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VÂNIO FLÁBIO DIAS FERREIRA
DECIFRA-ME OU TE DEVORO:
A RELIGIÃO CATÓLICA E AS NOVAS MEDIAÇÕES TECNOLÓGICAS
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
São Paulo, 2007
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VÂNIO FLÁBIO DIAS FERREIRA
DECIFRA-ME OU TE DEVORO:
A RELIGIÃO CATÓLICA E AS NOVAS MEDIAÇÕES TECNOLÓGICAS
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
MESTRE em Ciências Sociais, área de
concentração Sociologia, sob a orientação
da Profa. Dra. Eliane Hojaij Gouveia.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
São Paulo, 2007
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BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação por processos fotocopiadores ou eletrônicos.
Assinatura: _____________________________________
Local: _________________________ Data: _________________
A
GRADECIMENTOS
• À professora Elaine Hojaij Gouveia (Lili), pela firme e séria orientação.
• Ao Pe. Dom Robson Medeiros Alves O. S. B., diretor do Colégio São João
Gualberto, pela acolhida profissional num momento crucial dessa pesquisa.
• À Elaine R. A. Amorim, amada companheira, pelo apoio, incentivo e
inspiração desde o início.
• À minha família, com quem compartilho há tantos anos a luta e a labuta de
sobreviver e ser feliz em terra estranha, agradeço e dedico este trabalho: meu
pai, Osvaldo; minha mãe, Ana; meus irmãos e irmãs: Valdiana, Valdinéia,
Osvaldo Valério, Qelli, Thiago e Ana Érika.
• A Deus: “Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é
possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdidos
no vai-vem, e a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas
horas, não podendo facilitar – é todos contra os acasos. Tendo Deus, é
menos grave se descuidar um pouquinho, pois no fim dá certo.!” (João
Guimarães Rosa. Grandes Sertões: Veredas. Fala de Riobaldo). Deu certo!
Meus agradecimentos à CAPES (Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) que
concedeu bolsa para a realização desta pesquisa.
De maneira muito especial dedico esse trabalho a minha
mãe, Sra. Ana Dias Rocha, que, mesmo tendo passado tão
pouco tempo na escola, soube sempre nos ensinar o valor
da educação.
R
ESUMO
Este trabalho propõe uma análise da relação técnica-religião no mundo
moderno a partir das mediações das tecnologias de informação e
comunicação, numa abordagem teórica e um estudo de caso: a Associação
do Senhor Jesus e a TV Século 21, da Igreja Católica. Nas últimas décadas
do século XX, com a otimização crescente dos recursos tecnológicos da
informática e a diversificação das suas possibilidades de aplicação e a
popularização dos meios de comunicação de massa, fluiu-se livremente a
tendência de mudanças na sociedade, em decorrência do estabelecimento de
dados novos nas dinâmicas de relacionamentos, da produção material e de
valores. Já a experiência religiosa sempre esteve bastante ligada à
experiência individual e localmente próxima do indivíduo, numa profunda
identificação com seu espaço e seu tempo. O distanciamento dava-se apenas
o necessário para a diferenciação do campo sagrado, do campo profano e
dos campos sagrados distintos entre si, bem como da imanência cotidiana
com a transcendência temporalmente ritualizada. Tudo isso alagar-se na
possibilidade da virtualidade e da interatividade proporcionadas pelos meios
tecnológicos. Na forma tradicional, o nível de mediação é face a face. Com o
uso das tecnologias da comunicação e da informação, o contexto da
interação se expande e é aí que surge a possibilidade de se redimensionar as
categorias espaço e tempo. O espaço e o tempo assumem a dimensão da
rede, da conectividade, da instantaneidade desprovidas de um único lócus.
Os exemplos práticos são os usos da televisão, da internet e do telefone, de
forma simultânea, hoje em várias expressões religiosas.
Palavras-chave: religião; tecnologias; mídias.
A
BSTRACT
This paper presents an analysis of the relation technique-religion in the
modern world, from the meditations of the technologies of information and
communication, in a theoretical approach and a study of instance: the
Associação do Senhor Jesus and the TV Século 21, from the Catholic Church.
In the last decades of the twentieth century, with the increasing optimization of
the computing technological sources and the diversification of its possible
applications and the popularization of mass communication means, the
tendency of changes in society ran freely, due to the new data set in the
dynamics of relationships, material production and values. This way, the
religious experience, that has always been very related to individual
experience and located closed to the individual, in a deep identification with
his space and time, far enough just to distinct the sacred field from profane
field and different sacred fields, as well as the quotidian immanence with the
temporal ritualized transcendence, broaden in the possibility of virtual and
interactivity given by technological means. In the traditional way the mediation
level is face-to-face. With the communication and information technologies the
interaction context enlarges and then there is the possibility to change the
dimensions of the categories of time and space. The time and space assume
the dimension of the net of the connectivity of the instantaneously without a
locus. The practical examples are the use of television, internet and
telephone, in a simultaneous way, today in a lot of religious expressions.
Key-words: religions; technologies; medias.
S
UMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................1
Capítulo 1 – Técnica, Tecnologia e Religião ..........................................16
1.1. Considerações sobre a técnica .......................................................18
1.2. Técnica, tática da vida ....................................................................20
1.3. O desenvolvimento das tecnologias e seus efeitos ........................24
1.4. A lógica do mercado .......................................................................26
Capítulo 2 – Considerações sobre Modernidade,
Pós-modernidade e Religião ...................................................................29
2.1. O eclipse da razão ..........................................................................35
2.2. Uma nova ordem mundial ...............................................................37
2.3. Sobre a secularização ....................................................................40
2.4. O século XX e o paradigma tecnológico .........................................46
Capítulo 3 – Religião e Tecnologias: Transformações Práticas ..........52
3.1. As novas mediações e interações tradicionais: o tempo,
o templo e o espaço ...............................................................................55
3.2. O exemplo histórico da Ecclesia .....................................................63
3.3. Novos mediadores e novas interações ...........................................65
Capítulo 4 – A Associação do Senhor Jesus e a TV Século 21:
“A bênção de Deus mais perto de você” ...............................................77
4.1. Associação do Senhor Jesus: história, origem e estrutura .............82
4.2. Pe. Eduardo – Líder, profeta e carismático .....................................88
4.3. Quais os canais da bênção? Novos canais tecnológicos e os fiéis ....... 92
4.4. Recursos tradicionais e novas formas de interação ........................98
4.5. A programação e a percepção do fiel receptor .............................105
4.6. A percepção da instituição pelos seus intelectuais .......................110
CONSIDERAÇÕES FINAIS .....................................................................116
ANEXOS ..................................................................................................121
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................128
1
INTRODUÇÃO
A
idéia de pesquisar a relação entre a religião e emprego
das novas tecnologias da comunicação e da informação
ocorreu-me, primeiramente, em razão do meu interesse
por Ciências Sociais e religião, desde os primeiros momentos de ingresso na
vida acadêmica, no curso de Ciências Religiosas. O tema, no decorrer da
pesquisa, revelou-se fecundo, com variadas possibilidades de diálogo com
outras disciplinas.
Tecnologia e religião
1
são dois domínios distintos que, nas suas
especificidades, fascinam a humanidade há séculos e isso se traduz nos
mitos, nas artes, na literatura, etc. Com relação à questão tecnológica, por
exemplo, é comum a representação do Século XXI, ou outro marco de
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
1
Optamos por não fazer uma distinção conceitual e semântica de maneira rigorosa dos termos técnica
e tecnologia, por não haver uma proximidade de consenso sobre os mesmos. De qualquer forma, toda
vez que palavra tecnologia aparecer estará mais relacionada ao uso social da técnica e de forma mais
segmentada, especializada, recorrente a determinado setor.
2
tempo usado como metáfora do futuro da humanidade, como um mundo
dominado por máquinas, totalmente automatizado onde robôs e outras
formas de inteligência artificial são coisas vulgares no cotidiano dos
personagens. Neste sentido, o filme 2001 uma odisséia no espaço, de
Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke, produzido em 1968, é um referencial,
pois é um clássico da ficção científica que aponta a escalada tecnológica do
homem desde a sua aurora. Apresenta-nos a imagem do homem primitivo
que, em determinado momento, manipula um osso de um animal morto,
usando-o como objeto de defesa e ataque ou uma arma. Na seqüência das
imagens, somos remetidos ao século em que a humanidade cria inteligência
artificial e faz viagens interplanetárias à grande odisséia proposta no ano
2001. No filme, ao som da valsa Danúbio Azul, num instante e com poesia
cinematográfica, somos remetidos a esse novo século, em um mundo
admirável e novo, parafraseando Aldous Huxley
2
.
Ficção à parte, a história nos mostra que a tecnologia da vida real
pode de alguma maneira se rebelar, não porque possua inteligência própria,
mas na medida em que não for bem administrada ou que se toma rumos
indevidos diante do próprio modelo de desenvolvimento, ou seja, cria-se um
modo de dependência quase absoluta, daí o homem perde o controle.
O século XX foi o século dos motores, do avião, da bomba atômica,
das ondas de rádio, da fibra ótica, do satélite artificial, da informática, da
2
A paráfrase diz respeito ao romance de Huxley: Admirável Mundo Novo.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
3
Internet
3
. São tecnologias que foram desenvolvidas neste século, as quais
relacionamos sem uma preocupação cronológica. Já o século XXI, embora
não alcance a imaginação fértil de alguns escritores e cineastas,
percebemos que está além daquilo que um cidadão comum do século XIX ,
por exemplo, poderia imaginar, dadas as possibilidades tecnológicas agora
disponíveis.
Não é preciso recuar tão longe no tempo para percebermos a
dinâmica das revoluções através das tecnologias. A velocidade de inovações
tecnológicas acelera, provocando revoluções constantes, tornando as
novidades indispensáveis ou obsoletas num espaço de tempo cada vez
menor. Prova disso é o uso da telefonia móvel e da rede mundial de
computadores (Internet) que praticamente não existiam há 15 anos e
atualmente existem e se desatualizam rapidamente. Outras tecnologias
despontam em diversas áreas cada vez mais integradas, tornando difícil
para um leigo arriscar qualquer prognóstico.
A abordagem proposta nesse trabalho tem a finalidade analisar a
forma como a religião, fenômeno sociocultural, assim como a técnica se
estabelece no mundo moderno contemporâneo, a partir das mediações
tecnológicas da informação e da comunicação. Dessa forma, nesse
processo de apropriação da técnica pela religião, observamos as
adaptações e as possíveis conseqüências. Então percebemos
transformações práticas que influem nas relações físico-espaciais;
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Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
3
Segundo Paul Virilio (1998), a história moderna é organizada sob o referencial dos motores: 1 -
Motor a vapor. 2 - Motor a explosão. 3 - Motor elétrico. 4 - Motor foguete. 5 - Motor informático.
4
transformações éticas que dizem respeito às relações e vivências
interpessoais, que passam da forma tradicional de mediação para aquela
onde há uma interação por meio dos recursos das diversas mídias
4
e a
conseqüente adaptação dos repertórios de códigos de comunicação.
A técnica produzida pelo homem que analisaremos no primeiro
capítulo desse trabalho percorre o caminho da humanidade e se firma de
maneira importante e indispensável, cobrindo todas as suas dimensões. Se
é verdade que ela mata na sua vertente de tecnologia de guerra, também é
verdade que ela salva quando aplicada à medicina. Nesse momento da
pesquisa nos servimos de uma bibliografia que nos forneceu um quadro do
desenvolvimento histórico da técnica, bem como de reflexões de caráter
mais crítico-valorativo.
Percebemos crescente interesse pelo tema desde a segunda metade
do século XX até os dias de hoje. Os aspectos relacionados pautam várias
questões sobre uma proposta de indicação de períodos tecnológicos,
passando por críticas ao modelo estabelecido e questões mais
essencialistas, ligadas à filosofia e às ciências do homem.
Se a técnica nunca deixou de ser uma dimensão importante na
história e nas culturas, é fato que nas últimas décadas ela apresenta-se de
forma muito mais dinâmica, por meio de um incremento constante de
recursos tecnológicos colocados à disposição das pessoas. É importante
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
4
John B. THOMPSON. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de
comunicação de massa, 1995.
5
perceber um modo específico de utilização das tecnologias pela religião
católica, não obstante não deixarmos de considerar o quadro mais amplo no
qual a religião se insere.
As possibilidades de aplicação da técnica no empreendimento
religioso são várias, desde a sua adequação arquitetônica, visando maior
funcionalidade no espaço, até as tecnologias voltadas ao gerenciamento do
templo, práticas de divulgação e de proselitismo, uma vez que a
competitividade no mercado de bens simbólicos é levada em consideração.
Isso ocorre, conforme argumenta Peter Berger
5
, com a passagem de uma
situação de monopólio religioso para uma situação de pluralidade, retirando,
assim, a possibilidade de qualquer tradição religiosa se impor na sociedade
atual, seja por qual meio for, dependendo, então, de um processo de adesão
do fiel, de escolha por critérios comuns a outros aspectos da sua vida, que
quase sempre prima pela busca da qualidade. Esse é o momento em que a
religião será posta no mercado, apresentando o seu produto e apostando na
eficiência a na utilização dos meios possíveis e disponíveis.
Dadas as considerações iniciais sobre a técnica, ressaltando sua
dimensão e abrangência na sociedade, é importante verificá-la no contexto
contemporâneo e sua relação com a religião.
No segundo capítulo, analisamos as tecnologias e outros fenômenos
que desafiam a religião, como o pluralismo moderno e a secularização, além
da questão do debate do moderno e pós-moderno que, de qualquer maneira,
5
Peter BERGER. O Dossel Sagrado, 1985, p. 149.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
6
influi e molda a sociedade nos dias atuais. Pontuamos estes termos como
inevitáveis, entretanto com abordagens diferenciadas, no que diz respeito às
validades e argumentos, uma vez que alguns autores consideram o emprego
das tecnologias da comunicação e informação como elementos significativos
na passagem do moderno para o pós-moderno, por meio das suas
contribuições e transformações produzidas no âmbito cultural e social.
No terceiro capítulo, as análises realizadas dizem respeito às
transformações ligadas ao universo sociocultural. Temos a passagem da
comunicação escrita e da oralidade face a face para a comunicação por
imagens em movimento e comunicação a distância (cinema, tevê e rádio),
um grande momento de transformação, pois provocou caminhos de um
processo de industrialização de percepções, tornando o mundo uma grande
tela-visual, estimulando a mudança de segmentos sociais.
Uma das conseqüências do uso das tecnologias da comunicação e da
informação pela religião é que se redimensionam as formas de interação, da
tradicional face a face, para aquelas mediadas. A configuração também é
nova no aspecto da percepção ou compreensão das categorias espaço e
tempo que passam, através de processos virtuais, interacionais ou
informáticos, a serem dinamizados, estendidos, sintetizados ou
simultaneizados de acordo com a necessidade, subvertendo análises
clássicas sobre o tema.
6
6
Renato ORTIZ. Um outro território, 1994.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
7
Portanto, há um redimensionamento das categorias espaço-tempo. O
espaço dessa nova era virtualiza-se e o tempo submete-se porque ambos
saem do nível da contingência de uma compreensão da física tradicional
para o mundo das redes, da interatividade e da alta velocidade.
Para a análise da dinâmica das formas de interação, servimo-nos
principalmente das reflexões de Peter Berger, Luckmann e J. B. Thompson,
Percebemos as mudanças no ambiente da religião, que também tem uma
maneira de adaptação para a realidade do mundo moderno, que
entendemos como mudanças práticas, ou seja, são os veículos artificiais de
interação dos quais a religião faz uso.
Em diversas expressões religiosas encontramos exemplos que
acentuam o uso de tecnologias eletrônicas pela religião
7
. Nesses casos a
experiência religiosa proposta fica livre da contingência do território, da
delimitação do tempo e da materialidade do rito, tornando-se cada dia mais
comuns com o uso das tecnologias da comunicação e da informação. Sendo
assim, a escolha de um objeto empírico para estudo alargou nossa
compreensão sobre a relação técnica e religião, principalmente na questão
da forma como se influencia o fiel, ou seja, sua percepção das mudanças
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
7
À guisa de ilustração, citamos os exemplos de duas Igrejas que fazem uso de incrementos
tecnológicos na sua prática que até a pouco tempo exigiria um esforço de imaginação para se
conceber. A primeira é da Igreja Anglicana, que criou uma paróquia totalmente virtual, chamada e-
church. A diocese de Oxford abriu vagas para pastores on-line e o bispo responsável estabelece
critérios para preenchimento da vaga a familiaridade com a rede mundial de computadores. O
segundo é o exemplo da Igreja pentecostal Jesus é o Caminho a Verdade e a Vida, no Brasil, que cria
um serviço de “disk-oraçao” Além desses exemplos, podemos observar uma constante recorrência de
expressões religiosas aos meios técnicos. Uma busca na Internet confirma essa afirmação, pois
encontramos sites de grande parte das expressões religiosas: afro-brasileiras, vários cristianismos,
budismos, islamismo e tantos outros novos movimentos religiosos.
8
práticas, do grau de adesão, nos permitindo-nos avaliar qualitativamente o
que ocorre com seu senso de pertença.
No quarto capítulo, verificamos um empreendimento da Igreja Católica
que, nos últimos anos, ganhou muita vitalidade e visibilidade, firmando-se
como veículo importante de mobilização, evangelização (na legítima
concepção cristã) e doutrinação. O empreendimento ao qual nos referimos é
a TV Século 21, fundada pelo Pe. Eduardo Dougherty, em 1999.
O projeto de evangelização através da televisão do Pe. Dougherty
nasce em 1980 com a criação da Associação do Senhor Jesus (ASJ),
juntamente com um grupo de leigos, ligado à Renovação Carismática
Católica. No início a Associação do Senhor Jesus passa a produzir o
programa Anunciamos Jesus, com uma proposta de evangelização através
dos meios de comunicação. Embora nesse início tenha recebido aval
negativo da Igreja, conforme o estudo de Della Cava e Montero
8
, é um
empreendimento que cresceu, tornando-se importante para a Igreja Católica,
com razoável índice de audiência.
Na década de 1980, a tensão na Igreja Católica entre tendências
ligadas à Renovação Carismática e à Teologia da Libertação era mais
acirrada, sendo que a segunda tinha um poder institucional mais intenso. É
também a década em que a Igreja Católica entra na produção direta de bens
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
8
Ralph DELLA CAVA & Paula MONTERO. E o verbo se faz imagem. Igreja Católica e meios de
comunicação no Brasil, 1991.
9
culturais eletrônicos
9
. O surgimento de redes de televisão ligadas à Igreja
Católica a partir da década de 1990, em grande parte, é fruto do
arrefecimento dessa tensão entre tendências práticas-teológicas no seio de
uma mesma Igreja, já que o movimento carismático cresce, fica em
evidência e ganha adesão de vários bispos e a benevolência de Roma.
Pe. Eduardo Dougherty foi um dos promotores da Renovação
Carismática no Brasil e a história da Associação do Senhor Jesus e da TV
Século 21 faz parte da história maior desse movimento no país. Outros
produtores de audiovisuais eletrônicos da década de 1980 e década anterior
não alcançaram o mesmo nível de sofisticação. O sucesso do Pe. Eduardo
deve-se em grande parte à postura da própria Renovação Carismática, que
ressalta a importância da evangelização através de tecnologias da
informação e da comunicação e até hoje atua com sucesso nessa linha e
lança mão de investimentos cada vez mais arrojados.
Atualmente, a Igreja Católica no Brasil possui três importantes
empreendimentos no campo da televisão: A Rede Vida de Televisão
10
, a TV
Canção Nova e a TV Século 21. O motivo da escolha da TV Século 21 para
análise nesse estudo, além da visibilidade conseguida e dos resultados
alcançados, foi o fato de ela ter sede na cidade de Valinhos-SP, que faz
9
Idem, ibidem.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
10
No decorrer dessa pesquisa, no dia 02 de junho de 2005, o Santuário Nacional de Aparecida, a
Fundação Nossa Senhora Aparecida e a TV Século 21 assinam contrato, estabelecendo o uso do
mesmo sinal da Rede Vida para a veiculação da programação da TV Aparecida, que vai ao ar em 08
de setembro do mesmo ano. Em termos de finanças e de audiência, pensamos ser uma parceria
estratégica.
10
parte da diocese e da região metropolitana de Campinas, onde residíamos
nos início dessa pesquisa
11
.
Realizamos 14 entrevistas com questões abertas, procurando captar
a autocompreensão dos fiéis sobre o significado do uso dos meios
tecnológicos. Sob o ângulo da observação dos processos de recepção de
mensagem, pelas entrevistas, percebemos que, através principalmente da
televisão, além de outros veículos como a Internet e publicações impressas,
como a Revista Brasil Cristão, o fiel adquire um senso de engajamento mais
efetivo e afetivo à instituição, relacionando sua experiência pessoal de fé à
mediação de determinado veículo, que acabam agindo como vetores da
bênção, da graça e do milagre, ou seja, esse canal, além de proporcionar a
veiculação do conteúdo simbólico, proporciona ao fiel verdadeiras
experiências religiosas.
As entrevistas que realizamos com telespectadores fiéis revelaram
também um tipo de fascínio com as possibilidades de uso desses meios
tecnológicos. Percebemos nessas entrevistas uma espécie de euforia, fervor
religioso, o que torna comum uma expressão usada pelos entrevistados para
designar o significado do trabalho: “É uma bênção!”.
Nossa pesquisa procurou verificar as realizações da TV Século 21,
sobretudo a produção dos programas para então buscar a compreensão da
instituição representada por seus líderes e intelectuais sobre esse processo.
Além disso utilizamos o periódico revista Brasil Cristão, publicada pela
11
Em 2006 mudei-me para São Paulo.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
11
Associação do Senhor Jesus, que possui hoje uma tiragem perto de cento e
cinqüenta mil exemplares. Essa revista é um meio importante de divulgação
e comunicação com os fiéis, principalmente com os sócio-representantes
que ajudam, através de doações, no financiamento do Centro de Produções
Século 21. O conteúdo da revista Brasil Cristão ressalta aspectos litúrgicos e
doutrinários da Igreja Católica, bem como procura reafirmar a importância do
próprio trabalho como modelo de evangelização. Também estabelecemos
contatos via e-mail através do qual colhemos importantes contribuições.
Por meio das entrevistas, dos programas de TV, da Internet e
publicação impressa, buscou-se captar, pelas experiências pessoais, o grau
de engajamento efetivo e afetivo do fiel à instituição.
Sobre o método e as motivações
Para a realização dessa pesquisa, considero quatro momentos
importantes: o primeiro, a escolha do tema; o segundo, a abordagem teórica;
o terceiro, a pesquisa de campo; o quarto é exatamente a vivência cotidiana que,
como é comum, deixa o pesquisador em alerta para as sutilezas que
potencialmente possa esclarecer e contribuir com os resultados do seu
trabalho.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
A escolha da temática técnica e religião para objeto de estudo na área
das Ciências Sociais tem relação com minha formação anterior. Pode-se
dizer que há uma ligação afetiva, pois sou bacharel em Ciências Religiosas
e em Filosofia e apresentei um trabalho de conclusão de curso na área de
12
Filosofia que versou sobre a técnica em Heidegger. Portanto essas
influências aparecem na linguagem e na bibliografia utilizadas, porém sem
prejuízos epistemológicos na área sócio-antropológica.
A base teórica de análise presente nos três primeiros capítulos,
pretendeu tratar do tema de maneira atualizada, recorrendo aos
fundamentos clássicos e históricos. Verificar-se-á a presença constante de
Peter Berger, Thomas Luckmann, John B. Thopson, Renato Ortiz, Octávio
Ianni, entre outros autores contemporâneos.
A relação dos temas tratados não possui ainda clareza em todos os
aspectos, nem uma bibliografia abrangente. Na medida do possível, procurei
me manter em vigília à espera de luzes ou provocações que contribuísse de
forma a deixar esse trabalho mais completo. Não foi uma vigília em vão,
porque algumas vezes foi necessário voltar ao texto já escrito para
acréscimos ou correções. Ao final, que certamente não poderá ser
conclusão, restará importantes anotações para possíveis trabalhos futuros.
Ao levar em conta minha formação, conforme mencionado
anteriormente, não se poderia esperar experiência no que diz respeito ao
exercício de ida a campo ou da pesquisa prática. Se, nas Ciências
Religiosas, de alguma maneira e sem muita exigência, essa prática foi
recorrente, o mesmo não se pode dizer da Filosofia. A resistência do início
foi vencida até com certo entusiasmo, nesse caso, graças o convencimento
da minha orientadora. No que diz respeito à base teórica e ao procedimento
de pesquisa de campo, devo ressaltar as importantes contribuições das
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
13
disciplinas cursadas no programa de pós-graduação ao qual estou
vinculado.
A escolha do estudo de caso seguiu os critérios de praxe: pertinência
e praticidade. Nesse sentido a TV Século 21, da Associação do Senhor
Jesus, foi pertinente por ser importante veículo de comunicação da Igreja
Católica do Brasil, com projeção nacional, que prima e valoriza exatamente o
uso dos recursos tecnológicos, aplicados a sua área de atuação. Conforme
foi verificado, a busca por excelência tecnológica é característica da TV
Século 21 desde o início e mais anteriormente uma preocupação da
Associação do Senhor Jesus, posto que esta Associação foi criada antes da
TV Século 21. Praticidade pelo fato de a TV Século 21 ter sede na Cidade
de Valinhos, cidade conurbada à Campinas, região que eu conheço e
residia.
Realizaram-se cinco visitas ao Centro de Produções TV Século 21, as
quais aconteceram em cinco domingos, com o objetivo de uma observação
sistemática do programa Anunciamos Jesus, que é exibido ao vivo, das 9h
às 12h e depois das 13h às 17h. Nessas ocasiões, houve conversas
informais e entrevistas, sempre em forma de depoimentos de fiéis presentes
nas gravações do programa. Sem roteiro fixo, com questões abertas,
priorizamos a espontaneidade dos entrevistados. Foram feitas 14
entrevistas, sendo 9 mulheres e 5 homens de faixas etárias diferentes e as
entrevistas foram gravadas em VHS e transcritas posteriormente. Houve
ainda entrevistas via e-mail com intelectuais da TV Século 21. Este método
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
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foi muito importante porque as respostas obtidas apresentam dados
técnicos, além de aspectos qualitativos relevantes para a pesquisa.
A observação sistemática, as entrevistas, as conversas informais, o
material publicado no site da Associação do Senhor Jesus e da TV Século
21 e na Revista Brasil Cristão, além do monitoramento da programação da
tevê, proporcionou-nos um panorama geral do Complexo de Produção da TV
Século 21.
A TV Século 21 tem uma programação abrangente, mas
predominante numa linha da Renovação Carismática Católica. A análise da
programação ou de um programa não foi exatamente minha preocupação,
pois nos preocupamos com seus efeitos e o nível de mediação entre a
instituição e os fiéis.
A Associação do Senhor Jesus publica a revista Brasil Cristão, dado
já apontado nessa introdução. Apesar de a análise do discurso e do
conteúdo desta revista não ser objetivo desse trabalho, foi proveitoso, visto
que nos ajudou a compreender o modo de relação do fiel com a instituição
através de uma mediação tecnológica. A análise compreendeu, num
primeiro momento, uma leitura de todo o conteúdo da revista em questão, a
qual tem edições temáticas e, em seguida, optamos por um recorte dos
depoimentos publicados em duas seções distintas: cantinho do leitor, que
publica cartas dos leitores em geral, e outra seção que publica cartas dos
sócio-representantes. O relato das cartas publicadas despertou-nos
interesse, pois nelas ficam evidentes o relacionamento do fiel com a TV
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
15
Século 21 a qual é propulsora de fé e mediadora da bênção. Percebemos
que os leitores sempre enfatizam a televisão como a mediação de uma
graça alcançada e essa ocorrência não é por acaso. A revista Brasil Cristão
tem edição mensal e analisamos as edições desde março de 2004,
totalizando 18 edições.
Por fim, após percorrer as etapas anteriores para a realização desta
investigação, chegamos ao modus vivendi que se pautou na busca dos
resultados, num estado de alerta constante, tratando-se de um momento
importante para a realização deste trabalho, uma vez que a leitura, a notícia
e alguns fatos ocorridos revelaram dados relevantes para o nascimento
dessa pesquisa.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
16
CAPÍTULO
1
TÉCNICA, TECNOLOGIA E RELIGIÃO
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Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
17
“Será a técnica a passagem histórica para o
término, a derradeira queda do homem na
condição de animal tecnificado e que, assim,
perde inclusive a animilidade originária que o
ligava aos demais animais; ou será que ela pode
ser tomada, antes de mais nada, como um abrigo
e, assim, algo capaz de servir de fundamento para
repensar e levar nossa existência?”
Heidegger.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
18
CAPÍTULO
1
TÉCNICA, TECNOLOGIA E RELIGIÃO
1.1. Considerações sobre a técnica
N
o universo complexo das relações humanas, a técnica
apresenta-se de maneira importante e singular,
constituindo-se, no estudo desse universo, um tema que
proporciona diferentes possibilidades de abordagem. Por isso, há variações
sobre a questão desde a sua gênese, desenvolvimento, influências e
conseqüências no quadro conjuntural e histórico da humanidade.
Numa abordagem sociológica, a técnica é devidamente um fenômeno
social e cultural, portanto é fruto da produção coletiva. É a dimensão do
mundo material e imaginário criado e uma forma de exteriorização da
atividade humana, que se objetiva no cotidiano das pessoas.
Como uma dimensão importante na vida em sociedade, a técnica tem
uma importância singular, representando o potencial criativo do homem, sua
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Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
19
maneira de relacionar-se com o mundo que o cerca e a forma de satisfazer
suas próprias necessidades e aspirações.
A palavra técnica vem do grego: techne e, no seu sentido original,
denota mais do que fazer manual, quer designar a expressão artístico-
poética do homem, uma forma de Aletheia, o desvelamento profundo da
verdade, a própria irrupção do Ser
1
.
A história da técnica remonta à origem da história do homem,
considerando o período anterior à escrita desde as primeiras tentativas de
reaproveitamento dos recursos da natureza com a potencialização das
habilidades humanas de reproduzir bens materiais e sistemas simbólicos de
comunicação. Isso significa que a técnica é um elemento constituinte no
processo de hominização. Conforme Morin
2
, o homem sapiens dá “um salto
majestoso na natureza” e produz a linguagem, a sociedade, a cultura e a
técnica. Nesse sentido o homo faber
3
marca a fronteira entre o estado de
natureza e o estado de homem. “As determinações e as idades da
humanidade são os seus utensílios”
4
. Isso indica a vocação inata da técnica
de se colocar para o uso social, promovendo adaptações, condições de vida,
num contexto maior e, em outros termos, condição de morte.
A partir da segunda metade do século XX, as variedades tecnológicas
foram disponibilizadas à sociedade de maneira mais constante, algumas
1
Varmireh CHACON. Heidegger e a tragédia do ocidente, 1979, p. 25.
2
Edgar MORIN. O enigma do homem, 1979, p. 59.
3
Homem construtor, artificioso, habilidoso, que faz, que fabrica.
4
Edgar MORIN. O homem e a morte, 1970, p. 2.
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e as novas mediações tecnológicas.
20
geraram verdadeiras revoluções nos costumes, como foi o caso da
televisão
5
. Atualmente, não há uma linearidade no tempo de produção
tecnológica devido ao vertiginoso ritmo do surgimento novidades
tecnológicas. Ademais, as tecnologias evoluem em áreas distintas e com
possibilidades de mútuas referências, interfaces e combinações.
1.2. Técnica, tática da vida
6
Consideramos que o potencial criador do homem não é somente para
satisfazer as suas necessidades de sobrevivência, porque o ser humano cria
também para o lúdico, para a arte e para o aproveitamento do ócio. Como
afirma Ortega y Gasset
7
, o homem é o ser para o qual o supérfluo é
necessário, como o ócio também o é. Estar preso às suas necessidades
reduziria o homem a uma condição parecida com a dos outros animais.
Diferentemente do homem, os demais mamíferos e as outras espécies estão
ligadas ao que lhes permite a imediata condição de vida. O homem não quer
simplesmente estar no mundo, ele quer estar bem no mundo. Portanto o
bem-estar é uma necessidade básica do homem.
Decifrando o mundo e explorando suas possibilidades é que o ser
humano transforma, cria e recria as coisas tendo em vista não apenas
sobreviver, mas também sobreviver com qualidade. Como observa Morin:
5
Sobre o advento e importância da televisão no Brasil, ver Renato ORTIZ. A moderna tradição
brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo, Brasiliense, 2001 e Armand MATTERLART.
Carnaval de Imagens. Sobre a televisão no contexto das novas mídias, a partir de um centro pioneiro
no campo das tecnologias: os Estados Unidos, ver: DIZARD, W. A Nova Mídia. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1998.
6
José ORTEGA Y GASSSET. Meditações sobre a técnica, 1963.
7
Idem, ibidem.
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Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
21
A técnica é a apropriação prática do mundo e do homem pelo
homem. A técnica é o próprio produto do encontro entre as
participações e a autodeterminação individual; é estimulada não
pela necessidade bruta, que poderia ser satisfeita com a colheita
ou com a alimentação de animais pequenos, mas pelo impulso
das necessidades humanas, que podem parecer “luxo” em
comparação com as necessidades dos animais, mas que se
tornam imprescindível, como são hoje o gás, a eletricidade e o
automóvel.”
8
Diferente dos outros animais, o ser humano possui impulso criador e
cria como expressão de sua dimensão cultural, artística e lúdica. Há um
esforço de invenção, uma elucubração prévia, um plano de atividades e
finalmente a execução de um conjunto de atos técnicos que por fim deriva a
técnica, conforme Ortega y Gasset observou:
“A) Assegurar a satisfação das necessidades, inclusive
elementares; B) Obter satisfação com um mínimo de esforço; C)
Criar possibilidades completamente novas produzindo objetos que
não existam na natureza do homem (navegar, voar, falar com
antípoda mediante telégrafo ou a rádio comunicação, etc)”
9
Nesse caso, Ortega nos dá uma dimensão utilitária e compensadora
da técnica, que não nos deixa privar de uma adaptação e de um bom
usufruto da natureza. É a capacidade do homem, biologicamente inacabado,
no que tange às suas defesas naturais, de elevar a número alto de potência
suas chances de sobrevivência.
8
Edgar MORIN. O homem e a morte. p. 86.
9
ORTEGA Y GASSSET. Meditações sobre a técnica, 1963, p. 13.
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22
Numa definição simples, técnica é o jeito, o modo, a maneira de fazer
uma coisa. É um conjunto de habilidades desenvolvidas a partir não somente da
necessidade, mas também da manifestação do talento criador do homem. Com o
homem, a técnica progride e com ela faz, inseparavelmente sua história.
10
Pelo uso da técnica, em dinâmica sócio-histórico-cultural, é que o
homem satisfaz e recria as necessidades que lhe são vitais, mas não
somente isso, pois também lhe é peculiar o poder de escolha e, ao escolher,
não se torna vítima impassível das suas debilidades naturais. A não escolha
significa a morte e nesse caso o que escolher parece ser óbvio; não é tanto
porque o homem tem a consciência dessa escolha e, sabendo que escolhe,
poderia também não escolher. Dessa forma, transforma o meio, por escolha,
para compensar suas debilidades e potencializa suas chances de
sobrevivência. O estudo de Ellui mostra que tal questão foi considerada de
crucial importância e alerta para a significativa relação ao afirmar que:
“A técnica já penetrou profundamente no homem. Não somente a
máquina tende a criar um novo ambiente para o homem, mas
também já modifica seu próprio ser. Deve adaptar-se, como nos
primeiros tempos do mundo, a um universo para o qual não é
feito. O homem é feito para seis quilômetros à hora e faz mil. É
feito para comer quando tem fome e dormir quando tem sono, e
obedece ao cronômetro. É feito para o contato com os vivos e vive
em mundo de pedra”.
11
10
“É com o homem que as técnicas se desenvolvem completamente, pois o homem, pela forma de
seu corpo e pela aptidão do seu cérebro, não é um simples repetidor de processo industrial da vida,
mas um inovador, um prodigioso inventor de mecanismos novos, diferentes daqueles que a natureza,
por instinto associou à própria forma do corpo animal e ao seu ritmo” (VITA, L. W. Prólogo. In:
ORTEGA Y GASSET, Meditação sobre a Técnica. 1963)..
11
Jaques ELLUI. A técnica e o desafio do século, 1968, p 331.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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23
Para Ellui, que colabora com a tese de Ortega acima apresentada, o
ser humano artificializa o mundo em que vive através das suas criações e
dessa forma potencializa certas características, o que lhe impõe novas
adaptações. Assim o ser humano quebra as barreiras que a biologia havia
lhe apresentado, pois alcança o céu, o espaço extraterrestre, o fundo dos
mares e percorre distâncias com grande velocidade, as fronteiras nunca
antes exploradas. Mais ainda, agora ele expande seu espaço e dinamiza o
seu tempo de uma maneira que subverte a compreensão tradicional dessas
categorias. Isso será melhor abordado no terceiro capítulo deste trabalho.
As mais diversas etapas da história humana são destacadas por
transformações técnicas que repercutem sobre outros domínios das culturas.
Nesse sentido, podemos nos referir, por exemplo, ao uso e domesticação do
fogo, classificação e domesticação de plantas e animais, especialização das
tarefas, artesanato, industrialização com o alargamento das ações
econômicas e mais recentemente o advento da eletrônica, das tecnologias
da informação e comunicação e da informática, que revolucionam
continuamente as dinâmicas de interação social em vários setores, entres
eles o da religião, como abordaremos no terceiro e quarto capítulos.
Assim, a força viva do pluralismo se apresenta para mostrar as
diversas maneiras de reconhecer a técnica como parte de tais momentos
amplos dos quais o ser humano realiza e produz sua existência.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
24
1.3. O desenvolvimento das tecnologias e seus efeitos
O desenvolvimento tecnológico proporcionou que a praticidade se
tornasse uma das marcas da vivência em sociedade. Esse processo acentua-se
durante o período em que o historiador Hobsbawm
12
apresenta como a era dos
extremos, referindo-se aos anos de 1917 a 1991. A demanda tecnológica da
Segunda Grande Guerra preparou e potencializou vários usos tecnológicos.
O autor chama o período pós Segunda Grande Guerra de uma revolução
tecnológica
13
, que se dá concomitante ao momento de ascensão do capitalismo
mundial. Segundo Hobsbawm, nesse período o que mais impressiona
“é a extensão em que o surto econômico parecia movido pela
revolução tecnológica. Nessa medida, multiplicam-se não apenas
produtos melhorados de um tipo preexistente, mas outros
inteiramente sem precedentes, incluindo muitos quase
inimagináveis antes da guerra
14
.”
A revolução, nesse caso, mostra-se no cotidiano, pois acaba por se
forjar novo modo de vida, pautado numa maior praticidade e funcionalidade,
mudando também costumes e valores. Nos anos de 1990, segundo Santos,
“o impacto das assim chamadas novas tecnologias sobre o trabalho, a vida,
a cultura e todas as dimensões sociais se fez sentir com intensidade nova e
modo incontornável”.
15
12
Eric HOBSBAWM. Era dos extremos. Passim.
13
Idem, ibidem, p. 261.
14
Idem, ibidem. p. 260.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
15
Laymert Garcia SANTOS. Politizar as novas tecnologias: o impacto sócio-técnico da informação
digital e genética, 2003.
25
Na mesma dinâmica desse processo inicia-se o Século XXI. Agora a
técnica apresenta-se ao homem de forma quase fantástica. Um diversificado
processo de produção, desde a extração da matéria-prima para indústria até
a linha de produção, garante um produto ou um serviço final ao usuário da
forma mais simples, com operações que devam ser fáceis e remotas,
práticas e eficientes, portáveis e, quando possível, interativas. As novidades
já não surpreendem tanto, porque elas nos são bem mais comuns e na
verdade se espera por elas.
A pluralidade de componentes, comandos e qualquer outro recurso
de uma máquina, devem se reproduzir continuamente e de maneira ótima,
sem que o usuário se dê conta da complexidade da sua estrutura. É o
processo que Lyotard
16
chama de “cotidianização da tecnologia”. Isso não
quer dizer que o padrão de consumo tecnológico é universal, mas que, pela
sua eficiência, tem grandes efeitos. O usuário comum de determinado
produto tecnológico, embora se fascina com os resultados, não percebe o
que o mantém funcionando, recorrendo aos técnicos quando preciso. Aqui
podemos nos referir ao conjunto dos sistemas peritos e fichas simbólicas,
que Giddens dá o nome de Sistemas Abstratos
17
.
Giddens ressalta que nas religiões tradicionais, aproximando com
nosso objeto, ocorre algo contrário aos sistemas abstratos modernos,
“porque suas figuras personalizadas permitem uma transferência direta da
16
Jean-Françoi LYOTARD. A condição pós-moderna, 1998.
17
Anthony GIDDENS. As conseqüências da modernidade, 1991, p. 112.
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26
confiança individual, com grandes elementos de mutualidade”.
18
Nos
sistemas abstratos, a relação é impessoal, como a transmissão ao vivo de
um culto pela televisão. Atualmente, mesmo as religiões tradicionais
recorrem, através dos meios técnicos, aos recursos que se enquadram, na
concepção de Giddens, por sistemas abstratos, e caminham pari passu, no
que se refere ao uso de recursos modernos, com outras dimensões da vida
cotidiana com incidência na intimidade. Isso significa atribuir um juízo de
valor a todas as relações, um parâmetro de conduta que se pauta pela
fluidez, pelo prático e pelo facilmente acessível e, nesses casos, tem-se
normalmente em conta o atributo tecno-funcional.
A evidência do advento de uma sociedade tecnológica no século XX,
sobretudo nos países industrialmente mais desenvolvidos, faz surgir os seus
críticos, observadores estudiosos. Além disso, o desenvolvimento técnico
industrial faz surgir, em determinado momento, preocupações de ordem
ecológica e sobre os valores que emergem desse novo momento
19
. Surge
um paradoxo sobre as questões tecnológicas: ao mesmo tempo em que
oferece soluções para tantas dificuldades e problemas do ser humano, tira-
lhe o valor de si mesmo.
1.4. A lógica do mercado
Com a constatação do fenômeno do avanço e da crescente
importância da tecnologia na sociedade, advém a busca de se estabelecer
18
Idem, ibidem. p. 117.
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19
Sobre isso, ver Laymert Garcia SANTOS. Politizar as novas tecnologias: o impacto sócio-técnico da
informação digital e genética, 2003.
27
um pensamento ético sobre a questão, sobretudo pelo seu atrelamento a um
jogo de interesse ao modelo econômico vigente que tem por base a
produção de mercadorias. O avanço técnico nos dias atuais é voltado,
prioritariamente, para o incremento das forças produtivas, ou seja, para uma
maior eficiência na criação e na sofisticação de produtos, bem como no
barateamento dos custos envolvidos na produção. O avanço da ciência
traduz-se quase que imediatamente em tecnologias práticas, que possam
ser usadas em diversas áreas, por exemplo, no esporte, na medicina, na
guerra, etc.
Assim, de uma maneira geral e de modo especial, é isso que cumpre
a técnica dentro da lógica de mercado, criar produtos, artefatos e artifícios,
não somente por um imperativo imediato de satisfazer determinadas
necessidades, mas também é uma busca do fazer e usufruir humano que
deverá estar à disposição de todos da forma mais abrangente possível.
Como Figueiredo observa:
“O avanço tecnológico nas sociedades industriais
contemporâneas, visa, teoricamente, à produção de mercadorias
que, em termos imediatos, garantem o lucro e, a médio e longo
prazo, asseguram a própria reprodução do sistema social”.
20
Essa reflexão sugere, portanto, que há toda uma organização que
prima por uma lógica mercadológica na concepção e disponibilização das
tecnologias e se essa é a referência dominante, tornou-se difícil escapar dos
20
Vilma FIGUEIREDO. Produção social da tecnologia, 1989, p. 13.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
28
seus efeitos. E a religião não escapou, se não totalmente no conteúdo, com
muita proximidade na forma, como afirma Berger
21
, Campos
22
e outros. Em
contexto de concorrência o que é atrativo importa e o recurso tecnológico é
atrativo.
A questão da técnica e sua relação com a religião, em especial o
catolicismo, é o interesse desse estudo. Para tanto é necessário buscar o
entendimento de temas pertinentes, os quais serão abordados durante esta
pesquisa.
21
Peter BERGER. O Dossel Sagrado. Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
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22
Leonildo Silveira CAMPOS. Teatro, templo e mercado: organização e marketing de um
empreendimento neo-pentecostal, 1997.
29
CAPÍTULO
2
CONSIDERAÇÕES SOBRE MODERNIDADE,
PÓS-MODERNIDADE E RELIGIÃO
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30
“Algum dia tudo será melhor, eis a
nossa esperança; tudo vai bem,
eis a nossa ilusão”.
Voltaire
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
31
CAPÍTULO
2
CONSIDERAÇÕES SOBRE MODERNIDADE,
PÓS-MODERNIDADE E RELIGIÃO
O
pluralismo da era moderna e pós-moderna constitui um
desafio para a religião. De repente ela se vê diante da
esfinge que lhe propõe: “decifra-me ou te devoro”.
Decifrar o enigma não é o problema, isso foi feito com competência e a
religião pode assegurar o seu curso, de maneira distinta, conforme as
tradições diversas. Como Berger exemplifica, para percebermos os
caminhos distintos, o liberalismo protestante esteve mais adaptado e durante
o século XIX manteve fiel ao espírito moderno, enquanto a Igreja Católica
assumiu, no mesmo período, postura de auto-afirmação com atitudes que o
autor chama de defesas cognitivas
1
. No entanto uma e outra se mantiveram
no percurso, ou seja, mesmo havendo reformulações nos momentos
oportunos, alcançaram com certa vitalidade o século XXI.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
1
Peter BERGER. Rumor de anjos. A sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural, 1997, p. 36.
32
Se, inevitavelmente, foi preciso seguir o caminho com todos os
possíveis percalços da história, os desafios ainda continuam. Adentrar no
mundo moderno implica adaptações diversas diante da própria diversidade e
pluralidade dos novos apelos. A religião perdeu o monopólio de referencial
na vida das pessoas e uma série de novas diretrizes e propostas são
oferecidas por instituições seculares. Rapidamente as pessoas incorporam
novos valores e torna-se muito mais fácil transgredir normas que até pouco
eram bastante rígidas e sedimentadas, amparadas e legitimadas justamente
pela religião.
O advento de um mundo com referenciais mais plurais constituiu uma
nuvem sobre o sagrado que, no entanto, não lhe priva de forma absoluta do
seu brilho e da sua luz. Isso quer dizer que o sagrado permaneceu vivo
durante a modernidade e não poderia deixar de ser, se considerarmos as
estruturas frágeis de plausibilidade da vida cotidiana, que encontram
exatamente na religião uma das bases de apoio quando o indivíduo se
coloca diante de situações marginais, como sugere Peter Berger
2
. Para este
autor, a estrutura da realidade cotidiana é frágil e em alguns momentos há
possibilidade de colapso, tanto para o indivíduo, como para a sociedade e
nesses momentos o nomos estabelecido entra em xeque, fica ameaçada,
então, a plausibilidade das construções sociais. As situações marginais por
excelência são a morte e as catástrofes naturais ou a guerra. A religião
surge como uma forma de restabelecimento da plausibilidade desse mundo,
constituindo-se dessa forma um elemento de legitimação do nomos
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
2
Peter BERGER. O dossel sagrado. Elementos para uma teoria sociológica de religião, 1985.
33
socialmente estabelecido, competindo com outros elementos no contexto de
pluralismo da atualidade.
É o momento em que as tecnologias despontam, surgindo motores e
suas poderosas máquinas
3
. E a própria religião faz uso dos meios
tecnológicos para atestar o que antes o faria apenas com o poder da sua
palavra inserida na tradição, ou seja, o testemunho religioso vem à altura
das exigências modernas e tem força de expansão, de sedução, sai dos
templos e, de uma maneira geral, assume contornos bem mais criativos,
com o uso de todos os recursos disponíveis.
Para situar a religião no contexto da sociedade tecnocrática e sua
relação com as tecnologias de comunicação e informação, é preciso rever a
dimensão histórica e as mediações com os paradigmas históricos
correspondentes. Para nossa análise, interessa-nos as noções de
modernidade e pós-modernidade, que são temas de debates mais amplos.
Está em jogo uma concepção nova de modelos de vida que se espalham por
várias esferas da vida em sociedade e que não isenta qualquer indivíduo ou
instituição. Há um corte histórico referencial a partir do advento dessas distinções
conceituais, no contexto de uma sociedade plural, industrial e secular.
Os temas modernidade e pós-modernidade estão constantes nas
reflexões de diversas ciências, o que mostra a emergência de pensar sobre
a questão. Sobre esses conceitos se ocupam a filosofia, a sociologia, a
teologia, a antropologia, etc. O entendimento desses pressupostos é ainda
3
Paul VIRILIO. Os motores da história, 1998.
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34
necessário para elaboração de referenciais éticos, políticos e econômicos do
mundo atual e então fornecer bases epistemológicas à produção científica.
A aceleração da circulação de informações, através de recursos
tecnológicos no mundo atual, o processo de globalização, depõe velhos
referenciais e paradigmas antigos e ainda reivindica continuamente axiomas
novos. Diante disso, o que realmente fica claro é que emerge um momento
novo, mesmo que este momento seja tributário das concepções iluministas-
positivistas da era moderna.
É tempo do imediatamente acessível, quando tempo é dinheiro não
há tempo a perder, conforme adverte Benjamim Franklin apud Weber
4
,
anunciando o espírito do capitalismo, que é bem próprio dessa época.
Para compreender a modernidade, não obstante à diversidade de
interpretações, de um modo geral, o caminho para o consenso é mais
simples, ao menos no que se refere à aceitação do termo e à consideração
do surgimento de um novo sujeito histórico pautado na razão. Temos os
marcos classicamente propostos, que se firmam no cogito ergo sum
cartesiano.
Para o conceito de pós-modernidade, por sua vez, o caminho é mais
tortuoso. Nesse caso, há fronteiras teóricas, aliadas ou inimigas, quanto às
considerações sobre se houve ruptura, continuidade ou superação dos
paradigmas modernos. De que se trata esse momento novo e se é possível
4
Max WEBER. A ética protestante e o espírito do capitalismo, 2004.
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35
a classificação de “pós-moderno” é a questão do debate. Mas, ao mesmo
tempo, é fato inconteste que a cunha é irrevogável e heuristicamente
inevitável. Segundo Featherstone
5
é mesmo um conceito inevitável, já que
se estabeleceu na sociedade princípios organizatórios que se expande a
todas as esferas. Giddens
6
aponta a pós-modernidade como radicalização
da modernidade; Lyotard
7
proclama uma ruptura e Ianni
8
observa a
convivência do moderno e do pós-moderno numa mesma sociedade.
Consideramos, à luz da reflexão de Ianni anteriormente mencionada, que há
convivência entre as duas tradições, já que radicalização também pode
significar ruptura. No entanto, uma ruptura de fato faria com que fosse
depostos os pilares principais do pensamento moderno, que ainda
continuam presentes, com uma certa racionalidade e com o modelo vigente
de produção.
2.1. O eclipse da razão
O eixo orientador da modernidade é o triunfo da razão, a superação
das idéias e ideais religiosos da Idade Média. Requer um mundo ordenado,
que garanta o bem-estar do ser humano, o domínio da natureza e sua
emancipação. O progresso é o caminho para abundância, liberdade e
felicidade e a tecnologia é considerada a propulsora do progresso.
5
Mike FEATHERSTONE. Cultura de consumo e pós-modernismo, 1995.
6
Anthony GIDDENS. As conseqüências da Modernidade, 1991.
7
Jean-Françoi LYOTARD. A condição pós-moderna, 1998.
8
Octavio IANNI. Cidade e modernidade, 1999.
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36
No entanto a modernidade não cumpriu todas as suas promessas e
ruíram-se alguns dos seus pressupostos. A razão humana não deu conta de
proporcionar um mundo de abundância, tal qual havia sido proclamado por
seus arautos. Homens e mulheres continuam a padecer por não suprir suas
necessidades básicas de sobrevivência. Felicidade, liberdade e progresso
não foram realizações universais. Se a ciência pretensamente veio para
trazer a razão universal, deveria romper necessariamente com o senso
comum, com a subjetividade e com a tradição, o que vem a colaborar com a
crise dos ideais modernos, deixando insegura sua solidez, desmanchando-
se no ar. Entra em cena a pós-modernidade, filha revoltada da modernidade,
mas que não abre mão da sua herança.
A herança moderna não nos deixa privar inteiramente dos
racionalismos e do utilitarismo no mundo atual. Mas agora se pensa na
possibilidade de algo mais relativizado, sem referenciais demasiados
sedimentados, nem amalgamas incorruptível. Talvez por isso a religião se
desprenda de si mesma, indo ao encontro do sujeito, que, por sua vez, faz
menos concessões à razão.
A sociedade industrial, que nasce no bojo desse processo e com alicerce
no capitalismo, vai adquirindo nova configuração no decorrer do século XX. A
Segunda Grande Guerra é um marco histórico de referência. A partir de então o
capitalismo assume sua forma avançada, conforme Harvey nos coloca:
“Aceito completamente a visão de que o longo período de
expansão do pós-guerra, que se estendeu de 1945-1973, teve
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
37
como base um conjunto de práticas de controle do trabalho,
tecnologias, hábitos de consumo e configurações de poder
político-econômico. E de que esse conjunto pode com razão ser
chamado de fordista-keynesiano. O colapso desse sistema a partir
de 1973 iniciou um período de rápida mudança, de fluidez e de
incerteza”.
9
Obviamente essa referência diz respeito principalmente ao contexto
Europeu, no entanto, nesse período, era suficientemente mundializado para
ecoar em outras partes do mundo, como na América do Sul, que ainda
estava no início do processo de industrialização.
2.2. Uma “nova ordem mundial”
Brüseke
10
sugere o termo modernidade técnica para designar a época
histórica que nasce com a ciência e com a própria técnica, tentando
contemplar um elemento comum em interpretações divergentes sobre a
modernidade. Para ele, o comunismo, o socialismo real, assim como o
capitalismo estiveram, cada qual ao seu modo, a mercê do progresso
técnico. Se essas são as conjunturas que predominaram no século XX com
raio de influência nas diversas áreas, não furta a religião dos seus efeitos.
O Socialismo Real é de fato uma realização da modernidade, que tem
sua ascensão e queda no século XX. Marx propunha em sua teoria alguns
9
David HARVEY A condição pós-moderna, 1990, p. 119.
10
Franz Josef BRÜSEKE. A modernidade técnica, 2001, p. 48.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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38
dos ideais da revolução burguesa: liberdade, democracia, progresso.
Tributário das idéias de Marx, o socialismo surge com força revolucionária,
mas também se afunda nas suas contradições. A força do capital se impõe
de forma avassaladora, reivindicando, através de uma doutrina e de uma
postura livre, dinâmica e pragmática, a liberdade do mercado para o bem do
processo produtivo. É o que viria ser chamado de neoliberalismo. A partir,
mais efetivamente, do ano de 1980 a economia global passa a ser pautada
nesses parâmetros. Liberdade de mercado, reestruturação produtiva, crise
do emprego e trabalho, o advento de tecnologias revolucionárias, como a da
informática, bem como questões ambientais vêm à tona.
O capitalismo, embora triunfante com a derrocada do socialismo real,
revela como nunca suas contradições, como um sistema voltado para si
mesmo. Isso impõe modelos novos de relacionamentos e de valores. Sua
nova configuração requer que suas bases ideológicas sejam restabelecidas
de um jeito novo. O fim da utopia do socialismo real, que tem como marco
histórico a queda do muro de Berlim em 1989, põe fim à polarização entre os
dois modelos que vigorou em quase todo século XX. Uma doutrina liberal
propor-se-á então como utopia única. Para Boff: “O capitalismo privatizou os
bens e socializou os sonhos. O socialismo socializou os bens e privatizou os
sonhos”.
11
Se a primeira vista essas considerações parecerem inadequadas ao
quadro da pesquisa, há de se considerar que o capitalismo se firma
11
Leonardo BOFF. Nova Era e a civilização planetária, 1998, p. 67.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
39
enquanto sistema econômico dominante em quase todo planeta. Dessa
forma, como Moreira nos afirma, além da incorporação dos mercados, na
sua dimensão globalizante, o capitalismo age na esfera da subjetividade,
desde às questões amorosas até a arte. “Tudo pode virar potencialmente
mercadoria, e como tal ser produzido e para ser vendido no mercado.”
12
A
religião assume a linguagem do mercado, do marketing e sabe que não é a
única opção no universo de valores e de atribuição de sentido existencial.
Como Benedetti
13
adverte, isso sugere que as tradições religiosas não
concorrem somente entre si, mas também com o mercado e com o
consumo, gerador efêmero de universos de sentidos.
Mas o mercado ser reveste também numa aura de “religiosidade”
quando se apropria de símbolos, motivos, recursos e às vezes da estética da
própria religião
14
.
Esse novo contexto socioeconômico também acelera algumas
mudanças. Se o ideário capitalista é o consumo e, dentre o que se consome,
artefatos tecnológicos estão quase sempre na ordem da prioridade. A força
do capital impulsiona as novidades e as comodidades técnicas que estão à
disposição de qualquer pessoa ou instituição que possui recursos
financeiros. Nessa ordem social a religião se insere.
12
Alberto da Silva MOREIRA. A civilização do mercado: um desafio radical às igrejas, 1998, p. 134.
13
Luiz Roberto BENEDETTI. Religião: trânsito ou indiferenciação?, 2006.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
14
“Os símbolos religiosos “estão aí” para quem os quiser. Assim, um jornal brasileiro de circulação
nacional traz três quartos de página para apresentar dois top-models junto a uma cachoeira em meio à
floresta, carregando uma estátua de Iemanjá. Nus da cintura para cima, o azul do jeans (anunciado)
faz contraponto e, ao mesmo tempo, estabelece a continuidade com o vestido azul da divindade.
Insinua que a roupa confere identidade “religiosa” situando-os num mundo transcendente, a marca”
(Cf. Luiz Roberto BENEDETTI, Religião: trânsito ou indiferenciação?, 2006, p. 8).
40
Diante do debate sobre conceito, origem, significado e conseqüências
da modernidade e pós-modernidade, a religião, que se coloca nesse
contexto de maneira importante, influenciando os caminhos e tendências
também é reconfigurada em suas próprias práticas e discurso. Sempre que
se recorre a temas comuns como a modernidade e pós-modernidade, triunfo
ou eclipse da razão, secularização das instituições, advento do sagrado,
imanência de novas religiosidades ou analogias deverá se ter uma
referência religiosa para o entendimento.
2.3. Sobre a secularização
A secularização, que se irrompeu na modernidade, não minou
completamente a força institucional das expressões religiosas, nem mesmo
provocou o arrefecimento de movimentos mais espontâneos e populares,
embora tenha causado “um amplo colapso da plausibilidade das definições
religiosas tradicionais”
15
. Ao contrário, uma constatação comum nas últimas
décadas é o advento da religiosidade com renovado vigor e em mudança,
em pleno processo de reconfiguração. Dessa forma, isso não quer dizer que
a religião ressurja, renasça ou que agora peça revanche. À sua maneira, ela
permaneceu robusta durante toda modernidade.
Conforme Berger, a religião não deixa de dialogar com a
modernidade, fazendo as barganhas cognitivas
16
. Se a intimidade do
homem, na forma mais subjetiva, torna-se plena no discurso e na prática
15
Peter Berger. O dossel sagrado. Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985, p. 139.
16
Peter BERGER. Rumor de anjos, 1997.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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41
religiosa, a dimensão objetiva de outras escolhas e pertenças não pede aval,
necessariamente, a axiomas que emana de motivações transcendentes.
Agora, portanto, mesmo sem grandes avanços em seus discursos, a
religião está pronta para a pós-modernidade e sinaliza ser capaz, dentro
dessa lógica, de propagar ideais conservadores com métodos de vanguarda.
Vejamos a Igreja Eletrônica
17
e o uso que ela faz de recursos tecnológicos
da informação e comunicação. Seu discurso é agressivo, mas eficiente, uma
vez que essas igrejas têm uma embalagem novinha para um produto de dois
mil anos. E vende bem!
Martelli
18
, no seu estudo sobre a religião na sociedade pós-moderna,
trata do tema da secularização e desecularização, apontando as idéias de
Berger e outros autores como Acquaviva, que faz considerações sobre a
desecularização ou anuncia o “eclipse do sagrado” e B. R. Wilson, que
considera a secularização como marginalização da religião numa sociedade
cada vez mais racionalista que se referencia por dados pragmáticos.
No Brasil, concomitante com o processo de industrialização e
urbanização, há um grau de perda da religião como referencial na vida das
pessoas. Se antes, mesmo em cidades grandes, ela ditava valores e
atitudes, firmava-se como centro da vida social, sua atuação hoje já é bem
diferente. Há uma multiplicidade de referenciais para a vida das pessoas.
Benedetti cita o exemplo de como a Igreja Católica procurou, através da
17
Hugo ASMANN. A igreja eletrônica, 1986.
18
Stefano, MARTELLI. A religião na sociedade pós-moderna, 1995.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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42
educação, da assistência social e de uma imprensa apologética, manter um
bom nível de controle político-ideológico. Por esses meios, a Igreja de Roma
se fazia portadora da Verdade
19
e, portanto, quem contra ela estava contra a
própria Verdade estava também
20
. Ela mantém, ainda hoje, força nesses setores,
mas diluída em uma série de alternativas nos inúmeros empreendimentos laicos,
não mais na forma de monopólios, como Benedetti nos aponta:
“A Igreja em situação de monopólio se caracterizava por ser de
fato a religião oficial, protegida oficialmente, e todo esse esforço
para manter a coesão interna, reforça seus quadros, impõe uma
rigidez autoritária de direito divino, eliminando o leigo como agente
religioso autônomo pode ser encarado como esforço para num
primeiro momento obter o reconhecimento de sua força....”
21
Aqui podemos considerar alguns fatores como causa da
secularização, considerada como descentralidade do referencial religioso na
sociedade: o advento da urbanização, o super incremento dos meios de
comunicação de massa e a crescente acessibilidade de bens de consumo
tecnológicos. Um dado ainda importante é o deslocamento de uma atitude
religiosa para outros tipos de militância, algumas vezes de caráter
absolutista e dogmática, como nos coloca Thompson:
19
Numa análise dos depoimentos, é importante notar como empreendimentos católicos que fazem
uso da televisão, por exemplo, as TVs Século 21 e Canção Nova, com eficiência e modernas técnicas,
assumem uma postura de endurecimento ortodoxo e, às vezes, com um certo fundamentalismo. Um
exemplo disso é o discurso proferido pelo Pe. Roberto, fundador da Toca de Assis, no programa
Anunciamos Jesus, exibido ao vivo, pela TV Século 21, em 15/05/2005: “Jesus é único Senhor e a
Igreja Católica é portadora da verdade..” “Nós Católicos temos a verdade através dos meios de
comunicação...” “Que alegria ter uma TV como a Século 21 que pode dar ao católico a plenitude da
verdade...”
20
Luiz R. BENEDETTI. Os santos nômades e Deus estabelecido, 1984, p. 164.
21
Idem, ibidem, p. 164.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
43
“O declínio da religião e da magia preparam o campo para a
emergência de sistemas de crenças seculares ou “ideológicas”
que servem para mobilizarem a ação política, sem referência a
valores ou seres de outro mundo. A consciência religiosas e mítica
da sociedade pré-industrial foi substituída pela consciência prática
enraizada nas coletividades sociais e animadas pelos sistemas
seculares de crenças”
22
.
No Brasil, o número dos que se declaram sem religião cresce:
Segundo o último censo do IBGE, passou de 7,8% em 1990 para 8,30% em
2001. E, em contrapartida, paradoxalmente, há também o fenômeno chamado
“eclipse da secularização”
23
, que contrasta com o “eclipse do sagrado”
24
.
Isso se evidencia na difusão de uma multiplicidade de novas formas religiosas, a
partir da década de 1970, que abarcam elementos da religiosidade de
tradição judaico-cristã, como outras de origem oriental, militarista, esotérica,
além da revitalização dos cristianismos tradicionais, em modelos pentecostais
renovados e também o crescimento do hinduismo e do budismo.
Esse pluralismo, segundo Camurça
25
, é observado no campo da auto-
definição de pertença religiosa, que no censo de 2000, a partir da pergunta
“qual a sua religião?”, chegou-se ao número de 35.000 respostas diferentes.
Com o procedimento metodológico da pesquisa, eliminando repetições e
erros, encontrou-se ao número de 144 diferentes classificações de
22
John B. THOMPSON. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia, 2002, p. 106.
23
Stefano MARTELLI. A religião na sociedade pós-moderna, 1995.
24
ACQUAVIVA apud Stefano MARTELLI, A religião na sociedade pós-moderna, 1995; A. F.
PIERUCCI e R. PRANDI. As religiões no Brasil contemporâneo, 1998.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
25
Marcelo Ayres CAMURÇA. A realidade das religiões no Brasil no censo do IBGE-2000, 2006.
44
expressões religiosas. No entanto, a propósito do artigo de Camurça,
Pierucci pergunta
26
: Cadê nossa diversidade religiosa? Respondendo,
Pierucci argumenta que na soma dos dados, o porcentual de cristãos no
Brasil é de 89,2%. Todas as outras tradições estão distribuídas no universo
de 6 milhões de brasileiros. Divergências à parte, importa-nos mesmo
perceber essa diversidade no campo maior dos cristãos, católicos e
protestantes, que disputam entre si visibilidade e adesão de fiéis num
contexto de sucessivo surgimento de novas expressões religiosas e, como
acima observado, com o crescimento e divulgação de outros elementos
culturais geradores de sentido.
Na verdade, não se trata da existência desse paradoxo entre eclipse
do sagrado e o eclipse da secularização. Durante toda a modernidade, a
religião esteve presente de maneiras diferentes, independentemente de sua
denominação. Isso pressupõe a marca de um novo tempo, uma
multiplicidade de crenças que potencializa sua capacidade de alcance na
vida das pessoas, mediante o uso dos novos recursos de informação e
comunicação disponíveis e que estão de acordo com a tendência mais geral
do modo fragmentário de escolhas pessoais diversas, que é mais uma
característica do nosso tempo
27
. O desafio para todas é a adaptação.
26
Antônio Flávio PIERUCCI. Cadê nossa diversidade religiosa? Comentários ao texto de Marcelo
Camurça, 2006.
27
Como no seguinte exemplo citado por Maria José ROSANDO-NUNES em O Catolicismo sobre o
escrutínio da modernidade, 2004, p. 29: “Maria, negra, moradora de uma favela em São Paulo, tem
uma agenda religiosa interessante: às segundas-feiras vai à missa, na igreja dos Enforcados, no
centro da cidade, às terças pela manhã, atende, quem necessita de cura ou de alguma benzeção, e a
tarde, vai a uma igreja pentecostal.”
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
45
A passagem de uma situação de monopólio para uma situação
pluralista, retira a possibilidade de uma religião ou tradição se impor de
maneira absoluta e essa é uma característica de uma época secular.
O domínio secular, de qualquer maneira, desde a análise de sua
semântica, é o desfavorecimento dos elementos religiosos, sob quaisquer
aspectos: político, social ou axiológico. Poder-se-ia pensar que a religião
assume um papel figurante na sociedade e que a partir de então não teria
nada a dizer, porque também não teria quem se dispusesse a ouvir.
Conforme mencionado anteriormente, embora em termos de referências, a
religião compete com outros apelos e possibilidades da vida moderna, ela
procura adaptar suas práticas, daí a Igreja Tecnológica, parafraseando
Asmann, que se estende por recursos modernos em várias dimensões,
saindo do seu lócus, por meio da televisão, do rádio ou da Internet e
adentrando em dimensões espaciais em limites globais.
A região metropolitana de Campinas, por exemplo, que é a referência
geográfica para as análises nesse trabalho, tem característica cosmopolita,
industrial e, em muitos aspectos, considerando a realidade brasileira, de
vanguarda. Aberta, portanto, a muitas influências e catalisadora do domínio
secular. Mas ali, como em todas as metrópoles brasileiras, o sagrado resiste,
seja configurado no seu território, seja com seu território destituído ou
expandido por meio de possibilidades tecnológicas de comunicação.
Assim, a modernidade não é e não foi, necessariamente, um período
de desencantamento do mundo, mesmo porque, segundo Weber, desencan-
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
46
tamento é um processo anterior à própria modernidade, que remonta ao
profetismo do antigo Israel e com mais força no início do protestantismo
acético
28
. Melhor pensar em um período de secularização, como o advento
de uma pluralidade de valores concorrentes aos valores religiosos e busca
de limitação de espaços institucionais, por exemplo, entre Igreja e Estado.
A aparência do retorno do sagrado é porque ele assume uma postura
de competição diante da pluralidade pós-moderna. Nesse afã, a visibilidade
é fundamental, por isso o uso dos meios de comunicação. Há demanda para
religião e não raro são as referências que se faz dela como produto, sobre o
que nos referimos mais detalhadamente nessa dissertação.
2.4. O século XX e o paradigma tecnológico
No item anterior discorremos como a racionalidade marca o advento
da modernidade com suas implicações, favorecendo o surgimento de novos
referenciais de vida e outros valores senão aqueles tutelados pela religião.
“Um forte impulso para a secularização é dado pelo desenvolvimento das
ciências experimentais: física, química, biologia, etc.”
29
, bem como pelo
surgimento de sistemas teóricos críticos. Desemboca a partir desse
momento, fruto de um processo histórico anterior, uma multiplicidade de
28
Peter BERGER. O dossel sagrado. Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985 e Flávio
PIERUCCI. O desencantamento do mundo Todos os passos de um conceito em Max Weber, 2003.
29
Battista MONDIN. Quem é Deus?, 1997, p. 43.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
47
apelos que revolucionam a vida das pessoas, retirando do mundo o seu
dossel religioso.
30
O último século, nesse sentido, foi de profundas transformações, sem
precedentes na história da humanidade, deixando todos, ao mesmo tempo,
dependentes e desconcertados
31
. Mas não se perdeu totalmente a
concepção religiosa do mundo, os fundamentalismos sobrevivem, as
ortodoxias religiosas resistem, a magia e as devoções populares continuam
presentes; não foi um desencantamento com um máximo de radicalidade,
nem sequer um eclipse total do sagrado, mas surgem com força novos
referenciais pautados nas ciências e nas tecnologias.
Castells
32
, ao analisar a sociedade de rede, considera esses
referenciais como paradigma tecnológico, que tem como um dos seus
aspectos a grande penetrabilidade dos seus efeitos no dia-a-dia das
pessoas. Assim, “toda atividade humana, todos os processos de nossa
existência individual e coletiva são diretamente moldados, embora não
determinados, pelos novos meios tecnológicos”
33
. Nesses novos meios
apontados por Castells incluem-se as modernas tecnologias eletrônicas e
suas diversas aplicações. O autor insere uma generalização
desconsertadora, porque a princípio não oferece margens para as exceções.
Entretanto, tratando-se de paradigma
34
, importa verificar um modelo de
30
Peter BERGER. Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985.
31
Erik HOBSBAWM. A era dos extremos: o breve século XXI, 1914-1991, 1998.
32
Manuel CASTELLS. A Sociedade em rede, 1999.
33
Idem, ibidem, p. 68.
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e as novas mediações tecnológicas.
34
As revoluções científicas analisadas por Thomas Kuhn, sugerem mudanças periódicas de
paradigmas e sua contribuição foi incorporada nas análises sobre a tecnologia (cf. Thomas KUHN, A
48
referência para conduta, essa grande penetrabilidade dos efeitos na vida das
pessoas, agora reflexivamente mais contundente.
Isso favorece a possibilidade da pluralidade de modos e concepções
de vida. Sobre a questão do pluralismo, França oferece-nos a seguinte
contribuição:
“A sociedade moderna se caracteriza primeiramente pelo
pluralismo, a saber, pela multiplicidade das fontes de sentido, das
leituras da realidade, concorrendo entre si, relativizando-se e
enfraquecendo-se mutuamente. Com isso perde a religião a
hegemonia simbólica que gozava no passado, enquanto
fundamento último da cultura e da organização social. Ela se vê
confinada a ser um setor ao lado de outros na sociedade e se
encontra assim despojada de sua estrutura social de
plausibilidade
35
.”
É o fim dos monopólios religiosos e deslocamento da religião do
espaço público, caracterizando, portanto, o pluralismo e privatização como
aspectos do mundo secular, conforme Mariz
36
, num comentário sobre
sociologia de Peter Berger.
A metrópole, por exemplo, torna-se o lugar privilegiado do moderno e
do pós-moderno, em que “juntamente com a urbanização, o mercado, o
dinheiro, o direito, a política, bem como a secularização, a individuação, a
estrutura das revoluções cientificas, 1996 e Maria Lucia MACIEL, Ciência, tecnologia e inovação: a
arte entre conhecimento e desenvolvimento, 1995).
35
Mário de França MIRANDA. O pluralismo religioso como desafio e chance, 1995, p. 332.
36
Cecília Loreto MARIZ. Peter Berger: uma visão plausível da religião, 1997.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
49
racionalização, também floresce a arte e a filosofia”
37
e, acrescentamos, não
deixa de florescer também a religião, que amparadas por suas tradições e
pelas suas experiências fundantes, reelaboram suas práticas cotidianas.
Ianni coloca esta questão da seguinte forma:
“A razão pode emancipar-se de todas as amarras e vínculos
convencionais e tradicionais, supersticiosos, mágicos ou
religiosos. Aí a razão pode imaginar-se ingênua, consciente e
autoconsciente, em-si e para-si. Desprende-se de tudo, pairando
além do cotidiano, empírico, sensível, prático ou pragmático, de tal
maneira que constrói figuras, metáforas, alegorias: penso, logo
existo; categorias a priori do conhecimento; dialética servo e
senhor; luta de classes; tirania e democracia; soberania e
hegemonia; leis da evolução; etapas do progresso; revolução e
emancipação; ciência e tecnologia; ascetismo e consumismo;
desencantamento do mundo e morte de Deus; consciente e
inconsciente; teoria da relatividade; ideologia e utopia;
racionalização e alienação; dramático e épico; modernidade pós-
modernidade”.
38
Para isso, as práticas religiosas têm que se adaptarem às novas
exigências e aos novos desafios. São os mais diversos, desde os novos
meios de locomoção dos fiéis à adequação dos espaços físicos dos templos.
Além disso, o uso de aparatos, dos mais modernos, nos meios de
comunicação social, em diversos veículos: jornais, revistas, televisão,
Internet, etc. e ainda o recurso ao marketing religioso
39
.
37
Octavio IANNI. Cidade e modernidade, 1999.
38
Octavio IANNI. A era do globalismo. 2002, p. 66.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
39
Brenda CARRANZA. Renovação carismática católica: origem, mudança e tendência, 2006 e Miguel
Antônio Filho KATER. O marketing aplicado à Igreja Católica, 1995.
50
As tecnologias aplicadas em transportes, meios de comunicação e de
informação favorecem níveis altos de interação social, mudando a
percepção do espaço e tempo. Quando a religião faz uso desses meios,
submete-se a essa nova percepção e surgem as conseqüências devidas.
Sobre isso falaremos nos capítulos três e quatro.
Exige-se da religião sempre e mais respostas que satisfaçam seu
anseio de funcionalidade e não destoe do mundo de comodidades
oferecidas em outros aspectos da vida das pessoas. Com a praticidade do
dia-a-dia, quase não se consegue imaginar um mundo diferente, chegando-
se a uma espécie de vício, invertendo-se a antiga lógica em que a
necessidade criava o produto, entretanto, atualmente, o produto cria as
necessidades e deve enquadrar-se num modelo de excelência devidamente
certificado, ganhando status de confiabilidade, caso queira sobreviver ao
sistema que, ao modo darwinista, seleciona os melhores. O ato técnico e
criativo do ser humano não é puramente meio de satisfazer suas
necessidades vitais, tende-se, porém, desde o início, ao supérfluo
40
.
Com a proposta do consumo e da ética da individualidade, alguns
valores vão sendo deixados de lado, inclusive o da vida humana, em que os
investimentos visam muito mais reproduzir e potencializar o modelo vigente
à custa da exploração e de profundas desigualdades sociais e econômicas.
Quem está à margem desse processo é considerado subclasse, produto
do desemprego estrutural, da flexibilização e otimização dos processos
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
40
Franz Josef BRÜSEKE. A modernidade técnica, 2001 e José ORTEGA Y GASSET. Meditações
sobre a técnica, 1963.
51
produtivos com os incrementos da informática, da robótica, da
eletrônica, etc.
41
.
Uma sociedade tecnocrata é a que vive sob o referencial da técnica,
do cômodo, do funcional, do instantâneo, além da aparência e da imagem. A
exacerbação desse processo é o responsável pelo surgimento de grandes
problemas de ordem ecológica, com grandes ameaças às espécies animais,
vegetais, à qualidade do ar, do solo e do contínuo processo de esgotamento
dos recursos vitais que a natureza oferece. E tudo isso, que está no campo
da reflexão ética, só sinaliza afinal uma espécie de dialética ou uma
contradição com certos discursos tradicionais das Igrejas. E tem que ser
assim, já que uma tecnofobia pura e simples aliada com postura de renúncia
e boicote é simplesmente inviável.
A modernidade significou o predomínio da razão, mas as igrejas se
mantiveram firmes. Os grandes desafios foram doutrinários, poderíamos
dizer: agora, na era da técnica planetária, alguns outros pontos se delineiam,
supostamente como marca para uma nova era pós-moderna e exigem uma
atitude prática. A novidade técnica na religião está cumprindo essa nova
exigência, pois os templos são reconstruídos para atender essa demanda e
o incremento em sofisticação em todas as áreas atesta essa sintonia que
procura ter a religião com as novas tendências e as novas disponibilidades
tecnológicas, como procuraremos abordar no próximo capítulo.
41
Octavio IANNI. A era do globalismo, 2002.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
52
CAPÍTULO
3
RELIGIÃO E TECNOLOGIAS:
TRANSFORMAÇÕES PRÁTICAS
Foto de divulgação: www.tvseculo21.org.br
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
53
“Magnum miraculum est homo”
Hermes de Trismegisto
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
54
CAPÍTULO
3
RELIGIÃO E TECNOLOGIAS:
TRANSFORMAÇÕES PRÁTICAS
o iní
cons
tecno
N
cio desta dissertação, apresentamos os processos
titutivos do crescimento e do emprego das
logias eletrônicas pela religião no século XX.
Mostramos ainda a problematização sobre os impactos dessas tecnologias
em diálogo com experiências eletrônicas e citamos algumas dessas
experiências realizadas por religiões que compõem o campo religioso
brasileiro.
Neste capítulo, propomos uma análise da experiência religiosa
através dos novos meios de mediações tecnológicas da informação e da
comunicação eletrônica, compreendendo os níveis da produção, da
transmissão e da recepção.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
55
A partir da segunda metade do século XX, há um desenvolvimento
extremamente rápido das telecomunicações e posteriormente da informática.
Como em vários outros setores da sociedade, esses recursos também foram
apropriados pelas várias denominações religiosas, com certo pioneirismo
das denominações pentecostais
1
. Verifica-se que, de uma maneira geral, os
níveis de relacionamento dos fiéis entre e si e dos fiéis com as instituições
passam por uma transfiguração para se adaptarem a esses novos tempos.
3.1. As novas mediações e as interações tradicionais:
o tempo, o templo e o espaço
A experiência religiosa sempre esteve bastante ligada à experiência
individual, numa profunda identificação do seu espaço e do seu tempo, com
o distanciamento necessário para a diferenciação do campo sagrado ao do
profano e de campos sagrados distintos entre si e da imanência cotidiana
com a transcendência temporalmente ritualizada nos períodos devidos
2
.
O distanciamento tempo-espaço era somente em recorrência aos
mitos e à atualização das narrativas. Dessa mesma forma, as periodizações
dos ritos sacros ordinários no cotidiano ditavam os modos de convivência
1
Rolim faz uma breve colocação do uso do que ele chama de meios modernos de comunicação, o
rádio e televisão, no início do pentecostalismo no Brasil e a forma como esses meios foram usados de
forma pioneira, ajudando a desenvolver o próprio movimento pentecostal (Cf. Francisco Cartaxo
ROLIM, em Pentecostalismo: Brasil e América Latina, 1994).
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e as novas mediações tecnológicas.
2
Mircea ELIADE em Tratado de história das religiões, nos capítulos X e XI, comenta respectivamente
sobre o espaço e o tempo sagrados. Apresentando concepções clássicas, sua análise expressa
justamente o vínculo das concepções de tempo e espaço ligados a arquétipos religiosos vinculados à
tradição de uma comunidade local ou civilização específica.
56
social, delegando e legitimando devidamente os status sociais, por exemplo,
a figura do pastor, do padre, do beato, da benzedeira, do curador.
Assim, na metáfora comparativa que sugerimos: o tempo, o templo e
o espaço são dimensões, na forma da religiosidade tradicional, interconexas
e sincronizadas que se realizam simultaneamente, sem ruptura possível. O
templo localmente estabelecido organiza-se num espaço limitado com
fronteiras e jurisdição estabelecida pela comunidade. Em torno dele, os
adeptos fundam seu senso de pertença e adesão espontânea, além da
função de marco simbólico que instantaneamente revelará a identidade e a
vitalidade religiosa da comunidade. Como no caso da mais comum
arquitetura da Igreja Católica, que valoriza belas e altas torres em local bem
localizado, a vista dos visitantes e uma preocupação constante com novos
incrementos, nas diversas reformas com objetivos práticos e estéticos.
Na forma tradicional, o tempo do ritual é a referência do cotidiano. A
comunidade pára, usando ainda o catolicismo como exemplo, nos dias de
festa, nas procissões e outros eventos sacros. A comunidade guarda os
preceitos devidos e respeita os tabus, o que convém e o que não convém no
tempo específico. É um tempo marcado, estabelecido e esperado, sem
surpresas porque é programado. As práticas são amparadas pela
periodização, pouco se admite a surpresa e improviso, salvaguardadas num
calendário estático e nas prescrições devidamente legitimadas.
O espaço está circunscrito e é o domínio do padroeiro, tudo está
muito próximo e se sabe como chegar, aonde chegar e quando chegar. É
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
57
interessante notar que, inclusive, há uma teorização desse espaço
celebrativo por conta da própria Igreja, como a católica, que indica a
forma litúrgica adequada, como as considerações do padre jesuíta José
Raimundo Melo:
“O espaço celebrativo é o local em que processa a reunião
litúrgico-cultual da assembléia, a domus ecclessiae
3
, a qual não
se deve ser edificada de forma extrínseca e independente à
comunidade cristã que a utilizará, mas de acordo com a imagem
própria que este grupo tem de si a cada momento de sua
existência. Daí a grande diversidade de tipos de espaços cultuais
que se podem encontrar, correspondendo sempre à diversidade
de momentos e lugares em que a comunidade eclesial se radica.”
4
O espaço celebrativo, conforme o padre José Raimundo, remete, de
acordo com critérios litúrgicos estabelecidos, à própria imagem da
comunidade, à sua auto-imagem. Ele fornece ainda um elenco da
configuração do espaço celebrativo: o edifício de culto em geral, o lugar dos
fiéis, o lugar da presidência e dos ministros, o ambão ou mesa da palavra, o
altar ou mesa da eucaristia
5
. Nesta passagem, fica claro que tudo é
predeterminado no mesmo espaço, seguindo uma tradição.
Qual é o espaço cultual em que a comunidade virtual se radica? A
comunidade virtual está em todos os lugares sob apenas uma referência,
portanto ela não se radica em lugar algum, não tem um lócus como
3
Casa da igreja.
4
José Raimundo MELO. O espaço de celebração da comunidade cultual: considerações a partir dos
documentos pós-conciliares, 1998, p. 330.
5
Idem, ibidem.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
58
sugerimos e o domus ecclesiae do qual comenta o Pe. José Raimundo não
existe.
Comunidade virtual é aqui entendida como o conjunto de fiéis-
telespectadores, internautas e rádio-ouvintes. Disso concluímos que
elementos tradicionais de configuração religiosa entram em período
de mudança num contexto mais amplo de resignificação da relação
espaço-tempo.
No caso da televisão, consideremos a diferença da transmissão de
uma missa ao vivo em determinada Igreja e o caso da missa de estúdio, que
tem mais nitidamente tratamento de produto televisivo. Uma Igreja como a
Católica Romana que tem seu cerimonial rigoroso, possivelmente em algum
momento terá uma orientação oficial a respeito, no sentido de estabelecer
elementos ordinários do rito, bem como as rubricas devidas. Questões para
os teólogos: como converter a sacralidade do templo, local próprio do culto,
em estúdio? A preocupação já existe sim, mas em forma de orientações
genéricas e de comentários teológicos, sem ainda o rigor da praticidade
litúrgica tradicional.
Embora não seja um fenômeno homogêneo no planeta, o advento das
tecnologias da informática, da comunicação e do transporte está provocando
uma ruptura com as formulações tradicionais. O fenômeno chamado de
globalização ou o planeta tido como aldeia global impõe dados novos aos
diversos aspectos da cultura, conforme mencionado no primeiro capítulo.
Não há como ficar imune às influências da informação quando se tem a
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
59
possibilidade de se ter um televisor com uma rústica antena UHF-VHF ou
quando se instala uma antena parabólica, uma tevê por satélite ou se
acessa a Internet. Tem-se, nesses veículos, acesso a elementos capazes de
verdadeiras revoluções numa comunidade, proporcionalmente à intensidade
do uso dos meios.
E como Balandier aponta sobre termos mais amplos da concepção de
modernidade:
“Uma terceira forma específica plenamente a modernidade, o
espaço das teles, das redes técnicas pelas quais as
telecomunicações transmitem as mensagens e as imagens. É um
espaço quase saturado em alguns setores, que se adensa
continuamente. Introduz uma sobre-realidade que duplica a
realidade material, proporcionando manifestações do imaginário, a
criação de lugares, objetos e seres de evidência inteiramente
diferentes.
6
Assim, embora o indivíduo esteja localmente estabelecido, ele poderá
estar em conexão com o mundo e à mercê de influências diversas. Com o
uso do telefone e da Internet, ele terá chance de se tornar mais do que um
observador e reprodutor passivo, entrando, assim, no mundo da
interatividade. Ainda poderá contribuir, a partir do seu local, com a dimensão
da comunidade virtual, podendo ser um internauta que navega
tranqüilamente no ciberespaço, num tempo que, paradoxalmente, costuma-
se chamar de tempo real.
6
George BALANDIER. O Contorno: poder e modernidade, 1997, p. 234.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
60
O desenvolvimento de tecnologias novas sempre causa revolução no
agir social redefinindo suas práticas desde a invenção da roda,
alegoricamente falando. Proporciona, segundo Edgar Morin, processos de
emancipação
7
e isso é a marca de momentos novos na história da cultura do
homem. O que está em jogo agora é o ritmo e o alcance dessas mudanças,
porque há um sistema de troca altamente acessível e um sistema econômico
e ideológico patrocinador dessas mudanças. Em Ciência como Consciência,
Morin continua afirmando que além dos processos de emancipação
acontece “também novos processos de manipulação do homem pelo homem
ou dos indivíduos humanos pelas entidades sociais”.
8
Construiu-se a necessidade de interação e de padronização do
consumo de mercadorias e serviços através do agigantado esforço de
rompimento de fronteiras geográficas, culturais e econômicas. São as bases
da aldeia global ou do que se convencionou chamar de processo de
globalização. Ianni contribui mais uma vez com nossa reflexão quando
mencionou sobre a dimensão da interação planetária através das
tecnologias:
“A ‘aldeia global’ sugere que, afinal, formou-se a comunidade de
mudança, concretizada em realizações e as possibilidades de
comunicação, informação e fabulação abertas pela eletrônica.
Sugere que estão em curso a harmonização e a homogeneização
progressivas. Baseia-se na convicção de que a organização, o
funcionamento e a mudança da vida social, em sentido amplo,
compreendendo evidentemente a globalização, são ocasionados
7
Edgar MORIN. Ciência com consciência, 2002.
8
Idem, ibidem. p. 109.
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e as novas mediações tecnológicas.
61
pela técnica e, neste caso, pela eletrônica. Em pouco tempo, as
províncias, nações e regiões, bom como culturas e civilizações,
são atravessadas e articuladas pelos sistemas de informação,
comunicação e fabulação agilizados pela eletrônica.”
9
A singularidade da prática local tende a ser suplantada pela proposta
do mundo virtual. Esse processo parece ser muito natural para o indivíduo e
ele não percebe imediatamente o que se passa. Quanto mais recursos
tecnológicos ele tem disponível, mais comodidades ele terá e menos
contatos pessoais conseqüentemente também. Num clique de botão, poderá
fazer a compra e contratar o serviço que quiser. Uma sala de bate-papo na
Internet é uma maneira de não estar sozinho na sua solidão e, pela
televisão, estará espiritualmente confortável após “assistir” à missa em sua
própria casa. É o processo que Martelli
10
chamada de “deslocalização” ou
“des-realização de experiência”. São experiências eletrônicas, virtuais, nesse
caso de experiência de fé, que podem ser constadas por diferentes
interesses de abordagem.
A missa televisada do domingo, por exemplo, pode ser uma
experiência deslocalizada capaz de transmitir uma satisfação espiritual, um
conforto e até mesmo mediar prodígios de fé. É possível perceber isso nas
entrevistas que realizamos, conforme ilustraremos a seguir:
“Se a gente tiver oportunidade de comungar o Corpo e Sangue de
Cristo, melhor. Mas se não tiver, podemos comungar através da
9
Octavio IANNI. A era do globalismo, 2002, p. 16.
10
Stefano MARTELLI. A religião na sociedade pós-moderna, 1995.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
62
palavra de Deus, e isso é importante, comungarmos a Palavra.
Porque dentro da palavra tem Jesus transmitindo, né? Através dos
evangelhos, né? Na nossa vida, como experiência viver a palavra
de Deus, não somente ouvi, mas procurar viver a palavra que
Jesus coloca pra nós no dia-a-dia através da rede de tevê.” (V.)
11
Nesse caso, o fiel subjetivamente reelabora sua experiência religiosa
no sentido de adaptá-la ao nível da recepção do conteúdo em questão e
sentir a mesma satisfação. O falta de oportunidade da presença física é
resolvida de forma prática na comunhão da rede virtual, da comunidade de
receptores. Como Gouveia observa:
“Desprivatizando a intimidade da fé, a programação religiosa
apresentada na televisão, aparece como um novo organizador das
experiências religiosas, formando as novas sensibilidades e
singularidades do ser fiel.”
12
A televisão, portanto, exerce a função de irradiar o conteúdo religioso
que garante uma incidência na intimidade do fiel, na sua experiência mística
e na sua convicção de fé. A palavra de Deus, que para os Cristãos significa
os escritos contidos na Bíblia e o Corpo e Sangue de Cristo, que
compreende o sacramento chamado de Eucaristia, disponibiliza-se numa
outra dimensão, nesse caso, da imagem e do som transmitidos através das
ondas eletromagnéticas.
Na forma tradicional, a temporalidade e a espacialidade é, por assim
dizer, necessária, pois há um fluxo contínuo de ações e uma localização
11
Entrevista realizada em 15/05/2005.
12
Eliane Hojaij GOUVEIA. Comunidades eletrônicas de consolo. 1999, p. 122.
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e as novas mediações tecnológicas.
63
material imediata. A temporalidade e espacialidade ocorrem de forma
inevitável, na dinâmica do aqui e agora. Assim, por exemplo, o rito estará
dentro das prescrições das rubricas litúrgicas e haverá toda a materialidade
dos objetos e suas respectivas atribuições simbólicas.
Agora a novidade da comunicação permite, por exemplo, que o fiel
que não teve a oportunidade de ir à missa no domingo de manhã, como no
depoimento citado, além da opção de assistir em transmissão ao vivo, terá a
alternativa do video-taipe. Se ir à missa aos domingos é algo importante
para sua consciência cristã, ele não se sentirá constrangido em cumprir o
preceito, assistindo uma gravação.
3.2. O exemplo histórico da Ecclesia
A interação de uma comunidade religiosa, histórica e tradicional exige
o contato face a face, uma troca imediata entre fiéis. Vejamos o caso do
cristianismo: é uma religião de origem judaica que, por sua vez, remete à
experiência dos povos nômades do deserto da Caldeia. O processo de
consolidação dessa religião necessitou da constituição de um povo, no
estabelecimento de ethos e a fundação de uma instituição: o templo, que era
o lugar do culto e do sacrifício, portanto lugar de encontro.
O cristianismo, oriundo da tradição judaica e mergulhado no espírito
cultural greco-romano, estabelece a ecclesia que, a rigor, quer dizer
assembléia e originalmente designava uma assembléia da polis grega
13
. É
13
Werner JAEGER. Cristianismo primitivo e Paidéia grega, 1991, p. 31.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
64
uma religião do encontro, como ressalta sua própria teologia. A narrativa dos
Evangelhos mostra que Jesus de Nazaré, no início de sua vida pública,
primeiro convocou uma comunidade, chamando os apóstolos a abraçarem
sua causa e, como líder do movimento, envia-os para vários cantos da terra,
para que fundem novas comunidades cristãs
14
. Nesse contexto, o privilégio
está no exercício da reunião, na formação de comunidades que se reúnem
sempre recordando suas origens. Como observa Nathan Mitchel num artigo
publicado na revista Conclium, de cunho teológico:
“Nos dois primeiros milênios, a Igreja agiu baseando-se no
princípio de que, se as pessoas ‘trazem seus corpos para a
Igreja’, suas mentes gradualmente seguirão! Assim, a Igreja
insistiu na missa dominical como a principal expressão de
pertença dos católicos à ecclesia. De muitas maneiras, este
princípio tem sido o alicerce de nosso sistema ritual católico. (...)
Mas, se as pessoas descobrem que podem pertencer a
comunidades virtuais” e “bate-papos” on-line, sem precisar sair de
casa – o que dizer? Será realmente necessária a participação
ritual regular? A maneira que escolhemos para responder a esta
questão moldará sem dúvida o futuro da liturgia católica”
15
.
Isso exemplifica o ambiente localizado como forma de interação
tradicional no âmbito da religião, diferente das possibilidades virtuais e por
meios interativos. E, por mais que a capacidade do diálogo da Igreja com as
novidades tecnológicas seja verdade, o artigo citado anteriormente aponta o
desenrolar de uma preocupação que certamente resultará numa orientação
14
Mateus. Cap. 28. Vers. 19. Marcos Cap. 16. Vers. 15.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
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15
Nathan D. MITCHEL. Ritual e nova mídia. In: Concilium – Revista Internacional de Teologia, 2005,
p. 103.
65
e numa atitude prática da Igreja em determinado momento, ou seja, não se
trata apenas de dispor dos recursos disponíveis, mas adequá-los a uma
tradição milenar, que estabeleça um equilíbrio entre perdas e ganhos, ou
melhor, que se otimize os ganhos.
3.3. Novos mediadores e novas interações
Toda inovação é fruto de um conhecimento acumulado, toda época e
toda cultura têm seu repertório tecnológico próprio, mas, como já
ressaltamos, estamos numa época de transformações mais constantes.
Nas últimas décadas do século XX, com a otimização crescente dos
recursos tecnológicos e da informática e a diversificação de suas
possibilidades de aplicação, com a popularização dos meios de
comunicação de massa, flui-se de forma acelerada a tendência de
mudanças na sociedade, em decorrência do estabelecimento de dados
novos nas dinâmicas de relacionamento, da produção material e de valores.
No caso das mídias eletrônicas, surge o que Sodré chamou de ethos
midiatizado
16
, que implica uma requalificação da vida com base nas
influências desses meios. A partir de então, os relacionamentos das pessoas
passam a ser pautados pela absolutização do instantâneo e funcional,
prático e imediato, sendo que se encaminha para falência o que está na
contramão disso tudo, a não ser que se paute como fenômeno de resistência
ou que se proponha alternativo.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
16
Muniz SODRÉ. Antropologia do espelho: uma teoria da comunicação linear e em rede. 2000.
66
Hoje o espaço é qualificado, tendo em vista a funcionalidade e
praticidade. A multiplicidade de acontecimentos, as simultaneidades
propostas e disponíveis exigem respostas rápidas, soluções ligeiras,
operações precisas e fluidas. Se há desafios entre as distâncias e as
estruturas e preciso vencê-las.
Várias tecnologias eletrônicas desenvolveram-se rapidamente nas
últimas décadas, dentre elas a internet e, mesmo que se considere que é um
recurso que a grande maioria da população do planeta ainda não utiliza, já
proporciona inevitavelmente maneiras de relacionamentos, através da qual
se torna possível falar de um espaço social cibernético, de um ciberespaço
ou de uma cibecultura
17
.
A experiência religiosa passa então a sofrer mediações novas que
vão além da forma tradicional de interação face a face. O uso das
tecnologias da informação e da comunicação permite que experiência da
religiosidade aconteça fora do contexto da comunidade imediata, de
interações próximas e de presença local. Quando se pensa que a religião
aprendeu a enfrentar o desafio da modernidade e a pulverização de
influências, percebe-se que o que houve de fato foi uma espécie de
ajornamento
18
, em que as várias denominações constroem os arranjos que
17
Sobre o ciberespaço, Lévy define como “O espaço de comunicação aberta pela interconexão
mundial dos computadores e das memórias dos computadores” (cf. Pierre LÉVY. Cibercultura, 1999,
p. 92).
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
18
“O ajornamento surge em geral de considerações táticas. Argumenta-se que se deve modificar
certos traços da instituição ou de sua mensagem, pois, caso contrário, não se poderá atingir esta ou
aquela clientela recalcitrante” (cf. Peter BERGER. Rumor de anjos. A sociedade moderna e a
redescoberta do sobrenatural, 1997, p. 49).
67
acham necessários. É o que Berger chama de engenharia social, que é uma
forma de tornar uma instituição mais apta a enfrentar e sobreviver diante das
necessidades e exigências do mundo moderno.
19
O ajornamento nesse caso é uma maneira de traduzir a tradição,
adaptando-a às novas exigências, inclusive, os teólogos católicos se
preocupam com essa questão e de fato atualizam o seu discurso de maneira
sistemática, incluindo a modernidade, a pós-modernidade, os temas da
razão instrumental, bem como dos novos apelos tecnológicos, dentre às
suas demais reflexões, apontando, como faz o filósofo ou o sociólogo, por
exemplo, a característica desse novo tempo e, em vista disso, qual a
resposta da Igreja. Trata-se de verificar os impactos ocasionados pelo uso
das tecnologias na própria vivência espiritual, de um modo não tão
pragmático, no sentido de avaliar a atitude daqueles envolvidos com a
experiência da igreja que utiliza recursos tecnológicos, levando-se em
consideração uma perspectiva histórica e sócio-antropológica.
Supomos o uso das tecnologias como uma vertente prática do que
Berger chama de tradução da tradição religiosa. Mas ainda existe um
discurso crítico na Igreja Católica com relação a algumas formas do uso da
mídia
20
, de uma ala que se costumava chamar de progressista. Percebemos
19
Peter BERGER. O dossel sagrado. Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985, p. 166.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
20
Carranza fala do arcaísmo do discurso notada nas iniciativas midiáticas católica, que no entanto tem
a bênção e o legado de João Paulo II. Prossegue constando os conflitos gerados ad intra ecclesia,
mas não dá continuidade à reflexão, sugerindo uma outra oportunidade (cf. Brenda CARRANZA.
Catolicismo midiático, 2006).
68
que os grupos católicos que utilizam a mídia, na grande
21
maioria, estão
ligados à Renovação Carismática, que geralmente tem discurso
conservador. Dessa forma tal discurso tem contraste com uma prática que é
dinâmica e moderna, no sentido histórico-conceitual, já que é metódico e
racional. Portanto, se a barganha não acontece nos fins, como tenta revelar
por vezes o discurso, seguramente acontece nos meios.
Com diferentes abordagens, os estudiosos da questão religiosa
percebem que quando se fala em adaptação, em barganha com a
contemporaneidade e suas nuanças socioculturais, porém amparadas em
tradições pretéritas, o fator comunicação via processos eletrônicos sempre
entra em questão. Como no exemplo de Jardelino:
“Nesse ‘século das comunicações’, caracterizado por um mundo
micro processado e técnico-científico, onde o conhecimento e a
informação computadorizadas hiper-realizam o mundo,
transformando num espetáculo; onde a imagem tem valor
heurístico e o real se transforma em signo, a religião entendeu
que não mais teria chances de sobrevivência se continuasse com
seus pés fincados na Idade Média”.
22
Jardelino coloca a questão de forma radical, apontando que religião
tinha urgente necessidade de adaptação à tecnologia, caso contrário poderia
desaparecer. Certamente a religião tem se adaptado às exigências
modernas, como o fez ao longo dos vários séculos passados.
21
Peter BERGER. Rumor de anjos: A sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural, 1997.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
22
José Rubens JARDELINO. Religião y simulacro: alterações do campo religioso latino-americano,
2002, p. 102.
69
Com o uso dos meios de comunicação e da informática, de uma
forma geral, a realidade da vida cotidiana ultrapassa o lócus do indivíduo. Da
mesma forma, essa tecnologia favorece o relacionamento entre as pessoas
que se situam no campo da virtualidade e da interatividade, pois estar
próximo pode significar somente estar conectado. É o que J. B. Thompson
chama de experiência espaço-temporal descontínua. Segundo esse autor,
“os indivíduos que assistem à televisão suspendem, até certo ponto, as
coordenadas de espaço e de tempo do cotidiano e temporariamente se
transformam para um diferente conjunto de coordenadas espaço-
temporais.”
23
Dessa forma, a religião, como uma forma simbólica, tem
possibilidade de maior circulação pública, maior acessibilidade, tendo vista
os recursos de fixação do seu conteúdo através dos meios de
armazenamentos magnéticos e, mais recentemente, dos meios digitais.
Berger e Luckmann
24
apresentam a forma de interação face a face,
ou seja, o contato direto sem recursos intermediários, como maneira
singular, a mais importante forma de partilha entre os indivíduos. Na
interação face a face, comumente evita-se subterfúgios, as partes que
interagem, mesmo obedecendo aos padrões e recorrendo a sutilezas, se
expõem. Os autores nos colocam essa afirmação da seguinte maneira:
“Na situação face a face o outro é apreendido por mim num vivido
presente e partilhado por nós dois. Sei que no mesmo vivido
apreendido por ele. Meu ‘aqui e agora’ e o dele colidem
continuamente um com o outro enquanto dura a situação face a
23
John B. THOMPSON. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia, 1998, p. 86.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
24
. Peter BERGER; Thomas LUCKMANN. A construção social da realidade, 1976.
70
face. Como resultado, há um intercâmbio continuo entre minha
experiência e a dele. Vejo-o sorrir e logo a seguir reagindo ao meu
ato de fechar a cara parando de sorrir, depois sorrindo de novo
quando também sorrio, etc. Todas as minhas expressões
orientam-se na direção dele e vice-versa e esta contínua
reciprocidade de atos expressivos é simultaneamente acessível
mediante o máximo de sintomas”
25
.
Nesses termos, nota-se uma imediata adaptação ao contexto que se
enquadra na norma estabelecida aos padrões constituídos.
A interação face a face é a interação original e semente de todas as
outras, está calcada nas tradições diversas desde as origens. Thompson
aponta-nos que esse tipo de interação é o primeiro e mais elementar meio
divulgador das formas simbólicas, com o uso dos mais simples meios e
condições técnicas ao afirmar que:
“Mesmo uma simples troca de expressões verbais numa situação
face a face pressupõem um conjunto de aparelhos e condições
técnicas (laringe, cordas vocais, lábios, ondas de ar, ouvidos,
etc.), e muitas formas simbólicas pressupõem outras condições e
aparelhos que são especialmente construídos e desenvolvidos”.
26
Thompson chama de modalidades de transmissão cultural
27
. Ora, o
recurso tradicional de interação no contexto religioso é a forma face a face,
num ambiente geográfico circunscrito e numa lógica quase estática na
25
Idem, ibidem, p. 47.
26
John B. THOMPSOM. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de
comunicação de massa, 1995, p. 193.
27
Idem, ibidem.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
71
divisão e percepção do tempo. Isso quer dizer que há uma zona geográfica
definida, onde as pessoas se congregam, onde os rituais acontecem e sob
até mesmo uma jurisdição precisa de determinado líder religioso. Como
ainda abordaremos com mais detalhes, os recursos técnicos mais modernos
surgem como uma nova modalidade de transmissão cultural, que acaba
sendo muito mais abrangente e dinâmica. Sobre isso, há mais uma
contribuição de Thompsom:
“Mas novos meios técnicos tornam possíveis novas formas de
interação social, modificam ou subvertem velhas formas de
interação, criam novos focos e novas situações para a ação e
interação, e, com isso, servem para reestruturar relações sociais
existentes e as instituições e organizações das quais elas fazem
parte.”
28
A interação face a face, malgrado as possibilidades de interpretações
diversas de uma mesma realidade, proporciona uma partilha do contexto,
num mesmo ambiente-espaço e num mesmo período-tempo. A entrada do
meio técnico desfaz a solidariedade desse contexto, pois uma experiência
remota alcança um local distante e aí a experiência se desterritorializa. O
lugar é então estabelecido numa “topologia eletrônica
29
”, que é uma forma
de eliminação do espaço e o tempo num “falso dia eletrônico
30
”, que significa
comutações de informação sem relação verdadeira com o tempo real.
28
Idem, ibidem, p. 296.
29
Paul VIRILIO. O espaço crítico, 1993, p. 10.
30
Idem, ibidem.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
72
Balandier, por sua vez, fala que dessa forma surge a possibilidade do
surgimento de anacronias, ou tempos marcados por fragmentações. A
questão é colocada da seguinte forma:
“A primeira mediação que a recepção introduz, vista como um
lugar e não como uma etapa, é a questão das anacronias e das
diferentes relações com o tempo, que em castelhano chamamos
de destempos”.
31
O distanciamento do aqui e agora da situação face a face, sem
outras mediações, impõe o anonimato de uma maneira geral, ainda que
determinada figura esteja em evidência através do próprio recurso midiático.
O fiel relaciona-se com graus diferentes de intimidade quanto mais estiver
perto um do outro.
A interação face a face possibilita o reconhecimento entre os
membros de uma comunidade religiosa que se encontram regularmente.
Numa assembléia numerosa, que se reúne periodicamente, depois de algum
tempo, é possível distinguir rostos novos e ao mesmo tempo perceber a falta
de alguém que tem freqüência regular. As situações criadas, tais como
confraternizações, visitas, etc. possibilitam ainda o estreitamento de laços
afetivos. Assim, a partir das afinidades, os membros de uma comunidade
religiosa reagrupam-se, formando confrarias, irmandades, ministérios e
outras formas de organização de acordo com denominação.
31
George BALANDIER. O Contorno. p. 42.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
73
Apontando para os novos movimentos religiosos, Gouveia fala da
abertura de novas possibilidades de conectividade e um novo senso de
pertença pautados nos recursos de comunicação de massa. Isso, numa
forma geral, é uma tendência e constatamos em casos particulares. Diz ela:
“As comunidades religiosas tornam-se móveis, desterritorializadas
e propiciam aos seus adeptos o direito a uma pertença também
móvel e transitória, bem como propiciam aos fiéis variados
encontros com parceiros de fé. Tais parceiros religiosos
costumam ter as mais diversas origens étnicas, bem como são
provenientes dos mais diversos locais das cidades, do planeta
(turismo religioso) e dos mais variados níveis socioeconômicos.”
32
Com a interação midiática, a experiência religiosa tem, então, essas
possibilidades. O indivíduo fica deslocalizado e perde a dimensão, diria de
uma forma mais efetiva, do senso de pertença, de co-participação. Se
expusermos de uma outra forma e sendo mais precisos, essa experiência é
redimensionada porque ainda há de fato os mecanismos de pertença, mas
com outras configurações.
No caso das celebrações religiosas televisadas, conforme o constante
acompanhamento que fizemos, principalmente aquelas que há um realce na
figura de determinado líder, construindo uma imagem com recursos
simbólicos que permita a potencialização das suas qualidades e que, por
vezes, passam a ser consideradas extraordinárias, promovendo-o ao status
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
32
Eliane Hojaij GOUVEIA. Apontamentos sobre novos movimentos religiosos. In: Sociologia da
religião e mudança social, 2004, p. 153.
74
de carismático, próximo ao sentido weberiano
33
, cria-se um tipo de interação
e uma forma de intimidade mediada não recíproca, porque desprovida da
interação face a face, favorece, por um lado, a personificação do evento e,
em caso mais extremo, a descaracterização do culto, se a base de
referência for mediação próxima.
Assim, o sacerdote, o pastor ou quem quer que presida o evento
transmite, normalmente, um conteúdo genérico, de maneira que cada
receptor capte o que lhe convém, não obstante os resultados estejam
pragmaticamente estudados e estabelecidos. Queremos dizer, a mesma
mensagem e o mesmo rito será captado tanto por um telespectador de
classe média alta e intelectualizado de uma grande cidade como pelo
morador do meio rural e de uma pequena cidade, habitualmente muito mais
grudados às suas tradições.
A realidade midiatizada, como acompanhamos pela observação
sistemática, reconstrói o espaço e o ambiente, numa forma de co-produção
da realidade, isso, segundo Virilio
34
, causa um desequilíbrio perigoso entre o
sensível e o inteligível. O autor reflete da seguinte forma:
“De fato, a transparência (televisada) substitui a aparência de
olhar direto, a aparência sensível dos objetos sofre transmutação
da tele-observação e da telecomunicação dos dados da imagem,
de uma imagem globalizante, que visa suplantar definitivamente
as percepções imediatas, com riscos de perturbação iconológica
que isto implica.
35
33
Max WEBER. Economia e Sociedade, 1999.
34
Paul VIRILIO. O espaço crítico, 1993.
35
Idem, ibidem, p. 24
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
75
Entendemos, a partir da reflexão do autor e do acompanhamento dos
processos de recepção dos fiéis, que há mudança qualitativa na recepção da
mensagem, porque se colocam em cena outros vetores de representação
36
,
diferente do contato imediato. Mas de uma maneira ou de outra, o conteúdo
simbólico será transmitido.
No entanto, durante o trabalho de campo percebemos que mesmo
havendo a transmissão do conteúdo simbólico efetivamente, com o uso do
meio técnico, como a televisão, oferece-se a possibilidade de olhares
diferenciados, de acordo, inclusive, com o enquadramento da objetiva da
câmera. Valemo-nos mais uma vez de um exemplo de Virilio, que falando
sobre formas de interação sobre outros contextos, refere-se exatamente
sobre o redimensionamento do olhar, o qual podemos atualizar numa
perspectiva de análise da religião e a possibilidade de postura diferente
diante da veiculação do conteúdo simbólico sacro.
No teatro, por exemplo, cada um dos espectadores dispersos numa
sala vê obrigatoriamente uma peça diferente, de acordo sua posição. No
cinema e na televisão, ao contrário, o espectador, onde quer que esteja,
verá exatamente o que a câmera viu, ou seja, o mesmo filme
37
. Da mesma
forma, qualquer rito televisionado mostrará o enquadramento da câmera sob
direção profissional, da produção, dos recursos técnicos, das luzes e
posições favoráveis. Não queremos dizer que a recepção é inteiramente
passiva, porque o receptor irá atribuir um significado próprio ao conteúdo,
36
Idem, ibidem.
37
Paul VIRILIO. A arte do motor, 1996, p. 16.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
76
mas que a imagem e som o chegam de forma padronizada, fruto de uma
produção para um público demasiado heterogêneo. Na interação face a
face, ao contrário, a mensagem seria personalizada, regionalizada, mais de
acordo com as tradições da comunidade local.
Dadas essas considerações, sugerimos um estudo de caso que nos
forneça maior esclarecimento sobre esses aspectos. No quarto capítulo
desse trabalho, analisaremos um empreendimento da Igreja Católica que se
firmou como empreendimento bem-sucedido na área da comunicação de
massa, com importantes usos de recursos técnicos: a TV Século 21.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
77
CAPÍTULO
4
A ASSOCIAÇÃO DO SENHOR JESUS E A TV SÉCULO 21:
A BÊNÇÃO DE DEUS MAIS PERTO DE VOCÊ”
1
Foto de divulgação: www.tvseculo21.org.br
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
1
Esse é um slogan publicado na capa de um folder de divulgação da Associação do Senhor. Nas
páginas seguintes do mesmo folder um outro slogan é sugerido: “A bênção de Deus dentro da sua
casa!”.
78
“Sapere aude! Tem a coragem de servir-
te de tua própria inteligência!”
E. Kant
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
79
CAPÍTULO
4
A ASSOCIAÇÃO DO SENHOR JESUS E A TV SÉCULO 21:
A BÊNÇÃO DE DEUS MAIS PERTO DE VOCÊ”
R
alph Della Cava e Paula Monteiro
2
publicaram em livro,
em 1991, um estudo que analisou a história e
desenvolvimento do uso dos meios de comunicação de
massa, o rádio, a imprensa e a televisão, pela Igreja Católica do Brasil, no
período compreendido entre os anos de 1962 até 1989. Diante do
desenvolvimento do setor de comunicação dentro da Igreja Católica,
principalmente através das iniciativas da Renovação Carismática, é certo
que caberia um novo estudo dos anos de 1989 até hoje, o que, a priori,
demonstraria uma evolução bem mais dinâmica daquela que ocorreu nos 27
anos desse primeiro estudo, dado o desenvolvimento dos meios de
comunicação e da informação em todos dos campos. Nestes tempos, a
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
2
Ralph DELLA CAVA & Paula MONTEIRO. E o verbo se fez imagem: Igreja Católica e os meios de
comunicação no Brasil, 1991.
80
relação de presença vem sofrendo de maneira cada vez mais veloz
inúmeras modificações, ou seja, a presença, a co-presença, a proximidade
ou o distanciamento pode também se definir a partir dos eventos virtuais e
dos níveis de conectividade.
A internet, a televisão, o rádio, bem como materiais impressos
assinalam, talvez, a finalização da relação exclusiva do sagrado com os
territórios fixos. O fiel católico, objeto do nosso estudo, parece já poder
exercitar efetivamente a escolha de freqüentar os templos ou aproximar-se
deles pelas redes eletrônicas de comunicação oferecidas pela própria Igreja
Católica. Isso promove um dilema para a Igreja, pois, optando pelo uso da
tecnologia eletrônica de comunicação para transmitir sua mensagem de fé,
bem como para angariar novos adeptos, corre-se o risco de perder suas
competências de controle de comportamentos dos fiéis, já que a
proximidade virtual tende à flexibilização. O ganho, neste caso, é
quantitativo, considerando que se tem uma ferramenta de conquista de fiéis.
O slogan que ilustra o título deste capítulo indica essa perspectiva, posto
que o apelo é o meio prático da bênção: ela é mediada, ela é midiática.
Como Thompson
3
ressalta, não é possível separar, nas sociedades
modernas, a produção e a circulação das formas simbólicas das atividades
industriais da mídia, que se fazem onipresentes na vida cotidiana. E cada
vez mais a produção midiática incrementa-se tecnologicamente,
aumentando, portanto, continuamente seu raio de alcance e de influência.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
3
John B. THOMPSON. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de
comunicação de massa, 1995, p. 219.
81
Mas, diante da pluralidade de possibilidades dentro do universo da produção
da mídia, surge, de certa forma, a necessidade de segmentação, de
especialização que dê conta de demandas específicas, cujos interesses
podem ser de ordem comercial, político, cultural, de gênero, religioso, etc.
Segundo Martino
4
, é imperativo à religião, em contexto de pluralidade,
a divulgação do seu produto simbólico e é a mídia, nos dias de hoje, o
melhor caminho para isso, dada sua versatilidade de meios e sua
potencialidade de alcance. Assim essa divulgação só se realiza, atraindo o
interesse da mídia comum para os seus eventos ou criando os seus próprios
meios, ou seja, investindo na aquisição de veículos de comunicação.
O caso religioso que nos interessa parte exatamente para a auto-
produção de conteúdos ou a auto-representação midiática com recursos
próprios, uma das alternativas apontadas por Martino e demonstrada no
estudo de Della Cava e Paula Monteiro citados anteriormente. Para o nosso
trabalho, temos também um estudo de caso de um empreendimento
religioso que pauta a sua prática no uso de recursos midiáticos ligados à
tecnologia eletrônica da informação e comunicação: A TV Século 21.
4
Luís Mauro Sá MARTINO. Mídia e poder simbólico, 2003.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
82
4.1. Associação do Senhor Jesus: história, origem e estrutura
nosso principal objetivo é: anunciar a boa notícia
de Jesus Cristo através dos meios de
comunicação social.”
5
Anunciar a boa notícia de Jesus Cristo”: um objetivo muito comum na
Igreja Católica e de outras denominações cristãs. “Através dos meios de
Comunicação Social”: também não é uma novidade, considerando que
existem congregações no seio da Igreja Católica que professam esse
carisma há muitas décadas. O fato novo aqui é a experiência do uso da
televisão de maneira autônoma e profissional, gerenciada por uma
associação ligada a um movimento também novo na Igreja Católica: A
Renovação Carismática
6
.
Referimos-nos à Associação do Senhor Jesus (ASJ), fundada
formalmente em 16 de junho de 1980, pelo Pe. Eduardo Dougherty e um
grupo de leigos, justamente com o intuito de trabalhar com os meios de
comunicação percebendo nesse início uma certa urgência dos novos
tempos. No mesmo período surgem outros empreendimentos com objetivos
semelhantes, mas que não tiveram o mesmo sucesso, como as produtoras
Sono-Viso, Verbo Filmes e Sistema Salesiano Vídeo-Comunicaçao, todas
contemporâneas da Associação do Senhor Jesus.
5
Cf. site: www.asj.org.br/objetivos.asp
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
6
Ralph DELLA CAVA e Paula MONTEIRO. E o verbo se faz imagem: Igreja Católica e os meios de
comunicação no Brasil,1991.
83
Com o objetivo de trabalhar com os meios de comunicação social, a
Associação do Senhor Jesus pede ao CNBB a aprovação de um programa
que produzia, cujo nome era Anunciamos Jesus, submetendo seu vídeo-
teipe a uma análise. O intuito dessa Associação, na época, seria obter aval
para angariar financiamentos externos, entretanto o programa do Pe.
Eduardo recebeu um parecer bastante negativo do episcopado brasileiro. A
Equipe de Reflexão (ER), ligada à Linha 6 da CNBB, Setor de
Comunicações Sociais, que tinha poder de deliberação perante o organismo,
condenou o programa ao fracasso. O parecer foi dado nos seguintes termos:
“O programa Anunciamos Jesus, patrocinado pela Associação do
Senhor Jesus, produzido e gravado pelo Jesuíta, Pe. Edward
Dougherty, em Campinas, São Paulo, vai ao ar todos os sábados,
desde 1983, em 9 emissoras do país, numa linha desencarnada,
pentecostal, espiritualista, autoritária e verticalista, contrária a
caminhada pastoral da CNBB”.
7
.
O fato é que, mesmo sem contar com o aval oficial dos Bispos do
Brasil, a iniciativa do Pe. Eduardo consolidou-se e nos dias hoje representa
um dos mais eficientes sistemas de comunicação da Igreja Católica, com um
esquema profissional, com uso de uma tecnologia eletrônica de ponta e a
comercialização de diversos produtos como cds, dvs, agendas, terços,
camisetas, imagens, etc.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
7
Atas da Equipe de Reflexão da CNBB de 12 de novembro de 1984, p. 3. Citado por Ralph DELLA
CAVA e Paula MONTEIRO em E o verbo se fez imagem: Igreja Católica e os meios de comunicação
no Brasil, 1991.
84
Della Cava e Monteiro observam que os anos de 1980 marcam a
“entrada da Igreja na produção direta de bens culturais e simbólicos”.
8
Mesmo com a tensão entre tendências da Igreja nesse período, uma mais
ligada à Teologia da Libertação e outra na linha dos movimentos, como a
Renovação Carismática, está desperto o interesse e há sinalização da
Igreja, pois esta precisa manter o diálogo com o mundo do século XXI. O
parecer dado pela Equipe de Reflexão, conforme mencionado anteriormente,
é marca desse conflito de tendências, já que a Igreja Católica da época, no
plano pastoral, estava mais ligada à ala da Teologia da Libertação.
Este é o início da Associação do Senhor Jesus. Mesmo sem contar,
nesse primeiro momento, com um conhecimento técnico na área, a
Associação do Senhor Jesus começa a produzir o programa Anunciamos
Jesus. No começo, os equipamentos utilizados para a produção eram
emprestados da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. O primeiro
programa foi gravado em 04 de junho de 1983, numa capela também da
mesma universidade. O programa produzido começou a ser exibido em
espaço alugado na TV Gazeta, de São Paulo, com duração de 15 minutos e,
depois de uma reelaboração do sistema de financiamento através dos sócios
contribuintes e melhoria técnica, o programa passa a ser exibido em rede
nacional para todo o país, através da TV Bandeirantes de São Paulo, sendo
o primeiro programa católico a alcançar esse feito
9
. Segundo Vicente de
8
Ralph DELLA CAVA e Paula MONTERO. E o verbo se fez imagem: Igreja Católica e os meios de
comunicação no Brasil, 1991, p. 85.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
9
Vicente de ABREU. “Anunciamos Jesus: 30 minutos que fizeram diferença”. Revista Brasil Cristão,
n. 6, 2002.
85
Abreu, o programa Anunciamos Jesus atinge o ápice de 10 pontos de
audiência, quando ainda era exibido pela TV Bandeirantes, segundo a
medição do IBOPE.
10
A Associação do Senhor Jesus tem uma proposta de adaptação para
os novos tempos em que os aspectos tecnológicos e eletrônicos são muito
influentes na vida das pessoas. É reflexo dessa preocupação o próprio nome
escolhido para emissora de televisão que administra, TV Século 21, que, por
sua vez, insere-se no complexo Centro de Produções TV Século 21, hoje
situado na cidade de Valinhos-SP, ocupando um espaço físico de 24.000 m
2
.
De fato, ela surge no limiar do novo milênio em que a Igreja Católica celebra
festivamente o que chamou de Jubileu de Jesus Cristo.
11
O século XXI, conforme já mencionamos, traz o signo da
modernidade, da emancipação pela tecnologia por constantes revoluções,
em suma, pela coroação da tecnologia, dessa forma vários aspectos da vida
social se direcionam por aspectos tecnológicos.
Os passos rumo à concretização de uma emissora de televisão foram
dados pela Associação do Senhor Jesus alguns anos antes da proposta
oficial da Igreja Católica de celebração do Jubileu de Jesus Cristo. Na
preocupação com a evangelização através dos meios de comunicação
social, já havia a preocupação com os novos tempos, embora ainda não se
10
Idem, ibidem.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
11
Em 1997, atendendo a um apelo no Vaticano, a CNBB lança no Brasil o documento “Rumo ao Novo
Milênio”, preparando festivamente a chegada do século XXI, considerado como Jubileu de Jesus
Cristo.
86
vislumbrava concretamente a possibilidade de uma emissora de televisão
própria.
Segundo Carranza
12
, no início, apesar da grande estrutura de
produção montada pela Associação do Senhor Jesus, com estúdios e
equipamentos modernos, não havia interesse em adquirir uma emissora
própria, limitando-se ao objetivo de produção de audiovisuais para fins de
promoção da Igreja.
No entanto, conforme já ressaltamos, a Associação do Senhor Jesus
é ligada à Renovação Carismática Católica, que assumiu dois projetos
ambiciosos em nível mundial: Evangelização 2000 e Lumem 2000. Sobre o
projeto Evangelização 2000, Della Cava comenta:
Seu principal objetivo não é apenas o de promover os pontos de
vista do próprio movimento, e talvez garantir para si mesmos,
como fizeram séculos atrás Dominicanos e Jesuítas, um lugar
central na configuração do perfil do catolicismo mundial, mas
consiste sobretudo em ajudar a devolver tanto ao Papado quando
e ao seu magisterium a preeminência que “de direito” lhes cabe,
dentro e fora da Igreja.
13
O Projeto Lumem 2000, por sua vez, objetivava criar uma estrutura
tecnológica de comunicação bastante arrojada para Igreja Católica, com
transmissões de eventos de evangelização via satélite com alcance
planetário.
12
Brenda CARRANZA. Renovação carismática: origens, mudanças e tendências, 2000, p. 252.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
13
Ralph DELLA CAVA. E o verbo se fez imagem: Igreja Católica e os meios de comunicação no
Brasil, 1991, p. 88.
87
Embora não se tenha efetivamente notado grandes repercussões
desses projetos na ampla conjuntura da Igreja, revelou-se uma tendência do
método da Renovação Carismática, à qual a Associação do Senhor Jesus se
adaptou bem e serviu de instrumento: a tele-evangelização. O próprio nome
escolhido para a tevê indica a ligação com o signo do ano 2000, tal qual os
projetos em questão. O Jubileu de Jesus Cristo proposto pela Igreja também
aponta para a realidade e a imaginação da era das tecnologias.
A TV Século 21 vai ao ar no ano de 1999. Não se trata de um
empreendimento pioneiro no uso da televisão pela religião, visto as
incursões na mesma área da Rede Vida de televisão, também católica e
empreendimento neopentecostal da Igreja Universal do Reino de Deus
14
,
que adquire uma rede comercial de alcance nacional. Em constante
crescimento, a TV Século 21 possui atualmente 220 retransmissoras, entre
os canais abertos e por assinatura, conforme anexo I.
A tevê em geral é um instrumento comum da grande cultura de
massa, com grande poder de divulgação de idéias, conceitos e modos de
vida. Tem uma grande influência no Brasil, que ao longo de 50 anos
desenvolveu um dos melhores sistemas televisivos do mundo.
15
E essa
evidência da televisão inspira os seus críticos, ainda que não sejam muitos.
Sobre o poder do veículo no imaginário brasileiro vale a pena mencionar
Bucci:
14
CAMPOS, Leonildo Silveira. Teatro, templo e mercado: organização e marketing de um
empreendimento neopentecostal, 1997.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
15
Eugênio BUCCI. A TV aos 50: criticando a televisão brasileira no seu cinqüentenário, 2000.
88
“Hoje vivemos num imaginário globalizante e globalizado. O
telespectador que se formou como um brasileiro hipnotizado pelas
imagens do projeto nacional – essas imagens o constituíram
brasileiros – flana hoje como um consumidor da cultura mundial. A
face brasileira é uma face televisiva, por certo. Mas a face
televisiva, agora, não é mais apenas brasileira. Ultrapassou a
lógica do Estado nacional e tornou-se um reflexo – ao mesmo
tempo que um agente – de uma cultura industrializada em escala
planetária. E aí, sobretudo, o limite entre o imaterial e o concreto
se dissolvem. A realidade é o que as imagens dizem que ela é. As
imagens revestem o mundo, com sua nova linguagem global.
16
De acordo com essas considerações, reforça-se a idéia de que a
entrada da religião na produção televisiva, desde a década de 1990 com
seus próprios meios, partiu da percepção de uma necessidade dos
idealizadores e fundadores da TV Século 21, bem como tantos outros líderes
de outras denominações. A imagem que dita realidades é uma proposição
importante, dessa forma, no campo da audiência, acontece a guerra de
setores sociais e culturais para se imporem como realidade plausível,
concreta.
4.2. Pe. Eduardo – Líder, profeta e carismático
Segundo Weber
17
, uma das características do carisma e a sua
legitimidade em relação ao poder que exerce é a condição de pessoa
enviada por Deus, feitor de uma obra prodigiosa. Para Weber, o profeta é,
16
Idem, ibidem. p. 8.
17
Max Weber. Economia e Sociedade, 1999.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
89
por excelência, portador de carisma, que atua de acordo com seu dom
pessoal. Desse modo, podemos apontar a identificação dessas
características no fundador da Associação do Senhor Jesus, Pe. Eduardo
Dougherty, ainda que como presbítero tenha também a legitimação
institucional, já que é sacerdote.
O Pe. Eduardo é o “idealizador, fundador e presidente da Associação
do Senhor Jesus e da TV Século 21”
18
, além de ser, juntamente com o Pe.
Harold Joseph Rahm, um dos promotores da Renovação Carismática no
Brasil desde o seu início
19
. A imagem do padre Eduardo é muito constante
nos veículos de comunicação da Associação do Senhor Jesus. Essa
presença é, em termos de marketing, estratégica, pois, como veremos,
vincula esta Associação a uma personalidade forte nos seus esforços de
construção de um empreendimento religioso.
Pe. Eduardo Dougherty
20
nasceu nos EUA, em Louisiana, em
29/01/1941 e radica-se no Brasil a partir de 1969. Antes já estivera em terras
brasileiras, em 1966, mas retorna para a conclusão dos seus estudos e ser
ordenado padre, pela ordem da Companhia de Jesus (Jesuítas). Como
salienta Carranza
21
, o Pe. Eduardo apresentou desde o início da sua estadia
em terras brasileiras um forte espírito empreendedor e uma boa capacitação
18
Aspecto realçado num folder de divulgação da Associação do Senhor Jesus.
19
Sobre a origem da renovação carismática no Brasil, ver Brenda CARRANZA. Renovação
carismática Católica: origem, mudança e tendências, 2000 e Reginaldo PRANDI. Um sopro do
espírito, 1998.
20
Eduardo Dougherty é um nome aportuguesado. O nome original do padre é Edward John
Dougherty.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
21
Brenda CARRANZA. Renovação carismática Católica: origem, mudança e tendências, 2000.
90
para gestão empresarial. Poderíamos destacar sua obstinação, no bom
sentido da palavra, conduzindo sua obra mesmo quando não recebeu
aprovação do magistério da Igreja.
Embora não chegue à exaustão, fica evidente a vinculação da
imagem do Pe. Eduardo aos trabalhos da Associação do Senhor Jesus,
ressaltando seu aspecto de líder, nesse caso não apenas um líder
administrador, mas revestido de uma liderança espiritual, considerado
grande pastor. Diríamos que ele personaliza a imagem da instituição, como
notamos nas cartas enviadas pelos fieis à revista Brasil Cristão e nas
próprias ações de marketing da Associação do Senhor Jesus. No processo
de coleta de dados notamos que quase sempre no início das cartas há o
vocativo: Pe. Eduardo. Da mesma forma, nas mensagens imprensas na
revistas Brasil Cristão, freqüentemente há subscrito sua assinatura, em fac-
símile, tal qual o exemplo citado por Gutwirth
22
, quando se refere aos
pregadores eletrônicos dos Estados Unidos, que utilizam fórmula
semelhante. Vejamos os exemplos de referência ao Pe. Eduardo nas cartas
enviadas à editoria da revista Brasil Cristão:
“Pe. Eduardo, eu era uma mulher com problemas cardíacos. Vivia
com medo de morrer, estava muito doente. Procurei uma médica,
que aumentou a dosagem do remédio que eu tomava de 50 mg
para 100 mg, mesmo assim não obtive melhora. Então, rezando
diante do Santíssimo, no Programa Louvemos ao Senhor, pedi
com muita fé que Jesus me curasse” (M. M.)
23
22
Jaques GUTWIRTH. Construction Médiatique du religieus. La dynamique de la télévision et la
religion des télévangélistes, 1998.
23
Carta do leitor. Revista Brasil Cristão, n. 89.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
91
“Querido amigo Pe. Eduardo, fui tocada por uma grande emoção
quando estava muito doente, pois sofro de colite ulcerativa há 32
anos. Tenho lutado muito contra esse mal, até ganhar de minhas
companheiras Legionárias de Maria, a oração das Mãos
ensangüentadas de Jesus” (M. C)
24
Querido Pe. Eduardo,
queridos membros da Associação do
Senhor Jesus, acredito que falo em nome de todas as pessoas
conhecem o trabalho de vocês: sou fã de carteirinha de todos os
que escrevem na revista Brasil Cristã. (E. L.)
25
Na mesma linha, Martino
26
, numa comparação entre a imprensa de
diferentes denominações religiosas, ressalta que nas Igrejas evangélicas há
maior concentração e referência de poder na figura de um pastor, que tem
afinal a investidura de triplo poder: intelectual, moral e de escolhido por
Deus. Guardadas as devidas diferenças, a liderança do Pe. Eduardo diante
da Associação do Senhor Jesus ocorre da mesma forma, não obstante
notarmos que, como presbítero e membro de uma congregação religiosa,
esteja sujeito à hierarquia milenar da Igreja Católica e da colegialidade
presbiterial também peculiar à Igreja do papa. O fato é que a referência do
Pe. Eduardo, inclusive no uso da sua imagem, está em todas as atividades
da Associação do Senhor Jesus.
Desde o início até hoje, o Pe. Eduardo lidera os trabalhos da
Associação do Senhor Jesus. Essa vinculação da sua imagem com a
24
Carta do leitor. Revista Brasil Cristão, n. 86.
25
Carta do leitor. Revista Brasil Cristão, n. 86
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
26
Luis Mauro Sá MARTINO. Fronteiras invisíveis: uma análise sobre os limites institucionais do
conhecimento a partir do discurso religioso, 2004.
92
instituição é planejada, considerando que ele é um entusiasta e defensor do
uso da metodologia convencional de marketing aplicado às práticas
católicas. Com o intuito de obter resultados, deve-se usar os meios mais
racionalizados possíveis. Assim, Pe. Eduardo torna-se um fiel e competente
administrador de um bem religioso. As preocupações com a estética do
marketing da Associação procuram aproximar a verdade econômica da
verdade religiosa, fazendo uma e outra se viabilizarem mutuamente,
conforme que Bourdieu explicita:
“A verdade da empresa religiosa é a de ter duas verdades: a
verdade econômica e a verdade religiosa, que a recusa. Logo, pra
descrever cada prática seria preciso utilizar duas palavras:
apostolado/marketing, fiéis/clientes, serviço sagrado/trabalho
assalariado, etc. O discurso religioso que acompanha a prática é
parte integrante da economia dos bens simbólicos”
27
4.3. Quais os canais da bênção? Novos canais tecnológicos e os fiéis
“A bênção de Deus mais perto de você”. Essa é a sugestão de um
folder de divulgação da TV Século 21 e o tema de uma edição da revista
Brasil Cristão. Nesse caso, onde a bênção está menos perto? Seria
contraditório dizer que no local de culto a bênção está mais distante e menos
acessível. Na forma tradicional, o fiel desloca-se do seu canto ao local
sagrado de culto ou celebração, como bem mostra as romarias tradicionais
no Brasil e no mundo, em que as pessoas se dirigem a um local de prodígios
religiosos, onde geralmente ocorreu uma aparição, uma revelação ou um
27
Pierre BOURDIEU. Razoes práticas, 1997.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
93
sinal qualquer que remeta à divindade. Ali é o lugar da bênção e do milagre,
também de êxtases e conversões.
O slogan “A bênção de Deus mais perto de você” parece sugerir que
com os canais tradicionais de interação há menos acessibilidade à bênção,
porque justamente exige um deslocamento, uma transposição de espaço e
conseqüentemente dispêndio de tempo e de recursos. Mas existe a tevê
para levar a benção ao fiel. A benção nesse caso, via os recursos tecnológicos
disponíveis à instituição, tem potencializada, de alguma forma, sua eficácia,
se assim não for, a sugestão é clara, está potencializada seu alcance.
Podemos nos referir mais uma vez aos termos cotidianização da
tecnologia
28
e paradigma tecnológico
29
, usados, respectivamente, por
Lyotard e Castells. É a tecnologia, agora principalmente a eletrônica,
promovendo adaptações das vivências tradicionais, como a religião.
A bênção, na linguagem religiosa católica aqui examinada, é uma
forma de alcançar um benefício de Deus, diretamente dele ou através de
outra entidade intermediária, um santo ou uma outra pessoa, com a
profissão da palavra e com o recurso dos ritos e dos símbolos e das
fórmulas.
A bênção é algo recorrente praticamente em toda celebração litúrgica,
possui normatização própria, em que, geralmente, o sacerdote a exerce em
nome de Deus e dos poderes que a Igreja lhe investe. Através da bênção,
pode-se alcançar prodígios e milagres. Nesse caso, a TV Século 21
28
Jean-François LYOTARD. A condição pós-moderna, 1998.
29
Manuel CASTELLS. A Sociedade em Rede, 1999.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
94
proclama-se propulsora dessa bênção através da televisão. Fica, mais uma
vez, fora do contexto do contato e do toque, da proximidade e da interação
imediata, o que nas celebrações carismáticas não chega a ser desprezados.
Mas aqui a bênção é mediada, da mesma forma como as considerações
sobre as formas de interações que já tecemos no segundo capítulo. Da
forma tradicional, exige-se deslocamento, agendamento, preparação do
espaço, adaptação da rotina quando for o caso. Aqui exige-se um meio
receptor e um local qualquer, acrescentado-se a isso, somente a fé de
telespectador. Portanto, como observa Sodré
30
, há uma convergência entre
o ser humano e a máquina, ou seja, o ser humano utiliza a máquina de
maneira a experimentar algo que antes exigiria necessariamente a presença
física. E essa experiência que acontece de forma deslocalizada é uma
experiência virtual.
Com a tevê, a bênção está sempre disponível, ao clique do botão, à
mercê do controle remoto. No número 83 da revista Brasil Cristão, de Abril
de 2005, esta característica é enfatizada com as seguintes frases em
páginas distintas da revista: “TV Século 21: Como sintonizar essa bênção?”
(capa) e “Como sintonizar a bênção em seu lar!” (p. 19). Entendemos que
essas frases têm efeito de marketing, de promoção e não abrangem o
entendimento teológico sobre o tema. No mesmo número da revista, os
articuladores tratam do mesmo tema, transitando numa forma mais
teologicamente elaborada, ainda que resumida, e outros que tentam uma
forma mais popular para fundamentar o tema da edição. A bênção,
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
30
Muniz SODRÉ. Antropologia do espelho: uma teoria da comunicação linear e em rede, 2002.
95
considerada como obra maravilhosa de Deus, que pode ser obtida por aquilo
que se professa, ganha as dimensões das ondas eletromagnéticas, ganha
acessibilidade através de sinais.
Para nós, as considerações são ilustrativas e confirmam a forma de
deslocalização do conteúdo simbólico, que ganha muito mais abrangência
com a utilização dos veículos de comunicação em massa. Há, portanto, uma
valorização do capital religioso, algo importante no contexto de pluralidade,
de diversidade de oferta de bens simbólicos. E a sugestão, estrategicamente
orientada, tem efeito no comportamento e na relação do fiel com o conteúdo
sacro em questão. Como no depoimento abaixo:
“Querido Pe. Eduardo, nos abençoe em Jesus Cristo. Não podia
deixar de dar meu testemunho, em louvo e agradecimento pela
infinita misericórdia de nosso bom Deus, que me concedeu duas
graças de cura.
No começo do ano de 2002, apareceu duas doenças em mim que
faziam sofrer muito. Tantas consultas, tantos medicamentos, ultra-
som e radiografias e os médicos nada descobriam. No meu
sofrimento, pensei: “quem vai me curar é Jesus”! Nos domingos,
no programa Louvemos o Senhor, na hora da adoração do
Santíssimo Sacramento, de joelhos, como de costume, eu
colocava uma mão sobre a tela da televisão e a outra sobre o
lugar onde eu tinha aquela horrível dor, pedindo com tanta fé, que
Jesus me curasse! Foi um grande milagre. Estou completamente
curada. Só tenho que agradecer muito ao nosso bom Deus e ao
senhor, Pe. Eduardo, por sua divina inspiração de ter feito existir
esta tão abençoada emissora que é TV Século 21 e este
maravilhoso programa Louvemos o Senhor, que tão bem faz a
todos que o assistem.”
31
31
Revista Brasil Cristão, n. 95, p. 13.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
96
Exemplos de cura numa oração diante da televisão, como aqui
indicadas, são comuns nas cartas enviadas à revista Brasil Cristão. O fiel
leitor da revista evidencia, por meio dos depoimentos, que consegue sentir,
e há muitos apelos para isso, uma proximidade real com sua religião, que
nada deve à presença física. Assim como nos casos relatados através de
cartas enviadas à revista Brasil Cristão, as entrevistas que realizamos
mostram de igual maneira essas características, conforme os depoimentos a
seguir:
“Eu recebi um telefonema da minha mãe do Paraná, que ela
estava nos caso de fazer uma cirurgia e exatamente naquele
momento estava passando o Santíssimo. Eu me ajoelhei e pedi
pra que Nosso Senhor Jesus Cristo ponhasse a mão sobre ela,
para que ela não precisasse fazer aquela cirurgia, e graça a Deus
que eu recebi outro telefonema dela, os médicos disse que ela
não vai precisar fazer a cirurgia. Foi num momento de fé, num
momento que eu me ajoelhei e pedi para Deus.”(N. T.)
32
“Eu já fui até curada. Eu andava em cadeira de roda, eu travei a
perna e andei em cadeira de roda. Fui curada assistindo à missa,
comungando, acompanhando como se estivesse na missa. Eu
não andava, né? Eu tava no chão,deitada no colchão no chão. Aí
eu levantei na hora da missa, catei a Bíblia pra mim ler, depois
acompanhei na hora da comunhão, comunguei espiritualmente.
Quando saí dali saí andando.” (J. )
33
Os comentários anteriores mostram dois exemplos de cura em que a
mediação entre o fiel e o evento proporcionador do prodígio é mediado pela
televisão. Não obstante, termos presentes elementos comuns de devoção, a
32
Entrevista realizada em 08/05/2005.
33
Entrevista realizada em 15/05/2005.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
97
oração, os gestos, colocar a mão, ajoelhar-se, a leitura da Bíblia, ficando
claro o caráter prático da ação, o meio facilitador é uma forma de
acessibilidade ao sagrado diferenciada, já que dispensou o deslocamento
físico a um outro território.
Nos artigos e depoimentos a revista Brasil Cristão, um dos veículos
de comunicação da Associação do Senhor Jesus, há sempre, nos números
examinados, um direcionamento editorial no sentido de valorizar os recursos
da comunicação, principalmente da TV Século 21, usados pela própria
Associação. A análise detalhada dos artigos e dos depoimentos que
realizamos mostrou que o conteúdo proposto procura apresentar essa
mensagem, ressaltando a importância da escolha e os resultados até então
alcançados, sempre tendo em vista a promoção do evangelho e a
valorização e crescimento da Igreja Católica. Parte do conteúdo da revista
Brasil Cristão é disponibilizado no site da Associação do Senhor Jesus, um
artigo por edição.
É possível adquirir a revista através da compra de números avulsos e
também por meio de assinaturas. Nesse sentido, a revista conta com uma
rede de sócio-representantes. Em toda edição, há uma seção que publica
trechos de cartas desses sócios
34
. Também está sempre anexo um
formulário de adesão a sócio da Associação, o que implica uma
periodicidade de oferta em dinheiro. Nessa ficha consta a seguinte sugestão:
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
34
É possível, através de um cadastro, tornar-se sócio representante da Associação do Senhor Jesus.
O sócio-representante se compromete, informalmente, a divulgar a revista e conseguir novos sócios,
que também contribuirão em dinheiro com a Associação.
98
“Use estas DUAS FICHAS para conseguir DOIS NOVOS SÓCIOS fiéis e
generosos como você!”. Essas considerações importam porque se trata da
forma de parte do financiamento de parte dos custos de todo aparato usado
pela Associação do Senhor Jesus, principalmente a TV Século 21, que afinal
são modernos e caros.
Mais uma vez é usado o nome do Pe. Eduardo no estímulo aos
sócios. Na carta resposta que o fiel deverá remeter está impressa os
seguintes dizeres: “Pe. Eduardo, conte comigo para continuar anunciando
Jesus! Também é oferecido o benefício de 100 missas para o fiel
contribuinte:” Pe. Eduardo, escrevo aqui as minhas intenções para que
sejam colocadas no altar durante 100 missas.”
4.4. Recursos tradicionais e novas formas de interação
Como observamos anteriormente, a forma tradicional de interação
face a face possibilita uma troca de signos de comunicação instantânea e
imediata, numa proximidade física e numa sincronia de tempo e espaço. A
possibilidade oferecida por empreendimentos como a TV Século 21
revoluciona essa prática no campo religioso.
A mensagem religiosa atinge o fiel que possui o recurso técnico para
recepção, a qualquer momento, de acordo com a sua disponibilidade.
A TV Século 21 tem atualmente 24 horas de programação, entre
programas gravados e outros exibidos ao vivo. A programação ao vivo,
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
99
por exemplo, proporciona interação entre o fiel-telespectador e o
programa e isso ocorre por meio de carta escrita, telefone ou Internet.
Normalmente trata-se de pedidos de oração e relatos de bênçãos, curas e
milagres, estas formas de interação são valorizadas pelos apresentadores
dos programas que continuamente incentivam o uso. Por exemplo, no
programa Louvemos o Senhor, exibido ao vivo em 08/05/2005, Pe. Eduardo,
lendo as mensagens recebidas por e-mail, pede uma bênção especial aos
internautas, ressaltando a internet como veículo de comunicação importante
para Igreja.
A utilização dos recursos técnicos torna possível o incremento do
marketing religioso. Trata- se de uma investida da instituição em sua própria
promoção, de uma forma pragmática, seguindo a lógica e os métodos
tradicionais de anúncio e venda de produtos
35
.
Estabelece-se, então, um caráter empresarial na gestão do sagrado,
utilizando as conceituações correspondentes, ou seja, há cliente, produto,
oferta e demanda, por isso torna-se importante a devida exploração dos
meios, justamente para se anunciar, quando se verifica, no campo das
ofertas religiosas, maior pluralidade, conforme diz Berger, um sistema de
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
35
Em 2007 acontece em São Paulo a 5ª. Edição da Expocatólica - Feira Internacional de Produtos e
Serviços para Igrejas, Livrarias e Lojas de Artigos Religiosos. Trata-se de uma feira de negócios
ligados a produtos e serviços católicos, com edição anual desde 2003. Segundo Fábio Castro, um dos
organizadores do evento, o objetivo da feira é otimizar os negócios ligados a produtos e serviços
religiosos, ou seja, que haja uma melhoria no mercado religioso. O evento conta com o apoio das
maiores livrarias e mídias católicas do Brasil, bem como da CNBB. Cf. http://www.expocatolica.com.br/
expocatolica/index1.asp?cod=62&tp=1
100
competição
36
. A importância da utilização do marketing pela religião é
endossada pelo Pe. Eduardo Dougherty neste depoimento:
“Acredito que a Igreja Católica precisa encantar seus clientes.
Utilizando um termo de marketing, temos o melhor produto
possível, que é grátis; uma rede mundial de distribuição bastante
ampla, mas ainda temos que fazer muito barulho. O nosso produto
tem que ser uma experiência de Deus.”
37
A passagem de uma situação de monopólio da religião para uma
situação pluralista retira a possibilidade de uma tradição religiosa se impor,
seja por qual meio for, de acordo com as características desse momento
novo da história, como discorremos no capítulo 2, ao chamar a atenção
sobre as questões da secularização. Dessa forma dependerá da adesão e
de escolha do fiel, é o momento em que a religião é colocada no mercado
38
.
Essa preocupação é demonstrada, por exemplo, no trabalho de Kater Filho,
fundador do Instituto Brasileiro de Marketing Católico – IBMC
39
. Importa-nos
as considerações desse autor porque ele foi um dos promotores e
organizadores do sistema de sócios da Associação do Senhor Jesus, um
membro importante e muitas vezes porta-voz da instituição, como
esclareceremos melhor a seguir.
36
Peter BEGER. O Dossel Sagrado: Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985.
37
Eduardo DOUGHERTY apud Brenda CARRANZA. Renovação carismática católica: origem,
mudança e tendência, 2000, p. 251.
38
Idem, ibidem, p. 149.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
39
O IBMC – Instituto Brasileiro de Marketing Católico foi fundado por Antônio Miguel Kater Filho,
católico e membro da Renovação Carismática. A importância institucional dessa entidade se atesta no
fato de ser hoje presidida pelo arcebispo de Florianópolis, D. Murilo Sebastião Krieger.
101
Segundo Kater, produto “pode ser apenas uma sensação de
satisfação da necessidade através de uma resposta que pode ser percebida
pelo conforto, pelo prazer, enfim por uma realização abstrata
40
.” Kater,
quando escreve um livro sobre o marketing aplicado à igreja católica, tem
como título em um dos capítulos A Associação do Senhor Jesus e o
Marketing. O autor relata como, em 1983, recebe o convite para fazer parte
da equipe responsável pelo programa Anunciamos Jesus e a partir daí
aplicar seus conhecimentos profissionais na instituição, com resultados,
segundo ele, muito positivos em pouco tempo
41
. Sobre esses resultados
Kater escreve:
“Iniciando com técnicas eficazes de mala direta dirigida aos
católicos, conseguimos resultados imediatos. O número de sócios
aumentava mês a mês, atingindo rapidamente a casa dos vinte mil
sócios, o que permitiu a compra dos primeiros equipamentos para
gravação”.
“Paralelamente mantivemos contato com os Estados Unidos,
conseguindo, por intermédio do Pe. Eduardo, a doação de
algumas câmeras que não estavam sendo utilizadas por um
estúdio de tevê católico na cidade de Dallas, Texas. Colocaram
ainda gratuitamente à nossa disposição um estágio em seu
moderno centro católico de evangelização pela tevê.”
42
Segundo o depoimento de Kater, citado anteriormente, o aumento
expressivo do número de sócio-colaboradores deveu-se a um planejamento
que se revelou eficiente. Vale notar que o esquema de sócio-colaboradores
40
Antonio Miguel KATER Filho. O marketing aplicado à Igreja Católica, 1995, p. 22.
41
Idem, ibidem, p. 66.
42
Idem, ibidem, p. 66.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
102
não foi uma novidade da Associação do Senhor Jesus, por exemplo, essa
prática já era usada na Rádio Aparecida, desde a sua origem, com o Clube
dos Sócios
43
. Isso foi importante por se tornar valiosa fonte de captação de
recursos para financiamento dos empreendimentos da Associação do
senhor Jesus.
A preocupação com o marketing católico proposto por Kater
repercute na mídia, pois parece uma idéia bastante peculiar, quando a
religião está associada a práticas antiquadas. Assim é preciso apelar pelo
moderno, confortável, prático e agradável, além de se preocupar com a
imagem, com a segurança, em suma, com o serviço que se está prestando.
Dessa forma, antiquado é tudo que não corresponde a esses termos.
Essa linguagem do marketing, referindo-se à religião, é usada de
maneira natural por Kater, sem constrangimento algum, revelando com isso
uma tendência mais ampla que transpõe os limites clericais, numa
concepção mais prática do que transcendente.
Essa estratégia de marketing usada pela religião, neste e em outros
casos, é o que faz surgir o termo marketing religioso
44
. O marketing passa
por estratégias de ações que devem produzir a aceitação de determinado
produto. Isso passa por cultos com formatos novos, a criação de
celebridades e outros eventos de mídia. Essa é uma prática tipicamente
43
Ralph DELLA CAVA. E o verbo se faz imagem: Igreja Católica e meios de comunicação no Brasil,
1991, p. 228.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
44
Brenda CARRANZA. Renovação Carismática Católica: origem, mudança e tendência, 2000 e
Miguel A. F. KATER. O marketing aplicado à Igreja Católica, 1995.
103
empresarial, tendo definição clara do seu cliente e do seu produto, cunhando
uma linguagem midiática nova. Por esses meios se aperfeiçoa a capacidade
de divulgação dos ritos e símbolos religiosos
45
, lembrando que, desde sua
origem, quando ainda não possuía um canal próprio de televisão, a
Associação do Senhor Jesus já produzia audiovisuais com temas religiosos.
A possibilidade da exploração do produto religioso é tanta que já é
comum encontrarmos em cursos, palestras, workshops, cujo tema é
marketing, um subitem denominado marketing religioso. Isso sugere que o
mercado religioso é uma especificidade que está se profissionalizando e
abrangendo um público cada vez maior.
O marketing religioso é, dessa forma, a maneira de se colocar a
religião no mercado, atendendo a exigência de que, diante da diversidade de
ofertas religiosas, será preciso atender a desejos segmentados. A situação
pluralista, destarte, não permite que um monopólio religioso submeta uma
população de maneira absoluta, ou seja, que ela satisfaça e dê conta de
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
45
O cinema é um importante instrumento de veiculação das formas simbólicas, dado o seu alcance e
técnica. Segundo Paula Monteiro, em E o verbo se faz imagem: A igreja Católica e os meios de
comunicação no Brasil-1962-1989, a primeira incursão bem-sucedida da Igreja Católica no cinema se
deu em 1987, com o filme Pé na Caminhada, também primeiro longa-metragem latino-americano da
Igreja, sendo produzido pela produtora Verbo Divino, que tem vínculo institucional com a Igreja
Católica. Com roteiro assinado por Dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia, o filme foi
premiado em 1986, no III Festival Internacional de Cinema de Mannheim. Em 2003, é lançado em
circuito comercial o filme Maria, Mãe do Filho de Deus. Embora não seja de uma produtora católica,
esse filme tem como grande estrela o Pe. Marcelo Rossi e serve como investida no campo da
comunicação, com tendência confessional e proselitista. Maria, Mãe do Filho Deus é uma produção da
Columbia Pictures e Globo Filmes, com orçamento de 6,8 milhões de reais. Reflete, segundo o Pe.
Marcelo Rossi, em entrevista ao Programa do Jô, da Rede Globo, exibido em 18/10/2003, uma
preocupação da Igreja Católica em ocupar todos os meios disponíveis no seu trabalho de
evangelização. O padre ressaltou na entrevista o fato de estar usando no filme, onde ele próprio é um
ator, os mesmos recursos técnicos do cineasta americano George Lucas.
104
todos os apelos, ao contrário, exige uma estratégia, um método racional com
objetivos programados. Sobre isso, Berger nos coloca ainda:
“Resulta daí que a tradição religiosa, que antigamente podia ser
imposta pela autoridade, agora tem que ser coloca no mercado.
Nela, as instituições religiosas tornam-se agências de mercado e
as tradições religiosas tornam-se comodidades de consumo. E, de
qualquer forma, grande parte da atividade religiosa nessa situação
vem a ser dominada pela lógica da economia de mercado”
46
Em casos assim onde existe uma situação de pluralidade e diversas
opções de escolhas e acessos de maneira muito mais aceitas hoje do que
há anos atrás, as tradições entram em concorrência por espaços e por
clientes. A solução encontrada para sobrevivência passa pela criatividade e
capacidade de adaptação. No dizer de Berger, conforme a citação anterior,
as tradições tornam-se comodidades de consumo e as instituições, agências
de mercado. Então a gestão do empreendimento religioso lança mão dos
métodos e das adaptações comuns de outros segmentos. O produto é
atrativo e eficiente, pois, sendo diferente, não seduz. Dessa forma, investe-
se, além da elaboração de uma mensagem, da vinculação de um conteúdo,
também na forma e num sofisticado sistema de transmissão em rede,
neste caso, explorando os potenciais da tevê e da internet. E ainda de
acordo com Berger, surgem duas alternativas para as religiões, que ele
chama weberianamente de idéias típicas:
“Elas podem ou acomodar-se à situação, fazer jogo pluralista da
livre empresa religiosa e resolver da melhor maneira possível o
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
46
Peter BERGER. Dossel Sagrado: Elementos para uma teoria sociológica da religião, 1985, p 149.
105
problema da plausibilidade modificando seu produto de acordo
com a demanda do consumidor; ou recusar-se a se acomodar,
entricheirar-se atrás de quaisquer estrutura socioreligiosa que
possam manter ou construir e continuar a professar as velhas
objetividades tanto quando possível, como se nada tivesse
acontecido”
47
Nota-se o contraponto entre as formas tradicionais e as novas formas
de interação. O uso da tecnologia eletrônica é uma maneira de, na
concepção de Berger, não defender a religião, mas adaptá-la, por exigência,
a uma demanda. Daí o uso da estratégia, do mercado e da gestão
racionalizada. Esse processo pode ocorrer por graus, ou seja, pode-se levar
essa lógica às últimas conseqüências, como fazem algumas denominações,
relativizando ou não, assumindo uma orientação dogmática ou fazendo
concessões necessárias, mas tendo ainda o recurso da força da tradição e
de uma doutrina mais exigente.
4.5. A programação e a percepção do fiel receptor
A audiência da TV Século 21, conforme veremos, ajuda a solidificar
ainda mais a sua representação e sua inculcação no fiel-telespectador. Sua
prática, de certa forma, está voltada para isso, como observamos nas
técnicas de produção utilizadas e por possuir programação 24 horas. Mesmo
sendo a Associação do Senhor Jesus uma experiência de religiosidade
47
Idem, ibidem, p. 164.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
106
dentro do universo maior da Igreja Católica, é possível atribuir nessa prática
a constituição daquilo que Bourdieu
48
chamou de habitus religioso. Nos
vários eventos de mídia, com maior ou menor força, há uma mobilização
eficiente de força simbólica e material capazes de produzir satisfação no que
diz respeito aos interesses religiosos do fiel.
A TV Século 21 exibe aos domingos, com transmissão ao vivo por
quase cinco horas, o programa Louvemos ao Senhor. Trata-se de um
programa de auditório, com variedades, sempre ligadas à Igreja Católica,
realizado em amplo estúdio, no Centro de Produções Século 21, em
Valinhos-SP. Para realizarmos entrevistas com fiéis, utilizamos dois dos
cinco domingos de acompanhamento às atividades desse centro.
Percebemos uma platéia heterogênea e não foi possível perceber se
havia um grupo em maioria, de acordo com a faixa etária ou qualquer outra
distinção. Jovens, adultos e idosos festivamente se misturavam.
A programação de domingo é faixa nobre da TV Século 21 e o
programa Louvemos o Senhor é, segundo o jornalista Cássio Abreu
49
, um
dos maiores programas católicos do mundo em tempo de exibição, pois sua
duração é das 9h às 17h ao vivo. Vale a pena ressaltar que o domingo é um
dia importante para a religiosidade católica, dessa forma o programa
Louvemos o Senhor tem forte apelo de audiência, porque se liga a uma
tradição de espiritualidade.
48
Pierre BOURDIEU. A economia das trocas simbólicas, 1992.
49
Revista Brasil Cristão, n. 54, p. 15.
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
107
O programa Louvemos o Senhor é versátil e não possui um
apresentador fixo, revezando-se entre figuras ligadas à Renovação
Carismáticas, padres ou leigos. Nesse programa de domingo, há duas
palestras, uma de manhã e outra à tarde; orações atendendo os pedidos que
chegam por telefone ou por e-mail, e isso mostra o nível de interatividade do
programa; reportagens ligadas a temas religiosos; momento de bênção do
Santíssimo Sacramento e uma missa que encerra o programa. Segundo
Cássio Abreu
50
, durante esse programa dominical, atende-se em média
cerca de 200 ligações por minuto, as quais são vindas de todo Brasil.
Notamos, durante a permanência no centro de produção, que, anexo
ao estúdio, há uma razoável infra-estrutura para a platéia visitante, que inclui
amplo estacionamento para carros e ônibus, já que recebe excursões,
lanchonete, fornecimento de refeições com preços populares e uma área de
convivência com mesas, cadeiras e um pequeno mercado de produtos
religiosos.
Todas as pessoas entrevistadas afirmaram serem assíduos
telespectadores da TV Século 21 nos vários programas exibidos. O fiel
telespectador, internauta ou ouvinte de rádio, encontra nos respectivos veículos
uma nova forma de relação com o sagrado. Segundo todos os entrevistados, o
aparelho disponível em sua casa proporciona-lhe comodidade, ao mesmo
tempo em que lhe oferece um fascínio diferente. Nas entrevistas colhidas para
50
Em entrevista por e-mail.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
108
esse trabalho um aspecto sempre esteve presente, um misto de deslumbre e
fascínio, como no exemplo:
Olha, eu acho que a evangelização por televisão, rádio, internet,
foi algo assim surpreendente., maravilhoso. Um meio de trazer os
cristãos para mais próximos da Igreja, a Casa do Senhor. Eu acho
assim, quando uma pessoa não pode se locomover, então ela fica
assistindo à televisão, e graças a Deus nós temos três hoje
católica, né? Então nós rezamos pela televisão, assistimos missa
pela televisão, a consagração, a bênção do Santíssimo Sacramento,
recebemos a Eucaristia também, espiritualmente, que é válido, eu
creio que é válido porque a gente tendo fé tudo é válido. Eu acho
assim, a comunicação, evangelização por meio de comunicação,
televisão, internet, rádio, foi algo assim surpreendente mesmo de uns
anos pra cá, né? Trouxe mais cristãos”
51
(N.)
Paradoxalmente à concepção clássica, em que o fascínio do sagrado
se ampara no distanciamento do fiel do conteúdo sacro, com a televisão, por
exemplo, de alguma forma, esse conteúdo parece estar mais acessível e
manipulável. “É uma bênção!” Essa é uma exclamação comum dos
entrevistados e dos leitores da revista Brasil Cristão. E essa bênção está
nessa proximidade dos ritos, que via tevê, ganha tratamento de espetáculo,
com a linguagem própria da televisão, explorando todo seu alcance possível.
Percebemos que, no geral, pelos depoimentos dos nossos
entrevistados, os telespectadores mais assíduos da TV Século 21, que
também são telespectadores da TV Canção Nova e Rede Vida, têm um
senso de pertença muito forte à Igreja Católica e estão afinados com o
51
Entrevista realizada em 08/05/2005.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
109
discurso mais oficial e tradicional da Igreja. Embora a maioria participe da
comunidade local, também considera que ao assistir à missa pela televisão
está com o dever católico cumprido.
Outro item de destaque nas entrevistas é a defesa da fé e a importância
da tevê na conquista de fiéis. Nesse caso, a TV Século 21 cumpre um papel
pedagógico doutrinário importante, pois, embora com os recursos do culto na
forma de espetáculo, própria da forma do Movimento Carismático, está adaptada
à doutrina oficial, não se arriscando muito em novas interpretações e
preponderando para as questões internas da Igreja. Como observa Martino
52
, a
mídia institucional, cumpre de fato esse papel de instrumento de difusão de
doutrina religiosa. Essa questão é ressaltada tanto na programação da TV
Século 21, quanto através de outros meios como, por exemplo, a publicação
da revista Brasil Cristão, conforme o colocado no seguinte artigo:
“Nós católicos temos duas fontes riquíssimas para nossa
formação. Duas leituras obrigatórias: o Catecismo da Igreja
Católica e a Palavra de Deus, a Bíblia, onde está baseado o
Catecismo, toda a Doutrina da Igreja. A esse estudo não deve ser
apenas uma leitura breve. Deve ser um exercício constante,
diário, trazendo o conteúdo da leitura para o nosso dia-a-dia.
Assim, seremos coerentes com nossa fé. Conseqüentemente
nossa vida comunitária será mais rica e dará mais frutos.”
53
Isso é bem absorvido por alguns fieis e, mesmo com a experiência da
deslocalização que é proporcionada pelo meio técnico, nutre o senso de
52
Luís Mauro Sá MARTINO. Mídia e poder simbólico, 2003.
53
Revista Brasil Cristão, n. 90, p. 31.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
110
pertença, como fica demonstrado nas cartas envidas à revista Brasil Cristão,
bem como nas entrevistas que nós coletamos:
“É importante a televisão pra mim porque ela vai evangelizando as
pessoas, né? Conforme ela vai evangelizando as pessoas, as
pessoas vão evangelizando outras pessoas. Aqui no Brasil as
pessoas vão sendo evangelizadas. As pessoas sendo
evangelizadas cabe a elas passar para outras pessoas e assim
vai crescendo o número de cristãos na Igreja.”
54
(C.)
Nesse depoimento, o fiel assume para si o discurso da Igreja, o fato
de um apelo da mídia eletrônica apontar a possibilidade de multiplicação de
novos anunciadores sugere-nos também a concepção dessa funcionalidade,
praticidade, eficiência que sempre quer ser a marca, o referencial de
importância do uso da tecnologia. O fiel não tem a percepção da
possibilidade de outras mudanças, no que diz respeito, por exemplo, à sua
relação com o culto e à qualidade de sua pertença. Sua forma de compreensão
indica que ele passa por um processo de subjetivação
55
dessa experiência.
4.6. A percepção da instituição pelos seus intelectuais
Por que pensar sobre os intelectuais da Associação do Senhor Jesus
e da TV Século 21? Os dados coletados mostraram que eles constituem
liderança, além de atuarem na linha da produção, na elaboração do
discurso, na finalização do produto televisivo, do conteúdo vinculado na
54
Entrevista realizada em 15/05/2005.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
55
Sobre o processo dialético de apreensão da realidade: exteriorização, objetivação e interiorização,
conferir Peter BERGER, em Rumor de anjos. A sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural,
1988.
111
revista Brasil Cristão e na internet. São eles, portanto, que estabelecem o
teor da mensagem, da qual o receptor interativo acabará atuando como
multiplicador.
A Associação do Senhor Jesus, no seu trabalho de comunicação,
possui um corpo técnico qualificado, com profissionais de diversas áreas:
além do pessoal da área técnica mais operacional, conta ainda com adesão
de outros colaboradores, sobretudo os jornalistas, apresentadores e demais
articulistas, responsáveis por textos e roteiros. A adesão desses colaboradores é
mais do que profissional, é afetiva e confessional, ou seja, são membros
convictos da Renovação Carismática, sendo que alguns deles são padres e
outros religiosos. Dessa forma o caráter confessional está aliado a uma
postura profissional, que não abre mão, portanto, da qualidade e eficiência.
A falta de perspectiva profissional no trabalho de comunicação da
Igreja Católica foi antes criticada por Kater, uma vez que ele é um fiel da
Igreja Católica e adepto ao Movimento Carismático. Para Kater,
empreendimentos como a Associação do Senhor Jesus são caminhos novos
que, sob orientação pragmática, procuram os melhores meios para se
chegar aos fins. Dessa maneira, objetiva-se considerar um conteúdo
adequado na melhor forma técnica pautada na eficiência.
Procura-se construir uma identidade religiosa com base em textos
com argumentos pastorais e teológicos, tendo em vista promover a auto-
legitimação, sempre numa perspectiva de alinhamento com da doutrina
oficial da Igreja. Esse corpo de intelectuais, jornalistas, teólogos, etc.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
112
reafirmam sempre a importância do uso dos meios técnicos na promoção da
evangelização. Eles estão prontos para citar os documentos oficiais e
valorizar os resultados da obra que representam. Há, portanto, na
Associação do Senhor Jesus, um corpo de intelectuais, no entanto pouco
reconhecidos fora do âmbito da Renovação Carismática e, por vezes,
enfrentando divergências em outras tendências da Igreja.
É bastante ilustrativo para nosso trabalho o depoimento que Cássio
Abreu, jornalista que escreve regularmente na revista Brasil Cristão,
forneceu-nos, em entrevista por e-mail, a respeito da experiência da
Associação do Senhor Jesus e TV Século 21. Para compreensão do
engajamento do profissional, transcrevemos, ainda que longa, a entrevista
na íntegra:
“Não há dúvidas de que os meios de comunicação de massa
utilizados pela Igreja nos dias de hoje para evangelizar são de
fundamental importância. Como levar o Evangelho aos lugares
mais distantes de nosso país? Como levar não só o Evangelho,
mas também, educação e formação sólida, orientações pastorais,
familiares; os frutos da Pastoral da Criança, por exemplo, a países
do Terceiro Mundo? Existem no mundo, atualmente, cerca de 410
mil sacerdotes; 30 mil diáconos permanentes; 55 mil religiosos e
religiosas; 140 mil seminaristas e 145 mil missionários leigos e
catequistas. Esses números são pequenos para uma população
de 6 bilhões de habitantes, sendo mais de 1 bilhão de católicos.
Assim, os meios de comunicação tornaram-se a maneira mais
prática, rápida e eficiente para que a Igreja possa chegar ao
coração
de toda humanidade” (Fonte: Agenzia Fides –
www.pime.org.br).
56
56
Enviado por Cássio Abreu por e-mail em 20/01/2005.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
113
A análise de Abreu, nesse caso, revela um certo pragmatismo quando
se trata de avaliar a importância dos meios de comunicação de massa, pois
deixa claro a forma eficiente da comunicação para propagação da
mensagem católica. Se o número de agentes que se comprometem
efetivamente nos trabalhos de comunicação é insuficiente para alcançar a
grande dimensão da população mundial, os meios técnicos tornam-se uma
forma de suprir essa carência. É importante observar que temos aqui mais
uma indicação de estratégia institucional, racionalizada, que se alia ao
conteúdo de fé. Seria diferente se a consideração partisse simplesmente de
um profissional contratado a serviço da instituição, que possivelmente
abordaria o tema de maneira mais técnica e menos parcial. É um
depoimento de um intelectual engajado que apresenta junto com suas
justificativas práticas o conteúdo confessional. É ainda Cássio Abreu que
reafirma suas posições ao acrescentar:
“Se Jesus viesse ao mundo hoje, não usaria esses meios? E,
quanto às pessoas doentes, acamadas, hospitalizadas, sem
condição de freqüentar as Igrejas, as Missas, grupos de estudo e
formação, etc? Em muitos lugares a única maneira dessas
pessoas participarem de uma cerimônia espiritual é através dos
meios de comunicação. Hoje, graças a Deus, podemos participar,
não por completo por razoes óbvias, de uma Missa celebrada pelo
Santo Padre, em Roma; podemos assistir e ouvir, ao vivo, Missas
de canonização; podemos receber a bênção do Papa, de um
sacerdote ou a bênção do Santíssimo; e por aí vai.”
57
57
Enviado por Cássio Abreu por e-mail em 20/01/2005.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
114
Essa parte do depoimento de Abreu ilustra a análise que já
esboçamos nesse trabalho, ao darmos destaque à relação do emprego de
novas tecnologias e as possibilidades de desterritorializaçao da experiência
religiosa. Abreu recorre e aponta como vantagem a possibilidade de uma
bênção papal via satélite, ou seja, pela televisão. Ele deixa um adendo de
que a participação da cerimônia espiritual via televisão não se dá por
completo. E, de fato, uma elaboração mais sistemática de um referencial
ético-litúrgico-teológico dos ritos televisionados não é uma realidade para
Igreja Católica, talvez por isso a prudência do entrevistado.
“As pessoas estão sedentas de Deus, de espiritualidade, de
conhecimento espiritual; estão atrás de respostas para seus
problemas e aflições. Dado que o número de padres ou de
pessoas capacitadas para ouvir, acolher, orientar, rezar e
encaminhar essas pessoas é muito pequeno, os meios de
comunicação estão preenchendo essa lacuna de maneira
surpreendente. As pessoas querem ouvir, ouvir, e ouvir sobre
Deus e a salvação! A Igreja tem que acompanhar a evolução
tecnológica. Afinal, o Evangelho se espalhou pelo mundo porque
os primeiros cristãos, com destaque para São Paulo, não ficaram
fechados em seu mundo. Quanto às experiências alcançadas,
posso falar somente da Associação do Senhor Jesus e TV Século
21. Nós recebemos diariamente uma média de mil cartas de
pessoas que nos escrevem de todo o país pedindo orações e
orientações. Nos programas ao vivo da TV Século 21 recebemos,
em média, 200 ligações atendidas por hora. O número de pessoas
que alcançam graças é impossível de se medido. Não temos
como medir o alcance e a abrangência de tudo o que é falado,
ensinado, rezado, compartilhado pelos meios de comunicação. O
número de pessoas que são curadas fisicamente, que deixam
vícios como a bebida e as drogas, que mudam de vida, que se
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
115
perdoam; de casais,de pais e filhos que se reconciliam é muito
grande. Nossas cartas comprovam tudo isso.”
58
A afirmação de que a Igreja tem de acompanhar a evolução
tecnológica é bem ilustrativa para nós. Não se trata, nesse caso, de uma
afirmação oficial, nem mesmo da afirmação de um membro do clero. No
entanto aponta toda a perspectiva da Associação do Senhor Jesus e de
outros movimentos da Igreja Católica de estabelecer uma linguagem nova.
Durante a exibição de um programa, segundo o depoimento, são duzentas
ligações atendidas por hora. Pode parecer um número pequeno, se
compararmos ao universo televisivo das grandes corporações, mas o
exemplo em questão diz respeito a uma televisão fora do circuito comercial
tradicional, portanto de alcance inferior. Sendo assim, ressalta-nos um tipo
de interação que passa por uma mediação tecnológica e o depoente fala-nos da
impossibilidade de medição das graças quando afirma: “O número de pessoas
que alcançam graças é impossível de se medido”. Além de outros “resultados”
que implicam a mudança de comportamento individual, o abandono de vícios, a
resolução de conflitos familiares e outras variedades de conflitos.
58
Enviado por Cássio Abreu por e-mail em 20/01/2005.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
116
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O
aparato técnico é uma maneira importante de divulgação
das formas simbólicas quando usado nos meios de
comunicação e de informação. Dessa forma, a religião
apropria-se desses recursos, percebendo sua importância. Não é uma
tendência necessariamente nova, pois se trata de um processo antigo, se
considerarmos que a Igreja Católica foi uma das pioneiras no uso da
imprensa. Daí em diante, ela passa a fazer uso de todos os meios e hoje se
mostra devidamente atualizada e adaptada em relação ao uso das
tecnologias modernas. Embora não seja de maneira universal e aquém do
que poderia ser em termos potencial, essa é uma ressalva comumente feita
pelos analistas que se ocupam com o tema, o fato é que os diversos usos,
desde as transmissões ao vivo pela televisão, passando pelo uso do rádio e
da internet tem sido incrementado.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
117
Assim, a religião estabelece novas formas de interatividade ou de
interação entre os fiéis, promovendo as devidas adaptações institucionais,
seja em aspectos práticos de aquisições materiais e de infra-estrutura, seja
numa reelaboração do discurso ou numa busca de auto-legitimação,
autopromoção e práticas de proselitismo, ou seja, é preciso anunciar a
urgência dos novos tempos e angariar reforços na empreitada técnico-
modernizante para o bem daquilo que, no caso do cristianismo, se chama
anúncio ou evangelização.
Falando-se em esquemas de legitimação dessas novas práticas e
ainda considerando as religiões cristãs, tanto na católica como nas
protestantes, surgem os documentos oficiais, as fundamentações no livro
sagrado, a Bíblia, bem como os líderes-arautos, proféticos e carismáticos,
representantes dos novos tempos e outros líderes gestores e promotores de
grandes empreendimentos religiosos, sempre com perspectivas ambiciosas
de crescimento
1
.
Nesse sentido é que verificamos a importância do uso da técnica e
seus desdobramentos, sobretudo o uso das tecnologias da informação e
comunicação, que inclui a possibilidade de interatividade remota, primeiro
com o uso do rádio e depois, qualitativamente mais importante, com o uso
da televisão, mas que passa também por outras modernidades tecnológicas
possíveis que estejam ao seu alcance.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
1
Em qualquer um desses casos, reportamo-nos ao conceito de ajornamente ou rendição cognitiva
proposto por Peter BERGER em Rumor de anjos. A sociedade moderna e a redescoberta do
sobrenatural, 1997. Como analisa Berger, são considerações táticas, estratégicas, para adaptar a
instituição ao perfil de uma demanda religiosa.
118
Trata-se de recursos novos, comparados à história da Igreja, que
estabelecem importantes mudanças. Esse processo está no bojo do advento
da comunicação e informação de massa
2
, em todos os aspectos da vida das
pessoas. A mídia, que dá impressão de ser uma instituição onipresente,
coloca-se cada vez mais acessível, ainda que não atinja o universo da
população, com proporções diferentes, conforme o país. A recepção de som
e imagem nos são disponibilizadas através de ondas de rádio, de cabo, de
fibras óticas e outros meios, com a possibilidade de armazenamento em
quantidades cada vez maiores, agora também por meios cada vez mais
compactos.
Essas considerações são importantes porque é fato e cresce, cada
vez mais, a possibilidade da interatividade, simultaneidade, instanteneidade,
reprodutibilidade e do exercício de operações remotas, wireless, tudo isso
através de meios tecnológicos. Quando se adapta a tudo isso parece, enfim,
uma banalidade, mas na verdade o indivíduo não percebe a revolução
constante que ocorre em sua vida.
A comunicação em larga escala por rádio inicia-se nos anos de 1920,
nos Estados Unidos
3
. No entanto, Carvalho
4
nos ressalta que foi justamente
2
Thompson (1995) considera o surgimento da imprensa comercial como o início da era dos meios de
comunicação de massa, no século 15. Embora as técnicas de impressão tenham sido desenvolvidas
originalmente na china, próximo ao século VIII, é com sua difusão na Europa, já na segunda metade
do século XV, que o autor considera como a aurora da era de comunicação de massa. Esse período
coincide com o início das primeiras formas de produção capitalista e do estado-nação.
3
John B. THOMPSON. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de
comunicação de massa, 1995, p. 242.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
4
José Jorge de CARVALHO. Religião, mídia e os predicamentos da convivência pluralista: uma
análise do evangelismo transnacional norte-americano, 1998..
119
um padre chamado Charles Coughlin a primeira grande estrela desse
veículo, já em 1930. Segundo Carvalho, “o rádio e a televisão promoveram
uma mudança qualitativa em relação à capacidade do livro de globalizar
idéias”. Naturalmente, a dimensão de uso desse meio pela religião, ainda
que importante, é incipiente neste primeiro momento.
O advento da internet é outro fator novo e importante que possui,
tratando-se de interação, mais versatilidade, pois, além de instrumento de
divulgação, é instrumento de comunicação e de interatividade. Numa só
mídia é possível disponibilizar várias outras, como a imagem da tevê e o
som do rádio, além do conteúdo, por exemplo, de publicações impressas. A
internet não é ainda um veículo de acesso tão abrangente, no entanto já é
grande sua importância em nível de acessibilidade, principalmente em
determinado segmento da população.
Ela se apresenta como elemento de reprodução do mundo em todos
os sentidos, com o incremento constante de recursos de imitação do real, ou
seja, recursos de virtualidade. Isso provoca no usuário mais assíduo, além
de uma transformação subjetiva, estabelecendo valores novos, uma
mudança objetiva, em termos práticos, como a forma de consumo, pois a
aquisição de produtos é muito fácil além de outras formas de sociabilidade.
E assim consideramos, conforme interpretações de autores como
Thompson, Berger, Luckmann e Giddens entre outros, a possibilidade da
separação das formas simbólicas, do seu contexto físico-temporal, através
dos meios tecnológicos. Nessa abordagem, esboçamos uma análise das
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
120
estratégias e das conseqüências. Sobre as estratégias, notamos que requer
conscientemente o envolvimento da instituição de maneira racional,
estabelecendo os objetivos, os recursos e todas as outras maneiras de
manutenção e gerência. Ainda que as conseqüências sejam resultado da
estratégia, principalmente se a análise for quantitativa, o que nos interessará
é o aspecto do novo, ou seja, dos novos modelos de práticas religiosas que
cunham, ao mesmo tempo, novas formas de relacionamento e de interação.
A Associação do Senhor Jesus, que tem como um dos objetivos
evangelizar através dos meios de comunicação social, administra uma
emissora de televisão com objetivos de evangelização e ao longo dos anos
vem se firmando como um importante veículo da Igreja Católica do Brasil: A
TV Século 21. A Igreja Católica tem outros empreendimentos importantes na
área da comunicação, como a Rede Vida e TV Canção Nova. Recentemente
também foi criada a TV Aparecida, que utiliza o sinal da Rede Vida.
A tevê, a internet e o rádio são recursos tecnológicos de comunicação
e de divulgação que propagam uma nova maneira de relacionamento com
os fiéis, não desprezando a constância ao templo, a presença física, mas
potencializando o alcance de influência, sendo uma maneira de responder à
exigência atual de comodidades e ainda de ter uma postura competitiva no
mercado religioso.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
121
ANEXOS
ANEXO 1
COBERTURA ATUAL DA TV SÉCULO 21
1
Canais Abertos
Cidade Estado Número Estação Status
Cruzeiro do Sul
AC 17 UHF C. do Sul AC no ar
Cariacica
ES 50 UHF Vitória ES no ar
Serra
ES 50 UHF Vitória ES no ar
Vila Velha
ES 50 UHF Vitória ES no ar
Vitória
ES 50 UHF Vitória ES no ar
Goianesia
GO 31 UHF Goianésia GO no ar
Andradas
MG 53 UHF Andradas MG no ar
Araxá
MG 16 UHF Araxá MG no ar
Cambui
MG 26 UHF Cambui MG no ar
Campanha
MG 15 UHF Campanha MG no ar
Formiga
MG 27 UHF Formiga MG no ar
Guaxupé
MG 9 VHF Guaxupé MG no ar
Jacutinga
MG 38 UHF Jacutinga MG no ar
Machado
MG 20 UHF Machado MG no ar
Monte Sião
MG 47 UHF Monte Sião MG no ar
Muriaé
MG 9 UHF Muriaé MG no ar
Ouro Branco
MG 25 UHF Ouro Branco - MG no ar
Paraisópolis
MG 20 UHF Paraisópolis - MG no ar
Patos de Minas
MG 4 VHF Patos de Minas MG no ar
Poços de Caldas
MG 18 UHF Poços de Caldas MG. no ar
Raul Soares
MG 41 UHF Raul Soares - MG no ar
Salinas
MG 12 VHF Salinas MG no ar
Viçosa
MG 2 VHF Viçosa MG no ar
1
http://www.tvseculo21.org.br/ 14/01/2007.
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
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122
Alto Paraná
PR 31 UHF Maringá no ar
Astorga
PR 31 UHF Maringá no ar
Atalaia
PR 31 UHF Maringá no ar
Campo Mourão
PR 31 UHF Maringá no ar
Cianorte
PR 31 UHF Maringá no ar
Colorado
PR 31 UHF Maringá no ar
Cruzeiro do Sul
PR 31 UHF Maringá no ar
Doutor Camargo
PR 31 UHF Maringá no ar
Engenheiro Beltrão
PR 31 UHF Maringá no ar
Fênix
PR 31 UHF Maringá no ar
Florai
PR 31 UHF Maringá no ar
Floresta
PR 31 UHF Maringá no ar
Flórida
PR 31 UHF Maringá no ar
Iguaraçú
PR 31 UHF Maringá no ar
Itambé
PR 31 UHF Maringá no ar
Ivatuba
PR 31 UHF Maringá no ar
Jandaia do Sul
PR 31 UHF Maringá no ar
Jussara
PR 31 UHF Maringá no ar
Lobato
PR 31 UHF Maringá no ar
Mandaguaçú
PR 31 UHF Maringá no ar
Mandaguari
PR 31 UHF Maringá no ar
Marialva
PR 31 UHF Maringá no ar
Maringá
PR 31 UHF Maringá no ar
Marumbi
PR 31 UHF Maringá no ar
Munhoz de Melo
PR 31 UHF Maringá no ar
Nova Esperança
PR 31 UHF Maringá no ar
Ourizona
PR 31 UHF Maringá no ar
Paiçandu
PR 31 UHF Maringá no ar
Paranacity
PR 31 UHF Maringá no ar
Peaberu
PR 31 UHF Maringá no ar
Presidente Castelo Branco
PR 31 UHF Maringá no ar
Santa Fé
PR 31 UHF Maringá no ar
São Jorge do Ivaí
PR 31 UHF Maringá no ar
Sarandi
PR 31 UHF Maringá no ar
Terra Boa
PR 31 UHF Maringá no ar
Uniflor
PR 31 UHF Maringá no ar
Itaperuna
RJ 2 VHF Itaperuna no ar
Macaé
RJ 34 UHF Macaé RJ no ar
Ilópolis
RS 33 UHF Ilópolis RS no ar
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123
Estância
SE 6 VHF Estância SE no ar
Lagarto
SE 17 UHF Lagarto SE no ar
Propriá
SE 2 VHF Propriá SE no ar
Amparo
SP 52 UHF Amparo SP no ar
Artur Nogueira
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Arujá
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Avaré
SP 7 VHF Avaré SP no ar
Barueri
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Batatais
SP 13 VHF Batatais - SP no ar
Biritiba - Mirim
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Botucatu
SP 50 UHF Botucatu SP no ar
Caeiras
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Cajamar
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Campinas (geradora)
SP 53 UHF Campinas no ar
Capão Bonito
SP 16 UHF C. Bonito SP no ar
Carapicuiba
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Cosmópolis
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Cotia
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Cruzeiro
SP 16 UHF Cruzeiro - SP no ar
Diadema
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Divinolândia
SP 46 UHF Divinolândia SP no ar
Embú
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Embú - Guaçú
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Estiva Gerbi
SP 49 UHF Mogi Guaçú SP no ar
Ferras de Vasconcelos
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Francisco Morato
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Franco da Rocha
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Garça
SP 11 VHF Garça SP no ar
Guararema
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Guarulhos
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Holambra
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Hortolândia
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Indaiatuba
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Itaí
SP 10 UHF Itaí SP no ar
Itapecirica da Serra
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Itapeva
SP 48 UHF Itapeva SP no ar
Itapevi
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Itapira
SP 10 VHF Itapira SP no ar
Itaquaquecetuba
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Vânio Flábio Dias Ferreira
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124
Itatiba
SP 17 UHF Itatiba SP no ar
Jaguariúna
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Jandira
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Jaú
SP 31 UHF Jaú SP no ar
Juquitiba
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Mairiporã
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Matão
SP 14 UHF Matão SP no ar
Mauá
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Mococa
SP 46 UHF Mococa SP no ar
Mogi das Cruzes
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Mogi Guaçú
SP 49 UHF Mogi Guaçú SP no ar
Monte Mor
SP 53 UHF Campinas SP no ar
Nova Odessa
SP 57 UHF Sumaré SP no ar
Osasco
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Paraguaçú Paulista
SP 13 UHF Paraguaçú Paulista SP no ar
Paulínia
SP 57 UHF Sumaré SP no ar
Pedreira
SP 30 UHF Pedreira SP no ar
Piedade
SP 20 UHF Piedade SP no ar
Pirajuí
SP 7 VHF Pirajuí SP no ar
Pirapora de Bom Jesus
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Poá
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Porto Feliz
SP 49 UHF Porto Feliz SP no ar
Ribeirão Pires
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Rio Grande da Serra
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Rubinéia
SP 20 UHF Santa Fé do Sul SP no ar
Salesópolis
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Santa Fé do Sul
SP 20 UHF Santa Fé do Sul SP no ar
Santa Isabel
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Santa Rita d'Oeste
SP 20 UHF Santa Fé do Sul SP no ar
Santana de Parnaíba
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Santo André
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
São Bernardo do Campo
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
São Caetano do Sul
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
São João da Boa Vista
SP 34 UHF S. J. Boa Vista SP no Ar
São Lourenço da Serra
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
São Paulo
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
São Sebastião da Grama
SP 47 UHF S. S. da Grama SP no ar
Sumaré
SP 57 UHF Sumaré SP no ar
Suzano
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
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125
Taboão da Serra
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Tapiratiba
SP 15 UHF Tapiratiba SP no ar
Três Fronteiras
SP 20 UHF Santa Fé do Sul SP no ar
Valinhos
SP 59 UHF Valinhos SP no ar
Vargem Grande Paulista
SP 59 UHF São Paulo SP no ar
Vinhedo
SP 59 UHF Valinhos SP no ar
Votorantim
SP 34 UHF Votorantim SP no ar
Total:
147
Canais a Cabo
Cidade Estado Canal Estação Status
Barra de São Miguel AL 18 ACOM TV No ar
Coqueiro Seco AL 18 ACOM TV No ar
Maceió AL 18 ACOM TV No ar
Santa Luzia do Norte AL 18 ACOM TV No ar
Satuba AL 18 ACOM TV No ar
Careiro do Várzea AM 18 ACOM TV No ar
Iranduba AM 18 ACOM TV No ar
Manaus AM 18 ACOM TV No ar
Manaus AM 65 VIVAX No ar
Vila Velha ES 47 V V C No ar
Vitória ES 34 V V C No ar
Alfenas MG 2 TV CAFENAS No ar
Caratinga MG 12 SUPER CABO TV No ar
Governador Valadares MG 61 SOM E IMAGEM No ar
Bayeux PB 18 ACOM TV No ar
Cabedelo PB 18 ACOM TV No ar
Conde PB 18 ACOM TV No ar
João Pessoa PB 18 ACOM TV No ar
Santa Rita PB 18 ACOM TV No ar
Campo Mourão PR 99 TV Cidade Mourão No ar
Curitiba PR 58 TVA e NET No ar
Foz do Iguaçú PR 21 TVA e NET No ar
Foz do Iguaçú PR 58 TVA e NET No ar
Guarapuava PR 15 TV Cidade No ar
Barra Mansa RJ 65 VIVAX No ar
Campos dos Goytacazes RJ 43 C V C No ar
Guapimirim RJ 23 TREE SAT No ar
Nova Friburgo RJ 41 CATV SAT No ar
Resende RJ 65 VIVAX No ar
Teresópolis RJ 2 TVC No ar
Açu RN 13 TELECAB No ar
Ceará-Mirim RN 18 ACOM TV No ar
Extremoz RN 18 ACOM TV No ar
Vânio Flábio Dias Ferreira
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e as novas mediações tecnológicas.
126
Macaíba RN 18 ACOM TV No ar
Natal RN 3 DUNAS COMUNICAÇÕES No ar
Parnamirim RN 18 ACOM TV No ar
São Gonçalo do Amarante RN 18 ACOM TV No ar
Camburiú SC 58 TVA e NET No ar
Florianópolis SC 58 TVA e NET No ar
Americana SP 64 VIVAX No ar
Araçatuba SP 64 VIVAX No ar
Araraquara SP 64 VIVAX No ar
Assis SP 53 TVC ASSIS No ar
Barretos SP 30 MMDS No ar
Bebedouro SP 30 MMDS No ar
Bragança Paulista SP 64 VIVAX No ar
Caçapava SP 64 VIVAX No ar
Campinas SP 30 MMDS No ar
Campinas SP 24 NET No ar
Catanduva SP 56 NET No ar
Guaratinguetá SP 30 MMDS No ar
Hortolândia SP 64 VIVAX No ar
Indaiatuba SP 24 NET No ar
Itapetininga SP 64 VIVAX No ar
Limeira SP 64 VIVAX No ar
Mogi Guaçu SP 64 VIVAX No ar
Mogi Guaçú SP 30 MMDS No ar
Mogi Mirim SP 64 VIVAX No ar
Porto Ferreira SP 30 MMDS No ar
Rio Claro SP 64 VIVAX No ar
Santa Bárbara D'Oeste SP 64 VIVAX No ar
Santo Anastácio SP 42 TV SANTO ANASTÁCIO No ar
São Carlos SP 30 MMDS No ar
São José do Rio Preto SP 30 MMDS No ar
São José dos Campos SP 30 MMDS No ar
Sorocaba SP 7 TV Com No ar
Sumaré SP 64 VIVAX No ar
Taubaté SP 64 VIVAX No ar
Tietê SP 35 TV TIETÊ No ar
Tupã SP 35 TV Tupã No ar
Valinhos SP 32 BIG TV No ar
Total:
71
Satélites
Sistema Frequência
Analógico B1 1000 Mhz - horizontal 15 a 16 milhões de antenas (IBGE)
Digital B1 3633-6 Mhz - 2/3 FEC - SR 4.500 - POL.H
Total:
2
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
127
ANEXO 2
CAPA DE UM EXEMPLAR DA REVISTA BRASIL CRISTÃO
Vânio Flábio Dias Ferreira
Decifra-me ou te devoro: a religião católica
e as novas mediações tecnológicas.
128
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http://www.asj.org.br/
http://www.expocatolica.com.br/
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Revista Brasil Cristão n. 85, agosto/2004
Revista Brasil Cristão n. 86, setembro/2004
Revista Brasil Cristão n. 87, outubro/2004
Revista Brasil Cristão n. 88, novembro/2004
Revista Brasil Cristão n. 89, dezembro/2004
Revista Brasil Cristão n. 90, janeiro/2005
Revista Brasil Cristão n. 91, fevereiro/2005
Revista Brasil Cristão n. 92, março/2005
Revista Brasil Cristão n. 93, abril/2005
Revista Brasil Cristão n. 95, junho/2005
Revista Brasil Cristão n. 96, julho/2005
Revista Veja – edição n. 1601 – 09/06/2004
Revista Veja – edição n. 1823 – 08/10/2003
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