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TIAGO FALÓTICO
ESTUDO EXPERIMENTAL DO USO DE FERRAMENTAS
PARA QUEBRA DE FRUTOS ENCAPSULADOS POR
MACACOS-PREGO (Cebus apella) EM SEMI-LIBERDADE
Dissertação apresentada ao Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo,
como parte dos requisitos para a obtenção do
grau de Mestre em Psicologia.
São Paulo
2006
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TIAGO FALÓTICO
ESTUDO EXPERIMENTAL DO USO DE FERRAMENTAS
PARA QUEBRA DE FRUTOS ENCAPSULADOS POR
MACACOS-PREGO (Cebus apella) EM SEMI-LIBERDADE
Dissertação apresentada ao Instituto de Psicologia
da Universidade de São Paulo, como parte dos
requisitos para a obtenção do grau de Mestre em
Psicologia.
Área de Concentração: Psicologia Experimental
Orientador: Prof. Dr. Eduardo B. Ottoni
São Paulo
2006
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Ficha Catalográfica preparada pelo Serviço de Biblioteca e
Documentação do Instituto de Psicologia da USP
Falótico, T.
Estudo experimental do uso de ferramentas para quebra de frutos
encapsulados por macacos-prego (Cebus apella) em semi-
liberdade./ Tiago Falótico. – São Paulo: s.n., 2006. – 105p.
Dissertação (mestrado) – Instituto de Psicologia da Universidade
de São Paulo. Departamento de Psicologia Experimental.
Orientador: Eduardo Benedicto Ottoni.
1. Macacos-prego 2. Utilização de ferramentas 3. Cognição 4.
Etologia animal 5. Comportamento animal 6. Primatas I. Título
LC QL 737.P925
ESTUDO EXPERIMENTAL DO USO DE FERRAMENTAS
PARA QUEBRA DE FRUTOS ENCAPSULADOS POR
MACACOS-PREGO (Cebus apella) EM SEMI-LIBERDADE
TIAGO FALÓTICO
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
(Nome e Assinatura)
_________________________________________________
(Nome e Assinatura)
_________________________________________________
(Nome e Assinatura)
Dissertação defendida e aprovada em: ____/____/_____
Agradecimentos
Aos meus pais por todo apoio, carinho e incentivo durante os meus estudos, sem os quais
nunca teria chegado até aqui.
Ao meu orientador Prof. Dr. Eduardo B. Ottoni, pela paciência, orientação e ensinamentos
sobre pesquisa em comportamento animal que me transmitiu.
À Profª. Drª. Patrícia Izar por toda ajuda e apoio que me ofereceu quando necessário,
especialmente nas discussões sobre primatas.
À Briseida por ter me apresentado aos macacos-prego do PET, pelas discussões sobre os
macacos e pelas importantes sugestões oferecidas durante a qualificação.
Ao Prof. Fernando José Leite Ribeiro, pelas críticas e sugestões apresentadas durante a
qualificação.
Aos colegas e amigos do laboratório Michele, Camila, Érica, Juliana, Renata, Andressa,
Olívia, Darvin e Massimo, que ajudaram com conversas e discussões sobre comportamento
animal.
À Camila pela ajuda na coleta de dados.
À Andressa, por ter me fornecido os cocos utilizados no experimento.
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pela bolsa concedida sem a qual a
realização desse estudo não teria sido possível e pelo auxílio ao projeto.
À direção do Parque Ecológico do Tietê, por terem permitido a realização da pesquisa no seu
espaço.
À veterinária Liliane, por todo apoio nas questões sobre os macacos-prego e nos assuntos
administrativos do PET.
Aos tratadores, guardas e funcionários do PET, por toda ajuda e paciência.
Aos meus amigos por todo o apoio.
E também aos macacos-prego do PET, sem eles não haveria pesquisa.
Sumário
Lista de Figuras ......................................................................................................................vii
Lista de Tabelas ........................................................................................................................x
Resumo .....................................................................................................................................xi
Abstract ...................................................................................................................................xii
1. Introdução.............................................................................................................................1
1.1. Uso de ferramentas........................................................................................................1
1.2. Experimentos sobre uso de ferramentas por macacos-prego....................................6
1.3. Quebra de frutos encapsulados utilizando ferramentas ............................................8
1.4. Aprendizagem: definições.............................................................................................9
1.5. Objetivos.......................................................................................................................11
2. Material e Métodos.............................................................................................................13
2.1. Local..............................................................................................................................13
2.2. Sujeitos..........................................................................................................................16
2.3. Sítios Experimentais....................................................................................................19
2.4. Etograma......................................................................................................................21
2.4. Análises.........................................................................................................................22
3. Experimento 1 - Introdução de novos frutos encapsulados............................................26
3.1. Introdução....................................................................................................................26
3.2. Procedimento ...............................................................................................................27
3.3. Resultados e Discussão................................................................................................29
3.3.1. Habituação ............................................................................................................29
3.3.2. Experimento..........................................................................................................30
3.3.3. Observação............................................................................................................47
4. Experimento 2 - Escolha de martelos em função do peso/tamanho...............................53
4.1. Introdução....................................................................................................................53
4.2. Procedimentos..............................................................................................................54
4.3. Resultados e Discussão................................................................................................57
5. Experimento 3 - Transporte de martelos .........................................................................69
5.1. Introdução....................................................................................................................69
5.2. Procedimentos..............................................................................................................71
5.3. Resultados e Discussão................................................................................................73
5.3.1. Fase 1 .....................................................................................................................75
5.3.2. Fase 2 .....................................................................................................................79
6. Conclusão ............................................................................................................................83
6.1. Experimento 1..............................................................................................................83
6.2. Experimento 2..............................................................................................................87
6.3. Experimento 3..............................................................................................................88
6.4. Considerações finais ....................................................................................................90
7. Anexos..................................................................................................................................95
8. Referências Bibliográficas .................................................................................................99
vii
Lista de Figuras
Figura 1 – Mapa da área de preservação do parque Ecológico do Tietê, em vermelho a
localização dos sítios experimentais.........................................................................................15
Figura 2 – Sítios 5 e 6, onde são realizados os experimentos; dois indivíduos do grupo
estudado, à esquerda utilizando o sítio para quebra de coco, à direita coletando os cocos em
postura bípede...........................................................................................................................21
Figura 3 – (A) Cocos de jerivá (Syagrus romanzoffiana) em diversas fases de maturação (1-
verde, 2-maduro e 3-seco); (B) cocos de indaiá (Attalea dubia): os dois cocos da esquerda
estão parasitados por larvas de besouro, que também são consumidas pelos macacos............28
Figura 4 – Freqüência de visitas aos Sítios 1 e 2 pelos indivíduos do grupo estudado durante a
fase de habituação.....................................................................................................................30
Figura 5 – Freqüência de participação, do número total de sessões, dos indivíduos no
Experimento 1. .........................................................................................................................31
Figura 6 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Darwin, ao longo
do Experimento 1. ....................................................................................................................33
Figura 7 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Davi, ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................33
Figura 8 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Janete, ao longo
do Experimento 1. ....................................................................................................................34
Figura 9 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Medeiros, ao
longo do Experimento 1. ..........................................................................................................34
Figura 10 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Químico, ao
longo do Experimento 1. ..........................................................................................................35
Figura 11 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Suspeito, ao
longo do Experimento 1. ..........................................................................................................35
Figura 12 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Vavá, ao longo
do Experimento 1. ....................................................................................................................36
Figura 13 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Cisca durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................37
Figura 14 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Darwin durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................37
Figura 15 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Davi durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................38
Figura 16 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Janete durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................38
Figura 17 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Medeiros durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................39
Figura 18 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Químico durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................39
Figura 19 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Suspeito durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................40
viii
Figura 20 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Vavá durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................40
Figura 21 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Vitor durante as
sessões do Experimento 1.........................................................................................................41
Figura 22 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Darwin ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................43
Figura 23 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Davi ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................44
Figura 24 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Medeiros ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................44
Figura 25 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Químico ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................45
Figura 26 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Suspeito ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................45
Figura 27 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Vavá ao longo do
Experimento 1. .........................................................................................................................46
Figura 28 – N médio de observadores por sessão do experimento, para cada indivíduo-alvo.47
Figura 29 – Freqüência de episódios de observação da quebra de cocos para cada indivíduo
observador. ...............................................................................................................................48
Figura 30 – Árvores de Caminho mais Curto, com raiz destino. Estão apresentados todos os
indivíduos que foram observados durante o Experimento. Os arcos representam a freqüência
de ocorrência do comportamento; quanto mais curtos mais freqüentemente ocorreu o
comportamento e mais aquele sujeito na base da flecha observou coespecíficos....................49
Figura 31 – Martelos de granito oferecidos aos sujeitos do Experimento 2: os números
indicam o tamanho do martelo, seu peso e sua designação no experimento............................55
Figura 32 – Posicionamento dos martelos (quadrados) e bigornas (hexágonos) nas sessões do
Experimento 2. .........................................................................................................................56
Figura 33 – Participação dos indivíduos no Experimento 2 (escolha de martelos)..................58
Figura 34 – Participação de indivíduos que utilizaram os martelos fornecidos e quebraram
cocos no Experimento 2 (escolha de martelos). .......................................................................59
Figura 35 – Porcentagem de escolha de cada martelo pelos indivíduos do grupo no
Experimento 2. .........................................................................................................................60
Figura 36 – Porcentagem de escolha das posições dos martelos pelos indivíduos do grupo no
Experimento 2. .........................................................................................................................60
Figura 37 - Freqüência absoluta de escolha de cada martelo pelos indivíduo no Experimento
2. ...............................................................................................................................................61
Figura 38 - Freqüência absoluta de escolha dos martelos de acordo com as posições pelos
indivíduos no Experimento 2....................................................................................................62
Figura 39 – Freqüência de escolha dos martelos de acordo com as posições pelos indivíduos
juvenis no Experimento 2.........................................................................................................63
Figura 40 – Freqüência de escolha dos martelos de acordo com as posições pelos indivíduos
adultos/subadultos no Experimento 2.......................................................................................63
ix
Figura 41 – Freqüência de escolha de cada martelo pelos indivíduos juvenis no Experimento
2. ...............................................................................................................................................64
Figura 42 – Freqüência de escolha de cada martelo pelos indivíduos adultos/subadultos no
Experimento 2. .........................................................................................................................64
Figura 43 – Esquema do posicionamento de martelos (elipses) e bigornas (hexágonos) na Fase
1 do Experimento 3. Na Fase 2 somente o martelo mais distante, 10 m, estava disponível. ...73
Figura 44 – Número de sessões em que cada indivíduo visitou o sítio experimental durante o
Experimento 3. .........................................................................................................................74
Figura 45 – Freqüência de episódios de transporte dos martelos por indivíduo na Fase 1 do
Experimento 3. .........................................................................................................................76
Figura 46 – Número de sessões da Fase 1 do Experimento 3 em que o sujeito não transportou
nada/ transportou somente o coco/ somente a pedra ou transportou o coco e a pedra.............78
Figura 47 – Número de sessões da Fase 1 do Experimento 3 em que o sujeito não transportou
nada/ transportou somente o coco/ somente a pedra ou transportou o coco e a pedra.............78
Figura 48 – Número de sessões em que o indivíduo visitou o sítio experimental preparado
durante a Fase 2 do Experimento 3. .........................................................................................80
x
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Composição do grupo de macacos-prego estudado durante os três experimentos
realizados. As observações mostram casos em que o indivíduo não permaneceu o período
inteiro no grupo. .......................................................................................................................17
Tabela 2– Nome e abreviação utilizada para cada indivíduo do grupo estudado.....................18
Tabela 3 – Etograma com as categorias manipulativas e de observação que serão utilizadas
nos registros de animal focal. ...................................................................................................21
Tabela 4 – Média do tempo necessário para quebra dos cocos de Syagrus e Attalea por cada
indivíduo do grupo. ..................................................................................................................32
Tabela 5 - Indivíduos que observaram manipulação e quebra de cocos de indaiá antes de ter
sucesso na sua quebra...............................................................................................................42
Tabela 6 – Valores das árvores de caminho mais curto de cada indivíduo. Soma do tamanho
dos arcos, número de arcos, a relação da soma dos arcos dividida pelo número de arcos e o
“ranking” de cada indivíduo nessa relação...............................................................................49
Tabela 7 – Os pesos, medidas e designações dos martelos artificiais do experimento de
escolha de martelos pela variável peso.....................................................................................55
Tabela 8 – Média e desvio padrão do número de batidas para a quebra do coco de Syagrus sp
com cada martelo do experimento............................................................................................64
Tabela 9 – Média e desvio padrão do número de batidas para a quebra do coco de Syagrus sp
com cada martelo do experimento para cada indivíduo do grupo estudado.............................65
Tabela 10 – Freqüências e porcentagens de eventos de transporte de pedras para cada
distância durante a Fase 1 do Experimento 3. ..........................................................................75
Tabela 11 – Resultados individuais do Experimento 3 (apenas indivíduos que dele
participaram): Número de sessões em que o sujeito não transportou nada/ transportou somente
o coco/ somente a pedra ou transportou o coco e a pedra. .......................................................77
xi
Resumo
FALOTICO, Tiago. Estudo experimental do uso de ferramentas para quebra de frutos
encapsulados por macacos-prego (Cebus apella) em semi-liberdade. São
Paulo, 2006. 105p. Dissertação (Mestrado). Instituto de Psicologia,
Universidade de São Paulo.
Três experimentos foram realizados sobre o uso de ferramentas para quebra de frutos
encapsulados por macacos-prego (Cebus apella) em condição de semi-liberdade no Parque
Ecológico do Tietê,. O primeiro envolveu a introdução de um nova espécie de coco com o
objetivo de estudar a disseminação do uso desse fruto no grupo e os mecanismos de
transmissão social envolvidos. Essa disseminação, bastante rápida, em alguns casos deveu-se
à aprendizagem inteiramente individual, mas também houve casos de consumo somente após
observação de outros indivíduos quebrando cocos ou contato com restos dos cocos. Neste
último caso, as eventuais influências sociais estariam restritas ao Realce de Estímulo, mas,
onde houve observação direta do comportamento, Emulação ou Imitação não podem ser
descartadas. Não foi detectado um padrão definido de preferências na escolha dos indivíduos
alvos de observação por coespecíficos em função das características mensuradas dos animais
observados. O segundo experimento examinou as preferências na escolha de “martelos” de
pedra artificialmente produzidos variando de 300g a 1700g, tendo sido encontrada uma
preferência pelos dois martelos mais pesados, embora tenha sido observada uma tendência
dos juvenis a usar a ferramenta mais próxima, independentemente do peso. O terceiro
experimento abordou o transporte das ferramentas, para determinar se este ocorria quando os
“martelos” potenciais se encontravam a 5m ou 10m do seu local de uso (“bigorna”). Os
resultados confirmam a ocorrência desse comportamento, o qual, no entanto, foi quase sempre
acompanhado do transporte concomitante de cocos.
xii
Abstract
FALOTICO, Tiago. Experimental study of tool use to nutcraking by semifree ranging
capuchin monkeys (Cebus apella). São Paulo, 2006. 105p. Master Thesis.
Institute of Psychology, University of São Paulo.
Three experiments were conducted about tool use to nutcracking by capuchin monkey
(Cebus apella) at semi-free ranging condition in Tiete Ecological Park. The first involved the
introduction of a new species of nut; the aim was to study the dissemination of the use of this
new fruit in the group and the involved social transmission mechanism. The quite fast
dissemination occurred by individual learning in some cases, but there were instances of
consumption only after observation of other monkeys cracking the new nuts or contact with
their leftovers.In the latter case, the possible social influences would be restricted to Stimulus
Enhacement, but, in the cases where direct behavioral observation took place, Imitation and
Emulation cannot be ruled out. There was no correlation between the choice of targets for
observation and the measured traits of the targets. The second experiment examined the
preferences in the choice of artificial stone hammers ranging from 300g to 1700g,. We found
a preference for the two heviest hammers, although the juveniles had a tendency to use the
nearest tools, independently of weight. The third experiment was about the transport of tools,
to determine if the transport of potential tools occurred when these were found at 5m or 10m
from the use site (the “anvil”). The results confirms the occurrence of this behavior, always
involving the simultaneous transport of nuts.
1
1. Introdução
1.1. Uso de ferramentas
O comportamento do uso de ferramentas por animais pode ser definido de várias
maneiras. Hall (1963), o define como “o uso, por um animal, de um objeto ou outro
organismo vivo como um meio de adquirir uma vantagem. (...) O objeto é, por definição, algo
externo ao corpo do animal, e seu uso permite ao animal ampliar o alcance de seus
movimentos ou aumentar sua eficiência”.
Goodall (1970) e Beck (1980) definem uso de ferramenta como a utilização de um
objeto externo como uma extensão funcional da boca ou bico, mão ou garra do animal, que
tem como objetivo realizar certas alterações no ambiente. Alcock (1972) se refere à
“manipulação de um objeto inanimado, não fabricado internamente, com o efeito de aumentar
a eficiência do animal em alterar a forma ou posição de um objeto separado qualquer”. Todas
as definições, apesar de sutilmente diferentes, são bastante amplas e incluem o uso
estereotipado de ferramentas (uso de ferramentas “típico da espécie”, sem grandes variações
entre as populações), que constitui a maioria dos casos conhecidos entre animais não-
humanos.
Os relatos de uso estereotipado de ferramentas por animais incluem uma grande
variedade de espécies, desde invertebrados como polvos (Octopus vulgaris) que modificam
sua toca utilizando pedras e outros objetos (Mather, 1994), aranhas que posicionam pedras ao
redor da entrada da toca para aumentar seu raio de percepção de presas (Henschel, 1995),
insetos como a espécie Salyavata variegata que se camufla com pedaços de cupinzeiro para
predar os cupins (Pierce, 1986) e formigas que utilizam areia e barro para o transporte de
líquido ao formigueiro, até os vertebrados, com destaque para as aves e mamíferos (Pierce,
1986).
2
Corvos da Nova Caledônia (Corvus moneduloides) em vida livre fabricam e utilizam
uma grande variedade de ferramentas feitas a partir de material vegetal (pecíolos de folhas ou
recortes da borda de folhas) para captura de invertebrados (Hunt & Gray, 2004; Rutledge &
Hunt, 2004). Em laboratório, vários experimentos já foram realizados para estudar esse
comportamento, alguns mostrando que há escolha espontânea das ferramentas de tamanho e
diâmetro adequadas para a realização de novas tarefas, não havendo o processo de tentativa-e-
erro, sendo inclusive sugerido que os corvos entendem alguns aspectos funcionais das
ferramentas (Chappell & Kacelnik, 2002, 2004). Outro estudo mostrou, em laboratório, que os
corvos são capazes de manufaturar ferramentas: no experimento, eles dobraram pedaços de
arames, fazendo ganchos, para retirar alimento de dentro de um tubo (Weir et al., 2002). Pica-
paus (Cactospiza pallida) também utilizam gravetos e espinhos de cactos para capturar
artrópodes (Tebbich & Bshary, 2004). Abutres egípcios (Neophron percnopterus) utilizam
pedras para quebrar ovos de avestruz, segurando-as com o bico e batendo no ovo (van
Lawick-Goodall & van Lawick, 1966, 1968). Recentemente, foi relatado que araras-azuis
(Anodorhynchus iacyinthinus) utilizam lascas de madeira como um “calço” quando tentam
abrir certo tipo de coco com o bico (Borsari & Ottoni, 2005).
Algumas populações de lontras (Enhydra lutris) utilizam pedras para abrir conchas,
nadando de costas e quebrando as conchas contra a pedra apoiada na barriga (Byrne, 2004). E
certas populações de golfinhos (Tursiops sp.) utilizam esponjas para auxiliar no
forrageamento (Smolker et al., 1997).
Sobre leões, há um relato anedótico do uso de um espinho de acácia com a boca para
retirar um outro espinho que estava infeccionando uma das patas (Bauer, 2001). Elefantes já
foram observados utilizando galhos para remover ectoparasitas, para alcançar fontes de
alimento distantes e para limpar as orelhas (Chevalier-Skolnikoff & Liska, 1993; Hart & Hart,
1994). Toupeiras peladas (Heterocephalus glaber), que cavam e vivem em extensos túneis,
3
utilizam pedaços de madeira ou de tubérculos entre os dentes incisivos e os lábios quando
estão cavando, prevenindo assim a ingestão e o sufocamento pela terra (Shuster & Sherman,
1998).
No entanto, em geral o uso de ferramentas é bastante estereotipado e típico da espécie
(particularmente nos artrópodes). Diferente destes, o uso de ferramentas por primatas é
bastante flexível, apresentando ampla variação tanto intra- como interespecífica.
O uso de ferramentas por primatas tem sido objeto de muitos estudos, principalmente
em chimpanzés (Pan troglodytes), tanto em ambientes naturais como em laboratório, nesse
último caso iniciados na década de 1920, com os estudos pioneiros de Köhler (McGrew,
1992). Em vida livre já foram relatadas várias modalidades de uso de ferramentas por
chimpanzés, como o uso de varetas para captura de cupins, formigas, extração de mel e tutano
de ossos; esponja de folhas secas para captar água (McGrew, 1992; Whiten et al., 1999;
Whiten & Boesch, 2001), almofada de folhas em solo úmido (Hirata et al.,1998), pedras ou
madeira para quebra de cocos (Boesch & Boesch, 1983; Sakura & Matsuzawa, 1991;
McGrew, 1992; Inoue-Nakamura & Matsuzawa, 1997; Whiten et al.,1999; Whiten & Boesch,
2001) e folhas amassadas e dobradas como esponja para água (Kitahara-Frisch & Norikoshi,
1982). A ocorrência de algumas dessas formas de uso de ferramentas não era igualmente
distribuída entre as populações selvagens, como, por exemplo, no caso da quebra de coco:
enquanto os chimpanzés de Gombe, Tanzânia (leste da África) não quebram cocos, os
chimpanzés de Tai (oeste da África) o fazem freqüentemente, utilizando ferramentas. No
entanto não há diferenças ecológicas e genéticas significativas entre essas populações.
Somente um processo de transmissão social de informações poderia manter essas diferenças.
Essa grande diversidade de ferramentas utilizadas pelos chimpanzés, onde a homogeneidade
intra-populacional se contrapõe a diferenças significativas entre as populações que não podem
ser explicadas exclusivamente por fatores ecológicos ou genéticos, tornou necessária uma
4
explicação em termos de processos culturais de difusão de tradições comportamentais
(Whiten et al., 1999; Whiten & Boesch, 2001).
Gorilas (Gorilla sp) selvagens não usam ferramentas com tanta freqüência; só
recentemente foi publicado um relato sobre o uso de bastões para verificar a profundidade de
um corpo d´agua durante a travessia e um galho fincado no solo à margem de um lago
servindo como apoio durante o forrageamento de plantas aquáticas (Breuer et al., 2005). No
entanto, em cativeiro e laboratório eles utilizam ferramentas freqüentemente, como nos
experimentos com a gorila Koko (Tomasello & Call, 1997). Apesar de não usarem
ferramentas para forragear (pelo menos até onde sabemos), os indivíduos das populações
selvagens de gorilas executam formas complexas de processamento de alimentos, usando
diferentes técnicas para cada tipo de planta dependendo do tamanho, textura e localização da
parte palatável. E a execução dessas técnicas parece seguir organizações hierárquicas, nas
quais a seqüência dos comportamentos necessários para determinada tarefa, como o
processamento de cada tipo de planta, seguem uma ordem específica, obedecendo uma série
de rotinas e sub-rotinas (Byrne & Russon, 1998).
Orangotangos (Pongo pygmaeus), apesar das grandes capacidades manipulativas e
cognitivas mostradas em cativeiro (Lethmate, 1982; Stoinski & Whiten, 2003; Nakamichi,
2004), não haviam sido vistos usando ferramentas na natureza até poucos anos atrás;
entretanto, agora já há muitos relatos de utilização de ferramentas para forrageamento como,
por exemplo, gravetos para pegar mel de colméias, palitos para puxar sementes de dentro do
fruto e galhos com folhas para beber água em orifícios de árvores (Galdikas, 1982, 1989; van
Schaik et al., 2003; Fox et al., 2004). As diferenças de usos de ferramentas e outros
comportamentos entre populações de orangotangos foram estudadas por van Schaik e
colaboradores (2003), que interpretaram essas variações como evidência de cultura, assim
como feito anteriormente para chimpanzés. Além disso, foram determinadas correlações entre
5
a distância geográfica e as diferenças culturais entre os grupos, quanto mais distantes menos
parecidos eram os comportamentos. Também foram encontradas correlações entre as
características sociais do grupo que facilitam as oportunidades de aprendizagem (tempo de
contato entre indivíduos), aparentemente determinadas por diferenças ecológicas (padrão de
dispersão dos recursos alimentares), e o tamanho do repertório cultural local, sendo que
grupos em que os indivíduos passam mais tempo juntos possuem um maior repertório. Esse
último resultado mostra que a estrutura social - que modula as possibilidades de observação
entre indivíduos - é importante para a aprendizagem social e a manutenção de tradições
comportamentais como previsto por van Schaik e colaboradores (1999).
Em babuínos (Papio sp), há relatos de uso de ferramentas em cativeiro (Beck, 1973;
Westergaard, 1992), mas em populações selvagens isso é mais raro. No entanto, van Lawick-
Goodall et al. (1973) descreveram o uso de pedras por Papio anubis para a limpeza dos lábios
(através de fricção) após alimentação com alimentos viscosos e também para estancar
sangramentos.
Entre os primatas do Novo Mundo, uma das espécies com mais habilidades
manipulativas e cognitivas é o macaco-prego (Cebus apella), o que o tornou, na última
década, alvo de vários estudos envolvendo a compreensão sobre causalidade física (em alguns
casos, em situações mediadas por interações sociais), principalmente em laboratório
(Westergaard & Suomi, 1994; Byrne & Suomi, 1996; Chalmeau et al., 1997; Visalberghi et
al., 2000; Mendres & de Waal, 2000; Christel & Fragaszy, 2000; v. adiante).
Atualmente estudos já mostraram a ocorrência de usos de ferramentas em populações
selvagens de macacos-prego, e não só de quebra de frutos encapsulados, mas também de uso
de varetas para pegar mel, “enxadas” para cavar raizes e “machados” para cortá-las (Mannu &
Ottoni, 2005; v. adiante).
6
1.2. Experimentos sobre uso de ferramentas por macacos-prego
A resolução de problemas usando ferramentas envolve, para alguns autores, a
habilidade de (1) avaliar precisamente as relações de causa-e-efeito e (2) de escolher uma
solução apropriada de um grupo de possíveis estratégias (Garber & Dolins, 1996, apud
Lavallee, 1999). Entretanto, para Visalberghi e Limongelli (1994), falta aos macacos-prego,
mesmo quando bem-sucedidos em uma tarefa mecânica, uma verdadeira compreensão das
relações causais subjacentes: após um primeiro experimento em que aprendiam a inserir uma
vareta na extremidade correta de um tubo transparente, para empurrar um pedaço de comida
sem que este caísse em uma “armadilha” (depressão central), o único dentre quatro sujeitos a
atingir um desempenho não-casual mostrou não compreender a funcionalidade da armadilha
em testes subseqüentes, evitando-a mesmo quando invertida (inoperante). Entretanto, no
estudo de Lavallee (1999), os macacos-prego resolveram adequadamente a tarefa de
manufatura e/ou uso de ferramentas (varetas) para a obtenção de mel de orifícios feitos em um
tronco de árvore cortado.
O estudo laboratorial de Westergaard e Suomi (1994) mostrou o uso induzido de
ferramentas de pedra por macacos-prego. Nesse estudo foram realizados dois experimentos
consecutivos, sendo que no primeiro os macacos utilizaram pedras para produzir lascas e, no
segundo, utilizaram as lascas para rasgar uma placa de acetato e alcançar o alimento do outro
lado.
Os experimentos de Chalmeau et al. (1997) parecem mostrar que os macacos-prego
não conseguem entender uma tarefa cooperativa, que nesse caso consistia em dois indivíduos
puxarem dois cabos simultaneamente para receberem comida. Apesar de conseguirem realizar
a tarefa, não houve um aumento na freqüência do comportamento de puxar o cabo quando o
outro indivíduo também estava perto do cabo, o que seria esperado se houvesse um
entendimento da tarefa cooperativa e os autores concluem que os indivíduos agiram juntos na
7
tarefa, completando-a, mas sem entender o papel do companheiro e sem levar seu
comportamento em consideração. Em uma versão aperfeiçoada desse experimento,
Visalberghi et al. (2000) corroboram esses resultados, concluindo que os macacos-prego não
compreendem o papel do outro indivíduo para a efetividade da ação. Entretanto, os
experimentos de Mendres e de Waal (2000) sugerem que pode haver uma maior compreensão
de comportamentos cooperativos: nesses experimentos, que também consistiam em puxar
duas barras simultaneamente para alcançar a comida (sendo que em algumas tentativas o
parceiro estava visível e em outras não), os macacos-prego perceberam a presença do parceiro
e eram menos bem sucedidos em realizar a tarefa se o parceiro não estivesse visível,
indicando que há algum grau de compreensão da tarefa cooperativa. Uma situação de
cooperação, que pode sugerir uma compreensão, também foi relatada em vida livre por Taira
et al. (2002) e Taira e Izar (2005), que observaram macacos-prego abrindo em conjunto o topo
de palmeiras para ter acesso ao palmito, em situações em que um indivíduo sozinho não teria
sucesso ou este seria muito custoso.
Byrne e Suomi (1996) realizaram experimentos que demonstraram a existência de
diferenças entre faixas etárias na manipulação de objetos: os juvenis se mostraram mais
manipulativos que adultos. E não foram encontradas diferenças manipulativas entre os sexos.
Nos experimentos de escolha de ferramentas feitos por Visalberghi (1990), ela não
achou evidências de escolhas adequadas na tarefa que consistia em selecionar uma ferramenta
para penetrar um tubo transparente que continha alimento no meio e assim empurrá-lo para
fora; as ferramentas disponíveis variavam entre adequadas, como um pedaço cilíndrico de
madeira, e opções não funcionais, como varetas muito fina ou muito curtas para deslocar o
alimento.
Várias comparações entre chimpanzés e macacos-prego foram feitas (Visalberghi &
McGrew, 1997) com relação à compreensão de causalidade e ao uso de ferramentas (McGrew
8
& Marchant, 1997; Visalberghi, 1997), uma vez que ambas as espécies exibem muitos
comportamentos manipulatórios, exploratórios e sociais semelhantes. A comparação desses
comportamentos das duas espécies com o de crianças humanas ajudou a adicionar uma
perspectiva para um panorama geral das habilidades cognitivas das espécies estudadas
(Visalberghi, 1997). E os resultados sugerem, para estes autores, que apesar da performance
similar na resolução dos problemas existem diferenças nas estratégias cognitivas subjacentes
entre macacos-prego e chimpanzés, sendo os últimos mais adaptáveis a mudanças nos
problemas; além disso somente as crianças humanas teriam exibido a capacidade de
compreensão da causalidade do problema (Visalberghi, 1997). Tomasello e Call (1997)
criticam esses argumentos, afirmando que os testes realizados por Visalberghi eram
dependentes de conhecimentos físicos e causais muito específicos, e que mesmo crianças
humanas não eram proficientes naquelas tarefas até os dois anos de idade (além da idade
esperada para o entendimento da causalidade como um processo externo independente), e por
isso os testes não seriam adequados para verificar a compreensão de causalidade em
chimpanzés e macacos-prego.
1.3. Quebra de frutos encapsulados utilizando ferramentas
O uso de ferramentas na quebra de frutos encapsulados (que, naturalmente, traz
grandes vantagens adaptativas por permitir o acesso a alimento bastante calórico e às vezes
muito protéico - se o coco estiver parasitado por larvas de insetos) requer uma manipulação
complexa de objetos e processos cognitivos bastante elaborados, uma vez que há necessidade
da procura de um “martelo” (pedra solta utilizada para bater no coco) e uma “bigorna”
(substrato plano, geralmente uma pedra parcialmente enterrada, tronco ou raiz de árvore)
adequados, assim como um correto posicionamento do coco na bigorna e um golpe
apropriado com o martelo para a obtenção do endosperma comestível.
9
Os primeiros relatos desse comportamento em primatas selvagens apareceram para
chimpanzés das populações da costa oeste da África (Sugiyama & Koman, 1979; Boesch &
Boesch, 1981, 1983). E, como dito anteriormente, as diferenças regionais nesse
comportamento foram consideradas evidências de tradições culturais nos chimpanzés (Whiten
et al., 1999; Whiten & Boesch, 2001).
Os macacos-prego já haviam sido observados quebrando cocos com a ajuda de
ferramentas em diversas situações de cativeiro e existem estudos experimentais sobre o
comportamento de quebra de frutos encapsulados com o auxílio ferramentas em macacos-
prego, como os de Visalberghi (1987, 1990), que estudou a aquisição do comportamento de
quebra de cocos, de Anderson (1990), que estudou as vantagens do uso de ferramentas para a
mais rápida obtenção do alimento encapsulado - assim como o uso de ferramentas por uma
fêmea não-quebradora após a observação de outros indivíduos quebrando - e Westergaard e
Suomi (1993, 1994), que demonstraram o uso e a modificação de ferramentas de pedras pelos
macacos e sua similaridade com o uso de ferramentas por chimpanzé.
No entanto só recentemente começaram a surgir relatos e estudos de uso de
ferramentas para quebra de cocos em populações selvagens (Fragaszy et al., 2004; Moura &
Lee, 2004, Mannu & Ottoni, 2005). Esses estudos mostram que diversas populações de
macacos-prego utilizam espontaneamente pedras para a quebra de frutos encapsulados, além
de outros usos de ferramentas relatados nas populações selvagens da Serra da Capivara, como
pedras de cavar para alcançar raízes e varetas para pegar mel.
1.4. Aprendizagem: definições
Um animal pode aprender algo individualmente – em geral, por tentativa-e-erro – ou
através de processos socialmente mediados.
10
A aprendizagem social é aquela que ocorre a partir da observação do comportamento
de outros indivíduos ou das conseqüências deste sobre o ambiente. Segundo Heyes (1993),
existe, por diferenças históricas, uma grande confusão em relação à nomenclatura da
aprendizagem social, sendo que vários fenômenos iguais tem nomes diferentes. Nesse
trabalho serão adotadas as definições de Byrne e Russon (1998), que classificam a
aprendizagem social em facilitação social, realce de estímulo ou de local (stimulus
enhancement e local enhancement), emulação e imitação.
A facilitação social se dá quando a probabilidade de determinado comportamento
ocorrer aumenta com a presença de co-específicos realizando o mesmo comportamento. O
comportamento, nesse caso, já está no repertório do indivíduo.
O realce de estímulo acontece quando a probabilidade de um indivíduo entrar em
contato com um local ou objeto de seu ambiente é aumentada pela utilização por um co-
específico desse local ou objeto, tanto pela observação direta como pelo efeito da ação deste.
Quando esse indivíduo entra em contato com o objeto ele aprende individualmente a
apresentar um comportamento que leva às mesmas conseqüências que aquele do co-
específico.
Na imitação, o indivíduo adquire novos comportamentos através da observação e
cópia das ações e movimentos do modelo. Whiten e Ham (1992) não enfatizam a necessidade
do comportamento ser novo para ser considerado imitação. Heyes (1993) considera imitação a
copia exata das ações do modelo.
A emulação se refere aos casos onde um indivíduo, após observar um modelo realizar
determinado comportamento, reproduz os resultados desse comportamento sem copiar
exatamente os movimentos e seqüências motoras, mas chegando ao mesmo efeito através de
um modo particular. Desse modo o observador teria aprendido que certas relações entre
determinados objetos produzem certas conseqüências, o que levaria este observador a tentar
11
reproduzir o resultado observado, mas sem reproduzir o comportamento exibido pelo sujeito
observado.
1.5. Objetivos
O presente estudo, que faz parte de um projeto maior (“Uso de ferramentas e
forrageamento extrativo por macacos-prego (Cebus apella): socialidade, ecologia e
transmissão social de informação”), deu continuidade à pesquisa sobre comportamentos de
manipulação de objetos, uso de ferramentas para obtenção de alimento e transmissão social de
informação, que vem sendo desenvolvida pelo Laboratório de Etologia Cognitiva com um
grupo de macacos-prego do Parque Ecológico do Tietê. A Fase I dessa pesquisa foi a
observação-piloto do uso espontâneo de ferramentas no forrageamento por macacos-prego,
que permitiu uma descrição geral do uso de pedras para a quebra de coquinhos de jerivá,
Syagrus romanzoffiana (Mannu & Ottoni, 1996). A Fase II foi um aprofundamento do estudo
do uso de ferramentas na quebra de cocos, com o mapeamento dos sítios de quebra, e
observações diretas (pelos métodos do “Sujeito Focal” e de “Todas as Ocorrências”), que
resultou em um quadro mais detalhado do comportamento de quebra e seus aspectos
demográficos (Ottoni & Mannu, 2001). A Fase III da pesquisa deu início ao estudo da
ontogenia dos comportamentos manipulativos e dos processos aprendizagem individual e de
transmissão social desta técnica entre os manipuladores mais experientes e os “aprendizes”
potenciais (Resende & Ottoni, 2002; Resende, 2004). Todos os estudos realizados acerca
deste comportamento, até o momento, haviam sido naturalísticos, ou seja, nenhuma
intervenção experimental foi realizada, com o intuito de estudar sua expressão inalterada.
Na atual Fase IV, foram iniciadas algumas intervenções experimentais aprofundando o
estudo do comportamento de quebra de cocos e sua disseminação no grupo.
12
O primeiro experimento envolveu a introdução de novos tipos de frutos encapsulados
(cocos), com os quais os indivíduos do grupo não tinham nenhum contato prévio, de modo
semelhante ao que foi feito com chimpanzés por Matsuzawa (1994, v. adiante). Nosso
objetivo foi observar quais os primeiros animais a utilizar esse novo recurso alimentar (e o
processo de aprendizagem destes indivíduos) e acompanhar a dinâmica de disseminação dessa
prática no grupo. Nossos procedimentos também permitiram saber quais classes de indivíduos
(sexo/idade) tem mais interesse pelos frutos novos. Os resultados podem ser comparados com
os obtidos por Matsuzawa (1994) com chimpanzés.
O segundo experimento foi sobre a escolha entre martelos de diferentes pesos
disponíveis para a quebra de coco, com o objetivo de esclarecer os padrões individuais e de
classes nas preferências pelos martelos. Foram relacionados os pesos dos martelos
selecionados e características dos usuários tais como sexo, idade e proficiência na quebra de
cocos de jerivá.
No último experimento, verificamos se ocorria a busca, transporte e uso de martelos
quando estes não se encontravam disponíveis junto à bigorna (mas com os cocos ali
disponíveis) e os efeitos da distância entre a bigorna e os martelos disponíveis sobre a
atividade de busca e transporte. Este experimento nos deu novos subsídios para uma discussão
sobre o grau de planejamento ou antecipação envolvido no comportamento de quebra de
cocos.
O fato de não existirem na literatura intervenções experimentais explorando o
comportamento de quebra de cocos em condições naturalísticas justifica o interesse desse
estudo, que introduziu uma nova abordagem em nossa linha de pesquisa.
13
2. Material e Métodos
Apesar da denominação “experimentos” utilizada nesse estudo, as manipulações
experimentais aqui relatadas não se encaixam na descrição de um experimento típico, que
apresenta uma hipótese a ser testada e um resultado que rejeita ou não essa hipótese. Na
verdade esse estudo foi constituído de intervenções experimentais realizadas em condições
naturalísticas, inpiradas, dentre outras, nas realizadas por Matsuzawa e colaboradores. Os
estudos sobre quebra de cocos por chimpanzés de Matsuzawa (1994) em Bossou, Guiné,
foram realizados em um “laboratório de campo”, no qual os sítios de quebra foram instalados
pelo pesquisador e no qual eram controlados o número de pedras disponíveis e a quantidade e
qualidade das nozes de Elaeis guineensis. Um dos experimentos realizados foi a introdução de
tipos de nozes com que o grupo não tinha contato prévio, mas que se sabia que eram
consumidos por outro grupo próximo. Neste experimento, somente uma fêmea adulta tentou
quebrar as novas nozes no primeiro encontro (supostamente, uma imigrante proveniente do
grupo em que já se quebrava este tipo de noz); entretanto, os juvenis que a observaram no
primeiro dia a quebrar as novas nozes também passaram a quebrá-las subseqüentemente. Não
houve, entretanto, transmissão deste comportamento para nenhum outro adulto, o que pode
ser conseqüência de uma menor exploração de novos itens alimentares ou de barreiras
particulares, inerentes à dinâmica da transmissão social de informação nesta espécie.
2.1. Local
A pesquisa foi realizada no Parque Ecológico do Tietê, núcleo Engenheiro Goulart,
localizado na zona leste da cidade de São Paulo, no início da Rodovia Ayrton Senna, que
possui uma área de 14 km². O grupo de macacos-prego habita uma área de preservação de
200.000 m², localizada no centro do parque (
Figura 1). Essa área de preservação tem acesso
restrito a visitantes e sua vegetação é composta por mata de reflorestamento, com plantas
14
como jabuticabeiras (Mysciara jaboticaba), goiabeiras (Psidium guayava), cafés (Coffea
arabica), limoeiros (Citrus limonum), bananeiras (Musa paradisiaca), uvaias (Eugenia
uvalha), acerolas (Malpighia punicifolia), eucaliptos (Eucalyptus sp.), paineiras-rosa
(Chorisia speciosa), macadâmia (Macadamia sp.) e várias outras espécies naturais da flora
brasileira e exótica (Mannu, 2002), além das palmeiras jerivá (Syagrus romanzoffiana).
Várias espécies de mamíferos habitam a área de preservação, tais como quatis (Nasua nasua),
catetos (Tayassu tajacu), bugios (Alouatta fusca), gambás (Didelphis sp.), preguiças
(Bradypus variegatus), cotias (Dasyprocta agouti), antas (Tapirus terrestris) e capivaras
(Hidrochaeris hidrochaeris); além de répteis como cobras, lagartixas e teius (Tupinanbis sp.)
e várias espécies de aves. Não são encontrados predadores naturais de macacos-prego na área.
O local possui ainda construções utilizadas para atividades do Parque: o biotério (Centro de
Recepção de Animais Silvestres), o orquidário e os viveiros de mudas e de animais. Além
disso, existem várias construções abandonadas que foram engolfadas pela mata.
15
Figura 1 – Mapa da área de preservação do parque Ecológico do Tietê, em vermelho a localização
dos sítios experimentais.
16
2.2. Sujeitos
Os macacos-prego (Cebus apella, Linnaeus, 1758) são primatas neotropicais com peso
médio de 3,65 kg quando adultos para os machos, e 2,5 kg para fêmeas (Fleagle, 1999).
Nesse trabalho, foram considerados como infantes os indivíduos até 1 ano, juvenís até 6
anos para machos e até a primeira gravidez para as fêmeas e subadultos os indivíduos de 6 a 8
anos no caso dos machos e de 6 até a primeira gravidez para as fêmeas. Os machos foram
considerados adultos a partir de oito anos e as fêmeas, a partir da primeira gestação. As
fêmeas atingem a idade reprodutiva com aproximadamente cinco anos (Fragaszy et al., 2004),
mas há uma grande variação individual. A gravidez dura em média 155-162 dias (Hartwig,
1966, apud Fragaszy et al., 2004) e a fêmea geralmente dá a luz a um filhote, mas há relatos
de gêmeos no próprio PET (Mannu & Ottoni, 2000).
O grupo de macacos-prego (Cebus apella) estudado foi formado por animais de
apreensão do IBAMA que escaparam há mais de 10 anos das ilhotas onde foram confinados e
contava no início dos experimentos (Setembro/2003) com 16 indivíduos, mas no fim da coleta
de dados esse número era de 22 indivíduos. A composição do grupo no período de cada
experimento, incluindo as mudanças verificadas, está apresentada na Tabela 1. Todos os
sujeitos eram reconhecidos individualmente pelo experimentador. A maioria dos indivíduos
adultos do grupo utilizava ferramentas para a quebra do coco jerivá (Syagrus romanzoffiana).
Somente uma fêmea adulta nunca foi vista quebrando cocos com sucesso e figura em apenas
dois relatos de quebra adequada (ou seja, correto posicionamento do coco e uso da
ferramenta, mas sem ocorrer a abertura do coco), até o momento (Mannu, 2002).
A quebra de macadâmia (Macadamia sp.) também já foi registrada no local, ainda que
raramente, através de observações diretas e indiretas (Resende, com. pessoal).
Além de forragearem os itens naturais da área, os macacos-prego também recebiam
uma suplementação diária fornecida pelos funcionários do biotério, consistindo basicamente
17
de frutos (maçãs, bananas, mamões, abóboras, cocos), e ocasionalmente polenta, ovos,
mandioca e ração de cachorro.
Tabela 1 – Composição do grupo de macacos-prego estudado durante os três experimentos realizados.
As observações mostram casos em que o indivíduo não permaneceu o período inteiro no grupo.
Experimento 1 - Introdução de
novos frutos encapsulados
Início: 08/2003 Fim: 10/2004
Indivíduos do grupo no período Idade Observação
Ana Adulto
Angélica Juvenil
Artur Infante Nasceu 06/2004 - Morreu 10/2004
Bisqüi Adulto Macho alfa, morreu em 10/2003
Cisca Adulta
Claudia Juvenil
Chica Infante Nasceu 11/2003 - Desapareceu 05/2004
Darwin Juvenil
Davi Adulto Retornou ao grupo em 12/2003, novo
macho alfa
Fabio Infante Nasceu em 10/2003
Filo Juvenil
Física Adulta
Frida Juvenil
Fiapo Infante Nasceu em 08/2004
Janete Adulta
Joaquim Adulto
Lobato Subadulto Retornou ao grupo em 06/2004
Migrou p/ outro grupo em 08/2004
Medeiros Adulto (Castrado)
Químico Juvenil
Suspeito Adulto (Castrado)
Vavá Adulta
Vitor Juvenil
X Subadulto Migrou p/ o grupo em 09/2003
Z Subadulto Migrou p/ o grupo estudado 02/2004
Experimento 2 - Escolha de
martelos pela variável peso
Início: 08/2003 Fim: 08/2004
Indivíduos do grupo no período Idade Observação
Mesma constituição do experimento 1
Experimento 3 - Transporte de
martelos
Início: 10/2004 Fim: 01/2005
Indivíduos do grupo no período Idade Observação
Ana Adulto
Angélica Juvenil
Cisca Adulta
Claudia Juvenil
Chuchu Infante Nasceu em 11/2004
(Continua)
18
(Continuação)
Indivíduos do grupo no período Idade Observação
Darwin Juvenil
Davi Adulto
Fabio Juvenil
Filo Juvenil
Física Adulta
Frida Juvenil
Fiapo Infante Morreu em 11/2004
Janete Adulta
Joaquim Adulto
Joca Infante Nasceu em 10/2004 e desapareceu 7 dias
depois
Medeiros Adulto (Castrado)
Pedro Adulto Retornou ao grupo em 11/2004
Químico Juvenil
Suspeito Adulto (Castrado)
Vavá Adulta
Viola Infante Nasceu em 10/2004
Vitor Juvenil Desapareceu em 01/2005
X Subadulto
Z Subadulto
As siglas utilizadas para cada indivíduo durante o estudo e nas figuras dos resultados
são apresentadas na Tabela 2.
Tabela 2– Nome e abreviação utilizada para
cada indivíduo do grupo estudado.
Indivíduo Abreviação
Ana Aa
Angélica Ag
Artur At
Bisqüi Bq
Cisca Cc
Claudia Cd
Chica Ch
Chuchu Cu
Darwin Dw
Davi Dv
Fabio Fb
Filo Fl
Física Fs
Frida Fd
Janete Jn
Joaquim Jq
(Continua)
19
(Continuação)
Indivíduo Sigla
Lobato Lb
Medeiros Md
Pedro Pd
Químico Qm
Suspeito Sp
Vavá Vv
Vitor Vt
Viola Vl
X X
Z Z
Davi, Lobato e Pedro são originários do grupo estudado, mas haviam migrado
anteriormente para outro grupo que usa uma área diferente do PET. Davi tornou-se o macho
alfa algumas semanas após seu retorno ao grupo, posição que desde a morte de Bisqüi não
havia sido assumida por nenhum dos outros machos adultos do grupo. Os três indivíduos já
quebravam cocos proficientemente quando saíram do grupo (Ottoni & Mannu, 2001;
Resende, 2004), já os dois outros machos subadultos que chegaram ao grupo, X e Z, não
utilizaram ferramentas para quebra de cocos. No entanto, ambos demonstravam interesse
quando havia outros indivíduos quebrando e foram vistos várias vezes manipulando pedras e
cocos, mas sem sucesso na quebra. Devido ao interesse na transmissão social do
comportamento de quebra de cocos, foi dada uma atenção particular a esses dois indivíduos
durante a coleta de dados, já que nesse grupo nunca haviam sido acompanhados, desde sua
chegada, indivíduos maduros não usuários de ferramentas.
2.3. Sítios Experimentais
Os sítios 1 e 2 foram montados em 10/04/2003, sendo constituídos de 2 blocos de
concretos hexagonais de 16 cm de cada lado e 9 cm de espessura, distantes 1,5 m um do
outro, como bigornas (Figura 2). Oito pedras, variando de 200g a 1050g, foram
disponibilizadas entre as bigornas como martelos potenciais. Como no local só havia um
20
coqueiro de S. romanzoffiana, cocos obtidos em outros locais do próprio PET eram
continuamente adicionados pelo experimentador. Antes do início dos experimentos, foi feito
um período de habituação dos animais ao local e material. Nesse período (de 10/04/2003 até
16/07/2003) foram registradas, durante duas manhãs por semana, todas as ocorrências de
quebra de cocos nos sítios 1 e 2, para verificar a freqüência de visitas ao sítio antes do início
dos experimentos e garantir que estes tivessem sido visitados ao menos uma vez por todos os
indivíduos utilizadores de ferramentas do grupo. As visitas foram definidas como eventos
iniciando-se com a chegada do indivíduo a um dos sítios, seguida de quebra de cocos, e
terminando quando esse indivíduo deixava o sítio.
Em 12/2003, foi montado em outro local (olaria) um par adicional de sítios
experimentais (3 e 4), nas mesmas condições do primeiro. Isso foi feito pois o grupo estava
passando muito tempo nesse novo local, prejudicando a coleta de dados no primeiro.
Em 08/2004, os sítios experimentais 3 e 4 tiveram que ser deslocados devido a problemas
com a direção do PET relacionados a outras atividades do local. Os sítios foram movidos,
para um local próximo e nomeados sítios 5 e 6, nas mesmas condições do local original
(Figura 2).
21
Figura 2 – Sítios 5 e 6, onde foram realizados os experimentos; dois indivíduos do grupo estudado, à
esquerda utilizando o sítio para quebra de coco, à direita coletando os cocos em postura
bípede.
2.4. Etograma
A partir do modelo de Resende (2004), foi elaborado um etograma com as categorias a
serem utilizadas durante os registros de manipulação e quebra de cocos (Tabela 3).
Tabela 3 – Etograma com as categorias manipulativas e de observação que serão utilizadas nos registros
de animal focal.
Categorias de Manipulação Descrição
Ajeitar Posicionar coco (ou algo semelhante) na bigorna utilizando
movimentos finos
Bater Golpear com objeto ou alimento contra outro objeto, substrato
ou alimento
Examinar Revirar ou observar algo. Incluindo passar a língua, morder e
cheirar o objeto, substrato ou alimento
Esfregar Passar repetidas vezes a mão, pé, alimento ou objeto contra um
substrato, objeto, alimento ou o próprio corpo
Ingerir Mastigar e engolir alimento
(Continua)
22
(Continuação)
Pegar Segurar - com as mãos, pés, cauda ou boca - objeto, substrato
ou alimento
Transportar Deslocar-se de um lugar a outro carregando objeto ou alimento
Categorias de Observação
Observar Posicionar-se a menos de dois metros e voltado para outro
indivíduo - que manipula ferramenta (“modelo”).
Ser Observado Manipular ferramentas e/ou frutos nos sítios de quebra a dois
metros ou menos de outro indivíduo, o qual está voltado em
direção ao sujeito
Outras
Procurar Ficar bípede e olhar para o chão, na área próxima, examinando
visualmente a área.
Outros Qualquer comportamento que não esteja enquadrado nas outras
categorias
Não pegar o coco Passar a menos de 1 metro de um coco aparentemente no campo
de visão sem pegá-lo
Baseado em Resende (2004)
2.4. Análises
Os dados de indivíduos participantes, latências (o tempo que o individuo levava para
pegar o coco - latência para pegar - e o tempo que ele levava para golpear o coco após pega-
lo - latência de quebra), número de batidas e resultados dos episódios (não mexer no coco,
examinar ou quebrar) do Experimento de introdução de novos frutos encapsulados (Exp. 1);
assim como os dados de indivíduos participantes, escolhas, posição, resultado e número de
batidas do Experimento de escolha de martelos pela variável peso (Exp. 2); e de indivíduo,
transporte de cocos e pedras, distância, peso da pedra e o latência de transporte do
Experimento de transporte de martelos (Exp. 3) foram analisados com o programa SPSS 13.0,
através de estatísticas descritivas e não-paramétricas (Siegel & Castellan, 1988)
O Teste Qui-Quadrado foi realizado para determinar se havia diferenças entre as
escolhas de martelos de acordo com pesos e/ou posições no Experimento 2. Ainda no
Experimento 2 foi utilizado o teste ANOVA para comparar os martelos quanto ao número de
batidas necessárias para a quebra dos cocos, valor que é utilizado como uma medida de
eficiência dos martelos.
23
No Experimento 1, os dados de observação por coespecíficos também foram
analisados no programa Domina, para geração de Árvores de Caminho mais Curtos (Sato,
1998; Izar et al., 2006). Estas árvores foram construídas da seguinte maneira; primeiro foram
construídas matrizes onde as colunas representam os indivíduos que observaram a
manipulação e nas linhas os indivíduos observados. Nas caselas, foram colocados os valores
relativos ao número de vezes que determinado indivíduo observou o outro manipulando e
quebrando o novo fruto durante as sessões do experimento. A partir dessa matriz, foi gerada
então a árvore orientada de caminhos mais curtos, que é um grafo G (V,A) de estrutura
definida por V, o conjunto de vértices, e por A, o conjunto de arcos. Um arco é uma relação
de distância ou similaridade entre dois vértices. Um caminho é uma seqüência de arcos que se
inicia num vértice e pode passar por vários outros vértices. O comprimento de um caminho é
dado pela soma de arcos do vértice inicial ao vértice terminal. Uma árvore orientada com
T=(V,A’) com uma raiz fonte r (isto é, todos os caminhos partem dela) é um grafo parcial de
G, no qual apenas o subconjunto de arcos de A está presente. Nesse caso, a raiz fonte
representa as relações de observar, e uma raiz destino representa as relações de ser observado.
Foram construídas árvores orientadas de caminho mais curto com todos os indivíduos
do grupo sendo colocados (um de cada vez) como raiz fonte e destino; foram utilizadas nas
análises aquelas árvores que apresentavam alguma relação (muitos indivíduos nunca
observaram ou foram observados, gerando, portanto, árvores com um único indivíduo que não
são informativas) e somente as relações de primeira ordem foram utilizadas.
Estas árvores foram utilizadas para a análise dos dados do comportamento de
observação da manipulação e quebra de cocos por coespecíficos. Elas permitem visualizar
melhor as díades preferenciais de “modelos” e “observadores” e as relações entre estas
“escolhas” e outros comportamentos afiliativos.
24
Ainda para esse experimento, foram calculadas as correlações entre a matriz de
observação interindividual com os dados de idade, freqüência de visita ao sítio experimental,
proficiência (N de cocos de Syagrus quebrados por episódio) e eficiência (tempo de quebra
dos cocos de Syagrus) utilizando o teste TauKr (uma extensão do teste Kr, ver Hemelrijk,
1990a; Hemelrijk & Luteijn, 1998) através do programa MatrixtesterPrj v2.2.3b (Hemelrijk,
1990b) utilizando 2000 permutações por teste. Este teste minimiza os efeitos da dependência
que poderiam ocorrer devido à ocorrência de um mesmo indivíduo em diversas díades de
observador/observado.
No caso de uma das matrizes conterem zeros estruturais (zeros que não são devido aos
resultados do experimento, mas a uma impossibilidade de ocorrer qualquer outro número que
não o zero, como no caso da matriz de observação de quebra entre indivíduos, nas quais
existem macacos que não quebram cocos e por isso nunca foram observados por outros
indivíduos) foi realizada uma correlação parcial utilizando o teste TauKr Parcial, corrigindo a
correlação através de uma matriz ‘dummy’ com valores altos (maiores do que os existentes na
matriz corrigida) nos lugares dos zeros estruturais da matriz corrigida e zeros nas outras
células (Hemelrijk, 1990a). O TauKr Parcial compara duas matrizes, mas controla os
resultados a partir de uma terceira matriz, que no caso dessas análises foi a matriz “dummy”.
As matrizes de idade foram feitas a partir de um ranking de idade, os mais velhos com
os maiores valores e os mais jovens com os menores valores. Nos casos de indivíduos com
idades muito próximas, a estes foram dados o mesmo valor no ranking. No caso dos
indivíduos mais velhos, para os quais não há dados sobre nascimento, foi feito um ranking a
partir da condição física aparente dos indivíduos, colocando o mesmo ranking para aqueles
em condições parecidas.
25
As matrizes de proficiência foram construídas com as médias dos tempos de quebra de
cada indivíduo, sendo esse tempo medido a partir do comportamento de ajeitar o coco até sua
quebra. Nesse caso foram utilizados somente os dados de quebra de jerivá.
As outras matrizes (N de observações e freqüência de visita ao sítio) contêm esses
dados na sua forma absoluta, sendo que a freqüência de visita ao sítio se refere somente ao
período do Experimento 1. Todos os dados utilizados para a confecção das matrizes estão
apresentados nos Anexos A, B e C.
26
3. Experimento 1 - Introdução de novos frutos encapsulados
3.1. Introdução
O fornecimento de frutos encapsulados não-familiares para um grupo de primatas que
já utiliza ferramentas para a quebra de outras espécies de cocos permite, de uma só vez,
estudar a utilização dessa nova fonte de alimento pelos indivíduos, sua disseminação pelo
grupo e também o uso diferencial das ferramentas para a abertura desse novo coco, se houver.
Matsuzawa (1994) e Biro et al. (2003) realizaram em seu “laboratório de campo” em
Bossou, Guiné, estudos sobre a quebra de cocos por chimpanzés e sua transmissão social.
Nesse local, foram instalados pelos pesquisadores sítios de quebra nos quais eram controlados
o número de pedras disponíveis e a quantidade e qualidade das nozes de Elaeis guineensis.
Um dos experimentos realizados foi introduzir espécies de nozes com que o grupo não tivera
contato prévio, mas que se sabia que eram consumidas por outro grupo próximo. Como já dito
na introdução, somente uma fêmea adulta (provavelmente uma imigrante) tentou quebrar as
novas nozes no primeiro contato, sendo que rapidamente os mais jovens passaram a quebrá-
las após observarem essa fêmea. Já os indivíduos mais velhos demoraram significativamente
mais para começar a utilizar o recurso. Os autores ainda ressaltam que há seleção muito
específica dos modelos a serem observados, sendo preferidos os indivíduos da mesma faixa
etária ou mais velhos, mas não mais novos, o que poderia explicar o fato dos mais velhos
demorarem mais para aproveitar um recurso que começou a ser utilizado por um indivíduo
mais novo.
O presente experimento de introdução de uma nova espécie de fruto encapsulado é
uma adaptação do experimento de Matsuzawa. O objetivo foi observar quais os primeiros
animais a utilizar esse novo recurso alimentar (e seu processo de aprendizagem individual) e
acompanhar a dinâmica de disseminação dessa prática no grupo. Os resultados permitiram
saber quais classes de indivíduos (sexo/idade) têm mais interesse pelos frutos novos. Além
27
disso, foi possível determinar quem foram os observadores e suas preferências de modelos
observados. Também foram analisadas as possíveis correlações entre freqüência de
observação (N de observações feitas pelos indivíduos uns aos outros) com a idade, eficiência
(tempo de quebra dos cocos de Syagrus), proficiência (N de cocos de Syagrus quebrados) ou
freqüência de visita dos modelos observados (N de visita dos modelos observados aos sítios
de quebra experimentais).
3.2. Procedimento
O experimento de introdução de novos frutos encapsulados foi realizado de
Agosto/2003 até Outubro/2004, com periodicidade de duas vezes por semana. O fruto
escolhido para o experimento foi o coco da palmeira indaiá (Attalea dubia), mais resistente
que a castanha-do-pará e que não ocorre naturalmente na área do PET (Figura 3). Enquanto o
jerivá (S. romanzoffiana) apresenta frutos secos com aproximadamente 16,1 mm de diâmetro,
20 mm de comprimento e 2,9 mm de espessura da casca, o coco da palmeira indaiá tem, em
média, 27,6 mm de diâmetro, 41,1 mm de comprimento e espessura da casca de 5,4 mm,
sendo maior e mais resistente que o jerivá.
28
Figura 3 – (A) Cocos de jerivá (Syagrus romanzoffiana) em diversas fases de maturação (1-verde, 2-
maduro e 3-seco); (B) cocos de indaiá (Attalea dubia): os dois cocos da esquerda estão
parasitados por larvas de besouro, que também são consumidas pelos macacos.
A1
A2
A3
B
A preparação para as sessões desse experimento consistia em depositar dois cocos de
Attalea próximos às bigornas, procurando sempre colocá-los antes que qualquer indivíduo
chegasse ao local (o que nem sempre foi possível). Durante as primeiras sessões era
aguardado que todos os indivíduos se afastassem antes da colocação de novos cocos, mas isso
prejudicava o experimento, pois o grupo freqüentemente se afastava e não mais retornava ao
local naquele mesmo dia. Decidiu-se então adicionar mais cocos se algum indivíduo se
aproximasse da área onde este havia inicialmente pego os primeiros cocos e exibisse
comportamento de busca (ficar bípede e olhar para o chão, “varrendo” a área). Os cocos de
Syagrus estavam sempre disponíveis durante o experimento.
Todas as sessões foram filmadas (inicialmente com câmera VHS e posteriormente em
MiniDV) a partir do momento em que algum indivíduo se aproximava dos sítios pelo chão.
Era registrado tudo o que esse indivíduo fazia e também se havia algum outro indivíduo
observando - e sua distância aproximada. A sessão terminava quando o indivíduo que havia se
29
aproximado deixava o local sem mexer nos cocos de indaiá ou quando este largava o coco (ou
resto de coco quebrado) que havia pego e/ou quebrado. No entanto, se o indivíduo pegasse o
coco e saísse do local, ele era acompanhado até largar o fruto, sempre se anotando se houve
alguma interação com algum outro indivíduo enquanto o coco estava sendo carregado.
Também eram registrados quais indivíduos eventualmente mexiam nos restos de cocos
quebrados antes do experimentador recolhê-los.
Na análise do material gravado foi registrado para cada sessão: o indivíduo focal, a
ocorrência e o tipo de manipulação do coco (examinar, carregar, quebrar), quantas batidas
foram necessárias para quebrar o coco, quais os indivíduos que observaram a quebra ou se
aproximaram do indivíduo focal enquanto esse consumia o coco aberto, o tempo que o
indivíduo levava para pegar o coco (latência para pegar) e para golpear o coco após pegá-lo
(latência de quebra). O intervalo de tempo do primeiro golpe até a quebra do coco foi
chamado de tempo de quebra.
3.3. Resultados e Discussão
3.3.1. Habituação
Durante as observações na fase anterior aos experimentos (03/2003 à 08/2003), foram
registradas as freqüências de visita aos Sítios 1 e 2 (
Figura 4). Todos os indivíduos (com
exceção de um infante) visitaram os sítios experimentais; no entanto, foi baixa a freqüência de
visitas por infantes e juvenis. Essa baixa participação dos infantes e juvenis poderia ser
explicada pela localização dos sítios, que, por estarem em um local mais aberto (por causa das
filmagens), não ofereciam tanta proteção, fazendo com que os indivíduos mais jovens não
descessem muito ao solo naquele lugar; no entanto, considerando que a maior parte do grupo
já visitava freqüentemente o local, decidiu-se que o grupo estava bastante habituado aos sítios
e os experimentos foram iniciados.
30
1
1
1
8
7
6
1
5
5
5
2
3
2
2
5
2
2
1
9
1
2
5
3
2
2
2
2
1
1
0
0
20
40
60
80
100
120
Lb Sp Bq Md Vv Dw Jn Fs Cc Ed Aa Vt Ag Cd Fl Qm Ad Jb Fd
Subadulto Adulto Adulto Adulto Adulto Juvenil Adulto Adulto Adulto Subadulto Adulto Infante Infante Infante Juvenil Juvenil Juvenil Infante Infante
Indivíduos e faixas etária
Freqüência de visita aos sítios 1 e 2
Figura 4 – Freqüência de visitas aos Sítios 1 e 2 pelos indivíduos do grupo estudado durante a fase de
habituação.
3.3.2. Experimento
Foram realizadas 222 sessões experimentais, de Agosto/2003 a Outubro/2004. Houve
uma participação muito grande de Medeiros, que esteve presente em 31,5% das sessões
(Figura 5). Em segundo lugar, aparecem Darwin e Químico, cada um presente em 17,1% das
sessões. Devido a essa participação intensa de Medeiros, que chegava antes do grupo e
quebrava todos os cocos de indaiá - não permitindo que outros tivessem a chance de encontrar
os novos cocos - foi feita uma pausa no experimento em Maio/2004 na expectativa de que
diminuísse a ocorrência desse comportamento por parte de Medeiros. O experimento foi
reiniciado em Julho/2004 sem a presença tão constante de Medeiros.
31
X
F
i
l
o
F
i
s
i
c
a
A
n
a
C
i
s
c
a
V
i
t
o
r
J
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n
e
t
e
S
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s
p
e
i
t
o
V
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v
a
D
a
v
i
Q
u
i
m
i
c
o
D
a
r
w
i
n
M
e
d
e
i
r
o
s
Indivíduo
30
20
10
0
Participação nas sessões experimentais (%)
Figura 5 – Freqüência de participação, do número total de sessões, dos indivíduos no Experimento 1.
Em 76,5% (N=170) das sessões, o indivíduo que visitou o sítio apanhou o coco, o
quebrou e comeu. Em 14,9% (N=33) das sessões o indivíduo só examinou ou não foi capaz de
quebrar o coco. Somente em 8,6% (N=19) das sessões o indivíduo não pegou o coco.
A latência média para pegar o coco foi de 34s e para a quebra do coco, de 21s. No
entanto, devido a alguns tempos exageradamente grandes, que ocorriam por motivos que não
tinham relação com o experimento (geralmente barulhos que assustavam os animais e estes
voltavam para a árvore), essas médias incluíram vários outliers e, por causa disso, as médias
ficaram muito elevadas, sendo melhor utilizarmos nas análises as medianas: Lat. Peg.=6s e
Lat. Quebra=7s. Esses outliers foram retirados das amostras na realização das análises
estatísticas e dos gráficos desses dados de latência.
O número de batidas dadas pelos indivíduos para quebrar o coco variou de 1 a 31, com
média de 3,8 batidas (St. D.= 4,32); no entanto, em 54,2% dos casos, o indivíduo quebrou o
coco somente com uma ou duas batidas. Inicialmente esta seria uma medida de eficiência para
32
determinar a melhora dos indivíduos na quebra do novo coco, no entanto ela pareceu não ser
adequada a esta finalidade, uma vez que havia pouca variação entre os indivíduos durante
todo o experimento, não sendo possível fazer uma comparação adequada. Decidiu-se então
utilizar o tempo de quebra dos cocos, tanto para os cocos de jerivá quanto os de indaiá. A
tabela com a média de tempo para cada indivíduo é apresentada na Tabela 4.
Tabela 4 – Média do tempo necessário para quebra dos cocos de Syagrus e Attalea
por cada indivíduo do grupo.
Indivíduo
Média de tempo de quebra
de Syagrus (s)
Média de tempo de quebra
de Attalea (s)
#
Ana 7,24 3
*
Bisqüi 5,56 -
Cisca 18,42 16,33
Darwin 5,71 13,40
Davi 6,75 15,85
Edu 10,38 -
Janete 5,10 9,25
Lobato 8,20 -
Medeiros 5,10 15,30
Pedro 4,71 3
*
Químico 5,44 17,79
Suspeito 7,77 15,50
Vavá 5,13 10,88
Joaquim 8,89 15,50
TOTAL 6,48 14,42
#
- Os indivíduos sem valores não participaram do experimento.
* - Apresentam somente um valor.
Os tempos de quebra do coco Attalea ao longo do experimento foram também
analisados para cada indivíduo, como mostram as Figuras 6 a 12.
33
Darwin
y = 0,0034x - 117,84
R
2
= 0,0015
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
06/10/03 14/01/04 23/04/04 01/08/04 09/11/04 17/02/05
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 6 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Darwin, ao
longo do Experimento 1.
Davi
y = -0,0508x + 1952,2
R
2
= 0,2301
0
10
20
30
40
50
60
14/01/04 04/03/04 23/04/04 12/06/04 01/08/04 20/09/04 09/11/04 29/12/04
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 7 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Davi, ao longo
do Experimento 1.
34
Janete
y = 0,0009x - 28,142
R
2
= 0,0008
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
20
28/06/03 06/10/03 14/01/04 23/04/04 01/08/04 09/11/04 17/02/05
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 8 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Janete, ao longo do
Experimento 1.
Medeiros
y = 0,0069x - 245,79
R
2
= 0,0019
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
28/06/03 06/10/03 14/01/04 23/04/04 01/08/04 09/11/04 17/02/05
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 9 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Medeiros, ao longo
do Experimento 1.
35
Químico
y = -0,031x + 1203,7
R
2
= 0,035
0
20
40
60
80
100
120
140
28/06/03 06/10/03 14/01/04 23/04/04 01/08/04 09/11/04 17/02/05
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 10 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Químico, ao
longo do Experimento 1.
Suspeito
y = -0,0032x + 137,06
R
2
= 0,0013
0
10
20
30
40
50
60
06/10/03 14/01/04 23/04/04 01/08/04 09/11/04 17/02/05
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 11 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Suspeito, ao
longo do Experimento 1.
36
Vavá
y = -0,0519x + 1990,3
R
2
= 0,1558
0
10
20
30
40
50
60
06/10/03 14/01/04 23/04/04 01/08/04 09/11/04 17/02/05
Tempo de quebra de Attalea (s)
Figura 12 – Tempos de quebra do coco Attalea, em segundos, pelo indivíduo Vavá, ao
longo do Experimento 1.
De acordo com os gráficos acima e as equações de reta, pode-se perceber que os
resultados individuais geraram retas quase sem inclinação ou com inclinação decrescente. Os
casos com pouca ou sem inclinação mostram que não houve, durante o período, mudança na
habilidade de abrir os cocos daqueles indivíduos. Já os casos em que houve queda acentuada
(Davi, Químico e Vavá) sugerem uma melhora progressiva na habilidade de abrir o novo
coco.
Quando se analisam os dados comportamentais de cada indivíduo separadamente,
pode-se ter uma idéia de como cada um progrediu na exploração e consumo desse novo coco.
Somente os dados relativos aos nove indivíduos que participaram de mais de cinco sessões
serão analisados (Figuras 13 a 21).
Os gráficos das Figuras 13 a 21 apresentam a categoria comportamental Bater, que
agrupa os comportamentos de Quebra Adequada e Quebra Proficiente.
37
Cisca
0
1
2
3
4
5
3
/8/20
0
4
10
/
8/200
4
17/8/2004
24/8/
2
004
31
/
8/2004
7/9
/
2004
14/
9
/
20
04
21
/
9/2004
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 13 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Cisca
durante as sessões do Experimento 1.
Darwin
0
5
10
15
20
25
30
35
1
3
/
1
0
/
2
0
03
13/
1
1/2003
13/12/2003
13/1/2004
13/2/2004
1
3
/
3
/20
0
4
1
3
/
4
/20
0
4
1
3
/
5/2
0
04
1
3
/
6/2
0
04
13/7/2004
13/8/2004
13/9/2004
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 14 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Darwin
durante as sessões do Experimento 1.
38
Davi
0
2
4
6
8
10
12
14
2
3
/1
2
/2
0
0
3
2
3
/1
/
20
0
4
2
3/
2
/2
0
04
2
3/
3
/2
0
04
23/4/2004
23/5/2004
23/6/2004
23/7/2004
23/8/2004
2
3
/9
/
2004
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 15 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Davi
durante as sessões do Experimento 1.
Janete
0
1
2
3
4
5
6
7
24/9
/
2003
2
4
/10/2003
2
4
/11/200
3
24
/12/20
03
24
/1/
2
00
4
24/2
/
2004
24/3/2004
24/4/2004
24/5
/
20
0
4
24/6
/
20
0
4
24
/7/
2
00
4
24
/8/
2
00
4
24/9
/
2004
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 16 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Janete
durante as sessões do Experimento 1.
39
Medeiros
0
10
20
30
40
50
60
70
80
8
/9
/
2003
8
/
11/2
0
03
8
/
1/
2
0
0
4
8
/3
/
2004
8
/5
/
2004
8
/
7/
2
0
0
4
8
/
9/
2
0
0
4
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 17 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Medeiros
durante as sessões do Experimento 1.
Químico
0
5
10
15
20
25
30
35
40
4/9/2003
4/
1
0/2
0
0
3
4/
1
1/2
0
0
3
4
/
1
2
/
2
0
0
3
4
/
1/2004
4
/2
/
2
0
0
4
4
/3
/
2
0
0
4
4
/4
/
2
0
0
4
4
/5
/
2
0
0
4
4/6
/
2
0
0
4
4
/7
/
2
0
0
4
4/8
/
2
0
0
4
4/9
/
2
0
0
4
4
/
10/2004
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 18 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Químico
durante as sessões do Experimento 1.
40
Suspeito
0
2
4
6
8
10
12
14
1
3/
1
0/
2
003
1
3
/1
1/
2
0
03
1
3/
1
2/
2
00
3
13/
1
/2004
1
3/2/2
0
04
1
3
/
3
/20
0
4
13/4/2
0
04
13/5/2004
1
3/6/
20
04
1
3/7/2
0
04
1
3
/
8
/20
0
4
13/9/2
0
04
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 19 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Suspeito
durante as sessões do Experimento 1.
Vavá
0
2
4
6
8
10
12
14
17/10/2003
17/
1
1/2
0
03
17/
1
2/2
0
03
17/1/2004
1
7
/2/2004
1
7
/3/2004
17/
4/2
0
04
1
7
/5/2004
1
7
/6/2004
1
7
/7/2004
1
7
/8/2004
17/
9
/
2
0
0
4
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 20 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Vavá durante
as sessões do Experimento 1.
41
Vitor
0
1
2
3
4
5
6
7
2/
1
2/2
003
2/1/200
4
2/2/200
4
2/
3
/200
4
2/
4/
200
4
2
/
5/
200
4
2/6/200
4
2/
7
/200
4
2
/
8/
200
4
2/9/200
4
Freq. Acumulada
Não ver/Não pegar Examinar Bater
Figura 21 – Freqüência acumulada dos comportamentos apresentados por Vitor
durante as sessões do Experimento 1.
Darwin, Davi, Suspeito, Vavá e Cisca apresentaram uma evolução semelhante na
exploração e uso do novo fruto: nas primeiras sessões, há várias ocorrências do
comportamento de não pegar o fruto; subseqüentemente, houve uma diminuição na freqüência
desse comportamento e um aumento na freqüência de quebra do fruto. No entanto, há
diferenças individuais. No caso de Davi e Darwin, eles primeiro não interagiam com os cocos,
depois passaram a examiná-los e só mais tarde tiveram sucesso na quebra. Analisando as
primeiras participações desses indivíduos (Tabela 5) é possível notar que eles passaram a
quebrar cocos de indaiá somente após observar outro sujeito manipulando estes cocos, sendo
que antes, o ignoravam. O mesmo aconteceu com Cisca e Ana.
42
Tabela 5 - Indivíduos que observaram manipulação e quebra de cocos de indaiá antes de ter sucesso na
sua quebra.
Indivíduo
1ª observação de
manipulação de
indaiá por outros
indivíduos
1ª quebra indaiá
N° de contatos
com cocos (ou
restos) antes da
1ª quebra
N° de
observações
antes da 1ª
quebra
Ana 31/10/2003 – 8:36 17/02/2004 – 10:54 0 (coco) 5
Darwin 19/11/2003 10:53 19/11/2003 – 11:09 1 (coco) 1
Davi 15/01/2004 12:29 30/01/2004 – 8:32 2 (coco) 2
Cisca 17/08/2004 11:16 22/09/2004 – 12:03 1 (coco) 2
Suspeito, Vavá e Cisca apresentaram um padrão um pouco mais “abrupto” de
aprendizagem, uma vez que inicialmente ignoravam estes cocos e subitamente passam a
consumi-los. No caso de Cisca, houve observação do processamento dos cocos de indaiá por
coespecíficos antes da quebra, podendo ter ocorrido aprendizado por observação na utilização
desse novo recurso, mas o mesmo não aconteceu com Suspeito e Vavá, que, além disso, não
exploraram sítios com restos de cocos antes de suas primeiras quebras.
Medeiros, Químico e Janete não apresentaram grandes mudanças em sua interação
com os cocos de indaiá ao longo do experimento. Desde o início de suas participações, eles
abriram e consumiram os cocos, sem apresentar os comportamentos de examinar o fruto. No
caso de Medeiros (esse animal é um dos mais velhos do grupo, não nasceu no Parque e não
sabemos sua origem) e Janete (um indivíduo adulto que provavelmente nasceu no Parque),
existe a possibilidade de que eles já houvessem entrado em contato prévio com esse fruto ou
outros parecidos, o que explicaria a rápida utilização do recurso. O caso de Químico é
diferente, ele nasceu no grupo e nunca teve contato com esse fruto, entretanto apresentou o
mesmo padrão de Medeiros e Janete. A hipótese de que ele tenha visto algum outro macaco
quebrando cocos de indaiá não se aplica, pois ele foi o primeiro sujeito ativo do experimento e
já quebrou estes cocos nessa ocasião, não havendo oportunidade ou necessidade de
aprendizagem social. Talvez a semelhança entre os dois cocos seja muito grande, apesar da
43
diferença de tamanho, e esse sujeito tenha prontamente generalizado o seu uso como
alimento. A mesma explicação poderia se aplicar a Medeiros e Janete.
Vitor, o mais jovem desses indivíduos, não apresentou comportamento de quebra,
somente de exame dos novos cocos. No entanto, isso era esperado, uma vez que nunca foi
observado quebrando nenhum tipo de coco até seu desaparecimento, com 2 anos e 3 meses de
idade.
A latência de quebra, nas análises que se seguem, se refere ao início da atividade, ou
seja, ao tempo entre pegar o coco e o golpear com o martelo (havendo quebra ou não). Ela foi
analisada por indivíduo e está representada nos gráficos das Figuras 22 a 27. Através dessa
análise pode ser verificado se houve aceitação do novo fruto como recurso a ser adquirido
através da sua abertura, indicada pela diminuição das latências de quebra.
Darwin
0
5
10
15
20
25
6/10/2003
25/
11/2003
14/1/20
0
4
4/
3/
2004
23/4/2004
12/6/2004
1/
8/
2
004
20/9/20
0
4
9
/
11/
20
04
Latência da quebra (s)
Figura 22 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Darwin ao
longo do Experimento 1.
44
Davi
0
2
4
6
8
10
12
14
16
14/
1
/2
0
04
4/3/
2
004
23/
4
/2004
12
/6
/
2004
1/
8/200
4
20
/9
/
20
0
4
9/
11
/
20
04
Latência da quebra (s)
Figura 23 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Davi ao
longo do Experimento 1.
Medeiros
0
2
4
6
8
10
12
17
/8/2003
6/10/2003
25/11/2
003
14/1/2004
4/3/200
4
23
/4/2004
12/6/2004
Latência da quebra (s)
Figura 24 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Medeiros
ao longo do Experimento 1.
45
Químico
0
10
20
30
40
50
60
70
28/6/
2
003
17/8/
2
003
6/10/200
3
25/
1
1/
2
003
1
4/
1/20
04
4
/3/2004
23/4/2004
12/6/
2
004
1/
8/200
4
20/9/
2
004
9/11/200
4
29/
1
2/
2
004
Latência da quebra (s)
Figura 25 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Químico ao
longo do Experimento 1.
Suspeito
0
50
100
150
200
250
6/1
0/
20
03
25/1
1
/2
003
14
/
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0
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4/3/2004
23/
4/
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0
4
1
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6/
20
04
1/8/2004
20/
9
/2004
9/1
1/
20
04
Latência da quebra (s)
Figura 26 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Suspeito ao
longo do Experimento 1.
46
Vavá
0
20
40
60
80
100
120
140
6/
10/
2003
25/11/2003
14/
1/
2004
4/
3/
2004
23/
4/
2004
12/6/2004
1
/
8/
2
004
20/
9/
2004
9/11/2004
Latência da quebra (s)
Figura 27 – Latência de quebra dos cocos de indaiá para o indivíduo Vavá ao longo
do Experimento 1.
Como pode ser visto nos gráficos anteriores, as latências de Darwin e Medeiros
(Figuras 22 e 24) permaneceram bastante homogêneas e constantes. Nesses casos parece que
não houve grandes mudanças na latência durante o experimento.
Químico, Suspeito e Vavá (Figuras 25 a 27) tiveram alguns tempos de latência altos
no início do experimento, que são referentes aos primeiros contatos com o novo fruto onde o
tempo examinando-o era grande. No entanto, há um rápido decréscimo nesses valores, que
então permanecem mais baixos, mostrando que eles passaram a tentar quebrar os novos cocos
mais rapidamente após as primeiras sessões, o que poderia ser decorrente, também, de uma
rápida habituação ao fruto. E como na análise dos tempos de quebra (Figuras 6 a 12) foi
verificado que esses indivíduos quase não apresentaram variações durante o período, isso
seria um indicativo de que não teria havido aperfeiçoamentos significativos na técnica da
quebra de cocos. O que provavelmente ocorreu foi o reconhecimento do novo coco como
alimento pelos macacos, o que no caso desses indivíduos teria resultado de um processo de
47
aprendizagem individual, uma vez que eles não observaram outros indivíduos consumindo
este coco antes de começar a fazê-lo também.
3.3.3. Observação
Na análise geral dos dados de observação da quebra de cocos por coespecíficos, é
possível notar que alguns indivíduos foram mais observados durante a quebra do que outros,
como mostra o gráfico da Figura 28. Suspeito foi o sujeito mais observado durante o
experimento, com uma média de 1,26 indivíduos observadores por sessão, É interessante
notar que os três indivíduos com as maiores freqüências como alvos de observação são
machos adultos, o que é ligeiramente diferente do gráfico de freqüência de participação no
experimento (Figura 5), onde os juvenis Darwin e Químico são os mais constantes
participantes após Medeiros.
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
1,2
1,4
1,6
S
u
sp
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D
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vi
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o
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Da
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Ja
n
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te
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m
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Indivíduo alvo da observação
Nº médio de observadores por sessão
Figura 28 – N médio de observadores por sessão do experimento, para cada indivíduo-alvo.
48
A freqüência de observação por cada indivíduo (como observador) é mostrada na
Figura 29. Note-se que o principal observador é Vitor, um juvenil macho, seguido pelos
também juvenis Darwin e Químico. Uma comparação dessas informações com as do gráfico
anterior sugere que os papéis de observador e observado tendem a estar associados a
diferentes faixas etárias.
F
r
i
d
a
C
la
u
d
ia
M
e
d
e
ir
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s
B
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m
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c
o
D
a
r
w
i
n
V
i
t
o
r
Indivíduo observador
40
30
20
10
0
Frequencia de observação
Figura 29 – Freqüência de episódios de observação da quebra de cocos para cada indivíduo
observador.
Os dados de observação da quebra de cocos por coespecíficos, na forma de árvores de
caminhos mais curtos, estão apresentados na Figura 30. Essas árvores têm raízes destino: o
indivíduo na raiz da árvore é aquele observado pelos outros que estão ligados a ele. O
tamanho da flecha quantifica a relação: quanto menor a flecha, mais observações ocorreram.
A partir disso pode-se analisar quais os indivíduos mais observados e por quem (as árvores de
todos os indivíduos, como raízes fonte e destino, estão nos Anexos D e E).
49
Figura 30 – Árvores de Caminho mais Curto, com raiz destino. Estão apresentados todos os indivíduos
que foram observados durante o Experimento. Os arcos representam a freqüência de
ocorrência do comportamento; quanto mais curtos mais freqüentemente ocorreu o
comportamento e mais aquele sujeito na base da flecha observou coespecíficos.
Nessas árvores, é possível notar que Davi, Darwin, Medeiros e Suspeito foram os mais
observados; no entanto, Medeiros é o que tem as relações mais fortes com seus observadores,
ou seja, ele foi muito observado por aqueles indivíduos socialmente ligados a ele. Isso fica
mais claro quando se analisa a relação da soma dos tamanhos dos arcos (as flechas que
representam a quantidade de observação) de cada árvore dividida pelo número de arcos, ou
seja, o número de indivíduos que observam (Tabela 6): quanto menor o valor, mais os
indivíduos foram observados.
Tabela 6 – Valores das árvores de caminho mais curto de cada indivíduo. Soma do tamanho dos
arcos, número de arcos, a relação da soma dos arcos dividida pelo número de arcos e o
“ranking” de cada indivíduo nessa relação.
Indivíduos Soma dos arcos Numero de arcos Tamanho/N Ranking
Medeiros (Md) 1,6792 7 0,2399
Cisca (Cc) 0,8333 2 0,4167
Davi (Dv) 3,8092 8 0,4762
Químico (Qm) 2,6666 4 0,6667
Darwin (Dw) 4,7333 7 0,6762
Vavá (Vv) 2,2 3 0,7333
Janete (Jn) 1,5 2 0,7500
Suspeito (Sp) 8,5 11 0,7727
Ana (Aa) 1 1 1,0000
50
Pode-se notar que os indivíduos com menor valor são aqueles com as maiores árvores
(em número de ramos); a exceção é Cisca, que obteve com um valor baixo, apesar de sua
árvore pequena, devido às muitas observações que recebeu de Cláudia (Cd), sua filha.
Para determinar se os indivíduos mais observados são também os que mais
participaram do experimento ou se há alguma outra variável, tal como proficiência ou
eficiência de quebra, que explique essa diferença de observações, foram feitas análises de
correlação da matriz de observação (número de vezes que um sujeito observou os outros / foi
observado) com as matrizes das outras variáveis. Não foi encontrada uma correlação
significativa entre freqüência de participação no experimento e observação, somente uma
tendência (Tau Kr
xyz
Parcial=0,225 Pr=0,0535). As correlações de observação com idade não
foram significativas (Tau Kr
xyz
Parcial=0,104 Pr=0,2284), mostrando que esse fator não afeta
significativamente a escolha de modelos para observação. Também não foram encontradas
correlações entre observação e eficiência (Tau Kr
xyz
Parcial= -0,102 Pr=0,7661) e.
observação e proficiência (N de cocos de Syagrus quebrados pelos indivíduos durante o
experimento – v. rankings no Anexo A) - Tau Kr
xyz
Parcial=0,092 Pr=0,2799.
Até o momento, foram observadas algumas diferenças em relação aos experimentos
com chimpanzés (Matsuzawa, 1994; Biro et al., 2003), pois neles os chimpanzés observavam
preferencialmente os mais velhos ou de mesma faixa etária, diferente dos macacos-prego
nesse experimento, que não apresentaram uma escolha baseada na idade. Esse resultado é
condizente com o relatado para esse grupo por Ottoni et al. (2005), que também não
encontraram essa correlação entre idade e observação nesse mesmo teste.
A correlação entre proficiência e observação de coespecíficos que foi relatada para
esse grupo no estudo de Ottoni et al. (2005), não foi observada aqui. Essa diferença pode ser
pela diferença metodológica, pois no estudo de Ottoni et al. as medidas de proficiência eram
51
feitas com dados de presença de quebra por episódio, mas sem contabilizar os cocos. No
presente estudo as medidas foram feitas pelo N de coco quebrado por episódio. Outra
diferença são as mudanças que ocorreram nos integrantes do grupo (mortes, nascimentos,
crescimento), o que pode ter modificado os resultados. De qualquer modo, nesse estudo os
indivíduos parecem escolher como alvo para observação aqueles que estão mais
freqüentemente nos sítios de quebra, pois foi a única correlação que, apesar de não
significativa, foi bem próxima desse limite (p=0,0535).
A transmissão do comportamento de quebra e consumo de novos frutos não foi tão
clara como nos estudos com chimpanzés. No presente caso, alguns indivíduos utilizaram o
novo alimento sem observar diretamente ou ser influenciado pelas ações de outros indivíduos
utilizando o recurso. Mas houve eventos em que essa influência pareceu ocorrer, como no
caso de Cisca, não podendo ser descartada a aprendizagem social nesse caso.
Uma pergunta a ser feita aqui seria se os indivíduos precisaram aprender uma técnica
para quebrar ou se foi necessário somente reconhecer o novo fruto como alimento. Como a
mecânica da quebra dos dois frutos não parece diferir muito (exceto, talvez, pela maior força
necessária para a quebra do fruto de Attalea) e todos os indivíduos que passaram a consumir o
coco de Attalea já quebravam o Syagrus, a segunda explicação parece ser a mais apropriada.
Os indivíduos que não sofreram influência de outros (Químico, Suspeito, Janete e Medeiros)
provavelmente aprenderam sobre o novo coco generalizando a partir do coco já conhecido. Já
nos casos em que os indivíduos observaram outros consumindo o coco de Attalea ou tiveram
contato com restos antes de realizar a primeira quebra (Tabela 5), apesar de também se
encaixarem na explicação anterior, podem igualmente ter utilizado o mecanismo de realce de
estímulo: o indivíduo pode ter ouvido os barulhos de quebra ou observado outro mexendo no
novo fruto e ter sido atraído para o coco inteiro, levando esse indivíduo a interagir com o
novo fruto ou, no caso dos cocos já quebrados, além de interagir com os restos de coco, ser
52
reforçado pelos restos comestíveis a voltar àquele local onde estavam os novos frutos e a
partir disso ter aprendido individualmente sobre o novo coco.
Outro processo que pode ter ocorrido ao mesmo tempo é a facilitação social, da
mesma maneira que nos experimentos realizados por Visalberghi e Addessi (2000) e Addessi
e Visalberghi (2001), onde os macacos-prego comiam mais os alimentos novos (coloridos
artificialmente) quando estavam com o grupo e mais ainda quando os outros indivíduos
estavam comendo (tanto o alimento novo quanto o já conhecido) do que quando estavam
sozinhos.
O que parece claro é que houve muita facilidade no início do consumo do novo coco,
provavelmente em função da similaridade deste coco com o já consumido pelo grupo e que
não houve muitas observações antes do início do consumo dos novos cocos pelos sujeitos que
já quebravam os cocos de Syagrus proficientemente. Tudo isso favorece as explicações
baseadas no realce de estímulo e na generalização do coco de Attalea a partir do de Syagrus,
que permitiu aos indivíduos rapidamente reconhecer um novo fruto encapsulado como e fonte
de alimento e passar a utilizá-lo.
53
4. Experimento 2 - Escolha de martelos em função do peso/tamanho
4.1. Introdução
A escolha das ferramentas é uma tarefa essencial na otimização de seu uso. É
necessário escolher adequadamente a ferramenta (e/ou modificá-la) de acordo com o objetivo
desejado. A escolha da ferramenta adequada pode se dar por tentativa-e-erro, onde o
indivíduo as experimenta até achar uma que funcione para aquele objetivo, ou por
aprendizagem observacional do comportamento de coespecíficos. Além disso, existe também
a questão da eficiência, pois uma ferramenta pode ser funcional, mas não necessariamente a
mais eficiente daquelas disponíveis para a tarefa.
Várias observações naturalísticas e experimentos já foram feitos sobre a escolha de
ferramentas por animais. Chappell e Kacelnik (2002, 2004) realizaram experimentos que
verificaram a existência de escolha de ferramentas por corvos da Nova Caledônia. Os corvos
selecionavam ativamente as ferramentas pelo tamanho e diâmetro das varetas disponíveis já
na primeira exposição à tarefa de empurrar um pedaço de alimento para fora de um tubo
transparente, escolhendo somente aquelas adequadas para a extração da recompensa.
Anderson e Henneman (1994) descobriram que macacos-prego em cativeiro escolhem
varetas de diâmetro apropriado para tirar mel de uma caixa; além disso, em outro
experimento, quando as varetas apropriadas não estavam presentes, os macacos modificaram
as mais grossas, mordendo-as e deixando-as mais finas e utilizáveis. Por outro lado,
Visalberghi (1990) não achou evidências de escolha de ferramentas adequadas na tarefa que
consistia em escolher uma ferramenta (entre uma variedade de opções não funcionais) para
penetrar um tubo transparente que continha alimento no meio e assim empurrá-lo para fora.
Na escolha de martelos para a quebra de cocos algumas variáveis físicas são
primariamente importantes: o peso/tamanho, o formato e o material. O peso/tamanho tem que
ser consistente com a força que será necessária para a quebra do coco, sendo que para cocos
54
mais resistentes uma ferramenta mais pesada será necessária. Por causa do modo como os
macacos-prego quebram os cocos - geralmente pegando a pedra com as duas mãos,
levantando-a acima da cabeça e golpeando o coco - essa variável é bastante importante, pois,
dependendo do coco, a pedra terá que ser maior/mais pesada para haver a ruptura da casca. O
formato influencia a possibilidade de se acertar o coco adequadamente durante a batida, e os
martelos geralmente têm uma face mais plana que é utilizada como superfície de contato
durante a batida, diminuindo a probabilidade do coco ser deslocado por causa de uma batida
mal aplicada; além disso, o formato também afeta a capacidade do animal de manipular o
martelo. O material do martelo é importante para que a ferramenta resista às batidas durante a
quebra.
Nesse experimento foi analisado o efeito da variável peso/tamanho sobre as escolha
dos martelos para a quebra de cocos pelos animais, enquanto as outras variáveis mencionadas
(forma e material) foram mantidas constantes.
4.2. Procedimentos
Os locais e medidas dos sítios experimentais, assim como as bigornas, foram os
mesmos anteriormente descritos (v. seção 2.2); somente os martelos fornecidos foram
diferentes.
Os martelos potenciais foram confeccionados em granito, com formato quadrado,
espessura de 2,2 cm e pesos diferentes (Figura 31). Os pesos, dimensões e a designação dos
martelos estão indicados na Tabela 7.
55
Tabela 7 – Os pesos, medidas e designações dos martelos
artificiais do experimento de escolha de martelos
pela variável peso.
Designação no experimento Peso Dimensões
#1 300g 5,1x5,1cm
#2 600g 7,3x7,3cm
#3 900g 9x9cm
#4 1300g 10,8x10,8cm
#5 1700g 12,9x12,9cm
Figura 31 – Martelos de granito oferecidos aos sujeitos do Experimento 2: os números indicam o
tamanho do martelo, seu peso e sua designação no experimento.
As sessões experimentais foram realizadas de Agosto/2003 a Agosto/2004. Em cada
sessão, os martelos eram posicionados entre as duas bigornas (
Figura 32), sendo sua ordem
determinada por sorteio prévio entre todas as 120 combinações possíveis. Cerca de 15-20
cocos de Syagrus eram fornecidos inicialmente e repostos entre as sessões, se necessário,
colocados entre as bigornas junto aos martelos.
56
1,5 m
20 cm
20 cm
20 cm
20 cm
Figura 32 – Posicionamento dos martelos (quadrados) e bigornas (hexágonos) nas sessões do
Experimento 2.
Uma sessão era iniciada quando um indivíduo se aproximava dos sítios (+/- 5m),
sendo filmada continuamente até o fim da sessão – definido como sendo o momento em que o
indivíduo deixava o sítio sem mexer nos martelos, ou quando escolhia um dos martelos e o
levava até o sítio, usando-o ou não. Era registrado qual o martelo escolhido, além do sucesso,
ou não, da quebra – caso essa ocorresse. A eficiência dos martelos foi verificada pelo número
de batidas utilizadas para quebrar os cocos em todos os episódios de uso desses martelos
experimentais, independente de se tratar de uma sessão do experimento ou não (no caso de
uma sessão já iniciada ou finalizada nas quais os martelos não estavam em suas posições
iniciais mas foram utilizados para quebrar).
57
4.3. Resultados e Discussão
Foram realizadas 169 sessões desse experimento. As participações individuais nas
sessões foram condizentes com o esperado a partir das observações prévias: os adultos,
subadultos e juvenis mais velhos participaram de um número muito maior de sessões (Figura
33). As exceções foram Bisqüi, Física e Ana, todos adultos, mas que pouco participaram do
experimento. Bisqüi morreu no começo da coleta de dados. Física é o único indivíduo adulto
do grupo que nunca foi visto utilizando ferramentas no período do experimento (só existem
dois registros de quebra adequada para essa fêmea, feitos por Mannu, 2002), ela somente
come restos de cocos quebrados por outros indivíduos, conseqüentemente só se dirigia aos
sítios experimentais quando havia outro macaco quebrando cocos ou logo após. Ana, apesar
de ser uma quebradora de cocos proficiente, não o fazia freqüentemente, tanto nesse
experimento como nas observações prévias e no experimento anterior. Sendo assim, sua baixa
participação provavelmente se deve a características individuais como a quebra de cocos
infreqüente ou o medo e evitação do local.
58
X
F
isi
c
a
Bisq
u
i
An
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Filo
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or
Janete
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o
Darwi
n
Indivíduo
25
20
15
10
5
0
Participação nas sessões experimentais (%)
Figura 33 – Participação dos indivíduos no Experimento 2 (escolha de martelos).
Dessas 169 sessões, em 126 (74,6%) foi observado o uso proficiente do martelo e
conseqüente quebra do coco de jerivá. Analisando somente estas sessões (
Figura 34) notamos
que quase não há mudança na participação dos indivíduos, com exceção de Medeiros, que
apesar de ser um dos mais proficientes quebradores de cocos e um ativo participante do
Experimento 1 (introdução de novos cocos, v. Cap. 3), não utilizou muito os martelos de
granito, ignorando-os na maioria das vezes. Talvez justamente por ser um dos mais eficientes
quebradores de cocos, ele seja extremamente seletivo na escolha dos martelos e por isso
pouco utilize os martelos de granito, bastante diferentes das pedras utilizadas em situação
natural.
59
BisquiMedeirosJaneteVavaDaviSuspeitoJoaquimLobatoQuimicoDarwin
Indivíduo
30
25
20
15
10
5
0
Participação nas sessões experimentais (%)
Figura 34 – Participação de indivíduos que utilizaram os martelos fornecidos e quebraram cocos no
Experimento 2 (escolha de martelos).
A escolha dos martelos pelo peso/tamanho e pela posição, nos casos em que houve
quebra, é mostrada nas Figuras 5 e 6. As posições dos martelos foram numeradas de 1 a 5,
a partir do martelo mais distante da câmera (
Figura 32).
60
Martelos
#5#4#3#2#1
Freqüência de uso (%)
50
40
30
20
10
0
Seqüência
54321
Freqüência de escolha do local (%)
30
20
10
0
Posição
Figura 35 – Porcentagem de escolha de cada
martelo pelos indivíduos do grupo no
Experimento 2.
Figura 36 – Porcentagem de escolha das
posições dos martelos pelos indivíduos do grupo
no Experimento 2.
Os gráficos com as escolhas dos martelos pelo peso/tamanho e pela posição para cada
indivíduo são mostrados nas Figuras 37 e 38, respectivamente.
61
0
5
10
15
F
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b
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Darwin Ja nete Mede iros
Quimico Suspeito Vava
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0
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F
re
q
.
a
b
s
o
l
u
ta
d
e
u
s
o
12345
Martelo
0
5
10
15
F
re
q
.
a
b
s
o
l
u
ta
d
e
u
s
o
12345
Martelo
12345
Martelo
Figura 37 - Freqüência absoluta de escolha de cada martelo pelos indivíduo no Experimento 2.
62
2
4
6
8
10
F
re
q
.
a
b
s
o
l
u
ta
d
e
u
s
o
Darwin Ja nete Mede iros
Quimico Suspeito Vava
Dav i Joaquim Lobato
2
4
6
8
10
F
re
q
.
a
b
s
o
l
u
ta
d
e
u
s
o
12345
Posição
2
4
6
8
10
F
re
q
.
a
b
s
o
l
u
ta
d
e
u
s
o
12345
Posição
12345
Posição
Figura 38 - Freqüência absoluta de escolha dos martelos de acordo com as posições pelos indivíduos
no Experimento 2.
Foram realizados testes χ² nos dados de cada indivíduo, tanto para a escolha dos
martelos pelo tamanho/peso como pela posição do martelo. No entanto, essa análise foi
realizada somente com os dados de Darwin, Químico, Joaquim e Lobato, pois eram os
únicos que apresentavam um N suficiente de sessões para a realização do teste.
Uma preferência significativa pela posição dos martelos foi verificada para Químico
(χ²=11,636; df=4; α=0,019), que exibiu uma preferência pelos martelos mais centrais (Figura
63
38). Darwin apesar de não apresentar diferença significativa, exibiu uma tendência para
preferência pelos martelos mais centrais (χ²=7,758; df=4; α=0,10). Joaquim e Lobato não
apresentaram diferenças significativas para escolha pela posição dos martelos.
O fato dos juvenis (Químico e Darwin) pegarem os martelos mais centrais - mais
próximos das bigornas (Figura 39), pode ser um indicativo de que a o viés de se pegar o
martelo mais próximo ocorre na escolha dos martelos pelos juvenis, que, apesar disso,
escolheram significativamente mais o martelo #4 (ver adiante). Já o adulto faz sua escolha
baseada no tamanho da ferramenta, não havendo, nesse caso, o viés para o martelo mais
próximo (Figura 40), levando a crer que com a idade surge um padrão mais definido de
preferências pelas características físicas dos martelos.
54321
Posição
20
15
10
5
0
Freqüência absoluta de escolha do local
Faixa_Etária: Juvenil
Figura 39 – Freqüência de escolha dos martelos de
acordo com as posições pelos
indivíduos juvenis no Experimento 2.
54321
Posição
25
20
15
10
5
0
Freqüência absoluta de escolha do local
Faixa_Etária: Adulto/Subadulto
Figura 40 – Freqüência de escolha dos martelos
de acordo com as posições pelos
indivíduos adultos/subadultos no
Experimento 2.
Pelos gráficos gerais (Figuras 41 e 42) e individuais (Figuras 37 e 38) de escolhas de
peso/tamanho é possível notar uma diferença na preferência pelos martelos nessa variável. E
houve diferença significativa na quantidade de escolha dos cinco martelos nos quatro
indivíduos analisados, Darwin (χ²=18,667; df=4; α=0,001), Químico (χ²=23; df=4;
α<0,0001), Joaquim (χ²=15,875; df=4; α=0,003) e Lobato (χ²=14,778; df=4; α=0,006),
64
mostrando que havia algum martelo preferido. Na análise geral o martelo mais escolhido foi
o #4 (1300g), em 34,3% das vezes. E os juvenis escolheram o martelo #4 em 50% das
sessões, como mostra a Figura 41.
5432
Peso/Tamanho
30
25
20
15
10
5
0
Freqüência absoluta de uso
Faixa_Etária: Juvenil
1
Figura 41 – Freqüência de escolha de cada martelo
pelos indivíduos juvenis no Experimento 2.
54321
Peso/Tamanho
30
25
20
15
10
5
0
Freqüência absoluta de uso
Faixa_Etária: Adulto/Subadulto
Figura 42 – Freqüência de escolha de cada
martelo pelos indivíduos
adultos/subadultos no Experimento 2.
Para avaliar se o martelo #4 (1300g), mais escolhido, era o mais eficiente, foram
analisados os dados de eficiência, ou seja, quantas batidas foram necessárias para quebra com
cada martelo, sendo esses dados divididos também por faixa-etária (
Tabela 8) e por indivíduo
(
Tabela 9).
Tabela 8 – Média e desvio padrão do número de batidas para a quebra do coco de Syagrus sp com
cada martelo do experimento.
Adultos/Subadultos Juvenis Total
Martelo
Média de
batidas para
quebrar o coco
Desvio
Padrão
Média de
batidas para
quebrar o coco
Desvio
Padrão
Média de
batidas para
quebrar o coco
Desvio
Padrão
#1 3,18 1,991 2,33 0,577 3,00 1,797
#2 3,24 2,658 3,59 2,123 3,41 2,376
#3 1,62 0,958 2,07 1,307 1,76 1,093
#4 1,49 0,784 1,74 1,110 1,59 0,944
#5 1,41 0,657 1,63 1,064 1,47 0,792
TOTAL 1,61 1,092 1,92 1,333 1,72 1,193
65
Tabela 9 – Média e desvio padrão do número de batidas para a
quebra do coco de Syagrus sp com cada martelo do
experimento para cada indivíduo do grupo estudado.
Indivíduo Martelo
Média de batidas
para quebrar o coco
Desvio
Padrão
Darwin #1 2,33 0,577
#2 3,59 2,123
#3 1,85 1,047
#4 1,70 1,084
#5 1,41 0,665
Davi #1 2,56 1,590
#2 1,86 1,069
#3 1,25 0,577
#4 1,06 0,232
#5 1,22 0,417
Janete #3 1,20 0,422
#4 1,44 0,527
#5 1,56 0,726
Medeiros #1 6,00 -
#2 5,00 1,414
#3 3,00 -
#4 1,50 0,548
#5 2,58 0,707
Químico #3 4,00 2,000
#4 1,85 1,199
#5 2,06 1,526
Suspeito #1 6,00 -
#2 4,00 2,000
#3 1,75 1,500
#4 1,37 0,597
#5 2,00 0,707
Vavá #2 1,00 0
#3 1,25 0,622
#4 1,29 0,488
#5 1,44 0,726
Joaquim #3 2,14 1,464
#4 1,97 0,999
#5 1,74 0,964
Lobato #2 6,00 4,583
#3 2,31 0,947
#4 1,58 0,902
#5 1,29 0,529
TOTAL 1,72 1,193
Foi encontrada uma diferença significativa no número de batidas necessárias para
quebra com os martelos experimentais (ANOVA f=28,286 df=564 p<0,0001), e testes post
hoc (Tukey HSD e Bonferroni) mostraram que há uma divisão em dois grupos: os martelos #1
66
e #2 formam o primeiro e os martelos #3, #4 e #5 o segundo, sendo que esses últimos
apresentaram as menores médias de batidas para quebra, sendo, portanto, mais eficientes.
Olhando as médias e o desvio, o #5 é o mais eficiente uma vez que requer menos batidas para
realizar a quebra e tem uma variância menor. No entanto, levando em conta que ele é o mais
pesado e estatisticamente não existe diferença entre os martelos #3, #4 e #5, o martelo #3
seria o mais eficiente por ser mais leve, e com isso demandar menos energia para sua
utilização.
Quando os dados foram separados entre adultos/subadultos e juvenis, os testes
mostraram que, tanto para os adultos quanto para os juvenis, os martelos ficam
significativamente divididos nos mesmos grupos da análise conjunta: um grupo formado pelos
martelos #1 e #2 e outro pelos #3, #4 e #5 (Juvenis - ANOVA f=9,176 df=203 p<0,0001;
Adultos - ANOVA f=20,218 df=362 p<0,0001 – post hoc Tukey HSD e Bonferroni). Por
esses resultados é possível determinar que o martelo #3 seria o mais eficiente dentre os três
maiores, tanto para os juvenis quanto para os adultos/subadultos, devido a seu menor peso.
Quando são comparados os dados de Juvenis e Adultos/Subadultos, nota-se que os
valores das médias do número de batidas para quebrar o coco são menores para os adultos
(t=2,948 df=560 p=0,003), o que era esperado uma vez que os juvenis tendem a ser menos
proficientes e consistentes na quebra. Isso fica mais evidente ainda na correlação negativa
(Spearman ρ= -0,216; p<0,0001) entre batidas e faixa etária, ou seja, quanto mais velho o
animal, menos batidas ele dá para quebrar os cocos.
A correlação entre a seletividade de cada indivíduo (mensurada pela variância na
freqüência de escolha dos martelos) e a proficiência (N de cocos de Syagrus quebrados com
martelos naturais no Exp. 1/N de episódios) não foi significativa (Spearman ρ= -0,071;
p=0,867). Também não houve correlação significativa entre seletividade e eficiência do
indivíduo (tempo de quebra de Syagrus, v. Exp. 1) – Spearman ρ= 0,036; p=0,933).
67
Os resultados mostraram que há uma escolha de ferramentas para a quebra de cocos
pelos macacos-prego com relação ao peso destas. Todas as pedras foram utilizadas e foram
eficientes pelo menos uma vez. No caso da pedra #1 (300g), que era supostamente inadequada
para a quebra, ela foi escolhida e utilizada somente uma vez com sucesso nas sessões do
experimento e mesmo assim por um indivíduo muito proficiente (Medeiros) e que, segundo
Mannu (comunicação pessoal), sempre pareceu ter uma preferência por martelos muito
menores que os dos outros macacos.
As preferências por martelos dos juvenis e dos adultos não foram muito diferentes,
apesar dos últimos escolherem o martelo mais pesado (1700g) mais vezes que os juvenis.
Provavelmente isso se deve ao maior tamanho dos adultos, que por essa razão não tinham
tanta dificuldade para carregá-lo como parece ter ocorrido com os juvenis. No entanto, o
martelo mais escolhido não foi o mais eficiente segundo as análises, o que pode ser
conseqüência de um custo pequeno para a utilização de um martelo grande ou, por outro lado,
da pouca limitação de alimento (e conseqüentemente de disponibilidade de energia) pelos
indivíduos do grupo estudado, ou ainda porque a eficiência do martelo não é a única variável
relevante para a escolha desse, podendo haver influencias de fatores como facilidade de
manuseio ou maior facilidade para acertar o coco com martelos maiores.
A maior diferença entre as faixas etárias se deu na posição dos martelos escolhidos,
sendo que os juvenis pegavam os martelos em posições mais próximas às bigornas (apesar de
escolherem os maiores/mais pesados – martelos 4 e 5), enquanto os adultos não apresentaram
esse padrão. Obviamente pegar um martelo mais próximo por si só não é uma escolha, mas
uma falta dela, pois o indivíduo está somente fazendo o mais econômico. Os adultos deixam
algumas vezes de fazer essa economia para escolher um martelo que está mais distante, mas
que pode ser mais eficiente. Já os juvenis, na maioria das vezes, só vão fazer a escolha entre
os martelos que estão próximos, ignorando os mais distantes.
68
Apesar das diferenças mostradas, todos os indivíduos já proficientes na quebra
escolheram adequadamente entre os martelos novos para realizar a tarefa, mostrando
capacidade de escolha de ferramentas adequada mesmo em um material e formato diferentes
daqueles utilizados naturalmente.
69
5. Experimento 3 - Transporte de martelos
5.1. Introdução
O transporte de ferramentas até o lugar adequado para sua utilização é essencial em
muitos casos de uso de ferramentas em primatas, como, por exemplo, a “pesca” de cupins por
chimpanzés, na qual os indivíduos precisam fazer as ferramentas, longas varetas, a partir de
certa planta que normalmente está distante do cupinzeiro e depois levar até este para utilizá-la
(McGrew, 1974; McBeath & McGrew, 1982). Do mesmo modo, a quebra de cocos pode
exigir o transporte de pedras por longas distâncias até uma bigorna adequada, o que também
já foi descrito para chimpanzés em vida livre (Boesch & Boesch, 1984). Mas, uma vez
transportadas, as pedras podem ser reutilizadas diversas vezes no local, enquanto que as
varetas geralmente só são utilizadas uma vez. O transporte de ferramentas, quando seu local
de utilização é distante, exige certa previsão do uso da ferramenta quando o transporte começa
de um local em que não há visão do destino final.
Jalles-Filho et al. (2001) realizaram um experimento com um grupo de macacos-prego
em cativeiro em uma ilha, no qual os macacos tinham inicialmente, durante 10 minutos,
pedras e cocos juntos à sua disposição para realizar a quebra; após isso, havia uma sessão de
duas horas com uma caixa de acrílico com maisena dentro, junto com pedras para quebrar a
caixa. Depois de mais uma sessão com as pedras e os cocos, eles eram apresentados, durante
duas horas, a uma situação com a caixa de acrílico e as pedras a 15 metros dali; e por fim, eles
eram apresentados a uma situação com pedras e cocos a 15 metros um do outro. Os indivíduos
não transportaram as pedras em nenhum dos casos (com uma exceção na última situação
apresentada), e, no último caso, ocorreu somente o transporte dos cocos até as pedras. A partir
disso os autores concluem que os macacos-prego não realizaram as fases necessárias para
completar a tarefa apresentada, que são: (1) busca pela pedra, (2) transporte da mesma e (3)
seu uso como ferramenta.
70
Apesar dos macacos terem transportado os cocos até as pedras, os autores consideram
que isso não implica em representação mental (Fases 1 e 2) porque a fonte de alimento (coco),
que é o objetivo da tarefa, permanece em contato com o sujeito, fazendo com que não tenha a
necessidade de ter um modelo de representação para realizar a tarefa, podendo simplesmente
ser por tentativa-e-erro.
Jalles-Filho et al. (2001) propõem como hipótese para a não-ocorrência do transporte
de ferramentas (mas sim a de cocos) a pressão social exercida pelos outros indivíduos do
grupo, que seriam uma ameaça, pois poderiam pegar o alimento deixado de lado para o
transporte de ferramentas, desfavorecendo assim a ocorrência do transporte de ferramentas.
Cleveland et al. (2004) também fizeram um experimento de transporte de ferramentas
com macacos-prego em cativeiro, no qual era oferecida aos sujeitos uma caixa com melado
com uma pequena abertura no topo e varetas de 15 cm para alcançar o alimento. Essas varetas
foram inicialmente colocadas junto à caixa, depois a 5 metros e em outra sessão, a 11 metros
com uma barreira visual entre a vareta e o aparato. Eles observaram que os macacos
prontamente transportaram a ferramenta para o aparato e a utilizaram para pegar o alimento,
em todas as situações. Os autores fizeram ainda mais um experimento, desta vez com um
aparato de quebra de cocos, além da caixa de melado. Somente uma das caixas colocadas
continha alimento em cada sessão. Fora de visão, a 11 metros, eram disponibilizados varetas e
martelos para que os macacos escolhessem e transportassem ao local de uso. No caso das
varetas houve sucesso pelos sujeitos, mas no caso das pedras raramente houve transporte.
Esse resultado é consistente com aquele de Jalles-Filho et al. (2001) e os autores discutem que
isso pode ser em conseqüência do custo de se transportar uma pedra ao invés de varetas e o
risco de se perder o alimento enquanto se faz isso, sendo que provavelmente é mais vantajoso
transportar o coco até a ferramenta. No entanto os autores não acreditam que faltem ao
macaco-prego habilidades cognitivas para o transporte de ferramentas, mas sim que isso é
71
uma conseqüência de decisões ecológicas baseadas na disponibilidade de alimento, custos
fisiológicos do transporte e custos de deixar o alimento desprotegido enquanto pega a
ferramenta. Outro caso é o relatado por Mannu e Ottoni (2005) nas quais as varetas utilizadas
pelos macacos-prego sempre são transportadas até o local, pois geralmente são utilizadas para
retirar larvas ou outros alimentos de dentro de cavidades fixas, não restando outra alternativa
senão o transporte das ferramentas, enquanto que no caso das pedras e frutos encapsulados
estes últimos também podem ser transportados até a ferramenta.
Fragaszy et al. (2004), relataram o uso de ferramentas para quebra de cocos por
macacos-prego selvagens nos topos de morros nos quais só ocorrem naturalmente pedras de
arenito, que não são adequadas como martelos por sua fragilidade. No entanto, nesses morros
ocorrem sítios de quebra com martelos de seixos (adequados para quebra), sugerindo a
ocorrência de transporte dessas pedras (talvez por grandes distâncias) até as bigornas.
Neste experimento de transporte de cocos observamos se ocorre busca, transporte e
uso de martelos quando estes não se encontram disponíveis junto à bigorna (mas com os
cocos ali disponíveis) e os efeitos da distância entre a bigorna e os martelos potenciais
disponíveis sobre esta atividade. Este experimento visa compreender melhor o grau de
planejamento ou antecipação envolvido no comportamento de quebra de cocos. Uma vez que
esse experimento entrava em conflito com os anteriores, pois exigia tornar o sítio de quebra
menos atrativo, ele foi realizado somente após o término daqueles.
5.2. Procedimentos
Para examinar melhor a questão da distância da qual os sujeitos poderiam buscar e
transportar as ferramentas, o experimento foi dividido em duas fases: 1ª Fase - martelos
disponibilizados a duas distâncias (5 e 10 metros); 2ª Fase - martelos disponibilizados apenas
a 10 metros. Os martelos posicionados a cinco metros das bigornas eram bem visíveis a partir
72
destas, enquanto que a 10 metros a visualização dos mesmos era um pouco mais difícil por
causa da vegetação, apesar de estarem sempre na linha direta de visão a partir das bigornas.
Os martelos utilizados nas duas fases foram pedras selecionadas dentre as naturalmente
disponíveis no parque, com peso entre 800 e 1800g, formato arredondado-oval, achatado, e
que possuíam pelo menos uma face plana, sendo assim ferramentas adequadas para quebra, e
que já haviam sido utilizadas por indivíduos do grupo com sucesso para quebra de cocos.
Antes do início do experimento, foi feita a retirada de todos as pedras que poderiam constituir
martelos potenciais que estavam a até 15 metros das bigornas dos sítios experimentais (nem
sempre o pesquisador foi bem sucedido nessa tarefa, v. adiante).
Em cada sessão, os martelos eram colocados aleatoriamente nas distâncias (medidas
com uma trena) determinadas e os cocos de Syagrus romanzoffiana, disponibilizados ad
libitun entre as duas bigornas (Figura 43). Nas sessões da Fase 1, foram fornecidos três
martelos, sendo dois a 5 metros e um a 10 metros, esses martelos adicionais foram colocados
para aumentar as oportunidades de coleta de dados, pois mesmo quando um dos martelos
fosse transportado e estivesse sendo utilizado, um outro sujeito poderia começar outra sessão
com os martelos restantes. Na Fase 2, foi fornecido somente um martelo a 10 metros.
73
Figura 43 – Esquema do posicionamento de martelos (elipses) e bigornas (hexágonos) na Fase 1 do
Experimento 3. Na Fase 2 somente o martelo mais distante, 10 m, estava disponível.
5m
5
m
1,5 m
5
m
Experimentador
5
m
Quando qualquer indivíduo chegava às bigornas, sua atividade era continuamente
filmada. A sessão era finalizada quando o indivíduo pegava os cocos e os transportava para
mais de 10 metros das bigornas ou quando ocorria transporte da ferramenta até alguma
bigorna, sempre sendo registrado a distância e as ocorrências de uso da ferramenta e de
transporte conjunto dos cocos.
5.3. Resultados e Discussão
O experimento foi realizado entre 08/10/2004 e 02/02/2005. A Fase 1 foi realizada até
28/12/2004, num total de 100 sessões. Depois disso, foi realizada a Fase 2, com 30 sessões.
A participação total dos indivíduos nesse experimento (número de sessões em que o
indivíduo visitou o sítio experimental quando este estava preparado) está apresentada no
74
gráfico da Figura 44, onde é possível notar que a maioria dos participantes são machos e que
há uma grande participação do juvenil Darwin.
X
A
n
a
J
a
n
e
t
e
C
i
s
c
a
P
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d
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o
S
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Q
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c
o
M
e
d
e
i
r
o
s
D
a
r
w
i
n
Indivíduo
40
30
20
10
0
Frequencia de participação no experimento
Figura 44 – Número de sessões em que cada indivíduo visitou o sítio experimental durante o
Experimento 3.
As pedras utilizadas tinham um peso médio de 1289,55g (+/- 408,57). Houve
transporte de pedras pelos indivíduos em 61% das sessões da Fase 1 e em somente 30% da
Fase 2. Por outro lado, houve 91,9% e 100% de transporte de cocos por algum indivíduo
durante as sessões das Fases 1 e 2, respectivamente, tanto para outros sítios de quebra
distantes do sítio experimental, como até as pedras do experimento que eventualmente eram
transportadas junto com os cocos.
75
5.3.1. Fase 1
Na Fase 1 houve 61 eventos de transporte de pedra, sendo alguns por mais de cinco
metros (Tabela 10), - a distância mínima permitida pelo experimento. Nessa fase, 10
indivíduos transportaram as ferramentas (Figura 45). Houve, no entanto, transportes por
menos de cinco metros, pois algumas vezes os indivíduos transportavam um dos martelos até
o local onde estava o outro, ou até uma bigorna natural que não havia sido retirada do local;
isso aconteceu principalmente no início do experimento, quando nem todas as pedras no
entorno haviam sido retiradas ou quando os martelos do experimento não estavam todos a 5m
uns dos outros, e eram usados como bigornas, o que ocorreu nas primeiras sessões devido a
erros no posicionamento dos martelos nessas sessões iniciais, resultando na colocação dos
martelos em distâncias inapropriadas.
Tabela 10 – Freqüências e porcentagens de eventos de
transporte de pedras para cada distância durante
a Fase 1 do Experimento 3.
Distância (m) Freqüência Porcentagem
2 2 3,3
3 2 3,3
4 1 1,6
5 49 80,3
6 1 1,6
8 1 1,6
9 1 1,6
10 3 4,9
14 1 1,6
Total 61 100
76
Indivíduo
X
Suspeito
Janete
Pedro
Vava
Joaquim
Quimico
Medeiros
Davi
Darwin
Freqüência de transporte na Fase 1
30
20
10
0
Figura 45 – Freqüência de episódios de transporte dos martelos por
indivíduo na Fase 1 do Experimento 3.
O número de eventos de transporte, tanto dos martelos quanto dos cocos, para cada
indivíduo, está indicado na
Tabela 11 e nos gráficos das Figuras 46 e 47. Nota-se que Darwin
foi o responsável por grande parte das ocorrências de transporte de cocos e pedras.
77
Tabela 11 – Resultados individuais do Experimento 3 (apenas indivíduos que dele participaram):
Número de sessões em que o sujeito não transportou nada/ transportou somente o coco/ somente a
pedra ou transportou o coco e a pedra.
Fase 1
Indivíduo
Não transportou
nada
Transportou
o coco
Transportou a
pedra
Transportou o
coco e a pedra
Ana - 2 - -
Cisca - 3 - -
Davi - 4 1 8
Darwin 1 3 - 23
Janete - 1 - 1
Joaquim - 7 - 4
Medeiros 2 3 - 8
Pedro - 1 - 2
Químico - 6 1 7
Suspeito 1 2 - 1
Vavá - 3 1 3
X - - 1 -
TOTAL (Fase 1) 4 35 4 57
Fase 2
Davi - 5 - -
Darwin - 2 - 3
Janete - 1 - -
Joaquim - 1 - -
Medeiros - 5 - -
Pedro - - - 3
Químico - 2 - 2
Suspeito - 4 - -
Vavá - 1 - 1
TOTAL (Fase 2) - 21 - 9
TOTAL (Fases 1+2) 4 56 4 66
78
Fase 1
0
5
10
15
20
25
Ana
Cisca
D
a
vi
Dar
w
in
J
a
n
e
te
J
o
a
q
u
i
m
M
edeiro
s
Pedr
o
Químico
S
u
s
p
e
it
o
Vavá
X
Indivíduos
N de sessões do Exp. 3
Não transportou
nada
Transportou o coco
Transportou a pedra
Transportou o coco
e a pedra
Figura 46 – Número de sessões da Fase 1 do Experimento 3 em que o sujeito não transportou
nada/ transportou somente o coco/ somente a pedra ou transportou o coco e a pedra.
Fase 2
0
1
2
3
4
5
6
Davi
Darwin
Janete
Joaquim
Medeiros
Pedro
Químico
Suspeito
Vavá
Indivíduos
N de sessões do Exp. 3
Não transportou
nada
Transportou o
coco
Transportou a
pedra
Transportou o
coco e a pedra
Figura 47 – Número de sessões da Fase 1 do Experimento 3 em que o sujeito não transportou
nada/ transportou somente o coco/ somente a pedra ou transportou o coco e a pedra.
79
A maioria dos eventos de transporte envolveu distâncias de 5 metros, mostrando que
os macacos-prego tendem a pegar as ferramentas mais próximas - ignorando, na maioria das
vezes, as pedras a 10 metros - e transportam-nas para a bigorna mais próxima. Houve, no
entanto, casos como aquele em que Darwin pegou o martelo que estava a 5 metros, e o levou,
juntamente com os cocos, para cima do muro (+/- 3 metros de altura) de uma construção
abandonada a 14 metros de distância do local onde havia pego a pedra e lá quebrou o coco.
Darwin realizou esse comportamento por 3 vezes no total, sendo que, nas outras duas
ocorrências, o martelo estava a somente 10 metros do muro.
O transporte de cocos ocorreu em 93,3 % dos episódios de transporte de martelos da
Fase 1. Esse transporte do cocos ocorreu sempre antes do transporte do martelo, sendo que os
sujeitos, após pegarem os cocos, adotavam, em geral, uma postura bípede, olhando ao redor e
dirigindo-se então até o martelo, que era transportado, junto com os cocos, até uma bigorna,
onde era realizada a quebra.
Nessa fase, a média dos tempos de latência de transporte dos martelos, ou seja, o
tempo que os macacos levavam para pegar a pedra depois de pegar o(s) coco(s), foi de 33,6
segundos (+/-21,82), com mínimo de 9s e máximo de 102s. Essa grande variância se deu por
motivos sem importância para o experimento, geralmente sustos que os indivíduos sofriam e
por isso saiam do local e demoravam a voltar.
5.3.2. Fase 2
Na Fase 2 ocorreram 9 eventos de transporte de pedras em 30 sessões, sendo que
destes, 5 envolveram distâncias de 10 metros. Houve, no entanto, 4 eventos de transporte por
menos de 10 metros, pois, assim como na Fase 1, algumas vezes os indivíduos transportavam
o martelo até uma bigorna natural no meio da mata - onde estas não haviam sido retiradas
pelo experimentador por estarem (supostamente) longe da área do experimento.
80
Somente 4 indivíduos realizaram transportes nessa fase (Figura 48): Darwin, Pedro,
Químico e Vavá.
Indivíduo
VavaQuimicoPedroDarwin
Freqüência de transporte na Fase 2
4
3
2
1
0
Figura 48 – Número de sessões em que o indivíduo visitou o sítio
experimental preparado durante a Fase 2 do Experimento
3.
O transporte de cocos ocorreu em todas as sessões, associado ou não ao transporte de
ferramentas, sendo que, neste último caso, o sujeito geralmente pegava o coco, ficava bípede,
olhava o entorno e ia embora, transportando os cocos até um sítio de quebra natural, ou
simplesmente largava o coco depois de alguns minutos.
Os eventos de transporte de cocos, nos casos em que ocorreu quebra - assim como na
Fase 1 - ocorreram antes ou durante o transporte das pedras, nunca depois.
A latência média para o início do evento de transporte nessa fase foi de 97,14
segundos (+/-52,41, mínimo de 39s e máximo de 180s). Essa latência foi maior que a
observada na fase anterior, provavelmente porque era necessário procurar por mais tempo
pelos martelos (mais distantes) e também pela própria distância a percorrer.
81
O transporte de ferramentas pelos macacos-prego durante esse experimento aconteceu
de forma distinta do que o descrito na literatura até o momento. Diferente dos experimentos
de Jalles-Filho et al. (2001) e Cleveland et al. (2004), nos quais os macacos-prego não
transportaram ferramentas de pedra até os locais de utilização, nesse experimento houve
transporte por até 14 metros - e subseqüente utilização das ferramentas.
No entanto, de modo semelhante ao mostrado pelos dois estudos citados, os macacos
não abandonavam o alimento quando buscavam as ferramentas, sempre levando os cocos até
as pedras e depois transportando ambos até os sítios de quebra. Isso é consistente com a
explicação de Jalles-Filho et al. (2001) e Cleveland et al. (2004) de que pode haver uma
limitação social dada pela incapacidade de um indivíduo de guardar uma fonte de alimento se
não estiver perto dela, levando muitas vezes (como aconteceu na Fase 2 do experimento) o
indivíduo a levar o coco embora sem procurar ou transportar as pedras. No entanto, no grupo
de macacos-prego em vida livre estudado por Silva (2005) foram observados 20 episódios de
transporte de ferramentas de pedra para quebra, a média da distância de transporte foi 6m,
sendo 17m a maior distância de transporte registrada. Os episódios eram freqüentemente
dissociados de transporte de cocos.
A influência dos coespecíficos no transporte de cocos não foi examinada nesse estudo,
mas uma análise das gravações do experimento poderá mostrar se os episódios em que
ocorreram os transportes de coco foram sempre na presença dos coespecíficos ou se este fator
não influencia a ocorrência do transporte dos cocos.
O fato dos macacos nunca se separarem do alimento (seu “objetivo final”), é apontado
por Jalles-Filho et al. (2001) como uma evidência contra a hipótese de uma “representação
mental” pelos macacos-prego, pois, diferentemente dos chimpanzés, que fabricam e
transportam as ferramentas antes de ter em vista seu objetivo final, os macacos só pegariam e
utilizariam ferramentas quando em contato com aquele “objetivo”. Entretanto, essa
82
capacidade cognitiva poderia estar sendo justamente mascarada pela pressão social de
proteger o alimento, como lembram Cleveland et al. (2004), e nesse caso, o fato de estarem
com o coco não significa que não há representação, mas somente uma impossibilidade de
abandonar o coco sem correr o risco de ficar sem o alimento. Outra explicação possível seria a
economia de se transportar os cocos, que sempre são mais leves que os martelos, sendo,
portanto, menos custoso transportá-los do que as pedras, além daqueles serem sempre móveis
– ao contrário das bigornas. Nesse caso, os macacos estariam simplesmente realizando o
comportamento mais econômico, transportar o coco ao invés dos martelos. Mas, como
mostrado neste experimento, quando o transporte da ferramenta é necessário, ele
freqüentemente ocorre, e quanto mais perto o martelo se encontra da bigorna, maior a chance
de ocorrer o transporte.
Provavelmente o transporte de pedras é um comportamento mais raro do que o
transporte de outros tipos de ferramentas mais leves, como varetas, freqüentemente exibido
por macacos-prego (Mannu & Ottoni, 2005), porque o martelo, por ser mais perene que um
galho, é transportado somente uma vez ao local de uso, sendo utilizado depois pelo mesmo ou
outros indivíduos sem a necessidade de novo transporte da ferramenta.
83
6. Conclusão
6.1. Experimento 1
A partir dos resultados do primeiro dos experimentos acima descritos, foi possível
notar que a disseminação do uso de uma nova fonte alimentar (o novo fruto encapsulado,
indaiá) pode ser influenciada pelos indivíduos que já consomem o novo fruto. No entanto esse
fator social parece não ser o único a atuar, pois houve casos de animais que nunca haviam tido
contato com o fruto e mesmo assim o quebraram sem observar outros indivíduos, mostrando
que houve somente aprendizagem individual nesse caso. Esses resultados sugerem que
processos individuais e sociais ocorreram concomitantemente.
A análise dos dados comportamentais mostrou que há diferenças entre os indivíduos
com relação ao início da exploração do novo coco. Alguns não pegavam os cocos nas
primeiras sessões e demoraram algum tempo para começar a consumi-los, enquanto outros
começaram a consumir o fruto desde o primeiro contato com ele. Nesse último grupo se
encontram dois indivíduos adultos (Medeiros e Janete), que poderiam ter entrado em contato
com esse coco antes de habitarem o local (animais não nascidos no Parque, de local de origem
desconhecido). No entanto esse padrão também ocorreu com Químico, que nasceu no Parque
e não teve contato prévio com o fruto introduzido.
Os resultados das análises dos tempos de quebra mostram que na maioria dos casos
não houve variação na habilidade de abrir os novos cocos ao longo do experimento. Somente
os indivíduos Davi, Químico e Vavá apresentaram diminuição desses tempos, sugerindo uma
melhora em seu desempenho. Provavelmente a maioria dos indivíduos que utilizou o novo
coco conseguiu processá-lo sem que fossem necessários grandes ajustes nos comportamentos
de quebra.
As análises da variável latência de quebra mostraram que somente alguns indivíduos
(Químico, Suspeito e Vavá) apresentaram uma queda desses tempos a partir das primeiras
84
sessões do experimento. O que parece ter acontecido foi que esses indivíduos levaram algum
tempo até reconhecer prontamente o novo fruto como alimento. Os outros indivíduos que
também utilizaram o fruto não apresentaram muita variação nesse fator, sugerindo que
rapidamente reconheceram o novo fruto como alimento.
O que os macacos-prego precisaram aprender nesse experimento provavelmente foi a
reconhecer o novo fruto como alimento, pois a mecânica da quebra desse novo coco (Attalea)
não parece ser diferente da quebra de Syagrus, e todos os indivíduos que passaram a utilizar o
novo coco durante o experimento já eram quebradores de coco proficientes. Alguns
indivíduos provavelmente aprenderam individualmente a reconhecer o novo fruto, como no
caso de Químico, que foi o primeiro a utilizar o recurso. Mas o tipo de transmissão social de
informações envolvido em alguns casos (Ana, Cisca e Davi) pode ter sido o realce de
estímulo, pois esses indivíduos não utilizaram prontamente os novos cocos, mas apenas após
observarem outros a quebrá-los. Nesses casos, o sujeito pode ter sido direcionado e
estimulado pelo comportamento de outros indivíduos. No entanto não podem ser descartados
outros tipos de aprendizagem social como imitação ou emulação. Resumindo: alguns
indivíduos aprenderam rapidamente e sozinhos a utilizar o novo recurso, enquanto alguns
demoraram mais e observaram outros antes de consumir o coco. Talvez essa observação não
fosse necessária para a aprendizagem sobre o coco, mas pode, pelo menos, ter acelerado o
processo para alguns indivíduos.
Não houve uma classe particular de indivíduos que começou a utilizar o novo recurso
antes dos outros. Tanto juvenis como adultos aprenderam independentemente a utilizar os
novos cocos, o que difere do verificado no estudo de Matsuzawa (1994) no qual os
chimpanzés mais jovens é que começam a utilizar os novos frutos - e apenas posteriormente
esse comportamento foi sendo transmitido de adultos para jovens. No caso dos macacos-
prego, apesar de neofóbicos com novos alimentos (ou seja, não comem imediatamente novos
85
itens alimentares), eles os exploram bastante, principalmente os indivíduos mais jovens
(Visalberghi et al., 2003). Esse comportamento exploratório intensivo permite que os macacos
prego incluam rapidamente novos itens alimentares na sua dieta, tornando-se mais adaptáveis
a mudanças.
As análises dos episódios registrados de observação entre coespecíficos mostraram
que Davi, Darwin, Medeiros e Suspeito foram os mais observados pelos outros indivíduos, e
que Medeiros era o que tinha relações mais fortes com os observadores, ou seja, ele foi mais
observado do que os outros por aqueles indivíduos ligados a ele nas árvores de observação de
quebra.
Apesar dos adultos proficientes terem sido alvo de muitos episódios de observação,
não houve correlação significativa entre idade, proficiência ou eficiência do modelo com a
escolha deste como alvo da observação da quebra de cocos pelos coespecíficos. Somente
houve uma tendência, muito próxima ao limite de significância (p=0,0535), de correlação
positiva com a freqüência de visita aos sítios experimentais. Diferente do estudo de Ottoni et
al. (2005), com o mesmo grupo, no presente experimento o fator proficiência não apresentou
correlação com a escolha do modelo a ser observado, provavelmente devido a diferentes
metodologias e diferenças nos componentes do grupo.
Nos estudos de Matsuzawa (1994) os chimpanzés observavam o uso de ferramentas de
indivíduos com idade semelhante ou mais velhos, e demoravam a utilizar o novo recurso,
sendo que alguns adultos do grupo nunca adicionaram o consumo desse novo fruto a seu
repertório de quebra. Os macacos-prego não apresentaram, em nosso estudo, essas
características e, além de não haver correlação entre as preferências por modelos potenciais e
as idades destes, também não houve muita demora para o início do consumo do novo fruto.
Talvez o fruto utilizado no experimento seja muito parecido com o que eles já consumiam (no
86
entanto, aqueles usados nos experimentos com chimpanzés também não eram muito
diferentes daqueles já consumido por eles).
A proximidade dos novos cocos aos sítios de quebra já anteriormente utilizados pode
ter facilitado o reconhecimento daqueles como recurso alimentar a ser adquirido através da
quebra; no entanto, mais uma vez, isso não ocorreu no caso dos chimpanzés, o que nos leva a
acreditar que este não tenha sido um fator muito importante.
A neofobia para novos alimentos apresentada pelos chimpanzés pode ser um fator
importante, pois esta parece ser maior que a dos macacos-prego, o que explicaria a menor
utilização imediata do novo alimento naquela espécie, em comparação com os nossos
macacos-prego.
Os resultados apresentados no Experimento 1 mostram que os macacos-prego parecem
aprender muito rápido, e em geral individualmente, sobre novos recursos alimentares. Essa
rapidez é consistente com a adaptabilidade da espécie a variações ambientais, que permite aos
macacos-prego habitarem uma ampla gama de ecossistemas. Essa agilidade é ainda maior
quando há influência social na aprendizagem, que possibilita aos indivíduos aprender a
utilizar o novo recurso mais rapidamente. No presente caso, essa influência parece acontecer
por realce de estímulo, que direciona os indivíduos rapidamente para o novo alimento,
abreviando o tempo que estes poderiam demorar para descobri-lo por conta própria. Desse
modo a influência social pode ajudar na difusão do uso de novos recursos rapidamente por
todo o grupo, característica que permite à espécie se ajustar, por exemplo, ao migrar para
novos territórios com itens alimentares diferentes, ou ambientes com grande sazonalidade que
apresentem pouco tempo para o consumo dos recursos, onde os alimentos disponíveis em
determinada época precisam ser consumidos rapidamente. Nesses casos, os indivíduos que
não conhecem os novos itens precisam aprendê-lo rapidamente para aproveitar o recurso.
87
O realce de estímulo pode ser particularmente eficiente nos casos em que o local de
ocorrência do comportamento em questão é relativamente fixo, caso das bigornas para quebra
de cocos, nos quais a utilização de um novo fruto poderia ser mais facilmente aprendida pelos
indivíduos utilizadores de ferramentas devido a maior probabilidade de encontrar frutos ou
restos desses nas bigornas constantemente utilizadas. Nas populações selvagens de Gilbués,
PI, essas condições parecem existir em abundância, pois são poucos os locais em que ocorre a
quebra de cocos, permitindo assim que novos recursos alimentares possam ser rapidamente
assimilados pelo grupo. Nos casos de uso de ferramentas em locais mais aleatórios ou menos
conspícuos, o realce de estímulo provavelmente é menos eficaz - como por exemplo, o uso de
varetas (mas, mesmo nesse caso, ele pode acontecer, quando as ferramentas ficam no local
onde há alimento).
6.2. Experimento 2
Os resultados do Experimento 2 mostraram que os martelos mais pesados/maiores
foram mais escolhidos que os mais leves/menores. Outros experimentos testando diferentes
fatores físicos (como formato e densidade/material) poderiam mostrar se estas escolhas
acontecem também com outras características das ferramentas. Esses resultados comparados
podem gerar um quadro mais completo das características relevantes (e talvez do grau dessa
relevância) para a escolha de ferramentas para quebra de coco pelos macacos-prego.
A escolha das ferramentas pelo peso não parece ter sofrido influência da faixa etária e
sexo do usuário, sendo que todos os sujeitos escolheram martelos bem parecidos (apesar dos
adultos escolherem os mais pesados com mais freqüência) e quebraram proficientemente os
cocos. No entanto, verificamos que os juvenis usaram os martelos próximos das bigornas um
número significativamente maior de vezes, enquanto os adultos não apresentaram esse padrão.
Isso sugere que, com a idade, surge um padrão mais definido de preferências pelas
88
características físicas dos martelos. Se este padrão de escolha otimiza a quebra de cocos ainda
é incerto, pois os martelos de 900g, 1300g e 1700g (os mais pesados) são estatisticamente
iguais quando comparados pelas médias de batidas necessárias para a quebra do coco, e
poder-se-ia considerar o martelo de 900g mais eficiente por ser mais leve e, portanto
demandar menos energia para seu manejo; no entanto, não há dados sobre quanta energia é
gasta nesse manejo. Sem esses dados não é possível verificar quanto de energia é gasta na
abertura de cada coco, e nem comparar os martelos nessa questão e verificar se o padrão de
escolhas é otimizado ou não para a quebra de coco. Estudos biomecânicos se fazem
necessários para determinar os custos da utilização dos diferentes martelos para a quebra dos
cocos e subsidiar esta discussão.
6.3. Experimento 3
O transporte de ferramentas por indivíduos já proficientes na quebra de cocos ocorreu
em 60% das sessões em que a distância era de cinco metros entre o martelo e a bigorna.
Quando essa distância foi aumentada para 10 metros, o transporte de martelos diminuiu, mas
nunca deixou de ocorrer. Foi possível demonstrar que o transporte de ferramentas de pedra
pelos macacos-prego pode ocorrer em determinadas circunstâncias, contrariando alguns
estudos anteriores (Jalles-Filho et al., 2001; Cleveland et al., 2004) nos quais os macacos-
prego não transportavam as ferramentas de pedra até os locais de utilização.
O transporte do coco sempre ocorreu antes do transporte da ferramenta, quando esse
último ocorreu - um indício de que os macacos apanham os cocos em primeiro lugar, para
proteger o recurso, e só depois vão em busca da ferramenta (se ela não está próxima). Os
motivos para isso poderiam ser: o menor custo do transporte de cocos comparado com o das
pedras, ou a necessidade de proteger esse recurso dos outros indivíduos do grupo (ou os dois
fatores atuando ao mesmo tempo). Esse resultado é semelhante aos de Jalles-Filho et al.
89
(2001) e Cleveland et al. (2004), que relataram que os macacos não abandonavam o recurso
alimentar para transportar a ferramenta.
O transporte de ferramentas é essencial em locais onde estas se encontram distantes do
sítio de ação. Determinar se os macacos-prego ativamente transportam as ferramentas ou se as
utilizam somente quando já estão no local adequado é importante para o estudo desse
comportamento e dos processos cognitivos envolvidos. Se o sujeito ativamente busca a
ferramenta, antecipando o seu uso, mesmo que por pouco tempo, isso demonstra um grau de
antecipação ou planejamento mais complexo do que simplesmente pegar e utilizar a
ferramenta em um mesmo local. Apesar de nesse experimento os martelos não estarem fora da
vista dos sujeitos, seu transporte sugere que esse comportamento pode ocorrer por distâncias
maiores. E pelos indícios em grupos de macacos-prego selvagens onde os martelos adequados
são relativamente raros, como em Gilbués, o transporte de pedras parece ocorrer por grandes
distâncias (Fragaszy et al., 2004), pelo menos até o estabelecimento dos sítios, que são então
utilizados sistematicamente com os martelos lá deixados.
Um outro caso em que o planejamento da ação do uso de ferramentas por macacos-
prego parece ocorrer é relatado por M. Mannu (comunicação pessoal): um sujeito não estava
tendo sucesso em extrair mel de uma fenda na rocha com uma vareta - aparentemente muito
curta - e subitamente a abandonou, dirigiu-se a um ramo a alguns metros de distância, extraiu
e modificou uma nova vareta - mais longa - retornando imediatamente à extração do mel.
Uma questão que poderia ser melhor estudada seria o efeito da presença de
coespecíficos sobre a ocorrência de transporte de cocos durante o transporte das ferramentas
de quebra, pois uma possível explicação para o transporte de cocos pelos macacos junto com
o transporte de ferramentas seria a proteção do recurso contra outros indivíduos. Por outro
lado, se o custo de transporte de cocos for muito baixo, protegê-los sempre poderia ser a
melhor estratégia, pois desobriga da vigilância constante da presença de competidores. No
90
presente experimento, em somente 4 sessões (de um total de 70 sessões com transporte de
ferramenta) ocorreu transporte só das pedras. As análises do efeito da presença dos
coespecíficos no transporte de cocos não foram realizada no presente estudo, mas poderão ser
feitas futuramente, a partir das gravações das sessões deste experimento.
6.4. Considerações finais
Esse estudo deu continuidade a uma linha de pesquisa a longo prazo – “Uso de
ferramentas e forrageamento extrativo por macacos-prego (Cebus apella): socialidade,
ecologia e transmissão social de informação” – com esse grupo de macacos-prego e mostrou
que:
- Os macacos-prego adotaram rapidamente uma nova fonte alimentar, aparentemente
tanto por processos de aprendizagem individual como por mediação social. Neste último caso,
tanto o realce de estímulo como a imitação e emulação podem estar envolvidos. Sendo o
realce de estímulo o único mecanismo nos casos em que houve contato com restos de cocos,
mas não houve observação direta, antes dos indivíduos que não utilizavam prontamente o
novo fruto começarem a fazê-lo. Nos casos em que houve observação direta a imitação e a
emulação não podem ser descartadas;
- Não foi detectado um padrão definido de preferências na escolha dos alvos de
observação por coespecíficos em função das características mensuradas (idade, proficiência,
eficiência e o N de sessões) dos animais observados;
- A escolha das ferramentas ocorreu ativamente e foi similar para a maioria dos
indivíduos, que escolheram principalmente os martelos de 1300g e 1700g;
- Os juvenis ainda obedecem (significativamente) a um padrão econômico (ou mais
passivo) de pegar a ferramenta mais próxima, o que não ocorre mais com os adultos;
91
- O transporte de ferramentas de pedra ocorreu, mas sempre conjuntamente com o
transporte do coco.
Nossos dados não corroboram os resultados de Ottoni e colaboradores (2005) sobre a
observação dos modelos mais proficientes. As causas dessas diferenças podem ser
metodológicas, pois os métodos de coleta de dados utilizados nos dois estudos foram
diferentes: enquanto aqui foram contabilizados todos os cocos quebrados por indivíduo por
sessão, para determinar os mais proficientes, no estudo de Ottoni e colaboradores foram
utilizados a ocorrência ou não de (ao menos um caso de) quebra proficiente em cada evento.
Por outro lado, as diferenças podem estar relacionadas com alterações na composição do
grupo (que incluiram uma mudança de macho alfa). Como o presente estudo não encontrou
nenhuma relação significativa entre observação e quaisquer das características estudadas dos
modelos, os resultados apontam para um tipo de escolha dos observadores baseado apenas na
disponibilidade de modelos, (os observadores estariam observando os modelos que mais
tempo passam quebrando ou que estão sempre mais próximos deles na estrutura social do
grupo). Esta última variável não foi medida no presente trabalho, mas Ottoni e colaboradores
(2005) não encontraram correlação significativa entre observação e proximidade social.
Os resultados permitiram verificar que há uma escolha ativa de ferramentas (i.e., não é
simplesmente uma conseqüência da proximidade de cada ferramenta), e que as preferências
observadas são mais acentuadas nos adultos que nos juvenis. A escolha de ferramentas ainda
precisa ser melhor estudada, pois muitas outras variáveis (como formato e material) podem
afetá-la, além do peso/tamanho, aqui estudado. Mais experimentos de escolha com outras
variáveis seriam necessários para determinar as variáveis importantes, e talvez a importância
relativa entre elas. Outra questão a ser investigada seria a plasticidade na escolha de
ferramentas para quebra de diferentes frutos, mais ou menos resistentes.
92
O transporte de ferramentas de pedra se mostrou diferente nos chimpanzés e macacos-
prego, pois os chimpanzés freqüentemente transportam “martelos” de pedra sem carregar o
coco (Boesch & Boesch, 1984), enquanto que os macacos-prego aparentemente não o fazem.
Os chimpanzés também transportam as ferramentas pelo caminho mais curto até as bigornas,
iniciando-o quando o local do uso ainda não está visível, o que mostra planejamento e
antecipação no uso da ferramenta. Apesar dos martelos transportados pelos macacos-prego
não estarem fora da visão das bigornas como no caso dos chimpanzés, o seu transporte ainda
poderia ser considerado um indicador de planejamento na utilização das ferramentas, pois
nada sugere que a pequena distância até o local de uso signifique menor ou nenhum
planejamento. Mas para verificar melhor o planejamento dos macacos-prego, um experimento
com martelos potenciais mais distantes poderia ser realizado agora que o transporte por
menores distâncias foi verificado.
Nossas observações de transporte de martelos vão de encontro às de outros autores,
que não viram o transporte de ferramentas de pedra (Jalles-Filho et al., 2001; Cleveland et al.,
2004). No entanto, os macacos não largam os cocos durante o transporte, aparentemente
protegendo o recurso, provavelmente devido a pressões sociais. A ocorrência do transporte e
uso de ferramentas, junto com outras características da espécie que são análogas às dos “great
apes” – grande encefalização, infância longa, grande capacidade cognitiva – abre a
possibilidade que os macacos-prego sejam utilizados como um modelo comparativo para a
evolução do transporte de ferramentas na linhagem humana. Examinar as situações em que os
macacos transportam as ferramentas pode ser uma maneira de visualizar como os ancestrais
humanos enfrentavam as situações similares às vividas hoje pelos macaco-prego.
A disseminação de um comportamento - o consumo de um novo coco - foi observada
nesse experimento, mostrando que esta pode ocorrer de forma individual, mas pode também
sofrer uma influência social. Diferentes tradições em técnicas de forrageamento já foram
93
mostradas por Panger et al. (2002) para grupos selvagens de Cebus capucinus. O uso de
ferramentas é outro comportamento que poderia ser disseminado e formar tradições em
populações de macacos-prego. Para verificar se os macacos-prego possuem tradições
comportamentais para uso de ferramentas ainda são necessários estudos comparativos entre
grupos selvagens que utilizam ferramentas, e, encontrada diferença entre grupos, verificar se
esta não se deve a fatores ecológicos (disponibilidade de material/alimentos) ou genéticos
(diferentes espécies/subespécies) para poder sugerir processos sociais como responsáveis
pelas diferenças.
Os resultados dos presentes experimentos, quando comparados com os de estudos
semelhantes em chimpanzés, mostram que apesar das duas espécies apresentarem
comportamentos parecidos, estes comportamentos diferem em alguns pontos essenciais. Nos
chimpanzés a aprendizagem do uso de ferramentas se dá principalmente pela observação dos
adultos (especialmente a mãe) pelos jovens. Os macacos-prego não apresentam essa mesma
dinâmica: além dos jovens serem bem tolerados por todos os indivíduos, inclusive no
consumo dos restos de alimentos (scrounging), mesmo os adultos toleram-se o suficiente para
permitir observação. Esse maior acesso à observação parece possibilitar aos macacos-prego
uma maior velocidade na disseminação do consumo de um novo alimento e
conseqüentemente uma maior flexibilidade na ocupação de diferentes ambientes do que os
chimpanzés.
Apesar dos estudos com grupos selvagens de macacos-prego que utilizam ferramentas
estarem se expandindo, os estudos em condições de semi-liberdade ainda podem nos dar
informações importantes sobre o uso de ferramentas e a transmissão social de informação,
pois permitem uma observação mais detalhada desses comportamentos, que geralmente não é
possível nos grupos selvagens, além de permitir uma maior manipulação e controle do
ambiente para a realização de experimentos: geralmente os grupos em semi-liberdade
94
possuem uma menor área de uso, sendo mais fácil definir locais para realização de
experimentos, além de geralmente esses grupos já estarem bastante familizarizados com
humanos, permitindo assim uma grande aproximação, o que facilita a observação. As novas
informações sobre uso de ferramenta nos grupos selvagens podem ser complementadas por
experimentos em condições de semi-liberdade que testem hipóteses geradas nos estudos com
populações selvagens. Novos estudos, tanto em condições naturalísticas como em laboratório,
precisam ser realizados para um maior entendimento dos processos de decisão no
comportamento do uso de ferramentas para a quebra de cocos por macacos-prego, bem como
sobre a possível disseminação destes comportamentos como tradições comportamentais.
95
7. Anexos
ANEXO A – Valores individuais de freqüência de participação nas sessões do Exp 1, Eficiência e
Proficiencia. Esses valores foram utilizados para fazer o ranking utilizado nos testes
estatísticos dos Experimentos 1 e 2.
Indivíduo Idade Freqüência de
participação de
sessões do Exp. 1
Eficiência (média do
tempo de abertura de
Syagrus em segundos)
Proficiência (média do N
de cocos de Syagrus
quebrados por sessão dos
Exp. 1 e 3)
Aa 18 4 7,24 3,66
Ag 2 0 - -
Cc 8 5 18,42 2
Cd 2 0 - -
Dv 14 18 6,75 3
Dw 5 38 5,71 4,62
Fs 18 1 - -
Fd 2 0 - -
Fl 3 1 - -
Fb 1 0 - -
Jn 15 8 5,10 4,43
Md 20 70 5,10 3,41
Qm 5 38 5,44 2,74
Sp 18 15 7,77 3,54
Vv 9 16 5,13 3,88
Vt 2 7 - -
X 7 1 - -
96
ANEXO B – Matriz de observação entre indivíduos durante as sessões do Experimento 1. N absoluto.
Alvo (Observados)
Aa Ag Cc Cd Dv Dw Fs Fd Fl Fb Jn Md Qm Sp Vv Vt X
Aa 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 1 2 0 1 0 0 0
Ag 0 0 0 0 1 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0
Cc 0 0 0 0 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Cd 0 0 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0
Dv 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6 0 1 1 0 0
Dw 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 10 3 3 1 0 0
Fs 0 0 0 0 7 0 0 0 0 0 0 1 0 2 0 0 0
Fd 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 1 0 0 0
Fl 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Fb 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0
Jn 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 1 0 0 0
Md 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0
Qm 0 0 0 0 2 3 0 0 0 0 0 10 0 2 0 0 0
Sp 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 4 0 0 0 0 0
Vv 0 0 0 0 0 3 0 0 0 0 2 2 0 0 0 0 0
Vt 1 0 2 0 3 17 0 0 0 0 1 16 0 6 5 0 0
Agente (Observadores)
X 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 3 0 0 0 0
ANEXO C – Matriz de observação entre indivíduos durante as sessões do Experimento 1. Corrigido
pela frequencia de participação de cada inivíduo (Freq. Observação do indivíduo alvo
/ Freq. Participação x 1000)
Alvo (Observados)
Aa Ag Cc Cd Dv Dw Fs Fd Fl Fb Jn Md Qm Sp Vv Vt X
Aa 0 0 0 0 111 0 0 0 0 0 125 28 0 66 0 0 0
Ag 0 0 0 0 55 26 0 0 0 0 0 0 0 66 0 0 0
Cc 0 0 0 0 166 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Cd 0 0 600 0 0 0 0 0 0 0 0 0 26 0 0 0 0
Dv 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 85 0 66 62 0 0
Dw 0 0 0 0 55 0 0 0 0 0 0 142 79 200 62 0 0
Fs 0 0 0 0 388 0 0 0 0 0 0 14 0 133 0 0 0
Fd 0 0 0 0 0 26 0 0 0 0 0 0 26 66 0 0 0
Fl 0 0 0 0 0 26 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Fb 0 0 0 0 111 0 0 0 0 0 0 0 0 66 0 0 0
Jn 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 28 0 66 0 0 0
Md 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 66 0 0 0
Qm 0 0 0 0 111 79 0 0 0 0 0 142 0 133 0 0 0
Sp 0 0 0 0 0 26 0 0 0 0 0 57 0 0 0 0 0
Vv 0 0 0 0 0 79 0 0 0 0 250 28 0 0 0 0 0
Vt 250 0 400 0 166 447 0 0 0 0 125 228 0 400 312 0 0
Agente (Observadores)
X 0 0 0 0 0 52 0 0 0 0 0 0 79 0 0 0 0
97
ANEXO D – Árvores de caminho mais curtos com raiz fonte das relações de observação interindividual
durante o experimento de introdução de novos frutos encapsulados; nesse caso a raiz é o
sujeito que observa. O tamanho dos arcos é inversamente proporcional à quantidade de
observação. A direção da observação é indicada pela seta.
98
ANEXO E – Árvore de caminho mais curtos com raiz destino das relações de observação
interindividual durante o experimento de introdução de novos frutos encapsulados;
nesse caso a raiz é o modelo, o sujeito que é observado. O tamanho dos arcos é
inversamente proporcional à quantidade de observação. A direção da observação é
indicada pela seta.
99
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Créditos das Figuras
Mapa da Figura 1: Site Ecotietê (ecotiete.sites.uol.com.br)
Fotos da Figura 3: Eduardo B. Ottoni
Fotos e esquemas restantes: Tiago Falótico
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