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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP
FACULDADE DE DIREITO, SERVIÇO SOCIAL E HISTÓRIA
CAMPUS FRANCA
DISTRIBUIÇÃO DA RENDA ENTRE SALÁRIOS E LUCROS NA
INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA DE 1994 A 2002
UNESP
FRANCA
2004
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UNESP
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“Júlio de Mesquita Filho”
FACULDADE DE DIREITO, SERVIÇO SOCIAL E HISTÓRIA
FRANCA
2004
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HÉLIO BRAGA FILHO
DISTRIBUIÇÃO DA RENDA ENTRE SALÁRIOS E LUCROS NA
INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA DE 1994 A 2002
Tese de Doutorado apresentada à
Faculdade de História, Direito e Serviço
Social da UNESP Campus de Franca,
como requisito para a obtenção do título
de Doutor em Serviço Social
Área de Concentração: Serviço Social:
Trabalho e Sociedade
Linha de Pesquisa: Serviço Social:
Mundo do Trabalho
Orientador: Prof. Dr. José Walter Canôas
FRANCA
2004
Braga Filho, Hélio
Distribuição da renda entre salários e lucros na indústria
de calçados de Franca de 1994 a 2002 / Hélio Braga Filho.
Franca : UNESP, 2004
Tese Doutorado Serviço Social Faculdade de
História, Direito e Serviço Social UNESP.
1. Economia História Brasil. 2. Desigualdades
sociais Brasil. 3. Indústria calçadista História econô-
mica Franca (SP).
CDD 338.0981
HÉLIO BRAGA FILHO
Comissão examinadora
Tese para obtenção do título de Doutor
______________________________________________________
Presidente e Orientador: Prof. Dr. José Walter Canôas
2
o
. examinador ____________________________________
3
o
. examinador ____________________________________
4
o
. examinador ____________________________________
5
o
. examinador ____________________________________
Franca (SP) ____, de _________________, de _________
DEDICÁTÓRIA
Aos meus queridos pais, Didi,
saudosa mãe, e Hélio, pai e
amigo, e aos meus amados filhos,
Telinha e Glauber
AGRADECIMENTOS
Este é sem dúvida o espaço mais oportuno para se cometer injustiças,
pois, lembramos quase sempre de alguns poucos e, esquecemo-nos de muitos
outros.
Na condição especial de aluno (PGPE) pós-graduando e pós-
enfartado, não poderia em primeiro plano, deixar de agradecer a Deus, pela
oportunidade concedida a mim, de resistir ao choque provocado pelos excessos
cometidos ao longo de um percurso de cinqüenta milhas, que de forma quase
fulminante, por pouco não me proporcionou passagem sem passaporte, para uma
outra provável dimensão da morte,a vida.
Seria injusto também não agradecer aos meus filhos, Telinha
(Maristela) e Gugu (Glauber), pelo fato de ter me distanciado deles durante o quase
exílio que foram os últimos seis anos, período compreendido pelo meu ingresso no
curso da pós-graduação entre o mestrado e o doutorado.
De maneira geral, ampla e irrestrita, agradeço pela forma que me
acolheram, por ser um (EE) estudante estranho, ao programa de pós-graduação, a
todo pessoal do Serviço Social da UNESP-Franca. Diante dos meus descuidos
provocados pelos quase que constantes vôos orbitais, agradeço a Maisa Helena de
Araújo, Alan Silvio Berteli, Luzinete Suavinho Gimenes, e, pelas cobranças
carinhosa da Regina (Gigi) Celi Santos Gomes, que me alertavam o tempo todo
sobre os requisitos formais burocráticos a serem preenchidos durante minha
passagem pelo programa.
Também quero externar meus agradecimentos às outras meninas que
sempre foram muito atenciosas, como a Fátima do setor de publicações, pela
paciência de ler os textos que eu a ela encaminha, à Nanci do setor de
comunicações, que é também amiga e companheira das nossas jornadas de
pesquisa, como também à Maria de Fátima Garcia Ferreira, a Maria Consuelo A.
Garcia Aylon, a Aparecida Fátima Vieira Guiraldelli, bem, de tantas Marias e
Fátimas, só me resta diante deste rosário, pedir perdão pelas minhas faltas.
Agradeço à Profa. Dra. Neide Aparecida de Souza Lehfeld e à Profa.
Dra. Lilia Cristina de Oliveira Martins, por terem ambas proporcionado-me
basicamente a oportunidade inicial de freqüentar como intruso ouvinte, as aulas
primeiras inerentes ao programa de pós-gradução em Serviço Social.
Do mesmo modo, não poderia deixar de fazer jus aquela amiga que
muito respeito como pessoa e profissional, que me proporcionou a oportunidade de
apresentar-me ao pós-graduação, refiro-me à Assistente Social, Profa. Dra. Edna
Aparecida de Carvalho Pacheco.
Pelo fato de terem me suportado durante todo este espaço de tempo,
final de 2000 até o presente momento, devo expressar meus agradecimentos: à
Profa. Dra Maria Zita de Figueiredo Gera, Profa. Dra. Raquel Santos Santana, Profa.
Dra. Lilia Cristina de Oliveira Martins, Profa. Dra. Neide Aparecida de Souza Lehfeld,
Profa. Dra. Ana Maria Ramos Estevão e ao Prof. Dr. Mario José Filho, pelas
contribuições oferecidas ao longo das disciplinas ministradas.
Quero também externar meus agradecimentos ao amigo e algoz
ferrenho, representado pelo competente Prof. Dr. Pedro Geraldo Tosi, cujas
contribuições foram de grande valor quando da sua presença nas bancas de
qualificação no mestrado e no doutorado, motivo pelo qual, provavelmente servirá de
roteiro para “Perseguição Implacável”.
Ao Prof. Dr. Mario Jose Filho, agradeço não pela condição de amigo e
professor, mas, sobretudo pelo fato de alem de tudo, talvez por se tratar de uma
obsessão, em razão da minha presença no seu grupo de pesquisa “PRAPES”,
Pratica de Pesquisa, continuar tendo que suportar-me.
Em razão dos momentos que pudemos desfrutar, quase sempre
discutindo as idéias de Marx, um agradecimento aos amigos Ricardo Lara,
assistente social e pai fresco e, ao amigo de lamentações econômicas, Breno.
Agradeço também à Prof. Dra. Raquel Santos Santana por ter me
proporcionado a oportunidade de aplicar ao menos duas oficinas de trabalho com
alunos da graduação em Serviço Social, que tiveram a paciência e a ousadia de
freqüenta-las.
Pelas várias oportunidades oferecidas, assim como, pela nossa luta em
prol da instalação da “ADAM” Agencia de Desenvolvimento da Alta Mogiana,
expresso também meus agradecimentos ao amigo, assistente social, Marcio Nalini.
Não poderia deixar passar em branco um apreço, em razão das
minhas periódicas pertubações, ao amigo normal (quase) Paulo Augusto Brigagão
do Couto, sempre atencioso e paciente.
Incluindo no rol de gratidões, ao pessoal da Uni- FACEF, instituição a
qual pertenço, vai aqui o meu manifesto não-comunista, de agradecimento a todos
aqueles que ousam conviver comigo, ao mesmo tempo quero expressar sinceros
agradecimentos à galera surrealista do IPES Instituto de Pesquisas Econômicas e
Sociais.
Já ia me esquecendo daquela que não foi minha professora, mas,
pelas acalouradas discussões que tive (raras) com a Profa. Dra. Claudia Maria
Daher Cosac, como também pelo sempre atencioso Prof. Dr. Ubaldo Silveira.
Caso, tenha me esquecido de alguém, externo aqui meus
agradecimentos aqueles que por ventura não mencionei, que foram todos e todas
que compartilharam durante as aulas, a maravilhosa aventura de ouvir, pensar, falar
e, principalmente através da troca de experiências vividas, percebemos quão rica é a
natureza humana.
À Profa. Dra. Cilene Swain Canôas pela forma carinhosa que me
acolheu quando da minha passagem pela capital paulista.
Pela sempre atenciosa receptividade mineira, aqui vai também o
apreço pela amiga “Prof. Sara Lemos de Melo Mendes, mestra em Serviço Social
pela UNESP Franca e Diretora do curso de Serviço Social na FESP-UEMG,
Campus de Passos MG.
Aquela que não sendo mais minha companheira de matrimônio,
continua sendo mãe dos meus filhos, extendo também o meu agradecimento à
Natalina.
AGRADECIMENTO ESPECIAL
Reservo aqui, espaço especial para agradecer aquele que
obcecadamente me tolerou, orientou, ouviu, acolheu-me como professor, mas,
soube principalmente cultivar a riqueza traduzida pela grandiosa tarefa, que é
construir a amizade, ao amigo e companheiro de luta, Prof. Dr. José Walter Canoas.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 42
CAPÍTULO 1- BRASIL, UM PAÍS MARCADO PELAS DESIGUALDADES SOCIAIS: O
PROBLEMA DA DISTRIBUIÇÃO DA RENDA E DA RIQUEZA.......................................59
1.1 TENDÊNCIAS ECONÔMICAS E SOCIAIS DA AMÉRICA ATINA E CARIBE.........63
1.2 BRASIL, UM PAÍS DESIGUAL: INDICADORES ECONÔMICOS E SOCIAIS DA
DISTRIBUIÇÃO DA RENDA E DA RIQUEZA.....................................................................68
CAPITULO 2 A INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO NO BRASIL: DADOS GERAIS
SOBRE A ESTRUTURA DE CUSTOS / DESPESAS E RECEITA NA DÉCADA DE 90....89
2.1 BREVE RETROSPECTIVA DA INDÚSTRIA DE CALÇADOS DO BRASIL.............104
CAPÍTULO 3 COMPONENTES DO VALOR ADICIONADO DA INDÚSTRIA DE
CALÇADOS DO BRASIL: PRODUTIVIDADE, EXCEDENTE ECONÔMICO E MARKUP
DE 1990 A 1996 ......................................................................................................................116
3.1 RETROSPECTIVA DA ECONOMIA BRASILEIRA: DA CONJUNTURA
INFLACIONÁRIA PARA A ERA DA ESTABILIDADE.....................................................128
CAPÍTULO 4 ECONOMIA REGIONAL E A ROTA DOS INVESTIMENTOS NO
ESTADO DE SÃO PAULO EM 2003....................................................................................144
4.1 OS INVESTIMENTOS ANUNCIADOS NA REGIÃO ADMINISTRATIVA E NO
MUNICÍPIO DE FRANCA ....................................................................................................153
4.2 A DÉCADA DE 90 E A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA.........................157
CAPÍTULO 5 - A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA NA PERSPECTIVA DE
UMA EMPRESA NOS ANOS DE 1998 A 2003 ...................................................................174
5.1 A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA: O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE
INDICADORES ECONÔMICOS...........................................................................................186
5.2 A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA: ANÁLISE DOS RESULTADOS ......203
PERSPECTIVAS.....................................................................................................................222
TABELAS
TABELA 1: Estado de São Paulo, taxa de mortalidade infantil e coeficiente de
mortalidade por homicídio 1990 a 2000..........................................................60
TABELA 2: População, PIB per capita (PPC), força de trabalho rural (em %) e
analfabetismo (em %), Países desenvolvidos, América Latina, Ásia e
África. .................................................................................................................63
TABELA 3: América Latina e Países desenvolvidos, anos de escolaridade, gastos em
educação, gastos em P&D e gastos em P&D setor empresarial.........................64
TABELA 4: Brasil, Grau de abertura da economia, taxa real de variação do Pib e
exportações brasileiras sobre exportação mundial nas décadas de 50 a 90........68
TABELA 5: Brasil, Índice de preços das exportações e das importações e relação de
troca- 1980 a 2001 ..............................................................................................70
TABELA 6: Brasil, capacidade para importar- 1990 a 2001 ..................................................71
TABELA 7: Brasil, população economicamente ativa (PEA), ocupação total,
desocupação total e taxa de desocupação. ..........................................................74
TABELA 8: Produto Interno Bruto do Brasil, por grandes regiões da Federação em R$
milhões – 1995-1999 ..........................................................................................75
TABELA 9: Pessoas de 10 anos ou mais de idade, valor do rendimento médio mensal
(R$), por sexo e classificação do domicílio Brasil – 2001 ..............................75
TABELA 10: Chefe da família segundo a faixa etária e o sexo 1987 e 1996 ........................76
TABELA 11: Média da Renda Mensal da ocupação principal total dos ocupados nos
principais setores da atividade econômica segundo as regiões
metropolitanas (em R$) 1999 .............................................................................77
TABELA 12: Brasil, parcela da renda apropriada pelos mais ricos e pelos mais pobres
1980, 1985, 1990,1995 e 1999............................................................................78
TABELA 13: Percentual de despesa média mensal familiar, por classes de recebimento
mensal familiar, segundo os tipos de despesa – 1995-1996...............................80
TABELA 14: Brasil, famílias que possuem bens duráveis, total das áreas POF 1996:
bens duráveis microcomputador ......................................................................84
TABELA 15: Brasil, despesa média familiar em aumento do ativo* segundo classes
selecionadas de recebimento mensal familiar (em R$)** – 1995-1996.............85
TABELA 16: Brasil, Indústria de transformação, evolução da estrutura de custo
(porcentagem sobre as receitas operacionais): 69-75.........................................90
TABELA 17: Brasil, participação relativa da remuneração dos empregados e do
excedente operacional bruto sobre o PIB 1990 a 2002....................................92
TABELA 18: Brasil, Consumo intermediário e remuneração dos empregados como
proporção do valor da produção 1990 a 2002 .................................................93
TABELA 19: Brasil, consumo intermediário, salários e excedente operacional bruto
como porcentagem do valor da produção em subsetores da indústria de
transformação 1990 a 1996..............................................................................94
TABELA 20: Brasil, dados gerais das empresas industriais segundo o porte for faixa de
pessoal ocupado 1996 e 2002 .............................................................................96
TABELA 21: Brasil, dados gerais das empresas industriais segundo o porte por faixa de
pessoal ocupado, relação entre variáveis 1996 e 2002 ....................................96
TABELA 22: Brasil, empresas industriais, variação percentual dos gastos de pessoal e
receita total por pessoas ocupadas em empresas segundo o porte: 2002 /
1996..................................................................................................................101
TABELA 23: Fabricação de calçados, número de unidades locais em unidades e
porcentagem, Brasil, sul e sudeste 1996 e 2002 ............................................106
TABELA 24: Dados gerais das unidades locais, fabricação de calçados, Sul e Sudeste,
1996 e 2002.......................................................................................................107
TABELA 25: Dados gerais das unidades locais, relação entre variáveis do subsetor de
fabricação de calçados das regiões Sul e Sudeste do Brasil 1996 e 2002. ....109
TABELA 26: Brasil, taxa anual da inflação (em %) e força do markup na indústria de
transformação – 1962-1976..............................................................................111
TABELA 27: Empresas industriais, fabricação de calçados, variação percentual do
pessoal ocupado, dos gastos de pessoal e receita total por pessoas
ocupadas, Sul e Sudeste (em %) 1996 a 2002 ...............................................112
TABELA 28: Relação salários e produtividade 1970 e 1984 (1970 = 100).........................113
TABELA 29: Brasil, fabricação de calçados, número médio de pessoal assalariado
ligado à produção, salários e receita total 1996 a 2002 .................................114
TABELA 30: Brasil, fabricação de calçados, relação e variação do pessoal assalariado,
salários e receita total 1996 a 2002................................................................115
TABELA 31: EUA, Indústria de calçados, número de estabelecimentos, valor agregado
(em 1000 US$) e salários como porcentagem do valor agregado (%),
segundo o porte da planta 1939.....................................................................118
TABELA 32: EUA, Indústria de calçados, participação relativa de salários no valor
agregado (em %) – 1899 – 1939.......................................................................119
TABELA 33: Brasil, Fabricação de calçados, componentes do valor adicionado em
valores correntes – 1990 a 1996. ......................................................................122
TABELA 34: Brasil, fabricação de calçados, produtividade, markup, razão entre custos,
pessoal ocupado, remunerações e excedente operacional bruto como
proporção do valor adicionado bruto 1990 a 1996 ........................................123
TABELA 35: Brasil: fabricação de calçados, salários e consumo intermediário como
proporção do valor da produção: 1990-1996....................................................125
TABELA 36: Brasil, fabricação de calçados, markup, salários e consumo intermediário
como porcentagem do valor da produção 1990 a 1996 .................................126
TABELA 37: Brasil, PIB, exportações e importações (em US$ bi) e grau de abertura da
economia segundo décadas 1950 a 1999 .......................................................130
TABELA 38: Brasil, salário e produtividade (1970 = 100) 1970 a 1984.............................132
TABELA 39: Evolução da população economicamente ativa, da ocupação total e taxa
de desocupação total 1993 a 2002 .................................................................138
TABELA 40: Custo médio da mão-de-obra por hora trabalhada na indústria de
transformação, salários e encargos, em US$ ....................................................140
TABELA 41: Brasil, Índices de preços e quantum de exportação e de importação
1994 a 2002.......................................................................................................141
TABELA 42: Distribuição espacial da indústria de transformação Brasil: segundo
regiões e estados selecionados 1970/1995.....................................................146
TABELA 43: Distribuição percentual do VTI da indústria têxtil e vestuário e calçados
no Brasil segundo Estados e regiões selecionados 1970, 1975, 1980 e
1985..................................................................................................................147
TABELA 44: Estado de São Paulo, investimentos anunciados segundo setores de
atividade econômica: 1º semestre de 2002 1º semestre de 2003 ...................149
TABELA 45: RMSP, Interior e diversos municípios do Estado segundo investimentos
anunciados por tipo: 1º semestre de 2003.........................................................150
TABELA 46: Estado de São Paulo, Investimentos anunciados segundo número de
empreendimentos e valor (em US$ milhões) nas Regiões Administrativas
1º semestre de 2002 e 1º semestre de 2003....................................................152
TABELA 47: Estado de São Paulo e municípios selecionados, PIB (Produto Interno Bruto)
em US$ - 1970, 1980 e 1996 ............................................................................154
TABELA 48: Estado de São Paulo, municípios selecionados segundo o consumo (em
R$ mil) e consumo por habitantes (em R$)- 2000...........................................156
TABELA 49: Município de Franca, Região Administrativa de Franca, investimentos
anunciados por origem do capital, tipo de investimento e setor de
atividade economica Janeiro-Junho/2003......................................................156
TABELA 50: Município de Franca, composição setorial da economia – 1975, 1980,
1985 ..................................................................................................................158
TABELA 51: Município de Franca, atividades economicas selecionadas segundo
numero de estabelecimentos e em porcentagem do total 1995 e 2001..........159
TABELA 52: Município de Franca, população total, urbana e rural, e população
economicamente ativa 1980, 1990 e 2000.....................................................161
TABELA 53: Finanças públicas municipais do múnicipio de Franca, segundo
indicadores diversos (em R$) - 2001................................................................162
TABELA 54: Município de Franca, pessoas de 10 anos ou mais de idade
economicamente ativas, ocupadas, desocupadas na semana de referencia
e taxa de desocupação - 2000 ...........................................................................163
TABELA 55: Pessoas de 10 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência
por grupos de horas habitualmente trabalhadas por semana em todos os
trabalhos em Franca comparativamente ao estado de São Paulo - 2000..........164
TABELA 56: Municipio de Franca, unidade locais, empresas com CNPJ, segundo o
ano de fundação, pessoal ocpuado, e salário médio nominal (em R$) -
1997 ..................................................................................................................165
TABELA 57: Franca, industria de calçados, estabelecimentos, postos de trabalho e
remunerações segundo o porte e planta industrial – 1985 2002......................167
TABELA 58: Franca, índices de quantum e de preços das exportações de calçados (em
%) , 1984 -2002 ................................................................................................169
TABELA 59: Franca, moradores em domicilios partiulares permanentes, segundo
classe de recebimento nominal médio mensal, total do recebimento e
participação das classes de recebimento...........................................................172
TABELA 60: Empresa Kwanta, produção fisica, valor da produção(em R$) e preço
médio de venda dos mercados interno e extero 1998 a 2003 ........................176
TABELA 61: Empresa Kwanta, variações da produção física e do preço médio (em %)
1998 a 2003....................................................................................................177
TABELA 62: Empresa Kwanta, valor da produção, salários e encargos , consumo
intermediario, valor adicionado bruto e excedente operacional bruto (R$)
e pessoas ocupado 1998 a 2003 .....................................................................177
TABELA 63: Empresa Kwanta, remunerações, consumo intermediário, custos
indiretos, valor da produção e excedente operacional bruto (em R$
milhões) 1998 a 2003.....................................................................................178
TABELA 64: Empresa Kwanta, remunerações, consumo intermediário, custos indiretos
como porcentagem do valor (em %) 1998 a 2003............................................179
TABELA 65: Empresa Kwanta, produtividade do trabalhador, markup, razão entre os
custos, remunerações e excedente operacional bruto como proporção do
valor adicionado bruto 1998 a 2003 ..............................................................179
TABELA 66: Distribuição funcional do EOB/Remunerações na indústria nacional e na
empresa Kwanta de calçados 1990 a 2003 ....................................................182
TABELA 67: Empresa Kwanta, custos da produção, custo do trabalho, dos insumos,
indiretos e total 1998 a 2003................................................................................
TABELA 68: Empresa Kwanta, preço de custo, preço de venda, markup e margem (z)
1998 a 2003....................................................................................................185
TABELA 69: Cálculo da produtividade física do trabalhador da empresa Kwanta
(1998-2003) ......................................................................................................189
TABELA 70: Cálculo da produção física anual estimada da indústria de calçados de
Franca 1994 a 2000........................................................................................190
TABELA 71: Comparativo entre produção informada (Sindifranca) e a estimada ................190
TABELA 72: Produção anual estimada destinada ao mercado interno...................................191
TABELA 73: Exportações de calçados de Franca, quantidade em pares valor (em US$)
e preço médio (em US$) 1994 a 2002 ..........................................................192.
TABELA 74: Calça s de Franca, preço médio da exportação em US$ e R$, cotação do
dólar 1994 a 1997do ......................................................................................192
TABELA 75: Preço médio do Mercado Interno e da Exportação em Reais ...........................193
TABELA 76: Indústria de Calçados de Franca, produção física, preço médio e valor da
produção (R$)1994 a 2002 ...............................................................................193
TABELA 77: Indústria de calçados de Franca, postos de trabalho com vínculo ativo
(31/12), remuneração em quantidade média de salários mínimos, valor do
salário mínimo vigente e total das remunerações (em R$) - 1994 a 2002........194
TABELA 78: Brasil, fabricação de calçados, custo das operações industriais como
porcentagem do valor bruto da produção industrial 1996 a 2002 .................196
TABELA 79: Franca, indústria de calçados, estimativa do consumo intermediário da
indústria (em R$) 1994 a 2002 ......................................................................196
TABELA 80: Franca, indústria de calçados, valor bruto da produção, valor dos custos
diretos e custos diretos como porcentagem do valor bruto da produção
1994 a 2002.......................................................................................................197
TABELA 81: Estrutura dos custos de despesas (em %) das empresas industriais,
fabricação da calçados , Brasil 1996 a 2002..................................................198
TABELA 82: Indústria de calçados de Franca, remunerações e consumo intermediário
como porcentagem do valor da produção, custos indiretos em
porcentagem e custo total da produção 1994 a 2002.....................................199
TABELA 83: Brasil, subsetor industrial de calçados índice médio anual da produção
física industrial (Base: igual mês do ano anterior = 100) .................................200
TABELA 84: Franca, indústria de calçados, estimativa de custos da produção 1994 a
2002 ..................................................................................................................202
TABELA 85: Franca, Indústria de calçados, preço de custo e preço de venda 1994 a
2002 ..................................................................................................................203
TABELA 86: Franca, indústria de calçados, valor da produção, valor adicionado bruto,
consumo intermediário, remunerações, e excedente operacional bruto
(em R$) 1994 a 2002. ....................................................................................204
TABELA 87: Município de Franca, Valor adicionado total, valor adicionado da
indústria, valor adicionado da indústria de calçados (em Reais) 1994 a
2001 ..................................................................................................................205
TABELA 88: Estado de São Paulo, Produto Interno Bruto a Custo de Fatores dos
subsetores de atividade econômica do vestuário, calçados e artefatos de
tecido (em mil reais de 1995) diversos anos..................................................207
TABELA 89: Franca, Indústria de Calçados, pessoal ocupado, produtividade, markup,
razão entre custos, remunerações e excedente operacional bruto como
proporção do valor adicionado bruto 1994 a 2002 ........................................208
TABELA 90: Franca, Indústria de Calçados, consumo intermediário e remunerações
como porcentagem do valor da produção e relação entre excedente
operacional bruto e remunerações 1994 a 2002 ............................................210
TABELA 91: Franca, indústria de calçados, markup, remuenerações e consumo
intermediário como porcentagem do valor da produção 1994 a 2002...........211
TABELA 92: EUA, setor de manufatura, couros e produtos de couro segundo
indicadores diversos 1960 e 1997..................................................................218
FIGURAS
FIGURA 1: Fluxograma empresas famílias .........................................................................44
FIGURA 2: Fluxo Circular da Renda ......................................................................................45
FIGURA 3: Modelo de produção ...........................................................................................47
FIGURA 4: Fatores de produção e crescimento econômico ...................................................49
FIGURA 5: Variações da renda e do consumismo..................................................................54
FIGURA 6: Estado de São Paulo, taxa de
mortalidade infantil e coeficiente de mortalidade
por homicídio 1990 a 2000. .............................................................................61
FIGURA 7: Taxa Real (%) do Comércio e do PIB Mundial- 1993 a 2002 ............................69
FIGURA 8: Percentual de despesa média mensal familiar por classes de recebimento
mensal familiar ...................................................................................................81
FIGURA 9: Percentual de despesa média mensal familiar por classes de recebimento
mensal familiar ...................................................................................................82
FIGURA 10: Brasil, fabricação de calçados, markup, salários e consumo intermediário como
proporção (em %) do valor da produção: 1990 1996 ....................................101
FIGURA 11: Gastos com pessoal e receita total por pessoas ocupadas na indústria de
transformação em empresas segundo o porte (variação percentual) 2002 / 1996127
FIGURA 12: Salário e produtividade......................................................................................132
FIGURA 13: Franca, índice de quantum e de preços das exportações de calçados (em%)
1984 - 2002 ......................................................................................................170
FIGURA 14: Brasil, subsetor de calçados, índice da produção físical anual 1994 a 2002. .201
QUADRO 1: Tableu économigue de kaldecki..........................................................................52
QUADRO 2: Objetivos de política econômica........................................................................136
QUADRO 3: Município de Franca, dados gerais da industria de calçados – 1983.................187
RESUMO
A conjuntura econômica que se instalou no Brasil durante a década de 90, sobretudo a partir
de 1994, imprimiu em razão da dosagem das medidas adotadas pelo governo na área da
política econômica, uma nova dinâmica competitiva, marcada sobremaneira pelo intenso
processo de reestruturação produtiva combinado com os efeitos produzidos pela política de
estabilização dos preços, que somados ao aumento da concorrência interna e externa, e da
recuperação do sistema de preços para o conjunto da economia, entre outros fatores,
produziram significativos efeitos sobre a atividade produtiva e sobre o nível de emprego. As
empresas, foram obrigadas para o enfrentamento deste novo cenário, a adotarem posturas
mais radicais no que se relaciona aos custos da produção, sobretudo no sentido de reduzirem
custos e despesas para assegurarem seus respectivos lucros. Todavia, em razão das elevadas
taxas de juros e, do aumento abusivo da carga tributária sobre o produto da economia,
praticados pela área econômica do governo, forçaram as empresas a cortar custos da produção
para garantirem suas remunerações, de tal sorte, que o impacto destes expedientes produziu
aumento do desemprego, ampliação da informalidade e compressão dos rendimentos do
trabalhador, proporcionando significativo aumento do excedente econômico (lucro) em
detrimento da remuneração do trabalho. Assim, procuramos examinar como se procedeu à
distribuição do produto da indústria de calçados do município de Franca, entre lucros e
salários, no período compreendido entre os anos de 1994 e 2002.
Palavras-Chaves: concorrência, distribuição da renda, salários, lucros, preços, industria de
calçados.
SUMMARY
The economical conjuncture that settled above all in Brazil during the decade of 90, starting
from 1994, it printed in reason of the dosage of the measures adopted by the government in
the area of the economical politics, the new competitive dynamics, marked excessively by the
intense process of restructuring productive agreement with the effect produced by the politics
of stabilization of the prices, that added to the acirramento of the competition interns and
external, and of the recovery of the system of prices goes the group of the economy, among
other factors, they produced significant effect on the productive activity and on the job level,
the companies, they were forced for the to face of this new scenery, they adopt more radical
postures with regard to the costs of the production, above all in the sense of they reduce costs
and expenses for us to assure their respective profits. Though, in reason of the high interest
rates and, of the abusive increase of the tax burden on the product of the economy, practiced
by the government’s economical area, they forced the companies to cut costs of the
production for us to guarantee their remunerations, of such a luck, that the impact of these
files produced increase of the unemployment, enlargement of the informality and compression
of the worker’s incomes, providing significant increase of the economical surplus (1 profit) to
the detriment of the remuneration of the work. Like this, we tried to examine as it was
proceeded to the distribution of the product of the industry of shoes of the municipal district
of Franca, between profits and wages, in the period understood among the years of 1994 and
2002.
Key-words: competition, lace’s distribution, wages, profits, prices, industry of shoes
RESUMEN
La coyuntura barata que estableció todos anteriormente en Brasil durante la década de 90,
empezando de 1994, que imprimió en la razón de la dosificación de las medidas adoptada por
el gobierno en el área de la política barata, la nueva dinámica competitiva, marcada
excesivamente por el intenso proceso de reestructurar el acuerdo productivo con el efecto
producido por la política de estabilización de los precios que agregaron al acirramento de la
competición interna y externo, y de la recuperación del sistema de precios el grupo de la
economía, entre otros factores, va ellos produjeron el efecto significante en la actividad
productiva y en el nivel del trabajo. Las compañías, ellos se forzaron para el enfrentar de este
nuevo paisaje, ellos adoptan las posturas más radicales con respecto a los costos de la
producción, sobre todos en el sentido de ellos los costos y gastos reducen para nosotros
asegurar sus ganancias respectivas. Aunque, en la razón de las proporciones de interés altas y,
del aumento abusivo de la carga del impuesto en el producto de la economía, practicó por el
área barata del gobierno, ellos obligaron a las compañías partir costos de la producción para
nosotros garantizar sus remuneraciones, de tal una suerte, que el impacto de estos archivos
produjo aumento del desempleo, el agrandamiento de la ausencia de ceremonia y
condensación de los ingresos del obrero, proporcionando aumento significante del sobrante
barato (yo gano) al detrimento de la remuneración del trabajo. Así, nosotros intentamos
examinar como él se procedió a la distribución del producto de la industria de zapatos del
distrito municipal de Franca, entre las ganancias y sueldos, en el periodo entendido entre los
años de 1994 y 2002.
Palabras-claves: competición, distribución de la renda, sueldos, ganancias, precios, industria
de zapatos
APRESENTAÇÃO
A década de 1930, revestiu-se de um significado muito especial para o Brasil,
principalmente para os novos rumos da economia nacional em razão da opção feita pelo
governo Vargas, que para promover o desenvolvimento econômico e social do pais, enquanto
estratégia, daria inicio a um intenso processo de industrialização da economia.
Este processo por sua vez, ao fomentar o desenvolvimento da indústria de
transformação, promoveria pelas vias da migração, o esvaziamento da área rural, que em
quatro décadas aproximadamente teria produzido como resultado: a redução abrupta da
população rural e, o imoderado aumento da população urbana (notadamente nos grandes
centros urbanos), queda significativa da participação relativa do PIB (Produto Interno Bruto)
agrícola, em relação ao produto total da economia, e a diminuição da participação do setor
agrícola na absorção da força de trabalho. O Brasil, tornara-se então, um país urbano-
industrial.
Todavia, mesmo com a industrialização que se intensificou no país,
possibilitando inclusive o desenvolvimento dos setores de comércio (varejista e atacadista) e
de serviços, não foi possível promover o objetivo tão decantado pelos governos e até pelos
próprios empresários, de uma distribuição mais homogênea e justa do produto social da
economia.
Nos anos 1970, a economia brasileira experimentou taxas excepcionais de
crescimento econômico. Mas, mesmo assim, a distribuição do produto da economia
configurou a preferência dos ganhos apropriados pelo capital em detrimento dos salários,
pois, mesmo com o aumento contínuo da produtividade do trabalho, os salários não foram
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beneficiados, ao contrário, o que ocorreu foi senão certo distanciamento dos salários reais,
vis-a-vis aos ganhos obtidos pelo trabalhador na forma de produtividade do trabalho.
Os anos 1980, período subseqüente ao denominado “milagre econômico”,
deixou a marca registrada dos “anos perdidos”, posto que, instalou-se no país uma conjuntura
extremamente perversa principalmente para as classes de baixa renda de uma crônica e
persistente alta generalizada dos preços, a inflação. Assim, durante este intervalo de tempo, a
tentativa em vão dos governos de direita através de inúmeros choques aplicados como terapia
anti inflacionária, não produziram o efeito desejado. Ao contrário, a inflação persistiu, os
empresários retardaram o investimentos, a economia sofreu os sintomas do atraso tecnológico,
da perda de competitividade, os trabalhadores foram pelos efeitos perversos e corrosivos da
inflação, penalizados com os salários que foram achatados e, reduzidos em termos reais pelo
movimento altista dos preços, o que significou mais uma vez, que a distribuição da renda
havia assim sido prejudicada.
Nos anos 1990, os governos civis marcariam a dupla transição do país: da
ditadura de direita, para a instalação no país de governos democráticos e, a mudança de uma
era de protecionismo para a exposição mais acentuada da economia à concorrência externa
através da remoção da manta protetora até então mantida pelos governos militares.
Contudo, o ingresso da economia brasileira no círculo das economias globais, não
seria, provavelmente nem mesmo poderia ser, equilibrado e tranqüilo. A década de 1980, não foi
perdida, em razão da agenda dos governos ter sido preenchida com apenas medidas de curto
prazo, suscetíveis de tentarem debelar a inflação. A ausência de uma visão estratégica de longo
prazo em muito prejudicou a economia e a sociedade de modo geral, principalmente, pelo fato da
economia ter experimentado período significativo de proteção e, ausência de investimentos em
atualização tecnológica, além do que, as empresas passaram a assimilar a cultura inflacionária,
entorpecendo a sensibilidade do papel desenhado pelo sistema de preços.
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Deste modo, a inserção da economia brasileira no comércio internacional de
forma mais consistente seria feita de maneira bastante traumática. Esta, marcaria o seu
ingresso numa conjuntura completamente estranha, pois ocorreria, no quadro de um processo
de globalização crescente da economia mundial, cujo ingresso de entrada, significava entre
outros expedientes: liberalização comercial e financeira da economia, redução do déficit fiscal
em porcentagem do PIB, estabilidade dos preços, redimensionamento do papel e do tamanho
do Estado, privatização da economia etc.
A partir de 1994, as medidas adotadas pelo governo federal, na área das
políticas fiscal, tributária, monetária e cambial, visavam consolidar, entre outros objetivos: a
estabilidade dos preços, recuperação do atraso tecnológico mediante a atualização decorrente
do fomento às importações de máquinas e equipamentos favorecidas pelo regime de câmbio
apreciado entre 1994 e 1998 , reposicionamento competitivo da economia brasileira,
recuperação do sistema de preços (em particular a importância que assume no âmbito das
empresas o sistema de formação de preços), como também, o objetivo de promover uma
melhor distribuição da renda.
No Brasil, o mercado de trabalho sofreu profundas modificações, mais
acentuadamente, a partir de 1994, ao ser a economia brasileira submetida a uma exposição
maior à concorrência internacional. Impulsionada pelos expedientes adotados pelo governo
federal, tais como, câmbio sobrevalorizado, redução abrupta das alíquotas de importação,
elevada taxas de juros nominal, a economia sofreu um aumento da taxa de desemprego
bastante significativa. A taxa de desocupação (que é a população economicamente ativa
ocupada subtraída da população economicamente ativa total dividida por esta), saltou de 3,7%
no ano de 1990, para 9,2% no ano de 2002. Ampliou-se de forma imoderada o setor informal
da economia, precarizaram-se as relações de trabalho, degradando-se a estrutura dos empregos
com a intensificação dos processos de informalização, terceirização e sub-contração, adotados
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pelas empresas com a finalidade prescípua de redução dos custos da produção, notadamente
dos salários dos trabalhadores. As empresas brasileiras, protegidas da concorrência externa
em razão das medidas adotadas pelos governos militares durante a década de 80 (face à crise
externa na qual a economia do país ingressara), foram induzidas, graças ao circuito
inflacionário instalado na economia neste período, a não se preocuparem com problemas
relacionados aos ganhos de produtividade, formação de preços (custos da produção),
aprimoramento dos métodos de gestão, da qualidade, etc: mesmo porque a economia estava
protegida da concorrência internacional.
Em tal contexto, a economia do país enfrentaria uma conjuntura bem
diferente.As medidas de política econômica, ao priorizarem a estabilidade dos preços,
obrigaram as empresas, a reverem suas próprias políticas de formação de preços, o que
invariavelmente, acabou resultando da compressão dos custos da produção, sobressaindo a
redução dos salários.
Nesse ambiente de acirrada concorrência combinada com um quadro
conjuntural de estabilidade dos preços, produtores e trabalhadores travaram significativo
embate traduzido pelo aumento do conflito distributivo da renda (gerada no interior do
processo de produção) entre suas respectivas remunerações, quais sejam lucros e salários.
Deste modo este trabalho pretende examinar no período de 1994 até o ano de
2002, em razão da conjuntura que se instalou no país decorrente da inserção de economia do
país no quadro de referencia da globalização econômica, como se processou a distribuição do
produto elaborado pela industria de calçados do município paulista de Franca, entre salários e
lucros.
A indústria de calçados, é classificada como uma indústria tradicional, ou seja,
por ser intensiva de mão-de-obra e não-intensiva de capital, configura uma baixa relação
capital-produto. Outrossim, cumpre ressaltar que trata-se de um subsetor da atividade
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econômica produtor de bem de consumo semi-durável, e, que pelo fato de constituir-se gênero
de primeira necessidade, classifica-se também como categoria de bens de salários pois, são
considerados essenciais para o trabalhador, bem como, para sua família.
Assim, o problema da distribuição do produto da industria de calçados de
Franca, entre salários e lucros, será baseado na estrutura simplificada de custos e receita. Para
isto, construímos um conjunto de indicadores econômicos da referida indústria, a qual é,
produtora de bens de salários, intensiva de mão-de-obra, com deficiências competitivas,
inserida num ambiente econômico marcado por uma conjuntura de estabilidade dos preços e,
de maior exposição à concorrência internacional.
È importante observar também, que ao longo das últimas três décadas do
século XX (1970, 1980 e 1990), além das mudanças que ocorreram na composição estrutural
da economia brasileira dada pela participação relativa dos produtos da agricultura,
indústria, comércio e serviços no produto total da economia significativas foram as
alterações que se processaram no espaço econômico do país mudando a paisagem da
economia regional.
OBJETO DO ESTUDO
As medidas de política econômica implementadas no primeiro governo de
FHC, juntamente com outros instrumentos de ação econômica então acionados provocaram
sobre a economia, principalmente sobre as empresas grande impacto.
Diante do câmbio sobrevalorizado que por sua vez encarecia as exportações e,
o aumento abrupto da concorrência (interna e externa), as empresas passaram a se preocupar
mais com os custos da produção, conseqüentemente atribuíram significado especial ao
problema da formação de preços, mesmo porque a estabilização da economia e a concorrência
favoreciam sobremaneira os consumidores.
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Deste modo, para auferirem lucros, as empresas deveriam adotar diferentes
estratégias plausíveis de reduzirem de forma radical os custos da produção matérias-prima,
materiais auxiliares, componentes, incluindo os custos do trabalho (salário e encargos), etc;
com o intuito de ampliarem a diferença entre o preço de custo e o preço de venda.
Considerando o peso que o subsetor da indústria de calçados, representa em
relação ao conjunto das demais atividades econômicas desenvolvidas no município de Franca,
resolvemos assim elege-lo, como mais relevante para efeito do presente estudo, considerando
principalmente que na década de 90, este ramo da indústria de transformação, experimentaria
significativas modificações no formato da organização da indústria motivado pelo processo de
reestruturação produtiva. Assim optamos pela distribuição da renda entre lucros e salários
enquanto objeto de estudo.
OBJETIVO
Gostaríamos imensamente de estender o presente estudo em termos de
objetivos, uma vez que, muito contribuiria entendermos, como no interior da indústria de
calçados se processa a composição orgânica do capital, isto é, em que proporção o capital
total se distribue entre a sua parte constante (máquinas, equipamentos, instalações) e, a sua
componente variável (trabalho, matérias-primas, etc). Todavia, dada a precariedade de
informações disponíveis sobre esta atividade industrial local, bem como, da dificuldade de
obtenção de informações, este que poderia ser um dos nossos objetivos, foi então, por tais
motivos abandonado.
Diante disto, nosso objetivo é verificar e compreender como no período de
1994 a 2002, o produto total da indústria de calçados do município citado se distribuiu na
forma de lucros (representado pelo excedente operacional bruto) e salários (examinados
através do total das remunerações).
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De outro modo, podemos dizer que para verificar como se distribuiu o produto
total da indústria de calçados entre lucros e salários, um outro importante objetivo deveria ser
consolidado, qual seja, a apuração do preço de custo e o preço de venda.
Entretanto, a consolidação deste objetivo, demandaria, por sua vez, que outros
objetivos fossem também atingidos, resultando assim, da construção de indicadores
econômicos da indústria de calçados (do município de Franca). Desta forma, tornou-se
imprescindível enquanto objetivos específicos:
estimar a produção física anual total expressa em sua unidade convencional de
medida, isto é, em pares, cabendo neste caso quantificar da produção total, as parcelas
da mesma destinadas ao mercado interno e, ao mercado externo;
estimar o preço médio unitário de venda expresso em unidades monetárias (R$) para
ambos os mercados;
apurar o valor bruto total anual da produção, tanto da parcela destinada ao mercado
interno, como daquela destinada ao mercado externo;
estimar o valor de consumo intermediário referente ao consumo das matérias-
primas, materiais auxiliares, componentes, embalagens, energia elétrica, etc.
expresso em Reais (R$);
calcular o valor da massa anual nominal de rendimentos dos trabalhadores baseado no
total das remunerações anuais (em R$); e
calcular/estimar o preço de custo referente ao custo unitário do trabalho mais o
custo unitário do consumo intermediário e o custo indireto unitário total da
produção medido em Reais(R$).
Uma vez apurados por estimativa os indicadores econômicos da indústria
citada, ainda, no rol dos objetivos específicos, calculamos: o markup, o valor adicionado
bruto, a razão entre o consumo intermediário e a massa total anual das remunerações e, o
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excedente econômico. Desta maneira, pudemos assim, verificar a distribuição do produto
desta industria, entre salários (na forma das remunerações dos trabalhadores) e os lucros
(expressos de acordo com o montante de excedente econômico), segundo as respectivas
participações relativas dos salários e dos lucros, no valor total da produção da atividade de
fabricação de calçados do município de Franca, entre os anos de 1994 a 2002.
JUSTIFICATIVA
De 1990, até o ano de 2002, segundo dados disponibilizados pelo IBGE/SCN
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Sistema de Contas Nacionais), sobre o PIB
(Produto Interno Bruto), retratado sob a ótica da renda, revela-nos que a participação da renda
dos trabalhadores calculada segundo o valor total dos salários no produto total da
economia brasileira (PIB) que era de 36,3% no ano de 1990, caiu para 26,1% no ano de 2002,
no entanto, os ganhos do capital representados pelo excedente operacional bruto, passou de
39,5%, em 1990, para 46,5%, no ano de 2002, significando portanto, redução dos salários
enquanto proporção do PIB, em favor do lucro.
De acordo com dados do DIEESE (Departamento Intersindical de Estudos e
Estatísticas Sócio-Econômicas), obtidos através do Anuário dos Trabalhadores
DIEESE/2000 2001, a participação relativa do trabalho (remuneração dos empregados) no
PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, caiu de 44% em 1992, para 36% em 1998,
contrariamente, a participação do excedente operacional bruto (capital), passou de 38% para
44% no mesmo período.
Outro aspecto importante que merece ser destacado, relaciona-se ao quadro
conjuntural que se instalou no país com a tão decantada abertura comercial, sobretudo, o
período compreendido entre 1994 até 2002, em razão das medidas adotadas no âmbito da
política econômica pelo governo federal, como também, inaugurou-se uma nova fase para a
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economia brasileira: o fim do protecionismo de mercado combinado com a passagem da
conjuntura inflacionária para a denominada era da estabilidade com abertura comercial.
Sendo assim, em razão da conjuntura que se instalou no país, imprimindo a
partir de 1994, uma nova dinâmica competitiva marcada sobremaneira pelo intenso processo
de reestruturação produtiva com significativos efeitos deletérios sobre o emprego, como
também pelo conflito distributivo entre capital (lucro) e trabalho (salários), é que julgamos
sobretudo por se tratar de “uma questão social”, relevante pesquisar o tema proposto
delimitado na indústria de calçados do município de Franca.
Importante ressaltar inclusive enquanto prerrogativa, que antes de qualquer
conclusão provisória, torna-se mister primeiro compreender o problema, para posteriormente
estabelecermos algum juízo de valor, pois, sem qualquer inclinação ou pretensão, acreditamos
ser de certo modo curioso e, até mesmo preocupante, entender o que aconteceu para que em
1991, de acordo com dados do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) o
município de Franca com um índice de Gini calculado em 0,463, passasse para o ano de 2000
para 0,510, revelando-nos em termos distributivos: maior concentração, combinada com
aumento da desigualdade repartitiva da renda.
METODOLOGIA E REFERENCIAL TEÓRICO
O Sindicato da Indústria de calçados de Franca (Sindifranca), registra através
de boletim periódico, dados relativos à indústria de calçados: número de funcionários
mensalmente empregados na indústria de calçados, quantidade e valor (em US$) das
exportações de calçados, bem como, informa a quantidade anual de pares de calçados
produzidos pela indústria local distribuídos segundo o seu respectivo mercado de destino
(interno e externo).
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Porém, estas informações apenas, não são suficientes para atenderem os nossos
propósitos em termos de objetivos deste estudo, motivo pelo qual, fomos de certo modo,
obrigados a recorrer a outras fontes que pudessem servir-nos de referência. Assim, pelo fato
deste trabalho tratar-se de uma pesquisa quantitativa, procuramos como referência aquelas
fontes que desenvolvem pesquisas da mesma modalidade, isto é, produzem indicadores
quantitativos. Estes foram empregados, principalmente por nos proporcionar significativa
aproximação do propósito maior, que era compreender a própria indústria de calçados de
Franca no que tange ao problema da geração e, apropriação do valor da sua respectiva
produção, bem como, do problema relacionado à receita versus os custos da produção.
Em primeiro plano, adotamos os dados do IBGE-SCN (Sistema de Contas
Nacionais), Composição do Produto Interno Bruto, bem como, das informações fornecidas
pelo IBGE-MIP (Sistema de Contas Nacionais Matriz Insumo-produto). Posteriormente,
empregamos os dados disponibilizados pelo IBGE-PIA (Pesquisa Industrial Anual) que
possibilitaram-nos através dos dados gerais sobre a estrutura de custos/despesas e receitas
alçar vôo panorâmico sobre a indústria de transformação brasileira e, em seguida,
examinarmos a indústria brasileira de calçados.
O trabalho de José Celso Cardoso Júnior “Geração e apropriação de valor
adicionado na economia brasileira: um estudo da dinâmica distributiva no período
1990/1996”, divulgado no ano de 2000 pelo IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas
Aplicadas, e os dados do IBGE/SCN (Matriz Insumo-Produto), sobre o setor de fabricação de
calçados do Brasil quanto aos componentes do valor adicionado nos serviram de modelo para
analisarmos a indústria de calçados de Franca.
Para entendermos o processo de geração e de apropriação do valor adicionado
na indústria calçadista francana, optamos ainda, por examinar, como o mesmo ocorreu numa
empresa local. Contudo, procedemos a analise no período de 1998 a 2003, pelo fato das
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informações da empresa denominada “Kwanta”, estarem somente neste intervalo de tempo
devidamente organizadas. Assim, as informações da referida empresa, juntamente com as
demais, já devidamente anunciadas, forneceram-nos as bases sobre as quais pudemos
finalmente cumprir a etapa mais relevante deste estudo, que foi a construção de indicadores
econômicos do setor de fabricação de calçados de Franca.
No final do século XVIII e início do século XIX, entre os clássicos, o primeiro
a se debruçar sobre a questão relacionada à distribuição, ou, a repartição, da renda no bojo da
economia política foi David Ricardo, que verificou a repartição da renda entre os proprietários
da terra, os proprietários de capital, e, os trabalhadores.
Ricardo introduziu o conceito de “estado estacionário”, o qual, seria atingido
em razão do declínio na atividade econômica, provocado pela queda na acumulação de
capital, resultante da tendência à baixa da taxa de lucros.
Posteriormente, Marx desenvolveu os conceitos de mais valia e exploração,
modificando as formulações elaboradas por Ricardo.
No campo da teoria econômica, por tratarmos da questão inerente à formação
de preços deveríamos percorrer os desdobramentos teóricos desenvolvidos no compartimento
da denominada microeconomia. Todavia, não é do nosso interesse transitar por este caminho,
qual seja, o da teoria da firma e análise das condições de oferta, nem, da temática relacionada
às estruturas de mercado concorrência perfeita, oligopólio, monopólio , muito menos,
estudar no que tange à teoria dos preços os seus aspectos mais relevantes, os custos
propriamente ditos.
Deste modo, adotamos como referencial para examinar o tema em tela a
abordagem desenvolvida pelo economista polonês Michal Kelcki (19899-1970), que nas
palavras do economista brasileiro Edmar Bacha “Kalecki nunca tinha lido nenhum outro
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economista que não fosse Marx [...] Em cima de Kalecki é que Joan Robinson trabalha,
porque o foco da sua análise também é este: capital e trabalho.
ESTRUTURA DO TRABALHO
Este trabalho sustenta-se nos termos de sua estruturação em seus sete capítulos,
incluindo a introdução e a última parte que denominamos perspectivas, ao invés da tradicional
conclusão, uma vez que, não acreditamos tê-lo assim concluído, ao contrário, esperamos pelo
menos converte-lo em um embrião.
O Capítulo I trata de um panorama geral sobre o país retratado através da
temática “Brasil, um país marcado pelas desigualdades sociais: o problema da distribuição da
renda e da riqueza”, onde procuramos de maneira ainda que suscinta mostrar através de
indicadores econômicos e sociais o perverso lado da distribuição da renda e da riqueza entre
os seus respectivos habitantes nos anos 1990.
No segundo capítulo procuramos oferecer uma visão panorâmica sobre a
indústria de transformação e uma breve retrospectiva da indústria de calçados no Brasil sob as
lentes da estrutura de custos-despesas e receitas, também explorando anos selecionados da
década de 1990.
No Capítulo III, reservamos espaço para examinar “Componentes do valor
adicionado da indústria de calçados do Brasil (de 1990 a 1996)” onde, entre outros
indicadores, destacamos aqueles inerentes à produtividade do trabalho, markup e excedente
econômico. Neste mesmo compartimento, dedicamos atenção, ainda que, bem resumida, para
uma “Retrospectiva da economia brasileira: da conjuntura inflacionária para a era da
estabilidade”, espaço dedicado a uma análise do período da inflação galopante, face ao revés
da transição para a era da estabilidade.
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Procuramos no Capítulo IV com certa restrição, retratar em suas parcas
matizes a questão relacionada à economia regional do Brasil, reverberada pelas mudanças
ocorridas na geografia econômica resultante da composição do VIT (Valor da Transformação
Industrial) no espaço econômico regional do país. Do mesmo modo, promovemos uma breve
incursão pela economia paulista na perspectiva da “Economia regional e a rota dos
investimentos no Estado de São Paulo em 2003”, onde examinamos os investimentos
anunciados e realizados no estado paulista, incluindo o município de Franca, vis-a-vis às
demais regiões administrativas deste mesmo estado brasileiro.
Neste mesmo capítulo, desenhamos alguns traços gerais da indústria de
calçados de Franca inserida no quadro da abertura da economia praticada no país pelo
governo de FHC, assim como, através de um conjunto selecionado de indicadores econômicos
e sociais, oferecemos uma pequena fotografia da economia do município de Franca.
No Capítulo V, revelamos os resultados de uma pesquisa realizada numa
empresa calçadista local, considerando que os dados obtidos serviram-nos de referência para a
etapa subseqüente, como inclusive, assumiram a devida importância para examinarmos a
indústria de calçados, posto que, assumimos a hipótese de que esta empresa (especificamente)
configuraria o padrão da indústria (considerando os prováveis desvios e proporções). Na
segunda parte deste mesmo capítulo, procedemos quanto ao processo de construção de
indicadores econômicos da referendada indústria, para o período compreendido entre os anos
de 1994 a 2002, os quais, entre outras relações possíveis de serem estabelecidas (a partir deste
conjunto de indicadores), permitiram-nos examinar como se distribuiu o produto desta
indústria entre salários e lucros.
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INTRODUÇÃO
Diferentemente dos animais, o homem é possuidor de uma variada e complexa
relação de necessidades, as quais, por conseguinte, não se restringem apenas aquelas
suscetíveis de atenderem a sua sobrevivência física, condição essencial para a sua
preservação, isto é, o homem para sobreviver precisa se alimentar, porém, somente isto não
basta para garantir e reproduzir as condições capazes de atenderem outras necessidades.
O homem é um ser político, ou seja, é um ser social, portanto, é portador de
necessidades de agregação, que se efetivam através das relações que ele próprio estabelece
com outros homens nas mais diferentes formas de organização da sociedade humana,
organização política, organização social, organização econômica, etc.
O homem é um ser natural, isto é, ele é um ser que faz parte integrante da natureza,
sem nela inserira espécie humana. Ao mesmo tempo em que se constitui em ser
natural, o homem diferencia-se da natureza, que é, como diz Marx (1984), “o corpo
inorgânico do homem”[...]; para sobreviver ele precisa com ela se relacionar já que
dela provêm as condições que lhe permitem perpetuar-se enquanto espécie. Não se
pode, portanto, conceber o homem sem a natureza e nem a natureza sem o homem.
Na busca das condições para sua sobrevivência, o ser humano assim como outros
animais atua sobre a natureza e, por meio dessa interação, satisfaz suas
necessidades; no entanto, a relação homem natureza diferencia-se da interação
animal natureza.[...]. O processo de produção da existência humana é um processo
social; o ser humano não vive isoladamente, ao contrário, depende de outros para
sobreviver.[...]. Na base de todas as relações humanas, determinando e
condicionando a vida, está o trabalho uma atividade humana intencional que
envolve formas de organização, objetivando a produção dos bens necessários à vida
humana. Essa organização implica uma dada maneira de dividir o trabalho
necessário à sociedade e é determinada pelo nível técnico e pelos meios existentes
para o trabalho, ao mesmo tempo em que os condiciona; a forma de organizar o
trabalho determina também a relação entre os homens, inclusive quanto à
propriedade dos instrumentos e materiais utilizados e à apropriação do produto do
trabalho.
1
O homem relaciona-se com a natureza extraindo dela os recursos necessários à
produção dos bens indispensáveis à vida humana. Deste modo, à medida que o homem
evoluiu, formas mais complexas de organização (econômica, política, social, etc) se
1
ANDERY, Maria Amália Pie Abib. et al. Para compreender a ciência: uma perspectiva histórica. 8.
ed. Rio de Janeiro: Espaço e tempo; São Paulo: EDUC, 1999. p. 9-11.
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desenvolveram, da mesma maneira, que outras mais sofisticadas necessidades se
manifestaram. Assim, ao longo do tempo, a fixação dos agrupamentos humanos em dado
espaço territorial possibilitaram o surgimento de aglomerações urbanas, que à medida que as
suas populações cresciam, tornavam-se mais complexas, demandando para tanto formas mais
avançadas de organização.
Para o atendimento das necessidades materiais alimentação, vestuário,
habilitação, transporte, entre outras a organização da atividade de produção implicava
sobretudo na forma pela qual a sociedade dividia entre os seus próprios membros o trabalho
necessário à produção destes bens, como também na respectiva distribuição do produto do
trabalho. No bojo das necessidades humanas limitamo-nos ao conjunto das necessidades
materiais.
Eles brotam de um processo ininterrupto da produção, de modo que o mundo que
envolve o homem muda progressivamente: o meio natural cede seu lugar a um meio
transformado “humanizado”, produto ele mesmo da atividade humana precedente
[...] Por outro lado, a produção o trabalho conduz à mudança não somente de seu
objeto, a natureza, mas também de seu sujeito: o homem, a natureza humana.
Enquanto objetivamente, considerado sob um ângulo material, o trabalho se
apresenta como produção sempre renovada de objetos aptos a serem utilizados pelo
homem, como a acumulação da riqueza objetiva, por outro lado, sob o ângulo
subjetivo, ele nada mais é do que processo de criação e da acumulação de novas
capacidades e qualidades humanas.
2
Para o atendimento de suas necessidades materiais, o homem, organiza-se,
relacionando-se por conseguinte com o meio natural, a natureza, transformando-a, isto num
processo dinâmico, contudo, ao relacionar-se com o meio natural, não deve apenas por
intermédio da divisão social do trabalho inerente à própria organização produtiva da
sociedade, produzir os bens necessários ao provimento das suas necessidades materiais, mas,
principalmente, possibilitar fundamentalmente que sejam criadas as condições suscetíveis de
promoverem o desenvolvimento das suas potencialidades, etc.
2
MÁRKUS, György. A Teoria do conhecimento no jovem Marx. Tradução de Carlos Nelson Coutinho.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974. p. 83-84.
44
A organização da sociedade para produzir os bens no atendimento das
necessidades humanas, demanda por sua vez, no próprio interior do processo de produção, o
emprego de recursos materiais e técnicos, os quais, devidamente combinados transformam os
recursos fornecidos pela natureza em bens que serão consumidos pelo homem para o
provimento das suas necessidades.
Assim, um Sistema Econômico moderno compreende um complexo tecido de
relações diretas e indiretas, pelas quais os homens chegam a dispor de variadíssima
gama de bens, capazes de satisfazer suas múltiplas necessidades e desejos materiais.
É desta forma que os homens dividem socialmente seu trabalho, funcionando
integrados mediante uma extensa corrente de trocas de produtos e prestação de
serviços mútuos.
As atividades produtivas de uma sociedade contemporânea distribuem-se por
inúmeras unidades produtoras que, individualmente, articulam trabalho, capital e
recursos naturais, visando à obtenção de determinados bens e/ou serviços. As
unidades produtoras concretizam, pois, o fenômeno da divisão social do trabalho.
3
A produção de bens de consumo (para o atendimento das necessidades
humanas imediatas), como, daquela categoria de bens de capital (empregados na produção de
bens de produção, como máquinas e equipamentos, que não são consumidos), depende da
combinação dos fatores de produção: trabalho, capital e recursos naturais, os quais, são
devidamente empregados pelas unidades produtoras para produzirem os bens que atenderão às
necessidades da sociedade de forma geral
Figura 1: Fluxograma empresas famílias
Fatores de produção
(Trabalho e capital material)
Empresas Famílias
Bens e serviços finais
Fonte: Paulani (2000)
3
CASTRO, Antônio Barros de. & LESSA, Carlos Francisco. Introdução à Economia: uma abordagem
estruturalista. 32. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. p. 25.
45
As famílias que são detentoras dos fatores de produção (capital intelectual e
trabalho), oferece-os às empresas que, por sua vez, combinam esses fatores no processo de
produção obtendo por conseguinte os bens e serviços que serão oferecidos às famílias para o
seu consumo satisfazendo desse modo as suas respectivas necessidades.
Figura 2: Fluxo Circular da Renda
Compra de bens e serviços
(Despesa Agregada = Consumo)
Fornecimento de Bens e Serviços
(Produto Agregado)
Famílias Empresas
Serviços dos fatores de produção
Renda Agregada = Remuneração dos fatores
de produção (salários, lucros, juros e aluguéis)
Fonte: Vasconcellos (2000)
Assim, ao produzir os bens e serviços a serem fornecidos às famílias, as empresas
utilizam os fatores de produção fornecidos pelas famílias. Ao serem utilizados, os
fatores são remunerados, permitindo às famílias auferir uma renda que é,
inicialmente, destinada a aquisição dos bens e serviços produzidos pelas empresas.
Com base nesse fluxo, podemos estabelecer a identidade macroeconômica básica.
4
Produto Agregado = Despesa Agregada = Renda Agregada
(valor da produção final) (despesa com o produto) (salários + lucros + juros + aluguéis)
Assim, empresas e famílias estabelecem uma relação de retransferência
constante de bens e serviços, os quais, resultarão da elaboração de um produto agregado
(soma dos bens e dos serviços produzidos), de uma despesa agregada (resultante do consumo
4
VASCONCELLOS, Marco Antônio Sandoval de.; LOPES, Luis Martins (orgs.) Manual de
macroeconomia. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2000.
46
dos bens e serviços fornecidos e oferecidos pelas empresas), e de uma renda agregada, que é a
remuneração dos fatores empregados no processo de produção, distribuída na forma de
salários (que é a remuneração dos trabalhadores em contrapartida do trabalho realizado nas
empresas), dos alugueis (que é a remuneração dos proprietários de imóveis), dos lucros (que é
a remuneração dos capitalistas
5
), e, dos juros (que corresponde à remuneração do capital
financeiro resultante dos empréstimos, financiamentos concedidos aos agentes econômicos).
Cumpre salientar que os bens e serviços produzidos e consumidos, assim como o pagamento
dos fatores de produção (remuneração dos fatores) numa economia de mercado, considerando
sobretudo a introdução da moeda como meio de troca,ou seja, do fluxo circular que se
estabeleceu como resultado do processo de retransferências, é, em síntese, um fluxo
monetário, posto que, as retransferências são efetuadas, utilizando para tanto a moeda como
instrumento de troca.
Pois bem, observando o processo de produção material e o de consumo, vemos que
existe algumas proporções e interdependências. A nível global, isso implica que
numa sociedade devem ser definidas certas proporções entre produção e consumo,
entre consumo e acumulação, entre renda e consumo, etc., e de como são
distribuídas cada uma dessas variáveis numa determinada população. Definir essas
proporções é simplesmente a essência da política social [...] Esse aspecto tem grande
importância: uma alteração significativa dessas proporções pode desviar o curso da
reprodução, reduzir o ritmo de crescimento, criar situações de crise ou intensificar os
conflitos sociais.
6
De outro modo, podemos afirmar que a produção dos bens e/ou serviços
elaborados pelo homem (para o atendimento das suas respectivas necessidades) sobretudo
numa sociedade cuja forma de organização da atividade de produção sustenta-se sob as bases
de um sistema econômico que congrega, entre outras, importantes categorias, tais como:
5
LUCRO. Rendimento atribuído especificamente ao capital investido diretamente por uma empresa.
Em geral, o lucro consiste na diferença entre a receita e a despesa de uma empresa em determinado
período (um ano, um semestre, etc.) O lucro bruto é a diferença entre a receita obtida pela venda de
mercadorias e o custo de sua produção, incluindo-se nesse custo os gastos com insumos (matérias-
primas), energia e outras despesas, mais os impostos e a remuneração da força de trabalho. O lucro
liquido é calculado subtraindo-se do lucro bruto a garantia correspondente à depreciação do capital
fixo (máquinas e equipamentos) e as despesas financeiras [...]
SANDRONI, Paulo. Novíssimo dicionário de economia. São Paulo: Best Seller, 1999. p. 356.
6
BUSTELO, Eduardo do S. Planejamento e política social: a dialética do possível. In: BROMLEY,
Ray; BUSTELO, Eduardo S. (orgs.). Política x Técnica no planejamento: perspectivas críticas. São
Paulo: Brasilense, 1982. p. 134-135.
47
liberdade de escolha dos consumidores, livre iniciativa particular, propriedade privada dos
meios de produção, mercado, concorrência, oferta e procura (enquanto mecanismos
reguladores do próprio mercado) sistema de preços (mecanismo sinalizador das decisões de
produção/oferta e consumo/procura), lucros e investimentos.
Desta forma, de maneira suscinta, o consumo é aquela porção da produção
destinada ao atendimento imediato das necessidades humanas, enquanto o investimento
relaciona-se à aplicação de parcela do produto da economia à aquisição de novas máquinas e
equipamentos, ampliação do parque industrial (ou até mesmo da planta industrial da(s)
empresa(s)), entre outras modalidades, sucetíveis de promoverem pelas vias de expansão da
capacidade produtiva da economia (ou da(s) empresa(s)) e /ou da própria modernização, o
crescimento do produto da economia. Devemos no entanto salientar, que o crescimento
econômico (medido pela expansão do produto total da economia, ou, mais precisamente, pelo
produto interno bruto), depende também não apenas do ritmo de dilatação do consumo e do
dinamismo dos investimento mas, depende dos gastos do setor governo e do setor externo
da economia protagonizado principalmente pelo ritmo das exportações e das importações.
Figura 3: Modelo de produção
Fonte: Elaborada pelo autor
Recursos
Humanos
Consumo
Recursos de
Capital
Investimento
Recursos
Naturais
Produção
48
Os recursos naturais fornecidos pela natureza sob a forma de matérias-primas,
são transformados em bens de consumo por meio da ação humana, resultante da combinação
dos recursos humanos (capital intelectual e trabalho) e, dos recursos de capital (máquinas,
equipamentos, ferramentas, instalações, capital financeiro ou recursos financeiros, incluindo
neste conjunto a própria tecnologia), proporcionando desta maneira como resultado desta ação
e da combinação dos recursos humanos e de capital, a elaboração do produto da sociedade
(produção de bens e serviços). Este produto, é por conseguinte, destinado proporcionalmente
ao consumo para o atendimento das necessidades humanas e ao investimento
7
necessário
para a ampliação da capacidade produtiva instalada cujas modalidades assumem variadas
formas, como aquisição de máquinas e equipamentos mais sofisticados tecnologicamente,
construção de nova planta industrial, ampliação da planta industrial existente, aquisição de
outra empresa, investimento em qualificação, capacitação e atualização ou, na própria
formação dos recursos humanos, investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos
processos, produtos ou novos materiais, ampliação dos mercados, redução dos custos da
produção, etc. imprescindível sobretudo para a consolidação do objetivo relacionado ao
crescimento da economia, como também e, principalmente, para a consolidação do objetivo
da promoção do desenvolvimento econômico capaz de entre outros motivos, melhorar o
padrão de vida da população de modo geral.
7
INVESTIMENTO. Aplicação de recursos (dinheiro ou títulos) em empreendimentos que renderão
juros ou lucros, em geral a longo prazo. Num sentido amplo, o termo aplica-se tanto à compra de
máquinas, equipamentos e imóveis para a instalação de unidades produtivas como à compra de
títulos financeiros (letras de câmbio, ações, etc.). Nesses termos, investimento é toda aplicação de
dinheiro com expectativa de lucro. Em sentido estrito, em economia, investimento significa a
aplicação de capital em meios que levam ao crescimento da capacidade produtiva (instalações,
máquinas, meios de transporte), ou seja, em bens de capital.
SANDRONI, Paulo. Novíssimo dicionário de economia. São Paulo: Best Seller, 1999. p. 308.
49
Figura 4: Fatores de produção e crescimento econômico
Fonte: Elabora pelo autor
Ainda que grosseiramente, de acordo com o gráfico 1, verificamos que o
produto da economia resulta da conjugação dos fatores de produção, capital (K) e trabalho
(T), que numa economia de mercado, precisam ser combinados de maneira eficaz, de tal sorte,
que sejam sobretudo capazes de produzirem além do mais, o desejável resultado traduzido na
forma de lucro, o qual, por sua vez, pode ser entendido como sendo o resultado da diferença
entre o preço de custo expresso pela soma de todos os custos e despesas inerentes ao
processo de produção e o respectivo preço de venda, de modo que, quanto maior for o preço
de venda e menor for o preço de custo
8
, tanto maior será o lucro resultante da diferença entre
ambos os preços.
Por sua vez, a taxa de crescimento do produto da economia, subordina-se às
respectivas taxas da produtividade dos fatores; isto é, das produtividades do capital e do
8
No que respeita ao preço de custo, de forma bem resumida entendemos como sendo todos os
custos referentes ao processo de produção.
CUSTOS DIRETOS. Custos que podem ser identificados diretamente com uma unidade o produto. È
o caso dos custos decorrentes do consumo de matéria-prima, embalagem e mão-de-obra- a parte do
salário paga ao operário que trabalho diretamente no produto [...]. CUSTOS FIXOS. Custos que
permanecem inalterados, independentemente do grau de ocupação da capacidade da empresa ...,
sem levar-se em conta se ela está produzindo ou não (aluguél, juros, instalações, etc.). CUSTOS
INDIRETOS. Custos relacionados com a fabricação e que não podem ser identificados com as
unidades que estão sendo produzidas. Por exemplo: aluguel das instalações da fábrica, depreciação,
mão-de-obra indireta, impostos, seguro, etc. CUSTOS VARIAVÉIS. Parte do custo total que varia
conforme o grau de ocupação da capacidade produtiva da empresa; por exemplo, custos com
matérias-primas, salários por produção e outros. LUCRO. O lucro bruto é considerado excedente
econômico, ou seja, um rendimento gerado no interior da empresa, deduzidos todos os custos
necessários à produção da mercadoria. A produção de excedente caracteriza vários sistemas
econômicos, mas somente no capitalismo ela assume a forma de lucro.
SANDRONI, op cit, p.153-356.
Y = f (K,T)
Capital e Trabalho
(K, T)
Produto da
economia
(Y)
50
trabalho. Todavia, no que concerne aos incrementos obtidos por meio do capital no caso
aqui estamos referenciado-nos exclusivamente ao conjunto de máquinas e equipamentos
empregados no processo de produção vale lembrar, que isto só é possível, mediante aquela
modalidade de investimentos que contempla a expansão da produção por meio da sua
respectiva capacidade de ampliação, obtida também, pelo investimento realizado para a
modernização/atualização e/ou ampliação, uma vez que, ao longo do tempo, máquinas e
equipamentos, ficam expostos à depreciação produzida pelo desgaste físico e, à obsolescência
resultante da inovação tecnológica.
Por outro lado, o aumento da produtividade do trabalho, fica sujeito não
apenas àquela tipologia de investimentos relacionados ao incremento do capital intelectual
(formação, aperfeiçoamento, atualização, etc.), mas, sobretudo, depende das condições de
vida do trabalhador enquanto reflexo da sua participação na distribuição do produto social da
economia, traduzido em ultima instância, pelo próprio rendimento
9
do trabalho na forma de
salários.
A teoria pós-keynesiana tem emergido como uma síntese de três não ortodoxas
visões, sendo cada uma delas contribuição de um diferente individuo. Há, em
primeiro, John Maynard Keynes que via a economia com uma integridade própria,
na qual o comportamento no nível macro é mais que uma exata extrapolação do
comportamento no nível micro. Há, em adição, Roy Harrod que tinha a percepção da
economia como um sistema em contínuo movimento [...]. Finalmente, há Michal
Kalecki com o discernimento de que o processo de acumulação de capital, ou
expansão, é inextrincalvelmente ligado à distribuição da renda e ao conjunto de
preços
10
9
Os rendimentos proporcionados pela produção social dividem-se entre as classes sociais de acordo
com a forma como participam do processo econômico. Os trabalhadores participam da renda
recebendo salários; os donos de recursos naturais ou imóveis obtêm a renda da terra ou aluguéis; os
proprietários do capital financeiro recebem juros; e os donos das empresas industriais, comerciais, de
serviços ou de outra natureza, os lucros. Numa economia capitalista moderna, os rendimentos
fundamentais são os salários e os lucros , que mantém entre si uma relação complexa. Da magnitude
dos salários depende o poder aquisitivo da maioria da população. [...] Quando os salários aumentam,
cria-se uma expansão da demanda de bens, serviços, que permite às empresas elevar seus preços
e, assim, preservar suas margens de lucro. Nesse caso, são especialmente beneficiadas as
empresas que produzem mercadorias de consumo de massa, onde os assalariados concentram seus
gastos. Quando há uma queda de salários, os custos das empresas tornam-se menores e aumenta a
margem de lucro.
SANDRONI, op cit, p.356.
10
FERREIRA, Asséro. Limites da acumulação capitalista: um estudo da economia política de Michal
Kalecki. São Paulo: Hucitec, 1996. p. 26
51
Por esta forma, como o objetivo deste estudo é verificar como a distribuição do
produto que neste específico caso relaciona-se ao subsetor da industria de transformação
classificado como fabricação de calçados se processou na forma de salários e de lucros,
optamos por conseguinte em nos apoiar em Kalecki, uma vez que, para examinar a
distribuição do produto (do mencionado subsetor da industria de transformação) entre os
rendimentos do trabalho expressos na forma de salários, e, os rendimentos dos proprietários
de empresas expressos na forma de lucros, julgamos ser de certo modo, mais relevante
realiza-lo, na perspectiva da distribuição da renda sob ótica dos preços, sobressaindo os
preços de custo (analisados sob o prisma dos custos variáveis, retratados pelo consumo
intermediário, ou seja, pelo consumo de matérias-primas, materiais auxiliares, componentes,
etc.; e os custos referentes às remunerações traduzidas pelos valores inerentes aos salários e
contribuições sociais, etc.) e os preços de venda das mercadorias.
A renda social de nossa economia pode ser expressa de dois modos, ou seja pelo
lado das receitas e pelo lado das despesas:
Rendas Despesas
Renda dos capitalistas Investimentos
Salários Consumo
ou ainda:
Renda dos Capitalistas Investimentos
Consumo dos capitalistas
Salários Consumo dos trabalhadores
Como investimento entendemos aqui as compras de equipamentos de capital fixo
(prédios, máquinas, etc.) assim como o crescimento dos estoques. Visto havermos
suposto que os trabalhadores aplicam em consumo todas as suas receitas, se
eliminarmos os salários de ambos os lados do “balanço da renda social”, obteremos:
Renda dos capitalistas = Investimento + Consumo dos capitalistas
Essa igualdade tem um significado fundamental para a nossa análise. Ela nos dá a
chave das alterações que ocorrem na magnitude da produção
11
Deste modo, é bem transparente segundo este demonstrativo de rendas dos
capitalistas e dos trabalhadores (lucros e salários) e despesas (consumo dos trabalhadores,
consumo dos capitalistas e investimento) como numa economia de mercado os sujeitos:
capitalistas ou proprietários de empresas e os trabalhadores assalariados destinam suas rendas,
ao mesmo tempo, em que perceptível se torna o tradicional conflito entre o capital e o
11
KALECKI, Michal. Crescimento e ciclo das economias capitalistas. Tradução de Jorge Miglioli. 2.ed.
São Paulo: Hucitec, 1990. p. 75
52
trabalho, protagonizado pela luta que ambos os sujeitos travam na disputa por parcelas
maiores da própria renda social.
Quadro 1: Tableau économique de Kalecki
I II III TOTAL
P1 P2 P3 P
W1 W2 W3 W
I Cc Cw Y
Fonte: Kalecki (1990)
[...] vamos modificar um pouco a divisão marxista da economia em departamentos,
com o fim de simplificar nossa argumentação e concentrar-nos no problema básico
de esquemas de reprodução. [...] Obteremos assim o seguinte “tableau économique”
da renda nacional, onde P1, P2 e P3 são os lucros brutos (isto é, antes deduzir a
depreciação) dos três departamentos , W1, W2 e W3 são os respectivos montantes
de salários, P e W são os lucros brutos totais, respectivamente, Cc o consumo dos
capitalistas Cw o consumo dos trabalhadores, e Y a renda nacional bruta (antes de
deduzir a depreciação)
12
Consideramos a divisão da economia em departamentos segundo Kalecki, não
apenas para demonstrar como estão distribuídos os lucros e os salários entre os setores da
economia de acordo com Kalecki, o departamento I, produz bens de capital, ou, investimentos
(I), máquinas, equipamentos, etc., o departamento II, produz os bens de luxo destinados ao
consumo de capitalistas (CL), de departamento III, por sua vez, produz bens de salários,
destinados ao consumo dos trabalhadores (Cw) , isto é, como que a renda nacional (Y), se
distribue setorialmente entre lucros brutos totais (P) e salários totais (W), mas principalmente,
para mostrar que o objeto do presente estudo, na perspectiva Kaleckiana, se localiza no
departamento III. Consideramos que, o subsetor da industria de transformação, denominada
fabricação de calçados, produz bem de consumo final, destinado ao consumo da classe
trabalhadora, pois, não é este setor um departamento especializado na produção de bens capital,
nem mesmo produtor de artigos de luxo destinados ao consumo dos capitalistas. Logo, o
enquadramento da industria de calçados neste departamento resulta da própria orientação que
adotamos de Kalecki.
12
KALECKI, Op. cit., p.1
53
Deste modo, para que o fluxo circular (produção continuada de bens e serviços
circular e despesa agregada, consumo contínuo) garanta as condições de reprodução, tanto do
capital, na forma de produção de excedente e de acumulação sob a forma de investimento, como
do trabalho, no sentido de preservar as condições de reprodução da força de trabalho (física e
mental), como do próprio ritmo de crescimento da economia, bem como, evitar a instalação de
situações de crise, ou, de conflitos sociais, torna-se deste modo mister que a distribuição do
produto social da economia ocorra segundo certo equilíbrio entre as proporções.
Desta forma, é inaceitável a idéia, implícita a muitos movimentos “progressistas”, de
não dar atenção ao problema da criação de riqueza, da expansão da produção e da
produtividade, do crescimento enfim. Toda sua combatividade, seu apelo ao humano
e ao social se volta para o problema da redistribuição, para a injustiça social, como
se a inigüidade existente pudesse ser corrigida fora de um processo de crescimento
[...] Essa é a dimensão social do econômico. [...] É essencial ter o social
organicamente ligado ao econômico dentro da própria estratégia. E, por isso mesmo,
com política para ele voltada, diretamente. O efeito prático é que a redistribuição de
renda será procurada em si mesmo, e num enfoque que remonta às suas causas...
sem o tratamento assistencialista, ou populista, de correntes bem intencionadas, mas
destituídas de uma visão estratégica, que incorpore o econômico e o social. Essa é a
dimensão econômica do social.
13
Logo, a expansão do capital (geração de excedente econômico e acumulação)
depende principalmente do ritmo de crescimento da economia, que, por sua vez, depende
fundamentalmente do consumo em escala suficiente para promover a expansão da produção
(ampliação da capacidade de oferta) e, da produtividade que no caso do fator trabalho depende
essencialmente das condições de produção da força de trabalho, física (por meio de nutrição infra-
estrutura, saúde, etc) e intelectual (educação, capacitação, atualização profissional, entre outros),
que depende essencialmente da remoção de entraves estruturais, entre os quais, podemos citar
com certa ênfase, aquele relacionado à distribuição mais justa do produto social da economia
entre seus próprios cidadãos. É por tanto nítida a interdependência entre as duas dimensões, a
econômica e a social, assim sendo, a consolidação de objetivos de viés econômico depende da
remoção dos gargalos sociais, notadamente do problema distributivo da renda, por outro lado, a
13
VELLOSO, João Paulo dos Reis. A dimensão social da estratégia: crescimento com redistribuição e
reformas. Revista Planejamento e Políticas Públicas IPEA Instituto de Planejamento Econômico e
Social, Brasília, v.1.n.1. ago/1989. p. 58.
54
consolidação de objetivos de caráter social (entre outros fatores) requer condições econômicas
favoráveis.
A desconcentração da renda constitui a segunda reforma estrutural na condução das
economias de mercado e não apenas permite o surgimento de novos consumidores
como pode estimular também a geração de mais empregos nos setores secundários e
terciário, especialmente os de serviço pessoal e de pequenos negócios. Como no
Brasil os salários são baixos, especialmente o valor do salário mínimo legal, a renda
permanece concentrada em poucas famílias e os empregos gerados pelo setor
produtivo voltam-se apenas para segmentos restrito da população. [...] Na economia
brasileira, em especial por possuir parcela majoritária de sua população vivendo com
rendimentos reduzidos a melhoria na distribuição da renda não apenas seria um
principio de justiça social e tributaria, mas permitiria transformar parcelas
expressivas de trabalhadores em consumidores.
14
De fato, uma melhor distribuição da renda, promoveria a inclusão de mais
trabalhadores no próprio mercado de consumo, como poderia, até ampliar o numero de consumidores,
porém, para tanto, seria necessário não apenas a correção do salário real do trabalhador (ou seja,
promover sua compensação face a corrosão causada pela inflação), mas, principalmente, ampliar na
medida do possível, a sua participação no produto da economia, pois, assim ocorreria de forma efetiva
e simultânea muito provavelmente maior justiça social acompanhada da ampliação desejada do
numero de consumidores.
Figura 5: Variações da renda e do consumo.
(Y) Renda
Y3 P3
Y2 P2
Y1 P1
Y0 P0
0 C0 C1 C2 C3 (C) Consumo
Fonte: Elaborado pelo autor.
14
POCHMANN, Marcio. Emprego e Trabalho no Brasil em perspectiva. In: RATTNER, Henrique
(org.). Brasil no liminar do século XXI: Alternativas para Construção de uma Sociedade Sustentável.
São Paulo: Universidade de São Paulo, 2000. p. 133.
5
5
Supondo que no tempo T0, a renda seja (Y0) e o consumo (C0), e que no
tempo T1, a renda aumente para (Y1), o consumo irá aumentar para (C1), assim, sucessiva e
progressivamente, em dada comunidade, ao aumentar a renda do trabalhador, não apenas o
consumo em quantidade deverá aumentar, como e principalmente a cesta de bens outrora
consumida passa a se tornar mais diversificada (identificada pelos deslocamentos de P0, P1,
P2 e P3). Por meio desta diversificação, o surgimento de novos e diferentes empreendimentos,
(que empregaram mais pessoas, aumentando a renda da comunidade), promoveram a
diversificação da própria economia. Mas, em sentido contrario, ou seja, caso a renda da
comunidade não se expanda considerando a possibilidade de que os salários dos
trabalhadores até sofram alguma redução o consumo poderá reduzir-se, ou se contrair,
promovendo, ainda que temporariamente, o retardamento dos investimentos. Logo, ao invés
de proporcionar aquela comunidade a instalação de um circuito virtuoso, poderá ocorrer isto
sim, o seu ingresso num circulo vicioso de efeitos negativos.
Alias o Brasil é um dos países em que custo da mão-de-obra, quando medido pela
participação dos salários no custo de produção ou no valor agregado, é um dos mais
baixos do mundo. Não são as condições institucionais do mercado de trabalho, mas
sim a política macroeconômica (de abertura descontrolada, juros altos e câmbio
sobrevalorizado) e seus reflexos na dinâmica do sistema produtivo, bem como a
ausência de uma política de desenvolvimento, proteção, financiamento e
reestruturação econômica e social, os fatores determinantes da evolução do emprego
e das condições de uso e remuneração da mão-de-obra. Propor a degradação destas
condições sob o falso pretexto de evitar o desemprego ou de elevar a
competitividade da economia, numa sociedade como a brasileira já marcada por
profundas desigualdades sociais e, portanto, com muito menos “gorduras” para
ajuste deste tipo mais do que um absurdo ético, é uma inominável
irresponsabilidade social.
15
No que trata do “processo de produção material e o de consumo”, Bustelo
ressalta a existência de “algumas proporções e interdependências” entre consumo e
acumulação , renda e consumo , produção e consumo etc. Velloso, nos remete à visão de
interdependência entre o econômico e o social. Para Pochmann, a desconcentração da renda,
é a segunda mais importante tarefa a ser realizada no Brasil no bojo das reformas estruturais.
15
TAVARES, Maria da conceição. Destruição não criadora: memórias de um mandato popular contra
a recessão, o desemprego e a globalização subordinada. Rio de Janeiro: Record, 1999. p. 245.
56
Enquanto Tavares, desperta-nos a atenção quanto ao baixo custo da mão-de-obra brasileira e
da “irresponsabilidade social e absurdo ético” que seria propor a flexibilização do custo do
trabalho pela rota da compressão dos já anêmicos salários pagos no país, Kalecki, nos
proporciona sobre o mesmo problema referimo-nos ao problema distributivo da renda uma
abordagem suscetível de complementar as demais acerca do conflito distributivo da renda
entre lucros e salários.
A economia periférica tende, portanto, a apresentar um perfil de demanda em que o
segmento de baixo cresce horizontalmente e o de cima verticalmente. A
diversificação da demanda final reflete, basicamente, o comportamento de uma
minoria da população beneficiária do excedente. Sua dinâmica está, portanto,
intimamente ligada à canalização de uma de uma parte do excedente para financiar o
aumento dos dispêndios de uma minoria cujos padrões de consumo se distanciam
cada vez mais dos da massa da população.
16
Além de serem relativamente baixos os salários no Brasil, a sua compressão em
favor do capital na forma de aumento do excedente econômico não apenas aprofunda o
problema da desigualdade repartitiva da renda que já é deveras perversa, mas, degrada ainda mais
as condições de vida de parcela enorme da própria população. Do mesmo modo, limita e/ou
restringe o ingresso desse segmento da sociedade no mercado de consumo de bens mais bem
elaborados, isto é, de maior valor agregado e maior sofisticação tecnológica, privilegiando deste
modo, uma minoria da população cujos padrões de consumo assemelham-se aos dos países
desenvolvidos do Primeiro mundo.
“Uma redução substancial da pobreza e das desigualdades sociais poderia também
exercer efeitos positivos em termos de expansão de mercado interno. Hoje em dia
não se trata mais de opor, como foi feito com freqüência, o crescimento via mercado
interno ao crescimento via mercado externo, mas sim de combinar ambos. [...]
Portanto, o desenvolvimento deve ser impulsionado de dentro e de fora. Dois pólos,
interno e externo, que ambos implicam a implementação de uma política estatal
ativa, tanto social quanto industrial. O combate à pobreza e às desigualdades sociais
não pode, portanto, satisfazer-se com a caridade, seja essa privada ou pública. [...]
As desigualdades sociais aprofundam-se, favorecendo a violência nas relações
humanas. O combate à pobreza e às desigualdades sociais nos países
subdesenvolvidos constitui uma necessidade ética, econômica e social”
17
16
FURTADO, Celso. Introdução ao desenvolvimento: enfoque histórico-estrutural. 3. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2000. p. 83
17
SALAMA, Pierre. Pobrezas e desigualdades no terceiro mundo. Tradução de Catherine M.
Mathiem. São Paulo: Nobel, 1997. p. 182-183.
57
Não resta duvida de que a redução da pobreza e das desigualdades sociais
produziriam efeitos de sinal positivo. No plano social, reduziria o número de famílias e
crianças expostas a maior vulnerabilidade social situação na qual entre outros sintomas
podemos destacar o problema da dificuldade de acesso aos serviços públicos essenciais como
saúde, educação, transporte, etc.; além, daquelas situações que envolvem maior exposição
das famílias e crianças, jovens e adolescentes a situações de risco, seja por meio da
promiscuidade, das drogas, da violência, seja por meio da inserção dos jovens e adolescentes
no circuito do tráfico de drogas. No plano econômico, a inserção de um número maior de
pessoas por intermédio de um aumento da renda sobretudo de uma expansão dos
rendimentos do trabalho favoreceriam em muito o crescimento da própria economia para
dentro através da ampliação do próprio mercado domestico. Isto, por conseguinte, poderia
estimular os investimentos produtivos, permitindo desta forma, o ingresso da economia num
circuito virtuoso de crescimento do produto, aumento do consumo, estimulo ao investimento,
geração de empregos e renda e , assim sucessivamente.
Evidentemente, que num quadro como este, os proprietários de capital,
referimo-nos aos empresários industriais, poderiam ampliar os seus respectivos lucros, ou
excedente econômico, podendo até converte-los em acumulação de capital traduzida pelos
investimentos produtivos.
No que se refere ao investimento, isso é conseqüência direta do lapso de tempo
dependente do período de construção do equipamento de capital. Mas as alterações
no consumo dos capitalistas também acompanham as mudanças nos lucros com
algum atraso. Ora, as vendas e os lucros num dado período não podem ser um
resultado direto de decisões passadas: os capitalistas podem decidir quanto
investirão e consumirão no próximo ano, mas não podem decidir a respeito de
quanto serão suas vendas e seus lucros
18
Do exposto, destacamos com ênfase o argumento de Kalecki, segundo o qual,
os capitalistas podem decidir sobre o quanto consumirão e quanto irão investir.
18
KALECKI, Op. cit., p.3
58
Salários e lucros, por seu turno, por serem rendimentos obtidos por indivíduos com
posições de classe social distintas, respectivamente e, conseqüentemente, posições
sociais e políticas distintas, influenciam a dinâmica econômica de forma distinta.
[...] Assim, os trabalhadores têm papel relativamente passivo na determinação do
nível de emprego, uma vez que as suas reivindicações por aumentos de salários
podem ser historicamente contrapostas pelo poder de monopólio [...] os lucros dos
capitalistas são determinados pelos seus gastos em consumo e investimento [...] Em
resumo, o principio fundamental da dinâmica Kaleckiana principio da
possibilidade de realização da mais valia está assentada na situação em que “os
trabalhadores gastam o que ganham e os capitalistas ganham o que gastam”. [...]
dado que os lucros são determinados pelo consumo e investimento dos capitalistas é
a renda dos trabalhadores (igual aqui ao consumo dos trabalhadores) que é
determinada pelos fatores de distribuição [grau de monopólio, por exemplo, A. F.]
19
Diante de tais argumentos, considerando a passividade da classe trabalhadora
no que tange à determinação do nível de emprego, bem como, da sua respectiva capacidade
(salvo as exceções) de reivindicação por aumentos de salários, sobretudo no caso brasileiro,
na década de 90, resta-nos indagar sobre o problema destacado por Kalecki a respeito das
decisões dos capitalistas quanto ao consumo e ao investimento, sobretudo, no que se relaciona
aos detentores de capital circunscritos ao ramo da atividade de fabricação de calçados do
município paulista de Franca. Em decorrência da ausência de investimentos produtivos
relacionados à ampliação da capacidade produtiva instalada, de investimentos destinados à
atualização e modernização do parque industrial, dos investimentos direcionados à pesquisa
e desenvolvimento (P & D), suscetíveis de principalmente resultarem do desenvolvimento de
novos produtos, dos investimentos relacionados á expansão e conquista de novos mercados,
ou ate mesmo, dos investimentos destinados à ampliação do capital intelectual da força de
trabalho etc; o excedente econômico teria sido destinado apenas ao consumo daqueles que
detém e controlam os meios de produção?
19
FERREIRA, Op. cit., p. 29-30.
59
CAPÍTULO 1 - BRASIL, UM PAÍS MARCADO PELAS
DESIGUALDADES SOCIAIS: O PROBLEMA DA DISTRIBUIÇÃO DA
RENDA E DA RIQUEZA
O problema da desigualdade repartitiva da renda e da riqueza no Brasil, não
apenas se constitui de grave entrave estrutural, como se destaca por ser uma das mais
perversas do planeta. Ao mesmo tempo que limita as possibilidades de crescimento da
economia “para dentro”, produz acentuados desequilíbrios de caráter social. A distribuição
desigual da renda no Brasil se manifesta em razão de causas variadas, e seus efeitos podem
ser avaliados sob óticas diferentes: individual, familiar, gênero e raça, e regional, entre outras.
As desigualdades ocorrem em razão de um variado leque de motivos, entre os
quais podemos destacar: os diferentes processos de formação histórica, econômica, social,
política etc. Do mesmo modo, as desigualdades decorrem dos desequilíbrios intra e inter
setoriais, do intercâmbio desigual que se manifesta através das relações de troca (intra e inter
regiões) e com outros países, assim como, resultam de questões de natureza política, cultural e
psicológica, entre outras.
O fenômeno da desigualdade pode também ser identificado quando, no mesmo
espaço econômico, convivem e coexistem tempos históricos diferentes, ou seja, o dinâmico e
o moderno, convivem e coexistem ao lado do arcaico, tradicional, pouco dinâmico e atrasado.
A questão das desigualdades imprime outro desenho quando examinada sob a
ótica da renda e da riqueza, do gênero e da raça, pois, nesse conjunto o país é ainda mais
desigual.
Se considerarmos o crescimento e o desenvolvimento como processos
suscetíveis de promoverem certo equilíbrio entre indicadores de natureza quantitativa com
60
aqueles de natureza qualitativa, a negação dessa condição, ou, o comportamento não colidente
desses indicadores faz-nos acreditar na manifestação de um estado de desequilíbrio.
Assim sendo, acreditamos que a distribuição assimétrica da renda e da riqueza,
promove e contribui para o aprofundamento da(s) desigualdade(s), motivando por sua vez a
manifestação na sociedade de um quadro de desequilíbrios de diferentes matizes,
comprometendo o seu próprio desenvolvimento.
A evidência empírica desses desequilíbrios pode ser corroborada mediante o
emprego de indicadores econômicos e sociais, entre outros, especialmente quando
combinados revelam-nos como são contraditórios, ou de outro modo, como se comportam de
maneira tão conflitante.
TABELA 1: Estado de São Paulo, taxa de mortalidade infantil e coeficiente de mortalidade
por homicídio 1990 a 2000.
ANO
TAXA DE
MORTALIDADE
INFANTIL
COEFICIENTE DE
MORTALIDADE POR
HOMICÍDIO
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
31,43
27,05
26,78
26,19
25,26
24,58
22,74
21,60
18,67
17,49
16,97
30,7
30,7
28,1
28,1
30,1
34,3
36,1
36,1
39,6
43,9
42,0
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da Fundação SEADE (Sistema Estadual de Análise de Dados)
para taxa de mortalidade infantil e Ministério da Saúde (MS/DATASUS) para o coeficiente de mortalidade por
homicídios/tipo de causa externa (coeficiente por 100 mil/hab)
61
FIGURA 6: Estado de São Paulo, taxa de mortalidade infantil e coeficiente de mortalidade
por homicídio 1990 a 2000.
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da Fundação SEADE (Sistema Estadual de
Análise de Dados) para a Taxa de Mortalidade Infantil e DATASUS/MS (Ministério da
Saúde) para Coeficiente de Mortalidade por tipo de causa externa - Homicídio.
A redução da taxa de mortalidade infantil, no período compreendido entre os
anos de 1990 até 2000, sinalizou que houve considerável avanço no âmbito da Política
Pública na área da saúde que, combinada com outros fatores, produziram, sem dúvida
melhoria significativa na qualidade de vida da população do estado de São Paulo. Contudo,
em sentido contrário, no mesmo período, o coeficiente de (mortalidade por causa externa)
homicídios saltou de 30,7 em 1990, para 42,0 em 2000, isto é, um aumento de quase 37% em
dez anos. Diante disso, acreditamos que todo o esforço do poder público na área da saúde
pode se tornar quase nulo diante da proliferação de uma outra grave doença social, a
violência, a qual sem sombra de dúvida, possui entre os seus antecedentes aqueles de
natureza econômica.
Por isso, na era do capitalismo “turbinado”, os bem-sucedidos acumulam “tempo
livre” sob a forma de capital fictício enquanto para os mais fracos, a “liberação” do
esforço se apresenta como ameaça permanente do desemprego, a crescente
insegurança e precariedade das novas ocupações, a queda dos salários reais,
exclusão social.
20
20
BELLUZZO, Luiz Gonzaga. Imperialismo e cosmopolitismo. Fórum Social Mundial 2001. Biblioteca
das Alternativas. Artigo Inédito. São Paulo: Fundação SEADE, 2000. p. 5.
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00
Taxa de mor
talidade
infantil
Coeficiente de
mortalidade por
homicídio
62
De fato, a década de 90 foi mais pródiga para o Brasil sem mencionar o resto
do mundo subdesenvolvido pois, ao lado de alguns importantes avanços, profundos recuos
foram dados pela precarização das relações de trabalho, pelo rompimento de importantes
vínculos sociais, pelo aumento significativo da informalidade e queda dos salários reais, pelo
aumento do desemprego sobretudo nas regiões metropolitanas, que entre outros sintomas,
provocaram certa degradação da qualidade de vida, medida pela dimensão da pobreza, da
fome, da exclusão social (e outras modalidades de exclusão), da violência, entre outros graves
problemas.
Não podemos atribuir à economia, responsabilidade total pela violência, uma
vez que as causas da mesma são múltiplas, todavia, os problemas de caráter econômico
impactam, via de regra, de forma nociva sobre a área social, atingindo sobretudo a população
economicamente deprimida. Relatório recente da Organização Mundial da Saúde (OMS)
revela que, quando a renda e o nível educacional da população aumentam, a violência declina.
Com base nesse argumento, a má distribuição da renda e da riqueza combinada
com baixo nível educacional são por conseguinte poderosos componentes da violência.
O crescimento produto da economia depende de uma gama variada de fatores:
do seu respectivo estágio tecnológico, do dinamismo da capacidade empresarial, da
capacidade de formação de poupança (pública e privada), da qualificação e produtividade da
mão-de-obra, dos investimentos em Ciência e Tecnologia (C&T) e, em Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D), da participação da economia no comércio mundial, da política
econômica (fiscal tributária e cambial), da qualidade dos postos de trabalho e, das relações
entre o capital e o trabalho, do rendimento da classe trabalhadora, das relações de troca de
bens e serviços entre países através do comércio entre as nações, entre outros fatores.
63
1.1 TENDÊNCIAS ECONÔMICAS E SOCIAIS DA AMÉRICA LATINA
E CARIBE
A Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), órgão da
Secretaria Geral das Nações Unidas, com sede em Santiago do Chile, publicou, em 1996, de
forma resumida, um documento reunindo seletivamente as principais tendências econômicas e
sociais observadas na América Latina e no Caribe, notadamente entre 1980 e 1995, cujos
indicadores e conclusões adotamos (aqueles apenas que julgamos ser relevantes), com o
intuito de situar o Brasil no continente latino-americano.
Os indicadores (TABELAs) selecionados e as conclusões citadas foram
extraídas do documento Tendências Econômicas e Sociais na América Latina e no Caribe
produzidos pela CEPAL.
TABELA 2: População, PIB per capita (PPC)
21
, força de trabalho rural (em %) e
analfabetismo (em %), Países desenvolvidos, América Latina, Ásia e África.
População
(milhões)
PIB per capita
US$ (paridade do
poder de compra)
Força de
trabalho rural
(%)
Analfabetismo
(%)
Países desenvolvidos
América Latina
Ásia e África
800
450
3.600
20.000
6.000
1.500
5
25
70
1
15
45
Fonte: CEPAL, com base em Banco Mundial.
A América Latina e o Caribe encontram-se a meio caminho entre as regiões
mais pobres e as mais desenvolvidas do mundo, em termos econômicos e sociais. A média da
renda per capita dos países é de 2.700 dólares, mas medida em termos de “paridade de poder
de compra” ela alcança 6 mil dólares. (CEPAL, 1996).
21
Paridade do poder de Compra (PPC). Teoria que propõe que a taxa de câmbio entre duas moedas
se encontra em equilíbrio quando o poder de compra interno das moedas se encontra é equivalente
ao da taxa de câmbio. Assim, por exemplo, se 1 libra inglesa equivale no câmbio a 4 dólares, as duas
moedas estariam em equilíbrio se 1 libra comprasse os mesmos bens na Inglaterra que os 4 dólares
nos Estados Unidos. (..) Assim, é impossível medir satisfatoriamente o poder de compra relativo da
moeda de um país em relação ao outro, devido à dificuldade em determinar o preço médio de uma
combinação apropriada de bens e serviços (SANDRONI, Paulo. Novíssimo dicionário de economia.
São Paulo: Best Seller, 1999. p. 447).
64
Antes de passarmos às conclusões que julgamos relevantes e por termos
anteriormente abordado o problema dos investimentos em Ciência e Tecnologia (C&T) e em
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), acreditamos ser necessário destacar os indicadores de
ciência e tecnologia apontados pela CEPAL.
TABELA 3: América Latina e Países desenvolvidos, anos de escolaridade, gastos em
educação, gastos em P&D e gastos em P&D setor empresarial.
América Latina Países Desenvolvidos (a)
Anos de escolaridade (15 anos)
Gastos em educação / PIB (%)
Gastos em P&D / PIB (%)
Gastos em P&D setor empresarial /
gastos em P&D (%)
4,3
3,5
0,50
21
11,30
5,50
2,60 (b)
57
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da CEPAL.
(a) Excluídos: Espanha, Grécia, Portugal, Turquia e Iugoslávia
(b) Exclui Japão
A seguir, destacamos as conclusões da CEPAL baseadas no documento
anteriormente mencionado:
Os indicadores sobre formação de recursos humanos e sobre gastos com ciência e
tecnologia mostram grande inferioridade com relação aos padrões dos países
desenvolvidos;
A América Latina teve um desempenho econômico pior que o resto do mundo na década
de oitenta. Recuperou-se na primeira metade dos anos noventa, ainda que em um nível de
crescimento bem inferior ao dos países da Ásia meridional e oriental (China, Coréia,
Taiwan etc.);
Depois de crescer de forma sustentada durante trinta anos, a renda per capita despencou
nos anos 80. Em 1990, ela se situava nos níveis de meados dos anos setenta, e, em 1995,
ainda não havia recuperado o nível de 1980);
65
As taxas de crescimento oscilaram durante 30 anos em torno de 5,5%, caíram
vertiginosamente nos anos oitenta, e recuperaram-se nos noventa, ainda que a um nível
bem inferior ao do período 1950-1980;
Enquanto durante a década de oitenta o valor das exportações cresceu um pouco e o das
importações ficou virtualmente estagnado, nos anos noventa, ambos cresceram
aceleradamente, especialmente o valor das importações;
Os coeficientes de abertura externa (razão entre a média aritmética de exportações e
importações e o PIB) são superiores nos anos noventa aos da década de setenta. As
economias de maior tamanho relativo tendem a ter menores coeficientes de abertura;
Houve uma importante diversificação na composição das exportações de bens,
especialmente durante a década de oitenta, ganhando terreno as manufaturas em lugar das
exportações primárias; e
Na década de 1990, observa-se o retorno de elevados déficits na conta corrente (bens e
serviços reais e serviços de fatores)
22
.
Não resta dúvida de que ocorreram importantes mudanças na área econômica
para os países da América Latina na década de 90, apesar de alguns indicadores terem
apontado desempenho inferior ao de outras décadas. Entre tantas outras debilidades, podemos
destacar aquelas que devem no presente compor a agenda dos governos dos países da
América Latina com certa prioridade: aumentar os investimentos em C&T e em P&D,
retomada do crescimento econômico, diversificar a pauta de exportações, agregando mais
valor aos produtos exportados e exportáveis, aumentar a participação de suas economias na
corrente do comércio internacional, reduzir os déficits externos (balanço de pagamentos),
recuperar a capacidade de formação da poupança interna (pública e privada), reduzir a taxa de
desemprego e melhorar o perfil distributivo da renda e da riqueza.
22
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e Caribe. Tendências econômicas e sociais
na América Latina e Caribe, 1996.
66
Se por um lado o relatório da CEPAL nos revela que houve avanços na área
econômica, vejamos entre os demais, quais foram os principais resultados alcançados na área
social.
Observa-se, na maioria dos países da região, forte declínio na taxa de crescimento
demográfico;
A ocupação da força de trabalho cresceu essencialmente em atividades informais e em
empresas privadas pequenas;
Em alguns países, as taxas de desemprego aberto urbano (em % de trabalhadores sem
ocupação que dizem estar buscando emprego no momento das pesquisas), em 1994, eram
superiores às que se registravam em 1980. Em outros, eram inferiores;
Poucos países possuíam, em 1992, uma distribuição de renda menos ruim do que em
1980;
23
Comparado com o início dos anos oitenta, o número de países que haviam reduzido o
valor dos gastos por habitante em saúde, educação e habitação era maior do que os que
haviam aumentado;
Os impostos indiretos (sobre o consumo) são muito maiores que os impostos diretos
(sobre a renda), afetando negativamente a população de menor renda;
A proporção dos lares que vivem em condições consideradas inferiores à linha da pobreza
é maior nos anos noventa do que em 1980, por causa da ampliação da pobreza urbana; e
Cresceu consideravelmente a proporção dos lares urbanos em que a mulher passou a
contribuir para o orçamento familiar em conjunto com o cônjuge.
24
Na área social, as mudanças que ocorreram na América Latina (de acordo com
as conclusões da CEPAL), na década de 90, foram sintomáticas, pois, se por um lado avanços
23
Nota explicativa: De acordo com a CEPAL (distribuição pessoal da renda, correspondente à razão
entre os 40% de menores rendas e os 10% de maiores rendas) os países com menor desigualdade
foram: Uruguai e Colômbia, e os países com maior desigualdade foram: Brasil, Chile, Panamá,
Argentina, Venezuela e Costa Rica.
24
CEPAL Tendências econômicas e sociais na América Latina e no Caribe, 1996.
67
significativos foram alcançados, por outro, efeitos de sinal negativo também foram
experimentados.
Ao analisar a tensão entre a América Latina, ao integrar-se com o mundo ou
consigo próprio, o atual secretário da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e
Desenvolvimento (Unctad), Ricupero destaca dois riscos (dos quais optamos apenas em citar
o primeiro) que a opção encerra:
O primeiro é repetir o padrão colonial e abraçar um "tipo de inserção incapaz de
produzir o dinamismo gerador de empregos bem-remunerados, condição, por sua
vez, da inclusão, no mercado nacional, de massas dele excluídas ou apenas
participantes de forma marginal. Seria perpetuar ou agravar a pobreza generalizada
inseparável da nossa história e a desigualdade monstruosa que já ameaça a coesão
social por meio de níveis crescentes de violência e criminalidade.
25
De fato, a América Latina, na década de 90, vivenciou uma situação bem
diferente do quadro conjuntural de outras décadas, uma vez que, a taxa de crescimento
econômico nos anos 90 foi menor que nos anos 80, a taxa de desemprego aumentou ao lado
da imoderada expansão das atividades informais, o valor dos gastos públicos nas áreas de
saúde, educação e habitação reduziu-se, ampliou-se também, na década de 90, a pobreza
urbana, e outra importante e radical mudança foi o aumento da participação da mulher no
mercado de trabalho concomitantemente ao significativo crescimento da proporção de lares
chefiados por mulheres.
Desse modo, procuramos retratar a situação da América Latina apenas para
mostrar que o comportamento do Brasil, na década de 90, não foi tão diferente (considerando
as devidas proporções), e que o problema da distribuição da renda é, sobretudo, complexo,
pois entre outros aspectos, reflete um problema histórico, faz parte da herança colonial da
América Latina.
25
RICUPERO, Rubens. O Brasil e o dilema da globalização. 2. ed. São Paulo: SENAC, 2001. p.
24-25.
68
1.2 BRASIL, UM PAÍS DESIGUAL: INDICADORES ECONÔMICOS E
SOCIAIS DA DISTRIBUIÇÃO DA RENDA E DA RIQUEZA
Com o propósito de demonstrar o problema da desigualdade no Brasil,
optamos por selecionar um conjunto de indicadores sociais e econômicos, os quais por sua
vez, deve ilustrar, com maior transparência, aquilo que de fato constitui parte da nossa
herança colonial.
TABELA 4: Brasil, Grau de abertura da economia, taxa real de variação do Pib e exportações
brasileiras sobre exportação mundial nas décadas de 50 a 90
cada
Grau de abertura da
economia (1) *
Taxa real de variação do
PIB(%)*
Exportações Brasileiras/
Exportações Mundiais (%)
50 9,3 7,1 1,78
60 5,9 6,2 0,97
70 7,2 8,8 0,99
80 8,4 3,0 1,21
90 8,0 2,1 0,95
Fonte: Elaborada pelo autor, a partir dos dados - MDICE (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior ) e SECEX (Secretaria de Comércio Exterior).
Grau de abertura da economia
(1)
: medido pela participação relativa da média aritmética do somatório das
exportações mais importações em relação ao PIB (SECEX).
* Grau de abertura da economia e taxa real de variação do PIB (%): média aritmética simples para cada década.
Ao observarmos a década de 90 comparativamente à década de 50, verificamos
que, nos anos cinqüenta, o grau de abertura da economia, a taxa real de variação do PIB e a
participação das exportações brasileiras em relação às exportações mundiais foram
significativamente maiores que nos anos noventa.
Nas décadas de 50 e 70, a taxa real de variação do PIB foi muito maior que
aquela alcançada na década de 90. Contudo, salvo exceções, o mesmo fenômeno ocorreu em
escala mundial, uma vez que, nos anos noventa, para as principais economias do mundo
desenvolvido, as taxas de crescimento despencaram.
O comércio internacional, sem dúvida, é um dos caminhos para que uma
economia possa crescer e consolidar, ao mesmo tempo, a tarefa de distribuir melhor o seu
69
produto entre os membros da sociedade, de modo a proporcionar e garantir-lhes níveis
satisfatórios de qualidade de vida. Diante disso, é importante mencionar, que na década de 90,
o comércio mundial cresceu a taxas superiores às do PIB (Produto Interno Bruto) mundial.
FIGURA 7: Taxa Real de Crescimento (em %) do Comércio e do PIB Mundial- 1993 a 2002
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados do MDICE/SECEX
No entanto, devemos considerar que para se inserir no mercado internacional
com maior agressividade, é preciso promover as exportações, rompendo com as tradicionais
vantagens comparativas (abundância de recursos naturais e de mão-de-obra), substituindo-as
pelas atuais vantagens competitivas (aumentar a produtividade, melhorar a qualidade dos
produtos, qualificar a mão-de-obra, agregar maior valor possível ao(s) produto(s), desenvolver
novos produtos e materiais, substituir processos e produtos defasados, entre outros),
considerando inclusive outros importantes fatores que dificultam as exportações dos países
subdesenvolvidos aos países industrializados do Primeiro mundo.
Diante disso, ressaltamos a importância dos gastos públicos com a educação,
assim como da relevância dos investimentos em Ciência e Tecnologia (C&T) e em Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D).
De 1995 até o ano de 2000, a economia brasileira experimentou sucessivos
déficits da balança comercial, acumulando, no período, um saldo negativo (exportações-
importações) de US$24,3 (milhões/FOB). As exportações brasileiras acumularam de 1995 até
o ano de 2001 a cifra de US$ 359,9 milhões (FOB), sendo que desse total, 25% representam o
3,6
10,1
9,3
6,4
10,8
4,7
5,7
12,9
-0,6
2,2
2,3
3,7
3,7
4
4,2
2,8
3,6
4,7
2,2
2,8
-2
0
2
4
6
8
10
12
14
93 94 95 96 97 98 99 00 01
02
Comércio Mundial
PIB Mundial
70
valor das exportações dos produtos básicos, cujo índice de preço de 108,0, em 1997, declinou
para 68,3, no ano 2001, queda essa compensada pelo brutal aumento do índice de quantum,
que de 112,6, em 1997, saltou para a casa dos 188,9 no ano de 2001.
TABELA 5: Brasil, Índice de preços das exportações e das importações e relação de troca-
1980 a 2001
ANO EXPORTAÇÃO
ÍNDICE DE PREÇOS
IMPORTAÇÃO
ÍNDICE DE PREÇOS
RELAÇÃO DE
TROCAS***
1980 93,6 117,2 79,8
1981 90,2 128,2 70,3
1982 85,7 125,3 68,3
1983 81,4 120,3 67,6
1984 84,2 117,4 71,7
1985 78,3 113,9 68,7
1986 81,1 92,8 87,3
1987 81,3 104,3 77,9
1988 90,5 107,6 84,1
1989 92,6 115,4 80,2
1990 90,6 124,9 72,5
1991 88,9 115,8 76,7
1992 86,0 109,9 78,2
1993 79,5 100,0 79,1
1994 88,0 97,3 90,4
1995 100,0 99,5 100,5
1996 100,0 100,0 100,0
1997 100,7 94,9 106,1
1998 93,9 89,9 104,4
1999 81,9 90,4 90,5
2000 84,6 90,6 93,3
2001 81,6 87,7 93,0
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas
(IPEADATA).
***Relações de troca: relação entre os preços de exportação e os preços de importação de um país. O índice que
mede esta relação, geralmente calculado por meio dos índices dos preços das exportações e das importações,
reflete a posição de cada país em termos de seu poder de compra em âmbito internacional. Se os preços das
exportações sobem mais rapidamente (ou caem mais devagar) que os preços das importações, diz-se que há um
aumento ou melhoria nas relações de troca. Quando ocorre o inverso, isto é, quando os preços das importações
sobem mais (ou diminuem menos), há uma queda na relação de trocas, também denominada “deterioração das
relações de troca”
26
.
26
SANDRONI, op. cit., p. 518.
71
Mesmo que tenha ocorrido recuperação dos preços das exportações a partir de
1994, por menor que seja, ainda existe certa deterioração das trocas, isto é, o preço das
exportações brasileiras ainda se situou aquém dos preços das importações até o período
observado, podendo, de certo modo, prejudicar a receita dos exportadores, inibir a capacidade
de importar do país, reduzir o salário dos trabalhadores, comprometendo assim o propósito de
promover uma melhor distribuição da renda.
TABELA 6: Brasil, capacidade para importar- 1990 a 2001
Ano Exportações Índice
de preço
Exportações Índices de
quantum
Importações Índices
de preço
Capacidade para
importar ****
1990 90,6 72,6 124,9 52,66
1991 88,9 74,5 115,8 57,19
1992 86,0 87,2 109,9 68,24
1993 79,5 101,6 100,4 80,45
1994 88,0 103,7 97,3 93,78
1995 100,0 97,4 99,5 97,89
1996 100,0 100,0 100,0 100,00
1997 100,7 110,2 94,9 116,94
1998 93,9 114,0 89,9 119,07
1999 81,9 122,8 90,4 111,25
2000 84,6 136,4 90,6 127,37
2001 81,6 149,4 87,7 139,00
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IPEADATA
**** Capacidade para Importar: Capacidade medida pela razão entre o valor das exportações (preço x quantidade)
e o preço das importações. Geralmente, este índice é calculado pela seguinte fórmula: CPI= Pexp.x Qexp./Pimp.,
onde o preço das importações é incorporado à fórmula, mediante índices, a partir de determinado ano-base
(SANDRONI, op. cit., p. 77).
De 1990 até o ano de 2001, a capacidade para importar (da economia
brasileira) elevou-se de forma bastante significativa, muito mais em função do aumento do
índice de quantum das exportações do que pela melhoria das relações de troca.
Os lucros dependem também da concorrência entre os capitais na medida em que o
afluxo de capitais para um ramo de negócios ou para a nação como um todo tende a
fazer com que a taxa de lucros decresça. Os salários terão subido, devido à maior
demanda por trabalho, mas a queda dos lucros resulta do excesso de oferta de
mercadorias. A impossibilidade de vender as mercadorias ao “preço natural” leva à
queda dos lucros e, em seqüência, dos salários
27
.
27
COUTINHO, Maurício Chalfin. Lições de economia política clássica. São Paulo: HUCITEC, 1993. p.
129.
72
Considerando a reduzida participação relativa das exportações brasileiras no
comércio mundial, visto que os países industrializados e desenvolvidos do primeiro mundo
detêm a maior parcela desse mercado, considerando inclusive que o aumento da concorrência
em escala planetária, em alguns segmentos da economia devam ter produzido excesso de
oferta, comprimindo os preços e os lucros e, comprometido os salários dos trabalhadores, ou
até mesmo os seus respectivos empregos, resta-nos saber até que ponto seria interessante para
as economias subdesenvolvidas do Terceiro Mundo aumentar sua participação nesse mercado.
Os preços têm um duplo papel: se orientam as decisões dos agentes econômicos
compras, vendas -, eles fixam também, e ao mesmo tempo, sua remuneração, por
exemplo a salarial, e seu poder de compra [...] A concorrência é, por natureza, objeto
de contradição. Esta atravessa cada um de nós; como consumidores, nós nos
alegramos com a baixa dos preços e com a melhora de qualidade que ela induz,
detalhadamente registradas por nossas associações; como trabalhadores, tememos
seus efeitos sobre o mercado de trabalho, cujos ajustes ela regula paradoxalmente
(ameaçando a parte da renda que garante remunerações salariais superiores à média),
e seus efeitos sobre o emprego (já que ameaça eventualmente a sobrevivência da
empresa)
28
.
De fato, o que estamos vivenciando em tempos de capitalismo global é, entre
outros aspectos, o acirramento da concorrência em todo o mundo, produzindo efeitos
colaterais nocivos à saúde da sociedade, tais como desemprego, precarização das relações de
trabalho, informalidade, queda dos rendimentos reais dos trabalhadores, fechamento de
empresas, entre outros, especialmente nas nações economicamente deprimidas.
Analisando os ‘termos comerciais’ preços que tanto os países desenvolvidos
quanto os menos desenvolvidos conseguem por aquilo que produzem -, após o
último acordo comercial firmado em 1995 (o oitavo), o efeito líquido foi o de
reduzir as tarifas que alguns dos países mais pobres do mundo recebiam
relativamente ao que pagavam pelo que importavam. O resultado foi que algumas
das nações mais pobres do mundo, na verdade, ficaram em situação muito pior. [...]
As crises, por sua vez, que trouxeram em seu rastro o desemprego em massa, têm
sido acompanhadas por problemas de desintegração social de maior prazo desde a
violência urbana na América Latina até os conflitos étnicos em outras regiões do
mundo, como na Indonésia
29
.
28
GUESNERIE, Roger. A economia de mercado. Tradução de Reginaldo C. C. de Moraes. São
Paulo: Ática, 1997. p. 52;75.
29
STIGLITZ, Joseph E. A globalização e seus malefícios: a promessa não-cumprida de benefícios
globais. Tradução de Bazán Tecnologia e Lingüística. São Paulo: Futura, 2002. p. 33;35.
73
As instituições fundamentais do sistema econômico capitalista, a propriedade
privada dos meios de produção, a livre iniciativa particular, economia de mercado regulada
por mecanismos naturais de ajustamento (oferta e procura e um sistema de preços), a
concorrência, a liberdade de escolha, e o lucro, são por natureza conflitantes e contraditórias.
Os críticos da globalização, que acusam os países ocidentais de hipocrisia, estão
certos. Os países ricos do Ocidente forçaram as nações pobres a eliminar as barreiras
comerciais, mas eles próprios mantiveram as suas, impedindo que os países em
desenvolvimento exportassem seus produtos agrícolas privando-os, assim, da renda
tão desesperadamente necessária obtida por meio das exportações. [...] Entretanto,
mesmo quando não podia ser acusado de hipocrisia, o Ocidente liderava o programa
de globalização, garantindo para si uma participação maior nos benefícios, à custa
do mundo em desenvolvimento
30
.
Nas economias subdesenvolvidas e mesmo naquelas denominadas emergentes,
não resta dúvida de que ocorreram significativas mudanças nessas sociedades. No entanto,
sintomáticos também foram os efeitos de sinal negativo, uma vez que, para poderem enfrentar
a concorrência global, profundos ajustes estruturais foram implementados nessas economias.
O aumento imoderado da concorrência internacional e, da oferta mundial de bens e serviços,
deve ter provocado tamanha pressão sobre os preços dos produtos, que para não comprometer
ainda mais as margens e o lucro do capital, uma das alternativas adotadas foi aumentar a
produtividade do trabalho e reduzir os custos da produção, isto é, o ônus mais uma vez de
todo o engodo globalizante foi transferido aos trabalhadores.
A utilização capitalista das novas tecnologias, mediante a “flexibilização do
trabalho”, e a conseqüente rotação entre trabalhadores ocupados e desocupados,
aumenta a insegurança dos pauperizados “excluídos” e dos trabalhadores
“incluídos”. A “batalha pela competitividade” é a causa central do empobrecimento
recente: na última década, a aceleração da mudança tecnológica coexistiu com o
aumento da desnutrição de um quinto da população mundial, e com a morte pela
fome de vários milhões de homens na África em 1994. Inclusive, dentro dos Estados
Unidos, os 35 milhões em estado de pobreza absoluta, convivem com as maravilhas
do Sillicon Valley
31
.
30
STIGLITZ, op cit., p. 33.
31
COGGIOLA, Osvaldo. O capital contra a história: gênese e estrutura da crise contemporânea. São
Paulo: Xamã; Pulsar, 2002. p. 482.
74
TABELA 7: Brasil, população economicamente ativa (PEA), ocupação total, desocupação
total e taxa de desocupação.
ANO
PEA*
(A)
OCUPAÇÃO
TOTAL (B)
DESOCUPAÇÃO
TOTAL C=(A) - (B)
TAXA DE
DESOCUPAÇÃO (%)**
1990 64 467 62 100 2 367 3,7
1993 70 965 66 569 4 396 6,2
1995 74 138 69 628 4 510 6,1
1996 72 996 67 920 5 076 6,9
1997 75 213 69 331 5 882 7,8
1998 76 885 69 963 6 922 6,9
1999 79 315 71 676 7 639 9,6
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do MDICE Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior.
* PEA: Pessoas de 10 anos ou mais de idade.
** Taxa de desocupação: desocupação total (C) ÷ PEA (A)
O vertiginoso deslocamento da taxa de desocupação (%), no Brasil ao longo
dos anos 90, corrobora os argumentos tanto de Stiglitz como os de Coggiola, além do que
devemos considerar também o fraco dinamismo da economia do país nos termos da taxa de
crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), que entre outros fatores, promoveram
profundas mudanças de corte estrutural na economia e na própria sociedade brasileira,
contribuindo sobremaneira para que as desigualdades econômicas e sociais, apesar dos
avanços, continuassem acentuadas. A economista e professora da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro) Maria da Conceição Tavares, defende a idéia de que uma das
formas de se promover o desenvolvimento econômico e social é uma distribuição mais justa
da renda, seria aquela na qual o Brasil deveria “crescer para dentro e para os pobres, e não
para fora e para os ricos”.
Entretanto, crescer para dentro é uma tarefa que exigirá remover certos
entraves estruturais, entre os quais, demonstraremos apenas aqueles que julgamos de destaque
entre tantos outros.
75
TABELA 8: Produto Interno Bruto do Brasil, por grandes regiões da Federação em R$
milhões – 1995-1999
PRODUTO INTERNO BRUTO (R$ MILHÕES)
GRANDES REGIÕES DA
FEDERAÇÃO
1995 1996 1997 1998 1999
Norte 29 959 36 153 38 507 40 933 42 867
Nordeste 82 589 102 598 113 941 119 319 126 365
Sudeste 379 438 452 306 509 962 531 663 561 468
Sul 115 595 140 437 153 945 159 774 171 068
Centro-Oeste 38 610 47 394 54 388 62 498 62 100
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) /
Departamento de Contas Nacionais.
Apesar das mudanças que ocorreram e que continuam a se processar, é notória
a desigualdade repartitiva do produto interno bruto brasileiro entre as cinco grandes regiões da
federação, pois a região sudeste isoladamente produz o equivalente a quase 60% do produto
da economia, e, que se incluirmos aí a região sul, ambas produzem juntas algo em torno de
75% dos bens e serviços produzidos no país, revelando-nos um acentuado desequilíbrio
regional repartitivo do produto.
Entre as múltiplas faces da desigualdade, outra que desperta a nossa atenção
refere-se às diferenças entre o urbano e o rural e de gênero, especialmente no que trata do
valor do rendimento médio mensal das pessoas.
TABELA 9: Pessoas de 10 anos ou mais de idade, valor do rendimento médio mensal (R$),
por sexo e classificação do domicílio Brasil – 2001
Pessoas de 10 anos ou mais de idade
Valor do rendimento médio
mensal das pessoas de 10 anos
ou mais de idade (R$)
Situação
do
Domicílio
Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres
Total 137 686 979 66 433 655 71 253 324 365 500 241
Urbana 116 314 159 55 247 849 61 066 310 404 556 268
Rural 21 372 820 11 185 806 10 187 014 154 222 81
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE, Departamento de Emprego e Rendimento, PNAD
(Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, 2001).
De acordo com os dados da PNAD, referentes ao ano de 2001, do total de
137,6 milhões de pessoas de 10 anos ou mais de idade, 84,5% encontravam-se na região
76
urbana, enquanto apenas 15,5% situavam-se na região rural, os homens em relação ao
conjunto total representavam 48,2%, as mulheres totalizaram 51/8% desse universo.
Contudo, apesar da superioridade numérica das mulheres, é nítida a distribuição desigual do
valor do rendimento médio mensal das pessoas de 10 anos ou mais de idade entre o campo e
a cidade, e entre homens e mulheres. A desigualdade é bem mais acentuada se compararmos o
rendimento médio mensal dos homens domiciliados na zona urbana com o das mulheres
domiciliadas na área rural, pois, os homens auferem um rendimento 6,8 vezes maior que o das
mulheres e, mesmo em relação às mulheres residentes na área urbana, o rendimento dos
homens é senão 107,4% maior, o que é ainda mais grave face ao crescente número de
mulheres responsáveis por seus próprios domicílios.
TABELA 10 Chefe da família segundo a faixa etária e o sexo 1987 e 1996
Sexo do chefe da família*
FEMININO MASCULINO
Idade do
chefe da
família
1987 1996
Variação
%
1987 1996
Variação
%
10 a 19 anos 7 073 13 509 90,9 22 504 47 621 111,6
20 a 29 anos 205 218 261 509 27,4 1 553 163 1 583 109 1,92
30 a 39 anos 470 714 610 325 29,6 2 566 693 2 542 935 (0,93)
40 a 49 anos 574 119 676 069 17,7 1 902 084 2 364 283 24,3
50 a 59 anos 473 443 637 181 42,2 1 479 876 1 369 550 (7,46)
60 a 69 anos 372 450 529 071 42,1 810 228 898 697 10,9
70 anos ou + 220 462 436 545 98,0 355 126 567 278 59,7
Totais 2 323 479 3 164 209 36,2 8 689 674 9 373 473 7,86
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE/SIDRA (Sistema IBGE de Recuperação Automática)
POF: Pesquisa de Orçamentos Familiares.
* Refere-se ao total das áreas POF.
Apesar de ser inferior o número de pessoas do sexo feminino, em termos
percentuais, a variação que ocorreu, entre 1987 e 1996, revela-nos que a quantidade de
pessoas responsáveis pelo domicílio (chefe da família) do sexo feminino foi 4,6 vezes maior à
variação que ocorreu entre aqueles (chefe da família) do sexo masculino.
77
Se entre o gênero as diferenças são acentuadas (referimo-nos apenas aquelas
relacionadas ao rendimento), também são significativas as diferenças existentes entre os
principais setores da atividade econômica das regiões metropolitanas do país, segundo a renda
mensal da ocupação principal.
TABELA 11: Média da Renda Mensal da ocupação principal total dos ocupados nos
principais setores da atividade econômica segundo as regiões metropolitanas (em R$) 1999.
Média da renda mensal da ocupação principal total*
Regiões
Metropolitanas
Agricultura Indústria Serviços
Belém - 364,60 343,80
Fortaleza 102,90 311,60 306,90
Recife 103,70 448,10 328,40
Salvador 143,50 614,00 356,10
Belo Horizonte 75,20 527,00 404,30
Rio de Janeiro 473,50 700,60 553,60
São Paulo 535,00 815,80 683,90
Curitiba 197,30 676,70 514,60
Porto Alegre 139,90 524,60 562,60
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBAM (Instituto Brasileiro de Administração Municipal)
Área de Desenvolvimento Econômico e Social / Núcleo de Estudos Mulher e Políticas Públicas (2002).
* refere-se ao total de homens e mulheres de 14 anos e mais de idade.
** Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
Nesse caso, o problema da desigualdade repartitiva média da renda mensal
da ocupação principal entre os principais setores da atividade econômica é mais acentuada
na agricultura, comparativamente à indústria e ao setor de serviços, do mesmo modo, e, em
menor escala, também observamos sensível diferença entre as regiões metropolitanas.
O único ativo de que a população pobre dispões é sua força de trabalho, e, sendo
esta um bem de oferta elástica, o seu preço será fixado no mercado em função de seu
custo de reprodução, perpetuando-se a miséria
32
.
No Brasil, a abertura comercial praticada, a partir dos anos noventa, produziu
mudanças radicais no mercado de trabalho, pois a exposição da economia nacional ao
mercado internacional traduzida pelo aumento da concorrência, combinada com certos
32
FURTADO, Celso. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. p.
53.
78
expedientes de política econômica (câmbio, alíquotas de importação etc.) obrigou as empresas
sobretudo aquelas com considerável defasagem tecnológica a adotarem medidas de caráter
estrutural mais profundas, visando entre outros objetivos, reduzir os custos da produção e
aumentar a produtividade, as quais, somadas ao fraco desempenho da economia (taxa de
crescimento do PIB), aumentaram sobremaneira a taxa de desemprego, reduzindo, inclusive, o
rendimento dos trabalhadores, penalizando, desse modo, a distribuição da renda.
TABELA 12: Brasil, parcela da renda apropriada pelos mais ricos e pelos mais pobres
1980, 1985, 1990,1995 e 1999
PARCELA DA RENDA APROPRIADA (% da renda total) ANOS
1% mais ricos 10% mais ricos
20% mais
pobres
50% mais
pobres
1980 12,78 46,86 2,61 12,96
1985 14,24 48,22 2,53 12,40
1990 13,80 49,05 2,11 11,35
1995 13,86 47,92 2,29 12,32
1999 13,31 47,45 2,34 12,55
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da FGVDADOS (Fundação Getúlio Vargas) /Séries Anuais
IBRE: Instituto Brasileiro de Economia.
A parcela da renda apropriada pelos mais ricos e pelos mais pobres mostra-nos
que, de 1980 a 1999, a distribuição da renda no Brasil ainda continua concentrada nas mãos
de uma minoria. Contudo, vale ressaltar que se à distribuição da renda (monetária) somarmos
a distribuição dos ativos, então, a distribuição da renda e da riqueza é muito mais desigual e
perversa, limitando, desse modo, as possibilidades de crescimento da economia “para dentro”,
agravando ainda mais os problemas de corte social.
Não é de surpreender, portanto, que a especificidade do subdesenvolvimento se
manifeste conceitualmente na “teoria da pobreza”. Essa teoria estatui que a massa de
pobreza existente em determinada economia reflete a distribuição de ativos no
momento em que tem início o processo de crescimento da produtividade e também a
natureza das instituições que regulam a acumulação dos ativos. Simplificando: ali
onde a propriedade da terra está concentrada e o crédito é monopolizado pelos
proprietários, uma maioria de despossuídos não participará dos benefícios do
crescimento, acarretando essa concentração da renda
33
.
33
FURTADO, op. cit., p. 53.
79
Além do problema da distribuição da renda, outro aspecto que reforça ainda
mais o problema da desigualdade repartitiva da riqueza relaciona-se à composição dos gastos
familiares mensais, uma vez que, é daí que a renda é destinada ao consumo para o
atendimento das necessidades básicas, e, na medida do possível de acordo com a classe de
recebimento à poupança, ou ao investimento, aumentando a renda ou o estoque de riqueza.
O Brasil tem quase 20% de sua população na condição de menores pobres,
abandonados ou semi-abandonados, pelos pais ou pela sociedade em geral, que não
lhes oferecem a formação necessária para que o país possa utiliza-los quando eles
forem o presente. Quase 80% da população jovem está subalimentada, 70% não
termina o curso primário, mais de 90% não termina o secundário. É neste aspecto
que reside a maior de todas as ameaças sobre o futuro do Brasil
34
.
Entretanto, quanto mais desigual for a distribuição da renda, mais desigual será
a distribuição da riqueza, menores serão as facilidades de acesso da grande maioria dos
excluídos à educação, à saúde, e conseqüentemente ao mercado de trabalho, reduzindo por
sua vez, as possibilidades dessa grande massa de pessoas de participar de forma mais ativa e
efetiva do processo político, o que equivale, na prática, à supressão do exercício da
participação num regime político que prima pela salvaguarda da liberdade. Pior ainda que a
desigual distribuição do produto da economia entre os membros da sociedade, é a distribuição
dos direitos e, a prática efetiva e plena da justiça, uma vez que, se para ela todos são
considerados iguais, a aplicação das leis é bem diferente para os desprovidos em relação à
minoria que possui riqueza e apropria-se de grande parcela da renda.
O problema da desigualdade não apenas reside na distribuição da renda, mas,
principalmente na destinação da mesma entre as diversas categorias de despesas, tanto aquelas
que compõem o consumo, como as que se classificam como investimento (aumento do ativo).
34
BUARQUE, Cristovam. A desordem do progresso: o fim da era dos economistas e a construção do
futuro. 4 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993. p. 80.
80
TABELA 13: Percentual de despesa média mensal familiar, por classes de recebimento
mensal familiar, segundo os tipos de despesa – 1995-1996
Tipos de despesa (em %)
Classes de
recebimento mensal
familiar em salários
mínimos
1
(S.M.)
Alimentação
Impostos e
taxas
Remédios Educação
Aumento
do ativo*
até 2 s.m. 33,51 8,63 4,86 1,39 4,69
mais de 2 a 3 s.m. 33,94 8,61 3,56 1,43 5,81
mais de 3 a 5 s.m. 30,21 8,16 3,49 1,75 7,11
mais de 5 a 6 s.m. 26,34 6,95 3,18 1,87 8,81
mais de 6 a 8 s.m. 24,47 7,67 2,76 2,09 10,59
mais de 8 a 10 s.m. 22,61 8,11 2,59 2,21 11,89
mais de 10 a 15 s.m. 19,16 7,93 2,22 3,03 13,20
mais de 15 a 20 s.m. 16,45 7,94 1,94 3,96 14,87
mais de 20 a 30 s.m. 14,84 7,37 1,79 4,47 18,80
mais de 30 s.m. 10,31 6,88 1,01 3,98 23,69
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) do IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
1
Salários: as classes de recebimento mensal, na POF 1996, estão expressas em salário mínimo (R$ 112,00), nota
do IBGE.
* aumento do ativo: despesas com aquisição e reforma do imóvel e, com veículo.
81
FIGURA 8: Percentual de despesa média mensal familiar por classes de recebimento mensal familiar
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da POF/IBGE.
0
5
10
15
20
25
30
35
40
até 2 mais de
2 a 3
mais de
3 a 5
mais de
5 a 6
mais de
6 a 8
mais de
8 a 10
mais de
10 a 15
mais de
15 a 20
mais de
20 a 30
mais de
30
Alimentação Aumento do ativo
Em porcentagem (%)
Classes de
recebimento
(salários mínimos)
82
FIGURA 9: Percentual de despesa média mensal familiar por classes de recebimento mensal familiar
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da POF/IBGE.
0
5
10
15
20
25
30
35
40
até 2 mais de
2 a 3
mais de
3 a 5
mais de
5 a 6
mais de
6 a 8
mais de
8 a 10
mais de
10 a 15
mais de
15 a 20
mais de
20 a 30
mais de
30
Alimentação Educação Remédios
Em porcentagem (%)
Classes de
recebimento
(salários mínimos)
83
Em termos percentuais, podemos verificar que as famílias que recebem até
2 salários mínimos destinam às despesas com alimentação, impostos e taxas, remédios e
educação o equivalente a 48,3% do total de despesa média mensal. No outro extremo, as
famílias cuja classe de recebimento mensal familiar se situam na faixa de mais de 30
salários mínimo, para as mesmas categorias de despesa, destinam 22,1% do total de
despesa média mensal, ou seja, quase a metade do que gastam as famílias que recebem até
2 salários mínimos.
Enquanto as famílias que recebem mais de trinta salários mínimos se
alimentam mais e melhor, e, gastam em termos percentuais, com remédios menos do que
as famílias que recebem até dois salários mínimos, as primeiras destinam ao aumento do
ativo despesas com aquisição e reforma do imóvel, e, com veículo o percentual de
23,69%, ou seja, 5 vezes mais do que as segundas, o que confirma e reforça ainda mais a
observação de Buarque.
Outro aspecto a ser tratado refere-se aos gastos mensais das famílias com
educação, pois, para aquelas que recebem até 2 salários mínimos, em termos absolutos
gastam o equivalente a R$ 3,11, enquanto para as famílias com recebimento mensal acima
de 30 salário mínimos, essa modalidade de gastos mensais totalizaria R$ 133,72
aproximadamente, isto é, quase 43 vezes a mais do que gastam as primeiras. Desse modo,
podemos considerar que, na alimentação, na educação e no aumento do ativo, entre outros
fatores, a distribuição desigual da renda e da riqueza e, conseqüentemente do consumo,
ampliam ainda mais a distância entre ricos e pobres, favorecendo a concentração da renda
e da riqueza, limitando as possibilidades de crescimento da economia “para dentro”, entre
tantos outros sintomas.
84
O futuro da economia de mercado aberto depende também daqueles que serão
favorecidos pelos benefícios do crescimento. [...] Se as recompensas apontarem
para o topo da escala social, os beneficiários correrão para os mercados
financeiros em vez de investir em bens e serviços. O resultado disso será que a
demanda cairá, trazendo consigo os perigos do aumento de estoques, da
superprodução e da estagnação. A natureza da distribuição de renda é, portanto,
crucial para o bem-estar a longo prazo do sistema
35
.
No ano de 1998, as montadoras mundiais produziram 66 milhões de
veículos, dos quais, foram comercializados 44 milhões, isto é, as novas tecnologias
aplicadas ou empregadas especificamente por esse ramo da atividade econômica industrial
promoveram salto quantitativo sem precedentes, aumentando a produção e a produtividade
mundiais. Todavia, pela quantidade de veículos comercializados parece haver um hiato
entre a produção e o consumo.
TABELA 14: Brasil, famílias que possuem bens duráveis, total das áreas POF 1996:
bens duráveis microcomputador
Classes de recebimento
mensal familiar
(em salários mínimos)
Utilidades existentes
Total das áreas POF
1 microcomputador
Participação
Relativa
(%)
até 2 s.m. 14 493 1,66
mais de 2 a 3 s.m. 1 872 0,22
mais de 3 a 5 s.m. 4 093 0,47
mais de 5 a 6 s.m. 5 215 0,60
mais de 6 a 8 s.m. 19 009 2,18
mais de 8 a 10 s.m. 17 303 1,99
mais de 10 a 15 s.m. 70 707 8,12
mais de 15 a 20 s.m. 79 975 9,19
mais de 20 a 30 s.m. 141 002 16,20
mais de 30 s.m. 516 822 59,37
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) IBGE
Instituto Brasileiro de Geográfica e Estatística.
35
GEORGE, Susan. O relatório Lugano: sobre a manutenção do capitalismo no século XXI.
Tradução de Afonso Teixeira Filho. São Paulo: Boitempo, 2002. p. 31.
85
Em se tratando de acesso à informação, sobretudo da informação
eletrônica, esta se processa no caso brasileiro, de forma bem desigual. A concentração da
renda nas mãos de uma minoria privilegiada (que dispõe de instrumentos e mecanismos
suscetíveis de facilitarem o acesso à informação e à educação de qualidade), a diferencia
da grande maioria, que não tem acesso nem à informação nem à educação, reforçando e
reproduzindo os mecanismo distributivos da renda e da riqueza, preservando a
desigualdade.
TABELA 15: Brasil, despesa média familiar em aumento do ativo* segundo classes
selecionadas de recebimento mensal familiar (em R$)** – 1995-1996
Despesa média familiar (em R$)
Classe de recebimento mensal familiar
(em salários mínimos)
Mensal
a
Anual
a
até 2 s.m. (R$ 168,00) R$ 7,88 R$ 94,56
mais de 2 a 3 s.m. (R$ 280,00) R$ 16,27 R$ 195,24
mais de 20 a 30 s.m. (R$ 2.800,00) R$ 526,40 R$ 6.316,80
mais de 30 s.m. (R$ 4.200,00) R$ 994,98 R$ 11.939,76
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) - IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
* aumento do ativo: veículo, imóvel (aquisição e reforma)
** recebimento mensal familiar: em salários mínimos, salário-mínimo de referência (R$ 112,00)
a
:valores estimados pelo autor.
Supondo que os gastos médios familiares destinados ao aumento do ativo
das famílias (em apenas duas modalidades, veículo e imóvel) mensal e, anual, estimados,
se comportem da forma como foram demonstrados, para as famílias que recebem até dois
salários mínimos mensais, a parcela destinada a essa categoria de despesas (anual),
comparada com as famílias que recebem mais de trinta salários mínimos, revelam-nos que:
as primeiras considerando inalterados os recebimentos e os gastos , demorariam
aproximadamente o equivalente a dez anos e cinco meses, para aumentarem seus ativos, no
mesmo valor que as segundas, destinam em apenas um ano.
86
Entretanto, por outro lado, o social condiciona o econômico. Primeiro, porque
sem formação gradual do mercado de consumo de massa, compreendendo ampla
massa crítica de classe média (que inclui a faixa mais alta do operariado), não se
alcança o desenvolvimento, pelo lado do mercado, ou seja, de demanda. E, para
realizar-se esse mercado de massa, é necessário alcançar razoável distribuição de
renda.
36
.
De acordo com Velloso, se o social condiciona o econômico, e o econômico
condiciona o social, resta saber quem se responsabilizaria no Brasil pela promoção do
desenvolvimento e do crescimento, com vistas a atender não só as exigências do mercado,
como também, e, principalmente, contemplar e promover de forma efetiva as necessidades
sociais.
[...] o Brasil, em particular, continua a ser administrado por uma elite de visão
limitada. Seria de um otimismo quase ingênuo esperar da classe dominante do
Brasil algum projeto maior de superação dos limites de nosso modelo
econômico. [...] Por mais paradoxal que pareça, apesar de delegar à própria
sociedade civil o papel de resgatar políticas sociais redistributivas, cabe ao
Estado a tarefa de fazer com que tais políticas atinjam os mais carentes e que sua
manifestação seja o pleno exercício da cidadania.
37
.
O problema da distribuição da renda é por natureza amplo e complexo. Na
economia de mercado, o capital busca, acima de tudo, eficiência na alocação dos recursos
produtivos (capital e trabalho), a partir de um arranjo técnico, no qual os dois fatores são
no processo de produção mobilizados e combinados de modo que, minimizando o seu
emprego, seja possível obter o máximo de resultado, isto é, lucro, que é o objetivo maior a
ser alcançado.
Todavia, o capital, na economia de mercado, é submetido à concorrência, e
orientado por um sistema de preços, categorias por natureza conflitantes, principalmente
no quadro de um regime baseado na liberdade.
Assim, a propriedade privada dos meios de produção, a liberdade de
escolha, a concorrência entre os produtores, o ajustamento do mercado obtido pelos
36
VELLOSO, João Paulo dos Reis (coord.) Crescimento com redistribuição e reformas: reverter a
opção pelos não-pobres. Fórum Nacional: Idéias para a modernização do Brasil. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1991. p. 4,5.
37
MICHEL, Renault; RANGEL, Ronaldo. Desafios de um novo padrão de acumulação. Rio de
Janeiro: Editora Lumen Juris Ltda, 1994. p. 76, 77.
87
mecanismos naturais resultantes do choque de forças entre oferta e procura orientados por
um sistema de preços, entre outros, são os elementos essenciais do sistema econômico
capitalista, os quais, por sua vez, buscam promover igualdade com liberdade e eficiência
com justiça.
A atividade econômica descreve um fluxo: produção, distribuição, consumo
e investimento, cuja estabilidade e continuidade depende de um conjunto de outros fatores
de natureza econômica, social, política, etc. entre os quais, destacamos a distribuição social
do produto entre os membros da sociedade.
O produto da economia depende por sua vez de um outro variado elenco de
fatores, como: da estabilidade política, da condução da política econômica, do quadro
conjuntural da economia, da organização produtiva da sociedade, da produtividade dos
fatores de produção (capital, trabalho e, recursos naturais), do estágio tecnológico da
economia, da sua capacidade de penetração em outros mercados, da cultura empresarial, e,
das relações entre capital, trabalho e Estado.
No caso específico do Brasil, a distribuição desigual do produto social entre
os membros da sociedade produz variado leque de sintomas que somados à distribuição
desigual da riqueza, do difícil acesso à saúde, educação, habitação etc, agravam ainda
mais: a distribuição da renda e os problemas de índole social, como o desemprego, a
subalimentação, e a violência urbana, fora outros também considerados graves.
Acreditamos que na impossibilidade ou, na falta de vontade tanto política
como econômica de se remover no país a pobreza, a fome, a exclusão no sentido lato, a
retomada do crescimento da economia “para dentro” ficará seriamente comprometida,
debilitando assim, pela ausência do crescimento econômico, a dimensão social, que por sua
vez, fragilizada e enferma poderá irromper com fúria avassaladora sob a forma imperiosa
88
de cruel violência, desestabilizando, dessa forma, os pilares de uma suposta sociedade
democrática.
Igualdade, liberdade, eficiência e justiça, concorrência, lucro, propriedade
privada e preços são alguns dos elementos que se incorporarão à complicada equação para
a qual o sistema econômico capitalista, o regime político democrático e suas respectivas
instituições deverão empenhar-se na busca de alternativas suscetíveis de responderem de
forma efetiva aos anseios da sociedade brasileira, notadamente da porção ainda não
incluída.
Não é o regime totalitário o único capaz de oprimir. A economia de
mercado, quando sustentada por frágeis instituições pode criar a ilusão de liberdade, que
mesmo na ausência de aparatos ideológicos e/ou repressores, faz senão instalar, na
sociedade, uma sofisticada forma de supressão da liberdade, aquela na qual para “Ser” é
preciso “Ter”, ou ainda a sua variação, é preciso “Ter” para “Ser”.
Diante disso, a economia, a política e o direito, para promoverem a
igualdade, garantindo a liberdade, preservando a sobrevivência do sistema econômico
vigente e do regime democrático, devem praticar com eficiência, justiça para e,
principalmente aqueles que não têm, e, não são.
89
CAPITULO 2 A INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO NO BRASIL:
DADOS GERAIS SOBRE A ESTRUTURA DE CUSTOS / DESPESAS E
RECEITAS NA DÉCADA DE 90
O objeto desse estudo é a indústria de calçados masculino de couro situada
no município de Franca, estado de São Paulo, e que, de acordo com o número de
estabelecimentos e da representativa quantidade de pessoas direta e formalmente
empregadas nesse subsetor da indústria de transformação, ocupa posição de destaque em
relação às demais atividades econômicas desenvolvidas no próprio município, ou ainda, é
sua principal atividade econômica. Nosso objetivo é verificar como o produto desta
indústria foi distribuído entre salários e lucros no período de 1994 a 2002. Todavia, dada a
ausência de informações e estatísticas sobre este ramo da atividade econômica no
mencionado município, procuramos para isto, as informações disponíveis suscetíveis de
serem adotadas como referência.
Adotamos, como ponto de partida, dados mais gerais sobre a economia
brasileira com o propósito de mostrar a participação dos salários e dos lucros ou, do
excedente operacional bruto no produto da economia, para, em seguida, focalizarmos a
indústria de calçados retratada de forma mais genérica, mediante indicadores da indústria
nacional, para só então direcionar nossa atenção para aquilo que efetivamente almejamos
que é a indústria calçadista de Franca.
Devemos ainda ressaltar que não existe, no município de Franca, nenhuma
entidade de classe, órgão oficial, etc; que se dedique de forma sistemática a coletar
informações sobre este ramo da atividade econômica, assim, as poucas estatísticas
disponíveis são produzidas precariamente.
90
Sem nenhum pretensão de estabelecer alguma comparação, procuramos, de
início, apenas mostrar dados sobre a indústria de transformação, segundo a estrutura de
custo, no Brasil nos ano de 1969, 1972 e 1975.
TABELA 16: Brasil, Indústria de transformação, evolução da estrutura de custo
(porcentagem sobre as receitas operacionais): 69-75.
Estrutura de custos 1969 1972 1975
Custos Diretos
Salários
Matéria-prima
Demais
Custos Indiretos
Despesas Administrativas
Impostos
Despesas Financeiras
Demais
Lucro Operacional
60,2
7,9
30,7
21,6
34,7
12,1
10,9
3,7
10,0
5,1
62,8
7,2
32,2
23,4
31,4
10,4
9,5
3,7
9,9
5,8
64,5
6,6
33,1
24,8
30,5
9,5
8,5
5,5
7,2
5,0
TOTAL 100%
100%
100%
Fonte: Calabi, A. S. & Reiss, G. D.
38
De acordo com os dados referentes ao período observado, o aumento dos
custos diretos deveu-se sobremaneira ao item matéria-prima e demais. Em contrapartida,
os salários configuraram redução mais significativa do que a compressão observada do
lucro operacional.
A estrutura de custos das empresas reflete adequadamente a peculiaridade da
crise atual [...] Assim, a tendência ao aumento da importância relativa dos custos
diretos manteve-se durante a reversão cíclica, devido especialmente ao
crescimento das matérias-primas e outros custos e apesar da queda dos salários
39
.
Observa-se que, na média, três itens da estrutura de custos: matéria-prima,
demais custos diretos e impostos, juntos somaram 64,9% dos custos totais, enquanto
porcentagem sobre as receitas operacionais na indústria de transformação, dos quais,
38
CALABI, A. S. ; REISS, G. D. In: ZINI Jr, Álvaro Antonio; PINTO, Márcio Percival Alves. A inflação no
Brasil nos anos 70. Cadernos PUC, n. 7, maio 1981. p. 59.
39
CALABI; REISS, op. cit., p. 58-59.
91
apenas a matéria-prima, representou aproximadamente 49%, ou seja, seu peso na
composição dos custos é deveras relevante.
Avançando no tempo, examinamos, em seguida, indicadores
macroeconômicos disponibilizados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística) especialmente extraídos do SCN (Sistema de Contas Nacionais), no período de
1990 a 2002, com o propósito de verificar a evolução da participação relativa dos salários e
do excedente operacional bruto no PIB (Produto Interno Bruto).
Cumpre salientar que estamos, desse modo, baseando-nos nas informações
relacionadas ao PIB examinado sob a ótica da renda, a qual, por sua vez, decompõem o
produto interno bruto da economia, segundo as fontes da renda:
remuneração dos empregados: corresponde ao valor total dos salários, incluindo
as contribuições sociais efetivas e imputadas;
rendimento de autônomos;
impostos líquidos de subsídios sobre a produção e importação; e
excedente operacional bruto: obtido pela diferença entre o produto interno bruto
e o total da remuneração dos empregados mais o rendimento dos autônomos e o
total dos impostos líquidos de subsídios sobre a produção e importação assim
sendo, verificamos a evolução da remuneração dos empregados (RM) e do
excedente operacional bruto (EOB) sobre o PIB no período citado.
92
TABELA 17: Brasil, participação relativa da remuneração dos empregados e do excedente
operacional bruto sobre o PIB 1990 a 2002
ANO RM/PIB
1
EOB/PIB
2
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
45,2
41,6
43,5
45,1
40,0
38,2
38,5
37,5
38,8
38,1
37,9
37,0
36,1
39,5
45,5
44,3
41,7
44,1
46,2
46,7
48,3
47,2
46,2
45,9
45,9
46,5
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE SCN (Sistema de Contas Nacionais)
Composição do Produto Interno Bruto.
1. RM/PIB: refere-se ao total da remuneração dos empregados como porcentagem do PIB.
2. EOB/PIB: refere-se ao excedente operacional bruto como porcentagem do PIB exclusive o rendimento de
autônomos.
Independentemente do comportamento dos dois indicadores examinados
(RM/PIB e EOB/PIB) configurar um padrão definido, podemos verificar uma certa
alternância entre ambos, de modo que o acréscimo de um indicador resulte da redução do
outro, apesar de que, no período de treze anos, é nítido o rebaixamento do total da
remuneração dos empregados frente ao aumento do excedente operacional bruto como
porcentagem do produto interno bruto, revelando-nos ainda que, grosseiramente no interior
do processo distributivo da renda significativa vantagem do capital (examinado na forma
do EOB) sobre o trabalho (representado pelo total da remuneração dos empregados).
Considerando que o PIB (Produto Interno Bruto) resulta da diferença do
Valor Bruto da Produção (VBP) menos o consumo intermediário (CI), mais os impostos
sobre produtos (T), ou ainda, PIB = VBP CI + T, examinamos em seguida a participação
relativa da remuneração dos empregados (inclusive as contribuições sociais efetivas e
imputadas), e o consumo intermediário como proporções do valor bruto da produção, o que
93
nos permiteinclusive apurar o peso isolado e agregado de ambos sobre o valor da
produção, no período de 1990 até o ano de 2002.
TABELA 18: Brasil, Consumo intermediário e remuneração dos empregados como
proporção do valor da produção 1990 a 2002.
ANO CI / VP
1
RM / VP
2
CI + RM / VP
3
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
55,48
52,47
55,55
56,88
52,66
48,64
47,49
47,23
47,20
49,44
50,95
52,16
52,85
23,49
22,54
21,94
21,71
21,44
22,21
22,68
22,05
22,86
21,57
20,84
19,97
19,13
78,97
75,01
77,49
78,59
74,10
70,85
70,17
69,28
70,06
71,01
71,79
72,13
71,98
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE/SCN (Sistema de Contas Nacionais) Composição do
Produto Interno Bruto.
1. CI / VP: refere-se ao valor do consumo intermediário como proporção do valor da produção
2. RM / VP: refere-se ao valor da remuneração dos empregados como proporção do valor da produção
3. CI + RM / VP: é a soma das proporções do consumo intermediário e da remuneração dos empregados
sobre o valor da produção.
De acordo com os dados apurados, podemos constatar que apesar das
oscilações, a remuneração dos empregados como porcentagem do valor da produção
descreveu ligeiro movimento de queda, enquanto o consumo intermediário caiu bem
menos quando comparamos o ano de 1990 com o ano de 2002. Entretanto, quando
examinamos o total das participações relativas do consumo intermediário mais a
remuneração dos empregados no valor da produção, observamos nitidamente o peso que
ambos representam na composição da produção, apesar de que o consumo intermediário
representava, no ano de 2002, o equivalente a 2,76 vezes a remuneração dos empregados.
Afastando-nos dos indicadores macroeconômicos relacionados à
composição do produto interno bruto, procuramos verificar em três subsetores da atividade
94
econômica da indústria de transformação: fabricação de calçados, indústria têxtil e artigos
do vestuário, a participação relativa do consumo intermediário, dos salários (exclusive o
valor das contribuições sociais), e do excedente operacional bruto sobre o valor da
produção, aproximando-nos, deste modo, ainda que superficialmente, da indústria de
calçados.
TABELA 19: Brasil, consumo intermediário, salários e excedente operacional bruto como
porcentagem do valor da produção em subsetores da indústria de transformação
1990 a 1996
Fabr. de Calçados Indústria Têxtil Art. do Vestuário ANO
CI/VP
W/VP EOB/VP
CI/VP
W/VP EOB/VP
CI/VP
W/VP EOB/VP
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
71,5
68,6
62,3
62,7
64,7
65,1
64,8
17,0
15,3
13,7
14,0
15,1
14,8
14,6
9,2
14,1
25,0
19,8
17,8
14,9
14,6
67,8
70,6
71,6
69,7
71,9
70,9
72,0
7,4
7,4
7,1
7,3
6,9
6,6
5,8
23,0
20,0
21,3
20,2
18,4
18,3
18,0
60,2
61,8
61,1
61,6
61,1
61,4
61,3
13,7
13,6
12,9
14,4
14,6
14,2
12,2
23,3
21,0
22,8
20,0
19,4
18,9
20,5
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE / MIP (Matriz Insumo Produto)
CI / VP = consumo intermediário sobre o valor da produção;
W / VP = refere-se ao valor apenas dos salários como percentual do valor da produção; e
EOB / VP = refere-se ao excedente operacional bruto como porcentagem do valor da produção.
Examinando apenas os dados apurados sobre os subsetores selecionados
desconsiderando quaisquer outras caracterizações como regimes de mercado, estágios
tecnológicos, relação capital / produto etc; -, constatamos que a participação relativa do
consumo intermediário nos três subsetores é bastante representativa, configurando
aparentemente certa proporcionalidade. Já a participação dos salários em termos
percentuais (não se trata portanto do valor absoluto dos salários), era mais elevada nas
atividades de fabricação de calçados e artigos do vestuário, enquanto nos subsetores da
indústria têxtil e de artigos do vestuário, o excedente operacional bruto apontou-nos para
uma participação mais elevada nestes ramos. Ainda assim, nos três subsetores da atividade
econômica da indústria de transformação, visualizamos, no período observado, ligeira
95
compressão dos salários, e que, no caso específico da fabricação de calçados, a redução da
participação relativa dos salários reduz-se em favor do ligeiro aumento do excedente
operacional bruto.
Acreditamos que após essa breve incursão pelo Sistema de Contas Nacionais
(SCN), seja possível focalizarmos especificamente a indústria de calçados, ainda que em
perspectiva nacional, para posteriormente nos atermos apenas àquela situada no município de
Franca. Diante disto, passamos, em seguida, a analisar com um pouco mais de detalhes dados
gerais das empresas industriais (indústria de transformação), segundo o IBGE, notadamente a
PIA (Pesquisa Industrial Anual), que nos possibilita examinar a estrutura de custos e de
receitas de diversos subsetores da atividade econômica da indústria de transformação e também
das indústrias extrativas. Primeiramente, verificamos, no âmbito da indústria de transformação,
segundo faixas de pessoal ocupado, dados gerais relacionados às empresas industriais, assim
como, procuramos estabelecer possíveis relações entre os variados dados disponíveis: pessoal
ocupado, número de empresas, custos / despesas, receita total, consumo de matérias-primas,
materiais auxiliares e componentes, custo das operações industriais, valor da transformação
industrial e valor bruto da produção nos anos de 1996 e 2002, uma vez que, apenas por motivo
de simplificação, evitamos analisar período completo, isto é, de 1996 até o ano de 2002.
Cumpre ressaltar, ainda, que adotamos por conveniência o critério de agrupamento das faixas
de pessoal ocupado, de tal sorte que o porte das empresas configurará a seguinte denominação:
de 5 a 29 pessoas ocupadas (microempresa ME);
de 30 a 99 pessoas ocupadas (pequena-empresa PE);
de 100 a 499 pessoas ocupadas (média-empresa MDE);
de 500 e mais pessoas ocupadas (grande-empresa GE).
Deste modo, de acordo com os dados gerais das empresas industriais, podemos
aproximar-nos com mais detalhes dos problemas inerentes aos custos e receitas, inclusive dos
lucros, das empresas do setor da indústria de transformação, de acordo com os seus respectivos
96
portes em dois momentos específicos, ou seja, nos anos de 1996 e 2002, escolhidos apenas por
questões de simplificação.
TABELA 19: Brasil, dados gerais das empresas industriais segundo o porte for faixa de
pessoal ocupado 1996 e 2002
VARIÁVEL 1996 2002
M.E. P.E. MD.E. G.E. M.E. P.E. MD.E. G.E.
1. n.º empresas (un)
2. PO em 31/12 (pessoas)
3. CDT (mil reais)
4. CD-GP (mil reais)
5. RT (mil reais)
6. COI (mil reais)
7. CMPMaCp (mil reais)
8. VBPI (mil reais)
9. VTI (mil reais)
82.940
896.217
22.757.301
5.325.242
24.532.181
12.140.915
10.838.584
21.612.609
9.471.694
15.202
792.096
31.573.679
6.914.188
32.627.463
16.257.828
14.458.068
29.736.131
13.478.303
6.232
1.287.378
88.705.672
17.203.227
91.508.373
44.192.254
39.039.346
80.730.551
36.538.297
1.426
2.073.843
227.359.621
42.020.824
235.613.162
104.996.601
91.519.721
202.474.810
97.478.209
105.269
1.178.479
36.648.906
8.927.159
43.644.108
21.480.371
19.017.083
40.318.353
18.837.982
19.052
981.559
66.915.414
10.801.378
67.664.611
37.995.194
33.737.486
61.571.550
23.576.356
6.342
1.296.026
200.393.355
23.994.521
197.145.625
99.301.898
87.783.076
165.471.502
66.169.604
1.381
2.125.465
573.714.442
57.727.395
579.852.917
258.437.652
225.375.839
473.852.465
215.414.812
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE / PIA (Pesquisa Industrial Anual) / SIDRA: Banco
de Dados Agregado.
Nomenclaturas: 1. P.O. / n.º empresas: pessoas ocupadas por empresas (unidades locais); 2. G.P. / P.O.
gastos de pessoal por pessoas ocupadas; 3. G.P. / C.D.T.: gastos de pessoal em porcentagem dos custos e
despesas totais; 4. CMPMACP / V.B.P.I.: custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e
componentes em porcentagem do valor bruto da produção industrial; 5. R.T. / P.O.: receita total por pessoal
ocupado; 6. CMPMACP / C.D.T.: custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e
componentes como porcentagem dos custos e despesas totais; 7. C.D.T. / R.T.: relação entre custos e
despesas totais e receita total; 8. C.O.I. / C.D.T.: custo das operações industriais em porcentagem dos custos e
despesas totais; 9. K = V.B.P.I. / CMPMaCP + G.P.: K (markup) = calculado como produto da divisão do
valor bruto da produção industrial pela soma dos custos com consumo de matérias-primas, materiais
auxiliares e componentes mais os gastos de pessoal.
TABELA 20: Brasil, dados gerais das empresas industriais segundo o porte por faixa de
pessoal ocupado, relação entre variáveis 1996 e 2002
VARIÁVEIS 1996 2002
M.E. P.E. MD.E. G.E. M.E. P.E. MD.E. G.E.
1. P.O. / n.º empresas
2. G.P. / P.O. (em R$)
3. C.O.I. / C.D.T. (em %)
4. CMPMaCP / V.B.P.I. (em %)
5. R.T. / P.O. (em R$)
6. CMPMaCP / C.D.T. (em %)
7. C.D.T. / R.T.
8. K = V.B.P.I. / CMP + GP
*
10,8
5.941,91
53,3
50,2
27.373,04
47,6
0,93
1,34
52,1
8.728,98
51,5
48,6
41.191,30
45,8
0,97
1,39
206,5
13.363,00
49,8
48,3
71.081,20
44,0
0,97
1,44
1,454,3
20.262,30
46,2
45,2
113.611,86
40,2
0,96
1,52
11,1
7.575,15
54,2
47,2
37.034,27
47,9
0,91
1,44
51,5
11.004,31
56,7
54,8
68.935,86
50,4
0,99
1,38
204,3
18.513,92
49,6
53,0
152.115,49
43,8
1,02
1,48
1.539,1
27.159,89
45,1
47,6
272.812,26
39,3
0,99
1,67
GP / CDT 1996
**
GP / CDT 2002
**
M.E.
P.E.
MD.E.
G.E.
23,40
21,90
19,39
18,48
22,52
16,14
11,97
10,06
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE / PIA (Pesquisa Industrial Anual).
* 8 K. (markup) = valor bruto da produção industrial dividido pelo consumo de matérias-primas, materiais
auxiliares e componentes mais os gastos de pessoal.
** em porcentagem
97
Examinando os dados (relações entre as variáveis) apurados, podemos
extrair algumas constatações:
em razão do que já foi anteriormente mencionado, devemos apenas lembrar que
esses dados não retratam o universo da indústria de transformação, ao mesmo
tempo que não deve refletir uma situação padrão para todo o conjunto das
empresas industriais (pertencentes ao setor da atividade econômica da indústria
de transformação), uma vez que as empresas se diferenciam entre si em razão
de variado leque de fatores: escala de produção, composição orgânica do
capital, dinamismo empresarial, inovação tecnológica, produtividade dos
fatores de produção regime de concorrência, pesquisa e desenvolvimento,
formação e capacitação da mão-de-obra etc; assim, poderão ocorrer situações:
de total enquadramento de empresas vinculadas ao setor da indústria de
transformação, de aproximação, e de total afastamento;
os números obtidos e sistematizados pelo IBGE, na pesquisa industrial anual
(PIA), são números agregados, isto é, por serem totais não refletem a condição
de “especificidade”. Diante disto, as análises seguintes reproduzem apenas uma
leitura da situação baseada em dados agregados; e
considerando ainda o fato de estarmos examinando somente dois anos (1996 e
2002), as considerações basearam-se em apenas o que era em 1996, e o que
passou a ser em 2002, e aquelas variáveis expressas em valores (R$) refletem
apenas as modificações nominais, ou seja, não consideramos os efeitos
corrosivos da inflação para corrigir esses valores às suas magnitudes reais.
Após essa breve caracterização dos dados da pesquisa industrial anual,
podemos assim manifestar nossa análise:
98
a) em termos de quantidade, o número de empresas industriais de micro porte (ME)
cresceu tanto em termos absolutos (22.329 unidades), como em porcentagem (26,9%),
seguido das pequenas empresas (PE), cujo acréscimo absoluto foi de 3.850 unidades,
representado uma variação percentual de 25,3%, enquanto as empresas de médio e
grande porte configuraram alterações, ou seja, aumentos mais modestos, uma vez que,
em números absolutos, as empresas de médio porte totalizaram 110 unidades contra
um decréscimo de 45 das empresas de grande porte;
b) em se tratando de pessoal ocupado, as microempresas lideraram o conjunto das
empresas industriais, pois aumentaram, em 31,4%, o total de pessoas ocupadas,
seguida das empresas de pequeno porte com um aumento de 23,9%, quase nulo foi o
aumento do pessoal ocupado nas empresas de médio porte 0,67%, e, nas grandes
empresas, apesar da redução do número de empresas industriais houve um ligeiro
acréscimo do pessoal ocupado de 2,49% apenas;
c) o número médio de pessoas ocupadas por empresa registrou, nas empresas de micro,
pequeno e médio porte estabilidade, ao contrário das empresas de grande porte que
aumentaram em 5,8% o número de pessoas ocupadas por empresa;
d) quanto à variável (GP/PO), gastos com pessoal por pessoa ocupada, nas
microempresas, o aumento foi de 27,5%, nas pequenas empresas de 26,1%, nas
empresas de médio porte 38,5%, e, nas grandes empresas, o percentual atingiu a cifra
dos 34,0%, um pouco abaixo das empresas de porte médio;
e) quando examinamos a relação (COI / CDT) custo das operações industriais como
proporção dos custos e despesas totais, verificamos certa linearidade nas empresas
industriais de micro, médio e grande porte, conquanto para as empresas de pequeno
99
porte, esta relação foi acrescida de 10,1%, no ano de 2002 comparativamente ao ano
de 1996;
f) ao analisarmos o peso (proporção) da variável (CMPMaCP) consumo de matérias-
primas, materiais auxiliares e componentes sobre o valor bruto da produção industrial
(VBPI), constatamos que o mesmo representou, em média, para as quatro categorias
de empresas industriais 49,3% aproximadamente. Todavia, enquanto para as
microempresas a relação caiu para 47,2%, para as demais ocorreram acréscimos
diferenciados, de 48,6% para 54,8% (12,8%), excepcionalmente para as pequenas
empresas, de 48,3% para 53,0% (9,7%) nas empresas de médio porte, e, de 45,2%
para 47,6% (5,3%) apenas nas empresas de grande porte, o que independentemente da
variação nominal, em 2002, comparativamente ao ano de 1996, revela-nos peso
significativo desta variável no valor da produção industrial;
g) surpreendeu-nos o forte incremento apurado na relação (RT / PO) receita total por
pessoa ocupada em todas as categorias de empresas industriais no ano de 2002, em
relação ao ano de 1996, atingindo (35,2%) nas microempresas; (67,3%) nas empresas
de pequeno porte; (114,0%) nas empresas de médio porte, e, nas grandes empresas
industriais, o aumento também foi robusto chegando a cifra de 140,1% no ano de
2002 em relação ao ano de 1996. Esse fato inclusive nos mostra, a priori, que o
incremento da relação (RT / PO) tenha sido superior ao aumento dos gastos com
pessoal por pessoa ocupada (GP / PO);
h) em relação ao consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e de componentes
como proporção dos custos e despesas totais, na média, este indicador situou-se na
casa dos 44,9%. Porém, de forma diferenciada esta relação configurou
estabilidade para as microempresas, aumento de 10,0% para as pequenas empresas,
100
recuo de (-0,45%) para as empresas de porte médio, e redução de (-2,24%) para as
grandes empresas;
i) no que se refere à relação entre as variáveis (CDT / RT), a leitura dos dados sobre a
razão entre os custos e as despesas totais e as receitas totais, para as quatro tipologias
de empresas industriais, somente para as microempresas a relação configurou pequeno
afastamento de 1,0, ou seja, de igualdade entre custos e receitas o que resultaria de
uma situação típica de equilíbrio -, para as pequenas e grandes empresas industriais a
distância entre os custos totais e as receitas totais situaram-se numa posição de grande
aperto, enquanto para as empresas de médio porte, no ano de 2002, ocorreu o inverso,
isto é, os custos totais superaram as receitas; e
j) quanto ao grau de monopólio (K), ou markup, o ano de 2002 espelhou ligeira
recuperação para as quatro categorias de empresas industriais, todavia destacamos o
valor alcançado pelas grandes empresas, as quais, por sua vez, experimentaram um
aumento mais significativo em termos talvez de maior poder de remarcação de preços.
De certo modo, ainda que em caráter precário, salienta-se que muito
provavelmente a conjuntura da estabilidade econômica estabilidade de preços, regime
cambial, carga tributária, juros, aumento da concorrência interna combinada com a
conjuntura competitiva resultante da abertura da economia - , que se instalou no país,
associada a estes mencionados e outros fatores, deve ter promovido como resultado, uma
situação de acirramento imoderado da concorrência (intra-empresas, intra-indústrias, inter-
empresas e inter-indústrias), de tal sorte a reproduzir significativo grau de dificuldade para
o conjunto das empresas industriais que fizeram parte ou integraram a pesquisa industrial
anual (IBGE), ou, até mesmo nas empresas do setor da indústria de transformação que não
se integraram à referida pesquisa.
101
Antes de finalizarmos esta breve incursão pela indústria de transformação
brasileira, gostaríamos de examinar, em termos apenas de variação percentual as relações
entre (GP / PO), gastos de pessoal por pessoas ocupadas, e (RT / PO) receita total por
pessoas ocupadas, no ano de 2002, em relação ao ano de 1996.
TABELA 22: Brasil, empresas industriais, variação percentual dos gastos de pessoal e
receita total por pessoas ocupadas em empresas segundo o porte: 2002 / 1996.
Variação Percentual (%)
2002 / 1996
Empresas
GP / PO (em R$) RT / PO (em R$)
M.E.
P.E.
MD.E.
G.E.
27,49
26,07
38,55
34,04
35,29
67,36
114,00
140,13
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE PIA (Pesquisa Industrial Anual)
FIGURA 10: Gastos com pessoal e receita total por pessoas ocupadas na indústria de
transformação em empresas segundo o porte (variação percentual) 2002 / 1996
Fonte: Elaborado pelo autor de acordo com dados do IBGE Sistema de Contas Nacionais Matriz Insumo
Produto
GP/PO = gastos de pessoal por pessoa ocupada; RT/PO = receita total por pessoa ocupada
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110
120
130
140
M.E. P.E. MD.E. G.E.
G.P./P.O.
R.T./P.O.
102
No âmbito das empresas industriais de abrangência nacional, podemos
afirmar, de acordo com as relações: gastos de pessoal em porcentagem dos custos e
despesas totais (GP / CDT), e da variação percentual entre (GP / PO) gastos de pessoal por
pessoa ocupada e (RT / PO) receita total por pessoa ocupada (2002 / 1996) ainda que
provisoriamente:
i) nas microempresas, tanto em 1996 como no ano de 2002, os gastos de pessoal em
porcentagem dos custos e despesas totais praticamente permaneceram estáveis; nas
pequenas empresas, ocorreu significativa redução da ordem de 26% aproximadamente,
nas empresas de porte médio, a compressão dos gastos de pessoal atingiu a cifra de
38,2%, enquanto abrupto foi o corte produzido pelas empresas industriais de grande
porte, uma vez que, os gastos de pessoal como percentagem dos custos totais, totalizou
queda de 45,5% no ano de 2002 vis-à-vis o ano de 1996;
ii) quanto às variações ocorridas (2002 / 1996) entre as relações (GP / PO) e (RT / PO), de
forma bem explicita, verificamos que houve em escala variada significativa vantagem do
incremento da receita total por pessoas ocupadas, em relação às variações nos gastos de
pessoal por pessoas ocupadas. De forma bem reduzida, podemos dizer que os aumentos
de produtividade do trabalho (RT / PO) quase que acompanharam os incrementos dos
gastos de pessoal por pessoa ocupada nas microempresas. Já, nas empresas de pequeno
porte, os ganhos aparentes de produtividade situaram-se (2,58) vezes acima dos gastos
de pessoal por pessoa ocupada, nas empresas de médio porte os ganhos de produtividade
(RT / PO) quase que foram multiplicados por três (2,96), em relação aos gastos de
pessoal por pessoa ocupada. Porém, nas grandes empresas, os aumentos de
produtividade estamos nos referindo àquela possível de ser apurada no setor formal da
economia atingiram, em relação aos gastos de pessoal por pessoa ocupada a proporção
103
(140,13 / 34,04) de 4,12, ou seja, os incrementos da produtividade monetária do trabalho
(RT / PO) ficaram no comparativo de 1996 / 2002, quatro vezes acima dos gastos de
pessoal por pessoa ocupada (GP / PO). A priori, supomos que este quadro resultou do
acirramento da concorrência (interna e externa), da conjuntura da estabilidade dos
preços, da imperiosa necessidade de reposicionamento estratégico competitivo das
empresas, na busca de aumentos sucessivos de produtividade, aprimoramento da
qualidade no processo de produção e na própria gestão administrativa, da inovação
tecnológica, em processos e produtos, incluindo neste rol aqueles anteriormente
mencionados (câmbio, juros, tributação etc) manifestou-se de maneira generalizada .
Por outro lado, a reduzida margem de manobra das empresas industriais,
notadamente no que diz respeito à remarcação dos preços, deva ter ocorrido devido o
aumento da concorrência, da estabilidade dos preços, que somados à elevada taxa de
desemprego e ampliação do setor informal, devam ter reprimido o consumo.
As empresas industriais retratadas aqui, de acordo com os dados apurados,
sentiram-se forçadas pelos motivos expostos, entre outros, a aumentarem suas respectivas
produtividades de forma impieriosa, cuja conseqüência mais direta e visível face ao
estreitamento da relação custos totais e receita total, foi senão o rebaixamento dos custos e
despesas de pessoal.
104
2.1 BREVE RETROSPECTIVA DA INDÚSTRIA DE CALÇADOS DO
BRASIL
Após esta primeira aproximação com a indústria de transformação a partir
dos dados gerais das empresas industriais, segundo a já citada pesquisa disponibilizada
pelo IBGE, supomos ser não apenas conveniente, mas, sobretudo necessário, conhecermos
um pouco, ou pelo menos de forma geral, a indústria de calçados na sua abrangência
nacional, de maneira que seja possível vizualizá-la em paralelo com a indústria de
transformação (anteriormente examinada, de acordo com dados gerais das empresas
industriais) e, posteriormente compará-la, com a indústria calçadista francana .
Não muito diferentemente dos dados gerais das empresas industriais
sistematizados pelo IBGE (PIA), referentes ao setor da indústria de transformação (área de
abrangência Brasil), recorremos agora à mesma fonte de dados, para podermos visualizar
dados gerais das empresas industriais do subsetor de fabricação de calçados do Brasil.
Analogamente ao tratamento anterior, procuramos nos anos de 1996 e 2002,
de acordo com as informações disponíveis, examinar este ramo da atividade econômica,
industrial considerando que os dados disponíveis, segundo diversos subsetores da atividade
econômica
40
, diferem em certa medida dos valores agregados -, obedecendo, à medida do
possível, ao mesmo formato anteriormente empregado. Aqui também torna-se mister
ressaltar que são dados agregados, os quais, por sua vez, foram obtidos mediante a soma
de diferentes empresas industriais, classificadas como fabricação de calçados (código
19.3). Diante disto, temos como prováveis particularidades: empresas industriais de
variado porte físico (micro, pequena, média e grande), diferentes composições orgânicas de
40
Os subsetores da atividade econômica neste caso estão classificados segundo CNAE (Classificação
Nacional de Atividade Econômica) três dígitos, que no caso fabricação de calçados identifica-se pelo código
(19.3).
105
capital, convergindo para uma característica peculiar deste setor da indústria tradicional
41
,
qual seja, de baixa relação capital / produto intensivo de mão-de-obra, entre outras
configurações, diferentes escalas e destinação da produção (variada capacidade produtiva
instalada e diferentes destinações da produção para os mercados interno e externo), grau de
instrução, qualificação e remuneração da mão-de-obra diferenciados, assim como podemos
citar a presença de uma mentalidade empresarial inovadora, convivendo simultaneamente
com empresários mais conservadores, ou ainda colocada de outra forma, provavelmente
esta convivência resulte da presença da tradição e da modernidade (referimo-nos apenas ao
problema da tradição e modernidade recortados na dimensão da mentalidade empresarial
de gestão da produção, da administração e da inovação) no mesmo espaço de produção.
Devemos ainda salientar, que por uma questão de mera objetividade, e
também de simplificação, os dados gerais das empresas industriais que passamos doravante
a retratar referem-se aos “Dados gerais das unidades locais, por Unidades da Federação
segundo a divisão de atividades Brasil, Sul e Sudeste”, pois, acreditamos que ao mesmo
tempo que são mais que representativos em proporção ao universo da indústria brasileira
de calçados, pois, aproximam-se, de certa forma, da nossa realidade local, ou pelo menos,
não se distanciam tanto, apesar de que neste caso, também corremos o risco de anular a
“especificidade”, em razão da magnitude configurada no emprego de dados gerais
“agregados”, os quais, por conseguinte, camuflam o específico e revelam, no geral, uma
espécie de configuração padronizada, todavia, mesmo assim, assumimos que as análises
seguintes espelham um contorno de generalização.
41
Distinguem-se indústrias em vários ramos, conforme os bens que produzem: indústria de bens de capital ou
de bens de produção (máquinas, equipamentos), indústrias de bens intermediários (matérias-primas para
outras empresas) e indústrias de bens de consumo (artigos de utilidade individual ou familiar). São
classificadas como indústrias tradicionais ou de trabalho intensivo as que ocupam grande contingente de
mão-de-obra se apóiam em tecnologia atrasada; e como indústrias modernas ou de capital intensivo as
portadoras de tecnologia sofisticada, com operários altamente especializados e elevada taxa de investimento
por pessoa empregada (SANDRONI, op cit., p. 300).
106
Deste modo, supomos que as empresas (salvo, é claro, as exceções)
assumam e/ou retratem o padrão da indústria uma vez que o todo resulta da soma das
partes -, o que não descarta, em hipótese alguma, a possibilidade de que uma das partes
pode representar peso relativamente suficiente para influenciar na composição do todo.
TABELA 23: Fabricação de calçados, número de unidades locais em unidades e
porcentagem, Brasil, sul e sudeste – 1996 e 2002
NÚMERO DE UNIDADES LOCAIS
(UNIDADE) (EM %)
BRASIL E
UNIDADE DA
FEDERAÇÃO
1996 2002 1996 2002
Brasil
Minas Gerais
Rio de Janeiro
São Paulo
Paraná
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
2.919
541
82
1.002
79
89
910
4.271
733
33
1.243
60
164
1.624
100,0%
18,5
2,8
34,3
2,7
3,0
31,2
100,0%
17,2
0,8
29,1
1,4
3,8
38,2
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE / SIDRA (Banco de Dados Agregado Sistema de
Recuperação Automática) / PIA Pesquisa Industrial Anual.
De acordo com este universo amostral, as regiões / unidades da federação
sul e sudeste representavam do conjunto de unidades locais 92,6% do total das unidades
existentes no país, no ano de 1996, ligadas à atividade econômica de fabricação de
calçados e, no ano de 2002, um ligeiro recuo deste percentual ainda nos revela que, com
90,3% do total de unidades locais, estas duas unidades da federação brasileira, dado o
elevado percentual de empresas, em proporção do conjunto nacional, contemplam
significativa especialização na fabricação de calçados. Entretanto, devemos destacar o peso
que os estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul representam no âmbito
regional e nacional, enquanto importantes pólos industriais especializados na fabricação de
calçados em geral.
107
O espaço como campo de forças, ou polarizado, é outro tipo de espaço
econômico (abstrato). A polarização, como explica PERROUX, compreende
forças de atração (centrípetas) e de repulsão (centrífugas), e surge devido às
concentrações de população e de produção basicamente.
Uma grande empresa industrial exerce poderosas forças de atração sobre o
mercado de trabalho e sobre empresas fornecedoras de insumos, e forças de
repulsão não menos poderosas sobre concorrentes atuais ou potenciais e
possivelmente sobre outras atividades com as quais é incompatível, como
turismo ou agropecuária
42
.
Como não é do nosso propósito discutir temas relacionados ao espaço, à
região etc; apenas procuramos conceituar “pólo industrial”, no sentido de concentração da
produção, pois, segundo os dados anteriormente apresentados, os estados de Minas Gerais,
São Paulo e do Rio Grande do Sul configuraram, pelo elevado percentual apurado, o
formato de pólo, dada a representativa concentração de empresas industriais ligadas à
atividade industrial de fabricação de calçados.
TABELA 24: Dados gerais das unidades locais, fabricação de calçados, Sul e Sudeste,
1996 e 2002.
Variável 1996 2002 2002/1996 (%)
1. N.º de empresas (un.)
2. PO 31/12 (pessoas)
3. CDT (mil reais)
4. RT (mil reais)
5. CD GP (mil reais)
6. COI (mil reais)
7. CmpMaCp (mil reais)
8. VBPI (mil reais)
9. VTI (mil reais)
2.703
197.010
5.168.721
5.416.599
945.279
2.728.382
2.398.068
5.276.242
2.547.861
3.857
243.017
8.917.764
9.482.098
1.466.554
5.332.676
4.578.901
9.565.866
4.233.188
42,6
23,3
72,5
75,1
55,2
95,5
90,9
81,3
66,2
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados IBGE / SIDRA (Sistema de Recuperação Automática)
Banco de Dados Agregado PIA / Pesquisa Industrial Anual.
Examinando os dados da TABELA 25, notadamente a variação percentual
ocorrida no ano de 2002 comparativa ao ano de 1996 no que concerne aos valores
monetários, referimo-nos à variação nominal e não real -, verificamos para as regiões Sul e
Sudeste:
a) o número de empresas locais experimentou uma expansão física de 42,6% no ano de
2002, em relação ao ano de 1996, contrariando a variação ocorrida com o total de
42
CLEMENTE, Ademir; HIGACHI, Hermes Y. Economia e desenvolvimento regional. São Paulo:
Atlas, 2000. p. 14-15.
108
pessoal ocupado, uma vez que a ampliação do número de empresas (unidades locais)
foi superior em 50,0% o acréscimo de pessoas ocupadas;
b) os custos e as despesas totais praticamente expandiram-se proporcionalmente ao
acréscimo das receitas totais com ligeira vantagem desta última;
c) dos custos e despesas totais, as variações apuradas nos gastos de pessoal foram
significativamente inferiores àquelas verificadas nos custos das operações industriais e
dos custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e componentes, o que
em princípio nos mostra que a compressão praticada sobre os custos do trabalho, em
certa medida, refletiram a pressão maior exercidas tanto pelo aumento dos custos das
operações industriais (95,5%), como também do aumento dos custos com consumo de
matérias-primas (90,9%); e
d) o valor da transformação industrial do subsetor de fabricação de calçados das regiões
examinadas sofreu ligeira redução, pois, no ano de 1996, representava 87,5% do total
nacional, já, em 2002 (os dados disponibilizados pelo IBGE), este percentual atingira
76,4%, o que, entre outros fatores, pode ser reflexo do processo de reestruturação
produtiva protagonizado pela estratégia da relocalização industrial.
Do mesmo modo que anteriormente examinamos a indústria de transformação
na sua abrangência nacional, em seguida, verificaremos as relações entre as mesmas variáveis,
agora representadas pelas unidades locais do subsetor de fabricação de calçados das
unidades federativas do sul e sudeste brasileiro. Lamentavelmente, os dados gerais
disponíveis não retratam as empresas industriais segundo a faixa de pessoal ocupado.
109
TABELA 25: Dados gerais das unidades locais, relação entre variáveis do subsetor de
fabricação de calçados das regiões Sul e Sudeste do Brasil 1996 e 2002.
Variáveis 1996 2002
1. PO / N.º de empresas
2. GP / PO (em reais)
3. GP / CDT
4. CmpMaCp / VBPI
5. RT / PO (em reais)
6. CmpMaCp / CDT
7. CDT / RT
8. COI / CDT
9. K = VBPI / CMP + GP
72,9
4.798,13
18,3
45,4
27.494,03
46,4
0,95
52,8
1,58
63,0
6.034,78
16,5
47,8
39.018,25
51,3
0,94
59,8
1,58
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados IBGE / SIDRA (Sistema de Recuperação Automática)
Banco de Dados Agregado PIA / Pesquisa Industrial Anual
Nomenclatura: 1. P.O. / n.º empresas: pessoas ocupadas por empresas (unidades locais); 2. G.P. / P.O. gastos
de pessoal por pessoas ocupadas; 3. G.P. / C.D.T.: gastos de pessoal em porcentagem dos custos e despesas
totais; 4. CMPMACP / V.B.P.I.: custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e
componentes em porcentagem do valor bruto da produção industrial; 5. R.T. / P.O.: receita total por pessoal
ocupado; 6. CMPMACP / C.D.T.: custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e
componentes como porcentagem dos custos e despesas totais; 7. C.D.T. / R.T.: relação entre custos e
despesas totais e receita total; 8. C.O.I. / C.D.T.: custo das operações industriais em porcentagem dos custos e
despesas totais; 9. K = V.B.P.I. / CMPMaCP + G.P.: K (markup) = calculado como produto da divisão do
valor bruto da produção industrial pela soma dos custos com consumo de matérias-primas, materiais
auxiliares e componente mais os gastos de pessoal.
Das relações entre as variáveis , podemos considerar:
a) o número de pessoas ocupadas por empresas ou unidades locais sofreu ligeira
redução de 72,9 em 1996, para 63,0 no ano de 2002, ou 13,5%;
b) os gastos de pessoal por pessoa ocupada, em termos nominais, experimentaram um
aumento da ordem de 25,7%;
c) contrariamente, os gastos de pessoal como porcentagem dos custos e despesas
totais descreveram trajetória oposta (ao item b), pois, reduziram-se em 9,84%;
d) a porcentagem dos custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e
componentes no valor bruto da produção industrial sofreu, no ano de 2002, em
relação ao ano de 1996, ligeira elevação da ordem de 5,29%, porém, revela-nos o
110
peso que representam no valor bruto da produção, 45,4% e 47,8% respectivamente
nos anos de 1996 e 2002;
e) do mesmo modo que pudemos constatar anteriormente quando examinamos a
indústria de transformação, no caso da fabricação de calçados, também podemos
constatar que a receita total por pessoas ocupadas registrou aumento de 41,9%;
f) os custos com consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e componentes
como porcentagem dos custos e despesas totais assumem um peso relativamente
elevado, participando nos anos de 1996 e 2002, com 46,4%, e 51,3%
respectivamente;
g) analogamente aos dados gerais das empresas industriais do setor da indústria de
transformação brasileira, no caso específico do subsetor de fabricação de calçados,
a relação custos e despesas totais e receita total apontou-nos para uma configuração
muito semelhante a anterior, uma vez que os números obtidos, no ano de 1996,
(0,95) e no ano de 2002, (0,94) refletiram uma situação de reduzido estreitamento
entre custos e receita
43
;
h) o custo das operações industriais, como porcentagem dos custos e despesas totais
(COI / CDT), indica-nos o peso acentuado que representa em relação aos custos
totais, além do que, no ano de 2002, comparativamente ao ano de 1996, significou
59,8%, um acréscimo de 13,2%; e
43
Nota: Considerando que o lucro bruto resulta da diferença entre a receita total e o custo total,
podemos identificar três situações: a) RT = CT: a receita total é igual ao custo total, logo o
equilíbrio resulta da ausência de lucro ou prejuízo; b) RT > CT: quando a receita total é maior que
o custo total ocorre a existência de lucro; c) RT < CT: neste caso, sendo a receita total menor que
o custo total o resultado é prejuízo. No caso da relação que estamos apurando (CDT / RT),
podemos identificar duas situações: a) quando a relação é próxima de 1,0 (custos e receita são
quase iguais); b) quando a relação se aproxima de 0,0 (receita é maior que custos).
111
i) o markup da indústria de calçados descreveu uma trajetória de manutenção /
estabilidade, situando-se na faixa de 1,58, o que pode significar entre outras
possibilidades de interpretação, aumento da concorrência, dificuldades ou redução
do espaço de manobra das empresas face às condições de concorrência e
estabilidade econômica traduzida, em última forma, pela estabilidade do índice
geral dos preços.
TABELA 26: Brasil, taxa anual da inflação (em %) e força do markup na indústria de
transformação – 1962-1976.
ANO TAXA ANUAL DE INFLAÇÃO (%) MARKUP (Z)
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
51,3
81,3
91,9
34,5
38,8
24,3
25,4
20,2
19,2
19,8
15,5
15,7*
34,5
29,4
46,3
1,49
1,58
1,51
1,64
1,59
1,60
1,70
1,73
1,70
1,78
1,77
1,76
1,71
1,66
1,68
Fonte: Elaborada pelo autor, a partir dos dados de Brum (1995), para a taxa anual de inflação, e, Bacha
(1991) para os dados relativos ao markup.
* Nota: De acordo com Brum: “A taxa de inflação em 1973 foi manipulada pelas autoridades econômicas da
época, com a finalidade de conceder reajustes salariais mais baixos. O Banco Mundial estimou a inflação
brasileira de 1973 em 22,5% (bem acima dos 15,7% da taxa oficial).
Observando os comportamentos do markup industrial e da taxa de inflação
anual, no período de 1962 a 1976 no Brasil, aparentemente sem a pretensão de produzir
alguma conclusão, apenas notamos que, a partir de 1967 até o ano de 1973, enquanto a
taxa anual de inflação descreveu nítido movimento descendente, o markup, ao contrário,
experimentou trajetória não linear ascendente, ou seja, mesmo com certa irregularidade
112
aumentou e, que a partir de 1974, com a inflação em ritmo ascendente, o markup
ligeiramente reduziu-se, isto até o ano de 1976.
Uma série de fatores pode influenciar os markups, mas em geral são mecanismos
de lenta operação. O poder dos sindicatos, o grau de concentração industrial e os
preços das matérias-primas são fatores apontados. No caso brasileiro há outro
condicionamento importante: a atuação do CIP (Conselho Interministerial de
Preços), que é o órgão oficial encarregado de exercer controle de preços [...] as
empresas industriais no Brasil fixam seus preços em função dos seus custos,
através de um markup relativamente estável, o que parece confirmar a existência
de políticas de preço [...]
44
.
Nos anos de 1996 e 2002, o markup da atividade industrial de fabricação de
calçados manteve-se estável, e os custos com matérias-primas, materiais auxiliares e
componentes sofreram abrupta majoração, o que, ao nosso ver, deve ter forçado as
empresas no que tange às suas respectivas políticas de preços a adotarem medidas mais
aústeras de contenção de custos e despesas, entre as quais, muito provavelmente diante de
um quadro es estabilidade de preços sobressaindo-se a obsecada política de metas
inflacionarias adotada pelo governo federal , e concorrência exacerbada, acreditamos ter
sido a compressão verificada nos custos e despesas de pessoal, ou ainda de outro modo, a
redução dos custos do trabalho.
TABELA 27: Empresas industriais, fabricação de calçados, variação percentual do pessoal
ocupado, dos gastos de pessoal e receita total por pessoas ocupadas, Sul e Sudeste (em %)
1996 a 2002
VARIAÇÃO PERCENTUAL (EM %) (EM %) ANO
G.P. / P. O. R. T. / P. O. P. O.
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
-
9,24
(-6,55)
(-1,00)
4,68
13,89
4,39
-
9,02
(-6,60)
9,14
8,32
10,52
6,67
-
(-15,17)
(-2,00)
15,16
13,71
7,17
5,73
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados do IBGE / SIDRA Pesquisa Industrial Anual.
Nomenclatura: GP / PO: gastos de pessoal por pessoa ocupada; RT / PO: receita total por pessoa ocupada; e
PO: pessoal ocupado.
44
BACHA, Edmar. Introdução à macroeconomia: uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro:
Campus, 1991. p. 54-55.
113
De 1996 a 2002, as empresas do subsetor de fabricação de calçados
localizadas no sul e sudeste brasileiro, em razão dos argumentos anteriormente
explicitados, experimentaram, no acumulado do período, um incremento da ordem de
37,07% das receitas totais por pessoa ocupada, enquanto o pessoal ocupado cresceu em
torno de 24,60%, e os gastos de pessoal (salário, retiradas e outras remunerações)
aumentou de 24,65%, ou seja, bem abaixo do aumento apurado da receita total por pessoa
ocupada.
TABELA 28: Relação salários e produtividade 1970 e 1984 (1970 = 100)
ANO SALÁRIO MÉDIO REAL PRODUTIVIDADE*
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984**
100
102
106
111
111
120
127
129
139
142
137
133
152
134
115
100
109
118
130
139
143
152
157
160
165
176
171
169
159
162
Fonte: Brum (1995)
* Produtividade: aumento na renda per capita
** Dados para o primeiro semestre de 1984
Este breve retorno no tempo tem a finalidade de mostrar que, comparando
os índices de produtividade com salário médio real, no período de 1970 a 1984, os ganhos
de produtividade são significativamente maiores do que os ganhos do salário, lembrando
que, naqueles tempos, predominava o regime autoritário de direita, que entre alguns de
seus protagonistas, destacava-se com acentuada participação, a repressão política.
114
A política de contração dos salários (“arrocho salarial”) é a tônica durante todo o
período autoritário, mesmo na fase de acelerada expansão econômica. A exceção
ocorre em relação aos altos salários para profissionais e administradores
(executivos) na fase “gorda” dos anos setenta que, acompanhando o
extraordinário crescimento da economia, fazem o paraíso da classe média alta.
No mais, o rígido controle dos salários, com reajustes geralmente inferiores aos
índices da inflação, excluem os assalariadas dos frutos do crescimento
econômico, coletivamente produzido, e reforçam a lucratividade das empresas,
pela apropriação capitalista da mais-valia, possibilitando a estas uma mais rápida
acumulação de capital e a expansão de seus negócios. Com tal política,
persistentemente mantida, amplia-se a transferência de renda do trabalho para o
capital
45
.
Oportunamente, aproveitando a alusão feita pelo citado autor aos
“assalariados”, para efeito puramente comparativo, recorremos aos dados da pesquisa
industrial anual de abrangência nacional, uma vez que para as unidades da federação, os
dados gerais são mais agregados, ou seja, não permitem maior detalhamento -, para
examinar, no período de 1996 ao ano de 2002, o comportamento das empresas do ramo de
fabricação de calçados do Brasil quanto: ao número médio de pessoal ocupado assalariado
ligado à produção no ano, salários, retiradas e outras remunerações de pessoal assalariado
ligado à produção, e receita total, de modo a estabelecer relações entre estas variáveis e
suas respectivas variações no período.
TABELA 29: Brasil, fabricação de calçados, número médio de pessoal assalariado ligado
à produção, salários e receita total 1996 a 2002
ANO
Número médio de
pessoal ocupado assal.
ligado à prod. no ano
Salários, retiradas e
outras remun. de
pessoal assalar. ligado
à produção (mil reais)
RECEITA TOTAL
(MIL REAIS)
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
195.231
181.400
179.383
205.555
237.329
270.343
276.190
791.764
762.674
748.746
864.303
1.055.375
1.297.044
1.487.019
6.316.525
6.522.709
6.279.765
8.253.104
9.409.468
11.426.490
13.353.775
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do IBGE (SIDRA) Pesquisa Industrial Anual (PIA).
45
BRUM, Argemiro J. O desenvolvimento econômico brasileiro. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 1995, p.
160.
115
Comparando apenas o ano de 2002 com o ano de 1996, as três variáveis
descreveram trajetórias de sinal positivo, posto que o número médio anual de pessoal
assalariado ligado à produção aumentou de 41,4%, os salários, retiradas e outras
remunerações de pessoal assalariado também ligado à produção nominalmente cresceu em
torno de 87,9%. Contudo, bem acima da expansão dos salários, foi a expansão registrada
na variável receita total cujo aumento totalizou 111,4% no período.
TABELA 30: Brasil, fabricação de calçados, relação e variação do pessoal assalariado,
salários e receita total 1996 a 2002.
VARIAÇÃO PERCENTUAL ANO SAL./P.ASS.
1
(EM REAIS)
R.T./P.ASS.
2
(EM REAIS)
(1)* (2)**
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
4.055,52
4.204,38
4.174,01
4.204,73
4.446,89
4.797,77
5.384,04
32.354,11
35.957,60
35.007,58
40.150,34
39.647,36
42.266,64
48.349,96
-
3,67
(-0,72)
0,74
5,76
7,89
12,22
-
11,14
(-2,64)
14,69
(-1,25)
6,61
14,39
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados do IBGE (SIDRA) Pesquisa Industrial Anual (PIA).
1. Sal. / P. ass.: salários, retiradas e outras remunerações por pessoal assalariado ocupado no ano ligado à
produção; 2. RT / P. ass: receita total por pessoal ocupado assalariado ocupado no ano ligado à produção.
1.* refere-se à variação percentual (Sal. / P.ass.)
2.** refere-se à variação percentual (R.T. / P.ass.)
Embora ambas as variáveis não tenham se comportado de maneira
uniforme, mesmo assim é nítido o movimento descrito pela relação (R.T. / P.ass.) receita
total por pessoal ocupado assalariado ligado à produção que cresceu 49,4%, em 2002,
comparativamente ao ano de 1996, enquanto a relação (Sal. / P. ass.) salários por pessoal
assalariado aumentou 32,8%, configurando ao que nos parece certa semelhança com o que
ocorrera entre 1970 e 1984 com o salário médio real e a produtividade, evidenciando
transferência de renda do trabalho para o capital.
116
CAPÍTULO 3 COMPONENTES DO VALOR ADICIONADO DA
INDÚSTRIA DE CALÇADOS DO BRASIL: PRODUTIVIDADE,
EXCEDENTE ECONÔMICO E MARKUP DE 1990 A 1996
Mais uma vez, recorremos a outros estudos sobre a indústria de calçados
brasileira, como indicador importante para podermos verificar se uma empresa, ou, uma
indústria especificamente, configuram, ou não, o padrão da indústria nacional. Segundo,
porque a metodologia empregada para examinar a indústria nacional, será a mesma
utilizada para analisar aquela que de fato constitui o objeto deste trabalho.
A distribuição funcional da renda
46
, isto é, como a renda se distribui entre
diversos agrupamentos sociais, ou ainda, a proporção na qual esta se distribui entre os
fatores de produção (lucros, salários, juros), sem dúvida alguma, é um importante
instrumento de mensuração da distribuição do produto social da economia, visto que, dada
a proporção ou participação relativa de cada fator no produto total social, ficam definidos
inclusive os limites do crescimento da economia. Pois, quanto maiores forem as
46
DISTRIBUIÇÃO: modo como se processa a repartição da riqueza e dos bens socialmente
produzidos entre os indivíduos e entre os diversos segmentos da população em determinada
sociedade. O caráter e os mecanismos de distribuição do produto social variam de época para
época e dependem diretamente da organização da produção e da forma de propriedade nela
vigente [...] Há também a distribuição funcional, que recebeu atenção especial nas análises dos
economistas clássicos e que se refere à repartição do produto global entre os vários
agrupamentos sociais. Tal repartição, segundo esses economistas, relaciona-se diretamente com
a participação de cada grupo ou classe social no processo produtivo; relaciona-se também com a
propriedade dos fatores de produção e aparece sob a forma de juros, lucros, rendas e salários.
RENDA, Repartição da. [...] David Ricardo foi o primeiro a apontar a repartição da renda como a
principal questão da economia política. Segundo ele, a renda total da sociedade era distribuída
entre as classes de acordo com sua participação no processo produtivo. Haveria três classes
sociais: os proprietários da terra, os donos de estoque ou capital necessário ao seu cultivo e os
trabalhadores. A renda do trabalhador (salário) dependeria do valor dos produtos necessários para
sua subsistência. A renda do proprietário territorial seria determinada pela diferença entre os
custos de produção de cada propriedade e os preços dos produtos no mercado. A remuneração
paga ao capitalista seria determinada pela taxa de lucro, resultante dos preços dos produtos e das
taxas das diversas remunerações (salários, renda da terra, etc), que compõem o preço de custo.
(SANDRONI. op. cit., p. 179 e 521).
117
participações dos tributos, dos lucros e, dos juros, menor, será a participação dos salários,
conseqüentemente, menor será o consumo dos trabalhadores, o que por sua vez, limitará
sobremaneira o crescimento dos setores produtores de bens de salários, assim como,
definem-se outras expressivas questões de caráter social, como é o caso da reprodução das
condições materiais de subsistência do trabalhador, como também a sua permanência ou
não no mercado de trabalho, sobretudo do mercado formal.
Para complementarmos as análises sobre a indústria de calçados, adotamos
como referência aspectos que consideramos apenas mais relevantes evidentemente que
não pretendemos deste modo caracterizar que a obra fora isto não seja importante
inerentes à indústria de transformação dos EUA retratada por Josef Steindl
47
. Mais
recentemente, trabalho publicado e disponibilizado pelo IPEA (Instituto de Pesquisas
Econômicas Aplicada) da autoria de José Celso Cardoso Júnior
48
.
As análises de Steindl foram baseadas nos dados obtidos através do Censo
Industrial de 1899 a 1939 (devemos no entanto salientar que os dados não configuram
séries temporais ininterruptas, ou seja, existe quebra de seqüência) dos Estados Unidos da
América, entre os quais, selecionamos somente aqueles relacionados à indústria de
calçados.
Com base nos dados relativos ao ano de 1939, Steindl elabora para 87
diferentes classes de indústrias, um conjunto de TABELAs, cujos conteúdos reúnem
informações a respeito do número de estabelecimentos, valor agregado (expresso em 1000
US$) e, os salários dos trabalhadores como porcentagem do valor agregado. Contudo,
como o número de estabelecimentos está relacionado diretamente com o porte da planta
47
STEINDL, Josef Maturidade e estagnação no capitalismo americano. Tradução de Leda Maria
Gonçalves. São Paulo: Abril Cultural, 1983.
48
CARDOSO JR., José Celso. Geração e apropriação de valor adicionado na economia brasileira:
um estudo da dinâmica distributiva no período 1990 / 1996. Rio de Janeiro: IPEA TD/Textos para
Discussão, n. 733, junho de 2000.
118
no caso o porte da planta baseia-se na quantidade de pessoas empregadas -, o valor
agregado e, os salários como porcentagem do valor agregado, podem assim serem
verificados de acordo com o porte da planta.
TABELA 31: EUA, Indústria de calçados, número de estabelecimentos, valor agregado
(em 1000 US$) e salários como porcentagem do valor agregado (%), segundo o porte da
planta – 1939
Indústria de Calçados*
segundo o porte da
planta
1
Número de
estabelecimentos (E)
Valor agregado (em
1000 US$) (V.A.)
Salários como
porcentagem do V.A.
Sal/V.A. (em %)
De 5
a 19,9
De 20 a 49,9
De 50 a 99,9
De 100 a 249,9
De 250 a 499,9
De 500 a 999,9
De 1000 a 2499,9
De 2500 a 4999,9
De 5000 a além
89
90
101
161
179
205
197
44
4
490
1.543
3.614
13.079
31.149
71.904
146.347
64.369
13.649
59,0
55,7
57,1
58,0
57,2
53,7
52,1
53,1
43,8
Fonte: Steindl (1983) Elaborada e adaptada pelo autor.
* Indústria de calçados: exceto calçados de borracha
1
Porte da planta: definido de acordo com o número de pessoas empregadas.
De acordo com os dados relativos à indústria de calçados dos EUA no ano
de 1939, podemos constatar com certa regularidade, que o valor agregado descreve nítido
movimento ascendente de acordo com o porte do estabelecimento, isto é, o valor agregado
aumenta à medida que aumenta o porte da planta, no entanto, não percebemos
regularidade, quando examinamos os percentuais referentes aos salários como
porcentagem do valor agregado segundo o porte da planta. Todavia, verificamos ainda, que
a participação relativa dos salários no valor agregado é maior nas fábricas de menor porte
e, que nas plantas de maior porte, a sua participação é relativamente menor.
119
TABELA 32: EUA, Indústria de calçados, participação relativa de salários no valor
agregado (em %) – 1899 – 1939
Ano
Participação Relativa de
Salários no V.A.* (%)
1899
1904
1909
1914
1919
1921
1923
1925
1927
1929
1931
1933
1935
1937
1939
64,7
56,4
56,0
55,2
47,9
52,7
53,0
50,9
50,0
49,4
51,7
53,3
55,7
55,4
54,0
Fonte: Stindl (1983), Elaborada pelo autor
* V.A.: valor agregado
Comparando o ano de 1939 com o ano de 1899, os salários como
porcentagem do valor agregado apontaram nítida redução, apesar de que ao longo do
período examinado por Steindl o seu comportamento foi regular não descrevendo
oscilações tão significativas.
A participação de salários no valor agregado foi calculada em 87 indústrias,
selecionadas principalmente pelo seu porte e sua importância [...] Os resultados
são os seguintes: para 17 indústrias, a participação de salários diminui em quase
toda a extensão (exceção feita a pequenas irregularidades). [...] em três das
indústrias concorrenciais, têxteis, de madeira e couro, não há tendência
persistente e a longo prazo para um declínio na participação dos salários
49
.
Devemos no entanto ressaltar, que entre as excepcionalidades as quais se
referia Steindl, quanto ao problema da participação dos salários no valor agregado ter
diminuído em 17 indústrias em “quase toda a extensão” a “exceção de pequenas
irregularidades”, a indústria de calçados se enquadrava nesta situação de exceção, ou seja,
49
STEINDL, op. cit., p.40-101
120
não havia para este ramo da atividade econômica industrial evidência de que os salários
enquanto porcentagem do valor agregado tenderiam a um movimento de queda. Após este
resumido retrospecto da indústria de calçados norte-americana, notadamente da questão
relacionada aos salários enquanto proporção do valor agregado, no período de 1899 a
1939, voltamos a examinar a indústria brasileira de calçados através do trabalho
anteriormente mencionado da autoria de José Celso Cardoso Júnior.
O estudo sobre geração e apropriação do valor adicionado na economia
brasileira na década de 90, investiga a dinâmica distributiva setorial da repartição do valor
adicionado (1990 a 1996), apoiando-se em termos teóricos na Teoria da Formação dos
Preços de Kalecki, e a pesquisa empírica, baseou-se nos dados fornecidos pelo IBGE
Sistema de Contas Nacionais / Matriz Insumo Produto (SCN / MIP).
O fenômeno da apropriação do valor adicionado é investigado com base na
evolução dos markups setoriais médio calculados como a relação entre o valor da
produção setorial e os respectivos custos diretos, isto é, consumo intermediário
mais remunerações. O conceito de markup é entendido, fundamentalmente, como
resultado do processo dinâmico de repartição da renda gerada na economia entre
rendimentos do capital (EOB) e rendimentos do trabalho
50
.
Assim, entendemos que, dada a participação dos salários e, dos rendimentos
do capital, num determinado ramo da atividade econômica, a apropriação do produto deste
mesmo ramo por estes dois agentes econômicos (trabalhadores e capitalistas industriais),
em termos específicos, nos mostrará, de acordo com as proporções apuradas, o tradicional
conflito distributivo entre o capital e o trabalho, assim como, quando os salários são
comprimidos por outras razões, entre as quais, podemos citar os lucros auferidos pelos
produtores.
50
JUNIOR, op. cit., p. 1.
121
Para a América Latina, o resultado combinado de uma margem de lucro maior e
de uma relação produto / capital menor é uma taxa de lucro aproximadamente
duas vezes e meia maior que a taxa de lucros dos países industrializados [...] Se o
salário na América Latina fosse correlato a seu nível de produtividade relativa,
sua margem de lucro certamente se reduziria a nível se sua relação capital-
produto. O salário abaixo do nível de produtividade é o preço que a América
Latina paga por uma taxa de lucro duas vezes maior que a taxa vigente nos
países industrializados
51
.
Apesar dos períodos terem sido totalmente diferentes, Steindl ao examinar a
indústria norte-americana entre 1899 e 1933, e Kilsztajn analisando a economia da
América Latina e países industrializados nos anos de 1985 e 1990, ambos verificaram sob
prismas diferentes o problema do peso dos salários no valor agregado de um conjunto de
indústrias. Podemos constatar que nos países industrializados do primeiro mundo, a
participação dos salários é relativamente alta (no valor agregado e no PIB), inversamente é
sem dúvida o que acontece no Brasil.
Com o propósito de apurar como se processou na indústria de calçados
brasileira a distribuição do produto gerado por este ramo da indústria de transformação
entre salários e lucros ressaltando que os lucros aparecerão na forma de (EOB) excedente
operacional bruto -, assim como, outros indicadores, tais como, produtividade do
trabalhador, markup, razão entre os custos diretos, adotamos como referência a mesma
metodologia utilizada por Cardoso Jr.
Portanto, para calcularmos os indicadores mencionados baseamo-nos nas
seguintes fórmulas:
i) a produtividade do trabalhador (p) foi obtida pela divisão do VA (Valor Adicionado)
pelo PO (Pessoal Ocupado), ou, p = V.A. / P. O., (a produtividade no caso é monetária e
não física);
51
KILSZTAJN, Samuel. Produto, capital e taxa de lucro: países industrializados e América Latina.
Revista de Economia Política, vol. 18, n.º 3 (71), jul-set 1998, p. 68.
122
ii) os markups foram calculados a partir do modelo de Kalecki, assim, K (markup) é o
resultado do VP (Valor da Produção) dividido pela soma das remunerações (Rn) mais o CI
(consumo intermediário), ou seja, K = VP / Rn + CI;
iii) a razão entre os custos / variáveis (J) resulta da divisão do CI (Consumo Intermediário)
pelas Rn (remunerações), isto é, J = CI / Rn; e
iiii) o EOB (Excedente Operacional Bruto) obtém-se através da diferença do V. P. (Valor
da Produção) menos o CI (Consumo Intermediário) menos as Rn (Remunerações) menos
outros impostos sobre a produção (OIi: outros impostos indiretos), mais outros subsídios à
produção (OSp) menos o rendimento dos autônomos (R.A.), ou, podemos expressa-lo as
seguinte maneira:
EOB = V.P. (CI + RN) (OII + OSB) RA
As (Rn) remunerações totalizam os salários dos trabalhadores mais as contribuições sociais
como a previdência oficial (FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, a
previdência privada etc).
TABELA 33: Brasil, Fabricação de calçados, componentes do valor adicionado em
valores correntes 1990 a 1996.
Operações 1990
A
1991
A
1992
A
1993
A
1994
B
1995
B
1996
B
1. V.A.B.*
2. RN
3. E.O.B.**
4. O.Ii
5. Osb
6. V.P.
7. C.I.
120619
81528
37231
6495
-6497
423445
302826
597138
351100
262216
24364
-46729
1901936
1304798
7859434
3364817
5476932
240369
-1272801
20852255
12992821
178993
78900
94120
8587
-3648
480158
301165
1239925
614062
622651
107795
-110872
3518950
2279025
1880150
940754
795193
186455
-51219
5384219
3504069
2121415
1103207
876284
207396
-74914
6032761
3911346
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do IBGE Sistema de Contas Nacionais / Matriz Insumo
Produto.
Nomenclatura: 1. V.A.B. = Valor Adicionado Bruto; 2. R. N. = Remunerações; 3. E.O.B. = Excedente
Operacional Bruto; 4. O.I.i. = Outros impostos sobre a produção; 5. Osb = Outros subsídios à produção; 6.
V.P. = Valor da produção; 7. C.I. = Consumo intermediário
* Valor Adicionado Bruto = resulta da diferença entre o valor da produção menos o consumo intermediário
(V.A.B. = V.P. C.I.)
** Excedente Operacional Bruto = neste caso optamos por não considerar o rendimento dos autônomos.
A = em CR$ 1 000 000; B = em R$ 1 000
123
Antes de mostrarmos o resultado obtido referente ao cálculo dos indicadores
mencionados, convém ressaltar que, como pretendemos apenas examinar as relações entre
as variáveis, não procedemos desse modo à atualização dos referidos valores.
TABELA 34: Brasil, fabricação de calçados, produtividade, markup, razão entre custos,
pessoal ocupado, remunerações e excedente operacional bruto como proporção do valor
adicionado bruto 1990 a 1996
Anos
Pessoal
Ocupado
p K J
RN / VAB
(%)
EOB/VAB
(%)
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
433700
406800
406300
428100
403100
360500
344000
2781,1
1467,8
19343,8
4181,1
3075,9
5215,3
6166,9
1,101
1,148
1,274
1,263
1,216
1,211
1,203
3,714
3,716
3,861
3,817
3,711
3,724
3,545
67,5
58,7
42,8
44,1
49,5
50,0
52,0
30,8
43,9
69,7
52,6
50,2
42,2
41,3
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE Sistema de Contas Nacionais Matriz Insumo
Produto.
Nomenclatura: p = produtividade monetária do trabalhador; K = markup; J = razão entre os custos diretos;
RN / VAB = porcentagem das remunerações sobre o valor adicionado bruto; EOB / VAB = porcentagem do
excedente operacional bruto sobre o valor adicionado básico.
Importante ressaltar, que no estudo de Cardoso Jr., sobre a geração e
apropriação do valor adicionado, o autor analisou a evolução da produtividade, dos
markups, da razão entre os custos diretos e as remunerações e, do excedente operacional
bruto do complexo industrial têxtil, couros e calçados, assim sendo, as suas constatações
são válidas apenas para este grupo de indústrias. No caso específico da indústria de
calçados, podemos dos dados obtidos (apurados), verificar que:
i) houve no período observado de sete anos, uma redução em termos absolutos, de 89.700
pessoas ocupadas na fabricação de calçados, ou ainda, em termos porcentuais, ocorreu uma
diminuição de 20,6% no número de pessoas empregadas;
124
ii) a produtividade (p) não configura em razão das variações monetárias certa regularidade,
contudo, a partir de 1994, sua trajetória é nitidamente crescente, ao contrário do pessoal
ocupado;
iii) quanto ao comportamento do markup (K), recorremos às observações feitas por
Cardoso Jr
52
, uma vez que, no nosso ver, a indústria de calçados configurou o mesmo
comportamento descrito para o complexo têxtil, couros e calçados;
iiii) a razão entre os custos intermediários e as remunerações, isoladamente configurarão
comportamento bem estável ao longo do período examinado, porém, quando comparamos
a sua movimentação com o comportamento do markup, verificamos que quando o markup
aumenta a razão entre os custos intermediários e as remunerações também aumenta e, vice-
versa
53
; e
iiiii) as remunerações e o excedente operacional bruto enquanto percentuais do valor
adicionado bruto (RN / VAB e EOB/VAB), descreveram um movimento de alternância,
posto que, o aumento de um, resultou da diminuição do outro, sendo a recíproca também
verdadeira.
Outro aspecto que julgamos relevante ser destacado relaciona-se ao
comportamento apenas dos salários desprezando deste modo as contribuições sociais e
52
Considerando o cálculo do markup para a economia brasileira como um todo, é surpreendente o
comportamento contracíclico descrito entre 1990 e 1996. Durante a recessão do início da década,
ele subiu a taxas decrescentes até 1993, recuou com a retomada do crescimento em 1994/95 e
voltou a esboçar outra expansão no biênio 1995/96, quando a economia retrocedeu. Dentre os
principais segmentos da atividade econômica, o comportamento dos markups revela uma
tendência algo kaleckiana entre 1990 e 1996. No caso da indústria, eles sobem a taxas
decrescentes durante a recessão do início da década e arrefecem o ritmo com a volta do
crescimento positivo do produto [...] Em primeiro plano estão os complexos industrial extrativo e
mineral não-metálico; papel, papelão, editorial e gráfico, têxtil, couros e calçados, que tiveram
suas margens de lucro comprimidas ao longo de praticamente todo o período, muito
provavelmente pelo acirramento da concorrência externa. Não por acaso, esses complexos
industriais foram também os que mais perderam participação relativa em termos de massa de
lucros. (CARDOSO JR., op. cit., p. 43).
53
As implicações distributivas do comportamento dos markups dependem ainda do
comportamento observado para a relação entre os custos intermediários e as remunerações
(razão “custos / variáveis). [...] Ela expressa o confronto entre os principais componentes de custo
para as empresas e, de maneira agregada, para os setores e complexos da atividade econômica.
(CARDOSO JR., op. cit., p. 46).
125
efetivas, ou seja, previdência oficial (FGTS, PIS / PASESP) etc, - e do consumo
intermediário como porcentagens, ou, proporção do valor da produção (Sal / VP e CI / VP)
respectivamente, uma vez que, isoladamente estes dois componentes do custo direto,
podem fornecer-nos algum subsídio para compreender de uma outra forma o
comportamento da razão “custos / variáveis”, medidos anteriormente como porcentagens
do valor adicionado bruto, ressaltando ainda o peso que o consumo intermediário mais as
remunerações representam para as empresas, assim como, para as indústrias conforme
Cardoso Jr. afirma em relação ao “setores e complexos da atividade econômica”.
TABELA 35: Brasil: fabricação de calçados, salários e consumo intermediário como
proporção do valor da produção: 1990-1996.
Anos W / VP
1
(%)* CI / VP
2
(%)
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
17,0
15,3
13,7
14,0
15,1
14,8
14,6
71,5
68,6
62,3
62,7
64,8
65,0
64,8
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados do IBGE Sistema de Contas Nacionais Matriz
Insumo Produto
1. W / VP = salários em porcentagem do valor da produção
2. CI / VP = consumo intermediário como porcentagem do valor da produção
* refere-se somente ao valor dos salários exceto as contribuições sociais.
Conforme já dissemos, sobre o peso que estes dois componentes (salários e
consumo intermediário) dos custos diretos representam nos custos totais das empresas, no
período observado, ambos, na média, somaram 80,6%, restando, desse modo, pouco menos
de 20,0% para os denominados custos indiretos. Comparando o ano de 1996 com o ano de
1990, tanto os salários, como o consumo intermediário, sinalizaram queda, os salários
caíram bem mais, 14,1%, conquanto o consumo intermediário registrou queda de 9,3%.
Outro aspecto também relevante relaciona-se ao reduzido percentual dos salários no valor
126
da produção, frente à altíssima participação relativa do consumo intermediário, o que nos
faz acreditar que variações dos preços do consumo intermediário (matéria-prima,
componentes, materiais auxiliares, energia elétrica) devam refletir de forma negativa sobre
os salários.
Examinaremos agora, o comportamento conjunto de três indicadores:
markup, a participação relativa dos salários e, do consumo intermediário, no valor da
produção, pois acreditamos que tal procedimento, nos ajuda a compreender de forma mais
transparente, a estratégia adotada no caso do setor de fabricação de calçados, relativamente
à política de preços
54
.
TABELA 36: Brasil, fabricação de calçados, markup, salários e consumo intermediário
como porcentagem do valor da produção 1990 a 1996
Anos K W / VP (%) CI / VP (%)
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1,101
1,148
1,274
1,263
1,216
1,211
1,203
17,0
15,3
13,7
14,0
15,1
14,8
14,6
71,5
68,6
62,3
62,7
64,8
65,0
64,8
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do IBGE Sistema de Contas Nacionais Matriz Insumo
Produto
K = markup; W / VP = salários como porcentagem do valor da produção; CI / VP = consumo intermediário
como porcentagem do valor da produção
54
O preço de uma empresa qualquer, então, deve ser um múltiplo K dos seus próprios custos
diretos unitários, de tal sorte que, segundo Kalecki, quanto maior o grau de monopólio de uma
empresa no mercado em que atua, maior poderá ser o seu markup, e, portanto, maior será a
distância entre preços e custos (p/u). O grau de monopólio deve ser entendido como a
manifestação da “capacidade que tem a empresa de administrar preços a partir de uma dada
estrutura de custo de produção, como também de planejar o remanejamento da utilização da
capacidade produtiva ante modificações da demanda por seus produtos. Como expressão do
markup, o grau de monopólio se converte em um conceito muito útil para expressar os efeitos
complexos da estrutura e dinâmica competitiva em seu impacto sobre preços e distribuição, na
medida em que não se limita à concorrência entre empresas no mesmo mercado, mas engloba o
processo de apropriação de renda associado às relações capitalistas intersetoriais e às relações
de classe; é, por assim dizer, uma variável-síntese das implicações da estrutura competitiva sobre
o processo de apropriação da renda em cada indústria. Nesse sentido, estabelece-se a correta
relação entre grau de monopólio e markup: “o markup reflete o grau de monopólio e pode ser visto
como a relação entre o valor da produção e o valor dos custos diretos de um dado ramo industrial.
(CARDOSO JR., op. cit., p. 41).
127
FIGURA 11: Brasil, fabricação de calçados, markup, salários e consumo intermediário
como proporção (em %) do valor da produção: 1990 – 1996
Fonte: Elabora pelo autor
K= markup; W/VP = salaries omo porcetagem do valor da produção; CI/VP= consumo intermediário como
porcentagem do valor da produção
Nitidamente, onde podemos visualizar que, quando o markup descreve
trajetória de expansão, os custos diretos (salário e consumo intermediário), em sentido
contrário, experimentam suave movimento de redução (1991-1992), inversamente, quando
o markup sofre compressão (1993-1996), a participação relativa dos custos diretos, como
proporção do valor da produção, volta a aumentar.
Diante disto, acreditamos, a priori, que os ganhos obtidos de produtividade
pelo ramo de fabricação de calçados, no período de 1990 a 1996, foram resultantes de uma
estratégia centrada na administração dos custos da produção sobressaindo os custos
intermediários e os salários -, e, dos preços dos produtos, uma vez que, na defesa e
manutenção dos seus respectivos markups, a alternativa encontrada, entre outros
expedientes, foi, senão, a compressão dos salários simultaneamente à dos custos
representados pelo consumo intermediário, tudo isto, motivado, principalmente, pelo
acirramento da concorrência interna, combinada com a ampliação da competição externa
no quadro da abertura econômica do país.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996
ANOS
W/VP, CI/VP(%)
1,000
1,020
1,040
1,060
1,080
1,100
1,120
1,140
1,160
1,180
1,200
1,220
1,240
1,260
1,280
K
W/VP (%)
CI/VP (%)
K
128
3.1 RETROSPECTIVA DA ECONOMIA BRASILEIRA: DA
CONJUNTURA INFLACIONÁRIA PARA A ERA DA
ESTABILIDADE
Examinamos a indústria brasileira de transformação, do mesmo modo, que a
partir de dados gerais sobre a estrutura de custos / despesas e receitas procedemos em
relação à indústria brasileira de calçados. Contudo, até então, não nos detivemos em
examiná-las num quadro conjuntural mais amplo, suscetível de, pelo menos captar, com
dada simplificação, as mudanças experimentadas e vivenciadas pela economia brasileira na
década de 90, sobretudo pelo período compreendido entre os anos de 1994 até o ano de
2002, para não divergir do período em que a indústria de calçados também foi submetida à
apreciação.
A conjuntura que se instalou na economia brasileira, a partir de 1994,
marcou a transição da economia da era da inflação com proteção dos anos oitenta, para
uma nova fase, na qual, entre outros objetivos da política econômica, podemos, com certa
notoriedade, identificar a questão da estabilidade com abertura comercial.
No quadro vivido pela economia brasileira na década de 80, de economia fechada ao
exterior e vigência de taxas elevadas de inflação, “as firmas possuem um viés altista
na determinação dos markups desejados. A pressão altista exercida sobre o nível dos
markups desejados pode ser explicada pela existência de uma assimetria na
percepção privada do ônus implícito associado ao risco de uma empresa em cometer
uma avaliação equivocada para cima [risco de renda] ou para baixo [risco de
capital] sobre a evolução futura dos preços das mercadorias requeridas para
promover a reposição do nível desejado de estoques. [...] Em outras palavras, dada a
grande volatilidade das principais variáveis macroeconômicas durante os anos 80, as
empresas eram compelidas a constantemente remarcar para cima suas previsões
quanto à evolução futura dos seus próprios preços, sob pena de incorrer ou no “risco
de capital” ou no “risco de renda”. Aos olhos das empresas privadas, os prejuízos
associados ao “risco de capital” tendiam a superar, no contexto dos anos 80, o “risco
de renda” decorrente das decisões de preços que tinham de ser tomadas em curtos
períodos de tempo, enquanto prevaleciam a instabilidade do cenário
macroeconômico e o desconhecimento do futuro, favorecendo a opção por um
comportamento defensivo e altista dos markups desejados.
55
.
55
CARDORSO JR. no que trata do risco de capital e do risco de renda oferece-nos a seguinte
explicação: “No primeiro caso, a empresa arcaria com uma perda patrimonial real decorrente de uma
política de remarcação de preços que teria subestimado a evolução futura dos preços de seus insumos
e demais componentes de consumo intermediário. No segundo caso, a empresa obteria um nível de
lucros correntes inferior ao esperado devido a uma política de remarcação exagerada de seus próprio
preços vis-à-vis a evolução dos preços dos concorrentes, podendo dar origem inclusive a uma perda
temporária de seu markt share. (CARDOSO JR., op cit., p. 42).
129
De fato, o próprio ambiente macroeconômico que se instalou no Brasil, durante
os anos oitenta, induzia os agentes econômicos, os produtores, a remarcarem para cima das
expectativas inflacionárias, os preços dos produtos. Em razão das incertezas e também da
própria volatilidade da economia. Somados a isto, é preciso incluir no rol dos problemas
econômicos que, a economia brasileira, independentemente do grau de sua respectiva abertura
(medida pela média da soma dos percentuais das exportações e das importações sobre o
produto interno bruto), contava com certo protecionismo por parte de medidas adotadas na
esfera do governo federal, tais como, Lei da Similaridade Nacional, Lei de Reversa de
Mercado etc; e outros expedientes (como é o caso do das desvalorizações cambiais) que
estimulavam as exportações e inibiam as importações. Aliás, o estímulo às exportações e as
restrições às importações decorria da imperiosa necessidade de geração de saldo comercial
positivo (exportação menos importação) indispensável para o enfrentamento da crise externa,
na qual se encontrava a economia do país. Por sua vez, o próprio circuito no qual se inseriu a
economia brasileira nos anos oitenta, como resultado das elevadas taxas de inflação,
permitiram que a moeda em curso no país (CR$), face ao movimento geral dos preços,
sofresse contínua correção do seu respectivo valor nominal, resultando, deste modo, por parte
do governo federal, da adoção no âmbito da política econômica, de uma política de
desvalorização
56
da própria moeda frente a outras moedas. Assim, em razão da prática de
políticas monetárias e cambiais, entre outras, caracterizadas pela adoção do expediente de
desvalorização, passaram a estimular o setor externo da economia, mesmo porque, pelo fato da
moeda nacional (CR$) configurar continuada depreciação do seu valor, a mesma, ao tornar-se
56
DESVALORIZAÇÃO: Redução oficial do valor real da moeda de um país em relação a moedas
estrangeiras. Na maioria dos casos, essa operação tem o objetivo de eliminar o déficit acumulado
no balanço de pagamentos por meio de mecanismos de depreciação cambial. Decidida pelas
autoridades monetárias, essa medida tem efeito de tornar mais caras as importações, inibindo-as,
e de estimular as exportações, uma vez que o exportador recebe mais unidades de moeda
nacional para cada unidade de moeda estrangeiras convertida à nova taxa de cambio. Além disso,
a desvalorização tende a produzir fortes pressões inflacionárias. (SANDRONI, op. cit., p. 172.)_
130
mais barata frente a outras moedas sobressaindo as moedas de economias mais estáveis
e industrializadas, ou seja, do mundo desenvolvido acaba ficando mais competitiva (no
caso, referimo-nos ao conceito de competitividade tradicional baseado principalmente na
redução dos custos da produção), tornando-se por sua vez, mais atrativa, traduzindo-se na
forma de estímulo à importação por parte de outros países, conseqüentemente promovendo
a expansão das exportações da economia cuja moeda fora depreciada.
Contudo, da mesma forma que a desvalorização da moeda produz efeitos
significativamente benignos para a economia, no sentido do aumento das exportações
(emprego, renda, saldo comercial etc) provoca efeitos também significativamente
perversos. Pois, pelo fato da desvalorização da moeda torná-la mais barata em relação a
outras moedas estrangeiras, as importações acabam por sua vez, ficando mais caras. Diante
disto, o encarecimento das importações, pode inviabilizar a aquisição de máquinas e
equipamentos (bens de capital) mais modernos e tecnologicamente mais sofisticados do
exterior. Isto, em muito contribuiria negativamente, para que economias atrasadas (em
termos de tecnologia) e, dependentes da importação desta categoria de produtos possam
melhorar a sua competitividade e, ao mesmo tempo, em razão da obsolescência , (das
maquinas , equipamentos) manterem-se de alguma forma atualizadas.
TABELA 37: Brasil, PIB, exportações e importações (em US$ bi) e grau de abertura da
economia segundo décadas 1950 a 1999
DÉCADAS
PIB (US$ BI)
EXPORTAÇÃO
(US$ BI)
IMPORTAÇÃO
(US$ BI)
ABERTURA
ECONÔMICA
1950-1959
1960-1969
1970-1979
1980-1989
1990-1999
15,3
25,4
123,1
261,9
584,8
1,4
1,6
8,3
25,5
42,7
1,2
1,4
9,7
16,9
39,1
8,5
5,9
7,3
8,1
7,0
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do MDICE Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior Exportação e Importação: em US$ bi (FOB) PIB, Exportação e Importação: média anual
da década
131
Não nos interessa examinar o comportamento da economia brasileira,
segundo os indicadores macroeconômicos e as décadas contemplados, mas sim apontar
para os valores médios anuais das exportações e das importações (em US$ bi / FOB), entre
os anos de 1980 e 1989. Apesar da média do grau de abertura da economia (grau de
abertura da economia é medido pela participação relativa da média aritmética do somatório
das exportações + importações, em relação ao PIB (Ministério do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior) ter sido menor do que aquele praticado na década de 1950,
é notório o tamanho do saldo comercial (exportações menos importações) daquela década
(1980), comparativamente ao período subseqüente (década de 1990), o qual, por seu turno,
experimentou um grau de abertura bem menor, próximo do período denominado por
“milagre econômico”, ocorrido nos anos setenta.
O Brasil dos anos 80 é muito diferente do Brasil dos anos 50, 60 e 70. O
endividamento do Estado é, hoje, muito alto. A dívida interna do Estado,
incluindo as empresas estatais, representa 48,1% do PIB em 1985. [...] A
economia brasileira enfrenta nos anos 80 a mais grave crise de sua história
industrial uma crise definida a longo prazo pela estagnação da renda por
habitante nesta década e, a curto prazo, por taxas de inflação [...] aproximam-se
perigosamente da hiperinflação
57
.
Há, contudo, que ressaltar que, além da crise fiscal do Estado brasileiro, o
circuito inflacionário no qual ingressara a economia do país produziria efeitos, sem dúvida,
negativos para o conjunto da atividade produtiva, mas, com certeza e, em bem maiores
proporções para a população, sobretudo para a classe trabalhadora, na forma de os
aumentos sucessivos de preços dos bens de forma geral corroerem o poder aquisitivo do
trabalhador, principalmente, dos assalariados de baixa renda.
57
PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A crise do Estado: ensaios sobre a economia brasileira. São
Paulo: Nobel, 1992, p. 50, 55.
132
TABELA 38: Brasil, salário e produtividade (1970 = 100) 1970 a 1984
ANO SALÁRIO MÉDIO REAL
PRODUTIVDADE*
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984**
100
102
106
111
111
120
127
129
139
142
137
133
152
134
115
100
109
118
130
139
143
152
157
160
165
176
171
169
159
162
Fonte: Bresser Pereira (1992)
* Produtividade = aumento na renda per capita
** Dados para o primeiro semestre de 1984
FIGURA 12: SALÁRIO E PRODUTIVIDADE
100
110
120
130
140
150
160
170
180
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
Salário médio real
Produtividade
FONTE: Elaborado pelo autor segundo Bresser-Pereira, ano (1992)
133
É visível o aumento da produtividade proporcionalmente ao aumento do
salário médio real, a distância que os separa reflete, em parte, um dos grandes entraves
estruturais da economia brasileira patrocinado senão pelo conflito distributivo entre
salários e lucros, posto que os ganhos de produtividade não são repassados nem para os
preços dos produtos na forma de redução, nem para os salários no sentido de melhorar a
distribuição do produto social da própria economia.
O conseqüente aumento na taxa de mais-valia certamente resultou num aumento
da taxa de lucro. De 1974 a 1978, a taxa de aumento da produtividade
desacelerou-se e os salários aumentaram sua taxa de crescimento [...] Por essa
razão, durante os quinze anos que estou examinando, apenas nos primeiros
quatro anos (1970-1974) a relação lucro-salário, ou produtividade-salário, foi
altamente favorável ao capital. Desde 1975, a relação entre capital e trabalho
parece ter estado mais ou menos estabilizada. A diminuição da taxa de lucro
desde 1978 não pode ser explicada pelos aumentos de salários acima da
produtividade
58
.
O que é ainda pior é que a compressão dos ganhos da classe trabalhadora
mediante a relação salário-preço, além de reduzir o poder de compra, deteriora as
condições de reprodução da própria força de trabalho. Por outro lado, a redução dos
salários do trabalhador implica a contenção dos seus próprios gastos, isto é, a diminuição
do seu próprio consumo, o qual, por conseguinte, acaba senão por restringir e limitar as
possibilidades de crescimento da própria economia na perspectiva do crescimento para
dentro, ou seja, do mercado doméstico. Em alguns casos, dada a amplitude da renda da
população, além dos limites que esta promove sobre as possibilidades de crescimento da
economia, devemos ressaltar ainda, que a mesma, impede, ou, restringe o investimento
capaz de pelas vias da modernização e, da inovação, ampliar a capacidade de oferta da
própria economia.
Acreditamos, outrossim, que a década de 1980, além dos perversos
sintomas produzidos pela conjuntura inflacionária sobre a sociedade brasileira, em especial
a classe trabalhadora assalariada, tenha, sem sombra de dúvida, provocado outros sintomas
58
BRESSER-PEREIRA, op. cit., p. 48.
134
deletérios sobre a economia, notadamente no que se relaciona aos investimentos produtivos
traduzidos pela modernização do aparelho produtivo nacional, uma vez que, o circuito
financeiro induzia (pelos ganhos de curto prazo) os empresários a deslocarem os
investimentos produtivos, para a especulação financeira. Por outro lado, o processo
inflacionário instalou juntamente com os expedientes da política econômica uma
cultura entre os produtores nacionais que, em quase, nada despertava a sensibilidade dos
mesmos quanto às questões relacionadas aos custos da produção, aprimoramento da
qualidade, modernização e/ou atualização tecnológica, qualificação da mão-de-obra etc;
mesmo porque, além do mais, a economia estava sob regime ainda que provisório de
proteção das ameaças externas. Assim, o rompimento dos vínculos do empresariado
nacional com a cultura inflacionária e o regime de proteção, não poderia deixar de ser (em
razão da calibragem das medidas que seriam posteriormente adotadas) traumática, tanto
para os empresários, como para os trabalhadores. Diferentemente do que acontecera na
economia brasileira da década de 1980, era da inflação, seria, sem margem de dúvida, a
década subseqüente, marco inaugural de transição, da inflação com proteção, para a era da
estabilidade com abertura da economia.
Por sua vez, nos anos 90 o cenário macroeconômico se altera profundamente,
dando origem a um padrão diverso de formação de preços, em que a abertura
comercial impõe um limite superior à remarcação para cima dos markups: “o
viés altista defensivo e decorrente do ambiente de elevada instabilidade
macroeconômica e aceleração inflacionária contrapõe-se à pressão competitiva
exercida pelo acirramento da concorrência externa em um quadro de diminuição
significativa da proteção da indústria nacional.” [...] Isto porque modificam-se os
parâmetros a partir dos quais as empresas decidem seus markups, premidos pela
concorrência externa, quando “a determinação dos markups desejados ex-ante
depende da evolução dos preços internacionais, da evolução esperada da taxa de
câmbio nominal e do nível de proteção da indústria [...] A lógica da formação de
preços por meio dos markups continua, não obstante, válida para o conjunto dos
agentes privados em operação no país, a despeito da suposta contestabilidade de
seus mercados antes cativos
59
.
Os dados gerais da indústria de transformação parecem confirmar, entre
outros aspectos, o quadro geral acima, pois, de acordo com os números expostos pela
59
CARDOSO JR., op. cit., p. 42.
135
Pesquisa Industrial Anual (PIA) para o período de 1996 a 2002, basta examinarmos a
relação entre custos e despesas totais frente à receita total, para verificarmos certo
estreitamento entre ambos. Este quadro, de alguma forma nos mostra os efeitos da política
econômica, isto é, dos expedientes adotados na sua esfera pelos responsáveis pela política
monetária, política fiscal e cambial, que além de consolidarem o objetivo pretendido de
estabilização dos preços, promoveram para a sua efetivação, o acirramento da
concorrência. O regime de apreciação da moeda nacional, conjugado com a redução das
alíquotas de importação, aumentaram de forma substancial o volume das importações,
ampliando sobremaneira a exposição da economia nacional à concorrência externa, ao
mesmo tempo em que a própria estabilização dos preços através da contenção do seu
movimento altista, promoveu significativa recuperação do papel do sistema de preços para
a economia, notadamente da mudança da cultura empresarial necessária para a preservação
da estabilidade dos preços.
Quando ao ambiente de maior competição promovida pela abertura comercial se
soma a fase da estabilidade monetária a partir de 1994, o impulso altista dos
markups proveniente do regime de alta inflação sofre nova pressão à baixa, pois
a “estabilização reintroduz a dimensão estratégica ao cálculo de formação de
preços das firmas líderes. Esse cálculo passa a envolver considerações acopladas
às perspectivas de crescimento de longo prazo das empresas e sua avaliação
sobre o nível de barreira à entrada [...] Assim, ao contrário da tendência
francamente altista comprovada para os markups domésticos ao longo dos anos
80 reflexo da estratégia de ajuste patrimonial das empresas privadas no Brasil
observa-se, durante a década de 90, um comportamento diferenciado tanto entre
os grande segmentos da atividade econômica como entre os complexos
industriais, que de resto reflete a reação de cada um aos fenômenos da abertura
comercial e da estabilização inflacionária em período recente
60
..
É válido e importante mencionar que, no âmbito da política econômica, o
objetivo de promover a estabilidade enquadra-se na categoria de objetivos conjunturais,
isto é, passíveis de serem atingidos no curto prazo, do mesmo modo, que são assim
classificados os objetivos de promoção do pleno emprego, e de melhoria no balanço de
pagamentos.
60
CARDOSO JR., op. cit., p. 42-43.
136
Quadro 2: Objetivos de política econômica
I) Principalmente de curto prazo
(Conjunturais)
Breve descrição
1. Pleno emprego
Inclui tantos os objetivos de curto prazo, para
reduzir o desemprego cíclico, quanto os de
longo prazo, para reduzir o desemprego
estrutural e friccional.
2. Estabilidade de preços
Este também tem sido principalmente um
objetivo de curto prazo, embora alguns países,
no final do período analisado, estivessem
começando a considerá-lo mais como
problema de longo prazo.
3. Melhoria no balanço de pagamentos
Tanto inclui a necessidade de curto prazo, de
proteger as reservas de ouro e de divisas,
como os objetivos de longo prazo, tais como
uma mudança estrutural na proporção das
exportações ou importações em relação à
despesa nacional.
Fonte: Kirchen (1975)
61
Contudo, no campo da economia aplicada, nem sempre a consecução de um
objetivo é possível simultaneamente aos demais, ou, até mesmo a um outro objetivo, uma vez
que pode ocorrer que a consolidação de um objetivo resulte, por conseqüência, do sacrifício de
outro, ou até mesmo, de outros. Diante disto, é provável que, em certos casos, perseguir e/ou
priorizar determinado objetivo de política econômica signifique, em razão de dadas restrições
(técnicas ou teóricas), sacrificar outro ou outros também importantes objetivos.
Devo deixar claro, desde logo, que, no meu entender, as perspectivas “do Real”,
na verdade, são as perspectivas de continuidade e consolidação de um processo
que permita, simultaneamente, alcançar três objetivos indissociáveis: (a)
preservar a inflação sob controle; (b) crescer de forma sustentada, com mudança
estrutural e aumento da produtividade média da economia; mais importante,
dado que (a) e (b) são meios e não fins em si mesmo, (c) continuar o processo de
melhora das condições de vida da maioria da população brasileira. Estes três
objetivos exigem a continuidade do processo de reestruturação produtiva, em
curso, de reorganização do Estado e aumento de sua eficiência operacional, em
particular nas áreas social e regulatória, e de reconstrução político-institucional
do país, visando à consolidação do Estado democrático de direito e ao
fortalecimento tanto das instituições do Estado quanto das associações da
sociedade civil
62
.
61
KIRSCHEN, E. S. Política econômica contemporânea. Tradução de Auriphebo Berrance
Simões. São Paulo: Atlas, 1975, p. 30.
62
MALAN, Pedro. Brasil: três finais de década. In: MAGALHÃES, João Paulo de Almeida;
MINEIRO, Adhemar dos Santos; ELIAS, Luiz Antonio (Orgs.). Vinte anos de política econômica.
Rio de Janeiro: Contraponto, 1999, p. 19.
137
Todavia, não podemos perder de vista, nem mesmo nos esquecer, de que o
processo de reestruturação produtiva da economia brasileira baseou-se e sustentou-se nos
alicerces da: desestatização da economia, que resultou da venda, isto é, da transferência de
controle gerencial, acionário e patrimonial de empresas de natureza pública, para o capital
privado (nacional ou estrangeiro); da desnacionalização da economia, resultante da venda e
conseqüente transferência gerencial, patrimonial e acionário de empresas de origem
privada para o capital estrangeiro, dos processos de fusão-aquisição, de relocalização da
indústria, e, daqueles processos suscetíveis de promoverem profundas mudanças nas
estruturas das empresas com vistas acima de tudo de consubstanciarem o objetivo de
redução dos custos da produção, tais como, os processo de terceirização e sub-contratação.
No que concerne à estabilidade dos preços, bem como a sua respectiva
manutenção, a conjugação dos instrumentos de ação econômica (fiscais, monetários e
cambiais) sem margem de questionamento, obtiveram expressivos resultados quanto à
compressão dos preços, uma vez que, tomando por base o INPC IBGE (Índice Nacional
de Preços ao Consumidor) apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística,
este indicador que se situava na casa dos 2.489,1%, no ano de 1993, caiu para 929,3%, em
1994, 22,0% em 1995, desacelerando-se progressivamente, até atingir, no ano de 1998, o
seu mais baixo nível, no acumulado no ano chegara a 2,5%. No entanto, a partir de 1999,
esboça também, até o ano de 2002, progressivo aumento, atingindo a casa dos 14,7% no
ano de 2002.
A consolidação da política econômica de estabilização dos preços adotada
pelos governos de FHC, - produziu significativo impacto de sinal positivo revertendo a
tendência de alta dos preços, ao mesmo tempo, que manteve em patamares relativamente
baixos outros índices de preços (IPC FGV, Índice de Preço ao Consumidor medido pela
Fundação Getúlio Vargas, IPCA Índice de Preços ao Consumidor do IBGE, INPC
138
IBGE, Índice Nacional de Preços ao Consumidor). Contudo, produziu significativa queda
da taxa real de crescimento do produto da economia (PIB Produto Interno Bruto), pois,
em média, o PIB crescera 6,1% nos anos de 1960; 8,7% na década de 1970; reduzindo sua
taxa real de crescimento para 3,0%, ao longo dos anos de 1980, para experimentar, durante
o período de 1990 até o ano de 1999, a anêmica taxa real de crescimento de 1,8%, ou seja,
a mais baixa de todas. A indústria de transformação, vivenciou, de 1995 até o ano de 2002,
alternadamente períodos de expansão à taxas médias anuais de crescimento acima do PIB
(1997, 2000 e 2002); crescimento negativo (-3,7% em 1998 e 1,6% em 1999); como
também se situou (em termos de taxas médias anuais de crescimento) abaixo do PIB (2,0%
em 1995 e 2,1% em 1996).
Além da redução da taxa média real de crescimento do PIB, durante a
década de 90, outros significativos efeitos se manifestaram na economia brasileira como
sendo potencializados pelas medidas de estabilização dos preços, associada ao intenso
processo de reestruturação produtiva, que se instalou na economia do país, os quais, juntos,
entre outros fatores, provocaram profundas alterações no mercado de trabalho.
TABELA 39: Evolução da população economicamente ativa, da ocupação total e taxa de
desocupação total 1993 a 2002
ANO
População
Economicamente Ativa*
(n.º de pessoas)
Ocupação Total (n.º de
pessoas)
Taxa de Desocupação
total
1
(%)
1990
1993
1995
1996
1997
1998
1999
2001
2002
64.467.981
70.965.378
74.138.441
72.996.977
75.213.283
76.885.732
81.175.749
83.243.239
86.055.645
62.100.499
66.569.757
69.628.608
67.920.787
69.331.507
69.963.113
73.345.531
75.458.172
78.179.622
3,7
6,2
6,1
7,0
7,8
9,0
9,6
9,4
9,2
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados do MDICE Ministério do Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior
* População Economicamente Ativa: pessoas de 10 anos ou mais de idade
1. Taxa de desocupação total: desocupação total / população economicamente ativa (%)
139
O preço da estabilidade da economia, patrocinado pela estabilização dos
preços, combinado com a imperiosa necessidade de reposicionamento competitivo da
indústria brasileira, alicerçada sobre as bases do processo de reestruturação produtiva e, de
modernização / atualização tecnológica, entre outros, como é o caso da reduzida taxa de
expansão do PIB real, promoveram um abrupto aumento da taxa de desocupação total,
resultando da sua quase triplicação, no ano de 2002, comparativamente ao ano de 1990.
Ao longo dos anos 1990, quando as políticas neoliberais foram amplamente
aplicadas no Brasil, construiu-se o argumento de que o custo do trabalho era
muito elevado, o que inviabilizava a modernização do país, além de produzir
informalidade nas relações de trabalho e desemprego. Apesar de provocar maior
flexibilização dos contratos de trabalho e estimular a desregulamentação das
relações de trabalho, com sérios impactos negativos para o custo do trabalho, o
desemprego aumentou, assim como a informalidade dos postos de trabalho. O
mito do custo do trabalho foi produzido pelo neoliberalismo, como forma de
tornar ainda mais baixo o peso dos salários nas despesas das empresas, sem que
com isso houvesse estímulo a geração de mais empregos
63
.
Por um lado, o processo de reestruturação produtiva ao intensificar-se, face
aos expedientes adotados na esfera da política econômica sobrevalorização do câmbio,
redução das alíquotas de importação, elevadas taxas de juros, carga tributária
progressivamente crescente como porcentagem do PIB resultante da abertura comercial,
da necessidade de recuperar o atraso tecnológico e da busca do aumento da produtividade e
da competitividade, produziu senão o aumento do desemprego. Ainda, pelas vias da
compressão de custos das empresas, notadamente do rebaixamento do salário e da
precarização das relações de trabalho, ampliou-se de forma expressiva a informalidade, por
outro lado, o “mito do custo do trabalho”, supomos, atender outros e estratégicos objetivos,
que não se encontram diretamente e espacialmente localizados nas fronteiras do nosso país,
mas, provavelmente fora das nossas fronteiras, e, bem distante da nossa esfera de controle.
63
POCHMANN, Mário. A década dos mitos: o novo modelo econômico e a crise do trabalho no
Brasil. São Paulo: Contexto, 2001, p. 107.
140
TABELA 40: Custo médio da mão-de-obra por hora trabalhada na indústria de
transformação, salários e encargos, em US$
País
Custo médio da mão-de-
obra por hora trabalhada
(em US$)
Salários
(em US$)
Encargos
(em US$)
Total
(em US$)
Alemanha
Estados Unidos
Japão
Itália
França
Brasil
21,30
14,83
12,84
16,29
15,25
2,79
16
16
16
9
9
3
12
6
5
11
8
5
28
22
21
20
17
8
Fonte: Coggiola (2002), adaptada pelo autor.
Comparativamente aos demais países considerados, o Brasil ocupou
destacada posição no ranking ao revelar ser o país com o mais baixo custo médio da mão-
de-obra por hora trabalhada (em US$), assim como também, considerando o valor dos
salários (em US$) e dos encargos (em US$), situou-se como o país onde os salários são
muito baixos, compensando, desta maneira, seu reduzido valor com o dobro dos encargos
incidentes sobre o custo do trabalho.
Apesar dos índices de 12% de desemprego na Alemanha, a Basf abriu três novas
empresas na Ásia. Na França, a Hoover fechou uma fábrica e transferiu-a para a Escócia,
onde o Sindicato aceitaria fazer concessões para aumentar a produtividade. A Renault
fechou uma fábrica na Bélgica (Villevorde), demitiu milhares de trabalhadores na Franca,
para construir uma nova fábrica no Paraná (Brasil), e os exemplos poderiam-se
multiplicar. Se compararmos os salários dos trabalhadores de alguns paises, entenderemos
porque a exportação do capital é muito mais vantajosa do que a exportação de
mercadorias. Um dia de salário de um operário da indústria automobilística de Illionois
equivale a um mês de salário malaio
64
.
Não resta dúvida de que a exportação de capitais, adotada como estratégia por
determinadas empresas (ao se relocalizaram, instalando-se nos países onde o custo do trabalho
seja significativamente baixo), tenha, entre outros objetivos, o de se aproveitarem da mão-de-
obra barata e abundante de outros países, enquanto possibilidade efetiva de redução dos seus
custos de produção, mas inclusive o de aumentarem, sobretudo, o excedente econômico.
Contudo, acreditamos que além da exportação de capitais, um outro expediente também tenha
64
COGGIOLA, Osvaldo. O capital contra a história: gênese e estrutura da crise contemporânea.
São Paulo: Xamã: Pulsar, 2002. p. 480.
141
sido mobilizado com o mesmo propósito de aumentar o excedente, qual seja, o da substituição
da produção interna, por importação barata.
Ao mesmo tempo e simultaneamente, as taxas de exploração do trabalho atingem
(sobretudo nos “novos mercados emergentes” da periferia) níveis de fazer inveja aos
primeiros capitalistas industriais dos séculos XVIII e XIX. O número de Janeiro /
Fevereiro (1994) da revista inglesa Foreign Affairs traz artigo bastante ilustrativo
neste sentido, e diz num determinado trecho: “O choque entre o capitalismo e o
comunismo acabou, e os vencedores tem-se fixado em como tornar o mundo um
lugar eficiente e seguro para os negócios. A realidade é bastante clara. A Nike está
produzindo seus famosos e caros sapatos ‘tênis’ na Indonésia, onde suas operárias
trabalham longas horas por um salário mensal de US$ 38,00. A Wal-Mart, K-Mart e
a Sears, o mais importante ícone americano das vendas a varejo, têm produzido suas
roupas em Bangladesh pelas culturalmente passivas mulheres islâmicas que se
submetem a um salário mensal inferior a US$ 30,00, em troca de 60 horas semanais
de trabalho
65
.
Como podemos observar, o problema da exploração do capital sobre o
trabalho, nos anos de 1990, em busca de excedentes cada vez maiores, estendeu-se por todo o
planeta, sobressaindo aquelas regiões economicamente deprimidas do mundo subdesenvolvido.
Outros dois importantes indicadores da economia brasileira da recente década de
1990 que refletem de um lado a conjuntura mundial e, de outro, a própria conjuntura interna do
país (resultado da conjuntura internacional e da conjuntura interna produzida pelas medidas
adotadas na esfera da política econômica) referem-se ao comportamento das exportações e das
importações totais examinadas, através dos indicadores de preço e quantidades na forma de índices.
TABELA 41: Brasil, Índices de preços e quantum de exportação e de importação 1994 a
2002
Índices de Quantum Índices de Preço
Ano
Exportação Importação Exportação Importação
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
103,7
97,4
100,0
110,2
114,0
122,8
136,4
149,4
162,3
57,4
84,7
100,0
105,5
107,3
102,1
115,4
118,9
104,4
88,0
100,0
100,0
100,7
93,9
81,9
84,6
81,6
77,9
108,2
110,7
100,0
106,5
100,9
90,4
90,6
87,7
84,8
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do MDICE Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior.
* Índices de preços e quantum: base 1996 = 100 refere-se aos índices de preço e quantum do total geral das
exportações e das importações.
65
MELLO, Alex Fiuza de. Marx e a globalização. São Paulo: Bointempo, 2001, p. 261-262.
142
O impacto das medidas de política econômica, adotadas a partir de 1994,
entre outros efeitos, no que tange ao setor externo examinado através da balança comercial
são bem visíveis:
a) de 1994 a 1997, em se tratando de índices de quantum, as importações sofrem uma
abrupta impulsão, ao passar de 57,4 para 105,5, isto é, duplicam, para, em seguida,
de 1998 em diante praticamente estabilizarem-se;
b) as exportações também examinadas sobre o indicador de índice de quantum, de
1994 até 1998, praticamente não experimentaram oscilações tão significativas.
Contudo, de 1999 em diante sua trajetória é progressivamente crescente;
c) quanto aos índices de preço, por estarmos observando as exportações e as
importações totais, não observamos variações tão acentuadas, mas ainda assim, por
menor que tenha sido a diferença, notamos que o índice de preço das importações
situou-se acima do índice das exportações; e
d) o movimento de queda dos preços das exportações produzem efeitos de sinal
negativo para a economia, principalmente para os setores voltados para o comércio
internacional, pois, quando caem os preços dos produtos exportados, podem cair a
receita dos exportadores e, até mesmo o salário dos trabalhadores empregados neste
segmento da atividade econômica, a menos que, a queda dos preços, seja
acompanhada de aumento da quantidade exportada.
A promoção da estabilidade, protagonizada pelo rígido controle dos preços,
combinada com a remoção da manta protetora da economia, principalmente da industria
nacional, imprimiu nova dinâmica competitiva na economia brasileira na década de 1990.
A necessidade de atualização tecnológica, aprimoramento de qualidade, aumentar os
ganhos de produtividade, impulsionar o reposicionamento competitivo da economia
nacional, sobretudo, fomentar inserção mais ativa e agressiva da economia brasileira na
143
corrente do comércio internacional, conforme afirmara Tavares, no quadro da
“globalização subordinada”, resultaram de um pesado custo econômico, mas, com certeza,
de um marcante e sintomático ônus social, em especial , para a já sacrificada classe
trabalhadora.
144
CAPÍTULO 4 ECONOMIA REGIONAL E A ROTA DOS
INVESTIMENTOS NO ESTADO DE SÃO PAULO EM 2003
A economia, por ser uma ciência capaz de quantificar a atividade humana
dedicada à produção, circulação e distribuição dos bens e/ou serviços suscetíveis de atenderem
as necessidades e/ou desejos humanos, possibilita-nos analisar e compreender os fenômenos de
natureza econômica na perspectiva dos estoques e também sua dinâmica na dimensão dos
fluxos. Assim, em dado momento específico, é possível, pela mensuração da atividade
econômica, de acordo com os indicadores econômicos
66
, termos uma idéia a respeito do
estoque de reservas internacionais, do estoque da dívida interna e/ou externa pública, do
estoque de produtos acabados em determinado ramo da atividade industrial, do total de
depósitos bancários, do total de pessoas empregadas e desempregadas de uma economia etc, do
mesmo modo que podemos visualizar no tempo em razão do próprio dinamismo da atividade
econômica, modificações importantes que ocorreram, ou, que estão acontecendo em
determinado setor da economia de um país, de uma região e/ou de uma localidade específica.
Os movimentos populacionais (entradas e saídas) e a própria movimentação do capital
(espacial e setorial) são indicadores típicos dos denominados fluxos, os quais, no tempo e em
razão da sua intensidade, promovem ou podem promover significativas mudanças no espaço
econômico. Diante disto, a dinâmica que o capital pode imprimir, de intensidade variada,
poderá ser a movimentação dos contingentes populacionais, uma vez que, onde o capital for
66
Indicadores econômicos: conjunto de dados estatísticos, passíveis de mudança e oscilações,
capaz de dar uma idéia do estado da economia em determinado período ou data. Também
chamados indicadores de conjuntura, em geral fornecem dados sobre produção, comercialização
e investimentos. Entre os indicadores econômicos mais relevantes estão os referentes a
desemprego, oferta de empregos, empréstimos bancários, reservas, taxas de juros, movimentos
de importação e exportação, produção industrial geral e setorial, produção de aço e veículos etc
(SANDRONI, op. cit., p. 296.).
145
mais dinâmico provavelmente ocorrerá o fenômeno da atração, ao contrário, onde for menos
dinâmico, poderá na direção contrária se manifestar o efeito de repulsão.
É fácil ver como a expansão em uma localidade produz “efeitos regressivos”
(back-wash effects) em outras, isto é, os movimentos de mão-de-obra, capital,
bens e serviços não impedem, por si mesmos, a tendência natural à desigualdade
regional. Por si próprios, a migração, o movimento de capital e o comércio são,
antes, os meios pelos quais o processo acumulativo se desenvolve para cima,
nas regiões mais afortunadas, e para baixo, nas desafortunadas. Em geral, seus
efeitos são positivos nas primeiras e negativos nas últimas. As localidades e
regiões, onde a atividade econômica se está expandindo, atrairão imigração em
massa de outras partes do país
67
.
O crescimento e o desenvolvimento econômicos de determinadas localidades
não ocorrem acidentalmente, mas sim em função de uma conjugação de fatores variados
(econômicos, políticos, institucionais, locacionais, sociais, educacionais etc;) -, os quais,
juntos, podem produzir significativo efeito de atração, seja no sentido de atrair novos e
diferentes capitais, seja no sentido de atrair fluxos migratórios ou movimentos populacionais
de outras localidades. Neste sentido, determinadas localidades podem se beneficiar desses
movimentos e, até simultaneamente, serem contempladas com crescimento combinado com
desenvolvimento econômico e social, enquanto em outras localidades, a fuga de capitais ou de
população, promoverão em sentido oposto a debilitação econômica e social provavelmente.
Nos anos setenta, como conseqüência da política econômica, os indicadores apontam
o avanço da indústria em praticamente todas as regiões e principais estados
brasileiros, inclusive no Rio de Janeiro e São Paulo, que reduziram suas participações
relativas no total nacional: a) o Norte, em função da Zona Franca de Manaus e do
complexo de mineração e de siderurgia do Programa Grande Carajás; b) o Nordeste,
em que se destacam o Pólo Petroquímico de Camaçari, na Bahia, a cloroquímica de
Alagoas e Sergipe e a chamada “nova indústria” nordestina, constituída com apoio
dos mecanismos de incentivos fiscais do sistema 34/18 FINOR; c) o Centro-Oeste,
especialmente pelo crescimento da agroindústria do complexo soja; d) no Sudeste, os
estados de Minas Gerais e Espírito Santo ampliaram suas participações no VTI
nacional devido ao crescimento da siderurgia e da indústria de papel e celulose, além
da instalação da FIAT em Betim; e) o Sul vai gradativamente ampliando sua
participação, devido ao crescimento da metal-mecânica no conjunto da região,
especialmente da indústria de equipamentos agrícolas do Rio Grande do Sul, do Pólo
Petroquímico de Triunfo e da indústria de calçados também deste estado, da têxtil de
Santa Catarina, da indústria de papel e celulose do Paraná e Rio Grande do Sul e, por
fim, pelo acelerado processo de integração da agropecuária com a agroindústria nos
três estados
68
.
67
MYLDAL, Gunnar. Teoria econômica e regiões subdesenvolvidas. Tradução de: N. Palhano, 3.
ed. Rio de Janeiro/GB: Saga, 1972, p. 53.
68
PACHECO, Carlos Américo. Fragmentação da nação. Campinas: Unicamp, 1998, p. 70.
146
Estas modificações que ocorreram, na economia brasileira, produziram
alterações substanciais nas econômicas daquelas regiões mencionadas, uma vez que à
medida que intensificavam a indústria pelas vias da diversificação, a composição setorial
destas mesmas regiões modificava-se de maneira bastante acentuada, o que, de alguma
forma, contribuía para a ocorrência simultânea da desconcentração industrial no sentido de
promover, ainda que não de forma tão radical, possibilidades de tornar o espaço econômico
nacional senão um todo homogêneo, ao menos, um espaço menos heterogêneo, ou,
desigual, inclusive do ponto de vista da distribuição repartitiva regional do produto da
econômica.
TABELA 42: Distribuição espacial da indústria de transformação Brasil: segundo regiões
e estados selecionados 1970/1995.
REGIÕES E ESTADOS 1970 1975 1980 1985 1990 1995
1
Nordeste (Menos BA)
Bahia
Minas Gerais
Rio de Janeiro
a) Grande São Paulo
(2)
b) Interior
(2)
Paraná
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
Outros estados
4,2
1,5
6,4
15,7
43,4
14,7
3,1
2,6
6,3
2,1
4,5
2,1
6,3
13,6
38,8
17,1
4,0
3,3
7,5
2,8
4,4
3,1
7,8
10,2
34,2
20,2
4,1
3,9
7,9
4,2
4,8
3,8
8,3
9,5
29,4
22,5
4,9
3,9
7,9
5,1
4,3
4,0
8,1
9,8
26,2
23,0
5,7
4,2
7,7
7,0
4,3
3,7
8,8
8,8
26,6
23,3
5,9
4,3
8,7
5,6
TOTAL
100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: Pacheco (1998).
(1) os percentuais referentes aos anos de 1990 e 1995 foram estimados com base na distribuição regional do
VTI
69
de 1985 e nos índices de crescimento da PIM / PF
70
;
(2) para 1990 e 1995, a participação da metrópole e do interior de São Paulo foi estimada a partir do valor
adicionado calculado pela Secretaria da Fazenda do Estado, com os percentuais indicados para 1995 tendo
por referência o valor adicionado em 1994.
Entre 1970 e 1995, apesar de ainda ter sido de alguma maneira tímida a
mudança ocorrida na distribuição espacial da indústria de transformação no Brasil (medida
pelo valor da transformação industrial segundo, regiões e estados selecionados), é senão
69
VTI: Valor da transformação industrial = Dado pela diferença entre o valor bruto da produção
industrial e o custo das operações industriais (Conceituação do IBGE)
70
PIM/PF = refere-se aos dados do IBGE, disponibilizados através da Pesquisa Industrial Mensal
Produção Física.
147
abrupta a redução da participação relativa da metrópole paulista (Grande São Paulo) no
total do VTI, conquanto, inversamente é robusta a ampliação da participação relativa no
total deste indicador do interior paulista.
De fato, em paralelo à redução do peso da indústria do Rio de Janeiro e de São
Paulo a favor da indústria do restante do país, ocorreu no espaço paulista um
acentuado processo de desconcentração da indústria metropolitana. O resultado
foi a ampliação da participação do interior no VTI nacional, agora o segundo
maior aglomerado industrial do país, atrás apenas da Grande São Paulo. É o que
se batizou de “interiorização da indústria paulista”, com fortes desdobramentos
nas regiões de Campinas, São José dos Campos, Ribeirão Preto, Sorocaba e
Santos, e que foi determinado por um conjunto amplo de fatores / ...
71
.
Dentre os fatores apontados por Pacheco, apenas para efeito de torná-los
mais transparentes, destacamos resumidamente: a) produtos dos complexos soja, café,
laranja, carne, algodão e cana-de-açúcar estão relacionados diretamente com a política de
incentivos às exportações do setor da agroindústria paulista; b) o Pró-álcool e seus
desdobramentos traduzidos pelos estímulos à produção agrícola e à produção industrial de
equipamentos; c) dos investimentos em infra-estrutura e na malha de transportes etc; logo,
o aumento da participação relativa do interior paulista no valor da transformação industrial
do estado não ocorreu senão como resultado da maturação de um elenco variado de
investimentos.
TABELA 43: Distribuição percentual do VTI da indústria têxtil e vestuário e calçados no
Brasil segundo Estados e regiões selecionados 1970, 1975, 1980 e 1985.
Têxtil Vestuário e Calçado
1970 1975 1980 1985 1970 1975 1980 1985
Norte
Nordeste
Sul
Centro-Oeste
R.M. São Paulo*
Interior São Paulo
Minas Gerais / E. Santo
Rio de Janeiro
1,0
8,0
10,5
0,4
42,4
19,3
6,8
11,7
1,4
13,0
10,2
0,3
35,9
20,6
8,2
10,3
2,3
13,7
13,7
0,4
32,5
21,2
8,4
7,8
1,9
15,1
14,3
0,6
27,1
23,0
10,9
7,2
0,3
6,3
18,3
0,4
41,8
14,9
2,8
15,3
1,6
8,2
25,1
0,3
35,4
12,6
4,0
12,8
0,5
8,8
30,7
0,3
28,4
13,9
5,3
12,1
0,2
10,1
33,3
0,5
24,3
16,2
6,6
8,7
Fonte: Pacheco (1998), adaptada pelo autor.
* R.M. São Paulo: Região Metropolitana de São Paulo.
71
PACHECO, op. cit., p. 128.
148
Enquanto na Região Metropolitana de São Paulo, a participação dos
subsetores têxtil e do vestuário e calçados no valor da transformação industrial reduz-se em
mais de 50%, configurando nitidamente o processo de desconcentração industrial, o
interior paulista aumenta nestes mesmos subsetores sua participação relativa, muito
embora timidamente, conquanto o nordeste brasileiro quase dobra a participação relativa
da sua indústria têxtil, e, o sul na mesma proporção amplia a participação relativa (de
18,3% no ano de 1970, para 33,3% no ano de 1985) no VTI, através da indústria do
vestuário e do calçado.
Mais recentemente, trabalho realizado e disponibilizado pela SEADE
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados -, denominado Pesquisa de Investimentos
no Estado de São Paulo permite-nos visualizar, a partir dos investimentos anunciados, no
estado, a própria dinâmica setorial e regional de sua economia
72
.
A pesquisa produz uma radiografia dos investimentos anunciados, segundo
variado leque de intenções, os quais, por sua vez, dão-nos uma noção dos setores mais
dinâmicos, cujos investimentos revelam, de acordo com suas respectivas modalidades:
ampliação, implantação, modernização, e (P&D) Pesquisa e Desenvolvimento, diferentes
objetivos das empresas: ampliação da capacidade produtiva instalada, nova planta
72
A partir de 2002, com o fim do grande “pacote” de investimentos dos segmentos de serviços de
utilidade pública, iniciou-se um novo período, com características distintas. Os megaprojetos foram
substituídos por um crescente número de empreendimentos de menor porte em diversos
subsetores, espalhados por todo o Estado. A combinação entre o aumento do número de
empreendimentos e a redução do valor médio destes estabilizou o valor total dos anúncios de
investimentos para o Estado de São Paulo em patamares inferiores aos verificados em anos
anteriores.
Os principais fatores determinantes do nível de investimentos em uma economia são a
rentabilidade do investimento e o grau de incerteza. No primeiro semestre de 2003 vários fatores
contribuíram para afetar negativamente o investimento, tanto pela diminuição da rentabilidade
marginal, quanto pelo aumento das incertezas. O primeiro, e mais comentado pelos líderes
empresariais, políticos e imprensa, é o custo de oportunidade elevado, expresso pelas altas taxas
de juros (tanto nominais quanto reais).
O segundo motivo é a recessão da economia brasileira. Com o objetivo de convergir a inflação
para as metas estabelecidas e recuperar a credibilidade do mercado financeiro, o governo
brasileiro adotou políticas fiscal, monetária e cambial contracionistas, que visam segurar a
demanda interna através da diminuição da renda e do poder de compra da sociedade (SEADE
Pesquisa de Investimentos Anunciados no Estado de São Paulo 2002 2003, p. 03).
149
industrial, modernização de máquinas e equipamentos, pesquisa e desenvolvimento (de
novos produtos, novos processo e materiais, redução de custos da produção), entre outros.
De início, mostramos, quanto aos investimentos anunciados segundo os
setores (indústria, comércio e serviços e outros) de atividade econômica, o número de
empreendimentos, o respectivo valor (em US$) dos investimentos, o valor médio (em US$)
dos investimentos nos primeiros semestres de 2002 e 2003 no estado paulista.
TABELA 44: Estado de São Paulo, investimentos anunciados segundo setores de atividade
econômica: 1º semestre de 2002 1º semestre de 2003
Número de
empreendimentos
Valor
(em US$ milhões)
Valor médio
(em US$ milhões)
Setores de atividade
2002 2003 2002 2003 2002 2003
Indústria
Comércio
Serviços
Outros
(1)
276
221
495
1
352
415
598
8
3.648,91
196,61
3.390,07
1,84
4.083,32
197,29
3.091,07
2,99
13,22
0,89
6,85
1,84
11,60
0,48
5,17
0,37
Fonte: adaptada pelo autor segundo dados da SEADE - Sistema Estadual de Análise de Dados Pesquisa de
Investimentos Anunciados no Estado de São Paulo: 2002-2003. (1) englobam agricultura, pecuária,
sivicultura e exploração florestal e investimentos feitos por empresas cujo setor de atividade principal não foi
possível identificar.
De fato, o valor médio dos investimentos (em US$) estabilizou-se no ano de
2003 relativamente ao ano de 2002; o número de empreendimentos verificado no setor de
serviços supera, com certa vantagem, aqueles totalizados na indústria do mesmo modo que
são maiores do que aqueles apurados no setor de comércio. Contudo, em se tratando de
valores total e médio (expressos em US$), o valor dos investimentos anunciados na
indústria situaram-se em patamares mais elevados do que aqueles do comércio e, com
enorme distância, os investimentos na indústria e nos serviços se situaram face aqueles do
setor de comércio, e, isoladamente com valores extremamente reduzidos foram os
investimentos anunciados no setor primário.
150
É interessante, sobretudo, identificar até nos investimentos anunciados a
clara vocação industrial do estado paulista, seguido pelo número de empreendimentos e
seu respectivo valor no setor de serviços. Ainda examinando dados gerais sobre os
investimentos anunciados no estado de São Paulo, acreditamos ser oportuno
principalmente verificar a tipologia dos mesmos (ampliação, modernização etc), na RMSP
(Região Metropolitana de São Paulo), no interior e em diversos municípios paulistas)
73
.
TABELA 45: RMSP, Interior e diversos municípios do Estado segundo investimentos
anunciados por tipo: 1º semestre de 2003
Tipo de
investimentos
Total RMSP
(1)
Interior Diversos
Municípios
Ampliação
Part. (%)
4.202,51
56,99
1.988,34
67,72
1.556,63
43,36
657,54
77,51
Implantação
Part. (%)
2.206,25
29,92
682,05
23,23
1.336,70
37,23
187,50
22,10
Modernização
Part. (%)
949,30
12,87
256,89
8,75
692,12
19,28
0,29
0,03
P & D
Part. (%)
16,61
0,23
8,83
0,30
4,80
0,13
2,98
0,35
Total
Part. (%)
7.374,67
100,00
2.936,11
100,00
3.590,25
100,00
848,31
100,00
Fonte: adaptada pelo autor segundo dados da SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
Pesquisa de Investimentos Anunciados no Estado de São Paulo: 1º semestre de 2003).
1. RMSP: Região Metropolitana de São Paulo.
Do total de investimentos anunciado por tipo, no estado de São Paulo no
primeiro semestre de 2003, o interior participou com 48,7%, quase a metade do total dos
investimentos, a região metropolitana de São Paulo representou 39,8%, e os demais
municípios paulistas distribuíram, entre si, os 11,5% restantes. Apesar de configurarem
certa semelhança, o interior paulista se destaca sobremaneira, pelo fato de situar-se acima
73
Metodologia da Pesquisa de Investimentos no Estado de São Paulo: A metodologia atualmente
utilizada pela Fundação SEADE para realizar o levantamento das intenções de investimento no
Estado de São Paulo, desenvolvida a partir da originalmente empregada pela Secretaria da
Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico SCTDE, consiste em captar diariamente as
informações primárias anúncios de investimentos produtivos privados divulgadas pelos
principais meios de comunicação e obter sua confirmação por parte das respectivas empresas. As
informações são coletadas nas seguintes publicações: Gazeta Mercantil, O Estado de São Paulo,
Folha de São Paulo, Valor, Diário do Comércio & Indústria, Diário do Comércio [...] SEADE
Pesquisa de Investimentos Anunciados no Estado de São Paulo, p. 32.
151
da média estadual quanto às modalidades de implantação (de novas unidades) e de
modernização (de unidades já em funcionamento), enquanto a modalidade dos
investimentos relacionada à ampliação de unidades já em funcionamento concentrou-se
(ficando acima da média) na região metropolitana de São Paulo. Devemos aqui apenas
ressaltar que, de acordo com os investimentos anunciados no estado de São Paulo, pelo
menos aqueles observados no primeiro semestre de 2003, a exceção da RMSP e dos
demais municípios paulistas, é extremamente reduzido o percentual de intenções de
investimentos destinados às atividades de (P&D) Pesquisa e Desenvolvimento.
São diversos os motivos que determinam a região na qual a empresa fará seu
investimento. O interior possui vários atrativos, como qualidade da infra-
estrutura e transportes e telecomunicações, existência de uma ampla rede urbana,
presença de universidades e centros de pesquisa de padrão internacional,
disponibilidade de mão-de-obra qualificada, crescente oferta de serviços pessoais
e para empresas, baixo custo dos terrenos e excelente qualidade de vida que se
desfruta no interior paulista
74
.
Considerando a representatividade do interior paulista no total dos
investimentos anunciados (2002 e 2003), supomos ser relevante detalharmos o total dos
investimentos segundo as RA (Regiões Administrativas) do estado de São Paulo. Antes,
porém, convém ressaltar que, do total dos investimentos anunciados segundo a origem do
capital controlador da empresa, para o primeiro semestre de 2003, 78% eram de
empreendimentos detidos ou controlados por capital nacional, e, apenas 22% eram
controlados por capital estrangeiro.
74
SEADE, op. cit., p. 18.
152
TABELA 46: Estado de São Paulo, Investimentos anunciados segundo número de
empreendimentos e valor (em US$ milhões) nas Regiões Administrativas 1º semestre de
2002 e 1º semestre de 2003.
Número de
empreendimentos
Valor
(em US$ milhões)
Regiões Administrativas
2002 2003 2002 2003
Estado de São Paulo 993 1.373 7.237,43 7.374,67
RMSP
RA Campinas
RA S. José dos Campos
RA Baix. Santista
RA Araçatuba
RA S. José do Rio Preto
RA Sorocaba
RA Central
RA Marília
RA Barretos
RA Bauru
RA Presidente Prudente
RA Ribeirão Preto
RA Franca
RA Registro
389
232
70
31
51
18
49
24
17
7
44
11
18
11
-
522
235
102
64
48
53
86
40
39
9
39
30
35
14
-
3.015,08
1.797,88
377,90
426,31
429,48
56,04
68,53
44,09
24,69
13,22
108,41
7,72
60,72
28,23
-
2.936,11
1.563,79
618,66
275,44
225,47
98,51
57,35
43,20
39,52
37,01
36,30
22,57
19,32
12,46
-
Fonte: adaptada pelo autor de acordo com dados da SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de
Dados) Pesquisa de Investimentos Anunciados.
Somente a RMSP (Região Metropolitana de São Paulo) e as RA (Região
Administrativa) de Campinas e de São José dos Campos, juntas concentraram 72% e 69%
dos investimentos totais anunciados, no 1º semestre de 2002 e 1º semestre de 2003,
respectivamente, enquanto os 28% e 31% restantes, no mesmo período, foram distribuídos
entre as demais regiões administrativas (RA) do interior do estado de São Paulo.
153
4.1 OS INVESTIMENTOS ANUNCIADOS NA REGIÃO
ADMINISTRATIVA E NO MUNICÍPIO DE FRANCA
Após a breve passagem pelas transformações ocorridas na economia
brasileira, notadamente da indústria de transformação e seu respectivo valor da
transformação industrial, segundo as regiões e estados da federação brasileira, em
diferentes períodos das décadas de 70, 80 e início dos anos 90, também, de forma suscinta,
procuramos, nos anos de 2002 e 2003, proporcionar um reduzido panaroma do estado de
São Paulo: na RMSP (Região Metropolitana de São Paulo), e no interior do estado, sob a
ótica dos investimentos, segundo setores da atividade econômica, modalidade dos
investimentos anunciados, bem como da sua distribuição espacial.
Acreditamos ter sido justificável esta abordagem (resumida como foi) sobre
a rota dos investimentos no estado e pelo interior paulistano, pois, de alguma maneira, foi
possível ainda que implicitamente compreendermos o porquê da preferência do
investimento nesta ou naquela região, independentemente de entendermos a sua própria
lógica explicitada sob a forma do tipo de investimento.
Uma das conclusões mais importantes a que se tem chegado nesses estudos é que
quanto mais diversificada a atividade econômica de determinada região mais
estável tende a ser o desempenho econômico. E o Estado de São Paulo possui
grande diversificação da atividade econômica que vai desde setores de alta
tecnologia (telecomunicações, informática, aeronáutica e equipamentos
eletrônicos) até os segmentos mais tradicionais, como os setores têxtil, agrícola e
alimentício. Assim, o desempenho positivo dos investimentos anunciados no
Estado de São Paulo reflete a própria estrutura da economia paulista,
diversificada, dinâmica e com enorme capacidade de adaptação nos períodos de
crise
75
.
É oportuno lembrar que quanto mais diversificada a atividade econômica de
determinada localidade, com certeza, esta diversificação, entre outros fatores, relaciona-se
diretamente com a renda da população, uma vez que quanto maior for a renda da
população de uma economia (região e/ou município) não apenas provavelmente o
75
SEADE, op. cit., p. 5.
154
percentual da renda destinado ao consumo será elevado, mas também diversificada será a
cesta de bens de consumo e serviços desta mesma população, o que, por conseguinte,
estimulará a instalação de diferentes empreendimentos naquela economia, possibilitando,
assim, sua própria condução no sentido da diversificação.
Deste modo, não podemos nos esquecer de que como até o momento
tratamos as regiões administrativas (do estado de São Paulo), enquanto espaços de
produção, convém ressaltar que as referidas regiões, assim como, os seus respectivos
municípios sede são também espaços de trabalho, de consumo, de habitação / residência,
de educação, de relações, entre outros. Por este motivo, antes de examinarmos a questão
dos investimentos no município e na região administrativa de Franca, por configurarem
alguma aproximação, selecionamos os municípios sede de regiões administrativas: Bauru,
Presidente Prudente, Ribeirão Preto e Franca, para apurar em relação ao estado de São
Paulo, a magnitude que estes municípios representam no que se refere ao PIB (Produto
Interno Bruto) e ao consumo.
Quanto aos dados do PIB, comparamos dada a disponibilidade dos mesmos
os municípios elencados nos anos de 1970,1980 e 1996 (todos convertidos em US$ 1,00 de
1998). Contudo, no que se relaciona ao consumo baseamo-nos nos dados do ano de 2000,
publicados pela Revista Balanço Anual da Gazeta Mercantil “Índice do Potencial de
Consumo”.
TABELA 47: Estado de São Paulo e municípios selecionados, PIB (Produto Interno
Bruto) em US$ - 1970, 1980 e 1996
PIB ( em US$ 1,00 de 1998)
Municípios
1970 1980 1996
Estado de São Paulo
Bauru
Franca
Presidente Prudente
Ribeirão Preto
97.206.722.801
526.500.428
307.844.540
417.831.389
806.884.550
212.424.834.844
983.887.317
874.321.941
612.288.328
1.900.918.021
296.434.982.188
2.100.064.513
1.262.268.564
1.318.197.651
3.729.390.709
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas)
15
5
Do conjunto de quatro municípios do interior do estado de São Paulo, nos
três anos observados, a liderança de Ribeirão Preto é notória, seguida de Bauru, e depois de
Presidente Prudente e Franca, quanto ao valor absoluto do PIB. Já em termos de
participação relativa, verificamos que:
a) Ribeirão Preto: participou com 0,83% em 1970, 0,89% em 1980 e, no ano de 1996,
sua participação relativa subira para 1,26%;
b) Bauru: em 1970, participara com 0,54%, no ano de 1980 sua participação reduziu
para 0,46% e, em 1996, recupera-se da queda e atinge os 0,71% de participação
relativa comparativamente ao PIB estadual;
c) Franca: 0,32% era a participação relativa apurada em 1970, já em 1980, mesmo
com a quase duplicação do seu PIB, a participação relativa subiu para 0,41%, e, no
ano de 1996, uma pequena recuperação permite que sua participação relativa sobre
o PIB estadual suba para 0,43%; e
d) Presidente Prudente: no ano de 1970, sua participação era de 0,43%, contudo, em
1980 a mesma reduzira-se para 0,29%, e, em 1996 com pífia vantagem, supera o
município de Franca, totalizando uma participação relativa de 0,44% no total do
PIB do estado de São Paulo.
Com base nos dados divulgados pela Gazeta Mercantil (em parceria com
levantamento realizado pela empresa Florenzano Marketing), no ano de 2000, que nos
revelam o total em valores (R$ mil), referente ao consumo de 45 itens diversos de despesas
(alimentação, higiene pessoal, educação, eletrodomésticos, médicos, planos de saúde etc),
verificamos o consumo total e per capita do estado de São Paulo, e, dos quatro municípios
anteriormente retratados.
156
TABELA 48: Estado de São Paulo, municípios selecionados segundo o consumo (em R$
mil) e consumo por habitante (em R$) – 2000
Município População
(n.º habitantes)
Consumo Total
*
(em R$ mil)
Consumo por
**
Habitante (em R$)
Estado de São Paulo
Bauru
Franca
Presidente Prudente
Ribeirão Preto
36.391.212
320.769
297.936
187.959
478.831
136.633.204
1.392.506
906.633
774.418
2.820.147
3.754,57
4.341,15
3.043,06
4.120,14
5.889,65
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados da revista Balanço Anual / Gazeta Mercantil & Florenzano
Marketing
“Índice de Potencial de Consumo”
* Consumo total: refere-se ao valor total do consumo de 45 itens das despesas familiares
** Consumo por habitante: é o consumo em R$ por ano por habitante.
O município de Ribeirão Preto situou-se bem acima da média do estado, no que
se refere ao consumo por habitante, ou ainda, o consumo por habitante neste município era de
1,5 vezes a média do estado de São Paulo no ano de 2000, em seguida, em menor proporção,
mas, também acima da média estadual ficaram os municípios de Bauru e Presidente Prudente,
e, abaixo da média do estado ficou o município de Franca.
Retomando a questão dos investimentos anunciados no estado de São Paulo,
verificamos, a seguir, no ano de 2003: o valor, o setor de atividade, a empresa, a origem, o
tipo, e o período do investimento, na RA (região administrativa) e no município de Franca.
TABELA 49: Município de Franca, Região Administrativa de Franca, investimentos anunciados
por origem do capital, tipo de investimento e setor de atividade econômica Janeiro Junho / 2003
R.G. Franca
Empresa
Setor de Atividade Origem Tipo
Período do
Investimento
Valor (US$
milhões)
Aromas naturais Varejo e reparação de objetos Brasil Implantação 2003-2005 0,02
Centro
Oftalmológico de
Franca
Saúde e Serviços Sociais Brasil Implantação 2002-2002 0,08
Democrata Calçados Varejo e reparação de objetos Brasil Ampliação 2002-2003 0,17
Gasoline Varejo e reparação de objetos Brasil Implantação 2003-2005 0,03
Hospital do Câncer
de Franca
Saúde e Serviços Sociais Brasil Ampliação 2003-2003 0,48
Hotel Nacional Inn Alojamento e Alimentação Brasil Implantação 2003-2003 0,83
Kidgas Varejo e reparação de objetos Brasil Implantação 2003-2003 0,03
Ponto Frio Varejo e reparação de objetos Brasil Implantação 2003-2004 0,13
Santa Casa de Miser.
de Franca
Saúde e Serviços Sociais Brasil Ampliação 2002-2003 0,39
TOTAL - - - - 2,16
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados da SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados)
Pesquisa de Investimentos Anunciados.
157
Segundo o setor de atividade, os investimentos anunciados no setor de
saúde e serviços sociais somaram US$ 0,95 milhões, ou seja, 44% do total de
investimentos anunciados no município de Franca. Em seguida, com um total de US$ 0,38
milhões vem o setor de varejo e reparação de objetos, representando 18% dos
investimentos anunciados. Já o setor de alojamento e alimentação (hotelaria) ficou próximo
do setor de saúde, com um total de US$ 0,83 milhões, representando, deste modo, 38% dos
investimentos anunciados.
Além do baixíssimo valor dos investimentos anunciados no município de
Franca, devemos destacar que nenhum destes destinou-se à atualização e nem a P&D
(Pesquisa e Desenvolvimento), muito menos pode ser identificado como sendo
investimento no setor de fabricação de calçados, ou, até mesmo no ramo da indústria de
transformação pertencente à cadeia produtiva do calçado. Com baixo consumo per capita e
baixo valor dos investimentos anunciados, muito provavelmente em razão de uma reduzida
renda per capita, as possibilidades de atrair investimentos de maior peso, acabam ficando
restritas, o que, de certo modo, ou reforça a tendência de baixa (renda consumo
investimento) ou, os novos empreendimentos concentram-se em atividade econômicas de
baixo valor agregado.
4.2 A DÉCADA DE 90 E A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE
FRANCA
O município de Franca pode, pelo número de empresas ou de
estabelecimentos, pela quantidade de pessoas empregadas e, ainda, pelo expressivo valor
do seu produto, ser considerado como um município industrial, e, que, juntamente com o
tamanho da sua população urbana, poderíamos denominá-lo urbano-industrial. A
158
composição setorial da economia francana resultado da participação relativa do produto
da agricultura, pecuária e atividade extrativa, da indústria de transformação (setor
secundário) e do comércio varejista e atacadista e do setor de serviços (setor terciário) no
produto interno bruto mostra-nos que a indústria de transformação representa do produto
total de sua economia, maior participação entre os demais setores da atividade econômica.
TABELA 50: Município de Franca, composição setorial da economia – 1975, 1980, 1985,
1996.
PRODUTO INTERNO BRUTO (R$ milhões a preços de 1996) ANO
primário % secundário % terciário %
1975
1980
1985
1996
18
20
74
26
4
2
7
2
218
479
623
1028
48
57
58
59
218
347
382
673
48
41
35
39
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do BNDES Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e
Social / IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicada
Em 1975, o setor primário que participava com 4% do PIB (Produto Interno
Bruto) do município, perdeu pontos para os demais setores, passando a totalizar apenas 2%
do produto da economia no ano de 1996. O setor secundário, isto é, a indústria de
transformação, ao contrário do setor primário, passou dos 48% no ano de 1975, para quase
60% do produto total, conquanto o setor de comércio e serviços, perdeu um total de 9
pontos percentuais em 1996 comparativamente ao ano de 1975.
Entretanto, apesar da economia do município esboçar nítida vocação
industrial, a sua indústria está concentrada numa única atividade, medida pelo número de
estabelecimentos classificados, de acordo com a sua respectiva atividade.
159
TABELA 51: Município de Franca, atividades econômicas selecionadas segundo número
de estabelecimentos e em porcentagem do total 1995 e 2001
Estabelecimentos Part. Relativa % Classe CNAE*
1995 2001 1995 2001
19100 Curtimento e outr. prepar. de couro
19313 Fabricação de calçados de couro**
25194 Fabr. de artef. Diversos de borracha
29645 Fabr. Mag. e Equip. p/ Ind. Vest. e ...
45217 Edificações (Residenc. Industr. Com.)
50105 Com. varejo e por atac. Veíc. Automot.
50504 Comércio a varejo de combustíveis
52329 Com. Varej. de Art. Vest. e Complem.
52237 Com. Varej. de Calç. Art. Couro e Viag
52418 Com. Var. Prod. Farmac. Art. Méd e Ortopéd.
26
838
24
22
184
40
31
245
94
113
47
1.727
68
47
256
129
76
892
267
238
0,5
17,5
0,5
0,4
3,8
0,8
0,6
5,1
1,9
2,4
0,3
11,1
0,4
0,3
1,6
0,8
0,5
5,7
1,7
1,5
Totais
1
4.768 15.585 33,5 23,9
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados RAIS/MTE Relatório Anual de Informações Sociais
Ministério do Trabalho e Emprego.
* CNAE: Classificação Nacional de Atividade Econômica.
** 19313: engloba as atividades econômicas de fabr. de malas, bolsas e outros artefatos para viagem (19216),
fabr. de outros artefatos de couro (19291), fabricação de tênis de qualquer material (19321), fabricação de
calçados de plástico (19330) e fabricação de calçados de outros materiais (19399).
1. Totais: refere-se ao total de estabelecimentos de todas as atividades econômicas desenvolvidas no
município.
Em relação ao total de estabelecimentos, a atividade de fabricação de
calçados experimentou, de 1995 a 2001, uma redução percentual de 57%
aproximadamente, apesar do número de estabelecimentos da mesma atividade ter crescido
em 106,1%, ou seja, o número de estabelecimentos classificados naquela atividade chegou,
em seis anos, a dobrar, mas a redução da sua respectiva participação relativa deveu-se,
muito provavelmente, ao aumento do total de estabelecimentos mais que proporcional ao
seu próprio movimento de expansão, revelando-nos, de alguma forma, que o crescimento
verificado no período examinado ocorreu mediante a sua distribuição mais
heterogeneamente do que concentrada em poucas atividades, apontando-nos, ou, para uma
maior distribuição em atividades já existentes, ou para uma diversificação de atividades.
Contudo, devemos também observar que, apesar do percentual da atividade
de fabricação de calçados ter-se reduzido em relação ao conjunto total de atividades
econômicas efetivamente desenvolvidas no município, pode ter ocorrido o inverso em
160
relação ao sub-conjunto das atividades econômicas inseridas no ramo da indústria de
transformação, isto é, do total de estabelecimentos classificados no ramo industrial, o
aumento do total destes na atividade de fabricação de calçados tenha sido maior que os
demais, o que nos mostraria uma tendência oposta à diversificação.
Analisando os dados RAIS/MTE, obtidos dos arquivos “RAIS
Estabelecimentos”, no ano de 1995, do total de 4768, de acordo com a respectiva
classificação da atividade econômica, apuramos um total de 1254 estabelecimentos, ou
seja, 26,3%, enquadrados no ramo da indústria de transformação, dos quais, 66,8%
respondiam pela atividade de fabricação de calçados, enquanto no ano de 2001, do total de
15.585, a indústria de transformação representava 26,9%, e o ramo de fabricação de
calçados em relação à atividade industrial, representava 69,5% aproximadamente. A
população do município de Franca praticamente dobrou em duas décadas (1980 até o ano
2000), e a população urbana chegou a representar 98,1% da população total no ano de
2000.
O processo de industrialização não consiste apenas numa mudança de técnicas de
produção e numa diversificação maior de produtos, mas também numa profunda
alteração da divisão social do trabalho. Numerosas atividades manufatureiras,
que antes eram combinadas com atividades agrícolas, são separadas destas,
passando a ser realizadas de forma especializada em estabelecimentos
espacialmente aglomerados. A aglomeração espacial da atividade industrial se
deve à necessidade de utilização de uma infra-estrutura de serviços
especializados (de energia, água, esgotos, transporte, comunicações, etc) e às
economias externas que decorrem da complementaridade entre os estabeleci-
mentos industriais. Para reduzir os custos de transporte que consubstanciam estas
economia externas, as empresas que realizam intenso intercambio de
mercadorias tendem a se localizar próximas umas das outras. Surge daí a cidade
industrial
76
.
De fato, um dos aspectos relevantes do processo de industrialização do
município de Franca foi, senão, proporcionar significativa divisão social do trabalho,
sobretudo em razão da atividade de fabricação de calçados em seu processo de
desenvolvimento ter proporcionado a instalação de outras e diversificadas atividades
76
Singer, Paul. Economia política da urbanização. 14 ed. São Paulo: Contexto, 1998, p. 30.
161
correlatas à fabricação do calçados, produzindo, assim, não só à divisão social do trabalho
mais intensa no bojo deste processo, como também, possibilitou a efetivação de
organização da própria indústria sob a forma de uma aglomeração industrial, forjada
exatamente no princípio da complementaridade. Assim, à medida que a indústria produtora
do bem de consumo final (o calçado) se desenvolvia, com ela, de forma complementar,
progressivamente se desenvolvia a indústria correlata, do mesmo modo, em sintonia com a
expansão da indústria, a população aumentava.
TABELA 52: Município de Franca, população total, urbana e rural, e população
economicamente ativa 1980, 1990 e 2000.
POPULAÇÃO (mil habitantes) ANO
TOTAL URBANA RURAL PEA*
1980
1990
2000
1
147.962
222.382
287.400
143.125
217.189
281.869
4.837
5.193
5.531
91.954
140.578
193.484
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados da Fundação SEADE e IBGE para os dados censitários.
* PEA: população economicamente ativa
1. 2000: refere-se aos dados do Censo Demográfico
Ao lado do progressivo aumento da população total, sobressaindo a
população urbana que, em apenas vinte anos, amplia-se em 96,9%, a população
economicamente ativa praticamente duplica-se, atingindo 110,4% de aumento acumulado
no mesmo espaço de tempo. Diante disto, à medida que a população aumenta, amplia-se a
demanda por bens de consumo (alimentação, saúde, vestuário, aparelhos eletro-eletrônicos,
utensílios domésticos etc), assim como, amplia-se a demanda por serviços públicos
(educação, habitação, saúde pública, saneamento básico, energia elétrica, obras publicas
etc) enfim, o espaço local se modifica gradativamente por meio da ação humana, onde o
desenvolvimento da indústria, em conjunto com o crescimento da população, possibilita
alterar a divisão social do trabalho, ampliar o consumo de bens e de serviços, ao mesmo
tempo, que amplia simultaneamente a própria arrecadação de tributos, ou seja, desenvolve
162
no próprio espaço local, no interior das relações entre os diversos agentes econômicos:
produtores, trabalhadores, consumidores, e governo, um contínuo processo de
transferências de renda, na forma de salário, tributos, aluguéis, lucros, etc.
TABELA 53: Finanças públicas municipais do município de Franca, segundo indicadores
diversos (em R$) – 2001
INDICADORES ARRECADAÇÃO (EM R$)
Receita Orçamentária
IPTU
ISS
Receita Transferências Constitucionais
Cota-parte ICMS
Cota-parte IPVA
137.533.135,42
13.209.986,06
7.262.308,82
96.986.975,31
33.213.400,29
8.006.785,63
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados da STN Secretaria do Tesouro Nacional Finanças
do Brasil: Receita e Despesa dos Municípios 2001.
Da receita orçamentária total, o IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano)
representou 9,6% da arrecadação total, o ISS (Imposto Sobre Serviços) participou com
apenas 5,3%, o IPVA (Imposto sobre Proprietários de Veículos Automotores) participou
com 5,8%, totalizando estas três fontes de receita municipal 20,7% da receita orçamentária,
revelando-nos, por conseguinte, expressiva participação da receita proveniente de
transferências constitucionais, cuja participação relativa, no referido exercício, traduziu-se
no percentual de 70,5%, configurando baixa arrecadação tributária municipal própria e,
significativa dependência por retransferência constitucional.
Por sua vez, convém salientar que o espaço local, por ser um espaço de
produção, de consumo, de tributação, de relações sociais, é, por sua vez, e,
conseqüentemente, um espaço de trabalho.
O trabalho é a fonte de toda a riqueza, afirmam os economistas. Assim é, com
efeito, ao lado da natureza, encarregada de fornecer os materiais que ele converte
em riqueza. O trabalho, porém, é muitíssimo mais do que isso. É a condição
básica e fundamental de toda a vida humana. E em tal grau que, até certo ponto,
podemos afirmar que o trabalho criou o próprio homem.”
77
77
ANTUNES, Ricardo. A dialética do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2004. p. 13.
163
Destarte, considerando o seu significado, é por meio do trabalho que o
homem edifica as próprias condições de produção material de vida, suscetíveis de
assegurarem a sua sobrevivência, mediante a satisfação, ou o suprimento de suas
necessidades básicas, de alimentação, habitação, vestuário, saúde, higiene, educação etc;
de tal sorte que, através do trabalho, o homem preserve sua sobrevivência física, mas
também o seu aprimoramento intelectual, possibilitando, deste modo, garantir-lhe
condições dignas de vida material, social, cultural, política etc.
TABELA 54: Município de Franca, pessoas de 10 anos ou mais de idade economicamente
ativas, ocupadas, desocupadas na semana de referencia e taxa de desocupação – 2000
Pessoas de 10 anos ou mais de idade FRANCA
Total Economicamente
Ativas
Ocupadas
Total de
pessoas
desocupadas
Taxa de
desocupação
(%)
1
235.562
149.985
136.924
13.061
8,7%
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do IBGE Censo Demográfico 2000.
Taxa de desocupação: total de pessoas desocupadas / população economicamente ativa
A conjuntura que se instalou no país, enquanto resultado da combinação de
variado elenco de fatores reduzida taxa de crescimento do produto real, taxa de juros
nominal elevada, carga tributária bruta sobre o PIB também elevada, acirramento da
concorrência interna e externa, obsessiva preocupação com a estabilidade de preços
convergente à política de metas inflacionárias potencializou-se, entre outros fatores, sob
a forma perversa de ampliação do desemprego, que atingiu mais acentuadamente as
aglomerações urbanas de maior porte, ou seja, as áreas metropolitanas. No ano de 2000, os
dados censitários do IBGE mostravam, para o estado de São Paulo, uma população
economicamente ativa de 18.259.930 pessoas com 10 anos ou mais de idade, sendo que,
deste total, 15.069.645 estavam na semana de referência ocupadas, o que resultou de uma
164
população de 3.190.285 de pessoas desocupadas, o equivalente a 17,4%, em termos de taxa
de desocupação, o dobro dos 8,7% apurados para o município de Franca.
TABELA 55: Pessoas de 10 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência por
grupos de horas habitualmente trabalhadas por semana em todos os trabalho em Franca
comparativamente ao estado de São Paulo – 2000
Total Até 14h 15 a 29h
30 a 39h
40 a 44h
46 a 48h
49h ou +
Est. S. Paulo
Franca
100,00%
100,00%
2,2
1,5
5,6
4,9
8,7
6,2
38,8
46,4
18,8
18,5
25,9
22,5
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE Censo Demográfico 2000
O paradoxo do tempo livre se faz presente, posto que, das pessoas de 10
anos ou mais de idade ocupadas na semana da referência no município de Franca, com
jornada de trabalho de 40 a 49 horas ou mais, encontramos, no ano de 2000, o equivalente
a 87,4% do total de pessoas ocupadas, conquanto, no estado de São Paulo, na mesma faixa
de horas trabalhadas, o percentual foi de 83,5%.
A década de 90 (em decorrência das medidas de política macroeconômica,
adotadas pelos governos pós ditadura militar, sobressaindo a ênfase por eles atribuída à
estabilidade dos preços), quer seja na atividade produtiva de modo geral (em razão do
aumento da concorrência, ou, através da recuperação do sistema de preços, etc) como no
mercado de trabalho, imprimiu uma outra dinâmica na economia brasileira, fato este
corroborado pelo ritmo da economia de Franca, visto sobre a ótica do aumento
significativamente imoderado do número de novos estabelecimentos.
TABELA 56: Município de Franca, unidades locais, empresas com CNPJ, segundo o ano
de fundação, pessoal ocupado, e salário médio nominal (em R$) – 1997.
165
ANO DE
FUNDAÇÃO
EMPRESAS COM
CNPJ (Unidades
Locais)
PESSOAL
OCUPADO
SALÁRIO MÉDIO
NOMINAL
MENSAL (em R$)*
Até 1969
1970 a 1974
1975 a 1979
1980 a 1984
1985 a 1989
1990 a 1994
1995 em diante
187
199
205
555
1.463
3.413
4.356
10.360
3.839
3.308
4.162
6.723
10.531
13.976
646,93
532,61
554,54
497,96
325,28
271,96
210,48
TOTAIS 10.478 51.899 393,76
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE, Cadastro Geral de Empresas 1998, Malha
Municipal Digital do Brasil: situação em 1997. Rio de Janeiro: IBGE, 1999.
* Salário Médio Nominal Mensal: resultado da divisão da massa total de salário e outras remunerações por
13 meses, dividido ainda pelo pessoal ocupado.
No que diz respeito às empresas com CNPJ (Cadastro Nacional Pessoa
Jurídica), referentes às unidades locais, de 1969 até 1979, o total de empresas elevou-se em
números absolutos de 118 novas unidades, o que resultaria no período, de uma média de
11,8 novas unidades locais por ano. Já, de 1979 até o ano de 1989, o número de empresas
com CNPJ aumentou de 1.158 unidades locais, resultando de um aumento médio anual de
115,8 novas unidades, significando, em relação ao período anterior, um aumento de 9,8
vezes. De 1989 até o ano de 1995 em diante, o número de unidades locais com CNPJ,
aumentou em números absolutos de 2.893 unidades, o que representaria em termos de
média, um aumento de 482,1 unidades locais ao ano (considerado o período de apenas seis
anos), isto é, 4,1 vezes maior que o período anterior. Assim sendo, do ano inicial de 1969,
até o ano de 1995, podemos identificar dois movimentos bem distintos: de 1969 até a
década de 1980, muito provavelmente, o número de novas unidades locais (com CNPJ)
crescia numa progressão aritmética, enquanto a população descrevia trajetória de
progressão geométrica; de 1980 em diante, acreditamos que o oposto seja verdadeiro, ou
seja, o número de unidades locais cresceu numa trajetória progressivamente geométrica, e
a população cresceu a um ritmo bem menor.
166
Quanto ao pessoal ocupado, as empresas cujo ano de fundação situou-se no
intervalo de 1969 até 1979, empregavam 17.507 pessoas, isto é, 33,7% do total; de 1980
até o ano de fundação de 1989, encontramos 10.885 pessoas ocupadas, o que representava
20,9% do conjunto total de pessoas ocupadas. De outro modo, as empresas com ano de
fundação mais antigo, de 1969 ao ano de 1989, juntas, ocupavam o equivalente a 54,6% do
pessoal ocupado.
Coincidentemente, as empresas mais antigas, segundo seus respectivos anos
de fundação, eram com base nos dados do Cadastro Geral de Empresas (CGE), aquelas
cujo salário médio nominal mensal situava-se em patamares mais elevados, basta, para
isto, verificar que as unidades locais com (CNPJ) cujo ano de fundação era de 1995 em
diante, pagavam um salário médio nominal mensal, 3,0 vezes menor que as empresas
consideradas mais antigas segundo o ano de fundação.
No ano de 2002, comparativamente ao ano de 1985, ocorreram no interior
da indústria de calçados do município de Franca, dois fenômenos significativos e,
diametralmente opostos, quais sejam: o número de plantas industriais existentes no ano de
2002, representava o equivalente a 3,3 vezes acima o número de plantas existentes no ano
de 1985, ou ainda, a quantidade de estabelecimentos classificados como “fabricação de
calçados” triplicou no espaço de tempo mencionado, e, o número de empregos existentes
no ano de 1985, sobretudo nas plantas industriais de maior porte, era superior ao total de
postos de trabalho existentes no ano de 2002. Diante disto, quando relacionamos postos de
trabalho e remunerações segundo o porte da planta industrial verificamos que o
desaparecimento das empresas de grande porte, em muito, contribuíram de maneira
negativa: deixando de absorver mão-de-obra disponível, destruindo postos de trabalho, e,
concomitantemente, colaborando para a queda da remuneração dos trabalhadores.
167
TABELA 57: Franca, indústria de calçados, estabelecimentos, postos de trabalho e
remuneração segundo o porte da planta industrial 1985 e 2002
1985 2002 Porte do estabelecimento
E T RN E T RN
até 4 pessoas
de 5 a 9 pessoas
de 10 a 19 pessoas
de 20 a 49 pessoas
de 50 a 99 pessoas
de 100 a 249 pessoas
de 150 a 499 pessoas
de 500 a 999 pessoas
1000 ou mais
59
39
50
56
49
36
20
09
02
147
255
704
1.7061
2.076
4.154
7.751
6.454
2.702
1,43
1,51
1,58
1,68
1,95
2,12
2,29
2,79
2,31
569
214
126
88
41
20
03
03
01
1.169
1.426
1.762
2.803
2.990
3.270
900
1.840
1.211
2.07
1,98
2,03
2,16
2,16
2,38
2,38
3,02
2,81
TOTAIS 320 26.004 2,29 1.065 17.371 2,32
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do RAIS/MTE (Relatório Anual de Informações Sociais
Ministério do Trabalho e Emprego)
E = estabelecimentos; T = postos de trabalho (formal) com vínculo ativo existentes em 31/12; RN =
remuneração dos postos de trabalho em quantidade de salários mínimos.
Podemos assim observar a estreita relação existente entre porte da planta,
postos de trabalho e remuneração, visto que, à medida que aumenta o porte da planta
(conforme o número de pessoas ocupadas), a quantidade de salários mínimos
correspondentes à remuneração dos trabalhadores também aumenta, nos dois anos
observados. Diante disto, supomos que a redução do número de plantas industriais (da
atividade de fabricação de calçados) de maior porte, verificado entre os anos de 1985 e
2002 (em razão da relação entre porte e remuneração), tenha, entre outros fatores,
contribuído para que ocorressem simultaneamente queda da renda per capita, combinada
com aumento da desigualdade distributiva da renda, uma vez que, de conformidade com os
dados do IPEA, o índice de Gini
78
, calculado para o município de Franca que, em 1991, era
de 0,463, passou para 0,510, no ano de 2000, ou seja, a distribuição da renda se tornou
mais concentrada. Como se não fosse ainda suficiente, além do problema relacionado ao
78
Índice de Gini (nota do IPEA): mede o grau de desigualdade existente na distribuição de indivíduos
segundo a renda domiciliar per capta. Seu valor varia de 0, quando não há desigualdade (a renda de todos os
indivíduos tem o mesmo valor), a 1, quando a desigualdade é máxima (apenas um indivíduo detém toda a
renda da sociedade e a renda de todos os outros indivíduos é nula).
168
encerramento das atividades de importantes empresas de grande porte ligadas à fabricação
de calçados, podemos afirmar que a conjuntura competitiva que, na década de 1990,
instalou-se no país, não fora produzida apenas pelo processo de abertura da economia e,
nem pelas medidas de política econômica (câmbio sobrevalorizado, juros elevados,
controle da inflação etc), mas o que também promoveu forte impacto sobre o setor de
fabricação de calçados foi o imoderado aumento das importações, uma vez que a partir de
1994, as importações de calçados, em relação ao produto da economia (PIB), passam de
14,6% e, progressivamente aumentaram até atingir em 1999 a casa dos 47,3%, cujo reflexo
sobre o setor indubitavelmente comprometeu a produção, o emprego e a própria renda do
trabalhador.
Segundo o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Calçados, Confecções
de Roupas, Saltos, Solas, Formas, Bolsas, Cintos, Luvas e Vestuário de Franca e
Região, nos últimos sete anos foram fechadas na cidade de Franca 28 fábricas,
totalizando o fechamento de 7.890 posto de trabalho na indústria calçadista local,
somando-se ainda 2.300 postos de trabalhos fechados por motivo de redução,
transferência e abertura de outras unidades em locais diversos, o que totalizou a
perda de 10.900 empregos. Entre os anos de 1997 e 1999, segundo o mesmo
sindicato, foram por motivos diversos, demitidos pela indústria de calçados local
21.623 trabalhadores, sendo que 39% foram demitidos só no ano de 1997
79
.
O fechamento de empresas, especialmente daquelas de grande porte, a
relocalização (abertura de outras unidades em locais diversos), a redução de postos de
trabalho, a reoganização da indústria francana de calçados, mediante intenso processo de
terceirização, sub-contratação, resultantes do acirramento da concorrência interna e
externa, produziram, sem dúvida, efeitos deletérios sobre o emprego na própria indústria,
além de ter precarizado as próprias relações de trabalho motivadas pela necessidade de
redução de custos da produção das empresas face ao processo de abertura da economia e
do impacto produzido pela conjuntura da estabilidade dos preços.
79
BRAGA, Hélio Filho. Globalização em Franca: reorganização industrial e a economia informal.
Dissertação de Mestrado FACEF: Franca/SP, 2000. p. 195.
169
Porém, outro fator que, sem dúvida, contribuiu para o agravamento dos
problemas econômicos e sociais do próprio município, foi a significativa queda das
exportações de calçados verificadas, principalmente, a partir do ano de1994, vis-a-vis ao
seu respectivo preço.
TABELA 58: Franca, índices de quantum e de preços das exportações de calçados (em %)
1984 – 2002
ANO ÍNDICE DE QUANTUM ÍNDICE DE PREÇO
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
100,00
64,19
54,24
47,70
54,44
56,48
53,05
42,16
63,72
86,63
69,42
44,14
36,14
28,24
21,44
24,21
33,08
37,12
35,61
47,92
50,61
52,47
63,62
68,31
64,79
69,58
74,08
73,94
76,67
83,86
100,00
98,63
65,45
94,23
84,99
87,24
81,76
79,76
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do SINDIFRANCA Sindicato da Indústria de Calçados de
Franca.
Índice base fixa: índice de quantum (1984 = 100,00) e índice de preço (1995 = 100)
FIGURA 13: Franca, índice de quantum e de preços das exportações de
Calçados (em %) 1984 - 2002
170
0,00
10,00
20,00
30,00
40,00
50,00
60,00
70,00
80,00
90,00
100,00
110,00
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
ÍNDICE DE QUANTUM
ÍNDICE DE PREÇO
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados SINDFRANCA
Os índices de quantum e de preço descreveram, ao longo do período
examinado, uma trajetória nitidamente inversa, pois, a partir de 1990, o índice de quantum
experimenta progressiva queda, enquanto o índice de preço, apesar de registrar também
queda, é, por sua vez, maior do que aquele dos anos de 1980, mas ainda assim, não
podemos negar que, ao lado da redução das quantidades exportadas, também ocorreu
significativa compressão do preço médio do calçado exportado, o que deve ao nosso ver,
ter também contribuído para o agravamento da redução dos postos de trabalho
concomitantemente à precarização do emprego na indústria de calçados local.
Nos anos 90 os sinais de desestruturação do mercado de trabalho tornaram-se
ainda mais evidentes. Observa-se nessa década um movimento de
171
desassalariamento, provocado fundamentalmente pela eliminação dos empregos
com registro, que representavam 38,3% da PEA ao final da década de 80 e
chegam a 26,5% em 1999. Chama a atenção também a forte elevação do
indicador de precarização, que passa de 35,6% da PEA em 1991 para 42,7% em
1995, e 48,9% em 1999 [...] Desassalariamento, precarização e desemprego
parecem ter sido as palavras de ordem na implantação do projeto neoliberal para
o mercado de trabalho no Brasil dos anos 90
80
.
Diante destes argumentos, acreditamos que o processo de reestruturação da
indústria de calçados de Franca não só tenha provocado a redução dos postos de trabalho e
a precarização da estrutura dos empregos pelas vias da informalização, mas a necessidade
da redução dos custos da produção com o achatamento do salário dos trabalhadores deva
ter refletido, de forma negativa, no rendimento nominal desta categoria de trabalhadores.
Destarte, como a conjuntura que se instalou no próprio município notadamente no
período compreendido entre os anos de 1994 até o ano de 2002 tenha configurado uma
situação de retração geral da atividade econômica em razão da crise enfrentada pela
principal atividade da economia local, acreditamos, outrossim, que, entre outros efeitos,
um destes se manifestou na forma de aumento da desigualdade distributiva da renda
medida pelo seu respectivo grau de concentração (índice de Gini) conforme mencionado
anteriormente.
TABELA 59: Franca, moradores em domicílios particulares permanentes, segundo classe
de recebimento nominal médio mensal, total do recebimento e participação das classes de
recebimento – 2000
80
CARCANHOLO, Marcelo Dias. Abertura externa e liberalização financeira: impactos sobre
crescimento e distribuição no Brasil dos anos 90. Tese de Doutoramento. Instituto de Economia
(IE) UFRJ, 2002. p. 217.
172
Participação Relativa Total (%)
Classes de
recebimento
mensal médio
nominal da
pessoa
responsável pelo
domicílio (em
R$)
Total de pessoas
responsáveis
pelos domicílios
Total de
recebimento
médio mensal
nominal (R$)
Pessoas Recebimento
R$ 37,75
R$ 56,62
R$ 94,38
R$ 132,12
R$ 169,88
R$ 207,63
R$ 264,25
R$ 377,50
R$ 604,00
R$ 1.132,50
R$ 1.887,50
R$ 2.642,50
R$ 3.775,00
R$ 4.530,00
166
821
1.732
21.913
3.152
11.091
33.450
51.540
60.830
52.614
12.375
8.368
4.004
5.575
6.266,50
46.485,02
163.466,16
2.895.145,56
535.461,76
2.302.824,33
8.839.162,50
19.456.350,00
36.741.320,00
59.585.355,00
23.357.812,50
22.112.440,00
15.115.100,00
25.254.750,00
0,06
0,31
0,66
8,19
1,18
4,14
12,49
19,26
22,73
19,66
4,62
3,13
1,49
2,08
0,01
0,02
0,07
1,34
0,25
1,06
4,08
8,99
16,98
27,54
10,79
10,22
6,98
11,67
TOTAL 267.631
216.411.939,33
100,00
100,00
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do IBGE Censo Demográfico, 2000.
* Não consideramos a classe de pessoas responsáveis pelos domicílios particulares permanentes sem
rendimento.
O recebimento médio nominal mensal das pessoas responsáveis pelos
domicílios particulares permanentes do município de Franca, no ano de 2000, foi de R$
808,62. As classes de recebimento mensal médio nominal de R$ 37,75 até R$ 169,88
totalizaram 10,4% do total de pessoas responsáveis pelo domicílios particulares
permanentes, por sua vez, apropriaram-se de apenas 1,69% do total dos recebimentos
mensais nominais. Com recebimento médio nominal mensal entre R$1.887,50 e R$
4.530,00, encontramos 11,32% do total de pessoas responsáveis pelos domicílios
particulares permanentes, que se apropriaram de 39,6% de todo o recebimento médio
nominal mensal. Enquanto o primeiro grupo somou 27.784 pessoas com um rendimento
médio nominal deR$131.25, o segundo grupo, totalizou 30.322 pessoas responsáveis pelos
173
domicilios particulares permanentes, com um rendimento nominal mensal médio de
R$2.830,95, isto é, 21,5 vezes superior ao do primeiro grupo, e, 3,5 vezes maior do que o
valor médio nominal mensal total.
Se a distribuição da renda é desigual em conjunturas propícias ao
crescimento da economia, quem diria naquelas conjunturas marcadas pelas retração da
economia, sobretudo na década de 90, em que as empresas nacionais foram obrigadas a
rever, de forma mais intensa, suas estruturas de custos e despesas, principalmente, suas
próprias políticas de preços.
174
CAPÍTULO 5 - A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA NA
PERSPECTIVA DE UMA EMPRESA NOS ANOS DE 1998 A 2003
Conforme já assinalamos anteriormente, em razão da ausência de dados
estatísticos sobre o ramo de fabricação de calçados do município de Franca, recorremos
aos dados disponibilizados por uma empresa local, os quais são empregados e identificados
sob o codinome “empresa Kwanta”.
Esta empresa existe há bem mais de trinta anos. Desde a sua fundação,
fabrica calçados masculinos de couro, destinando parte da sua produção ao mercado
interno e outra parcela destina ao comércio exterior, e, que, de acordo com o número de
pessoas formalmente empregadas direta e indiretamente, pode ser configurada como uma
empresa de grande porte, além do que, pelo tempo que vem produzindo e distribuindo seu
principal produto pelo mercado brasileiro, e, em razão da constante dedicação à qualidade,
já é uma marca consolidada neste mercado, do mesmo modo, que também é uma grande
exportadora de calçados, enquanto resultado de sua maturidade e experiência alcançada ao
longo de sua trajetória.
Deste modo, em razão da carência de informações sobre este ramo da
atividade econômica local da indústria de transformação, assumimos a hipótese de que:
guardadas as devidas proporções, bem como os prováveis desvios, a “empresa Kwanta”
configura o padrão da indústria e, esta comporta, em certa medida, o padrão da referida
empresa.
Todavia, devemos considerar que, anteriormente (Pesquisa Industrial
Anual), examinamos dados gerais da indústria. Agora, estamos verificando dados gerais de
uma empresa em particular, portanto, corremos o risco de, ao generalizarmos alguns
conceitos, desviarmo-nos das particularidades, ao mesmo tempo e da mesma maneira que,
175
ao estudarmos o particular (a empresa adotada como referência), correspondente é o risco
de estabelecermos conceitos genéricos.
Deste modo, os indicadores antes examinados: produtividade dos
trabalhadores (expressa em unidades monetária), markup; razão entre os custos variáveis
(consumo intermediário e remunerações); a participação relativa do consumo intermediário
e das remunerações no valor total da produção; o valor adicionado bruto; e o excedente
operacional bruto, na perspectiva da indústria brasileira de calçados, são, daqui em diante,
apurados de acordo com os dados obtidos da empresa referendada. Contudo, convém
explicar que dadas as dificuldades de obtenção de informações mais detalhadas
considerando o nível de detalhamento encontrado na metodologia empregada pelo IBGE -,
faremos, diante disto, adaptações, as quais obedecem às seguintes denominações:
I) V.P. = o valor da produção, corresponderá ao traduzido na forma do faturamento total
expresso em reais (R$) dos mercados interno e externo;
II) Pmv = preço médio de venda do mercado interno e da exportação, indicador que passa a
ser incorporado aos demais, posto que, por terem sido informados, as quantidades
produzidas e, o faturamento de ambos os mercados (interno e externo), logo sendo possível
apurá-los, assim o fizemos, em se tratando de serem ambos de grande valia para este
estudo;
III) o pessoal ocupado (P.O.) refere-se à média anual do total de pessoas direta e
indiretamente ligadas à produção formalmente empregadas;
IV) o consumo intermediário (C.I.) matérias-primas, material de consumo, embalagens,
material secundário e componentes engloba a soma das compras (R$) anuais deste grupo
de materiais exceto a variação dos estoques (pois não foi possível obtê-la); e
V) Rn = o total das remunerações, o qual engloba os valores anuais dos salários (diretos e
indiretos) acrescidos dos encargos sociais.
176
Primeiramente, efetuamos os cálculos devidos sem, contudo, considerar os
custos indiretos, sendo que, num segundo momento, passamos a incorporá-los aos
cálculos. Importante ainda ressaltar que os dados doravante examinados não retratam ainda
a indústria francana de calçados, mas se trata de uma abordagem inicial que para nós é
tomada como referência.
TABELA 60: Empresa Kwanta, produção física, valor da produção (em R$) e preço
médio de venda dos mercados interno e externo 1998 a 2003
Produção Física (em
reais) MERCADO
Valor da Produção (R$)
1
MERCADO
Preço médio vendas
(R$)
Anos
INTERNO EXTERNO
INTERNO EXTERNO
INTERNO
EXTERNO
1998
1999
2000
2001
2002
2003
598.000
613.000
564.000
536.000
462.000
490.000
342.000
290.000
412.000
283.000
358.000
370.000
21.498.100
22.999.760
23.225.520
24.999.040
22.799.700
28.998.200
8.498.700
11.298.400
14.700.160
13.700.030
18.898.820
20.498.000
35,95
37,52
41,18
46,64
49,35
59,18
24,85
38,96
35,68
48,41
52,79
55,40
Fonte: Elaborado pelo autor de acordo com os dados fornecidos pela empresa Kwanta.
1. Valor da produção: expresso em milhões de reais
No período observado, a produção física média anual atingiu a casa dos
886,3 mil pares, sendo que, acima deste número, foram as produções referentes aos anos de
1998, 1999 e 2000, e, abaixo desta média, os demais anos. Já em relação ao
comportamento dos preços médios de venda praticado no mercado doméstico e na
exportação, apesar da ligeira redução do preço médio da exportação apurado no ano de
2000, comparativamente ao ano anterior, ambos os preços médios descreveram nítida
trajetória ascendente, acompanhando aparentemente a própria dinâmica interna da inflação
e dos custos da produção, como também refletem as condições da concorrência e das
flutuações cambiais, entre outros sintomas.
177
TABELA 61: Empresa Kwanta, variações da produção física e do preço médio (em %)
1998 a 2003
Variação Percentual (em%)
Produção Física
MERCADO
Preço Médio
VENDA
Anos
INTERNO EXTERNO INTERNO EXTERNO
1998
1999
2000
2001
2002
2003
-
2,5
-7,9
-4,9
-13,8
6,0
-
-15,2
42,1
-31,3
26,5
3,35
-
4,3
9,7
13,2
5,8
19,9
-
56,8
-8,4
35,6
9,0
4,9
Fonte: Elaborada pelo autor, a partir dos dados fornecidos pela empresa Kwanta
Enquanto a produção física, em termos de variação percentual, registrou
movimentos de sinal negativo em quatro anos, em sentido oposto, os preços médios de
venda descreveram, de forma irregular, trajetória ascendente, excepcionalmente no ano de
2000, o que deve englobar variado conjunto de motivos, além dos que já foram
mencionados.
TABELA 62: Empresa Kwanta, valor da produção, salários e encargos, consumo
intermediário, valor adicionado bruto e excedente operacional bruto (R$) e pessoal
ocupado 1998 a 2003
ANOS P. O. V.P.* R.N.* C.I.* V.A.B.* E.O.B.*
1998
1999
2000
2001
2002
2003
673
635
626
604
644
680
29.996
34.298
37.925
38.699
41.698
49.496
6.075
6.030
7.200
6.950
7.850
9.500
12.700
14.200
18.080
16.400
18.290
23.000
17.296
20.098
19.845
22.299
23.408
26.496
11.221
14.068
12.645
15.349
15.558
16.996
Fonte: Elaborada pelo autor, segundo dados fornecidos pela empresa Kwanta.
P.O. = pessoal médio anual empregado; V.P.
81
= valor da produção; R.N. = remunerações (salários +
encargos sociais); C. I. = consumo intermediário (valor anual das compras de matérias-primas, componentes,
material de consumo e de embalagem, material secundário exceto variação de estoques); V.A.B. = valor
adicionado bruto, resulta da diferença entre o valor da produção menos o consumo intermediário (V.A.B. =
V.P. C.I.); e E.O.B. = excedente operacional bruto, diferença do valor adicionado bruto menos as
remunerações (E.O.B. = V.A.B. RN)
* Todos expressos em milhões de reais.
81
V.P. = o valor da produção, conforme já dissemos, expressa o produto da produção física pelo
respectivo preço médio, exceto a variação de estoques de produtos acabados e em elaboração
conforme a metodologia adotada pelo IBGE.
178
Considerando, para efeito de cálculo do excedente operacional bruto,
apenas a diferença do valor adicionado bruto menos as remunerações, acreditamos que a
cifra calculada, talvez, não deva expressar a dimensão da realidade, pois conforme
analisamos anteriormente, segundo dados do IBGE/PIA (estrutura de custos e despesas e
receitas das empresas), estes, por sua vez, revelaram-nos um distanciamento muito estreito
entre custos totais e receita total, motivo pelo qual assumimos, para o cálculo mais
aproximado, a incorporação dos custos indiretos, os quais, por terem sido devidamente
informados, são deste modo utilizados para esta finalidade.
TABELA 63: Empresa Kwanta, remunerações, consumo intermediário, custos indiretos,
valor da produção e excedente operacional bruto (em R$ milhões) 1998 a 2003
ANOS R.N. C.I. C. Ind V.P. E.O.B.*
1998
1999
2000
2001
2002
2003
6.075
6.030
7.200
6.950
7.850
9.500
12.700
14.200
18.080
16.400
18.290
23.000
8.234
9.088
9.296
10.538
11.435
9.337
29.996
34.298
37.925
38.699
41.698
49.946
2.987
4.980
3.349
4.811
4.123
8.109
Fonte: Elaborada pelo autor, de acordo com os dados fornecidos pela empresa Kwanta.
E.O.B. = excedente operacional bruto, é o valor da produção menos as remunerações, consumo intermediário
e custos indiretos.
Diante dos valores obtidos, acreditamos que estes espelham de algum modo,
uma situação mais próxima da realidade. Contudo, verificamos a seguir, as remunerações,
o consumo intermediário e os custos indiretos, enquanto porcentagens do valor da
produção, posto que a soma dos custos diretos e indiretos, nos permitem visualizar os seus
respectivos pesos, os quais servirão posteriormente como referenciais importantes
82
.
82
Os dados do IBGE/PIA relacionados à estrutura de custos e despesas das empresas industriais,
segundo o grupo de atividades, mostram que no ramo de fabricação de calçados encontramos,
para a variável remunerações, nos anos de 1996 e 2002, os percentuais de 23,6%, e, 20,3%,
respectivamente, sobre o total de custos e despesas, enquanto para o consumo intermediário,
para os mesmos anos, a participação relativa do mesmo foi de 42,1%, e, 45,8% sobre os custos e
despesas totais, e, os demais custos (serviços de terceiros, manutenção, aluguéis e
arrendamento), demais custos e despesas operacionais e não operacionais, impostos e taxas e
depreciação, os percentuais para este grupo totalizaram 30,1%, e, 30,6% respectivamente.
179
TABELA 64: Empresa Kwanta, remunerações, consumo intermediário e custos indiretos
como porcentagem do valor da produção (em %) 1998 a 2003
ANOS R.N. / V.P. C.I. / V.P. C.Ind / V.P. TOTAIS (%)
1998
1999
2000
2001
2002
2003
20,3
17,6
18,9
17,9
18,8
19,2
42,3
41,4
47,7
42,3
43,9
46,5
27,5
26,5
24,5
27,2
27,4
18,7
90,1
85,5
91,1
87,4
90,1
84,4
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com os dados da empresa Kwanta.
Se compararmos a participação relativa das remunerações segundo IBGE
Matriz Insumo Produto, fabricação de calçados no valor da produção com a empresa
examinada, a participação relativa das remunerações desta no valor da produção situaram-
se pouco acima da média nacional. Contudo, a participação relativa do consumo
intermediário, no valor da produção desta mesma empresa, ficou abaixo do percentual
nacional em aproximadamente 30,0% na média, se bem que os períodos são diferentes.
As remunerações, assim como o consumo intermediário (enquanto
proporções do valor da produção), mostram-nos certa regularidade no período, apesar de
que o segundo configurou oscilações mais acentuadas, enquanto os custos indiretos quase
que permaneceram inalterados, exceto no ano de 2003.
TABELA 65: Empresa Kwanta, produtividade do trabalhador, markup, razão entre os
custos, remunerações e excedente operacional bruto como proporção do valor adicionado
bruto 1998 a 2003.
ANOS p* K J
RN / VAB
(%)
EOB/VAB*
(%)
1998
1999
2000
2001
2002
2003
25.699
31.650
31.701
36.919
36.347
38.965
1,597
1,695
1,500
1,657
1,595
1,523
2,090
2,354
2,511
2,359
2,329
2,421
35,1
30,0
36,3
31,1
33,5
35,8
64,9
70,0
63,7
68,9
66,5
64,2
Fonte: Elaborada pelo autor, de acordo com os dados fornecidos pela empresa Kwanta.
* p = produtividade do trabalhador em reais (p = VAB / PO)
K = markup (K = VP / Rn + CI); J = razão entre os custos (J = CI / Rn)
** EOB / VAB = neste caso adotamos o valor inicial do excedente operacional bruto.
180
De acordo com os dados apurados, o comportamento da empresa examinada
no período considerado nos permite constatar:
a) o número médio anual de pessoas ocupadas oscilou de forma quase regular em
torno da média de 643,6 pessoas, onde, no limite inferior no ano de 2001, foram
empregadas 604 pessoas (-6,06%), e, no limite superior no ano de 2003, foram
empregadas 680 pessoas, uma variação positiva em relação à média de 5,75%;
b) a produtividade do trabalhador (expressa em unidades monetárias) experimentou
uma trajetória nitidamente expansionista, haja vista que, comparando o ano de
2003, com o ano de 1998, enquanto o total de pessoas ocupadas cresceu de apenas
1,04%, a produtividade, por sua vez, experimentou um aumento da ordem de
51,6%;
c) o markup situou-se acima daquele anteriomente apurado para indústria brasileira de
calçados, o que já era esperado, pois se trata de uma característica da
especificidade, uma vez que a empresa Kwanta, provavelmente, no quadro da
indústria de calçados nacional, não espelhe todas as suas matizes, mesmo porque é
importante destacar que a indústria francana de calçados é, na sua quase maioria,
especializada na fabricação de calçados masculinos de couro, diferenciando-se,
deste modo, dos demais fabricantes de calçados em função de um variado leque de
fatores, entre os quais, podemos supor que seja o preço médio de venda
considerando no caso tratar-se de um produto mais elaborado de maior valor
agregado entre outros aspectos -, contudo, mesmo assim, a empresa em questão
praticou um markup que, de certo modo, oscilou abaixo da média de 1,594 -,
entre 1,500 no ano de 2000 (-5,89%), e 1,695 no ano de 1999 (6,34%);
d) a razão entre os custos diretos (J) com certa irregularidade situou-se num patamar
ligeiramente inferior àquele apurado para o ramo de fabricação de calçados do
181
Brasil, porém, ainda assim, revela-nos o peso que a variável consumo intermediário
(matéria-prima, material secundário, componentes, embalagens etc) representa na
composição dos custos da produção;
e) quanto à participação das remunerações no valor adicionado bruto (Rn/VAB)
(apesar da mesma ter configurado certa regularidade no período observado, em
relação à mesma variável em dimensão nacional), no caso específico da empresa
kwanta, a proporção das remunerações, no valor adicionado bruto da mesma,
situou-se abaixo daquela apurada para a indústria brasileira;
f) contrariamente, a participação relativa do excedente operacional bruto no valor
adicionado bruto da empresa Kwanta, apesar de ter configurado no período um
comportamento quase estável, o mesmo, em comparação com a indústria nacional,
situou-se (em termos percentuais), em torno de 40% acima ao da média nacional; e
g) examinando em conjunto os indicadores (k, J. Rn/VAB e EOB/VAB) apurados,
podemos verificar que existe uma certa alternância de comportamento entre os
mesmos, pois, quando o markup aumenta, também aumenta o (EOB/VAB)
excedente operacional bruto sobre o valor adicionado bruto, porém, a proporção
das remunerações no valor adicionado bruto diminui, e, em sentido oposto, quando
a porcentagem das remunerações no valor adicionado bruto aumenta, no sentido
inverso se comportam o markup e o excedente operacional bruto.
182
TABELA 66: Distribuição funcional do EOB/Remunerações na indústria nacional e na
empresa Kwanta de calçados 1990 a 2003
ANOS* Fabricação de
Calçados
1
EOB/RN
ANOS Empresa Kwanta
EOB/RN
2
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996*
45,7
74,7
62,8
119,29
101,39
84,53
79,43
1998
1999
2000
2001
2002
2003
-
84,71
133,30
75,63
120,85
98,19
78,91
-
Fonte: Elaborada pelo autor, a partir dos dados do IBGE/SCN (Sistema de Contas Nacionais / Matriz Insumo
Produto) e dos dados disponibilizados pela empresa Kwanta.
1. Fabricação de Calçados: refere-se aos dados do setor de fabricação de calçados obtidos do Sistema de
Contas Nacionais Matriz Insumo Produto.
2. EOB/RN: refere-se ao valor inicial calculado para o excedente operacional bruto (EOB = VAB RN),
diferença do valor adicionado bruto menos as remunerações, para não divergir do cálculo adotado para o
setor de fabricação de calçados.
* Não dispomos dos dados do IBGE para os anos seguintes.
Em razão dos períodos de observação serem diferentes, a análise
comparativa entre os objetos contemplados fabricação de calçados em sua abrangência
nacional e a empresa Kwanta fica prejudicada, contudo, tanto uma como a outra apontam
para um percentual significativo em termos de apropriação do excedente em detrimento
dos salários e outras remunerações No entanto, a partir de 1992 até o ano de 1996, o
markup do setor de fabricação de calçados inicia um movimento de ligeiro declínio
analogamente ao comportamento do excedente operacional bruto, do mesmo modo, a
empresa Kwanta, pois simultaneamente, à medida que o markup aumenta (1999 e 2001)
aumenta o excedente operacional bruto. Já, nos anos de 2000, 2002 e 2003, ambos (markup
e EOB) descrevem trajetória decrescente
83
.
83
Com vistas a sintetizar o comportamento conjunto dos lucros e remunerações na economia
brasileira ao longo do período 1990/96, é possível perceber, em termos gerais, um movimento
geral de maior apropriação de lucros relativamente às remunerações para o conjunto da
economia. Na fase descendente do ciclo econômico, cresce a participação dos lucros sobre as
remunerações, fenômeno esse que se reverte na fase ascendente, mas é ainda positivo em 1996.
Do ponto de vista dos grandes segmentos da atividade econômica, entretanto, constatam-se, para
a agropecuária, um comportamento não-aderente ao ciclo e uma tendência praticamente contínua
de apropriação de lucros sobre remunerações para a indústria, [...] Dos outros dois complexos
medianamente concentrados, têxtil e calçados foi o que demonstrou o menor potencial de
apropriação de lucros sobre remunerações, com taxa anual média nula para a evolução da relação
EOB/Rn [...] (CARDOSO JR., op. cit., p. 49; 50; 52.).
183
Sem a devida pretensão de estabelecer alguma comparação por se tratarem
de subsetores distintos da atividade econômica da indústria de transformação, quais sejam
a fabricação de calçados e o segmento de farmacêutica e perfumaria, vale lembrar que este
último é considerado um setor oligopolizado, assim como os segmentos eletrônico,
químico, petroquímico, alimentar etc; apenas fizemos questão de enfatizá-los, pois, de
acordo com Cardoso Jr. “[...] Para a maioria deles, alem disso, o êxito explica-se, em
termos do movimento de apropriação de lucros sobre remunerações, por estarem à frente
dos processos de reconversão produtiva engendrados pelo novo paradigma tecnológico
[...]”
84
uma vez que, o setor de fabricação de calçados
85
situou-se entre aqueles com menor
potencial de apropriação de lucros.
No caso específico da empresa referendada, importa-nos ainda ressaltar que,
entre 1998 e 2003, comparando os movimentos do markup e das remunerações sobre o
valor da produção (Rn/VP), ambos descrevem trajetórias simultaneamente distintas e
invertidas.
Pelo fato de a empresa que estamos examinando ter disponibilizado as
informações de que precisamos, passamos finalmente para o cálculo de um outro
importante indicador, qual seja o preço unitário de custo, o qual, uma vez apurado, será,
em seguida, comparado ao preço médio unitário de venda, bem como, examinamos o
comportamento deste último comparativamente ao comportamento do markup. Para efeito
de simplificação adotamos a seguinte nomenclatura:
84
CARDOSO JR., op. cit., p. 52.
85
Comparando o setor de fabricação de calçados com o ramo da indústria farmacêutica e
perfumaria, segundo os dados do (SCN/MIP) Sistema de Constas Nacionais Matriz Insumo
Produto, notadamente as variáveis: remunerações, pessoal ocupado, valor adicionado bruto e
excedente operacional bruto; ao estabelecermos correlação entre estas obtemos como resultado:
a indústria farmacêutica remunerou (Rn/PO) 3,4 vezes acima em média do que o ramo de
fabricação de calçados; o valor adicionado (farmacêutico e perfumaria) representou em média 1,9
vezes ao da fabricação de calçados; e o EOB deste ramo na média foi de 3,12 vezes inferior ao do
setor de perfumaria e farmacêutica.
184
Pc = refere-se ao preço unitário de custo
Pv = preço médio total de venda (total porque expressa a média de ambos os
mercados). Assim sendo, o preço unitário de custo(Pc), será calculado da seguinte forma:
dividindo-se os valores referentes às remunerações, consumo intermediário e dos custos
indiretos pelas quantidades físicas totais produzidas, obteremos:
Rn/Q = da divisão do total das remunerações pelas respectivas quantidades produzidas,
obteremos o custo do trabalho, ou Ct;
CI/Q = o valor total do consumo intermediário, dividido pelas quantidades produzidas nos
fornecerá o custo da matéria-prima, ou melhor, o custo dos insumos, Ci; e
Cind/Q = dividindo o valor dos custos indiretos pelas mesmas quantidades físicas
produzidas apuraremos o custo indireto unitário, ou, Cind.
Deste modo, podemos dizer que o Preço de Custo, Pc poderá ser expresso
da seguinte forma:
Pc = Ct + Ci + Cind
lembrando que (como já apuramos), a soma destes componentes do custo da produção
totalizaram na média algo por volta de 88%, ou seja, aproximam-se ainda mais da
atividade industrial que propomos estudar.
TABELA 67: Empresa Kwanta, custos da produção, custo do trabalho, dos insumos,
indiretos e total 1998 a 2003
ANOS Ct (R$) Ci (R$) Cind (R$) Total (Pc) (R$)
1998
1999
2000
2001
2002
2003
6,46
6,68
7,38
8,49
9,57
11,05
13,51
15,73
18,52
20,02
22,30
26,74
8,76
10,06
9,52
12,87
13,95
10,86
28,73
32,47
35,42
41,38
45,82
48,65
Fonte: Elaborada pelo autor, segundo dados fornecidos pela empresa Kwanta.
185
Com base nos números apurados, verificamos no período 1998/2003, que o
preço de custo evidenciou movimento progressivamente crescente, sendo que, comparando
o ano de 2003 ao ano inicial, 1998, o aumento do mesmo somou 69,3%; o custo do
trabalho experimentou alta de 71,0%, enquanto o custo dos insumos despontou com
majoração de 97,9%, e os custos indiretos aumentaram de 23,9%, destacando ainda que o
custo dos insumos, em relação ao custo do trabalho (Ci/Ct), apontou-nos para um resultado
no qual seu respectivo valor representou senão ser 2,0 vezes superior ao custo do trabalho.
TABELA 68: Empresa Kwanta, preço de custo, preço de venda, markup e margem (z)
1998 a 2003
ANOS Pc (R$) Pv(R$) Pv-Pc / Pv K
1998
1999
2000
2001
2002
2003
28,73
32,47
35,43
41,38
45,82
48,65
31,91
37,98
38,86
47,25
50,85
57,55
0,099
0,145
0,088
0,124
0,099
0,154
1,597
1,695
1,500
1,657
1,595
1,523
Fonte: Elaborada pelo autor, de acordo com os dados fornecidos pela empresa Kwanta.
Ainda que o preço de custo por nós calculado represente algo em torno de
88% do seu valor total (100%), é perceptível com certa irregularidade não tão acentuada, a
estreita relação entre este e o preço de venda, do mesmo modo, quando observamos o
comportamento do indicador de margem (z) (diferença entre o custo de produção e o preço
de venda dividido pelo preço de venda) com o movimento descrito pelo markup (k),
verificamos estreita correlação.
186
5.1 A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA: O PROCESSO DE
CONSTRUÇÃO DE INDICADORES ECONÔMICOS
O Sindifranca (Sindicato da Indústria de Calçados de Franca) realizou, no
ano de 1984, um levantamento de dados gerais das empresa ligadas à atividade de
fabricação de calçados, o qual, por sua vez, reuniu informações de todas as empresas
sediadas no município de Franca, isto é, conseguiu avaliar todo o universo de empresas
fábricas de calçados, comércio varejista de produtos para calçados, fábricas de
componentes para calçados e prestadoras de serviços. Deste modo, diante da sua
abrangência, intitulou-se “Censo Industrial”. De acordo com os dados levantados
referentes ao exercício de 1983, foram totalizadas 400 empresas, das quais, 236
denominavam-se de indústria, 29 foram identificadas como sendo indústria de
componentes, 43 foram classificadas como indústria e comércio e, totalizando, 92 foram as
empresas prestadoras de serviços.
Do total das vendas anuais (expressas na unidade monetária vigente da
época), foi encontrado um valor da ordem (em CR$ 1000) de CR$ 241.787.148, que fora
destinado ao estado de São Paulo (CR$ 64.891.008), ou, de 27% do total, aos outros
estados (CR$ 85.529.244) ou, 35%, e ao exterior (CR$ 91.366.896) o maior percentual,
qual seja, 38%, o que não significa afirmar que normalmente a indústria calçadista local
destine este percentual de suas vendas ao mercado exterior.
Os dados censitários revelaram também que, medida em pares, a indústria
calçadista local possuía uma capacidade instalada anual de 36.778.656 pares, ou ainda,
3.064.888 pares de capacidade instalada mensal, e, que o grau de utilização da capacidade
instalada atingia, em termos anuais, algo em torno de 86,3%, restando, portanto, como
resíduo, 13,7% de capacidade ociosa anual.
187
Quadro 3: Município de Franca, dados gerais da indústria de calçados - 1983
PRODUÇÃO ANUAL PARES %
Calçado Masculino
Calçado Feminino
Calçado Infantil
Tênis
Outros calçados
23.370.780
2.707.992
1.479.300
3.398.280
206.880
75
8
5
11
1
MÃO-DE-OBRA PESSOAS FOLHA PAGAMENTO
Direta
Indireta
Total
(Anual)
25.864
2.324
28.188
(Anual) CR$ 1000
22.834,800
6.033,600
28.868,400
GRAU DE MECANIZAÇÃO INDUSTRIAL
Grau de mecanização Quantidade de empresas
Alto
Médio
Baixo
Não respondem
30
170
35
1
Fonte: Elaborado pelo autor, de acordo com os dados do Sindifranca Censo Industrial, 1983.
Não pretendemos estabelecer, de acordo com os dados revelados, conexão
com o tempo presente, para efeito de análise comparativa, mas apenas registrar que fora
este abrangente levantamento sobre a indústria de calçados de Franca, nenhum outro
trabalho ou mesmo até levantamento amostral foi feito de lá para cá, isto é, com base nos
números registrados pelo censo industrial, - nada de maior significado, incluindo
acompanhamento periódico das empresas de modo a alimentar a base censitária hoje, o
que possuímos é senão uma enorme lacuna sobre esta atividade econômica do município
de Franca
86
.
86
“Não existem dados que permitam avaliar diretamente o investimento na indústria de
transformação no Brasil no período até 1939. Porém, uma vez que nesse período o investimento
era quase inteiramente dependente de maquinaria importada, haveria a possibilidade de obter
uma estimativa aproximada desse investimento com base nos dados de investimento com base
nos dados de importação de maquinaria industrial. No entanto, as estatísticas brasileiras de
importação são praticamente inexistentes para o período até 1900, e por demais agregadas a
partir daí. Assim, o único caminho possível é trabalhar com dados de exportação dos principais
países fornecedores de máquinas e equipamentos industriais para o Brasil. Felizmente foi possível
obter esses dados dos quatro principais países industriais fornecedores de maquinaria industrial
para o Brasil, a saber: Grã-Bretanha, Estados Unidos, Alemanha e França“ (SUZIGAN, Wilson.
Indústria brasileira: origem e desenvolvimento. São Paulo: Hucitec; Unicamp, 2000, p. 384).
188
Destarte, devemos salientar que, atualmente, o Sindicato da Indústria de
Calçados de Franca divulga periodicamente (mensal) um conjunto de informações sobre a
mencionada indústria sob o título de “Informações Gerais sobre o setor calçadista”, o qual,
por sua vez, reúne dados variados sobre: população, piso salarial do sapateiro, número de
funcionários na indústria de calçados, grau de instrução dos funcionários das industrias de
calçados, número de industrias, capacidade instalada, tipos de calçados produzidos,
principais matérias-primas utilizadas, produção anual de calçados (milhões de pares),
vendas para o mercado interno (em milhões de pares), vendas para o mercado externo (em
pares e em US$), dados sobre as exportações de calçados, partes e componentes (em US$),
e, outras informações sobre o Brasil. Contudo, não existem informações relacionadas ao
faturamento (valor monetário das vendas para o mercado interno) e, ao preço médio
praticado nas vendas destinadas ao mercado doméstico, sobre o valor do consumo
intermediário (matéria-prima, componentes, material secundário, de embalagem e outros),
preço de custo, investimentos em máquinas e equipamentos e de expansão da capacidade
produtiva instalada, valor da folha de salários dos trabalhadores direta e indiretamente
empregados na indústria etc; o que dificulta sobremaneira o trabalho daqueles que
pretendem estudar com mais detalhes este segmento da atividade econômica local. Não
existe também um sistema de acompanhamento de dados nem conjunturais (de curto
prazo), como muito menos existe um relatório anual que possa traduzir, de forma mais
precisa, a realidade da indústria calçadista. Enfim, não nos cabe aqui lamentar, mas sim, à
medida do possível e, de acordo com o que está disponível, procurar construir algo
suscetível de nos aproximar da realidade a que se pretende examinar.
Nosso primeiro passo, no sentido de construir os indicadores propostos, é o
de estimar a produção física total anual, cuja unidade de medida, é o número de pares. Para
tanto, empregamos as seguintes variáveis:
189
n = corresponde ao número de dias úteis efetivamente trabalhados;
T = refere-se ao total de postos de trabalho em 31/12 (do ano de referência), com vínculo
ativo formal, sendo que, este número foi obtido através do RAIS / MTE (Relatório Anual
de Informações Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego); e
p = denominaremos de produtividade média física anual do trabalhador (que será, em
seguida, explicada como foi apurada). Assim sendo, o cálculo da produção física anual de
calçados será o resultado da multiplicação destas variáveis, ou, de outro modo:
Q = T.n.p
Sendo que (Q) corresponde à quantidade anual de pares produzidos.
Para efeito de cálculo da produtividade média do trabalhador, recorremos mais
uma vez aos dados fornecidos pela empresa Kwanta, pois, tanto dispomos da produção física e
do número de pessoas formalmente por ela empregadas, como também do número de dias úteis
trabalhados, logo, adotaremos a produtividade anual física do trabalhador da mencionada
empresa como referência para o cálculo da produtividade anual da indústria de calcados entre
os anos de 1998 a 2002. Porém, como nosso período de análise da indústria de calçados de
Franca inicia-se no ano de 1994 e se estende até o ano de 2002, assumimos para os anos de
1994, 1995, 1996 e 1997, um número médio constante.
TABELA 69: Cálculo da produtividade física do trabalhador da empresa Kwanta (1998-
2003)
Ano
Pessoal
Ocupado
Produção
Física * Total
(em Pares)
Dias Úteis
Trabalhados
p
1998
1999
2000
2001
2002
2003
673
635
626
604
644
680
940.000
903.000
976.000
819.000
820.000
860.000
216
216
229
226
226
224
6,46
6,58
6,81
5,99
5,63
5,65
Fonte: Elaborada pelo autor dados da empresa Kwanta.
p = produtividade física do trabalhador: produção física total anual dividida pelo pessoal ocupado e pelo
número de dias úteis.
Produção física total: é o total anual produzido para o mercado interno e mercado externo.
190
Para os anos de 1994 a 1997, adotamos a produtividade média de 6,18.
Assim, o cálculo da produção física total destes anos é efetuado com base em dois
indicadores variáveis, quais sejam, os postos de trabalho e o número de dias úteis, e um
indicador constante, qual seja a produtividade média do trabalhador (6,18).
TABELA 70: Cálculo da produção física anual estimada da indústria de calçados de
Franca 1994 a 2000
ANOS T p n Q
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
21.893
14.057
15.539
12.609
12.099
14.354
16.649
16.490
17.371
6,18
6,18
6,18
6,18
6,46
6,58
6,81
5,99
5,63
245
240
247
234
216
216
229
226
226
33.148.191
20.849.342
23.719.662
18.234.127
16.882.460
20.401.053
25.963.949
22.323.172
22.102.513
Fonte: Elaborado pelo autor dados dos Postos de Trabalho de acordo com RAIS/MTE
T = postos de trabalho com vínculo ativo (formal) em 31/12;
p = produtividade do trabalhador produtividade física;
n = quantidade anual de dias úteis trabalhados; e
Q = produção física total anual (expressa em milhões de pares).
TABELA 71: Comparativo entre produção informada (Sindifranca) e a estimada
ANOS SINDIFRANCA ESTIMADA
DIFERENÇA
ABSOLUTA
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
31.500.000
22.000.000
24.800.000
29.000.000
29.000.000
29.500.000
32.500.000
32.500.000
30.000.000
33.148.191
20.849.342
23.719.662
18.234.127
16.882.460
20.401.053
25.963.949
22.323.172
22.102.513
+1.648.191
-1.150.658
-1.080.338
-10.765.873
-12.117.540
-9.098.947
-6.536.051
-10.176.828
-7.897.487
Total 260.800.000
203.624.469
-57.175.531
Fonte: Elaborado pelo autor Produção informada segundo o SINDIFRANCA.
Em termos percentuais, a produção que estimamos representou, no período,
em valores acumulados, 78,1% daquela acumulada e informada pelo Sindifranca, isto é, há
191
uma distorção próxima de 21,9% entre a produção estimada e a informada. Vale porém,
salientar apenas, que com uma exatidão interessante, a produção informada nos anos de
1998, 1999, 2000 e 2001, são repetitivas.
TABELA 72: Produção anual estimada destinada ao mercado interno
Ano
Produção Anual
Estimada (pares)
(A)
Exportações Anuais
(pares) (B)*
Produção Anual
Estimada destinada
ao mercado interno
C = (A) (B)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
33.148.191
20.849.342
23.719.662
18.234.127
16.882.460
20.401.053
25.963.949
22.323.172
22.102.513
11.656.119
7.412.321
6.069.191
4.742.371
3.600.075
4.065.523
5.555.467
6.232.286
5.979.985
21.492.072
13.437.021
17.650.471
13.491.756
13.282.385
16.335.530
20.408.482
16.090.886
16.122.528
Fonte: Elaborada pelo autor * SINDIFRANCA
Temos, assim, do total estimado da produção anual física, as respectivas
quantidades físicas anuais destinadas ao mercado interno e, as exportações pela indústria
de calçados de Franca entre os anos de 1994 a 2002.
Para calcularmos o valor monetário das produções destinadas ao mercado
interno e a exportações, definimos que:
a) entre 1994 e 1997, o preço médio do mercado interno (por falta de informações,
referência) será igual ao praticado na exportação;
b) de 1998 a 2002, o preço médio do mercado interno será o preço do mercado interno
apurado e praticado pela empresa Kwanta, tomado como referência, porém
multiplicado por 80%, pois, considerando o conjunto, a indústria de calçados
francana deva produzir calçados de menor preço unitário de venda, dada a variada
tipologia de calçados masculinos produzidos.
192
TABELA 73: Exportações de calçados de Franca, quantidade em pares valor (em US$) e
preço médio (em US$) – 1994 a 2002
ANOS
Quantidade de
pares exportada
Valor das
exportações (US$)
milhões
Preço Médio da
Exportação (US$)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
11.656.119
7.412.321
6.069.191
4.742.371
3.600.075
4.065.523
5.555.467
6.232.286
5.979.985
199.856.567
151.550.491
122.385.723
92.584.795
69.383.972
70.670.691
99.086.787
104.195.496
97.529.156
17,15
20,45
20,17
19,52
19,27
17,38
17,84
16,72
16,31
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados do Sindifranca
Como já temos o preço médio e o valor da produção destinada ao mercado
externo, falta-nos apurar o valor da produção e o preço médio da produção destinados ao
mercado interno, lembrando que, de 1994 a 1997, o preço médio da exportação e do
mercado interno são os mesmos. Assim, devemos então converter o preço médio da
exportação de (US$) dólares para (R$) reais, usando para a conversão a cotação do dólar
oficial.
TABELA 74: Calçados de Franca, preço médio da exportação em US$ e R$, e cotação do
dólar 1994 a 1997
ANOS
Preço Médio da (1)
Exportação (US$)
Cotação do (2)
Dólar Comercial
Preço Médio da
Exportação (R$)
1994
1995
1996
1997
17,15
20,45
20,17
19,52
0,8460
0,9072
1,0090
1,0812
14,51
18,55
20,35
21,10
Fonte: Elaborada pelo autor, de acordo com dados do (1) Sindifranca para preço médio da exportação de
calçados e (2) Banco Central do Brasil para cotação do dólar: valor calculado a partir da média aritmética
simples das cotações do último dia útil do 1º mês do ano e do último dia útil do último mês do ano.
193
TABELA 75: Preço médio do Mercado Interno e da Exportação em Reais
ANOS
Preço do
Mercado
Interno (R$)
Preço da
Exportação (em
US$)
Cotação do
Dólar
Preço da
Exportação (em
R$)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
14,51
18,55
20,35
21,10
28,76
30,01
32,94
37,31
39,48
17,15
20,45
20,17
19,52
19,27
17,38
17,84
16,72
16,31
0,8460
0,9072
1,0090
1,0812
1,1662
1,8861
1,8789
2,1458
2,9758
14,51
18,55
20,35
21,10
22,47
32,78
33,52
35,88
48,53
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com dados do Sindifranca e do Banco Central do Brasil.
Em seguida, calculamos, com base nas quantidades físicas estimadas da
produção destinada aos mercados interno e externo e seus respectivos preços médios de
venda, o valor bruto da produção da indústria de calçados de Franca do período de 1994 a
2002.
TABELA 76: Indústria de Calçados de Franca, produção física, preço médio e valor da
produção (R$) 1994 a 2002
Produção Física Estimada
Mercado
Interno
Mercado
Externo
Preço Médio de Venda
(R$)
MERCADO
ANOS
(em pares) (em pares) Interno Externo
Valor Total da
Produção *
(em R$)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
21.492.072
13.437.021
17.650.471
13.491.756
13.282.385
16.335.530
20.408.482
16.090.886
16.122.528
11.656.119
7.412.321
6.069.191
4.742.371
3.600.075
4.065.523
5.555.467
6.232.286
5.979.985
14,51
18,55
20,35
21,10
28,76
30,01
32,94
37,31
39,48
14,51
18,55
20,35
21,10
22,47
32,78
33,52
35,88
48,53
480.980.251,41
386.755.294,10
482.695.121,70
384.740.079,70
462.895.077,85
623.497.099,24
858.474.650,92
823.965.378,34
926.726.077,49
Fonte: Elaborada pelo autor, a partir de dados do Sindifranca para produção física exportada e preço médio
da exportação (US$).
* Valor total da produção: obtida pelo produto (das quantidades) da produção física estimada (mercado
interno e externo) multiplicada pelos seus respectivos preços médios.
194
Em seguida, devemos apurar os valores referentes ao consumo
intermediário e ao total das remunerações. Assim, começando pelo segundo
(remunerações), baseamo-nos nas informações (RAIS/MTE) Relatório Anual de
Informações Sociais Ministério do Trabalho e Emprego, referentes aos postos de
trabalho formal com vínculo ativo em 31/12, a remuneração média destes postos de
trabalho, em quantidade de salários mínimos, o valor do salário mínimo (em R$) vigente
no ano,e o total das remunerações (em R$).
TABELA 77: Indústria de calçados de Franca, postos de trabalho com vínculo ativo
(31/12), remuneração em quantidade média de salários mínimos, valor do salário mínimo
vigente e total das remunerações (em R$) - 1994 a 2002
ANOS
Postos de
Trabalho
(31/12)
Remuneração
média em
quantidade de
sal. mínimos
Salário Mínimo
Médio anual
vigente no ano
(em R$)
Total das
Remunerações
Anuais
Nominais
(em R$)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
21.893
14.057
15.539
12.609
12.099
14.354
16.649
16.490
17.371
3,46
3,42
3,15
3,01
2,69
2,62
2,66
2,42
2,32
67,39
85,00
106,00
116,00
125,00
133,00
143,50
165,50
190,00
66.362.109,76
53.122.808,70
67.450.137,30
57.233.259,72
52.887.753,75
65.023.332,92
82.616.167,27
85.857.328,70
99.542.778,40
Fonte: Elaborado pelo autor, segundo dados RAIS/MTE Relatório Anual de Informações Sociais
Ministério do Trabalho e Emprego e DIEESE (Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Sócio-
Econômicas) para o Salário Mínimo vigente.
* Total das Remunerações Anuais (R$): é o total dos postos de trabalho multiplicado pela remuneração
média em quantidade de salários mínimos, multiplicada pelo valor do salário mínimo (médio) anual vigente
no ano, multiplicada ainda pelo número de meses do ano (13), incluindo o pagamento do 13º e férias. O total
das remunerações refere-se à média anual da remuneração dos postos de trabalho com vínculo ativo segundo
a faixa de remuneração em salários mínimos
87
.
87
Visto que os dados RAIS (Relatório Anual de Informações Sociais) disponibilizados pelo
Ministério do Trabalho e Emprego, notadamente dos postos de trabalho formais com vínculo ativo,
somente retratam a situação em 31/12 do ano de referência, ou seja, não estão estes mesmos
dados sistematizados de outra forma, ou ainda, segundo um período maior de abrangência que
proporcionasse uma verificação mais significativa, ao longo do ano, mesmo porque, normalmente
o final do ano não retrata a situação ou o comportamento deste importante indicador, cientes disto,
mesmo assim, na ausência de informações de outras fontes, é conviniente adotar a fonte acima.
195
Até então, conseguimos estimar os números relativos ao valor bruto da
produção da indústria de calçados de Franca tanto da parcela destinada ao mercado
doméstico, como daquela cujo destino é o comércio exterior -, assim como, calculamos o
valor anual nominal total das remunerações referentes aos postos de trabalho com vínculo
ativo e formais da mesma indústria.
Dando prosseguimento ao processo de construção dos indicadores, agora
quantificamos o valor do consumo intermediário anual da mencionada atividade
econômica da indústria de transformação.
Destarte, devemos considerar que diversos fatores contribuem para que o
valor do consumo intermediário sofra no tempo alteração, visto que a quantidade
produzida que reflete o próprio nível da atividade econômica pode produzir variações para
cima ou para baixo do seu respectivo valor, assim como, também e, principalmente, as
flutuações do nível de preços das matérias-primas e materiais diversos, as variações do
câmbio, considerando possível dependência de insumos importados, como as variações de
estoques de matérias-primas, entre outros.
Assim, o consumo intermediário que nos servirá de referência é aquele
baseado nos valores dos custos das operações industriais obtidos através dos dados da
Pesquisa Industrial Anual, estrutura do valor da transformação industrial das empresas
industriais, grupo de atividade de fabricação de calçados enquanto porcentagem do valor
bruto dá produção industrial.
196
TABELA 78: Brasil, fabricação de calçados, custo das operações industriais como
porcentagem do valor bruto da produção industrial – 1996 a 2002
ANOS COI / VBPI
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
51,4
54,5
54,0
55,9
55,8
55,3
53,8
Fonte: Elaborada pelo autor, segundo dados do IBGE PIA Pesquisa Industrial Anual.
COI = o custo das operações industriais refere-se aos custos ligados diretamente à produção industrial, ou
seja, é o resultado da soma do consumo de matérias-primas, materiais auxiliares e componentes, da compra
de energia elétrica, do consumo de combustíveis e peças e acessórios; e dos serviços industriais e de
manutenção e reparação de máquinas e equipamentos ligados à produção prestados por terceiros.
Portanto, para efeito de cálculo do valor do consumo intermediário da
indústria de calçados de Franca, baseamo-nos nos percentuais obtidos (COI / VBPI) entre
os anos de 1996 a 2002, sendo que, como estamos examinando a indústria francana de
calçados, no período de 1994 até 2002, os percentuais para os anos de 1994 e 1995 são um
valor (em %) constante, resultante da média do COI/VBPI, que foi de 54,4%.
TABELA 79: Franca, indústria de calçados, estimativa do consumo intermediário da
indústria (em R$) 1994 a 2002
ANOS Valor da produção
(em R$)*
CI / VP (%)
1
Valor estimado do Consumo
Intermediário (em R$)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
480.980.251,41
386.755.294,10
482.695.121,70
384.740.079,70
462.895.077,85
623.497.099,24
858.474.650,92
823.965.378,34
926.726.077,49
54,4
(a)
54,4
(a)
51,4
54,5
54,0
55,9
55,8
55,3
53,8
261.653.256,77
210.394.879,99
248.105.292,55
209.683.343,44
249.963.342,04
348.534.878,48
479.028.855,21
455.652.854,22
498.578.629,69
Fonte: Elaborada pelo autor
* Valor da produção: refere-se ao valor total da produção de calçados ou valor bruto da produção industrial.
1. CI / VP = é o percentual adotado como referência do custo das operações industriais como porcentagem do
valor bruto da produção industrial calculado a partir dos dados fornecidos pela PIA Pesquisa Industrial
Anual / IBGE
(a) = média do COI / VBPI
197
Uma vez apurados o total das remunerações anuais nominais e o valor do
consumo intermediário, calculamos o valor total dos custos diretos (total das remunerações
somado ao consumo intermediário), assim como a porcentagem que ambos representam
sobre o valor bruto da produção industrial.
TABELA 80: Franca, indústria de calçados, valor bruto da produção, valor dos custos diretos
e custos diretos como porcentagem do valor bruto da produção 1994 a 2002
ANOS
Valor Bruto da
Produção (em R$)
Total Estimado dos
Custos Diretos (R$)
Custos Diretos em %
do Valor da
Produção
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
480.980.521,41
386.755.294,10
482.695.121,70
384.740.079,70
462.895.077,85
623.497.099,24
858.474.650,92
823.965.378,34
926.726.077,49
328.015.366,53
263.517.688,69
315.555.429,85
266.916.603,16
302.851.095,79
413.558.211,40
561.645.022,48
541.510.182,92
598.121.408,09
68,20
68,14
65,37
69,38
65,43
66,33
65,42
65,72
64,54
Fonte: Elaborada pelo autor.
Analogamente à empresa Kwanta, no que tange à indústria de calçados,
consideramos também os custos indiretos serviços prestados por terceiros, manutenção,
aluguel e arrendamento, demais custos e despesas operacionais e não operacionais,
impostos e taxas e depreciação. Contudo, para a indústria de calçados local, adotamos os
percentuais do IBGE/PIA (Pesquisa Industrial Anual), para os anos de 1996 a 2002, e um
percentual médio constante (média de 1996 a 2002), para os anos de 1994 e 1995, cientes,
porém, de que ainda assim, não atingimos, na soma dos custos (diretos e indiretos), o total
de 100%, porém, um pouco menos distantes do que se desprezássemos os custos indiretos.
198
TABELA 81: Estrutura dos custos e despesas (em %) das empresas industriais, fabricação da
calçados , Brasil 1996 a 2002.
Participação relativa no total de custos / despesas (%)
Variável
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Serviços Industriais prestados p/
terceiros e manut.
Despesas c/ arrendamento
Aluguéis e arrendamento
Impostos e taxas
Depreciação
Demais custos e despesas oper
Despesas não-operacionais
4,12
0,35
0,60
0,36
8,79
15,11
0,80
3,96
0,25
0,55
0,36
8,58
14,58
1,03
4,18
0,17
0,54
0,38
9,09
14,37
0,75
3,53
0,11
0,41
0,37
10,36
14,41
0,63
4,73
0,09
0,46
0,44
7,01
14,41
0,42
4,87
0,12
0,46
0,52
8,05
13,69
0,42
5,01
0,09
0,37
0,76
10,16
13,84
0,40
TOTAL 30,12 29,31 29,48 29,82 27,56 28,13 30,63
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados do IBGE/PIA Pesquisa Industrial Anual.
Calculamos os percentuais do consumo intermediário, das remunerações
totais e dos demais custos e despesas (custos indiretos), para sabermos quanto estes
representam do total, devendo salientar que os dois primeiros (consumo intermediário e o
total anual das remunerações) são apurados como porcentagem do valor bruto total anual
da produção de calçados, enquanto os custos indiretos totais são baseados nos percentuais
acima apurados (Tabela 82). Cumpre, no entanto, lembrar que do mesmo modo que
anteriormente apuramos os custos unitários totais de produção do trabalho, do consumo
intermediário e, dos custos indiretos totais e comparamos com os preços médios de
venda (empresa Kwanta), do mesmo modo, procedemos para o caso da indústria de
calçados de Franca.
199
TABELA 82: Indústria de calçados de Franca, remunerações ,consumo intermediário, e
custos indiretos como porcentagem do valor bruto da produção 1994 a 2002
ANOS CI / VP (%) Rn / VP (%) Cind/VP (%)
CI + Rn + Cind
(%)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
54,4
54,4
51,4
54,5
54,0
55,9
55,8
55,3
53,8
13,8
13,7
13,9
14,9
11,4
10,4
9,6
10,4
10,7
29,3*
29,3*
30,1
29,3
29,5
29,8
27,5
28,1
30,6
97,5
97,4
95,4
98,7
94,9
96,1
92,9
93,8
95,1
Fonte: Elaborada pelo autor, segundo dados estimados para o consumo intermediário e valor da produção
Custos Intermediário e Custos Indiretos baseados nos dados do IBGE/PIA e remunerações segundo dados
RAIS/MTE.
* custos indiretos: baseados na média dos custos indiretos totais de 1996 a 2002.
A soma do consumo intermediário, das remunerações e dos custos indiretos,
como porcentagem do valor da produção, na média dos nove anos examinados, totalizou
97,5%, ou seja, o total destes componentes dos custos da produção da indústria de calçados
em estudo, ficou muito próxima dos custos totais da mesma. Devemos apenas ressaltar que
a empresa anteriormente examinada (Kwanta), por adotar provavelmente uma política de
remunerações diferente do conjunto da indústria de calçados, de uma forma geral, apontou-
nos para uma relação RN / VP acima da indústria.
Outro aspecto que julgamos relevante considerar apenas para efeito
puramente explicativo que talvez possa assumir inclusive a condição de justificativa -,
refere-se aos dados relacionados à produção física da indústria de calçados, especialmente
no que se relaciona à diferença entre a produção informada (Sindifranca) e aquela por nós
estimada, posto que, sem a devida pretensão de julgar, muito menos fazer juízo de valor,
mas, somente para efeito de constatação, recorremos aos dados disponibilizados pelo IBGE
através da PIM Pesquisa Industrial Mensal / Produção Física, Produção Física Industrial
200
(Número Índice), abrangência Brasil notadamente do índice de base física mensal com
ajuste sazonal (Base: média de 1991 = 100) que retrata, através deste, ou de outros índices,
o desempenho da atividade econômica da indústria de transformação, onde o subsetor
industrial, denominado calçados, pode ser examinado segundo os índices de abrangência
mencionados. Sendo assim optamos por examinar o período de 1994 a 2002, segundo o
índice mensal (Base: igual mês do ano anterior = 100) que compara a produção do mês de
referência do índice em relação a igual mês do ano anterior. Contudo, como não nos
interessa examinar os diferentes índices disponíveis de produção física, e ainda mais,
período tão extenso (108 meses), julgamos conveniente verificar os índices médio anuais
do referido período.
TABELA 83: Brasil, subsetor industrial de calçados índice médio anual da produção física
industrial (Base: igual mês do ano anterior = 100) – 1994 - 2002
ANO
ÍNDICE MÉDIO
ANUAL*
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
92,15
88,15
103,34
92,89
88,30
99,51
103,85
97,27
100,12
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da PIM (Pesquisa Industrial Mensal) Produção Física
Industrial (Número Índice) IBGE
* Tipo de Índice Índice mensal, convertido para média anual.
201
FIGURA 14: Brasil, subsetor de calçados, índice da produção física anual 1994 a 2002.
Fonte: Elaborado pelo autor segundo dados do IBGE/PFI Produção Física Industrial.
Verificamos, de maneira mais nítida, que, no intervalo de tempo
considerado, o subsetor de calçados na área de abrangência nacional, em se tratando de
produção física anual, registrou, nos anos de 1996, 2000 e 2002, índices de produção acima
daquele considerado base, ou seja, igual a cem. Porém, nos anos de 1995, 1997, 1998 e
2001, a produção física descreveu movimento de queda. Já em 1999, apesar de ter ficado
aquém do índice base, esboçou movimento de recuperação em relação ao ano anterior.
Deste modo, examinando o comportamento da indústria francana de calçados através da
produção estimada e daquela informada pelo Sindifranca, atestamos que:
em relação à produção estimada, registramos queda da produção nos anos de 1995,
1997, 1998 e 2001, recuperação, nos anos de 1996 e 2000, e ligeira queda em 2002,
ou ainda, praticamente o mesmo desempenho da indústria brasileira de calçados;
quanto à produção informada pelo Sindifranca, nos anos de 1996 e 2000, o
desempenho da indústria francana, em termos de produção física, aproximou-se da
indústria brasileira, especialmente o ano de 2000, do mesmo modo, o ano de 1995
também configurou comportamento idêntico ao da indústria brasileira. Contudo,
70
80
90
100
110
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Ano
Índice Anual
Indice médio anual
202
em sentido diametralmente oposto, foi o comportamento da indústria francana de
calçados nos anos de 1997, 1998 e 2001, pois enquanto esta nos aponta movimento
de expansão, aquela caminhava na direção da contração; e
se a indústria brasileira de calçados não pode ser considerada como referência, e o
desempenho da indústria de calçados de Franca, esboçou exatamente em termos de
produção física as quantidades informadas pelo Sindifranca, perguntamos então,
por que o número de pessoas empregadas foi por este ramo da indústria local
reduzido?
Retornando ao processo de construção dos indicadores da indústria de calçados
de Franca, calculamos o custo unitário do trabalho (Ct), o custo unitário do consumo
intermediário (Ci), o custo indireto unitário (Cind). A soma dos três nos fornece, como
resultado, o custo estimado total da produção, ou o preço de custo (Pc), o qual, por
conseguinte, é posteriormente comparado com o preço médio unitário de venda.
TABELA 84: Franca, indústria de calçados, estimativa de custos da produção 1994 a
2002
ANOS RN/Q
CT (1) R$
CI/Q
Ci (2) R$
Cind/Q*
Cind (3) R$
Pc (em R$)
4 = 1 + 2 + 3
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2,00
2,55
2,84
3,14
3,13
3,19
3,18
3,85
4,50
7,89
10,09
10,46
11,50
14,81
17,08
18,45
20,41
22,56
4,25
5,44
6,13
6,18
8,09
9,11
9,09
10,37
12,83
14,14
18,08
19,43
20,82
26,03
29,38
30,72
34,63
39,89
Fonte: Elaborada pelo autor segundo IBGE/PIA (Pesquisa Industrial Anual) RAIS/MTE (Relatório Anual de
Informações Sociais Ministério do Trabalho e Emprego.
Nomenclatura: RN/Q = é o total das remunerações totais anuais (em R$) dividida pela produção física estimada total
anual (em pares); CI/Q = corresponde ao valor total anual do consumo intermediário estimado (em R$) dividido pela
produção física estimada total (em pares); CIND/Q = é o total estimado dos custos indiretos (em R$) dividido pela
produção física estimada total anual (em pares), e PC = é o preço de custo (em R$) resultante da soma dos três
componentes dos custos da produção.
* O valor unitário do total estimado do custo indireto foi obtido através da multiplicação do valor da produção pelo
percentual do custo indireto dividido pela quantidade anual da produção estimada em pares.
203
Para apurarmos o preço médio unitário de venda, dividimos o valor total da
produção anual estimada (em R$), destinada ao mercado domestico e às exportações, pelos
respectivos preços médios de venda (em R$).
TABELA 85: Franca, Indústria de calçados, preço de custo e preço de venda 1994 a
2002
ANOS Pc (R$) Pv (R$)
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
14,14
18,08
19,43
20,82
26,03
29,38
30,72
34,63
39,89
14,51
18,55
20,35
21,10
27,42
30,56
33,06
36,91
41,93
Fonte: Elaborada pelo autor .
Após termos percorrido todo este caminho resultado da ausência de
informações desta e de outras atividades econômicas desenvolvidas no próprio município
prosseguimos com as análises subjacentes aos números que pudemos obter sobre a
indústria de calçados de Franca. Primeiramente, efetuando apenas a leitura dos dados
apurados, para, em seguida, empregando outro conjunto de indicadores (econômicos e
sociais), ampliarmos nossas reflexões a respeito da conexão entre estas duas dimensões da
realidade, a econômica e a social no quadro de referência circunscrito no interior da
atividade econômica da indústria de calçados.
5.2 A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA: ANÁLISE DOS
RESULTADOS
De acordo com os resultados provenientes do processo de construção de
indicadores econômicos, calculamos: o valor adicionado bruto e o excedente operacional
204
bruto, para depois então calcularmos os demais indicadores e, ao mesmo tempo,
procedermos quanto as devidas análises.
TABELA 86: Franca, indústria de calçados, valor da produção, valor adicionado bruto,
consumo intermediário, remunerações, e excedente operacional bruto (em R$) 1994 a 2002.
Indicadores 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
V.P.
C.I.
Rn
VAB
EOB
480,9
261,6
66,3
219,3
153,0
386,7
210,4
53,1
176,3
123,2
482,6
248,1
67,4
234,5
167,1
384,7
209,6
57,2
175,1
117,9
462,8
249,9
52,8
212,9
160,1
623,4
348,5
65,0
274,9
209,9
858,4
479,0
82,6
379,4
296,8
823,9
455,6
85,8
368,3
282,5
926,7
498,5
99,5
428,2
328,7
Fonte: Elaborada pelo autor.
* Os valores estão expressos em (R$ milhões), porém, para simplificar optamos por reduzir o número de
casas decimais.
VP = valor total da produção; CI = consumo intermediário; RN = total das remunerações anuais; VAB =
valor adicionado bruto (VAB = VP CI) e EOB = excedente operacional bruto (EOB = VAB RN)
De acordo com os valores estimados (considerando-os em termos nominais
e não reais ), verificamos que:
a) o valor da produção, no ano de 2002, comparativamente, ao ano de 1994,
experimentou uma variação positiva da ordem de 92,7% (2002 / 1994), porém,
entre os anos de 1994 até o ano de 1998, o seu comportamento esboçou, com
alguma irregularidade, uma trajetória caracterizada por compressão, isto é, pouco
espaço para ampliação dos preços, ou da quantidade produzida, ou até mesmo de
ambos;
b) o consumo intermediário, do mesmo modo (2002 / 1994) situou-se um pouco
abaixo, uma vez que o seu valor no ano de 2002, via-a-vis, ao ano de 1994, ficou
em torno de 90,5%;
c) o total das remunerações registrou variação positiva bem abaixo que os dois
indicadores anteriores, totalizando 50,0%;
d) o valor adicionado bruto, passou dos R$ 219,3 (milhões) para R$ 428,2 (milhões),
ou seja, 95,2% de variação percentual no comparativo 2002/1994; e
205
e) superando os demais indicadores, o excedente operacional bruto subiu da ordem de
114,8%, no ano de 2002, comparativamente ao ano de 1994.
Em se tratando do valor estimado por nós do valor adicionado bruto,
apenas para efeito de referência, julgamos conveniente recorrer aos dados divulgados pela
Fundação SEADE (Sistema Estadual de Análise de Dados) sobre o valor adicional fiscal
total, valor adicionado da indústria e o valor adicionado da indústria de couros e calçados
(disponíveis somente para os anos de 2000 e 2001), de modo que possamos, aos menos,
situarmo-nos sobre a magnitude deste indicador da atividade econômica do município.
TABELA 87: Município de Franca, Valor adicionado total, valor adicionado da indústria,
valor adicionado da indústria de calçados (em Reais) 1994 a 2001
Valor Adicionado (em Reais de 2002) ANO
Total
(R$ milhões)
Indústria
(R$ mil)
Indústria Couros e
Calçados
(R$ mil)
Estimado para a
Ind. Calçados
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2.026
1.299
1.145
1.103
1.083
1.012
1.003
1.049
1.170
651
570
515
480
438
430
451
n.d.
n.d.
n.d.
n.d.
n.d.
n.d.
343
349
219,3
176,3
234,5
175,1
212,9
274,9
379,4
368,3
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados da Fundação SEADE (Sistema Estadual de Análise de Dados)
* Valor adicionado estimado para a indústria de calçados
n.d. = não disponível
Nota da Fonte Valor Adicionado Fiscal Total: O Valor Adicionado Fiscal é calculado pela Secretaria da
Fazenda, e é utilizado como um dos critérios para a definição do Índice de Participação dos Municípios na
receita do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços ICMS. Ele é obtido, para cada município,
através da diferença entre o valor das saídas de mercadorias e dos serviços de transporte e de comunicação
prestados no seu território, e o valor das entradas de mercadorias e dos serviços de transporte e de
comunicação adquiridos, em cada ano civil.
Quanto ao valor adicionado fiscal da indústria, devemos informar que se
refere ao valor adicionado de toda a atividade econômica inserida no quadro do setor da
indústria da transformação, e não somente a determinada atividade industrial
206
especificamente considerada. É interessante, no entanto, observar que, no ano de 2001,
comparativamente ao ano de 1994, o valor adicionado fiscal total caiu de R$ 2.026
(milhões) para R$ 1.049 (milhão), uma redução de 51,7%. O valor adicionado total da
indústria, do mesmo modo, reduziu-se de R$ 1.170 (milhão) para R$ 451 (mil), o que
representou uma queda de 38,5%, levando-nos, deste modo, a supor que ou houve, de fato,
uma significativa queda da produção de calçados (por ser a mais representativa atividade
da indústria de transformação) ou outros prováveis motivos justificariam tamanha,
compressão do valor adicionado total e da indústria
88
.
Basta examinarmos o valor adicionado fiscal, segundo dados da Fundação
SEADE sobre o município de Ribeirão Preto, que entre os anos de 1993 e o ano de 2001, o
valor adicionado total (bem como, o dos setores de comércio e indústria e serviços) fora as
flutuações normais, não registrou tão significativa queda como aquela verificada no
município de Franca, no mesmo período, motivo pelo qual acreditamos ser relevante
retratar um pouco mais esta questão, examinando, sob outro ângulo, o problema
relacionado à redução do valor adicionado da indústria de calçados, o que nos levou a
buscar informações relacionadas à evolução deste sub-setor da indústria de transformação
nas contas regionais especialmente do produto interno bruto a custo de fatores
89
segundo
os setores e sub-setores de atividade econômica do estado de São Paulo.
88
Apenas para efeito ilustrativo, baseando-nos nas informações sobre produção física de calçados
(Sindifranca), os preços médios de venda que estimamos e os percentuais estimados do consumo
intermediário, teríamos, para tanto, como cálculo para o valor adicionado bruto, (VAB = VP CI),
diferentemente do conceito de valor adicionado fiscal no caso usado apenas como uma referência de
indicadores , os seguintes valores correspondentes ao valor adicionado da indústria de calçados: em 1998,
o valor adicionado seria de R$ 458,8 (mil) em 1999, seria de R$ 528,2 (mil), em 2000 teria totalizado R$
561,9 (mil) e, finalmente no ano de 2001, o valor adicionado teria atingido R$ 690,9 (mil).
89
PIB a custo de fatores: O Produto Interno Bruto que é um valor costuma ser medido a preços de
mercado. Não obstante, pode ser medido a custo de fatores ou a preços de mercado com exclusão dos
impostos indiretos e subsídios. É que tanto os impostos indiretos como os subsídios não são considerados
remunerações aos fatores de produção (PINHEIRO, A.F. de Lima. Elementos de macroeconomia e
contabilidade nacional. 2. ed. São Paulo: Nobel, 1975. p. 40).
207
TABELA 88: Estado de São Paulo, Produto Interno Bruto a Custo de Fatores dos
subsetores de atividade econômica do vestuário, calçados e artefatos de tecido (em mil
reais de 1995) diversos anos
ANOS PIB a Custo de Fatores
1980
1985
1990
1994
1995
1996
1997
2.016.710
1.858.644
1.234.144
1.001.317
912.100
830.741
787.376
Fonte: Elaborada pelo autor a partir dos dados Fundação SEADE Sistema Estadual de Análise de Dados.
Ainda que os valores correspondentes ao PIB a custo de fatores englobe os
totais de três subsetores de atividade econômica, a queda abrupta do mesmo, no ano de
1997, em relação ao ano de 1980, representou 156% de redução do seu respectivo valor.
Vale reproduzir o comentário de Wilson Cano sobre estes indicadores: “Os
índices da Indústria do Vestuário e Calçados são, no mínimo, intrigantes: a) em
1980 = 100, Brasil e São Paulo atingem a 96,7 e 92,8 em 1985, próximos à
média do setor industrial; b) com 1985 = 100 eles atingem 69,1 e 57,4
respectivamente, enquanto a média da indústria atingia 102,2 e 97,4. Como as
exportações do ramo passam de 400 milhões de US$ em 1980 a 1 bilhão em
1985 e 1,5 em 1992, os fenômenos de terceirização, informalização e sonegação
tributária devem ‘explicar’ essa inaceitável queda de sua produção
90
.
Supostamente, entre os prováveis motivos que mencionados anteriormente
acerca da queda do valor adicionado total e da indústria do município de Franca, estejam a
“terceirização, a informalização e a sonegação tributária”, conforme mencionado por Cano.
Cabe ressaltar que o valor adicionado fiscal sendo utilizado como um dos
critérios para o cálculo do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), representa, em
termos absolutos, uma soma de recursos a ser incorporada à receita municipal do setor
público, isto é, dos governos municipais. Descarte, a sua redução, proveniente de outros
motivos, como é o caso da sonegação tributária, pode, via de regra, produzir sobre as
finanças públicas municipais impacto negativo e indesejável. Poderá comprometer a
execução de políticas sociais direcionadas a segmentos carentes (de recursos financeiros)
90
PACHECO, op. cit., p. 148.
208
da população, dificultando as suas próprias condições de vida, devendo ainda ser lembrado
que, em municípios onde a receita tributária própria como porcentagem da receita total é
relativamente pequena, muito provavelmente, a dependência em relação ao valor das
receitas provenientes de retransferências (do Estado e da Federação) deva ser bem maior.
TABELA 89: Franca, Indústria de Calçados, pessoal ocupado, produtividade, markup,
razão entre custos, remunerações e excedente operacional bruto como proporção do valor
adicionado bruto 1994 a 2002
ANOS P.O. p K J RN/VAB EOB/VAB
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
21.893
14.057
15.539
12.609
12.099
14.354
16.649
16.490
17.371
12.412,8
15.545,0
17.550,8
17.239,9
22.075,4
25.454,2
26.967,5
28.781,3
29.928,8
1,466
1,467
1,529
1,441
1,529
1,508
1,529
1,522
1,549
3,942
3,960
3,678
3,664
4,726
5,360
5,798
5,307
5,001
30,23
30,12
28,74
32,67
24,80
23,64
21,77
23,30
23,24
69,77
69,88
71,26
67,33
75,20
76,36
78,23
76,70
76,76
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados estimados - Pessoal Ocupado (PO) e Remunerações (RN) dados
do MTE/RAIS (Relatório Anual de Informações Sociais)
p = produtividade (VA/PO); K = markup (VP/CI + RN); J = razão entre os custos (J = CI/RN).
Diante dos números mensurados para os indicadores elencados, podemos
verificar, para a indústria de calçados do município paulista de Franca:
I) de acordo com os dados obtidos do RAIS/MTE (Relatório Anual de Informações
Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego), o pessoal ocupado no subsetor de
fabricação de calçados quantidade de postos de trabalho com vínculo ativo em 31/12
a partir de 1999, experimentou um suave aumento até o ano de 2002, pois se
tomarmos o ano de 1998 como referência, houve um acréscimo de 5.272 pessoas
ocupadas, comparando o ano de 2002, com o ano de 1998, ou seja, um aumento da
ordem de 43,5%, apesar de que, quando observamos o ano de 2002 com o ano de 1994,
ocorreu uma redução em números absolutos de 4.522 pessoas ocupadas, ou, em termos
209
percentuais de 26,0%, menor, portanto, do que o aumento verificado de 1998 em
relação ao ano de 2002;
II) a produtividade (p) expressa em unidades monetárias, de 1994 até o ano de 2002,
revelou-nos um comportamento nítido de significativo e sucessivo aumento ao longo
do período, uma vez que, no ano de 2002, comparativamente ao ano de 1994, ocorreu
um aumento nominal da ordem de 141,1%. Isto significa dizer que o aumento da
produtividade foi 3,2 vezes maior que o incremento do total de pessoas ocupadas
(43,5%) entre 1998 a 2002;
III) no que diz respeito ao comportamento do markup, é interessante notar que, em 1995, o
aumento registrado em relação ao ano anterior foi pífio; já, em 1996, volta a subir em
ritmo mais acelerado que 1995; em 1997, sofre queda abrupta, para, a partir de 1998,
iniciar certa recuperação, atingindo seu ponto mais alto em 1999, coincidentemente, o
ano em que inclusive o excedente operacional bruto (como porcentagem do valor
adicionado bruto) atinge o seu maior percentual;
IV) quase que concomitante ao comportamento do markup, a razão entre os custos (J), no
período de 1994 até o ano de 1997, com alguma irregularidade, descreveu uma
tendência suavemente declinante, ao passo que, de 1998 até o ano de 2002, seu ritmo
inversamente ao anterior, evidencia movimento nitidamente expansionista;
V) quanto às remunerações, nos primeiros quatro anos do período examinado, isto é, de
1994 até o ano de 1998, o seu desempenho apontou-nos ainda que timidamente para
aumentos constantes. Contudo, a partir do ano de 1998, de forma progressivamente
decrescente, descreveu queda aparentemente suave, entretanto, comparando o ano de
2002 com o ano de 1994, verificamos que ocorreu uma redução da ordem de 23,12%; e
VI) o excedente operacional bruto (como porcentagem do valor adicionado bruto), durante
o período de 1994 a 1997, no sentido inverso das remunerações, experimentou ligeira
210
redução, entretanto, com a recuperação do markup a partir de 1998, combinada com a
redução da participação das remunerações, esboçou um ritmo diferente marcado por
tênue movimento de ampliação, e que, se compararmos o ano de 2002 com o ano de
1994, o aumento do excedente operacional bruto foi de apenas 10,02%, contrariamente
às remunerações que sofreram redução.
TABELA 90: Franca, Indústria de Calçados, consumo intermediário e remunerações como
porcentagem do valor da produção e relação entre excedente operacional bruto e
remunerações 1994 a 2002
ANOS CI/VP RN/VP EOB/RN
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
54,4
54,4
51,4
54,5
54,0
55,9
55,8
55,3
53,8
13,8
13,7
13,9
14,9
11,4
10,4
9,6
10,4
10,7
130,76
132,02
147,92
106,12
203,22
222,92
259,32
229,25
230,35
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados estimados Remunerações MTE/RAIS (Ministério do
Trabalho Relatório Anual de Informações Sociais).
O consumo intermediário, como porcentagem do valor da produção, oscilou
relativamente pouco em torno da média do período que foi de 54,4%, apesar da tímida
expansão entre os anos de 1999 e 2001. Entretanto, mesmo assim, revelou-nos que o seu
peso, no valor da produção, é representativo. As remunerações como porcentagem do valor
da produção apresentaram oscilações mais acentuadas em relação à média do período que
ficou em torno de 12,1%, aproximadamente. Porém, de 1998 até o ano de 2002, sua
trajetória experimentou ligeiro movimento descendente.
Quanto ao comportamento do excedente operacional bruto, o seu peso sobre
as remunerações descreveu dois movimentos distintos: a) entre os anos de 1994 e 1997,
seu traçado é decrescente; b) a partir de 1998, inicia movimento de recuperação apesar de
211
irregular, ou seja, oscilando para cima e para baixo, contudo, neste período, o seu aumento
contrasta com a queda das remunerações. Quando comparamos o excedente operacional
bruto como porcentagem das remunerações (EOB/RN) da indústria de calçados de Franca
com a empresa (Kwanta), acreditamos que a relação EOB/RN é menor na empresa
referenciada pelo fato desta remunerar o trabalhador com salários bem acima do conjunto
da indústria, posto que, enquanto a média da relação RN/VP na citada empresa foi de
18,78% (nos anos de 1998 ao ano de 2003), a indústria de calçados, de modo geral,
configurou uma proporção média de 12,08% (de 1994 a 2002).
TABELA 91: Franca, indústria de calçados, markup, remunerações e consumo
intermediário como porcentagem do valor da produção 1994 a 2002
ANOS K RN/VP CI/VP
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
1,466
1,467
1,529
1,441
1,529
1,508
1,529
1,522
1,549
13,8
13,7
13,9
14,9
11,4
10,4
9,6
10,4
10,7
54,4
54,4
51,4
54,5
54,0
55,9
55,8
55,3
53,8
Fonte: Elaborada pelo autor segundo dados estimados remunerações MTE/RAIS (Relatório Anual de
Informações Sociais Ministério do Trabalho e Emprego)
Quanto ao comportamento do markup, das remunerações e do consumo
intermediário (sendo os dois últimos em porcentagem do valor da produção), verificamos
que:
i) o markup, nos anos de 1994 a 1997, foi menor que no período subseqüente (1998 até o
ano de 2002);
ii) as remunerações como percentual do valor da produção situaram-se, entre 1994 e 1997,
num patamar um pouco acima do que aquele referente ao período seguinte (de 1998 a
2002);
212
iii) de 1994 a 1997, o consumo intermediário também como porcentagem do valor da
produção situou-se abaixo do período compreendido, entre 1998 a 2002, apesar do
movimento altista aparentemente suave ter-se iniciado de 1998 em diante, a exceção do
ano de 2002; e
iiii) os três indicadores sinalizaram comportamentos distintos no período compreendido
por nove anos (1994 a 2002), pois, enquanto as remunerações representaram porcentagens
um pouco mais elevadas (em relação ao valor da produção), o markup foi menor, assim
como, o consumo intermediário. Contudo, a recuperação esboçada, a partir de 1998 do
markup, traduzido por um viés tendencialmente altista, foi seguida convergentemente por
um movimento contracionista das remunerações, indicando, deste modo, certa alternância.
Podemos ainda dizer que, analogamente ao traçado do markup, foi o
desenho esboçado pelo excedente operacional bruto como porcentagem do valor
adicionado bruto, que aumentou, exatamente no mesmo período que o markup, indicando-
nos certa relação.
Com tudo isso, pode-se afirmar que o perfil distributivo da economia brasileira
foi agravado na década de 90, por conta do processo de abertura externa,
intensificado pela sobrevalorização cambial entre 1994-1999 e pelas altas taxas
de juros, que provocaram o crescimento do excedente operacional bruto,
especificamente dos rendimentos financeiros, e a redução da participação salarial
na renda nacional
91
.
De alguma forma, este mesmo quadro pareceu-nos ser semelhante ao mesmo
que pudemos até então pincelar considerando as suas diferentes matizes - sobre a indústria
de calçados de Franca, em razão sobretudo da ligeira, porém, visível comprensão dos salários
dos trabalhadores.
No entanto, a redução dos salários não foi o único problema enfrentado pela
classe trabalhadora, pois, ao lado da perda de vínculos sociais resultante do rompimento dos
contratos de trabalho pelas vias da informalização, pela precarização das relações de trabalho,
etc.; outros graves sintomas foram também sentidos pela classe trabalhadora no Brasil.
91
CARCANHOLO, op. cit.,p. 127.
213
Em conseqüência do fechamento dos canais de articulação entre o aparato
governamental e os grupos de interesse, os empresários, que haviam participado
ativamente da campanha pela retirada do Estado da economia e pela abertura
política do regime militar, na expectativa de garantir maior espaço no processo
decisório, viram-se, como categoria, diante de uma nova situação de exclusão.
Os sindicatos, por sua vez, sofreram um profundo esvaziamento, em decorrência
dos efeitos combinados do desenvolvimento do novo paradigma tecnológico, das
políticas recessivas e do desemprego crescente. Dessa forma, durante a segunda
metade dos anos 1990, no que diz respeito à esfera federal, observar-se-ia o
reforço do distanciamento Estado-sociedade
92
.
Curiosamente, o Brasil dos anos 1980, viveu sob a tutela de governos ultra-
liberais de direita, onde o Estado exercia e garantia o seu poder através do aparelho repressivo
(política, exército, etc.) que castrava as liberdades individuais, mas, sua interferência na
economia era mais intensa, sobretudo nesta década, de significativo retrocesso político
combinado com a deterioração do quadro econômico matizado pelas nuances da inflação
associada à proteção da economia.
Os patrões estão atentos; e aproveitam-se da sombra do golpe de Estado e tentam
manobrar com o sindicato dos trabalhadores, usando dos variados artifícios de
que dispõem: a força de uma classe no poder de Estado; a coaptação da liderança
sindical na empresa; a política de corrupção do sindicato através de seus
representantes “pelegos” etc. para intimidar os trabalhadores francanos.
Os sindicatos em Franca apresentavam, até 1980, baixa quantidade de filiados, se
considerarmos o número de representantes da categoria profissional. No entanto
apresentam uma elevada capacidade de mobilização da massa trabalhadora, que
intimida a burguesia, quando saem à rua em suas lutas e reivindicações
93
.
Eis aqui uma situação no mínimo paradoxal, nos anos 1980, mesmo com a
ditadura militar que se instalara no país e, mediante o emprego do aparelho repressor e de
outros expedientes adotados pelo Estado com o propósito de manter e preservar a “ordem
interna”, a classe operária, conseguia apesar das dificuldades, significativa mobilização dos
trabalhadores que ainda assim, enfrentavam o poder repressor do Estado na luta contra a
exploração do capital. Contudo, na década de 1990, o aparelho repressor do estado fora
substituído pela constitucionalidade de um Estado democrático em substituição ao antigo
regime ditatorial, mas, apesar disto, o novo arranjo do sistema econômico capitalista ao
reforçar e defender a idéia baseada no Estado-mínimo (contrária à concepção do Wall-Faire
92
DINIZ, Eli. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais: Brasil anos 1990. Rio de
Janeiro: FGV, 2000. p.91.
93
CANÔAS, José Walter. O movimento operário-sindical em Franca/SP: o Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria de Calçados STIC e a ação do serviço social. Tese de Doutorado em
Serviço Social: PUC/SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1991. p. 175.
214
State, Estado do bem-estar social), revigora e enaltece o conceito de liberdade, concedendo
desta maneira passaporte de mobilidade total ao próprio capital.
Como resultado do processo de globalização e das políticas governamentais de
estabilização e de ajuste, notadamente a abertura comercial e a liberalização dos
fluxos financeiros, o setor empresarial passaria por profunda reestruturação e
renovação internas. Setores inteiros foram desativados ou desnacionalizados,
com os setores têxtil, de calçados, bens de capital, eletro-domésticos, produtos de
higiene e limpeza e autopeças, entre outros. Operou-se também um processo de
realocação industrial, com a transferência de indústrias tradicionais, como têxteis
e calçados para o Nordeste, atraídas por incentivos fiscais e pelos custos
diferenciais da mão-de-obra, enquanto, em outros setores, como na indústria
automobilística, observou-se um processo de relativa descentralização, dada a
tendência das novas fabricas de se estabelecerem fora de São Paulo, em busca de
benefícios fiscais, entre outros estímulos instituídos pelo regime automotivo de
1996
94
.
Diante desse quadro de intensa reestruturação produtiva da economia
brasileira, que resultou da ação conjugada dos processos de desestatização,
desnacionalização, fusão-aquisição, relocalização, redução dos custos da produção,
racionalização do processo de fabricação, “downsizing” (redução dos níveis hierárquicos
das empresas), combinada com os expedientes da política econômica que passaram a
vigorar a partir de 1994 período de maior intensidade do processo de abertura da
economia brasileira , os efeitos destes procedimentos produziriam impacto fulminante
sobre a atividade econômica, notadamente em razão do aumento inconseqüente das
importações, que por sua vez, desencadearia reação de sentido invertido sobre o nível de
emprego.
O Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Calçados STIC conta com 35.000
filiados em sua base, no município de Franca. Este sindicato, juntamente com os
cortumeiros dos condutores e dos profissionais de saúde, constituem a vanguarda do
movimento operário sindical francano, pela dinâmica de vida sindical que
desenvolvem e capacidade de mobilização das massas trabalhadoras locais para
organização e luta. [...] O que constatamos em 1982, em Franca, é que a dinâmica da
luta de classes em 1980, com a Pastoral Operária da Igreja Libertária, atingia parte do
clero local, que passa a se preocupar com a questão dos trabalhadores. O Estado, sob
o domínio dos militares, sofre pressões do conjunto da sociedade, que intensifica sua
mobilização para defesa do Estado de Direito, garantidor do exercício da cidadania..
Os próprios trabalhadores francanos, mobilizados para a defesa de seus direitos
sociais e sindicais, além da luta pela autonomia e democracia sindical, organizam-se
para a resistência e luta contra o capital. Passam a denunciar, a nível local, a
exploração do capital sobre o trabalho e reúnem-se com grande entusiasmo e
voluntarismo no partido político o PT
95
.
94
DINIZ, op. cit., p.92
95
CANÔAS, op. cit., p.178-281-282.
215
Decorridos mais de vinte anos (tomando por referência o ano de 1982), quando
então a classe operária sobressaindo os trabalhadores da indústria de calçados de Franca ,
possuía significativa capacidade de mobilização e organização em torno da “luta contra o
capital”, simultaneamente à sua reação de indignação e denúncia em termos locais sobre a
“exploração do capital sobre o trabalho”, principalmente pelo fato de tal comportamento e
procedimento, encontrar ressonância no interior do Partido dos Trabalhadores (PT), Ao
contrário, podemos verificar mais recentemente, isto é, do início dos anos 1990 para frente,
uma certa ruptura marcada pelo “distanciamento Estado-sociedade”, enfraquecimento e
“esvaziamento” dos sindicatos, sobretudo pela débil “capacidade de mobilização das massas
trabalhadoras”.
Estreitamente relacionado às novas tendências da economia e do mercado de trabalho
ganha expressão, em todo mundo, o crescimento de formas precárias de emprego e
de proteção social. A flexibilização do trabalho, que revalorizou o emprego em
tempo parcial, o auto-emprego, a atividade laboral temporária e a domicílio, trouxe
em seu rastro, as seguintes implicações para o trabalhador: fragmentação da força de
trabalho, enfraquecimento dos sindicatos, baixa remuneração, diminuição da
proteção social, baixo “status” , parca possibilidade de qualificação, redescoberta de
formas de subsistência precária e crescimento de pequenas firmas sem adequadas
condições de trabalho e de benefícios sociais correspondentes. [...] Surge, como
complemento o “dumping” social, mediante o qual desvalorizam-se os salários, os
direitos de cidadania e a proteção social pública, ao mesmo tempo em que aumenta a
produtividade capitalista
96
.
Na década de 90, ao contrário do decênio anterior apesar do autoritarismo
de direita proteger a economia da concorrência externa que coexistia com um quadro de
inflação crônica, a mobilização da classe operária era maior , percebemos a manifestação
de um vácuo deveras preocupante, posto que, com o fim do regime de supressão das
liberdades, patente registrada do grupo radical de direita os governos militares a
instalação de governos de vertente denominada democrática não favorecera os
trabalhadores no que diz respeito à sua respectiva capacidade de articulação, organização
mais consistente, reivindicação e mobilização, ao contrário, as estratégias adotadas pelo
96
PEREIRA, Potyara Amazoneida P. As políticas dos anos 90: crise ou reestruturação. Debates
Socais, Rio de Janeiro, v.31, n.57, 1999. p.70-71.
216
capital no interior de um sistema econômico que privilegia o mercado e prioriza o lucro,
acabam senão promovendo a troca de um regime político baseado na supressão das
liberdades, por um sistema econômico regido pela ditadura do mercado.
Diante disto, a classe trabalhadora, sobretudo os assalariados,
experimentaram nos anos 1990, mais uma vez, perdas irreparáveis.
As desigualdades no Brasil são antigas. O regime militar não foi capaz de
enfrenta-las e, hoje, sob o signo da ideologia neoliberal elas tendem a se agravar.
Isso porque, ao invés de se procurar reformar o Estado e redirecionar o setor
público para atender necessidades sociais, está se querendo restringir direitos
duramente conquistados desde os anos 30, sem se colocar nada no lugar
97
.
O Estado brasileiro, não foi capaz de remover o nó estrutural da repartição
da renda e da riqueza, quer seja sob tutela de regimes políticos mais autoritários, quer seja
nos períodos mais brandos, por isto mesmo, torna-se de difícil realização e efetivação a
instalação no país de valores tão significativos como democracia, autonomia, cidadania,
justiça, liberdade, etc.; principalmente para aquela parcela da população brasileira
economicamente deprimida e socialmente marginalizada situada nas camadas inferiores da
sociedade.
Para os trabalhadores de forma geral, os anos do último decênio do século
XX trouxeram, ao invés de esperança, mais angústia e desesperança. De acordo com os
dados da Fundação SEADE (em convênio com o DIEESE, em relação à Pesquisa de
Emprego e Desemprego na Região Metropolitana de São Paulo, sobre o tema relativo às
“Horas Semanais Trabalhadas pelos Assalariados no Trabalho Principal”), os assalariados
no ano de 1985 com porcentagem que trabalha mais que a jornada legal era de 26,1% do
total de assalariados, já, em 2003, este percentual subira para 44,0%. Na industria, em 1985
o percentual de 22,4%, atingiria no ano de 2003 a porcentagem de 43,2%, enquanto no
comercio, no ano de 1985, o percentual de assalariados que trabalhavam mais que a
97
POTYARA, op. cit., p.71
217
jornada legal era de 41,8%, chegara a totalizar 60,6% no ano de 2003. Ainda de acordo
com a mesma fonte, o rendimento médio real dos ocupados no trabalho principal segundo
setor de atividade econômica (em valores reais em novembro de 2003) na RMSP Região
Metropolitana de São Paulo , no ano de 1985 era em média de R$ 1.817, despencou no
ano de 2003, para R$ 931, na industria de transformação, o valor médio no ano de 1985
que era de R$ 2.118, cairia para R$ 1.053 no ano de 2003.
No mesmo sentido aconteceria com o rendimento médio real familiar e per
capita, pois no ano de 1986, o rendimento médio real familiar total de R$3.743
representando em termos de valor per capita R$ 1.205, sofreria queda acentuada no ano de
2003, passando para R$ 1.706 e R$ 652 respectivamente.
Assim, o quadro descrito para o Brasil de maneira geral, e , para a Região
metropolitana de São Paulo, guardadas as devidas proporções, não foi tão diferente daquele
que pudemos traçar para os trabalhadores da industria de calçados do município de Franca
no período compreendido entre os anos de 1994 a 2002. Entretanto, entre os motivos que
destacamos que de alguma forma contribuíram para a ocorrência da queda dos rendimentos
do trabalho referimo-nos aos rendimentos dos trabalhadores da indústria calçadista do
citado município , muito provavelmente outros tenham também colaborado.
Qualquer produto custa x para ser produzido e é vendido a um preço y. Y- x é o
lucro. Segue-se que quanto mais alto for y, e quanto menor for x, maior será o
lucro. Mas até que ponto é possível para uma empresa capitalista controlar o x ou
o y?
98
Estamos diante deste argumento de Wellerstein, fazendo referencia
exclusiva ao diferencial apurado entre o preço de custo e, o preço de venda, praticados
pela industria de calçados francana no período examinado, através da parcela da produção
destinada ao mercado norte-americano.
98
WALLERSTEIN, Immanuel. Utopística, ou as decisões históricas do século vinte e um.
Tradução de Vera Lúcia Mello Joscelyne. Petrópolis: Vozes, 2003. p.51.
218
TABELA 92: EUA, setor de manufatura, couros e produtos de couro segundo indicadores
diversos 1960 e 1997
Indicadores 1960 1997
W/VA 78,9% 55,9%
EOB/W 17,3% 76,1%
Sal. Médio Anual US$ 3.591,16 US$ 24.311,82
Empregos 362.000 93.000
EOB/VA 13,6% 37,7%
VA/Empregos US$ 4.549,72 US$ 49.043,01
EOB/Empregos US$ 621,54 US$ 18.494,62
Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com dados do Bureau of Economic Analysis BEA/Industry
Economic Accounts (census of manufactures)
Nomenclatura: W/VA = salários como porcentagem do valor adicionado; EOB/W= excedente operacional
bruto como porcentagem dos salários; Sal. Médio Anual = salário anual (em US$) médio por trabalhador;
Empregos = refere-se ao total de empregos durante o ano em mil pessoas; EOB/UA = excedente operacional
bruto como porcentagem do valor adicionado; VA/Empregos = refere-se ao valor adicionado por pessoa
empregada; EOB/Empregos = excedente operacional bruto por pessoa empregada.
Os dados apurados pelas informações censitárias sobre o setor de
manufatura norte-americana, couros e produtos de couro (leather and leather products) nos
anos de 1960 e 1997, permitem-nos constatar que:
a) a participação dos salários no valor adicionado (W/VA) de 78,9% no ano de 1960,
passou para 55,9% em 1997;
b) o excedente operacional bruto em porcentagem dos salários, inversamente ao item
anteior (W/VA), de 17,3% em 1960, saltou de maneira acentuada para 76,1% no ano
de 1997;
c) o salário médio anual de trabalhador subiu de maneira surpreendente de US$ 3.591,16
anuais em 1960, para US$ 24.311,82 por ano em 1997;
d) na contramão, o total de empregos neste subsetor da industria manufatureira norte-
americana sofreu drástica redução de 362.000 pessoas no ano de 1960, para 93.000
pessoas no ano de 1997, ou seja, uma diminuição da ordem de 289%
aproximadamente;
219
e) no ano de 1960, o excedente operacional bruto como porcentagem do valor adicionado,
de 13,6%, aumentou para 37,7% no ano de 1997;
f) quanto ao valor adicionado por pessoas empregadas, o valor médio em US$,
aumentou de dez vezes, de US$ 4.549,72 no ano de 1960, passou para US$ 49.043,01
no ano de 1997; e
g) finalmente, o excedente operacional bruto por pessoas empregadas aumentou de quase
30 vezes o seu valor de 1960, comparativamente ao ano de 1997, passando de US$
621,54 para US$ 18.494,62.
Diante destes argumentos seria evidente perguntarmos qual a relação disto
com a industria de calçados de Franca, especificamente com o problema inerente ao
rendimento dos trabalhadores.
Ora, de conformidade com os dados da mesma fonte (U.S. Buerau of
Economic Analysis) em 1978, o valor (em milhão de dólares) das importações norte-
americanas de calçados de couro, borracha e outros materiais (imports footwear of leather,
ruber and other materials) totalizaram US$ 2.634 (milhões), conquanto no ano de 2003,
este mesmo grupo de mercadorias importadas pelo Estados Unidos da América, atingiram
a cifra de US$ 11.875 (milhões), valor quase que cinco vezes maior ao de 1978.
Deste modo, entre as alternativas , ou, estratégias adotadas pelas empresas
norte-americanas, visando principalmente aumentar o excedente operacional bruto, não teria
sido substituir produção interna (em razão do percentual significamente elevado dos salários
no produto, basta verificar para o ano de 1960, a relação W/VA que situava-se na casa dos
78,9% ) por importação barata ,obtida de outros países, cujo custo da mão-de-obra não fosse
tão elevada?
A industria de calçados de Franca, no ano de 2002, exportou um total de
5.979.985 de pares de calçados, sendo que, desde mesmo total, 83,8% foram destinados aos
Estados Unidos da América, isto é, 5.001.227 de pares. O preço médio do calçado exportado
220
(preço médio de venda do produtor francano para o importador norte-americano) atingiu no
mencionado ano (de acordo com dados do Sindifranca) o valor médio de US$ 16,31.
Supondo que esse importador, vendeu os 5.011.727 de pares para os
consumidores norte-americanos ao preço médio de US$ 70,00 o par, a diferença entre o preço
de custo (US$ 16,31) e, o preço de venda (US$ 70,00), resultaria da transferência de um
excedente econômico (no ano de 2002 apenas) de Franca para os EUA, da ordem de
aproximadamente US$ 269.052.777,63 (milhões de dólares). Segundo a cotação do dólar de
2,9758, este mesmo valor na moeda nacional seria de R$ 800.647.255,67 (milhões), pequena
diferença, entre o preço de custo e o preço de venda.
Preço de custo menos preço de venda, uma distancia que pode ser grande ou
pequena, mas, com certeza, pode produzir grandes ou pequenas diferenças em se tratando de
situação econômica, social, política, etc.; de milhares de pessoas, uma vez que, o bem-estar
material, o conforto, a segurança, a inclusão, a autonomia, etc; de alguns poucos, pode ser
obtida através do sacrifício de muitos, que ao contrário, vivem o mal-estar, o desconforto, a
insegurança, a exclusão, a dependência, entre outros sintomas, entre os quais, pode significar a
perda do próprio sentido da vida, quando ao invés da liberdade, o homem sente-se prisioneiro
de si mesmo, por não conseguir libertar-se do domínio e da opressão de outros homens.
Com a ampliação do trabalho em domicílio, assistimos a uma retomada de um
recurso comum ao início do capitalismo industrial, mostrando a imensa capacidade
do capital recuperar antigas relações de trabalho para assegurar sua reprodução
ampliada. A polivalência, a multifuncionalidade e a rotação de tarefas parecem ser as
principais modificações na organização do trabalho implantadas em algumas
empresas de calçados de couro de Franca. Essas estratégias, apresentadas pelo
empresariado local como “modernas” e “racionais” representam, na realidade, para o
trabalhador, uma superposição de tarefas e a intensificação do seu ritmo de trabalho,
levando a uma dilapidação ainda mais intensa da força de trabalho alie empregada.
[...] Há de se destacar que resultou dessas mudanças a elevação da qualidade do
calçado masculino de couro produzido sem a incorporação significativa de meios de
produção mais avançados, o que possibilitou, para o setor calçadista francano, a
manutenção de um nível de rentabilidade calculado, para o mercado interno, 6, 5
vezes maior do que os setores que produzem calçados confeccionados com outros
materiais, como os esportivos tênis os de plástico, borracha, sintéticos e têxteis,
setores esses que alteram, significativamente, o nível tecnológico de sua base
produtiva
99
.
99
NAVARRO, Vera Lúcia. A reestruturação produtiva na indústria de calçados de couro em Franca
(SP). IN: ANTUNES, Ricardo; SILVA, Maria Aparecida Moraes (Orgs). O avesso do trabalho. São
Paulo: Expressão Popular, 2004. p.147-148.
221
Esses argumentos reforçam a questão anteriormente suscitada a respeito da
geração de excedente econômico produzidos pela indústria calçadista francana, pois,
segundo Navarro, “sem a incorporação significativa de meios de produção mais
avançados”, (o que supomos ser equivalente ao nosso enredo sobre a ausência de
investimentos), nos levam a acreditar que o excedente econômico não sendo convertido em
acumulação de capital, deva talvez, ser destinado ao consumo e ao aumento do ativo, isto
é, da riqueza daqueles que controlam os meios de produção.
O intenso processo de reestruturação produtiva promovido pela industria
calçadista local, teria se alicerçado sobre as bases da transferência de etapas do processo de
fabricação do produto (calçado) para terceiros daí o processo denominado terceirização
que resultaria da redução dos custos da produção para o produtor, sobressaindo os custos
da mão-de-obra, modificações no arranjo de máquinas e equipamentos, no aumento da
intensidade de trabalho, e, na redução da remuneração do trabalho.
222
PERSPECTIVAS
Ainda que, de maneira suscinta, procuramos esboçar um panorama do
problema distributivo da renda no Brasil em diferentes décadas, sobressaindo entre estas,
os anos 1980 e, a década de 1990.
Durante a década de 1970, mesmo com as virtudes do “milagre
econômico”, verificamos, que não ocorreu uma distribuição mais equilibrada do produto
da economia nacional, de sorte a favorecer o trabalho, ao contrário, pudemos, isto sim,
observar que os ganhos de produtividade não foram repassados aos salários dos
trabalhadores.
A década seguinte, marcaria o ingresso da economia brasileira num circuito
protagonizado pela inflação persistente, no qual, o índice geral dos preços, configurara
trajetória progressivamente ascedente. Assim, o crescimento da economia desenhava
movimento do tipo “stop and go”, isto é, crescia e parava. Ao mesmo tempo, a economia
de maneira geral ficou protegida da concorrência internacional, os investimentos capazes
de promoverem a expansão da capacidade de oferta e da atualização tecnológica foram
protelados. Assim, mais uma vez, os efeitos nocivos e corrosivos da inflação associados
com o expediente da política de achatamento dos salários, prejudicaram a distribuição do
produto em favor do trabalho.
Nos anos de 1990, a economia do país, enfrentaria um cenário nacional e
internacional significativamente diferenciado da década anterior. No plano interno, o
processo de redemocratização registrava o fim da ditadura de direita, e, no âmbito da
economia, a década de 1990, significaria a transição da inflação-proteção-atraso, para a era
da estabilidade-abertura-modernização. No front externo, o país enfrentaria uma
223
conjuntura marcada sobremaneira pelo acirramento da concorrência ditada por um
processo de globalização crescente, moldada pela competitividade, baseada na inovação
tecnológica, entre outros fatores.
Em tal contexto, inaugurou-se na economia brasileira, uma etapa de intensas
mudanças estruturais promovida pelos processos de desestabilização e desnacionalização
da economia, fusões e aquisições de empresas, que por sua vez, promoveriam a ampliação
da participação do capital estrangeiro no país. Simultaneamente, ocorreram também, de
maneira acentuada, os processos de relocalização industrial, combinados com a
intensificação de práticas gerenciais sedimentadas na redução abrupta dos custos da
produção movidos pelos expedientes da “terceirização”, da “subcontratação”, que,
impulsionariam de forma surpreendente o aumento da taxa de desemprego e a exponencial
ampliação da informalidade.
Tudo isto, somado aos ingredientes da elevada taxa de juros nominal, carga
tributária bruta sobre o PIB em movimento de continuada expansão, controle da inflação
convergente à política de metas inflacionárias, recuperação do sistema de preços, taxa de
câmbio etc; produziriam em termos de taxa real, um anêmico crescimento do produto
interno bruto, que, mais uma vez, ao encontrar ressonância nas praticas de flexibilização do
trabalho, promoveram o aviltamento do salário. O resultado foi senão, uma distribuição do
produto da economia em favor do capital, expresso na forma do excedente operacional
bruto, em detrimento do trabalho, expresso na forma dos salários, penalizando deste modo
a distribuição da renda.
Pudemos também, retratar de maneira discreta, a economia paulista na
perspectiva da rota dos investimentos segundo as suas respectivas categorias, subsetores
da atividade econômica e, sua localização espacial distribuída entre as Regiões
Administrativas do estado de São Paulo, no ano de 2003.
224
Neste contexto, procuramos inserir a economia do município de Franca
representada pela sua principal atividade econômica, a industria de calçados masculino,
para compreender como se processou a distribuição do produto deste subsetor da industria
de transformação, entre lucros e salários.
A década de 1970, consolidou a industria calçadista francana. Os anos 1980,
acreditamos que marcaram a sua estagnação. Em seguida, a década de 1990, representaria
a etapa da sua reestruturação, ou ainda, da sua reorganização.
Os anos 1980, em razão do quadro de instabilidade econômica pincelado
sobretudo pelas elevadas taxas de inflação e, do regime de proteção da industria,
combinado com a política de fomento às exportações (subsídios, desvalorização cambial),
promoveram o retardamento dos investimentos, os quais, pelo prolongamento da vida útil
das maquinas e equipamentos industriais aprofundaram a obsolescência e o atraso da
própria industria.
O incremento das exportações pelas vias do artificialismo do regime de
desvalorizações cambiais, seria reforçado pela ilusão protagonizada pelas vantagens
comparativas enaltecidas sobremaneira pelo baixo custo da mão-de-obra.
Apesar das dificuldades, a classe trabalhadora, encontraria na sua
capacidade de mobilização, o revigoramento necessário para promover embate mais
consistente contra o capital, na defesa dos seus direitos e das suas reivindicações.
A década de 1990, submeteria a industria de calçados e a categoria
profissional dos seus trabalhadores, a um vigoroso teste de força e resistência.
Em razão da intensidade das medidas política econômica, notadamente
aquelas que já mencionamos no período de 1994 a 1998, enfaticamente, as empresas
calçadistas do município de Franca para resistirem ao seu impacto, praticaram intenso
processo de reestruturação produtiva alicerçado nos pilares da terceirização e, da sub-
225
contratação, os quais, por conseguinte, ampliaram de maneira imoderada a informalização
do próprio setor, que, por sua vez, enfraqueceu a categoria profissional dos trabalhadores
desta atividade industrial. Assim, a força do capital, na luta pela sua sobrevivência no
quadro da abertura da economia, não encontrou como outrora, resistência por parte dos
trabalhadores.
Acreditamos que diante deste quadro conjuntural de acirramento da
concorrência e de reestruturação produtiva mais ampla, a sobrevivência biológica,
subordinou a consciência política e, fragilizou a capacidade de mobilização da classe de
trabalhadores da industria calçadista local.
Nesse cenário, as dificuldades da industria de calçados aumentariam de
maneira significativa, uma vez que, a má distribuição da renda no país, restringe o aumento
do consumo per capita do produto (calçados), o cambio que estivera apreciado de 1994 a
1998, desmontou a vantagem comparativa das exportações, a redução das alíquotas de
importação promoveram a invasão das importações que ao substituírem produção interna,
por importação barata, promoveram compressão da oferta seguida de aumento do
desemprego.
Como se isto não fosse ainda suficiente, os Estados Unidos da América,
ampliaram de maneira robusta as importações de calçados da China, e, reduziram as suas
compras (em volume de pares) provenientes da industria de calçados de Franca. Assim, a
economia do município de Franca vivenciaria uma situação de dificuldades crescentes,
pois, ao lado do aumento da informalidade da industria calçadista, ampliava-se a
informalidade do comercio varejista produzida pelo imoderado aumento dos vendedores
ambulantes, do mesmo modo, como a informalidade em seu traçado geral, corroia pelas
vias da sonegação de impostos, as finanças publicas municipais.
226
No ano de 1986, o número de empregados ocupados na industria de
calçados local, totalizara 36.000 pessoas aproximadamente, enquanto entre 1994 e 1998, a
média de funcionários empregados por este subsetor da industria, situou-se na casa dos
20.000 trabalhadores.
Diante dos indicadores de investimentos no estado de São Paulo, o
município francano mostrou-se pouco propenso a investimentos capazes de promoverem a
expansão da capacidade de oferta e modernização da sua industria principal, ou, transitar
pelas vias da diversificação.
A distribuição da renda, medida como vimos pelo coeficiente de Gini,
revelou-nos significativa concentração e aumento da desigualdade repartitiva entre os anos
de 1991e 2000.
Com uma reduzida renda per capita, a economia local restringe a
capacidade de ampliação da receita tributária própria, quer seja pelas vias da tributação
sobre a propriedade (IPTU), que seja, pelo imposto que incide sobre a atividade (ISS), do
mesmo modo, o baixo consumo, justifica e estimula os investimentos nas áreas de
alimentação (sobressaindo o comércio varejista de produtos alimentícios), serviços de
alimentação (restaurantes), bem como, o comercio varejista de vestuário, calçados e
acessórios, e o setor de serviços na área de saúde.
Considerando ainda que o município de Franca, é urbano-industrial, temos a
sensação de que o mesmo, basicamente se resume na dualidade de ser, um local de
trabalho e, de consumo.
Na perspectiva do desenvolvimento, entendido como processo capaz de
promover reformas estruturais mais amplas, e, ainda, proporcionar o desenvolvimento
pleno do homem econômico, social, político, intelectual, cultural etc. , acreditamos que
ainda temos muito que avançar.
227
Para isto, torna-se fundamental o estreitamento das relações entre as
instituições de natureza pública e daquelas de caráter privado forjadas pelo espírito da
prosperidade, amparadas pelo principio da complementariedade, visando sobremaneira a
promoção do homem na conquista da sua cidadania e autonomia.
Em razão da distribuição do produto da industria calçadista local, no
período por nós examinado, ter de alguma maneira favorecido os ganhos do capital, na sua
expressão dada pelo excedente operacional bruto, em detrimento dos salários, isto é, do
trabalho, resta senão na ausência de uma política de salários mais ativa por parte das
empresas, acreditar na possibilidade ainda que débil, de articulações e de mobilização da
classe trabalhadora.
Em se tratando da estreita relação entre o econômico e o social, falta-nos,
acreditamos, uma postura menos passiva e, mais ativa, da parte daqueles que atuam no
campo das políticas sociais, uma vez que, uma política social mais ativa, poderia em muito
proporcionar o desenvolvimento com autonomia, ao invés, da assistência subordinada.
Por outro lado, também carecemos de um projeto econômico suscetível de
contemplar as necessidades da economia local, com as mudanças em curso na economia
nacional e mundial, o que demandaria um esforço significativamente robusto de
articulação entre o poder público, as instituições de ensino superior, a classe produtora e, a
sociedade de maneira geral. Todavia, nem um , nem outro, ou seja, nem o social e, nem o
econômico, serão devidamente contemplados, ou, enfrentados de maneira mais ativa e
efetiva, caso não haja, vontade e determinação política.
228
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