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Marcelo (La Carretta) Enrique López da Cunha Pereira
Cinema: memória audiovisual do mundo
Belo Horizonte
Escola de Belas Artes /UFMG
2005
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Marcelo (La Carretta) Enrique López da Cunha Pereira
Cinema: memória audiovisual do mundo
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Artes Visuais da Escola de
Belas Artes da Universidade Federal de
Minas Gerais, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre em Artes
Visuais.
Área de Concentração: cinema
Orientador:
Luiz Nazario
Belo Horizonte
Escola de Belas Artes /UFMG
2005
2
LA CARRETTA, Marcelo L. da Cunha, 1979-
Cinema, memória audiovisual do mundo / Marcelo La
Carretta. – 2005
102 f.. : il. –
Orientador: Luiz Nazario
Dissertação apresentada ao Mestrado em Artes Visuais da Escola
de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais,
como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em
Artes Visuais.
1. Cinema, conservação, restauração e exibição. – 2. Cinematecas,
História. – 3. Cinema, História. – I. Nazario, Luiz, 1957- II.
Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Belas
Artes IV. Título.
CDD : 702.88
CDU : 7.025 código p/BIB/EBA
3
Agradecimentos
Luiz Nazario, por estar sempre ao meu lado nesta importante jornada. Com ele,
entendi o real significado da palavra orientação.
Adriana Ferreira Cunha, minha namorada na graduação, minha noiva na
iniciação científica, minha esposa no mestrado (Deus sabe o que me aguarda no
doutorado)!
Alda Cunha, minha mãe para todas as horas (até as que ela desconhece).
Carlos Alberto Ferreira, meu grande tutor.
Marco Antônio Anacleto, Tatiana Amaral, Alexandre Pimenta, André
Martins e outros que me apoiaram (e me aturaram) durante o processo.
4
Resumo
A palavra restauração vai um pouco além do simples ato de restaurar. Ela pode
também ser entendida como uma poderosa ferramenta, parte importante da
compilação de um arquivo de valor cultural e histórico. Dirigindo nossa atenção
para essa área, pretendemos destacar não apenas as técnicas de conservação e
restauração de películas, como também o resgate da memória de uma sociedade, de
uma época, considerando o filme como um importante documento histórico.
Qualquer filme é importante sob a ótica de uma análise histórica, pois todos
registram não só imagens, mas idéias, costumes, gestos da humanidade daquele
período. São analisados nesta pesquisa os conceitos que fazem do filme um
documento histórico, o surgimento de uma consciência de conservação e
restauração, a história de algumas cinematecas pelo mundo e particularmente pelo
Brasil, as técnicas utilizadas na recuperação dos filmes e, numa visão mais
intimista, os esforços da Escola de Belas Artes – UFMG para a salvaguarda de sua
própria memória audiovisual.
Abstract
The word restoration goes a little beyond for the simple act to restoring. It can also
be understood as a powerful tool, an important part for the compilation on archive
of cultural and historical value. Directing our attention for this area, we intend to
not only detach the techniques of conservation and restoration of films, as also the
rescue of the memory of a society, a time, considering the film as an important
historical document. Any film is important under the optics of a historical analysis,
therefore all not only register images, but ideas, customs, gestures of the humanity
in that period. The concepts that make of the film a historical document, the
sprouting of a conservation conscience and restoration, the history of some film
restoration institutes of the world and particularly for Brazil, the techniques used
in the recovery of the films and, in a intimate vision are analyzed in this research,
the efforts of the Belas Artes School - UFMG for safeguards her proper audiovisual
memory.
5
Cinema: memória audiovisual do mundo
Índice
Introdução: a recuperação da memória
audiovisual 7
I – O filme como documento histórico 10
II – O nascimento de uma mentalidade
conservadora 24
III – Conservar, restaurar e reviver a
memória audiovisual 42
IV – Breve histórico da memória
audiovisual do Brasil 71
V – Aprendendo em casa: a memória
audiovisual da Escola de Belas Artes 98
Conclusão: sobre o passado e o futuro do
cinema 147
Bibliografia 153
Anexos 162
6
Introdução
A recuperação da memória audiovisual
A palavra restauração vai um pouco além do simples ato de restaurar. Ela
pode também ser entendida como uma poderosa ferramenta, parte importante da
compilação de um arquivo de valor cultural e histórico. Dirigindo nossa atenção
para essa área, pretendemos destacar não apenas as técnicas de conservação e
restauração de películas, como também o resgate da memória de uma sociedade, de
uma época, considerando o filme como um importante documento histórico.
Na presente monografia, levantamos algumas evidências que tornam o filme
um objeto digno de ser preservado para as gerações futuras. Qualquer filme é
importante sob a ótica de uma análise histórica, pois todos registram não só
imagens, mas idéias, costumes, gestos da humanidade daquele período. Porém, o
cinema revelou-se, com o passar dos anos, a mais efêmera das artes: traiçoeira,
enganou os que acreditavam em sua eternidade, sendo sua mídia um dos mais
precários suportes já inventados. Quando se percebeu este fato, restavam apenas
10% das imagens feitas pelos pioneiros. Desde então existe a corrida contra o fim
dos filmes para se salvar o que se puder do maior inimigo da memória audiovisual:
o tempo. Foi criado o hábito de guardar filmes, constituindo os primeiros acervos
pessoais; os cineclubes – os núcleos das primeiras filmotecas, cinematecas e
museus do cinema. Os defensores da mentalidade conservacionista são chamados
de loucos por uns, de dragões a proteger tesouros por outros. No entanto, são os
responsáveis pelo fato de hoje podermos conhecer as obras de Griffith, Méliès,
Einsenstein, Pudovkin e tantos outros.
7
No Brasil, foram também esses apaixonados por cinema que ajudaram a
manter viva nossa memória audiovisual na salvaguarda dos filmes de Igino
Bonfioli, Humberto Mauro, Joaquim Pedro de Andrade, Adhemar Gonzaga,
Glauber Rocha; das empresas Cinédia e Atlântida; dos Ciclos Regionais, da
Chanchada, do Cinema Novo; trazendo à vida o discurso dos que já se foram
através de cinejornais e documentários; e de toda a gama de imagens que
constituem o nosso passado histórico, fundamental para entendermos de onde
viemos e para olharmos com mais segurança em direção ao futuro. Mais que mero
entretenimento, o cinema é o melhor registro de nossa época.
Essa pesquisa revelou possuir muitos argumentos que merecem atenção, tais
como o entendimento dos processos técnicos e químicos para a conservação e
restauração das películas; o uso das novas tecnologias digitais para a conservação
da memória audiovisual e, numa visão mais intimista, o resgate do rico e quase
desconhecido acervo da Escola de Belas Artes, UFMG. Neste último caso, nossos
esforços no sentido de remasterizar o acervo foram descritos em detalhes na
presente monografia, um diário do trabalho realizado dentro do projeto Filmoteca
Mineira, coordenado pelo Prof. Dr. Luiz Nazario, projeto do qual participei ativa e
apaixonadamente. Pérolas como animações de alunos, produções de Minas Gerais
e em particular de Igino Bonfioli, raridades como o mais antigo filme conservado
no Brasil e inclusive películas da extinta Alemanha Oriental foram remasterizados
para DVDs neste projeto, revelando alguns dos tesouros que a Escola esconde.
O trabalho proposto registra – talvez de forma mais duradoura que uma
película, um filme e um DVD (todos esses suportes frágeis e de duração limitada) o
8
esforço coletivo e pessoal na propagação da memória audiovisual enquanto
documento histórico; seja na teoria, através de levantamentos sobre conservação,
preservação e restauração de filmes, seja na prática, através do uso de processos
digitais para recuperar memórias e torná-las acessíveis ao público através da
coleção Filmoteca Mineira.
9
As pessoas sentam-se em cadeiras enfileiradas, todas voltadas para uma
parede, onde apenas um fino tecido conhecido como écran se destaca. No alto da
sala, do lado oposto, uma pequena janela. Apagam-se as luzes. Durante um
instante, alguém pode pensar no ridículo de diversas pessoas desconhecidas e
anônimas num cubículo escuro, de portas fechadas, sentadas por mais de duas
horas de frente para uma parede. Mas esse instante é logo interrompido por um
facho de luz que corta a sala e preenche quase em sua totalidade a tela da parede
oposta. Em segundos, o cinema fará com que essas pessoas esqueçam onde estão.
Suas realidades serão outras.
Desde sua invenção, o cinema tornou-se um elemento catalisador do
raciocínio do homem do século XX, seguramente um dos grandes responsáveis
pelo salto gigantesco da humanidade nesse período. Sentado numa sala escura,
podia-se viajar sem sair do lugar, conhecer novas culturas, novos lugares, novas
pessoas, “devorar” numa pílula de duas horas as imagens compactadas de um
romance que custaria dezenas de horas de leitura em páginas escritas. Pelo cinema,
as possibilidades do homem alcançar seus sonhos atingem níveis antes
inimagináveis.
É antigo o desejo do homem em registrar o movimento. Das figuras de arte
rupestre do início da civilização humana a pinturas como Nu descendo uma escada
(1912), de Marcel Duchamp, é fácil identificar na expressão artística a ânsia perene
de capturar a síntese do que ele vê, base inclusive de sua sobrevivência: o
10
movimento é a atração visual mais intensa da atenção
1
. Joseph-Antoine Plateau,
físico belga, foi um dos primeiros da história a medir o fenômeno da persistência
retiniana, fundamental para o cinema, acabando cego por conseqüência das
inúmeras tentativas e experimentos sobre o tema
2
. Dentro do contexto de
inovações tecnológicas iniciadas com o advento da eletricidade e logo após expressa
em inúmeras invenções que surgiram, podemos entender que a do cinema foi um
dos maiores passos dados pelo homem na busca do autoconhecimento, definindo
novos rumos para a história.
Com o cinema, o homem pode expressar com extrema fidelidade o
movimento tal como ele o imagina. O cinema nasce registrando, nasce como
documento, independente de gênero, classe, época ou país, o filme é seguramente
uma das mais importantes fontes históricas. Causa então assombro o fato de que
boa parte desses documentos, principalmente os primeiros, tenha sido perdida
para sempre. O descaso pelo “velho” e a ânsia por “novidades” sempre foram os
grandes inimigos da consciência e da memória do homem. A revolução industrial e
a lâmpada de Edison levaram as pessoas a imaginar um sem número de
possibilidades para a modernização da vida: na civilização industrial, quem possuir
mais energia elétrica e soltar mais fumaça da chaminé de sua fábrica passa a ser
considerado o mais poderoso. Celebrando essa mentalidade, no inverno de 1909 o
poeta Filippo Marinetti compôs em prosa o que viria a ser o primeiro Manifesto
Futurista:
1
Apud: ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepção visual, p. 365.
2
PEDREIRA, Paulo Antônio. Imagens do movimento: introduzindo ao cinema, p. 12.
11
Marinetti e alguns amigos estavam juntos a altas horas da noite,
em sua casa em Milão. [...] Indignava-os seu silêncio, sua capacidade de
abarcar e refletir o imenso céu estrelado, os ecos abafados da água dos
canais, a agourenta quietude dos palácios de pedra, indignava-os a
harmonia que criava com uma Itália repleta de lembranças da
Antiguidade, uma Itália alheia às forças aglutinadoras do industrialismo.
[...] Esse anseio do rumor e da velocidade, capazes de quebrar a
imobilidade do silêncio em que se sentiam asfixiados, teve como resposta o
repentino ruído dos bondes embaixo da sua janela. Eletrizado, Marinetti
conclamou, aos brados, os seus companheiros a segui-lo – a saírem de
carro à luz do alvorecer. Não há nada, gritava, que possa igualar o
resplendor da espada vermelha do sol, rasgando pela primeira vez nossa
escuridão milenar! Amontoaram-se em automóveis e saíram a toda pelas
ruas da cidade, incitado pela velocidade, Marinetti começou a ansiar por
um fim da ‘sabedoria domesticada’, do que já fora pensado, do que já era
conhecido. Como que em resposta, sua disputa com a experiência terminou
tumultuadamente, pois, ao desviar para evitar uma colisão, seu carro
capotou numa vala. Para Marinetti, esse choque com o perigo era o
desfecho necessário para sua experiência: - Oh, Vala Materna - exclamou -
quase repleta de água lamacenta! Belo esgoto fabril! Engoli teu lodo
nutritivo; e lembrei-me do abençoado seio negro de minha ama
sudanesa... Quando saí - roto, imundo e malcheiroso - debaixo do
automóvel emborcado, senti o ferro incandescente da alegria
perpassando-me deliciosamente o coração
3
!
3
KRAUSS, Rosalind. Espaço Analítico: Futurismo e Construtivismo, in: Caminhos da Escultura
Moderna, p. 49.
12
O próprio Manifesto Futurista proclama um amor pela velocidade e pelo
perigo, incita ao culto de uma “nova beleza”: um automóvel em alta velocidade é
mais belo que a Vitória de Samotrácia
4
. Advoga valores de agressão e destruição,
clamando pelo desmantelamento de museus, bibliotecas e academias – de todas as
instituições dedicadas à preservação e ao prolongamento do passado. É curioso
notar que Filippo Marinetti cita a Vitória de Samotrácia como padrão de beleza da
época. A estátua, cujos restos encontram-se na entrada do Museu do Louvre, existe
em sua integridade apenas na imaginação das pessoas, que projetam a partir de
suas ruínas a maravilha que ela deveria ter sido. Ouro e maldição (Greed, 1924), de
Erich Von Stroheim, foi comparado na época de seu lançamento à Vitória de
Samotrácia. Sinônimo de beleza, a estátua é hoje uma ruína. E, por ironia, Ouro e
maldição teve o mesmo destino, tornando-se símbolo da destruição da história do
cinema
5
. Os futuristas olhavam com bons olhos o cinema, pois segundo eles, ele “
havia nascido futurista, ou
seja, desprovido de passado
e livre de tradições
6
”. Por
outra ironia do destino, os
filmes dos futuristas foram
vítimas da política
4
KRAUSS, Rosalind. Espaço Analítico: Futurismo e Construtivismo, in: Caminhos da Escultura
Moderna, p. 50.
5
Mais detalhes sobre o caso do filme Ouro e maldição podem ser encontrados no capítulo III da
presente monografia, Restaurar, conservar e reviver a memória.
6
Apud: Revista L’Italia futurista, nº. 9, setembro de 1916.
13
destrutiva que defendiam: hoje se encontram desaparecidos a maioria dos filmes
feitos em 1916, entre eles um curta-metragem intitulado Vita futurista, rodado em
Milão e Florença e que contou com a colaboração do próprio Filippo Marinetti
7
.
Mas a exaltação das possibilidades do aparelho cinematógrafo lançaria, além
do pensamento futurista de uma nova arte descomprometida com o passado,
apenas voltado para a realidade, outra vertente de idéias totalmente opostas. Em
25 de março de 1898, apenas três anos depois da primeira exibição pública do
cinematógrafo dos irmãos Lumière, o fotógrafo checo Boleslav Matuszewski lançou
em Paris o que se acredita ser o primeiro manifesto do mundo a favor da
preservação dos filmes, um livreto intitulado Uma nova fonte histórica
8
. Boleslav
chamava a atenção para a nova forma de documentação da realidade, antevendo de
forma espantosa o que seria o futuro daquela invenção:
Acreditávamos, erradamente, que todos os gêneros de documentos
figurativos que se tornassem históricos teriam seus lugares nos Museus e
nas Bibliotecas. Colocada ao lado de selos, medalhas, desenhos sobre
cerâmica, esculturas etc., que são recolhidas e classificadas, a fotografia,
por exemplo, não tem seu departamento específico. (...) Obrigatoriamente
restrita no seu começo, esta coleção ganharia uma extensão cada vez
maior à medida que a curiosidade dos fotógrafos cinematográficos
trouxesse cenas simplesmente de diversão ou fantasistas, além das ações e
espetáculos de interesse documental e de entrechos de vida divertida, além
7
BENNET, Carl. “The Progressive Silent Film List”, in:
http://www.silentera.com/PSFL/data/V/Vitafuturista1916.html, ativo em 26/04/2005.
8
Ver Anexo III, Uma nova fonte histórica.
14
dos entrechos de vida pública e nacional. De simples passatempo, a
fotografia em movimento se tornará então um método agradável para o
estudo do passado; ou, mais ainda, uma vez que ela trará a visão direta,
ela suprimirá, ao menos para certos pontos que têm sua importância, a
necessidade de investigação e de estudo. Por outro lado, ela poderá se
tornar um método de ensino singularmente eficaz. Dos textos de vaga
descrição, oferecidos pelos livros destinados à juventude, um dia
poderemos chegar a ter numa sala de aula, em um quadro preciso e em
movimento, os aspectos mais ou menos importantes de uma assembléia
em deliberação, o encontro de chefes de estado próximos de selar alianças,
um deslocamento de tropas ou de esquadras ou mesmo a fisionomia
inconstante e móvel das cidades. Mas é necessário que se passe um longo
tempo antes que possamos recorrer a essa fonte auxiliar para o ensino de
História. É preciso de imediato armazenar a história pitoresca e exterior,
para a empregar mais tarde, sob os olhos dos que não a testemunharam
9
.
O cinema cumpre importante papel ao registrar os hábitos das pessoas. A
câmara, apenas captando imagens à sua volta, já transforma o filme em um espelho
da realidade. Portanto, o filme pode e deve ser entendido como uma poderosa
ferramenta, um arquivo de valor cultural e histórico da humanidade, capaz de
resgatar identidades de grupos e épocas, como numa revisitação do passado de
uma cultura. Entende-se então o filme como documento histórico, incluindo a
produção de ficção: os veículos, os figurinos, os objetos de cena, a paisagem natural
e urbana – tudo, e mesmo o imaginário criado na tela, está impregnado e marcado
9
MATUSZEWSKI, Boleslav. Uma nova fonte histórica, 1898.
15
pela época na qual o filme foi rodado. Mesmo o seu suporte (seja película de nitrato
ou acetato, vídeo ou DVD); sua técnica de colorização (pintado à mão, viragem,
Technicolor ou pintura digital); seus efeitos especiais (que revelam o estágio
tecnológico da indústria); a presença ou não de banda sonora (e o formato da
mesma)... Tudo num filme pode evidenciar o tempo em que foi realizado.
Por ser basicamente um instrumento de entretenimento, o filme sempre
refletiu as ânsias do público, mais uma referência que indica sua importância para
a análise histórica. Marc Ferro aponta em seu livro Cinema e História as possíveis
causas que fizeram o filme ser relegado ao segundo plano enquanto registro
histórico:
(...) Isso (o descaso com o cinema) também diz respeito ao estatuto
do cinema na sociedade no início do século XX. Herdeiro de suas origens,
por um lado, ele foi considerado como uma máquina de vanguarda pelos
sábios e técnicos. Via-se nele o instrumento registrador do movimento e de
tudo aquilo que os olhos não podem reter. Por outro lado, o filme era
completamente ignorado enquanto objeto cultural. Produzido por uma
máquina, como a fotografia, ele não poderia ser uma obra de arte ou um
documento. É significativo que os cine-jornais jamais tenham tido outro
autor reconhecido além da empresa que os produziu. O homem da câmara
não pertence à sociedade dirigente, ao mundo dos letrados. Ele é
simplesmente um caçador, um caçador de imagens. Produzida assim, órfã,
a imagem é perfeita para se prostituir para o povo. Para a sociedade
cultivada e para os notáveis, o cinema é um espetáculo de párias
10
.
10
FERRO, Marc. Cinema e história, p. 71.
16
O cinema, talvez por nascer pré-destinado a registrar, acaba tornando-se um
espelho fiel da sociedade. E esta sociedade ao ver sua imagem refletida tende a
questionar seu próprio aspecto. O crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes
acredita que o cinema é um reflexo fiel do povo que o produz, tanto que se pode
classificar o cinema da mesma forma que a divisão da sociedade é feita:
desenvolvidos, subdesenvolvidos, todos retratos de suas culturas
correspondentes
11
. Pode-se dizer que o cinema é o mais “penetrante” dos
documentos: além de registrar modos de vida, registra também o ato de pensar.
André Bazin, criador da revista Cahiers do Cinema e um dos principais pensadores
do chamado realismo cinematográfico, considera o cinema uma refração da
realidade. O cinema não seria um instrumento para se olhar a natureza, e sim um
instrumento da ciência e da natureza; ou seja, ele não capta o meio, é um produto
dele: Seu desejo de ver o cinema expandir-se em novas áreas era alimentado, ao
mesmo tempo, por sua preocupação com o futuro do cinema e por sua
preocupação com o futuro da realidade, ou pelo menos da nossa relação com a
realidade
12
.
A preocupação com o futuro do cinema expressa por André Bazin não diz
respeito apenas ao filme, mas também à sociedade retratada na película. Perder um
filme significa perder um fragmento da memória audiovisual da sociedade que o
produziu. Portanto, todos os filmes produzidos por determinada sociedade são
documentos históricos passíveis de serem analisados, e capazes de ajudar os
11
GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: Trajetória no subdesenvolvimento, p 85.
12
Apud: ANDREW, J. Dudley. As principais teorias do cinema, p. 139.
17
historiadores a recompor e compreender determinada época numa certa sociedade.
Nesse contexto, uma questão deve ser levantada: se todos os filmes, não
importando seu gênero, sucesso ou fracasso de crítica e público, devem ser
considerados documentos a serem preservados, que critério adotar para a
hierarquia de preservação da massa de películas produzidas em todo o mundo?
Eduardo Valente, na época estagiário da Cinemateca do MAM, do Rio de Janeiro,
lançou em artigo da revista Contracampo uma opinião polêmica sobre o tema:
Quando se fala que “devemos preservar” é lógico que parece uma
coisa óbvia, simples de defender. Porém, perde-se a perspectiva da
complexidade do assunto. Por exemplo: especialmente num país como o
Brasil, é claro que não poderíamos jamais preservar TUDO. Nossas
cinematecas e instituições simplesmente não teriam espaço, pessoal,
orçamento para todos os longas, todos os curtas, todos os cine-jornais,
todos de tudo. Ainda mais no trabalho atual onde começamos um “pronto-
socorro” de filmes, no qual precisamos optar na emergência por qual
paciente salvar. Aí a coisa começa a ficar um pouco mais confusa. Porque
afinal quem escolhe o que se preservará, o que se restaurará (ainda mais
grave)? Sob quais critérios? Obras relevantes? Para quem? Geralmente é
sob este tipo de pressão que a coisa começa a ficar estranha, porque
passamos por conceitos voláteis como o de relevância, importância,
permanência, que significam uma coisa para cada pessoa. E muitas vezes
começamos a ver um certo cânone do “bom gosto” escolher qual memória
afinal devemos preservar, e ao fazer isso direcionar o que é o “nosso
passado”. Na minha modesta opinião, todo passado é importante. Desta
18
maneira só posso levar a sério a questão do “passado” quando perder
Cidadão Kane seja considerado o mesmo que perder uma
pornochanchada. Enquanto junto com o discurso do “preservar” venha
sempre as frases “estamos perdendo filmes importantes como...”, não
posso defender de todo o conceito. Então, o que o escriba está fazendo,
propondo a paralisia, e que nada se preserve para não se fazer opções?
Longe disso... O escriba apenas tenta mostrar que algo que parecia
extremamente simples e óbvio vai se mostrando cada vez mais dúbio
13
.
Eduardo Valente levanta uma hipótese curiosa, que podemos descrever aqui
por uma metáfora: se na sala de emergência de um hospital um indigente
disputasse o atendimento com Fernanda Montenegro, qual deles teria prioridade?
Naturalmente, o indigente iria esperar porque, como disse certa vez Jean-Paul
Sartre, todo homem precisa de uma estrela e ninguém, nem o mais ferrenho
socialista, perdoaria um médico que deixasse morrer uma estrela nacional para
salvar um indigente. O humano seria resgatar o príncipe e o mendigo, a estrela e o
indigente, ao mesmo tempo e da mesma forma. Mas numa sociedade de recursos
limitados, isso é no mínimo improvável, e por isso as celebridades são privilegiadas
em detrimento dos anônimos, e os humanos “de alto nível”, socorridos antes dos
“de baixo nível”.
A seleção do material a ser restaurado é extremamente subjetiva, de acordo
com quem executa o trabalho de restauração (por vezes são as famílias dos
cineastas que levantam o patrocínio necessário para a restauração dos títulos);
13
Revista Contracampo nº 34, in: http://www.contracampo.he.com.br/34/frames.htm, ativo em
15/05/2004.
19
onde ela é feita (culturas, sociedades e políticas distintamente adotadas interferem
na salvaguarda dos filmes; por vezes, um filme considerado desaparecido no seu
país de origem é encontrado intacto nos arquivos de outro país); sua finalidade
(existe um mercado cada vez maior de exibidores e produtores de DVDs
interessados em obras restauradas); ou mesmo sua urgência. Mesmo obras de
diretores consagrados como Charles Chaplin tiveram um processo natural de
seleção na hora da preservação de seus títulos: o excelente e único filme
melodramático de sua cinematografia, Uma mulher de Paris / Opinião pública (A
Woman of Paris, 1918), ignorado pelo público e mal recebido pela crítica, por
muito tempo caiu no esquecimento, sendo uma das últimas obras suas a serem
restauradas
14
. Apesar de hoje serem lembrados como obras-primas do cinema,
vários filmes foram fracassos de bilheteria na época em que foram lançados. Entre
eles, Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941), de Orson Welles, colocando por terra a
teoria de que somente filmes que fizeram sucesso integram a cada vez mais seleta
triagem da preservação. Retornemos a Matuszewski:
Portanto, a prova cinematográfica, onde uma cena se compõe de
mil quadros, e que, repassada entre um foco luminoso e uma tela branca
faz se apresentarem e andarem os mortos e os ausentes; essa simples fita
de celulóide impresso constitui não somente um documento histórico, mas
uma parcela da História, e de História que não desapareceu; que não
precisa de um gênio para ressuscitá-la. Ela está lá recolhida e, como esses
14
Informações fornecidas pela organização do Festival do Rio na mostra Tesouros da Cinemateca
(2002), que exibiu filmes restaurados pelo MoMa de Nova York. No programa, pérolas da comédia
muda como A General (The General, 1927), de Buster Keaton; e O circo (The circus, 1928), de
Charles Chaplin. Uma mulher de Paris é destacado no programa como a exceção de Chaplin, rara
incursão do diretor pelo drama, “mais que uma curiosidade, é um grande e inesperado filme”.
20
organismos elementares que, vivendo de uma maneira latente, se
reanimam depois de anos sob um pouco de calor e de umidade, não lhe é
preciso, para acordar e viver novamente as horas do passado, mais do que
um pouco de luz atravessando uma lente em meio à escuridão! (..) O
cinematógrafo talvez não dê a história integral, mas traz ao menos aquilo
que num livro é incontestável e de uma absoluta verdade. A fotografia
ordinária admite o retoque que pode chegar até à transformação. Mas
tentem então retocar, de maneira idêntica para cada figura, estes mil e
doze centenas de quadros quase microscópicos...! Pode-se dizer que a
fotografia animada tem um caráter de autenticidade, de exatidão, de
precisão, que só a ela é possível. Ela é por excelência a testemunha ocular
verídica e infalível. Ela pode controlar a tradição oral e, se os testemunhos
humanos se contradizem sobre um fato, colocá-los de acordo silenciando
aquele que ela desmente. Suponham uma manobra militar ou naval, na
qual o cinematógrafo registrou as fases, uma discussão começada; ela
será terminada rapidamente... Ele pode dar com uma exatidão
matemática as distâncias os pontos das cenas que ele registra. Na maioria
das vezes ele mostra através de indícios bem claros a hora do dia, a época,
as condições climáticas nas quais o fato se produziu. Mesmo o que escapa
aos olhos, o progresso imperceptível das coisas em movimento, a objetiva
o surpreende, desde seu início perdido no horizonte até o ponto mais
próximo em primeiro plano na tela, Em suma, seria desejável que todos os
outros documentos históricos tivessem esse mesmo grau de certeza e de
evidência
15
.
15
MATUSZEWSKI, Boleslav. Uma nova fonte histórica, 1898.
21
Este trecho, ainda do citado primeiro manifesto pela conservação dos filmes,
não conseguiu antever a revolução digital e a manipulação de pixels, impensável no
século XIX e cada vez mais comum atualmente. Mas consegue, a seu modo, exaltar
a gama de possibilidades propiciadas pelo registro da imagem, tentando inclusive
sobrepor essa nova fonte histórica sobre outras formas de documentação. Teremos
no futuro uma produção em massa de películas e/ou similares, e uma destruição na
mesma proporção. Seja pelo progresso ou pelo abandono, filmes que marcaram
época desaparecem das prateleiras e, em seguida, de nossa memória. Sempre que
deixamos desaparecer um filme, estamos deixando desaparecer um registro de
nossa história.
É incrível como muitos países democráticos demoraram a reconhecer a
importância do filme como documento histórico, percebida já em 1898 por
Matuszewski. Já os ditadores totalitários perceberam cedo a importância do filme
como meio de propaganda de seus regimes baseados numa doutrinação de massa:
Lênin e Stalin na União Soviética, Mussolini na Itália fascista e Hitler na Alemanha
nazista criaram grandes estúdios, companhias produtoras monopolistas, redes de
exibição e algumas das primeiras cinematecas da Europa para a preservação de
toda a propaganda produzida... Os países que mais cedo se preocuparam em
preservar seus filmes foram os que adotaram essas políticas estatais
ultranacionalistas: de certo modo, eles compreendem o alcance do cinema como
“documento”, “prova” e até mesmo como “arma”, capaz tanto de educar
22
convencendo e de doutrinar entretendo o povo, assim como de difamar
estereotipando e destruindo moralmente o “inimigo”
16
.
Uma cultura que não preserva as imagens que gera perde parte importante
de seu registro histórico a cada geração. Riquíssima de elementos, a memória
audiovisual é fundamental para compor o novo mundo de imagens em que
vivemos. A preservação do cinema está submetida à política, mas acima desta está
a real função das imagens, imprescindíveis para a compreensão do passado, base
para o futuro imagético e digital. O resultado é que restam apenas 10% da memória
do mundo registrada em filmes, e essa carência aumenta se analisamos
separadamente cada país. Não é esse ou aquele filme que pede para ser socorrido,
mas toda a memória audiovisual do mundo.
16
Apud: FERRO, Marc. Cinema e história, p.70; NAZARIO, Luiz. Diversão e terror: dos autos-de-fé
ao cinema nazista, in: GORENSTEIN, Lina; TUCCI CARNEIRO, Maria Luiza (Orgs.). Ensaios sobre
a intolerância, inquisição, Marranismo e Anti-semitismo, p. 367-416.
23
As cinematecas são dragões que protegem nossos tesouros.
Jean Cocteau
17
O cinema é uma arte essencialmente efêmera, e já nasceu sem maiores
preocupações em ser conservada para as gerações futuras. Porém, difere do teatro
por dar aos envolvidos uma falsa esperança de que aquela cena, aquele gesto, a
interpretação deste ou daquele ator durariam para sempre. Seu suporte é frágil e o
descaso com que as películas são tratadas fazem do cinema, a mais nova das artes,
também a mais frágil em termos de conservação e memória.
No início do cinema, era comum descartar as películas que já haviam sido
exibidas. Elas já haviam atingido o público desejado, já tinham feito dinheiro,
ninguém imaginava que essas películas poderiam ter outra serventia ou aplicação.
Na maioria das vezes, elas eram vendidas a quilo, e acabavam virando pente,
vassoura ou esmalte. Outras vezes, a película velha era queimada pelos realizadores
para criar efeitos especiais nas novas produções. Os primeiros projecionistas
jogavam na rua os filmes já exibidos. Os que restavam eram cuidadosamente
queimados fora das salas, a fim de evitar que os mesmos queimassem essas salas
no caso de um incêndio generalizado, fato comum numa época em que a
eletricidade, ainda uma novidade, era usada sem controle. Já existiam algumas
17
Apud: Gosfilmofond of Russia, in: http://www.aha.ru/~filmfond/indexe.htm, ativo em 20/06/2005.
24
práticas de guarda de arquivos fílmicos, como o Museu Britânico, em Londres, e a
Biblioteca do Congresso, nos EUA. Sobre o primeiro, a prática de armazenar
fotografias em movimento recebia duras críticas, como a publicada no jornal
Westminster Gazette em 20 de fevereiro de 1897:
O funcionamento arbitrário da sala de gravuras do Museu Britânico
está gravemente perturbado pela coleção de fotografias animadas que têm
caído no colo dos estupefatos funcionários do local. (...) Na degradada
sala, destinada a Dürer, Rembrandt e aos outros mestres (...) [os
funcionários] catalogam paulatinamente “O Derby do Príncipe”, “A praia
de Brighton”, “Os ônibus de Whitehall”, e outras cenas atrativas que
deleitam o coração do grande público dos espetáculos musicais (...).
Falando sério, esta recompilação de idiotices não está sendo convertida em
uma tarefa absurda
18
?
O filme era considerado um mero divertimento, de alcance muito imediato;
mas nem todos pensavam assim. Um artigo de 10 de dezembro de 1906, publicado
na revista Views and film index, já tentava alertar para as potencialidades das
imagens cinematográficas:
Costumamos nos perguntar para onde vão todos os filmes que são
feitos e usados algumas vezes, e a pergunta que não sai das nossas mentes
é: Será que os fabricantes de filmes percebem que estão fazendo história?
18
EDMONDONSON, Ray. Filosofia e princípios dos arquivos audiovisuais, p. 30.
25
Será que não pensam que daqui a 50 ou 100 anos os filmes feitos hoje
serão curiosidades
19
?
A história do cinema não é feita apenas de grandes invenções, aparelhos
engenhosos, demanda por novidades e a constante destruição das películas ao
sabor dos novos aperfeiçoamentos e técnicas. Existe outra história, paralela a esta,
que acaba tornando-se a principal ponte de ligação entre o mundo novo e o antigo,
entre o cinema atual e sua memória. Partindo de práticas isoladas, criando acervos
pessoais, cineastas realizadores ou apenas cinéfilos apaixonados pela sétima arte
criaram o “insano” hábito de colecionar filmes, já percebendo que suas películas
favoritas desapareciam dos cinemas e, num segundo instante, de suas memórias.
Eles entenderam o cinema como o melhor registro de seu tempo, além de ser não
apenas um divertimento, mas a mais nova das artes.
De simples curiosidade científica a divertimento; de divertimento a
importante objeto de reflexão sobre a sociedade. Na Itália, Ricciotto Canudo
publicaria em 1911 um artigo intitulado O nascimento da Sétima Arte. Esta arte
seria o cinema, e o termo seria adotado e usado até hoje. Na França, Georg Lukacs
também entenderia o cinema como uma nova forma de expressão, publicando em
1913 um dos primeiros ensaios sobre a linguagem e estética, Introdução à estética
do Cinema. Também na França, Louis Delluc cria em 1914 o termo cineasta,
identificando o realizador não como um mero caçador de imagens, mas como
artista de uma nova arte
20
. Ricciotto Canudo fundaria em 1920 na Itália o
19
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
26
Cineclube dos Amigos da Sétima Arte
21
. Germaine Dulac, cineasta, criaria uma
Associação semelhante em Paris, defendendo o cinema como objeto de reflexão e
arte
22
. E assim surgiram pelo mundo os Cineclubes, espaços destinados não só à
exibição de filmes, mas dedicados a refletir sobre o cinema como um todo. São os
cineclubistas os primeiros criarem parâmetros da visão do cinema elevado à arte,
inclusive criando escolas de introdução à estética, crítica e prática do cinema.
O Cineclubismo expandiu-se pelo mundo, e no final dos anos 1920 quase
todos os países possuíam estes tipos de sociedades. No Brasil, o Cineclubismo
possuía razões éticas e técnicas: o lançamento do filme O cantor de jazz em 1927
inaugurava a era sonora no cinema. E o questionamento sobre as vantagens desse
novo avanço tecnológico em detrimento dos filmes mudos, que de um dia para o
outro se tornaram obsoletos, acabaram criando grupos de discussão e debates a
favor e contra o sonoro, entendido por alguns apenas como uma moda passageira,
sendo o filme silencioso (com sua estética expressiva e a pantomima dos atores)
considerado a essência mesma do cinema. Plínio Sussekind Rocha, Otávio de Faria,
Almir Castro e Cláudio Mello, eram os que defendiam estes ideais. Eram todos
integrantes do Chaplin Club, cineclube que daria origem à Filmoteca Brasileira e à
Fundação Cinemateca Brasileira
23
.
20
WILLEMEN, Paul. An introduction to Framework, in:http://www.frameworkonline.com/about2.htm,
ativo em 14/03/2005.
21
GORIA, Gianfranco. Scrivere Fumetti, in:http://www.fumetti.org/goria/scrivere/002.htm, ativo em
27/05/2005.
22
Germaine Dulac foi a segunda mulher a dirigir filmes na França, atrás somente de Alice Guy-
Blanché, contemporânea de Méliès e hoje esquecida. Fonte: World Cinema, in:
http://www.geocities.com/Paris/Metro/9384/directors/dulac.htm
ativo em 26/05/2005.
27
Da crítica e reflexão, os Cineclubistas passaram a conservar filmes, matéria
prima dos seus estudos, iniciaram na década de 1930 uma verdadeira cruzada
perservacionista, no intuito de proteger como dragões os tesouros do cinema.
Destacam-se neste período os esforços de Henri Langlois, Georges Franju e Lotte
Eisner, na França; Ernest Lindgren, no Reino Unido; Jacques Ledoux, na Bélgica;
Iris Barry e James Card, nos EUA; Mario Ferrari e Maria Adriana Pólo, na Itália;
Einar Lauritzen, na Suécia; Paulo Emilio Salles Gomes, no Brasil; e tantos outros
que, partindo de práticas isoladas, ajudaram a constituir uma nova mentalidade
conservacionista
24
.
Assim aconteceu nos países democráticos e de livre mercado, num processo
diferente do que ocorreu nos países totalitários, onde o Estado controlava e
monopolizava toda a produção e exibição dos filmes. Os governos dos países
considerados livres viram-se, num primeiro momento, desobrigados da
conservação da produção audiovisual. Nesses países, foi uma política
conservacionista dos estúdios de cinema mais previdentes na guarda de suas
produções ou o colecionismo de alguns apaixonados pelo cinema que
desempenharam o principal papel na conservação dos filmes: o colecionismo gerou
os cineclubes; alguns cineclubes deram origem a arquivos de filmes; numa etapa
seguinte, essas filmotecas particulares, muitas vezes associadas a museus,
organizaram-se em verdadeiras cinematecas, fundações que, articulando-se
internacionalmente e promovendo campanhas de conscientização sobre a
necessidade da preservação do patrimônio audiovisual, acabaram, tardiamente,
23
Vieira, João Luiz. Verbete Chaplin Club In: RAMOS, Fernão. MIRANDA, Luiz Felipe (orgs.).
Enciclopédia do cinema brasileiro, p. 119.
24
USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an introduction, p. 77.
28
obtendo o apoio dos Estados democráticos para preservar, restaurar e exibir os
filmes desde então considerados como tesouros nacionais.
Fundado em 1929, o MoMa é uma entidade dedicada a preservar a arte
moderna como um todo. A idéia é criar um centro de referência direcionado
principalmente para escolas, tornando-se um museu da história de todas as artes,
inclusive o cinema. O MoMa é responsável pela preservação de pérolas do cinema
mudo como Nanuque, o Esquimó (Nanook of the North, 1922), de Robert Flaherty,
e Intolerância (Intolerance, 1916), de David Wark Griffith, depositados na
instituição pelos seus próprios realizadores
25
.
De todas as cinematecas, certamente poucas detêm tantos filmes antigos
quanto a Biblioteca do Congresso, com películas datadas de 1890, praticamente do
início de cinema. E a razão de tão rico acervo é que, na corrida industrial, os
produtores de filmes criaram as mais loucas maneiras de registro de patentes,
tentando assegurar a propriedade intelectual de suas produções num período que
ficou conhecido como guerra de patentes. Uma engenhosa e curiosa maneira de
25
MoMa, in: http://www.moma.org/, ativo em 05/05/2005.
29
registro acabou salvando vários filmes: a impressão da película em um rolo de
papel. O cinema, novidade nos anos 1900, ainda não possuía um método de
registro: se nem era considerado documento, muito menos tinha espaço nos
museus e arquivos; as leis de direito autoral só iriam mencionar o cinema em
1911
26
. Nos Estados Unidos, alguns realizadores optaram, assim, por imprimir em
papel os seus filmes. Essa prática assegurava o filme como documento: o papel
podia ser patenteado e, como documento em papel, guardado na Biblioteca do
Congresso. O que acabou sendo criado inconscientemente foi um arquivo de 3 mil
rolos de papel de produções do início do cinema, bem armazenados, ao contrário
da cópia original em película de nitrato, desgastada e por muitas vezes
desaparecida. Graças a essa matriz de papel, mais de 200 obras puderam ser, após
a invenção de uma máquina especialmente adequada para isso, restauradas e
transferidas novamente para a película, garantindo a sobrevida de uma boa parte
da memória audiovisual do primeiro cinema norte-americano
27
.
26
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
27
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
30
Além disso, a Biblioteca do Congresso detém a salvaguarda de relíquias do
cinema em nitrato, como o negativo original de O grande assalto do trem (The
Great Train Robbery, 1903), de Edwin S. Porter; e clássicos do cinema como A
mulher faz o homem (Mr. Smith Goes to Washington, 1939), de Frank Capra;
Relíquia macabra (The Maltese Falcon, 1941), de John Huston; Casablanca (idem,
1942), de Michael Curtiz, entre tantos outros
28
.
Nascido em 1914, na Turquia, Henri Langlois seria um dos mais importantes
defensores da memória do cinema. Começou por gosto a colecionar os filmes que
amava, e o hábito tornou-se uma obsessão
quando percebeu que certos títulos de sua
coleção tornavam-se ao longo dos anos a única
cópia que deles restava. Langlois guardava suas
raridades em nitrato na banheira da casa, para o
desgosto da família, que não podia tomar banho
na banheira e ainda corria (sem saber) sérios
riscos, pois o aquecimento do banheiro era a gás
29
. Gastou todo o dinheiro que
possuía para adquirir quantos filmes fossem possíveis, até que o governo francês,
muito tempo depois, reconheceu seu empenho e passou a auxiliá-lo
financeiramente na aquisição dos títulos. Com apenas 10 títulos fundou, com o
amigo Georges Franju, e também inspirado pelas palestras do professor de cinema
Jean Mitry, em 1936, um museu-teatro destinado a guardar, restaurar e exibir
28
Biblioteca do Congresso, in: http://www.loc.gov/, ativo em 21/05/2005.
29
EISNER, Lotte. Ich hatte einst ein schönes Vaterland, p. 175.
31
filmes: a Cinemateca Francesa, que hoje dispõe de mais de 60 mil títulos
30
. Estava
dado, na França, mais um passo definitivo para a salvaguarda dos filmes e o
exemplo de Henri Langlois seria seguido em vários outros países em todo o mundo.
Além de guardar como um dragão os filmes da Cinemateca, Henri Langlois
promovia exibições dos seus tesouros, pois um acervo não serve apenas para
proteger os filmes do desaparecimento, mas também para divulgá-los, e assim
propagar a memória deles. Uma reunião de amigos acaba tornando-se um
importante centro de reflexão sobre o cinema e o seu papel na sociedade: de
simples espectadores a cinéfilos, de leitores passivos a críticos, essas pessoas
tentam desesperadamente salvar a memória audiovisual do mundo, na medida em
que divulgam, criticam e debatem filmes, levando o cinema a um nível intelectual
de reflexão indispensável à sua inserção na cultura. Henri Langlois exibia seus
filmes para uma platéia pequena, às vezes limitada a vinte pessoas, mas muito
entusiasmada, entre as quais encontravam-se Jean Cocteau, Jean-Paul Sartre,
Simone de Beauvoir, Simone Signoret e amigos estrangeiros de Langlois: Alberto
Cavalcanti, Luigi Comencini e Alberto Lattuada
31
.
Considerado o pioneiro na prática de conservação de filmes, Langlois
enfrentou todo tipo de empecilhos para assegurar a vida do seu maior projeto, a
Cinemateca Francesa. Em 1968 acabou destituído do cargo de diretor da
Cinemateca que fundara por desentendimentos com o então Ministro da Cultura da
França, André Malraux. Essa demissão causaria uma onda de manifestações a favor
de Henri Langlois de proporções gigantescas em todo o mundo. Passeatas de
30
Cinemateca Francesa, In:http://www.cinemathequefrancaise.com/, ativo em 19/03/2004.
31
EISNER, Lotte. Ich hatte einst ein schönes Vaterland. p. 175.
32
estudantes enfrentando a polícia e o apoio de diretores franceses famosos como
Claude Chabrol, Jacques Demy, Jean-Luc Godard e François Truffaut (que se
proclamaram “filhos da Cinemateca”) mergulharam a França num caos. Nunca um
trabalho como de Langlois tivera tanta projeção: Os protestos contra a demissão de
Langlois tiveram repercussão no mundo inteiro, chegando inclusive a cancelar o
festival de Cannes de 1968
32
. O ministro Malraux se viu obrigado a voltar atrás,
restituindo Henri Langlois ao cargo.
A organização maior da classe seria criada por iniciativa de Henri Langlois
em 1938: a FIAF (Federação Internacional de Arquivos de Filmes). Com sede em
Bruxelas, Bélgica, a associação que no ato de sua criação contava com apenas
quatro sócios, hoje conta com mais de 120 instituições, numa mostra da crescente
importância da preservação do patrimônio das imagens. Entre as atribuições da
FIAF, destacam-se a normalização das técnicas criadas para a conservação e
preservação de filmes, a facilitação da investigação histórica permitindo o livre
intercâmbio entre cinematecas e o treinamento de mão de obra especializada para
a difícil tarefa de preservação, restauração e divulgação do patrimônio
audiovisual
33
. Dentre as instituições pertencentes à FIAF, observa-se que o
fenômeno de conservação de filmes data da década de 1930, mas a conscientização
sobre técnicas e práticas de restauração só ocorre de fato nos anos 1950.
Por ironia, algumas das instituições mais bem sucedidas na conservação dos
filmes na Europa foram amparadas por estados totalitários. Mas nem todos os
32
O episódio é lembrado até hoje, sendo reconstituído no filme Os sonhadores (The Dreammers,
2003), de Bernardo Bertolucci. Fonte: Internet Movie DataBase, in:
http://www.imdb.com/name/nm0486581/bio, ativo em 15/05/2005.
33
FIAF, in: http://www.fiafnet.org/es/, ativo em 27/05/2005.
33
filmes desses países foram salvos da destruição. Na Rússia, o Estado Soviético
confiscou todo o imenso acervo particular de filmes do Czar Nicolau II, imperador
que via no cinema uma fantástica forma de entretenimento. Desse acervo, até hoje
pouco explorado, surgiu oficialmente em 1937 a Cinemateca Russa (Gosfilmofond),
local que ainda conserva relíquias ocultas do cinema mundial. Como Hitler e
Goebbels na Alemanha nazista, também Stalin adorava o cinema, e assistia a filmes
praticamente todos os dias. Vários filmes ele só encontrava no Gosfilmofond, que,
por essa demanda, acabou se expandindo. Apesar de ser estatal, Gosfilmofond
tinha uma liberdade de aquisição de títulos pouco praticada na época em outros
países. Acabou tornando-se referência mundial, mesmo tendo censurado até hoje
filmes que contam a história audiovisual da Rússia
34
. Dos poucos títulos
produzidos no período czarista lançados em LD e DVD, alguns impressionam pela
qualidade e uso de técnicas avançadas para a época, como cinco dos oitenta filmes
produzidos pelo cineasta e poeta russo Evgeni Bauer (1865-1917). Esse brilhante
realizador estava fadado ao esquecimento sob o Estado Soviético, que
simplesmente “apagou” da historiografia todo o passado fílmico anterior à
Revolução de Outubro
35
.
A Alemanha nazista criou, em 1935, uma das primeiras cinematecas do
mundo: a Reichsfilmarchiv, em Berlim, dirigida por Frank Hensel: membro do
Partido Nacional-socialista dos Trabalhadores Alemães (Nationalsozialistische
34
DMITRIEV, Vladimir. Entrevista a EISENSCHITZ, Bernard, in: Lignes d'ombre. Une autre
histoire du cinéma sovietique (1926-1968). Milano: Edizioni Gabriele Mazzota, 2000. On line:
Otra historia del cine soviético (1926-1968). La conservación como acto de historia,
in:http://www.mcu.es/jsp/plantilla_wai.jsp?id=8304&area=cine&contenido=/cine/film/dore/dore_n
otas/2004/marzo/dore_sovietico.html, ativo em 27/05/2005.
35
Milestone Films, in: http://www.milestonefilms.com/movie.php/madl/, ativo em 27/05/2005.
34
Deutsche Arbeiterpartei - NSDAP) e das SS desde 1928, sua biografia é repleta de
contradições e omissões. Acabou tornando-se importante figura no mundo dos
arquivos de filmes tanto na Alemanha quanto no estrangeiro, sendo um dos
fundadores da FIAF em 1938 e seu presidente em 1939. Encarregava-se de exibir
para os membros do NSDAP tanto filmes alemães quanto os filmes proibidos pelo
regime, pois segundo o Ministro da Propaganda e do Esclarecimento Público,
Joseph Goebbels, estes filmes deveriam ser estudados como parte importante dos
planos da contra-espionagem. Frank Hensel mantinha contatos com a Cinemateca
Francesa e se atribuía o mérito de ter inspirado outros arquivos de filmes segundo
o modelo alemão, que qualificava, para efeito de propaganda, como “o primeiro do
mundo” e “meio de comunicação não-política entre nações”. Na verdade, seu
trabalho como conservador de filmes nunca se dissociou de sua mentalidade e de
suas atividades nazistas
36
.
A Reichsfilmarchiv não evitou a destruição de filmes, livros e demais
documentos proibidos pelo regime nazista. Lotte Eisner, a primeira mulher crítica
de cinema na Alemanha, por ser judia perdeu seu emprego como jornalista,
exilando-se na França. Em Paris, passou fome até encontrar, em 1934, Henri
Langlois e Georges Franju. Passou a realizar trabalhos para Langlois, que negociava
com os nazistas o salvamento de filmes do cinema mudo alemão da Alemanha
hitlerista. Langlois incumbia Lotte Eisner de missões arriscadas - não na Alemanha
nazista, onde ela não podia por os pés, mas na França ocupada pelos nazistas, onde
ela passou a viver na clandestinidade com papéis falsos fornecidos por ele, sob o
nome de Lotte Escoffier. Assim ele a hospedou num castelo do século XV em
36
FIAF, Journal of Film Preservation, nº 64, p. 20.
35
Figeac, onde descobrira que a proprietária possuía latas de filmes armazenadas
num porão: Lotte passou semanas dormindo no belo e velho castelo onde não havia
banheiro, só um buraco no chão, quebrando as unhas das mãos nas latas que abria
e pesquisava, descobrindo, por exemplo, uma cópia de O grande ditador que não
podia de modo algum cair nas mãos dos alemães. Depois da guerra, em 1945, ela se
tornou a curadora da Cinemateca Francesa e voltou à Alemanha para tentar
resgatar o que podia de filmes, programas, requisitos e outros documentos do
cinema alemão para a Cinemateca Francesa
37
.
Os estados autoritários na América Latina também fizeram estragos na
memória audiovisual. Durante a ditadura imposta pelo General Pinochet no Chile,
praticamente todas as produções feitas no país naquele período foram geradas em
VHS por não ser possível obter película virgem. Estes filmes, por estarem em um
suporte muito inferior à película, podem comprometer no futuro toda a produção
do Chile da época. Neste quadro, destaca-se a figura de Carmem Brito, a única
montadora de filmes de sua geração que não “desapareceu” durante a ditadura.
Durante aqueles anos, trabalhando como intrusa na Chile Films, Carmem
embaralhava propositalmente os títulos nas prateleiras e guardava a ordem certa
na cabeça, evitando assim que os militares destruíssem importantes obras do
período mudo chileno. Foram proibidos cerca de 400 filmes no Chile entre os anos
1970 e 1980. Devido ao retrocesso cultural promovido pelos longos e duros anos da
ditadura, este país ainda não possui uma cinemateca e luta para conservar sua
memória audiovisual
38
.
37
EISNER, Lotte. Ich hatte einst ein schönes Vaterland. p. 204-211.
38
NAZARIO, Luiz. As sombras móveis, p. 307.
36
Assim que um filme é identificado como documento histórico torna-se
objeto de estudo por parte de instituições de ensino. Muitas vezes, a ajuda para a
recuperação de filmes parte de bolsas de pesquisa patrocinadas por entidades como
a UNESCO, sendo os trabalhos de restauração realizados em universidades. Nos
anos 1970, a UCLA descobriu que a Paramount não sabia o que fazer com seus
filmes de nitrato produzidos entre 1929 e 1949. A UCLA entrou com um projeto de
conservação e restauro do material e o acervo deu início ao Departamento de
Conservação daquela instituição. Assim que a notícia se espalhou, outras empresas
de Hollywood como a Twenthy Century Fox, a Warner Bros, a Columbia e a RKO
também doaram suas cópias em nitrato. Hoje, a UCLA é referência na conservação
de películas nas universidades, exportando mão de obra especializada para todo o
mundo
39
.
Mas nem sempre os filmes encontram um destino confortável. O Canadá,
por exemplo, era um dos últimos lugares onde as distribuidoras enviavam seus
filmes, e eles muitas vezes não eram mandados de volta. William O’Farrel, diretor
do National Archives of Canadá, encontrou, em 1978, 510 filmes raros na cidade
de Dawson, alguns considerados perdidos, no fundo de uma piscina. Eles eram
usados como forro para aterrar o local, que havia se transformado em um ringue de
hóquei, “algo bem canadense” segundo ele. Por estar numa temperatura baixa e de
certa forma protegido, grande parte desse acervo aterrado estava em perfeitas
condições. É o acaso colaborando com a História
40
.
39
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
40
USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an Introduction, p.45; Documentário Salvadores de imagens
(Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
37
Em 1995, por ocasião das comemorações do centenário do cinema, foram
realizadas inúmeras mostras de filmes e eventos especiais. Na França, berço do
cinema, Thierry Frémaux, diretor do Instituto Lumière, uma das mais importantes
organizações regionais de restauração do mundo, organizou uma reconstituição
histórica das filmagens dos Irmãos Lumière de Saída dos operários da fábrica,
captada com a mesma câmera e película semelhante à de 1895, sendo os operários
substituídos por destacados cineastas de todo o mundo
41
. O Instituto Lumière foi
criado em 1991 com o propósito de proteger a herança audiovisual da Europa,
restaurando clássicos como O gabinete do Dr. Caligari (Das Kabinett des Dr.
Caligari, 1919), de Robert Wiene; Cabíria (Cabiria, 1914), de Giovanni Pastrone;
Fausto (Faust, 1926), de Friedrich Murnau; filmes de Alfred Machin (considerado
o primeiro cineasta europeu); a coleção completa de filmes de Alan Roberts,
famoso colecionador da Nova Zelândia; de diretores italianos dos anos 1920, entre
outras centenas de títulos. Soma-se a isso o encontro e catalogação de outras
centenas de títulos, publicação de livros e artigos, numa gigantesca operação
conjunta entre as cinematecas da Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Alemanha,
41
NAZARIO, Luiz. As sombras móveis, p. 280.
38
Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Noruega, Portugal, Espanha e Reino
Unido
42
.
Dignos de destaque também são os festivais de cinema destinados a exibir
somente filmes mudos e restaurados, como o Festival de Podernone, na Itália; o
Festival Internacional de Cine Mudo de La Serena, no Chile; o Retour des
Flammes, na França. Em 2002, o Festival de Podernone foi um dos responsáveis
por trazer à tona a figura do já citado cineasta russo Evgeni Bauer, exibindo
relíquias nunca vistas desse cineasta, como Daydreams (1915), com uma trama que
antecipa a de Um corpo que cai (Vertigo, 1958), de Alfred Hichtcock; e Woman’s
Soul (1913), com um belo plano-seqüência avançado para sua época
43
.
Na França, o Retour des Flammes, que presenteia os espectadores com
exibições de filmes até então considerados perdidos e que foram encontrados em
porões, teve, em 2002, uma de suas mais especiais apresentações: havia sido
encontra na Espanha uma cópia colorida à mão de Viagem a lua (Voyage à la
Lune, 1902), de Georges Méliès. O festival fez uma apresentação especial da
película, restaurada durante dois anos por Serge Bromberg e Eric Lange. O título
agora faz parte de uma coleção de 70 mil filmes da empresa Lobster Films,
patrocinadora do evento, que planeja levar o Retour des Flammes a outros
países
44
.
42
SUROWIEC, Catherine (Org.). The Lumiere Project. p. 23.
43
News on Podernone Festival, in: http://www.labyrinth.net.au/~muffin/news-home_c.html;
Milestone Films, in:
http://www.milestonefilms.com, ativos em 27/05/2005.
44
Revista Eletronica Cineuropa, in: http://www.cineuropa.org, ativo em 27/05/2005.
39
No mesmo ano, o filme Viagem a lua também teria em outro local uma
exibição especial: por ocasião da 164º Sessão da UNESCO, foi apresentado a
película de Méliès em sua cadência original (16 quadros por segundo),
acompanhada pelo piano de Lawrence Lehérissey e comentada pela neta do diretor,
Madeleine Malthête-Méliès. A exibição, que tentava reconstituir em detalhes como
este filme era visto na época do seu lançamento possuía um motivo especial:
Viagem a lua é o primeiro filme outorgado pela UNESCO como Patrimônio
Audiovisual da Humanidade, prática iniciada em 1980 por aquela instituição e que
ajuda à preservação de títulos importantes que compõem o registro da memória
do mundo. Um filme tido como Patrimônio da Humanidade obriga o Estado a
preserva-lo eternamente, um status somente alcançado por obras de arte. É a
consolidação definitiva do cinema como documento histórico-cultural
45
.
45
A lista de importantes filmes que se tornaram Patrimônio da Humanidade inclui, além de Viagem
a lua, a versão restaurada em 2001 de Metrópolis (Metropolis, 1927), de Fritz Lang, e O bandido
da luz vermelha (idem, 1968), do brasileiro Rogério Sganzerla. UNESCO, Initiative for world
cinema, in: http://portal.unesco.org, ativo em 15/05/2005.
40
Também assistimos atualmente ao ressurgimento de centenas de títulos, em
sua maioria até então esquecidos, e que voltam à memória do mundo através do
DVD, atendendo normalmente um público doméstico, mas também exibidos
clandestinamente em salas de aula e pequenos auditórios de universidades, que
constituem novos cineclubes, alimentando e ampliando o público cinéfilo. Os
lançamentos de clássicos do cinema mudo nessa mídia constituem importante
exercício de divulgação de títulos esquecidos. Junto com os festivais de cinema
restaurado, que promovem hoje em toda sua magnitude o impacto que o filme
causou no dia em que foi lançado, o DVD (que pode conter não só o filme
restaurado como precisosos extras) cria um mercado de consumo de filmes
esquecidos e meios de restauração para os detentores dessas cópias e estúdios que
normalmente não se interessariam em restaurar suas películas. Assim,
paradoxalmente, é graças à tecnologia digital (que também produziu grande
impacto na restauração das películas) que a sociedade criada por pioneiros
considerados loucos como Henri Langlois vem crescendo. Esperamos que os loucos
apaixonados pelo cinema se multipliquem, pois só assim poderemos manter acesa
nossa memória audiovisual.
41
O cinema sempre teve sua sobrevivência associada à superação de obstáculos
tecnológicos que, ao mesmo tempo em que permitiam sua evolução, jogavam ao
esquecimento tudo o que já fora feito para dar lugar a novidades. O cinema é
totalmente dependente de seu suporte, e como observou o crítico e historiador de
cinema Leonard Maltin, a ironia é que, apesar de mais novo, o filme é mais frágil
do que qualquer outra mídia. Telas de grandes pintores, por exemplo. Centenas
de anos depois elas continuam existindo. A película, que é algo muito mais
recente, teve a infelicidade de ser feita de um elemento instável que, em alguns
casos, faz com que ela desapareça para sempre
46
.
O cinema foi uma culminância de várias invenções desenvolvidas no final do
século XIX: a lâmpada de Edison, a pesquisa sobre persistência retiniana de
Newton, e, sobretudo, Reynaud e seu Praxinoscópio
47
fundamentaram as bases da
máquina criada pelos Irmãos Lumière, o Cinematógrafo. Vale ressaltar nesta
invenção o uso de uma película de base aquosa sensível, perfurada
sistematicamente para adaptar-se ao projetor. Até atingir um padrão, foram feitas
46
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
47
Emile Reynaud (1844-1918) exibia em 1889 um instrumento que se constituía de uma gaiola
central com 12 espelhos e um cilindro do metal que, ao girar, permitia projetar imagens em
movimento a partir de uma película perfurada em intervalos regulares. É um dos aparelhos que
mais se assemelham ao Cinematógrafo dos Lumière e, portanto, importante precursor do projetor
de películas. Fonte: Les independants du primer siècle: Emile Reynaud, in:
http://www.lips.org/bio_Reynaud_GB.asp, ativo em 12/10/2004.
42
várias tentativas de melhorar a performance da película: a alteração de seu
diâmetro (que variou de 15mm a 70mm); a localização de suas perfurações
(inclusive uma que consistia em furos no meio da película); a alteração da
velocidade em que a seqüência de imagens era exibida (da manivela manual ao
processo mecânico)... Até que se
chegou a um consenso: 35mm de
diagonal, perfurações nas laterais e
cadência de 24 quadros por segundo,
padrão seguido até hoje
48
, embora
nos anos 1990 Douglas Trumbull,
rado que a projeção ideal da película
para o olho humano se daria na velocidade de 60 quadros por segundo, cadência
em que a imagem parece quase “saltar” da tela
após inúmeras experiências, nos tenha assegu
e seu surgimento como curiosidade científica à sua consagração como
entre
49
.
D
tenimento, o cinema passou por várias transformações técnicas, procurando
sempre atingir um padrão prático-técnico a ser seguido. E foi durante esse processo
que começaram a surgir os problemas que revelariam ser o cinema, ao contrário do
que alguns ideólogos afirmaram, uma das artes mais efêmeras da História. Por ter
a sua sobrevivência intimamente ligada a um suporte químico, físico e mecânico, a
48
Manual de catalogação de filmes. Cinemateca Brasileira, 2002.
49
Douglas Trumbull ganhou fama ao revolucionar os efeitos especiais no cinema com o filme 2001,
uma Odisséia no espaço (1968, de Stanley Kubrick). Trumbull desenvolveu um sistema de
projeção de películas chamado de Showscan. O formato exibia uma película de 70mm numa
cadência de 60 quadros por segundo, criando um efeito impressionante.
Fonte: Internet Movie DataBase, in:
http://www.imdb.com/name/nm0874320/bio, ativo em
12/06/2005.
43
película produzida passa por um obsoletismo técnico irreversível já no momento
em que é concebida - daí sua dificuldade de conservação. O cinema representa um
dos maiores entretenimentos da humanidade, com uma geração de renda que o
eleva ao patamar de uma das mais lucrativas indústrias do mundo. Isso acarreta
milhares de soluções técnicas caça-níqueis, de curto prazo, que não favorecem a
preservação do material produzido. Como exemplo desse fato, temos já no começo
do cinema a implementação de uma composição química para as películas
extremamente precária, apesar de ter sido a primeira base fílmica bem sucedida,
flexível e transparente. Criada em 1889, a chamada base de nitrato
50
já era
conhecida pela sua periculosidade (sendo usada na fabricação da dinamite) antes
mesmo de ser escolhida como melhor suporte para o filme. Várias razões, inclusive
técnicas, tentam explicar essa escolha perigosa. Imaginam ser um suporte fiel à
representação da imagem, mas a explicação mais plausível é que os filmes, por
constituírem um divertimento rápido (no início, os filmes eram simplesmente
descartados poucos dias depois de serem exibidos), não mereciam maiores
cuidados com conservação.
O principal problema da base em nitrato é sua inflamabilidade. Um filme de
nitra
to tem seu ponto de combustão em 130°C no momento em que é fabricado.
Esse é um nível praticamente impossível de ser alcançado naturalmente; por outro
lado, o ponto de combustão da película de nitrato já desgastada cai para 40°C,
alarmante para países de temperaturas elevadas como o Brasil. O nitrato não
depende de oxigênio para propagar-se, pois os próprios químicos que compõem a
50
Pode receber também o nome de nitrato de celulose, nitrocelulose, celulóide e filme inflamável,
in: USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an introduction, p. 77.
44
película agem como oxidantes. Ou seja, quando um rolo de película em nitrato
entra em combustão espontânea nada pode ser feito, pois nenhum tipo de material
ou composto (água, areia, espuma) pode penetrar de fato no foco do incêndio, que
se propaga com rapidez e de forma quase explosiva
51
.
Cinemas e principalmente cinematecas incendiaram-se por conta desse
supo
grande problema da base em nitrato é sua fraca estabilidade. Desde o
mom
rte, resultando em prejuízos incalculáveis para a memória cinematográfica:
restam apenas 10% dos filmes produzidos em nitrato. Existem muitas histórias
trágicas envolvendo as películas nesse material. Harold Lloyd, famoso comediante
do cinema mudo, teve quase todos os seus filmes destruídos quando sua casa pegou
fogo. Os filmes estavam cuidadosamente guardados em um cofre, que explodiu
com o calor. Os únicos filmes que se salvaram estavam por acaso emprestados ao
MoMa
52
.
Outro
ento da sua manufatura, o nitrato de celulose lentamente se decompõe. Essas
propriedades deformadoras da película podem levar anos para aparecer a olho nu,
mas em um estágio elevado significa sua perda total. Num primeiro momento,
temos na película de nitrato em decomposição uma imagem completamente
esmaecida, ‘acastanhada’, num filme originalmente concebido em preto e branco.
Deve-se isso à liberação do suporte de ácido nítrico, mistura fatal para a emulsão,
composta de partículas de prata. Nos estágios seguintes, temos o filme hidrolisado
(processo de liquefação). Além de apresentar um líquido pegajoso e bolhas, a
película solta um forte odor. Finalmente, temos a solidificação do nitrato, que passa
51
SOUZA, Carlos Roberto. Manual de operações. Cinemateca Brasileira, 1990.
52
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
45
a ser uma pasta amarela e quebradiça, formando ao final do processo uma areia
marrom. Todos esses estágios podem estar ocorrendo ao mesmo tempo num
determinado filme, dependendo do grau de abandono da lata
53
.
Curiosamente partiu da área médica a necessidade do desenvolvimento
conc
ra nova a experiência com o acetato: as primeiras películas usando uma
prim
décadas seguintes.
iso de um suporte que fosse mais estável para a película. Como o uso do nitrato
para raio-x em hospitais representava um risco, implantou-se o chamado filme de
segurança, feito com triacetato de celulose ou simplesmente acetato
54
. Empresas
de fornecimento de películas só alcançariam um suporte em acetato de celulose
satisfatório em 1948, com propriedades óticas e mecânicas semelhantes às de
nitrato
55
.
Não e
eira versão desse material já tinham sido exibidas na Feira de novidades,
evento realizado juntamente com as Olimpíadas de Paris em 1900
56
. Como essas
primeiras versões apresentavam péssima resistência a condições climáticas
adversas (o filme encolhia), seu desenvolvimento e uso só ocorreram de fato
cinqüenta anos depois. O nitrato foi descontinuado pela Eastman Kodak em
fevereiro de 1951, mas torna-se tarefa impossível determinar quando de fato foi
abandonado, pois em várias partes do mundo o último lote foi usado ao longo das
53
USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an introduction, p. 77.
54
COELHO, Fernanda. Palestra ministrada no CRAV, em Belo Horizonte, a 15/ 04/2004.
55
SOUZA, Carlos Roberto. Manual de operações. Cinemateca Brasileira, 1990.
56
KARNSTEDT, Hans. Filme Cinematográfico. Estrutura: revelação; durabilidade e os fatores que
a influenciam; condições para armazenamento a longo prazo, in: CALIL, Carlos Augusto (org.).
Cinemateca imaginária. p. 113.
46
A película de triacetato de celulose, ou acetato, usada até hoje, tem ponto de
combustão e vida útil semelhantes a uma folha de papel de boa qualidade, sendo
mais
de, ocasionando, entre outras
coisa
máquinas usadas no cinema, não arrebentava de forma alguma, danificando o
estável e resistente do que o filme de nitrato. Por possuir essa particularidade,
especialistas entendiam o filme de segurança como a salvação do cinema
57
. John
Hampton inaugurou em 1942 um dos primeiros cinemas dos Estados Unidos
destinado exclusivamente à exibição de filmes mudos, o Silent Movies. Para
recuperar filmes em nitrato desenvolveu uma técnica artesanal de migração para o
acetato. Porém, não imaginava que a manipulação dos materiais químicos usados
nesse processo fosse tão perigosa. Acabou morrendo vítima dos químicos
venenosos que usava para tentar salvar seus filmes.
Logo se descobriu que o filme em acetato não era a solução definitiva: apesar
de não pegar fogo, essa base é mais sensível à umida
s, encolhimento e resistência à tração. Em altas umidades relativas (+60%),
ocorre um processo de decomposição seguido de forte cheiro, chamado pelos
restauradores de “síndrome do vinagre”
58
. Esse novo problema levou os técnicos a
desenvolverem um suporte mais resistente: em 1941 foi inventado o suporte de
poliéster, mais forte e durável que o de acetato. A vida útil do poliéster é indefinida,
além de possuir imensa resistência à tração. Contudo, o acetato continuou sendo
fabricado, apesar dos testes positivos com o poliéster. Ocorre que 0 suporte de
poliéster era tão forte que quando a película travava nos projetores e demais
57
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
58
KARNSTEDT, Hans. Filme Cinematográfico. Estrutura: revelação; durabilidade e os fatores que
a influenciam; condições para armazenamento a longo prazo, in: CALIL, Carlos Augusto (org.).
Cinemateca imaginária. p. 113-114.
47
aparelho, muito mais caro que a película. Somente nos anos 1980 seriam
desenvolvidas máquinas inteligentes que param ao menor sinal de resistência,
abrindo o caminho para as películas de poliéster. Nos Estados Unidos já não se usa
filme em acetato, mas o suporte em poliéster ainda não tem previsão de chegar
definitivamente em países como o Brasil
59
. O progresso técnico sempre esteve à
frente de sua aplicação e consumo no mercado e mais ainda em relação à
conservação da memória histórica.
Se o suporte sempre foi precário, o que dizer dos avanços tecnológicos que
ocorram dentro desse suporte? É o caso do advento da cor e do som nas películas.
Para uma invenção como o cinema, anunciada desde seu início como “realidade
fantá
ada
stica”, películas em preto e branco não podiam fazer parte do universo novo
que surgia. Abriu-se outro mercado, paralelo ao da captação de imagens: a
colorização artesanal das mesmas. Artesãos pacientes, na sua maioria mulheres,
coloriam à mão filmes inteiros fazendo uso de palheta e corantes. O resultado é
extremante belo, permitindo nuances e degradés nos trabalhos mais apurados.
Outra forma acrescentar cor aos filmes que fez muito sucesso durante os anos 1916-
1927 foi a colorização das imagens de preto e branco para uma tonalidade
específica, fazendo uso de químicos que atingiam um única cor para determin
seqüência, processo conhecido como viragem. Os filmes eram tingidos
basicamente através de banhos químicos, seja através de corantes, seja trocando ou
adulterando os sais de prata (cinza) por outros químicos que acabavam colorindo a
59
COELHO, Fernanda. Palestra ministrada no CRAV, em Belo Horizonte, em 15/04/2004.
48
49
emulsão
60
. Essa última fundamentou as bases para a criação de três camadas
compostas de corantes nas cores primárias, sensíveis à captação, surgindo assim o
filme colorido.
A maneira de se restaurar filmes coloridos à mão ou com viragens
61
é a
mesma usada hoje para transferir filmes do nitrato para o acetato. Conforme vários
historiadores salientam, infelizmente o filme em acetato perdeu o brilho que o
nitrato ostentava, tecnicamente falando. A base de nitrato, em conjunto com os sais
de prata, parecia brilhar na tela, e os exibidores da época ainda ampliavam este
brilho borrifando água sobre o écran, criando uma impressão maravilhosa da
imagem, efeito talvez perdido para sempre.
Seria pouco se o problema do desbotamento das cores fosse apenas de ordem
técnica. Já na era do acetato verificou-se que filmes feitos há menos de dez anos
60
HERTOGS, Daan; KLERK, Nico. Disorderly Order: Colors in silent film, p. 12; USAI, Paolo
Cherchi. Silent Cinema: an introduction, p. 28.
61
Químicos coloridos usados no banho das películas durante os primeiros anos do cinema. Sua
finalidade era diferenciar através da cor interiores de exteriores, dias e noites, inserções, além de
ressaltar pontos de tensão na trama.
50
corriam o risco de ter suas cores totalmente apagadas. O fenômeno do
desbotamento ocorria pela má fixação das camadas de corantes, compostos
químicos que diferem dos pigmentos por apresentar transparência, mas que são
mais
tores, aparentemente incontornáveis.
Ainda segundo o artigo, ironicamente os filmes atuais tendem a perder a cor de
maneira mais rápida por usarem a técnica Eastman Color, a mais avançada da
época. Estudos e processos revelaram que essa técnica, usada em substituição ao
antigo Technicolor, perdia a cor de forma espantosa: em 25 anos todas as cores da
película teriam desvanecido
63
.
O diretor George Lucas enfrentou sérios problemas quando se dispôs a
restaurar Guerra nas estrelas (Star Wars, 1977), rodado em Eastman Color,
enquanto um filme mais antigo, guardado e protegido nas mesmas condições de
temp
George Lucas sempre deixou claro que certas soluções na filmagem de Guerra nas
fracos à ação da luz, a exemplo do que ocorre nos afrescos em todo o
mundo
62
.
Um artigo publicado na revista Film Comment causou grande alvoroço no
começo dos anos 1980. Nele, Bill O’ Connel chamava a atenção para o fato de que
apenas metade dos filmes rodados antes de 1950 sobreviveram à incúria e à fácil
degradação física do nitrato, enquanto os produzidos em acetato, a partir de 1950,
tiveram suas cores esmaecidas por vários fa
eratura como Janela indiscreta (Rear Window, 1954), de Alfred Hitchcock,
realizado no sistema Technicolor, resultou ser muito mais fácil de ser restaurado.
THOMPSON, David e CHRISTIE, Ian. Scorsese por Scorsese. p.65.
62
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions;
USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an introduction. p. 77.
63
51
estrelas desagradavam-no, principalmente por se tratarem de limitações
tecnológicas da época. Em 1997, ele teve a chance de ‘consertar’ esses erros e
acrescentar cenas antes impensáveis na remontagem do filme original. Mas Guerra
nas estrelas – Edição especial apresentou problemas que surpreenderam: os
negativos originais estavam em tão más condições que se tornava impossível usá-
los. A
essa certeza, o cineasta sedimenta uma tendência
que vem apaixonando cada vez mais os “cineastas de ponta”: o chamado cinema
digital. Mas, como observou Luiz Nazario, essa preferência representa o fim do
cinema como o conhecemos ao eliminar não só a produção da película, como
também os aparelhos de captação, projeção e edição analógicos, e as profissões
associadas ao cinema: laboratoristas de revelação e copiagem, distribuidores e
exibidores locais, projecionistas, etc. num processo de aniquilamento de todos os
intermediários entre o estúdio de produção e a sala de exibição que pertence ao
s cores outrora brilhantes tinham esmaecido em 15% no total e a sujeira
acumulada nos seis rolos de negativo poderia produzir arranhões e marcas que
apareceriam gigantescas no cinema. Todas as precauções haviam sido tomadas:
desde o lançamento do filme, seus negativos estavam guardados num cofre
subterrâneo numa temperatura ideal de 10ºC. Mas, devido a problemas com o
processamento da película a cores, os produtores tiveram de restaurar o negativo
antes de operar qualquer mudança no filme. Hoje, George Lucas diz-se satisfeito
com o resultado da remasterização de Guerra nas estrelas, mas afirma: “De uma
coisa eu tenho certeza: depois de dirigir A ameaça fantasma, eu jamais vou fazer
outro filme em película”. Com
mesmo conglomerado
64
.
rodução cinematográfica e
64
NAZARIO, Luiz. A era digital, in: Políticas de Acervo: o acesso da p
52
O diretor de cinema Martin Scorsese, ao tomar conhecimento do problema
que George Lucas tivera e do preocupante artigo de Bill OConnell, decidiu filmar
Touro indomável (Raging Bull, 1980) em preto e branco, num alerta para os
demais cineastas (já que os filmes iriam perder a cor, para que usá-las)? Além de
Touro indomável, Martin Scorsese fez uso toda a influência que tinha sobre a
indústria cinematográfica para sanar o problema, elaborando até um abaixo
assinado endereçado à Eastman Kodak alertando os colegas da área:
Tudo que estamos fazendo não significa nada! Nosso trabalho
extenuante e nosso esforço criativo não valem nada porque nossos filmes
estão desaparecendo. Não estou me referindo ao terrível problema com o
qual muitos já estão familiarizados, mas a algo mais imediato, a
escandalosos importam mais do que a qualidade do produto
65
.
Somente após a campanha de Scorsese sobre a degradação das cores que a
Eastman Kodak apareceu com uma nova película que, segundo ela, era vinte vezes
mais durável (500 anos). Em Nova York, sua cidade natal e palco de quase todos os
seus filmes, Martin Scorsese receberia, segundo ele, ‘o maior prêmio da sua vida’. E
descoloração. Desde há alguns anos a descoloração do filme atingiu seu
ponto crítico. Precisamos enfrentá-la agora; ela não pode ser ignorada
por mais tempo. (...) A Eastman Kodak nada fará para resolver o
problema, simplesmente porque os lucros financeiros imediatos e
videográfica nas escolas, dentro do Seminário Nacional Cinema e Educação – Construção de uma
política pública de memória
8/10/2004.
e formação da cultura da imagem, na Escola de Belas Artes,
65
Martin Scorsese: Nossos filmes. Carta feita em 1980 (ver anexo V).
53
não e
sse esforço pode ser comprovado no Centro Nacional para Preservação de
Filme e Vídeo, ins
arquivos cinematográficos espalhados pelo mundo. O diretor também salvou
Satyricon (Satyricon de Fellini, 1969), de Federico Fellini, pois “talvez um jovem
apreciador de cinema, depois de ver A estrada [(La strada, 1954), de Fellini],
Satyricon [(idem, 1969), de Fellini] ou A carroça de ouro [(Le Carrosse d’Or,
1953), de Jean Renoir]
cineasta, um gr
O desbot , ainda
preocupa cinematecas do mundo inteiro. Para se restaurar as películas coloridas
(que
ra um Oscar. O evento era o 39º Festival de Cinema de Nova York realizado
em 2001. E o prêmio, entregue pela FIAF, tinha um objetivo claro: consagrar
Martin Scorsese como um dos maiores preservadores de filmes do mundo. Sem seu
empenho pessoal, vários filmes importantes como Janela indiscreta (Rear
Window, 1954), de Alfred Hitchcock; Lawrence da Arábia (Lawrence of Arabia,
1962), de David Lean; e O dragão da maldade contra o santo guerreiro (idem,
1969), de Glauber Rocha, teriam desaparecido
66
.
E
tituto que Scorsese criou visando levantar fundos para os
possa se tornar, dentro de 10 ou 15 anos, um grande
ande escritor ou um grande ator”
67
.
amento das cores, apesar de teoricamente solucionado
para piorar a situação não desbotam todas as cores ao mesmo tempo), é
preciso seguir um árduo caminho: através do negativo colorido, é gerada uma cópia
das três cores primárias (vermelho, verde e azul) em três filmes preto e branco
SCORSESE, Martin; HAWKRIGE, Janis. Scorsese declara amor e dedicação à arte. Entrevista
r Josepha Szwarcuch para o
rnal O Estado de S. Paulo, 27/09/1996.
66
O Estado de S. Paulo. O mensageiro do diabo em cópia restaurada, in:
http://www.estadao.com.br/divirtase/noticias/2001/out/04/55.htm, ativo em 15/06/2005.
67
originalmente publicada no International Press Syndicate, traduzida po
jo
54
distintos, refotografando-os através de filtros coloridos (usa-se o filme preto e
branco porque nesse processo é usada apenas a camada de sais de prata, que não
desbota como os corantes). Com os três filmes, a cópia da informação de cor
contida no filme fica assegurada, interessante notar que o Technicolor usava
exatamente esse processo para gerar suas cores, daí a facilidade em restaurar
filmes nesse sistema
68
.
Outro avanço tecnológico no cinema, o som, é também fonte de problemas
para restauradores. O som era fotografado diretamente sobre uma das bandas da
película, processo que às vezes facilita a sua restauração. Mas nem sempre a
imagem esteve acompanhada fisicamente
quando o som chegou aos cinemas, usava-se em muitas salas o sistema Vitaphone.
para indicar o ponto exato onde a película ia ser sincronizada com aquele áudio .
Com o avanço tecnológico, resulta tarefa fácil restaurar esses discos, mas o que
ivo áudio.
do áudio: em meados dos anos 1920,
Consistia em gravar o áudio separado do filme em disco de vinil de 33,5 rpm e 16
polegadas. A agulha corria de dentro para fora, e era usada uma marcação especial
69
aconteceu em alguns casos é que a película separou-se do seu respect
68
USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an introduction, p. 77.
69
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
55
Hoje temos filmes sem som e discos sem filme. Nos Estados Unidos, graças a uma
extensa pesquisa, a UCLA conseguiu identificar através dos discos que possuía
cerca 20 longas e 150 curtas cujas respectivas películas encontram-se na Biblioteca
do Congresso. Agora, as duas instituições, juntas, promovem o reencontro dessas
duas mídias, que passam a ser novamente uma só
70
.
Além do supor te e da técnica, outros problemas, estes de ordem política,
ameaçam a sobrevivência dos filmes. O cinema é um mercado de entretenimento,
que atinge diariamente milhares de pessoas em todo o mundo e representa uma
inesgotável fonte de renda. Portanto, não são raras as passagens na história do
cinema em que filmes são em parte cortados ou simplesmente queimados em sua
totalidade por não atenderem às exigências básicas do público. São comuns casos
como o do diretor D. W. Griffith, que “remontou” O nascimento de uma nação
(The birth of a nation, 1915) entre cada exibição ao saber das críticas que o filme
recebia de retorno
71
. Às vezes os pesquisadores encontram cinco ou seis versões do
mesmo filme, censurado de formas distintas em cada parte do mundo onde foi
exibido.
Documentário Salvadores de imagens (Keepers of the frame, 1999), da WinStar Productions.
70
71
NAZARIO, Luiz. As sombras móveis, p. 15.
56
Considerado um dos maiores diretores do cinema mudo, mas de narrativa
excessivamente lenta, Erich Von Stroheim sempre teve problemas na montagem
dos seus filmes, mutilados ao longo do percurso pelas distribuidoras. Em 1924
terminava de montar Ouro e maldição (Greed), mas o filme de 47 rolos (algo em
torno de 10 horas) não agradara à MGM. Foi apresentada ao Estúdio uma segunda
versã
comercial de 130 minutos. No
final, o filme tornou-se uma caricatura daquele originalmente concebido e
realizado por Stroheim. Sempre votado entre os dez melhores filmes de todos os
tempos, Ouro e maldição foi despedaçado a ponto de revelar muito pouco de sua
verdadeira e complexa trama. Em 1997, por ironia do destino, o restaurador Rick
Schmidlin encontrou numa pesquisa feita nos arquivos de Hollywood 650 stills
73
da versão original de Ouro e maldição, mais o roteiro do próprio Stroheim. Uma
o, de pouco mais de quatro horas. Foi novamente recusada, assim como uma
versão de três horas do montador Grant Whytock. A MGM tirou o filme de
Stroheim e fez uma versão de 130 minutos. O resto do material foi queimado para
extrair prata
72
. Perderam-se exatamente
420 minutos do filme, num montante
original de 540 minutos. As quase dez
horas de película foram sendo mutiladas
com o tempo por produtores que ora
achavam a versão inicial dispersiva, ora
achavam que o filme não emplacaria sem
o padrão
tm,
tivo em 03/03/2004.
Fotos de estúdio; imagens captadas no momento da filmagem.
72
Revista Contracampo nº. 48, in: http://www.contracampo.he.com.br/sessaocineclube/greed.h
a
73
57
opor
ilmes de todos os tempos, não foi um
ram irremediavelmente a imagem de
iversos fracassos, os grandes estúdios
rca da maldade (Touch of evil, 1958)
ar na terra do cinema. Convidado para
do protagonista Charlton Heston sendo
inalmente intitulado Bagdet of evil, foi
tunidade que todo restaurador sonharia em ter. O resultado desse feliz
encontro pode ser visto no filme Ouro e maldição – Reconstrução, lançado em
2001 por Schmidlin. Aproveitando-se a base do filme que restou com os stills, o
filme conta agora com a metade do que era. A história foi resgatada pelo menos em
sua essência. É a reconstituição possível dessa obra-prima
74
.
Orson Welles foi outro gênio da indústria cinematográfica cuja obra sofreu
inúmeras mutilações. Mas Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941), considerado um dos
melhores filmes realizados em Hollywood e também presença marcante em
praticamente todas as listas dos maiores f
sucesso de bilheteria. Na verdade, o filme, p
tantos problemas e polêmicas que mancha
Orson Welles em Hollywood. Depois de d
deram mais uma chance para Welles: A ma
era o filme com que esperava voltar a brilh
trabalhar como ator, acabou por indicação
também o diretor do filme. O roteiro, orig
modificado por Welles, que deu mais vida aos personagens, que vivem uma história
de paixão e suspense na fronteira do México com os Estados Unidos.
A marca da maldade apresentou soluções e técnicas inovadoras para a época.
Logo no início temos um plano-seqüência de três minutos que corta quarteirões
inteiros da fronteira entre os dois países. Muitas outras sugestões ousadas, dadas
inclusive pelos atores, contribuíam para fazer de A marca da maldade um filme de
rimeiro na carreira do cineasta, rendeu
74
Revista Contracampo nº. 48, in: http://www.contracampo.he.com.br/sessaocineclube/greed.htm,
tivo em 03/03/2004.
a
58
linguagem dinâmica e única. Porém, a Universal não era da mesma opinião. Como
produtora conservadora, achou a história e a montagem confusas, na verdade por
estar muito à frente de seu tempo. Para piorar a situação, Orson Welles tinha saído
dos EUA durante a edição do filme. Estava no México captando recursos para sua
nova empreitada, um filme sobre Don Quixote. Orson Welles foi demitido e o
elenco chamado novamente para a gravação emergencial de cenas adicionais
dirigidas por outro cineasta. Ao saber que estavam refazendo seu filme, Orson
Welles escreveu em dezembro de 1957 uma carta de 58 páginas, contendo
sugestões para a edição de seu material. Sua carta foi ignorada, e A marca da
maldade teve sua pré-estréia em fevereiro de 1957 com a abertura modificada e
uma edição diferente da imaginada por Welles. No final da exibição da fita de 96
minutos, uma senhora abordou um representante da Universal. Disse que era “o
pior e mais nojento filme que ela já tinha visto em sua vida”, agredindo logo em
59
seguida o executivo com uma bolsada. O estrago estava feito: o filme estava sem
sentido, e uma nova montagem, com 108 minutos, foi encomendada às pressas. A
marca da maldade estreou novamente em abril do mesmo ano, numa versão ainda
mais adulterada. Orson Welles nunca quis ver essa montagem, e o filme foi um
novo fracasso em sua carreira de fracassos.
Em 1975, o professor de cinema Bob Epstein, da UCLA, encaminhou à
Universal uma cópia de A marca da maldade para ser exibida em sala de aula.
Assistindo ao filme, ele se deu conta de que o filme tinha cenas que ele nunca havia
visto. Tratava-se do filme exibido na pré-estréia, que erradamente fora identificada
como a cópia feita por Orson Welles. A partir desse achado, foi feita uma suposta
“restauração” do filme. Na verdade, juntaram as cenas da versão de 96 minutos que
não existiam na versão de 108 formando uma versão ‘extralonga’ do filme, que
ainda não continha nada do originalmente previsto por Welles.
Somente em 1997 um funcionário do Departamento de Restauração da
Universal, Rick Schmidlin (o mesmo que encontrou os stills de Ouro e maldição),
teve a idéia de restaurar e remontar definitivamente A marca da maldade. De
posse também da carta de Orson Welles que Charleston Heston havia encontrado
entre seus papéis, sua intenção era reconstruir o filme seguindo as orientações
deixadas pelo diretor. A idéia causou certa resistência, mas acabou sendo aceita
pela Universal. Rick chamou um estudioso do período em fotografia e som, Walter
Murch, para auxiliá-lo na missão. A Universal colaborou com a consultoria de
Jonathan Rosenbuam, que ficaria a cargo de ‘destrinchar’ as intenções de Welles. A
tarefa não era fácil: sabia-se que o cineasta tinha sido demitido antes da
montagem, portanto, algumas sugestões da carta poderiam soar como apelos
60
desesperados de alguém que havia perdido o controle do filme. Mas a maior
dificuldade era a de que várias cenas haviam sido refilmadas, e as feitas por Orson
Welles, destruídas. Ou seja, o material que os restauradores tinham em mãos não
era o mesmo de 1957. A primeira providência foi feita logo na cena inicial, a do
plano-seqüência de três minutos. A Universal, para poupar tempo, inseriu todos os
crédi
dios, conversas de
rua,
tos no plano, uma idéia que não agradava nada Welles. Felizmente, essa
seqüência foi encontrada intacta pelos restauradores, através de uma cópia usada
originalmente para inserir créditos em outras línguas, (usada para evitar o uso de
legendas). A música do início do filme montado pela Universal fazia parte de uma
excelente trilha composta por Henry Mancini. Porém, Welles tinha outra idéia para
aquele plano-seqüência. Seguindo as instruções da carta, que previam uma
composição de sons “diretos” da cidade à medida que a grua caminhava por seus
espaços – ruídos, trechos de músicas e notícias ouvidas em rá
gritos em apartamentos, risos de bêbados, etc. – os restauradores
encomendaram uma trilha sonora especialmente composta e gravada em estúdio
(uma ousadia condenada pelos restauradores puristas, já que tais iniciativas vão
além da restauração em direção a uma recriação do filme, modificando-o
igualmente em relação à sua virtual versão original). A idéia do diretor era que se
escutassem no plano-seqüência todos os ruídos que provinham da cidade,
aumentando ou diminuindo à medida que a câmera fosse ‘andando’, aproximando-
se ou afastando-se das fontes dos ruídos: de dentro do carro, das boates, dos bares,
pedestres, das cabras na rua, policiais, etc. Os pesquisadores viram a cena ganhar
uma profundidade de campo extraordinária, que não conseguia ser vista na versão
da Universal feita apenas com a trilha de Mancini. Esta música tema foi posta na
61
versão restaurada, como o diretor queria, no final do filme. Excluíram-se as cenas
inseridas pela Universal contendo diálogos que explicavam didaticamente todos os
pontos da trama. Essas cenas, ao contrário do que imaginavam os produtores,
confundiam a ação. Algumas sugestões de Orson não puderam ser cumpridas, pois
não existiam mais as cenas originais. Mas, um a um, os pedidos de Orson Welles
feitos em 1957 estavam sendo na medida do possível realizados quarenta anos
depois. A marca da maldade foi relançado em 1999 em DVD, numa versão que os
críticos consideram muito próxima dos filmes anteriores de Orson Welles. Ao
assistir à versão restaurada, todos se depararam com outro filme - muito mais
interessante que a versão considerada oficial. É impossível saber se Orson Welles
teria aprovado a nova montagem. Mas fica registrado o esforço do Departamento
de Restauração da Universal em resgatar a memória do que poderia ter sido A
marca da maldade
75
.
Além das mutilações do filme para atingir o gosto do público, foram
desenvolvidos outros suportes além da película 35mm buscando atender todas as
demandas da sociedade que se modernizava e queria cada vez mais participar e
interagir com esse mundo audiovisual que se formava. Para o cinema ágil,
documental e expressivo, foi criada durante a Segunda Guerra Mundial uma
câmara leve e compacta, que usava películas 16mm. Para o usuário doméstico,
câmaras ainda mais leves e de fácil operação, as Super-8. O processo de revelação,
exibição e restauração dessas películas é semelhante ao das 35mm, e acabaram
constituindo um banco de dados importante não somente da história dos filmes
Universal Studios/ Colleen A Benn.
75
Documentário Reconstruindo um clássico: a marca da maldade. (Reconstructing Evil, 1999), da
62
através de grandes produções, mas também de produções feitas pelo homem
comum, no cotidiano de sua casa. Documentários recentes como Nos braços de
estranhos (Into the Arms of Strangers: Stories of the Kindertransport, 2000), de
Mark Jonathan Harris, ou Na captura dos Friedman (Capturing the Friedmans,
2003), de Andrew Jarecki, beneficiaram-se com a possibilidade de usar filmes e
vídeos caseiros, restaurados e inseridos nas narrativas que reconstituem memórias
de familiares, histórias da vida cotidiana e da intimidade mais secreta,
respectivamente nos anos 1930 e 1980.
Foi pensando numa maior agilidade no processamento das imagens em
movimento que a TV (que fez suas primeiras transmissões públicas em telões nos
Jogos Olímpicos de Berlim em 1936) criou na década de 1970 o videotape - sistema
que captava a imagem por impulsos eletromagnéticos, sem a necessidade de
revelação e positivação, como ocorria com a imagem óptica. As primeiras cintas
magn
éticas, de 2 polegadas, revolucionaram principalmente a maneira como os
telejornais eram gerados, solucionando a questão do imediatismo que a TV
exigia
76
. As pesquisas concentraram-se então em buscar formatos portáteis para
esta nova tecnologia. Um engenhoso sistema portátil e relativamente leve de
gravação (roldanas faziam a fita magnética girar em forma de U), batizada de U-
Matic, foi criada em 1971 pela empresa japonesa Sony. Para o usuário doméstico, a
empresa oferecia em 1975 um formato de mídia mais econômica, a Betamax. Mas
outra empresa, a também japonesa mas com fortes filiais nos EUA, a JVC, já havia
76
Sony Capsule, in: http://www.sony.net/Fun/capsule/index2.html, ativo em 30/05/2005; JVC, in:
8.
http://www.jvc.com/company/index.jsp?pageID=2, ativo em 30/05/2005; Pinnacle Edition.
Reference Manual. Glossary, pp.1-5
63
conquistado o mercado com um produto inferior, mas de enorme apelo comercial:
O sistema VHS (Video Home System)
77
.
Mais tarde foram criadas alternativas de maior qualidade para competir com
o VHS. Destaca-se entre estas alternativas o sistema 8mm magnético, lançado pela
Sony em 1977 com este nome para alcançar o mercado saudoso deste suporte em
película. O 8mm evoluiu mais tarde para Hi-8 e logo em seguida para o Digital8. A
JVC tentou uma alternativa ao caro U-Matic, criando um sistema que gerava
através de um único cabo as três cores primárias em separado, o cabo S-video,
incor
porado aos seus vídeos Super-VHS. A Sony contra-atacou com um sistema
que gerava as três cores de forma separada por via de três cabos distintos o YUV,
incorporado ao sistema Betacam, lançado em 1981 para substituir o U-matic e
usado até hoje
78
. Além dos formatos, a geração das cores é outro ponto importante
a ser levantado já que vários países adotaram um sistema próprio de conversão de
cores. Ou seja, além dos milhares de formatos, temos ainda diversos sistemas de
leitura de cores. É o caso do sistema de cores usado nos Estados Unidos e no Japão,
o NTSC (sigla de National Television Systems Commitee); o PAL (Phase
Alternating Line), usado na maioria da Europa; o SECAM (SEquential Couleur
Avec Mémoire) sistema francês; e de variações usando duas ou mais dessas
palhetas (caso do Brasil, que usa o sistema de cores PAL-M, uma mistura do PAL
europeu com o NTSC americano)
79
.
77
Pinnacle Edition. Reference Manual. Glossary, pp.1-58.
78
Sony Capsule, in: http://www.sony.net/Fun/capsule/index2.html, ativo em 30/05/2005; JVC, in:
http://www.jvc.com/company/index.jsp?pageID=2, ativo em 30/05/2005; Pinnacle Edition.
ital, p. 48.
Reference Manual. Glossary, pp.1-58.
79
NEGROPONTE, Nicholas. A vida dig
64
O formato digital foi concebido em 1989, numa
sucessão de invenções e tecnologia aperfeiçoada
princ
existirão engenhosas
adaptações, mas é extremamente complexo simular
ipalmente pela guerra das empresas Sony e JVC.
Difere-se do analógico por captar imagens e converte-las
em bits e bytes (dados), e não apenas em pulsos
eletromagnéticos. Classificamos a qualidade das imagens
digitais pelo número de MBits que são usados para gerar a
imagem: 15 Mbits, 25 Mbits ou 50 Mbits, com diversos
formatos no mercado
80
.
Essa confusão de formatos, bits, bytes, palheta de
cores e sistemas em uso ou já em desuso constituem um
agravante para o resguardo da memória audiovisual. Seria
necessário conservar também todos os aparelhos e todos os
sistemas, a exemplo dos projetores do início do cinema, dos
gravadores, das moviolas... Quando é lançada uma nova
mídia, mais resistente que as anteriores, é preciso fazer
migrar as informações para o novo formato, senão a
produção audiovisual do período morre juntamente com os
aparelhos obsoletos. Mas e se os aparelhos desaparecerem?
Para projetores mecânicos, sempre
aparelhos eletroeletrônicos.
p.1-58.
80
Pinnacle Edition. Reference Manual. Glossary, p
65
A imagem digital ainda é muito nova (menos de dez
despreocupação com a conservação da mídia DVD, por exe
suporte final, a imagem digital tem outros problemas, est
todos os filmes gerados em DVD e mais recentemente em CD
uma gigantesca compactação no momento em que são gerad
um processo sem volta. O próprio suporte é dos mais frágei
filme pode ser apagada com apenas um arranhão na supe
defeito na leitura do mesmo. A tendência é a mesma na mi
com o advento da tecnolo
anos), daí a inicial
mplo. Além do seu
es de ordem técnica:
s e na Internet sofrem
os, e normalmente é
s: uma hora inteira de
rfície do disco, ou um
niaturização do filme
gia HDv (High Definition Video) e do Blu-Ray (substituto
do at z mais a compactação
produzido no mundo
acessados pelas salas
s arquivos virtuais de
iam desaparecer num
anto soluções quanto
e entre a restauração
e pesquisar a fundo o
da. Recentemente foi
), de Fritz Lang, num
o na época do seu
de 155 minutos, fora um fracasso. Ao lançar o filme
nos EUA, a Paramount contratou o dramaturgo Channing Pollack para reduzir o
tempo do filme. Ao final do trabalho, Pollack deixou o filme com 113 minutos,
ual sistema DVD) e de outros formatos que usam cada ve
para levar o cinema para a palma da mão. O novo cinema
estaria inteiramente conservado em gigantescos servidores,
de cinema numa simples operação via satélite; mas todos o
nossa nova memória audiovisual em formato digital poder
segundo após o ataque terrorista de um hacker.
As novas possibilidades dos sistemas digitais geram t
problemas. Mesmo com boas intenções, existe uma linha tênu
e a profanação da obra cinematográfica. É preciso conhecer
objeto de restauração antes de tomar uma decisão erra
lançada a versão restaurada de Metrópolis (Metropolis, 1927
longo e tortuoso trabalho. O filme já havia sido mutilad
lançamento: a versão inicial,
66
corta
contrada sobre o filme, inclusive
cartõ
ndo cenas que “mergulhavam o espectador num simbolismo do qual saía sem
conseguir responder do que se tratava”
81
. Desde então os negativos originais do
filme rodaram pela Europa, perdendo-se nos arquivos de diversas distribuidoras e
cinematecas. Até hoje não se sabe de um dos três negativos editados por Lang em
1926. Da versão da Paramount, encontrada em 1960, surgiram várias tentativas de
restauração do filme como um todo, inclusive uma chamada de Metrópolis versão
FIAF, que até o fim do século XX foi considerada a mais completa. Em 1984, uma
verdadeira violação acontece com Metrópolis: o compositor Giorgio Moroder
adquire os direitos sobre a película e realiza uma versão pop do filme de Lang,
colorida por computador e sonorizada por músicas como Love Kills, de Fred
Mercury, Here she comes, de Bonnie Tyler e Cage of freedom, de Jon Anderson,
numa demonstração absurda do poder de deturpar um clássico
82
.
Somente em 1987 o crítico Enno Patalas tenta reconstruir seriamente
Metrópolis. Em 1998, um novo e primoroso trabalho de reconstrução é
empreendido utilizando toda documentação en
es de censura e as partituras originais. Graças à política de trocas da FIAF e
dos esforços do MoMa, do British Film Institute, da George Eastman House, da
UCLA e da Fondazione Cineteca Italiana, Metrópolis atinge, em 2002, o máximo de
sua metragem possível, faltando “apenas” um quarto para a metragem original
83
.
O filme contou com a importante participação dos novos processos de restauração,
sendo a chamada restauração digital em 2K, realizada em Metrópolis,
NAZARIO, Luiz. Viagens imaginárias, in: NAZARIO, Luiz (org.). A cidade imaginária, p.234.
83
81
82
NAZARIO, Luiz. Viagens imaginárias, in: NAZARIO, Luiz (org.). A cidade imaginária, p.236.
NAZARIO, Luiz. Viagens imaginárias, in: NAZARIO, Luiz (org.). A cidade imaginária, p. 237.
67
uma das mais usadas hoje. Funciona da seguinte maneira: a sujeira ou o rasgo na
imagem é interpretado pelo programa do computador como ausência de
informações do sinal que gera a imagem. Ele define se aquele ponto é um defeito ou
não por verosemelhaça; observa-se o quadro anterior e o posterior, e através da
análise dos dois o programa detecta a anomalia e a corrige, usando para tanto as
informações captadas pelas duas
imagens analisadas. Parece fácil, mas o
em 2002 pela National Society of Film Critics, é um exemplo das possibilidades
processo automático comete
imperdoáveis erros de cálculo: Em
Metrópolis, o personagem Freder
Frederson “perde” uma das pernas ao
atravessar rapidamente um quarto,
decepada pelo processo digital que não
a enxergou no quadro anterior e no seguinte. A atenção então para que esse tipo de
problema não inutilize a cena é redobrada
84
. A restauração digital de Metrópolis,
eleita pela UNESCO Patrimônio Audiovisual da Humanidade em 2001 e premiada
que essa técnica oferece para ajudar a preservar a memória audiovisual.
84
KOERBER, Martin. Notes on the restoration of Metropolis, p. 01.
68
Como outros exemplos de sistemas digitais de conservação, temos o ASC, ou
film dirt and scratch concealment”. O sistema efetivamente remove em tempo
real os distúrbios de filmes “empoeirados, sujos ou arranhados”, com o mínimo
efeito lateral. Mesmo estragos gerados pela má fixação da emulsão podem ser
efetivamente tratados. Sua versatilidade é surpreendente, permitindo sua utilização
Cingapura e aperfeiçoada por Chong Man
r
manipulação de frames via processos matem
12 países têm esta tecnologia, entre eles o Br
Apesar dos avanços tecnológicos propi
de restauração e divulgação dos filmes em
preservação dessas novas mídias praticame
em conta é o avanço tecnológico em detr
em materiais considerados perdidos e para o toque final de transferência para
negativos virgens. O ASC utilizado no vídeo pode também remover efetivamente
tape “drop-outs”, centelhamentos e outros distúrbios baseados em freqüência de
campo. O ASC é considerado um padrão em eliminação de arranhões e sujeira em
película, trabalhando em tempo real
85
. A tecnologia Revival foi inventada em
Nang na Universidade Tecnológica de
adantes à película (somente a já citada
áticos e uso de computador). Somente
asil, único na América Latina
Nanyang. Não usa processos químicos deg
86
.
ciarem o surgimento de novos métodos
novas e modernas mídias, a política de
nte inexiste, pois sempre o que se leva
imento do que já foi feito. Ou seja, a
mesma mentalidade de destruição da história do cinema em razão da novidade
técnica do final do século XIX vigora até hoje. O processo de migração de mídias é
caro, mas necessário. Sempre que uma nova mídia é inventada e consolidada no
mercado, todo o conteúdo gerado nos anos anteriores pelas tecnologias agora
85
Fonte: Sterling do Brasil, in: http://www.sterlingdobrasil.com.br/. Ativo em 15/06/2005.
ivo em 15/06/2005.
86
Fonte: Revival Discreet, in: http://www.davsys.com/revival.htm. At
69
obsoletas deve ser transferido. Mas como acompanhar o ritmo cada vez mais
acelerado das invenções tecnológicas? O que dizer às pessoas que produzem filmes
digit
ais ou montam imensas “filmotecas” numa mídia e em sistemas cujos
aparelhos de leitura podem desaparecer amanhã? Ao mesmo tempo em que o
cinema se torna tecnicamente mais poderoso, o uso exagerado da tecnologia que
sempre o caracterizou como arte efêmera consolida-se de forma assustadora.
Nunca geramos e vimos tantas imagens em movimento quanto agora, mas o preço
dessa facilidade é o desaparecimento de toda essa produção digital na mesma
velocidade com que ela está sendo produzida e consumida.
70
Domingo, 19 de junho de 1898. O italiano Afonso Segreto, a bordo do
paquete francês Brésil, chegava no porto da baía de Guanabara, e registrava com a
câmera que comprara em Paris o que viria a ser o primeiro filme documentário
brasileiro. O feito foi registrado nos jornais com
uma pequena nota, mas nunca se soube de uma
exibição da película feita pelo italiano. A própria
história deste cinegrafista é quase desconhecida.
Existem até estudos cuidadosos sobre o porquê de
não existirem películas feitas na Rua do Ouvidor,
reduto principal da cultura carioca
87
, mas
pouquíssima informação sobre o embrião do nosso
cinema.
Nas décadas de 1940 a 1960, Vinícius de
Morais, Adhemar Gonzaga, Paulo Emílio Salles Gomes, Alex Viany tentaram
constituir, cada um a sua época, um histórico sobre os primórdios do nosso cinema.
Pedro Lima, jornalista, havia publicado na década de 1920 alguns artigos sobre os
fundadores do cinema nacional
88
. Alex Viany faria nos anos 1950 uma tentativa de
87
A escuridão de suas vielas impossibilitava a boa captação de imagens, já que a luz natural era
impre el. Fonte: RAMOS, Fernão (org.) História do Cinema Brasileiro, p. 20.
scindív
71
reconstituição da memória audiovisual de Brasil no livro Introdução ao cinema
rasileiro, afirmando desconhecer quem de fato foi o primeiro a realizar uma
filmagem brasileira. A tese de que fora o português Antônio Leal acabou rejeitada
assim que os estudos avançavam, confirmada definitivamente como errônea em
1956 por Adhemar Gonzaga
89
. O próprio Adhemar escreveria na mesma época do
lançamento do livro de Alex Viany uma série de artigos no Jornal do Cinema
intitulados História do Cinema Brasileiro. Nos artigos, levantavam-se diversos
nomes de realizadores do início do cin
a
filmagem do Brasil
90
.
Em 1995, ano do cent
Vittorio Capellaro afirmou ter
do Brasil não foi feita na costa
em 1897. Existe inclusive um ar
de maio de 1897, comprova
Fluminense divulgava neste jor
os filmes destacavam-se Chega
no colégio do Andarahy e Pont
m quarto filme brasileiro na exibição, Uma artista
b
ema brasileiro, e buscava-se à medida que os
avançavam uma definição da data da primeira
enário do cinema mundial, o pesquisador Jorge
encontrado indícios claros que a primeira filmagem
da Baía de Guanabara em 1898, mas em Petrópolis
tigo publicado no jornal Gazeta de Petrópolis em 1º
ndo o fato. Um local conhecido como Cassino
nal apresentações do seu Cinematographo, e entre
da do trem em Petrópolis, Bailando com creanças
o terminal da linha dos bonds de Botafogo, vendo-
se os passageiros subir e descer. Anadaraí e Botafogo são bairros do Rio de
Janeiro. Existiria ainda u
estudos de Adhemar Gonzag
do cinema, p. 67.
Até então se comemorava o dia 5 de novembro de 1903, data da filmagem de Antônio Leal,
como sendo o dia do Cinema Brasileiro. Fonte: VIANY, Alex, introdução ao cinema brasileiro p. 38.
88
SOUZA, José Inácio de Melo. Imagens do Passado: São Paulo e Rio de Janeiro nos primórdios
89
90
VIANY, Alex, introdução do Cinema Brasileiro, p. 33.
72
trabalhando no trapézio do Poltheana,
vindo provavelmente de São Paulo
91
.
Adhemar Gonzaga já conhecia e
contestava esta certidão de nascimento em
1956, reiterando de que estas provas
seriam insuficientes, já que estes filmes
nunca apareceram. Estas películas
poderiam ser estrangeiras, tendo seus
títulos regionalizados a fim de buscar uma
identificação com os espectadores. Já
Capellaro reforça o resultado da pesquisa
afirmando que os moradores de
O historiador Vicente de Paula considera o feito de Afonso Segreto como
primeiro, sendo a palavra ‘supostamente’ suprimida por Paulo
Petrópolis, oriundos em sua maioria de
famílias abastadas e de boa educação, não
seriam enganados já que conheciam bem a
estação de Petrópolis e os bondes de
Botafogo, principal local de encontro da
elite carioca do início de século. Mas o maior obstáculo para a definição de uma
nova data para o nascimento do cinema está na falta de uma data precisa da
realização destes filmes, além do anonimato de seus autores.
supostamente o
a no Brasil. Publicado em 25 de agosto de
995.
91
In: Folha de São Paulo. Pesquisa revê início do cinem
1
73
Emílio Salles Gomes
92
. De 1960 em diante, a data 19 de junho de 1898 é aceita por
historiadores como Jurandir Passos Noronha e Paulo Paranaguá
93
. Em 1995, Jean
Claude Bernardet faz no seu livro Historiografia clássica do cinema brasileiro uma
reflexão sobre o tema, argumentando inclusive alguns fatos do que pode ter
ocorrido com a película feita por Afonso Segreto:
Mas, poderiam objetar os historiadores, que data inaugural
escolher, se não esta filmagem, já que não sabemos quando foi exibido o
filme de Afonso Segreto? Depois da filmagem, pegou fogo o salão Paris no
Rio, casa de exibição de Pascoal Segreto para a qual o filme fora feito. Não
temos notícia de sua exibição e, considerando o estado razoavelmente
adiantado das pesquisas, é provável que nunca tenhamos. É até possível
que nunca tenha sido publicamente exibido. Descartaríamos então – se
resolvêssemos adotar como critério não uma filmagem, mas uma exibição
pública e paga – ignorar quando se deu o nascimento do cinema
brasileiro, e poderíamos inclusive abandonar essa idéia de nascimento
94
.
Bernardet ainda divide a história do cinema brasileiro em duas vertentes: a
história da realização de filmes no Brasil e o da exibição de filmes no Brasil,
concluindo que a primeira é hipervalorizada no país em detrimento da segunda, daí
a data do nascimento do cinema nacional pertencer ao primeiro grupo, o da
realização.
92
BERNARDET, Jean Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro. p. 18.
93
BERNARDET, Jean Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro. p. 18.
94
Apud: BERNARDET, Jean Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro, p. 29.
74
José Inácio de Melo Souza destaca-se e
paralelo entre todos os pesquisadores
metalinguagem da historiografia cinem
sua autoria Imagens do passado: São P
cinema, realiza no capítulo A construção
atualizando as pesquisas sobre o nas
atualizando o banco de dados sobre os
cinema no Brasil, como o ainda pouco
prometer em 1920 numa das edições d
pioneiro a realizar um filme no Brasil e
brasileiro, nunca publicada. Critica os hi
momento sobre tema, em especial Alex
e informações (debruçar em revistas e jo
que eles não estavam na época das primeiras compilações muito longe do chamado
ponto zero do cinema brasileiro
95
.
Porém, estas
alcançar algu
Carlos Diegu
Viany:
Essa Introdução ao cinema brasileiro, de Alex Viany, foi um dos
fatores de aproximação de toda uma geração que, com sua publicação
ntre os historiadores ao traçar um
que vieram antes dele, numa espécie de
atográfica brasileira. Em 2004, o livro de
aulo e Rio de Janeiro nos primórdios do
de uma história importantes observações,
cimento do cinema nacional, e inclusive
pioneiros a escrever sobre a história do
conhecido crítico Pedro Lima, que chega a
a revista Selecta uma reportagem sobre o
como ocorreu o aparecimento do cinema
storiadores que se lançaram num primeiro
Viany, pela falta de maiores levantamentos
rnais, procurar relatos dos ainda vivos), já
iniciativas, por mais rudimentares que sejam, conseguiram
m objetivo no momento em que estes artigos encontraram ouvintes.
es em outubro de 1987 faria uma observação sobre o livro de Alex
s primórdios
o cinema. p. 73.
95
SOUZA, José Inácio de Melo. Imagens do Passado: São Paulo e Rio de janeiro no
d
75
original em 1959, tomava consciência de que havia uma certa tradição à
qual nunca nos haviam remetido, por ignorância e também preconceito
96
.
Se há mais de quatrocentos e cinqüenta anos já existisse o cinema, a
viagem de Pedro Álvares Cabral poderia ter sido objeto de um
documentário de grande interesse para nós, porém seria pouco provável
que a partir de 1530 ainda existisse alguma cópia conservada do filme.
A questão de uma prova, uma certidão de nascimento do cinema brasileiro é
sintomaticamente esclarecida por Paulo Emílio Salles Gomes:
Não sei que interesse terão para os brasileiros do ano 2357 a imagem e a
voz de Getúlio Vargas prestando juramentos a Constituições, as passeatas
de Plínio Salgado, os comícios de Luís Carlos Prestes, as vistas do Rio, de
São Paulo ou da Central do Brasil, O Cangaceiro de Lima Barreto. Mas a
perspectiva para quem se ocupa da conservação de filmes é assegurar sua
preservação para a posteridade
97
.
Jurandir Noronha, na abertura da 1ª Mostra Retrospectiva do Cinema
Brasileiro, evidenciava a necessidade de um levantamento profundo sobre a nossa
herança cinematográfica:
96
Apud: BERNARDET, Jean Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro, p. 23.
Imaginária,
. 09.
97
Apud: SALLES GOMES, Paulo Emílio, in: CALIL, Carlos Augusto (org.).Cinemateca
p
76
Quando assistimos, ainda hoje, as películas com as quais os
Lumiere extasiaram a p
latéia daquele longínquo 28 de dezembro de 1895,
versão original de Iracema, terminada aqui em São Paulo pelo
inesquecível Victorio Capellaro, em 1913; muito menos no Pátria e
bandeira de Antonio Leal, pronto à época da Primeira Grande Guerra,
trabalho que era um pouco de ficção e um pouco de documentário, pois
apresentava as manobras do exército realizadas imediatamente após a
promulgação do serviço militar obrigatório. Quanto mais assistir a essa
cousa controversa, perdida no tempo, e que foram os primeiros metros
filmados no Brasil
98
...
O fato é que o cinema brasileiro nunca se preocupou em registrar seus feitos,
concentrando-se apenas em fazê-los. Esta prática leva nosso cinema a um eterno
recomeço, já que nã
memória do
particulares, espalhadas em acervos pessoais e relíquias de família.
Jovens inic
vislumbrar p
processo que
produtores re
já não pensamos em como seria bom examinar. O transformista original,
realizado pelo grande Paulo Benedetti entre 1903 e 1910, tampouco a
o se formam as bases históricas para o futuro aprendizado. A
cinema nacional manteve-se, em grande parte, por iniciativas
iados no Cinematógrafo, em sua maioria imigrantes, já conseguiam
ossibilidades de renda fazendo visitas às fábricas e fazendas num
ficou conhecido como cavação. Munidos de uma câmera, estes
gistravam toda a vida dos que estavam dispostos a pagar. Com isso,
98
Apud: NORONHA, Jurandir. Depoimento em ocasião da abertura da 1ª Mostra Retrospectiva do
inema Brasileiro. Fonte: Revista Contracampo nº 34, In:
C
http://www.contracampo.he.com.br/34/frames.htm, ativo em 19/04/2005.
77
sustentavam
da vida bras interessante ressaltar que a quase
totalidade dos filmes do início do cinema brasileiro que sobreviveram ao tempo são
registros de família, guardados
documento apresenta uma
particularidade: é o mais antigo
filme preservado do
brasileiro, guardado com
carinho numa geladeira durante
décadas pelos progenitores da
família Junqueira. Poderíamos
pensar em m
primeira real
como um ma
memória aud
Aristides Junqueira não estava sozinho na captação destas primeiras imagens
brasileiras, existindo outros cinegrafistas espalhados pelo país. Um cinegrafista
anônimo realizaria em 1911 o que se acredita ser a primeira filmagem de índios no
Brasil. Destaca-se nestas imagens entre índios do Amazonas a figura do
ntropólogo Roquette Pinto, um dos primeiros a criar um acervo de filmes em
o custo de equipamentos e películas, e acabaram cobrindo boa parte
ileira do começo do século XX,
com carinho pelos descendentes. Reminiscências
(1909), de Aristides Junqueira, feito em Minas Gerais, é um álbum de família do
próprio cineasta. Esse
cinema
ais uma data importante, além de buscar a da primeira exibição e da
ização: o da primeira preservação. Comemorar-se-ia Reminiscências
rco do que conseguimos preservar, pois se trata do marco zero da
iovisual.
a
1910, a Filmoteca do Museu Nacional, e que seguramente já tinha vislumbrado as
possibilidades que a máquina Cinematógrafo poderia oferecer para as gerações
78
futur
o os atos dos chamados desbravadores da
hoje em extinção, e principalmente as tentativas da comissão em impor
aos í gistrados. O Major Luis Tomás Reis, além de
o, fez inúmeros outros filmes, retratando o dia-a-
filmava a demolição do quartel general no Rio
r uma das paredes. Morreu em ação, com sua
Registros destes pioneiros, hoje preservados,
histórica.
Nos Estados Unidos acaba de ser criado um Museu
as
99
. Igino Bonfioli registraria fatos importantes da sociedade mineira, sendo
um dos mais importantes cineastas do período. O Major Luis Tomás Reis registrou,
a partir de 1912, cenas valiosas, montando um perfil do que foi a campanha da
Comissão Rondon pela Amazônia. Ele e sua câmera acompanharam o General
Rondon por 16 anos, registrand
Amazônia. Os costumes indígena
animais
s, seu artesanato, a matança indiscriminada de
ndios a cultura branca foram re
filmar as campanhas da Comissã
dia do exército brasileiro. Em 1940,
de Janeiro quando foi atingido po
câmera, aos 60 anos de idade
100
.
acabam sendo uma importante fonte
Entre os cinéfilos, a preocupação com a conservação dos filmes aparece no fim
da década de 1920, com Adhemar Gonzaga. Criador da revista Cinearte em 1926,
ele lançaria através da publicação um dramático apelo à conservação dos filmes
brasileiros:
Cinematográfico, destinado apenas a guardar filmes. Se entre nós aludisse
Enciclopédia do cinema brasileiro, p. 146; Documentário 90 anos do Cinema Brasileiro. Rede
100
99
HEFFNER, Hernani. Verbete Cinemateca In: RAMOS, Fernão. MIRANDA, Luiz Felipe (orgs.).
Manchete de Televisão. 1988.
Documentário 90 anos do Cinema Brasileiro. Rede Manchete de Televisão, 1988.
79
alguém à possibilidade de coisa semelhante, a proposição seria recebida
por entre gargalhadas, e o autor necessariamente receberia a
consagração de maluco, pelo menos. (...) O tempo varre da memória
humana a recordação do que se foi, os museus e arquivos constituindo-se
os depositários das tradições que carecem ser conservadas. Os livros de
Debret, Rugendas, Chamberlain, as litografias de Moreau e outros, fazem
fotografia animada merece especial consideração de nossa parte. Nós
possuímos ainda certas tradições, aspectos pitorescos da vida,
principalmente do nosso interior, que vão desaparecendo aos poucos. Ora,
são justamente esses aspectos fugitivos de uma época que a
reviver para nós o velho Rio de Janeiro de nossos avós. A fotografia
facilitou e multiplicou as facilidades dessa documentação. A
cinematografia ampliou ainda mais o campo, permitindo fixar uma época
com todas as suas características. Por isso mesmo, o cuidado que povos
mais adiantados estão consagrando ao filme-documento, destinando-os
aos museus onde se conservarão a serviço das gerações vindouras,
permitindo-lhes ter a idéia da vida contemporânea, da época da invenção
da cinematografia, em seus mínimos detalhes. (...) Esse aspecto da
cinematografia pode fixar para sempre, e para sempre os museus
conservam. Em outros países, disso se cuida com carinhoso empenho
101
.
earte, 06 de fevereiro de 1929.
101
O Museu criado nos EUA seria o MoMa (1929), e foi planejado como um museu destinado a
guardar todos os tipos de arte, e não somente o cinema, como pensava Adhemar Gonzaga. Apud:
Artigo publicado in: Revista Cin
80
Passados mais de oitenta anos desse diagnóstico, o Brasil continua a sofrer
com a ausência de uma política sistemática de conservação de seu patrimônio
audio
anha sua identificação com a sétima arte, sendo protagonista de
muitas façanhas para preservar filmes
nacionais. Foi por inspiração de um
dos maiores nomes da conservação e
preservação do cinema mundial,
Henry Langlois, que Paulo Emílio
O ‘garimpo’ que Paulo Emílio
fez nas cidades do Brasil em busca de
filmes rendeu interessantes passagens.
Entre 1940 e 1960, qualquer filme
nacional exib
o trajeto da
ou descobrindo um homem que guardava todos os filmes
visual. De todos os historiadores que se preocuparam na conservação da
memória audiovisual no Brasil, destaca-se a figura de Paulo Emílio Salles Gomes
co-autor do projeto da Cinemateca Brasileira. Era conhecido como homem de
cinema, tam
iniciou o projeto de um museu
destinado a preservar filmes, apoiado
por diversos nomes da cultura paulista
e pela FIAF, entidade internacional
das cinematecas
102
.
ido no país percorria salas de projeção de cidade em cidade, seguindo
linha do trem. Paulo Emílio foi para a última cidade da linha –
Catanduva – e acab
102
SOUZA, José Inácio de Melo. Paulo Emílio no paraíso, p. 303.
81
brasileiros nu
caminhão alu
películas que
toda a coleção do DIP
subdesenvolvimento, traça um perfil do comportamento do brasileiro com relação
à preservação:
O Brasil se interessa pouco pelo seu passado. Essa
atitude saudável exprime a vontade de escapar a uma
maldição de atraso e miséria. O descaso pelo que existiu
explica não só o abandono em que se encontram os arquivos
nacionais, mas até a impossibilidade de se criar uma
cinemateca. Essa situação dificulta o trabalho do historiador,
particularmente o que se dedica a causas sem importância
como o cinema brasileiro
104
.
O resultado do esforço de Paulo Em
Cinemateca de São Paulo, hoje Cinemate
amparadas pelo governo. No final dos anos
m depósito. Recuperou dezenas de cópias. Por vezes viajava com um
gado ao Rio de Janeiro, ia até o palácio do governo e recolhia as
eram jogadas na rua. Por conta disso, a Cinemateca hoje tem quase
103
. O próprio Paulo Emílio, no livro Cinema: Trajetória no
ílio Salles Gomes está estampado na
ca Brasileira, uma das poucas ainda
1940, Paulo Emílio consegue montar a
Filmoteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo, embrião da futura
cinemateca, baseada nos moldes da Cinémathèque Française. O plano de criar uma
nvolvimento, p.22.
103
Revista Carta Capital. 17 de julho de 2002.
104
GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: trajetória no subdese
82
instituição de salvaguarda do cinema brasileiro continuou de forma ininterrupta,
mesmo a instituição tendo sofrido um imenso incêndio em 1957. Sobre o fato,
Paulo Emílio declararia “lamentar pelo resto dos dias da sua vida”
105
. Em 1960,
consol
te perdemos ao menos um filme nacional por semana. Da
cinematografia muda brasileira, sobrou pouco menos de 10% do que foi produzido.
Hernani Heffner tra
dos
país.
rte
esa
do aparecimento de fragmentos ou até o conjunto completo de obras há
ida-se a Cinemateca Brasileira, tornando-se um órgão público na década de
1980. Na mesma década surgem filmotecas regionais por todo o país, inclusive
dentro de escolas e empresas. A consciência da necessidade da conservação das
películas nacionais estava formada.
Porém, nos anos 2000 ocorre a desestruturação da Cinemateca do MAM no
Rio de Janeiro, uma das mais antigas do país. Passando por várias dificuldades,
acabou desmontada, pois o conselho curador do MAM quis desfazer-se do acervo.
A Cinemateca Brasileira por sua vez passou por dificuldades semelhantes, que
quase a levaram à falência em 1984
106
, mostrando que esta mentalidade
conservacionista não está tão consolidada assim.
Atualmen
ça um perfil da destruição do cinema brasileiro:
A filmografia brasileira tem milhares de títulos considera
desaparecidos desde 1898, ano zero da produção cinematográfica no
Não se tem esperança de encontrar qualquer material para a maior pa
deles. Mesmo assim, vez por outra, acontece a rara e agradável surpr
105
SOUZA, José Inácio de Melo. Paulo Emílio no paraíso, p. 370.
. MIRANDA, Luiz Felipe (orgs.).
106
HEFFNER, Hernani. Verbete Cinemateca In: RAMOS, Fernão
Enciclopédia do cinema brasileiro, p. 146.
83
muito tidas como definitivamente perdidas. As mais lamentadas ausên
giram quase sempre em torno d
cias
e obras ficcionais tidas como importantes
histórica ou esteticamente. Dessa forma integram tais listas títulos como
“Paz e Amor” (1910), de José do Patrocínio Filho, “Barro Humano” (1929),
interesse suficiente pelo que era a regra e não a exceção em determinada
época. Assim, ressaltando que qualquer fotograma relativo ao período
1898-1909 será imensamente bem vindo, pois nada restou dessa época
107
.
fez recentemente um apelo para obter um
patrocínio para o resgate de sua obra: todos os seus 14 filmes precisam
108
alguns deles, como Pixote, estão “em condições deploráveis”, segundo o diretor, e
terão de ser restaurados quadro a quadro. Já clássicos do cinema nacional como os
de Adhemar Gonzaga, “Favela do Meus Amores” (1936), de Humberto
Mauro, “Moleque Tião” (1943), de José Carlos Burle, “Cruz na Praça”
(1959), de Glauber Rocha, e “Surucucu Catiripapo” (1973), de Neville
D’Almeida. Mas o conhecimento do passado cinematográfico brasileiro
tem que avançar para além dos marcos e penetrar no terreno não
desbravado da produção corrente perdida. A história do cinema pode ser
trabalhada indiretamente, sem a presença do material fílmico, se houver
O cineasta Carlos Diegues
urgentemente de restauração: Sinto-me arrasado quando vejo um filme destruído,
mesmo que não seja meu, pois antes de tudo sou um cinéfilo . Já Hector Babenco
obteve o apoio da Columbia TriStar para o relançamento de seus filmes em DVD;
107
Apud: HEFFNER, Hernani. Filmes brasileiros considerados perdidos ou prestes a sê-lo, in:
Revista Contracampo nº 34. http://www.contracampo.he.com.br/34/frames.htm, ativo em
6/05/2005
1
108
O Estado de S. Paulo, 21 de julho de 2000.
84
mencionados Barro humano, Favela dos meus amores e Moleque Tião (que
marcou a estréia de Grande Otelo no cinema), simplesmente deixaram de existir.
Uma história curiosa aconteceu com
Peixoto. Disp
Adhemar Go
mesmo acont
equipamento
contato com
uma magistra
já falava, Limite
Somente o Chaplin Club (famoso por exaltar clássicos do cinema mudo),
promoveria uma sessão do filme em 4 de maio de 1931. O filme acabou pela mão de
alguns cinéfilos tornando-se um cult, e muitos cineastas o citavam como exemplo
perfeito da metalinguagem no cinema mudo. Mário Peixoto, que havia herdado
Limite, único filme do cineasta Mário
ondo de um modesto orçamento, o então jovem cineasta procurou
nzaga e lhe propôs a direção do filme. Adhemar não a aceitou, o
ecendo com Humberto Mauro. Porém, ambos o ajudaram fornecendo
s para a produção do filme, inclusive colocando Mário Peixoto em
Edgar Brazil, na época pouco conhecido e que realizaria em Limite
l fotografia
109
. Por ser um filme mudo numa época em que o cinema
recebeu críticas severas, e nunca foi exibido comercialmente.
109
MELLO, Saulo Pereira de. Limite. p.20.
85
uma fortuna
patrimônio e
Walter Salles, diretor de Central do Brasil, foi um dos poucos que se preocuparam
com o estado de pobreza a que Mário Peixoto chegara, levando-o inclusive a ajuda-
lo financeiramente na sua luta contra o câncer, doença que o levaria à morte em
importante do século
110
. Não era uma opinião isolada, pois muitos pesquisadores
consideravam Limite uma obra prima. Plinio Süssekind Rocha, professor de
filosofia, e Saulo Pereira de Mello (amigo de Mário Peixoto, aluno de Plínio e
físico), por meio de um projeto de pesquisa
realizaram a primeira restauração de Limite
em 1979. Em 1987 foi feita uma cópia em
vídeo, sendo finalmente possível sua
distribuição. Saulo Pereira de Mello montaria
em 1995 o Arquivo Mário Peixoto, espaço
localizado dentro da produtora Videofilmes, do
cineasta Walter Salles. Foi lançado pela
FUNARTE um CD contendo dados preciosos sobre Limite, além da já existente
bibliografia produzida. Mesmo com todos estes esforços, até hoje Limite é um filme
muito falado, mas pouco visto
111
.
considerável da família e nunca trabalhou na vida, foi consumindo seu
no fim da vida foi obrigado a vender seus bens para sobreviver.
1992. Segundo Walter Salles, Mário Peixoto é o cineasta brasileiro mais
Revista Contracampo nº 27, in:http://www.contracampo.com.br/27/limitesaulo.htm, ativo em
110
Tribuna do Norte, In: http://www.tribunadonorte.com.br/especial/br500/f13_n6.htm, ativo em
02/04/2005.
111
02/04/2005.
86
Mesmo um dos cineastas mais cultuados do Brasil, Glauber Rocha, teve
alguns dos seus filmes prejudicados com a falta de conservação. Sempre atento às
novas tecnologias que surgiam e defensor do papel da Cinemateca na conservação e
restauração de filmes, Glauber chegou a mandar em 1980 (um ano antes de sua
morte) uma carta endereçada a Carlos Augusto Calil, um dos diretores da
Embrafilme, com claras instruções de conservação de seus filmes (indicava os
locais onde os seus filmes estariam em melhores condições, sugeria uma ordem na
programação de uma possível mostra retrospectiva, fazia um levantamento geral do
estado dos filmes e ainda chamava à atenção daqueles que ele ainda não
considerava prontos, caso de Câncer, filme no qual pedia que mandassem uma
cópia em videocassete para realizar o plano de montagem final). Esta carta
evidencia o caráter de Glauber Rocha, um cineasta muito à frente do seu tempo.
Com este verdadeiro mapa do tesouro em mãos, os restauradores não tiveram
maiores dificuldades em encontrar e conservar seus filmes
112
.
Mesmo com todo este cuidado, acabaram desaparecendo os negativos
originais de Terra em transe (1967) e de O dragão da maldade contra o santo
guerreiro (1968), e deles só restavam cópias de cópias, com qualidade inferior
113
.
Seu filme Claro (1975) estava, por ironia, escuro e sem definição de cor quando
chegou às mãos do pesquisador Duvaldo Bamonte, da USP, que usou o dinheiro da
própria bolsa para restaurá-lo em vídeo, solução emergencial que lhe garantiu uma
sobrevida de 25 anos, mas insatisfatória para os padrões de restauração
114
. Graças
112
DVD Deus e o diabo na terra do sol. Disco dois: Extras.
113
O Estado de S. Paulo, 28 de setembro de 2002.
izam, in: Revista Carta Capital n° 198, p.58.
114
MANEVY, Alfredo. As Imagens que Agon
87
novamente à carta de Glauber, este filme conseguiu ser restaurado e exibido em
2005
115
. A matriz oficial de Terra em Transe queimou num arquivo de filmes na
França, mas graças à carta de Glauber foi encontrada outra matriz em Berlim.
Depois de nove meses de trabalho, a cópia restaurada digitalmente de Terra em
Transe foi exibida pela primeira vez em 18 de fevereiro de 2005 no Mostra de
Clássicos do Cinema em Berlim, num sinal de agradecimento
116
.
Outro filme importante da obra de Glauber Rocha restaurado digitalmente é
Deus e o diabo na terra do sol, lançado em DVD em 2004. O filme recebeu um
tratamento especial da equipe de restauração encabeçada pelo pesquisador Fábio
a incipiente sulfuraçãoFraccaroli. O filme apresentava um
riscos na película e perfurações gas is uma limpeza manual de todo o
material para a posterior migração para o
ao mundo o cineasta Glauber Roch
diabo. Porém, um desentendiment
a
aceitando o pedido do diretor, qu
contrastada, simulando xilogravura
117
, além de pequenos
tas. Foi prec o
digital.
118
Há 40 anos, Cannes divulgava
a, que se consagraria através do filme Deus e o
o com o laboratório de revelação (que insistia
drão de revelação internacional, e acabou não
e desejava dar ao filme uma fotografia mais
) havia deixado o filme aquém do que Glauber
imaginara. Somente após a restauração digital, tendo como principal consultor o
que o filme tinha que seguir um p
24 de junho de 2005 no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo, in:
ativo em 22/06/2005.
115
A exibição do filme Claro ocorreu durante o evento O Cinema segundo Glauber e Pasolini, 22 e
http://www.bb.com.br/appbb/portal/bb/ctr/rptg/ReportagemDetalhe.jsp?Reportagem.codigo=2280,
116
O Estado de S. Paulo, 18 de fevereiro de 2005.
In: http://www.estadao.com.br/rss/divirtase/2005/fev/18/157.htm
Filme amarelado.
e o diabo na terra do sol. Disco dois: Extras.
ativo em 02/04/2005.
711
118
DVD Deus
88
diretor de fotografia do filme Waldemar Lima, a película poderia obter novamente
o contraste desejado no projeto inicial. Este novo filme revela uma fotografia
densa, muito diferente da leveza das imagens de quarenta anos atrás. Waldemar
Lima acredita que uma mudança desta num filme já absorvido há quarenta anos
pode gerar um certo choque, ocasionando um abalo intelectual. Fracarolli fecha a
questão sobre as mudanças do filme durante a restauração:
Logo no início do filme, aparecia uma coisa estranha na película
em três ou quatro fotogramas. Ao voltar à imagem, constatamos que era
uma frase que passava pelo quadro todo. Achávamos que poderia ser uma
‘mensagem subliminar’ que o Glauber deixou. Chamamos o Waldemar
(Waldemar Lima, diretor de fotografia), e ele apenas falou: Eu não filmei
isso aí não. Tira isso daí, eu não fiz isso. A explicação estava no copião
original da Cinemateca: tratava-se da marca de um carimbo, escrito em
câmera pode ser confundido com um tremor da projeção, por exemplo. Se
alemão, provavelmente uma marcação feita nos arquivos da Alemanha,
que não aparecia na película projetada, mas apareceu no escaneamento
para o digital. Optamos por apagar a tal mensagem. O limite ético para
modificar ou não um filme nem sempre é tão claro: Um movimento de
o diretor é vivo e dizer ‘Não quero desse jeito, quero que fique de outro’,
‘apaga aquela nuvem que eu não quero, no dia em que eu filmei não era
da é o autor da obra. Muita gente
do diretor. Eles argumentam: Mas as
para ela estar aí’, é um direito dele, ain
pode ser contra, mas é a opção
pessoas viram este filme desse jeito por quarenta anos, e como você muda
89
isso? Se escreveram sobre o filme daquela forma por muitos anos,
escrevam a partir de hoje outros livros, porque aquilo e
ra diferente
119
.
A restauração feita totalmente no computador é um fenômeno recente, e
Deus e o diabo na terra do sol foi o primeiro filme da América Latina concebido
nesta técnica. O prazo era curto, gastaram-se apenas 50 dias para a restauração do
filme para manter o pioneirismo
120
. O processo digital permite o uso quase
automático do software de restauração para eliminar riscos, ranhuras e demais
pontos que não eram originalmente pertencentes à película, mas como dito
anteriormente nem todo o processo pode ser automático, levando à vezes os
restauradores a uma restauração quadro a quadro manualmente. No caso do filme
Deus e o diabo na terra do sol, uma minuciosa restauração teve que ser feita em
moscas que haviam sumido do filme por estarem se mexendo de forma aleatória na
cabeça de uma vaca em decomposição, portanto, em movimentos muito próximos à
de uma sujeira na película. Segundo Fracarolli, a máquina nem sempre faz
interpretações certas, por isso chamamos o processo digital de semi-automático.
Chamamos de artefato as anomalias causadas pelo programa, e constituem um
dos piores defeitos que o filme pode ter, pois são problemas que antes o filme não
tinha. Aí entra o trabalho do bom restaurador, que identifica esta anomalia a
tempo de corrigi-la
121
.
119
Programa Almanaque, exibido pela Globo News em 02/03/2005.
ue, exibido pela Globo News em 02/03/2005.
3/2005.
120
Programa Almanaq
121
Programa Almanaque, exibido pela Globo News em 02/0
90
Além da já citada carta à cinemateca, foi usado vasto material deixado por
Glauber Rocha na restauração dos seus filmes, o que mostra que o cineasta baiano
sempre se preocupava em manter todas as referências possíveis para a perpetuação
de sua obra. M
temática dos seus filmes, mas pela sua po
O embaixador Arnaldo Carrilho, diretor-presidente da Riofilme e amigo de
Glauber, exemplifica numa declaração a importância dos lançamentos dos seus
filmes em
orreu aos 42 anos de idade, mas deixou um legado não só pela
stura em relação ao cinema e à memória.
DVD: No início dos anos 70, quando apareceu o VHS, o Glauber
91
chamou a atenção para esse o veículo que surgia. Ele era muito ligado em novas
tecnologias e lançar seus filmes nesses suportes honra sua memória
122
.
Infelizmente, o DVD apresenta em parte dos seus extras uma qualidade
discutível: os entrevistados são ricos em fatos e histórias sobre o filme, mas a
produção comete erros gravíssimos na captação destas entrevistas. Carlos Roberto
de Souza, curador da Cinemateca Brasileira e um dos discípulos de Paulo Emílio
Salles Gomes, foi inserido em um mal feito espaço virtual (nota-se a sombra do
Chroma Key
123
na iluminação), e a captação do áudio é péssima; Waldemar Lima,
diretor de fotografia do filme, divide as atenções com o cinegrafista que aparece no
reflexo dos seus óculos (imperdoável erro de fotografia com um diretor de
fotografia); O diretor-presidente da Riofilme Arnaldo Carrilho aparece numa
biblioteca bagunçada lendo o texto de seu depoimento; Dona Lúcia Rocha, mãe do
Glauber, seria uma das raras exceções no festival de erros não fosse um Drop
Out
124
, seguramente originado da matriz em Mini-DV que passou desapercebida no
momento da autora ão.ç Falhas que tiram um pouco do brilhantismo do DVD, já
que eram depoimentos importantes para a conservação da memória audiovisual de
Glauber Rocha.
122
Jornal O Estado de S. Paulo. 27 de setembro de 2002
In: http://www.estadao.com.br/divirtase/noticias/2002/set/27/207.htm
ativo em 02/05/2004.
123
Painel localizado no fundo do estúdio, pintado em determinada coloração azul ou verde,
normalmente usado para recortar o fundo do cenário e inserir outro previamente selecionado.
o um escorregão na imagem
erada. Normalmente é ocasionado pelo uso de uma fita velha, um cabeçote de exibição/gravação
ão do DVD.
124
“Pulo” das linhas que compõem a tela do vídeo, ocasionand
g
sujo ou um erro no momento da captura das imagens para a autoraç
92
Restauração, às vezes, pode ser sinônimo de ‘tiro de misericórdia’. Uma
pesquisa feita pelo professor Carlos Augusto Calil, da USP, aponta erros no atual
sistema brasileiro de conservação:
No Brasil, se gasta muito dinheiro em restauração com resultados
duvidosos. Em alguns casos, uma restauração mal feita pode consagrar
uma degradação que o filme não tinha
125
.
Chico Moreira, ex-funcionário do MAM do Rio de Janeiro, observou:
Existem duas escolas, enfim: uma manda exibir, exibir, exibir... outra
manda preservar, preservar, preservar... não adianta nada guardar o
filme, muvucar e não mostrar mais... Mas também exibir a qualquer
preço, a qualquer custo... é difícil. Eu vi coisas absurdas, como você exibir
a posse do Juscelino em nitrato, o material já muito comprometido e o
filme se desfazendo no projetor...eu vi isso! Isso em função de um
programa para meia dúzia de pessoas. E a tese do conservador da época
era: tem que exibir! Eu pensava: Tá, mas antes tem que preservar, depois
exibir. Agora, exibir cópias únicas é um absurdo
126
!
125
Apud: MANEVY, Alfredo. As Imagens que Agonizam, in: Revista Carta Capital n° 198, p.58.
126
Apud: Revista Contracampo nº 34. http://www.contracampo.he.com.br/34/frames.htm, ativo em
16/05/2005.
93
Um episódio semelhante ocorreu no Festival de Tiradentes em 29 de janeiro
de 2003. Anunciava-se a exibição do filme Eles não usam Black-tie, de Leon
Hirszm
servar filmes, aqui, é eternamente brigar com a natureza
127
.”
Como exemplo da força da natureza, podemos citar que dos 60 filmes
produzidos pela Cinédia de 1930 até a década de 1950, somente 26 sobreviveram a
or Hernani Heffner e a filha do
esa (Adhemar Gonzaga) Alice Gonzaga, planejam migrar para
an. Porém, o que prometia ser a exibição de um clássico transformou-se
num apelo desesperado pela preservação dos filmes nacionais, já que essa exibição
foi interrompida pelos protestos da platéia, que não podia acreditar que o filme
exibido, todo amarelado, era a matriz guardada na Cinemateca Brasileira. A extinta
Rede Manchete de Televisão produziu em 1985 uma série de documentários
comemorando os 90 anos de história do cinema brasileiro, e para tanto restaurou
apenas os trechos dos filmes que iriam ser exibidos, deixando o restante na mesma
situação em que havia sido encontrado, às vezes até pior.
O Brasil perdeu filmes pelas ações do homem, mas também não são poucos
os casos de caprichos da natureza. Fernanda Coelho, restauradora da Cinemateca
Brasileira, salientou em uma palestra realizada em Belo Horizonte que “nosso país
tropical é naturalmente trágico para a conservação de filmes. O Brasil, na sua
maior parte, é quente e úmido com grandes variações, em poucas horas, tanto da
temperatura quando da umidade. Os filmes precisam de frio, secura e
estabilidade. Pre
uma enchente ocorrida em 1996. O pesquisad
fundador da empr
novas mídias e realizar restaurações dos filmes remanescentes até 2006, mas a
127
COELHO, Fernanda. Palestra ministrada no CRAV, em Belo Horizonte, a 15/ 04/2004.
94
falta d
empresas se interessam por filmes antigos.
Preferem patrocinar produções novas, que dão mais visibilidade
128
.” Hoje vários
diretores têm suas obras restauradas graças aos esforços de seus herdeiros. Tendo
como base as leis de Incentivo Fiscal,
fundos para a restauração de im
A ANCINAV – órgão criado para regulamentar o cinema nacional e os
demais meios de comunicação – pretende criar uma espécie de censo de todos os
filmes produzidos no país, além de exigir que todos os produtores enviem uma
cópia do seu filme para a Cinemateca Brasileira, sob pena de multa
129
. Para o
presidente da en
deveria ser a
cinea
um to
nasce
Centr
e atuais políticas de incentivo atrapalham o processo. Segundo Heffner, "O
problema é que a Lei do Audiovisual, mais vantajosa para o investidor, não
contempla a restauração. Poucas
eles buscam junto a empresas privadas
portantes títulos da cinematografia brasileira.
tidade, Gustavo Dahl, a preservação da memória cinematográfica
primeira prioridade, e não a última, como vem sendo:
A preservação é a última etapa do processo cinematográfico. Há entre os
stas e os produtores uma dificuldade de entender o cinema brasileiro como
do. Eu reclamava muito que as pessoas achavam que o cinema brasileiro
u com Deus e o Diabo na Terra do Sol; agora vão achar que começou com
al do Brasil
130
!
128
O Cruzeiro.Net in: http://www.cruzeironet.com.br/run/33/163706.shl#
ativo em 02/04/05.
129
(Medida Provisória nº 2.228-1 de 6-9-2001). PEREIRA, Francelino. O povo do cinema. Brasília:
cia
acional de Cinema - ANCINAV.
ista Carta Capital n° 198, p. 58.
pub. oficial, 2001 - p. 155. O livro reúne os estudos e discursos que acabaram firmando a Agên
N
130
Apud: Rev
95
A maioria dos cineastas colocou objeções a alguns itens da nova Lei do
Audiovisual, entre os quais o Artigo 26 do Capítulo V, que diz o seguinte:
videofonográfica com recursos públicos ou provenientes de renúncia fiscal
deverá depositar na Cinemateca Brasileira ou entidade credenciada pela
ANCINE uma cópia de baixo contraste, interpositivo ou matriz digital da
obra, para a sua devida preservação
Art. 26. A empresa produtora de obra cinematográfica ou
Em 12 de maio de 2004, durante uma palestra na Semana da Associação
Brasile
o no
federa
131
.
ira de Cinegrafistas – ABC – no Rio de Janeiro, foram discutidas medidas de
preservação com técnicos da Cinemateca Brasileira e cineastas. Durante o evento,
foi criticada a falta de apoio por parte das instituições para a restauração de filmes
nacionais, levando-se em consideração que se trata do entendimento do filme
como memória popular. Pelo visto, a política histórica que incentiva a produção em
detrimento da conservação do material produzido, observada por Jean Claude
Bernardet, continua vigente
132
. A prática de incentivos fiscais adotada pelo g ver
l para incentivar a cultura deveria concentrar seus esforços também na
conservação do que passou, o que seria um importante incentivo à memória
audiovisual, ou seja, à cultura do Brasil.
131
PEREIRA, Francelino. O povo do cinema. Brasília: pub. oficial, 2001 - p. 155.
2
BERNARDET, Jean Claude. Historiografia Clássica do Cinema Brasileiro. p. 29.
13
96
O cinema nacional evoluiu em conceitos e técnicas, mas a conservação e
restauração de suas obras ainda é precária. Não há linhas de pesquisa em
conservação de filmes nas universidades; não há cursos de restauração de películas
(somente apareceu o primeiro este ano, organizado pelas instituições Filmes do
Serro e Cinemateca Brasileira e que dispõe de apenas quatro vagas para
brasileiros); praticamente não existem filmotecas regionais; não existem no
momento especialistas formando-se nesta área. O cinema nacional precisa recobrar
a cons
ciência, ou nunca poderá ser levado a sério. Precisamos todos olhar para trás
e socorrer o patrimônio audiovisual ameaçado. O nosso passado está na UTI. E se o
abandonarmos agora, um pedaço de nós fatalmente se perderá.
97
Se quiser iniciar uma revolução, comece pelo seu próprio quarto. Com base
nesta premissa, inic
da UFMG. Es uação em artes plásticas, etapa
onde o aluno escolhe sua especialização (pintura, escultura, desenho, licenciatura
ou cinema de animação). Optei pelo cinema de animação, e logo no primeiro
trabalho, realizado na disciplina Técnicas audiovisuais, planejei com meus colegas
Kátia Schittine e Alexander Ribeiro o documentário O cinema de animação na
UFMG, curta metragem que visava contar a história do início da habilitação sob a
ótica das pessoas que participaram da sua implementação. O ponto de partida era
tão vago que tivemos que fazer antes um levantamento dos funcionários e
professores mais antigos do Departamento de Fotografia, Teatro e Cinema (FTC),
departamento que acabávamos de conhecer. Desde o início, tivemos a sorte de
contar com Marco Antônio Anacleto, um funcionário treinado desde o início do
curso para responder por toda a parte técnica das animações produzidas. Sua
trajetória dentro da Escola de Belas Artes casava exatamente com o perfil que
procurávamos para a nossa entrevista: formado inicialmente em desenho, já como
funcionário do FTC graduou-se novamente na primeira turma de Cinema de
Animação, sendo o técnico responsável por todos os trabalhos deste período. Mais
arde foi integrante da primeira turma do Mestrado em Artes Visuais, alcançando o
iei em 2002 minhas pesquisas dentro da Escola de Belas Artes
tava no quinto período da minha grad
t
98
título
isciplina Técnicas
Alternativas de Animação (ministradas na época pelo prof. José Américo),
animações de alunos em formaturas ao longo dos anos, animações produzidas nos
Festivais de Inverno em Ouro Preto e alguns registros esparsos, mas não menos
importantes, das mudanças que a Escola de Belas Artes sofreu ao longo dos anos
sua estrutura (mudanças de prédio, implementação do terceiro andar). Muitas
tas deste acervo, que atualmente encontra-se na Biblioteca, foram fundamentais
ara os projetos que futuramente ajudaria a implementar.
A estrutura do documentário O cinema de animação na UFMG foi finalizada
m mais dois entrevistados: Maria Amélia Palhares, então professora de Técnicas
lternativas de Animação, ex-coordenadora do Núcleo Regional de Cinema de
nimação de Minas Gerais; e José Américo Ribeiro, um dos maiores responsáveis
ela implementação do curso e peça fundamental no documentário.
Professor formado pela já extinta Escola Superior de Cinema da PUC, José
do nos Estados Unidos, onde aprendeu diversas
de Mestre em Cinema. Praticamente todos os projetos da Escola de Belas
Artes que envolviam animação passavam por ele, tanto da área de pesquisa quanto
os da Graduação. Seus depoimentos foram de grande importância para o
documentário, além de oferecer acesso irrestrito a toda a coleção de VHS da Escola
de Belas Artes, composta em grande parte de produções de alunos. Foi a primeira
vez que tomava conhecimento e assistia a este acervo, e fiquei espantado com a
quantidade (e qualidade) do material: Animações experimentais ainda da década
de 1960, primeiros filmes de animação feitos na década de 1980 (início da
habilitação), todos os filmes do Núcleo Regional de Cinema de Animação de Minas
Gerais, pedaços ainda não montados de tele-aulas para a d
em
fi
p
co
A
A
p
Américo Ribeiro fez seu Mestra
99
técnicas de animação. Partiu dele a idéia de implantar uma habilitação em
animação dentro da Escola de Belas Artes. Seu depoimento foi surpreendente:
como se já soubesse de antemão exatamente todos os tópicos que pretendíamos
abordar no documentário, José Américo iniciou a entrevista a partir da minha
primeira pergunta e foi até o fim, num depoimento ininterrupto. Ao conferir a fita
gravad
a, toda a entrevista já parecia editada. Era como se José Américo tivesse em
mente o documentário pronto. Soube mais tarde, pesquisando no acervo em VHS,
que de fato José Américo já havia tentado fazer um documentário similar ao que
pretendíamos. Descobrimos também que nosso filme era de certa forma inédito, já
que não temos notícia de documentários finalizados sobre este tema.
Coordenado pelo Prof. Dr. Luiz Nazario, o projeto Filmoteca Mineira teve
seu início em 1997. Na primeira etapa deste projeto, os pesquisadores e bolsistas de
Iniciação Científica Alexandre Martins e Edward de Carvalho fizeram uma
identificação precisa do conteúdo do acervo, classificaram e catalogaram todo o
material existente, desde sua bitola original ao seu atual estado de conservação.
Alexandre Martins buscou catalogar os filmes através de uma ficha padronizada do
Arquivo Nacional. Edward Carvalho fez um levantamento das condições do acervo,
coordenado pelo Prof. Luiz Sousa, do CECOR (órgão de restauração de bens móveis
da UFMG). Marco Anacleto ficou a cargo de uma nova catalogação do acervo de
fitas em VHS, Nina Faria catalogou o Banco de Roteiros. A finalização do trabalho
gerou um extenso catálogo, composto de três volumes. O levantamento do material
que hoje está dentro do Departamento de Fotografia, Teatro e Cinema foi
atualizado: Além do catálogo de todos os filmes existentes no acervo, o próprio
projeto Filmoteca Mineira gerou um extenso banco de dados. Todos os textos e
100
imagens gerados pelo coordenador Luiz Nazario, curadores e demais colaboradores
nos levou a criar, em vez de encartes separados, um livro de 120 páginas intitulado
Catálogo Filmoteca Mineira.
Iniciei meus trabalhos já na segunda fase do projeto Filmoteca Mineira, em
2002. Luiz Nazario acabara de assistir a meu documentário O cinema de animação
na UFMG. Ele tentava revitalizar a memória audiovisual da Escola de Belas Artes,
propósito que casava com meu anseio de fazer algo por todo aquele rico material do
acervo. Partindo de uma monografia sobre conservação e restauração de filmes no
Brasil intitulada O cinema brasileiro e o surto amnésico que o corrompe (realizada
ainda na graduação, disciplina Cinema Brasileiro, ministrada pela professora Ana
Lúcia Andrade), acrescentei outros dados importantes à medida que a minha
pesquisa foi progredindo. Em dezembro de 2002, incorporei a pesquisa como
resultado teórico de minha pesquisa de Iniciação Científica, desenvolvida com uma
bolsa da FAPEMIG e coordenado pelo Luiz Nazario, iniciado em outubro de 2003,
a parte teórica do Mestrado em Artes Visuais ainda receberia dados desta
monografia, constituindo as bases de um dos capítulos da presente dissertação (IV-
Breve histórico da memória audiovisual no Brasil).
Iniciei na mesma época a parte prática no Mestrado em Artes Visuais,
dentro do projeto Filmoteca Mineira. Esta nova fase do projeto, financiada pela
FAPEMIG, consistia em remasterizar
133
em um novo formato produções
audiovisuais do acervo da Escola de Belas Artes. A meta era apresentar em apenas
seis meses dez DVDs, numa primeira seleção de títulos representativos do acervo,
conteúdo e tentando preservar e melhorar a qualidade do mesmo com a adição de recursos das
133
Fazer migrar o conteúdo de um determinado material para outra mídia, quase sem alterar seu
tecnologias atuais.
101
que até então permanecia desconhecido por parte dos alunos e até de alguns
professores da Escola. Associei a teoria e a prática na pesquisa de estilos,
movimentos e produções, sendo o responsável técnico da identidade visual e
autoração dos DVDs produzidos. Aprofundamo-nos principalmente na pesquisa
dos novos métodos de remasterização de películas destinadas ao desaparecimento,
levando-os para um formato atual, de acesso quase irrestrito e disponível à maioria
da população: o DVD.
Quando se fala em revitalização do acervo, não se trata apenas do ato de
catalogar e conservar, mas também de propagar sua memória através de uma
migração urgente para uma mídia de maior acesso. Esta prática, além de trazer o
descanso das já desgastadas matrizes em película, ajuda a promover a revitalização
da memória audiovisual no momento em que estes filmes migram para um suporte
contemporâneo, podendo ser exibidos em aparelhos mais comuns de serem
encontrados no cotidiano. A migração para o suporte DVD ainda traz as vantagens
da inserção de materiais extras, produto do esforço dos pesquisadores em
encontrar elementos pertinentes à história daquele conjunto de filmes,
constituindo mais uma série de importantes objetos de estudo daquela obra. O
principal objetivo do projeto Filmoteca Mineira era evidenciar produções
importantes do acervo da Escola de Belas Artes, revitalizando sua importância e
assim formulando um apelo para a necessidade de conservação e restauração
destes materiais. Como a verba obtida era inviável para restaurar o acervo,
optamos pela catalogação e remasterização do material, o que já era de grande
valia.
102
No início de 2003, estabelecendo as bases de produção e fazendo um
levantamento do maquinário necessário, conseguimos no FTC uma sala própria e o
apoio de que necessitávamos para iniciar o projeto, consolidando uma área de
pesqui
m projetos anteriores, como
Image
sa de Iniciação Científica e Mestrado dentro da Escola: a Ophicina Digital.
Tivemos desde o início vários problemas com alguns setores do Departamento, que
consideravam um absurdo “tomar uma sala do já reduzido espaço da Graduação”.
Estávamos, segundo se dizia, “tomando” a antiga sala da truca, local usado para os
alunos terminarem suas animações. Na verdade, a sala da truca foi apenas
transferida para o Estúdio, onde ficou melhor amparada. Além disso, durante o
processo de transferência das salas reabilitamos outra truca para a graduação,
instalando-a na sala de aula e que acabou facilitando os pencil tests
134
e demais
exercícios. Em menos de um mês, o projeto Filmoteca Mineira mudava inclusive a
estrutura de produção na Escola, movimentando todos os setores do FTC.
Com o projeto aprovado pela FAPEMIG e amparado pela Escola de Belas
Artes, começamos a digitalizar títulos relevantes dos acervos do FTC. O Centro de
Referência Audiovisual da Prefeitura de Belo Horizonte (CRAV) era um parceiro
antigo, com produções conjuntas e ajuda mútua e
ns de Minas. Com o reforço de uma equipe do CRAV, foram organizados
grupos de trabalho, nomeando curadores e técnicos para organizar e escolher o
material de cada um dos dez DVDs, transferir para arquivos digitais (fitas
magnéticas Mini-DV) o material escolhido, editar, escrever textos para o encarte
dos títulos e criar a identidade visual dos menus e os demais materiais gráficos do
134
Teste feito a lápis para melhor visualizar a animação e verificar se a mesma funciona, muito
usado na técnica 2d tradicional.
103
DVD. Com o financiamento da FAPEMIG foram adquiridos dois computadores
(um para a captação, edição e autoração dos DVDs, tendo o segundo como apoio),
uma câmera Mini-DV (com a finalidade de ser um VT de fácil transporte) e um VT
combo Mini-DV – SVHS (para a captura na ilha de edição do material tanto
analógico quanto digital). O tempo era curto: as máquinas para a realização do
trabalho chegaram na Escola de Belas Artes em setembro de 2003 e precisávamos
apresentar um resultado concreto em dezembro de 2003. Por ter maiores
conhecimentos na área de edição e produção da mídia, fui encarregado da parte
técnica da autoração
135
dos DVDs, assumindo ainda a curadoria de dois deles e
auxiliando diretamente os demais curadores na produção dos outros títulos.
Usamos no projeto dois PCs equipados com processadores Pentium 4 de
1GB de memória, 512MB de memória RAM e HD de 80GB (aproximadamente
cinco horas de captura ininterrupta), o que tinha de melhor à época em termos de
custo-benefício. Um dos PCs estava equipado com um gravador de DVD Pioneer
A07. Como programas, usamos inicialmente o Adobe Premiere 6.5 para capturar os
filmes, Sound Forge 6.0 para ajustes de áudio, Adobe Photoshop 6.0 para criar os
menus e Pinnacle Impression para compilar e gravar os DVDs. Para os discos DVD
foram compradas mídias da marca PowerDVD, sendo substituídas mais tarde pela
marca S-Mac, de melhor aceitação no mercado por parte dos aparelhos
reprodutores de DVD-R.
Foram organizados os seguintes títulos, seguidos pelos nomes de seus
respectivos curadores:
do se fala em autoria de DVD, refere-se à função de criar o menu com seus botões ou
fazê-lo funcionar, compilar, linkar o menu com o material, criando capítulos, passar o material para
o formato MPEG Layer 2 (necessário para se criar o DVD), especificar as diretrizes da mídia e
queimar o disco.
135
Quan
104
DVD Cineclubismo Mineiro: Alexandre Martins
DVD Nota 10 Belas Artes: Marcelo La Carretta
DVD Núcleo Regional de Cinema de Animação de Minas Gerais:
Marcelo La Carretta
DVD Cinema e propaganda: filmes da Ex-República Democrática
Alemã: Soraia Nunes Nogueira
DVD Trilogia do caos – Parte I - A flor do caos: Alessandro Costa
(Parceria EBA – CRAV)
DVD Memória e Cinema, em três volumes: Alexandre Pimenta
(Parceria EBA – CRAV).
DVD 10 minutos de História, 10 minutos de Modernidade:
Aristides Junqueira e BHIS: Sérgio Vilaça (Parceria EBA – CRAV).
DVD Canção da Primavera: André Reis e Alexandre Pimenta
Brasil: a produção caseira de DVDs. Os discos, por
O tempo era curto, mas aprendemos durante o processo uma das maiores
lições que o meio acadêmico poderia oferecer: aprender com os erros. Em um meio
comercial, é comum trabalhar sob demanda, onde o mais importante é o produto
finalizado no prazo determinado pelo cliente. Numa escola os prazos também
existem, mas a criação de uma metodologia de trabalho, e, sobretudo o estudo e
aprendizagem do processo são fatores igualmente importantes. Os problemas
foram surgindo à medida que os DVDs iam apresentando suas particularidades, ora
por culpa da mídia, ora por problemas na hora de compactar os arquivos para o
formato, ora por problemas no áudio, mas basicamente por se tratar de uma
écnica que ainda é novidade not
105
serem queimados quase artesanalmente por softwares e não prensados como no
processo industrial, mostram-se perfeitos em alguns aparelhos, mas totalmente
inoperantes em outros. Nossa luta foi conseguir que os DVDs lessem na maioria
dos aparelhos. Chegamos ao cúmulo de produzir um disco que inicialmente lia
somente num aparelho da Phillips e que, no final do processo, feitos os ajustes
necessários, lia em todos os aparelhos, menos naquele da Phillips! Percebemos que
alguma coisa no processo estava errada. O problema estava em descobrir onde
estava o erro. Para fazer um DVD, os filmes eram inicialmente transferidos da
bitola original (16mm) para uma mídia digital compatível com nosso equipamento
(no caso, Mini-DV). Depois, usava-se o Adobe Premiere para a captura digital e
edição
do material. No Sound Forge realizavam-se os ajustes necessários no áudio.
Os menus, criados no Adobe Photoshop, eram cuidadosamente formatados
segundo a palheta de cores e os padrões do software de autoração de DVD, que era
o Pinnacle Impression. O Impression recebia os arquivos de vídeo do Premiere
(previamente formatados e compactados
136
), marcava os capítulos, inseria os
menus, criava o mapa de navegação dos botões aos filmes e finalmente o DVD era
queimado. Logicamente este processo de migração constante, aliado ao uso de
softwares (alguns de fabricantes diferentes) era passível de falha, o que percebemos
já na feitura do primeiro DVD. Pessoalmente já tinha tido vários problemas com
136
Para entrar em discos de DVD, um filme é obrigado a ser comprimido no modo MPEG-2 para
atingir
aproximadamente 36 Gigas de tamanho (numa já existente compressão de 3,4 Megas por
o HD de uma ilha de edição padrão. Para entrar em um disco, este
de tamanho ao ponto de que toda a compilação (extras, menus, etc)
alcancem o tamanho máximo de 4,7 Gigas (atualmente o tamanho máximo de um disco de DVD
o tamanho em dados necessário. Para se ter uma idéia, um filme de 120 minutos têm
segundo de filme) dentro d
mesmo filme tem que reduzir
gravável). O processo industrial diferencia-se por permitir que este filme seja dividido em camadas,
cada uma com 4,7 Gigas, que são coladas no mesmo disco e são lidas progressivamente pelos
aparelhos.
106
autoração de DVDs na época da sua implantação no mercado, em 2000. Naquele
tempo (q uas horas demorava no
mínimo o do no compartimento da
gravadora e mar ao
ambiente’ e sofrer as dilatações necessárias (eram perdidas mídias DVD no verão
só porque n ia uma
climatização do ambiente e um ator externo que
pudesse fazer tremer a base do gravador do DVD, caso contrário inutilizaria toda a
mídia (que era caríssima) e o trabalho feito.
A solução que encontramos foi o de tentar descartar etapas. Por sorte, o
projeto já previa a migração do software de edição, o Adobe Premiere, para outro
mais completo, o Pinnacle Edition. O upgrade foi mais favorável do que
imaginado: a nova versão do , o Pinnacle Liquid Edition, já
possuía ferramentas próprias para a autoração do DVD. Passamos a capturar,
editar,
ue nem é tanto tempo assim), um filme de d
ito para se tornar um DVD. O disco era coloca
p lo menos uma hora antes de ser queimado, para se ‘acostu
ti ham sido feitas no inverno). O processo, além de lento, exig
total isolamento de qualquer f
Pinnacle Edition
trabalhar o áudio, criar e queimar o DVD usando apenas um programa, o
Liquid Edition, com o Adobe Photoshop cuidando apenas da identidade visual. Esta
nova tática possibilitou uma melhor visualização dos problemas de configuração
que tínhamos, solucionando-os gradativamente com êxito. Em dezembro de 2003,
todos os curadores haviam concluído um primeiro protótipo de seu respectivo
DVD. A FAPEMIG ficou assombrada com os resultados obtidos, tendo em vista o
curto espaço de tempo (quatro meses). Uma vitória que consolidou as pesquisas da
Ophicina Digital dentro da Escola de Belas Artes.
Assim que acabou a corrida contra o tempo, tivemos praticamente todo o
ano de 2004 para corrigir imperfeições que haviam escapado nas primeiras versões
107
destes DVDs. Mais maduros, começamos a entender o mecanismo dos menus dos
DVDs; assim como evoluímos na autoração, compreendemos melhor o
funcionamento da mídia. Mais ousados, impulsionados pelas novas possibilidades
que a máquina oferecia, saímos um pouco do propósito inicial de apenas
remasterizar o material e esboçamos também algumas estratégias de “restauração”,
na medida do possível, do material que iria compor as mídias.
Do início do projeto em 2003 à sua finalização, em 2004, nossa empreitada
ganhou muitos incentivos, alguns provindos de instituições de renome, como a
Cinemateca Brasileira (que ficou encantada com nossa iniciativa pioneira, já
fazendo uso da mídia DVD, prática ainda pouco comum em arquivos brasileiros e
na própria Cinemateca).
Em outubro de 2004 foi feita uma primeira apresentação oficial de todo o
material, numa outra operação conjunta da UFMG - Belas Artes e o CRAV. No
museu Abílio Barreto foi apresentada ao público a versão final dos 10 DVDs
produzidos acrescida do catálogo do projeto, numa caixa personalizada - o Box
Filmoteca Mineira. A FAPEMIG, a Biblioteca da Escola de Belas Artes, o CRAV, o
coordenador e os curadores receberam exemplares do material produzido, seguida
a solenidade por um pequeno release do conteúdo dos DVDs. A mostra, assim
como toda a seleção dos filmes integrantes do Box, foram muito bem recebidos
pelo público presente. Ao ver a reação do público, sentimos que a missão estava
cumprida: firmava-se, no momento da exibição da mostra, o reencontro dos
espectadores com a memória audiovisual da Escola de Belas Artes.
108
Os títulos produzidos durante o projeto são analisados a seguir, respeitando-
se uma ordem cronológica (desde o protótipo inicial em 2003 às mudanças ao
longo do tempo e a finalização do DVD em 2004).
DVD Cineclubismo Mineiro
Nos anos 1960 uma geração de jovens cineastas, a
maioria formada na extinta Escola Superior de Cinema da
Puc-Minas, passam da crítica à produção de curta-metragens,
forma
cineclubismo católico, na década de 50, teve um papel preponderante
na difusão e divulgação da cultura cinematográfica no Brasil. A
formação destes dirigentes constituía um dos objetivos da Escola.
(...) A criação do festival de Cinema Amador JB/Mesbla provocou
ndo um verdadeiro surto de produções mineiras inspiradas na Nouvelle
Vague francesa de Truffault, Chabrol e Godard. O movimento ficou conhecido
como Cineclubismo Mineiro. José Américo Ribeiro, ex-professor da UFMG e
participante do movimento, tece em seu Memorial considerações e razões da
formação do Cineclubismo:
Fazia parte das atividades extra curriculares a participação
dos alunos no Cine club universitário. No terceiro ano da Escola, a
disciplina cineclubismo fornecia informações a respeito dessa
atividade aos futuros dirigentes cineclubistas. Vale ressaltar que o
uma mudança importante na produção da Escola. Os filmes, que
antes eram feitos como exercícios estilísticos e para serem vistos em
109
sala de aula, ganharam um novo objetivo – concorrer ao festival – e
um local privilegiado de exibição – o Cine Paissandu no Rio de
Janeiro
137
.
Nos filmes, destacavam-se os dramas existências, a falta de saída e demais
indagações que norteavam pensamentos no difícil período da ditadura militar no
Brasil.
nte, do Cineclubismo à produção cinematográfica da
década
u uma nota no
Estado de Minas falando sobre o seu projeto de levantamento e pesquisa,
José Américo Ribeiro fez em 1976 um primeiro levantamento do que
representou o Cineclubismo Mineiro para a produção cinematográfica mineira, e o
resultado foi uma tese de doutorado na USP em 1989 e um livro sobre o período: O
Cinema em Belo Horizo
de 60.
Em 1975, o então recém criado Departamento de Fotografia, Teatro e
Cinema da Escola de Belas Artes oferecia apenas duas disciplinas em cinema:
Introdução ao Cinema, ministrada pelo professor José Américo Ribeiro, e Cinema
(realização de curta metragem), ministrada pelo professor Evandro Lemos da
Cunha. Todos os professores do Departamento empenhavam-se na época em
compilar e restaurar um importante material: O acervo de Igino Bonfioli, um dos
pioneiros em cinematografia de Minas Gerais. Os filmes Cineclubistas, todos em
16mm, foram trazidos à Escola pelas mãos do Prof. José Américo. Em 1978 enviou
um questionário a um grande número de realizadores e participantes do
cineclubismo. Com a colaboração de Ricardo Gomes Leite, publico
137
RIBEIRO, José Américo. Memorial. p. 22 – 23.
110
confia
erados perdidos já na década de
setenta. Oito filmes estavam em poder de seus respectivos realizadores, e não
reiterados pedidos de empréstimo. Tir
uinze filmes que ficaram na Escola de Belas Artes, talvez a maioria dos outros
vinte e s desaparecidos.
sados (o vídeo só
rtes escolas no final
Por coincidência, foram estes os primeiros filmes em película que tive
contato na minha vida, numa aula de Semiologia da Imagem ministrada na
graduação por Alexandre Martins, na época professor substituto. O DVD
Cineclubismo Mineiro iria integrar a parte prática do Mestrado em Artes Visuais do
Alexandre Martins, curador da seleção, e com a defesa já marcada, uma equipe
emergencial foi montada para atender o propósito. Alexandre selecionou o
material, Nelson Barraza cuidou
do material e o de
imagens. Adr veu
os textos que nte
com o Profes iam
ndo à Escola de Belas Artes a salvaguarda dos filmes deste período. Dos
cinqüenta filmes produzidos em Belo Horizonte no período de 1963 a 1969, quinze
estão depositados no FTC. Seis filmes foram consid
integraram a pesquisa apesar de ando os
q
oito filmes do período estejam hoje engordando a lista do
Exibidos até a exaustão para alunos e demais interes
começou a ser usado para ministrar aulas na Escola de Belas A
da década de oitenta), a maioria dos filmes necessita de urgente restauração. O
problema principal é a sulfuração
138
, presente em todos os filmes do ciclo.
de toda a telecinagem. Fiquei a cargo da captura
da concepção gráfica (identidade visual), fazendo uma pré-seleçã
iana Ferreira cuidou da autoria do disco. Alexandre Martins escre
iriam compor os extras e o encarte, além de selecionar, juntame
sor Luiz Nazario (que orientou todo o processo) as imagens que ir
que o filme vai amarelando com o passar do tempo, na maioria das vezes
á fixação do químico que segura a imagem captada, ou mesmo pela
lícula.
138
Processo em por
conseqüência de uma m
qualidade da pe
111
ilustrar o men D e
todo o materi ma
verdadeira odisséia: os DVDs teimavam em não funcionar. O principal problema
estava nas vinhetas iniciais, que saíam de sincronia com o áudio, e nas diversas
telas c
s a idéia de telas
com
na tela,
compr
u, o encarte e a capa. Em quatro dias tínhamos que finalizar o DV
al impresso. Porém, o que parecia ser uma tarefa fácil revelou-se u
om texto que usamos para os extras (usamos oito ao total). Acabamos
descartando nos títulos
seguinte
texto, difíceis de
serem confeccionadas,
inoperantes em alguns
aparelhos de DVD e de
difícil leitura
ovando na prática
que com nossa atual
televisão feita de fields
139
a leitura de textos é inviável. Outro problema decorreu do
fato do material ter mais de cento e vinte minutos de duração, o que ultrapassava a
capacidade inicial do disco (80min.), obrigando-nos a aumentar a taxa de
compressão num primeiro momento. Conseguimos fazer cinco cópias para exibição
e distribuição na banca do Mestrado de Alexandre Martins, mas já nesta primeira
incursão identificamos erros na concepção do disco (lia em pouquíssimos
aparelhos, reprovado até pelo aparelho Pioneer de uso profissional). Ficou acertado
Os fields, ou meios-frames, são os elementos que ficam entre os frames, auxiliando na
varredura constante de dados no vídeo e facilitando que a ação se desenvolva livre na televisão
139
sem ‘agarrar’. O computador não faz uso dos fields, deixando os quadros inteiros e não
compactando a imagem exibida, daí o fato de imagens paradas (como texto) ficarem bem melhor
no monitor do que na TV.
112
a partir deste DVD o formato das capas e encartes, os créditos, as logomarcas da
Ophicina Digital e da Filmoteca Mineira (que criei), além das outras logomarcas e
demais informações, como créditos padronizados.
Em 2004, chegamos à
formatação final da mídia,
ros, na
após 09 tentativas. O principal
problema estava nos menus de
seleção de filmes, uma espécie
de parede com quad
verdade fotogramas tirados
dos filmes. A disposição dos quadros na tela atrapalhava a navegação do menu,
sendo preciso remanejar o espaço. Outra importante medida foi tomada, num
primeiro processo do que podemos chamar de restauração: Os filmes, concebidos
originalmente em preto e branco, estavam sulfurados
(amarelados) pelo tempo. Na montagem do material, pude
consertar este defeito descolorizando o filme e aplicando
filtros de correção de brilho e contraste, devolvendo ao seu
filme o aspecto original. A trilha sonora dos filmes foi
trabalhada de forma que o barulho do carretel da máquina
não interfira no áudio do filme. O filme O começo é difícil,
novamente o atentado (1969), de Camillo Souza Filho, concebido originalmente
como filme mudo, tornava-se sonoro com o excesso de barulhos que a película
113
emitia ao passar pela máquina de projeção. Alguns fotogramas adicionais foram
criados para suprir a deficiência dos que estavam na película, feitos a partir da
informação dos anteriores e dos posteriores (base da restauração digital). Os mais
danificados eram os fotogramas iniciais de Rosa Rosae (1968), de Rosa Antuña, e
os intertítulos iniciais do filme Ruptura (1967), de José Américo Ribeiro.
Ruptura foi o filme esco
na apresentação do Box F
Barreto, constituindo um do
presentes estavam o diretor Jos
período e ex-professor da Esco
integrantes da atual adminis
(ou re-impressão) de todos s
quem abria um baú há muito
esquecido: imagens da Praça Sete
ainda conservando os seus
bondinhos invadiam a sala;
divertiam-se os presentes com
cenas do protagonista da trama
lendo O pequeno príncipe às margens da ainda não poluída Lagoa da Pampulha. O
lhido para representar o DVD Cineclubismo Mineiro
ilmoteca Mineira, feita no Museu Histórico Abílio
s momentos mais marcantes da mostra: dentre os
é Américo Ribeiro, o também realizador daquele
la de Belas Artes, Prof. Dr. José Tavares de Barros, e
tração da prefeitura de Belo Horizonte. Da impressão
obre o filme apresentado, algumas particularidades
destacam-se: a maioria observava
o filme com a curiosidade de
diretor emocionou-se ao rever seu filme, uma exibição que não estava especificada
no programa do evento. Já os representantes da prefeitura prestavam mais atenção
no jovem ator principal da película, o hoje político, conhecido socialmente (e em
114
particular pela Prefeitura, onde exerceu diversos cargos), ex-candidato à prefeitura
de Belo Horizonte, Amílcar Vianna Martins, filho do Dr. Amílcar Vianna Martins.
Este reencontro do público com sua identidade audiovisual valeria mais um
a a quantidade de elementos que foram surgindo
. A ruptura acabou acontecendo
bém com
quebravam a barreira do tempo e reencontra
audiovisual. Um presente para nós do projeto Film
exemplo prático de tudo o que foi exposto até agora n
DVD Nota 10 Belas Artes
Nota 10 Belas Artes é uma seleção de dez
uiz Nazario, Marco
artes plásticas e no
ja característica está
capítulo nesta dissertação, tamanh
ao longo dos doze minutos de exibição de Ruptura
não só entre o personagens da trama, mas tam os espectadores, que
vam-se com o seu passado
oteca Mineira, um verdadeiro
a presente dissertação.
dos
melhores trabalhos em animação produzidos na Escola
de Belas Artes entre 1997 e 2003, inicialmente uma
encomenda do diretor da Escola de Belas Artes, Prof. Dr.
Evandro José Lemos da Cunha. A mostra seria exibida
no Encontro Internacional de Escolas de Cinema
Latino-americanas, no Rio de Janeiro. Encarreguei-me da cu
cuja seleção ficou a cargo de uma comissão formada por L
Anacleto e Marcelo La Carretta.
Na Escola de Belas Artes temos alunos iniciados nas
cinema criando animações. Futuros artistas criando obras cu
em que o suporte final das mesmas é uma imensa tela projetada. Por isso mesmo os
alunos executam na Escola trabalhos tão diferenciados daqueles que são
radoria desse DVD,
115
normalmente vistos na televisão. No caso específico das animações desses alunos,
notam-se sempre duas influências muito fortes: a da escola canadense do National
Film Board, com suas animações de caráter experimental; e a própria formação
acadêmica do aluno de Belas Artes, seguindo ao longo dos primeiros quatro anos
disciplinas de Artes Plásticas e só nos anos seguintes trabalhando de fato com o
cinem
á
filme (produção, roteiro, domínio de técnica
polêmica é a questão dos direitos sobre o filme
opiniões: os alunos acham que a Escola de Belas
na confecção de seus filmes (principalmente n
nenhuma ajuda na divulgação e distribuição dos m
Belas Artes ‘não mereceria’ figurar nos créditos
seus filmes na Escola. O outro lado diz que os
a de animação. Nem tudo é perfeito nesta união das Artes Plásticas com a
arte e a técnica cinematográfica: temos na Escola defeitos gravíssimos, como o uso
constante de trilhas sonoras de filmes conhecidos (o que reduz a obra a um
exercício, excluindo-a de festivais competitivos ou exibições comerciais); ou
trabalhos sem um roteiro elaborado (com histórias, gags, e argumentos inferiores à
concepção estética e à técnica empregada, que assim se perdem aos olhos
impacientes do espectador). Herança da influência majoritária das Artes Plásticas
sicas que ajudam a estruturar um
s audiovisuais). Outra questão
feito pelos alunos. Dividem-se as
Artes não os auxilia devidamente
o âmbito técnico), nem oferece
esmos. Portanto, a logomarca da
, e os mais radicais nem deixam
filmes feitos para disciplinas da
Escola, utilizando sua estrutura, seus equipamentos e o Know-How de seus
professores e técnicos devem ter o crivo da Escola de Belas Artes, pois estes filmes
não podem ser figurados como produções independentes. Se por um lado, o aluno
deveria ter o orgulho de colocar a Logo da Escola de Belas Artes no filme (o que o
(composição, cor) em detrimento das técnicas b
116
diferenciaria de outras produções ‘caseiras’), a Escola por outro lado poderia servir
como filmoteca segura para estes filmes em questão, e entre estas novas
possibilidades, estruturar projetos de divulgação deste material, o que seria
tos de
duração. Três deles na época ainda estavam em fase de pós-produção: (que
is não chegou a ficar pro
Verda
de melhor entre 1997 e
das Artes Plásticas nos
trabalho de stop motion,
uadro a quadro fazendo
o criados na maioria das
o, pois exige um timing de cena perfeito: não há
espaço
benéfico para todos os lados.
A seleção dos filmes que integrariam o DVD Nota 10 Belas Artes baseou-se
em três critérios: domínio da técnica utilizada, qualidade do argumento e trilha
sonora adequada (embora nem todas tenham sido compostas para o filme). A
mostra acabou sendo bem heterogênea, com técnicas e estilos variados. De uma
seleção inicial de vinte e três filmes escolhemos dez, totalizando 50 minu
acabou sendo substituído, po nto), O navio negreiro e
des.
Com esta mostra, uma seleção do que se produziu
2003, conseguimos perceber claramente as influências
trabalhos dos alunos. Em Zapping e Ogum, há um belo
técnica que consiste em movimentar bonecos articulados q
uso de uma câmera. Para tanto, personagens e cenários sã
vezes em dimensões reduzidas, tendo a iluminação do filme uma importância
fundamental para o sucesso do mesmo. Assim como o recorte tradicional, animar
bonecos é um trabalho complicad
para o erro. Uma cena inteira em stop motion precisará ser refeita se o
movimento do personagem não for convincente. Por ser uma das técnicas que mais
se aproximam da encenação de atores (com câmeras e cenários reais) o stop motion
mantém seu encanto.
117
Existem casos onde os bonecos são deixados de lado e atores reais entram
em cena, executando movimentos surreais. Pixilation é a técnica – e uma forma de
expressão – largamente usada por Norman McLaren em diversos filmes do
National Film Board do Canadá, como Vizinhos (Neighbours, 1952), Oscar de
Melhor Animação. Muito utilizada nas animações da escola canadense, acabou
sendo adotada no mundo inteiro, tornando-se a modalidade predileta dos alunos
da Escola de Belas Artes. A razão dessa preferência está no fato de ser essa uma
técnica de fácil execução, fazendo uso apenas de uma câmera que dispara quadro a
quadro, iluminação apropriada e um bom argumento, e possibilitando resultados
surpreendentes. O representante dessa modalidade na seleção é o filme Pixel Fight,
um pixilation com inserções feitas no computador. Atores reais (todos alunos da
Escola) foram filmados quadro a quadro. Essas imagens serviram como base para
uma posterior manipulação digital, onde se adicionaram efeitos para que se
parecessem com personagens de videogame. Um cenário virtual e efeitos de raios
completam a atmosfera das cenas.
Para a técnica de recorte foram selecionados três exemplares que
demonstram a variedade do que se pode obter dentro dessa modalidade, apenas
fazendo uso da criatividade. No meio do caminho tinha uma pedra é o que se pode
chamar de recorte tradicional, pois faz uso de movimentos da truca (mesa
composta de engrenagens, com uma câmera acoplada no alto para fotografar
quadro a quadro os desenhos) e seus personagens são concebidos e recortados
artesanalmente. Usam-se palitos de dentes para movimentar pacientemente os
personagens dentro do cenário, protegido por um vidro junto com as partes que
não irão se movimentar nele. Já a animação de Francisco já havia sido feita no
118
papel, tendo os recortes como molde de decalque. O filme é um caso a parte nas
técnicas citadas, pois faz uso de xilogravuras (gravuras feitas com entalhes na
madeira transferidos para papel vegetal). Por ser uma técnica de artes plásticas, o
filme i
antigo problema de ter que refazer uma seqüência inteira se
lustra bem o afirmado acima sobre “artistas plásticos criando animações”. O
personagem previamente animado é transferido junto com o cenário para o papel.
Esse papel é então digitalizado; Fazendo uso do computador, inserem-se máscaras
em outras seqüências também criadas em xilogravura (no caso de Francisco,
movimentos do rio), e a cena está pronta. Tendo custado imenso trabalho, esse
filme em xilogravuras animadas é o único feito com entalhes reais, não se tendo
conhecimento de outro artista que tenha se aventurado a usar técnica semelhante.
Verdades, assim como No meio do caminho tinha uma pedra, também faz
uso da técnica do recorte tradicional, com apenas um diferencial: os movimentos
da câmera e do personagem não são feitos numa truca real, e sim por uma truca
virtual simulada em um programa de computador. Essa nova ferramenta
praticamente elimina o
119
os mo
do para essa animação ainda tinha limitações
própri
vimentos falham, pois toda a animação pode ser alterada depois de pronta.
Outros recursos adicionais que a nova técnica digital oferece, só para citar alguns
exemplos: possibilidade de adir diversos planos (layers) na mesma seqüência; de
amenizar as emendas existentes em um personagem tradicional de recorte; de
obter com facilidade iluminação, movimentos de câmera e profundidade de campo;
trabalhar virtualmente o eixo Z, elemento responsável pela tridimensionalidade. O
recorte digital, como essa nova técnica tem sido chamada, aproxima-se da
animação 3D com o mesmo encanto do artesanato da animação de recortes
tradicional.
A possibilidade de trabalhar virtualmente o eixo Z nos computadores acabou
criando uma nova modalidade de animação, baseada em primitivas geométricas e
contando com um número infinito de aplicações: a animação tridimensional. O
filme Pico do Cogumelo foi a primeira experiência da graduação nesse campo, mais
um motivo para ter sido incluída na seleção. Todo baseado no antigo sistema
operacional DOS, o programa usa
as de sua época. Os programas evoluíram de forma espantosa, tanto que as
animações de hoje tornam Pico do Cogumelo uma antigüidade do seu gênero.
Porém, um fator importante torna o filme ainda atual: seu bem elaborado
argumento e a maneira como a narrativa foi conduzida. Existe um plot que
acompanhamos com interesse até o desfecho. Isso prova que não importa que a
ferramenta seja antiquada ou que os recursos sejam escassos: o que faz um filme
perdurar é sua capacidade de bem contar uma história interessante.
Mesmo no campo do 2D tradicional (caso das animações da Disney e a
maioria dos desenhos da televisão) existe experimentação, e assim entendemos os
120
traços soltos de Os Pipichadores. Este filme, concebido inicialmente em preto e
branco, acabou sendo prejudicado por uma inconseqüente exigência: como os
filmes eram revelados no Rio de Janeiro por empreitada, no mesmo lote iam na
maioria das vezes mais de duas animações, às vezes na mesma lata. Um dos
realizadores daquele semestre desejava que o seu filme tivesse uma coloração
azulada, mas preferiu não usar filtros na captura, optando por colocar este “efeito”
no processo de revelação, feito no Rio. Por distração na hora da revelação do filme
(ou achando que se tratava de uma exigência comum), todos os filmes ganharam a
tal coloração, estragando irremediavelmente a fotografia dos mesmos. No caso de
Os Pipichadores, um fator estava contra a sua ‘restauração’: o filme havia sido
concebido em preto e branco, mas os protagonistas ganhavam cores à medida que a
história ia avançando, um deles inclusive ganhando a cor azul. Este defeito pode ser
finalmente consertado na confecção do DVD Nota 10 Belas Artes: fiquei a cargo
desta restauração, limpando o azul das cenas em preto e branco e fazendo uso de
máscaras e filtros nas cenas coloridas dos personagens. O resultado ainda guarda
resquícios do azul, pois a tonalidade empregada era próxima do preto, dificultando
sua remoção completa (o filme
perdia referências de imagem).
Felizmente, somente um espectador
atento consegue perceber hoje o
estrago causado no passado em Os
Pipichadores. O trabalho durou
alguns dias, mas valeu a pena.
121
O segundo filme selecionado que faz uso da técnica, Chico Rei, ilustra, por
meio de animações, a cultura do congado de forma didática. Suas animações foram
feitas desenhando-se os personagens quadro a quadro num papel, sendo a única
diferença entre os dois a maneira como foram finalizados: enquanto Os
Pipichadores usou papel e lápis de cor, Chico Rei usou o tradicional acetato (uma
lâmina de plástico transparente) e tinta para finalizar seus personagens. É uma das
últimas animações dentro da Escola a usar este tipo de suporte.
Falando em experimentação, não se pode deixar de mencionar O navio
negreiro, filme feito com uma técnica complicada e que exige muita paciência:
anima
mbém assumi:
somen
ção com areia. Consiste em animar pequenos grãos de areia da mesma forma
que o recorte tradicional, iluminando-se por baixo para se conseguir um alto
contraste da imagem. Exatamente por ser de natureza bastante instável, a areia é
um material dos mais difíceis de serem animados, exigindo, desde o início, um
completo entendimento do argumento, do roteiro e do storyboard, tendo-se ainda o
cuidado de evitar formas e personagens detalhados ou bem definidos. Esta arte
teve em Caroline Leaf uma das maiores divulgadoras, tendo muitas animações
premiadas.
Essa seleção de filmes de animação, muito elogiada, ainda participou da
mostra de cinema de animação Cineanima Brasil, em Belo Horizonte, e ganhou
menção especial no Encuentro Internacional de Escuelas de Cine, em Montevidéu,
Uruguai, sendo confeccionado especialmente para o evento um DVD especial com
legendas em espanhol para participar do concurso trabalho que ta
te no filme Chico Rei, de André Reis Martins, traduzi e inseri 59 letreiros;
para Verdades, gravei toda a fala do personagem em espanhol.
122
O DVD foi um dos mais divulgados antes da confecção do Box. Por se tratar
de uma mostra contemporânea de animação, seus filmes foram exaustivamente
exibidos em festivais (enviados pela própria Escola) e programas como o Curta
Minas, da Rede Minas de Televisão. Curiosamente esta seleção sempre é exibida na
ordem original e sem adição de outros filmes de produção da Escola, o que
infelizmente mostra que sem o projeto Filmoteca Mineira, a exibição deste
material poderia não acontecer. Com esta seleção feita especialmente para o
projeto, intocada em sua estrutura e usada exaustivamente pela Escola de Belas
Artes, a impressão que se tem é a de que existem apenas estes filmes no acervo, o
que está longe de ser verdade. A seleção deste DVD é apenas um exemplo do
potencial que a Escola de Belas Artes oferece, mostrando não só toda a
complexidade das técnicas de produção como também a magia que existe no
cinema de animação, onde bonecos, desenhos e objetos realmente se tornam seres
animados, dotados do poder de nos fazer rir, pensar, aprender e sonhar.
DVD Núcleo Regional de Cinema de Animação
e alguns
animação
uma nova
rática em
o já havia
em Minas Gerais
Em 1982, já existia a vontade d
professores e implantar não só disciplinas de
dentro da Escola de Belas Artes, mas criar
habilitação. Desejo que foi colocado em p
1985, com a reforma curricular
140
. A animaçã
140
PALHARES, Maria Amélia. Memorial. p. 25.
123
sido e
o com a extinta
EMBR
or que acabaria com a EMBRAFILME, em 1990. A animação em Minas
Gerais
xperimentada pelos alunos desde a implantação do FTC, em 1973: Alguns
professores, como Maria Amélia Palhares e José Américo, já ofereciam aos seus
alunos a possibilidade de usar a animação em seus exercícios práticos de fotografia
e cinema, além de cursos de extensão ministrados por profissionais do ramo.
Com a habilitação em Cinema de Animação consolidada em 1986, foram
feitos alguns convênios internacionais, sendo o maior deles com o National Film
Board do Canadá, instituição que planejava, em conjunt
AFILME, criar núcleos de animação em vários pontos estratégicos do Brasil.
A sede seria no Rio de Janeiro, com a recém criada CTAv, e a idéia dos
coordenadores era a de espalhar núcleos de animação pelo Brasil inteiro. Minas
Gerais encontrou dentro da Escola de Belas Artes a estrutura de que necessitava, e
em agosto de 1988 foi criado o Núcleo Regional de Cinema de Animão em Minas
Gerais
141
. Dos quinze alunos selecionados através de currículo e entrevista, oito
eram alunos e ex-alunos da Escola de Belas Artes. O Núcleo Regional de Cinema de
Animação em Minas Gerais foi o único que teve vida longa, cumprindo os prazos e
estimativa de produção dos filmes e terminando somente após o decreto do
governo Coll
teria na Escola de Belas Artes o seu porto seguro graças à infra-estrutura da
Universidade. O Núcleo teve sua experiência resguardada no curso de animação,
ajudando a mesma com a adição de equipamentos e consolidando a já forte
graduação.
Esta história, esquecida durante anos nos arquivos da Escola de Belas Artes,
foi lembrada por Marco Anacleto em sua Dissertação de Mestrado e por mim no
141
PALHARES, Maria Amélia. Memorial. p. 28.
124
docum
to para o
programa Agenda da Rede Minas (depoimentos de alunos explicando como
curiosa apresentação do
tografia do
Depar
material estava espalhado em todos
entário O cinema de animação na UFMG. Para a composição deste DVD,
garimpamos durante meses o acervo em VHS da Escola de Belas Artes, e acabei
encontrando outros materiais que ajudam a contar esta história, como entrevistas
concebidas pelos alunos à extinta Rede Manchete de televisão e a Rede Minas.
Tivemos gratas surpresas, como o encontro de um negativo em preto e branco do
que seria a primeira experiência em animação dos integrantes do Núcleo, um
divertido pixilation. Marco Anacleto reconheceu o filme e chamou a atenção para o
fato deste negativo em preto e branco ser na verdade uma cópia do original,
colorido, e que este filme estaria guardado em algum lugar. Nelson Barraza, um dos
responsáveis técnicos da Escola, conseguiu encontrar este filme, mas ele já estava
irremediavelmente deteriorado, o que nos deixou como única opção positivar a
cópia em preto e branco, adicionar trilha e apresenta-la no lugar da original. A
positivação foi feita no próprio computador.
Dentre os extras, destaca-se a adição de um material antigo, fei
conceberam suas animações para o Núcleo) com uma
Professor de Fo
tamento, Luis Felipe Cabral.
Todos os filmes da primeira
fase do Núcleo, 13 no total, estão
no DVD. Este título foi um dos que
mais exigiram pesquisa, pois o
125
os formatos disponíveis na Escola, do 16mm ao BetaCam e VHS. Soma-se o
material aos extras, acrescido do documentário já citado O Cinema de Animação
na UFMG. Planeja-se uma continuação, tanto deste documentário quanto de outro
DVD contendo a chamada segunda fase do Núcleo. Esta fase teve vida curta, pois a
EMBR
deo U-Matic, sendo por sua vez descontinuado para dar lugar ao atual
sistem
Arienrot estava ganhando no processo, e seria hoje seguramente um dos melhores
AFILME e o convênio já estavam sendo desfeitos. Mas ainda teve fôlego para
produzir três filmes, todos muito bem elaborados e que podem ser nominadas
como as animações mais importantes do período. Balançando na gangorra (1993),
de Tânia Anaya foi o primeiro filme da Escola que participou do Festival
Hiroshima de Animação, um dos mais importantes festivais do gênero, e pela
dificuldade em encontrar informações sobre a participação dos filmes da Escola em
festivais, arrisca-se a dizer que é o único. Para perdão dos pecados (1993), de
Marta Neves, é até hoje o mais longo filme feito em animação dentro da escola de
Belas Artes, dez minutos, número espantoso para uma animação feita
normalmente por apenas uma pessoa.
O terceiro filme, Arienrot, do diretor Alexandre Albuquerque, teve uma
produção mais complicada, não sendo finalizado dentro da Escola de Belas Artes, o
que representa um problema para a nossa pesquisa. O que se levantou até o
momento sobre a animação são pencil tests e demais exercícios feitos durante a sua
breve produção na Escola de Belas Artes, perdidas no meio da intensa migração de
tecnologias (neste período, o FTC deixou de usar a película 16mm, adotando o
padrão de ví
a BetaCam, padrão que ainda resiste ao novo formato da Escola, o DVCam).
Pelos testes de animação, pode-se ter uma idéia da qualidade de animação que
126
filmes feitos pelo Núcleo. O que resta saber é se o filme está finalizado dentro das
dependências da Escola ou o perdemos, o que seria uma perda lastimável.
As novas gerações dos alunos da Escola poderão finalmente assistir aos
filmes recuperados desta proveitosa experiência, e mergulhar no passado
acompanhando os primeiros passos de nomes hoje conhecidos no cinema de
animação de Minas Gerais, outrora alunos descobrindo a magia dessa arte. O
resgate desses filmes representa não só um resgate da memória, mas também um
conhecimento do passado da Escola que enriquece o presente e aponta com mais
clareza para o seu futuro. É simplesmente a história do cinema de animação na
Escola de Belas Artes sendo finalmente contada através de suas produções
recuperadas.
DVD A Flor do Caos – Trilogia do Caos
parte I
S, o projeto consiste
em re e animação, tendo
rdenada e sem
estético o Expressionismo alemão.
O DVD A flor do caos foi o quarto DVD
produzido. Os filmes que compõem a Trilogia do Caos
são frutos de um projeto ambicioso, intitulado
Animação Expressionista
142
. Fin
FAPEMIG, CNPq e pela bolsa CAPE
anciada pela
alizar três curta-metragens d
como temática a evolução deso
escrúpulos da ciência e como padrão
142
Projeto iniciado em 1998 com orientação do Prof. Dr. Luiz Nazario e que contou com a
participação de vários alunos da Escola de Belas Artes.
127
A única dificuldade da pesquisa somente dizia respeito à identidade visual e
autoração do DVD, pois além do projeto em questão ser coordenado pelo Prof. Dr.
Luiz Nazario, o filme dispunha de vasto material audiovisual, coletado e
cuidadosamente armazenado ao longo de sua produção. Este armazenamento foi a
base para a criação de uma biblioteca, um banco de dados digital, organizado por
Alessandro Costa e base da sua atual tese de doutorado pelo Icex-UFMG.
O filme, pensado inicialmente em Stop Motion, acabou sendo gerado no
âmbito virtual: Animação 3D para as cenas principais, Recorte digital para as cenas
secundárias. No segundo filme, ocorrem até interações entre as duas modalidades
de animação, mostrando que as duas vertentes podem dialogar num mesmo filme.
De fato, este novo patamar de possibilidades trazem inovações e progressos, mas
carregam outros problemas gerados pela nova tecnologia: como conservar e
restaurar bens “virtuais”? O suporte digital ainda é muito jovem para ter uma
definição correta da idade que ele pode alcançar, mas já podemos estabelecer
alguns critérios para a melhor conservação deste material.
De início, podemos constatar que o atual sistema não foi originado para
durar muito tempo, principal viés da nova tecnologia: o formato digital se torna
obsoleto numa velocidade espantosa. Podemos dizer, a exemplo das moviolas e do
Vitaphone, que além de preservar o formato devemos preservar também as
máquinas que o exibem. Mas como preservar um computador obsoleto? Como
garantir que todas as suas peças vão perdurar, e como garantir a sobrevivência do
software, programa que concebeu o arquivo em questão? Os programas também se
tornam obsoletos, o próprio projeto Animação Expressionista já usa a quarta
versão do Estúdio Max 2.0, a 6.5. Outro problema: o sistema atual de conservação
128
dos arquivos do projeto es numa base eletro-mecânica (o Hard Disc, ou HD), um
suporte extremamente precário, cheio de pequenas peças e passível de curto e
defeito
ão pode estar no formato mais antigo após a película: o meio
magnético. Ainda hoje pode ser considerado o suporte mais seguro já criado para a
ai de fábrica protegida por
uma fo
ões climáticas adversas:
lônia de fungos devido
te magnético as fitas no
matrizes em DVD é a fita
V atende
perfeitamente as necessidades de uma mídia DVD, além de ser atualmente no
mercado a melhor em termos de custo-benefício. Além deste suporte, deve-se
de ordem mecânica, impedindo irremediavelmente o acesso se danificado.
O DVD, apesar de ser apontado como a evolução dos backups de segurança por ter
uma capacidade considerável de armazenamento, também é uma mídia frágil,
bastando uma pequena queda e um arranhão para destruir vários arquivos. Além
destes problemas, há ainda o fato de que várias empresas de software usam uma
metodologia de compressão e formatação de arquivos própria, às vezes só lida
pelos programas de origem, que chamamos de codecs. Como assegurar que estes
complexos materiais audiovisuais poderão ser vistos no futuro?
A soluç
guarda de material audiovisual. A fita magnética já s
rte caixa de plástico. Suas engrenagens apenas ob
adaptação, limitando assim os acidentes por uso indevido e/ou falha mecânica. O
único fator que pesa é a sua instabilidade frente a condiç
Uma fita magnética mal-condicionada pode se tornar uma co
à sua eventual “caixa protetora”. Entende-se como supor
formato VHS, BetaCam, DVCam, Mini-DV, etc.
Atualmente, a melhor maneira de se preservar as
Mini-DV. Explica-se: a qualidade alcançada por uma Mini-D
edecem a um padrão de
preservar em DVDs de dados a autoração e os demais menus.
129
A equipe de produção da Trilogia do Caos seguiu à risca as recomendações
dadas pelo coordenador técnico Marco Antônio Anacleto, e o resultado pode ser
conferido no extenso banco de imagens gerado pelo projeto, certamente a produção
mais documentada da Escola de Belas Artes. A terceira parte da Trilogia parece
seguir o mesmo caminho: todos os modelos 3D das produções anteriores estão
sendo aproveitados neste terceiro filme, graças a um cuidado técnico em migrar os
projetos à medida que os programas evoluíam. Um caminho seguro que usa a
experiência como referência.
130
DVD Cinema e Propaganda – Filmes da
Em 1997 o Departamento de Fotografia e Cinema
da Escola de Belas Artes recebeu uma curiosa doação:
com a queda do Muro de Berlim, a República
Democrática da Alemanha desativou seu Consulado,
doando à Escola de Belas Artes seu acervo de 183
películas de propaganda daquele país, material ainda inédito para muitos
pesquisadores e desconhecido até por alguns professores, funcionários e alunos da
Escola. Para a produção do DVD Cinema e propaganda, o ac
Ex-República Democrática Alemã
ervo das películas
doada
sendo reconstruído
s pelo Consulado da ex-RDA ao FTC foi novamente revisitado, agora para
tornar públicas algumas
pérolas desconhecidas.
Rolos de filmes de
propaganda da
Alemanha, com imagens
do país arrasado pela
Segunda Guerra Mundial
foram selecionados pela
curadora Soraia Nunes,
mestranda em Artes Visuais. O material contou ainda com um ensaio de Alexandre
Martins. É certamente um dos mais interessantes DVDs produzidos pelo Projeto
Filmoteca Mineira, devido ao seu conteúdo incomum.
131
As películas em 16mm deram bastante trabalho aos pesquisadores do
projeto. Por já estarem desgastadas e com as cores esmaecidas, o telecine não
estava conseguindo captar corretamente as imagens geradas. Para piorar, o filme
corria o risco de arrebentar a qualquer momento da projeção. Para solucionar o
problema, foi montado um telecine improvisado: a imagem era projetada numa
tela branca dentro do Estúdio da Escola de Belas Artes, e esta imagem projetada
era gravada diretamente por uma câmera Sony PD150 DVCam. O áudio do projetor
também era captado diretamente pela câmera. O resultado já superava os
anteriores, bastando apenas umas pequenas restaurações no áudio original, feitas
no computador. A escolha dos filmes narrados em português foi determinante,
além de exibirem interessantes imagens de Berlim destruída e sendo aos poucos
reconstruída, importante memória audiovisual de uma nação arrasada e reerguida.
O DVD Cinema e propaganda é motivo de orgulho para o nosso projeto, pois nele
elevamos o âmbito da revitalização a níveis internacionais de restauração da
memória.
DVD Memória e Cinema
Vols. I, II e III
O CRAV iniciou sua colaboração na produção dos
DVDs com títulos do seu acervo e do acervo comum EBA
/ CRAV no final de 2003, produzindo inicialmente o DVD
Memória e Cinema, coletânea em três volumes de curtas-
etragens cujo tema é a história do cinema mineiro, com
uradoria de Alexandre Pimenta. Estes filmes são o resultado prático do projeto
m
c
132
Memória e Cinema
coordenado pelo Prof. Dr.
Ev
um
Núc
Ima
esse
de Fotografia e Cinema
adquiriu os primeiros
equipamentos de vídeo, possibilitando as primeiras edições lineares por VT dentro
da Escola de Belas Artes. Nas apresentações dos filmes, o ator Mateus Nachtergaele
s para a revitalização da
ção para o DVD, estando
s em BetaCam da Escola.
as para exibição em TV,
ntar a todos os filmes as
venida Afonso Penna no
tentava o título de Cidade
esa que ocupa lugar de
destaque, ficando o volume III com a imagem dos bondes elétricos. As fotos
possuem uma cor especial, que determina a coloração dos botões do volume
seguinte, formando um ciclo.
andro Lemos da Cunha,
a continuação do Projeto
leo de documentação:
gens de Minas. Graças a
projeto o Departamento
ressaltava a importância das produções, todas voltada
ra
todos catalogados e em boas condições de uso nos arquivo
Concebidos inicialmente em forma de blocos de program
foi necessária apenas uma pequena edição para acresce
respectivas apresentações. Auxiliei na autoração dos DVDs, criando um efeito
visual para os menus. O volume I tem como fundo a A
começo dos anos 1950, época em que Belo Horizonte sus
Jardim. No segundo volume, é o viaduto Santa Ter
memória cinematográfica mineira.
Os filmes não tiveram maiores problemas de mig
133
Na capa dos DVDs, uma foto do cine Metrópole na sua fase áurea ressuscita
os valores que esta seleção de filmes tanto querem divulgar. Histórias do cinema,
de seus autores, de seus filmes e até da cidade que acolheu toda esta produção,
conhecida na época de sua construção como uma Tapera Revolvida, são assuntos
largamente abordados pelos DVDs. Uma importante fonte de referência para os
iniciados no estudo da história do cinema mineiro.
DVD Reminiscências & BHIS: 10 minutos de
história, 10 minutos de modernidade
Este DVD apresenta uma associação da produção
passada e presente de uma mesma cidade,
estabelecendo paralelos num sentido de reflexão sobre a
obra de ontem e a de hoje. O formato do menu já sugere
a linha, sendo um dos mais elaborados do projeto: os
filmes antigos são vistos acessando o menu pela esquerda, encontrando como
ndo em movimento o “Pirulito” da Praça Sete nos seus primeiros anos e uma
trar nos filmes contemporâneos
ual Praça Sete e sons de modems conectando à internet, fazendo
com q po.
fu
marchinha de carnaval. Ao en , a imagem do fundo
funde-se com a at
ue o espectador passe por uma rápida visita pelo tem
134
Nos dez minutos de
história, é com orgulho que o
projeto Filmoteca Mineira
lança pela primeira vez em
DVD o filme Reminiscências,
de Aristides Junqueira (1909),
considerado a mais antiga
película preservada do Brasil.
Trata-se de um filme raro, mineiro, guardado com zelo pela família Junqueira, daí
o seu bom estado de conservação. A filmagem foi feita na casa da família
Junqueira, em Belo Horizonte, com duração de dez minutos. A película recebeu
tratamento especial, reduzindo-se a razão de aspecto e acrescentando-se uma trilha
sonora
tre a produção atual e as produções do passado,
de época. É comum dar este tipo de tratamento aos filmes do início do
cinema, pois correm o risco de terem sua imagem cortada na tela da televisão
(existe uma área cega, onde o tubo de imagem se encaixa e por isso perde-se de
10% a 20% da imagem exibida). O som aproxima o filme do espectador
contemporâneo, lembrando também que normalmente os filmes mudos eram
exibidos com acompanhamentos musicais. O mesmo tratamento foi dados aos
outros filmes desta parte, todos pertencentes do acervo do Crav.
10 minutos de modernidade é o resultado do projeto Belo Horizonte
Imagem e Som, que consistia em dez filmes com a proposta de um minuto cada
um, e que tivessem como enfoque principal a cidade de Belo Horizonte. O resultado
estabelece um contraponto en
135
mostra
DVD Canção da Primavera
nção da
Prima
de Cinema,
ndo que ambas podem conviver no mesmo espaço – e no mesmo DVD –
pois constituem um interessante paralelo de reflexão sobre o cinema mineiro e a
cidade de Belo Horizonte.
Outra pérola do cinema mudo mineiro ganhou
seu primeiro título nacional em DVD: Ca
vera, de Igino Bonfioli. Para contar a história
deste filme, é preciso voltar no tempo. Em 1975, o
recém criado Departamento de Fotografia e Cinema
da UFMG concentrava-se em recuperar os filmes de
Bonfioli, um dos pioneiros em cinematografia de Minas G
precárias, e os filmes, em nitrato, corriam o risco da autocombustão, pondo em
risco todo o acervo
erais. As condições eram
143
. Numa operação conjunta das Cinematecas Brasileira e
Funarte, conseguiram recuperar num primeiro momento três filmes importantes
da obra do artista: Canção da Primavera, Tormenta e o documentário Minas
Antiga. Os resultados foram exibidos no Encontro de Pesquisadores
em Brasília e Belo Horizonte; nas cinematecas do Rio de Janeiro e São Paulo. No
Palácio das Artes, em Belo Horizonte, os filmes restaurados foram exibidos aos
remanescentes da família Bonfioli. Por gratidão e confiança, no mesmo ano as
filhas de Igino Bonfioli, Sylvia e Leonor, doaram todo o material que ainda
143
RIBEIRO, José Américo. Memorial. p.16
136
possuíam para o Departamento de Fotografia e Cinema. À medida que o acervo ia
sendo ampliado, as verbas para a conservação do m
anos
t nfioli
ulta,
ópias
etato
nal,
dada
adas tentativas de
telecin
esmo iam aumentando. O
resultado é que no início dos
oitenta odo o acervo do Bo
estava à disposição para cons
devidamente catalogado, em c
em 35mm e 16mm feitas em ac
a partir da matriz origi
restaurada, conservada e guar
nas dependências da Funarte e da
Fundação Cinemateca Brasileira, infelizmente o processo parou nesta época,
provocando um abandono do material e a conseqüente perda do controle sobre o
mesmo. Hoje, o material de Igino Bonfioli é um dos mais abandonados do acervo.
A produção deste DVD foi das mais árduas. Primeiro porque a Escola de
Belas Artes detém os direitos sobre a obra de Bonfioli, o que eleva ainda mais a
responsabilidade sobre a autoração e veiculação deste material na nova mídia.
Tarefa que se revelou gratificante para os pesquisadores, que puderam recorrer ao
Acervo Igino Bonfioli doado à Escola: fotos, intertítulos originais, material de
divulgação e o roteiro datilografado pelo próprio diretor, com o mapeamento
completo das viragens que o filme continha. Depois de frustr
agem do desgastado rolo de 120 minutos, constatou-se que faltavam,
naúnica cópia depositada na Escola, aproximadamente 30 minutos que constavam
da duração original do filme. Encomendou-se então uma cópia em Beta de Canção
da primavera, telecinado anos atrás pela Funarte àquela instituição. Quando a
137
nova cópia em Betacam chegou, foi um alívio verificar que aquela cópia estava
completa e em perfeitas condições. Como as partituras originais haviam sido
perdidas, André Reis Martins inseriu um acompanhamento musical com
omposições de Carlos Gomes, contemporâneo de Bonfioli e autor de músicas
rovavelmente muito próximas das originais. Mas havia outro problema: como
uitos intertítulos estavam quase ilegíveis na cópia, e cerca de 60 haviam sido
ndo refeitos por André Reis Martins a partir da
digital o dos faltantes a partir do
a questão das viragens do
inal mesmo não sabendo se
reconstruir um filme mudo
a e cor a um filme sem
c
p
m
perdidos, todos eles acabaram se
ização do material original, com reconstituiçã
roteiro.
Antes de descoberto o roteiro, gerou polêmica
filme, pois já existia o desejo de acrescentá-las no orig
elas realmente existiram. Existia um anseio de tentar
em todo seu potencial, mas como adicionar músic
inevitavelmente alterar os propósitos do diretor sobre sua obra? Como imaginar a
emoção que Bonfioli gostaria de ter passado em cada seqüência de seu filme de
duas horas? Até onde um pesquisador pode intervir, mesmo munido das melhores
intenções, no intuito de restaurar uma obra tal como ela teria sido criada em sua
época? Essas perguntas tiraram o sono dos pesquisadores e do próprio
coordenador. Sabíamos do risco que corríamos, pois tínhamos conhecimento de
notáveis fracassos nesse campo, como o da “restauração” de Metropolis, de Fritz
Lang, por Giorgio Moroder, usando uma trilha composta pelo grupo de rock
Queen
144
. A descoberta das viragens no roteiro original de Bonfioli trouxe a todos
144
NAZARIO, Luiz. Viagens imaginárias, in: NAZARIO, Luiz (org.). A cidade imaginária, p.236;
of Metropolis, pp. 01-04.
KOERBER, Martin. Notes on the restoration
138
grande alívio, e revelou práticas engenhosas do cineasta, um autodidata que
fabricava as próprias máquinas de projeção. Uma das viragens em azul, que
representava a noite, era substituíd
personagem carregando um lampião e
este se afastava. Uma solução brilhan
dispunha, em mais uma prova de sua
a por uma viragem amarela quando um
ntrava em cena, voltando ao azul quando
te para os poucos recursos que o cineasta
genialidade. As viragens seguiram à risca o
139
roteiro original, mas seguramente não mantêm o mesmo encanto e brilho que as
viragens originais em nitrato, como atesta o professor de cinema José Tavares de
Barros. Mas a música de acompanhamento permanece, de qualquer forma, um
“paliativo”, que não pretende em momento algum substituir a trilha original
perdida talvez para sempre. Só podemos, nesse caso, pedir licença e desculpas a
Igino Bonfioli aonde quer que ele esteja, e esperar que não se zangue com nosso
atrevimento.
O filme Canção da primavera procurou ser reconstruído em sua essência, e
acabou sendo o trabalho que mais se aproximou do que podemos chamar de uma
restau
in
resultado dos esforços em preservar estes filmes pode ser verificado no voto de
ração, e não a convencional remasterização que vínhamos praticando nos
outros DVDs. Foram remodelados todos os intertítulos e acrescentadas viragens
nas cenas; foi diminuída a razão de aspecto para respeitar a margem da TV e
adicionada uma trilha sonora da época, um processo que ao todo acabou exigindo
das nossas máquinas mais que qualquer outro título em DVD produzido na
Ophicina Digital.
Futuro: finalmente uma filmoteca na Escola de Belas Artes?
Historicamente, pode-se dizer que o processo de restauração, conservação,
divulgação e pesquisa de filmes surgiu paralelamente à criação do Departamento
de Fotografia e Cinema, em 1973. Num primeiro momento, pesquisava-se sobre a
obra c ematográfica de Igino Bonfioli, pioneiro na área em Minas Gerais. O
confiança dado pela família Bonfioli ao doar o material que ainda possuíam para a
140
salvaguarda do Departamento, como citado anteriormente. Este esforço foi
novamente reconhecido em 1982, ao receber uma verba de pesquisa significativa
por parte do CNPq
145
.
Este reconhecimento propiciou vôos mais ousados: o Projeto Núcleo de
documentação: Imagens de Minas, coordenado pelo Prof. Dr. José Américo
Ribeiro e tendo como pesquisadores os professores Evandro José Lemos da Cunha,
Silvino José de Castro, Heitor Capuzzo Filho e Luiz Gonzaga Teixeira visava um
resgate audiovisual das produções do início da cultura cinematográfica de Minas
Gerais. Buscava um enfoque amplo, talvez por tratar de um estudo pioneiro sobre o
tema. Exaltados com as novas possibilidades que viriam a surgir com a ampliação
do espaço físico da Escola de Belas Artes, seus organizadores apostavam na criação
de um Centro de Referência e Memória Cinematográfica nas dependências da
Escola:
Suas atividades de pesquisa, desenvolvidas tradicionalmente desd
sua criação, ainda que em condições técnicas e materiais pouco
satisfatórias e com reduzido número de professores/pesquisadores, vem-
se impondo, desde então, no quadro da pesquisa cinematográfica que se
realiza no país. Assim é que, fruto de importante trabalho de prospecção a
produção cinematográfica do Estado – já localizou, recuperou, catalogou
e investigou preliminarmente significativo acervo de filmes realizados, de
1909 a 1970 (...) – assumiu papel de liderança na pesquis
cinematográfica nacional participando, entre outras atividades, da
criação e, posteriormente, estruturando e sediando, por vários períodos, o
Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro (CPCB), entidade civil
e
a
145
RIBEIRO, José Américo. Memorial. p. 43.
141
legalmente registrada.(...) No quadro dessas considerações introdutórias,
o presente projeto, resultado da lenta maturação das atividades de
pesquisa do Departamento, configura singular proposta que visa a ação
da Universidade, em integração com outras agências públicas e
particulares, no processo de produção de bens culturais do país, com
vistas à sua efetiva inserção no sistema mercadológico de consumo.
Vencida a primeira etapa do processo de recuperação, o acervo obtido
permanece hoje, por mais de dez anos, simplesmente depositado nos
O Departamento, ainda em sua fase de implantação, já se preocupava com
érico ainda
abordava outra questão: O FTC se preocupava em recuperar filmes mais antigos,
não levando em consideração os realizados mais recentemente. Devem ser
preservados não só os filmes dos anos 1920 e 1930, mas também com a produção
Cineclubista dos anos 1960. Vale lembrar que a observação data de 1975
147
. De fato,
arquivos, aberto apenas aos especialistas da área. Justifica-se, por si
mesmo, um projeto que pretende organizar todo a material recuperado,
completar as descrições analíticas já iniciadas, pelo seu interesse potencial
não apenas para os estudiosos do cinema, mas também para todos
aqueles que, sob um enfoque histórico, antropológico, sociológico e
político, necessitam de um contato visual com os valores da cultura
mineira
146
.
seu acervo, de acesso “somente aos especialistas da área”. José Am
146
147
RIBEIRO, José Américo. O Cinema em Belo Horizonte, do cineclubismo à produção
cinematográfica da década de 60, p.19.
TEIXEIRA, Luiz Gonzaga. Projeto Núcleo de documentação: imagens de Minas, p. 05.
142
estes filmes só voltaram a ter o devido cuidado anos depois, sendo finalmente
remasterizados em 2003, no projeto Filmoteca Mineira. Em 1975, estes filmes
tinham pouco mais de 10 anos, e seguramente apresentavam melhores condições
de uso
videográfico, por todos os meios disponíveis, no território do Estado e,
supletivamente, no país e no exterior. Etapa significativa do projeto, visa
oferecer à comunidade mineira condições de conhecer momentos
expressivos da evolução política, social e cultural de sua história recente,
em reg
de temas, de modo a possibilitar sua leitura contemporânea .
Para o projeto Memória e Cinema foram adquiridos aparelhos profissionais
de videotape, formato BetaCam. O avanço na pesquisa do acervo propiciou avanços
do que nos 40 anos que se seguiram antes de sua revitalização.
Houve uma continuação deste projeto, intitulado Memória e Cinema,
coordenado pelo Prof. Dr. Evandro José Lemos da Cunha e que consistia na
produção de curtas metragens visando o resgate da memória audiovisual de Minas
Gerais, como já previa o projeto antecessor, Imagens de Minas:
Difusão: Promover a divulgação do material, em suporte fílmico ou
istros documentais que a expressividade imagética particulariza.(.)
Registre-se que, além da apresentação de filmes originais, em curta,
média ou longa metragem, serão exibidas também produções
contemporâneas, em vídeo ou filme, realizadas por professores,
pesquisadores e cineastas da equipe que, utilizando trechos ou fragmentos
de filmes de época, promovam, em seus trabalhos, a atualização e reflexão
148
e Documentação: imagens de Minas. p. 12.
148
TEIXEIRA, Luiz Gonzaga. Projeto Núcleo d
143
tecnológicos
películas 16m
Janeiro, pois
artesanal era usado para revelar pequenos
Memória e Cinema acabaram integrando o box Filmoteca Mineira, último projeto
feito em prol do acervo. Por sua vez, o projeto Filmoteca Mineira representa numa
linha histórica a quarta tentativa feita a favor da memória audiovisual da Escola de
Belas Artes, mas ol
recomeço. Av
intocado acer
os projetos a
princípio de
existem pelíc
Departamento, um dado gravíssimo levantado ainda em 1975 por José Américo
Ribeiro. O local onde atualmente o acervo está é incrivelmente contrário a todos os
levant
produzidos em vídeo e digital, os filmes novos estão cada vez mais descartáveis,
a tentar
erial que ainda vale a pena ser visto, seja por seu
no Departamento, que até 1997 trabalhava de forma precária com
m. (Para a revelação dos filmes, viajava-se a São Paulo ou Rio de
em Minas Gerais não existia laboratório. Um tanque feito de maneira
testes). Os filmes feitos no projeto
hando para trás, vemos que estamos num interminável
anços são tidos com o passar dos anos, mas frases como quase
vo e primeiro levantamento do estado dos filmes são comuns a todos
presentados até hoje, talvez porque todos os projetos partem do
que o acervo está cada dia que passa mais deteriorado. Ainda hoje
ulas em Nitrato em condições favoráveis à sua combustão dentro do
amentos feitos pela própria Escola sobre a conservação de filmes: Local
abafado, com carpete, de difícil ventilação e anexado a uma sala de aula de acesso
constante, representando um risco para o professor e seus alunos.
Quando se fala em preservar, quase sempre a idéia que as pessoas têm é a da
coisa velha, que ficou esquecida na poeira do tempo porque foram criadas coisas
novas para a substituírem. Não é bem assim. Talvez por serem mais facilmente
feitos sem a preocupação de durar mais que uma semana. Preservar signific
manter acesa a chama de um mat
144
valor histórico e testemunhal, seja pela qualidade de seu conteúdo, resgatando
memórias e conservando-as para as próximas gerações.
Neste contexto, um último dado extremamente preocupante precisa ser
levantado. De todos os projetos, apenas o Filmoteca Mineira, de 2003, previa a
conser
vo, talvez por isso
não tenham maior atenção por parte dos projetos anteriores ao Filmoteca Mineira.
Em breve his
do Departam
Embrafilme, foram produzidos 13 filmes de
de animação feitos por alunos da graduação, todos depositados no acervo da Escola
nos mais variados formatos (16mm, U-Matic, Betacam e VHS). Em 2004, plena era
digital, com a Escola melhor equipada, o saldo de filmes depositados no acervo do
Departamento é zero. O mesmo número parece se repetir em 2005. Em poucos
anos, isso sig
Artes.
Dois pro
produção téc ar com a
participação da área técnica da Escola (em geral, os que se preocupavam com a
salvag
Fotografia e Cinema hoje se preocupa quase que exclusivamente em ampliar seu
vação, restauração e divulgação das animações produzidas na Escola de
Belas Artes. José Américo já salientava em 1975 a tendência dos projetos de
pesquisa em favorecer quase que exclusivamente as produções mais antigas. As
animações da Escola constituem o material mais novo do acer
tórico, podemos constatar que em 1988, ano de intensa produção
ento em convênio com o National Film Board do Canadá e a
animação pelo Núcleo, mais oito filmes
nifica a extinção da memória audiovisual recente da Escola de Belas
váveis motivos explicam esse hiato: Os alunos hoje assimilam mais a
nica dos seus exercícios, finalizando-os em casa sem cont
uarda dos filmes); e a Escola por sua vez não orientou devidamente os alunos
sobre a importância de manter seus filmes no acervo. O Departamento de
145
espaço para produzir mais, não importando se este mesmo material irá
desaparecer no ano seguinte. Nos últimos festivais, os filmes exibidos pela Escola
eram fruto dos esforços da área de pesquisa, em particular o Projeto Filmoteca
Mineira. O Departamento precisa de uma reformulação, visando uma retomada de
valores. Uma política de conservação, restauração e divulgação das suas produções
é hoje mais do que nunca necessária. A criação de um setor que cuide de toda a
manipulação deste material tornou-se uma obrigação, já que não é possível se
manter indiferente frente a este acervo que cresce e se deteriora a cada dia.
O próximo projeto precisa ser a criação da Filmoteca Belas Artes, um espaço
que tenha como atribuições principais conservar, restaurar e promover o acervo de
produções da Escola. A idéia é que se avance num sentido de aprofundamento da
área de pesquisa dentro de nossas próprias produções, buscando uma identidade.
Num sentido prático, salvaria as produções já incorporadas ao acervo e facilitaria a
conservação do material hoje produzido. Filmoteca, como diz sua definição, é a
formação de um banco de arquivos audiovisuais do núcleo em que ela está inserida.
Com o histórico da Escola de Belas Artes em produzir projetos bem sucedidos nesta
área, fica fácil prever qual seria o resultado de uma iniciativa de um projeto desta
magnitude.
Uma definição sobre a situação do nosso rico e hoje mais do que nunca
ameaçado acervo é necessária. É o futuro da memória audiovisual da Escola de
Belas Artes que está em jogo. E uma escola de cinema sem passado fílmico
simplesmente perde sua razão de ser. Como diria Martin Scorsese: se os filmes vão
desaparecer, para quê fazê-los? Vale a reflexão.
146
Conclusão
Sobre o passado e o futuro do cinema
reun
es, mas não conservava o que ia sendo alcançado. Nos termos de cultura
livres
E sou celulóide, não aço; Oh, Deus da máquina, tenha piedade. (...) Eu
sou uma fita delicada de celulóide - empregue-me mal e eu decepciono
milhares; queira-me bem e eu cresço e instruo o mundo.
A. P. Hollis, A oração do filme, 1920
149
.
A revolução tecnológica pela qual estamos passando parece não ter fim. No
século XX, presenciamos mais mudanças do que todos os séculos anteriores
idos. A invenção do cinema foi apenas uma peça nessa avalanche de inovações
realizadas pelo homem nos últimos 150 anos de sua existência. Considerado
primeiramente apenas uma invenção interessante; depois atração irresistível, mais
tarde a mais nova e importante das artes; logo em seguida transformado em
poderosa indústria de entretenimento de massa e máquina de propaganda, o
cinema evoluiu paralelamente aos progressos da técnica. Mas, assim como todas as
invenções calcadas em progressos tecnológicos, o cinema perdia uma boa parte de
seu passado à medida que sua técnica evoluía. Seguiram-se inovações após
inovaçõ
ca seria como deixar apodrecer em úmidos porões livros importantes apenas
porque agora se imprimem livros em papel de qualidade superior. O cinema, antes
considerado por alguns intelectuais do começo do século XX como espetáculo de
párias
150
, não foi imediatamente reconhecido como expressão artística, e mais
FERRO, Marc. Cinema e história, p. 71.
149
Apud: USAI, Paolo Cherchi. Silent Cinema: an introduction, p. 206.
150
147
tempo ainda levou para ser percebido como documento histórico. Somente em
1920 o homem começou a preocupar-se com a preservação da memória audiovisual
para as gerações futuras. E apenas nos anos 1950 descobriu-se que o cinema não
era eterno. As engenhosas máquinas de captura da realidade e seu suporte fílmico
que propiciou a mágica do movimento contínuo, a impressão da realidade, não
suportaram nem meio século de existência. O cinema tornou-se, depois do teatro e
da dança, a mais efêmera das artes: e à diferença do teatro e da dança, que
reafirmam a cada apresentação seu momento único, o cinema ilude o espectador,
que a
eos, como um documento para as gerações futuras, um documento
que a
credita erroneamente que a imagem impressa na película durará para sempre,
quando na verdade pode desaparecer bem diante dos seus olhos.
Mesmo os artistas do cinema, envoltos na magia da imagem, tornam-se
vítimas dessa ilusão e imaginam que seus filmes perdurarão por si mesmos, sem se
preocupar em conservá-los, investindo toda sua energia na produção. Se esse
pensamento se generalizasse para as outras artes, não teríamos mais o que expor
nos museus, não restaria mais nenhum traço das cidades antigas e medievais que o
Oriente e a Europa conservam, ou das cidades coloniais na América. O filme
deveria ser considerado, para além de seu efeito imediato sobre os
contemporân
judará o homem a entender a época e o passado, um registro vivo da cultura
de uma sociedade, assim como o visionário Matuszewski já o entendia em 1898
151
.
Se tivéssemos conservado melhor o cinema, hoje teríamos um registro muito mais
completo da história do progresso alcançado pelo homem do século XX. É pelo
151
Ver Anexo III.
148
cinema que podemos ver os grandes líderes políticos e os homens ilustres do
assado, ouvir os discursos que mudaram o mundo, assim como assistir ao desfile
dos homen
comportava
entregavam em a imensa
memória audiovisual.
sombra que se projeta sobre o novo cinema digital que está nascendo é a
de um
Lucas, Steven Spielberg, Bernardo Bertolucci, Pedro Almodóvar e tantos outros não
lições para seu próprio
p
s comuns, assistir ao seu modo de vida - como se pareciam e se
m; que veículos usavam para se transportarem; a que passatempos se
; milhares de pequenos fragmentos da vida que compõ
A
novo esquecimento de tudo o que já foi feito. Embevecidas pelo sempre
sedutor progresso, as novas gerações afastam-se do estudo da história do cinema –
dos construtores da linguagem cinematográfica (Méliès, Griffith, Einsenstein,
Chaplin, Gance, Hitchcock, Welles...) e se lançam à “produção de filmes”
esquecendo-se de que o cinema exige um mínimo de conhecimento técnico e
artístico para ser feito. No Brasil, o quadro chega ao absurdo: nos anos 1960, os
“bem informados” sabiam que o cinema nacional tinha nascido com Limite, de
Mário Peixoto. Nos anos 1970, os “bem informados” asseguravam que não existia
cinema no Brasil antes de Humberto Mauro. Nos anos 1980, os “bem informados”
apontaram a obra de Glauber Rocha como o verdadeiro marco do nascimento do
cinema nacional. Hoje, os “bem informados” afirmam que, antes de Central do
Brasil, de Walter Salles, só havia pornochanchada.
Se os filmes desaparecem, para que fazê-los? De que vale o esforço artístico e
técnico se esse irá desintegrar-se na poeira do tempo, sem perdurar para o proveito
de futuras gerações? Cineastas como Brian de Palma, Martin Scorsese, George
abrem mão de aprender com o passado fílmico, e dele tiram
149
trabalho atual, prática que deveria ser seguida por todos aqueles que desejam
trabalhar em cinema. A conservação do passado fílmico só se tornou possível
porque alguém, em algum lugar, simplesmente guardou uma cópia do filme.
Muitas vezes, essas pessoas não eram cineastas ou produtores: a conservação do
cinema ocorreu principalmente graças a pessoas comuns, que queriam salvar os
filmes porque acreditavam que aquelas latas de rolos de película constituíam uma
parte importante de suas vidas, e queriam dividir essa experiência com outros que
pensavam da mesma forma. Esse pensamento levaria à criação de cineclubes,
filmotecas e cinematecas. Esse trabalho rendeu importantes fontes de inspiração e
aprendizagem: os cineastas da Nouvelle Vague francesa, por exemplo,
procla
Logo depois os filmes evoluíram: não pegavam mais fogo, mas viravam água e
inagre e perdiam as cores. O novo cinema digital não entra em combustão nem se
mavam-se filhos da cinemateca, local onde todo o passado cinematográfico
pode ser visto e revisto. E este local só foi possível através dos esforços de pessoas
como Henri Langlois, considerado em sua época como um louco: foi graças a esses
dragões que guardaram filmes, que já consideravam como tesouros de cinemateca,
que uma parte da história do cinema foi preservada. Somente pelo trabalho, muitas
vezes realmente insano, desses dragões enfurecidos espalhados pelo mundo é que
se puderam até hoje conservar fragmentos importantes da breve, mas já tão
devastada, memória audiovisual do mundo.
O cinema tem uma história difícil de se contar. Não se pode dizer com
certeza quem foi de fato o pioneiro em realizar determinado feito ou técnica, pois
90% dos filmes produzidos no mundo desapareceram. Os filmes nasceram para
pegar fogo, graças a uma combinação explosiva da emulsão de nitrato e o tempo.
v
150
liquefaz, mas por ser virtual ele pode num piscar de olhos simplesmente evaporar-
se no ar - “ir para o espaço”, conforme a expressão já corrente, utilizada sempre que
se perdem arquivos por qualquer acidente.
O digital não é o vilão da história, muito pelo contrário. Nunca tivemos tanto
acesso ao que já foi feito no passado. Nas comemorações do centenário do cinema,
nomes de diretores esquecidos voltaram a ter merecido destaque. O DVD trouxe de
volta em versões restauradas pérolas perdidas, relíquias de nossa ainda vasta
memória audiovisual. Quando bem empregadas, as novas tecnologias tornam-se
reforços imprescindíveis para salvar a memória audiovisual do mundo. A
verdadeira evolução do cinema se dará quando o mundo dedicar à conservação o
mesmo tempo, espaço, dinheiro e energia que emprega na produção: as práticas de
conservação correriam paralelamente às práticas de produção, as grandes salas de
exibição relançariam periodicamente os velhos filmes restaurados na mesma
proporção em que seriam lançados os novos filmes produzidos. Enfim, antes de
tentar responder à questão: “para onde vai o cinema”, devemos perguntar: “de
onde veio o cinema”. Pois só conhecendo o passado poderemos entender o presente
e caminhar com segurança em direção ao futuro.
151
152
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O Estado de S. Paulo, 04 de outubro de 2001.
O Estado d
clássicos em Berlim.
161
Anexo I
A experiência uruguaia
ateca mais antiga e ativa da América Latina completou 50 anos em
menos que 1.200 programas para um público de 450 mil pessoas. Para manter-se
a agência particular), essa cinemateca conta com 10 mil sócios, que
videoteca e da escola de cinema
152
.
equivalente a um bairro de São Paulo. São números que refletem o cuidado e a
cinematográfica. Como se não bastasse ter o próprio circuito de exibição, a
comercial até nos famosos complexos multinacionais de cinemas. Com o sugestivo
projeção de shoppings e multiplex, ampliando consideravelmente seu público e
ferecendo alternativas aos Blockbusters. Que essa saudável diferença, única na
América Latina, continue sempre viva
153
.
A cinem
2001. Comportando atualmente sete salas de projeção, espalhadas pelos shoppings
e ruas da capital, ela possui, em seu acervo, 14 mil títulos e, em 2000, exibiu nada
(trata-se de um
pagam o equivalente a cerca de R$ 10 mensais, além do funcionamento da
Os números impressionam, ainda mais quando se revela que a cinemateca
em questão é a do Uruguai, país que tem pouco mais de 3,2 milhões de pessoas, o
determinação do povo uruguaio com a preservação e divulgação de sua cultura
Cinemateca Uruguaia ainda desenvolve projetos de formação de platéias em
colégios da rede pública e consegue abrir espaço para títulos de perfil menos
slogan "¡Viva la diferencia!", mantém sessões semanais nas principais salas de
o
152
A monumental cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense, 28/02/2003, in:
153
A
http://www.oparaense.com/cultura12.htm, ativo em 21/07/2003.
http://www.oparaense.com/cultura12.htm, ativo em 21/07/2003.
monumental cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense, 28/02/2003, in:
162
A história cinematográfica do Uruguai não começou diferente de outras
partes do mundo. Um festival de silhuetas realizado em 1839 mostrava o General
Rivera entrando triunfante no chamado Monte VI Del Oeste, mais tarde conhecido
s
Óptico, Fuegos Diamantinos, Daguerreoticos, e diversos outros instrumentos
dessa espécie. A primeira crônica sobre cinema escrita no país, a do jornal El Siglo,
sticos filmes Salida de los
Obreros... La llegada de un tren’, relatando a primeira exibição, privada, que
ocorr
se na Rua 25 de maio, nº. 287, na mesma sala onde antes se encontrava o
Dianorama .
Ávidos consumidores das idéias que vinham do velho continente, os
acabaram confundindo o nome daquele engenhoso aparelho dos irmãos
verdade outro invento similar entre os vários que competiram com o dos
uma das funções da nova linguagem: contar fatos e costumes com precisão
omprada dos Lumière, realiza em 1898 o primeiro filme uruguaio de que se tem
otícia: Uma carrera de ciclismo en el velodromo de Arroyo Seco. Olivier
rabalharia em 1900 com Georges Méliès, aprendendo alguns de seus truques.
como a cidade de Montevidéu. Outros brinquedos óticos vieram, a maioria do
quais importada da França. Marcaram presença o Gran Cosmorama, o Gabinete
já mencionava, em 28 de dezembro de 1896, osfantá
era em 18 de julho daquele ano. O local da exibição, Le Salon Rouge, situava-
154
uruguaios
Lumière: ao invés de Cinematógrafo, insistiam em chamá-lo de Biógrafo, na
Lumière
155
. Mas talvez nesse equívoco os uruguaios tenham compreendido bem
biográfica. Não tardam as produções nacionais: Félix Olivier, com uma câmera
c
n
t
4
ZAPPIOLA, Guillermo; CARRIL, Manuel Martínez. La historia no oficial del cine uruguayo, p. 09.
ALVAREZ, José Carlos. Breve história del cine uruguayo, p. 03.
15
155
163
Acabou fazendo filmes próprios, onde ele mesmo atuava, para promover suas
atividades de pintor e letrista. Félix Olivier se tornaria também projecionista,
abrind
ida (local que seria mais tarde o Cine
Indepe
Massardi, foi a primeira película lírica sul-
o um pequeno cinema na Avenida 18 de Julio. Coincidência ou não, esta
avenida, que é uma das mais importantes da capital, é onde se encontra hoje a
principal sala de exibição da Cinemateca.
Merece destaque, neste período, a figura de Lorenzo Adroher. Comprando
em 1909 sete câmeras e um projetor dos Lumière, formaria juntamente com seu
irmão, Juan Adroher, a primeira empresa cinematográfica do Uruguai, instalaram
seu Biógrafo Lumière na Rua Flor
ndência), realizando, entre 1910 e 1914, importantes filmes documentários,
num processo parecido com o dos cavadores
156
no Brasil, infelizmente, todas essas
produções estão hoje desaparecidas. Dos filmes Desfile de la marinería Española
por las calles 18 de Julio y Sarandí, Carreras en Maroñas e Procesión de Corpus
Christi sobraram apenas resenhas e críticas da época
157
.
Do período silencioso, restam poucos documentários, salvos de constantes
incêndios. Esse problema reflete-se na história da Cine0mateca, e por vezes até na
história do próprio país. Manuel Martinez Carril e Guillermo Zapiola, descrevem
no prólogo do livro La historia no oficial del cine uruguayo, um fato curioso dos
primórdios do cinema nacional:
“Almas de la costa” (1923, Juan Borges) foi o primeiro filme uruguaio;
em 1938, “Vocación?”, de Rina
tivo em 14/02/2005.
tivo em 14/02/2005.
156
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm, a
157
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm, a
164
americana; mas, em 1979, “El lugar del humo”, que ainda por cima era uma
co-produção argentina de Eva Landek, foi novamente anunciada como o
primeiro longa metragem uruguaio; e apenas quinze anos depois, “El
dirigible”, de Pablo Dotta, era novamente (anúncio oficial em Cannes) “o
longas-metragens uruguaios existem desde 1919 (“Pervanche”, de Leon
Ibañes Saavedra, tio-avô do atual presidente do país), mas agora parece
difícil saber até onde este distante antecedente (destruído pouco depois da
estréia por um marido enciumado pela pecaminosa atriz protagonista) era
realm
primeiro filme do cinema uruguaio”. Nunca, em nenhum país, o cinema
nasceu tantas vezes. O que eleva a suspeita de que os cineastas emergentes
nunca tinham visto o cinema do seu país, ou esse cinema morria depois de
cada filme lançado, e era preciso começar de novo. A rigor, pelo que se sabe,
ente uma primeira ficção de longa duração. Desde então, foram
realizados mais de cinqüenta longas, fora o fato de o cinema nacional existir
desde 1898, quando o armador catalão emigrado, Félix Oliver, filma
“Carrera de bicicletas en el Velódromo de Arroyo Seco”
158
.
O cinema uruguaio sempre viveu uma crise de identidade, a mesma que
aflige vários países subdesenvolvidos. Seus cineastas sempre procuram fora de seu
país referências cinematográficas, e talvez por isso o descaso às produções locais.
Os primeiros documentários uruguaios foram produzidos na época da extensa
guerra civil entre blancos e colorados
159
, mas os cineastas uruguaios preferiram
158
CARRIL, Manuel Martinez, ZAPIOLA, Guillermo. La historia no oficial del cine uruguayo, p. 03.
9
Partidos vigentes até hoje no Uruguai; corresponderiam aos partidos Democrata e Republicano
15
norte-americanos, ou às facções de Ruralistas x Urbanistas.
165
filmar a aristocracia andando em luxuosos carros, festas, piqueniques em parques
urbanos e corrida de bicicletas, de preferência que as sangrentas batalhas.
Este descaso acabou propiciando um equívoco histórico gigantesco,
atingindo inclusive os livros de história uruguaios. A guerra civil entre blancos e
colorados, iniciada em meados de 1839, e só terminada em 1904, quando o
presid
bomba
arquivado na Cin
criados pel
Manuel Martínez Carril, presidente da Cinemateca: ‘As imagens, guardadas em
nceito que
ente José Batlle y Ordoñez finalmente controlou com méritos a fúria dos
Blancos, era assim contada nos livros de história: os colorados, heróis da
resistência, eram ovacionados pelo caráter e raça que demonstraram diante de
uma situação tão adversa. Mas era tudo mentira. Um documentário de 1904,
recentemente descoberto na República Tcheca, revelou que a guerra terminou em
um simples acordo entre
cavalheiros, sem nenhum
ato heróico. A película de 50
minutos caiu como uma
em arraigadas
convicções alimentadas por
superficiais livros de
história; este documento se
encontra devidamente
emateca Uruguaia. A força das imagens destruiu todos os mitos
os historiadores sobre a guerra de 1904, comentou às gargalhadas
alguma prateleira de Praga, ajudaram a reformular todo o co
166
tínhamos s
Montevidéu
noticiários
1904.
Desde 1895 documentaristas registram a trajetória da humanidade. Ainda
na Cinemateca Uruguaia estão armazenadas latas que contêm flagrantes da
Espanha pré-Guerra Civil. Imagens raras, analisadas com regularidade por
estudiosos de todos os cantos do mundo.
documentaç
corrigindo a
Dos
sendo lanç
Charrúa Fi
do público,
cartaz por a quarenta e três
minutos
162
.
obre o fato
160
. Um francês de sobrenome Corbicier, enviado a
pela empresa argentina Lepage em busca de imagens para os
de atualidades, teria realizado o polêmico filme, intitulado La paz de
É o cinema preenchendo os buracos da
ão escrita, dando vida aos conceitos, revelando verdades factuais e
s falsas interpretações dos historiadores oficiais
161
.
primeiros longas-metragens, realizados desde 1919, apenas um acabou
ado, em 1923: Almas de la costa, produção da empresa uruguaia
lms, dirigida por Juan Antonio Borges. O filme foi bem aceito por parte
até então habituado a assistir a pequenos documentários, ficando em
dois anos. De Almas de la costa, restam hoje apen s
El pequeño héroe del Arroyo de oro (1929), filme do documentarista Carlos
Alonso, é considerado pelos uruguaios como a maior obra do cinema mudo
nacional, algo parecido com o culto que a crítica brasileira dedica ao filme Limite
(1930), de Mário Peixoto. Não pelas histórias, que atingem pólos opostos
11-12/mat_16483.htm, ativo em 20/12/2004.
161
Futuro imperfeito. Correio Brasiliense, 12/11/2000, in: http://www2.correioweb.com.br/cw/2000-
, ativo em 14/02/2005.
160
Futuro imperfeito. Correio Brasiliense, 12/11/2000, in: http://www2.correioweb.com.br/cw/2000-
11-12/mat_16483.htm, ativo em 20/12/2004.
162
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm
167
(enquanto Limite elabora metáforas para angústias existenciais, El pequeño
héroe... brilha pela caracterização realista e extremamente detalhada dos fatos da
trama)
os. Num flashback, conta aos policiais que seu pai,
, mas por terem sido realizados com parcos recursos, na mesma época, e por
serem o único longa-metragem da carreira de seus respectivos diretores.
El pequeño héroe del Arroyo de oro é baseado num caso real, ocorrido em
29 de maio de 1929, uma tragédia que chocou a população. Carlos Alonso adaptou
para seu filme uma crônica escrita por José Sanches Flores. Valeu-se também do
frescor dos fatos, filmando nos locais onde o crime aconteceu, reconstituindo-o nos
mínimos detalhes. O menino Dionísio Dias chega numa delegacia, gravemente
ferido, com um bebê nos braç
velho camponês da comarca de Treinta e Tres, havia enlouquecido e atacado a
168
família a punhaladas. Um vizinho que tentou impedir acabou morto. Somente o
menino, num ato de coragem, conseguiu fugir com a irmãzinha, andando
quilômetros até a delegacia mais próxima. Depois de contar sua história, Dionísio
Dias morre a caminho do hospital. O filme reconta com sutilezas e extrema
precisã
conheceu o achado.
Mais t
exibido nas escolas com fins didáticos
164
.
o o ocorrido, dando a impressão aos espectadores que eles assistiam à
tragédia no exato momento em que ela ocorria.
El pequeño héroe del Arroyo de oro chegou perto de cair no esquecimento: a
viúva de Carlos Alonso vendeu numa tenda as latas do filme.
163
Manuel Martinez
Carril viajava a passeio pelo interior, nos anos 1970, e descobriu tiras de um filme
decorando as portas e janelas de um rancho. Imediatamente re
arde, encontrou outros pedaços de cenas em tendas de antigüidades. Graças
a essas felizes coincidências, Carril acredita estar faltando, além dos intertítulos,
apenas um minuto do filme original. El pequeño héroe del Arroyo de oro teve tanta
identificação com o público que chegou a ser reeditado em uma versão sonorizada
(perdida), e o menino Dionísio Dias considerado uma espécie de herói nacional,
sendo o filme
Nos anos seguintes, com a chegada do cinema falado e da 1ª Guerra
Mundial, a produção uruguaia deu uma estagnada. Durante muito tempo ninguém
se atreve a fazer um filme; a sonorização da película e os custos do negativo, que
vinham da Europa inflacionada com a guerra, impediam qualquer investida.
163
Vender os pertences na rua, em pequenas bancas e tendas, é uma prática comum da
nze, aparelhos de barbear, postais antigos e qualquer
outra coisa que possa ter valor.
população uruguaia. As feiras de antiguidades funcionam a céu aberto em vários pontos da capital,
vendendo pratarias de família, objetos de bro
164
NAZARIO, Luiz. As sombras móveis, p. 310-312.
169
Em 1930 o cinema uruguaio, ainda mudo, produziria o documentário
Campeonato mundial de football de 1930. O filme, exibido em sua integridade
apenas nos festejos do centenário da FIFA, em 2004
165
, representa uma das
primeiras coberturas de uma competição esportiva de porte internacional, antes de
Olymp
ia (1932), sobre as olimpíadas de Berlim, realizado por Leni Riefenstahl.
Se a transição do cinema mudo para o sonoro foi deficitária em todos os
países da América Latina pelo alto custo tecnológico, no Uruguai o quadro era
agravado pela quase inexistência de infra-estrutura mesmo para a realização de
películas mudas. Somente em 1936 surgiria o primeiro filme sonoro uruguaio, Dos
destinos, do diretor Juan Etchebehere
166
. Este filme, estrelado pelo cantor El
Parisino, assim como Radio Candelario (1938), de Rafael Abella, protagonizado
pelo comentarista Eduardo Depauli, revelavam que os talkies
167
uruguaios se
limitavam apenas a apresentar ícones do rádio, na base da improvisação e sem
nenhum rigor estético ou identidade, chegando a imitar o que de pior se produzia
em Buenos Aires.
O ano de 1949 é decisivo para o cinema uruguaio: movimentam o mercado
cinematográfico cineastas como Adolfo L. Fabregat e Enrico Gras, e tem lugar o
Primeiro Concurso Cinematográfico de Aficionados, evento organizado pelo
recém-criado Cine Club del Uruguay
168
. Conquista o primeiro prêmio o filme
165
A película foi recebida com assombro pelos espectadores presentes, pois tratava-se de material
nunca antes exibido. A Cinemateca Uruguaia guarda este documentário como um tesouro,
conservado com 45% de umidade e lavado a cada quatro anos. Fonte: Jornal El País, 22/05/2004.
166
ALVAREZ, José Carlos. Breve historia del cine uruguayo, p.10.
167
Como são chamados em Hollywood os filmes falados.
168
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm, ativo em 14/02/2005.
170
Redención, de Nelson Covián. Logo Gras realiza o belo Pupila al viento, filme
poético de inspiração expressionista. Em 1949, também é lançado o filme Detective
a contramano, de Fabregat, uma paródia dos filmes policiais estrangeiros e que
lembra muito as chanchadas brasileiras. Em 1950, Gras realiza o documentário
Artigas, protetor de los pueblos
libres. Narrado através de
reinta e tres orientales, de
Migue
ões do
centenário da Orientalidade
169
.
quadros, monumentos e
proclames, o filme alcança uma
qualidade estética até então rara
na cinematografia uruguaia. Em
1951, surgem os primeiros
Concursos Relâmpagos,
revelando a safra de cineastas jovens que se formavam nas faculdades, como um
reflexo do Cine Club. Em 1952, a Cinemateca Uruguaia inicia suas atividades, sendo
a mais antiga da América do Sul. No mesmo ano, inicia-se uma busca pelo cinema
histórico nacional. É produzido El desembarco de los t
l Angel Melino, ambicioso épico sobre a independência uruguaia, que ficou
perdido por quase vinte anos. Somente em 1975, por iniciativa do governo militar, é
que foram efetuados trabalhos de investigação para encontrar a película, operação
efetuada com sucesso: restaurada, ela foi exibida por ocasião das comemoraç
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
aces.htm, ativo em 14/02/2005.
169
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enl
171
Nos anos 1960, curtas-metragens de conteúdo político marcam a
cinematografia uruguaia. Como el Uruguay no hay (1960), de Hugo Ulive,
inaugura essa tendência. Mario Handler realiza, em 1965, Carlos, cineretrato de un
caminante montevideano, filme que usa o pretexto de seguir um vagabundo para
mostrar uma sociedade em crise. Handler e Ulive trabalhariam juntos em 1966 no
filme
cional, chegando a auxiliar o país a produzir longas-metragens.
Com
cinemas que exibiam películas uruguaias (em 1996 foi vendido menos de um
Elecciones. Seguem-se os filmes militantes: Me gustan los estudiantes
(1968), de Mario Handler; Líber Arce, Liberarse (1969), de Mário Handler, Mario
Jacob e Marcos Banchero. Esse Ciclo Militante é fechado com outro filme de
Handler: Uruguay 69: el problema de la carne
170
.
Os filmes do Ciclo Militante possuíam outra característica comum: eram
quase todos realizados em Super-8 preto e branco, sob precárias condições
técnicas. Para piorar, boa parte desse material só sobreviveu em cópias VHS, o que
dificulta ainda mais sua conservação.
Nos anos 1980 cresce a participação da Cinemateca Uruguaia no mercado
cinematográfico na
o apoio da instituição, Juan Carlos Rodriguez Castro realiza, em 1982
Mataron a Venancio Flores, que teve sua estréia na Sala Cinemateca 18.
Nos anos 1990, uma estagnação na produção fez o país reduzir a quase zero
a continuidade de sua história cinematográfica. A população afastou-se dos
milhão de entradas, número muito inferior que os 18 milhões de 1959). O
170
ZAPPIOLA, Guillermo; CARRIL, Manuel Martínez. La historia no oficial del cine uruguayo, p. 18;
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm, ativo em 14/02/2005.
172
videotape ganhava cada vez mais adeptos, já que as produções em película nem
pagavam o investimento.
Em 2001, a crise dos países do Mercosul, em especial a Argentina, lançou os
uruguaios numa recessão econômica que atingiu todos os setores da sociedade. A
bloqueadas pelo Banco Central.
de cinema e das sete salas de
e um milhão de pesos - continua
mateca. A instituição mantinha
nado, único na América Latina,
te. Quase falida, a Cinemateca
nto de um fundo de emergência
10,00) par adão e um
acréscimo de igual valor para os sócios
Cinemateca Uruguaia teve suas contas financeiras
O dinheiro necessário à manutenção da escola
exibição mantidas pela entidade - algo em torno d
retido, ameaçando o bom funcionamento da Cine
um laboratório de restauração em Camino Maldo
mas com a crise sua produção caiu drasticamen
apelou para a sociedade uruguaia com o lançame
no valor de 75 pesos (o equivalente a quase R$ a cada cid
lquer
filme realizado. Realizar longas como El dirigible (1992), de Pablo Dotta, que
171
. A Cinemateca precisa, sobretudo, de
verba para restauração, tendo já provado seu valor: o laboratório da Cinemateca
Uruguaia auxiliou na preservação de verdadeiros ícones do cinema mundial, como
a versão com viragens de O gabinete do dr. Caligari (Das Kabinett des Dr.
Caligari, 1920), de Robert Wiene
172
. Por tudo isso, e principalmente por se tratar
de um país de reduzida população, a produção atual de longas-metragens
dificilmente ultrapassa dois filmes por ano, a maioria resultando de co-produções
com as vizinhas Argentina e Brasil, além de algumas parcerias com a Europa. O
pequeno mercado uruguaio é insuficiente para recuperar os custos de qua
171
Bloqueio financeiro ameaça cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense, 25/02/2004, in:
http://www.oparaense.com/cultura-45.htm, ativo em 12/05/2004.
172
Cinemateca Uruguaia, in: www.cinemateca.org.uy, ativo em 25 de junho de 2005.
173
custou
dina, Sergio Miranda, Gabriel
Pérez
plementando a Retomada, En la puta vida
(2001)
hacia el
mar (
U$800 mil para ser produzido, foi um audácia. O cinema uruguaio poderia
melhor sustentar-se através das baratas produções em vídeo, como La historia casi
verdadera de Pepita la pistolera (1993), de Beatriz Flores Silva
173
.
Se o final da década de 1990 é marcado pela duplicação e modernização das
salas de cinema pelo país, a década seguinte assiste ao ressurgimento dos filmes
nacionais. A Escola de Cinema da Cinemateca Uruguaia realiza em 1999 o filme 8
histórias de amor (oito curtas de 15 minutos tendo como locação comum o Hotel
Carrasco), revelando novos talentos cinematográficos (Juan Alvarez, Marisa
Barboza, Gabriel Bossio, Luis González, Darío Me
e Ariel Wolff)
174
. Sergio Miranda acabou tornando-se o diretor da Escola de
Cinema da Cinemateca Uruguaia (ECU), movimentando ainda mais este novo ciclo
de produções. Com mostras, concursos, filmes e escolas, a Cinemateca Uruguaia é
hoje a mais ativa das Américas. Com
, de Beatriz Flores Silva, vencedor do Festival de Cinema Ibero-Americano
de Huelva (Espanha); 25 Watts (2001), de Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll, um dos
maiores sucessos da cinematografia uruguaia; Aparte (2002), de Mario Handler,
documentário assinado por esse remanescente do Ciclo Militante; Viaje
2003), de Guillermo Casanova, também vencedor do Festival de Cinema
Ibero-Americano daquele ano; e Whisky (2004), segundo longa dos diretores Pablo
173
ZAPPIOLA, Guillermo; CARRIL, Manuel Martínez. La historia no oficial del cine uruguayo, p. 25.
174
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine latinoamericano, in:
/05/2004.
http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm, ativo em 14/02/2005; O Uruguai e
seu tempo detido em “El Viaje Hacia El Mar”. Revista Super Interessante Online, in:
http://super.abril.uol.com.br/aberta/colunas/index_cinema_28_11_03.html, ativo em 15
174
Stoll y Juan Pablo Rebella, vencedor do Festival de Gramado, reforçam que a
cinematografia uruguaia está mais forte e mais viva que nunca
175
.
A restauração de filmes e sua divulgação ainda sofrem com o atraso
tecnológico: somente em 2003 seria realizado um convênio para a migração dos
filmes uruguaios em DVD, prática mais adiantada em outros países sul-
americanos. Mas esse atraso reflete-se na maioria da população, com poucos tendo
acesso a um aparelho de DVD, infelizmente, o passado cinematográfico do Uruguai
está longe de estar assegurado. Mas esse país, acostumado a produzir cinema nas
mais adversas condições, encontrará uma maneira de preservar seus filmes. A ativa
Cinemateca Uruguaia é a maior prova de que esse é o desejo dos milhares de
cinéfilos que a freqüentam e sustentam o projeto da conservação da memória
audiovisual.
517
NIETO, Víctor Hugo. Premios de la producción uruguaya de cine. Actualización: 31 de mayo de
2004, in: http://www.geocities.com/vhnieto/main.htm, ativo en 19/06/2005.
175
Anexo II
Associados da FIAF (organizados por data de fundação oficial)
1915 - MÉDIATHÈQUE DE LA DÉFENSE ECPAD (Ivry)
1920 - LIBRARY OF CONGRESS (Washington)
1927 - A
1929 - DEPARTMENT OF FILM AND MEDIA - THE MUSEUM OF MODERN ART- MoMa (New York)
1933 - BRITISH FILM INSTITUTE - BFI (London)
1936 - CINEMATHEQUE FRANCAISE / MUSEE DU CINEMA (Paris)
1942 - ARCHIVO AUDIOVISUAL DE VENEZUELA BIBLIOTECA NACIONAL (Caracas)
1945 - FILMMUSEUM (Amsterdam)
1949 - JUGOSLOVENSKA KINOTEKA (Beograd)
1951 - CINEMATECA URUGUAYA (Montevideo)
1953 - FILMOTECA ESPAÑOLA (Madrid)
1954 - FUNDACION PATRIMONIO FILMICO COLOMBIANO (Bogotá)
5
CADEMY FILM ARCHIVE - CENTER FOR MOTION PICTURE STUDY (Los Angeles AFA)
1929 - ARCHIVO NACIONAL DE LA IMAGEN-SODRE (Montevideo)
1934 - ARHIVA NATIONALA DE FILME - CINEMATECA ROMANA (Bucuresti)
1935 - FILMMUSEUM BERLIN - DEUTSCHE KINEMATHEK (Berlin)
1935 - FONDAZIONE CENTRO SPERIMENTALE DI CINEMATOGRAFIA / CINETECA NAZIONALE (Roma)
1937 - GOSFILMOFOND (Moscow)
1938 - CINEMATHEQUE ROYALE/KONINKLIJK FILMARCHIEF (Bruxelles)
1940 - NARODNI FILMOVY ARCHIV (Praha)
1943 - CINEMATHEQUE SUISSE (Lausanne)
1943 - IRISH FILM INSTITUTE (Dublin)
1944 - CINEMATHEQUE MAROCAINE (Rabat)
1646 - CENTRE NATIONAL DE LA CINEMATOGRAPHIE (Bois d'Arcy)
1947 - FONDAZIONE CINETECA ITALIANA (Milano)
1949 - GEORGE EASTMAN HOUSE (Rochester)
1950 - TAINIOTHIKI TIS ELLADOS (Athinai)
1955 - BUNDESARCHIV-FILMARCHIV (Berlin)
195 - DEUTSCHES FILMINSTITUT - DIF (Direction-Documentation-Information) (Frankfurt)
1955 - FILMOTEKA NARODOWA (Warszawa - Polônia)
176
1956 - CINEMATECA BRASILEIRA (São Paulo)
1957 - CINEMATECA DO MUSEU DE ARTE MODERNA (Rio de Janeiro)
1957 - SUOMEN ELOKUVA-ARKISTO (Helsinki)
1960 - P
1963 - CINEMATEKET - SVENSKA FILMINSTITUTET (Stockholm)
1963 - SLOVENIAN CINEMATHEQUE SLOVENSKA KINOTEKA (Ljubljana)
1966 - FILM AND VIDEO ARCHIVE IMPERIAL WAR MUSEUM (London)
ATECA ARGENTINA (Buenos Aires)
1969 - CINEMATHEQUE AFRICAINE DE OUAGADOUGOU / FESPACO (Ouagadougou)
1970 - KVIKMYNDASAFN ISLANDS (Reykjavik)
1970 - NORTH WEST FILM ARCHIVE (Manchester)
1970 - UCLA FILM AND TELEVISION ARCHIVE (Los Angeles)
1971 - DEUTSCHES FILMMUSEUM (Frankfurt)
1974 - CINETECA NACIONAL (México)
1974 - KINOTEKA NA MAKEDONIJA (Skopje)
1976 - CINEMATECA BOLIVIANA (La Paz)
1976 - CINETECA DEL FRIULI (Gemona)
1978 - EUSKADIKO FILMATEGIA - FILMOTECA VASCA (San Sebastian)
1979 - ARCHIVIO AUDIOVISIVO DEL MOVIMENTO OPERAIO E DEMOCRATICO (Roma)
1979 - CHINESE TAIPEI FILM ARCHIVE (Taipei)
1979 - FILMMUSEUM DÜSSELDORF (Düsseldorf)
1979 - HARVARD FILM ARCHIVE (Cambridge)
ACIFIC FILM ARCHIVE University of California (Berkeley)
1960 - STEVEN SPIELBERG JEWISH FILM ARCHIVE (Jerusalem)
1962 - KOREAN FILM ARCHIVE (Seoul)
1963 - ISRAEL FILM ARCHIVE/JERUSALEM CINEMATHEQUE (Jerusalem)
1963 - LA CINEMATHEQUE QUEBECOISE (Montréal)
1963 - SLOVAK FILM INSTITUTE (Bratislava)
1964 - CINEMATHEQUE DE TOULOUSE (Toulouse)
1964 - CINETECA DEL COMUNE DI BOLOGNA (Bologna)
1964 - OESTERREICHISCHES FILMMUSEUM (Wien)
1967 - FUNDACION CINEM
1981 - THE NEW ZEALAND FILM ARCHIVE / NGA KAITIAKI O NGA TAONGA WHITIAHUA (Wellington)
177
1982 - FILMOTECA DE CATALUNYA - ICIC (Barcelona)
DE CINEMATOGRAFIA) (Valencia)
SKI FILMSKI ARHIV (Ljubljana)
ND AND IMAGE ARCHIVE (Mo)
DA IMAXE (A Coruña)
g)
ATHEQUE (Kobenhavn)
nchen)
wa)
OF MODERN ART, TOKYO (Tokyo)
1984 - NATIONAL FILM AND SOUND ARCHIVE (Canberra)
1985 - IVAC - LA FILMOTECA (INSTITUTO VALENCIANO
1986 - CINEMATHEQUE DE BRETAGNE (Brest)
1986 - INTERNATIONAL CENTRE OF CINEMA (ICC) (Riga)
1987 - FILMOTECA DE ANDALUCIA (Córdoba)
1989 - CENTRE NATIONAL DE L'AUDIOVISUEL (Luxembourg)
1990 - ARHIV REPUBLIKE SLOVENIJE / SLOVEN
1990 - CINEMATHEQUE ONTARIO (Toronto)
1990 - EUROPEAN FOUNDATION JORIS IVENS (Nijmegen)
1990 - NATIONAL CENTER FOR FILM AND VIDEO PRESERVATION (Los Angeles-Washington)
1990 - THE NATIONAL LIBRARY OF NORWAY, RANA DIVISION SOU
1991 - CENTRO GALEGO DE ARTES
1992 - INSTITUT LUMIERE (Lyon)
1993 - HONG KONG FILM ARCHIVE (Hong Kon
1995 - FONDAZIONE FEDERICO FELLINI (Rimini)
1997 - FILMARCHIV AUSTRIA (Wien)
1997 - THE DANISH FILM INSTITUTE ARCHIVE & CINEM
2001 - NORSK FILMINSTITUTT (Oslo)
Sem data no site – Site indisponível:
ARMENIAN NATIONAL CINEMATEQUE (Yerevan)
BIBLIOTHEQUE DU FILM (BIFI) (Paris)
FILMMUSEUM IM MÜNCHNER STADTMUSEUM (Mü
FILMOTECA DE LA UNAM (México)
FILMOTECA DE LIMA / MUSEO DE ARTE (Lima)
LIBRARY AND ARCHIVES OF CANADA (Otta
NATIONAL FILM AND TELEVISION ARCHIVE (London)
NATIONAL FILM CENTER / NATIONAL MUSEUM
NATIONAL SCREEN AND SOUND ARCHIVE OF WALES (Aberystwyth)
SCOTTISH SCREEN ARCHIVE (Glasgow)
178
Anexo III
Uma nova fonte histórica
Paris, 25 de março de 1898
Senhor,
Permita-me chamar a sua atenção para o projeto que você encontrará aqui
ria de despertar seu
de interesse geral a uma coleção de
dos em circunstâncias muito particulares e
res em que me foi permitido apresentá-
comunique, por via do seu jornal ou
qualquer outra, as reflexões, as críticas ou os olhares novos que esse projeto pode
informações
B. M.
a entre as fontes históricas
Acreditávamos, erradamente, que todos os gêneros de documentos
tóricos teriam seus lugares nos Museus e nas
nhos sobre cerâmica,
esculturas e etc., que são recolhidas e classificadas, a fotografia, por exemplo, não
erdade, os documentos que ela oferece
rica relevante, e sobretudo, é documento
exposto, cuja execução já está preparada e pelo qual gosta
interesse. Trata-se de definir um destino
documentos cinematográficos recolhi
que despertaram grande interesse nos luga
los.
Eu lhe serei muito grato caso me
lhe sugerir, e me coloco à sua disposição para todas as
complementares que você possa desejar.
O lugar da fotografia animad
figurativos que se tornassem his
Bibliotecas. Colocada ao lado de selos, medalhas, dese
tem seu departamento específico. Na v
raramente têm uma informação histó
demais! Enquanto isso, um dia ou outro classifica-se em série os retratos dos
179
homens que agiram de forma marcante na vida de seus tempos. Mas isso não será
esde agora a questão já é de
das esferas oficiais, foi aprovada a idéia de
ráfico.
eu começo, esta coleção ganharia uma
dos fotógrafos
plesmente de diversão ou fantasistas, além
e de entrechos de vida divertida,
dável para o estudo do passado;
ela trará a visão direta, ela suprimirá, ao menos para
certos pontos que têm sua importância, a necessidade de investigação e de estudo.
rá se tornar um método de ensino singularmente
dos à juventude,
um dia poderemos chegar a ter numa sala de aula, em um quadro preciso e em
s ou menos importantes de uma assembléia em
stado próximos de selar alianças, um
deslocamento de tropas ou de esquadras ou mesmo a fisionomia inconstante e
cessário que se passe um longo tempo antes que
e para o ensino de História. É preciso de
imediato armazenar a história pitoresca e exterior, para a empregar mais tarde, sob
e espírito: é que o fato
pera por ele. Seria preciso que a História
então mais que um retorno em marcha-à-ré, porque d
ir além neste sentido – portanto, dentro
criar em Paris um Museu ou Depósito Cinematog
Obrigatoriamente restrita no s
extensão cada vez maior à medida que a curiosidade
cinematográficos trouxesse cenas sim
das ações e espetáculos de interesse documental
além dos entrechos de vida pública e nacional. De simples passatempo, a fotografia
em movimento se tornará então um método agra
ou, mais ainda, uma vez que
Por outro lado, ela pode
eficaz. Dos textos de vaga descrição oferecidos pelos livros destina
movimento, os aspectos mai
deliberação, o encontro de chefes de e
móvel das cidades. Mas é ne
possamos recorrer a essa fonte auxiliar d
os olhos dos que não a testemunharam.
Uma dificuldade poderia frear por um instante est
histórico se produz nem sempre onde se es
180
se compusesse unicamente de solenidades preparadas e que se organizassem
reviamente, prontas a posar diante da objetiva. São os inícios de ação,
fatos inesperados que se escondem do registro do
fotográfico... como, de resto, escapam às informações.
quer gênero de informação, científica ou histórica. Mesmo a relações orais e os
docum
or natureza. À espreita em todas as suas
es, seu instinto o fará adivinhar freqüentemente onde se passarão os fatos
ue se transformarão em causas históricas. É provável que seja mais comum ter
r sua timidez. Em
pouco
p
movimentos iniciais, e os
aparelho
Sem dúvida os efeitos históricos são sempre mais fáceis de serem registrados
que as causas. Mas as coisas se esclarecem umas pelas outras; estes efeitos,
expostos no grande dia da cinematografia, jogarão nos espíritos vislumbres muito
vivos sobre as causas guardadas na sua penumbra. E se apoderar não de tudo que o
for, mas de tudo que puder ser apanhado, esse será já um excelente resultado para
qual
entos escritos não nos esclarecem totalmente a ordem dos fatos com que se
relacionam, e mesmo assim a História existe, apesar de tudo verdadeira em suas
linhas gerais, mesmo que seus detalhes sejam freqüentemente falsos. Além disso, o
fotógrafo cinematográfico é indiscreto p
ocasiõ
q
que limitar seus excessos de zelo do que, ocasionalmente, deplora
tempo, a curiosidade do espírito humano e o incentivo do lucro, reunidos, o
deixarão inventivo e ousado. Autorizado em circunstâncias um pouco solenes, ele
se misturará sem autorização entre os outros, e saberá quase sempre encontrar as
ocasiões e lugares onde se elabora a história do amanhã. Um movimento popular
ou uma revolta se iniciando não o amedrontarão, e mesmo numa guerra se pode
imaginá-lo apontando sua objetiva para as mesmas muralhas que os fuzis do mais
forte e surpreendendo ao menos um pedaço da batalha. Por todos os cantos onde
181
reluzir um raio de sol, ele passará carregando ela...Se, para o Primeiro Império e
para a Revolução por exemplo, nós tivéssemos somente a reprodução das cenas que
a fotografia animada pode facilmente render à vida, quantos mares de tinta inútil
poderiam ter sido guardados para questões complementares talvez mais
interes
calor e
ue só a ela é possível. Ela é por excelência
a teste
santes, apaixonantes mesmo!
Portanto, a prova cinematográfica, onde uma cena se compõe de mil
quadros, e que, repassada entre um foco luminoso e uma tela branca, faz se
apresentarem e andarem os mortos e os ausentes, essa simples fita de celulóide
impresso constitui não somente um documento histórico, mas uma parcela da
história, e de história que não desapareceu, que não precisa de um gênio para a
ressuscitar. Ela está lá recolhida e, como a esses organismos elementares que,
vivendo de uma maneira latente, se reanimam depois de anos sob um pouco de
de umidade, não lhe é preciso, para acordar e viver novamente as horas do
passado, mais do que um pouco de luz atravessando uma lente em meio à
escuridão!
Característica particular do documento cinematográfico
O cinematógrafo talvez não dê a história integral, mas traz ao menos aquilo
que num livro é incontestável e de uma absoluta verdade. A fotografia ordinária
admite o retoque que pode chegar até à transformação. Mas tentem então retocar,
de maneira idêntica para cada figura, estes mil e doze centenas de quadros quase
microscópicos...! Pode-se dizer que a fotografia animada tem um caráter de
autenticidade, de exatidão, de precisão, q
munha ocular verídica e infalível. Ela pode controlar a tradição oral e, se os
testemunhos humanos se contradizem sobre um fato, colocá-los de acordo
182
silenciando aquele que ela desmente. Suponham uma manobra militar ou naval, na
qual o cinematógrafo registrou as fases, uma discussão começada; ela será
terminada rapidamente... Ele pode dar com uma exatidão matemática as distâncias
os pontos das cenas que ele registra. Na maioria das vezes ele mostra através de
indícios bem claros a hora do dia, a época, as condições climáticas nas quais o fato
se produziu. Mesmo o que escapa aos olhos, o progresso imperceptível das coisas
em movimento, a objetiva o surpreende, desde seu início perdido no horizonte até
o ponto mais próximo em primeiro plano na tela, Em suma, seria desejável que os
outros documentos históricos tivessem todos este mesmo grau de certeza e de
evidência.
Constituição do Depósito de Cinematografia Histórica
Trata-se de dar a esta fonte talvez privilegiada da História a mesma
autoridade, a mesma existência oficial, o mesmo acesso dado aos outros arquivos já
conhecidos. Isto faz parte das mais altas esferas do estado, e os caminhos e meios
não parecem, de resto, muito difíceis de serem encontrados. Bastará garantir às
provas cinematográficas que tiverem uma característica histórica uma seção de
Museu, uma área de Biblioteca, uma área dos Arquivos. O depósito oficial será
instalado junto à Biblioteca Nacional, ou à do Instituto, sob a guarda de uma das
Academias que se ocupam da História, ou nos Arquivos, ou ainda no Museu de
Versalhes. Ainda se irá escolher e decidir. Uma vez a fundação criada, as remessas
gratuitas ou mesmo interessadas não pararão de chegar. O preço do aparelho de
recepção cinematográfica à base de rolos peliculares, bastante elevado nos
primeiros dias, diminui rapidamente e tende a cair até as possibilidades dos
simples amadores de fotografia. Vários entre eles, sem contar os profissionais,
183
começam a se interessar pela aplicação cinematográfica desta arte e não querem
nada mais que contribuir para constituir a História. Os que não trouxerem sua
coleção poderão ser voluntários para cuidar do legado. Um comitê competente
receberá ou afastará os documentos oferecidos, após apreciar seu valor histórico.
Os rolos negativos que forem aceitos serão selados dentro de estojos, etiquetados,
catalog
o ou tarde. Eu gostaria de contribuir para o enriquecimento desta em
em cena.
ados; serão os tipos nos quais não se tocará. O mesmo comitê decidirá as
condições nas quais os positivos serão disponibilizados e colocará em reserva os
que, por razões de conveniência particular, só poderão ser liberados ao público
após uma certa temporada de comercialização. Será feito o mesmo para certos
arquivos. Um conservador do estabelecimento escolhido tomará conta desta nova
coleção pouco numerosa a princípio, e uma instituição de futuro será fundada.
Paris terá o seu Depósito de Cinematografia Histórica.
Primeiras bases da Fundação imaginada
É uma criação que se impõe e será feita em qualquer grande cidade da
Europa ced
que fui tão bem acolhido. E aqui eu peço para entrar modestamente
Fotógrafo do Imperador da Rússia, eu pude, sob a ordem expressa do
próprio imperador, registrar ao olhar do cinematógrafo, entre outras situações
curiosas, as cenas importantes e os incidentes familiares da visita a Petersburgo do
Presidente da República Francesa, em setembro de 1897.
Estes rolos que uma iniciativa vinda tão do alto me havia permitido registrar
foram projetados diante dos seus olhos; em seguida, pude, dentro de uma série de
apresentações consecutivas, oferecer o mesmo espetáculo aos soldados das
casernas de Paris. Fiquei surpreso e encantado pelo efeito produzido sobre estes
184
espíritos simples, com os quais eu tivera a chance de descobrir , com esta realmente
genuína manifestação nacional que é esta organização de solenidades tão novas
para eles, a fisionomia de um povo e de um país estrangeiros.
Eu proponho esta primeira série, até banal, de rolos cinematográficos como
base para o estabelecimento do novo Museu. Fico muito feliz por ter convencido
pessoas de considerável autoridade, e, com este apoio, possivelmente logo terei
visto serem fundados em Paris estes arquivos de um novo gênero.
Já expus por que prevejo para eles um desenvolvimento fácil e rápido. Eu
mesmo contribuirei para isto. Além das cenas que mencionei, tenho já da minha
parte várias outras a oferecer, relativas à coroação de Sua Majestade Nicolau II, às
leu da Rainha da
Inglate
viagens pela Rússia de dois outros imperadores e ao Jubi
rra. Nos últimos tempos, pude registrar em Paris alguns eventos bastante
imprevistos e empolgantes. Eu me proponho a recolher pela Europa e enviar ao
futuro depósito a reprodução de todas as cenas que me pareçam apresentar um
interesse histórico.
Meu exemplo será imitado... se vocês realmente quiserem encorajar esta
idéia nova mas tão simples, sugerindo a outros que a complementem, e sobretudo
dando a ela toda divulgação que for necessária para que ela seja viva e fecunda.
Boleslav Matuszewski
176
http://www.contracampo.he.com.br/34, ativo em 03/03/2004.
176
Tradução de Daniel Caetano. Fonte: Revista Contracampo nº. 34, in:
185
Anexo IV
Nos Estados Unidos acaba de ser criado um Museu Cinematográfico, destinado
apenas a guardar filmes.
Quando o professor Agache, encarregado pela Prefeitura de remodelar a nossa
capital, quis estabelecer seus planos, além da visita de
Cinematecas - Adhemar Gonzaga
Se, entre nós, aludisse alguém à possibilidade de coisa semelhante, a proposição
seria recebida por entre gargalhadas, e o autor necessariamente receberia a
consagração de maluco, pelo menos.
talhada à cidade, cuidou de
s, à cata de fotografias, gravuras,
planta
Essa contribuição dos estabelecimentos destinados à guarda das memórias urbanas
foi considerada de tal valia que inúmeros documentos foram logo copiados para os
estudos do artista.
O tem
percorrer nossos arquivos, museus, biblioteca
s, desenhos, pelos quais pudesse fazer juízo perfeito sobres as
transformações sofridas pelo Rio de Janeiro, nestes cento e poucos anos de capital
do país.
po varre da memória humana a recordação do que se foi, os museus e
arquivos constituindo-se os depositários das tradições que carecem ser
conservadas.
186
Os livros de Debret, Rugendas, Chamberlain, as litografias de Moreau e outros,
fazem reviver para nós o velho Rio de Janeiro de nossos avós.
A fotografia facilitou e multiplicou as facilidades dessa documentação. A
cinematografia ampliou ainda mais o campo, permitindo fixar uma época com
todas as suas características.
grando ao filme-
docum
Na França, guardam-se preciosamente não só os filmes da atualidade, mas ainda as
reconstituições históricas, laboriosa e conscienciosamente feitas, consideradas boas
pela Comissão de Belas-Artes.
grafia animada merece especial consideração de nossa parte.
Nós po
As cavalhadas, os reisados, as congadas são tradições brasileiras que se esvaem,
relegadas já para o alto sertão, pelo avanço vitorioso dos nossos hábitos que o
progresso vai impondo.
automóvel, perlustrando estradas de rodagem na região nordestina, parece que
matou o bumba-meu-boi. Tive ocasião de ver, em tempos não muitos remotos, um
Por isso mesmo, o cuidado que povos mais adiantados estão consa
ento, destinando-os aos museus onde se conservarão a serviço das gerações
vindouras, permitindo-lhes ter a idéia da vida contemporânea, da época da
invenção da cinematografia, em seus mínimos detalhes.
Esse aspecto da foto
ssuímos ainda certas tradições, aspectos pitorescos da vida, principalmente
do nosso interior, que vão desaparecendo aos poucos.
O
congado em Ouro Preto e cavalhadas na cidade de Viçosa. Creio mesmo que
187
cavalhadas, não há muitos anos, corriam-se em São Gonçalo, às barbas desta
capital.
Ora, são justamente esses aspectos fugitivos de uma época que a cinematografia
pode fixar para sempre, e para sempre os museus conservam.
o se cuida com carinhoso empenho. Nós ficamos
indiferentes, mesmo à parte prática da cinematografia, aquela que diz respeito à
propaganda que devemos entreter, para não sermos alvos das constantes
apreciações injustas e malévolas com que nos mimoseiam os outros países, para os
quais não passamos de terra semi-selvagem, apreciável apenas como sofrível
Não fosse a exigüidade de verbas de que dispõe o nosso Museu Nacional, ele
poderia começar a coleção de filmes documentários que conservassem a expressão
da época presente.
uita pretensão de nossa parte chamar a atenção do Ministério da
Agricultura, do qual depende aquela repartição, para esse assunto?
Em outros países, diss
entreposto comercial.
Seria m
Cinearte – 6 de fevereiro de 1929
177
.
177
Fonte: Revista Contracampo nº. 34, in: http://www.contracampo.he.com.br/34, ativo em
03/03/2004.
188
Anexo V
Para meus amigos e colegas - Martin Scorsese
o significa nada!
Todo nosso trabalho extenuante e nosso esforço criativo não valem nada
porque nossos filmes estão desaparecendo. Não estou me referindo ao terrível
problema com o qual muitos já estão familiarizados, mas a algo mais imediata, (a
descoloração). Desde há alguns anos a descoloração do filme atingiu seu ponto
crítico. Precisamos enfrentá-la agora; ela não pode ser ignorada por mais tempo.
nte. Precisamos agir agora, ou os filmes que estamos
fazendo na década de 80 sofrerão a mesma destruição indiscriminada que atingiu
os filmes feitos nos últimos quarenta anos. Continuar trabalhando com um filme
virgem que seguramente deteriora em questão de meses é insultante e selvagem.
Não temos outra escolha senão agir para combater essa situação que é
diatos e escandalosos importam mais do que a qualidade
do produto. Enquanto for conveniente para seus interesses, a Eastman Kodak -
através de seu monopólio nos Estados Unidos e em muitas outras partes do mundo
– continuará responsável pela destruição de nosso trabalho passado e presente. Ela
Assunto: Nossos filmes
Tudo que estamos fazendo nã
Todo apoio na divulgação das preocupações com este problema é altamente
louvável, mas não é mais o suficiente. A simples consciência do fato de o filme
colorido desbotar não é o basta
absolutamente intolerável.
A Eastman Kodak nada fará para resolver o problema, simplesmente porque
os lucros financeiros ime
189
nos burla e será responsável pela deturpação proposital da futura história do
cinema.
Precisamos agir para acelerar e encontrar a solução para a estabilidade e a
permanência da cor nos filmes, solução que pode e deve ser encontrada nesta
década. Os cientistas e pesquisadores que trabalham independentemente neste
dade cinematográfica pode agir coletivamente, gerando
publicidade e levantando dinheiro. Não só procuraremos atrair recursos de
instituições privadas e governamentais como, de nossas posições na indústria,
poderemos angariar o apoio e os recursos de produtores e dos próprios fabricantes
de película.
r, insistiríamos
na inclusão de cláusulas em nossos contratos exigindo a feitura de um negativo
branco e preto separado em três suportes como forma de nos garantir contra a
instabilidade da cor do filme virgem e também a feitura de uma cópia ("answer
print") desse negativo, de forma a assegurar um registro correto. Mas ficaria claro
que os negativos em três suportes são um meio temporário de preservação porque,
todo teis.
projeto fazem-nos com recursos lamentavelmente inadequados. Esse é o único
obstáculo para a descoberta da solução técnica para o problema. Com nossa ajuda
esse obstáculo pode ser removido.
Se nos unirmos, organizarmos e agirmos energicamente teremos maneiras
eficazes de atacar o problema. Uma organização de fotógrafos, diretores e outros
membros da comuni
Nós, membros e defensores dessa organização contribuiríamos anualmente
para um fundo de pesquisa e desenvolvimento da tecnologia da co
se não armazenados convenientemente, um negativo pode encolher, tornando
s os três inú
190
A solução de preservação mais prática e econômica é o desenvolvimento de
um FILME COLORIDO ESTÁVEL. Assim, se vocês prezam seu trabalho e o futuro
dele, empreste-nos seu nome e seu apoio. Em anexo está uma carta para a Eastman
Kodak, solicitando uma ação imediata para melhorar a deplorável condição do
os fornece. Como primeiro passo, por favor junte-
se a nós no abaixo assinado.
Se você tem perguntas, idéias, preocupações ou sugestões não hesite em
Unidos teremos força para encontrar a solução.
Martin Scorsese
filme colorido que ela fabrica e n
escrever para Martin Scorcese, a/c Charteff Winkler Productions 110 West 57
Street, New York, N.Y., 10019.
Saudações,
À Eastman Kodak
O problema da descoloração do filme atingiu seu ponto crítico e não pode
mais ser ignorado. A instabilidade da película colorida Kodak está causando um
dano irreparável a nossos filmes. Os filmes que fizemos no passado estão
deteriorando drasticamente ou definitivamente perdidos. Devemos encontrar a
191
solução para este problema, não só para eliminar essa ameaça aos filmes que
estamos fazendo agora, mas para salvar os feitos no passado e que ainda podem ser
salvos
umentou enormemente com o correr dos anos,
nada f
lcançar a solução que precisa ser encontrada nessa década. Se o
proble
.
Sendo a Eastman Kodak a única grande fabricante de filme colorido do
mundo e a principal fonte de película cinematográfica, essa companhia deve ser
considerada responsável pelo defeito da instabilidade da cor inerente ao filme
virgem.
Enquanto o preço do filme a
oi ou está sendo feito para resolver o problema da descoloração do filme.
Essa falha está destruindo o nosso trabalho.
Nós, abaixo assinados, estamos unidos em nossa determinação de encontrar
e estimular a solução para o problema. Sentimos que é do interesse da Eastman
Kodak não apenas reconhecer a severidade do problema como, mais importante,
compreender e aceitar que uma ação concreta deve ser empreendida agora para
acelerar e a
ma não for sanado, pretendemos usar métodos de produção alternativos que
estão atualmente sendo explorados e cogitados.
Tendo em vista o exposto acreditamos que a Eastman Kodak deve
reconhecer sua responsabilidade frente às pessoas que serve e precisa assumir o
principal papel na pesquisa e no desenvolvimento da película colorida estável.
Pedimos e esperamos sua inteira colaboração neste assunto e rogamos sua ação
imediata. Por favor, não subestimem o poder coletivo que temos nas áreas da
propaganda, na conquista de apoio e participação dos produtores e distribuidores
192
cinem
a Eastman Kodak responderá positivamente e nos
apoiar
Martin Scorsese
178
atográficos e, se necessário, no encontro de um fornecedor alternativo de
filme virgem.
Nossa preocupação é tal que pretendemos usar todos os meios à nossa
disposição para encontrar a solução para o problema que ameaça nosso trabalho.
Sabemos que a solução existe e sentimos que a sua descoberta está atrasada. Daí
esta petição. Confiamos que
á. É tanto de seu interesse fazê-lo como é do nosso que o faça.
178
Fonte: Revista Contracampo nº. 34, in: http://www.contracampo.he.com.br/34, ativo em
03/03/2004.
193
Anexo VI
Recomendação sobre a salvaguarda e a
conservação das imagens em movimento
das pela Divisão do Patrimônio Cultural da UNESCO, com a participação
de per
as
cinem dos Arquivos de Filme) e os
produ
reunião,
expressão, particularmente características da sociedade atual, e nas quais se
A Assembléia Geral da UNESCO, reunida em Belgrado em outubro de 1980,
aprovou a redação final deste texto, resultado de inúmeras reuniões de consulta
organiza
itos indicados pelas instituições internacionais diretamente envolvidas com o
problema da conservação das imagens em movimento, em particular
atecas (através da Federação Internacional
tores (através da Federação Internacional dos Produtores Cinematográficos).
Os Estados membros da UNESCO são chamados, através desta
Recomendação, a criar condições técnicas e econômicas para que o patrimônio
cultural cinematográfico seja preservado para as gerações futuras.
A Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência
e a Cultura, reunida em Belgrado de 23 de setembro a 28 de outubro, em sua 21a
Considerando que as imagens em movimento são uma expressão da identidade
cultural dos povos e que, devido a seu valor educativo, cultural, científico e
histórico, formam parte integrante do patrimônio cultural de uma nação,
Considerando que as imagens em movimento constituem novas formas de
194
manifesta uma parte importante e cada vez maior da cultura contemporânea,
Considerando que as imagens em movimento constituem também uma forma
fundam
do mundo,
bservando ainda que, ao difundir conhecimentos e cultura em todo o mundo, as
imagens em movimento contribuem amplamente para a educação e o
enriquecimento de todos os seres humanos, Considerando, entretanto, que
evido às características de seu suporte material e aos diversos métodos de sua
xação, as imagens em movimento são extraordinariamente vulneráveis e devem
ser conservadas em condições técnicas específicas, Observando, ainda, que
muitos elementos do patrimônio constituídos pelas imagens em movimento
esapareceram devido a decomposições, a acidentes ou a uma eliminação
injustificada, o que constitui um empobrecimento irreversível deste patrimônio,
Reconhecendo os resultados obtidos graças aos esforços das instituições
specializadas para salvar as imagens em movimento dos perigos aos quais estão
xpostas, Considerando a necessidade de que cada Estado tome medidas
adequadas destinadas a garantir a salvaguarda e a conservação para a posteridade
desta parte particularmente frágil de seu patrimônio cultural, do mesmo modo que
e salvaguardam e conservam outras formas do patrimônio cultural como fonte de
enriquecimento para as gerações presentes e futuras, Considerando, ao mesmo
ental de registrar a sucessão dos acontecimentos e, como tal, são
testemunhos importantes e muitas vezes únicos de uma nova dimensão de história,
modo de vida e cultura dos povos e da evolução do universo, Observando que as
imagens em movimento têm um papel cada vez mais importante como meio de
comunicação e compreensão mútua entre todos os povos
O
d
fi
d
e
e
s
tempo, que as medidas adequadas destinadas a garantir a salvaguarda e a
195
conservação das imagens em movimento deveriam levar devidamente em conta a
liberdade de opinião, expressão e informação, reconhecidas como parte essencial
dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, e a necessidade de reforçar a
paz e a cooperação internacional, assim como respeitar a posição legítima de todos
os det
mais
m que, devido à
crescente cooperação internacional, as imagens em movimento importadas
lar aqueles anteriormente colonizados, estão registrados em forma de
imagens em movimento que nem sempre são acessíveis para os países
entores de direitos que participem na produção das imagens em movimento,
incluindo especialmente os direitos de autor e direitos afins, Reconhecendo
também os direitos dos Estados para adotar medidas adequadas para a salvaguarda
e conservação das imagens em movimento, tendo em conta as obrigações que lhes
são impostas pelo direito internacional, Considerando que as imagens em
movimento criadas pelos povos de todo o mundo fazem parte do patrimônio da
humanidade em seu conjunto e que, por conseguinte, deveria ser promovida uma
estreita cooperação internacional para salvaguardar e conservar estes
testemunhos insubstituíveis da atividade humana, em particular em benefício dos
países que dispõem de recursos limitados, Considerando també
desempenham um importante papel na vida cultural da maioria dos países,
Considerando que importantes aspectos da história e cultura de alguns países,
em particu
interessados, Tomando nota que a Conferência Geral já aprovou vários
instrumentos internacionais relativos à proteção dos bens culturais móveis, em
particular a Convenção para a proteção dos bens culturais em caso de conflito
armado (1954), a Recomendação sobre as medidas encaminhadas para proibir e
impedir a exportação, a importação e a transferência de propriedades ilícitas de
196
bens culturais (1964), a Convenção sobre as medidas que devem adotar-se para
proibir e impedir a importação, a exportação e a transferência de propriedades
ilícitas de bens culturais (1970), a Recomendação sobre o intercâmbio
internacional de bens cultural (1976) e a Recomendação sobre a proteção dos bens
culturais móveis (1978), Desejando complementar e ampliar a aplicação das
normas e princípios estabelecidos nessas convenções e recomendações,
Tendo presente as disposições da Convenção universal sobre direito de autor, do
Convênio de Berna para a proteção das obras literárias e artísticas e do Convênio
para a proteção dos artistas intérpretes ou executantes, os produtores de
fonogramas e os organismos de radiodifusão, Havendo examinado as propostas
relativas à salvaguarda e à conservação das imagens em movimento,Havendo
decidido, em sua 20a reunião, que este tema seria objeto de uma recomendação
dirigida aos Estados membros, Aprova, no dia de hoje, a presente recomendação.
III. Medidas Recomendadas
IV. Cooperação Internacional
I. Definições
II. Pricípios Gerais
A Conferência Geral recomenda aos Estados membros que apliquem as
seguintes posições, adotando as medidas legislativas ou de outra natureza que
sejam necessárias, de conformidade com o sistema constitucional ou a prática de
cada Estado, para aplicar em seu território os princípios e normas formulados
nesta Recomendação.
197
A Conferência Geral recomenda aos Estados membros que dêem conhecimento
desta Recomendação às autoridades e serviços competentes.
A Conferência Geral recomenda aos Estados membros que informem, nas datas
e nas formas que se determinarem, das medidas que tenham tomado para aplicar
esta Recomendação.
I. Definições
1. Para os efeitos desta Recomendação:
I. produções cinematográficas (como filmes de
longa metragem, curta metragem, filmes de
divulgação científica, documentários e
a. Será entendido por “imagens em movimento” qualquer série de
imagens captadas e fixadas em um suporte (independente do
método de captação das mesmas e da natureza do dito suporte -
por exemplo, filmes, fitas, discos, etc. - utilizado inicial e
ulteriormente para fixa-las) com ou sem acompanhamento sonoro
que, ao serem projetadas, dão uma impressão de movimento e
estão destinadas à comunicação ou distribuição ao público ou se
produzam com fins de documentação; considera-se que
compreendem, entre outros, elementos das seguintes categorias:
198
atualidades, desenhos animados e filmes
educativos);
II. produções televisivas, realizadas por ou para as
organizações emissoras;
III. produções videográficas (como as contidas nos
videogramas) que não sejam as mencionadas em
I. e II.
b. Será entendido por “elementos de copiagem” o suporte material
das imagens em movimento, constituído no caso de um filme
cinematográfico por um negativo, ou internegativo ou um
interpositivo, e no caso de um videograma por um original,
destinando-se esses elementos de copiagem à obtenção de cópias.
c. Será entendido por “cópia de projeção” o suporte material das
m movimento propriamente destinado à visão e/ou à
imagens.
2. P ra ão, será entendido por “produção nacional”
as imagens em movimento cujo produtor, ou pelo menos um dos co-produtores,
tenha seu domicílio social ou sua residência habitual no território do Estado de que
se trata.
II. Princípios gerais
3. Todas as imagens em movimento de produção nacional deveriam ser
consideradas pelos Estados membros como parte integrante de seu “patrimônio de
imagens e
comunicação das
a os fins da presente Recomend
199
im
estrangeira podem também formar parte do patrimônio nacional do ponto de vista
cultural ou histórico do dito país. Caso não seja possível, po
agens em movimento”. As imagens em movimento de produção original
r motivos técnicos ou
nanceiros, a transmissão da totalidade deste patrimônio às gerações futuras, se
es interessados, com objetivo de formular e aplicar uma
política ativa com esse fim.
er tomadas as medidas apropriadas para que o patrimônio
to tenha uma proteção física apropriada
contra a deterioração causada pelo tempo e pelo meio ambiente. Como as más
condições de armazenamento aceleram a deterioração à qual estão constantemente
expostos os suportes materiais e podem ocasionar inclusive sua destruição total, as
imagens em movimento deveriam ser conservadas em arquivos de filmes e de
televisão oficialmente reconhecidos e serem processadas de conformidade com as
melhores normas de arquivo. Por outro lado, deveriam ser realizadas investigações
encaminhadas especificamente para a elaboração de suportes materiais de alta
qualidade e permanentes, para a adequada salvaguarda e conservação das imagens
em movimento.
5. Deveriam ser tomadas medidas para impedir a perda, a eliminação injustificada
ou a deterioração de quaisquer dos elementos que integram a produção nacional.
Por conseguinte, em ra que os
elementos de copiag gens em
fi
deveria salvaguardar e conservar a maior parte possível dele. Deveriam ser
tomadas as medidas necessárias para coordenar a atividade de todos os organismos
públicos e particular
4. Deveriam s
constituído pelas imagens em movimen
cada país, deveriam ser encontrados meios pa
em ou as cópias com qualidade de arquivos das ima
200
movimento possam rdadas e
conservadas em instituições públicas ou privadas de caráter não lucrativo.
6. Deveria s ac e fontes de
informação que ns em movimento incorporadas,
salvaguardad co caráter não
lucrativo. A utilizaçã gítimos nem
os interesses daqueles que intervêm em sua produção e exploração, segundo o
estipulado na Convenção universal sobre o direito de autor, no Convênio de Berna
para a proteção das obras literárias e artísticas e na Convenção internacional sobre
a proteção dos artistas intérpretes ou executantes, os produtores de fonogramas e
os organismos de radiodifusão e na legislação nacional.
7. Para levar a cabo com êxito um programa de salvaguarda e conservação
verdadeiramente eficaz, se deveria solicitar a cooperação de todos os que
intervenham na produção, distribuição, salvaguarda e conservação das imagens em
movimento. Portanto, deveriam ser organizadas atividades de informação pública
com objetivo de inculcar nos círculos profissionais interessados uma visão geral da
II. Medidas recomendadas
os princípios antes expostos e de acordo com a sua prática
ser sistematicamente incorporadas, salvagua
er f ilitado o acesso mais amplo possível às obras
representam as image
as e nservadas por instituições públicas ou privadas de
o destas obras não deveria prejudicar os direitos le
importância das imagens em movimento para o patrimônio nacional e a
conseqüente necessidade de salvaguarda-las e conservá-las como testemunhos da
vida da sociedade contemporânea.
I
8. De conformidade com
constitucional habitual, os Estados membros ficam convidados a tomar as medidas
necessárias, inclusive a concessão aos arquivos oficialmente reconhecidos dos
201
recursos necessários no que se refere a pessoal, material, equipamento e fundos
para salvaguardar e conservar efetivamente seu patrimônio constituído por
imagens em movimento, de acordo com as seguintes diretrizes.
A Medidas jurídicas e administrativas
9. Para conseguir que as imagens em movimento que formam parte do patrimônio
cultural dos países sejam sistematicamente conservadas, os Estados membros
ficam convidados a adotar medidas em virtude das quais as instituições de arquivos
stas intérpretes ou executantes, os produtores de fonogramas e os
oficialmente reconhecidas possam obter, para sua salvaguarda e conservação, uma
parte ou a totalidade da produção de seu país. Tais medidas poderiam incluir, por
exemplo, acordos voluntários com os detentores de direitos para depósito das
imagens em movimento, obtenção das imagens em movimento através de compra
ou doação, ou a criação de sistemas de depósito legal através de medidas
legislativas ou administrativas apropriadas. Tais medidas complementariam e
coexistiriam com os atuais acordos referentes às imagens em movimento de
propriedade pública. As medidas que se tomarem com este fim deverão ser
compatíveis com as disposições da legislação nacional e com os instrumentos
internacionais sobre a proteção dos direitos humanos, o direito de autor e a
proteção dos arti
organismos de radiodifusão, relativas às imagens em movimento, e deveriam levar
em conta as condições especiais existentes nos países em vias de desenvolvimento
com referência a alguns destes instrumentos. No caso de adoção de sistemas de
depósito legal, estes deveriam estipular que:
202
a. as imagens em movimento da produção nacional,
independentemente de quais sejam as características materiais
eiro;
ito o mais cedo possível, dentro de um
prazo máximo estipulado por regulamento nacional;
ria ter acesso controlado ao material
de seu suporte ou da finalidade para a qual hajam sido criadas,
deveriam ser depositadas através de pelo menos uma cópia
completa, da mais alta qualidade técnica, acompanhada
preferencialmente por elementos de copiagem;
b. o material deveria ser depositado pelo produtor - tal como
definido pela legislação nacional - que tenha a sua sede
profissional ou residência habitual no território do Estado
concernente, independentemente de qualquer acordo de co-
produção estabelecido com produtor estrang
c. o material depositado deveria ser conservado em arquivo de
filmes ou televisão oficialmente reconhecido; onde estes
arquivos não existem, deveriam ser feitos todos os esforços para
cria-los em um nível nacional e/ou regional; enquanto arquivos
oficialmente reconhecidos não sejam criados, o material deveria
conservar-se provisoriamente em locais apropriadamente
equipados;
d. o depósito deveria sr fe
e. o depositante deve
depositado cada vez que necessitasse efetuar novas cópias, na
condição de que tal acesso não causasse dano ao material;
203
f. conforme o disposto nos convênios internacionais e na
legislação nacional em matéria de direitos de autor e do que se
estipula para a proteção dos intérpretes, produtores de
fonogramas e organizações de radiodifusão, os arquivos
m ser autorizados a: oficialmente reconhecidos deveria
I. tomar todas as medidas necessárias para
salvaguardar e conservar o patrimônio de
imagens em movimento e, onde seja possível,
melhorar sua qualidade técnica; quando se
procede à reprodução das imagens em
movimento deveriam ser levados em conta todos
os direitos aplicáveis às obras em questão;
II. proceder à exibição, em suas dependências, de
uma cópia de projeção, em caráter não lucrativo,
por um número limitado de assistentes, com
finalidades didáticas, de estudo ou de pesquisa,
sob condição de que tal uso não entre em conflito
com a exploração normal da obra e sempre que
não haja risco de dano ao material depositado;
g. o material depositado e as cópias que sejam tiradas a partir dele
não deveriam ser utilizadas para qualquer outra finalidade nem
deveria ser modificado seu conteúdo;
204
h. os arquivos oficialmente reconhecidos deveriam ser autorizados
a solicitar aos usuários que contribuam de maneira razoável para
sufragar os custos dos serviços prestados.
10. A salvaguarda e conservação de todas as imagens em movimento da produção
nacional deveria ser considerada como principal finalidade. Entretanto, enquanto o
progresso da tecnologia não encontra soluções que o permitam em todas as partes,
naqueles casos onde não seja possível, por razões de custo ou de espaço, gravar a
totalidade das imagens em movimento difundidas publicamente ou salvaguardar e
conservar a longo prazo todo o material depositado, convida-se cada Estado
membro a estabelecer os princípios que determinem quais imagens devem ser
gravadas e/ou depositadas para a posteridade, incluindo as “gravações efêmeras”
que tenham um excepcional caráter documental. As imagens em movimento que,
por seu valor educacional, cultural, artístico científico e histórico formam parte do
patrimônio cultural de uma nação deveriam ser conservadas em caráter prioritário.
Todo sistema que se estabeleça com este fim deve prever que a seleção deve ser
baseada no mais amplo consenso possível de pessoas competentes e, com
particular referência, os critérios de avaliação estabelecidos pelos arquivistas
profissionais. Além disso, se cuidará para evitar a eliminação de material até que
tenha transcorrido tempo suficiente para permitir uma correta avaliação. O
material assim eliminado deveria ser devolvido ao depositante.
11. Os produtores estrangeiros e aqueles responsáveis pela distribuição pública de
imagens em movimento produzidas no estrangeiro deveriam ser encorajados de
acordo com o espírito desta Recomendação e sem prejuízo da livre circulação das
205
imagens em movimento através das fronteiras nacionais, a depositar
voluntariam s são
publicamen ens
em movim r se
deverá insi em movimento
dubladas ou end licamente
distribuídas, que tais imagens em movimento são consideradas como parte do
patrimônio do país ara fins de
pesquisa ou ensino spírito de
cooperação internac iam tratar
de estabelecer tais s salvando os
direitos concernentes, cópias de imagens em movimento de excepcional valor
universal, me o q no país em
questão. O controle disposições
do parágrafo 9, e., f.
12. Os Estados mem eficácia das
medidas propostas n do de prova,
a forma sugerida d a adequada
salvaguarda e conse que sejam, de
particu i tado,
caberá ao e sua
legislação ser adotadas para impedir o
desaparecimento, particularmente através da destruição, de cópias de imagens em
ente nos arquivos oficialmente reconhecidos dos países nos quai
te distribuídas, uma cópia da mais alta qualidade técnica das imag
ento, ressalvando-se todos os direitos concernentes. Em particula
stir junto aos responsáveis pela distribuição de imagens
leg adas no idioma ou idiomas do país onde são pub
em questão e que possuem um valor importante p
e portanto devem ser depositadas, dentro do e
ional. Os arquivos oficialmente reconhecidos dever
istemas de depósitos e, além disso, incorporar, res
sm ue não tenham sido distribuídas publicamente
e acesso a tal material deveriam estar regidos pelas
, g. e h., anteriormente referido.
bros ficam convidados a prosseguir no estudo da
o parágrafo 11. No caso de, após um razoável perío
e depósito voluntário não conseguir assegurar
rvação das imagens em movimento, adaptadas
lar mportância, do ponto de vista da cultura e da história de um Es
Estado em questão determinar, de acordo com as disposições d
nacional, as medidas que deveriam
206
movim o
direitos sobre estas imagens em movimento de importância nacional especial.
13. Os Estados membros ficam também convidados a investigar a viabilidade de
permitir - levando em conta as convenções internacionais concernentes aos direitos
de autor e à proteção dos intérpretes, produtores de fonogramas e organizações de
radiodifusão - aos arquivos oficialmente reconhecidos a utilização do material
depositado para investigações e reconhecidas finalidades didáticas, desde que tal
utilização não entre em conflito com a exploração normal das obras.
B. Medidas técnicas
14. Os Estados membros ficam convidados a prestar a devida atenção aos padrões
de arquivo referentes ao armazenamento e tratamento das imagens em movimento,
recomendados pelas organizações internacionais competentes em matéria de
salvaguarda e conservação das imagens em movimento.
15. Além disso, os Estados membros ficam convidados a tomar as disposições
necessárias para que as instituições encarregadas de salvaguardar e conservar o
patrimônio das imagens em movimento adotem as seguintes medidas:
o descrições
ent adaptadas, levando devidamente em conta os legítimos detentores dos
a. estabelecer e facilitar filmografias nacionais e catálogos de todas
as categorias de imagens em movimento, assim com
de suas coleções, procurando, onde for possível, a padronização
dos sistemas de catalogação; tal material de documentação
207
constituiria em seu conjunto um inventário do patrimônio de
imagens em movimento do país;
b. coletar, conservar e tornar disponíveis, com fins de investigação,
registros institucionais, documentos pessoais e outros materiais
que documentam a origem, a produção, a distribuição e a projeção
das imagens em movimento, sob condição de acordo das pessoas
concernentes;
c. manter em boas condições o equipamento, parte do qual talvez já
não se utilize, mas que talvez seja necessário para a reprodução e
projeção do material conservado ou, quando isto não for possível,
assegurar que as imagens em movimento em questão sejam
transferidas para outro suporte material que permita sua
reprodução e projeção;
d. assegurar que sejam rigorosamente aplicadas as normas relativas
ao armazenamento, à salvaguarda, à conservação, à restauração e
à reprodução das imagens em movimento;
e. na medida do possível, melhorar a qualidade técnica das imagens
em movimento a serem salvaguardadas e conservadas,
assegurando que fiquem em condições compatíveis com seu
duradouro e efetivo armazenamento e uso; quando o tratamento
requerer a reprodução do material haveria que levar em conta
todos os direitos referentes à imagem em questão.
208
16. Os Estados membros serão convidados a estimular os organismos privados e os
particulares que possuam imagens em movimento a que tomem as medidas
. Medidas complementares
s ficam convidados a estimular as autoridades competentes
a. promover entre todos aqueles envolvidos com a produção e a
distribuição de imagens em movimento uma noção do valor
permanente de tais imagens do ponto de vista educativo, cultural,
artístico, científico e histórico, assim como sensibilizá-los da
conseqüente necessidade de colaborar para sua salvaguarda e
conservação;
necessárias para assegurar a salvaguarda e conservação destas imagens sob
condições técnicas adequadas. Estes organismos e particulares deveriam ser
estimulados a depositar nos arquivos oficialmente reconhecidos os elementos de
copiagem disponíveis ou, na falta deste, cópias das imagens em movimento feitas
antes de introdução do sistema de depósito.
C
17. Os Estados membro
e outros órgãos que se interessem pela salvaguarda e conservação das imagens em
movimento a empreender atividades de informação pública destinadas a:
b. chamar a atenção do público em geral sobre a importância
educativa, cultural, artística, científica e histórica das imagens em
movimento e para as medidas necessárias à sua salvaguarda e
conservação.
209
18. Medid ar as
pesquisas alvaguarda e conservação das imagens
em mo ograr
sua conservação a longo prazo por um custo razoável. Todas as pessoas
interessad uarda
e conserva ações
relevantes
19. De uarda
e conserva mais
recentes.
IV. Coop
20. Os Estados membros ficam convidados a associar seus esforços com o objetivo
de pro mam
parte do ulada
pelas co
govern
a. participação em programas internacionais para o estabelecimento,
em nível regional ou nacional, da necessária infraestrutura para a
salvaguarda e conservação do patrimônio de imagens em
movimento de países que não dispõem de instalações apropriadas
ou de recursos adequados;
as deveriam ser tomadas, em nível nacional, no sentido de coorden
em campos relacionados com a s
vimento e para estimular investigações especificamente dirigidas para l
as deveriam ser informadas sobre métodos e técnicas para a salvag
ção das imagens em movimento, inclusive os resultados de investig
.
veriam ser organizados programas de treinamento referentes à salvag
ção das imagens em movimento, abarcando as técnicas e métodos
eração internacional
mover a salvaguarda e conservação das imagens em movimento que for
patrimônio cultural das nações. Tal cooperação deveria ser estim
mpetentes organizações internacionais governamentais e não-
amentais e devia compreender as seguintes medidas:
210
b. troca de informações sobre métodos e técnicas de salvaguarda e
conservação das imagens em movimento e, em particular, sobre
os resultados das investigações mais recentes;
c. organização de cursos de treinamento nacionais ou internacionais
em campos afins, em particular para participantes de países em
desenvolvimento;
d. ação comum para a padronização dos métodos de catalogação
especificamente destinados aos arquivos que colecionam imagens
es
de fonogramas e os organismos de radiodifusão, para o
empréstimo de cópias de imagens em movimento a outros
arquivos oficialmente reconhecidos, exclusivamente para fins
didáticos, de estudo ou de pesquisa, desde que se obtenha o
consentimento dos detentores dos direitos e dos arquivos
concernentes e que nenhum dano seja causado ao material
emprestado.
21. A
U não-
governam mais
especificamente com países em desenvolvimento, tendo em vista a adoção de
medidas para a adequada salvaguarda e conservação das imagens em movimento.
em movimento;
e. autorização, sujeita às disposições pertinentes dos convênios
internacionais e da legislação nacional que rege o direito de autor,
a proteção dos artistas intérpretes ou executantes, os produtor
NESCO, em colaboração com as organizações internacionais
entais competentes deveria cooperar com seus Estados membros e
211
22. Os Estados membros ficam convidados a cooperar para que todos eles possam
ter acesso às imagens em movimento relacionadas com sua história e sua cultura e
das quais não possuam elementos de copiagem ou cópias de projeção. Para esta
finalidade, cada Estado membro fica convidado a:
a. facilitar, no caso de imagens em movimento depositadas em
arquivos oficialmente reconhecidos e que se relacionem com a
história ou cultura de outro país, a obtenção, por parte dos
arquivos oficialmente reconhecidos deste país de elementos de
copiagem ou de uma cópia de projeção de tais imagens;
b. estimular as instituições e organismos privados existentes em seu
território que possuam tais imagens em movimento, a depositar
voluntariamente elementos de copiagem ou uma cópia de
projeção de tais imagens nos arquivos oficialmente reconhecidos
do país em questão.
c. quando necessário, o material fornecido de acordo com a. e b.
deveria ser posto à disposição contra reembolso das despesas por
parte do organismo requisitante. Entretanto, considerando o
s oficialmente reconhecidos daqueles
países em condições especialmente favoráveis. Qualquer material
custo envolvido, os elementos de copiagem ou as cópias de
projeção de imagens em movimento conservadas por Estados
membros como propriedade pública e que se relacionem com a
história e cultura de países em desenvolvimento, deveriam estar
disponíveis para os arquivo
212
a ser fornecido de acordo com este parágrafo deverá levar em
conta os direitos de autor e os direitos dos intérpretes, produtores
de fonogramas e organismos de radiodifusão.
23. Quando imagens em movimento que formem parte do patrimônio histórico e
cultural de um determinado país tenham sido perdidas por este país,
independentemente das circunstâncias, e em particular como conseqüência de
ocupação estrangeira ou colonial, os Estados membros ficam convidados, no caso
de solicitação de ditas imagens, a cooperar do espírito da Resolução 5/10/1/1.III
adotada pela Conferência Geral na sua vigésima reunião.
UNESCO, outubro de 1980
179
179
(tradução do espanhol: Cosme Alves Neto) Fonte: Cinemateca Brasileira, in:
http://www.cinemateca.org.br/, ativo em 23/06/2005.
213
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