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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Centro de Ciências Biológicas
Programa de Pós-Graduação em Biologia Vegetal
Tatiana Mota Miranda
ETNOBOTÂNICA DE RESTINGA EM COMUNIDADES DA ILHA DO
CARDOSO (SP) E DA ILHA DE SANTA CATARINA (SC)
Orientadora: Professora Doutora Natalia Hanazaki
Florianópolis
2006
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i
Miranda, Tatiana Mota
Etnobotânica de Restinga em Comunidade da Ilha do Cardoso (SP) e da Ilha
de Santa Catarina (SC). – 2005.
f. 147; grafs, tabs.
Orientador: Prof. Dra. Natalia Hanazaki
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de
Ciências Biológicas.
Bibliografia: f. 147.
1.Etnobotânica 2.Mata Atlântica 3.Restinga 4.Conhecimento local 5.Caiçaras
6.Açorianos.
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ii
Tatiana Mota Miranda
ETNOBOTÂNICA DE RESTINGA EM COMUNIDADES DA ILHA DO CARDOSO
(SP) E DA ILHA DE SANTA CATARINA (SC)
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Biologia Vegetal do Centro de
Ciências Biológicas da Universidade
Federal de Santa Catarina, como
parte dos requisitos para a obtenção
do título de Mestre em Biologia
Vegetal.
Orientadora: Professora Doutora Natalia Hanazaki
Florianópolis
2006.
iii
“Dedico este trabalho a meus pais, José Vicente e Maria Leonor.
Definitivamente, não existem palavras suficientes que traduzam
com a real dimensão
a importância de vocês em minha vida! ”
iv
Agradecimentos
Dirijo estas sinceras palavras àquelas pessoas que contribuíram, não somente para
minha formação profissional, como também pessoal durante minha estadia na Ilha
de Santa Catarina:
À Natalia Hanazaki, pela valiosa orientação, amizade, apoio,
companheirismo...Pelas construtivas discussões etnobotânicas, por me ensinar a ter
calma em momentos difíceis!
Ao Nivaldo Peroni, pela ajuda “multivariada” em gráficos, fotos e análises... Pelas
ótimas aulas e “etnodiscussões”.
À Tânia Tarabini Castellani, pela orientação no estágio de docência, pelas
discussões ecológicas, pelo ombro amigo, pelas boas risadas e pelo exemplo de
dedicação profissional.
Ao Mauricio Sedrez dos Reis, pelas valiosas contribuições ao longo do
desenvolvimento do trabalho.
Ao Daniel Falkenberg, pela grande ajuda na identificação das plantas e pela
correção inicial do projeto.
Aos professores dos Departamentos de Botânica e Antropologia, que possibilitaram
a abertura de novos caminhos e idéias: Clarice Leite, Ademir Reis e Miriam Grossi.
v
Ao pessoal do Parcelas Permanentes, especialmente, Ricardo Ribeiro Rodrigues,
Alzira Politi Bertoncini e Vinicius Castro Souza, pelo apoio na execução do projeto e
pela disponibilização do banco de dados.
Ao meu querido pai, pela revisão de português, pela ajuda nas tabelas... Pelo amor
incondicional...
À minha querida mãe, pelas palavras de incentivo e por me fazer acreditar que as
coisas sempre darão certo...
À minhas irmãs, Patrícia e Daniela, e meus irmãos Rafael, Kadú e Roberto... pela
alegria do reencontro!
Ao pequeno grande Luquinhas, que preenche de alegria a família Mota Miranda,
Alves, Brucker...
À amiga Cíntia Neves Godoi, pelo companheirismo, amizade e ajuda no campo.
À três grandes amigos que aqui encontrei e que, sem dúvida, fizeram de minha
passagem por Florianópolis, muito mais leve e divertida: Flávia Camargo de Oliveira,
Fernanda Ribeiro da Silva e Alex... Pelas discussões, ajudas em campo e as
intermináveis risadas.
À amiga Elaine Zuchiwschi, pela ajuda em campo, pela amizade e carinho.
vi
À Mirella Cultrera, pela grande ajuda em campo, pelo apoio, carinho e amizade.
Ao casal Bio Vegetal, Lucia e Peri, pela amizade.
À parceira de PGBVE , Cristina Baldauf, pelas conversas e “etnodiscussões”.
Aos moradores da Ilha do Cardoso, pela oportunidade de descobrir na simplicidade,
as melhores coisas da vida.
Aos moradores de Naufragados, pela valiosa contribuição na pesquisa.
Aos informantes que ajudaram na coleta de plantas.
Ao Murilo Mello, por continuar me mostrando que a vida pode ser ainda mais bonita!
Por nosso, tão esperado, final/início feliz!
À minha eterna república, pelo apoio pessoal, mesmo à distância...Pelo real valor de
uma amizade!!
À todos vocês, o meu mais sincero agradecimento!!!!!!
vii
Sumário
Resumo......................................................................................................................xiv
Abstract......................................................................................................................xvi
Introdução.....................................................................................................................1
Capítulo I: “Os caiçaras da Ilha do Cardoso e os descendentes de açorianos da Ilha
de Santa Catarina”.......................................................................................................4
I. Introdução.......................................................................................................5
II. Os caiçaras na Ilha do Cardoso.....................................................................6
III. Área de influência açoriana........................................................................20
IV. Métodos......................................................................................................26
V. Resultados e Discussão..............................................................................27
VI. Considerações Finais.................................................................................38
Capítulo II: “Conhecimento e uso de recursos vegetais”............................................40
I. Introdução.....................................................................................................41
II. Métodos.......................................................................................................45
III. Resultados e Discussão.............................................................................53
III.1. Principais espécies utilizadas.......................................................53
III.2. Comparações entre comunidades................................................65
III.3. Comparação entre gênero e idade...............................................81
IV. Considerações Finais.................................................................................86
Capítulo III: “Considerações sobre o acesso ao conhecimento tradicional associado
à biodiversidade e relato do repasse de resultados nas comunidades
estudadas”..................................................................................................................89
I. Introdução.....................................................................................................90
II. Acesso ao conhecimento associado à biodiversidade................................91
viii
III. Repasse de resultados.............................................................................105
III.1. O retorno nas comunidades da Ilha do Cardoso........................106
Cambriú e Foles.......................................................................106
Pereirinha e Itacuruçá..............................................................108
III.2. O retorno nas comunidades da Ilha de Santa Catarina..............111
Naufragados.............................................................................111
IV. Considerações Finais...............................................................................113
Considerações Finais...............................................................................................114
Referências Bibliográficas........................................................................................117
Anexos......................................................................................................................132
ix
Índice de Figuras
Capítulo I: “Os caiçaras da Ilha do Cardoso e os descendentes de açorianos da Ilha
de Santa Catarina”.......................................................................................................4
Figura I.1: Localização das comunidades estudadas, no litoral sul do Estado
de São Paulo................................................................................................................9
Figura I.2: a) Instalações do Núcleo Perequê: alojamento de
pesquisadores............................................................................................................10
b) Instalações do Núcleo Perequê: alojamento de visitantes.10
Figura I.3: Transporte diário – “Minke”.............................................................11
Figura I.4: Comunidade de Pereirinha.............................................................12
Figura I.5: Restaurante localizado na comunidade de Itacuruçá.....................14
Figura I.6: Bar localizado na comunidade de Itacuruçá...................................14
Figura I.7: Capela desativada, situada na comunidade de Itacuruçá..............15
Figura I.8: Construção destinada à recepção de turistas, situada na
comunidade de Itacuruçá...........................................................................................15
Figura I.9: Vista geral da paia de Cambriú......................................................16
Figura I.10: Moradia caiçara da comunidade de Cambriú...............................17
Figura I.11: Sede escolar da comunidade de Cambriú...................................18
Figura I.12: Vista geral da praia de Foles, indicada com a seta......................19
Figura I.13: Moradia caiçara da comunidade de Foles....................................19
Figura I.14: Moradia caiçara da comunidade de Foles....................................20
Figura I.15: Localização da comunidade estudada, no sul da Ilha de Santa
Catarina......................................................................................................................23
x
Figura I.16: Capela localizada na comunidade de Naufragados.....................24
Figura I.17: Moradia da comunidade de Naufragados....................................25
Figura I.18: Moradia da comunidade de Naufragados....................................25
Figura I.19: Procedência dos entrevistados por grupo de comunidades
estudadas. .................................................................................................................30
Figura I.20: Escolaridade dos entrevistados por grupo de comunidades
estudadas...................................................................................................................31
Figura I.21: Atividades dos entrevistados por grupo de comunidades
estudadas...................................................................................................................32
Capítulo II: “Conhecimento e uso de recursos vegetais”............................................40
Figura II.1: Agrupamento com base no coeficiente de Bray Curtis para as
comunidades de Pereirinha........................................................................................66
Figura II.2: Agrupamento, com base no coeficiente de Sorensen para as
comunidades estudadas.............................................................................................67
Figura II.3: Agrupamento, feito pelo coeficiente de Bray Curtis para as plantas
citadas nas comunidades estudadas.........................................................................69
Figura II.4: Porcentagens de plantas citadas em cada categoria de uso........75
Figura II.5: Curvas de riqueza esperada para o total de plantas citadas nas
comunidades estudadas, de acordo com o número de entrevistas...........................80
Figura II.6: Curvas de riqueza esperada para as plantas citadas, de acordo
com gênero dos informantes......................................................................................82
Figura II.7: Número de etnoespécies citadas em cada categoria de uso, de
acordo com o gênero dos entrevistados....................................................................83
xi
Figura II.8: Curvas de riqueza esperada para as plantas citadas, de acordo
com a idade dos informantes.....................................................................................85
Capítulo III: “Considerações sobre o acesso ao conhecimento tradicional associado
à biodiversidade e relato do repasse de resultados às comunidades
estudadas”..................................................................................................................89
Figura III.1: Menina caiçara, lendo o folheto contendo informações sobre a
pesquisa...................................................................................................................109
Figura III.2: Repasse de resultados na comunidade de Cambriú (Ilha do
Cardoso-SP).............................................................................................................110
xii
Índice de Tabelas
Capítulo I: “Os caiçaras da Ilha do Cardoso e os descendentes de açorianos da Ilha
de Santa Catarina”.......................................................................................................4
Tabela I.1: Características sócio-econômicas dos entrevistados....................33
Tabela I.2: Número de entrevistados nas comunidades, de acordo com o
tempo de residência nos locais pesquisados, por grupo de comunidades................34
Tabela I.3: Número de entrevistados de acordo com as atividades
desenvolvidas nos locais pesquisados, por grupo de comunidades..........................36
Capítulo II: “Conhecimento e uso de recursos vegetais...........................................40
Tabela II.1: Plantas conhecidas e utilizadas pelos moradores de Pereirinha,
Itacuruçá, Foles e Cambriú (Ilha do Cardoso – SP) e Naufragados (Ilha de Santa
Catarina –SC)............................................................................................................54
Tabela II.2: Características gerais das comunidades estudadas quanto ao
conhecimento etnobotânico........................................................................................71
Tabela II.3: Plantas mais citadas por grupo de comunidades, de acordo com o
número de citação por entrevistado...........................................................................72
Tabela II.4: Número de citações de plantas cultivadas e não cultivadas e já
utilizadas nos grupos de comunidades estudadas.....................................................76
Tabela II.5: Comparações de índices de diversidade (Riqueza, Shannon-
Wiener e Simpson) e de equitabilidade (Shannon-Wiener e Simpson) entre o total
de etnoespécies citadas nos grupos de comunidades estudadas.............................77
xiii
Tabela II.6: Comparações de índices de diversidade (Riqueza, Shannon-
Wiener e Simpson) e de equitabilidade relativos ao gênero e idade dos
informantes.................................................................................................................81
xiv
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo geral estudar a etnobotânica de
comunidades litorâneas em áreas de Restinga, analisando o uso de recursos
vegetais para fins alimentares, medicinais e manufatureiros, além de investigar a
atual situação de dois grupos populacionais quanto ao conhecimento e uso dos
recursos vegetais locais, comparando também as maneiras com que ambos os
grupos, com modos de vida semelhantes, mas de origem e localização geográfica
distintas, utilizam os recursos naturais de que dispõem. O estudo foi realizado em
duas regiões onde a vegetação de Restinga arbórea está presente: a Ilha do
Cardoso (SP) e a porção sul da Ilha de Santa Catarina (SC). Os capítulos que
compoem este trabalho consistem: a) na caracterização do perfil sócio-econômico
das populações estudadas; b) na descrição das formas de utilização dos recursos
vegetais de cada comunidade, analisando o conhecimento etnobotânico e
comparando-o entre as diferentes áreas de estudo; e c) em considerações sobre o
acesso ao conhecimento tradicional associado à biodiversidade e a devolução de
resultados às comunidades estudadas. Em linhas gerais constatou-se que, além de
possuírem uma identidade cultural mais evidente, os caiçaras da Ilha do Cardoso
apresentam um conhecimento acerca dos recursos vegetais distinto daquele dos
descendentes de açorianos da Ilha de Santa Catarina, sendo ele mais diverso e
associado à vegetação de Restinga. O conhecimento local acerca do uso dos
recursos vegetais mostra-se heterogeneamente distribuído, conforme o gênero e a
idade dos informantes. Desta forma, verificou-se que homens apresentam um maior
conhecimento acerca das espécies vegetais presentes na mata, enquanto que as
mulheres mostram-se mais familiarizadas com espécies medicinais. Em relação à
idade dos informantes, nota-se o conhecimento de uma maior diversidade de plantas
xv
citadas entre os informantes mais velhos do grupo estudado, o que pode indicar uma
perda do conhecimento entre os moradores mais jovens. Por fim, são tecidas
algumas considerações sobre as questões atuais relacionadas com o acesso ao
conhecimento tradicional associado à biodiversidade.
Palavras-chave: Etnobotânica; Mata Atlântica; Restinga; Conhecimento local;
Caiçaras; Açorianos.
xvi
Abstract
The present study has the general objective of study the ethnobotany of coastal
communities in areas of Restinga, analyzing the use of plants for medicine, food and
handicraft purposes, investigating the actual situation of two local populations
concerning their knowledge and use of plants and comparing the way these distinct
groups, with similar livelihoods but with distinct origin and localization use the plant
resources. The chapters of this study are about: a) the characterization of the studied
populations; b) the description of plant use, the analysis of this knowledge and
comparisons between the studied areas; and c) considerations about the access of
traditional knowledge and the devolution of the results to the studied communities.
We notice that caiçaras have a stronger cultural identity and a distinct knowledge
about plant resources when compared with people descendent from açorianos, being
this knowledge more diverse and associated with the Restinga. The local knowledge
about the plant use is differently distributed, considering the gender and age of the
informants. In this study we noted that men were more knowledgeable about the
forest plants while women have more familiarity with medicinal plants. Considering
the age of the informants we found a higher knowledge among the older ones,
situation that could indicate a lost of knowledge among the youngest interviewees.
And, finally, some considerations about questions related with the access of the
traditional knowledge associated to biodiversity are made.
Key-words: Ethnobotany; Atlantic Forest; Restinga; Local knowledge; Caiçaras;
Açorianos.
1
Introdução
Há pouco mais de 500 anos, os europeus, ao desembarcarem na costa
brasileira em busca de novas terras e riquezas, depararam-se com uma exuberante
vegetação, denominada posteriormente de Mata Atlântica. Cobrindo, na época, uma
área aproximada de 1.000.000 Km
2
, distribuída do estado do Rio Grande do Norte
ao Rio Grande do Sul, ela se reduz atualmente a apenas cerca de 7% de sua
cobertura original (Myers, 1997; Morellato e Haddad, 2000; SOS Mata Atlântica,
2003).
Considerada aqui como um bioma, a Mata Atlântica se compõe, conforme
registra o Decreto nº 750, de 10 de fevereiro de 1993 (Anexo I), de distintas
formações florestais e ecossistemas associados: a Floresta Ombrófila Densa
Atlântica, a Floresta Ombrófila Mista, a Floresta Ombrófila Aberta, a Floresta
Ombrófila Estacional Semidecidual, a Floresta Ombrófila Decidual, manguezais,
campos de altitude, brejos interioranos e restingas. Devido às constantes ameaças
que vem sofrendo e, por apresentar elevados índices de espécies endêmicas, ela é
considerada o quarto “hotspot” para conservação da Biodiversidade mais ameaçado,
entre os 25 estabelecidos no mundo (Myers,1998; Myers et al., 2000).
Apesar de ser uma área prioritária para a conservação da biodiversidade e,
como tal, apresentar-se protegida pela legislação brasileira (com destaque para o
artigo 225 da Constituição Federal de 1988 (Anexo II) e o citado Decreto nº 750),
fatores como o desmatamento, a industrialização e a agricultura extensiva,
intensificados a partir de 1950, além da elevada densidade populacional registrada
na área, são os principais responsáveis, segundo Wilson (1997), pelo
desaparecimento de grande parte da cobertura da Mata Atlântica no Brasil. Tal
2
devastação provoca danos irreparáveis ao meio ambiente e também ameaça de
extinção diversas comunidades tradicionais nela instaladas, que, apesar de
constituírem parte importante da identidade cultural do país (MMA, 2002), estão,
segundo Plotkin (1988), desaparecendo mais rapidamente do que as florestas em
que habitam.
No litoral brasileiro, encontram-se pelo menos cinco tipos de comunidades
tradicionais
1
, de modos de vida bastante semelhantes, porém de distintas origens
(Diegues e Arruda, 2001; Willems, 2003). Tais populações caracterizam-se por
possuírem conhecimentos, práticas e crenças próprios e intimamente relacionados a
processos adaptativos, adquiridos e perpetuados pela transmissão cultural,
envolvendo as relações entre os seres vivos e seu ambiente (Berkes, 1999). No
litoral sudeste e sul do Brasil existem, respectivamente, grupos populacionais de
origem caiçara e açoriana, que habitam áreas de Restinga da Mata Atlântica.
A Restinga brasileira é um ecossistema costeiro, composto por um conjunto
diversificado de comunidades biológicas, distintas florística e fisionomicamente,
comuns em solos arenosos pouco desenvolvidos, formando complexos
vegetacionais pioneiros. Compreende fisionomias originalmente
herbáceas/subarbustivas, arbustivas ou arbóreas, que variam de acordo com a
inundação do terreno e o teor da salinidade. Pode apresentar-se em mosaico ou em
certa zonação, geralmente no sentido oceano-continente, ocorrendo aumento tanto
da lenhosidade e da altura da vegetação, como também do número de espécies
ocorrentes (Barros et al. 1991; Falkenberg, 1999; Sampaio et al., 2005).
Valendo-se de abordagem contemporânea da Etnobotânica, que busca
entender as formas como as populações percebem as plantas, a maneira como
1
Açorianos, caiçaras, pescadores artesanais, jangadeiros e praieiros. Para um maior detalhamento
sobre tradicionalidade, ver Diegues e Arruda (2001).
3
interpretam tais percepções, as influências desse processo nas atividades da
comunidade e como tudo isso se reflete, afinal, no ecossistema do qual dependem
as sociedades (Davis, 1995), o presente trabalho pretende aprofundar o estudo das
relações entre esses dois tipos de grupos populacionais, de origem caiçara e
açoriana, e a Restinga em que habitam, ampliando o conhecimento acerca da
cultura de cada um deles. Este estudo, portanto, tem como objetivo geral estudar a
etnobotânica de comunidades litorâneas em áreas de Restinga, analisando o uso de
plantas para fins alimentares, medicinais e manufatureiros, além de investigar a
atual situação desses grupos locais quanto ao conhecimento e ao uso dos recursos
vegetais locais, comparando também as maneiras com que ambos os grupos, com
modos de vida semelhantes, mas de origem e localização geográfica distintas,
utilizam os recursos naturais de que dispõem e registrando ainda sugestões que
poderão eventualmente subsidiar futuras propostas de manejo ou adequar planos de
manejo vigentes.
É oportuno ressaltar também que, diferentemente do que ocorre com
populações caiçaras, a escassez de estudos etnobotânicos evolvendo comunidades
de influência açoriana foi fator decisivo para a definição do tema.
Os três capítulos de que se compõe a dissertação consistem, em síntese e
pela ordem: a) na caracterização do perfil sócio-econômico das populações
estudadas; b) na descrição das formas de utilização dos recursos vegetais de cada
comunidade, analisando o conhecimento etnobotânico e comparando-o entre as
diferentes áreas de estudo; e c) em considerações sobre o acesso ao conhecimento
tradicional associado à biodiversidade e ao repasse dos resultados às comunidades
estudadas.
4
Capítulo I
“Os caiçaras da Ilha do Cardoso e os descendentes de açorianos
da Ilha de Santa Catarina”
Foto: Natalia
Hanazaki
Pescador da Ilha do Cardoso
5
I. Introdução
Para a elaboração deste estudo etnobotânico comparativo sobre moradores
de áreas de restinga, foi necessário selecionar localidades que, embora situadas em
regiões geograficamente distintas, fossem ocupadas por comunidades que, apesar
de diversas em origem e/ou influências, compartilhassem algumas características.
A comprovada existência de comunidades caiçaras com histórico de uso de
recursos na Ilha do Cardoso (Milanelo, 1992; Parada, 2004) definiu a realização da
pesquisa em povoados situados no interior da ilha e próximos a áreas com mata de
restinga, sobre os quais nenhum estudo etnobotânico foi ainda publicado. Na
escolha da comunidade de Naufragados, consideraram-se, além do fato de situar-se
em área de restinga arbórea, a possibilidade de se estabelecerem comparações
com as populações selecionadas da Ilha do Cardoso, e também a inexistência de
estudos etnobotânicos sobre populações de influência açoriana em questão.
Embora vivam próximos de grandes centros urbanos e, por isso, tenham
contato com a medicina moderna e com outros recursos “urbanos” para alimentação
e manufatura, os moradores das comunidades estudadas nestas localidades ainda
mantêm conhecimentos sobre plantas e seus respectivos usos, provavelmente
devido à sua restrita condição econômica (Prance, 1991), que os torna relativamente
dependentes dos recursos florestais para sobrevivência (Figueiredo et al. 1993).
O aumento da especulação imobiliária, o turismo (Silva, 1993) e a criação de
unidades de conservação de uso restrito, além da devastação das florestas que as
abrigam, constituem ameaças à sobrevivência dessas comunidades (Hanazaki,
1997), se não forem adequadamente consideradas. Em tal contexto e destacando as
6
características desses grupos populacionais, tais comunidades mostram-se
adequadas a estudos etnobotânicos.
O objetivo desse primeiro capítulo é, pois, caracterizar as quatro comunidades
caiçaras e a de origem açoriana estudadas, destacando-lhes as características
sócio-econômicas e culturais.
II. Os caiçaras na Ilha do Cardoso
Habitantes rurais nativos da Floresta Atlântica, na região que se estende do
litoral norte do Paraná ao litoral sul do Rio de Janeiro, os caiçaras são o resultado da
miscigenação entre índios e portugueses (Mussolini, 1980). Sobrevivem da
agricultura de pequena escala, com o cultivo predominante da mandioca (Mendonça,
2000), de produtos obtidos com a pesca artesanal e da extração de recursos do
ambiente, como plantas empregadas para fins alimentares e medicinais (Begossi,
1998), com o que garantem a subsistência familiar. Segundo Willems (2003), esta
dependência dos recursos naturais para a sobrevivência confere-lhes uma
característica de alta adaptabilidade ao ambiente em que estão inseridos.
Nos últimos 20 anos, os caiçaras têm se dedicado também, para a obtenção
de recursos financeiros, a atividades relacionadas ao turismo (Begossi et al., 2002a).
De acordo com Hanazaki (1997), esses nativos podem desempenhar papel de
destaque na conservação da Mata Atlântica, em função do seu vasto conhecimento
sobre a natureza, acumulado ao longo de gerações, e passível, segundo Toledo
(1987), de ser transformado em valioso aliado na busca da melhoria da qualidade de
vida das populações mundiais. Estudos feitos sobre algumas comunidades caiçaras
7
(Begossi et al., 2002b; Figueiredo et al., 1993; Hanazaki et al., 1996; 2000)
evidenciaram a importância de seu conhecimento para conservação do meio
ambiente, em decorrência da concepção sistêmica que dele possuem (Berkes et al.,
1999).
A riqueza da cultura caiçara não se restringe, porém, aos conhecimentos
sobre o ambiente natural que habitam. A história dessa gente registra, por exemplo,
o costume de festejar o fim dos mutirões – dias de trabalho coletivo – ao som do
ritmo musical conhecido como fandango, em que homens e mulheres participavam
de danças típicas, como o batido e o vilão, cujas letras, da autoria dos violeiros,
contavam suas histórias ou sonhos (Mendonça, 2000).
Todas essas características podem ser igualmente encontradas entre os
habitantes da Ilha do Cardoso, localizada no litoral sul do Estado de São Paulo,
entre as coordenadas 25º 05' a 25º 15' Lat S e 47º 53' a 48º 06' Long W. No local,
encontram-se também vestígios de antiga ocupação humana, como, por exemplo, a
existência de sambaquis que indicam a presença de uma civilização anterior à dos
índios guaianãs e carijós, que habitavam a região quando da chegada dos europeus
em 1501 (Barros et al., 1991; Plano de Manejo do PEIC, 2000; Sampaio et al.,
2005).
A partir de 1650, várias famílias de moradores da região se estabeleceram na
ilha, tornando-a, na época, uma das localidades mais habitadas da região (Barros et
al., 1991). De acordo com Mendonça (2000), o número total de habitantes da Ilha do
Cardoso correspondia a 391 pessoas em 1998, população declinante em relação à
de 1974, quando a ilha contava com cerca de 420 moradores, mas semelhante à
constatada em 1991, de 384 pessoas. Esta autora atribui essa diminuição
populacional a vários fatores: declínio da agricultura; início da pesca comercial;
8
busca pelos ilhéus de melhores de condições de vida, incluindo serviços mais
complexos e avançados de educação e saúde; mudanças de atividade profissional e
a transformação da ilha em unidade de conservação de uso restrito (Mendonça,
2000).
Em face da sua importância biológica, criou-se na ilha, em 1962, pelo Decreto
nº 40.319, o Parque Estadual da Ilha do Cardoso (PEIC), compondo o complexo
lagunar de Iguape/Cananéia/Paranaguá. Abrangendo 22.500ha, o PEIC é
constituído por áreas de Floresta Pluvial de Encosta e Planície, Manguezal e
Restinga, além da Praia Arenosa e Costão Rochoso (IF, 2004). Para a elaboração
do presente estudo, das comunidades existentes no parque foram selecionadas as
de Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú, por estarem estabelecidas em áreas com
mata de Restinga, sobre as quais poucas pesquisas etnobotânicas foram até hoje
publicadas (Milanelo, 1992; Parada, 2004) (Figura I.1).
9
Fonte: Instituto de Pesca - Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento do Litoral
Sul do Estado de São Paulo (2004).
Figura I.1: Localização das comunidades estudadas, no litoral sul do Estado de São Paulo.
Separado do continente pela Bacia de Trapandé, o Parque Estadual da Ilha
do Cardoso – PEIC (Figura I.1), com sede instalada na zona urbana de Cananéia,
conta com transporte diário para o Núcleo Perequê, (Figuras I.2 e I.3), na ilha,
destinado principalmente à condução dos seus funcionários que residem no
continente. Partindo de Cananéia e navegando pela Bacia de Trapandé,
desembarca-se na comunidade de Pereirinha (Figura I.4).
10
Fotos: Tatiana Miranda
Figura I.2: a) Instalações do Núcleo Perequê: alojamento de pesquisadores
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.2: b) Instalações do Núcleo Perequê: alojamento de visitantes
11
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.3: Transporte diário – “Minke”
Foto: Natalia Hanazaki
Figura I.4: Comunidade de Pereirinha
12
A comunidade de Pereirinha (Figuras I.1 e I.4) é composta
predominantemente por funcionários do PEIC, que atuam como monitores
ambientais ou como responsáveis pela manutenção do Núcleo Perequê, que, criado
em 1978, é também conhecido como Centro de Pesquisas Aplicadas de Recursos
Naturais da Ilha do Cardoso - CEPARNIC (Barros et al., 1991). Dotado de infra-
estrutura para o atendimento de visitantes e pesquisadores, o Centro conta com
alojamento, dependências de recepção, laboratórios e museu (Figura I.2). De acordo
com Mendonça (2000), a construção do CEPARNIC, por ter demandado obras de
aterro, acarretou grandes alterações na região.
Segundo levantamentos realizados nos anos de 1974, 1991 e 1998, a
comunidade de Pereirinha era composta respectivamente de 12, 23 e 13 habitantes
(Mendonça, 2000). Atualmente observações de campo, confirmadas por
informações bibliográficas (Milanelo, 1992) registram-lhe seis casas: três delas
habitadas usualmente por famílias, totalizando 12 moradores e as três moradias
restantes utilizadas ocasionalmente para acomodação temporária de eventuais
monitores e vigias do PEIC. A localidade não dispõe de serviços de saúde,
educacionais e comerciais e o abastecimento de água é feito a partir da captação de
nascentes da região, Entretanto, apresenta um sistema de captação de energia
solar, assim como um gerador.
Localizada na face estuarina da ilha, nas proximidades do Núcleo Perequê, a
comunidade de Itacuruçá (Figura I.1) possui infra-estrutura modesta para
atendimento de turistas, mais freqüentes no verão, constituída por um restaurante e
um bar (Figura I.5 e I.6), ambos de propriedade de moradores do local. Conta
também com uma pequena capela (Figura I.7), no momento desativada e ainda com
uma pequena construção destinada à recepção de turistas (Figura I.8).
13
Semelhantes, em parte, aos de Pereirinha, seus moradores não podem se valer, na
localidade, de serviços médicos, de escola, de qualquer outro estabelecimento
comercial além do restaurante e do bar. O sistema de captação de água é o
semelhante ao de Pereirinha. Porém, como em Pereirinha, contam também com
sistema de captação de energia solar. Levantamentos populacionais anteriores
revelam que, em 1974, a comunidade apresentava 24 habitantes, número que
declinou, nos anos de 1991 e 1998, para respectivamente 15 e 10 moradores
(Mendonça, 2000).
Atualmente, nas sete residências existentes habitam cerca de 18 pessoas, de
elevado grau de parentesco com os moradores de Pereirinha, cujas principais
atividades econômicas são a pesca e a monitoria de turismo vinculado ao PEIC
(Milanelo, 1992; Mendonça, 2000), a que são escalados pela administração,
conforme o agendamento das visitas. Convém ressaltar que o declínio populacional
é atribuído, pelos próprios moradores locais, principalmente à busca por melhores
serviços de educação e de saúde. Pereirinha e Itacuruçá são comunidades
instaladas em áreas de Restinga, com moradias em terrenos de vegetação pioneira
de dunas e de Restinga arbórea.
14
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.5: Restaurante localizado na comunidade de Itacuruçá
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.6: Bar localizado na comunidade de Itacuruçá
15
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.7: Capela desativada, situada na comunidade de Itacuruçá.
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.8: Construção destinada à recepção de turistas, situada na comunidade de Itacuruçá.
16
A comunidade de Cambriú está localizada, como a de Foles, na face oceânica
da Ilha do Cardoso (Figuras I.1 e I.9). Seu acesso ao local é possível por barco, pela
praia ou por trilhas no interior da mata. Ambas são consideradas as comunidades
mais isoladas da Ilha, por situarem-se a cerca de três horas das localidades de
maior contingente populacional: Marujá, no sentido sudoeste, e Pereirinha e
Itacuruçá, na direção norte. Cambriú dista cerca de 50 minutos de Cananéia, em
percurso feito por barcos de alta velocidade (voadeiras).
Foto: Flávia Oliveira
Figura I.9: Vista geral da praia de Cambriú.
17
A denominação da comunidade deriva do nome do rio que corta a região.
Atualmente, a população local, ocupante de 13 casas (Figura I.10), é de 49
moradores, que, segundo levantamentos anteriores, já somaram, em 1974, 1991 e
1998, respectivamente, 34, 22 e 53 moradores (Mendonça, 2000). As atividades
principais são a pesca e serviços ligados ao turismo (Milanelo, 1992). O número de
crianças da região (n=20, em 2005) justifica o núcleo escolar, que atende também
alunos da comunidade vizinha, Foles. Segundo informações dos moradores, a cada
ano uma nova professora leciona em classe multisseriada do Ciclo I (1ª à 4ª série)
do ensino fundamental, alternando os dias de trabalho docente (cerca de 15
mensais) com estadas no continente (Figura I.11).
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.10: Moradia caiçara da comunidade de Cambriú
18
Foto: Natalia Hanazaki
Figura I.11: Sede escolar da comunidade de Cambriú
A comunidade de Foles, situada nas proximidades de Cambriú, localiza-se em
área mais exposta à ação dos ventos oceânicos (Figuras I.1 e I.12). Seus atuais 19
moradores (Milanelo, 1991 e observações de campo), incluindo crianças, que já
foram 16 em 1974, 22 em 1991 e 52 em 1998 (Mendonça, 2000), oriundos de um
segmento da mesma família que formou Cambriú, residem hoje em oito moradias
(Figura I.13 e I.14). Tal como em Itacuruçá, o declínio populacional pode ser
atribuído, principalmente, à busca por serviços médicos e educacionais em áreas
urbanas. A principal atividade dos moradores é a pesca e, mais recentemente, o
turismo. Note-se que a comunidade não conta com serviços comerciais e médicos
nem com energia elétrica, sendo água captada nas nascentes da região.
19
Foto: Flávia Oliveira
Figura I.12: Vista geral da praia de Foles, indicada com a seta.
Foto: Natalia Hanazaki
Figura I.13: Moradia caiçara da comunidade de Foles
20
Foto: Natalia Hanazaki
Figura I.14: Moradia caiçara da comunidade de Foles
III. Área de influência açoriana
No litoral sul do país são encontradas comunidades costeiras, de influência
açoriana, que resultaram de um fluxo de imigração para o Brasil, ocorrido em
meados do século XVIII.
O povoamento do arquipélago de Açores pelos portugueses teve início por
volta do ano de 1432, dada a necessidade de se aumentar a produção de trigo, para
manter abastecido o reino português. Durante praticamente todo o século XV, as
ilhas açorianas foram tidas como grandes celeiros de trigo e importantes
exportadoras de plantas tintureiras. No início do século XVI, o arquipélago passa de
grande fornecedor a entreposto vigilante e protetor do Atlântico, atuando na
prestação de serviços a navios e viajantes. O auge dessa fase se deu em 1583,
21
quando Filipe II da Espanha torna-se também rei de Portugal (Crosby, 2002;
Lacerda, 2003).
Em 1640, o “fim da União Ibérica” e a intensificação da exploração do ouro no
Brasil acabam por reduzir a importância do arquipélago. A partir dessa época, tem
início a imigração açoriana para o Brasil, com o incentivo da coroa portuguesa que
pretendia, dessa forma, diminuir a pobreza e reduzir o crescimento da população
nos Açores, além de preencher vazios demográficos, resultantes de um rearranjo
das fronteiras entre as colônias portuguesas e espanholas no Brasil, na Argentina e
no Paraguai. Foi entre 1748 e 1756 que os açorianos desembarcaram com maior
intensidade no Brasil, particularmente nos estados do sul do país: Santa Catarina e
Rio Grande do Sul. Dedicaram-se, na época, à agricultura de pequena escala, à
pesca e à confecção de artesanato, que lhes assegurava a subsistência; eram
chamados, de acordo com a ocupação, de lavradores, pescadores e artesãos e
possuíam amplo conhecimento sobre o ambiente em que viviam e uma rica cultura
(Lacerda, 2003; Ribeiro, 2004).
A comunidade da praia de Naufragados, situada no extremo sul da Ilha de
Santa Catarina pode ser considerada, por sua origem, de influência açoriana.
Formada por uma colônia de pescadores e posseiros ocasionais, o lugarejo possuía
em 2002 cerca de 78 moradias, contabilizando aproximadamente 178 habitantes
(Reis, 2002). Segundo Diegues e Arruda (2001), populações de origem açoriana
dedicam-se também ao turismo. Segundo Reis (2002), a denominação do local se
deve a um naufrágio ocorrido em 1751, quando um barco de imigrantes açorianos foi
a pique em decorrência da fúria das águas.
22
A comunidade se insere no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (PEST),
criado em 1975, através do Decreto nº 1.260, tendo como justificativas o elevado
potencial hídrico da região e a sua importância como hábitat de várias espécies
animais e vegetais ameaçadas de extinção (CECCA, 1997). Na condição de maior
unidade de conservação do estado de Santa Catarina, o PEST ocupa uma área de
87.405ha, correspondente a 1% do território estadual e abrange nove municípios:
Palhoça, Santo Amaro da Imperatriz, Águas Mornas, São Bonifácio, São Martinho,
Imaruí, Garopaba, Paulo Lopes e Florianópolis, além das ilhas de Fortaleza,
Araçatuba, Ilha do Andrade, Papagaio Pequeno, Três Irmãs, Moleques do Sul, Siriú,
Coral e dos Cardos. Em seus domínios encontram-se áreas de Restinga,
Manguezais, Floresta Ombrófila Densa e Floresta Ombrófila Mista e Campos de
Altitude (CECCA, 1997; FATMA, 2004) (Figura I.15).
23
Fonte: Ferretti, 2002, alterado.
Figura I.15: Localização da comunidade estudada, no sul da Ilha de Santa Catarina
Situada no extremo sul da Ilha de Santa Catarina, no município de
Florianópolis, a praia de Naufragados dista 42 km do centro da cidade (Figura I.15).
A via de acesso principal é a estrada que termina no bairro Caeira da Barra Sul,
ponto de parada dos veículos, a partir do qual se segue por uma trilha, cujo percurso
se faz em aproximados 40 minutos. No Costão Oeste da localidade está o Farol de
Naufragados, inaugurado pela Marinha brasileira em 1861, em área cujas
adjacências pertencem ao Exército Brasileiro. Atualmente destruída, até a década
de 1980 havia ali uma vila de casas destinadas ao abrigo de militares, que cuidavam
24
do controle físico da área (Reis, 2002). Os moradores contam com uma capela
(Figura I.16), mas não dispõem de serviços de saúde, educacionais, de
estabelecimentos comerciais nem de energia elétrica e saneamento básico.
Foto: Natalia Hanazaki
Figura I.16: Capela localizada na comunidade de Naufragados
Atualmente, a comunidade tem cerca de 20 moradores, residentes em 15
casas, (Figura I.17 e I.18) que, além da prática da pesca e de atividades de turismo,
prestam serviços como autônomos nos arredores. Segundo Reis (2002), em 2002,
seus moradores mantinham uma associação, a AMOPRAN (Associação de
Moradores da Praia de Naufragados).
25
Foto: Tatiana Miranda
Figura I.17: Moradia da comunidade de Naufragados
Foto: Cintia Godoi
Figura I.18: Moradia da comunidade de Naufragados
26
A comunidade tem também uma população flutuante que, embora não resida
permanentemente no local, possui ali casas de veraneio, utilizadas pelos
proprietários em feriados e durante as temporadas, ou alugadas a terceiros.
É notória a animosidade latente dos moradores locais para com as
instituições ambientais, devido ao fato da área pertencer a um Parque Estadual. A
fim de conter a degradação ambiental e a ocupação desordenada da área, em 1999,
a FATMA (Fundação Estadual do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina), o
IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), a
FLORAM (Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis) e o Ministério
Público Federal e Estadual, por meio de ação judicial, obtiveram mandato para a
demolição de várias moradias e de outros tantos barracos de pescadores, utilizados
para a guarda de botes e baleeiras, ação que marcou o auge do conflito (Reis,
2002).
Ainda hoje, ao se percorrer o local, vislumbram-se as ruínas de casas
demolidas ou lacradas naquela ocasião, que, segundo informações dos moradores,
pertenciam a pessoas que não as utilizavam para moradia fixa.
IV. Métodos
A metodologia utilizada para a obtenção dos dados consistiu na realização de
entrevistas semi-estruturadas
2
com os moradores locais, residentes no local há pelo
menos 5 anos, maiores de 18 anos, de ambos os sexos, com questões relativas a
aspectos sócio-econômicos do entrevistado e envolvendo seu conhecimento sobre
2
As entrevistas semi-estruturadas são métodos amplamente utilizados na etnobotânica, baseadas em
tópicos pré-definidos que permitem ao pesquisador certa flexibilidade, facilitando, durante a
entrevista, o direcionamento do diálogo para as questões a serem investigadas (Viertler, 2002).
27
os recursos vegetais da região e seus respectivos usos (Hanazaki et al., 1996;
2001a) (Anexo II). Por se tratarem de comunidades relativamente pequenas (menos
de 15 famílias) foram entrevistados todos os moradores que se dispuseram a
colaborar.
O trabalho de campo demandou também uma fase anterior à coleta de dados
propriamente dita. Estabeleceu-se contato prévio com os moradores das
comunidades selecionadas para explicitar-lhes os propósitos do projeto, a fim de
verificar sua viabilidade junto aos potenciais partícipes da pesquisa. A aproximação
inicial ocorreu em março de 2004, quando foi feita a primeira visita às comunidades
estudadas. As entrevistas foram realizadas em contatos posteriores, nos meses de
agosto a novembro de 2004 e de janeiro a abril de 2005.
V. Resultados e discussão
Foram entrevistados, no total, 63 moradores: 51 residentes na Ilha do
Cardoso (9 em Pereirinha; 11 em Itacuruçá; 8 em Foles; 23 em Cambriú) e 12 na
comunidade de Naufragados, Ilha de Santa Catarina. Considerando-se o reduzido
tamanho de cada uma, as relações de parentesco existentes, assim como a
proximidade geográfica, as comunidades estudadas foram reunidas nos três
seguintes grupos:
Grupo I: Pereirinha e Itacuruçá;
Grupo II: Foles e Cambriú;
Grupo III: Naufragados.
28
Dos 20 entrevistados
3
nas comunidades de Pereirinha (9) e Itacuruçá (11),
55% são homens e 45% mulheres. 50% deles apresentam idade entre 18 e 30 anos
e, dos demais, 5%, estão na faixa de 31 a 40 anos; 15% têm entre 41 a 50 anos e
20% entre 51 a 60 anos. Os maiores de 61 anos totalizam 10%. Dos informantes,
90% (n=18) são caiçaras de origem, ou seja, nasceram no próprio local ou nas
proximidades (Figura I.19). Em relação ao tempo de residência, 95% dos
entrevistados moram na localidade há mais de 10 anos, sendo de 63 anos o tempo
máximo informado de residência na área. Quanto à escolaridade, 65% (n=13)
declararam não ter concluído o ensino fundamental, 30% (n=6) chegaram ao ensino
médio e os 5% (n=1) restantes consideram-se analfabetos (Figura I.20). No tocante
à atividade profissional, para 60% dos moradores o turismo é a atividade principal,
seguido da pesca (30%), do cumprimento das atribuições de cargo público (15%) e
da execução de afazeres domésticos (1%)
4
(Figura I.21). Em relação ao vínculo
empregatício, 50% são funcionários do PEIC, onde trabalham como monitores e
vigias (Tabela I.1).
O segundo grupo, composto por moradores de Foles e Cambriú, envolveu 31
entrevistados
2
(Foles 8; Cambriú 23), 58% do sexo masculino e 42% do sexo
feminino. Em relação à idade, 45% encontram-se na faixa etária dos 18 aos 30 anos,
13%, com idade entre 31 e 40 anos; 26%, de 41 e 50 anos; 3%, de 51 e 60 e 13%,
têm mais de 61 anos. Todos eles (n=31) podem ser considerados caiçaras, naturais
da Ilha do Cardoso ou de localidades próximas, como Cananéia (Figura I.19), e 87%
desses moradores vivem na região há mais de 10 anos, com o tempo máximo de
residência no local chegando a atingir 70 anos. Os 13% restantes, que ali moram há
3
Do número inicial de entrevistados potenciais, somente quatro pessoas do primeiro grupo e sete do
segundo não participaram, ou por se recusarem a fazê-lo ou por não terem sido encontradas em
nenhum dos momentos do trabalho de campo.
4
Alguns moradores chegam a ocupar-se com mais de uma atividade e foram considerados em cada
uma delas, razão pela qual a soma das porcentagens ultrapassa 100%.
29
menos de 10 anos, migraram de praias vizinhas do PEIC para os atuais locais de
residência. Quanto ao nível de escolaridade, 84% (n=26) não concluíram o ensino
fundamental, 13% (n=4) são analfabetos e 3% (n=1) alcançaram o ensino médio,
apesar de não concluí-lo (Figura I.20). Diferentemente dos componentes do grupo
anterior, a principal atividade desenvolvida pelos moradores locais é a pesca (54%),
com 13% deles se ocupando com o turismo, alguns exercendo até mesmo ambas
atividades (Figura I.21). A execução dos afazeres domésticos constitui a principal
ocupação para 42% das mulheres. Como fonte de renda complementar, no verão,
algumas famílias alojam turistas, locando dependências das próprias residências ou
áreas de terreno para praticantes de camping (Tabela I.1).
O terceiro grupo foi composto por 12 pessoas residentes em Naufragados
5
,
50% homens e 50% mulheres, 25% deles com idade entre 18 e 30 anos; 8% na
faixa etária de 31 e 40 anos; 25%, entre 41 e 50 anos; 25%, entre 51 e 60 anos e
17% maiores de 61 anos. 58% desses moradores são originários de Florianópolis ou
municípios próximos, como Paulo Lopes e 42% vieram de locais mais distantes,
incluindo estados, como São Paulo e Paraná. Há até mesmo argentinos. Quanto à
origem, ao contrário do quadro encontrado na Ilha do Cardoso, nenhum desses
moradores nasceu na praia de Naufragados (Figura I.19), embora 67% deles lá
residam há mais de 10 anos. O tempo máximo de permanência atingiu 40 anos. Foi
baixo o nível de escolaridade apurado, como, aliás, o das demais localidades. 75%
(n=9) chegaram até o ensino fundamental, 17% (n=2) são analfabetos e 8% (n=1)
atingiram o ensino médio (Figura I.20). Em relação à ocupação, apurou-se um
quadro distinto do dos grupos anteriores: 42% dos informantes vivem da pesca; 33%
atuam como empregados autônomos, como vigias e faxineiras, e 25% desenvolvem
5
Do número inicial de entrevistados potenciais oito moradores não participaram devido, sem dúvida, à
manifesta desconfiança demonstrada ao serem questionados sobre o uso de plantas. Os conflitos
com a direção do PEST provavelmente explicam a atititude.
30
atividades relacionadas ao turismo (Figura 1.21). 33% das mulheres ocupam-se com
afazeres domésticos (Tabela I.1).
7
18
31
5
2
0
0
5
10
15
20
25
30
35
Naufragados Pereirinha/Itacuruçá Foles/Cambriú
Local ou proximidades Outras regiões**
Figura I.19: Procedência dos entrevistados por grupo de comunidades estudadas.
Valores absolutos (Naufragados=12 entrevistas; Pereirinha/Itacuruçá=20 entrevistas; Foles/Cambriú=31
entrevistas).
Outras regiões** = inclui outros estados (PR, RS), e países (AG).
31
2
1
4
9
6
26
1
13
1
0
5
10
15
20
25
30
Naufragados Pereirinha/Itacuruçá Foles/Cambriú
Analfabeto Ensino Fundamental Ensino Médio
Figura I.20: Escolaridade dos entrevistados por grupo de comunidades estudadas
(Naufragados=12 entrevistas; Pereirinha/Itacuruçá=20 entrevistas; Foles/Cambriú=31 entrevistas).
32
12
6
3
2
0
4
17
0
13
0
3
5
0
44
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
Turismo Pesca Funcionalismo
público
Lar Terceirizados
Pereirinha/Itacuruçá Foles/Cambriú Naufragados
Figura I.21: Número de pessoas que praticaram cada atividade, por grupo de comunidades
estudadas.
Valores absolutos (Naufragados=12 entrevistas; Pereirinha/Itacuruçá=20 entrevistas; Foles/Cambriú=31
entrevistas).
A soma das respostas por grupo excede o total de entrevistados, pois alguns deles exercem mais de
uma atividade.
33
Tabela I.1: Características sócio-econômicas dos entrevistados.
Dados sócio-econômicos Pereirinha/Itacuruçá Cambriú/Foles Naufragados
Homens 55% 58% 50%
Sexo
Mulheres 45% 42% 50%
18 a 30 anos 50% 45% 25%
31 a 40 anos 5% 13% 8%
41 a 50 anos 15% 26% 25%
51 a 60 anos 20% 3% 25%
Idade
61 anos 10% 13% 17%
Local 90% 100% 0
Origem
Externa 10% 0 100%
< 10 anos 5% 13% 33%
Tempo de residência
> 10 anos 95% 87% 67%
Analfabeto 5% 13% 17%
Ensino Fundamental 65% 84% 75%
Escolaridade
Ensino Médio 30% 3% 8%
Turismo 60% 13% 25%
Pesca 30% 54% 42%
Funcionalismo 15% 0 0
Lar 1% 42% 33%
Atividade
profissional
Terceirizados 0 0 33%
Total de entrevistados
20 31 12
34
A análise comparativa dos resultados aponta que as maiores diferenças entre
as comunidades se referem ao local de origem dos entrevistados e à atividade por
eles desenvolvida. Em relação à origem, é possível se afirmar que os moradores das
comunidades da Ilha do Cardoso são majoritariamente caiçaras nativos,
característica confirmada quando se considera também o tempo de residência no
local. Em relação ao tempo de permanência, com a aplicação do teste qui-quadrado
para independência, a 5% de significância, percebe-se que as proporções
comparadas diferem estatisticamente (
F
2
= 26,13, a 4 graus de liberdade) (Tabela
I.2).
Tabela I.2: Número de entrevistados nas comunidades, de acordo com o tempo de residência nos
locais pesquisados, por grupo de comunidades.
Comunidades
Pereirinha/Itacuruçá Foles/Cambriú Naufragados
Tempo
Número de informantes Total
menos de 10 anos 1 1 4
6
de 11 até 40 anos 6 2 8
16
toda vida 13 28 0
41
Total 20 31 12 63
Várias outras comunidades do litoral do estado de São Paulo apresentam
também porcentagens semelhantes de moradores caiçaras. No litoral norte: Puruba
e Picinguaba, com 86% de moradores caiçaras; Ilha de Búzios: com 75%; Gamboa:
com 93% e Jaguanum: 80% (Begossi, 1995); Almada: 87% e Cambriú: 95%
(Hanazaki, 1997). No litoral sul: Icapara: com 91%; Pedrinhas: com 89% e São
Paulo Bagre: com 96% (Hanazaki, 2001). Por outro lado, em Naufragados, 100%
dos entrevistados vieram de outras localidades, quer do próprio município de
Florianópolis ou de municípios vizinhos, em áreas de influência açoriana, quer de
outros estados e país. Tal constatação torna possível concluir que, baseado na
35
origem dos entrevistados, a influência açoriana é menor na formação da identidade
cultural da comunidade de Naufragados, quando comparada à influência caiçara na
formação da identidade cultural dos habitantes da Ilha do Cardoso. Também os
recém-chegados habitantes, oriundos de outros estados e do exterior, trouxeram
novos valores e costumes que modificaram os traços característicos da cultura
açoriana propriamente dita.
Diferença considerável também se nota entre os caiçaras e os de influência
açoriana, ao se observarem as atividades profissionais de cada grupo. A pesca é a
principal ocupação dos moradores de Foles e Cambriú e em Itacuruçá e Pereirinha,
60% ocupam-se do turismo e mantêm-se vinculados ao PEIC. Em Naufragados, um
terço dos moradores trabalha em empregos terceirizados
6
, como autônomos, e,
apesar de constituir-se como a principal atividade, a pesca é sazonal e periódica.
Para os três grupos, o turismo é uma atividade ainda recente que, apesar de
tida como secundária por alguns moradores, apresenta relativa importância para
algumas localidades, como as de Pereirinha e Itacuruçá, devido, provavelmente, à
sua proximidade com o Núcleo Perequê. Considerando as atividades de maior
destaque, pesca e turismo, o cálculo do teste qui-quadrado para independência, a
5% de significância, evidenciou que as proporções relativas a elas são distintas (
F
2
= 9,16; 2 graus de liberdade) (Tabela I.3).
6
As atividades terceirizadas realizadas pelos moradores são predominantemente aquelas em que atuam como
vigias e faxineiras, desenvolvidas no centro da cidade de Florianópolis (SC), para as quais são temporariamente
contratados.
36
Tabela I.3: Número de entrevistados de acordo com as atividades desenvolvidas nos locais
pesquisados, por grupo de comunidades.
Comunidades
Pereirinha/Itacuruçá Foles/Cambriú Naufragados
Atividades
Número de informantes
Total
turismo* 12 4 3
19
pesca* 6 17 5
28
funcionalismo público 3 0 0
3
lar 2 13 4
19
terceirizados
0 0 4
4
Total 18 21 8 47
* Atividades para as quais calculou-se o teste qui-quadrado para independência.
Autores como Robben (1982), Mansperger (1995), Diegues (2004), Parada
(2004), Calvente et al. (2004), avaliam as conseqüências da introdução do turismo
em pequenas sociedades. Robben (1982) afirma a respeito que, em muitos
aspectos, o turismo mostra-se benéfico, ao criar, por exemplo, novas oportunidades
econômicas. Entretanto, conflitos relativos à posse de terra; aumento da
dependência de sociedades locais em relação aos grandes centros urbanos; a
estratificação social; deslocamento da população; mudanças na forma de
subsistência; e a perda de autonomia são algumas das conseqüências negativas
que também podem advir (Robben, 1982; Mansperger, 1995).
Ao considerar a questão, Parada (2004) afirma que a adaptação de
sociedades locais a novas situações, como a prática do turismo (aspecto
característico de culturas caiçaras) apresenta-se como um processo natural de
qualquer cultura, não implicando necessariamente na sua descaracterização. A
população envolvida precisa, porém, conscientizar-se do valor e da importância de
sua cultura, para que o capital oriundo do turismo contribua para a sua preservação
(Parada, 2004; Calvente et al., 2004).
Nas comunidades de Itacuruçá e Pereirinha notam-se algumas
conseqüências positivas da prática de atividades turísticas. Alguns moradores,
37
quase sempre jovens, atuam como monitores ambientais do PEIC e, ao serem
avisados das visitas previamente agendadas, organizam-se para receber os turistas,
guiando-os, quando chegam, pelo Parque, nas visitas às instalações do Núcleo
Perequê e conduzindo-os em caminhadas pelas trilhas existentes. A atividade
contribui, na prática, para a conservação da natureza, uma vez que envolve as
populações locais e os setores administrativos do PEIC, sedimentando conceitos e
princípios ecológicos, valorizando e evitando a descaracterização da cultura local e
contribuindo para a preservação do meio ambiente.
Em Foles e Cambriú, a atividade turística é ainda bem incipiente,
provavelmente em decorrência das dificuldades de acesso a cada local. Por isso, a
pesca ainda é a principal como fonte de sobrevivência. Alguns moradores dedicam-
se ao turismo com o intuito de complementar sua renda, e recebem turistas, quer
alugando suas próprias casas, quer cedendo, mediante pagamento, área de seus
terrenos para a montagem de barracas. Para tanto, mediante solicitação, precisam
obter autorização da direção do PEIC para construir uma estrutura mínima de
camping. O número permitido de barracas, nessas condições, é de seis para cada
sanitário em uso.
Em Naufragados, atividades relacionadas ao atendimento de turistas vêm
sendo praticadas por alguns moradores, embora, muitas vezes, sua prática tenha
sido impedida pela administração do PEST.
38
VI. Considerações finais
As comunidades dos três grupos estudados apresentam semelhanças quanto
a algumas características, como número de entrevistados por sexo e por nível de
escolaridade e diferenciam-se em relação à origem, à atividade profissional e ao
tempo de residência dos entrevistados no local.
Na Ilha do Cardoso, tanto em Pereirinha e Itacuruçá quanto em Foles e
Cambriú, constata-se que a grande maioria é natural da própria Ilha e, uns poucos,
de locais próximos, diferentemente de Naufragados, onde todos os entrevistados
vieram de outras localidades. Assim, a comunidade de Naufragados é composta
tanto por pessoas oriundas de áreas próximas, de influência da colonização
açoriana, como por pessoas oriundas de áreas urbanas ou de regiões bastante
distantes. O tempo médio de residência no local das comunidades da Ilha do
Cardoso foi também duas vezes superior ao dos residentes em Naufragados.
Considerando-se a atividade profissional dos entrevistados, é possível
identificar efeitos aparentemente benéficos do exercício de ocupações turísticas
para os moradores de Pereirinha e Itacuruçá. Incentivados pela administração do
PEIC, com tais atividades buscam-se, afinal, a conservação florestal e a valorização
da cultura local, ameaçadas pela proximidade com os centros urbanos. Em Foles e
Cambriú, apesar de, por não serem tão perceptíveis as suas conseqüências, ser
ainda difícil avaliá-la, a prestação de serviços turísticos melhora, sem dúvida, a
renda dos que a ela se dedicam. O controle exercido pela administração do Parque
garante que a atividade, introduzida de forma relativamente gradual e organizada,
não cause maiores danos ao ambiente. Os efeitos da iniciativa merecem, porém,
investigações mais aprofundadas, uma vez que isso não foi aqui analisado. Em
39
Naufragados, merecem maior atenção os cuidados para impedir a destruição das
áreas de Restinga e evitar a poluição delas e do mar, do que iniciativas que
minimizem as ameaças à identidade cultural dos moradores, que mostra-se já
descaracterizada como comunidade nativa.
Pode-se afirmar que os habitantes da Ilha do Cardoso são realmente
caiçaras, que mantêm vivas ainda hoje as principais características de sua
identidade cultural, até mesmo por residirem no local ao longo de várias gerações.
Em Naufragados, porém, os moradores locais, poucos deles descendentes de um
grupo populacional de influência originalmente açoriana, já não mais apresentam as
características distintivas desses ancestrais, cujo amplo conhecimento sobre as
práticas de pesca e agricultura chegava, por exemplo, a configurá-los como
comunidade tradicional (Diegues e Arruda, 2001). A constatada descaracterização
cultural, decorrente da mudança de valores, causada inclusive pela incorporação ao
grupo de novos componentes, recém-chegados ao local, ocupando-se com
atividades não mais ligadas à natureza, não permite mais considerá-los como sendo
realmente um grupo populacional de origem e cultura marcadamente açoriana.
Alternativamente, trata-se de uma comunidade com um histórico de uso de recursos
locais mais recente, com alguma influência da colonização açoriana, mas também
com influências mais diversificadas.
40
Capítulo II
“Conhecimento e uso de recursos vegetais”
Foto: Flávia Oliveira
Vista Panorâmica da Restinga – Comunidade de Foles e Cambriú (Ilha do Cardodo, SP)
Fotos: Natalia Hanazaki
Armadilha de pesca Canoa caiçara Moradia caiçara
41
I. Introdução
Devido à sua incontestável importância para a sobrevivência humana e frente às
inúmeras ameaças que vem sofrendo, a conservação da biodiversidade tem sido foco
de atenção de vários estudos, cujos argumentos de defesa abrangem dimensões desde
ecológicas, econômicas e políticas, até étnicas, estéticas e utilitárias (Hanazaki, 2003).
Até a década de 1980, dentro de uma corrente mais “clássica” da Biologia, os
conservacionistas preconizavam que a conservação da biodiversidade deveria limitar-se
a atividades de proteção, manutenção e restauração do mundo natural e que, para ser
efetivamente preservada, carecia estar separada de sociedades humanas (Diegues,
2000). Há pelo menos 25 anos, discussões relativas à importância e valorização do
Conhecimento Ecológico Local para a conservação da biodiversidade começaram a
ganhar espaço (Hanazaki, 2003), dando lugar a uma corrente, cuja visão encara a
conservação, o desenvolvimento e as populações locais, como ingredientes
intrinsecamente associados. Característico de sociedades não industriais e com
histórico de uso dos recursos naturais (Berkes et al., 1995), o Conhecimento Ecológico
Local pode ser entendido como “um conjunto de conhecimentos, práticas e crenças
acumulados, que evoluem através de processos adaptativos, passando por gerações
através da transmissão cultural, sobre as relações entre seres vivos e entre estes e seu
ambiente”, sendo, na prática, sinônimo de conhecimento indígena, local ou
etnoecológico (Berkes, 1999).
De natureza diversa do conhecimento científico, o Conhecimento Ecológico Local
está estruturado com base em componentes morais, éticos, espirituais e intuitivos de
determinadas sociedades e não considera isoladamente as relações sociais,
42
supranaturais e ambientais, característica esta que lhe confere um caráter integrador de
conhecimentos, práticas e crenças. Resultado de longas e sistemáticas observações de
locais particulares ou ecossistemas regionais e de práticas baseadas no “aprender
fazendo”, ao evidenciar, em inúmeras ocasiões, as complexas interações ambientais, o
Conhecimento Ecológico Local enfatiza a dependência de tais sociedades dos recursos
locais, aos quais tais populações acomodam-se, guiadas por processos adaptativos
que lhes otimizam a capacidade de resiliência e lhes permitem a conseqüente
sobrevivência nos respectivos ambientes (Berkes et al., 1995).
Berkes et al. (1995) afirmam que, devido a tais características, o Conhecimento
Ecológico Local é de fundamental importância para a conservação, ao possibilitar o
oferecimento de novos “insigths” biológicos e ecológicos; a promoção de modelos de
manejo sustentáveis dos recursos; a educação no interior de áreas protegidas e de
conservação; a criação de planos de desenvolvimento mais adequados, e de
avaliações ambientais, bem como o desenvolvimento de uma nova ciência da
conservação.
De acordo com Tuxill e Nabhan (2001), o sucesso da conservação é resultado de
um trabalho integrado entre pesquisadores, moradores locais e profissionais atuantes
na área de manejo, fatores aos quais, somente a partir da década de 1960, se deu
maior importância. Tais autores destacam também que a eficácia dos esforços
conservacionistas aumenta quando prioritariamente se investigam os recursos
utilizados e sua importância local, dos quais pode-se ocupar também a Etnobotânica.
A Etnobotânica, termo concebido em 1895, é a ciência que teve origem nas
numerosas observações de exploradores, missionários, naturalistas e botânicos ao
estudarem o uso de plantas por comunidades de todo o mundo (Davis, 1995), e pode
43
ser definida como o estudo das interações homem-planta, considerando os aspectos
naturais e sociais de ecossistemas dinâmicos (Alcorn, 1995). Devido à sua
interdisciplinaridade, decorrente do vasto campo de estudo, a Etnobotânica apresenta
metodologias diversas, originárias tanto das ciências biológicas quanto sociais. Inclui
também técnicas de diversas disciplinas como economia, linguística, ecologia,
antropologia e farmacologia (Prance, 1991; Cotton, 1996). Segundo Di Stasi (1996),
essa característica tem sido reconhecida como ponto crucial para o desenvolvimento de
estudos mais elaborados, profundos e, conseqüentemente, de maior credibilidade
científica e menores probabilidades de erros.
Nesse contexto, principalmente a partir da década de 1980, nota-se, na
Etnobotânica, o surgimento de uma corrente mais quantitativa, definida por Phillips
(1996) como “a aplicação direta de técnicas quantitativas para análise de dados de uso
de plantas”. A Etnobotânica quantitativa pode ser usada para, entre outras finalidades,
estudar a relação entre a diversidade biológica e cultural, incluindo a avaliação da
intensidade do uso dos recursos naturais por populações nativas; estabelecer
comparações entre comunidades distintas ou segmentos de uma mesma comunidade;
analisar os tamanhos amostrais do universo a ser investigado (Begossi, 1996b). Para
tanto, tais estudos valem-se de medidas de diversidade, análises multivariadas
(Begossi et al. 2002a; Hanazaki et al., 1996, Höft et al, 1999) e utilizam também
índices, como alocação subjetiva, valores de usos totais e o consenso de informantes
7
(Phillips, 1996; Silva, 2005).
7
Maior detalhamento sobre alocação subjetiva, valores de usos totais e consenso de informantes em
Phillips, 1996.
44
Segundo Albuquerque (1997, 1999), a acumulação do conhecimento oriundo das
investigações etnobotânicas possibilita a promoção de programas para a utilização do
conhecimento tradicional e dos complexos sistemas de manejo e conservação dos
recursos naturais dos povos tradicionais. Possibilita, também, o reconhecimento e a
preservação de plantas potencialmente importantes em seus respectivos ecossistemas
e a descoberta de substâncias de origem vegetal com aplicações médicas e industriais.
A Etnobotânica mostra-se igualmente útil inclusive quando aplicada a estudos de
sociedades não tradicionais, como as agrícolas e urbanas (Silva-Almeida e Amorozo,
1998; Pilla, 2002). De natureza distinta das que perscrutam o Conhecimento Ecológico
Local, pesquisas tais podem auxiliar no entendimento das relações entre populações e
o ambiente, das transformações que ocorrem ao longo de um período de tempo, no
resgate cultural de costumes e crenças perdidos com a aquisição de novos e diversos
valores, pontos fundamentais para a valorização da cultura de qualquer sociedade,
tradicional ou não, urbana ou agrícola (Pilla, 2002).
O presente capítulo tem como objetivos descrever e analisar o conhecimento e o
uso de plantas por comunidades locais habitando áreas onde encontra-se vegetação de
restinga, e com diferentes influências culturais (caiçaras e influência açoriana),
identificando-lhes semelhanças e diferenças e comparando os resultados obtidos.
Partindo-se do pressuposto de que, em face da grande diversidade biológica da
Mata Atlântica (Myers et al., 2000; Brooks et al., 2002), os grupos estudados que
interagem diretamente com este bioma podem acumular amplo conhecimento sobre
suas espécies vegetais e que, apesar de distintas em relação à origem, as
comunidades caiçaras e as de influência açoriana podem apresentar o mesmo padrão
de uso do ambiente florestal, buscou-se especificamente:
45
- efetuar um registro das plantas conhecidas e utilizadas por comunidades dos
dois grupos populacionais, assim como verificar a existência de potencial econômico
das principais espécies;
- analisar a distribuição do conhecimento nas e entre as comunidades;
- comparar o conhecimento etnobotânico nas diferentes áreas de estudo.
As perguntas que direcionaram a investigação foram:
1) Há diferença no conjunto total de plantas usadas entre os moradores da Ilha
do Cardoso e da Ilha de Santa Catarina?
2) É maior o número de plantas nativas usadas pelas comunidades mais
isoladas?
3) O conjunto das plantas conhecidas pelos moradores das comunidades mais
isoladas é mais diversificado?
4) Há diferenças no tipo de conhecimento dos entrevistados, quando se lhes
considera o gênero e a idade?
II. Métodos
Os dados sobre o conhecimento e uso de plantas pelas comunidades estudadas
foram obtidos por meio de entrevistas individuais (veja Capítulo I e Anexo III) -
realizadas nos períodos de agosto a novembro de 2004 e de janeiro e fevereiro de
2005. Os informantes foram solicitados a nomear as plantas que conheciam e a indicar-
lhes a respectiva utilidade. As informações eram anotadas pela entrevistadora nas
fichas de campo, categorizando as seguintes finalidades: manufatura, alimentação,
46
remédio e outras. As anotações das informações fornecidas pelos entrevistados
ocorriam no momento da entrevista, em cujos locais e ocasião eram também, se
possível, coletadas as plantas citadas. Nos casos de localização em sítio distante ou de
difícil acesso, solicitava-se ao informante ou a outro morador que igualmente bem
conhecesse a planta citada, que indicasse onde a planta poderia ser encontrada e que
participasse também das coletas, nas quais foram recolhidas amostras reprodutivas das
espécies ou, quando isto não foi possível, amostras vegetativas.
Os procedimentos da coleta, efetuada com auxílio de moradores locais,
atenderam os padrões metodológicos definidos para estudos etnobotânicos (Ming,
1996), com a posterior herborização das amostras. A identificação inicial das plantas,
feita com a utilização de material bibliográfico (Lorenzi e Moreira de Souza, 2001;
Lorenzi e Abreu Matos, 2002; Souza e Lorenzi, 2005; Sampaio et al., 2005; Wanderley
et al., 2001; 2002; 2003; 2004), foi posteriormente confirmada pelo Professor Doutor
Daniel Falkenberg, do Departamento de Botânica da Universidade Federal de Santa
Catarina. As amostras coletadas foram registradas e depositadas no Herbário ESA
(ESALQ/USP) – espécies vegetais mencionadas na Ilha do Cardoso – e no Herbário
FLOR (UFSC), espécies coletadas na Ilha de Santa Catarina. As amostras não
depositadas nos herbários, por apresentarem apenas material vegetativo, foram
incorporadas ao acervo do Laboratório de Ecologia Humana e Etnobotânica
(Departamento de Ecologia e Zoologia/UFSC), bem como as fichas de campo utilizadas
nas entrevistas.
Os dados foram analisados qualitativa e quantitativamente, por meio de
ferramentas utilizadas em etnobotânica (Begossi, 1996a; Begossi et al., 2002a;
Hanazaki et al., 1996). Primeiramente efetuou-se a descrição geral das espécies
47
utilizadas pelas cinco comunidades, considerando-se: o número de etnoespécies
8
citadas, as espécies e famílias botânicas; seu local de origem
9
; a(s) categoria(s) de uso
e o potencial econômico das espécies mais citadas.
A etapa seguinte da análise foi realizada com o auxílio de análises multivariadas
(Valentin, 1995; 2002; Höft et al., 1999; Peroni, 2002), que, de acordo com Höft et al.
(1999), mostram-se muito úteis à Etnobotânica, uma vez que permitem analisar os
dados de diferentes amostras coletadas, considerando-lhes as variáveis particulares. A
verificação da existência de similaridades quanto ao uso e ao conhecimento dos
recursos vegetais pelas comunidades de Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú, na Ilha
do Cardoso (SP) e Naufragados, na Ilha de Santa Catarina (SC), se fez com a utilização
do agrupamento, uma técnica multivariada que consiste em agrupar objetos e
reconhecer entre eles um grau de similaridade suficiente para reuni-los num mesmo
conjunto (Valentin, 1995). Para tal, compuseram-se três agrupamentos distintos, nos
quais se consideraram as comunidades ou os informantes como unidades amostrais e
as plantas ou suas características (origem e uso), como variáveis.
O primeiro agrupamento foi feito com base na freqüência relativa
10
de cada
planta citada por comunidade. Tendo em vista o uso de dados quantitativos, optou-se
pelo emprego do coeficiente de distância Bray Curtis, uma vez que este não considera
8
O termo etnoespécie é aqui empregado como sinônimo de nome popular de uma planta, da
denominação pela qual ela é conhecida e chamada vulgarmente. Na catalogação das etnoespécies,
notaram-se as ocorrências de: a) homonimia (um mesmo nome popular para designar plantas de
espécies diferentes, cujos exemplos são a hortelã - utilizado para denominar a Mentha arvensis L. e a
Mentha sp – e o boldo, empregado para designar a Plectranthus barbatus Andrews, a Vernonia
condensata Baker e a Salvia sp) e b) sinonimia (vários nomes populares pelos quais se denominam uma
única espécie, caso de capim-limão, capim-cidró e erva-cidreira, todos utilizados para designar a
Cymbopogon citratus).
9
Refere-se, neste trabalho ao local em que a planta ocorre naturalmente, sendo, como tal, considerada:
planta nativa (de Restinga e/ou áreas do domínio mata atlântica) e planta exótica (oriundas de outras
áreas).
10
A freqüência relativa é estimada dividindo-se o número de citações de cada planta pelo número total de
citações.
48
as duplas-ausências e é influenciado pelas espécies dominantes (as plantas mais
citadas mostram a similaridade entre as amostras) (Valentin, 1995; 2000). O método de
agrupamento escolhido foi o UPGMA
11
, por ter apresentado menor grau de distorção,
medido pelo valor do coeficiente cofenético, mostrando-se, dessa forma, mais
adequado para a representação dos dados.
O segundo agrupamento, baseado na presença e na ausência da citação de
cada planta por informante, foi efetuado através do coeficiente de similaridade de
Sorensen, devido à natureza binária dos dados, pela não consideração das duplas
ausências e ainda por dar peso àquilo que está realmente presente na amostra
(Valentin, 1995; 2000). O método de agrupamento escolhido foi o mesmo do anterior,
pelas razões já declaradas.
Finalmente, o terceiro agrupamento foi realizado considerando-se as condições
de local de coleta (mata ou cultivo) e de uso (medicinal; manufatura, alimentar e outros)
das plantas, também com o auxílio do coeficiente de distância Bray Curtis, por meio do
método UPGMA de agrupamento. O coeficiente de distância de Bray Curtis equivale ao
coeficiente de similaridade de Sorensen, sendo, porém, o primeiro usado para dados
quantitativos e o segundo para dados binários (Valentin, 1995; 2000). Para as análises
multivariadas utilizou-se o programa FITOPAC 1 for Windows, de autoria de prof. G. J.
Shepherd (Departamento de Botânica, UNICAMP).
Na última etapa, fez-se a análise de diversidade das plantas citadas. Tendo em
vista que a diversidade envolve tanto a riqueza de espécies de determinado local, como
11
Este método de agrupamento, também conhecido como método da associação média, calcula a média
aritmética da similaridade ou da distância entre o objeto que se quer incluir num grupo e cada objeto
desse grupo. O objeto é atribuído ao grupo com o qual ele tem a maior similaridade média (ou da
distância) com todos os objetos (Valentin, 1995).
49
a forma pela qual elas se encontram distribuídas (abundância ou eqüitabilidade), ela
pode ser expressa por meio de índices (Krebs, 1998), de emprego comum na
etnobotânica (Begossi, 1996a, b; Hanazaki, 2001), como os de Shannon-Wiener e
Simpson e as curvas de rarefação, que permitem comparações objetivas entre o
conhecimento local em diferentes comunidades e entre distintos segmentos de uma
mesma comunidade, e são ferramentas auxiliares úteis ao entendimento da dinâmica
deste conhecimento (Begossi, 1996).
Os índices de diversidade de Shannon-Wiener e Simpson e as curvas de
rarefação foram estimados para as plantas citadas nas comunidades, considerando-se
as etnoespécies e aplicados também em relação ao gênero e à idade dos informantes.
Nos dois últimos casos, realizou-se a análise com o total de informantes entrevistados
na pesquisa, independente da comunidade à qual pertenciam, pois a análise isolada
por local resultaria excessivamente segmentada. Em relação à idade, compuseram-se
duas classes etárias: de 18 a 40 e de 41 a 70 anos, cujo corte foi definido em razão do
tempo médio de vida dos informantes e pelo fato de constituírem classes padrões,
comumente utilizadas em estudos etnobotânicos (Figueiredo et al, 1993; Rossato et al.,
1999; Hanazaki et al, 2000).
50
Segundo Zar (1996), o índice de Shannon-Wiener (H’) pode ser calculado por:
H’= n logn - fi logfi / n
onde: n = número de total de indivíduos por espécie (ou, no caso deste
estudo, número de citações de cada planta);
fi = número de observações em cada categoria (ou, no caso deste
estudo, número total de citação por planta).
O índice de diversidade de Simpson (1/D) é dado por (Magurran, 1988):
1/D = 1 / pi
2
onde: pi = ni / N
sendo: ni = número de indivíduos (citações) para a espécie i;
N = total de indivíduos (citações).
51
As comparações estatísticas dos índices de Shannon-Wiener foram feitas com a
utilização do teste t (Zar, 1996), através da fórmula:
t = (H’
1
H’
2
)/ (SH
1
H
2
)
onde:
S
H’
1
H’
2
= (S
2
H’1
+ S
2
H’2
)
1/2
A variância é calculada por:
S
2
H
= ( fi log
2
fi – ( fi log fi)
2
/ n ) / n
2
onde:
S = riqueza
fi
= freqüência (número de observações em cada categoria - no caso deste
estudo, número total de citação por planta).
n = numero total de citações
Os graus de liberdade são dados por:
v = [(S
2
H’1
+ S
2
H’2
)
2
]
/ {[(S
2
H’1
)
2
/ n
1
] + [(S
2
H’2
)
2
/ n
2
]}
52
Segundo Magurran (1988), o índice de equitabilidade de Shannon-Wiener pode
ser calculado por:
E = H’ / H
max
onde: H
max
= log S
sendo: S = riqueza
De acordo com Krebs (1989), a equitabilidade de Simpson é dada por:
E
1/D
= (1/D) / S
onde: 1/D = índice de diversidade de Simpson
S = riqueza
O método da rarefação, que permite estimar o número esperado de espécies em
determinada amostra, possibilitando a comparação entre amostras de diferentes
tamanhos, complementa os índices de Shannon-Wiener e Simpson, que se mostram
suscetíveis, respectivamente, ao tamanho amostral e às espécies dominantes (Krebs,
1989; Begossi, 1996). As curvas de rarefação foram construídas com o software
Estimates 7.5, desenvolvido por Colwell (2005), de acordo com a fórmula:
53
onde: E(S) = número esperado de espécies na amostra rarefeita (riqueza
esperada para dado n);
n = tamanho padronizado da amostra;
N = número de entrevistas em que a espécie i foi mencionada
III. Resultados e discussão
III.1. Principais espécies utilizadas
Pelos 63 moradores locais entrevistados (12 em Naufragados, 9 em Pereirinha;
11 em Itacuruçá; 8 em Foles e 23 em Cambriú), foram citadas 264 etnoespécies,
correspondentes a 201 espécies científicas, agrupadas em 76 famílias botânicas.
Considerando-lhes o status, apuraram-se 111 plantas nativas e 109 exóticas
12
. As
famílias botânicas com maior número de espécies foram Myrtaceae (25 espécies);
Asteraceae (18 espécies), Poaceae (17 espécies), Lamiaceae (12 espécies),
Euphorbiaceae (10 espécies), Arecaceae e Rutaceae (as duas últimas com 9 espécies
cada) (Tabela II.1). Resultado semelhante foi obtido por Hanazaki et al. (2000), ao
estudar comunidades caiçaras do município de Ubatuba, litoral norte de São Paulo.
12
Restaram sem identificação em relação à espécie, à família botânica e ao status, respectivamente, 47,
30 e 29 plantas.
54
Tabela II.1: Plantas conhecidas e utilizadas pelos moradores de Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú (Ilha do Cardoso
– SP) e Naufragados (Ilha de Santa Catarina –SC).
Local: N=Naufragados; PI=Pereirinha/Itacuruçá; F/C= Foles/Cambriú. Usos: 1- Manufatura; 2- Medicamento; 3 –
Alimento; 4 - Outros. A Identificação botânica foi feita por Prof. Dr. Daniel Falkenberg (Departamento de Botânica,
UFSC); * Espécies que não tiveram o uso indicado
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
abacate
Persea americana Mill.
Lauraceae exótica N-PI-CF 2-3
abacaxi
Ananas comosus (L.) Merril
Bromeliaceae exótica N 3
abóbora
Cucurbita moschata Duchesne ex. Poir.
Cucurbitaceae exótica CF 2-3
abricó
Mammea americana Beccari L.
Clusiaceae exótica CF 3
abutiá
Butia odorata Beccari
Arecaceae nativa N 3
acerola
Malphighia glabra Crantz L.
Malpighiaceae exótica N 3
aipim / mandioca
Manihot esculenta Crantz
Euphorbiaceae nativa N-PI-CF 3
aipo
Apium sp.
Apiaceae nativa PI-CF 2
alface
Lactuca sativa L.
Asteraceae exótica N 3
Ocimum sp.
Lamiaceae exótica
alfavaca
Ocimum vulgare L.
Lamiaceae exótica
N 3
alga marinha
Ulva fasciata Delile
Ulvaceae nativa N 3
alho Allium sativum L. Liliaceae exótica PI-CF 2
almeirão
Chicorium sp.
Asteraceae exótica CF 3
amendoeira / chapéu-de-sol
Terminalia catappa L.
Combretaceae exótica N-CF 3-4
anador / novalgina
Achillea millefolium L.
Asteraceae exótica N 2
ananás-de-raposa indet. Bromeliaceae nativa PI 2-3
anoga
Aleurites moluccana Willd.
Euphorbiaceae exótica N 4
araçá / araçá-roxo
Psidium cattleyanum Sabine
Myrtaceae nativa N-PI-CF 1-2-3
55
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
araçapeva
Marlierea racemosa (Vell.) Kiaersk
Myrtaceae nativa PI 1
arapaçu indet. indet. nativa PI-CF 1
araribá
Centrolobium sp.
Fabaceae nativa PI 1
Annona crassifolia Mart.
Annonaceae nativa
araticum
Rollinia sericea (R. E. Fr.) R. E. Fr.
Annonaceae nativa
N-PI-CF 2-3
arnica / calêndula
Wedelia trilobata (L.) H. Rob. & Cuatrec
Asteraceae exótica N-CF 2
aroeira
Schinus terebinthifolia Raddi
Anacardiaceae nativa N-PI-CF 1-2-4
arroz
Oryza sativa L.
Poaceae exótica CF 3
babosa
Aloe sp.
Liliaceae exótica N-PI 2
baga-de-espinho indet. indet. indet N *
bambu indet. Poaceae exótica PI-CF 1
bambu-da-índia indet. Poaceae exótica N 4
banana
Musa acuminata Colla
Musaceae exótica N-PI-CF 2-3
banana-de-raposa indet. Bromeliaceae nativa PI 2
barbatimão
Vernonia scorpioides Pers
Asteraceae nativa CF 2
barlieira
Cordia curassavica (Jacq.) Roem & Schult.
Boraginaceae nativa N 2
batata
Ipomoea batatas Lam.
Convolvulaceae exótica PI-CF 2-3
batata-doce
Ipomoea sp.
Convolvulaceae exótica N-PI-CF 3
batata-inglesa
Solanum tuberosum L.
Solanaceae exótica N 3
batatão
Ximenia americana L.
Olacaceae nativa CF 3
beterraba
Beta vulgaris L.
Chenopodiaceae exótica N 3
boa-noite
Mirabilis sp.
Nyctaginaceae exótica N 2
indet. Asteraceae exótica
Plectranthus barbatus Andrews
Lamiaceae exótica
boldo
Salvia sp.
Lamiaceae exótica
N-PI-CF 2
boldo-da-argentina (boldo)
Vernonia condensata Baker
Lamiaceae exótica N 2
bonina indet. indet. indet. PI 2
bracuí
Hymenolobium janeirense Kuhlmann
Fabaceae nativa CF 1
brejaúva
Astrocaryum aculeatissimum (Schott) Burret
Arecaceae nativa PI-CF 1-3
bromélia indet. Bromeliaceae indet. CF 4
café
Coffea arabica L.
Rubiaceae exótica N-CF 2-4
56
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
cafezinho-do-mato
Maytenus robusta Reissek
Celastraceae nativa PI 1
caju / caju branco
Anacardium occidentale L.
Anacardiaceae nativa N-PI-CF 2-3
camarinha
Gaylussacia brasiliensis (Spreng.) Meisn.
Ericaceae nativa PI 3
cambará
Vernonia polyanthes Less.
Asteraceae nativa PI 3
cambuí
Myrcia sp.
Myrtaceae nativa PI 1-4
camomila
Matricaria chamomilla L.
Asteraceae exótica CF 2
cana
Saccharum officinarum L.
Poaceae exótica N-CF 3
cana-do-brejo
Costus spiralis (Jacq.) Roscoe
Zimgiberaceae nativa PI-CF 2-3
canela
Inga sp.
Mimosaceae nativa PI-CF 1
canelinha
Ocotea pulchella (Ness) Mez.
Lauraceae nativa PI 1-4
capim-cidró / capim-limão / erva-cidreira
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf.
Poaceae exótica N-PI-CF 2
capororoca
Myrsine parvifolia A. DC.
Myrsinaceae nativa PI 4
cará
Dioscorea alata L.
Dioscoriaceae exótica CF 3
caroba
Jacaranda puberula Cham.
Bignoniaceae nativa PI 1-2
carobinha
Jacaranda sp.
Bignoniaceae nativa PI 1-2
carqueja
Baccharis trimera (Less.) DC.
Asteraceae nativa N-PI 2
carvalhinho
Casearia sylvestris SW.
Flaucortiaceae nativa N 2
carvalho
Roupala sp.
Proteaceae nativa PI 4
castanheira
Bombacopsis glabra (Pasq.)
Bombacaceae exótica N 1
cataia
Pimenta pseudocaryophyllus (Gomes)
Landrum Myrtaceae nativa PI 2
caúna
Ilex theeazans Mart. Ex. Reissek
Aquifoliaceae nativa PI 4
cauvi indet. indet. indet. CF 1
caxeta
Tabebuia cassinoides (Lam.) A. P. DC.
Bignoniaceae nativa PI-CF 1
cebola
Allium cepa L.
Liliaceae exótica N 3
cebolinha
Allium fistulosum L.
Liliaceae exótica N 3
cedrinho
Cedrela sp.1
Meliaceae indet. PI-CF 1
cedro
Cedrela sp.2
Meliaceae indet. N-PI-CF 1
cenoura
Daucus carota L.
Apiaceae exótica N 3
cerca-viva indet. indet. indet. N 4
chorão indet. indet. exótica N 4
57
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
chuchu
Sechium edule Swartz
Cucurbitaceae exótica N-PI 2-3
cipó indet. indet. indet. PI 1
cipó-caboclo indet. indet. nativa PI-CF 2
cipó-imbé
Anthurium sp.
Araceae nativa PI 1
cipó-timbopeva indet. Sapindaceae nativa PI 1
citronela / mata-mosquito
Cymbopogon martini (Roxb.) Wats.
Poaceae exótica N-PI 2
coco-da-bahia
Cocos nucifera L.
Arecaceae exótica N 3
colchão-de-noiva
Verbena sp.
Verbenaceae exótica N 4
colorau indet. Lamiaceae indet. CF 3
combatá
Cupania vernalis Cambess
Sapindaceae nativa N 4
coração-de-negro
Gomidesia sp.
Myrtaceae nativa PI 1
couve
Basella rubra L.
Basellaceae exótica N 3
drósera
Drosera sp.
Droseraceae nativa PI 2
embaúva
Cecropia sp.
Cecropiaceae nativa PI-CF 1-2-*
embaúva-roxa / embaúva-vermelha
Cecropia glaziovi Snethlage
Cecropiaceae nativa PI-CF 1-2
erva-baleeira / mentruz / saliana
Cordia verbenacea DC.
Boraginaceae nativa N-PI-CF 2
erva-de-santa-maria
Chenopodium ambrosioides L.
Chenopodiaceae nativa PI-CF 2
erva-de-são-joao
Eupatorium pauciflorum Kunth.
Asteraceae exótica PI 2
erva-do-bicho indet. Polygonaceae exótica PI-CF 2
erva-doce
Foeniculum vulgare Mill.
Umbelliferae exótica CF 2
erva-pedra
Phyllanthus sp.1
Euphorbiaceae nativa CF 2
erva-tostão
Boerhavia diffusa L.
Nyctaginaceae nativa PI 2
espartina
Spartina sp.
Poaceae nativa PI 2
espinheira-santa
Zollernia ilicifolia Vogel
Fabaceae nativa N-PI 2
eucalipto
Eucalyptus sp.
Myrtaceae exótica N 1
feijão
Phaseolus vulgaris L.
Fabaceae exótica PI-CF 3
figueira
Ficus insipida Willd
Moraceae nativa N-PI-CF
1-2-3-
4
figueirinha
Ficus sp.
Moraceae nativa PI 1
fruta-pão
Erythroxylum argentium OE. Schulz
Erythroxylaceae exótica N 3
gabiroba indet. indet. indet. PI 1-3
gáfrica indet. indet. exótica N 1
58
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
gamiova
Geonoma schottiana Mart.
Arecaceae nativa CF 4
garapuvu / guapiruvu
Schizolobium parayba (Vell.) Blake
caesalpiniaceae nativa N-PI-CF 1-2-4
gelol-de-praia
Polygala cyparissias A. St. Hil. & Moq.
Polygalaceae nativa PI 2
gervão
Stachytarpheta cayennensis (L. C. Rich.) Vahl
Verbenaceae nativa N-PI 2
goema
Seguieria sp.
Phytolaccaceae nativa PI *
goiaba / goiaba branca / goiaba
vermelha
Psidium guajava L.
Myrtaceae exótica N-PI-CF 1-2-3
gravatá indet. indet. nativa N-CF 1-4
guaco
Mikania glomerata Spreng
Asteraceae nativa N-CF 2
guairana
Marlierea racemosa (Vell.) Kiaersk
Myrtaceae nativa CF 1
guamirim
Myrcia pubipetala Miq.
Myrtaceae nativa PI 1
guanandi
Calophyllum brasiliense Cambess.
Clusiaceae nativa PI-CF 1
guanxuma
Sida carpinifolia (L. f.) k. Schum.
Malvaceae exótica N 2
guapê
Eugenia umbelliflora O. Berg.
Myrtaceae nativa PI 1-3
guapê-guaçu indet. indet. nativa PI 3
guapira
Guapira opposita (Vell.) Reitz.
Nyctaginaceae nativa CF 1
guapurunga / vapurunga
Marlierea tomentosa Cambess.
Myrtaceae nativa PI 3-4
guarda-chuva indet. indet. indet. CF *
guaricica indet. indet. nativa PI 1
guiné
Petiveria sp.
Phytolaccaceae exótica PI 2
guruguva
Amaioua intermedia Mart.
Rubiaceae nativa PI 1
hipomea
Ipomoea pes-caprae (L.) R. Br.
Convolvulaceae exótica PI 2
Mentha arvensis L.
Lamiaceae exótica
hortelã
Mentha sp.
Lamiaceae exótica
N-PI-CF 2-3
indaiá Attalea dubia Mart. Arecaceae nativa PI-CF 3
ipê
Tabebuia sp.
Bignoniaceae nativa CF 1
itaúba indet. indet. indet. N 1
jaborandi
Piper sp.
Piperaceae indet. PI 2
jaboticaba
Myrciaria cauliflora Vell.
Myrtaceae nativa PI 3
jabutitana
Xyris af. jupicai L. C. Rich.
Xyridaceae nativa CF 3
jacatirão
Tibouchina pulchra Cogn.
Melastomataceae nativa PI-CF 1-4
59
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
jambo
Syzygium jambos (L.) Alston
Myrtaceae exótica PI 3
jambolão
Syzygium cumini (L.) Skeels
Myrtaceae exótica N 4
jasmim
Jasminum sp.
Oleaceae indet. N 2
jatobá
Hymenaea courbaril L.
Caesalpinaceae nativa PI *
jeruvá
Syagrus romanzoffiana (Cham.) Glassman
Arecaceae nativa PI-CF 2-3
laranja
Citrus aurantium L
Rutaceae exótica N-PI-CF 2-3
laranja grande
Citrus sp.1
Rutaceae exótica CF 2
lichia
Litchi chinensis Sonn.
Sapindaceae exótica N 3
lima
Citrus sp.2
Rutaceae exótica N 3
Citrus limon (L.) Burm. F.
Rutaceae exótica
limão
Citrus sinensis (L.) Osbeck
Rutaceae exótica
N-PI-CF 2-3
limão-bravo
Citrus sp.3
Rutaceae exótica PI 2
limão-caipira
Citrus sp.4
Rutaceae exótica N 3
malva indet. indet. exótica N 2
mamão
Carica papaya L.
Caricaceae indet. N-CF 2-3
mamãozinho indet. indet. nativa PI 3
mamona-roxa
Ricinus communis L.
Euphorbiaceae exótica N 2
manga
Manguifera indica L.
Anacardiaceae exótica N 3
mangue-amarelo
Avicennia schaueriana Stapf.
Avicenniaceae nativa PI 2
mangue-branco / manguinho-manso
Laguncularia racemosa L.
Combretaceae nativa PI 1-2
mangue-bravo / mangue-vermelho
Rhizophora mangle L.
Rhizophoraceae nativa PI 1-2
manguerana
Clusia criuva Cambess
Clusiaceae nativa PI-CF 1-*
manta-de-viúva
Tradescantia zebrina Heynh.
Commeliaceae exótica N 4
Passiflora alata Dryand
Passifloraceae nativa
maracujá
Passiflora edulis Sims
Passifloraceae nativa
PI-CF 2-3
maracujazinho
Passiflora sp
Passifloraceae indet. PI 3
marcela
Achyrocline satureioides (Lam.) DC.
Asteraceae nativa N-PI 2-3
maria-mole indet. Araliaceae nativa PI 4
marmelo
Dalbergia ecastophyllum L. Taub.
Fabaceae nativa PI 4
massaranduba
Endlicheria paniculata (Spreng.) J. F. Macbr.
Lauraceae nativa PI 3
melancia
Citrullus lanatus Thunb.
Cucurbitaceae exótica PI-CF 3
60
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
melissa / salva-vida
Lippia alba (Mill.) N. E. Br.
Verbenaceae exótica N-PI-CF 2
menta
Mentha sp.
Lamiaceae exótica N 2
mentrasto / tanchais
Plantago australis Lam.
Plantaginaceae exótica PI-CF 2
mexerica
Citrus sp.5
Rutaceae exótica PI-CF 2-3
milho
Zea mays L.
Poaceae exótica PI-CF 3
mil-homem indet. indet. indet. CF 2
moeirão indet. indet. indet. PI 1-3
Blepharocalyx salicifolius (Kunth) O. Berg.
Myrtaceae nativa
murta
Eugenia sulcata Spring ex Mart.
Myrtaceae nativa
PI-CF 1-3
muxita
Byrsonima ligustrifolia A. Juss.
Malpighiaceae nativa PI 3
nabo indet. indet. exótica N 3
nego-vira indet. indet. indet. PI 1
nhutinga indet. indet. indet. PI 3
olho-de-boi indet. Fabaceae indet. N-PI-CF 1-2-*
olho-de-cabra
Ormosia arborea (Vell.) Harms
Fabaceae nativa PI 1
onze-horas indet. Portulacaceae exótica N 4
orégano
Origanum sp.
Lamiaceae exótica N 3
orelha-de-gato
Tibouchina clavata (Pers.)
Melastomataceae nativa PI-CF 2
orquídea indet. Orchidaceae indet. N-PI 3-4
palma-de-são-jorge
Sansevieria trifasciata (De Wild) N. E. Br.
Liliaceae exótica N 4
palmito
Euterpe edulis L.
Arecaceae nativa PI-CF 1-3
papa-goela
Gomidesia fenzliana O. Berg.
Myrtaceae nativa PI 1-3
pata-de-mula indet. indet. indet. N *
pata-de-vaca
Centella asiatica (L.) Urban
Apiaceae exótica N-PI 2
pata-de-vaca / viola-de-praia
Hydrocotyle bonariensis Lam.
Apiaceae nativa PI 2
pé-de-espada
Cycas revoluta Thunb.
Cycadaceae exótica N 4
penicilina
Alternanthera sp.
Amaranthaceae exótica N-PI-CF 1-2
pepuna
Myrcia rostrata DC.
Myrtaceae nativa PI 1-2-3
peroba
Aspidosperma sp1.
Apocynaceae nativa N-PI-CF 1
peroba-do-norte
Aspidosperma sp2.
Apocynaceae exótica N 1
picão / pico-pico
Bidens pilosa L.
Asteraceae exótica N-PI-CF 2
61
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
pimentão
Capsicum sp.
Solanaceae exótica N 3
pimentinha
Erythroxylum amplifolium (Mart.) O. E. Schulz
Erythroxylaceae nativa PI 4
pindaúva
Xylopia brasiliensis Spreng.
Annonaceae nativa PI 1
pinhão brabo
Jatropha gossypiifolia L.
Euphorbiaceae exótica PI 2
pinho Pinus sp.1 Pinaceae exótica CF 1
pinus Pinus sp.2 Pinaceae exótica N-CF 1
piri
Typha angustifolia L.
Typhaceae nativa PI 3
pitanga
Eugenia uniflora L.
Myrtaceae nativa N-PI-CF 2-3
poejo
Mentha pulegium L.
Lamiaceae exótica PI-CF 2
pronto-alívio indet. indet. indet. PI 2
quebra-dente indet. indet. indet. N 4
quebra-pedra
Phyllanthus sp.2
Euphorbiaceae nativa N-PI-CF 2
rabanete
Raphanus sativus L.
Brassicaceae exótica N 3
radite
Emilia sp.1
Asteraceae exótica N 3
repolho
Brassica oleraceae L.
Brassicaceae exótica N-CF 3
rosa branca
Rosa sp.
Rosaceae exótica PI 2
rosa-de-vento
Malvaviscus arboreus (Bullock) Scheery
Malvaceae exótica N 4
roxinha indet. indet. exótica N 2
rúcula
Eruca sativa Mill.
Brassicaceae exótica N 3
sabugueiro
Sambucus australis Cham et Schltdl.
Caprifoliaceae exótica N 2
salsa
Petroselinum crispum (Lii.) A. W. Hill
Apiaceae exótica N-PI 2-3
samambaia
Rumohra adiantiformis (G. Forest.) Ching
Aspidaceae nativa CF 4
sapê
Paspalum sp.
Poaceae exótica PI-CF 2
seriguela
Spondias sp.
Anacardiaceae exótica N 3
seriúva indet. indet. indet. PI *
serralha
Emilia sp.2
Asteraceae nativa PI 2-3
sete-sangrias
Cuphea carthaginensis Cham & Schlecht
Lythraceae exótica N-PI 2
sumbarê indet. Orchidaceae nativa PI 4
tabucuva / tapiá
Pera glabrata (Schott) Baill.
Euphorbiaceae nativa PI-CF 1
taiá indet. Araceae exótica N-CF 3
tangerina
Citrus sp.6
Rutaceae exótica N 3
62
Continuação Tabela II.1
Nome Popular Espécie botânica Família Status Local Uso
taquara indet. Poaceae exótica PI 1
taquara-lixa indet. Poaceae exótica PI 1
taquara-mirim indet. Poaceae exótica PI 1
taquara-uvu
Merostachys sp.
Poaceae indet. PI 1
timbuva
Pithecellobium langsdorfii Benth.
Mimosaceae nativa PI-CF 1
tomate
Lycopersicon esculentum Mill.
Solanaceae exótica N-CF 3
tucum
Bactris setosa Mart.
Arecaceae nativa PI-CF 1-3
vacarana indet. indet. indet. CF 1
vacupari
Garcinia gardneriana (Planch & Triana) Zappi
Clusiaceae nativa PI-CF 1-3
vamirim
Calyptranthes concinna DC.
Myrtaceae nativa PI 1-3
vamirim-amarelo indet. indet. indet. PI 1
vamirim-ferro
Myrcia bicarinata (O. Berg) D. Legrand
Myrtaceae nativa PI 1
vanila
Vanilla planifolia Jacks. Ex. Andrews
Orchidaceae nativa PI 3
vassorinha-ferro / vassoura-de-praia /
vassourão
Dodonaea viscosa Jacq.
Sapindaceae exótica N-PI 4
63
As plantas mais citadas pelos entrevistados foram, respectivamente, o
guarapuvu ou guapiruvu (Schizolobium parahyba (Vell.) S. F. Blake) lembrado por
55% (n=35) deles; a hortelã (representada pelas espécies Mentha arvensis L. e
Mentha sp.) por 51% (n=32); o boldo (Plectranthus barbatus Andrews, Vernonia
condensata Baker; Salvia sp.) por 49% (n=31), o araçá (Psidium cattleyanum
Sabine) por 40% (n=25) e a caxeta (Tabebuia cassinoides (Lam.) DC.) (n=24) por
38% dos informantes.
Segundo Barros et al. (1991) e Backes e Irgang (2002), o guapuruvu (S.
parahyba) e a caxeta (T. cassinoides) são espécies amplamente úteis que, devido à
consistência leve e macia, são adequadas para confecção de caixotaria ou de
artefatos como remos, cabos de ferramentas e até para a fabricação de canoas,
apresentando potencial econômico para a confecção de artesanato. Possui também
características ornamentais, sendo adequada para plantio em áreas ciliares e, S.
parahyba, amplamente empregada na arborização de cidades, devido ao grande
potencial ormanental, presta-se também para reflorestamento de áreas degradadas
(Backes e Irgang, 2002). Esses usos foram também confirmados em um estudo
etnobotânico realizado em comunidades caiçaras do litoral norte do Estado de São
Paulo (Hanazaki, 1997).
Incluído entre as espécies mais citadas, o araçá (P. cattleyanum), de madeira
resistente e durável, mostra-se adequado para uso em cabos de ferramentas,
esteios e para a confecção de peças que exijam resistência. Pela produção de frutos
consumidos in natura como alimento, é também bastante cultivado em pomares
domésticos (Reitz, 1974), sendo usado ainda como medicamento em comunidades
caiçaras do litoral sul do Estado de São Paulo (Hanazaki, 2001).
64
O guanandi (Calophyllum brasiliense Cambess) (citado por 22% dos
entrevistados; n=14), muito procurado por várias espécies da fauna, tem também
algum potencial econômico, pois, em decorrência da durabilidade de sua madeira,
pode ser empregado na confecção de produtos manufaturados como remos,
caixilhos e também na fabricação de canoas (Rizzini e Mors, 1921; Hanazaki, 1997;
2001). Por suas características ornamentais, é indicado para projetos paisagísticos.
Também dentre as mais citadas, a M. arvensis L., conhecida popularmente
como hortelã, é cultivada em larga escala no sudeste do Brasil para a produção de
mentol e de óleo essencial, utilizados por indústrias alimentícias e farmacêuticas,
além de ser freqüentemente encontrada em jardins e hortas de todo o país. Por suas
propriedades é utilizada na cura de vários tipos de desordens, como dores-de-
cabeça (Lorenzi e Matos, 2002). Nas comunidades estudadas, é amplamente
cultivada em quintais e vasos, assim como em outras comunidades do litoral de São
Paulo (Hanazaki et al. 1996; 2000).
V. condensata, um dos tipos de boldo, é uma planta amplamente cultivada em
hortas e jardins domésticos e empregada no tratamento de várias moléstias. As
folhas são usadas como analgésico, sedativo e estimulante do apetite e, ainda, para
problemas estomacais e distúrbios do fígado. Suas propriedades analgésicas e de
proteção gástrica já foram comprovadas cientificamente (Lorenzi e Matos, 2002).
Empregada para finalidades semelhantes, P. barbatus (boldo), de comprovada
propriedade medicinal, é usada em todo o Brasil como medicação para tratamento
dos males do fígado e de distúrbios digestivos (Lorenzi e Matos, 2002).
Das plantas referidas, S. parahyba, T. cassinoides, C. brasiliense e P.
cattleyanum são nativas de áreas de restinga e/ou mata de encosta. Todas são
bastante usadas para produção de manufaturas e a última também como alimento.
65
Dentre as espécies que também se destacaram como as mais citadas, M. arvensis
e Mentha sp 1.; P. barbatus, V. condensata e Salvia sp. são mundialmente
empregadas para fins medicinais e possuem propriedades farmacêuticas de eficácia
comprovada (Lorenzi e Matos, 2002) Elas, porém, como várias outras plantas
medicinais usadas em diversas localidades do Brasil, são espécies introduzidas
(Hanazaki et al., 2000; Begossi et al., 2002a,b).
É interessante observar que as plantas que, neste trabalho, figuram entre as
mais citadas são também usadas por outras comunidades caiçaras, que residem em
áreas de restinga do litoral norte e sul do Estado de São Paulo e do litoral do Rio de
Janeiro (Figueiredo et al., 1993; Hanazaki et al., 1996; Hanazaki et al., 2000,
Hanazaki, 2001, Begossi et al., 2002; Fonseca-Kruel e Peixoto, 2004).
III.2. Comparações entre comunidades
Para comparar o conjunto de plantas citadas em cada comunidade foi
utilizada a análise de agrupamentos. No primeiro agrupamento, efetuado com base
em informações da freqüência relativa de cada planta por comunidade, constatou-
se, primeiramente, a existência de dois grupos: um, constituído pelos moradores de
Naufragados e o segundo, pelos da Ilha do Cardoso, cujas dessemelhanças
compuseram dois subgrupos: de um lado, Pereirinha e Itacuruçá e de outro Foles e
Cambriú. Conforme demonstra a Figura II.1, o percentual de semelhanças é maior
entre Foles e Cambriú (56%), do que entre Pereirinha e Itacuruçá (51%).
66
UPGMA
Bray Curtis
1.00
0.95
0.90
0.85
0.80
0.75
0.70
0.65
0.60
0.55
0.50
0.45
0.40
0.35
0.30
0.25
0.20
0.15
0.10
0.05
0.00
Per
Ita
Foles
Cam
Naufra
Figura II.1: Agrupamento com base no coeficiente de Bray Curtis para as comunidades de Pereirinha
(Per), Itacuruçá (Ita), Foles, Cambriú (Cam) e Naufragados (Naufra), utilizando UPGMA (coeficiente
de correlação cofenética = 0,958).
O segundo agrupamento, composto com base nas plantas citadas por
informante, considerando sua presença e ausência, mostra que, apesar de não tão
evidentes, uma vez que a semelhança dos dois reside em apenas 10% dos
informantes, há certa tendência para a formação de grupos dissimilares. Primeiro,
ocorre a separação em dois grupos: um constituído somente por moradores de
Naufragados (8 dos 12 informantes) e o outro predominantemente de moradores da
Ilha do Cardoso. Enquanto os moradores de Pereirinha e Itacuruçá, quase em sua
totalidade, aparecem agrupados, alguns de Cambriú e Foles misturam-se, tanto com
informantes de Naufragados, como de Pereirinha e Itacuruçá. Para o conjunto de
plantas mencionadas em cada comunidade, tal resultado evidencia a existência de
67
maior semelhança entre alguns moradores de Cambriú e Foles com os de
Naufragados, assim como os de Pereirinha e Itacuruçá com os de Foles e Cambriú,
e comprova maior dessemelhança entre os moradores de Pereirinha e Itacuruçá
com os de Naufragados, entre os quais não ocorre mistura de informantes, exceto
um (informante 6N, Figura II.2).
UPGMA
Sorenson
1.00
0.95
0.90
0.85
0.80
0.75
0.70
0.65
0.60
0.55
0.50
0.45
0.40
0.35
0.30
0.25
0.20
0.15
0.10
0.05
0.00
26PI
28PI
30PI
27PI
49FC
33FC
6N
14PI
29PI
18PI
20PI
19PI
23PI
25PI
15PI
21PI
13PI
16PI
17PI
24PI
31PI
32PI
22PI
44FC
56FC
35FC
36FC
46FC
38FC
60FC
34FC
61FC
40FC
39FC
41FC
48FC
55FC
58FC
47FC
59FC
10N
37FC
9N
8N
52FC
62FC
53FC
63FC
45FC
54FC
57FC
51FC
42FC
43FC
50FC
3N
7N
1N
5N
12N
2N
4N
11N
Figura II.2
: Agrupamento, com base no coeficiente de Sorensen para as comunidades estudadas,
utilizando UPGMA (coeficiente de correlação cofenética = 0,62). Os códigos que aparecem na barra
inferior do gráfico registram o número de identificação dos informantes e o respectivo grupo de
comunidade (PI=Pereirinha/Itacuruçá; FC=Foles/Cambriú; N=Naufragados).
68
O terceiro agrupamento foi efetuado de acordo com as informações
fornecidas sobre a ocorrência das plantas na mata ou se eram cultivadas e também
considerando o uso indicado (alimentar, medicinal, manufatura e outros).
Inicialmente ocorre a separação de dois grupos: um, composto por alguns
moradores da Ilha do Cardoso que citaram poucas plantas e o outro, por aqueles,
cujo número de citações foi maior. O grupo daqueles que citaram maior número de
plantas se subdivide em dois. O primeiro se compõe da maioria dos moradores de
Naufragados (7 dos 12) e de alguns moradores de Foles e Cambriú que indicaram
plantas cultivadas, geralmente destinadas ao consumo alimentar. O segundo grupo,
formado sobretudo por moradores de Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú,
referiram-se a plantas da mata, geralmente empregadas para distintos fins,
destacando-se também, por isso, a multiplicidade de usos mencionados. Pelo
agrupamento comprova-se ainda que os informantes, apesar das dessemelhanças,
apresentam algumas características comuns em relação às plantas citadas. Os
resultados confirmam que o modo de vida das comunidades, expresso
principalmente pelas atividades que desenvolvem (Capitulo I), influi no conhecimento
delas sobre as plantas, diferenciando-o, mesmo quando habitam áreas onde a
disponibilidade dos recursos naturais é similar. Por isso, a formação de grupos,
previamente estabelecidos, considerando-se seus distintos modos de vida e também
a distância geográfica, apresenta resultados coerentes com aqueles grupos
formados em função da freqüência relativa de cada planta por comunidade, da
presença/ausência das plantas citadas nas entrevistas, bem como em relação às
características de hábitat e de uso das espécies conhecidas.
69
Resulta, então, que as comunidades de Pereirinha e Itacuruçá são as mais
dissimilares de Naufragados, enquanto nas comunidades de Foles e Cambriú há
moradores que se assemelham aos de ambas (Figura II.3).
UPGMA
Bray Curtis
1.00
0.95
0.90
0.85
0.80
0.75
0.70
0.65
0.60
0.55
0.50
0.45
0.40
0.35
0.30
0.25
0.20
0.15
0.10
0.05
0.00
32PI
63FC
31PI
44FC
9N
40FC
16PI
17PI
23PI
39FC
4N
36FC
60FC
53FC
8N
62FC
34FC
51FC
35FC
43FC
10N
46FC
56FC
24PI
38FC
27PI
29PI
11N
15PI
28PI
49FC
26PI
30PI
33FC
19PI
20PI
21PI
13PI
25PI
18PI
42FC
14PI
45FC
52FC
57FC
2N
5N
59FC
3N
6N
7N
1N
37FC
47FC
41FC
55FC
12N
54FC
50FC
58FC
48FC
22PI
61FC
Figura II.3: Agrupamento, feito pelo coeficiente de Bray Curtis para as plantas citadas nas
comunidades estudadas, utilizando o UPGMA (coeficiente de correlação cofenética = 0,67). Os
códigos que aparecem na barra inferior do gráfico registram o número de identificação do informante
e seu respectivo grupo de comunidade (PI=Pereirinha/Itacuruçá; FC=Foles/Cambriú;
N=Naufragados).
70
Em Pereirinha e Itacuruçá foram entrevistados 20 moradores, cujas citações
totalizaram 156 etnoespécies, correspondentes a 124 espécies científicas,
pertencentes a 57 famílias botânicas. Considerando o status das plantas, constatou-
se serem 88 nativas e 36 exóticas (Tabela II.2). As famílias botânicas com maior
número de espécies foram Myrtaceae (16 espécies), Poaceae (10 espécies),
Asteraceae (7 espécies), Fabaceae (6 espécies) e Arecaceae (5 espécies).
As plantas mais citadas em Pereirinha e Itacuruçá (n=20) foram,
respectivamente, o guapiruvu (S. parahyba), mencionado por 85% dos entrevistados
(n=17 citações); o araçá (P. cattleyanum), por 70% (n=14 citações); a cataia
(Pimenta cf. pseudocaryophyllus (Gomes) Landrum), por 65% (n=13 citações); a
caxeta (T. cassinoides), por 55% (n=11 citações) e a pitanga (Eugenia uniflora L.),
por 50% dos moradores (n=10 citações) (Tabela II.3).
Em relação ao segundo grupo de 31 entrevistados, composto por moradores
das comunidades de Cambriú e Foles, obtiveram-se resultados diferentes. As
etnoespécies citadas totalizaram 101 nomes vernaculares, correspondentes a 86
espécies científicas, pertencentes a 47 famílias botânicas, 43 delas nativas e 36
exóticas (Tabela II.2). As famílias botânicas com maior número de espécies foram
Asteraceae (6 espécies); Arecaceae (6 espécies); Poaceae (6 espécies); Myrtaceae
(6 espécies); Clusiaceae e Euphorbiaceae (4 espécies cada); e Rutaceae (5
espécies).
A hortelã (Mentha sp1), citada por 61,3% (n= 19 citações) dos entrevistados,
assim como o guapiruvu (S. parahyba), por 58% (n= 18 citações); o poejo (M.
pulegium L.), por 54,8% (n= 17 citações); a caxeta (T. cassinoides), por 41,3% (n=13
citações), o boldo (P. barbatus), por 38,7% (n=12 citações) e a erva-de-santa-maria
71
(Chenopodium ambrosioides L.), por 32,3% (n=10 citações), foram as plantas mais
citadas pelos moradores (Tabela II.3).
Em Naufragados (n=12) foram mencionadas, no total, 108 etnoespécies,
correspondentes a 93 espécies científicas, agrupadas em 48 famílias botânicas,
sendo 78 exóticas e 24 nativas (Tabela II.2). As famílias botânicas que
apresentaram maior número de espécies foram Asteraceae (9 espécies); Myrtaceae
(5 espécies); Anacardiaceae (4 espécies); Euphorbiaceae, Liliaceae, Poaceae e
Rutaceae (4 espécies cada).
As plantas mais citadas pelos entrevistados foram o boldo (P. barbatus Andr.),
mencionado por 83,3% dos informantes (n=10 citações), seguido do capim-limão
(Cymbopogon citratus (DC.)) e da hortelã (M. arvensis L.; Mentha sp 1.),
mencionados por 58,3% dos moradores (n=7 citações) (Tabela II.3).
Tabela II.2: Características gerais das comunidades estudadas quanto ao conhecimento
etnobotânico.
Características Pereirinha-Itacuruçá Cambriú-Foles Naufragados
Etnoespécies 156 101 108
Espécies científicas 124 86 93
Famílias botânicas 57 47 48
Plantas nativas 88 43 24
Plantas exóticas 36 36 78
Número de citação 473 340 190
Número de entrevistas 20 31 12
Média de citação/entrevista 23 11 16
Restaram sem identificação em Pereirinha-Itacuruçá, Cambriú-Foles e Naufragados,
respectivamente, em relação: à espécie, 27; 13 e 16 plantas; à família botânica, 14; 7 e 11 e ao status
16; 10 e 10 plantas.
72
Tabela II.3: Plantas mais citadas por grupo de comunidades, de acordo com o número de citação por
entrevistado.
Citações (%) Plantas mais citadas
Comunidades
Nome popular Nome científico Pereirinha/Itacuruçá Cambriú/Foles Naufragados
Guapiruvu
S. parahyba
85% 58% --------
Araçá
P. cattleyanum
70% -------- --------
Cataia P. cf. pseudocaryophyllus
65% -------- --------
Caxeta
T. cassinoides
55% 41,3% --------
Pitanga
E. uniflora
50% -------- --------
Hortelã M. arvensis / Mentha sp 1
-------- 61,3% 58,3%
Poejo
M. pulegium
-------- 54,8% --------
Boldo
P. barbatus
-------- 38,7% 83,3%
Erva-de-santa-
maria
C. ambrosioides
-------- 32,3% --------
Capim-limão
C. citratus
-------- -------- 58,3%
A Tabela II.2 contabiliza, para o primeiro grupo, um maior número de
etnoespécies, de espécies botânicas e de famílias, e quantia elevada de plantas
nativas, contrastando com o segundo grupo, de Cambriú e Foles, que, embora
sendo também da Ilha do Cardoso, ao contrário do que se poderia esperar tendo em
vista o maior isolamento dos moradores, apresentou número menor de
etnoespécies, de espécies científicas e de famílias botânicas do que Naufragados,
superando, porém, este último, no número de plantas nativas e sendo por ele
superado no total de plantas exóticas. O cálculo do teste qui-quadrado para
independência, a 5% de significância, revelou que a quantidade de plantas nativas e
exóticas encontradas em cada localidade é diferente (
F
2
= 50,95, a 2 graus de
liberdade) (Tabela II.2).
Para efeito de classificação quanto ao uso, definiram-se, no presente
trabalho, três categorias principais: “medicinal”, “alimentar” e “manufatura”, incluindo-
se, nesta última, as plantas empregadas na confecção de artesanatos, na
construção de casas e na fabricação de canoas. Tais categorias, estabelecidas
73
como as mais usuais em estudos etnobotânicos das mais distintas populações
(Prance et al., 1987; Figueiredo et al., 1993, Hanazaki, 1997, Hanazaki et al., 2000),
abrangem plantas extraídas e/ou cultivadas nas próprias localidades. As espécies
empregadas para fins ornamentais, bem como aquelas utilizadas como lenha ou
para alimento da fauna foram agrupadas na categoria “outros”, que não foi detalhada
em função do reduzido número de citações e de espécies.
Entre as plantas citadas pelos moradores de Itacuruçá e Pereirinha
predominam as de uso medicinal e as destinadas à manufatura, cada uma destas
categorias com 35% das plantas citadas (n=71). As de uso alimentar atingiram 23%
das plantas citadas (n= 46), enquanto os 7% (n=14) restantes compuseram a
categoria “outros” (Figura II. 4). A planta mais citada como medicamento foi a cataia
(P. cf. pseudocaryophyllus), mencionada por 65% (n=13) dos entrevistados e
indicada sobretudo como calmante. Na categoria manufatura, o guapuruvu (S.
parahyba), utilizado para a fabricação de canoa, foi a planta mais citada pelos
entrevistados (85%, n=17). Entre as plantas alimentares, o araçá (P. cattleyanum) foi
mencionada por 50% dos moradores (n=10). Tais plantas são todas nativas de áreas
de Restinga e/ou mata de encosta, que, com as demais totalizaram 88 espécies,
citadas pelos moradores de ambas comunidades (n= 156) (Tabela II.2).
Nas comunidades de Foles e Cambriú as categorias de uso mais salientes
foram, nessa ordem: a alimentar e a medicinal, totalizando, respectivamente 37%
(n=41) e 35% (n=39) das plantas citadas. As plantas utilizadas para manufatura
foram citadas por 25% (n=28) dos entrevistados, com os 3% (n=4) restantes
compondo a classe “outros” (Figura II.4). As plantas mais citadas pelos entrevistados
em cada categoria de uso foram, respectivamente o vacupari (Garcinia gardneriana
(Planch. & Triana) Zappi) (29%) (n=9): alimentar; a hortelã (Mentha sp1) (61%)
74
(n=19): medicinal, indicado no tratamento de resfriados; o guapiruvú (S. parahyba)
(55%) (n=17): manufatura, amplamente utilizado na fabricação de canoas e para
confecção de artesanato. Convém enfatizar o considerável número de plantas
nativas de áreas de Restinga e/ou mata de encosta (n=43), citadas pelos
entrevistados de Foles e Cambriú, algumas mencionadas entre as que se
destacaram (Tabela II.2).
Em Naufragados, a categoria de uso que mais se destacou foi a alimentar,
com 40% das plantas citadas (n= 46), seguida da medicinal, que atingiu 33% (n= 38)
das plantas mencionadas (Figura II.4), com destaque, entre essas últimas, para o
boldo (P. barbatus) (citado por 83% dos entrevistados, n=10), utilizado para
tratamento de desarranjos estomacais e distúrbios hepáticos. As categorias de uso
de menor expressividade foram “outros” com 18% das plantas (n=21) e “manufatura”
com apenas 9% delas (n=1) (Figura II.4), contrastando com o observado nos dois
primeiros grupos de comunidades discutidos acima. A grande maioria das plantas
citadas (n=78) em Naufragados é exótica (Tabela II.2).
75
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
Medicinal Manufatura Alimentar Outros
Pereirinha-Itacuruçá Cambriú-Foles Naufragados
Figura II.4: Porcentagens de plantas citadas em cada categoria de uso, por grupo de comunidade.
A Figura II.4 indica que em Pereirinha-Itacuruçá as categorias de uso
mais salientes foram “medicinal” e “manufatura”, e que em Foles-Cambriú e
Naufragados foi superior o número de plantas alimentares, secundadas pelas
medicinais, seguidas das usadas para manufatura. Apesar de muito semelhantes, as
comunidades de Foles-Cambriú e Naufragados mostram-se diferentes em relação à
categoria de uso “manufatura”, cuja redução, em Naufragados, desperta a atenção e
se contrapõe à categoria “outros”, apurada na mesma comunidade, com várias
plantas indicadas para uso ornamental ou para alimento da fauna.
A predominância de plantas para uso alimentar nas comunidades de
Cambriú-Foles e Naufragados evidencia, sobretudo nesta última, uma maior
dependência dos moradores por plantas por eles próprios cultivadas em roças,
quintais ou hortas (78%) (n=190 citações), mesmo não sendo a agricultura, apesar
de praticada, uma atividade de subsistência. Em Pereirinha-Itacuruçá (19%; n=473
citações) e Foles-Cambriú (51%; n=340 citações), tais percentuais em relação às
plantas cultivadas são menores (Tabela II.4). Em Naufragados, 91% das plantas
76
citadas (n=190 citações) já tinham sido usadas pelos entrevistados. Em Cambriú-
Foles e Pereirinha e Itacuruçá, os percentuais são ligeiramente inferiores e atingem,
respectivamente, 87% (n=473 citações) e 78% (n=340 citações).
Tabela II.4: Número de citações de plantas cultivadas e não cultivadas e já utilizadas nos
grupos de comunidades estudadas.
Pereirinha-Itacuruçá Cambriú-Foles Naufragados
Plantas cultivadas
92 175 148
Plantas não cultivadas
373 160 42
Não informado
1
8 5 0
Plantas já usadas
371 295 172
Plantas conhecidas mas
nunca usadas
89 39 15
Não informado
1
13 6 3
1
Alguns informantes não responderam à pergunta relativa ao cultivo e utilização das plantas
Nos grupos da Ilha do Cardoso foi maior o número de plantas de Restinga
e/ou Mata de Encosta, em relação a Naufragados (Tabela II.2). Isto pode ser
explicado por vários fatores complementares, como a distância maior de cidades e
do continente na Ilha do Cardoso; a decorrente dificuldade de acesso; as condições
de funcionários do PEIC, dedicando-se, por isso, a tarefas que envolvem o
ambiente; e o maior tempo de permanência na ilha, de onde muitos são mesmo
nativos. Já no caso de Naufragados, ressalta-se ainda a composição mais recente
de sua população e a sua menor identificação como um grupo cultural distinto e
coeso, como já discutido no Capítulo I.
À semelhança do que ocorre também em outras regiões do Brasil, como litoral
norte de São Paulo, no município de Ubatuba e no litoral fluminense, na região de
Arraial do Cabo e Baia de Sepetiba (Figueiredo et al., 1993; Hanazaki, 1997;
Hanazaki et al., 2000; Fonseca e Peixoto, 2004), as plantas mais citadas para uso
77
medicinal não são nativas da Mata Atlântica, mas introduzidas, como P. barbatus,
Citrus limon (L.) Burm, C. sinensis L. (Osbeck), C. citratus e Mentha sp. Bennett e
Prance (2000) ressaltam a importância de plantas introduzidas nos sistemas
medicinais de populações indígenas sul-americanas, e o mesmo pode ser aplicado
às populações de caiçaras. Para analisar a distribuição do conhecimento relativo ao
uso de plantas entre os grupos estabelecidos, foram utilizados os índices de
diversidade de Shannon-Wiener (H’) e inverso de Simpson (1/D) (Tabela II.5).
Tabela II.5: Comparações de índices de diversidade (Riqueza, Shannon-Wiener e Simpson) e de
equitabilidade (Shannon-Wiener e Simpson) entre o total de etnoespécies citadas nos grupos de
comunidades estudadas.
Pereirinha-Itacuruçá Cambriú-Foles Naufragados
Riqueza (S) 156 101 108
Shannon-Wiener (H') (base 10) 2,04 1,83 1,90
Equitabilidade Shannon (E) 0,93 0,92 0,94
Simpson (1/D) 85,42 46,95 57,85
Equitabilidade Simpson (E
1/D
) 0,55 0,46 0,54
Citações 473 340 190
Entrevistas 20 31 12
A análise da Tabela II.5 destaca, dos três grupos, maior riqueza de
etnoespécies citadas pelos moradores de Pereirinha-Itacuruçá, assim como maior
equitabilidade de Shannon, refletida também pelo maior valor do índice de Shannon-
Wiener (H’), e menor dominância, comprovada pelo maior valor do inverso do índice
de Simpson (1/D). Naufragados apresentou valores intermediários de riqueza de
plantas citadas, de dominância e de equitabilidade, embora não muito diversos do
segundo grupo, composto por Cambriú e Foles. O cálculo do teste t para os índices
de Shannon-Wiener, evidenciou uma diferença significativa relativa à diversidade de
plantas citadas entre Pereirinha-Itacuruçá e Naufragados (t
0.05
=44,19, a 352 graus
78
de liberdade), o que também ocorreu entre Cambriú-Foles e Naufragados (t
0,05
=2,35,
a 440 graus de liberdade) e entre Pereirinha-Itacuruçá e Cambriú-Foles (t
0,05
=7,98, a
690 graus de liberdade).
De modo geral, a elevada dominância e a relativa baixa equitabilidade
apuradas nos grupos podem ser explicadas pela ocorrência de um reduzido número
de plantas muito citadas de um grande número delas com poucas citações.
Era esperada uma maior interação com os recursos vegetais locais nas
comunidades de mais difícil acesso, que seria refletida numa maior diversidade de
plantas conhecidas e utilizadas. Entretanto, a menor diversidade de etnoespécies
constatada no segundo grupo (Cambriú-Foles) talvez decorra do fato de que o
retorno financeiro obtido com a pesca, principal atividade econômica, embora
ocasional, seja suficiente para suprir as necessidades alimentares das famílias. A
aquisição de gêneros alimentícios nos centros urbanos reduz a dependência dos
moradores em relação aos recursos vegetais, que, com o decréscimo de sua
importância, não são lembrados com tanta facilidade. No caso do primeiro grupo
(Itacuruçá-Pereirinha), a maior diversidade observada pode estar refletindo uma
maior interação com a vegetação local, desta vez não como recursos alimentares ou
recursos ligados à subsistência direta da população, mas devido às atividades
intimamente relacionadas ao ambiente em que vivem, como monitores ambientais e,
mais esporadicamente, ajudantes de pesquisadores. Outra explicação plausível
poderia atribuir o reduzido número de etnoespécies em Cambriú-Foles à
desconfiança dos entrevistados, num primeiro momento, receosos de colaborar com
o trabalho, em decorrência do isolamento em que vivem, do seu estreito círculo de
relações pessoais e familiares e do reduzido acesso às informações externas. Após
79
um período de convívio com a comunidade, a rejeição inicial se amainou, sendo as
três primeiras entrevistas, nas quais encontrei dificuldades, refeitas.
Os índices de diversidade para plantas conhecidas assemelham-se aos
encontrados em outras comunidades caiçaras, no litoral norte do estado de São
Paulo, como a de Puruba (em região de praia: 22 informantes, H’=1,92, 1/D= 58,14;
no sertão: 28 informantes, H’=1,92, 1/D=55,87); Picinguaba (83 informantes,
H’=2,06, 1/D=77,12); Casa de Farinha (18 informantes, H’=1,85, 1/D=55,98)
(Rossato, 1996); Almada (45 informantes, H’= 1,99, 1/D=67,03) e Camburi (57
informantes, H’=1,98;1/D=60,23) (Hanazaki et al., 2000).
As curvas de rarefação ou de riqueza esperada, definidas com base no total
de entrevistas (Figura II.5), comprovam, em relação às comunidades de Foles e
Cambriú, que o número de etnoespécies citadas por entrevista tende à estabilização
e é menor quando comparado às de outras comunidades estudadas. Nas
comunidades de Pereirinha e Itacuruçá, notamos uma maior riqueza de
etnoespécies citadas, tendendo a curva de rarefação à estabilização, embora esta
se apresente menos acentuada que a anterior, ressaltando sua maior diversidade.
Em posição intermediária, a comunidade de Naufragados apresenta maior riqueza
de etnoespécies citadas por entrevista, quando comparada com as de Foles e
Cambriú, e menor, se comparada a Pereirinha e Itacuruçá. A curva em ascensão
indica que, ao aumento do número de entrevistas, talvez pudesse corresponder a
uma maior riqueza de plantas citadas. Entretanto, o esforço amostral não pôde ser
aumentado devido ao reduzido número de moradores dessas comunidades.
80
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
135791113151719212325272931
Número de entrevistas
Número de etnoespécies esperado
Pereirinha-Itacuruçá Cambriú-Foles Naufragados
Figura II.5: Curvas de riqueza esperada para o total de plantas citadas nas comunidades estudadas,
de acordo com o número de entrevistas.
81
III.3. Comparações entre gênero e idade
Quanto à distribuição do conhecimento nas comunidades, foram efetuadas
análises com base no total de entrevistados (n=63), pois o reduzido número de
participantes de cada local produziria resultados excessivamente fragmentados. Foi,
então, efetuado um estudo geral sobre a distribuição do conhecimento em relação à
idade e ao sexo de todos os entrevistados.
A Tabela II.6 registra os índices de diversidade calculados em relação ao
gênero e aos dois grupos de idade dos informantes.
Tabela II.6: Comparações de índices de diversidade (Riqueza, Shannon-Wiener e Simpson) e de
equitabilidade relativos ao gênero e idade dos informantes.
Sexo Idade
Masculino Feminino 40 anos > 40 anos
Riqueza (S) 212 154 154 210
Shannon-Wiener (H') (base 10) 2,13 2,02 2,01 2,16
Equitabilidade Shannon (E) 0,77 0,77 0,75 0,80
Simpson (1/D) 85,07 71,28 72,5 101,72
Equitabilidade Simpson (E
1/D
) 0,17 0,15 0,15 0,19
Citações 579 424 480 523
Entrevistas 35 28 33 30
Os maiores valores nos índices de Shannon-Wiener e Simpson entre os
homens, quando comparados às mulheres, indicam que eles detêm um
conhecimento mais diverso sobre as plantas nas regiões estudadas. O cálculo do
teste t modificado (Zar, 1996), para o índice de Shannon, aponta a significância de
tais diferenças (t
0,05
=4,23, a 962 graus de liberdade). Os índices de equitabilidade de
Shannon-Wiener e Simpson mostraram-se semelhantes. A curva de riqueza
esperada (Figura II.6) ratifica o resultado apontado, ao demonstrar que a curva
82
masculina, quando comparada à feminina, que tende à estabilização, além de
indicar um maior número de espécies citadas por entrevista, mostra-se ainda em
ascensão.
0
50
100
150
200
250
1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33
Número de entrevistas
Número esperado de etnoespécies
Feminino
Masculino
Figura II.6: Curvas de riqueza esperada para as plantas citadas, de acordo com gênero dos
informantes.
Entre os homens, a categoria de uso mais freqüentemente mencionada foi a
manufatura, com 33,7% das plantas citadas (n=204), seguida da medicinal (30,6%,
n=165) e da alimentar (29,9%; n=181). Os 5,8% restantes são compostos pela
categoria outros, com 4,6% (n=28), e por 1,2% (n=7) que não teve uso indicado
(Figura II.7).
Em relação às mulheres, a categoria de uso medicinal foi a mais citada, com
55,9% das plantas (n=249), seguida da alimentar (32,1%; n=143), da manufatura
(7,4%;n=33) e outros (3,6%; n=16). 1% das citações (n=4) ficaram sem indicação de
uso (Figura II.7).
83
204
185
181
28
7
33
249
143
16
4
0
50
100
150
200
250
300
Manufatura Medicinal Alimentar Outros Não indicados
Categorias de uso
Número de espécies citadas
Homens Mulheres
Figura II.7: Número de etnoespécies citadas em cada categoria de uso, de acordo com o gênero dos
entrevistados.
Os resultados mostram-se semelhantes aos encontrados em outros estudos
etnobotânicos, ao comprovarem que o conhecimento relativo ao uso dos recursos
naturais é heterogêneo dentro das comunidades. Conforme tendência geral, os
homens mostram-se mais familiarizados do que as mulheres com espécies
empregadas na construção de casas, na fabricação de canoas e na confecção de
artesanatos e possuem, por isso, conhecimento maior de espécies nativas das
florestas que cercam as regiões em que vivem (Hanazaki et al., 2000). Em
contrapartida, as mulheres, dedicadas predominantemente aos afazeres domésticos
e aos cuidados com a família, dominam um conhecimento sobre um conjunto de
84
espécies utilizadas com finalidades medicinais (Begossi et al., 2002), sendo grande
parte delas introduzidas.
Em relação à idade, é notoriamente maior a diversidade e a riqueza do grupo
de plantas citadas pelos entrevistados com mais de 41 anos, se comparada com as
dos informantes da faixa etária de 18 a 40 anos (Tabela II.6). O cálculo do teste t
para o índice de Shannon-Wiener ressalta esta diferença (t
0,05
=6,13, a 993 graus de
liberdade). A equitabilidade mostrou-se superior entre os moradores mais velhos. As
curvas de riqueza esperada, calculadas com base na idade dos informantes,
também ressaltam o conhecimento de uma maior diversidade de plantas pelos
moradores mais velhos, que citaram maior número de espécies nas entrevistas, e
uma menor diversidade de plantas conhecidas pelos mais jovens, proporcional ao
número inferior de citações quanto ao uso das plantas (Figura II.8).
85
0
50
100
150
200
250
1 3 5 7 9 1113151719212325272931
Número de entrevistas
Número de etnoespécies esperado
40 anos > 41 anos
Figura II.8: Curvas de riqueza esperada para as plantas citadas, de acordo com a idade dos
informantes.
Os resultados obtidos encaixam-se no padrão de outros estudos
etnobotânicos que analisaram a distribuição do conhecimento por idade em
comunidades com outras características. É até mesmo natural se esperar que os
mais idosos detenham um maior conhecimento, especialmente de plantas
medicinais e para manufaturas, cujo acúmulo é favorecido pelo maior tempo de vida
(Phillips e Gentry, 1993a,b; Hanazaki et al., 2000). Comparativamente, a menor
diversidade desse conhecimento entre os mais jovens pode decorrer da aquisição
por eles de novos valores culturais, tornando desinteressante seu aprendizado.
86
IV. Considerações finais
Existem padrões de uso distintos entre os grupos estudados. Os
agrupamentos efetuados comprovam que o modo de vida das comunidades influem
no conhecimento delas sobre as plantas, diferenciando-o, mesmo quando habitam
áreas onde a disponibilidade dos recursos naturais é similar. Por isso, a formação de
grupos considerando-se a distância geográfica (Pereirinha/Itacuruçá; Foles/Cambriú;
Naufragados), apresenta resultados coerentes com os de grupos formados em
função da freqüência relativa de cada planta por comunidade, da presença/ausência
das plantas citadas nas entrevistas, bem como em relação às características de
hábitat e de uso das espécies conhecidas.
A diversidade de plantas conhecidas e utilizadas é maior nas comunidades de
Pereirinha-Itacuruçá do que nas de Foles-Cambriú e Naufragados e a maioria das
plantas citadas pelos habitantes das primeiras é considerada nativa de áreas de
restinga e/ou mata de encosta, além de serem também empregadas para finalidades
diversas.
Em Cambriú e Foles foi menor a diversidade de plantas citadas, equivalendo
à de Naufragados. Entretanto, as plantas ali usadas, como as de Pereirinha e
Itacuruçá, são, em sua maioria, nativas da mata circundante e de usos variados. Em
Naufragados, as plantas mencionadas são, em grande parte, cultivadas em roças,
quintais e/ou hortas e não extraídas da mata para uso, e em relação ao uso das
mesmas notou-se que as empregadas para manufatura são muito pouco utilizadas,
quando comparadas às dos dois primeiros grupos de comunidades.
O quadro descrito permite inferir a maior interação das comunidades da Ilha
do Cardoso, especialmente Itacuruçá e Pereirinha, com os recursos vegetais
87
circundantes. Uma das plausíveis explicações pode se basear no fato de que, em
tais localidades, a maioria dos moradores são funcionários do PEIC e se envolvem,
por isso, em atividades intimamente relacionadas ao ambiente em que vivem,
incluindo o trabalho como guias e monitores ambientais e trabalhos esporádicos de
ajuda à pesquisadores no núcleo Perequê. Dessa forma, além de utilizarem-se da
vegetação para a própria sobrevivência, os moradores têm reconhecido e valorizado
o conhecimento que acumulam sobre a natureza, o que ajuda a preservá-lo de
eventuais intervenções externas.
Em Cambriú e Foles, apesar do menor grau de interação com os recursos
vegetais nativos, os moradores preservam um nível considerável de conhecimento
sobre o ambiente que os cerca e com o qual mantêm relativa intimidade. A
preservação desse conhecimento, fator determinante para a manutenção da
identidade cultural de tais grupos, merece atenção e investimentos.
Finalmente, em Naufragados, o conhecimento dos atuais moradores se
restringe praticamente a espécies cultivadas, o que evidencia o rompimento de uma
eventual interação ou dependência do grupo por recursos do meio ambiente e o
desaparecimento dos traços característicos da identidade cultural açoriana, que, em
outros tempos, pode ter sido presente na região. É possível concluir ainda que,
inseridas em ambientes de alta diversidade vegetal, como a Mata Atlântica, nem
sempre as comunidades valem-se, para sua sobrevivência, dos recursos naturais
que as circundam. Estes resultados sugerem uma indagação para investigações
futuras: Os antigos açorianos que aportaram no Brasil por volta do século XVII
tiveram uma relação com o meio ambiente similar à dos caiçaras, quanto ao uso de
recursos naturais nativos?
88
O conhecimento etnobotânico mostra-se heterogeneamente distribuído, ao se
considerar a idade e o gênero dos entrevistados. Os homens demonstraram maior
diversidade no conhecimento de plantas empregadas para manufatura e as
mulheres de espécies medicinais. A diferença se relaciona, sem dúvida, à natureza
das atividades desenvolvidas por ambos: os homens operando na mata, em busca
de plantas para a fabricação de canoas, construção de casas e de armadilhas de
pesca, e as mulheres, dedicando-se às atividades domésticas e aos cuidados com a
família. Quanto à idade, os mais velhos possuem maior conhecimento sobre as
plantas, acumulado pelo maior tempo de vida.
Os resultados do trabalho quanto ao uso e ao conhecimento dos recursos
vegetais por comunidades caiçaras e de influência açoriana são, sem dúvida,
significativos em si, pelo diagnóstico que compõem a respeito. È possível, contudo,
supô-los também interessantes e úteis aos moradores, não só pelo aspecto da
valorização de sua cultura, mas pelo enriquecimento que poderão ocasionar àqueles
que têm no turismo uma atividade de subsistência. Por isso, cópias do presente
trabalho serão encaminhadas aos moradores locais das comunidades estudadas e
às administrações do PEIC e PEST.
89
Capítulo III
“Considerações sobre o acesso ao conhecimento tradicional associado à
biodiversidade e relato do repasse de resultados às comunidades estudadas”
Foto: Cíntia Godoi
Entrevista com morador de Naufragados
Foto: Natalia Hanazaki
Repasse de resultados na comunidade de Itacuruçá.
90
I. Introdução
Este capítulo, quando comparado aos anteriores, foi estruturado de maneira
diferente, reunindo apontamentos e reflexões sobre o acesso ao conhecimento
tradicional associado à biodiversidade, bem como registrando um relato sobre o
repasse de resultados às comunidades estudadas, considerando as etapas
percorridas e as dificuldades encontradas ao longo da elaboração do trabalho.
O objetivo deste capítulo é situar a dissertação no contexto atual das
discussões acerca do acesso ao conhecimento tradicional associado à
biodiversidade. Estas discussões encontram-se num processo de definições e
regulamentações, que possuem conseqüências diretas sobre a elaboração e
condução de pesquisas etnobotânicas.
Na execução deste trabalho considerou-se o termo “repasse” e não “retorno”
de resultados. Este último remete a idéia de beneficio econômico, o que não foi
objetivo desta pesquisa. Este estudo buscou diagnosticar a relação entre pessoas e
plantas e a realidade local de comunidades caiçaras e de influência açoriana e
valorizar o conhecimento local. Portanto, este repasse de resultados mostra-se
como um modo de “dar satisfação” aos moradores locais sobre o que foi feito com o
conhecimento acessado.
91
II. Acesso ao conhecimento tradicional associado à Biodiversidade
13
Inúmeras são as definições de “Conhecimento Tradicional”. A definição legal
atualmente utilizada no Brasil está presente na Medida Provisória n. 2.186-16/2001,
em que o Conhecimento Tradicional Associado é conceituado como a “informação
ou prática individual ou coletiva de comunidade indígena ou de comunidade local,
com valor real ou potencial, associada ao patrimônio genético”, incluindo-se técnicas
de manejo de recursos naturais, métodos de caça e pesca, conhecimentos sobre os
diversos ecossistemas e sobre propriedades farmacêuticas, alimentícias e agrícolas
de espécies e as próprias categorizações e classificações de espécies da flora e
fauna, utilizadas por populações tradicionais (Santilli, 2004).
Descrito por Berkes et al. (1995) como “um conjunto de conhecimentos,
práticas e crenças acumulados, que evoluem através de processos adaptativos,
passando por gerações através da transmissão cultural, sobre as relações entre
seres vivos e entre esses e seu ambiente”, o Conhecimento Tradicional resulta de
atividades e práticas coletivamente desenvolvidas na floresta (Santilli, 2004).
Diegues e Arruda (2001) o conceituam como “o conjunto de saberes e saber-fazer a
respeito do mundo natural e sobrenatural, transmitido oralmente, de geração em
geração.”
A quantidade e a variedade de definições e a freqüência com que figura como
tema de discussões ressaltam-lhe a importância, sobretudo em tempos de tantas e
13
Apesar de aparentemente claro, e até mesmo de entendimento intuitivo, o conceito de
“biodiversidade” apresenta algumas variações. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC, 2000), de visão institucional, define Biodiversidade como sendo “a variabilidade de
organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres,
marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte;
compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas”. Na área
de conhecimento das Ciências Biológicas, esta definição considera também “a variedade e
abundância de espécies em uma definida área de estudo” (Magurran, 2005), sendo esta a definição
aqui utilizada.
92
tamanhas ameaças à biodiversidade, para cuja conservação constitui inestimável
aliado, como já se mencionou anteriormente (Capítulo II), ao possibilitar o
oferecimento de novos “insights” biológicos e ecológicos; a promoção de modelos de
manejo sustentáveis dos recursos; a educação no interior de áreas protegidas e de
conservação e a criação de planos de desenvolvimento mais adequados, e de
avaliações ambientais. Mais do que simplesmente um valor de uso, o conhecimento
tradicional tem também, para as populações que o detêm, um valor simbólico e
espiritual, e deve, por isso, ser conservado, tanto quanto os seus mantenedores.
Nesse contexto, por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento, também denominada Rio 92, foi assinada a
Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), que, até o final de 1997, contava
com 187 signatários e cujos objetivos principais são promover a conservação da
diversidade biológica, o uso sustentável de suas partes constitutivas e a repartição
justa e eqüitativa dos benefícios que advêm do uso dos recursos genéticos. No
Brasil, sua ratificação ocorreu em 1994, quando passou a vigorar como lei. Parte,
porém, de sua regulamentação se deu pela Medida Provisória nº 2.186-16, de 23 de
agosto de 2001, que “dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o
acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios e o
acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e
utilização”.
Ao definir o acesso ao conhecimento tradicional associado, a CDB o
caracterizou como a “obtenção de informação sobre conhecimento ou prática
individual ou coletiva, associada ao patrimônio genético, de comunidade indígena ou
de comunidade local, para fins de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico
ou bioprospecção, visando sua aplicação industrial ou de outra natureza.”
93
Pois bem, o acesso a esse conhecimento associado à biodiversidade é
justamente um dos propósitos da Etnobotânica, base da maioria das pesquisas
científicas da área, feitas em comunidades tradicionais e/ou indígenas e figura entre
os objetivos gerais deste trabalho.
A CDB, buscando proteger esse conhecimento e assegurar a integridade de
seus possuidores de eventuais ameaças, resguardando-lhes os direitos, dispõe, na
referida Medida Provisória, que os eventuais usuários do conhecimento ou partes
contratantes, em conformidade com a legislação nacional busquem:
“(j)...respeitar, preservar e manter o conhecimento, inovações e práticas das
comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais
relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica e
incentivar sua mais ampla aplicação com a aprovação e a participação dos
detentores desse conhecimento, inovações e práticas; e encorajar a repartição
eqüitativa dos benefícios oriundos da utilização desse conhecimento, inovações
e práticas” (Convenção sobre a Diversidade Biológica, artigo 8º, alínea (j)).
A determinação tem a aprovação e o apoio de pesquisadores de diferentes
áreas do conhecimento, incluindo, naturalmente, etnobotânicos, etnoecólogos e
etnobiólogos, que permanentemente o estudam e buscam entendê-lo. O tema,
objeto de preocupação do meio científico, fez com que, em 1988, momento anterior
à CDB, reconhecidos cientistas das áreas de Antropologia, Biologia, Química e
Sociologia e representantes de várias populações indígenas se reunissem em Belém
(PA), no 1º Congresso Internacional de Etnobiologia, para discutir preocupações
comuns, e promover estudos dos meios únicos pelos quais as populações indígenas
94
percebem, utilizam e manejam seus recursos naturais, e o desenvolvimento de
programas que iriam garantir a preservação das diversidades cultural e biológica. Do
encontro, resultou a Declaração de Belém, cujo conteúdo clama com urgência,
dentre outras, as seguintes ações:
“2) que sejam estabelecidos mecanismos pelos quais os especialistas indígenas
sejam reconhecidos como autoridades e, portanto, consultados em todos os
programas que afetem seus povos, recursos e meio ambiente;
3) que todos os outros direitos humanos inalienáveis sejam reconhecidos e
garantidos, incluindo a identidade cultural e lingüística;
4) que sejam desenvolvidos procedimentos para compensar os povos nativos pela
utilização de seu conhecimento e de seus recursos biológicos;”
(...)
“8) que os etnobiólogos tornem os resultados de suas pesquisas disponíveis para as
populações com as quais trabalham, especialmente através da inclusão de material
de divulgação na língua nativa.”
Algumas destas preocupações estão também presentes no Código de Ética
da International Society of Ethnobiology, expressas nos seguintes princípios
14
:
14
Princípios extraídos do Código de Ética da International Society of Ethnobiology. Disponível em
http://ise.arts.ubc.ca/ethics.html
(Acessado em 20 / 02 / 06), traduzidos pela autora.
95
- Princípio da ampla exposição (Principle of Full Disclosure)
”Este princípio reconhece que populações indígenas, tradicionais e comunidades
locais devem ser necessariamente informadas sobre a natureza, objetivos e
propósitos do trabalho a ser desenvolvido (incluindo informações metodológicas, de
coleta de dados e relacionadas à divulgação e aplicação dos resultados). Estas
informações devem ser repassadas levando-se em consideração o corpo do
conhecimento e as preferências culturais das populações ou comunidades
estudadas.”
- Princípio do consentimento prévio e veto (Principle of Prior Informed Consensus
and Veto):
”Este princípio reconhece que o consentimento prévio de todas as pessoas ou suas
comunidades deve ser obtido antes do ínicio de qualquer pesquisa. Populações
indígenas, sociedades tradicionais e comunidades locais tem direito de vetar
qualquer projeto, programa ou estudo que os afete. A obtenção do consentimento
prévio presume que todas as comunidades envolvidas serão devidamente
informadas quanto aos propósitos e natureza das atividades da pesquisa e seus
prováveis resultados, incluindo todos os benefícios e riscos (tangíveis e intangíveis) ,
que podem afetá-las.”
96
- Princípio da compensação e repartição equitativa de benefícios (Principle of
Compensation and Equitable Sharing):
”Este princípio reconhece que populações indígenas, comunidades tradicionais ou
locais devem ser adequadamente compensadas por sua contribuição em pesquisas
etnobiológicas e benefícios advindos de seu conhecimento.”
É, sem dúvida, inquestionável a necessidade de se proteger, resguardar e
ressarcir as comunidades locais, em relação ao conhecimento tradicional de que são
detentoras, mas há também que se ter muita clareza sobre as verdadeiras e as
potenciais ameaças ao conhecimento local associado à Biodiversidade,
Alguns pesquisadores, como Vandana Shiva, afirmam que 75% dos 120
princípios ativos atualmente isolados de plantas superiores e largamente utilizados
na medicina moderna têm utilidades que foram identificadas pelos sistemas
tradicionais (Santilli, 2004). É possível, pois, se concluir que é evidente que as
grandes indústrias de biotecnologia, especialmente a farmacêutica, química e
agrícola representam ameaça potencial às condições de produção do conhecimento
tradicional e a seus mantenedores e que, para assegurar a integridade dessas
comunidades contra a indevida apropriação e utilização, por terceiros, do
conhecimento que detêm, se faz necessária a criação de um regime jurídico de
proteção a esse conhecimento, atualmente representado pela MP 2186.16, que
proporcione igualmente maior segurança às relações entre os interessados no
acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais associados e seus
97
detentores, definindo parâmetros e critérios a serem observados em tais relações e
acordos (Santilli, 2004).
Entretanto, como aponta Manuela Carneiro da Cunha (Cunha, 1999), a
criação de um sistema jurídico, baseado na falta de “bom senso”, pode não ser a
solução para este problema, uma vez que este acaba por atribuir valores
econômicos ao conhecimento tradicional e à biodiversidade associada, tratando-os
como meros produtos. Portanto, o cuidado se faz estritamente necessário na
elaboração de qualquer sistema jurídico que vise à proteção do conhecimento
tradicional e seus mantenedores.
Aqui, cabe também uma pergunta: os trâmites exigidos no processo de
solicitação de autorização para o acesso ao conhecimento tradicional associado à
biodiversidade devem ser os mesmos tanto para pesquisas de caráter puramente
investigativo, como para as que têm como finalidade o desenvolvimento de novos
medicamentos e visam, ao final, retorno econômico?
Pela Medida Provisória 2.186-16, de 2001, regulamentada pelo Decreto nº
3.945, de 2001, o acesso e a remessa do patrimônio genético, bem como o acesso
ao conhecimento tradicional associado existente no País passaram a depender da
autorização do CGEN -Conselho Gestor do Patrimônio Genético (MMA, 2005), órgão
de caráter deliberativo e normativo criado no âmbito do Ministério do Meio Ambiente
e integrado por representantes de diversos Ministérios, órgãos e entidades da
Administração Pública Federal, com direito a voto, e representantes da sociedade
civil, com direito a voz.
98
De acordo com a Medida Provisória e com o CGEN, o acesso ao
conhecimento tradicional, nos casos de pesquisa de natureza puramente
investigativa, exige o cumprimento de uma série de etapas
15
, a seguir descritas.
Inicialmente, é necessário preencher o “Formulário para solicitação de
autorização de acesso a componente do patrimônio genético e ou acesso ao
conhecimento tradicional associado para fins de pesquisa científica”.
A seguir, há a necessidade de se comprovar que a instituição solicitante:
- constitui-se sob as leis brasileiras;
- exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e
afins;
- possui qualificação técnica para o desempenho de atividades de acesso e
remessa de amostra de componente do patrimônio genético ou de acesso ao
conhecimento tradicional associado, quando for o caso;
- possui estrutura disponível para o manuseio de amostra de componente do
Patrimônio Genético;
Por ocasião da solicitação ao CGEN, é necessária a apresentação dos
seguintes documentos:
- projeto de pesquisa que descreva a atividade de acesso à amostra de
componente do patrimônio genético ou de acesso a conhecimento tradicional
associado, incluindo informação sobre o uso pretendido, o qual deverá conter:
1) introdução, justificativa, objetivos, métodos e resultados esperados a partir
da amostra ou da informação (conhecimento tradicional associado) a ser acessada;
2) localização geográfica e cronograma das etapas do projeto, especificando
o período em que serão desenvolvidas as atividades de campo e, quando se tratar
15
Etapas extraídas das “Regras para o Acesso Legal ao Patrimônio Genético e Conhecimento
Tradicional Associado”, disponível em www.mma.gov.br/port/cgen (Acessado em 20 / 02 / 06).
99
de acesso a conhecimento tradicional associado, identificação das comunidades
indígenas ou locais envolvidas;
3) discriminação do tipo de material ou informação a ser acessado e
quantificação aproximada de amostras a serem obtidas;
4) indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das
responsabilidades e direitos de cada parte;
5) identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos,
caso não estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq.
- termo de compromisso assinado pelo representante legal da instituição,
comprometendo-se a acessar patrimônio genético ou conhecimento tradicional
associado apenas para a finalidade autorizada;
- anuência(s) prévias(s) da(s) comunidade(s) indígena(s) ou local(ais)
envolvida(s), em observância aos artigos 8º, § 1º; 9º, inciso II e 11, inciso IV, alínea
“b”, da Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001 e às Resoluções CGEN nº 005 e 009
(esta última apenas quando o projeto também envolver o acesso a componente do
patrimônio genético) e em áreas públicas;
Finalizando o processo, deve-se indicar o destino das amostras dos
componentes do patrimônio genético ou das informações relativas ao conhecimento
tradicional associado e a instituição depositária credenciada pelo Conselho de
Gestão onde serão depositadas as subamostras de componente do patrimônio
genético.
Do processo, destaque-se o item relativo à obtenção da anuência prévia,
regulamentada pela Resolução nº 9 do CGEN, de 2003, que estabelece diretrizes
para a obtenção de Anuência Prévia para acesso a componente do patrimônio
genético situado em terras indígenas, em áreas privadas, de posse ou em
100
propriedade de comunidades locais e em Unidades de Conservação de Uso
Sustentável para fins de pesquisa científica sem potencial ou perspectiva de uso
comercial.
O artigo 2º da referida Resolução define as seguintes diretrizes do processo
de obtenção de Anuência Prévia:
I – esclarecimento à comunidade anuente, em linguagem a ela acessível,
sobre o objetivo da pesquisa, a metodologia, a duração, o orçamento, os possíveis
benefícios, fontes de financiamento do projeto, o uso que se pretende dar ao
componente do patrimônio genético a ser acessado, a área geográfica abrangida
pelo projeto e as comunidades envolvidas;
II – respeito às formas de organização social e de representação política
tradicional das comunidades envolvidas, durante o processo de consulta;
III – esclarecimento à comunidade sobre os impactos sociais, culturais e
ambientais do projeto;
IV – esclarecimento à comunidade sobre os direitos e as responsabilidades
de cada uma das partes na execução do projeto e em seus resultados;
V – estabelecimento, em conjunto com a comunidade, das modalidades e
formas de contrapartida derivadas da execução do projeto;
VI – garantia de respeito ao direito da comunidade de recusar o acesso ao
componente do patrimônio genético, durante o processo de Anuência Prévia.”
A respeito, o artigo 6º ainda determina que “o Termo de Anuência Prévia deve
ser apresentado à deliberação do CGEN, devidamente firmado pela comunidade,
respeitando suas formas tradicionais de organização social e de representação
política, ou pelo órgão ambiental responsável pela gestão da Unidade de
101
Conservação a que se refere o artigo 4º desta Resolução”, ressalvando-se, no § 1º
que “caso os signatários não possam, por qualquer circunstância, firmar o Termo de
Anuência Prévia, tomar-se-ão suas impressões datiloscópicas.”
Ciente da necessidade e da importância do cumprimento das exigências
legais para o acesso do conhecimento local associado à biodiversidade, abrimos
nosso processo junto ao CGEN em setembro de 2004. Concomitantemente com a
elaboração do projeto, em março e abril de 2004, ocorreu a primeira saída de campo
e, neste primeiro contato com as comunidades de Foles, Cambriú, Itacuruçá e
Pereirinha, na Ilha do Cardoso, fez-se o reconhecimento preliminar do local. Na
visita, foram contactados alguns moradores locais, que foram esclarecidos sobre o
intuito da pesquisa, consultados sobre o trabalho e solicitados a autorizarem
informalmente sua realização. Nova visita foi feita nos meses de janeiro de fevereiro
de 2005, com a finalidade específica de, após nova rodada de conversação e
esclarecimentos, obter o consentimento formal (Anexo IV) de cada um que se
dispusesse a colaborar, tudo de acordo com as normas propostas pelo CGEN.
Percorreram-se todas residências habitadas das comunidades de Foles,
Cambriú, Itacuruçá e Pereirinha, contactando-se os residentes maiores de 18 anos,
de ambos os sexos, aos quais, após esclarecimentos sobre o projeto, seus objetivos
e finalidades, foi solicitada a concordância em participar da pesquisa, representada
pelo Termo de Consentimento, o qual de acordo com as normas do CGEN, deveria
apresentar a assinatura dos prováveis colaboradores, ou, no caso destes serem
analfabetos, suas impressões datiloscópicas.
Além de dificultosa, a tarefa mostrou-se inadequada e ineficaz. Os moradores,
na maioria pessoas de baixa escolaridade, vivendo relativamente isolados dos
centros urbanos, não se mostraram dispostos a assinar e, menos ainda, a carimbar
102
suas digitais no termo de consentimento, pois não compreendiam a necessidade de
tal formalidade, ainda mais pela timidez e pelo receio característicos de
comunidades tradicionais que residem no interior de Unidades de Conservação. A
situação foi constrangedora, pois, apesar de terem concordado informalmente em
participar da pesquisa, agora se recusavam a assinar um documento, causando um
sério impasse.
Respeitando-se a decisão da maioria que não se dispôs a assinar o termo,
foram obtidas somente duas assinaturas e a concordância informal (não assinada)
de outros 49. Diante deste problema, optou-se pela anotação do nome completo dos
que se mostraram inseguros e não assinaram o termo, procedimento que não é
normalmente pedido e menos ainda divulgado em pesquisas desta natureza.
É importante mencionar que o projeto de pesquisa já havia sido autorizado
pela instituição responsável pela gestão do Parque Estadual da Ilha do Cardoso, o
Instituto Florestal, através de seu Conselho Técnico (COTEC). Entretanto, mais
tarde o COTEC relembrou a necessidade de autorização do CGEN para acesso ao
conhecimento tradicional associado à biodiversidade.
Na Ilha de Santa Catarina, as visitas aos moradores da praia de Naufragados
foram feitas em quatro ocasiões, entre março de 2004 e dezembro de 2005. Dada a
existência de conflito entre o órgão gestor do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro
(Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina, FATMA) e os moradores
que nele residem (Reis, 2002), a FATMA não reconhece a presença de moradores
em Naufragados. Apesar disso, o órgão emitiu autorização para a execução do
presente estudo. Aos moradores visitados explicou-se o intuito do trabalho e foi
solicitada a autorização informal para realização da pesquisa. Ao lhes ser
103
comunicada, porém, a necessidade de que assinassem o Termo de Consentimento,
eles mostraram-se igualmente inseguros em fazê-lo.
Respeitando-lhes o direito de se recusarem a assinar o Termo, foram
indagados se concordavam em participar da pesquisa. A grande maioria respondeu
afirmativamente, desde que suas identidades não fossem reveladas. Apesar da
disposição dos moradores em colaborar, a obtenção das assinaturas no Termo de
Anuência uma vez mais não se concretizou.
Além disso, os trâmites para obtenção da autorização do CGEN mostram-se
demasiado lentos, principalmente quando se considera a curta duração dos cursos
de mestrado. No caso, o início do pedido de autorização ao CGEN ocorreu em
setembro de 2004. Após comunicação dessas ocorrências nas áreas de estudo, a
resposta obtida do Conselho, em maio de 2005, consistia em: “não deliberar sobre o
mesmo em razão da não apresentação de documentos que comprovem a obtenção
das anuências prévias junto às comunidades com previsão de acesso ao
conhecimento tradicional associado”. Ao avaliarmos esta resposta, solicitamos então
o arquivamento do processo, em junho de 2005. A resposta que viria a negar a
autorização para o acesso ao conhecimento tradicional foi enviada em setembro de
2005 ao COTEC e à FATMA, não sendo por nós recebida até o presente momento.
Considerando que a exigência de se providenciar o Termo de Anuência é
realmente importante nos casos de pesquisas que visem retorno econômico, para
trabalhos de natureza puramente investigativa, como o presente projeto, deveriam
se definir outros mecanismos, que não a obtenção das assinaturas, uma vez que
podem prejudicar e até mesmo impedir a realização de tais trabalhos. Apesar da
maioria se recusar a cumprir a formalidade legal, todos os moradores contactados
foram esclarecidos sobre a possibilidade de livremente participarem ou não do
104
projeto e também sobre o direito, a qualquer momento, de se recusarem a continuar
colaborando.
Sugere-se, pois, que as normas, especialmente aquelas que regulamentam a
anuência prévia, sejam revistas, com o intuito de adequá-las às situações reais e
concretas de trabalho. O esclarecimento às comunidades é, sem dúvida, necessário
e o direito de participarem ou não deve ser respeitado, mas o esquema atual
proposto pelo CGEN mostra-se inadequado e, como tal deveria ser reavaliado.
Como já dito por João Paulo Capobianco, atual secretário de Biodiversidade e
Florestas do MMA, “a MP transformou todo cientista em um biopirata potencial”
(Folha de São Paulo, 7/11/05).
105
III. Repasse de resultados
16
O Código de Ética, elaborado por pesquisadores das áreas de Etnobiologia e
Etnoecologia, e concretizado na Declaração de Belém, menciona a importância e a
necessidade de se realizar o repasse dos resultados às comunidades estudadas
(itens 4 e 8 anteriormente citados).
Considerando a importância do procedimento também na presente pesquisa,
cujo intuito, entre outros, é valorizar o conhecimento local, realizaram-se, em
fevereiro e março de 2006, na Ilha do Cardoso e na Ilha de Santa Catarina, saídas
de campo para cumprir tal tarefa (Figuras III.1 e III.2) . O repasse consistiu, em
verdade, na entrega dos folhetos informativos, elaborados com base nos dados
colhidos ao longo do trabalho de campo considerados interessantes e oportunos,
voltados ao esclarecimento dos principais objetivos da pesquisa e de seus
desdobramentos subseqüentes (Anexos V.1, V.2 e V.3), em visitas domiciliares aos
informantes colaboradores. Os relatos que seguem registram as impressões, os
questionamentos e as ocorrências desta parte final do trabalho.
16
Para a comunidade de Naufragados, esta etapa ocorrerá no mês de março do ano corrente, em
visita semelhante à realizada na Ilha do Cardoso.
106
III.1. O retorno nas comunidades da Ilha do Cardoso
Cambriú e Foles
Dia 03 / 02 / 06
“Eu, Natalia e Flávia saímos de Cananéia às 8:30 em direção as comunidades
de Foles e Cambriú. Ao chegarmos, notamos pouca movimentação na praia.
Decidimos iniciar a entrega dos folhetos pelo final da praia, sendo a D. A. a primeira
a ser visitada. Meu maior receio era não ser reconhecida pelas pessoas, o que não
se mostrou verdadeiro. Caminhando em direção à casa de D. A., encontramos seu
filho, S. K., pintando a casa. Ele logo nos reconheceu. Chamei por D. A. Ela, que se
ocupava com os afazeres domésticos, veio nos receber. Ao nos vermos, logo nos
abraçamos. L., sua neta, que ajudava D. A. na limpeza da casa também veio nos
receber!
Fomos convidadas a entrar. D. A. me mostrou as fotos que havia enviado a
ela, através de um morador de Cambriú que vive também em Cananéia. Aliás, todos
receberam as fotos. Permanecemos conversando durante um tempo. D. A., assim
como outros moradores, se queixaram do pouco movimento de turistas na
temporada deste ano. Bem, após a emoção do reencontro, entreguei os folhetos
(ANEXO V.1) contendo as principais informações levantadas na pesquisa, sendo
esta a forma que encontramos ser a mais acessível de retorno para os moradores.
As visitas consistiam basicamente na explicação das informações contidas neste
folheto, nas quais procurava ressaltar a importância do conhecimento caiçara na
107
manutenção da cultura local, além da minha gratidão pela participação de cada um
na pesquisa.
E assim seguiu-se o trabalho. Buscávamos todos os moradores que
participaram da pesquisa para conversar. Na casa seguinte à de D. A., a de R. e O.,
não obtivemos êxito, uma vez que os moradores estavam em Cananéia. A próxima
família a ser visitada foi a de L... O reencontro com as crianças, suas filhas, foi pra
mim, muito emocionante! D. M. e M., seus netos, D. R., S. A., C. e M., I.... todos
deixarão saudades!!!
Ao longo das visitas, perguntamos sobre os moradores e recebemos a notícia
de que muitos estão em Cananéia... Para os que não encontramos, pedimos a
outros moradores que, posteriormente, entregassem os folhetos sobre a pesquisa.
Tendo encerrado o trabalho em Cambriú, caminhamos para Foles.
Em Foles, iniciamos a busca pelos moradores, pela casa de D. V.. Muito
receptiva, mostrou-se agradecida pela visita... Em nossa conversa, disse que,
apesar de um pouco mais fraco do que na temporada anterior, o movimento de
turistas está bom, especialmente no carnaval, uma vez que já estava com sua área
de camping comprometida para esse período.
Nesta comunidade, tivemos dificuldade de encontrar os moradores, a maioria
homens que trabalham na pesca e não estavam em casa no momento. O outro
morador encontrado foi G.... Sempre muito receptivo e animado, agradeceu-nos pela
visita.
Assim se fez o repasse de resultados à Cambriú e Foles, comunidades que
tive a imensa satisfação em conhecer... Partimos, então, para Pereirinha e
Itacuruçá.”
108
Pereirinha e Itacuruçá
Dia 03 / 02 / 06
Chegamos nestas comunidades por volta das 12:30hs. Em Itacuruçá, a
primeira visita realizada foi ao restaurante da família de D. B. e S. A.. Ao chegarmos
lá, encontramos as filhas do casal: J., I. e A.. Entreguei-lhes o folheto (Anexo V.2),
explicando-lhes a finalidade da pesquisa e agradecendo-lhes pela atenção, me
despedi. Todas mostraram-se muito receptivas.
Seguimos para a casa de S. A. e encontramos D. B.. De forma muito amável,
recebeu-nos com muita simpatia e atenção... Infelizmente, não conseguimos
encontrar S. A.. Gostaria de tê-lo agradecido pessoalmente pela valiosa ajuda em
minhas saídas de campo. Nesta comunidade, buscamos ainda, D. M. e S. I., que
não foram encontrados.
Em Pereirinha, fomos à casa de S. T. e D. M.... Lá encontramos N., a
pequena A. e A.. Após uma agradável conversa, expliquei-lhes o motivo da visita,
agradecendo-lhes pela atenção e pela ajuda. Foi nesta visita que entendi o sentido e
a real importância da realização da devolução de resultados, tanto para as
comunidades locais envolvidas, como para quem executa a pesquisa. N. e A.,
moradores nativos da comunidade, disseram-nos que muitas pesquisas sobre o
modo de vida caiçara foram desenvolvidas na área, estas envolvendo o mesmo
procedimento de coleta de dados, as entrevistas. Entretanto, em nenhumas das
pesquisas anteriores efetuou-se a uma explicação sobre o que foi feito com as
109
informações coletadas, muito menos uma visita direcionada somente para esta
finalidade. Na ocasião da visita à família de D. M., expliquei-lhes que um exemplar
da dissertação, após a defesa, será enviado à biblioteca do Núcleo Perequê, local
de fácil acesso para os monitores. Nos despedimos... Minha felicidade era muito
grande! Para finalizar, fomos à casa de V.. Algumas pessoas não foram
encontradas: J., T., L. e E.. À eles deixamos folhetos a serem entregues pelos
familiares de D. M..”
Foto: Natalia Hanazaki
Figura III.1: Menina caiçara, lendo o folheto contendo informações sobre a pesquisa.
110
Foto: Natalia Hanazaki
Figura III.2: Repasse de resultados na comunidade de Cambriú (Ilha do Cardoso-SP).
111
III.2. O retorno nas comunidades da Ilha de Santa Catarina
Naufragados
25 / 03 / 06
Era um final de semana. Às 8:30hs saímos eu, Fernando e Alex, da Armação
rumo a Naufragados. Era uma manhã ensolarada de março. Ao chegarmos no bairro
da Caieira, logo me deparei com a senhora responsável pelo estacionamento. Me
apresentei e ela logo me reconheceu. Conversamos um pouco e ela se apressou a
falar sobre a situação dos moradores da comunidade de Naufragados frente à
administração do PEST. A situação mostra-se aparentemente tensa no local. A
administração mostra-se irredutível em relação a permanência dos moradores na
localidade. Chegando à praia, após a trilha, sentamos para descansar. Havia vários
grupos de turistas na área, em virtude do feriado. Bares e restaurantes funcionavam.
Após um breve lanche no restaurante, reconheci um morador que havia entrevistado
e me reapresentei a ele. Após uma breve explicação sobre minha visita, entreguei-
lhe o folheto e este mostrou-se muito agradecido. Partimos em busca das outras
pessoas. Após uma longa caminhada pela comunidade, infelizmente não
encontramos o restante dos moradores entrevistados. Retornamos ao restaurante
onde encontramos um morador que deu-nos valiosas informações sobre os
moradores ausentes. Disse-nos que muitos deles, em virtude da realização de
acordos com a administração do PEST, mudaram-se da comunidade, sendo essa a
real intenção do PEST: a retirada de, senão todos, ao menos a maioria deles. Agora
112
pergunto-me: sob quais condições tais negociações estão sendo feitas? Seria o
direito dessas pessoas respeitado? Bem, alguns moradores ainda residem na área.
Perguntei por Seu A., um dos informantes mais atenciosos e interessados no bom
andamento da pesquisa, na época de seu desenvolvimento. Este encontrava-se no
bar, ao lado da casa de D. M. Ele logo se recordou de mim. Expliquei-lhe o motivo
da visita e entreguei-lhe o folheto. Sua reação foi de contentamento! Disse ter ficado
realmente feliz por ter ajudado e por saber notícias sobre o andamento da pesquisa.
Disse-me que iria conversar e repassar o material ao presidente da AMOPRAN para
que meu trabalho, assim como as informações colhidas ao longo do mesmo, fossem
divulgados. Entreguei-lhe outros folhetos para que distribuísse aos outros
moradores. Seu A. pediu-me autorização para fazer cópias dos folhetos para que
entregasse aos turistas, caso fosse de interesse para os moradores. Concedi-lhe
permissão e confesso que senti-me lisonjeada e surpresa com tamanho interesse.
Despedi-me e parti de certa forma satisfeita. Sensação de dever cumprido.
Agradeço a todos aqueles que sensibilizaram-se e mostraram-se solícitos comigo
ao longo do desenvolvimento do trabalho.”
113
IV. Considerações finais
O repasse de resultados aqui efetuado, apesar de simples, dadas as
limitações financeiras e logísticas, foi de fundamental importância, especialmente
para o entendimento sobre os efeitos do contato com os caiçaras da Ilha do
Cardoso. Reconhecendo as eventuais limitações, uma vez que os benefícios diretos
(melhoria em condições de vida; retorno financeiro), não apresentam-se como
conseqüências desse trabalho, conclui-se que o retorno dado mostra-se tão
importante para as comunidades locais, para as quais é feito, quanto para quem
realiza a pesquisa. Para os moradores, o efeito não se resume somente como uma
satisfação sobre o que foi feito com as informações obtidas, mas também com o
reconhecimento da importância de sua cultura. Muitos moradores mostraram-se até
mesmo agradecidos por terem colaborado com a pesquisa. Para a pesquisadora o
efeito foi constatar a positiva “repercussão” da pesquisa entre os moradores. A
impressão que fica foi a de que, pelo menos para alguns, a conscientização sobre a
valorização da importância de sua cultura se concretizou. E isso, para quem, como
eu, os conheceu e com eles conviveu, ainda que por tempo tão curto, é o retorno
mais valioso que se pode obter.
114
Considerações Finais
1) Os caiçaras, moradores da Ilha do Cardoso, apesar de estarem relativamente
próximos a centros urbanos, ainda mantém forte identidade como um grupo cultural.
Uma das possíveis explicações reside no fato de muitos deles aturem como
monitores ambientais do PEIC, o que faz com que ajam de forma coletiva com a
administração do parque, tirando desta atividade seu sustento e tendo seu
conhecimento valorizado. Para eles, a auto-caracterização como população
tradicional caiçara é também uma forma de assegurar o seu direito de permanência
no interior de uma unidade de conservação de uso indireto. Em contrapartida, os
moradores da Ilha de Santa Catarina, não apresentam uma identidade cultural de
influência açoriana tão marcante. O conflito existente na região de Naufragados
entre a direção do PEST e os moradores locais e ainda a prática de atividades de
subsistência não mais ligadas aos costumes açorianos antigos podem ter sido
algumas das razões da descaracterização deste grupo populacional.
2) O padrão de uso dos recursos vegetais mostrou-se distinto entre as duas áreas
estudadas. Na Ilha do Cardoso percebeu-se uma maior semelhança entre os
moradores de Pereirinha e Itacuruçá, grupo que foi diferenciado dos moradores de
Cambriú e Foles. Naufragados pode ser considerado o grupo mais diferente de
Pereirinha e Itacuruçá, mas com alguns elementos em comum com Foles e Cambriú.
De maneira geral, nos dois primeiros grupos registrou-se um maior número de
espécies nativas de áreas de Restinga e/ou mata de encosta, conhecidas e
utilizadas pelos moradores. Em contrapartida, Naufragados apresentou um elevado
número de espécies cultivadas, conhecidas e usadas. Além disso, uma maior
115
diversidade de plantas foi registrada nas comunidades de Pereirinha e Itacuruçá,
enquanto que para Foles, Cambriú e Naufragados a diversidade mostrou-se
semelhante. Isso pode indicar que na Ilha do Cardoso, os caiçaras mostram-se mais
familiarizados com o ambiente em que vivem, apresentando uma maior dependência
do mesmo. Em Naufragados esta maior dependência pode ter sido eliminada pela
aquisição de novos valores pelos moradores locais, opostos à cultura açoriana, e
pelo fato da ocupação desta área ter sido mais recente.
3) O conhecimento etnobotânico mostrou-se heterogeneamente distribuído entre o
grupo estudado, variando em relação ao gênero e idade dos informantes. De
maneira geral, os homens mostraram-se maiores conhecedores de um conjunto de
plantas nativas de Restinga e/ou mata de encosta empregadas para manufatura de
casas, canoas, armadilhas de pesca, etc. As mulheres apresentam-se mais
familiarizadas com as plantas medicinais utilizadas para diversos fins, o que nos leva
a acreditar que o tipo de atividade desenvolvida por homens e mulheres pode
influenciar no tipo de conhecimento que possuem sobre os recursos vegetais.
Considerando a idade dos informantes, constatou-se que os entrevistados mais
velhos detêm um maior conhecimento acerca dos recursos vegetais, o que pode ser
resultado de uma maior acumulação de conhecimento ao longo da vida, assim como
da maior necessidade de recursos, como medicinais, nesta fase da vida.
4) O acesso ao conhecimento tradicional associado à Biodiversidade mostra-se a
base da maioria dos estudos etnobotânicos. Atualmente seu acesso encontra-se sob
a “guarda” do CGEN, que com seu sistema engessado, coloca inúmeros empecilhos
para o desenvolvimento de pesquisas de caráter investigativo básico. Sugere-se,
116
então, a revisão de tais regras para que o desenvolvimento de pesquisas de caráter
básico não seja comprometido.
5) A etapa que constitui o repasse de resultados mostrou-se fundamental para o real
entendimento do impacto da pesquisa frente aos moradores locais, além de
constituir-se uma forma de agradecimento à participação dos mesmos na presente
pesquisa.
6) Estudos etnobotânicos focados em diagnósticos de plantas conhecidas e
utilizadas e na análise da distribuição do conhecimento sobre os recursos locais
dentro e entre diferentes populações humanas contribuem com o desenvolvimento
da Biologia Vegetal porque permitem que o conhecimento etnobotânico seja
considerado na busca de estratégias mais efetivas de conservação.
7) Tais estudos contribuem com as populações estudadas principalmente através da
valorização do conhecimento e da cultura local, podendo inclusive atuar como
fatores que elevam a auto-estima de populações humanas que têm sido
historicamente marginalizadas no processo de desenvolvimento econômico e de
conservação da natureza.
117
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Wanderley, M. G. L.; Shepherd, G. J.; Melhem, T. S.; Giulietti, A. M. 2004. Flora
Fanerogâmica do estado de São Paulo. vol. 4; Editora Hucitec. São Paulo,
394p.
131
Willems, E. 2003. A ilha de Búzios: uma comunidade caiçara no sul do Brasil.
São Paulo: Editira Hucitec. 185p.
Wilson, E. O. 1997. A situação atual da diversidade biológica. In: Wilson, E. O (Org.)
Biodiversidade. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 3-24.
Zar, J. H. 1996. Biostatistical analysis. 3
rd
ed. Prentice-Hall International: London.
132
Anexo I
Decreto Nº 750, de 10 de fevereiro de 1993
Dispõe sobre o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou
nos estágios avançado e médio de regeneração de Mata Atlântica, e dá outras
providências
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art.
84, inciso IV, e tendo em vista o disposto no art. 225, § 4º, da Constituição, e
de acordo com o disposto no art. 14, alíneas "a" e "b", da Lei Nº 4.771, de 15
de setembro de 1965, no Decreto-lei Nº 289, de 28 de fevereiro de 1967, e na
Lei Nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, DECRETA:
Art. 1º - Ficam proibidos o corte, a exploração e a supressão de vegetação
primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica.
Parágrafo único - Excepcionalmente, a supressão de vegetação primária ou em
estágio avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica poderá ser
autorizada, mediante decisão motivada do órgão estadual competente, com
anuência prévia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis - IBAMA, informando-se ao Conselho Nacional de Meio
Ambiente - CONAMA, quando necessária à execução de obras, planos,
atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social, mediante
aprovação de estudo e relatório de impacto ambiental.
Art. 2º - A exploração seletiva de determinadas espécies nativas nas áreas
cobertas por vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de
regeneração da Mata Atlântica poderá ser efetuada desde que observados os
seguintes requisitos:
I - não promova a supressão de espécies distintas das autorizadas através de
pratica de roçadas, bosqueamento e similares;
II - elaboração de projetos, fundamentados, entre outros aspectos, em estudos
prévios técnico-científicos de estoques e de garantia de capacidade de
manutenção da espécie;
III - estabelecimento de área e de retiradas máximas anuais;
IV - prévia autorização do órgão estadual competente, de acordo com as
diretrizes e critérios técnicos por ele estabelecidos.
133
Parágrafo único - Os requisitos deste artigo não se aplicam à exploração
eventual de espécies da flora, utilizadas para consumo nas propriedades ou
posses das populações tradicionais, mas ficará sujeita à autorização pelo órgão
estadual competente.
Art. 3º - Para os efeitos deste Decreto, considera-se Mata Atlântica as
formações florestais e ecossistemas associados inseridos no domínio Mata
Atlântica, com as respectivas delimitações estabelecidas pelo Mapa de
Vegetação do Brasil, IBGE 1988: Floresta Ombrófila Densa Atlântica, Floresta
Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual,
Floresta Estacional Decidual, Manguezais, Restingas, Campos de Altitude,
Brejos Interioranos e Encraves Florestais no Nordeste.
Art. 4º - A supressão e a exploração da vegetação secundária, em estágios
inicial de regeneração da Mata Atlântica, serão regulamentados por ato do
IBAMA, ouvidos o órgão estadual competente e o Conselho Estadual de Meio
Ambiente respectivo, informando-se ao CONAMA.
Parágrafo único - A supressão ou exploração de que trata este artigo, nos
Estados em que a vegetação remanescente da Mata Atlântica seja inferior a
cinco por cento da área original, obedecerá o que estabelece o parágrafo único
do art. 1º deste Decreto.
Art. 5º - Nos casos de vegetação secundária nos estágios médio e avançado
de regeneração da Mata Atlântica, o parcelamento do solo ou qualquer
edificação para fins urbanos só serão admitidos quando de conformidade com
o plano diretor do Município e demais legislações de proteção ambiental,
mediante prévia autorização dos órgãos estaduais competentes e desde que a
vegetação não apresente qualquer das seguintes características:
I - ser abrigo de espécies da flora e fauna silvestre ameaçados de extinção;
II - exercer função de proteção de mananciais ou de prevenção e controle de
erosão;
III - ter excepcional valor paisagístico.
Art. 6º - A definição de vegetação primária e secundária nos estágios
avançado, médio e inicial de regeneração da Mata Atlântica será de iniciativa
do IBAMA ouvido o órgão estadual competente, aprovado pelo CONAMA.
Parágrafo único - Qualquer intervenção na Mata Atlântica primária ou nos
estágios avançado e médio de regeneração só poderão ocorrer após o
atendimento do disposto no caput deste artigo.
Art. 7º - Fica proibida a exploração de vegetação que tenha a função de
proteger espécies da flora e fauna silvestre ameaçadas de extinção, formar
corredores entre remanescente de vegetação primária ou em estágio avançado
134
e médio de regeneração, ou ainda de proteger o entorno de unidades de
conservação, bem como a utilização das áreas de preservação permanente, de
que tratam os arts. 2º e 3º da Lei Nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.
Art. 8º - A floresta primária ou em estágios avançado e médio de regeneração
não perderá esta classificação nos casos de incêndio e/ou desmatamento não
licenciados a partir da vigência deste Decreto.
Art. 9º - O CONAMA será a instância de recurso administrativo sobre as
decisões decorrentes do disposto neste Decreto, nos termos do art. 8º, inicio
III, da Lei Nº 6.938, de 31 de agosto de 1981.
Art. 10 - São nulos de pleno direito os atos praticados em desconformidade
com as disposições do presente Decreto.
§ 1º - Os empreendimentos ou atividades iniciados ou sendo executados em
desconformidade com o disposto neste Decreto deverão adaptar-se às suas
disposições, no prazo determinado pela autoridade competente.
§ 2º - Para os fins previstos no parágrafo anterior, os interessados darão
ciência do empreendimento ou da atividade ao órgão de fiscalização local, no
prazo de cinco dias, que fará as exigências pertinentes.
Art. 11 - O IBAMA, em articulação com autoridades estaduais competentes,
coordenará rigorosa fiscalização dos projetos existentes em área da Mata
Atlântica.
Parágrafo único - Incumbe aos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente -
SISNAMA, nos casos de infrações às disposições deste Decreto:
a) aplicar as sanções administrativas cabíveis;
b) informar imediatamente ao Ministério Público, para fins de requisição de
inquérito policial, instauração de inquérito civil e propositura de ação penal e
civil pública;
c) representar aos conselhos profissionais competentes em que inscrito o
responsável técnico pelo projeto, para apuração, de sua responsabilidade,
consoante a legislação específica.
Art. 12 - O Ministério do Meio Ambiente adotará as providências visando o
rigoroso e fiel cumprimento do presente Decreto, e estimulará estudos técnicos
e científicos visando a conservação e o manejo racional da Mata Atlântica e
sua biodiversidade.
Art. 13 - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 14 - Revoga-se o Decreto Nº 99.547, de 25 setembro de 1990.
135
Anexo II
Artigo 225 da Constituição Federal de 1988
Capítulo VI
Do Meio Ambiente
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo
ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material
genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a
supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos
e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies
ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio
ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão
público competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
136
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua
utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por
ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização
definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
137
ANEXO III
ROTEIRO PARA ENTREVISTAS – ETNOBOTÂNICA
Localidade: ________________________ Data: ____ / ____ / ____ GPS:_______
Sexo: ( )M ( )F Idade: _____ anos Local de nascimento: ________________
Tempo de residência no local ou região: _____________
Escolaridade (até que ano cursou):
Grau Não concluído (indicar até que série
estudou)
Concluído
Analfabeto
Ensino fundamental 1ª - 2ª - 3ª - 4ª - 5ª - 6ª - 7ª - 8ª
Ensino médio 1ª - 2ª - 3ª - 4ª
Ensino superior 1ª - 2ª - 3ª - 4ª - 5ª - 6ª
Estado civil: ( )Solteiro/a ( )Casado/a ( )Viúvo/a ( )Separado/a ( )Outros
Nº de residentes: ______________ Nº de homens: _______ Nº de mulheres:______
Atividade
Conhecimento e uso de plantas: manufatura (H), medicinal (M), alimento (A), outros (O)
Nome popul
a
Ambiente Uso Finalidade Cult.? Já usou
?
Coleta?
...
Na sua opinião, quem são as pessoas que conhecem mais sobre plantas aqui na
sua comunidade?
________________________________________________________________________
138
Anexo IV
Termo de Consentimento
139
Anexo V.1
Folheto explicativo usado como repasse de resultados à comunidade de
Cambriú e Foles
140
Olá pessoal!
Meu nome é Tatiana e estive aqui fazendo um trabalho
sobre as plantas que vocês conhecem e usam para se
alimentar, como remédio, na construção de casa, para
fazer canoa e artesanato...
Passei por 4 comunidades aqui da Ilha do Cardoso:
Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú para entrevistar
todos os moradores, homens e mulheres, que quisessem
participar da pesquisa.
Mas, por que eu fiz este trabalho???
Bem, estudo na Universidade Federal de Santa Catarina,
num curso chamado Pós-graduação em Biologia Vegetal,
que é feito pelas pessoas que querem saber mais sobre as
plantas.
Para terminar o curso, tive que fazer um trabalho. Como
eu e minha professora, Natalia, já conhecíamos a Ilha do
Cardoso e sabíamos que os moradores daqui conheciam
muitas plantas, achamos que seria interessante fazer um
estudo sobre esse conhecimento de vocês.
Então, foi isso que eu fiz! Passei alguns dias em cada
comunidade e fiz perguntas sobre as plantas para vocês.
Estão lembrados?
Eu fiz também essa mesma pesquisa em uma outra
comunidade de Santa Catarina, num lugar chamado
Naufragados, onde os moradores são muito parecidos com
vocês.
Etnobotânica: é o estudo das pessoas que usam e
conhecem plantas.
Restinga: são essas plantas que estão nas praias ou que
ficam perto do mar.
O meu trabalho é sobre vocês e sobre as plantas que
conhecem e usam!!!!!
Com esse estudo, eu também fiquei sabendo de coisas
novas...
A primeira coisa que descobri é que a grande maioria de
vocês nasceu na Ilha do Cardoso ou em cidades próximas,
e que muitos vieram de praias vizinhas para o local atual.
O principal trabalho desenvolvido pelos homens é a pesca,
enquanto as mulheres cuidam da família e da casa. O
turismo é uma atividade que vem crescendo na região.
Os moradores de Foles e Cambriú conhecem e usam 101
tipos de plantas, muitas delas da Restinga.
A maioria delas é usada pra fazer remédios para
diversos problemas de saúde ou como alimento. São
conhecidas também plantas pra fazer casas, canoas,
cercos e artesanato.
É importante lembrar que parte desse conhecimento
parece estar sendo perdido, porque os moradores mais
antigos foram os que falaram mais plantas.
Bem, o nome do trabalho é: “Etnobotânica de restinga
em comunidades da Ilha do Cardoso e de Santa Catarina”
Vamos ver o que isso que dizer?
Apesar de parecer complicado...
141
Continuação do Anexo V.1
As plantas que foram mais lembradas são:
Guapiruvu, usado para construir canoa;
Poejo, usado para fazer remédio;
Erva-de- santa- maria, usada
para remédio;
Boldo, usada para remédio;
Para terminar, agradeço a todos os moradores de Foles
e Cambriú que me ajudaram nessa pesquisa e que me
receberam de modoo carinhoso. Obrigada!!!!
ATENÇÃO!!!!!
Caso queiram saber mais sobre o trabalho, por terem
vidas ou não concordem com algo, entrem em contato
comigo!!!! Ficarei muito feliz em contribuir!
Tatiana Mota Miranda
Laboratório de Ecologia Humana e Etnobonica
F: (48)3331-9460
ECZ – CCB – UFSC
Campus Universitário Trindade
88010-970 – Florianópolis - SC
Apoio:
Mas qual a importância de sabermos sobre isso???
Primeiro: vocês, moradores desses lugares são as
pessoas que mais conhecem o ambiente em que vivem e,
por isso, devem valorizar essa sabedoria e se orgulhar
dela.
Segundo: vocês devem saber que o conhecimento que
vocês têm da natureza é tão importante quanto o
conhecimento das escolas e faculdades.
142
Anexo V.2
Folheto explicativo usado como repasse de resultados à comunidade de
Pereirinha e Itacuruçá
143
Olá pessoal!
Meu nome é Tatiana e estive na sua aqui fazendo um
trabalho sobre as plantas que vocês conhecem e usam para
se alimentar, como remédio, na construção de casa, para
fazer canoa e artesanato...
Passei por 4 comunidades aqui da Ilha do Cardoso:
Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú, para entrevistar
todos os moradores, homens e mulheres, que quisessem
participar da pesquisa.
Mas, por que eu fiz este trabalho???
Bem, estudo na Universidade Federal de Santa Catarina,
num curso chamado Pós-graduação em Biologia Vegetal,
que é feito pelas pessoas que querem saber mais sobre as
plantas.
Para terminar o curso, tive que fazer um trabalho. Como
eu e minha professora, Natalia, já conhecíamos a Ilha do
Cardoso e sabíamos que os moradores daqui conheciam
muitas plantas, achamos que seria interessante fazer um
estudo sobre esse conhecimento de vocês.
Então, foi isso que eu fiz! Passei alguns dias em cada
comunidade e fiz perguntas sobre as plantas com vocês.
Estão lembrados?
Eu fiz também essa mesma pesquisa em uma outra
comunidade de Santa Catarina, num lugar chamado
Naufragados, onde os moradores são muito parecidos com
vocês.
Etnobotânica: é o estudo das pessoas que usam e
conhecem plantas.
Restinga: estas plantas que estão nas praias ou que ficam
perto do mar.
O meu trabalho é sobre vocês e sobre as plantas que
conhecem e usam!!!!!!
Com esse estudo eu também fiquei sabendo de coisas
novas...
A primeira coisa que descobri é que a grande maioria de
vocês nasceu na Ilha do Cardoso ou em cidades próximas,
como Registro e Pariqueraçu. O principal trabalho que
realizam está ligado ao turismo, na atividade de monitor
ambiental. A pesca também é bem importante para os
moradores, que conhecem e utilizam uma armadilha
chamada de cerco-fixo, para pescar peixe. Outra coisa
que descobri é que a cultura de vocês é tão rica que até
possui um tipo de música próprio: o fandango, muito bem
tocado por vocês!!!
Os moradores de Pereirinha e Itacuruçá conhecem e
usam 156 tipos de plantas, grande parte da Restinga.
A maioria delas é usada pra fazer remédios para
diversos problemas de saúde. Foram citadas também
plantas pra fazer casas, canoas, cercos... Como
alimento, foram citadas várias que possuem frutos
gostosos... Mas para fazer artesanato, poucas plantas
são usadas, talvez porque muitos moradores já não
vivem disso e não mais se interessam por esse tipo de
conhecimento.
Bem, o nome do trabalho é: Etnobotânica de restinga
em comunidades da Ilha do Cardoso e de Santa Catarina”
Vamos ver o que isso que dizer?
Apesar de parecer complicado...
144
Continuação do Anexo V.2
As plantas que foram mais lembradas são:
Guapiruvu, usado para fazer canoa;
Araçá, usado como remédio ou para comer;
Caxeta, usada para
artesanato;
Pitanga, usada como remédio ou
para comer;
Outra parte do trabalho foi levar alguns moradores para
andar nas parcelas, o que comprovou ainda mais o grande
conhecimento que possuem. Cada um dos entrevistados nas
parcelas soube me dizer 119 nomes de plantas!
Para terminar, agradeço a todos os moradores do
Itacuruçá e Pereirinha que me ajudaram nessa pesquisa
e que me receberam de modo tão carinhoso. Obrigada!!!!
ATENÇÃO!!!!!
Caso queiram saber mais sobre o trabalho, por terem
dúvidas ou não concordem com algo, entrem em contato
comigo!!!! Ficarei muito feliz em contribuir!
Tatiana Mota Miranda
Laboratório de Ecologia Humana e Etnobotânica
F: (48)3331-9460
ECZ – CCB UFSC
Campus Universitário Trindade
88010-970 – Florianópolis - SC
Apoio:
Mas qual a importância de saber sobre isso???
Primeiro: vocês, moradores desses lugares são as
pessoas que mais conhecem o ambiente em que vivem e,
por isso, devem valorizar essa sabedoria e se orgulhar
dela.
Segundo: vocês devem saber que o conhecimento que
vocês têm da natureza é tão importante quanto o
conhecimento das escolas e faculdades.
145
Anexo V.3
Folheto explicativo usado como repasse de resultados à comunidade de
Naufragados
146
Olá pessoal!
Meu nome é Tatiana e estive aqui fazendo um trabalho
sobre as plantas que vocês conhecem e usam para se
alimentar, como remédio, na construção de casa, para
fazer canoa e artesanato...
Passei por 4 comunidades aqui da Ilha do Cardoso:
Pereirinha, Itacuruçá, Foles e Cambriú para entrevistar
todos os moradores, homens e mulheres, que quisessem
participar da pesquisa.
Mas, por que eu fiz este trabalho???
Bem, estudo na Universidade Federal de Santa Catarina,
num curso chamado Pós-graduação em Biologia Vegetal,
que é feito pelas pessoas que querem saber mais sobre as
plantas.
Para terminar o curso, tive que fazer um trabalho. Como
eu e minha professora, Natalia, conhecíamos a Ilha do
Cardoso e sabíamos que os moradores daqui conheciam
muitas plantas, achamos que seria interessante fazer um
estudo sobre esse conhecimento de vocês.
Então, foi isso que eu fiz! Passei alguns dias em cada
comunidade e fiz perguntas sobre as plantas para vocês.
Estão lembrados?
Eu fiz também essa mesma pesquisa em uma outra
comunidade de Santa Catarina, num lugar chamado
Naufragados, onde os moradores são muito parecidos com
vocês.
Etnobotânica: é o estudo das pessoas que usam e
conhecem plantas.
Restinga: são essas plantas que estão nas praias ou que
ficam perto do mar.
O meu trabalho é sobre vocês e sobre as plantas que
conhecem e usam!!!!!
Com esse estudo, eu também fiquei sabendo de coisas
novas...
A primeira coisa que descobri é que a maioria de vocês
nasceu na região de Florianópolis ou em locais próximos,
como Canoinhas e Paulo Lopes. O principal trabalho
desenvolvido pelos homens é a pesca, enquanto as
mulheres cuidam da família e da casa. O turismo é uma
atividade que vem crescendo na região.
Os moradores de Naufragados conhecem e usam 108
tipos de plantas, muitas delas cultivadas nos quintais ou
hortas das casas.
A maioria delas é usada como alimento ou pra fazer
remédios para diversos problemas de saúde.
Bem, o nome do trabalho é: “Etnobotânica de restinga
em comunidades da Ilha do Cardoso e de Santa Catarina”
Vamos ver o que isso que dizer?
Apesar de parecer complicado...
147
Continuação do Anexo V.3
As plantas que foram mais lembradas são:
Boldo, usado para remédio;
Para terminar, agradeço a todos os moradores de
Naufragados que me ajudaram nessa pesquisa e que me
receberam de modo tão carinhoso. Obrigada!!!!
ATENÇÃO!!!!!
Caso queiram saber mais sobre o trabalho, por terem
dúvidas ou não concordem com algo, entrem em contato
comigo!!!! Ficarei muito feliz em contribuir!
Tatiana Mota Miranda
Laboratório de Ecologia Humana e Etnobotânica
F: (48)3331-9460
ECZ – CCB – UFSC
Campus Universitário Trindade
88010-970 – Florianópolis - SC
Apoio:
Mas qual a importância de sabermos sobre isso???
Primeiro: vocês, moradores desses lugares são as
pessoas que mais conhecem o ambiente em que vivem e,
por isso, devem valorizar essa sabedoria e se orgulhar
dela.
Segundo: vocês devem saber que o conhecimento que
vocês têm da natureza é tão importante quanto o
conhecimento das escolas e faculdades.
Capim- limão, usada como chá calmante;
Hortelã, usada para remédio;
63
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