípios e diretrizes da Escola Democrática e Popular.
5º) Materialização dos mesmos, na perspectiva de reconstrução dos Projetos
Político-Pedagógicos, Regimentos Escolares e Planos de Estudos.
Houve muitos conflitos durante o processo da Constituinte Escolar.
Segundo a secretária Lúcia Camini (2005) [entrevista], a Constituinte Escolar teve
níveis diferenciados de participação, por diversos motivos
85
. Estes conflitos,
segundo ela, foram um
Este processo não ocorreu de forma tranqüila e linear, como a própria
secretária Lúcia Camini (2005) afirma. Houve a participação do CPERS/Sindicato
no início do movimento Constituinte Escolar, principalmente nas reuniões
preparatórias. No entanto, posteriormente “surgiu a proposta da não participação
no processo, condicionando-o à concessão de reajuste salarial e à definição de
uma política salarial para a categoria” (CAMINI, 2005, p.123).
Essa proposta da não participação dos professores na Constituinte Escolar
foi aprovada na Assembléia Geral dos professores que ocorreu em Porto Alegre,
em maio de 1999. O embate entre a Secretaria de Educação e o CPERS/Sindicato
84
Ver MENDES, Valdelaine da Rosa. Participação na definição de uma política educacional:
mecanismo de controle público sobre as ações do governo? Faculdade de Educação: USP, 2005.
(Tese de Doutorado)
85
Ver CAMINI, Lúcia. A política educacional no Governo Olivio Dutra (1999-2002): movimentos,
relações, contradições e avanços. Porto Alegre: PPGEdu/UFRGS, 2005. (Dissertação de
Mestrado)
“[...] limitador, pois poderíamos ter avançado mais, e muitas questões do interesse da
categoria poderiam ter sido resolvidas no processo de discussão via Constituinte
Escolar
[
...
]
(
CAMINI
,
2005
)
.
130
durou todo o período do governo de Olívio Dutra; greves aconteceram, assim
como disputas públicas na imprensa e negociações.
A grande maioria dos princípios e diretrizes construídas no movimento
Constituinte Escolar se relaciona com a gestão democrática da escola,
incentivando maior participação da comunidade escolar, integrando escola-família-
sociedade.
Uma das principais linhas de ação relacionada com a gestão democrática
da escola apontada no Congresso Constituinte foi a transformação do Conselho
Escolar em uma unidade executora. Conforme analisamos no Capítulo 2, uma Uex
consiste numa organização social de direito privado sem fins lucrativos; esta
entidade representa a comunidade, auxiliando na gestão escolar. A determinação
do governo federal pela instituição de uma UEx surgiu a partir de 1995,
materializando as diretrizes do PDRAE.
Conforme a proposta do Congresso Constituinte, o Conselho Escolar
passaria a ser uma entidade privada sem fins lucrativos, que receberia os recursos
do governo federal de programas específicos. A escolha do Conselho Escolar se
deu porque este órgão representa todos os segmentos da comunidade escolar:
pais, professores, alunos e funcionários. Esta escolha origina-se da compreensão
de que a gestão democrática seria fortalecida, pois todos os envolvidos com o
cotidiano escolar participariam do processo de discussão e decisão da aplicação
desses recursos. No governo de Olívio Dutra,
A gestão democrática, tradução do princípio da radicalização da
democracia na Escola Pública, se concretiza num exercício contínuo
de Planejamento Participativo com todos os segmentos da
comunidade escolar (conselhos escolares, grêmios estudantis,
equipes diretivas, funcionários (as), estudantes, educadores (as), entre
outros). (CAMINI, 2002, p.36)
Acreditando na democratização do acesso, do conhecimento e,
principalmente, da gestão no início do seu mandato para o governo do estado do
RS, Olívio Dutra, juntamente com a secretária de Educação, Lúcia Camini, instituiu
um grupo de estudos ou comissão paritária, para a reformulação do texto legal
para a Lei de Gestão Democrática, composta pela UGES, pela ACPM –
131
Federação, pelo CPERS – Sindicato e por representantes da Secretaria de
Educação. Esta comissão paritária reuniu-se paralelamente com o processo da
Constituinte Escolar.
Estas discussões tiveram o seu início no dia 31 de março de 1999. A pauta
da primeira reunião foi a apresentação dos componentes titulares e os objetivos
da comissão. Os componentes titulares da comissão paritária foram Mariza
Terezinha Rigo (SARH), Zélia Moraes Goulart (SE), Ana Maria Py Lucca (SE),
Claudiomiro Ambrósio (SE), Raul Gomes de Oliveira Filho (ACPM), Ênio Mânica
(CPERS), Rosa Bott (CPERS), Márcio Carvalho (UGES) e Fábio Lorenzi (UGES).
A dinâmica dos trabalhos desta comissão se desenvolveu por meio de
reuniões quinzenais; nestas reuniões seriam analisados cada componente da Lei
10.576/95, e os subsídios teóricos poderiam ser trazidos por qualquer membro da
comissão. Os subsídios em relação à legislação foi incumbência do representante
da Assessoria Jurídica da Secretaria de Educação.
O resultado destas discussões foi enviado à Assembléia Legislativa em 16
de agosto de 1999. O Projeto de Lei 172/99 proposto pelo Executivo,
fundamentado nas discussões da comissão paritária propunha a eleição direta,
uninominal por chapas, formas de propaganda eleitoral, curso de qualificação para
os eleitos e o aumento do mandato do diretor para três anos novamente com
apenas uma recondução. Esta proposta mantinha a proporcionalidade na votação,
mantinha a idade mínima para votar e colocava o Conselho Escolar como co-
responsável pela gestão dos recursos financeiros.
Nesta época o parlamento estadual era formado por onze deputados do PT,
onze deputados do PPB (atual PP), dez deputados do PMDB, dez deputados do
PTB, sete deputados do PDT, dois deputados do PFL, dois deputados do PSDB,
um deputado do PSB e um deputado do PC do B. Em Plenário no dia 18 de
agosto de 1999 houve uma discussão em relação ao conteúdo do PL 172/99. O
deputado estadual José Ivo Sartori (PMDB) falou que entendia o interesse dos
professores na aprovação do projeto, pelo seu sentido político, mas fez ressalvas
quanto à questão administrativa. Segundo o deputado, a pretensão de eleger o
diretor de escola e também o vice, numa única chapa, faria com que
132
predominasse o interesse político e ideológico nas composições feitas para a
eleição, ficando “a realidade pública e administrativa” em segundo plano. Segundo
sua opinião, o diretor é um ordenador de despesas e se seu vice-diretor não é
pessoa de confiança por ele escolhido, poderá passar por inúmeras situações de
constrangimento e de dificuldades de operacionalização.
O deputado Edson Portilho (PT) defendeu a proposta do Executivo quanto à
eleição do vice-diretor. Segundo ele, é “necessário que ele [vice-diretor] esteja
sintonizado com a direção, porque precisa ser responsável e estar integrado ao
projeto da direção escolhida pelos professores” (DIÁRIO DA ASSEMBLÉIA,
19/08/99).
A deputada estadual Maria do Rosário (PT) assegurou que “as
modificações propostas foram feitas a partir do diálogo aberto e franco com o
sindicato que tem uma contribuição histórica de 54 anos de trabalho no Rio
Grande do Sul em defesa da qualidade da educação pública” (DIÁRIO DA
ASSEMBLÉIA, 19/08/99). Segundo a deputada, a Assembléia “tem uma dívida
com os trabalhadores em educação, por não ter sabido ouvir, na legislatura
passada, as suas reivindicações” (Idem). Na sua opinião, “o fundamento do Poder
é justamente reconhecer aquilo que é trazido pela comunidade” (Idem).
Diante da apresentação de inúmeras propostas de emendas, as quais
descaracterizavam o projeto proposto pela comissão paritária, o Executivo acabou
retirando o Projeto 172/99 da pauta da Assembléia Legislativa. O conflito de idéias
foi muito intenso na discussão deste Projeto de Lei.
A crença da necessidade de uma qualificação técnica para os diretores
demonstrou as influências das novas correntes de gestão pública, visando à
eficiência e à produtividade no discurso de parte dos deputados estaduais.
Segundo os defensores destas idéias, a escolha do vice-diretor por chapa daria a
preponderância ao aspecto político-ideológico, desconsiderando a concordância
do candidato a vice-diretor ao projeto proposto pelo candidato a diretor.
Em 2000 – 2001, o grupo de trabalho composto pelas entidades
relacionadas à educação (CPERS/Sindicato, UGES, ACPM e Secretaria de
Educação) retornou às discussões sobre a Lei 10.576/95. Nesse período, houve
133
uma polêmica em relação à proposta da Secretaria de Educação advinda do
Congresso Constituinte em tornar o Conselho Escolar uma Unidade Executora.
Uma organização de direito privado sem fins lucrativos e o ordenador de
despesas, dividindo a responsabilidade da gestão dos recursos financeiros com o
diretor, fazendo a comunidade escolar participar da gestão da escola pública.
A ACPM e o CPERS, num primeiro momento [em 1999], apoiaram a
Secretaria. No entanto, depois de consultar os outros membros das suas
entidades, discordaram desta proposta, criando-se a polêmica.
A ACPM acreditava que as finalidades do Conselho Escolar – C.E e do
Círculo de Pais e Mestres – CPM eram diferentes. Segundo a entidade, o C.E
cuidava das questões pedagógicas e da fiscalização de recursos, todos
envolvendo a escola. O CPM, por sua vez, integrava a família à escola e a escola
à comunidade, fazendo o papel de controlador social. Segundo Raul Gomes de
Oliveira Filho (2003) [entrevista], representante da ACPM na comissão paritária,
“[...] os Conselhos Escolares têm representação até o portão da escola; saindo
fora do portão da escola, o Conselho Escolar não representa qualquer segmento
[...]”. Com isso, a organização que melhor representaria a escola “fora dos seus
portões” seria o CPM. Este posicionamento demonstrou um certo receio da ACPM
em relação à perda de poder no interior da escola.
O CPERS/Sindicato acreditava que o C.E deveria ter seu papel reforçado
no âmbito político e fiscalizador, contribuindo com a gestão democrática na escola.
Entretanto, a denominação “organização de direito privado sem fins lucrativos”
causou preocupação, pois poderia estar sendo criado um mecanismo de
fortalecimento de uma política de privatização da escola (LAZZAROTTO, 2003)
[entrevista]. Por isso, o CPERS/Sindicato acabou concordando com a proposta da
ACPM, do Círculo de Pais e Mestres continuar sendo uma Unidade Executora.
De qualquer modo, mesmo a Secretaria de Educação propondo a garantia
de uma qualidade maior através da autonomia financeira com a personalidade
jurídica para o CE (FERREIRA, 2003 [entrevista]) – proposta esta justificada por
uma das diretrizes acordadas no Congresso Constituinte – os outros segmentos
da comissão paritária repudiaram essa proposição. Esse repúdio acabou por
134
fortalecer os Círculos de Pais e Mestres dentro das escolas estaduais e
intensificar as discussões em torno do tema na Assembléia Legislativa.
Em 28 de junho de 2001, o Projeto de Lei (PL 171/01) novamente foi
enviado pelo poder executivo à Assembléia Legislativa; nele permanecia a
proposta do Congresso Constituinte. No entanto, no dia 14 de agosto, a presidente
da Comissão de Educação da Assembléia Legislativa, Iara Wortmann (PMDB),
apresentou um substitutivo que alterava significativamente o projeto inicial.
Em 15 de agosto o PL 171/01 foi encaminhado para a Comissão de
Constituição e Justiça – CCJ para exame e parecer. Em 21 de agosto de 2001 sai
parecer contrário do relator Paulo Odone (PMDB), o parecer 256/01. Conforme o
parecer, ao dar poderes de gestão para o Conselho Escolar, o PL 171 fere o
Decreto Lei Federal 200/67, que dá somente ao servidor público o exercício de
ordenador de despesas. O parecer ainda coloca que o Artigo 42, § único, Artigo
67, § 1º e o Artigo 72 do PL 171, não têm amparo legal, ferindo a Constituição
Federal de 1988. Os artigos citados pelo parecer do deputado Paulo Odone são
os seguintes:
Art.42 – Os Conselhos Escolares são entidades civis de direito privado,
sem fins lucrativos, com estatuto que rege suas relações internas e
externas, com poderes para representar a comunidade escolar, deliberar
sobre os recursos financeiros da escola e movimentar conta bancária em
conjunto com o Diretor da escola.
Parágrafo único – O Diretor e o Presidente do Conselho Escolar serão
considerados ordenadores de despesa nos termos da Lei.
[...]
Art 67- Fica instituído, na forma desta lei, o suprimento mensal de
recursos financeiros às escolas da rede pública estadual de ensino e às
Coordenadorias Regionais de Educação para custear as suas despesas
de manutenção.
§ 1º - Os recursos serão disponibilizados ao presidente do Conselho
Escolar, ao Diretor de cada estabelecimento de ensino, e ao
Coordenador Regional de cada Coordenadoria Regional de Educação,
que os administrarão com prerrogativas e responsabilidade de
ordenadores de despesa.
[...]
Art.72 – O suprimento mensal de recursos que trata esta lei será
precedido de empenho em dotações orçamentárias próprias, tendo como
beneficiário o Conselho Escolar de cada estabelecimento de ensino e o
Coordenador Regional de cada Coordenadoria Regional de Educação
(PL 171/01).
135
Qualquer pessoa da comunidade pode ser presidente do Conselho Escolar;
com isso, o parecer da CCJ coloca que o ordenador de despesa deve ser
necessariamente um servidor público, conforme o Decreto Lei Federal 200/67.
Portanto, uma pessoa que não esteja vinculada ao serviço público não pode ser
um ordenador de despesa.
O Parecer 256/01, da Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia
Legislativa, ainda coloca que
O Art.80 do PL por sua vez, ao submeter a autonomia da gestão
pedagógica dos estabelecimentos de ensino à implementação dos
princípios e diretrizes constantes no plano político pedagógico, definidos
em conferência estadual de educação, que é a Constituinte Escolar do
atual Governo, viola o Art.206, inciso VI da Constituição Federal, que
trata a gestão democrática do ensino público e o Art.12 da LDB, pelo que
não pode prosperar porque transforma a Escola Pública em instrumento
ideológico-partidário (PARECER Nº256/01).
O Artigo 206, inciso VI da Constituição Federal coloca que o ensino será
ministrado com o princípio da gestão democrática no ensino público. O Artigo 12
da LDBEN/96 coloca que os estabelecimentos de ensino terão a incumbência de
elaborar e executar a sua proposta pedagógica, administrar seus recursos
materiais, financeiros e humanos, assegurar o cumprimento dos dias letivos
estabelecidos, velar pelo cumprimento do plano de trabalho do docente, ofertar a
recuperação dos alunos, articular-se com a comunidade e informar pais e
responsáveis sobre a freqüência, o rendimento e a proposta pedagógica da
escola.
Conforme o parecer, a definição de diretrizes na Conferência Estadual de
Educação para a rede estadual de ensino restringiu o princípio de gestão
democrática e autonomia pedagógica de cada estabelecimento de ensino.
Segundo o parecerista, o governo Olívio Dutra estaria difundindo suas idéias
político-partidárias nas escolas estaduais.
Diante destas colocações, constatamos a desconsideração, por parte do
relator Paulo Odone, do processo da Constituinte Escolar. Durante o processo,
houve a discussão de diferentes temas educacionais com a comunidade escolar,
136
assim como a reconstrução dos Projetos Políticos Pedagógicos, Planos de
Estudos e Regimentos Escolares em cada escola.
Sobre o parecer Nº256/01, a secretária Lúcia Camini (2005) afirma que
[...] a resistência do Sindicato, em relação ao processo Constituinte,
oficialmente se manteve obtendo apoio da oposição na Assembléia
Legislativa, a qual materializou sua posição contrária com a retirada dos
recursos orçamentários para subsidiar essa atividade governamental
(p.125).
Com isso, percebemos que os conflitos extrapolavam as discussões e
negociações internas. A Secretária de Educação afirma que a definição da não
participação do CPERS/Sindicato no processo da Constituinte Escolar obteve o
apoio do grupo de oposição ao governo Olívio Dutra na Assembléia, gerando
muitas polêmicas.
A imprensa e a Assembléia Legislativa tiveram tensionamentos muito fortes
com o governo de Olívio Dutra. Em 31 de agosto de 2001, alguns deputados
estaduais
88
que faziam parte da situação entraram com recurso contra o parecer
da Comissão de Constituição e Justiça que decidiu pela inconstitucionalidade do
PL 171/01. Segundo o recurso,
O simples fato de os Conselhos Escolares terem a formatação
jurídica em direito privado, não o descaracteriza como órgão público
regido pelos demais dispositivos do direito público. Tal procedimento é
uma opção jurídica que não o descaracteriza como órgão público.
(RECURSO CONTRA O PARECER 256/01)
Este recurso utiliza como exemplo a legislação estadual que criou
fundações estaduais como a FADERS, o FGTAS, o Teatro São Pedro, etc. Sobre
o argumento do parecer da CCJ a respeito do Art.80, contido no PL 171, o recurso
coloca que a gestão pedagógica possui o mesmo sentido contido na Lei 10.576,
elaborada no governo de Antônio Britto, em seus artigos 75 e 76.
88
Luciana Genro – PT, Edson Portilho – PT, Jussara Cony – PC do B, Cecília Hypólito – PT, Maria
do Rosário – PT, José Gomes – PT, Luis Fernando Schmidt – PT, Roque Grazziotin – PT, Elvino
Bohnbass – PT, Ivar Pavan – PT, Dionilson Marcon – PT, Ronaldo Zulke – PT.
137
Inclusive esta lei em vigor [10.576/95], diz que a autonomia
pedagógica se submete às políticas públicas vigentes. Portanto, se
submete às políticas públicas definidas pela Secretaria da Educação.
Enquanto que na proposta em análise vigora a participação da
comunidade e não apenas a vontade da Secretaria da Educação
(RECURSO CONTRA O PARECER 256/01).
Portanto, de acordo com o recurso, os argumentos levantados pelo parecer
da CCJ não se sustentam, pois partiram de “premissas ou entendimentos
errôneos” (RECURSO CONTRA O PARECER 256/01). Os deputados que
entraram com o recurso demonstravam a contradição existente no discurso do
parecer, pois a Lei 10.576/95 submete a autonomia pedagógica das escolas
estaduais às políticas educacionais vigentes. E, pela proposta da Constituinte,
houve a participação da comunidade escolar e não apenas a definição de políticas
por parte de um órgão, a Secretaria de Educação
89
.
No dia 12 de setembro de 2001, em plenário, houve a apresentação de
diversas emendas; a Deputada Estadual Iara Wortmann acabou retirando o
substitutivo Nº1, e o Deputado Estadual Vilson Covatti (PPB) apresentou o
substitutivo Nº2 que modificava substancialmente as principais propostas do PL
171.
Sobre a apresentação e retirada do substitutivo Nº1, a então deputada Iara
Wortmann (PMDB) afirma que
Na sua fala, Iara Wortmann demonstra os embates da oposição com o
governo de Olívio Dutra, revelando o agrupamento daqueles deputados da
oposição na apresentação do substitutivo Nº2. Em uma comparação entre o PL
171/01 e o substitutivo apresentado pela oposição (Nº2) temos
89
O recurso relacionou este fato à restrição da autonomia pedagógica por meio da política
educacional do governo de Antônio Britto, o Padrão Referencial de Currículo, em que houve a
padronização dos currículos escolares.
[...] como deputada, eu tinha este direito [de apresentar um substitutivo]. Ele mantinha
algumas coisas, uma delas era inclusive a votação proporcional. (...) Mas esta é uma
casa legislativa, uma casa em que todos os deputados têm direito à voz e voto (...).
Então numa composição, a oposição apresentou um novo substitutivo, e eu retirei o
meu. (WORTMANN, 2005)
138
Quadro 7: Análise Comparativa
PL 171/2001 SUBSTITUTIVO Nº2
Substitui a caráter “relativamente autônomo
na gestão administrativa, financeira e
pedagógica dos estabelecimentos de
ensino” por “dotados de autonomia na
gestão administrativa, financeira e
pedagógica”.
Mantém o texto da Lei 10.576/95, com o
caráter “relativamente autônomo dos
estabelecimentos de ensino”.
Define que os vices diretores terão
mandato, sendo eleitos em chapa
juntamente com o diretor da escola.
Mantém o texto da Lei 10.576/95, com o
vice-diretor como cargo de confiança do
diretor eleito.
Substitui o Plano Integrado da Escola pelo
Plano Político-Administrativo-Pedagógico
da Escola.
Mantém o texto da Lei 10.576/95, com o
Plano Integrado de Escola, entendido como
um plano na área administrativa, financeira
e pedagógica, em consonância com as
políticas públicas vigentes, com o plano de
metas da escola e com o plano do Diretor.
Retira a avaliação externa da escola. Mantém o texto da Lei 10.576/95, com a
avaliação externa coordenada pela
Secretaria de Educação, tendo como base
o Padrão Referencial de Currículo.
Muda a duração do mandato da direção da
escola de dois para três anos, mantendo
uma reeleição.
Aceita a mudança de mandato para três
anos e permite reeleição com sucessivas
reconduções.
Transforma os Conselhos Escolares em
entidades civis de direito privado. Modifica
sua composição e funções, passando a ser
co-gestores na administração da escola,
atribuindo aos seus presidentes a condição
de ordenadores de despesa.
Mantém o texto da Lei 10.576/95, com o
Conselho Escolar atuando na fiscalização
(pedagógica-administrativo-financeira), nas
consultas e deliberações.
Adota o curso de qualificação para os
diretores eleitos.
Igual ao PL 171/2001.
Retira a possibilidade de prêmios para
projetos inovadores ou qualidade de
ensino.
Igual ao PL 171/2001.
Quadro formulado por Josiane Carolina Ramos do Amaral, baseado no Parecer da Comissão de
Educação,Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia
CECDCT.
O Substitutivo Nº 2 desconsiderava todo o processo de discussão sobre a
gestão democrática entre os setores vinculados ao cotidiano escolar. Logo após a
sua aprovação, o governador vetou
90
o Projeto aprovado. Em 15 de outubro de
2001, o PL 171 com o Substitutivo Nº 2 foi encaminhado à CCJ e à Comissão de
90
A pedido do CPERS – Sindicato por decisão tomada em Assembléia Geral do Magistério,
entendendo que houve um retrocesso na democratização da gestão.
139
Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia – CECDCT, juntamente com o
veto do governador, para análise.
No parecer da CECDCT, segundo o relator Jorge Gobbi (PSDB), o
substitutivo Nº2 aperfeiçoa a Lei de Gestão Democrática, assim como contempla,
em grande parte, a proposta do Poder Executivo Estadual, opinando pelo parecer
contrário ao veto do poder executivo. Em 27 de novembro de 2001, em sessão
Plenária, a Assembléia Legislativa
91
rejeitou o veto total do PL 171/2001. Em 10
de dezembro de 2001 foi promulgada a Lei 11.695 que alterou a Lei 10.576/95,
dispondo sobre a Gestão Democrática do Ensino Público.
Com estas mudanças, constatou-se que a última alteração na Lei de
Gestão democrática da educação deixou algumas lacunas, dando continuidade
aos debates e reivindicações dos setores vinculados à educação. Estas lacunas
são polêmicas, porém estamos no processo de construção desta gestão
democrática na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul.
Estas lacunas podem ser visualizadas, segundo Lúcia Camini (2005)
[entrevista], no voto universal, defendido pela ACPM na Comissão Paritária e
atendido pelo Substitutivo Nº 2. Esta proposta instituiu que a decisão das eleições
fosse tomada por pais e alunos, fazendo com que os educadores e funcionários
passassem a secundários no processo eleitoral, apesar de suas influências na
comunidade escolar, podendo também ser apresentada na avaliação externa, que
traduz a influência das políticas centralizadoras, objetivando o estabelecimento de
rankings e, conseqüentemente, a competição entre escolas, introduzindo a lógica
empresarial ou o “quase-mercado”. Esta avaliação gera uma regulação por parte
do estado, mas também, conforme Jarbas Santos Vieira, uma auto-regulação dos
docentes:
Este mecanismo gera uma espécie de auto-regulação, que ajuda a
produzir uma visão binária da educação que opõe condutas e
conhecimentos legítimos a condutas e conhecimentos ilegítimos. Na
lógica da GQT [Gestão da Qualidade Total] são legítimas todas as
condutas e todos os conhecimentos úteis e práticos formadores do futuro
91
Os seguintes deputados estaduais assinaram a rejeição do veto total do governador Olívio Dutra:
Ônix Lorenzoni (PFL), Ciro Simoni (PDT), Eliseu Santos (PTB), Iara Wortmann (PMDB), Iradir
Pietroski (PTB), João Osório (PMDB), Otomar Vivian (PPB) e Jorge Gobbi (PSDB).
140
empreendedor (gerente de conhecimentos). Ilegítimos são todas as
condutas e todos os conhecimentos que contestem as demandas da
sociedade de mercado globalizada (VIEIRA, 2004, p.144).
Segundo o autor, esta auto-regulação desenvolve nos docentes e demais
profissionais da educação um sentimento de naturalidade, sendo propagada a
ilusão de ser um mecanismo imprescindível para a qualidade do sistema escolar e
manipulando todas as pessoas envolvidas com o processo educativo.
As sucessivas reconduções do mandato do diretor também se
apresentaram como uma lacuna, pois admitiram a permanência de uma direção
por tempo indeterminado, facilitando as relações patrimonialistas e clientelistas no
interior de cada estabelecimento público de ensino.
Diante de toda esta contextualização, entendemos que o processo de
construção da gestão democrática na rede estadual de ensino do Rio Grande do
Sul foi muito conflituoso. No entanto, estes conflitos fazem parte da luta política.
Esta construção se dá de forma contínua e descontínua, ora avançando, ora
retrocedendo.
De acordo com István Mészáros (2005), estas práticas geram
Estratégias apropriadas e adequadas para mudar as condições
objetivas de reprodução [do capital], como para a automudança
consciente dos indivíduos chamados a concretizar a criação de uma
ordem social metabólica radicalmente diferente (p.65).
Mesmo observando o desrespeito por parte de alguns membros do
executivo estadual e os arranjos no interior da Assembléia Legislativa neste
processo, constatamos também o avanço da consciência cidadã da sociedade civil
organizada que soube reivindicar as suas propostas, mesmo não tendo sido
atendidas plenamente. É importante que os movimentos sociais, juntamente com
a comunidade escolar, discutam temas relacionados à educação, pois, assim,
poderemos aprimorar o processo democrático, fazendo com que a comunidade
escolar seja cada vez mais incitada a participar, exercendo a sua cidadania e
sendo beneficiada por ela.
141
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo desta pesquisa foi o de percorrer a trajetória da regulamentação
da gestão democrática nas escolas da rede estadual de ensino do estado do Rio
Grande do Sul de 1985 a 2001, tendo como foco os embates ocorridos nas
décadas de 1980 e 1990.
Ao iniciar a construção do meu objeto de pesquisa, foi estabelecida a
seguinte hipótese:
Na década de 1980 e 1990 ocorreram muitos embates entre as forças políticas e
sociais na busca pela gestão democrática da educação. Com isso, surgiram
concepções diferentes de gestão educacional, uma de cunho democrático,
advinda das reivindicações dos movimentos sociais vinculados à educação, e
outra de cunho neoliberal vinculada às propostas dos organismos internacionais.
Estas concepções influenciaram os projetos governamentais que, por sua vez,
foram implementados na rede estadual de ensino do RS.
Ao analisarmos a política educacional brasileira a partir da ditadura militar e
o desenvolvimento do processo de gestão democrática da educação no estado do
Rio Grande do Sul, constatamos que, neste processo, ocorreram muitos embates
entre diferentes projetos de gestão assumidos pelas entidades vinculadas à
educação (CPERS/Sindicato, ACPM, UGES, Secretaria de Educação) e pelo
parlamento estadual que fizeram parte do jogo político e que só acrescentam ao
debate educacional.
No entanto, apesar de o Rio Grande do Sul ter sido um dos estados
pioneiros a iniciar o debate sobre a gestão democrática da educação em sua
política educacional, ele não se isentou das influências neoliberais. As políticas
educacionais do governo federal tiveram influências significativas nas políticas
públicas de educação na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul,
principalmente a partir da segunda metade da década de 1990.
Portanto, a hipótese inicial foi confirmada. Ambas propostas influenciaram
as políticas relacionadas à gestão da educação. No entanto, percebeu-se uma
142
apropriação dos termos democráticos (participação, democratização,
descentralização, etc) por parte das políticas neoliberais. Estas políticas
ressignificaram o sentido destes conceitos, imprimindo uma neutralidade e
valorizando a técnica em seu discurso.
Constatou-se que o PDRAE e a legislação educacional no Rio Grande do
Sul instituíram dois movimentos na gestão da educação pública:
a perspectiva do “quase- mercado”, que é a implantação da lógica empresarial
na educação pública com o objetivo de representar a dinâmica do mercado;
a esfera “pública não-estatal”, que é a introdução de uma esfera privada que tem
como objetivo desburocratizar a gestão escolar (Círculo de Pais e Mestres).
Estes dois movimentos demonstram a influência direta das duas correntes
ideológicas expostas no Capítulo 1: o neoliberalismo e a terceira via. Estas
correntes acreditam que a crise materializada pela queda dos lucros, pela
degeneração da esfera financeira com o aumento do capital volátil, pela
concentração de capital pelas empresas e pelo colapso de políticas de
redistribuição de renda é causada pelo Estado. Portanto, este Estado deve ser
reduzido ou reformado.
Com isso, segundo a lógica destas escolas de pensamento, o mercado é
visto como a solução dos problemas. De acordo com esta idéia, diversas reformas
foram introduzidas no aparelho estatal dos diferentes países. No Brasil, tivemos o
PDRAE em 1995. Conforme este Plano, as políticas sociais que estariam na parte
de “serviços não-exclusivos do Estado”, que poderiam ser oferecidas pelas
diferentes esferas (privada, pública ou “pública não-estatal”), deveriam simular o
mercado, se permanecessem no âmbito estatal ou “público não-estatal”.
Nesta simulação, uma diversidade de conceitos está presente na
implementação destas políticas. Estes conceitos seriam a competição, a
racionalização, a produtividade, a qualidade total, a supressão do termo cidadão
por cidadão-cliente, a avaliação como forma de regulação das instituições públicas
e a execução repassada para as comunidades locais (desconcentração de poder).
Este último fator, além de demonstrar a desobrigação do Estado, demonstra
também a responsabilização da sociedade pela realização dos serviços, sendo
143
culpada pelo seu sucesso tanto quanto pelo seu insucesso. A fórmula para este
novo Estado é a redução dos investimentos e o fortalecimento do seu papel
fiscalizador, deixando para a escola pública a responsabilidade da eficiência.
Em termos de políticas educacionais voltadas para a gestão da educação,
mesmo com a luta dos movimentos populares em prol da efetivação do princípio
de gestão democrática da educação na legislação (CF/1988, CE/1989, Lei
10.576/1995, LDBEN/1996, PNE/2001), como vimos no Capítulo 2, estas políticas
não se isentaram dos conceitos mercadológicos. A partir de 1990, o termo
“democrático” passou a ser entendido como desobrigação do Estado e
responsabilização da sociedade civil.
A lógica empresarial vem colaborar com esta perspectiva de solucionar a
crise através da reformulação do Estado. Diante desta perspectiva, este Estado
torna-se ineficiente, pesado, inchado. Portanto, os princípios ditos eficientes,
modernizadores e flexíveis são o da esfera privada, devendo ser implementados
no Estado.
A década de 1980, conforme Maria da Glória Gohn (1995), foi impulsionada
pelos anseios de redemocratização do país e pela crença da relevância da
participação popular. Estes anseios, de acordo com a autora, estariam no desejo
de democratização dos órgãos. Neste contexto, o estado do Rio Grande do Sul foi
uma arena de grandes embates por estas aspirações, havendo muitos avanços,
mas também estagnação e retrocessos.
Diante desta conjuntura e acreditando que não há política social desligada
dos reclamos populares (VIEIRA, 1992), em 1985, época de abertura política,
temos a promulgação da primeira lei que regulamentou a eleição para diretor. A
Lei 8.025/85 instituiu a eleição para diretor por lista tríplice. Segundo Vitor Paro
(2003), esta medida ocorre em duas situações: com a intenção de viabilizar a
democracia ou então para coibi-la. No caso da rede estadual de ensino, esta
medida se deu pela abertura gradual das instituições públicas, em que a eleição
por lista tríplice significou um grande avanço em relação à nomeação dos
diretores, possibilitando a participação, ainda que timidamente, da comunidade
escolar.
144
No início da década de 1990, promulgou-se a Lei 9.032/91 que instituiu o
Conselho Escolar em cumprimento ao artigo 213 da Constituição do Estado do Rio
Grande do Sul, colocando-o como principal órgão de representação da
comunidade escolar. Conforme o referido artigo da Constituição Estadual, as
escolas públicas estaduais contarão com conselhos escolares, constituídos pela
direção da escola e representantes dos segmentos da comunidade escolar. A Lei
9.033/91 atendeu a reivindicação dos movimentos sociais da década de 1980,
instituindo a eleição uninominal por chapas para diretor na rede estadual. No
entanto, os avanços não tiveram continuidade. Em 1991, no início do governo
Alceu Collares, o poder legislativo promulgou a Lei 9.263, que alterava a eleição
uninominal, impedindo a disputa por chapas e passando a idade que dava direito
ao exercício do voto de 14 anos para 12 anos.
Esta lei foi o início de uma ruptura com a continuidade democrática, pois,
conforme a secretária de educação da época, Neuza Canabarro, diante de um
desentendimento com os diretores das escolas estaduais na época, todo o
processo de democratização da gestão escolar foi estagnado. Com isso, o
governador Alceu Collares argüiu a inconstitucionalidade da Lei 9.033/91 e
9.263/91, entrando com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Superior
Tribunal Federal, baseado no artigo 84, II e XXV da Constituição Federal. Esta
passagem marca a volta de diretores nomeados ou “interventores”.
Neste mesmo período, efetivava-se no Brasil as influências neoliberais dos
organismos internacionais, principalmente pelo Plano Diretor de Reforma do
Aparelho do Estado de 1995. As políticas que se instalaram no Rio Grande do Sul
nesse período tiveram o mesmo sentido político que os projetos do governo
federal (AZEVEDO, 1995). A partir da Lei 10.576/95, surgem políticas
educacionais influenciadas por estas idéias na rede estadual de ensino do Rio
Grande do Sul.
O Plano de governo de Antônio Britto explicitou uma posição clara diante
das políticas que seriam adotadas em seu governo. Em relação às políticas
educacionais, além de inserir conceitos empresariais na gestão das escolas
públicas, evidenciou um posicionamento bastante conservador frente às
145
reivindicações das entidades como CPERS/Sindicato, UGES e ACPM pela gestão
democrática da educação.
No processo de tramitação do PL 410/95, constatou-se a desconsideração
por parte do Executivo da discussão realizada com as entidades educacionais.
Foram apresentadas na Assembléia Legislativa dispositivos que não foram
aqueles acordados entre o grupo de discussão para a gestão democrática do
ensino público.
Estando para ser julgada a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 578-
2) argüida pelo governador Alceu Collares, no dia 08 de novembro de 1995 foi
promulgada a Lei 10.576/95. Esta Lei regulamentava a gestão democrática do
ensino público dispondo sobre os três pilares que sustentam esta forma de gestão:
a eleição para diretor, o Conselho Escolar e a autonomia financeira, pedagógica e
administrativa. Para não ferir a ADI 578-2, esta lei utilizou o termo indicação ao
invés de eleição.
Diante da utilização do termo “indicar”, constatamos que não há a
possibilidade de uma lei conseguir estagnar o processo de gestão democrática
quando existe uma efetiva legitimidade social. Nesse período, a democratização
da gestão já era um fator legitimado pela comunidade escolar na rede estadual de
ensino do Rio Grande do Sul, principalmente pelos debates promovidos pelo
CPERS/Sindicato. Os movimentos sociais ligados à educação mostraram sua
força, conseguindo regulamentar em lei o princípio da gestão democrática e a
regulamentar o processo de escolha do diretor.
O discurso utilizado pelo governo de Antônio Britto foi o da neutralidade,
não deixando transparecer seus reais interesses de diminuição do Estado e de
inserção da lógica empresarial produtivista, técnica e excludente. O curso de
qualificação apresentado aos professores que quisessem se candidatar para o
cargo de Diretor determinava quem poderia participar do pleito. Este fato
demonstrou a relevância da técnica para a gestão da escola pública. Conforme
este curso ou prova, os professores que tivessem o conhecimento técnico
estariam aptos a desenvolver uma gestão qualificada.
146
Para superar a forma burocrática de organização do setor público, além de
conhecimento técnico, dever-se-iam implementar outros conceitos apresentados
pelas diferentes correntes de administração pública. Conforme o estudo realizado
por Fernando Abrúcio (1999), explicitado no Capítulo 1, estas correntes são
denominadas de Gerencialismo puro, Consumerism e PSO. O autor afirma que
não existe a utilização de uma única corrente nas reformas instituídas nos
diferentes países, mas uma compilação destes conceitos.
Durante o período pesquisado, mais especificamente no governo de
Antônio Britto, constatamos na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul
alguns programas que incentivaram estas iniciativas na gestão da educação:
O Programa de Incentivo à Produtividade Docente (Lei 11.126/98)
demonstrou influências do Gerencialismo Puro e do Consumerism. As parcerias
(Art.1º, V) para a obtenção de uma gestão mais ágil e qualificada e a indução à
competição confirmam as idéias difundidas pelo Consumerism. A arrecadação de
novas formas de financiamento (Art. 1º, IX), a otimização de recursos humanos,
financeiros e físicos, assim como a sua racionalização (Art.5º), a gestão pautada
por objetivos visando a uma avaliação individual de cada funcionário (Art. 26, §1º)
denotam as influências do Gerencialismo puro.
A avaliação externa dos alunos para a auferição do Prêmio Produtividade
Docente aos professores (Lei 11.126/98) e a avaliação externa das escolas (Lei
10.576/95) evidenciam a intervenção do Consumerism. Conforme esta corrente, a
avaliação qualifica os serviços públicos e aumenta o poder do consumidor perante
os mesmos. A competição e o controle evitam o monopólio, criando a liberdade de
escolha para os cidadãos-clientes.
Estes programas foram veiculados para a comunidade escolar como sendo
modernizadores. No entanto, eles indicam uma lógica excludente, não
considerando a cooperação e o atendimento às demandas de cada escola. Todas
estas políticas demonstraram que o estado do Rio Grande do Sul, apesar de ter
sido um estado referência em relação à construção de uma legislação voltada
para a gestão democrática, não se eximiu das influências do capital na educação
pública.
147
Ainda que o Prêmio Produtividade Docente não tenha sido colocado em
prática, ele demonstrou os interesses do Governo Antônio Britto para com a
educação pública estadual, assim como a instituição da avaliação externa. A
avaliação externa além de ter sido uma diretriz suscitada pelo MEC e pelo Banco
Mundial objetivou a qualificação das escolas por meio de um processo
competitivo. Este modelo de competição serviu como estratégia para a superação
do modelo ineficiente de organização das instituições públicas, segundo seus
idealizadores.
Dentro desse processo de avaliação das escolas, percebeu-se ainda um
movimento de terceirização das provas. A Secretaria de Educação do Estado do
Rio Grande do Sul contratou a Fundação para o Desenvolvimento de Recursos
Humanos FDRH e a Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul – FAURGS para construir e organizar as provas realizadas na avaliação
externa em 1996, 1997 e 1998, demonstrando o seu real objetivo: a avaliação dos
resultados e não do processo, constituindo uma regulação do sistema de ensino.
Esta forma de avaliação explicita a lógica empresarial, considerando a educação
como um produto a ser vendido.
Além disso, revela uma concepção: a visualização da gestão democrática
da educação a partir de um padrão de escola. E pergunto: como atender às
demandas específicas de cada escola a partir de um padrão já pré-estabelecido?
Cada escola tendo sua autonomia poderá escolher o seu projeto de educação a
partir das necessidades levantadas da realidade com a flexibilidade requerida a
todo ato educativo.
Acreditando que a gestão democrática visa ao atendimento das demandas
de cada região, não podemos pensar em um padrão de escola ou em um
parâmetro de resultados. Esta forma de avaliação não é feita para a comunidade
repensar sobre as suas necessidades reais, mas para que a Secretaria de
Educação identifique as “melhores” escolas, para assim poder recompensá-las. A
148
avaliação externa das escolas não teve continuidade
92
no Governo Olívio Dutra,
havendo uma ruptura nesse processo de regulação da rede estadual de ensino.
No entanto, na continuidade da correlação de forças, com a instituição de
uma comissão paritária em 1999 para a discussão da reformulação do texto legal
da Lei de gestão democrática da educação para a rede estadual, outras polêmicas
surgiram. Nesse período, com uma proposta diferenciada, o processo de
construção das políticas educacionais se deu por meio do movimento denominado
Constituinte Escolar.
Este processo culminou com uma Conferência Estadual de Educação que
definiu linhas de ação para estas políticas. Nessa conferência, ficou acordado com
todos os segmentos da comunidade escolar a definição do Conselho Escolar para
ser a Unidade Executora; por sua vez, os Círculos de Pais e Mestres continuavam
atuando nas escolas. Esta diretriz da conferência baseava-se na crença de que,
dando mais responsabilidades ao Conselho Escolar, a gestão democrática na
escola seria reforçada.
A política do governo federal da época exigia a constituição de uma
Unidade Executora no interior das escolas públicas para o recebimento de
recursos públicos advindos de programas próprios de financiamento, como o
PDDE. Esta definição que, num primeiro momento foi aceita pela Comissão
Paritária, viria a ser o principal ponto de discórdia em 2001.
Conforme o PDRAE, foi necessário inserir uma forma intermediária entre a
propriedade estatal e a propriedade privada, a “propriedade pública não-estatal”.
Esta mudança de propriedade reafirmou a crença de que a esfera pública é
ineficiente, sendo necessária a interferência de uma outra esfera para
desburocratizar, tornando o serviço público eficiente. Na prática cotidiana, ocorre a
coexistência de dois órgãos dentro da escola pública estadual do Rio Grande do
Sul: um público, o Conselho Escolar, e outro privado, o CPM. Conforme o
92
Mesmo estando fora do período pesquisado, cabe referendar que este mecanismo teve a sua
continuidade a partir de 2005 na rede estadual de ensino no governo de Germano Rigotto (PMDB).
Esta concepção de avaliação foi materializada na rede estadual de ensino do estado do Rio
Grande do Sul por meio dos contratos de gestão. O contrato de gestão é uma parceria firmada
entre o governo do estado do Rio Grande do Sul e a Secretaria de Educação, com a assessoria da
Secretaria do Planejamento, tratando conforme a Lei 12.237 de 13 de janeiro de 2006, da política
de produtividade, qualidade e racionalização dos recursos humanos e materiais do estado.
149
relacionamento entre estes órgãos, alguns enfrentamentos poderiam surgir,
advindos da relação público-privado.
No início do segundo semestre de 1999, foi enviado pelo Executivo o
resultado destas discussões (PL 172/99). No entanto, dentro da Assembléia
Legislativa, constatou-se um movimento muito forte de oposição às propostas de
governo de Olívio Dutra que eram democráticas e advinham de discussões com a
comunidade por meio do processo da Constituinte Escolar.
Esse projeto foi retirado pelo Executivo, pois as emendas apresentadas
descaracterizavam toda a discussão realizada com o CPERS/Sindicato, a UGES e
a ACPM. Em 2000, o grupo de discussão voltou a se reunir. Nesse momento, a
ACPM revelou a sua posição em relação à Unidade Executora. Segundo a ACPM,
o Círculo de Pais e Mestres deveria ser a entidade de direito privado sem fins
lucrativos no interior da escola, pois este órgão melhor configuraria os interesses
da comunidade, representando a escola fora de seus limites físicos.
Nesse momento, os conflitos foram intensificados dentro do
CPERS/Sindicato. A entidade sempre acreditou que toda política que viesse a dar
mais poder ao Conselho Escolar iria reforçar a gestão democrática. No entanto, a
transformação do Conselho Escolar, órgão máximo dentro da escola, em uma
entidade de direito privado poderia vir a iniciar um processo de privatização da
rede pública de ensino. Esta crença acabou por reforçar a proposta da ACPM e a
fortalecer o grupo de oposição ao governo.
Novamente a discussão da comissão paritária foi enviada à Assembléia em
2001 e novamente apresentaram-se emendas e substitutivos que
descaracterizavam a proposta inicial. A correlação de forças, mais uma vez, foi
intensificada, e as contradições foram expostas.
A ala de oposição ao governo de Olívio Dutra argumentou que a
Constituinte Escolar restringia a autonomia pedagógica das instituições
educacionais, vinculando suas diretrizes às políticas educacionais implementadas.
Percebeu-se que a Constituinte foi um processo construído por todos os
segmentos que compõem a comunidade escolar, portanto suas diretrizes foram
150
baseadas nas idéias dos segmentos, havendo legitimidade social e não
predominância da vontade de um segmento apenas.
Em relação à argumentação do grupo de oposição ao governo Olívio Dutra,
constatou-se que a Lei 10.576/95, formulada pelo governo de Antônio Britto, em
seu Artigo 76, estabelecia a inclusão do Padrão Referencial de Currículo na
proposta pedagógica de cada escola estadual. Portanto, a restrição afirmada pelos
deputados de oposição não era verdadeira. Esse episódio demonstra a dificuldade
por parte de alguns deputados no interior da Assembléia Legislativa do Estado do
Rio Grande do Sul de aceitar as diretrizes convencionadas por meio da
democracia participativa.
Mais uma vez desconsideram-se as propostas formuladas pela comunidade
escolar, prejudicando a soberania popular, negando o conceito de democracia que
advém da coletivização das decisões. Constata-se um posicionamento
antidemocrático na Assembléia Legislativa, pois “quanto menos interesses
coletivos, quanto menos coletivização há nas decisões e, portanto, quanto mais
particularização, menos ou nada democrático é o governo” (VIEIRA, 1998, p.12). A
descaracterização dessas propostas convencionadas através da participação
popular mostra-nos uma intensa luta de classes com a hegemonia da classe
dominante.
Em relação à trajetória da construção da gestão democrática da educação
na rede estadual de ensino, percebemos avanços, rupturas e retrocessos. Houve
diferentes propostas de gestão democrática que produziram continuidades e
descontinuidades nas políticas educacionais voltadas para a gestão.
O voto proporcional, o voto universal e as formas de propaganda eleitoral
foram outros pontos polêmicos nas discussões do poder legislativo. A
apresentação de diferentes substitutivos na tramitação do Projeto de Lei em
questão acarretou a descaracterização dos pontos discutidos pelos setores da
educação, dificultando a intervenção do estado na área social, fazendo prevalecer
à vontade de poucos na Lei 11.695 de 2001, alterando significativamente a Lei
10.576/95.
151
De acordo com estes enfrentamentos, as questões levantadas nesta
pesquisa possibilitaram a visualização das ambigüidades presentes nos discursos
e nas práticas concebidas enquanto gestão democrática. Principalmente pelos
limites demonstrados pelo ato de governar um estado sem a maioria no
parlamento. As disputas e os tensionamentos que ocorreram no processo de
construção das políticas voltadas para a gestão na rede estadual de ensino entre
1985 e 2001 metamorfosearam o termo gestão democrática.
De propostas construídas através da participação popular, acabamos em
consensos entre as lideranças do poder legislativo, desconsiderando todo o
processo de mobilização pública e de participação popular nas discussões sobre o
tema pesquisado.
Em tempos de crise no capital, a democracia é confundida com as leis do
mercado; o cidadão é entendido como cliente ou consumidor e o Estado como
regulador e não como provedor. Sob este prisma, a democracia embasada a partir
do mercado assume-se como uma “farsa bem-sucedida” (MOUSQUER, 2003,
p.213), diante dos mecanismos de gestão que iludem a comunidade escolar e
conservam as vontades da classe dominante.
Por tudo que foi exposto e analisado ao longo desta dissertação, conclui-se
que a gestão democrática da educação, além de ser um tema muito discutido
recentemente, é uma política estratégica para a construção de uma sociedade
mais justa e igualitária calcada nos direitos humanos, que visa, sobretudo, à
transformação social.
Mais do que apresentar soluções para tal problemática na construção das
políticas de gestão democrática na rede estadual de ensino, pretendi trazer
elementos que colaborassem para a superação de uma gestão empresarial
voltada para o produto ou para o mercado que, ao invés de objetivar a
colaboração e a melhoria da qualidade social da escola pública, consolidam-se
estratégias que incentivam a competição entre estas escolas, fazendo com que
cada vez mais as diferenças sejam ampliadas.
Acreditando que a gestão democrática da educação está sempre em um
processo de construção que se articula dialeticamente com a comunidade escolar,
152
pretendi contribuir com a discussão do tema e com processos futuros que venham
a ocorrer.
Por fim, a hipótese elaborada no início do processo de pesquisa foi
confirmada pelos diferentes dados coletados. Conclui-se que os movimentos
iniciados pelo CPERS/Sindicato muito estimularam o debate sobre a proposta de
gestão democrática, assim como os embates e as negociações com os diferentes
governos estaduais do período pesquisado. Houve algumas rupturas nesse
processo, porém a sociedade civil organizada soube reivindicar seus direitos,
tendo, no governo Olívio Dutra, uma discussão mais apurada sobre o tema. As
resistências do poder legislativo, dos professores e da mídia para com o governo
Olívio Dutra acabaram originando alguns entraves para a ampliação da gestão
democrática da educação.
Os mecanismos que sustentam a gestão democrática do ensino público no
estado do Rio Grande do Sul desvelam aspectos que precisam avançar, pois a
eleição para diretor não significa o rompimento com o autoritarismo, o
patrimonialismo e o clientelismo. O funcionamento do Conselho Escolar não
garante a participação real da comunidade escolar e a retirada da política de
manipulação e favorecimento. A autonomia, administrativa, pedagógica e
financeira, não garante o atendimento às demandas da população. No entanto, a
legislação construída foi vista como um importante instrumento indutor de
mudanças nas práticas escolares, concebidas como um processo em pleno
desenvolvimento.
153
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______. Decreto Nº 3.100/99, de 30 de junho de 1999, regulamenta a Lei nº
9.790, de 23 de março de 1999, que dispõe sobre a qualificação de pessoas
jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras
providências.
______. Lei N º 10.172, de 09 de janeiro de 2001, que aprova o Plano Nacional de
Educação e dá outras providências.
______. Projeto de Lei 2546, de 30 de junho de 1999 que dispõe sobre a Parceria
Público-Privado.
______. Projeto de Lei 1258, de 28 de novembro de 1988 que dispõe sobre as
diretrizes e bases da educação nacional.
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. LEI Nº 8.025, de 14 de agosto de 1985,
estabelece normas para escolha de diretores e vice-diretores de escolas
estaduais.
______. LEI Nº 8.026, de 14 de agosto de 1985, dispõe sobre vantagens do
Magistério Público Estadual, institui o décimo terceiro (13º) vencimento, considera
de efetivo exercício os dias em que os professores participaram do movimento
reivindicatório e dá outras providências.
166
______. LEI Nº 9.233, de 13 de fevereiro de 1991, dispõe sobre a eleição de
diretores e vice-diretores de escolas públicas estaduais, em cumprimento ao
disposto no § 1º do artigo 213 da Constituição Estadual e dá outras providências.
______. LEI Nº 9.232, de 13 de fevereiro de 1991, que dispõe sobre os Conselhos
Escolares nas Escolas públicas estaduais, em cumprimento ao disposto no "caput"
do art. 213 da Constituição Estadual, e dá outras providências.
______. LEI Nº 9. 262, de 5 de junho de 1991, que altera a Lei nº 9.232, de 13 de
fevereiro de 1991.
______. Projeto de Lei Nº 410/95. Assembléia Legislativa do Estado do Rio
Grande do Sul.
______. Projeto de Lei Nº 171/01. Assembléia Legislativa do Estado do Rio
Grande do Sul.
______. LEI Nº 10.576, de 14 de novembro de 1995, dispõe sobre a Gestão
Democrática do Ensino Público e dá outras providências.
______. LEI Nº 11.126, de 09 de fevereiro de 1998, implanta Plano de
Desenvolvimento e Valorização do Ensino Público Estadual, dispõe sobre
mecanismos de parceria e colaboração, institui Programa de Avaliação da
Produtividade Docente, dispõe sobre vencimento e dá outras providências.
______. LEI Nº 11.304, de 14 de janeiro de 1999, altera disposições da LEI Nº
10.576, de 14 de novembro de 1995, que dispõe sobre a Gestão Democrática do
Ensino Público e dá outras providencias.
167
______. LEI Nº 11.695, de 10 de dezembro de 2001, altera a LEI Nº 10.576
, de 14
de novembro de 1995, que dispõe sobre a gestão democrática do Ensino Público
e dá outras providências.
______. Secretaria da Educação. Princípios e diretrizes para a educação estadual.
Porto Alegre: Corag, 2000.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. DECRETO LEI Nº 200, de 25 de fevereiro de
1967, que sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes
para a Reforma Administrativa e dá outras providências.
Outros documentos
BANCO MUNDIAL. Prioridades y estrategias para la educación: exames del
Banco Mundial. Washington, D. C. 1996.
COMISSÃO PARITÁRIA. Atas 1999, 200 e 2001.
DIRETRIZES DO GOVERNO ANTÔNIO BRITTO 1994-1998.
DIRETRIZES DE AÇÃO PEDRO SIMON 1987 – 1991.
MAGISTER. Jornal de circulação Dirigida do Centro dos Professores do Estado do
Rio Grande do Sul. (1978 – 2001)
MARRE, Jacques A. L. A construção do objeto científico na investigação empírica.
In: SEMINÁRIO DE PESQUISA DO OESTE DO PARANÁ, 1991, Cascavel.
PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO – Proposta da sociedade brasileira. II
Congresso Nacional de Educação – II CONED. Belo Horizonte, 09 de novembro
de 1997.
PLANO DE GOVERNO JAIR SOARES 1983 – 1987.
PROGRAMA DE GOVERNO NA EDUCAÇÃO RS: AÇÕES 1999-2002.
PROJETO “POVO GRANDE DO SUL” /ALCEU COLLARES 1991-1994.
RELATÓRIO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. Governador do Estado: Antônio
Britto / Secretária de Educação: Iara Wortmann.
168
APÊNCICE A – Governos brasileiros (1985 – 2002)
PERÍODO
PRESIDENTE
MINISTRO DA
EDUCAÇÃO
15.03.1985 / 14.03.1990
José Sarney (PDS)
Marco Maciel, Jorge
Bornhausen, Hugo
Napoleão e Carlos
Sant’Anna
15.03.1990 / 29.12.1992 Fernando Collor de Mello
(PRN)
Carlos Chiarelli, José
Goldenberg
30.12.1992 / 31.12.1994 Itamar Franco (PMDB)
Murílio Hingel
01.01.1995 / 31.12.1998 Fernando Henrique Cardoso
(PSDB)
Paulo Renato de Souza
01.01.1999 / 31.12.2002 Fernando Henrique Cardoso
(PSDB)
Paulo Renato de Souza
169
APÊNDICE B – Governos do estado do Rio Grande do Sul (1983 –
2002)*
PERÍODO GOVERNADOR SECRETÁRIO DE
EDUCAÇÃO
PRESIDENTE DO
CPERS/Sindicato**
15.03.1983 -
14.03.1987
Jair de Oliveira
Soares (PDS)
Francisco Salzano
Vieira da Cunha e
José Rubens Pillar
Paulo Egon
Wiederkhern
15.03.1987 -
01.04.1990
Pedro Jorge Simon
(PMDB)
Observação:
Desistiu do cargo
para candidatar-se a
Senador da
República.
Bernardo de Souza,
Ruy Carlos
Osterman e Iara
Wortmann
Dilmar Steffani
02.04.1990 -
15.03.1991
Sinval Sebastião
Duarte Guazzelli
(PMDB)
Bernardo de Souza,
Ruy Carlos
Osterman e Iara
Wortmann
Maria Augusta
Feldmann
15.03.1991 -
31.12.1994
Alceu de Deus
Collares (PDT)
Neuza Canabarro
Paulo Egon
Wiederkhern
01.01.1995 -
31.12.1998
Antônio Brito Filho
(PMDB)
Iara Wortmann
Lúcia Camini
01.01.1999 -
31.12.2002
Olívio Dutra (PT)
Lúcia Camini
Juçara Dutra Vieira
* Tabela elaborada por Josiane C. S. Ramos do Amaral.
** O período do mandato de presidência do CPERS/Sindicato não é o mesmo período do
mandato para Governador do Estado do Rio Grande do Sul, no entanto, este quadro foi
elaborado com o objetivo de apresentar os sujeitos que estavam à frente dos principais
cargos públicos voltados para a gestão da educação.
170
APÊNDICE C - ROTEIRO PARA ENTREVISTA (Secretários de
Educação)
1) Qual é a sua formação profissional?
2) Quais foram os momentos mais marcantes do seu período na Secretaria de
Educação?
3) Quais foram as políticas voltadas para a gestão educacional implantadas no
seu período?
4) Como era feita a construção destas políticas?
5) Quais as leis que regiam a gestão da educação no seu período?
6) Existiram políticas para o Conselho Escolar? Como eram escolhidos os
conselheiros?
7) Existiram políticas para a CPM? Como era feita a escolha dos participantes
do CPM?
8) Como era feita a escolha para diretor?
9) Com quais recursos a escola se mantinha?
10) Como era a relação da Secretaria de Educação com os principais setores
ligados à educação (CPERS, a ACPM/Federação e a UGES)?
171
APÊNDICE D - ROTEIRO PARA ENTREVISTA (Colaboradores)
1) Qual é a sua formação profissional?
2) Qual movimento social você estava envolvido? E qual o período?
3) Quais eram as reivindicações dos movimentos educacionais para a gestão
da educação?
4) Como era feita a construção das políticas de gestão democrática na época?
5) Quais as leis que regiam a gestão da educação na época?
6) Como era a relação da Secretaria de Educação com o movimento social ao
qual você estava envolvido?
7) Quais foram os principais embates na construção da política de gestão
democrática da educação?
8) Onde posso conseguir maiores informações sobre este tema?
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