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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO BIOMÉDICO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ATENÇÃO À SAÚDE COLETIVA
O ACOMPANHANTE NA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR: RELATOS DE
UMA EXPERIÊNCIA
VITÓRIA
2005
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MÁRCIA BÁRBARA SOUZA DIBAI
O ACOMPANHANTE NA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR: RELATOS DE
UMA EXPERIÊNCIA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Atenção à Saúde Coletiva do Centro
Biomédico da Universidade Federal do Espírito Santo,
como requisito parcial para obtenção do grau de
mestre em Saúde Coletiva, na linha de pesquisa
Riscos e Agravos à Saúde de Grupos Humanos.
Orientador: Profª Drª Nágela Valadão Cade.
VITÓRIA
2005
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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
Dibai, Márcia Bárbara Souza, 1967-
D543a
O acompanhante na instituição hospitalar : relatos de uma
experiência / Márcia Bárbara Souza Dibai. – 2005.
126 f. : il.
Orientadora: Nágela Valadão Cade.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito
Santo, Centro Biomédico.
1. Hospitais. 2. Pacientes. 3. Acompanhantes de pacientes. 4.
Humanização na saúde. I. Cade, Nágela Valadão. II. Universidade
Federal do Espírito Santo. Centro Biomédico. III. Título.
CDU: 614
MÁRCIA BÁRBARA SOUZA DIBAI
O ACOMPANHANTE NA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR: RELATOS DE
UMA EXPERIÊNCIA
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Atenção à
Saúde Coletiva do Centro Biomédico da Universidade Federal do Espírito Santo, como
requisito final para obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva.
Aprovada em 24 de novembro de 2005.
COMISSÃO EXAMINADORA
__________________________________
Profª Drª Eugênia Célia Raizer
__________________________________
Profª Drª Elizabete Regina A. de Oliveira
__________________________________
Profª Drª Nágela Valadão Cade
(orientador)
A Deus, por ter sido sempre o meu elo de
sustentação, se manifestando em vários
momentos de minha vida.
“Quero acrescentar, à guisa de informações
sobre a jovem e sobre mim, que vivemos
exclusivamente no presente, pois sempre e
eternamente é o dia de hoje e o dia de amanhã
será um hoje. A eternidade é o estado das
coisas neste momento”.
Clarice Lispector
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer a todas as pessoas que, de forma direta ou indireta, contribuíram para
que a conclusão desse trabalho se tornasse uma realidade.
Especialmente a toda a equipe de professores do PPGASC e à coordenadora do
Programa de Pós-Graduação em Atenção à Saúde Coletiva Profª Drª Rita Lima.
A todos os colegas de turma pela oportunidade de desfrutarmos tantos momentos de
alegria e de troca de aprendizagem, especialmente Cremilda, Otília, Luciene, Beatrice,
Ronaldo, Eida.
À minha irmã Francisca e à minha sobrinha Aline, que estiveram presentes no momento
em que eu enfrentava muitas dificuldades.
Às minhas amigas de trabalho, em especial à Gislene Brunholi, pela compreensão dos
meus tantos momentos de afastamento e pela troca de discussão sobre o assunto
pesquisado.
À Profª Drª Lúcia Garcia, pela rica contribuição no momento da qualificação do projeto
de pesquisa.
À Profª Drª Eugênia Raizer por proporcionar uma discussão importante em várias
etapas de construção do trabalho e por aceitar participar da minha banca de defesa
final.
Aos demais membros integrantes da banca pela sua participação , Profª Drª Elizabete
de Araújo Oliveira, Profª Drª Denise de Castro. E, especialmente, à Profª Drª Maria
Beatriz Herkenhoff, que deu sua contribuição desde o momento da elaboração do
projeto de pesquisa.
À minha orientadora, Profª Drª Nágela Valadão Cadê, por ajudar-me a crescer na
diferença.
À Profª Drª Leonor Mauad pela grande ajuda no direcionamento do trabalho e pela
concessão espontânea de materiais.
Ao Dr. Camillo Chamoun, por ajudar-me a adquirir coragem e determinação para vencer
essas e outras etapas em minha vida.
Ao grande amigo Fabrício, que sempre demonstrou disponibilidade para auxiliar-me nos
momentos de dúvidas.
Aos acompanhantes do hospital, protagonistas dessa história, o meu agradecimento. E
á equipe de profissionais por aceitarem participar da pesquisa.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO.................................................................................................15
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................17
2 A POLÍTICA HOSPITALAR E O ACOMPANHANTE........................................23
2.1 O HOSPITAL E O ATENDIMENTO AO ACOMPANHANTE...........................32
3 PERCURSO METODOLÓGICO........................................................................ 38
3.1 TIPO DE ESTUDO...........................................................................................38
3.2 LOCAL DE ESTUDO....................................................................................... 38
3.3 POPULAÇÃO.................................................................................................. 40
3.4 AMOSTRA...................................................................................................... ,40
3.5 INSTRUMENTOS.............................................................................................42
3.6 ASPECTO ÉTICO............................................................................................ 43
3.7 COLETA DE DADOS....................................................................................... 43
3.8 PROCEDIMENTOS......................................................................................... 44
3.9 TRATAMENTO DOS DADOS..........................................................................45
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO..........................................................................48
4.1 CARACTERIZAÇÃO SÓCIO-DEMOGRÁFICA DOS ACOMPANHANTES.....49
4.2 PERCEPÇÃO DOS ACOMPANHANTES SOBRE A EXPERIÊNCIA DE ACOM
PANHAR O PACIENTE HOSPITALIZADO...........................................................52
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................104
6 REFERÊNCIAS.................................................................................................114
APÊNDICES.........................................................................................................119
APÊNDICE A – Instrumento de pesquisa aplicado aos acompanhantes.............120
APÊNDICE B – Instrumento de pesquisa aplicado aos profissionais.................. 122
APÊNDICE C – Termo de consentimento livre e esclarecido..............................123
APÊNDICE D – Termo de consentimento livre e esclarecido..............................124
ANEXOS...............................................................................................................125
ANEXO A – Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)................................................126
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Caracterização sócio-demográfica dos acompanhantes de pacientes
hospitalizados.........................................................................................................51
Tabela 2 – Motivos que levaram os acompanhantes a ficarem com os pacientes
hospitalizados.........................................................................................................54
Tabela 3 – Atividades realizadas pelos acompanhantes no hospital.....................57
Tabela 4- Dificuldades apresentadas pelos acompanhantes durante sua permanência
no hospital........................................................................................66
Tabela 5 – Alterações físicas percebidas pelos acompanhantes durante sua
permanência no hospital.........................................................................................88
Tabela 6- Alterações emocionais percebidas pelos acompanhantes durante sua
permanência no hospital.........................................................................................90
Tabela 7 – Alterações na vida diária percebida pelos acompanhantes durante sua
permanência no hospital.........................................................................................92
Tabela 8 – Estratégias de enfrentamento utilizadas pelos acompanhantes durante o
período de acompanhamento ao paciente internado..........................................98
LISTA DE SIGLAS
AIH – Autorização de Internação Hospitalar
CEP – Comitê de Ética em Pesquisa
CTI – Centro de Tratamento Intensivo
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
GTH – Grupo de Trabalho de Humanização
HINSG – Hospital Infantil Nossa Senhora da Glória
HUMANIZA SUS – Política de Humanização do Sistema Único de Saúde
INCA – Instituto Nacional de Câncer
MS – Ministério da Saúde
ONGs – Organização não-governamentais
PNH – Política Nacional de Humanização
SBP – Sociedade Brasileira de Pediatria
SPSP – Sociedade de Pediatria de São Paulo
SUS – Sistema Único de Saúde
UTI – Unidade de Terapia Intensiva
RESUMO
O presente estudo teve por objetivo conhecer, a partir da percepção do acompanhante
familiar, sua experiência em acompanhar o paciente adulto hospitalizado. Trata-se de
um estudo exploratório e descritivo, baseado na abordagem qualitativa e do tipo estudo
de caso, que foi desenvolvido no setor de clínica médica de um hospital-escola. Foi
utilizada a amostra por saturação, sendo entrevistado 12 acompanhantes familiares.
Optou-se, também, por obter dados de 8 profissionais do hospital, a fim de
compreender melhor o objeto de estudo. Como metodologia de coleta de dados, foram
realizadas entrevistas semi-estruturadas, e os dados foram tratados pela técnica de
análise de conteúdo (BARDIN,1977). Os resultados mostraram que a afetividade e a
obrigação foram os principais motivos que levaram os acompanhantes a ficarem com os
familiares hospitalizados. Durante a permanência no hospital, os acompanhantes
realizaram mais atividades de autocuidado, que tinha por objetivo suprir as
necessidades básicas do paciente por nutrição, hidratação, eliminação, higiene,
atividade-repouso, e de conforto. As dificuldades mais percebidas por eles foram
relativas às questões pessoais e à infra-estrutura da instituição hospitalar, que implicam
na necessidade de oferecer um melhor conforto para a sua permanência junto ao
paciente internado. As dificuldades relacionadas à interação com a equipe profissional,
bem como as relacionadas às atividades que realizavam foram menos percebidas.
Durante o período de acompanhamento, apresentaram alterações físicas, com
predominância de cansaço, e alterações emocionais, em que a preocupação permeou
todo o processo, sendo manifestados também outros sentimentos como, tristeza,
nervosismo, medo, insegurança, fragilidade e solidão. Quanto às alterações ocorridas
na vida diária, as mais citadas pelos acompanhantes familiares foram ter que
abandonar a casa, interromper as atividades domésticas, como também deixar de dar
atenção aos filhos. A fé foi reconhecida por eles como a principal estratégia de
enfrentamento para a superação das dificuldades encontradas no contexto hospitalar. A
experiência relatada pelos acompanhantes revela suas demandas tanto objetivas,
quanto subjetivas, e aponta a necessidade de criar uma política de atendimento a esse
grupo específico, trazendo implicações para a instituição hospitalar e para a equipe
profissional.
Palavras chaves: Hospitais; Pacientes; Acompanhantes de pacientes: Humanização na
saúde.
ABSTRACT
The present study had as objective to know, from the family companion perception, their
experience in accompanying the hospitalized adult patient. It is an exploratory and
descriptive study, based on the qualitative approach and case study example, which
was carried out in the medical clinic department of a hospital-school. It was used the
sample by saturation, being interviewed 12 family companions. It was also opted to
obtain data from 8 professionals from the hospital, in order to better understand the
study object. As a methodology of data collection, semi-structured interviews were
realized and the data were treated by the content analysis technique (BARDIN, 1977).
The results showed that affectivity and obligation were the main reasons that led the
companions to stay with the hospitalized relatives. During the stay in the hospital, the
companions realized more self-care activities that had as objective to supply the
patient’s basic needs of nutrition, hydration, elimination, hygiene, rest-activity and
comfort. The most perceived difficulties by them were related to personal questions and
the infra-structure of the hospital, that imply the necessity to offer a better comfort for
their permanence with the interned patient. The difficulties related to interaction with the
staff, as well as the activities that they realized were less noticed. During the
accompanying period, physical alterations were identified, with weariness
predominance, and emotional alterations, in which preoccupation permeated all the
process, also being manifested other feelings like sadness, nervousness, fear,
insecurity, fragility and loneliness. In relation to the alterations occurred in the daily life,
the most cited by the family companions were to abandon the house, interrupt the
household chores, as well as not to give attention to children. Faith was recognized by
them as the main confrontation strategy for the overcoming of the difficulties found in the
hospital context. The experience narrated by the companions reveals their objective
demands as well as the subjective, and shows the necessity to create a service policy to
this specific group, bringing implication to the hospital institution and the staff.
Keywords: Hospitals; Patients; Patient’s companions; Health humanization.
15
APRESENTAÇÃO
O interesse pela temática surgiu da minha própria experiência profissional, ao observar
as dificuldades vivenciadas pelos acompanhantes, durante o período de
acompanhamento ao paciente internado. Dificuldades concretas, relativas à ausência
de condições necessárias para a permanência deles no hospital, por exemplo, cama
para dormir e local para fazer a higiene, como também dificuldades subjetivas
relacionadas ao próprio convívio com o ambiente hospitalar e todo seu arsenal
terapêutico.
Na ocasião, já havia uma interrogação pessoal a respeito da presença do
acompanhante nas enfermarias, se ela se constituía em um direito adquirido para o
paciente, ou em um dever perante as necessidades impostas pela hospitalização e pela
incapacidade do paciente. Os profissionais do hospital, freqüentemente, convocavam a
presença dos familiares e/ou responsáveis pelo paciente. Caso não fosse possível
comparecerem, logo se instalava uma desconfiança, e a equipe julgava que o paciente
havia sido abandonado. Por outro lado, não estava bem definido, por parte da
instituição, o que se esperava daqueles acompanhantes que permaneciam junto ao
paciente internado.
Dessa forma, as questões relativas ao acompanhamento de familiares se apresentavam
com uma gama de complexidades que não era perfeitamente compreendida pelos
acompanhantes e pelos próprios profissionais, o que passou a causar problemas para o
hospital, visto que presença desses acompanhantes familiares gerava muitos conflitos
internos e trazia uma série de demandas que necessitavam ser atendidas. Diante dessa
realidade, eu questionava se o hospital estava preparado para receber esses
acompanhantes, e em que medida a instituição poderia contribuir para a permanência
deles junto ao paciente internado.
Na ocasião, tive a oportunidade, juntamente com uma colega, de desenvolver um
trabalho sobre as questões referentes às mães que acompanhavam seus filhos
16
internados, no setor de pediatria do hospital. Essa foi a minha primeira aproximação
com as questões referentes ao acompanhamento familiar, e ela mostrou como
resultado, a verificação de que os acompanhantes (assim como os pacientes) sofriam
os reflexos da hospitalização. Por isso, fazia-se necessário criar estratégias que
minimizassem o sofrimento dessas mães, durante o seu período de acompanhamento
no hospital, como, por exemplo, atendimento individualizado das suas demandas,
participação em grupos de orientação e auto-ajuda, atividades de entretenimento,
dentre outras.
Havia, também, o interesse pessoal de desenvolver o mesmo estudo, voltado para as
questões relativas ao acompanhante do paciente adulto hospitalizado, por ter atuado
com essa clientela, enquanto profissional, por um período de oito anos e ter, ainda, uma
série de questionamentos a respeito.
A minha inclusão no curso de mestrado foi a oportunidade de concretizar esse projeto,
que, em princípio, pretende conhecer como os acompanhantes se percebem no
processo de acompanhar o seu familiar internado e que possibilidades poderão ser
apontadas, no sentido de auxiliá-los durante a permanência deles na instituição
hospitalar.
17
1 INTRODUÇÃO
O processo de adoecer traz em seu bojo uma configuração de total falta de sentido
para o próprio significado existencial do paciente. É como se tudo que fosse percebido
anteriormente desmoronasse e perdesse a configuração com o real pela possibilidade
do adoecer e das implicações de sua ocorrência. Essa totalidade irá se mostrar de
maneira mais aguda num processo de hospitalização, quando o surgimento de uma
determinada patologia por si só estabelece novos parâmetros à realidade existencial do
paciente.
Tesk (1988) refere-se à doença e à hospitalização como uma agressão ao indivíduo,
agravada pela separação dos familiares e amigos. O autor explica que, ao ser retirado
de seu habitat natural, o indivíduo encontra no hospital um ambiente completamente
adverso, onde normas e rotinas rígidas passam a controlar e a determinar suas ações,
dando origem a um sentimento de insegurança emocional, agravada com a
conscientização de sua vulnerabilidade e impossibilidade de controle da situação.
Conforme ressalta Regeanini (1973, p.337):
O indivíduo hospitalizado, mesmo adulto, vive uma série de experiências
emocionais importantes como, a ansiedade, o medo, as fantasias mórbidas, a
sensação de desamparo e fragilidade, podendo desenvolver comportamentos
regressivos a um estado de dependência compatível ao da infância.
Essa gama de manifestações psicológicas que assola o paciente o reporta a condições
emocionais primitivas e à necessidade de se sentir amparado e protegido, sobretudo
por aquelas figuras que historicamente já ocuparam esse papel e que passam a ser
solicitadas por ele de diversas formas. Assim, a família passa a ter uma importância por
vezes decisiva no auxílio à adaptação do paciente frente a esse episódio crítico da vida
dele. Provavelmente, esse seja o fato de que a maioria das pesquisas que se
dedicaram a explorar a temática do acompanhante se utilize pouco dessa terminologia,
reportando, com freqüência, ao estudo de família e apropriando-se de termos, como
cuidadores ou familiares de pacientes internados.
No presente estudo, optou-se por adotar o termo acompanhante por considerar sua
utilização no hospital pesquisado e pela identificação dos indivíduos por essa
18
terminologia. E também por diferenciar do cuidador que reporta aos indivíduos que
prestam cuidados nos domicílios dos pacientes. Ferreira (1986, p. 28) define
acompanhante como “a pessoa que faz companhia ou dá assistência a indivíduo
doente, idoso, inválido, etc”. Enquanto para Houaiss (2001, p.62), o acompanhante “é
quem acompanha, assiste e protege, o doente, idoso, menor ou incapaz”.
A presença do acompanhante requerida junto ao paciente hospitalizado parece
expressar uma necessidade de segurança emocional cujo apoio busca, principalmente,
entre os familiares e pode ter relação com aquilo que descreve Regeanini (1973),
quando afirma tratar-se de um hábito cultural próprio dos países onde os recursos
econômicos e tecnológicos das instituições hospitalares são escassos. Por outro lado,
ela parece estar relacionada a uma sociedade caracteristicamente afetiva do ponto de
vista social e familiar.
Segundo a autora, o mesmo não acontece nos países onde existem recursos
suficientes para suprir os hospitais em termos de equipamento, material e pessoal, em
quantidade e qualidade necessárias e o que os torna merecedores de confiança de
seus usuários. Há, ainda, o aspecto educacional, que é caracterizado nos países
desenvolvidos pelo preparo progressivo para a independência das pessoas.
Ao refletir sobre a evolução da assistência hospitalar como um todo, autores têm
observado que alguns aspectos mais diretamente relacionados com o atendimento às
necessidades psicossociais do paciente e de sua família não têm apresentado igual
progresso, se comparado aos avanços científicos e tecnológicos na área da saúde e,
ainda, que tal aspecto não tem merecido o devido destaque que a situação requer em
nosso meio. Para exemplificar a situação, Franco (1988) cita a questão do
acompanhante hospitalar cuja presença no hospital ainda não se encontra instituída e
onde tampouco está definido o papel dele.
Ainda a respeito dessa questão, outros autores verificaram que, muitas vezes, o
acompanhante não é bem visto dentro das instituições hospitalares, pois parece que a
presença dele representa mais a idéia de um fiscal da qualidade do cuidado que é
prestado pela equipe, principalmente pela enfermagem, do que a de um colaborador,
19
um aliado e um companheiro, principalmente em se tratando do paciente (LAUTERT;
ECHER; UNICEVSKY, 1998).
Por isso, a relação diária com os acompanhantes poderá habitualmente ser vista pela
equipe profissional como estressante, limitada e menos satisfatória devido à falta de
tempo (visto que a atenção primeira é cuidar do paciente) e, também, pela falta de
formação e informação de como lidar com os mesmos. Então, o afastamento da equipe
em relação aos acompanhantes familiares tem sido um acontecimento natural – por não
conhecer suas carências; não ter tempo, nem disponibilidade interna para estar junto;
não saber o que e nem como atuar com eles, e nem quem se responsabiliza por eles.
Mas, conforme ressalta Romano (1997), esse fato em absoluto deve ser encarado
como desejável ou inevitável. É preciso que os profissionais de saúde fiquem atentos
para as necessidades e demandas dos acompanhantes, durante a permanência deles
no hospital, uma vez que correm o risco de doenças físicas, diminuição de atenção,
irritabilidade e comprometimento quanto à capacidade de decisão. Dessa forma, pode
estar comprometida a habilidade deles para entender políticas, rotinas e procedimentos
do hospital que parecem lógicos e racionais para a equipe.
Uma revisão na literatura mostra que muitos estudos foram realizados acerca das
necessidades de familiares que acompanhavam pacientes de cuidado intensivo, e os
mesmos referem-se a estudos desenvolvidos na abordagem quantitativa. (LUCCHESE,
2003; THOMAS; MORRIS; HARMAN, 2002; ERIKSSON; LAURI, 2000; AZOULAY et
al., 2001; CASTRO, 1999; SCARELLI, 1994; PRICE et al., 1991; MOLTER, 1979).
Como resultados, foi encontrado que as necessidades mais importantes para os
familiares dos pacientes são relativas às informações sobre o estado de saúde do
paciente e à segurança referente ao tratamento oferecido pela instituição hospitalar e à
equipe de saúde. As necessidades referentes aos próprios sentimentos e emoções,
bem como em relação à infra-estrutura da instituição, cuja satisfação poderia lhes
proporcionar um melhor conforto, foram menos percebidas entre os familiares. Também
foi encontrado que a necessidade desses familiares por informação foi maior do que a
necessidade por apoio emocional, visto que recebiam dos profissionais do hospital
20
menos informações do que precisavam, principalmente sobre a oportunidade para
participar na implementação dos cuidados do paciente.
Em contrapartida, poucos estudos se propuseram a analisar questões referentes aos
acompanhantes de pacientes adultos em enfermarias não-intensivas, numa abordagem
qualitativa (JÚNIOR; SILVEIRA, 2002; ASTEDT-KURKI et al., 1999; SHIOTSU, 1998;
LAUTERT; ECHER; UNICEVSKY, 1998). Estes estudos apontaram que os
acompanhantes poderiam colaborar com seus pacientes nas ações de autocuidado,
reduzindo-se a dissonância e o sentimento de impotência, com a contribuição mais
efetiva para a recuperação destes. E, uma vez pertencendo à família do paciente,
tendem a dedicar-lhe maior atenção, não só pela cumplicidade que o grupo social
sugere, mas pelas prováveis conseqüências que advêm da falta de cuidado. Por outro
lado, foi encontrado que a instituição hospitalar oferece muito pouco em termos de
orientação para a saúde dos acompanhantes. Ficar como acompanhante gera
transtornos no ritmo de trabalho, nas atividades domésticas, no sono e no repouso,
porque o acompanhar é ocasionado por um desgaste físico e emocional de onde
emergem sentimentos e emoções, como: cansaço, tristeza por conviver de perto com o
sofrimento, expectativas e incertezas frente ao tratamento e dúvidas sobre o agir e
fazer.
Embora exista uma extensa literatura desenvolvida sobre os acompanhantes familiares
no contexto hospitalar, autores apontam a necessidade de se saber o que pensam
esses acompanhantes; como se organizam no grupo hospitalar para exercer suas
funções; quais são as tensões e os conflitos experienciados por eles; quais são as
principais queixas e desejos; suas estratégias para resolver problemas cotidianos do
cuidado; bem como as necessidades de auxílio no exercício dessas atividades; e
demais questões que ainda se encontram desconhecidas. Igualmente, apontam que
pouco se sabe sobre o que a equipe de saúde e o próprio paciente pensam a respeito
dessa questão (SANTOS, 2003b; FRANCO, 1988).
21
Nesse sentido, o presente estudo propôs como objetivo geral conhecer, a partir da
percepção dos acompanhantes, sua experiência em acompanhar um paciente adulto
hospitalizado. A partir dessa questão mais ampla, outros objetivos específicos foram
contemplados, como:
a) Conhecer as atividades realizadas pelos acompanhantes junto ao paciente internado.
b) Identificar as dificuldades percebidas pelos acompanhantes, durante o período de
acompanhamento do paciente no hospital.
c) Identificar quais são os motivos para acompanhar o paciente internado.
d)Conhecer as alterações percebidas pelos acompanhantes durante a permanência
deles no hospital.
e) Verificar as estratégias de enfrentamento utilizadas pelos acompanhantes, diante das
dificuldades experienciadas no hospital.
f) Conhecer a percepção da equipe profissional sobre a permanência do acompanhante
na instituição hospitalar.
Para realizar a investigação foram colocadas as questões seguintes norteadoras.
Como o acompanhante se percebe no processo de cuidar de seu familiar internado?
Que situações envolvem esses acompanhantes, dificultando ou facilitando o
desenvolvimento de suas atividades de cuidado? Em que proporções a instituição
hospitalar e a equipe profissional contribuem para a permanência do acompanhante
junto ao paciente internado?
A relevância do estudo justifica-se pelo fato de cada vez mais o acompanhante familiar
ser incluído na participação do tratamento do paciente, seja na rede hospitalar ou
domiciliar, constituindo-se como uma parte da proposta de uma assistência integral. E
por considerar também que assim como o paciente internado, o acompanhante
representa um usuário do serviço de saúde, com demandas específicas, diferenciadas
dos pacientes.
Visando apresentar as linhas gerais da investigação, inicialmente, foi desenvolvido um
capítulo conceitual sobre a política hospitalar e o acompanhante, trazendo uma breve
22
discussão de como se deu o processo de abertura da permanência de familiares nas
unidades de internação dos hospitais públicos brasileiros. Posteriormente, foi realizada
uma descrição sobre a forma de atendimento dos acompanhantes na instituição
hospitalar, local da pesquisa, procurando mostrar os princípios normativos que
fundamentam a autorização do acompanhante, bem como as regras e normas
estabelecidas durante a permanência dele, os recursos disponíveis e outras questões.
Nos capítulos seguintes, serão apresentadas as etapas metodológicas percorridas pela
pesquisadora, a fim de atingir aos objetivos propostos e, ao final, serão apresentados
os resultados e as considerações finais.
23
2 A POLÍTICA HOSPITALAR E O ACOMPANHANTE
Historicamente, havia limites para o tempo em que familiares poderiam permanecer no
hospital. Somente nas décadas de 60 e 70 é que começou a haver uma mudança
significativa nas políticas de acompanhante, iniciada primeiramente nas enfermarias
pediátricas e vindo a expandir-se, posteriormente, para as enfermarias de pacientes
adultos. Há décadas, o que havia de instituído nos hospitais pediátricos era o horário de
visitas, geralmente curto, não-diário e em horários que habitualmente não facilitava a
freqüência dos pais junto às crianças hospitalizadas, principalmente, em se tratando
daqueles que trabalhavam.
Conforme analisa Toporovski (1988, p.260), foi baseando-se em alguns argumentos
pejorativos que diversos profissionais da instituição hospitalar recusavam a presença
dos familiares nas enfermarias, como “a presença das mães seria fator de
desorganização, já que elas interfeririam nos cuidados, atrapalhando o tratamento e
contribuindo para a disseminação de infecção, além de aumentar o custo da
hospitalização”. Essa realidade apenas começou a se modificar a partir do momento em
que grupos de pediatras se mobilizaram na defesa de novos paradigmas, com o início
de um movimento de luta pela humanização da medicina, em geral, e da pediatria, em
particular, nesse mesmo período. Especificamente, a respeito desse fato, Toporovski
(1988, p. 260) acrescentava que:
Por humanização não se deve entender uma atitude piegas ou paternalista em
relação a crianças e seus familiares. Humanização significa respeito aos direitos
e exigência do cumprimento dos deveres humanos. Assim, a cada direito
corresponde uma obrigação. Por outro lado, urge definir quais as práticas
médicas que são realmente úteis à recuperação integral do doente e à promoção
da saúde e, então, equacionar e resolver as dificuldades e os problemas
administrativos decorrentes dessa definição.
Com base em tais pressupostos, iniciou-se um processo lento e gradual de abertura
das enfermarias pediátricas para a permanência dos pais ou responsáveis junto às
crianças hospitalizadas, o qual, com o tempo, foi sendo introduzido nas demais
unidades hospitalares. No entanto, é importante lembrar a influência de práticas
advindas de outros países como um dos fatores que também vieram a somar-se à
24
tendência humanizante que estava sendo discutida na época em relação aos pacientes
internados e a qual contribuiu para a adoção desse modelo de assistência em hospitais
brasileiros.
Ângelo (1982) analisando dados de uma pesquisa aponta que nos anos de 1977 e
1978, cerca de 636 hospitais norte-americanos, isto é, 62% deles já permitiam a
presença dos pais nas enfermarias pediátricas por vinte e quatro horas ininterruptas, ou
seja, em período integral.
No Brasil, na década de 80, a Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP), em
parceria com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), iniciava uma campanha
denominada “Mãe Participante”, com o propósito de defender a presença das mães
junto às crianças internadas nos hospitais públicos do país. Esse programa abrangia
um leque de complexidades cuja finalidade principal seria tornar a participação da mãe
alvo de uma nova proposta de assistência à criança hospitalizada, e ressaltava como
um de seus objetivos:
[...] o direito da mãe em permanecer junto ao filho durante a hospitalização (todo
o período diurno e de acordo com as possibilidades, também no período
noturno); condições passíveis de conforto para a mãe (higiene, alimentação,
repouso); horário livre de visitas para o pai; e aproveitamento do período de
hospitalização para educação sanitária dos pais e apoio psicológico em relação à
doença, sempre que possível através de uma equipe multiprofissional que deverá
ser composta por médico, enfermeiro, psicóloga, nutricionista, assistente social,
terapeuta educacional e recreacionista (TOPOROVSKI, 1988, p 260).
Essas primeiras medidas que foram adotadas visando regularizar a presença das mães
nas enfermarias pediátricas foram se consolidando com o passar dos tempos e
receberam respaldo legal a partir da década de 90, através da Lei nº 8069/90, do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), onde o acompanhamento familiar
encontra-se especificado em seu artigo 12, e dispõe “que os estabelecimentos de
atendimento à saúde deverão proporcionar condições para a permanência em tempo
integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou
adolescente” (BRASIL, 1990, p.18).
25
Outras medidas similares também foram sendo adotadas com o objetivo de regularizar
a presença dos acompanhantes nas demais enfermarias dos hospitais, como reflexos
de mudanças advindas no âmbito das políticas de saúde pública no Brasil, por exemplo,
o movimento da Reforma Sanitária que se inicia no final da década de 70 e a
implementação do SUS no final dos anos 80.
Atualmente, o direito à permanência de um acompanhante está regulamentado em leis
e decretos para alguns grupos específicos de pacientes e de acordo com as
particularidades de cada segmento. O grupo de pacientes idosos, por exemplo, passou
a ter reconhecido seu direito a acompanhante através da Portaria nº 280/1999 do
Ministério da Saúde (MS), que prevê, em seu art. 1º, tornar obrigatório nos hospitais
públicos, contratados ou conveniados com o Sistema Único de Saúde (SUS), a
viabilização de meios que permitam a presença do acompanhante de pacientes
maiores de sessenta anos de idade, quando internados.
Nos parágrafos 1º e 2º do referido artigo, fica autorizada ao prestador de serviços a
cobrança, de acordo com as tabelas do SUS, das despesas previstas com
acompanhante, cabendo ao gestor a devida formalização da autorização de cobrança
na Autorização de Internação Hospitalar (AIH). No valor da diária de acompanhante,
estão incluídos a acomodação adequada e o fornecimento das principais refeições.
Deve-se acrescentar que ficam excetuadas da obrigatoriedade definida no art. 1º, as
internações em Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) ou nas situações clínicas em
que tecnicamente esteja contra-indicada a presença do acompanhante, o que deverá
ser formalmente justificado pelo médico (BRASIL, 1999).
A garantia do acompanhamento aos pacientes idosos também se encontra assegurada
por meio da Lei nº 10741/2003 do Estatuto do Idoso, a qual estabelece, em seu artigo
16, que ao idoso internado ou em observação é assegurado o direito de acompanhante,
devendo o órgão de saúde proporcionar as condições adequadas para a permanência
dele em tempo integral, segundo critério médico. Acrescenta, ainda, que caberá ao
26
profissional de saúde responsável pelo tratamento, conceder autorização para o
acompanhamento do idoso ou, no caso de impossibilidade, justificá-la por escrito.
A defesa de tal garantia parte do princípio de que caberá aos órgãos e às entidades
públicas da área de saúde, em consonância com a Política Nacional do Idoso, prevenir,
promover e recuperar a saúde desse segmento da população, assegurando-lhe os
direitos de cidadania, de defesa à sua dignidade, ao seu bem-estar e ao direito à vida
(BRASIL, 2003).
No estado do Espírito Santo, já foi decretada e sancionada a Lei nº 7.690/2003, que
garante o mesmo direito ao grupo de gestantes, onde consta, em seu artigo 1º, que os
hospitais da rede pública de saúde e os hospitais conveniados do Estado do Espírito
Santo ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de um acompanhante
durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato. Esclarece, ainda, que o
acompanhante de que trata o “caput” do referido artigo será indicado pela própria
parturiente, e em partos considerados de alto risco, a presença do acompanhante
poderá ser vedada a critério do médico assistente, desde que seja justificada. A referida
lei encontra-se em tramitação, devendo ser sancionada em nível nacional (ESPÍRITO
SANTO, 2003).
Apesar de ser reconhecida a extensão do direito de acompanhamento aos pacientes
portadores de deficiências, internados na instituição hospitalar, a Lei nº 7.853/1999, que
vem regulamentar as garantias para esse segmento não é tão clara, dizendo apenas
que os órgãos e as entidades da administração direta e indireta responsáveis pela
saúde devem dispensar aos assuntos objeto desse decreto tratamento prioritário e
adequado, com a viabilização, sem prejuízo de outras, das seguintes medidas: “a
garantia de acesso da pessoa portadora de deficiência aos estabelecimentos de saúde
públicos e privados e de seu adequado tratamento sob normas técnicas e padrões de
conduta apropriados” (art. 16, alínea IV, Decreto Nº 3.298/1999).
27
No entanto, os parágrafos 2º e 3º podem dar margem à interpretação em favor do
paciente portador de deficiência, tanto em relação de o mesmo vir a ter direito ao
acompanhante quando estiver internado, quanto em relação a recursos que poderão
ser disponibilizados para esse segmento, quando afirma que a deficiência ou
incapacidade deve ser diagnosticada e caracterizada por equipe multidisciplinar de
saúde, para fins de concessão de benefícios e serviços e que as ações de promoção da
qualidade de vida da pessoa portadora de deficiência deverão também assegurar a
igualdade de oportunidade no campo da saúde. Dessa forma, fica implicitamente
entendida a extensão de direito a acompanhante para esse grupo de pacientes, sendo
possível equipará-los aos demais pacientes que têm essa garantia por lei.
Por outro lado, essa mesma lei abre um leque de possibilidades para a inclusão de
vários pacientes, uma vez que reconhece como pessoa portadora de deficiência física
aquela que se enquadra em diversas categorias, tais como: deficiência física, auditiva,
visual, mental e deficiência múltipla. Dessa forma, estão incluídas nas referidas
categorias pessoas que apresentam deformidades congênitas ou adquiridas; alterações
completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano; quadros neurológicos;
perda parcial ou total das possibilidades auditivas e visuais; limitações associadas a
duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, como comunicação; cuidado pessoal;
habilidades sociais; utilização da comunidade; saúde e segurança; habilidades
acadêmicas; lazer; e trabalho (Alíneas I,II,III, IV e V do art. 4º).
Mais recentemente foi lançado pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA) um manual
sobre os direitos dos pacientes dentro das unidades de saúde e outro sobre os direitos
sociais de pessoas que têm câncer. Além da garantia dos direitos beneficiários, mais
um direito que estará no manual voltado para o atendimento nas unidades de saúde é o
da garantia de acompanhante para o paciente, especialmente para idosos e
adolescentes, e consta no manual lançado em 2005 que foi baseado em documentos,
como o Estatuto do Idoso, e o Estatuto da Criança e do Adolescente.
28
É importante ressaltar que as questões relativas ao direito a acompanhante e à visita
aberta de familiares no hospital estão sendo atualmente discutidas, em conjunto, no
âmbito da Política Nacional de Humanização (PNH), que foi implementada pelo
Ministério da Saúde a partir de 2004. A PNH sob a denominação HUMANIZA SUS se
apresenta como uma política construída a partir de experiências concretas que foram
identificadas no SUS em relação a algumas tecnologias de humanização da atenção e
da gestão no campo da saúde. Os valores que norteiam essa política são “a autonomia
e o protagonismo dos sujeitos, a co-responsabilidade entre eles, o estabelecimento de
vínculos solidários e a participação coletiva no processo de gestão” (ALBUQUERQUE,
2004, p. 1).
O HUMANIZA SUS, ao considerar o conceito de clínica ampliada como trabalho clínico
que visa ao sujeito e à doença, à família e ao contexto, tendo como objetivo produzir
saúde e aumentar a autonomia do sujeito, da família e da comunidade, defende a
inclusão de familiares/acompanhantes, como ponto essencial para a concretização
dessa proposta. Parte-se, pois, do pressuposto de que quando uma pessoa fica doente
e é internada em uma unidade de tratamento, ela tende a perder parte, ou até mesmo
toda a capacidade de se reencontrar. Nesse sentido, tudo aquilo que vier do seu
contexto exterior e puder ajudar no restabelecimento de sua confiança, como, por
exemplo, a presença de familiares e de pessoas da comunidade, contribuirá para a sua
reabilitação.
Rollo (1997, p.139), ao discutir sobre a possibilidade de se construir novas práticas
assistenciais nos hospitais públicos visando à superação do modelo assistencial
hegemônico, destaca que “o plano terapêutico ou contrato de cuidados deve prever
atividades de envolvimento do paciente e família no processo de cura, além de informá-
los do diagnóstico, dos objetivos das condutas diagnósticas e terapêuticas e dos
prognósticos prováveis”. Esses novos ideais de humanização visam combater antigas
visões, como, por exemplo, aquelas que se referem também à questão da presença
dos visitantes e que ainda perpetuam nos serviços de saúde, por exemplo:
29
[...] a visita é freqüentemente pensada como elemento que atrapalha o trabalho
do serviço de saúde, um ‘peso’ a mais, uma demanda que precisa ser contida;
não existe uma estrutura física e de pessoal destinada ao acolhimento dos
visitantes; há dificuldade de compreensão da função do visitante na reabilitação
do doente (ALBUQUERQUE, 2004, p.6).
A partir desse novo enfoque proposto para tratar as questões relativas à saúde, o
cuidar vem sendo discutido como um conceito amplo que envolve não apenas os
tratamentos propostos, mas também a criação de um ambiente que proporcione
mínimas condições de conforto à pessoa cuidada, um reencontro com ela mesma,
fazendo remetê-la a um estado de confiança. Portanto, dentro dessa nova concepção, é
entendida a necessidade de redimensionar o espaço do visitante e do acompanhante
nos hospitais públicos brasileiros no sentido de oferecer um atendimento mais integral
ao paciente hospitalizado.
Para Cecílio e Merhy (2003, p.197) a atenção integral de um paciente no hospital seria
“o esforço de uma abordagem completa, holística, portanto integral, de cada pessoa
portadora de necessidades de saúde que, por um certo período de sua vida, precisasse
de cuidados hospitalares”. Tal abordagem implicaria garantir desde o consumo de todas
as tecnologias de saúde disponíveis para melhorar e prolongar a vida, até a criação de
um ambiente que resultasse em conforto e segurança para a pessoa hospitalizada.
Assim, tecnologia e humanização deverão estar combinadas no desafio de adotar o
lugar do paciente e suas necessidades singulares, como ponto de partida para qualquer
intervenção hospitalar.
Com o propósito de multiplicar algumas práticas humanizantes em relação à saúde e ao
tratamento do paciente, é lançada a Cartilha da PNH pelo Ministério da Saúde, onde se
encontram estabelecidos os princípios que reforçam a importância da presença dos
acompanhantes e dos visitantes no contexto hospitalar, os quais são: a) captar melhor
os dados do contexto de vida do doente e do momento existencial dele; b) ajudar na
identificação das necessidades do doente, através da fala dos
familiares/acompanhantes, contribuindo, assim, para o conhecimento dos principais
problemas dele; c) manter a inserção social do doente durante toda a internação; d)
30
incluir, desde o início da internação, a comunidade nos cuidados com a pessoa doente;
e) permitir, desde o início, a integração das mudanças provocadas pelo motivo da
internação; f) fortalecer a confiança da pessoa doente.
Conforme pode ser observado, as discussões referentes à presença dos
acompanhantes nas instituições hospitalares constituíram um processo iniciado no
âmbito das práticas desenvolvidas por profissionais da área da saúde o qual,
posteriormente, foi ganhando espaço no âmbito das políticas públicas. No entanto, é
importante ressaltar que, mesmo reconhecendo esse avanço, a permanência do
acompanhante nas instituições hospitalares ainda se constitui como um direito de
apenas alguns grupos de pacientes, não se estendendo a todos. Sob esse aspecto, não
poderíamos nos referir ao atendimento integral em se tratando de pessoas
hospitalizadas. Nesse sentido, quais seriam as possibilidades reais de se criar novas
práticas no hospital que supere essa iniqüidade?
Primeiramente, é preciso esclarecer que a política incorpora sempre a idéia de atores
em disputa e defesa de interesses e projetos distintos, assim como o conflito e o poder
na construção de sua teoria e na formulação de métodos concretos de intervenção.
Então, nesse caso específico, conforme analisa Cecílio (2001, p.116) “a explicação da
iniqüidade e a luta pela eqüidade perpassam, necessariamente, pelo reconhecimento
de atores com maior ou menor capacidade de reconhecer, formular e batalhar na
defesa dos seus interesses”. Isso nos leva a pensar sobre a maior representatividade
na sociedade dos grupos de pacientes pediátricos, idosos, gestantes, oncológicos e
portadores de deficiência, em relação aos demais pacientes que são atendidos na rede
do SUS, e o interesse público em ampliar direitos no campo da saúde, no que diz
respeito, particularmente, à garantia de que os mesmos possam ter um acompanhante
durante o período de hospitalização.
A segunda questão é que a formulação de uma política por si mesma não garante a
implementação dela na prática, visto que existem vários determinantes – econômicos,
sociais, políticos e culturais, que poderão favorecer ou comprometer a sua efetivação.
31
Em se tratando especificamente do hospital, local onde foi realizado este estudo,
podem ser cogitadas algumas possibilidades de a temática do acompanhante ser
encaminhada para discussão a fim de que uma política institucional de atendimento a
esse grupo possa ser formulada. Isso porque o atual modelo de gestão participativa
adotado pela instituição vem facilitando a implantação da PNH em todas as suas
instâncias, uma vez que esse novo modelo propõe uma descentralização como diretriz
política e a gerência participativa como estilo gerencial, visando descentralizar o
processo avaliativo e decisório e democratizando as relações no trabalho, estimulando
o debate sobre a vida hospitalar, criando espaço para discussão da metas a serem
alcançadas e definindo as tarefas por setores.
Assim, a política de humanização do Ministério da Saúde (MS) perpassa todos os
âmbitos do hospital, supondo uma interdependência entre pacientes, profissionais da
atenção direta e gestão, com o caráter de transversalidade embutida em todos os
âmbitos de atuação e todas as práticas: para aos usuários, há a política de acolhimento
e a ouvidoria; para os gestores, existe a gestão participativa na composição dos
colegiados e para os profissionais, viabiliza-se curso de formação. Entendida
atualmente com um novo enfoque, como uma política e não apenas como um
programa, a PNH, atualmente, ampliou seu campo de atuação e, conseqüentemente,
agregou novos sujeitos sociais, possibilitando a abertura de novos espaços de
discussão e a troca de experiências profissionais. Tornou-se um espaço coletivo,
organizado, participativo e democrático que se destina a empreender uma política
institucional de resgate de uma atenção humanizada na assistência, em benefício dos
usuários, profissionais e gestores, com a abertura de possibilidades para que várias
questões referentes às práticas assistenciais do hospital possam ser colocadas em
pauta.
Cecílio (2001), ao refletir sobre a possibilidade de enfrentar a iniqüidade nos espaços
singulares, como a exemplo dos hospitais, entende que a não-integralidade e a não-
eqüidade não só poderão ser escutadas ou apreendidas, mas também enfrentadas,
superadas ou reduzidas, se conseguirmos captá-las na sua dimensão individual,
32
subjetiva, singular, ali no espaço de cada serviço e no encontro de cada usuário com
suas necessidades únicas de saúde e a equipe de trabalho. Partindo desse princípio,
faz-se necessário que as questões relativas aos acompanhantes possam ser discutidas
entre todos os atores institucionais – desde aqueles profissionais que atuam na ponta,
até os gestores, a fim de que soluções possam ser encontradas para atender as
necessidades trazidas por esses usuários.
2.1 O HOSPITAL E O ATENDIMENTO AO ACOMPANHANTE
Mesmo com o avanço ocorrido em termos de existir legislações específicas que visem
regulamentar a presença dos acompanhantes nas instituições hospitalares, na prática,
o que se tem observado é que os hospitais ainda não dispõem de uma política
plenamente voltada para a inserção do acompanhante em suas unidades de
internação. Através de contatos realizados com profissionais de outros hospitais, o que
foi encontrado em termos da realidade, em nível estadual, é que as normas e regras
voltadas para os acompanhantes são definidas de acordo com as particularidades de
cada instituição hospitalar, assim como as suas atribuições que não estão definidas
como regra geral.
Na instituição onde foi realizada a pesquisa, também não existe uma política
formalizada com esse mesmo intuito. Algumas medidas institucionais são
explicitamente adotadas a fim de regularizar a presença dos acompanhantes nas
diversas unidades de internação da instituição. Algumas dessas diretrizes foram
traçadas, a partir da discussão iniciada por algumas categorias profissionais -
enfermeiros, assistentes sociais, nutricionistas - que se preocupavam com a questão
dos acompanhantes e sentiram a necessidade de estabelecer alguns parâmetros que
serviriam como critério para avaliar a presença dos mesmos junto aos pacientes
internados.
33
No entanto, apesar de existir algumas diretrizes que são adotadas na prática, estas
ainda se encontram em permanente discussão, passando por modificações de acordo
com as mudanças que vão surgindo em termos da realidade institucional e em termos
da política nacional do sistema de saúde. Atualmente, o que tem sido adotado na
instituição em que foi desenvolvido o estudo, em termos de regularizar a permanência
do acompanhante, são algumas normas e regras descritas a seguir.
A autorização para permanecer como acompanhante prescinde de autorização
expressa pelo enfermeiro, por meio de crachá de identificação, após ser avaliado o grau
de dependência física do paciente e a necessidade do acompanhante. Em casos,
porém, que envolvam dependência psicológica ou social, profissionais da área de
psicologia e serviço social também podem emitir parecer relativos à autorização da
presença de familiares ou responsáveis junto aos pacientes internados. Entretanto, a
condição clínica do paciente não é o único critério utilizado na instituição para autorizar
o acompanhante, visto que já é reconhecido o direito de acompanhamento para alguns
grupos de pacientes que estão assegurados por lei, como pacientes menores de idade;
idosos; deficientes físicos e gestantes. Nesses casos, a autorização é automaticamente
expressa pelos profissionais.
Quanto à condição para acompanhar, não é permitida a presença de acompanhantes
em adiantado estado de gravidez; menores de 18 anos de idade; idosos com idade
igual ou superior a 60 anos de idade; e do sexo oposto ao paciente que se encontra na
enfermaria, visando evitar constrangimento aos demais pacientes, salvo em situações
especiais e mediante avaliação da equipe. O tempo de permanência do acompanhante
também é avaliado pelo enfermeiro, podendo, eventualmente, ser prorrogado de acordo
com as necessidades do paciente e do interesse consensual dos familiares.
É permitido apenas um acompanhante por paciente, mas é permitido aos familiares
revezar com outras pessoas durante o período em que o paciente estiver internado,
ficando a critério deles o período e o turno que deverão acompanhar, segundo as
circunstâncias da situação e de sua própria disponibilidade de tempo. Também é
34
permitido à família contratar profissionais da área da saúde ou acompanhantes
remunerados, caso ela opte por essa decisão, sendo que os mesmos serão avaliados
em igualdade de condições em relação aos demais acompanhantes, pelos profissionais
do hospital. O horário estabelecido para a troca de acompanhantes é das 8h às 9h, no
período da manhã, e das 19h às 20h, no período da noite, sob o controle da Portaria
Central do hospital, mediante apresentação do crachá de identificação.
Em termos de infra-estrutura necessária à acomodação do acompanhante, o hospital
não dispõe de condições satisfatórias, pois existe dificuldade não apenas relacionada
com a falta de espaço físico nas enfermarias, como também com a falta de mobiliário
adequado ao sono e repouso, pois disponibiliza apenas uma cadeira comum para que
ele possa descansar durante todo o período que permanece no hospital. Além disso, o
hospital não dispõe de facilidades para que o acompanhante possa efetuar sua higiene
pessoal na própria unidade. Ele tem que utilizar o banheiro dos pacientes, não sendo
também disponibilizadas roupas de cama e banho, as quais devem ser trazidas de
casa.
Diante da precariedade da instituição para manter o acompanhante, é permitido que ele
traga uma cadeira de praia para que possa se acomodar melhor e, em casos de
extrema necessidade, ele pode utilizar a área da lavanderia para lavar e secar suas
roupas. Na enfermaria, existe um armário onde deverão ser guardados os pertences de
todos os acompanhantes, juntamente com os dos pacientes, e o hospital não se
responsabiliza pelos mesmos.
Os benefícios concedidos para o acompanhante são avaliados pelo assistente social,
conforme critérios previamente estabelecidos e incluem direito à alimentação; vale-
transporte; ligações locais e interurbanas; e em casos, eventuais, kit-higiene e
vestuários. A alimentação é fornecida para os acompanhantes dos pacientes que têm a
garantia assegurada por lei, como: a) idosos com idade igual ou superior a 60 anos de
idade; b) crianças e adolescentes, com idade inferior a 18 anos de idade; c) portadores
de deficiência física e/ou mental; d) gestantes.
35
Entretanto, apenas as mães acompanhantes têm direito às três refeições diárias - café
da manhã, almoço e o jantar - e para os demais acompanhantes são fornecidas apenas
duas refeições – o café da manhã e o almoço. Os casos que ainda não estão
assegurados por lei, são avaliados pelo assistente social e, caso fique constatada a
necessidade, o acompanhante passa a ser incluído em uma lista de excedentes para
que possa receber a alimentação do hospital.
É importante ressaltar que essa medida foi adotada pela equipe profissional, perante a
ordem estabelecida pela direção do hospital, proibindo-se a concessão das refeições
para os casos de acompanhantes que não estavam respaldados pela legislação do
SUS. Em princípio, as legislações que garantem os acompanhantes vêm beneficiar
alguns pacientes, postergando-se o direito de outros que, muitas vezes, apresentam
condições sócio-econômicas menos favoráveis.
Os acompanhantes com direito à alimentação devem pegar o tíquete alimentação com
a secretária do Serviço Social, todos os dias, no período das 8h às 10h, mediante
apresentação do crachá de identificação que, nesse caso, é pessoal e intransferível. As
refeições são servidas aos acompanhantes no refeitório do hospital. O horário
estabelecido para o café da manhã é das 8h30min às 9h; o almoço das 12h às 13h; e o
jantar das 21h30min às 22h. A fim de controlar a distribuição da alimentação, o Serviço
Social atua em parceria com o Serviço de Nutrição do hospital, que fica com a
responsabilidade de receber e conferir os tíquetes, ou, em alguns casos, a autorização
é emitida pelo assistente social.
Quanto à questão da liberdade para circular dentro do hospital, o acompanhante tem
sua entrada e saída controlada pelos profissionais da portaria central, mediante
apresentação do crachá de identificação com a autorização do enfermeiro responsável
para cada setor. Cabe a esses profissionais controlar, também, a troca do
acompanhante, para evitar que duas pessoas permaneçam com o mesmo paciente.
36
Como forma de padronizar as ações dos acompanhantes, o hospital tem adotado
algumas prerrogativas que, na prática, convergem-se em normas institucionais, as
quais eles devem cumprir durante o período de permanência junto ao paciente
internado. Dessa forma, estão oficialmente definidas pela instituição algumas funções
de responsabilidade exclusiva do acompanhante, junto ao paciente, que se acham
inscritas em manual específico.
Dentre as responsabilidades dos acompanhantes, encontram-se definidas: a) auxiliar
nos cuidados básicos do paciente junto à enfermagem somente quando solicitado; b)
permanecer ao lado do paciente; c) estar sempre alerta durante o período noturno,
comunicando à enfermagem qualquer alteração que possa ocorrer com o paciente; d)
permanecer com o crachá nas dependências do hospital; e) caso necessite sair de
perto do paciente, deverá imediatamente comunicar à enfermagem; f) ter o máximo de
cuidado com punções venosas, sondas, drenos, ao transportar o paciente para o
banheiro ou outros lugares; g) não permitir que o paciente retire punções venosas,
sondas e outros, contribuindo assim para a recuperação dele; h) informar à
enfermagem caso necessite deslocar o paciente para fora das dependências do setor; i)
estabelecer um bom relacionamento com os demais acompanhantes e pacientes nas
enfermarias; j) colocar roupas sujas do paciente em local apropriado, ou seja, em
sacolas; l) retirar-se da enfermaria, em horário de visita médica e execução de
procedimentos, a menos que seja solicitado; m) dirigir-se aos profissionais da instituição
com respeito.
Em relação aos limites impostos aos acompanhantes, também foram definidas pelos
profissionais do hospital, algumas condutas que não devem ser permitidas aos mesmos
quando da permanência deles junto ao paciente internado. Dentre elas, constam: a)
estar alcoolizado; b) interferir na assistência de enfermagem; c) administrar
medicações, tentar controlar os soros, fazer curativos ou realizar qualquer procedimento
de enfermagem; d) profissionais da área de saúde ou acompanhantes remunerados
contratados pela família não serão autorizados a realizar procedimentos que são
funções da enfermagem, bem como trajar roupas brancas; e) transitar ou permanecer
37
nos corredores, postos de enfermagem, outras enfermarias ou setores do hospital; f)
sentar-se na cama do paciente; g) fazer comentários negativos próximos ao paciente; h)
usar roupas de praia, shorts, bermudas curtas, decotes muito acentuados e roupas
transparentes; i) lavar ou secar roupas no banheiro ou dependências da enfermaria,
inclusive janelas, cabeceira das camas e suporte de soro; j) trazer televisores, rádios e
colchonetes para as dependências do hospital; l) atender ao telefone do setor, caso
necessário, utilizar os telefones públicos ou do Serviço Social; m) fumar nas
dependências do hospital; n) perturbar o silêncio em todas as dependências do
hospital, após as 22h, bem como permanecer com o televisor do setor ligado após esse
horário; o) utilizar o crachá de acompanhante como meio de entrada de outras pessoas
no hospital; p) utilizar lençóis, cobertores e fronhas da instituição para uso próprio; q)
dormir no chão das enfermarias; r) manusear prontuários; s) comer nas enfermarias e
corredores; t) mexer em equipamentos e materiais do setor.
O não-cumprimento de tais responsabilidades e condutas disciplinares previstas é
discutido e avaliado pela equipe profissional, a quem caberá tomar as medidas
necessárias, podendo ser adotada a advertência ou mesmo o desligamento do
acompanhante.
O hospital também procura regularizar a presença dos visitantes nas suas unidades de
internação, definindo alguns critérios que devem ser observados, tais como: a) o horário
diário estipulado para as visitas; b) o número de apenas dois visitantes para cada
paciente, sem revezamento; c) a realização de cultos ou orientações religiosas somente
poderá ser efetivada com a permissão do paciente, em voz baixa, e depois de
agendado anteriormente com o pastor do serviço de capelania do hospital. Em relação
a algumas proibições, o hospital determina que não será permitido ao visitante: a)
sentar na cama do paciente; b) trazer alimentos sem a liberação prévia e por escrito da
nutricionista do hospital; c) entrar nas enfermarias com identificação de isolamento, sem
a orientação da enfermagem.
38
Essas são algumas das diretrizes adotadas no hospital para autorizar e regulamentar a
presença do acompanhante em suas diversas unidades de internação e que, de acordo
com as necessidades, costumam passar por reformulações.
39
3 PERCURSO METODOLÓGICO
3.1 TIPO DE ESTUDO
O estudo realizado foi do tipo exploratório e descritivo, de natureza qualitativa, que
pretendeu conhecer a experiência de acompanhar um paciente adulto hospitalizado na
perspectiva dos próprios acompanhantes. Os estudos exploratórios, segundo Selltiz et
al. (1975), destina-se a obter idéias e a compreensão mais acurada do fenômeno para,
posteriormente, precisar melhor o problema ou formular hipóteses mais significativas,
ou seja, possibilitam ampliar o conhecimento do pesquisador sobre o fenômeno para,
em um segundo momento, ele poder ser aprofundado.
A pesquisa foi do tipo descritiva, na medida em que pretendeu identificar, descrever e
caracterizar o fenômeno ou fato, e do tipo estudo de caso, na expectativa de conhecer
uma realidade mais detalhada do comportamento de poucos sujeitos enquanto
acompanhante, de forma que amplie a compreensão e as descobertas sobre esse
universo. Como limitação do método, no estudo de caso destaca-se a não
generalização dos resultados. (ABRAGMO, 1979; GIL, 1994, SANTOS, 2000;
SIGELMANN, 1984).
3.2 LOCAL DE ESTUDO
A pesquisa foi desenvolvida em um hospital governamental, geral, que recebe alunos
em nível de graduação e pós-graduação e que tem como objetivo prestar assistência
médico-hospitalar, além de atender às necessidades do processo ensino-
aprendizagem, propiciando o aperfeiçoamento de alunos em via de formação
profissional. Com as características de um hospital-escola, é regido dentro de alguns
princípios nos quais busca uma identidade própria e cujas finalidades fundamentais
são: a) constituir-se em centro de promoção e manutenção da saúde da comunidade; b)
constituir-se em centro de ensino e pesquisa no âmbito da saúde, promovendo
estágios, treinamentos e servindo como pólo de educação permanente de profissionais
40
no campo das ciências da saúde; c) desenvolver programas de medicina preventiva e
atividades de pesquisa de ordem científica técnico-operacional, atuando como hospital
de referência no estado, contribuindo para o aperfeiçoamento da assistência médico-
hospitalar regional; d) operar em regime cooperativo com as demais instituições de
saúde promovendo a elevação dos níveis de educação para a saúde da comunidade.
O Hospital, além de serviços de internação, possui serviços ambulatoriais para áreas de
especialidades médico-odontológicas, com um total de duzentos e oitenta e um leitos
para internações clínicas, CTI (Centro de Tratamento Clínico) e Pronto-Socorro. Além
disso, possui sete salas de cirurgias e um banco de sangue. Quanto à sua clientela, o
Hospital recebe paciente proveniente de todo o estado e de outros estados vizinhos,
principalmente do norte de Minas Gerais e do sul da Bahia.
Foi selecionado o setor de clínica médica do hospital para coleta de dados por ser um
local onde ficam internados pacientes por um longo período, portadores em sua
maioria, de doenças crônicas, e devido às suas características, alguns deles têm a
presença diária de um acompanhante. Nesse sentido, entendeu-se que era um setor
que apresentava condições favoráveis para investigar o objeto de estudo.
No setor de clínica médica, admitem-se pacientes de diversas especialidades, como
hematologia, dermatologia, neurologia, reumatologia, infectologia, clínica geral,
possuindo quatorze enfermarias com três leitos cada uma delas. Consta também de um
hospital-dia, cuja finalidade é atender pacientes para pequenos procedimentos sem
necessidade de internação, funcionando em articulação com os ambulatórios. A média
de atendimento do hospital-dia é de vinte a trinta pacientes. A equipe de saúde desse
setor é composta por médicos staff e residentes, enfermeiros, assistente social,
nutricionista e auxiliares e técnicos de enfermagem e de nutrição. O setor conta ainda
com alunos de cursos de graduação relacionados à saúde – medicina, enfermagem,
serviço social, nutrição e fisioterapia.
41
3.3 POPULAÇÃO
Foram incluídos no estudo os acompanhantes que apresentavam laços de parentesco
com o paciente internado. Em casos com mais de um acompanhante, optou-se por
entrevistar aquele que ficava o maior tempo com o paciente.
A opção por pesquisar acompanhantes familiares decorreu do fato de que se observa
que na maioria dos casos, é a família que disponibiliza tempo para o acompanhamento
de pacientes hospitalizados, seja ao longo da evolução da doença, ou em parte desse
percurso. Por outro lado, a maioria das pesquisas realizadas a respeito dessa temática
aponta como resultado que os acompanhantes, em sua maioria, são membros
familiares dos pacientes (LAUTERT; ECHER; UNICEVSKY, 1998, VAN DER SMAGT-
DUIJNSTEE et al., 2000; THOMAS; MORRIS; HARMAN 2002; PAI; SOARES, 1999).
Optou-se também por obter dados da equipe profissional, a fim de melhor compreender
algumas questões que permeiam o acompanhante hospitalar, estabelecendo uma
comparação entre os dados.
3.4 AMOSTRA
O critério para o tamanho da amostra de acompanhantes foi a similaridade no conteúdo
das respostas, ou seja, a amostragem por saturação. Segundo Turato (2003, p.363):
o pesquisador fecha o grupo quando, após as informações coletadas com um
certo número de sujeitos, novas entrevistas passam a apresentar uma
quantidade de repetições em seu conteúdo [...] e novas falas passam a ter
acréscimos pouco significativos em vista dos objetivos inicialmente propostos
para a pesquisa.
No presente estudo, verificou-se a repetição nas informações com as doze primeiras
entrevistas realizadas com os acompanhantes, não sendo observados outros
conteúdos novos.
42
No que diz respeito à seleção dos acompanhantes, optou-se por utilizar a amostragem
intencional. Segundo Turato (2003, p.357) nesse tipo de amostragem “o pesquisador
delibera quem são os sujeitos que comporão seu estudo, ficando livre para escolher
entre aqueles cujas características possam, em sua visão, trazer informações
substanciosas sobre o assunto em pauta”.
Além do critério quanto a ser um familiar do paciente, foi estabelecido também que não
deveriam ser selecionados no estudo os acompanhantes remunerados, pois se entende
que o tipo de vínculo que estes estabelecem com o paciente é diferente. Pretendeu-se,
com isso, trabalhar com uma amostra mais homogênea.
Além disso, foi definido que os acompanhantes selecionados deveriam estar
acompanhando o paciente por, no mínimo, trinta dias, período considerado como
suficiente para que eles pudessem relatar a experiência deles em ser acompanhante.
A amostra utilizada para a seleção dos profissionais foi do tipo intencional, onde foram
escolhidos aqueles integrantes que na opinião da pesquisadora, tinham maior contato
com os acompanhantes na rotina diária das enfermarias e que poderiam, assim,
fornecer informações mais substanciosas sobre o objeto em estudo. Também foi
estabelecido que os profissionais deveriam estar atuando na instituição hospitalar por,
no mínimo, um ano, por considerar como um prazo que possibilitaria a vivência deles
com os acompanhantes.
Dessa forma, foram entrevistadas duas médicas residentes, duas enfermeiras e quatro
técnicos de enfermagem, por considerar que estes últimos atuam mais diretamente nos
cuidados com o paciente internado. Ao total, foram entrevistados oito integrantes da
equipe profissional.
43
3.5 INSTRUMENTOS
Para a coleta dos dados, foi elaborado um roteiro semi-estruturado de entrevista para
os acompanhantes (APÊNDICE A), contendo trinta questões, sendo que treze
perguntas se referiam à caracterização pessoal dos informantes, como sexo, estado
civil, religião, idade, escolaridade, procedência, renda per capita, ocupação, tempo de
acompanhamento e grau de parentesco com o paciente. As demais perguntas foram
distribuídas em quatro blocos distintos, que foram construídos com base nos objetivos
do estudo, compreendendo:
a) sobre as atividades de cuidado desenvolvidas pelos acompanhantes (perguntas nº
14;15);
b) sobre a experiência no acompanhar (perguntas nº 16; 17; 18; 19; 20; 21; 22; 23; 24);
c) sobre as estratégias de enfrentamento utilizadas (perguntas nº 25; 26);
d) sobre a percepção da instituição hospitalar e sua relação com a equipe profissional
(perguntas nº 27; 28; 29; 30).
Também foi elaborado um roteiro semi-estruturado de entrevista para ser aplicado com
os profissionais (APÊNDICE B), com o objetivo de obter dados desses sujeitos e fazer
uma correlação com aqueles que foram fornecidos pelos acompanhantes, procurando
apontar as divergências e convergências em ambos os discursos.
Esse instrumento apresentou o total de doze questões, sendo que as sete perguntas
primeiras eram referentes à caracterização pessoal dos profissionais, como nome, setor
de atuação, categoria profissional, carga horária semanal, turno de trabalho, tempo de
formação e tempo de trabalho na instituição. As cinco perguntas restantes foram
incluídas num único bloco, que visava explorar sobre a experiência diária da equipe
com os acompanhantes na instituição hospitalar. Os instrumentos foram submetidos ao
teste piloto com oito acompanhantes e três profissionais a fim de avaliar o conteúdo das
questões, havendo a necessidade de alterar algumas delas, que não acrescentavam
valor referente ao objeto de estudo.
44
3.6 ASPECTO ÉTICO
A fim de cumprir com os preceitos éticos, o projeto de pesquisa foi encaminhado
primeiramente para avaliação junto ao Comitê de Ética em Pesquisas do Hospital
Infantil Nossa Senhora da Glória, sendo aprovado para sua execução (ANEXO A). O
projeto também foi encaminhado para a direção do Hospital e solicitada autorização
para que a pesquisa fosse realizada na instituição, tendo havido o consentimento.
Para que os participantes sentissem segurança em prestar informações, procurou-se
esclarecer quem era a pesquisadora, os objetivos da pesquisa, o tipo de colaboração
que se desejava receber, o modo como os dados seriam registrados e utilizados para
publicação, bem como se especificou da liberdade que eles tinham em recusar a
participar do estudo. Caso concordassem em colaborar com a pesquisa, era fornecido o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para que fosse assinado (APÊNDICE C).
A mesma medida foi adotada com os profissionais que participaram do estudo, sendo
elaborado um Termo de Consentimento (APÊNDICE D) visando igualmente assegurar
os acordos estabelecidos no estudo.
Como alguns acompanhantes apresentaram dificuldade na leitura, foi necessário que
todo o conteúdo do documento fosse lido pela pesquisadora em voz alta e
pausadamente, explicando aos entrevistados os termos nele contidos à medida que
também esclarecia as suas dúvidas.
3.7 COLETA DE DADOS
Os dados foram coletados no período de dez de janeiro a 28 de fevereiro de 2005,
quando começou haver a repetição no conteúdo das respostas, não havendo
necessidade de realizar novas entrevistas.
45
3.8 PROCEDIMENTOS
Quanto aos procedimentos de coleta adotados, primeiramente, foi realizado um
levantamento dos pacientes da clínica médica do Hospital que tinham acompanhantes
e verificado quais deles estavam dentro dos critérios previamente estabelecidos para
que pudessem participar da pesquisa.
Uma vez constatada a possibilidade de participação do acompanhante, ele era
previamente convidado pela pesquisadora a comparecer no local reservado para fazer
a entrevista no dia e horário marcados. Procurou-se respeitar a possibilidade de os
acompanhantes poderem ausentar-se de perto dos pacientes.
Os membros familiares foram entrevistados individualmente e uma única vez. Após a
gravação das entrevistas, procedeu-se à transcrição dela na íntegra, tarefa que foi
realizada por outra pessoa. Após receber o material transcrito, a pesquisadora revisou
todo o material, checando a fidedignidade da transcrição com o conteúdo das fitas
gravadas. Posteriormente, as fitas foram destruídas.
O fato de a pesquisadora ter vínculo com o local de estudo contribuiu para que algumas
etapas fossem alcançadas sem maiores dificuldades, como a facilidade em ter acesso
aos membros familiares do paciente e o estabelecimento de uma relação de confiança
com eles, um fato constatado durante todo o processo da entrevista. Portanto, a adesão
dos acompanhantes foi total, não havendo ninguém que se recusasse a participar.
Também o fato de a pesquisadora ter experiência por alguns anos com as questões
pertinentes ao estudo, facilitou a aplicação das entrevistas.
Pela própria característica da instituição hospitalar, tornou-se inevitável a presença de
alguns obstáculos, quando se pretendeu a realização de um trabalho onde foi exigida
maior disponibilidade das pessoas selecionadas. Durante a fase de coleta de dados, a
pesquisadora teve dificuldade, algumas vezes, em cumprir com o cronograma
46
estabelecido para as entrevistas. Isso decorreu da impossibilidade de o acompanhante
não poder se ausentar da enfermaria no horário agendado para a entrevista, o que
exigiu que outros horários fossem acordados. A dificuldade maior, porém, foi em
relação à participação da equipe profissional, uma vez que os componentes dela
sempre alegavam a falta de tempo para dar entrevistas, devido ao acúmulo de tarefas.
Isso exigiu que a pesquisadora visitasse várias vezes as enfermarias para negociar os
horários com esses profissionais, chegando, muitas vezes, a aguardar por horas a
disponibilidade deles em prestar as informações.
O fato de não se contar com um local apropriado para realizar as entrevistas nas
enfermarias foi outra dificuldade encontrada durante essa etapa. Os profissionais, em
hipótese alguma, aceitavam ausentar-se das enfermarias para que fossem
entrevistados, por isso os locais eram improvisados e tomavam-se as medidas para
evitar o acesso de outras pessoas e interrupções durante a gravação. Houve, também,
maior resistência por parte desse grupo e maior questionamento sobre a finalidade e
aplicabilidade da pesquisa que estava sendo desenvolvida. Entre a equipe profissional,
apenas uma pessoa se negou a participar da entrevista, justificando que tinha pouco
tempo de trabalho na instituição e que também não queria se envolver com as questões
relativas ao estudo.
3.9 TRATAMENTO DOS DADOS
A técnica selecionada para o tratamento dos dados foi a análise de conteúdo, que,
segundo definição da Bardin (1977, p.9):
Constitui-se em um conjunto de instrumentos metodológicos, que se aplicam a
‘discursos’ (conteúdos e continentes) extremamente diversificados [...] desde o
cálculo de freqüências que fornece dados cifrados, até à extração de estruturas
traduzíveis em modelos, é uma hermenêutica controlada, baseada na dedução: a
inferência.
A opção pela aplicação da técnica de análise de conteúdo ocorreu em virtude do
interesse da pesquisadora em conhecer os fatos além da objetividade traduzida nos
47
dados. Importava, sobretudo, compreender o não-aparente, o potencial de inédito (ou
do não-dito) retido em qualquer uma das mensagens, que seriam emitidas pelos
acompanhantes selecionados no estudo, como forma de atingir a maior compreensão
possível do fenômeno em investigação. Acredita-se que a análise de conteúdo possa
permitir alcançar essa magnitude de avaliação e análise dos dados, visto que, enquanto
esforço de interpretação, é um tipo de técnica que permite ao investigador oscilar entre
dois pólos distintos - do rigor da objetividade à fecundidade da subjetividade.
Optou-se, ainda, por trabalhar com abordagens qualitativas que visem manter a forma
literal dos dados. Neste tipo de abordagem, o pesquisador decide prender-se às
nuanças de sentido existentes entre as unidades, aos elos lógicos entre essas
unidades, ou entre as categorias que as reúnem, “visto que a significação de um
conteúdo reside largamente na especificidade de cada um de seus elementos e na
relação entre eles, que escapa amiúde ao domínio do mensurável” (LAVILLE; DIONNE,
1999, p.227). Dessa forma, ao trabalhar com os dados, o pesquisador procurou manter
uma flexibilidade quanto à forma de tabular, classificar e interpretar os dados, não
perdendo de vista o rigor necessário ao uso da técnica.
Os dados foram analisados seguindo-se as distintas fases da técnica de análise de
conteúdo, que segundo Bardin (1977, p.95), compreende: “a pré-analise; a exploração
do material; o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação”, que não
correspondem, necessariamente, a uma seqüência lógica. Após a correção do
conteúdo das entrevistas que havia sido transcrita, foi feita uma leitura flutuante de todo
o conteúdo, demarcando as idéias centrais do texto que respondiam aos objetivos do
estudo. A fim de facilitar a compreensão dos dados, optou-se por analisar toda a
enunciação emitida em cada entrevistado e por agrupar as que tinham o mesmo
sentido de significação. Importante ressaltar que, nesse momento, fez-se necessário
que o pesquisador retornasse à leitura do texto por várias vezes consecutivas, a fim de
ir estabelecendo uma correlação entre as diversas mensagens que foram emitidas.
48
Uma vez estabelecias as unidades de registro, a partir das idéias centrais, repassadas
pelos acompanhantes, foi possível formar os seguintes blocos de categorias de análise
específicas aos objetivos do estudo: a) sobre os motivos que levaram os
acompanhantes a ficarem com os pacientes; b) sobre as atividades que realizaram
junto aos pacientes internados; c) sobre as dificuldades apresentadas durante a
permanência no hospital; d) sobre as alterações percebidas depois que passaram a
acompanhar o paciente no hospital; e) sobre as estratégias utilizadas durante o período
de acompanhamento.
49
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
No sentido de organizar a apresentação dos resultados, foi realizado, inicialmente, um
agrupamento dos dados em cinco blocos de resposta, de acordo com os objetivos
propostos neste estudo. Primeiramente, será apresentado o bloco de respostas
referente à caracterização dos doze acompanhantes: a) caracterização sócio-
demográfica – sexo, idade, escolaridade, ocupação, religião, estado civil, procedência e
renda per capita; b) caracterização em relação ao paciente – tempo de
acompanhamento, grau de parentesco com o paciente e motivo para acompanhar o
paciente; c) caracterização das atividades de cuidado desenvolvidas pelos
acompanhantes.
A seguir, virá um bloco de respostas sobre os motivos que levaram os acompanhantes
a ficarem com o paciente internado. Posteriormente, serão apresentadas as atividades
que realizaram, as dificuldades e demandas apresentadas na instituição hospitalar, bem
como os dados referentes às modificações ocorridas na vida deles, durante o período
de acompanhamento do paciente. E por fim, as estratégias de enfrentamento
apontadas pelos acompanhantes, diante de algumas dificuldades experienciadas no
hospital.
Os dados serão apresentados em forma de tabelas, contendo as unidades de
significação extraídas dos resultados ou as categorias formadas e a freqüência de
ocorrência delas. Também serão apresentados fragmentos do discurso dos doze
acompanhantes para ilustrar a apresentação dos dados.
Um sujeito pode apresentar mais de um elemento codificado em dada resposta, e,
nesse sentido, a freqüência de ocorrência das respostas poderá ultrapassar o número
de sujeitos do estudo. É importante, deixar claro, que o total de porcentagem foi
calculado sobre o nível de aparecimento das respostas e não sobre o número de
sujeitos (n).
50
4.1 CARACTERIZAÇÃO SÓCIO-DEMOGRÁFICA DOS SUJEITOS
Quanto à caracterização sócio-demográfica dos doze acompanhantes entrevistados,
observa-se na Tabela 1, que onze deles pertenciam ao sexo feminino e apenas um era
do sexo masculino. Esses achados corroboram com resultados encontrados em outros
trabalhos que foram realizados nessa área, em que a maioria das pessoas que
acompanhava os pacientes hospitalizados era mulheres. (FRANCO,1988; LAUTERT;
ECHER; UNICEVSKY, 1998; LUCCHESE, 2003). E quanto ao estado civil, dez
acompanhantes eram casados e apenas dois eram solteiros.
Sobre a faixa etária, sete acompanhantes apresentavam idade superior a 50 anos, três
tinham idade entre 30 a 50 anos e somente duas apresentavam idade inferior a 30
anos. Desta forma, observa-se que na amostra estudada, os acompanhantes são
constituídos por pessoas adultas, acima de 50 anos, o que também vai ao encontro de
outros resultados (ASTEDT-KURKI; PAUNONEN; LEHTI, 1997; LAUTERT; ECHER;
UNICEVSKY, 1998; ERIKSSON; LAURI, 2000).
Quanto à escolaridade, observa-se na Tabela 1 que nove acompanhantes
apresentavam baixo nível educacional, estando entre os que possuíam apenas o
ensino fundamental incompleto ou que nunca tinham freqüentado a escola. Dois
acompanhantes tinham completado o ensino médio e apenas um o ensino superior
incompleto.
A renda per capita variou entre abaixo de um salário e menos de três salários mínimos,
características essas também encontradas em outros estudos que mostraram que a
renda per capita dos acompanhantes atingia, no máximo, três salários mínimos e que
poderia estar associada ao baixo nível de escolaridade apresentado por esses
indivíduos (FRANCO,1988; LAUTERT; ECHER; UNICEVSKY, 1998).
Quanto à ocupação, nove acompanhantes não tinham ocupação definida, conforme
classificação utilizada por Fonseca (1967). Desses, seis eram donas de casa, dois eram
51
aposentados e uma era desempregada. Apenas três delas estavam inseridas no
mercado de trabalho tendo ocupação manual especializada (costureira) e não manual
(agente de saúde e professora). Quanto ao vínculo empregatício desses trabalhadores,
dois eram mantidos por contrato e apenas uma era autônoma. Outras pesquisas
corroboram com os resultados encontrados sobre o fato de a maioria dos
acompanhantes serem donas de casa (FRANCO, 1988) ou pensionistas e assalariados
(ASTEDT-KURKI; PAUNONEN; LEHTI, 1997).
Em relação à procedência, sete acompanhantes eram da Grande Vitória, três eram do
interior do estado e dois de outros estados, como Bahia e Minas Gerais. E quanto à
religião, nove se declararam como católicos e três como evangélicos.
Os dados sócio-demográficos da amostra estudada evidenciam que a maioria dos
acompanhantes é constituída por mulheres casadas, com idade superior a 50 anos de
idade. Pelo fato de serem donas de casa e estarem fora do mercado de trabalho,
provavelmente, têm maior disponibilidade de tempo para acompanhar o paciente
internado. Em sua maioria, são pessoas que apresentam uma idade avançada para
ficar acompanhando diariamente o paciente no hospital, passando a exercer as
atividades que exigem certo esforço físico e emocional.
São indivíduos que por suas características sócio-demográficas, fazem parte de extrato
social menos privilegiado e de baixa qualificação, não tendo, muitas vezes, condições
financeiras para custear despesas que surgem em conseqüência da doença e
hospitalização de seu familiar. Também é significativo o número daqueles que
precisaram se deslocar da sua cidade de origem para acompanhar o paciente no
hospital, considerando-se que de uma amostra de doze acompanhantes, cinco deles
estavam entre aqueles que eram provenientes de outras cidades do interior do estado
ou de outros estados. Como conseqüência, tiveram que se afastar por um longo
período de seus amigos e familiares precisando se adaptar de forma súbita a uma nova
realidade. Em alguns casos, esses acompanhantes sentiam mais dificuldades para
52
enfrentar a nova situação por não terem pessoas conhecidas e próximas com quem
pudessem contar, realidade esta muitas vezes observada na rotina diária dos hospitais.
Sobre a caracterização dos acompanhantes em relação aos pacientes, o tempo de
acompanhamento variou de trinta a quarenta dias, sendo que sete deles permaneciam
no hospital acompanhando por doze horas ininterruptas e os outros cinco por vinte
quatro horas diárias, ou seja, em período integral.
Quanto ao grau de parentesco, a maioria dos acompanhantes era cônjuges dos
pacientes, sendo que cinco deles eram esposas e um era esposo; quatro delas eram
filhas e duas eram mães. Esses resultados também foram encontrados em outros
estudos que mostraram esposas e filhas como maioria de acompanhantes dos parentes
internados (ASTEDT-KURKI; PAUNONEN; LEHTI, 1997; AZOULAY et al., 2001; VAN
DER SMAGT-DUIJNSTEE et al., 2000).
Quanto à caracterização sócio-demográfica dos oito profissionais entrevistados, sete
era do sexo feminino e um do sexo masculino.
Quanto ao tempo de titulação, três desses profissionais tinham até três anos de
formados, outros três até seis anos de formados, um tinha oito anos e outro mais de
dez anos de formação.
Quanto ao tempo de vínculo profissional, dois deles estavam atuando na instituição
hospitalar por um período de dois anos, outros dois por cinco anos, e três por oito anos
e apenas um por mais de oito anos. A carga horária de trabalho desses profissionais
variava de quarenta a sessenta horas semanais e em turnos variados – matutino,
vespertino, noturno.
53
Tabela 1. Caracterização sócio-demográfica dos acompanhantes de pacientes hospitalizados. Vitória.
2005.
Variáveis
n %
Sexo
Feminino
Masculino
Estado civil
Casados
Solteiros
Idade
< 30 anos
30 a 40 anos
41 a 50 anos
51 a 60 anos
> 60 anos
Escolaridade
Ensino fundamental incompleto
Ensino médio completo
Ensino superior incompleto
Nunca freqüentou a escola
Renda per capita
< 1 salário mínimo
1
1 a 3 salários mínimos
> 3 salários mínimos
Ocupação
Manual especializada
Não manual
Sem ocupação definida
11
1
10
2
2
2
1
4
3
6
2
1
3
5
6
1
1
2
9
91,7
8,3
83,3
16,7
16,7
16,7
8,3
33,3
25
50
16,7
8,3
25
41,7
50
8,3
8,3
16,7
75
1
O salário mínimo atual é de R$300,00.
54
4.2 PERCEPAÇÃO DOS ACOMPANHANTES SOBRE A EXPERIÊNCIA DE
ACOMPANHAR O PACIENTE HOSPITALIZADO
Sobre os motivos que levaram os acompanhantes a ficarem com o paciente, as
respostas foram categorizadas em - afetividade e obrigação (Tabela 2). Quando
interrogados sobre os motivos que os levaram a acompanhar o paciente no hospital,
seis acompanhantes declararam que foi pelo sentimento de afetividade mantido entre
eles. Dessa forma, a pré-disposição em acompanhar seria pelo fato de quererem ficar
perto do paciente para que ele se sentisse mais tranqüilo, poderem apoiá-lo quando ele
estivesse em estado grave, poder facilitar a adaptação do paciente no hospital por
conhecer bem a rotina do mesmo, e por ter interesse em obter informações sobre a
doença e o tratamento do paciente.
Eu estando perto dele [paciente] ele se acha mais confortável. Eu penso
isso. A gente nunca se largou porque a gente vai se dividir agora? (Ac.
2).
2
Ah! Eu preferi acompanhar para saber tudo o que estava acontecendo
com ele (Ac. 4).
Eu prefiro ficar, porque eu é que convivo com ele, né? Então, eu sei o dia
a dia de nós dois como é o horário da comida, dos remédios. Então, é
mais fácil acompanhar (Ac. 11).
Os outros quatro acompanhantes relataram que o motivo que os levaram a acompanhar
foi o sentimento de obrigação quanto a assumir o paciente internado, pois não havia
outras pessoas que pudessem desempenhar essa função.
É porque não tem outra pessoa pra trocar comigo. É só eu mesmo. Tanto
faz aqui, como onde estiver, só tem eu mesmo (Ac. 1).
2
A abreviatura “Ac” é utilizada para acompanhante.
55
Não tem escolha, minha filha. Escolha nenhuma. Eu sou o esposo dela,
estou casado há 33 anos (Ac. 3).
Porque somos em dois filhos. Só eu e meu irmão de 16 anos. Ele não
queria ficar mesmo, porque achava que pra ele é muito difícil (Ac. 7).
Porque somos marido e mulher. Nós somos um casal. E tem só nós dois
(Ac. 9).
Apenas um acompanhante alegou que o motivo dele acompanhar o paciente é porque
ele tem mais disponibilidade, uma vez que estava de férias e outro expressou
apresentar características pessoais que o favorecia no trato com o paciente.
Porque eu estou de férias. Estou disponível. As outras irmãs estão
trabalhando (Ac. 11).
Porque eu sou a única que tem paciência com a minha mãe [...] Eu já
passei quatro meses internada aqui e já sei um pouquinho, sobre hospital.
E eu sou assim, estou pro que der e vier (Ac.12).
Tabela 2. Motivos que levaram os acompanhantes a ficarem com os pacientes hospitalizados. Vitória.
2005.
Categorias Freqüência de respostas
n %
Afeto
6 50
Obrigação
4 33,4
Disponibilidade
1 8,3
Paciência
1 8,3
56
Pelo fato de a amostra ter sido selecionada a partir do parentesco com o paciente,
entende-se o sentimento de afetividade declarado pelos acompanhantes como o
principal motivo que os levaram a acompanhar. Era também esperado que tomassem a
decisão de estar junto do paciente, principalmente aquelas pessoas que apresentavam
sentimento de amor e de responsabilidade por ele. Dessa forma, foi possível perceber
como esses acompanhantes mantinham esses laços de afetividade pelo seu familiar
internado, mesmo diante da nova situação imposta pela doença e pela hospitalização.
No entanto, também é importante lembrar que a maioria desses acompanhantes era
casais, que vinham de casamentos duradouros, e que, portanto, haviam assumido a
responsabilidade de uma convivência mútua, o que era de se esperar que tivessem
dificuldade para se manterem afastados durante esse período.
O sentimento de dever e de obrigação para com o companheiro(a) era muito evidente
entre os cônjuges que acompanhava, demonstrando existir entre eles muita afinidade e
cumplicidade, o que é confirmado quando declararam conhecer bem a rotina um do
outro e quando expressaram o desejo em estar por perto para propiciar-lhe melhor
conforto. Na pesquisa, entre doze acompanhantes entrevistados, foram encontradas
cinco esposas, que eram as acompanhantes permanentes, durante o processo de
internação dos seus maridos, estando presente apenas um marido que exercia essa
mesma função. Esse fato está relacionado com a literatura, que destaca a tendência de
as esposas assumirem o papel de acompanhante nessas horas, sendo que o mesmo
não pode ser afirmado em relação aos maridos.
Para alguns autores, essa questão poderia ser entendida por duas vertentes: ou seria
pelo fato de o marido trabalhar para prover a família ou porque os homens não se vêem
como cuidadores, isto em função de diversos fatores – culturais, sociais, ideológicos – e
acabam delegando essas funções para as mulheres da família, preferencialmente as
esposas e as filhas. (SILVA, 1998a; PERRACINI; NERI, 2001; BORGES, 2003). Seja
por qualquer um desses motivos, a tarefa de cuidar já estaria a partir daí associada a
uma questão de gênero nas sociedades. Segundo definição de NERI (2001, p.30) as
57
tarefas de cuidar “envolvem classes de ações concernentes a auxiliar diretamente uma
pessoa física e mentalmente incapacitada, a desempenhar tarefas práticas de vida
diária e tarefas básicas de autocuidado”.
Sobre as atividades que realizaram junto aos pacientes internados, as respostas
mostraram que os acompanhantes desempenharam atividades relacionadas ao
atendimento das necessidades humanas básicas e atividades relacionadas à
terapêutica (Tabela 3). Com base nos relatos dos acompanhantes, foi possível verificar
que as atividades mais executadas por eles eram aquelas que tinham por objetivo
atender às necessidades humanas básicas do paciente internado, como por exemplo,
dar água, dar comida, pentear o cabelo, trocar a fralda, cortar a unha, fazer a barba, dar
a medicação, levar ao banheiro, fazer exercícios e sentar no leito. Ou seja, seriam as
atividades para suprir as necessidades dele de nutrição, hidratação, eliminação,
higiene, atividade-repouso e de conforto.
Levanto de manhã cedo, faço ele ir pro banheiro, troco a roupa de cama,
penteio o cabelo, dou almoço (Ac. 2).
Ajudo a dar banho, na hora do banho. Na hora do almoço, dou comida pra
ela. E sempre dou água quando precisa (Ac. 6).
Eu dou comida, porque ele tá parado de tudo. Então, eu ajudo a fazer
tudo. Eu coloco ele pra urinar, eu faço a higiene (Ac. 7).
Ajudo a dar o banho, troco a fralda dela. A cama a gente mesmo também
troca (Ac. 11).
Eu faço ginástica com ela improvisada, entendeu? Ela tem que fazer
fisioterapia. Tem uma professora de fisioterapia que me ensinou (Ac. 3).
Mas os acompanhantes também realizavam junto ao paciente algumas atividades que
denominamos como terapêuticas por constituírem procedimentos relacionados ao
58
tratamento oferecido pelos profissionais de saúde, como acompanhar o paciente em
exames de maior complexidade, fazer curativos, ter alguma forma de controle sobre as
soroterapias, além de controlar a dieta. É importante ressaltar aqui que as duas
primeiras atividades relacionadas constam no manual do hospital, como proibições dos
acompanhantes, mas na prática eles acabam realizando.
Quando o soro tá acabando e precisa, vou lá e chamo a médica (Ac. 6).
Às vezes, faço até um curativo nele. Vou lá, pego a gaze e coloco (Ac. 8).
Quando ele precisa descer pra fazer algum exame, eu desço com ele.
Depois, trago ele e sento ele um pouco pra não ficar muito tempo deitado
(Ac. 7).
Eu evito sal, eu evito que ela saia da dieta. Sempre estou conversando
com ela (Ac. 12).
Como outras atividades comuns que puderam desenvolver nesse mesmo período, os
acompanhantes citaram o fato de conversarem com o paciente e até mesmo usar de
brincadeiras para distraí-lo e, também, conversar com o médico à procura de
informação sobre como poderiam melhorar os cuidados que prestavam ao paciente.
Quando preciso de alguma coisa, eu vou lá me informo com o médico o
que eu tenho que fazer. As coisas que eu gosto no hospital é, assim, os
médicos me orientar o que eu tenho que fazer (Ac. 10).
Ela está assim angustiada, doida, querendo ir embora. Só que eu
converso com ela tudo direitinho [...] a gente ri o tempo todo, brinca, fala
besteira. E assim ela distrai (Ac. 12).
59
Tabela 3. Atividades realizadas pelos acompanhantes de pacientes hospitalizados. Vitória. 2005.
Categorias Freqüência de respostas
n %
Atividades relacionadas às necessidades humanas básicas
48 81,3
Atividades relacionadas à terapêutica 8 13,6
Outras 3 5,1
Foi possível verificar que os acompanhantes realizaram vários tipos de atividades junto
ao paciente internado. Entretanto, eles acabaram executando mais as atividades
ligadas ao atendimento das suas necessidades humanas básicas, especificamente as
necessidades fisiológicas e de proteção, em comparação às atividades terapêuticas e
outras que realizaram nesse mesmo período.
Segundo definição de Potter e Perry (2004), as necessidades humanas básicas são
elementos necessários à sobrevida e saúde do ser humano, como por exemplo,
alimento, água, segurança e afeto. Embora cada pessoa tenha outras necessidades
próprias, as necessidades humanas básicas são compartilhadas por todas as pessoas,
constituindo a extensão em que essas necessidades são satisfeitas um fator importante
à determinação do nível de saúde de uma pessoa.
As autoras, ao comentar sobre a hierarquia das necessidades do homem proposta por
Abraham Maslow, em 1954, dizem que esta é uma teoria que pode ser usada para
melhor compreender as relações entre essas necessidades. De acordo com essa
teoria, certas necessidades humanas são mais básicas do que outras, ou seja, algumas
devem ser supridas antes de se procurar satisfazer outras. Assim, por exemplo, é mais
provável que uma pessoa faminta procure comida do que se preocupe com atividades
para melhorar sua auto-estima. No entanto, em um determinado momento, as
necessidades básicas de um indivíduo podem não ser supridas, ser parcialmente
supridas ou completamente satisfeitas.
60
Tomando por base essa teoria, uma pessoa cujas necessidades são todas supridas,
pode ser considerada saudável, enquanto uma pessoa com uma ou mais necessidades
não satisfeitas corre o risco de contrair doenças ou pode não ser saudável em uma ou
mais dimensões.
A hierarquia das necessidades humanas as relaciona em cinco níveis, de acordo com a
prioridade de uma em relação às outras, sendo que no primeiro nível estão as
necessidades fisiológicas, tais como ar, água, comida, eliminação; no segundo nível,
estão a segurança e proteção; no terceiro nível, as necessidades de amor, de
companhia dos familiares, de pertencer a grupos – familiar, social e religioso; no quarto
nível, a necessidade de auto-estima; e o nível final é reservado à realização pessoal, ou
seja, o estado em que cada um está completamente feliz com o potencial alcançado,
sendo capaz de resolver seus problemas e enfrentar, de forma realista, as situações da
vida. Embora a hierarquia das necessidades seja um modo útil para se avaliar e
compreender as necessidades de todos os pacientes, a assistência integral visa
atender a todas elas, simultaneamente, nos seus diferentes níveis.
A explicação para o fato de que essas atividades (relacionadas às necessidades
básicas do paciente) tenham sido as mais realizadas pelos acompanhantes, é que elas
podem estar associadas justamente àquelas atividades que são diariamente realizadas
pelas mulheres, donas de casa e mães, e a quem sempre coube na sociedade
desempenhar a função de cuidadora. No hospital, estiveram mais presentes mulheres
acompanhantes que decidiram cuidar de seu familiar internado, desenvolvendo essas
atividades que, provavelmente, foram apreendidas no seu próprio cotidiano e que não
exigiam maior preparo para que fossem realizadas. Talvez, por isso, mesmo que não
tenham recebido treinamento formal, por parte da equipe profissional, essas
acompanhantes eram capazes de executá-las junto ao paciente internado e até se
consideravam como aptas para exercer essa função.
Dessa forma, a maioria das atividades que realizavam no hospital, junto ao paciente
internado, poderiam não apresentar para elas muitas dificuldades, uma vez que
61
poderiam representar uma extensão das atividades domésticas as quais estavam
habituadas a realizar em seus lares.
Quanto às atividades terapêuticas, poderíamos dizer que estas, ao contrário das
anteriores, exigiam maior preparo para que fossem realizadas. Mas, provavelmente os
acompanhantes foram capazes de apreendê-las mediante a observação da rotina dos
profissionais, visto que o período que estavam no hospital variava de no mínimo trinta
dias e em horários ininterruptos. Portanto, esse contato diário com a rotina hospitalar
poderia favorecer o aprendizado deles em relação a algumas atividades técnicas que
eram executadas, principalmente, pela enfermagem. No entanto, entende-se que esse
tipo de atividade não deveria ser de competência do acompanhante, segundo normas
estabelecidas pelo hospital, mas foi demonstrado na prática que eles acabavam
realizando como forma de auxiliar o trabalho da equipe.
E quanto às atividades recreativas, estas foram pouco citadas pelos acompanhantes,
sendo apresentadas por eles como uma forma de ajudar na auto-estima do paciente e
aliviar o estresse dele decorrente do longo período de hospitalização.
Sobre a questão de gênero como determinante das práticas de cuidado, estudos
mostram que desde a antiguidade, os papéis de homens e mulheres já estavam
definidos na sociedade. Assim, vários mitos foram sendo desenvolvidos em função da
identificação das práticas de cuidar com a mulher e, dentre eles, um aspecto refere-se,
especificamente, à característica de fecundidade e da capacidade de gerar e
amamentar. Daí o fato de que, durante muito tempo, as práticas de cuidar estarem
sempre relacionadas às atividades da mulher e ligadas à vida.
Santos (2003) destaca que as primeiras formas de realizar as atividades de cuidar
foram desenvolvidas no campo familiar e eram destinadas às mulheres, fazendo
distinção, desde já, das atividades segundo o gênero nas sociedades. Ressalta que
para elas, o ato de cuidar era algo muito natural e quase sempre estava incorporado às
demais funções relativas às atividades familiares e domésticas. Portanto, as mulheres
62
parecem ter adquirido um comportamento diferenciado dos homens, mas assemelhado
entre elas, nas diferentes épocas, devido à maternidade.
Quase que de forma universal, entre os diversos clãs, tribos e civilizações, ao longo da
história, os cuidados com o parto ficavam a cargo das mulheres. À semelhança dos
animais, a mulher lambia sua cria, nutria e protegia, e, entre as práticas de higienizar e
de alimentar, foram introduzidos comportamentos de tocar, cheirar e gestos
rudimentares de afago. No entanto, pode-se concluir que o segundo modo de expressar
o cuidado, ou seja, a demonstração de interesse e de afeto é mais evidente entre as
mulheres, porque que elas valorizam altamente sentimentos e relacionamentos,
definindo sua identidade tanto através de relações de cuidado como de intimidade. O
macho é menos gentil, e parece que as relações ocorriam através das lutas e jogos,
onde o toque se fazia presente de maneira bastante rude, e mesmo com os membros
da família.
Conforme analisa Waldow (2001), as atividades tradicionalmente associadas à mulher,
como por exemplo, tomar conta, cuidar, tratar, na verdade correspondem a garantir ou
compensar funções vitais e que, essencialmente, se organizam em torno de dois pólos
distintos, ou seja, do nascimento à morte. Poder-se-ia dizer, então, que através do
cuidar, as mulheres expressam uma forma de relação com o mundo. Dessa forma, ao
pensar o cuidado humano como uma forma de estar, de ser, e de se relacionar, as
mulheres, inquestionavelmente, podem ser consideradas cuidadoras, por excelência.
Assim, mulheres, ao longo da história, além das práticas de cuidado relacionadas às
funções reprodutivas, desempenharam cuidados aos incapacitados e idosos,
dedicando-se à educação dos filhos, à manutenção da casa, ao preparo dos alimentos
e, em muitas culturas e épocas, ao preparo de medicamentos caseiros. No entanto,
conforme analisa Pitta (1990, p.53):
uma questão de gênero sempre se impôs e este tem sido um trabalho
tipicamente feminino em todas as épocas, em que por séculos as mulheres foram
doutores sem graduação, afastadas de livros e leis, aprendendo uma das outras
e passando experiência de vizinha a vizinha, de mãe para filha.
63
No entendimento da equipe profissional do hospital, o tipo de atividade que os
acompanhantes poderiam estar desempenhando com mais freqüência junto ao
paciente internado, também seriam aquelas relacionadas às suas necessidades
humanas básicas, como dar água, dar comida na boca, pentear o cabelo, auxiliar no
banho, trocar fralda, cortar unhas, levar ao banheiro, virar no leito, dentre outras,
conforme eles relataram a seguir.
O acompanhante poderia, essencialmente, dar alimentação ao seu
doente; pegar um copo com água; ajudar no banho, entendeu? Acho que
isso ele poderia fazer sim, com certeza! (Prof. 2).
3
O acompanhante pode ajudar a virar o paciente no leito; trocar uma fralda;
oferecer uma dieta via oral. E auxiliar no autocuidado como, cortar uma
unha, pentear o cabelo. Eu acho que isso é uma tarefa do acompanhante
(Prof. 4).
O acompanhante pode ajudar um paciente que tem uma deficiência
motora, por exemplo, e que não está podendo fazer uma simples rotina do
cotidiano como, pentear um cabelo, tomar um banho (Prof. 3).
O acompanhante poderia ajudar o paciente que não se alimenta sozinho,
dando comida na boca. E ajudar a levantar do leito; tirar o soro para ele ir
ao banheiro (Prof. 8).
Como se pode observar, os profissionais do hospital consideram que os
acompanhantes devem desenvolver apenas algumas atividades de autocuidado que
possam ajudar na recuperação do paciente internado, e que não devem estar
relacionadas aos procedimentos que constituem as condutas técnicas de maior
complexidade, que são de competência exclusiva da enfermagem, por exemplo,
administrar uma medicação, avaliar os sinais vitais, dar banho e alimentar paciente
grave. Eles entendem que seria necessário que o hospital definisse as atribuições dos
64
acompanhantes, a fim de evitar que condutas de competência profissional sejam
repassadas e/ou assumidas por eles na prática, conforme declararam que tiveram a
oportunidade de constatar em alguns momentos.
Às vezes, você vê um acompanhante dando comida para um paciente
que precisa estar de cabeceira levantada. Um paciente que tosse e pode
asfixiar (Prof. 7).
Dar alimentação para um paciente grave não é conduta do
acompanhante, é conduta da enfermagem [...] dar um remédio ou
administrar uma medicação. Isso é conduta nossa, entendeu? O
acompanhante está assumindo porque alguém do hospital está passando
essa visão pra ele (Prof. 3).
O acompanhante não deve dar banho em paciente grave. Não deve
ajudar mexer nas medicações; ficar olhando os sinais vitais como, por
exemplo, a temperatura do paciente. Porque nós, profissionais, temos os
nossos horários de fazer os sinais vitais e de estar olhando a temperatura
(Prof. 4).
Sobre a experiência de acompanhar, os discursos revelaram uma certa forma de
obtenção de prazer e um sentimento de perseverança que foi expresso pelos
acompanhantes por estarem desempenhando essa função. Por outro lado, revelaram
que cuidar do paciente internado tornava-se uma tarefa fácil por terem passado por
experiências anteriores com outros amigos e familiares.
Eu gosto de mexer com doente. Já ajudei de amigos doentes, sabe?
Doente mesmo difícil de mexer. Toda vida eu gostei disso (Ac. 4).
Eu acho tudo fácil. Já cuidei da minha sogra, um dia. Então, eu já estou
bem civilizada com isso já. E pra dizer a verdade, até gosto sabe? Eu
gosto de cuidar (Ac. 6).
3
A abreviatura “Prof” é utilizada para profissionais.
65
Eu tenho o maior prazer de dar comida a ele; fazer massagem na hora
dele tomar banho; passar talco e creme nele todo. E isso pra mim, tenho o
maior prazer de fazer (Ac. 7).
Tudo é desafio, mas eu sei dominar esse desafio. Eu acho que nada é
impossível. Tudo é possível, quando a pessoa tem força de vontade (Ac.
12).
Os discursos de alguns acompanhantes também pareciam revelar que acompanhar o
paciente internado significava uma boa experiência, pois, apesar de todas as
dificuldades vivenciadas, representava para eles uma forma de aprendizado e uma
possibilidade de interagir com outras pessoas.
Pra mim, eu não estou fazendo nada de ruim [...] Pra mim, é bom demais,
apesar que é a primeira vez que está acontecendo isso, né. Aprendi muita
coisa (Ac. 2).
Bom... Pra mim foi ótimo. Uma experiência muito boa (Ac. 5).
Eu não estou achando ruim, não. Apesar de ver tanto sofrimento, porque
eu vivo muito isolada na minha cidade. E isso pra mim, é novidade (Ac. 6).
De um modo geral, as declarações desses acompanhantes poderão ser talvez
interpretadas como discursos que pretendem reproduzir aquilo que é socialmente aceito
e esperado por parte de alguém que necessita ficar acompanhando uma pessoa
acamada e que requeira cuidado. Assim, atitudes passivas e dóceis são reveladas,
onde o acompanhar e o cuidar têm um significado de valorização e recompensa, sendo
apresentado quase como um atributo natural. E, por outro lado, parecem revelar traços
característicos de pessoas, cuja cultura pode está relacionada a uma sociedade
particularmente afetiva e cristã, como é o caso da sociedade brasileira. Assim, atitudes
de resignação, quando presentes nesses casos são aceitas e compreensíveis,
estabelecendo-se como um processo de troca de recompensas entre quem cuida e
quem é cuidado.
66
Bourdieu (2004), ao discorrer sobre os sistemas simbólicos no campo religioso, instiga-
nos a buscar o entendimento da resignação que se apresentam nas atitudes
abnegadas dos que se dedicam ao cuidado dos enfermos, desejando, talvez, o
deslocamento de aspirações e conflitos através da compensação e transfiguração
simbólica, como por exemplo, uma promessa de salvação. Enquanto Pitta (1990) irá
descrever que a religiosidade dos sujeitos tem, através dos tempos, desempenhado
uma importante função no estabelecimento de regras gerais de sociabilidade, como as
que, por exemplo, determinam que as pessoas enfermas devam ser cuidadas e que tais
cuidados possam significar o ofício de um contingente de pessoas cujas características
(externas e internas) de sua individualidade devam merecer um reconhecimento social
de generosidade e abnegação.
O fato de permanecerem por um período juntos e estarem enfrentando as mesmas
dificuldades impostas pela situação de doença e hospitalização do seu familiar, pareceu
despertar entre esses acompanhantes um sentimento de pertença, fazendo com que
eles se reconhecessem enquanto grupo, ou até como uma pequena comunidade,
passando a estabelecer laços de solidariedade e de ajuda mútua. Essas ações
desenvolvidas de maneira espontânea pelos acompanhantes também poderiam ser
compreendidas como outro tipo de suporte social que foi disponibilizado por eles dentro
do hospital.
[...] A gente convive com todas as pessoas, de todas as espécies. Então,
acontece de quando você pega o telefone no corredor, você já sabe até o
nome do acompanhante. A gente faz aquele convívio, entendeu? (Ac. 3).
Aqueles que estão ali acompanhando é todo mundo unido [...] Quando eu
ouço o barulhinho do telefone, seja pra quem for, eu vou procurar onde for
naquele quarto direitinho e a pessoa vem. A mesma coisa fazem comigo.
É uma comunidade, né? (Ac. 6).
67
[...] Conseguimos uma moça que o irmão dela teve o mesmo problema
que o meu pai, e ela doou o remédio que restou dele pra nós (Ac. 7).
Você acaba criando um ambiente de amizade. Vai conhecendo pessoas
de todo lugar, vai conversando [...] Às vezes, o acompanhante precisava
sair e eu ficava ajudando olhar, se precisava de alguma coisa. É um
ajudando o outro (Ac. 12).
Conforme analisa Zimerman (2000), um grupo só se torna grupo, isto é, mais do que a
soma de indivíduos, quando desenvolve um determinado tipo de relacionamento, um
vínculo, uma força que confere a ele um sentido de pertença. Em todo grupo se produz
uma força interna que regula a conduta dos seus membros e os faz comportarem-se de
uma forma peculiar, distinta do comportamento que assumem os membros
individualmente. É por meio das experiências das interações e das oportunidades de
vivências que surgiram mudanças no comportamento, tanto como indivíduos quanto
como elementos do sistema. As pessoas agem e se comportam socialmente,
permitindo a interação humana para desenvolver a interação social, que é o processo
pelo qual elas se influenciam mutuamente, pela troca de pensamentos, sentimentos e
emoções, e ajuda direta.
Os acompanhantes do presente estudo, ao experienciarem as mesmas situações,
adquiriram comportamentos, sentimentos e percepções que estão relacionados ao
aprendizado de grupo, e foi dessa forma que eles se identificaram no espaço hospitalar.
Apenas um acompanhante revelou dificuldade para acompanhar o paciente internado,
nesse mesmo momento, alertando para a necessidade de preparar a pessoa para
exercer essa função que considera como física e emocionalmente desgastante, mesmo
se sentindo inserido em um grupo que partilhava das mesmas experiências.
[...] A gente tem que ficar bem preparado para exercer essa função. Não é
qualquer pessoa que está apta para ser acompanhante não. E isso eu
garanto com a pureza d’alma. Além de estar fisicamente tenso, ainda tem
68
o problema de ter aquele jeito, sabe? Aquela paciência com o paciente,
entendeu? (Ac. 3).
Sobre as queixas apresentadas e as demandas referidas pelos acompanhantes, as
respostas foram categorizadas em dificuldades pessoais e em relação à infra-estrutura
da instituição (Tabela 4). De forma menos relevante, as atividades desenvolvidas junto
aos pacientes internados, bem como as relacionadas à interação com os profissionais e
servidores da instituição também foram citadas. Quanto às dificuldades pessoais
apresentadas durante o período de permanência no hospital, sete acompanhantes
declararam que achavam difícil a situação por não terem direito a alimentar-se no
hospital, dormirem na cadeira, fazerem as refeições em horário impróprio, ficarem
perdidos no hospital, ficarem emocionalmente abalados diante das intercorrências com
o paciente e não terem como revezar o acompanhamento com outras pessoas da
família (Tabela 4).
O negócio é só o tipo de alimentação mesmo, que eu tô achando
dificuldade pra conseguir, pra mim. Não tenho direito (Ac. 5).
A única coisa que eu penso, que eu acho assim meio ruim, é que eu não
consigo dormir sentado numa cadeira. Isso ai eu acho, assim, a maior
dificuldade (Ac. 11).
Uma vez resolvi jantar aqui. Ai, disse que não vou jantar mais não. A janta
é quase dez horas da noite. Me senti super impazinada naquele dia (Ac.
12).
Tive dificuldade no dia que eu me perdi aqui dentro. Eu que muitas vezes
me perdi, logo que cheguei. Agora, não (Ac. 2).
A minha dificuldade foi quando a minha mãe passou mal no banheiro [...]
Por causa do pânico, eu estava ficando nervosa e quase chorava (Ac. 6).
69
A dificuldade é que minha irmã quer ficar aqui com ele. Só que ele não
aceita. Então, o problema é este, é cansativo pra mim (Ac. 8).
As dificuldades pessoais também foram expressas pelos acompanhantes em forma de
demandas, como ter a necessidade de interagir com outras pessoas dentro do hospital,
obter informações sobre o tratamento do paciente e ter necessidade de retornar às
atividades diárias, como cuidar dos afazeres domésticos, ir à igreja, estar com
familiares e amigos.
Tem vez que eu tenho necessidade de conversar com algumas pessoas
aqui dentro do hospital (Ac. 2).
Eu tenho necessidade, assim, de fazer minhas coisas. De estar na igreja,
de estar junto do pessoal. Eu tenho isso como prioridade pra mim (Ac. 7).
Depois que eles termina a visita médica, eu fico esperando um pouquinho
pra conversar. Porque tem coisas que eles falam, que a gente não
entende. Ai, eu vou lá e pergunto (Ac. 6).
É possível perceber, a partir desses discursos dos acompanhantes, a capacidade que
eles tiveram em identificar as suas próprias dificuldades, mesmo que o tratamento do
paciente fosse uma prioridade a ser atendida no momento. Dessa forma, não
mantiveram sublimadas algumas de suas necessidades, colocando para os
profissionais do hospital o desafio de atender as suas demandas específicas, que
deverão ser compreendidas independentemente das demandas dos pacientes. Por
outro lado, os discursos revelaram que essas demandas estariam relacionadas à
melhoria da infra-estrutura do hospital, para propiciar melhores condições para
acomodação deles; ao suporte que deve ser oferecido pela equipe profissional, no
sentido de melhor orientá-los e informá-los durante o período de acompanhamento do
paciente; e a possibilidade de que sejam revistas algumas normas e critérios
destinados a eles, como por exemplo, o direito igualitário à alimentação.
70
A literatura mostra que, por imposição ou escolha, o acompanhante familiar é aquele
que põe a necessidade do outro em primeiro lugar. Geralmente é tão pressionado por
necessidades imediatas, que esquece de si mesmo, “é modesto em suas demandas, e
é relutante em falar sobre suas dificuldades não querendo parecer desleal à pessoa da
qual cuida” (LEAL, 2000, p.2). Alguns se mostram tão agradecidos por pequenas ajudas
conseguidas que não querem fazer críticas, mesmo que estas sejam construtivas.
Romano (1997), ao procurar identificar as principais necessidades dos familiares que
acompanham seu parente no contexto hospitalar, diz que elas estão referenciadas na
literatura, como: receber informação, carinho, ter suas perguntas respondidas
honestamente, sentir que havia esperança, ter explicações compreensíveis e ser
informados sobre os fatos a respeito do progresso do paciente.
Tabela 4. Dificuldades apresentadas pelos acompanhantes durante a permanência deles no hospital.
Vitória. 2005.
Categorias Freqüência de respostas
n %
Pessoais 7 41,1
Em relação à infra-estrutura da instituição 5 29,4
Em relação às atividades desenvolvidas 3 17,7
Em relação à equipe profissional 2 11,8
As dificuldades em relação às condições de infra-estrutura física da instituição foram
citadas por cinco acompanhantes e também estavam associadas à falta de condições
ideais para o atendimento e tratamento do paciente, como por exemplo, a falta de
medicamentos na farmácia do hospital, de acomodação adequada para o atendimento
do paciente em determinado setor da instituição e a falta de lençóis. Como se pode
perceber, essas questões não deveriam ser de preocupação dos acompanhantes, visto
que seriam de responsabilidade da instituição hospitalar. Então, qual será o motivo que
os acompanhantes a apresentaram como uma dificuldade especificamente deles?
71
Essa colocação nos remeteria a pensar que, por um lado, os acompanhantes percebem
a fragilidade da instituição hospitalar para prestar uma assistência de qualidade aos
pacientes internados, o que poderia gerar ansiedade e insegurança entre eles. E, por
outro, que algumas dessas responsabilidades poderiam estar sendo divididas com os
acompanhantes, na complementaridade do tratamento do paciente.
Eu tive muita dificuldade quando precisou de um remédio. Porque não
tinha aqui no setor e nem na farmácia do hospital (Ac. 3).
A dificuldade foi no Pronto-Socorro, de não conseguir arrumar alguma
coisa pra ele. Um colchão que seja. Não podia trazer um colchão de casa,
uma esteira, nada, pra ele deitar (Ac. 7).
Às vezes, acaba o lençol e o paciente fica sem. Se bobear, tem pacientes
que fica a semana todinha com o mesmo lençol (Ac. 12).
As dificuldades sobre a estrutura organizacional do hospital também apareceram na
expressão de queixas e estavam relacionadas tanto aos recursos físicos que deveriam
ser dispensados aos acompanhantes, quanto às normas que eles deveriam cumprir
dentro da instituição.
Porque acho assim, que se a gente tem o direito de acompanhar, então,
teria que ter uma cama pra gente dormir. A gente não tem. Acho que a
gente teria que ter até direito da comida. Tem gente que tem que procurar
fora (Ac. 8).
Ficar sentado a noite toda em uma cadeira. Às vezes tira um cochilo em
cima de cadeira, prejudica uma coluna, prejudica muitas coisas no
acompanhante (Ac. 10).
Eu li o que o acompanhante pode e não pode fazer. A maioria não pode
[risos]. É mais punir mesmo, né. Na verdade, só tem desvantagem para o
acompanhante (Ac. 12).
72
O hospital em si, acho que tem condição para o paciente, e não para o
acompanhante [...] A acomodação é péssima porque se você não trouxer
alguma coisa de casa pra você se acomodar, você fica toda torta. Às
vezes você encosta assim e alguns enfermeiros reclamam porque falam
que a gente passa infecção para a pessoa (Ac. 7).
As dificuldades relacionadas às atividades que realizavam no hospital, que em princípio
não haviam sido citadas por eles, foram declaradas, nesse momento da entrevista, por
três acompanhantes, que achavam difícil ter que levar o paciente com o soro para o
banheiro; terem que fazer esforço físico devido ao peso da paciente; e terem que limpar
fezes e vômitos do paciente. Como se pode analisar, essas dificuldades estariam
diretamente relacionadas às atividades que exigem certo esforço físico para que sejam
realizadas e que os obrigam a entrar em contato com os detritos dos pacientes.
Eu acho mais difícil assim, pra mim, é levar ela para o banheiro com o
soro. Porque tem que ir, tem que levar aqueles negócios e colocar lá, né
(Ac. 1).
A dificuldade é o peso, porque ela é muito pesada. Às vezes, tenho que
chamar alguém pra ajudar a levar ela no banheiro (Ac. 6).
A dificuldade é quando ela vomita e, até mesmo, quando faz cocô que eu
tenho que limpar. Vai me dando um incômodo, eu não consigo (Ac. 11).
Quanto às dificuldades apresentadas em relação à equipe profissional, elas foram
apresentadas somente por dois acompanhantes e praticamente se deu com
funcionários que desempenhavam atividades não diretamente relacionadas ao
paciente, como por exemplo, problemas com o segurança do hospital e com uma
atendente do refeitório. As mesmas apontam a falta de preparo desses profissionais, no
sentido de atender as demandas dos acompanhantes na instituição hospitalar, o que
chama a atenção para a necessidade de melhor qualificá-los para essa finalidade e
evitar que contra-tempos possam interferir no tratamento do paciente.
73
A dificuldade foi que eu precisei discutir um dia, porque eu estava muito
brava com aquela situação toda. Eu queria subir e o segurança disse que
não podia. Ele ficou falando, falando, no meu ouvido e não sei o que...
(Ac. 7).
A minha dificuldade foi em relação ao pessoal. Eu fui devolver a bandeja e
a moça do refeitório veio com grosseria e na hora que apertou o copo,
caiu o mingau na minha mãe. Acho que isso atrapalha o tratamento do
paciente (Ac. 12).
De modo geral, é possível observar que os acompanhantes apresentaram vários tipos
de dificuldades durante a permanência no hospital, onde muitas delas se convertiam
em demandas que precisavam ser atendidas pela equipe de profissionais da instituição
hospitalar. As maiores dificuldades apresentadas por eles diziam respeito,
primeiramente, à falta de condições oferecidas pela instituição para que pudessem
permanecer nas enfermarias e darem melhor assistência ao familiar internado, quando
se queixaram da falta de uma cama para dormir e de não terem direito à alimentação. E
também estavam relacionadas à própria condição física e emocional para vivenciar
determinadas situações em relação ao paciente internado e ficarem diariamente no
hospital, na maioria das vezes, sem ter com quem revezar o acompanhamento.
Em seguida, apresentaram dificuldades em relação à organização e à infra-estrutura da
instituição que podem ser compreendidas como a ausência de condições para
prestarem um atendimento adequado às pessoas hospitalizadas, quando citaram, por
exemplo, a falta de medicamentos no setor onde o paciente se encontra internado; a
escassez de lençóis e a insuficiência de leitos na unidade de emergência. As
dificuldades em relação às atividades que realizavam junto aos pacientes internados,
bem como no que diz respeito ao relacionamento interpessoal com os profissionais do
hospital, foi percebida de forma menos relevante pelos acompanhantes.
As dificuldades encontradas pelos acompanhantes no hospital também foram
analisadas por outros trabalhos realizados acerca da temática e estavam diretamente
74
associadas à sobrecarga física e emocional, ao fator econômico, à ausência de
informações, à falta de preparo emocional e à falta de reconhecimento do familiar como
elemento indispensável no cuidado ao paciente, por parte da equipe profissional
(LAUTERT; ECHER; UNICEVSKY, 1998).
Regeanini (1973), ao discutir sobre a relação entre a política hospitalar e o
acompanhante, comenta que as vantagens da presença do acompanhante já são
óbvias, mas que as desvantagens também existem. No entender da autora, a política
do hospital é limitada pelos recursos orçamentários da própria instituição, sendo esta
dependente dos recursos econômicos de cada país especificamente. Porém, mesmo
considerando uma carência de recursos dos hospitais, cabe aos mesmos cumprirem
com a sua função social de atender ao paciente na sua integralidade, bem como ao seu
acompanhante.
Partindo desse pressuposto, é possível afirmar que cabe à administração do hospital,
no momento de definir sua política institucional, levar em consideração as necessidades
dos pacientes e também as de seus familiares, oferecendo a assistência e segurança
de que necessitam em caso de estarem acompanhando pessoas hospitalizadas.
Nesse contexto, a maioria dos acompanhantes percebeu o hospital como um ambiente
desagradável que gera nas pessoas sentimentos de rejeição, insatisfação e
insegurança, por ser um local de abrigar pessoas doentes e com problemas. E também
como um local confuso e contrastante. Por isso, o fato de estarem em contato diário
com o ambiente hospitalar representava igualmente uma dificuldade com a qual eles
tiveram que se deparar diante da necessidade de ficar com o familiar internado,
conforme declaração dos dez acompanhantes.
O ambiente hospitalar é um lugar que ninguém gostaria de estar.
Infelizmente! (Ac. 3).
O hospital não é bom, não. Porque você vê muitas coisas que você não
deve ver. Eu não quero isso pra mim não (Ac. 5).
75
Ah! O ambiente hospitalar eu não gosto não. O cheiro de remédio;
pessoas doentes, cheias de problemas; pessoas tristes... (Ac. 11).
No hospital você vê tanta coisa! Tanta gente ruim, entendeu? Aí você tem
que reter o que é bom e esquecer o que é ruim (Ac. 7).
Ah! O hospital é um lugar horrível pra gente ficar, né. Porque você vê
muita pessoa doente. A tristeza é grande (Ac. 8).
O hospital por um lado, é uma comédia. Por outro lado, é triste. Porque
você vê, ao mesmo tempo, pessoas tristes, outras sorrindo, outras
contando alguma coisa... (Ac. 12).
Apenas um acompanhante reconheceu o hospital como um local que cumpre com sua
função social, que seria a de socorrer e proporcionar tratamento às pessoas doentes.
Eu acho que o hospital é um local de socorrer e de se tratar das pessoas.
E onde a gente acha socorro é no hospital mesmo [...] É um lugar de
tratamento (Ac. 1).
Então, podemos dizer que de forma geral, a percepção que eles apresentaram em
relação ao hospital é a mesma que se acha presente no imaginário coletivo, e que
parece perpetuar até os dias atuais, ou seja, como um local sombrio, obscuro, confuso
e aterrorizante. Foucault (1979, p.203), ao fazer uma análise sobre a origem da
instituição hospitalar, já descrevia essa imagem de que o hospital aparecia como uma
estrutura em muitos pontos ultrapassada, “como fragmento de um espaço fechado
sobre si, lugar de internamento de homens e de doenças, arquitetura solene mais
desajeitada que multiplica o mal no interior sem que ele se difunda para o exterior [...]”.
Assim, a questão relativa à imagem dos hospitais poderá estar fundamentalmente
ligada ao espaço ou a diferentes espaços que ele ocupa na sociedade, que pode variar
ou não de acordo com cada época específica, podendo ser abstraída de forma
diferente pelas pessoas.
76
Em contrapartida, os acompanhantes consideraram que tinham uma boa relação com
os profissionais do hospital, porque na sua concepção, todos os tratavam com carinho e
estavam sempre disponíveis para dar informações e esclarecer suas dúvidas sobre o
tratamento do paciente, parecendo reconhecer na equipe um tipo de suporte emocional
e instrumental.
Não tenho nada que queixar não. Pra mim tá tudo bom. Tem muita gente
boa ai (Ac. 1).
Eles tratam muito bem [...] É muito carinho. (Ac. 2).
É uma relação de respeito, um pelo outro, entendeu? (Ac3).
Toda vez que eu procuro eles me atende muito bem. Não tenho nada que
reclamar de ninguém aqui (Ac. 4).
Eles pára, conversa com a gente e explica tudinho. E eu gosto (Ac. 10).
A gente conversa com a auxiliar de enfermagem e até mesmo brinca. A
doutora também está sempre presente no quarto (Ac. 11).
A interação entre acompanhante e equipe também foi percebida pelos próprios
profissionais como positiva, apresentando uma congruência entre ambos os discursos,
uma vez que eles relataram ter uma boa relação com o mesmo, deixando transparecer
que a presença do acompanhante seria um fator importante, uma vez que ele poderia
ajudar tanto o paciente, como auxiliar o próprio trabalho da equipe.
Geralmente a convivência, o relacionamento é bom. É adequado. E
geralmente é muito benéfico para o paciente e para a gente também [...]
Eu acho que ajuda muito o paciente e ajuda a gente também. Ajuda muito
o nosso trabalho (Prof. 8).
77
Geralmente eu tenho um bom relacionamento com eles [...] Eu tenho uma
maneira de conversar com eles; tenho um carinho especial. Eu me
identifico com eles (Prof. 7).
A nossa relação é boa. Eu acho importante a presença do acompanhante
(Prof. 1)
Olha! Eu tenho um bom relacionamento com os acompanhantes. Eu
respeito e eles me respeitam, então não vejo problemas (Prof. 5).
Caldas (2002) chama a atenção para a importância da interação interpessoal entre os
profissionais e os acompanhantes familiares, destacando que estes não devem ser
tratados como meros cumpridores de orientações padronizadas, mas como pessoas
que são capazes de tomar decisões, que possuem grande capacidade criativa e que
têm muito a ensinar a partir de vivências junto ao paciente. Sendo assim, a autora
reforça ser fundamental os acompanhantes poderem efetivamente contar com o
suporte técnico de profissionais sensíveis às suas necessidades.
Por outro lado, Romano (1997) também ressalta que a equipe profissional deve estar
atenta para o fato de que, apesar da interação com a família não ser uma prioridade na
dispensão dos cuidados, o fato de não serem estabelecidos contatos satisfatórios com
ela poderá comprometer todos os resultados da atuação com o paciente. Portanto, o
estabelecimento de uma boa interação entre os profissionais do hospital e os
acompanhantes é um fator importante, visto que pode contribuir para a recuperação do
paciente.
Os acompanhantes também perceberam na própria equipe um outro tipo de apoio, o
qual eles poderiam contar para satisfazer algumas de suas necessidades dentro do
hospital, como a solicitação por informação, conforto físico, assistência, afeto e
valoração. Thoits (1997, p.147) define apoio como “o grau em que as necessidades
sociais básicas de uma pessoa são gratificadas mediante a interação com outros”.
Estas necessidades foram identificadas por ele como incluindo os desejos de afeto,
78
estima ou aprovação, pertença, identidade e segurança, e são satisfeitas mediante o
conceder desse tipo de ajuda sócio-emocional e de ajuda instrumental, como por
exemplo, conselho, informação, dinheiro e assistência. House (1997) sustenta que o
apoio pode ser melhor entendido em termos de alguém que dá algo a outros, com
respeito a algum problema. O algo incluiria quatro tipos principais de assistência, como
o interesse emocional, assistência instrumental, informação e valoração. Os outros
deveriam incluir cônjuges, parentes, amigos, vizinhos, supervisores de trabalho,
prestadores de serviços e profissionais.
Em suma, o autor visualiza o apoio social desde o ponto de vista das interações sociais
que estão relacionadas com um problema e que são mantidas por uma vasta gama de
pessoas que se envolvem com esses tipos de assistência. O apoio social tem sido um
dos conceitos mais utilizados na investigação atual dos fenômenos saúde/enfermidade
e tem despertado interesse porque se tem postulado um papel protetor da saúde das
pessoas em conjunturas críticas, como as provocadas por exposição a eventos de
elevado estresse, a exemplo dos que foram vivenciados por esses acompanhantes de
pacientes hospitalizados.
Sobre a permanência dos acompanhantes, a equipe profissional entrevistada
considerou que os acompanhantes poderiam contribuir dentro da instituição hospitalar,
uma vez que eles poderiam oferecer apoio emocional aos pacientes internados e tornar
o ambiente hospitalar o menos agressivo possível para eles, principalmente, em se
tratando ser alguém da família e de sua confiança. Também reconheceram que eles
seriam importantes por poder auxiliar o paciente em suas necessidades físicas, além de
auxiliar o trabalho de médicos e enfermeiros através de informações que poderiam ser
repassadas sobre a real situação.
Nesse sentido, acreditamos que a equipe profissional deve aproveitar a oportunidade
da presença dos acompanhantes no hospital para incluí-los no plano de assistência ao
paciente, procurando resgatar os dados do contexto familiar e social dele, visando a
sua recuperação integral.
79
Eu acho importante a presença do acompanhante. Porque além dele
facilitar o trabalho do médico, passando informações, pode auxiliar
também nos cuidados específicos do paciente [...] Ele pode dar apoio
pessoal, dar força ao paciente. Eu acho que o ideal seria sempre ter o
acompanhante (Prof. 1).
O acompanhante pode dar apoio psicológico para o seu próprio paciente,
porque o paciente está fora de casa. Está fora do ambiente aconchegante
da família (Prof. 7).
O acompanhante pode contribuir, dando um conforto para o paciente.
Porque o próprio leito hospitalar é agressivo para ele (Prof. 3).
O acompanhante pode comunicar a enfermagem de alguma anormalidade
que esteja acontecendo com o paciente que está ali internado, para que a
gente possa tomar a devida providência (Prof. 2).
Sendo assim, na percepção da equipe profissional, haveria motivos reais que
justificariam a necessidade da permanência dos acompanhantes junto aos pacientes
internados e que levariam o hospital a convocar e a autorizar a participação deles nas
unidades de internação. Esses motivos estariam relacionados, principalmente, ao
conforto e ao bem-estar do paciente, mas também a uma forma de contribuição com a
equipe, conforme relataram a seguir.
O hospital autoriza o acompanhante para dar um conforto maior ao
paciente. Para ele estar ao lado de um familiar; de alguém que ele possa
contar, além da gente. Porque alguém da família, ao lado do paciente, no
momento da doença é muito importante (Prof. 2).
[...] Pra assumir algumas práticas que, às vezes, os profissionais de
saúde não assumem (Prof. 6).
80
O hospital admite o acompanhante para ajudar o paciente. Eu acho que o
primordial seria isso: pra alimentação; pegar um copinho com água. Mas
acho que pra ajudar a enfermagem também (Prof. 7).
O hospital convoca porque aqui a gente tem muito problema social e, às
vezes, os acompanhantes ajudam nessa parte. É um medicamento que
falta; é uma ajuda pra mobilizar, acontece isso também. Mas, eu acho que
o principal é pela parte afetiva e emocional do paciente (Prof. 1).
Em contrapartida, os profissionais do hospital ressaltam que a principal função dos
acompanhantes no hospital deveria ser acompanhar ou estar ao lado do paciente
internado, a fim de proporcionar seu conforto e bem-estar, e não para assumir condutas
e práticas de competência dos profissionais. Assim, ao tentar definir a função do
acompanhante, a equipe parece dissociá-la da execução de tarefas, querendo reforçar
que ele deva apenas oferecer apoio emocional ao paciente. Essas afirmações se
contradizem com aquelas que emitiram anteriormente, em que podemos inferir que não
está definido nem mesmo para a equipe, qual seria o papel conferido aos
acompanhantes na instituição.
A função do acompanhante, ao meu ver, é estar ao lado do paciente,
acompanhando. Nunca assumindo condutas e práticas que não está apto
a fazer (Prof. 3).
A função do acompanhante, como o próprio nome já diz, é acompanhar! É
trazer o bem-estar para o paciente; dar um consolo aos pacientes (Prof.
6).
A função do acompanhante é acompanhar. Porque nem tudo o
acompanhante pode estar ajudando. Porque tem os cuidados da
enfermagem e é importante que a enfermagem providencie, não o
acompanhante (Prof. 4).
81
A principal função do acompanhante é dar um conforto maior ao paciente.
E é por isso que o hospital deve autorizar (Prof. 2).
Nesse contexto, os acompanhantes também atribuíram valoração a si mesmos, sendo
congruentes com os profissionais, pois consideravam ser de muita importância para os
pacientes internados, principalmente, porque na opinião deles, poderiam oferecer-lhe
apoio emocional transmitindo amor, carinho, segurança e tranqüilidade, de forma que
não se sentissem isolados dentro do hospital e com a sensação de terem sido
abandonados pela família.
Dessa forma, é possível que esses acompanhantes tenham reduzido seu sentimento de
impotência, ao perceberem que podem colaborar mais efetivamente para a
recuperação do seu ente querido.
Ah! O acompanhante é tudo na vida do paciente. Ele transmite amor,
carinho, paciência (Ac. 3).
Acho que é importante ter acompanhante, né. Porque o paciente se sente
mais seguro [...] Eu acho que até pra melhora dele é muito importante,
sabe? (Ac. 4).
O acompanhante é importante porque parece que o paciente se sente
mais seguro do que ficar abandonado, sozinho no hospital. Se não ele
pode ficar pensando... A minha família me abandonou (Ac. 10).
Os acompanhantes também se reconheceram como importantes dentro do hospital por
considerar que poderiam passar informações para a equipe a respeito do estado de
saúde do paciente e por poder auxiliar nos cuidados dos mesmos, principalmente, ao
perceberem que o número de funcionários é insuficiente para atender a todos que estão
internados.
Eu vejo tudo, pra passar para os médicos. Por isso, eu sou importante
(Ac. 2).
82
Ah! Eu acho muito bom botar acompanhante, porque logo que acaba um
soro você vai lá e avisa. A pessoa está com uma dor, vai lá e chama a
enfermeira. Eu acho muito importante nessa hora (Ac. 5).
Às vezes, não tem o técnico de enfermagem. Pessoas, para está dando
conta da quantidade de pacientes para coleta de exames [...] Eu acho que
é muito importante o acompanhante (Ac. 12).
Apenas um acompanhante considerou que a presença dele seria importante dentro do
hospital, porque ele poderia fiscalizar o trabalho da equipe profissional, conforme ele
próprio descreve. Dessa forma, o seu papel seria mais o de um fiscalizador das ações
profissionais que estavam sendo direcionadas para o paciente, do que qualquer outro
objetivo. A literatura aponta que esse seria o principal motivo pelo qual os profissionais
de saúde costumam rejeitar a presença do acompanhante na instituição, porque acham
que eles querem interferir no trabalho da equipe, além de questionar muito sobre a
conduta com o paciente.
O acompanhante é importante, até mesmo por cuidado com o auxiliar de
enfermagem. Ele, às vezes, trás um remédio e pode se enganar. E
acontece muito isso, né? E você está ali mais perto. (Ac. 11).
Conforme podemos observar, assim como a equipe profissional, os próprios
acompanhantes reconheceram a importância deles dentro do hospital, principalmente,
para oferecer apoio emocional aos pacientes internados, auxiliá-los em seus cuidados e
passar informações sobre seu estado de saúde, havendo uma congruência em ambos
os discursos. Porém, mesmo não desconsiderando a participação dos acompanhantes
no sentido de auxiliar nos cuidados, os profissionais do hospital ressaltaram que os
mesmos devam contribuir apenas com aquilo que fosse possível realizar
(provavelmente se referindo às atividades ligadas às necessidades básicas do
paciente) e, na sua opinião, em hipótese alguma, eles deveriam assumir condutas da
83
equipe de enfermagem, que por considerarem ser de maior complexidade,
automaticamente, exigiriam competência técnica para que fossem executadas.
Nesse sentido, na opinião da equipe, a função do acompanhante deveria ser
acompanhar ou estar ao lado do paciente, para reduzir o sentimento de isolamento
provocado pelo ambiente hospitalar, sendo que os motivos que levariam o hospital a
convocar e autorizar a presença dos acompanhantes seria, principalmente, para
proporcionar o conforto e bem-estar dos pacientes, mas também de alguma forma,
contribuir com o trabalho dos profissionais. Mas, mesmo reconhecendo a importância
desses acompanhantes dentro do hospital, a equipe profissional percebeu algumas
dificuldades que são geradas pelos mesmos na rotina diária das enfermarias, que no
seu entendimento, seriam resultantes do longo período de convivência deles dentro do
hospital. Estas dificuldades estariam relacionadas, principalmente, à: grande solicitação
de atendimento ao paciente; à dificuldade em cumprir as normas do hospital; à busca
constante por informações; a não querer participar nos cuidados do paciente; e a querer
assumir algumas condutas profissionais, conforme depoimento da equipe.
Muitos acompanhantes não entendem que nós estamos atendendo muita
emergência. E, às vezes, eles vêm só pedir para a gente olhar a
temperatura do paciente. A gente pede pra aguardar um pouquinho
porque estamos atendendo uma urgência. E eles não gostam (Prof. 7).
Tem acompanhante, por exemplo, que não respeitava normas nenhuma
de higiene do paciente que tinha que ter um cuidado total. Porque o
acompanhante estava em isolamento de contato e o acompanhante não
queria usar luvas. Às vezes, tirava a camisa na nossa frente (Prof. 8).
Tem alguns acompanhantes que nos atrapalha porque eles perguntam
demais (Prof. 4).
Porque muitas vezes o acompanhante só está interessado no almoço e
não quer participar nos cuidados do paciente [...] E tem acompanhantes
também que esquece de ficar com seu paciente e fica andando pelas
84
enfermarias ou passeando pelo hospital. Já tivemos casos aqui, no quarto
andar, de acompanhantes terem casos amorosos (Prof. 6).
Às vezes o acompanhante fica tanto tempo no hospital que ele acaba
aprendendo algumas coisinhas que nós fazemos. Então, ele pensa que é
um enfermeiro, e quer fazer tudo [...] A minha profissão é várias outras
coisas que eu aprendi e que eu acho que não se baseia só no que o
acompanhante viu e aprendeu (Prof. 5).
Analisando esses discursos apresentados, é possível afirmar que a mensagem
transmitida pelos profissionais era de que a convivência diária com esses
acompanhantes poderia, em contrapartida, aumentar o trabalho da equipe de
enfermagem e que a sua longa permanência nas enfermarias poderia tornar o ambiente
hospitalar tão familiar para eles que isso acarretaria na dificuldade dos mesmos em
cumprirem com as normas e rotinas da instituição, havendo, assim, um afrouxamento
dos limites que deveriam ser impostos. E, de certa forma, deixou transparecer a
obrigatoriedade dos acompanhantes para participar nos cuidados dos pacientes, como
se isso fosse uma função explicitamente delegada aos acompanhantes no hospital.
Mas, onde se encontram instituídos esses cuidados? Ao que tudo indica, essa é uma
questão que parece está apenas subentendida para os profissionais, uma vez que
consta, no manual do hospital, que a função do acompanhante deve ser apenas auxiliar
nas atividades de cuidados do paciente junto à enfermagem, e somente quando
solicitados, mas não deixa especificado quais seriam esses cuidados. Por outro lado, a
própria equipe não parece ter clareza sobre quais seriam as atribuições dos
acompanhantes, quando faz associação ora à execução das atividades, ora à função
de apoio emocional ao paciente internado.
Como forma de superar essas e outras dificuldades que, eventualmente, surgem na
instituição hospitalar, foi apresentada pela equipe profissional a necessidade de
preparar o acompanhante para que ele possa realmente contribuir com o paciente
internado. Esse preparo poderia se dar, na opinião da equipe, através de orientações
sobre o que o acompanhante poderia estar fazendo dentro do hospital, além de
85
propiciar sua participação em atividades de grupo para que os mesmos possam ter a
oportunidade de expressar seus sentimentos e dificuldades.
O acompanhante pode contribuir com certeza. Basta, ele ser bem
orientado (Prof. 7).
Tenho certeza que o acompanhante pode contribuir. Eu só acho que ele
deveria receber uma orientação [...] Poderia ter uma reunião; uma troca
de experiência entre eles (Prof. 8).
O acompanhante pode contribuir, desde que esteja preparado para isso.
Ele chegou e não teve orientação nenhuma das normas, da rotina do
hospital. O que ele pode ou não fazer. O que é dever dele, o que é direito.
Ele não teve preparação, como é que ele vai contribuir? (Prof. 3).
Sobre a possibilidade de receber orientação, nove acompanhantes disseram ter sido
orientados pelos profissionais do hospital a partir do momento em que foram
autorizados a ficarem como acompanhantes, sendo que apenas três deles negaram ter
recebido qualquer tipo de orientação a respeito do tratamento do paciente e do
acompanhamento. Conforme os mesmos declararam, quem mais lhes forneceu
orientações/informações dentro do hospital foram os próprios médicos ou o pessoal de
enfermagem, sendo também esses profissionais a quem eles mais recorreram quando
mais precisaram solicitar algum tipo de ajuda.
Em relação ao tipo de orientação que receberam, a maioria estava relacionada aos
direitos sobre os benefícios que poderiam receber quando estivessem acompanhando o
paciente e também ao dever de cumprimento das normas institucionais. Em relação aos
benefícios, as orientações fornecidas consistiam sobre os critérios para a concessão
das refeições, os horários em que teriam que ser realizadas, e o número de refeições
fornecidas pelo hospital e sobre o direito que teriam de visitar o paciente. Sobre as
normas institucionais, as orientações eram para que não ficassem circulando nos
corredores, mantendo-se dentro das enfermarias junto aos seus familiares; não
86
entrassem nas enfermarias dos outros pacientes; não trouxessem alimentos;
conservassem as enfermarias limpas; não lavassem roupas nas dependências locais,
conforme eles mesmos declararam a seguir.
É importante ressaltar aqui, a dificuldade apresentada por um acompanhante ao tentar
interpretar a legislação, quando se refere ao direito de alimentação, não entendendo
que a idade limite de menor de 16 anos e maior de 60 anos, para concessão desse
benefício, estaria relacionada ao paciente internado e não a eles próprios, pois, como
se sabe, uma das normas institucionais é não permitir a presença de acompanhantes
idosos e menores de idade. Esse fato chama a atenção pela dificuldade, muitas vezes
apresentada pelos acompanhantes, em entenderem e aceitarem algumas normas
institucionais estabelecidas.
Sobre a alimentação; pra não ficar no corredor na hora da limpeza; não
sair da enfermaria (Ac. 4).
A supervisora do andar [enfermeira] chamou e disse todo o procedimento.
Por exemplo, nós que ficamos com o paciente, não devemos entrar em
quarto de outro paciente nenhum [...] Orientação do horário de jantar;
lugar pra lavar roupa lá dentro [enfermaria] é difícil
e não pode fazer
sujeira lá dentro; não pode subir com comida, com frutas, nem nada (Ac.
2).
Passaram um boletim pra mim dizendo os deveres do acompanhante, ou
seja, o acompanhante só tem direito a almoço ou janta, se de repente ele
for acompanhante menor de
16 anos, ou mais de 60 anos [...] Quanto às
visitas diárias, o período, isso tudo passou. Fui bem orientado, quanto a
isso não tenha dúvida [...] A gente não pode entrar no setor, na enfermaria
ao lado; pode tentar assistir televisão; se quiser dar um recado tem que
ficar lá fora e transmite o recado (Ac. 3).
87
Não entrar no quarto dos outros pacientes; das refeições. O que eu ouvi
foi isso, só (Ac. 6).
Que eu não podia trazer comida (risos). Não podia subir com comida lá
pra cima. Essas coisas de alimento, só (Ac. 7).
As orientações que eu recebi é que eu tenho que ficar no quarto pra
acompanhar ele, paciente. A menina que autorizou disse que eu tinha
direito ao ticket-alimentação, por causa da idade dele (Ac. 8).
As outras orientações que foram repassadas pela equipe do hospital estavam
relacionadas à forma como o acompanhante deveria proceder com o paciente
internado, envolvendo alguns cuidados de assepsia, como por exemplo, usar luvas e
máscaras; lavar as mãos; e auxiliar no controle de aparelhos e medicamentos, sendo
explicitadas apenas por três acompanhantes.
Ela, a enfermeira, falou pra eu poder usar as luvas na hora de trocar as
fraldas (Ac. 6).
Eles falaram que eu devia botar máscara; pra toda hora passar álcool nas
mãos, ao tocar o paciente. E nunca chegar perto do paciente, por causa
da infecção da pele. Foi essas as instruções que eu tive (Ac. 5).
Me falaram que era só quando a máquina começasse a apitar, pra
chamar a enfermeira. Ou o soro acabasse pra eu avisar. Essas coisas
(Ac. 10).
De acordo com o que foi declarado pelos acompanhantes, é possível verificar que as
orientações mais repassadas pela equipe profissional diziam respeito, principalmente,
às normas que eles deveriam cumprir a partir do momento que fossem autorizados a
acompanhar o paciente internado. Apenas poucas orientações foram repassadas pela
equipe no sentido de melhor preparar os acompanhantes em relação à forma como eles
poderiam estar ajudando o paciente internado e, ao mesmo tempo, criando meios de
88
redefinir ou reduzir o potencial de danos deles, elevando a capacidade de
enfrentamento às demandas e proporcionando o seu bem-estar.
Por outro lado, as orientações sobre as normas institucionais parecem representar mais
uma forma de manter a disciplina dos acompanhantes dentro do hospital, uma vez que
se constituem em uma série de medidas restritivas e punitivas, tais como foram
reconhecidas por eles. Além disso, parece existir uma diferença qualitativa bastante
significativa em relação aos direitos contidos nessas normas para os acompanhantes e
as necessidades que são percebidas por eles, revelando uma distância entre aquilo que
constitui uma prioridade para a instituição – manutenção da ordem interna – e as reais
demandas dos acompanhantes, quando da sua inserção no hospital.
COSTA (2000), ao realizar uma análise sobre o trabalho de profissionais em uma
unidade de saúde, entende que a interpretação das normas e rotinas era uma atividade
voltada para a formação de atitudes e de comportamentos do paciente, dos
acompanhantes e da família, durante a sua permanência nas unidades. Consistia num
conjunto de orientações sobre os regulamentos, o funcionamento e as condições
exigidas pelas unidades, tais como: observância de horários, prazos de retorno do
paciente, documentos exigidos. Dessa forma, sua utilidade seria a de assegurar a
disciplina e o enquadramento dos usuários às normas e rotinas da unidade, mais do
que qualquer outro objetivo.
Para Foucault (1979, p.107), “a disciplina é o conjunto de técnicas pelas quais os
sistemas de poder vão ter por alvo e resultado os indivíduos em sua singularidade,
exercendo sobre eles uma vigilância perpétua e constante”. O autor, ao descrever
sobre a origem do hospital, destaca que a disciplinarização do espaço hospitalar,
associado à transformação do saber e da prática médica, estão na origem da sua
constituição institucional. Assim, o aparecimento de uma disciplina hospitalar terá por
função assegurar o esquadrinhamento, a vigilância, a disciplinarização do mundo
confuso do doente e da doença, como também transformar as condições do meio em
que os indivíduos serão colocados, sendo possível individualizá-los e distribuí-los em
89
um espaço onde possam ser vigiados e que se possa registrar tudo o que acontece.
Dessa forma, a disciplina é, antes de tudo, uma arte de distribuição espacial dos
indivíduos, ou seja, a inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório
e combinatório, sendo que ela exerce o seu controle não apenas sobre o resultado de
uma ação especificamente, mas sobre o próprio desenvolvimento.
Berger e Luckmann (1985) analisam que esse caráter controlador é inerente à
institucionalização enquanto tal e anterior a quaisquer mecanismos de sanções
especificamente estabelecidos. Sendo assim, pela simples força de sua facticidade, ela
tem um poder coercitivo sobre os indivíduos e a realidade objetiva não fica diminuída se
eles não compreendem a finalidade dela ou seu mundo de operação. Portanto, os
autores ressaltam que toda instituição tem um corpo de conhecimento que é transmitido
como receita, ou seja, como aquele que fornece as regras de conduta
institucionalmente adequadas, define as áreas institucionalizadas da conduta e designa
todas as situações que se localizam dentro dessas áreas. Além de definir e construir os
papéis que devem ser desempenhados no contexto das instituições em questão.
Refletindo sobre o que foi declarado e reconhecendo o caráter controlador da instituição
na qual se encontram inseridos os acompanhantes, perguntamos se seria possível
estabelecer regras que visem não apenas ao seu enquadramento dentro do hospital,
mas que possam ter, sobretudo, a função de orientá-los, informá-los e fazer com que
sintam acolhidos pelos profissionais. Pois, institucionalização não significa,
necessariamente, organização dos serviços, fazendo-se necessário haver uma
flexibilização das normas e critérios estabelecidos.
Alguns acompanhantes parecem revelar também em seus discursos uma atitude de
submissão, não querendo deixar transparecer suas verdadeiras inquietações em
relação ao tratamento recebido dentro do hospital, o que poderia estar associado, entre
outras questões, ao pouco espaço conferido para que possam se pronunciar sem que
se sintam ameaçados pelos mecanismos de controle institucional, conforme descrevem
a seguir.
90
Às vezes, uma pessoa fala alguma coisa que a gente não gostou, e a
gente fica quieto [...] Até a doutora chegou e achou eu meia triste, e
perguntou quem tinha feito alguma coisa comigo. Eu disse: deixa pra lá,
não vou citar nome de ninguém (Ac. 1).
O pessoal daqui é muito bom [...] Quer dizer, eles não são obrigados a
fazer tanto sacrifício aqui, né? A gente deve muita obrigação a eles (Ac.
4).
[...] Porque acaba tendo pessoas que fazem grosserias. E eles não
gostam, entendeu? Não é obrigação deles está fazendo nada para o
acompanhante (Ac. 7).
Porque eu sou assim, uma pessoa de pouco caso, né. Então, eu não fico
assim...cobrando muito, sabe? (Ac. 8).
Sobre as mudanças ocorridas na vida dos acompanhantes depois que passaram a
acompanhar o paciente no hospital, a análise das respostas mostrou três categorias
principais - alterações físicas; alterações emocionais e alterações na vida diária.
Durante o período em que estavam acompanhando o paciente internado, dez
acompanhantes perceberam alterações físicas (Tabela 5), como cansaço, por ter que
acompanhar diariamente o paciente, emagrecimento, por não conseguir se alimentar
adequadamente no hospital, dores nas costas, por ter que mobilizar o paciente no leito,
inchaço e dores nas pernas por dormir sentado em cadeira, e ganho de peso, conforme
alguns deles relataram.
Apesar de estar cansada, eu não arredo o pé não. Porque é importante
para o paciente (Ac. 4).
Emagreci uns três ou quatro quilos, porque a minhas roupas estão
caindo. Estão caindo tudo (Ac. 7).
91
Senti que as pernas inchou muito. A inchação ficou dura. Pedi meu
marido para trazer uma cadeira de praia, pra eu espichar as pernas um
pouquinho (Ac. 1).
Senti dores nas costas, nas pernas, porque a gente tem que virar ela e
tal. E, às vezes ela cola na gente e é muito pesada (Ac. 11).
Acho que engordei, peguei peso. E aqui dentro do hospital (Ac. 9).
Tabela 5. Alterações físicas percebidas pelos acompanhantes durante a permanência deles no hospital. Vitória.
2005.
Alterações físicas Freqüência de respostas
n %
Cansaço 6 54,5
Emagrecimento 2 18,2
Ganho de peso 1 9,1
Dor 1 9,1
Inchaço 1 9,1
Os acompanhantes também perceberam alterações emocionais e elas foram citadas
por nove acompanhantes (Tabela 6). Dentre essas alterações emocionais a
preocupação predominou na fala de seis acompanhantes. Preocupavam-se,
principalmente, com a doença e com o tratamento do paciente.
Assim, fico preocupada como é que esta passando ele, paciente. Se eu
sair de perto, eu não vou saber (Ac. 1).
A minha maior preocupação é a doença. Porque o que me falaram é que
ela é a causadora de todos os sintomas que ele [paciente] está no corpo,
como a falta de movimento (Ac. 7).
A preocupação que eu tenho é, assim, de uma hora pra outra perder ele,
paciente. Eu não sinto assim, muita segurança no estado físico dele. Eu
acho ele um pouco frágil (Ac. 9).
92
Eu me preocupo muito com ele. O que será dele, assim, ficar toda a vida
no hospital. Dele ficar acamado dentro do hospital, dele morrer. Eu penso
muito nisso também (Ac. 10)
Enquanto três deles preocuparam-se mais com os cuidados da casa e dos familiares
que tiveram que abandonar durante esse período em que acompanhavam o paciente,
conforme eles mesmos declararam.
Eu fiquei pensando, assim, a gente fora de casa, longe. Não pode ir lá.
Não pode deixar pra trás. Mas, eu preciso, eu tenho que olhar minha
filha (Ac. 4).
A única preocupação pessoal que eu tenho é o meu companheiro. É
porque ele é hipertenso, e está sozinho em casa (Ac. 5).
A preocupação que eu tenho é que eu queria está na minha casa com
os meus filhos e com a minha mãe (Ac. 11).
Outros tipos de preocupações, como por exemplo, referente à dívida adquirida pela
compra de medicamentos e a possibilidade de perder o período da faculdade por estar
acompanhando o paciente, foram citadas apenas por um acompanhante.
A preocupação é contas de remédio na farmácia [risos]. Tem que pagar,
né. Essa semana passada, eu gastei quinhentos reais de remédio (Ac.
4).
Eu fico com medo do meu pai demorar muito a sair daqui. Porque senão
eu perco a faculdade de fisioterapia que faço (Ac. 7).
Nesse mesmo período em que estavam no hospital, também manifestaram tristeza,
medo e nervosismo pela gravidade do diagnóstico e hospitalização do paciente,
insegurança em serem contaminados pela doença, fragilidade diante das
93
intercorrências que o paciente poderia vir a ter e solidão por perceberem que não
poderiam mais compartilhar os momentos junto com a família.
Ah! A gente fica mais triste, né. Porque a mãe da gente doente. Eu queria
que ela estivesse em casa (Ac. 11).
Tenho medo de na hora do banho, um dia desses, ela pode morrer nos
meus braços, entendeu? Eu fico com medo. Aquele medo é que me deixa
transtornado (Ac. 3).
Às vezes, eu pergunto o médico se ela pega [doença]. Ele disse que não.
Mas, eu fico insegura (Ac. 9).
Eu chego em casa e não encontro ninguém. Filho trabalhando; a filha vai
pra casa do noivo. Eu fico sozinho em casa (Ac. 3).
Tabela 6. Alterações emocionais percebidas pelos acompanhantes durante a permanência deles no
hospital. Vitória. 2005.
Alterações emocionais Freqüência de respostas
n %
Preocupação 9 50
Tristeza 3 16,7
Nervosismo 2 11,3
Medo 1 5,5
Insegurança 1 5,5
Fragilidade 1 5,5
Solidão 1 5,5
Néri (2001) analisa que estados físicos, mentais e emocionais negativos, associados ao
cuidado de pacientes hospitalizados e estando relacionados aos seus familiares,
ocorrem por causa de alguns elementos que, de um modo geral, seriam: a) o exercício
do acompanhante colide com a individualidade da pessoa que está cuidando, ele vê a
vida pessoal e social interrompida por ter que auxiliar o paciente em tempo integral; b)
as tarefas acarretam ônus físico, emocional e financeiro, que tendem a se agravar com
94
a evolução da doença; c) não existem informações suficientes para quem exerce o
cuidado, há poucos recursos sociais de apoio, escassez de pessoas especializadas
para oferecer-lhes suporte e poucas fontes de apoio emocional; d) a dinâmica cuidar –
ser cuidado pode fazer aflorar sentimentos negativos antigos que permaneciam latentes
e a situação ficar de difícil manejo; e) as atividades de cuidar são exercidas geralmente
por um único membro da família, sem ajuda ou reconhecimento dos demais integrantes.
Algumas alterações na vida diária foram percebidas pelos doze acompanhantes, a
partir do momento em que passaram a acompanhar o paciente no hospital (Tabela 7).
Sete deles declararam que tiveram que abandonar a sua casa e interromper as
atividades domésticas, enquanto cinco reconheceram que estavam dando menos
atenção aos filhos e que também tiveram que abandonar temporariamente atividades
sociais, como por exemplo, parar de freqüentar a igreja e não visitar a casa de amigos e
de familiares; ter que abandonar o trabalho foi citado por quatro acompanhantes. Além
disso, declararam ter que interromper outras atividades nesse mesmo período, por
exemplo, adiar uma viagem programada; deixar de fazer algumas atividades manuais
(bordado e ponto cruz); ver com menor freqüência o namorado; e deixar de cuidar do
neto que ficava sob sua responsabilidade.
Deixei de cuidar dos meus filhos, lavar roupa, cuidar da casa. Quem
está fazendo isso agora é a minha filha. Ela lava a roupa, ela faz o
almoço dos irmãos e limpa a casa (Ac. 6).
Eu me considero até um funcionário do hospital. Todo dia eu tenho que
acordar às 8 horas, tomar banho e vir pra cá. Eu trabalhava e parei de
trabalhar em função dela, paciente (Ac. 3).
Eu tenho menos tempo pra fazer as coisas. Eu tenho ido à igreja, mas
não com tanta freqüência. Tem um tempão que eu não vou no
ministério de dança (Ac. 7).
Sempre vivi pra trabalhar e agora é minha filha e minha nora que cuida
da minha casa. Eu gostava de marcar, bordar. Eu não faço mais nada
95
disso. Olhar meu neto que mora em Guarapari, que não olho mais.
Deixei de lado essa parte (Ac. 4).
Meu namorado, eu só vejo nos finais de semana e já estava programado
a semana toda (risos). E tem todo o relacionamento dentro de casa, que
eu ficava tão pouco, e eu queria nos finais de semana todo mundo
unido, né (Ac. 12).
É importante ressaltar que apenas uma acompanhante percebeu mudanças positivas,
nesse mesmo período que acompanhava o paciente hospitalizado. Conforme ela
mesma descreveu, essa experiência possibilitou o estreitamento da sua relação com o
pai e, ao mesmo tempo, contribuiu para torná-la uma pessoa mais responsável. Isso
demonstra a singularidade presente na experiência vivida pelos indivíduos, que pode
está relacionada aos significados que atribuem ao processo de doença, à
hospitalização, ao contato com o ambiente hospitalar, e a tudo o que esse universo
representa.
Teve mudanças, mas eu acho que foi para melhor. Essa experiência fez
com que eu me aproximasse mais do meu pai. E amadureci também,
porque você acaba tendo mais responsabilidade pela situação (Ac. 7).
Tabela 7: Alterações na vida diária percebida pelos acompanhantes durante a permanência deles no hospital.
Vitória. 2005.
Alterações na vida diária Freqüência de respostas
n %
Abandonar a casa e interromper as atividades domésticas
7
27
Dar menos atenção aos filhos 5 19,2
Abandonar as atividades sociais 5 19,2
Abandonar o trabalho 4 15,4
Outras atividades 5 19,2
A partir da análise dos discursos, é possível observar que os acompanhantes sofreram
alterações físicas, emocionais e em sua vida diária depois que passaram a acompanhar
96
o paciente no hospital. Quanto às alterações físicas percebidas, o cansaço predominou
na fala desses acompanhantes, podendo estar relacionado ao fato de que eles estavam
acompanhando por um período mínimo de trinta dias e tinham que cuidar
ininterruptamente do paciente sem as condições ideais para o seu repouso eficiente,
pois, como se sabe, o hospital oferece apenas uma cadeira para que ele possa dormir à
noite e o pequeno espaço das enfermarias para que possa ser dividido entre eles.
Porém, outras manifestações de desgaste físico também foram apresentadas por eles
nesse momento, como dores e inchaço no corpo por ter algumas vezes que carregar o
paciente para o banheiro, ter que virá-lo no leito, e emagrecimento ou ganho de peso,
que poderiam estar relacionados a mudanças no padrão alimentar por não conseguirem
se alimentar direito no hospital, demonstrando uma dificuldade para se adaptarem às
novas regras.
Quanto às alterações emocionais, a preocupação em relação à doença e ao tratamento
do paciente foi predominante, sendo manifestados também sentimentos de tristeza,
nervosismo, medo, insegurança, fragilidade e solidão. Essa reação por parte dos
acompanhantes já poderia ser esperada, considerando-se o fato de estarem
acompanhando pacientes com doenças graves e que exigiam longo período de
internação, em que muitos deles eram submetidos a vários tipos de exames e a
terapêuticas agressivas. Em alguns casos, também, esses acompanhantes
aguardavam pela definição diagnóstica do paciente, o que seria um fator gerador de
ansiedade. Ainda sem contar com todas as mudanças que a situação estava
acarretando em suas vidas.
Quanto às alterações ocorridas na vida diária, as mais citadas pelas acompanhantes
foram ter que abandonar a casa e interromper as atividades domésticas, como também
deixar de dar atenção aos filhos. Como podemos observar, essas seriam as principais
atividades relacionadas a essas mulheres que são donas de casa, com filhos e que
diante da necessidade de acompanhar um familiar internado, tiveram que ser
interrompidas, tendo muitas vezes que ser delegadas a outras pessoas da família ou
amigos. O afastamento das atividades sociais foi outra modificação percebida pelos
97
acompanhantes, como também o abandono do trabalho, o que traria conseqüências
mais sérias por comprometer o rendimento familiar.
Conforme analisa Romano (1997), a hospitalização de um membro da família é um
evento que gera estresse. Dessa forma, pode haver um desequilíbrio dinâmico que
decorre tanto das necessidades internas (redistribuição de papéis, reorganização
emocional, surgimento de sentimentos de insegurança, ansiedade, tristeza, nervosismo
e outros) como também das solicitações de pressões que o ambiente externo faz
(quebra de rotina e aspectos sócio-econômicos e financeiros). Frente a esse episódio,
as alterações que ele provocará, bem como as necessidades adaptativas que poderão
ser mobilizadas dependerão de como o evento se iniciará, dos recursos que essa
família dispõe para lidar com essa situação e com a importância e a valorização que
fazem desse novo acontecimento. Assim, as estratégias adaptativas usadas para
enfrentar a situação de doença e hospitalização de um parente e seu sucesso em
restaurar o equilíbrio do sistema familiar podem ser medidas pelas respostas individuais
das pessoas, tanto físicas como afetivas, que segundo a autora, seriam: dormir menos,
com pior qualidade de sono; permanecer acordado ou ter dificuldade para dormir;
redução ou aumento na ingestão de alimentos; mudanças no padrão alimentar (para
pior); aumento do uso de cigarros, álcool e medicações autoprescritas, como
analgésicos, aspirina e calmante; ficar menos tempo vendo televisão e mais tempo
conversando, rezando, visitando o paciente, esperando, lendo; sentimento de
abandono, menos valia, culpa, raiva.
Todas essas respostas que representariam manifestações universais de ansiedade
foram apresentadas pelos acompanhantes desse estudo tanto para o enfrentamento
das questões relativas ao tratamento do paciente, como para o enfrentamento das
questões pessoais deles, que surgiram em decorrência de mudanças surgidas com a
hospitalização do familiar internado.
A autora ressalta, ainda, que frente a essa situação, as fontes mais freqüentes de
ansiedade nessa família poderiam ser em conseqüência das seguintes questões
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ameaçadoras, que no caso específico aqui, também foram experienciadas pelos
acompanhantes, como: súbita e inesperada instalação da doença; incerteza sobre o
prognóstico; medo de que o paciente sinta dor, tenha inabilidade pós-evento mórbido,
ou morra; falta de privacidade e de individualidade; ambiente desconhecido e
aterrorizante do hospital; e separação física do paciente e/ou distância de casa,
acarretando ausência do grupo de amigos, vizinhos ou parentes com quem havia
convívio, e a sensação de amparo e disponibilidade. Por outro lado, esse afastamento
levaria a mudanças nos papéis familiares; quebra das rotinas; sentimentos de
isolamento; sentimento de perda de controle; outros problemas, como cuidados com as
crianças que estão em casa, outras doenças na família, perda de proventos, despesas
extraordinárias para custeios de manutenção nas proximidades do hospital e/ou para
custeios do tratamento. Dessa forma, a manifestação pelos acompanhantes de um
desgaste físico e emocional, pode ser explicado pelo fato de os mesmos estarem
expostos a algumas dessas fontes ameaçadoras, presentes nesse momento, no
contexto hospitalar.
Conforme analisa Angerami-Camon (1996), como o desequilíbrio do sistema é
interrompido pelas necessidades internas e pelas solicitações externas, a
hospitalização é percebida como ameaçadora, e, se o equilíbrio não é restaurado, tem-
se uma crise. Por ora, essa crise que se instala passa a provocar grande mobilização
no sistema familiar, e este, assim como o paciente, tentará buscar formas adaptativas
para se reorganizar frente a essa nova realidade e criar uma situação temporária de
reequilíbrio com o objetivo de superar alguns obstáculos enfrentados nesse momento e
resgatar o seu status quo que era estabelecido anteriormente ao evento. Essa
sensação de ameaça que pode ser tanto objetiva, quanto subjetiva, mobiliza os
integrantes dessa família de forma a gerar comportamentos os mais diversos em
relação à pessoa que adoeceu, à equipe de saúde, ao tratamento e a eles próprios.
Segundo a autora, pode haver três níveis de reação mais comumente observados
nesses casos, como: o sistema familiar mobiliza-se na intenção de resgatar seu estado
anterior; o sistema familiar paralisa-se frente ao impacto da crise; o sistema familiar
identifica benefícios com a crise e se mobiliza para mantê-la.
99
No primeiro caso, que é o mais freqüente, o impacto inicial frente ao diagnóstico e à
internação é gradativamente substituído por uma ação franca no sentido de buscar a
recuperação do paciente e reintegrá-lo a seu lugar e a papéis no sistema. Assim, a
família, tal qual o paciente, pode passar por diversos estados emocionais, como medo,
ansiedade, angústia e mobilização de mecanismos de defesa, sendo negação,
racionalização e fantasia os mais freqüentes. Mas, nesse caso, toda a mobilização é no
intuito de superação da crise.
No segundo caso, a família entra num processo de imobilidade, semelhante à reação
emocional ao estado de choque. Essa imobilidade é diretamente proporcional ao grau
de importância que o paciente possuía na determinação do equilíbrio da estrutura do
sistema e ao grau de maturidade que essa família, enquanto grupo, possui.
Dessa forma, os sentimentos de desamparo, desesperança, medo, ansiedade e
ameaça são freqüentemente constatados. Então, a família torna-se um fardo para o
paciente que, tentando poupá-la, pode omitir dados sobre seu estado real para estes e
até mesmo à equipe de saúde, com o intuito de obter a alta para voltar a assumir o seu
lugar no sistema. Ela não poupa o paciente dos problemas que ficaram do lado de fora
do hospital, é insistente com a equipe de saúde em relação à melhora do paciente,
muitas vezes, negando-se a ouvir as ponderações desta.
No terceiro caso mencionado, a família pode identificar benefícios na mudança que foi
gerada no sistema a partir da doença. Aqui, o paciente assume no sistema o papel de
“ovelha negra” ou de “bode expiatório”, e essa função tem por objetivo manter o
equilíbrio do sistema, de tal forma que este desloca e/ou projeta para o eleito (no caso o
paciente) todas as patologias das relações.
A doença e internação podem ser um fenômeno gerador dessa condição. Por um lado,
dando à família um real “emergente patológico” ou, em outros casos, possibilitando
àquele que era o “emergente” até então passar sua função para o paciente, livrando-se,
100
assim, da penosa carga que levava. Em ambas as situações, há um grave problema,
que é o risco de serem instalados comportamentos de cronificação da doença,
independentemente do caráter crônico que esta possa ter, pois a família estrutura um
padrão de relacionamento com a pessoa doente de tal forma que essa só obtém sua
atenção se agir e responder enquanto doente. Dessa forma, a doença é sempre
experimentada de forma coletiva nessa microssociedade – a família - que tem objetivos
comuns, regras e acordos de relação. Portanto, sua existência, sua organização e
capacidade de adaptação dependem da busca incessante de manter seu equilíbrio, que
é dinâmico, interativo e que sempre trará um novo resultado.
No contexto hospitalar é importante a equipe profissional reconhecer qual o significado
que a doença adquire em cada grupo familiar em particular, e a partir dessa
identificação procurar trabalhar com os acompanhantes as implicações contidas no
processo de hospitalização, a fim de auxilia-los na relação com os pacientes internados,
visando à superação do elo de dependência que é comum nessas situações. Dessa
forma, é possível pensar em ações de cuidado desenvolvidas pelos acompanhantes
que possibilitem ao paciente desenvolver suas próprias capacidades.
Sobre as estratégias utilizadas pelos acompanhantes diante das dificuldades e das
demandas apresentadas, a análise das respostas mostrou uma categoria principal – a
fé (Tabela 8). Durante a permanência no hospital, nove acompanhantes conseguiram
disponibilizar algumas estratégias para o enfrentamento das dificuldades que surgiram
nesse período. A fé em um ser superior foi declarada por três acompanhantes, como o
recurso que eles mais utilizaram para enfrentar os problemas decorrentes em relação
ao tratamento e ao estado de saúde do paciente.
Quando eu vi ela [paciente] naquele estado, aí foi difícil. Pra superar, eu
comecei a louvar o senhor. É a única tranqüilidade que nós temos (Ac. 5).
A situação era difícil, então vamos orar. Porque não tinha como a gente
conseguir lá no IAPI, trocar a medicação no prazo que o paciente
precisava [...] mas Deus abençoou (Ac. 7).
101
Eu peço muito a Deus pra dar força, pra mim, conversar tudo com Ele.
Assim [...] doença, coisas assim. (Ac. 10).
Outros três acompanhantes também utilizaram a fé como forma de trazer conforto para
si mesmos, a fim de suportar o período em que teriam que ficar acompanhando o
paciente internado e estarem submetidos às condições impostas pela instituição
hospitalar.
Eu me sinto feliz e falo: obrigada meu Deus, por este dia e ter essa força
pra novamente outro dia (Ac. 2).
Ah! Primeiro é Deus. Que me dá aquela força fora do sério [...] o principal
é a fé em Deus, acreditar em Deus. Então, é aquela fé positiva (Ac. 3).
Estou preparada, graças a Deus [...] eu estou sempre bem, graças a
Deus. Eu não reclamo de nada. Só agradeço (Ac. 9).
Tabela 8. Estratégias de enfrentamento utilizadas pelos acompanhantes durante o período de
acompanhamento. Vitória. 2005
Estratégias de enfrentamento Freqüência de respostas
n %
Fé 6 60
Caminhada 1 10
Dança 1 10
Escrever cartas e mensagens 1 10
Refletir sobre a situação 1 10
Outras formas de enfrentar as dificuldades surgidas nesse período também foram
citadas por três acompanhantes, como fazer caminhadas; dançar; escrever músicas e
mensagens; e ficar refletindo sobre a sua própria situação.
102
Eu pratico muito esporte [...] continuo minhas caminhadas, três
vezes por semana, de uma hora e meia. Além do mais, eu danço
duas horas de baile direto. Isso me dá uma condição física muito
boa pra suportar esse embalo aí (Ac. 3).
Eu escrevo e tento escrever música. Gosto de escrever coisas
bonitas ou alguma mensagem pra alguém. E faço isso. Escrevo
algo diferente (Ac 12).
Vou ali fora, no jardim, e fico sentada num banco e volto [...] fico lá
sentada e penso um pouco nas coisas. Depois eu subo e pronto,
esqueço (Ac 11).
Em vários outros momentos da entrevista, os acompanhantes fizeram referência à
busca de ajuda junto à equipe profissional, o que pode ser entendido como outra forma
encontrada por eles para resolver as suas dificuldades dentro do hospital. Os motivos
mais freqüentes da sua solicitação estavam relacionados a pedidos de informação
sobre o tratamento e de como proceder com o paciente, além da necessidade de
auxílio na assistência direta do mesmo, por exemplo, dar banho.
Pra informação eu vou para as pessoas que entendem o estado de
saúde dele. Eu tô sempre perguntando (Ac 9).
Eu procuro mais mesmo é a assistente social, os médicos que
cuida dele. Quando eu sinto uma coisa assim [...] eu procuro pra
me orientar, o que devo fazer (Ac 10).
Quando ele se sente mal ou cai, vou no corredor e chamo. Ontem
mesmo eu dei banho nele, pois ele estava febril. Aí botei bastante
toalha molhada nele e chamei o enfermeiro. (Ac 8).
Mesmo considerando que os acompanhantes conseguiram disponibilizar alguns
recursos para enfrentar as dificuldades surgidas durante o período de permanência no
103
hospital, a fé em um ser superior foi declarada por eles como a estratégia mais utilizada
para a redução das ameaças que a situação impunha. O modelo interacionista proposto
por Lazarus e Folkman (1984, p.47) conceitua enfrentamento como “uma constante
mudança cognitiva e esforços comportamentais para manusear demandas externas ou
internas específicas que são avaliadas como algo que excede os recursos da pessoa”.
Nesse sentido, enfrentamento é compreendido como um processo dinâmico, que se
retroalimenta, devendo ser julgado dentro do contexto do indivíduo enfocando a
redução de angústia ou sensação desagradáveis, podendo ser considerado como uma
resposta à percepção de dificuldade ou conflito, real ou não, podendo levar ou não ao
ajustamento.
Considerando que os acompanhantes estavam inseridos em uma instituição hospitalar
que não dispunha de muitos recursos que pudessem ser disponibilizados, no sentido de
reduzir sua ansiedade frente à situação de doença e hospitalização do seu familiar
internado e também de suas questões pessoais, é compreensível que a fé (enquanto
um recurso próprio) tenha sido a forma de enfrentamento mais perceptível e utilizada
por eles, pois, as ações que visem ao atendimento das necessidades específicas desse
grupo ainda são inexistentes no hospital, como por exemplo, grupos de apoio,
programas de orientação e atividades de entretenimento. Por outro lado, o
reconhecimento da utilização da fé enquanto um recurso considerado eficaz pelos
acompanhantes pode ser associado às características do meio no qual eles se
encontram inseridos, ou seja, uma sociedade tipicamente afetiva e cristã, tanto do
ponto de vista social, quanto familiar, que poderá ter contribuído para a formação dessa
crença específica, em que o acompanhar e o cuidar adquirem um significado de
valorização e recompensa, podendo ser utilizados como forma de superação ou
ajustamento às dificuldades percebidas.
Para Lazarus e Folkman (1984) existem variáveis situacionais, pessoais e externas que
estão implicadas no processo de enfrentamento, sendo este multideterminado por
alguns condicionantes que atuam sobre ele, como: a característica da situação, quanto
à sua magnitude e controlabilidade; qualidade e quantidade de ameaça percebida;
104
possibilidades de opções para resolver a situação; observação de como os resultados
são vislumbrados; recursos; e barreiras encontradas para utilizar esses recursos, visto
que algumas ações de enfrentamento podem gerar novas ameaças, devido limitações
presentes. Esses condicionantes, por sua vez, estão atrelados ao processo cognitivo,
constituído pelas crenças, valores, memória, visão de mundo, necessidades e metas
em curto e em longo prazo, constitutivos do processamento de informação necessário
para avaliar o ambiente e levantar opções para enfrentar a situação. Essas estruturas
cognitivas expressam as experiências de vida, direcionam as escolhas de ação de
forma subjetiva e são menos vulneráveis às mudanças. Por outro lado, desencadeiam
diferentes emoções de acordo com a avaliação emitida, impingindo uma inter-relação
importante entre cognição, emoção e outros constructos na escolha e emissão de um
comportamento.
Considerando que os acompanhantes desse estudo não tinham como agir diretamente
na situação no sentido de modificá-la totalmente, visto que precisavam aguardar pelo
desfecho da situação, ou seja, pela possível melhora e alta hospitalar do paciente,
podemos dizer que eles buscaram uma forma de adequar sua resposta emocional
frente ao problema que estavam enfrentando procurando manter uma esperança e
otimismo até que pudessem retornar às suas atividades do cotidiano. Procuravam,
assim, manter o equilíbrio necessário a fim de que pudessem continuar apoiando o
paciente nas suas necessidades físicas e emocionais.
Baseando-se no modelo interacionista cognitivo, Silva (2003b) avalia as funções de
enfrentamento para as pessoas e as formas pelas quais elas as utilizam, chamando
atenção para a diferença que existe entre a função e a conseqüência de determinada
estratégia escolhida. Assim, a função estaria relacionada ao propósito ao qual a
estratégia serviria, enquanto as conseqüências estariam relacionadas aos efeitos
produzidos por ela. Partindo desse princípio, o enfrentamento teria duas funções
básicas que seriam especificamente: modificar a relação entre a pessoa e o ambiente
(enfrentamento centrado no problema) ou adequar a resposta emocional ao problema
(enfrentamento centrado na emoção).
105
Em geral, as formas de enfrentamento centradas na emoção são mais passíveis de
ocorrer quando já houve uma avaliação, por parte da pessoa, de que nada poderá ser
feito no sentido de modificar as condições de dano, ameaça ou desafio ambiental, ao
qual se encontra submetido. Refletindo particularmente sobre a situação experienciada
pelos acompanhantes, podemos pensar na sua possível vulnerabilidade e impotência
diante da nova realidade que foi imposta pelo surgimento da doença e da necessidade
de hospitalização de uma pessoa da sua família, escapando, assim, à sua capacidade
de modificação e controle do fato.
Em relação ao tipo de estratégias utilizadas, no enfrentamento centrado na emoção,
elas podem se originar de processos cognitivos de reavaliação da situação, seja por
uma interpretação realista do fato, ou por distorção da realidade, todos visando atenuar
o desconforto emocional. As experiências relatadas pelos acompanhantes, sujeitos do
estudo, evidenciam alguns momentos em que eles sentiram a necessidade de refletir
sobre a situação em que estavam vivenciando, procurando minimizar sua importância,
como também conseguiram estabelecer comparações positivas em relação ao fato de
permanecerem no hospital, relacionando este momento como um fator que veio
contribuir para o seu amadurecimento e aprendizado. Assim, tentavam deslocar suas
aspirações para uma forma de compensar seus sentimentos de angústia frente a
situação experienciada.
Quanto à possibilidade de opções para resolver os seus problemas, poderíamos
ressaltar sobre a capacidade de os acompanhantes em disponibilizar além dos próprios
recursos internos, como a sua fé e o desenvolvimento de algumas potencialidades
pessoais, outros recursos externos que foram buscar fora da instituição hospitalar,
como participar de bailes de dança, fazer caminhada e praticar esportes, aumentando,
dessa forma, seu repertório de estratégias para enfrentar as dificuldades. Também é
importante ressaltar que mesmo os acompanhantes não percebendo a interação
estabelecida com a equipe e a ajuda recebida, como sendo um recurso estratégico que
foi utilizado no hospital, estas poderão ser compreendidas como outra forma de
enfrentamento da situação, assim como o vínculo que foi estabelecido entre si mesmos,
106
enquanto grupo, correspondendo como ações espontâneas deles que viriam contribuir
para que se sentissem fortalecidos nesse momento.
Ao tratarmos dessa questão, podemos utilizar-nos da referência feita por Cade (2002)
em relação a outro aspecto que constitui como mais um condicionante que se encontra
implicado no processo de enfrentamento, que são os recursos compreendidos como os
que a pessoa mobiliza para lidar com a situação e cuja presença constitui um fator
importante no desenvolvimento do enfrentamento. Nesse sentido, considera-se
necessário que o indivíduo também tenha competência para procurá-los e saber utilizá-
los de forma adequada a cada situação específica.
Finalizando, a noção do que seja enfrentamento diz respeito às várias maneiras como
os indivíduos reagem aos desafios do meio-ambiente e às situações novas para quais
não existem respostas prontas. No sentido aqui utilizado, trata-se dos recursos
utilizados pelos acompanhantes que serviriam para manter o seu bem-estar, em um
determinado momento, minimizando suas sensações de angústia e desconforto diante
das situações ameaçadoras. Portanto, amparando-se em Vieira (1997), não caberia
propor às mesmas um parâmetro de medidas, pois mesmo que essas estratégias de
enfrentamento não sejam consideradas como adaptativamente as melhores, em longo
prazo, e mesmo que sejam algumas vezes utilizadas por eles como forma de fugir de
imediato do problema e representar uma situação de fuga, elas não podem ser
avaliadas como boas ou ruins, visto que correspondem como escolhas específicas
compatíveis com suas crenças e práticas sócio-culturais.
107
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A temática sobre os acompanhantes no contexto hospitalar é uma questão ampla que
envolve vários determinantes – políticos, econômicos, culturais, sociais e psicológicos,
não permitindo uma discussão unidimensional, passando a exigir a participação de uma
equipe multiprofissional no entendimentos dessa complexidade.
No que tange ao aspecto político, podemos dizer que o processo de abertura dos
hospitais para a permanência dos acompanhantes que teve início, primeiramente, nas
alas pediátricas, foi resultado de um movimento mais amplo que acontecia na
sociedade brasileira para a mudança do tipo de assistência que deveria ser prestada
aos usuários na saúde. Esse movimento político acabou refletindo na prática dos
profissionais da área, onde alguns médicos pediatras, juntamente com o apoio de
profissionais da psicologia, começaram a introduzir novos conceitos sobre a relação
saúde/doença e passaram a defender a presença de familiares nos hospitais como
peça fundamental para o tratamento das crianças hospitalizadas.
Vasconcelos (2002) assinala que no Brasil, no final da década de 70, ganha destaque
na relação Estado/Sociedade o movimento pela democratização da saúde, que,
envolvendo intelectuais, profissionais da saúde, movimentos sociais e estudantes, criou
condições para a construção do projeto da Reforma Sanitária brasileira. Este
movimento teve como princípio uma crítica à concepção de saúde restrita à dimensão
biológica e individual, bem como a afirmação da relação entre organização social,
organização dos serviços de saúde e prática na saúde, tendo como uma de suas
estratégias fundamentais o Sistema Único de Saúde (SUS). Portanto, a modificação
nas práticas da assistência que ocorre nos espaços privados dos hospitais representa
uma mudança de paradigma, que, nessa época, já estaria associado ao resgate da
humanização e do atendimento integral ao paciente hospitalizado, tendo forte influência
dos movimentos realizados por grupos políticos no Brasil e de novas práticas médicas
assistenciais que começavam a ser adotadas em outros paises.
108
A implantação do SUS no final dos anos 80, como um sistema plural que tem como
diretrizes básicas a descentralização, o atendimento integral e a participação
comunitária, vem reforçar esses princípios e surge como uma proposta de superação
ao modelo médico hegemônico vigente até o momento. Costa (2000, p.63), ao analisar
esse tipo de modelo de atenção à saúde descreve que:
O modelo médico hegemônico, ao centrar suas ações nas atividades de
clínica médica curativista individual, secundariza e desqualifica as ações
e atividades profissionais que não se constituem objeto de práticas
privilegiadas por esse modelo assistencial, como é o caso das ações de
educação em saúde e das atividades de categorias profissionais, como:
assistentes sociais, nutricionista, sociólogos, psicólogos.
Portanto, somente uma análise mais apurada, buscando recompor tais atividades e
suas conexões com os objetos e objetivos do SUS, pode dar visibilidade à qualificação
técnica que esse trabalho ocupa, no interior do processo de trabalho de saúde.
Em relação às mudanças políticas ocorridas no cenário nacional, outra questão
relevante ocorre nessa mesma década, quando a Constituição Brasileira de 1988
incorpora um conceito mais ampliado de saúde, a qual passa a ser entendida como
direito de cidadania e dever do Estado e como integrante da seguridade social, ao lado
da previdência e da assistência social, cujas ações e serviços devem ser providos por
um sistema unificado de saúde.
A atual política nacional de humanização que é implementada pelo Ministério da Saúde
a partir de 2004 se caracteriza como uma continuidade desse mesmo processo, uma
vez que propõe a adoção de novas práticas nos espaços públicos dos hospitais
brasileiros apresentando-se, dessa maneira, como uma forma de sustentação de
alguns princípios do SUS, como a universalidade, a eqüidade e a integralidade da
atenção à saúde e, ao mesmo tempo, possibilita uma discussão mais ampla sobre as
questões relativas à institucionalização dos acompanhantes, entre outras de maior
amplitude relacionadas à assistência na área da saúde.
109
Conforme analisa Cecílio (2001), pensar a eqüidade e a integralidade da atenção nos
obriga a enxergar como o micro está no macro e vice-versa, e esta recursividade, mais
do que uma formulação teórica tem importantes implicações na organização de nossas
práticas. Dessa forma, a luta pela eqüidade e pela integralidade implica,
necessariamente, repensarmos aspectos importantes da organização do processo de
trabalho, gestão, planejamento e construção de novos saberes e práticas em saúde.
Quanto ao fato de o acompanhamento hospitalar ter alcançado a legislação e ter-se
instituído como um direito, podemos interpretar esse fato como um avanço, mas que na
prática vem se desvelando em um antagonismo, no sentido de que acaba infringindo os
princípios da integralidade e eqüidade no atendimento para a maioria dos pacientes
internados que não se encontram rotulados enquanto grupo.
É justamente nesse contexto macro da política de saúde brasileira e nas contradições
presentes na prática que deve ser entendida a questão da institucionalização dos
acompanhantes, que nesse cenário se configura como uma questão micro a ser
desvelada, mas não menos relevante.
A experiência relatada pelos acompanhantes sobre acompanhar um paciente adulto
hospitalizado na enfermaria de um hospital público especializado nos remete ao
aprofundamento de algumas questões subjetivas que também estão implicadas nesse
processo. É importante ressaltar que, mesmo que essa experiência dos
acompanhantes seja uma particularidade apresentada em cada um deles, retrata
igualmente a apreensão da realidade que é construída a partir de uma coletividade,
representada aqui pelos pacientes, profissionais e pelos próprios acompanhantes.
Uma síntese sobre a experiência dos entrevistados revelou que ser acompanhante é
um processo importante para o paciente, para si e para os membros da equipe
profissional. Mas, experienciar esse processo revelou dificuldades, necessidades,
preocupações, conflitos e demandas.
110
As dificuldades encontradas pelos acompanhantes no contexto hospitalar estiveram
relacionadas, principalmente, às suas questões pessoais e se resumiam na falta de
infra-estrutura da instituição para atender as suas demandas por melhor acomodação e
conforto, como não ter direito à alimentar-se no hospital, dormir em cadeiras e não ter
um local reservado para fazer sua higiene. E também à estrutura organizacional do
hospital que implicava para eles o cumprimento de normas e regulamentos, por
exemplo, ter que fazer as refeições nos horários determinados, não poder transitar
livremente nas dependências do local, não trazer alimentos de casa, não usar
determinado tipo de vestimenta, não atender telefone no setor, não fazer barulho na
área do hospital.
As suas necessidades foram expressas no desejo de interagir com outras pessoas
dentro do hospital, de obter informações sobre o tratamento do paciente e de retornar
às atividades diárias, como cuidar da casa, dar atenção aos filhos, freqüentar a igreja,
reunir-se com amigos e familiares.
A preocupação foi um sentimento que permeou todo o processo do acompanhar e do
fazer do acompanhante. Era decorrente do receio pela doença e tratamento do
paciente, por ter que abandonar a casa e a família, por adquirir dívidas e por
interromper projetos pessoais importantes.
A importância do acompanhante foi justificada por eles pelo apoio emocional ao
paciente, por poder auxilia-los nas atividades de cuidado, acompanhar a sua evolução
clínica, observar e fiscalizar a assistência prestada pelos profissionais, e passar
informações para a equipe. O acompanhante ajudou a equipe de enfermagem,
principalmente, no atendimento das necessidades de locomoção, higiene pessoal,
hidratação, alimentação e repouso.
O acompanhante não apenas permaneceu ao lado do paciente, fazendo companhia,
mas realizou atividades de cuidado, algumas delas de maior complexidade e de
competência profissional.
111
O acompanhar, o estar com, resultou de sentimentos de afetividade, obrigação,
disponibilidade e paciência e remeteu a necessidade de: estar próximo do paciente,
transmitir apoio, tranqüilidade, coragem e otimismo, facilitar a adaptação dele no
hospital, obter informações sobre a doença e o tratamento, informar sobre sua rotina,
ajudar na sua limitação física. E também implicou na manifestação de um desgaste
físico e emocional, expresso por sentimentos de cansaço, preocupação, tristeza,
nervosismo, medo, insegurança, fragilidade e solidão, relacionados com a necessidade
de estar próximo do paciente e conviver com o ambiente hospitalar.
A hospitalização do paciente trouxe como conseqüência alterações no ritmo de
trabalho, abandono das atividades sociais e de lazer, afastamento de amigos e
familiares, redistribuição de papéis no meio familiar, despesas extraordinárias, perda de
proventos e incertezas quanto ao futuro. Mas, acompanhar o paciente no hospital
significou para os acompanhantes, contraditoriamente, uma boa experiência por
proporcionar-lhes aprendizado, crescimento pessoal e uma forma de interagir com
outras pessoas.
No contexto hospitalar, por estar vivenciando as mesmas experiências, eles se
identificaram enquanto grupo e estabeleceram laços de solidariedade e de ajuda mútua,
fortalecendo-se entre si para enfrentar a situação de doença e hospitalização do seu
familiar hospitalizado.
Os sentimentos de prazer e recompensa em acompanhar o paciente foram expressos
pelos acompanhantes através de atitudes abnegadas e de discursos dóceis, que
mostravam certo conformismo diante da situação, podendo estar relacionado às
características culturais de uma sociedade predominantemente afetiva e cristã.
Revelou-se para eles como uma oportunidade de mostrar perseverança, força de
vontade, determinação, onde o cuidar adquiria quase um significado de atributo natural.
Néri (2001), ao discorrer sobre a questão do cuidado, afirma que a internalização das
normas sociais pelos indivíduos faz com que eles assumam pessoalmente a obrigação
112
de cumprir o dever moral de cuidar como algo natural e esperado. Ao fazê-lo, eles
também se afirmam como pessoas, mostram que são ajustados, evitam sentimentos de
culpa, estabelecem ou restabelecem os laços afetivos com o paciente, dão exemplos às
próximas gerações, enfim, realizam tarefas da maturidade. Em relação aos
acompanhantes aqui investigados, foi possível observar a internalização de algumas
condutas que são socialmente aceitas, quando negavam associar a experiência de
ficar, permanentemente, no hospital, como algo difícil, parecendo não querer assumir
uma atitude considerada como reprovável pela família e pela sociedade.
Durante o período de acompanhamento, a fé foi reconhecida pelos acompanhantes
como a principal estratégia para a superação das suas dificuldades, mas foram capazes
de buscar outros recursos externos, como forma de apoio. A solicitação de ajuda à
equipe profissional, bem como os laços de solidariedade estabelecidos entre si, mesmo
não sendo apresentados por eles como uma estratégia de enfrentamento, podem ser
entendidos como outro tipo de apoio que conseguiram disponibilizar no hospital.
As orientações fornecidas pela equipe profissional foram percebidas pelos
acompanhantes como medidas disciplinares, restritivas e punitivas, contribuindo muito
pouco, no sentido de orientá-los quanto aos procedimentos que deveriam ser adotadas
junto ao paciente hospitalizado.
Segundo Vieira (1997), evidências mostram que a falta de informação sobre a melhor
forma de cuidar estão entre os fatores que estimulam o surgimento de tensões e
estresse, como resposta emocional do acompanhante às demandas práticas e às
responsabilidades envolvidas. Associados a este fator, estariam também a falta de
apoio emocional, a exposição prolongada ao evento estressor, uma concepção
negativa da situação e as dificuldades de estabelecer vínculo positivo.
A presença do acompanhante foi avaliada pela equipe profissional como necessária
para suprir as necessidades físicas e emocionais do paciente, mas, de alguma maneira,
também para contribuir com o seu trabalho. Em contrapartida, as dificuldades geradas
113
pela presença do acompanhante nas enfermarias foram percebidas por ela e
apontaram a necessidade de prepará-los para a sua inserção no hospital.
A permanência diária dos acompanhantes, nas enfermarias, pareceu significar para os
profissionais do hospital um aumento no ritmo do seu trabalho, pois era preciso orientá-
los, prepará-los e estar atento às suas solicitações.
A equipe profissional, ao procurar definir a função do acompanhante, afirmou que ele
deveria apenas acompanhar o paciente ou estar ao seu lado, não fazendo alusão à
execução de atividades de cuidados. Isso se revelou como contraditório, no sentido de
que haviam declarado, anteriormente, que os acompanhantes poderiam auxiliar os
pacientes em suas necessidades básicas.
Os discursos dos acompanhantes e da equipe profissional revelaram congruência
quanto às atividades que os acompanhantes deveriam realizar no hospital, sobre a boa
relação mantida entre ambos e sobre a importância do apoio físico e emocional para o
paciente.
As demandas trazidas pelos acompanhantes se revelaram como independentes
daquelas dos pacientes internados, trazendo implicações para a instituição hospitalar e
para os profissionais do hospital. E apontam a necessidade de que seja elaborada uma
política de atendimento para esse grupo específico.
Algumas ações que devem ser contempladas no cotidiano da instituição hospitalar,
visando ao atendimento dos acompanhantes podem ser citadas, as quais seriam:
melhoria da infra-estrutura do hospital visando proporcionar o seu conforto e bem-estar;
definição das atribuições junto ao paciente internado; rediscussão sobre os critérios de
concessão de benefícios; reflexão sobre as normas e regras estabelecidas; criação de
espaço para a discussão de suas necessidades, tanto objetivas quanto subjetivas; e
estabelecimento de uma rede de apoio, ampliando as fontes de recursos.
114
A proposta de desenvolvimento de uma nova forma de gestão apresentada pelo
hospital, através de uma gerência participativa, mostra-se como um momento oportuno,
para que o projeto de criação de uma política voltada ao atendimento dos
acompanhantes possa, ser levada para discussão em todas as instâncias da instituição
– usuários, profissionais, colegiados gestores e, assim, estabelecer condições reais
para sua implementação. O Grupo de Trabalho de Humanização do hospital se
apresenta como um mecanismo pelo qual essa proposta pode ser encaminhada, uma
vez que se constitui como um espaço democrático e representativo, onde as demandas
internas da instituição podem ser apresentadas e discutidas.
No cotidiano do hospital, já podem ser identificadas algumas atividades de
humanização, mas estas ainda se constituem em ações isoladas. As atividades
especificamente desenvolvidas para atender aos acompanhantes estão concentradas
apenas nas unidades pediátricas onde já se acham implementados alguns projetos
educativos e de entretenimento. Entretanto, é necessário que essas atividades sejam
também implementadas junto aos acompanhantes de pacientes adultos internados nas
demais unidades do hospital.
A proposta de trabalho em grupo, a criação de programas de orientação, o treinamento
e a supervisão, são atividades que poderiam ser desenvolvidas pelos profissionais do
hospital, visando preparar o acompanhante para sua permanência no hospital junto ao
paciente internado.
Sobre as estratégias que visem suprir as necessidades de acompanhantes familiares
no hospital Romano (1997) refere que programas de orientação pré-operatória, por
exemplo, possibilitam atitudes positivas sobre a hospitalização e, conseqüentemente,
facilitam a reestruturação cognitiva, aumentando a percepção de apoio social e da
própria equipe profissional. No entendimento da autora, trata-se, assim, do primeiro
passo para que os mesmos se mostrem disponíveis para receber, aceitar e participar do
tratamento, de suas orientações para torná-lo eficiente durante o processo de
reabilitação do paciente.
115
Sobre o grupo de apoio, a mesma autora acrescenta que ele, freqüentemente, é
generalizado para além das fronteiras da sessão grupal, o que reforça ainda mais as
vantagens da participação dos acompanhantes familiares. Acrescenta, ainda, que esse
tipo de grupo permite a participação de outros profissionais e, por meio de uma
participação conjunta, o grupo de apoio também traz benefícios para a equipe, porque:
possibilita reconhecer mais acompanhantes familiares de uma só vez; facilita a
identificação daqueles que necessitarão de atenção individual maior; sistematiza a
transmissão de informação; e avalia o grau de satisfação dos usuários, pacientes e
familiares acompanhantes, em todos os sentidos – cuidado dispensado, contato com os
membros da equipe, qualidade das enfermarias, etc., e, portanto, identifica problemas.
Pode-se, assim, a partir dessas informações colhidas, rever suas próprias rotinas.
Halm (1990) resume os benefícios dos grupos de apoio, do ponto de vista destes
familiares, destacando que eles percebem que não estão sós; compartilham
sentimentos com pessoas na mesma situação; aprendem que os problemas dos outros
podem ser piores que os seus; reduzem a ansiedade; aprendem novos métodos de
adaptação; conseguem melhor compreensão da doença e dos cuidados dispensados
ao doente. Dessa forma, as atividades de grupo – operatório, psicoterápico ou
psicodramático - assim como os programas de orientação se mostram como opções
para que as dificuldades dos acompanhantes possam ser trabalhadas no contexto
hospitalar.
Mas, a questão dos acompanhantes é complexa e não se esgota no hospital se
pensarmos na possibilidade dele vir a ter que estender seus cuidados ao paciente em
casa, após a sua alta hospitalar. Nesse caso, faz-se necessário, ampliar a rede de
apoio social, visando atender de maneira integral as demandas do acompanhante
familiar. A parceria com prefeituras, organizações não-governamentais (ONGs),
unidades de saúde, associações e outras entidades, são medidas que poderão ser
adotadas nesse sentido.
116
Salvá (2004) ao fazer um estudo das redes, cita uma classificação entre os tipos de
sistema de apoio que podem ser operacionalizados a partir de algumas estratégias
mobilizadoras dos indivíduos. O primeiro seria os sistemas de apoio naturais – que
incluem, por exemplo, a família, os amigos de estudo, os companheiros de cultos e
crenças, os amigos, vizinhos. O segundo seria os sistemas de apoio organizados,
incluindo os serviços sociais institucionais, associações de auto-ajuda, organizações
não-governamentais e ajuda profissional (médicos, enfermeiros, assistentes sociais,
dentre outros).
As principais funções das redes de relações e apoio social para os adultos estariam
assim discriminadas por NERI (2001): a) dar e receber apoio emocional, ajuda material,
serviços e informações; b) manter e afirmar a identidade social; estabelecer novos
contatos sociais; permitir às pessoas crer em que são cuidadas, amadas, valorizadas;
dar-lhes garantias de que pertencem a uma rede de relações comuns e mútuas; ajudá-
las a encontrar sentido nas experiências do desenvolvimento, principalmente, quando
elas são não-normativas e estressantes; auxiliar as pessoas a interpretar expectativas
pessoais, grupais e avaliar as próprias realizações e competências; dar chances para
que as pessoas desenvolvam estratégias de comparação de suas competências e
realizações com as de outras pessoas. Com isso, os indivíduos podem manter a auto-
imagem e aprender sobre si mesmos.
Finalizando, podemos dizer que a instituição hospitalar representa o espaço de
desenvolvimento de diversas práticas profissionais, sendo o local propício para que
sejam criadas e implementadas novas práticas de assistência aos usuários da saúde,
estando incluídos entre estes os próprios acompanhantes. É justamente no cotidiano de
suas práticas, que residem as questões mais prementes sobre os limites e
possibilidades de garantir o princípio da integralidade, pelo fato de os profissionais
terem a oportunidade de identificar as diferentes demandas trazidas pelos usuários.
Entretanto, se faz necessário, nesse contexto, perceber não apenas os limites
estruturais inerentes à instituição hospitalar, mas também identificar as possibilidades
117
de se construir um agir, capaz de renovar e recriar novas práticas de saúde a partir de
diferentes conhecimentos, frutos de uma mesma interação, que é construída na relação
entre usuários, profissionais de saúde e gestor. Só dessa forma seria possível pensar
numa possibilidade real de concretizar o atendimento de pacientes e familiares,
pautados nos princípios da eqüidade e da integralidade.
118
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123
APÊNDICES
124
APÊNDICE A – Instrumento de pesquisa aplicado aos acompanhantes.
Data da entrevista: -----/-----/------.
Nome do paciente:_____________________________ Reg:____________
CARACTERIZAÇÃO PESSOAL DOS SUJEITOS
1) Sexo: F ( ) M ( )
2) Estado civil: ( ) Solteiro ( ) Casado ( )Amasiado ( ) Separado ( ) Viúvo
3) Religião: _____________________
4) Data de nascimento: ____________
5) Procedência
Sobre a escolaridade
6) Estudou até que ano? ___________________ ( ) Completo ( ) Incompleto
Sobre a renda per cápita
7) Quantas pessoas moram em casa?
8) Quantas pessoas apresentam rendimento?
9) Quanto cada pessoa ganha aproximadamente?
Sobre a profissão/ocupação
10) Tem profissão/ocupação? ( ) Sim ( ) Não Qual? _____________________
11) Tipo de vínculo empregatício?
( ) Com contrato ou carteira assinada ( ) Autônomo/informal ( )Aposentado
( ) Afastado por doença ( ) Desempregado
12) Tempo de acompanhamento do paciente? ____________
13) Grau de parentesco com o paciente? _________________
125
Continuação...
SOBRE AS ATIVIDADES DE CUIDADO DESENVOLVIDAS
14) Quais são as atividades diárias que você realiza com o paciente no hospital?
15) Dentre as atividades que você vem desenvolvendo quais são as que se apresenta
para você com maior dificuldade? E quais as que se apresenta com maior facilidade?
SOBRE A EXPERIÊNCIA NO ACOMPANHAR
16) Por que você foi escolhido (a) para ficar acompanhando o paciente no hospital?
17) Que tipo de orientação você recebeu a partir do momento em que foi autorizado a
acompanhar o paciente no hospital?
18) Você no seu dia-a-dia como acompanhante gostaria de receber outras informações?
19) A que você atribui a importância do acompanhante para o paciente?
20) Você percebeu alguma modificação no seu estado físico ou emocional depois que
passou a acompanhar o paciente? Caso afirmativo qual?
21) Quais alterações que você percebeu na sua vida diária depois que passou a
acompanhar o paciente?
22) No momento quais são as suas necessidades?
23) No momento quais são as suas preocupações?
24) Quais foram as dificuldades encontradas durante a sua permanência no hospital?
SOBRE AS ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO UTILIZADAS
25) O que você costuma fazer quando sente alguma dificuldade dentro do hospital?
26) A que pessoas você costuma recorrer dentro do hospital quando necessita de algum
tipo de ajuda?
SOBRE A PERCEPÇÃO DA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR E DA EQUIPE
PROFISSIONAL
27) O que você acha do ambiente hospitalar?
28) Na sua avaliação, como são as condições oferecidas pelo hospital para a
permanência do acompanhante?
29) Como você avalia a sua relação com a equipe profissional?
30) Como você acha que os profissionais do hospital poderiam te ajudar durante esse
período de acompanhamento?
126
APÊNDICE B – Instrumento de pesquisa aplicado aos profissionais
CARACTERIZAÇÃO DA EQUIPE PROFISSIONAL
1) Nome:
2) Setor:
3) Categoria profissional:
4) Carga horária semanal:
5) Turno: ( )Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno
6) Tempo de titulação:
7) Tempo na instituição:
SOBRE A PERCEPÇÃO DA EQUIPE PROFISSIONAL EM RELAÇÃO AOS
ACOMPANHANTES
8) Como é a sua experiência no contato diário com os acompanhantes nas
enfermarias?
9) No seu entendimento, qual seria o papel do acompanhante no hospital?
10) Na sua opinião, por quê o hospital convoca o acompanhante?
11)Qual a sua expectativa em relação à presença do acompanhante? Por exemplo, no
apoio ao paciente, na relação com a equipe, no contato diário com o hospital?
12) Você acha que o acompanhante pode contribuir com a equipe profissional do
hospital? Por quê?
127
APÊNDICE C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pelos
acompanhantes
Prezado (a) Senhor (a)
Como assistente social mestranda do Curso de Pós-Graduação em Atenção à Saúde
Coletiva da Universidade Federal do Espírito (UFES), solicito sua colaboração em
participar da minha pesquisa cuja temática é “O acompanhante na instituição hospitalar:
Relatos de uma experiência”.
O Objetivo do estudo é conhecer, a partir da própria percepção dos acompanhantes,
sua experiência em acompanhar um paciente adulto hospitalizado, analisando as
condições da instituição hospitalar, bem como a relação com a equipe profissional.
A pesquisa consta de uma entrevista que será gravada pela pesquisadora. Após a
transcrição dos dados, a fita será automaticamente destruída.
Os participantes do estudo serão entrevistados uma única vez, individualmente e em
uma sala reservada. As informações obtidas têm caráter individual sendo resguardada
sua privacidade, uma vez que os dados serão analisados em conjunto e não haverá
identificação de nomes em nenhum trecho da entrevista.
Venho esclarecer que a sua participação nesta pesquisa é opcional e de caráter
voluntário, sendo o Termo de Consentimento necessário para que se configure a sua
participação de livre e espontânea vontade no estudo, bem como seu consentimento
para utilização dos dados.
A sua recusa em participar não irá interferir no tratamento do paciente no hospital e em
nenhum ônus para você. Esperando contar com sua valiosa colaboração, antecipo
meus agradecimentos pela atenção dispensada.
Estou de acordo com os termos deste documento e aceito participar da pesquisa.
Vitória, _____/______/_______.
Nome completo: ________________________________________________
Assinatura: ________________________
Pesquisadora: Márcia Bárbara Souza Dibai
Tel (contato): 33357154 Telefax: 33357155
Hospital das Clínicas (ES) – Deptº de Serviço Social
128
APÊNDICE D – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pelos
profissionais
Prezado (a) Senhor (a)
Venho solicitar sua colaboração em participar da minha pesquisa que tem como
temática “O acompanhante na instituição hospitalar: relatos de uma experiência”. O
objetivo é analisar a percepção da equipe profissional sobre a presença diária dos
acompanhantes junto aos pacientes internados no setor de clínica médica do hospital.
A pesquisa está vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Atenção Saúde Coletiva
da Universidade Federal do Espírito Santo e constará de uma entrevista gravada
realizada pela pesquisadora. Logo após a transcrição dos dados, as fitas serão
automaticamente destruídas.
A sua participação é espontânea e de caráter voluntário. As informações obtidas terão
caráter confidencial, sendo resguardada a privacidade dos entrevistados no momento
da análise e apresentação dos dados. Esperando contar com sua valiosa colaboração,
antecipo meus agradecimentos pela atenção dispensada.
Estou de acordo com os termos deste documento e aceito participar da pesquisa.
Vitória, _____/_____/_______.
Nome completo: ___________________________________________________
Assinatura: ______________________________
Pesquisadora: Márcia Bárbara Souza Dibai
Tel (contato): 33357154 Telefax: 33357155
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